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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


O Melhor dos Erros / Nora Roberts
O Melhor dos Erros / Nora Roberts

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

O Melhor dos Erros

 

Zoe Fleming tivera uma carreira meteórica como modelo, mas a gravidez a obrigara a se tornar mãe solteira em tempo integral. Em busca de uma pessoa para dividir as despesas domésticas, ela aceitou J. Cooper McKinnon, um ho­mem rabugento e charmoso. Ele logo se afeiçoou ao filho de Zoe, ao mesmo tempo em que a encantava... Ela, porém, tinha de focar suas prioridades, e isso significava dinheiro... Portanto, talvez Zoe estivesse no caminho certo para um desastre... ou prestes a cometer o seu melhor erro!

 

Ninguém atendeu a porta. Coop deu uma olhadinha para o bilhete rabiscado que tinha em mãos para ter certeza de que era o endereço certo. Conferia, e como o imóvel limpo e antigo de dois andares na vi­zinhança arborizada era precisamente o que ele pro­curava, ele bateu outra vez. Ruidosamente.

Havia um carro na garagem, uma perua envelhe­cida que precisava de uma lavagem e de um peque­no trabalho de funilaria. Alguém estava dentro do prédio, ele pensou, franzindo a testa diante da janela do segundo andar, de onde a música vinha bem alta, um rock ensurdecedor com uma batida colossal. Ele amassou o bilhete e, com as mãos nos bolsos, reser­vou um instante para vistoriar as redondezas.

A casa era bem localizada, bem destacada na estra­da detrás das cercas vivas de samoucos bem aparadas. O jardim florido, cujos botões da primavera começa­vam a florescer, era colorido e selvagem o suficiente para não parecer estático.

Não que ele fosse um grande amante de flores, mas aquilo era algo a ser citado para criar o ambiente de uma reportagem.

Havia um triciclo vermelho reluzente ao lado da entrada da garagem e aquilo o deixou um pouco desconfortável. Ele não era particularmente adepto de crianças. Não que não gostasse delas. Era só que elas sempre pareciam um tipo de entidade alienígena para ele, como seres de um planeta remoto: elas fala­vam uma linguagem diferente, tinham uma cultura diferente. E, bem, elas eram baixas e, normalmente, pegajosas.

Ainda assim, o anúncio tinha mencionado paz, pri­vacidade e uma distância conveniente de Baltimore. Aquilo era exatamente o que ele estava procurando.

Coop bateu outra vez, apenas para uma onda ful­minante de música decair sobre ele. O rock não o in­comodava. Pelo menos ele o compreendia. Mas não era homem de esperar impacientemente do lado de fora por muito tempo, então pôs a mão na maçaneta.

Quando ela girou, ele empurrou a porta e entrou. Seguindo um hábito antigo, ele colocou o cabelo escuro que caía sobre a testa para trás e analisou a sala de estar não muito asseada na qual entrara.

Havia muita bagunça e ele, um solteirão que pas­sara grande parte de seus 32 anos morando sozinho, se espantou com aquilo. Não era meticuloso ou ob­sessivo, ele dizia freqüentemente a si. Simplesmente tudo tinha seu lugar, e era mais fácil encontrar algu­ma coisa se esta fosse colocada ali. Obviamente seu pretenso senhorio não concordava com aquilo.

Encontrou brinquedos que combinavam com o triciclo do lado de fora, pilhas de revistas e jornais, um boné enorme de beisebol que declarava a torcida pelos Baltimore Orioles.

Pelo menos a criança tinha bom gosto, Coop jul­gou, e continuou.

Havia um lavabo decorado em uma combinação sensacional de roxo e verde, e um pequeno espaço no canto convertido em escritório temporário. As ga­vetas dos arquivos estavam abertas, papéis transbor­dando. Na cozinha, os pratos aguardavam na pia para serem lavados, e desenhos lúgubres, criados por uma criança com imaginação ousada, decoravam a frente da geladeira.

Talvez, ele pensou, tivesse mesmo sido melhor que ninguém houvesse atendido a porta.

Ele cogitou recuar e passear pelo andar de cima. Enquanto estava ali, fazia sentido checar o restante do local. Em vez disso, ele saiu para captar a configuração do terreno. Descobriu degraus de madeira que levavam a uma pequena varanda. A entrada privativa que o anúncio mencionara, ele refletiu, e subiu.

A porta de vidro estava aberta e a música era do­minante. Ele captou o cheiro de tinta fresca, odor que sempre apreciara, e adentrou.

A área aberta abrangia a cozinha e a sala de estar de forma suficientemente engenhosa. Os utensílios não eram novos, mas estavam brilhando. O piso de cerâmica havia sido lavado há tempo suficiente para ele conseguir identificar o perfume do detergente de pinha sob o cheiro de tinta.

Sentindo-se mais esperançoso, ele seguiu a mú­sica, espionando um pouco conforme continuava. O banheiro estava tão meticulosamente limpo quanto a cozinha e, felizmente, num branco natural e lustroso. Ao lado da pia havia um livro sobre reforma de casas, aberto na seção de encanamento. Cauteloso, Coop abriu a torneira. Quando a água fluiu rápida e limpa, ele assentiu, satisfeito.

Do outro lado do corredor havia um pequeno cômodo com potencial para ser um escritório e ti­nha uma bela vista do jardim. O anúncio citara dois quartos.

A música o guiou até eles, um cômodo bastante amplo na parte dianteira da casa, com espaço sufi­ciente para sua cama king size. O piso, que parecia de tábuas de carvalho em bom estado, encontrava-se coberto por panos cheios de respingos. Havia latas de tinta, bandejas, pincéis, rolos adicionais. Uma operá­ria vestindo macacões largos e descalça completava a cena. Apesar do boné que escondia os cabelos e da roupa de tamanho desproporcional, Coop reconhe­cia uma mulher quando via uma.

Ela era alta, e os pés descalços na escada eram alongados e estreitos, e estavam decorados por man­chas de tinta e unhas pintadas em rosa choque. Ela cantava, mal, acompanhando a música.

Coop deu uma pancada seca no batente da porta.

— Com licença.

Ela continuou pintando, os quadris se movendo ritmicamente enquanto começava a margem do teto. Passando por sobre os panos respingados, Coop lhe deu um tapinha nas costas.

A mulher gritou, deu um pulo e virou, tudo de uma vez. Embora ele fosse ligeiro, não foi rápido o suficien­te para evitar a bofetada do pincel contra sua bochecha.

Coop praguejou e se inclinou para trás, então para a frente outra vez a fim de pegá-la antes que despen­casse da escada. Ele captou uma rápida, e nada desa­gradável, impressão de um corpo esbelto, de um ros­to triangular e pálido dominado por enormes olhos castanhos adornados por longos cílios, e do perfume de madressilva.

Então ele estava resmungando e tropeçando para trás, massageando o ponto da barriga onde o cotove­lo dela acertara. Ela berrava algo enquanto ele lutava para recuperar o fôlego.

— Você está louca? — ele conseguiu dizer, então ergueu a mão quando ela suspendeu uma lata, der­ramando tinta pelos lados enquanto preparava para usá-la como arma. — Senhora, se você atirá-la em mim, vou ser obrigado a machucá-la.

— O quê? — ela gritou.

— Eu disse, não atire isso. Estou aqui por causa do anúncio.

— O quê? — ela berrou outra vez. Os olhos ainda arregalados e repletos de pânico, e ela parecia capaz de qualquer coisa.

— O anúncio, droga. — Ainda esfregando a bar­riga, Coop marchou até o aparelho de som portátil e o desligou. — Estou aqui por causa do anúncio — ele repetiu, a voz alta sobre o silêncio repentino.

Os enormes olhos castanhos dela se estreitaram em desconfiança.

— Que anúncio?

— O apartamento. — Ele esfregou uma das mãos por sobre o rosto, analisou a mancha branca sobre ela e praguejou outra vez. — O apartamento.

— Mesmo? — Ela manteve os olhos grudados aos dele. Parecia durão, ela pensou. Tal como um homem briguento, com aqueles ombros largos, estrutura atlética e pernas longilíneas. Os olhos dele, uma chama, de um verde quase translúcido, pare­ciam tudo, menos amigáveis, e a camisa desbotada dos Baltimore Orioles e jeans gastos não contribuíam para transmitir qualquer senso de decência. Ela cal­culou que poderia escapar dele, e certamente poderia sobrepor-se a ele com gritos. — O anúncio só vai sair amanhã.

— Amanhã? — Confuso, ele pegou ò bilhete rabiscado no bolso. — Esse é o endereço certo. O anúncio era para este lugar.

Ela se manteve firme.

— Só vai sair amanhã, então não vejo como você poderia saber a respeito disso.

— Eu trabalho no jornal. — Movimentando-se cautelosamente, ele segurou o bilhete. — Já que te­nho procurado por um lugar, pedi a uma das garo­tas dos Classificados para ficar de olho. — Ele deu uma espiada no bilhete novamente. — Apartamento de dois quartos no segundo andar, entrada privativa, vizinhança tranqüila, prático para quem faz longos trajetos entre casa e trabalho.

Ela apenas permaneceu franzindo a testa.

— Está certo.

Percebendo que sua posição vantajosa não era exatamente ética, ele estremeceu.

— Olha, acho que ela se entusiasmou um pouco demais. Eu dei a ela um par de ingressos para um jogo, e ela deve ter achado que deveria me fazer um favor e passar a informação um pouco mais cedo.

Quando ele viu que as mãos dela não mais aper­tavam tanto a lata, tentou um sorriso.

— Eu bati, então entrei. — Provavelmente era melhor não mencionar que ele havia passeado pela casa primeiro.

— O anúncio não continha o endereço.

— Eu trabalho no jornal — ele repetiu. Ele estava dando uma boa olhada nela agora. Havia algo vaga­mente familiar no rosto dela. E que rosto! Bochechas esculpidas e olhos suaves, aquela pele de porcelana aveludada como a que os anúncios de creme para mulheres sempre proferiam. Ela estava com a boca aberta, com um lábio inferior sedutoramente mais cheio. Até o momento, o rosto continuava franzido.

— Eles tinham o endereço para faturamento — ele continuou. — E já que eu tinha algumas horas, pensei que poderia vir e dar uma olhada. Veja bem, eu posso voltar amanhã. Se você se sentir mais con­fortável. Mas estou aqui agora — ele deu de ombros. — Posso lhe mostrar minha credencial.

Coop apresentou para ela, e ficou satisfeito quan­do ela estreitou os olhos para avaliá-la.

— Eu escrevo uma coluna. J. Cooper McKinnon, dos esportes. "Faz parte do jogo"?

— Ah. — Aquilo significava nada para ela. A se­ção de esportes não era uma opção de leitura. Mas o sorriso dele a abrandara. Ele não se parecia tanto com um assassino quando sorria. E a mancha de tinta de­corando o rosto esbelto e bronzeado adicionava gra­ça suficiente para acalmá-la. — Acho que está tudo bem então. Eu não esperava mostrar o apartamento por uns dias ainda. Não está pronto. — Ela segurou a lata, colocou no chão novamente. — Ainda estou pintando.

— Percebi.

Ela riu daquilo. Era um som profundo, fumegante, que combinava com a rouquidão natural da voz dela.

— Acho que percebeu. Sou Zoe Fleming. — Ela se abaixou para pegar um trapo umedecido com removedor de tinta.

— Obrigado. — Ele esfregou o pano na boche­cha. — O anúncio dizia ocupação imediata.

:— Bem, imaginei que teria terminado até ama­nhã, quando o anúncio estava marcado para sair. Você é da região?

— Tenho um apartamento no centro. Estou pro­curando por algo com um pouco mais de espaço, um pouco mais de ar.

— Esse é um apartamento razoavelmente grande. Foi convertido há cerca de oito anos. O proprietário havia construído para o filho e, quando ele morreu, o filho o vendeu e se mudou para a Califórnia. Ele queria escrever seriados de televisão.

Coop andou para checar a vista. Ele se movimen­tava fluidamente, Zoe pensou, como um homem que sabia como se manter leve e firme. Ela havia sen­tido o vigor rijo quando seu corpo tombou sobre o dele. E boas mãos fortes. Rápidas também. Ela fran­ziu os lábios. Poderia ser cômodo ter um homem por perto.

— É só você, sr. McKinnon? — Ela pensou de modo desejoso no quão bom seria se ele tivesse uma família, outra criança para Keenan brincar.

— Só eu. — O lugar parecia certo, ele julgou. Ia ser bom sair de uma caixa que era apenas mais uma caixa em um prédio de caixas, sentir o cheiro da gra­ma agora e sempre. A fumaça de churrasco. — Posso me mudar no fim de semana.

Ela não tinha pensado que seria tão fácil, e mordiscou o lábio quando refletiu. Nunca havia sido se­nhoria antes, mas havia sido inquilina, e achava que entendia do assunto.

— Vou precisar do adiantamento do aluguel.

— Sim.

— E, ah, referências.

— Vou lhe dar o número administradora do meu prédio. Você pode ligar para o departamento pessoal do jornal. Já tem um contrato para eu assinar?

Ela não tinha. Pegou um livro na biblioteca e pre­tendia redigir um modelo reduzido de um contrato que havia nele na manhã seguinte.

— Terei amanhã. Você não quer ver o restante do apartamento, perguntar alguma coisa? — Ela estivera praticando a rotina de senhoria por dias.

— Eu já vi. Está ótimo.

— Bem. — Aquilo a decepcionou um pouco. — Acho que posso cancelar o anúncio.

Houve um som como o de uma manada de ele­fantes em alvoroço. Zoe olhou em direção à porta aberta e se agachou para interceptar o míssil que sur­giu ruidosamente.

Era um garoto, Coop viu quando ela ergueu a criança. Ele tinha cabelos loiros reluzentes, usava tê­nis vermelhos e jeans riscados por uma substância não identificável que parecia facilmente transferível a outras superfícies. Ele carregava uma lancheira de plástico com a foto de alguma batalha espacial apo­calíptica, e uma folha de papel encardida nas bordas.

— Eu desenhei o oceano — ele anunciou. — E um milhão de pessoas foram comidas por tubarões.

— Horrível. — Zoe estremeceu amavelmente antes de aceitar o beijo molhado dele. Ela o colocou no chão a fim de admirar o desenho. — São tubarões bem grandes — ela disse, distinguindo cautelosa­mente a massa de tubarões e a massa de pessoas.

— Eles são tubarões monstros. Tubarões mons­tros mutantes. Eles têm dentes.

— Estou vendo. Keenan, este é o sr. McKinnon. Nosso novo inquilino.

Keenan agarrou um braço em torno na perna de Zoe por precaução enquanto observava o estranho. Os olhinhos estavam indo rumo ao rosto de Coop quando eles se iluminaram sobre a camiseta.

— É beisebol. Vou aprender. Mamãe vai comprar um livro então vai poder me ensinar.

Um livro. Coop mal esboçou um bufar. Como se você pudesse aprender o maior jogo já inventado pelo homem com um livro. Que tipo de nerd era o pai da criança?

— Legal. — Foi tudo que Coop pretendia dizer. Ele sempre considerara sábio evitar se enredar em uma conversa com qualquer um com menos de 16 anos.

Kennan tinha outras opiniões.

— Se você vai morar aqui, tem que pagar aluguel. Então poderemos pagar as dívidas e as coisas e ir para a Disney.

O que aquela criança era? Um contador?

— Certo, rapazinho. — Zoe riu e eriçou o cabelo dele. — Posso cuidar disso a partir de agora. Desça e guarde suas coisas.

— Beth vai jogar comigo esta noite?

— Sim, Beth está vindo. Agora corra. Vou descer em um minuto.

— Tá. — Ele arremeteu até a porta, parando quando a mãe o chamou. Foi preciso apenas um olhar, a sobrancelha erguida para que ele se lembrasse. Keenan olhou de volta para Coop, deu um sorriso rápido e reluzente. — Tchau, senhor.

A manada de elefantes alvoroçou outra vez, então só se ouviu o barulho da porta batendo.

— Ele faz uma entrada triunfal — Zoe disse quan­do se voltou para Coop. — O talento dramático vem da minha mãe. Ela é atriz, de teatros bem pequenos. — Inclinando a cabeça, Zoe descansou um dos pés descalços sobre o degrau de baixo da escada. — Você parece estar pronto para mudar de idéia. Tem algum problema com crianças?

— Não. — O garoto poderia tê-lo desconcerta­do, mas Coop duvidava que seria um problema. O menino dificilmente bateria à porta dele. E caso o fizesse, Coop pensou, ele o mandaria de volta com rapidez suficiente. — Não, ele é, ah, bonitinho.

— Sim, ele é. Não vou alegar que ele é um anjo, mas não vai perturbar. Se ele lhe causar algum pro­blema, apenas me avise.

— Claro. Olha, vou retornar amanhã para assinar o contrato e lhe dar um cheque. Então vou pegar as chaves.

— Assim estará ótimo.

— Algum horário em especial que seja bom para você?

Ela pareceu inexpressiva por um instante.

— Que dia é amanhã?

— Sexta-feira.

— Sexta-feira. — Ela fechou os olhos e folheou seu bagunçado calendário interno. — Estou traba­lhando entre dez e duas. Acho. — Ela abriu os olhos novamente, e sorriu. — Sim, tenho certeza. Qual­quer hora depois das duas e meia?

— Ótimo. Prazer em conhecê-la, sra. Fleming. Ela pegou a mão que ele oferecia.

— É senhorita — ela disse comodamente. — Não sou casada. E já que vamos morar juntos, por assim dizer, pode me chamar de Zoe.

 

Ninguém atendeu a porta. De novo. Coop checou o relógio de pulso e viu que eram 14:45h. Ele não gostava de pensar que era um homem obcecado com o tempo, mas como vivia focado em prazos, ele o respeitava. A perua velha não estava na garagem desta vez, mas ele andou até a parte de trás da casa, espe­rançoso. Antes que pudesse começar a subir as esca­das até o apartamento, ele foi saudado por uma voz ao outro lado da cerca de arame.

— Rapaz! U-hu, rapaz! — Do outro lado do quintal do vizinho surgiu uma figura de vestido flo­rido, coroada por volumosos cabelos encaracolados tingidos com hena que ornavam um rosto largo. A mulher se apressou em direção à cerca num atropelo de cores. Não era apenas o vestido e o cabelo impro­vável, Coop notou. O rosto em si era um arco-íris com batom vermelho intenso, bochechas rosadas e sombra cor de lavanda.

Quando ela alcançou a cerca, pressionou uma das mãos adornadas por muitos anéis sobre a enorme sa­liência dos seios.

— Não tão jovem quanto eu costumava ser — ela disse. — Sou a sra. Finkleman.

— Olá.

— Você é o rapaz que vai morar no andar de cima. — A sra. Finkleman, uma paqueradora nata, alisou as próprias curvas. — Zoe não me contou que você era tão bonito. Solteiro, não é?

— Sim — Coop disse cautelosamente. — A srta. Fleming deveria me encontrar. Ela não parece estar em casa.

— Bem, típico da Zoe, indo para lá e para cá. — A sra. Finkleman sorriu e se apoiou confortavelmente contra a cerca, como se estivesse preparando uma boa fofoquinha acolhedora. — Se tiver de equilibrar uma dúzia de coisas de uma vez só, ela consegue. Tendo de criar aquele garotinho meigo completamente so­zinha. Ora, eu não sei o que eu faria sem meu Harry quando nossos pequenos estavam chegando.

Coop era um repórter, afinal. Tal circunstância, adicionado ao fato de ele estar curioso sobre sua se­nhoria, colocou-o no modo entrevista.

— O pai do garoto não ajuda com nada? A sra. Finkleman bufou.

— Não vi nem sombra dele. Pelo que me con­taram, ele deu o fora no minuto em que soube que Zoe estava grávida. Ele a deixou à deriva, e ela mesma não era mais do que uma criança. Até onde sei, ele não viu o garoto muitas vezes. Nosso queridinho.

Coop presumiu que ela estivesse se referindo a Keenan.

— Bom garoto. Quantos anos ele tem, cinco, seis?

— Apenas quatro. Muito perspicaz. Eles estão sen­do criados com mais esperteza nos dias de hoje. E sendo ensinados rapidamente também. O fofinho está na pré-escola agora. Vai estar em casa a qualquer momento.

— A mãe saiu para pegá-lo, então?

— Ah, não, não é a semana dela na escala caro­na. E a vez de Alice Miller, da casa branca com aca­bamento em azul ao fim do quarteirão. Ela tem um menino e uma menina. Dois fofinhos. A mais nova, Steffie, é da idade de Keenan. Agora o mais velho, Brad, é páreo para você.

Assim que ela começou a inserir Coop nos assun­tos menos louváveis da vizinhança, ele decidiu que era hora de dar um fim à entrevista.

— Talvez você pudesse dizer à srta. Fleming que passei por aqui? Posso deixar um número onde ela pode me localizar quando...

Oh, Deus. — A sra. Finkleman abanou uma das mãos. — Eu preciso correr. Quase me esque­ci por que vim aqui, em primeiro lugar. Zoe ligou e me pediu para procurá-lo. Ficou presa na flori­cultura. Ela trabalha lá três vezes por semana. E a Floral Bouquet, ali na Ellicott City. Um bom lugar, porém caro. Ora, é um crime cobrar tanto por uma margarida.

— Ela ficou presa — Coop incitou.

— O substituto dela teve um problema com o carro, então Zoe vai se atrasar um pouco. Ela disse que você podia ir diretamente à cozinha, onde ela deixou o contrato e as chaves.

— Está bem. Obrigado.

— Sem problema. Esta é uma vizinhança ami­gável. Sempre tem alguém para oferecer uma mãozinha. Não acho que Zoe tenha mencionado seu trabalho.

— Sou um colunista esportivo no Dispatch.

— Não diga! Ora, meu Harry é simplesmente louco por esportes. Não consigo tirá-lo da frente da TV quando está passando um jogo.

— É isso que torna este país maravilhoso.

A sra. Finkleman riu e deu uma pancada no bra­ço de Coop que teria derrubado um homem mais fracote.

— Vocês homens são todos iguais. Pode vir e con­versar sobre esportes com Harry a qualquer hora. Para mim, se não for sobre beisebol, não vale a pena conversar.

Coop, que estivera prestes a se retirar, se animou.

— A senhora gosta de beisebol?

— Filho, sou uma nativa de Baltimore. — Como se aquilo explicasse tudo. — Nossos meninos vão até a final do campeonato este ano. Guarde minhas palavras.

— Eles poderiam chegar, se aquecessem aqueles tacos. O revezamento de lançadores está um time de ouro este ano, e os jogadores das bases são firmes como um tambor. O que eles precisam é de...

Coop foi interrompido por um toque de buzina animador. Ele se virou para ver Keenan irromper de um sedã vermelho e correr como um foguete ao lon­go do pátio lateral.

— Olá, senhor. Olá, sra. Finkleman. Carly Myers caiu, e tinha sangue. — Os enormes olhos castanhos brilharam perniciosamente. — Muito, muito sangue, e ela gritou e chorou. — Ele demonstrou, soltando um grito agudo que fez os ouvidos de Coop doe-rem. — Então ela colocou um curativo com estrelas nele. — Keenan achou que teria valido a pena perder um pouco de sangue para ganhar o tal maravilhoso emblema de honra. — Onde está mamãe?

— Carneirinho. — A sra. Finkleman se inclinou sobre a cerca para beliscar a bochecha de Keenan. — Ela está trabalhando até um pouco mais tarde. Ela disse que você poderia vir e ficar comigo até ela che­gar em casa.

— Certo. — Keenan gostava de suas visitas à casa do lado, já que elas sempre incluíam biscoitos e ser embalado no colo maravilhosamente macio da sra. Finkleman. — Preciso guardar minha lancheira.

— Um garoto tão bom — a sra. Finkleman falou de forma amorosa. — Venha quando tiver acabado. Por que você não mostra a casa para esse homem le­gal, assim ele pode esperar por sua mãe?

— Certo.

Antes que Coop pudesse demonstrar uma atitu­de ambígua, a mão dele foi agarrada pela de Keenan. Ele estava certo, Coop pensou com uma careta. Era pegajosa.

— Temos biscoitos — Keenan disse a ele, dedu­zindo engenhosamente que poderia dobrar seus regalos vespertinos se jogasse as cartas do jeito certo.

— Ótimo.

— Nós mesmos assamos, na nossa noite de folga. — Keenan deu um olhar esperançoso para Coop. — Eles são muito bons.

— Aposto que sim. — Coop segurou a porta de trás antes que batesse.

— Ali. — Keenan apontou para um pote de bis­coitos de cerâmica no formato de um enorme pássa­ro amarelo sobre o balcão. — Dentro do Garibaldo.

— Certo, certo. — Já que parecia o melhor jeito de saciar a criança, Coop pegou o pote e surgiu com a mão cheia de biscoitos. Quando ele os colocou na mesa, os olhos de Keenan se arregalaram, ficando do tamanho do pires. Ele mal conseguia acreditar na própria sorte.

— Você pode comer um também. — Ele enfiou um biscoito inteiro na boca e sorriu.

— Tão bom assim, hein? — Com um dar de om­bros, Coop provou um. O garoto, Coop concluiu após a primeira mordida, conhecia seus biscoitos. — É melhor você ir para a vizinha.

Keenan devorou outro biscoito, protelando.

— Preciso lavar minha garrafa térmica, porque se você não lava, fica com cheiro.

— Certo. — Cooper sentou à mesa para ler o contrato enquanto o garoto arrastava um banquinho para a frente da pia.

Keenan esguichou detergente líquido na garrafa, e então, quando notou que Coop não estava prestan­do atenção, esguichou mais. E mais. Ele ligou a água em pressão máxima e deu risadinhas quando o sabão começou a borbulhar e transbordar. Com a língua entre os dentes, ele sacudiu o tampão do ralo na pia e começou a brincar de lavar os pratos.

Coop se esqueceu dele, lendo rapidamente. O contrato parecia adequado o bastante, ele julgou. Zoe já havia assinado ambas as cópias. Ele rabiscou sua assinatura paralelamente à dela, dobrou sua có­pia, então colocou o cheque que já havia preenchido sobre a mesa. Ele pegou as chaves e se levantou para enfiar sua via no bolso quando focou em Keenan.

— Ai, Deus.

O garoto estava ensopado, da cabeça aos pés. Bo­lhas de sabão pontilhavam seu rosto e cabelo. Uma poça grande estava se formando no piso, aos pés do banquinho.

— O que você está fazendo?

Keenan olhou por sobre o ombro, sorrindo ino­centemente.

— Nada.

— Veja, você tem água em todo lugar. — Coop olhou em volta, buscando por uma toalha.

— Todo lugar — Keenan concordou e, testando o adversário, bateu as mãos na pia. A água e a espuma esguicharam.

— Pare! Deus! Você não deveria estar em outro lugar? — Ele pegou um pano de prato e avançou, apenas para ser acertado no rosto pelo jato seguinte. Os olhos dele se estreitaram. — Olhe, garoto...

Ele ouviu a porta da frente bater. Tal mãe, tal fi­lho, ele pensou.

— Keenan? — Zoe chamou. — Espero que não esteja comendo aqueles biscoitos.

Coop olhou para as migalhas na mesa, no chão, flutuando na água repleta de sabão.

— Ah, inferno — ele murmurou.

— Ah, inferno — Keenan ecoou, sorrindo para ele, deu risadas e dançou no banquinho. — Oi, mamãe.

Zoe, com os braços cheios de ramos de irises do dia anterior, captou a cena com uma olhadela. O fi­lho estava tão molhado quanto um cachorro afoga­do, parecia que a cozinha havia sido assolada por um pequeno furacão. Furacão Keenan, ela pensou. E seu novo inquilino parecia abatido, irritado e charmosamente encabulado.

Como um garoto flagrado com a mão no pote de biscoitos, ela notou, olhando para as migalhas denunciadoras.

— Andou brincando de lavador de pratos de novo? — Com uma calma que deixou Coop des­concertado, ela largou as flores. — Só não tenho certeza se essa é a carreira certa para se escolher, Keen-man.

Keenan saracoteou seus longos cílios molhados.

— Ele queria biscoitos.

Coop começou a se defender, então simplesmen­te olhou zangado para o garoto.

— Tenho certeza de que ele queria. Vá para a área de serviço e tire essas roupas molhadas.

— Certo. — Ele pulou do banquinho, espirrando mais água antes de sumir rapidamente. Parou apenas por tempo suficiente para dar um beijo molhado na mãe antes de desaparecer rumo ao cômodo adjacente.

— Desculpe, estou atrasada — Zoe disse tranqüi­lamente, puxando o tampão da pia e então indo até o armário para pegar um vaso.

Coop abriu a boca. Ele começou a explicar o que havia se passado nos últimos dez minutos, mas per­cebeu que não estava tão seguro.

— Eu assinei o contrato.

— Estou vendo. Você se importaria em colocar um pouco de água nisso? — Ela ofereceu o vaso. — Preciso pegar um esfregão.

— Claro.

Ela provavelmente iria surrar o garoto com ele, Coop pensou, e sentiu uma pontada rápida de arre­pendimento e culpa. Mas os sons que vieram da área de serviço para onde ela desapareceu não eram aque­les associados à punição física. Eram risadas de um garotinho e uma risada vigorosa de mulher. Coop ficou de pé, um vaso com água nas mãos, e surpreso diante da situação.

— Você está parado numa poça — Zoe comentou quando voltou com um esfregão e um balde.

— Ah, certo. — Coop olhou para seus tênis mo­lhados, e se deslocou.

— Aqui está seu vaso.

— Obrigada. — Ela cuidou das flores primeiramen­te. — Você conheceu a sra. Finkleman, fiquei sabendo.

— As notícias correm.

— Por aqui, sim. — Quando ela deu um pano para Coop secar o rosto, ele captou o perfume dela, muito mais potente, muito mais vivo que o das flo­res. Ela usava jeans e uma camiseta larga na qual estava escrito Floral Bouquet no peito. O cabelo dela, ele notou, tinha um sombreado ilusório entre castanho e loiro. Ela o usava preso em um rabo de cavalo vistoso.

Quando Zoe ergueu as sobrancelhas, ele perce­beu que a estivera encarando.

— Desculpe. Quero dizer... Sinto muito pela bagunça.

— Você estava brincando de lavador de pratos também?

— Não exatamente. — Foi impossível não sorrir de volta, ignorando o golpe forte da atração.

Não iria ser tão ruim, ele refletiu, ter uma bela dama, dividir a casa com ela, talvez uma refeição ca­sual. Ou outra coisa casual...

— Mamãe! — Keenan parou à porta, completa­mente nu. — Não consigo encontrar minhas calças.

— No cesto perto da máquina de lavar — ela dis­se a ele, sem tirar os olhos dos de Coop.

Ele tinha se esquecido da criança, se permitiu fan­tasiar um pouco antes de se lembrar que ela não vi­nha sozinha. Ele retrocedeu o pensamento e tilintou as chaves de seu novo apartamento.

— Tenho algumas caixas no carro — ele disse a ela. — Vou mudar algumas coisas nesta tarde.

— Está bem. — Era bobagem se sentir decep­cionada, Zoe pensou. Bobagem ter sentido aquela vibração feminina quando ela reconheceu interesse nos olhos dele. Mais bobagem ainda se sentir para baixo porque o interesse se esvaíra quando o filho a chamou. — Precisa de alguma ajuda?

— Não, posso dar conta. Tenho um jogo para co­brir esta noite, então vou mudar o restante amanhã. — Ele recuou em direção à porta. — Obrigado.

— Bem-vindo a bordo, sr. McKinnon.

— Coop — ele disse assim que saiu. — É Coop.

Coop, ela pensou, se inclinando sobre o cabo do esfregão. Pareceu uma idéia tão boa fazer uso do apar­tamento no andar de cima. A renda extra iria aliviar um pouco a pressão, e talvez acrescentar algum bô­nus. Como aquela viagem à Disney que Keenan de­sejava tanto.

Comprar a casa tinha sido um risco, mas ela que­ria que o filho crescesse em uma boa vizinhança, com jardim, talvez um cachorro quando ele ficasse um pouco mais velho. A renda do aluguel iria ame­nizar parte do risco.

Mas ela não havia percebido que poderia acrescen­tar outro, um risco mais pessoal. Ela não tinha perce­bido o quão complicado poderia ser ter um inquilino do sexo masculino, solteiro e absolutamente lindo.

Ela riu de si. Vá sonhando, Zoe, ela pensou. J. Cooper McKinnon era simplesmente como o res­tante, que corria como um cão de caça quando ouvia os passos miúdos de pezinhos.

— Venha, marinheiro — ela chamou Keenan. — E hora de esfregar o convés.

 

— Bom trabalho, Coop. Realmente muito bom. — Ben Robbins, um redator do Dispatch, bebia uma cerveja gelada enquanto inspecionava o apartamento de Coop. — Eu não dei muito crédito a ele quando arrastamos todas as suas tranqueiras para cá, mas não é de todo ruim.

Era bem melhor do "não é de todo ruim", e Coop sabia disso. Ele tinha tudo exatamente onde queria. A sala estava dominada por seu longo sofá rebaixado de couro vinho e sua televisão de tela grande, tão perfeita para assistir aos jogos. Um par de luminárias de latão, uma mesinha de centro lindamente desgastada pelos solados de dúzias de sapatos que haviam descansado nela e uma única poltrona generosa completavam a parte formal do cômodo.

Havia um aro de basquete de interiores, em es­cala menor, para práticas, e porque uma pequena rodada de bolas ao cesto o ajudava a pensar. Uma máquina de pinball usada chamada Home Run, um suporte que ostentava dois tacos de beisebol e uma calejada mesa de pebolim formavam a área de recreação.

Coop não os teria chamado de brinquedos. Eram ferramentas.

Ele havia escolhido venezianas, preferíveis a cor­tinas, para as janelas. Venezianas, ele pensou, que iriam bloquear a luz caso um homem decidisse se regalar com uma soneca vespertina.

O quarto comportava pouco mais do que sua cama, um criado-mudo e outra TV. O quarto era para dormir, ou, se ele tivesse sorte, praticar outro tipo de esporte.

Mas era seu escritório que mais o agradava. Ele já conseguia se imaginar passando horas diante do computador, com um jogo passando na TV da área de trabalho. Ele a havia equipado com um grande su­porte giratório, uma escrivaninha que tinha o núme­ro certo de machucados e queimaduras, um fax, duas linhas telefônicas e um vídeo-cassete para reproduzir aquelas discussões controversas ou jogadas dignas de fazer o coração parar.

Com todas as placas, fotos e coisas dignas de se­rem lembradas no esporte espalhadas, era um lar. O lar dele.

— Se parece com o bar da vizinhança — Bem dis­se, e esticou suas pernas curtas e peludas. — Onde os jóqueis se divertem.

Coop considerou aquilo o maior dos elogios.

— Combina comigo.

— Concordo plenamente — Ben falou, e ergueu sua garrafa de cerveja num brinde. — Um lugar onde um homem pode relaxar, ser ele mesmo. Você sabe, desde que comecei a morar com Sheila, tenho coisinhas de porcelana espalhada por todo canto e calci­nhas penduradas no banheiro. Outro dia ela chegou em casa cora uma colcha nova. Tinha flores em toda a estampa. Flores cor-de-rosa. — Ele fez uma careta enquanto bebia. — É como dormir em uma campina.

— Ei. — Com toda a equidade complacente de um homem desimpedido, Coop estacou o pé sobre a mesinha de centro. — Escolha sua, camarada.

— Sim, sim. Uma pena que eu seja louco por ela. E ela é fã dos Orioles também.

— Tem lugar para todos. Dizem que os Orioles vão substituir o Remirez.

Ben resmungou.

— Claro, claro, conta outra, campeão.

— O rumor é esse. — Coop deu de ombros, deu um gole na cerveja. — Vão mandá-lo para o Mansas City Royals em troca do Dunbar e daquele pegador novato, o Jackson.

— Eles devem estar doidos. Remirez rebateu 280 bolas válidas na última temporada.

— Duzentas e oitenta e cinco — Coop disse a ele. — Com 24 jogadas desperdiçadas. Levou o time a erros também.

— Sim, mas com um taco como aquele... E Dun­bar, o que é aquilo? Ele rebateu o quê... 220?

— Foram 218, mas ele é como um aspirador de pó na segunda base. Nada passa por ele. E o garo­to tem potencial. Grande, um caipira robusto com um braço como um projétil. Eles precisam de sangue novo. Muitos dos titulares têm mais de 30 anos.

Eles discutiram beisebol e terminaram suas cer­vejas numa completa harmonia masculina.

— Tenho um jogo para cobrir.

— Hoje à noite? Eu pensei que os Baltimore Orioles estariam em Chicago até amanhã.

— E estarão. — Coop colocou o gravador, o bloco e o lápis no bolso. — Estou cobrindo o jogo da uni­versidade. Há um sujeito excelente na terceira base que deixou os olheiros babando. Pensei que poderia dar uma olhada, pegar uma entrevista.

— Que emprego. — Ben se colocou de pé. — Ir a jogos, matar o tempo nos vestiários.

— Sim, é uma vida dura. — Ele passou um braço em volta dos ombros de Ben enquanto eles seguiam para fora. — Então, como está a história dos bichos de estimação castrados?

— Vá se catar, Coop.

— Ei, alguns de nós passeamos no curral, e outros no estádio.

E que dia fantástico estava para isso também, Coop pensou. Agradável e com céu limpo. Ele quase podia sentir o cheiro de amendoim torrado e cachorros-quentes.

— Enquanto você está passeando em volta de um monte de universitários suados vestindo cinta elásti­ca, eu estarei aconchegado a uma mulher.

— Debaixo de uma coberta florida.

— Sim, mas ela diz que flores a fazem se sentir sexy. E vou te contar... Ai, meu Deus... — Quando o rosto pequeno e quadrado de Ben fi­cou vago, Coop se virou. Ele sentiu o próprio queixo cair. E, se não estava errado, a língua acompanhou e chegou aos pés.

Zoe usava o que seria a menor saia projetada pelo homem. Sob o pano estava um par interminável de pernas moldadas por uma meia arrastão preta. Ela re­quebrava enquanto andava. Como poderia evitar, já que se equilibrava em saltos pretos altíssimos?

Um pequeno bustiê branco expunha uma deli­ciosa quantidade da fenda do colo. Em volta do pes­coço ela usava uma pequena gravata borboleta, que, por razões totalmente inexplicáveis a Coop, faziam cada célula do corpo dele chiar.

Os cabelos estavam soltos, extremamente lisos sobre os ombros em uma mistura de tons que o fa­ziam pensar em um cervo selvagem saltando através de uma floresta iluminada pelo sol.

Ela parou, sorriu, disse alguma coisa, mas a mente dele congelara no momento em que seus olhos pou­saram nas pernas dela.

— ...se você está bem estabelecido.

— Ah... — Ele piscou como um homem saindo do coma. — O quê?

— Eu disse que não tive a chance de ver se você está bem estabelecido.

— Estou bem. — Ele recolheu a língua à boca e se endireitou. — Muito bem.

— Ótimo. Keenan pegou um resfriado, então as coisas têm estado agitadas. Eu percebi que suas coisas estavam sendo rebocadas lá para cima há alguns dias.

— Rebocadas — ele repetiu. — Sim. Ben — ele disse quando o amigo lhe deu uma cotovelada. — Este é Ben. Ele tem me dado uma mãozinha na mu­dança.

— Oi, Ben. Eu sou Zoe.

— Olá, Zoe — Ben disse estupidamente. — Eu sou o Ben.

Ela apenas sorriu. Era a roupa, ela sabia. Por mais que a odiasse, ela não podia evitar, mas se divertia com o quanto afetava determinados mem­bros da espécie.

— Você trabalha no jornal também?

— Sim, eu, ah, estou escrevendo uma história so­bre animais castrados.

— Mesmo? — Ela quase sentiu pena dele, pelo modo como o pomo de Adão estava tremulando. — Com certeza vou procurar por ela. Estou feliz porque você está se acomodando. Preciso ir para o trabalho.

— Você vai sair? — Coop disse. — Para onde? Ela contraiu os lábios.

— Bem, essa é minha roupa costumeira quando dou carona às crianças para a escola, mas pensei que poderia usá-la para trabalhar esta noite. No Shadows? Sou garçonete. Prazer em conhecê-lo, Ben.

Ela caminhou até o carro. Não, Coop pensou, re­quebrou até o carro, em passos longos e preguiçosos. Ambos ainda estavam encarando-a quando ela saiu da garagem e cruzou a rua.

— Sua senhoria — Ben disse em um sussurro respeitoso. — Aquela era sua senhoria.

— Acho que era. — Ela não tinha se parecido com aquilo quando ele assinou o contrato. Linda, sim, ela tinha ficado linda, mas de um jeito sadio, inofensivo. Ela não tinha parecido tão... tão... As palavras lhe fal­taram. Zoe era mãe, pelo amor de Deus, ele lembrou a si. Não deveria se parecer com aquilo. — Ela tem um filho.

— Mesmo? De que tipo?

— Humano, eu acho.

— Pare com isso.

— Um garoto. — Coop disse distraidamente. — Deste tamanho. — Ele ergueu uma das mãos, a pal­ma para baixo, uns 90 centímetros do chão.

— Ela pode ter um filho, mas também tem um belo par de pernas. Deste tamanho. — Bem abanou uma das mãos em frente à própria garganta. — Você tem muita sorte na vida, Coop. Meu senhorio tem braços como blocos de carvão e uma tatuagem de la­garto. Você tem uma que parece o pôster central de uma revista.

— Ela é mãe — Coop disse bufando.

— Bem, eu não me importaria em ir à casa dela para saborear leite e biscoitos. Vejo-o na senzala.

— Claro. — Coop permaneceu onde estava, franzindo o rosto diante da rua tranqüila. Mães não deveriam se parecer com aquilo, ele pensou nova­mente. Elas deveriam parecer... maternais. Inofensi­vas. Confortáveis. Ele bufou, dispensando o nó que sentia no estômago.

Ela não era a mãe dele, Coop lembrou a si.

 

Por volta da meia-noite, os pés de Zoe estavam gri­tando. As costas doíam e os braços davam a sensação de que ela estivera erguendo rochas em vez de ban­dejas de drinques. Ela se esquivou de seis propostas, duas bem intencionadas o suficiente para fazê-la rir, uma delas insultante o bastante para fazer o sujeito em questão merecer um pisão para machucar, corte­sia de um dos saltos agulha. As outras tinham sido o de sempre, e facilmente ignoradas.

Faziam parte do pacote daquele território, e não a incomodavam além da conta.

O local ganhara o nome Shadows por causa do efeito sombrio do neon e de todos os cantos obscu­ros. A decoração tinha a cafonice dos anos 1950 e as garçonetes eram embonecadas como vadias antiqua­das de cabeça-oca para combinar.

Mas as gorjetas eram excelentes e a clientela, em sua maioria, inofensiva.

— Dois vinhos brancos da casa, um Black Russian e café, fraco. — Depois de informar o pedido ao bartender, Zoe tirou um instante para movimentar os ombros.

Ela esperava que Beth tivesse levado Keenan para a cama sem rebuliço. Ele ficara irritadiço o dia todo, o que significava que estava quase se curando do resfriado. Havia feito uma bagunça e tanto naquela ma­nhã, Zoe se lembrou, quando ela rejeitou a idéia de levá-lo para a escola.

Ele não puxou isso de mim, ela pensou. Ela nunca fizera estardalhaço por não ir à escola. Agora, aos 25 anos, se arrependia profundamente por deixar a edu­cação formal lhe escapar. Se ela tivesse se dedicado, tentado ir à faculdade, poderia ter desenvolvido um talento, ter conseguido uma carreira.

Em vez disso, possuía um diploma de ensino mé­dio que mal tinha merecido, e era qualificada para um pouco mais do que servir bebidas a homens cujos olhos tentavam mergulhar em seu decote.

Mas ela não era mulher de arrependimentos. O que estava feito, estava feito, e tinha o maior prêmio de todos. Keenan. Em uns dois anos, ela calculou, teria economizado o suficiente para que pudesse en­tregar o bustiê e fazer um curso noturno. E não pre­cisaria deixar Keenan com babás à noite.

Ela serviu seus drinques, anotou o pedido de ou­tra mesa e agradeceu a Deus porque seu intervalo chegaria em cinco minutos.

Quando ela viu Coop entrar, Keenan foi a pri­meira coisa que lhe veio à cabeça. Mas o alarme aflito passou quase tão rapidamente quanto tinha vindo. Coop estava relaxado, obviamente analisando o lugar. Quando os olhos dele encontraram os dela, ele assentiu tranqüilamente e seguiu rumo às mesas dispersas.

— Eu pensei em parar para tomar um drinque.

— Este é o lugar para isso. Deseja sentar no bar ou quer uma mesa?

— Uma mesa. Tem um minuto?

— Daqui a pouco terei 15 minutos. Por quê?

— Eu gostaria de conversar com você.

— Certo. O que posso trazer para você?

— Café, preto.

— Café, preto. Sente-se.

Ele a observou seguir em direção ao bar e tentou não enfatizar o quão atraente ela ficava caminhando. Ele não a procurara porque queria um drinque, mas porque ela lhe parecera uma mulher legal em uma saia justa.

Contenha-se, Coop, alertou a si. Ele era esperto demais para deixar o pensamento embaralhar seu dis­cernimento. Ele só tinha ido fazer algumas perguntas, saber da história toda. Era o que ele fazia, e era bom nisso. Assim como era bom analisando um jogo, qual­quer jogo, e encontrando aqueles pequenos triunfos e pequenos erros que influenciavam o resultado.

— Estamos ocupados esta noite. — Zoe colocou dois cafés sobre a mesa antes de deslizar para uma ca­deira ao lado de Coop. Ela deixou escapar um longo e sincero suspiro, então sorriu. — Esta é a primeira vez que consegui me sentar em horas.

— Pensei que você trabalhasse em uma floricultura.

— Eu trabalho, três dias na semana. — Ela tirou os pés com câimbras dos sapatos. — Próximo ao Dia das Mães, Natal, Páscoa, você sabe, os grandes dias para dar flores, posso me encaixar em mais. — Ela deu um gole no café que carregara no açúcar e o deixou bombear no organismo. — E só uma loja pequena e Fred, o proprietário, mantém apenas dois funcionários em meio período. Deste modo ele não tem de pagar nenhum benefício, como plano de saú­de e licença.

— Isso é nojento.

— Ei, é um emprego. Eu gosto dele. São apenas Fred e Martha, ela é a esposa dele. Eles têm me ensi­nado muito sobre flores e plantas.

Alguém colocou moedas na jukebox. O ambiente se aqueceu com a música. Coop se inclinou sobre a mesma para que ela pudesse ouvi-lo. Por um instan­te, perdeu o fio da meada em algum lugar dos enor­mes olhos castanhos dela.

— Eu a conheço de algum lugar? — ele pergun­tou a ela.

— Do apartamento.

— Não, quero dizer... — Ele balançou a cabeça, deixou para lá. — Ahn, por que aqui?

— Por que aqui o quê?

— Por que você trabalha aqui?

Ela pisou, aqueles enormes cílios esvoaçando para cima e então para baixo.

— Por um salário.

— Não parece que você deveria estar trabalhando em um bar.

— Perdão? — Zoe não tinha certeza se deveria se deleitar ou se sentir insultada. Ela escolheu a primeira opção simplesmente porque era da natureza ela. — Você tem algum problema com garçonetes e coquetéis?

— Não, não. É só que, você é mãe.

— Sim, eu sou. Eu tenho um filho para provar isto. — Ela riu e apoiou o queixo no punho. — Você está pensando que seria mais apropriado eu estar em casa assando biscoitos ou tricotando um cachecol?

— Não. — Embora ele ficasse constrangido por pensar que sim. — É essa roupa — ele falou sem pensar. — E o jeito como todos esses homens olham para você.

— Se uma mulher vai usar algo assim, os homens vão olhar. Olhar é tudo que eles fazem — ela com­pletou. — Se isso o faz se sentir melhor, eu não me visto assim nas reuniões de pais da escola.

Ele estava se sentindo mais ridículo a cada segun­do que passava.

— Olhe, não é da minha conta. Eu só tenho o hábito de perguntar coisas. Parece-me que você po­deria fazer melhor do que isso. Quero dizer, você tem o trabalho na floricultura, e o aluguel...

— E tenho uma hipoteca, um filho que parece ficar maior do que suas roupas e sapatos semana sim, semana não, prestações de um carro, contas da mer­cearia, contas do médico.

— Médico? O garoto está doente?

Zoe revirou os olhos. Exatamente quando ela es­tava começando a ficar irritada, ele a subestimou.

— Não. Crianças da idade do Keenan estão sem­pre carregando algum germe ou outro da escola para casa. Ele precisa de check-ups regulares com o pe­diatra, com o dentista. Essas coisas não são de graça.

— Não, mas há programas de governo. Assistên­cia. — Ele parou, pois aqueles enormes olhos casta­nhos se tornaram ferozes.

— Sou perfeitamente capaz de ganhar a vida e de cuidar do meu filho.

— Eu não quis dizer...

— Talvez eu não tenha um diploma universitário e habilidades exorbitantes, mas posso pagar meu es­tilo de vida, e não falta nada para o meu filho. — Ela espremeu os pés nos saltos opressivos e se pôs de pé. — Temos seguido muito bem sozinhos e eu não pre­ciso de um repórter de esportes intrometido vindo aqui e me dizendo como ser mãe. O café é por conta da casa, seu idiota.

Ele se assustou quando ela saiu da mesa enfure­cida, então deixou escapar um longo suspiro. Lidou com isso realmente bem, Coop.

Imaginou se haveria uma ordem de despejo em sua porta de manhã.

 

Ela não o expulsou. Pensara no assunto, mas decidira que a satisfação que teria não seria exatamente igual à renda do aluguel. Além disso, ela já ouvira tudo aqui­lo antes.

Um dos motivos de ela ter se mudado de Nova York era ter se tornado exaustivamente impossível tolerar amigos e família dizendo a ela como conduzir a vida. Como criar seu filho.

Baltimore havia sido uma folha em branco.

Agora, dois anos após a mudança, ela possuía uma casa e um jardim, no tipo de vizinhança que desejava para o filho. E pagara cada pedacinho disso sozinha.

Várias pessoas tinham dito que ela era louca, que era jovem demais, que estava desperdiçando a vida e as chances. Com um grunhido, Zoe deixou o aparador de grama de lado e começou a arrancar outra tira de grama. A grama dela, ela pensou com os dentes cerrados.

Ela provara que eles estavam errados. Havia tido seu filho, ficado com seu bebê, e criava uma vida decente para ele. Zoe e Keenan não eram estatística. Eles eram uma família.

Não precisavam de ninguém para sentir pena de­les ou para oferecer caridade. Ela estava cuidando de tudo, um passo de cada vez. E tinha planos. Planos bons, sólidos.

O tapinha em seu ombro a fez dar um pulo. Quando virou a cabeça depressa e olhou para Coop, as mãos apertaram o aparador de grama.

— O quê?

— Quero pedir desculpas — ele gritou. Quan­do ela apenas continuou a encará-lo, ele se abaixou a desligou a máquina. — Quero pedir desculpas — ele repetiu. — Eu ultrapassei os limites na noite passada.

— É mesmo?

— Eu sou meio viciado em remexer a vida das outras pessoas.

— Talvez você devesse parar imediatamente. — Ela se abaixou para puxar o fio de arranque do motor. A mão dele se fechou sobre a dela. Zoe encarou-o por um instante, palmas enrijecidas. Lembrou-se da impressão que captara de força e energia. Agora a mão parecia gentil, e era difícil resistir a ela.

Ela não sentia mãos masculinas, não desejava sen­tir mãos masculinas, há muito tempo.

— Algumas vezes eu aperto o botão errado — Coop continuou. Ele estava olhando para a mão de ambos também, pensando no quanto a dela era pequena sob a dele. O quão delicada era. — Eu mereci um soco uma vez ou duas. — Ele experimentou dar um sorriso quando o olhar dela deslizou rumo ao dele.

— Isso não me surpreende.

Ela não sorriu de volta, mas ele sentiu um esmorecimento. O ronco do aparador o havia acordado. Quando ele olhou para fora e a viu marchando detrás dele vestindo shorts largos, uma camiseta e um chapéu de palha ridículo, teve vontade de voltar para a cama. Mas fora compelido a procurá-la.

Era apenas uma bandeira branca, ele disse a si. Afinal, ele tinha de morar cora ela. Mais ou menos.

— Eu não quis ser crítico. Estava curioso sobre você. E sobre o menino — ele acrescentou rapida­mente. — E talvez vê-la naquelas roupas ontem à noite tenha acionado alguns botões meus.

Zoe ergueu uma sobrancelha. Era honesto o sufi­ciente, ela pensou.

— Está certo. Nenhum dano permanente.

Havia sido mais fácil do que ele esperara. Coop decidiu abusar da sorte.

— Ouça, preciso cobrir um jogo esta tarde. Talvez você gostasse de ir junto. É um bom dia para apro­veitar o beisebol.

Ela supunha que fosse. Estava cálido, ensolarado, com uma brisa refrescante e agradável. Havia jeitos piores de passar o dia do que em um estádio com um homem atraente que estava se esforçando ao máximo para não falar bobagem.

— Parece divertido, se eu não tivesse de trabalhar. Mas Keenan adoraria. — Ela viu o queixo dele cair, e reprimiu um sorriso.

— Keenan? Você quer que eu o leve?

— Não consigo pensar em outra coisa que ele preferiria fazer. Algumas crianças brincam nos cam­pos dele e as deixam perseguir as bolas. Mas ele nun­ca viu a coisa de verdade, exceto na TV — Ela sorria agora, desprovida de culpa, e retinha um barulho de risada. Ela quase conseguia enxergar a mente de Coop trabalhando.

— Eu não sei muito, sobre crianças — ele disse, recuando cautelosamente.

— Mas você sabe sobre esportes. Vai ser ótimo para Keenan experimentar seu primeiro jogo de ver­dade com um especialista. Quando vocês sairão?

— Ah... Em duas horas.

— Vou me certificar de que ele esteja pronto. Isso é muito legal da sua parte. — Enquanto ele permane­cia encarando-a, ela se inclinou e lhe beijou o rosto.

Após um arranco forte no motor, o aparador estava roncando novamente.

Coop ficou plantado como uma árvore quando ela começou a vagar. Que diabos ele deveria fazer com uma criança durante a tarde toda?

 

Ele comprou pipoca, cachorros-quentes e enormes copos de refrigerante. Coop imaginou que comida iria manter a criança quieta. Keenan pulara sobre o banco do carro do começo ao fim do trajeto até Camden Yirds, e desde o momento em que chega­ram, ficara de olhos arregalados diante de tudo.

Coop ouvira "O que é aquilo?" e "Como acon­teceu isso?" por vezes demais para contar. Excitável como um gato, ele se sentou na tribuna da imprensa com seu laptop.

— Você pode assistir através desta janela aqui — ele instruiu Keenan. — E você não pode incomodar ninguém porque eles estão trabalhando.

— Certo. — Explodindo de excitação, Keenan apertou seu cachorro-quente.

Havia muitas pessoas na tribuna de imprensa, algumas com computadores maravilhosos, como Coop, outras com fones de ouvido. Algumas sorri­ram para ele e todas cumprimentaram Coop. Keenan sabia que Coop era importante. Conforme sua mãe lhe havia instruído, ele se manteve por perto e não pediu nenhum presente. Embora houvesse coisas realmente sensacionais nas tendas. A mãe havia lhe dado cinco dólares e dito a ele que poderia comprar um souvenir. Mas havia tantos que ele não soube qual escolher. E Coop andara tão depressa que difi­cilmente conseguira olhá-los.

Mas isso não importava porque ele estava em um jogo de verdade.

Olhos arregalados, ele olhava para o campo. Era maior que qualquer coisa que ele imaginara. Sabia onde o arremessador iria ficar e reconhecia a última base, mas não tinha certeza de nada mais.

O enorme placar explodiu em fotos e palavras que ele não conseguia ler. Havia tendas circundando tudo, repletas de mais gente do que ele jamais vira.

Quando eles anunciaram os titulares, ele olhou para os jogadores com uma admiração exposta. O hino nacional começou e, reconhecendo-o, Keenan se pôs de pé, conforme lhe fora ensinado.

Coop olhou por cima, viu o garoto em pé, com um cachorro-quente em uma das mãos e um sorriso ofuscante no rosto. De repente ele se lembrou de sua primeira vez no estádio. A mãozinha ansiosa agar­rando a mão do pai, os olhos tentando ver tudo de uma só vez e o coração tão preenchido por excitação, pelo jogo, pelo fato de apenas ser um garoto.

Quando os jogadores tomaram o campo, Coop estendeu a mão e mexeu nos cabelos brilhantes de Keenan.

— Bem legal, ahn?

— A melhor coisa do mundo. Aqueles são os nos­sos caras, certo?

— Aqueles são os nossos caras. Eles vão arrebentar. Keenan deu risadinhas e se aproximou do vidro para observar o primeiro lance.

— Arrebentar — ele disse com gosto.

Ele não incomodou, choramingou ou foi um com­pleto aborrecimento como Coop esperara. Como ele estava acostumado a trabalhar sob condições baru­lhentas e confusas, as perguntas constantes de Keenan não o incomodaram além da conta. Pelo menos, ele pensou, o menino tinha o bom-senso de perguntar.

Entre entradas, Keenan observava por sobre os ombros de Coop e repetia em voz alta as palavras que estavam surgindo na tela do computador, e chegou a passar um pouco de mostarda das mãos para as man­gas de Coop. Mas não foi o desastre que Coop tinha previsto.

Coop até mesmo sentiu uma ponta de orgulho quando o locutor do lance a lance chamou Keenan e deixou o garoto sentar no colo dele durante uma das entradas.

A maioria das crianças teria corrido pela cabine, implorando por mais doces. Mas esta, Coop pensou, havia vindo pelo jogo.

— Como ele não correu aquele pedaço todo? Como ele não correu? — Keenan mudou o pé de apoio. Sua bexiga estava para lá de cheia, mas ele não podia suportar perder um minuto.

— O arremesso foi para a segunda base, então ele foi colocado para fora — Coop explicou. — Veja, o jogador da segunda base pegou a bola e pisou na base para afastar o adversário.

— Afastar o adversário — Keenan repetiu respei­tosamente. — Mas nós ainda estamos ganhando?

— Os Baltimore Orioles estão ganhando por um ponto no fim da nona entrada. Vendo a ordem de rebatedores, eu diria que eles vão colocar um jogador canhoto.

— Jogador canhoto — Keenan repetiu, como se fosse o evangelho.

— Um lançador reserva canhoto. Provavelmente Scully. — Ele deu uma olhadela e notou que Keenan estava segurando a virilha. — Ahn, algum problema?

— Nã-ão.

— Vamos visitar o Miguel, o banheiro. — Ele pe­gou a mão de Keenan e esperou que não fosse tarde demais. Assim que passaram pela porta, Scully foi anunciado como o lançador reserva que iria entrar.

— Exatamente como você disse. — Keenan olhou para Coop com uma admiração fascinante. — Você é mais inteligente que qualquer pessoa.

Coop sentiu um sorriso irromper no próprio rosto.

— Vamos apenas dizer que eu conheço o jogo.

 

Quando eles chegaram em casa, Keenan estava usan­do um suéter novo dos Orioles e carregando uma luva gigante de beisebol autografada. Ele sacolejava uma flâmula na outra mão enquanto escalava os degraus.

— Olha! Olha o que o Coop me deu! — Ele cor­reu em direção à mãe que mal havia passado pela porta. — Fomos no vestiário com os Orioles de ver­dade e eles assinaram a bola para mim. Para guardar.

— Vejamos. — Ela pegou a bola e a examinou. — Isso é realmente especial, Keenan.

— Vou guardar para sempre. E eu ganhei essa blusa também, a mesma que eles usam. E uma luva. Até cabe.

A emoção ficou presa na garganta dela.

— Certamente cabe. Parece que você está pronto para jogar!

— Vou jogar na terceira base, porque é o... o...

— Canto quente — Coop soprou.

— Isso. Posso ir mostrar para o sr. Finkleman? Posso mostrar minha bola para ele?

— Claro.

— Ele vai ficar surpreso. — Ele se virou e abraçou as pernas de Coop. — Obrigado, obrigado por me levar. Gostei mais do que tudo. Podemos ir de novo e levar a mamãe?

— Ah, claro, acho que sim. Claro. — Sentindo-se embaraçado outra vez, ele deu um tapinha na cabeça de Keenan.

— Certo! — Dando um último apertão em Coop, Keenan disparou porta afora para mostrar seus novos tesouros.

— Você não precisava comprar todas aquelas coisas para ele — Zoe começou. — Levá-lo era o suficiente.

— Nada de mais. Ele não pediu por aquilo, ou por nada. — Coop enfiou as mãos nos bolsos. — Ele gostou tanto de conhecer os jogadores, e uma coisa meio que levou a outra.

— Eu sei. Eu soube que seu time venceu.

— Sim. Golpeou o adversário por um ponto. Eu tive que parar no jornal e arquivar a história, do con­trário teríamos chegado mais cedo.

— Eu mesma acabei de chegar. — Num impulso, ela foi em direção a ele, passou os braços em torno dele e o abraçou. As mãos de Coop ficaram paralisa­das nos bolsos. — Eu lhe devo isso. Você proporcio­nou um grande dia a ele. Keenan não vai se esquecer. — Ela recuou. — Nem eu.

— Não é nada de mais. Ele só fez o que teve von­tade na tribuna da imprensa.

— É algo grandioso, especialmente porque fui eu quem lhe colocou nessa enrascada. — Ela riu e colo­cou os cabelos para trás. — Você foi tão transparente esta manhã, Coop. A idéia de ter um garoto de quatro anos a tiracolo o apavorou. Mas você se saiu bem, de verdade. De qualquer modo... Desculpe — ela disse quando o telefone tocou. — Alô? Ah, oi, Stan. Hoje à noite? Não é minha escala. — Deixando escapar um suspiro, ela se sentou na poltrona. — Preciso que você saiba. Não, Stan, não posso dizer agora. Preci­so ver se consigo encontrar uma babá. Uma hora, então. Sim, eu entendo que você está atribulado. Eu ligo de volta.

— Problemas?

— Hum... Duas das garçonetes adoeceram esta noite. Eles estão com a equipe desfalcada. — Ela já estava discando. — Oi, sra. Finkleman. Sim, eu sei. Ele se divertiu muito. Hum... — O olhar de Zoe se moveu repentinamente de encontro ao de Coop enquanto a sra. Finkleman dizia a ela o quão impor­tante era para o garoto ter um homem em sua vida.

— Com certeza a senhora está certa. Eu estava ima­ginando se estará ocupada esta noite. Oh. Está certo, eu me esqueci. Não, não é nada. Divirta-se.

Zoe desligou e comprimiu os lábios.

— É a noite de bingo deles — ela disse a Coop. — Beth tem um encontro. Talvez Alice. — Ela pegou o telefone outra vez, meneou a cabeça. — Não, ela está dando um jantar para os sogros. — Os olhos dela se iluminaram sobre Coop e contraíram em especulação.

— Você não teve problema algum com Keenan hoje.

— Não — Coop disse lentamente, alerta a outra armadilha. — Ele foi legal.

— Stan não precisa de mim até as nove. Keenan vai para a cama às oito, então você não teria de fazer nada, exceto matar o tempo, assistir à televisão ou qualquer coisa assim.

— Matar o tempo aqui, enquanto você traba­lha? — Ele deu um passo atrás. — Só eu e o garoto... como uma babá? Ouça...

— Eu vou pagá-lo. Beth ganha dois dólares por hora, mas eu posso aumentar sua parcela.

— Eu não quero seu dinheiro, Zoe.

— Isso é tão gentil. — Ela sorriu, pegou a mão dele e a apertou. — Mesmo, tão gentil da sua parte. Se você pudesse descer por volta de oito e meia.

— Eu nunca disse que...

— Você pode se servir de qualquer coisa na co­zinha. Vou fazer alguns brownies, se tiver tempo. É melhor eu ligar para Stan antes de ele arrancar o que lhe restou dos cabelos. — Ela pegou o telefone, sor­riu para Coop. — Agora eu lhe devo duas.

— Sim, claro. — Ele saiu apressadamente antes que ela pudesse descobrir um jeito de dever três a ele.

 

Pelas duas horas seguintes, Coop mergulhou na "Faz parte do jogo", sua coluna semanal publicada em diversos veículos. O garoto dera o gancho a ele, pensou. A primeira visita a um jogo de beisebol, a transmissão de uma tradição e o laço criado duran­te as comemorações, a batida do taco, as cascas de amendoim.

Era um bom artigo, Coop julgou, e escreveu fa­cilmente. Ele supunha que já que devia a Idéia a Keenan, o mínimo que poderia fazer era matar o tempo no andar de baixo e comer brownies enquanto o ga­roto dormia.

Ele perambulava pelo andar de baixo exatamente enquanto Zoe vinha pela porta da cozinha.

Ela não estivera muito certa de que ele iria. Sabia que o havia pressionado, e depois que parará de se divertir com o fato, se sentiu culpada. Mas ali estava ele, bem na hora, parado aos pés da escada.

— Eu o encurralei... — ela começou.

— Sim, encurralou. — Ela parecia tão melancó­lica, que ele teve de sorrir. — Você tem um talento verdadeiro para isso.

Ela encolheu os ombros e sorriu de volta para ele.

— Algumas vezes, ser insistente é o único jeito de se conseguir que as coisas sejam feitas, mas eu sem­pre me sinto mal depois. Eu assei brownies.

— Eu consegui sentir o cheiro deles por todo can­to lá em cima. — Quando ela não se moveu, ele in­clinou a cabeça. Engraçado, embora estivesse usando os trajes de garçonete sexy outra vez, ela não parecia tão ultrajante. Exceto por aquela gravata borboleta, ele pensou. Algo naquela roupa black tie em volta daquele pescoço branco e esguio atirou diretamente na libido dele.

— Você vai me deixar entrar ou quer que eu fique aqui fora?

— Eu tenho essa coisa de culpa — ela explicou — sempre que preciso pedir um favor a alguém. E foi tão doce da sua parte levar Keenan ao jogo, especial­mente quando...

— Quando eu estava chamando você para sair?

Ela encolheu os ombros novamente, e os deixou cair. Coop olhava para ela daquele jeito outra vez, e algo no corpo dela estava reagindo de maneira impo­tente. Melhor, ela pensou, para estabelecer as regras rapidamente.

— Eu não saio com homens. Devia ter falado diretamente.

Ele precisou se obrigar a não erguer a mão até aquela gravatinha e arrancá-la.

— De jeito nenhum?

— É tão mais fácil não sair. Eles não estão interes­sados em Keenan, ou fingem que estão, assim podem me levar para a cama. — Quando ele tremeu nas bases e pigarreou, ela gargalhou. — O que eles não sabem é que são transparentes como celofane. En­tenda, Keenan e eu somos um time. Como colunista esportivo, você deveria saber o que isso significa.

— Com certeza, eu entendo.

— De qualquer forma, você proporcionou a ele um dia realmente maravilhoso, e eu sinto como se estivesse lhe torturando esta noite.

Ele julgou, após um instante, que ela não esta­va fazendo de propósito. Havia sinceridade demais naquele rosto glorioso para ser uma trapaceira. E se havia uma pontada de culpa porque ele pensara con­sideravelmente em levá-la para a cama, aquilo era problema dele.

— Olha, ele está dormindo, certo?

— Então, vou comer seus brownies e assistir à sua televisão. Nada de mais.

O sorriso dela veio tranqüilamente agora, linda­mente, e o fez salivar.

— Eu deixei o número do bar perto do telefone, caso precise. Os Finkleman estarão em casa por volta das 23h. Ela pode vir e substituí-lo, se quiser.

— Vamos improvisar.

— Obrigada, mesmo. — Ela deu um passo atrás para dentro da cozinha para deixá-lo entrar. — Meu turno termina às duas, quando o bar fecha.

— Longo dia para você.

— Eu terei folga amanhã. — Depois de pegar a bolsa, ela deu uma olhada rápida em volta. — Fique à vontade, certo?

— Ficarei. Vejo você mais tarde.

Ela se apressou, aqueles saltos incrivelmente sen­suais batendo contra o piso. Coop deixou escapar um longo suspiro e disse a si para sossegar. A moça havia acabado de estabelecer as regras. Diversão e jogos es­tavam fora.

Zoe tinha o rosto de uma sereia, o corpo de uma deusa e pernas desenhadas para fazer um homem forte choramingar, mas bem no fundo ela era Betty Crocker, a cozinheira de mão cheia.

Coop deu uma fungada e decidiu se contentar com um prato de brownies com camada dupla de calda.

 

A tempestade chegou em abundância pouco antes de meia-noite. Coop havia levado as palavras de Zoe ao pé da letra e se sentiu em casa. Ele estava estirado no sofá, mergulhado nas almofadas, com os pés esco­rados confortavelmente sobre a mesinha de centro. Cochilava diante de um filme de guerra antigo, seu único arrependimento foi não ter pensado em levar algumas cervejas consigo.

A seleção de Zoe passava por leite, suco e um lí­quido verde indefinido.

Ele havia bisbilhotado um pouco, era simples­mente nato da parte dele. A bagunça imperava na casa, mas ele começava a enxergar um padrão naqui­lo. Obviamente ela não era uma pessoa detalhista, mas a falta de ordem em geral tornava a casa confor­tável, muito aconchegante. Coop não estava certo se tal resultado se devia à decoração ou simplesmente porque ela era uma mulher que tinha jornada dupla e um filho para criar.

E, de acordo com os livros de biblioteca que ele encontrou empilhados aqui e ali, parecia que ela pas­sava a maior parte do tempo livre lendo sobre flores, conserto de carros, leis tributárias e administração do tempo.

Ele não podia evitar pensar que era um desperdí­cio de uma mulher perfeitamente estonteante, este enterro voluntário em livros e trabalhos de meio pe­ríodo em algum lugar.

Mas isso não era problema dele.

O estrondo do trovão do lado de fora harmoni­zava lindamente com a barragem de artilharia na tela da TV Coop havia acabado de concluir essa função de babá era moleza.

Então ele ouviu o choramingo.

Fuzileiros navais não choramingavam, ele pensou vagamente, especialmente quando estavam comba­tendo a escória nazista. Ele bocejou, alongou o pes­coço até estalar, então viu Keenan.

O garoto parou ao pé das escadas, em seu pijama do Batman, com um cachorro de pelúcia surrado em um braço e lágrimas escorrendo pelo rosto.

— Mamãe! — A voz dele soou contundente como um picador de gelo, então soluçante. — Onde está minha mãe?

— Ela está no trabalho. — Coop se endireitou no sofá e o encarou, impotente. — Algo errado.

O clarão de um raio iluminou o cômodo. No mo­mento em que o trovão surgiu em resposta, Keenan gritou como uma gralha e se lançou ao colo de Coop.

— Estou com medo. Tem monstros lá fora. Estão vindo me pegar.

— Ei... — Coop deu uma pancadinha impró­pria na cabeça enterrada em seu colo. — Ei, é só um temporal.

— Monstros — Keenan soluçou. — Eu quero a mamãe.

Bem, ela... — Ele começou a praguejar, mas se conteve. O pobre garoto estava tremendo. Com um instinto que ele não reconhecia, Coop afagou Keenan no colo. — Você não gosta de tempestades, hein? — Tudo que Keenan conseguiu fazer foi menear a cabeça e enterrá-la mais fundo. — Eles são como fogos de artifício. Você sabe, como no dia da Independência, ou depois que seu time ganha? Pro­vavelmente eles apenas tiveram um grande jogo lá em cima. Eles estão comemorando.

— Monstros — Keenan repetiu, mas havia se acalmado o suficiente para erguer a cabeça e olhar para Coop. — Monstros grandes e pretos com den­tes afiados. — Ele deu um solavanco com a trovejada seguinte. Novas lágrimas começaram a rolar. — Eles querem me comer.

— Não. — Fazendo uma experiência, Coop tes­tou os bíceps de Keenan. — Você é durão demais.

— Sou?

— Pode apostar que sim. Qualquer monstro que viesse aqui veria você e correria para se salvar. Eles nunca dariam conta de Coop e do Keen-man.

Keenan fungou, esfregou uma lágrima.

— Mesmo?

— Absolutamente. — Coop viu o lábio inferior de Keenan tremer quando um trovão rosnou. — Correriam sem parar — ele disse, e a boca trêmula de Keenan se rendeu a um sorriso hesitante.

— Posso ficar aqui com você?

— Claro. Eu acho.

Keenan, um especialista em tais situações, se aco­modou confortavelmente no colo de Coop, deitou a cabeça contra o peito dele e suspirou.

 

Zoe estava cambaleando de cansaço quando entrou. Eram quase três horas da madrugada e ela estivera acordada e ativa 24 horas, direto. Tudo que ela queria era cair na cama e dormir.

Ela os viu sob a luz acinzentada da tela da TV fora do ar. E estavam encolhidos juntos no sofá, o garoto intensamente aconchegado ao homem. Algo se revirou dentro dela diante da visão dos dois, ambos dor­mindo profundamente, os cabelos loiros de Keenan despenteados sob a mão larga e bronzeada de Coop.

Zoe colocou a bolsa e as chaves de lado sem tirar os olhos deles.

O quão pequeno o filho dela parecia, o quão seguro.

Ela retirou os sapatos e andou em direção a eles com os pés ainda envolvidos nas meias. Em um gesto natural, acariciou o cabelo de Coop antes de erguer o filho gentilmente. Keenan se mexeu, então sossegou contra o corpo dela.

— Mamãe.

— Sim, bebê — murmurou. Ela o aninhava en­quanto o carregava, capturando o perfume de ho­mem misturado ao do menino.

— Os monstros vieram, mas nós espantamos eles.

— É claro que espantaram.

— Coop disse que os trovões são só fogos de arti­fício. Eu gosto de fogos de artifício.

— Eu sei. — Ela o deitou na cama, alisando os lençóis, os cabelos dele, beijando suas bochechas de­licadas. — Volte a dormir agora.

Mas eleja havia adormecido. Ela o observou um pouco mais sob a luz fraca do abajur, então se virou e voltou lá para baixo, indo até Coop.

Ele estava se sentando agora, a cabeça nas mãos, as palmas esfregando os olhos. Ela desligou o zunido intermitente da televisão, então se sentou no bra­ço da poltrona. Todo homem que podia dormir tão confortavelmente com uma criança, sob o ponto de vista dela, tinha potencial ilimitado.

Ela imaginou, apenas por um instante, como seria se aninhar ao lado dele.

— A tempestade o acordou?

— Sim. — A voz dele estava rouca. Ele pigarreou. — Estava bem assustado.

— Ele disse que você afugentou os monstros.

— Pareceu a coisa certa a fazer. — Ele girou a ca­beça para fitá-la. Aqueles enormes olhos castanhos estavam sonolentos e sorrindo. O solavanco rápido na batida do coração dele o alertou para cair fora. Mas ele prolongou a conversa. — Ele está bem agora?

— Ele está bem. Você seria um bom pai.

— Ah, bem.... — Aquilo o comoveu. Ele se levan­tou, espreguiçando. — Esse não é o meu forte. Mas não foi grande coisa.

— Foi para mim. — Ela o constrangeu, Zoe no­tou, e não tivera a intenção de fazê-lo. — Por que eu não preparo um café da manhã para você amanhã?

— Hum?

— Retribuo com minhas panquecas. A sra. Finkleman diz que você traz muita pizza e comida chine­sa, então eu não acho que você cozinhe. Gosta de panquecas?

— Quem não gosta?

— Então me avise quando você estiver por aqui. Vou jogar umas para o ar para você. — Ela levantou uma das mãos, tirou os cabelos da testa. — Obrigada por me ajudar.

— Sem problemas. — Ele deu um passo para trás, praguejou baixinho e voltou. — Ouça, eu só precisa­va fazer isso, ok?

Antes que ela pudesse responder, ele pegou o ros­to dela nas mãos e colocou os lábios sobre os dela.

O beijo foi rápido, e suave, e enviou faíscas para todos os nervos dela.

Quando ela não movimentou um único múscu­lo, ele levantou a cabeça e olhou para ela. Ela o estava encarando, os olhos escuros e pesados. Ele pensou ter visto a mesma reação atordoada neles que o estava fazendo se revirar no íntimo. Ela abriu a boca como se fosse falar, mas ele meneou a cabeça e a beijou no­vamente. Mais demorada e profundamente, até ele sentir os ossos começarem a derreter. Até ele ouvir o pequeno choramingo de prazer resfolegar na gar­ganta dela.

As mãos dela deslizaram para os braços dele, agar­raram, então se moveram para emaranhar nos cabe­los dele. Ficaram ali, entrelaçados um ao outro.

Um deles estremeceu, talvez ambos. Não parecia ser importante enquanto o gosto cálido dela se infil­trava na boca de Coop, no sangue dele. Era como um sonho do qual ele não havia sido despertado, um que o tentava a se afundar, a esquecer a realidade.

Ela havia se esquecido de como era. Tudo que sabia, por um instante glorioso, era que estava sen­do envolvida por braços fortes, que sua boca estava sendo maravilhosamente saboreada, e que aqueles desejos, há tanto adormecidos, nadavam rumo à su­perfície e ganhavam vida.

Toque-me. Ela imaginava se tinha dito aquilo, ou se as palavras simplesmente rodopiavam nebu­losamente em sua cabeça. Mas a mão dele, rija e segura, correu corpo abaixo de uma vez, acendendo fogos.

Ele se lembrou de como era se queimar, e de como era quando as chamas se extinguiam e o dei­xavam só.

— Coop. — Ah, ela queria, tanto, apenas deixar acontecer. Mas não era uma garota jovem e negligen­te desta vez. E tinha mais coisas em que pensar além de si. — Coop, não.

A boca grudou à dela por outro instante, os dentes machucando. Mas ele recuou. Coop estava, ele per­cebeu, tão esbaforido quanto um homem que havia chegado impetuosamente à base do jogo de beisebol pela primeira vez.

— Agora eu deveria me desculpar. Ela meneou a cabeça.

— Não, não precisa. Eu não preciso.

— Bom. — As mãos que estavam se apoiando sobre os ombros dela fizeram um movimento de massagem, então deslizaram para os bolsos dele. — Nem eu. Eu tenho pensado em fazer aquilo desde a primeira vez em que vi seus pés.

Ela ergueu as sobrancelhas. Certamente ela en­tendera errado.

— Meus o quê?

— Seus pés. Você estava parada na escada, pin­tando. Estava descalça. Você tem pés tremendamente sensuais.

— Mesmo? — Ela ficou surpresa por como ele conseguia fisgá-la e deixá-la impotente em um mo­mento, e então fazê-la rir no instante seguinte. — Obrigada. Eu acho.

— Acho que é melhor eu ir.

— Sim, é melhor.

Ele assentiu, e começou a sair. Desta vez, quando ele parou, Zoe se retesou, desejosa. Mas ele simples­mente se virou e olhou para ela.

— Eu não vou tentar levá-la para a cama. Mas eu a quero lá. Pensei que deveria lhe dizer isso.

— Agradeço pela consideração — ela disse com voz trêmula.

Quando a porta se fechou detrás dele, ela deixou as pernas fracas se dobrarem e se sentou no sofá. O quê, ela se perguntou, deveria fazer agora?

 

Quando Coop se arrastou para fora da cama, era praticamente meio-dia. Ele seguiu trôpego para o chuveiro e quase se afogou antes de os olhos se abri­rem de fato. Molhado e aborrecido, ele se ensaboou, cogitou se barbear, então descartou a idéia.

Ele se enfiou em shorts de ginástica e uma cami­seta antes de seguir diretamente em direção à cafe­teira elétrica. Enquanto ela fervia a água, ele abriu a porta da frente e deixou o poder total do sol impactá-lo para espantar o restinho de sono.

Eles estavam no jardim, Zoe e Keenan, gargalhan­do enquanto a mãe tentava ajudar o filho a acertar bolas com um taco de plástico. A criança não estava tendo muita sorte, Coop notou. Mas com certeza se divertia. Ele começou a recuar para dentro antes que qualquer um dos dois o visse. Mas o comentarista esportivo nele o fez se intrometer.

— Ele nunca vai acertar nada ficando nessa posi­ção — Coop gritou, e ganhou dois pares de enormes olhos castanhos virando na direção dele.

— Oi, Coop. Oi. Estou jogando beisebol. — Ex­citado por ter uma platéia, Keenan brandiu o taco e quase acertou o queixo da mãe.

— Cuidado, campeão — ela disse, e se moveu para fora do alcance dele. — Bom dia — ela gritou.

— Quer seu café da manhã?

— Sim, talvez.

Keenan deu outra gingada patética e Coop pra­guejou baixinho. Gingava como uma garota. Alguém tinha de mostrar ao menino como segurar um taco, não?, ele se perguntou quando começou a descer.

— Você está apertando muito o taco. Zoe contraiu o cenho.

— O livro que peguei disse que...

— Livro — ele praguejou automaticamente. Kee­nan repetiu. — Desculpe — ele murmurou quando Zoe o fitou com olhos contraídos. — Agora ouça, aprenda como adicionar e subtrair dos livros. Você não aprende beisebol. Exatamente como uma garota. — Ele agachou e ajustou as mãos de Keenan.

Zoe tinha ficado pronta para admitir a derrota para o especialista, mas a última declaração a fez parar.

— Perdão? Você está sugerindo que mulheres não podem praticar esportes?

— Não foi o que eu disse. Balance os ombros — ele disse a Keenan. Coop podia ter soado resmungão, mas ele não era bobo. — Há muitas atletas fabulosas. Mantenha seu olho na bola, garoto. — Ele manteve uma das mãos em volta de Keenan e arremessou a bola delicadamente com a outra. O taco bateu com um som oco.

— Eu bati! Eu bati muito, muito forte!

— Coisa de jogador profissional. — Os olhos de Coop deslizaram de encontro aos de Zoe outra vez. — Pensei que você estivesse fazendo panquecas.

— Eu estava... Eu estou. — Ela bufou. — Acho que você está assumindo o cargo.

— Bem, eu não sei nada sobre panquecas e você não sabe bulhufas sobre beisebol. Por que ambos não fazemos o que sabemos?

— Como se fosse grande coisa bater uma bola estúpida com um taco estúpido — ela murmurava enquanto seguia rumo à porta de trás.

— Você não consegue.

Ela parou no meio do trajeto, os olhos se estrei­taram, girou.

— Eu certamente consigo.

— Tá, claro. Certo, Keenan, vamos tentar outra vez.

— Acho que é a minha vez. — Com o desafio em cada movimento, Zoe tirou o taco das mãos do filho.

— Você vai bater, mamãe? Vai?

— Pode apostar que vou. — Ela mostrou uma das mãos sinalizando a bola que Coop estava segurando. Ela a arremessou, gingou e bateu na bola fazendo-a chegar à cerca de arame que delimitava a lateral do jardim. Keenan deixou escapar urna comemoração e correu para recuperá-la.

Coop fungou e sorriu.

— Nada mal para uma garota. Mas qualquer um pode acertar desse jeito.

— Keenan é novinho demais para qualquer coisa diferente de uma bola de plástico.

— Não, eu me refiro a essa jogada de você mesma arremessar a bola para cima e acertar.

— Ah.

— Vou arremessar, Coop. Você pega.

— Claro, mande com força.

Keenan precisou de três tentativas, melhorando a cada vez, para mandar a bola para algum lugar pró­ximo a Coop.

— Suponho que não ache que eu conseguiria bater nela se você a atirasse para mim... — Zoe começou.

— Arremessasse para você. — Coop corrigiu pa­cientemente. — Se eu arremessasse para você.

— Está certo, arremesse para mim então. — Ela ergueu o taco.

— Ótimo, mas talvez você queira girar um pou­quinho mais para o lado. É, isso — ele disse, se afas­tando. — Zoe, você está segurando o taco como se fosse usá-lo como martelo para bater um prego. Cer­to, lá vai.

Ele arremessou a bola de forma suave e traiçoeira, mas ela ainda teve de ranger os dentes para não de­sistir. Como o orgulho dela e o respeito do filho dela pelas mulheres estavam em jogo, ela gingou com vontade. Ninguém ficou mais surpreso do que Zoe quando ela acertou a bola. Coop desviou da bola um instante antes que pudesse esmagar seu nariz.

— Bem. — Zoe entrego o taco de volta a um Keenan de olhos arregalados, e limpou as mãos. — Vou providenciar aquelas panquecas.

— Ela bateu realmente muito forte — Keenan disse repleto de admiração.

— Sim. — Coop viu a porta dos fundos se fechar detrás dela. — Sua mãe é mesmo... uma coisa, garoto.

— Você vai arremessar para mim, Coop? Vai?

— Claro. Mas vamos trabalhar essa postura, hein? Você precisa se parecer com um jogador.

Quando Zoe terminou de fazer a última pan­queca da pilha, ela olhou pela janela e viu o filho movimentando o taco. A bola não foi longe, mas Coop fez um pretenso mergulho na recepção dela, errando, enquanto Keenan dançava alegremente no lugar.

— Quente demais para segurar — Coop alegou, e Keenan pulou em cima dele. — Ei, não existe ataque no beisebol. Não estamos na temporada de futebol americano. — Ele carregou o menino e o segurou de cabeça para baixo. Em algum momento ao longo da manhã, seu humor azedo tinha evaporado.

 

Passar um tempo com o garoto se tornou um hábito. Nada planejado, apenas jogar um pouco no jardim ou mostrar a Keenan como enterrar cestas no apar­tamento. Não era como se ele estivesse afeiçoado ao garoto, Coop assegurou a si. Mas quando tinha algu­ma hora livre e o garoto queria matar o tempo, que mal havia nisso? Talvez fosse bom ver aqueles olhos enormes repletos de veneração heróica. E talvez não fosse um sofrimento tão grande ouvir aquela risadinha brincalhona na qual Keenan explodia quando algo estimulava sua imaginação.

Se o garoto algumas vezes vinha com o bônus que era a mãe dele, não era exatamente um sofrimento.

O fato era que Zoe tinha mais consideração com Keenan do que com ela desde a noite das trovoadas. Ela era amigável o suficiente, mas tomava cuidado, ou assim pareceu a Coop, para não ficar a sós com ele.

Aquilo era algo que ele iria consertar, ele decidiu assim que desligou seu computador.

Ele pegou algumas miniaturas de carros de cor­rida, algumas tralhas infantis que Keenan havia dei­xado no apartamento dele. Se Coop conhecia Zoe como pensava que estava começando a conhecer, os brinquedos iriam ser um ingresso mais eficiente do que um buquê de rosas de cabo longo.

Sacolejando os carrinhos na mão, ele desceu os degraus para bater à porta da cozinha dela.

Na área de serviço, Zoe fechava a tampa da má­quina de lavar.

— Quem é?

— É Coop.

Ela hesitou, e ligou a máquina.

— Entre. Já vou aí. — Ela ergueu um cesto de roupa limpa, muito mais como defesa do que por ne­cessidade, e seguiu para a cozinha.

Deus, ele estava bonito. Ela tinha tentado muito não se fixar no quão bonito o sujeito estava. Tão más­culo, ela pensou, o corpo alto e atlético, os músculos, os cabelos escuros e desordenados, e aqueles maravi­lhosos olhos verdes. Ela desejou do fundo do coração não gaguejar sempre que ele lançasse um daqueles sorrisos convencidos em sua direção.

— Oi. — Ela colocou o cesto na mesa da Cozinha e imediatamente começou a ocupar as mãos dobran­do meias.

— Oi. — A cozinha estava bagunçada, como sem­pre. Ela realmente precisava de alguém para ajudá-la a organizar, ele pensou. Deus, ela estava com um cheiro fantástico. — Keenan deixou isso lá em cima. — Coop pôs os carrinhos na mesa. — Pensei que ele poderia estar procurando por eles.

— Obrigada.

— Então, onde ele está?

— Na escola.

— Ah, certo. — Coop conhecia os horários de Keenan assim como sabia a pontuação dos lançado­res no jogo do dia anterior — Você chegou agora da floricultura?

— Uhum... O trabalho está acumulando. Tive­mos alguns casamentos. Na verdade, eu poderia tra­balhar em período integral nas próximas três sema­nas, mas simplesmente não se encaixa aos horários de Keenan.

— O que você quer dizer? — A toa, ele pegou uma camiseta depenada no cesto.

— Bem, os casamentos da primavera. Os prepa­rativos exigem muito pessoal extra, então Fred per­guntou se eu poderia ficar em tempo integral por um tempo.

— Então, isso é bom, certo?

— A escola que Keenan freqüenta é realmente mais uma pré-escola do que uma creche. Não fica aberta depois das três da tarde. E eu tenho a escala da carona das crianças na semana que vem, de qual­quer forma. Além disso, prometi levá-lo com mais algumas crianças para nadar no centro comunitário na sexta-feira. Ele está realmente ansioso por isto.

— Sim, ele mencionou. — Umas vinte vezes, Coop recordou.

— Eu não quero decepcioná-lo.

— Então eu faço isso.

Ela olhou para trás, as meias oscilando nas mãos.

— O quê?

Coop não conseguia acreditar que havia dito aqui­lo. Ele olhou para ela por mais um instante, então deu de ombros.

— Eu disse que faço isso. Não é nada demais. Ele pode sair comigo quando chegar da escola.

Ela inclinou a cabeça.

— Você não tem um emprego?

— É assim que eu chamo, já que eles me pagam. — Ele sorriu, achando que a idéia foi facilmente aceita. — Eu escrevo a maioria das coisas aqui, e ele poderia ir junto quando eu vou ao jornal ou fa­zer uma entrevista. Ele provavelmente se divertiria a valer.

— Tenho certeza de que sim. — Ela estreitou os olhos. Por que ela não conseguia decifrar J. Cooper McKinnon? — Mas por que você faria isso?

Ele não tinha certeza de que possuía uma resposta para aquilo, então arriscou:

— Por que não? Ele não é tão pestinha assim.

Com uma gargalhada, ela voltou à área de serviço.

— Talvez ele não seja, mas você se esqueceu da escala da carona.

— Eu sei dirigir. Qual é o problema em levar um monte de crianças para a escola e trazer de volta?

— Não consigo nem começar a lhe contar — ela murmurou. Era, talvez, algo que todos os adultos de­veriam experimentar. — E a piscina.

— Eu era capitão do time de natação na faculda­de. Por mérito.

Ela deu uma olhada de relance.

— Eu pensei que você jogasse beisebol. Ahn, Kennan mencionou isso.

— Sim, eu jogava. Duzentas e doze corridas im­pulsionadas na minha última temporada. Eu joguei basquete também, fazia em média 42 pontos por partida. — Ele estava se gabando, Coop percebeu. Como algum adolescente tolo tentando impressio­nar a líder de torcida. Ele franziu a testa diante dos carrinhos, começou a deslizar um deles sobre a mesa.

— Keenan diz que você imita bem barulhos de motor.

— Sim, é um talento.

Ele ficou constrangido, Zoe percebeu, e ela quis abraçá-lo.

— É o seguinte. Por que não fazemos um dia por vez? Se você perceber que pode dar conta...

Os olhos dele cintilaram diante daquilo.

— Acho que posso lidar cora uma criança magricela e alguns de seus amiguinhos.

— Está certo. Se você perceber que não quer lidar com isso, não ficarei chateada.

— Ótimo. Quando você quer começar?

— Amanhã seria ótimo.

— Certo. — Estava estabelecido. Agora, ele pen­sou, iria tratar de outro assunto. — Que tal um jantar?

Os olhos dela se arregalaram em surpresa.

— Hum... Claro. Nós estávamos escolhendo fran­go. Provavelmente vou fazer frito.

— Não. — Ele deu um passo à frente. Ela deu um passo atrás. — Quero dizer, por que nós não janta­mos? Fora. Você e eu.

— Ah, bem... — Boa reposta, ela pensou estupidamente. Muito sucinta. Ela deu outro passo em recuo. — Eu preciso trabalhar esta noite.

— Amanhã.

— Eu realmente não saio muito.

— Eu percebi. Do que você está fugindo, Zoe?

— De você. — Perturbada consigo, ela ergueu uma das mãos. E a flagrou pressionada contra o peito dele. — Eu não quero sair com ninguém. Começar nada. Eu tenho bons motivos.

— Você vai ter que me contar quais são em algum momento. — Ele estendeu uma das mãos, passou pe­los cabelos dela e soltou o elástico que o prendia atrás.

— Você não vai me beijar de novo.

— Claro que vou. — Ele tocou os lábios dela com os seus para provar. Os olhos dele permaneciam abertos enquanto ele sugava o lábio inferior dela, enquanto usava a língua e os dentes para provocar e seduzir. — Você tem uma boca incrível.

Ela não conseguia respirar. Mesmo enquanto ofegava, a visão turvava. Era tudo que era queria. Pa­recia que a vida dela dependia de manter os lábios de encontro aos dele. Isso não era justo, ela pensou vagamente quando começou a afundar na glória da sensação. Tempo demais, ela disse a si. Certamente estava reagindo deste modo porque passara muito tempo desde que ela se permitira se sentir apenas como uma mulher.

Zoe estava derretendo contra ele feito cera. Ele não tinha idéia do quão dolorosamente erótico se­ria sentir aquele corpo alto e esbelto se desfazer. Só queria beijá-la, testar a ambos, mas as mãos dele já estavam tocando, acariciando, explorando.

O toque dele, daquelas mãos fortes e calejadas contra a pele dela, quase a fez ficar de joelhos.

— Eu preciso pensar.

— Pense depois. — Ele pressionou a boca contra o pescoço dela. Oh, era glorioso, glorioso desejar an­siosamente de novo. Mas ela sabia bem demais o que vinha com aquele desejo calmante.

— Coop, não podemos fazer isso.

— Sim, podemos. Vou lhe mostrar.

Com uma risada que veio com um misto de ge­mido, ela desviou a cabeça.

— Minha cabeça está girando. Você precisa pa­rar. Deus, tem alguma idéia do que está fazendo comigo?

— Eu nem comecei. Suba, suba comigo, Zoe. Eu quero senti-la sob o meu corpo. Eu quero me sentir dentro de você.

— Eu quero. — Ela tremeu, as necessidades ex­plodindo dentro dela como bombas incendiárias. — Coop, eu preciso pensar primeiro. Eu preciso pensar. Eu não estivesse com ninguém nesses cinco anos.

A boca dele cessou a jornada desesperada pelo pescoço dela. Lentamente, ele se afastou para olhá-la. Os olhos dela estavam nebulosos e a boca inchada e perfeita.

— Ninguém?

— Não. — Ela engoliu e rezou para seu organis­mo se reestabelecer antes que ela cedesse à urgência de rasgar as roupas dele e se libertar. — Desde antes de Keenan nascer. Eu sinto como se todas aquelas necessidades tivessem pecado, como folhas velhas. Você ateou fogo nelas e eu não sei como lidar com isso.

— O pai do garoto — Coop disse cautelosamen­te. — Você ainda é apaixonada por ele?

— Não. — Ela podia ter rido daquilo se não es­tivesse tão trêmula. — Ele não tem nada a ver com isso. Bem, é claro que tem, mas... Preciso me sen­tar. — Ela andou cambaleante para a cadeira. — Eu sabia que isso iria acontecer. Eu soube na primeira vez em que o vi. Não houve ninguém porque eu não queria ninguém. Porque Keenan era tudo que importava para mim. Eu tenho planos. — Aquilo saiu como uma acusação, e os olhos dela se escure­ceram. — Droga, eu tenho planos. Eu quero voltar a estudar. Eu quero ter minha própria floricultura um dia. — A voz dela começou a falhar, deixando-o inquieto.

— Zoe...

Mas ela o embarrilou.

— E tudo estava fluindo bem. Eu comprei a casa. Eu queria que ele tivesse uma casa, um jardim e vi­zinhos. Todo mundo disse que eu era louca, que eu nunca seria capaz de fazer isso, que eu me lamentaria por ter desistido de tudo para criar uma criança sozi­nha. Mas eu não me arrependo. Ele é a melhor coisa que já me aconteceu. E tenho feito um bom trabalho. Keenan é feliz, e brilhante, engraçado e maravilhoso. Temos uma vida boa e eu sei que posso fazer ainda melhor. Eu não preciso de ninguém. E... Ah, Deus. Eu estou apaixonada por você.

A mão que ele erguera desajeitadamente para lhe acariciar a cabeça, congelou.

— O quê?

— Ai, que confusão. Que confusão. — Ela pegou uma pequena meia do cesto de roupa e limpou os olhos. — Talvez sejam apenas os hormônios. Poderia ser, você sabe. Mas eu entrei e você estava dormin­do com ele no sofá. Foi tão doce. Então você esta­va me beijando e tudo enlouqueceu. Então chegou lá no jardim parecendo tão presunçoso e másculo, mostrando a Kennan como bater uma bola estúpi­da. E depois estava comendo panquecas e olhando para mim. Eu mal consigo respirar quando você fica olhando para mim.

Em algum momento, e mente dele ficou vazia.

— Acho que perdi alguma coisa.

— Não, não perdeu. — Ela fungou e lutou para se manter controlada. —: Eu apenas tenho sido afe­tada demais. É minha culpa. Você tem sido bom para Keenan e tem sido honesto comigo. — Ela suspi­rou, e largou a maldita meia no colo. — Acredite em mim, eu sei que minhas emoções são minha respon­sabilidade. — Como ele ainda a encarava como um homem que havia acabado de ser atacado no pes­coço pelo amigável cachorro da família, ela sorriu. — Sinto muito, Coop. Eu não devia ter despejado isso tudo em você. Eu nem mesmo sabia que estava tudo contido.

Desta vez ele deu um passo atrás.

— Zoe, eu gosto do garoto. Quem não gostaria? E estou atraído por você. Mas...

— Não há necessidade de explicar. — Ereta agora, ela levantou. — Mesmo, não há. Eu não espero nada de você e sinto muito se o deixei desconfortável. Mas eu me sinto bem melhor. — E, de um jeito extrava­gante o suficiente, ela se sentia. — Quando eu for para a cama com você, nós vamos nos entender.

— Quando você...

— Acho que nós dois sabemos o que vai aconte­cer — ela disse calmamente. — Ambos queremos, e é mais esperto encararmos isso do que conviver com toda essa tensão. Kennan tem desejado passar uma noite com um amigo dele. Vou providenciar isso. — Ela riu um pouco diante da expressão de Coop. — É um pouco difícil ser espontânea com um garoto de quatro anos por perto. Espero que você não se im­porte em planejar uma noite juntos.

— Não, eu quero dizer, eu não... Deus, Zoe.

— Se você preferir não fazer ou se quiser um tempo para decidir, tudo bem.

Ele analisou o rosto dela, sentindo a mesma pontada voraz e uma labareda de algo completamente diferente. Completamente novo.

— Não, eu quero você. Sempre.

— O que acha de segunda à noite?

— Eu tenho dois jogos de beisebol para cobrir no fim da tarde de segunda. — Ele não conseguia acreditar que estava parado ali planejando uma noite de amor selvagem como se fosse uma consulta ao dentista.

— Ah... Quarta-feira? Ele assentiu.

— Quarta está bom para mim. Você quer ir a al­gum lugar?

Era gentil, ela pensou, muito gentil da parte dele perguntar.

— Não é necessário. — Ela colocou uma das mãos no rosto dele. — Eu não preciso de flores e luz de velas. Vou subir depois que Keenan estiver acomodado.

— Bom. Ótimo. É melhor eu... voltar ao trabalho.

— Sim, sem problemas. Digo a ele para subir. — Coop se voltou em direção à porta enquanto Zoe co­meçava a dobrar a roupa novamente. — Acho que o vejo por aí.

Ela ouviu os passos dele. Certamente era um erro, Zoe disse a si. Mas ela cometeria erros. A vida ficava muito mundana quando você evitava todos os cami­nhos errados.

 

— Ele vai e marca! — Coop fez barulhos de multi­dão quando Keenan enterrou na cesta.

— Posso fazer de novo! Posso, certo? — De sua posição elevada nos ombros de Coop, Keenan balan­çou os pezinhos calçados no tênis.

— Certo, você cometeu uma falta. — Coop se­gurou a bola do tamanho de sua palma e passou para as mãozinhas ansiosas de Keenan. — É o ponto da vitória, garoto, dez segundos para jogar. Este lance livre é tudo ou nada. Entendeu?

— Entendi!

— Um silêncio assola a multidão quando Fle­ming pisa na linha. Ele jogou a partida de sua vida esta noite, mas tudo acaba em um lance. Ele olha para a cesta. Você está olhando para a cesta?

— Olhando para a cesta — Keenan disse, com a língua entre os dentes.

— Ele prepara... E lança! — Coop tremeu quando a bolinha de borracha circulou o aro, então assistiu com olhos meio fechados quando entrou na cesta.

— E a multidão enlouquece! — Coop dançava em volta do sofá enquanto Keenan dava uma das gar­galhadas exageradas que sempre faziam Coop sorrir. — Você é um talento nato.

— Você lança, Coop! Você!

Prestativo, Coop fez um rápido giro seguido de uma cesta. Não era um jeito tão ruim de passar uma tarde chuvosa, ele pensou. E o ajudava a não man­ter a mente em como iria passar a noite chuvosa à frente.

— Certo, tempo esgotado. Preciso terminar meu texto sobre o campeonato.

— Nós vamos ao jornal de novo? E legal lá.

— Hoje não. Vou mandar para eles por fax quando estiver pronto. Assista a um pouco de TV — Coop apertou o controle remoto, então entregou a ele.

— Posso pegar uma bebida?

— Sim, tem um pouco daquele suco que sua mãe mandou para você. Não se meta em encrencas, certo?

— Certo.

Quando Coop seguiu para o escritório, Keenan se levantou do sofá. Gostava mais quando Coop ficava com ele depois da escola. Sempre tinham algo legal para fazer e Coop nunca perguntava se ele tinha lava­do as mãos ou dizia que comer biscoitos demais iria estragar o apetite.

O melhor de tudo, ele gostava quando Coop o buscava. Era diferente quando sua mãe o fazia. Ele gostava quando ela o abraçava, aninhava-o depois do banho, ninava-o quando ele tinha um pesadelo. Mas Coop tinha um cheiro diferente, e era diferente.

Ele sabia o porquê, Keenan pensava enquanto va­gava na cozinha. Era porque Coop era um pai em vez de uma mãe.

Gostava de fingir que Coop era seu papai, e ima­ginava que se talvez não fizesse nada de mau, Coop não iria embora.

Depois de alguns puxões, ele abriu a geladeira. Estava orgulhoso porque Coop tinha pendurado na porta os desenhos que fizera para ele. Keenan espiou dentro, viu a jarra de suco que a mãe havia levado para ele. E as garrafas verdes das quais Coop gostava.

C-E-R-V-E-J-A, Keenan disse para si. Ele se lem­brou de que já havia perguntado a Coop se podia provar da garrafa, e Coop dissera a ele que não, até ser grande o suficiente. Depois que Coop o deixou cheirar a cerveja, Keenan tinha ficado feliz porque não era grande ainda.

Havia uma garrafa nova na geladeira hoje, e Kee­nan uniu as sobrancelhas e tentou reconhecer as le­tras. C-H-A-R-D-O-N... Tinha letras demais para ler, então ele perdeu o interesse.

Ele pegou a jarra, agarrando-a virilmente e co­locando no chão. Fazendo um som de "hum", ele arrastou uma cadeira para pegar copos no armário. Um dia ele seria tão alto quanto Coop e não preci­saria ficar numa cadeira. Ele ficou nas pontas dos pés.

O estrondo e o grito fizeram Coop se levantar, batendo o joelho com força contra a escrivaninha. Os papéis se espalharam quando ele correu do escri­tório para a cozinha.

Keenan ainda uivava. A cadeira estava virada, o suco entornando alegremente no chão e a geladeira totalmente aberta. Coop passou pela poça e ergueu Keenan.

— Você está machucado? O que você fez? — Quando sua única resposta foi outro soluço, ele co­locou Keenan na mesa da cozinha e procurou por sangue. Ele imaginava ferimentos abertos, ossos quebrados.

— Eu caí. — Keenan se acomodou nos braços de Coop.

— Certo, está tudo bem. Você bateu a cabeça?

— Nã-ão. — Com uma fungada, Keenan aguar­dou beijos que ele esperava depois de um machuca­do. — Eu caí de bumbum. — Os lábios de Keenan tremeram. — Beija ele.

— Quer que eu beije seu... Vamos lá, garoto, você está brincando.

O lábio tremeu, outra lágrima caiu.

— Você tem que beijar onde dói. Tem que fazer ou não vai sarar.

— Ah, cara. — Desconcertado, Coop passou uma das mãos pelos cabelos. Ele se sentia desesperadamente aliviado porque nenhum sangue havia sido derramado, mas se qualquer um, qualquer um, des­cobrisse o que estava prestes a fazer, ele jamais con­seguiria que fosse esquecido. Ele girou Keenan e deu um beijo rápido no pequeno traseiro. — Isso resolve?

— U-hum. — Keenan fechou os olhos, então es­tendeu os braços. — Você vai me pegar?

— Sim. — Ele não se sentiu tão ridículo quanto esperava quando os braços do garoto lhe envolveram o pescoço.

— Está bem agora?

Com a cabeça descansando nos ombros de Coop, ele assentiu:

— Eu não quis fazer isso. Eu derrubei todo o suco.

— Não foi nada. — Mal se dando conta do que fez, Coop virou a cabeça para roçar os lábios sobre os cabelos de Keenan. Algo estava se movimentando dentro dele, chiando.

— Você não está bravo comigo? Não vai embora?

— Não. — O que diabos estava acontecendo? Coop perguntou enquanto as emoções inexploradas e inesperadas serpenteavam dentro dele. — Não, não vou a lugar algum.

— Eu te amo — Keenan disse, com o desembara­ço simples de uma criança.

Coop fechou os olhos e imaginou como um ho­mem crescido deveria lidar com o fato de estar en­cantado por um garoto de quatro anos de idade.

 

Bem, aqui estava ela, Zoe pensou quando ficou aos pés das escadas que levavam ao apartamento de Coop. Tudo de que ela precisava fazer era subir, abrir a porta e começar um caso. Sentiu um aperto no estômago.

Que bobeira ficar nervosa, ela disse a si, e subiu o primeiro degrau. Ela era uma mulher normal com necessidades normais. Caso as emoções dela fossem ficar perto demais de superfície, ela lidaria com tal fato. Era muito mais difícil se machucar quando não se tem expectativas.

Ela tivera expectativas certa vez, mas agora estava mais esperta.

Era simplesmente uma atração física entre duas pessoas solteiras e saudáveis. Ela quase retornou um passo antes de se obrigar a seguir em frente. Todos os detalhes práticos haviam sido vistos. O filho dela es­tava seguramente guardado na noite em que dormiria fora.

Ela havia cuidado do controle de natalidade, que não seria um descuido que cometeria novamente.

Nada de arrependimentos, ela prometeu a si quando ergueu uma das mãos para bater. Sabia o quão inúteis elas estavam.

Ele respondeu tão rapidamente, que ela quase deu um pulo. Então eles ficaram parados, olhando um para o outro.

Ela usava um daqueles vestidos leves e frescos de verão, projetados para fazer um homem agrade­cer pelo fim do inverno. Os cabelos estavam soltos, caindo sobre as tiras fininhas cor de framboesa e ombros nus cor de pêssego. Havia ousadia nos olhos dela.

— Olá. — Ele olhou para baixo, para o telefone sem fio que ela segurava. — Esperando uma ligação?

— O quê? Oh. — Ela riu desgraçadamente cons­trangida. — Não. Eu só não gosto de sair quando Keenan não está em casa.

— Ele está acomodado na casa do amigo?

— Sim. — Ela entrou, colocou o telefone sobre o balcão. — Ele estava tão excitado porque... — Ela interrompeu quando a sandália grudou no piso.

Coop fez uma careta.

— Acho que esqueci de algum ponto. Entorna­mos alguma coisa.

— Hã?

— O garoto levou um tombo, ceifou uns dez anos da minha vida. Não perdeu sangue, entretanto. Só meio galão de suco de laranja. — Quando ela ape­nas sorriu, ele foi até a geladeira. Por que diabos ele estava conversando bobagens?

— Quer um pouco de vinho?

— Seria bom. — Ora, ele está tão nervoso quanto eu, ela percebeu, e o amava por isso. — Keenan está tendo momentos ótimos ficando com você. Eu pre­ciso estudar as páginas de esportes agora só para ficar atualizada com o que ele está falando.

— Ele aprende rápido.

— Eu também. Vá em frente — ela disse quando ele lhe entregou uma taça de vinho. — Pergunte-me sobre estatísticas. Eu sei sobre corridas impul­sionadas e média de corridas limpas. — Ela deu um gole, então fez um gesto com o copo. — Acho que os Orioles teriam dominado o segundo jogo daquela rodada dupla na outra noite se tivessem colocado um fechador na segunda entrada.

Ele contorceu os lábios.

— Você acha?

— Bem, o iniciador da partida tinha perdido o controle da bola, obviamente. O sujeito que estava narrando...

— O homem lance-a-lance.

— Isso, ele mesmo confirmou isso.

— Então você assistiu ao jogo.

— Eu assisto a Vila Sésamo também. Eu gosto de ficar atualizada sobre os interesses de Keenan. — A voz dela morreu quando Coop esticou a mão para torcer um cacho do cabelo dela entre os dedos.

— Ele tem uma coisa com dinossauros também.

— Eu sei, eu peguei uma meia dúzia de livros na biblioteca. Nós... — Os dedos trilharam o ombro dela. — Fomos ao museu de história natural duas vezes.

Ela deixou a taça de lado e caiu nos braços dele.

Ele a beijou ainda que tivesse ficado sôfrego pelo sabor dela. O impacto foi rápido, profundo, deses­perado. Os pequenos murmúrios que vibravam da garganta dela faziam os músculos deles se transfor­marem em uma barreira elétrica.

— Eu não tinha certeza de que você viria.

— Nem eu. Eu...

— Não consigo pensar em nada além de você — ele disse quando a pegou no colo. — Eu pensei que iríamos mais devagar.

—  Não vamos — ela murmurou, pressionando os lábios contra o pescoço dele enquanto ele a carre­gava para o quarto.

Ela captou uma impressão breve da organização espartana e das linhas e cores simples e viris antes de eles se jogarem na cama.

Nenhum dos dois estava procurando por paciên­cia. Eles rolaram juntos, um entrelaçado de mem­bros sôfregos, tateando, esplendorosos. A completude natural do ato, carne com carne, boca com boca, fazia a cabeça de Zoe vacilar. Ah, ela queria ser tocada assim, se sentir mulher tão desesperadamente, com a mão masculina sobre ela, com os lábios dele sabo­reando cada batida da pulsação dela.

Então ela se deixou perder. Nada mais de nervo­sismo, nada mais de medo. E se ela amava, aquilo ape­nas tornava a alegria de se envolver mais fascinante.

Ela era a fantasia de todo homem. Surpreendente­mente suscetível, ansiosamente agressiva. E tão linda, ele pensou. Nu, o corpo era tão esbelto, tão perfei­to, ele não conseguia acreditar que já havia carregado uma criança. Sob a luz dourada do crepúsculo, o ros­to dela era elegante, de fazer parar o coração. Sempre que ele a tocava, onde quer que fosse, conseguia ver o eco nítido do prazer refletido nos olhos dela.

Ele observou aqueles olhos vitrificarem, sentiu a tensão do corpo, ouviu o choro sufocado de reali­zação dela. Submerso pelo poder daquilo, ele a er­gueu novamente, até ambos ficarem ofegantes, até ela erguer o quadril da cama e se enlaçar em volta dele.

Pele úmida deslizava sobre pele úmida, boca fa­minta buscava boca faminta. Eles rolaram pela cama novamente, gemendo, tremendo. Então as mãos dele agarraram as dela, e os lábios dele subjugaram os dela. A ele investiu dentro dela, forte e profundamente.

Ela recebeu a sensação como se fosse uma lança em seu corpo, dolorosa, fantástica. Por um instante, nenhum deles se moveu, eles apenas permaneceram tensos e trêmulos ao limite.

Então foi tudo movimento, tudo velocidade, uma corrida selvagem que terminou com ambos mergu­lhando delirantemente na linha de chegada.

 

Não foi exatamente do jeito que ele havia imagina­do, Coop pensou. Eles estavam estatelados na cama. Zoe curvada contra o corpo dele. A luz estava quase extinta e o quarto repleto de sombras.

Ele tinha imaginado que eles iriam progredir até a cama em estágios. Ambos eram adultos e sabiam que aquele era o objetivo, mas ele havia pensado que eles se movimentariam lentamente.

Então ela estava parada ali, sorrindo, o vigor bri­lhando nos olhos dela... Ele nunca havia desejado algo ou alguém mais na vida. Ainda assim, pensou que ela merecia mais do que uma luta rápida, recompensadora, no entanto. Mas a noite era uma criança.

Ele flexionou o braço para aproximar a cabeça de Zoe um pouco mais, e roçou os lábios na têmpora dela.

— Tudo bem?

— Hum... No mínimo isso. — O corpo dela pa­recia dourado. Ela estava surpresa porque sua pele não brilhava no escuro.

— Eu apressei um pouco.

— Não, velocidade perfeita.

Ele começou a trilhar um dedo no braço dela, para cima e para baixo. Ele a queria novamente. Deus, o organismo dele já estava latejando à vida. Um pouco de controle, Coop, ele ordenou a si.

— Você vai ficar?

Ela abriu os olhos, olhando nos dele.

— Sim.

— Vou pegar o vinho.

— Isso é bom. — Ela suspirou quando ele dei­xou a cama. Tinha se esquecido de como lidar com o depois, ela percebeu. Ou com o antes e o duran­te, no que dizia respeito ao assunto, ela pensou com um sorriso torto. Embora achasse que tinha se saído muito bem até então.

Zoe não tomara conhecimento do quanto havia estado contido dentro dela. Ou do quanto precisara se sentir mulher outra vez. Mas até então, ela não soubera se conseguiria amar novamente.

Ela se remexeu, deslizando sob os lençóis desor­denados, erguendo-os automaticamente até os seios quando Coop retornou com o vinho e as taças.

A visão dela na cama dele latejou em sua região íntima, com um rápido desvio no coração. Ele não disse palavra, servindo o vinho, oferecendo a ela uma taça límpida e se acomodando ao seu lado.

— Por que você não tem estado com ninguém? — No momento em que a pergunta saiu, ele dese­jou uma faca afiada para cortar a língua. — Desculpe, não é da minha conta.

— Está tudo bem. — Porque eu não me apaixonei por ninguém antes de você, ela pensou. Mas aquilo não era o que ele queria ouvir, ela sabia. Nem era realmente o que ele havia perguntado.

— Você quer saber sobre o pai de Keenan.

— Não é da minha conta — ele repetiu. — Sinto muito, é o repórter em mim.

— Foi há muito tempo, o equivalente a uma vida inteira. Eu não me importo de contar a você. Eu cres­ci em Nova York. Acho que mencionei que minha mãe era atriz. Eu fui fruto de um segundo casamento. Ela tinha se casado cinco vezes, até então.

— Cinco?

Zoe riu de encontro à taça de vinho, e deu um gole.

— Clarice se apaixona e troca de marido do mes­mo jeito que algumas mulheres mudam o cabelo. Meu pai durou aproximadamente quatro anos antes de eles se separarem amigavelmente. Clarice sempre tem divórcios amigáveis. Eu não tive muito contato com ele porque se mudou para Hollywood. Ele fa­zia comerciais e narrações, na maioria das vezes. De qualquer modo, eu acho que ela estava no marido número quatro quando eu me encontrava no cole­gial. Ele tinha alguma influência sobre a Towers Modeling Agency. Eles são bem grandes.

— Eu ouvi falar deles.

— Bem, ele me colocou dentro. Eu comecei a fa­zer algumas fotos. E fiquei popular.

— É isso — Coop disse, interrompendo-a. — Eu sabia que tinha visto seu rosto antes.

Ela remexeu os ombros.

— Cinco, seis anos atrás, foi difícil evitar. Eu fiz vinte capas em um mês, no ano seguinte à formatura na escola.

— Capa da In Sports, edição de biquíni. Ela sorriu.

— Você tem boa memória. Aquilo foi há seis anos.

Ele se lembrou das pernas longas sujas de areia, do suculento biquíni vermelho molhado, um arre­medo de roupa de banho, da risada, do rosto sedutor. Ele deu um trago no vinho.

— Era uma foto magnífica.

— E uma foto longa e exaustiva. De qualquer modo, eu estava ganhando muito dinheiro, conce­dendo muitas entrevistas, indo a muitas festas. Eu conheci Roberto em uma delas.

— Roberto. — Coop sorriu diante do som do nome.

— Lorenzi. Jogador de tênis. Você deve ter ouvi­do falar dele.

— Lorenzi? Claro... Ganhou o Aberto da França três anos antes em sets diretos, então caiu nas semi­finais de Wimblendon. Ele tem atitudes ruins e gosta de correr de carro e de caçar mulheres nas horas va­gas. Não tem chegado ao ranking dos 25 melhores nos últimos dois anos. Apareceu de um jeito negati­vo nos jornais nesta primavera quando bebeu vinho demais e socou um fotógrafo. — Coop começou a beber, e parou. — Lorenzi? Ele é o pai do Keenan? Mas ele é...

— Um mulherengo? — Zoe completou. — Um egoísta baixo, rico e mimado? Eu sei... agora. O que eu via naquela época era um homem maravilhoso e charmoso que me enviou flores e me levou de jato para Monte Carlo para jantares íntimos. Eu fiquei deslumbrada. Ele disse que me amava, que me ado­rava, me venerava, que não podia viver sem mim. Eu acreditei nele e nos tornamos amantes. Pensei que, já que ele era meu primeiro homem, que seria o único. De qualquer jeito, eu não percebi que ele já estava ficando cansado de mim quando descobri a gravidez. Quando contei a ele, ficou bravo, então muito cal­mo, muito racional. Ele presumiu que eu quereria um aborto e concordou em pagar todas as despesas, até mesmo providenciar tudo.

— Um verdadeiro príncipe.

— Era uma presunção lógica — Zoe disse calma­mente. — Eu tinha uma carreira em rápida evolução em um campo que não iria esperar enquanto eu ganhasse peso e sofresse de enjôos matinais. Ele, é claro, não tinha a intenção de se casar comigo, e na minha cabeça, com clareza suficiente, eu conhecia as regras do jogo. Eu as conhecia de fato — ela disse calmamente. — Mas algo havia mudado quando o médico confirmou a gravidez. Depois da descrença, do pânico, até mesmo da raiva, eu me senti bem. Eu queria o bebê, então desisti do meu emprego, mu­dei de Nova York e li tudo no qual conseguia pôr as mãos sobre maternidade.

— Simplesmente assim?

— Bem, houve algumas cenas, alguns prognósticos terríveis e muito ódio, mas é assim que funcionava. Roberto e eu rompemos abaixo do ami­gavelmente, mas com a concordância de que ele iria ficar fora da minha vida e eu ficaria fora da dele.

— O que você disse ao Keenan?

— É complicado. — E ela nunca deixou de sentir culpa. — Até agora eu tenho dito a ele que o pai teve de ir embora, que não ia voltar. Ele está feliz, então não faz muitas perguntes.

— Você está? Feliz?

— Sim. — Ela sorriu e tocou o rosto dele. — Es­tou. Durante toda minha vida eu quis um lar, uma família, algo sólido e estabelecido. Eu nem mesmo sabia disso até ter Keenan. Ele mudou minha vida.

— Nenhum desejo de voltar e sorrir para a câmera?

— Ah, não. Nem mesmo uma pontinha.

Ele colocou uma das mãos atrás do pescoço dela, analisando-a.

— É um rosto tão lindo — ele murmurou. Agora ele gostava da idéia de tê-lo todo para si.

 

O conceito de escala de carona obviamente havia sido maquinado por alguém com um senso de hu­mor deturpado e cruel. Tendo morado a maior par­te da vida em cidades onde o transporte público ou uma caminhada rápida levariam um homem de casa para o trabalho, Coop nunca experimentara sua ver­são adulta.

Mas ele ouvira rumores.

Discussões, rixas insignificantes, superlotação, café espirrado.

Depois de uma semana como o motorista nomea­do, Coop não tinha dúvidas de que a versão infantil era pior. Infinitamente pior.

— Ele está me beliscando de novo, sr. McKinnon. Brad está me beliscando.

— Pare com isso, Brad.

— Carly está olhando para mim. Eu disse a ela para parar de olhar para mim.

— Carly, não olhe para o Brad.

— Eu vou vomitar, sr. McKinnon. Vou vomitar agora.

— Não, não vai.

Entretanto Matthew Finney fez sons de ânsia de vômito que fizeram as outras crianças gritar. Coop rangeu os dentes e continuou dirigindo. Matt ameaçava vomitar duas vezes por dia a menos que seguisse no banco da frente. Depois de cinco dias desgraçados, Coop descobriu as intenções dele. Mas aquilo contribuiu muito pouco para amaciar seus nervos.

Keenan, que havia esperado a semana inteira por sua vez de ir na frente, girou no banco para fazer ca­retas para Matt. Isto incitou uma pequena algazarra de cotoveladas, berros, gritos e empurrões.

— Keenan, vire-se! — Coop rebateu. — Vocês endireitem-se aí atrás. Parem com isso! Se eu tiver de parar este carro... — Ele parou, e se arrepiou. Ele havia soado como a própria mãe. Agora Coop tinha receios de que ele iria vomitar. — Certo, primeira pa­rada. Matt, desapareça.

Quinze minutos depois, com o banco de trás agradecidamente vazio, Coop entrou na garagem e des­cansou a cabeça palpitante sobre o volante.

— Preciso de uma bebida.

— Temos limonada — Keenan disse a ele.

— Ótimo. — Ele se esticou para desatar o cinto de segurança de Keenan. Tudo de que precisávamos era meio litro de vodca para misturar junto.

— Podemos nadar de novo em breve?

A idéia de levar uma manada de crianças gritalhonas de volta à piscina comunitária em qualquer época até o próximo século estava descartada por Coop.

— Peça à sua mãe.

Coop começou a olhar para o banco de trás e per­cebeu que não podia encarar aquilo. Ele havia come­tido aquele erro mais cedo na semana e descobriu chumaços de chiclete no tapete, migalhas de biscoi­to em todo lugar e uma substância verde misteriosa manchada no estofado.

Em seu estado de enfraquecimento, até mesmo um papel de bala era passível de abalar o equilíbrio.

— U-hu! — A sra. Finkleman tirou as luvas de jardim e seguiu pelo gramado usando um vestido florido e sandálias em azul vivo. — Como foi na pis­cina, rapazinho?

— Tivemos corridas, e Brad molhou Carly e fez ela chorar até mesmo na hora que Coop disse a ele para não fazer aquilo, e eu consigo segurar minha respiração debaixo da água por 12 segundos.

— Meu Deus. — Ela riu e acariciou os cabelos de Keenan. — Você vai estar nas próximas Olimpía­das. — Os olhos astutos dela seguiram para o rosto fatigado de Coop. — Você parece um pouco exaus­to, Coop. Keenan, por que não corre e diz para o sr. Finkleman que você quer um pedaço daquele bolo de cereja que ele assou hoje?

— Certo! — Ele deu um puxão na mão de Coop. — Você quer um pouco? Quer vir?

— Vou dispensar essa. Vá em frente.

A sra. Finkleman riu quando Keenan disparou e escalou os degraus.

— Anjinho. Vamos mantê-lo entretido por algu­mas horas... ou ele vai nos manter entretidos. Você parece precisar de alguns minutos em um quarto tranqüilo.

— Em um quarto acolchoado — Coop resmun­gou. — Como alguém consegue sobreviver a crianças?

— É mais fácil se você encarar as fases com elas. Uma vez que tenha andando de um lado a outro a noite toda com um bebê com cólica, nada mais o in­timida. — Ela suspirou. — Exceto projetos de ciên­cia. Projetos de ciência sempre me levaram ao limite. E aquela primeira lição de direção. — Ela balançou a cabeça diante da lembrança. — Aquilo pode fazê-lo desabar. — Ela sorriu e deu um tapinha no braço dele. — Mas ainda faltam anos para se preocupar com isso. E você tem feito um bom trabalho. Ora, Harry e eu estávamos dizendo agora mesmo sobre o quão bom é para Zoe e Keenan ter um homem na vida deles. Não que Zoe não esteja dando conta de tudo. Criar aquele garoto doce completamente sozinha, trabalhando em dois empregos e cuidando da casa. Mas me faz bem ver você e aquele anjinho jogando bola no jardim ou o modo como Zoe se ilumina quando você está por perto. Vocês formam uma família adorável. Agora vá e tire uma boa sone­ca. Vamos manter um olho no seu garoto.

— Eu não sou... Ele não é... — Mas enquanto Coop gaguejava, ela estava indo embora.

Família?, ele pensou enquanto uma bola de gelo se formava em seu estômago. Eles não eram uma fa­mília. Ah, não, ele prometeu a si enquanto andava em volta da casa até sua escadaria. Ele não tinha as­sumido aquilo.

Ele gostava do menino, claro. Por que não iria gostar? E estava quase louco pela mãe dele. Mas aquilo não os tornava uma família. Aquilo não torna­va as coisas permanentes. Talvez ele tenha se volun­tariado a passar um tempo com a criança, ensinado algumas coisas sobre arremessar bolas, mas aquilo não o transformava no Papai.

Coop seguiu diretamente para a geladeira, abriu uma cerveja e bebeu um longo gole.

Claro, talvez ele gostasse de ter o menino por per­to, e Deus sabe que ele gostava de estar com Zoe. Até mesmo ficara meio que lisonjeado quando uma mulher na piscina se equivocou sobre Keenan e co­mentou que ele tinha um filho muito bonito. Mas aquilo não significava que ele começaria a pensar em seguros de saúde familiares ou fundos para pagar a faculdade.

Ele era solteiro. Gostava de ser solteiro. Aquilo significava ir e vir quando ele desejasse, planejar jo­gos de pôquer madrugada afora, passar o dia todo com o canal de esportes em volume alto.

Gostava de trabalhar no próprio espaço, é por isso que ele escrevia a maioria das coisas em casa, mais do que na redação do jornal. Ele não queria pessoas bagunçando suas coisas ou estruturando seu tempo ou planejando excursões.

A vida familiar, de acordo com o que ele se lem­brava da infância, era chata com excursões.

De modo algum ele iria mudar sua vida boa e confortável para acomodar uma família.

Então ele havia cometido um erro, concluiu, e se esticou no sofá com sua cerveja. Ele dera a Zoe e à criança um pouco mais do seu tempo, um pou­co mais de sua atenção. Não tinha sido nada que ele não quisera dar, mas conseguia ver agora que o gesto poderia ser mal interpretado. Particularmente desde que Zoe havia trazido à tona a palavrinha com A. Apenas uma vez, ele lembrou a si, e ele gostaria de pensar que tinha sido uma coisa de mulher.

Ainda assim, se ele não se afastasse, ela poderia começar a depender dele. Coop se mexeu desconfortavelmente quando a idéia de que ele inclusive poderia vir a depender deles passou pela sua cabeça.

Era hora de se reestabelecer como o inquilino do andar de cima.

 

Keenan correu para fora da casa ao lado no minuto em que sua mãe saiu do carro na garagem.

— Oi, mamãe, oi! Segurei a respiração por 12 se­gundos debaixo d'água!

Zoe o pegou no ar e o balançou duas vezes.

— Você deve estar escondendo guelras aí — ela disse, lhe fazendo cócegas nas costelas. — Olá, sra. Finkleman.

— Olá. Tivemos uma hora ótima. Eu mandei Coop subir para uma soneca quando eles chegaram em casa. Parece que ele teve um dia difícil.

— Obrigada. — Ela beijou os lábios de Keenan que estavam à espera, então sentiu o sabor nos pró­prios lábios. — Hum... cerejas.

— O sr. Finkleman assou elas e estavam boas.

— Aposto que sim. Você agradeceu?

— U-hum. Matt quase vometou no carro de Coop.

— Vomitou — Zoe corrigiu enquanto carregava Keenan para dentro.

— U-hum. Porque era minha vez de ir na frente. Eu me diverti muito e Coop me ajudou a nadar sem minhas boias. Ele disse que eu era um campeão.

— É exatamente o que você é. — Ela desmo­ronou com ele em uma cadeira. A idéia de fazer o jantar, trocar o uniforme e servir drinques durante seis horas a assolou de modo pesado. — Dê-me um abraço — ela exigiu, então se reconfortou com al­gum carinho. — Definitivamente, um campeão dos abraços. Por que não vem à cozinha e me conta o que mais você fez hoje enquanto eu faço o jantar?

Meia hora depois, enquanto Zoe estava escor­rendo o macarrão e Keenan estava se distraindo com papel e giz de cera no chão da cozinha, ela ouviu o som dos passos de Coop nas escadas. O coração dela acelerou. A reação normal, saudável a fez sorrir. Ima­gine, ela pensou, acreditar em si como alguém imu­ne a homens.

Ela deixou a massa escorrendo na pia e foi até a porta de trás assim que ele chegou nos degraus de entrada.

— Olá.

— Como está? — Coop tilintou as chaves no bol­so. Ela parecia iluminada?, ele se perguntava. Ela es­tava sorrindo, e apesar das sombras de fadiga sob eles, os olhos tinham a luz mais linda.

— Eu já ia chamá-lo lá em cima. Pensei que você gostaria de jantar depois de um dia difícil na piscina. — Ela abriu a porta de tela e se inclinou para beijá-lo. O sorriso se apagou um pouco quando ele recuou lentamente. — É só frango e macarrão.

O cheiro era quase tão bom quanto o dela. Ele deu uma olhada de soslaio para dentro, a cena aco­lhedora, balcões em desordem, flores frescas, vapor surgindo de uma panela no fogão, a criança rela­xada no chão, a linda mulher oferecendo comida e beijos.

Uma armadilha definitiva.

— Obrigado, mas estou de saída.

— Ah. Pensei que você tivesse algumas horas an­tes do horário do jogo. — Ela riu diante das sobran­celhas arqueadas dele. — Acho que tenho prestado mais atenção à cena esportiva. Baltimore contra To­ronto, primeiro jogo de três.

— Sim. — Quando ela começa a se interessar pe­los seus interesses, realmente está fechando a porta da jaula. — Tenho algumas coisas a fazer.

— Posso ir com você? — Keenan correu até a porta para puxar as calças de Coop. — Posso ir para o jogo? Acho melhor assistir com você.

Coop quase podia ouvir as trancas fechando o local.

— Tenho muita coisa para fazer — ele disse, com uma aspereza na voz que fez os lábios de Keenan tre­merem. — Olhe, não é só um jogo, é o meu trabalho.

— Você disse que eu dava boa sorte.

— Keenan. — Zoe pôs a mão no ombro do filho para afastá-lo, mas os olhos dela permaneceram em Coop. — Você se esqueceu de que Beth está vindo para ficar com você esta noite? Ela vai chegar logo e você vai assistir à fita do seu filme favorito.

— Mas eu quero...

— Agora vá lavar suas mãos para o jantar.

— Mas...

— Vá agora.

O modo como o rosto de Keenan enrugou teria amansado o coração de um ogro. Arrastando os pés, ele seguiu para fora da cozinha.

— Eu não posso levá-lo comigo para todos os lu­gares... — Coop começou defensivamente.

— É claro que não. Ele só está exaurido. Eu não poderia deixá-lo ir, de qualquer forma. — Ela hesi­tou, desejando que conseguisse ignorar seus instin­tos. — Está tudo bem?

— Está tudo ótimo. — Ele não sabia por que fa­lou aquilo gritando. Não sabia por que sentia como se houvesse algo pegajoso preso sob seus sapatos. — Eu tenho uma vida, sabe. Eu não preciso de crianças se pendurando em mim ou de você cozinhando o jantar. E eu não preciso me explicar.

Os olhos dela ficaram muito frios, o rosto muito sereno.

— Você certamente não precisa. Agradeço sua ajuda nas últimas semanas. Avise-me se eu puder re­tribuir o favor.

— Olhe, Zoe...

— Preciso colocar o jantar na mesa ou me atrasa­rei para o trabalho. — Ela deixou a porta de tela bater entre eles. — Aproveite o jogo.

Ela soube exatamente por quanto tempo ele per­maneceu ali enquanto ela trabalhava no fogão. Soube exatamente quando ele se virou e foi embora.

Não era inesperado, ela lembrou a si. Este recuo era típico, até mesmo compreensível. Talvez Coop tivesse levado algumas semanas para compreender completamente que ela não vinha sozinha. Era parte de um par, uma família pronta, com sua parcela de responsabilidades, problemas e rotinas.

E ele estava optando por não participar.

Coop poderia nem saber disso ainda, ela pensou, mas ele estava nos primeiros estágios de retirada.

Os olhos dela turvaram, o peito pesou. Resoluta­mente, ela engoliu as lágrimas. Iria ceder à vontade de dar uma boa e longa chorada mais tarde, ela prome­teu. Mas agora tinha um garotinho para cuidar.

Quando ele retornou, ela agachou até eles fica­rem olho no olho.

— Você se divertiu com Coop hoje, não se di­vertiu?

Keenan fungou e assentiu.

— E ele tem levado você para muitos lugares. Vo­cês têm se divertido e feito um monte de coisas novas.

— Eu sei.

— Você devia ser grato a isso, bebê. Em vez de fazer beicinho porque não pode ter mais.

Ela se endireitou novamente e esperou que pu­desse acatar o próprio conselho.

 

— Você está passando muito tempo por aqui. — Ben firmou o quadril na quina da mesa de Coop. Os telefones tocavam e os teclados tiniam em todos os lugares em torno da baia de Coop.

— E daí? — Sem tirar os olhos da tela do compu­tador, Coop martelou o rascunho de sua coluna se­manal.

— Eu acabei de perceber que você escrevia na­quele seu apartamento. Quero dizer, ótima localiza­ção. — Ele pensou em Zoe. — Ótima vista. Você não passava tanto tempo aqui quando morava no centro.

— Eu precisava de uma mudança de cenário.

— Sim. — Ben resmungou e pegou uma bola de beisebol da mesa de Coop. — Problemas no paraíso?

— Eu não sei do que você está falando. E eu te­nho uma coluna para escrever.

— Está bem óbvio nas últimas semanas que você tem estado vidrado na senhoria. — Ele atirou a bola de uma das mãos à outra. — Quero dizer, quando um homem arrasta uma criança por aí, compra casaquinhos de beisebol, deduz-se que ele está jogando a linha para fisgar a mãe.

Os olhos de Coop incendiaram.

— Eu gosto da criança, está bem? Eu não preciso usar um menino de quatro anos para conseguir uma mulher. O garoto é legal.

— Ei, não tenho nada contra os pirralhos. Posso até ter os meus um dia. O negócio é, quando uma mulher tem um, o homem tem de bancar o papai se quiser ficar em vantagem.

— Quem disse que preciso bancar qualquer coisa para conseguir uma mulher?

— Eu não. Mas foi você que não pôde ir ao jogo de basquete na semana passada porque estava levan­do a família ao aquário. — Ben piscou, deixou a bola de lado. — Ainda assim, aposto que teve um placar melhor que o meu. — Ben recuou quando Coop fez menção de decapitá-lo.

— Não é bem assim — Coop disse entre os dentes.

— Ei, ei. Só estou arrancando suas algemas. Eu não teria feito nenhuma piada se soubesse que seu negócio com ela era sério.

Coop ficou perdido.

— Eu não disse que era sério. Eu disse que não era bem assim.

— Seja lá o que você disser.

Enfastiado consigo, Coop recostou na cadeira. Ele e Ben haviam perturbado um ao outro sobre mu­lheres por uns bons cinco anos. Não havia motivo para exagerar na reação, ele pensou. Ou para se fazer de bobo.

— Desculpe. Estou com a cabeça cheia.

— Esqueça. Você precisa de uma distração. Vai ao jogo de pôquer esta noite?

— Sim.

— Ótimo. Perder dinheiro deveria colocar você de volta nos trilhos.

Algo precisava colocar, Coop pensou quando se sentiu sozinho no cubículo para olhar a tela do compu­tador. Nos últimos três dias ele dormira pouco, come­ra menos ainda e entrara em um estado constante de vicissitude.

Porque ele estava evitando o assunto, ele con­cluiu. Optando por postergar quando deveria se ex­por sem reservas. A única solução para colocar sua vida em ordem de novo era encarar o problema de cabeça erguida.

Ele deu uma banana para sua estação de trabalho.

 

A melhor coisa de uma tarde fora, Zoe pensou, era a solidão. Nada de clientes com quem conversar, nada de pedidos para preencher. Significava que ela não precisava ser balconista, ou garçonete, ou mãe, ou qualquer coisa, exceto Zoe.

Sentada na varanda da parte de trás, ela lutava para entender as instruções de montagem da nova chur­rasqueira que havia comprado. Ela ia fazer uma sur­presa para Keenan com hambúrgueres.

Ela apreciava a quietude, o tipo de quietude dela, o que significava que havia música palpitando do rá­dio da cozinha. Gostava da solidão, o tipo de solidão dela, o que significava que Keenan iria arremeter em direção a ela com braços abertos e tagarelando.

Sabia que o apartamento do andar de cima estava vazio, e tentava não pensar nisso. Tentava não pensar no fato de que Coop tinha ficado fora mais do que em casa nos últimos dias.

Bobagem da parte dela ter pensado que ele era di­ferente. Ele a desejara, a tivera e agora perdera o in­teresse. Bem, ela o desejara, então eles estavam qui­tes ali. Se o coração dela estava sofrendo, iria passar. Já havia passado antes. Ela e Keenan podiam seguir bem sozinhos. Como sempre.

A chave de fenda dela escapou, arranhou os nós dos dedos dela e a fez xingar.

— Que diabos você está fazendo?

Com os olhos em chamas, ela olhou para Coop.

— Assando um bolo. O que parece que estou fazendo?

— Você não pode juntar alguma coisa se vai es­palhar todas as partes pela droga de lugar. — Au­tomaticamente, ele se abaixou para organizar. Ela afastou a mão dele com o cabo de borracha da chave de fenda.

— Eu não preciso de você para organizar as coisas para mim. Eu não sou uma pobre mulher indefesa que precisa de um homem para fazer o trabalho pen­dente. Estava indo bem antes de você chegar.

Ofendido, ele socou as mãos nos bolsos.

— Ótimo. Faça sozinha.

— Eu estou fazendo sozinha. Gosto de fazer so­zinha.

— Maravilha. E quando a coisa desmoronar, você não vai ter mais ninguém para culpar.

— Isso mesmo. — Ela soprou os cabelos para longe dos olhos. — Eu aceito quando alguma coisa é culpa minha. — Ela pegou uma porca e colocou um parafuso no lugar. — Você planeja me rondar a tarde toda?

— Eu quero falar com você.

— Então fale.

Ele tinha tudo bem planejado. Ele era um escri­tor, afinal.

— Eu percebo o modo como tenho passado o tempo com você e o garoto...

— O nome dele é Keenan — Zoe disse entre os dentes.

— Eu sei qual é o nome dele. O modo como eu tenho passado o tempo nas últimas semanas pode dar a impressão errada.

— Ah, mesmo? — Ela olhou para cima novamen­te, batendo a chave de boca contra a palma.

— Ele é uma criança ótima, do tipo que impres­siona mais e mais. Eu tenho me divertido passando tempo com ele.

Embora ela se odiasse por isso, Zoe amaciou. Ela entendia que ele gostava genuinamente de Keenan. Aquilo só tornava tudo mais difícil.

— Ele gosta de passar o tempo com você. Tem sido bom para ele.

— Bem, sim, de certo modo. Por outro lado, eu comecei a pensar que ele, que você, que ambos po­deriam ter a idéia errada. Quero dizer, arremessar uma bola ou levá-lo para um jogo, isso é legal. Eu só não quero que ele pense que é... permanente.

— Entendo. — Ela estava calma agora, fria até. Ia ajudar a manter a dor controlada. — Você teme que ele comece a vê-lo como uma figura paterna.

— Bem, sim. Algo assim.

— Isso é natural o suficiente. Mas e daí, ele passa muito tempo com o sr. Finkleman também, e com Billy Bowers do fim da rua.

— Finkleman é velho o suficiente para ser o avô dele, e o filho dos Bowers tem 18 anos. — Coop re­cuou, percebendo que havia um toque de ciúme em sua defesa. — E eles não têm o mesmo tipo de coisa rolando com você.

Ela arqueou as sobrancelhas.

— Coisa?

— Relacionamento — ele disse firmemente. — Seja lá como você queria chamar isso. Droga, nós só dormimos juntos uma vez.

— Estou ciente disso. — Cuidadosamente, ela colocou a chave de boca de lado. Atirá-la na cabeça dele só iria lhe dar prazer momentâneo.

— Aquilo soou errado — ele disse, furioso con­sigo. — Parece que não significou nada. Significou, Zoe. — Grande coisa que ele estava com medo. Grande coisa. — É só que...

— Agora você está apavorado porque Keenan e eu vamos laçá-lo para uma família. Que você vai acor­dar uma manhã e ser o papai, com uma esposa, uma hipoteca e um garotinho que precisa de atenção.

— Sim. Não. Algo assim. — Coop estava se es­condendo, ele percebeu, e de repente não sabia o porquê. — Eu só quero deixar claro.

— Oh, acho que você deixa. Perfeitamente. — Ela esfregava as mãos nos joelhos enquanto o ana­lisava. — Você não precisa se preocupar, Coop. Eu coloquei um anúncio procurando um inquilino, não um pai para o meu filho ou um marido para mim. Eu dormi com você porque queria, não porque pensei que poderia atraí-lo para o altar.

— Eu não quis dizer isso. — Frustrado, ele pas­sou uma das mãos pelos cabelos. Por mais que te­nha planejado bem esta ceninha, tudo estava dando errado. — Eu desejava você. Ainda desejo. Mas eu não sei a gravidade da situação quando você foi aban­donada antes. Eu não quero machucá-la, Zoe. Ou o menino. Eu só não quero você pensando que estou caindo no buraco.

A raiva voltou, uma onda veloz avermelhou a vi­são dela. Ela estava de pé antes de qualquer um deles perceber que ela havia se movido,

— Keenan e eu não temos um buraco. Somos uma família, tão real e completa e tão íntegra quan­to uma família poderia ser. — Ela bateu a chave no peito dele. — Só porque o papai não completa o trio não quer dizer que somos menos do que um grupo.

— Eu não quis dizer...

— Vou lhe contar o que quer dizer. Você vê uma mulher e um garotinho e acha que eles simplesmen­te estão se consumindo de desgosto esperando que algum homem forte e grande venha para preenchê-los. Bem, isso é conversa. Se eu precisasse de um homem, eu teria um. E se eu pensasse que Keenan precisava de um pai para fazê-lo feliz, eu encontraria um para ele. E — ela continuou, avançando e dando outra pancadinha nele — se você acha que está no topo de alguma lista fictícia, está errado. Talvez eu esteja apaixonada por você, mas isso não é o suficien­te. Não sou só eu, não é só você. Keenan vem em primeiro lugar. Quando e se eu quiser um pai para Keenan, ele será alguém com compaixão e paciência, alguém disposto a ajustar sua vida para dar espaço ao meu filho. Então relaxe, Cooper. Você está livre de culpa.

— Eu não vim aqui para brigar com você.

— Ótimo, porque eu terminei.

Ele agarrou o braço dela antes Zoe pudesse se virar.

— Eu não. Estou tentando ser direto com você, Zoe. Eu me importo com você, certo? Com os dois. Eu só não quero que isso saia do controle, fique fora de mão.

— Das mãos de quem? — ela replicou de forma mordaz. — Suas? Então isso não é um problema, é? Porque você sabe como segurar tudo, bem aper­tado. Apenas continue se segurando, Coop. Não se preocupe comigo ou com Keenan. Ficaremos bem. — Ela soltou o braços e se sentou outra vez. Pegou o manual de instruções e dedicou atenção completa a ele.

Agora por que, ele se perguntava, ele se sentia como se tivesse acabado de ser rejeitado? Meneando a cabeça, Coop deu um passo em retirada.

— Contanto que sejamos claros.

— Estamos sendo.

—Eu tenho, ah, um tempinho, se quiser que eu ajude a montar essa churrasqueira.

— Não, obrigada. Eu posso fazer isso. — Ela deu uma olhadela para ele. — Vou grelhar hambúrgueres mais tarde. Você é bem-vindo para se juntar a nós. A menos que esteja com medo de isso levar a um compromisso.

Ela arremessa, ele pensou estranhamente, ela marca.

— Obrigado, de qualquer forma. Tenho planos. Talvez eu possa remarcar com você.

— Ótimo. Você sabe onde nos encontrar.

 

Coop ficou bêbado. Não romanticamente, mas com­pletamente. Quando saiu do táxi e cambaleou em di­reção à casa, ele já sabia que se odiaria na manhã se­guinte. Mas era com esta noite que precisava lidar.

Ele se apoiou pesadamente contra a porta da fren­te da casa de Zoe e esperou a varanda parar sob os pés dele. Ela podia achar que eles haviam terminado a conversa, ele disse a si de forma lacrimejante, mas estava errada. Totalmente errada.

Havia pensado em uma dúzia de coisas que tinha de dizer a ela.

Não havia tempo como o presente.

Erguendo um punho, ele bateu à porta.

— Vamos, Zoe. — Ele bateu outra vez. — Eu sei que você está aí. — Ele viu uma luz se acender lá dentro e continuou batendo. — Vamos, vamos. Abra.

— Coop? — Do outro lado da porta, Zoe colocou o cinto do penhoar rapidamente. Ela havia chegado do bar há uns parcos vinte minutos, e estava na cama há menos de cinco. — Já passa das duas da manhã. O que você quer?

— Eu quero conversar com você. Deixe-me entrar.

— Vamos conversar de manhã.

— Você acabou de dizer que já era de manhã. Quando ele bateu outra vez, ela abriu as trancas.

— Pare com isso... Você vai acordar Keenan. — Furiosa, ela abriu a porta num arranco e foi surpreen­dida por um homem de 77kg tombando contra ela. — Você está machucado? O que aconteceu? — Os sinais de alarme que haviam berrado mudaram quando ela captou o cheiro de cerveja. — Você está bêbado.

— Principalmente. — Ele começou a se endirei­tar, então se perdeu no perfume dela. — Deus, você está ótima. Com o que você se lavou? — Ele acari­ciou os cabelos dela. — Tem cheiro de raios de lua.

— Realmente bêbado — ela disse com um suspi­ro. — Sente-se. Vou pegar um café para você.

— Não quero café. Não me deixará sóbrio, só me acordará. E estou acordado, e tenho algo para dizer a você. — Ele se afastou, e descobriu que não estava tão firme quanto esperava. — Mas vou sentar. — Ele o fez, pesadamente. — Odeio ficar bêbado. Não faço isso desde que jogava em ligas menores. Contei que joguei beisebol em uma liga amadora? Triple A.

— Não. — Perplexa, ela se manteve firme e o observou.

— No fim do colegial. Dois anos. Pensei que me faria notar. Para os maiores. Mas não consegui, então fui para a faculdade e agora eu escrevo sobre as pes­soas que conseguiram.

— Sinto muito.

— Não. — Ele fez sinal de adeus. — Eu gos­to de escrever. Sempre gostei. Gosto de assistir aos jogos e ver todos os pequenos dramas. Se eu tives­se jogado, estaria quase acabado agora. Estou com quase 33 anos. Velho demais para o jogo. — Ele se concentrou nela e sorriu. — Você é a mulher mais linda que já vi na vida. Sabe, o menino se parece exatamente com você. Olho para ele, vejo você. É assustador. Eu vejo você o tempo todo. Estou cui­dando das minhas coisas e bum! Lá está seu rosto na minha cabeça. O que acha disso?

— Eu não sei. — Ela queria estar brava com ele, ela realmente estava. Mas ele estava tão estupidamente bêbado. — Por que eu não levo você para cima, Coop? Coloco você na cama.

— Eu quero você na minha cama, Zoe. Eu quero fazer amor com você. Eu quero tocá-la de novo.

Ela queria aquilo também. Muito. Mas novos li­mites haviam sido impostos.

— Você disse que queria conversar comigo.

— Você sabe como é o tato da sua pele? Eu não consigo descrever, é completamente suave, delicado e cálido. Eu comecei a pensar na sua pele quando es­tava jogando pôquer e me embebedando esta noite. Eu venci também. Ganhei uma bolada enorme com um par de seis. Ganhei mais de 250 dólares.

— Parabéns.

— Mas continuei pensando em você. Nessa covinha aqui. — Ele quase acertou o próprio olho, então arrastou um dedo pela bochecha, até o canto da boca.

— Fiquei pensando naquela covinha, e na sua pele, e naqueles olhos grandes e pernas matadoras. E fiquei pensando no quanto gosto de observar você e o garo­to, como faço algumas vezes lá de cima, quando você não sabe. Não sabia disso, sabia?

— Não — ela disse baixinho. — Eu não sabia.

— Bem, veja... — Ele gesticulou furiosamente.

— Você tem esse jeito de passar a mão nos cabelos dele. Isso me toca. — Ele meneou a cabeça. — Isso me toca mesmo. Keenan me ama, você sabe. Ele me disse que ama. Você também.

— Eu sei.

— E eu falava sério a respeito de tudo que disse esta tarde.

— Eu sei. — Suspirando, ela andou para desa­marrar os sapatos dele.

— Cada palavra, Zoe. Eu tenho minha vida esta­belecida, do jeito que eu quero.

— Certo. — Ela tirou os sapatos dele, colocou as pernas dele no sofá.

— Então você pode parar de surgir na minha ca­beça, porque isso não vai mudar nada.

— Vou manter isso em mente.

Ele ja estava dormindo antes de ela se abaixar e beijá-lo no rosto.

 

Quando a ressaca veio, Coop soube que esta seria das piores. Ele não tinha que abrir os olhos, não tinha que se mexer, não quando sua cabeça já estava baten­do como os tambores da corporação do exército.

Ele não tinha certeza de como dera um jeito de chegar em casa e na cama, mas a obscuridade do iní­cio de noite não era reconfortante. Ainda assim, ele pensou, era melhor esperar antes de sobrecarregar seu cérebro.

Cauteloso, quase receoso, ele abriu os olhos. O rostinho diretamente acima dele o fez dar um so­bressalto, então gemer de dor.

— Bom dia — Keenan disse alegremente. — Você dormiu demais?

— Eu não sei. — Coop levantou uma das mãos em direção à cabeça. — Onde está sua mãe?

— Está fazendo meu almoço. Ela disse que eu po­dia vier e olhar para você se eu não te acordasse. Eu não te acordei, acordei? Eu estava realmente quieto.

— Não. — Coop fechou os olhos outra fez e re­zou por esquecimento.

— Você está doente? Você tem um temômeto? — Keenan colocou uma das mãozinhas leves e peque­nas na testa dolorida de Coop. — Mamãe pode fazer isso melhor. Ela sempre faz melhor.

Muito gentilmente, Keenan substituiu a mão com um beijo.

— Isso ajuda?

Ah, diabos, Coop pensou. Até mesmo uma ressa­ca não tinha chance contra o garoto.

— Sim, obrigado. Que horas são?

— O ponteiro grande está no dez e o pequeno está no oito. Você pode dormir na minha cama até melhorar e brincar com meus brinquedos.

— Obrigado. — Coop fez um esforço supremo e se sentou. Quando sua cabeça rodou, ele fez o me­lhor possível para segurá-la com as mãos. — Keenan, seja um camarada e peça à sua mãe uma aspirina.

— Certo. — Ele correu e o som dos tênis batendo no piso fizeram Coop tremer.

— Dor de cabeça? — Zoe perguntou um instante depois.

Coop levantou a cabeça. Ela ainda estava de penhoar. Ele se lembrava do penhoar, da noite anterior. Estava começando a se lembrar um pouco da noite anterior.

— Se você vai gritar comigo, poderia fazer isso mais tarde?

Em resposta, ela entregou uma aspirina e um cor­po com um líquido avermelhado. — O que é isso?

— Um remédio de Joe, o atendente do bar. Ele garante que isso vai lhe tirar da situação crítica.

— Obrigado.

Havia um ruído de buzina vindo do lado de fora que cortou o crânio de Coop como uma faca cega. Enquanto ele estava lidando com o choque disso, Keenan retornou correndo.

— Tchau, mamãe, tchau!— Ele deu um beijo esta­lado nela, então se virou para abraçar Coop. — Tchau.

Assim que a porta bateu detrás dele, Coop engo­liu o remédio de Joe.

— Você quer café? — Zoe passou a língua nos dentes e tentou não sorrir. — Café da manhã?

— Você não vai gritar comigo?

— Por cambalear até aqui, bêbado, no meio da noite? E por desmaiar no meu sofá? — Ela pausou apenas o tempo suficiente para alcançar seu objetivo. — Não, eu não vou gritar com você, acho que está sofrendo o suficiente.

— Estou, juro para você. — Ele se levantou para segui-la até a cozinha. — Não apenas fisicamente. Eu me sinto um idiota completo.

— Você foi um idiota completo. — Ela serviu uma caneca de café e colocou na mesa para ele. — O ter­ceiro marido da minha mãe tinha uma predileção por uísque de malte. Ele jurava que ovos no dia seguinte eram a cura. Como você quer?

— Mexidos seria bom. — Ele se sentou cuidado­samente à mesa. — Desculpe-me, Zoe.

Ela continuou de costas para ele.

— Pelo quê?

— Por ser um imbecil ontem à tarde e um imbe­cil maior ainda ontem à noite.

— Ah, aquilo. — Com o bacon fritando, ela pe­gou uma tigela pequena para mexer os ovos. — Eu não imagino que esta será a primeira ou a última vez que você será um imbecil.

— Você não... — Ele se remexeu miseravelmente. — Ah, você não disse para Keenan que eu estava...

— Bêbado e confuso? — Com um meio sorriso no rosto, ela olhou por cima do ombro. — Eu disse a ele que você não estava se sentindo bem e que foi dormir no sofá. O que estava perto o suficiente da verdade.

— Obrigado. Eu não gostaria que ele pensasse... você sabe. Que faço disso um hábito.

— Assim você disse na noite passada. — Ela virou o bacon e bateu os ovos.

Ele a observou, gradualmente afastando a per­plexidade de que ela não ia esfregar no nariz dele a bagunça que ele fizera. Lembrando-se da tarde an­terior, quando ela o encarara com todo o orgulho e fúria brilhando nos olhos. E da outra noite, quando ele adormecera no sofá, do modo como ela observara quando ele transferira o garoto de seus braços para os dela e ela o levara para a cama.

Uma dúzia de outras imagens, capturadas em tão pouco tempo, passou rapidamente pela cabeça dele, até chegar gradualmente a uma. Esta: Zoe parada à beira do fogão, com o sol da manhã iluminando seu cabelo desalinhado, o penhoar flutuando, o cheiro do café da manhã aquecendo o ambiente.

Como ele podia ter pensado que não queria isso? Só isso. E o que ele faria agora que sabia a verdade?

— A comida deve ajudar. — Ela colocou um pra­to em frente a ele. — Eu preciso me arrumar para trabalhar.

— Você pode... Você tem um minuto?

— Acho que sim. — Ela serviu outra xícara de café para si. — Eu não preciso estar lá até as dez horas.

Ele começou a comer enquanto pensamentos se misturavam em seu cérebro.

— Isso está gostoso. Obrigado.

— Por nada. — Ela se recostou no balcão. — Você queria mais alguma coisa?

— Sim. — Ele comeu mais, esperando que os ovos lhe dessem coragem. Então ele largou o garfo. Era a nona entrada, ele pensou, e dois jogadores já haviam sido expulsos. — Você. Eu quero você.

Ela sorriu um pouco.

— Coop, duvido que esteja em forma para isso. E eu realmente preciso ir trabalhar, então...

— Não, eu não quero dizer desse jeito. Quero dizer, eu quero, mas... — Ele interrompeu, deu um suspiro longo e desesperado. — Eu quero que você se case comigo.

— Perdão?

— Acho que você deveria se casar comigo. É uma boa idéia. — Em algum lugar no fundo de sua men­te, ele percebeu, estivera maquinando isso o tempo todo. Ele havia descoberto. — Você pode desistir do seu trabalho noturno e voltar para a escola se qui­ser. Ou abrir aquela floricultura. Qualquer coisa. Eu acho que é o que deveríamos fazer.

— Mesmo. — Ela deixou o café de lado, pois a mão estava trêmula. — Bem, isso é muito generoso da sua parte, Coop, mas eu não preciso me casar para fazer qualquer uma dessas coisas. Então agradeço mesmo assim.

Ele a encarou.

— Não? Você está dizendo não? Mas você me ama. Você disse isso. Disse duas vezes.

— Podemos considerar três — ela disse calma­mente. — Sim, eu o amo. Não, eu não vou me casar com você. Agora eu realmente preciso me arrumar para o trabalho.

— Só um minuto. — Com a ressaca esquecida, ele se afastou da mesa e se levantou. — Que tipo de jogo é esse? Você me ama, seu filho é louco por mim, somos fantásticos na cama, eu até mesmo sei como fazer uma maldita escala de carona para a criançada, mas você não vai se casar comigo.

— Você é tão idiota. Tão bobo. Você acha que só porque eu não fiz uma grande batalha antes de cair na sua cama pode ter tudo do seu jeito? Quando você quiser, do jeito que quiser? Bem, está errado. E você é um imbecil.

Ele se assustou quando ela irrompeu para fora do quarto. Primeiro golpe, pensou. E ele mesmo tinha visto o lance.

Mas o jogo não havia acabado, ele pensou inflexivelmente, até a cerimônia de encerramento.

 

Zoe ainda estava fervilhando quando chegou do tra­balho. De todos os idiotas arrogantes, intrometidos e egoístas que ela já conhecera, J. Cooper McKinnon levava a medalha de ouro. Imagine dizer a ela que se casar com ele era uma boa idéia, então listar todos os benefícios que ela ganharia.

Ah, ele pensava que fosse um prêmio.

Em um dia ele está dizendo a ela para tirar da cabeça qualquer idéia de persistir em um relaciona­mento. Como se ela estivesse deixando armadilhas para ele. No outro, está com pena dela e oferecendo uma grande ajuda masculina.

Ela deveria ter enlouquecido.

Nem uma vez, nem uma vez ele tinha citado o que ela traria de bom a ele, o que sentira por ela, o que ele queria. Nem uma vez trouxera à tona o fato de que ele poderia ou aceitaria o filho de outro ho­mem como seu.

Ela abriu a porta da frente num tranco e bateu. Ele poderia pegar sua proposta imatura e enfiar...

— Mamãe! Ei, mamãe! — Keenan adentrou a sala energicamente e agarrou a mão dela. — Venha, ve­nha. Temos uma surpresa.

— Que surpresa? O que você está fazendo em casa, Keenan? Deveria estar na casa dos Finkleman.

— Coop está aqui. — Ele deu arrancos na mão dela virilmente. — Temos uma surpresa. E temos um segredo. E você tem que vir agora!

— Está certo, estou indo. — Ela se firmou e dei­xou Keenan arrastá-la até a cozinha.

Havia flores, amontoados delas, vasos e cestas transbordando nos balcões, no chão, nos parapeitos das janelas. Havia música no rádio, alguma sonata clássica suave e dada a sonhos. A mesa estava posta, cristais que ela nunca vira cintilando sob a luz do sol, uma garrafa de champanhe resfriando em um balde de prata. E Coop estava lá, vestindo uma camisa aper­tada e calças folgadas.

— É uma surpresa — Keenan anunciou alegre­mente. — Deixamos tudo bonito assim você ia gos­tar. E a sra. Finkleman disse que podíamos usar os copos e pratos. E o sr. Finkleman fez esse frango es­pecial porque é irresistível.

— Irresistível — Coop disse, os olhos em Zoe. — Você, ah, disse que não precisava de flores e de luz de velas, mas eu nunca a levei para sair como em um encontro. Pensei que isso seria a melhor solução.

— Você gosta, mamãe? Gosta?

— Sim, é muito bonito. — Ela se abaixou para beijar Keenan. — Obrigada.

— Eu tenho que voltar para a casa dos Finkleman, assim vocês podem namorar.

— Ah, pare com isso, garoto — Coop carregou Keenan. — Para começo de conversa, você deveria ficar quieto sobre isso, — ele murmurou enquanto carregava o menino para fora.

— O que é namorar?

— Eu lhe conto depois.

Satisfeito com aquilo, Keenan abraçou o pescoço de Coop.

— Você vai contar para a mamãe o segredo sobre todos nós nos casarmos?

— Esse é o plano.

— E você vai morar com a gente e pode ser meu papai e isso vai ser legal?

— Vai ser ótimo. Vai ser perfeito. — Ele parou à cerca para dar um beijo em Keenan. — Eu o amo, Keenan.

— Certo. — Ele apertou o abraço. — Tchau.

— Tchau.

— U-hu! — A sra. Finkleman parou à porta de trás. Ela deu uma piscadela para Coop e um sinal exagerado de polegares para cima antes de levar Kee­nan para dentro rapidamente.

Quando Coop retornou, Zoe estava basicamente no mesmo lugar onde a deixara. Ele não tinha certeza se aquele era ou não um bom sinal.

— Então, pronta para beber champanhe?

— Coop, isso é muito gentil da sua parte, mas...

— Como as flores? — Nervoso feito um gato, ele tirou a rolha.

— Sim, são maravilhosas, mas...

— Eu não poderia comprá-las onde você traba­lha, ou eu teria estragado a surpresa. Keenan real­mente me deu uma ajuda arrumando as coisas. — Ele entregou a taça a ela, e quando ela estava dis­traída, ele se inclinou para lhe dar um beijo lento e cálido. — Olá.

— Coop. — Ela precisava esperar o coração ter­minar aquelas cambalhotas preguiçosas. — Eu sei que você deve ter tido muito trabalho...

— Eu deveria ter feito isso antes. Mas não sabia o que queria.

— Ai, Deus. — Ela se virou de costas e lutou para manter as emoções sob controle. — Eu é que dei as impressões erradas desta vez. Eu não preciso de pompa. Eu não preciso ter noites românticas e... — ela apontou em direção às velas na mesa, esperando para serem acesas — luz de velas.

— É claro que precisa. Eu também, quando estas coisas estão associadas a você.

— Você está tentando me cativar — ela disse irresolutamente. — Isso é novidade.

— Você me conhece. Do jeito que esta casa está organizada, praticamente temos morado juntos no último mês ou mais. As pessoas se conhecem mais rapidamente desse jeito do que apenas se socializan­do. Então você me conhece, e sente algo por mim do mesmo jeito.

Ela deu um gole no champanhe.

— Você está terrivelmente presunçoso a respeito disso. Eu lhe disse que meus sentimentos são minha responsabilidade, e isso permanece sendo verdade. Um jantar romântico não muda nada.

Parecia o segundo golpe, mas Coop sabia que se ele iria cair, lutaria antes.

— Então quero lhe proporcionar uma boa noite. Há algo errado com isso? Eu quero fazer melhor do que propor casamento em frente a um prato de ovos mexidos durante uma ressaca. — A voz dele havia se elevado e ele se conteve. — Droga, essa é a minha primeira vez fazendo isso, tenha um pouco de tole­rância. Não, não diga nada, deixe-me terminar. Você não precisa de mim. — Ele deu outro suspiro longo.

— Não para cuidar das coisas, para você ou para o garoto, quero dizer, para aparar a grama ou montar churrasqueiras estúpidas. E as minhas necessidades, Zoe? 

Ela piscou para ele.

— Bem, é só isso. Não vê? Você deixou claro que não precisa ou não quer laços. Eu venho com laços, Coop.

— Eu deixei claro — ele murmurou. — Eu não agi de forma clara porque não sabia. Eu não queria saber. Estava com medo. Aí está. Sente-se melhor sabendo disso? — Ele deu uma olhada para ela. — Eu estava com medo porque preciso de você. Porque preciso ver seu rosto, ouvir sua voz e sentir o cheiro dos seus cabelos. Eu só preciso que você esteja lá. E eu preciso ajudá-la a aparar a grama e montar a churrasqueira. Preciso que você precise de mim em retorno.

— Oh. — Ela fechou os olhos. — Eu gosto de ouvir isso.

— Então diga que vai se casar comigo. — Ele se­gurou os braços dela até ela abrir os olhos outra vez.

— É minha última jogada, Zoe. Case-se comigo.

— Eu... — Sim. Ela queria dizer sim. — Não sou só eu, Coop.

— Você acha que eu não quero o garoto? Deus, abra seus olhos. Sou louco por ele. Eu me apaixonei por ele antes de me apaixonar por você. Eu quero me casar com os dois, então talvez ter um outro filho ou dois, assim posso erguer o piso térreo. Nós já plane­jamos isso.

— Você... Você fez o quê?

Ele praguejou, deu um passo atrás e mexeu os ombros.

— Eu meio que apressei isso por causa do meni­no. Imaginei que deveria facilitar as coisas um pouco, e descobrir o que ele queria. — Quando ela apenas o encarou, ele enterrou as mãos nos bolsos. — Não parecia justo não o deixar participar disso, já que ele seria meu também.

— Seu — ela murmurou, encarando sua taça de vinho cegamente.

— Já que vocês dois são um time, seria meio que um tipo de expansão. De qualquer modo, ele está disposto. Então são dois contra um.

— Entendo.

— Talvez eu não saiba muito sobre a coisa pater­na, mas eu o amo. É um bom começo.

Ela olhou para ele novamente, bem nos olhos. O coração dela se abriu, inundou.

— É um bom começo, está certo.

— Eu a amo. — As mãos dele relaxaram dentro dos bolsos. — É a primeira vez que digo isso a uma mulher, exceto minha mãe. Eu a amo, Zoe. Então por que você não se casa comigo e dá uma folga para o garoto?

— Parece que fui vencida em número de votos. — Ela colocou uma das mãos no rosto dele.

— Isso é um sim?

— Definitivamente é um sim. — Ela gargalhou quando ele gingou nos braços dela. — Papai.

— Eu gosto como isso soa. — Ele subjugou os lábios dela com os dele. — Gosto muito.

 

                                                                                            Nora Roberts

 

 

                      

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