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Clara fingiu entrar na casa em Epsom com Althea. Ela ficou parada na rua por, no mínimo, cinco minutos, enquanto o sr. Brady carregava suas valises para dentro da casa.
Ela cumprimentou muitas mulheres que conhecia.
— Muito bem — Althea disse assim que estavam lá dentro e a carruagem fora embora. — Vejo-a de manhã cedo. Agora, são quase duas, e hora do seu encontro. Vá.
Clara olhou em volta na sala de estar da casa, vagamente notando que era aconchegante e acolhedora. A maior parte de sua concentração estava em tudo que poderia dar errado nessa aventura. Um ataque de nervos sério estivera se formando nos últimos oito quilômetros.
— Se meu irmão souber que estou ficando aqui e vier...
— Vou me certificar de que ele não saiba onde você está. — Althea pegou suas mãos. — Claro, se preferir permanecer aqui, não vou acusá-la de covarde.
— Seria mais generosa do que eu comigo mesma. Ainda assim, não posso negar que isto é diferente da última vez. Desta vez, eu estou tomando uma decisão muito deliberada bem adiantada.
— Acho que é melhor assim. Não acha?
Ela achava? Podia ser mais escolha dela, mas não era mais fácil. Ela não conseguiria fingir que sucumbira à surpresa ou que fora arrastada por beijos à luz mágica da lua.
Pegou sua valise e foi até os fundos da casa.
— Você deveria provavelmente subornar o cocheiro para garantir a discrição dele — Althea disse, andando ao lado dela.
— Aumentei o salário do sr. Brady ontem. Acho que ele sabe por quê.
— Se não, vai saber em breve.
Elas saíram da casa e andaram por um pequeno, mas bem cuidado, jardim murado até o portão do fundo. Do outro lado, sua carruagem aguardava. Ela deu um beijo em Althea.
— Vou retornar a tempo de acompanhá-la à corrida amanhã.
Subiu na carruagem e Althea acenou. Ela puxou as cortinas até a metade.
A carruagem deixou a cidade e seguiu para oeste. As estradas naquela direção não tinham o mesmo trânsito que o sentido oposto. O tráfego atrasara consideravelmente a viagem, o suficiente para, às vezes, passageiros saírem e andarem até carruagens de amigos e para dar água aos cavalos. Cinco dos vizinhos de Mayfair de seu irmão tomaram ar entre a multidão no espaço para os cocheiros.
A propriedade de Stratton era perto de Guilford, no lado oposto. Quando estavam bem longe de Epsom, ela abriu as cortinas e aproveitou a paisagem do interior.
Após uma hora, saíram da estrada principal e subiram um lago particular. Quando as árvores espaçaram e a casa apareceu, Clara teve que rir. A pequena e secundária propriedade de Stratton provavelmente era uma das maiores casas do condado. Seu tamanho era a maior característica de ostentação. No entanto, o piso cinza e o design comedido indicavam não ser muito antiga.
Stratton saiu enquanto o cocheiro entregava a valise dela para um criado. Depois de recebê-la e dar as instruções ao criado de buscar a governanta, falou em particular com o sr. Brady. Clara não conseguiu ouvir o que conversaram, mas pensou ter visto uma moeda sendo entregue pelo duque ao motorista.
— Contou a ele sobre amanhã? — ela perguntou quando Stratton se reuniu a ela e a acompanhou para dentro de casa.
— Com uma torturante precisão. Ele vai nos encontrar em um lugar designado do lado de fora de Epsom e estará esperando desde as nove horas.
— Será um emprego incomumente lucrativo para ele, eu acho, já que também o paguei a mais por seu silêncio.
— Não o suficiente. Ele entendeu minhas expectativas e minha ameaça repentina quando pegou aquele guinéu. Não é burro.
Um guinéu! Quem diria que aquele pecado pudesse ser tão caro? Ela não sabia o que esperar quando chegou. Não as formalidades que a tragaram. Ela se viu sendo tratada como qualquer hóspede. Uma governanta chegou para levá-la ao seu quarto. Uma dama esperava ali, a fim de desfazer sua valise e ajudá-la a se vestir para descansar. Antes de sair, a dama prometeu acordá-la para prepará-la para o jantar.
Ela verificou seu relógio de bolso e pensou que teria pelo menos três horas até a dama retornar. Já que não sentia necessidade de descansar, ficar presa ali a incomodava. No mínimo, Stratton poderia tê-la convidado para explorar a casa e o jardim sozinha se ele não queria sua companhia imediatamente.
Ela não sabia como amantes eram tratadas quando havia encontros marcados, mas nunca achou que ficaria entediada.
O mordomo acompanhou Adam ao piso superior. Enquanto ele dava os passos previsíveis para se acomodar, sua mente media como a recepção de Clara estava progredindo.
— Preparamos a suíte para o senhor, Sua Graça. Um criado, Timothy, vai servi-lo. Ele tem experiência como camareiro.
— Excelente. — Eles estariam mostrando a Clara seus aposentos agora.
Adam virou a escada para subir ao próximo andar, onde estava sua suíte. O mordomo não o fez.
— Sua Graça, mudamos tudo para a suíte do duque. Espero que não tenhamos errado.
A dama dela está desfazendo sua valise agora.
— Nem um pouco. — Ele acompanhou o mordomo até a porta dos aposentos usados pela última vez por seu pai e se preparou para um ataque de lembranças.
Ele não ia a Kengrove Abbey desde o dia em que os restos de seu pai foram transportados para o norte. Não pretendia entrar nos espaços particulares naquela visita. Agora, com o mordomo atrás dele, virou a tranca com um mau pressentimento.
As portas se abriram totalmente, revelando um lugar estranho. Ele entrou, amenizando sua reação. Não reconheceu nada da suíte que um dia vira. Nada do falecido duque. Aqueles aposentos poderiam até ser em outra casa.
Ela está verificando os aposentos e a vista da janela agora.
Pretendera evitar as lembranças, mas agora sentia como se tivessem sido roubadas dele.
— O que aconteceu aqui? Quem fez essas mudanças?
— A duquesa, Sua Graça. Chegaram cartas da França com instruções dela, há muito tempo.
Agora, seus próprios livros preenchiam as prateleiras na sala de estar. Suas próprias roupas preenchiam o novo guarda-roupa. Ele entrou no quarto. Cada item de mobília fora mudado e as paredes, repintadas e com novo papel de parede. A cama tinha até sido posicionada de forma diferente.
— O que fizeram com as coisas do meu pai?
— Foram encaixotadas e colocadas no sótão.
— E seus documentos pessoais?
— Enviados a Drewsbarrow, Sua Graça.
— Deixe-me — ele demandou. — Diga a Timothy que não o quero até o jantar.
A porta se fechou em silêncio atrás do mordomo. Adam deu mais uma volta na suíte diferente. Fora decisão da mãe dele fazer isso. Ela deve ter adivinhado que ele evitaria fazer mudanças por conta própria.
Ela poderia ter lhe contado. Sem saber, ele resistira a ir ali desde que voltou à Inglaterra. Aquele fora seu verdadeiro lar, não Drewsbarrow, em Warwickshire. Cresceu ali e em Londres. Poderiam passar anos até ele usar a suíte se não tivesse sido reformada.
Concluiu que gostara das mudanças. Não se importaria de usar os aposentos porque não guardavam aquelas lembranças. Elas seriam encontradas em outro lugar, claro.
Em certo momento, ele as enfrentaria, mas não por muito tempo ainda.
Sua dama a está despindo e convidando-a para descansar da viagem.
Ele tirou seus casacos e arregaçou as mangas. Voltou ao quarto e olhou uma parede. Os painéis foram pintados, mas não retirados. Colocou a mão em um deles e pressionou delicadamente.
Finalmente, encontrou o ponto onde o painel cedia sob sua pressão. Um clique baixo soou, e o painel se abriu.
Bom, lugares seguros, o advogado tinha dito. Aquele era um deles, e havia outros.
A primeira coisa que viu foi uma pilha de dinheiro. O sr. Leland ficaria chocado em saber que muitas famílias, na verdade, guardavam, sim, milhares de notas em casa.
Ele as colocou de lado, depois se esforçou para ver o que mais se escondia atrás da parede.
Ela está sozinha agora. A dama saíra.
Cinco minutos mais tarde, os conteúdos do esconderijo estavam espalhados na cama. Não incluíam joias. Havia outros esconderijos seguros ali em Abbey que também deveriam ser examinados.
Ele cuidaria disso depois. No momento, outras coisas precisavam de sua atenção, como a adorável hóspede em um dos aposentos acima.
la perambulou pelo quarto. A dama tinha afastado os lençóis e fechado as cortinas. Ela puxou o tecido para o lado para que a luz de uma janela lhe permitisse ver os arredores. Aquele aposento devia ter sido decorado bem recentemente, já que mostrava elementos góticos que ainda estavam na moda.
Os pisos inferiores não pareciam um típico jardim. Bem diferente, pequenos lagos, colinas e plantações criavam ornamentos de grande apelo. Nenhuma das floreiras parecia planejada, embora ela soubesse que eram muito bem cuidadas devido aos desenhos.
Mãos circularam sua cintura. O calor pressionou suas costas. Um beijo trilhou a lateral de seu pescoço. O rosto de Stratton flanqueou o seu, e ele olhou junto com ela.
— Era obra da minha mãe — ele disse sobre o jardim.
Ela se apoiou nele, que a abraçou.
— Temi que fosse prisioneira aqui, e sozinha.
— Foi minha intenção ser um anfitrião atencioso e permitir que descansasse da viagem. — Ele beijou seu pescoço de novo. — Depois, outras intenções mudaram essa ideia.
— Suas outras intenções são muito mais interessantes.
Um de seus braços subiu pelo corpo dela. Sua mão acariciou seu seio, fazendo-a arfar. A boca dele pressionou o pulso no pescoço dela, que fechou os olhos e se entregou às deliciosas sensações.
O carinho dele a acalmava e excitava. Ela não tinha mais dúvida de sua decisão. Claro que tinha vindo. Para isso. Para o prazer e a intimidade. Para a chance de se sentir desejada e cuidada.
O toque em seu seio a excitou misericordiosamente. De costas para ele, ela poderia apenas aceitar a forma como ele a provocava em direção ao delírio. Seu corpo ficou tenso de ansiedade quando sua outra mão começou a desabotoar sua camisola. O lento progresso dele a deixou louca de impaciência. Tensa com seu desejo, seus seios reagiam ao mais leve estímulo, até o movimento do tecido de sua camisola contra os mamilos.
Ele puxou sua camisola para baixo e ela se acumulou aos pés. Ele segurou seus seios e acariciou gentilmente as auréolas com os polegares.
— É para isso que está implorando?
Ela mal conseguia falar, e sua mente só sabia de prazer e desejo. Conforme o prazer crescia e se espalhava, ela se flexionava contra ele, e seus quadris pressionavam a excitação dele cada vez mais. A impaciência logo a incomodou de novo, até ela querer gritar. Agarrou os ombros de sua camisa de debaixo do pijama e a puxou para baixo, para poder sentir o toque dele na pele. Ele a abaixou mais, até ela estar nua em seus braços.
A excitação dela cresceu cada vez mais até se tornar um poder lindo que consumiu sua consciência. Ela o deixou segurá-la e abraçar o abandono. A forma como ele a tocava era boa demais para suportar, e cada toque e carinho só a faziam querer mais. Ela desejava o que ele fizera da última vez, sua boca em seus seios e barriga, sua mão pressionando o meio de suas pernas, a insanidade de o prazer enlouquecê-la até nada mais existir.
Os dentes dele se fecharam em seu lóbulo da orelha e mordiscaram gentilmente.
— Juro que esta noite vou devagar, mas faz muito tempo e preciso de você agora. — Sua mão escorregou pelo corpo dela até as coxas. Ele a virou o suficiente para que conseguisse beijá-la. Segurou-a assim e violou sua boca enquanto acariciava seus lábios inferiores latejantes.
Cada carinho longo e oculto enviava uma reverberação silenciosa que tomava todo o corpo dela, cada um mais intenso e completo em reunir seu desejo em uma exigência furiosa por algo mais, algo completo, algo final.
Ele a moveu, inclinou-a e pressionou suas costas. Ele não mais a abraçava. Em vez disso, ela se sentiu brocada sob as mãos dele. Inclinou-se sobre o braço grosso do divã de barriga para baixo, seus quadris descansando no alto e suas pernas penduradas para o lado.
Pareceu que ele a deixou um tempo assim, posando de forma tão escandalosa. Então ele acariciou suas costas e nádegas. Uma mão firme permaneceu na sua lombar, mas a outra buscou de novo a fonte de sua loucura.
A sensação a desmoronou. Firme, profunda e intensa, a fez gritar. Ela tentou engolir o som, mas não conseguiu.
Ela o sentiu então, entrando nela, primeiro devagar, depois forte. A intensidade concentrou em sua completude e em suas investidas. Ela soube do alívio primeiro, mas depois um tremor começou e cresceu, um que ela não conseguiu controlar. Os tremores rígidos a assustaram, e os movimentos dele só os deixaram mais fortes. O corpo dela pareceu desaparecer, exceto de onde eles se juntavam, e a intensidade aumentou em algo doloroso, mas atraente. Deixou-a mais tensa até e, de repente, o tremor tomou seu corpo em uma onda poderosa de sensação que a inundou.
A visão retornou, mas pouca força veio com ela. Ele segurou o braço do divã com as duas mãos, equilibrando-se para não cair em cima de Clara. Adormecida e em silêncio, ela não emitiu som agora, mas o cômodo ainda reverberava com o gemido de alegria dela alguns instantes antes.
Ele se inclinou para beijar sua lombar e, então, a pele macia de suas nádegas. Mesmo agora, saciada depois de um alívio desconcertante, o erotismo de sua pose a envolvia.
Ele arrumou as roupas, depois a levantou. Com um solavanco, pegou-a e a carregou até a cama. Ela se aninhou no travesseiro enquanto ele a cobria com o lençol. Clara esticou o braço e colocou a mão no braço dele, e olhou-o através das pálpebras pesadas.
— Realmente sabe como deixar os hóspedes à vontade.
— Faço meu melhor.
— Se esse é seu melhor, é espetacular. — Ela esfregou o tecido da manga dele entre dois dedos. — O senhor não se despiu, e parece pronto para encontrar a rainha. Eu, por outro lado... — Ela olhou para os delicados cumes de seu corpo debaixo do lençol.
Ele se abaixou para beijá-la.
— Vou pedir que a dama venha em uma hora, e um banho também, se quiser.
— Um banho será maravilhoso, supondo que consiga me mexer até lá.
— Até mais tarde. — Ele se virou para sair.
Ela se virou de lado e se aconchegou no travesseiro.
— Ainda consigo senti-lo. Ainda consigo sentir o que aconteceu — murmurou, sonolenta.
Ele também. Delicadamente, acariciou sua face e a observou cair no sono, depois foi para seus aposentos.
Diferente de Clara, ele não dormiu. Nem descansou. Continuou o que estava fazendo antes de seus pensamentos o levarem ao quarto dela.
Na suíte do duque, logo, havia livros espalhados no chão em vez de nas prateleiras da sala de estar. A parede atrás de uma prateleira estava aberta, revelando um buraco. Seus conteúdos agora estavam na mesa dele.
Ele passou por uma bolsa de moedas de ouro e pilhas de papéis e foi ao quarto de vestir. Puxou o tapete e se ajoelhou em um canto, sentindo a madeira com os dedos. Encontrou o lugar que procurava e empurrou forte. A parte do piso, um quadrado, afundou em um esconderijo. Ele sentiu a estrutura subjacente da casa.
Aprender os locais desses esconderijos foi parte de sua educação tanto quanto aprender a história do partido conservador. Esses lugares secretos foram construídos junto com a casa, assim como poderia encontrar outros na maioria de suas propriedades. Moedas de ouro normalmente são encontradas em lugares assim. Ele tateou, escorregando os dedos pelas vigas, garantindo que não tivesse sobrado nada. Sua mão encontrou um saquinho. Arrastou-o para a luz e o abriu. Caiu uma joia em sua mão.
A peça não se parecia com a que faltava no último inventário. Nem a prata, pérolas e pedras roxas batiam com a descrição de algo que viu nos inventários. Parecia muito antiga. Talvez estivesse escondida por gerações.
Ele a guardou de volta no esconderijo e colocou a parte do piso. Essa era a casa mais provável para encontrar as joias perdidas e, como aquele colar de prata, esquecidas. Agora, ele precisaria procurar em Drewsbarrow, o que demoraria muito.
— Acredito que sua amiga não a repreendeu muito. — Stratton serviu vinho enquanto fazia essa observação.
Eles haviam jantado uma boa refeição e ainda estavam à mesa, aproveitando o restante do vinho tinto.
Uma soneca e um banho tinham revigorado Clara. Ela nem tinha corado quando desceu para se juntar ao duque no jantar. Mas deveria. A tarde fora uma revelação de várias maneiras, nada tão empolgante quanto à forma dominadora como ele lidou com ela.
Outro dia ela pensaria no que aquilo dizia sobre ele. Ela também teria que refletir no que dizia sobre ela, supunha.
— Só alertou de que teria que pagar o diabo se fosse só uma vez. Eu já sabia disso. — Althea tinha dado mais do que um conselho, que não seria compartilhado com o duque. Sobre as dificuldades de se ter um caso realmente discreto. Sobre o perigo de ser uma mulher solteira. Estava falando por experiência própria.
— Conheço o irmão dela, mas confesso que nunca a tinha visto antes de a senhorita nos apresentar.
— Althea tem uma história trágica. Diferente de meu pai, o dela a deixou dependente do irmão. Quando ele tentou casá-la com um homem cujo favor ele desejava suprir, ela se recusou e, em vez disso, casou-se com um oficial do exército que, infelizmente, morreu na guerra. É tratada como a pobre parente desde então. Uma governanta viveria melhor.
— Ela pareceu elegante quando a encontrei. Não com roupas maltrapilhas.
— Leva jeito com a agulha, então consegue se virar bem para ficar confortável com as amigas da juventude. Agora, conte-me sobre esta casa. — Ela mudou de assunto rápido porque falar de Althea os aproximava do assunto sobre o jornal.
Althea realmente tinha talento para costura, mas não era como ela mantinha sua aparência. Essa era uma ficção designada para explicar a todo mundo, mas principalmente à cunhada dela, sobre as adições cuidadosamente escolhidas que apareciam de vez em quando em seu armário. Nunca daria certo explicar que Althea tinha emprego tanto como autora quanto como editora de jornal. Clara lhe pagava pela ajuda, mas não o suficiente, considerando o papel que Althea desempenhava.
O duque começara a descrever a história da casa.
— Talvez queira vê-la — ele ofereceu.
— Sim, por favor.
Enquanto passeavam pelos cômodos comuns no térreo, ela percebeu, cada vez mais, que, como seu quarto, tinham decoração mais moderna. As cores ricas, diferente do que fora popular há vinte anos, destacavam os diversos detalhes exóticos. A sala matinal, por exemplo, dava a impressão de um jardim árabe com suas molduras pontudas distintas, telas de filigrana e azulejos azuis e verdes na lareira.
— Penso que não seja uma propriedade obscura raramente visitada — ela disse.
— Era a que mais usávamos. Raramente íamos a Drewsbarrow. Esta era mais conveniente por ser mais próxima da cidade.
Ela pensou se o motivo pelos quais raramente visitavam Drewsbarrow tinha algo a ver com as sensações ruins compartilhadas com outra família naquele condado. Provavelmente, sim. O falecido duque não iria querer participar de um evento do condado para se martirizar ao evitar o outro lorde presente. Que confusão aquela briga tinha criado. E tudo por causa de um pedaço idiota de terra. Ambas as famílias com certeza tinham muitas propriedades.
Eles subiram as escadas e Stratton a levou a um cômodo anexo à biblioteca.
— Isso foi adicionado há uns dez anos.
Com painéis parecidos com os da biblioteca, aquele cômodo não continha livros. Em vez disso, havia uma grande mesa de bilhar no centro. Ela uniu as mãos com prazer.
— Podemos jogar?
— Você sabe?
— Nem um pouco. Meu pai começou a me ensinar, mas minha avó insistiu que não era coisa de uma dama, e ele parou.
— Ele a levou para caçar e a ensinou a atirar, mas concordou que bilhar era passar dos limites?
— Acho que era porque outros poderiam me ver com um taco, mas não poderiam me ver com um mosquete. Mas o senhor pode me ensinar. Aprendo rápido.
— Isso eu já sei. — Ele pegou dois tacos de um armário totalmente esculpido e lhe entregou um. — Faça como eu digo, e vai ser profissional muito rápido.
— Quer dizer que logo será muito normal para mim. Bem natural.
Ele percebeu a insinuação.
— Exatamente. — Ele arrumou as bolas, depois usou o taco para espalhá-las. — Uma batida rápida. Viu?
— Talvez eu devesse praticar primeiro. — Ela juntou todas as bolas de novo e ficou ao lado dele.
Posicionou seu taco.
— Deve se inclinar para mirar — ele disse.
— Assim?
A mão dele gentilmente pressionou as costas dela. Bem como tinha feito há algumas horas.
— Mais assim.
Ela olhou para trás e para cima.
— Acho que entendo a preocupação da Vovó. Não teria entendido ontem, claro. — Ela tentou fazer como ele fizera e falhou miseravelmente. Uma das bolas pulou o suficiente para cair da mesa. — Talvez eu devesse deixar o senhor me guiar, já que é bem mais experiente.
Ele juntou as bolas de novo.
— Vamos começar da maneira mais simples. Se achar que gosta, com o tempo, vou mostrar formas mais sofisticadas de jogar. Há algumas técnicas interessantes que não são para aprendizes.
— Está me provocando a não querer fazer mais nada, se há grandes mistérios por trás. — Ela se inclinou para mirar o taco.
Ele se inclinou sobre ela e reposicionou suas mãos.
— Agora, mire no meio da bola da frente.
— Devo tentar uma batida forte e direta ou uma mais cuidadosamente colocada e efetiva atribuída ao talento mais do que à força?
Ele deu risada e beijou-a em suas costas bem disponíveis.
— Está incorrigível esta noite. Uma dama bem ruim.
Ela riu e olhou a ponta de seu taco.
— Vou me atrapalhar se não me instruir mais.
Ela optou por menos força e mais precisão. Nenhuma das bolas caiu da mesa, pelo menos.
Eles jogaram, mas só era a vez dela quando pensava que ele errava deliberadamente. Quando ela ia jogar, ele a ajudava, seu corpo cobria o dela e seus braços compridos ensinava os dela aonde ir e como atacar a bola que ela escolheu.
— Vou perder — ela disse enquanto se inclinava mais para jogar o que com certeza seria sua última tacada. — É para o senhor me deixar ganhar. Qualquer cavalheiro faria isso.
Ele ficou em cima dela de novo, sua voz perto de seu ouvido.
— Achei que ficaria insultada se eu perdesse deliberadamente. Não que pudesse, mesmo que tentasse, já que se recusa a seguir minhas instruções.
Ele moveu a mão dela na ponta do taco.
— Se segurasse o taco assim como eu disse, teria se desenvolvido mais.
— Então devo segurar o cabo firmemente assim, mas deixar a ponta dos dedos acariciar a ponta para ele deslizar. Parece mais eficiente. Da próxima vez que me disser como segurar um taco, vou escutar. — Ela mirou, mas sua tacada nem acertou a bola porque, de novo, ele acariciou sua lombar.
Só que, desta vez, a mão dele permaneceu ali.
— Tem um senso de humor obsceno para uma jovem bem-educada, Clara.
Ela se endireitou, indo para os braços dele.
— Deve ser o vinho. Eu o choquei?
Ele deu risada e a puxou mais para perto.
— Não acho que consiga me chocar.
— Decepcionante. Tentei muito.
— Se está determinada, provavelmente terá sucesso um dia. — Ele a beijou. — Suspeito que esteja acostumada a fazer a maioria das coisas do seu jeito.
— Sou muito ignorante para saber qual é meu jeito em algumas coisas.
Ele segurou sua cabeça e lhe deu um beijo fervoroso.
— Vamos retificar isso em breve.
Não havia mais ironia, nem jogo. Aquele beijo nunca terminava. Ela se pendurou nele e ficou excitada com ele conforme os beijos se tornaram famintos e os abraços, de perder o fôlego. Ela pensou que ele a deitaria ali mesmo na mesa. Esperava que o fizesse. Em vez disso, ele a soltou, depois pegou suas mãos e a tirou do cômodo, puxando-a enquanto ele subia as escadas.
Ele a levou para dentro do quarto dela e a sentou na cama. Jogou as cobertas para o lado, depois se ajoelhou diante dela. Enquanto a abraçava e beijava, seus dedos encontraram os colchetes de seu vestido. Depois, ele se sentou nos tornozelos. Com os olhos ardentes e a expressão rígida, ele acariciou suas pernas debaixo do vestido. Carícias longas e firmes pinicaram sua pele com calor. Ele ergueu sua saia.
— Tire o vestido enquanto a beijo. — Ele se abaixou ali mesmo na parte interna de sua coxa.
Ela observou enquanto erguia a saia até os quadris, depois tirou o vestido por cima da cabeça. Sua camisa permaneceu acumulada nas coxas. Os beijos dele foram naquela direção. O efeito a maravilhou. Assim como o caminho deles.
Ele havia descrito isso no parque ? falado em beijar suas coxas nuas repetidas vezes, até ele finalmente dar o beijo mais íntimo imaginável. Agora, conforme a tensão sensual se espalhava por sua virilha e ela latejava a meros centímetros da cabeça dele, entendia o que não entendera na época.
— O senhor vai... vai... — Sua respiração continuava falhando a cada beijo, e ela não conseguia falar.
Ele segurou seus quadris e a puxou para a beirada da cama.
— Vou. — Ele abriu mais as coxas dela. — Deite-se.
Ela afundou na cama. Beijos quentes e devastadores subiam cada vez mais por suas pernas. Ele a tocava, e o prazer a fazia delirar. Então ela sentiu os beijos mais íntimos imagináveis, e enlouqueceu até sua consciência explodir de prazer.
Quando a sanidade reapareceu, ele estava em pé ao lado da cama, segurando suas pernas enquanto estocava dentro dela. Ela olhou o próprio corpo, depois os olhos dele. Observou a fúria crescer nele, depois dominá-lo e, enfim, trazê-lo ao único êxtase que as pessoas conheciam.
Adam passava os dedos para cima e para baixo nas costas de Clara. Agora nua, ela estava deitada ao lado dele de barriga para baixo, abraçando um travesseiro onde apoiava a cabeça. Seus olhos estavam fechados, mas ela não estava dormindo. A ponta dos dedos perambulantes dele continuava fazendo-a sorrir.
Ela esticou o braço e apoiou a mão no peito dele, como se buscasse certeza de que ele estava ali.
— A senhorita é linda, Clara. Sua pele cremosa parece seda e veludo. Seu cabelo nessa luz fraca é um cetim escuro, exceto por manchas onde a luz encontra algumas mechas ruivas.
— Não pare. Meu orgulho está devorando sua bajulação. Normalmente, quando ouço comentários sobre minha aparência, alguém está apontando os defeitos.
— Impossível. Não há defeitos.
— Que mentiroso encantador. Disseram que minha boca é grande demais. Com certeza, notou.
— Acho que sua boca é perfeita, e erótica.
Ela abriu os olhos.
— Erótica? — Ela ficou confusa. — Obrigada por pelo menos não a odiar. Um perfeito do senhor vale mais do que centenas de críticas de outros. Mesmo assim, acho que podemos concordar que a irmã oferecida ao senhor era a mais bonita.
Ele a abraçou e a colocou por cima dele, então seus seios e rosto ficaram pressionados no peito dele, não apenas a mão dela. Ela se sentiu bem e segura nos braços dele daquela forma, toda maciez e calor femininos. Sua respiração fazia cócegas no peito dele e, lentamente, reavivava outras sensações.
— Eu não concordo. Mesmo de longe, pensei que a senhorita seria o grande prêmio. Assim que nos conhecemos, tive certeza. A senhorita não é nada menos do que magnífica, querida.
Ela ergueu a cabeça e o olhou. Uma cortina grossa, livre de grampos, caiu em seu rosto de apenas um lado.
— Acha mesmo?
— Não sou falso bajulador. — Sim, magnífica. Ele lhe diria mais. Deveria encontrar palavras para explicar como ela era rara de uma forma que se desdobrava inteira durante a paixão. Como ela fazia escolhas por conta própria. Não era imune a opiniões do mundo, claro. O subterfúgio elaborado para levá-la até ali provou isso. Mas, no fim, ela estava ali, sem culpa ou preocupação, encantando-o com seu corpo e mente.
— O senhor pareceu um verdadeiro hóspede quando andamos pela casa — ela disse.
— Não vinha para cá há anos. Desde que voltei, visitei a principal propriedade em Drewsbarrow, mas não vim aqui.
— E é tão perto de Londres.
— Estava ocupado com outros assuntos da propriedade. Depois estava ocupado perseguindo-a.
— Não fomos ao jardim. Ele é incomum. Vou me aventurar pela manhã, antes de sairmos para a corrida.
— Aguarde-me, ou vai permanecer no jardim. Não quero que se perca.
Ela deu risada.
— Não acho que isso vá acontecer.
— Nós vamos juntos. — Ele beijou sua cabeça. — Você se lembra do que fazer amanhã?
— Se eu esquecer, Althea vai lembrar. Ela está sendo bem protetora. Muito maternal.
— Deve achar irritante.
— O cuidado dela comigo é desarmante. Toda a sua preocupação vem com boa intenção. Não é o mesmo que as repreensões e os sermões de membros da família que só estão pensando em si mesmos.
— Se ela cuida tanto da senhorita, provavelmente não me aprova. Não assim.
— Ela não disse nada. Também, diferente da minha família, não me trata como idiota. Supõe que eu já tenha pensado em qualquer cautela ou alerta que poderia dizer.
Ele sabia quais seriam esses. Ela não precisava listar os itens que devem passar por sua mente às vezes. Talvez o fizessem com frequência. Como naquele instante.
Não havia uma maneira boa de falar sobre isso. Certamente não agora e não ali. Ela precisava pensar, às vezes, se interpretara mal os motivos de ele persegui-la, no entanto.
— Não acha estranho estarmos aqui assim? Tudo em nossa vida diria que seria impossível.
Ela falou em um tom de curiosidade, como se tivesse escutado os pensamentos dele. Ele ficou impressionado por ela ter tocado no assunto. Parecia ser mais corajosa do que ele.
— O desejo cria os próprios argumentos, eu acho.
— É isso? O senhor poderia ir embora quando estivesse satisfeito. Mas não foi. A menos que se sentisse obrigado a estar aqui comigo. Ou talvez tolere essa intimidade enquanto espera o desejo chegar de novo.
Nada na voz dela indicava que buscava uma resposta específica. Ela mal falava sobre coisas que pensava. Ou pelo menos algumas das coisas.
— Não me senti obrigado. Vou admitir que pretendo tê-la novamente, mas estar com a senhorita não é algo que apenas tolero para isso, Clara.
— Talvez o que nos conecte seja mais do que desejo. Talvez seja também a amizade.
Não era a palavra que ele usaria. Se ela escolheu essa, ele não se oporia.
Ela ergueu a cabeça de novo, depois olhou para a lateral do corpo. Brilhos maliciosos preencheram seus olhos.
— Eu não me mexi, mas estou achando que o senhor, sim.
— Não me movi.
— Então cresceu.
Ele fingiu pensar muito.
— Ah. Sim, acredito que esteja correta. — O pênis dele inchou mais e pressionou a barriga dela.
— Acredito que o desejo tenha subido à sua cabeça de novo. — Ela se sentou, rindo da sua piada de duplo sentido. Descansou as nádegas nas coxas dele e observou fascinada a transformação contínua. — É uma maravilha não ter me matado da primeira vez. — Ela o cutucou com delicadeza. Ele inchou mais.
Ela veio por cima e o beijou profundamente, quase de maneira selvagem. Ele a fez voltar para onde estava sentada, pegou sua mão e fechou-a na base de seu pênis.
— Exatamente igual ao taco — ela disse, divertida. — Devo lidar com a outra ponta mais delicadamente?
Ele disse a ela o que fazer.
Clara pensou que nunca conheceria tal prazer. Mesmo as revelações no início da noite não se comparavam. Continuou provocando-a a um alívio que permanecia além do alcance.
Ela estava deitada sobre ele, apoiada nas mãos e nos joelhos. A boca dele torturava seus seios enquanto a cabeça de seu pênis incitava a entrada de sua passagem. A satisfação de absorvê-lo permanecia além do alcance, transformando-se em uma provocação impiedosa.
Finalmente, ela não conseguiu aguentar. Desistiu de um prazer pelo outro. Foi para trás e o colocou para dentro. Nada nunca foi tão bom.
O alívio não demorou. Ela mexeu os quadris para senti-lo melhor. Ergueu-se, e depois pressionou para baixo a fim de criar mais sensações.
— Isso. Assim — ele disse. — Até o fim, se quiser.
Ela ficou surpreendida por ele aceitar tanta passividade. Movimentou-se de várias formas, explorando as sensações, encontrando a pressão de sua completude que a fez arfar. Certificou-se de arfar cada vez mais, obtendo o prazer gananciosamente, ferozmente, até ficar desesperada. Ele ajudou então, segurando os quadris dela e estocando. Ela gritou de alegria a cada investida que compartilharam, até aquele incrível êxtase trazer o alívio profundo.
dam esperava impaciente enquanto seu criado limpava sua sobrecasaca. Ele tinha se levantado mais tarde do que pretendia, e aquele criado havia levado o dobro de tempo do que seu lacaio de sempre demorava para fazer seus deveres. Já que até agora a mão do homem tremia enquanto segurava a escova, estava óbvio que servir Sua Graça provavelmente estava sendo enervante para o camarada.
Ele engoliu o impulso de dizer para ele se apressar e sofreu com o esforço. Finalmente terminado, ele partiu e foi para a sala matinal.
Não havia ninguém lá. Ele comeu o café da manhã, depois perguntou ao mordomo se Lady Clara já tinha descido.
— Ela desceu há algum tempo, Sua Graça. Quase uma hora, eu diria. Fez o desjejum, depois foi lá para fora.
Clara decidiu passear no jardim sozinha. Ele saiu no terraço e a procurou. Não a encontrou. Espreitou, esperando que saísse de trás de um arbusto ou de uma das delicadas floreiras da paisagem. Finalmente, viu uma movimentação na pequena colina nos fundos. Clara estava parada entre duas árvores, olhando para baixo daquele ângulo. Ela não o tinha visto. Enquanto ele observava, ela se virou e desapareceu.
Havia descido pelo outro lado. Os jardins acabavam ali. Pelo menos os oficiais. Não havia nada na direção em que ela foi, exceto um pouco de vida selvagem. Ele esperou que ela percebesse e reaparecesse. Só que não o fez.
Amaldiçoando sua teimosia, ele foi atrás dela. Ele não tinha falado para ela esperá-lo? Não tinha exigido que ficasse no jardim? Ele andou rápido. Seu rancor aumentava mais do que tinha direito, mas não conseguia se controlar. Não queria que ela perambulasse pela floresta. Com certeza não queria ter que ir atrás dela.
Do topo da colina baixa, ele olhou para a encosta com as árvores e o arbusto. Aquela área rústica não tinha mais do que quatrocentos metros, mas não tinha espaços abertos. Ele poderia andar vendado, já que brincava ali quando menino. Uma estranha, no entanto, poderia se perder.
Xingando e pensando que, em vez de acariciar suas nádegas redondas e lindas, deveria ter dado um tapa nela, desceu a colina e entrou nas árvores. Parou a fim de enxergar o vestido em tons de hortênsia que ela estava usando. Quando não a viu, chamou-a.
— Estou aqui — ela gritou de volta. — Do lado de um pequeno lago.
Ela iria encontrar o caminho até ali. Inferno.
Clara observava a água borbulhar em uma ponta da piscina. Deveria ser uma nascente. Ela estava sentada na rocha grande admirando a pequena clareira. Pensou que era um dos lugares mais encantadores que vira em anos.
Ouviu Stratton chegando. Ele se aproximava enquanto ela pensava em tirar os sapatos e enfiar os pés na água. Então ele chegou. Ela o sentiu à sua esquerda enquanto as bolhas a fascinavam.
— Não é lindo? — ela perguntou. — Tão tranquilo e sereno. Deve ser perfeito no verão.
— Venha comigo, Clara.
O tom dele assustou-a. Ela olhou por cima do ombro. Ele estava ali parado, um homem muito diferente do que ela tinha visto nos últimos dias. Sombrio. Severo. Ele a lembrou de como se comportara no primeiro encontro deles, quando ele estava bravo por ela o expulsar. Não conseguia imaginar por que estava bravo agora.
— Por que está tão mal-humorado?
Ele não a olhou diretamente, mas mais para o lago.
— Eu disse para não ir ao jardim se saísse sozinha. Poderia ter se perdido.
Ela queria rir.
— Tem um caminho que me trouxe até aqui. Acho que teria encontrado o caminho de volta.
— Mesmo assim, eu disse para não o fazer. Agora, dissera para vir comigo, e também desobedeceu.
— Não pode ficar surpreso. Já sabia que não obedeço ordens, principalmente as que não são racionais.
Ele olhou de repente para ela. Não, não para ela. Para a rocha em que estava sentada. O olhar dele travou ali. Não disse nada. Enquanto ela observava, algo emergiu nele e se misturou com a raiva. Não a substituiu. Se fez alguma coisa, só a piorou. Mas ela não conseguiu ignorar a mudança nele. Seus olhos não ardiam mais apenas com fúria. Também tinham profunda tristeza.
Ela olhou para a rocha, depois voltou à concentração dele. No seguinte instante terrível, ela pensou que sabia o que o tinha mudado tanto, e o que ele via enquanto encarava.
Ela saiu da rocha.
— Sim, vamos. Obrigada por me encontrar. Posso ter me perdido, apesar de achar que nunca o faria.
Ela passou por ele e foi para a beirada da clareira e o começo do caminho. Ele permaneceu onde estava, longe dela, dentro de sua mente.
Ela voltou e o abraçou, por algum tempo. Isso o fez olhar para ela. O coração dela se apertou com a dor que viu nele. Ela pegou seu braço com um sorriso, como se não tivesse percebido, e apressou-o para sair da clareira.
Eles voltaram para a casa em silêncio. Ela não ousou falar. Tinha se intrometido em algo particular naquela clareira ao qual não tinha direito. Perguntou-se se um dia ele a perdoaria por isso.
O caminho de Epsom para a pista de corrida era de apenas um quilômetro e meio, mas Clara concluiu que poderiam ter ido andando e chegado em metade do tempo que a carruagem levou. Ela tinha voltado à cidade a fim de se reencontrar com Althea. A única coisa boa sobre a viagem lenta entre centenas de outros veículos era sua confiança de que muitos olhos a viam com sua amiga em uma quinta de manhã.
Pessoas de todos os lugares preenchiam a estrada. Das carruagens mais chiques às carroças mais humildes, todos iam para a corrida que demoraria apenas alguns minutos para se completar. Ela olhou para fora pela janela e percebeu que não seria uma boa ideia ir andando. Aqueles que usavam os pés em vez de rodas eram obrigados a sair da estrada completamente e andar nos campos molhados e na grama ao lado.
— Não me importo de disfarçar por onde realmente anda, Clara — Althea disse. — Mas acho que significa que posso ouvir se seu encontro está indo bem.
— Foi muito bom. Pelo menos até esta manhã depois do café.
— Vocês discutiram?
— Mal conversamos antes de eu partir. — Ela contou a Althea sobre o passeio na floresta e encontrar o lago e a rocha. — A raiva dele não fazia sentido, até eu perceber onde estava. Acho que o pai dele fez ali. Matou-se.
— Oh, nossa. Por isso ele não a queria andando sozinha.
— Consegui perambular exatamente por onde ele não escolheu andar. Acho que provocou lembranças que permaneceram nele até minha carruagem partir.
Ela nunca esqueceria do olhar nos olhos dele na clareira. Raiva vívida e dor profunda e emotiva. O coração dela conhecia o luto e o reconheceu nele. Deve ter sido muito pior perder um pai da forma como ele perdera.
— Ainda vamos nos juntar a ele na arquibancada, como ele planejou? — Althea perguntou.
— Acho que vamos descobrir em breve. Ele disse que um criado viria até nós quando chegássemos. Se ninguém o fizer, ou ficar claro que não nos veremos...
— Ainda assistiremos à corrida, apenas com uma vista menos vantajosa.
Clara não teve coragem de contar a Althea que ver a corrida, que ela estivera tão empolgada desde a proposta de Stratton, não lhe interessava mais. Uma preocupação doentia se alojara em seu coração. Depois de ficarem tão próximos na noite anterior, a distância de Stratton naquela manhã a deixou nervosa. A formalidade fria tingia cada palavra que ele disse. Fora como se tivessem compartilhado intimidades em um mundo diferente. Talvez o tivessem, e entrar naquela clareira o trouxera de volta à Terra.
A carruagem não se movera em alguns minutos. Agora, o sr. Brady abriu a porta.
— Não chegaremos mais perto. — Ele colocou a escadinha e lhes estendeu a mão. Apontou para a ponta de uma cerca ao longo da estrada. — Estarei bem ali quando precisarem de mim. Procurem aquele último poste e estarei ali perto, independente de onde a carruagem estiver. Não me demoraria muito na corrida se quisesse chegar a Epsom antes do cair da noite.
Clara lhe agradeceu, depois ela e Althea passaram pelo mar de carruagens e o monte de pessoas.
— Não sei como alguém vai ver alguma coisa — Althea disse. — Parece que estão indo para perto da pista. Tem mais de um quilômetro, então a vista ficará longe do final.
Claro que elas precisavam ir até onde a corrida iria terminar, então isso não ajudou muito. Finalmente, depois de muito desvio e caminhada, chegaram à arquibancada grande onde a família real assistia confortavelmente no alto.
A arquibancada grande era a única construção permanente, mas havia outras colocadas ali temporariamente ao redor. Algumas tendas grandes as rodeavam.
Clara se obrigou a não olhar para as arquibancadas. Uma pertencia a Brentworth, que tinha um cavalo de corrida. Seria o criado dele que viria convidá-las para subir, se ninguém o fizesse.
— Não pareça tão carrancuda — Althea falou. — Tenho certeza de que superestimou o humor dele esta manhã. O pior que pode acontecer é eu e você aproveitarmos o dia, e você vai ficar comigo naquela casa muito linda esta noite. É tão encantadora que estou ficando mimada. Estou certa de que ele precisava me deixar ali por mais do que dois dias. Talvez você e eu possamos ficar por uma semana antes de voltarmos.
Clara enganchou o braço no de Althea.
— Parece o paraíso. Podemos passar o tempo planejando as próximas três edições do jornal entre visitas ao spa para longas imersões.
Encontraram um lugar onde conseguiam ver alguma coisa além de chapéus de homens e boinas de mulheres. Não muito depois de terem chegado ali às cotoveladas, um criado uniformizado se aproximou para informá-las de que o Duque de Brentworth pedia a companhia delas na arquibancada dele.
— Viu? — Althea disse enquanto seguiam o criado de volta pela multidão.
Clara pensou que não veria nada até olhar Stratton de novo nos olhos.
— everíamos apresentar um projeto de lei para melhorar as estradas de Londres — Langford disse.
Estava ao lado de Adam enquanto ele olhava a multidão no mesmo nível em que os cavalos iriam correr. Ao lado de Langford estava a estilosa e adorável sra. Harper. Pela forma como ela e Langford trocavam sorrisos, Adam supôs que a sra. Harper era uma nova e complacente amante.
Brentworth observava do outro lado de Adam. Brentworth deixara sua amante em Londres. Adam achava que a maior parte da cidade nem sabia que ele tinha uma.
Outros se apertavam na plataforma. Como proprietário de um dos cavalos, Brentworth criara uma pequena festa ali e convidara, no mínimo, vinte pessoas para se juntar a ele. No fundo da arquibancada, havia uma plataforma com mesa arrumada com prataria, louças e toalha chiques com comida suficiente para alimentar cinquenta.
Langford e sua nova amante saíram para se sentar nas cadeiras confortáveis e voltaram sua atenção somente um para o outro.
Brentworth olhou por cima do ombro para a sra. Harper.
— Ouso dizer que Langford ficará muito mais pobre antes que ela acabe com ele.
— Ambos parecem euforicamente felizes, então duvido que ele vá se importar com o custo.
— Langford se comportou assim, pelo menos, umas doze vezes, pelo que me lembro. Nós todos ficamos euforicamente felizes no auge da paixão. Exceto você, aparentemente. Está cismado, apesar de seus esforços para esconder.
— É passageiro. — E era. Ver aquele lugar de novo tinha estremecido sua alma, e bem pior do que esperava. Conforme ele ficava ali parado, tudo voltava. O choque e o luto, e também o ódio. Sabia que tudo aquilo o esperava. Evitara retornar por um motivo.
— Talvez, quando Lady Clara se juntar a nós, passe totalmente. Aí vem ela.
— Não sei como consegue ver alguma coisa nessa multidão.
— Faço meus criados usarem uniforme, assim consigo enxergar o trançado dourado em seus chapéus tricornes. Quando penso em acabar com as tradições antiquadas, penso nesse trançado e em como é útil para ocasiões assim.
Adam viu o chapéu e as duas mulheres atrás dele. Clara olhou para cima ao encarar as escadas. Ela o viu imediatamente. Seu sorriso pareceu tentador.
Ele havia se comportado mal de manhã quando a encontrou na nascente. Tinha sido grosseiro e permitira que o passado controlasse sua reação.
Clara adivinhara o motivo. Ele soube, pela forma delicada como ela falou com ele e a maneira como o apressou para se afastar do local.
Assistiu-a subir, seus lindos olhos brilhando com humor enquanto ria de algo que Althea disse. Ele fora um caos de sentimentos sombrios naquela manhã, mas só a presença dela já fornecera o conforto que ele conhecia.
Ela e Althea entraram na plataforma. Ele e Brentworth foram até elas, e Clara apresentou a amiga. Ambas lhe agradeceram pela gentileza de convidá-las para assistir daquele lugar elevado.
Adam levou Clara para o lado. Podia ver sinais de sua hesitação, e a intimidade profunda da noite pareceu distante.
— Está aborrecida por ter demorado muito para encontrar as senhoritas e trazê-las aqui? — ele perguntou.
— Nem um pouco. Com essa multidão, é um milagre o criado ter conseguido.
— Então, por que o sorriso rígido e os olhares semicerrados, Clara?
Ela permaneceu em silêncio, sujeitando-o a uma longa análise.
— Estou me perguntando com que Stratton estarei hoje. O de ontem à noite, ou o desta manhã.
— Sou sempre o mesmo homem.
— É mesmo? Eu era uma estranha naquela casa esta manhã, depois de retornarmos do jardim. Uma estranha para o senhor. Em troca, o senhor era um estranho para mim. Acho que sei por quê, e como me ver naquela nascente o afetou seriamente. Apesar de eu me solidarizar bastante, não gostei de ser despejada esta manhã com menos cerimônia ou gentileza do que alguma prostituta que encontra em uma taverna. — Sentimentos além da raiva coloriam sua expressão.
— Está exagerando. Não fui tão frio assim.
— Duvido que se lembre bem o suficiente para saber. O senhor estava completamente imerso em pensamentos, e nenhum deles tinha a ver comigo.
— Claro que a senhorita estava em meus pensamentos.
Ela inclinou a cabeça.
— Não de uma forma boa, então.
Ele não queria ter aquela conversa ali, e falou as palavras necessárias a fim de garantir que não iria acontecer.
— Então peço que me perdoe por esta manhã, Clara. Não merecia a maneira como falei com a senhorita quando a encontrei na nascente e a forma com que a tratei depois. Minha distração não tinha nada a ver com a senhorita.
Só que não era completamente verdade. Uma parte era, não era? O que acontecera na clareira o enviara para longe da Inglaterra e o trouxera de volta, e ela não estava totalmente excluída dos acontecimentos, mesmo que ele tentasse dizer a si mesmo que não.
Ela sabia disso também. Ele podia ver em seus olhos.
— Família, até paixão, não muda o que somos — ela disse.
Soava como se ele fosse condenado, e um epitáfio para o caso de amor deles.
— Althea sugeriu que eu fique em Epsom com ela esta noite. Na verdade, ela quer que aproveitemos aquela casa por muitas noites ainda.
— Pode fazer como quiser. No entanto, eu espero que não o faça.
Pelo sorriso que ela lhe deu, ele pôde ver o que ela faria. Clara voltou a atenção para o tablado atrás deles.
— Se nos aproximarmos daquela parede casualmente, acha que consigo xeretar os duques reais sem ser tão óbvia?
— Vou apresentá-la a alguns deles, então não precisará xeretar.
Ele a acompanhou até lá e o fez. Os duques reais, todos, tinham olho bom para mulheres, e haviam conhecido o pai dela. Alguns pareceram surpresos em vê-la na companhia do Duque de Stratton. Conversaram um pouco e foram apenas interrompidos pelos gritos da multidão, indicando que a corrida começara. Então voltaram à frente da plataforma.
Clara assistiu à corrida com uma expressão extasiada. Brentworth torceu por seu cavalo, e em volta deles havia uma empolgação crescente. Quando os cavalos saíram de vista, Clara se equilibrou pegando o braço de Adam e se debruçou para fora da arquibancada o máximo que pôde para continuar vendo-os.
Acabou em minutos quando os cavalos alcançaram a linha de chegada. O dinheiro começou a trocar de mão.
— Quase — Adam disse a Brentworth, que fez uma careta severa para os resultados.
— Isso não me salva disso. — Ele colocou a mão no bolso e tirou um pacote de notas de dinheiro. Tirando cem, ele entrega a Langford, que estava esperando.
— Você aposta contra o cavalo dele, mas comeu a comida dele e aproveitou sua hospitalidade? — Clara perguntou.
— Eu sabia que Moses ia ganhar. Tenho observado-o por um ano. Até tentei comprá-lo para o Duque de York. — Langford sorriu para o dinheiro. — É bem parecido com achar dinheiro perdido na rua. Implora para ser gasto de forma decadente.
— Você vai pensar em algo apropriado — Brentworth disse.
Langford olhou por cima do ombro para sua adorável sra. Harper.
— Acho que vou pensar ali.
Lá embaixo, a multidão se agitava como um animal enorme vivo, criando tentáculos conforme as pessoas iam embora em filas. Haveria entretenimento no campo para aqueles que quisessem passar o dia, mas a apresentação principal tinha terminado.
Ainda corada com empolgação, Clara olhou em volta na plataforma.
— Ah, ali está ela. — Acenou para a amiga, que estava sentada perto do fundo, conversando com uma mulher.
Althea pediu licença e veio se juntar a eles.
— Deveríamos procurar o sr. Brady? — ela perguntou à Clara.
— Acho que sim. Vou me despedir de Brentworth. — Então se afastou.
Althea permaneceu. Baixa, elegante e loira, sorriu serenamente.
— Eu deveria explicar uma coisa, Sua Graça.
— O que é?
— Ela confiou no senhor com pouco motivo para isso e muito motivo para não o fazer. Se abusar dela de alguma forma, se trouxer mágoa e humilhação para a vida dela, o senhor vai responder a mim.
Nunca uma pessoa tão pequena o tinha ameaçado de maneira tão poderosa. Ele teria dado risada, mas ela falava sério. Mesmo com todos os seus sorrisos, ela estava mortalmente séria.
— Não farei isso.
Assentindo, ela foi se juntar à Clara. Ele ficou observando até ambas partirem.
Na plataforma, as damas estavam sentadas para jantar à mesa. Os cavalheiros apostavam em um bar improvisado adiante. Um dos criados dava as cartas para jogar vinte e um.
— Isso é bem melhor do que tentar passar por todas aquelas carruagens — Langford disse enquanto olhava suas cartas.
— Sou obrigado a concordar. Além disso, quanto mais você fica, mais certeza tenho de que vou ganhar de volta aquele dinheiro — Brentworth declarou.
— Não estamos jogando um contra o outro, mas contra o banco.
— E quem você acha que forneceu o banco? — Adam perguntou.
Langford olhou para o criado e a pilha de dinheiro diante dele.
— Excelente argumento.
A multidão lá embaixo havia dispersado bastante, mas ainda se podia ouvir o barulho do campo no qual muitos veículos aguardavam. Adam pensou se Clara e Althea já tinham conseguido sair.
Também se perguntou se o subterfúgio do dia anterior iria se repetir ou ele deveria presumir que Clara permaneceria com a amiga. Provavelmente a segunda opção. Já que voltar a Kengrove Abbey significaria encarar a verdade, ele não estava com pressa de ir embora.
Nem seus dois amigos. Ambos eram convidados dos Oaks e do Conde de Derby, cujo nome foi homenageado pela corrida. Derby se juntara a eles e se sentou no bar de cartas por um tempo. O Duque de Clarence, que se tornara herdeiro da coroa com a ascensão de seu irmão George, acomodou-se para uma visita mais longa. Outros vinham e iam. Isso lembrou Adam dos camarotes no teatro, já que outras plataformas também davam suas festas.
As apostas aumentaram. O vinho e o uísque fluíam. Os homens começaram a conversar do jeito que faziam em seus clubes. Com algumas sobrancelhas erguidas, as damas iam embora para buscar companhias mais gentis. Até a sra. Harper desapareceu. Os criados trouxeram charutos.
A notícia de que se poderia passar um bom tempo na plataforma de Brentworth se espalhou, porque mais homens entraram. Um grupo atacou a comida na mesa e usou a ponta dela para outros objetivos. Os criados continuavam trazendo mais garrafas.
— A sorte está com você hoje, Stratton. Você está positivo, em o quê, duzentos? — Brentworth perguntou.
— Verdade? Não estou contando.
— Olha só, gosto de homens que não reparam em seus ganhos e perdas. Geralmente perdem mais — o Duque de Clarence gritou. — Sinta-se à vontade para apostar comigo a qualquer hora.
Langford saíra por um tempo, mas agora recuperara seu lugar.
— Sua comida está bem superior à da plataforma de Portland. Ele nem tem champagne.
— Nem eu — Brentworth disse.
— Daí minha pequena missão de busca.
— Você foi ao acampamento do inimigo para ver se as provisões eram superiores? — Adam perguntou. — Que desleal da sua parte.
— Tinha esperança de beber champagne. Só uma taça. Brentworth aqui não se importa com isso, então todos nós devemos sofrer.
Brentworth bebeu uma taça com algo bem mais poderoso do que simplesmente champagne.
— Não consigo suportar vinho que provoca bolhas no nariz.
— Você nunca desenvolveu gosto. Não teve isso em sua juventude, porque seu pai era o duque certinho, assim como você é agora. Minha família, por outro lado, de alguma forma, conseguiu obter champagne durante toda a guerra.
— Havia somente uma maneira de fazer isso — Adam disse. — Você acabou de admitir que comprava produtos contrabandeados, Langford.
— Alguém tinha que comprar. Do contrário, as estradas de Kent a Londres teriam ficado cheias de caixas de mercadoria.
Brentworth balançou a cabeça.
— Nós tínhamos bastante champagne em casa durante a guerra. Meu avô comprava uma boa quantidade quando via oportunidade, então nossa adega ficava bem abastecida. Já que ele não era o... como você disse?... duque certinho, é verdade que meu pai não apoiava contrabandistas. Se não estivesse bêbado, não admitiria que sua família fazia isso. Soa desleal.
— Não tão desleal quanto os feitos de algumas das suas famílias, sem mencionar nomes, claro. — A voz inserindo essa observação veio detrás deles.
Adam virou a cabeça e viu o Marquês de Rothborne em cima de seu ombro, olhando para baixo com um sorriso embriagado e olhos lacrimejantes. O marquês não era mais jovem e arruinara sua saúde há muito tempo com bebida.
— Excelente uísque, Brentworth — Rothborne elogiou, erguendo o copo. — Escocês?
— Irlandês, e acho que o senhor aproveitou bastante dele.
— Ouvi que você tinha o melhor, então aqui estou. Claro que ninguém me falou sobre sua companhia. Sou um pouco mais nervoso do que você, acho. Evito me sentar à mesa com um homem que só tem título porque seu pai escapou do julgamento atirando nos próprios miolos.
Rothborne deu risada de sua própria piada. Brentworth congelou. Adam começou a decidir qual amigo seria seu assistente no duelo. Ninguém na mesa disse nada. Parecia que ninguém também respirava muito.
— Está bêbado, Rothborne — Langford disse. — Desculpe-se, depois sente e jogue. Estou perdendo muito, e o destino ordena que eu pare um pouco. — Ele se levantou. — Aqui, use minha cadeira. Posso arruinar minha fortuna outro dia.
— Nunca vou sentar ao lado dele.
Com um sorriso afável, Langford segurou o ombro de Rothborne. Apertou forte, colocando seu peso e sua força.
— Eu insisto que se sente em meu lugar. Sente.
O corpo de Rothborne caiu na cadeira. Seu rosto ficou vermelho. Lentamente, ele virou a cabeça até olhar para Adam, bem ao seu lado.
— Tenho certeza de que quer se desculpar — Brentworth disse do outro lado de Adam e gesticulou para o criado lhe dar outra carta. — Será sábio fazê-lo antes de essa jogada terminar. Duvido que possa segurar Stratton mais tempo que isso.
— Para o inferno que vou me desculpar.
Brentworth suspirou e balançou a cabeça.
— E hoje foi um dia tão agradável. Agora vai terminar mal, e tudo por causa de um tolo bêbado que não soube segurar a língua. Desculpe, Stratton. Como anfitrião, sinto-me responsável.
— Alguma hora tinha que acontecer. Se não fosse esse tolo bêbado, então seria outro. De alguma forma, acostumei-me a matá-los. — Ele voltou seu olhar para Rothborne e esperou que esse tolo em particular recuperasse sua razão nos próximos dois minutos.
Langford se inclinou para falar no ouvido de Rothborne.
— Caso tenha se esquecido de como isso funciona, deixe-me lembrá-lo. Stratton precisa contestá-lo agora. Seu orgulho não vai deixá-lo recusar, mesmo quando, pela manhã, acordar sóbrio e perceber que vai morrer em breve. Não foi um pequeno insulto à honra dele, e ele era um atirador especialista quando tinha quinze anos.
— Eu não vou morrer. Ele vai, com mais honra que o pai, pelo menos.
Outro silêncio rígido pairou sobre os homens à mesa. Adam percebeu que alguns dos outros da plataforma agora observavam. Inferno.
— Rothborne, não me dá escolha a não ser...
— Desculpe-se — o Duque de Clarence, que estivera assistindo com minuciosa atenção, cuspiu o comando. — Vou ter que explicar que me sentei aqui enquanto um duque e um marquês arranjavam um duelo? Pare de ser idiota, Rothborne.
— Mas eu...
— Eu disse para se desculpar agora, ou vou pedir para George chamá-lo no palácio como uma criança e enviá-lo para o sul do país. Alguns anos em lugares rústicos podem lhe fazer bem.
Rothborne pareceu miserável. Seu queixo baixou até o peito. Ele murmurou algo. Langford, ainda perto dele, olhou para Adam e deu de ombros.
— Não conseguimos ouvi-lo — o Duque de Clarence anunciou. — O senhor insulta alto o suficiente. Pode falar claramente agora também.
— Desculpe, Stratton. Não estou me sentindo bem hoje. — Ele mal falou, sua voz estava muito estrangulada.
Langford soltou o ombro de Rothborne, mas lhe deu um tapa bem caloroso nas costas que chacoalhou o corpo do homem.
— Ah, isso mesmo. Agora, fique e jogue uma ou duas rodadas, para todo mundo ver que todos somos bons amigos.
Rothborne jogou duas rodadas, depois se levantou e saiu cambaleando. Langford retomou seu assento. Seu olhar encontrou o de Adam de uma forma ameaçadora. Adam não falou nada. Agradeceria a Langford e Brentworth depois.
— Agradecemos sua ajuda — Brentworth disse ao duque real.
— Sim — Adam concordou. — O senhor me poupou de um aborrecimento desagradável.
— Não poderia deixar que ele arruinasse um dia em que estou bebendo um uísque tão bom. Irlandês, então? — Ele bebeu tudo.
— Vou pedir que enviem uma caixa ao senhor — Brentworth prometeu.
— Não precisa, não precisa. Meu médico pede que eu beba mais cerveja ultimamente. Embora não me importaria de beber um pouco daquele champagne que seu avô escondeu, se tiver sobrado.
— Brentworth vai me contar sobre a fonte, e vou enviar um pouco da França — Adam disse.
Eles continuaram jogando. Adam ficou porque ir embora agora ficaria ruim. Contribuiu com a camaradagem, mas a ameaça de Rothborne pesou nele.
Haveria outro tolo outro dia. Mesmo que, por um milagre, ele limpasse o nome do pai, duvidava que isso fosse parar.
lara assistiu ao entardecer, depois a noite se acumulou do lado de fora das janelas. Começou a pensar que Stratton não voltaria naquela noite.
Culpava apenas a si mesma se isso acontecesse. Ela não tinha lhe prometido que iria lá, como planejado originalmente. Quando eles se separaram, ela não sabia se iria.
Mesmo assim, ali estava ela, sentindo-se menos confiante em sua decisão a cada minuto. Ele fora muito gentil na corrida. Muito charmoso. Ela não duvidava que sua desculpa tenha sido sincera. O tempo amenizara o pior de seu humor também. Ela ainda sentiu aquela sombra e a viu em seus olhos, mas não com a intensidade da manhã.
Perigoso. Havia se esquecido de que as pessoas diziam isso sobre ele. Ele não parecera perigoso para ela. Não da forma que os boatos diziam. Naquela manhã, no entanto, quando ele apareceu na clareira, aquela palavra se encaixou bem demais.
Será que ele estivera lá naquele dia? Será que tinha visto o resultado? Ela suspeitava que sim. Ele estivera perdido para ela, para o mundo todo, enquanto encarava aquela rocha. Perdido para si mesmo também. Olhou em volta no cômodo no qual descansava. Althea dissera para ela não ir lá. Se ele precisar de você, vai encontrá-la, ela tinha dito. Althea pensava que, como a maioria dos homens, Stratton iria querer ficar sozinho depois de perder a batalha para si mesmo. Provavelmente, Althea estava certa.
Adam entrou na casa perto da meia-noite. Tinha sido um dia infernal. A única coisa boa havia sido ver Clara. O tempo que passaram juntos na corrida foi um período brilhante rodeado por tempestades. Havia um quadro assim na galeria, uma paisagem de um dia nublado com feixes da luz do sol ultrapassando as nuvens, iluminando algumas fazendas no meio. Eventualmente, claro, as nuvens iriam se fechar sobre aquelas fazendas também.
Demorara dois meses para alguém desafiá-lo ali na Inglaterra. Como esperado, não tinha sido um homem que se responsabilizava pelo que acontecera há anos. Rothborne poderia saber o que qualquer um em sua posição saberia ou ouvira em conversas privadas, mas estava bêbado com tanta frequência que sua voz não tinha influência, e sua mente confusa nunca poderia formar um argumento para agir.
Adam subiu as escadas. Por impulso, foi até o cômodo que Clara tinha usado. No segundo antes de abrir a porta, uma esperança o tomou. No instante seguinte, essa esperança desapareceu. Ela não estava ali, claro. Por que estaria? Um pedido de desculpa não o absolvia da forma fria com que a tratara naquela manhã. Ele não a culpara, não com palavras, nem em sua mente, mas ela havia visto o que tinha dentro dele e provavelmente achou que ele culpava a família dela.
Família, até paixão, não muda o que somos.
Foi até seu quarto, grato agora por ter sido completamente reformado para que nada de seu ocupante anterior o assombrasse. Seu servo dormia em uma cadeira no quarto de vestir. Ele não queria nenhum criado bajulador se impondo sobre ele agora. Empurrou o camarada para acordar e o expulsou. Então tirou seus casacos e se sentou para tirar as botas.
A segunda bota fez um barulho alto no chão. Ele tirou a camisa.
Havia outra presença no quarto; ele sentiu antes de olhar. Quando virou a cabeça, viu Clara na soleira, envolvida com o lençol. Seu ombro nu indicava que ela estava nua por baixo. Estava linda ali, iluminada pela luz dourada fraca do candelabro. Parecia estar emergindo das sombras, pouco visível, mas elegante e linda.
— Pensei que tivesse ficado em Epsom — ele disse.
— Decidi não ficar.
— Não posso imaginar por quê.
Ela ergueu um pouco a sobrancelha.
— Não sei se posso também.
Ele estendeu o braço.
— Venha aqui. Solte o lençol.
Ela soltou e foi até ele, nua e adorável. Ele a colocou no colo encarando-o, para que ela conseguisse segurar no peito dele. Seu calor o inundou. A satisfação se espalhou como um suspiro longo e físico.
Seu rosto se aconchegou no pescoço dele.
— Fiz errado? Cometi um erro?
— Estou feliz que esteja aqui. — Acariciou as costas dela e desceu até o quadril e as nádegas enquanto ela se deitava contra ele. As respirações dela se aceleraram de um jeito ritmado conforme sua excitação crescia.
Ele deveria levá-la para a cama e lhe mostrar gratidão dando-lhe todo o prazer que ela já imaginou. Deveria expressar sua afeição fazendo amor lentamente. Em vez disso, um desejo forte e desesperado explodiu nele.
Ergueu-a de joelhos e a colocou para montar nele. Ele usou a boca em seus seios e tirou as roupas de baixo. Ela apoiou os braços no encosto da cadeira enquanto ele empurrava impiedosamente na direção da renúncia que não lhe negaria nada.
Ele colocou a mão nela até ela chegar ao alívio, depois assistiu-a desfalecer. Os tremores de seu alívio a chacoalharam com força. Lindamente. Enquanto ela os sentia, ele colocou suas pernas em volta de sua cintura, levantou-se e a carregou para a parede mais próxima. Com furiosas investidas, ele exorcizou as lembranças e os ressentimentos que o assombravam.
— Essa cama é muito boa. — Clara fez a observação durante a noite.
Eram as primeiras palavras desde aquelas no quarto de vestir. Só agora, uma hora depois que ele a carregara para sua cama e fizera amor uma segunda vez, ambos se acalmaram o suficiente para alguma conversa. Parecia um assunto seguro.
— É, não acha? Boa e grande, para que eu me sinta um duque apropriado. É tudo novo. Fiquei surpreso ao ver quando cheguei.
Muitas respostas vinham à sua mente, mas cada uma o levava de volta ao seu pai. Então ela não disse nada.
A cama em questão parecia desonrada naquele momento. Eles estavam deitados sob o lençol que ela tirou no quarto de vestir. Mal os cobria, fora levado até ali de algum jeito e jogado desordenadamente. As empregadas se perguntariam o que tinha acontecido. Mas provavelmente saberiam.
Ela estava deitada no peito dele, saciada, e, para dizer a verdade, um pouco dolorida. Não se importava. Seu espírito soubera o que havia dentro dele enquanto acontecia. Seus alívios foram muito mais do que um prazer carnal.
— Quase tive que desafiar um homem hoje — ele disse. — Um camarada bêbado e estúpido. Ele não conseguia se conter. No mínimo, vinte homens ouviram o que ele disse, então não poderia fingir que eu não o tinha.
— Ainda assim, não o desafiou. — Ela fez uma declaração, mas procurou confirmação. Não havia garantia de que o estúpido camarada não era bom com uma pistola.
— Langford e Brentworth tentaram intervir, mas foi o Duque de Clarence que salvou o dia. Graças a Deus ele gosta de desobedecer seu médico ao beber o uísque de Brentworth, ou poderia ter ido embora mais cedo.
— Dizem que ele é chamado de Tolinho. — Seu pai tinha lhe contado isso, mas ela não disse essa parte.
— Eu sei, mas não por mim depois de hoje.
Ficaram deitados em um silêncio pacífico, ambos acordados, a mão dele subindo e descendo pelas costas dela como se ditasse os ritmos dos pensamentos dele.
— Ele morreu lá, naquela clareira. Mas acho que adivinhou isso.
As palavras dele cortaram a noite. Clara prendeu a respiração.
— Era um de seus lugares preferidos. Ele e minha mãe iam lá. Acho que às vezes se banhavam naquela nascente, não que eu já tenha visto.
Ela não ousou falar. Permitiria que ele dissesse o que quisesse, embora seu coração já pulasse pelo que estava prestes a ouvir.
— Ele esteve melancólico por meses. Eu não sabia de tudo ainda, mas sabia o suficiente, porque também não fui poupado. Naquele dia, sugeri que fôssemos cavalgar. Era minha tentativa de distraí-lo. Quando ele não apareceu no estábulo na hora combinada, eu soube. Simplesmente soube. Então fui procurá-lo.
Clara fechou os olhos para tentar conter a angústia que sentia por ele.
— Ele deve ter se sentado naquela rocha, mas caíra ao lado dela. Era o que os romanos antigos faziam, para salvar suas famílias e fortunas, quando a desgraça caía sobre eles. Para salvar seus filhos. Senti uma raiva terrível naquele dia, a maior parte por ele. Ainda sinto, o que parece injusto.
— Essa raiva é comum quando aqueles que amamos nos deixam.
Ela sabia disso por experiência própria, e não perdera o pai do jeito que ele perdeu.
Ele beijou sua cabeça.
— Não tinha ido lá desde aquele dia. Até esta manhã. Foi por isso que...
— Não precisa explicar. — Ela se esticou e o beijou.
Ele passou os dedos no cabelo dela e segurou sua cabeça para um beijo mais profundo, cheio de sentimento. Então puxou o lençol até os ombros dela e a aconchegou debaixo de seu braço.
Ela ficou ali, sonolenta agora, seu coração inundado com camadas de emoção.
— Não precisava explicar — ele disse. — Mas queria.
rentworth percebeu a distração de Adam.
— Vejo que o estou entediando.
— Estou escutando cada palavra. Acabou de confessar que tem uma nova amante. Estou esperando descobrir o nome dela, mas pensando se planeja compartilhar.
— Acho que agora não. O que está olhando? Parece um tigre observando sua presa. — Ele virou a cabeça para procurar na multidão do salão. — Já foi ruim você ter me convencido a vir. Sabe que não gosto de festas assim, e Lady Prideux não tem limite em seus convites. Você poderia, pelo menos, me ocupar com uma conversa.
— Eu precisava de você aqui. Ele pode me ignorar, mas não vai ignorar você.
— Quem é ele?
— Hollsworth. Venha comigo.
Adam deu três passos, depois percebeu que Brentworth não o seguira. Olhou para trás e viu a expressão severa de Brentworth em seu estilo bem ducal.
— Não vou a lugar algum — Brentworth disse. — A menos que me adiante por que vou aonde quer que seja. E, antes que diga alguma coisa, vou deixar bem claro que não serei seu assistente se desafiar Hollsworth. Ele é idoso, e um duelo seria o mesmo que assassinato a sangue frio.
— Acha que sou capaz disso?
Brentworth suspirou.
— Claro que não. É só que... — Ele suspirou de novo. — Vá na frente. Tente não me obrigar a perder um amigo esta noite. Meu pai conhecia Hollsworth há décadas.
— Não acho que vá perder a amizade dele esta noite.
— Não estava me referindo a essa amizade em particular, Stratton.
Adam guiou o caminho pela multidão até as portas do terraço.
— Está úmido esta noite. Neblina pesada. Não acho que teremos muita companhia.
A neblina estava tão baixa que a figura solitária de Hollsworth mal aparecia perto da fachada de pedra.
— O que ele está fazendo aqui fora? Ah, está com um charuto — Brentworth sussurrou. — Mas está tendo uma dificuldade dos diabos para acendê-lo. Não vai ficar muito tempo.
— Convide-o para se juntar a nós. — Adam tirou dois charutos do casaco.
— Você nunca vai conseguir acender nesse tempo.
— Convide-o. Vou acendê-los.
Brentworth fez uma demonstração de aparecer através da névoa.
— Hollsworth, é o senhor aí? Junte-se a nós. O senhor e eu podemos apostar se meu companheiro consegue acender.
Hollsworth olhou.
— Brentworth. Não o vi aí. Se conseguir acender, será melhor que eu. Maldita neblina.
Ele andou devagar. Só quando chegou ao lado de Brentworth foi que viu Adam. Demonstrou desânimo por trás das lentes grossas.
Adam usou seu fósforo na área coberta da fachada do terraço e acendeu o fogo. Hollsworth o usou rapidamente, depois foi Brentworth. Apagou antes de Adam tentar acender seu próprio charuto.
— Isso é muito melhor do que aquela multidão lá dentro — Brentworth declarou.
— Eu mesmo detesto-a — Hollsworth disse. — Minha esposa sempre quer participar, mas eu fujo quando posso. Na minha idade, bailes não são interessantes. São para os jovens, como vocês dois. Uma chance de ver todas essas moças.
— Normalmente estaríamos fazendo exatamente isso, mas o terraço chamou Stratton aqui.
— Bom, não há nada como um bom charuto, concordo.
— Não foi a chance de fumar que o atraiu. Foi o senhor.
Hollsworth soprou fumaça tranquilamente. Não parecia feliz. Mas não se moveu.
— Ele precisa saber — Brentworth disse. — Tenho certeza de que concorda.
— Se está querendo brigar com alguém, não tenho um nome para ele.
— Só quero saber a acusação contra meu pai — Adam esclareceu. — Não pode ter sido simplesmente um boato.
Hollsworth olhou para baixo para a ponta brilhante do charuto. Depois, por cima do ombro para Brentworth, que se afastou para a outra ponta do terraço.
— As pessoas escutam coisas — Hollsworth disse.
Adam tinha certeza de que Hollsworth escutava mais do que a maioria. Era o tipo de homem que todos tratavam como amigo porque ele nunca falava muito para criar inimigos. Se ele estivesse na corrida na plataforma de Brentworth, e tivesse sentado para jogar cartas, em quinze minutos, a maioria deles esqueceria sua presença.
— Soube que algumas joias podem ter sido envolvidas.
Hollsworth assentiu.
— Valiosas, pertencentes à sua família. Valem milhares, de acordo com a conta de alguns. Bom, as pessoas falam. Quem sabe o valor? Caíram nas mãos erradas enquanto iam de Córsega a Elba. Mãos francesas. Foram usadas para ajudar a financiar o novo exército.
— Como souberam ou provaram?
— Depois da guerra, foram levantados questionamentos dos envolvidos. Os métodos comuns. Não por nós, claro. Somos mais civilizados.
— Claro.
— Dois oficiais conhecidos falaram disso.
A mente de Adam se rebelava em absorver isso. Os boatos foram infundados.
— Quem as recebeu? Para quem foram enviadas?
— Marechal Ney. — Hollsworth soprou demoradamente, e uma nuvem de fumaça saiu girando pela névoa. — Era amigo do pai de sua mãe.
Inferno. Droga. Ney era o oficial de mais alta patente que se juntou à campanha de Cem Dias de Napoleão, e o único a morrer por isso.
O que será que seu pai disse quando apresentou sua história? Como explicara enviar algo para Ney? E, se enviou ? ele não conseguia acreditar que se permitia pensar isso ?, por quê? Porque sua mãe pediu para ele ajudar um velho amigo da família?
As perguntas continuavam vindo, um caos, enchendo sua cabeça e esvaziando sua alma.
— Ney corroborou alguma coisa disso antes de sua execução?
— Nada. Provou-se um inconveniente. Estávamos muito interessados em saber de onde o dinheiro tinha vindo, como pode imaginar. Precisava de mais do que aquelas joias para montar um exército, a menos que um alqueire de joias francesas completasse. A investigação continuou por muitos anos na França. E aqui.
Adam sabia como tinha terminado, mas não como tinha começado. Cedo, parecia. Muito antes das questões e suspeitas afetarem visivelmente o humor e a distração de seu pai.
— Pode entender por que o governo tinha que verificar tudo isso — Hollsworth disse baixinho. — Era para ser muito discreto. Bem secreto. Bom, isso nunca aconteceu, embora pouquíssimos soubessem dos detalhes. Foi esquecido por um tempo, então vozes que importavam insistiram em continuar e... bom...
— Quais vozes?
— Não lhe darei nomes, eu disse.
— Acho que sei, de qualquer forma.
O charuto de Hollsworth, pela metade, esmoreceu, então. Seu brilho diminuiu, depois se apagou.
— Todo homem tem inimigos. Até um homem como seu pai.
— O senhor não tem.
Hollsworth deu risada.
— Pode-se dizer isso quando se é esquecido. — Ele jogou o charuto no jardim. — Seu pai fez o que achou que deveria fazer. Talvez você devesse deixar assim. — Ele andou para as portas do terraço.
Brentworth saiu da névoa.
— Descobriu alguma coisa?
— Nada bom. — A ideia de entrar naquele baile era horrível para ele. Toda aquela alegria... A neblina úmida combinava melhor com ele.
Mesmo assim, juntou-se a Brentworth na caminhada pelo terraço.
— Acho que não lhe fiz um favor, se não foi nada bom.
— Você me fez um grande favor. Obrigado. Estava certo quando disse a ele que eu precisava saber. — Ele abriu a janela francesa. — Agora me conte sobre essa mulher que o seduziu. Não olhe assim para mim. Você não é tão astuto para eu acreditar que foi tudo ideia sua.
Clara estava sentada no divã em sua sala de estar, com Althea ao lado. Uma mesa portátil, dessas que viajantes usam, estava sobre uma almofada entre elas. Althea estava de frente para ela, com uma caneta no tinteiro. Lady Farnsworth, Lady Grace, sra. Clark e sra. Dalton estavam sentadas com elas. Lady Farnsworth havia pedido xerez de novo, e até instruído a sra. Finley onde encontrá-lo.
Se ela, um dia, tivesse seu clube de mulheres ali, Clara esperava que as tardes nele fossem mais como a que acontecia naquele instante.
— O objetivo — ela disse — é planejar as próximas duas edições do Parnassus. Temos aqui uma lista de assuntos e extensões. Precisamos determinar a forma como os assuntos serão abordados e qual colaboradora escreverá.
— Haverá poesia? — a sra. Clark fez a pergunta em sua voz normal hesitante.
Ela raramente aceitava os convites de Clara para participar dessas reuniões. Embora a sra. Clark sempre tivesse a boa desculpa de sua chapelaria, Clara pensava que o verdadeiro motivo era que a mulher não se sentia confortável sentada assim com outras nascidas em classe tão superior a ela.
Naquele dia, no entanto, a sra. Dalton também estava lá. Uma aristocrata de circunferência considerável e uma nuvem de cabelo branco, a sra. Dalton fornecia textos pesquisados historicamente que assinava como Filha de Boadiceia. Ela tinha ficado amiga da sra. Clark e levara todas as suas boinas e chapéus para serem feitos em sua loja.
— Claro que haverá poesia — a sra. Dalton disse. — Que pergunta.
— Haverá mesmo. Já estou recebendo rascunhos deixados para o jornal em algumas das livrarias. Talvez possa examiná-los e escolher as próximas, sra. Clark.
Clara abriu a mesinha e pegou um maço de papéis.
— Como sabemos que não são escritos por homens? — Lady Farnsworth perguntou.
— É só ver a letra para saber — Althea disse. — Suponho que muitos homens possam ditar para uma mulher a fim de nos enganar. Entretanto, os sentimentos na maioria deles não parecem ser masculinos.
A sra. Clark pareceu feliz e nervosa por terem pedido para ela escolher os próximos poemas. Ela olhou o primeiro com interesse.
— Agora, quanto ao texto de viagem — Clara iniciou.
Lady Grace pigarreou.
— Se estivermos dispostas a receber uma nova colaboradora, poderíamos publicar um texto que provavelmente nos faria triplicar a impressão.
— Que tipo de texto de viagem seria? — Althea perguntou.
— A jornada de uma dama pelo continente com uma pessoa do mais alto cargo. Poderíamos permitir que fosse escrito como uma confiança compartilhada com a autora, se ela não quiser usar o próprio nome.
— Estou correta em presumir que a pessoa seria a falecida Princesa Caroline? — Lady Farnsworth perguntou diretamente. — Pensei que sim. Significa que sua colaboradora seria Lady Anne Hamilton. Visto que Anne já escrevera indiscretamente uma vez sobre a situação de Caroline enquanto a pobrezinha estava viva, não duvido de que ela concordará em fazê-lo de novo, agora que está morta. Quanto à questão de ser sábio para o Parnassus publicar, deixo para outras decidirem.
Seu tom deixou bem clara sua opinião sobre tal sugestão.
— Se preferir que eu não a convide, não vou, é claro — Lady Grace disse.
— Quero pensar sobre isso — Clara pediu. — Sra. Dalton, tem o assunto do seu próximo artigo de história?
— Acho que será uma mulher romana da nobreza. Todos gostam de ler sobre romanos.
— Gostam de ler sobre as orgias, quer dizer — Lady Farnsworth falou. — Encontre uma maneira de incluir isso, e vamos triplicar nossa impressão sem recorrer à traição de Anne em relação à memória da pobre Caroline.
A sra. Dalton ficou triste.
— Não sei se conheço o suficiente sobre orgias romanas.
Clara deu risada.
— Não são necessárias orgias, sra. Dalton. Não deveria dizer tais coisas, Lady Farnsworth. Ela pensa que está falando sério.
— E acha que não estou? — Lady Farnsworth sorriu misteriosamente.
Clara estava prestes a mudar para o próximo item quando a sra. Finley entrou no cômodo e se apressou ao seu lado, inclinando-se para seu ouvido.
— Há uma carruagem estacionando lá fora. A carruagem do seu irmão.
Althea escutou. Levantou-se e olhou para fora.
— Aí vem ela.
Clara sabia quem era ela.
— Ladies, estamos prestes a receber uma visita — Clara anunciou. — Por favor, conversem sobre outra coisa até ela ir embora. Qualquer coisa. — Ela se esticou, tirou os poemas das mãos da sra. Clark e os guardou na mesinha. Althea pegou a mesinha e a colocou na prateleira.
— Ela está aqui? — A voz da viúva podia ser ouvida. — Disse que ela tem visitas? Então vou me juntar a elas.
A viúva apareceu na porta. Parou, surpresa pelo grupo de mulheres que visitaram coincidentemente no mesmo dia. Usando sua sombrinha como muleta, ela entrou e as analisou.
— Bolos. Você é uma anfitriã generosa, Clara. — Seu olhar pairou no decanter. — É álcool?
— Xerez — Clara disse. — Gostaria?
— Devo dizer que não.
— Talvez devesse, mas é isso mesmo que vai dizer, Hannah? — Lady Farnsworth perguntou, rouca.
Isso chamou a atenção da viúva.
— Dorothy. Que estranho encontrá-la aqui.
— Ouso dizer que Clara gosta da minha visita tanto quanto gosta da sua, Hannah.
Sua avó entendeu a insinuação.
— Bom, que festinha boa. — Franzindo o rosto, ela procurou um lugar para sentar.
— Por favor, madame. — A sra. Clark se levantou e ofereceu sua cadeira.
Sua avó aceitou e virou-se assim que se sentou, analisando muito e demoradamente a sra. Clark.
— Por favor, junte-se a nós aqui, sra. Clark — Clara falou, indicando o lugar onde esteve recentemente a mesa portátil.
Clara fez as apresentações. Só falou o nome de suas convidadas e esperou que sua avó não começasse a perguntar o histórico de cada uma. Lady Grace, é claro, já conhecia a viúva, assim como Lady Farnsworth.
— Não deixem que eu interrompa — Vovó disse. — Continuem.
— Estávamos falando sobre a triste história da falecida Princesa Caroline — Lady Farnsworth respondeu. — Tenho certeza de que tem opiniões sobre isso, Hannah.
Tinha mesmo. Dada a idade avançada, ela produziu um monólogo. Pela forma como o sorriso de Lady Farnsworth endurecia, Clara pensou que Dorothy discordava de cada palavra que Hannah disse.
— Você é bem severa, Hannah. Mesmo assim, ficou amiga dela logo, depois se virou contra ela quando o marido libertino dela o fez. — Lady Farnsworth bebeu seu xerez. — Suponho que não quisesse arriscar perder convites das festas obscenamente excessivas dele ao defender uma amiga.
A viúva pareceu, momentaneamente, desanimada com o ataque direto, mas recuperou-se rapidamente.
— Nunca fui amiga dela, Dorothy. Sua memória a engana. Talvez seja todo esse xerez.
— Minha memória está excelente, Hannah. Na verdade, eu estava presente quando tentou ser uma das damas dela. Seria bom se ela tivesse aceitado. Teria lhe dado algo para fazer além de aterrorizar todo mundo.
Os olhos da viúva se estreitaram perigosamente.
— Ao falar algo para fazer, suponho que queira dizer escrever artigos ingênuos sobre política que são publicados em jornais de origens suspeitas, como faz atualmente.
— Se soubesse algo sobre política, saberia que os artigos estão bem longe de serem ingênuos, e o jornal está acima de qualquer suspeita. Mas, sim, quero dizer algo assim.
Clara e Althea trocaram olhares desesperados. A sra. Clark viu, sentada entre elas como estava. Inclinou-se para a frente e pegou o prato de bolo.
— Alguém gostaria de outro? Estão deliciosos.
— Eu gostaria. — Lady Grace pegou um. — Falem, alguém ouviu algum detalhe sobre aquele pequeno drama na arquibancada de Brentworth na corrida? Disseram que Rothborne insultou Stratton e só um dos duques reais impediu que houvesse um duelo ali mesmo.
A atenção da viúva se voltou para Lady Grace. Estava tão chocada que parecia que alguém a tinha estapeado.
— Parece que isso é novidade para você, Hannah — Lady Farnsworth ronronou. — Não sei por quê. Em certo momento, alguém iria começar a falar, e Stratton iniciaria os duelos. Pergunto-me o que Rothborne disse. Acredito que não tenha dito nomes. Deus, que problema isso seria para certas pessoas.
Lady Grace olhou de uma mulher para outra.
— Não acho que foram ditos nomes. — Ela deu uma grande mordida no bolo.
Lady Farnsworth se arrumou e se levantou.
— Bom, é só uma questão de tempo até alguém fazê-lo. Preciso ir, Clara. Aproveitei-me muito de sua hospitalidade, e tenho algo para fazer. — Ela quase gritou as últimas palavras bem no ouvido da viúva ao passar.
Clara acompanhou Lady Farnsworth até a porta.
— Sinto muito por nossa reunião ter sido interrompida.
— Eu não sinto. Não teria faltado por nada. Vou escrever para você com algumas ideias para meu próximo artigo.
A partida de Lady Farnsworth deu às outras uma boa chance de ir embora também. Uma por uma, elas fugiram, até somente Clara permanecer na sala de estar. Não sozinha, infelizmente. Sua avó escolhera ficar.
— Que mulher terrível é a Dorothy. Passa dos limites. — Sua avó havia retornado à postura altiva e rígida. — Não consigo entender por que a recebeu. Ela não tem noção de limite. É escandalosa, prepotente e emite suas opiniões como se fosse o próprio Deus falando. É um milagre que alguém consiga suportar sua companhia.
Clara mal conteve um sorriso no rosto.
— Bom, ela já foi. Que bom que a senhora ficou.
— Precisava ficar. Vim por um motivo. Soube que foi ao Derby. Com uma amiga. Não Dorothy, eu espero.
— Não. Com a sra. Galbreath. — Ela apontou para o lugar de Althea no divã. — É viúva. Seu falecido marido era do exército e morreu em Waterloo.
— Seria melhor se não passasse tempo demais com ela, se é viúva. Não quer que Stratton pense que esteja a par de confidências de uma mulher experiente.
Clara só olhou para ela. Sua avó, na verdade, parecia mortificada.
— Sim, bom, falando do Stratton, fiquei sabendo que foi à arquibancada de Brentworth, e Stratton estava lá.
— Fui, e ele estava.
— É vista bastante com ele.
— Não muito.
— Suficiente para haver falatório. Do melhor tipo. O mundo está esperando, por assim dizer. Se ele não se declarar logo, pode refletir mal para nós.
Clara gostou daquele “nós”.
Sua avó segurou o cabo de sua sombrinha com ambas as mãos e inclinou-se para a frente, usando a sombrinha como apoio.
— Aqui está o que acho que devemos fazer. Acredito que seu irmão deveria visitar Stratton e perguntar a ele.
— Qual seria a pergunta?
— Sobre as intenções dele, é claro. Como o parente homem responsável por você, seria apropriado que Theo buscasse informação de intenções honráveis. Stratton pode estar precisando só de um empurrãozinho.
Clara imaginou aquele encontro. Viu Theo pomposo como algum chefe de família perguntando a Stratton. Então ouviu Stratton dizer a Theo para não se preocupar, já que fora feita uma proposta há semanas.
Ele prometera não revelar isso, não é? Ela, com certeza, lembrara-se de extrair essa garantia dele.
— Vovó, devo insistir que não encoraje Theo a interrogar Stratton de nenhuma maneira. Tal conversa sugere que Theo não confia em Stratton, e, pelo contrário, implica que ele questiona a honra do duque. Depois de todos os seus esforços para ser amiga dele, seria lamentável se as coisas só piorassem.
Sua avó refletiu sobre isso, franzindo o cenho.
— Normalmente, eu discordaria. Dois cavalheiros tendo tal conversa é muito comum. No entanto, após o que Grace disse sobre quase ter havido um duelo... — Ela perfurou Clara com um olhar fuzilante. — Você estava lá? Viu isso?
— Tinha ido embora há muito tempo nessa hora.
— Que infortúnio. Gostaria muito de saber exatamente o que aconteceu.
— A senhora poderia perguntar a Stratton.
— Perguntar ao duque? Acho que não! — Ela se levantou. — Que ideia imprudente. De verdade, Clara, às vezes, não entendo a insistência de meu filho de você ser tão esperta quanto eu. Agora, vou embora. — Ela foi para a porta, onde a sra. Finley aguardava para acompanhá-la. — Perguntar a Stratton...
— reciso ir a Drewsbarrow — Adam disse.
Ele combinara para Clara visitá-lo na Casa Penrose, seu lar em Londres. Ele e Clara subiram as escadas quando ela chegou, e agora satisfaziam outros apetites no jantar.
— O senhor me seduz, depois me abandona rápido assim? Acho que está muito seguro de mim quando não lhe dei motivo para tal confiança.
Os olhos dela refletiam seu desprazer com o anúncio dele. Ele gostou como ela não escondeu a reação à sua ausência iminente. A sofisticação que ela mostrava a outros não mais se estendia a ele.
— Quanto tempo vai ficar fora?
— Uma semana, talvez.
— Não é muito tempo. Mas é tempo suficiente para eu flertar com outros homens. Vou precisar rever meus convites e escolher algumas boas festas.
Ele pegou sua mão e entrelaçou os dedos com os dela.
— É tempo demais, mas necessário.
— Então, claro que deve ir. Vou sentir sua falta, mas tenho assuntos particulares para resolver que farão meus dias voarem.
Ele se perguntava, às vezes, como ela passava o tempo. Sua chegada na carruagem alugada hoje o lembrou que ela as usava no passado e se lembrou de encontrá-la sozinha na cidade longe de Mayfair quando ela ainda morava na casa do irmão.
— Mais afazeres misteriosos? — ele perguntou. — Que assuntos exigem sua atenção?
— Coisas normais de mulher.
— Que tipo de coisas de mulher? A senhorita não faz muitas visitas agora, e não está comprando muitas roupas.
— Mulheres não fazem apenas visitas e compras. Somos pessoas frequentemente ocupadas. Se homens não sabem disso, é devido à falta de interesse, e não nos importamos.
— Porque os homens seriam contra? É isso que está insinuando.
— Talvez. A maioria das mulheres têm um homem que elas podem pensar que vá interferir. Eu, é claro, não tenho.
Não respondo a ninguém, nem ao senhor. Ele entendia que ela tinha motivos para recusar se casar, ambos emocionais e práticos. Só que agora se perguntou se Clara poderia estar envolvida em algo que temia que um marido pudesse proibir.
O que poderia ser? Trabalho de reforma que a levava a áreas perigosas? Demonstrações radicais que pudessem se tornar violentas? O que quer que fosse, a capacidade de ir e vir quando quisesse sem interferência poderia ser o motivo de ela agora morar em Bedford Square.
— Espero que saiba que eu não tentaria impedi-la de fazer algo que realmente importa para a senhorita, Clara.
Ela sorriu docemente, mas ele duvidava de que ela soubesse realmente disso. Ao terminarem a refeição, foram à biblioteca.
— Eu adoro este cômodo. — Ela abriu os braços e deu um pequeno giro no meio dele, olhando para cima. — Foi meu preferido assim que o vi quando o senhor me levou para um tour antes do jantar. Ninguém adivinharia, olhando a casa por fora, que a biblioteca teria uma abóbada.
— À noite, se olhar por aquelas janelas, consegue ver as estrelas na noite limpa, ou até a lua.
Ela se jogou em um divã debaixo da abóbada e olhou para cima.
— Pode mesmo! Que maravilha. A luz da vela daqui de baixo não a alcança, então as janelas ficam bem pretas.
Ele foi até uma escrivaninha e pegou uma caixa na gaveta.
— Tenho algo para a senhorita.
Ele sentou-se ao lado dela e lhe entregou a caixa. O colar de rubi, há tanto tempo comprado, estava lá dentro. Ela o ergueu. A luz do candelabro criou brilhos intensos nas pedras.
— É lindo. E gentil da sua parte. — Ela o abriu e colocou em seu pescoço. — Também é muito generoso.
— Não acho que seja generoso o suficiente. Já passou do tempo de eu expressar meu... afeto pela senhorita.
Ela não pareceu notar a breve pausa causada pela confusão das palavras dele. Ela olhou para baixo, admirando as joias em seu peito.
Para expressar meu amor pela senhorita. Foi isso que ele quase disse. A palavra emergiu em sua língua sem pensar ou escolher. Ele parou porque tais declarações exigiam ambas as coisas. Não queria soar como um homem que declara amor facilmente, sem significado, mesmo que ele tivesse sido esse homem no passado às vezes. Agora se perguntava como ela teria reagido se ele tivesse sido menos cuidadoso.
Ela colocou a mão atrás do pescoço para tirar o colar.
— É esplêndido. Vou encomendar um vestido especial para usar com ele assim que eu puder ostentar joias de novo. Devo encontrar um evento apropriado para a riqueza dele. Um ao qual minha avó não irá.
— Acha que ela não vai gostar dele?
— Ela vai adorar. Este colar é do gosto dela. Adicione mais quatro ou cinco pedras e ela iria amar mais ainda. Não quero que o veja porque vai me perguntar como adquiri.
Ele colocou o braço em volta dos ombros dela.
— Diga a ela que seu amante lhe deu.
Ela deu risada.
— Ou melhor ainda, direi a ela que um dos meus amantes me deu. Oh, posso imaginá-la agora, desconfiada de que eu a esteja provocando, mas se perguntando preocupada se estou falando a verdade.
Ele beijou sua têmpora.
— Ou melhor ainda, diga a ela que eu lhe dei.
Ela parou de rir, segurando o conjunto de ouro com o rubi maior.
— Então ela será implacável tentando forçar uma proposta. O senhor deve me prometer que nunca vai contar a ela que já houve uma. Falsa, mas houve.
— Não vou dar a ela motivo para intimidar a senhorita, mas... nós poderíamos fazer muito pior, querida.
— O senhor certamente poderia fazer muito melhor.
— Acho que não. — Ele virou o rosto dela para poder olhá-la nos olhos. — Preciso me casar, eventualmente. Sabe disso. A senhorita pode escolher continuar assim, mas eu não posso.
A expressão dela se entristeceu.
— Claro que sei. É indelicado me lembrar disso agora, ainda mais depois de me dar esse presente.
— Tem razão. Foi indelicado e atrapalhado. — Ele beijou sua face e sentiu umidade. Nunca esperou ver Clara chorar por nada, muito menos por ele.
Puxou-a para seu colo para abraçá-la e beijá-la até o prazer fazê-la esquecer qualquer infelicidade.
Meia hora mais tarde, eles estavam deitados entrelaçados no tapete, debaixo da abóbada, recuperando a respiração enquanto olhavam para as estrelas manchando as janelas. Ela usava apenas o colar, e ele não usava nada.
— Venha para o interior comigo — ele disse. — Pode ficar em Grange e cavalgar para Dresbarrow todos os dias para ficar comigo.
Ela não respondeu de imediato.
— Claro, se seus afazeres misteriosos permitirem isso...
— Soa escandaloso — ela respondeu com um sorriso malicioso. — Chocante. Uma semana inteira de paixão desenfreada. Alguns chamariam isso de decadente. Que tipo de mulher pensa que sou?
— Uma mulher encantadora. Uma mulher linda. — Ele a beijou. — Uma mulher rara.
Ela deu risada.
— Foram respostas excelentes.
— Posso continuar.
— Por favor, continue.
Ele continuou elogiando-a, com as palavras e depois com as mãos e a boca, até ela concordar tentar se juntar a ele em Warwickshire.
Clara não acreditava que poderia sair da cidade por uma semana sem sua família saber. Teria que contar a eles, mas precisava encontrar bons motivos para ir para lá. Na manhã seguinte, escreveu para sua avó, explicando que precisava ir a Hickory Grange a fim de encontrar o administrador para falar de alguns inquilinos de sua propriedade. Ofereceu-se para trazer qualquer coisa que sua avó quisesse.
Uma carta chegou na postagem seguinte, de Emilia. Fiquei sabendo que vai para Warwickshire. Por favor, não fique muito tempo lá. Ficarei com uma companhia diferente durante sua ausência, o que significa que não me divertirei nem um pouco.
Naquela noite, uma carta de Theo chegou, pedindo-lhe para trazer seu casaco favorito que ele esquecera. Nenhuma resposta veio da avó. Nenhuma repreensão. Nenhuma reclamação. Nenhuma objeção. Que esquisito. Talvez ela planejasse usar esse período para enviar Theo a Stratton, para interrogar o duque. Se fosse isso, Theo não seria capaz de fazê-lo.
De malas prontas, no dia seguinte, ela e Jocelyn subiram em uma carruagem com o sr. Brady às rédeas. Dois dias depois, chegaram na mansão de Hickory Grange.
Ela deixou Jocelyn se acomodar enquanto encontrava o administrador durante a tarde. Não havia mentido sobre ter negócios com ele. Usava o mesmo que Theo e, juntos, cavalgaram pelas fazendas em questão e falaram sobre melhorias que ele sentia que as duas casas precisavam.
Terminaram cedo o suficiente para ela debater seus planos. Pretendera cavalgar a Drewsbarrow pela manhã, mas agora ela já estava na metade do caminho.
— Por favor, diga à governanta e ao mordomo que resolvi continuar cavalgando — ela instruiu ao administrador. — Devo chegar em casa ao entardecer, mas, de qualquer forma, eles não precisam se preocupar. Se a noite ou o tempo me impedirem, vou parar na casa de um vizinho.
Ele foi embora encarregado do recado. Ela virou seu cavalo para o leste. Stratton ficaria surpreso em vê-la agora, mas de um jeito bom.
Nunca tinha ido a Drewsbarrow. Nunca tinha nem espiado a casa da estrada. Conforme cavalgava na direção dela, sua aparência atingiu-a. Um bosque denso a rodeava em sua colina, cheio de carvalhos antigos e altos. Pessoas do condado normalmente se referiam a ela pelo nome antigo da colina de séculos antes. Na época, era chamada de Druidas Barrow, ou bosque dos druidas.
Nenhum druida a recebeu. Apenas criados. A casa, construída em pedra, era alta, ampla e formidável. Havia pouca decoração. Qualquer pensamento de que não deveria ter sido um lugar confortável desapareceu assim que um mordomo a recebeu. Uma luxúria da moda antiga aguardava.
Os criados não a conheciam, mas sabiam quem ela era. O mordomo nem olhou para seu cartão de visita.
— A senhorita é esperada — ele disse. — Vou levá-la à Sua Graça imediatamente.
Vaguearam por cômodos cavernosos e corredores vazios que davam eco. Os painéis ricos, os tetos altos, as tapeçarias grossas e as lareiras enormes a faziam sentir que estava andando por um dos castelos da Rainha Elizabeth.
Finalmente, no que parecia um canto profundo no térreo, o mordomo abriu a porta. Havia um escritório simples do outro lado, com paredes de gesso e pergaminhos estendidos por uma mesa comprida. Só quando o mordomo a anunciou foi que uma cabeça escura emergiu do outro lado da parede.
— Lady Clara. Que surpresa boa. — Stratton se levantou e deu a volta na mesa.
Ele se curvou. Clara o cumprimentou. Ele mandou o mordomo embora e, assim que o trinco se fechou, a segurou.
— Nossa, pensei que nunca iria chegar aqui — ele murmurou entre beijos. — Tinha perdido as esperanças para hoje.
— Posso ficar só um pouco antes de voltar cavalgando. — Ela olhou para as caixas. — O que está fazendo?
— Estudando documentos da família enviados para cá de Kengrove Abbey.
Os documentos do pai dele, ela presumiu.
— Passou os quatro dias aqui fazendo isso?
— Não, primeiro abri todos os esconderijos, para ver o que tinha neles. Há muitos deles.
— Descobriu algum tesouro?
— Não o que eu procurava. — Ele pegou a mão dela e a levou para fora do cômodo. — Sei que está fora por horas, mas eu fiquei enclausurado aqui. Vamos tomar um ar.
Uma porta para fora não era muito longe. Dava acesso ao bosque. Assim que saíram, ela olhou para cima para a fachada severa de pedra da casa.
— Poderia fazer uma nova decoração.
— Acha mesmo? Não aprecia o gosto do meu bisavô?
Ela deu risada.
— É tudo muito escuro.
Ele deu de ombros.
— Ficou abandonada depois que meu pai se casou. Eles moravam em Kengrove Abbey, não aqui.
— Quer dizer que não vinham para cá por nossa causa.
— É.
Ela detestava como aquela briga antiga durou anos, afetando não apenas a geração que a começou, mas a seguinte. E a atual, ela tinha que admitir. Perguntou-se se poderia realmente acabar. Talvez se todos eles concordassem em não falar nada para os filhos que nascessem, eventualmente, isso acabaria.
Ele a colocou de costas em uma das árvores e lhe deu um beijo demorado.
— Quanto tempo pode ficar?
— Não o suficiente para o que está pensando.
Ele deu risada.
— Sou tão óbvio?
— Leio sua mente em seu beijo. Prometo vir cedo amanhã para que tenhamos muitas horas juntos.
Ele a beijou de novo como se isso não o acalmasse. Com um suspiro de resignação, ele a soltou e pegou sua mão.
— Venha para dentro e vou lhe mostrar alguns dos esconderijos. Há um que poderia abrigar muitas pessoas dentro das paredes.
Jocelyn arrumou seu traje verde para cavalgar.
— Esse terá que servir para hoje. Ou tem o preto. Preciso consertar o azul.
— Esse está bom.
Jocelyn começou a ajudá-la a se vestir.
— Os criados estão falando um pouco sobre suas cavalgadas todos os dias, o dia inteiro. As mulheres temem que a senhorita se machuque de alguma forma, com todo esse tempo na sela. Os homens lembram como fez isso depois que seu pai faleceu, e se preocupam de estar de novo perdida no luto.
— E você?
— Eu acho que a senhorita não está cavalgando o dia inteiro.
— Apenas guarde esses pensamentos para você.
— Claro.
— E assegure aos criados que estou saudável e feliz e muito além do luto profundo. Não quero ninguém se sentindo obrigado a escrever a Londres com preocupações.
— Vou cuidar disso.
Vestida e pronta, de novo apontou seu cavalo para o leste. Ela duvidava de que um dia iria viver momentos grandiosos assim. Ela e Stratton tinham trocado o dia pela noite. Passavam a manhã na cama e, depois dos dois primeiros dias, quando ainda estavam lá no fim da tarde, vestiam-se, comiam e brincavam como crianças. Em um dia lindo, ele a levou para um lago, onde se banharam. Outro dia, fizeram uma competição de arco e flecha. No dia anterior, levaram pistolas e mosquetes e praticaram tiro. E, claro, tinham se beijado. Tinham se beijado muito.
Ele também lhe contava histórias, sobre como o pai conhecera a mãe quando ela era pequena, depois voltou à França para se casar com ela e trazê-la antes de os problemas começarem. Ele lhe mostrou o túmulo da família, onde dois irmãos mais velhos estavam enterrados. Ambos tinham morrido quando bebês, o que tornou sua sobrevivência um milagre. Descreveu Paris nos anos logo após a guerra, quando parecia que toda a sociedade do mundo inteiro chegava para andar na Champs Élysées. Nenhuma vez mencionou a morte do pai ou o motivo dela. Ela começou a pensar que talvez, só talvez, não precisaria de outra geração para as lembranças antigas desaparecerem.
Eles poderiam fazer isso juntos. Poderiam encontrar paz eterna, se tentassem.
Um cavalariço aguardava para pegar o cavalo dela, como sempre. Um mordomo abriu a porta. Nenhuma formalidade a recebeu, no entanto. Ela foi para as escadas e subiu ao quarto de Adam.
Tinha decoração antiga, como a casa inteira, mas pelo menos aqueles aposentos tinham sido reformados no último século. Entalhes dourados enfeitavam a cabeceira enorme da cama. As molduras se dissolviam em arabescos de folhas. O quarto inteiro tinha um clima de excesso e decadência.
Ele ainda estava deitado na cama. As cortinas nem tinham sido abertas. Ela se aproximou e se sentou na cama, e ele desabotoou o traje dela. Clara se despiu totalmente e subiu na cama com ele.
— Queria que pudesse ficar aqui e fosse poupada de todo esse coloca e tira de roupa — ele disse após um beijo. — Eu a tomaria o tempo todo.
— Nós teríamos que pagar o diabo para não sermos descobertos. Além disso, não estou vestindo nada durante o tempo aqui, então a parte de se vestir é mais fácil. — Assim como a brincadeira indecente no fim do dia, quando eles queriam.
— Qual é a pior coisa que pode acontecer se formos descobertos? Seu irmão exigir que me case com a senhorita?
Provavelmente era o pior que poderia acontecer. Naquela manhã, depois da crescente familiaridade daquela semana e das profundezas da intimidade entre eles, não soava tão ruim.
— Ficaríamos aqui juntos e cavalgaríamos, nadaríamos e atiraríamos durante o dia e seríamos escandalosos à noite — ele enumerou. — A senhorita poderia redecorar esta casa antiga e reformar os jardins, e eu poderia recuperar meu lugar no estado e no condado.
— Soa bem doméstico.
— Não é? Tudo é muito atraente para mim. — Ele a olhou de canto de olho.
Também era atraente para ela. Mais porque ele deixou as partes ruins de fora.
— Ou, se não ficar, a senhorita poderia cavalgar como Godiva e ser poupada de qualquer roupa.
— Seria uma visão e tanto para os inquilinos.
— Ficariam admirados. Lá estaria a senhorita, cavalgando na névoa da manhã, seu cabelo esvoaçante, toda cremosa naquele cavalo preto. Pareceria algo saído de um mito ou sonho. As lendas começariam. Centenas de anos depois, fazendeiros falariam sobre a fada nua que aparecia na primavera.
— Que imaginação o senhor tem. Deveria escrever poemas ou romances.
— O que posso fazer se a senhorita me inspira? — Ele a puxou para mais perto. — Prefiro o prazer criativo do que poesia, no entanto. Estou pensando que a senhorita também.
Ele provou o que queria dizer. Sua boca a provocou com uma precisão devastadora. Ela não tinha mais defesas com ele e sucumbia rapidamente a tudo que ele fazia. Naquela manhã, chegara tão ardente e cheia de alegria que um olhar sedutor poderia tê-la deixado sem fôlego. No fim, ele tinha muito mais em mente.
Seus beijos fizeram uma trilha quente pelo corpo dela. Ela sabia o que ele iria fazer, mas ele se movia tão devagar que ela gemeu com impaciência. Ele também não seguiu até embaixo de seu corpo, mas inclinou-se para beijar sua barriga, e mais além.
A respiração era quente em seu centro. Ele segurou firme seu quadril. Virou-a de lado, e depois se virou também para que ambos se encarassem de cabeça para baixo. Ele ergueu o joelho dela sobre o ombro e a fez gritar de delírio. Mesmo em sua confusão, ela percebeu que aquela posição estranha lhe permitia acariciá-lo. Ela pegou seu falo nas mãos para lhe dar prazer também. Quanto mais ela o agradava, mais ele lhe dava, até finalmente ela usar a boca também, primeiro com beijos, depois com mais, enquanto a língua dele não parava de deixá-la extasiada.
Adam se levantou da cama enquanto Clara dormia. Foi ao quarto de vestir e colocou calças, botas e uma camisa. Saiu assim que seu criado entrou, carregando um de seus casacos. Voltou ao quarto, pegou o traje de cavalgar de Clara e sua camisa, e os estendeu na cadeira próxima. Colocou o casaco em cima deles.
Saiu do aposento pelo quarto de vestir.
— Não a perturbe. Deixe água quente aqui, depois pode se retirar. Estarei no antigo escritório.
Ele desceu as escadas e foi até o cômodo com as caixas.
Desde que chegou, tinha examinado cada esconderijo mais uma vez, procurando a joia desaparecida. Não encontrara nada de tanto valor. Então havia começado a longa missão de procurar nos documentos pessoais de seu pai. Encarou as caixas de novo e puxou uma para perto.
Quando o mordomo de Kengrove Abbey encaixotou tudo aquilo, começara com os documentos mais recentes e trabalhou no sentido contrário do tempo. Se não acabava rapidamente era porque cada carta revelava algo sobre seu pai. Até os relatórios dos administradores abriam pequenas janelas.
Os itens mais interessantes foram cartas de sua mãe, escritas antes de eles se casarem. Enviadas da França, ela relatou o clima em seu país e expressou suas preocupações. Mas não eram cartas de amor, eram carinhosas e afetuosas como amigos. Ele as tinha colocado de lado para dar a ela na próxima vez que a visse.
Ele sentou-se atrás das caixas e tirou uma grande pilha de uma das últimas. Em dez minutos, percebeu que tinha, diante dele, documentos do último ano da vida de seu pai. Eram muitos, e muitas cartas de outros lordes. Ele abriu cada uma e leu.
Em algumas, as pessoas recusavam o convite de uma festa que a mãe dele planejara. Em outras, colegas recusavam formalmente os boatos e escreviam sobre contas a serem discutidas. Mas o tom começou a mudar. Um homem escreveu que romperia a amizade deles. Outro bruscamente se referiu ao cheiro da traição. Então, por muitos meses, não houve cartas.
Finalmente, ele soube o motivo. Uma carta longa em uma letra rebuscada começou com arrependimentos com as dificuldades que um velho amigo encontrava. No entanto, delicadamente, deu a má notícia.
Ficou emocionado pelo falecido Brentworth ter permanecido um amigo até o fim e até presumiu que os boatos fossem mentira, apesar da nova evidência provando o contrário. A última frase aparecia em letras maiores, no entanto. Se não foi você, então quem foi?
Havia apenas uma pessoa possível. A mais provável. Será que seu pai perguntou a ela e descobriu que ela tinha realmente feito isso? Será que ele havia escolhido um caminho que garantisse que nunca perguntassem a ela, ele ou outra pessoa?
Adam encarou cegamente a carta por muito tempo. As revelações nela o esvaziaram até haver um buraco negro no lugar de seu coração. Ele presumira que encontraria provas que comprovassem que as acusações estavam erradas. Quanto à pessoa...
— O que tem aí que o faz franzir a testa de maneira tão séria?
Ele olhou para cima. Clara estava dentro do cômodo. Uma fita amarrava seu cabelo na nuca. Ela estava usando o casaco, e ele achou que era só isso. Era grande demais, e as mangas cobriam suas mãos. A barra se acumulava em seus pés. Se algum criado a tinha visto, ela nunca saberia. Todos eles tinham ordens de desaparecer caso ela o visitasse.
Seus olhos tinham brilhos maliciosos que diziam que ela queria brincar. Os brilhos se apagaram, um por um, conforme ela olhava para ele. Foi até a ponta da mesa e olhou a pilha de documentos diante dele.
— Os documentos de seu pai.
— Estou analisando a última parte. — Colocou a pilha de volta na caixa. — Vou levar estes comigo para Londres e terminar lá.
— O que estava lendo, Adam? Estava longe e quase perdido.
Ele olhou para baixo, para a carta, não dobrando-a de novo.
— Foi uma carta que ele recebeu explicando o que ele enfrentava. — Ergueu a mão. — Vamos. Vou pedir para levarem o café da manhã ao quarto.
Ela não pegou a mão dele, em vez disso, continuou olhando para a caixa.
— Descobriu alguma coisa?
— Algumas, sim.
— Descobriu que meu pai teve participação?
Ele queria mentir, desesperadamente. Se ela tivesse perguntado uma hora antes ou uma hora depois, ele provavelmente teria mentido.
— Sim.
— Acho que o senhor sempre suspeitou disso. Temia que descobrisse bem aqui. É por isso que meu irmão o teme e minha avó está tão ansiosa para fazer as pazes. Não por causa de uma velha briga sobre um pedaço de terra. Por causa disso.
Ela o olhou com um olhar triste e desafiador ao mesmo tempo.
— Pensa em meu pai quando me vê?
— Não mais. Não desde muito antes. Por favor, acredite nisso.
— Não sei se acredito. E se descobrir que ele é o culpado de tudo? Ou já descobriu? Ele está morto e não pode desafiá-lo. Vai se vingar como pode através de mim? — Sua voz tinha fúria e mágoa. — Quando está comigo, talvez fique pensando “Olhe o que estou fazendo com sua querida filha, seu canalha”.
— Não é verdade. Não diga isso. — Ele tentou segurá-la, mas ela se afastou. De costas para ele, ela se abraçou. Ele foi para perto dela, mas se conteve do abraço que desejava lhe dar. — Quando estou com a senhorita, penso em como gostaria de viver aqui com a senhorita, como eu disse de manhã.
— Aqui? A alguns quilômetros da casa dele? Da casa da minha família? O senhor nunca vai desistir disso, nunca, se morar aqui, com o túmulo de um homem que culpa a meros quilômetros de distância. Quanto a mim, devo abandoná-los? Cruzar a fronteira e nunca olhar para trás?
Ele ousou tocar em seu braço. Ela não o empurrou nem se afastou.
— Podemos fazer as pazes, assim como sua avó propôs. Não haveria necessidade de cruzar uma fronteira se for construída uma ponte.
Ela se virou, ainda brava, e olhou para ele.
— O que estava lendo quando cheguei, Adam? Algo ruim, eu acho. Muito ruim, se não quer falar disso.
— Confirmou algumas coisas que eu já tinha pensado e me contou outras que eu desejava não saber.
— Foi suficiente? Suas perguntas estão respondidas? Acabou com isso? Porque, se não, não haverá ponte que suporte muito tempo, e não haverá lugar para mim em seu coração em que eu consiga confiar.
Será que tinha terminado? Tinha acabado? Ele queria que tivesse. Com toda a sua alma, se significasse que poderia ficar com ela.
A expressão dela suavizou. Ergueu a mão e a descansou no rosto dele. Ele se lembraria eternamente do olhar que ela lhe deu, como se buscasse memorizar seu rosto.
— Precisa acabar com isso, claro. Este é seu legado, assim como essas terras. Como fui tola em me apaixonar pelo senhor, sabendo disso. E, ainda assim, não estou arrependida, mesmo sabendo que vou sofrer.
— Clara...
Ela tocou os lábios dele com a ponta dos dedos.
— Não. Por favor, não. Acho que mentiria se precisasse, e seria triste demais. — Ela ergueu a barra do casaco e foi até a porta. — Por favor, fique aqui até eu ir embora.
Ela desapareceu. A mente dele ficou preta e ele socou a parede. Depois se arrastou para baixo até sentar-se no chão, e o vazio dentro dele se preencheu de angústia.
lara abriu a carta. Ela sabia o que leria. Sabia que Adam a tinha enviado.
, ela leu.
Cartas parecidas chegavam três vezes por dia. Continuaram chegando por uma semana. Só a primeira, falando sobre o retorno dele a Londres, tinha sido mais longa.
Cada carta a fazia querer chorar. Cada uma também acendia uma chama minúscula de incerteza.
Poderia fazer isso? Será que o amor lhes permitiria separá-los do passado? Mesmo que aquele passado incluísse a crença dele de que o pai dela cometeu um erro gravíssimo com o dele?
Significaria acreditar nele mais do que o senso comum garantia. Mais do que ela acreditava realmente em qualquer pessoa. Será que o amor permitiria que ela visse mais do que o normal ou a cegaria?
A sra. Finley anunciou que Althea estava chegando. Clara guardou a carta em sua escrivaninha junto com as outras e tirou uma pilha de notas e uma bolsa de moedas.
— Está com tudo? — Althea perguntou assim que entrou.
— Fui a todas as lojas nos últimos dois dias. Aqui está. Três cópias permaneceram na Ackermann’s, mas ele espera vendê-las e me disse para aumentar o pedido para vinte da próxima vez.
Althea abriu uma folha de papel na mesa, depois pegou seu tinteiro.
— Vamos continuar, então, para que nossas senhoras vejam os frutos do trabalho delas.
O papel de Althea listava todas as mulheres que tinham contribuído com a última edição do Parnassus, desde Lady Farnsworth até as mulheres que levaram as cópias às lojas. Ela lia a quantia que cada uma receberia, e Clara contava.
— Sra. Galbreath, dez xelins — Althea leu o último nome.
Clara pegou uma nota de cinco libras e a colocou ao lado das outras. Althea viu, depois olhou para Clara.
— Aí não tem dez xelins.
— Não mesmo. Mas acho que é a quantia certa. Sua lista estava errada.
— Concordamos com dez xelins há quase dois anos.
— Concordamos antes de saber se venderíamos uma única cópia. Você faz mais da metade do trabalho, Althea. Não poderia fazer isso com você, muito menos contemplar uma programação regular de publicação. Na verdade, acho que deveria ser minha sócia oficialmente, não apenas na responsabilidade.
O grande sorriso de Althea a fez brilhar.
— Também acho. Onde assino?
Clara riu até chorar. Enxugou os olhos.
— Oh, isso foi muito bom. Estava começando a pensar que nunca riria de novo. — Ela respirou fundo. — Vou pedir ao meu advogado para fazer um contrato, e vamos assinar assim que estiver pronto. Agora, pegue essas notas antes que eu decida que seriam boas para dar uma festa.
Althea pegou e guardou em sua bolsa.
— Se entregar o dinheiro àquelas que vivem perto, vou fazer com as que moram perto de Mayfair.
— Você terá que ser mais discreta do que eu.
Na forma organizada de Althea, ela colocou pedacinhos de papel com nome em cada pilha, depois guardou as moedas em saquinhos com o papel dentro. Juntou as pilhas de Mayfair de um lado e do leste de Londres do outro.
— Agora — ela disse —, quero comemorar e fazer algo decadente com meu salário. Acho que deveria vir comigo para Berkeley Square e se deliciar com um sorvete.
— O sr. Brady pode nos levar, depois deixar você em casa antes de voltarmos para cá. — Clara foi até o hall para chamar a sra. Finley e lhe disse para avisar ao sr. Brady.
Ela e Althea colocaram suas boinas.
— Estou muito feliz por ir comigo nessa pequena orgia — Althea declarou. — Enquanto nos deliciamos no Gunter’s, você pode explicar por que temeu que nunca mais daria risada.
Clara mergulhou a colher no sorvete, depois saboreou a doçura gelada e boa. Ajudou a amenizar a tristeza que veio quando ela explicou o término com Stratton para Althea.
De sua mesinha, ela pôde ver os outros produtos que tornavam Gunter’s famoso: bolos, biscoitos e outras sobremesas alinhadas no balcão da confeitaria. Também tinha marzipã, decorado com esculturas minúsculas artísticas de animais e flores. Um cheiro doce luxurioso permeava os arredores.
— Claro que não podia confiar nos motivos dele, não tinha mais nada a fazer — Althea concordou.
— Foi isso que disse para mim mesma.
— Seria horrível continuar, só para depois descobrir que ele a enganou o tempo todo.
— Terrível. Só que... parece, para mim, que ele não é de enganar. Dizer isso é injusto.
— Então não acha que teria descoberto? — Ela pensou nisso. — Suponho que havia a chance de eu descobrir. Prefiro pensar que não.
Althea soltou sua colher.
— Se acredita que ele não a enganaria, por que duvida dos motivos dele em persegui-la? Está se contradizendo, querida.
Clara colocou uma colher cheia de sorvete na boca. Era demais. Doía.
— Como posso me casar com um homem que carrega tanto ódio pelo pai que me amou e me protegeu? E ele deve odiá-lo, e descobriu que meu pai encorajou as acusações contra o pai dele. Por um instante, quando ele me olhou naquele dia, acho que me odiou também, ou pelo menos odiou o fantasma que viu atrás de mim.
Althea ergueu a mão, segurando a colher.
— Pare, por favor. Vamos voltar à sua primeira frase. Você disse casar?
— Disse?
— Tenho certeza de que disse. Está pensando nisso?
— Acho que um pouco.
— Ele lhe propôs, mesmo um pouco?
— Oh, ele propôs na segunda vez que conversamos. Era uma forma astuta de vingança. Ele admitiu.
— Ele propôs de novo?
Clara cutucava o resto do sorvete repetidamente com a colher.
— Acho que sim.
Althea estendeu a mão e deu um tapinha no braço dela.
— Você está achando muito. O coração partido está deixando-a estúpida?
— Acho que sim — ela murmurou.
— Clara, sua menção ao casamento me faz mudar de opinião sobre ele e entender melhor sua tristeza atual. Se pensou até em se casar, deve gostar muito dele. Acredito que deva descobrir se há possibilidade de felicidade com ele. Deve ter muita certeza antes de desperdiçar essa chance.
— Ele disse a mesma coisa — Clara confessou quando elas terminaram. — Ou melhor, escreveu.
— Então talvez devesse vê-lo mais uma vez, e precisam conversar honestamente.
Naquela noite, depois de debater muito, Clara pegou sua pena e tinta.
Não era covardia que a fazia adiar o encontro com Adam, ela disse a si mesma. Não temia o que poderia ser a separação final e imutável com ele. Nem um pouco. Não passava as noites lutando contra a esperança impossível de querer controlar seu coração. Ela só não poderia vê-lo naquele momento porque tinha coisas a fazer, só isso.
No dia seguinte, saiu cedo para pagar suas colaboradoras. Visitou a sra. Dalton primeiro, em sua casa perto do rio. Seu marido e ela deixavam a casa modesta apenas para a Temporada, depois retornavam à propriedade deles em Kent.
O sr. Dalton não sabia que sua esposa era a Filha de Boadiceia, então Clara chegou à uma da tarde, supostamente para fazer uma visita. Enquanto ela e a sra. Dalton conversavam sobre fofocas da sociedade, o saquinho foi movido da bolsa de Clara para o corpete amplo da sra. Dalton.
Nenhum truque de mãos foi necessário com a sra. Clark. Ela recebeu Clara em sua loja e a levou a um escritório minúsculo, onde fizeram negócios.
— Se tiver o pagamento das outras, posso entregar antes — a sra. Clark disse.
— Gostaria de pagá-las eu mesma, se me disser o endereço delas.
— Bondade sua, mas pode ser melhor que eu o faça. As ruas delas não são adequadas para uma dama como a senhorita.
— Tenho um cocheiro comigo. Acho que ficarei bem segura. Se a senhora anda nessas ruas, eu também consigo.
A sra. Clark não gostou disso. Mesmo assim, anotou os endereços.
— Tome cuidado, Lady Clara. Há batedores de carteira e pior por lá. Não deixe seu homem abandonar a carruagem, independente do que ele fizer, e diga para ele ficar com o chicote preparado.
— Prometo ficar alerta e ser cautelosa, sra. Clark. — Antes de ela partir, admirou algumas das boinas na loja. Quando embarcasse na orgia do excesso de roupas, precisaria encomendar algumas coisas ali.
O alerta da sra. Clark provou ser menos encantador e mais sensível quando a carruagem de Clara entrou no bairro onde uma de suas mulheres da entrega morava. O sr. Brady não queria que ela saísse da carruagem quando encontraram a triste casa da sra. Watkins. Clara insistiu, no entanto, e bateu à porta.
Claro que nenhum criado atendeu, mas, sim, a própria sra. Watkins. Uma jovem a acompanhava, segurando a saia.
— Milady. O que a traz aqui? Aquele senhor da livraria disse que não levei os jornais para ele? Se sim, ele está mentindo para roubá-la. Eu levei, com certeza, e...
— Não houve reclamação, sra. Watkins. Vim para lhe trazer isso. — Ela entregou o saco de moedas.
A menina ouviu o som e arregalou os olhos. A sra. Watkins corou.
— Mil perdões. Só fiquei surpresa ao vê-la aqui na minha porta. — Ela olhou para trás. — Não vai entrar?
Clara pôde ver o cômodo e as preparações de um jantar. Havia um pano cobrindo uma parede. A sra. Watkins e sua família pareciam ocupar apenas esse cômodo, e não a casa inteira.
— Não quero atrapalhar, e tenho mais coisas a fazer — ela disse, para poupar a mulher da dificuldade de tentar receber uma visita. — Só queria trazer isso à senhora e agradecer muito pela ajuda.
A sra. Watkins sorriu.
— Eu que agradeço, milady. Fico feliz em fazê-lo a qualquer hora.
Clara voltou à carruagem. O sr. Brady a colocou rápido para dentro.
— Bedford Square? — ele perguntou pela janela.
— Temo que não. Vamos agora para St. Giles.
— Lady Clara, não acho que...
— St. Giles, sr. Brady.
Ela olhou para a casa da sra. Watkins enquanto eles iam embora. O Parnassus poderia ser um passatempo para ela e outras, como Lady Farnsworth e Lady Grace, mas, para a sra. Clark e a sra. Watkins, e até a sra. Dalton e Althea, os pequenos ganhos que elas recebiam com o jornal faziam diferença. Muita, em alguns casos.
dam puxou os remos, forte. Seu corpo não doía porque toda a sua concentração permanecia nos pensamentos. Eles voltavam ao ritmo de sua remada. Clara queria saber de tudo. Acreditava que ele nunca poderia separá-la do resto, das ações de sua família, de seu dever de extrair justiça. Poderia convencê-la do contrário. Tudo, entretanto, incluía as recentes revelações que ele descobriu naquela carta.
Que o levou a um lugar terrível, onde seus pensamentos moraram por dias. Se não tivesse perdido Clara, poderia ter tido uma melhor ideia de onde seu dever terminava. Nunca esperou enfrentar uma escolha entre dois familiares, mas agora o fazia.
Deixar a mentira como estava, e o bom nome de seu pai permanecer desonrado. Ou tentar retificar uma injustiça, e significaria fazer perguntas que nenhum filho deveria fazer à mulher que lhe deu a vida.
Ele puxou mais forte, seu corpo todo se esticava, seus ombros tensionando com o esforço. Sexta, Clara tinha dito. No dia seguinte. Terminou isso? Talvez poderia ter terminado. Se ela não o abandonasse completamente, ele poderia.
Ouviu gritos. Olhou em volta. Atrás dele, viu braços abanando.
— Você ganhou, droga — Brentworth gritou. — Planeja remar até Richmond?
Ele ergueu os remos enquanto ia com a correnteza, depois virou o barco e foi para a margem.
Brentworth e Langford já tinham vestido seus casacos. Criados que os seguiram ao longo da margem começaram a levar os barcos de volta para onde todos começaram a corrida. Outros seguravam os cavalos. O barco de Adam bateu na margem, e ele pulou para fora.
— Inferno, você remou como se sua vida dependesse daquilo — Langford disse. — Nem tivemos chance.
— O exercício foi bom para meu humor e me ajudou a pensar.
— Está fazendo muito isso esses dias. — Langford enxugou a cabeça com uma toalha. Seus cachos emergiram mais rebeldes. — Vamos tomar uma cerveja para seu cérebro encontrar um pouco de tranquilidade.
Havia uma taverna do outro lado da rua. Os três sentaram-se a uma mesa e Langford foi pegar as canecas.
— Ele tem razão — Brentworth começou. — Você está muito absorto em pensamentos. Parece bravo. Deixa os homens nervosos. Ontem à noite, no White’s, o salão de cartas quase se esvaziou quando você chegou.
— Não reparei.
— Claro que não.
Langford voltou com a bebida.
— Está contando a Stratton que ele está lançando um terror em toda a Temporada com seu humor infernal?
Adam bebeu a cerveja, depois a colocou de lado.
— Descobri uma coisa. Muitas coisas. Agora desejo que não tivesse descoberto.
Nenhum amigo o incitou. Apenas esperaram.
— Descobri uma carta do seu pai para o meu — ele disse a Brentworth, e descreveu o que estava escrito.
Langford assobiou.
— Então o conde não deixou isso passar enquanto os outros escolheram fazê-lo. Não há como buscar satisfação com ele morto, não que algum júri aceitaria isso como justa causa para um desafio, de qualquer forma.
— Não é isso que o assombra, é? — Brentworth perguntou.
— Não.
— Escreveu para ela e perguntou sobre isso?
Langford entendeu a direção que a conversa estava tomando.
— Oh, inferno. Sim, claro. — Sua expressão se tornou francamente solidária.
— Escrevi a carta e anexei uma cópia do desenho da joia em questão para enviar. Não a selei e enviei. Na verdade, estou evitando a escrivaninha onde ela está.
— Caramba — Langford murmurou. — Alguns se perguntaram se você parecia um homem ansioso que iria acabar com alguém nos últimos dias. Se enviar essa carta para pedir que ela admita... que a morte dele... Acho que eu não conseguiria.
— Pode viver sem enviá-la? — Brenworth questionou. — Viver sem saber, e permitir que tudo permaneça como está?
— Essa é a questão que me consome. — Adam gesticulou para pedir mais bebida. — Vamos falar de outra coisa, para que eu não pareça um homem querendo brigar. Me contem como vão as coisas com suas damas.
Ele tinha tocado no assunto preferido de Langford, e seu amigo não o decepcionou.
À uma hora, e ainda pensando na conversa que teria com Stratton no dia seguinte, Clara pediu sua carruagem e que o sr. Brady a levasse à cidade para um compromisso com seu advogado.
O próprio sr. Smithers a recebeu. Um jovem quase novo na profissão, ele tinha gostado de obter tal cliente distinta. Ela tivera muita dificuldade para encontrar um advogado que era altamente recomendado e em que confiasse que resistiria às tentativas de alguém em descobrir seus negócios particulares. Quando Theo descobriu que ela mudara seus negócios privados para outra pessoa, e não o advogado da família ? que tinha lhe informado sobre as decisões problemáticas dela, sem pedir, é claro ?, foi uma confusão e tanto.
Agora, o sr. Smithers arrumava seu cabelo loiro, endireitava a gravata e sorria gentilmente do outro lado da mesa em seu escritório. Ele lhe entregou o documento que preparara a pedido dela para dar metade da posse do Parnassus a Althea.
— Vai ver que ela deve lhe pagar um xelim, que é o que chamamos de consideração. No entanto, como proprietárias iguais, vão compartilhar qualquer lucro. Confio que a sra. Galbreath entende que também será igualmente responsável por qualquer dívida.
Clara leu o contrato. Não haveria dívidas. O Parnassus tinha um benfeitor que pagava qualquer custo além daqueles cobertos pelas assinaturas e vendas.
— Se me enviar as cópias, vou mandá-las assinadas.
— Muito bem, Lady Clara.
Por impulso, ela levantou outra questão.
— Estou curiosa com uma coisa. Se eu me casar, o que é meu continua sendo meu?
Ela o surpreendeu.
— Está pensando em se casar?
— Não. Só estou curiosa.
— Pergunto porque há uma resposta simples que pode satisfazê-la. No entanto, caso planeje se casar, explicações mais longas podem ser mais sábias para que entenda completamente a situação. A resposta simples é que tudo que é seu continua sendo seu. Entretanto, sua propriedade real seria do uso e lucro do seu marido durante a vida toda. Ele poderia substituir os moradores, ou construir vilas, por exemplo. A renda seria dele.
— Então eu perderia o controle da terra. Pensei nisso, mas queria estar certa.
— Sim, e também a casa que comprou recentemente. Se tivesse usado seu legado para comprar vestidos, seriam propriedade pessoal. A casa, no entanto, é propriedade real.
— Eu sabia da terra, mas também ter um homem permitido pela lei caçando minha casa parece muito injusto.
O sr. Smithers deu risada.
— Caçando é uma palavra divertida para descrever. Tende a ser animada, no entanto. Um marido poderia usá-la ou deixá-la. Não daria, porém, para vendê-la sem convencer um juiz que a senhorita concorda livremente.
Aquele encontro pendente com Stratton ficava se apossando de sua mente e de seu coração. Já que ela estava ali...
— Tenho outra pergunta. O senhor tem conhecimento da propriedade que foi contestada por anos por minha família e aquela do Duque de Stratton?
— Nossa, sim. O caso é bem conhecido, mesmo que tenha acontecido antes de eu nascer. É o tipo de história que advogados mais velhos contam aos mais jovens durante um vinho.
— Pode descobrir os detalhes de como foi finalmente destinada? Quando e como. Pergunto porque me disseram que meu pai pode ter se aproveitado da situação, e eu gostaria de ter prova de que ele não o fez.
— Para poder apresentar essa prova à pessoa que o depreciou?
— Possivelmente.
Ele anotou em um papel.
— Há registros, claro. Nada que acontece legalmente na corte é segredo. Encontrar tais registros pode ser difícil, mas é o que advogados fazem. Vou fazer isso imediatamente, para que possa colocar essa fofoca no lugar dela. Embora o resultado mais recente seja de seu conhecimento.
— Está dizendo que foi vendida?
O sr. Smithers olhou para ela, confuso.
— Nossa, não. Por ter tido tanto trabalho e esperado tanto para tê-la, vendê-la seria muito estranho.
— Extremamente estranho. Então, o que quer dizer com seu recente resultado?
— Vejo que não sabe. Peço desculpas, mas pensei que soubesse. — Ele se inclinou na direção dela e ofereceu um sorriso confortador. — Não se preocupe. Permanece segura na família, Lady Clara. É sua agora. É a propriedade que foi deixada por seu pai para a senhorita.
Exercício, ar fresco e amizade mudaram o humor de Adam. Ele ainda enfrentava uma escolha difícil, mas sua cabeça tinha se anuviado. Decidiu que esperaria alguns dias, depois tomaria uma decisão sobre aquela carta preparada para enviar a Paris.
No fim da tarde, ele colocou a carta e outros documentos relacionados de lado na escrivaninha de seu escritório e se ocupou com negócios da propriedade. Em específico, continuou uma comunicação em andamento com o administrador da casa de Drewsbarrow sobre melhorar a aparência do imóvel. Todas as madeiras e ouro realmente tinham que mudar. A última carta do administrador implicava que poderia ser dinheiro perdido, já que ninguém usava muito a casa. Adam escreveu uma carta deixando claro que isso iria mudar.
Uma hora escrevendo cartas o fez pensar que poderia ter passado da hora de contratar uma secretária. Estava pensando em como proceder com isso, quando começou uma comoção na casa que aumentou intensamente.
De repente, a porta de seu escritório se abriu rápido. Clara estava ali parada. Atrás dela, o mordomo fazia expressões e gestos de perdão.
Um dia melhor se tornou um maravilhoso quando Adam a viu. Ela tinha mesmo ido até ele, finalmente, um dia inteiro antes do que ela tinha prometido.
Infelizmente, sua expressão indicava que sua chegada inesperada poderia não ter boas notícias. Seus olhos azuis brilhavam como joias que poderiam cortar o aço. Sua postura permaneceu rígida como um bastão. Sua expressão sombria encorajou a impressão de um poder de destruição. Ela estava brava como ele nunca tinha visto.
Ele pensou que ela estava linda.
Levantou-se e foi até ela, gesticulando para o mordomo sair.
— Que surpresa maravilhosa, Clara. — Ele tentou tocar nela.
Ela passou por ele, entrando no escritório.
— Não. Me. Toque. — Pelo tom dela, ela poderia também ter adicionado Seu. Canalha. Miserável.
— Vejo que está de bom humor hoje.
— Eu estava. Há uma hora. — Virou-se para ele. — Pode esperar até amanhã para me contar o resto, mas hoje exijo que me conte isto. Sabia que eu tinha herdado aquela propriedade contestada? Sabe a qual terra me refiro. A propriedade que começou os anos de aborrecimento entre nossas famílias
Maldição. Ele passara dias pensando em explicações e promessas de seus pais, suas famílias, seus deveres, seu amor por ela. Não esperara que isso viesse à tona, muito menos agora.
Ela o examinou.
— Não tente mentir. Agora o conheço muito bem. Vou saber se disfarçar o mínimo que for.
Inferno.
— Sim, tive conhecimento disso.
— Quando?
— Só não sei quando. Acho que...
— Quando?
Merda.
— Percebi isso depois de conversarmos no primeiro dia. Cavalguei de volta para Drewsbarrow o caminho que fez durante todo nosso tempo lá. — Nosso tempo glorioso, apaixonado e amoroso lá. — Reconheci alguns marcos de fronteira, como a cidade e o moinho. E percebi por que seu pai e sua avó queriam que eu me casasse com Emilia, não com a senhorita.
Ela andava de um lado a outro, brava e, ele sabia, magoada.
— Então decidiu que mostraria a eles, não é? Garantiria que aquela velha briga terminasse a favor de sua família. Case-se comigo e aquela terra seria sua.
— Não, seria nossa. Seria um fim adequado ao assunto todo, não acha? Nenhuma família ganha, e nenhuma família perde. Sua avó diz que quer paz.
— Acho que o senhor viu uma oportunidade de virar a mesa com ela. Com meu pai. Acho que gostou da ideia de vencê-los no próprio jogo deles.
— Já que isso enfraquecia o plano cuidadoso dele de garantir que aquela terra permanecesse eternamente fora das mãos da minha família, definitivamente gostei de saber disso.
— O que quer dizer com plano cuidadoso?
— Por que acha que ele deixou para a senhorita aquela propriedade, Clara? Tem que haver outras terras não complicadas que teriam sido boas para a senhorita. Ele acreditou que nunca se casaria. Contou com isso. Theo poderia vendê-la, talvez até para mim, se um dia ele se visse com problemas financeiros. A senhorita nunca o faria porque seria sua fonte de independência.
Ela queria discordar; ele viu isso em seu olhar fulminante e sua postura rígida. Adam contava com o fato de ela ser muito inteligente para não entender como o plano tinha sido perfeito.
Ela olhou para baixo na escrivaninha e para os papéis.
— Estava aqui fazendo seus planos de como arruinar o bom nome dele como ele fez com o seu pai? — Clara ainda soava brava, mas pelo menos não parecia mais prestes a atirar nele.
— Minha última carta falava sobre redecorar Dresbarrow, se quer a resposta sincera.
O pior de sua fúria a abandonou como um espectro sombrio voando para fora de seu corpo.
— Diga ao administrador para não usar muito azul. Muitas pessoas usam azul. — Parecendo cansada agora, ela foi até a porta. — Vou embora agora. Minha carruagem está esperando.
Ele foi até lá e pressionou a mão contra a porta para ela não conseguir abri-la.
— Está aqui agora. Não posso deixá-la ir se não prometer voltar amanhã.
Ela ficou ali, sua mão no ferrolho, suas costas a meros centímetros do corpo dele. Adam se embriagou em seu perfume e proximidade como um homem privado por anos.
— Não posso deixá-la ir, Clara, porque temo que, se o fizer, nunca mais vou vê-la sozinho.
Ela se virou.
— O senhor é mais corajoso do que eu, se quer essa conversa agora.
— Não muito corajoso. — Nada corajoso. Desesperado. — Vou mandar sua carruagem embora. Não se mexa. Não saia.
Ele mandou o recado ao cocheiro dela. Quando voltou ao escritório, ela estava sentada em um banco da janela que dava para o jardim. Tinha tirado sua boina preta, e o sol da tarde encontrou aquelas súbitas mechas acobreadas em seu cabelo. Ela não parecia ansiosa para vê-lo de novo.
— Tem xerez aqui?
— Posso pedir para comprarem, ou tenho conhaque à mão.
— Suponho que conhaque vá funcionar.
Ele abriu o armário em que o guardava e serviu dois copos. Ela provou um pouco, pensou, depois deu de ombros.
— Vai funcionar.
— A senhorita estava fazendo visitas hoje — ele disse.
— O que o faz pensar isso?
— Está usando preto.
Ela olhou para o vestido.
— Visitei meu advogado. Foi assim que descobri sobre a terra. Enquanto penso sobre o que disse, sobre o plano de meu pai, acho que lhe dá mais crédito por uma trama nefasta assim do que lhe é justo. Minha avó mudou de ideia, sabe. Quando concluiu que o senhor preferia a mim à Emilia, ela decidiu que também serviria.
Ele colocou o copo na mesa e foi até ela, e se ajoelhou em uma perna à sua frente. Queria dizer que estava errado e jurar que nunca pensou sobre a terra, os pais ou qualquer coisa que ela estava preocupada, além de seus sentimentos sinceros. Eu a vi e decidi me casar com a senhorita. Não era totalmente verdade.
— Sua avó decidiu isso porque aquela velha briga e a terra eram o menor problema. Ela sabia que eu tinha causas mais recentes para querer acertar as contas com sua família. Motivos mais sérios. Não vou mentir e dizer que meu interesse na senhorita sempre foi separado disso, Clara. Eu a desejei desde o início pela mulher que é, mas também vi imediatamente o quanto poderia me beneficiar com seu conhecimento enquanto eu buscava descobrir a verdade.
— E o beneficiou?
— Em pequenas formas, primeiro. Depois, não me importei mais com isso.
Ela analisou o rosto dele, seus olhos, procurando sinais de mentira, ele presumiu. Adam contava com o conhecimento dela sobre ele, como ela disse.
Ele arriscou tocar a mão dela. Quando ela não resistiu, ele pegou sua mão.
— Em Drewsbarrow, a senhorita perguntou se eu conseguiria esquecer. Se poderia acabar com isso. Pela senhorita, eu posso, e vou.
A mão dela se virou com a palma para cima, para que ela segurasse a dele.
— Eu disse que precisa me contar tudo. Não acho que o senhor queira.
— Se vou acabar com isso, talvez a senhorita também devesse. Os detalhes importarão quando colocarmos tudo isso no passado?
Ela sorriu tristemente e apertou a mão dele.
— O que estava lendo quando o encontrei naquele cômodo naquela manhã? O que descobriu sobre nossos pais? Acho que nós dois precisamos descobrir o que há entre nós, se vamos realmente acabar com isso.
Ele hesitou. Considerou discutir. Em vez disso, levantou-se, foi até a escrivaninha e voltou com uma carta para ela.
— Foi do falecido Duque de Brentworth.
Ela a leu. Seu olhar voltou para o topo e ela a leu de novo, lentamente. Quando terminou, lágrimas brilhavam em seus olhos.
h, papai. Ela mal conseguia acreditar no que Brentworth revelou, que seu pai tinha ido tão longe para arruinar um homem... Ele poderia ter segurado aquela arma que tirou a vida do falecido duque.
Esse não era o homem que ela conhecia. Não era o pai que a ensinou a cavalgar e passava horas com ela depois que sua mãe morreu. Não era o homem que lhe permitiu se tornar a mulher que estava destinada a ser. Aquele homem era generoso, carinhoso e bom, não essa pessoa vingativa e cruel que precisava ganhar tanto que causou a morte de um homem.
O sofrimento a inundou, tão primitivo quanto quando seu pai morreu. Inundou seu coração, só que era pior desta vez porque ela nem tinha o refúgio das lembranças nas quais poderia confiar. Fechou os olhos até aquela onda de sentimento se esvair.
Deixou a carta cair no colo, brilhando branca contra seu vestido preto.
— Por isso estava tão sério e perdido naquela manhã. Estou pensando que devo implorar seu perdão em nome dele.
— Não teve nada a ver com a senhorita, ou comigo. Nada a ver conosco. Não diretamente, e não no futuro.
Ele parecia muito certo disso. Determinado. Colocou uma pequena pilha de papéis no canto de sua mesa.
— Disse que queria saber tudo. Já sabe o que importa, mas, se precisar de mais, há uma carta ali para minha mãe que explica tudo, incluindo algumas perguntas que permanecem. Pode ler se quiser, agora ou depois.
— Talvez eu leia. Depois. — Ela foi até ele. Ele se aproximou e ela o fez sentar ao seu lado. — Estava falando sério quando me escreveu que me amava, Adam?
— Sou insanamente apaixonado pela senhorita. Até escrevi um poema sobre a senhorita.
— Ficou bom?
Ele deu risada.
— Ficou terrível.
— Quero ler mesmo assim.
— Vai fazê-la rir.
— Mais provável que me faça chorar. Ninguém nunca escreveu um poema sobre mim.
— Tenho certeza de que há dúzias guardados em gavetas por Londres, sem seu conhecimento.
Ela o adorava por realmente acreditar nisso. Pegou a mão forte dele e a levou aos lábios.
— Descreveu-me gentilmente?
— Eu a descrevi de forma adoradora.
— Até minha boca?
— Há uma frase escandalosa sobre sua boca.
— Oh. É esse tipo de poema.
— Um poema muito carinhoso.
Ela se aproximou mais, então o rosto deles estava a um centímetro de distância.
— Não vai me beijar?
— Escreveu que não haveria beijos.
— Isso era para o encontro de amanhã.
— Ah, bom. — Ele passou os dedos no cabelo dela e segurou sua cabeça para um beijo completo. — Suba comigo, antes de eu fazer uso chocante do tapete com minha impaciência.
Ele falou de impaciência, mas não mostrou nenhuma. Nem ao levá-la para sua cama. Nem ao despi-la, e nem quando a deitou e a cobriu com seu corpo. Demorou-se a cada beijo e a cada carinho. Murmurou palavras de amor em seu ouvido enquanto lhe dava o prazer mais doce. Primeiro, em inglês, depois em francês, suas palavras davam voz às emoções que preenchiam o coração dela também, até o prazer e o amor serem um só, ambos mais fortes com o poder do outro.
A união deles se tornou uma intimidade preciosa, para não ser apressada, a primeira depois de reconhecer o amor entre eles. A visão dele, a sensação dele ? ela sabia que se lembraria de tudo aquilo para sempre, desde a primeira pressão de sua completude à imagem dele abraçando-a em cima dela com o êxtase encharcado de amor no fim.
Ela o abraçou depois, com os braços e as pernas envolvendo-o. Não teria conseguido conter seu amor nem se quisesse. Livre agora, não mais conectados por perguntas, culpa ou preocupações, mexeu tanto com ela que chorou em silêncio de felicidade.
De madrugada, Clara saiu da cama enquanto Adam dormia. Colocou seu vestido e o fechou pela metade para que ficasse o mínimo coberta. Pegando o castiçal, desceu as escadas. Os servos tinham todos se recolhido, exceto o criado à porta, e ele dormia em seu posto. Ela foi até o escritório e sentou-se à escrivaninha de Adam. Colocou a vela perto dela e ergueu os papéis do canto.
Não precisava ler nada disso, mas ela queria. A carta à mãe dele estava no topo. Tinha quatro páginas. Nem uma única palavra tinha sido riscada. Pensou que ele teria escrito muitos rascunhos que mostrariam várias alterações, e aquela era a versão final.
Foi estranho ler suas palavras para a mãe que ela nunca conhecera. Ele se direcionava a ela com a informalidade de um filho, até intimidade. Seu amor por ela apareceu, mesmo que ele não tenha usado essa palavra. A cada parágrafo, ele contava a ela o que descobrira sobre os acontecimentos que levavam à morte de seu pai. Na quarta página, explicou as revelações que descobriu pelo homem enviado a Paris ao comando do Conde de Marwood.
A prova fora condenatória na carta de Brentworth e estava igualmente condenatória ali. Adam não tentou amenizar nada. As joias deles tinham sido enviadas à França. Só uma pergunta permanece, ele escreveu. Ele as enviou, ou foi a senhora?
Ele não pediu uma resposta. Não fez acusações. Aquela pergunta só estava ali e, antes, adicionou dois parágrafos com informações sobre a propriedade.
Soltou a última folha. Ele não tinha enviado. Ainda não tinha uma data. Poderia ter sido escrita há dias. Imaginou-o angustiado em enviá-la, tentando decidir se precisava saber ou até se queria.
Seu coração se partiu por ele. Tinha vindo da Inglaterra limpar o nome do pai. Mas foi horrível descobrir que só poderia fazê-lo se achasse que poderia trair sua mãe.
Enxugou os olhos das lágrimas que surgiam e colocou a carta de lado. Uma página de anotações nomeada como Hollsworth a encarava. Incluía informação já encontrada na carta. Esperava que todo o resto estivesse naquela pilha também, mas ela folheou tudo, de qualquer forma.
Por último, encontrou um desenho. Dois, na verdade, mas do mesmo objeto. Um colar e uma coroa. Grandes e antigos, estavam desenhados nas páginas. Ela achou um conjunto lindo. Devia ser a joia que tinha desaparecido dos inventários da família e que Adam pensava que estavam na França.
Colocou o desenho mais perto da luz, depois ainda mais perto. Encarou-o por muito tempo. Levantou-se, afastou-se e olhou pela janela para a noite enquanto lutava contra uma profunda tristeza. Então se recompôs, voltou à escrivaninha e dobrou um dos desenhos. Retornou ao quarto.
O sonho tremia. Não, o corpo dele tremia. Ele abriu os olhos para a escuridão.
Clara empurrava seu ombro.
— Vai clarear em breve. Devo ir, Adam.
Ele envolveu a cintura dela com um braço e a puxou para ele. Clara caiu dando um gritinho e tentou se libertar. O tecido preto cobriu o rosto dele enquanto ela lutava com ele. Já estava vestida. Bom, isso era fácil de retificar. Ele procurou os colchetes de seu vestido.
Ela colocou a mão nas costas e deu um tapa na mão dele.
— Pare de ser safado.
— Não precisa ir. Quem vai se importar ou saber se ficar? Aquela governanta que me levou ao seu quarto na primeira noite?
Ela escapou de seu abraço, sentou-se na beirada da cama, depois virou para segurar seus braços, pressionando-os com seu peso.
— Parece que fui preso — ele disse. — Se ficar, vou deixá-la me amarrar adequadamente e fazer seu pior.
Um brilho de curiosidade passou pelos olhos dela, mas ela balançou a cabeça.
— Tenho coisas a fazer esta manhã.
— Mais coisas misteriosas?
— Muito misteriosas.
— Se um dia eu convencê-la a se casar comigo, vai ter que me contar sobre elas.
De repente séria, ela inclinou a cabeça.
— Vou? Parece-me uma obrigação.
— Vou lhe contar sobre qualquer coisa minha também, então é justo.
Ela olhou para o peito dele e se abaixou para dar um beijo.
— Está propondo de novo. Esses são os termos do acordo?
— Espero que sim.
— Prometeria que posso continuar usando minha casa?
Ela perguntou diretamente, como se tivesse uma lista em mente.
— Contanto que não leve amantes para lá. Ou para nenhum lugar, claro.
— Posso pelo menos receber metade da renda da propriedade, para usar como quiser?
Ela pressionava sua vantagem agora, mas ele não estava em condição de realmente negociar depois da noite anterior.
— Não preciso daquela renda.
— Posso continuar com meu círculo de amigas literárias? Aquelas sabichonas, como um dia me chamou?
— Nunca a privaria de suas amigas. — Poderia estar sendo generoso demais. Era Clara, afinal. — Contanto que elas não sejam revolucionárias nem criminosas.
Ela ergueu as sobrancelhas.
— Criminosas?
— Só estou eliminando o impossível, querida.
Ela decidiu deixar isso passar.
— E não importa o que mais descobrir, promete que acabou com essa questão que trouxe de volta com o senhor? Promete que nunca vai buscar vingança?
— Já disse que sim.
Ela soltou os braços dele e se endireitou.
— Então vou me casar com o senhor, Adam. — Ela riu baixinho. — Essas palavras quase me fizeram engasgar, mas parece que consegui falar. — Inclinou-se e o beijou. — Vou me casar porque o amo muito para não casar. Tanto que nunca ficarei feliz sem o senhor.
Ele a abraçou e a segurou perto de seu corpo. Permaneceram tanto assim que ela decidiu que devia ficar. De novo, ele tateou para encontrar os colchetes de sua roupa. De novo, ela deu um tapa nele e levantou-se.
— Deveria escrever para sua mãe e dizer para ela vir para casa, acho. Tenho certeza de que vai querê-la no casamento. Agora devo mesmo ir. Vou falar para o criado à porta encontrar uma carruagem de aluguel para mim.
Dois pensamentos passaram pela mente dele depois que ela foi embora, enquanto caía no sono novamente. Um era que escrever aquela carta para sua mãe seria muito mais fácil do que a outra, a qual ele nunca enviaria. O outro foi que, assim que se casassem, ele pretendia descobrir os afazeres misteriosos de Clara.
s Duques Decadentes estavam sentados em suas cadeiras de sempre no cômodo do piso superior do White’s. Adam tinha acabado de contar aos amigos sobre seus planos nupciais.
— Vamos anunciar em quinze dias.
Brentworth o parabenizou graciosamente. Langford também, mas com menos entusiasmo. Ele olhou em volta.
— Suponho que isto acabe agora ou em breve. Os Duques Decadentes não mais existirão.
— Por quê? Ainda sou decadente, só que com uma mulher.
— Não será a mesma coisa. Não há nada decadente em ser mau com sua esposa. Se continuarmos, vamos ter que trocar nosso nome. — Ele refletiu. — Os Duques Obstinados. Os Duques Desesperados...
— Com o tempo, suponho que sejamos os Duques Domesticados — Brentworth zombou.
— Retire o que disse. Não suporto nem pensar nisso.
Brentworth riu.
— Os Duques Obedientes.
Langford cobriu as orelhas com as mãos.
— Recuso-me a ouvir.
— Poderia continuar sozinho e ser o Duque Depravado.
Langford se animou.
— Não é tão ruim.
Brentworth se virou para Adam.
— Já se encontrou com o irmão dela?
— Esta tarde. Ele ficou tão feliz que quase chorou. Acreditava que um duelo era inevitável e que só a aliança pelo casamento o salvaria.
— Se ele souber metade do que você sabe, ficará preocupado por um bom motivo.
— Clara disse que a avó também está exultante.
— Tenho certeza, já que provavelmente ela sabe tudo que você sabe — Langford concordou.
— Então decidiu deixar como estava, afinal — Brentworth disse. — Muito bem.
É, muito bem. Ele tinha enfrentado a escolha do diabo. Entendia melhor seu pai agora, e por que ele terminara daquele jeito.
— Vamos sair — chamou. — Está uma noite muito bonita para ficar aqui. Langford, pode ir na frente. Vamos visitar seus covis favoritos.
Langford ficou de pé imediatamente.
— Sigam-me, e vamos reivindicar nosso nome. Há uma festa muito interessante acontecendo esta noite que vocês dois vão achar uma revelação. Depois, vamos visitar uma nova casa de prazer que abriu perto do Covent Garden. Stratton, pode permanecer no salão de jogos, se quiser. A menos que, até se casar, acredite que possa visitar os cômodos mais interessantes. Há um em que uma mulher prende um homem e usa um chicote e uma pena para...
— Parece criativo, mas vou permanecer no salão.
Clara saiu de sua carruagem na Casa Gifford. Assim que o fez, a porta se abriu e Emilia correu para abraçá-la.
— Theo me contou. Todo mundo está muito animado e feliz. Ainda acho Stratton assustador, mas, se gosta dele, a notícia é maravilhosa.
— Eu gosto, sim, dele. Muito. — Clara deu o braço a Emilia e elas andaram juntas. — Talvez possa nos visitar, se quiser. Vovó não deve fazer um espetáculo sobre isso.
— Fala sério mesmo? Aqui em Londres?
— Em qualquer uma das propriedades dele. Você será sempre bem-vinda como parte de nossa família, Emilia. É importante, para mim, que saiba disso.
— Fico tão feliz. Minha única tristeza quando soube foi que não nos veríamos muito mais. Assim, nos veremos.
Dentro da casa, Clara foi ao cômodo matinal imediatamente. Emilia a seguiu.
— A Vovó já desceu?
— Ainda está no quarto — Emilia respondeu. — Ela me acompanhou ontem à noite ao teatro. Foi maravilhoso, já que muitas senhoras pararam para demonstrar respeito a ela. Não estou surpresa por ainda estar dormindo.
Clara imaginou sua avó exibindo-se no camarote da família no teatro. Claro que ela aproveitou toda aquela bajulação indicando seu lugar na sociedade.
— Vou subir para vê-la — Clara disse.
— Sabe que ela não gosta.
— Isso não pode esperar.
Emilia pensou que era melhor não ir junto e ficou na sala matinal. Clara subiu as escadas lentamente, sem ansiar por esse encontro. Não via sua avó desde que escreveu e lhe contou sobre o noivado com Stratton. Cinco cartas vieram em resposta, em rápida sucessão, parabenizando-a primeiro, e listando uma série de instruções nas outras.
Ela encarou a porta do quarto da viúva por um minuto inteiro antes de bater. Margaret abriu-a e foi para o quarto de vestir.
A viúva estava sentada em sua penteadeira, vestida e pronta. Olhou para sua visita, e sua expressão se iluminou.
— Bem-vinda, Duquesa. Estou feliz em vê-la, embora tenha demorado para vir. Sente, sente. Margaret, traga café para nós. Lady Clara e eu temos muito a conversar.
— Por favor, não, Margaret. Não vou demorar.
— Oh, bobagem, claro que vai ficar. Na verdade, mandei prepararem seu quarto. É melhor se mudar de volta até se casar.
Clara não discutiu. Queria que Margaret saísse, e isso forneceu motivo.
— Agosto será bom, eu acho — a viúva disse. — Idealmente, esperaríamos até o ano de luto acabar, mas acho que podemos esquecer isso. Ou até julho, se não for muito apressado. A maior parte da sociedade ainda está na cidade no começo de julho. Não preciso dizer que deve ter uma licença especial, mas duvido que Stratton faria de outra forma...
Sua avó continuou falando, mudando de um plano para outro. Clara passou o tempo encontrando a coragem de dizer o que tinha ido falar.
— A senhora provavelmente está aliviada — ela finalmente interrompeu.
— Satisfeita, certamente.
— Não, aliviada. Estava tão preocupada que Stratton machucasse Theo. Lembra? Foi seu motivo para tentar formar uma aliança através do casamento. Para que ele não encontrasse motivo para desafiar Theo.
— Tenho certeza de que não foi bem o que eu disse.
— Disse exatamente assim. E Theo também. A senhora insinuou que tinha a ver com aquela velha briga sobre a propriedade. Pensei que era bizarro a senhora acreditar que ele mataria um homem por uma desavença antiga. E a senhora disse que eu não sabia tudo.
— Eu disse isso? Não me lembro. Nem consigo me lembrar por que o faria. Agora, sobre seu vestido de casamento...
— A senhora sabe por que ele voltou. Por que ele lutou aqueles duelos. O que ele pretendia descobrir. Por isso estava com medo.
— Estou certa de que não sei o que você...
— Ele descobriu o que a senhora temia, Vovó. Sobre meu pai reviver as acusações e até ter enviado um homem para investigar. Ele diz que sabe de tudo.
A viúva se ocupou com os frascos e as caixinhas em sua escrivaninha, mantendo a expressão firme e sua compostura forte.
— Só que ele está enganado — Clara disse. — Não sabe realmente de tudo, mesmo agora. Mas acho que eu sei. — Ela se levantou, foi até a avó, e colocou uma folha de papel na mesa diante dela. — E a senhora também.
Sua avó olhou para o papel. Ela ficou vermelha. Pegou-o e o chacoalhou.
— Que disparate é este?
— É um desenho de joia.
— Estou vendo isso.
— Esse conjunto pertencia à família de Stratton. Só que eu o vi aqui quando era bem jovem. Bem aqui, neste mesmo quarto. Estava na gaveta com suas maquiagens. Eu até a coloquei. Depois a encarei no espelho enquanto a senhora me chicoteava. Lembra? Nunca me esqueci.
O braço de sua avó caiu. O desenho voou lentamente de sua mão, chegando ao chão. Ela virou o corpo e encarou Clara. Parecia com medo.
O coração de Clara se apertou por ela. Aquela mulher era normalmente uma megera intrometida, mas era sua família também.
— Eu a amo, Vovó, mas não o suficiente para fingir ignorância sobre isso. Um homem se matou por causa desta farsa. O homem que amo acredita que um de seus pais cometeu traição. Então devo fazer a pergunta à senhora. Como a joia que vi em sua posse encontrou o caminho para a França para ajudar a pagar o último exército de Napoleão?
dam entrou cavalgando pela Casa Gifford e entregou seu cavalo para um cavalariço que aguardava. Para sua surpresa, Brentworth entrou logo atrás.
— Espero que não tenha se esquecido de trazer a licença especial — Brentworth disse depois de desmontar.
— Ainda não tenho licença.
— Não pode se casar sem uma.
— Não vou me casar hoje.
— Que estranho. Recebi uma carta ontem da viúva exigindo minha participação hoje para ser testemunha. Suas exatas palavras.
— Já que estou aqui também por exigência dela, vamos entrar e ver qual extravagância nos chamou até aqui.
Eles foram levados à sala matinal. A viúva estava sentada, resplandecente em preto. Seu neto também, parecendo entediado. Clara também aguardava, junto com uma mulher mais velha.
— O que Lady Farnsworth está fazendo aqui? — Brentworth murmurou para Adam.
— Talvez também seja testemunha. Seria muito típico da condessa viúva encontrar uma forma de planejar um casamento sem o meu consentimento.
Depois de cumprimentar Adam e Brentworth, a viúva se virou para Clara.
— Está bem satisfeita agora?
— Estou.
Franzindo o rosto, a viúva olhou para sua companhia.
— Não deveria começar, Condessa? — Lady Farnsworth perguntou.
A viúva olhou desafiadoramente para ela, depois se recompôs. Olhou para Adam, ou melhor, para sua cabeça, não seus olhos.
— Pedi que viesse aqui, Duque, para explicar alguns assuntos de família ao senhor. Por que minha neta insistiu que também viesse, Brentworth, é além do meu entendimento. Quanto à Lady Farnsworth, é totalmente compreensível para mim.
— Ela queria testemunhas para que ninguém acreditasse se você falar que Stratton mentiu sobre o que está prestes a dizer — Lady Farnsworth intrometeu-se. — Caso decida reformular mais tarde algo que irá dizer agora.
— Por favor, Lady Farnsworth — Clara sussurrou. — Vamos permitir que minha avó faça isso do jeito dela.
— Desse jeito vai levar duas horas — Lady Farnsworth murmurou.
— Nada disso — a viúva disse. — Não tenho desejo de prolongar isso. Vou direto ao ponto. Stratton, nenhum de seus pais enviou aquela joia para a França. Eu enviei. Não para apoiar Córsega, garanto-lhe. No entanto, não foram eles, fui eu.
Adam esperava que sua expressão permanecesse neutra, mas suspeitava que não estivesse. Tal admissão pública limpava o nome de seu pai e respondia o resto da questão em uma frase.
Clara se levantou e foi para o lado dele. Ela sorriu gentilmente para ele, feliz por seu alívio e surpresa.
— Se não foi para apoiar aquele exército, foi para quê? — Brentworth perguntou. — Se não explicar, o mundo vai crucificá-la independente do motivo verdadeiro.
— Ela presume que sua palavra será suficiente — Lady Farnsworth disse. — Não é, Hannah?
Se olhares pudessem matar, as espadas no olhar fulminante da viúva cortariam Lady Farnsworth. Então ela fechou os olhos, como se procurasse se restabelecer.
— O verdadeiro motivo é vergonhoso. Devo pedir que meus netos o escutem com generosidade no coração. — Ela olhou para o conde, não para Clara. Theo não mais parecia entediado, mas preocupado. — Quando eu era muito mais jovem, criei um afeto por um jovem. Um francês. Isso foi antes de todos os problemas aqui. Eu o conheci quando estava visitando aquele país, e me apaixonei.
— Mas a senhora só foi lá com o Vovô, então... — Theo parou de falar. Sua expressão estava em choque.
— Obrigada, Theo, por dizer o que eu esperava que não precisasse ser dito. — Ela pigarreou. — Claro que aquele amor foi condenado. Voltei para cá, e a vida continuou. Aquele jovem sobreviveu à revolução na França o máximo que pôde, mas, no fim, claro, isso provou ser impossível. Quando o corsicano tomou o poder, ele foi um dos que foram banidos por se opor ao imperador e foi enviado à prisão.
— A senhora parece saber muito do que aconteceu com ele — Theo disse, desconfiado.
— Que sorte temos de tê-lo aqui, meu querido, para fornecer declarações do óbvio. — Ela suspirou com pouca paciência. — Como o amor não durou, mantive a lembrança dele em meu coração. Então, após a derrota de Napoleão, busquei soltá-lo da prisão ao subornar certos oficiais do governo em Paris. As joias foram enviadas com o entendimento de que comprariam a liberdade dele. Infelizmente, fui traída, e elas foram usadas para outros propósitos.
— É compreensível que a senhora não tenha admitido isso quando os questionamentos começaram — Adam se pronunciou.
Algo como gratidão suavizou a expressão da viúva. Ela olhou para ele com lágrimas nos olhos. Essa explicação a tinha humilhado. Tinha diminuído, e ela sentia isso claramente.
— Não entendo, no entanto, como a senhora tomou posse do colar e da coroa — ele disse. — Tenho quase certeza de que são de propriedade da minha família.
— Sua mãe me deu. Ela os usou uma vez, e eu os admirei, e ela me deu de presente.
Lady Farnsworth se inclinou para a frente, na direção da viúva, e estreitou os olhos.
— Conte a ele por que, ou eu vou. Alguns de nós já sabem essa parte, afinal de contas.
— Não tenho ideia do que quer dizer, Dorothy.
— Não foi um presente, foi um tributo, Hannah — Lady Farnsworth rebateu. — Ela lhe deu de presente para que você parasse com a crueldade. Para que ela não fosse cortada de todos os lados, e ignorada, e pudesse ser recebida como a duquesa que era. Deu a você para que tirasse a corda do pescoço dela.
A expressão da viúva endureceu. Ela não olhou para Adam ou mais ninguém.
— Acabamos? — Brentworth perguntou. — Já ouvi o suficiente, caso algumas perguntas surjam no futuro. Vou embora agora. — Ele cumprimentou as damas.
— Vou acompanhar o senhor — Lady Farnsworth disse. — Ouso dizer que Stratton ficará grato por nossa ausência. — Sem dúvida, ele tem muito o que dizer em particular. Sei que eu teria, se fosse ele.
A porta se fechou para eles dois.
— Tem algo que queira dizer, Adam? — Clara questionou baixinho.
A viúva ainda estava sentada ereta e rígida. Seu rosto não mostrava expressão. Tal mulher sabia o custo do que tinha acabado de fazer. Agora, ela que seria cortada de todos os lados. Seu poder tinha acabado.
— Não tenho nada que precise dizer.
— Bom, eu tenho — Theo começou. — Papai sabia disso? Ele enviou aquele homem à França que disse que foi tudo planejado por Stratton. Ele mentiu sobre isso?
O rosto da viúva se enrugou. Ela fechou os olhos.
— Acho que nunca vamos saber. Se o fez, foi para proteger a mãe dele, Marwood. Não sei se você ou eu teríamos feito diferente — Adam disse.
Clara pegou a mão dele e a apertou.
— Vou me retirar agora, se não se importam — a viúva declarou, levantando-se. — Acho que, no outono, vou me retirar para a casa da viúva. Há anos venho pensando que posso gostar de lá.
Adam e Theo ficaram em pé até ela sair.
— Por favor, sente-se, Theo — Clara pediu. — Tenho mais coisa para lhe explicar. Vovó já sabe o que vou dizer.
— Tem mais? — Theo se jogou na cadeira com desânimo.
— Infelizmente, sim. Haverá falatório, claro. E, com os falatórios, algumas coisas vão sair errado. As amigas dela vão tentar mudar para soar menos mal. Haverá ambiguidades.
— Garanto-lhe que estou bem consciente do escândalo que vamos enfrentar.
— Essa é a menor de suas preocupações. Realmente, não posso deixar que haja mais questionamentos sobre a família de Adam. Nenhum. Então a história dessa farsa infeliz será publicada. A história exata. Todo mundo saberá que é exata porque, se não for, Vovó será processada por difamação. O que não acontecerá.
Theo ficou de novo chocado.
— Em que folhetim de fofoca planeja propagar?
— Não é um folhetim de fofoca. É um jornal muito respeitável. Um que vai me permitir ver o texto para garantir que está correto. Um que vai tratar Vovó da forma mais gentil possível. Vai enfatizar como seus motivos iniciais em enviar as joias à França foram nobres e generosos.
— Vai matá-la. Ela acabou de dizer que está se retirando da sociedade. Não é o suficiente? E quanto ao nome do nosso pai e sua memória?
— Não posso deixar que insultem meu marido, Theo. Não vou arriscar que chegue de novo o dia em que ele seja insultado e haja um duelo. E isso vai acontecer, você sabe e eu sei, a menos que seja completamente e finalmente terminado porque a verdadeira história é claramente conhecida por todos.
— Ela ficará acabada. Espero que saiba disso — Theo soltou.
— Ela já sabe disso, Theo. Soube disso até quanto explicava a verdade para mim.
Theo se jogou de novo na cadeira. Depois, distraído e sem parecer mais um menino, se levantou de repente e saiu do cômodo.
Adam levou a mão de Clara à boca e a beijou. Ele a levantou e a colocou sentada em seu colo.
— Obrigado, querida. Não estou surpreso por ser corajosa o suficiente para fazer isso, mas ainda estou abismado, e muito grato.
— Não é difícil ser grato pelo senhor. Quanto à minha família, sempre é melhor se a verdade ganhar, eu penso.
— Como ela admitiu tudo isso para a senhorita?
Ela acariciou os lábios dele com delicadeza.
— Se eu lhe dissesse que a consciência dela não lhe permitiu ficar mais em silêncio, e que ela queria retirar a sombra do nome do seu pai, acreditaria em mim?
— Acreditaria em qualquer coisa que me dissesse. — Ele a beijou, e a luz e a gratidão do coração dele o lavaram livremente. E o amor. Mais o amor. — Qual é esse jornal respeitável para o qual vai fornecer a história? Não conheço nenhum que vá lhe permitir controlar o texto como descreveu a Theo.
Ela jogou os braços em volta do pescoço dele. Beijou-o profundamente. Avidamente. Eroticamente. Ele parou de se importar com as revelações do dia ou qualquer coisa exceto tê-la nua em seus braços, ao seu lado, abaixo dele... Com ele.
Ela olhou nos olhos dele e sorriu misteriosamente.
— Ah, sim, o jornal. Explicar isso vai demorar um pouco.
— Depois, então. — Ele a beijou, saboreando a claridade quente em sua alma que era novidade depois de cinco anos nas sombras. — Agora, só me deixe segurá-la e amá-la. Haverá tempo para explicações depois.
Madeline Hunter
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