Chamava-se Edge e era o último de um grupo de Imortais perseguidos e assassinados por Frank Stiles, um caça-vampiros empenhado em descobrir os segredos mais ocultos. A vingança se converteu na obsessão de Edge e, para realizá-la, teria que encontrar a jovem que os rumores diziam ser a Menina Prometida.
Amber Lily, um ser metade humano e metade vampiro, era a única que podia compreender o perigo que representava Frank Stiles, e a única capaz de encontrar seu ponto fraco... E fazê-lo encontrar-se com seu destino.
Embora Edge fosse um ser perigoso, Amber se uniu a ele na busca pelo caça-vampiros. Ao fazê-lo, deixava sua sorte a mercê da noite, de uma paixão possivelmente predestinada, de um mal que poderia ser mais forte que ela... E da escuridão onde só moravam os Imortais.
Verão de 1959
— O cara se mijou do susto que lhe dei — disse Bridget rindo, quando depois de cruzar o beco, saltaram à armação que restava da escada de incêndios e entraram por uma janela quebrada, aterrissando no andar de baixo. O armazém abandonado tinha o chão de madeira rachado por culpa daqueles impactos. Mas era o lar da Turma dos Cinco.
Edge amava muito à menina. Mas estava zangado com ela. Revolveu sua juba encaracolada. A menina tinha doze anos quando a transformaram; e continuava tendo-os, apesar de estar morta a mais de uma década. Edge a tinha encontrado na rua, perdida e sozinha. Abandonada por seu “sire”, por seu criador, igual a ele. Igual a todos eles.
— E quem demônios era? — perguntou.
Bridget deu de ombros e subiu por uma escada de mão até o segundo andar, aonde costumavam se reunir ao final do dia para repartir os lucros. Edge não subiu; saltou. Ao aterrissar levantou uma pequena nuvem de pó.
— Bela entrada — disse com sarcasmo Ginger sem levantar do chão, onde estava sentada. Estava vestida completamente de negro, usava o cabelo curto e as unhas afiadas como adagas e pintadas da mesma cor, como se tentasse dar vida a um clichê. Sacudiu o pó dos jeans negros como se Edge a tivesse manchado de propósito.
— Deixa de chatear, Ginger — disse Bridget.
— Fique calada, molenga.
Bridget deu meia volta e Ginger se levantou de um salto.
— Ok, ok! Parem agora! — Scott ficou em pé e se colocou entre elas. — Pode-se saber o que acontece?
Scott era magro, mas forte. Tão forte como qualquer um deles, ao menos; quer dizer, endiabradamente forte em comparação com os humanos. Mas, como vampiros, eram gatinhos. «Pintinhos», tinha ouvido Edge como os chamavam os mais velhos. Ginger e Scottie eram não mortos fazia menos de cinco anos. Ela tinha dezoito e ele um ano a menos quando se produziu a transformação. Uns pirralhos. Por esse motivo precisavam um do outro. E precisavam dele.
Ginger e Bridget não retrocederam.
A cabeça loira, os olhos azuis e a compleição enxuta de Scottie davam tão pouco medo como sua voz melosa.
— Fiquem quietas de uma vez — disse Edge com severidade.
As garotas piscaram arrependidas, e se separaram. Sempre seguiam suas ordens. Edge não tinha pedido o cargo de chefe daquela pequena turma, que tinha recaído nele de maneira natural. Era o mais velho. Tinha vinte e três anos quando o transformaram; era, pois, o mais velho do grupo. E também era um vampiro muito tempo antes que os outros. Tinha doze anos de transformação. Aquele esconderijo era dele. Eles o seguiram até a casa um a um formando ao seu redor aquela turma de vampiros sem teto. Uma progressão natural imaginava. Ele fazia parte de uma turma de garotos de rua da Irlanda no ano em que se transformou. Embora aquela turma fosse diferente. Eram meninos sem lar que tentavam mostrar uns aos outros quem mandava. Aquele pequeno grupo, em troca, converteu-se quase em uma família.
Edge amava a todos e a cada um deles. Cuidava deles. E, por alguma razão, eles confiavam que os protegesse. Por sua idade, por sua experiência, não sabia. Simplesmente, assim eram as coisas.
— Onde está Billy Boy? — perguntou Ginger. — Já deveria ter voltado.
Bridget deu de ombros e abriu sua mochila.
— Hoje fiz uma boa pilhagem — disse enquanto esvaziava seu conteúdo. Uma carteira, umas abotoaduras e um relógio muito caro caíram no chão.
— Bridget, já disse a você — começou a dizer Edge que não deve...
— Caramba, Edge, eu não tenho doze anos; só pareço — Bridget sorriu e em suas bochechas de menina apareceram umas profundas covinhas. — Deveriam ter visto esse cara — disse aos outros. — Acho que era universitário. Parecia muito jovem. Do primeiro ano, possivelmente. Notava-se que estava cheio da grana e que andava perdido. Certamente era a primeira vez que pisava na grande cidade. Vi-o na rua, dei uma olhada no Rolex que usava no pulso e achei que não podia deixar passar essa oportunidade. Assim me adiantei um pouco e esperei em um beco. Quando passou, chamei-o com minha vozinha de menina — suavizou a voz e elevou o tom até proferir um gemido agudo e suplicante. — Ajude-me. Por favor, senhor, me ajude.
Edge franziu o cenho, mas viu que os outros estavam com a atenção no relato.
— Assim que entrou no beco e pulei sobre ele — Bridget deu de ombros. — Deus, que fome tinha.
— Bridget, não o matou, verdade? — perguntou Scottie, olhando para Edge com preocupação. — Não queremos chamar a atenção.
— Não bebi o suficiente para matá-lo. Só lhe dei um bom susto. E saciei minha sede — lambeu os lábios e sorriu ao retomar seu relato. — Saltei sobre suas costas, rodeei-lhe a cintura com as pernas, coloquei os braços no pescoço e mordi com força. Assustou-se tanto que mijou nas calças! Eu me curvei de rir!
Scottie sacudiu a cabeça lentamente e resmungou: — Mas o que fez a você esse pobre tipo, Bridget?
— Deixa-a em paz, Scottie — ladrou Ginger. — Trata-se da sobrevivência do mais forte. Matar ou morrer. Fazemos o que temos que fazer. Além disso, não fez mal a ele.
— Tampouco tinha por que dar esse susto nele.
Bridget fez girar seus olhos.
— Só peguei seu relógio, sua carteira e umas abotoaduras — insistiu ela.
— Tirou-lhe muito mais, Bridget — disse Scottie. — Tirou-lhe a dignidade.
Edge estava de acordo.
— E, além disso, colocou em perigo a todos, Bridget — disse à menina. — O que acredita que esse tipo vai fazer? E se for à polícia ou à imprensa e falar de uma menina com força sobrenatural que lhe roubou a carteira e lhe mordeu no pescoço?
— Não o fará — disse ela com um sorriso. — Afinal, é um homem. Tem que pensar em seu ego. Basta ter que viver com essa lembrança. Não o dirá a ninguém. Além disso, quem ia acreditar nele? — sorriu. — Deveria tê-lo ouvido quando o deixei ali, jogado no lixo com as calças molhadas e o pescoço ensanguentado. Começou a me xingar, jurando que se vingaria. Então me voltei e disse a ele: «Sim, pois veja o medo que me dá um tio que mija nas calças por sentir medo de uma menina com os dentes afiados» — pôs-se a rir. — Ficou sem fala.
Edge suspirou e um sombrio pressentimento se apoderou de seu espírito. Bridget não estava desenvolvendo empatia com os outros, nem valores morais, apesar de seus esforços por lhe inculcar alguns princípios éticos, embora fossem mínimos. Toma só o que necessita, não faça mal gratuitamente a um inocente, essa espécie de coisas. Scottie tinha um coração grande como à noite, mas Edge suspeitava que já fosse assim antes de transformar-se. Ginger sempre tinha sido egoísta, e estava ficando cada vez mais, e Bridget não era o bastante mais velha para saber no que podia ter se transformado. Entretanto, parecia estar se moldando na imagem e semelhança de Ginger, mais que dos outros.
Edge tomou a carteira que Bridget tinha roubado, tirou a carteira de motorista e examinou sua fotografia, na qual via um jovem de aparência agradável, de olhos e cabelo escuros.
— Frank W. Stiles — leu. — Vinte e um anos — verificou o conteúdo da carteira, mas não encontrou nada de interesse, além de um cartão de visita com um número de telefone e as letras DIP gravadas em negro. Não sabia o que significava aquilo, mas no cartão figurava o nome I.D. Smith, e abaixo dele a palavra “recrutador”. Ao que parece, alguma empresa estava por trás do jovem senhor Stiles. Devia ser um grande estudante.
Edge suspirou e sacudiu a cabeça.
— O que está feito, feito está, suponho. Mas você e eu temos que falar Bridget — voltou a guardar a carteira de motorista e o cartão e atirou a carteira no chão. — E como foram os outros?
— Eu tenho setenta e cinco em moedas e três cartões de crédito — disse Scottie. — Usei essa técnica de controle mental que nos ensinou Edge. Se funcionar, nenhum lembrará de nada. E como só tirei um pouco de dinheiro e um cartão de crédito de cada um, pensarão que perderam os cartões e certamente nem sequer sentirão falta do dinheiro — olhou para Bridget enquanto falava, como se isso pudesse ajudá-la a captar a mensagem. — Vê menina? Pode-se fazer sem lhes dar um susto de morte e sem que todo mundo saiba que existimos.
Bridget lhe mostrou a língua.
— Eu consegui trezentos paus e um bracelete de diamantes — disse Ginger com certa petulância. — Uma só vítima. Fiquei na parte de trás da sua limusine, deixei inconsciente ao condutor e esperei. Quando entrou, roubei-lhe a bolsa e o bracelete e saí pelo outro lado. Nem sequer soube de onde vinha o golpe.
— Pobre perua rica, espero que não esteja muito traumatizada — disse Bridget.
Scottie sabia que o comentário era dirigido a ele.
— O fato de ser rica não significa que mereça que lhe façam mal ou que a assustem, Bridget.
Edge suspirou.
— Ponham o dinheiro na caixa. O resto usaremos — olhou o Rolex, que tinha o nome do Frank Stiles gravado na parte de trás. — Amanhecerá dentro de duas horas. Vou sair para procurar o Billy Boy. Preocupa-me que demore tanto.
— Quando teremos suficiente para sair daqui, Edge? — perguntou Bridget.
Bridget queria ter uma casa no campo. Um lugar seguro onde não tivessem que preocupar-se de que os descobrissem em algum dia ensolarado enquanto dormiam. Francamente, Edge acreditava que para isso precisariam de muito mais que a miséria que conseguiam com seus pequenos furtos. Teria que pensar num modo melhor de consegui-lo.
— Logo — disse a Bridget. — Muito em breve, meu bem.
Logo saiu. Mas não encontrou Billy Boy. Quando retornou ao armazém, pouco antes do amanhecer, encontrou a todos juntos. Estavam pendurados de cabeça para baixo na viga que sustentava o mezanino. Tinham cordas amarradas ao redor dos tornozelos e penduradas à viga. Em baixo deles, o chão estava empapado com seu sangue. Tinham todos eles a garganta cortada.
Ginger, Billy Boy, o doce e delicado Scottie, e sua querida Bridget. Mortos. Assassinados. Ao vê-los, ficou sem respiração e caiu de joelhos. Não precisava tocar seus corpos para saber que estavam mortos. O fedor do sangue era poderoso. Tinha-o sentido ao aproximar-se do armazém, e tinha percorrido a toda velocidade os últimos quarteirões.
Mas tinha chegado muito tarde. Seus pequenos inadaptados, aqueles pintinhos que dependiam dele para que os mantivesse a salvo, tinham sido assassinados.
Fechou os olhos, mas não conseguiu sufocar a dor. E por fim teve que desempenhar a espantosa tarefa que o aguardava. Tinha que ocupar-se deles pela última vez. Subiu ao mezanino para cortar as cordas. E ali, no chão, viu o montão de carteiras roubadas, dinheiro e cartões de crédito, no mesmo lugar onde tinha deixado. Havia alguns objetos a mais, sem dúvida roubo de Billy Boy. O bracelete de diamantes refulgia. Aparentemente, não tinha interessado ao assassino. E, entretanto, notou Edge, faltavam algumas coisas.
Franzindo o cenho, aproximou-se dos objetos. O Rolex não estava. As abotoaduras, tampouco. Nem a carteira pertencente ao jovem chamado Frank W. Stiles.
Edge piscou lentamente e compreendeu por fim que aquele homem tinha voltado. Vingou-se, tal e como tinha prometido. Edge ignorava como o tinha feito. Um homem contra quatro vampiros? Parecia impossível. E, entretanto, tinha acontecido.
Edge fechou os olhos e jurou vingar-se do homem que tinha matado a sua família.
— Pagará por isso, Frank Stiles — disse em voz alta. — Embora me custe toda a eternidade, encontrarei você e o farei pagar por isso.
Na atualidade
A mulher não podia saber que a estava esperando em seu apartamento quando entrou nessa noite. Não podia ouvi-lo, porque não fazia nenhum ruído. Não podia detectar seu calor corporal, porque não emitia nenhum. Tinha todas as vantagens. Podia vê-la tão bem na escuridão como se estivessem à plena luz do dia. Possivelmente melhor. Ouvia cada ruído que fazia, até o batimento regular de seu coração e o zumbido do sangue em suas veias. Podia cheirá-la. Shampoo de morangos, desodorante com aroma de talco, esmalte de unhas rançoso, um pingo de perfume; inclusive notava o leve aroma do amaciante que desprendia sua roupa.
Ela entrou no apartamento às escuras, fechou a porta a suas costas e jogou a chave sem acender a luz. Reclinou-se contra a porta e tirou os sapatos; logo se livrou da pesada bolsa e do casaco e os pendurou no cabide que próximo à porta. Mas não acendeu a luz.
Suspirou e cruzou descalça o tapete afundou-se no sofá e jogou a cabeça para trás. Era enfermeira em uma escola elementar de um povoado da Pennsylvania e passava o dia limpando narizes ensanguentados e examinando cabeças em busca de piolhos. O que distanciava muito de sua profissão anterior.
Edge aguardou enquanto a mulher pegava o controle remoto e o apontou para o televisor. Então disse:
— Não acenda.
O controle remoto caiu no chão e ela se levantou com um grito estrangulado, levando as mãos ao peito enquanto esquadrinhava a escuridão com olhos aterrorizados.
— Não fique assustada — disse Edge, e saiu de entre as sombras mais densas que rodeavam a porta para as mais claras que circundavam a mulher.
Ela conseguiu distinguir uma negra silhueta na escuridão. Para ajudá-la, Edge tirou um cigarro do pacote, pôs nos lábios e o acendeu. Viu como aumentava seu medo quando a chama iluminou um instante seu rosto. Inalou uma longa baforada e exalou enquanto ela permanecia imóvel, com o coração acelerado como o de um coelho.
— Não vim fazer mal a você. Mas o farei, se me obrigar. E certamente eu gostarei. Mas tudo depende de você.
— Que... Quem é você? O que quer?
Ele girou os olhos, exasperado pelas perguntas previsíveis.
— Sente-se. Tranquila. Só quero falar com você — ofereceu-lhe o pacote de cigarros. — Quer um?
— Não, não — ela se sentou, apoiando-se apenas na beira do sofá. Tremia dos pés à cabeça
— P... Mas...
— Mas o que? Adiante, pergunta. O pior que pode acontecer é que eu diga não. O que quer?
— Po... Posso acender a luz?
Ele sorriu, divertido por sua pequena brincadeira.
— Não. Vê? Não foi tão difícil, não é?
Ela deixou cair à cabeça para frente e a apoiou nas mãos. Estava chorando. Deus odiava às mulheres choronas. Edge estendeu uma mão, tomou um punhado de seu cabelo loiro e a obrigou a levantar a cabeça. Não fiz mal a você, mas ela gemeu de qualquer modo.
— Vamos, vamos. Necessito que se concentre.
Ela soluçou, enxugou os olhos e voltou a esquadrinhar a escuridão, tentando distinguir seus traços. Edge supôs que, em todo caso, poderia ver seu cabelo. Mas não o importava. Só se tinha negado a acender a luz porque ela queria acendê-la. Queria que estivesse incômoda, assustada, aturdida pelo medo.
— Veja — disse, — o caso é que estou a... não sei, mais de quarenta anos procurando certo tipo. E no transcurso de minha busca, soube que teve algo que ver com ele. Recentemente, conforme entendi. Por isso estou aqui.
— Que tipo? — sussurrou ela.
— Frank Stiles — notou que ela ficou agitada e que logo tentava dissimular sua confusão.
— E por que busca a esse tal... Stiles?
Edge não tinha por que responder. Mas respondeu de qualquer modo.
— É um caça-vampiros. Veja, eu sou um vampiro. Pareceu-me divertido mudar as coisas, que o caçador se converta na caça e tudo isso.
— Oh Deus, Oh Deus...
— Entendi que trabalhou para o Stiles faz cinco anos, mais ou menos — Edge deu outro trago ao cigarro e exalou uns quantos anéis de fumaça. — É certo?
— Não. Eu... Nunca ouvi falar dele.
Edge moveu a mão tão rapidamente que ela não a viu. Agarrou sua garganta e apertou um pouco, o suficiente para cortar a entrada de ar e reduzir o fluxo de sangue; o suficiente para que se assustasse. Mas não o suficiente para esmagar sua laringe. Morta não lhe servia de nada. Levantou-a do sofá agarrando-a pela garganta enquanto com a outra mão dava um trago no cigarro. Logo a soltou. Ela caiu de lado sobre o sofá e levou as mãos à garganta, arquejando.
— Vai dizer o que quero saber antes que acabe a noite. Não dou importância a quanta dor queira suportar antes de falar. Como eu dizia, certamente desfrutarei mais se me obrigar a fazer mal a você. Para mim pouco importa — sentou-se em uma poltrona, junto do sofá e continuou fumando enquanto ela tentava recuperar o fôlego. — Seu nome é Kelsey Quinlan — disse após um momento. — É enfermeira associada. Trabalha na escola elementar Remsen. Estou errado?
Ela se levantou lentamente, sem afastar a mão de sua garganta, e assentiu com a cabeça.
— Há cinco anos trabalhou para o Frank W. Stiles como ajudante em uma investigação. É correto?
— Sim, sim. M... Mas...
— Cale-se. Se limite a responder a minhas perguntas. Não vim castigá-la por seus crimes, sejam quais forem.
Ela levantou a cabeça e engoliu saliva com dificuldade.
Doía-lhe ao engolir. Edge notou.
— É a ele que quer castigar, não é certo?O que fará quando o encontrar? Vai matá-lo?
— Oh, já o matei. Um par de vezes, na realidade. E é estranho. Sempre se recupera.
A mão com a qual ela esteve esfregando a garganta ficou quieta, e seu rosto empalideceu na escuridão.
— Isso... Não é possível.
— Era o que eu pensava. Mas na segunda vez o deixei bem morto. Seriamente. Estava morto e re-morto. E logo... Enfim, o caso é que ressuscitou — Edge deu de ombros. — Então o que preciso saber é que espécie de investigação tinha nas mãos quando trabalhou para ele — os olhos dela se dilataram. Edge farejou seu medo. — Não vou castigá-la, Kelsey. Já disse a você — deu de ombros outra vez. — A não ser que tente fugir, nesse caso... — enquanto falava, estendeu uma mão para ela.
— Eu não fiz nada à menina! Não fui eu. Foi Stiles. Juro.
Edge baixou as mãos lentamente, sem tocá-la. As torneiras estavam abertas; a bomba funcionava. A informação tinha começado a fluir.
— De que menina fala?
Ela piscou lentamente.
— Da que apanhou faz cinco anos. A meio vampira.
Ele assentiu devagar. Aquilo encaixava com o que havia dito o mercenário que trabalhava na força de segurança de Stiles, depois de esbanjar suas técnicas de persuasão.
— Essa... Meio vampira tem nome? Ou só recebeu um número?
— Ela se chamava Amber Lily Bryant. Nos arquivos era o sujeito X-l.
Amber Lily. A Menina Prometida. Então, existia. Edge tinha ouvido contar muitas histórias sobre ela, claro. Que vampiro não as tinha ouvido? Mas sempre as tinha considerado simples lendas. E o mercenário a quem tinha interrogado estava mal informado sobre o que ocorria dentro do velho casarão de Connecticut onde Stiles efetuava sua «investigação». Mesmo assim, para certificar-se, tinha que pôr a prova a sua testemunha.
— Essa menina... Diz que é meio vampira? — a mulher assentiu com a cabeça. — Acredito que está mentindo. Isso é impossível. Está inventando essa historia para me distrair. Todo mundo sabe que os vampiros são estéreis.
— Só os varões. Parece que as fêmeas podem ovular durante os primeiros meses depois de sua transformação. Acreditava que todos os vampiros soubessem.
Edge pensou que seus olhos começavam a acostumar-se à escuridão. Olhava-o como se pudesse ver-lhe o rosto.
— Por que não fazemos de conta que eu não sei de nada e me conta sobre isso?
Ela se apressou a concordar e pareceu espremer a memória.
— Havia um mortal, um dos Escolhidos. Como sabe são os únicos humanos que podem transformar-se em vampiros. Todos eles têm esse estranho antígeno da beladona no sangue.
— E todos tendem a morrer jovens se não se transformarem. Sei disso. Continua.
Ela assentiu.
— Esse mortal, um varão, copulou com uma vampiresa recém transformada, e o fruto de sua união foi X-l.
Ele franziu os lábios.
— Suponho que era uma experiência da DIP, não? Ela assentiu.
— Sim. Tudo isso ocorreu antes que a Divisão de Investigações Paranormais fosse desmantelada. Stiles trabalhava então para eles. Acredito que tomou parte ativa na experiência. Mas um grupo de vampiros atacou o laboratório...
— O laboratório! — bufou ele com desdém. — O campo de extermínio é o que quer dizer.
Ela baixou a cabeça. .
— Os pais escaparam com a menina. É só o que sei.
Ele assentiu devagar.
— Assim, embora a DIP nunca voltasse a funcionar como agência estatal, Frank Stiles continuou trabalhando por sua conta. E parte de seu trabalho consistia em caçar a essa menina mestiça que lhe escapou faz anos.
— Isso parece. Mas então já não era uma menina.
— Ah, não?
Ela sacudiu a cabeça.
— Tinha dezoito anos quando a pegou em Connecticut — baixou os olhos um momento e logo olhou para a esquerda. — Fiz o que pude para protegê-la enquanto a reteve. E ainda estava viva quando apareceram os vampiros e a liberaram — olhou-o de novo nos olhos e pareceu ver certa dúvida neles. — Não me mataram quando se foram com ela. Suponho que isso quer dizer algo.
— Os de minha espécie são em geral bastante escrupulosos com o assassinato a sangue frio..., embora seja merecido. O fato de que a deixassem viva só significa que eram fracos de estômago — deu de ombros. — Eu, por minha parte, sou uma exceção a essa regra — ela permaneceu imóvel, contendo o fôlego. — Stiles reteve à garota muito tempo?
— Eu... Não me lembro exatamente. Uns dias, nada mais.
— Fez experiências com ela?
Ela baixou a cabeça.
— Sim.
— Detalhes, Kelsey. Necessito detalhes — agarrou-a pelo queixo e a obrigou a levantar o rosto para olhá-lo. — Saberei se está mentindo. Sei que mentia quando disse que tentou protegê-la. Você foi tão cruel com ela como todos os outros. Pra sua sorte, há mim isso pouco importa. O que me interessa é Stiles. Assim... Conte-me tudo.
A mulher lambeu os lábios e Edge compreendeu que acreditava nele.
— Stiles queria saber que tipo de poderes tinha. Se era imortal ou não. O que podia matá-la. Esse tipo de coisas. Mas a mantinha drogada, assim não se inteirou da maioria das experiências. Certamente não sentiu nada.
Edge sentiu um pequeno nó no estômago.
— Não me diga. E o que é o que não sentiu Kelsey?
Ela respirou profundamente e pareceu envergonhada.
— Aplicou nela correntes elétricas — disse num sussurro, — o suficiente para seu coração parar, para ver se voltava a pulsar outra vez. Afundou-a na água para ver se afogava. Introduziu-lhe distintas toxinas no sangue em dose letais. Fez-lhe transfusões de sangue. Golpeou-a na cabeça.
— Jesus — ele resmungou.
— Ela ressuscitava a cada vez, mas partiu antes que Stiles pudesse tentar coisas como colocar uma bala no cérebro ou cravar uma estaca no coração.
Edge girou os olhos. Até estaca.
— Parece envelhecer como uma humana. Ao menos, tinha o aspecto de uma garota de dezoito anos normal. Mas ressuscita como uma imortal.
— E que mais?
Ela deu de ombros.
— Tirou as amostras habituais. Muito sangue. Tecido, cabelo, medula óssea.
— O que fez com essas amostras?
Ela o olhou de frente.
— Não sei. Eu acreditava que tentava tirar seu genótipo, mas ele não me contava nada. Costumava se trancar em seu laboratório particular horas e horas. Um dos que trabalhava para ele acreditava que fazia dois registros de notas em separado. Um que podíamos ver e outro ao qual só ele tinha acesso — deu de ombros. — Uma vez peguei-o injetando algo na garota. Mas não soube o que era.
Ele franziu os lábios. Suspeitava que Stiles estivesse tentando colocar no seu organismo o que tornava imortal à garota; tentando roubar sua imortalidade e outros poderes que possuísse. E parecia que suas suspeitas eram certas. O safado procurava um modo de viver eternamente sem transformar-se em vampiro, sem ser um dos Escolhidos, apropriando-se do antígeno. E talvez tivesse conseguido.
— Com todas essas experiências, Stiles encontrou alguma vez o ponto fraco da garota? Descobriu o que podia matá-la?
Ela fechou os olhos.
— Que eu saiba, não. Se tivesse encontrado, não estaria viva para poder fugir.
Não importava, pensou Edge. Ele encontraria Amber Lily e, quando a encontrasse, descobriria qual era seu ponto fraco. Seu veneno. Sua kriptonita. Porque, fosse o que fosse era a arma que necessitava para matar Frank Stiles.
E essa era sua meta há quatro décadas. Nenhuma vampiresa mestiça ia colocar-se em seu caminho. Nem sequer a Menina Prometida.
Atirou a bituca do cigarro no tapete e a pisou com o calcanhar ao 1evantar-se.
— Foi de grande ajuda, Kelsey.
Ela fechou os olhos e ficou muito quieta.
— E agora vai matar-me, não é?
— Obrigado, mas já comi — sorriu, mas ela não pareceu entender a brincadeira. — Você não é uma ameaça para mim, Kelsey Quinlan. Disse o que eu queria saber, e duvido que seja tão estúpida para tentar avisar ao Stiles, se soubesse onde encontrá-lo, o que não sabe. Estive lendo seu pensamento todo o tempo. Assim, para que ia matá-la?
— Por meus crimes contra a sua... Espécie.
Ele sacudiu a cabeça enquanto se aproximava da porta.
— Pouco me importa a minha espécie,
A meia-noite, Amber deteve seu Ferrari negro no caminho de entrada do palácio de seus pais. Porque, vivessem onde vivessem sempre era em um palácio. Este era na realidade uma mansão georgiana de tijolo vermelho, situada em uma pequena e afastada enseada da baía de Irondoquoit, no lago Ontário. Tinha até passagens secretas e saídas ocultas para escapar, e era uma das aquisições mais recentes de sua família. Tiveram que vender a casa do lago Michigan fazia cinco anos. Amber, na verdade, gostava muito mais de seu novo lar. Talvez porque, pela primeira vez, tinha começado a desfrutar de sua independência.
— Bom, o que acredita que seja esta reunião familiar? — perguntou Amber, olhando para Alicia. — Acha que é outra tentativa para que voltemos com eles?
Alicia desabotoou o cinto de segurança e abriu a porta.
— Até agora mantiveram sua promessa de não nos pressionar sobre isso.
— Sim, desde que fiquemos a um raio de quarenta quilômetros.
— Depois de nossa pequena aventura em Nova Iorque, Amber, é uma sorte que não nos tenham trancado em um convento.
— Deus, isso foi há cinco anos — Amber abriu a porta e as duas saíram. Fechou a porta e apertou o botão de fechamento do seu chaveiro. — O que acredita que dirá o regulamento familiar sobre algo assim?
— O das famílias normais ou o da nossa? — perguntou Alicia, e deu de ombros enquanto passava uma mão sobre o suave e reluzente capô da Ferrari. — Não acredito que as famílias normais comprem presentes tão bonitos para suas filhas desencaminhadas — franziu as sobrancelhas . — Ainda acredito que você deveria ter se decidido pelo Corvette vermelho. Assim teríamos ido juntas.
— Sim, que mico — Amber fez girar os olhos, afastou o cabelo do rosto e pôs-se a andar junto de sua irmã. Porque Alicia era sua irmã, e lhe importava bem pouco que o fosse de maneira oficial ou extra-oficial. A sua era uma família muito estranha. Estranha, superprotetora e obscenamente rica.
As garotas tinham duas mães, sempre tiveram. Uma vampiresa, a outra mortal. E o pai de Amber zelava por todas elas..., embora parecesse tão jovem que podia passar por seu irmão.
Por isso não tinha contado a ele o sonho que a perseguia fazia mais de um ano. Um sonho que a intrigava... E que a aterrorizava, embora não estivesse segura do por que. Seus sonhos costumavam ser premonitórios; todo mundo sabia. Assim não havia razão para preocupar toda a tribo até que descobrisse o que significava aquele pesadelo.
Quem demônios era o vampiro loiro de olhos ferozes que fazia com que se derretesse cada vez que seus olhos se encontravam? E o que havia naquela caixa trabalhada que ele entregava a ela fazendo seu coração gelar de medo? Nunca conseguia recordar. Nunca. Mas estava segura de que aquela caixa continha... A morte. Não entendia o que significava isso. Mas estava segura de que era assim. As lágrimas do vampiro ao entregar a caixa para ela eram reais. A morte. Fosse quem fosse aquele tipo, levava-lhe a morte.
Amber fechou os olhos e procurou pensar em sua mãe. Afugentou a lembrança do sonho e tentou guardar para si mesma. «Estamos aqui, mamãe».
Enquanto subiam os degraus, ouviu como girava a fechadura. A porta se abriu de repente e Angélica, bela e eternamente jovem, correu para abraçá-las.
— Não imaginam quanto me alegra que estejam aqui.
Amber abraçou a sua mãe com força e logo se afastou.
— Mamãe, nós viemos todos os fins de semana. Como é possível que já sinta saudades?
Então notou: a vibração de tensão e tristeza que desprendia de sua mãe, e que não podia ocultar. Angústia. Dor, inclusive. Sentiu que seu sangue esfriava de repente e escrutinou o rosto da Angélica.
— O que houve mamãe? Aconteceu algo a papai?
— Estou bem, filha — disse Jameson, e apareceu no saguão com a Susan a seu lado, lhes estendendo os braços. Amber foi abraçá-lo enquanto Alicia abraçava a sua mãe; logo trocaram de lugar e repetiram os abraços.
Angélica, que não deixava de retorcer as mãos, entrou na sala de estar a toda pressa. Outros a seguiram. Amber olhava sem cessar para seu pai, lhe perguntando em silêncio o que estava acontecendo. Ele disse-lhe sem pronunciar palavras que fosse paciente e que se preparasse para o pior.
Amber estava à beira das lágrimas quando entrou na sala de estar e se sentou em uma fofa poltrona. Alicia, embora não fosse capaz de ler o pensamento com a precisão de um vampiro, tinha um dom especial para interpretar as expressões e perceber as emoções dos outros. Ela também havia sentido a dor que impregnava o ambiente. Sentou-se em uma cadeira de balanço e tomou a mão de Amber. Susan e Angélica se sentaram no sofá. Com os anos, Susan tinha envelhecido como uma mulher normal, e tinha chegado a transformar-se em uma espécie de mãe para Angélica. Protegia-a, amava-a e lhe dava seu apoio.
Jameson permaneceu de pé. Parecia estar ensaiando o que ia dizer.
— Pelo amor de Deus, papai, diga algo! — pediu Amber por fim . — Morreu alguém? Eric e Tamara estão bem? Não será Rhiannon? Ou Roland? O que aconteceu?
Jameson umedeceu os lábios e moveu a cabeça de um lado para outro.
— Não morreu ninguém, Amber. Mas é... É Willem.
Amber piscou, aturdida. Cinco anos atrás, Willem Stone a tinha salvado das mãos de um desumano cientista que a tinha tomado como se fosse seu porquinho da índia particular. Depois, Willem e Serafina, a vampiresa por quem se apaixonou, fizeram parte de sua pequena e extraordinária família. Mas, diferente dos outros, Willem era um simples mortal. Não um dos Escolhidos. Não podia, portanto, transformar-se. Era tão somente um mortal. E o homem mais excepcional que Amber tinha conhecido.
Embora temesse a resposta, obrigou-se a formular a pergunta.
— O que aconteceu com Willem?
Alicia lhe apertou a mão com força.
— Tem câncer — disse Jameson.
Era como se estivesse falando num idioma estrangeiro. Amber sentiu que lhe franziam as sobrancelhas.
— O que?
— Tem um tumor cerebral, Amber. Não pode operar. E é... Terminal.
— Não — sondou os olhos de seu pai, e logo os de sua mãe e os da Susan. — Mas haverá algo que possamos fazer. Tem que haver algo...
— Willem é mortal — murmurou Angélica — e os mortais... Morrem.
Enquanto Angélica falava, Alicia e sua mãe olharam-se com tristeza resignada. Amber Lily percebeu seu olhar. Não estava acostumada a enfrentar à morte. Negava-se a aceitá-la como o fim inevitável de seus seres queridos. Mesmo dos mortais.
— Não pode ser. Agora não, ainda não — disse, como se pôr ênfase naquelas palavras pudesse torná-las realidade. — Meu deus, Serafina acaba de conhecê-lo. Como é possível que o arrebatem assim? Deveriam viver juntos muitos anos. Décadas!
— Não é justo — murmurou Alicia e, lambendo lábios, sacudiu a cabeça. — Mas não morrerá. Will é o homem mais forte que conheço. Vencerá o câncer. Vocês verão.
Amber assentiu.
— Alicia tem razão. Deus, ele aguentou a tortura no deserto, deram-lhe medalhas por proteger a todos esses homens que teriam morrido se tivesse falado. É um herói. Venceu Stiles, venceu até a tia Rhiannon e a Serafina e viveu para contar.
— Isto é diferente Amber — disse Susan com suavidade. — Sei que não é justo, mas assim é a vida. A morte é... Uma parte do ciclo natural para alguns de nós meu bem. Assim são as coisas. Faz parte da vida do ser humano.
Amber levantou a cabeça e ficou olhando para Susan. Reparou em seu cabelo grisalho, em seus quilos a mais, nas rugas que rodeavam seus olhos. Logo olhou para Alicia que nos últimos cinco anos estava mudando de maneira sutil. Tinha perdido a aparência de uma adolescente e agora parecia uma mulher adulta. Amber, ao contrário, não tinha mudado absolutamente nada desde a época daquela casa em Byram, Connecticut. Das experiências de Frank Stiles.
Baixou a cabeça.
— Serafina está destroçada.
— Rhiannon está com eles em sua casa de Salem Harbor — disse Jameson. — Eric está investigando no laboratório de Wind Ridge, mas... — sacudiu a cabeça. — Não resta muito tempo.
Amber franziu o cenho.
— Quanto?
— Seis meses, no máximo.
Amber fechou os olhos e começou a chorar. Deus, seis meses. Era um suspiro. Soluçou e limpou as lágrimas com os nódulos.
— Tenho que ir vê-lo. Preciso vê-lo... Ver os dois. Como está? Falou com ele?
— Foi Rhiannon quem chamou para nos dar a notícia — disse Angélica suavemente. — Pediu-nos expressamente que fosse.
Amber assentiu.
— E vocês?
— Iremos mais tarde. Primeiro vamos à casa do Eric. Roland já está lá. Necessitam ajuda com a investigação — disse Jameson.
— Além disso — acrescentou Angélica , — não queremos incomodar a Fina e Will. Seria demais irmos todos de uma vez.
Amber engoliu as lágrimas com muita dificuldade. –Eles vão querer ficar sozinhos. Vem comigo, Alicia?
— Alguém tem que ficar para abrir a loja, céu. A Caixa de Pandora não abre sozinha. Mas, se precisar de mim, me chame e estarei lá como um relâmpago.
— Alicia, ficaria mais tranquila se fosse com ela — disse Angélica.
— Mamãe — disse Amber, — tenho vinte e três anos e sou perfeitamente capaz de chegar sozinha a Salem Harbor.
Angélica apertou os lábios.
— Nós duas aprendemos com nossos erros, Angélica — disse Alicia com delicadeza. — Já não somos meninas. Agora temos um negócio. A Caixa está começando a dar lucro. Somos mulheres adultas e responsáveis. As duas.
— Sei — Angélica lançou um olhar para Jameson, e ele assentiu em silêncio.
Amber exalou um suspiro, cheia de gratidão. Alicia queria lhe dar tempo para que enfrentasse aquilo a sua maneira. Amber e Will tinham formado um estranho vínculo desde que ele a salvara, cinco anos atrás. Will era como o irmão mais velho que nunca teve. Amber o queria com loucura, possivelmente em parte porque era um intruso. Fazia parte de sua extensa família de não mortos, embora não fosse um deles. Tal como Susan e Alicia. Tal como ela mesma. Mas não do mesmo modo, pensou. Ela tampouco era mortal. Não sabia exatamente o que era.
Assentiu resolutamente com a cabeça e disse:
— Vou fazer as malas. Sairei amanhã pela manhã.
— Quer que chame à companhia aérea, Amber? — perguntou Susan.
— Não, creio... Creio que vou de carro. Assim terei tempo de assimilar tudo isto.
Alicia se levantou.
— Parece boa ideia. Vocês estão bem?
— Fazemos o que podemos para nos conformarmos — respondeu Angélica. — Mas não é fácil. Eric se nega a dar-se por vencido, e pode ser que haja alguma possibilidade de que tenha razão.
— Mas não acreditam nisso, verdade? — perguntou Amber. Sua mãe baixou os olhos, mas Amber sentiu a desesperança em seu coração.
— Vamos, Amber — disse Alicia. — Ajudarei a fazer as malas e até pode ser que faça uns sanduíches para a viagem.
Amber sorriu, agradecida, e assentiu. Logo ficou em pé e deixou que seu pai a abraçasse com força.
— Quando chegar lá, Amber, esquece sua própria dor. Pensa em aliviar a dele.
— Eu o farei.
— Sei que o fará.
Edge espreitava entre as sombras, junto à loja New Age, um tanto kitsch, do vilarejo chamado Irondequoit, no território de Rochester, Nova Iorque. A placa da vitrine dizia A Caixa de Pandora, e incluía o desenho estilizado de um cofre do tesouro com a tampa aberta do qual saía uma espiral de faíscas de cor violeta. O apartamento onde vivia Amber Lily Bryant com sua colega de apartamento, uma mortal chamada Alicia Jennings, ficava no segundo andar. As pesquisas de Edge mostravam que eram sócio-proprietárias da loja, que a tinham comprado fazia dois anos.
Edge não conseguia entender por que a Menina Prometida compartilhava casa e negócio com uma mortal, em lugar de viver rodeada por meia dúzia de guarda-costas vampíricos. Nenhum dos vampiros aos quais tinha interrogado para chegar até ela soube lhe dar uma razão. A informação que tinha conseguido cavar era fragmentada, mas Edge tinha sido persistente e exaustivo, quando não pouco ético em suas pesquisas, e de vez em quando tinha conseguido captar algum pensamento involuntário. Reunidas, as peças do quebra-cabeça o tinham levado até o vulgar apartamento aonde Amber Lily vivia com uma garota comum.
Amber Lily devia ser o mais prezado troféu de qualquer caça-vampiros que houvesse sobre a face da terra, e Edge conhecia muitos, além de Frank Stiles, aquele patife às ordens da DIP. E, entretanto, vivia como uma mortal. Sem proteção.
Na casa não havia ninguém quando chegou, mas as duas garotas retornaram por volta das duas e meia da madrugada em um carro ainda mais suculento que o Corvette vermelho que havia na garagem: uma Ferrari negra. Edge não trocaria seu Mustang 69 por nada no mundo, mas que demônios, a gente tinha direito a olhar.
As garotas se detiveram na porta de entrada do bloco de apartamentos, mas não colocaram o carro na garagem, que se comunicava com a loja.
Edge fez um grande esforço para esconder sua presença da Menina Prometida, proteger sua mente, seus pensamentos, até sua existência. Ignorava quais poderes Amber Lily possuía, se tinha a habilidade de detectar sua presença ou não, de modo que tomou precauções.
Mas, de qualquer modo, ela não teria notado sua presença, pensou Edge ao ver em que estado se encontrava. Ela saiu do carro, subiu de dois em dois os degraus que levavam ao edifício de dois andares onde vivia e logo se deteve, apoiou um braço na parede de tijolo e baixou a cabeça. Tinha o cabelo comprido e muito liso, e tão escuro que a princípio lhe pareceu negro. Mas não o era. Era do tom mais escuro de castanho avermelhado que pudesse imaginar. Sua cor avermelhada, de densos matizes, refulgia ao resplendor das luzes. Se precisasse descrever seu cabelo, Edge diria que era como cetim negro banhado em sangue. Caía-lhe para frente, de modo que não podia ver seu rosto. Mas podia senti-la, do mesmo modo que sentia a qualquer outra criatura viva. Não a sentia como uma mortal, mas tampouco como uma vampiresa. Havia nela certa energia elétrica, uma carga estática que fazia sua pele arrepiar, seu sexo esticar e endurecer e o pêlo de seus braços ficar em pé.
Ela deixou escapar um soluço estrangulado. Edge se deu conta de que estava chorando e deu automaticamente um passo para frente, ficando em movimento como uma rótula golpeada suavemente pelo martelo de um médico. Parou em seco e afugentou aquela reação instintiva, que dissimulou com seu sarcasmo característico. Só faltava essa, pensou. Outra chorona. Que merda acontecia com aquela?
A outra moça apareceu junto a Amber Lily um instante depois, e as duas se abraçaram com veemência, chorando. Estava claro que a outra era a mortal. Tinha o cabelo curto e tão loiro quanto o de Edge. Sem dúvida se enrolaria se o deixasse crescer, mas assim curto saía em todas as direções, formando um gracioso emaranhado que lhe assentava muito bem. Era bastante atraente. E cheirava ligeiramente a magia. Edge pensou que na loja devia dedicar-se a algo mais que a preencher as estantes e a dirigir a caixa registradora. Pensou que tinha estado estudando, fazendo algumas experiências, sem dizer a ninguém.
— Não posso esperar até manhã, Alicia — disse Amber quando conseguiu controlar seus soluços. — Tenho que ir. Assim que esteja pronta — enxugou os olhos e se separou da outra garota. — Não queria dizer a mamãe para que não se preocupasse.
— Fez bem. Sua mãe faz o que pode Amber, mas não pode evitar preocupar-se. Coloca algumas coisas em uma bolsa, céu. Eu vou conectar a Internet para procurar a rota enquanto você faz a mala.
Amber assentiu e as duas subiram a escada exterior que levava ao apartamento do segundo andar, de braços dados. Ao chegar, fecharam à porta.
Mas para Edge, uma porta fechada nunca tinha sido um problema.
Edge não podia afastar os olhos da mulher. Porque isso era, uma mulher, não uma garota, nem uma menina. Nem prometida, nem nada. Em duas ocasiões, ela tinha deixado o que estava fazendo e ficou tensa e alerta. Sentia sua presença, apesar de seus esforços por ocultar-se. Sentia seus olhos cravados nela.
Permanecia apoiado na parede de tijolo do pequeno balcão que dava para seu dormitório, observando-a através da finíssima cortininha negra enquanto ela guardava a roupa em uma mala. De vez em quando, ela se detinha como se de repente se apoderasse dela uma onda de dor. Edge percebia. Essa noite, ela não estava protegida, talvez porque acreditasse que não havia ninguém a seu redor que pudesse ler o seu pensamento, ou porque não lhe importava. Edge tendia a pensar que não se importava. Não estava seguro do que tinha acontecido a ela nessa noite; mas tinha a impressão de que alguém tinha morrido. Era uma espécie de aflição. E, entretanto, havia algo oculto embaixo dela. Algo que ela procurava ignorar. Uma espécie de teimosa negação. Um arrebatamento de rebeldia que Edge conhecia muito bem. Uma lutadora que procurava briga. Aquilo estava enterrado sob toda aquela tristeza, mas estava ali. Edge tinha percebido em seguida.
Enquanto ela se movia por seu dormitório, acrescentando coisas à mala, Edge pôde por fim ver seu rosto. Tinha os olhos enormes, fundos e espaçados, ovalados e de densas pestanas. Eram assombrosos. De um tom de azul tão escuro que no começo Edge acreditou que fossem pretos como o ébano. O resto de seu rosto era muito belo: pálido e delicado, de fina estrutura óssea. Edge nunca havia se sentido particularmente atraído pelas mulheres de excepcional beleza. E para aquela, não teria dedicado um segundo olhar..., se tivesse tido escolha. Mas, ao que parecia, sua mente e seu corpo tinham decidido desobedecer a suas preferências. Aquela mulher o atraía tanto e de formas tão diversas que sua cabeça começou a dar voltas.
Pensou que devia ser um de seus poderes e deu-lhe as costas.
Mas tinha que olhá-la, devia averiguar o que estava fazendo, como ia conseguir que dissesse a ele o que queria saber. Assim voltou a olhar outra vez, e a viu na porta do dormitório, olhando para o corredor. Um instante depois, fechou a porta e tirou a chave. Tentava não fazer ruído, atuar com o maior sigilo.
Edge franziu o cenho, surpreso. Ela subiu a uma cadeira, levantou os braços por cima da cabeça e empurrou um dos painéis do teto. Aquilo começava a ficar interessante. Ela cutucou na abertura e tirou um arquivo de bom tamanho, uma dessas caixas de papelão para guardar documentos e pastas. Edge se aproximou da janela, absorto em seus movimentos, enquanto ela descia da cadeira, deixava a caixa sobre a cama e levantava a tampa. Logo em seguida franziu os lábios e tirou algo da caixa: um arquivo de três argolas, de cor negra, com uma etiqueta branca no dorso.
Edge entreabriu os olhos até que começou a lacrimejar, fixou a vista no dorso do arquivo e por fim conseguiu ler a etiqueta: X-l. Tomo A.
— X-I — murmurou. Era como Stiles a chamava. Portanto, os arquivos que continha a caixa tinham que ser as notas do Stiles. — Que me enforquem — resmungou. — Tem tudo o que descobriu sobre ela. Tudo, aqui mesmo.
Possivelmente até as respostas que ele necessitava. A chave do ponto fraco de Stiles.
Ela ficou um momento folheando o arquivo, e Edge se introduziu em sua mente e tentou escutar seus pensamentos. Ouviu-a pensar que seus pais acreditavam que as notas continuavam guardadas em segurança na caixa forte de sua casa. Sentia-se um pouco culpada por isso. Um sujeito chamado Eric tinha tirado cópias de tudo e o tinha levado ao seu laboratório, enquanto os originais voltavam a ser guardados na casa da baía do Irondequoit. Mas não era assim. Os originais estavam ali, escondidos em seu quarto. Edge não conseguiu fundir-se em sua mente até o ponto de ler através de seus olhos, mas notou sua exasperação antes que fechasse de repente o arquivo.
Fosse o que fosse o que estava procurando, não encontrava.
Ela tirou outra mala de sob da cama, colocou-a sobre o colchão e a abriu. Logo colocou os arquivos nela, empilhando-os cuidadosamente, um junto do outro, e acrescentou uma segunda fila. Finalmente, pôs em cima alguns objetos e fechou o zíper da mala. Guardou a caixa vazia sob a cama, revisou o painel do teto para assegurar-se de que estava no lugar e logo abriu a porta do quarto.
— Estou quase pronta — disse elevando a voz, e, pegando as duas malas, dirigiu-se ao corredor.
Edge abandonou seu posto de vigilância, desceu à rua de um salto e rodeou sigilosamente o edifício até a fachada, onde ela tinha deixado o carro. O porta-malas se abriu momentos antes que ela saísse da casa. Edge supôs que funcionava por controle remoto. Um instante depois, ela saiu às pressas do apartamento, seguida por sua amiga. Colocou as malas no carro, fechou o porta-malas e se aproximou da porta do condutor.
A loira deu a ela um maço de papéis e uma sacola de compra.
— Aqui tem as indicações para chegar. E um pouco de comida para o caminho.
Amber Lily. Lírio Ambarino. Edge pensou que o nome não combinava com ela. Aquela mulher era mais radiante que o âmbar e muito mais dura que a delicada flor do lírio. De qualquer modo, ela agarrou a sacola e olhou dentro. Logo a outra a pegou, abriu a porta do passageiro e a pôs sobre o assento. Colocou as folhas de papel sobre o painel e se voltou de novo para Amber.
— Amo você, sabe?
— Sim, sei. E sei por que não vem comigo.
— Ah, sim?
Amber assentiu.
— Sim. E agradeço a você isso. Tem razão, Alicia. Preciso ir sozinha.
— Eu irei depois. Assim poderá passar uns dias a sós com o Will.
Quem diabos era Will? Perguntou-se Edge com uma paixão que o surpreendeu.
— Não sei se poderemos ficar sozinhos. A tia Rhi está lá. E não se esqueça de Fina. Terei sorte se a perder de vista um momento.
— Não acredito que Fina esteja aguentando muito bem.
— Eu não acredito que esteja aguentando não — disse Amber, e baixou a cabeça. — Deus, eles estão tão apaixonados... Não sei como vai seguir adiante se ele morrer.
— Talvez... Talvez não queira seguir adiante –disse Alicia em voz baixa.
Amber olhou fixamente a sua amiga.
— Que isto sirva de lição às duas. Alguém pode apaixonar-se tão profundamente por um homem que não possa viver sem ele. É um risco muito grande sacudiu a cabeça. — Deus, quando vejo quanto dependem meus pais um do outro, sinto pânico. Se algum dos dois morrer...
— Sim, sei, sei. Mas isso não vai acontecer.
— Poderia acontecer. Mas não me acontecerá. A mim não acontecerá jamais.
— Você não sabe. Olhe como encara o que acontece com Will.
Amber baixou os olhos e suspirou.
— O que acontece é que Will é diferente e você sabe — exalou um suave suspiro. — Will me salvou a vida. Não deixo de pensar que tem que haver algum modo de... devolver-lhe o favor.
— Oh, Amber, não diga isso — disse Alicia com suavidade. — Não se iluda. Você pode ser uma Super girl, mas não é uma deusa. Não pode curar o câncer.
— Sei — disse ela.
Mas Edge teve a sensação de que mentia. Percebia aquela teimosa determinação, aquela rebeldia que esperneava dentro dela. Amber procurou acalmar-se e abraçou Alicia.
— Mas, se pudesse fazer algo, faria. Devo-lhe a vida, compreende? Se pudesse dá-la a ele, o faria sem pensar duas vezes.
— Ele não aceitaria se a oferecesse — Alicia a beijou na bochecha e depois lhe acariciou o rosto, possivelmente para lhe enxugar uma lágrima. — Anda, vai. E tenha cuidado.
— Sim.
Amber entrou no carro e colocou a chave no contato. Alicia tirou algo do bolso e o deu pelo guichê.
— Um CD?
— Minhas músicas preferidas para viagens longas. Stroke-9. Matchbox-20 e franziu o cenho. — Já parou pra pensar que todos os grupos que nós gostamos têm nomes com números?
— Como Sum-41?
— Exato.
As duas puseram-se a rir. Amber tirou o cd de sua capa e o colocou no reprodutor. Um instante depois, o ar se encheu de uma música lenta e suave. Amber deu ré no carro e o tirou lentamente da calçada. Alicia ficou ali um momento, olhando-a afastar-se enquanto lhe dizia adeus com a mão.
Edge perdeu o final da emotiva despedida. Entrou no apartamento, cuja porta estava aberta, percorreu-o em vertiginosa velocidade e em seguida encontrou o computador. Estava no quarto de Alicia. A tela mostrava ainda a rota automobilística que a garota havia imprimido para sua amiga. Leu rapidamente a tela. Amber se dirigia para um lugar chamado Harbor Rock, em Salem Harbor, nos subúrbios de Salem, Massachussets. Edge memorizou a rota. Dez horas de carro. Surpreendeu-o um pouco ver que rota evitava a auto-estrada, a via mais rápida para chegar a seu destino. Logo, ao ouvir que Alicia voltava, meteu-se no quarto de Amber e saiu pela mesma janela por onde esteve observando Amber. Fechou-a atrás dele e se afastou do apartamento, perdendo-se na escuridão.
Apos alguns quarteirões mais à frente, encontrou seu Mustang. Em seus bons tempos o carro tinha sido negro e reluzente. Agora estava descolorido, e Edge lhe devia uma boa mão de pintura em troca de seus muitos anos de leal serviço. Mas teria que servir até que chegasse a seu destino. Umas horas depois, pensava estar dirigindo um deslumbrante Ferrari.
Amber Lily era muito terna. Edge tinha percebido sua bondade. Mas, a julgar pela vizinhança onde vivia e pelo que tinha visto no apartamento, para não falar do carro, era também uma menina mimada, acostumada a viver entre algodões.
Aquilo seria como tirar um caramelo de uma menina. Mas teria que andar com cuidado. Porque, apesar das aparências, Amber Lily não era uma menina.
Amber levava duas horas conduzindo. Eram mais das cinco da madrugada quando o carro pareceu se chocar com algo. Sentiu o impacto, o ruído surdo, viu um vulto que ricocheteava sobre o capô do carro. Era uma pessoa! Deus, nem sequer o tinha visto! Fez-lhe um nó no estômago e pisou a fundo o pedal do freio. Os pneus chiaram e o aroma de borracha queimada assaltou seu olfato.
— Meu deus! De onde saiu?
Abriu de repente a porta e se lançou para o exterior, mas o cinto de segurança a reteve de um puxão. Impaciente e angustiada, começou a amaldiçoar, conseguiu tirar o cinto e sair tropeçando do carro, e correu para o homem que jazia imóvel sobre o pavimento.
— Meu Deus, encontra-se bem? Sinto muito, sinto muitíssimo. Não o vi — ele estava de barriga para baixo. Amber se ajoelhou a seu lado e o tocou no ombro. — Por favor — murmurou, — por favor, que esteja bem.
Ele gemeu e Amber abriu seus sentidos, procurando em sua mente dor, lesões. Mas o que encontrou causou tal surpresa a ela que afastou a mão bruscamente e, levantando-se de um salto, retrocedeu rapidamente para o carro.
— É um vampiro!
Ele ergueu as mãos lentamente, levantou-se sobre o pavimento e ergueu a cabeça.
— Isso não significa que não doam os colhões.
Virou-se para olhá-la e ela inalou o ar tão bruscamente que doeram seus pulmões. « meu deus é ele!». O vampiro de seus sonhos.
Deixou de retroceder, mas não se aproximou. Ficou olhando-o como um falcão enquanto ele se levantava e sacudia o pó dos jeans e da jaqueta de couro.
Edge limpou o sangue do arranhão que tinha na bochecha e ficou olhando a mancha em seu polegar.
— Como sabe o que sou? — perguntou como se acabasse de perceber o que ela disse — Logo baixou a mão e seus olhos aumentaram levemente. Atropelou-me por acidente ou é um desses caça-vampiros dos quais tanto ouço falar?
Amber relaxou um pouco. Se aquele tipo tinha medo dela, certamente ela não tinha por que temê-lo. Ao menos, se esquecia do sonho. Aquele sonho no qual ele levava um presente para ela: a morte em uma linda caixa.
— Não sou uma caça-vampiros.
Ele franziu o cenho e deu um passo adiante. Amber não retrocedeu. Assim, ele deu outro passo. Mancava um pouco. Parecia um lobo farejando o ar, embora não farejasse. Estava sentindo-a. Percebendo-a.
— É uma Escolhida..., mas não, não exatamente. Não é mortal. Mas tampouco é dos nossos.
Ela franziu os lábios e baixou a cabeça.
— Olhe, o que sou não importa. Não sou uma ameaça para você.
— Não, a menos que esteja atrás do volante, suponho — Edge temperou suas palavras com um sorriso. Ao sorrir, aparecia uma covinha em sua bochecha. Sustentou-lhe o olhar, e o coração do Amber deu um salto mortal.
«Meu Deus», pensou. Olhá-lo nos olhos surtia o mesmo efeito sobre ela que no sonho. Era como uma descarga elétrica. Acelerava-lhe o coração e lhe dava um nó no estômago. Seu sangue se esquentava e sua pele parecia arrepiar-se. Quem era aquele sujeito?
Edge se aproximou dela, ainda mancando, e lhe estendeu a mão.
— Chamam-me Edge.
Apertou-lhe a mão. Era uma mão grande e muito forte. Gostou da leve pressão que exercia sobre a sua, e o modo em que seu sangue se amornava e afluía ao centro de seu ser ao tocá-lo.
— Então é Edge? É um apelido?
— O que acontece? Você não gosta? — ele levou a mão livre ao coração enquanto com a outra continuava segurando a dela um instante mais. — Suponho que o seu é melhor.
Estava perguntando seu nome.
— Amber Bryant.
Ele piscou e franziu as sobrancelhas.
— Não será Amber Lily Bryant?
Ela assentiu, exalando um suspiro. Era uma chateação ser uma espécie de lenda, ao menos entre os não mortos.
— Temo que sim.
— Bom isso explica a mescla de vibrações que emite. É a Menina Prometida — Edge deu de ombros e disse. — Mas me parece que não combina nada com você.
— O que? Meu nome?
Ele assentiu.
— Tão pouco como não combinava comigo o meu, o autêntico. Soa frágil e delicado. Como uma flor de estufa que tem medo de sair à intempérie. Mas você não parece uma flor de estufa. Exótica, sim. Bem mais selvagem. E dura.
— Insinua que preciso de um apelido?
Ele concordou.
— Amber Lily — estalou os dedos. — AL.
— AL? E isso parece exótico e selvagem para você?
— Não, mas é duro. O que acha de Alby? — sorriu. — Sim. Alby.
Ela levantou as sobrancelhas.
— Poderia me acostumar.
Na realidade, quando ele pronunciava aquela palavra, lhe arrepiava a pele.
Edge a soltou por fim e passou a mão pelo flanco, fazendo uma careta de dor.
— Sinto ter atropelado você. Dói-te muito?
— Acredito que tenho uma costela quebrada. Nada sério. Passará assim que dormir. Mas suponho que não vou percorrer tantos quilômetros como esperava esta noite.
— Viaja a pé?
— Só depois que meu carro me deixou na mão faz uns quilômetros.
Ela umedeceu os lábios. Quantas vezes lhe haviam dito seus pais que não confiasse em vampiros desconhecidos? Mas, até esse momento, todos os vampiros que tinha conhecido acabaram sendo pessoas decentes. Principalmente com ela, a Menina Prometida.
— Aonde vai? — ouviu-se perguntar.
— A Salem.
Ela piscou. Se Alicia estivesse ali, diria que aquilo era um sinal. As coincidências não existem, diria. A sincronia não se dava por acaso. Alicia estava lendo muito sobre magia ultimamente, pensou Amber. Mas, mesmo assim, tinha parte de razão.
— A Salem — disse em voz baixa. — É uma boa caminhada, até para um vampiro.
— Sim, e está muito longe para ir depressa — respondeu ele.
— Quer... v... vir comigo?
— Está brincando? Pagaria para ir com você — ele umedeceu os lábios e baixou a cabeça. — Se não estivesse falido, claro.
— Não importa. Não preciso de dinheiro.
— Achei mesmo isso, por seu carro — olhou o Ferrari. — Deve estar cheia da grana.
— Meus pais estão cheios da grana. O carro foi um presente de meu pai.
Ele sorriu.
— De maneira que é uma menina mimada, não é?
Devolveu-lhe o sorriso.
— Sim, muito mimada.
— Deve ser agradável.
— Quer conduzi-lo?
Ele a olhou com surpresa.
— Sério?
— É o mínimo que posso fazer depois de tê-lo atropelado — lançou-lhe as chaves e ele as agarrou no ar. Pareceu esquecer-se de sua claudicação ao aproximar-se da porta do condutor. Entrou no carro e ela se sentou no assento de acompanhante e prendeu o cinto. Ele, não.
— É muito... amável, Alby.
— Tento sê-lo. Você não?
— Não — respondeu ele e colocou a marcha, endireitou o carro e pisou no acelerador. — Não, não acredito que ninguém que me conheça me considere amável.
Moveu-se, pisou no pedal do acelerador até que o motor rugiu e voltou a mover-se. O carro atravessou a escuridão como uma flecha. Estava projetado para isso, apesar de Amber nunca ter conduzido dessa maneira. O carro pareceu ganhar vida sob a mão de Edge, como se elevasse sobre suas rodas traseiras e ronronasse agradecido.
Amber sentiu-se um pouco invejosa.
Inclinou-se para frente, ligou o cd-player e ficou perplexa quando Edge começou a cantarolar. Conduzia como um expert, em muito mais velocidade que ela, mas com tanta destreza que Amber não sentiu medo. Aquele tipo exalava confiança em si mesmo. E perigo.
E, entretanto, Amber não tinha medo dele, embora fosse consciente de que possivelmente devia ter.
Principalmente pensando no sonho. Mas isso pretendia ao convidá-lo a acompanhá-la: averiguar que demônio significava aquele sonho, e o que vinculava aquele homem com sua psique e seu subconsciente. Quando a canção acabou, Edge esticou a mão para desligar o cd e a olhou um momento.
— Bom, e por que vai a Salem? De férias?
— Oxalá. Não, meu amigo está doente.
— Será um amigo mortal, então.
Ela assentiu.
— Sim. É um amigo fantástico.
Ele franziu um pouco o cenho. Olhava-a frequentemente, como se gostasse de fazê-lo.
— É estranho que um vampiro faça boas ligações com os mortais.
— Eu não sou um vampiro — respondeu ela. — E para muita gente sou bastante estranha — inclinou a cabeça e observou seu perfil. Tinha a estrutura óssea de uma obra de arte, pensou. Uma mandíbula larga e angulosa, e umas maçãs do rosto de morrer. .
— O que? — perguntou ele, olhando-a. — Tenho algo entre os dentes?
Ela sorriu.
— Você não tem nenhum amigo mortal? –perguntou só para desviar a questão.
— Nem mortal, nem de outro tipo.
Ela piscou.
— Quer dizer que não tem amigos?
— Sim, é o que quero dizer.
— E não se sente... sozinho?
— Isso depende de como defina a solidão, querida. Sinto falta de ter a um montão de intrometidos cheios de boas intenções que esquadrinhem minha alma e se metam em minha vida? Nem em sonhos. Desejaria ter um montão de gente que dependesse de mim? Nem morto. Sei o que não é bom. É muita responsabilidade para qualquer pessoa em seu juízo perfeito. Em todo caso, eu não me dou ao trabalho. Sinto falta de vez em quando de alguém em minha cama? Pode apostar a que sim. Mas isso se resolve facilmente. E para isso não preciso fazer amigos.
Amber pensou que sem dúvida Edge não tinha problemas para encontrar mulheres dispostas a compartilhar sua cama. Estava muito gostoso. E era um desses bad boys que despertam o apetite de qualquer mulher.
— Alguma vez... tem vontade de falar com alguém? Com alguém a quem importe um pouco o que diga?
Ele inclinou a cabeça.
— Essa é a espécie de amigos que tem você? Dos que a escutam e lhes importa um pouco o que diga?
Ela sorriu.
— Claro. Mas também são dos que esquadrinham minha alma e se metem em minha vida. Suponho que é difícil conseguir uma coisa sem a outra.
— Nisso tem razão — suspirou ele. — E têm muitos? Amigos quero dizer.
— Mmm. Amigos, família... Guardiões e protetores. Quase todos vampiros, mas também alguns mortais — olhou-o e sorriu de repente. — A verdade é que tenho tantos que até posso me permitir compartilhá-los com você.
— Agradeço muito, mas não. Não os necessito — Edge observou seu rosto um momento antes de voltar a fixar o olhar na estrada. — Não parece que sirva de muito a você, de qualquer modo. Ao menos, ultimamente.
— O que quer dizer?
— Esteve chorando esta noite.
Amber deveria estar acostumada à aguda capacidade de percepção dos vampiros. Aquele dom não devia surpreendê-la. Mas, mesmo assim, Edge a pegou despreparada.
— É por esse amigo teu que está doente? — perguntou ele. Ela assentiu com a cabeça. — O que lhe acontece exatamente?
Ela piscou e o olhou com o cenho franzido.
— Como sabe que é um homem e não uma mulher? — Amber tinha erguido um escudo ao redor de seus pensamentos no momento em que tinha percebido que Edge era um vampiro. De modo que ele não podia estar lendo sua mente.
— Raramente se vê uma garota bonita chorando por outra. Esse cara de Salem... é seu noivo?
Ela sorriu.
— Não. É mas bem um irmão mais velho a quem amo muitíssimo. Uma vez me salvou a vida.
— Seriamente? Um mortal normal e comum?
— Will é possivelmente o mortal menos normal que possa haver. Foi coronel do exército. Das Forças Especiais. Capturado no deserto o torturaram até que escapou, e não lhes contou nada.
Ele levantou as sobrancelhas E se voltou lentamente para olhá-la.
— Tem certeza que não está apaixonada por ele?
— Tenho certeza.
— Nem sequer deitou com ele?
— Não, isso jamais.
— Jamais?
— Quero dizer que jamais me deitaria com o Willem.
Ele sorriu.
— Ah. Acreditava que se referia a que fosse virgem.
Ela girou a cabeça para o guichê.
— Está sendo um pouquinho bisbilhoteiro, e faz uma hora que nos conhecemos, Edge.
— Deixou-me conduzir seu carro. Suponho que isso nos converte em íntimos.
— Pois supõe mal.
— Então, é? — ela o olhou enrugando o cenho. — Virgem, quero dizer.
— E que importa a você?
— Tenho curiosidade, isso é tudo.
— Pois não vou satisfazer sua curiosidade. Assim deixa de perguntar.
— É misteriosa, certo? Eu gosto disso — Edge esticou o braço por cima do assento e passou suavemente o dedo indicador por sua bochecha, fazendo-a estremecer-se . — Há muitas coisas de você que eu gosto Alby.
Ela baixou os olhos, tentou não ficar vermelha e que não lhe acelerasse o coração, porque ele o ouviria. Mas sua carícia a fez estremecer-se até os ossos.
— Não respondeu a minha pergunta — Amber fixou os olhos nele, surpreendida por sua insistência – Falo do seu amigo Will. O que acontece a ele?
— Ah — Amber deixou que sua irritação se dissipasse. — Tem câncer.
— Terminal?
Ela deu de ombros.
— Isso é o que dizem. Mas eu não quero me dar por vencida ainda.
— Sério? — ela assentiu com a cabeça. — Suponho que... Enfim, dá no mesmo.
— Não, continua. O que ia dizer?
Ele a olhou com os olhos entreabertos. Quando a olhava, Amber sentia como se a tocasse, e nessa ocasião sentiu que seus olhos se deslizavam do seu rosto até seu pescoço, sobre seu seio, seus quadris e suas pernas, até o chão.
— É só que, bom, suponho que terá... poderes, a falta de uma palavra melhor, diferentes dos de outros vampiros. Curar enfermidades mortais é um deles?
— Não acredito — ele franziu o cenho, olhando-a, e Amber compreendeu o que queria lhe perguntar. — Há muitas coisas sobre mim mesma que não sei Edge. Não houve ninguém igual a mim antes, assim não tenho referências.
— Mas terá testado seus poderes. É imortal?
— Acredito que sim.
— Mas envelhece como uma mortal?
— Antes sim.
— Antes?
Ela franziu os lábios e não disse nada. Edge deslizou uma mão sobre a sua, que ela tinha apoiada sobre sua perna.
— Pobre cordeirinha, está bastante perdida, não? Apesar de todos os seus amigos.
— Estou perfeitamente bem.
— Não, o que é isso. Nem sequer sabe quem é. Nem o que quer ser.
Amber o olhou nos olhos e Edge lhe sustentou o olhar, sorriu suavemente e de repente pareceu um anjo cansado.
— Fica comigo uma temporada, Alby. Eu ajudarei você a encontrar a si mesma.
Ela franziu o cenho, assombrada pela reação que o contato de sua mão suscitava em seu corpo, e surpreendida por lhe permitir que entrelaçasse seus dedos. Edge fixou de novo a atenção na estrada, mas não lhe soltou a mão.
— Como? — perguntou ela. — Nem sequer me conhece.
— Mas eu gostaria de conhecê-la. Eu gostaria de explorar você inteira, por dentro e por fora. E, já que estamos nisso, você poderia fazer o mesmo comigo. Quem sabe o que descobriria?
Quando voltou a olhá-la, a expressão de seus olhos deixava ver claramente que Amber não o tinha interpretado mal. Edge pretendia que suas palavras soassem tão insinuantes como lhe tinha parecido, que acariciassem seus sentidos como veludo sobre cetim.
— Logo será de dia — disse ele. — Deveríamos procurar um lugar escuro e íntimo onde não bata sol.
Não tinha se excitado tanto em toda sua vida, pensou ela, aturdida.
— Conheço o lugar ideal. Para aqui mesmo.
Ele deteve o carro na sarjeta com um sorriso satisfeito. Amber apertou o botão do painel que abria o porta-malas e saiu do carro enquanto ele a olhava com o cenho franzido. Aproximou-se da parte de atrás, voltou-se para o porta-malas aberto e esperou a que ele se aproximasse. Edge a olhou a ela e logo olhou o porta-malas.
— Não é muito romântico, querida. E não há muito lugar para... mover-se.
— Então, sugiro que fique quieto.
Amber apoiou de repente as duas mãos sobre suas costas e empurrou com força. Surpreso por aquele ataque repentino, Edge caiu dentro do porta-malas e, enquanto rodava de costas, desconcertado, ela olhou a portinhola, baixou os olhos um instante, e fechou de repente.
Edge prorrompeu em uma corrente de blasfêmias.
— Merecia algo pior. Alguma vez ouviu falar de boas maneiras, Edge? Passou dos limites.
— Mas encantei você — ele golpeou o porta-malas sem muita convicção, para que não amassasse. — Abre ou encho seu belo carro de buracos!
— Faça isso, e irá caminhando até Salem. Faltam vinte minutos para que amanheça. Fique quieto e durma. Quando despertar, estaremos em Salem.
— Maldita menina mimada...
— Cuidado, Edge, ou despertará em um acostamento, em um lugar ensolarado e ao meio-dia.
Edge continuava resmungando em voz baixa quando Amber se aproximou da porta do motorista e se sentou atrás do volante.
Assim que saiu o sol, Amber procurou um lugar onde estacionar e dar um cochilo. Supunha que seu cansaço era bem mais emocional que físico; — A impressão que lhe tinha causado a notícia da enfermidade de Will, a dor... E, logo, topar-se literalmente com o homem com quem sonhava há um ano. Estava aflita, e disse a si mesma que só precisava dormir um momento; que uma hora bastaria.
Voltou a ter aquele sonho.
Estava na cama, e Edge se aproximava lentamente dela; levava nas mãos uma caixa e a olhava fixamente nos olhos. No sonho, ela sentia um nó no estômago, e o coração parecia a ponto de arrebentar, repleto de emoções contraditórias, muito poderosas para poder suportar. Sentimentos apaixonados que giravam em torno daquele homem... e em torno do que continha a caixa. Não conseguia afastar os olhos dele e da lágrima que brotava de seu olho e rodava lentamente por sua bela bochecha. Ele se ajoelhava e baixava a caixa para que ela pudesse ver o que havia dentro.
«Não olhe!», sua consciência gritava. «É a morte o que ele traz! A morte!»
Amber despertou bruscamente e se levantou tão rápido que bateu o cotovelo na porta do carro.
Pouco a pouco foi se livrando do medo paralisante que o sonho deixava em seu rastro. O que significava aquilo? Estava cometendo um erro muito grave ao aproximar-se de Edge?
Suspirou e se perguntou se teria coragem para separar-se dele, embora decidisse que era o melhor. Olhou o relógio, piscou e voltou a olhá-lo. Eram mais das onze da manhã. Tinha dormido mais de cinco horas.
Que chateação.
Ligou o motor e pôs o carro em marcha. Duas horas depois, deteve-se para comer um sanduíche vegetal e ir ao banheiro assear-se um pouco, embora o que na verdade desejava era tomar uma ducha. Logo continuou dirigindo sem parar. Mas, mesmo assim, o sol estava se pondo a suas costas quando por fim tomou o caminho rural que levava serpenteando de Salem a Salem Harbor e dali à casa do Harbor Rock. Serafina e Will tinham comprado aquela casa cinco anos atrás, e Amber tinha estado ali várias vezes, mas ainda não tinha memorizado como se chegava de carro. Supunha que isso significava que a memória fotográfica não se achava entre seus dons. Já podia riscar uma coisa mais de sua lista de dúvidas, pensou.
A casa era moderna, uma gigantesca estrutura de madeira situada no extremo de uma pequena península e rodeada por rochas e espuma do mar. As janelas eram grandes e davam vista ao oceano. Ninguém teria suspeitado que ali vivesse uma mulher vampiro com seu amante mortal. Seu amante muito mortal.
Amber parou o carro, desligou o motor e ficou ali parada um momento, contemplando as formosas cores da casa de madeira ao tempo que tentava controlar suas emoções. Sua mãe tinha razão; não devia mostrar-se aflita. Will estava vivo. Rodeá-lo de choro não ia servir de nada, nem a ele, nem a Serafina. Amber fechou os olhos E procurou tirar forças da fraqueza.
Mas um golpe no porta-malas a tirou de sua concentração.
— Já é de noite e continuo trancado neste maldito buraco — ela baixou a cabeça e a sacudiu lentamente. — Alby está aí?
Toc, toc.
Ela franziu os lábios e apertou o botão. O porta-malas se abriu de repente, e ela sentiu que o carro se movia quando Edge saia. Abriu a porta e saiu, e ao virar-se, encontrou-se cara a cara com ele. Seu nariz chegava ao queixo.
— Isso não foi muito amável, sabe?
Ela sorriu.
— Tentava fazer com que entendesse meu ponto de vista.
— Pois eu entendi — disse ele.
— Serio?
Ele assentiu.
— Sim. É uma dessas mulheres que gostam que os homens lhes supliquem.
Ela ficou boquiaberta.
— Engana-se.
— Enganado, eu? Vamos, Alby, gosto de você quanto você da mim. Reconhece.
Ela franziu os lábios e procurou armar-se de paciência.
— É bastante atraente, suponho. Mas eu não diria que eu gosto. Nem sequer o conheço.
Ele se aproximou e fixou os olhos em seus lábios.
— Então, insinuas que o magnetismo que há entre nós é meramente físico?
Ela piscou.
— Está pondo palavras em minha boca.
Ele seguiu olhando sua boca.
— Eu gostaria...
— Nem pense nisso.
Ele sorriu, e aquela covinha voltou a aparecer em sua bochecha. Amber amoleceu dos pés à cabeça.
— Está bem, reconheço que pareço um cavalo no cio. É porque não estou acostumado a tratar com meninas mimadas e virgens.
— Eu não disse que sou...
Ele levantou uma mão para sossegá-la e logo olhou para a casa.
— Então, é aqui onde vivem seus amigos? Ela assentiu. — Deveria ir — virou-se, disposto a partir.
— Estou segura de que não se importarão que... que traga um convidado.
Ele ficou imóvel, de costas para ela.
— Não se preocupe Alby. Não vou partir para sempre. Voltarei quando estiver instalado.
— É um presunçoso, sabe?
— Sim. E, se jogar bem suas cartas, pode ser que ele diga por que — tentou lhe dar um pontapé as costas, mas ele conseguiu esquivar-se; logo se voltou para olhá-la. — É um pouquinho violenta, não?
— Pelo visto é você que traz à tona meus instintos violentos.
Ele deixou que seu olhar fogoso se deslizasse sobre o corpo do Amber.
— Meteu-me no porta-malas como um vampiro. É muito forte?
— Mais do que acredita.
— Mais forte que eu?
Ela deu de ombros.
— Não sei. Por que?
— Estava me perguntando se me dará uma surra se a beijar.
— Mas não...
Amber deixou escapar um gemido de surpresa quando ele a enlaçou pela cintura, apertou-a contra si e, enquanto lhe segurava a cabeça com a outra mão, apoderou-se de sua boca. Beijou-a com a boca aberta, acariciando e chupando seus lábios. E justo quando ela começava a relaxar e a abrir a boca, justo quando desejava que ele usasse sua língua e seguisse beijando-a muito, muito tempo, Edge a soltou e levantou a cabeça; piscou-lhe um olho, deu meia volta e se afastou pelo atalho que levava a estrada.
Não olhou para trás. Amber ficou ali parada, olhando-o até que se perdeu de vista, enquanto a brisa marinha refrescava sua pele acesa.
— O que era isso? — perguntou Rhiannon. Amber suspirou e se voltou para olhar a sua tia.
— Isso era Edge — lançou um olhar para Rhiannon, que estava ali parada, com seu cabelo comprido e muito negro ondeando ao vento, os braços cruzados sobre o peito e uma expressão severa no rosto.
— Que tipo de nome é «Edge»?
— Um que lhe cai à perfeição, suponho. Onde está Pandora? Não a vejo por aqui.
Sua tentativa de mudar de assunto era ridícula, e sabia. Se estivesse na casa, a pantera que sua tia tinha por mascote estaria ali, colada às saias de sua proprietária.
— Está ficando velha. Ultimamente se sente mal em viagens longas. Ficou no Wind Ridge com o Eric, Tam e Roland. E agradece por você ter colocado seu nome em sua loja. Agora, se podemos voltar para o assunto que nos ocupa...
— Refere-se à Will?
— Refiro ao Edge — disse ela com tranquilidade. — Pode-se saber o que há entre você e esse indivíduo, Amber Lily?
— É muito cedo para dizer, Rhiannon. Mas será melhor que não apareça morto antes que tenha oportunidade de averiguá-lo.
Rhiannon sorriu.
— Pois convém que veja logo isso. Depois de beijar a minha sobrinha diante de meu nariz, pode ser que não tenha muito tempo — abriu os braços e Amber se aproximou dela e a abraçou suavemente. — Que tal está, tesouro? Senti saudades. Fazia meses que não a via.
— Pensei que estava bem, até que fiquei sabendo do Will.
Rhiannon esticou os lábios.
— Agora mesmo não está em casa. Tinha consulta com outro médico.
— E Fina?
— Disse-me que precisava ficar um pouco sozinha, assim que lhe preparei um banho bem quente e perfumado e lhe disse que ia dar um passeio pela praia. Sabia que estava perto e queria falar com você a sós antes que a veja.
— Como ele está?
— Surpreendentemente bem — disse Rhiannon. — Muito bem. Isso é o que me preocupa — Amber baixou os olhos e lambeu os lábios. Rhiannon respirou fundo e a segurou pelo braço. — Não há necessidade de que proteja seus pensamentos de mim, Amber. Não deixo de pensar nessa mesma ideia.
— Não sei a que se refere.
— Claro que sabe — Amber franziu os lábios e abaixou a cabeça. Trouxe as notas?
Amber levantou a cabeça bruscamente.
— Que notas?
— Oh, vamos, menina, não temos tempo que perder. As notas do Stiles. As que seus pais acreditam que estão guardadas em sua caixa forte. Trouxe-as, claro.
— Como sabe?
— É o que eu teria feito — disse Rhiannon. Amber suspirou. Sua tia a conhecia muito bem.
— Sim, trouxe-as, mas isso não significa que vamos encontrar a resposta nelas. Procurei e procurei, mas de momento...
Um grito horripilante rasgou de repente a escuridão, calando Amber na metade da frase. As duas puseram-se a correr para a casa, enquanto se ouvia um estrondo e um uivo.
— Meu deus, Fina... — murmurou Rhiannon, e apertou o passo até que se desvaneceu em um borrão negro.
Amber corria a passo mais próprio de um mortal. Fazia tempo que não ia por ali, e não queria tropeçar pelo caminho.
Quando chegou a casa, subiu correndo as escadas e entrou no banheiro, cuja porta estava totalmente aberta. Serafina estava no centro da habitação, empapada. E nua, salvo pela toalha branca que segurava contra seu peito. O suporte de vidro da penteadeira estava em pedacinhos. Havia produtos cosméticos espalhados por toda parte.
— Fina, carinho, o que aconteceu?
Rhiannon, que já tinha se encarregado da situação e tinha saído do banheiro, apareceu junto de Amber com um grosso penhoar nos braços.
— Vamos tirá-la daqui antes que se despedace — disse, e se aproximou de Serafina pisando em cacos de vidro. — Fique quieta, Fina. Não se mova.
Serafina estava tremendo e as olhava fixamente, sem as ver. Enquanto Rhiannon tentava lhe pôr as mangas do penhoar, Fina se separou dela com um grito estrangulado; logo se sentou sobre os joelhos entre os cristais quebrados, jogou a cabeça para trás e começou a gemer como um animal ferido.
— Meu deus... — murmurou Rhiannon.
Amber sentiu que lhe saltavam as lágrimas e que sua garganta se apertava, mas reprimiu o impulso de tornar a chorar e se aproximou do Rhiannon. Cada uma delas passou um braço pelo ombro de Serafina e o braço livre sob suas coxas. A toalha caiu ao chão quando a levantaram e a tiraram do banheiro tentando não pisar nos cacos enquanto Serafina se desmanchava em um pranto incontrolável. Deixaram-na sobre uma ampla cama rodeada de finíssimas cortinas negras. Amber vislumbrou sangue, mas não soube de onde procedia.
— Cuida dela. Eu vou limpar o banheiro — disse Rhiannon. Recolheu o penhoar, que tinha caído no meio caminho entre o banho e a cama e o jogou para Amber. Depois retornou ao banheiro.
Amber sentou-se na cama e pôs o penhoar em Serafina. Ela não resistiu. Chorava e seu corpo inteiro se sacudia por um fluxo de emoções semelhante a uma tormenta.
— Não acontece nada, Fina. Tudo vai dar certo — Amber fechou o penhoar na frente, esticando a parte de baixo sobre as longas pernas de Serafina, e amarrou frouxamente o cinturão. Logo se inclinou sobre ela para afastar do rosto molhado o cabelo negro e encaracolado. — Faz bem chorar — murmurou. — Não é de pedra — piscou para refrear suas lágrimas, apesar de ser quase impossível contê-las.
O rosto de Fina se contraiu em uma careta dolorosa.
— É... ele não pode... Não posso. Não posso...
— Sei, sei — Amber a abraçou, apertando-a suavemente, e de repente lhe pareceu loucura estar reconfortando a uma das duas mulheres mais fortes e duras que tinha conhecido na vida. A outra estava no banheiro e, se seus sentidos não a enganavam, também estava chorando.
— É muito cruel — murmurou Serafina . — Muito cruel. Por que o tiram de mim? Por quê?
— Não sei.
Serafina estremeceu e, soltando-se dos braços de Amber, caiu na cama e se aconchegou de lado, em posição fetal, de costas para ela.
— Sabia que não devia apaixonar-me por ele.
— Não diga isso — Amber fechou os olhos e pensou que aquele era o motivo pelo qual nunca devia entregar-se a um homem até esse ponto. Nunca.
— Todas as pessoas que amo me abandonam. Minha mãe morreu ao me dar a luz. Minha irmã sempre me odiou por isso. Meu primeiro amor, André, conspirou e pôs a todo o clã contra mim. Bartrone, meu sire, caminhou para o sol um amanhecer — seus ombros deixaram de repente de tremer. — Pela primeira vez, entendo por que o fez.
— Não fale assim, Fina. Tem que ser forte.
— Estou cansada de ser forte. Estou tão cansada... — soluçou. Se Willem morrer...
— Willem não morreu ainda — disse Rhiannon com aspereza da porta da habitação . — Se seu destino é morrer, terá tempo para ficar histérica quando ocorrer. Enquanto isso, não se dê por vencida tão facilmente.
Serafina se virou e olhou Rhiannon com irritação.
— Os médicos dizem que não há esperança.
— Médicos mortais. Humanos. Idiotas. O que sabem eles de nós, de nossa espécie? Nós podemos fazer coisas que eles não podem nem sonhar, Serafina. Comparados com eles, somos deuses.
— Will não é um deus. Não é um de nós. É só um homem.
— É muito mais que isso e você sabe — Rhiannon se aproximou e tirou do bolso de sua saia de seda um frasquinho de cristal com uma rolha de cortiça. — Beba isto.
— O que é?
Rhiannon tirou a rolha.
— Uma versão modificada desse delicioso tranquilizante que inventou a DIP para utilizá-lo conosco. Eric esteve brincando com ele. Tem muitos usos para nossa espécie. Ajuda a suportar a dor. Fará você dormir.
— Não quero dormir. Quero estar com o Willem quando voltar.
— Ainda demorará horas para voltar. Já estará acordada quando retornar, prometo a você.
Rhiannon aproximou o frasquinho dos lábios da Serafina e esta engoliu seu conteúdo e fez uma careta. Logo lambeu os lábios e olhou a Amber aos olhos:
— Me alegro de vê-la.
— E eu de estar aqui.
— Sinto... tudo isto.
— Não se preocupe. Se eu estivesse em seu lugar, a estar alturas já teria destruído a casa.
Ela piscou lentamente. .
— Sabia o risco que corria. Mas não, nem sequer é um risco. Quando um imortal se apaixona por um mortal, o resultado é certo — olhou para Rhiannon . — Estava avisada.
— Isto ainda não terminou Serafina — disse Rhiannon. — Durma. Dê-me tempo para fazer o que sei de melhor.
Fina levantou as sobrancelhas.
— E o que é? Aterrorizar as pessoas?
— Fazer-me de deusa, é obvio — Rhiannon olhou Amber de soslaio, e Amber compreendeu imediatamente o que estava pensando.
Ficaram as duas ali até que Serafina deslizou em um profundo torpor. Logo Rhiannon tocou o ombro do Amber, indicou a porta com a cabeça e voltou a descer as escadas.
Edge estava fora da casa, escondido entre as sombras. Tinha ouvido o grito, o estrondo, os vidros quebrados, foi só despedir-se de Alby e imediatamente tinha aberto todos os seus sentidos e havia voltado correndo a casa, que se levantava a beira do mar.
Não tinha entrado. Não precisava. Podia ver o que acontecia do exterior. Era errado entre seus congêneres bisbilhotar dessa maneira, mas não dava importância ao protocolo e a etiqueta dos não mortos. Nunca tinha dado importância a isso. Em geral, aquele tipo de bisbilhotice não passava despercebida, mas as três mulheres do interior da casa estavam tão angustiadas que não detectaram sua presença. A mulher a que chamavam Fina sofria por um mortal que se achava à beira da morte. Willem. Era seu companheiro, deduziu Edge, que, ao sentir sua dor, teve que proteger-se contra ela, pois era muito intensa. Quase paralisante.
Não estava certo de que a Menina Prometida e sua «tia» Rhiannon eram conscientes disso, mas para ele estava claro que Serafina, a cigana, não queria seguir vivendo uma vez que Willem tivesse morrido. Seus sentidos o percebiam tão claramente como as imagens daquela mulher dançando ao redor de uma fogueira, em meio de um círculo de carretas pintadas nas quais se lia a palma da mão em troca de um pouco de prata, fazia muitíssimo tempo.
A ele, naturalmente, pouco importava. Tinha a sensação de que aquela mulher tinha conhecido em outro tempo o que ele já sabia. Quão absurdo era preocupar-se com os outros. Que estúpido e destrutivo era antepor o bem-estar dos outros ao próprio. Serafina tinha aprendido aquela lição em outro tempo. E a tinha esquecido. E agora estava pagando o preço. Morreria. Não havia dúvida. Uns dias, talvez umas horas depois da morte de seu companheiro, ela tiraria a sua vida. Edge sentiu um nó no estômago ao pensar em quanto ia doer aquilo para Alby. Logo se recordou que para ele importava bem pouco. Alby não era nada para ele.
Concentrou-se de novo. A vampiresa a quem chamavam Rhiannon, que lhe parecia extremamente velha e poderosa, e que vislumbrava entre dunas e pirâmides, templos egípcios e faraós, tinha levado Alby ao piso de baixo, onde as duas se achavam sentadas. Edge voltou a abrir seus sentidos para assistir à cena mentalmente.
Sentada em uma cadeira que parecia um trono, Rhiannon olhou para Alby e disse:
— Não podemos permitir.
— Não sei se podemos fazer algo para impedir.
— Tolices. Há uma coisa que podemos fazer. E você sabe tão bem como eu. .
— Rhiannon, não sei se...
Rhiannon levantou uma mão e Amber guardou silêncio.
— Você o viu igual a mim. Faz cinco anos, Willem atirou Frank Stiles por um escarpado. Stiles deveria ter morrido. Mas não morreu. Subiu em uma lancha e fugiu.
— Não sabemos se era ele — disse Amber suavemente, embora soubesse que, com efeito, tratava-se de Stiles. Edge sentiu que sabia, e sentiu que Rhiannon também estava certa. — O sujeito da lancha estava muito longe, nem sequer nós podíamos vê-lo com clareza. Pode ser que o mar tenha levado o corpo de Stiles.
— Não, não é verdade. Esse homem ressuscitou. Sobreviveu, e vive ainda.
— Talvez...
— Um mortal como outro qualquer, Amber. Nem sequer um Escolhido. Os rumores são certos. Stiles fabricou um soro a partir de seu sangue e se fez indestrutível. Mas, se pôde fazer uma vez, poderá de novo.
Amber baixou a cabeça.
— Não sabemos como o fez. Em suas notas não há nenhuma fórmula. Não disse a ninguém o que estava fazendo, nem sequer aos ajudantes em quem mais confiava. Ninguém sabe como o conseguiu, se é que o conseguiu: Além dele mesmo.
Rhiannon pareceu considerar aquela ideia um momento. Logo disse:
— Se tivesse a fórmula, deixaria que usássemos seu sangue para fabricar o soro?
— Daria qualquer coisa para salvar ao Willem. Isto não é diferente de oferecer um rim, ou um transplante de medula óssea. Claro que o faria.
Edge estava assombrado. Por que razão alguém estaria disposto a fazer algo assim por outra pessoa? Para ele não tinha sentido. Uma vozinha sussurrou em seu interior que ele também teria feito o mesmo fazia muitíssimo tempo. Por seus pintinhos. Pela pequena Bridget. Mas tinha aprendido que era absurdo querer às pessoas até esse ponto. Nem todo o amor do mundo podia deter a morte quando chegava.
Rhiannon posou sua mão sobre a de Amber.
— Eric quer que mande a ele todos os diários de Stiles, junto com uma amostra de seu sangue. Está trabalhando sem descanso para encontrar a fórmula.
Amber assentiu com a cabeça.
— Mas tem cópia de tudo.
— Sei. Acredito que está convencido de que pode haver algo que passou por cima, algo que a fotocopiadora não tenha registrado. Uma tinta especial, ou possivelmente alguma anotação nas tampas dos arquivos. Não sei.
— Então os enviaremos. E o sangue também. Mas... e se não conseguir a tempo?
Rhiannon assentiu com a cabeça.
— Já estou me ocupando disso. Penso encontrar ao Stiles. E me acredite, quando o encontrar, assegurar-me-ei de que me conte seus segredos.
Amber sentiu um leve calafrio. Edge sentiu seu eco. E sentiu também um repentino arrebatamento de agitação. Se a imortalidade de Stiles era resultado de um soro extraído do sangue daquela jovem, então a chave de sua debilidade se achava também dentro dela. Tudo o que lhe tinha contado a enfermeira estava certo. Stiles tinha tido que descobrir todos os segredos da garota, até os que ela mesma ignorava. Tinha que saber o que era que podia matá-la. E ele tinha que estar perto quando encontrassem Stiles. Para poder acabar com ele. Estava seguro de que Rhiannon, aquela mulher imponente, não quereria que a acompanhasse em sua caçada ao homem. Mas isso não importava. Rhiannon não ia encontrar Stiles, pensou de repente. Porque Stiles estaria ali. Ali, naquela casa. Stiles não tinha tido oportunidade de completar seus experiências com a Menina Prometida. Sua fuga devia tê-lo posto à beira da loucura. Era muito possível que, tal como Amber Lily, não conhecesse ainda toda a extensão de seus poderes. Talvez nem sequer conhecesse seus pontos fracos. E devia arder em desejos de averiguá-lo.
Sim, Stiles viria ali porque Edge tinha a isca perfeita para atraí-lo. Amber Lily Bryant. Alby.
Ganharia sua confiança. Descobriria seus segredos. Faria correr o rumor de que estava ali, e logo a usaria para atrair o seu odiado rival. E depois mataria ao Frank Stiles. Seria muito fácil.
— Rhiannon — disse Amber suavemente quando a outra se levantou. — Terá que ter muito cuidado com ele. Se o matas, nunca saberemos seus segredos.
— Oh, não o matarei. Pode ser que o faça suplicar pela morte, mas não o farei — Amber assentiu. — Você deve ficar aqui, Amber. Dante e Morgan estão a caminho, mas mesmo assim, Serafina precisa de você. E Willem também. Não tem a ninguém durante o dia. Isso não é bom estando doente — Amber assentiu. — Eu mesma levarei os diários e o sangue ao Eric.
— Meus pais também vão vê-lo, se por acaso podem dar uma mão.
— Bem. Necessitamos toda a ajuda possível — Rhiannon baixou a cabeça e sorriu levemente. — Se alguém me houvesse dito que algum dia estaria tão desesperada para salvar a vida de um mortal, teria rido em seu rosto — disse. — Mas não suporto ver essa perua sofrer tanto.
— Isso é porque recorda a você mesma — disse Amber.
— Por favor, não compare. Eu sou a filha de um faraó. Uma princesa do Egito.
— Mas ela é dura como uma rocha, altiva e desumana.
Rhiannon baixou a cabeça.
— E, entretanto ficou reduzida a... –lançou um olhar para cima, para o segundo piso. — Não suporto vê-la assim. .
— Sei — Amber baixou a cabeça e suspirou. — Então, quando quer partir?
— Assim que Willem volte — suspirou Rhiannon. — Suponho que foi boa ideia que esse cabeçudo tenha ido sozinho à consulta desta tarde. Acredito que sabia que Serafina precisava desabafar.
— E que não o faria diante dele — acrescentou Amber, fazendo um gesto de assentimento com a cabeça. — Sabe extrair sangue, Rhiannon? — começou a subir a manga da camisa enquanto falava.
Rhiannon pôs-se a rir suavemente e Amber, dando-se conta de quão irônico era perguntar aquilo a um vampiro, sorriu. Logo, sua tia assentiu.
— Eric me deu instruções bastante precisas. Tenho tudo o que necessitamos em meu quarto. Fiz uma visita noturna a uma clínica médica de Salem.
— Pois vamos lá — disse Amber, ficando em pé.
Edge tinha que ver aquilo com seus próprios olhos. Aproximou-se sigilosamente da casa e abriu seus sentidos para determinar a posição das duas mulheres. Logo se introduziu na casa, aproximou-se silenciosamente do dormitório E viu como Rhiannon amarrava uma borracha ao redor do antebraço de Amber, inseria uma agulha no ângulo de seu braço e soltava a borracha.
Um néctar escarlate fluiu da carne rosada e tenra de Amber, encheu o tubo e começou a encher a bolsa de plástico que havia em seu outro extremo. O sangue corria ao compasso do pulso de Amber. Edge sentiu um anseio repentino. Não conseguia afastar os olhos do fluxo de sangue que ia enchendo a bolsa. Lambeu os lábios. Sua paixão se agitou. Quanto gostaria de prová-la. Só uma vez.
— Esta quantia bastará – disse Rhiannon quando a bolsa estava cheia. Logo tirou a agulha, aplicou uma gaze de algodão à diminuta espetada e dobrou o braço de Amber. Depois recolheu as outras coisas. — Descanse um pouco. Eu vou guardar isto e trazer um pouco de suco para você.
Edge se escondeu em um canto quando Rhiannon saiu do quarto. Rhiannon parou no corredor, franziu o cenho e olhou de um lado e do outro. Edge tentou proteger-se. Devia ter baixado a guarda, excitado pelo sangue.
Ao ver que ela seguia seu caminho, entrou no quarto. Amber ficou espantada ao vê-lo.
— O que você faz aqui?
— Eu disse que voltaria — Edge sentiu um nó no estômago. — Senti que precisava de ajuda, que estavam tirando seu sangue. Mas vejo que interpretei mal a situação — aproximou-se da cama onde ela estava deitada.
— Não aconteceu nada, mas me alegra saber que estava disposto a vir em meu auxílio.
Edge tomou seu pulso, esticou-lhe o braço e tirou suavemente a gaze que cobria a espetada.
— Sou um herói, suponho — murmurou. Logo abaixou a cabeça e encostou os lábios na ferida. Provou o sabor de um pingo de sangue e sua mente explodiu em chamas.
Notou que ela exalava um leve suspiro, e não pôde resistir à tentação de percorrer com a língua o oco de seu cotovelo, saboreando a diminuta gota de sangue que havia nele. Um calafrio lhe percorreu até os ossos ao sentir seu sabor.
Amber não tinha o mesmo sabor de uma mulher mortal. Mas tampouco tinha o gosto de uma vampiresa. Seu sabor era distinto, exótico, e a sacudida que o percorreu quando o sangue dela tocou sua língua lhe pareceu muito mais poderosa que qualquer outra coisa que houvesse sentido antes.
Ela fechou os dedos sobre seu cabelo. Quase lhe apertou a cabeça contra seu braço. Quase. Tremia-lhe a mão pelo esforço de refrear-se. Edge o sentiu. Tudo o que ela sentia chegava até ele como um sussurro.
Obrigou-se a levantar a cabeça e se perguntou que espécie de poder era o daquela mulher. Nunca havia sentido nada semelhante, nem tinha ouvido nada a respeito daquele fenômeno nas lendas que falavam sobre a Menina Prometida. Nenhuma delas dizia que ao tocá-la sentiria uma descarga, que seu sabor pudesse ser aditivo, ou que o olhar daqueles profundos e escuros olhos pudesse ser perigoso.
Precisava afastar os olhos e refazer-se, de modo que se virou para pegar um dos curativos que havia sobre a mesinha de cabeceira. Tirou-lhe o envoltório e tentou evitar o tremor das mãos quando o pôs sobre a espetada.
— Gr... obrigado — murmurou ela.
Edge a olhou nos olhos um momento e compreendeu que estava tão comovida como ele. Pensou em beijá-la. Não para pôr em prática seu plano, mas sim porque gostava. E ele nunca se privava do que gostava. Assim que se inclinou um pouco para ela.
— Vá, vá, o que temos aqui? — perguntou Rhiannon da soleira.
Edge parou em seco e notou a expressão de alarme de Amber ao ouvir a voz da outra mulher. Amber clareou a garganta.
— Tia Rhiannon, este é Edge.
Rhiannon se aproximou. Edge se levantou, dando a volta para olhá-la, compôs seu sorriso mais encantador. Estendeu-lhe a mão.
— É um prazer conhecê-la. Ouvi falar de você. A princesa do Egito, não?
O severo e formoso semblante de Rhiannon se suavizou ligeiramente.
— Sim — estreitou-lhe a mão. — Como conheceu minha Amber Lily?
— Atropelou-me com o carro.
Rhiannon piscou e olhou para Amber perplexa.
— Foi um acidente — disse Amber. — Pensei que o mínimo que podia fazer era trazê-lo. De qualquer forma, vinha para cá.
Rhiannon levantou as sobrancelhas.
— Seriamente? E o que o trouxe para Salem Harbor, Edge?
— A Ferrari de Amber — ela fez uma careta, como se não achasse graça na piada. — A verdade é que sempre quis conhecê-la.
Ela não pareceu acreditar.
— Pois já está aqui.
Ele lambeu os lábios.
— Eu, eu... Ouvi ruídos. Posso fazer algo para ajudar?
— Temos tudo sob controle.
Ele assentiu com a cabeça e lançou um olhar para Amber.
— Então, acredito que deveria ir e... deixá-las sozinhas.
Rhiannon se separou da porta e disse:
— Foi um prazer conhecê-lo.
Amber se sentou na cama.
— Tem onde ficar?
Ele sorriu.
— Já encontrarei um lugar. Sempre encontro. Amber lançou a Rhiannon um olhar suplicante, ao qual a outra respondeu franzindo o cenho. Mas então lhes chegou outra voz de fora da casa.
— Esse é o problema das princesas. Podem ser muito grosseiras — uma terceira mulher entrou no dormitório. Levava um grosso penhoar e parecia esgotada. Arrastava um pouco os pés ao andar e tinha os olhos avermelhados, como se tivesse estado chorando ou tivesse ressaca.
Amber se levantou de um salto, e Rhiannon estendeu os braços à outra mulher, mas esta levantou as mãos e as deteve a ambas.
— Já basta.
Rhiannon suspirou, mas baixou os braços.
— Deveria estar dormindo.
A outra deu de ombros.
— Diga a seu amigo Eric que tem que revisar seu tranquilizante para vampiros. Pode ser que deixe fora do ar Rhiannon, mas a uma vampiresa tão poderosa como eu só produz um leve enjôo.
— Se estivesse em forma, cigana, ensinaria a você o que é ser poderosa de verdade — disse Rhiannon suavemente. Não era uma ameaça real.
A «cigana» cruzou o quarto e abraçou a Amber com ternura.
— Não dei boas-vindas como é devido, verdade?
— É compreensível — disse Amber enquanto a abraçava. Ao separar-se, a vampiresa observou Amber, lhe acariciando o cabelo.
— Está mais vermelho que da última vez que a vi.
— Mais violáceo que vermelho — disse Rhiannon.
Amber deu de ombros.
— Muda o tempo todo. Minha mãe diz que tenho cabelo de corvo com reflexos de sangue.
Tudo nela eram reflexos, pensou Edge. Seus olhos, negros como o ébano, voltavam-se quase azuis como a noite se olhasse de perto. Edge se perguntava se também foram transformando-se com o tempo, ou se sempre tinham sido assim. Embora pouco importasse a ele
A terceira mulher se aproximou dele e estendeu a mão, esboçando um débil sorriso.
— Sou Serafina.
Ele lhe deu a mão. O apertão de Serafina não era tão forte como teria esperado de uma vampiresa tão velha como ela. O poder do vampiro flutuava a seu redor como um nimbo. Crescia com a idade, e Edge sentiu sua profundidade naquela mulher, que parecia irradiar quase a mesma força que Rhiannon. Entretanto, aquele poder parecia escondido, ou adormecido·.
— Chamam-me Edge.
— E é amigo do Amber Lily?
Ele olhou para Amber.
— Eu gostaria de ser.
— Então pode ficar aqui, conosco.
— Poderíamos falar um momento, por favor? — Sussurrou Rhiannon.
— Serafina lhe lançou um olhar.
— Não há necessidade de ficar com secretos, Rhiannon Suponho que Edge já se deu conta de que não confia nele, e de que vigia a Amber Lily como sua Pandora vigiaria a um antílope recém caçado.
— «Pandora?», sussurrou — Edge mentalmente para Amber perguntando-se se ela ouviria e responderia:
— «Sua mascote. Uma pantera negra», respondeu ela.
Edge ficou impressionado com suas habilidades telepáticas e não soube como receber a notícia de que Rhianon tinha como mascote uma pantera, assim não disse nada.
Serafina se aproximou dele e observou seu rosto.
— Não é que a proteja demasiado, nada disso. Há muito filhos da puta por aí que dariam qualquer coisa para pôr as mãos em cima da nossa Amber Lily.
Ele tentou aparentar surpresa e olhou as três sucessivamente.
— E acreditam que eu possa ser um deles? Sou um vampiro senhoras. Um dos seus.
— É um vampiro. Mas não um dos nossos — disse Rhiannon com voz suave e ameaçadora.
Ele levantou as mãos.
— Não vim aqui procurando alojamento grátis.
Serafina deu de ombros.
— Mesmo assim não me ocorre melhor modo de vigiá-lo.
Ele sorriu
— Nem sonhe senhora — logo se voltou para Amber. — Eu me vou daqui, Alby. Mas não estarei muito longe.
Virou-se para a porta, mas Amber aproximou-se dele.
— Edge, não tem por que...
Calou-se quando ele se voltou de repente, enlaçou-a pela cintura, atraiu-a para si e a beijou na boca. Não foi um beijo longo. Não pretendia que fosse. Era uma mensagem. E Edge pensou que as vampiresas o receberam alto e claro.
Quando soltou Amber, ela o olhou com o cenho franzido, quase como se soubesse o que ele pretendia. Maldição supunha que devia estar aturdida e com os joelhos tremendo. Mas de repente parecia olhá-lo com a mesma desconfiança que as outras duas.
— Nos veremos logo — disse Edge e, dando meia volta, saiu ao corredor, desceu as escadas e abandonou a casa.
Amber fechou os olhos, ergueu os ombros e se voltou para olhar para Rhiannon e Serafina.
— Não comecem.
— Eu não gosto dele — disse Rhiannon.
— Está tramando algo — acrescentou Serafina.
— Claro que está tramando algo — Amber começou a descer as escadas, seguida pelas outras duas. Entrou na cozinha, pôs um bule no fogo e procurou em um armário o chá que Wiliem e a ela tanto gostavam. Só então se voltou e olhou às outras duas mulheres. Sentem-se.
— Amber... — começou a dizer Rhiannon.
— Disse que se sentem. Serafina vai cair se não se sentar – segurou-a pelo braço e a aproximou uma cadeira.
Serafina se sentou. Rhiannon, não. Cruzou os braços sobre o peito e transpassou Amber com o olhar.
— Amber, é muito bonito, isso eu reconheço — disse. Serafina estava de acordo.
— Bonito de morrer.
— O melhor cara que vi em toda minha vida acrescentou Amber. As duas a olharam com os olhos arregalados. — Eu não nasci ontem, sabem?
— Não. Só faz vinte e três anos — disse Rhiannon. — Ou seja, ontem.
— Pode ser para você. Mas não sou estúpida.
— Eu não disse que é estúpida, Amber, só... inexperiente.
— Com os homens, quer dizer — acrescentou Serafina.
— Não tanto para não ver quando tentam jogar comigo. Mas seriamente acreditam que engulo isso? Aparece do nada no meio de uma estrada às escuras e não noto que está lá. Tinha que estar camuflando-se sacudiu a cabeça lentamente. — Estive pensando nisso todo o caminho. A única resposta que me ocorre é que não queria que o visse antes que o atropelasse — Rhiannon piscou, olhou a Serafina e logo voltou a olhar para Amber. — E por coincidência também vinha para Salem. Vamos, teria que ser uma cretina para engolir isso.
— Mas o trouxe de qualquer forma — murmurou Serafina.
Amber assentiu e, colocando-se atrás dela, apertou-lhe os ombros.
— Sim. E sinto muito ter acrescentado mais tensão a uma situação que já é insuportável, Serafina. Não queria piorar as coisas.
— Então, por que o fez? –perguntou Rhiannon.
Amber a olhou nos olhos.
— Acredito... acredito que devia fazê-lo.
— O que quer dizer?
Amber suspirou e moveu a cabeça de um lado para outro.
— Olhem, eu sei o que faço, de acordo? Ainda não estou preparada para falar disso. Mesmo por que há coisas muito mais importantes em que pensar — inclinou-se para Serafina. — Não se preocupe por isso. Eu me ocupo de Edge. E não perca a esperança pelo Wiliem.
Serafina girou a cabeça para olhar a Amber e logo fixou o olhar em Rhiannon.
— Estão planejando algo, verdade?
Amber assentiu.
— Amber, não... — começou a dizer Rhiannon.
— Tem direito de saber — Amber se sentou em uma cadeira, junto de Serafina, pegou suas mãos e a olhou nos olhos. — Recorda quando Will me salvou do Stiles e o atirou ao mar do alto desse escarpado?
Ela assentiu com a cabeça.
— Nunca encontramos seu corpo.
— Eu acredito que seu corpo não estava ali. Rhiannon e eu... acreditamos que sobreviveu.
— Mas como...? — logo piscou e seus olhos se dilataram. — As experiências? Acreditam que teve êxito?
— Não estamos seguras — disse Rhiannon.
— Mas vamos averiguar — o bule começou a apitar suavemente. Amber se levantou para apagar o fogo. — Nosso novo amigo Edge não tem nenhuma importância comparado a isso.
Rhiannon suspirou.
— Nisso acredito que tenho que dar razão a você.
Amber pôs uma bolsinha de chá em sua xícara e a encheu de água quente.
— Rhiannon vai levar uma amostra de meu sangue ao Eric em Wind Ridge. Meus pais se encontrarão com ela lá. Já conhece o Eric. E se pode encontrar algo, encontrá-lo-á. É só questão de tempo.
— Tempo... — suspirou Serafina, baixando a cabeça . — Disso não temos muito.
— Dante e Morgan estão a caminho, Serafina — disse Rhiannon — vão trabalhar daqui para localizar Frank Stiles. Se ainda está vivo, o encontrarão. E quando soubermos onde está... — Rhiannon não acabou a frase. Não precisava.
— Pode ser que não tenha importância — disse Serafina em voz baixa. — Embora encontremos um modo de... de fazer isto... — «Deus», pensou Amber. «Nem sequer pode dizê-lo» . — Não estou certa de que Willem queira renunciar a sua mortalidade.
Amber franziu o cenho.
— Então, já falou com ele?
Serafina moveu a cabeça de um lado a outro.
— Tentamos não fazê-lo. Está tão empenhado em que vivamos o momento, tão decidido que não me torture pensando no inevitável... — levantou os olhos e disse. — Ou no que acredita inevitável.
— Então, não sabe — disse Amber. — Nem saberá até que você pergunte.
— É um homem muito teimoso.
— Não o são todos? — perguntou Rhiannon, e engoliu saliva, olhando de novo para Amber. — Mesmo assim, eu não gosto da ideia de partir enquanto esse tal Edge ronda por aqui.
— Já disse que eu me ocupo de Edge — disse Amber. .
— Nós cuidaremos dela — disse Serafina, e mordeu o lábio. — Embora suponha que isso não a reconforta, tendo em conta o que passou na última vez que tivemos Amber a nosso cuidado.
— Amber não necessita que ninguém cuide dela – disse Amber.
Rhiannon suspirou.
— Dante e Morgan chegarão muito em breve. Suponho que entre os quatro... — deixou que sua voz se apagasse.
Amber não insistiu em que podia cuidar de si mesma. Sabia que não serviria de nada. Como uma garota de vinte e três anos podia convencer a um par de imortais com muitos séculos nas suas costas que era uma mulher adulta? Era impossível. Retornou à mesa com sua infusão, sentou-se e a bebeu enquanto pedia paciência ao céu.
Edge sorriu ironicamente enquanto contemplava a igreja abandonada. Não tinha se afastado da costa da península porque gostava. Fazia muito tempo que não passava uma temporada junto ao oceano. O mar estava essa noite escuro e melancólico, e parecia ocultar um mistério em suas profundidades. Recordava-lhe os olhos de Amber Lily. E, por alguma razão, sentia a necessidade de não perdê-lo de vista. Assim esteve caminhando pela linha da praia, cobrindo vários quilômetros em muito pouco tempo. E então o viu. O alto campanário, com as vigas nuas em alguns lugares, ali onde as tábuas tinham sido arrancadas pelas tormentas e as investidas do mar. Sua cor, antigamente branca, parecia agora de um esvaído tom de cinza claro. Não era uma igreja grande. Era um simples quadrado, um pouco mais longo que largo, de costas para o mar.
Enquanto rodeava a melancólica igreja, notou que as altas janelas arqueadas, fechadas com portinhas antigamente vermelhas, estavam vedadas com tábuas cruzadas. As portas duplas da fachada estavam também vedadas. Em outra época tinha havido uma escadaria, mas o tempo tinha carcomido os degraus, dos quais só restavam alguns pedaços de madeira roídos, rodeando um quadrado de dois metros de terra negra que se abria sob as portas como uma espantosa cicatriz.
Em ambos os lados da igreja tinha árvores mortas, na frente do edifício se levantavam um punhado de arbustos, rodeados de um ralo matagal de ervas daninhas. Edge encaminhou para ali e encontrou a estreita vereda pela qual possivelmente já não passava ninguém. Tinha um sulco de erva no centro e esvaídos rastros de pneumáticos a cada lado. Certamente tinha sido substituída por uma estrada de asfalto, mais reta, várias décadas atrás. Talvez tivessem construído uma igreja nova junto à estrada. Mas aquela não se usava fazia muito tempo.
Aproximou-se do lado em que as ervas daninhas eram mais densas e arrancou sem esforço as tábuas. Logo abriu os postigos para deixar visível a janela quebrada. Se não estivesse arrebentada, teria que quebrar de qualquer forma. Não pensava em arrancar as tábuas das janelas que davam à praia, por onde podia passar algum transeunte e notá-lo. E as portas dianteiras também eram mais fáceis de ver, se alguém passasse por ali. Tinha que ser por aquele lado ou nada.
Afastou os vidros quebrados, tomando cuidado de não cortar-se. Não queria sangrar até morrer antes que amanhecesse Logo agarrou à parte de debaixo da janela e saltou através dela, apoiando os pés na parte de dentro.
Enquanto sacudia as mãos, deu uma olhada ao redor.
As paredes estavam descascadas; as tábuas do chão, quebradas; e as teias de aranha formavam um denso manto. Foi afastando ao entrar na igreja. Ficava um par de bancos, como os poucos dentes de um velho.
Na parte dianteira, o chão se elevava, embora não havia altar. Viu uma porta mais à frente do estrado, aproximou-se dela e tentou abri-la, admirando o intrincado desenho do trinco de bronze, enegrecido pelo tempo. A porta estava torta, não queria mover-se, mas ele era um vampiro e não estava de humor para tolices. Deu um empurrão e a porta cedeu de repente e ficou pendurada de um lado, pois faltava uma dobradiça.
Edge entrou no cômodo. Era um quarto pequeno; certamente, um armazém. Na parede do fundo havia estantes; inclusive havia uma caixa ou duas, cobertas de mofo. Tirou uma de uma prateleira. O fundo bolorento cedeu e o conteúdo da caixa caiu sobre seus pés.
Velas.
Edge sorriu. Perfeito. Tudo que um vampiro necessitava para sentir-se como em casa. Uma abertura no chão levava a um pequeno porão no que mal havia espaço para ficar de pé. O chão estava sujo; as paredes de pedra, escoradas, não tinham nenhuma pingo de cimento. Edge assentiu com a cabeça, gostando, e retornou ao piso de cima, onde pendurou sua mochila em um banco. Logo levantou um dos outros dois bancos, levou-o a parte dianteira e o colocou no centro do estrado onde em outro tempo tinha estado o altar.
Retornou a por sua mochila, abriu-a e tirou um saquinho que levou com ele. Do saquinho extraiu vários objetos pequenos que foi colocando com toda delicadeza em círculo sobre o banco. Uma navalha automática, com punho de madeira, com as iniciais do Billy Boy gravadas na parte de trás. A lua crescente de prata que Ginger levava na orelha. A pluma de ouro do Scottie. Scottie sempre tinha tido alma de poeta. E as presilhas de opala que Bridget costumava usar no cabelo.
Edge tirou um punhado de velas do armazém, usou seu acendedor para acendê-las, deixou que a cera gotejasse sobre o banco e foi colocando direitas as velas sobre ele, para que não caíssem, formando um círculo ao redor de sua pequena coleção de lembranças, sobre as quais dançava a alegre luz das chamas.
Sua família. Aqueles objetos representavam a sua família. A única que tinha conhecido. A única que amava, porque não desejava voltar a sentir aquela dor. As pessoas que representavam tinham morrido fazia muito tempo. Caçadas e executadas por um homem chamado Frank W. Stiles. E Edge estava mais perto que nunca de encontrá-lo e de desabar finalmente sobre ele sua vingança.
— Está muito bonito — disse Amber ao Will quando voltou para casa.
— Esperava outra coisa? — ele deixou de lado sua bengala e a abraçou.
Amber notou que seus braços continuavam a ser fortes e poderosos. Sorriu e lhe devolveu o abraço. Não queria admitir que tivesse esperado outra coisa. Will tinha câncer, estava sentenciado a morte. Ela esperava que estivesse pálido e débil, que tivesse perdido peso. Mas não era assim. O cabelo havia se tornado branco. Seu rosto parecia mais magro, e tinha mais rugas ao redor dos olhos, mas pareciam mais produzidas pela risada que pelo passar do tempo. E embora sua claudicação fosse mais pronunciada que antes, isso podia ser por diversas razões, além do câncer.
— Não pareço um doente terminal, não é pequena? — perguntou ele.
Amber estremeceu, mas conseguiu conservar seu sorriso.
— Parece saudável como um cavalo. Parece que é preciso algo mais que um pequeno câncer para vencer a um coronel das Forças Especiais.
— Um coronel reformado — disse ele, e voltando a pegar a bengala, lavrada e pintada com intrincados desenhos, que Serafina tinha comprado para ele em uma viagem recente a África, aproximou-se coxeando aonde sua companheira permanecia sentada. Inclinou-se sobre Fina, deslizou-lhe uma mão sobre os ombros e se agachou para lhe beijar o pescoço. Ela fechou os olhos. Tinham dado a volta ao mundo, os dois juntos. Para Amber, aquilo parecia à coisa mais romântica que podia imaginar. Felizmente, tinham gozado do tempo que lhe tinham concedido. No caso de estar chegando a seu fim.
Amber rodeou a mesa e afastou a cadeira que havia junto à de Serafina.
— Sente-se, Willem, e tome um chá comigo.
Ele lhe sorriu.
— Faz muito tempo que não tomo um chá com alguém — Fina o olhou com uma careta brincalhona, e lhe deu uns tapinhas na mão. — Não é que me queixe.
Amber serviu o chá e Willem se sentou. Seu olhar penetrante deslizou atentamente pelo rosto de Serafina, e Amber compreendeu que tinha notado algo. Talvez um indício da crise que sua mulher tinha sofrido durante sua ausência. Serafina tinha conseguido refazer-se a toda pressa. Tinha arrumado o cabelo, maquiado e vestido. Mas Will a conhecia muito bem para não notar que acontecera algo estranho.
Rhiannon também se sentou.
— Bom, vai dizer logo ou tenho que adivinhar? — perguntou Willem quando Amber pôs o chá diante dele.
Amber franziu o cenho.
— Dizer o que?
Ele fez uma careta, sacudiu a cabeça, bebeu um gole de chá e deixou a taça sobre a mesa.
— Vamos, menina, conheço-a. E conheço sua tia e a minha mulher. Estiveram fazendo planos — Amber umedeceu os lábios e afastou o olhar. — Não o faça, Amber — disse suavemente. — Não tente encontrar ao Stiles — fixou seu olhar na Serafina e logo em Rhiannon. E prosseguiu. Se averiguar onde está Amber, virá atrás dela. Sabem muito bem. Não vale a pena arriscar sua vida pela remota possibilidade de salvar a minha.
— Não acredita que eu tenho que tomar esta decisão? — perguntou Amber.
Ela olhou-o nos olhos.
— Suponha que funcione, mas que a mate. Espera que eu viva com essa carga sobre minha consciência?
— Você arriscou sua vida para salvar a minha, Will. Só pretendo devolver o favor.
— Você é só uma menina.
Ela baixou o olhar para a bengala, que estava apoiada contra a mesa, junto à cadeira de Will. Logo levantou bruscamente o olhar e o fixou no outro lado da sala. A bengala saiu voando como uma flecha certeira, tão rapidamente que o ar zumbiu. Exatamente antes que se cravasse na parede, Amber levantou uma mão e a bengala se deteve em seco. Ela girou a mão e a bengala ficou em posição vertical; logo cruzou rapidamente a sala e foi posar sobre a palma de Amber. Ela a deixou no chão, apoiada contra a mesa.
— Não sou só uma menina, Will. Pode ser que pareça jovem. Pode ser que o seja, cronologicamente falando. Mas sou descendente direta do vampiro mais poderoso que conheço — dizendo isto, olhou para Rhiannon. — Você fez ao Roland; Roland fez ao Eric; Eric, a Tam, e vocês juntos salvaram a meu pai de uma morte certa quando lhe deram seu sangue para transformá-lo em um de vocês. Esse sangue corre por minhas veias. Pode ser que não seja uma vampiresa, mas tampouco sou humana. E sou mais forte do que acreditam.
Will assentiu lentamente.
— Sei. Mas cresceu protegida desde menina. Nunca teve que lutar para sobreviver. Matar ou morrer, Amber. Isso não é algo que se aprenda da noite para o dia, e não é fácil. Não importa quão forte seja. A experiência valem muito mais que a força. E embora você tenha força de sobra, tem muito pouca experiência.
Sustentou-lhe o olhar e disse:
— Rhiannon vai levar ao Eric e a Tam uma amostra de meu sangue esta noite. Trabalharão com ela no laboratório do Eric com ajuda de meus pais e do Roland. Pode ser que encontrem a resposta. Pode ser que não tenhamos que colocar ao Stiles nisto, se é que está vivo.
— Oh, claro que está vivo — disse alguém.
Todos olharam para a porta, onde permaneciam os dois recém chegados: Dante, forte e poderoso, e Morgan, sua companheira, menor e de aspecto frágil.
Dante fixou os olhos em Serafina e lhe sustentou o olhar. Ela tremeu ligeiramente e ficou em pé, e Amber compreendeu que lhe custava mais que nunca refrear suas emoções agora que seu amado Dante estava ali. Dante se adiantou e a apertou entre seus braços.
— Já estou aqui, minha preciosa Fina. Sempre estarei aqui.
— Não faça essas promessas, Dante — murmurou ela. — Já sabe que a vida é incerta quase sempre e, às vezes, cruel.
Ele fechou os olhos como se sentisse sua dor. Serafina era parente dele, tia ou tia avó, Amber não estava certa; da mesma turma de ciganos. Mas, em realidade, eram como irmãos. Amavam-se, brigavam e faziam as pazes, como irmão e irmã.
Amber esperou até que se separaram. Não conhecia Morgan, a noiva de Dante, embora tenha visto todos os seus filmes. Ainda estavam sendo produzidos, embora a ela acreditassem morta. Supostamente, sua irmã tinha encontrado vários baús cheios de roteiros escritos por ela e que não foram levados ao cinema. Morgan tinha ganho mais prêmios morta que a maioria dos roteiristas enquanto viviam. Além disso, seus filmes eram bons.
Quando acabaram de fazer as apresentações, Willem disse:
— O que queria dizer com que Stiles está vivo?
Dante separou uma cadeira para Morgan e ficou de pé. .
— Já sabe que Morgan e eu somos sócios ocultos da agência de detetives de sua irmã no Maine. Temos... certas informações. De mortais e de não mortais. Stiles foi visto numerosas vezes desde seu ultimo encontro, faz cinco anos.
— Estão certos de que era ele? — perguntou Will.
— Não, mas há provas circunstanciais suficientes para me convencer de que era ele — Will esticou os lábios. — Acredita que não deveríamos persegui-lo? — perguntou Dante.
— É lógico ter dúvidas — disse Morgan em voz baixa . — Stiles é muito perigoso, uma ameaça para todos nós. Esteve a ponto de me matar duas vezes, Dante. Mas sobre tudo é perigoso para Amber.
Willla olhou e assentiu com a cabeça.
— Obrigado. Alegra-me que alguém mais compreenda quão arriscado é isto, com exceção de mim. Prefiro dar ao Eric algum tempo para que trabalhe no laboratório com as amostras do sangue de Amber, antes de expormos a esse monstro nisto.
— Mas permitirá que irem atrás do Stiles como último recurso? — perguntou Serafina, cheia de esperança.
— Não responda sequer, Will — disse Amber. — Não importa se nos dá permissão ou não. Se Eric não conseguir descobrir a fórmula, nós encontraremos ao Stiles.
Will baixou a cabeça.
— É muito teimosa.
— Tão teimosa como você, Will. E não estou disposta a me dar por vencida.
— Mesmo se não formos atrás de Stiles — disse Morgan , — podemos começar a seguir seu rastro. Trouxemos nossos arquivos, tudo o que pudemos reunir sobre esse homem e, se não lhes importar, podemos instalar um computador aqui, conectamos a rede e continuar procurando pistas.
Serafina assentiu com entusiasmo, mas logo se deteve e olhou ao Will. Ele assentiu também, exalando um profundo suspiro.
— Mas tomem cuidado. Não quero que corra a noticia de que Amber está aqui. Seria muito arriscado.
— De acordo — disse Dante, e Amber levantou os olhos ao teto.
— Já que estão todos aqui — disse Rhiannon, — acredito que posso partir. Confio em que Serafina e Amber lhes ponham a par da outra complicação que surgiu.
— Não sabemos se é uma complicação se apressou a dizer Amber.
— Mas o averiguaremos — disse Rhiannon.
Ao despedir-se, Rhiannon abraçou ao Amber com força e lhe sussurrou ao ouvido:
— Não abaixe a guarda com esse Edge. É poderoso, menina. Não é muito velho, mas mesmo assim é poderoso. Sinto o poder que emana.
— Então possivelmente seja teu parente — Amber a acompanhou até seu carro.
Rhiannon franziu o cenho.
— A verdade é que, se não estivesse tramando algo contra a menina que mais amo no mundo, até eu gostaria dele.
— Prometo que tomarei cuidado. E, Rhiannon... A vampiresa a olhou levantando uma sobrancelha.
— Oh, não — disse. — Não me peça que não fale com seus pais sobre Edge.
— Não vou pedir isso — disse Amber — vou insistir nisso.
— Rhiannon franziu os lábios e cruzou os braços sobre o peito.
— Amber...
— Seriam capazes de apresentar-se aqui com lança-chamas e besta que disparassem estacas meladas em alho e em forma de cruz, se soubessem.
Rhiannon sorriu levemente, mas seu sorriso se desvaneceu pouco a pouco.
— Cedo ou tarde terão que sabê-lo, Amber.
— Prefiro que seja tarde.
— Sabe que não vão gostar.
— Então, quanto mais demorem em descobrir, melhor — disse Amber. .
— Não sei...
— Rhiannon, Will tem razão de que me falta experiência. me deixe fazer isto a minha maneira. Deixa que averigúe por minha conta o que está tramando Edge e por que me escolheu como meio para consegui-lo — deu de ombros. — Além disso, sempre há uma pequena possibilidade de que esteja simplesmente ligado em mim. Enfeitiçado por minha beleza, cativado por minha intuição aguda e enfeitiçado por meus infinitos encantos.
— Oh, não tenho duvidas disso — disse Rhiannon com um sorriso — Como você mesma disse aí dentro, meu sangue corre por suas veias.
Amber fez girar os olhos e observou ao Rhiannon meter-se no Mercedes e afastar-se entre as sombras. Logo se voltou para a porta, onde esperavam Dante e Morgan, dois vampiros que, por sorte, não a conheciam desde seu nascimento e que, portanto, não a viam como uma menina, e sim pelo que era.
Amber entrou com eles e, como era uma dos dois únicos mortais que havia na casa, disse que estava cansada e que precisava tirar um momento para si, embora na realidade fosse só uma desculpa para sair às escondidas e dar um passeio pela praia.
Enrolou as pernas das calças, tirou os sapatos e ficou chapinhando pela areia lambida pelas ondas geladas e pelas rochas da borda. Mas não era dar um passeio o que queria, nem a solidão o que procurava, e sabia.
Aquietou sua mente, abriu-a e pôs o rosto do Edge ante seus olhos. Conhecia já intimamente seu rosto. Levava muito tempo vendo-a em sonhos.
Chamou-o em silêncio. .
Ele respondeu imediatamente. E Amber teve a sensação de que estava esperando sua chamada.
— Tem todas as comodidades de um lar, não acha?
Edge estava de pé na janela de uma igreja em ruínas e abandonada. Tinha aberto os postigos e tinha falado suavemente enquanto ela seguia as vibrações que emanava ao longo da praia. Girou e esquadrinhou a escuridão. Via bem no escuro, não tão bem como um vampiro, mas muito melhor que um humano.
Era sempre assim, pensou Amber ao vê-lo ali e, alterando seu rumo, girou para a igreja. Todos os seus atos, todos os seus talentos, comparava-os com as normas dos não mortos e dos vivos, tentando averiguar onde encaixava. .
Aproximou-se da janela e ficou no chão, levantando o olhar para ele.
— Sua luxuosa casa na praia tem porta ou...?
Edge se inclinou e lhe estendeu a mão. Ela a deu e ele a puxou, levantou-a E a colocou dentro da igreja.
Ao aterrissar, seus corpos se chocaram, E Edge a enlaçou pela cintura para que não perdesse o equilíbrio.
Ela levantou a cabeça, viu um brilho mal intencionado em seu olhar e a expressão provocadora de seu sorriso. Sentiu a firmeza de seu corpo e a força de seus braços estreitando-a. Era delicioso.
Edge a soltou em seguida e, dando a volta, começou a passear pela igreja ruinosa. Ela esquadrinhou o lugar, notando cada detalhe. A mochila pendurada de um dos bancos, o banco colocado sobre o assoalho, os estranhos objetos colocados sobre ele, entre um círculo de velas recém apagadas. Ele a observou olhar a seu redor.
— E então? — perguntou. — Você gosta?
— É uma pocilga.
Ele encolheu os ombros.
— Sim, mas é meu lar — ele sacudiu o pó de um banco vazio e ela se sentou.
— Deveria ter ficado conosco na casa. Poderia ter tido sua própria habitação, uma cama suave, sanitários...
— Aqui tenho meu próprio sino — ao ver que ela franzia o cenho, assinalou para cima, e Amber viu a corda que saía de um buraco do teto. — Há uma ao outro lado dessa corda.
— Se a tocas, descobrirão seu esconderijo.
— É um dilema.
Ela sorriu.
— Bom, para que esse pequeno altar? — assinalou com a cabeça o banco com as velas e as outras coisas. — É vodu ou algo assim?
— São só lembranças.
Amber se levantou e se aproximou do banco para dar uma olhada.
— Importa-se?
Ele deu de ombros e Amber examinou atentamente aqueles objetos. Inclusive pegou um par deles. Um brinco, um par de presilhas.
— Usava um brinco e presilhas quando estava vivo?
— Não exatamente.
Ela tomou a navalha e observou as iniciais gravadas ao longo da haste. B. R.
— Estas coisas não são suas, verdade?
— São agora.
Edge a olhava com inquietação. Tocarem suas coisas deixava-o nervoso. Ela deixou cuidadosamente a navalha sobre o banco.
— Se não quer falar disso, diga-me.
Ele deu de ombros e voltou-se.
— Bom o que é o que acontece? Na mansão, quero dizer.
A casa do Harbor Salem não era uma mansão. Amber afastou os olhos. .
— Já falei do Willem. É mortal e está doente.
— Vai morrer — disse ele.
Ela suspirou.
— Não, se eu puder impedir.
— Mas esse é o problema, não? — ela o olhou com irritação. — Que você não pode impedir.
Amber deu de ombros.
— Pode ser que o surpreenda.
Ele lambeu os lábios.
— Essa princesa egípcia... tirou seu sangue, verdade?
Amber franziu o cenho.
— Com meu consentimento.
— Pareceu isso para mim. Se não, a teria feito em pedaços.
Amber esboçou um sorriso. Edge notou e inclinou a cabeça. .
— O que acontece? Acredita que eu não poderia com ela?
— Não é que o acredite. É que sei.
Ele fez girar os olhos.
— Sou mais duro de que o que pareço, sabe?
— Parece bastante duro. Não fique irritado.
Ele suspirou. .
— Dá no mesmo Se tivesse acreditado que estava fazendo mal a você...
— Teria me defendido, não é?
— Você duvida? — estava de repente muito sério; seus olhos se obscureceram e tinham uma expressão de profunda emoção.
Amber teve a sensação de que estava mentindo, mas decidiu acreditar. Ele se aproximou, acariciou-lhe a bochecha com uma mão e se inclinou para ela. Ia beijá-la. E Amber queria que o fizesse, mas sabia perfeitamente que perderia o domínio de si mesma assim que seus lábios a tocassem. Assim falou bem antes que a beijasse, enquanto ele permanecia com os olhos fechados e seu fôlego lhe acariciava o rosto.
— O que quer realmente de mim, Edge?
Ele abriu os olhos, surpreso. De repente, parecia um menino a quem tivessem surpreendido com a mão no pote de bolachas. Mas se refez em seguida, ocultou aquela expressão de culpabilidade e a substituiu por um olhar malicioso.
— Tinha pensado começar por uns beijos. A partir daí, me ocorrem toda espécie de coisas.
Amber sentiu um pequeno nó no estômago, apesar de Edge não ter falado claramente de sexo. Não precisava. Aquele homem gotejava sexualidade.
— Além disso — disse com voz áspera, pois de repente sentia seca a garganta. — Por que se lançou sobre meu carro ontem à noite? Por que o interesso agora?
Ele piscou aparentemente confuso.
— Você tem reflexo, Alby?
Ela assentiu surpresa.
— Sim, por quê?
— Porque estava me perguntando se alguma vez você tinha se olhado no espelho.
Ela fez girar os olhos, pensou que não devia permitir que suas palavras lisonjeiras a desviassem de seu propósito e se soltou suavemente de seus braços.
— Se já se olhou, por que me acusa de fingir desejá-la?
— Só faz vinte e quatro horas que me conhece, Edge, e a metade delas passou dormindo.
— Desejei-a depois de dez segundos após conhecê-la – respondeu ele, e logo deu de ombros — Mas, dado que é mulher e meio mortal, suponho que acredite que é necessário conhecer bem a uma pessoa antes de embarcar em um transação de prazer mútuo.
— Pois sim. Sobre tudo, com alguém que não foi muito sincero a respeito seus motivos.
— Eu fui perfeitamente sincero, Alby. Não jurei amor eterno, e digo cara a cara que nunca o farei. Demônios, neste momento nem sequer sei se gosto de você. Isto... — disse, e passou um dedo por sua bochecha até que ela estremeceu. — É puramente físico — deslizou lentamente a mão por seu pescoço, até seu ombro, e dali a suas costas, seguindo a curva de sua coluna. As pontas de seus dedos deixavam em seu rastro uma delicada onda de prazer. Sua mão seguiu baixando, até que Amber se afastou.
— Eu não gosto de me privar de nenhum prazer — disse ele suavemente.
— Então serei eu quem se priva.
— Demônios — ele deixou escapar um profundo suspiro e se sentou em um dos bancos. — O que faz aqui, Alby? Se não veio para estar comigo, o que faz aqui?
Ela mordeu o lábio.
— Já lhe disse, quero saber por que o interesso. O que fazia nessa estrada?
— Ia caminhando para Salem.
— Por quê?
— Porque o carro quebrou. Já lhe disse isso.
— E por que se jogou na frente do meu carro e fingiu que eu tinha atropelado você?
Ele franziu os lábios, olhou ao chão e suspirou.
— Está bem. Está bem, é muito esperta para mim. Tem razão. Pensei que era o melhor modo de conseguir que alguém me levasse — umedeceu os lábios e esquadrinhou seus olhos. — Mas não tinha nem ideia de quem era. E não tenho por que a enganar agora. Já consegui que me trouxesse. A questão agora é como vou conseguir fazê-la mudar de ideia — ela afastou o rosto e sentiu que se ruborizava. — Quanto tempo vais ficar te em Salem Harbor, Alby?
Ela deu de ombros.
— Depende. Há... um homem que talvez possa me ajudar a salvar Willem. Se descobrir onde está, irei imediatamente.
Ele assentiu devagar.
— Então teremos que aproveitar o tempo, não acha? — ela levantou as sobrancelhas e se voltou para ele, surpreendida. — Não me diga que esqueceu nossa conversa no carro. Prometi ajudar você a descobrir quem é — Edge deu de ombros. — E assim, já que estou nisso, talvez possa enrolá-la para que tire a roupa. .
— É mesmo — suspirou ela. — E como pensa fazê-lo?
— Enrolá-la para tirar a roupa?
— Me ajudar a descobrir quem sou — para falar a verdade, estava mais interessada na outra opção. Uma metade sua temia o que Edge pudesse fazer. E a outra metade esperava ansiosa.
— Volta aqui amanhã à noite e mostrarei a você.
Ela umedeceu os lábios, nervosa.
— Não espere nada em troca, Edge.
— Oh, eu não espero. Eu exijo.
Ela levantou as sobrancelhas.
— Ah, sim?
— Mmm... mmm.
— O que?
— Isto — ele se levantou do banco, aproximou-se lentamente dela, olhando-a fixamente. Amber não se afastou; nem sequer lhe ocorreu fazê-lo. Ele a agarrou pelas mãos, apertou-a contra si, esfregou-se contra ela, e ela não se afastou. Não, ficou ali parada, enquanto Edge se apertava contra ela, e inclusive talvez tenha se esfregado um pouco contra ele. Edge inclinou a cabeça para um lado; ela a inclinou para o outro, e ele se inclinou lentamente. Bem antes que seus lábios se tocassem, murmurou:
— Naturalmente, não exigirei minha recompensa até que tenha cumprido minha promessa.
Começou a afastar a cabeça, e Amber se ouviu dizer:
— Nem o sonhe — largou suas mãos, agarrou-o pela nuca e o atraiu para si para beijá-lo na boca.
Sentiu que ele esboçava um sorriso enquanto o beijava; logo, os lábios de Edge tremeram e se entreabriram, e seus braços a enlaçaram pela cintura e a apertaram contra ele. Edge a obrigou a abrir um pouco mais a boca e afundou a língua nela como se estivesse sedento. Amber ouviu um gemido, mas não soube se era dele ou dela, e sentiu que seu sangue ardia como lava que se deslizasse sob sua pele. Por fim, enquanto ela tremia, Edge levantou a cabeça e sussurrou:
— Meu deus, Alby, poderia comê-la viva.
Aquelas palavras e o ávido fulgor de seu olhar causaram em Amber uma súbita pontada de pavor. Nunca um vampiro a tinha mordido. Ignorava como era aquela experiência, mas sabia que Edge podia perder facilmente o controle e sangrá-la até a morte.
Ele afastou o cabelo de seu rosto.
— Não, Alby, não me refiro a isso — deu de ombros. — Embora também fosse bom. Acredito que farei ambas as coisas antes que nos digamos adeus.
Ela resmungou uma maldição, enfurecida pelo arrebatamento de desejo que suas palavras despertavam nela.
— Eu... tenho que ir.
— Mas voltará amanhã à noite — disse ele e logo esboçou um lento e malévolo sorriso. — Asseguro-lhe isso.
Amber piscou, deu meia volta e se aproximou da janela. Saiu de um salto e aterrissou pesadamente no chão. Depois pôs-se a correr com todas suas forças para a casa.
Edge tinha, em sua opinião duas opções. Podia seduzir Amber e esperar que seus amigos e ela encontrassem a pista de Frank Stiles, e logo segui-los até ele. Ou podia seduzir Amber e seguir adiante com seu plano de fazer correr a voz de que a Menina Prometida estava na zona de Salem e utilizá-la como isca para atrair Stiles. Em qualquer caso, faria algo. Pensava seduzi-la desde o começo, desde que a tinha visto pela primeira vez. Mas o que não tinha previsto era que seu ardor pudesse surtir aquele efeito sobre ele. Nunca tinha desejado tanto a uma mulher. Confiava em que ela fosse tão forte como dizia ser, porque, se não, o mais provável era que lhe fizesse mal. Fazê-la sua era um estímulo inesperado. Seria tão gratificante como matar Stiles.
Perguntava-se se devia esperar uns dias. Dar tempo aos amigos de Amber para que procurassem o rastro do Stiles. Dar a si mesmo mais tempo para conhecer a Amber, para satisfazer todas suas fantasias e dissipar todas suas inibições. No fim das contas, se ia utilizá-la como isca, ela corria certo risco. Embora não lhe importasse, é obvio. A única coisa que lhe importava era seu objetivo.
E, para demonstrá-lo, devia agir o quanto antes. Mas se asseguraria de apanhar Stiles antes que pudesse aproximar-se de menos de uma milha do Amber Lily. Seria uma pena se ocorresse algo a aquela garota antes que ele satisfizesse seus desejos.
A casa estava em silêncio. Tinha amanhecido fazia meia hora, e todos, salvo Amber, sumiram-se no sonho semicomatoso dos não mortos. Inclusive Will se deitou. Amber o viu profundamente adormecido em sua enorme cama, junto à Serafina.
Aquilo lhe dava tempo para pensar no que tinha averiguado sobre Edge essa noite Dante e Morgan tinham transformado um dos quartos da casa em uma espécie de quartel general de busca. No quarto havia dois computadores com modem incorporado, um telefone com várias linhas e um fax. Se não fosse pela cama, que estava colocada de lado em um rincão, teria parecido mais um escritório que um dormitório.
Amber passou um par de horas ali, lendo a informação que Dante e Morgan tinham conseguido reunir sobre o Stiles. Havia pastas inteiras. Mas nada substancial. Várias fotografias desfocadas que podiam ser do rosto desfigurado do Stiles ou de qualquer outro homem. Numerosos relatos de testemunhas presenciais anotados com todo detalhe e que nada esclareciam. Não encontrou indício algum sobre seu paradeiro; nem sequer sobre a zona geográfica precisa em que podia estar. Paris, Albany, San Diego, Houston. Olhou o mapa-múndi parecido em um painel de cortiça que pendurava da parede do quarto, e compreendeu o que significavam aquelas tachinhas de cores. .
Conectou-se a internet e procurou alguma pista sobre o Stiles, mas não conseguiu nada claro. Por fim cedeu ao sonho que começava a apoderar-se dela. Não precisava dormir muito. Nunca lhe tinham feito falta as oito horas de sono que as pessoas normais necessitavam, possivelmente pelo que era, ou possivelmente porque seus pais só despertavam de noite. Fosse pelo que fosse o caso era que tinha o costume de dormir por parcelas, uma hora ou dois de vez em quando. Seu corpo parecia saber quanto descanso necessitava, e sempre despertava quando tinha dormido o suficiente.
Nesse momento, seu corpo lhe aconselhava que fosse à cama. E isso fez. Dormiu profundamente, e teve sonhos eróticos em que apareciam Edge e ela, se abraçando e retorcendo um contra o outro, e nos quais ele declarava entre sussurros amor eterno junto a toda espécie de promessas obscenas.
Quando despertou, estava suando e seu coração pulsava a toda pressa. Levantou-se, e de repente se alegrou de ter sonhado com Edge sem experimentar uma preocupante sensação de aflição e impotência, e sem que a presença da morte se abatesse sobre ela. Foi direto à ducha e notou que o sol estava já muito alto e brilhava com força. Logo preparou uma terrina de cereais de fibra com uma banana cortada em rodelas e se sentou para comer vestida com a bata, com uma toalha na cabeça.
— Isso tem boa cara. Acredito que eu também quero.
Ao levantar o olhar, viu que Will entrava coxeando na cozinha. Levava postos uns jeans e uma camiseta. Ia descalço e tinha o cabelo algo revolto. Amber se levantou e o abraçou, rodeando com os braços seu robusto pescoço. Custava acreditar que estivesse doente. Essa manhã, entretanto, parecia exausto, como se tivesse passado umas horas particularmente ruins.
— Alegra-me muito que esteja aqui, Amber. Sentíamos saudades de você. E reconheço que me sinto um pouco sozinho, sendo o único humano que há por aqui. Sobre tudo, durante o dia.
— Diz isso a mim — ela se virou e lhe ofereceu sua cadeira. Ele a aceitou. — Coma isso. Eu vou preparar outro para mim — ele ameaçou protestar, mas Amber virou-se para o balcão para preparar outra terrina de cereais com rodelas de banana e, como só demorou uns segundos, Will fechou a boca e começou a comer.
Amber voltou para a mesa com a terrina de cereais e se sentou.
— Claro que eu não sou de todo humana. Tecnicamente.
— Está acordada e é de dia. A mim isso parece bastante humano.
Ela sorriu, compreendendo que Will tentava dar à conversação um tom leve.
— Deveria contratar a algum mortal para lhes ajudar. Eu não sei como teria sobrevivido se Susan e Alicia não me tivessem feito companhia.
Ele sorriu.
— Mas essas duas são únicas. Tem sorte de ter encontrado gente em que possa confiar como nelas.
— São minha família. — Amber ficou a comer os cereais, deixando que um cômodo silêncio se estendesse entre eles. Logo os dois disseram ao mesmo tempo:
— Como se sente?
Amber sorriu, e lhe devolveu o sorriso.
— Você primeiro, já que é você quem tem câncer — disse ela.
— Você tão franca como sempre, não é?
— E espero que você também o seja.
Ele franziu os lábios.
— Sinto-me como sempre a maior parte do tempo. Mas de vez em quando me dão uns dores de cabeça espantosos, tenho náuseas e enjôo, e fico completamente inutilizado até que passa a enxaqueca. Depois, estou fraco e trêmulo um dia ou dois.
— Hoje teve uma dessas dores de cabeça — disse ela. Ele não o negou. — Quanto duram? — perguntou, agradecida porque foi sincero com ela.
— O primeiro durou dez minutos. Depois começaram a fazer-se mais longas. Meia hora, uma hora. Duas.
— E a de hoje? — perguntou ela.
Ele franziu os lábios e olhou seu relógio.
— Quatro horas e meia.
— Deus. Não podem dar nada para a dor?
— Podem me dar morfina suficiente para me deixar inconsciente até que passe. Mas não quero.
Ela assentiu com a cabeça, franzindo os lábios. Sabia que Willem preferia suportar a dor e conservar o domínio sobre si mesmo.
— São frequentes? — perguntou ela.
— Cada vez mais, sim. Agora tenho uns duas por semana.
Ela ergueu um braço e lhe acariciou a fronte.
— Sinto-o muitíssimo, Will. Não é justo.
— A vida não é justa. Eu vivi melhor que muita gente, assim não me queixo.
— Tem razão.
— É Fina. quem me preocupa. Francamente, não acredito que aceite bem se... — olhou-a aos olhos. — vai necessitar toda a ajuda que seja possível. E, mesmo assim, não sei se poderá suportá-lo.
— Também me preocupa — reconheceu ela. — Todos a apoiaremos, Will, já sabe. Afinal, é o único que podemos fazer. O resto depende dela.
— Sei — ele sorriu. — Agora é com você. O que é o que acontece? — antes que ela pudesse falar, acrescentou. — E espero que seja igualmente franca comigo, Amber.
Ela apertou os lábios.
— Está bem. Eu... bom, não estou do todo segura, mas acredito que não envelheci desde o que aconteceu em Connecticut.
Ele franziu o cenho e pareceu olhá-la com mais atenção. Logo inclinou a cabeça.
— Bom, entre os dezoito e os vinte e três anos não se produzem muitas mudanças, sabe?
— Sim,sei.
— Mas, mesmo assim, suponho que deveria haver algum.
— Estive observando a Alicia que é, por certo, a única pessoa com quem falei sobre isto, assim que isto deve ficar entre nós — ele assentiu com a cabeça. — As mudanças são sutis. Muito sutis, mas Alicia mudou. Seu rosto mudou. Tem os quadris um pouco mais largos, e não é porque tenha engordado. É porque cresceu, entende?
— Sim — Willem franziu o cenho. — Você cresceu normalmente até que Stiles a apanhou, passou de ser um bebê a ser uma menina pequena, logo uma adolescente e depois uma jovem preciosa. Por que acredita que deixou de crescer de repente?
— Acredito que talvez fosse pela morte — ele a olhou com surpresa . — Stiles me matou várias vezes enquanto estive cativa, como sabe. Acredito que não tornei a envelhecer depois — deu de ombros.
— É uma teoria muito sólida.
— É a única que tenho de momento.
Ele assentiu, comeu um par de colheradas de cereais e por fim afastou a terrina.
— Bom, me fale de Edge.
Ela esteve a ponto de engasgar-se com uma rodela de banana. Will se recostou na cadeira, sorrindo, com os braços cruzados sobre o peito, e esperou que ela respondesse. Amber se levantou, aproximou-se da geladeira para tirar o suco de laranja, serviu dois copos e bebeu um gole de um deles.
— Tenta ganhar tempo?
Ela voltou a deixar o suco e levou os dois copos à mesa.
— É muito ardiloso para mim — sentou-se e acrescentou. — Não é que eu não queira contar sobre ele. É que não sei se há algo para contar.
— Fina diz que o atropelou com o carro.
— Sim, mas não estou segura de que foi um acidente. Saí para ver se estava bem e me disse que ia para Salem. Assim me ofereci para trazê-lo.
Ele assentiu lentamente.
— Acredita que foi uma coincidência? Que os dois se dirigiam ao mesmo lugar?
Ela deu de ombros.
— Suponho que é possível. Ontem à noite consegui que reconhecesse que se lançou deliberadamente sob meu carro, confiando em que me sentisse culpada e o levasse. Disse-me que seu carro se avariou e que não tinha vontade de andar.
— Então, ao menos foi sincero com você.
Ela umedeceu os lábios.
— Tenho a sensação de que há algo mais.
— Acha que pode ser perigoso para você?
— Sim, mas não no sentido que você acredita.
Ele ficou olhando-a um momento e logo levantou as sobrancelhas.
— Ah — ela teve que afastar o olhar. — Então, você gosta dele, verdade?
— Não sei Willem, nem sequer o conheço.
— Mas se sente atraída por ele.
Ela assentiu sem olhá-lo aos olhos.
— Sim, muito.
— E o interesse é mútuo?
Ela deu de ombros.
— Ou é mútuo, ou está fingindo porque trama algo, e eu não consigo averiguar qual das duas coisas é certa.
— Quer que lhe dê uma surra? — ela se pôs a rir e Willem pôs uma expressão magoada. — O que acontece? Acha que não estou em forma?
— Estou segura de que poderia fazer isso Willem. Nesse aspecto, não está mal dotado, para um mortal. Estava pensando que teria que ir para a fila atrás de sua mulher, meus pais e a tia Rhiannon.
Ele assentiu.
— Duvido que me deixassem algum despojo.
— Pandora tem direito aos despojos. Mas, francamente, eu preferiria dar uma oportunidade ao Edge para que mostre suas verdadeiras intenções.
Ele assentiu lentamente.
— É lógico. Então, qual é o plano?
— Ao que parece, quer me ver. Estar comigo. Não consigo imaginar o que é que quer de mim, mas... — ignorou o rápido olhar que Will lançou . — Mas acredito que, com um pouco de tempo, descobrirei. E, já que está aqui, posso passar algum tempo com ele, ver o que posso descobrir.
Ele umedeceu os lábios e não disse nada. Amber o olhou aos olhos.
— O que?
Ele se mexeu no assento, incômodo. Logo disse:
— Maldita seja, Amber, isto não me corresponde fazer. Mas... enfim, dado que conheço seus pais e que sei como foi criada, suponho que não tem muita... experiência. Com o sexo oposto, quero dizer.
Ela deu de ombros.
— Sou humana. Sou poderosa. Sou forte. Lutei junto a meu pai mais de uma vez.
— Mas nunca teve um namorado.
Ela lambeu os lábios e evitou seu olhar.
— Bom, saí com o Jimmy no instituto; Mas só o que fizemos foi... — ele levantou uma mão, e ela se calou e assentiu com a cabeça.
— Está bem, basta dizer que tem razão. Não tenho muita experiência nesse campo. Mas posso ajeitar isso.
— Você acha?
Ela assentiu.
— Sim... acho. Além disso, acredito que... que é necessário.
Willem franziu o cenho.
— Necessário?
Ela fixou o olhar nos cereais, mas Willem a segurou pelo pulso. A colher cheia de cereais tremeu em sua mão.
— O que está ocultando de mim, Amber?
Ela engoliu saliva, piscou duas vezes e por fim olhou-o nos olhos.
— Tive... sonhos.
— Sobre o que?
— Sobre ele. Sobre o Edge.
Ele suspirou.
— Docinho, isso é normal. Não deve preocupar-se. Quando há atração, o subconsciente costuma...
— Faz um ano que os tenho, Willem. E conheci o Edge quando vinha para cá, quando o atropelei com o carro. Mas faz meses que o vejo com toda clareza em meus sonhos. E não sei por que. Não sei o que significa. Mas acredito... acredito que tem que significar algo.
Ele piscou lentamente, lambeu os lábios, com o olhar voltado para dentro, recordando sem dúvida seus próprios sonhos.
— Tem razão — disse em voz baixa . — Tem que descobrir o que significa.
Ela assentiu e olhou o relógio.
— Ainda resta uma hora de luz. Acredito que vou passar por seu esconderijo, a dar uma olhada em suas coisas, ver o que descubro.
— Quer que acompanhe você?
Ela negou com a cabeça.
— Não, acredito que preciso enfrentar a isto sozinha.
— Me avise se precisar de ajuda, Amber. E tome cuidado. Onde ele se esconde, com certeza? — ela o olhou levantando as sobrancelhas. — Só para o caso de não voltar para casa esta noite. Assim saberei onde buscar você.
— Ah. Pois… há uma igreja abandonada a uns dois quilômetros, praia acima.
— Sim, conheço-a.
Ela levou a terrina aos lábios para beber o resto do leite de soja e logo a deixou sobre a mesa.
— Então, acho que me vou vestir — ficou em pé.
Will também se levantou, rodeou a mesa e lhe pôs as mãos sobre os ombros.
— Seu pai não achará graça em nada disso.
— Meu pai ainda me considera uma menina. Mas você sabe que não o sou.
— Sim, sei — respondeu ele. — Mas não deixe que esse tal Edge brinque com isso. Seja o que for o que decida fazer, assegure-se de que é o que quer. Que seja sua decisão, Amber. Recorda o que sabe sobre ele e permanece atenta ao que desconhece.
Ela assentiu, pensando que ignorava muitas mais coisas a respeito de Edge do que sabia.
— Se fizer mal a você, farei picadinho dele — acrescentou ele. Amber sorriu.
— Conto com isso — ficou nas pontas dos pés e lhe deu um beijo na bochecha. — Amo você, sabe?
— Eu também a você, Amber. Tome cuidado.
— Sim.
Amber foi caminhando lentamente pela beira da praia rochosa, descalça, com os jeans arregaçados para que a água fria lhe molhasse os tornozelos à investida das ondas. Sentia-se culpada por desconfiar de Edge. Mas só um pouco. Sufocava seus remorsos recordando-se quantas vezes a paranóia de seus pais tinha acertado no alvo. Havia pessoas más no mundo. Edge podia ser um deles.
Quando chegou à igreja, viu que os postigos estavam bem trancados. perguntou-se onde Edge descansava e olhou com certo nervosismo o céu. O sol continuava ali, atrás das árvores, baixo, mas ainda brilhante. Tinha tempo de sobra.
Esticou os braços, alcançou a parte baixa dos postigos e puxou. Não se moveram. Estavam trancados por dentro. Puxou com mais força e conseguiu abri-los ligeiramente. Não queria que entrasse um raio de sol, no caso de Edge estava convexo ao outro lado, onde o sol pudesse alcançá-lo. Impulsionou-se para cima, entrou pela fresta e, não vendo rastro algum de Edge, abriu um pouco mais os postigos e entrou subindo. Levantou uma nuvenzinha de pó ao posar no chão. Girou rapidamente para fechar a janela e a seguir olhou de novo o interior da igreja enquanto sacudia as mãos. E então, ao ver que a igreja parecia mudada, franziu o cenho.
Os bancos estavam colocados de um lado, e no amplo espaço onde estavam antes havia... equipamento esportivo. Um banco de pesos, um saco de boxe pendurado nas vigas, e um colchonete no chão.
— Mas o que está fazendo? — perguntou-se Amber em voz alta enquanto atravessava a igreja, examinando aquelas coisas, que tinham estampado o selo do Centro Ginástico Salem, Salem, Massachussets. Arqueou uma sobrancelha. Edge não tinha perdido tempo.
Olhou a seu redor, procurando a mochila, mas não a encontrou. Sobre o banco de madeira continuava a pequena coleção de lembranças. Havia mais velas. Edge tinha colocado uma em cada parapeito. Todas estavam apagadas, certamente. Amber se perguntou para que queria as velas, se via na escuridão melhor sem ela.
Onde estaria?
Amber cruzou uma porta que havia no fundo da igreja. Estava um pouco torta, torcida pela umidade, e pendurava sobre uma só dobradiça, mas a abriu de um empurrão e entrou no poeirento armazém às escuras. Havia prateleiras, um par de caixas meio desintegradas, cheias de velas, e outra porta. Amber a abriu e ficou olhando a frágil escada de madeira. Faltavam alguns degraus e outros estavam quebrados.
Edge estava ali embaixo, naturalmente. Era o lugar mais seguro para descansar. Ninguém em seu são julgamento se arriscaria a descer por aquela escada danificada, em meio da escuridão. Ao que parecia, levou também a mochila, pois Amber não a viu em nenhuma parte.
Respirou fundo e se dispôs a descer com todo cuidado pela escada, saltando o primeiro degrau, que faltava, e o segundo, que estava quebrado. Ao apoiar o pé lentamente no terceiro degrau, que parecia intacto, sentiu ranger a madeira e compreendeu que tinha cometido um grave engano.
A sensação de que se afundava na escuridão confirmou que estava certa, e o golpe tirou definitivamente suas dúvidas.
Edge sentiu algo um pouco além das margens de sua consciência. Um sussurro. Seu rosto se esticou e seu nariz se enrugou. Sentiu o aroma de Amber, aquele perfume suave e exótico que não era nem humano nem vampírico, e todas as células de seu corpo ficaram alertas, cheias de desejo. O desejo formou um torvelinho em seu cérebro enquanto a neblina de sua mente se dissipava pouco a pouco. Sua pele se arrepiava e fazia cócegas. Sentia-a. Estava perto.
Outras sensações voltaram gradualmente. Sentiu a terra compacta e dura do chão sob suas costas, e a suavidade da manta sobre a qual estava deitado. Percebeu o aroma de umidade do porão sujo. Sentiu o ar frio e úmido e o sabor do mar que arrastava consigo. Recuperou a consciência e abriu os olhos, esticou os braços e sentou-se.
Amber estava caída no chão, a uns metros dele, sob o esqueleto imprestável da escada. Edge despertou de repente, levantou-se de um salto e correu para ela. Não se movia. Edge notou o odor do sangue. E viu uma ruptura nova na escada. Amber devia ter caído por ela. Maldição.
Edge se ajoelhou a seu lado. Ela permanecia deitada de lado, e o cabelo lhe cobria o rosto. Ele afastou o cabelo e viu o fiozinho de sangue que escorria da têmpora pela bochecha. Já estava secando. Devia estar ali caida a algum tempo.
— Alby? — murmurou ele. Estava viva. Edge notava sua vida, sentia palpitar seu coração e o fluxo do sangue por suas veias. Ouvia sua suave respiração. — Vamos, Alby, diga algo.
Não houve resposta. Edge fechou os olhos e deslizou as mãos sobre ela. Sobre seus braços, sobre seu pescoço, ao longo de sua coluna, sem quase tocá-la, abrindo seus sentidos para procurar suas feridas. Examinou suas pernas e passou logo as mãos por seus flancos para apalpar as costelas. Não parecia ter nada sério. Edge a tomou suavemente nos braços, recolheu sua manta do chão e se aproximou do pé da escada quebrada. Logo dobrou os joelhos e deu um salto.
Quando aterrissou acima, ela deixou escapar um gemido. Edge sentiu a garganta seca e engoliu saliva. De repente se deu conta de que não queria que acontecesse nada com ela. Pensou que era porque precisava dela para encontrar o rastro de Frank Stiles, para que revelasse suas fraquezas e ele averiguasse como matar ao Stiles quando o encontrasse. E necessitava desesperadamente deitar-se com ela porque, se não, sua cabeça explodiria.
Mas nada disso explicava o enfraquecimento que tinha sentido no estômago ao vê-la ali caída e ferida.
Aquilo o chateava um pouco. Riu-se de sua própria debilidade, pensou que Amber não era mais que um meio para um fim e atravessou a igreja com ela nos braços.
Logo afastou seu rosto para olhar atentamente a ferida da cabeça. Apalpou-a com os dedos. Era uma brecha bastante larga, com um galo do tamanho de uma noz.
— Ai!
Edge olhou seu rosto, viu que piscava e abria os olhos. Amber fixou o olhar nele, suspirou suavemente e voltou a fechar os olhos.
— Outra vez não — resmungou.
— Outra vez o que? — perguntou ele, inclinando-se para ouvi-la melhor.
— O sonho. O mesmo sonho de sempre. Onde está a caixa?
Ele franziu o cenho e inclinou a cabeça.
— Escuta Alby, sou eu. Edge. Levou um golpe na cabeça e está... delirando, acredito.
— Não estou sonhando?
— Não, Alby, não está sonhando.
Ela enrugou a testa e entreabriu os olhos. — Edge?
— Mmm... mmm.
Amber levou uma mão à cabeça, mas assim que a tocou fez uma careta e a retirou. Abriu os olhos um pouco mais.
— Já está acordada?
— Sim. O que aconteceu?
— Isso eu gostaria de saber.
— O que quer dizer?
— Quero dizer por que demônios estava rondando por aqui em pleno dia, Amber Lily.
Ela piscou, pareceu espremer os miolos e logo seus olhos adotaram uma expressão séria.
— Vim ver você..., mas cheguei cedo e decidi entrar e esperar. Pensei que não se importaria.
Ele arqueou uma sobrancelha, olhando-a. Sabia que estava mentindo.
— Bom, claro, sei que a qualquer vampiro importaria que alguém invadisse seu esconderijo enquanto está indefeso, mas sou eu. Quero dizer que pensei que entre você e eu havia uma... uma conexão.
Edge arqueou as duas sobrancelhas, — Então pensou isso, é?
Ela deu de ombros.
— Você não pensa? — sentou-se, poupando a necessidade de responder, e levou uma mão à fronte. — Deus, como me dói à cabeça.
— Entrou no porão. Um degrau quebrou e você caiu. É curioso que fizesse isso, se só pensava entrar e me esperar.
Ela o olhou piscando.
— O que acha que ia fazer? Cravar uma estaca em você? Vê alguma em meus bolsos?
Ele deu de ombros.
— O que estava fazendo, então?
Ela afastou o olhar. Na escuridão, o cabelo negro lhe caía sobre a bochecha e ocultava sua expressão. — Já respondi isso, cheguei cedo e decidi esperar.
Edge tentou penetrar em sua mente com sutileza, sem que ela notasse. Ela pareceu obrigar-se a olhá-lo de novo e a parecer sincera. Mas não conseguiu enganá-lo.
— Como vou evitar que a curiosidade se apodere de mim?
Ele ficou olhando-a e sentiu de repente um leve comichão na nuca. Algo dentro de Amber parecia pulsar com a força gravitacional de um buraco negro. Havia ali um denso vazio e, de maneira consciente ou inconsciente, Amber ansiava que ele o enchesse.
Edge sentiu que seu próprio sexo se agitava e procurou dominar-se, embora não conseguisse ignorar toda aquela sensação.
— Tinha curiosidade — disse, afastando o olhar dela. — Sobre o que? Queria ver como fico dormindo? — esboçou um sorriso sarcástico. — Ou o que uso para dormir?
— Só por que você quer.
Ele deu de ombros.
— O que, então?
Ela sacudiu a cabeça como se estivesse zangada com ele, e fez uma careta ao sentir uma pontada de dor. Mas, de qualquer forma, levantou-se.
— Olhe, se não confia de mim, vou agora mesmo. Foi você quem me pediu que viesse — deu um passo e cambaleou ligeiramente.
Edge a segurou pelos ombros.
— Não tão depressa. Ainda está enjoada.
— Não me diga.
Amber cambaleou de novo, quase imperceptivelmente, e, entretanto o corpo de Edge reagiu imediatamente, aproximando-se dela uns milímetros. Segurou-a com força nos ombros e deixou que a gravidade fizesse o resto. Amber se apoiou nele. Edge fechou os olhos e pensou que a força que parecia fundi-los era produto de sua imaginação. Era uma tolice, e completamente contrário a seus planos.
— Não se ofenda, Alby. Eu não confio em ninguém. Não é nada pessoal.
— Fala como meu pai.
Ele fez uma careta. Seu pai era a última pessoa a quem queria recordar.
— Por quê? Ele tampouco confia em alguém?
— Eu antes pensava que meus pais eram uns paranóicos.
— Antes? — Edge se obrigou a soltá-la e deixou que suas mãos deslizassem por suas costas e posassem sobre sua cintura. A seguir se separou dela.
Amber deu de ombros.
— Até que Frank Stiles me sequestrasse faz cinco anos e me demonstrasse com acréscimo que meus pais tinham razão.
Edge se sentiu incômodo ao recordar que Stiles a tinha sequestrado. Não queria pensar nisso.
— Usou-a como porquinho da índia, verdade? — perguntou enquanto tentava convencer-se de que aquilo lhe importava e, dando meia volta, afastou-se dela e ficou a dar voltas pela habitação.
— Então, sabe quem é?
Ela olhou rapidamente.
— Sim, ouvi falar dele. É um antigo agente da DIP. Um caça-vampiros empenhado em investigar. Estou errado?
— Absolutamente.
Ele assentiu com a cabeça.
— Suponho que a considerava seu troféu mais prezado.
Amber sorriu tão inesperadamente que seu sorriso deslumbrou um instante ao Edge.
— E não pensaria o mesmo qualquer homem? –ele fez girar os olhos e sorriu.
— Bom, e para que quer todo esse equipamento? perguntou ela, olhando as coisas que ele tinha comprado na noite anterior. — Não basta a você a força de um vampiro? Deseja ficar mais robusto?
Ele esboçou um sorriso.
— Tenho toda a força que necessito Alby. Não o duvide. Estas coisas eu trouxe para você, não para mim.
— Para mim? — ela o olhou e arqueou as escuras sobrancelhas . — E o que quer que faça com tudo isto?
— Testar você.
Ela franziu o cenho, mas olhou com curiosidade as máquinas.
— Você me colocou no carro, recorda? Disse-me que não conhecia o alcance de seus poderes.
— E você me disse que me ajudaria a descobrir.
Ele assentiu com a cabeça.
— Pensei começar pela força física — sorriu-lhe. — E também que podia ensinar a você um par de coisas, já que estamos aqui. Deveria aprender a se defender, sabe?
— Acredita que não sei me defender?
Ele deu de ombros.
— Disse que Stiles a apanhou. Nunca me apanhou.
— Tinha um exército, armas, tranquilizantes. Não pude fazer nada. Acredite, tentei-o.
Ele a olhou inquisitivamente. .
— O que tentou? Dar-lhe uma bofetada?
Ela enrugou o cenho, um pouco zangada.
— Por que não jogamos um momento com estes brinquedos, Edge? Assim verá por si mesmo o que posso fazer.
Ele sacudiu a cabeça.
— Esta noite, não. Levou um bom golpe na cabeça.
Amber se aproximou dele lentamente, agarrou-o pelo pulso e aproximou a mão de sua cabeça. Ele franziu o cenho e apalpou o lugar onde tinham estado o nódulo e o corte. Mas o nódulo tinha desaparecido quase por completo, e o corte se reduziu grandemente. Edge lhe lançou um olhar.
— Recupero-me depressa. Antes demorava alguns dias. Curava-me antes que um humano, mas não tão rápido como um vampiro. Mas isso mudou desde o caso Stiles. Muitas coisas mudaram depois.
— Então, agora se cura antes que nós? Ela deu de ombros.
— Não tenho que esperar adormecer. Assim que o processo de cura começa imediatamente.
Edge assentiu com a cabeça.
— Por que acredita que seu cativeiro tem que ver com essas mudanças?
Ela franziu os lábios e baixou a cabeça.
— Não sei.
Edge compreendeu que estava mentindo. E ela também sabia. Ou acreditava sabê-lo. Edge podia adivinhar sua teoria. Stiles a tinha matado várias vezes, só para ver se ressuscitava. A morte e a ressurreição, inclusive no mito, geravam drástica metamorfose.
— Que outras mudanças notou?
Ela se limitou a sacudir a cabeça. Edge inclinou a sua.
— Não confia em mim, não é, Alby?
— Assim como você, Edge, não confio em ninguém.
Ele deu de ombros.
— Mereci isso. Bom, o que quer usar? — aproximou-se do saco de boxe e o abraçou. — Vêem, vamos ver do que é capaz querida.
Ela suspirou, aproximou-se do saco e lhe deu um par de murros.
— Vamos, Alby. Faz isso com vontade.
— Não quero ferí-lo.
Edge soltou uma gargalhada e notou que a expressão de Amber mudava, viu que levava para trás seu braço esbelto e que levantava o outro em atitude defensiva.
Agarrou com força o saco. Ela descarregou o golpe. O saco balançou com tanta força que Edge perdeu o equilíbrio e, soltando o saco, caiu para trás, golpeou a parede e deslizou até o chão.
Amber se aproximou e pôs os braços na cintura. Edge levantou o olhar para ela.
— Está bem? — perguntou Amber.
— Depende. Vê uns passarinhos voando ao redor de minha cabeça?
Ela estendeu a mão. Edge tomou-a e deixou que o puxasse para levantar-se.
— Sinto muito.
— Não, fui eu quem pediu isso — Edge sacudiu a roupa e procurou recolher os pedacinhos de seu orgulho. — Então é forte. Isso está claro.
Ela assentiu com a cabeça.
— Sou forte. Posso levantar meu carro. Pelo menos, um lado de cada vez, não inteiro.
Edge pensou que possivelmente ele também podia fazer isso. Sim, podia.
— E o que me diz da velocidade?
— Meu pai mandou construir uma esteira mecânica, para que pudesse me cronometrar em casa, onde ninguém me visse. Cheguei aos cento e vinte.
Então não podia mover-se com a velocidade de um vampiro, tão rapidamente que seu deslocamento escapava à percepção humana. Ele sim podia. Ao menos nisso estava por cima dela.
— E logo, claro, há isso.
Amber fixou os olhos ao fundo da sala e Edge seguiu seu olhar. Ela inclinou um pouco a cabeça, e o banco que parecia estar olhando se levantou do chão e saiu voando para eles. Edge abaixou a cabeça e levantou um braço para proteger-se, porém o banco se deteve no ar e aterrissou pesadamente, de pernas para cima.
Edge se levantou, abaixou o braço e a olhou assombrado.
— Incrível.
Amber deu de ombros.
— Essa sou eu — disse, e deixou escapar um suspiro. — Não ponha essa cara de pasmo, Edge. Não posso controlar a mente, nem hipnotizar aos mortais, nem brincar com suas lembranças. Posso mandar e receber, se a outra parte não se proteger. Mas não gosto de bisbilhotar a mente alheia — deu de ombros. — Psiquicamente, isso é tudo. Além de...
Interrompeu-se de repente, mas Edge ouviu o final de sua frase de qualquer modo. A mente do Amber a pronunciou, não seus lábios.
— Os sonhos? — perguntou ele. Esquadrinhou seu rosto e recordou que pouco antes, em seu delírio, ela havia dito algo de um sonho. — Que sonhos, Alby?
Ela deu de ombros e evitou seu olhar.
— Às vezes sonho... coisas.
— Coisas que logo passam?
Ela assentiu com a cabeça.
— Em geral, são coisas sem importância.
— Mas...? — insistiu ele.
Amber o olhou de frente.
— Por que o interesso tanto, Edge? me diga a verdade. O que quer de mim?
Ele esboçou um sorriso e abriu deliberadamente sua mente ao tempo que enchia sua cabeça com imagens nas quais os dois apareciam pondo em prática diversas posturas amorosas. As imagens eram tão vívidas que os olhos do Amber se dilataram e seu rosto se ruborizou.
Ela deu meia volta e murmurou.
— Além de tudo isso, quero dizer.
Ele voltou a proteger sua mente.
— Nada, Alby. por que não acredita em mim?
— Porque não sou tola, por isso, Edge. Você quer me usar...
— Em todos os sentidos que possa imaginar — aproximou-se dela por trás, e seu fôlego fresco lhe acariciou o pescoço. — Não tentei esconder isso Alby.
Ela estremeceu.
Edge começou a lhe acariciar os ombros e os braços, e logo pegou suas mãos.
— Não tem importância. Posso esperar.
— Há algo mais. Há algo mais que quer de mim. Sei.
— Juro que não.
— Sonhei com você, Edge.
Ele ficou muito quieto, tão assombrado como se ela tivesse disparado entre seus olhos.
— Levo quase um ano sonhando com você.
— Sério? — ele não sabia como reagir, o que dizer. — O que ocorre nesses sonhos? — perguntou.
— Bom, nos mais recentes... — murmurou ela e logo Edge pôde penetrar em sua mente e viu as mesmas imagens eróticas que tinha desenhado para ela uns instantes antes. Sentiu que o sangue se tornava lava nas veias. Sua mente acelerou, e seu desejo começou a arder.
— Jesus — resmungou.
— Oh, há mais — Amber se recostou contra seu peito e inclinou a cabeça. Deu-lhe um beijo na garganta e deixou que seus lábios deslizassem por seu pescoço, lambendo suavemente sua pele ao tempo que sentia o palpitar da jugular. Deus, que vontade tinha de prová-la.
— Deus, sim — resmungou. — Que mais? — sussurrou sem afastar-se de seu pescoço.
— Um par de coisas. Invadem-me sentimentos de paixão, de medo e de dor. E você me dá algo.
— Sim? — ele lambeu com delicadeza a pele de sua garganta e a roçou com os dentes sem chegar a mordê-la. Sentia a paixão que se agitava dentro de Amber, semelhante à sua.
— Oh, sim. Dá-me a morte.
Edge ficou paralisado. Afastou lentamente a cabeça de seu pescoço e, segurando-a pelos ombros, a fez virar-se para olhá-lo.
— Eu... a mato?
— Não sei. Só sei que me traz um presente, e que o presente é a morte. Talvez agora compreenda por que me custa um pouco confiar em você, Edge.
Amber o observava com o mesmo cuidado com que teria observado a uma cobra enroscada. Edge parecia atônito. Achou que seu assombro parecia sincero.
— Não vou fazer com que a matem — pelo modo como ele disse, para Amber pareceu que tentava convencer a si mesmo tanto como a ela. — Juro-lhe isso, Alby. Jamais faria uma coisa assim.
Ela deu de ombros.
— É uma forma estranha de falar.
— Qual?
— Disse que não vai fazer com que me matem. Não disse que faria com que me matem no sonho. Disse que me dava a morte de presente.
— Dá no mesmo, não?
— Acredito que não. Não exatamente.
Ele abaixou a cabeça e se afastou dela.
— Demônios, como ia matar você, de qualquer modo? Nem sequer sei se há algo que possa matá-la. Nem sequer você sabe.
Ela deu de ombros.
— Bom, não, mas sei o que não me mata. Não posso morrer afogada, nem eletrocutada, nem envenenada, nem pela luz do sol. Se perder sangue, fico muito fraca, mas quem sabe se isso me mataria ou não? Suponho que me queimar ou me decapitar...
— Chega!
Ela sorriu, porque Edge parecia impressionado pelas imagens que ela tinha pintado ante seus olhos. Separou-se dele e passou vários minutos golpeando o saco de boxe com braços e pernas. Estava se exibindo, e lhe pareceu que Edge sabia. Quando parou para tomar ar, ele estava a seu lado, com as mão na cintura, olhando-a.
— Seus sonhos sempre se cumprem? — perguntou.
Ela lançou um olhar.
— Até agora, sim, sempre – deu um último chute no saco . — Me acompanha até em casa?
— E me dar à oportunidade de atacá-la?
— Acredito que poderia derrubá-lo.
— Oxalá... — disse Edge, e ela sorriu devagar — por que não foge de mim a toda pressa? Não o entendo.
— Eu tampouco. Em parte, porque quero saber o que significa esse sonho. E em parte... — Amber baixou os olhos.
— Sim, em parte por isso. Já sei.
Ela ignorou seu comentário.
— Quero passar mais tempo com os outros.
— Eu sou um solitário, Alby.
Ela inclinou a cabeça.
— Sem problemas, Edge. Eles não sabem nada dos sonhos. Ninguém sabe, exceto Will, e não sabe como são. Só sabe que sonho com você.
Ele franziu os lábios e abaixou a cabeça.
— Além disso, eles são melhores que você em ler a mente, verdade? Talvez consigam advinhar minhas intenções. Por isso quer que vá, verdade?
— Não mentia quando dizia que não confiava em ninguém, não é? — ela deixou escapar um profundo suspiro. — Se isso for o que pensa, Edge, por mim tudo bem. Mas, se não tem nada que esconder; que mais importa?
Ele ficou pensando um momento. Logo pareceu animar-se um pouco.
— E o que obtenho em troca? — perguntou.
Surpresa, Amber observou o brilho de seus olhos.
— Insinuas que tenho que recorrer à chantagem para que passe algum tempo comigo?
— Passarei todas as noites que queira com você, Alby. Mas se quiser que me relacione com os outros, terá que me compensar. Assim, o que me oferece?
— O que quer?
Ele sorriu maldosamente. Amber sabia o que ia dizer. Sexo. Ou sangue. Ou ambas as coisas. Edge queria fazê-la sua, possuí-la, apropriar-se dela, beber seu sangue e a ideia a avivava até derretê-la.
— Um beijo — disse ele.
Amber piscou enquanto seu cérebro processava o que acabava de dizer.
— Perdão?
— Um beijo. Quero um beijo longo, apaixonado, sem inibições.
— Mas se já me beijou.
Ele deu de ombros.
— Isso não significa que não queira voltar a fazê-lo. Além disso, não importa. Quero que me beije.
Ela o olhou com o cenho franzido.
— E, se o fizer, virá para casa comigo?
— E ficarei até um pouco antes que amanheça, se isso for o que quer. Mas tem que ser um beijo de verdade. Não um selinho, quero que me beije com desejo.
Amber não estava segura de que pudesse beijá-lo sem desejo, mas não pensava dizer-lhe.
— Está bem, trato feito. Prepare-se.
Ele arqueou as sobrancelhas, olhando-a, e se sentou em um banco.
— É para que alcance melhor — explicou-lhe. — Sem ter que ficar nas pontas dos pés.
— Mmm. Mmm — Amber se aproximou do banco e fez ameaça de sentar-se a seu lado, mas Edge a deteve, segurando-a pela cintura.
— Não, não. Assim, espera.
Colocou-a de lado até que ficou frente ao banco, olhando-o. Logo deslizou as mãos por seus flancos, sobre seus quadris. Tocou com os dedos suas costas e logo deslizou as mãos sobre suas coxas, até chegar à parte de atrás de seus joelhos. Logo puxou-a suavemente para que se aproximasse, até que seus joelhos ficaram entre os dela e sua cabeça ficou à altura de seus seios. Levantou-lhe um joelho e a fez flexioná-lo sobre o banco, ao redor dele. Logo levantou o outro.
Amber apoiou as mãos sobre seus ombros e se colocou como ele queria. Edge a fez sentar-se sobre ele, a cavalo.
— Desse jeito. Assim está melhor, não acha? –perguntou com voz baixa e um tanto rouca. Amber notou que se excitava sob ela. Sentiu um comichão no ventre e de repente desejou não conformar-se com um beijo. Edge moveu um pouco seus quadris, esfregando seu membro duro contra ela — Sim, assim está muito melhor. Agora, me beije.
Amber lambeu os lábios. Os olhos de Edge seguiram o movimento de sua língua. Ela apoiou as mãos sobre as bochechas, o fez levantar um pouco a cabeça e se inclinou para ele. Edge não fechou os olhos, e ela não pôde afastar-se de seu olhar e fechar os seus olhos.
Até que suas bocas se tocaram.
Edge não a beijou. Ficou imóvel, passivo e espectador. Ela deslizou os lábios sobre os dele, abrindo-os e fechando-os, chupou-os, sugando-os um pouco, e gostou daquilo. Acariciou-os com a língua, obrigou-o a entreabrir os lábios e deslizou a língua dentro de sua boca. Seguiu com a ponta da língua a forma de seus lábios, tocou o céu de sua boca e a deslizou sobre seus dentes. Sentiu suas presas, longas e afiadas como navalhas de barbear. Logo brincou com sua língua até que conseguiu lhe arrancar a resposta que desejava.
Edge lhe rodeou a cintura com os braços e começou a beijá-la. Suas presas lhe roçaram o lábio, e ele sentiu o gosto do sangue do arranhão. Seus dedos se introduziram entre o cabelo do Amber. Parecia empenhado em beber sua alma em seus lábios e sua boca.
Quando finalmente levantou a cabeça, a ânsia de sangue se apoderou dele com tanta força que seus olhos pareciam refulgir. Amber estava sem fôlego, ofegava e o coração palpitava como o som de um baixo. Seu corpo inteiro tremia e estremecia, e se sentia aturdida. Rodeou-lhe o pescoço com os braços e apoiou a cabeça sobre seu ombro, esperando que aquela descarga elétrica se dissipasse.
— Alby? — disse ele.
— Mmm?
— Isto também faz parte de suas... já sabe de suas habilidades?
Ela levantou a cabeça lentamente.
— O que?
Ele pareceu procurar a forma adequada de reformular a pergunta.
— Beijou a outros homens? — perguntou por fim.
— Claro que sim — a meninos, mas só, pensou. Não a homens.
— E eles...? Foi… foi assim?
— Assim? — ela sorriu, dando-se conta de que para ele aquele beijo tinha sido tão perturbador como para ela. Mas queria que ele o dissesse, assim pôs sua expressão mais inocente e disse.
— Como?
— Assim — repetiu, e a olhou de tal modo que ela compreendeu que sabia o que pretendia.
— Os olhos deles saltaram das órbitas, boneca? Caiu-lhes a língua até os joelhos? Derreteram-se até a medula?
Ela sorriu radiante, sem poder evitar.
— Você também sentiu?
Ele afastou o olhar.
— Eu não disse isso — deu-lhe uma pequena cotovelada, afastou-a, pondo-a em pé, e se levantou.
— Vamos.
Começou a andar e, antes que ela pudesse dizer algo, saiu pela janela e ficou esperando-a na praia.
Amber se aproximou da janela, saltou ao batente e aterrissou de cócoras, levantando-se imediatamente. Aproximou-se dele, deu-lhe a mão, entrelaçando seus dedos, e pôs-se a andar pela praia.
Edge olhou suas mãos unidas e franziu o cenho. E não exatamente porque aquele gesto o desagradasse. Sentia-se, talvez... confuso.
— Para mim nunca tinha sido assim, Edge. Com ninguém.
Ele franziu os lábios.
— Claro que isso não quer dizer muito, não? Dada sua falta de experiência, quero dizer.
Ela levantou o olhar e pensou: «Você sabe perfeitamente que isto não tem nada que ver com minha virgindade. Entre nós há algo muito forte».
Ele fingiu não tê-la ouvido, mas não conseguiu enganá-la. Juntos seguiram caminhando para a casa.
— Eu não gosto disso. Eu não gosto nem um pouco — disse Morgan suavemente. Estava sentada em uma cadeira do pátio, com um pequeno computador portátil sobre os joelhos que coloria seu rosto com um tênue fulgor azul elétrico.
— Aonde se meteu? Não estará com esse tal Sting, não?
— Sting? — perguntou Dante, que estava sentado em uma espreguiçadeira, junto à mesa de cristal do guarda-sol.
O guarda-sol, naturalmente, faltava. Só o teria protegido da luz da lua. Serafina e Willem estavam sentados a seu lado.
— Acredito que não se parece nada com Sting — disse Amber, apertando a mão de Edge enquanto subia as escadas de madeira de sequóia do pátio que dava à praia. — Ao Billy Idol, talvez.
Os outros a olharam. Amber havia sentido que Edge se esticava para ouvir a conversa. Mas não relaxou quando ela tinha replicado ao comentário de Morgan.
Dante se levantou ao se aproximarem.
— Temo que não sei quem são — disse com um sorriso, saudando-os com uma leve inclinação de cabeça.
— Tanto faz. Nenhuma das duas comparações é precisa, de qualquer forma — disse Edge, e olhou a Morgan e a seu computador.
— Más notícias, suponho.
Ela franziu os lábios e olhou para Amber.
— Certamente direi a ele de qualquer forma — disse ela, interpretando corretamente o olhar de Morgan. Esta suspirou. Serafina disse:
— Se Amber confiar nele, nós devemos fazer o mesmo. Afinal de contas, é ela quem corre perigo. Edge levantou as sobrancelhas.
— O que os faz acreditar que Alby está em perigo?
— Amber Lily sempre está em perigo — disse Willem. — É única, Edge. A presa mais apreciada para certos caçadores.
— Como Frank Stiles — disse-lhe Amber em um aparte — Esse é quem os preocupa.
— E agora alguém fez correr o boato de que está aqui, em Salem — disse Morgan e transpassou ao Edge com o olhar ao dizer — Está por toda a internet.
— Pois não olhe para mim — Edge foi olhando um a um. — Eu não sou muito aficionado dos computadores.
— Edge nem sequer tem eletricidade onde vive, e menos ainda conexão com a internet — Amber dirigiu-se para um balanço de grossas almofadas. Sentou-se ali e Edge se deixou cair a seu lado. Ela exalou um profundo suspiro. — Então, acham que Stiles se inteirou de que estou aqui?
— Se estiver vivo, inteirou-se — respondeu Willem com suavidade. — Acredito que deveria ir, Amber Lily. Vá a Wind Ridge e se reúna com Rhiannon, Roland e seus pais na casa de Eric e Tam.
Edge olhou para Amber.
— Se Stiles souber onde está, virá por sua causa?
Ela esboçou lentamente um sorriso enquanto considerava sua resposta; depois deixou que seu sorriso se fizesse mais amplo.
— Não tenho a menor duvida — disse — O que não é necessariamente mau.
— Não é mau? Mas o que diz? — perguntou Morgan . — Amber, já pegou você uma vez. Você melhor que ninguém deveria saber do que é capaz.
Amber a olhou.
— Precisamos dele — disse. — Pode ser que seja nossa única oportunidade de salvar ao Will. Se o fato de que eu estar em Salem o trouxer para nós, então penso ficar aqui. Que venha. Assim economizaremos tempo e aborrecimentos buscando-o. Francamente, se me tivesse ocorrido, eu mesma teria colocado essa informação na rede.
Willl a olhou nos olhos.
— Não vou permitir que se ofereça como isca, Amber.
Ela deu de ombros, mas não o olhou nos olhos.
— O que o faz pensar que estaria mais segura se fosse com os outros para Wind Ridge? Quem vai impedir que quem quer que tenha feito correr essa notícia difunda essa também?
Ao olhar para Willem e ver como apertava a mandíbula, compreendeu que tinha acertado em cheio.
— Tem razão, Will — disse Dante — Não podemos assegurar que está a salvo até que saibamos quem está nos espiando e por que.
Will assinalou com a cabeça o computador.
— Pode rastrear essa notícia até o safado que filtrou a informação?
Em lugar de responder, Dante olhou a Morgan. Ela assentiu com a cabeça.
— Podemos rastrear até o computador de onde foi enviada a informação. Mas não necessariamente descobriremos a quem a enviou e levará algum tempo.
— Quanto? — perguntou Edge, e a Amber surpreendeu um pouco que parecesse tão interessado.
— Um dia, talvez dois. Terá que atravessar uma confusão de identidades falsas e apelidos, mas o conseguirei.
Ele assentiu com a cabeça e olhou para Amber.
— Pode ser que tenham razão. Talvez deva ir para Windy Hill ou onde se escondam essa princesa e o resto de sua família.
— Wind Ridge, e não estão se escondendo Edge — disse ela com suavidade — Rhiannon não gosta de esconder-se.
— O que seja. Poderíamos tirá-la daqui em segredo. E, no que concerne ao Stiles, continua aqui.
Ela inclinou a cabeça e esquadrinhou seus olhos até que ele afastou o olhar.
— Tenta se livrar de mim, Edge?
Ele a olhou de esguelha e, ao ver um brilho zombador em seu olhar, fez-lhe uma piscada;
— Tento mantê-la perto, Alby. Vivinha e abanando o rabo.
Amber se sentiu um pouco melhor. Embora não soubesse se acreditava. Era estranho, pensou sentir-se tão atraída por um homem e, entretanto, duvidar de cada palavra que diga.
— Não importa — disse-lhe. — Não vou partir — olhou aos outros — Sou tão capaz de me defender como qualquer um de vocês, e sabem.
Will assentiu devagar.
— Sabemos.
— Então, passemos a outro tema.
— A qual? — perguntou Dante com um leve brilho de admiração no olhar.
— Bom..., pode ser que Stiles esteja a caminho. Deveríamos traçar um plano, decidir o que vamos fazer a respeito. .
— Esperá-lo — disse Serafina suavemente — Não há muito mais que fazer. Ele virá a nós.
Will sacudiu a cabeça.
— Virá a Amber. De dia, quase com toda probabilidade, porque sabe que está menos protegida.
Edge franziu o cenho.
— Não tinha pensado nisso.
— É o que fez da outra vez — disse Will. — Foi a ela durante o dia, com meia dúzia de assassinos, todos eles armados — sacudiu a cabeça — Não sei como prepará-la para rechaçar um ataque assim, Amber. Mas acredito que de dia não deve se separar de mim. A menos que não esteja sozinha.
Ela abaixou a cabeça e afastou o olhar.
— Nós dois poderíamos moer a pauladas ao Stiles, Will — logo acrescentou. — Além disso, nem sequer sabemos se ainda está vivo. Não há por que alarmar-se.
— Coloquei rastreadores em seu número de segurança social — disse Morgan — Se cometer a estupidez de usá-lo, localizarei os cartões de crédito que tente conseguir ou os que já tenha e possa usar, os empregos que possa ter, os veículos que compre ou tente registrar; quase tudo o que faça — franziu os lábios e sacudiu a cabeça — Mas se estiver vivo, conseguiu tornar-se invisível durante os últimos cinco anos. Mesmo assim; se acreditar que pode por a mão em Amber outra vez pode ser que fique nervoso e cometa algum engano.
— Eu confio mais nos não mortos que nos computadores — disse Dante suavemente.
— O que quer dizer? — perguntou Edge.
Dante sustentou seu olhar fixamente.
— Enviei mensagens a todos os vampiros a meu alcance — disse. E Amber sabia que se referia a mensagens mentais, não a um correio eletrônico massivo — Sabem que agora é mais importante que nunca vigiar os movimentos de Stiles e entrar em contato conosco se o encontrarem.
— Alguma notícia? — perguntou Amber.
Ele negou com a cabeça.
— Eu posso vigiar os hotéis por aqui, as pensões, esse tipo de coisas — propôs Edge.
— Há dúzias deles — disse-lhe Serafina. Amber pensou que estava estranhamente calada, embora entendesse o por que. Seu coração estava se partindo.
Edge se limitou a dar de ombros.
— Sou um vampiro. Posso cobri-los todos em uma noite.
— É boa ideia — disse Will — Stiles terá que alojar-se em alguma parte, e o mais provável é que venha aqui a toda pressa quando souber que Amber está na cidade.
— Enquanto isso temos que enfrentar a outro problema.
— Outro problema? — Amber esquadrinhou o rosto de Dante. — Não sei o que pode ser mais grave que a condenação à morte de Will e a iminente visita de Stiles.
— Mostre-o, Dante — disse Morgan.
Dante apertou os lábios, mas se levantou e, descendo rapidamente os degraus, cruzou a ladeira de grama que descia para a praia. Amber o seguiu. Edge ia a seu lado, com as mãos metidas nos bolsos dos jeans. As ondas se deslocavam com lentidão, hipnoticamente, sobre a areia salpicada de rochas e seixos. A pequena lancha a motor de Willem estava ali, atracada na praia. Uma corda se estendia de uma argola metálica colocada em sua proa até um poste de madeira escuro, fincado profundamente no chão. Uma lona de cor ocre a cobria.
— Alguém esteve caçando em Salem — disse Dante.
Ela piscou.
— Caçando? — enrugou o nariz ao notar um aroma conhecido e desagradável.
O aroma da morte.
O coração acelerou. O medo que sentia no sonho a atravessou como um calafrio. Dante se agachou e afastou a lona da lancha. Amber conteve o fôlego ao ver o corpo que estava ali e girou a cabeça automaticamente.
— Demônios — resmungou Edge — Deveriam tê-la avisado-apoiou as mãos sobre os ombros de Amber como se quisesse confortá-la. Mas lhe lançou um olhar tranquilizador e deu outra olhada.
A mulher jazia no fundo da lancha. Tinha uns cinquenta anos, era magra e estava, naturalmente, pálida como a porcelana. Usava um vestido longo e negro de tecido fino, sobre uma combinação de cetim. As mangas tinham bordados nos punhos. Amber notou que em sua garganta havia duas pequenas incisões, justo sobre o jugular. Afastou o olhar de novo e observou a Edge, e de repente se deu conta de que Dante estava fazendo o mesmo.
Ele levantou as mãos.
— Por que estão me olhando?
Amber franziu o cenho, e desejou saber o que estava pensando ele nesse momento, mas Edge tinha protegido seus pensamentos.
— Claro — continuou ele — Jogam a culpa ao novo. Isto é Salem, pelo amor de Deus. Deve estar cheia de vampiros.
Amber piscou lentamente e se voltou para Dante.
— Por que estava vestida assim?
— Não sei. Encontrei isso quando estive na cidade, faz um tempo, para ver como estavam as coisas. Cheirei-a e a trouxe aqui. Estava debaixo de um cais, estendida nas rochas. Não levava identificação, nem tinha mais marcas.
— Por quanto tempo está morta?
— Mataram-na ontem à noite. Mas ainda não se denunciou o desaparecimento de ninguém.
Amber apertou os lábios.
— Por que a trouxe aqui? — perguntou Edge.
O rosto de Dante ficou sombrio, e Amber respondeu por ele.
— Não podemos permitir que apareçam corpos sem sangue, com marcas de presas na garganta, em Salem, Edge. Imagina o que faria a imprensa com uma história assim? Seria um convite aberto a todos os caça-vampiros do país.
— Do mundo — disse Dante — Você é um solitário, verdade? Um desses vampiros solitários que renegam os de sua espécie.
Edge deu de ombros e voltou a tampar o corpo com a lona.
— Eu não renego a minha espécie. Mas tampouco procuro sua companhia.
— Até agora — disse lhe Dante.
Edge o olhou nos olhos.
— Se quer me acusar de algo, deixa de dar voltas e o faça de uma vez.
Dante refreou sua ira, apesar de Edge acabar de lhe lançar um desafio direto.
— Nós não matamos humanos.
— Nós? O que acontece, é que agora fala também por mim? Vocês não matam humanos, Dante. Eu faço o que tenho vontade.
Dante entreabriu os olhos e fechou os punhos. Edge se inclinou um pouco para ele, e Amber se interpôs entre os dois, pondo-lhes uma mão sobre o peito.
— Já basta Dante, se Edge disse que ele não matou a essa mulher, é que não o fez. Deixa-o já.
Mas era consciente de que Edge não havia dito tal coisa.
— Seria bom para você aprender boas maneiras – resmungou Dante, e, dando meia volta, pôs-se a andar para a casa — Quem demônios foi seu sire? Satã?
— Não ficou para me dizer seu nome — replicou Edge. — Mas segundo a lenda local, foi O'Roark.
Dante se deteve em seco, cravado na areia.
— Donovan O 'Roark?
— Podemos levar meu carro — disse Amber, tirando Edge de sua concentração, estava contemplando uma lancha a motor que se afastava. Ele afastou o olhar do mar e o fixou na mulher que permanecia a seu lado, sobre a praia pedregosa.
— Para ir dar uma olhada nos hotéis da cidade, quero dizer — acrescentou ela — Ver se Stiles se registrou em algum.
— Sim — Edge fixou de novo a vista no mar. — Surpreende-me que esteja disposto a jogar o corpo assim, sem mais.
— Por que?
Ele deu de ombros.
— Pensava que os de sua turma eram desses que notificam o falecimento e consolam aos parentes — tirou um cigarro do maço que levava no bolso e o acendeu.
Ela baixou a cabeça e seu cabelo negro caiu sobre seus olhos. .
— São boa gente, Edge, mas não são estúpidos. Deixar vítimas por aí só consegue chamar a atenção sobre nossa existência. Seria perigoso fazê-lo, para todos nós — olhou para o oceano, que se estendia atrás deles. — Mas lamento por sua família. Nunca saberá o que foi feito dela.
— Não tinha família.
Amber o olhou, alarmada. Ele colocou as mãos nos bolsos e abaixou a cabeça.
— Perdeu-a faz seis meses, em um incêndio. Seu marido e suas duas filhas as gêmeas, adolescentes.
Ela encolheu os olhos.
— Como sabe?
Ele não respondeu a sua pergunta.
— Logo, no mês passado, diagnosticaram-lhe um câncer. Não podiam operar. Assim que foi a essa ponte, amarrou um bloco maciço de pedra à perna e ficou ali parada, tentando encher-se de coragem para saltar.
— Você a matou, não?
— Fiz-lhe um favor.
Amber exalou um profundo suspiro e abaixou a cabeça.
— Não devia ter feito.
— Você acha que há vida além da morte, Alby? Um paraíso aonde vão as almas quando morrem seus corpos?
Ela pôs-se a andar pela praia em direção a casa e Edge a seguiu, fumando, enquanto esperava uma resposta.
— Suponho que sim — disse ela.
— Então, essa mulher está ali agora, com seu marido e suas filhas. Melhor que onde estava, enfrentando a uma morte lenta e cruel, com a única companhia de seu sofrimento.
Tinham rodeado a casa e se encontraram junto ao carro de Amber, no caminho de entrada. Amber se aproximou da porta do condutor, abriu-a, mas não entrou.
Olhou Edge por cima do carro.
— E você?
— O que? Se acredito no céu?
Ela assentiu com a cabeça. Ele deu uma última tragada no cigarro e o jogou.
— Não parei para pensar nisso, Alby. Para que? Não vou morrer nunca.
Visitaram todos os hotéis e pensões que encontraram, mas não entraram. Não precisavam dar uma olhada no registro de hóspedes, nem nos computadores. Amber conhecia Stiles muito melhor do que tivesse desejado. Para buscá-lo, só tinha que abrir sua mente, seus sentidos, e escutar, cheirar e sentir sua presença. Estava segura de que, se estava ali, notá-lo-ia. Seus poderes psíquicos eram, certamente, mais fracos que os de um vampiro, mas mesmo assim eram muito agudos. Sobre tudo no que referia ao homem que a tinha raptado uma vez.
Tinha a estranha sensação de que Edge estava fazendo o mesmo. E, entretanto, ele não conhecia o Stiles. Ou sim?
Quando acabaram eram as quatro da madrugada. Amber conduziu de volta à casa da praia, que estava em silêncio. Ao que parecia, todos estavam dentro. Quando saíram do carro, Edge disse:
— Então, não há nem rastro do Stiles. Suponho que será um alívio para você.
Ela o olhou nos olhos e suspirou:
— Não tanto quanto acredita. Precisamos dele.
Ele assentiu com a cabeça.
— E o encontraremos.
Amber estava segura de que assim seria. Tinham que encontrar Stiles. umedeceu os lábios.
— Essa mulher a que...
— O que tem ela? — ela baixou a cabeça e afastou o olhar . — Quer saber que classe de câncer tinha. Se era como o de seu amigo Willem — Edge rodeou o carro e, para surpresa de Amber, pegou sua mão e puxou-a ao mesmo tempo em que punha-se a andar para a praia.
— E o era?
— Não. Era pancreático. E tinha se estendido ao fígado e ao estômago. Não tinha solução.
Amber assentiu. Estavam na praia, caminhando lentamente para o esconderijo de Edge. Ela o olhou, esquadrinhou seu rosto e se perguntou se era um monstro e como teriam sido os últimos momentos daquela mulher.
Edge sustentou seu olhar enquanto caminhavam; logo se deteve e se virou para olhá-la.
— Aproximei-me dela, na ponte. Sua dor era tão intensa que nem sequer tive que me incomodar em ler sua mente. Seus pensamentos emanavam sozinhos. Olhou-me. Limitou-se a me olhar um momento. E compreendeu o que era. Não sei como, mas sabia.
Amber se sentiu presa em seus olhos, hipnotizada por eles.
— Tinha medo?
Ele moveu lentamente a cabeça para a direita e esquerda.
— Jogou o cabelo para trás, inclinou a cabeça e disse: «Por favor». Só isso, nada mais. Mas o disse com tanto dor que era... insuportável.
Amber percebeu o eco daquela dor em seus olhos, só um instante.
— Assim que a tomei em meus braços — prosseguiu Edge, e estreitou Amber ao dizê-lo. Ela relaxou, e ele inclinou a cabeça e roçou seu pescoço com os lábios — Abracei-a e bebi dela –seus lábios se moveram sobre a garganta de Amber enquanto falava — Sua dor, sua aflição, seu sofrimento, seu desespero... bebi tudo isso, e senti tudo. Mas ela sentiu... só êxtase. Um arrebatamento de alívio e prazer — deixou que seus lábios se entreabrissem e se fechassem sobre a pele do pescoço de Amber, sugando suavemente. — Agradeceu-me com seu último suspiro.
— Foi melhor morte que a que tivesse tido de outro modo — murmurou Amber. — Então realmente o fez só para... ajudá-la?
Ele se separou de seu pescoço e a olhou com surpresa.
— Fiz porque era uma comida grátis — o feitiço se rompeu de repente. Amber se separou dele, surpresa. — Não acredita que sou um desses benfeitores da humanidade, Alby. Eu só decido segundo o que me convém e nada mais que a mim. Não sou um herói. E não me pareço com seus amigos.
Amber ficou ali parada um momento, desejando que ele abrisse a mente, mas seus pensamentos eram impenetráveis.
— Não acredito — disse.
— Não quer acreditar. Não quer se entregar a um homem como eu. Acha que está acima de mim. Mas ao mesmo tempo quer se entregar a mim. Por isso tenta se convencer de que sou outra pessoa.
— Eu não tento nada desse estilo.
— Não?
Ela negou lentamente com a cabeça.
— Não. Só tento... conhecê-lo.
— E por que quer me conhecer, Alby?
Amber sustentou seu olhar e decidiu surpreendê-lo sendo completamente sincera com ele.
— Porque o desejo, e não posso me permitir... intimidades com um homem a quem nem sequer conheço. E porque não acredito que nosso encontro foi um acidente. Acredito que está tramando algo, e não posso me entregar a um homem em quem não confio.
Ele esboçou lentamente um sorriso.
— Isso não saberá até que o tente.
— E que sentido teria?
— O mesmo sentido que teve sempre o sexo, Alby. O prazer. Um prazer que a faça gritar, tremer e voar — passou um dedo por seu rosto, da têmpora ao queixo. — E que outra coisa há?
Ela sustentou o olhar e estremeceu profundamente. De repente compreendeu que ele tentava persuadi-la de algo através dos olhos e da mente. Edge queria suscitar seu desejo. Tinha que ser assim, porque ela nunca havia sentido uma confusão semelhante. Nunca.
— Tem medo de mim, verdade? — perguntou Edge. Ela negou com a cabeça. — Não acontece nada. Assim será melhor. Vamos.
Ele deslizou os braços ao redor de sua cintura e a atraiu para si, de modo que seus quadris ficaram unidos. Logo apoiou as mãos em seus rins e a apertou contra ele. Baixou a cabeça e lhe roçou o pescoço com os lábios uma vez mais. Amber estremeceu. Edge deslizou os lábios riscando a linha de sua mandíbula até que, finalmente, chegou a sua boca. Beijou-a, e Amber abriu os lábios e se deixou lamber e saborear.
Edge a apertava tão forte que, quando dobrou os joelhos e tombou sobre a areia, arrastou-a com ele. Era muito forte. Mas ela também. E estava sobre ele, zangada consigo mesma por ter medo de algo tão singelo como o sexo com aquele homem, apesar de desejá-lo ardentemente.
Moveu as pernas até que ficou sentada de cócoras sobre ele, com os joelhos afundados na areia, e colocou os dedos entre seus cabelos e o beijou enquanto se esfregava contra ele. Edge deixou escapar um leve gemido, semelhante a um grunhido, e a deitou rapidamente de costas, aprisionando-a com seu corpo sobre a areia.
Logo se ergueu um pouco, colocou um dedo sob a gola da blusa de Amber e puxou, abrindo a blusa pescoço abaixo com um sorriso.
Ela gemeu ao sentir o ar fresco do mar sobre seus seios nus, mas foram os olhos de Edge, tanto como o frio, que fizeram excitar seus mamilos.
Edge começou a acariciá-la. Roçou primeiro com os polegares seus mamilos, e ela conteve o fôlego com cada carícia. Logo se inclinou e, deslizando para baixo, tomou na boca um de seus mamilos enquanto acariciava o outro com os dedos.
Ao sentir seus lábios, Amber deixou escapar um leve grito. Ao sentir sua sucção, seu puxão, deixou de respirar. Ao notar a espetada de seus dentes, cada fibra de seu corpo gritou de prazer.
Edge deslizou uma mão entre seus corpos unidos, por seu jeans e, sem vacilar, sem pedir permissão, abriu-os de um puxão. Separou-lhe as pernas com as suas e deslizou os dedos entre o sexo úmido, que esfregou e acariciou até que ela começou a retorcer-se.
Bruscamente, afastou a mão e sua boca abandonou o seio de Amber, deixando-o molhado ao ar frio. Ajoelhou-se então entre suas pernas separadas e tirou seus jeans a puxões tão rapidamente que Amber não teve tempo de protestar. Arrancou-lhe a calcinha e a jogou; logo levantou-lhe os joelhos até o peito e inclinou a cabeça sobre seu sexo.
Amber se ouviu gemer, suplicar, ofegar e gritar, apesar de nem sequer reconhecer o som de sua própria voz. Edge devorava seu sexo com ânsia; apoderava-se dele com a língua. Quando ela se retorcia, mantinha-a quieta; quando lhe empurrou a cabeça, afastou-lhe as mãos e seguiu lambendo-a com mais força. Mordiscou-a, lambeu-a e a chupou até que Amber sentiu que sua mente explodia e gritou seu nome.
E, enquanto os espasmos se apoderavam de seu corpo, Edge se deslizou sobre ela ao tempo que baixava os jeans. Amber sentiu a pressão de seu membro duro em seu sexo palpitante. Então, Edge se afundou nela, penetrando-a profundamente. Amber notou resistência, não dor. Um prazer tão intenso se apoderou de seu corpo que quase não sentia dor. E antes mesmo de que as ondas do primeiro orgasmo se dissipassem, os poderosos ataques de Edge, que a sustentava para que o recebesse por inteiro, começaram a empurrá-la de novo para o êxtase.
Quando explodiu de novo, ele se deixou levar. Amber sentiu como sua investida a enchia, sentiu o prazer de seu orgasmo e, por fim, pela primeira vez desde que o conhecia, notou que as barreiras que circundavam sua mente se dissolviam e pôde sentir tudo que sentia ele. Seu prazer. Sua confusão. Suas dúvidas a respeito de quem era e o que havia nela que fazia com que aquela experiência fosse muito mais poderosa que qualquer outra que tivesse tido antes. Suas dúvidas a respeito de poder convencê-la a que o fizessem outra vez. E sua dor na consciência por ter que usá-la...
«Me usar para que?», perguntou-se Amber e, no instante em que formulou aquela pergunta, os escudos que protegiam a mente do Edge se fecharam de repente.
Edge se estendeu de costas, atraindo-a para si, e Amber ficou aconchegada na curva de seu braço, com a cabeça apoiada sobre seu peito, estremecida ainda pelo refluxo do prazer.
— Ainda tem medo de mim? — perguntou ele.
— Muitíssimo — reconheceu ela.
— Acha que vou ferí-la?
— Tenta e darei uma surra em você. Suponho que me assusta um pouco deixar em você sequelas permanentes se for obrigada a isso.
— Sim, sei — ela levantou a cabeça e sorriu. — Não me referia a isso e sabe.
Amber afastou o olhar.
— Acredita que poderia me ferir de algum outro modo? Emocionalmente? Não penso dar a oportunidade. Não se superestime.
Ele sustentou o olhar.
— É uma garota esperta, Alby. Uma garota muito esperta — logo a atraiu para si de novo e arqueou os quadris, esfregando-se contra ela, excitado e preparado de novo.
Beijou-lhe o queixo e murmurou:
— Logo amanhecerá, Edge.
Ele fechou os olhos, cheio de frustração, e voltou a deixar-se cair sobre a areia, amaldiçoando suavemente.
— Não fui mal, não é? Até consegui que um vampiro se esqueça do amanhecer.
Ele levantou os quadris da areia e subiu as calças.
— Não foi nada mal, Alby.
Ela franziu os lábios.
— É todo um romântico — deitou-se de costas, sentou-se e olhou a seu redor, procurando sobre a areia sua roupa dispersa. Tinha os jeans ao alcance da mão e os pôs. Mas suas calcinhas e sua blusa estavam imprestáveis. — Como demônios quer que volte para casa assim?
Ele se sentou, tirou a camiseta e a deu. — Ponha a minha. Eu não preciso.
Amber o olhou fixamente, tentando não distrair-se pensando em seus abdominais, parecidos com uma tábua de lavar, e lhe lançou um olhar de recriminação.
— Nem sequer se despiu.
— Teria tirado tudo se tivéssemos mais tempo. Farei isso na próxima vez — disse-lhe. — Prometo-lhe isso — deu-lhe uma piscada.
Ela o olhou com o cenho franzido e lhe estendeu a mão. Quando ele a deu, ficou em pé.
— É claro que sim.
O sorriso do Edge se fez mais amplo.
— Vá.
— O que?
— Quase esperava que me dissesse que não ia haver uma próxima vez.
— Isso seria bastante estúpido, tendo em vista que nós dois sabemos que haverá.
Ele franziu as sobrancelhas.
— Sou assim tão bom?
— Não é isso o que me pareceu ouvir sussurrar a sua mente faz uns minutos.
Ele entreabriu os olhos.
— Desconfiei que estava escutando.
— É a primeira vez que baixa a guarda desde que o conheço. Não pude resistir.
— Hum. É o que tem de mau a euforia do sexo. Ela deu de ombros.
— Assim sou o melhor que teve, não é?
— Cada uma é a melhor do momento, Alby. Não dê muita importância.
— Não se preocupe, não penso fazê-lo.
Ele ficou observando seu rosto um momento; mas Amber não o olhou nos olhos enquanto caminhavam pela praia. Manteve os olhos baixos e se surpreendeu observando de novo o peito de Edge. Tinha um peito lindo. Não muito largo, nem muito robusto, mas se notavam todos os músculos, tensos e duros, sob a pele terna e clara. Parecia uma escultura. Amber pensou vagamente que devia ser um crime cobrir um corpo assim.
Finalmente levantou o olhar.
— Vamos devagar, se quiser que o acompanhe a casa — disse-lhe.
— Não, sou eu quem vai acompanhá-la — Edge deixou de olhar, suspirou e lhe passou um braço pelos ombros. .
— Não me diga que agora quer me proteger por que nos enrolamos?
Ele proferiu uma exclamação de incredulidade.
— Demônios, não. Não queria que me acompanhasse a casa. Só queria que ficássemos a sós na praia para poder me lançar sobre você.
— Entendo — ela contemplou o céu esbranquiçado. — Vai dar tempo de voltar para casa?
— Viu quão rápido sou?
— Sim, faz uns minutos, na praia.
Ele virou a cabeça bruscamente e a olhou surpreso, mas viu que estava sorrindo. Mesmo assim, disse:
— Isso era uma queixa?
Ela baixou a cabeça, pôs uma mão sobre seu peito e a deslizou lentamente por seus peitorais.
— Desfrutei da cada segundo, Edge.
— Mas a próxima vez você gostaria que fosse mais devagar — ele apoiou uma mão sobre a dela, detendo-a. Ela se perguntou por que. Ele lambeu os lábios e olhou além dela . — chegamos.
Muito depressa, pensou ela. E, ao dar a volta, viu a casa, deixou escapar um suspiro e voltou a olhá-lo.
— Devo ir — disse Edge.
— Pois vá, anda — ele começou a afastar-se.
— Adeus, Edge. Que durma bem.
Edge ficou ali parado; logo se virou pela metade, e a Amber pareceu que se debatia consigo mesmo. Por fim, ele exalou um suspiro, resmungou um juramento e a tomou com força entre seus braços. apoderou-se de sua boca e a beijou com ânsia, apertando-a com tanta força que Amber se perguntou por que não se fundiam. E acreditou sentir que Edge estremecia.
Quando a soltou, ele deu a volta sem dizer uma palavra e desapareceu. Amber sabia que não tinha desaparecido. Só tinha experimentado um estalo de velocidade.
Amber umedeceu os lábios, baixou a cabeça e se perguntou por que cada fibra de seu corpo estremecia. Sentia-se mais viva que nunca. Seria por ele?
Não, pensou. Não podia ser por ele. Era porque acabava de experimentar algo que nunca antes tinha experimentado, e tinha sido fantástico. Melhor que fantástico.
Mas não podia atribuir a Edge aquele sentimento. Não podia apaixonar-se por ele, porque Edge já tinha deixado bem claro que seria um erro. E porque acreditava nele.
Tinha sonhado com ele. No sonho, era um figura escura, torturada, temível. Entregava-lhe algo, algo que a aterrorizava. A morte. Mas o que significava aquele maldito sonho?
Tinha que averiguar. E devia ser muito precavida. Esteve caminhando um pouco pela praia, encontrou um lugar onde sentar-se, com um penhasco a suas costas, e se afundou na areia, aproximando os joelhos ao peito. Olhou como se deslizavam as ondas para a borda lentamente. A silhueta do sol despontava no céu, pintando os farrapos de nuvens de vermelho violento, de laranja néon, de amarelo limão.
— É lindo o amanhecer — Amber não afastou os olhos da formosa vista para ouvir a voz de Willem, nem quando seu amigo se sentou na areia, junto dela. — Acredito que as pessoas como nós apreciam mais que outros.
— Suponho que sim. Estamos tão perto de quem não pode vê-lo...
— É estranho, verdade? A mesma coisa que assegura a vida na terra significa a morte para os vampiros.
— Hum. Pode ser que algum dia encontremos um remédio para isso — suspirou e se voltou para observar Will. Pensou que não tinha bom aspecto. Estava mais pálido que de costume, e tinha profundas olheiras . — Como você está?
— Não muito bem. mas que fique entre nós. Ela assentiu com a cabeça.
— Pode confiar em mim.
— Sei. Confio em que você também saiba que pode confiar em mim.
— Sim — Amber lhe deu a mão e se reclinou sobre seu ombro.
— Amber, Morgan conseguiu encontrar a fonte dessas notícias da internet.
Ela levantou a cabeça.
— Algo é algo. Quem as mandou?
Ele umedeceu os lábios.
— Não sabemos quem foi. Mas partiram de um computador do escritório de um ginásio daqui — sobre o coração do Amber, formou-se lentamente uma fina capa de gelo. — O Centro Ginástico Salem — acrescentou ele — e as notícias foram enviadas fora do horário comercial, de madrugada. Comprovamos o periódico local e ao que parece a polícia informou um roubo nessa mesma noite. Levaram algumas máquinas do ginásio.
Ela baixou a cabeça lentamente.
— Obrigado por me dizer isso
Ele ficou calado um momento. Logo disse: — Acha que foi Edge?
Ela deu de ombros, apesar de saber que tinha sido ele. Edge a estava usando, aparentemente para atrair Stiles. Mas com que propósito?
— Amber, não conheço esse cara. Pelo que vi não me parece especialmente recomendável, mas... as coisas não são sempre o que parecem — ela levantou a cabeça e esquadrinhou seus olhos.
— Quando conheci Fina, pensei que sabia como era. Sedenta de sangue, fria, desumana. Mas estava errado. Pode ser que esse Edge não seja o que parece.
— Eu tenho a mesma impressão.
— Pode ser que logo saibamos algo mais dele, em todo caso.
— Por que?
Will suspirou. Amber teve a sensação de que lhe faltava a respiração. E lhe pareceu que tinha frio. Levantou-se e lhe estendeu uma mão. Ele fingiu não ver e se levantou sem sua ajuda, apoiando-se na perna boa e na bengala. Era um homem muito teimoso.
Juntos puseram-se a andar para a casa. A claudicação do Will parecia mais pronunciada que antes.
— Dante me disse que ontem à noite mencionou o nome de seu sire.
— Sim. O'Roark. Acredito que Dante o conhece.
— Dante foi seu sire — disse Will.
Ela piscou, surpreendida.
— Está de brincadeira?
Ele negou com a cabeça.
— Não se vêem há séculos Faz alguns anos Dante retornou para a Irlanda com a esperança de encontrá-lo, mas não conseguiu.
Ela esboçou um sorriso.
— Dante não gostou de Edge a primeira vista. É curioso. Agora descobrimos que estão aparentados.
Will fez girar os olhos.
— Suponho que, em termos vampíricos, estão — ele também sorriu, embora sem vontade — Para Dante o termo está bem empregado. Em minha opinião, ele sempre acreditou nisso um pouco.
— O que acontece é que não se perdoou por ter ferido a Serafina faz muitos anos.
Ele deu de ombros e se deteve ao pé da escada de trás. Amber pensou que precisava recuperar o fôlego.
— Deus, Will, está pior do que diz.
Ele levantou a cabeça.
— Sim. Mas não diga a ninguém.
— Sabe que não o farei, mas como consegue ocultar? Principalmente de Fina.
— Bom, pequena, neste tempo aprendi uma ou duas coisas sobre como proteger meus pensamentos da turma de além tumba.
Ela sorriu.
— Como está? Seja sincero comigo, Will.
Ele franziu os lábios e baixou a cabeça.
— Passei por coisas piores.
— Superou a tortura, assim que isso não é dizer muito.
Ele suspirou e subiu os três degraus que levavam ao terraço.
— Não é tanto a dor, que vem e vai, e que agora mesmo não sinto a não ser o maldito cansaço. Não suporto estar tão fraco.
— Talvez esse cara nos tenha feito um favor, colocando essa informação na internet — disse ela em voz baixa.
— Esse cara? ele lançou um olhar.
— Seja quem for, tem que ser um homem. As mulheres são mais sutis.
Will sabia perfeitamente que Amber pensava que era Edge, mas não quis insistir.
— O típico sexismo ao inverso.
Amber chegou à porta antes que ele abriu-a e esperou que ele entrasse.
— Você vai dormir um pouco? — perguntou-lhe.
Ele assentiu. .
— Sim, e você?
— Sim, assim que tome uma ducha.
Will fechou a porta com chave e apertou um botão. — O sistema de alarme está ligado. Se alguém se aproximar da casa, ouvirá apitos. Se ouvir algo, vá me buscar em seguida. De acordo?
Ela assentiu enquanto subia com ele as escadas que levavam ao segundo andar. Detiveram-se junto ao dormitório principal.
— De acordo.
— Digo-o a sério. Estou doente, não morto. Ainda posso disparar e meu quarenta e cinco é capaz de parar em seco a um elefante.
— Tenho que conseguir uma dessas.
Deu-lhe um beliscão no queixo.
— Sei que tem muitos recursos, pequena. Mas se Stiles e seus mercenários vierem atrás de você e não deixar que a ajude a defender-se deles, vou me zangar muitíssimo.
Amber pensou que, se Stiles e seus mercenários fossem atrás dela, os mercenários acabariam mortos ou fugindo, E Stiles se converteria em seu prisioneiro, para variar.
— Que durma bem — disse ao Will.
— Você também.
Mas Amber não dormiu bem. Voltou a ter aquele sonho. Aquele homem muito belo, com o rosto de um arcanjo, vestido completamente de negro, aproximava-se dela de novo, surgindo de um denso redemoinho de névoa.
Seu misterioso anjo tinha já nome: Edge. E de novo lhe oferecia uma caixa. Uma caixa de madeira nobre de aspecto antigo, escura e ornamentada, sem um só centímetro da superfície lisa. Por toda parte estava lavrada e adornada com símbolos, figuras e intrincadas bordas. Ela acreditou ver olhos lavrados na madeira. Edge voltou a oferecer-lhe.
Como nas outras ocasiões, ela disse que não.
«Não a aceite. Não a toque. Não olhe dentro».
Mas dessa vez não pôde resistir a aceitar o presente.
Estendeu os braços. Suava e lhe tremiam as mãos, mas agarrou a caixa pelos lados e baixou o olhar. Deu uma olhada dentro e essa vez... viu o que havia ali.
Deixou escapar um grito de terror. sentou-se na cama, acordada de todo, e seguiu gritando até que conseguiu fechar a mandíbula.
A porta de seu dormitório se abriu de repente. Hill apareceu com uma pistola tão grande que ao Amber surpreendeu que pudesse sustentá-la nas mãos.
— O que aconteceu? — gritou ele. — O que aconteceu, Amber?
Ela baixou a cabeça e a moveu de um lado a outro enquanto espremia a memória: Mas o sonho se dissipou. Fosse o que fosse que tinha visto e causado aquele pânico, esfumou-se como a neblina matutina ao sair o sol. Que demônios tinha visto nessa caixa que fazia o seu sangue gelar e que sua mente bloquear-se de puro horror?
— Meu deus — murmurou. — Não pode ser tão mau. Não?
Amber se recusava a aceitar a dor que lhe oprimia o coração quando retornou à igreja abandonada, pouco antes que anoitecesse. Podia aguentar a ira. Edge a tinha usado, tinha difundido na internet a notícia de que estava em Salem, só para atrair ao Stiles. Ela ignorava com que propósito o tinha feito. Edge devia ter alguma conta pendente com o caça-vampiros, como tantos de sua espécie. Mas o porquê carecia de importância. Tampouco importava que ela tivesse feito o mesmo se lhe tivesse ocorrido antes.
O que importava era que Edge tinha posto sua vida em perigo para satisfazer seu desejo de vingança. Pois ia sentir a sua ira. Essa noite enfrentaria a ele. Iria dizer que sabia o que pretendia. Deixaria bem claro que não conseguiria nem tocar o rosto cheio de cicatrizes de Stiles até que lhe tirasse a informação que necessitava.
Depois, poderia fazer com ele o que quisesse. Maldição, por que lhe doía tanto? Edge não lhe importava. Não podia ser tão estúpida para abrigar algum sentimento para um homem como ele. Algum sentimento emocional, ao menos. Porque suas emoções físicas escapavam a seu controle.
Quando pensava nisso, parecia que estava derretendo por dentro, assim afugentou aquela lembrança e pulou até à janela da igreja. Ao aterrissar no chão, sacudiu as mãos e observou o saco de boxe pendurado em uma viga, no qual se lia de um dos lados Centro Ginástico Salem.
— Sacana — resmungou ao tempo que dava um murro no saco.
Era um alívio golpear o saco imaginando que era seu rosto. Seu rosto anguloso e cinzelado. Com aquelas maçãs e aquela covinha endiabradamente sexy. Amber golpeou de novo.
— Usou-me, filho da... — um gancho direto à têmpora, justo por debaixo do cabelo loiro oxigenado. Um murro na boca que rompesse aqueles lábios carnudos e sensuais. — Certamente nem sequer me desejava — ferrou outro golpe ao saco e a seguir uma série de pontapés capazes de romper várias costelas de qualquer um . — Era tudo um jogo, verdade, Edge? — o golpe final poderia ter lhe arrancado a cabeça.
O saco se rachou, desprendendo-se da argola que o sustentava, saiu voando e caiu a uns metros de distância, rompendo várias lâminas de madeira do chão e levantando uma nuvem de pó.
Amber franziu os lábios, respirou fundo várias vezes e sentiu o prazer do sangue que corria impetuosamente por suas veias, livrando-se de sua raiva. Logo girou, notou que tinha escurecido e notou que, pela primeira vez, faltava o altar improvisado sobre o banco. .
Franziu as sobrancelhas. Abriu seus sentidos, mas não sentiu a presença de Edge.
— Edge?
Não precisava, entretanto, esperar, nem escutar o eco de sua resposta. Sabia que não estava ali. Partiu.
Edge abriu os olhos e ficou olhando as ripas de madeira que se curvavam para baixo, a seu redor. Por um instante, pensou divertido, que tinha sido engolido por um enorme peixe. Mas logo começou a despertar e se lembrou. Tinha a cabeça apoiada em sua mochila, e as costas sobre a areia e a relva. Estava deitado em uma região onde a praia dava lugar a um prado. Tinha retornado à igreja com tempo para recolher suas coisas e partir, mas tinha tido que conformar-se com o primeiro refúgio que tinha encontrado que resultou ser um barco de remos invertido. Tinha arrastado o barco ao interior para assegurar-se de que a maré não o alcançasse e se colocou debaixo para esperar a noite.
Era um bom refúgio. Não entrava a luz. E, ao levantar um lado do barco, viu que se pôs o sol. Rodeou o barco, sentou-se, passou as mãos pelo cabelo e imediatamente pensou em quem tinha decidido esquecer. Em Amber Lily Bryant.
A essas horas, pensou, ela já saberia o que estava tramando, de que tinha sido ele quem tinha difundido pela rede a notícia de que estava ali.
Demônios, certamente não devia ter feito isso. Ela tinha que estar furiosa. Mas, de qualquer forma, ele não tinha a intenção de permitir que Stiles se aproximasse dela nem de longe. Amber não corria perigo. Ele não permitiria que lhe acontecesse nada. Apanharia Stiles muito antes que Amber corresse algum risco.
E, além disso, aquilo acabaria muito em breve. Stiles estava a caminho. Edge sentia nos ossos. Dirigia-se para o norte pela US 1, E se aproximava mais de Salem a cada segundo que passava. Era estranho que tivesse escolhido a rota turística, em lugar da mais rápida, mas Edge supunha que aquele açougueiro tinha suas razões. Aquela certeza tinha vindo enquanto ele descansava, Com toda clareza. Não a punha em dúvida. Pensava rondar por Salem, evitando a AIby tanto tempo quanto fosse necessário. Quanto antes acabasse tudo aquilo, melhor.
Jogou a mochila no ombro e se encaminhou para a cidade. Não precisava usar sua velocidade sobrenatural. Tinha tempo de sobra e, além disso, gostava de dar um passeio pela noite, sentindo a brisa do mar. Uma hora depois, achava-se ao sul de Salem, caminhando pela sarjeta da estrada enquanto aguardava que Stiles aparecesse. Ia ser fantástico matar por fim aquele canalha. Pensava certificar-se de que o filho de puta morria desta vez, embora para isso tivesse que cortá-lo em pedacinhos e lhe colocar fogo.
Os faróis dos carros se aproximavam, ficando mais brilhantes, passavam ao largo. Edge focalizava todos os seus sentidos em cada veículo que passava, até que por fim, após um momento, sentiu que se aproximava aquele ao qual estava esperando. Stiles. Ia sentado no assento de atrás, no lado do passageiro. Edge se concentrou nele para introduzir-se em sua mente. Podia ver a parte de atrás das cabeças de dois homens no assento dianteiro. Ouviu a voz de um barítono que cantava em italiano, e compreendeu que procedia de um fone. Sentiu o roçar de um cós muito estreito e a dor dos músculos duros pela imobilidade.
Aguardou, deixando que os faróis se aproximassem, e então se colocou no centro da estrada. O carro não diminuiu a velocidade. Edge não se moveu.
O condutor pisou no acelerador, e Stiles tirou os fones e se inclinou para frente. Merda. Iam atropelá-lo. Edge se preparou para o impacto, apertou os dentes e esperou. Não pensava ceder facilmente, e aquele carro acabaria fumegando na sarjeta, pelo menos.
O carro seguia aproximando-se cada vez mais depressa.
Edge apertou a mandíbula e então Alby estava diante dele.
Edge percebeu atônito, sua presença e estendeu as mãos para afastá-la do perigo, mas ela fincou os pés no chão e levantou as mãos, como se sacudisse uma mosca. Seu cabelo voou para trás, roçando o rosto de Edge, mas ele seguiu vendo o carro, cujos pneus giraram bruscamente, deixando marcas negras de borracha no asfalto. Logo, o carro tombou de lado.
Ouviu-se um chiado metálico E saltou uma chuva de faíscas. Edge levantou automaticamente os braços ante si.
Mas Alby seguia ali, sem mover-se, observando, enquanto o carro se detinha entre o pó da sarjeta.
Ela se virou lentamente. Edge conteve o fôlego. Seus olhos refulgiam, azulados, quase negros, como se os iluminasse uma luz interior.
Mas, enquanto esquadrinhava seu rosto, aquela luz se foi dissipando. Quando ao fim se sentiu capaz de falar, Edge disse:
— Que faz aqui, Alby?
— Vim dizer-lhe que vá para o inferno respondeu ela. — E parece que cheguei no momento oportuno.
Virou e pôs-se a andar para o carro. Edge a segurou pelo braço e a fez girar para olhá-lo.
— Como me encontrou?
Ela se limitou a esboçar lentamente um sorriso e se afastou de novo. Ele voltou a segurá-la.
— Maldita seja, Alby, sai daqui. Stiles fará mal a você se puder.
— Ah, e me proteger é o primeiro em sua lista de prioridades, não, Edge? Igual a fazer amor?
— Alby...
Ela levantou bruscamente uma mão, E Edge pensou que ia goleá-lo. Mas não foi isso o que fez. Embora não o tocasse, Edge sentiu sua energia. Notou seu impacto como um golpe de vento abrasador que o levantou do chão e o lançou de costas a dez metros de distância.
Quando aterrissou, estava sem fôlego. Levantou a cabeça, sacudiu-a para limpar-la e fixou seu olhar em Amber. Deus, estava furiosa. Notava a ira que emanava dela como ondas.
Ela ficou de frente ao carro e levantou e abaixou a cabeça exageradamente. O carro se moveu seguindo seu gesto e oscilou sobre si mesmo até que as quatro rodas voltaram a tocar no chão. Amber girou a cabeça para a esquerda e as portas dianteiras se abriram de repente. Apontou o carro com o dedo, girou o pulso para cima e o condutor foi expelido como se fosse atirado por uma mão gigantesca. Percorreu trinta metros rodando pelo chão. Amber repetiu o gesto e o outro indivíduo foi expelido do lado do passageiro.
Ela se sentou atrás do volante e fechou a porta.
Edge ficou de pé com muita dificuldade colocou-se na estrada, consciente de que Stiles estava naquele carro, com Amber, certamente sentado no assento de atrás. Céu santo, e se a ferisse? E se...?
Ela ligou o motor; as rodas giraram e o carro voltou para a estrada, levantando uma nuvem de pó e pedras. Edge pôs-se a correr e ficou em seu caminho. E então a ouviu gritar mentalmente: « afaste-se!»
— «Terá que me atropelar».
— «Como quiser».
Amber pisou no acelerador e bateu em Edge. Ele sentiu um estalo de dor no quadril, onde o pára-choque bateu, e na cabeça ao chocar-se com o pavimento. Sentiu que seu crânio se rompia e que a dor o cegava.
Não podia acreditar que ela o tivesse atropelado. Oh, Deus, que dor!
Tentou levantar-se e sentiu que o sangue emanava da ferida aberta. Maldição. Fluía com excessiva rapidez e, embora tapasse com a mão para deter o fluxo, sabia que não serviria de muito sentou-se, tentou levantar-se, com uma mão na cabeça e por entre o sangue que lhe corria pelo rosto viu o carro passar. E então seus joelhos cederam, e desabou.
Amber tentava dividir sua atenção entre Edge e o homem que permanecia inconsciente no assento de trás.
Seguiu avançando e resmungou:
— Maldito seja. Não volte a fazer isto. Está fingindo. Maldito seja Edge.
Mas viu emanar o sangue entre seus dedos, colados à cabeça, e sentiu a dor que o atravessava como uma sacudida elétrica. E, além dele, viu que os valentões de Stiles começavam a mover-se.
Edge rodou sobre si mesmo e ficou estendido de costas. Ela deteve o carro. Não podia deixá-lo ali naquele estado.
Demônios. Girou em seu assento e se inclinou para examinar Stiles. Estava estendido de lado, com o cinto de segurança preso e o corpo frouxo, sem um só arranhão. Estaria fingindo?
A seu lado, sobre o assento, havia uma maleta negra, parecida com a de um médico. Amber sorriu lentamente, agarrou a maleta e abriu. Estava cheia até a boca de cacarecos. Vidros de drogas, pistolas de tranquilizantes, algemas com a chave presa, grilhões e até uma pistola calibre 38 com silenciador e um pequeno estojo de primeiro socorros. Amber pegou as algemas, pôs uma no braço de Stiles e o empurrou para frente, até que conseguiu prender o outro ao volante.
Logo guardou as chaves no bolso e saiu, levando a maleta.
— Edge?
Aproximou-se dele, certa de que estava fingindo outra vez. Maldito fosse, primeiro a usava para atrair ao Stiles e depois tentava apanhar aquele safado antes dela. Ajoelhou-se sobre o asfalto e o tocou. Ele deixou escapar um fraco gemido.
— Edge?
Deitou-o de costas e viu que saia sangue da ferida da cabeça.
— Maldito seja, por que não se afastou?
Ele não abriu os olhos, mas moveu os lábios e disse em um sussurro apenas audível:
— Acreditava que não ia me atropelar.
— Você mereceu isso.
— Hum. Tem razão.
Amber tirou o estojo de primeiros socorros da maleta negra e olhou dentro. Encontrou a um cilindro de gaze e outro de esparadrapo. Cortou algumas tiras de esparadrapo, fechou com os dedos o corte e colocou as tiras. Ele fez uma careta de dor, e Amber compreendeu que sentia uma dor centuplicada. Os vampiros sentiam a dor como nenhuma outra pessoa. e ela sofria por ele, embora ao mesmo tempo o odiasse. Não teria se detido, a não ser porque Edge podia sangrar antes que amanhecesse.
Quando acabou, a hemorragia parecia ter cessado. Pôs um pouco de gaze sobre a ferida e a prendeu com esparadrapo.
— Logo estará melhor — disse-lhe. — Tenho que ir.
— Não — ele a segurou pelo braço ao ver que se levantava. — Por Deus, Alby, não pode me deixar aqui. Estou fraco como um gatinho.
— Durará até que amanheça. Busca algum lugar onde se esconder e ficará bem.
— Não durarei nem uma hora. Olhe a seu redor.
Ela fez o que ele pedia. Os dois valentões se levantaram e estavam se aproximando cautelosamente.
— Afastem-se! — ordenou ela e, a um giro de seus pulsos, ambos foram jogados para trás.
Edge seguia ali estendido, sem mover-se. Amber se inclinou sobre ele e o segurou pelos ombros.
— Vamos, levante-se. O levarei a algum lugar seguro.
— Morrerei se me deixar aqui — disse ele.
— É o melhor mentiroso que já conheci.
— Nunca menti. Agora tampouco.
— E espera que acredite nisso?
Ele fechou os olhos, vacilou e voltou a abri-los. Ao fazê-lo, deixou que visse, ouvisse e sentisse o que ocorria dentro dele. «Necessito de você, Alby. Não me deixe morrer. Me leve com você, seja onde for».
Ela o olhou fixamente. Enquanto o observava, um fiozinho de sangue saiu de sob da bandagem e deslizou lentamente pela bochecha de Edge.
— Maldito seja — sentou-o de um puxão, apoiou o braço sobre seus ombros e se levantou, levantando-o com ela.
— Obrigado — resmungou Edge enquanto avançavam para o carro.
Amber abriu a porta do acompanhante sem tocá-la e o jogou no assento. Logo rodeou o carro e abriu sua porta. Tirou a algema do volante, inclinou-se para o assento traseiro, empurrou Stiles de bruços sobre o assento e, colocando suas mãos para trás, as imobilizou nas costas com as algemas.
Por fim girou no assento, guardou a chave das algemas no bolso e pôs o carro em marcha.
Edge levantou a cabeça, abriu os olhos e tentou comprovar seu estado enquanto se limpava lentamente. Doía-lhe a cabeça. Isso foi o primeiro que sentiu: dor. E uma sensação de cansaço extremo, como se tivesse ficado sem energias. Perguntou-se um instante por que se sentia assim. Pouco a pouco foi recuperando a memória. O choque de Stiles. A ira de Amber Lily. Franziu o cenho então, porque a última coisa que recordava era que ela o tinha ajudado a entrar no carro. Mas não estava mais no carro. Estava deitado sobre um monte de feno que cheirava a mofo, dentro do que parecia ser um estábulo. Amber devia tê-lo deixado naquele lugar, pensando que estaria a salvo até o amanhecer.
Mas, por desgraça, sentia-se tão mal que não estava muito seguro de poder sobreviver até o amanhecer.
— Por fim acordado?
Edge girou a cabeça para o lugar de onde vinha a voz de Amber. Ela se aproximou e se sentou no feno, a seu lado.
— Por fim? — mesmo falar lhe custava esforço. — Quanto tempo estou inconsciente?
— O suficiente para que acabasse a refrigeração do radiador e o carro se esquentasse, graças a você.
— Foi você quem me atropelou.
— Devia ter se afastado.
— Pensei que não seria capaz.
— Então não me conhece muito bem.
— Não tão bem quanto acreditava — Edge se sentou, mas começou a ficar tonto. Ao ver que cambaleava, Amber o segurou pelos ombros.
— Como está?
— Tão mal que não tinha me dado conta de que estava aqui — levou uma mão à cabeça e apalpou as bandagens — E, tendo em conta como geralmente reajo quando está perto, devo estar nas ultimas.
— Oh, vamos. Deixa disso, Edge. Já pode parar de fingir — ele levantou a cabeça e escrutinou seu rosto. — Nós dois sabemos que só pretendia me usar para pegar Stiles.
Edge sustentou seu olhar até que ela virou o rosto. Logo ele acariciou sua bochecha, obrigando-a a voltar-se.
— Não tinha que fazer amor com você para apanhar Stiles, Alby.
Ela fez girar os olhos e se afastou. Edge deixou escapar um suspiro.
— Onde está ele?
— Stiles? — ela olhou do outro lado do estábulo e apontou com a cabeça um canto onde jazia um homem inconsciente, com as mãos algemadas e presas ao redor de um poste. — Encontrei um pouco de seu tranquilizante favorito em sua maleta.
— Deveria matá-lo e acabar o quanto antes. Amber fixou nele seus enormes olhos negros.
— Preciso dele vivo — ele ficou olhando-a por um momento e logo desviou os olhos. — Por que o odeia tanto? — ele sacudiu a cabeça sem dizer nada. — Não vou permitir que o mate, Edge. Não posso.
— Se continuar passeando pelo campo com ele, Alby, acabará escapando. E logo tentará apoderar-se de você. Sabe perfeitamente.
— Desta vez não conseguirá.
Enfurecido, Edge tentou levantar-se, mas a debilidade caiu sobre ele como uma bola de demolição, e de repente se encontrou deitado de costas no feno.
Sentiu que o cabelo de Alby lhe fazia cócegas no rosto.
Ela estava ajoelhada a seu lado, inclinada sobre ele, e parecia preocupada, apesar de aparentemente estar empenhada em odiá-lo até a morte. Edge fechou os olhos.
— A cabeça vai se curar assim que o sol sair, mas parece que você não vai durar tanto tempo, não, Edge?
— Estou bem.
Ela sacudiu a cabeça.
— Precisa se alimentar.
— Boa ideia — Deus, até sua voz soava débil. — Traz o Stiles aqui e me deixe fazer isso.
— Não confio em que não o mate.
— Sim, bom, é ele ou eu.
— Não necessariamente — lhe lançou um olhar.
Amber deu de ombros – Eu estou aqui.
— Não.
— Vamos, Edge. Está se derretendo mais rápido que a neve em uma onda de calor. Precisa de sangue e eu o tenho e estou disposta a compartilhar com você. Seria uma tolice não aceitar.
Edge sentiu que a fome se agitava dentro dele só em pensar no desejo de saborear o sangue de Amber. E, embora estivesse fraco, de repente ficou a cem.
— Você... nunca deixou que um vampiro bebesse de você, não é, Alby?
— Não. Mas ouvi que é... agradável. — Agradável?
— Hum — ela levantou um braço, subiu a manga e olhou fixamente as veias de seu pulso.
— Quando a fiz gozar na praia e tremia e gritava meu nome, diria que era «agradável»?
— Edge, isso não tem nada que...
— Quando beber de você sentirá que é dez vezes mais agradável.
Ela piscou incrédula.
— Acredito que está exagerando.
Edge deu de ombros.
— Ninguém a provou nunca. Eu provei a muitos humanos, e até a um vampiro ou dois. Sei o que digo.
Ela o olhou nos olhos.
— Eu não sou nem humana, nem vampiro. Comigo poderia ser completamente diferente.
E o seria, Edge não tinha nenhuma dúvida. Isso era o que o preocupava. Seu encontro sexual com ela tinha sido a experiência mais avassaladora de sua vida.
Como seria beber de suas tenras veias?
Edge o desejava. Ardia em desejos. Ansiava ser o primeiro a devorá-la, da mesma forma que tinha sido o primeiro a possuí-la.
Ela o estava olhando nos olhos que sem dúvida começavam a brilhar, cheios de desejo. Tremendo, ofereceu-lhe o braço, que estendeu até seu pulso deixando-o quase colado aos lábios de Edge.
— Adiante — murmurou. — Eu posso aguentar, se você puder.
Ainda deitado no feno, ele levantou as mãos, fechou-as sobre seu antebraço e o aproximou de sua boca. Deixou que seus lábios e sua língua saboreassem a pele salgada, sem afastar os olhos dela. Então compreendeu que, embora fingisse odiá-lo, na realidade o desejava.
Separou os lábios, chupou a pele e logo, enquanto a segurava com mais força, cravou-lhe os dentes. Seus incisivos se afundaram em sua carne, transpassando as paredes das veias. Não mordeu muito forte. O suficiente para que brotasse um fiozinho de sangue.
Mas, quando aquele sangue tocou sua língua, sentiu uma energia para a qual não estava preparado. Um arrebatamento tão poderoso que seu corpo inteiro se esticou. Deus! Os olhos do Amber se dilataram e sua boca se abriu. Sua cabeça caiu para trás, e começou a tremer.
Edge sugou um pouco mais, e a energia de Amber começou a correr por seu corpo. Sentiu que recuperava as forças. Amber gemeu, caiu para trás sobre o feno, e Edge se levantou e afastou a mão de seu pulso para jogar-se sobre ela. Queria mais, muito mais do que lhe tinha dado. Queria-a por inteiro.
Suas mãos se deslizaram sob a blusa de Amber e se fecharam sobre seus seios. Ela estava tremendo, seu corpo parecia lhe suplicar que o tomasse. Seus mamilos estavam duros e quentes. Edge afastou a blusa e se inclinou sobre seus seios; chupou um e logo o mordeu até que ela deixou escapar um grito que mesclava o prazer e a dor. Edge notou o sabor do sangue na língua e chupou com mais força.
Ela arqueou as costas. Edge estava muito excitado, sentia um desejo furioso que o atravessava com uma força que jamais tinha conhecido. Tirou-lhe os jeans sem soltar seu mamilo, e logo se desembaraçou dos seus.
Um instante depois se afundou nela com todas as suas forças. Amber gritou e se agarrou a seus ombros; logo lhe rasgou a camiseta e a tirou. Rodeou-lhe a cintura com as pernas, juntando os tornozelos, e elevou os quadris para receber suas investidas. Edge a agarrou pelas nádegas, as apertou com força, e a apertou contra si enquanto ficava de joelhos, levantando-a com ele. Ficou ajoelhado, sustentando-a desequilibrado, e começou a move-la para cima e para baixo sobre ele, uma e outra vez, enquanto olhava sua cabeça arremessada para trás, seu cabelo que se deslizava para os lados, e seu pescoço nu.
Colou a boca a sua garganta, beijou-a, preparando-a, e ela deixou escapar um gemido que ele interpretou como um sinal de rendição. Assim afundou as presas em sua jugular.
O sangue brotou e fluiu para ele. E, com ela, tudo que Amber sentia... e tudo que era. Deus, que poderosa era aquela mulher! Sua energia se agitava dentro dele, tão avassaladora que o impulsionou a levantar-se de um salto. Cambaleou para trás, bateu contra uma parede e sentiu que se quebrava atrás dele. Algo caiu com estrépito ao chão. Uma viga e vários fardos de feno se precipitaram do teto e caíram perto deles, mas Edge não se deu conta. De repente conhecia Amber, sabia tudo sobre ela, tudo que tinha sentido durante seu cativeiro.
O amor veemente que sentia por seus pais e seus amigos. A dor que lhe causava a enfermidade de Willem Stone, e sua ferrenha determinação de salvá-lo. E sua paixão por ele, por Edge, que envolvia a tudo isso. O que sentia por ele era tão intenso que o sacudiu até a medula dos ossos, apesar de que também sentia sua reticência, seu medo, sua cautela.
Mas havia também algo mais, algo... distinto. além de tudo, Edge foi tomando consciência pouco a pouco de que havia algo mais dentro dela. Em seu interior, mas separado. Era algo novo. Pequeno. Quase imperceptível. Dentro, muito dentro dela.
Uma nova vida.
O orgasmo se desatou em seu interior ao mesmo tempo em que se apoderava dele o assombro de seu descobrimento, e afastou a boca de sua garganta para afastar-se daquela certeza impossível.
Ela estava gozando, agarrava-se a ele com todas as suas forças, estremecendo, movia-se e o espremia até o fundo. Edge a abraçou enquanto o orgasmo a atravessava e seu próprio êxtase bombeava dentro dela. Sustentou-a até que o prazer começou a refluir. E logo voltou a depositá-la sobre o feno muito suavemente e, ao afastar seu cabelo do rosto, viu que tinha lágrimas nas bochechas.
Amber tinha mentido. E ele supunha que se zangaria com ela... mais tarde. Mas, de momento, estava tão assombrado por sua nova percepção dela que não podia pensar nisso. Não estava preparado para aquilo. Fosse o que fosse o que tivesse previsto do que planejava para ela, se enganou. Amber superava com sobra o que tinha esperado. Tudo nela era extraordinário.
Fisicamente, era assombrosa; sua beleza era própria de um anjo ou de uma deusa. De um demônio ou de uma bruxa. Uma beleza sobrenatural. Seus poderes eram muito intensos, não maiores que os dele, mas sim distintos. A telequinesia, a vidência... Sim, Amber possuía todos esses atributos. Edge o tinha sentido ao saboreá-la. Seu sangue tinha sacudido o cérebro de Edge de forma parecida, imaginava ele, a uma dose de cocaína no cérebro de um viciado. Edge se perguntava se seria capaz de viver sem aquela sensação. A paixão de Amber superava a de qualquer mulher que tivesse conhecido, e estava à altura da sua.
Suas emoções eram também muito intensas. O que sentia por ele era devastador, e até o fugaz vislumbre que tinha visto bastava para pô-lo a beira do pânico.
Além disso, tinha a sensação de ter cometido um sacrilégio, de ter corrompido algo sagrado. Não tinha entendido quão especial era Amber até esse momento. A culpa disso era dela. Fosse quem fosse o outro homem, certamente valia muito mais que ele.
Assim imaginava que tanto fazia. Ou isso dizia a si mesmo.
Acariciou as bochechas umedecidas pelas lágrimas do Amber, as enxugando com os dedos.
— Não devi...
— Sim, claro que sim.
Ele fechou os olhos para não ver seu intenso olhar.
— Está bem? Passei dos limites? — ela assentiu com a cabeça, mas parecia sonolenta. — Deus, o que lhe eu fiz? — murmurou ele.
— Não exagerou tanto, Edge. Estou bem.
— Não me referia a isso.
Ela franziu o cenho e logo assentiu.
— Ah — disse com frieza. De repente já não parecia tão sonolenta. — Deixa de preocupar-se, Edge. Não sou idiota. Sei que isto não significa nada. Nós dois nos deixamos levar, nada mais — deitou-se de lado, lhe dando as costas.
Certamente, pensou ele, para que ele não visse a mentira refletida em seus olhos.
— Claro que não significa nada. Por que ia significar algo?
Considerando o que sabia agora, sentia-se de repente possuído por uma energia fora do comum. Mais poderosa que nunca. Aquela força se fazia mais presente a cada segundo que passava. O sangue de Amber era... diferente. Carregado de energia e potente. Zumbia em suas veias e fazia com que sua pele se arrepiasse, carregada de eletricidade. Em sua cabeça se amontoavam um sem-fim de sensações, e seu corpo vibrava cheio de energia estática.
Amber ficou em pé com esforço. Procurou sua roupa e se vestiu lentamente, desajeitada. Edge se aproximou com intenção de ajudá-la, mas ela afastou sua mão. Estava cansada e aturdida, mas continuava zangada. Sem dúvida, ela também começava a ganhar consciência da distância que os separava. Provavelmente estivesse pensando no outro fosse quem fosse. Edge estava muito abaixo dela. Não era digno de um anjo e, francamente, tampouco queria ser.
— Vou ter que procurar outro carro — disse ela. — o do Stiles está a alguns quilômetros daqui, onde o deixei quando esquentou o motor. E não chegarei muito longe a pé.
Assim, nem sequer queria falar sobre o que acabava de acontecer entre eles. Nem do segredo que guardava.
De repente, Edge pensou que talvez nem sequer soubesse que estava grávida.
Demônios era isso. Não sabia.
— Aonde vamos? — perguntou-lhe.
— Tenho que levar Stiles a casa de Eric e Tam. Eric tem ali um laboratório.
— E quando chegar lá?
— Farei ele falar; o obrigarei a me falar de sua fórmula para roubar a imortalidade, E logo criaremos nosso próprio soro.
— Usando seu sangue?
Ela abotoou a camisa sem olhá-lo.
— Não penso permitir que polua o sangue de Willem com sua maldade. Não. Usaremos o meu.
Ele assentiu com a cabeça. Entendia as razões do Amber, mas não estava seguro de que fosse boa ideia.
Tinha visto os piores pesadelos de Amber, e em todos eles aparecia Stiles e o tempo que tinha passado em suas mãos. Razão de mais para matar aquele safado. E quanto antes melhor. Mas não entendia por que continuava sentindo-se assim, sabendo o que sabia. Era realmente patético.
— Não pensa me deixar ir com você, verdade, Alby?
Ela o olhou e esboçou um doce sorriso, mas Edge vislumbrou a dor que se escondia atrás de seu sorriso e que aflorava em seus olhos muito negros.
— Assim que você dormir, Stiles e eu sairemos daqui.
— E não acha que eu sigo você?
— Não sabe onde vivem.
— Em Windy Ridge — disse ele — Ou algo assim.
Ela fez uma careta.
— Em que estado? — ele baixou os olhos. — Não acredito que meus queridos amigos de Salem digam a você. Sobre tudo, quando chegar a um lugar onde meu celular tenha cobertura e possa chamá-los.
— Tem tudo planejado, não é?
— Mmmm... mm.
— Só há um problema, amorzinho. Agora mesmo, sinto-me mais forte do que nunca. Você, ao contrario, está um tanto fraquinha.
Edge estava cada vez mais zangado, e sabia. Amber não só lhe tinha mentido, mas também estava se comportando como se ele fosse o inimigo, e tudo para defender a um porco como Stiles.
Ela deu de ombros. — E?
Edge esboçou um sorriso perverso, girou sobre seus calcanhares e se aproximou de Stiles. Agarrou-o pela garganta e o sacudiu, de modo que sua cabeça se agitava sobre seus ombros como a de um boneco de pano. .
— Acorda safado. Estou a muito tempo esperando este momento.
Amber se lançou para ele e o segurou pelo ombro para tentar afastá-lo, mas não tinha forças. Edge a afastou com cuidado. Ela cambaleou um momento, mas não caiu.
— Me deixe Alby. É melhor que o mate agora mesmo. Assim não correrá o risco de fazer uma absurda viagem a sós com ele. Sobre tudo agora.
— Os riscos que corro são meu assunto, maldito seja!
Edge não fez caso dela, apesar de Amber começar a lhe golpear as costas, e voltou a sacudir Stiles.
— Acorda Stiles.
Stiles abriu os olhos, aturdido. Mas quando seu olhar posou sobre o Edge, seus olhos se dilataram.
— Você!
De repente, Alby deixou de golpeá-lo, e Edge compreendeu que estava se perguntando como ele conhecia aquele homem.
— Passou muito tempo, não é? — disse Edge com ironia.
Stiles o olhou com ódio.
— Veio para tentar outra vez? Não pode me matar, e sabe.
— Oh, desta vez eu conseguirei. Só queria despertá-lo para que saiba quem vai tirá-lo de circulação.
Stiles puxou as algemas, mas estas não cederam.
— Edge, não faça isso. Por favor, não faça isso — murmurou Amber.
Edge apertou a garganta de Stiles enquanto Amber lhe gritava que parasse. Ele não deu atenção. Seguiu apertando e, por estranho que parecesse, a satisfação que lhe produzia esmagar ao Stiles não era tanta como a que lhe produzia imaginar que a garganta que estava apertando pertencia ao homem com quem tinha estado Amber Lily. Com quem se deitou. A quem possivelmente até amasse. Sentiu como se quebravam os ossos sob sua mão e observou como se extinguia a luz dos olhos de Stiles. Seguiu apertando um pouco mais para assegurar-se de que não ficava sinal algum de vida e logo o soltou e deixou que o corpo flácido caísse ao chão coberto de feno.
— Filho de puta — Edge se voltou para olhá-la e viu o ódio refletido em seus olhos. — Será melhor que se coloque debaixo de um montão de feno, Edge — disse ela com frieza . — Está saindo o sol.
Edge olhou além dela e viu que a primeira claridade da alvorada se filtrava por entre as frestas das pranchas do estábulo. Engoliu saliva.
— Não vá sem mim — disse. — Temos que conversar. E Stiles...
— Não quero ouvir nada do que tenha a dizer.
— Alby, há coisas que você não sabe — disse, olhando ao Stiles com ansiedade. Sentiu de repente uma pontada na pele e, ao baixar o olhar, viu que seu ombro fumegava ali onde um leve raio de luz lhe havia tocado.
Alby o afastou de um empurrão, apoiando as duas mãos sobre seu peito.
— Esconda-se maldito seja.
Ele ficou ali parado um momento, consciente de que estava amanhecendo. Entretanto, a luz não parecia agir sobre ele com o efeito costumeiro. Estava cansado, mas não tinha um sono esmagador, como costumava. Seu corpo não enfraquecia e sua mente não parecia entrar em estado letárgico. Sentia-se tão forte e desperto como a meia-noite. e isso se devia ao sangue de Amber.
A luz seguiu avançando em finos raios que pareciam arrastar-se para ele à medida que o sol se levantava, filtrando-se por entre as pranchas da parede.
— Isto não acabou ainda. Tem que me escutar. E tem muitas coisas que me explicar.
— Eu tenho muitas coisas que explicar? É você quem possivelmente tenha firmado a sentença de morte de Will – empurrou-o outra vez — Vai!
— Importaria a você, não é? Que ficasse aqui e me queimasse?
— Assaria salsichas e cantaria canções ao redor do fogo.
— É uma mentirosa.
Edge sentiu de novo sua dor. A luz abrasou outra vez sua carne, justo por cima das costelas, de um lado. E de novo Alby lhe deu um empurrão, afastando-o da luz.
— Quer ir de uma vez, Edge?
Ele sacudiu a cabeça.
— Só se me esperar. Volta para a casa de Salem, onde está a salvo, e me espere ali.
— Eu...
A luz seguia entrando. Seu cabelo começou a queimar-se lentamente.
— Só uma conversa mais, Alby. Isso é tudo. Em Salem. Depois, a deixarei em paz para sempre — sentia cada vez mais calor. de repente, Amber começou a lhe golpear a cabeça com as mãos. Sem dúvida para apagar as pequenas chamas.
— Está bem, está bem, farei isso.
— Promete-me?
Ela o empurrou com todas as suas forças, apesar de ainda estar muito débil e cansada por ter compartilhado seu sangue com ele. Entretanto, juntou suas forças e o empurrou de novo, combinando sua força física e sua força mental. Edge foi lançado para trás e caiu sobre um montão de feno. Logo, ela levantou as mãos e abaixou de repente ao tempo que seu rosto se contraía. Um instante depois, uma montanha de feno caiu sobre Edge. O peso o esmagou contra o chão. Os golpes continuaram até que ele ficou estendido de bruços, asfixiado pelo pó e as sementes do feno, por seu aroma mofado, mas completamente envolto na escuridão.
Edge procurou mentalmente por Amber enquanto a letargia diurna começava a apoderar-se dele ao fim, despojando-o pouco a pouco da consciência.
«Alby?»
Edge sentiu sua exasperação.
«Prometa que fará o que eu pedi. prometa-me isso
«Se assim for calar você, prometo-lhe isso».
Ele suspirou e ao fim deixou que seu corpo relaxasse e que sua mente sucumbisse ao sonho.
Amber se girou lentamente ao sentir que algo se movia atrás dela. O corpo do Stiles jazia meio sentado e frouxo, suspenso pelas mãos presas muito por cima de sua cabeça graças às algemas, presas a uma viga baixa e perpendicular. Sua cabeça pendia quase ao reverso, com o pescoço torcido em um ângulo impossível.
Mas, enquanto ela o olhava, Stiles se moveu. Girou a cabeça, e ela pôde ouvir o horripilante rangido de seus ossos. Tinha os olhos totalmente abertos, desfocados, mas fixos nela. A parte desfigurada de seu rosto, cuja pele era de um rosa vivo, não se moveu, mas a outra metade se contraiu em uma careta quando foi levantando pouco a pouco a cabeça, colocando-a de novo em linha com o pescoço. Os ossos crepitavam e rangiam como os cereais que Amber mais gostava quando era pequena. Quando sua cabeça se ergueu totalmente, Stiles a moveu lentamente para a direita e esquerda e ao fim se levantou. Puxou sem muita convicção as algemas que lhe prendiam os braços, e que agora ficavam à altura de seu peito, e cravou seus olhos abrasadores nela.
Amber engoliu seu medo, mas deu sem querer um passo atrás. Não estava segura de que Stiles pudesse ressuscitar até que o tinha visto com seus próprios olhos. Mas mesmo assim lhe custava acreditar. Estremeceu. Stiles se limitou a sorrir.
— Hum, vejo que me drogou — disse Stiles lentamente enquanto puxava de novo as algemas que o prendiam — Bem pensado. Em circunstâncias normais, sou capaz de partir esta corrente em duas.
Amber tentou sacudir a horripilante sensação de tê-lo visto retomar à vida diante de seus olhos e procurou aparentar despreocupação.
— Eu também. Logo eu estava consciente quando lhe coloquei isso, mas imaginei que, quando despertasse, seria um risco.
Ele assentiu com a cabeça.
— Assim essa é sua revanche, não é? Posso perguntar o que pensa fazer comigo, agora que me tem em suas mãos? Me matar, obviamente, não acredito que entre em seus planos.
— O que o faz estar tão seguro?
Ele deu de ombros.
— Ainda estou vivo. E faz uns minutos você estava pedindo ao Edgar que não me matasse.
Ela piscou lentamente.
— Edgar?
Ele assentiu com a cabeça.
— Bonito não é?
— Sim, precioso — ela baixou a cabeça para dissimular um sorriso. Edgar. Quem o teria adivinhado?
— Então, vai dizer-me o que pensa fazer comigo?
Ela tomou fôlego, exalou um lento suspiro e cruzou o estábulo para recolher o estojo de primeiros socorros que tinha encontrado no carro e que continha seringas de injeção, uma bolsa de solução salina, ataduras, anti-séptico e até instrumental de sutura. Tirou um par de ampolas de pequeno tamanho e encheu uma seringa de injeção antes de dar-se conta de que a maioria já estavam carregadas. Do que, ignorava-o. E, depois de pensar melhor, esvaziou-as todas no chão e voltou a encher. Guardou a primeira que tinha enchido no bolso, de costas para Stiles, e levou outra na mão.
— Temo que deixá-lo consciente muito tempo não seria sensato — disse.
Sobre tudo, pensou, tendo em conta que se achava fraca. Entretanto, morria de vontade de saber como Stiles tinha conhecido Edge. Ou Edgar. Mas imaginava que não podia acreditar em nenhuma palavra que dissesse aquele desalmado. Assim não tinha sentido arriscar sua vida deixando-o acordado.
Era uma lástima, pensou que não pudesse manter a promessa que tinha feito para Edge. Seu sorriso se desvaneceu ao recordar a expressão de assombro do Edge depois do que tinha acontecido entre eles.
Saltava à vista que, ao dissipar a paixão, Edge estava preocupado. Amber acreditava saber a razão. Imaginava que se devia a que tinha notado que estava tecendo ilusões românticas a respeito dele, ou apaixonando-se, ou que esperava dele algo mais depois da intimidade que tinham compartilhado. Compartilhar o sangue era um ato poderoso. Mais poderoso do que ela tinha imaginado. Um ato que, conforme lhe havia dito sua mãe, costumava criar vínculos indissolúveis entre duas pessoas, ou a intensificar os existentes.
Edge sem dúvida sabia todas essas coisas. Estava claro que não queria ter nada a ver com ela. Tinha se arrependido assim que esfriara a paixão, até ao ponto de parecer ter se zangado com ela.
Amber deu de ombros. Ao diabo com ele. E, entretanto, no fundo, já sentia saudades.
Retornou junto ao Stiles, levando a seringa de injeção, e se perguntou se estava tão fraco como parecia.
— Sinto muito — disse — Mais tarde o quero acordado e falador. Mas até que tenha reforços, prefiro estar segura a ter que lamentar.
Estendeu o braço para subir a manga.
Ele pegou a corrente das algemas e a rompeu como se fosse um fio de linha, agarrou Amber pelo pulso e o retorceu até que deixou cair a seringa de injeção.
— Segura, não sei — sussurrou-lhe ao ouvido. — Mas sem dúvida vai lamentar.
Ao cair o sol, Edge respirou sua primeira baforada de ar noturno e imediatamente se engasgou. O feno mofado não ia bem, pensou enquanto começava a abrir passo entre o monte de palha. De repente pensou que despertou de repente e por completo. Não tinha experimentado a habitual sonolência que pouco a pouco ia dissipando-se até que recuperasse a lucidez e as forças. Ao sair por fim do monte de feno, enquanto sacudia a palha do cabelo e a roupa, compreendeu que a infusão de energia que lhe tinha dado Alby não se dissipara ainda. Ao contrário, tinha aumentado de intensidade.
Encontrou sua camiseta jogada no chão, sacudiu-a com força, levantando uma nuvem de pó, e a pôs antes de dar uma olhada a seu redor. Não esperava que Amber estivesse ali. Tinha lhe prometido retornar à casa de Salem e esperá-lo lá. De modo que não se alarmou por sua ausência. Embora possivelmente devesse alarmar-se, dado que tinha descoberto que não tinha sido honesta, ao menos com ele. Imaginava, entretanto, que esse era seu único defeito. Mas era um defeito muito grande. Um defeito que ele jamais teria imaginado e que tinha ferido seu orgulho.
Apesar de tudo, não o alarmou sua ausência... até que cruzou o estábulo e se aproximou do lugar onde tinha deixado o corpo sem vida de Stiles.
Nunca tinha tentado matar ao Stiles partindo-lhe o pescoço, e ao que parecia tinha conseguido. Embora o preocupava não ter tido tempo de certificar-se. De repente começou a inquietar-se. Porque não havia nenhum corpo.
Fechou os olhos lentamente. Teria ressuscitado outra vez o bastardo? Suspirou e se obrigou a inspecionar a zona com mais atenção em busca de pistas. Encontrou duas coisas que o aterrorizaram. As algemas, com a corrente partida limpamente em duas, e uma seringa de injeção hipodérmica usada no meio do feno.
— Meu deus.
Sua mente lhe dizia que talvez não tivesse acontecido nada. Se Stiles tinha voltado para a vida enquanto Alby estava ali, embora tivesse conseguido livrar-se das algemas, ela podia lhe ter injetado um tranquilizador para levá-lo a Salem.
E seria melhor que fosse assim. Porque, se não, Amber estava metida em uma boa confusão. Edge sufocou o arrebatamento de pânico que tentava apoderar-se dele. Aquele sentimento lhe era quase desconhecido; aquela preocupação exagerada por outro ser humano. Não se sentia assim desde... desde que seus pintinhos foram assassinados. E, entretanto, era real. Imaginava que, dadas as circunstâncias, era compreensível.
Tentou tranquilizar-se e concentrar sua atenção em Alby. Imaginou seu rosto e estirou os dedos de sua mente para alcançá-la. Mas não sentiu nada. Não havia nem rastro dela. Ou o estava rechaçando... ou estava morta.
Demônios tinha que voltar para a casa daquela panda de intrometidos de Salem, embora temesse fazê-lo. Era o único modo de averiguar o que tinha acontecido com Amber Lily. E ainda não tinha saldado sua dívida com Stiles.
Empreendeu o caminho a pé, mas a marcha forçada, detendo-se unicamente para orientar-se antes de pôr em marcha seus poderes a plena potência. E ao fazê-lo surpreendeu comprovar que se movia a uma velocidade que nunca antes tinha alcançado. Quando chegou à casa da praia, ergueu as costas e se aproximou lentamente da porta. Esta se abriu antes que chegasse.
Serafina estava ao outro lado, e tinha cara de poucos amigos. Tampouco a tinham outros, que pareciam espectadores e cheios de resolução, mas não amistosos.
— Onde caramba está Amber? — perguntou com aspereza a vampiresa.
Edge não se acovardou ante o olhar acusador de Serafina.
— Esperava encontrá-la aqui.
Por um instante, acreditou que Serafina ia lançar-se sobre ele, mas Willem Stone a agarrou pelos ombros por trás e a afastou suavemente a um lado.
— Será melhor que entre e nos conte o que ocorreu, Edge.
Serafina assentiu.
— Sim, entra. Convém que saibamos o que aconteceu antes que arranque seu coração.
— Sim, será melhor — disse ele, e entrou no que lhe pareceu um ninho de víboras, perguntando-se se voltaria a sair. Então recordou que seus poderes pareciam ter se multiplicado. Os outros ignoravam quão forte era. Ele mesmo ignorava os limites de seus poderes. Colocou a mão no bolso de sua camiseta para tirar seu pacote de cigarros.
— Importam-se que eu fume?
— Willem tem câncer, moleque ignorante. O que você acha?
Edge tirou o pacote de qualquer modo, extraiu um cigarro e saiu ao terraço de madeira de sequóia para acendê-lo. Logo tomou assento em uma espreguiçadeira e girou a cabeça para eles, esperando.
Serafina exalou um suspiro exasperado e saiu ao terraço. Willem, Morgan e Dante a seguiram. Todos eles se sentaram. Morgan foi primeira em falar.
— Sabemos que foi você quem divulgou o paradeiro de Amber — disse.
Ele deu de ombros.
— Pensei que era o melhor modo de atrair Stiles. Isso era o que queriam todos, não?
— Nós não lhe pedimos ajuda — espetou-lhe Serafina.
Willem lhe pôs uma mão sobre o braço para apaziguá-la.
— O que nos molesta não é sua ajuda. Mas não pensávamos utilizar Amber como isca.
Edge baixou a cabeça.
— E eu não tinha intenção de permitir que Stiles se aproximasse dela. E não o teria feito, se ela ficasse quieta — deu um trago no cigarro enquanto os outros esperavam, exalou uma baforada de fumaça formando anéis e logo prosseguiu dizendo — Estava a ponto de capturar ao Stiles quando apareceu e ficou no meio. Fez capotar o carro de Stiles em um acostamento como se pesasse menos que uma pluma e logo me atropelou como a um cão com ele.
— Outra vez? — perguntou Morgan com um brilho de incredulidade no olhar.
— Desta vez, de verdade. Me colocou arrastado no carro, com o Stiles, e arrancou a toda velocidade. Eu estava... um pouco aturdido. Despertei em um estábulo. Stiles estava algemado a um poste, inconsciente. Amber ficou o tempo suficiente para assegurar-se de que eu sobreviveria, enterrou-me sob uma avalanche de feno quando começou a amanhecer e, quando despertei, Stiles e ela tinham ido.
Willem estava escrutinando seu rosto, como se soubesse que Edge estava lhes ocultando partes essenciais da história.
— Devia ter matado a esse safado. Não vale a pena correr o risco de que Amber caia outra vez em suas mãos para me salvar.
— A verdade é que o matei. Esmaguei-lhe o pescoço. Mas, pelo que encontrei ao despertar, acredito que não esteve morto muito tempo.
— O que encontrou? — perguntou Serafina.
— As algemas estavam partidas. E havia uma seringa de injeção jogada no chão — ao ver que ela franzia o cenho, acrescentou. — Acredito que Alby tirou a maleta que Stiles levava no carro. Dentro havia um tranquilizante. Manteve-o drogado quase todo o tempo.
— Ao que parece, não o suficiente — resmungou Dante. Edge sacudiu a cabeça.
— Fiz ela me prometer que viria aqui me esperar. Mas está claro que não o fez. O que não sei é qual dos dois é o raptor e qual o cativo — sua voz se quebrou um instante. Pigarreou e deu outro trago a seu cigarro.
— Temos que avisar ao Jameson e a Angélica disse Will. — Quererão sair imediatamente. É mais de uma noite de viagem até Wind Ridge.
Edge assentiu com a cabeça.
— Suponho que quanto antes a busquemos, melhor.
— Para ela, possivelmente. Mas não para você, Edge — disse Serafina. — Porque, se eu não o matar por isso, Rhiannon o fará. E ela está com os pais de Amber.
— Sim, em algum lugar onde venta muito, com um vampiro cientista e sua noiva.
— Eric e Tamara — disse Will.
— Ali é onde pensava levar o Stiles — disse-lhes Edge. — Se ela seguir ao plano, ali será onde a encontremos.
— E, se não — acrescentou Will, — talvez Angélica possa introduzir-se em sua mente e localizá-la.
Edge sacudiu a cabeça.
— Está bloqueando sua mente. Já o tentei e não serviu que nada.
— Vá, quanta soberba — bufou Serafina — Por acaso acha que seu vínculo com Amber Lily pode comparar-se com o que compartilha com sua mãe?
Edge levantou as sobrancelhas. – Pode ser que a surpreenda.
Ela entreabriu os olhos. Deus, parecia morrer de vontade de lhe arrancar a garganta.
— Há algo mais — disse Will — O que está ocultando de nós, Edge?
Edge observou Willem e pensou que não parecia um mau tipo, para um ser humano. Dentre todos eles, era o que mais o agradava. Mas sacudiu lentamente a cabeça.
— O que seja só interessa a Alby e a mim. E daqui não sairá. por agora.
Willem apertou os lábios e Serafina se levantou de um salto.
— Maldito bastardo! Vou tirar esse sorriso do seu rosto!
— Não — Willem a deteve agarrando sua mão. Nem sequer teve que levantar-se — A menos que nos sirva para encontrá-la — olhou ao Edge.
— Não tem nada a ver com isso.
— Então, não é nosso assunto.
Serafina rangeu os dentes e ficou a passear pelo terraço.
— Necessitamos um plano. Temos que começar a procurá-la.
— Chamem a seus pais. Me digam onde vive esse tal Eric e me dêem a lista dos lugares onde Stiles foi visto. Eu a encontrarei — disse Edge suavemente.
— Como se fôssemos dar a você esta missão! — exclamou Serafina.
Ele deu de ombros.
— De qualquer forma, vou procurá-la. Com a informação ou sem ela. Vocês escolhem — deu uma última baforada no cigarro e atirou a bituca por cima do corrimão, para a areia.
— Trarei o que temos em nossos arquivos disse Morgan, levantando-se. — Me dê um minuto para imprimi-lo.
Ele assentiu com a cabeça, e Morgan entrou na casa apressadamente. Dante se voltou para o Edge.
— Eu vou com você.
— Nem o sonhe.
O outro deu de ombros.
— Então, seguirei você. Não confio em você, Edge. Se encontrar Amber Lily, um de nós tem que estar perto. Serafina e Will têm que ficar aqui para que Will possa continuar com seu tratamento. Morgan também deve ficar para continuar procurando pistas através do telefone e da internet. Eu sou o único que resta.
Edge sacudiu a cabeça e fez girar os olhos. — Está bem. Mas só os dois.
— Os três, na realidade — disse Dante. Edge o olhou com o cenho franzido, sem compreender. — Fiz algumas chamadas, mentais e físicas, enquanto Amber e você estavam fora, Edge. Por fim consegui contatar com um velho amigo meu que podia me esclarecer em parte esta situação. E está a caminho.
Edge moveu a cabeça de um lado a outro.
— Pois eu não penso esperá-lo. Pode me alcançar quando chegar seu misterioso convidado.
— Estará aqui a qualquer momento, Edge.
— Já está aqui — disse uma voz profunda das sombras, além do terraço.
Edge sentiu que um calafrio lhe corria pela espinha dorsal. De repente, experimentou uma sensação que não tinha sentido desde sua metamorfose. Um comichão, uma sacudida elétrica, como se tivesse um cabo nu sob a pele. Voltou-se para a voz e fixou a vista enquanto o outro homem se aproximava.
— Você — murmurou Edge. Sentiu-se de repente sacudido até a medula dos ossos, quando o vampiro que o tinha transformado e logo abandonado apareceu ante ele e sustentou seu olhar — Filho da puta!
Edge saltou o corrimão e se jogou sobre o outro com toda a raiva que tinha acumulado durante mais de cinquenta anos.
Depois que Stiles lhe deu a injeção, Amber, em que pese a sua debilidade, deu graças aos deuses porque ao menos seu cérebro seguiu funcionando a plena capacidade, e desabou.
Stiles, de cujos pulsos penduravam ainda as algemas com a corrente partida em duas, inclinou-se sobre ela.
— Tinha a esperança de tropeçar com você outra vez — disse com suavidade — Embora a verdade é que me surpreendeu que fosse assim.
Ela fechou as pálpebras, entreabrindo os olhos, como se seriamente a seringa de injeção que Stiles lhe tinha cravado no braço contivesse tranquilizador em lugar da solução salina que tinha encontrado na maleta negra. A seringa de injeção com a droga seguia em seu bolso. Tinha tido a sensação de que Stiles estava fingindo convencida de que a droga já devia ter se dissipado. E, do mesmo modo, havia sentido que averiguaria mais coisas se seguisse a corrente do que se lutasse com ele, pois, dado seu estado de fraqueza, certamente a venceria. De modo que tinha tomado... certas precauções.
— Do que... está falando? — perguntou com voz pastosa.
Ele deu de ombros.
— Levou meus diários. Já sabe o que fiz com o sangue que tirei de você.
Ela assentiu com a cabeça, movendo o pescoço como se fora de borracha.
— Fez... uma fórmula... com meu sangue...
Ele deu de ombros.
— Entre outros ingredientes. Eu o chamo «Ambrosia». Bonito, não acha? O néctar dos deuses, a chave da imortalidade.
— Ambrosia — repetiu ela.
— Ambrosia-6, na realidade. As primeiras cinco tentativas foram inúteis.
— Injetou-se com isso. E agora... é... é... imortal?
— Bom, não exatamente — Stiles sorriu — Verá, o efeito vai se dissipando. Tenho que injetar a cada seis meses, e quase já não resta Ambrósia-6. Assim, como compreenderá, precisava vê-la outra vez. Muito obrigado, Amber Lily.
Ele a observou atentamente, como se esperasse algo, e ela compreendeu que já deveria estar inconsciente, assim fechou os olhos e deixou a cabeça frouxa. Stiles se aproximou da maleta e Amber ouviu que voltava, girava a chave das algemas e as atirava ao feno. Amber tentou não estremecer de repulsa quando a carregou sobre seu ombro e saiu do estábulo levando na mão livre a maleta. Stiles se deteve além da porta e olhou a seu redor.
— Se soubesse onde está esse safado do Edgar, pararia para matá-lo. Temo que seguirá me perseguindo até que um dos dois morra. E não penso ser eu — suspirou, como se lamentasse profundamente não poder matar Edge e seguiu caminhando.
Amber notava a seringa de injeção com o tranquilizador que levava no bolso. Pensou em tirá-la e cravar nele, mas decidiu que Stiles lhe estava oferecendo precisamente o que necessitava. Ia levá-la a alguma parte com intenção de extrair o sangue que usaria para fabricar a poção que ela necessitava para salvar ao Willem.
Se passasse por sua prisioneira, poderia conseguir a fórmula ou até lhe roubar o elixir. A ambrosia. Embora, em mãos de um homem tão malvado como Stiles, era, mas bem o néctar dos demônios que dos deuses.
Precisava saber como Stiles fabricava a poção. Assim, seguiu pendurada frouxamente sobre seu ombro e deixou que a levasse pelo bosque, até que chegaram a uma estreita estrada tosca. Para sua surpresa, havia um veículo esperando ali. Um Lincoln negro, estacionado no acostamento.
Quando Stiles se aproximou, uma mulher saiu do assento do condutor e abriu a porta de trás sem dizer uma palavra. Amber viu com as pálpebras entreabertas um rabo de cavalo vermelho e amarrado que rodeava à mulher como uma nuvem. A desconhecida levava óculos de sol com diamantes falsos na moldura. Ia vestida com umas malhas de lycra até as panturrilhas, e a ponta de suas sandálias de salto deixava ver as unhas de seus pés, pintadas de rosa vivo. Seu pulôver de tricô, negro e apertado, tinha uma borda de pele de leopardo sintética ao redor do decote e os punhos.
Stiles colocou a maleta no carro.
— Vejo que o dispositivo de busca funcionou às mil maravilhas.
— Que esperto é Frankie — disse a mulher com voz estridente – Colocou essa coisa debaixo do salto de seu sapato! Caramba, que ideia — ele resmungou algo e se agachou para depositar Amber sobre o assento traseiro. — Então, é esta?
— Sim.
— Pois não parece nada do outro mundo.
— Ah, não? — ele suspirou, fechou a porta e rodeou o carro até o assento do acompanhante enquanto a ruiva voltava a sentar-se atrás do volante. — Vamos à casa de Boston, Brookie. É a mais próxima.
— Tem certeza que não quer dirigir? –perguntou ela.
— Sim, certeza. Tive uma noite muito dura, e ainda não estou cem por cento. Drogou-me. Se não, teria vindo antes.
— Drogou você?
— Hum.
Amber sentiu que a ruiva lhe lançava um olhar furioso e a ouviu resmungar:
— Maldita puta — então estourou a bola que tinha feito com o chiclete e arrancou. — Fiquei a noite toda esperando — disse — Teria ido buscá-lo se não houvesse dito para que não o fizesse.
Amber esteve a ponto de começar a rir ao imaginar a ruiva dando tropeções pelo bosque com aqueles saltos de agulha de ponteira aberta.
— Fez bem — assegurou-lhe Stiles. — Espero que não tenha sido muito duro para você — de repente, sua voz se tornou adocicada.
— Foi espantoso. Estava muito escuro e me sentia sozinha. Tive que fazer xixi no mato. E não gostei nada. Além disso, vi um gambá.
— Sinto muito. Mas compensarei você, eu prometo. Amber supôs que a estava tocando; que lhe tinha dado a mão para reconfortá-la e lhe pedir desculpas, ou algo do tipo. Estava claro que entre eles havia uma relação íntima. Casal de gentinha pensou Amber. Um gênio malvado, desfigurado e avançado em anos, e uma formosa jovenzinha com a cabeça cheia de ar.
Suspirando, pensou que devia relaxar durante a viagem a Boston. Assim poderia recuperar-se fisicamente daquele amanhecer tão... Movimentado com o Edge.
Mas, assim que pensou nele, ficou tensa. Os sentimentos começaram a agitar-se dentro dela, como se Edge tivesse deixado atrás de si uma parte dele; uma parte que se alojou sob sua pele e no mais profundo de seus ossos. Edge estava ali, dentro dela. Podia cheirá-lo, senti-lo, saboreá-lo de novo, só pensando nele. Podia ouvir sua voz, ver seu sarcástico sorriso, e sentir a paixão que ardia entre eles como se estivesse a seu lado.
A viagem levou só algumas horas, quase o mesmo tempo que ela tinha conseguido percorrer com o Stiles antes que seu carro se avariasse. Boston. Isso estava bem. Perto de Salem. Perto de seus amigos, se necessitasse deles. Mas não os necessitaria.
Amber calculou o tempo que tinha durado a dose de tranquilizante que tinha injetado em Stiles e chegou à conclusão de que não devia fingir que começava a voltar em si até que tivessem transcorrido seis horas. Assim seguiu fingindo dormir enquanto o carro tomava um longo e curvo caminho que subia por uma colina, em direção a uma bela casa de tijolos no subúrbio da cidade, rodeada pelo que parecia malha metálica normal e corrente.
Deixou que Stiles a levasse nos braços e, enquanto Stiles marcava um código em um caixinha eletrônica para abrir a grade e logo a porta, notou o estranho silêncio que reinava naquele lugar. Parecia... vazio. Abriu seus sentidos um instante, tentando averiguar se havia outras pessoas na casa da colina, mas não sentiu nada. Só notou duas presenças: a escura, perversa e opressiva do Stiles, e outra. Uma presença inteligente, decidida e manipuladora.
Piscou, porque aquilo não encaixava com o que tinha deduzido do comportamento da ruiva. Entretanto, não sentia uma terceira aura. Só duas. E duas pessoas que cruzavam a casa e entravam em um dormitório, ao final de um corredor. Amber foi depositava em uma cama.
— Traga-me o estojo de primeiro socorros, Brookie.
A garota se afastou a toda pressa, fazendo repicar seus saltos, e retornou um momento depois. Amber ouviu ruídos e sentiu logo que Stiles lhe atava uma cinta de borracha ao redor do braço. Consciente do que ia acontecer se preparou e ordenou a seu corpo que não se esticasse nem reagisse de modo algum. Notou no braço a frieza do algodão molhado em álcool. Logo notou a espetada.
— Seguro que tem que fazer isto? –perguntou Brookie.
— Eu já disse a você. Se não o fizer, morrerei.
— De uma enfermidade degenerativa do sangue — disse ela.
— Sim. Necessito transfusões, e ela é a única doadora que tem meu tipo de sangue. E se nega a me ajudar.
Amber pensou, enfurecida, que Stiles estava mentindo. Não tinha nenhuma enfermidade degenerativa. Talvez morresse sem seu sangue, mas só de velho ou por causas naturais. Estava claro que não confiava na ruiva o suficiente para lhe dizer a verdade. Amber sentiu que as forças a abandonavam à medida que o sangue emanava de seu braço e ia depositando-se no recipiente. O atordoamento parecia ir enchendo o vazio que deixava o sangue. Sentia-se débil. Tonta. Deus, Stiles não sabia que já lhe faltava bastante sangue.
A bolsa se encheu ao fim. Stiles se inclinou sobre ela.
— Hum. Hoje não emana com muita rapidez. Que estranho — passou-lhe a mão pela bochecha — Será melhor que me conforme com uma. Está pálida como um fantasma.
— E o que te importa isso?
— Pensa Brookie. Se morrer, de onde tirarei minha transfusão a próxima vez que a necessite? –aplicou uma bola de algodão à espetada e retirou a agulha. Logo lhe dobrou o braço para lhe sujeitar o algodão.
— E como tem certeza de que a próxima vez poderá tirar sangue dela? Pode ser atropelada por um caminhão amanhã. Ou pode não se deixar apanhar outra vez.
— Não se preocupe com isso, Brookie. Tenho um plano.
— Ah, sim?
— Vamos, Brooke. Vêem comigo. Temos que nos pôr a caminho.
— Está bem, Frankie.
Saíram do quarto e fecharam à porta.
Amber abriu os olhos assim que partiram. Stiles tinha um plano? Demônios, aquilo não tinha boa cara. Em realidade, dava-lhe calafrios. Mas não devia pensar nisso de momento. Percorreu o quarto com o olhar, visual e mentalmente, sem mover-se. Mas não viu câmaras que a vigiassem, nem sentiu olhar algum a observando. Aquele lugar não estava equipado para reter vampiros. Stiles contava com que o tranquilizante a mantivesse sob controle... no momento. E essa era sua vantagem.
Levantou-se, mas imediatamente caiu de joelhos. Deus, que fraca estava. Levantou-se de novo, aproximou-se da porta e tentou girar o trinco.
Estava fechado com chave. E, tendo em conta que havia dispositivos eletrônicos em todas as fechaduras, sem dúvida seus raptores se inteirariam imediatamente se tentasse abrir uma fechadura. Embora arrebentá-la não custaria nenhum esforço, quando recuperasse as forças.
Seria bom comer algo. Deus estava morta de fome.
Examinou o quarto, tentando fazer uma ideia do lugar. Não havia janelas. As paredes pareciam muito sólidas. Havia um pequeno ralo de calefação. E painéis no teto. Umedeceu os lábios. Aqueles painéis podiam ser uma solução.
Mas não em seu estado.
Voltou a sentir-se tonta e se dobrou sobre si mesma ao sentir uma náusea. Retornou a tropicões à cama, tombou-se de bruços nela e com muita dificuldade conseguiu conter o vômito. Que demônios acontecia? Fazia um momento, estava morta de fome. E, de repente, seu estômago se revelava.
Agarrou-se à cama como se assim pudesse impedir que seguisse dando voltas ao redor do quarto, e decidiu dormir. Ela não rejuvenescia com a letargia diurna, como um vampiro. Não recuperava suas forças no espaço de um par de horas, e suas feridas não curavam milagrosamente enquanto dormia. Curava a maior velocidade que os mortais vulgares e correntes, mas não tão rápido como um vampiro de dia. Entretanto, tinha a vantagem de que não tinha que esperar que fosse dia para começar a curar-se. Podia demorar um dia inteiro, possivelmente mais, em voltar a sentir-se como nova.
Mas talvez se sentisse com forças suficientes muito antes.
Edge infligiu um forte murro na mandíbula de Donovan O'Roark antes que Dante o agarrasse por trás e o lançasse ao chão. Aterrissou pesadamente, de costas, e ficou sem ar. Logo se levantou lentamente enquanto Dante se abatia sobre ele.
— Deve aprender a respeitar a seus maiores, guri.
— Deixe-o em paz — Donovan O'Roark apareceu junto a Dante esfregando a mandíbula com uma mão — Eu mereci isso — logo estendeu uma mão a Edge.
Este o olhou com o cenho franzido e se levantou sem sua ajuda. Donovan deu de ombros e fixou sua atenção em Dante.
— Faz muito tempo, meu amigo.
— Muito — respondeu Dante e lhe estendeu uma mão com certa vacilação.
Donovan não a deu. Em lugar de fazê-lo, deu-lhe um forte abraço. Dante pareceu surpreso um instante. Logo lhe devolveu o abraço. .
— Maldito seja, Dante, por que não voltou? Durante décadas pensei que estava morto.
— Sei. Sinto muito.
— Comecei a ouvir histórias sobre você de pessoas que diziam que tinha vivido algum tempo aqui ou lá. Mas sempre sozinho — disse Donovan, cuja curiosidade saltava à vista.
Edge teve a sensação de que os dois se esqueceram dele e isso o enfureceu ainda mais. Entretanto, a conversação lhe interessava ligeiramente.
— Ao princípio, quando os aldeãos queimaram o castelo, pensei que tinha morrido. E tudo por minha estupidez — Dante sacudiu a cabeça lentamente. — Não queria voltar a ter nada que ver com os de minha espécie, Donovan. E quando por fim soube que tinha sobrevivido, eu... — deixou que sua voz se apagasse.
— Pensou que se culparia pelo ocorrido.
— Por minha culpa estiveram a ponto de matá-lo, Donovan.
— Traíram-no. Devia ter imaginado que não se odiaria por isso.
Dante deixou escapar um suspiro.
— Ao final, minha querida Morgan me convenceu disso. Viajei a Irlanda para buscá-lo, mas já tinha ido. E ainda...
— Ainda se sente culpado.
— Eu fui seu mestre — disse Dante — Meu dever era ensiná-lo a se proteger. E o abandonei.
Edge tomou a palavra ao fim.
— É curioso como à história se repete, não?
Os outros dois o olharam, e Donovan inclinou a cabeça cortesmente.
Dante abriu a boca, sem dúvida para repreender Edge, mas Donovan levantou uma mão.
— Não, tem razão. Eu fui quem o fez, e o abandonei na mesma noite.
— Sim, tinha pressa — disse Edge — Tem ideia do confuso que me senti quando despertei sendo um vampiro? Meu deus, nem sequer sabia que devia me esconder do sol até que a minha pele se encheu de bolhas. E não estava preparado para uma dor tão intensa. Nem sequer sabia como sobreviver, graças a você.
Donovan assentiu.
— Devo-lhe uma desculpa.
— Deve-me muito mais que isso. Por sorte para você, já não me importa — deu a volta, preparado para partir. .
— Há coisas que não sabe sobre essa noite, Edgar. Ele ficou paralisado.
— Agora me chamo Edge. E não quero saber nada.
— Mas quer encontrar à Menina Prometida, verdade?
Edge deu a volta lentamente e olhou de novo a seu sire.
— Para isso não preciso de sua ajuda. Afinal de contas, consegui seguir em frente sem você. Durante mais de cinquenta anos.
Donovan suspirou.
— Não pense em si mesmo, nem no que quer ou precisa, Edge — disse Dante. Pensa em Amber Lily. Quanto mais logo a busquemos, mais probabilidades temos de encontrá-la.
— Sim, E quanto menos tempo passe em mãos do Frank Stiles, melhor — acrescentou Donovan. Ao ver que Edge o olhava inquisitivamente, explicou — Esta noite não está protegendo muito bem seus pensamentos. E está concentrado em Amber e em sua situação, embora também dirija algum dardo envenenado contra mim.
Edge não disse nada.
— Pode ser que Edge não queira ouvir suas explicações — disse Dante. — Mas eu sim.
Donovan assentiu com a cabeça e se voltou para Dante.
— Encontrei ao Edge meio morto. Tomava parte de um bando de rua em Dublin. Tinha havido uma guerra entre bandos rivais. Eu vi parte da batalha e me impressionou sua coragem. Lutava como um autêntico guerreiro. Sem medo. Pensei que merecia viver.
— Assim você me transformou e me deixou atirado na rua — disse Edge suavemente.
— Transformei e fui atacado. Os dois bandos se lançaram sobre mim ao mesmo tempo, sem dúvida surpreendidos pelo que tinham visto eu fazer — explicou Donovan . — Moeram-me a pauladas. E logo seus amigos lhe levaram a rastros a alguma parte, sem dúvida pensando que deviam recuperar os corpos dos seus caídos em combate.
— Deus, teve sorte de que não o enterrassem — disse Dante.
— Isso mesmo temi eu — respondeu Donovan . — Busquei-o por toda parte, Edge. Inclusive quando me perseguiam e teria sido mais sensato partir da Irlanda, fiquei e segui buscando você. Mas nunca o encontrei — esboçou um leve sorriso — até agora. Alegra-me muito saber que sobreviveu.
Dante baixou a cabeça e a sacudiu ligeiramente.
— Não é de surpreender que desconfie de sua própria espécie — disse. — Conte-nos que se passou naquela noite, Edge.
Ele deu de ombros, como se não tivesse importância.
— Levaram-me a um beco e me atiraram em um acostamento ao ouvir que se aproximava alguém. Suponho que pensavam retornar por mim. Mas despertei quando o sol começou a me queimar. Saí correndo, com a roupa em chamas. Encontrei um charco e me inundei para apagar as chamas. Não sabia que devia me esconder do sol, mas por sorte nesse momento perdi a consciência.
— E despertou de novo ao anoitecer — disse Donovan. — Perguntando-se por que não tinha se afogado.
Edge deu de ombros.
— Dá no mesmo. Aquilo passou. Já não importa.
— Sim me importa — disse Donovan.
A porta se abriu de repente e Morgan, aquela vampiresa miúda que parecia quase uma mortal, cruzou a terraço e baixou à grama, onde estavam os três.
— Conseguiu falar com os pais de Amber? — perguntou Dante.
— Sim. Não souberam nada dela esta noite, mas vêm para cá no caso de que entre em contato. Eric e Tam vão ficar lá para o caso dela aparecer. Podemos nos comunicar com o Jameson e outros pelo celular, se precisarmos. Estão muito longe para alcançá-los telepaticamente — deu-lhe um cartão com um número rabiscado no verso.
Edge fechou os olhos, angustiado, e logo se sobressaltou ao sentir a mão do Donovan sobre seu ombro.
— Amber não teve tempo de chegar. Não devemos supor o pior.
— Você deve ser Donovan — disse Morgan. — Não sabe quanto tempo faz que queria conhecê-lo.
— Esqueci minhas bons maneiras — apressou-se a dizer Dante. — Donovan, esta é Morgan, minha noiva.
— Já tinha imaginado isso — O'Roark tomou a mão de Morgan e a levou aos lábios. — Alegra-me muitíssimo saber que Dante a encontrou, querida Morgan. Mas Oxalá tivéssemos podido nos conhecer em circunstâncias mais...
— Oh, pelo amor de Deus, não podemos pular as formalidades? — interrompeu Edge — A vida de Amber está em jogo — afastou-se sacudindo a cabeça.
— Edge, nem sequer sabe por onde começar disse Dante atrás dele.
— Começarei por onde a vi pela última vez. Venham ou fiquem e continuem com sua pequena reunião. Pra mim tanto faz.
Amber passou um longo tempo dormindo. Ignorava quanto tempo exatamente, mas quando despertou compreendeu que tinha caído a noite. Sentia-se um pouco mais forte e, quando finalmente se virou para olhar seu relógio de pulso, amaldiçoou-se por ter deixado que passassem tantas horas. Desde quando dormia tanto tempo seguido? O que teria perdido?
Levantou-se e se aproximou da porta fechada, colou a orelha a ela e aguçou o ouvido, concentrando todos seus sentidos. Distinguia o som de um televisor em algum lugar distante da casa, e um ruído de mastigação. Brookie estava vendo televisão e comendo pipocas, concentrada no programa.
Mais perto, distinguiu passos intermitentes, o tinido de cristais que se entrechocavam, e um ruído de líquidos ao verter-se. Stiles estava sem dúvida em seu laboratório e mantinha guardados em segurança seus pensamentos, até que de repente exclamou:
— Não posso acreditar! — e sua mente lançou um estalo de surpresa semelhante a um brilho luminoso.
Uma porta se fechou de repente e Amber ouviu passos que se aproximavam separou-se da porta e se jogou de costas na cama; fechou os olhos e procurou relaxar. A fechadura girou e a porta se abriu.
— Acorda. Preciso falar com você.
Ela piscou e abriu os olhos enquanto contava mentalmente às horas que fazia que Stiles tinha injetado o tranquilizante. Tinha passado já tempo suficiente para que ele acreditasse que os efeitos da droga se dissiparam.
— Estou acordada.
— Hum. Já imaginava. Suponho que já somou dois mais dois e se deu conta de sua situação.
Certamente, pensou ela. Mas se dava ele conta da sua?
— Pelo visto — disse em voz alta, — sou de novo sua convidada. E já me tirou sangue — acrescentou olhando a atadura que tinha no braço. — Mas suponho que necessita mais.— Muito mais.
— Surpreende-me que não tenha me deixado seca para acabar de uma vez.
— Bom isso seria secar minha única fonte, Amber. A única que tenho no momento, ao menos. Se quiser viver para sempre, tenho que mantê-la sã.
— Assim pretende me raptar de vez em quando para se abastecer?
— É não parece muito prático, não? Pode ser que após um tempo aprenda a se esquivar, e isso seria o fim para mim.
— Vai me manter cativa para sempre? Não acredito nisso e nem você.
— Oh, céus, claro que não. Seus entes queridos me perseguiriam até o fim do mundo.
— Alegra-me que por fim tenha se dado conta.
— Não, o que pensava fazer é muito diferente. Compilar um par de centenas de óvulos de seus ovários fertilizá-los com seu próprio DNA, e criar uma ninhada de pequenos doadores.
Ela sentiu que lhe gelava o sangue nas veias e que voltavam as náuseas
— Acredito que vou vomitar.
— Não me surpreende.
Stiles a segurou pelo braço e a tirou de rastros para o corredor. Logo abriu a porta de um banheiro e se afastou.
Amber entrou cambaleando, caiu de joelhos e vomitou tudo que tinha comido no dia anterior.
Agachou a cabeça e puxou a corrente com mão trêmula.
Stiles a segurou pelo braço, ajudou-a a levantar-se e a fez virar-se para o lavabo. Ela limpou a boca e se lavou as mãos.
— Então, está falando de... me clonar.
— Hum.
Ela sacudiu a cabeça.
— Não pode. É impossível que saiba fazer algo assim.
— Sim, mas posso convencer a alguém para que o faça. Os geneticistas estão mais interessados na imortalidade que os humanos normais e comuns. Estou seguro de que algum a aceitará como pagamento por me prestar sua ajuda.
— Mas ainda não encontrou a nenhum. Ele deu de ombros.
— Estou me aproximando. Há um punhado de cientistas muito qualificados em minha curta lista. Mas nesse momento não é a escolha de um cientista o que importa, Amber.
— Não?
— Não, não, absolutamente. O que importa é seu sangue. Há algo nele que não estava antes e que certamente me impede de recolher os óvulos que tinha previsto. Naturalmente, isto poderia redundar em meu benefício. Mas não estou seguro de que coincida exatamente com... Enfim, suponho que demorará uns nove meses.
Ela virou muito devagar e o olhou fixamente. — De que droga está falando, Stiles?
Ele arqueou uma sobrancelha. O outro olho não tinha sobrancelha, a não ser unicamente uma cicatriz rosada que se enrugava com as mudanças de expressão.
— Realmente não sabe?
Ela fez girar os olhos.
— Deixa de brincar de adivinhações, certo? Estou muito enjoada para ficar aqui de pé, seguindo teu jogo.
— Oh, vou lhe dizer. O que pode ter de mau nisso, afinal de contas? De todas as formas você notará no devido tempo. Fiz as análise habituais com seu sangue para me assegurar de que não se alterou, nem tinha mudado... Afinal de contas, passou muito tempo.
— E?
— E descobri algo... surpreendente.
— Uma intoxicação alimentar? Câncer de estômago? O que?
Ele a olhou fixamente aos olhos e disse:
— Um bebê. Está grávida, Amber.
Amber fechou os olhos muito devagar, emocionada, mas se dominou rapidamente ao dar-se conta de que Frank Stiles estava mentindo.
— Muito engraçado — disse — Mas resulta que sei que isso é impossível.
— Por que o diz? Roubou meus diários quando foi, faz cinco anos. Leu minhas notas. Ela deu de ombros. — Então saberá que é fértil. Foi uma das coisas que anotei. O que significa que não é nem um pouco impossível. A menos que tente me dizer que nunca esteve com um homem.
Amber se separou dele e saiu ao corredor. Pensou em atacar ao Stiles ali mesmo, mas preferiu refrear-se. Ainda não tinha o que procurava. E, além disso, supunha-se que estava sob os efeitos residuais do tranquilizador.
— Não vou falar disto. É absurdo.
Stiles saiu atrás dela, agarrou-a por braço e a conduziu ao quarto.
— Então, é uma espécie de concepção imaculada?
— Me deixe em paz — Amber se separou dele e se sentou na cama.
— Poderia jogar você na mesa de meu laboratório e examiná-la. Ou pode me dar uma resposta direta. É virgem ou não?
Ela baixou a cabeça. Não desejava que Stiles voltasse a examiná-la.
— Não.
— Então deitou com um homem. Ou com vários — ela não respondeu . — Usou algum anticoncepcional? — ao ver que ela não dizia nada, suspirou. — Está bem, se isso for o que quer, irei dar uma injeção. Só espero que não afete ao bebê.
— Não há nenhum bebê.
Ele girou os olhos.
— Cinco minutos. Voltarei dentro de cinco minutos. Não tente nada — Stiles saiu do quarto e fechou a porta com chave.
Amber se deixou cair na cama, levando as mãos à cabeça, cheia de incredulidade. Os vampiros varões eram estéreis. Todo mundo sabia.
Levantou o olhar para o teto, perguntando-se se devia tentar sair dali. Mas não. Stiles voltaria após cinco minutos. Tinha que esperar, deixar passar algum tempo, conseguir a fórmula que Stiles utilizava para fabricar sua Ambrosia-6.
Stiles estava brincando com ela. Nada mais.
Os cinco minutos resultaram ser quase quinze. Amber ficou a passear pelo quarto, ansiosa para que ele retornasse de uma vez para voltar a ficar em movimento. Estava morta de fome outra vez. Mas ao menos as náuseas e o enjôo tinham desaparecido. Entretanto, continuava sentindo-se cansada e fraca.
Stiles abriu a porta e entrou. Levava na mão uma bolsa de plástico com o logotipo de uma cadeia de drogarias. Deu-lhe a bolsa e Amber a agarrou e olhou dentro com o cenho franzido.
Um teste de gravidez para fazer em casa. Esticou os lábios e sentiu um nó de medo na garganta. Stiles estava disposto a levar aquele jogo até o final. O que não conseguia entender era o que esperava ganhar convencendo-a de que estava grávida.
— Foi com um vampiro, verdade? — perguntou ele. Ela o olhou com estranheza — Só esteve com uma pessoa, e essa pessoa era um vampiro. Por isso se empenha em dizer que é impossível. Diga-me, foi meu velho amigo Edgar?
Ela apertou com força a bolsa e resmungou: — Isso não é teu assunto.
— Pareceu-me ver a marca de suas presas em seu pescoço antes que saíssemos do estábulo, esta manhã — tocou-lhe o queixo e a fez girar o rosto para olhar o pescoço. — Embora já não fica nem rastro; claro.
Ela apertou os lábios e Stiles a agarrou de novo pelo braço, arrastou-a pelo corredor e a colocou de um empurrão no banheiro.
— Faça o teste — disse — Convença a si mesma; para ver se resolvemos este assunto e podemos seguir adiante.
Ela sacudiu a cabeça.
— O que o faz pensar que vou confiar nessa prova? Como sei que não a alterou para me colocar na cabeça essa absurda ideia?
Ele deu de ombros.
— Limitei-me a ir comprá-la na drogaria da esquina. O ticket está na bolsa. Comprova você mesma — fechou a porta, mas não se afastou. .
Amber sabia que estava ali, esperando. Verificou a única janelinha do banheiro e pensou que certamente conseguiria sair por ela. Mas ainda não. Ainda não tinha o que queria. Se tinha que seguir ao sabor do Stiles, o faria. Mas não pensava partir dali sem uma cura para Willem. Tirou o teste de gravidez da bolsa. Examinou cuidadosamente o pacote de celofane procurando alguma ruptura. Mas não encontrou nenhuma. Ao tirar o plástico, comprovou o selo da caixa. Rompeu-o e viu que dentro tudo estava intacto. Inclusive comprovou o ticket, da loja, no que figurava a data e a hora de compra.
De acordo. Certamente Stiles não havia adulterado a prova.
Leu as instruções, deixando escapar um suspiro, e as foi seguindo. Logo ficou a passear pelo quarto de banho enquanto observava com impaciência o ponteiro dos segundos de seu relógio de pulso.
Stiles bateu na porta. Amber abriu e o encarou.
— E bip?
— Ela olhou seu relógio.
— Faltam trinta segundos.
Ele franziu os lábios e esperou.
O tempo foi passando lentamente.
Finalmente, chegou a hora; Amber pegou o teste e olhou o símbolo que aparecia na tela. Verde. Sinal de “positivo”
Piscou, desalentada, e olhou de novo. Mas estava claro como a luz do dia
Um sinal de “positivo”. Voltou a comprovar as instruções para se assegurar de que não se equivocou.
— Não é possível — murmurou
Stiles a segurou pelo braço e a conduziu de novo a seu quarto. Amber estava aturdida e se movia tontamente. Ainda não podia acreditar.
— É do Edgar, verdade? – ela não disse nada — É assombroso. Todas as provas do DIP demonstravam que os vampiros são estéreis. Os homens desde o momento da transformação e as mulheres após seis meses. Certeza que não esteve com ninguém mais? — ela o olhou com o cenho franzido embora não acabasse de assimilar suas palavras — Claro que não — disse ele — Se não, não estaria tão surpresa — sacudiu a cabeça lentamente enquanto avaliava as implicações de seu descobrimento.
Amber se estendeu na cama e cobriu os olhos com o antebraço.
Stiles deixou escapar um suspiro e saiu do quarto. Mas retornou ao fim de um momento com uma seringa de injeção hipodérmica. Amber se sobressaltou ao sentir a agulha no braço. Stiles lhe lançou seu sorriso fabricado, meio natural, meio deformado pela pele cicatrizada.
— Não se preocupe, é meia dose. Não acredito que faça mal ao feto.
— Mas tampouco está seguro — Amber se deu conta de que havia cometido um deslize — Embora não haja nenhum feto para se preocupar–olhou ao chão e, ao ver a pequena maleta, pensou que Stiles tinha tirado a seringa de injeção dali. Ou, ao menos, isso esperava.
Sentiu como penetrava a fina agulha em sua carne e ficou tensa, esperando o ataque do atordoamento e o torpor, mas não chegou. Deu graças aos anjos que velavam por ela, fossem quais fossem, e deixou que seu braço se deslizasse lentamente e que seus olhos se fechassem.
Passaram horas antes que Amber sentisse ao fim que a pesada e branda energia que emanava do sonho invadia a casa. Estava ainda cansada, e sua mente girava como um torvelinho a ideia de que talvez estivesse grávida. Na realidade, não estava convencida. Stiles era muito ardiloso. Podia ter alterado o teste de gravidez e falsificado o ticket da drogaria. Possivelmente tivesse alguma razão para lhe fazer acreditar algo que sabia impossível. Ignorava qual podia ser essa razão, mas alguma tinha que ter. Possivelmente acreditasse que desse modo não tentaria envolver-se em uma briga violenta, ou possivelmente pensasse que podia utilizar a segurança de seu futuro filho como uma espada do Damocles, a fim de obrigá-la a cooperar com ele.
Mas ela não engolia aquela história. Não podia fazê-lo.
Mesmo assim, se descobriu levando as mãos ao abdômen. Fechou os olhos e abriu seus sentidos. De repente sentiu algo, e sua garganta se fechou até que quase não pôde engolir. Percebia algo muito tênue, muito sutil. Tanto, que duvidava de fosse real. Estava sentindo a essência de uma nova vida ou os efeitos do poder da sugestão?
Fez uma careta, levantou-se e escondeu o travesseiro sob o lençol, embora sabendo que certamente não conseguiria enganar ao Stiles nem por um segundo. Com um pouco de sorte, não seria preciso. Tinha que manter-se concentrada em sua missão. Tinha ido ali com intenção de encontrar a fórmula que Stiles chamava Ambrosia-6 e levar ao Willem para lhe salvar a vida. Não podia permitir que as tentativas de Stiles para distraí-la surtissem efeito. Não podia acreditar naquela loucura. Nem por um instante. Porque se fosse certo...
Não. Não. Ficou de pé sobre a cama e se agarrou logo à mesinha de noite, que era pouco mais alta. De lá podia chegar facilmente ao teto. Empurrou um dos painéis. Não foi fácil. Havia silicone entre os painéis e teve que tirar com os dedos para que a prancha se movesse. Afastou o painel a um lado e deu uma olhada ao retângulo de escuridão, procurando as vigas. Havia uma a cada lado do buraco, tal e como esperava; o marco do painel tinha que estar unido a algo, afinal de contas. Apoiou as mãos de ambos os lados do buraco, deu um pequeno salto e se agarrou até o teto, entrando pelo buraco. Assegurou-se de apoiar os pés sobre as vigas e não sobre os painéis para não rompê-los. Apoiou as mãos e os joelhos sobre as vigas dos beirais, a mão e o joelho do lado esquerdo em uma e as do lado direito em outra, separadas por uns centímetros. O painel era muito estreito. Não era agradável arrastar-se por ali. Na verdade, resultava doloroso. Ao fim, acreditou ter percorrido distância suficiente para ter deixado atrás a porta fechada do quarto.
Deteve-se, tirou um pouco de silicone com as unhas e levantou um painel do teto para olhar para baixo. Estava sobre o corredor. Pensou em descer, mas sabia que certamente o laboratório do Stiles estaria fechado com chave, igual ao quarto. Tinha que continuar avançando.
Arrastou-se um pouco mais, segura de que, quando acabasse, teria duas profundas marcas nos joelhos. Foi deslizando as mãos até que se cravou uma lasca na palma, fazendo-a conter o fôlego.
— Merda — murmurou. A lasca tinha se cravado sob o dedo indicador. Tentou tirar-lhe com a boca, mas estava muito cravada na carne. Teria que aguentar a dor.
Começou a mover-se outra vez.
O quarto seguinte a que deu uma olhadela era um dormitório. Stiles estava deitado em uma cama muito grande, profundamente adormecido, coberto com um lençol do qual se sobressaíam um braço e uma perna nus que tinha apoiado sobre a mulher que jazia a seu lado. Brookie permanecia muito quieta. Não parecia tensa, mas tampouco relaxada. Estava adormecida, mas não profundamente.
Aquela mulher tinha algo estranho.
Amber voltou a colocar o painel em seu lugar e continuou avançando. Localizou a sala de estar, um dormitório vazio e uma cozinha antes de afastar finalmente um painel e ver o laboratório. .
Teve vontade começar a gritar. Mas, em lugar de fazê-lo, agachou-se sobre seus braços e passou pelo buraco, deixando-se cair ao chão.
Sacudiu as mãos enquanto percorria a sala com o olhar.
Era completamente branca. As paredes, o chão, os armários, as bancadas. Além dos puxadores de prata das gavetas e das torneiras da pia, não havia nenhuma outra cor. De um lado havia uma geladeira. Do outro, uma mesa de escritório e um computador. Aproximou-se do computador, ligou-o e procurou os arquivos que foram abertos mais recentemente.
O mais recente se chamava «Diários de Hilary Garner».
Amber franziu o cenho e clicou no ícone. O documento se abriu com um processador de textos e, ao ler as primeiras linhas, Amber compreendeu que não era obra do Stiles.
Devia ter feito caso a Tamara faz anos, quando me disse o que estava fazendo a DIP. Devia ter acreditado nela então, mas não o fiz. E agora que vi a verdade com meus próprios olhos, é muito tarde. Se tento partir; quando o tentar, pois tenho que fazê-lo, me caçarão e me matarão. Sei. E, entretanto, não é o medo o que me impede de fugir. É sua última experiência. A prisioneira está grávida. Inseminaram-na com o esperma de um Eleito, um mortal provido do estranho antígeno da beladona. Não se trata de um homem qualquer, mas sim do menino com o qual Tamara trabalhou faz muitos anos, quando fomos melhores amigas e ela ainda se contava entre os vivos. Jameson Bryant. O precoce Jamey.
Amber piscou. Céu santo, aquilo falava de seus pais! Falava sobre ela!
Baixou o ponteiro do cursor com impaciência e seguiu lendo.
Hilary Garner tinha mandado em segredo uma carta a Tamara e ao Eric Marquand, lhes falando da prisioneira e de sua gravidez, — sabedora de que o diriam ao Jameson e que ele faria algo. Mas, enquanto isso escrevia a respeito da rapidez com que Angélica parecia ter tomado consciência de sua gravidez, mesmo antes que se manifestassem os primeiros sintomas. Sentava-se em sua cela, cobrindo o abdômen com as mãos e acariciava o ventre como se acariciasse ao bebê que levava dentro.
... e canta. Deus, o som de sua voz é como um coro de anjos. Nunca ouvi nada tão comovedor, tão triste e cheio de amor. Acredito que em parte, o poder de sua voz é sobrenatural. Canta como nenhum humano pode cantar. Mas é mais que isso. É quase... mágico. Os outros prisioneiros ouvem seus cantos. E até os mais violentos, o mais nervosos, parecem tranquilizar-se para ouvi-los. Deixam de passear por suas celas, deitam-se, fecham os olhos. É extraordinário. E os cães de guarda também reagem. observei a alguns deles quando o vento arrasta sua voz. Levantam as orelhas e balançam a cauda. Alguns começam a choramingar, como se eles também tentassem cantar. Acredito que se soltariam e o fariam se não estivessem tão bem treinados.
Fala com o bebê como se pudesse ouvi-la e lhe responder. E talvez possa, não sei. Diz que sabe que é uma menina.
Não posso deixá-la aqui ainda. Porque acredito que talvez eu seja a única pessoa que está disposta a ajudá-la. Ela me suplica que a ajude. Cada vez que a vejo, roga-me com os olhos. São tão implorantes, tão expressivos... Eu tento lhe dizer que o farei que farei o que possa, mas não posso dizer-lhe em voz alta. Espero que me entenda. Confio em que possa me ler o pensamento, como dizem os da DIP. Espero que saiba. Vou ficar aqui, vou seguir trabalhando para a DIP até que nasça o bebê. Logo, tentarei ajudá-la. Embora ignore como.
Ela não é um monstro. É uma mãe. Os únicos monstros que há aqui são Fuller, Stiles e os outros.
Amber fechou os olhos e sentiu um nó no estômago. Sua mãe. Aquela era sua querida mãe, que desafogava seu coração cantando da cela de uma prisão, perguntando-se o que seria de sua filha. Pouco tempo depois, uma multidão de vampiros rodeou aquele edifício e o queimou até os alicerces. Assim era como Stiles tinha adquirido suas cicatrizes.
Deus, e se encontrava na mesma situação que sua mãe? Sozinha, encarcerada e incapaz de saber se poderá proteger a seu bebê.
— Mas não é assim — murmurou — Eu não estou presa, nem indefesa. Tenho a faca e o queijo na mão. Eu decido quanto tempo vou ficar. E quando partir — mas, enquanto pensava aquilo, olhou para a porta e pensou em fugir. Logo engoliu saliva e voltou a olhar o computador. — Além disso, eu não estou grávida — fechou o arquivo e abriu o documento seguinte.
Edge chegou sozinho ao estábulo. Não sabia, nem lhe importava, se os outros dois o tinham seguido. Não tinha tempo de olhar para trás. Só podia olhar para frente. Para Amber Lily e aquele safado do Stiles.
Rodeou o estábulo lentamente, procurando qualquer rastro de Amber.
— Olhe para ele, disse Dante. — É como um sabujo em busca de um rastro.
— Hum — murmurou Donovan — Li em algum lugar que, quando encontram um rastro, os sabujos se concentram tanto que perdem a noção de todo o resto e até são capazes de passar por cima de precipícios e até de cruzar auto-estradas. .
— Então minha analogia se enquadra perfeitamente nele — disse Dante. — Nem sequer nota que estamos aqui.
— Claro que noto que estão aí, caramba — disse Edge, girando bruscamente. — por que não se calam para que possa me concentrar?
Dante e Donovan se olharam.
— Pode ser que haja um modo melhor, filho — disse Donovan com suavidade.
Edge se girou muito devagar e cravou o olhar nele. — Filho? Você é meu sire, não meu pai.
— Há alguma diferença?
Edge o olhou com tanta fixidez que pensou que o outro deveria estalar em chamas. Mas, ao que parece, só havia um vampiro capaz de tal façanha: um vampiro chamado Darnien, o primeiro, segundo a lenda.
— Dante tem algo a dizer, Edge — disse Donovan.
Edge lançou um olhar a Dante.
— Não vai querer que o chame de «Vovozinho», certo?
— Não, nada disso — respondeu Dante, muito sério, e tirou um maço de papéis grampeados do bolso da gabardina negra — revisei os arquivos da DIP. Tinham o que eles chamavam «casas seguras» por todo o país. Eram casas de aspecto comum, em bairros normais, que na verdade estavam equipadas com laboratórios, computadores e celas para os prisioneiros.
— E o que?
— Que tenho a lista completa. A Região Nordeste começa na página três — disse enquanto lhe estendia os papéis.
Edge suspirou e passou as primeiras duas páginas.
— Não sei do que vai servir isto. É pouco provável que Stiles esteja usando uma das antigas casas da DIP.
— Por que? Quando o governo desmantelou a DIP, as casas foram postas a venda. E foram vendidas imediatamente, com muita pressa, porque o governo queria lavar as mãos e tirar isso de cima. Certamente se por acaso se tornassem públicas as atrocidades que tinha cometido a agência — apontou Donovan.
Edge franziu os lábios e leu por cima as direções que figuravam sob o epígrafe «Região Nordeste». Enquanto lia, ia deslizando o dedo pela folha.
«Essa», disse alguém.
Edge franziu o cenho e levantou a cabeça bruscamente.
— Se já sabem qual é, por que caramba me perguntam isso?
Dante e Donovan franziram o cenho e se olharam.
— O que o faz pensar que nós sabemos qual é? — perguntou lhe Dê.
— Um de vocês o disse.
— Eu não disse nenhuma palavra — disse Dante.
— Nem eu. Nem mentalmente nem em voz alta – acrescentou Donovan.
Edge suspirou e voltou a fixar a atenção na folha para seguir lendo.
«Não, não, volta atrás. É essa daí de cima, já disse».
Edge voltou a levantar a cabeça e olhou aos outros dois.
«A quarta começando de acima, é essa!»
Nenhum dos dois tinha falado. E aquela voz não se parecia com as que ouvia quando se comunicava telepaticamente com seus semelhantes. Não, aquela voz parecia proceder de seu interior.
— Terão ouvido isso, não? — perguntou.
O desconcerto de Donovan se converteu em preocupação.
— Eu não ouvi nada. Edge está bem?
— Por favor, me economize sua preocupação paternal, voltou a olhar a página, contou quatro de acima e leu em voz alta — Cento e sessenta e três da Poplar Avenue, Boston. É essa?
— Não sei — disse Donovan, ainda confuso.
«Sim», disse a voz. Era um voz de homem, não tão grave como a de Edge. Seria algum outro vampiro, que tentava lhe ajudar de longe? Ou seria um novo truque do Stiles? Teria aprendido a comunicar-se telepaticamente? Tentava atrair a Edge e aos outros a uma armadilha?
Edge fechou os olhos com força.
— Está bem. É essa.
— O que o faz pensar isso? — perguntou Donovan.
Edge abriu os olhos, levantou as sobrancelhas e inclinou o rosto para a direita.
— É o que está me dizendo a voz na minha cabeça, ok? — deu de ombros — e não parece que lhes ocorra nada melhor.
— Está bem. Vamos a Boston, então.
A fórmula não estava no computador, nem no armário arquivo que tinha conseguido abrir com a força de sua mente. Encontrou várias ampolas cheios com seu sangue na geladeira, mas nada mais.
Maldição.
Por fim voltou a deixar tudo tal e como tinha encontrado e se agarrou no teto, introduzindo-se pelo buraco do painel. Ao voltar a olhar a sala, viu um pedacinho de material rosa no chão: uma parte de silicone. Olhou-o e girou a cabeça ligeiramente. O fragmento de silicone se moveu velozmente pelo chão e desapareceu debaixo de um armário.
Perfeito. Amber voltou a colocar o painel e avançou engatinhando de novo, até que se achou fora do laboratório e ainda por cima do corredor. Ali baixou ao chão com sigilo e endireitou o painel para não deixar nenhum rastro. Continuando, começou a percorrer o resto da casa.
Stiles devia ter suas notas em algum lugar. Tinha que ter levado um registro de suas experiências enquanto desenvolvia a fórmula e tinha que ter a fórmula propriamente dita escondida naquela casa. Que ela soubesse, não tinha memória fotográfica, de modo que tinha que haver notas, uma receita, algo, o que fosse.
Mas onde podia guardá-lo se não era no laboratório?
Atravessou nas pontas dos pés o corredor e foi olhando de aposento em aposento. Ao cruzar a sala de estar e olhar o relógio de parede se deu conta de que quase estava amanhecendo. De repente lhe ocorreu pensar que Stiles a mudaria logo para um lugar mais seguro. E então estaria desprotegida. Provavelmente deveria tirar as proteções que tinha levantado ao redor de sua mente. Enviar uma chamada a seus amigos. A sua mãe. Ao Edge. Só para que soubessem que estava bem.
Fechou os olhos e recordou as razões pelas quais não devia fazer isso. Seus amigos não permitiriam que permanecesse ali tempo suficiente para pegar a fórmula. Se sabiam onde estava se lançariam sobre ela como um bando de morcegos sobre um enxame de mosquitos. E, se baixasse suas proteções, saberiam onde estava. Iriam em seu auxílio, como sempre faziam. E Edge iria com eles, embora imaginasse que ele o negaria com todas as suas forças, se lhe perguntassem. Se a encontrava, não deixaria vivo ao Stiles. Amber ignorava o que tinha contra ele, mas ao que parecia era algo grave.
Não, não podia abaixar a guarda. Não podia permitir que conhecessem seu paradeiro. Ao menos, até que conseguisse a fórmula.
Cruzou sigilosamente a sala de estar e deixou atrás o sofá, a televisão e a mesinha baixa. Ali, sobre a mesa, havia uma pasta. Amber leu sua etiqueta ao passar: Poe. Franziu o cenho e levou a pasta à cozinha, deixou-a sobre a mesa e abriu a geladeira. As gavetas estavam cheias de fruta e de verdura, e pensou em comer algo. Parece que alguém, provavelmente Brookie, tinha ido fazer compras. Perguntou-se se notariam a falta de algo e decidiu arriscar-se. Pegou uma maçã, uma banana e um ramo de aipo. Abriu logo os armários e encontrou uma caixa de barrinhas de cereais. Por sorte já estava aberta, assim tirou uma. Por fim, tomou uma garrafinha de suco de tomate. Colocou os alimentos em uma sacola de plástico que encontrou debaixo da pia, voltou-se para a pasta que havia sobre a mesa e a abriu.
— Poe, Edgar, aliás, Edge — leu no cabeçalho. — Irlanda, 1943. Sire, Donovan O'Roark.
Amber piscou lentamente. Edge se chamava Edgar Poe? Sua mãe devia ter um senso de humor muito peculiar. E Stiles devia estar preocupado com ele, se tinha pego seu arquivo.
De repente, sentiu algo que a fez levantar a cabeça. Não era um som, era uma sensação. Não, a ausência de uma sensação. Nem todo mundo dormia na casa.
Fechou a pasta e a guardou na bolsa, convencida de que poderia devolvê-la à sala de estar antes que notassem sua ausência. Logo atravessou sigilosamente a casa, com todos os sentidos alertas. Chegou à porta de seu dormitório e viu o ferrolho que a fechava por fora.
Um ferrolho. Nada mais. Excelente. Abriu o ferrolho, abriu a porta rapidamente e entrou. Logo, depois de fechar a porta, utilizou seus poderes mentais para voltar a colocar o ferrolho. Ouviu seu estalo metálico e compreendeu que o tinha conseguido.
Continuando, ficou de pé sobre a cama, escondeu a bolsa de plástico depois do painel solto do teto e voltou a colocar o painel em seu lugar.
Enquanto uns passos se aproximavam pelo corredor, Amber se deitou na cama, meteu-se sob o lençol e empurrou o travesseiro para a cabeceira. No instante em que o abraçava, escondendo o rosto nele, a fechadura girou e a porta se abriu.
Mas não foi Stiles quem entrou, e sim Brookie.
Amber sentiu uma suave rajada do perfume de Brookie: uma mescla adocicada que cheirava a chiclete e a frutas tropicais. Era um perfume próprio de uma colegial, um perfume que certamente se vendia em um frasco rosa com a forma de um gatinho.
A mulher entrou no aposento com passo sigiloso. Não usava saltos, e sim umas sapatilhas, ou talvez meias. Certamente estava ainda de camisola. Aproximou-se da cama de Amber detendo-se a cada dois passos, como se aproximasse de um tigre adormecido. Passo, passo, pausa. Sua respiração era tensa, como se tentasse abafar seu ruído, apesar de que seu coração acelerado exigia mais e mais oxigênio. Tomava rápidas e superficiais baforadas de ar.
Amber sentia seu medo. Que demônios fazia ali, se tinha medo?
— Ei — murmurou. — Ei acorda.
Amber piscou, virou-se e a olhou com expressão sonolenta.
— O que? — franziu o cenho como se a surpreendesse vê-la ali e esfregou os olhos
— Só queria... dar uma olhada em você. Ver se estava bem — disse Brookie.
Amber se sentou na cama, levando uma mão à cabeça como se estivesse aturdida. Não pensava em dizer nada para aquela mulher. Dava-lhe uma sensação ruim. Enquanto estudava seu rosto, disse:
— Quem é você?
— Sou Brooke. Eu... trabalho com o Frank. Mais ou menos.
Ah — disse Amber — É um de meus sequestradores.
— Não é isso — Brooke tinha os cachos ruivos revoltos e olhava com nervosismo para a porta; seus olhos eram verdes, enormes e arredondados — Eu não gosto do que ele está fazendo. Mas não posso impedí-lo. Booke a olhou com o cenho franzido.
— Não, claro que não.
— Vi o teste de gravidez no banheiro, assim sei que já o usou. É verdade? Está...?
Amber sacudiu a cabeça.
— Não é possível.
— Pois o teste diz que sim.
— Era um truque. Não sei por que, mas Stiles quer que acredite nessa ideia absurda, mas eu sei que não é assim.
Brooke a olhou com o cenho franzido.
— Como ia ser um truque? O teste...
— Forjou-o antecipadamente. Alterou para que dê positivo. Suponho que levou algum tempo planejando tudo isto — Brooke baixou a cabeça. — O que? — perguntou Amber.
Brooke levantou a cabeça e seus cachos ruivos oscilaram.
— Mandou-me à drogaria para comprar o teste — Amber sentiu que lhe encolhia o coração. — Estava em uma estante. Havia um montão, de muitas marcas distintas. Frank não me disse que comprasse uma marca específica. Nem sequer disse a que drogaria tinha que ir. E há três neste bairro — moveu a cabeça lentamente de um lado a outro — A não ser que seja hábil para forjar todos os testes das três lojas. E, como não estivemos nesse lugar até no dia anterior de trazê-la aqui, não vejo como...
— Um dia antes de me sequestrar? Ela assentiu com a cabeça.
— Passamos aqui a noite. O tempo certo para montar o laboratório, encher os armários e acender a calefação. Logo fomos a Salem para buscar você. Eu tinha que me manter a certa distância e continuar usando um dispositivo de localização e esperar até que Frank fosse me buscar.
Amber franziu os lábios. — por que está me contando isso?
— Eu... você me perguntou isso.
— Ele disse isso, não é? Disse a você para ser amável comigo para ganhar minha confiança. Assim talvez possa me convencer dessa loucura que tenta que eu engula.
Brooke retrocedeu uns passos para a porta.
— Se me pegar aqui me meterei em uma boa confusão. Eu só... sinto pena de você.
— Pena de mim?
— É jovem, está grávida e sozinha. E estão prendendo você contra sua vontade — lançou outro olhar para a porta — Posso trazer algo que a faça sentir-se melhor?
— Claro várias coisas. A chave dessa porta seria genial. E também eu gostaria que me devolvesse o sangue que me tirou.
Brooke franziu os lábios.
— Poderia trazer umas vitaminas para grávidas.
— Preferiria uma metralhadora. Embora, de qualquer forma, nem com isso o mataria, não?
— Então, sabe — murmurou Brooke.
— E você? — perguntou Amber. Brooke levantou a cabeça e assentiu. — Sabe o que pode matá-lo, Brooke? Como pode morrer?
Ela negou com a cabeça e seguiu retrocedendo para a porta.
— Ele não sabe que sei.
Eu não quero matá-lo — apressou-se a dizer Amber — De fato, é a última coisa que quero. Por isso não deixei que Edge o matasse — nem sequer sabia se Brooke tinha consciência das coisas que tinham acontecido até esse momento. Mas em seguida viu um brilho de assentimento nos olhos verdes da outra.
— Perguntava-me... por que o fez.
— Então, ele contou isso.
Ela sacudiu a cabeça.
— Estive lendo suas notas. Se supõe que eu não sei nada disto.
— Stiles é a única pessoa no mundo que é como eu — disse Amber. — Tem ideia do que é não saber o que pode matá-la?
Brooke. umedeceu os lábios e passou a mão sobre o trinco.
— Por favor — disse Amber, compreendendo que estava a ponto de perder sua melhor oportunidade.
Brooke a olhou nos olhos.
— Incineração — disse rapidamente ao mesmo tempo em que abria a porta. — Até que não fiquem mais que cinzas. É o único modo — saiu, fechou a porta com sigilo atrás dela e prendeu o ferrolho.
Amber molhou os lábios e se sentou para tentar assimilar aquela informação. Entretanto, não podia confiar nela. Não tinha modo de saber se atrás da visita de Brooke se achava Stiles.
Tinha fome. Pensou em seus mantimentos escondidos e no arquivo de Edge, perguntou-se se Stiles iria logo ver como estava e decidiu arriscar-se. Subiu à cama e tirou a bolsa. Logo se sentou na cama, abriu a pasta, cortou a banana e manteve seus sentidos alertas se por acaso Stiles se aproximasse.
— Exatamente aí, vê?
Edge permanecia a plena luz do sol, junto a um garoto fraco e curtido de uns dezessete anos. Surpreendia-se por estar exposto ao sol sem queimar-se. Mas, depois de um momento, acostumou-se e fixou sua atenção no menino — Este levava uns jeans descoloridos, com as pernas retas e os joelhos desgastados. A barra estava desfiada. Tinha o cabelo comprido, negro e liso, que caia sobre os olhos.
— Ali — repetiu o menino. Assinalava algo com o dedo, e Edge olhou para ali ao longe, sobre uma colina, havia uma casa de tijolo normal e comum. Umas escadas inseridas na pradaria de grama subiam ziguezague ando até a porta. Ao redor da casa havia uma grade de ferro forjado — mais ornamental que funcional
— Ali é onde está? — perguntou Edge.
— Sim.
— Como sabe?
— Que importa isso? Está ali. Quer ver?
— Pois claro.
O menino esboçou um sorriso e assentiu com a cabeça. Edge notou que seu cérebro se retorcia e girava como se o tragasse um torvelinho. Apertou a cabeça com as mãos, dolorido. E logo, repentinamente sentiu um estalo e uma onda de alívio. Piscou para enfocar o olhar e sacudiu a cabeça
— Meu deus, que caramba era isso?
A dor tinha cessado. Baixou as mãos e olhou a seu redor
Estava em um aposento muito pequeno e, exatamente diante dele, Alby estava sentada em uma cama, coberta com o lençol, com as costas apoiadas na cabeceira e os joelhos levantados. Tinha sobre as coxas uma pasta. Estava olhando algo que havia dentro dela. Tinha uma casca de banana e o miolo de uma maçã a seu lado sobre a cama, e estava devorando uma barrinha de cereais e bebendo uma garrafinha de suco de tomate.
— Alby!
Edge se aproximou e notou que, em que pese estar ainda pálida, parecia encontrar-se bem. Gostaria de manter sua indignação, sua ira. Mas nesse momento só sentia alegria por vê-la de novo.
— Está bem?
Ela não se moveu, não reagiu de modo algum. Edge estendeu um braço para tocá-la, mas sua mão a atravessou. Como se um dos dois fosse feito de fumaça.
— Isto é um sonho, Edge. Ela não sabe que está aqui — disse-lhe seu companheiro.
— É o caramba. Alby! — gritou seu nome com todas suas forças, com sua mente, com sua alma.
Ela piscou, franziu o cenho, levantou o olhar da pasta e olhou a seu redor como se houvesse sentido algo. Edge procurou concentrar-se nela. «Vou encontrá-la». Edge sentiu que contraía sua garganta. Ela continuava olhando a seu redor; logo deixou escapar um suspiro e voltou a olhar as páginas que estava lendo com tanto interesse. Edge se moveu até que pôde ver a pasta. Na folha da esquerda havia um desenho a lápis que se parecia surpreendentemente com ele. Mostrava a um jovem desengonçado com jaqueta de couro, sentado sobre o capô de um Mustang ano 69, com um cigarro na mão.
Um momento, aquele era seu Mustang.
Olhou a página da direita e viu um grosso maço de páginas datilografadas nas quais se narrava sua história. Ou, melhor dizendo, a versão do Stiles sobre sua história.
De novo se sentiu engolido por um torvelinho e, quando voltou a sair do outro lado, achou-se no armazém abandonado, naquela espantosa noite de 1959.
«Deus, não, não quero ver isto».
Mas não podia controlar a cena que se desenvolvia ante ele e sabia instintivamente por que. Aquela era a mente de Alby. Estava vendo o que ela ia imaginando à medida que lia o relato de Stiles. Via a si mesmo. As coisas não pareciam exatamente como tinham sido. O armazém estava mais limpo, mais ordenado, e as janelas não estavam quebradas. Ele também estava diferente, mais parecido ao que era nesse instante que como tinha sido então.
Tentou sair da consciência de Amber, mas não pôde. Aquilo não era como ler seu pensamento ou penetrar em sua cabeça. Edge ignorava o que era. Mas era algo diferente, e escapava a seu controle.
Fechou os olhos, mas continuou vendo aquela cena. Viu a si mesmo entrando no armazém, ouviu-se chamar ao Scottie, a Bridget e aos outros.
— Já estou aqui! Mas não encontrei ao Billy Boy. Não voltou ainda? .
Só o eco de sua própria voz lhe respondia. Recordava a angústia, a certeza de que tinha ocorrido algo terrível. Seguiu movendo-se e logo, de repente, sentiu aquele aroma com mais intensidade ainda que naquele momento.
A morte mais sangrenta tingia o ar com seu fedor.
Aquele aroma procedia do interior do armazém.
— Meu deus, não — ouviu-se murmurar, e pôs-se a correr através do armazém. Ao dobrar uma esquina, deteve-se em seco e sufocou uma náusea.
Estavam pendurados de barriga para baixo, suspensos das vigas do teto com cordas atadas aos tornozelos. Tinham-lhes degolado. A todos. Bridget, sua pequena, tinha o rosto manchado de sangue. O sangue tinha empapado seus cachos ruivos e tinha formado um atoleiro no chão. Seu terror ainda ressonava no ar.
Edge ouviu seu próprio grito de dor, sentiu que a debilidade se apoderava dele até lhe fazer cair de joelhos; notou as lágrimas ardentes que transbordavam de seus olhos. .
Mortos. Desaparecidos. Todos eles. E estava sozinho.
Levantou-se cambaleando, tentou se recompor, saltou ao mezanino e observou os objetos que havia no chão. Os que faltavam identificavam claramente ao assassino.
Stiles. Frank W. Stiles. Recordaria aquele nome o resto de sua vida.
Tirou sua navalha. Uma a uma, foi cortando as cordas, segurando os corpos e baixando-os ao chão suavemente, com grande cuidado. Seus meninos , como ele os chamava.
Seus pintinhos. O mais parecido aos filhos que jamais teria. Quando voltou a descer do mezanino, ajoelhou-se junto a eles e tocou seus rostos, banhando-os em lágrimas enquanto lhes falava.
— Você, idiota! — disse-lhe Edge a seu eu de então — Deixe de ter pena e perceba que ainda está aí, em alguma parte! Está observando você! Poderia apanhá-lo aí mesmo! Acorda!
Mas, naturalmente, não podia mudar o passado. Naquele instante, sentia-se tão aflito que não lhe tinha ocorrido abrir sua mente para registrar o espaço que o rodeava. Edge viu como seu antigo pegava uma vasilha de água e um trapo e procedia a limpar o sangue de seus órfãos. Viu como se aproximava para lavar as manchas do rosto delicado de Bridget.
Stiles. Aquele nome crepitava em sua cabeça insistentemente. A ira se apoderou dele como um fogo que se estendesse por suas veias. Seu sangue se converteu em lava. Encontraria aquele corno onde estivesse e o mataria.
Mas primeiro...
O Edge daquele tempo revolveu entre os pertences dos meninos, procurou roupa e os vestiu. Logo escolheu um objeto de cada um deles para guardar uma lembrança. Acendeu um cigarro. sentou-se no chão, com os corpos estendidos ante ele, e fumou enquanto lhes falava.
— Eu o encontrarei — disse — O farei pagar pelo que fez a vocês. Prometo isso. Pagará por isso.
Por fim se levantou e jogou o cigarro ao atoleiro de querosene que tinha derramado ao redor dos cadáveres. Depois abandonou aquele lugar.
Mas ao sair, enquanto via arder o armazém, sentiu uma presença estranha. Havia alguém ali. Observando-o.
Stiles!
Girou sobre si mesmo, tentando localizá-lo. O safado tinha tido a desfaçatez de ficar ali para vê-lo sofrer. Abriu sua mente e aguçou seus sentidos, lançando a seu redor uma espessa rede, e sentiu que Stiles fugia, que escapava, que ficava fora de seu alcance. E então as imagens cessaram.
Edge sentiu que uma enorme pressão esmagava seu cérebro ao sair da consciência em que tinha estado imerso e achar-se de novo no dormitório, olhando Amber Lily.
Ela fechou a pasta e ficou olhando o desenho, que sustentava na mão, enquanto as lágrimas escorriam por suas bochechas.
— Meu deus, não me espanta que odeie tanto ao Stiles — murmurou.
Edge espantou a dor insuportável da lembrança. «Isso não importa», disse, dirigindo-se a ela. «Já passou. Já não tem importância. Mantenha-se viva. Irei até você».
De repente ouviu passos no corredor, e girou a cabeça ao mesmo tempo em que Amber. Ela se levantou de um salto, colocou a pasta, a pele de plátano e a barrinha de cereais detrás de um painel do teto, deixou-se cair de novo no colchão e fingiu dormir.
Estava um pouco fraca, mas se encontrava bem. A velocidade com que se moveu o demonstrava.
A fechadura girou e se abriu a porta. Edge esgotou os olhos ao ver entrar o safado do Stiles no quarto. Lançou-se instintivamente contra ele, colocando a mão na sua garganta, mas transpassou seu corpo e de repente se sentiu enjoado e aturdido. Sacudiu-se mentalmente.
Stiles se aproximou de Amber, agarrou-lhe a mão e a deixou cair. A mão do Amber caiu frouxamente sobre os lençóis. Stiles lhe deu umas palmadas nas bochechas enquanto lhe movia a cabeça de um lado a outro.
— Amber Lily, vamos, acorda. Tem que comer algo. Não queremos que aconteça nada ao bebê, não?
Edge estremeceu. Então era certo o que havia sentido. Amber Lily estava grávida. E já sabia. Sabia o que ele só tinha intuído em seu interior.
E, o que era mais importante, Stiles também sabia. Onde demônios estava o pai daquele bebê? Deveria estar ali, tomando medidas para proteger a seu rebento. Mas não estava. Edge sentiu rancor contra ele. Dava-lhe raiva ser o único que se preocupava, apesar de que o bebê não era dele, não podia ser. O que era uma estupidez, pois a última coisa que desejava era ter um filho. Não queria voltar a sentir-se responsável por ninguém. Só por si mesmo.
Sentia raiva de Amber Lily por não ter dito que tinha estado com outro homem antes dele. Tinha-lhe deixado acreditar que era virgem. Mas por que razão?
Enfurecia-o saber que tinha estado com outro. Que outro a tinha tocado, tinha beijado...
Amber piscou, abriu os olhos e disse com voz pastosa:
— Para agora. Não há nenhum bebê.
Stiles sorriu, sacudindo a cabeça.
— É muito teimosa, certamente — deixou a bandeja com comida que levava sobre a cômoda.
Ia dizer algo mais, mas nesse momento Edge se sentiu arrastado fora daquela cena e introduzido de novo em seu próprio corpo. Quando despertou no estábulo, que era o mais longe que tinham conseguido chegar na noite anterior antes de ter que procurar refúgio, deu-se conta de que tinha caído a noite.
Dante e Donovan estavam de pé junto a ele, sacudindo-o pela roupa. Pareciam preocupados.
— Que caramba...? — doía-lhe a cabeça e levou uma mão a ela, fechando os olhos com força.
— Não há quem durma a seu lado — disse-lhe Dante — Não para de resmungar e de sacudir a cabeça.
— Por um momento, pensamos que não fosse despertar — disse Donovan — É muito estranho. O sonho diurno é muito profundo para ter sonhos.
— Não era um sonho — Edge se sentou lentamente e afastou as mãos da cabeça — Acredito que era, mas bem uma... não sei... Era como se meu espírito tivesse abandonado meu corpo — olhou-os e viu refletida a curiosidade em seus rostos — Havia uma espécie de guia que me levava até Amber.
Dante levantou as sobrancelhas.
— Ela se encontra bem?
Edge assentiu com a cabeça.
— Sim. Por alguma razão, o tranquilizante de Stiles não a afeta, embora ela finja que sim. Tem-na em uma casa, em Boston. Vi-o claramente.
— Iremos tirá-la dali antes que acabe a noite — disse Dante.
— Que mais há? — perguntou Donovan — Edge, que demônios nos está ocultando?
Edge suspirou, protegeu sua mente e baixou a cabeça. Era Amber Lily e não ele quem devia decidir se lhes contava seu pequeno segredo.
— Nada. Deveríamos dizer a sua família onde acreditamos que está, e que vamos atrás dela.
— Boa ideia — disse Dante — Disseram que iam trazer dois carros. Não acredito que demorem mais que um par de horas.
— Pode entrar em contato com eles telepaticamente? Dizer onde podem reunir-se conosco? — Dante assentiu — Então, vamos por Alby –disse Edge.
Amber não confiava nas comidas que lhe tinha levado Stiles com o passar do dia, embora devesse admitir que a surpreendia quão mudado parecia. Tratava-a quase com... ternura e ia ver como estava frequentemente. Muito frequentemente; Amber tinha demorado quase todo o dia para ler o arquivo de Edge porque Stiles a interrompia continuamente com suas visitas. Edge estava perseguindo-o desde 1959, mas só tinha conseguido dar com ele depois do desmantelamento da DIP. Previamente, teorizava Stiles, o amparo da organização tinha impedido que seguisse seu rastro. Edge havia tentando matá-lo duas vezes, conforme tinha escrito Stiles. Em uma ocasião lhe tinha esmagado a cabeça com um tijolo, e em outra o tinha apunhalado mais de doze vezes. Mas em ambas as ocasiões, Stiles tinha revivido.
Amber supôs que Stiles não tinha tido tempo de incluir em suas notas a ultima tentativa de Edge, quando quebrou seu pescoço no estábulo. As notas que Brooke tinha visto deviam estar em outro lugar.
Stiles deixou o último prato de comida que lhe tinha levado sobre a mesinha de noite, junto à cama, e se inclinou para afofar os travesseiros.
— Como você está?
— Muito enjoada. Não acredito que possa comer isso.
Ele assentiu com a cabeça.
— É normal na gravidez, segundo li.
Ela levantou as sobrancelhas.
— Esteve lendo sobre gravidez? — esteve a ponto de lhe perguntar se era normal inchar. Os jeans começavam a lhe apertar. Mesmo que sua gravidez fosse real, o que não era não deveria estar engordando tão rápido.
— Mandei a Brookie ir comprar uns livros. Embora não ache que algum trate sobre este tipo de gravidez tão peculiar.
Ela umedeceu os lábios enquanto ele colocava a bandeja sobre o regaço e aproximava uma cadeira.
— Por que está fazendo isto, Stiles?
Ele deu de ombros.
— Tem certeza que não pode comer nem um pouquinho?
— Planeja me manter aqui uma temporada, certo? Até que saiba o suficiente sobre cuidados pré-natais — ficou a beliscar a comida sem comer nada, apesar de estar morta de fome.
— Na investigação vampírica não tinha ocorrido nada tão notável desde... bom, desde que você nasceu. Naturalmente, quero anotar tudo.
— E também precisa de mais sangue. Para fabricar o soro, o Ambrosia-6.
Ele moveu lentamente a cabeça de um lado a outro.
— O que tirei ontem me basta para minha seguinte ronda de injeções. Não vou tirar mais sangue até que nasça o bebê. Não quero pôr em perigo a gestação, e, além disso, nem sequer sei se o soro terá o mesmo efeito. Seu sangue é diferente agora que está grávida.
Amber resistiu o impulso de negá-lo de novo. Se ele estava empenhado em lhe fazer acreditar aquela fantasia, tudo bem. Seguiria o jogo.
— Tentou fazer o soro com o sangue que me tirou?
Ele assentiu com a cabeça.
— Acabei esta manhã — respondeu. — Dado que seu sangue é diferente, terei que chamá-lo Ambrosia-7. Olhou-a fixamente- por que o pergunta?
Ela deu de ombros e desviou os olhos.
— Quero saber tudo... sobre mim, sobre o que sou, sobre como... funciona meu organismo — atreveu-se a olhá-lo de novo. Ele continuava olhando-a com receio — É frustrante não saber as coisas mais simples... quanto tempo viverei se ainda continuo envelhecendo, como posso morrer...
O semblante do Stiles se alterou e um brilho de simpatia pareceu brilhar em seus olhos.
— Se seu filho será normal? — perguntou.
Ela decidiu seguir o jogo e assentiu com veemência.
— Principalmente isso.
Stiles deu de ombros.
— Os efeitos do soro duram seis meses. Quando começam a dissipar-se, tendo a envelhecer rapidamente, mas o envelhecimento se detém assim que volto a me injetar. Não sei como podem aplicar-se em você essas coisas. Você sempre envelheceu normalmente. O mais provável é que seu filho também o faça.
Amber pensou que tinha envelhecido normalmente só até que Stiles a matou pela primeira vez para ver se ressuscitava. Ao recordá-lo, recordou também o verdadeiro caráter daquele homem. Stiles era malvado. A simpatia que estava mostrando era uma farsa. Um truque. Tentava ganhar sua confiança por alguma razão perversa. Até não ter sabido que não estava grávida, teria pensado que queria mantê-la tranquila até que pudesse se apoderar do bebê. Mas não havia bebê.
— Não provou ainda o novo soro?
— Ainda não o necessito. Não me fará falta até dentro de cinco ou seis semanas. E ainda resta uma ampola de Ambrosia-6. Embora admita que estou ansioso por ver como funciona a nova fórmula. Seu sangue parece... aprimorado. Pode ser que seja ainda mais potente que antes.
— Sério?
— Hum. Pode ser que Ambrósia-7 seja meu maior lucro até a data.
— Claro — murmurou Amber — também pode ser que não funcione absolutamente.
— Temo que tem razão.
Pelo menos, já parecia, pensou Amber. Só tinha que apropriar-se dela e sair dali. Assim que Stiles dormisse, pensou. Assim que...
Ele ficou em pé.
— Vou transferir você logo para um lugar mais seguro. Assim poderemos prescindir do tranquilizador — deteve-se, como se esperasse que lhe agradecesse. Amber não disse nada — Mas, no momento... — tirou uma seringa de injeção hipodérmica do bolso de seu jaleco de laboratório.
Amber se sobressaltou ao sentir a espetada no braço, mas pensou que não aconteceria nada. Só era água salgada.
Mas não o era. Stiles devia ter reabastecido sua maleta, ou possivelmente tirou aquela ampola de outro lugar. Amber começou a sentir-se aturdida e começou a amaldiçoar em voz baixa. Stiles lhe tirou a bandeja do colo e a deixou sobre a mesinha de noite.
— Relaxe e dorme um pouco — disse-lhe e, apoiando as mãos sobre os ombros, deitou-a suavemente sobre o travesseiro — Aqui está. Não resista.
O sonho se apoderou dela como a maré, arrastando sua consciência.
Voltou a ter aquele sonho. Desenvolvia-se como de costume. Via Edge de pé ao fundo de um quarto às escuras, olhando-a de frente. Sustentava nos braços uma caixinha adornada, como o cofre de um tesouro em miniatura. Edge olhava o cofre e seu rosto se contraía. Logo dava a volta e se encaminhava para ela.
— Não — sussurrou ela — Não o quero.
Edge se inclinou de novo ao aproximar-se da cama para que ela pudesse olhar dentro do cofre.
— Não quero olhar — ouviu-se dizer — Por favor, não me faça olhar.
Mas não tinha escolha. E dessa vez, quando viu o que continha a caixa, o sonho não se dissipou como nas demais ocasiões. Não se fundiu em negro, nem se alterou. Amber o viu claramente. Era uma espécie de trouxa, algo pequeno, envolto em suaves mantas.
Sentiu que o coração começava a martelar no peito pelo que parecia aquela trouxa. Mas não podia ver além das mantas. Olhou o rosto de Edge e conteve o fôlego. Uma só lágrima rodava lentamente por sua bochecha. Amber olhou de novo a trouxa da caixa. Estava quieto. Não se movia.
Edge se aproximou e lhe estendeu a caixa. E então ela viu o diminuto rosto de duende. Os olhos fechados. A pele azulada. A quietude mortal.
Estava olhando o rosto da morte, encarnado no rosto de seu próprio filho.
O ruído de seus gritos a despertou.
Agachado atrás de um carro estacionado, Edge se levantou de um salto ao ouvir Amber Lily gritar. Donovan impediu que se pusesse a correr agarrando-o por ombro.
— Tranquilo. Temos que esperar aos outros.
— É um safado!
— Edge, não seja tolo — disse Dante com aspereza — Teremos mais oportunidades de resgatá-la ilesa assim que cheguem Rhiannon, Roland e seus pais.
Edge o olhou com incredulidade.
— Ilesa? Esse grito soou como se estivesse ilesa?
— Seremos mais fortes se estivermos em maior numero.
— Eu me basto sozinho — soltou-se da mão que o segurava e correu para a casa, saltou a grade e derrubou a porta de um chute.
Imediatamente se disparou um alarme que emitia breves e ensurdecedores assobios. Ouviu que alguém corria para ele; viu a expressão perplexa do Stiles ao vê-lo aparecer ante ele, vestido com as calças de um pijama e uma camiseta, com uma pistola tranquilizadora na mão.
Edge o golpeou tão forte e tão rápido que não teve tempo de apertar o gatilho. Stiles voou pelo ar, golpeou-se contra a parede, descascando-a, e caiu no chão. A pistola aterrissou a seus pés e Edge a esmagou de um pisão ao entrar na casa. Não lhe preocupava Stiles. Os outros dois foram atrás dele. Ocupar-se-iam dele.
— Alby! Onde está?
Não houve resposta. Edge pôs-se a andar pelo corredor, arrebentando cada porta que encontrava de um tapa. Todas elas se abriram, incrustaram-se na parede e ricochetearam para ele. Todas as habitações estavam vazias.
Até que chegou à última e ali foi onde a encontrou.
Estava estendida na cama, apenas consciente, com os olhos entreabertos e desfocados, o cabelo revolto e empapada de suor. Edge se aproximou dela, afastou os lençóis e tomou-a nos braços. Levava uma camisola de musselina branca. Estava chorando e tremia da cabeça aos pés. Edge se ergueu e deu a volta para tirá-la dali.
— Não — murmurou ela. Edge se deteve. Ela assinalava o teto. — O... o arquivo...
— Esqueça o arquivo — Edge a tirou pelo corredor. Amber levantou a cabeça.
— Edge, por favor! — disse com esforço — O laboratório. O soro — fechou os olhos lentamente. Saltava à vista que se achava sob os efeitos de um forte narcótico.
— Onde? — perguntou ele.
Ela levantou fracamente uma mão e lhe indicou o caminho. Ao avançar pelo corredor, Edge viu Dante e Donovan inclinados sobre o corpo imóvel de Stiles.
— Tomem cuidado — disse-lhes — Ressuscitará — logo disse a Amber — Por onde?
Ela apontou de novo e ele cruzou a sala, entrou em outro corredor e abriu outra porta de um chute. Depois dela se achava o impecável laboratório, tão imaculado como antes. E vazio. A porta da geladeira estava aberta e não havia nada dentro dela. As gavetas do arquivo estavam igualmente abertas e vazias. Amber olhou a seu redor e deixou logo que sua cabeça caísse sobre o ombro de Edge.
— Oh, não.
— Havia alguém mais?
Ela umedeceu os lábios.
— Uma mulher. Brooke — abriu os olhos de novo — O computador...?
Ele olhou para a mesa e viu que estava vazia.
— Não está. Suponho que ela também se foi.
Edge a levou para a sala de estar, onde Donovan estava atando as mãos de Stiles às costas. Dante saiu de outra sala.
— A casa está vazia.
— Amber diz que havia uma mulher.
Dante levantou as sobrancelhas.
— Pois se a havia, partiu antes que nós chegássemos.
— Pois levou as notas de Stiles e o soro — disse Edge. Logo apontou com a cabeça ao Donovan — Essas algemas não o deterão quando reviver.
— Então, será melhor que nos ocupemos de que não reviva, não lhes parece? — perguntou uma voz de mulher.
Ao virar-se, viram que Rhiannon entrava na casa.
Depois dela entrou correndo outra mulher a quem Edge nunca tinha visto. Ao ver seu rosto, compreendeu que era a mãe de Amber. Tinha seus mesmos olhos penetrantes e maçãs do rosto esculpidas. Era muito bela e, entretanto, não podia comparar-se com sua filha.
Ela passou as mãos sobre o rosto de Amber e lhe acariciou o cabelo.
— Minha menina — sussurrou, — me diga que está bem.
— Estou bem — disse Amber com voz débil e crispada — Stiles... leva um dispositivo. No salto do sapato. Para ser localizada — conseguiu lhes dizer.
— Eu me encarregarei disso — disse Donovan.
A mãe de Amber olhou Edge, preocupada com o estado de torpor em que se achava sua filha.
— É efeito do tranquilizante — disse ele — Passará logo.
Pela parte de trás da casa entrou outro homem que se aproximou de Edge e tomou a Amber em seus braços.
— Não aconteceu nada, amorzinho. Já a peguei.
Edge confiava, por seu bem, em que aquele tipo fosse o pai de Amber. Porque se não...
— Suponho que você é o que usou a minha filha como isca para atrair Stiles.
— Calma Bryant — disse Dante — Também foi ele quem nos trouxe até aqui.
— Posso andar — gaguejou Amber — Por favor, papai, me ponha no chão.
Jameson Bryant ficou olhando a sua filha um momento e logo a abraçou com força antes de deixar-la de pé. Ela olhou ao Edge e seus olhos pareceram lhe atravessar a alma.
— Edge tinha uma boa razão para fazer o que fez — disse a seu pai sem afastar o olhar do Edge — E não queria que Stiles se aproximasse de mim.
— Foi um erro — disse ele — Se pudesse desfazer o que fiz, desfaria.
— Acredito que acaba de fazê-lo — disse suavemente Angélica.
Rhiannon agarrou ao Stiles pelo pescoço da camisa.
— Saiamos daqui. Esse alarme se ouviu fora daqui – dando a volta, arrastou ao Stiles pelo chão e saiu.
Os outros a seguiram, mas as pernas de Amber falharam ao dar uns passos. Edge estendeu os braços, mas sua mãe foi mais rápida e a segurou para ajudá-la a andar. E então, de repente, Angélica se deteve. Seus olhos brilharam e olhou a sua filha.
— O que? O que acontece?
Angélica abriu a boca, voltou a fechá-la e lançou um olhar ao Edge e outro ao Jameson, que ia atrás deles.
Umedeceu os lábios e pareceu conter as lágrimas.
— Nada. Não importa — fechou os olhos e apoiou a cabeça de Amber sobre seu ombro. Logo se pôs a andar de novo.
Ela sabia. Edge tinha visto em seus olhos. Sabia. Demônios, se seus pais acreditavam que ele era responsável pelo estado de Amber, certamente no dia seguinte seria convertido em pó. A família de Amber o abandonaria no deserto para esperar o amanhecer.
Por desgraça para ele, todo mundo sabia que tal coisa era impossível. Os vampiros eram estéreis. O filho de Amber não podia ser dele.
— Temos que revistar a casa de cima abaixo antes de ir — disse Jameson ao depositar Amber no sofá. Ela sentiu ainda o leve rastro cheiroso das pipocas do Brookie — Amber fique aqui descansando. Aqui está a salvo.
— Eu fico com ela – ela ouviu Edge dizer.
Logo sentiu fugazmente o chiado da tensão no ar.
Ao abrir os olhos, viu-o sentado no sofá, a seu lado, com o olhar fixo em seu rosto, como se procurasse algo.
— Não precisava que me resgatasse — conseguiu dizer — Deixei-me trazer aqui de propósito.
— E as coisas estavam saindo bem, querida. Até que ele injetou essa droga em você.
Ela apertou os lábios e assentiu.
— Enchi algumas seringas de injeção com solução salina. As duas primeiras vezes o enganei.
— Acha que percebeu?
— Não. Simplesmente, escolheu a seringa de injeção equivocada — tomou ar e suspirou — Parecia... zangado comigo depois de... .
Ele deu de ombros.
— Estava mais zangado comigo que com você — inclinou a cabeça — Bom, também estava um pouco zangado com você.
Ela franziu os lábios.
— Tentou matar o Stiles apesar de eu suplicar que não o fizesse.
— De acordo, estava bastante zangado com você. Acredita que não tinha motivos? — ela franziu o cenho, desconcertada — Deus, Alby, não há nada que queira me dizer?
Ela se apressou a afastar o olhar. Estava claro que Edge intuía que ela estava ocultando algo. Não podia saber o que era certamente. Mas... não estava preparada para falar disso. Como ia dizer uma coisa assim a um homem que se acreditava estéril? Imaginava lhe dizendo: «Pode ser que tenha me deixado grávida, embora nós saibamos que isso é materialmente impossível. Ah, por certo, não se preocupe muito, porque vai nascer morto».
Não.
— Alby?
Ela suspirou.
— Olhe, há uma coisa, mas não é...
— Meu assunto? — perguntou ele.
Ela franziu o cenho.
— Não é isso o que ia dizer.
— Por que não? É certo. Sinto muito, Alby, mas tem razão. Não tenho direito de pressionar você. Não... não me corresponde fazê-lo.
— A casa está limpa — Amber ouviu seu pai gritar — Vamos tirar Amber daqui.
Alguém a levantou do sofá. Não era Edge. Tinha que falar com ele, lhe dizer que se equivocava. Mas a droga o impedia.
— Rhiannon e Angélica a levarão para Salem. É o lugar mais seguro para ela, e o mais próximo — disse seu pai.
— E os outros? — perguntou Edge.
— Roland, Dante, Donovan e eu levaremos o Stiles ao laboratório do Eric em Wind Ridge. Está na parte sudoeste da Pennsylvania, perto da fronteira com a Virginia Ocidental. Você escolhe com que grupo vai, Edge.
Amber tentou abrir os olhos e falar. Queria dizer ao Edge que ficasse com ela, que tinha algo a decidir. Mas, antes que pudesse sobrepor-se à droga, ouviu que ele dizia: ·.
— Fico com o Stiles. Alby está em boas mãos. Não precisa de mim.
Amber sentiu que o coração se contraía no peito. Edge parecia tão zangado, tão... doído. Amber deu-se por vencida e, sentindo que tinha perdido algo mais que a batalha, sucumbiu ao sonho.
Tinha a sensação de que devia achar-se em estado de pânico, mas não conseguia alcançar aquela emoção.
Tudo parecia desenvolver-se em meio de uma suave e doce névoa na qual as coisas aconteciam em câmara lenta. Pesavam-lhe a cabeça e os membros e tinha os olhos tão cansados que não podia mantê-los abertos.
E, entretanto, quando os fechava, o sonho ou sua lembrança voltavam a assaltá-la. Abriu os olhos de repente.
— O que...? Onde...?
— Tranquila querida — disse sua mãe com suavidade — Está bem. Está comigo.
Amber viu que estava no assento traseiro de um carro, apoiada em sua mãe.
— Onde... onde estão outros?
— Os homens se foram com o outro carro para Pennsylvania — disse Rhiannon com doçura. Era ela quem conduzia — Levam ao Stiles no porta-malas.
— E Edge?
Sua mãe a olhou inquisitivamente enquanto lhe acariciava o cabelo.
— Oh, ele não vai no porta-malas — disse Rhiannon, muito séria — Embora fosse conveniente levá-lo ali, virou-se um pouco e lançou a ela um sorriso malicioso.
— Não deveria estar com eles — disse Amber — Quer matar ao Stiles. Vai matá-lo assim que se descuidem.
— Carinho — disse Angélica, — Dante, Donovan, Roland e seu pai vão com ele. Não permitirão que faça mal ao Stiles.
— Não poderão detê-lo.
— Claro que sim. Enquanto isso, nós vamos levar você para Salem afim de que descanse e se recupere.
Amber se sentou.
— Mamãe, só preciso me recuperar da dose de tranquilizante que Stiles me deu. De resto estou bem.
— Realmente? — perguntou sua mãe.
Amber esquadrinhou seu rosto com o cenho franzido.
— Aonde quer chegar?
Rhiannon olhou para trás com curiosidade enquanto conduzia.
— Acreditava que eu não ia perceber, Amber? Pensava que não notaria assim que a tocasse, assim que visse seus olhos?
— Mamãe, não sei do que está...
— Está grávida, Amber.
Rhiannon pisou no freio com tanta força que as rodas chiaram e começou a cheirar a borracha queimada. Deu um tranco na direção para endireitar o carro e o parou no meio fio entre uma nuvem de pó. Logo se virou e encolheu-se sobre o assento para poder olhar para Amber, assombrada.
Amber soltou o braço do assento, ao qual se agarrou, e se obrigou a olhar nos olhos de Rhiannon e logo para sua mãe.
— Está claro que Stiles conseguiu lhes colocar essa descabelada ideia na cabeça antes de ficar inconsciente.
— Stiles? — perguntou Rhiannon. — O culpado é ele?
— Ele o inventou — disse-lhes Amber, embora já não sabia se era verdade — Tentou me convencer disso por alguma razão. Não sei por que. E tampouco sei por que tentou enganar vocês.
Rhiannon fez girar os olhos. Mas Angélica se limitou a baixar a cabeça.
— Stiles não disse nada disso, Amber Lily — murmurou:
— Então, de onde tirou essa ideia absurda?
Angélica levantou a cabeça outra vez. Tinha os olhos cheios de lágrimas.
— Já disse. Vi em seus olhos, senti ao tocá-la — tocou o ventre de Amber. — Você não o sente, Amber? Há vida dentro de você.
Amber sentiu que empalidecia e começou a mover a cabeça de um lado a outro.
— É impossível. Não pode ser.
— Está equivocada.
— Mas... mas...
— Quem é o pai? — perguntou Rhiannon com voz crispada e carregada de ameaças — vou comer seu fígado. .
— Não, não pode lhe fazer mal. Deus nem sequer quero que digam a ele — sacudiu a cabeça — Deixem que siga seu caminho. É um solitário, sempre o foi. Não quererá saber nada disso.
— Isso não sabe querida — disse Angélica — Tem que dar a esse jovem uma oportunidade.
— Não, vocês não o entendem. A única coisa que quer é vingar-se de Stiles. Nada mais.
As outras duas se olharam e logo, lentamente, olharam de novo a Amber.
— Carinho, parece acreditar que Edge é o pai — disse Angélica em voz baixa.
— Não explicaram a você? — perguntou Rhiannon — Amber, os vampiros não podem reproduzir-se.
— Mas parece que não é assim — disse Amber e respirou fundo e baixou a cabeça — O pai é ele.
Angélica esquadrinhou seus olhos e voltou a olhar para Rhiannon.
— Como é possível?
— Não sei o que importa isso — disse Rhiannon — Agora terei que pensar em outro modo de eliminá-lo.
— Rhiannon, você não vai...
— Podemos molhá-lo com gasolina, lhe dar um pouco de vantagem e logo ver qual de nós será a primeira a aproximar-se com um fósforo ardendo — Rhiannon sorriu — Seria como brincar de resgate (no Brasil seria brincar de “policia e ladrão”), mas melhor.
— Rhiannon, está assustando-a.
— Não, nada disso — Amber se endireitou e olhou para Rhiannon com fixidez — Se quer lhe fazer mal, tia Rhiannon, primeiro terá que passar por cima de meu cadáver. E asseguro que sou mais dura de cortar do que acredita.
Rhiannon pareceu surpreendida e logo zangada.
— Atreve-se a...?
— Quer que provemos agora mesmo?
Amber abriu a porta do carro, saiu e agitou uma mão indicando a porta do condutor, que se abriu de repente. Estava aturdida e enjoada, e lhe apertavam tanto as calças que lhe faziam mal. Mas também estava furiosa e pronta para brigar. Rhiannon saiu do carro lentamente e com elegância, como uma rainha que desembarcasse de uma limusine. Amber se preparou para lutar, separou os pés, flexionou os joelhos e manteve os braços relaxados junto aos flancos.
— Suponho — disse Rhiannon devagar — que a culpa toda é do tranquilizante de Stiles e dos hormônios.
— Ou pode ser que esteja apaixonada — disse Angélica ao sair do carro e, aproximando-se de sua filha, pôs-lhe uma mão sobre o ombro. — Não seja ridícula, Amber. Rhiannon não vai lutar com você.
Rhiannon deu de ombros.
— Ao menos, não enquanto estiver grávida.
— Pois terá que lutar se pretende fazer mal a Edge.
— Por mim que siga respirando uns meses mais — Rhiannon deu de ombros — de repente defender sua honra perdeu sua atração. Moleca ingrata — virou-se e voltou a sentar-se no carro, fechando a porta de repente.
Angélica sacudiu a cabeça. — Ofendeu-a, Amber.
Amber baixou a cabeça.
— Ela mereceu — mas lamentava ter sido tão brusca com sua tia. Ninguém a queria como Rhiannon — Não quero que Edge saiba — disse a sua mãe depois de decidir solucionar as coisas com tia Rhi mais tarde — Ainda não.
Sua mãe deu de ombros.
— Tem o direito de saber. Mas deve ser você quem o diga — sacudiu a cabeça — Mas não espere que eu esconda de seu pai. Não mentimos um ao outro.
— Então, se mantenha separada dele um tempo. Em Salem, com a Serafina e Willem. Morgan também está ali, sabe?
— Morgan? do Dante?
Amber assentiu consciente de que sua mãe tinha muita vontade de conhecer a vampiresa — roteirista.
— Está bem. Ficarei com você em Salem uma temporada — acariciou-lhe o cabelo — Uma garota necessita a sua mãe em um momento assim — esboçou um sorriso. — Um bebê... — disse — Não posso acreditar que vamos ter outra vez um bebê na família...
Amber deixou que a abraçasse para esconder seu rosto. Mas a temível lembrança do menino pálido e imóvel do sonho, metido em sua caixa ornamentada, semelhante a um ataúde, voltou a apoderar-se dela.
Fechou os olhos para afugentá-lo. «Por favor», pensou. «Outra vez não».
Passou um carro, seguido de um ônibus tão grande que o pavimento começou a vibrar.
Amber notou algo e levantou o olhar para seguir o progresso do ônibus. Logo abriu bruscamente a porta do carro e afastou-se de sua mãe.
— Segue a esse ônibus, Rhiannon!
— O que?
— A mulher que levou o soro vai nele. Senti quando ele passou. Brooke, chama-se Brooke, e tem a cura para o Willem.
A voz em sua cabeça seguia lhe dizendo que ia na direção errada. Era muito forte; tanto, que Edge se espantava que os que estavam com ele no carro não a ouvissem. E, além disso, era insistente. Depois de discutir com ela uns minutos, ao mesmo tempo em que tentava defender seus pensamentos, gritou por fim:
— E onde caramba quer que vá então? — os outros o olharam pasmados. — Caramba — resmungou Edge, e se recostou no assento como se tentasse conciliar o sono.
Na realidade, só queria deixar de ouvir aquela insistente voz e esquecer-se de seu sentimento de culpa. Separou-se de Amber levado por um acesso de raiva e um surto do ciúmes. Era um idiota. Afinal de contas, não estava apaixonado por ela. Não tinha por que estar com ciúmes. Supunha que devia ser o orgulho viril.
Entretanto, tinha tomado a decisão errada, e sabia.
Jameson olhou para Dante, que ia no assento dianteiro, a seu lado, e logo ao Donovan e ao Roland, que estavam atrás, com o Edge.
— Encontra-se bem?
— Ouve vozes — disse Dante, e moveu um dedo em círculos junto a seu ouvido.
— Todos ouvimos vozes — particularizou Donovan. — Vozes, pensamentos... tanto os nossos como dos mortais — voltou-se para Edge. — Trata-se dessas vozes, Edge?
— Oh, Deus, acredita ser um psiquiatra de vampiros — grunhiu Edge.
Donovan apertou os lábios.
— Se nos dissesse o que se passa, talvez pudéssemos ajudá-lo — olhou para Jameson. — acontece inclusive quando dorme.
Jameson franziu o cenho.
— Isso não é normal. E certamente tampouco é um sintoma de loucura. É necessário muito mais que uma enfermidade mental para transpassar o sono diurno. Poderia ser alguém do exterior, Edge? Alguém que deliberadamente envia essas mensagens?
Ele moveu a cabeça de um lado a outro.
— Não sei.
— E como soam essas vozes?
— Não se incomode, Jameson. É um solitário. Muito macho para compartilhar seus problemas conosco.
Edge olhou Dante, que parecia detestá-lo e, possivelmente só para demonstrar a ele que se equivocava, disse:
— É uma só voz. Masculina. Jovem, embora não seja a voz de um menino. Dá a impressão de que surge de meu interior. Mas não posso controlá-la, não posso sossegá-la.
— Pode conversar com ela? — perguntou Roland.
Edge franziu o cenho.
— Sim.
— E o que diz?
Edge suspirou e sacudiu a cabeça.
— Disse a você onde estava Amber Lily — falou Donovan com os olhos fixos no Edge — Verdade?
Ele assentiu com a cabeça.
— E o que está dizendo agora? — perguntou Jameson.
— Que vou na direção errada — suspirou Edge.
— Sério?
Edge assentiu sem dizer nada.
Jameson olhou seu relógio.
— Logo amanhecerá. Teremos que parar e procurar refúgio.
— Alby pode conduzir o dia todo — disse Edge — Poderia conseguir muita vantagem enquanto descansamos.
Deus, por que tinha se deixado levar por seu mau gênio e se afastou de seu lado? O que importava que estivesse grávida de outro? Estava em perigo, e ele tinha que encontrá-la. Sentia-o com todo seu ser. Jameson estava observando seu rosto intensamente.
— Está muito preocupado com ela.
— Acredito que deveria ir se acostumando. Eu já me acostumei.
Jameson levantou as sobrancelhas e logo seu rosto se obscureceu um pouco. Donovan se apressou a falar como se quisesse dissipar a tensão.
— Eu não me preocuparia que ela se afaste muito, Edge. Afinal de contas, parará assim que chegue a Salem.
«Não vai a Salem!»
Edge piscou e sacudiu a cabeça, mas não pôde evitar ouvir de novo a voz.
— Não vai a Salem.
— O que? Como não? — perguntou Jameson.
— E como caramba quer que eu saiba — Edge sacudiu a cabeça de novo e ouviu que a vozinha lhe sussurrava: «Canadá. Edmunston, New Brunswick». A ansiedade começava a apoderar-se dele. Maldição odiava separar-se de Stiles. O sacana podia escapar outra vez, e já era hora de que ele cobrasse a vingança que era sua única prioridade. Ou que tinha sido até então. Demônios, quando tinha mudado aquilo?
Passaram junto a um letreiro que indicava uma estação de ônibus.
— Toma a saída seguinte — disse. — Há uma estação de ônibus. Me deixe lá.
— Não pode subir em um ônibus estando a ponto de amanhecer — disse Donovan.
— Não vou subir. Vou me colocar debaixo — olhou ao Jameson, que o estava observando sem piscar — No compartimento da bagagem — disse — Não é primeira classe, mas me leva aonde quero ir — olhou para Dante — Não finja que não se alegra de livrar-se de mim.
— Não pensava fazê-lo Dante tomou a saída seguinte e foi seguindo os indicativos da estação de ônibus.
— Vocês quatro podem se ocupar do Stiles perfeitamente sem mim — disse Edge ao sair quando Dante deteve o carro frente ao terminal.
— Três — disse Jameson, saindo do carro. Edge o olhou — Nem pense em discutir. É minha filha.
Edge suspirou e baixou a cabeça. Jameson tinha razão. Tinha dez vezes mais direito a ir em busca de Alby que ele. Se fosse sua própria filha...
«Filho».
Edge levantou bruscamente a cabeça e olhou a seu redor, mas não viu ninguém. Piscou com força e sentiu que contraía sua garganta.
— O que? O que acontece?
Amber ia ter que dizer a seu pai que estava grávida cedo ou tarde. Edge não tinha medo de dizer-lhe afinal de contas, não tinha por que. Mas não correspondia a ele fazê-lo. Entretanto, nesse momento... nesse momento não sabia o que pensar.
Aproximaram-se os dois da parte dianteira do terminal, onde os ônibus se alinhavam obliquamente, estacionados emparelhados, alguns deles com o motor em marcha. Jameson se aproximou de um motorista que estava passeando junto a seu veículo.
— Algum desses ônibus vai ao Canadá?
O condutor olhou seu relógio e assentiu.
— Sim, para Woodstock, Grand Fans e Edmunston — disse — É esse daí. Mas só sai dentro de meia hora – olhou ao guichê da bilheteria — A bilheteria não abre até as nove, mas falem com o motorista. Ele dará os bilhetes.
— Obrigado.
Edge pôs-se a andar para o enorme ônibus, que permanecia em silêncio.
— Meia hora — disse, olhando o céu.
— O sol já teria saído então — disse Jameson.
— Mas o motorista virá antes — disse Edge — Para esquentar o motor e abrir o compartimento de bagagem.
— E então... o que? Colocamo-nos dentro e confiamos em que não nos vejam?
— Podemos nos mover mais rápido do que pode perceber o olho humano. Ninguém nos notará.
— E quando o condutor for colocar alguma mala e ver que há dois corpos dentro?
Edge o olhou nos olhos sério.
— Tenha um pouco de fé. Não é a primeira vez que faço isto, sabe?
Jameson não parecia muito convencido, mas se sentou em um banco, fora da estação.
— Então, ficarei aqui sentado. Por sorte, este banco está virado para o este, assim verei o sol uma fração de segundo antes de estalar em chamas.
— Que otimista.
Foram passando os minutos. Jameson parecia ir ficando mais nervoso com cada segundo que passava. Edge, enquanto isso passeava junto ao ônibus, fumando.
Ao final, vários carros e táxis desembarcaram alguns passageiros e partiram. Os passageiros foram invariavelmente primeiro à bilheteria e, ao vê-la fechada, começavam a ficar nervosos. Continuando, reuniam-se ao redor do ônibus.
Mas não se aproximavam de Edge. A fumaça de seu cigarro parecia criar uma tela protetora a seu redor. Aquela era uma das vantagens de fumar: impedia que os não fumantes invadissem seu espaço pessoal.
De repente ouviu que o motor do ônibus foi ligado e, um instante depois, o compartimento da bagagem se abriu. O condutor começou a guardar as malas sem muita atenção, uma atrás de outra. Edge se aproximou da parte dianteira do veículo, caminhou até onde Jameson continuava sentado, contemplando o céu, que tinha clareado de maneira alarmante, adquirindo um pálido tom cinza perto do horizonte.
— Preparado?
— Tanto como posso estar — disse Jameson.
Levantou-se e seguiu Edge até que se acharam junto à parte de atrás do ônibus. O condutor estava de costas, e os passageiros estavam subindo a bordo, escolhendo seus assentos e lutando com suas bolsas de mão.
Edge esperou até que o condutor se dispunha a pegar a última mala e o último passageiro tinha subido a bordo para tirar várias malas do compartimento dando um rápido puxão. O condutor se virou surpreso, e se agachou para as recolher, amaldiçoando em voz baixa. Edge havia jogado algumas a certa distância, para mantê-lo distraído.
— Vamos — disse Edge, e se lançou dentro do compartimento, sobre as malas, afastando-as para o lado até que ficou lugar para os dois. Jameson se reuniu com ele em um abrir e fechar de olhos e o ajudou a recolocar a bagagem diante deles. Apenas ficava lugar para sentar-se. Não podiam deitar-se, nem ficar de pé.
— Que cômodo Edge.
— Hum. Por sorte, estaremos inconscientes quase toda a viagem.
— Estaremos algo mais que inconscientes, se o condutor não se apressar e fechar a porta.
Além das malas, Edge viu a primeira claridade do alvorada.
O compartimento oscilou quando o condutor arrojou dentro as bolsas. Logo, finalmente, fechou a porta com força. Edge ouviu que fechava a tranca. Jameson suspirou, aliviado.
— Bem a tempo. Suponho que já estamos a salvo. Edge deu de ombros.
— A não ser que o ônibus tombe ou se incendeie, sim, suponho.
— Você é sempre tão otimista hem Edge?
— Sempre.
Amber olhou o céu com o cenho franzido, irritada porque tivessem passado quase toda a noite esperando ao ônibus em suas longas paradas.
— Teremos que parar logo. Vai amanhecer.
Rhiannon a olhou.
— Esquece de quem é esse carro, querida. Não precisa parar.
— Mas o sol...
Rhiannon deu de ombros.
— Venha para frente, pequena.
Amber franziu o cenho e passou ao assento dianteiro do acompanhante. Rhiannon pôs o controle de velocidade.
— Agarra o volante.
Amber se apoderou do volante e manteve o carro em linha reta enquanto Rhiannon passava para o assento detrás. Então Amber deslizou no assento do condutor. O carro oscilou um pouco e passou por um instante sobre a faixa branca, mas Amber o endireitou em seguida.
— Acredito que seria melhor parar — disse Angélica — Amber precisa descansar e comer algo.
— Perderíamos muito tempo — disse Rhiannon — E esse maldito ônibus com suas paradas, suas baldeações e seus desvios, já nos custou bastante tempo. Nunca entenderei por que as pessoas os usam. Além disso, aqui estamos a salvo. Fiz instalar certas... precauções.
— Não é isso o que me preocupa — respondeu Angélica, olhando para Amber.
— Eu estou bem, mamãe. Se quisesse descansar, o teria feito durante as paradas do ônibus. E comprei algo para beliscar em todas. Não quero me arriscar a perder a Brooke.
— Tem que começar a se cuidar, Amber. Não é só porque dirige até o esgotamento. É pelo bebê.
Amber fechou os olhos ao recordar de repente aquela situação absurda. Claro, a quem tentava enganar? Nunca se esquecia dela de todo.
Olhou para o assento de atrás, fazendo caso omisso das advertências de sua mãe.
— E onde estão essas medidas de segurança, tia Rhi?
— Tem certeza que está bem para dirigir? — perguntou Angélica antes que Rhiannon pudesse responder — A droga...
— Já se dissipou. Encontro-me melhor.
— Não gosto disso, Amber. Não quero que você enfrente a essa mulher sozinha.
— É só uma mortal — disse Amber.
— Stiles também era.
Amber franziu o cenho.
— Se papai estivesse morrendo e a cura estivesse nesse ônibus, ia querer parar?
Angélica levantou o olhar para o céu e finalmente moveu a cabeça de um lado a outro.
— Suponho que não.
— Então pensa na Serafina. E no Will. Will me salvou a vida, mamãe. E a sua também.
— E a mim — acrescentou Rhiannon — Não tem sentido discutir com ela, Angélica. Fará o que deseje enquanto dormimos — deu de ombros — Embora me custe reconhecer, neste caso tem razão.
— Está amanhecendo. Querem se colocar no porta-malas ou fazer o que tenham pensado antes que se convertam em fumaça?
Rhiannon apertou um botão do apoio de braços que Amber pensava ser um controle de abrir janelas. As janelas laterais tingidas não se moveram, mas dentro delas se ergueram uns painéis negros e opacos, fabricados de algum material acrílico. Rhiannon apertou outro botão e outra lâmina cobriu suavemente o vidro traseiro. Amber podia ver através delas, apesar de serem muito escuras. .
— Pode-se ver através delas, mas a luz não as atravessa. Além disso, são a prova de balas, de fogo e de pressão aérea — disse Rhiannon com orgulho.
— Muito próprio de você, ter um ataúde sobre rodas — disse Amber — E em um Mercedes.
— Então, você gosta — disse Rhiannon.
— Sempre e quando houver um biombo que separe os assentos da frente dos de trás.
— Certamente.
— Então sim, parece-me muito engenhoso. — Rhiannon franziu os lábios.
— Não vou esquecer suas péssimas maneiras mesmo que doure a pílula, Amber Lily.
Amber suspirou.
— Sinto muito, Rhiannon. Pode atribuir isso à droga, ao estresse, ao medo e ao fato de que estava ameaçando arrancar as vísceras do pai de meu... bebê — disse com esforço. Dizê-lo em voz alta era em certo modo como reconhecer sua existência.
— Eu faria o mesmo se alguém ameaçasse Roland — disse Rhiannon lentamente — Mas só porque o quero com loucura. Irracionalmente. Além da vida, a morte, a prudência e a demência. Mais que tudo no mundo. É isso o que você sente por esse tal Edge?
— Não seja ridícula — contestou Amber automaticamente. — Seria idiota se sentisse algo assim por um homem como ele.
Rhiannon deu de ombros, apertou outro botão e o biombo de separação entre os assentos começou a elevar-se.
— Bom, então não posso aceitar suas desculpas. Terá que se esforçar um pouco mais.
Amber deixou escapar um suspiro e se perguntou quanto tempo teria que puxar o saco de sua tia para que a perdoasse.
— Que durmam bem — disse quando a lâmina de cristal opaco estava a ponto de fechar totalmente.
— Tome cuidado, Amber — disse-lhe sua mãe, sonolenta.
— Terei.
O biombo de separação se fechou. O silêncio rodeou Amber. Notou que as duas mulheres que mais queria sumiam em uma profunda letargia, fora de seu alcance, e de repente se sentiu completamente sozinha. Os pensamentos que tinha estado mantendo afastados a assaltaram de improviso. Um bebê. Deus, um bebê... um menino que talvez não chegasse a viver.
Seus sonhos nunca se equivocavam. Nenhuma só vez.
Seus olhos se encheram de lágrimas enquanto dizia a si mesma que talvez, se não pensasse naquele menino como seu bebê, se imaginasse como uma massa de células destinado a viver nove breves meses para logo, morrer, seria capaz de suportá-lo. Não se podia perder o que nunca teve certo?
«Mas o tenho. Já o tenho. Está vivo e cresce dentro de mim. Um bebê. Meu bebê».
Apertou o botão da rádio. Uma melodia clássica se espalhou pelo carro, mas seguiu movendo o dial até que encontrou uma emissora em que estavam tocando soul. Subiu o volume e deixou que a voz áspera e sensual e a densa melodia do baixo afogassem seus sombrios pensamentos.
Quando a noite começou a sussurrar-lhe, tirando-o de sua impenetrável letargia diurna, Edge notou o peso de uma dúzia de malas sobre ele. O bico de uma mala tinha se cravado nas suas costelas, e um objeto pesado, que ricocheteava com cada buraco, golpeava continuamente sua cabeça.
Proferiu um grunhido e empurrou até que conseguiu afastar as malas e abrir um pequeno espaço.
— Deus — resmungou Jameson com a voz sufocada — Sinto-me como se me tivessem dado uma surra — algumas malas se moveram e seu rosto apareceu no buraco que tinham deixado — Isto é uma tortura.
— Para um velho pode ser mesmo.
Jameson franziu o cenho. Edge lhe sorriu e esteve a ponto de deixar escapar um gemido de surpresa ao ver que o outro também esboçava um sorriso.
— Muito engraçado.
— Faço o que posso.
— Bom, quando vamos sair?
Edge olhou seu relógio.
— Ainda resta uma hora. Mas não precisamos esperar.
— Não?
— Estamos perto.
— De Amber?
Edge assentiu com a cabeça. Jameson entreabriu os olhos.
— Como é que está tão conectado com minha filha, Edge?
Edge evitou seu olhar.
— Não sei se o estou. Afinal, não é sua voz a que se empenha em me gritar.
— E está seguro de que essa... essa voz está de nosso lado? Quero dizer que poderia ser um truque. Alguém que tenta nos colocar em uma armadilha.
— Já pensei nisso — Edge deu de ombros — Francamente, poderia ser isso. Não sei como interpretar isto. E você?
Jameson lhe lançou um olhar.
— Está pedindo minha opinião?
— Imagino que, sendo o pai de Alby, não será tão mal — suspirou. — Bom, o que pensa? Você ouviu alguma vez uma voz assim?
Jameson sacudiu a cabeça.
— Como a que você descreve, não. Mas... que tipo de sentimentos desperta em você essa voz? Uma reação visceral? Raiva, agitação, medo?
Edge sacudiu a cabeça.
— É, mais como... como uma chamada para entrar em batalha. Faz com que deseje entrar em batalha como uma espécie de herói mitológico — suspirou de novo.
— E isso o preocupa?
— Pois sim, muito. Eu não sou assim. Não estou acostumado a fazer essas coisas.
— Não é muito heróico, hem?
— Os heróis morrem jovens. E eu penso viver muito tempo.
Jameson assentiu com a cabeça.
— E, entretanto aqui está seguindo uma voz em que não confia totalmente e metido em uma aventura que poderia custar sua vida.
— Sim — Edge esboçou um sorriso sobressaltado, sacudindo a cabeça. — Imaginei.
— Por que o faz? — perguntou Jameson.
— Oxalá soubesse — afastou algumas malas mais e abriu caminho até a porta do compartimento.
— É porque prefere arriscar sua vida em lugar da dela? .
Edge respondeu descuidado:
— Certamente é porque essa voz me deixará louco com tanto chiado se não lhe fizer caso — aproximou-se da parte dianteira do compartimento, virou até sentar-se e apoiou os braços contra a porta. — O que acha de deixarmos a psicanálise e nos pormos em movimento?
— Quando quiser — disse Jameson.
Edge assentiu com a cabeça, empurrou com os pés e a porta do compartimento cedeu. Viu o asfalto passar a toda velocidade abaixo ele.
— Isto vai doer pra caramba — olhou para Jameson — Tem certeza que seus velhos ossos poderão suportar?
— Já basta de brincadeiras sobre a idade. Pode ser que fosse mais velho quando fui transformado, mas é provável que você seja um vampiro há mais tempo.
— Hum. Ou seja, que supero você em juventude mortal e poderes vampíricos.
— Não tenho intenção de negar isso. — Jameson se aproximou da porta do compartimento e se agarrou ao ombro de Edge. — Preparado?
— Se jogue para a grama do meio fio — disse Edge — Será mais macia que o asfalto.
Saltaram do ônibus ao mesmo tempo. Aterrissaram com força sobre a terra e rodaram pela faixa de grama que corria junto à estrada. Ricochetearam contra o chão até que pararam. Jameson se sentou lentamente e sacudiu o pó e os ramos da roupa enquanto fazia caretas de dor. Edge fez o mesmo enquanto se inspecionava, procurando cortes ou arranhões.
— Tem sangue em algum lugar? — perguntou Jameson. Edge negou com a cabeça.
— E você?
— Acredito que não — levantou-se e lhe estendeu uma mão. Edge vacilou, logo tomou-a e deixou que o puxasse para levantar-se.
— Obrigado.
Jameson fez um gesto de assentimento e logo deu a volta e pareceu concentrar-se. Ficou calado um momento e logo suspirou.
— Não posso senti-la — disse ao fim.
— Está se protegendo desde o começo.
Jameson lhe lançou um olhar.
— Tenta nos proteger, impedir que a sigamos e nos metamos em confusões.
Edge pensou que era mais provável que tivesse fechado sua mente para ocultar a seu pai um pouco de índole muito mais íntima, mas não disse nada.
— Se sua mãe estivesse aqui, a sentiria — disse Jameson.
Edge levantou as sobrancelhas.
— Embora esteja se protegendo?
— Às vezes, sim. Têm uma conexão muito poderosa. Não vi nada igual, nem sequer entre os nossos. Começou muito antes que Amber nascesse. Angélica podia comunicar-se com ela em seu ventre.
— É assombroso.
— Sempre me deu um pouco de inveja esse vínculo — Jameson suspirou. — Agora nos serviria maravilhosamente.
Edge deu de ombros.
— Sim, mas não nos faz falta — olhou ao longe e levantou uma mão — É por aí.
Quando o sol se pôs, Amber tinha estacionado o Mercedes de Rhiannon na ruela flanqueada de árvores que dava para as portas fortificadas de um castelo em miniatura. O edifício era construído em grandes blocos de pedra clara, levemente coberta de óxido, e tinha duas estruturas em forma de torre que flanqueavam a entrada. Um muro construído naquela mesma pedra, de uns três metros de altura, rodeava por inteiro o imóvel e tinha uma grade de ferro que fechava a entrada de carros.
No sinal que havia sobre a grade se lia «Ateneu», e havia esculturas de grandes mochos sobre os arremates de pedra, a cada lado da porta.
Amber esquadrinhou aquele lugar, mas só conseguiu ouvir o leve zumbido do biombo opaco ao baixar. Rhiannon se espreguiçou e bocejou. Angélica afastou o cabelo do rosto.
— O que não daria por uma ducha — resmungou.
— Amém, irmã — acrescentou Rhiannon.
Amber lançou-lhe um olhar e olhou logo para sua mãe.
— Sinto muito — apressou-se a dizer Rhiannon — Não pretendia rir de sua vocação anterior. Me escapou.
— Já sei.
Amber abriu a porta do carro e saiu. Colocou as mãos nos rins e se arqueou. Angélica também saiu e se deteve quando estava a ponto de inalar uma profunda baforada de ar ao ver o edifício que se elevava além da grade, no outro lado da rua.
— Que lugar é esse?
— Sim, o que nós perdemos Amber? nos atualize — disse Rhiannon ao sair do carro.
Amber tirou as chaves e as guardou no bolso,
— Bom, estamos no Canadá. Cruzamos a fronteira faz um momento. Não sei o que é esse lugar. Mas Brooke entrou aí. Tomou um táxi na estação de ônibus, que, por certo, deve ter custado uma fortuna, porque percorreu uns cem quilômetros. Eu a segui, é obvio.
— Viu-a? — perguntou — Rhiannon para Amber.
— Claro que não. Nem sequer me aproximei dela. E o carro está escondido entre esse arvoredo e o muro de pedra.
Rhiannon assentiu.
— Então, não têm nem ideia de que estamos aqui.
— Não — Amber olhou a sua mãe e franziu o cenho. Angélica estava olhando absorta aquele lugar — O que sente mamãe?
Angélica piscou e sacudiu um pouco a cabeça.
— Não sei — disse — Isto me parece... familiar.
— Esteve aqui antes? — perguntou Amber.
— Não, nunca. Mas tenho a sensação... — olhou de novo a casa e logo levantou as sobrancelhas — Acredito que é um convento — disse de repente. Rhiannon piscou, surpreendida.
— Ah, que alegria. Essa tal Brooke procurou refúgio em um convento de monjas?
— Acredito que não são monjas — disse Angélica — Mas percebo o mesmo tipo de energia.
Amber deslizou uma mão sobre o ombro de sua mãe.
— Que tipo de energia?
— É uma espécie de irmandade. Esse lugar está cheio de mulheres que compartilham um poderoso vínculo e uma devoção única para... algo.
— Para o que? — perguntou Rhiannon.
— Isso não posso dizer.
Amber engoliu saliva com esforço.
— Não sei por que, mas estaria mais tranquila se fosse o acampamento de um exército.
— Não me espanta — disse-lhe Rhiannon, e franziu o cenho — Bom, qual é o plano?
Amber olhou às duas.
— Alicia me chamou no celular quando amanheceu. — Tinha ido a Salem para reunir-se comigo e, quando lhe disse onde estávamos, insistiu em vir. Disse-me que tinha a sensação de que íamos precisar dela. Vem para cá. E quando chegar entramos.
— Amber, não sabemos que tipo de medidas de segurança haverá aí dentro — disse Rhiannon com cautela — E não podemos nos apresentar na porta. Se estão vinculadas ao Stiles ou a DIP, é possível que se dêem conta de que sua mãe e eu somos vampiros assim que nos vejam.
Angélica assentiu.
— Já vi muitas celas da DIP — disse — Não quero acabar em outra.
— E, além disso, essa tal Brooke a viu Amber — prosseguiu Rhiannon.
Amber mordeu o lábio enquanto olhava a grade e o muro.
— Então, Alicia tinha razão. Vamos precisar dela.
— A que distância está? — perguntou Angélica.
Amber olhou seu relógio.
— Está em seu Corvette e vinha diretamente para cá, assim demorará muito menos que nós. Um par de horas mais, se muito — apertou de repente sua garganta. Por que de repente a comovia tanto a ideia de ver Alicia? Só fazia um par de dias que não se viam. E, entretanto, parecia-lhe que fazia uma eternidade.
Sua mãe adivinhou o que estava pensando.
— Então, esperaremos a ela.
— Não acredita que é muito arriscado, mamãe? Não quero mandá-la para um ninho de víboras. .
Angélica também parecia preocupada.
— Não sei. E você, Rhiannon?
Rhiannon agitou uma mão no ar.
— Oh, por favor, o que vão fazer a nós um punhado de mulheres mortais? Às gordas eu fritarei como aperitivo e usarei às magras como palito de dentes quando acabar.
— Amber fez uma careta. Rhiannon sorriu mansamente — Lamento ofender sua sensibilidade de vegetariana, querida. O que quer que faça? Estou morta de fome.
— Eu também — disse Amber — Vi um restaurante a uns quilômetros daqui. vou chamar a Alicia e pedir que vá para lá. Havia uma clínica perto. Talvez ali encontrem algo de comer para vocês.
— Uma boa provisão de sangue ou um doutor bonito e jovem — disse Rhiannon com um brilho nos olhos. — Neste momento, qualquer uma das duas coisas me serve.
«É aqui. É aqui! Este é o lugar. Já chegou! Ela está aqui. Está aqui. Está aqui! Está...!»
— O que acha? — perguntou Jameson, olhando a mansão por entre os barrotes da grade.
Edge estava de cócoras e segurava a cabeça com as mãos para tentar silenciar a maldita voz, que estava ficando cada vez mais forte e poderosa.
— Acredito que está aqui. Em algum lugar — fechou os olhos com força. — Cale-se, maldita seja!
A voz se calou como por milagre.
Edge sentiu uma mão sobre seu ombro e ao levantar o olhar viu que Jameson o estava observando com expressão preocupada.
— Está piorando, não? — Edge deu de ombros. — Poderia notar a dor a vinte metros de distância — continuou — Já parou?
— Sim — Edge se levantou devagar enquanto massageava as têmporas. — É a primeira vez que me dá atenção.
— Sinto muito, Edge. Se soubesse que demônios é, como detê-lo...
— Não faria nada — disse Edge. — Nem eu tampouco. É nossa única pista.
Jameson apertou os lábios e deixou escapar um suspiro.
— Suponho que tem razão — olhou a seu redor. — Mas não vejo o carro de Rhiannon.
— Não. Mas, mesmo assim... — Edge olhou o muro de pedra. Jameson assentiu com a cabeça.
— Vamos?
— Entremos antes que comece a me estalar a cabeça outra vez.
Os dois vampiros saltaram facilmente o muro e puseram-se a andar pelo caminho que levava a porta principal, frente à qual se detiveram.
— Vai chamar? — perguntou Jameson.
Edge franziu os lábios, agarrou o trinco e o girou.
— Acho que não será necessário. A porta está aberta.
Olhou ao Jameson e ele assentiu. Edge abriu a porta e entraram. Edge olhou à direita e Jameson à esquerda. Logo os dois avançaram sigilosamente pelo amplo vestíbulo do castelo.
— Não sinto sua presença — disse Jameson.
— Eu tampouco — murmurou Edge. E deveria senti-la, pensou. Se estivesse perto dela, deveria estar estremecendo dos pés à cabeça, como lhe acontecia sempre. Deus, quanto sentia sua falta, e só fazia umas horas que não se viam. O que estava lhe acontecendo?
De repente, sentiu que ali estava acontecendo algo mau. E um instante depois captou outra energia, mas não era a de Amber. Eram pessoas, mulheres, muitas, todas escondidas a seu redor, observando-o, à espreita.
Um calafrio lhe correu pelas costas. Olhou para Jameson e notou que ele sentia o mesmo. Os dois se viraram bruscamente para retornar para a porta.
Mas não a alcançaram.
De repente, dúzias de mulheres surgiram de todas as partes e uma chuva de golpes caiu sobre eles. Edge caiu ao chão como uma fibra de erva arrastada pela tormenta. A última coisa que ouviu foi aquela voz em sua cabeça, rindo-se a gargalhadas.
Alicia chegou ao pequeno restaurante aberto toda a noite vinte minutos antes do previsto. Amber viu estacionar seu Corvette vermelho cereja da janela que havia junto a seu tamborete e teve que refrear-se para não pôr-se a correr para ela.
Mesmo assim, levantou-se do assento quando Alicia abriu a porta de cristal. Sua amiga a viu, sorriu amplamente e correu a abraçá-la.
Quando se separaram, o sorriso de Alicia tinha desaparecido, substituída por um olhar inquisitivo.
— Está bem, diga. O que é o que acontece?
— O que a faz pensar que acontece algo? — perguntou Amber enquanto se sentava em seu assento, evitando seu olhar.
— Abraçou-me com tanta força que podia ter me quebrado uma costela, e está tremendo. Além disso, tem os olhos dilatados. E não me olha — franziu o cenho e olhou a seu redor. — Onde estão Angélica e a tia Rhi?
— Foram procurar algo para comer.
Alicia levantou as sobrancelhas.
— Alguém da cidade tocou seus narizes? — Não, é que passamos por uma clínica a uns vinte quilômetros daqui. E precisam estar fortes.
— Está bem. Por que está tão angustiada?
— Além do fato de alguém a quem amo estar morrendo?
— Sim — disse Alicia, imitando com precisão o tom triste, mas sarcástico de sua amiga. — Além disso.
Amber levantou a cabeça e a olhou nos olhos.
— É uma longa história, Alicia.
— Então, fala depressa.
Amber assentiu com a cabeça.
— Tem a ver com esse sonho.
— O sonho recorrente? Esse em que o vampiro mais sexy que nunca viu dá a você algo que a assusta? — Amber abriu a boca para objetar, mas Alicia levantou uma mão. — Ouça, foi assim que você descreveu.
Amber deixou escapar um suspiro e baixou a cabeça,
— A verdade é que é uma descrição bastante precisa. Esse cara é real.
Os olhos da Alicia aumentaram.
— Conheceu-o?
— Levei-o a Salem no meu carro.
— Deus bendito. Então, é Edge? — Amber franziu o cenho. — Will e Serafina me falaram dele. E bem? O que aconteceu? Deu algo a você?
— Poderia dizer que sim, sim.
Alicia inclinou a cabeça e a observou atentamente. Amber a olhou nos olhos, mas não disse nada. Logo Alicia tampou a boca com a mão e murmurou:
— Deitou-se com ele.
— Sim — disse Amber. — E agora estou grávida. Alicia franziu o cenho.
— Está assustada, nada mais. Isso não pode ser. Sabe perfeitamente que os vampiros não...
— Este sim pode.
— Mas... tem certeza?
— Fiz o teste quando estava com o Stiles, mas pensava que talvez tentava me enganar por alguma razão. Mas não era assim. Minha mãe soube assim que me viu. Não precisava do teste. É verdade, Alicia, e estou assustada.
— Edge sabe?
— Não, e não estou certa de querer que ele saiba. Isto é meu assunto. Não preciso que se misture.
— Bom, eu acredito que não tem jeito — Amber fez uma careta. Alicia sorriu com certa malícia. — Meu deus, vou ser tia.
Amber sacudiu a cabeça lentamente e estendeu a mão sobre a mesa.
— Voltei a ter o sonho, Alicia. Desta vez, vi o que Edge me dava.
— E era um bebê?
Amber assentiu com a cabeça. de repente, sem prévio aviso, lhe saltaram as lágrimas.
— Sim, mas... estava... estava...
— O que, querida? Como estava? — Alicia se levantou de seu assento e se sentou junto de Amber.
— Não se movia, nem respirava.
— Não — murmurou Alicia.
— Acredito que vai nascer morto, Alicia. Acredito que lhe acontece algo terrível e que não pode sobreviver.
Alicia a rodeou com seus braços e a apertou com força enquanto lhe acariciava o cabelo.
— Não — disse de novo. — Está aflita e tem medo. Não sabe o que fazer.
— As visões de meus sonhos sempre se cumprem, Alicia. Você sabe.
— Sim; bem, mas também sei que os vampiros varões são estéreis. Ao que parece, é certo que há uma primeira vez para tudo, Amber. Uma primeira vez para que um vampiro seja fértil e uma primeira vez para que a Menina Prometida interprete mal um sonho premonitório. Não é tão difícil — recostou-se um pouco e pôs o cabelo suavemente detrás da orelha. — E a conheço. Está com medo se acreditar que tudo sairá bem. Acha que está se protegendo para não sofrer uma desilusão. Pretende ser forte, prática e dura, como sempre. Está com medo de amar a um homem até o ponto de não poder viver sem ele. Mais medo ainda tem de sentir carinho por seu bebê.
Amber umedeceu os lábios.
— Suponho que tem razão.
— Anjo, está grávida. E agora mesmo seu bebê está bem, não?
— Acredito que sim. Minha mãe... parece pensar que sim.
Alicia assentiu lentamente.
— Quer minha opinião?
— Preciso dela, Alicia. Quando me inteirei, quase não pude me controlar. Agora mesmo não sei o que fazer.
Alicia assentiu com à cabeça.
— Para ser um gênio, às vezes é uma autêntica idiota, sabia? — exalou um suspiro. — Olhe, se o bebê não sobreviver, ficará mal. Não importará nada que não tenha querido bater palmas, nem tentar ser prática ou realista. Ficará despedaçada. Você sabe e eu também.
Amber se recostou na cadeira e fechou os olhos.
— Até agora não foi de grande ajuda.
— Não, mas ao menos sou sincera. Tanto faz acreditar ou não acreditar. Vai doer do mesmo jeito.
— Mesmo assim, não estou muito alegre.
Alicia passou uma mão por seu cabelo.
— O que quero dizer é que não vai servir de nada a você negar a existência desse bebê. Não vai fazer nenhum bem negar-se a amá-lo, ou sentir-se feliz, ou iludir-se. Se o perde, de qualquer modo ficará despedaçada. Assim de que merda serve? Alegre-se, alegre-se. Iluda-se e pense em nomes e cante para ele canções de ninar e compre roupas. Procure ser feliz. Não vai servir de nada chorar com nove meses de antecipação. Haverá tempo para isso logo. Possivelmente. Porque pode ser que não haja nada pelo que chorar. Enfrente a isso quando chegar a hora.
Amber abriu os olhos e olhou maravilhada a seu amiga.
— Como é que é tão esperta?
Alicia deu de ombros.
— Tenho amigos muito espertos — disse, e pôs uma mão sobre o ventre de Amber. — Oh, vá. Juraria que já está engordando. Pergunto-me se será menino ou menina.
Olhou-a aos olhos e sorriu com tanta vontade que Amber não pôde reprimir um sorriso. E não era um sorriso falso. Era fruto da alegria que esteve contendo por medo.
— O que faria eu sem você, Alicia?
— Não sei. Mas estou certa que não se divertiria — piscou de repente e seus olhos se dilataram. — Seu pai sabe?
— Não. Se soubesse, Edge já estaria morto.
— Oh, vá. Isso vai ser um problema.
— Nem me diga — Amber viu estacionar o Mercedes de Rhiannon. — Aí vêm mamãe e Rhiannon. — Oh, Deus, Rhiannon sabe?
— Sim. Ameaçou comer o fígado de Edge e lhe disse que teria que passar por cima de meu cadáver — Amber umedeceu os lábios. — Feri seus sentimentos. Ainda está zangada comigo.
— Logo passará.
— Alicia nem mamãe nem Rhiannon sabem do sonho. Não o diga.
— De acordo. Procurarei não pensar nisso.
— Obrigado.
— Então, o que acontece com a cura do Will?
Rhiannon tocou a buzina uma vez. Amber se levantou, pegou sua vitamina de chocolate e se dirigiu à porta.
— Explicarei a você pelo caminho. Vamos.
Vozes, sussurros. Olhos e olhares. Mulheres, todas elas, rodeando-o. Edge levantou a cabeça e ao fazê-lo sentiu uma pontada de dor. levou uma mão ao lugar que mais lhe doía e piscou, tentando enfocar sua visão.
Estava no centro de uma sala de paredes de cimento, muito grande. No chão estava desenhada uma faixa branca, como o limite de uma quadra de esportes de basquete, que delimitava a seu redor um quadrilátero de uns dez metros quadrados.
— Que merda...? — tentou levantar-se.
— Não transpasse a linha ou será destruído — disse uma voz de mulher.
Edge franziu o cenho e fixou o olhar na escuridão, mas o potente foco que iluminava sua pequena prisão quadrada o impedia de concentrar-se na escuridão que havia mais à frente.
Fez sombra com a mão, baixou o olhar e viu o Jameson estendido no chão, a seus pés. Sentiu de repente uma pontada de medo e, ficando de joelhos, deitou Jameson de costas e começou a lhe dar palmadas nas bochechas.
— O que usaram? Um dos tranquilizadores do Stiles? — perguntou com recriminação.
— Não precisamos — disse uma mulher. — Os golpes repetidos na cabeça incapacitam a um vampiro com a mesma eficácia, embora por um período de tempo mais curto e com menos efeitos secundários.
— Oh, isso é muita consideração de sua parte. Moemos a pauladas em lugar de utilizar um método relativamente indolor. Provavelmente deveria lhes agradecer.
— De nada.
Aquela mulher, fosse quem fosse não parecia ter muito senso de humor.
— Bom, e que lugar é esse? E o que acontecerá exatamente se transpassar a linha branca? Além de deixá-las secas, quero dizer.
— Sarah... — disse a mulher.
Outra mulher se adiantou e se aproximou do foco de luz, junto à linha de demarcação branca. Era alta e esbelta e ia vestida com uma blusa de lã e uma saia. Tinha o cabelo recolhido e uns óculos de arame sobre o nariz. Tinha um aspecto muito formal e segurava na mão o cabo de uma escova.
— Observe — disse-lhe.
Aproximou o extremo do cabo à linha branca e, em uma fração de segundo, do teto e do chão surgiram labaredas que se encontraram no meio. Quando a mulher afastou o cabo, estava ardendo. Baixou-o e o afundou em um balde cheio de água. A fumaça começou a levantar-se em ondas, empesteando tudo.
Edge ainda estava resmungando maldições quando aquela mulher chamada Sarah lhe explicou:
— As boquilhas do lança-chamas percorrem toda a linha de demarcação, tanto no teto como no chão. Qualquer movimento as dispara, e aparecem tão rápido que nem sequer um vampiro poderia esquivar-se — ele levantou as sobrancelhas.
— Sim, sabemos o que são — disse a outra mulher. Edge engoliu saliva.
— Então, suponho que você é a chefa desta... Academia de Garotas Más, não?
— Estou no comando, sim.
— E tem nomes?
— Não precisa saber.
— Vai dizer-me o que vão fazer conosco? por que nos deteem?
Ela sacudiu a cabeça.
— Detemos vocês porque ainda não sabemos que espécie de ameaça representam para nós. Quanto ao que vamos fazer com vocês... lhes diremos assim que tenhamos decidido.
Aquela mulher permanecia longe da luz. Edge estava furioso por não poder ver-lhe o rosto.
— Não lhes faremos mal. Estarão bem, sempre e quando não tentarem escapar.
— Temo que tenho assuntos urgentes dos quais me ocupar, chefa.
— Sim, E eu gostaria de saber quais são esses assuntos tão urgentes — replicou ela. — por que vieram aqui? O que estão procurando?
Ele franziu o cenho e tentou introduzir-se em sua mente, mas descobriu que ela tentava proteger seus pensamentos, embora não o fizesse muito bem. Não descobriu em seus pensamentos rastro algum de Amber, nem das outras vampiresas. Não sabia nada dela. E ele não pensava contar-lhe.
E então, justo então, Edge tomou consciência do formigamento que acendia seu sangue e daquela tensão em seu sexo. Alby estava ali. Estava perto. Acabava de chegar.
— Vim por curiosidade — disse — Ouvi que aqui vivia um grupo de mulheres formosas e, como sou muito fogoso, me ocorreu dar uma olhada.
— Ou talvez pensasse dar-se um banquete a nossa custa esta noite — disse ela. — Ou pode ser que tenha ouvido outras coisas sobre este lugar.
— Isso significa que há outras coisas que ouvir. Agitou minha curiosidade, chefa.
— Melina, há alguém na porta — disse outra mulher.
— De maneira que é Melina? Bonito nome.
— Está perdendo seu tempo — disse ela — Todo mundo a seus postos, com exceção das que estejam de guarda. Guardas, não falem com eles. Mantenham suas mentes fechadas. E se causarem algum problema, me avisem.
— Sim, senhora — responderam várias vozes em uníssono.
— Céu santo — gemeu Jameson ao abrir os olhos — Que demônios está acontecendo? Onde estamos?
As mulheres começaram a sair em fila da sala. Edge não podia vê-las, mas ouvia seus passos e sentia enquanto se afastavam.
— Acredito que aterrissamos em uma espécie de acampamento para dominatrizes — disse Edge — Poderia ser divertido, não acredita?
— Deixa de se mover. Vão vê-la — sussurrou-lhe Rhiannon.
Estavam as três agachadas entre os arbustos, frente à formosa e ondulante pradaria de grama da mansão, do outro lado do muro.
— Não a vejo!
Amber tentou de novo aparecer por cima dos matagais e ver a rua, além da grade que se abriu lentamente para deixar passar Alicia depois que falasse com alguém através de um interfone. Alicia se achava frente à grade aberta, explicando a história que tinha ensaiado à mulher que estava do outro lado do interfone. A grade se fechou finalmente atrás dela com força, e Amber sentiu acelerar seu coração.
— Avise se necessitar de ajuda — disse Angélica. — Telepaticamente, é quase tão capaz como você.
Amber pensou que sua mãe exagerava. Mas Angélica tinha em parte razão. Alicia podia lançar telepaticamente um grito de ajuda se fosse necessário. Amber aguçou o ouvido para ouvir a conversa, mas não conseguiu ouvir nada daquela distância. Sabia, entretanto, o que estava dizendo Alicia. Que seu carro se avariou a algo mais de um quilômetro dali. Que ia fugindo de um noivo que a maltratava e que temia que não estivesse muito longe. Aquelas mulheres a deixariam usar o telefone para que chamasse o seguro. E a grua demoraria várias horas para chegar, assim deixariam que ficasse ali, a salvo dentro dos muros de pedra, até que chegasse.
Possivelmente.
De onde se achava agachada, Amber viu que uma mulher saía à soleira, olhava a seu redor, além de Alicia e por fim assentia com a cabeça e, apoiando a mão no braço de Alicia, levava-a para dentro. A porta se fechou. Amber se deixou cair no chão.
— Bom, está lá — disse — entrou.
Angélica assentiu com a cabeça.
— Não lhe acontecerá nada, Amber. É muito esperta.
— A mortal mais esperta que conheço — acrescentou Rhiannon.
Amber assentiu com a cabeça. Não queria que a preocupação por sua amiga nublasse seu cérebro, mas até quase agradecia a distração. Desde que tinham chegado ali, depois de sair do restaurante, tinha uma estranha sensação, como se de seus centros nervosos irradiassem pequenas faíscas. Sentia a presença de Edge, aquela sensação imediata que se apoderava dela cada vez que estava perto dele. Uma sensação de sentir-se inexoravelmente arrastada para ele. Mas aquela sensação só durava um instante e logo desaparecia. Entretanto, a fazia pensar nele.
Tentou concentrar-se e se recordou que Edge estava muito longe dali, levando ao Stiles para o laboratório do Eric, junto com Donovan, Dante e...
— Papai — murmurou, franzindo o cenho.
Sua mãe a segurou pelo ombro.
— Então, você também o sente? — perguntou. Rhiannon a olhou, espantada.
— Sentir o que?
Amber sacudiu a cabeça.
— Acabo de ter a estranha sensação de que meu pai está perto. E Edge...
— Já se desvaneceu — disse Angélica. — Mas, por um instante, eu também senti a seu pai. Como se estivesse de pé atrás de nós — fechou os olhos um momento e logo sacudiu a cabeça e voltou a abri-los — Já se foi, seja o que for.
— Certamente terão chamado a Salem para saber como estamos — disse Amber — Terão descoberto que nos desviamos e estarão preocupados. Pode ser que seja a preocupação deles o que sentimos.
— Sua atenção e sua concentração, em vez de sua presença? — perguntou Rhiannon. Logo deu de ombros. — Pode ser, mas acredito que saberiam distinguir uma coisa de outra.
— Foi muito fugaz — Angélica franziu o cenho — e como se estivesse... amortecida.
— Diluída, mas bem — disse Amber.
Rhiannon deixou escapar um suspiro.
— Não deixem que isso as distraia. Temos que nos concentrar. Não sabemos quando poderá Alicia escapar para... — deteve-se de repente, arqueou uma sobrancelha e olhou para a casa.
Amber e sua mãe seguiram seu olhar e viram que a luz da porta apagava, reacendia, apagava-se e acendia de novo.
— Três — disse Rhiannon — Ela não perde o tempo.
— Quanto antes, melhor, no que me diz respeito — disse Amber. — Odeio que esteja lá dentro sozinha. Vamos.
Foram passando as mãos sobre o muro de pedra até que encontraram o lugar que parecia menos visível do interior. Amber se agachou, deu um salto, agarrou-se na beira da parede com as mãos e se impulsionou para cima, movendo as pernas para os lados como uma ginasta sobre o cavalo. Flexionou as pernas para que seus joelhos absorvessem o impacto da queda e logo ficou ali escondida, com as mãos sobre a erva fresca, enquanto levantava o olhar, abrindo seus sentidos.
Sua mãe e sua tia aterrissaram a seu lado.
— Neste lugar há meia dúzia de portas — murmurou Rhiannon — Por qual vamos?
Amber esquadrinhou a escuridão, procurando algum sinal. Então...
— Ali — disse, apontando uma espécie de anexo de vidro. — Esse solário ou estufa, ou o que seja, junto à parte de atrás da casa. Veem a porta? — esperou a que as outras vissem os óculos rosa de Alicia pendurados de sua corrente de contas no trinco da porta.
— Vamos — disse Amber.
Puseram-se a correr as três, encurvadas, movendo-se às pressas e em silêncio. A estrutura de cristal era inclinada. Seu teto e suas paredes eram completamente de painéis de cristal presos por um marco de metal verde. A porta era também de cristal. Amber se sentiu completamente exposta ao abri-la. Enfocou seus sentidos além da porta e segurou os óculos de sol da Alicia antes de entrar.
A primeira coisa que a surpreendeu foi a umidade. Fazia ali um mormaço. E, no entanto, o cristal estava só embaciado, Por toda parte havia plantas exóticas, trepadeiras que penduravam do alto, árvores e samambaias. Aqui e lá, viu mesas de vime, cadeiras e bancos. Uma fonte borbulhava no centro e, em um canto uma banheira redonda de pedra desprendia vapor. Alicia se achava dentro dela, vestida com um traje de banho emprestado. Junto a ela havia um copo embaciado.
— Trabalha duro, não é, Alicia?
Ela levantou a cabeça e abriu muito os olhos. Olhou a seu redor e, ao vê-las, lançou um rápido olhar às portas duplas que havia do outro lado; portas que deviam levar a parte principal da casa.
— Psiu! Fechem a porta.
— Já a fechamos — disse Amber, e lançou-lhe os óculos — Bem pensado.
— O que esperava? — Alicia pegou os óculos no voo e colocou sua corrente ao redor do pescoço. As outras se aproximaram sem afastar o olhar da porta. — Ainda não sei que espécie de comunidade é essa, mas parecem muito simpáticas.
— Terá que reconhecer que são hospitaleiras Rhiannon colocou uma mão na água – Colocaram você na banheira mal acabou de chegar.
— Deu-me a sensação de que revistaram minha roupa e minha bolsa quando estava distraída. Não imaginam que sou eu quem tenta distraí-las.
— Há algo que possa delatar você? — perguntou Amber, alarmada.
— E que importa isso? Já estão aqui dentro — levantou-se da água, agarrou um penhoar que havia ali perto e o pôs — além dessa porta há um corredor. As cozinhas estão à direita e a despensa à esquerda. Depois há bibliotecas, contei três, e escritórios na parte leste da casa. No lado oeste há um refeitório, uma sala de estar e outra sala. O vestíbulo ocupa toda a parte dianteira. Ali é onde estão as escadas do segundo piso, mas me pareceu ver outras que saíam da despensa, junto a outras que desciam.
— Não está mau — disse Rhiannon.
— O que acredita que estive fazendo, me encharcando em uma banheira quente bebendo ponche de frutas todo este tempo?
— Eu vou descer — disse Amber — Mamãe, você revista este piso e os escritórios. Rhiannon, você sobe e verifica os quartos. E vê se pode averiguar que espécie de lugar é este e o que tramam essas mulheres. Mas recorda que o principal objetivo é o soro. Certamente estará em ampolas ou seringas de injeção, e quase com toda segurança em uma geladeira. Se estiver etiquetado, estará escrito algo assim como Ambrósia-6 — Rhiannon levantou as sobrancelhas, surpresa — Assim foi como o chamou Stiles.
— Que engenhoso.
— E eu? — perguntou Alicia. — Eu o que faço?
— Você tem que seguir representando seu papel. Para que não suspeitem enquanto revistamos o lugar.
Ela suspirou, mas ao fim concordou.
— Está bem. Se insistem — tirou a bata e voltou a meter-se na banheira. Mas não esqueçam de voltar por aqui quando forem, ou pode ser que decida ficar — piscou os olhos para Amber, mas por alguma razão esta sentiu um calafrio.
Ouviram passos que se aproximavam e Amber, Angélica e Rhiannon se esconderam atrás de um arbusto. A porta se abriu e entrou uma mulher. Ia vestida com um traje longo de seda verde e sapatos baixos. Tinha o cabelo curto, loiro e muito bem penteado. Exalava classe e uma espécie de elegância natural quando se aproximou da banheira e se deixou cair em uma cadeira de vime.
— Como está? Está mais tranquila? Alicia assentiu com a cabeça.
— Este lugar transborda calma, Melina. Não sei como agradecer-lhe — disse — Telefonaram do guincho?
— Não, ainda não. Mas pode ficar até que telefonem. Disseram que demorariam um par de horas, não?
Alicia assentiu.
— Mas estou abusando de sua hospitalidade — se levantou, pegou o penhoar e o pôs de novo.
— Não nos incomoda absolutamente.
— Bom, e o que é este lugar exatamente? — perguntou Alicia — Suponho que não é um balneário, porque só há uma banheira.
A mulher chamada Melina sorriu.
— É... nossa casa.
— Quantas são? — Alicia tinha posto umas pantufas de toalha rosa, como o penhoar.
— Doze por agora.
— Todas mulheres?
— Mmm... mmm — Melina rodeou a Alicia com o braço e a conduziu para as portas.
— E como é isso? Reuniram-se e compraram este lugar? Não o entendo. São uma espécie de comunidade?
— Somos mais uma irmandade. Nós... compartilhamos os mesmos interesses.
— Que espécie de interesses?
A mulher sorriu suavemente enquanto saíam ao corredor.
— Mary fez seu famoso bolo de queijo para nosso café da noite na sala de estar. Tem que provar um pouco.
— Bolo de queijo? Querida, não é necessário que insista para me convencer disso.
As duas riram suavemente enquanto entravam na casa.
Amber saiu dentre a folhagem.
— Eu não gosto disto.
— Está claro que não pensa dizer a Alicia o que é este lugar — disse Angélica.
— Não pude lê-la — disse Amber — Parece que está bloqueando seus pensamentos. Os mortais comuns não o fazem.
Rhiannon levantou as sobrancelhas.
— Aqui acontece algo mais preocupante que isso — disse em voz baixa. — Tenho a sensação de que há mais vampiros nesta casa.
Amber apertou a mão de sua mãe antes de soltar e virar para a direita. Rhiannon ia a seu lado. Angélica seguiu avançando em linha reta, para os escritórios e as salas de estar do piso baixo. Amber e Rhiannon entraram em uma espaçosa sala rodeada de estantes e armários, completamente lotada. Uma das paredes tinha duas portas, uma a cada lado, como duas sentinelas. Amber empurrou mentalmente as portas e se abriram devagar, em silêncio, deixando ver dois lances de escadas estreitas. Uma subia; a outra descia.
Amber inclinou a cabeça olhando para Rhiannon e começou a descer pelas escadas que levavam a porão, enquanto Rhiannon pegava o lance que levava ao segundo piso. As escadas do sótão eram toscas e velhas e pareciam muito descuidadas. Aquilo não encaixava, pensou enquanto ia descendo passo a passo. A casa podia ser antiga, mas seus proprietários a mantinham como nova. Aquilo, por outro lado, era diferente.
Parecia quase... deliberado.
Chegou ao final da escada e se achou em um porão com o chão de terra e paredes de pedra.
— Que estranho — resmungou e continuou entrando no porão, examinando tudo, do triturador de lixos à caldeira, que pareciam recém estreados. Então sentiu algo que a fez parar em seco.
Franziu o cenho e mediu a atmosfera. — Edge?
«Alby!»
Deus, ele estava ali. Ali embaixo, em alguma parte. Sua voz soava amortecida, mas não muito longínqua. «Edge, o que está fazendo aqui?», perguntou mentalmente, e seguiu movendo-se pelo porão em busca de um lugar onde o sinal fosse mais intenso, como se movesse a antena de uma rádio.
«Vim te buscar».
«Sem o Stiles? Pensava que só se importava ele».
«Está ciumenta, hem?»
Levantou o dedo indicador, confiando em que ele o notasse. Quando sentiu sua risada compreendeu que a tinha entendido.
«Então, segue louca por mim, embora a salvasse do Stiles?»
«Meu herói», pensou ela com sarcasmo.
«A verdade gatinha, é que não suportava pensar que estava bancando a princesa guerreira em seu estado». Amber ficou imóvel. Ele sabia?
«O que? Não responde a isso?»
O sinal era mais forte junto à parede do fundo.
Amber se aproximou dela e começou a apalpar as pedras. «Ia... ia contar a você.
Notou uma fissura. Não uma greta natural da pedra, mas uma juntura apenas perceptível que, embora irregular, formava um limite curvado em forma de porta. Suas bordas seguiam as saliências da pedra, camuflando-se perfeitamente na parede.
«Não se desculpe. Afinal de contas, não é meu assunto».
Ela piscou.
«Que merda significa isso?»
«Bom, reconheço que a princípio estava louco de ciúmes. Agora me dou conta de que era uma estupidez. Pensava que eu tinha sido o primeiro, sabe? Acreditei em você nisso».
— Será filho de... — Amber levantou o joelho até a altura do queixo e lançou um pontapé à porta. Esta se quebrou para dentro, de cima abaixo, e Amber entrou na espaçosa sala. Viu Edge sentado no meio do chão, e a seu pai a seu lado, muito perto, alheio à conservação que Edge e ela estavam mantendo telepaticamente. Os dois se levantaram de um salto ao vê-la entrar.
— Amber, cuidado! — gritou seu pai.
As duas mulheres postadas em ambos os lados da porta se lançaram sobre ela e a agarraram pelos braços, tentando jogá-la ao chão. Amber fez girar os olhos, soltou-se delas, levantou os punhos, jogou-os para trás e as golpeou no rosto. As mulheres desabaram e Amber se aproximou da estranha linha branca desenhada no chão, ao redor do Edge e de seu pai. Edge estendeu os braços, lhe indicando que se detivesse.
— Para!
— Não se aproxime Amber! — disse seu pai ao mesmo tempo.
Ela franziu o cenho e olhou o chão. As ponteiras de seus sapatos estavam na beira da linha branca. Ela fez girar os olhos e sacudiu a cabeça.
— Mas se não há nada — estendeu uma mão como se esperasse tocar um escudo invisível.
Edge a empurrou pelo peito, lançando-a para trás. Ela bateu contra a parede e caiu ao chão, e então viu as chamas que se fechavam sobre o braço de Edge décima abaixo, como fauces. Edge deixou escapar um gemido e retirou o braço. A manga de sua camisa estava em chamas. Jameson tirou a jaqueta e envolveu o braço de Edge, sufocando as chamas.
— Oh, Meu deus, Edge, que merda...? — perguntou Amber.
Ele se deixou cair ao chão e, afastando a jaqueta, colou o braço ao peito. A manga tinha desaparecido. Só ficavam alguns pedaços de tecido enegrecido. A pele de Edge se tornou negra e estava solta.
— Não queria que se queimasse — disse com voz rouca com a mandíbula apertada. A dor fazia tremer-lhe todo o corpo — Não seria bom para o pequenino.
— O pequenino? — perguntou Jameson, que estava de joelhos a seu lado, e olhou para Edge e logo virou a cabeça para ela — Que demônios significa isso?
— Este não é o momento — apressou-se a dizer ela . — Temos que encontrar um modo de apagar esses malditos lança-chamas para que possamos sair daqui.
Amber ficou de pé e se aproximou de novo da raia branca. Ajoelhou-se a seu lado e viu as boquilhas de aspecto inofensivo no chão. Ao levantar o olhar, viu que também as havia no teto, camufladas com fita isolante branca. Entre cada uma das boquilhas havia uns quinze centímetros de separação.
Umedecendo os lábios, disse:
— Tenho uma ideia.
— Amber Lily... — murmurou Jameson. — Está...? Está... ?
Edge fez uma careta de dor e mordeu o lábio.
— Sinto muito, querida. Perdi a cabeça por um momento — deixou escapar um gemido involuntário e caiu no chão.
Amber ignorou a ambos, embora a dor de Edge fosse como um atiçador vermelho vivo que tivesse aparecido no peito; colocou as mãos nos bolsos e tirou um chiclete.
— Amber...
— Sim, papai. É certo. Ao que parece, estou grávida. Mas tenho vinte e três anos. Assim não é uma catástrofe — colocou o chiclete na boca e começou a mastigar.
— M... mas... quem...?
Amber olhou para Edge, que parecia estar inconsciente.
Ela esperava que não estivesse morto. A dor era muito aguda, podia matar aos de sua espécie, conforme dizia a tradição. Claro, que a tradição não estava resultando uma fonte muito confiável.
Seu pai seguiu seu olhar e seus olhos se aumentaram.
— Mas...
— Sei. supõe-se que é impossível — tirou o chiclete da boca e o partiu pela metade — Mas é possível, porque ocorreu. Não posso explicar. Só confio em que me conheça o bastante bem para saber que não mentiria em uma coisa assim.
— Céus, Amber, não pensará que vou duvidar de sua palavra?
— Então está na frente de nosso amigo.
Seu pai pareceu tão assombrado como se o tivesse golpeado entre os olhos com um malho. Olhou de novo para Edge e de repente pareceu que tinha vontade de matá-lo.
— Deveria ter deixado que o safado se queimasse.
— Fala como a tia Rhiannon — ela deu de ombros. — A verdade é que ainda não disse que é dele. Acredito que pensa o lógico. Embora eu achasse que não seria assim.
— Amber... — começou a dizer seu pai com voz terna.
Ela levantou uma mão para que guardasse silêncio e olhou fixamente o chão. Escolheu um lugar a meio caminho entre duas boquilhas e disse:
— Penso que os sensores estão dentro das boquilhas, porque não vejo outro lugar onde possam estar. Vou atirar esta parte de chiclete entre as boquilhas, a ver se disparam as chamas. Não tente agarrá-lo, papai. Espera um momento.
Ele assentiu. Amber atirou o chiclete, que voou limpamente entre duas boquilhas e caiu ao chão, dentro do quadrado delimitado pela raia branca. Jameson o recolheu.
— Como uma vez disse minha garotinha sobre a dieta líquida de seus pais: Hei que legal.
Ela sorriu.
— Sempre serei sua garotinha.
— Está bem, amorzinho?
Jameson estava emocionado. E aquilo não era bom sinal. Nesse momento, a ternura de seu pai podia lhe causar um ataque de choro. Já começava a sentir tensa a garganta por apenas olhá-lo nos olhos. Assim, em lugar de responder, assentiu com a cabeça e conseguiu engolir as lágrimas.
— Este é o plano. Vou colar meu chiclete à boquilha do chão. Você tem que saltar e colar o seu na do teto. Temos que fazê-lo ao mesmo tempo, porque se não um dos dois vai queimá-lo. Por sorte, nós dois somos rápidos. Dou a você um segundo para que o faça.
— Meio segundo — disse ele.
Ela assentiu.
— No três. Preparado? — seu pai flexionou os joelhos — um, dois, três!
Jameson saltou e, assim que seus pés abandonaram o chão, Amber pregou seu pedaço de chiclete à boquilha do fornecedor de gás e afastou a mão. Logo Jameson estava de novo no chão, dentro do quadrilátero.
As chamas não dispararam.
— Funcionou — disse Jameson. Amber movimentou-se para aproximar-se, mas ele levantou uma mão — Deixe-me comprovar primeiro — recolheu a jaqueta que tinha utilizado para apagar as chamas e a jogou para os fornecedores. Não aconteceu nada. Jameson assentiu — Fique aí, Amber. Eu a tiro.
Amber se forçou a obedecer. ficou quieta enquanto seu pai levantava o Edge e se virava para a linha de demarcação. De repente sacudiu a cabeça e deu involuntariamente uns passos para a raia.
— Não, papai. Não há espaço para que passem os dois. Só há meio metro, mais ou menos — ficou de joelhos e lhe indicou o buraco separando as mãos.
Jameson suspirou e depositou ao Edge no chão.
— Segura-o pelas mãos — disse. — Eu o mantenho reto e você puxa — levantou os braços de Edge e os estendeu no chão, por cima de sua cabeça.
Amber o segurou pelo braço direito, mas ao tentar agarrar o da esquerda se sobressaltou.
— Tenho que puxar um só braço, papai. O outro está muito machucado.
Jameson assentiu.
— Se acordar, será ruim.
— Não despertará — Amber começou a puxar lentamente, arrastando ao Edge através do buraco. Ele se moveu uma vez, e Amber lhe falou diretamente com sua mente com todas suas forças: «Não se mova Edge. Fica aquieto. Confia em mim».
Tinha o rosto banhado em suor quando por fim conseguiu tirá-lo da armadilha. Não pelo cansaço, mas sim pelo medo. Medo pelo Edge. .
Por fim, os pés do Edge passaram a linha de marcação. Jameson saiu atrás dele e suspirou, aliviado, ao achar-se fora do quadrilátero. Logo se aproximou de sua filha e a abraçou com ternura.
Ela devolveu o abraço.
— Mamãe e Rhiannon estão em cima. E Alicia também. Ele assentiu com a cabeça.
— Cuide do Edge — disse — Eu vou limpar o caminho e reunir as tropas. Avisarei quando estivermos preparados.
— Me chame com força, papai. Há algo nesta sala que parece... amortecer a telepatia.
Ele assentiu com a cabeça.
— Não me surpreende que não a sentíssemos claramente. Ela, que estava olhando ao Edge enquanto seu pai a abraçava, pensou em como havia sentido sua presença e se perguntou se ele também teria sentido a sua, apesar da força que parecia envolver aquela habitação.
— Querida...
Ela tragou saliva.
— Não posso falar disso. Agora não, papai — se separou dele e se agachou junto ao Edge, lhe acariciando o rosto. — Quanto tempo até que amanheça?
— Oito horas — disse seu pai — Mas é forte. Sairá dessa.
— Sim — disse ela.
Jameson suspirou e saiu da sala arrastando pelo braço as guardas inconscientes para pô-las fora do alcance de sua filha, supôs Amber. Ela se inclinou sobre o Edge e ao olhá-lo sentiu uma onda tão intensa de prazer que ficou atônita.
— Ei — murmurou. — Vamos, acorda — suas pálpebras se abriram, mas voltaram a fechar-se em seguida — Edge, vamos. Sei que dói. Tenta-o. — Nada. Nada absolutamente. Amber franziu os lábios e disse. — Está bem. Farei eu mesma — revistou-o, encontrou a navalha que sempre levava no bolso e a abriu. Logo fez um pequeno corte no braço que a fez proferir um leve gemido. A navalha caiu ao chão. Amber viu como brotava o sangue. Assentiu com firmeza, levantou a cabeça de Edge com uma mão e aproximou o corte dos seus lábios.
O corpo do Edge se esticou ao primeiro contato. Sua língua apareceu, deslizou sobre a carne de Amber, fazendo com que sua pele ganhasse vida. De repente, abriu os olhos e levantou uma mão para lhe afastar o braço.
— Não, Amber — murmurou — Não pode, o bebê...
— É necessário, Edge. Deixe-me fazê-lo — tentou aproximar de novo o braço à boca, mas ele o afastou de novo. Ao fazê-lo, Amber viu que um fiozinho de fumaça branca se elevava de seu braço — Edge! — Deus, não podia estar ardendo outra vez. O fogo estava apagado, como era possível que...?
Amber ficou imóvel ao ver que uma gota de sangue de seu corte caía sobre a carne enegrecida de Edge e que se elevava outro fiozinho de fumaça branca.
— Que diabos...?
— O que? — Edge levantou a cabeça para olhar, mas a deixou cair de novo, como se seu pescoço fosse de borracha.
Amber se inclinou sobre ele e observou o braço queimado. Entretanto, a parte de pele onde tinha caído seu sangue estava... curando. A cor negra foi clareando até que apareceu uma pequena superfície de pele rosada, em forma de gota.
— Não o entendo... — Alby?
— Psiu. Fique quieto. Fique quieto, Edge — Amber esticou o braço e, enquanto trincava os dentes, comovida pela dor de Edge, deixou que o sangue gotejasse lentamente sobre ele. Logo foi espalhando cuidadosamente sobre sua pele queimada e de novo se levantou aquela fumaça branca.
— O que está...? Deus, que sensação tão estranha.
— Dói?
— Faz-me cócegas. O que está fazendo, Alby? — ele tentou de novo levantar a cabeça.
Dessa vez, ela o ajudou e observou seu semblante quando olhou o braço. As queimaduras estavam sarando diante de seus olhos. Ali onde seu sangue tinha entrado em contato com a carne, a pele se curava. Enquanto ele observava aquele fenômeno, Amber apertou de novo o corte do braço, mais forte desta vez, para que caísse um fiozinho de sangue.
— Para, Alby! — Edge fechou a mão sobre o corte em um ato reflexo para deter a hemorragia. Mas ao fazê-lo utilizou a mão queimada, e o processo continuou. Amber viu como seu sangue escoava entre os dedos de Edge, deixando em seu caminho a pele intacta.
Edge a soltou e olhou pasmado a mão, com os dedos estendidos. A palma estava intacta, imaculada. O dorso estava enegrecido, queimado.
Amber tocou a parte queimada com os dedos molhados de sangue. Edge levantou os olhos para ela. — Como é possível? Como pode...?
Ela deu de ombros.
— Não sei. É a primeira vez — ele afastou os olhos tão depressa, que Amber compreendeu o que estava pensando. — É a segunda vez que tenho com você minha primeira vez.
Ele levantou a vista lentamente e a olhou nos olhos. — Não tem importância. Fui muito mesquinho, Alby. Dá no mesmo.
— Importava-se o bastante para que ficasse furioso comigo na casa de Stiles.
Ele deu de ombros.
— Já sabe quão frágil é o ego masculino.
Ela suspirou.
— Pois, para que saiba Edge, eu não menti.
Ele franziu o cenho; logo seus olhos se dilataram e se encheram de uma emoção indefinível.
— Você foi o primeiro. E o único homem com quem me deitei Edge.
— Mas se supõe que não é possível.
— Como isto, quer dizer? — passou os dedos por seu antebraço, acima e abaixo. Edge viu com assombro a pele intacta que ia aparecendo ante seus olhos. Sua mão, seu braço, estavam completamente recuperados.
— Ultimamente estão acontecendo muitas coisas que eu acreditava impossíveis, Edge. Esse bebê, por exemplo. Eu acreditava que era impossível que um vampiro tivesse filhos — deu de ombros. — Mas parece que não é assim. Ele a olhou, piscando, cheio de estupor.
— O bebê... é... é meu?
Ela sustentou o olhar e assentiu com a cabeça, sem afastar os olhos.
Edge sabia que Amber estava esperando uma resposta, mas não conseguiu dizer nada. Ficou sem fala. Ansiava acreditar nela. E acreditava. Mas no fundo de sua mente havia um cínico recalcitrante que lhe dizia que era um imbecil. Todo mundo sabia que os vampiros não podiam procriar.
Salvo, possivelmente, ele.
Ou possivelmente não fosse ele, pensou ao olhar o braço. Possivelmente fosse só ela.
A dor tinha desaparecido. Podia dobrar e abrir a palma sem sentir dor alguma.
Amber se afastou ferida por seu silêncio.
— Tanto faz se acredita em mim ou não.
Ele voltou a fixar nela sua atenção.
— Não, é só que... custa entender — disse, mas pensou que tinha demorado muito para falar. O momento tinha passado. Amber estava esperando algo que ele não tinha lhe dado.
— E diz isso a mim — respondeu ela com ironia — Mas não significa nada. Afinal de contas, não somos mortais comuns. Não espero que se case comigo e, embora o esperasse, daria no mesmo.
Edge se levantou e Amber se afastou dele.
— Por que não?
Ela se deteve de costas para ele.
— Não sei.
Edge franziu o cenho e de repente sentiu algo. Medo. Quase... dor.
— O que está me escondendo, Alby?
— Nada.
Edge se aproximou, agarrou-a pelos ombros e a fez voltar-se. Ao ver que o evitava, viu em seus olhos, confirmadas suas suspeitas. Agarrou-a pelo queixo, a levantou e viu um brilho em seus olhos que fez acelerar o coração.
— Fale.
Ela fechou os olhos.
— No sonho... o bebê... — baixou a cabeça. — Por fim vi o que você me dava no sonho.
— A morte — Sussurrou ele. — Disse que dava a você a morte.
Ela assentiu com a cabeça.
— Em uma pequena caixa de madeira. Nunca via o que havia dentro, mas sabia que era algo aterrador — ele baixou os olhos, angustiado por sua dor — Não sabia o que significava.
— E agora sabe?
Ela assentiu.
— A outra noite voltei a ter o sonho, mas desta vez pude ver o que me dava. Era um bebê. Um bebê muito pequeno, imóvel, sem vida.
Edge sentiu que se encolhia e revolvia o estômago. Dobrou-se pela cintura e levou as mãos à barriga, cambaleando. Com a boca aberta, tentou respirar, assombrado pela força do golpe.
— Edge?
Ele a olhou confuso. Não entendia o que estava acontecendo com ele. Tinha a sensação de ser um menino de novo, quando seu pai o golpeava na barriga. Chocou-se de costas com a parede e tentou erguer-se e respirar. Amber correu para ele, agarrou-o pelo ombro e lhe tocou o rosto.
— Está bem?
Ele a olhou nos olhos, ainda úmidos.
— Não, Meu deus, Alby, você está?
Ela baixou a cabeça.
— Pensava que devia saber. É melhor estarmos preparados, sabe?
Falava com um tom desapaixonado... E, entretanto, Edge sentia a tormenta que desatou em seu interior.
— Não há modo de estar preparado para algo assim disse — Alby...
Ela se afastou e começou a passear pela sala.
— Talvez seja o melhor — murmurou com voz crispada. — Nem sequer sabemos o que seria.
— Como pode dizer isso?
Ela deu de ombros.
— Suponho que nasça sendo um vampiro. Deus, você o imagina? Um bebedor de sangue imortal, preso para sempre no corpo de um recém-nascido.
— E se não for assim? E se for normal?
— Vamos, Edge. É teu e meu. Não temos nem um só gen normal entre os dois.
— Por que se comporta assim?
— Como?
Edge se aproximou dela e observou seu rosto.
— Tão friamente. Como se não importasse, embora esteja destroçada.
— Eu não...
— Sinto sua dor, Alby. Isto está matando você. Deus, carregar essa certeza sozinha...
Ela se afastou quando tentou abraçá-la.
— Não, me deixe. Não há tempo para isto.
A mente do Edge funcionava a velocidade vertiginosa. Dentro de sua cabeça se amontoavam centenas de coisas.
— Esse sonho, essa visão... não tem por que cumprir-se.
— Nunca tive um sonho que não se cumprisse.
— Nem que os tenha tentado mudar? — Amber fechou os olhos e baixou a cabeça — Pensa. Lembra. Alguma vez tentou mudar algum desses sonhos premonitórios?
— Não. até agora, não. Sonhava que Will... desaparecia. Não que morrera, mas ninguém podia encontrá-lo. Deu de ombros. — Agora estou tentando mudar isso.
— Então também pode tentar mudar isto.
— Não posso — fechou os olhos e mordeu o lábio — Não posso.
— Claro que pode — Edge a segurou pelos ombros — Maldita seja, tem que fazê-lo.
Ela abriu os olhos bruscamente.
— Edge, tenho tanto medo...
Abriu as comportas de sua alma e Edge sentiu que suas emoções e seus medos o alagavam. Dava-lhe medo se iludir. Dava-lhe medo tentar e fracassar. Dava-lhe medo amar... e sair maltratada. Inclusive lhe dava medo deixar que ele a abraçasse, porque quase não podia dominar suas emoções e um abraço dele, uma carícia, podia fazê-la em pedacinhos.
Edge ansiava estreitá-la em seus braços possivelmente mais do que tinha desejado qualquer outra coisa. Mas se conteve.
— Alby, já não tem por que carregar todo o peso sozinha. Eu a ajudarei a carregá-lo. Aconteça o que acontecer, estaremos juntos nisso.
Ela o olhou nos olhos com certo assombro.
— Pensava que não acreditava que pudesse ser seu.
— Bom isso foi antes que me dissesse que é.
— E acredita?
Ele inclinou a cabeça.
— Recorda a última vez que estivemos juntos, verdade? Quando estava meio morto e me obrigou a beber...
— E?
— Algo ocorreu então, Alby — algo prodigioso pensou. Ela estava agora em seu interior, era parte dele. Possivelmente tivesse sido sempre assim. Ele só sabia que desde esse momento...
— O que? O que ocorreu?
— Que vi dentro de você — respondeu ele e deu de ombros — Conheço-a, isso é tudo — ela o olhou como se fosse a primeira vez que o via — Nem por um instante me ocorreu pensar que pudesse me mentir em uma coisa assim. Conheço-a.
As lágrimas dela saltaram.
— Obrigado.
Edge engoliu saliva.
— Vêem, vamos para cima. Estou me curvando aqui embaixo, e não há por que ficar esperando agora que fez seu pequeno milagre, não?
— Não, suponho que não.
— Então, vamos — pegou seu braço e puxou-a para a porta. Subiu as escadas e se encontrou de frente com a flecha de ferro, afiada como uma lamina, de uma arapuca.
— Poderia arrancar sua cabeça — disse suavemente uma mulher. — Assim nem ocorra tentar nada.
Amber foi contando os batimentos de seu coração. Sentiu de repente que a mão de Edge se deslizava por seu quadril e a afastava para o lado, até que ficou atrás dele.
— Não precisa recorrer à violência — disse ele com seu sorriso mais encantador.
Mas aquela mulher não se alterou.
— Vamos, venham se reunir com seus amigos.
— Eu não tenho amigos, querida. Só vim pelo bolo de queijo — ela o olhou com surpresa — É bolo de queijo o que cheiro, não? Não me diga que me equivoquei.
— Ande — disse ela, movendo a mola de suspensão.
Edge se moveu, mantendo a mão atrás dele, sobre o quadril de Amber. «Não se preocupe, gatinha. Sairemos desta».
— Quem disse que estou preocupada?
Ele lançou um olhar entre admirado e divertido.
A mulher os conduziu através da casa, até uma sala lateral onde Amber viu outras mulheres, armadas até os dentes com diversas armas com as quais apontavam para Angélica, Rhiannon e Jameson. Amber e Edge se reuniram com outros aos empurrões.
— Acredito que chegou a hora de dizerem o que estão fazendo aqui — disse por fim uma mulher.
Rhiannon lhe lançou um gélido sorriso.
— Qualquer um pensaria que uma mortal deveria escolher suas últimas palavras com um pouco mais de cuidado, não acha?
A mulher vacilou um instante e engoliu saliva.
— São vocês que entraram em nossa casa. Devem-nos uma explicação.
— Eu devo algo a você? — perguntou Rhiannon. Amber lhe pôs uma mão sobre o ombro. — Segui até aqui a uma mulher — disse — Chama-se Brooke, e tem algo que não lhe pertence.
Brooke saiu do meio das outras. Mas estava diferente. Levava o cabelo recolhido belamente para trás e um traje formal, com sapatos de aspecto sério. Olhou nos olhos à mulher que estava no comando.
— É ela, Melina.
A mulher a quem tinha chamado Melina se aproximou um passo. Mas Edge se interpôs em seu caminho.
— Oh, não, nada disso — disse enquanto Jameson afastava Amber para trás e outros fechavam filas a seu redor — Não vai se aproximar dela. A menos que passe por cima de mim, claro.
— De todos nós — acrescentou Jameson, aproximando-se de Edge.
Melina ficou quieta.
— Estão enganados. Nós não lhes desejamos nenhum mal.
— Não demonstram isso os galos de minha cabeça — disse Edge. — Nem o fosso de fogo no qual nos colocaram.
Outra mulher entrou na sala.
— A outra garota se foi. Não a encontro em nenhum lugar.
Melina assentiu.
— Alicia. Estava com vocês?
— Nunca ouvi falar dela — disse Edge. Melina o olhou como se soubesse que estava mentindo e logo voltou a olhar à outra garota. .
— O que há com a Keisha e a Kelly?
— Encontramos as duas presas no armário do porão. As levamos a seus quartos. Estão doloridas, mas ficarão bem.
— Essas devem ser as que estavam montando guarda embaixo. Claro que ficarão bem — disse Edge — Se quiséssemos matá-las, o teríamos feito — colocou a mão no bolso e todas as armas se dirigiram para ele. Ele levantou uma mão e tirou um cigarro que ficou entre os lábios — São um pouquinho nervosas, não? — olhou para Angélica enquanto procurava seu acendedor. «Descobriu algo sobre elas?»
Ela manteve a vista fixa nas mulheres enquanto respondia: «fazem-se chamar Ateneu. consideram-se vampirólogas».
« Uma espécie do DIP no feminino?», perguntou Edge em silêncio.
— Não, nada disso — disse Melina.
Amber conteve o fôlego e todos olharam para Melina. Esta deu de ombros.
— Tenho alguns poderes psíquicos — deixou escapar um suspiro. — Nós não caçamos vampiros, os estudamos.
— Isso seria algo mais fácil de acreditar se não estivessem nos apontando com um pequeno arsenal — disse Edge.
Ela pareceu pensar um momento. Logo olhou às demais mulheres.
— Baixem as armas.
— Melina, não acredito que...
— Baixem. Voltem para seus postos e procurem encontrar a Alicia e trazê-la aqui. Brooke, você pode ficar.
As mulheres foram baixando lentamente as armas e saindo, embora com receio. Amber exalou um suspiro de alívio e se sentou em uma poltrona de aspecto cômodo. Ouviu que Edge resmungava uma maldição. Ele jogou o cigarro, ajoelhou-se a seu lado e a segurou pelo braço.
— Está sangrando outra vez — olhou a Melina — Pode... ?
Antes que acabasse a frase, Melina se aproximou da porta e pediu a alguém que levasse umas ataduras e uma pomada. Um instante depois, entregou para Edge um cilindro de gaze e um pouco de esparadrapo.
Amber ficou muito quieta, surpresa por aquele giro dos acontecimentos, enquanto Edge enfaixava meigamente seu braço com expressão preocupada.
— Agora que penso, terei que me acostumar a não fumar diante de você. Não? Não acredito que seja bom para o pequenino.
Ela viu que seus pais se olhavam e que Rhiannon levantava as sobrancelhas.
— Posso lhes trazer algo mais? — perguntou Melina.
— Uma jarra de sangue do grupo A positivo estaria bem — resmungou Edge, e piscou um olho para Amber. Ela pensou que estava tentando... desviar o assunto.
— Talvez nos conformemos com uma explicação disse Rhiannon — Você, Brooke, ou como se chama, o que estava fazendo com o Stiles?
Brooke olhou a Melina e esta assentiu. Deixando escapar um suspiro, Brooke disse:
— Trabalhava incógnita.
Amber estava assombrada pela mudança que ocorreu nela, e não só em seu aspecto, mas também em sua voz e suas maneiras. Já não era a amiguinha descerebrada de Frank Stiles. Parecia segura de si mesma, confiante, inteligente.
— Tivemos notícia de que Stiles tinha desenvolvido uma fórmula que lhe concedia a imortalidade. E que tinha usado o sangue de... — olhou Amber — da Menina Prometida.
— E por que lhes interessava tanto isso? – perguntou Rhiannon. .
Brooke olhou de novo a Melina. Esta disse:
— Porque vai contra a ordem sobrenatural. Não se pode permitir.
— A ordem sobrenatural? — perguntou Angélica.
— Sim. As coisas que não podem explicar-se consideram sobrenaturais, embora não o sejam na realidade. São perfeitamente naturais, mas escapam à compreensão humana — suspirou. Entretanto, quando o ser humano se mistura, as coisas... deturpam-se. Olhou a Amber ao dizê-lo.
— Coisas como eu, quer dizer — disse Amber em voz baixa — Afinal de contas, eu sou o resultado da manipulação humana com a ordem sobrenatural.
Melina moveu a cabeça de um lado a outro. — Chegamos à conclusão de que poderia ter sido concebida com ou sem a intervenção humana disse. — Sua mãe foi inseminada artificialmente, mas poderia ter ocorrido igualmente se não tivesse sido assim.
— Então, decidiram deixá-la viver, não é isso? perguntou Rhiannon.
— Não somos assassinas. Somos protetoras. As Irmãs do Ateneu levam séculos protegendo a ordem sobrenatural. Sempre em segredo. Procuramos passar despercebidas. Nosso trabalho consiste em vigiar e proteger, nada mais.
— Então, o que pensavam fazer com o Stiles? — perguntou Edge.
Ela baixou a cabeça.
— Detê-lo. Destruir a fórmula, para que ninguém possa fazer uso dela. Impedí-lo de criá-la de novo até que morra de morte natural.
Brooke assentiu e prosseguiu o relato.
— Mas então me inteirei de seus planos para a Menina Prometida e pensei que não podia pegar a fórmula e fugir, como planejava. Tinha que ficar e me assegurar de que não a usava para fabricar mais.
Amber se levantou de um salto.
— Mas ao final partiu levando a fórmula.
— Sim — disse ela — Seus amigos foram resgatar você. Escapei assim que os vi reunirem-se fora.
— O que fez com ela, Brooke? — perguntou Amber — O que fez com o soro?
Brooke olhou a Melina e esta olhou ao chão.
— Destruímos. Igualmente a todos os arquivos informáticos e as notas de Stiles. Tudo desapareceu.
— Oh, Deus, não — murmurou Amber, se deixando cair de novo na poltrona.
Edge se ajoelhou frente a ela, segurou-a pelos ombros e disse com veemência:
— Ainda temos ao Stiles, querida. E acredito que Rhiannon, você e eu, o convenceremos de que fale — voltou-se para Melina — Obrigado pela informação. Dado que não têm o que procuramos, vamos.
Melina se colocou na frente da porta.
— Sinto muito, mas temo que não é tão simples.
Rhiannon entreabriu os olhos. Edge fez girar os seus e, ficando em pé, virou-se para a Melina. — Por que será que não me surpreende?
— Somos uma sociedade secreta — disse Melina. — Sua espécie não pode saber de nossa existência. Não podemos completar nosso trabalho se nossa existência sair à luz.
— É um pouco tarde para isso, não acredita? –murmurou Angélica. Jameson lhe deu a mão.
— Se queria reter-nos aqui, não deveria ter baixado as armas.
— São muito desconfiados, não? — perguntou suavemente Melina. — Embora suponha que não os pode reprovar. Só ia pedir-lhes que me dêem solenemente sua palavra de que não revelarão nossa existência. Isso é só o que queremos. Uma simples promessa.
Edge deu um passo adiante.
— Não.
— Edge, que mal pode nos fazer...? — começou a dizer Rhiannon.
Edge levantou uma mão e Rhiannon se calou.
— Estava pensando em uma espécie de trato. Melina franziu o cenho.
— Que tipo de trato?
— Nós guardamos seu segredo, se vocês guardam o nosso — enquanto falava, olhou a Amber — A única pessoa fora desta sala que sabe que Amber está grávida é Stiles. Acredito que é melhor mantê-lo em segredo.
— Nisso estamos de acordo — Melina se voltou para Amber — Daria meu braço direito para saber como ocorreu e se pode ocorrer outra vez.
— Nós tampouco sabemos — disse Amber em voz baixa.
A outra assentiu com a cabeça.
— Espero que tudo corra bem.
Amber inclinou a cabeça.
— Acredito em você.
Melina se afastou da porta exalando um suspiro e segurou o trinco. — Manter-me-ão informada?
— Certamente não — disse Edge e, tomando a Amber pela mão, conduziu-a para a porta — Mas não é nada pessoal.
Melina assentiu com certa tristeza.
— Acompanho-os até lá fora — dispunha-se a abrir a porta quando algo a golpeou do outro lado, abrindo-a e ali, na soleira, estava Alicia com uma arma do tamanho de um pequeno canhão apoiada em seu ombro.
— Que ninguém se mova! — gritou.
Brooke e Melina levantaram as mãos e ficaram imóveis enquanto os outros a olhava boquiabertos.
— Vamos, meninos! Saiamos daqui! — disse Alicia.
Rhiannon baixou a cabeça e beliscou a ponte do nariz. Edge olhou a Amber e sorriu.
— Bom, o que estão esperando? Vamos, vou tirá-los daqui!
Amber se pôs-se a rir e, aproximando-se dela, tirou-lhe a arma das mãos.
— Está tudo bem, Alicia. Não tentam nos prender aqui.
— Ah, não?
Melina e Brooke baixaram os braços quando Amber apoiou a arma contra a parede.
— Deus, onde encontrou isto? Mas se quase não podia com ela.
— Encontrei na sala onde guardam as armas — Alicia deu de ombros e esboçou um sorriso — e pensei que por fim tinha chegado minha oportunidade de ser a heroína.
Amber olhou a sua querida amiga.
— Qualquer pessoa com um pouco de inteligência teria ido faz tempo. Seriamente pensava que podia enfrentar sozinha a um montão de mulheres armadas?
Alicia deu de ombros e olhou significativamente o ventre de Amber.
— Tinha que tentar.
— Tem ideia de quanto amo você, Alicia?
Alicia a olhou nos olhos e sorriu.
— Eu também a você.
Amber se voltou para os outros.
— Saiamos daqui — deslizou um braço ao redor dos ombros de Alicia e esperou que Melina lhes indicasse o caminho para a porta principal.
Edge se voltou para Melina ao sair.
— Não esqueça nosso trato — disse.
Ela sustentou o olhar e assentiu.
— Eu nunca rompo uma promessa.
Foram caminhando até a porta da frente e ninguém os seguiu. A grade se abriu quando se aproximaram e voltou a fechar-se quando saíram. Amber olhou os mochos de pedra esculpidos sobre os pilares da grade. Final,mente baixou a cabeça e deu rédea solta a suas lágrimas. Edge lhe apertou o ombro.
— Tudo vai sair bem — disse.
— Como? Destruíram o soro, Edge. Destruíram tudo. E era a única esperança do Will.
— Não exatamente — disse Alicia.
Todos a olharam. Ela sorriu e tirou algo do bolso. Era uma pequena ampola de vidro, cheia de um líquido transparente.
— Acredito que depois de tudo vou ser a heroína — disse, dando a ampola a Amber.
— Isto é...? Mas como...?
— Encontrei escondido no quarto da Brooke, junto com este disquete — tirou um disquete do outro bolso — Deve ter lhes dado todo o soro, menos essa ampola. E, se não me engano, também guardou cópia das notas mais importantes de Stiles.
— Essa puta mentirosa... — resmungou Edge.
— Não seja muito duro com ela, Edge — disse Angélica — A imortalidade é muito tentadora.
Amber tomou a ampola e a olhou atentamente.
— Esse é o soro antigo, a última que restava ao Stiles do Ambrósia-6 — entreabriu os olhos — Brooke deve ter entregue a elas o soro novo, mas guardou a última ampola do velho.
— Como pode estar tão certa? — perguntou Edge.
— Stiles ia chamar Ambrósia-7 ao novo soro — disse ela, e apontou a etiqueta do frasquinho de cristal — Suponho que deveríamos dizer a Melina que Brooke não é de confiança.
— Se o fizermos, também teremos que dizer o que pensamos fazer com a fórmula — disse Rhiannon — e quem sabe o que poderia fazer esse bando de mulheres se considerarem que Willem vai violar sua prezada «ordem sobrenatural».
— Acha que poderiam lhe fazer mal? — perguntou Jameson.
Rhiannon olhou a casa com os olhos entreabertos. — Não confio nelas.
— Por alguma razão ou é simples instinto? — perguntou-lhe Edge.
Ela o olhou nos olhos.
— São mortais. Essa é razão suficiente – então mordeu o lábio e lançou um olhar para Alicia — conheci muito poucos mortais que sejam de confiança. E ainda menos que sejam tão valentes e excepcionais como nossa querida Alicia — apressou-se a acrescentar.
Alicia abaixou a cabeça e se ruborizou.
— Temos que levar isto ao Willem — disse Amber.
— Só a metade — disse Jameson. — A outra metade terá que levá-la ao laboratório do Eric para que possam duplicar a fórmula. Se não, estaremos na mesma quando se acabar essa dose.
— E como sabemos que a metade basta para mantê-lo com vida? — perguntou Amber.
— Não sabemos — respondeu seu pai — Só podemos confiar que seja assim.
Alicia voltou a guardar o disquete no bolso.
— Tentei abri-lo para dar uma olhada no computador do quarto de Brooke, mas está protegido com uma contra-senha.
— Poderá abri-lo?
Alicia assentiu com a cabeça.
— Se eu não puder, Morgan poderá. Deveríamos levar para Salem e logo mandar o arquivo para Eric por correio eletrônico.
— Acredito que é hora de nos separamos — disse Amber — Assim, aonde vai cada um?
O Mercedes de Rhiannon continuava estacionado onde o tinham deixado, junto ao Corvette de Alicia. Edge se aproximou do Corvette e ergueu as costas, preparando-se para uma batalha, embora esperasse que não fosse necessário.
— Bonito carro, Alicia. Mas só há lugar para dois — sustentou-lhe o olhar.
A garota, miúda e loira, parecia entendê-lo imediatamente. Tirou do bolso um jogo de chaves e atirou para ele.
— Por que você e Amber não o levam?
Jameson abriu a boca para opor-se e Edge o notou. Mas Angélica lhe pôs uma mão sobre o ombro e Jameson se calou.
— Creio que é uma boa ideia — disse Angélica — Os outros podem ir no Mercedes de Rhiannon.
— De acordo, então — disse Edge — Nós levamos a metade que irá para o laboratório desse como se chama.
— Preferiria que levassem a dose de soro para Willem — disse Jameson. — Não quero que Amber se aproxime de Frank Stiles.
Edge levantou as sobrancelhas.
— Eu tenho um assunto pendente com o Stiles. E me acredite, não vou permitir que volte a pôr as mãos em cima de Alby.
Amber clareou a garganta.
— Alguém vai perguntar o que eu quero fazer? — Todos a olharam. Rhiannon pareceu sufocar um sorriso.
— Acredito que Edge tem razão. Deveríamos ir à ao laboratório. Eric e Tamara, Donovan e Dante, e até o Roland estão lá para me proteger se Stiles tentar algo. E é necessário que esteja à mão quando Eric fizer suas provas — assinalou a ampola — Isto é tudo o que sobra da fórmula original do Stiles. Temos que aprender a duplicá-lo, e meu sangue é um ingrediente chave.
Edge inclinou a cabeça. — É um bom argumento.
— Sim, muito melhor que sua sede de vingança — disse Amber — Não tocará no Stiles até que eu o diga. Se não aceitar agora mesmo, pode partir e irei sozinha.
Ele esboçou um sorriso zombador.
— Seria capaz de me deixar aqui só e sem carro?
— Sem pensar duas vezes.
Edge suspirou e olhou para Jameson.
— Como vê, sua filha e eu temos certas coisas a esclarecer — de repente ficou sério — Pode confiar em mim, Bryant. Não permitirei que lhe aconteça nada.
— Acredito em você, Edge — disse Jameson com um suspiro . — Mas lembre que, se lhe ocorrer algo, terá que responder ante mim.
— Entendido.
Amber pareceu surpresa, talvez porque Edge não respondesse à ameaça de Jameson Bryant com sarcasmo ou desafio. Na realidade, ao Edge também surpreendeu sua resposta. Mas o entendia perfeitamente, e inclusive o respeitava pela devoção que sentia por Amber Lily. Abriu a porta do lado do acompanhante para que Amber entrasse. Ela entrou no carro, colocou o cinto de segurança e fechou a porta.
Jameson deu ao Edge a ampola. Já tinha extraído a metade com uma seringa de injeção que tinha encontrado no estojo de primeiro socorros do carro de Rhiannon, para levar ao Willem Stone.
— Leva uma carga preciosa, Edge. Não o esqueça.
— Nem por um instante — Edge tomou a ampola e sustentou-lhe um momento o olhar. Algo aconteceu entre os dois. Edge pensou que pareciam entender-se. Finalmente, deu meia volta e se aproximou da porta do condutor. Ali olhou para Alicia com um cálido sorriso — Obrigado — murmurou.
Ela assentiu com a cabeça.
— Espero que mereça isso, Edge.
Ele entrou no carro, ligou o motor e pôs o carro em marcha. E, de repente, a ideia de passar várias horas no carro a sós com Amber começou a parecer menos atrativa. Ela estava zangada, embora Edge ignorasse o por que. E não tinha nem ideia do que podia lhe dizer.
Ela o olhou por fim quando tinham percorrido vários quilômetros em silêncio.
— E então?
— E então o que? — perguntou.
Ela fez girar os olhos.
— Está claro que queria ficar a sós comigo para me falar de algo. Então fala.
Edge a olhou de soslaio e esboçou um sorriso.
— E por que acha que queria ficar a sós com você para falar? Mmm? — ela ficou um pouco vermelha e afastou o olhar — Não se faça de ofendida, Alby. Nunca se fez de tonta comigo, assim não comece agora.
— Não estou me fazendo de tonta. E me ofende que acredite que agora mesmo pode haver algo mais importante que... que o que tenho que enfrentar.
Ele acariciou sua bochecha com o dorso dos dedos.
— O que temos que enfrentar, quer dizer — ela sacudiu a cabeça lentamente — O que acontece? Você não acredita em mim? Pensa que vou fugir e deixá-la na mão?
— Não, até que consiga o que quer — respondeu ela em voz baixa.
— E o que acha que quero?
Ela o olhou com o cenho franzido.
— Deixou bastante claro desde o começo, Edge. Ao menos, quando decidiu deixar de mentir a respeito. Quer se vingar do Stiles. Isso é só o que importa a você.
— Não — disse ele — Absolutamente — exalou um profundo suspiro — Suponho que não ganhei nenhum ponto por ter deixado o Stiles e ter vindo buscar você quando pensei que estava metida em uma confusão. — Ela não disse nada — Vamos, por favor. Acredito que é suficiente para compensar o fato de que decidi ir com ele em vez de com você — fixou os olhos nela e sorriu, deixando aparecer sua maldita covinha . — Foi um engano estúpido, Alby. Me dei conta assim que nos separamos, e depois não deixei de me lamentar por isso.
— Quando vais colocar na cabeça que não me importa o que faça?
— Quando for verdade, suponho. Mas agora não.
Ela deu de ombros.
— Amanhecerá muito antes que cheguemos ao Wind Ridge.
— Sim, mas não tenho intenção de voltar a me colocar no porta malas — olhou-a. — Além disso, está esgotada. Quando foi a última vez que dormiu?
Ela pensou e se deu conta de que não se lembrava.
— Não sei. Não durmo desde antes que saíssemos da casa do Stiles.
— Pois tire uma soneca, querida. Eu conduzirei até que tenha que parar.
Ela piscou lentamente e sacudiu a cabeça.
— Nem sequer sabe aonde vamos.
— Pode me dizer antes de dormir.
Ela abriu o porta-luvas, tirou um mapa de estradas de bolso e passou suas páginas.
— Pode tomar a auto-estrada a uns trinta quilômetros daqui. Mas certamente terá que parar antes que tenhamos que deixá-la.
Edge assentiu distraidamente enquanto lançava rápidos olhares à estrada.
— Como você está? — perguntou.
Ela levantou o olhar, surpresa pela brusca mudança de tema.
— Bem, suponho.
— Está pálida como o alabastro.
— Pois olhe para si mesmo — disse ela com um leve sorriso.
Edge lhe devolveu o sorriso, aliviado porque voltou a ficar de bom humor. Era um bom sinal, pensou.
— Bom, eu tenho motivos para estar.
— E eu também, embora, enjoada como estou, acredito que minha pele, mais que de cor alabastro, é verde. O sorriso do Edge se apagou.
— Tão mal está?
— Não posso levar mais que uns dias de gravidez — disse ela — Não posso acreditar que já tenha sintomas. E, quando não estou enjoada ou vomitando, como tudo o que cai em minhas mãos. Parece que estou engordando a olhos vistos — afastou o olhar e de repente pareceu ficar nervosa e disse apressadamente — Suponho que deve ser por tudo o que comi — disse, levando as mãos ao ventre — Não pode ser pelo bebê. Só faz uns dias — afastou o olhar — Começo a me perguntar se... se haverá algo em mim que faz com que as coisas ocorram... antes do tempo: Sei que parece uma loucura, Edge, mas suponho que Eric poderá confirmar com alguns exames e...
— Espera, espera — disse ele rapidamente e a olhou com o cenho franzido, escrutinando seu rosto — Deus, ainda continua pensando que não acredito em você — ela não levantou o olhar — Alby, olhe para mim — ela umedeceu os lábios e se obrigou a levantar a cabeça e a olhá-lo aos olhos . — Não tenho nem ideia de como caramba aconteceu isto. Tal como você. Mas não pensei nem por um instante que esteja mentindo para mim.
— Eu não sei se acreditaria se estivesse em seu lugar.
Edge exalou um profundo suspiro e golpeou com a mão o volante.
— É devido a como reagi no princípio, verdade? Demônios, Alby, é lógico que pensasse que o menino não era meu. Acreditava que era impossível. E não esqueça que você não me disse nada. Não me deu nenhuma oportunidade.
Ela deu de ombros.
— Então, seriamente não tem dúvidas?
— Claro que tenho dúvidas. Tenho dúvidas sobre como pôde ocorrer e por que, se tem algo a ver com a química de meu corpo, ou com a do seu, ou se trata de uma reação química que se produz ao estarmos juntos. Afinal de contas, entre nós há algo muito explosivo. Mas não duvido de você, Alby. Jamais o faria. E não preciso que seu amigo o cientista faça exames para comprová-lo.
Ela o olhou fixamente um momento, mas não disse nada. Edge seguiu conduzindo em silêncio várias horas. Amber se aconchegou por fim no assento, voltada para ele e após um momento fechou os olhos. Tinha os lábios ligeiramente entreabertos e úmidos. Seus seios se moviam ao ritmo de sua respiração, como ondas ao entrar na praia e voltar a refluir de volta ao mar. Edge se deu conta do instante preciso em que mergulhava em um profundo sonho. Sentiu que as barreiras que tinha erguido ao redor de sua mente se dissolviam pouco a pouco. A resistência se desfez, e Edge não pôde resistir a tentação de entrar às escondidas em sua psique e dar uma olhada em seus sonhos.
Diminuiu a velocidade do carro para poder concentrar-se nela e começou a ver como se foram desdobrando seus sonhos. Viu-a estendida em uma grande cama, com o cabelo revolto e o rosto suarento. Viu a si mesmo do outro lado de uma sala estranha, levando nos braços uma caixa de madeira pequena e ornamentada. Sentiu que ela sussurrava em sonhos: «Não, não, por favor, não quero vê-lo outra vez». Mas o sonho seguiu adiante, desdobrando suas imagens ante eles.
O Edge do sonho aproximava a caixa da cama, inclinava-se para ela e Amber olhava o que havia dentro. Um bebê muito pequeno e formoso, com as pestanas e as sobrancelhas negras e o cabelo loiro. Estava imóvel, calado, e branco como a porcelana.
Um véu negro caiu sobre as imagens do sonho, mas Edge ouviu como giravam os pensamentos pela cabeça de Amber. «vou perder o bebê», dizia ela, aterrorizada. «e embora possa suportá-lo, será só o princípio, porque também perderei a ele».
Edge franziu o cenho e, ao dar-se conta de que se colocou no acostamento e estava levantando uma nuvem de pó, voltou a fixar sua atenção na estrada.
«Não posso amá-lo. Não posso querer ao menino. Não posso ter esperanças, porque é inútil».
— Maldita seja, Alby, isso não é verdade.
Um carro tocou a buzina, tirando-o de sua concentração. Edge deu uma guinada e voltou para sua pista quando estava a ponto de bater de frente com outro carro. Amber se ergueu, sobressaltada. Edge deteve o carro no acostamento e lhe lançou um olhar inquisitivo.
— Não aconteceu nada — disse ele. — É que... distraí-me um momento.
Ela o olhou piscando e Edge viu a dor refletida em seus olhos. Logo, ela voltou a colocar uma cortina sobre suas emoções e ficou fria. Edge compreendeu de repente por que parecia decidida a manter a distância. Entendia, mas não sabia o que fazer a respeito.
Amber olhou para o céu e se virou para inspecionar a zona onde pararam.
— Pelo menos escolheu um bom lugar para parar — disse.
Ele estava tão distraído que não a entendeu até que voltou seu olhar e viu um pôster de madeira que agitava a brisa.
— Hospedaria Haven, Cama e Café da manhã — leu em voz alta, e levantou as sobrancelhas — Suponho que tanto faz um lugar como outro.
— Se os quartos forem ensolarados, pode se esconder debaixo da cama, ou no armário.
Ele sorriu.
— Ah, obrigado. Que acolhedor.
— Acha que sim? — disse ela em tom levemente zombador.
Edge se animou de repente ao ver que parecia um pouco mais contente.
— Só espero que tenham serviço de quarto.
— Quer pedir algo para beber? – perguntou ela.
— Estava pensando, mas em comer ao garçom.
Ela fez uma careta e Edge sorriu e seguiu o caminho de entrada à hospedaria. Além das lanterninhas a gás de imitação, o edifício estava escuro como boca de lobo.
— Espero que sejamos capazes de despertar aos caseiros antes que amanheça — resmungou Edge e, depois de apagar o motor e os faróis, saiu do carro.
Amber saiu atrás dele.
— No pior dos casos, sempre tem o porta-malas — disse-lhe ela.
Edge lhe lançou um olhar por cima do teto do carro e apertou o botão de fechamento do chaveiro.
— Já se encontra melhor, não?
Ela desviou o olhar e deu de ombros.
— Vamos pra dentro, Edge.
Ele assentiu e, quando ela rodeou o carro, pegou sua mão e pôs-se a andar a seu lado para a porta.
A encarregada da hospedaria era uma mulher baixa e gorda de idade indeterminável, embora parecesse já entrada em anos. Aproximou-se da porta com uma bata de flanela que tinha atada com força à cintura e umas pantufas de pelúcia nos pés. Girou a fechadura, abriu a porta e olhou piscando para Amber entre uma massa de cachos tingidos de vermelho.
— Lamento incomodá-la a estas horas — disse Amber — Confiávamos em que tivesse um quarto livre.
Ela enrugou o nariz e olhou para Edge, que estava um pouco afastado, entre as sombras. Edge lhe lançou um sorriso.
— Só somos um par de viajantes cansados, senhora — disse — Pagaremos o preço completo, embora a noite esteja a ponto de acabar.
A mulher franziu os lábios, pensativa, e vacilou só um instante. Logo fez por fim um gesto de assentimento e abriu a porta de par em par.
— Entrem — disse. — Estão com cara de sono. Não acredito que possam continuar dirigindo.
O vestíbulo estava pouco iluminado por uma lamparina de mesa que a mulher devia ter acendido quando ouviu a campainha. Ela se colocou atrás do amplo balcão que ocupava um canto, sentou e tirou um livro debaixo de uma prateleira.
— Sejam bem-vindos à hospedaria Haven. Sou a senhora Monroe, mas meus hóspedes me chamam Sally, disse — É a única norma. E seus nomes são...? — ficou ali parada, com a caneta suspensa sobre a página.
— Smith — apressou-se a dizer Edge. — O senhor e a senhora Smith.
A mulher estava pondo uns óculos bifocais que tinha tirado de uma gaveta quando se deteve e o olhou.
— Smith?
— Ninguém acredita nunca — disse Edge. — É a má sorte de ter um sobrenome tão comum.
Ela sorriu e virou o livro para ele.
— Assinem aqui e ponham a marca, o modelo e o número de matrícula de seu carro.
— Claro.
— E vou necessitar um cartão de crédito.
— Pagaremos à vista — disse Edge enquanto rabiscava uns dados falsos no livro. Um momento depois deixou a caneta, tirou a carteira do bolso de trás e a abriu. Tirou notas de um dólar, separou seis e as deslizou sobre o mostrador, para a mulher.
Amber franziu o cenho ao ver as notas e ao olhar para Edge captou a intensidade de seu olhar. Estava brincando com as percepções da senhora Monroe.
Esta sorriu e tomou cinco notas.
— São oitenta dólares por noite — disse — Mais impostos, claro. No total, oitenta e seis dólares e quarenta. Vou pegar o troco — abriu uma gaveta do balcão.
— Edge... — disse Amber em tom de recriminação.
Ele piscou um olho.
— Vamos querida, deixaria que ficasse com o troco, mas vamos precisar para gasolina e outras coisas pelo caminho.
«Podemos usar meu cartão de crédito», disse-lhe ela telepaticamente.
«É muito fácil rastreá-la. Stiles tem amigos, não esqueça. Não vale a pena arriscar-se».
A senhora Monroe lhe entregou uma nota de dez dólares, três de um dólar e alguns trocados. Mais dinheiro do que ele tinha dado. Amber suspirou e sacudiu a cabeça, olhando-o com desaprovação, e disse a si mesma que enviaria um cheque assim que chegasse em casa. A senhora Monroe sorriu ao lhes dar a chave.
— Subindo as escadas, à esquerda. O café da manhã se serve às oito.
— Não queremos que nos incomode, Sally — disse Amber — Estamos dirigindo toda a noite, assim certamente dormiremos até a noite. Mas pode ser que eu desça para tomar algo. Poderia assegurar-se de que ninguém nos incomode durante o dia?
— Bom..., sim, suponho que sim.
— Obrigado.
— Necessitam ajuda com as malas?
— Não, subirei logo — disse Edge — Agora mesmo, só quero me sentar e descansar os olhos — lançou-lhe um sorriso — Volte para a cama, Sally. Prometemos não voltar a despertá-la.
Ela sucumbiu a seu irresistível encanto e lhe lançou um sorriso trêmulo.
Amber subiu as escadas atrás de Edge. Ele tinha razão: começava a sentir-se melhor, apesar daquele sonho persistente. E isso se devia a que estava de novo com ele. Estava segura disso, embora ignorasse a razão, reagia ante ele como o mar à atração da lua, e se sentia um pouco boba por isso, mas não podia remediá-lo. Quando estava a seu lado, sentia-se bem. Até a ameaça da insuportável dor que a esperava parecia dissipar-se quando estava a seu lado.
Não tiveram que usar a chave. A porta estava aberta. O quarto era tão brega que se mostrava quase insuportável, com sua colcha azul e rosa, seus almofadões com babados, seu dossel e suas cortinas confeccionadas com o mesmo tecido. Havia um grosso tapete azul no chão. E a cômoda estava provida de uma copia de um relógio antigo e de um abajur que parecia tirado do filme “E o vento levou”.
Amber cruzou o quarto e entrou no banheiro, fechando a porta atrás dela. Enquanto estava ali, abriu as torneiras da banheira para preparar um banho quente.
Quando retornou ao quarto, Edge estava deitado na cama, com os braços cruzados sob a cabeça, relaxado e cômodo.
— Que amável, me preparar um banho — disse sem olhá-la.
Ela franziu os lábios, aproximou-se da cama e se sentou a seu lado.
— Está bem, você pode se banhar primeiro. Falta pouco para que amanheça. Eu me banharei mais tarde.
— Ou podemos nos banhar juntos — lhe lançou um olhar com o cenho franzido. Ele deu de ombros — Demônios, o dano já esta feito, querida. Não pode ficar mais grávida do que já está. Já não posso fazer nada, não? Além de coisas boas.
— Edge, não acredito que...
Ele se sentou e deslizou uma mão sobre sua nuca. Amber guardou silêncio ao sentir sua carícia e fechou os olhos com reticência. Edge se inclinou sobre ela e lhe sussurrou ao ouvido:
— Desejo-a, Alby. Desejo-a desde a primeira vez que a vi.
Ela ficou tensa e franziu os lábios.
— Achei que estava fingindo.
— Não fui convincente? — chupou-lhe o lóbulo da orelha e ela estremeceu. — Não estava fingindo, coração. Achei que o desejo passaria quando a possuísse. Porque o fruto proibido é mais doce e essas coisas. Mas agora é mais intenso que antes — deslizou lentamente a mão por suas costas, movendo-a em círculos.
— Então, me deseja — disse ela.
— E você a mim — respondeu ele.
«Mas eu quero mais», pensou ela contra sua vontade. Fechou os olhos e disse a si mesma que não devia permitir que ele advinhasse seus pensamentos. Não só o desejava. Havia algo mais, algo tão profundo que transpassava sua alma. Sabia. Edge estava dentro dela, fazia parte de seu ser. Tinha sido assim desde o começo. O fato de compartilhar seu sangue tinha intensificado aqueles sentimentos, e possivelmente também a gravidez. Mas a razão de seus sentimentos carecia de importância. A única coisa que importava era que sentia por ele algo um milhão de vezes mais poderoso que o desejo. Não gostava de ser ela a que mais amava a que estivesse destinada a sofrer. Teria preferido mil vezes ser objeto de adoração e saber desde o começo que podia tomá-lo ou deixá-lo. Não ser nunca a que mais queria. Quantas vezes ela tinha dado aquele conselho para Alicia? Não amar nunca a um homem mais do que ele a ama. E nunca, jamais amar a alguém até o ponto de que a ideia de perdê-lo fosse paralisante.
— Me deixe abraçá-la, Alby — disse Edge em voz baixa — Deixe que eu apague sua angústia, embora seja só por um momento. Hum?
Maldição, não tinha força de vontade para resistir. Deixou que ele a beijasse e sentiu que todo seu corpo tremia. Edge era como chuva para seu árido e rachado deserto. Ele colocou os dedos entre seu cabelo e Amber se deleitou em seus beijos, em suas carícias, em sua essência. E de repente, ele afastou a cabeça.
Ao abrir os olhos, surpresa, Amber viu que estava observando seu rosto com o cenho franzido.
— Está... está chorando — murmurou ele.
Ela levou uma mão ao rosto para enxugar as lágrimas.
— É pela falta de sono e pelos hormônios — disse — Esquece isso.
— Não há nada em você que possa esquecer Alby — afastou meigamente seu cabelo do rosto e o pôs atrás da orelha — O que posso fazer para que se sinta melhor?
Ela piscou e pensou que pouco importava o que fizesse ou deixasse de fazer na hora que faltava para que amanhecesse. Já não podia amá-lo mais. Era muito tarde para isso. Tentando ignorar o convencimento de que estava destinada a sofrer um desengano de proporções abismais, apoiou-se nele e aproximou a boca da sua.
— Faça amor comigo — disse.
Edge a rodeou com os braços e a beijou ao mesmo tempo em que ficava em pé, levando-a com ele. Levou-a ao banheiro, sentou-a na beira da banheira e, afastando-se dela um momento, fechou a torneira. Logo passou a mão pela água um par de vezes.
— Bonita banheira. E grande — comentou enquanto tirava a camisa.
Deus tinha um peito de morrer. Amber deslizou as mãos sobre ele.
— Sempre treinou muito, certo? — perguntou ela — Mesmo quando era mortal.
Ele deu de ombros.
— Naquele tempo era, mas como exigência de meu trabalho — desabotoou-lhe a blusa e a tirou.
— Quer dizer que fazia parte de uma gangue?
Ele assentiu com a cabeça.
— Mas não era como hoje. Não éramos um monte de vândalos, e sim um grupo de meninos que faziam o que podiam para seguir em frente — inclinou a cabeça — Leu o arquivo de Stiles sobre mim.
Ela assentiu com à cabeça.
— Como sabe? .
— Vi-o. Enquanto dormia, estava ali com você, Alby. Em sua cabeça, dentro do quarto onde a prenderam. Era a coisa mais estranha.
Ela franziu o cenho, mas Edge a atraiu para si e a beijou de novo enquanto lhe desabotoava o sutiã e nesse preciso instante, Amber já não era capaz de concentrar-se no que significava tudo aquilo, nem em se talvez Edge sentia por ela algo mais que desejo.
Quando Edge acabou de lhe tirar os calças e se despojou das suas, Amber estava completamente concentrada no prazer, naquele instante. No modo como as mãos de Edge se deslizavam sobre suas costas, em como sua boca lhe beijava o pescoço e os seios, em como se apertava contra ela.
Edge deslizou as mãos por suas coxas, subiu-lhe as pernas e a fez rodear sua cintura com elas. Amber ficou aberta para ele e deixou que se esfregasse contra seu sexo. Logo, Edge entrou na banheira e se sentou lentamente, reclinando-se. Amber se ajoelhou sobre ele. Seus seios suspensos sobre ele. Edge começou a lamber um deles, mordiscando o mamilo até que ela deixou escapar um gemido. Logo, Amber se moveu sobre ele e abaixou, fazendo com que a penetrasse. Edge fechou os olhos, extasiado, e Amber começou a mover-se, a subir e a baixar sobre ele enquanto arranhava seu peito com as unhas para que sentisse o mesmo que ela.
Deus, que prazer.
Edge a segurou com força pelas nádegas, atraindo-a para si e logo moveu os quadris, afundando-se nela lentamente. Ela jogou a cabeça para trás e murmurou seu nome.
Mas ele continuou movendo-se devagar enquanto acariciava seu corpo com mãos e lábios. Passou os dedos por sua coluna, acariciou seus ombros e deslizou as mãos por seus braços. Era como se quisesse memorizar todo seu corpo. Quando passou a palma por sua barriga, ela baixou o olhar e viu que seu ventre estava inchado e arredondado. A mão de Edge tremeu ao tocá-la. Ela o olhou nos olhos, perguntando-se o que significava aquilo. Uma mulher grávida não tinha sintomas durante os primeiros dias da gestação. Duvidava Edge dela de repente, ao ver que seu corpo parecia empenhado em desmenti-la?
Não. Amber viu só um maravilhado assombro em seus olhos. E algo mais.
Edge baixou a mão até que roçou com o polegar seus clitóris, muito perto de onde se achavam unidos. Começou a esfregar-lhe e ela estremeceu. Seguiu lhe chupando os seios, cada vez com mais força, ao tempo que incrementava o ritmo de suas investidas. Logo, quando por fim a arrastou mais à frente do limite do prazer, ela começou a murmurar seu nome.
Edge a abraçou até que as convulsões do orgasmo começaram a desvanecer-se; logo a atraiu para si para que se deitasse sobre ele na água quente e começou a lhe acariciar o cabelo e a lhe beijar o pescoço.
— Melhor agora? — perguntou.
Ela fechou os olhos, cheia de prazer ao sentir seu corpo e seus braços rodeando-a.
— Sim — mentiu — muito melhor.
Talvez Amber se sentisse melhor, pensou Edge, mas ele estava só o pó. Ignorava que diabos lhe estava fazendo aquela mulher, que parecia ter se introduzido em suas veias para espalhar-se por seu organismo. Amber o estava mudando. E Edge não gostava disso. Não era justo, e não era o que queria. Demônios. Já não sabia o que queria. A vida tinha sido muito simples até que tropeçou com aquela mulher. Sempre soube exatamente o que queria. Suas prioridades eram limitadas: auto conservação e vingança. Mas de improviso aquelas coisas pareciam ter sido deslocadas por outras: a segurança de Amber, seu bem-estar, sua felicidade. E a de seu filho.
O filho de ambos.
Aquelas coisas tinham sido a princípio tão importantes como suas aspirações e seus desejos. Logo, se tornaram mais importantes. E nesse instante lhe parecia que tinham deixado de lado seu desejo de vingança e seu desejo de auto conservação. Essas coisas empalideciam comparadas com ela. E com o bebê.
Além disso, dentro dele estavam se operando outras mudanças. Se fez de repente mais forte, mais poderoso, mais sensível aos estímulos psíquicos. Aquela voz que ninguém salvo ele ouvia. A que o tinha conduzido até Amber; a que se divertiu vendo como o moíam a pauladas um monte de mulheres. Se desse uma olhada para trás, também acharia graça. E tudo era por ela. De alguma forma, seu sangue, seu sabor, seu contato o tinham mudado. Em todos os sentidos.
Não duvidava dela pelo suave inchaço de seu ventre. A própria Amber havia dito que ultimamente comia sem parar, e talvez estivesse inchada. Havia diversas razões que podiam explicar isso. Mas Amber não tinha mentido. Isso nem cogitava. O bebê era dele. Sabia com uma certeza que não podia nem queria questionar, e tinha a impressão de saber intuitivamente desde o começo. Deveria ter se dado conta no mesmo instante da concepção. Como não ia notar um homem quando seu mundo se via inexoravelmente alterado?
Amber tinha se apoderado dele. Edge se perguntava se ela sabia se sentia o quanto necessitava dela. Deus odiava aquela sensação. Estava completamente a sua mercê.
Abriram as torneiras de água quente e Amber se sentou na banheira, a seu lado, e o lavou, ensaboou-o e esfregou-o com uma esponja. Esfregou seus ombros e os braços, as axilas e logo o peito, onde se demorou um pouco mais.
Gostava de seu peito, pensou Edge com orgulho. Parecia prestar muita atenção nele. Por fim, ele posou suas mãos sobre ela e, sem dizer nada, tirou-lhe o sabão e a esponja e começou a lavá-la. Era ela quem estava grávida. Ela a que era a meia mortal. A fêmea, a mais fraca entre eles dois. Ao menos, Edge gostava de pensar que assim era, apesar de que tudo que Amber fazia demonstrasse o contrário.
Lavou-lhe os seios e logo a fez virar-se e esfregou suas costas. Parecia muito pequena e delicada entre seus braços. Poderia parti-la em duas como se fosse um raminho, e essa ideia o assustava profundamente. Deixou de lavá-la um momento e a abraçou, esperando que passasse aquele estremecimento que tinha sacudido sua alma. Não queria parar de pensar em quão frágil era, no quão delicada era a vida que albergava em seu interior.
— Edge? — murmurou ela.
Ele engoliu saliva e se obrigou a soltá-la.
— Vai amanhecer — disse como se aquilo explicasse seu momentâneo sobressalto.
— Apresse-se — disse ela, e se levantou como uma Vênus surgindo da espuma do mar. Saiu da banheira, ainda pingando, e vestiu um dos penhoares de cor verde esmeralda que havia no quarto e que na parte dianteira tinha bordado o nome da hospedaria em letras douradas — vou ver se estão bem fechadas as janelas.
— Não lavou seu cabelo.
— Posso lavar depois.
— Mas eu queria lavar para você.
Ela pareceu surpreendida e inclinou ligeiramente a cabeça, esboçando um tímido sorriso. Edge deu de ombros.
— Nunca lavei o cabelo de uma mulher.
Mas tampouco o tinha desejado nunca, pensou. Era patético. Dava graças ao céus porque Amber estiva grávida. Isso parecia razão suficiente para que se permitisse ficar a seu lado. Para que desfrutasse de sua luz, da qual não era digno.
Amber amarrou a bata, pegou uma toalha e se aproximou da janela do quarto de banho para pendurá-la sobre o vidro antes de fechar as cortinas.
— Não é o momento para isso, Edge, não se distraia.
— Já saio — disse ele.
Ela assentiu e saiu do banheiro. Edge acabou de banhar-se rapidamente, envolveu-se em uma toalha e se reuniu com ela no quarto. Amber tinha conseguido já tampar as duas janelas do aposento. Edge a olhou assombrado e sacudiu a cabeça.
— De onde tirou a fita colante e os sacos de lixo?
Ela sorriu.
— Lá de baixo. Dei uma volta pela cozinha enquanto você acabava de se banhar.
— Mas se só demorei cinco minutos.
— Está mais pra dez. E eu posso me mover quase tão rápido quanto você, sabe?
Ele assentiu, aproximou-se da cama com dossel, olhou-a e logo levantou a colcha e olhou debaixo.
— Acha que deveria me deitar debaixo?
Ela tirou a colcha de sua mão, afastou-a, despiu o penhoar e se meteu na cama. Depois deu um tapinhas sobre o colchão, a seu lado, sorrindo.
— Que demônios — disse ele, e se lançou à cama, abraçando-a — Ah, isto é muito melhor que compartilhar o tapete com os ácaros da poeira.
— Isso me parecia.
— Mas acha que será seguro?
— O que acontece com você, Edge? Não confia em mim? Ele a beijou no cabelo.
— Claro que sim.
— Não vou permitir que ninguém se aproxime de você enquanto esteja descansando. A porta está fechada com chave, com ferrolho e corrente. Assim relaxe. Ele inclinou a cabeça e olhou o relógio.
— Pode ser que ainda não queira relaxar –me — ela lançou um olhar inquisitivo e ele moveu as sobrancelhas — Faltam vinte minutos para que amanheça. Acha que há tempo suficiente?
— Para você ou para mim?
— Ufa! — Edge levou a mão ao peito como se estivesse ferido e logo sorriu e a atraiu para si.
— Era só uma brincadeira, sabe? — murmurou ela — É um amante incrível, Edge. Pode me levar a lugares com os quais nunca tinha sonhado — deu de ombros enquanto ele começava a acariciá-la — Embora a verdade é que não tenho muito com que comparar.
— Nem nunca terá se conseguir o que quero — ouviu-o resmungar ao mesmo tempo em que a estreitava entre seus braços. Mas o que o surpreendeu foi que o dizia a sério.
Amber ficou adormecida em seus braços e, ao despertar, a casa tinha ganhado de novo vida a seu redor. Cheirava a gente movendo-se de um lado a outro e vozes diversas. Gente comum. Gente comum e amável. Era de certo modo reconfortante achar-se rodeada de pessoas que não sabiam nada dela. Tomou uma ducha rápida e se alegrou ao encontrar em uma gaveta no banheiro escovas de dente envoltas em celofane e um tubo de creme dental de uso individual, junto com outras coisas de asseio, como desodorante, uma escova para o cabelo, um pequeno jogo de costura e um mapa da cidade mais próxima. Saltava à vista que Sally gostava que seus hóspedes se sentissem como em casa.
Quando acabou de arrumar-se, saiu do quarto, pôs o aviso de «Não incomode» na porta e decidiu colocar a corrente, por segurança. De pé no corredor, concentrou-se. Mover coisas pequenas com certa precisão era muito mais difícil que mudar de lugar objetos grandes. Utilizou o dedo indicador para enfocar o fluxo de energia, deslizou-o sobre a porta, levantou a corrente do outro lado e a deslizou na ranhura. Logo tentou abrir a porta para assegurar-se. Por fim deu meia volta e desceu as escadas.
Um casal acabava de sair pela porta principal da hospedaria, rindo sem parar. Amber se deixou guiar por seus sentidos até a cozinha, onde encontrou Sally embelezada com um vestido de flores e um avental branco, cortando verduras em uma tabua. Junto a ela, sobre a bancada, havia sete formas de bolos individuais, cheios de massa.
— Há torta de verduras para jantar? – perguntou. Sally levantou o olhar, sobressaltada e, ao fazê-lo cortou o dedo, preferiu um grito e sobressaltou-se. A faca caiu ao chão e ela segurou a mão ensanguentada.
— Oh, desculpe! Sinto muito! — Amber se aproximou dela apressadamente, arrancou uns pedaços de papel de um rolo e os apertou contra a mão de Sally — Aguente firme. Vou buscar ataduras — disse.
— Por aí, no banheiro, no fundo do corredor à esquerda — disse Sally apontando com a cabeça. As lagrimas saltando aos olhos — E não se desculpe — acrescentou rapidamente.
— Poderia me dar um chute na bunda — Amber foi ao banheiro em busca de gaze e anti-séptico.
Mas logo se deteve com as coisas nas mãos, recordando o efeito que tinha surtido seu sangue sobre as queimaduras de Edge. Só podia curar a ele ou a um vampiro, ou aquilo funcionava com todo mundo?
Umedeceu os lábios, rebuscou um pouco mais no armário e ao fim encontrou um alfinete. Logo levou todas as coisas à cozinha, com ela. Arrancou umas partes mais de papel, molhou-os na pia e se aproximou de Sally.
— Sente-se. Me dou muito bem com essas coisas.
— Espero que sim. Temo que é mais profundo do que acreditava. Pode ser que precise de pontos.
— Deixe-me dar uma olhada — Amber tomou sua mão, virou-a e com a mão livre afastou os papéis molhados de sangue. O corte estava no meio do dedo indicador, e era profundo. Assim que cessou a pressão, começou a sangrar outra vez.
— Oh, céus — disse Sally.
— Não deveria olhá-lo ou ficará enjoada — Amber começou a sentir-se mal ao ver tanto sangue, mas conseguiu se recompor. Recoste-se na cadeira, feche os olhos e mantenha os dedos apertados, assim — ensinou-lhe como tinha que apertar sobre o indicador — Aperte com força.
Terá que deter a hemorragia. Sally fez o que ela dizia, fechou os olhos e apertou. Amber levantou a toalha de papel, trocou-o por um novo e limpou o sangue. A hemorragia começou a abrandar.
Olhou a Sally para assegurar-se de que tinha os olhos fechados, agarrou o alfinete e furou com ele no dedo indicador.
Quando o sangue começou a brotar da espetada, afastou de novo os papéis e apertou o dedo para que caíssem algumas gotas sobre a ferida da Sally. Logo voltou a tampar o ferimento com as toalhas de papel.
— Segure-o forte — disse a Sally.
Sally obedeceu e franziu o cenho.
— Que sensação tão... estranha, querida.
— Estranha? — perguntou Amber enquanto desembrulhava o band-aid decorado com rosas.
— É como uma coceira, muito fria e muito quente ao mesmo tempo — abriu os olhos e pareceu preocupada.
— Acha que cortei um nervo ou algo assim?
— Não se preocupe não lhe aconteceu nada. Feche os olhos outra vez. Já estou acabando.
Sally obedeceu e voltou a recostar-se na cadeira. Amber levantou as toalhas de papel. Mas viu que não continuava sangrando. Quando limpou o resto de sangue, comprovou que não havia mais ferida alguma. Só uma pálida linha rosa onde antes tinha estado o corte.
Abafou a exclamação de surpresa que aflorou de seus lábios e limpou o sangue, pôs um pouco de anti-séptico em um band-aid e o colou no dedo.
— Pronto – disse — Acabei.
Sally estava olhando pasmada para ela.
— Já não me dói — disse.
— Bom, pode ser que esse anti-séptico tenha algum analgésico tópico.
Sally olhou o dedo com o cenho franzido, dobrou-o e voltou a endireitá-lo.
— Mas não me dói absolutamente. É como se não tivesse cortado.
— O que quer que eu diga? Sou boa com os curativos — Amber sorriu — Agora, o que acha de limparmos esta confusão e a ajudo a acabar essas tortas de verduras.
— Você é uma hóspede, querida. Nem sonhe.
— Tolices. Por minha culpa você se cortou. Devo-lhe uma.
— Mas se nem sequer tomou o café da manhã.
— Oh, não se preocupe. Penso beliscar algo enquanto a ajudo. Por que acredita que vim à cozinha?
Sally sorriu.
— Guardei o café da manhã para você e seu marido. Sirva-se — apontou com a cabeça o frigorífico.
Amber o abriu e viu dois pratos envoltos em papel alumínio. Levantou o papel de um e viu umas torradas francesas, uns esponjosos ovos mexidos, batatas fritas e salsichas. Afastou o papel alumínio, tirou as salsichas do prato e as envolveu no papel alumínio. Logo fez o mesmo com o outro prato.
— Sou vegetariana — explicou a Sally ao ver que ela olhava espantada.
— Ah, o verão passado tive um vegetariano. Não se preocupe querida. As batatas estão fritas em azeite vegetal e nem sequer na mesma frigideira.
— É um alívio. Deus, estou morta de fome tirou os dois pratos, colocou um no microondas, deixou o outro na bancada e apertou o botão.
— Vai levar um prato para seu marido?
— Oh, não acredito que desperte antes da hora do jantar. Vou comer os dois sozinha.
Sally sorriu amplamente. Levou os papéis e os pacotes dos curativos ao lixo e lavou as mãos na pia.
— Céus, eu imaginava que era uma dessas jovens que comem como passarinho. Está tão magra...
— Não estou acostumada a comer tanto — reconheceu ela.
Sally passeou o olhar pelo corpo de Amber e o pousou sobre seu ventre.
— Há alguma razão para isso? — perguntou com um sorriso.
Amber umedeceu os lábios.
— A verdade é que agora como por dois.
Sally levantou o olhar com um sorriso.
— Está grávida!
Amber assentiu.
— Faz alguns dias que fiquei sabendo.
— Oh! — Sally deu uma palmada e voltou correndo ao balcão, onde a esperavam suas tortas — Coma. Eu acabo isto em seguida. E logo nós vamos ao povoado comprar roupinha de bebê.
— Sério?
— Oh, querida, claro que sim. Vamos, atenda-me e coma isso.
O microondas começou a apitar. Amber tirou o primeiro prato, colocou o segundo, segurou um garfo e uma garrafa de suco e se pôs a comer.
Edge se manteve nas sombras enquanto Amber agradecia a Sally pela enorme cesta de comida que lhes tinha preparado para a viagem. Não devia se surpreender, pensou que Amber tinha ganho o afeto daquela mulher no espaço de um só dia. O seu o tinha conquistado em um abrir e fechar de olhos.
Sorriu, disse adeus com a mão, tirou a pesada cesta de Amber e se dirigiu ao carro. Amber abriu a porta do acompanhante e ele colocou dentro a bolsa. Logo a olhou com o cenho franzido.
— Faz frio esta noite. Terá que ligar a calefação. Não acha que a comida estaria melhor no porta-malas?
— Não — apressou-se a dizer ela.
Edge franziu o cenho e inclinou a cabeça.
— Tem escondido a outro vampiro aí, Alby? Ela fez girar os olhos e se aproximou do lado do condutor.
— Não seja ridículo.
— Bom, sei que você gosta de nos trancar no porta-malas. E está claro que não quer que bisbilhote aí atrás.
Ela colocou a chave no contato e ligou o motor.
— Vem comigo ou vai ficar aí?
Edge franziu os lábios e entrou no carro. Logo a olhou enquanto ela punha o carro em marcha e voltou a olhá-la.
— Você mudou de roupa — disse.
— Mmm... mmm... Sally me levou às compras. E precisava muitíssimo me trocar.
Edge se fixou em seu vestido de algodão solto, adornado com fitas lilás e brancas e girassóis amarelos, e em sua jaqueta de tricô na cor amarela.
— É bonito — disse — Embora um pouco discreto para você.
— Eu não sou discreta?
Lançou-lhe um olhar.
— Você é apaixonada. Deveria usar cores vivas, não tons pastel. E cetim e veludo, não algodão — franziu um pouco o cenho — Está tentando mudar, não?
Ela deu de ombros.
— Por que ia querer mudar?
— Pela gravidez. Acha que deve se comportar como uma futura mãe, Alby? Ser respeitável, discreta..., apagada? — ela não o olhou, e Edge advinhou que tinha acertado na mosca — Não tente diluir suas cores, amorzinho. De qualquer modo, não servirá de nada. São muito brilhantes para que as cubram as cores mais pálidas. O que fará será destacá-las.
Ela ficou pensando um momento. Logo disse:
— Supus que tinha que ir me acostumando. Estava procurando roupa de gestante, e quase todas são em tons pastel muito suaves e com estampado de flores. Além disso, comi tanto que esta manhã quase não podia abotoar as calças.
— Roupa de gestante — disse ele — eu não o tinha pensado que dentro de pouco estará inchada como uma bola, verdade?
Ela virou a cabeça tão rapidamente que Edge pensou que podia ter quebrado o pescoço.
— Algum problema com isso?
Ele sorriu, olhou-a de cima abaixo e ao tentar imaginar-lhe com a barriga inchada como uma bola de praia sentiu disparar o coração. Estendeu o braço e lhe tocou a barriga.
— Difícil de acreditar. É tão miúda que dá a impressão de que não será capaz de se esticar tanto.
— Oh, espera e verá — disse ela como se fosse uma ameaça.
— Penso em fazer isso — ele seguiu lhe acariciando a barriga — Uma vez vi uma escultura de uma deusa. Era verde como um bosque e tinha um ventre enorme e uns seios também enormes. Parecia uma selvagem, a mãe terra, e, entretanto tinha uma expressão muito... serena. Nesse momento pensei que era a coisa mais bonita que tinha visto — disse com um sorriso — Assim vai ser você, AIby. Como a mãe terra, uma deusa da natureza.
Quando se atreveu a olhá-la de soslaio, ela estava boquiaberta e piscava como se nunca o tivesse visto. Ele deu de ombros.
— Tem razão, é a coisa mais brega que já disse. Acredito que seus hormônios estão me afetando também. Deve ser por causa do seu sangue.
Ela esboçou um sorriso.
— Tem um lado terno, sabe?
— Nada disso.
De repente se ouviu um estalo parecido com um disparo e o carro girou bruscamente à esquerda. Amber segurou o volante com todas as suas forças e pisou no freio enquanto o carro se sacudia de um lado a outro.
Edge pegou o volante para ajudá-la a segurá-lo, de repente sentiu uma onda de pânico e começou a pensar na pequena vida que Amber levava em seu ventre e em quão frágil era.
O carro se deteve por fim no meio fio. Edge se virou para Amber e pôs as mãos no seu ventre enquanto esquadrinhava seu rosto ansiosamente.
— Está bem? Se machucou? O bebê...?
— Estou bem... Estamos bem.
Ele fechou os olhos e deixou escapar um suspiro de alívio. Nunca tinha se assustado tanto. Enquanto a auto conservação tinha sido sua principal prioridade, nunca tinha se preocupado se ia viver ou morrer. Havia decidido, naturalmente, que preferia continuar vivo, mas não tinha medo da morte.
Agora em compensação... estava tremendo de medo por uma simples derrapagem. Era aquele o efeito da paternidade? Nunca teria acreditado ser capaz de cair tão baixo.
Deixou escapar um suspiro e se recostou no assento, Abriu a porta e saiu para ver o que tinha acontecido. A roda do lado do condutor estava mucha e tinha uma fenda larga. Amber saiu e se aproximou dele.
— O que aconteceu?
— Um pneu estourou — disse — Não é grave. Posso consertar. As chaves?
Ela as pôs na mão e Edge apertou o botão do chaveiro que abria o porta-malas. O porta-malas se abriu como por arte de magia e se aproximou da parte de atrás do carro. Amber deixou escapar de repente uma exclamação de alarme e correu atrás dele.
— Espera!
Ele não deu atenção. De repente ficou parado, olhando o interior do porta-malas, que estava cheio de sacolas semitransparentes nas cores rosa e azul, com um logotipo onde se via um ursinho de pelúcia. Olhou para Amber e ela baixou os olhos. Logo voltou a olhar as sacolas, abriu uma e olhou o que continha. Tirou um coelhinho de pelúcia marrom, com as orelhas caídas, uma pequena colcha xadrez amarela e pequenos sapatinhos, um montão de camisetinhas brancas e uns quantos pijamas minúsculos de tecido muito suave e de todas as cores do arco íris.
Edge levantou a cabeça de novo e a olhou aos olhos enquanto sustentava os pijaminhas.
— Você foi comprar roupa para o bebê — Ela assentiu — e não queria que eu visse?
Amber franziu os lábios e fez um esforço para lhe sustentar o olhar.
— Não sei por que comprei. Pode ser que o bebê não tenha oportunidade de usar.
— Não diga isso.
— SalIy me levou a povoado, às lojas de crianças. Vi estas coisas e me pus um pouco... Tola. Me esqueci do que sei. Deixei-me levar pela esperança.
Edge a segurou pelos ombros e a fez virar-se para olhá-lo.
— Deve ter esperança. Maldita seja Alby, se você não tiver quem demônios vai ter? Se você não tiver fé, que esperanças pode ter o bebê? – ela o olhou com os olhos cheios de lágrimas — Para de tentar se proteger da dor, Alby. Sabe perfeitamente que não pode. Acontecerá o que tiver que acontecer. Mas não pode encolher-se como uma ratazana a esperar que as coisas que teme passem. Tem que lutar.
Ela o olhou nos olhos.
— Isso foi mais ou menos o que me disse Alicia.
— Alicia é uma garota muito esperta. Amber umedeceu os lábios.
— As visões nunca falharam.
— Pois que se danem às visões. Não há nada seguro. Qualquer pequena mudança que faça pode alterar o futuro e você sabe.
Ela piscou, pareceu se controlar e engoliu saliva.
— Como desejo acreditar nisso.
— Pois não deseje. Acredite. — sacudiu-a suavemente — Faça isso, Alby. E sabe o que eu penso? Que nenhum filho meu vai se render sem lutar.
— Mas não sei se terei forças para suportá-lo se...
— Eu terei forças pelos dois — disse ele, embora não estivesse muito seguro disso. Apertou-a contra seu peito e a beijou no cabelo. .
Após um momento, sentiu que ela relaxava. Logo sentiu que começava a soluçar suavemente.
— Não... não sabia que cores escolher. Assim... comprei das duas.
— Então, não tem nenhum pressentimento sobre se será menino ou menina? — perguntou Edge.
Ela deixou de soluçar, ergueu-se um pouco e o olhou, sorrindo apesar das lágrimas.
— Não tenho nem ideia.
«Sou um menino. Meu nome é J.W., embora mamãe me chame de Jimmy. Diga que eu gosto de azul e de verde, e sobre tudo o vermelho. eu adoro o vermelho».
Edge franziu o cenho ao sentir de novo aquela voz em sua cabeça.
— Minha mãe diz que ela me notou em seguida. Sabia que era uma menina e como seria.
«Tenho o cabelo de minha mãe, quase negro, com esses reflexos vermelhos como de sangue. Mas o rosto e o cabelo são seus. Quando tiver dezenove anos, as pessoas que nos virem juntos pensarão que somos irmãos».
— Que diabos...? — murmurou Edge.
Voltou a guardar os pijaminhas e afastou as sacolas para tirar a chave de roda e o macaco.
— Minha mãe diz que inclusive havia uma espécie de... comunicação entre nós quando eu ainda estava em seu ventre — disse Amber, que estava a seu lado, com as mãos sobre a barriga — E depois também. Ainda continua sendo muito forte. Posso ocultar o que estou pensando de todo mundo, mas com minha mãe é quase impossível — umedeceu os lábios e suspirou — Edge, preocupa-me não sentir essas coisas pelo bebê. Não deixo de pensar que talvez seja sinal de que não está bem.
— Ou poderia ser porque, neste caso, o vínculo psíquico é com o pai.
Tirou a roda e ficou ali parado, com o pneu em uma mão e o macaco na outra enquanto Amber o olhava desconcertada.
— O que quer dizer?
— Acabo de me dar conta. — disse ele — Essa voz que ouço a que me disse onde estava quando Stiles a mantinha prisioneira e quando foi à casa das Irmãs do Ateneu — sacudiu a cabeça como se ele tampouco acreditasse que era o bebê.
Ela o olhou com os olhos como pratos.
— Edge!
— Não mentiria a você, Alby. É um menino. Diz que gosta de azul e de verde e, sobre tudo, de vermelho, e que tem seu cabelo e meus olhos — franziu um pouco o cenho — Além disso, achou muita graça que um monte de garotas dessem uma surra em seu velho..., embora suponha que não sabia o que ia acontecer.
— Ele... fala com você?
Edge assentiu com a cabeça.
— Sim. E, além disso, fala-me de seu futuro, de como será quando tiver dezenove anos. Não acha que isso sugere que suas visões poderiam estar erradas, Alby?
— Eu... não sei.
— Pois ele sim. Sabe o que estamos pensando e ouve o que dizemos. E não acredito que ache engraçado ouvir você dizer que está condenado desde o nascimento.
— Não, claro que não.
Edge assentiu com firmeza e aproximou a roda à parte dianteira do carro. Apoiou-a contra o pára-choque e se ajoelhou para colocar o macaco debaixo.
— Edge, por que se incomoda em colocar isso? — perguntou ela com suavidade. E ele compreendeu que estava ansiosa por se pôr de novo a caminho.
Deu de ombros, olhou para os lados, viu que não vinha nenhum carro e se levantou, erguendo o carro com uma mão. Amber se agachou e tirou os parafusos com os dedos. Extraiu o pneu furado de um puxão, pôs o novo e voltou a colocar os parafusos a toda velocidade. Logo ficou de pé e sacudiu o pó das mãos enquanto Edge voltava a baixar o carro.
— Por que será que não fala comigo? — perguntou.
Edge recolheu a roda velha e o macaco e voltou a guardá-los no porta-malas.
— Não sei. Por que você não falava com seu pai antes de nascer? — ela deu de ombros — Era porque ama mais a sua mãe?
— Claro que não! Eu adoro a meu pai. Ele... Ah, vejo aonde quer chegar com isso — esboçou um sorriso — Obrigado.
— Escuta, avisarei você na próxima vez que esse girino me fale. Pode tentar escutar através de mim. Já sabe que entre você e eu há um vínculo muito forte.
— Isso é dizer o mínimo.
— Então certamente saberá que agora eu quero conduzir.
— Sim — disse ela — E você saberá que estou morta de fome e que preciso parar em alguma parte e comer um sanduíche vegetal ou morrerei.
Ele sorriu.
— Sim, sei. Mas o que acontece? Enjoou das coisas que Sally preparou?
Ela fez uma careta.
— Acabaram faz uma hora.
— Pararei no primeiro lugar que veja — disse ele com um sorriso.
Edge estacionou no caminho de entrada do imóvel dos Marquand exatamente depois de meia-noite. Enquanto desligava o motor, deixou escapar um assobio.
— Quase uma choça. Parece uma versão em miniatura da Casa Branca.
— Eric gosta de viver muito bem. Embora esta casa seja mais moderna que as que está acostumado a escolher.
— Ah, sim?
— Eric gosta mais dos castelos.
— Pode ser que tenha se cansado de viver como um clichê — Edge abriu a porta, saiu e rodeou o carro com intenção de abrir a porta, mas Amber saiu antes que chegasse.
— Aí está Tam — disse, e começou a agitar a mão ao ver que Tamara descia a elegante escadaria, flanqueada por pilares idênticos.
Amber correu para ela e a abraçou com força. Tamara levava calças jeans e uma camisa branca de renda, e seus longos cachos negros caíam sobre os ombros como um xale. Amber suspirou cheia de felicidade ao ver de novo a sua querida amiga.
— Fazia muitíssimo tempo, anjo. Como está?
— Bem. Eu... tenho muitas coisas que contar a você, Tam. Muitíssimas — baixou os olhos um momento e voltou a levantá-los ao ouvir os passos de Edge. Tamara, este é Edge.
— Ouvi falar muito de você — disse Tam, estendendo a mão.
Edge a estreitou.
— Não acredito que tão bem como eu ouvi falar de você, temo. Mas espero que me conceda o benefício da dúvida — disse com um leve sorriso, mas Amber notou em seu voz, certo sinal de preocupação. Seriamente o preocupava o que pensasse sua gente dele?
— Ouvi que salvou a vida de Amber algumas vezes, conforme me disse sua mãe, e isso me basta — afastou-se para o lado — Entrem. Estávamos esperando vocês.
Edge entrou com Amber na casa. Amber levantou o olhar para ele e se perguntou se estava nervoso ou se acontecia alguma outra coisa. Parecia um tanto distraído.
Tam os conduziu a uma elegante sala de estar decorada com móveis antigos. Eric sempre teve fraqueza pelos móveis de madeira grandes e opulentos de diversas épocas e culturas, e isso se notava na sala. Havia ali quatro homens sentados. Dante, Donovan, Roland e Eric. Os quatro se levantaram para lhes dar as boas-vindas. De todos eles, Roland era o único que estava vestido formalmente. Usava um traje negro e uma camisa branca com a gola engomada.
Amber não sentiu sinal algum de animosidade entre eles, e começou a suspeitar que sua mãe lhes tinha contado seu pequeno segredo. O que possivelmente estava bem.
Tirou de sua mochila a pequena ampola e a deu ao Eric.
— É uma amostra da fórmula que Stiles fabricou a partir de meu sangue na última vez que me prendeu. Mandamos a outra metade a Salem, para o Will. Mas... isto é tudo o que há.
Eric tomou a ampola e assentiu.
— Estive fazendo análises do sangue de Stiles desde que o trouxeram para cá. Mas...
— Não teve sorte?
Eric sacudiu a cabeça.
— Sim, tive sorte. Mas sempre má. Seu sangue está se deteriorando. E muito rapidamente, temo. As mudanças que experimentou estão revertendo. Em outras palavras, está envelhecendo.
Amber franziu o cenho.
— Disse-me que ainda demoraria várias semanas a experimentar esses sintomas.
— E certamente pensava que era certo.
— Também me disse que precisava injetar o soro a cada seis meses, mais ou menos.
Desta vez... há algo diferente.
Amber franziu o cenho.
— O que?
Eric sacudiu a cabeça.
— Não sei — levantou a ampola — Pode ser que com isto seja capaz de duplicar a fórmula.
— E, quando o fizer, criará uma nova dose para o Willem.
Ele desviou os olhos.
— Cruzaremos essa ponte quando chegarmos a ela — olhou para Edge — Está morto de fome.
— Desta vez, adiantei-me, meu amigo — disse Roland.
Amber notou que Roland tinha saído da sala discretamente e voltou com uma taça de cristal sobre uma bandeja de prata que ofereceu ao Eric. Edge tomou a taça com o cenho franzido, farejou-a e logo apurou seu conteúdo.
— Que delícia — disse ao deixar de novo a taça na bandeja — Obrigado, já me sinto muito melhor — se virou para o Eric — Onde mantêm Stiles?
— Edge... — começou a dizer Amber.
Ele a olhou aos olhos.
— Não vou matá-lo, Alby. Ainda. Só quero vê-lo.
Ele sustentou seu olhar, tentando advinhar o que estava pensando. Donovan se interpôs entre eles.
— Levarei você até ele. Está em cima, em um dos quartos.
— Contou algo?
— Não, nada — disse Donovan . — Vamos, é por aqui — os dois começaram a subir as escadas.
Amber suspirou e se voltou para Tam.
— Jurou vingar-se do Stiles faz muito tempo. Leva mais de quarenta anos perseguindo-o.
— Sabe por que? — perguntou Tamara.
Amber assentiu.
— Edge era uma espécie de... mentor e protetor de um pequeno grupo de pintinhos. Meninos de rua a quem tinham transformado sendo muito jovens e a quem seus sires tinham abandonado.
— Como ele — murmurou Tamara, e olhou de novo para Amber — Donovan nos explicou o que aconteceu.
— Edge queria com loucura a esses pirralhos. Não me disse nada, mas eu noto. Stiles os matou a todos.
— Oh, Meu deus — Tamara fechou os olhos E sacudiu a cabeça — Acha que Edge tentará matar ao Stiles outra vez aqui?
Amber engoliu saliva.
— Não acredito que tenha mentido para mim, mas no caso de...
— Manteremos Stikes vigiado, Amber, não se preocupe — prometeu-lhe Dante — Vamos, vá ao laboratório com o Eric. Têm muito trabalho a fazer.
Amber suspirou e seguiu Eric através da casa, até chegar ao laboratório.
— Sente-se, Amber. Suponho que a primeira coisa que devo fazer é tirar outra amostra de seu sangue.
Ela esticou os lábios, sabendo que Eric se inteiraria em seguida de seu segredo. Mas, mesmo assim, tirou a longa jaqueta. Logo ficou muito quieta, olhando a barriga.
— Oh, Meu deus — murmurou.
Eric deu a volta, olhou-a com os olhos como pratos E piscou lentamente.
— Há algo que esqueceu de me dizer, Amber.
Edge entrou no quarto com Donovan e deu uma olhada em seu redor. Havia um macio tapete, uma cama de casal grande com um grosso edredom e travesseiros e uma mesinha de noite antiga com uma jarra de vidro com água e um copo.
— De quem foi a ideia? — perguntou Edge amargamente.
— Perdão?
— Bom, quando Stiles prende a um de nós, mete-nos em uma masmorra ou em uma jaula. Quem decidiu lhe dar a suíte presidencial?
Donovan suspirou.
— A vingança não é o estilo dos Marquand, Edge. Além disso, não têm jaulas nem masmorras.
— E não os preocupa que escape?
— Venha. Vamos dar uma olhada nele.
Edge se aproximou da cama e se deteve em seco ao ver o rosto de Stiles, que o grosso edredom tinha impedido de ver da porta.
Este jazia na cama, muito pálido. Tinha o rosto sulcado de rugas e seu cabelo se tornou completamente branco. Abriu os olhos fracamente, mas ao ver o Edge não pareceu assustado.
— Bem – resmungou — Estava esperando que aparecesse. Mate-me e acabemos de uma vez.
Edge franziu os lábios e o ignorou.
— Parece ter envelhecido vinte anos. Que merda aconteceu?
— Não sabemos. Não acredito que se deva unicamente a que os efeitos do elixir estejam revertendo, embora acredite que Eric tenta com que Amber não se preocupe. Se o Ambrósia-6 tivesse começado a enfraquecer, segundo as notas que temos, Stiles teria começado a envelhecer outra vez, mas só até alcançar sua verdadeira idade cronológica. Mas não é isso o que está acontecendo. Em muito pouco tempo envelheceu muito mais, e parece que isto não tem fim.
Edge inclinou a cabeça e tentou entrar na mente de Stiles.
— Ele sabe o que lhe acontece — disse ao fim.
— Sim, nós pensamos o mesmo. Mas se nega a falar.
— Oh, falará.
— Edge, não pode permitir que...
Edge voltou a olhar ao homem da cama.
— Continuando assim, estará morto dentro de duas semanas. Suponho que não vai querer levar seus segredos para a tumba.
Donovan baixou a cabeça. De repente, Tamara disse detrás deles suavemente:
— Não, Edge. Não pensamos em permitir isso — os dois se voltaram para olhá-la — Só esperamos descobrir o que necessitamos sem recorrer à violência. Ou à tortura.
— E se não puderem? — perguntou Edge.
Tamara baixou os olhos.
— Ainda temos tempo.
Edge franziu os lábios e se voltou para olhar ao Stiles.
— Bom, velho — disse-lhe , — parece que dispõe ainda de algum tempo para dizer-nos o que sabe. Mas não resta muito. Eu não tenho tantos escrúpulos como essa gente.
Deu meia volta e saiu do quarto, mas logo que saiu ao corredor sentiu uma pontada de pânico que vinha de Amber.
— Alby?
Algo terrível estava acontecendo. Lançou-se pelo corredor correndo a toda, desceu as escadas e cruzou a casa deixando-se levar por seu instinto. Não se deteve nem sequer ao dar-se conta de que os outros o tinham seguido. Não tinha que parar para olhar nos aposentos para saber que porta o levaria a Amber. Simplesmente, sabia e, quando encontrou aquela porta, abriu-a de par em par.
Ela se voltou lentamente para olhá-lo. Tinha os olhos úmidos e um olhar assustado. E o ventre tinha inchado tanto que o tecido do vestido parecia a ponto de rasgar.
— Oh, Meu deus — murmurou Tamara atrás dele — Amber... Amber... está grávida?
Amber sustentou o olhar de Edge.
— Sim — disse — Estou de quase uma semana.
— Uma semana? Mas... — Tam não acabou a frase e deixou escapar um débil gemido.
— Pensava que estava inchando e que talvez estivesse engordando um pouco, porque estive comendo sem parar, mas... isto...
— Não entendo — disse Edge em voz baixa.
— Algo vai mal, Edge — murmurou ela — Algo vai terrivelmente mal.
Ele sacudiu a cabeça com veemência e a estreitou entre seus braços, confiando em que ela não sentisse o medo que começava a paralisá-lo, nem o medo que o fazia tremer até a medula dos ossos.
Amber deixou que a abraçasse um instante, mas logo se separou dele bruscamente e, dando meia volta, pôs-se a correr. Edge deu um passo para frente, mas Tamara se interpôs em seu caminho e apoiou uma mão sobre seu peito.
— Precisa desabafar Edge. E não vai fazer isso na sua frente.
— E por que não, merda?
Ela sorriu suavemente, como se soubesse coisas que ele ignorava.
— Eu irei com ela. Você pode ficar aqui e averiguar o que meu marido está fazendo.
Edge se virou e viu o Eric curvado sobre uma tela de computador, olhando rapidamente o conteúdo de uma página. Parecia estar procurando algo de concreto.
— O que ocorre?
Eric sacudiu a cabeça. Tam já se foi. Donovan e Dante se retiraram discretamente. Mas Roland se aproximou e lhe pôs uma mão sobre o ombro.
— Dê a ele um momento. Falará assim que saiba o que é. Enquanto isso, meu amigo, suponho que devo dar o parabéns. Isto é uma espécie de milagre.
Edge lhe lançou um olhar.
— Pode ser que seja um pouco cedo para isso, Roland.
— Não, se tiver conquistado o coração de Amber, moço.
Ele levantou um momento o olhar, disposto a lhe dizer que não era assim, mas logo pensou que não era muito agradável para Amber dizer a sua família que se deitou com um homem pelo qual não estava apaixonada.
— Que diabos pode estar acontecendo? Como pode estar tão... tão gorda tão cedo?
Roland deu de ombros.
— Está seguro da data em que... bom, já sabe, em que ela e você...?
Edge assentiu.
— Ela era... — refreou-se de repente e começou de novo — Foi sua primeira vez. Não há engano possível. E, além disso, não é algo que eu possa esquecer facilmente.
— Aqui está... Sim, exatamente aqui — Eric se levantou — Alicia mandou um correio eletrônico enquanto estávamos descansando. É sobre as notas mais recentes do Stiles, as que estavam no disquete que pegou da casa das Irmãs do Ateneu. Escutem isto: «O Ambrósia-7 está pronto, e embora não necessite injetar-me até dentro de umas semanas, que melhor sujeito de estudo que eu mesmo? Na realidade, há algum tempo estou convencido de que tratamentos mais frequentes aumentariam minha fortaleza física e meus poderes psíquicos. Só vacilo em pôr a prova minha teoria devido dispor de uma provisão muito limitada do Ambrósia-6. Agora, tendo em minhas mãos a fonte e depois de ter decidido... » Oh, Meu deus.
— O que? — perguntou Roland, alarmado.
Edge ficou imóvel, com a mandíbula tensa e o rosto crispado.
— «Agora, tendo em minhas mãos a fonte e depois de ter decidido clonar todos os indivíduos fonte dos que possa ter necessidade no futuro, não há razão para demorar mais. Esta noite começo o novo tratamento» — Eric levantou a vista da tela e olhou ao Edge — Estas notas datam da noite em que resgataram Amber — sondou os olhos do Edge – Ele o fez? Injetou-se?
Edge deu de ombros.
— Como caramba quer que eu saiba? E o que importa, além disso? Isso não tem nada que ver com o que está acontecendo a Amber e a meu filho.
— Claro que... — Eric se deteve de repente — Filho? Já sabe que é um menino?
Edge assentiu e começou a andar de um lado para outro, passando uma mão pelo cabelo.
— Lamento ter gritado. Estou um pouco...
— Irritado? — disse Roland.
Edge fez uma careta, suspirou e voltou a olhar para Eric.
— Quando pus a porta abaixo, Stiles estava de pijama. O que tivesse planejado fazer naquela noite, já o tinha feito. Assim que o mais provável é que, se não mudou de ideia, já tivesse se injetado o soro.
Eric assentiu.
— É perfeitamente lógico.
— Para mim, não.
— Temo que eu também me perdi, Eric. — disse Roland — Explique-se, por favor.
— Stiles está envelhecendo a passos rápidos. E o bebê também parece estar desenvolvendo-se a um ritmo vertiginoso — olhou ao Edge — Está seguro de que é seu filho? — Edge pôs cara de poucos amigos e Eric se apressou a levantar uma mão para tranquilizá-lo — O que quero dizer é que, se estiver seguro de que a gravidez não se deve a que Stiles lhe implantasse um embrião clonado.
Edge assentiu.
— Estou seguro. Amber estava grávida antes que Stiles a apanhasse — olhou nos olhos do Eric — Não se incomode em me perguntar como sei. O caso é que sei.
— Está bem — Eric franziu o cenho e ficou pensando.
— Então, o sangue de Amber contém alguma substância que acelera o processo de envelhecimento? — perguntou Edge, ansioso por esclarecer tudo aquilo.
— Isso parece, mas o curioso é que antes não acontecia. Seu sangue parece ter mudado depois da gravidez.
— Poderia ser por causa da gravidez? — perguntou Roland.
— Poderia ser. Eu diria que é o mais provável.
Edge sacudiu a cabeça e levantou as mãos.
— Eu me queimei no outro dia. Alby cortou-se no braço. Pensava em me dar de beber para que me recuperasse, mas uma gota caiu no meu braço e...
— E o que? O que aconteceu? — perguntou Eric.
— Me curei. Senti um comichão e uma queimação na pele e... curei-me. Como se não tivesse acontecido nada.
— É assombroso — murmurou Roland.
— Mas tem sentido. Seu sangue acelera os processos físicos, a regeneração celular, a cura.
Edge sacudiu a cabeça.
— Sim, mas o que significa tudo isto? Nascerá meu filho dentro de uma semana e alcançará a velhice dentro de um par de anos? — olhou ao Eric com ansiedade.
Eric baixou o olhar.
— Oxalá soubesse.
— Meu deus, isto não pode estar acontecendo — Edge jogou a cabeça para trás e sentiu que a dor de Amber caía sobre ele como uma onda — Amber não poderá suportá-lo.
— Chegaremos ao fundo da questão. Eu só... só necessito mais tempo — Eric levantou uma mão — Sei, sei. Tempo é precisamente o que não temos.
Edge umedeceu os lábios.
— Tenho que ir atrás ela.
— Anda, vai — disse Roland — Deve lhe dizer o que está acontecendo — olhou ao Eric — vou chamar ao Jamey — virou-se e saiu da sala. — Jamey? — perguntou Edge da porta.
— Para o Roland, Jameson sempre será Jamey, por muito velho que fique e por muitos netos que tenha. Virtualmente ele o criou, sabe?
— Não, não sabia — Edge se levantou e se voltou para o corredor — Como caramba vou dizer isto a ela?
— Ainda não temos nenhuma certeza, Edge. Conviria que esperasse até que saibamos algo mais.
— Não sei se será possível ocultar-lhe. — dirigiu-se para o vestíbulo, onde se achavam as escadas que levavam ao segundo andar.
— Está em seu lugar preferido — disse Eric atrás dele — A quarta porta à esquerda.
Edge começou a subir as escadas. Mas Amber não estava na quarta porta à esquerda. Edge abriu a porta e olhou a cama revolta e a caixa de lenços de papel que havia na mesinha. O quarto estava vazio. Edge abriu sua mente e sentiu a presença de Amber. A dor o inundou de novo, mas já não era paralisante. Era ativo e furioso.
Deu a volta, pôs-se a andar pelo corredor e deixou atrás as escadas. Ela o atraía como um ímã. Abriu a porta do quarto em que tinha estado antes e de uma só olhada compreendeu o que estava acontecendo.
O abajur de porcelana estava quebrado, no chão. Amber tinha arrancado o fio, um de cujos extremos estava ligado. O outro tinha os extremos cortados e se abria como a língua bífida de uma víbora venenosa. Amber o segurava com força a curta distância do ancião que jazia na cama. Stiles tinha o rosto cheio de lágrimas.
— Diga-me o que está acontecendo comigo — disse ela em voz baixa e áspera . — Diga-me isso maldito seja — aproximou-lhe um momento os cabos e o corpo do Stiles se convulsionou na cama.
— Santo Deus, Alby!
Ela se ergueu e se voltou para olhá-lo. Edge se aproximou dela e lhe tirou o fio das mãos.
— Me dê isso antes de se machuque — desligou o fio de um puxão e ao voltar-se viu que Stiles estava tremendo e chorava. Parecia um velho indefeso. Edge sacudiu a cabeça e tomou Amber pelo braço — Onde diabos está Tamara? Pensei que estava cuidando de você.
— Eu não preciso que ninguém me vigie. Mandei-a abaixo para fazer um chá — respondeu ela com aspereza . — Como se fosse me servir de algo.
— Eu não...
— Stiles sabe algo. Será que não o vê? Sabe algo e vai morrer sem nos dizer.
— Não, eu não vou permitir isso, Alby — Edge suspirou e ao olhá-la notou as rugas de tensão que tinha de ambos os lados da boca e o modo como sua mandíbula se esticava, como se estivesse fazendo um esforço tão intenso por refrear-se que tremia dos pés à cabeça. Ele tocou suavemente a sua bochecha — Isto não é próprio de você. Demônios é mais meu estilo que o seu.
— Não posso permitir que isto aconteça. Não posso deixar que morra Edge. Não posso permitir que nosso bebê morra.
De repente, a tensão abandonou seu corpo e caiu como uma bandeira quando o vento se aquieta.
Edge a estreitou entre seus braços e a apertou com força enquanto seus olhos posavam nos do homem que jazia na cama. Leu o que se refletia naqueles olhos, compreendeu o que queria Stiles e, de repente, sua sede de vingança se dissipou por completo. Sabia o que tinha que fazer. Assentiu com a cabeça quase imperceptivelmente. Mas o ancião o notou e inclinou a sua vez a cabeça em um gesto de assentimento.
«Que assim seja», pensou Edge. «Que assim seja».
Levantou cuidadosamente Amber em seus braços e a conduziu a seu quarto. Era um quarto moderno, pintado em uma pálida cor violeta. As cortinas e o edredom eram brancos, com pequenos girassóis rosados, e da barra das cortinas penduravam babados estreitos de cor violeta.
Edge afastou o edredom com uma mão e a depositou na cama.
— Me escute, Alby. Tem que deter esse furacão de dor que se apoderou de sua mente e me escute — ela levantou os olhos e Edge a olhou com toda sua alma — vou me ocupar do Stiles e prometo a você que averiguarei o que sabe. Tudo o que sabe. Juro-lhe. Juro-lhe pela memória de meus pintinhos, mortos faz tanto tempo — ela conteve os soluços e assentiu. — Eric está se ocupando da parte científica e porá em prática toda a informação que me dê Stiles. Se houver um modo de resolver isto, resolveremos.
— E se não o há?
— Mas e se houver? E se houver um modo e o encontrarmos? Alby, você só tem que fazer uma coisa e é cuidar de nosso filho. Cuide-se para que tenha um lugar quente e seguro onde crescer. Tenta superar o estresse. Livre-se dele, porque é tóxico. É como veneno para ele. Entendido?
— Eu... não sei se posso.
— Tem que tentar. Tenta-o, Alby. Não fumaria um pacote de cigarros, nem beberia uma garrafa de uísque ou injetaria uma dose de heroína estando grávida. Pois é a mesma coisa. Tem que se tranquilizar.
As lágrimas começaram a rodar pelas bochechas do Amber.
— Me diga como.
— Confia em mim — disse ele — Sei que não sou o tipo com quem certamente sonhava desde pequena. Não sou um cavalheiro de reluzente armadura, Alby. Sou consciente disso. Mas não vou deixar você na mão. Não vou abandonar a nosso filho. Deixa que eu me ocupe de tudo. Confia em mim e se concentre no pequeno J.W.
Ela piscou.
— J.W.?
Ele assentiu.
— Assim se chama — disse e esboçou um terno sorriso enquanto lhe acariciava o cabelo . — Mas diz que sua mãe o chama Jimmy.
— Ele... ele disse seu nome?
Ele assentiu.
— Ao princípio pensei que eram as iniciais de Jameson Willem, em honra de seu pai e do Will, mas não estava muito convencido — fechou os olhos e pôs as mãos sobre a barriga de Amber — Psiu, escuta entre em minha mente e fala com seu filho, Alby.
Amber pousou as mãos sobre as dele e fechou os olhos e Edge ouviu aquela vozinha que já se tornou familiar. «Estou bem. Cada vez mais forte. Por que mamãe está tão triste?»
Amber abriu os olhos bruscamente e voltaram a saltar-se as lágrimas.
— É ele.
— Sim, é ele.
Ela umedeceu os lábios, voltou a concentrar-se e murmurou:
— É James William. Esse é seu nome, por meu pai e pelo Will, mas o bastante diferente para que seja dele.
Edge esboçou um sorriso.
— Isso. Isso sim encaixa.
— E está bem. Neste momento, está bem. São e forte.
— Sim. E nisso tem que se concentrar. Se tivermos algo pelo que sofrer, Alby sofreremos quando chegar o momento. Mas não antes — ela assentiu com firmeza — Confia em mim, Alby. vou ocupar me de tudo. De você. Do J.w. De tudo.
«Eu confio em você, papai».
— Eu também — murmurou ela e levantou o olhar para ele.
Edge sentiu de repente que uma lâmina de aço transpassava seu flanco. Deus, como ia estar à altura daquela promessa? A única pessoa que tinha dedicado a ele tanta confiança tinha sido sua querida Bridget, e ele tinha falhado. Tinha permitido que Stiles a degolasse. Tinha-a deixado morrer. Aterrava-lhe pensar que alguém a quem queria tanto dependesse dele outra vez.
Desta vez não o suportaria.
— Obrigado, Edge — murmurou Amber — Obrigado — fechou os olhos outra vez e adormeceu. Seu corpo se relaxou sob o edredom e sua respiração se fez profunda e rítmica.
— Não, Alby — sussurrou ele — Obrigada a você.
Separou as mãos dela, exalou um profundo suspiro e ao virar-se para a porta viu que Tamara estava ali, com uma taça de chá nas mãos e lágrimas lhe correndo pelo rosto.
Quando Amber abriu os olhos de novo, o sol entrava em torrentes pela janela e Alicia estava sentada em uma cadeira, junto à cama. Piscou e fixou o olhar em sua amiga.
— Como conseguiu...?
— Edge me chamou ontem à noite. Disse-me que não queria que ficasse sozinha enquanto os outros descansavam, e seu pai alugou um avião para chegar ao amanhecer.
Amber suspirou.
— Que tal está Willem? Deram-lhe o Ambrósia-6?
— Sim, assim que voltamos — Alicia deu de ombros — Serafina diz que tem melhor aspecto.
— E você o que acha?
Alicia evitou seu olhar.
— É muito cedo para saber.
Alicia acreditava que a fórmula não tinha funcionado. Amber compreendeu em seguida.
— Embora funcionasse — disse Amber , — o efeito não é permanente. Dura uns meses, no máximo, e logo...
— Deixa-o, Amber. Se funcionar, estupendo. Não adiantemos os acontecimentos. Já tem muitas coisas com que preocupar-se seus olhos se posaram sobre o volumoso ventre do Amber.
— Eric fez algum progresso ontem à noite?
Alicia desviou os olhos. .
— Edge diz que tenho que evitar que você pense nas coisas negativas.
— É a melhor amiga do Edge ou a minha?
— Amber...
— Diga-me isso Preciso saber o que está acontecendo, Alicia.
Alicia esticou os lábios, mas ao fim respondeu: .
— Não conseguem duplicar a fórmula com seu sangue. Ao que parece, o Ambrósia-7 é muito diferente do Ambrósia-6. Eric diz que seu sangue mudou. Acha que talvez, depois da gravidez, mude outra vez. Mas não há modo de estarmos seguros — Amber fechou os olhos — Mas conseguiu fazer os experiências sem destruir a amostra que nos trouxe — apressou-se a acrescentar Alicia — O que significa que poderemos administrar-la no Will.
— Essa ampola é a única que resta. E pode ser que não haja mais.
— Ou pode ser que sim. Deus, Amber, desde quando é tão pessimista? — Amber suspirou. Roncavam-lhe tanto as tripas que Alicia sorriu . — Tem fome?
— Uma fome de lobo. E parece que não me sacio — franziu o cenho, sentou-se na cama e afastou o edredom . — Mas pelo menos já não vomito.
— Não, eu diria que já superou essa etapa – disse indicando com a cabeça a barriga de Amber.
Amber passou as mãos pelo abdômen.
— Aumentou desde ontem à noite. Tudo vai muito depressa, Alicia. Já não sei o que pensar.
— Pois está com sorte, porque estou aqui para dizer a você o que tem que fazer. Agora mesmo, quero que tome uma ducha, ponha roupa limpa e faça algo no cabelo. Quando acabar, vou preparar o maior café da manhã que tenha comido na vida.
— Será um milagre que encontre comida nesta casa.
— Mas acha que vim com as mãos vazias? Quando vinha para cá do aeroporto parei em um supermercado que abre toda a noite. Também eu gosto de comer, sabe?
Amber sorriu e deu a mão a sua amiga. — É um sol. — Bom, vou ser tia. Tenho que me cuidar bem — apertou a mão de Amber e se voltou para a porta, mas se deteve ao chegar a ela — Tam deixou um pouco de roupa do Eric no armário. E Edge me pediu para dizer a você que foram levar o Stiles para outro lugar.
— Aonde? — perguntou Amber.
Alicia deu de ombros.
— Não me disse. Só me disse que o levaram a um lugar onde não poderá encontrá-lo – suspirou — Que desilusão. Eu teria gostado de ver cara a cara a esse safado. I
— Está se tornando uma autêntica guerreira, sabia?
— Estou me tornando muitas coisas. Mas mudar é bom. E agora, anda, vá tomar uma ducha.
Amber obedeceu. Mas, enquanto estava sob o jorro da ducha, pegou-se olhando com assombro a forma inusitada que apresentava seu corpo; teria se examinado nua em um espelho, se houvesse algum na casa. Passou as mãos pela barriga e, ao fazê-lo, sentiu um golpezinho de dentro — ficou imóvel e deixou a mão imóvel. O bebê deu outro pontapé e ela sorriu e logo tornou rir.
— Ei, você, já vi que está acordado, hem?
Perguntou-se se significaria algo que o bebê estivesse acordado e ativo durante o dia. Deus tinha tantas perguntas...
Vestiu seu jeans sem fechar, uma camisa branca do Eric e seu sutiã, embora tivesse que afrouxar as alças. Alicia e ela comeram entre as duas um montão de tortinhas e uma deliciosa omelete e beberam uma cafeteira inteira. Logo, Amber tirou as sacolas do porta-malas do carro e mostrou a Alicia a roupa de bebê que tinha comprado. Passaram o dia falando e Alicia passou creme na barriga de Amber, pois tinha esticado tanto a pele que começava a arder e a pinicar.
Ao entardecer, Amber se sentia um pouco mais otimista, graças ao bom humor de Alicia e às promessas que Edge lhe tinha feito no dia anterior. Possivelmente tudo saísse bem, afinal de contas. Talvez Edge conseguisse surrupiar a verdade de Stiles, e Eric pudesse usar a informação para resolver o mistério de seu sangue.
Possivelmente.
Sentada em uma poltrona da sala de estar, suspirou e levantou o olhar ao ver Edge entrar, uns minutos depois de que anoitecesse. Ele se deteve na soleira e cravou seus olhos nela. Amber compreendeu então que estava fazendo o que ele queria que fizesse. Confiar nele. Acreditar nele. Depender dele. Nunca tinha tido intenção de fazer tal coisa, E lhe dava medo. Gostava de dominar a situação, cuidar de si mesma, sem necessitar de ninguém. Mas aquilo... aquilo era diferente.
Estava completamente apaixonada por ele. E isso aumentava seus temores.
Edge tomou Amber pela mão e a conduziu ao jardim pela porta detrás da casa. Na grama, rodeado ali por uma cerca, havia um balanço antigo do qual podiam contemplar as estrelas.
Sentaram-se no balanço. Edge passou um braço sobre seus ombros e a abraçou.
— Faz uma noite bonita — disse. Amber levantou o olhar para ele.
— Sim.
— Mas dói algo em você.
Ela abriu a boca para dizer que não, mas ao ver seu olhar se deu conta de que não serviria de nada.
— Como sabe?
— Sinto-a. Cada vez mais. O que dói, Alby?
— As costas, principalmente.
Edge a fez deitar-se sobre seu colo e passou sua mão sobre as costas, exercendo uma leve pressão.
— Oxalá pudesse aliviar você.
— Já o faz — disse-lhe ela, fechando os olhos . — Só estando aqui.
— Alegra-me sabê-lo.
— Isto não durará muito, Edge — disse ela . — A este passo, o bebê poderia nascer a qualquer momento, e eu...
— Está assustada. — Ela assentiu — Eu me ocuparei de que tudo saia bem.
— Seriamente acha que pode conseguir? — perguntou ela, um pouco mais tranquila.
— Tenho que acreditar. Não posso aceitar a alternativa. Mas o que eu ache não importa. A pergunta é: você acha?
Amber abriu os olhos e olhou seu rosto.
— Parece uma loucura, mas sim.
Ele assentiu, satisfeito.
— Então, agarre-se a isso.
— Tentarei.
Edge se inclinou sobre ela e a beijou com ternura nos lábios.
— Sim, tente — disse.
Amber ouviu que a porta traseira se abria e sentiu que os outros saíam ao jardim. Levantou-se, sonolenta, e viu que Tamara se aproximava dela pela grama.
— Vou ver como vai Eric — disse Edge — Descansa aqui um momento. Desfruta a noite.
— Está bem — Amber estava confusa. Inquietava-lhe a ternura do Edge, o olhar de seus olhos. Perguntava-se o que significava e tentava não ter esperanças.
Edge se levantou e saudou a Tamara ao cruzar-se com ela a caminho da casa. Amber o olhou afastar-se com lágrimas nos olhos. Deus, por que tinha que ser tão maravilhoso? Por que a fazia ter ilusões que não podiam fazer-se realidade?
Ou sim?
— Será que alguma vez descansa? — perguntou Edge ao entrar no laboratório.
Eric, que estava inclinado sobre o microscópio, ergueu-se e esfregou os olhos.
— Como tudo vai tão depressa, não me atrevo a baixar o ritmo — tirou uma plaqueta de cristal do microscópio e pôs outra . — Que tal está Amber?
— Aterrorizada. Embora finja não estar.
— E Stiles?
— Segue no quarto do sótão, envelhecendo. Não vejo muitas mudanças — Edge apontou com a cabeça as ampolas escuras que havia em um suporte, junto ao Eric — O Ambrósia-6 é um desses?
— Não, isso são amostras do sangue de Amber Lily. Este é uma réplica do soro que Stiles chamou Ambrósia-7.
— Mas não serve para nada.
— Para nossos propósitos, não — respondeu Eric — O A-6 eu embalei e o guardei na geladeira. Aí estará a salvo até que alguém o leve ao Willem.
— Bem pensado. Não queremos que lhe aconteça nada — disse Edge enquanto olhava a geladeira, do outro lado do laboratório.
— Não. Mas, por isso Alicia me disse, não acredito que Willem possa sobreviver muito mais tempo sem ele. Pelo visto o primeiro tratamento não está surtindo efeito.
Edge baixou a cabeça e procurou afogar seu sentimento de culpa.
— Deveria ir dar uma olhada no Stiles – disse lentamente.
Eric, que havia tornado a olhar pelo microscópio, levantou-se.
— Pensei que havia dito que não havia mudanças aparentes.
— Não, ao menos para mim. Mas segue envelhecendo e eu não posso adivinhar quanto tempo resta. Confiava em que você sim pudesse. Afinal de contas, temos que encontrar um modo de fazê-lo falar antes que morra e leve seus segredos à tumba.
Eric assentiu pensativo.
— Nisso tem razão — tirou as luvas de látex e se encaminhou para a porta — Está bem. Vou dar-lhe uma olhada — Edge saiu atrás dele do laboratório. Quando entraram na espaçosa sala de estar, Eric franziu o cenho — Onde estão todos?
— Lá fora. Faz uma noite bonita, Eric. Muito cálida para esta época do ano. Amber acredita que seus pais e Rhiannon chegarão muito em breve.
— Me alegro que seus pais estejam aqui para apoiá-la.
— Sim, fará bem a ela estar com sua mãe — disse Edge — Acredito que eu também vou sair um momento.
Eric assentiu e se dirigiu para as escadas. Assim que o perdeu de vista, Edge deu meia volta e retornou correndo ao laboratório. Aproximou-se da pequena geladeira, abriu-a e abriu uma caixa cheia de espuma de embalagem. A ampola estava ali, envolta em espuma plástica. Pegou-a e retirou a embalagem. Logo procurou uma ampola vazia para substituí-la e voltou a colocar a caixa.
Ninguém devia inteirar-se. Ao menos até que voltasse a abrir a caixa. Depois, possivelmente Amber o odiasse por aquilo. Demônios, todos o odiariam. Mas o que mais o surpreendia era que lhe importasse tanto.
Possivelmente os outros o perdoassem com o tempo, se seu plano funcionasse. Se não, nunca o perdoaria. Mas Amber... Amber jamais o perdoaria, nem se ele tivesse êxito. Fechou os olhos e segurou com força a ampola. Não importava que ela o odiasse. Tinha que fazê-lo. Por ela. E por seu filho. Mas como desejava que houvesse algum outro modo de fazê-lo!
Amber se balançava suavemente no fofo assento do balanço, com Tamara a seu lado. As estrelas titilavam no céu como se o mundo estivesse em paz. Como se as vidas de Willem e de seu filho não pendessem por um fio. Alicia não tinha contado a verdade sobre o estado de Will. Tinha tentado lhe tirar importância. Mas Amber sentia que a presença do Willem ia se desvanecendo.
— Que noite tão bonita — disse Eric ao sair ao jardim.
— Alicia foi à cozinha fazer o jantar para as duas — disse-lhe Amber — Donovan e Dante foram percorrer o imóvel, para assegurar-se de que não há ninguém rondando por aqui.
Ele assentiu.
— Não é má ideia. Stiles segue tendo muitos sócios. E Roland?
— Acredito que foi esperar a Rhiannon. Sente muitas saudades. — disse Tamara em voz baixa.
Eric a olhou nos olhos, e de repente pareceram falar-se em silêncio. Amber baixou os olhos e fingiu não notá-lo.
— Onde está Edge? — perguntou, estranhando que não estivesse com Eric.
— Não está aqui fora?
— Não. Que eu saiba tinha ido ao laboratório ver como estava.
— Que estranho — disse Eric — Me disse que ia sair a reunir-se com vocês.
O coração de Amber deu um salto. Edge havia dito que ele se encarregaria de tudo, que encontraria um modo de fazer Stiles falar antes que morresse e se…?
Tamara a olhou nos olhos e adivinhou o que estava pensando.
— Não fará mal ao Stiles. Deixou de lado seus desejos de vingança, Amber.
Ela umedeceu os lábios.
— Sei, mas mesmo assim... — levantou-se com esforço. A barriga tinha inchado ainda mais durante a noite — Me diga onde está escondido Stiles, Eric. Tenho que me assegurar.
— Vamos com você — disse Tamara, e a segurou pelo braço se por acaso necessitasse ajuda.
Voltaram a entrar na casa, subiram as escadas e percorreram o corredor até o final. Eric abriu uma porta que dava a outra escada, mais antiga, que raramente usava. Conduziu-as por aquela escada até outra porta que dava ao gigantesco sótão.
— Está escondido aqui em cima?
— Edge disse que tinha que afastá-lo de você — disse Eric enquanto as conduzia pelo sótão — Embora estranhasse que queira protegê-lo.
— Não queria proteger ao Stiles, e sim a Amber – disse Tam.
Amber soltou um gemido.
— Stiles não está em condições de me fazer nenhum dano.
— Fisicamente, não — Tamara lhe apertou o braço — Mas emocionalmente, sim. Amber, se o tivesse matado, não sei se teria conseguido superar. Você não é uma assassina. É muito boa, embora aparentemente seja também muito dura. Edge se deu conta. Sabe.
Amber esticou os lábios e manteve os olhos fixos à frente enquanto percorriam o sótão e cruzavam uma porta além da qual se instalou um quarto. Uma cama, uma mesinha de cabeceira e um abajur. O teto se abaulava ali ao redor da janela. Não havia muito mais. As mantas estavam revoltas, mas a cama estava vazia. E a janela aberta.
Eric ficou olhando um momento a cama e logo se voltou para elas.
— Stiles se foi.
— E Edge também — disse uma voz atrás deles, e ao voltar-se, Amber viu o Roland ali parado — Descobri faz um momento que Stiles tinha desaparecido e revirei a casa procurando o Edge. Mas não está.
Amber segurou-se aos pés da cama para manter-se direita. Eric apoiou uma mão sobre seu ombro.
— Sei Amber. Sei que é decepcionante. Deus, estava seguro de que deixaria de lado sua sede de vingança por seu bem, mas...
— Não é isso — balbuciou ela.
Todos a olharam, mas ninguém disse nada. Amber sabia, entretanto, o que estavam pensando. Que era uma dessas mulheres patéticas que se deixavam cegar pelo amor e se negavam a ver os defeitos que para outros reluziam como luzes de néon. E por um momento se perguntou se era certo.
— Amber, pequena — disse Roland com suavidade . — Sei que é difícil aceitar que alguém a quem quer não pense em ninguém, mas...
— Se Edge levou Stiles, foi para tentar lhe tirar a verdade. Não para matá-lo. Ele não faria isso.
Os homens se olharam. Tamara a rodeou com o braço.
— Tem razão. Edge não seria capaz de abandoná-la.
— Tam, talvez seja melhor não alimentar falsas esperanças — disse Eric.
— Oh, pelo amor de Deus! Eu sei quando um homem está apaixonado, e Edge está louco pela Amber.
Amber a olhou com Surpresa — Vamos querida. Está muito pálida. Precisa se deitar um momento.
— Preciso comer algo — disse ela.
— Vocês vão procurar Dante e Donovan e tentem encontrar ao Edge — disse-lhes Tam.
Os dois homens partiram a toda pressa. Tam e Amber os seguiram mais devagar e, quando os perderam de vista, Amber disse:
— Não é verdade, sabe?
— O que?
— Que Edge esteja apaixonado por mim. Edge é um espírito livre. Um solitário. Não é dos que se apaixonam.
Tam sorriu.
— Acredita nisso?
— Sei.
— E acredita conhecê-lo muito bem?
— Sim — respondeu ela — Às vezes é como se estivéssemos um dentro do outro. Entendo-o muito bem.
— Já percebi.
— E sei que não está apaixonado. Mas também sei que não me teria feito tantas promessas se pensasse em rompê-las ao primeiro sinal de mudança. Está tramando algo, Tam. Deve acreditar que sabe como fazer com que Stiles fale.
Tam assentiu.
— Continue acreditando nele, Amber, seja o que for que digam os outros. Você é quem melhor o conhece.
— Sim.
Chegaram ao andar de baixo e Tam a conduziu ao sofá da sala de estar, junto à chaminé de gás. Amber deixou que a agasalhasse. Sentia-se frágil, esgotada e a ponto de chorar. Recostou-se no braço acolchoado do sofá e recolheu as pernas.
— Voltará, Tam — murmurou — Sei que voltará.
Tam assentiu.
— Agarre-se a essa ideia.
Amber tentou. Mas não era fácil. A noite foi passando e os homens retornaram sem ter encontrado rastro algum do Edge nem do Stiles. Estavam cada vez mais zangados. Quando os pais de Amber, Rhiannon e Morgan chegaram por fim, Amber estava fora de si, com medo que chegassem a conclusões equivocadas e pensassem o pior de Edge. Essa preocupação se dissipou levemente, entretanto, quando viu entrar Serafina e Willem atrás deles.
Will estava macilento E curvado e arrastava os pés, apoiando-se pesadamente na bengala e nos ombros de Fina.
Amber se levantou do sofá, surpreendida ao vê-los. Como era possível que tivesse piorado tanto em tão pouco tempo? Correu para ele, mas se deteve ao ver sua expressão de perplexidade. Então se deu conta de que não era o único que a olhava assim. Seus pais pareciam atônitos, e Rhiannon a olhava com a boca aberta.
— Meu deus — disse — Isto é muito pior do que imaginava.
— Oh, não é para tanto — disse Eric — Jameson, nos acompanhe à biblioteca, sim? Temos que falar.
Jameson levantou as sobrancelhas e assentiu.
— Em seguida volto docinho.
— Espera papai.
— Me dê... me dê um minuto.
— Eu também vou — disse Rhiannon, e os dois saíram seguindo ao Eric. Donovan, Dante e Roland já estavam na biblioteca.
— É como se pensassem que já estou morto — disse Will com voz débil e rouca, embora irônica — Que tal está, Amber Lily? — estendeu-lhe os braços, embora Serafina continuasse segurando-o pela cintura.
Amber o abraçou suavemente.
— Está horrível — disse.
— E você parece que engoliu uma bola de praia — ela retrocedeu e lhe sorriu — Bom, eu não penso em perder a reunião secreta da sala ao lado.
Acha que poderá me levar até ali, meu amor? perguntou Will.
Serafina lhe sorriu.
— Não até que tenhamos o que viemos procurar, carinho — olhou a Tamara — e a segunda dose?
— Está no laboratório de Eric. Leva-o para a biblioteca, Fina. Eu lhes trarei a injeção.
Serafina assentiu e Will a rodeou com o braço. Amber se colocou do outro lado, mas sua mãe a deteve levantando uma mão e ocupou seu lugar, apesar de que não parecia poder afastar os olhos da barriga de Amber.
— Já sei que estou imensa.
— Está preciosa. Resplandecente. Mas parece esgotada — Angélica sorriu — Estou assombrada. A chamada da Tam não nos preparou para isto.
— Bom, é provável que lhes fizesse uma descrição bastante precisa naquele momento. Dá a impressão de que me expando exponencialmente.
Sua mãe a olhou com preocupação.
— Edge me proibiu pensar nisso — disse Amber.
— No que?
— No que acontecerá se este crescimento acelerado continua quando o bebê nascer. Terá vinte anos por esta data, o ano que vem? Morrerá de velho antes de começar o colégio? E se não conseguir sobreviver ao parto?
— Basta, Amber — disse Will com firmeza, e lhe lançou um olhar severo — Edge tem razão. Que bem pode lhes fazer pensar assim?
— Nenhum Will. Sei. Mas sabê-lo não impede que essas perguntas me ressonem constantemente na cabeça.
Quase tinham chegado à biblioteca. Will se movia muito devagar e tinha que parar a cada poucos passos para descansar.
— Do que acha que vai tratar a grande reunião? — perguntou Angélica.
Amber suspirou.
— Trata-se do Edge. Desapareceu e levou ao Stiles — os olhos da Angélica se dilataram — Eric e Roland parecem acreditar que ao final Edge decidiu vingar-se do Stiles. Mas eu sei que não é assim — abriu a porta da biblioteca E se afastou para que Serafina e Angélica ajudassem Wil a entrar.
— Esse safado — estava dizendo Rhiannon — Se lhe fizer mal antes que saibamos o que precisamos saber, eu...
— Não seja ridícula, princesa — disse Jameson, interrompendo-a. Estão todos equivocados. Eu passei mais tempo com o Edge que qualquer um de vocês. Se levou ao Stiles é porque acreditava saber como fazê-lo falar.
— Eu gostaria de estar de acordo com você, Jamey disse Roland, aflito — Mas se o que queria era fazê-lo falar poderia tê-lo feito aqui.
— Não é culpa sua — disse Donovan — Não esqueçam que não teve ninguém que o ensinasse, ninguém que lhe explicasse as coisas.
— Isso faz mais de cinquenta anos, Donovan. Se o está usando como desculpa... — disse Dante.
— Eu não o ouvi dar nenhuma desculpa! — estalou Jameson — Deus, estão todos procurando explicações para uma perversidade que não existe. Estou dizendo que ele levou ao Stiles para fazê-lo falar.
— E que método poderia empregar em outro lugar que não pudesse empregar aqui? — perguntou Eric.
Antes que alguém pudesse responder, Tamara entrou correndo na sala.
— O Ambrósia-6! — gritou com uma caixa de cortiça branca vazia nas mãos — Não está aqui!
— Não — murmurou Amber, agarrando-se ao braço do Will — Por favor, Deus, isso não.
Will assentiu lentamente.
— Bom, suponho que isso responde à pergunta do Eric — disse — Vai suborná-lo... lhe oferecendo a vida.
Jameson fechou os olhos.
— Will tem razão. Stiles é desses homens que anseiam a imortalidade a qualquer custo. Teria dado qualquer coisa pela última dose da A-6, inclusive sabendo que talvez agora não funcione. É provável que Edge soubesse que era a única oportunidade que tinha de lhe arrancar a verdade.
— Não — murmurou Serafina — Não!
Will a abraçou, embora tivesse que apoiar-se na parede para manter-se em pé.
— Se Edge pode lhe tirar informação que ajude a Amber e ao bebê, valerá a pena. Eu teria feito o mesmo — Serafina começou a chorar contra seu peito — Não o reprove, Amber Lily — disse-lhe Willem — Sabe que não quero viver a sua custa, nem a de seu filho. Se ele não o fizesse, o faria eu mesmo – seus joelhos se dobraram um pouco. Serafina se afastou e o enlaçou pela cintura. Logo se voltou para os outros.
— Temos que levá-lo para uma cama. Precisa descansar.
Jameson se aproximou e, tomando ao Will nos braços, tirou-o da sala. Serafina foi atrás dele.
— Irei ver se necessitam de algo — disse Tamara, e saiu apressadamente.
— Donovan, você e eu deveríamos continuar procurando Edge até que amanheça — disse Dante — Você, que é seu sire, é quem tem um vínculo mais forte com ele.
Amber se deixou cair em uma poltrona e pensou que Dante se equivocava. Ela era quem tinha um vínculo mais poderoso com o Edge. Sabia que só levou ao Stiles com intenção de lhe arrancar seus segredos. Mas e se estivesse errada ao confiar nele? Edge acabava de assinar a sentença de morte de seu melhor amigo?
Começou a chorar e sentiu de repente que um punho gigantesco se fechava sobre seus rins e seu abdômen. A pressão era muito intensa. Gritou, e pensou que certamente a teriam ouvido em toda a casa.
— Bom, aqui estamos. Só os dois. Engraçado, não é mesmo? Que, dentre tanta gente, eu seja quem está com você no final — Edge se achava sentado em uma desconjuntada cadeira de madeira, fumando um cigarro enquanto observava ao ancião, que jazia no chão, coberto com um tecido de lona. Edge o tinha carregado nas costas até que tinha encontrado uma granja abandonada. Estava usando um abrigo que havia fora. Usar a casa teria sido muito óbvio. E, além disso, não tinha muito tempo.
— Nós dois sabemos que isto não é o fim — disse Stiles lentamente.
— Ah, não?
— Não vai deixar que eu morra.
Edge deu de ombros, deu um lento trago no cigarro e exalou a fumaça.
— Isso depende de você, Stiles. Não há nada de que gostaria mais que ver você morrer. Talvez até o ajudasse. Mas, por sorte para você, encontrei outra razão para viver, além da vingança — assentiu com a cabeça — E suas notas são um tanto... incompletas.
Stiles levou um dedo à cabeça.
— Algumas anotações guardo aqui.
— Como quais?
— A fórmula, por exemplo.
— Oh, a fórmula já descobrimos. Esse Marquand é um ás, sabe? Vai ter que me oferecer algo mais se quiser o presentinho que eu trouxe – Edge tirou a ampola do bolso da jaqueta e o aproximou de Stiles para que pudesse ler a etiqueta.
Os olhos do Stiles se iluminaram, cheios de esperança, umedeceu os lábios.
— Vai me dar?
Edge assentiu.
— Se me disser o que sabe sobre Amber. E o bebê.
— E como sei que vai cumprir sua parte do trato?
Edge deu de ombros, meteu a mão no bolso, tirou uma seringa de injeção e tirou o pacote de celofane. Cravou-a na ampola, atravessando a tampa e sugou todo seu conteúdo.
— Deixarei que aplique você mesmo a injeção. O que acha?
Ofereceu-a ao Stiles. Ele franziu o cenho, tomou e imediatamente a aproximou do braço.
— Não, não, não — disse Edge, levando a mão do Stiles ao chão. — Não pode injetar-se até que me diga o que quero saber. Não sou estúpido. Se deixar que aplique agora, não me dirá nada.
— Pode ser que não me deixe de qualquer modo — disse Stiles — Agora é muito mais forte que eu.
— Mas também sou a única oportunidade que tem, Stiles e agora, me diga, vai começar a falar ou quer continuar perdendo o tempo?
Stiles franziu o cenho e assentiu.
— Por onde quer que comece?'
— Pelo princípio — disse Edge. — Pela concepção.
Stiles assentiu.
— Bom, tem que ser seu sangue. Possui propriedades curativas, sabe? Sempre foi assim, desde criança. Essa foi uma das coisas que descobri sobre ela a primeira vez que a tive em minhas mãos. Uma das coisas que não pus em minhas notas — sacudiu a cabeça lentamente — Mas agora essas qualidades se multiplicaram. Acredito que quando seus espermatozóides entraram em seu corpo... regeneraram-se. Voltaram para a vida. Ela o tornou fértil de novo. Mas provavelmente só com ela.
— Amber é única — resmungou ele.
— O que?
— Nada — Edge pensou que devia concentrar-se e voltou a fixar sua atenção no Stiles — Sua química sanguínea mudou quando ficou grávida.
— Sim. A noite que apareceram, estava fazendo testes com seu sangue. Agora é muito mais poderosa, mas também mais volátil. Mais imprevisível.
— O que quer dizer?
— Quero dizer que não posso predizer como vai reagir em uma experiência. Injetei uma amostra de plasma em um camundongo e seu tamanho dobrou em duas horas. Outro camundongo morreu, e um terceiro deu a luz.
— Estava prenhe? — perguntou Edge.
— Tinha sido esterilizado — respondeu Stiles.
— Mas, o que você está dizendo?
— Às vezes, o sangue cura. Outras, em compensação, causa... fenômenos inexplicáveis. Não há nenhuma pauta lógica que o explique. E, entretanto, está claro que se trata do fluido mais poderoso que possa imaginar. Assim fiz o soro. O Ambrósia-7. E não pude resistir à tentação de prová-lo.
— Então, injetou-se — disse Edge.
Stiles assentiu.
— E imediatamente comecei a envelhecer.
— Acha que o A-6 reverterá o processo?
— É o único que pode fazê-lo.
— E se só o detém? — perguntou Edge — Suponha que o deixe como está agora mesmo por anos e anos.
— É um risco que estou disposto a correr – Edge sacudiu a cabeça — Posso me aplicar a injeção?
— Só uma ou duas perguntas mais, velho. Logo poderá fazer o que quiser.
Ele assentiu.
— Quer saber algo mais sobre o bebê. Sobre quais são suas possibilidades de sobreviver. Isso não sei. Não tenho modo se saber.
Edge assentiu. Por uma vez, acreditava no Stiles.
— E quanto a Amber? Voltará seu sangue a seu antigo estado quando nascer o bebê?
Stiles assentiu.
— O de sua mãe voltou.
— O que?
— A DIP manteve retida a sua mãe durante a gravidez. Faziam contínuas provas. Sua química sanguínea se alterou drasticamente durante a gravidez, mas não como no caso de Amber. Justo depois do parto tomamos outra amostra. E tinha voltado para seu estado anterior. Não tenho motivos para acreditar que no caso de Amber não aconteça o mesmo.
— Você estava ali quando nasceu Amber Lily?
— Sim, estava ali.
— Houve... complicações?
O velho assentiu.
— Sim. Na realidade, estivemos a ponto de perdê-la.
— A Amber Lily ou a sua mãe? — perguntou Edge.
— À mãe, devido as dores do parto os de sua espécie não suportam muito a dor — deu de ombros — Embora, naquele momento, a ninguém importasse a mãe.
— Claro que não. Para vocês era só um meio para conseguir um fim.
— Se não fosse por nós, sua querida Amber Lily não existiria.
— Pode ser que sim. Pode ser que o destino tivesse mais a ver com isso que você ou a DIP.
— O destino — disse Stiles com desdém.
Edge acendeu outro cigarro, recostou-se no assento e soltou o pulso de Stiles, mas não afastou a mão. Stiles não tentou mover-se.
— Tem uma teoria, não é? Sobre por que a química orgânica de Amber mudou tão drasticamente? Sobre por que seu sangue de repente parece ter esse poder de cura tão poderoso? — Stiles o olhou nos olhos e assentiu — Então, conta-me a e não deixe nada de fora. Logo poderá tomar sua injeção.
Stiles assentiu, tomou ar e seguiu falando.
Amber agarrou o ventre e caiu de joelhos enquanto os outros chegavam correndo. Todos, salvo Edge.
— Deus, não. Ainda não! — gritou — Ainda não, ainda não sei o que fazer. Ainda não sei... Ahhhh!
— Calma docinho. Calma — sua mãe a rodeou suavemente com os braços — Vamos. Terá que subir à cama. Tam, Rhiannon...
— Já vamos — disse Rhiannon.
Então as três ajudaram Amber a levantar-se. Seu pai tomou-a nos braços e a levou. Enquanto subiam as escadas, observou seu rosto.
— Eu não estava presente quando você nasceu — disse — É quase como se tivesse a oportunidade de me ressarcir por aquilo.
— Pode ser que não seja a feliz ocasião que estão esperando — murmurou ela — Prepare-se, papai. Não sei... Ahhh!
Jameson apertou o passo e logo Amber se achou na cama. Ela tinha um tato diferente, e Amber pensou vagamente que alguém havia coberto o colchão com algum tipo de material. Mas não teve tempo para pensar nisso. As contrações eram contínuas e muito fortes. Fechou os olhos e se concentrou no Edge. «chegou o momento», pensou desesperada. «Edge, onde está? Preciso de você!»
Edge escutou atentamente a teoria do Stiles a respeito do que estava acontecendo ao corpo de Amber, a qual tinha toda a aparência de ser o delírio de um demente..., a não ser porque explicava tudo o que acontecia. E a ele não ocorria outra explicação. De modo que possivelmente não fosse tão descabelada, afinal de contas.
Então ouviu a chamada de Amber como o grito de uma sereia ferida e seu corpo se encheu de energia nervosa. Olhou Stiles.
— Só isso? Isso é tudo o que sabe?
— Isso é tudo o que sei — Stiles olhou a seringa de injeção que sustentava na mão — Vai manter sua palavra?
Edge assentiu uma única vez. Stiles aproximou a seringa de injeção do outro braço, cravou-se a agulha e logo se deteve um momento e olhou ao Edge, como se — surpreendesse que permitisse continuar. Logo seu rosto se obscureceu.
— Como sei que isto não é um truque? Que é de fato a Ambrósia-6?
Edge deu de ombros.
— Como sabe que não é? O que acontece, Stiles? Está se arrependendo?
— Não. Não, esta é minha única esperança. Para continuar vivendo... vale a pena correr qualquer risco.
— Acredite em mim, Stiles, nem tudo que reluz é ouro. Ao menos, para mim.
Stiles tomou ar, afundou a agulha no braço e fez baixar o êmbolo da seringa de injeção. Logo tirou a agulha e a jogou no chão. Jogou a cabeça para trás, fechou os olhos e aguardou.
— Lembra-se do que aconteceu faz tantos anos? — perguntou Edge — De como matou a minha família?
— Sua família! Demônios, Edge, isso não era uma família. Era uma turma de rua.
— Era minha família.
— Pintinhos. Sem idade, sem poder. Sem experiência. Muito tolos para vivendo.
— Todo este tempo me perguntei por que o fez.
Stiles entreabriu os olhos e olhou para Edge.
— Acaso importa?
— A mim sim.
— Eram delinquentes. Todos eram.
— Era nossa única maneira de sobreviver. Roubar carteiras aqui e lá, roubar o que podíamos, quando tínhamos oportunidade.
Stiles assentiu.
— Um de seus pintinhos me abandonou em um beco, levou minha carteira e meu sangue...
— Sim, Bridget me contou isso. Mas não tirou a sua vida — disse Edge. — Deixou-o viver — observou o rosto de Stiles — Ah, mas aterrorizou você, não é isso? Assustou-o tanto que se mijou nas calças — inclinou a cabeça — riu de você, humilhou-o. Demonstrou que era um covarde.
Stiles franziu o cenho. Já não estava escutando ao Edge.
— Algo vai... mau...
— Assim voltou, certamente com sua própria turma, porque você nunca teve guelra para fazer o trabalho sujo.
— Tinha uns amigos novos — disse Stiles — Um grupo chamado DIP. Estavam tentando me recrutar. Mas levá-los até sua guarida foi... minha iniciativa.
— Assim que os torturaram e depois os mataram. A todos.
— Deus, algo vai mal! — exclamou de repente o velho.
Edge viu que seu rosto começava a mudar. Contraía-se e se enrugava ante seus olhos.
— Tinha razão, Stiles — disse — O que havia na ampola não era Ambrósia-6. Era Ambrósia-7.
— Não...
— Temo que sim.
Stiles levou a mão à garganta e começou a retorcer-se enquanto seu rosto se ia contraindo. A dor devia ser muito intensa, pensou Edge. Bem.
Stiles começou a sofrer convulsões enquanto a fórmula fazia seu efeito. Foi envelhecendo ante o olhar de Edge em uma velocidade vertiginosa.
— Acredito que isto salda nossa dívida — disse Edge — Por Bridget e pelo Scottie. Por Billy Boy e por Ginger. Por tudo o que tem feito para Amber. Por todos os vampiros que atormentou Stiles. Não é nem a metade do que merece.
Os olhos do Stiles se dilataram e se incharam. De repente, ficou imóvel, com o rosto paralisado em um espantoso rictus. Uns segundos depois, sua pele se rachou e se desintegrou, deixando só ossos que por sua vez se pulverizaram até que dele não ficou mais que um montão de cinzas com a vaga forma de um corpo humano.
Edge se levantou e abriu a porta. Uma rajada de ar entrou no abrigo e as cinzas se dispersaram em um torvelinho. Bem. Edge deixou a porta totalmente aberta e pôs-se a correr com todas as suas forças. Amber precisava dele, embora certamente nesse instante também o odiasse.
— Ah, Deus, que dor!
Amber ofegava, seguindo as instruções que sua mãe dava, enquanto se perguntava como uma vampiresa, cujas sensações se centuplicavam, tinha podido suportar aquela dor sem perder a razão. Agarrou-se à mão de sua mãe.
— Logo passará Amber.
— Sei. Se você o superou, eu também posso fazê-lo.
Os homens tinham sido expulsos do quarto. Tamara, Rhiannon, Alicia e Angélica a rodeavam. Tam estava aos pés da cama, e Rhiannon passeava de um lado para outro sem cessar.
— Rhiannon, não pode fazer nada? –perguntou Alicia.
— Não sou médico — disse Rhiannon — E nunca dei a luz — Amber acreditou perceber uma nota de melancolia em sua voz.
— Mas foi princesa. Tenho lido algo sobre as sacerdotisas de Isis. Você tem muito poder. E as mulheres iam a você quando estavam a ponto de dar a luz.
Rhiannon se deteve e olhou para Alicia.
— Esteve fazendo tolices com as artes mágicas, não é, menina?
— Pode ser. Um pouco.
Rhiannon exalou um profundo suspiro.
— É certo. Havia um ritual de iluminação que parecia aliviar a dor das parturientes. Mas faz tanto tempo... — voltou-se para a Angélica e Amber — Querem que eu tente?
— Claro — disse Angélica, olhando Amber para lhe pedir seu consentimento.
— Neste momento, seria capaz de provar qualquer coisa — disse Amber.
Rhiannon subiu à cama, fez Amber sentar-se e deslizou atrás dela, de joelhos colocou um travesseiro sob as coxas e fez com que Amber se deitasse sobre ela em ângulo. Logo tocou com os dedos as têmporas de Amber, fechou os olhos e começou a cantar em uma estranha língua estrangeira que princípio lhes pareceu tosca, mas que muito em breve tomou uma suave cadência.
Angélica observava o rosto de Amber inquisitivamente. Sua filha assentiu com a cabeça, porque, em que pese a suas dúvidas iniciais, sentia algo. Uma espécie de calor que se difundia por seu corpo como um líquido.
— Tam, traz umas velas — sussurrou Alicia . — E também incenso. E sândalo, se tiver, vou amortecer as luzes.
Uns instantes depois, o ambiente do quarto tinha mudado por completo. Tamara voltou a colocar-se ao pé da cama para seguir o progresso do parto. Angélica permanecia sentada em uma cadeira, junto a Amber, cuja mão segurava enquanto lhe dava instruções para que respirasse. Rhiannon seguia acariciando suas têmporas suavemente e cantando com sua voz grave e poderosa. Alicia percorria o quarto colocando velas que ia acendendo, e agitava as mãos para difundir o aroma do incenso. Sobre os abajures tinham posto lenços. E Angélica sussurrava a Ave Maria junto a Amber.
A porta se abriu e entrou Serafina. Ao ver a cena, assentiu e se uniu a elas.
— É hora de empurrar — disse Tamara suavemente — Quando chegar a próxima contração, empurra até chegar a dez, de acordo?
A contração chegou em seguida. Amber começou a empurrar. Todas as mulheres deixaram seus cânticos e suas orações e começaram a contar em voz alta.
— Dez, nove, oito, sete...
Ao chegar a zero, voltaram para suas tarefas anteriores, mas ficaram de novo a contar quando Amber sofreu uma nova contração.
— Está saindo a cabeça. Vai nascer Amber.
A porta se abriu bruscamente. Amber levantou o olhar e viu Edge ali de pé, com os olhos arregalados.
— Oh, Deus — murmurou ele de repente. Parecia a ponto de desmaiar.
— Onde porra está Stiles? — disse Amber, quase sem fôlego e coberta de suor.
— Stiles é pó.
— Então... então o fez? Matou-o?
— Não exatamente. Meu deus, Alby, todo isso pode esperar.
— Não, não pode! Ahhh!
— Empurra agora, empurra — as mulheres começaram a contar e Edge se aproximou e se colocou junto de Amber, frente a sua mãe.
Ao chegar ao zero, Amber voltou a deitar-se sobre o regaço de Rhiannon, ofegando. Quando recuperou o fôlego, disse:
— Me diga o que aconteceu, Edge. Onde está o A-6? O que fez com o Stiles?
Ele segurou sua mão e a levou aos lábios para beijá-la. Logo disse:
— O Ambrósia-6 está no laboratório do Eric, a salvo. Mas em uma ampola sem etiqueta.
Serafina interrompeu de repente sua canção.
— Não o deu ao Stilles?
— Pensava fazê-lo, mas sabia que Amber nunca me perdoaria por isso. Ocorreu-me que talvez pudesse enganar ao Stiles, assim que lhe disse que o daria, mas o que dei a ele foi o sete, não o seis.
Serafina fechou os olhos.
— Graças aos deuses – murmurou . — Tenho que...
— Vá — disse-lhe Amber — vá aplicar no Will. Vamos, depressa.
Serafina saiu correndo do quarto, mas Edge a chamou e lhe disse onde podia encontrar o precioso elixir.
— O que disse Stiles? — perguntou Amber.
Edge sacudiu a cabeça como se quisesse clareá-la.
— Que seu sangue sempre teve propriedades curativas. Descobriu-o quando a prendeu na primeira vez. E que seu sangue tinha regenerado de algum modo meu esperma, fazendo-o fértil outra vez. E que a concepção do bebê causou em você uma reação química que certamente retrocederá assim que nasça o bebê.
Ela tomou ar com esforço.
— E do bebê?
— Não sabia nada. Amber tem uma absurda teoria, mas não sabia nada em concreto. Eu não...
— Ah, Deus! — Amber começou a empurrar outra vez ao sentir uma nova contração.
Tamara se inclinou sobre ela.
— Um pouco mais, um pouco mais. Isso. A cabeça está fora!
A contração seguinte se produziu um instante depois. Amber empurrou de novo e sentiu de repente uma onda de alívio. Um momento depois, Tamara se levantou levando nos braços um bebê envolto em uma manta. Amber apertou com força a mão de Edge e murmurou:
— Por favor, por favor...
E então a trouxinha se moveu. E um suave pranto, amortecido e borbulhante, saiu dele. Tamara pôs o bebê em seus braços. Ela sustentou a seu filho e olhou soluçando seu rosto rosado e manchado de branco, e seus olhos abertos e brilhantes.
— Está vivo. Deus, Edge, está vivo.
— Não só está vivo, mas também é grande e forte — disse Tamara com um sorriso. Amber suspirou.
— O sonho estava errado.
— O sonho? — perguntou sua mãe.
Amber sentiu de repente outra contração muito aguda. Gritou e entregou o bebê a seu pai. Edge tomou a seu filho e o abraçou suavemente, olhando seu rostinho, cheio de felicidade.
— Hei J.W., quanto me alegra te conhecer por fim — sussurrou.
— Oh, Deus, o que está acontecendo? — gritou Amber.
Edge levantou o olhar, alarmado.
Tamara, que continuava aos pés da cama, olhou aos dois.
— Há outro bebê — disse.
Edge sentiu que fraquejavam suas pernas. Angélica se levantou de um salto e se inclinou sobre a cama.
— Me dê o bebê. Não vai acontecer nada. Vêem aqui, pequenino.
Edge deixou que lhe tirasse o bebê dos braços. Angélica saiu do quarto com o bebê e Edge voltou a concentrar-se em Amber e na cena que tinha lugar ante seus olhos. Não suportava ver como sofria. Sentia-se confuso. Se havia dois bebês, por que tinha ouvido só uma voz?
Amber empurrou e as mulheres começaram a contar enquanto Edge lhe sussurrava que tudo ia dar certo, embora não estivesse seguro disso. Só sabia que ela precisava ouvi-lo.
Angélica retornou. Tinha forrado com grossas mantas o que parecia a gaveta de uma cômoda lavrada. Tinha lavado e vestido o bebê, envolveu-o em uma manta e deitou ali dentro. Deixou o berço improvisado sobre uma mesa para esperar ao segundo bebê e, tirando o menino dela, foi sentar-se com ele ao lado da cama enquanto o embalava suavemente.
Amber deixou o corpo frouxo.
— Deus, não posso. Não posso mais. Não posso...
Angélica se inclinou e Amber tocou a mão do recém-nascido. Edge viu que o pequeno agarrava com força seu dedo indicador. E de repente Amber pareceu ganhar forças.
Começou a empurrar quando o disseram. Tinha o rosto ruborizado e o cabelo empapado de suor. Estava exausta. Edge o sentia. Sentia tudo: a dor, o cansaço, mas, sobretudo, o medo.
— Está quase aqui. Um empurrão mais, Amber disse Tamara.
Ela empurrou de novo, obrigando ao seu segundo filho a vir ao mundo.
— É uma menina — disse Tam enquanto envolvia delicadamente ao bebê. Mas não sorria — Vamos pequenina. Vamos — posou a mão sobre o peito da menina e a sacudiu suavemente — Vamos, amorzinho, respira.
Mas a menina não se moveu, nem começou a chorar.
— Trarei para o Eric — murmurou Tam, dando a volta.
Deixou à menina no berço improvisado e se dirigiu à porta abafando um soluço.
«Não, não pode ser».
Edge levantou o olhar bruscamente. Essa voz. Essa voz familiar.
«Traga-me a minha irmã!» e de repente Edge soube o que tinha que fazer.
Amber via horrorizada como seu sonho ia se fazendo realidade, como um filme que discorresse em câmara lenta ante seus olhos. Edge cruzava o quarto, tomava a gaveta da cômoda e baixava o olhar para ela. Exalava um suspiro e se voltava para a cama.
A parte dianteira da gaveta estava lavrada com intrincados desenhos. Daquele ângulo, parecia uma caixa lavrada. Como a de seu sonho. Amber levantou o olhar e viu que por seu rosto rolava uma única lágrima.
— Não — murmurou — Não, Edge, isto não pode estar acontecendo.
— Psiu, aguenta, Alby — ele se aproximou da cama, junto à qual Angélica sustentava nos braços ao menino, com o rosto cheio de lágrimas — Ponha-o aqui. Deite-o junto de sua irmã.
— Mas, Edge, está...
— Por favor — sussurrou Edge com voz enrouquecida pela emoção.
Angélica se levantou e pôs suavemente o menino na gaveta, junto à menina imóvel. Edge se ajoelhou no chão, junto à cama. Amber se levantou para ver o que fazia. Olhou o rosto de sua filha. Estava pálida e tinha um leve colorido azul na pele. Era tão pequena, muito menor que o menino... Mas, enquanto olhava com o coração oprimido pelo peso da dor, o menino começou a mover a mão ao acaso. Quando tocou a mão sem vida do outro bebê, começou a fechá-la e a abri-la de maneira reflexa e agarrou os dedos de sua irmã.
A porta se abriu e Tamara e Eric entraram no quarto seguidos pelos outros. Inclusive Will conseguiu chegar até lá. Reuniram-se no quarto e ficaram calados ao tomar consciência do que estava acontecendo ante seus olhos. Amber sabia que estavam ali. Mas não podia afastar os olhos de seus bebês.
— Edge... – murmurou . — Seu rosto... estou imaginando isso?
— Não, já tem mais cor. Eu também o vejo.
— Está se movendo — murmurou Angélica — Olhem seu pezinho...
De repente um pranto agudo e áspero, semelhante ao balido de um cordeiro recém-nascido, rompeu o silêncio. A garotinha que jazia no berço improvisado começou a retorcer-se e a chorar enquanto seu rosto se contraía.
Amber estendeu os braços, chorando e rindo ao mesmo tempo. Edge se inclinou sobre o berço e tomou aos dois bebês nos braços. Levantou-se e os pôs na cama, com sua mãe, cada um em um braço. Amber olhou para um e para o outro, chorando copiosamente.
Edge ficou ali olhando-os um momento; logo se deixou cair em uma poltrona próxima, como se não pudesse sustentar-se em pé.
— Como... como sabia o que tinha que fazer Edge? — perguntou Jameson, agachando-se diante dele.
— J.W. me disse. Acho que... acredito que ele a curou.
— É lógico — disse Eric — O sangue de sua mãe tem propriedades que curam. Se combinarem com os poderes do sangue de um vampiro, obtém-se uma substância poderosamente curativa.
— Pode ser — Edge sacudiu a cabeça — Stiles tinha a descabelada teoria de que, de algum modo, o bebê controlava algumas coisa do interior do ventre de sua mãe. Por isso o sangue de Amber tinha de repente muito mais poder. Esse poder não provinha dela, mas sim do bebê. Até pensava que o bebê podia ter certo controle sobre a forma como se manifestava esse poder. Eu não acreditava nisso, mas agora... já não estou tão seguro.
— Talvez devêssemos dar a esta nova família um pouco de tempo para que estejam sozinhos — disse Angélica, que estava atrás de Jameson, com as mãos apoiadas sobre seus ombros — Mas não muito. Estou desejando começar a mimar a meus netos.
Jameson se levantou e se aproximou de Amber para lhe dar um beijo na fronte.
— Tinha razão ao confiar nele, mesmo quando todo mundo duvidava.
— Você não duvidou — disse ela.
— Eu confio em seu julgamento.
Um a um foram se aproximando da cama para beijar aos bebês. Alicia chorava tanto que não podia falar. Will só lhes acariciou as cabecinhas. Amber pensou que tinha melhor aspecto e notou que levava um curativo no braço, como se acabasse de injetar-se. Meia dose não tinha sido suficiente, mas, depois de injetar o resto, o soro parecia estar fazendo efeito.
— Acha que funcionou? — perguntou-lhe Amber, esquadrinhando seu rosto.
— O que importa? Se não funcionar, deixarei que J.W. agarre-me o dedo.
Amber não o contrariou, não disse que não podiam ter certeza de que o poder curativo de J.W. surtisse sobre todos o mesmo efeito que tinha surtido sobre sua irmã e que não tinham razões para acreditar que concedesse a imortalidade. Mas antes que acabasse de formular aquela ideia, Will lhe piscou um olho.
— Funcionou, Amber. Tenho certeza.
Levantou-se e caminhou lentamente para a porta.
Quando saiu do quarto, Amber olhou ao Edge. Ele parecia tão cansado quanto ela. Mas a olhou nos olhos, levantou-se com esforço da cadeira e se aproximou.
— Acha que poderá se separar deles um momento?
— Não quero deixar de tocá-los — murmurou Amber — Mas quase não posso manter a cabeça erguida.
Tirou à menina de seus braços.
— Vai precisar de um nome.
— O que acha de Bridget? — perguntou Amber suavemente.
Edge levantou o olhar, surpreso. Ao olhar, seus olhos se encheram de lágrimas.
— Obrigado.
— Você me agradece? Isto foi possível graças a você, Edge. Cumpriu sua promessa. Conseguiu que Stiles falasse sem tirar a cura de Will. E salvou a nossa pequena.
— Seu irmão salvou-a.
— Os dois a salvaram.
Edge abraçou um momento à pequena e a deixou logo em seu berço. Logo tomou ao pequeno, beijou-lhe na bochecha e o depositou junto de sua irmã.
— Vai ser uma peste. Já riu de mim quando as Irmãs do Ateneu me moeram a pauladas — beliscou o queixo do menino — Devo uma, J.W — logo levantou e se sentou na cama, junto de Amber, tomando suas mãos — Alby, com todas as coisas que aconteceram, não tivemos tempo para falar sobre... nós.
Ela baixou o olhar. — Não precisa.
— O que? Falar?
— Que fique — murmurou ela — Não tem por que ficar. Comigo, quero dizer.
Ele esboçou um lento sorriso.
— Já está na hora de parar de enrolar, não acha? — ela o olhou com o cenho franzido — Vamos, Amber, renda-se e diga que me quer.
Amber sentiu que seu coração dava um pulo enquanto esquadrinhava seus olhos.
— O que?
— Diga que me quer, Alby. Embora não seja o príncipe com quem sonhava, embora não mereça isso. Diga que me quer de qualquer forma. Mas só se sentir isso.
Sustentou seu olhar e deixou de fingir. Levando suas mãos às bochechas, disse:
— Merece todo meu amor. E sabe perfeitamente o que sonhava. Amo você desde a primeira vez que me beijou. Embora me avisasse para que não me apaixonasse por você.
— Ah, sim?
Ela assentiu com a cabeça.
— Disse-me que não era um romântico, que não era dos que se apaixonam e escolhem uma companheira para toda a vida. E eu, como uma idiota, ignorei sua advertência. E me apaixonei perdidamente por você.
Ele sorriu. Amber ficou sem fôlego ao ver as covinhas de suas bochechas e o brilho de seus olhos.
— Tanto melhor. De qualquer forma, não eram mais que idiotices.
— Ah, sim?
— Demônios, sim. Ainda não se deu conta? Alby estou louco por você. E até me afeiçoei a este bando de intrometidos que é sua família – a beijou meigamente nos lábios.
Quando levantou a cabeça, ela seguia sondando seus olhos inquisitivamente.
— Ainda não estou... O que está dizendo, Edge? Se for... se for pelos meninos...
— Não é pelos meninos — disse ele — Nem pela situação. Nem pelos outros. É por você, Alby. É... É a única mulher que pode haver para mim. Tem meu coração cativo dentro de você. Minha alma inteira. Se tivesse que viver sem você, acredito que murcharia até morrer. Amo-a, Alby. Ficou claro?
Amber sentiu que sua garganta se apertava até deixá-la sem fala. Era verdade. Todas as suas esperanças viraram realidade. Edge a amava. Tentou dizer o que isso significava para ela, mas não encontrou palavras. Assim, com lágrimas de alegria, beijou-o de novo nos lábios.
A loira Bridget usava uma saia rodada, um monte de braceletes e dois grandes aros nas orelhas. Estava imitando a sua tia Serafina, que a estava ensinando a dançar como uma cigana enquanto tocava seu pandeiro novo. Era o dia do segundo aniversário dos gêmeos, e a grande festa se converteu em um acontecimento anual. A família tinha concordado em alternar-se para celebrá-la, e esse ano havia tocado à casa da Serafina e Willem em Salem. As corridas de pôneis eram contribuição de Rhiannon, e a fogueira e os disfarces de cigana, ideia de Fina. Havia bolos, sorvetes, música e um sem-fim de cuidados. Cada presente que as crianças abriam era mais elaborado que o anterior. E, entretanto, J.W. ignorava-os todos e passava o tempo brincando de correr pela praia com seu tio Willem, em busca de estrelas do mar moribundas. Cada vez que encontrava uma, recolhia-a, sustentava-a em suas mãos um momento para que sarasse e a devolvia ao mar.
Amber permanecia reclinada em uma poltrona, no terraço de madeira de sequóia, rodeada pelas mulheres. Sua mãe e sua melhor amiga. Sua tia Rhiannon e Tamara.
Morgan também estava ali, e Donovan tinha conseguido por fim convencer a Rachel para que fosse conhecê-los. Susan, a mãe da Alicia, também se achava presente. Era maravilhoso.
Amber olhava a seu marido falar com outros homens. Via com que respeito o olhavam. Todos eles o queriam. Seu pai daria a vida pelo homem que tinha salvado a seus netos, e Eric e Roland sentiam o mesmo. Edge tinha conseguido até forjar uma cálida e intensa amizade com Donovan e Dante.
Quanto ao Will... Bom, Will sempre estaria agradecido a ele. Voltava a estar são e cheio de energia. O câncer tinha desaparecido. E, quando necessitasse uma nova dose da formula do Stiles, procuraria Amber. - Tal e como se esperava, seu sangue tinha voltado para seu estado original. Rhiannon tinha tomado «emprestada» uma dose da nova provisão da A-6 para prová-la com a Pandora, sua pantera, que parecia achar-se de novo na flor da vida.
Serafina esteve dançando com Bridget entre risadas, cujos cachos dourados quase chegavam ao chão do terraço. Logo se sentou nos degraus, ofegante, e abraçou à pequena. Dante se separou dos homens e se aproximou dela.
— É como se tivéssemos recuperado a nossa tribo, verdade, Fina? — perguntou.
Ela assentiu.
— Mas aqui ninguém nos trairá. Nunca — olhou ao Willem, que estava chapinhando na água com o J.W. — Will já nem sequer coxeia.
— Sei — disse Amber — É maravilhoso vê-lo com tanta saúde. Estivemos a ponto de perdê-lo — suspirou — Antes me sentia muito sozinha. Como uma intrusa. Porque era diferente do resto de vocês. E também diferente de Alicia e de Susan.
— Ah, mas o bando de intrusos está crescendo – disse Angélica suavemente — Agora temos Will e os meninos.
— E Edge — murmurou Amber — Nunca voltarei a me sentir sozinha.
Edge, que estava de pé junto à fogueira, levantou os olhos e a olhou. Nenhum dos outros vampiros se atrevia a aproximar-se tanto do fogo. E havia água por toda parte, no caso de que algo ocorresse. Mas a vida era um risco, e Serafina tinha insistido em fazer uma fogueira, como em tempos passados, era um risco muito pequeno.
Sempre e quando não cometessem a estupidez de aproximar-se muito.
Respondendo à mensagem sussurrada de Edge, Amber se levantou e se aproximou dele. Edge saiu a seu encontro.
— Acha que poderão ficar com os meninos uma hora? — perguntou.
— Confio neles como em ninguém mais. Por que? O que está tramando?
Ele sorriu.
— Pensei que podíamos dar um passeiozinho pela praia. Para visitar esse lugar que encontramos uma vez. Lembra-se, não é? Essa pequena enseada isolada...
— Onde foram concebidos nossos filhos.
Os olhos do Edge se obscureceram e Amber sentiu um estremecimento. Lançou a Alicia um olhar e sua amiga fez um gesto de assentimento. Logo, Edge passou um de seus braços pelo ombro e puseram-se a andar pela praia.
— Está feliz? — perguntou ele.
Ela o olhou nos olhos.
— Encontrei a felicidade — murmurou — Atropelar você foi o melhor que fiz na vida.
— Me ocorrem muitas coisas que tem feito depois que eu gosto mais.
— Hum, seriamente?
— Sim. Defender-me diante de sua família. Dar a luz a esses dois pequenos bandidos. Curar ao Will. Curar a mim.
— Quando queimou o seu braço, quer dizer?
Edge se voltou para olhá-la aos olhos.
— Não, o braço não. A alma. O coração. Você me curou por completo, Alby. Só me amando. É de verdade a Menina Prometida. É um milagre, e prometo amar você e cuidar de você até que caiam as estrelas.
Envolveu-a em seus braços e a beijou. E Amber compreendeu que enfim tinha encontrado seu lugar no mundo.
Maggie Shayne
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