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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


O PARQUE DO TERROR / R. L. Stine
O PARQUE DO TERROR / R. L. Stine

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

O PARQUE DO TERROR

 

QUEM NÃO SABE AONDE QUER CHEGAR, SEMPRE CHEGA AONDE NÃO QUER.

Quando a família Montes decidiu passar o final de semana no sítio de um amigo, nem imaginava o que poderia acontecer. Desorientados pela falta de um mapa, perderam-se no caminho e encontraram um estranho parque de diversões. O que poderia ser a promessa de um dia divertido torna-se uma apavorante experiência...

 

 

Quando entramos pelos portões do Parque do Terror, não podíamos imaginar que em menos de uma hora, estaríamos deitados em caixões.

Sou a pessoa mais tranqüila da família Montes. Muita gente diz: "Isa, você é a mais calma da família." E eu vou tentar contar calmamente a vocês esta história.

Mas acreditem em mim - é impossível!

Não havíamos planejado visitar o Parque do Terror. Para dizer a verdade, nunca tínhamos ouvido falar nele.

Saímos de casa, cinco pessoas no pequeno carro de papai, com a intenção de passarmos o dia num sítio próximo à cidade. Papai tinha esquecido o mapa em casa. Mas mamãe afirmara que o lugar era fácil de encontrar.

Ela tinha dito que, quando nos aproximássemos do local, certamente haveriam sinais indicando o caminho a seguir. Mas ainda não tínhamos visto sinal algum.

Meu pai dirigia e mamãe ia ao lado dele. Eu estava sentada atrás, com meu irmão mais novo, Beto, que tem dez anos, e o seu amigo Nei.

Não era o melhor lugar para viajar. O meu irmão não consegue ficar quieto um segundo. Especialmente no carro. Tem energia sobrando.

E é completamente idiota.

Quanto mais andávamos, mais inquieto ele ficava. Quis lutar com Nei, mas não havia espaço suficiente. Depois, tentou fazer braço-de-ferro com ele, e continuavam a se mexer e a pular até que perdi a paciência e comecei a gritar.

- Por que não jogam Stop? -, sugeriu mamãe. - Procurem letras na estrada.

- Não há anúncio nenhum - respondeu Beto.

- Não há nada para olhar - resmungou Nei.

Tinha razão. Atravessávamos extensos campos completamente planos. Viam-se algumas árvores raquíticas aqui e ali. O resto era deserto.

- Vou seguir por este desvio - anunciou papai. Tirou o boné e alisou o escasso cabelo louro. - Já não estivemos por aqui?

Papai é o único louro da família. Mamãe, Beto e eu temos cabelo preto, liso, e olhos azuis.

De fato, papai não parece pertencer à mesma família. Nós três somos altos e magros, com a pele muito branca. E papai é baixo e gorducho, tem uma cara redonda que está quase sempre cor-de-rosa. Eu brinco muito com ele, porque acho que se parece mais com um praticante de luta livre do que com um gerente de banco, que é a profissão dele.

- Tenho certeza de que já estivemos aqui - disse papai, desanimado.

- É difícil dizer. É tudo deserto - respondeu mamãe, olhando através da janela.

- Grande ajuda. - murmurou papai.

- Como quer que eu ajude? - ela disse, enfezada. - Foi você quem deixou o mapa em cima da mesa da cozinha.

- Pensei que você o tivesse guardado na bolsa - resmungou papai.

- E por que eu teria a obrigação de pôr o mapa na bolsa? - gritou mamãe.

- Parem com isso, vocês dois - interrompi. Quando começavam a discutir, não paravam mais. Era sempre melhor interrompê-los antes que começassem a discutir sério.

- Sou o Beliscador Louco! - gritou Beto. Soltou uma gargalhada horripilante, como nos filmes de terror, e começou a beliscar Nei nos braços e no peito.

Odeio a brincadeira do Beliscador Louco mais do que qualquer outra brincadeira de Beto. Fiquei contente por Nei estar sentado no meio, junto de Beto, e não eu. Geralmente, a única forma de acabar com os beliscões de Beto é dando-lhe uma bofetada.

Nei começou a contorcer-se e a rir. Ele acha que tudo o que Beto faz tem muita graça. Ri com todas as idiotices do meu irmão. Acho que é por isso que Beto gosta tanto de Nei.

Começaram a beliscar-se um ao outro. Até que Beto empurrou Nei para cima de mim.

- Deixe-me em paz! - ele gritou.

Empurrei Nei outra vez. Sei que não o devia ter feito, mas estava calor no carro, estávamos viajando há horas, como queriam que eu me comportasse?

- Isa! Rapazes! Relaxem aí atrás! - gritou papai.

- Pai, ninguém mais diz "relaxem" hoje em dia - respondi-lhe, muito calma e sossegada.

Por alguma razão, a resposta deixou-o completamente furioso.

Começou a berrar, e o seu rosto ficou todo vermelho.

Sabia que ele não estava zangado comigo. Estava zangado porque não conseguíamos encontrar o tal sítio.

- Respirem fundo e fiquem todos calados - sugeriu mamãe.

- Ai! Pare de me beliscar! - gritou Nei. Deu um forte empurrão em Beto.

- Pare você de me beliscar! - berrou o meu irmão, dando-lhe também um empurrão.

Os garotos conseguem mesmo se comportar como animais.

- Ei, olhem. - um letreiro ali à frente! - Mamãe apontava para um grande letreiro verde do qual nos aproximávamos.

Beto e Nei pararam de lutar. Papai inclinou-se sobre o volante, aproximando-se do pára-brisas.

- Aí diz onde é o sítio? - perguntou Beto.

- Diz onde estamos? - quis saber Nei.

As palavras do letreiro tornaram-se legíveis quando passamos por ele. Dizia: ALUGA-SE.

Todos nós resmungamos, desapontados.

- O Beliscador Louco está de volta! - gritou Beto, dando um forte beliscão no braço de Nei. Ele nunca sabe quando deve parar.

- Esta estrada não vai a lugar nenhum - disse papai, carrancudo.

- Acho que devia perguntar o caminho a alguém - sugeriu mamãe.

- Perguntar a alguém? Perguntar a alguém? - explodiu papai. - Você vê alguém que eu não esteja vendo? - O rosto dele estava todo vermelho outra vez.

- Pergunte, se vir um posto - murmurou mamãe.

- Um posto? - gritou papai. - Nem árvores eu vejo.

Papai tinha razão. Olhei pela janela e não vi nada a não ser areia branca dos dois lados da estrada. O sol batia forte sobre a areia, fazendo-a brilhar. Ela brilhava tanto que quase parecia neve.

- É melhor voltar - disse mamãe.

- Estamos perdidos? - perguntou Nei. Notei algum medo na sua voz.

Nei não é propriamente o rapaz mais corajoso do mundo. Na verdade, assusta-se com facilidade. Uma noite, aproximei-me por trás dele no quintal e sussurrei o seu nome. - e ele quase desmaiou.

- Pai, estamos perdidos? - Beto repetiu a pergunta.

- Sim, estamos perdidos - respondeu papai, calmamente. - Irremediavelmente perdidos.

Nei soltou um pequeno grito e afundou-se no banco. Parecia um pequeno balão sem ar.

- Não diga isso! - gritou mamãe, ralhando.

- E o que quer que eu diga? - replicou papai. - Não estamos nem perto do sítio. Nem perto da civilização! Estamos no meio do deserto, em direção a lado nenhum!

- Então, volte. Tenho certeza que encontraremos alguém que possa nos informar o caminho - disse mamãe, suavemente. - E deixe de ser tão dramático.

- Vamos todos morrer aqui, no fim do mundo - disse Beto, fazendo uma careta arrepiante. - E os abutres vão bicar nossos olhos e comer nossa carne!

O meu irmão tem um grande senso de humor, não tem?

Vocês nem calculam o que é ter de viver com um louco varrido!

- Eu não estou com medo - insistiu Nei. Mas parecia. O seu rosto redondo estava pálido. E os olhos não paravam de piscar nervosamente. Com o seu curto e fofo cabelo louro, Nei parecia uma coruja assustada.

Resmungando para si mesmo, papai parou o carro. Depois deu meia-volta, e seguimos por onde tínhamos vindo.

- Grande feriado – disse entredentes.

- Ainda é cedo - comentou mamãe, olhando para o relógio.

O sol do fim da manhã estava quase no alto. Sentia o seu calor em meu rosto através do teto solar.

Andamos durante quase meia-hora. Beto queria jogar com Nei. Mas ele recusou, aborrecido. Olhava pela janela, vendo a estrada passar. De minuto em minuto, perguntava:

- Ainda estamos perdidos?

- Bem perdidos - respondia papai, desanimado.

- Está tudo bem - assegurava-nos mamãe.

À medida que íamos avançando, foram reaparecendo as árvores raquíticas. Algum tempo depois, a paisagem se modificou. Surgiram algumas outras árvores e arbustos baixos.

Mantinha-me silenciosa, com as mãos muito quietas no colo. Não estava verdadeiramente assustada ou preocupada. Mas desejava ver um posto ou uma loja, ou outro ser humano!

- Estou ficando com fome - disse Beto. - Já está na hora do almoço?

Com um longo suspiro, papai encostou o carro à beira da estrada. Estendeu a mão para o porta-luvas.

- Tem de haver um mapa aqui.

- Não há. Já procurei - disse mamãe.

E começaram a discutir outra vez. Eu levantei os olhos para o teto solar acima da minha cabeça.

- Oh! - exclamei, pois um monstro hediondo estava olhando para mim, abaixando a cabeça enorme, prestes a esmagar o carro.

 

Abri a boca para gritar, mas não consegui emitir nenhum som.

O monstro olhava fixamente através do teto solar. Era da altura de um prédio. Seus olhos vermelhos brilhavam de maldade e sua boca contorcia-se numa careta zangada.

- P-pai! - consegui finalmente gaguejar. Ele estava inclinado para a frente, vasculhando no porta luvas.

- Aiii! - ouvi Beto gritar.

Voltei-me e vi que ele também estava olhando para o monstro, com os olhos azuis muito abertos, cheios de medo.

- Pai! Mãe! - O meu coração estava batendo tão depressa que pensei que fosse explodir.

- Que foi, Isa? - perguntou mamãe, impaciente.

O monstro abaixava a cabeça em nossa direção. A sua boca estava toda aberta, pronta para engolir o carro inteiro.

E então Beto começou a rir:

- Uau! Boa! - gritou ele.

Nesse exato momento, percebi que o monstro não estava vivo. Era um boneco mecânico que fazia parte de um painel publicitário gigantesco.

Abaixando a cabeça para ver melhor através da janela lateral, notei que papai tinha parado o carro junto ao painel. Os meus pais estavam tão ocupados discutindo sobre mapas que nem tinham notado nada.

Olhei para o monstro de olhos vermelhos. Inclinava a cabeça e abria a bocarra. Depois, a boca fechava-se repentinamente e a cabeça enorme voltava a subir.

- Parece mesmo verdadeiro! - exclamou Nei, olhando espantoso para o monstro.

- Pois ele não me enganou - menti. Não ia admitir que quase tinha saltado pelo teto solar. Afinal de contas, sou a mais calma da família.

Abri a janela e pus a cabeça de fora para ler o que dizia o painel do monstro mecânico. Em enormes letras vermelhas, lia-se: BEM-VINDOS AO PARQUE DO TERROR, ONDE OS PESADELOS SE TORNAM REALIDADE!

Havia uma seta vermelha no canto superior esquerdo, com a indicação: 1,5 km.

- Não podemos ir lá? - perguntou Beto, ansioso. Chegou-se à frente e agarrou o banco de papai com as duas mãos. - Podemos, pai? Que tal?

- Parece um pouco assustador - disse Nei, desconfiado.

Papai fechou o porta-luvas com um suspiro. Estava desistindo de procurar o mapa.

- Beto, pare de puxar o meu banco - ele bronqueou. - Vá para trás.

- Podemos ir ao Parque do Terror? - perguntou Beto mais uma vez.

- Parque do Terror? - perguntou mamãe.

- Nunca ouvi falar disso - resmungou papai.

O monstro abaixou a cabeça sobre o carro, olhando pelo teto solar. Depois, levantou novamente a cabeça.

- Acho melhor não irmos - disse mamãe, olhando para o gigantesco painel. - Este lugar não me parece nada simpático.

- É ótimo! - insistiu Beto, puxando novamente o banco de papai para trás. - Parece mesmo excelente!

- Beto, para trás - ralhou papai.

- Vamos lá - pedi. - Nunca encontraremos este sítio.

Mamãe hesitou, mordendo o lábio inferior.

- Não sei - disse, preocupada. - Alguns destes lugares não têm segurança nenhuma.

- Este tem! - afirmou Beto. - Vai ver que este tem muita segurança!

- Beto, para trás - ordenou papai.

- Podemos ir? - ele insistiu, ignorando a ordem. - Podemos?

- Pode ser engraçado - disse Nei, calmamente.

- Pelo menos, vamos experimentar - pedi. - Se não gostarmos, podemos ir embora.

Papai coçou o queixo e suspirou.

- Bem, acho que é melhor do que ficar aqui o dia todo discutindo.

- Iuuuuupiii! - gritou Beto.

Eu e Beto fizemos uma saudação batendo nas mãos um do outro. O Parque do Terror também me parecia um local interessante. Eu adorava diversões de terror.

- Se as diversões forem tão assustadores como aquele monstro, - eu disse, apontando para o painel - este parque deve ser o máximo!

- Mas você não acha que é muito assustador, não é? - perguntou Nei. Reparei que ele tinha as mãos fechadas. E estava outra vez com aquele ar aterrorizado.

- Não, não deve ser muito assustador - respondi.

Oh, como estava enganada!

- Não consigo entender como alguém construiu um parque de diversões no meio deste lugar - declarou papai.

Atravessávamos o que parecia ser uma floresta interminável. Árvores velhas e altas inclinavam-se na estrada de dois sentidos, tapando o sol do fim da manhã.

- Talvez ainda não tenham construído o parque - sugeriu mamãe. - Talvez tirem estas árvores e o construam aqui.

Nós três esperávamos que mamãe estivesse enganada. E estava mesmo.

A estrada tinha uma curva fechada. E quando passamos por ela, avistamos os altos portões do parque à nossa frente.

Por trás de um muro alto pintado de púrpura, o Parque do Terror parecia estender-se por muitos quilômetros. Inclinando-me para a frente no banco. Consegui ver o topo das várias diversões e estranhos edifícios coloridos. Quando entramos no enorme estacionamento, uma sinistra música de órgão invadiu o lugar.

- Iuupiii! Isto é o máximo! - exclamou Beto.

Eu e Nei concordamos entusiasticamente. Mal podia esperar para sair do carro e ver tudo.

- O estacionamento está quase vazio - disse papai, olhando nervosamente para mamãe.

- Isto quer dizer que não vamos ter de esperar em longas filas! - exclamei rapidamente.

- Acho que a Isa está entusiasmada com este lugar - comentou mamãe, sorrindo.

- Eu também! - gritou Beto. Deu animadamente um murro no ombro de Nei.

Atravessamos o grande estacionamento. Vi alguns carros parados perto do portão principal. Do lado oposto via-se uma fila de ônibus púrpura e verde com as palavras PARQUE DO TERROR escritas na lateral.

Enquanto nos aproximávamos, observei atentamente o portão principal. O mesmo monstro que tínhamos visto no painel erguia-se por detrás de um grande letreiro que estava acima do portão. Ele dizia: OS HORRORES DO PARQUE DO TERROR DÃO AS BOAS-VINDAS AOS VISITANTES.

- Não entendo este letreiro - disse mamãe. - O que são os Horrores do Parque do Terror?

- Já vamos descobrir! - exclamei, muito contente.

A solene e sinistra música de órgão soava pesadamente sobre o estacionamento. Papai parou num lugar vago à direita do portão principal.

Beto e eu abrimos logo as portas traseiras ainda com o carro em movimento.

- Vamos lá! - gritei.

Nei, Beto e eu começamos a correr na direção do portão. Enquanto corria, olhei para o monstro por cima do letreiro. Este não mexia a cabeça como o monstro do painel. Mas parecia muito real.

Olhei para trás e vi que papai e mamãe se apressavam para nos alcançar.

- Isto vai ser demais! - exclamei.

E depois engasguei-me ao ouvir uma explosão ensurdecedora que fez o chão tremer.

E vi, com horror, o nosso carro explodir, desfazendo-se em mil pedaços.

 

Continuei a gritar durante algum tempo. Finalmente, consegui me controlar.

Todos olhávamos, chocados. Pequenos pedaços de metal retorcido eram tudo o que restava do nosso carro.

- Mas como? - foi o que papai conseguiu dizer.

- N-não, n-não acredito! - gaguejei.

- Graças aos céus que estávamos todos fora do carro! - exclamou mamãe. Juntou-se a nós e deu-nos um grande abraço. - Graças aos céus, estamos todos bem.

Beto e Nei ainda não tinham murmurado uma palavra. Estavam com os olhos muito abertos, olhando para o lugar em que o carro estivera.

- O meu carro! - disse papai num suspiro horrorizado. - O meu carro... Como? Como?

- Estamos a salvo - murmurou mamãe. - Estamos todos bem. Mas que explosão aterradora. Parece que ainda ouço o barulho.

- Te-tenho de chamar a polícia! - murmurou papai.

Dirigiu-se rapidamente ao portão, abanando a cabeça, resmungando para si mesmo.

- Como é que o carro pode ter explodido assim? - perguntou mamãe, apressando-se atrás dele. - O que teria provocado isso?

- Como quer que eu saiba? - disse papai muito zangado. - Não entendo! Realmente! E agora, o que vamos fazer? - Ele parecia mesmo em pânico.

Não o censuro. A explosão foi mesmo assustadora.

E quando me dei conta de que podíamos estar todos dentro do carro na hora que explodiu, senti arrepios por todo o corpo.

- Talvez exista uma agência de aluguel de carros para a qual possamos telefonar - sugeriu mamãe.

Mamãe é como eu, sempre calma nas emergências.

Seguimos papai, que se dirigiu, correndo, para a bilheteria da entrada. Dentro da bilheteria havia um monstro verde. Tinha olhos amarelos salientes, e chifres pretos saindo pela cabeça. Era uma fantasia realmente bem-feita.

- Bem-vindos ao Parque do Terror! - disse, numa voz rouca e grave. Um acorde sonoro de música de órgão fez-se ouvir dentro da bilheteria. - Eu sou um Horror do Parque do Terror. Todos nós desejamos que tenham um dia cheio de terror.

- O meu carro! - gritou papai, freneticamente. - Explodiu! Preciso de um telefone!

- Desculpe, senhor. Não temos telefone - respondeu o homem com a fantasia de monstro.

- Hã? - O rosto de papai estava novamente vermelho. Sua testa estava coberta de suor. - Mas eu preciso de um telefone! Imediatamente! - insistiu, olhando furiosamente para o monstro verde. - O meu carro explodiu! Estamos presos aqui!

- Nós tratamos disso - respondeu o Horror, abaixando o tom de voz.

- Vocês o quê? - gritou papai. - Nós precisamos de um carro! Preciso usar um telefone!

- Não temos telefone - repetiu o monstro. - Mas prometo que trataremos de tudo. Não deixe que isto estrague a sua visita ao Parque do Terror.

- Estragar a minha visita? - guinchou papai, com a cara cada vez mais vermelha. - Mas, e o meu carro?

Outro sonoro acorde de música de órgão me fez saltar. A sinistra melodia fazia com que eu me sentisse realmente num filme de terror!

- Vamos cuidar de vocês. Prometo - disse o Horror. Um estranho sorriso surgiu em seu rosto. Os olhos amarelos iluminaram-se. - Por favor, aproveitem o passeio e não se preocupem com o transporte. Eu e os outros Horrores faremos com que sejam bem tratados.

- Mas-mas... - gaguejou papai.

O Horror gesticulou em direção ao parque.

- Por favor, são nossos convidados. Oferecemos as entradas. Peço desculpas pelo carro. Mas, por favor, não se preocupem. Garanto que não têm necessidade de se preocupar com o carro.

Papai voltou-se para nós, com o suor gotejando na testa. Estava visivelmente aborrecido.

- Eu-eu não vou me divertir nada no parque depois disto - disse. - Não consigo acreditar no que aconteceu. Realmente, não consigo. Temos de arranjar um carro de qualquer maneira, e...

- Oh, por favor, pai! - gritou Beto. - Por favor! Não podemos entrar? Ele disse que tratava de tudo.

- Só um pouquinho? - eu disse, juntando-me a Beto.

- Viajamos durante tanto tempo - disse mamãe. - Vamos entrar. Deixe que brinquem um pouco.

Papai pensou durante alguns momentos e encolheu os ombros.

- Está bem. - concordou, finalmente.

A música de órgão tocou ainda com maior volume quando atravessamos o portão.

- Uau! Olhem bem para este lugar! - exclamei. - Parece mesmo um filme de terror.

Estávamos numa estranha rua pavimentada. Pequenas casas amontoavam-se em ambos os lados. As altas árvores que ladeavam a rua tapavam quase completamente a luz do sol. O ar estava gelado.

Uivos graves, iguais a uivos de lobo, pareciam vir daquelas casas.

Num letreiro lia-se.

BEM-VINDOS À ALDEIA DOS LOBISOMENS.

NÃO ALIMENTEM OS LOBISOMENS. SE CONSEGUIREM.

Os uivos assustadores aumentaram.

Beto e eu rimos do letreiro.

Vi um monstro verde, um dos Horrores, observando-se através da janela de uma das casas. Outro Horror passou por nós segurando uma cabeça humana, que parecia muito real. Agarrava-a pelo cabelo louro comprido e, enquanto andava, balançava-a para cima e para baixo, como se fosse um ioiô.

- Demais! - exclamou Beto outra vez.

Parecia ser a sua palavra preferida do dia.

Caminhamos pela rua pavimentada. Os sons dos nossos sapatos ecoava nas paredes das casas.

- Ohhh! - Todos soltamos gritos de surpresa quando um grande lobo cinzento passou à nossa frente. Desapareceu na esquina de uma casa antes de podermos olhar bem para ele.

- Aquilo era um lobo de verdade? - perguntou Nei, com a voz trêmula.

- É claro que não - respondi. - Provavelmente, era um cão. Ou, então, um boneco mecânico.

Papai ficara um pouco para trás.

- Tenho de encontrar um telefone - disse, inconformado. - Não vou conseguir aproveitar nada disto enquanto eu não souber se temos meios de ir para casa.

- Mas, querido... - começou mamãe.

- Tem de haver um telefone aqui - interrompeu papai. - Continuem sem mim.

- Não. Vou com você - disse mamãe. - Está tão nervoso. Irei ajudá-lo a fazer os telefonemas. De qualquer modo, as crianças vão se divertir muito mais sem nós.

- Deixá-los sozinhos? - gritou papai. - Quer dizer, deixá-los seguir sem nós?

- Claro - disse mamãe, aproximando-se dele. - Ficam muito bem sozinhos. Este lugar parece interessante. O que poderia acontecer?

O que poderia acontecer?

Com estas palavras, papai e mamãe foram procurar um telefone.

- Vamos nos encontrar aqui! - disse mamãe.

Beto, Nei e eu estávamos por nossa conta.

Virei-me e vi meus pais se afastarem.

Voltei-me a tempo de ver um lobo cinzento que se aproximava, vindo dos fundos de uma das casas. Abaixou a cabeça e rosnou, de modo ameaçador.

Ficamos os três paralisados quando percebemos que os seus olhos, vermelhos e assustadores, estavam fixos em nós.

Ele estava com fome.

 

Gritei e puxei Beto e Nei para trás.

O lobo aproximou-se, mantendo a cabeça baixa, olhando para nós com grandes olhos vermelhos, abrindo a boca esfomeada.

- É-é verdadeiro! - exclamou Nei, engolindo com dificuldade. Eu tinha uma das mãos no ombro dele. Sentia-o tremer.

O lobo uivou novamente.

Depois voltou a desaparecer atrás da parede da casa.

- Acho que é uma espécie de robô, ou outra coisa qualquer - disse ao Nei.

- Vamos para outro lugar - respondeu Nei, que de repente ficara muito pálido.

- O que diz aquele letreiro ali à frente? - perguntou Beto.

O letreiro dizia: NÃO BELISCAR.

Beto riu.

- Que estupidez!

- Mas que letreiro mais idiota! - concordou Nei.

- Este letreiro foi feito de propósito para você, Beto. - exclamei. Belisquei-o com força no braço.

- Ei! Não sabe ler? - disse ele, apontando para o letreiro.

Reparei num Horror verde que nos observava. Depois, vi uma família que seguia o seu percurso por trás da fila de casas. Eram o pai, a mãe e uma garota ainda pequena. A garota estava chorando. Os pais tinham as mãos nos ombros dela e pareciam muito preocupados.

Um uivo de lobo cortou o ar.

- Vamos procurar outras brincadeiras! - sugeriu Nei.

- Brincadeiras assustadoras! - acrescentou Beto.

Lado a lado, sempre juntos, saímos da Aldeia dos Lobisomens. A rua seguia até uma praça, A luz brilhante do sol voltou assim que saímos da Aldeia.

Vários edifícios de cor verde e púrpura rodeavam a praça. Vi mais algumas famílias e mais Horrores verdes que vigiavam tudo. Um Horror atarracado vendia sorvetes negros!

- Eca! - disse Beto, fazendo uma careta.

Passamos apressadamente pelo carrinho de sorvete, e por outro letreiro NÃO BELISCAR, e paramos em frente do que parecia ser uma alta montanha púrpura.

- É uma atração! - exclamei.

Havia uma porta cortada num dos lados da montanha. E, por cima da porta, um letreiro: ESCORREGADOR DA MALDIÇÃO. QUER ESCORREGAR PARA SEMPRE?

- Legal! - disse Beto, dando um tapa nas costas de Nei.

- Aposto que se escala até lá em cima e depois se desce escorregando por todo o caminho - eu disse, apontando para o topo do edifício em forma de montanha.

- Vamos lá! - gritou Beto, animadamente.

Corremos para o edifício, e entramos pela porta lateral. Lá dentro, estava escuro e frio. Uma larga rampa elevava-se em direção ao topo.

Ouvi crianças rindo e gritando, mas não os consegui ver. Nós três corremos para a rampa, ansiosos para chegar lá em cima.

Mas no meio do caminho, paramos para ler outro letreiro: AVISO! VOCÊ PODE ESCORREGAR PARA A SUA MALDIÇÃO!

Agora podia ouvir crianças gritando enquanto desciam pelo escorregador. Mas estava muito escuro para ver alguma coisa.

- Está com medo, Nei? - perguntei, reparando em sua expressão tensa.

- Claro que não! - ele disse, atrapalhado com a minha pergunta. - Já vi muitas coisas assim. São apenas grandes escorregadores. Basta sentar e deslizar.

- Depressa! - gritou Beto, correndo á nossa frente.

- Ei! Espere por nós! - chamei. Segui-os até o alto da rampa. Era uma grande plataforma com uma fila de longos escorregadores cheios de curvas, numerados de um até dez.

Apesar da fraca luz, reparei em dois Horrores que nos observavam enquanto nos aproximávamos. Estavam à frente dos escorregadores. Seus grandes olhos amarelos acenderam-se quando chegamos perto deles.

- Escorrega-se mesmo até lá embaixo? - perguntou Beto a um deles.

O Horror acenou afirmativamente.

- E vamos bem depressa? - perguntou Nei, ficando alguns passos atrás de nós.

O Horror acenou afirmativamente mais uma vez.

- É um percurso longo até lá - resmungou ele.

- Prestem atenção ao escorregador que escolherem - avisou o outro Horror. - Não escolham o Escorregador da Maldição. - E apontou para os números pintados de preto, em cada entrada.

- Sim. Não escolham o Escorregador da Maldição - repetiu seu companheiro. - Ficariam lá para sempre.

Ri, achando graça naquela idéia.

Ele estava só tentando nos assustar - não estava?

 

Escolhi o escorregador número três porque esse é o meu número da sorte. Beto sentou-se no escorregador número dois. Nei foi para o mais afastado, o número dez.

Olhei para trás a fim de ver o que os Horrores estavam fazendo. Mas antes que os pudesse ver, senti o fundo estremecer por baixo de mim.

Soltei um grito agudo e longo quando comecei a descer.

Levantei os braços para cima e gritei durante todo o percurso. Os meus gritos ecoavam pelo enorme e escuro edifício do Escorregador da Maldição.

Era ótimo. O escorregador dava curvas e mais curvas e eu rodopiava para a escuridão, cada vez mais depressa.

Na fraca luz, conseguia ver Beto ao meu lado. Estava deitado de costas e olhava para cima com a boca muito aberta.

Tentei chamá-lo. Mas o escorregador fez uma curva, e afastei-me.

Para baixo, para baixo.

Descia tão depressa que a escuridão se transformou num borrão sólido.

O escorregador curvava para cima e depois novamente para baixo. Era uma montanha-russa humana, concluí alegremente.

"Estou indo mais rápido do que a velocidade da luz", pensei.

Olhei para um lado e para o outro, tentando ver Beto e Nei. Mas estava muito escuro e eu escorregava cada vez mais depressa.

Muito depressa.

E depois, bump! Bati com força no chão.

Surgiu uma saída.

Estava de novo ao ar livre.

Beto saltou para fora e caiu ao meu lado. Bateu no chão ainda deitado e não fez qualquer tentativa para se levantar. Fez uma careta e olhou para cima. - Onde estou?

- Está em terra firme - disse-lhe, pondo-me de pé. Limpei as calças e depois ajeitei a minha trança.

- Grande aventura, hã?

- Vamos andar outra vez - disse Beto, ainda deitado no chão.

- Não podemos ir outra vez se ficar aí deitado no chão - respondi.

- Ajude-me - disse Beto, levantando a mão.

Soltei um gemido enquanto lhe dava um puxão para ajudá-lo.

- Lá dentro, ouvi você gritar - disse Beto.

- Era de propósito - respondi. - Eu queria gritar...

- Ah, sim. Claro! - disse Beto, revirando os olhos. Depois pôs-se de pé. - Uau. Estou um pouco tonto. A que velocidade andamos?

Encolhi os ombros.

- Bastante depressa, acho eu. Lá dentro está tão escuro que é difícil perceber isso.

E foi então que dei pela falta de um membro do nosso grupo. Olhei para as saídas na parede do edifício.

- Onde está o Nei?

- Hã? - Beto também tinha se esquecido dele.

Ficamos olhando para a parede do edifício, esperando que Nei aparecesse.

- Onde estará ele? - perguntou Beto com voz estridente. - Ele não podia vir muito mais devagar do que nós, certo?

Abanei a cabeça. Estava começando a ficar muito nervosa. Tinha uma sensação estranha no estômago. E de repente, as minhas mãos ficaram geladas e úmidas.

Beto coçava a cabeça.

- Onde terá ido? - perguntou. - Por que não saiu ainda?

- Deve ter saído pela frente - respondi. - Talvez o escorregador número dez acabe na parte da frente. Vamos lá ver.

Enquanto corríamos para a parte da frente do edifício, fiquei zangada comigo mesmo por me assustar tão facilmente. É claro que o Nei havia saído por uma abertura diferente. Provavelmente estava à nossa espera na parte da frente do edifício. Com certeza estava preocupado conosco.

Quando voltávamos ao edifício púrpura, começamos a ver a grande praça circular. Procurei papai e mamãe, mas não estavam lá. Vi umas poucas famílias no outro lado da praça, e o Horror atarracado inclinado sobre o carrinho de sorvetes.

Nenhum sinal do Nei.

Beto e eu continuamos a correr até a entrada do Escorregador da Maldição. Paramos a alguns passos da abertura.

- Ele não está aqui! - gritou Beto, ofegante.

A minha respiração também estava acelerada. E a sensação estranha no meu estômago era cada vez mais forte.

- Também não o vejo - murmurei.

- O que vamos fazer agora? - perguntou Beto. Tinha os olhos arregalados e assustados.

Vi uma grande mulher Horror que estava junto à entrada.

- Ei! - gritei, correndo para ela. - Viu algum garoto sair por aqui? - os olhos amarelos da máscara de Horror mexeram-se e pareceram acender-se.

- Não. Aqui é a entrada. Ninguém sai por aqui - respondeu.

- Ele é louro e gorducho. Usa óculos - eu disse. - Estava de camiseta e calça jeans.

A Horror abanou a cabeça.

- Não. Ninguém sai por aqui. Procuraram lá atrás? Todo mundo sai por trás.

- Ele não saiu! - disse Beto, com voz estridente. - Nós estivemos lá. Ele não saiu.

O meu irmão falava com uma voz aguda e esganiçada. Estava tão ofegante que seu peito movimentava-se para cima e para baixo. Estava totalmente em pânico.

Eu também fiquei assustada. Mas sabia que tinha de me manter calma. Por causa de Beto.

- Ele não saiu pelos fundos - disse à mulher Horror. - e também não saiu por aqui. Então, o que lhe aconteceu?

A mulher Horror permaneceu calada durante algum tempo. Depois, com a voz muito baixa, quase num murmúrio, disse:

- Talvez seu amigo tenha escolhido o Escorregador da Maldição.

 

Fiquei olhando para a mulher com a fantasia de Horror.

- Vo-você está brincando, não está? - gaguejei. - Quer dizer, o Escorregador da Maldição é apenas uma brincadeira.

A Horror também olhava para mim com seus grandes olhos amarelos e não respondeu à minha pergunta.

- Os letreiros dão o aviso - disse ela. - Há sempre um aviso.

Voltou-se e desapareceu pela entrada escura. Beto e eu agarramo-nos um ao outro. Engoli com dificuldade. Subitamente, a minha garganta ficara seca. As minhas mãos estavam agora frias como o gelo.

- Isto é uma estupidez - murmurou Beto. Enterrou as mãos nos bolsos da calça. - Não passa de um estúpido escorregador. Por que ela está tentando nos assustar?

- Acho que esse é o trabalho dela - respondi.

- Temos de encontrar papai e mamãe - murmurou Beto.

- Primeiro temos de encontrar Nei - eu disse. - Se papai e mamãe descobrirem que nós o perdemos, ficarão zangados.

- Se o encontrarmos - disse Beto, tristemente.

Dei uma olhada na praça. Nem um sinal deles. Dois garotos compravam sorvetes negros do Horror do carrinho. Dois Horrores varriam a praça, trabalhando lado a lado.

Longe ouvia-se os uivos da Aldeia dos Lobisomens.

O sol ia alto. Sentia-o na cabeça e nos ombros. Mas continuava fazendo muito frio.

- Nei, onde está? - perguntei, aflita.

- Ele está escorregando para todo o sempre - respondeu Beto, abanando a cabeça. - Escorregando para todo o sempre no Escorregador da Maldição.

- Isto é uma idiotice - respondi. Mas Beto me dera uma idéia. - Venha aqui - eu disse, puxando a manga de sua camiseta. Comecei a arrastá-lo para a entrada escura.

- Hã? Para onde? - Beto resistia.

- Vamos outra vez para os escorregadores - sugeri.

Beto começou a protestar.

- Sem o Nei? Não podemos ir lá outra vez sem o Nei.

- Vamos procurar o Nei - eu disse, agarrando em seu braço e puxando-o para a porta.

- Quer dizer...

Finalmente, o meu irmão começava a entender.

Acenei afirmativamente.

- Sim. Vamos segui-los. Vamos no mesmo escorregador que ele escolheu.

- Escorregador número dez - murmurou Beto. E depois acrescentou solenemente: o Escorregador da Maldição.

- Pegamos esse escorregador e vamos nos encontrar com o Nei - eu disse.

Subimos a rampa em silêncio. O ruído dos nossos tênis ecoava no interior da grande montanha oca.

Passamos pelo letreiro que ficava na metade da subida. Li mais uma vez: AVISO! VOCÊ PODE ESCORREGAR PARA A SUA MALDIÇÃO!

"Nei, ainda estará escorregando?", pensei.

Abanei a cabeça para afastar o pensamento. É claro que ele não estava escorregando. Mas que idéia mais estúpida!

Os dois Horrores nos observavam das plataformas.

- Tenham cuidado com o escorregador que escolherem - avisou um deles.

- Sabemos qual é o escorregador que queremos - eu disse, sem fôlego. - Escorregador número dez. Vamos os dois. Juntos.

O Horror mais próximo de nós fez sinal para que nos sentássemos. Olhei para Beto, que estava atrás de mim, com o rosto tenso e cheio de medo.

Puxou-me para trás alguns passos.

- Talvez não devêssemos ir - murmurou.

- Por que não? - perguntei impaciente.

- E se o aviso for verdadeiro? - ele disse.

- Não seja bobo - respondi. - Isto é um parque de diversões. Não matam crianças aqui nem as mandam escorregar para sempre. É tudo brincadeira!

Beto engoliu a seco.

- Tem certeza?

- Claro que tenho certeza - respondi. - Agora, quer encontrar o Nei ou não?

Beto fez um sinal afirmativo.

- Então, vamos embora - eu disse.

Sentei-me no topo do escorregador número dez. Beto sentou-se atrás de mim, colocando as pernas abertas ao lado das minhas.

Senti o chão tremer por baixo de nós.

Começamos a escorregar.

- Nei, aqui vamos nós! - gritei.

 

Desta vez, não gritei. Cruzei as mãos sobre o colo e cerrei os dentes.

Não estava gostando desta decida. Só queria chegar ao fim. Queria resolver o mistério e encontrar Nei.

Enquanto escorregávamos juntos, Beto agarrou-se a mim, pondo as mãos em volta do meu corpo. Gritou quando passamos por uma grande lombada. Parecia que íamos sair voando.

Depois, gritamos os dois quando uma parte do escorregador desceu subitamente e começamos a cair.

Em seguida viramos abruptamente para a direita. Nessa altura, já estávamos gritando a plenos pulmões.

Escorregávamos cada vez mais depressa, na escuridão total. Tentei ver se nos movíamos ao lado de outros escorregadores. Mas estava tão escuro que nem conseguia ver meus próprios pés.

Beto agarrava-se em mim com tanta força que eu quase não conseguia respirar. Tentei dizer-lhe que não me apertasse tanto, mas ele gritava de tal forma que não ouvia nada.

Para baixo, para baixo.

Mais escuro, mais escuro.

Passamos por mais uma lombada que nos lançou no ar. Depois, o escorregador mergulhava e curvava velozmente para a esquerda.

Já devíamos estar chegando ao fim, pensei.

Estávamos escorregando há muito tempo.

Cerrei ainda mais os dentes e preparei-me para sair voando pela abertura e cair no chão.

Mas não surgiu nenhuma abertura.

O escorregador nunca mais chegava ao fim.

Começamos a escorregar mais depressa. O ar, quente e úmido, engasgava-me, por causa da alta velocidade em que seguíamos.

O escorregador afundava-se e curvava, levando-nos cada vez mais para a escuridão.

"Vamos ficar escorregando para sempre."

"O sinal de aviso não era brincadeira."

Tentei afastar aqueles pensamentos assustadores da cabeça.

De repente, Beto ficara muito calado.

- Tudo bem? - perguntei-lhe.

- Não sei - respondeu, apertando-me ainda mais. - Por que estamos escorregando há tanto tempo.

- Está me machucando! - gritei.

Ele me apertou com menos força.

- Não estou gostando disso! - ele gritou em meu ouvido.

Passamos por uma outra lombada. As mãos dele me soltaram.

Outra lombada. Ainda mais alta. Pensei que fosse voar do escorregador e cair no fundo - se é que existia fundo!

Para baixo, para baixo.

De repente Beto e eu gritamos de surpresa, com nojo de alguma coisa pegajosa que nos cobrira o rosto. Tentei arrancar aquilo com as duas mãos.

- Iarrc! - gritou Beto. - O que é isto?

- Parecem teias de aranha - gritei. - Teias de aranha quentes e pegajosas.

Senti um formigamento no rosto. As teias pegajosas me cobriram como se fosse uma rede. Puxei-as com força.

- Oh! - gritei quando o escorregador mergulhou novamente.

Consegui tirar a maior parte das teias de aranha do rosto. Mas ainda tinha aquela expressão horrível. Parecia que um milhão de formigas caminhava em meu rosto.

- Mas que nojo! - gritou Beto, atrás de mim.

Para baixo, para baixo, para a escuridão profunda.

E, depois, um clarão de luz brilhante fez-me fechar os olhos.

Seria a luz do dia? Estaríamos próximos da saída?

Não.

Forcei os olhos até que eles se abrissem e olhei para a luz amarela.

E então percebi que estava olhando para labaredas de fogo.

O escorregador à nossa frente estava em chamas!

As chamas amarelas e cor de laranja elevavam-se cobertas por uma cortina de fumaça negra.

Levei as mãos ao rosto e comecei a gritar.

Estávamos escorregando em direção às chamas!

- Vamos ser queimados! - gritava Beto.

- Socorro! Ajudem-nos!

 

Fechei os olhos e senti uma onda de calor, quase como uma explosão.

"Estou queimando!", pensei.

Uma corrente de ar fresco me fez abrir os olhos.

O fogo tinha ficado para trás. Tínhamos atravessado as chamas.

Curvando suavemente, escorregávamos agora através da escuridão fresca. Ainda conseguia ver as chamas avermelhadas refletidas nas paredes escuras acima de nós.

Beto e eu mantínhamo-nos em silêncio. Eu estava esperando que o meu coração parasse de dar pulos no peito.

- Grandes efeitos especiais! - gritou Beto. Soltou uma gargalhada louca, sinistra, como eu nunca tinha ouvido antes.

O fogo era falso, percebi então. Uma espécie de projeção, ou outro truque qualquer.

Respirei fundo. Nunca havia sentido tanto medo na vida.

- Mas quando é que isso acaba? - gritou Beto.

Sua voz estava agora estridente e assustada.

"Nunca", pensei, sombriamente. "Vamos escorregar para sempre."

E ao mesmo tempo que este pensamento perturbador atravessou minha mente, vimos a luz do dia entrar por uma abertura logo adiante.

Bump!

Aterrei violentamente sobre a grama macia.

Segundos depois, Beto aterrou atrás de mim.

Pisquei várias vezes até que os olhos se acostumassem à luz do sol.

Depois, levantei-me lentamente, ainda com o coração aos pulos.

À nossa frente estava um letreiro verde e amarelo fixado num poste de madeira. Dizia: BEM-VINDOS À MALDIÇÃO. POPULAÇÃO: 0 HUMANOS.

Ao lado do letreiro estava Nei. Aproximou-se, com um alegre sorriso em seu rosto redondo e cor-de-rosa.

- Olá, amigos! - disse ele. - Onde estiveram? - Deu uma palmada nas costas de Beto, que retribuiu com um leve murro no estômago.

- Onde nós estivemos? - perguntei. - Onde é que você esteve?

- Aqui - respondeu Nei. - Não sabia onde tinha vindo parar. Acho que aqui é o outro lado do parque. Por isso, fiquei esperando por vocês.

- Tivemos de voltar ao Escorregador da Maldição - explicou Beto. - Escolhemos o mesmo escorregador que você. Número dez. Mas que descida! Foi mesmo demais!

Há alguns minutos, Beto havia gritado de terror. Agora ali estava ele, fingindo que tinha gostado, dizendo ao Nei como aquilo era ótimo!

- Escolheu o melhor escorregador! - disse Beto ao Nei. - Uau! Foi excelente!

- Fiquei um pouco assustado - confessou Nei. - Quero dizer, o fogo...

- Grandes efeitos especiais! - exclamou meu irmão. - Este parque é espantoso!

Beto era mesmo um mentiroso. Não havia maneira de admitir que tinha estado preocupado com Nei. E nunca iria concordar com o fato de que o percurso do Escorregador da Maldição era apavorante.

Mas fiquei contente em vê-lo entusiasmado.

- O escorregador é um bocado longo - disse Nei, fazendo uma careta. - Longo demais, acho eu.

- Gostaria de andar outra vez! - disse Beto.

Olhei à minha volta. Estávamos definitivamente noutra zona do Parque do Terror. Nada parecia familiar.

Do outro lado da rua, viam-se crianças em roupas de banho que desciam por um caminho de areia. Um letreiro dizia: RÁPIDOS DO HORROR.

À nossa direita, um prédio quadrado construído em vidro refletia a luz do sol. As paredes brilhavam como se estivessem ardendo. Piscando os olhos por causa da luz, mal conseguia ler o letreiro junto à entrada, que dizia: CASA DOS ESPELHOS.

- Vamos experimentar a Casa dos Espelhos! - disse Beto, puxando Nei pelo braço.

- Espere um pouco! - eu disse. - Não acha que devemos procurar papai e mamãe?

- Eles estão do outro lado do parque - respondeu Beto, puxando Nei atrás de si. - Vamos nos divertir primeiro, depois vamos procurá-los.

- Eles devem estar preocupados. - exclamei, aflita.

- O parque não tem muita gente. Eles irão nos encontrar - respondeu Beto. - Vamos lá, Isa! Parece ser divertido!

Hesitei, pensando em nossos pais. Fiquei olhando para a luz branca que o edifício de espelhos refletia.

De repente, senti que alguém batia em meu ombro.

Assustada, soltei um grito.

Era um Horror vestido com uma roupa verde. Seus grandes olhos amarelos me fitavam enquanto ele se inclinava sobre mim.

- Vá embora enquanto pode! - ele murmurou.

Olhou rapidamente a sua volta, como se quisesse ter certeza de que ninguém o observava.

- Por favor, estou falando sério. Vá embora enquanto é tempo!

 

Fiquei tão surpresa que não disse nada. Apenas olhei para ele enquanto se afastava rapidamente, enfiado em sua roupa de Horror, arrastando a cauda púrpura atrás dele.

- O que ele queria? - perguntou Nei. Ele e Beto estavam quase na entrada da Casa dos Espelhos.

- Ele disse que devíamos ir embora o quanto antes - gaguejei, correndo para perto deles. Por um momento perdi-os de vista por causa da luz incandescente refletida pelas paredes de vidro.

Beto riu.

- Estes Horrores são o máximo! - afirmou. - Fazem tudo para nos assustar neste parque!

Por trás dos óculos, os olhos de Nei semicerraram-se pensativamente.

- Ele estava brincando, não estava? - perguntou, calmamente. - Quero dizer, tudo não passa de uma brincadeira, certo?

- Não sei - respondi. - Acho que não. - Olhei para o Horror que desaparecia rapidamente por trás de um edifício azul, alto e em forma de pirâmide.

- É o trabalho dele - insistiu Beto. - Passa o dia assustando as pessoas.

- Talvez ele estivesse nos avisando sobre algo - murmurou Nei, olhando para mim.

- Nem pensar! - afirmou Beto, dando uma palmada forte nas costas de Nei. - Para de pensar em coisas tristes. Este parque é maravilhoso! Gosta de ser assustado, não gosta?

Nei continuava com uma expressão preocupada.

- Acho que sim - respondeu, hesitante.

Comecei a dizer a Nei que tinha certeza de que tudo não passava de uma brincadeira, quando Beto me interrompeu.

- Depressa! Vamos ver a Casa dos Espelhos. Vamos nos divertir um pouco antes de ir embora!

Arrastou Nei para a entrada, e eu os segui. Passamos por outro letreiro que dizia PROIBIDO BELISCAR quando nos dirigíamos para o edifício de vidro brilhante.

Junto à entrada, parei para ler o aviso verde e amarelo: CASA DOS ESPELHOS, É POSSÍVEL QUE NUNCA MAIS NINGUÉM O VEJA!

- Ei, esperem aí! - eu disse aos rapazes. Mas eles já tinham entrado.

Segui-os por um túnel escuro e estreito. Os meus olhos ainda estavam habituados à luz que brilhava lá fora. Não conseguia ver nada.

- Beto, Nei! Esperem por mim! - gritei. - Minha voz ecoou através do túnel baixo. Ouvia-os rindo mais à frente.

Comecei a andar às cegas, abaixando a cabeça, porque o teto era muito baixo. Finalmente, os meus olhos habituaram-se à escuridão.

O túnel acabou, e eu encontrava-me num corredor estreito com paredes e teto espelhados.

- Oh! - soltei um pequeno grito. Conseguia ver minha própria imagem refletida dezenas de vezes.

Parei por um momento e arrumei a minha longa trança preta. Estava sempre se soltando. Depois chamei outra vez os rapazes.

- Onde estão? Esperem por mim!

Consegui ouvi-los à minha frente.

- Tente nos encontrar! - disse Beto. Mais risadas.

Atravessei rapidamente o corredor espelhado. Ele seguia curvando-se para a direita e depois para a esquerda. Minhas imagens refletidas seguiam-me, multiplicando-se nos espelhos até o infinito.

- Ei, não se afastem muito! - gritei.

Ouvi novas risadas. Depois, ouvi som de passos que pareciam vir do outro extremo da parede espelhada.

Segui pelo corredor, andando devagar, cuidadosamente, até que vi uma estreita abertura à minha frente.

- Esperem aí. Vou passar para esse lado! - avisei.

Comecei a passar pela abertura, e - Tum! - bati com a cabeça no vidro.

- Aiii! - gritei à medida que se alastrava em direção ao pescoço, e depois descia pela coluna abaixo.

Apoiei-me no espelho até recuperar o equilíbrio.

- Isa, onde você está? Tente nos encontrar! - ouvi Beto dizer.

- Bati com a cabeça! - gritei, esfregando a testa.

Ouvi Beto e Nei rirem. Suas vozes pareciam vir de algum lugar atrás de mim. Voltei-me, mas só vi espelhos. Nenhuma abertura.

A minha cabeça ainda doía um pouco, mas a tontura já tinha desaparecido. Comecei a andar novamente, com mais cuidado desta vez.

Dobrei uma esquina e entrei em outra sala. Para minha surpresa, o chão desta sala era um espelho. As paredes, o chão, o teto - tudo era feito de espelhos.

Dei alguns passos, cuidadosamente. Era estranho andar sobre a minha própria imagem.

Conseguia ver a parte de cima e as solas dos meus tênis enquanto caminhava. Era muito difícil andar. Tinha a sensação de que ia cair em cima de mim mesma!

- Ei, rapazes! Onde estão? - chamei.

Nenhuma resposta.

Senti uma forte sensação de medo. Uma pressão no estômago.

- Beto? Nei? Estão aí? - Vi as bocas das minhas imagens refletidas movimentando-se enquanto os chamava. Eram dúzias de bocas. Mas só uma voz se ouvia, a minha, fraca e estridente.

- Beto? Nei?

Silêncio.

- Não brinquem comigo! - gritei. - Onde vocês estão?

Silêncio. Nenhuma resposta.

Olhei para as dúzias de reflexos que me rodeavam. Pareciam todos muito assustados.

Para onde teriam ido?

 

Olhei para os meus reflexos, enquanto horríveis pensamentos me ocorriam.

Será que os rapazes tinham realmente desaparecido?

Será que tinham caído em alguma armadilha? Estariam perdidos no labirinto de espelhos e vidros.

O Parque do Terror era muito assustador, pensei. Era divertido ser assustado. Mas era difícil dizer quando os sustos eram divertidos - ou quando eram pra valer. Haveria perigo naquele lugar? Ou seria apenas uma grande brincadeira de arrepiar?

- Beto? Nei? - chamei com a voz trêmula, olhando em toda a volta, procurando uma saída.

Silêncio.

Depois, ouvi uma risada abafada.

Depois, ouvi murmúrios. Perto.

Outra risada, mais alto desta vez. Uma risada do Beto.

Estavam querendo me assustar.

- Ei, não tem graça alguma! - gritei, zangada. - Falo sério! Isso não tem graça!

Ouvi-os desatar às gargalhadas.

- Tente nos encontrar, Isa! - chamou Beto.

- Por que demora tanto? - acrescentou Nei.

Mais risadas. Pareciam vir dali de perto.

Segui para o lado direito. Tive de abaixar a cabeça para passar por uma estreita abertura entre os espelhos.

Encontrei-me noutra sala pequena. Os espelhos estavam dispostos em ângulos estranhos, de modo que os meus reflexos pareciam bater uns nos outros cada vez que eu me movia.

- Onde estão? Estou chegando perto? - perguntei.

A luz enfraquecia à medida que eu entrava na sala. Os meus reflexos escureceram. As sombras ficaram mais longas.

- Não conseguimos ver você! - disse Nei.

- Rápido! - gritou Beto, impaciente.

- Estou andando o mais rápido que posso! - gritei. - Não saiam do lugar em que estão, está bem? Fiquem no mesmo lugar.

- Estamos parados! - disse Beto.

- Como é que vamos sair daqui? - ouvi Nei perguntar em voz baixa.

- Aii! - Bati outra vez com a cabeça numa saliência de vidro.

Aquilo não tinha graça. Estava ficando chato.

- Ande rápido! - dizia Beto, muito perto. - É aborrecido ficar aqui esperando!

- Num minuto - murmurei, esfregando a cabeça.

Dobrei uma esquina e entrei numa sala maior. Não tinha espelhos. As paredes eram todas de vidro. Parei e fiquei olhando à minha volta - e lá estava Beto.

- Finalmente! - ele gritou. - Por que não conseguia nos encontrar?

- Vamos embora daqui. - respondi. Onde está Nei?

- Hã? - A boca de Beto abriu-se de surpresa. Olhou em volta, à procura do amigo. - Estava aqui mesmo ao meu lado - exclamou.

- Beto, não estou com paciência para mais brincadeiras idiotas - eu disse, muito séria. - Nei, onde você se escondeu?

- Não estou escondido. Estou aqui - respondeu Nei.

Aproximei-me alguns passos do meu irmão e vi Nei. Estava rodeado de sombras escuras por trás de uma parede de vidro, com as mãos pressionadas contra a parede.

- Como é que foi parar aí? - perguntou-lhe Beto, espantado.

Nei encolheu os ombros.

- Não consigo encontrar nenhuma saída.

Dei mais alguns passos e depois parei. De repente, percebi que Nei estava atrás de uma parede de vidro. Beto e eu estávamos numa sala diferente.

- Onde é a entrada? - perguntei-lhe.

Beto olhou em volta.

- O que quer dizer, Isa?

- Nós não estamos na mesma sala - respondi. Dirigi-me à parede de vidro e bati com a mão.

- Hã? - A cara de Beto encheu-se de espanto. Aproximou-se também. Depois, foi ele quem bateu na parede de vidro, para ter certeza de que ela realmente existia.

- Como esta parede veio parar aqui? - murmurou.

Nei começou a andar em volta da sala, fazendo deslizar as mãos nas paredes de vidro, procurando uma abertura.

- Fique aí - disse ao Beto. - Vou procurar uma entrada.

Segui o exemplo de Nei. Movi-me lentamente pela sala, mantendo sempre uma das mãos na superfície de vidro. A luz era fraca. Minha sombra repetia os movimentos à medida que me deslocava. Podia ver meu rosto refletido no vidro. Meus olhos devolviam-me o olhar, sombrio e desesperado.

Antes que eu percebesse, fiz um círculo completo.

Voltara ao ponto de partida. E não existia nenhuma abertura. Nenhuma passagem.

Nenhuma saída.

- Ei! Estou preso aqui dentro! - disse Nei, com voz estridente.

- Eu também - respondi-lhe.

- Tem que existir uma abertura - disse Beto. - Como é que entramos?

- Tem razão - respondi nervosamente. - Devíamos sair pelo mesmo lugar por onde entramos. - Comecei a procurar outra vez nas paredes, movendo-me rapidamente.

O meu coração começou a bater muito depressa. Tinha uma sensação inquieta no peito. Como havíamos entrado ali? Tinha de existir uma saída.

Beto batia no vidro com força. Na outra sala, pude ver que Nei empurrava as paredes á medida que se movia.

Dei mais duas voltas e depois parei.

- Es-estou presa - gaguejei. - É como uma caixa. Uma caixa de vidro.

- Estamos todos presos! - gritou Nei.

Beto continuava batendo nervosamente nas paredes de vidros.

- Beto, pare - gritei. - Isso não ajuda em nada!

Ele baixou os braços.

- Isto é ridículo - ele murmurou. - Temos que sair daqui de alguma maneira.

- Talvez haja um alçapão, ou coisa assim. - sugeri. Comecei a observar pelo chão espelhado. Apesar da pouca luminosidade ele não parecia ter nenhuma abertura.

Voltei para a parede de vidro.

- Isto não tem graça alguma - repeti, tristemente.

Beto e Nei concordaram. Podia perceber que estavam realmente assustados. Eu também estava. Mas como era mais velha do que eles, decidi ser a mais corajosa.

Contudo, não me sentia confiante. Encostei-me na parede que me separava de Beto.

E, quando me encostei, a parede começou a se mover.

Dei um salto para trás e gritei.

Tive a impressão de que as paredes de espelho se aproximavam de mim.

Dei outro passo para trás.

Olhando, nervosa, em toda a volta, vi que as paredes realmente se moviam.

- Beto! - gritei. Voltei-me e vi que ele também recuava.

- As paredes! - gritou Nei. - Ajudem-me!

- Também estão deslizando para cima de mim! - gritou Beto.

Estávamos aprisionados.

Com uma expressão de desespero, atirei-me contra uma parede e tentei empurrá-la para trás.

Mas não conseguia detê-la.

Elas se aproximavam, e a sala ficava cada vez menor.

- Vamos ser esmagados! - gritei, apavorada.

 

- Por favor! Faça qualquer coisa! - gritava Nei.

Beto encostava o ombro no vidro tentando deter as paredes. Mas não tinha força suficiente. Elas continuavam a aproximar-se dele.

Dei alguns passos para trás, com as mãos erguidas, como escudos.

Não havia nenhum refúgio.

- Façam alguma coisa! Alguém faça alguma coisa! - Os gritos aterrorizados de Nei ecoavam nos meus ouvidos.

- O vidro está me esmagando! - gritou Beto.

- Isa!

- Não posso me mexer! - gritei.

As paredes de vidro começaram a me apertar por todos os lados. De repente, lembrei-me daqueles carros que são esmagados naquelas grandes máquinas de sucatas até se reduzirem a um quadrado perfeito.

Todo o meu corpo tremeu quando percebi que eu também ia ser esmagada até ficar com a forma de um quadrado perfeito.

- Ai! - gritei, enquanto o vidro ia me apertando cada vez mais. - Socorro! - tentei gritar mais alto, mas da minha garganta saiu apenas um fio de voz.

Começava a ser difícil respirar.

As paredes aproximavam-se. Mais apertadas. Cada vez mais apertadas.

Eu lutava por um pouco de ar.

Reuni todas as minhas forças para empurrar o vidro mais uma vez.

Mas não adiantou.

Eu ia ser esmagada até ficar um quadrado humano.

 

Já não conseguia ouvir Beto ou Nei.

Só podia ouvir a minha própria respiração ofegante.

Fechei os olhos.

Senti o chão ceder.

E antes de perceber o que se passava, estava caindo rapidamente.

Abri os olhos a tempo de ver as paredes de vidro unirem-se completamente lá em cima, enquanto eu deslizava para baixo, através de uma abertura.

E, poucos segundos mais tarde, estava outra vez ao ar livre. Aterrei sentada num monte de grama.

Beto e Nei deslizaram ao meu lado.

Durante muito tempo ficamos ali, sentados na grama, olhando uns para os outros, espantados.

- Estamos bem - disse Nei, um pouco hesitante, quebrando finalmente o silêncio. Levantou-se lentamente. Tinha o rosto redondo muito vermelho, e os óculos tortos sobre o nariz. - Estamos bem!

Beto soltou uma gargalhada de felicidade. Levantou-se e começou a dar pulos de alegria.

Eu não queria exatamente dar pulos de alegria. Ainda estava pensando no carro esmagado.

Beto abaixou-se, agarrou-me nas duas mãos e me puxou até que fiquei de pé.

- Que vamos fazer agora? - perguntou, sorrindo.

- Hã? Agora? - gritei. - Está falando sério?

- Aquilo foi mesmo assustador - disse Nei, com o rosto ainda vermelho. - Pensei que íamos ser completamente esmagados.

- Foi espantoso! - afirmou Beto.

Mais uma vez, ele parecia se esquecer de que apenas alguns segundos antes havia gritado, completamente em pânico.

- Era assustador demais - murmurou Nei, abanando a cabeça.

- Tem razão - concordei. - Foi muito assustador para ser piada. Mais um segundo e...

- Não estão percebendo? A idéia é precisamente essa! - gritou Beto. - É assim que eles assustam as pessoas neste parque. É maravilhoso! Fazem-nos pensar que vamos desta para melhor. Mas tudo é perfeitamente cronometrado. Eles querem que ficamos petrificados de medo e depois - puf! - deixam tudo bem!

- Talvez tenha razão - disse Nei, ainda desconfiado. Ajeitou os óculos e depois coçou o queixo.

- Não vamos ficar chateados nem nada - continuou Beto. - Isto é um parque de diversões, lembram-se? Eles querem que voltemos mais vezes. Por isso não vão machucar as pessoas.

- Talvez - disse Nei.

- Mas Beto, e se eles fizerem alguma coisa errada? - perguntei. - E se as máquinas quebrarem? E se elas errarem na contagem do tempo? Imagine se o chão das salas de vidro não abrisse. O que aconteceria?

Ele não respondeu. Ficou olhando para mim pensativamente.

- O que nos teria acontecido se o chão não se abrisse naquele momento? - perguntei-lhe novamente.

Beto encolheu os ombros.

- Eles certificam-se de que todas as máquinas estejam funcionando bem - respondeu Beto, finalmente.

Fiz uma careta.

- É possível morrer de susto? - perguntou Nei, com uma expressão muito séria. - Quero dizer, sei que acontece nos livros e nos filmes. Mas isso pode acontecer na vida real?

- Não sei. Talvez - respondi.

- Aposto que algumas pessoas morreriam de susto naquela Casa dos Espelhos - continuou Nei, muito sério.

- Nem pensar! - insistiu Beto. - Ouça o que eu digo. Este é um lugar para as pessoas se divertirem. Para se divertirem com sustos.

Beto olhava por cima do meu ombro, para alguma coisa que estava além de mim. Voltei-me e vi um dos empregados vestidos de Horror, que levava um grande número de balões pretos.

Beto foi ao encontro dele.

- Ei, alguém já morreu neste parque? - perguntou Beto.

O Horror continuou a andar. Os balões pretos balançavam por cima da sua cabeça.

- Só uma vez - respondeu o Horror.

- Já morreu uma pessoa? - perguntou Beto, espantado.

O Horror abanou a grande cabeça verde.

- Não. Não foi isso o que eu quis dizer.

- Então, o que quis dizer?

- Aqui as pessoas só morrem uma vez - disse o Horror. - Ninguém ainda morreu duas vezes.

- Quer dizer que aqui já morreram pessoas?

Mas o Horror começou a caminhar mais depressa, com os balões batendo uns nos outros, flutuando contra o céu azul.

A resposta do Horror deixou-me arrepiada. Não eram só as palavras que tinha utilizado. Era qualquer coisa no tom de sua voz, qualquer coisa que soava muito como um aviso.

- Ele estava brincando, não estava? - perguntou Nei, com a voz tremendo. Coçou nervosamente a cabeça.

- Sim. Acho que sim - respondi.

Passou por nós uma família que se dirigia à Casa dos Espelhos. Os dois filhos, de cinco ou seis anos, choravam.

- Já vi tantas crianças chorando neste parque! - comentei.

- São uns bobocas - respondeu Beto. - Uns medrosos. Vamos procurar outra diversão.

- Não. Agora temos que procurar papai e mamãe - eu disse.

- Sim, vamos procurá-los - disse Nei, ansiosamente.

Pobre rapaz. Acho que estava mesmo aterrorizado. Mas fazia o possível para disfarçar.

- Ei, qual é a pressa? - protestou Beto. - Eles que nos procurem.

- Mas eles devem estar muito preocupados - insisti. Comecei a caminhar para o portão da entrada.

- Papai vai nos obrigar a ir embora - resmungou Beto. Mas seguiu-me. E Nei veio também, de boa vontade, caminhando perto de mim.

Seguindo em frente, passamos por uma velha montanha-russa feita de madeira. Tinha a altura de um prédio de quatro andares, lançando uma grande sombra escura sobre o caminho. Uma placa, junto à entrada, dizia: FORA DE SERVIÇO. QUER DAR UMA VOLTA, MESMO ASSIM?

O portão estava aberto. Não havia nenhum empregado.

- Ei, Isa, vamos andar nisto? - perguntou Beto, olhando para os velhos carros estacionados, junto às pistas.

- Nem pensar! - respondemos eu e Nei juntos. Continuamos a andar.

O caminho seguia por baixo de umas árvores espessas, e de repente ficamos à sombra. Um letreiro avisava: CUIDADO COM AS ÁRVORES-COBRA.

Nei cobriu a cabeça com as mãos. Todos erguemos os olhos para as árvores.

Será que existiam mesmo cobras ali?

Estava muito escuro para se conseguir ver alguma coisa. As folhas eram tão densas que não deixavam passar luz alguma.

De repente, ouvi um silvo suave.

A princípio, pensei que fossem apenas algumas folhas secas.

Mas depois o silvo tornou-se mais forte - até que todas as árvores pareciam silvar.

- Corram! - gritei.

Desatamos a correr pelo caminho, com a cabeça baixa. O silvo das árvores era cada vez mais forte.

Pensei ver uma grande serpente negra deslizando na grama à beira do caminho. Mas podia ter sido apenas uma sombra.

Continuamos a correr mesmo depois de termos deixado as árvores para trás e de já estarmos de novo à luz do sol. Depois, o caminho seguia passando perto de um conjunto de estátuas de aspecto maligno. Eram de pedra. Representavam monstros, com olhos semicerrados e ameaçadores, com grandes dentes saindo das bocas torcidas. Tinham os braços esticados, como se estivessem à nossa espera.

Ao passar por ali fiquei observando as horríveis estátuas. Subitamente, ouvi uma risada baixa. Era sinistra e assustadora.

- Este som vem das estátuas! - exclamou Nei. - Continuem a correr!

Teriam as estátuas se movido para nos apanhar? Teriam levantado os braços? Estavam tentando nos atrair até elas?

Não tenho certeza. Com o seu riso malévolo ainda nos meus ouvidos, baixei a cabeça e corri o mais depressa que pude.

Estávamos ofegantes. Não se viam quaisquer outras pessoas. Também não se via ninguém vestido de Horror.

Abrandamos o passo quando chegamos perto de outra tabuleta. Esta tinha uma seta que apontava na direção em que seguíamos. Dizia: SAÍDA PRINCIPAL. NÃO SE PREOCUPE, NUNCA CONSEGUIRÁ ESCAPAR.

Reparei na expressão preocupada de Nei, depois de ler a tabuleta.

- É só uma brincadeira - eu lhe disse. - Até os avisos têm piada.

- Ah! Ah! - disse Nei, fingindo que ria. Estava ofegante e tentava controlar a respiração.

Sem aviso, Beto saltou para os ombros de Nei.

- Ei, que tal procurarmos mais uma diversão?

Nei gritou, zangado.

- Sai de cima de mim!

Beto riu e continuou pendurado em Nei. Este caiu de joelhos, tentando tirar Beto de cima dele.

- Beto, deixe de bobagens. Estamos tentando encontrar papai.

Mas os dois estavam rindo e fingindo que lutavam.

- Chega, rapazes - gritei. - Vamos embora!

Os óculos de Nei tinham caído. Ele apanhou-os do chão. Em seguida, continuamos o nosso caminho.

A trilha conduziu a um jardim retangular, com flores - flores negras! Depois levava a um grande celeiro vermelho.

Os rapazes dirigiram-se à porta que estava aberta. Fiquei para trás, à procura de um caminho que rodeasse o celeiro. Não encontrei nenhum.

- O caminho atravessa o celeiro até o outro lado. Vamos, Isa! - ele disse, fazendo-me sinal para que o seguisse.

Reparei num pequeno letreiro à direita das portas duplas do celeiro: CELEIRO DOS MORCEGOS.

- Ei, será que há morcegos ali dentro? - perguntei, sentindo um arrepio nas costas. Gosto da maior parte dos animais. Mas os morcegos me dão nojo.

Beto entrou no celeiro. Nei ficou perto da porta.

- Não vejo morcego nenhum - disse Beto. - Está muito escuro.

Um estranho cheiro invadiu minhas narinas. Era forte e acre. Vinha do celeiro.

Eu não queria entrar ali.

- Vamos, Isa! - disse Beto. - O caminho vai dar no outro lado. Não seja medrosa. Pode correr até o outro lado.

Aproximei-me de Nei e fiquei junto á porta, olhando lá para dentro.

- Parece tudo normal - disse Nei, calmamente.

O cheiro acre era agora muito mais forte.

- Eca! - eu disse, com uma careta. - Cheira mesmo mal.

Beto estava dentro do celeiro, olhando para as vigas.

- Não vejo nada lá em cima - anunciou ele.

As portas do outro lado estavam abertas de par em par. Demoraríamos dez segundos para correr até o outro lado do celeiro, pensei.

- Vamos lá - disse Nei.

Entramos os dois. O cheiro agora era insuportável. Retive a respiração e tapei o nariz com a mão.

Começamos a correr para as portas do outro lado - quando estas se fecharam!

Olhei surpresa para as portas por onde tínhamos entrado - que também se fecharam!

- Ei! - gritei, furiosa.

- O que é isso? - murmurou Nei.

Estávamos na escuridão total.

O cheiro invadia meu nariz. Comecei a me sentir enjoada.

Em seguida, ouvi batidas de asas. Suavemente, no princípio, e depois mais alto, mais perto.

Gritei quando senti uma coisa roçar meu pescoço.

 

- Deixem-me em paz! - exclamei, horrorizada, enquanto agitava as mãos por cima da cabeça.

O barulho de asas recuou, voltando logo em seguida.

- Morcegos! - gritou Nei, numa voz aterrorizada, agarrando-se ao meu braço.

- Não vejo nada! - gritou Beto. - Está muito escuro!

- Eu-eu odeio morcegos! - gaguejei.

Senti um calafrio quando outro morcego voou por cima da minha cabeça.

Agitei novamente os braços.

À medida que meus olhos se habituavam lentamente à escuridão, comecei a ver formas sombrias que passavam rapidamente por mim. Para trás e para frente. Cada vez mais depressa.

Senti que algo roçava meu ombro.

- Oh, socorro! - gritei.

Nei desatou a gritar.

- Alguém nos ajude!

- Estão se aproximando! - exclamou Beto, horrorizado.

Algo esbarrou em mim. Gritei.

- Socorro! Alguém nos ajude! - Nei continuava a gritar a plenos pulmões. Seus gritos eram abafados pelo bater das asas dos morcegos.

Cobrindo o rosto, tentei às cegas chegar à porta.

O cheiro acre e intenso quase me sufocava. Minhas pernas tremiam tanto que eu mal conseguia andar.

Então, senti um forte puxão no cabelo. E outro puxão, um bater de asas próximo ao meu ouvido.

Um guincho agudo e arrepiante. Tão perto, que podia ter sido meu.

Gritei. E gritei outra vez.

- Es-está preso no meu cabelo! - gritei, caindo de joelhos.

Mais um guincho. Mais um puxão no cabelo.

Agitei os braços e acertei o morcego. Senti seu corpo quente e as asas que se moviam rápidas.

Dei-lhe um forte empurrão e consegui afastá-lo.

- Ohhh, socorro! - gritei.

O barulho de asas e os guinchos estavam por todo lado. Ouvi Beto e Nei gritando. Mas pareciam estar longe, muito longe.

Outro morcego roçou meu rosto.

As sombras moviam-se para frente e para trás. O celeiro estava repleto de morcegos!

- Ohh! Por favor, ajudem-nos!

Mas não havia ninguém para nos ajudar.

 

Cobri os olhos com uma das mãos e agitei a outra freneticamente, tentando afastar os morcegos.

Eu soluçava, mal conseguia respirar. Na verdade quase sufocava.

Ouvi Beto me chamar longe, muito longe. Ele parecia estar distante.

E então, subitamente, a luz invadiu o celeiro.

Ainda de joelhos, tirei a mão dos olhos e vi que a porta estava aberta.

Beto, bem próximo, com a boca aberta de susto, virou-se para mim e para Nei.

- Eu-eu toquei na porta e ela se abriu - explicou.

Nei tinha os óculos pendurados numa orelha. Seu cabelo estava completamente despenteado.

- Onde estão os morcegos? - perguntou.

Levantei os olhos para as vigas.

- Ei! - gritei. Não havia morcegos. Não havia sinal de morcegos em lugar algum.

Fiquei em pé e arrumei o cabelo.

- Vamos embora daqui! - gritei.

Eu e Nei seguimos Beto para fora do celeiro.

- Detesto morcegos! Detesto mesmo! - exclamei com um arrepio.

- Mas lá não havia morcegos - disse Beto, rindo. - Era tudo um truque.

- Hã? Não era nada! - disse Nei, muito zangado. - Eram morcegos. Tenho certeza!

- Eram efeitos especiais - afirmou Beto.

- Não foi nenhum efeito especial que ficou preso no meu cabelo! - gritei. Só de pensar naquilo, ficava toda arrepiada.

- Efeitos especiais - repetiu Beto. - Efeitos especiais muito bem-feitos. Quase fiquei assustado.

- Quase? - gritei. Aproximei-me dele, agarrei-o e fingi torcer seu pescoço. - Quase? Você não parava de gritar, Beto!

Ele libertou-se, rindo.

- Sabia que aquilo não era pra valer. Só gritei assim para assustar vocês!

Mas que mentiroso! Nem acreditava no meu irmão. Ele se assustara. Muito. Eu sabia disso!

- Eram morcegos e não efeitos especiais - insisti, furiosa.

- Então, onde eles se meteram quando a porta se abriu? - perguntou Beto.

- Vamos falar de outra coisa - pediu Nei. - Que tal procurar seus pais?

- Isso mesmo - concordei, olhando para Beto. - Você é mesmo louco, sabia? - disse.

Ele me mostrou a língua.

Só me restava partir para a briga. Mas tento ser uma pessoa pacífica. Por isso, limitei-me a dar-lhe um murro no olho.

Ele protestou.

- Você é muito boba, Isa. - murmurou. - E tem medo de morcegos de faz-de-conta!

Ignorei-o e dirigi-me ao caminho que conduzia ao portão principal. Apareceram dois Horrores, caminhando na direção contrária, conversando animadamente.

- Este é o caminho para o portão principal? - perguntei.

Não deram resposta e continuaram andando.

- Ei! - gritei-lhes.

Mas eles continuaram caminhando, sem me dar atenção.

O sol brilhava sobre nós. O ar tornara-se quente, sem qualquer brisa.

Limpei o suor da testa com a mão. Ainda sentia o cheiro do Celeiro dos Morcegos. Ele estava em minhas mãos, na minha roupa.

Vi quatro adolescentes correndo sobre o gramado na direção de um grande lago. Havia um cartaz junto à margem. Nele podia se ler: LAGO DOS JACARÉS. NADE AQUI À VONTADE.

Beto deu uma gargalhada.

- Esses caras são doidos!

Paramos e ficamos olhando enquanto eles entravam pra água.

- Acha que existem mesmo jacarés naquele lago? - perguntou Nei, mordendo o lábio inferior.

Encolhi os ombros.

- Quem sabe? Já nem sei o que pensar deste parque!

 

Continuamos o nosso caminho. Minutos mais tarde, reconheci a montanha do Escorregador da Maldição. Depois, vi a grande praça circular. Estava praticamente deserta. Até mesmo o Horror que vendia sorvetes tinha abandonado o carrinho.

- Onde estarão nossos pais? - perguntei.

- Devem estar à nossa procura há horas e agora ficarão furiosos - disse Beto, fazendo uma careta.

- Onde eles estão? - gritou Nei. Parecia muito preocupado. - Temos de encontrá-los.

- Não são aqueles ali? - perguntou Beto. Apontava para um homem e uma mulher sentados à sombra de uma grande fonte de pedra.

Protegi os olhos da luz do sol para enxergar melhor. A mulher era alta e morena. O homem era baixo e louro.

- Sim! São eles! - gritei, alegremente. Comecei a correr para a fonte, chamando: - Mãe! Pai!

Os outros me seguiram correndo.

- Mão! Pai! - gritei, outra vez.

Voltaram-se ambos, com uma expressão de surpresa.

- Oh! - exclamei, quando vi que não eram eles. Parei de repente e Beto esbarrou em mim.

- Desculpem - eu disse ao confuso casal. - Pensei que fossem outras pessoas.

Atravessamos a praça rapidamente. Conseguia ouvir os uivos que vinham da Aldeia dos Lobisomens. O carrinho de sorvetes estava abandonado junto à entrada do Escorregador da Maldição.

- Onde eles se meteram? - perguntou Nei, resmungando. - Estou começando a ficar com fome.

- Sim. Já passa da hora do almoço - concordei.

- Podem estar em qualquer lugar - disse Beto, tristemente, dando um pontapé numa pedra. - Podem estar em qualquer lugar deste parque enorme.

Suspirei, desanimada.

- Vamos andar pela sombra. O sol já está muito quente.

 

Dirigimo-nos para a sombra do Escorregador da Maldição. De repente, vimos dois Horrores vestidos de verde.

Sem pensar, corri até eles.

- Viram os meus pais? - perguntei, ofegante.

Olharam para mim surpresos.

- Seus pais? - repetiu um deles.

- Sim - acenei afirmativamente. - A minha mãe tem cabelo preto. O meu pai é baixinho e louro.

- Hmmmm... - os dois Horrores entreolharam-se.

- A minha mãe está com um vestido amarelo.

- E o meu pai, com um boné azul e branco. - acrescentou Beto.

- Oh sim. Claro - disse um dos Horrores.

- Vocês os viram? - perguntei, ansiosa.

Eles acenaram afirmativamente.

- Sim. Lembro-me perfeitamente. Eles foram embora há cerca de meia-hora.

- Hã? - exclamei, sem querer acreditar.

- Pediram que eu transmitisse uma mensagem a vocês. - disse o Horror.

- Que mensagem?

- Adeus - ele respondeu, com um medonho sorriso.

 

- Estão enganados! - gritei. - Eles não iriam embora.

- Partiram há cerca de meia hora - repetiu o Horror, encolhendo os ombros. - Eu estava no portão quando eles saíram.

- Mas-mas... - gaguejei.

Os dois Horrores voltaram-se e começaram a andar em direção a uma pequena cabana branca na extremidade da praça.

- Ei, esperem! - chamei, correndo atrás deles. - Vocês estão enganados. Os nossos pais não partiriam sem nós.

Entraram na cabana. Bateram a porta.

Virei-me para Beto e para Nei. Estavam sem nenhuma expressão nos rostos.

- Ele está enganado - afirmei. - Mamãe e papai ainda estão aqui. Tenho certeza.

- Então por que eles disseram... - começou Nei, mas ficou sem voz. Via-se que estava muito preocupado e assustado. O suor escorria-lhe pela testa.

Beto tentou gracejar.

- Isso quer dizer que temos todo o parque para nós! - exclamou, forçando um sorriso.

- Muito engraçadinho - eu disse, sarcasticamente. - Estamos sem dinheiro e bem distantes de casa.

- Podemos telefonar a alguém - sugeriu Beto.

- Não há telefones por aqui - murmurou Nei. Abaixou a cabeça, enfiou as mãos nos bolsos e afastou-se de nós.

- É verdade - lembrou-se Beto. - Disseram a papai que não havia telefones no parque.

- Isso é uma bobeira - eu disse, acaloradamente. - São uns mentirosos. Os Horrores são todos mentirosos.

- Estão só fazendo o trabalho deles - disse Beto. - Dizem estas mentiras só para nos assustar. É por isso que o parque se chama Parque do Terror.

- Devia chamar-se Parque dos Idiotas - murmurou Nei, amargamente.

- Mas aqui é bem legal! - protestou Beto. - Eu adoro ser assustado até ficar aterrorizado. Você não gosta? - Deu um empurrão em Nei.

- Não - disse Nei, calmamente.

- Bem, eles estavam mentindo sobre nossos pais - insisti, olhando para a cabana branca. - Estavam apenas tentando nos meter medo. Papai e mamãe ainda estão por aqui. Temos de encontrá-los.

- Então, vamos procurar por aí. - disse Beto. - Estou ficando com fome.

 

Vagueamos pelo parque durante duas horas, ou assim nos pareceu. Procuramos em grandes bosques misteriosos e em estranhas vilas de monstros. Passamos por uma zona de carrosséis com muitas diversões assustadoras.

Do outro lado da Vila dos Vampiros, encontramos um edifício estranho: o Zôo dos Monstros. Estava fechado. Mas ouviam-se do lado de fora os mais aterradores urros, uivos e rugidos.

Um alto edifício amarelo tinha um letreiro onde se lia: MUSEU DA GUILHOTINA. POR FAVOR, NÃO PERCAM A CABEÇA. Beto queria entrar, mas eu e Nei não deixamos.

O Parque do Terror estava surpreendentemente vazio. Passamos por vários Horrores que corriam de um lado para o outro. E vimos algumas famílias, sempre com crianças que choravam sem parar.

As diversões na área dos carrosséis estavam todas vazias. Os restaurantes e as barraquinhas de comida também estavam desertos.

Atravessamos todo o parque. Sentia-me cada vez mais preocupada.

Por que não encontrávamos nossos pais?

Já devíamos tê-los visto.

Nei tornara-se muito calado. Até Beto caminhava de ombros caídos e cabeça baixa.

Quando estávamos novamente junto ao Lago dos Jacarés, já me sentia desesperada. Passei pela margem do lago e aproximei-me de suas águas escuras.

- O que acham que aconteceu àqueles garotos que vieram nadar aqui? - perguntou Beto, olhando para o lago. - Será que foram atacados pelos jacarés?

- Talvez - respondi. Não estava realmente prestando atenção ao que ele dizia. Pensava em papai e mamãe.

- Ei, olhem! - gritou Nei, apontando para a água.

Vi dois troncos castanho-esverdeados que deslizavam em nossa direção. Só passados alguns segundos percebi que eram jacarés.

- E são dos grandes! - afirmou Nei, num sussurro.

- Vamos nos afastar - avisei.

Estávamos à beira da água. Os jacarés flutuavam silenciosamente abaixo da superfície de águas calmas, sem provocar ondulação.

- Papai e mamãe nunca iriam embora sem nós. Portanto... - hesitei. Tinha mil pensamentos na cabeça, e todos eram assustadores.

- Portanto? - perguntou Nei, ansiosamente.

- Se não estão no parque, - continuei - quer dizer que alguma coisa aconteceu. Alguma coisa grave aconteceu com eles.

Nei ficou boquiaberto. Beto semicerrou os olhos e virou para mim.

- Que quer dizer, Isa? - perguntou.

- Quero dizer que este lugar é mesmo assombrado - respondi. - E que talvez os Horrores, ou alguém, tenham feito alguma coisa má aos nossos pais.

Olhei para as costas do jacaré castanho que flutuava suavemente e sem esforço na nossa direção.

- Mas que estupidez - murmurou Beto.

Sabia que era uma idéia idiota. Mas não tinha qualquer outra explicação.

- Tenho uma sensação estranha em relação a este parque - eu disse aos rapazes. - Sinto que é um lugar muito ruim, mau.

Nesse momento, alguém me agarrou pelas costas e me empurrou para o Lago dos Jacarés.

 

Gritei.

Só depois percebi que não estava sendo empurrada para a água.

As mãos estavam só segurando meus ombros.

Virei-me.

- Pai! - gritei.

- Isa! - ele exclamou, ainda agarrado a mim. - Onde é que vocês se meteram?

- Procuramos pelo parque inteiro! - disse mamãe. Estava por trás de nós, sobre o gramado, com as mãos nervosamente pressionadas contra o peito.

- Estávamos procurando vocês!

- Pensei que tivessem ido embora! - disse Beto.

- Já estávamos um pouco assustados - acrescentou Nei.

Começamos todos a falar ao mesmo tempo. Eu estava tão feliz por vê-los! E percebi que Beto e Nei também estavam radiantes.

Imaginara coisas terríveis que poderiam ter acontecido a eles. Nem era o meu estilo deixar a imaginação correr daquela maneira.

Mas o Parque do Terror era mesmo um lugar arrepiante! Era impossível não ter pensamentos horríveis ali.

- Quero ir para casa - eu disse, cansada de andar.

- Chegaram a encontrar um telefone? - perguntou Nei. - Arranjaram um carro?

Papai abanou a cabeça.

- Não. Aqui não têm telefone. O funcionário com roupa de monstro não mentiu. Não existem telefones no parque.

- Mas os Horrores foram muito simpáticos - disse mamãe.

- Disseram para nos dirigirmos à bilheteria quando quiséssemos ir embora - contou papai.

Mamãe acariciou ternamente a cabeça de Beto.

- Foram andar em algumas diversões?

- Fizemos muitas coisas assustadoras - ele respondeu.

- Muito assustadoras - acrescentou Nei.

- Estou com muita fome - disse Beto.

Papai olhou para o relógio.

- Já passa da hora do almoço. Acho que devíamos ir comer.

- Os restaurantes e lanchonetes estão do outro lado do parque - disse mamãe.

- Não podemos almoçar e depois ir embora? - perguntei, ansiosamente. Continuava a ter uma má impressão do parque. Queria ir para longe dali. Para bem longe.

- A sua mãe e eu passamos todo o tempo procurando por vocês - disse papai, limpando o suor da testa. - Ainda não nos divertimos nada.

- Pelo menos, antes de partirmos, devíamos conhecer juntos uma das atrações. - disse mamãe.

- Eu só quero ir embora - pedi. - Quero mesmo.

- Isa, isso não se parece com você - repreendeu mamãe.

- Ela está com medo - disse Beto. - É uma garotinha medrosa.

- Talvez exista alguma diversão que nos leve até a parte da frente do parque - sugeriu papai. - Podíamos ir juntos, depois almoçamos e vamos embora.

- Parece boa idéia - disse mamãe. Fitou-me. - O que acha?

- Acho que sim - respondi, suspirando. - Só que as diversões aqui são todas assustadoras. Não têm graça alguma.

Beto riu.

- São muito assustadoras para Isa, mas não para mim e para o Nei - disse ele. - Certo, Nei?

- Tive um pouco de medo no Celeiro dos Morcegos - ele confessou.

Abandonamos o Lago dos Jacarés, atravessando a grama até o caminho pavimentado. Passaram por nós dois Horrores, conversando em voz baixa.

Os agudos gritos de terror de uma garota chegaram até nós, vindos de algum lugar bem longe. Repetiram-se vezes sem conta.

Começamos a ouvir os uivos dos lobos à nossa frente. E, de um auto-falante escondido nas árvores, ouviu-se uma gargalhada malévola, uma risada hedionda que se repetia sem parar.

- É como estar num filme de terror - comentou mamãe.

- Muito inteligente - acrescentou papai, caminhando com uma das mãos em meu ombro. - É estranho que nunca tenhamos ouvido falar deste parque.

- Deviam anunciá-lo na televisão - disse mamãe. - Muitas pessoas viriam visitá-lo.

Passamos por um edifício alto e estreito, pintado de verde, que tinha à sua frente um letreiro onde se lia: QUEDA LIVRE. O ÚNICO SALTO SEM ELÁSTICO.

- Quer experimentar isto? - perguntou papai, sorrindo para mim.

- Acho que não - respondi, rapidamente.

Beto já ia à nossa frente. Voltou-se e veio outra vez para trás, esperando por nós.

- Papai e mamãe deviam experimentar o Escorregador da Maldição - disse, sorrindo. - É um espanto!

Será que já tinha se esquecido de como ficara aterrorizado?

- Acho que não iam gostar - eu disse, calmamente.

- Talvez consigamos encontrar uma coisa que não meta muito medo - sugeriu Nei.

Papai riu.

- Está se divertindo, Nei?

Ele hesitou antes de responder.

- Um pouco - disse, finalmente.

- Eu estou me divertindo muito - afirmou Beto.

O caminho seguia ao longo de um estreito riu acastanhado. Dezenas de insetos brancos voavam sobre a superfície da água. Sob a luz do sol, pareciam pequenos diamantes.

Avistamos uma casa de barcos. Ao lado dela, viam-se estreitas canoas flutuando junto a um cais de madeira.

Um letreiro ao pé da casa dos barcos dizia: CRUZEIRO DO CAIXÃO. UMA AGRADÁVEL VIAGEM ATÉ A SEPULTURA.

- Isto pode ser interessante - disse mamãe, observando os pequenos barcos.

- Acho que o rio vai dar na parte da frente do parque - disse papai. - Vamos lá!

Beto aplaudiu e foi correndo para o cais.

Preferi ficar para trás. Quando, finalmente, cheguei ao cais, levei algum tempo para perceber que os objetos que flutuavam na água castanha não eram canoas - eram caixões!

Eram feitos de madeira preta polida. As tampas estavam puxadas para trás, revelando um forro de cetim vermelho. Em cada caixão cabia uma pessoa.

Senti um arrepio.

- Vamos mesmo entrar nestes caixões? - perguntei.

- Parecem muito confortáveis - disse mamãe, sorrindo para mim. - A água é calma e sossegada, Isa. Não acho que isto meta medo.

- Eu sou o primeiro! - disse Beto, correndo para o fim do cais de madeira.

Apareceram dois Horrores para nos ajudar a entrar nos caixões.

- Deitem-se. Boa viagem - disse um deles.

- Será sua última viagem - acrescentou outro Horror, rindo de um modo estranho.

Quando estávamos todos dentro dos caixões, os Horrores soltaram as amarras. Eles deslizaram suavemente para longe do cais.

"Aqui estou eu", pensei, "deitada em meu caixão."

"Aqui estamos nós, a minha família inteira, dentro de caixões."

O caixão flutuava suavemente, balançando sobre a água. Olhei para cima e fitei o céu azul. Podia ver os galhos das árvores e suas folhas verdejantes.

Era tão bom, tão tranqüilizador.

Por que pensei que alguma coisa terrível ia nos acontecer?

 

Deitada em meu caixão, não conseguia ver os outros. Mas podia ouvir o ruído que eles faziam enquanto deslizavam sobre a água.

- Isto é tão bom - exclamou mamãe. - Muito relaxante.

- É aborrecido! - disse Beto, que ia à minha frente. - Onde está a parte assustadora?

- É apenas um agradável passeio de caixão - disse papai. - Acha que estamos mesmo flutuando? Ou existe alguma espécie de trilho condutor.

- Não me importaria de ficar aqui por várias horas. - disse mamãe.

- As diversões demoram bastante tempo. - disse Nei.

- Aquilo ali no céu é um falcão? - perguntou papai. - Ninguém está vendo?

Protegendo os olhos do sol com uma das mãos, olhei para o céu. Acima de nós via-se uma sobra escura pairando no ar.

- Não é um falcão. Aposto que é um abutre! - afirmou Beto, rindo. - Viu os caixões e está esperando para nos comer!

- Beto, aonde vai buscar essas idéias absurdas? - perguntou mamãe.

- Acho que o Beto devia viver no Parque do Terror! - exclamou papai. - Podíamos arranjar-lhe uma daquelas roupas verdes de monstro, e ele ficaria aqui muito bem instalado!

- Ele não precisa de roupa! - grecejei. Começava a me sentir um pouco mais calma. O passeio era suave e relaxante. E pensei que nada de terrível poderia acontecer com a minha família.

Aconcheguei-me no caixão, com os braços estendidos ao longo do corpo, e fiquei olhando sonhadoramente para o pássaro que descrevia círculos no céu limpo. O caixão balançava suavemente, fazendo ruídos tranqüilizadores.

Tão agradável...

Tão tranqüilo...

E então, antes de poder soltar um grito, a tampa do caixão fechou-se sobre mim. E mergulhei na escuridão total.

 

Deitada em meu caixão, não conseguia ver os outros. Mas podia ouvir o ruído que eles faziam enquanto deslizavam sobre a água.

- Isto é tão bom - exclamou mamãe. - Muito relaxante.

- É aborrecido! - disse Beto, que ia à minha frente. - Onde está a parte assustadora?

- É apenas um agradável passeio de caixão - disse papai. - Acha que estamos mesmo flutuando? Ou existe alguma espécie de trilho condutor.

- Não me importaria de ficar aqui por várias horas. - disse mamãe.

- As diversões demoram bastante tempo. - disse Nei.

- Aquilo ali no céu é um falcão? - perguntou papai. - Ninguém está vendo?

Protegendo os olhos do sol com uma das mãos, olhei para o céu. Acima de nós via-se uma sobra escura pairando no ar.

- Não é um falcão. Aposto que é um abutre! - afirmou Beto, rindo. - Viu os caixões e está esperando para nos comer!

- Beto, aonde vai buscar essas idéias absurdas? - perguntou mamãe.

- Acho que o Beto devia viver no Parque do Terror! - exclamou papai. - Podíamos arranjar-lhe uma daquelas roupas verdes de monstro, e ele ficaria aqui muito bem instalado!

- Ele não precisa de roupa! - grecejei. Começava a me sentir um pouco mais calma. O passeio era suave e relaxante. E pensei que nada de terrível poderia acontecer com a minha família.

Aconcheguei-me no caixão, com os braços estendidos ao longo do corpo, e fiquei olhando sonhadoramente para o pássaro que descrevia círculos no céu limpo. O caixão balançava suavemente, fazendo ruídos tranqüilizadores.

Tão agradável...

Tão tranqüilo...

E então, antes de poder soltar um grito, a tampa do caixão fechou-se sobre mim. E mergulhei na escuridão total.

 

- Ei! - gritei. Minha voz soava abafada pela pesada tampa do caixão.

Ouvi os outros caixões fecharem-se.

- Ei, deixem-me sair daqui!

Empurrei a tampa com força, mas ela não se movia.

Respirei fundo e tentei novamente. Desta vez, empurrei com as mãos e com os pés. Mas nem assim consegui que se mexesse.

O meu coração estava batendo tão depressa que pensei que fosse explodir. O ar dentro do caixão fechado já estava se tornando quente e úmido.

- Abram! Abram! - gritei.

Tentei empurrar a tampa mais uma vez. Podia ouvir os gritos abafados de Nei no caixão ao lado. O pobre garoto estava aterrorizado.

"Calma, Isa. Tenha calma.", disse a mim mesma.

"É só outra brincadeira estúpida. A tampa do caixão vai se abrir em breve."

Respirando com dificuldade, esperei.

Contei até dez.

E contei mais uma vez até dez.

A tampa não abria.

Fechei os olhos e contei até cinqüenta. "Quando chegar aos cinqüenta", pensei, "abro os olhos e a tampa já estará aberta."

- ... vinte e dois, vinte e três, vinte e quatro... - eu contava em voz alta. Minha voz soava fraca e abafada. Era difícil respirar. O ar começava a ficar muito rarefeito.

Parei de contar aos vinte e cinco e abri os olhos. Nada. Tudo continuava escuro.

"Está tão abafado aqui", pensei. "O sol está batendo na tampa. Não há ar suficiente, vou fritar aqui dentro!"

Tentei gritar, mas não consegui.

Precisava de ar!

Lá fora, ouvia gritos abafados.

Era a minha mãe que gritava assim?

- É só uma brincadeira - eu disse em voz alta. - Só uma brincadeira idiota. A tampa vai saltar agora!

Mas não saltou.

O ar estava tão quente, tão quente e rarefeito.

Por que a tampa não se abria?

Por quê?

Tentei controlar o pânico, mas não fui capaz. Todo o meu corpo tremia. Senti suores frios na testa.

- Alguma coisa está errada! - gritei, desesperada. - A tampa devia abrir, mas não abre!

Freneticamente empurrei com as duas mãos. Fiquei com os braços doloridos fazendo tanta força. Mas mesmo assim, a tampa não abriu.

O caixão balançava na água.

Abaixei os braços, desistindo. Respirei fundo o ar quente e rarefeito. Meu peito arquejava. E então comecei a sentir comichão nas pernas. Umas picadinhas nos tornozelos.

Pelas pernas acima.

Uma sensação de formigamento.

Alguma coisa me subia pelas pernas.

Alguma coisa pequena e áspera.

- Ohhh! - soltei um gemido de terror.

Aranhas!

 

Tentei coçar as pernas, mas não podia me sentar nem mexer dentro do caixão.

Senti as patinhas subindo pelo meu corpo.

Queria gritar, mas comecei a tossir.

E então a tampa do caixão se abriu. A luz brilhante do sol obrigou-me a fechar os olhos.

- Oh! - Consegui me erguer e fiquei sentada no caixão. Piscando os olhos, vi os outros levantando-se também.

Cocei as pernas furiosamente. Para minha surpresa, não havia nenhuma aranha, nem quaisquer outros insetos.

O caixão tinha encostado num pequeno cais. Agarrei a borda do caixão com as duas mãos e pus-me de pé.

- Vamos embora daqui! - ouvi Nei gritar.

- Isto foi horrível! - disse mamãe.

Beto não disse nada. Estava pálido, e o seu cabelo preto havia colado na testa por causa da transpiração.

- Realmente, foram longe demais! - disse papai, zangado. - Vou fazer uma reclamação.

- Vamos embora daqui - disse mamãe.

Saltamos todos para o cais. Ajudei Nei a subir. Depois, respirei fundo o ar fresco.

Papai saiu do cais correndo e dirigiu-se à praça. Corremos atrás dele.

- Para a bilheteria! - gritou. - É ali!

O passeio de caixão nos tinha deixado na parte da frente do parque. Avistei o portão principal e a fila de bilheterias verdes do lado direito.

- Esta diversão era mesmo um horror! - disse Nei, abanando a cabeça.

- Senti uma coceira nas pernas. Pensei que fossem formigas! - afirmou Beto.

- Eu pensei que fossem aranhas! - comentei.

- Como será que fazem aquilo? - perguntou Beto, pensativo.

- Não sei e nem me interessa - respondi. - Só quero ir embora daqui. Odeio este lugar!

- Eu também - concordou Nei.

- Eles exageram muito - disse mamãe, sem fôlego, correndo para nos acompanhar enquanto seguíamos papai. - Uma coisa assim tão assustadora não tem graça nenhuma. Tive dificuldade até para respirar.

- Eu também - afirmei.

- Ei, e como vamos para casa? - perguntou Beto subitamente, olhando para mamãe. - O nosso carro explodiu.

- Acho que aqueles empregados vestidos de monstros vão nos emprestar um carro - respondeu mamãe. - Disseram ao seu pai para se dirigir a uma das bilheterias.

- Podemos parar para comer uma pizza? - perguntou Beto.

- Vamos embora deste lugar e depois almoçamos - respondeu mamãe.

A praça principal estava completamente deserta. Não havia mais ninguém.

Seguimos papai até a bilheteria mais próxima. Ele voltou-se para nós com uma expressão de desapontamento.

- Está fechada - disse. Uma grade de metal fora colocada sobre a janela.

Ele estava ofegante por ter corrido o caminho todo. Com as mãos, afastou o cabelo louro da testa suada.

- Por aqui - indicou.

Seguimos até a bilheteria seguinte. Também estava fechada.

A seguinte. Fechada.

Não demoramos para descobrir que todas as bilheterias estavam fechadas.

- Estranho - disse Beto, abanando a cabeça.

- Será que não estão à espera de mais visitantes para hoje? - perguntou mamãe. - Como é que podem fechar assim de repente?

Papai encolheu os ombros.

- Temos de perguntar a alguém.

Voltei-me e olhei para a praça. Ninguém à vista. Não havia visitante. Nem Horrores.

- Vamos tentar ali em frente - disse papai. Começou a andar na direção de um edifício verde e baixo que ficava atrás das bilheterias. Parecia ser um escritório.

Também estava fechado. Papai experimentou abrir a porta. Havia sido trancada.

Ele coçou a cabeça.

- Mas o que está acontecendo aqui? Onde é que se meteu todo mundo? - perguntou.

Mamãe lhe deu o braço.

- É muito estranho - disse, em voz baixa.

Olhei para Beto e para Nei. Os dois estavam muito tensos, nem falavam.

- Tem certeza de que são essas as bilheterias? - perguntei.

- Sim - respondeu papai, cansado. - Esta é a entrada principal.

- Onde estarão todos? - perguntou mamãe, mordendo o lábio inferior.

- Talvez encontremos alguém no estacionamento - sugeri. - Um vigia ou um empregado qualquer. Devem nos dizer como conseguir um carro para irmos para casa.

- Boa idéia, Isa. - disse papai, fazendo-me um carinho na cabeça, como costumava fazer quando eu era pequena.

Esperei que Beto começasse a gozar comigo. Mas não disse uma palavra. Acho que estava muito preocupado e inquieto.

- Vamos lá - eu disse. Voltei-me e passei correndo pelas bilheterias vazias. O alto portão de metal do Parque do Terror ficava atrás delas.

Parei para ler uma tabuleta que dizia: NÃO HÁ SAÍDA. NINGUÉM SAI VIVO DO PARQUE DO TERROR.

- Ah! Ah! - ri, sarcasticamente. - Estes avisos têm muita graça, não têm?

Corri o resto do percurso e fui a primeira a chegar. Puxei o portão, mas este não se abriu. Por isso, tentei empurrá-lo.

Não se moveu.

Foi então que reparei na pesada corrente com cadeado que fechava o portão.

Engolindo em seco, voltei-me para os outros.

- Estamos presos aqui! - exclamei.

 

- O quê? - Papai olhava para mim, com uma expressão transtornada. Acho que ele não acreditou em mim.

- Estamos presos aqui! - repeti. Levantei o pesado cadeado com as duas mãos e depois deixei-o cair com um sonoro ruído contra as grades do portão.

- Mas isto é impossível! - gritou mamãe, levando as mãos ao rosto. - Não podem prender as pessoas dentro de um parque de diversões!

- É outra brincadeira - disse Beto. - Neste parque, tudo acaba sendo uma brincadeira. Talvez esta seja mais uma.

Levantei outra vez o pesado cadeado.

- Não me parece que isto seja uma brincadeira, Beto. - eu disse, tristemente.

- Então deve existir outro portão, pelo qual querem que a gente saia - sugeriu mamãe.

- Talvez - disse papai, sem muita certeza. - Talvez exista uma saída lateral. Mas eu não vi nenhuma.

- Que vamos fazer? - perguntou Nei, choramingando. Tinha o rosto vermelho e respirava com dificuldade.

- Onde é que está todo mundo? - perguntou Beto, choramingando também. - Eles têm de nos deixar sair. Têm de deixar!

- Vamos tentar manter a calma - disse papai, pousando uma das mãos sobre o ombro de Beto. - Não há razão para entrarmos em pânico. Este lugar é estranho, mas não corremos perigo algum.

- Seu pai tem razão. - disse mamãe. - Não há motivo para ter medo. Daqui a pouco, estaremos lá fora, a caminho de casa. - E deu um sorriso forçado.

- Assim que estivermos lá fora, vou comprar pizzas e refrigerantes do tamanho gigante - prometeu papai. - E vamos dar boas gargalhadas quando pensarmos em nossas aventuras aterradoras no Parque do Terror.

- Mas como é que vamos sair? - perguntou Beto, com voz estridente.

- Bom... - papai coçou o queixo.

- Acham que podemos saltar este muro? - perguntei.

Levantamos os olhos para o alto. Devia ter quase dez metros de altura.

- Não consigo subir por ali! - gritou Nei. - Vou cair!

- É muito alto - disse mamãe, rapidamente.

- Má idéia - murmurei.

Uma grande nuvem branca cobriu o sol. As nossas sombras projetadas no chão ficaram mais longas. Depressa o ar tornou-se mais frio.

Senti um arrepio nas costas.

- Tem de haver uma saída deste estúpido parque! - gritei, zangada. Levantei o cadeado e bati com ele contra as barras do portão.

- Calma, Isa - disse papai, suavemente. - Temos de encontrar um daqueles empregados do parque que andam mascarados. Eles nos dirão como sair.

- Hã... pai...

Voltei-me e vi Beto agarrando o braço de papai.

- Eles vêm ali.

Soltamos gritos de surpresa quando vimos os Horrores atravessando a praça. Dúzias deles. Caminhavam rapidamente, em passos cadenciados. Silenciosamente.

Segundos atrás, a praça estava deserta. Agora havia Horrores vestidos de verde que marchavam na nossa direção, dispersando-se, preparando-se para nos cercar.

Sentia o pânico subindo por meu estômago. Meus joelhos começaram a tremer. Olhei aterrorizada para eles à medida que se aproximavam. Não conseguia falar. Não conseguia me mexer.

- Que vão fazer? - gritou Nei, com o rosto deformado pelo terror. Escondeu-se atrás do meu pai. - Que vão fazer conosco?

 

Juntamo-nos todos à medida que os Horrores iam se aproximando de nós. O único som que se ouvia era o barulho de seus passos no pavimento e o de suas longas caudas arrastando-se pelo chão.

- São centenas! - murmurou mamãe. Agarrou o braço de papai com uma das mãos. Passou a outra mão por cima dos meus ombros e puxou-me para ela.

Tínhamos as costas voltadas para o muro. Olhamos desesperadamente para os dentes arreganhados, para as caras verdes, para os salientes olhos amarelos que pareciam rir cruelmente.

Finalmente, pararam a alguns passos de nós.

A praça estava tranqüila e silenciosa. Terrivelmente silenciosa.

O sol ainda estava encoberto pela grande nuvem. Dois grandes pássaros negros descreviam círculos no céu cinzento.

Olhamos para os Horrores, e eles olharam para nós.

Engoli a seco e encostei-me em minha mãe. Todo o seu corpo tremia.

Respirei fundo e gritei:

- O que querem? - O som da minha voz surpreendeu-me.

Um dos Horrores, uma jovem mulher, avançou.

Assustada, recuei.

- O que querem? - repeti, com a voz tremendo.

A Horror olhou para nós, um por um.

- Quero agradecer a vocês - disse, numa voz alegre.

- Hã? - exclamei.

- Sou a Mestre-de-Cerimônias do Parque do Terror. Queremos agradecer a todos vocês por terem sido nossos convidados. - Lançou-nos um caloroso sorriso.

- Quer dizer que podemos ir embora? - perguntou Beto, meio escondido atrás de papai.

- Claro - respondeu a Horror, sorrindo mais uma vez. - Mas, primeiro, queremos agradecer a vocês por terem aparecido no Apanhados no Parque do Terror.

As dúzias de Horrores atrás dela aplaudiram entusiasticamente.

- Hã? Quer dizer que isto é para algum espetáculo? - perguntou papai, franzindo as sobrancelhas.

- Vêem as câmeras ali? - perguntou a Mestre-de-Cerimônias. Apontou para dois postes altos que estavam na praça.

Então, vi as duas câmeras de televisão.

- Quer dizer que fomos filmados?

- Desde o momento em que chegaram - respondeu a Mestre-de-Cerimônias. - Desde a cena hilariante em que fizemos explodir o seu carro, as nossas câmeras estiveram com vocês. E sei que as pessoas que fizeram o teste de audiência adoraram ver suas caras de horror e ouvir seus gritos arrepiantes enquanto passeavam pelo Parque do Terror.

- Bem, espere um segundo - disse papai, zangado. Tinha os punhos cerrados ao lado do corpo. - Quer dizer que isto é um programa de televisão?

- Vamos para o ar todos os fins de semana no Canal dos Mortos - respondeu a Horror.

- Oh! - respondeu papai rapidamente, abaixando os olhos. - Não temos TV a cabo.

- Deviam mandar instalar - aconselhou a Horror. - Têm perdido uma série de grandes espetáculos assustadores no Canal dos Mortos.

Os Horrores bateram palmas e gritaram.

- Bem, vocês foram mesmo bons companheiros - continuou a Mestre-de-Cerimônias, com os olhos amarelos balançando à medida que falava. - Gostamos muito de tê-los aqui. Para demonstrar o nosso agradecimento, temos um carro novinho em folha a espera de vocês no estacionamento!

Mais gritos e aplausos dos Horrores.

- Um carro novo? Isto é excelente! - exclamou Beto.

- Isto quer dizer que podemos ir embora? - perguntou Nei, timidamente.

A Horror acenou afirmativamente.

- Sim, está na hora de irem embora. A verdadeira saída é por ali, através daquela porta.

Apontou para um alto edifício verde perto da extremidade do muro. Vi uma porta amarela num dos lados.

- Saiam pela porta amarela - disse a Horror. - E mais uma vez, os nossos agradecimentos por terem aparecido no Apanhados no Parque do Terror!

Enquanto todos os Horrores batiam palmas, afastamo-nos do muro e dirigimo-nos à saída.

- Nem acredito que estivemos todo este tempo na televisão! - afirmou mamãe.

- E ainda nos deram um carro novo! - exclamou Beto, muito feliz. Começou a pular. Depois saltou para as costas de Nei, quase o fazendo cair.

Ri. Era bom ver o velho Beto animado outra vez.

- Temos de comprar televisão a cabo! - disse Beto a papai. - Quero ver o Canal dos Mortos. Deve ser o máximo!

- Temos de arranjar a televisão a cabo para nos vermos na televisão - disse mamãe.

Fui a primeira a chegar à porta amarela e abri-la. Entrei para uma sala enorme, com paredes brancas e luzes fortes no teto.

- Isto é a saída? - perguntei.

Assim que estávamos todos lá dentro, a porta fechou-se fazendo um barulho que fez o meu coração saltar.

Depois, as luzes se apagaram.

- Bem-vindos ao Desafio do Parque do Terror! - disse uma voz assustadora que saía de um alto-falante.

- Hã? - Dei uma volta às cegas, tentando ver alguma coisa - qualquer coisa - na escuridão total.

- Têm um minuto para realizar a Prova de Obstáculos de Monstros - gritou a voz. - Por favor, lembrem-se de que as brincadeiras acabaram. Isto agora é sério. Suas vidas estão em jogo!

 

- Fomos enganados! - exclamou papai, zangado. Depois, gritou a plenos pulmões: - Vamos embora daqui!

- Corram! - disse a voz profunda, no alto-falante. - Têm cinqüenta e seis segundos.

Papai começou a gritar novamente. Mas paramos quando apareceu uma luz fraca, e vimos uma nojenta criatura com quatro braços aproximar-se de nós.

- Ohhh! - gritei, sem me conter.

Do tamanho de um gorila, o monstro tinha enormes olhos verdes rodeados de pêlos vermelhos. De sua boca caía uma saliva gosmenta. E quando abriu as mandíbulas, uma fileira de dentes enormes sobrepôs-se aos seus delgados lábios púrpura.

- Não fiquem aí parados! Fujam! Isto é uma prova de obstáculos! - disse a voz, impacientemente. - Têm cinqüenta segundos de vida! Pelo menos, façam uma boa prova!

O monstro soltou um rugido e aproximou-se de nós na escuridão. Suas mandíbulas estavam abertas para nos morder. As quatro mãos enormes, com garras, varriam o ar a sua frente.

Eu estava chocada demais para me mexer, assustada demais para fugir.

Mas, subitamente, senti alguém agarrar minha mão e puxá-la.

Era papai, percebi, tentando proteger-me.

Ouvi os rapazes gritando de medo. Senti mamãe atrás de mim quando começamos a avançar.

- Fujam! Corram! - dizia a voz, sobrepondo-se aos gritos.

Não conseguia ver para onde corria. Havia pouca luz. Só via manchas, manchas de pés e sombras que se moviam.

O monstro soltou um rugido ensurdecedor. Tapei os ouvidos e continue correndo.

As quatro patas com garras tentaram atingir papai. Falharam.

Conseguimos passar pelo monstro.

Mais à frente, tivemos de enfrentar dois pássaros gigantes, com pelo menos três metros de altura. Pareciam garças. Guinchavam e abanavam as enormes asas. Pareciam tendas gigantescas agitando-se com o vento.

- Ohhh! Socorro!

Era eu quem gritava assim?

Estava mesmo sendo envolvida por suas asas quentes? Esmagada? Sufocada?

- Não, por favor!

Como terei escapado?

Estaria agora sendo perseguida por seis criaturas parecidas com porcos, que rosnavam, com dentes pontiagudos que se encaracolavam para fora das bocas deformadas?

Os gritos e guinchos aterrorizados da minha família sobrepunham-se às batidas de asas dos pássaros, dos rugidos e grunhidos monstruosos.

Ouvi papai gritar. E na semi-escuridão, vi que lutava para se libertar do monstro de quatro braços.

- Não! - gritei, quando senti que uma coisa quente se enrolava em meu tornozelo. Uma serpente coberta de pêlos!

Gritei novamente e agitei a perna freneticamente, atirando a serpente para longe.

Mas antes que pudesse afastar-me, outra cobra peluda enrolou-se em minha perna, apertando-a com força.

Abaixei-me, puxei-a e a cobra silvou em protesto.

Atirei-a para longe.

- Fujam! Corram! - disse a voz do alto-falante. - Têm vinte segundos de vida!

 

Apareceram mais monstros à nossa frente. Criaturas amarelas semelhantes a lagartos, agitando suas línguas como se fossem chicotes. Uma bola de pêlo saltitante que rugia enquanto saltava, com dentes afiados que saíam de suas três bocas.

Serpentes sibilantes, insetos enormes com brilhantes olhos vermelhos, porcos rosnadores. Depois, uma criatura gigante parecida com um urso dirigiu-se a nós caminhando sobre duas patas. Sacudiu a cabeça negra e enorme, rindo como uma hiena enquanto as suas patas socavam o ar.

- Ajudem-me! - ouvi Beto gritar. Depois, vi-o desaparecer, envolvido pelas asas de um dos pássaros gigantes.

O pássaro grasnou triunfantemente enquanto apertava as asas em torno do meu irmão.

- Dez segundos! - gritou a voz.

- Não! - gritei. Aproximei-me do pássaro, agarrei-lhe a asa e puxei-a até que o pássaro cedeu.

Beto conseguiu libertar-se, e desatamos os dois a correr.

Os monstros grunhiam, rugiam, batiam as asas e guinchavam.

- Será que vamos conseguir? - ele perguntou, numa voz sumida.

Não tive oportunidade de responder.

Fui agarrada pelo peito por duas patas poderosas que me elevaram no ar e depois me lançaram contra o chão.

Caí no chão com a barriga para baixo e bati a cabeça.

Ferida e com tonturas, olhei para cima a tempo de ver uma criatura enorme prestes a esmagar-me com sua enorme para coberta de pêlos.

"Não vou conseguir escapar", pensei.

"Não vou conseguir escapar."

 

A porta gigantesca abaixou sobre mim, devagar mas firmemente. O monstro não tinha pressa.

Parecia que tudo se passava em câmera lenta.

Queria me mover. Queria rolar para fora do alcance dele.

Mas a queda tinha me tirado a força. Fiquei ali deitada, ofegante, olhando para a pata do monstro que se preparava para me esmagar.

- Ohhh!

Não conseguia recuperar o fôlego. Não conseguia me afastar.

Sentia o calor da pata do monstro. Sentia o seu cheiro fétido.

A pata esmagou meu estômago.

Fechei os olhos e esperei pela dor.

O estridente som de uma buzina me fez abrir os olhos.

A buzina ecoava pela saída.

O monstro retirou a pata do meu estômago. O chão tremeu sob seu peso enquanto ele se afastava.

"Estou viva?", pensei.

"Ou estou apenas pensando que ainda estou viva?"

"Será que aquela criatura realmente está se afastando sem me esmagar?"

A buzina ressoava em meus ouvidos. Parou subitamente.

Ouviu-se um zumbido no alto-falante.

- Acabou o tempo! - disse uma voz de mulher, a voz da Mestre-de-Cerimônias do Parque do Terror que tinha nos levado até esta aterradora prova de obstáculos.

- Acabou o tempo! Mas que prova excitante! - exclamou ela.

Gemi e comecei a levantar-me. Na semi-escuridão, vi que todos os monstros tinham desaparecido.

- Foi uma dura batalha - continuou a voz da Mestre-de-Cerimônias no alto-falante. - Temos alguns sobreviventes?

- Sim, temos alguns - respondeu uma voz grave e sonora.

- Quantos sobreviventes estão lá dentro? - perguntou a mulher.

- Três - respondeu a voz. - De cinco, três sobreviveram.

 

Senti um arrepio percorrer meu corpo.

Abri a boca num grito silencioso e pus-me de pé, num salto.

Três sobreviventes?

Queria dizer que dois estavam mortos?

O meu peito ainda estava dolorido. Os joelhos tremiam. Olhei na escuridão, procurando desesperadamente os outros.

No centro da sala vi Beto e Nei.

Estavam abraçados, caminhando como sonâmbulos.

- Ei! - tentei chamá-los. Mas a minha voz morreu num lamento abafado.

Onde estavam papai e mamãe?

Teriam sido mortos pelos monstros?

Três sobreviventes. Três sobreviventes

- Nããããooo! - Finalmente recuperei a voz e soltei um terrível grito que ecoou pelas paredes.

- Desculpem. Um pequeno engano - disse a voz profunda. - Afinal, são cinco sobreviventes.

- Sobreviveram todos! - exclamou a Mestre-de-Cerimônias do Parque do Terror. - Um novo recorde. Nunca tivemos um resultado assim. Um grande aplauso para eles!

Respirei fundo e mantive o ar nos pulmões, tentando parar de tremer.

"Eles estão bem!", pensei, cheia de felicidade. "Papai e mamãe estão bem."

E, depois, os vi. Junto de Beto e de Nei. Aproximavam-se de mim.

- Estamos todos bem! - gritei, correndo para eles com os braços esticados. - Estamos todos bem!

Juntamo-nos os quatro no centro da sala, abraçando-nos uns aos outros e soluçando.

Um corte profundo sangrava no braço de papai. Um dos monstros o tinha atingido.

À parte disso, estávamos todos abatidos, mas não feridos.

- E agora? - perguntou Beto, com a voz tremendo. - Vão nos deixar partir?

- Eles não podem nos tratar assim - disse papai, zangado. - Não podem tratar as pessoas assim e ficar impunes. Não me interessa se é para a televisão!

- Os monstros eram verdadeiros! - exclamei com um arrepio. - Não eram falsos. Estavam mesmo tentando nos matar.

- Como é que vamos sair daqui? - perguntou Beto. - Eles vão nos deixar sair?

Começamos todos a falar ao mesmo tempo, assustados.

Subitamente, as luzes do teto acenderam-se, inundindo a sala de luz. E a voz da Mestre-de-Cerimônias interrompeu a nossa conversa.

- Vamos deixar sair os nossos campeões com uma salva de palmas! - anunciou, alegremente.

Começamos a gritar quando o chão inclinou-se debaixo de nós. Agarrei-me a papai e começamos a escorregar.

O chão estava inclinado como um escorregador. Deslizamos para fora da sala - e caímos lá fora, na praça.

Ainda um bocado tonta, pus-me rapidamente de pé quando a Mestre-de-Cerimônias correu para nos felicitar. A multidão de Horrores continuava batendo palmas.

- Vocês não podem fazer isto! - gritei.

Estava tão zangada que nem sabia o que dizia. Fiquei completamente louca.

Saltei para cima da mulher, agarrei a parte de cima da máscara e comecei a puxá-la com as duas mãos.

- Não podem fazer isto! Não podem! - gritei. - Quero ver a sua cara! Quero ver quem é você!

Com toda a minha força, dei um puxão na máscara.

Mas soltei um grito e larguei-a quando percebi a verdade.

 

Ela não usava máscara alguma!

A monstruosa cara verde era a cara dela!

Não vestia roupa de monstro. Percebi que nenhum Horror vestia roupa de monstro.

Dei alguns passos para trás, levantando os braços, horrorizada, como se quisesse me proteger.

- Vo-vocês são monstros mesmo! - gritei. - Mas-mas vocês disseram que isto era um programa de televisão - gaguejei para a Mestre-de-Cerimônias.

Ela olhou para mim com seus olhos amarelos salientes.

- Estamos no primeiro lugar de audiência no Canal dos Mortos graças a grandes participantes como você e sua família. - disse ela, alegremente. - O Canal dos Mortos é visto por cerca de dois milhões de monstros no mundo inteiro.

- Mas-mas... - hesitei, recuando mais um passo.

- As pessoas nem sempre nos levam a sério - continuou ela. - As pessoas vêm ao Parque do Terror e pensam que é uma grande brincadeira. Riem dos avisos que estão espalhados pelo parque. Riem das diversões e das atrações. Mas, para nós, é tudo sério. Tudo.

Papai avançou para o meu lado, agitando furiosamente um punho.

- Mas vocês não podem fazer isto a pessoas inocentes! - gritou. - Não podem trazer as pessoas para este parque para as torturar, e... e...

- Oh, peço desculpas. O nosso tempo para esta semana chegou ao fim - interrompeu a Mestre, abanando a enorme cabeça verde. - É com muita tristeza que teremos que nos despedir dos nossos convidados especiais desta semana.

- Não, esperem... - gritou papai, erguendo as duas mãos para pedir silêncio.

A multidão de Horrores avançou silenciosamente. Não tínhamos outro remédio senão movermo-nos ao mesmo tempo que eles.

- Deixem-nos mostrar a vocês como é que nos despedimos aqui no Apanhados no Parque do Terror - disse a Mestre-de-Cerimônias.

Papai tentou ficar para trás, tentou resistir, mas alguns Horrores chocaram-se contra ele. Estavam empurrando-nos para o que parecia ser um tanque púrpura, redondo, ao lado da praça.

Não conseguíamos resistir. Estávamos cercados.

Conduziram-nos como se fossem cães pastores, reunindo o gado. Passados alguns segundos, estávamos à beira do tanque púrpura.

Do tanque vinha um cheiro ácido. O líquido púrpura borbulhava e gorgolejava, fazendo ruídos de sucção horríveis.

- Deixem-nos partir! - gritou Beto, estridentemente. - Queremos ir para casa!

A Mestre-de-Cerimônias ignorou os pedidos desesperados e subiu para a borda do tanque.

- Dizer adeus é sempre triste - disse ela. - Por isso, tentamos nos divertir um pouco com as nossas despedidas.

- Deixem-nos ir embora! - insistiu Beto. Papai pôs-lhe a mão no ombro, tentando confortá-lo.

Olhamos todos para a Mestre-de-Cerimônias quando ela ergueu uma grande pedra com uma das mãos e a segurou sobre o tanque, cujo líquido não parava de borbulhar.

- Observem - ela nos disse, com um sorriso.

E deixou a pedra cair dentro do tanque.

Assim que tocou na espessa superfície ela foi puxada para baixo, com um sonoro ruído de sucção.

- Vêem como é fácil dizer adeus? - disse a Horror, olhando para nós. - Agora irão saltar lá dentro. Ou preferem ser empurrados?

 

Silenciosamente, os Horrores começaram a aproximar-se de nós. Cada vez mais perto. Mais perto.

Recuando, Nei tropeçou no meu pé e quase caiu no líquido borbulhante. Agarrei-o e segurei-o até que ele recuperasse o equilíbrio.

Estávamos os cinco à beira do tanque.

O odor acre envolvia-me. Senti-me enjoada. O espesso lodo púrpura lambeu-me os tornozelos, como se quisessem me engolir.

- Mãe! Pai! - gritei. Não sabia o que esperar dos monstros. Nenhum de nós podia fazer nada.

Sabia que desta vez não íamos escapar.

Sem termos reparado, estávamos todos de mãos dadas.

- Vão saltar lá dentro, ou preferem ser empurrados? - repetiu a Mestre-de-Cerimônias.

- Lamento muito - murmurou papai, ignorando-a. - Lamento ter trazido vocês aqui. Eu não sabia... - Faltou-lhe a voz. Papai abaixou a cabeça.

- A culpa não é sua, pai! - exclamei, apertando-lhe a mão.

E enquanto lhe apertava a mão, tive uma idéia.

Uma idéia louca, estúpida. Uma idéia completamente maluca.

- As pessoas riem de tudo neste parque - dissera-nos a Mestre-de-Cerimônias. - Mas para nós, é tudo muito sério - acrescentara.

Tudo muito sério...

Muito sério...

Ela estava agora à minha frente, à espera que saltássemos para a nossa morte, ansiando que fôssemos sugados pelo lodo púrpura.

Sabia que era a minha última oportunidade. Sabia que era uma loucura.

Mas sabia que tinha de tentar.

Aproximei-me da Mestre-de-Cerimônias, toquei-a e dei-lhe um beliscão com toda a força.

 

A Mestre-de-Cerimônias abriu a boca, e soltou um grito abafado.

Tentou soltar o braço. Mas eu o segurava e belisquei-o outra vez, com mais força.

- O Beliscador Louco ataca outra vez! - gritei, lembrando-me da irritante brincadeira de Beto.

Os olhos amarelos da Horror estavam esbugalhados.

- Não! - implorou.

Mais força. Mais força.

Depois, foi minha vez de gritar quando ela abriu a boca novamente e deixou escapar o ar através dos lábios.

Saltei para trás.

À medida que o ar lhe saía pela boca, ela parecia desinchar, tal e qual um balão.

Olhei espantada quando ela caiu, desamparada e vazia, no chão.

Ouviu-se um grito furioso vindo da multidão dos Horrores.

- Encham-na! - gritou um deles. - Encham-na imediatamente!

Começaram a aproximar-se de nós, rosnando e grunhindo ameaçadoramente.

- Belisquem-os! - gritei para a minha família. - Belisquem-os! Os avisos de Não Beliscar que achamos uma estupidez eram verdadeiros! Os Horrores desincham quando são beliscados!

Aproximou-se de mim um Horror, com os braços esticados para me empurrar para o tanque. Belisquei-lhe o braço com força e, alguns segundos mais tarde, o Horror estava vazio.

Ouvi ruídos de ar escapando à minha direita e vi que Beto também tinha esvaziado um Horror.

Vuuu! Outro Horror esvaziado e caído no meio do chão.

E não foi preciso mais nada.

 

A praça encheu-se de gritos assustados e expressões de terror.

Os Horrores voltaram as costas e fugiram, alarmados. Debandaram, melhor dizendo, espalharam-se pelo parque, gritando enquanto corriam.

Com um suspiro de alívio, olhei, feliz, para eles.

- Estão vendo? Nada como um beliscão para acabar com a má educação! - disse, divertida.

Acho que ninguém da minha família me ouviu. Estavam gritando de felicidade, abraçando-se uns aos outros e dando pulos de alegria.

- Vamos embora daqui! - gritei. Comecei a correr para o portão principal. Os outros seguiram-me de perto.

O portão estava aberto agora. Acho que os Horrores o abriram pensando que o nosso destino era o fundo do tanque.

Sem olhar para trás, corremos até o estacionamento, que estava vazio.

E paramos.

- O carro... - murmurei.

Com toda aquela excitação, esquecera que o nosso carro tinha explodido.

Cansada, suspirei. Parecia que estava a desinchar, como os Horrores.

- E agora? - perguntei, olhando para o enorme estacionamento vazio.

- É muito longe para irmos a pé! - lamentou-se Beto. - Como vamos sair daqui?

- Os ônibus! - gritou mamãe, apontando para a direita. Voltei os olhos para a fila de ônibus verde e púrpura. Eles estavam parados no outro extremo do estacionamento. Brilhavam sob o forte sol da tarde.

- Sim! - gritou papai, animado. - Talvez consigamos sair daqui!

Desatamos a correr até os ônibus.

- Façam figas - disse papai, que ia à frente. - Talvez alguém tenha deixado as chaves lá dentro. É a nossa única chance!

- Depressa! - gritou Beto, de repente. - Eles vêm aí!

O meu coração deu um salto. Olhei para o portão.

Não havia dúvida, os Horrores estavam saindo do parque, para nos perseguir.

- Desistam! Não podem escapar! - vociferou um deles.

- Ninguém consegue escapar! - berrou outro Horror.

- Depressa! - gritou Beto. - Vão nos alcançar.

 

Com os Horrores muito perto de nós, gritando e proferindo ameaças, corremos a toda velocidade para a fila de ônibus.

O meu coração fazia quase tanto barulho quanto os tênis batendo contra o chão. Minha garganta doía e eu sentia o corpo estremecer.

Mas continuei a correr e não desisti.

- Não vão escapar!

- Parem!

- Não há saída!

Os gritos furiosos dos Horrores soavam cada vez mais próximos. Mas não olhei para trás para ver se eles nos alcançavam.

O primeiro ônibus estava com a porta aberta. Papai foi o primeiro a chegar, saltar os degraus e entrar.

Mamãe subiu em seguida, com Beto e Nei.

O motor estremeceu e começou a trabalhar ruidosamente quando eu entrei. As portas fecharam-se atrás de mim.

- Pai, as chaves! - exclamei, ofegante.

- Sim, estavam aqui! - ele disse, alegremente. - Segurem-se! Vamos embora!

Pisou no acelerador, e o ônibus deu um solavanco para frente. Desequilibrei-me e cai num dos bancos atrás de Beto e de Nei.

- Depressa! Estão se aproximando! - eles gritaram, ao mesmo tempo.

Os gritos zangados dos Horrores eram ouvidos através das janelas fechadas do ônibus.

- Está tudo bem! - disse papai, inclinando-se sobre o grande volante. - Está tudo bem! Vamos embora!

- Sim! - gritei, alegremente. - Vamos!

Começamos a festejar. Continuamos a gritar de alegria até sairmos do estacionamento e entrarmos na auto-estrada.

Rimos e demos vivas durante todo o caminho para casa.

A viagem demorou horas e horas, mas não nos importamos. Estávamos a salvo! Tínhamos escapado!

 

Já era noite quando papai estacionou o ônibus à porta de nossa casa.

- Lar, doce lar! - gritei, muito feliz.

Apressamo-nos todos para sair do ônibus. Respirei fundo e espreguicei-me. O ar cheirava tão bem! A grama do jardim brilhava ao luar.

E foi então que o vi. Era um Horror, e estava agarrado à parte detrás do ônibus.

- Oh, não! - gritei.

- Que está fazendo aqui? - perguntou papai.

- Veio agarrado ali durante toda a viagem? - perguntou Beto, incrédulo.

Recuei quando o Horror deslizou para o chão. Os seus olhos amarelos estudavam-nos de modo ameaçador. Então, aproximou-se de nós.

Nei e Beto estenderam-se atrás de papai. Mamãe abriu a boca de medo.

- O que quer?

Ele estendeu sua mão verde.

- Tomem - disse. - Esquecemos de entregar as entradas grátis para o próximo ano.

 

                                                                                            R. L. Stine  

 

                      

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