Biblio "SEBO"
A tempestade estava a ponto de cair sobre Annie Hess...
De fato já tinha começado com a chegada de sua filha secreta, a que anos atrás tinha deixado aos cuidados de seu irmão e que agora necessitava de respostas. Mas as coisas não tinham feito mais que piorar com a aparição do Logan Drake. O homem que a tinha rechaçado em outro tempo agora pretendia levar a moça. Nenhum dos dois esperava que aquele reencontro despertaria seus sentimentos do passado. O que ainda não sabiam era se as duras decisões que tinham tomado anos atrás poderiam agora levá-los até encontrar a felicidade.
BASTA. Ela se sentiu aliviada ao reconhecer a rouca voz que tinha surgido da escuridão. Aproveitou a momentânea surpresa de Drago para liberar-se e afastar-se da esquina do abrigo onde a tinha esquecido.
Entretanto, Drago reagiu em seguida, agarrou-a por cabelo e atirou para ele. Ela gritou de dor e se torceu um tornozelo ao retroceder.
—Hei dito que basta —repetiu a voz. encontrava-se apanhada entre duas sensações: a dor que lhe causava Drago ao lhe atirar do cabelo e o alívio ao comprovar que sua estupidez não ia supor, como tinha pensado, seu fim. De seu salvador só podia ver a ponta de um sapato. Mas não necessitava nada mais para recuperar a valentia.
-me solte, Drago. Hei-te dito que me deixe em paz.
O homem riu brandamente.
—Mas se tínhamos um trato, pequena. Ou é que já não o recorda?
—Tínhamo-lo, mas o tenho quebrado. Assim...
Drago voltou a atirá-la do cabelo, essa vez com mais força, e ela tropeçou e perdeu o equilíbrio. Tentou pôr as mãos para frear a queda, mas não o conseguiu e o golpe foi tão duro que os olhos lhe encheram de lágrimas. Quando reagiu, observou que Drago também estava no chão, tentando levantar-se.
O homem que tinha golpeado a seu agressor era muito alto, mais inclusive que seu irmão, Will, que ultrapassava o metro oitenta. A tênue luz do abajur lhe permitiu observar a cor de seu cabelo, negro como o ébano, e o tom moreno de sua pele. Entretanto, não era um moreno de homem com dinheiro e tempo livre, como o que cultivava seu pai para contrastar com os objetos brancos de jogar tênis, mas sim de um homem que podia tombar a um valentão de um murro sem fazer uma só ruga no smoking que levava.
—Não te mova.
A pesar do som das risadas e da música que chegava do mole, onde seguia a festa das bodas, sua voz se podia ouvir com toda claridade.
Observou a Drago com medo, mas ele se manteve no chão e se limitou a olhá-la a sua vez com gesto de recriminação, como se todo aquilo fora culpa dela. Annie Hess pensou que talvez tivesse razão; ultimamente as coisas não lhe tinham saído muito bem e se por acaso fora pouco nesse momento teria que as ver-se com o homem que !a tinha salvado e ao que já tinha reconhecido: Logan Drake, o amigo de seu irmão maior.
— Encontra-te bem?
Annie pensou que aquela situação resultava muito irônica. Levava dois dias tentando chamar sua atenção, mas não tinha imaginado que o conseguiria de um modo tão estranho.
—Encontra-te bem? —repetiu.
Ela assentiu.
— Vá chamar à polícia. Ah, e lhe diga a seu pai ou a seu irmão que venha.
— Não.
— Como? —perguntou, surpreso.
Drago sorriu com satisfação.
—Não quero danificar as bodas ao Will.
— Se não queria danificar-lhe não deveria ter convidado a seu noivo.
—Não o convidei. Além disso, não é meu noivo.
—Já —disse Logan, com desconfiança.
—Vamos, Annie, não lhe minta —interveio Drago-
—Fecha a boca, Drago.
Annie tentou levantar-se, mas o comprido vestido ajustado que se pôs não lhe facilitava o trabalho. Logan suspirou com impaciência, aproximou-se dela e a levantou como se ela fora uma menina incapaz de caminhar por si mesmo.
Olhou-o à cara e quase se estremeceu. Logan não só era amigo de seu irmão, mas também também era seu padrinho. Tinha-o visto em infinidade de ocasiões e sempre se sentou atraída por ele. Era diferente a outros. Mais elegante, mais perigoso.
—Parte, Drago —disse ela—. Se não o fizer, é possível que troque de opinião e chame à polícia.
Fazia tempo que Annie queria livrar-se dele. Havia-lhe dito várias vezes que a deixasse em paz, que sua relação tinha terminado, mas não fazia nenhum caso. Inclusive o tinha ameaçado contando-lhe a seu pai, o venerável juiz George Hess, embora sabia que a ameaça não podia ser mais vã. Aquela mesma noite, ao ver drago na festa, tinha tentado falar com seu pai; mas nem ele nem a mãe do Annie, Luzia, demonstraram o menor interesse por deixar de tomar champanha com seus amigos e ajudá-la.
Drago se levantou do chão, passou-se uma mão por seu loiro cabelo e sorriu.
— Não vais liberar te de mim tão facilmente. Você e eu somos iguais.
—Não somos iguais em nada.
—Annie, faz o que te hei dito —insistiu Logan.
Olhou aos dois homens e pensou que falar com seu pai seria inútil. Quanto ao Will, já estava bastante molesto com ela; sempre tinham estado muito unidos, mas ao haver-se casado com o Noelle, tinha iniciado uma nova vida e a problemática Annie não cabia nela.
—Está bem, está bem... Já vou.
Ela se afastou, cravando os altos saltos dos sapatos no chão, embora não gostava de voltar para a festa. Mas se disse que a situação não era tão malote como poderia ter sido; se tivesse aceito o convite do Noelle para ser uma das damas de honra, teria tido que ficar um vestido de cor salmão como as demais.
Para ouvir que falavam, Annie se voltou e os olhou de novo.
— Será melhor que te mantenha afastado de —lhe advertiu Logan nesse instante.
Drago sorriu.
—O que acontece? Você também quer te aproveitar de uma menor de idade?
Logan respondeu lhe dando um forte murro na mandíbula. Drago retrocedeu pelo impacto, mas surpreendentemente, manteve o equilíbrio e se afastou do lugar.
Como Logan parecia disposto a segui-lo, Annie decidiu intervir.
—Deixa-o, é um idiota.
— O que o deixe? Para que volte a te pegar?
—Não me pegou. Em realidade...
Annie se deteve um momento antes de terminar a frase. Embora não tinha ido tão longe, não sabia o que poderia ter acontecido se Logan não tivesse aparecido a tempo. Mas até essa noite, Drago se tinha limitado a cumprir o trato: ela tinha conseguido que entrasse em seu instituto, para que ele tivesse acesso como mecânico aos muito caros carros de seus companheiros, e ele se comportava em público como um noivo socialmente inapropriado. Em privado, em troca, não lhe punha as mãos em cima.
—Olhe, agradeço-te que aparecesse a tempo. Mas falava a sério ao dizer que não quero montar uma cena na festa.
—Que curioso. Não recordo que nunca te tenha preocupado montar cenas. O que têm feito seus pais? É que lhe ameaçaram te deserdando se hoje ocorrer algo mau?
—Meus pais me ameaçam com isso todas as semanas —respondeu ela—. No fundo, acredito que se sentirão decepcionados se ao final do dia não tenho feito nada que os envergonhe ante os convidados.
Em realidade, Annie tinha sido sincera. Não queria danificar a festa porque não queria que Will se zangasse ainda mais com ela.
—E por isso não quer lhes pedir ajuda?
—Para falar a verdade, já o tenho feito.
Logan arqueou uma sobrancelha.
— E o que disseram?
Ela se encolheu de ombros.
—Imagine o Se tivessem feito algo, Drago não teria estado aqui. Mas volta para a festa... Suponho que Will estará cortando a liga de seu flamejante algema ou algo assim.
— E você? Não pensa voltar?
—As bodas não são o meu. Não é meu estilo.
—OH, vamos, só tem dezessete anos. Ainda não tem nenhum estilo próprio.
Ela esteve a ponto de rir.
—Em primeiro lugar, só faltam uns meses para que cumpra os dezoito. E em segundo, conhece-me o suficiente para saber que meu estilo é causar problemas.
— Isso o pensa a sério? Ou te limita a repetir as palavras de seus pais?
O sorriso do Annie fraquejou.
Há alguma diferença?
—É obvio. E se houver algo que você não gosta em sua vida, deve recordar que é quão única pode trocá-lo.
—Meus pais dizem que não trocarei nunca, que sempre serei igual.
Annie se sentiu um pouco enjoada. Tinha bebido muito e tentou concentrar o olhar na garrafa que jazia no chão.
—Que lástima de champanha. A garrafa se rompeu quando tentei golpear com ela a Drago.
— De todas formas, já bebeste bastante por esta noite.
— Eu? Beber eu? —burlou-se—. Mas se for menor de idade...
—Não faz falta que me recorde isso. Já sei. Entretanto, não deveria beber sozinha. Algo me diz que veio ao abrigo para fazer precisamente isso.
—É muito perceptivo.
—Ou você muito evidente —declarou ele —. Deveriam te atar.
Logan era um homem impressionante e muito seguro, mas Annie não se sentia incômoda quando estava com ele. Bem ao contrário, agradavam-lhe aqueles intercâmbios. E além disso, desejava-o.
—Vamos, Logan... Estou segura de que baixo essa aparência séria e estirada pulsa um coração apaixonado.
Annie se aproximou dele com a evidente intenção de tentá-lo. Graças a seus sapatos de salto alto, quase chegava ao queixo.
— pode-se saber o que está fazendo? —perguntou ele.
—te dando as obrigado de forma apropriada. Annie ficou nas pontas dos pés e o beijou na cara.
— Já, bom... De nada —disse ele, nervoso.
Entretanto. Logan não se moveu. Permaneceu ali, como enfeitiçado; e já estava inclinando-se sobre ela, a ponto de deixar-se levar e de beijá-la, quando se apartou súbitamente.
— Maldita seja, Annie... Compreendo que pretenda chamar a atenção de seus pais, mas não é necessário que me utilize .
—Deseja-me, Logan, sei.
— Cresce de uma vez —disse ele, irritado—. Só é uma menina bonita e mimada que não pensa em ninguém salvo em si mesmo.
Annie estava acostumada a que lhe dissessem coisas similares e nunca se incomodava por isso; mas ouvir o de sua boca resultou bem diferente.
—Dava o que queira, mas sei que desejas me beijar, me tocar... me acredite, Logan, sei reconhecer aos homens que se interessam por mim.
— Isso é o que faz nesse instituto para meninos ricos ao que vai? te convencer de que provocar uma reação física é o mesmo que despertar e! interesse de um homem? Espero que não, porque minha irmã é tua companheira...
Em realidade, Annie não era precisamente uma devoradora de homens. Ainda não tinha feito o amor com ninguém, e pelo resto, sua imagem agressiva e independente era simples e pura fachada.
— Não se preocupe pela Sara; segue sendo tão pura como a neve —disse, refiriéndose à irmã do Logan, com quem compartilhava habitação—. Mas dentro de uns meses terminarei os estudos e poderei partir dessa prisão... Então já terei dezoito anos, e você, quantos? Vinte e três, vinte e quatro? Venha, Logan, já quase sou major de idade. Só faltam umas semanas.
Logan entrecerró os olhos.
— O que me está propondo exatamente? Que façamos o amor no abrigo? Olhe, é amiga de minha irmã pequena e não me importa o que pense de mim. Se quer te deitar com alguém, vá procurar a esse cretino de Drago; certamente estará escondido entre as árvores. Não me interessa.
Logan se afastou então e Annie pensou que tinha acertado ao dizer que era uma egoísta que só pensava em si mesmo.
Olhou para o mole, onde continuava a festa, e uma vez mais se sentiu agradecida. Logan a tinha salvado de uma situação muito comprometida. Além disso, era o único que tinha advertido sua ausência, o único que se preocupou por ela e o único que tinha decidido ir procurar a.
Um pouco angustiada, tirou-se os sapatos e desapareceu na noite, caminhando pela grama. Sabia onde tinham guardado as caixas de champanha, assim pensou que ninguém sentiria falta de uma garrafa.
OUVIU claramente o som de um cristal quebrado. Annie fechou os olhos e tentou tranqüilizar-se, mas não precisava os ter abertos para saber que o ruído procedia da parte posterior da loja; conhecia cada centímetro do Island Botânica.
Abriu a porta que separava o armazém e seu escritório da zona de venda ao público e jogou uma olhada a seu redor. Ramos de lavanda, romeiro e papoulas decoravam a sala, e ao fundo pôde ver uma adolescente junto aos restos de um floreiro.
—Encontra-te bem?
—É o terceiro floreiro que rompo —disse Riley, a ponto de chorar.
Annie se relaxou ao comprovar que não se cortou.
—Bom, são coisas que passam quando se tem um chão de cimento; tudo se rompe quando cai. Sara e eu estávamos acostumados a brincar com isso e dizíamos que seria muito mais conveniente um chão de espuma.
—Sinto muito, Annie. Meu pai pagará as imperfeições.
Annie sentiu uma pontada no coração. Desde que Riley tinha aparecido na porta da loja, dois dias antes, aquela era a primeira menção que fazia de seus pais. De fato, tinha tido que insistir em que chamasse o Will e ao Noelle para que soubessem onde se encontrava sua filha.
—Não seja tola, não faz falta —disse ela.
—claro que sim. Papai sempre diz que Sara e você logo que conseguem sobreviver com o negócio, e não quero piorar sua situação com este tipo de coisas.
— Um floreiro mais ou menos não troca nada —comentou com ironia—. A sério, não passa nada... por que não vais descarregar as caixas que trouxe o fornecedor? Logo poderíamos tomar um descanso e comer algo.
Annie limpou os restos do floreiro com uma vassoura e um recolhedor e os atirou ao lixo antes de acrescentar:
— Uma das vantagens de ser sua própria chefa é que pode comer à hora que queira. Poderíamos ir ao local do Maisy. A comida é magnífica e talvez possamos nos sentar fora se deixar de chover. Venha, descarga essas caixas e me chame quando tiver terminado.
Mais animada, Riley assentiu e se dispôs a cumprir o encargo enquanto Annie retornava à parte dianteira.
Era uma manhã bastante tranqüila, como quase sempre entre semana. Island Botânica era uma loja de ervas e flores e só funcionava bem os fins de semana, quando chegavam os turistas. Por fortuna, tinham muitos clientes que faziam encargos por telefone ou correio eletrônico. Do contrário a opinião do Will se teria imposto, dado que possuía parte do negócio, e o estabelecimento que compartilhava com seu amiga Sara Drake já teria fechado.
Começou a limpar as prateleiras, corrigiu a posição de alguns objetos e logo olhou à rua; alegrou-se ao observar que a calçada estava seca, embora o céu, coberto, ameaçava tormenta.
Na ilha Turnabout garoava com freqüência, mas as nuvens que cobriam a zona durante os últimos dias não eram tão habituais; tinham aparecido justo quando chegou Riley, como querendo compartilhar a confusão que sentiu Annie ao ver sua sobrinha. escapou-se de casa e tinha decidido ir com ela à loja, embora ainda não sabia por que.
Uns segundos depois, soou a campainha da porta, um sinal inequívoco de que tinha entrado um cliente. E quase ao mesmo tempo, Riley saiu do armazém e disse:
—Tia Annie, já terminei. Se quiser que...
Riley não terminou a frase.
—Magnífico, Riley. Espera um momento enquanto termino o que estou fazendo e em seguida...
Annie também se deteve em seco ao ver o homem que acabava de entrar. levou-se tal surpresa que a ponto esteve de atirá-lo tudo.
— Logan?
— O adverti, adverti-lhes que não viessem a me buscar — interveio Riley, nervosa—. Assim decidiram te enviar a ti... Não sou tola, sabe? Sei quem é porque te vi muitas vezes nas fotografias das bodas de meus pais.
Logan arqueou uma sobrancelha, como se não soubesse a que se referia.
— Logan? Logan Drake? —perguntou a sua vez Annie, sem poder acreditar que estivesse ali.
Tinham passado anos da última vez que o tinha visto. Tinha perdido o contato com o Will depois de que se casasse e quão único tinha sabido dele era o que lhe contava Sara de vez em quando.
—Olá, Annie. passou muito tempo —disse, com um sorriso.
— Sim, muito tempo.
Annie tentou manter a calma, embora aqueles olhos azuis e aquelas largas pestanas apenas o permitissem.
—Você é amigo de meu pai —insistiu Riley.
— Quem é seu pai?
A adolescente se cruzou de braços com desconfiança e Annie decidiu intervir para esclarecer situação.
— Logan, apresento a minha sobrinha, Riley. — A filha do Will? —perguntou—. Sim, claro, parece-se muito a ele... Está na ilha?
—Não. Noelle e ele seguem vivendo em Washington — respondeu Annie—. Riley, apresento ao Logan Drake. Certamente, é um velho amigo de seu pai, mas também é o irmão da Sara e estou segura de que veio a vê-la a ela e ao doutor Hugo, não para te buscar a ti. A fim de contas, é do Turnabout. Verdade, Logan?
—É obvio. Cresci na ilha —respondeu ele, sem deixar de sorrir.
— Mas seguro que estava desejando partir. Aqui não há nada a fazer, embora nos encontremos em Califórnia. Se em toda a ilha não há mais que cinco carros... É muito aborrecida.
—Riley... —protestou sua tia.
Entretanto, Annie olhou ao Logan e sorriu. Riley tinha razão. A ilha era muito pequena, tanto que ninguém necessitava carros para ir de um lado a outro.
— Temo-me que Sara se partiu a passar uns dias em San Diego —continuou Annie—. Não me disse que te esperasse...
Logan a olhou com aquele sorriso permanentemente fixo em seus lábios. Por alguma razão, punha-a nervosa.
—Porque não esperava minha visita —observou ele.
Ao Annie sentiu saudades um pouco seu puntualización. Tinha querido dizer que estava de visita para deixar claro que não tinha intenção de ficar, mas não era necessário absolutamente. A fim de contas tinha ido ver sua irmã, não a ver sua sócia. Embora tinham acontecido dezesseis anos desde seu último encontro, ainda recordava que não tinha muito boa opinião dela.
—Riley e eu estávamos a ponto de sair para tomar algo no botequim do Maisy. Se quer vir conosco...
Logan a olhou com gesto pensativo e Annie se perguntou que diabos estava fazendo. Não tinha o costume de convidar a comer de qualquer jeito a nenhum homem. Embora fora um de que tinha estado total e locamente apaixonada. Embora fosse o irmão de seu melhor amiga.
— Entretanto, suponho que terá pressa por ir ver seu pai —continuou ela—. Vi o doutor Hugo esta manhã, quando abri a loja. Sua consulta está... Que tolice, sabe de sobra onde está.
—Não, não há pressa. Aceito-te o convite a comer.
O coração do Annie se deteve durante uma milésima de segundo. Ao parecer, sua presença seguia afetando a de igual modo.
—Excelente.
Riley suspirou, evidentemente molesta com o convite ao Logan, e Annie pensou que devia melhorar suas maneiras. Mas ato seguido se disse que ela tinha sido ainda pior a sua idade e recordou as palavras que estava acostumado a lhe dedicar sua mãe, Luzia, para condenar seu supostamente atroz comportamento.
Em realidade, a atitude do Riley não era atroz absolutamente. Simplesmente era uma adolescente com problemas que se partiu de casa para ir ver uma tia a que logo que conhecia. Devia encontrar a forma de convencê-la para que voltasse com seus pais, logo que fora possível, mas sem pressionaria.
Então notou que os dois a estavam observando com atenção e sorriu. Resultava evidente que esperavam que dissesse algo.
— Sim, claro, a comida... Esperem um momento.
Annie foi ao armazém a recolher a bolsa e as chaves do local e retornou em questão de segundos. Riley e Logan se olhavam o um ao outro com desconforto e pensou que os ter juntos na mesma mesa não ia ser precisamente fácil.
Riley a olhou com ironia, como se fora perfeitamente consciente do que estava pensando, e Annie se estremeceu. Por muito que queria negá-lo, não havia dúvida alguma de que ainda o desejava.
Acabavam de sair à rua, quando Riley aproveitou que Logan se adiantou para comentar a sua tia, em voz baixa:
— Não me importa de quem seja irmão. Você arrumado um milhão de dólares a que o enviou meu pai para que me leve de volta a casa.
Annie elevou os olhos ao céu. Seguia totalmente coberto e pensou que não teria sido estranho que um raio caísse sobre ela naquele instante; a presença de sua sobrinha e de seu antigo amor já tinha complicado bastante as coisas.
—Não tem um milhão de dólares —lhe recordou—. Mas sim, é possível que tenha vindo por seu pai.
—Pois não penso voltar.
Apesar de que Annie tinha tentado tranqüilizá-la pela presença do Logan, nunca tinha acreditado nas coincidências. Resultava muito estranho que aparecesse na ilha naquele momento, assim supôs que a hipótese do Riley podia ser correta.
Pensou que sua sobrinha voltaria para casa por muito que se empenhasse no contrário e voltou a olhar ao céu. Acabava de ouvir um trovão e o ambiente se carregou de eletricidade.
—A tormenta está a ponto de nos alcançar —disse Logan, que seguia uns metros mais adiante.
Annie acelerou o passo para o estabelecimento do Maisy Fielding. No relativo a ela, a tormenta já tinha chegado.
Capítulo 2
SERÁ possível? Enganam-me os olhos ou é meu sobrinho Logan Drake? —perguntou Maisy Fielding, com os braços em jarras.
Logan sorriu. Maisy era certamente tia dela, embora pelos cabelos; o marido da mulher, já falecido, era primo de sua mãe. Mas em qualquer caso, surpreendeu-lhe que seguisse tal e como estava a última vez que a tinha visto. Tinha os mesmos cachos avermelhados, levava a mesma roupa de cores brilhantes e seguia sendo uma mulher um pouco exagerada e de forte caráter.
—Bom, acredito que isso é o que diz minha carteira de conduzir.
Maisy riu, aproximou-se dele e o abraçou.
—Pelo visto, não perdeu seu senso de humor quando te partiu do Turnabout. Mas me assombra que lhe permitam ter carteira de conduzir. As árvores contra os que estrelou seu carro aquele dia demoraram dez anos em recuperar-se.
Logan e Riley riram.
—Não esperava que me falhassem os freios, Maisy — se defendeu—. Ao menos o estrelei contra as árvores e não contra seu local.
Maisy voltou a rir e ao fazê-lo deixou bem claro que tinha esquecido o assunto. Já tinham acontecido vinte e três anos desde dia em que Logan, então um adolescente de dezesseis, perdeu o controle do veículo que seu pai lhe tinha proibido que comprasse. Maisy se zangou muito e lhe obrigou a pagar os danos com seu trabalho, assim que se passou todo o verão pintando móveis e paredes, limpando e inclusive cuidando da filha de sua tia, Tessa; mas preferia algo antes que cuidar da menina.
Logan se sentiu súbitamente culpado por não ter estado na ilha quando Tessa faleceu. Mas nem sequer se inteirou; tinha-o sabido tempo depois graças a um comentário da Sara em uma carta.
— Mas bom, entrem... Suponho que terão vindo a comer —disse a proprietária do estabelecimento—. Sente saudades que te tenha apresentado assim, de sopetón. Hugo não me disse que estivesse esperando sua visita.
Logan se separou da entrada para deixar entrar antes às mulheres, fez caso omisso do comentário do Maisy e trocou de conversação.
—Vejo que o negócio vai bem. Antes não dava comidas, só cafés da manhã...
— Agora vêm muitos turistas à ilha e naturalmente têm que comer —disse, enquanto os conduzia a terraço posterior—. Enfim, sentem-se onde queiram e desfrutem da comida. Se começar a chover, buscarei-lhes um sítio dentro.
Maisy deu um tapinha ao Logan nas costas e voltou para interior do local.
— Onde querem que nos sentemos?
Como Riley não se deu por aludida e Annie se encolheu de ombros, Logan decidiu sentar-se no extremo mais afastado da terraço, o mais longe possível do resto dos comensais. Não queria correr o risco de encontrar-se com mais conhecidos. Estava na ilha para limpar sua consciência, não para renovar velhas relações.
Acabavam de sentar-se quando uma jovem garçonete se aproximou da mesa, serve água e tomou nota. Assim que se afastou, Logan jogou uma olhada a seu redor. Havia um casal de média idade, claramente turistas; outra mais jovem que parecia estar de lua de mel e uma mulher só que mostrava mais interesse pelo resto dos comensais que por sua comida.
Riley, enquanto isso, estava-se olhando as unhas com expressão despreocupada. Quanto ao Annie, permanecia em silêncio.
Ao vê-la ali, a seu lado, recordou a fotografia que Will lhe tinha ensinado no dia anterior; ao contemplar a imagem se havia dito que se parecia notavelmente a seu irmão, mas nesse momento, cara a cara, pensou que tinham muitas diferenças.
Annie notou que a estava observando e se cruzou de braços. Logan pensou que era uma típica reação defensiva.
— Suponho que já não preciso te perguntar se Sara e você mantiveram o contato quando terminaram os estudos no Bendlemaier...
Logan decidiu falar com o Annie, mas era muito consciente da reserva e a desconfiança do Riley. Will já lhe tinha advertido a respeito.
— Eu não terminei meus estudos no Bendlemaier, mas efetivamente mantivemos o contato. Tínhamos falado muitas vezes sobre a possibilidade de abrir uma loja e decidimos fazê-lo quando se apresentou a oportunidade.
Ao pensar no muito que tinha trocado Annie, Logan se perguntou se Sara também o teria feito. Estava desejando ver sua irmã pequena.
Nos últimos anos tinha falado muitos vezes com ela por telefone, mas não a tinha visto desde fazia uma década e ainda recordava seu gesto de confusão e dor quando lhe disse que não pensava retornar ao Turnabout. sentia-se culpado por isso e a chamava sempre que podia ou lhe enviava dinheiro quando o necessitava. Era uma forma como outro qualquer de aliviar sua consciência. E durante muito tempo quase tinha conseguido convencer-se de que funcionava.
Entretanto, não tinha retornado à ilha por sua família; de modo que voltou a observar ao Annie. Levava um vestido de cor cáqui sob o que se via uma camiseta branca sem mangas. Não levava mais objeto que um relógio na boneca esquerda e tinham desaparecido todos os braceletes, os pendentes e os colares que estava acostumado a ficar na adolescência.
Will lhe tinha advertido que teria que vê-la porque Riley estava em sua casa, mas Logan não esperava sentir-se atraído por ela.
—Antes levava o cabelo mais largo, verdade?
Logan recordava perfeitamente aquela juba de cor loira platino, brilhante e tão bela que voltava loucos aos homens.
—Em efeito —respondeu, ligeiramente ruborizada—. Em troca, você está como sempre. Um pouco mais velho, claro, mas como todos.
—Tantas lembranças do passado me estão produzindo vontades de vomitar —interveio Riley.
—Pois contén as vontades —disse Logan—. Eu não gostaria que nos arruinasse a comida.
Riley o olhou com cara de poucos amigos e Logan sorriu. A jovem lhe recordava muito a Annie que tinha conhecido.
—OH, te perca —protestou Riley.
Annie olhou a sua sobrinha e ato seguido ao Logan. Quando seus olhares se encontraram, ruborizou-se de novo e se umedeceu os lábios com a língua para dizer algo, mas a garçonete retornou naquele momento com a comida que tinham pedido.
Logan se surpreendeu. Nunca a tinha visto ruborizar-se daquele modo, embora não se encontraram da festa das bodas do Will. Ainda recordava o muito que se zangou com ela por sua atitude provocadora, mas recordava ainda mais o muito que se zangou consigo mesmo. A fim de contas, a juventude do Annie desculpava suas ações. Em troca, ele não podia apelar à falta de experiência.
— Poderia me passar o tomate? —perguntou Riley.
Logan o passou.
— Você gosta das batatas fritas com tomate?
-Sim.
—A mim também.
Riley o olhou com desdém. Annie, enquanto isso, já tinha começado a dar boa conta da salada que tinha pedido.
— Como é que não vive no Turnabout se nasceu aqui? —perguntou Riley.
— Meu trabalho não me permite isso. — No que trabalha?
—Riley, isso não é teu assunto —interveio Annie.
—Não, não me importa responder —disse Logan —. Sou espião.
— Sim, já... —burlou-se Riley, sem acreditá-lo.
—Está bem, está bem... —disse Logan, com um sorriso—. Em realidade sou assessor.
Logan tinha sido sincero ao afirmar que era espião, mas a gente não acreditava e preferia uma mentira à verdade.
— Assessor? Que tipo de assessor?
Logan notou que a garota só lhe estava fazendo perguntas para evitar que a perguntasse a ela ou a sua tia, e lhe pareceu muito inteligente por sua parte.
— Onde aprendeste a técnica do interrogatório? Ensinou-lhe isso seu pai? Sempre pensei que se não tivesse estudado Direito, Will teria sido um excelente polícia.
—Ainda não me respondeste... —disse Riley, sem deixar-se enganar.
Annie decidiu intervir e se somou ao peculiar turno de perguntas.
— O que aconteceu sua licenciatura em Direito?
— Nada. Tenho o título guardado em uma gaveta, acumulando pó.
Nesse momento apareceu uma segunda garçonete e os interrompeu.
— Querem tomar algo mais?
—Não, obrigado, Janie —respondeu Annie.
A garçonete partiu em seguida.
— Quem é? Resulta-me vagamente familiar — observou Logan.
— É Janie Vega. Ajuda ao Maisy quando tem muitos clientes, embora em realidade é artista. Fabrica vidraças de cores e tem seu próprio estudo na ilha.
-Vega?
—Sim. A irmã do Sam Vega. Acredito que o conheceu...
— É obvio. Estudamos juntos no colégio. —Pois agora é o xerife.
Logan pareceu surpreender-se.
—Não posso acreditá-lo. De meninos, não deixava de repetir que queria partir desta ilha logo que pudesse.
—Pelo visto, Sara não mentiu ao dizer que só falam de vez em quando. De outro modo, teria sabido que Sam é o xerife.
— me perdoem, mas me parto daqui —disse Riley—. Me aborrece sua conversação dos velhos tempos.
— E aonde vai?
—Não sei, a sua casa ou a alguma outra parte.
Annie lhe deu as chaves a sua sobrinha, resignada.
—Toma. Vá à loja e fique ali até que retorne.
— Dá-me as chaves? Confia em mim? —perguntou Riley, surpreendida.
—Claro que confio em ti. Não pensa ir a nenhuma outra parte, verdade?
-Não.
Logan pensou que, em qualquer caso, ao Riley não resultaria fácil sair da ilha. Já tinha falado com o Diego Montoya, dono do único transbordador que fazia o trajeto entre o continente e a ilha, e lhe havia dito que não deixaria que subisse a ele. Além disso, os residentes do Turnabout mostravam um curioso desprezo por volta das coisas do mar e ninguém possuía mais embarcação que alguma barco.
Riley já se partiu quando Annie disse:
—Minha sobrinha está no certo. Will te enviou a procurá-la. Não sabia que seguisse em contato com ele.
—Encontramo-nos por simples casualidade e me contou que Riley se escapou.
Annie arqueou uma sobrancelha.
— Encontraram-lhes por acaso? Que curioso! E suponho que também é casualidade que seu trabalho de assessor te permita fazer viagens a pequenas ilhas como esta quando quer.
—Agora estou de férias.
Logan só havia dito parte da verdade. Efetivamente lhe tinha pedido a seu chefe, Penetrei, que lhe desse umas férias porque necessitava um descanso. Mas a petição de ir procurar ao Riley não havia partido do Will, mas sim do próprio Penetrei. Ao parecer, ele e o irmão do Annie tinham negócios em comum.
—Pois acredito que teria sido mais apropriado que viesse Will em pessoa.
—Talvez. Mas seu irmão tem medo de que sua presença empurre ao Riley a fazer algo ainda mais drástico que escapar.
—Sim, bom... ameaçou partindo se vinha a procurá-la. Entretanto, terá que voltar para casa em algum momento.
—Deu-te problemas?
—Não, nenhum.
—Contou-te por que escapou?
—Não. Não confia em mim.
Logan franziu o cenho.
—Isso não é verdade. Riley não escapou de casa para partir a qualquer sítio. Veio a verte.
—Mas o fez por curiosidade. Suponho que queria ver como vive a ovelha negra da família.
—Will e Noelle me hão dito que querem enviá-la ao Bendlemaier.
—É uma instituição muito boa.
—Muito boa? Mas se você a odiava... Dizia que era uma espécie da prisão.
—É um bom sítio. Riley é uma garota brilhante e aprenderá muito ali —insistiu ela.
—Claro, por isso o abandonou sem terminar os estudos. Surpreende-me que tenha tão má memória... Falas exatamente igual a seus pais.
—Já sei que nunca você gostou de muito, Logan. Mas, realmente me está comparando com o George e Luzia?
Logan a olhou com impaciência.
—pode-se saber o que te passou, Annie?
—Nada. Simplesmente cresci —respondeu—. E a ti? O que te passou? É você quem desapareceu depois das bodas do Will e Noelle.
—Mas não estamos falando de mim.
—Nem de mim. Falamos do Riley e de que vieste para lhe levar isso porque Will não se atreveu a vir em pessoa.
—Sabe de sobra por que. Noelle e ele preferem atuar com cautela.
—Compreendo-o, mas ao Riley gostaria que viessem a procurá-la, embora diga o contrário. Só tenta chamar a atenção —comentou—. De fato, surpreende-me que Will te tenha enviado a ti e não tenha vindo a salvar a sua filha de meu terrível influencia.
— me diga uma coisa, Annie... Quanto tempo faz que não vê seu irmão?
Annie se endireitou no assento.
— Isso importa?
antes de que Logan pudesse responder, apareceu alguém que não esperava. Seu pai, Hugo Drake.
—Maisy me há dito que estava aqui e vim a vê-lo com meus próprios olhos —disse o homem—. Suponho que no inferno devem estar construindo muitos iglus, porque disse que não voltaria para o Turnabout até que o inferno se congelasse.
Logan olhou a seu pai, um homem ao que tinha odiado durante tanto tempo que não recordava haver sentido nada distinto por ele. Seguia sendo tão alto e forte como sempre, embora seu cabelo tinha adquirido a cor das cãs e seus olhos já não brilhavam do mesmo modo. Quanto ao resto, seguia com o costume de levar um puro no bolso da camisa.
Annie se levantou então e deixou uns quantos bilhetes sobre a mesa, para pagar a comida.
—Vai? —perguntou Logan, sem fazer caso ao Hugo.
— Sim, vou a casa e logo irei à loja.
Logan se levantou da cadeira, tomou os bilhetes e os devolveu. Depois, apressou-se a pagar de seu próprio bolso e a deixar uma generosa gorjeta para evitar que Annie tivesse ocasião de protestar.
—me deixe que te eu convide —disse—. Te verei mais tarde na loja.
Annie partiu e Logan se perguntou o que teria pensado ao ver o Hugo Drake. Entretanto, não soube por que lhe importava o que pudesse pensar a respeito.
Aquele homem tinha convertido a vida de sua esposa em um inferno; até o ponto de que tinha decidido suicidarse com uma overdose de pastilhas antes que seguir casada com ele.
Logan odiava ser filho do Hugo. Supunha que nos vinte anos transcorridos desde sua marcha teriam trocado muitas coisas no Turnabout, mas nada que pudesse trocar o passado.
Estava no Turnabout por uma razão concreta: porque seu chefe, o responsável pelo Hollins—Winword, o tinha ordenado. E essa razão não incluía a obrigação de comportar-se como o filho pródigo com o Hugo Drake, o culpado da morte de sua mãe.
ANNIE se sentiu surpreendida, aliviada e um pouco decepcionada quando chegou à loja e viu que Logan não estava ali. Mas não quis pensar nisso; sabia que se encontrava na ilha com o único propósito de obter que sua sobrinha voltasse com seus pais e que não permaneceria muito tempo.
Riley, em troca, estava sentada em cima do mostrador, junto à caixa registradora, mascando chiclete e observando suas botas enquanto movia os pés.
— veio algum cliente?
-Não.
—chamou alguém?
—Tampouco.
—Viu a algum gorila vestido com um tutu rosa?
Riley levantou o olhar e sorriu.
-Sim.
Annie devolveu o sorriso a sua sobrinha e decidiu que aquela era uma boa ocasião para tirar o tema de sua fuga.
—Riley...
—Não quero falar disso —a interrompeu—. Não penso voltar.
—Olhe, não quis te pressionar com esse assunto; mas talvez se desse uma oportunidade ao Bend-lemaier...
—Uma oportunidade? Como você a deu? Ouvi como dizia a esse velho que nem sequer terminou seus estudos ali.
— chama-se Logan, não é velho, e eu agüentei três anos no Bendlernaier antes de partir. Mas não se trata de mim, mas sim de ti.
Riley negou com a cabeça, saltou do mostrador e se dirigiu a uma das prateleiras. Uma vez ali, tomou um dos objetos em venda e o olhou com curiosidade.
—Como é que não te casaste, tia Annie?
—Não o tenho feito porque ninguém me pediu isso.
—É que crie que terá que esperar a que lhe peçam isso? Minha mãe o pediu a meu pai, por exemplo.
Annie não sabia, mas não lhe surpreendeu absolutamente. Noelle sempre tinha sido uma mulher independente que não esperava a que outros tomassem decisões por ela.
—Não, claro que não acredito que terei que esperar. Mas em qualquer caso, não conheci à pessoa apropriada.
—Tem noivo ou amante?
-Não. E você?
—Tampouco. Mas de todas formas, meus pais não deixariam que saísse com ninguém. Temem que me deite com alguém e fique grávida como uma garota de meu instituto... Que estúpida. É que não tinha ouvido falar da pílula nem de outros métodos anticoncepcionais? — perguntou-se em voz alta—. Mas voltando para ti, tenho a impressão de que gosta ao Logan.
—Esta conversação começa a me incomodar. Logan não está interessado em mim, e por outra parte, não vai se ficar na ilha.
—Mas não deixou que te olhar durante a comida...
Annie pensou que não a olhava porque se sentisse atraído por ela, mas sim porque estava surpreso e se perguntava o que tinha passado com a adolescente atrevida, independente e original que tinha conhecido. —Riley... — Foram noivos?
— Não, não l ou fomos. É amigo de seu pai, Riley. Riley não fez nenhum comentário a respeito. limitou-se a inflar uma pompa com o chiclete e a arrebentá-la no interior da boca.
— O que te parece se falar com seu pai e intento convencê-lo para que não enviem ao Bendlemaier? — continuou Annie —. Voltaria então para casa? Tenha em conta que estamos em metade do curso acadêmico e está perdendo muitas classes. —Bom, posso ir a classe aqui. —Isso não é o que...
—Acredito que esta tarde passamos por diante de um instituto, verdade?
—Sim, mas é para os meninos que vivem na ilha.. —Vá, já vejo que você também quer te liberar de mim.
Annie suspirou, desesperada-se.
—Riley, ninguém quer livrar-se de ti, mas seu sítio está com seus pais. Seja qual seja o problema, seguro que se pode encontrar alguma solução.
— Meu pai diz que não falaste com os avós há mais de dez anos.
Annie pensou que Will e Noelle falavam muito.
—É verdade, mas seus pais não se parecem nada ao George e Luzia. Por fortuna para ti, devo acrescentar.
—Pode ser. Mas se encontrar soluções é tão fácil como diz, por que não solucionaste seu problema com eles?
— Riley....
— Não importa. Se quiser que me parta, irei. Riley saiu da loja e sua tia a seguiu. Tinha começado a chover e o ar se carregou. —Eu não hei dito que queira que te parta.
— Pensei que eu te importava... mas está visto que não importo a ninguém.
Riley fez gesto de afastar-se, mas Annie a agarrou pelos ombros e a deteve.
—Importa a todos, Riley. Seus pais estavam muito preocupados quando falei com eles.
— OH, sim... Por isso vieram à ilha —disse com ironia.
Annie pensou que tinha acertado com ela. Embora se tivesse escapado de casa, no fundo esperava que seus pais fossem procurar a.
—Assustaste-lhes, Riley, porque acreditaram suas ameaças. Mas não te equivoque a respeito: estão desejando que volte com eles, que retorne a seu lar.
Riley moveu a cabeça em gesto negativo. A chuva tinha escurecido seu cabelo loiro, que agora tinha pego à cara. Parecia incrivelmente jovem e vulnerável.
— por que? De todas formas, nunca estão ali. passam-se a vida trabalhando.
A sobrinha do Annie se afastou então.
— Aonde vai?
Riley seguiu andando e nem sequer se voltou.
—Não irá longe, tranqüila. Além disso, Diego não sairia com o transbordador com um tempo como este.
— De onde saíste? —perguntou sobressaltada, para ouvir a profunda voz do Logan.
Logan sorriu.
—Detive-me um momento no escritório do xerife para saudar o Sam e lhes vi pela janela.
—Talvez deveria ir procurar a...
—Talvez. Busca um guarda-chuva e volta logo. Sam me há dito que o tempo vai piorar. Annie duvidou.
— Venha, não se preocupe. vá procurar a e eu fecharei a loja.
Vinte minutos mais tarde, quando Annie entrou em sua casa, estava chovendo muito. Ainda não tinha encontrado a sua sobrinha, mas se sentiu enormemente aliviada para ouvir que alguém estava na ducha.
Esgotada, apoiou-se na parede para tentar tranqüilizar-se. Estava tremendo e não só porque se empapou, mas sim porque o passado parecia persegui-la.
Permaneceu ali uns segundos e depois se dirigiu à cozinha, onde ainda estava quando Riley apareceu. Então, tendeu-lhe uma taça com um líquido fumegante.
—O que é? Espero que não seja um desses repugnantes chás de camomila que te prepara.
—É chocolate quente.
Riley não o duvidou. aproximou-se e tomou a taça.
—Está muito bom...
—Não deveria te surpreender.
—Tenha em conta que o chocolate que prepara minha mãe é asqueroso. Chocolate sem cafeína, sem graxa, sem cacau, sem nada.
Annie elevou a taça que se preparou e sorriu. Noelle estava obcecada com sua figura e alguma vez, estando de visita em sua casa, Will se tinha queixado amargamente da dieta que mantinham.
—Pois quando era pequeno, a seu pai adorava. Era muito guloso.
— Sim, minha mãe sempre diz que me pareço com ele. De fato, diz-o todo o tempo.
—Will é uma grande pessoa. te parecer com ele não é mau.
—por que não tiveste filhos? —perguntou a adolescente, de sopetón.
Annie tomou um pouco mais de chocolate e acendeu a luz da cozinha. Começava a obscurecer.
— Há gente que não nasceu para ser pai.
Mas por fortuna para a espécie, Will e Noelle não pertencem a meu grupo.
Riley se tomou o comentário do Annie como uma referência às dificuldades que davam os filhos e partiu sem terminar o chocolate. Uns segundos depois, ouviu que entrava em sua habitação dando uma portada.
Annie se amaldiçoou por ter metido a pata e decidiu sair ao pequeno mole. O mar, cinza escuro , resultava ameaçador; além disso, o céu estava completamente coberto e a temperatura tinha baixado vários graus da manhã.
Quis sentar-se em uma das tumbonas, mas estava molhada e antes teve que limpá-la com um pano. Já se tinha acomodado quando, de repente, apareceu Logan.
—Talvez deveria ir dentro. Faz frio —disse.
—Então, o que faz dando voltas pelos arredores de minha casa?
Logan caminhou para ela, com o cabelo revolto pelo vento. Entre sua escura juba se viam algumas cãs, e uma vez mais se fixou no moreno de sua pele.
— Não sente curiosidade, Annie?
— Curiosidade? por que? Pela fuga de minha sobrinha? Suspeito que há algo mais que sua negativa a estudar no Bendlemaier. Noelle me disse que é uma garota muito difícil.
— Só sente curiosidade pelo Riley? —perguntou, aproximando-se um pouco mais.
Nesse momento, uma rajada de vento arrastou um papel pela próxima praia. Aquele detalhe bastou para que Annie fora mais consciente que nunca da solidão em que vivia. De fato, os vizinhos mais próximos se encontravam a dois quilômetros da casa.
—Não, mas é a única concessão à curiosidade que posso me permitir —respondeu.
—Parece que a Annie que conheci se converteu em uma mulher excessivamente cautelosa.
—Essa Annie já não existe —declarou em voz apenas audível—. Aprendeu certas lições e o fez da pior maneira possível.
— Que lições?
Nesse preciso instante, um som incrivelmente estridente e alto rompeu a tranqüilidade da ilha. Annie se teve que tampar os ouvidos com as mãos.
— Que diabos é isso? —gritou, para que Logan pudesse entendê-la.
Logan a agarrou por um braço e a levou a interior da casa a toda pressa.
—É a sereia de emergência. Uma velha sereia da segunda guerra mundial. vá procurar ao Riley.
Annie levava cinco anos no Turnabout e nem sequer sabia que a localidade tivesse uma sereia para emergências. Mas aquele não era o momento mais apropriado para pensar nessas coisas, de modo que entrou correndo na habitação de convidados e chamou a sua sobrinha.
Por desgraça, o dormitório estava vazio.
Capítulo 4
O coração do Annie se deteve. Riley não estava na habitação. Desesperada-se, olhou debaixo da cama, embora sabia que quão único cabia em tão pouco espaço eram as caixas onde guardava as fotografias. Também comprovou o armário, mas dentro só havia um montão de roupa que raramente ficava. -Riley?
aproximou-se da janela do dormitório para ver se a via no exterior do edifício, mas justo então o ramo de uma árvore próxima golpeou no cristal e se assustou. além de chover, levantou-se muito vento.
—te afaste da janela.
Logan a agarrou pela cintura para impedir que perdesse o equilíbrio com o susto, mas ela se apartou E seguiu chamando a sua sobrinha. A sereia de emergência não tinha deixado de soar e o céu se obscureceu tanto que parecia de noite.
_No está na casa —disse, presa do pânico—.
Tenho que encontrá-la...
—Mas se nem sequer está meio-fio. Deixa-o, irei eu —disse com voz firme—. E fica em casa. Não pode estar muito longe.
Logan acabava de sair do dormitório quando Annie se dirigiu a sua habitação, ficou umas sapatilhas de esporte e o seguiu.
É obvio, ficou empapada em questão de segundos. Além disso, entre o som do vento e o da sereia era virtualmente impossível que Riley ouvisse seus gritos.
Como Logan tinha tomado o caminho da parte dianteira da casa, ela decidiu ir procurar pela zona da praia. Mas não encontrou a sua sobrinha, embora procurou por toda parte.
-Riley!
Ao cabo de um momento, decidiu retornar à casa. Estava tão molhada como se se cansado ao mar, e as sapatilhas lhe tinham cheio de areia. Recuperou o fôlego, dirigiu-se ao salão e olhou à rua.
Logan estava ali, frente à casa, sozinho.
A mulher voltou a sair e disse:
—Não estava na praia, embora duvide que se partiu por ali.
—Disse-te que ficasse na casa...
—Sei, mas temos que encontrá-la.
—Não se preocupe, encontrarei-a.
Nesse momento se ouviu um forte trovão e Logan amaldiçoou e a separou da palmeira sob a que se protegeram. Uns segundos mais tarde, um raio caiu sobre ela e começou a arder.
Assombrada, Annie se levou uma mão à boca. Em outras circunstâncias se teria ficado geada, incapaz de reagir, mas sua sobrinha tinha desaparecido e não podia deixar-se levar.
—Não pode ter ido à cidade, porque demoraria muito. Se for preparada, terá procurado algum lugar onde proteger-se da chuva —disse ele. Annie se estremeceu e assentiu. —Irei contigo.
Logan a olhou com cara de poucos amigos, mas permitiu que o acompanhasse e se dirigiram para a estrada principal. Ela se sentia muito agradecida por contar com sua ajuda; aquela situação a transbordava.
Seguiram caminhando vários minutos, que ao Annie lhe fizeram horas, sob uma chuva tão intensa que parecia cair de todas partes. O céu estava completamente coberto e a escuridão era quase absoluta, embora ainda faltavam várias horas para que se fizesse de noite. —Maldita seja...
Logan amaldiçoou porque tinham estado a ponto de meter-se em uma espécie de corrente. Annie ficou assombrada; o caminho que tinham tomado devia ser um velho leito de um arroio, mas nunca se deu conta porque jamais tinha chovido daquele modo.
Quando tentou apartar-se, tropeçou com ele e esteve a ponto de cair. —OH, sinto muito... Logan nem sequer a olhou. limitou-se a dizer:
-Ali--.
Estava apontando para uma velha choça que, segundo Sara, tinham levantado as pessoas que construíram a casa onde vivia.
—Fique aqui. vou jogar uma olhada dentro.
Annie obedeceu. Sempre tinha estado acostumada a valer-se por si mesmo, mas essa vez decidiu não pôr nenhum reparo.
Logan começou a cruzar a corrente; a água lhe chegava até os joelhos e avançava lentamente, sem deter-se em nenhum momento. Pouco depois, o vendaval arrancou parte do telhado da choça, que foi parar a escassos metros do homem. Mas nem mesmo assim se deteve.
Quando por fim chegou à edificação, entrou. Apenas um minuto depois, voltou a sair com o Riley em braços e cruzou de novo a corrente.
—Está bem, não se preocupe —disse—. Venha, voltemos para a casa...
Retornaram tão depressa como puderam. O tempo estava piorando por momentos, como se a ilha estivesse sofrendo um furacão.
Assim que entraram, Logan deixou a adolescente e Annie a abraçou com força.
—Menos mal que não te aconteceu nada...
—Este sítio não é seguro. Deveríamos ir A...
Logan não terminou a frase. O vento abriu a porta da casa e Annie se aproximou de fechá-la. Jogou um velho fecho de ferro que nunca tinha utilizado até então e que parecia muito resistente; mas mesmo assim, a madeira não deixou de ranger e de golpear contra o marco violentamente.
Logan empurrou o sofá do salão e o pôs contra a porta. Depois, disse:
— Assim nos asseguraremos de que não se volta a abrir. A última vez que ouvi a sereia da ilha, eu tinha dez anos. Foi algo terrível. A gente se refugiou no porão do instituto.
Um trovão fez tremer toda a casa. Por fortuna, o caminho que se converteu em corrente se encontrava a certa distância, mas sabia que teriam que cruzá-lo se queriam ir à cidade.
— Mas não poderemos chegar ao instituto...
— Então, vamos ao quarto de banho.
Annie notou que sua sobrinha estava tremendo e lhe pôs uma toalha sobre os ombros assim que entraram no serviço.
—lhes coloque na banheira —ordenou Logan.
As duas mulheres se meteram dentro. Logan quis acender a luz, mas se tinha talhado.
—Tem velas, ou uma lanterna?
Annie começou a esfregar o corpo do Riley. Ainda estava tremendo, mas felizmente se encontrava sã e salva.
— Há uma lanterna na cozinha, em alguma parte —respondeu Annie—. É possível que esteja na gaveta de abaixo, junto ao forno. E se não recordar mau, há umas quantas velas na cômoda de meu dormitório.
—Está bem.
Logan partiu e Annie abraçou a sua sobrinha. Em outro momento lhe haveria dito umas quantas palavras sobre a ocorrência de partir com semelhante clima, mas não era o momento adequado.
—Não nos passará nada, descuida —disse, tentando tranqüilizá-la.
— supunha-se que esta ilha é paradisíaca... Annie nunca o tinha exposto daquele modo. Quando decidiu ficar a viver ali não estava procurando um paraíso, a não ser unicamente um lugar tranqüilo e pacífico.
— Está bem? Tem-te feito mal?
Riley negou com a cabeça.
—Graças a Deus...
Logan retornou em seguida. Deu ao Annie a lanterna e disse ao Riley que pusesse as velas na encimera da banheira. Também tinha recolhido um garrafão cheia de água que Annie tinha deixado sobre a mesa da cozinha porque o frigorífico estava cheio. Deixou-a no chão e voltou a partir.
—ficará conosco, verdade? —perguntou Riley, assustada.
— É obvio que sim —respondeu Annie, fechando os olhos—. Logan não nos deixará.
Não demoraram muito em averiguar por que se partiu outra vez. Quando apareceu, levava uma manta, vários jerséis e o colchão da habitação de convidados.
Annie não sabia o que a surpreendia mais, se o fato de que tivesse rebuscado em suas gavetas para encontrar os jerséis ou a habilidade para introduzir o colchão em um quarto de banho particularmente pequeno.
Logan lhe pediu que se apartasse e um segundo depois, para assombro da mulher, introduziu-se na banheira com elas, colocou o colchão a modo de parapeito e não contente com isso se tirou a camisa, totalmente empapada, e a atirou ao chão.
— Isto começa a ser te desassossegue —sussurrou Riley, acurrucada em uma posição impossível para lhes fazer sitio—. Se começarem a lhes tirar a roupa, vou .daqui.
—Riley, Logan está tão empapado como você.
Riley grunhiu, mas não disse nada mais.
Então, Logan agarrou um extremo da manta e começou a esfregar ao Annie tal e como ela o tinha feito antes com sua sobrinha.
—Não, espera... Você também deve estar gelado.
Logan não disse nada, mas Riley não pôde resistir à curiosidade:
— por que trouxeste meu colchão?
—Para nos cobrir com ele se for necessário.
— Brinca? —perguntou a jovem, alarmada—. Annie, é que a casa vai sair voando ou algo assim? Estamos no Turnabout, não em uma ilha do Caribe...
Annie abraçou ao Riley, que tremia quase tanto como ela, e Logan o fez com o Annie.
Durante uns segundos, sentiu-se imensamente aliviada. Seu antigo amor tinha conseguido encontrar a sua sobrinha e todos estavam, ao menos momentaneamente, a salvo.
Parecia que o céu ia se derrubar sobre eles. A porta se ficou aberta e Annie olhava para o corredor e contemplava os brilhos dos raios enquanto continha a respiração.
—Acende a lanterna, por favor —rogou Riley—. Está muito escuro...
Annie a acendeu e fez um esforço por manter a calma. Ela mesma estava ao bordo de um ataque de nervos, mas não se podia permitir semelhante luxo. Tentou concentrar-se no mais próximo, na sólida e tranqüilizadora presença do Logan e na vulnerável e tremente Riley, que se apertava contra ela procurando calor.
A fim de contas, não era a primeira vez que se enfrentava a uma grande tormenta. Aquela era a pior, de um ponto de vista climatológico, que tinha sofrido; mas as emocionais eram muito mais problemáticas e entretanto, as tinha arrumado para sobreviver a elas.
Mais ou menos.
Voltou a olhar ao Logan e súbitamente foi consciente do íntimo daquela situação. Apesar de que a manta e sua roupa estavam molhadas, podia sentir o duro, largo e perfeito peito do homem contra as costas. Um peito merecedor de situações bastante mais cálidas.
Nesse preciso instante, os trovões e os raios cessaram. Foi como se o mundo se deteve, como se o céu também estivesse contendo a respiração.
Logan lhe acariciou uma bochecha e Annie se estremeceu. Um simples contato tinha bastado para que compreendesse que o calor que sentia junto a ele não se devia à tranqüilidade que lhe proporcionava em semelhantes circunstâncias, a não ser a um pouco mais profundo.
Suspirou, sem poder evitá-lo, e ele passou um dedo por seu queixo e acariciou levemente o bordo de sua boca.
Impossíveis lembranças de suas carícias e de seu corpo alagaram a mente do Annie. Impossíveis, porque Logan a tinha rechaçado anos atrás. Impossíveis, porque as únicas relações sexuais que tinha mantido com ele eram sonhos de sua imaginação, desejos.
—Estamos no olho da tormenta —anunciou ele com solenidade.
Logan apartou a mão da cara do Annie e lhe aconteceu a manta por cima dos ombros. Ela se estremeceu uma vez mais ao sentir sua respiração, ou talvez foi pelo tremendo raio que iluminou todo o lugar.
Riley soltou uma espécie de grunhido, que em realidade era uma risada histérica, e a casa começou a tremer e a ranger como se estivesse a ponto de arrebentar.
Logan amaldiçoou em voz alta, pediu-lhes que se acurrucaran na banheira e situou o colchão por cima de suas cabeças.
OH, Meu deus... Annie ficou olhando o que ficava de sua casa, atônita.
Tinham permanecido na banheira, protegidos sob o colchão, durante um período indeterminável que lhe tinha feito interminável. Mas nesse momento, enquanto contemplava o enorme buraco do teto pelo que entrava a luz do sol, deu-se conta de que em realidade não tinha passado tanto tempo.
Logan não apartou o colchão até que esteve seguro de que a tormenta se afastou. E quando o fez, puderam ver os restos do telhado que tinham cansado sobre ele.
O céu começava a limpar-se e já só caía uma fina chuva.
—Menos mal que trouxe o colchão —disse Riley—. Se não o tivesse feito, os restos teriam cansado sobre nós e nos teriam matado.
— É incrível. Não sabia que Turnabout sofresse furacões...
— Pois já sabe.
Logan tomou um dos jerséis para ficar o ao Annie, como se ela não fora capaz de fazê-lo por si mesmo. Mas Annie pensou que estava no certo: naquele momento não se sentia capaz de fazer nada.
Apesar disso, saiu da banheira, dirigiu-se a sua habitação e se trocou de roupa. Entretanto, não podia fazer grande coisa em relação à roupa molhada do Logan. Não tinha nada que coubesse a um homem de costas tão largas, e muito menos uma calça de sua talha.
Logan ficou sua jaqueta de couro e Annie não pôde evitar contemplar seu peito nu, visível sob a cremalheira ao meio subir.
—Teremos que reparar esse coberto antes de que a chuva piore o estado de sua casa —comentou ele.
— E como o arrumamos? A única madeira que tenho são as lascas que guardo para utilizar no andaime —comentou, enquanto recolhia restos no corredor.
Annie pensou nos estragos que a tormenta teria causado nos campos da zona. Era um grande problema, porque se tinha quebrado as colheitas, teria ficado sem os produtos que necessitava para sua loja.
Mas decidiu concentrar-se no mais imediato. A porta de cristal do salão tinha sobrevivido; em troca, a janela da cozinha estava destroçada, o pomar tinha sofrida imperfeições e um dos armários havia se medeio solto da parede e ameaçava caindo.
—Bom, tenta arrumar o que puder. Eu vou à cidade a ver se posso encontrar os materiais necessários para tampar os buracos do teto —informou Logan.
Annie assentiu e olhou para o exterior da casa. Não tinha chorado em muitos anos e não tinha intenção de fazê-lo então, mas gostava de muito.
— Quer vir comigo?
voltou-se para o Logan, pensando que falava com ela. Mas se referia ao Riley.
— Para que? Para que possa me tirar da ilha?
Logan olhou com ironia a adolescente e Riley se encolheu de ombros.
—Está bem... vou contigo.
antes de partir, ele acrescentou:
—Voltaremos em seguida, mas não tente arrumar nada que pareça instável.
Justo nesse instante, como se suas palavras tivessem sido proféticas, o armário da cozinha se soltou de tudo e caiu ao chão aparatosamente. Pelo som de cristais e de porcelana, resultou evidente que seu conteúdo se quebrado.
—Vá, espero que não guardasse dentro a baixela da família ou algo assim —disse Riley.
Annie negou com a cabeça.
—Acredito que lhes acompanharei. Certamente haverá casas que tenham ficado em pior estado que a minha e gente que necessitará ajuda.
antes de sair, Annie recolheu um guarda-chuva e o deu ao Logan para que o abrisse. Ainda estava chovendo, embora levemente, e a visão da palmeira queimada pelo raio bastou para que recordasse o perto que tinham estado de morrer.
O céu, entretanto, estava precioso. A chuva e o sol que se filtrava por entre as nuvens cada vez menos densas tinham provocado um enorme arco íris que lhes chamou a atenção.
—Os céus do Turnabout sempre foram tão belos como suas postas de sol —comentou Logan —. O melhor sítio para desfrutar delas está no extremo da ilha, em Castelo, embora suponha que já teriam derrubado a velha mansão...
— Segue ali —lhe informou Annie.
Annie estava particularmente interessada na antiga Missão espanhola, mas nesse momento lhe preocupava mais sua sobrinha, que caminhava a certa distância deles.
—Faz-o porque caminhar sob o guarda-chuva lhe parece pouco elegante —disse ele, adivinhando seus pensamentos.
—Devi levá-la com seus pais o dia que se apresentou. Em lugar de falar por telefone com meu irmão, me devi levar isso
—Está bem, Annie, não se preocupe. Seguro que se sente muito culpado por ter saído da casa com semelhante clima.
—Mas não teria tido tanta sorte se você não tivesse estado aqui. Encontrou-a e a trouxe de volta, sã e salva. Além disso, a mim não me teria ocorrido utilizar o colchão para nos cobrir.
—Se não a tivesse encontrado eu, teria-o feito você. E quanto ao segundo, seguro que teria pensado em algo.
—Riley não deveria estar em perigo. Só é uma adolescente, uma menina. É completamente inocente e não merece...
—Né, não siga. Nenhuma pessoa merece estar em perigo, mas isso era um maldito furacão. Quanto a ti, trocaste muito se agora te dedicar a tentar proteger a sua sobrinha de... a vida.
Annie quis dizer algo a respeito, mas nesse instante ouviram o inconfundível som de um veículo que acabava de deter-se frente à casa.
Era Sam, o xerife. apareceu pela destroçada janela da cozinha e perguntou:
— Estão todos bem?
— Sim —respondeu Annie—. O que passou na cidade?
—Há meia dúzia de feridos entre os que se encontra Janie. Ao parecer, estava tentando salvar sua baixela e se rompeu uma boneca. percorri a ilha várias vezes, mas à margem de uns quantos imperfeições e de um montão de cristais quebrados, a maioria das estruturas dos edifícios estão bem —explicou o xerife—. Terá que fazer uns quantos acertos em sua loja e por outra parte, desapareceu o mole onde atracava Diego. Quanto às plantações, ainda não tive tempo de ir.
— O mole? desapareceu o mole? E o que passa com as embarcações do Diego?
—Passará certo tempo antes de que se possam utilizar. Se alguém quer abandonar a ilha, terá que pedir-lhe ao guarda costeiro.
— E não poderíamos sair por avião? Lembrança que o ano passado, quando Trahern e sua esposa tiveram que levar ao April Fielding ao hospital para que a operassem de urgência, um avião aterrissou na estrada principal...
Annie pensou que seria a solução perfeita. Ao fim e ao cabo seu irmão tinha dinheiro e muitos contatos e poderia enviar um avião ou um helicóptero. Já tinha comprovado que não funcionavam os telefones fixos nem os móveis, mas supôs que Sam podia chamar o guarda costeiro e conseguir que ficassem em contato com o Will.
— Sim, claro, e o avião destroçou meia estrada —-recordou-lhe Sam—. Teria que ser um helicóptero, mas só o enviariam para um caso de urgência. Tenha em conta que meia Califórnia está em alerta vermelha. Se aqui tivermos mau tempo, no continente é pior. Conforme me hão dito, San Diego sofre nestes momentos um verdadeiro vendaval.
Annie se levou uma mão à boca, assustada. Sara estava em San Diego.
—É que quer levar ao Riley a casa de seus pais —disse Logan.
—Pois não poderá são Riley está em perfeito estado, conforme vejo, e naturalmente temos que concentrar nossos recursos nos feridos. Hugo faz tudo o que pode, é obvio, mas sua clínica é muito pequena e terá que levar às pessoas ao continente. E sim que te sugiro que te concentre na reparação da loja...
—E no telhado de sua casa —o interrompeu Logan.
—Bom, sim, em tudo o que necessite reparações. No melhor dos casos, teremos uns dias de bom tempo. No pior... Mas deixemos isso agora. Tenho que partir, mas voltarei quando puder para retirar essa palmeira queda que curta a estrada. O que passou? Partiu-a um raio?
—Exatamente —respondeu Annie.
Sam partiu em seguida. Annie se tornou para trás o cabelo e disse:
—Tenho que ir ver como estão as plantações.
Não espero a que Logan a seguisse, embora o fez, ao igual a Riley. Os campos estavam em direção contrária à cidade e já se feito de noite quando chegaram, assim não puderam comprovar os danos.
—Voltaremos quando amanhecer —disse Logan.
— Sim, será melhor.
dirigiram-se então à cidade. As ruas estavam cheias de gente que caminhava com lanternas para poder iluminar-se. Annie desejou ter levado a sua, mas a tinha deixado na banheira.
— O que estão fazendo ali? —perguntou Riley.
A jovem se referia ao centro social da localidade. No exterior tinham aceso uma fogueira e havia pessoas que entravam e saíam com caixas de todos os tamanhos.
—Levam fornecimentos —explicou Logan —. Devem ter convertido o centro social em um ponto para organizar a distribuição de materiais.
Riley duvidou, mas pouco depois viu vários adolescentes junto ao fogo e se foi com eles.
Annie a observou e se tranqüilizou bastante ao comprovar que cercava conversação rapidamente.
—Ao menos não é tímida —disse ao Logan.
— Nisso se parece com tí. Tampouco o foi a sua idade.
—É certo.
—De fato, acredito que nasceu para ser o espírito de todas as festas —brincou.
Annie se cruzou de braços.
—Equivoca-te, era pura fachada. Comportava-me assim porque era mais fácil que mostrar o que verdadeiramente sentia.
—Por isso e para chamar a atenção de seus pais, não o esqueça.
— E você? Como foi você a essa idade?
—Bom, além disso do assunto das árvores do Maisy, acreditava que Sara já te teria informado sobre mim...
—Não cria. Em geral temos coisas mais interessantes das que falar.
— Vá, isso doeu.
Logan se levou uma mão ao peito e pôs cara de sentir-se realmente ferido pelo comentário, mas era uma brincadeira.
Ao Annie adorou seu senso de humor. Entretanto, não queria deixar se adorar por um homem que pensava partir assim que pudesse.
— Não faz falta que venha comigo à loja. Sou capaz de arrumar as imperfeições eu sozinha.
— Ah, sim? E de onde vais tirar os tablones que certamente necessitará?
—Tenho madeira no armazém. E embora não a tivesse, estou segura de que alguém teria. Aqui nos ajudamos uns aos outros quando faz falta.
—Falas como se fosse do Turnabout, mas te recordo que não nasceu aqui. E embora você te considere tão ilhoa como outros, segue sendo uma forasteira.
—É possível, mas sua irmã não é nenhuma forasteira e passa por ser minha sócia. Em conseqüência, tratam-me como se fora daqui.
—Está sonhando se crie que lhe aceitarão alguma vez. A gente deste lugar é muito conservadora e não admite facilmente a forasteiros.
Annie sabia que Logan tinha parte de razão, assim disse:
—Você deve sabê-lo muito bem, porque nasceu na ilha.
—Em realidade, não. Temo-me que sou tão forasteiro como você.
— Como? Mas se seu pai e sua irmã são daqui...
-E o que?
—E nada. Simplesmente supus que você também teria nascido no Turnabout.
—Pois não. Nasci no Oregón.
Ao Annie sentiu saudades muito. Sara nunca lhe tinha comentado nada do Oregón.
—Compreendo. Isso quer dizer que sua família vivia ali antes de que nascesse Sara...
—Quer dizer que meus pais estiveram separados uma boa temporada, embora voltaram a juntar-se quando nasci eu. E agora, dirá-me onde tem guardada essa madeira? Ou terei que procurá-la eu por toda a loja?
Annie decidiu ceder e caminharam para o estabelecimento. Uma vez dentro, dirigiram-se ao armazém; embora estava escuro e não podiam ver muito, alegrou-se ao observar que a maioria das coisas estavam onde as tinha deixado e que não tinham sofrido grandes danos.
Acenderam umas quantas velas e a sala ficou iluminada em seguida.
—Aí tem os tablones. Sara e eu os compramos para fazer várias estanterías, mas não tivemos tempo —disse, enquanto lhe acontecia a caixa de ferramentas.
—Pois nos vão vir muito bem.
Annie se fixou então nos cristais que enchiam o chão e disse:
—Que desastre. Embora suponha que não deveria me queixar, porque poderia ter sido muito pior.
— Eu não hei dito nada...
—Não, mas pelo tom de sua voz é evidente que me tomaste por uma quejica.
—me acredite, não estou em posição de julgar a ninguém.
Logan ficou mãos à obra e em poucos minutos tinha abafado a janela rota do armazém com vários tablones. Quando terminou, viu que Annie estava tentando varrer os cristais.
—Talvez deveria deixá-lo para amanhã. Agora não há luz suficiente.
—Sou perfeitamente capaz de limpar o chão de minha loja.
_No o duvido. E ao parecer, também é capaz de fabricar estanterías. notei que há dito que Sara e você pensavam as fazer, não que tivessem intenção de encarregar-lhe a um carpinteiro. Surpreende-me.
Annie voltou a cruzar-se de braços e o observou. Logan Drake sempre tinha sido um homem enormemente atrativo; mas nesse momento, com uma jaqueta de couro, o cabelo revolto e as mãos ocupadas com os pregos e o martelo, resultava mais sexy que nunca.
—É um machista.
— Se com isso pretende dizer que acredito que os homens devem proteger às mulheres, sou-o.
— É que crie que as mulheres não são capazes de lhes proteger a vós? —Eu não hei dito isso.
— Ou talvez crie que os homens não devem proteger a outros homens nem as mulheres a outras mulheres? —continuou perguntando-se Annie.
—Não te equivoque, Annie. Não somente não estou dizendo isso mas sim além disso sei muito mais do que crie sobre esse tema. Consta-me que há homens capazes de fazer algo por proteger a outros homens.
Annie se estremeceu. Resultava evidente que a declaração do Logan ocultava algo escuro e secreto.
—Fala por própria experiência?
Pensou que Logan não responderia à pergunta. Mas a olhou com uma intensidade que a encheu de uma estranha tristeza e disse:
—Sim. Falo por experiência.
DISSERAM-ME que havia tornado, Logan. — Me alegro de verte, Logan. — Por fim voltaste para casa, né. Logan? Logan começava a estar farto de ouvir tantas aproximações distintas ao mesmo tema. Uma e outra vez lhe assaltavam com perguntas, e uma e outra vez se via obrigado a negar com a cabeça e a lhes explicar que só estava na ilha de visita.
O centro social esteve cheio de gente até bem entrada a madrugada. Tinham estado fazendo o possível por manter em funcionamento o gerador do local e acumular combustível; sabiam que dependeriam dele durante vários dias. E naquele momento, quando todos se partiram ou estavam dormindo. Logan se deteve e olhou a seu redor. Várias pessoas dormiam em sacos de dormir, embora não se ouviam prantos de meninos e a situação estava controlada. No exterior seguia chovendo ligeiramente, e ao menos tinha conseguido tampar os buracos do telhado do Annie com um plástico que lhe tinha emprestado Leão Vega, o manitas do Maisy.
Enquanto Annie e Riley ficavam na cidade para ajudar a outros, Logan, Leão e várias pessoas mais deram uma volta à ilha e passaram várias horas arrumando imperfeições. Mas apesar de todo o trabalho que tinham feito, ainda ficava muito por fazer.
Pelo visto, Turnabout não tinha trocado nada. Graças a radio mochila se inteirou, sem pretendê-lo, de que lhe Dêem Vega estava outra vez em liberdade condicional; das aventuras pesqueiras do Diego e da estranha curiosidade que demonstrava o último inquilino do Maisy, um indivíduo que tinha chegado uma semana antes, pela gente e pelos sítios da ilha.
É obvio, também falaram de mulheres, do divórcio de Dá-la Towers até os maneiras da própria Annie Hess, que segundo todos, espantava a qualquer homem que cometesse o engano de aproximar-se dela.
Precisamente então, Annie suspirou. Estava sentada a seu lado. Já lhe tinha secado o cabelo e agora brilhava como a lua.
— Encontra-te bem? —perguntou ele, em voz baixa.
— Sim, embora ainda não posso acreditar que o vento estivesse a ponto de derrubar o hotel Seaspray —respondeu com voz suave—. É um milagre que não haja mais feridos. Contaram-me que um homem sofreu um enfarte, mas ao parecer se está recuperando. .. Seu pai esteve trabalhando sem descanso.
—Ah, sim, meu pai. Todo um santo.
Annie o olhou, mas não disse nada. limitou-se a umedecê-los lábios com a língua.
—Por fortuna, Maisy tinha sítio livre e se pôde fazer cargo dos clientes do Seaspray. Alguns se alojam nas habitações e outros nas cabanas.
-—Sim, isso me hão dito. É curioso... Sempre tenho que me recordar que Sara e você são família do Maisy Fielding.
— Só família indireta.
—Pois ela e seu pai se levam muito bem, sabia? Levam juntos uma boa temporada. -Sim, sei.
— E o que te parece? —perguntou, com voz ainda mais doce que antes.
—Que Maisy tem muito mal gosto.
— pode-se saber o que acontece seu pai e você?
Logan não respondeu.
— Não te incomode pela pergunta. A fim de contas, você sabe o que acontece meus pais e eu. Comportei-me mal com eles.
— Deixa-o já, Annie, não siga. Parece que isto de estar sentada no chão do centro social te produz vontades de conversar.
Ela sorriu.
—Que remédio. Todas as mantas e os sacos de dormir estão ocupados, assim teremos que seguir no chão.
—Vi que Riley e outros meninos se encarregaram que cuidar dos meninos...
—Ah, sim, é certo. Perguntou-me se podia ficar aqui para dar uma mão e lhe disse que não havia nenhum inconveniente. Parece verdadeiramente interessada em ajudar, assim suponho que está bem.
Logan franziu o cenho. Annie se comportava como se precisasse dar explicações de todos seus atos.
—É uma boa garota.
— É verdade. E enquanto tenha algo que fazer, certamente não se meterá em mais problemas —comentou ela—. Enfim, vou daqui.
Annie se levantou e Logan a seguiu e a deteve, lhe pondo uma mão em um braço, quando estava a ponto de sair do edifício.
—Necessita algo? —perguntou ela, inquieta.
—Uma cama.
—Bom, todas as camas estão ocupadas, mas talvez...
—Há uma cama livre em sua casa. Se Riley ficar aqui, isso quer dizer que não ocupará sua habitação.
Ela negou com a cabeça.
—Não, isso não é possível. Avaliação muito o que tem feito hoje, mas não é possível absolutamente.
—Olhe, aqui não fica espaço para dormir. E por outra parte, sua casa está em melhor estado que a maioria. É o mínimo que pode fazer depois do que passou, não te parece?
—Dorme em casa da Sara.
— Conforme me hão dito, meu hermanita não dorme em uma cama a não ser em uma rede. E não me pergunte como sabe Leão Vega, que é quem me contou isso... Venha, Annie, vais deixar na estacada a um velho amigo, ao melhor amigo de seu irmão?
Annie retrocedeu um passo.
—Não somos amigos, a não ser somente conhecidos. E se alguém há dito que Sara dorme em uma rede, é um idiota.
Logan esteve a ponto de rir, mas não o fez.
—Vou a sua casa contigo, Annie. Necessito uma cama e você tem uma livre. Além disso, estou farto de ter que falar contigo em voz baixa para não despertar a outros. Parecemos dois meninos conversando pelo baixinho durante um exame de matemática.
Annie saiu então do edifício. Logan, é obvio, acompanhou-a. E ao chegar à rua, ensinou-lhe umas chaves pequenas.
— O que é isso?
—As chaves do carro de golfe de Leão.
— Emprestou-lhe isso, ou as roubaste?
— Importa muito? —perguntou, enquanto subia ao diminuto veículo—. Venha, sobe. Está chovendo e se não for empapar.
— Suponho que esta é outra dessas ocasiões nas que se sente obrigado a proteger às mulheres...
— Em realidade, só tentava ganhar um colchão razoavelmente seco e cômodo para esta noite.
Annie cedeu e subiu ao veículo, que não tinha luzes.
—Está bem, mas conduzirei eu. Viajando às escuras, não sentiria saudades que nos jogasse por um escarpado.
—Ora, duvido que a estrada tenha trocado muito em quinze anos —disse ele.
Annie não fez conta. Separou-o do assento do condutor e ficou ao volante.
—Quando foi a última vez que conduziu? — perguntou Logan.
—te cale —respondeu ela, divertida.
Logan sorriu. Começava a comportar-se como a mulher que tinha conhecido. E embora não disse nada, pensou que conduzia muito bem. Apesar dos buracos e dos obstáculos que encontraram na estrada, chegaram sãs e salvos.
Ela desceu do veículo e entrou na casa silenciosamente, sem dizer nada. Logan quase teria preferido que pegasse uma portada, que fizesse algo que lhe recordasse à velha Annie. Aquela era muito distinta, mais tranqüila, mais calada, e ainda não sabia como tratá-la.
Mas em qualquer caso, seguiu-a ao interior da casa.
Já no salão, Annie acendeu várias velas e perguntou:
— Quanto te paga Will por lhe levar a sua filha? Pague-te o que te pague, dobro o preço se te partir. Eu a levarei a sua casa assim que funcionem os transbordadores.
—Pensava que não queria obrigá-la a voltar contra sua vontade.
—Pensava-o, é certo, mas agora acredito que estará melhor ali.
O entrecerró os olhos.
—Pois já que quer sabê-lo, não cobro nada ao Will. De fato, não vendo meu tempo. E se o fizesse, não lhe poderia permitir isso
Ela grunhiu e ele a tirou da mão. Estava tremendo.
— Tem frio? —perguntou—. É uma lástima que não haja chaminé... —Não tenho frio. —Pois está tremendo. — Então, será que tenho frio —se apressou a corrigir.
Annie se afastou e segundos depois Logan ouviu um golpe e uma maldição. Obviamente tinha tropeçado com algo. Iluminou-a com a lanterna e viu que estava tirando uma manta de uma gaveta.
—Terá que recolher os lençóis você mesmo. Estão no quarto de banho. Mas duvido que esteja muito cômodo na cama de convidados... o colchão ficou bastante prejudicado.
— Descuida, arrumarei-me isso.
Annie partiu à cozinha, mas quando entrou e viu o armário que se cansado ao chão e os pratos quebrados que continha, abraçou-se e ficou olhando-os sob a tênue luz de uma vela.
—Comprei-os quando vivia em mim antigo apartamento, um lugar tão pequeno que não tinha dormitórios nem mais móveis que um sofá cama, um par de cadeiras e uma mesa. Parecerá-te ridículo, mas lhes tinha carinho a esses pratos. E pensar que Riley brincou dizendo que esperava que não fora a baixela da família...
—É evidente que lhe importam bastante mais esses pratos.
—É obvio. Além disso, minha mãe jamais me teria crédulo sua baixela.
—Sua mãe era uma bruxa.
Annie o olhou, plantou-se ante ele com os braços em jarras e disse:
—Se Will não te pagou por dever buscar a sua filha, pode-se saber o que está fazendo? Não me parece que seja da classe de pessoas que devem fabores a ninguém. O que faz aqui, Logan?
— Crie necessário perguntá-lo?
Nem o próprio Logan estava seguro de suas razões. É obvio, Penetrei o tinha pedido; mas poderia haver-se negado perfeitamente. Em realidade, tinha aceito o encargo por curiosidade, ou mas bem porque em todos esses anos não tinha deixado de pensar no Annie.
— Ao parecer, sim —respondeu ela—. É por sua família? Sara está bem, como já sabe, embora te sente falta de. E quanto a seu pai...
—Não estou aqui por eles.
—Então, por que? Para te colocar em outra confusão com os Hess? É possível que estivesse louca por ti faz anos, mas não tenho nenhum desejo de repetir essa experiência.
— Seguro?
Logan quis lhe dizer que naquela época a tinha rechaçado unicamente porque era muito jovem, mas não era o momento mais oportuno. Entretanto, nenhum dos dois teria podido negar que o velho desejo seguia vivo.
—É obvio. Já me humilhou bastante uma vez.
— te humilhar? A ti? — Perguntou, entre risadas—. Vamos, Annie. Sou eu quem não pôde...
— Já basta! —gritou—. Olhe, será melhor que nos esqueçamos disso. passou muito tempo e já está esquecido.
—me acredite: eu não tenho tal capacidade de esquecimento. tentei apagar o de minha memória, mas não pude —comentou com sinceridade.
—Por Deus, Logan, passou uma eternidade... Então eu tinha dezessete anos e me joguei em seus braços, mas me rechaçou —lhe recordou—. Se tivesse atuado de outro modo, teríamos sido amantes.
Ela se jogou o cabelo para trás, tomou uma vela e se dirigiu para o corredor.
Logan ficou na cozinha, ouvindo os sons que fazia Annie ao mover-se em seu dormitório e o rumor do mar.
Havia dito que o tinha esquecido, e embora não queria admiti-lo, aquele comentário lhe tinha ferido. Não em vão, a noite que o tinha açoitado durante toda sua vida não parecia significar nada para ela.
SEU coração pulsava mais depressa do normal e sentia que sua pele estava extrañamente tensa. Levava dias esperando aquele beijo, esperando sentir seu corpo, tocá-lo. Era distinto a todos os homens que tinha conhecido, incluído Drago, e nesse momento estava a seu alcance.
incorporou-se um pouco, apoiando-se sobre um braço, e lhe acariciou o cabelo.
—me beije —sussurrou.
Ele não disse nada.
Então, inclinou-se sobre ele e esperou um momento enquanto desfrutava de do contato de seus seios contra o peito do homem. Depois, beijou-o. Seus lábios eram doces, peritos, e enquanto se apertava contra ele pensou que nunca se havia sentido tão excitada nem tão segura como entre aqueles braços.
Desejava que ele falasse, que lhe dissesse que sentia o mesmo por ela, mas permanecia em silêncio.
Passou uma perna por cima de seu corpo e começou a acariciá-lo. Ele gemeu e a atraiu para si. A prova de que também estava excitado a animou a seguir tocando-o, a baixar uma mão para seu entrepierna, sentindo as texturas de sua pele.
Quando chegou a seu duro sexo, conteve a respiração e disse:
—Agora, Logan. Agora, por favor...
Logan a empurrou brandamente e se situou sobre ela, sem deixar de beijá-la, sem deixar de acariciá-la.
Infelizmente, tudo tinha sido um sonho.
Annie abriu os olhos, sobressaltada, e se sentou na cama. Demorou uns segundos em cair na conta de que estava no Turnabout, dormindo em sua própria habitação.
E sobre tudo, sozinha.
Suspirou, cansada, e notou que um ligeiro feixe de luz entrava pela janela. Quis acender a lamparita da mesinha de noite, mas não funcionava; pelo visto, a eletricidade seguia atalho.
tombou-se de novo e se tampou os olhos com um braço. Cheirava a café, e era um aroma tão maravilhoso que só podia significar duas coisas: que Logan seguia na casa e que o preparava melhor que ela.
Normalmente, teria preferido tomar um chá. Mas aquela manhã se encontrava tão esgotada, depois de uma larga noite de sonhos tão inquietantes como reais, que necessitava uma boa dose de cafeína para despertar.
Duvidou entre ficar ali, na cama, encerrada em se mesma como uma ostra, ou em afastar-se dos lençóis e com isso, também, dos sonhos eróticos e do próprio Logan. Mas sabia por experiência que a estratégia da ostra não servia de nada, de modo que se levantou.
Fazia frio. tirou-se o pijama e ficou uma sudadera e umas calças largas de esporte. Depois, dirigiu-se ao quarto de banho, olhou-se no espelho, arrumou-se um pouco o cabelo e se lavou um pouco; como não havia eletricidade, a água estava fria. Pouco depois, entrou na cozinha pensando que em realidade não lhe importava que Logan a visse sem arrumar; mas trocou de opinião quando ele a olhou e sorriu.
—bom dia, beleza.
— bom dia.
Annie se fixou no pequeno fogão elétrico no que Logan tinha preparado o café. Não era dele, o que significava que tinha ido comprá-lo. Além disso, tinha limpo totalmente a cozinha.
— estiveste na cidade?
— Sim, e também joguei uma olhada às plantações. Não sou agricultor, mas tenho a impressão de que não sofreram nenhum dano que uns quantos dias de sol não possam arrumar. Em troca, a cidade é um desastre. À luz do dia tem pior aspecto.
— Viu ao Riley?
— Sim. Maisy a pôs a ela, ao April e a outros meninos a trabalhar. Se tiverem coisas que fazer, não lhes ocorrerá fazer nenhum vandalismo.
April era a neta do Maisy. Tinha estado doente durante quase toda sua infância, mas o ano passado, depois de uma operação, recuperou-se por completo.
— E o que há do transbordador?
— Duas das embarcações do Diego se afundaram e a terceira precisa entrar em dique seco. O guarda costeiro esteve faz um par de horas e se levou a homem que tinha sofrido o enfarte e a um par de feridos mais.
—Então, talvez poderíamos alugar um helicóptero.
—Não. Faz muita névoa e além todos os aparelhos estão ocupados. Quanto ao guarda costeiro, já sabe que têm muito trabalho. por que tem tanta pressa em te liberar de sua sobrinha?
—Porque vieste para lhe levar isso
—Isso não é uma resposta.
—Estará melhor com seus pais.
— Está segura?
— Só leva vinte e quatro horas na ilha e olhe tudo o que aconteceu —respondeu ela.
Logan a olhou com expressão inescrutável.
—Annie, ninguém tem a culpa de que se apresentasse essa tormenta. Por outra parte, Riley está bem e nenhum sabemos por que razão partiu realmente de sua casa. A que vêm suas pressas?
Ela não respondeu. serve-se uma taça de café e se queimou ao tentar beber.
—Tome cuidado. Está muito quente.
—Obrigado pela advertência —disse com ironia.
Embora estava cansada e nervosa, sentia a estranha necessidade de sorrir a aquele homem. Gostava. O negava uma e outra vez porque não queria sentir-se atraída por ele nem repetir o passado, mas gostava. E esse era o verdadeiro motivo de suas pressas.
—Faz frio —continuou ela—. É curioso, não recordo que tenha feito tão frio desde que cheguei ao Turnabout.
— Sim, a temperatura baixou muito. Menos mal que temos o gerador no centro social e a gente pode esquentar-se um pouco. Sam não sabe quando arrumarão o sistema elétrico. Ao parecer, caiu um raio nas instalações e ardeu a metade.
Ela assentiu.
—Por certo, Annie, obrigado pela cama.
— De nada.
— Sei que não te deixei muitas opções... —É verdade.
— Seja como for, quero que saiba que está equivocada.
— A que te refere?
— A que crie que aquela noite te rechacei porque eu não gostava. Mas eu gostava de muito, e você sabia.
Ao Annie ficou a boca seca.
—Gostava aos dezessete anos e eu gosto agora —acrescentou.
Annie retrocedeu e se golpeou as costas com o frigorífico quando, repentinamente, Logan avançou para ela. Estava assustada e excitada de uma vez.
—Basta, Logan. Não siga por esse caminho.
— Não quer que siga?
—Não. E pelo resto, não acredito que naquela época você gostasse.
Logan tomou uma das mãos da mulher e a pôs sobre seu coração, para que pudesse notar os batimentos do coração.
— Sente-o? Nada trocou. Em realidade, vim porque pensei que podia encontrar a forma de limpar minha consciência, de... Bom, não sei.
Annie quis deixar-se levar. Desejava beijá-lo, tocario, mas não podia fazê-lo. Tinha esbanjado muitos anos tentando expulsar todo aquilo de seu interior. Entretanto, quando lhe aconteceu um braço por cima dos ombros e lhe tirou a taça para deixá-la a salvo na encimera, ela só foi capaz de dizer:
—Logan...
— Ssss.
Logan tomou a cara do Annie entre suas mãos e a beijou. Ela pensou que ainda estava sonhando Assombrada, apoiou a frente em seu queixo e começou a acariciá-lo; mas se apartou de repente.
—Não. Tenho que pensar no Riley. Em minha sobrinha.
—Já te hei dito que Maisy a tem ocupada. Se alguém pode fazer-se carrego dela, essa pessoa é Maisy.
—De todas formas, não quero fazê-lo contigo Não quero. Já não sou uma mulher fácil.
— Uma mulher fácil? — perguntou ele, entrecerrando os olhos—. Que tolice é essa? Você nunca foi fácil.
— Olhe, será melhor que deixemos esta conversação. Tenho que limpar a casa, fazer coisas, arrumá-lo tudo...
Logan se meteu as mãos nos bolsos porque do contrário, teria tentado tocá-la outra vez. Annie se apartou, com um brilho de pânico em seus olhos, de cor esmeralda. Parecia um animal encurralado que queria fugir a toda costa.
amaldiçoou-se por havê-la beijado. Não tinha imaginado que lhe causaria semelhante inquietação.
—Está bem, como quer —disse ele —. esquentei água se por acaso queria te lavar.
—Agradeço-lhe isso.
—Se quiser, posso levá-la ao lavabo.
— Como?
—Bom, não há suficiente para que te possa banhar, mas certamente sim para encher o lavabo. lhe jogue um pouco de água fria para não te queimar.
—Obrigado…
Annie o seguiu ao quarto de banho e fechou a porta quando Logan partiu. Enquanto isso, ele permaneceu no corredor. A porta não era grande coisa, mas não podia ouvir nenhum som e imaginou que estava ali, frente ao espelho, sem fazer outra coisa que olhar-se, preocupada.
Logan reconhecia perfeitamente os sintomas do Annie porque também os tinha sofrido. Eram os de uma pessoa perseguida por seus fantasmas, acostumada a lutar, e às vezes a perder, com eles.
Mas não sabia que tipo de fantasmas podiam ser os seus, embora começava a imaginá-lo. E a idéia de que algum homem lhe pudesse ter feito tanto dano, enervava-o.
Respirou a fundo para tentar tranqüilizar-se, sem êxito.
Ele também começava a estar assustado.
Capítulo 8
OUÉ sabe do Annie? Logan estava trabalhando com o Sam Vega. estavam-se dedicando a retirar as árvores e os ramos que tinham cansado na estrada principal, interrompendo a circulação.
Sam se incorporou, secou-se o suor da frente e se encolheu de ombros.
— Não há muito que saber. Não se mete na vida de ninguém, não deixa que ninguém se meta na sua e pelo resto, é sócia de sua irmã. Isso é tudo, amigo.
Logan estava verdadeiramente interessado e não teria duvidado em chamar a Sara para conseguir que alguém lhe ampliasse a informação, mas as linhas telefônicas seguiam cortadas. Além disso, fazia muito tempo que não falava com ela e não teria estado
bem que a chamasse para lhe fazer perguntas sobre o Annie.
Derrotado, inclinou-se de novo e seguiu retirando e cortando ramos.
—Turnabout segue tão atrasada como sempre — protestou, enquanto olhava uma grande árvore cansada—. Me parece incrível que ninguém tenha uma serra elétrica.
Nem sequer podiam utilizar o todoterreno do Sam para atirar da árvore e retirar o da estrada. Estava encaixado em uma cerca próxima e a teriam derrubado por completo se tivessem tentado atirar dele.
Em outras circunstâncias não teria tido importância, mas aquela não era uma cerca qualquer: era a grade de ferro da velha mansão, do Castelo, como o chamavam; um lugar quase sagrado para todo mundo.
—Ah, o passado...
— Sim, já sabe que no Turnabout se apreciam essas coisas —disse o xerife.
Seguiram trabalhando cotovelo com cotovelo, até que ao cabo de um bom momento, depois de muitos esforços, conseguiram cortar o tronco e apartar o da grade. Já só tinham que retirar duas árvores mais.
Logan tomou a tocha e se aproximou do seguinte árvore. A tarde era fria e cheirava a madeira atalho, uma combinação muito pouco habitual para a ilha. Em certo modo, recordou a Washington. Mas o duro trabalho deixou seu rastro e tiveram que tirá-las jaquetas para poder seguir. Teoricamente ia ajudar os o irmão do Sam, Leão; entretanto, tinha-o enviado à cidade a fazer um par de recados e pelo visto o tinha tomado com excessiva tranqüilidade.
—Ódio fazer isto. Seria mais fácil cruzar a nado o cã! para comprar uma motosierra. me diga uma coisa: por que voltou para a ilha?
— E você? por que tornaste?
—Eu não tornei. Estou de visita.
Sam sorriu.
— Seja como for, está aqui.
—Estou apanhado aqui —particularizou Logan—. Mas só de momento.
—Isso é o que dizem todos.
—Esta ilha não tem nada que me oferecer.
Logan jogou uma olhada à paisagem. Naquela zona estava cheio de enormes e ameaçadores escarpados, mas ao outro lado, onde se encontravam as plantações da Sara e Annie, era muito mais suave.
— Não te pergunte o que pode te oferecer a ilha, a não ser o que pode oferecer você a ela.
De ter tido uma serra elétrica, Logan a teria utilizado com o xerife.
—O que ocorre? Agora te está pondo filosófico?
—Não —respondeu ele, entre risadas—. Mas, por que me perguntaste antes pelo Annie? Há algo entre ela e você?
—Não —respondeu com rapidez.
—Contaram-me que aconteceste a noite em sua casa.
—A gente deste sítio é muito fofoqueiro.
—É o que acontece em todas as cidades pequenas. Não têm nada que fazer e se dedicam a falar de outros.
—E pelo visto, você se inteira de tudo...
Sam bebeu um gole de água e deixou o cantil vazio no todoterreno.
—Há coisas piores, me acredite.
Logan seguiu trabalhando. Aquela situação lhe resultava irônica; uma vez mais estava arrumando o desastre causado por outros. Embora nessa ocasião não tinham sido pessoas, a não ser um furacão.
—Parece que a tormenta não deixou uma árvore em pé.
Os dois homens levantaram a vista ao mesmo tempo e olharam à mulher que acabava de falar.
Era Annie. aproximou-se deles, acompanhada do Riley, sem que nenhum dos dois o notasse. Tanto Annie como sua sobrinha levavam jeans e um pulôver parecido, de modo que pareciam as gemam.
—Olá, Annie —disse o xerife—. Me temo que nem seu talento poderia salvar estas árvores.
Annie e a adolescente se aproximaram de um dos troncos.
—Que lástima —disse Annie.
— A gente ainda grava suas iniciais nas árvores? — Perguntou Riley—. Que curioso.
— Bom, muitas dessas iniciais são de faz décadas. Então estava de moda.
Sam riu.
—Sim. Até é possível que encontre as do Logan por toda parte. Sempre trazia para as garotas aqui para...
—Contemplar as postas de sol —se apressou a cortá-lo Logan.
— Sim, claro, sim.
—E quase sempre me encontrava contigo e me danificava o dia, velho amigo.
—Ora, isso é água passada. Já ninguém vem aqui para isso.
—Então, não terei que me preocupar porque venha com seu novo amigo de Denver A... contemplar as postas de sol, verdade? —perguntou Annie ao Riley.
— Amigo? —perguntou Logan com curiosidade.
— Sim, um amigo —respondeu a garota, à defensiva—. Se chama Kenny, Kenny Hobbes. Sua família se aloja no local do Maisy.
Riley observou com atenção a árvore e disse: —Ninguém gravava seus nomes inteiros. Só há iniciais. Mas olhem, note nestas... HD e DC. O coração que gravaram está muito bem feito —declarou—. E mais abaixo há outras nas que parece ler-se É e C...
— Certamente será um l, pelo Luís Castelo — explicou Sam—. Ao parecer era o filho das pessoas que compraram a mansão. diz-se que a maldição do Turnabout começou quando a prometida do Luís, Elena, apaixonou-se por um amigo que tinha chegado à ilha depois da primeira guerra mundial.
— Uma maldição? Quem crie a estas alturas em maldições? —perguntou Riley.
Logan pensou que toda a ilha acreditava nelas, mas não disse nada.
— Sara e Maisy acreditam —disse Annie—, e nenhuma das duas são precisamente idiotas.
—Não, mas fazem mal em acreditar tolices — interveio Logan—. Riley tem razão. Isso só são superstições.
—Seu pai estava acostumado a dizer o mesmo, mas o certo é que há coisas que se saem do normal.
Ao Logan não agradou a idéia de estar de acordo com seu pai em algo, assim voltou para tema original.
— Conhece a maldição? —perguntou ao Annie. A gente do Turnabout quase nunca fala dela porque tem medo.
— Sara me contou isso.
— Sério? —perguntou Sam.
—Bom, e qual é? —interessou-se Riley.
—Ora, não tem importância—disse Logan.
— Se não ter importância, por que não o conta? — perguntou Annie—. Além disso, nem é do Turnabout nem tem intenção de ficar aqui.
— Meus planos não têm nada que ver com este assunto. Mas se alguém pedisse minha opinião, diria que deveriam restaurar a velha Missão ou rui-la.
—Que curioso. Eu hei dito algo muito parecido ao ver as plantações do Annie —comentou Riley—. Se encontram em um estado calamitoso.
Cansada de tantos jogos, Annie decidiu explicar no que consistia a maldição da ilha:
—Prometida-a do Luís Castelo se casou com seu amigo, Jonathan, que era um forasteiro. Ao Luís lhe rompeu o coração e sua mãe lançou uma maldição, segundo a qual nenhuma pessoa nascida no Turnabout pode ser feliz se não se casar com outra pessoa nascida na ilha. supõe-se que era uma forma de evitar que outros fizessem quão mesmo Elena, casar-se com um forasteiro.
—Que história...
—O mais interessante do assunto é que ninguém viveu perto da mansão após. Em realidade, o único vivo que cresce nos arredores eram estas árvores que derrubou a tormenta... É um bom sítio, e por isso semeei novelo nesta zona —continuou Annie.
—Antes, a grade de ferro continuava e bloqueava a estrada —disse Sam—, mas tirei essa parte porque os meninos tinham o costume de subir nela e temia que se pudessem fazer mal. As árvores que se cansado estavam do lado exterior da grade. Dentro não cresce nada.
— E esses restos são seu novelo, as que se supunha que devíamos salvar? — perguntou Riley—. Pois não ficou muito delas...
—O que lhe vai fazer. Mas Sam tem razão: por estranho que pareça, dentro da propriedade da antiga Missão não cresce nada.
— Ora, é provável que alguém jogasse algo tóxico à terra com tal de assustar às pessoas e convencer os de que a maldição existe. Quanto às árvores, não se têm cansado somente pela tormenta; é que eram muito velhos e tinham as raízes médio podres opinou Logan.
—Cético...
—Cético, não. Realista.
—Pois já que te interessa, fiz uma análise da terra da propriedade e não tem nenhum componente tóxico. Embora seja certo que seu ph é muito ácido... Seja como for, Sara e eu temos intenção de plantar mais nesta zona. Só vendemos novelo desenvolvidas sem produtos nem fertilizantes químicos; tudo é natural —disse Annie.
— A mansão segue em venda? —perguntou Logan, enquanto a olhava.
— Precisamente Sara foi a San Diego para averiguá-lo. O último dono conhecido foi Caroline Castelo, mas não pudemos localizá-la ainda. partiu da ilha faz quarenta anos e nem sequer sabemos se seguir com vida. Seria mais fácil se pudéssemos nos permitir o luxo de contratar a um detetive, mas não temos dinheiro.
Logan se dispôs a seguir cortando outra árvore e Annie acrescentou:
— Não há forma de que possamos salvar parte do tronco?
— Para que?
—Não sei, para a posteridade... Essas iniciais significam muito para algumas pessoas. Além disso, nem sequer o ides usar para fazer lenha.
— Se não arrumarem a central elétrica logo, é possível que o façamos. Mas, onde o poria?
—Talvez no centro social, por exemplo, embora acredite que deveria decidi-lo a prefeitura. Enquanto isso, posso guardá-lo no armazém se ninguém o quiser. Pensa-o, Sam. Provavelmente, esta árvore era o ser vivo mais antigo do Turnabout.
Sam se encolheu de ombros.
—Bom, já veremos. De momento, tiraremo-lo da estrada.
Então, o xerife agarrou ao Riley da mão e a subiu ao todoterreno. Annie quis segui-los, mas se enganchou em um ramo.
—Espera, enganchaste-te...
Logan se aproximou para ajudá-la, e estava tão perto que podia sentir o calor de seu corpo.
—Tome cuidado. Não te mova ou te fará um arranhão.
—Temo-me que já me tenho feito isso.
—Deveria falar com o Hugo.
— Com o Hugo? Por um simples arranhão? Parece-me um pouco exagerado. Além disso, tenho meus próprios remédios naturais que...
—Não, não, não. Referia ao do Caroline Castelo.
— Ah, claro... Seguro que seu pai tem sua ficha médica. Embora não comentou nada a Sara.
—Não me surpreende, porque Sara não sabe nada — disse, enquanto tentava separar o pulôver do ramo sem rompê-lo.
— O que é o que não sabe?
— Que Caroline Castelo partiu da ilha quando se fez público que tinha mantido uma relação amorosa com meu pai. Não me surpreenderia que Hugo a tivesse seguido vendo.
—OH, vá, sinto muito...
—Descuida, são coisas do passado.
—Às vezes é duro aceitar que os pais não são perfeitos, como acreditam quando somos meninos. Mas disso aconteceu muito tempo. Se suas más relações com ele se devem A...
Riley apareceu nesse momento e a interrompeu.
—Né, espero que não estejam desfrutando de nenhum pôr-do-sol...
Logan sorriu. A adolescente mostrava uma marcada inclinação por proteger a sua tia.
Em troca, Annie se ruborizou e aproveitou a oportunidade para dar por terminada sua conversação.
—Bom, obrigado pelo de ontem e por salvar o tronco da árvore. É um bom tipo, Logan Drake.
O sorriso do Logan se gelou para ouvir o sobrenome de seu pai. Não em vão, odiava-o por ter feito infeliz a sua mãe, mas no fundo sabia que Hugo era o mais parecido que havia no Turnabout a um bom tipo. Em troca, não tinha a mesma opinião de si mesmo.
—Não, não o sou.
LOGAN estava sentado no escritório do xerife, falando por rádio. Já era de noite, mas não tinha aceso o farol do escritório do xerife
— Algo novo? —perguntou —. chegaram mais cartas?
Um segundo depois se ouviu a voz do Will, com interferências.
—Da semana passada não chegou nenhuma. Se quiser, posso enviar um avião para que lhes recolha a ti e ao Riley.
Logan olhou o microfone. Em teoria, a solução que propunha Will era a mais lógica. Entretanto, algo lhe dizia que seria melhor que esperasse um pouco. E sua intuição não lhe tinha falhado nunca.
A última vez que tinha estado no despacho do Will, seu antigo amigo lhe tinha mostrado várias cartas nas que o ameaçavam de forma velada se não retirava sua candidatura às eleições de fiscal geral. Embora não eram ameaças diretas, sim continham as suficientes referências inquietantes como para que queria ter ao Riley em casa quanto antes.
—Espera um momento, Will... Te ouça muito mal e não te entendo.
Logan compreendia que estivesse preocupado por sua filha. Mas apesar disso, tinha chegado a pensar que a preocupação do Will não se devia só às supostas ameaças, a não ser ao efeito negativo que a escapada do Riley pudesse ter em sua campanha eleitoral.
A fim de contas, era um homem poderoso e podia ter utilizado mil molas distintas para obter que Riley retornasse a casa. Entretanto, tinha preferido ficar em contato com o Coleman Black, quem a sua vez encarregou o caso a ele. E aquilo também resultava bastante estranho; suspeitava que Penetrei tinha motivos ocultos para ter querido pô-los em contato depois de tantos anos sem falar-se.
—Está bem, voltarei-te a chamar amanhã...
Logan desconectou a rádio e se passou as mãos pela cara. Não queria levar ao Riley a sua casa até averiguar por que se escapou em realidade. Além disso, tampouco queria deixar ao Annie.
Logan pensou que Penetrei teria estalado em gargalhadas de ter visto seu melhor homem preocupado por fantasmas do passado.
Minutos mais tarde, deixou ao Sam em seu escritório e se dirigiu ao centro social. Como na ocasião anterior, teve que passar por um sem-fim de interrogatórios sobre sua vida e intenções antes de alcançar a mesa onde estava sentada Annie, conversando com outra pessoa.
Decidiu aproveitar que ainda não tinha notado sua presença para observá-la e admirar seu perfil e seus lábios. Mas o sorriso que lhe formou na boca desapareceu imediatamente.
— Onde está Riley?—perguntou.
Annie se voltou para ele.
— Com o Maisy, suponho. Parece fascinada com o April.
— Acabo de falar com o Will e lhe hei dito que todos estamos bem.
—Me alegro. Então, quererá que a leve em seguida...
Nesse instante apareceu Dá-la Towers, que os saudou e se sentou em uma cadeira ao outro lado da mesa.
—Vá pesadelo, né? Morrerei se não consigo um pote de sua nata de lavanda, Annie.
—Temos nata de sobra na loja, Dá-la. Posso ir te buscar uma vasilha.
—Obrigado, Annie. E tampouco estaria mal que encontrasse a alguém para que me ponha isso nas costas —disse, sonriendo.
—Prova com Leão —sugeriu Logan.
Dá-la apertou os lábios, furiosa, e se levantou da cadeira tão rapidamente que esteve a ponto de atirá-la.
—Não deveria ter sido tão grosseiro com ela — disse Annie.
Logan se encolheu de ombros. Não estava interessado em Dá-la Towers. Só lhe interessava Annie. Por sua vida tinham acontecido muitas mulheres, mas nenhuma que o mantivera acordado todas as noites, nenhuma como Annie Hess.
serve-se um prato de comida, porque ainda não tinha provado bocado, e jogou uma olhada a seu redor. O centro social estava cheio de gente, como no dia anterior, e tinha a impressão de que o último em chegar tinha sido seu pai, Hugo.
Entretanto, a falta de apetite do Annie, que logo que tinha provado sua comida, chamou-lhe mais a atenção. Não deixava de olhar ao Hugo, de forma subrepticia.
—As aparências enganam —disse.
— A que te refere?
Logan olhou para o lugar onde se encontrava seu pai.
— Seguro que te está perguntando se Hugo for tão mau, tendo em conta que tem fama de santo.
—Não, não me perguntava isso. Estava pensando que é muito triste que haja tanta distância entre vós.
Logan encontrou divertido o comentário.
— Quanto tempo faz que não fala com seus pais?
Annie inclinou a cabeça, reconhecendo a ironia.
—Não se pode dizer que a situação seja a mesma. o de seu pai é algo muito velho, algo do passado. A fim de contas, Caroline Castelo partiu da ilha faz décadas... Por certo, o que estiveste fazendo todos estes anos, Logan?
—Já lhe hei isso dito. Trabalhando de assessor.
— Para quem?
—Para gente que não te soaria de nada.
—Conta-me o de todas formas.
Logan arqueou uma sobrancelha.
—me diga ao menos de que tipo de trabalho se trata. .. Tem que ver com o Direito?
—Mais ou menos.
— Está tentando incitar minha curiosidade, Logan? Ou me está mostrando essa parte dura de ti que procuras ocultar sob uma fachada elegante e educada?
Seus olhares se encontraram então e só se apartaram quando o ruído que havia a seu redor cessou por completo.
Sam se acabava de subir a uma mesa e tinha pedido a atenção dos ali reunidos. Entretanto, Logan logo que emprestou atenção às informações de seu amigo, que despertavam amargas queixa entre os pressente; estava mais ocupado pensando no que havia dito Annie.
De haver-se tratado de outra pessoa, não lhe teria dado importância, mas se tratava dela.
Quando Sam deixou de falar, Annie disse:
—Não sei se poderei viver sem eletricidade.
—Bom, eu posso fazê-lo perfeitamente —comentou ele.
A curiosidade do Annie pelo Logan ainda não tinha encontrado as respostas que necessitava quando foi procurar a sua sobrinha e retornaram à casa da praia, aquela noite.
Logan não as acompanhou e Annie tentou convencer-se de que o preferia assim. Acendeu umas quantas velas e esquentou água no fogão; embora tivesse que passar-se várias horas esquentando água, estava decidida a obter que Riley se banhasse.
Mas o gás do fogão se gastou logo, e embora a jovem pôde banhar-se, ela não teve tanta sorte.
Minutos mais tarde, Riley apareceu na cozinha. sentou-se e disse:
—A vela do quarto de banho já se consumou.
—Logan disse que trará mais vela quando vier a te dar as pilhas para seu reprodutor do CD.
Logan tinha desaparecido depois do bate-papo do Sam no centro social, sem dar mais explicações que comentar que levaria fornecimentos mais tarde.
—Bom, isso será se ficarem pilhas. A gente o está gastando tudo rapidamente —comentou Riley.
—Sobre as pilhas não posso fazer nada, mas pelas velas não se preocupe. Se for necessário, utilizaremos as que temos guardadas na loja. Seguro que quando veio à ilha não pensou que acabaria vivendo deste modo...
—Que não tenhamos eletricidade não significa que esquilo em desejos de retornar a minha casa —advertiu Riley.
— Seja como for, o guarda costeiro voltará amanhã ou passado. O xerife me há dito que pode arrumá-lo para que lhes levem ao Logan e a ti ao continente. Acredito que deveria ir.
— Está bem. Irei ao continente.
Annie entrecerró os olhos, com desconfiança.
— Sim, claro. Ir ao continente não significa que tenha intenção de voltar para casa, verdade?
Riley não respondeu.
Annie se acomodou junto a sua sobrinha e tentou encontrar algo que dizer, algo que pudesse convencê-la.
—Riley, quero que saiba que não há nada que não possa me contar a mim. Talvez, se confiasse...
Riley se levantou.
—Vou à cama.
— Está bem... boa noite.
A garota partiu a sua habitação e fechou a porta. Annie se aproximou do telefone e desprendeu o auricular, embora sabia que ainda não tinham arrumado a linha.
Embora estava acostumada à tranqüilidade, o silêncio da casa lhe resultou excessivo. De modo que decidiu ocupar seu tempo em algo útil.
Tomou uma toalha, um penhoar e um frasco do xampu que preparavam em sua loja e se dirigiu à praia; uma vez ali, acendeu um fogo e pôs um caldeirão com água a esquentar.
Depois, deixou-o e voltou a entrar na casa para assegurar-se de que sua sobrinha estava bem. Bateu na porta de seu dormitório, mas ao não obter resposta decidiu passar. Supunha que se teria ficado dormida e assim era; estava tombada na cama.
Temendo que pudesse esfriar-se, avançou com muito cuidado e a cobriu com uma manta. Logo retornou à praia e começou a despir-se para lavar-se ali mesmo. Desde não ter feito tão frio, teria se tirado toda a roupa; mas em tais circunstâncias lhe pareceu pouco conveniente.
É obvio, não tinha medo de que a vissem.
Ninguém vivia nas cercanias e por outra parte, não se via nada salvo as estrelas e a lua. Infelizmente, ficou geada no processo e já tinha começado a tremer quando terminou de secar o cabelo.
Recolheu todas suas coisas e deixou a fogueira acesa para que se apagasse sozinha. Depois, retornou para a casa e se levou um bom susto ao distinguir um brilho de cor vermelha.
—Logan, é você?
— Sinto te haver sobressaltado...
Logan estava sentado no mole, fumando um cigarro. Automaticamente, Annie se perguntou quanto tempo levaria ali e quanto tempo teria estado observando-a.
Entretanto, disse-se que não tinha importância. A fogueira estava a certa distância do mole e certamente não teria visto nada. Ou talvez sim. Em realidade, seu problema era outro: tinha decidido fazer algo tão estranho como lavar-se meio nua na praia, a pesar do frio, porque no fundo desejava que Logan a visse.
— Annie? —Perguntou ele, ao notar seu gesto de preocupação—. Te encontra bem?
LOGAN se levantou, alarmado, porque Annie parecia a ponto de deprimir-se. Mas ela se limitou a piscar e a fechar o penhoar.
— Sim, estou perfeitamente. É que me assustei ao verte. Não sabia que fumasse...
—Intento fumar pouco.
— Ah... Tinha saído a me lavar o cabelo.
Já o vejo —disse ele —. trouxe vela e pilhas. —Magnífico —comentou, algo nervosa—. Riley estará encantada. Necessita as pilhas para seu reprodutor do CD.
—Sei, disse-me isso.
—Sim, claro —repôs, incômoda.
—Também trouxe mais gás para o fogão. Mas quase não fica no centro, assim que talvez queira guardá-lo para cozinhar ou para alguma outra coisa útil.
— E suponho que outro banho para o Riley não é uma coisa urgente, verdade?
—Não, provavelmente não. teria te trazido algum farol, mas já não ficam.
— Quanto te gastaste? Quero te devolver o dinheiro.
—Esquece-o, Annie. E entra na casa... Está tremendo.
Annie abriu a porta da cozinha.
—Riley se dormiu, assim que esta noite não nos incomodará.
—Me alegro muito. Ter que sair a procurá-la baixo aquele dilúvio foi uma das piores experiências de minha vida.
—Isso me recorda que não poderá dormir em sua habitação, mas pode fazê-lo no sofá se quiser. É bastante cômodo, embora não sei se suficientemente comprido para ti. Se o preferir, vete ao centro social ou a alguma outra casa.
— Pretende me convidar a dormir em seu sofá ou tenta evitá-lo? —perguntou com curiosidade.
—Boa pergunta... Digamos que eu não gostaria que se repetisse o que passou esta manhã.
—Nem a mim.
— Bem, então, você escolhe.
Annie entrou na casa e Logan ficou fora.
Ao cabo de uns segundos, acendeu outro cigarro e se dedicou a contemplar o mar, sempre tão distinto. Só levava dois dias na ilha e sabia que em outras circunstâncias teria sido mais que suficiente para desejar sair correndo dali, mas a presença do Annie o trocava tudo.
Embora ela tivesse esquecido o que tinha passado entre eles, anos atrás, ele seguia recordando-o perfeitamente. E embora em sua vida havia muitas coisas das que se arrependia, aquela lhe parecia a pior de todas.
Aquela noite, Sam lhe tinha devotado uma cama em sua casa; mas Logan tinha preferido voltar. No fundo, albergava esperanças.
Apagou o cigarro, levantou-se e entrou pela porta da cozinha. Apenas um segundo depois ouviu uma voz:
—Quero que saiba que não saí à praia para te proporcionar um espetáculo erótico.
Logan se deteve.
—Pensava que te teria ido dormir...
—Pois obviamente não o tenho feito —disse ela—. Em todo caso, e com independência do que tenha visto, insisto em que não o tenho feito por ti. De modo que se está procurando que alguém se dispa ante seus olhos, será melhor que procure em outra parte.
Logan não havia visto grande costure. Logo que tinha distinto suas pernas contra o brilho do fogo, e suas costas quando se tinha agachado para tirar o pulôver. Em suas ações não havia nada sedutor, e entretanto lhe tinham resultado incrivelmente desejáveis.
—E bem? —perguntou ela.
—Não vi nada —mentiu ele.
— Me alegro. Nesse caso, irei te buscar uma manta e uns lençóis para que durma no sofá, se é que tem intenção de ficar aqui.
— Sim, obrigado.
Annie partiu e retornou um par de minutos depois com o prometido.
— Aqui o tem. Espero que esteja quente com isto...
—Não acredito que o calor seja um problema —disse ele, com ironia.
—Já... Bem. Então, boa noite.
Annie nem sequer sabia por que não se partiu ainda. Estava ali, parada, sem fazer nada, embora era consciente de que tentava a sua sorte; quanto mais tempo permanecesse a seu lado, mais possibilidades tinha que a tocasse.
— Bom, devo te advertir de que tinha intenção de esquentar água e de me lavar aqui mesmo, na cozinha. De modo que se não querer ter seu próprio espetáculo, sugiro-te que te parta.
Annie entreabriu a boca e se passou uma mão pelo cabelo.
O a olhou e pensou que o estava voltando louco.
—Annie...
A menção de seu nome bastou para que a mulher recuperasse a prudência. Olhou-o e, sem dizer nenhuma só palavra mais, partiu.
Durante a madrugada, horas antes do amanhecer, uma segunda tormenta açoitou a ilha.
Annie se levantou o ouvir os tremendos trovões e essa vez não perdeu o tempo; saltou da cama e saiu da habitação a toda pressa.
Riley ainda estava em seu dormitório quando sua tia entrou.
—Vá, que lástima. Pensava que estava sonhando... —disse a jovem.
—Com um pouco de sorte não será tão malote como., a última —comentou Annie.
—Oxalá, porque eu não gostaria de ter que dormir na banheira.
Nesse momento ouviram a voz do Logan.
— por que não? Os jovens são muito flexíveis —brincou.
— Certamente, são muito mais flexíveis que eu —murmurou Annie.
Depois de assegurar-se de que sua sobrinha estava bem, Annie quis fechar a porta; mas Logan o impediu.
—Acredito que deveríamos deixá-la aberta...
—Não se lhes ides passar toda a noite falando — protestou Riley.
Logan sorriu e os dois adultos se dirigiram à cozinha. Ela quis acender uma vela, mas ele lhe adiantou.
— Embora saiba que os perigosos som os raios, confesso que esses trovões me dão pânico. Está seguro de que devemos ficar na casa?
—Não gosta de voltar para a cidade sob a chuva, a não ser que seja estritamente necessário.
—É uma pena que e devolvesse o carro a Leão.
Annie se aproximou da janela para olhar ao exterior. Em realidade, o fazia por ocupar sua mente em algo. Ela não levava mais roupa que um pijama; e ele, só umas calças.
—Parece que o vento não sopra tão forte.
—Menos mal... Mas volta para a cama, Annie. Despertarei se o clima piora.
—Nem sequer estava dormida.
—Vete à cama de todas formas.
Ela duvidou ao ver que tinha uma pequena ferida em um braço.
— Como te tem feito isso? —perguntou.
—Cortei-me quando estava arrumando o teto.
— Deixa que lhe olhe isso...
—Não é nada, sério, não tem importância.
—Preferiria lhe jogar uma olhada. Se não ser muito profunda, tenho alguns remédios que...
— Se te deixar que me olhe a ferida te partirá à cama? —interrompeu-a, desesperado.
—Trato feito.
—Nesse caso, adiante.
Annie foi ao lavabo e retornou com seu estojo de primeiro socorros de primeiros auxílios e com uma toalha que acabava de umedecer. Levou-o a salão, convidou-o a sentar-se no sofá e ela se acomodou sobre umas almofadas para ter mais fácil acesso à ferida.
—Posso fazê-lo eu, não te incomode —disse ele.
Ela o olhou e tirou um tubo do estojo de primeiro socorros.
—Está bem, faz o que queira —continuou Logan—. Pelo visto, está acostumada a sal ir com a tua.
Annie lhe estendeu a nata sobre a ferida, que resultou ser apenas um arranhão, e depois lhe massageou o braço brandamente, até que entrou em calor. Logan gemeu.
— Sente-se melhor?
—Como não... Qualquer sabe o que leva esse linimento que me puseste. Não quero nem pensá-lo.
—Leva cayena, pimenta e umas quantas ervas mais. Mas me acredite: se lhe pusesse isso por engano nos olhos ou em uma ferida profunda, descobriria um novo significado da palavra dor.
— Pimenta? Cayena? OH, Meu deus...
—Sentirá-se melhor, já o verá. Também posso te preparar um chá de ervas se quiser. Talvez um pouco de valeriana ou de salgueiro negro...
—Não, obrigado, não quero nada. Também faz encantamentos? Começo a pensar que no fundo é deste sítio. diz-se que os donos da velha mansão eram bruxos.
— Agora entendo o da maldição, mas não tema. Meus remédios funcionam. São remédios tradicionais que se utilizaram há séculos —explicou ela.
— Em qualquer caso, acredito que já pode deixar de me pôr pimenta no braço —disse ele, exasperado.
Embora as condições nas que estavam vivendo resultavam mas bem duras, Annie sentiu vontades de rir. Não tinham eletricidade nem água quente nem telefone e meia casa seguia destroçada, mas Logan terminou conseguindo que sonriera, e não foi um sorriso medida, a não ser um sorriso amplo e verdadeiro.
Annie fechou o tubo, guardou-o no estojo de primeiro socorros, secou-se as mãos com a toalha e se levantou.
Estava segura de que não conseguiria conciliar o sonho, mas decidiu aceitar a sugestão de seu convidado.
—boa noite, Logan.
— boa noite, Annie.
Annie avançou pelo escuro corredor até chegar a seu dormitório, e uma vez dentro, meteu-se na cama. No exterior se ouvia o som da chuva e os trovões.
Cansada, tampou-se com a manta até o pescoço e fechou os olhos.
Segundos mais tarde se ficou dormida.
TRÊS dias na ilha. Logan se encontrava na rua, contemplando a colorida casa que seu pai tinha convertido anos atrás em consulta médica, embora o edifício tinha um aspecto mais familiar que profissional.
Como a porta estava aberta, entrou diretamente.
Seu pai estava com um paciente. Não soube pela recepcionista que estava sentada depois de um escritório, na sala dianteira, mas sim porque podia ouvir o murmúrio das vozes através das finas paredes. Assim avançou para uma cadeira e se sentou.
junto à cadeira havia um velho barril que reconheceu imediatamente. De menino se sentava nos joelhos de seu pai enquanto Hugo fazia solitários com as cartas.
meteu-se as mãos nos bolsos e olhou pela porta aberta. De ali se podia ver o telhado do local do Maisy, as altas palmeiras que o rodeavam e, mais à frente, o mar.
Voltou a fixar-se no barril, aborrecido, e então notou que em cima havia uma pequena caixa de madeira lavrada. Não era precisamente uma maravilha, mas lhe surpreendeu muito; não em vão a tinha feito ele mesmo no colégio, em vida de seu difunta mãe. Abriu-a e tal e como esperava encontrou dentro um baralho de cartas.
Fechou a caixa, um pouco perturbado, e voltou para recepção.
Hugo acabava de sair da consulta e estava conversando com seu paciente, uma mulher de avançada idade. Naturalmente, notou sua presença; entretanto, era um profissional e não se aproximou de seu filho até que a mulher saiu do edifício.
—ouvi que está saindo com a jovem Annie —disse, sem mais preâmbulos.
Logan se dirigiu à sala de espera para que a recepcionista não pudesse ouvi-los.
— Já não é nenhuma menina. Por certo, sabe o que passou com o Caroline?
Hugo franziu o cenho.
— por que te interessa Caroline precisamente agora?
—Porque Sara e Annie querem a velha mansão. —Não, só querem as terras —lhe corrigiu.
— Se já sabia, por que não ajuda a sua filha? — Como? lhe emprestando dinheiro? Sabe de sobra que não tenho nada. Como não enfaixa as tuberías da casa...
Ao Logan não pareceu um comentário divertido.
—Ao menos poderia lhe dizer como pode localizar ao Caroline.
Hugo parecia não sentir-se muito bem. sentou-se em uma cadeira e disse:
—Caroline partiu da ilha faz anos, antes de que nascesse Sara, quando você ainda foi um menino. E não a voltei a ver.
—Mas era o amor de sua vida...
Hugo o olhou aos olhos.
— Pergunta-o ou o afirma?
—Afirmo-o. É um fato.
— Só segundo a versão de sua mãe.
— Bom, suponho que ela devia sabê-lo. Hugo apertou os lábios, mas não disse nada. — Aonde foi quando partiu do Turnabout? —Não sei.
—Não te acredito.
— Pois sinto não poder te ajudar a respeito. Como sinto não ter sido capaz de convencer a sua mãe de que estava equivocada.
—Não estava equivocada.
—Estava-o, mas não o reconheceria nunca porque é tão cabezota como ela —observou—. A diferença é que sua mãe tinha melhores motivos que você.
—É obvio; sabia a verdade sobre seu marido, sobre o Caroline e você. por que não lhe concedeu o divórcio? por que não deixou que partisse?
— Sei que crie que sua mãe ainda seguiria com vida se nos tivéssemos divorciado, mas me temo que não sabe a verdade porque nunca quiseste sabê-la. Para ti é mais fácil culpar a seu pai, assim segue fazendo-o, adiante —declarou Hugo—. Segue acreditando o que queira. Odiava esta ilha e me odiava . Nem sequer teria aceito meu dinheiro quando estudava na universidade.
— É que tinha dinheiro para gastá-lo em mim? — perguntou com ironia.
Entretanto, Logan pensou que seu pai tinha razão. Se lhe tivesse devotado dinheiro, o teria rechaçado apesar de que o necessitava. E como conseqüência de sua falta de recursos econômicos, ao final tinha aceito a oferta de um homem que alguns tinham por santo e outros pelo muito mesmo diabo.
De fato, nem sequer ele estava seguro do que era.
—Dá-me igual se segue saindo com o Caroline ou se não a viu em várias décadas. Só quero saber onde vivia a última vez que soube algo dela.
—Estou-te dizendo a verdade, não sei nada dela. Crie que eu não me perguntei isso? A única família que tinha eram seus pais, mas nem sequer eles voltaram a vê-la... Só sei que era uma moça que nunca tinha saído do Turnabout.
—E te aproveitou de sua inocência.
—Parte, Logan. Tenho trabalho que fazer —. Disse seu pai, com frieza.
—Aproveitou-te dela e te liberou de minha mãe por essa mulher.
—Sua mãe me deixou , Logan, e o fez muito antes de que eu contratasse ao Caroline. Nem sequer sabia que estava grávida de ti quando partiu; tive que contratar a um detetive privado para que a encontrasse e demorou um ano em fazê-lo. Para então, você já tinha seis meses de idade.
— Já. E nos trouxe de volta ao Turnabout, onde minha mãe teve que suportar a presença de seu amante. É que tomava por tola? É que pensou que não se daria conta do que a recepcionista e você faziam na consulta?
Hugo o olhou com intensidade e perguntou:
— por que voltaste para o Turnabout?
Logan sentiu uma profunda dor e lhe devolveu o olhar a seu pai. pareciam-se muito e eram da mesma altura, mas em sua opinião, não podiam ser mais diferentes.
—Porque eu gostaria de corrigir alguns enganos.
Então, Logan se deu a volta e partiu.
Levavam três dias sem eletricidade.
Annie olhou as caixas do armazém e amaldiçoou sua sorte; vários clientes estavam esperando seus pedidos, mas não podia enviá-los porque não havia nenhum meio de transporte disponível.
—Seus produtos cheiram fatal.
Era Riley. A jovem já tinha deixado claro, várias vezes, que preferia ajudar ao Maisy antes que trabalhar com ela na loja. Obviamente, não lhe interessavam as ervas nem as flores.
Entretanto, Annie sabia que seu verdadeiro interesse pelo Maisy não tinha nada que ver com o local, a não ser com o Kenny Hobbes. Resultava evidente que estavam saindo.
—Por fortuna, meus clientes não pensam quão mesmo você.
Riley pôs cara de poucos amigos, mas começou a olhar as etiquetas dos frasquitos.
—Cheira como a regaliz. E ódio o regaliz.
—Então, tentarei não lhe pôr isso para jantar.
Annie seguiu trabalhando na cesta que estava preparando, até que dez minutos mais tarde, ouviu-se a voz do noivo do Riley.
—Ah, por fim te encontro... Esta loja está cheia de coisas estranhas. Seguro que não vendem nada ilegal?
—Não —respondeu Annie—, mas me resultaria fácil envenenar a alguém se gostasse.
—Latido... Ouça, Riley, tem trabalho que fazer ou pode sair um momento?
Riley olhou a sua tia e perguntou:
— Posso?
Annie assentiu.
—Está bem, mas nada de postas de sol. Já sabe ao que me refiro.
Riley se ruborizou e assentiu.
—-Ah, e quero que esteja no centro social a hora de jantar.
Os dois adolescentes saíram da loja e se cruzaram com o Logan, que entrava naquele momento.
—Olá, Annie...
Annie o olhou e se perguntou onde teria estado todo o dia. barbeou-se e se trocou de roupa. Levava uns jeans tão desgastados que pareciam brancos e uma camiseta da Universidade de Los Anjos, mas sua expressão era tão estranha que perguntou:
— Encontra-te bem?
— Sim, perfeitamente —respondeu, enquanto olhava as caixas do armazém, preparadas para o envio—. Vejo que estiveste trabalhando.
-—Sim. Esses são os últimos pedidos que recebemos antes da tormenta. Mas não posso enviá-los sem transporte.
—E suponho que terá perdido outros muitos pedidos por culpa do mau tempo —disse ele.
—O que lhe vai fazer...
Annie terminou a cesta que estava preparando, introduziu-a com supremo cuidado em uma caixa de cartão e a deixou sobre as demais. Ato seguido, limpou-se as mãos no avental que tinha posto e tentou pensar em outra coisa que a mantivera ocupada.
Não queria ficar sem fazer nada porque corria o perigo de deixar-se levar pelo desejo.
— Que tal está seu braço hoje? —perguntou ela.
—Bem, muito bem. E você arranho?
—Ora, isso não foi nada —respondeu, em pleno intercâmbio de naderías—. Como certo, sabe quando vão arrumar a eletricidade e o telefone?
-Não.
Logan tomou uma ramita de romeiro e a cheirou.
—Não parece que isso te incomode muito.
— Sou um homem paciente. Ela arqueou uma sobrancelha.
— Se você o disser...
Annie tomou um pote de nata, meteu-o em uma bolsa com o logotipo da loja, recolheu as chaves e se dirigiu à saída posterior.
— Aonde vai? —perguntou ele.
— A levar isto a Dá-la Towers. E depois, às plantações.
—Ainda estão cobertas de água.
— Revistam está-lo.
Logan a seguiu e ela fechou a porta com chave. —Quando vivia aqui, ninguém fechava as portas com chave...
—Pensava que você não gostava de Turnabout.
— E eu não gosto.
— Entretanto, há-o dito como se sentisse falta daqueles tempos.
—Não, só sinto falta dos tempos em que a gente não tinha que fechar suas casas com chave.
—Eu só fecho a loja porque dentro está a caixa registradora, o ordenador e os produtos que vendemos. No Turnabout não está acostumado a acontecer nada, mas de vez em quando roubam e quase sempre está acostumado a ser algum turista. Entretanto, nunca fecho a porta de minha casa.
Começaram a caminhar para o domicílio de Dá-la, uma casa que se encontrava não muito longe do local do Maisy.
—Por certo, onde vive? —perguntou ela.
— Em nenhum lugar em particular. Annie se deteve e disse:
—Logan, se não querer que me meta em seus assuntos, só tem que dizê-lo.
—Não é isso. Hei-o dito a sério.
—Não posso acreditar que seja um vagabundo.
— Eu não hei dito isso.
—Bom, está bem. Se não me querer dizer isso não o faça.
Annie seguiu caminhando.
— Sempre entrega seus produtos em pessoa?
—Não, mas não tem sentido que abra a loja estes dias. Se alguém necessitar algo, pede-me isso diretamente. Como Dá-la.
— me acredite, ontem à noite não se sentou a nossa mesa para te pedir natas, a não ser para me pôr seus seios de silicone diante da cara.
—OH, vamos, Logan... É uma boa mulher, embora esteja acontecendo uma má temporada.
—Vá, não sabia que agora fosse defensora de causas perdidas...
— É que você não gosta de como sou?
—Ao contrário. De fato, agora me parece muito mais interessante que antes.
Aquele comentário a desconcertou.
—Pois não tenho nenhuma intenção de lhe resultar interessante a ninguém.
—Bom, há coisas que não se podem evitar.
—De todas formas, isso de ser interessante é muito relativo. Há insetos de oito patas que são muito interessantes e gente que é muito interessante na cama, por exemplo —comentou ela.
Logan baixou o olhar e observou suas pernas. Ela pensou que não as encontraria particularmente atrativas, porque levava um vestido que quase chegava aos tornozelos e sapatos com meias três-quartos.
—Eu só vejo duas pernas...
Annie seguiu caminhando. Quando chegaram à casa de Dá-la, fez a entrega do pedido e partiu rua abaixo.
—Recordo-te que seu novelo estão em direção contrária, Annie.
— Sim, mas estamos perto do estabelecimento do Maisy e quero ver se Riley estiver bem.
—O menino com o que está saindo recorda a alguém. Adivinha a quem.
—Ao Iván Mondrago, verdade? —perguntou, refiriéndose a um velho conhecido de sua juventude.
—Em efeito. E não estou seguro de que deva lhe permitir que saia com ele.
—Não sou a mãe do Riley, Logan, e nem sequer sei se seria uma boa mãe.
— Mas agora é o mais parecido que tem a uma mãe e é responsável por ela. Deveria mantê-la afastada desse menino.
— O que quer? Que a encerre? Isso não serviria de nada. Além disso, tem que aprender suas próprias lições. Talvez o tenha esquecido, mas os adolescentes também têm problemas, como os adultos e até os meninos. E às vezes devem tomar decisões.
—Está-lhe dando muito margem porque seus pais não confiavam em ti.
— Isso é o que acreditava então, mas agora não opino o mesmo. Eles tinham razão. Confiavam em mim e traí sua confiança. E quanto ao Riley... o problema não é ela a não ser Kenny.
—Annie não engane a ti mesma. Os maneiras na mesa e o tipo de faca que se devia utilizar para cada prato eram o único no que seus pais não se equivocavam.
Annie riu, embora a situação não lhe parecia nada graciosa.
—Bom, vou ao local do Maisy. Vem comigo?
—Não, obrigado.
Ela soube em seguida por que não queria ir. Temia encontrar-se com o Hugo. Ao pensar nisso, voltou a sentir uma intensa tristeza. Ela não falava com seus pais desde fazia tempo, mas a diferença dela, não recordava que Hugo tivesse falado mal de seu filho nenhuma só vez.
—De acordo. Então, veremo-nos a hora de jantar.
—Ali estarei.
Annie se tomou a frase como uma promessa e uma maldição.
Sentiu uma estranha sensação no estômago e justo então começou a chover brandamente.
Passaram vários segundos sem que nenhum dos dois abrisse a boca. E ao final, ela estendeu um pouco os braços, com as Palmas para cima, e disse:
—Parece que o céu está empenhado em dar um bom banho ao Turnabout.
—É possível. Mas seja qual seja a razão, está preciosa sob a chuva.
Annie ficou muito quieta quando Logan se aproximou, beijou-a nos lábios e partiu.
Ainda seguia ali, tocando-os lábios com um dedo, quando ouviu a voz de uma pessoa muito conhecida.
Era Sara.
— Annie?
— Sara! Quando chegaste?
— Isso é o de menos agora. Mas me diga uma coisa... O homem que te estava beijando não era meu irmão, por acaso?
O jantar no centro social já tinha terminado. Os vizinhos do Turnabout se recuperaram do susto do furacão e pouco a pouco foram recuperando seu humor habitual. A gente conversava animadamente junto ao fogo e inclusive alguns se atreveram a dançar ao som de uma banda local que resultava tão entusiasta como pouco profissional.
—É uma espécie de festa —disse Riley, com um sorriso—. Deixará que fique aqui esta noite, tia? Em casa não tenho nada que fazer.
—Não há problema sempre e quando ficar aqui de verdade. Não quero te encontrar com o Kenny na mesma situação em que te encontrei faz um momento, quando cheguei. De acordo?
Annie os tinha descoberto quando estavam a ponto de beijar-se e lhe tinha sentado bastante mal.
— Kenny vai se ficar com seus pais. Já lhe hei isso dito antes —lhe recordou sua sobrinha.
Era certo.
Annie se disse que devia recordar que Riley não era a buscapleitos que ela tinha sido a sua idade. Não atraía os problemas, não se pareciam em nada e não era justo que a tratasse como se fora de outro modo.
—Está bem. Se tiver algum sítio onde possa dormir esta noite, fique.
Riley e Annie cruzaram a sala e se encontraram com o diretor do instituto, quem, conforme tinha anunciado Sam depois do jantar, ia encarregar se de manter a ordem no centro social. O homem lhe asseguro que a presença do Riley era bem-vinda, porque podia dar uma mão com os mais pequenos, e Annie ficou bastante mais tranqüila.
Quando sua sobrinha desapareceu entre a multidão, sentiu certa angústia. Ainda não tinha averiguado por que razão tinha fugido de seus pais; seguia tão ignorante a esse respeito como quando Riley se apresentou na porta de sua casa.
Nesse momento, apareceu Logan.
— Ah, olá —disse, um pouco sobressaltada—. Sabe que Sara está na ilha?
Seu amiga a tinha submetido a um intenso interrogatório depois de contemplar o beijo que Logan lhe tinha dado. Queria-a muitíssimo, mas nunca lhe tinha contado que tinha estado apaixonada por ele. E ter que lhe explicar o que ele estava fazendo na ilha e o que ela sentia, tinha-a deixado completamente esgotada. Além disso, o descobrimento da pequena aventura do Riley e Kenny acrescentou mais desconforto à tarde.
—Sim, hão-me dito que conseguiu cruzar o canal. Deveu ficar no continente.
—Bom, Sara sabia o que tinha passado e lógicamente quis dever jogar uma mão. Há gente a quem gosta de estar em seu lar.
— Sim, e há gente tão afortunada que tem um lar —particularizou ele.
Annie o olhou de forma estranha.
— O que acontece?
—Nada. Mas já que está na ilha, não crie que deveria ir ver a? ficou encantada quando soube que te tinha dignado a vir de visita... Ou é que pensa evitá-la, tal e como faz com seu pai?
— Se isso for o que te incomoda, pode estar tranqüila. Já vi a minha irmã. E a meu pai, por certo.
—Não estou molesta.
Logan não acreditou. Seus olhos estavam frágeis e suas bochechas um pouco ruborizadas. Ou estava zangada ou bêbada, mas duvidava que a última opção fora possível; conforme lhe tinham contado, não provava o álcool.
—Então, é pelo Riley? Eu diria que se está divertindo...
— Sim, é verdade. vai se ficar aqui a passar a noite.
Logan a olhou e Annie se estremeceu. Excluído o álcool, já só ficavam duas possibilidades: ou lhe preocupava sua sobrinha ou reagia desse modo por sua presença.
Agarrou-a por braço e disse:
—Vêem comigo.
—Não penso te acompanhar a nenhum sítio. Vou a casa.
—Como quer. Nesse caso irei pelo cochecito de golfe e te levarei.
— Não necessito que me leve. Levo cinco anos fazendo este caminho a pé e seguirei fazendo-o quando te tiver ido.
—Ainda sigo aqui.
—É uma lástima, porque se te tivesse levado já ao Riley...
— teria se escapado outra vez —a interrompeu—. Sabe perfeitamente, assim deixa de te comportar desse modo e me diga que diabos é o que te inquieta tanto.
—Disse que estaria aqui a hora de jantar —espetou, sem dar-se conta do que dizia. —Tinha coisas que fazer.
— Bom, de todas formas não é meu assunto. Sara...
— Sara já me deu sua opinião.
A irmã que recordava Logan como uma jovencita ruiva e tranqüila, converteu-se em uma mulher preciosa, de largas pernas e cabelo encaracolado, que resultava tão pouco calada e tranqüila como Hugo. E essa irmã, precisamente, havia-lhe dito que não lhe parecia boa idéia que beijasse a seu melhor amiga se não pretendia chegar a nada com ela.
Logan tinha estado a ponto de lhe dizer que não tinha intenção de fazer nada que pudesse lhe causar a menor dor, mas naturalmente não o fez. Entretanto, desejava ao Annie. Desejava-a com loucura e de fato estava surpreso consigo mesmo por ter sido capaz de controlar suas emoções até então.
—Levarei-te a casa.
— Já te hei dito que não o necessito.
—Mas pode que eu sim.
Annie ficou perplexa. Olhou-o, contemplou suas olheiras e pela primeira vez pensou que realmente não conhecia aquele homem, que ele tampouco era quem tinha sido. Mas apesar de que pretendia manter as distâncias, não foi capaz de resistir à tentação.
Tragou saliva e assentiu.
A tensão pareceu desaparecer automaticamente do rosto do Logan, que a acompanhou ao veículo de Leão.
Nessa ocasião, Annie não se empenhou em conduzir. A lua iluminava o caminho e ela procurou manter-se afastada dele para não roçá-lo sequer. Tinha passado vários anos construindo a vida que tinha, fazendo amigos, levantando o negócio, organizando-o tudo e avançando pelo caminho da responsabilidade. concentrou-se completamente nisso, como se queria apagar a jovem rebelde e extrovertida que tinha sido, e durante todo esse tempo se conseguiu convencer de que o tinha conseguido.
Entretanto, no curto espaço de três dias, sua vida tinha sofrido um tombo e não sabia se era pelo Logan, pela tormenta, pelo Riley ou pelas três coisas de uma vez.
perguntou-se por que seguia empenhado em dormir em sua casa. Compreendia que não queria fazê-lo em casa do Hugo porque se levava mal com ele, mas já que Sara tinha retornado, podia alojar-se com ela.
Em qualquer caso, sabia que teria sido capaz de lhe rogar que ficasse a seu lado. Aquele homem gostava de muito por muito que tentasse negá-lo.
Quando chegaram à casa, Annie se desceu do veículo. Logan não a seguiu. afastou-se antes de que ela pudesse entrar na casa, como se não tivesse razão alguma para ficar.
Annie entrou, dirigiu-se ao dormitório e se agachou para tirar de debaixo da cama a bolsa onde guardava o fio e as agulhas de costurar; lhe tinha solto um botão. Mas em lugar disso, trocou de opinião e tirou as caixas com as fotografias.
Depois, decidiu sair ao mole e se sentou na tumbona a contemplar sua vida inteira em imagens.
Nem sequer tinha terminado o primeiro álbum, quando seus olhos já se encheram de lágrimas.
— Annie?
Era Logan.
— Sinto aparecer assim, mas bati na porta e não respondia...
Annie fechou os olhos para dissimular sua emoção. —Pensava que te tinha partido...
— Sim, mas tornei. Podemos entrar um momento?
—Não, não quero fazê-lo. A casa está muito vazia.
Logan suspirou e se sentou. Depois, elevou-a como se fora uma menina e a sentou sobre seus joelhos para tentar animá-la.
—Annie... Não chore. Tudo se arrumará, já o verá.
—Não, não o fará...
Tinha perdido o controle da situação e estava chorando sem poder evitá-lo. E surpreendentemente, sem saber como nem por que, inclinou-se sobre ele e o beijou nos lábios.
A boca do Logan estava fria como a noite.
—Annie...
—me beije.
Logan gemeu e ela desejou voltar a saboreá-lo, voltar a tocá-lo, sentir aquelas mãos em seu corpo.
—me beije —repetiu.
—Quero muito mais que um beijo, Annie. Você não é...
Annie o interrompeu tomando a iniciativa e beijando-o outra vez.
—Eu também quero mais —disse em um sussurro—. O quero tudo.
Logan tomou a cara do Annie entre suas mãos e a obrigou a olhá-lo. Os olhos do homem pareciam tão escuros como o céu noturno, mas não resultavam menos intensos por isso.
— Está segura?
Ela assentiu.
-Sim.
Esperava que Logan devorasse sua boca, mas a beijou suave e docemente, como provando.
Annie não queria isso. Não queria que a tratasse com delicadeza.
—Logan...
—Não diga nada.
Logan elevou uma mão e lhe secou as lágrimas com um dedo. Depois, inclinou-se sobre ela e a beijou na comissura dos lábios com uma infinita doçura da que nunca lhe teria acreditado capaz.
—Não te farei mal —disse.
De ter tido forças para isso, Annie se teria rido. Mas se limitou a ficar em silêncio, deixando que a acariciasse e que explorasse os rasgos de sua cara e a curva de seu pescoço, baixando pouco a pouco para a parte superior de seus seios.
Aquilo era uma verdadeira tortura.
—É tão bela... Mais bela que nunca.
Nesse momento, Annie recordou a noite da festa das bodas do Will. Então também lhe havia dito que era muito bonita, mas para acrescentar depois que também era uma menina mimada e egoísta.
—Não pensemos no passado —disse ela—. O passado já não existe.
—É certo. Já não existe. foi-se.
— me faça o amor, Logan. me faça o amor agora...
Annie não perdeu o tempo. tirou-se o vestido por cima da cabeça e deixou que caísse ao chão. Mas debaixo levava uma camiseta.
Logan se inclinou e começou a beijá-la no ventre e nos seios enquanto se trabalhava em excesso por tirá-la camisa. Entretanto, aquilo não era suficiente para ela. Queria senti-lo nua, sem barreira alguma.
Lhe ajudou com a camisa e ele fez o próprio com a camiseta do Annie, que sentiu frio. Supôs que devia ter um aspecto muito estranho; já só levava o prendedor, as braguitas e os sapatos com meias três-quartos brancos.
Ato seguido, Logan tomou em braços e a levou a interior da casa. dirigiu-se diretamente a seu dormitório, sem tropeçar com nada apesar da escuridão, e Annie quase agradeceu que a falta de eletricidade os ocultasse. Desse modo se sentia menos coibida.
Deixou-a sobre a cama. Depois, tirou-lhe os sapatos e os meias três-quartos e a beijou nas pernas.
—Logan, não sei se puder...
—Tranqüila. Nos tomaremos com tanta calma como quer. Faremos o que necessite.
Annie precisava superar o passado, tirar-se de dentro tudo o que tinha acumulado durante anos. E isso se podia expressar de uma forma tão direta como singela:
—Necessito a ti.
arqueou-se contra ele, tentando-o, e ele a beijou de forma apaixonada. Era uma sensação maravilhosa, única, imensamente sedutora. E quando ao cabo de uns minutos se apartou um pouco, só pôde ouvir suas aceleradas respirações; um som que a acompanharia o resto de sua vida.
—Ainda podemos nos deter se quiser...
A voz do Logan soava rouca.
— Ainda? —perguntou ela, embora não queria deter-se.
—É obvio que sim. Se não estar preparada, podemos deixá-lo.
— nota-se que é mais forte que eu —disse, arqueando-se outra vez—. Porque eu não poderia me deter embora quisesse.
Ele começou a beijá-la e a acariciá-la; essa vez, sem conter-se.
Cobriu de beijos seus ombros, suas coxas e seus seios. Depois, introduziu uma mão entre suas pernas e acariciou brandamente o sexo do Annie. Estava tão excitada que acreditou que ele poderia ouvir os batimentos do coração de seu coração. Não era precisamente virgem, mas a todos aquilo efeitos era novo para ela. Nunca tinha experiente nada tão intenso.
— Seguro que quer que sigamos?
-Sim.
—Em tal caso...
Logan se tombou a seu lado e estiveram beijando-se e acariciando um bom momento, apertados o um contra o outro, até que ele se apartou repentinamente e disse:
—Espera um momento.
Annie não demorou para comprovar por que se afastou. Tinha tirado um preservativo e o tinha posto.
—Pensa em tudo —disse ela, divertida.
—É obvio. Sempre terá que estar preparado.
A partir desse momento não houve mais palavras. Não houve nada salvo gemidos, ofegos e a sensação do contato de seus corpos.
Annie pensou que provavelmente Logan podia proteger a de si mesmo. Mas enquanto se amavam, enquanto a noite transcorria entre beijos e carícias, também pensou que ela também podia protegê-lo a ele.
Annie abriu os olhos, sobressaltada. incorporou-se levemente, apoiando-se nos cotovelos, e Logan lhe acariciou o cabelo.
— Encontra-te bem? —perguntou.
Ela ficou calada um momento. Não sabia o que a tinha despertado, mas a casa estava em silêncio e não se ouvia nenhuma tormenta no exterior. Pela luz da habitação, supôs que estava a ponto de amanhecer.
—Sim, estou bem.
Annie o olhou e esqueceu o sobressalto imediatamente. Sua visão bastou para excitá-la outra vez, para fazer que o sangue voltasse a percorrer suas veias.
Seu cabelo parecia mais escuro que nunca contra o travesseiro branco, e seu corpo resultava de um moreno acobreado contra os lençóis. Mas por muito atrativo que fora, o que a voltava completamente louca não era seu corpo a não ser aquele olhar intensamente íntimo, como um raio de sol que abrisse suas pétalas.
deixou-se levar pelo desejo e se inclinou sobre ele até que seus lábios estiveram a escassos milímetros da boca de seu amante. Depois, dobrou uma perna sobre seu corpo e apertou os seios contra seu peito. Ele levou as mãos a seus quadris e a penetrou brandamente.
Logan gemeu. Apertou os dedos sobre o corpo do Annie, que gritou sem poder evitá-lo, e os dois começaram a mover-se ao uníssono, como se fossem uma única pessoa.
Ao parecer, a realidade era melhor que os sonhos.
LOGAN aproveitou que Annie seguia dormida para lhe preparar um banho quente. Quando ela despertou e foi ao quarto de banho, surpreendeu-se ao descobrir o inesperado gesto de ternura e mais ainda ao vê-lo com gesto arrasado e carregando duas caçarolas repletas de água quente. inclinou-se para frente e o abraçou enquanto pensava que até o homem mais prático podia atuar como um autêntico inexperiente.
—Olá —disse ele, enquanto deixava as panelas no chão—. De ter sabido que encher a banheira ia custar me tanto trabalho...
Annie sorriu com cumplicidade, acariciou-lhe uma bochecha e se apartou para tirar o penhoar e meter-se na água. sentou-se lentamente e recostou as costas contra a banheira. A sensação era tão prazenteira que, embora estava ansiosa por ir ao centro social a procurar o Riley, suspirou e se convenceu de que não passaria nada se se esperava um pouco mais.
—Obrigado. Sinto-me como se estivesse no paraíso... — murmurou — . te Coloque comigo, Logan. A água está perfeita.
—Esquentei-a para ti... —desculpou-se.
Ela se inundou na banheira até que a água lhe roçou o queixo e sorriu com picardia.
—Há espaço suficiente para ambos —afirmou—. Vamos, entra e deixa que te ensaboe as costas.
—E o que posso te fazer em troca?
—O que queira —respondeu Annie, mordendo o lábio inferior.
—De acordo. me faça sitio —ordenou ele enquanto se tirava as calças.
A mulher tragou saliva ante a visão; essa vez, não havia sombras nem matagais de lençóis nas que ocultar-se, só seu amante em toda a esplendorosa virilidade de sua nudez. Com um suspiro afogado, moveu-se para o centro da banheira.
Logan se meteu na água, abraçou-a pela cintura, atraiu-a para ele e agarrou o sabão.
— Ervas da ilha? —perguntou, cheirando a pastilha.
—É obvio.
—Cheira —lhe sussurrou ao ouvido.
Annie lhe tirou o sabão das mãos, deu-se a volta e recostou as costas contra o extremo oposto da banheira; sabia que se permitia que a tocasse com as mãos saponáceas, perderia o controle definitivamente.
—Quero ir procurar ao Riley quanto antes —disse.
— antes de que Kenny a encontre? —perguntou Logan enquanto lhe ensaboava as pernas—. Tranqüila, é cedo ainda. Despertamo-nos ao amanhecer e ninguém irá ao centro social até dentro de um bom momento.
—Em um dia normal, trabalharia no campo antes de abrir a loja...
Então, sentiu que Logan a estava acariciando e quis resistir.
— É que não te cansa alguma vez?
Ele a olhou com malícia, recuperou o sabão e a rodeou com suas pernas.
—Nunca é suficiente... —assegurou.
Consciente das intenções do Logan, Annie se levou os joelhos ao peito e se enxaguou as coxas com determinação. Ele riu enternecido pelo pudor que mostrava com semelhante gesto.
Depois de jogar durante alguns minutos a disputar o sabão, Logan aceitou a contra gosto usar o barbeador elétrico do Annie para barbear-se. Depois, observou-a com aberta fascinação enquanto ela se depilava as pernas com uma destreza admirável.
Annie se sentia um pouco envergonhada pela situação. Talvez banhar-se com um homem era algo comum para outra mulher; para ela, em troca, não. Jamais se havia sentido tão exposta nem tão endiabladamente feliz.
Mas apesar de todos seus temores, convenceu-se de que o melhor era atuar com naturalidade.
— Como é um dia normal para ti? — perguntou enquanto se umedecia o cabelo para lavá-la cabeça Quero dizer, como é quando não está apanhado em uma ilha que odeia, tratando de convencer à filha de um amigo para que retorne a casa?
Annie tinha falado em tom amigável e sorria de maneira zombadora; entretanto, aquela pergunta inocente, tinha servido para lhe recordar ao Logan que seus dias no Turnabout estavam contados.
—É mais normal do que crie —respondeu.
Ato seguido, o homem lhe alcançou uma caçarola com água poda para que se enxaguasse o cabelo e sem dizer uma palavra mais, ficou de pé. inclinou-se para frente com intenção de ajudá-la a sair da banheira, mas se deteve o ver que Annie o olhava com seus grandes e preciosos olhos verdes.
Aquele olhar que misturava medo e fascinação era capaz de derreter um iceberg. Logan compreendeu que era melhor que se afastasse dali quanto antes. Saiu da banheira e se desculpou:
—deixei água no fogo.
Com a esperança de que não se consumou, envolveu-se em uma toalha e saiu do quarto de banho.
Ao chegar à cozinha descobriu que a água não se evaporou mas que a chama estava apagada. O bujão de gás estava vazia e só ficava uma mais.
Logan suspirou e amaldiçoou em voz baixa. Infelizmente, Turnabout não tinha população suficiente para justificar que se solicitasse assistência ao governo nacional e ainda por cima, para desgosto do Sam, os vereadores da ilha tinham assegurado a todas as organizações de emergências que estavam em condições de agüentar a situação por seus próprios meios. Mas a realidade era bem distinta; nem se tinham ocupado de reparar o sistema elétrico nem tinham feito nada por conseguir provisões. Quão único tinham obtido, e com acréscimo, era ganhar o ódio da população.
Ele não tinha dúvidas sobre quão acertado tinha sido partir da ilha; nunca o tinha duvidado. Tinha retornado ao Turnabout por um motivo concreto e com a absoluta certeza de que sairia dali assim que resolvesse o problema. A tormenta, é obvio, não teria sido nenhum obstáculo para ele.
Entretanto, não podia negar que se sentia muito mais inquieto ante sua marcha do que tinha imaginado.
Respirou fundo e se passou uma mão pela cabeça. Quão único tinha que fazer era retornar ao quarto de banho, atrair ao Annie por volta dele e evitar qualquer pensamento prudente durante um momento. Entretanto, preferiu esperar. Levantou o bujão vazio, deixou-a a um lado com inapetência e se deu a volta.
Ela acabava de entrar e estava de pé na porta da cozinha, envolta em uma toalha e olhando-o com inquietação.
—Está molesto —disse ela.
Logan tentou ocultar a frustração que sentia.
—Não —respondeu.
Os olhos do Annie se posaram no bujão durante uns segundos.
— Sabe que pode falar comigo do que seja, Logan.
O comentário desatou os alarmes dos dois. colocaram-se na pele do outro até voltar-se quase inseparáveis, mas em realidade nunca tinham falado de seus sentimentos.
—Não estou zangado —insistiu ele.
Annie entrecerró os olhos e assentiu com resignação.
— Será melhor que vá procurar ao Riley. — Isso é tudo? —exclamou Logan— Não vais discutir nem a questionar nada do que digo? Só vais acatar e a atuar como se nada tivesse passado?
Ao ver o gesto pesaroso do Annie, ele sentiu que lhe partia o coração.
— O que é o que quer de mim, Logan?
—Quero que deixe de atuar como se a vida fora a te castigar se te equivocar; quero que deixe de esconder a cabeça como uma avestruz...
Annie logo que podia conter o pranto; seus preciosos olhos verdes brilhavam como duas esmeraldas recém polidas.
—A vida já me castigou, Logan. E a verdade é que eu gosto de muito mais a Annie que sou agora que a que estava acostumado a ser. Você pode dizer o mesmo? — replicou ela, movendo a cabeça de um lado a outro—. Não faz falta que responda, sei que não diria nada. Pode vir aqui, te fazer o herói porque Riley está angustiada, passar algum bom momento com a boa do Annie, ou melhor dizendo, com a pobre e parva do Annie, e logo te largar de novo com a sensação de que cumpriste com seu dever.
—Eu não hei...
— Deveria te olhar ao espelho, Logan. Necessita tanta ajuda como o resto dos mortais. Alguma vez permitirá que ninguém te conheça tal qual é? Alguma vez abrirá sua alma e seu coração?
—Tenho-te aberta minha alma e meu coração, Annie — assegurou ele, em tom lento.
Ela parecia assustada e triste, a julgar pelo gesto de sua boca.
— Acredito que os dois sabemos que há parte de verdade nessa afirmação. Entretanto, apesar do que fazemos juntos, há muitas coisas que não sabemos. Muitas coisas que ocultamos —disse e desviou o olhar para o chão—. Você e eu somos tão parecidos, Logan. Nunca o tinha notado, mas agora o vejo claramente.
—Você não te parece em nada a mim.
Para ele, Annie era alguém que semeava, cultivava, colhia e começava de novo. Alguém que construía. Ele, em troca, destroçava-o tudo.
—Você abre o coração só até onde te resulta cômodo —afirmou ela—, mas isso não basta. Fecha-te e não te deixa levar por seus sentimentos porque teme que lhe machuquem.
—Nada nem ninguém me machucou.
— Em minha opinião, Logan Drake, sofre muito mais que qualquer de nós.
Ele a percorreu com o olhar.
— Se algo me machuca é desejar tanto o que se oculta baixo essa toalha.
Annie tragou saliva e, ante os surpreendidos olhos de seu amante, levou-se uma mão ao peito, liberou-se da toalha e a deixou cair ao chão. Depois, caminhou para ele; tinha um corpo precioso, um verdadeiro festim de pele e curvas femininas. Logan não dava crédito a seus olhos quando pôde reagir, tinha as costas pega a encimera e os seios do Annie apertados contra seu peito nu.
O que te está machucando, Logan, está aqui — sussurrou e lhe apoiou uma mão no peito à altura do coração —. Aqui.
Embora o contato era apenas um roce suave e ligeiro, ele sentia como se o estivessem atiçando com um ferro candente.
Ato seguido, ela se deu a volta para recolher a toalha e partiu a seu dormitório. Uns segundos mais tarde, Logan a ouviu fechar a porta.
Depois de um comprido momento em silêncio, obrigou-se a ir até a sala a procurar um pouco de roupa com a que vestir-se. Quando Annie apareceu na porta principal, ele estava esperando fora. Parecia surpreendida de vê-lo ainda ali, mas não disse nada. Tampouco fez comentário algum enquanto caminhavam para o carro de Leão, que Logan tinha estacionado a um lado da estrada a noite anterior.
Tudo parecia indicar que seria um dia quase primaveril; o sol que aparecia pelo horizonte começava a esquentar o ambiente, não havia nuvens à vista e soprava uma brisa suave e agradável. Entretanto, o ambiente entre eles era sombrio e carregado de tensão.
Subiram ao veículo e se dirigiram ao centro social. Ao chegar viram uma coluna de fumaça saindo da chaminé. Alguém tinha armado várias mesas largas fora, repletas de cubos com laranjas, uvas e damascos. Também havia uma grande cesta com pão-doces e uma bandeja com ovos mexidos.
Ao menos o gerador de eletricidade estava funcionando. Diego tinha um bom fornecimento de combustível no porto.
Maisy, que parecia ser a chefa da operação, fez- um gesto ao Logan e disse:
— chegaste bem a tempo. Vêem me ajudar com estas mesas. Necessitamos mais espaço.
Logan não tinha vontades de voltar a ver seu pai, mas não ia desprezar ao Maisy só porque estivesse com ele. Annie olhou ao grupo, saudou entre dentes e entrou em edifício. Maisy tomou ao Logan do braço e lhe explicou como estava organizando tudo.
—George está preparando o café da manhã aqui. A cozinha de meu local não funciona. Além disso, se não consumir os mantimentos perecíveis logo, teremos que atirá-los —argumentou a mulher—. Para o caso, é melhor usar o gerador. Meus clientes chegarão em qualquer momento.
Naquele instante, Annie apareceu na porta.
— Logan, Riley não está —disse, pálida—. Nem sequer dormiu aqui.
— Vi-a esta manhã, Annie —afirmou Maisy—. Faz um momento estava na praia com esse menino, Hobbes...
—Kenny —balbuciou Annie, tensa.
Depois, voltou-se para ir procurar a sua sobrinha, mas Logan a agarrou por um braço para detê-la.
—É minha culpa—exclamou ela, com gesto desesperado—. Deveria havê-la levado a casa comigo.
Com um movimento brusco se separou do Logan e saiu correndo para a praia. Quando estava a metade de caminho, acelerou o passo e gritou:
— Não! te afaste dela!
Logan soltou um palavrão e saltou o mole de pedra, preparado para o pior. Annie se tinha arrojado sobre os adolescentes e tinha afastado ao Kenny de sua sobrinha de um empurrão. Riley estava chorando desconsoladamente mas, além das lágrimas, parecia estar sã e salva.
Annie se voltou para o Kenny e o agarrou pela camiseta.
—O que lhe tem feito? —perguntou, furiosa.
Apesar de que era vários centímetros mais alto que ela, o menino parecia aterrorizado.
—Eu não... —balbuciou enquanto tratava de escapar.
Annie avançou sobre ele com gesto ameaçador.
—Maldito seja, Drago —exclamou—. O que tem feito?
Logan a agarrou pela cintura e a separou do Kenny.
—Ele não é Drago —lhe sussurrou ao ouvido—. Não é Drago, preciosa.
Ato seguido, olhou ao moço e ao ver que tentava escapar, ordenou-lhe:
—Não te mova.
Embora tinha que lutar com a resistência do Annie, a voz do Logan soava notavelmente acalmada. Kenny não lhe caía bem, mas não podia permitir que Annie cometesse uma loucura.
— Está bem? —perguntou ao Riley.
A jovem estava olhando a sua tia com a boca aberta. Tinha os olhos cheios de ódio e rebeldia e parecia disposta a escapar, mas não o fez. Simplesmente, assentiu com a cabeça.
— Quem demônios é Drago? —perguntou Kenny, desconcertado.
Mas Annie estava muito concentrada em livrar-se do Logan para ouvi-lo.
—Juro que se lhe houver meio doido um cabelo a minha sobrinha, terá que as verta comigo.
Logan a aferrou com mais força e a amaldiçoou quando, no meio da resistência, deu-lhe uma patada em um tornozelo.
—te acalme, Annie. Estou tratando de te ajudar.
— Então, me solte!
— Só estávamos falando! —Afirmou Riley a gritos—. Está louca, Annie. Louca.
— Falando? —Replicou a mulher em idêntico tom—. Está chorando, Riley.
Os olhos da jovem pareciam duas safiras úmidas.
— Sim, falando! Ele pelo menos me escuta. Você só quer me enviar de retorno a casa para poder desfrutar das postas de sol com esse homem — disse, assinalando ao Logan.
De repente, Annie deixou de lutar.
— Não —respondeu —. Riley, isso não é...
—Vi-lhes juntos —a interrompeu sua sobrinha—. Retornei porque por fim me sentia em condições de te dizer o que sei, mas estava com ele.
— Voltou para a casa?
Logan sentiu a consternação que sacudia ao Annie para ouvir sua sobrinha.
— Quando, Riley? —perguntou.
—Sua roupa estava no estou acostumado a —disse a garota, olhando-o com ódio—, estava em sua habitação... Não terá que ser um gênio para saber o que estavam fazendo ali.
Fez uma pausa, respirou fundo e dirigindo-se a sua tia, adicionou:
—Não me surpreende que dissesse que podia ficar no centro social. Queria te liberar de mim, sempre quiseste fazê-lo!
—Isso não é certo, minha vida —replicou Annie.
— Não me minta! Estou farta de que todos me mintam!
Annie se tinha inclinado para abraçar a jovem, mas se conteve para ouvir a acusação.
—Ninguém te está mentindo —afirmou, com a voz engasgada—. Riley, carinho...
—Todos me estão mentindo. Minha vida inteira é uma mentira! Ninguém me quer perto. Você me quer fora da ilha. Meus pais pretendem me enviar a um internato para esquecer-se de que existo.
—Riley, sabe que isso não é verdade. Eles lhe querem. Eles...
—Eles amam seus trabalhos —alegou a garota—. William Hess, nascido para ser o novo fiscal general. Todos me repetem uma e outra vez quão grandioso é. Se de verdade fora tão preparado e tivesse tanto talento como dizem, teria notado que nossa casa deixou de ser um lar faz muito tempo. Sempre há dito que fomos o mais importante para ele, mas mentia e converteu a casa no quartel geral de sua campanha eleitoral.
—Mas isso se acabará assim que passem as eleições — assegurou Annie.
— Seja como for, nunca está em casa. Quanto a minha mãe, sempre está ocupada tirando algum cliente do cárcere, às vezes nos passamos vários dias sem nos ver —disse Riley com a voz quebrada—. Lhe adverti que o lamentaria, mas não lhe importou...
Logan se estremeceu ao compreender o que acontecia.
—foste você quem enviou essas cartas, verdade, Riley? —perguntou ele.
— Que cartas? —disse Annie com um fio de voz.
A jovem olhou ao Logan com atenção e confessou.
—Sim, fui eu, mas ao parecer não serviram de muito —declarou entre lágrimas — . Fiz o impossível para que se fixassem em mim, mas nem mesmo assim consegui lhes chamar a atenção. Utilizei os envelopes de minha mãe, cortei as letras das revistas de meu pai e nada. Muito observadores, não te parece?
—Will jamais teria pensado que sua própria filha podia encontrar-se entre os suspeitos —observou Logan.
— Suspeitos? —insistiu Annie, visivelmente desconcertada.
— Eu não sou filha do Will! —gritou Riley. Depois, olhou ao Annie e com as bochechas umedecidas pelo pranto, adicionou:
— Sou filha dela.
ANNIE sentiu que lhe afrouxavam as pernas ao inteirar-se de que Riley sabia a verdade. Estava tão aturdida que logo que notou que Logan a tinha solto; estirou uma mão para tratar de alcançar a sua sobrinha, à filha que não tinha podido reclamar em todos esses anos, mas a jovem retrocedeu para impedir que a tocasse.
—OH, Riley...—murmurou.
— Vê-o? mentiste —disse a garota, compungida—. Eles mentiram. Todos mintam. Todos.
Annie pensou que Riley tinha razão. Todos lhe tinham mentido, ou ao menos, não lhe haviam dito a verdade.
— Como te inteiraste?
—Pela avó Hess. Veio a me buscar ao instituto o dia que fiz quinze anos e me contou —explicou isso Riley —. Não te parece encantado de sua parte? Luzia Hess não tinha tido um só gesto de generosidade em sua vida. Se essa vez tinha recorrido à , verdade tinha sido por simples crueldade: sabia que hiriendo ao Riley machucaria ao Annie.
— O que te contou? —disse Annie com voz trêmula.
— Tudo.
Riley fez uma pausa para olhar ao Kenny, que observava a situação com receio e fascinação, e continuou:
— Queria saber quem demônios era o tal Drago? — perguntou-lhe.
Annie sentiu que ia vomitar e rogou em silêncio para que Riley não seguisse adiante com suas revelações.
— É meu pai —disse a garota—. A avó acreditou que tinha direito ou seja que meu verdadeiro pai está na prisão por tráfico de drogas.
O jovem a abraçou e a levou do lugar. Annie se levou uma mão à boca e tratou de segui-los, mas Logan se interpôs em seu caminho.
— Deixa que se vá, Annie.
— Mas ele é...
— Ele não é Drago —afirmou Logan, olhando-a aos olhos—. Tampouco eu gosto de Kenny, mas de momento, é a única pessoa com a que Riley não está molesta.
— Como pôde minha mãe fazer algo semelhante? Ferir o Riley? Ela jamais tem feito nada mau a meus pais, nunca os envergonhou nem lhes faltou ao respeito. Não é mais que uma menina inocente —soluçou e se deixou cair de joelhos na areia—. Como pôde, Logan? por que?
Logan se sentou a seu lado mas não tratou de tocá-la; parecia só querer rodeá-la, protegê-la. Annie agradeceu a delicadeza de seu gesto, mas naquele momento sentia que já nada podia protegê-la.
—Riley não pode seguir castigando ao Will e ao Noelle. Apesar do que Riley cria, Logan, querem-na como se fora sua própria filha —afirmou—. Às vezes, confiar nesse amor é o único que me mantém viva.
— Riley é inteligente, Annie. Está sofrendo, mas assim que descobriu a verdade veio a te buscar.
—E lhe tornei a falhar.
— Como? Por não ler sua mente? Vamos, preciosa, não podia saber...
— Sabia que havia algo mais, pressentia-o. Não era só que não queria ir ao Bendlemaier, havia outro motivo.
—Provavelmente, queria te julgar com seus próprios olhos. Se tivesse acreditado em todas as barbaridades que lhe disse Luzia, não teria vindo aqui.
— E em lugar de desmentir as palavras de minha mãe, Riley comprovou que estava no certo...
—O que descobriu foram os fatos —disse Logan, enquanto ficava de pé—, mas não sabe a verdade porque desconhece as circunstâncias que rodearam a esses fatos.
Annie se passou uma mão tremente pelo cabelo e se endireitou, embora tomando cuidado de não olhá-lo aos olhos. Não podia, não tinha forças. perguntava-se qual era a verdade. Os poucos dias que Logan tinha passado com ela tinham bastado para que se metesse sob sua pele. Entretanto, iria e a deixaria em meio de uma solidão insuportável. Tinha aceito converter-se na tia do Riley porque sabia que era o melhor para sua filha mas, naquele momento, sentia que a muralha que tinha construído para reprimir a pena se desmoronava ante os sensíveis olhos de seu amante.
— A verdade é que Will e Noelle adotaram ao Riley quando tinha dois anos —explicou Annie —. E sempre a quiseram como se fosse sua filha.
— Mas por que não lhe disseram a verdade? O que tinha de mau que soubesse que foi sua mãe biológica? Estou seguro de que teria entendido que foi virtualmente uma menina quando nasceu —afirmou ele, tomando a do queixo para forçá-la a olhá-lo —. Quantos anos tinha? Dezoito?
— Sim e vinte quando reconheci a verdade —respondeu ela, com crueldade—. A verdade era que era incapaz de lhe brindar ao Riley a classe de cuidados que se merecia. Adoeceu, Logan, teve uma infecção respiratória que poderia a haver matado e eu era muito pobre para pagar um bom médico e muito orgulhosa para pedir ajuda à segurança social. Desde não ter sido pelo Will e Noelie...
Ao Annie lhe fez um nó na garganta ao recordar aquela tremi e dolorosa época.
E seus pais não lhe ajudaram? —perguntou Logan.
— Brinca? Quando descobriram que estava grávida, trataram de me obrigar a abortar. Não queriam que o sangue dos Hess se mesclasse com a de Drago. Quando me neguei a fazê-lo, jogaram-me de casa. Estou segura de que acreditaram que como não tinha dinheiro nem trabalho faria o que queriam.
—Mas não o fez.
Ela se apoiou contra o muro de pedra que bordeaba a praia; tremiam-lhe as pernas e não estava segura de poder manter-se em pé muito mais tempo. Baixou a vista e se concentrou em suas mãos.
— Sempre fiz o que queriam, Logan, mas pela primeira vez havia algo que importava mais que satisfazer os desejos de meus pais. Estava grávida, ia ter um filho, um bebê inocente —relatou, com voz trêmula—. Sei que era muito jovem para ser mãe, mas era meu corpo e tinha direito a decidir o que fazer com ele. Sabe o que foi o último que me disse minha mãe? Que era tão inútil que seria incapaz de me fazer carrego de uma criatura.
— E o que fez?
Embora Annie levava anos sem falar sobre aquela época, a lembrança era tão vivida que parecia ter ocorrido no dia anterior.
—Will e Noelle me ajudaram a encontrar um pequeno piso e se ocuparam de pagar o aluguel os primeiros meses. Depois, neguei-me a que seguissem fazendo-o porque não queria viver de sua caridade eternamente. ia ser mãe e tinha que assumir minhas responsabilidades —rememorou Annie—. Tratei de conseguir um bom trabalho mas foi impossível; tinham-me jogado do instituto porque não queriam estudantes grávidas e não tinha referências trabalhistas, assim menti a respeito de minha idade e consegui um trabalho como garçonete em um bar próximo à universidade, aproveitando que ao dono lhe importava mais como preenchia o uniforme que o bem ou mau que servisse as taças. Tive que renunciar quando o embaraço se começou a notar, mas para então tinha conseguido juntar algumas economias e podia pagar o aluguel por minha conta. Além disso, aos poucos dias consegui outro trabalho no que não importava tanto a figura.
— Sara estava a par do que ocorria?
— Sara foi meu anjo da guarda —disse, emocionada—. Riley nasceu o dia em que se supunha que ela devia apresentar-se a seu exame final. Tinha prometido estar comigo e não se separou de meu lado até que nasceu a menina.
— Sara, sempre tão leal...
—Riley era um bebê maravilhoso, Logan. Todo o fazia antes de tempo. Andar, falar —contou ela com a voz quebrada—. Sabia que se merecia mais do que podia lhe dar, mas não podia. Era muito egoísta.
—Não há nem um grama de egoísmo em ti.
Annie moveu a cabeça em sentido negativo.
— Havia-o, me acredite. Depois, ela adoeceu e, como sempre, Will e Noelle estiveram ali para me ajudar. E pensar que estava tão ciumenta do Noelle quando se casou com meu irmão...
Logan assentiu com um gesto.
—Acreditava que ia roubar me a minha família, mas estava equivocada —continuou Annie—. Ela foi maravilhosa e muito mais amável do que me merecia. Às vezes ficava cuidando do Riley quando eu tinha que trabalhar. Estava preparando sua tese doutoral V sabe quão duro é isso; entretanto, sempre esteve aí para me ajudar com a menina.
— Sim, são todos uns Santos...
Havia certo sarcasmo no tom do Logan. morria de vontades de estrangular ao George e Luzia Hess e, certamente, não lhe faltavam vontades de fazer um pouco parecido com o Will e Noelle.
—O que não acabo de compreender é por que não se limitaram a te ajudar com o Riley —declarou—. Ou por que, ao menos, não lhe contaram que foi sua mãe antes de que o averiguasse por sua conta. Tinha direito ou seja a verdade.
— Porque fui eu quem lhes suplicou que a levassem! —Gritou Annie, cobrindo-a cara por vergonha—. Quase morre porque eu não me dava conta de quão doente estava. Não estava a salvo comigo! Tudo o que meus pais me tinham advertido era certo. o melhor que podia fazer era deixar ao Riley com gente que fora capaz de ocupar-se dela. Ao Noelle bastou lhe jogar uma olhada para nos levar diretamente ao hospital. Ela sabia como ser mãe. Eu, não.
-E Drago?
Annie pôs cara de asco, como se ouvir esse nome lhe provocasse náuseas.
— Estava na prisão. Nunca o contei. Não tornei a falar com ele desde aquele dia, depois das bodas do Will. Nem sequer lhe dirigi a palavra quando nos prenderam o dia seguinte.
Logan se estremeceu para ouvi-la. — Não tornaste a ver o Iván Mondrago? Jamais?
—Quando saiu do cárcere quis ir à casa, mas meu pai tinha contratado a um guarda de segurança para impedir que se aproximasse e para garantir que eu não saísse dali —respondeu Annie—. Acredito que sempre acreditaram que estava envolta no assunto do tráfico de drogas.
deteve-se um momento e o olhou aos olhos.
— Compreende por que não queríamos que Riley soubesse que sou sua mãe, Logan? Teria perguntado quem era seu pai biológico e não queríamos que se inteirasse de que era filha de um delinqüente.
Ele desviou a vista por volta do mar, mas em sua mente tinha a imagem do Annie quase dezesseis anos atrás. Não podia deixar de pensar no que tinha sentido ao entrar nela. Estava seguro de que então era virgem; por isso não compreendia por que Annie insistia em que Drago era o pai do Riley se assegurava que não havia o tornado a ver depois das bodas.
Ninguém tinha feito o amor com ela antes que Logan, mas Annie parecia havê-lo esquecido.
—Tenho que ir buscá-la —disse a mulher—. Falar com ela, lhe contar...
— lhe contar o que?
—Não sei, mas não posso permitir que siga acreditando que não é importante para seus pais —afirmou Annie, antes de partir.
Logan a observou enquanto se afastava e depois se sentou com o olhar perdido no oceano. Estava aturdido; Riley acreditava sabê-lo tudo, mas nem sequer a própria Annie conhecia completamente a verdade. Ele, sim: Riley era sua filha. E se Annie considerava que Drago era um pai inapropriado para a pequena, Era-o temia o que poderia chegar a pensar se se inteirava de quem era ele com exatidão.
Naquele momento apareceu Sara e se sentou a seu lado.
— O que acontece? —disse—. Tem cara de ter perdido a seu melhor amigo.
—Não tenho amigos —respondeu ele, sarcástico.
Sara sorriu, agarrou-o por braço e recostou a cabeça sobre o ombro de seu irmão.
—Lembrança que estávamos acostumados a nos sentar aqui antes de que te partisse da ilha.
—Mas se só foi uma menina...
— Sim, mas me lembro —insistiu ela—. Nos sentávamos aqui e lhes jogávamos pão aos pássaros. Eram bons tempos.
— Bons tempos?
Logan quase não recordava nada salvo o sofrimento de sua mãe e quão horríveis eram seus pãozinhos, mais apropriados para lhe dar de comer aos pássaros que para tomar o café da manhã.
— por que retornou, Sara? Licenciaste-te na universidade com diploma de honra, poderia ter ido a qualquer outra parte.
Ela suspirou e Logan viu como percorria o oceano com seus olhos azuis. Os mesmos olhos azuis do Riley. Seus mesmos olhos azuis.
perguntou-se como não o tinha notado. Desde que sabia a verdade, começava a ver o parecido. Riley tinha o cabelo encaracolado e a cor da pele do Annie, mas as sobrancelhas, o queixo afiado e os olhos eram uma clara herança dos Drake.
—Turnabout é um lugar interessante —respondeu Sara, finalmente—. Parece um pouco detido no tempo, mas até nisso tem seu encanto. Há muito por fazer, sem dúvida. Precisamos encontrar alternativas para resolver o problema da eletricidade. Mais geradores, uma planta de energia solar ou algum sistema de energia eólica que nos permita aproveitar o vento permanente da ilha.
— Deveria trabalhar na prefeitura. Ninguém como você para tirar este lugar da pré-história.
—Não tudo é mau, Logan. Não sei, eu sinto que Turnabout tem uma mística muito especial, algo irresistível. Além disso, esta é minha casa.
Para ele, aquela ilha só tinha más lembranças.
—A estas alturas, deveria estar casada e com filhos —opinou.
Sara não saía de seu assombro.
— Casada e com filhos? Falas como papai.
— Que horror!
—Poderia dizer o mesmo de ti —assinalou ela—, mas suponho que está muito ocupado com sua vida de intrigas e mistérios para ter esposa e filhos. A menos que os esteja ocultando em alguma parte por temor a que se apaixonem por uma ilha a que odeia.
Logan fechou os olhos e tragou saliva.
—Papai te sente falta de... —comentou Sara, depois de um comprido silencio.
Mas Logan fez caso omisso do comentário. Não podia pensar nem no Hugo nem no Turnabout nem em sua irmã pequena.
—Riley sabe que Annie é sua mãe biológica — disse, abruptamente.
Sara se levou uma mão à boca e o olhou angustiada.
—meu deus —murmurou—. Mentiria se dissesse que me surpreende; cedo ou tarde Riley o ia descobrir.
Então, Logan lhe contou o que tinha feito Luzia.
—Essa mulher é uma arpía —afirmou a menor dos Drake—. E você como te inteiraste? Contou-lhe isso Annie?
— Sim, mas porque não teve mais alternativa. Estava presente quando Riley lhe há dito que sabia a verdade.
Depois de dizer isso, olhou a sua irmã com ternura e adicionou:
—foste uma boa amiga para ela.
Sara pareceu entristecer-se ante o comentário.
— Ela também o foi para mim —assegurou—, embora eu não tenha tido que atravessar uma situação como a sua.
—Melhor assim.
— Posso perguntar que intenções tem com o Annie? —perguntou ela, divertida.
— Sabe que ódio que se metam em meus assuntos. —Logan...
— Sara... —replicou entre risadas e a beijou na cabeça—. Anda, vá procurar ao Annie, que necessita um amigo.
— E o que tem que ti? O que é o que você necessita?
Enquanto ficava de pé, Logan se disse que levava dezesseis anos necessitando o mesmo: redenção. Acreditava que a obteria ao voltar para o Turnabout mas, bem ao contrário, a volta à ilha só tinha servido para piorar sua condenação.
—Tomar o café da manhã —respondeu finalmente—. Preciso tomar o café da manhã.
Sara sorriu, embora com os olhos cheios de tristeza. Tinham passado anos sem ver-se, mas lhes bastava um olhar para dizer-se tudo.
— Está ali, hermanito, esperando. Só tem que estender a mão e pedir.
Ato seguido, a mulher se incorporou e partiu pela praia.
Logan colocou as mãos nos bolsos e olhou por volta do mar.
«Estender a mão e pedir», repetiu mentalmente.
Era fácil de dizer mas impossível de fazer.
O céu estava azul e já não ficavam rastros do temporal. Annie, em troca, ainda devia confrontar a pior das tormentas.
Não lhe custou encontrar ao Riley porque era a única pessoa que se achava no comilão do hotel do Maisy; outros se foram a tomar o café da manhã ao centro social. Cruzou o salão para o lugar onde a garota estava sentada. Era a mesma mesa em que tinham estado com o Logan o dia em que apareceu na loja.
Annie se perguntava como a vida de uma pessoa podia trocar tanto em questão de dias. A resposta era singela: a vida trocava todo o tempo, e em seu caso, tinha-o feito em uns poucos dias.
—A verdade sempre triunfa, Annie —estava acostumado a lhe dizer Will —. Deixa de te complicar a vida.
E não havia nada mais complicado para o Annie que cruzar esse salão, vendo como Riley a olhava com uma mescla de pena e receio que lhe partia a alma. Se para ela era uma situação difícil, sem dúvida, para o Riley era pior. Sempre o tinha sido.
—Teríamos que haver lhe contado —disse isso ao chegar à mesa.
-Sim.
Com os olhos avermelhados pelo pranto, Riley baixou a vista e se concentrou na laranja que tinha entre as mãos. Não disse nada mais, mas tampouco tentou partir. Annie se sentou na cadeira oposta e suspirou.
—Lamento ter acusado ao Kenny de te machucar.
— O fato de que leve um brinco no lábio não o converte em alguém perigoso.
—Sei —afirmou a mulher—. O sinto.
—Amava-o?
-A Drago?
—Não, ao Logan. Fez o amor com ele e você mesma me há dito que não te deita com homens aos que não ama. Acaso era outra de suas grandes mentiras?
— Sim —disse Annie, lacônica.
— Era mentira.
— Não, quero dizer que sim, que o amo —admitiu ela com a voz entrecortada.
Era certo; tinha-o amado em sonhos durante dezesseis largos anos. Amava que olhasse além da superfície, que a fizesse sorrir quando menos o esperava, que lhe preparasse um banho quente embora isso lhe supusera um enorme esforço e que a fizesse sentir mais viva que nunca quando a acariciava.
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E seguiria amando-o quando partisse, algo que certamente faria logo.
—Mas Logan não tem nada que ver com isto, Riley —assegurou, olhando como a garota jogava com a laranja—. Quando foi uma menina adorava tudo o que fora laranja. A fruta, as flores, a roupa. Tudo.
—pintei uma das paredes de minha habitação de laranja. Mamãe o odeia.
— Por isso o fez?
Riley não respondeu.
— Estava acostumado a fazer o impossível para zangar a meus pais —confessou Annie.
—Por isso ficou grávida? Para incomodá-los?
—Não, você foi algo totalmente inesperado.
—Um castigo... —murmurou Riley.
Annie a tirou da mão e a olhou aos olhos.
—Não, minha vida. Um prêmio, sempre foste um prêmio para mim.
— Então por que me abandonou? —perguntou sua filha, chorando.
—Porque te queria muito e não podia me ocupar de ti como te merecia.
—Poderia ter abortado; os avós nunca se teriam informado.
Annie não podia suportar ouvir o Riley falar do George e Luzia, mas não queria carregar a sua filha com o peso de saber que seus avós tinham sido os primeiros em lhe exigir que interrompesse o embaraço.
—Jamais me arrependi que te ter —disse, olhando-a com os olhos cheios de lágrimas—. Nunca, nem antes de que nascesse, nem depois. Sempre te quis, Riley. E Will e Noelle também. Teríamos que te haver contado a verdade faz tempo mas, por favor, não cria que foi porque algum de nós não te queria. Os três lhe adoramos e sempre desejamos o melhor para ti.
—Mamãe não pode ter filhos; contou-me isso como resultado da decisão de me enviar ao Bendlemaier —confessou Riley entre soluços—. Disse que eu era a única filha que tinha e que queria que tivesse todo o melhor.
Annie assentiu embora até esse momento desconhecia o problema do Noelle. Entretanto, tinha sentido. Sua cunhada era doce, bela e inteligente e jamais tinha oculto a adoração que sentia pelo Riley nem seus desejos de ser mãe. De ter podido, provavelmente teria cheio a casa de meninos.
— por que nos visitava tão pouco? — Perguntou a garota—. E por que quer que me parta do Turnabout?
Annie sentiu que a verdadeira pergunta de sua filha era por que não a queria o suficiente; uma pergunta que ela mesma se feito centenas de vezes ao pensar em seus pais.
— Porque é muito doloroso verte e ter que te deixar de novo —se justificou—. Quando chegou aqui e pinjente que queria que fosse, foi porque o coração pedia a gritos que te rogasse que ficasse e, além de minha dor, seu lar é a casa de seus pais. Eles lhe criaram e lhe querem com todo seu coração...
As lágrimas lhe impediram de seguir falando. Respirou fundo, tratou de conter os soluços e adicionou:
— E não importa quão zangada esteja com a campanha eleitoral do Will, com o trabalho de sua mãe ou com o lixo que te há dito a avó; o fato é que quer a seus pais, ou do contrário, agora não estaria tão doída.
Riley ficou em silencio durante um bom momento. Depois, soltou a laranja e acariciou a mão do Annie.
— Posso vir a te visitar? —disse, quase sussurrando.
A mulher assentiu. Riley ficou de pé, aproximou-se de sua mãe e se fundiram em um sentido abraço.
Annie se perguntou se ia ser capaz de suportar que uma vez mais lhe partisse o coração ao separar-se dela.
Logan chegou a casa do Annie pouco antes do anoitecer.
—Está lista para voltar para casa —disse ela sem mover do sofá—. Quando quiser, podem partir. Não voltará a escapar.
Ele fechou a porta com um pé e deixou a estufa e o pesado cilindro de cabo que levava no chão. Com isso, Annie poderia conectar-se ao gerador que tinha conseguido encontrar entre os trastes do Diego.
— Está bem, preciosa?
—Não —afirmou ela, com a voz rouca—, mas sobreviverei. É o que melhor sei fazer.
—Possivelmente seja uma supervivente, mas há outras coisas que sabe fazer melhor.
— Como desejar impossíveis? —suspirou ela e lhe alcançou um pedaço de papel —. Sam trouxe esta mensagem para ti. Acredito que é algo que lhe transmitiram por rádio esta tarde.
Logan tomou a nota e a guardou no bolso.
— Não a vais ler?
Ele moveu a cabeça em sentido negativo.
—Diz: dois dias. Isso é tudo.
Era evidente que Logan não estava interessado na mensagem.
—Onde está Riley? —perguntou.
—ficou-se no local do Maisy; disse que queria ajudá-la com os meninos. Acredito que está tratando de tomar distância para assimilar a situação.
— falaste com ela?
-Sim.
— E lhe há dito que crie que Drago é seu pai biológico?
— E quem mais poderia ser? —replicou Annie.
Logan sentiu uma dor aguda no peito.
— E contaste isso ao Riley?
—Não, ela não perguntou sobre ele e eu não mencionei o tema. Quem sabe as barbaridades que lhe terá contado Luzia, não podia lhe acrescentar mais angustia.
— Deixa de te fazer carrego dos defeitos de seus pais.
— Não o posso evitar —reconheceu enquanto estudava a estufa—. Para que é isso?
—Manterá-te quente de noite. consegui um gerador para ti. Está na entrada.
Annie pestanejou com ar sedutor.
—Você poderia me manter quente —disse, sonriendo com picardia—. Obrigado, Logan. Sei que seria mais fácil que se ficasse no centro social, mas não gostava.
—Quer estar em sua casa. Compreendo-o.
Ela assentiu com a cabeça.
— Devo te dar as obrigado por ter evitado que machucasse a esse pobre menino —comentou ela—. Não sei onde tinha a cabeça. Ou sim. E não queria que acontecesse o mesmo ao Riley.
Naquele momento, parecia tão frágil que Logan temia tocá-la e que se partisse em mil pedaços.
— O que é o que não queria que lhe passasse?
—Nunca lhe disse a Drago que queria fazer o amor com ele. Não o disse a nenhum dos meninos com os que saía —particularizou Annie—. Eles viam a maneira em que me vestia, como me comportava, e supunham que era uma garota fácil. Isso parecia incomodar a meus pais, assim que os deixava paquerar comigo com descaramento. Entretanto, jamais lhe prometi nada a nenhum.
—Sei.
— Disse-lhe a Drago uma e outra vez que não tinha a menor intenção de me deitar com ele. Tínhamos um trato: ele queria contar com um contato no Bendlemaier e eu acreditava que isso bastaria para conseguir que me expulsassem dali. Quando descobri que estava vendendo drogas, disse-lhe que cancelávamos o trato. Não queria me envolver em algo assim. Mas ele não me acreditou porque, ao parecer, realmente acreditava que era uma adolescente irreverente e desprejuiciada —explicou e se levou as mãos à cabeça—. Fui uma idiota, uma imbecil que merecia o que aconteceu. Eu me busquei isso.
— O que diz, Annie?
—Tinha demasiado tanto champanha e meus pais estavam furiosos porque tinha convidado a Drago...
— Bebeu mais champanha? —interrompeu-a Logan—. Até depois do que tinha passado entre nós?
— Sim, levei-me uma garrafa ao dormitório e acredito que me tomei toda. Não recordo bem. Sei que fiquei dormida e que quando despertei pela manhã, estava em minha cama, completamente nua e algo dolorida —relatou, angustiada—. antes de que pudesse me levantar da cama, chegou a polícia. Primeiro encontraram a Drago escondido na adega e depois vieram por mim.
Annie tinha os olhos cheios de lágrimas e lhe tremiam as mãos.
— Ele estava na casa aquela noite —continuou—, e aproveitou que estava ébria para abusar de mim. meu deus, Logan! Não sei o que é pior, se ter feito o amor com alguém a quem desprezava ou ter estado tão bêbada como para nem sequer recordar que me violou. Luzia, é obvio, assegurou-me que o tinha visto sair de meu quarto antes do amanhecer.
Logan a rodeou com seus braços. Tinha que lhe contar a verdade, lhe dizer quem era, o que tinha feito e como ganhava a vida.
—Possivelmente Drago estivesse em sua habitação aquela noite, mas você não. Não estava com Drago. Você não o escolheu.
—Não sabe. Nem sequer sei eu!
— Mas eu, sim —assegurou Logan, tomando a cara para olhá-la aos olhos—. Sei porque essa noite esteve comigo na habitação de convidados. Eu mesmo te levei até seu dormitório pela manhã.
Ela o olhou aturdida.
— Como? Isso não pode ser certo. Você não me desejava, disse-me isso nas bodas do Will. Seu nunca...
—É a verdade, Annie. Veio a minha habitação de madrugada, despertei e estava deitada a meu lado.
Aquela noite, não só tinha traído a confiança do Will mas também se aproveitou do estado de embriaguez do Annie. Em lugar de lhe ordenar que retornasse a seu dormitório sem lhe tocar um cabelo, tinha-a beijado e lhe tinha feito o amor. A culpa por aquele ato indevido o tinha torturado após e mais, desde que sabia que Annie tinha vivido na mentira durante todos esses anos.
Tremiam-lhe as mãos. O homem de aço que não se comovia ante nada, que atuava com frieza quando não havia outro recurso, estava aterrorizado.
—Acreditei que o recordaria —murmurou.
— Foi real? —disse ela, olhando-o como se fora a primeira vez que o via. Meu sonho de todos estes anos, era real?
— Que sonho?
— Um no que você e eu fazemos o amor —revelou Annie e se tampou a boca com uma mão.
— Sonha com essa noite?
—Meu psicanalista disse que era uma negação inconsciente do que tinha passado com Drago. E eu sabia que ele tinha estado em minha habitação, não só porque Luzia o havia dito mas sim porque se esqueceu a jaqueta. Era uma jaqueta de couro que usava sempre. Levava-a posta no abrigo quando você...
—Era nossa lembrança, Annie. Não um sonho. Drago não abusou de ti antes das bodas. Nunca esteve em seu dormitório com ele. E estou seguro de que não se deitou contigo enquanto estava na prisão.
Ela ficou pálida e começou a tremer.
—Riley. OH, Deus...
— Sim, Riley é minha filha.
Annie sentia que lhe ia estalar a cabeça. Riley era filha do Logan, não de Drago. Era uma realidade difícil de assumir e se sentia doente por não ter notado o parecido e, sobre tudo, por ter apagado de sua memória o que tinha acontecido aquela noite.
— Não te deprima —murmurou ele, lhe empurrando brandamente a cabeça para frente.
—Não me vou deprimir —assegurou e lhe apartou a mão da nuca—. Sabia. Tinha-te dado conta de que foi o pai e não o disse. Planejava fazê-lo em algum momento ou foste partir te alegremente como se nada?
— O que esperava que dissesse, Annie?
—Não sei. Algo, o que fora! Durante todo este tempo, estes anos, sabia.
— Quão único sabia era que tinha feito o amor contigo quando não teria que te haver meio doido sequer. Teria que me haver detido, poderia havê-lo feito, mas não o fiz. Depois te deprimiu, assim pela manhã te levei em braços até sua cama e me parti.
—Lembrança que me surpreendi ao ver que não estava na delegacia de polícia com o Will, mas me disse que tinha tido que ir a resolver uns assuntos de trabalho.
— Sim. Quanto a estes dias, comecei a pensar que lhe tinham violado de verdade.
— Não sente saudades —ironizou ela—, sou um exemplo de debilidade mental.
—Reconheci os sintomas, isso é tudo. E não passa nada com sua saúde mental.
— Salvo que confundi a um menino de Denver com Drago.
—O esgotamento, a fuga do Riley, a tormenta. Eu. foram muitas coisas juntas, Annie. Mas isso não significa que esteja louca nem que represente uma ameaça para ninguém.
Ela ficou de pé e começou a passear pela sala. Olhou através da janela; o mar estava revolto e o céu cada vez mais talher de nubarrones que pressagiavam uma nova tormenta.
—Temos que dizer-lhe Logan.
— É melhor que não saiba que sou seu pai. Annie esticou as mãos.
—por que não? Porque teme que isso te obrigue a sê-lo? —perguntou, molesta—. Riley já tem um pai, um homem que, apesar do que ela cria, adora-a com loucura. Não pode me dizer que tem direito ou seja quem sou e te negar a que saiba quem é você. Não podemos seguir vivendo na mentira, Logan. Olhe o que me passou por acreditar que Drago era o verdadeiro pai.
—Drago é um ladrão de médio pêlo incapaz de viver fora do cárcere. Nunca vai afetar à vida do Riley.
— Se Luzia foi capaz de lhe contar ao Riley que eu era sua mãe, o que te faz pensar que não encontraria a forma de lhe falar com Drago sobre sua suposta filha?
—Luzia jamais disse nada antes, o que ganharia fazendo-o agora?
— Não sei! Nem sequer sei por que o contou ao Riley! — Respondeu Annie, quase a gritos—. Faz séculos que deixei de tentar compreender a meus pais. Entretanto, não vou permitir que voltem a ferir o Riley, Logan, e a única maneira de evitá-lo é lhe dizendo a verdade. Tem que saber que é seu pai.
-Não.
Annie o olhou com atenção, procurando uma pista que lhe permitisse entender por que resistia a falar com o Riley.
— O que é o que te assusta tanto, Logan? Teme que Riley te amaldiçoe ou algo assim?
—Deixa-o assim, Annie.
Ela se ajoelhou frente a ele e olhando-o aos olhos, disse:
—Não posso. Já não. ocultei a verdade durante muito tempo porque acreditei que era melhor assim. Mas estava equivocada. Total e absolutamente equivocada.
Logan ficou de pé e se separou dela intempestivamente.
—Há coisas que não sabe —afirmou.
— Será porque não me há isso dito —replicou, sentando-se no sofá com os braços cruzados—. Não é um assessor de empresas.
-Não.
—Jamais tinha conhecido a um espião —comentou ela, isso Sarcástica foi o que nos disse o primeiro dia. Suponho que teríamos que te haver acreditado.
— Não, a espionagem não é minha especialidade.
— E qual é? —desafiou-o—. Vamos, Logan, dava algo que me convença de que está no certo e que é melhor que Riley não saiba nada de ti. Porque, francamente, a menos que seja uma espécie de assassino feroz, não vejo qual...
—Sou-o.
Annie o olhou atônita.
-O que?
—Queria ser advogado —explicou ele—, mas não tinha dinheiro e não conseguia que me dessem uma beca.
—Sei —disse ela, franzindo o cenho—. Mas o que...
—me deixe terminar. Fui contatado por uma organização que se ocuparia de pagar o resto de meus estudos e de cancelar as dívidas que tinha até então. Em troca, assim que me licenciasse, trabalharia para eles durante um tempo.
—Isso não tem nada de particular, muitas escrivaninhas de advogados fazem contratos similares com os estudantes destacados.
—O particular era o tipo de organização que me contratou.
— Organização? —perguntou, inquieta—. Te refere à máfia?
Logan soltou uma gargalhada nervosa.
— Não. Hollins—Winword não é a máfia. Digamos que é um exército privado que trabalha a nível internacional.
—Não entendo.
—É melhor que não o faça.
— Mas tem alguma especialidade?
— Sou um limpador, por assim dizê-lo —respondeu. —Algo me diz que isso não significa que vá por aí com uma faxineira, mas segue sem me parecer motivo suficiente para lhe ocultar ao Riley que é seu pai biológico.
Evidentemente, ela não tinha compreendido.
—Diabos, Annie... Não é isso.
—Riley não vai pedir te um curriculum, Logan. É uma pessoa decente...
— Sou um franco-atirador —a interrompeu—. Me enviam quando me necessitam para resolver problemas sem solução.
Annie ficou de pé e o observou com atenção; notava-se que estava tratando de assimilar o que acabava de ouvir.
— E por que o faz? Em benefício pessoal? Porque você gosta? Por sua expressão, diria que não.
—Possivelmente te equivoque. Pagam-me muito bem — respondeu ele, em tom inexpressivo.
Durante anos Logan tinha acreditado que fazia o que queria, até que um dia compreendeu que era um vulgar assassino. Se ele mesmo tinha chegado a odiar sua vida, era perfeitamente lógico que outros sentissem asco por ele.
— Que te odeie por algo não implica que Riley vá odiar te. Se você não gostar do que faz, é o único que pode trocá-lo.
Logan sabia que eram muito poucos os que tinham conseguido abandonar sua organização sem ter graves problemas.
—Bonita frase —murmurou.
Annie o olhou em silencio durante uns segundos e logo afirmou:
—Pode ser. Mas é certa e é tua, Logan. Disse-me isso aquela noite, no abrigo. Custou-me entendê-lo, mas finalmente o fiz. por que não lhe pode aplicar isso a ti mesmo?
Annie se aproximou da encimera e recolheu o pulôver e o guarda-chuva que tinha deixado ali.
—Vou à loja —disse.
—A loja não se vai a nenhuma parte, Annie. foi um dia difícil para...
— Para mim? Para ti? Para o Riley? —exclamou ela—. Às vezes o trabalho é tudo o que temos. A mensagem que te trouxe Sam é um assunto trabalhista, verdade? Não quero seguir falando, Logan. Vou à loja a ver meu amiga, você irmana... a tia do Riley.
E detrás dizer isso, partiu dando uma portada.
Logan ficou sozinho. O papel que se guardou no bolso era pequeno, mas naquele momento, pesava uma tonelada.
FAZIA quatro dias que não tinham eletricidade. — Annie suspirou e limpou o pó das prateleiras da loja. Por simples costume, olhou para a janela para ver a rua, mas se topou com o frio cinza da grade metálica. Suspirou de novo e se deu a volta. Tinha deixado a porta aberta para que entrasse um pouco de luz e as campainhas que penduravam na esquina superior tilintavam com a brisa. Era um som suave e agradável que contrastava tanto com o estado mental do Annie como com o deprimente dia de chuva.
Riley saiu da oficina e deixou uma taça no mostrador.
—Tenha, é chocolate quente —disse.
Annie sorriu e tomou a taça.
—Obviamente, Sara e você conseguistes manter o fogo aceso apesar da chuva.
— Sou muito hábil para essas coisas —afirmou Sara, entrando com uma taça na mão — . Saí algum tempo com um montañista e, entre outras coisas, ensinou-me a acender o fogo em qualquer circunstância.
A menor dos Drake piscou os olhos um olho ao Riley e a garota fez uma careta cúmplice. notava-se que se levavam muito bem.
Annie suspirou e bebeu um sorvo de chocolate. Não tinha visto o Logan nem sabia nada dele desde no dia anterior. Pelo tamanho da ilha, isso só podia significar que estava ocultando-se em alguma parte para evitar encontrar-se com alguém, incluída ela. E Riley.
Observou a jovem e a Sara por um momento e lhe encheram os olhos de lágrimas. Deixou a taça no mostrador e levantou as caixas com velas que tinha preparado mais cedo.
—Vou levar estas coisas ao Maisy.
—Ajudaremo-lhe.
—Não tem sentido que nos molhemos todas —argumentou Annie—. Retornarei em seguida.
Tinha rechaçado a oferta porque não queria chorar diante delas, mas vacilou ao ver a cara do Riley.
—A menos —continuou—, que de verdade queiram vir.
A garota relaxou o gesto e assentiu.
—irei procurar um guarda-chuva —disse e partiu à oficina.
Ao Annie lhe escapou um soluço e Sara a agarrou por braço.
—Estou aqui, coração —sussurrou—. te Apóie em mim.
De repente, Annie passou da angústia à fúria. Estava furiosa com o Logan por lhe negar a possibilidade de lhe contar a Sara toda a verdade e molesta com o remetente da mensagem que Sam lhe tinha dado para o Logan. A nota dizia dois dias e já tinha passado um. Não terei que ser um gênio para imaginar que isso significava que partiria logo, e uma coisa era imaginar que Logan abandonaria a ilha e outra bem distinta era ter a certeza de que o faria.
Riley retornou com o guarda-chuva e as três saíram da loja. Em poucos minutos chegaram ao hotel do Maisy e a garota aproveitou para ir ver o Kenny enquanto sua mãe e Sara levavam as velas ao despacho.
Ver o Logan sentado junto ao escritório do Maisy, foi uma surpresa. Mas ver o Hugo Drake inclinado sobre seu filho com uma agulha de sutura na mão, foi ainda mais impressionante.
Annie ficou paralisada no corredor. Sara correu para ali para olhar a ferida.
— Por Deus, Logan! Tratava de te matar ou o que? Por pouco não te fatiaste o pescoço.
Annie deu um grito afogado e Logan voltou a cabeça para olhá-la.
— Maldição, filho, fica aquieto ou te fará outra cicatriz como esta.
Annie sentiu que lhe nublava a vista.
— Como te tem feito semelhante corte? —perguntou Sara.
—Fazendo algo estúpido, sem dúvida —comentou Hugo.
—Maisy, pedi-te que não chamasse a meu pai —_ disse Logan.
— Preferia te sangrar com tal de que não te tocasse? —exclamou Hugo sem deixar de trabalhar—. Deveria ter ido a meu consultório, mas não. É mais teimoso que uma mula.
—Igual a alguém a quem conhecemos e nos querer — interveio Maisy, assinalando ao Hugo com o olhar—. Deixa de grunhir e padre a seu filho.
—Quão único queria era uma atadura —protestou Logan.
—Hei-te dito que não te movesse. Isso inclui não falar —o repreendeu seu pai—. Ou acaso quer seguir perdendo sangue?
— Sigo sem saber como te tem feito isso —insistiu Sara—. Parece como se lhe tivessem parecido uma adaga.
De repente, Annie se desvaneceu. Logan ficou de pé de um salto, apartou a seu pai do caminho e a sujeitou antes de que se golpeasse a cabeça contra o chão.
— Por Deus, Logan! —exclamou Maisy, tratando de apartá-lo—. Deixa que seu pai termine.
—Mas...
Ela o olhou com aborrecimento e lhe indicou que retornasse à cadeira. Depois se sentou junto ao Annie e lhe esfregou as mãos.
Sara também se agachou. Tinha os olhos abertos como pratos e os movia sem parar.
—Está-a manchando de sangue —disse a seu irmão e lhe alcançou uma gaze.
Logan a apertou contra a mandíbula e, com cuidado, apoiou a cabeça do Annie sobre uma almofada.
—Está esgotada.
— E você não? — perguntou Sara, arqueando as sobrancelhas—. Deixa que papai termine, Logan.
Annie abriu os olhos lentamente e o olhou aturdida.
— O que há...? —balbuciou—. OH, sinto muito.
— Ssss. Fica recostada —lhe ordenou Logan, lhe acariciando o cabelo.
— O que te passou na cara?
—Um arame de pua que se soltou.
—Terá que tomar antibióticos, filho —informou Hugo—. Agora, volta aqui.
—Deixa que seu pai termine —lhe suplicou Annie—. Por favor.
Logan suspirou com chateio, voltou para a cadeira do despacho do Maisy e aceitou seguir com as padres.
— Se utilizasse o mesmo tom para te pedir que fique na ilha, também aceitaria? —perguntou Hugo.
—Fecha a boca —grunhiu Logan.
—É um canalha frio e insensível.
—Em algo tínhamos que parecemos, papai.
Logan sentiu uma mão firme sobre seu ombro. Levantou a vista e viu que se tratava do Maisy. Estava irritada e lhe brilhavam os olhos de raiva.
—Deveria lhes encerrar aqui até que aprendierais a lhes comportar civilizadamente o um com o outro — manifestou.
—Alguém encontraria nossos cadáveres —declarou Hugo, sarcástico.
Maisy levantou as mãos. Essa vez, não fez nenhum intento por manter a calma.
—Idiotas. Os dois. Você, Hugo, porque nunca contou a seus filhos que sua mãe padecia uma depressão e que quando não tomava a medicação, convertia sua vida em um inferno. E você —disse, assinalando ao Logan—, porque foi incapaz de ver que seu pai sofria mais que vós. Sua mãe não se suicidó por sua culpa, fez-o apesar dele.
—O lhe deu motivos para estar deprimida —afirmou Logan.
—Basta, já não o suporto —exclamou Maisy, chutando o chão.
Hugo a olhou como se se tratasse de uma absoluta desconhecida.
—Mulher, não tem direito a lhes falar sobre o Madeleine.
Ela franziu o cenho.
— Que não tenho direito? Sua filha cresceu virtualmente sem mãe. Crie que não tem direito ou seja por que?
Maisy fez uma pausa para olhar ao Logan e a Sara, que do chão a olhava atônita, e continuou.
—Madeleine estava doente desde muito antes de que vós nascessem —assegurou—. Era muito orgulhosa para admiti-lo em público, embora isso não significava que a gente não soubesse. Se ninguém disse nada foi porque este povo acostuma a respeitar as decisões de seus habitantes. Mas que sentido tem manter o segredo depois de todos estes anos se só servir para ferir seus seres queridos?
Hugo terminou de suturar a ferida do Logan e depois lhe pôs uma injeção com antibióticos no braço. Guardou o instrumental em sua maleta, acendeu um puro e se voltou para o Maisy.
—É uma velha fastidiosa.
—E você, um velho cascarrabias.
Hugo resmungou, deu-se meia volta e partiu. Sara ficou de pé e correu a abraçar ao Maisy.
—Não se preocupe. A papai não duram muito os aborrecimentos.
—Sei —afirmou a mulher enquanto se acomodava o vestido—. Sara, lhe enfaixe a ferida a seu irmão. E você, Annie, vá à cozinha e lhe diga ao George que te dê algum das bolachas que fez ontem no centro social. Precisa comer algo.
E sem dizer uma palavra mais, Maisy abandonou o despacho a toda velocidade.
—Não me atrevo a desobedecer as ordens da comandante Maisy —murmurou Sara.
Tomou as gazes que Hugo tinha deixado no escritório e cobriu a ferida do Logan. Depois, limpou-se as mãos, olhou ao Annie e a seu irmão e se apressou a sair dali.
Annie ficou de pé e ele saltou da cadeira para ajudá-la. Assim que a tocou, Annie começou a tremer.
— Dói-te? —perguntou, lhe roçando a atadura.
— Não tanto como a agulha que Hugo me cravou no braço.
— O que estava fazendo para te cortar com um arame?
—Não importa.
— Em outras palavras: não é meu assunto. Logan a olhou com gesto desesperado. —Onde está Riley? —quis saber. —Com o Kenny.
—Nesse caso, vamos procurar a. — Logan? —vacilou ela, impressionada. — O diremos juntos.
Ao final, Riley se tomou a notícia melhor do que supunham. Observou ao Logan durante um momento e comentou:
—Agora compreendo de quem herdei os olhos azuis.
Annie relaxou as mãos e Logan assentiu.
—Acreditei que havia dito que não era seu noivo —lhe disse Riley a sua mãe—. Nem agora nem antes.
—Não o era. Nós...
—Nunca tivemos tempo de ser noivos —interrompeu Logan, olhando ao Annie —. Mas fomos amigos.
— E então como não sabia que tia Annie estava grávida de mim?
—Porque a abandonei —admitiu Logan —. E o lamento muitíssimo.
Estava-lhe falando com o Riley mas Annie sabia que as palavras eram para ela.
— Sabe que não necessito outro pai —afirmou Riley, à defensiva—. Nem outra mãe...
Annie sentiu que lhe queimavam os olhos. Não pelo que Riley acabava de dizer mas sim porque entendia para onde se dirigia com esse comentário.
Logan assentiu depois de um momento.
—Sei, já tem pais.
—Isso o faz mais fácil para ti, verdade?
—Riley... —murmurou Annie.
— O que? — replicou a garota—. Ele nunca se fez cargo de nada. Só fez o amor contigo e partiu. Nem sequer veio ao Turnabout por sua própria conta. Veio porque meu pai o contratou para que me levasse de volta a casa. Apostaria a que papai não sabe nada de tudo isto. Do contrário, teria contratado a outro.
—Pode que tenha razão —afirmou uma voz rouca do fundo do salão.
Annie se voltou para olhar. Riley pegou um salto e atirou a cadeira ao chão. Logan ficou de pé lentamente e olhou ao homem aos olhos enquanto tratava de reprimir as vontades de estrangulá-lo.
-Olá, Will -disse.
—Riley —sussurrou Annie —, pode ir procurar ao Kenny. Estou segura de que ainda te está esperando.
—Mas...
—Por favor.
Finalmente, Riley acessou; meteu-se as mãos nos bolsos e caminhou para seu pai. - —Sigo zangada contigo—declarou.
—Supunha-o.
— Onde está mamãe?
—Em casa, nos esperando.
A garota seguiu avançando e quando chegou à porta, voltou-se e exclamou:
Advirto-lhe isso, papai: sei amável ou me zangarei muito mais.
Os adultos esperaram até estar seguros de que Riley se partiu. Então, Annie se voltou para a mesa, apoiou os cotovelos e afundou a cabeça entre as mãos.
— Quanto ouviste?
Logan observou como o outro homem se afrouxava a gravata enquanto se aproximava da mesa.
— O suficiente —respondeu Will e olhou a seu velho amigo com receio.
depois de um comprido momento, Logan também se sentou.
Finalmente, Will rompeu o silêncio.
—Quem teria imaginado todas estas casualidades...
—Eu não —assegurou Logan —. por que recorreu a Penetrei?
— Recrutaram-lhe enquanto estava na universidade?
—Essa não é uma resposta.
Will fez uma careta com os lábios.
—Não. Sempre me incomodou que tivesse desaparecido dessa forma; entretanto, não estava disposto a fazer nada por te buscar. Noelle tinha sido seu casal, mas se tinha casado comigo.
Annie levantou a cabeça e os olhou surpreendida.
— O que? —exclamou—. Não sabia nada.
— Sim, saímos durante um tempo —admitiu Logan—. Depois conheceu bonito de seu irmão e já não teve olhos para ninguém mais. Nem me incomodou então, nem me incomoda agora.
Não obstante, Logan seguia tendo a horrível sensação de que todos eles tinham sido manipulados.
— Como conheceu penetrei? —insistiu.
— Não é a única pessoa com a que falou quando estávamos na universidade.
Logan arqueou as sobrancelhas, acomodou-se na cadeira e riu
—Não me acredito, Will. É um personagem público, jamais lhe utilizariam.
—Não o fizeram, mas ficou o contato e nos intercambiávamos favores de tanto em tanto. O tipo tem um par de anos mais que eu, mas... —Will se conteve e moveu a cabeça em sentido negativo—. Isso não importa. O certo é que quando Riley escapou, automaticamente pensei nele.
— Contou-lhe que era adotada?
Will assentiu.
—Acreditei que ele mesmo se ocuparia de vir aqui e queria que estivesse preparado —explicou—. Não sabia o que havia dito minha mãe ao Riley, quão único sabia era que estava recebendo cartas com ameaças e que queria a minha filha sã e salva.
—Mas Penetrei não vinho, enviou-me .
—Parece que seu estilo é delegar —ironizou Will.
—Todos os que trabalham com Penetrei são investigados ao detalhe. Mais, durante os primeiros anos de serviço.
-E?
—Isto estava em meu expediente desde o começo —afirmou Logan, furioso—. Debilidades do Logan Drake: trair a seu melhor amigo, deitando-se com sua irmã menor.
—Basta —disse Annie—. Isto não conduz a nenhuma parte. Não traíste a ninguém, Logan. Diga-lhe Will; lhe diga que não te traiu.
— Só se me promete que não te seduziu para vingar-se de mim por me haver casado com o Noelle.
Annie se estremeceu e olhou ao Logan com os olhos frágeis.
— Genial! Sempre todos querem mais ao Noelle. Meu irmão, minha filha e você.
Ato seguido, a mulher ficou de pé e se foi furiosa da sala sem olhar atrás, nem sequer quando Logan gritou seu nome.
— vais reclamar a? —perguntou Will.
-O que?
—A custódia do Riley. Pode fazê-lo, sabe? É justo te dizer que tem direito, embora te advirto que brigarei por ela.
— Annie é invisível para ti? Não viu o que passou?
— partiu-se. Sempre faz o mesmo. Quando as coisas ficam duras para ela, deixa-as.
Logan fechou os punhos.
— Sabe o que, Will? Annie insistiu todo o tempo em que Riley tinha que estar com o Noelle e contigo porque foram os melhores pais que podia ter e eu nunca o pus em dúvida. até agora.
Quando Logan saiu a procurar o Annie, topou-se com o Riley nas escadas do hotel do Maisy. A garota lhe jogou uma olhada e comentou:
—Meu pai e você já não são tão amigos, verdade?
—De momento, não —admitiu ele —, mas não tem por que ser assim eternamente.
Ao Riley lhe encheram os olhos de lágrimas.
— Não teria que ter vindo ao Turnabout. Assim, ninguém se teria zangado com ninguém. Salvo a avó Luzia, embora acredite que ela está brigada com o mundo.
—Possivelmente tenha razão no que corresponde a Luzia, mas não é culpa tua que todos estejam molestos. Nós somos os adultos, você só é uma criatura pedindo respostas.
—A tia Annie diz que o melhor para mim é querê-los a todos. Suponho que isso te inclui.
Ao Logan lhe fez um nó na garganta.
—Não está obrigada a me querer, Riley. Nem sequer me conhece.
—Ela te quer. Há-me isso dito.
Ele não soube o que dizer.
—Papai não vai partir do Turnabout sem mim —afirmou a garota—. Para ele, a tia Annie é um inseto estranho.
— equivoca-se.
—Sei. Mas não quero deixá-la sozinha. Riley ficou olhando ao Logan, esperando que lhe assegurasse que Annie não estaria sozinha.
— Annie não quereria preocupar-se —disse, finalmente.
Tinha sido uma resposta tola, um torpe intento de reprimir a necessidade de levar-se ao Annie e a sua filha a um sítio onde nada nem ninguém pudesse feri-los. Mas era impossível. Sua vida estava governada por um mundo que requeria organizações como Hollins— Winword e pessoas como Coleman Black. E esse mundo não combinava com o mundo do Annie.
— Será melhor que vá ver meu pai antes de que lhe dê um enfarte —assinalou Riley.
Entretanto, não se moveu nem um centímetro.
—Não ponha um brinco no lábio como Kenny — suplicou Logan—. E não deixe de criticar ao Will por lhe dedicar muito tempo a sua campanha eleitoral. E não vá ao Bendlemaier se não querer.
Uma lágrima rodou pela bochecha do Riley e ele a secou com mão tremente.
— E jamais esqueça que é tão bela como suas duas mães —adicionou.
Riley se mordeu o lábio inferior, assentiu e se dirigiu para a porta. Mas quando estava a ponto de chegar, retrocedeu e correu a abraçá-lo com todas suas forças. Logan sentiu que lhe parava o coração.
Quando ela entrou no hotel, suspirou e se sentou na escada. Não tinha forças para mover-se. Apoiou os cotovelos nos joelhos e se observou as mãos enquanto pensava que Annie não era um inseto estranho a não ser alguém muito mais forte e nobre que todos eles juntos.
Justo nesse momento, ouviu o inconfundível som do motor do carro do Hugo e levantou a vista justo quando estava estacionando junto a ele.
—Maisy acredita que talvez queira que te leve a casa do Annie —disse seu pai, com resignação —. Já sabe como é quando lhe coloca uma idéia na cabeça. E bem? Sobe ou não?
Logan subiu ao veículo e Hugo arrancou dando um inclinação brusca.
—É avô.
Hugo não parecia surpreso.
— Sara me contou isso tudo. Já não é um menino, Logan...
—É insuportável.
— O mesmo digo —replicou seu pai com um sorriso irônico—. É de família.
Assim que Hugo estacionou o carro, Logan se desceu de um salto e entrou correndo à casa do Annie. Estava sentada no sofá, chorando e com um álbum de fotos a um lado.
—Vete, Logan —disse, sem sequer olhá-lo.
Não lhe fez caso e se sentou frente a ela.
—Não me importou quando Noelle se foi com seu irmão —declarou.
Ela se encolheu de ombros.
—Isso passou faz muito tempo, já não importa.
Logan tomou as mãos; estavam fritem.
— Sim que importa. Não deve acreditar que Riley a queira mais que a ti.
—Sei. Eles são os únicos pais que conhece. E eu não sou capaz de...
—Não diga isso.
—É a verdade —exclamou ela—. defraudei a minha própria filha da pior maneira.
— Então foi uma criatura, Annie. Agora não o é.
—Agora é muito tarde.
-É-o?
Ela o olhou com assombro.
—Se quer tê-la contigo, Annie, ajudarei-te a te enfrentar a eles.
— E o que passaria se ganharmos o julgamento pela custódia?
—Bom...
—Partiria-te de todas maneiras —afirmou ela, com voz rouca—. me Diga que estou equivocada.
Logan não pôde fazê-lo. Em lugar disso, inclinou a cabeça e disse:
—Assegurarei-me de conseguir comida e tudo o que faça falta na ilha. Farei que tragam um navio novo para o Diego e a ilha não correrá o risco de voltar a ficar isolada.
Embora Logan nunca tinha recorrido aos contatos que tinha conseguida graças a seu trabalho, essa vez estava disposto a fazê-lo.
—Os vereadores da prefeitura se estão ocupando disso —assegurou ela.
—Os vereadores permitiram que Turnabout fique isolada. Se fosse por eles, declarariam-na uma nação independente —replicou Logan, zangado—. foi assim durante cinqüenta anos e seguirá assim durante outros cinqüenta mais. Se esperas que façam algo produtivo, será melhor que comece a plantar algo mais que malmequer e lavanda em seus campos ou morrerá de fome.
—Parece-me que está exagerando.
— Exagerando? Vamos, Annie...
—De acordo, pode que tenha razão —concedeu ela e trocou de tema—. Lamento o que disse Maisy sobre sua mãe.
—Eu também. Nada é o que parecia. Nem em minha família, nem na tua —manifestou e a olhou com inquietação—. E se estiver grávida de novo?
Annie ficou pálida.
—Mas se tivermos tomado cuidado.
A primeira vez o tinham feito; a última, não. despertaram-se ao amanhecer e ela se deslizou sobre ele sem lhe dar tempo a nada, igual a fazia dezesseis anos, quando o surpreendeu na habitação de convidados da casa do George e Luzia Hess, nua, beijando-o na boca e lhe acariciando o sexo com seus dedos torpes e inocentes.
— O que faria se estivesse grávida, Annie? — insistiu.
—Não me interessa ser mãe solteira e não imagino devendo jantar ou trocando fraldas.
— Annie...
— Faria-o melhor que a primeira vez! —gritou ela—. Está satisfeito?
—Equivoca-te se crie que o fez todo mal. Queria ao Riley o suficiente para saber o que era o melhor para ela. Deixa de te torturar por isso.
—Em qualquer caso, não estou grávida, assim não se preocupe.
Ele se perguntava se realmente estava preocupado ou só procurava uma desculpa para não separar-se dela. de repente ouviu o som de um motor sobre a casa e viu o gesto do Annie ao reconhecer do que se tratava.
— Isso é um helicóptero? —perguntou, angustiada—. A está levando agora mesmo, verdade? Sem sequer deixar que se despedisse.
Ato seguido, ficou de pé e correu para fora. Olhou para o céu e disse:
— foi-se? Riley se foi sem que pudesse lhe dizer adeus?
Logan sabia que o piloto daria outra volta.
—Will não veio em helicóptero, Annie.
—Mas... —balbuciou antes de compreender o que acontecia—. É para ti, não é certo?
-Sim.
O helicóptero voltou a sobrevoar a casa procurando um claro onde aterrissar. Logan sabia que o único lugar possível era a velha mansão. Seus dias no Turnabout terminariam em poucos minutos. Apesar do zangado que estava com Penetrei por havê-lo manipulado dessa maneira, forçando-o a encontrar-se com o Annie e com sua filha, tinha um trabalho urgente que cumprir. voltou-se para olhar a pequena casa de praia do Annie e pensou que em menos de uma semana, aquele lugar se converteu em seu primeiro lar em muitos anos. Entrou em procurar a jaqueta e aproveitou para jogar uma olhada ao álbum que se encontrava sobre o sofá. Estava cheio de fotos do Riley, de quando era pequena. Suspirou e ficou o álbum sob o braço.
Annie o olhou sair da casa. Sem dúvida tinha visto o que se levava, mas não disse nada.
—Até que a central elétrica volte a funcionar, Diego se ocupará de te trazer o combustível que necessite para o gerador —a informou Logan —. E Sara te vai trazer outro fogão elétrico. Maisy há dito que Leão estava instalando um de seus fornos no centro social... O gerador dali é maior, assim poderia usá-lo quando precisar secar suas ervas.
— Sempre soube que iria, sei que aqui não há nada que te importe, mas não esperava que fora tão logo.
O se aproximou, tomou a cara e a beijou durante um comprido e doloroso momento.
—Você me importa, Annie Hess.
— por que? Porque agora sabe que temos uma filha?
—Não. Por ti. Importa-me você.
—Mas não o suficiente para ficar...
O helicóptero voltou a passar sobre eles. Logan elevou a vista e amaldiçoou a Penetrei por obrigá-lo a partir.
—O suficiente para saber que a vida que levo não é boa para ti —declarou.
Depois, separou-se do Annie e correu à vida que tinha eleito tempo antes e que fazia que se odiasse a si mesmo. Atrás deixava a uma mulher a que não devia ter amado, mas também a um amor do que nunca se arrependeria.
SETENTA e dois dias sem o Riley. Setenta e cinco sem o Logan. Annie tirou o chocolate que estava esquentando ao fogo e olhou o oceano através da janela. O fazia todos os dias. Ao princípio, contava os minutos. Se tinha conseguido deixar de pensar neles durante cinco minutos, poderia fazê-lo durante cinco horas, cinco dias. Talvez, em cinco meses, ou anos, a sensação de vazio desapareceria.
Encheu uma taça de chocolate quente e lhe jogou algumas bolachas, como estava acostumado a fazer Riley. Eram os primeiros dias de maio e fazia muito calor para tomar algo assim, mas o clima não era um obstáculo para seu ritual diário.
Levantou o chapéu que tinha deixado na em-cimera e o pôs. Aquele dia estava plantando romeiro; as sementes que tinha recolhido no campo tinham jogado raízes e enchiam a casa com seu particular perfume.
antes de que pudesse alcançar a porta, soou o telefone. Annie respondeu enquanto ficava umas luvas de jardineiro.
— Annie! —exclamou Riley ao outro lado da linha.
como sempre lhe ocorria para ouvir a voz de sua filha, à mulher lhe parou o coração. Sorriu e se apoiou o auricular no ombro.
— Que tal esteve o debate?
—ganhamos, é obvio.
—Disse-te que o fariam.
Enquanto isso, Annie levantou os vasos de romeiro e os carregou até a caminhonete que tinha estacionada na entrada. O veículo tinha chegado um par de dias depois de que Logan partisse, junto a um carregamento de provisões e ferramentas.
— Como anda todo o resto? —perguntou, sentando-se na caminhonete.
—Mamãe renunciou a seu trabalho, mas provavelmente já lhe tenha contado isso ela. Estamos tomando classes de piano juntas. Quer que toquemos a dueto. O que te parece?
Pelo tom de voz, Riley parecia cansada, mas Annie era capaz de ouvir mais à frente. Não todos os assuntos familiares estavam resolvidos, mas sua fuga tinha servido para fazê-los compreender que precisavam acontecer mais tempo juntos.
—Quando vier a me visitar este verão —disse Annie—, poderá tocar no piano do centro social.
—Duvido-o —afirmou a garota—. Me tenho que ir, Annie. Só queria te contar como tinha saído o debate. Já sabe, a equipe do Bendlemaier foi campeão estatal durante quatro anos seguidos. Minha escola vai dar uma boa patada no traseiro no próximo ano. Espera e verá. Por certo, o outro dia recebi carta do Logan.
Ao Annie lhe congelou o sorriso.
—Que bem, e o que dizia?
—Não muito. Está viajando um montão; o selo era da Alemanha. Perguntou-me se seguia falando com o Kenny Hobbes e lhe escrevi para lhe contar que o tipo era um imbecil, mas não pude enviar a carta porque o sobre do Logan não tinha direção no remete.
Nunca havia uma direção. Annie sabia que Logan tinha escrito ao Riley várias vezes durante as últimas semanas. Em geral, não dizia muito salvo que estava pensando nela. E o gesto parecia ser suficiente para o Riley, para quem assumir que ele era seu pai, e não Drago, tinha resultado menos traumático que o saber que Annie era sua verdadeira mãe.
Após, Annie tinha ido a Olympia duas vezes e Riley tinha planejado acontecer um mês de férias no Turnabout.
Não sempre era tão fácil. Riley não era sempre doce e encantadora; depois de tudo, era uma Hess. Mas era melhor do que Annie tinha imaginado e, graças à influência tranqüilizadora do Noelle, Will tinha deixado de torturar-se com a idéia de que Logan reclamaria a custódia de sua filha.
Possivelmente, Annie devia lhe dar as graças a Luzia por ter revelado a verdade. Tinha tirado muitos véus procurando ferir seus filhos e o que tinha conseguido era ajudá-los a sanar velhas feridas.
—Tenho-me que ir. Mamãe está tocando a buzina. Temos classe de piano. Quero-te.
Riley se despediu a toda pressa e pendurou o telefone sem esperar resposta.
—Eu também te quero —murmurou Annie.
Depois, a mulher jogou a cabeça para trás e olhou ao céu. O calor do sol lhe acariciou a cara. Finalmente, suspirou, agarrou as luvas e a taça de chocolate e saiu da caminhonete. Desviou a vista para o tronco da árvore que se trouxe do Castelo. Os vereadores não ficavam de acordo sobre o que fazer com o tronco, mas Sam lhe assegurou que podia o ter no jardim.
Entretanto, Annie não estava olhando o tronco a não ser o que tinha esculpido nele. Mas se obrigou a deixar de olhá-lo. Passava muito tempo contemplando-o, assim pisou no acelerador e se dirigiu para a estrada que conduzia à casa do Castelo. Por sorte, só lhe levaria uns minutos chegar ali, porque Sara a estava esperando na loja. Era primavera, a ilha se estava enchendo de turistas e no Island Botânica tinham muito trabalho.
Estacionou tão perto da casa como pôde e saiu do veículo. Tinha esquecido a idéia de cultivar perto da cerca e em lugar disso tinha plantado em direção à casa. De momento, só tinha conseguido que prendesse uma Santa Rita tinta, mas era muito mais do que tinha conseguido até então.
Tirou o romeiro do veículo e carregou o vaso de barro até a casa, decidida a plantá-la em um dos jardins laterais.
—Bonito chapéu.
Annie se deteve. Lhe afrouxaram as mãos e lhe escorregou o vaso.
—fui para te buscar à loja.
—Como vê, não estou ali —disse ela, sem pensar.
Annie o percorreu com o olhar. Tinha o cabelo mais largo, estava bronzeado, apenas lhe notava a cicatriz e tinha os olhos mais azuis que o oceano.
— O que faz aqui, Logan?
O seguiu caminhando e se afastou do velho e ruído casarão. Vestia uma camisa branca e umas calças cor cáqui e para ela estava mais bonito que nunca. Fez um gesto para a Santa Rita que crescia na parede e comentou:
— Tinha razão. Pode fazer que as novelo cresçam em qualquer parte.
— Logan...
—Vejo que tem a caminhonete. Funciona bem?
— por que não lhe revisa o motor e o comprova?
Não lhe respondeu, mas sorriu divertido.
Annie se cruzou de braços.
—A caminhonete me foi que grande ajuda —afirmou—. Obrigado. As janelas estão perfeitas, o novo telhado é melhor do que a cabana merece. Agora bem, pode me dizer o que está fazendo aqui?
—Queria que tivesse tudo o que necessitava.
—Pode estar tranqüilo —disse ela—, sou a inveja da ilha.
A casa do Annie, além das da Sara, Maisy e Hugo, era uma das poucas que tinha um gerador de eletricidade próprio e com potência suficiente para iluminar o povo inteiro durante vários séculos.
—Por sorte não necessitamos utilizar os geradores —acrescentou a mulher—, mas nunca se sabe...
—Assim tem tudo o que necessita.
Logan se aproximou dela e levantou o vaso de romeiro do chão.
— Onde queria pôr isto? —perguntou.
Annie lhe indicou onde deixar a planta e tirou as ferramentas da caminhonete. Ato seguido, ajoelhou-se junto ao vaso de barro e, com as mãos trementes, ficou as luvas. Se Logan queria atuar como se sua presença fora algo natural, lhe seguiria o jogo. Que ele tivesse esculpido seus nomes naquele tronco infernal não significava que tivesse que estar esperando-o durante setenta e cinco intermináveis dias.
Tirou uma pá pequena da caixa de ferramentas e a afundou na terra. Uns segundos mais tarde, Logan se agachou a seu lado, agarrou uma pá e começou a escavar com destreza.
— Não me olhe tão surpreendida —murmurou—. Não pensará que Sara é quão única aprendeu um pouco de jardinagem ao crescer nesta maldita rocha, verdade?
Annie soltou a pá e se sentou.
— Sinceramente, não sei o que pensar. O que está fazendo aqui, Logan?
Ele também se sentou e apontando com a manga da pá para a Santa Rita, perguntou:
— Como conseguiste que crescesse isso?
—Hei-lhe isso dito mil vezes: não há nada mau nesta terra.
— Sim, mas em quarenta anos, é a única que foi capaz de demonstrá-lo —afirmou ele, olhando a seu redor—. Estava acostumado a vir aqui quando era menino.
—Recordo-o. A ver as postas de sol, dizia.
—antes disso —disse, com um sorriso tímido—. Quando era um menino, vinha para assustar a minha mãe. Sempre temeu que alguém caísse pelo escarpado que está detrás da casa.
— Não está farto de tantas lembranças?
Ao Annie não preocupava soar mal-humorada. Estava-o. Tinha-a abandonado, tinha estado longe durante mil e oitocentas intermináveis horas.
—Ainda não encontraste ao dono, verdade?
-Não.
Logan assentiu com a cabeça e ficou de pé. Deu algumas pazadas mais e voltou a sentar-se.
—Renuncio —protestou.
—Eu não te pedi que me ajudasse com isto. Não te pedi nada, nem esperei nada de ti — assegurou ela, sem poder deter sua verborréia—. Te parte deixando essa mensagem no tronco para mim e depois simplesmente aparece e atua como se tudo estivesse de maravilha! Para que saiba, poderia ter estado grávida quando foi, embora aquele dia o negasse.
Em realidade, Annie não se ficou grávida e isso a tinha aliviado e entristecido de uma vez.
Logan lhe percorreu o corpo com o olhar. Era magra mas estava cheia de curvas. Levava postos umas calças curtas, de cor verde, que deixavam suas preciosas pernas à vista.
—Não estava grávida. Chamei a Sara várias vezes. Sei que não poderia lhe haver oculto esse segredo e que ela me teria contado isso.
—Envia- cartas ao Riley —murmurou Annie, com voz trêmula—, chama a sua irmã...
— Sim —admitiu ele—. Mas retornei por ti.
Ela o olhou com frieza.
—Não jogue comigo, Logan.
—Ajudarei-te a encontrar ao dono deste lugar.
Annie se surpreendeu ante a repentina mudança de tema, mas se recuperou rapidamente.
— E como pensa fazê-lo?
—Conheço muita gente.
Não tinha sentido que negasse suas conexões. E por outra parte, sentia-se tão inseguro que quis lhe demonstrar que podia ser útil.
—Não me deve nenhum favor, Logan. me posso arrumar isso sozinha. Além disso, deveria me haver liberado de tudo isto...
—E por que não o tem feito?
—Porque era teu.
— Quer dizer que encontraste o tronco da árvore?
— Sim. Sam se assegurou disso, embora você não quis admitir que te tinha talhado enquanto o transportavam. Por isso vejo, a ferida já cicatrizou...
—Sabe uma coisa? O que gravei ia a sério.
Ela não parecia muito convencida.
— De verdade? Logan ama ao Annie... Era uma espécie de prêmio de consolação ou algo assim?
Logan não disse nada a respeito. Sabia que se merecia o comentário.
— Como está Riley?
—Chama-a e descobre-o você mesmo. Suponho que está crescendo apesar das muitas imperfeições de seus pais, incluídas as tuas. Mas se isso é tudo o que queria dizer, será melhor que vá. Sara me está esperando.
—Annie, deixei meu trabalho.
— por que? Pensava que o era tudo para ti...
— Queria fazer algo distinto, criar em lugar de destruir. Entretanto, todos sabemos que abandonar ao Coleman não é tão fácil. Quando te escolhe, escolhe-te para sempre.
—Sonha perigoso...
Logan pensou que Penetrei era, embora o maior perigo não era ele a não ser as agências que trabalhavam à margem da lei.
— Bom, digamos que não tomou muito bem. —Fez-te mal?
Logan riu com suavidade e a tirou da mão.
— Se o fez, seria capaz de lhe cortar o pescoço? —Pode ser.
—Annie, é a pessoa a quem mais respeito neste mundo —lhe confessou. —Respeito —repetiu ela.
— Sim. Em troca, suponho que eu não posso esperar semelhante coisa de ti.
— por que diz isso?
—Porque os fatos falam por si mesmos. Abandonei-te não uma, a não ser duas vezes.
— Os fatos? Os fatos não dizem necessariamente a verdade, Logan. Quando eu tinha dezessete anos sabia o que queria e quis tomá-lo, mas me convenceu de que as coisas não são sempre assim.
—E entretanto, não consegui te deter...
—Não, mas esqueçamos essa noite. Pertence ao passado, a um passado que já não podemos trocar e que não precisamos trocar porque criamos algo distinto.
Ela se umedeceu os lábios e ele a olhou aos olhos. Eram os olhos da mulher de sua vida.
—Suponho que os dois poderíamos ter tomado outras decisões ao longo destes anos, Logan — continuou—. Talvez poderíamos havê-lo feito melhor, mas ao menos Riley está exatamente onde deve estar. É o correto por muito que me aduela. Como foi o correto para mim que abrisse a loja com a Sara... Eu amo esta ilha. É meu lar.
—E você gostaria de compartilhá-lo?
—Isso depende de que fosse a sério quando gravou essas iniciais no tronco.
—Sentia-o de verdade, Annie.
— E durante quanto tempo o sentirá?
—Durante toda a vida.
— Porquê?
—Porque me hão dito que consegue que cresçam coisas em qualquer parte. E embora não estou seguro de que eu mereça a pena, talvez tenha sorte comigo em um ou dois séculos —brincou.
Ela se inclinou sobre ele e disse:
— Às vezes as pessoas necessitam uma boa provocação...
—Annie, eu não queria que minha escura vida se cruzasse em seu mundo luminoso. Mas quando me parti, foi como se levasse sua luz comigo. Não podia te esquecer, não queria fazê-lo, e me odiava por meu trabalho... Assim decidi voltar. E te asseguro que estar sem ti todos estes dias foi um verdadeiro inferno.
Logan se deteve um momento antes de continuar. Olhou para a velha mansão e acrescentou:
— O dia que recuperamos o tronco, Sam disse que não devia pensar no que a ilha podia me dar, a não ser no que eu podia lhe dar a ela. Pois bem, quero lhe devolver esse casarão.
— Restaurando-o ou derrubando-o?
—Restaurando-o, é obvio... Amo-te, Annie. É a primeira mulher a quem o digo e será a última.
Annie permaneceu um bom momento em silêncio, estremecida. Depois, elevou o olhar. Seus olhos se encheram de lágrimas.
— A última? Espero que não... A mansão é muito grande e seria uma pena que não aproveitássemos as habitações. Eu gostaria de ter ao menos uma filha, uma pequena que se acostumasse para ouvir o muito que a quer seu pai.
— Sério? depois de tudo o que aconteceu ainda quer...?
—Ainda o quero tudo. E o quero contigo, Logan Drake, só contigo.
Então, Annie o beijou. E foi a decisão mais fácil de todas.
Allison Leigh
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