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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


O TERRIVEL MR. / Fel Marty
O TERRIVEL MR. / Fel Marty

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

" Histórias do F.B.I."

 

O TERRIVEL MR.

 

Orson Poitier, agente especial do FBI, tinha descoberto uma organização que tornaria os Estados Unidos num Caos. Seus superiores, não acreditavam, em suas palavras, nas suas suspeitas, apenas lhe pediam provas, apenas lhe pediam nomes. Quando Poitier estava em condições de confirmar os integrantes da organização é assassinado em plena avenida. Rocket, com o assassinato do colega, viu que as suas suspeitas estavam confirmadas e com a ajuda de clew, acaba por desmascarar todo o grupo.

 

              

Morte misteriosa em meio à mul­tidão. Um homem com cara de assassino julga-se muito esperto. Perde-se a pista e o caso volta ao ponto de partida, é você que deve fazer. Ele não o conhece.

Essas palavras eram a sentença para o agente especial Orson Portier, que trabalhara infatigavelmente durante meses até conseguir penetrar no complexo mundo da organização que deveria aterrorizar o país para levá-lo ao caos e à des­truição.

Todos os setores da administração pública já estavam infiltrados por elementos subversivos, prontos para semear a desordem e a confusão. Esperavam apenas ordens superiores para dar início ao trabalho de sabotagem nas estradas-de-ferro, nas linhas aéreas, apossar-se de segredos militares e desarticular a vida da nação.

Orson Portier já sabia de tudo e tinha avisado seus superiores sobre o perigo iminente, mas ninguém lhe dera atenção.

Onde estavam as provas desse perigo? Tudo funcionava na mais perfeita normalidade. Ne­nhum atentado, nenhum segredo militar tinha sido violado.

A vida seguia seu ritmo normal, e, embora as relações com certos países continuassem claudicantes, não havia razões para um alarme des­necessário.

A "guerra fria" já era uma coisa antiga e aceita tranquilamente. Espiões sempre existi­ram e continuariam a existir em todos os países. Mas Orson Portier fora longe demais ao julgar que nos Estados Unidos estivesse em formação uma organização de tal quilate, tão poderosa que não era possível aceitar sua existência.

Talvez o agente especial estivesse sendo ex­cessivamente cauteloso.

"Provas" era o que seus chefes exigiam, e ele não tivera nenhuma. O inimigo sabia fazer o seu trabalho. Era perfeito nos mínimos detalhes, e agia tão bem sincronizado quanto sigiloso. Cada membro parecia apenas uma peça insignificante, mas a organização ia aumentando a cada dia, e cada vez mais se firmando para, no momento determinado, agir abertamente, destruindo em pouco tempo o que fora construído através de séculos de civilização.

Portier tinha a intuição do perigo, sentia-o, mas não podia precisar de onde viria o primeiro golpe, onde se escondiam os inimigos à espera do momento de se lançarem ao ataque como bestas sedentas de sangue.

- "Esqueça isso" - diziam-lhe os amigos. - "Você está perdendo o tempo. Você está imaginando coisas." - Imaginando? Como estavam longe da reali­dade! Mas naquela tarde poderia finalmente le­var-lhes uma prova. Diria: "Consegui localizar um dos homens, um dos principais elementos da organização."

Seria uma vitória sua, somente sua. Quando detivessem aquele homem, o resto viria por si, e a nefasta organização ruiria como um castelo de areia.

Ia contente e feliz. Os amigos não voltariam a rir dele, nem seus chefes pediriam mais provas. Tinha vencido. Queriam provas? Ele as daria. Queriam nomes? Ele os mencionaria.

Tinha sido uma luta tenaz, que travara - so­zinho, cheio de angústia. Mas ele tinha a convic­ção do triunfo, e o conseguira.

Imaginava a expressão de assombro do inspetor-chefe quando dissesse o nome do homem que tinha nas mãos o destino do pais.

"Não, não pode ser", diria. E ele provaria que podia ser, que o gigantesco polvo da espionagem já tinha estendido seus tentáculos por toda a nação, pronto para esmagá-la quando chegasse o momento oportuno.

Aquela era a maior operação de espionagem e terrorismo da História! E ele desarticularia a organização e impediria sua tremenda obra destruidora.

Orson Portier, alto, musculoso e um tanto de­selegante, não se diferenciava da multidão que passava ao seu lado naquele momento.

Era um homem a mais, um cidadão como outro qualquer, uma aparência comum. Mas isso era o aspecto externo, e ninguém poderia imaginar o que se passava dentro de seu cérebro, o que ia em seus pensamentos.

Havia apenas uma diferença entre ele e os outros: se ele morresse naquele instante, uma organização terrorista continuaria agindo, e aquela multidão que circulava ao seu lado, os milhões de seres que povoavam os Estados Uni­dos, permaneceriam sob a ameaça da destruição.

Mas não, ele não permitiria. Ia satisfeito.

No entanto, a mesma voz de antes repetiu:

- Faça você, ele não o conhece.

- Bem, chefe.

E aquele homem começou a caminhar atrás do agente especial. Naquele instante, Portier teve a súbita sensação do perigo. Um perigo vago, in­definido, mas ao mesmo tempo angustioso e pe­netrante.

Instintivamente, girou a cabeça para a direita e para a esquerda. Nada. Nenhum sinal de perigo. À sua direita, uma loura fenomenal, que piscou um olho para ele. Portier sorriu.

À sua esquerda, uma senhora gorda, com uma bolsa de compras no braço. Não podia infundir qualquer temor.

Em seguida, voltou a cabeça para trás. Junto a ele, quase lhe pisando os calcanhares, um homenzinho de aspecto inofensivo. O agente teria jurado que era um anjo. Tinha cara de menino bom.

Portier continuou andando. Precisava desfazer seus repentinos e absurdos temores.

A loura estonteante, vendo que ele não fazia caso de seus olhares e seu sorriso, passou a di­rigir seu fogo de conquista para alguém mais vulnerável que o agente especial.

A massa de gente continuava a passar, tro­peçando uns com os outros. Novamente Portier experimentou a angustiosa sensação de perigo. A senhora gorda com a bolsa de compras con­tinuava ao seu lado, intensa aos empurrões. À sua direita, agora, ia um tipo grande, com cara de assassino, parecendo interessado em caminhar no mesmo passo que ele.

Olhou-o com receio. O homem também olhou para ele, com ar agressivo e desafiador. O agente se pôs em guarda, embora perguntando a si mesmo o que lhe poderia acontecer ali, no meio de tanta gente.

Era absurdo pensar em qualquer perigo. Estava nervoso.

Mas, sem dúvida, o perigo andava à sua volta. O homenzinho com cara de menino bom olhou para sua esquerda, de soslaio, e o outro, o que lhe tinha ordenado que fizesse o que tinha de fazer, com um gesto da cabeça instigou-o a seguir em frente.

"Bem" - disse para si mesmo o homenzinho - "Depois de tudo, não há pressa. Vá para o diabo. Você é que deveria fazer isso."

De qualquer modo, tinha de ser ele mesmo. "Será fácil para você", disseram.

Não, não era fácil. Além disso, tinha de agir o quanto antes. Talvez o agente especial cismasse de sair daquela rua tão povoada, e então seria impossível desincumbir-se de sua tarefa.

Portier, ocupado em observar o que fazia o homem que caminhava ao seu lado, não pôde ver a ação do homenzinho.

Tudo foi tão repentino e inesperado que o apanhou de surpresa. Uma súbita e aguda pontada, como se fosse a mordida de um inseto.

Quase nada. Voltou rapidamente a cabeça e olhou para trás: uma multidão apressada. Homens e mulheres empurrando-se, querendo passar uns na frente dos outros. A mesma coisa que vira antes, apenas o homenzinho desaparecera de vista.

Orson pensou que a pontada tinha sido apenas imaginação sua.

Sim, estava nervoso, sem saber por que e.. o que lhe estava acontecendo agora? Começou a sentir uma angustiosa sensação de asfixia. Sem querer, parou. O homem com cara de assassino perguntou-lhe:

- O que é que há, amigo? Sente-se mal? Portier, no meio da calçada, com as mãos no pescoço, respirava como dificuldade.

- Ouça, amigo não me ouve? - insistiu o outro.

Ouvia, mas era incapaz de responder. Aquela sensação, aquela asfixia...

As pessoas foram-se agrupando em volta deles, curiosas e alarmadas.

- O que há com ele? - perguntavam.

E o cara-de-assassino, segurando o agente es­pecial para que não caísse, repetia:

- Não sei. Deve estar doente.

- Está morrendo - aventurou um homem.

- Ai, meu Deus! — exclamou uma mulher.

- Temos que fazer alguma coisa - disse outro homem.

O que poderiam fazer? Nada. Portier não se­gurava mais o
pescoço, nem lutava desesperadamente para continuar vivendo. O cara-de-as-sassino, já não mais aguentando mantê-lo de pé, pediu:

- Ajudem-me,  está pesado demais!

De boa vontade teria saído dali correndo. Me­tera-se num aperto. Claro que não podia ter feito outra coisa senão enfrentar a situação.

Alguns policiais acudiram e tomaram conta do caso. Um deles disse:

- Este homem está morto.

De fato, Orson Portier tinha deixado de exis­tir.

Outro policial, pondo a mão sobre o ombro do cara-de-assassino, ordenou:

- Você terá de vir conosco.

De nada serviram os seus protestos de que não sabia de nada, que tinha apenas segurado o homem e perguntado o que estava sentindo.

O pior veio depois, quando os agentes do FBI. se encarregaram do caso. O cara-de-assassino esteve a ponto de desmaiar quando o agente es­pecial Rocket lhe disse:

- Sabe o que aconteceu ao nosso compa­nheiro? Foi assassinado.

- Assassinado? - repetiu o homem, assus­tado.

De fato, Orson Portier tinha sido assassinado. Demoraram a averiguar isso. Não havia nenhum ferimento externo, apenas um pequeno orifício na região glútea.

- Mataram-no, injetando-lhe veneno com uma agulha hipodérmica - disse o legista.

O cara-de-assassino empalideceu ao ouvir aqui­lo e começou a gritar:

- Não fui eu! Não fui eu!

Ninguém tinha dito que fora ele. Natural­mente, os agentes especiais não estavam muito certos de sua inocência. Poderia ter sido ele o assassino de Orson Portier, ou outra qualquer pessoa das que passavam junto do agente pela calçada.

- Ninguém o está acusando - disse o agente Rocket para tranquilizá-lo. - Mas sem dúvida você terá visto as pessoas que caminhavam mais perto de vocês no passeio. Injetaram-lhe veneno segundos antes de morrer.

Evidentemente, o homem era tão suspeito como outra pessoa qualquer que tivesse estado junto a Orson Portier quando este caminhava. Mas o agente Rocket não quis assustar o cara-de-assas­sino e tornou a perguntar:

- Procure lembrar-se, senhor Brown. Conse­guiu reparar nos que iam ao lado de vocês pela calçada?

O senhor Brown tentava lembrar alguma coisa e após alguns instantes em que pareceu forçar a memória, respondeu:

- O... o senhor Portier parecia um pouco inquieto.

- Sim? - Rocket sorriu com ironia. - Já é alguma coisa.

- Olhou para mim várias vezes com ar des­confiado.

- E por que o olhou com ar desconfiado? Acha que ele o conhecia?

- Não, não. Eu, pelo menos, não o conhecia. Pode ter sido a minha cara. Muita gente diz que que eu tenho cara de assassino.

Os agentes olharam para ele com atenção. In­dubitavelmente, sua fisionomia inspirava pouca confiança, ainda que se possa ter cara de assassino e ser boa pessoa, e, ao contrário, ter cara de boa pessoa e ser um assassino. Insistiram:

- Não se lembra de mais nada?

O senhor Brown parecia desesperado.

- Não, não me lembro de mais nada. Havia muita gente passando por ali.

Brown parecia realmente não saber mais nada. As investigações sobre sua pessoa revelaram ser ele estimado pelos que o conheciam. Por fim, sem mais nenhuma acusação, deixaram-no livre.

- Senhor Brown - disse Rocket - talvez precisemos, chamá-lo outra vez, quando conse­guirmos averiguar algo mais sobre a morte de Portier. Até então, o senhor está livre. Pode ir.

Saiu com muita pressa, naturalmente. Nem Rocket nem nenhum dos agentes pôde ver o sorriso irônico que o senhor Brown levava nos lábios ao atravessar os umbrais daquela seção do FBI.

Arthur Brown considerava-se um homem in­teligente. Certo de que não tinha sido ele o assas­sino de Portier e de que ninguém poderia acusá-lo - ao menos por enquanto, - de qualquer relação com a morte do agente especial, ia com um ar triunfante e tranquilo.

Mas ele sabia que se não tivesse estado ao lado de Orson Portier o homenzinho não reconheceria a quem "espetar". Talvez tivesse errado em ficar ao lado de Portier, mais a coisa foi mais rápida do que esperava e não teve tempo de sumir entre a multidão.

Por outro lado, se tivesse escapulido, talvez despertasse suspeitas, com aquela cara de assas­sino. E tudo saiu melhor do que imaginara, pois agora estava livre. Os agentes do FBI não suspeitavam dele. Ele os tinha enganado.

A morte do agente Orson Portier podia ser tida como um crime perfeito. Somente Brown e Cole sabiam quem era o assassino, e nem ele nem Cole, naturalmente, iriam dar com a língua nos dentes.

A maioria dos componentes da organização terrorista era gente bem conceituada, gozando da máxima confiança nos lugares por onde an­dava.

Arthur Brown também era considerado da má­xima confiança e lisura por todos que o co­nheciam.

Arthur Brown ignorava como era difícil en­ganar o FBI. Apesar de ter sido solto sem maio­res suspeitas, não sabia que se tinha transformado no coelho perseguido pelos caçadores. Tão logo saíra para a rua, um agente especial co­meçou a segui-lo de perto.

Brown entrou no "subway" sem perceber que alguém o acompanhava e que dali para a frente todos os seus passos seriam do conhecimento do FBI.

Só depois de Orson Portier morrer, o inspetor-chefe compreendeu que o agente tinha razão. Sem dúvida, Portier tinha conseguido provas com­prometedoras para a organização terrorista. Por isso, fora assassinado.

Agora tinham de descobrir os assassinos e des­truir a organização.

Mas Portier tinha levado seu segredo para o outro mundo e não havia maneira de se come­çar uma investigação, pois seus assassinos não tinham deixado nenhuma pista.

Cabia apenas esperar que Brown fosse um elo na corrente de terror que ameaçava a integridade da nação. Por isso o FBI não perderia Arthur Brown de vista...

 

Onde uma entrevista tem um des­fecho inesperado. Aumenta o mis­tério em torno do tenebroso Mister K. Bom começo, péssimo final.

Brown dirigiu-se para Murray Street, ao sul de Manhattan, onde residia. Ao sair do "subway" já não era seguido pelo mesmo agente. A mudan­ça era uma maneira de evitar qualquer suspeita por parte de quem era seguido, em caso de notar uma presença constante perto de si. De qualquer modo, Arthur Brown não desconfiava de nada. Estava muito seguro de si e de que sua inocência era coisa mais do que provada.

Se tivesse voltado a cabeça ao entrar em casa, teria visto na calçada fronteira um homem pa­rado, fumando distraidamente, mas que, por bai­xo do chapéu caído sobre a testa tinha os olhos pregados nele.

Se Brown suspeitasse de alguma coisa, também não teria apanhado o telefone e discado aquele número, pois seu aparelho já estava sob o contro­le do FBI. Todas as suas palavras seriam ouvidas e gravadas.

Quando atenderam do outro lado, Brown per­guntou: - É você, Henry?

Henry parecia ser mais desconfiado, por isso respondeu furioso: - Animal! De onde está me chamando?

- De minha casa.

- E por que de sua casa? Tem certeza de que não está sendo vigiado?

Brown achou muita graça da desconfiança de Henry. Depois de rir alguns segundos, grunhiu:

- Acha que eu sou idiota, Henry? Os caras do FBI estão convencidos da minha inocência. Julgam-me um cordeirinho... Além disso, eu não fiz nada, foi você que...

- Cale a boca, imbecil! Era melhor que mor­desse a língua. As paredes têm ouvidos, idiota. Bem, o que é que você quer?

- Nada, só dizer que tudo vai bem e que não fique preocupado.

- Para isso, você não precisava ter chamado. Bem, de qualquer modo, K. deseja vê-lo esta noite,, no lugar de sempre.

- Que é que K. quer comigo? - Brown pa­recia assustado.

Henry não respondeu, e Brown desligou o apa­relho. Agora, a vigilância sobre Brown seria dobrada. Quanto a Henry, seria fácil localizá-lo, pois o número discado pelo cara-de-assassino constava da lista telefônica em nome de um tal Sinclair Steton, rua Setenta Oeste, número duzentos e oito, e bem podia ser o personagem a quem Brown chamava de Henry.

Não havia mais o que averiguar. No momento, só interessava vigiar Brown sem despertar sus­peitas. Ele poderia levar aos outros, a Henry e ao tal K.

Quem seria o misterioso cavalheiro que Henry mencionara apenas como K.? Devia ser um mem­bro importante na organização, pois fora men­cionado em tom de respeito, e Brown parecera muito preocupado ao saber que devia avistar-se com ele.

Agora, teriam apenas que seguir Brown até o local do encontro, e ali deitar-lhes a mão, para esclarecer todo o mistério.

Os agentes do FBI esperaram durante toda a tarde pela saída de Arthur Brown. Já começa­vam a desconfiar que o telefonema não passava de um despistamento, quando Brown desceu à rua.

Envergava um "smoking" azul, sapatos brilhan­do, e fumava um charuto havana. Tomou um táxi a poucos passos de casa e seguiu para o seu destino.

Atrás do táxi, outro carro também se pôs em marcha. Dentro dele, iam os agentes especiais, prontos para entrar em ação.

No táxi, Brown tirava largas baforadas do charuto enquanto imaginava o que K. poderia querer, uma vez que o misterioso personagem nunca se comunicava com figuras tão insignifi­cantes como ele, um simples membro secundário na organização. Sempre que queriam alguma coisa com ele, apenas telefonavam.

O táxi seguia seu rumo, e a cada milha um carro diferente tomava o lugar do anterior, para não despertar suspeitas.

Por fim, o táxi se deteve na esquina da Ave­nida Westchester com a rua Cento e Setenta e Sete.

O local do encontro era, sem dúvida alguma, o "Salão Tropical", um luxuoso e elegante cabaré, onde Arthur Brown entrou.

Três agentes especiais, entre os quais se acha­va o ruivo Horst Rocket, entraram atrás dele.

Apesar de seu elegante "smoking" azul, Arthur Brown parecia um tanto acanhado naquele am­biente. Sua condição de vendedor de roupas para homem não lhe permitia, certadamente, a fre­quente despesa de vinte dólares, que era quanto custava a entrada naquele lugar, e muito menos desfilar com as elegantes damas que andavam por ali à caça de cavalheiros dispostos a livrar suas carteiras do peso de algumas notas.

Claro que o ambiente não era desagradável. Apenas Brown não podia dar-se ao luxo de vi­sitá-lo com frequência.

Talvez que com o tempo ou mesmo a partir daquela noite, em que conheceria K. - um privi­légio concedido a poucos - pudesse repetir com regularidade suas escapadas noturnas até o "Sa­lão Tropical". Tinha certeza de que sua entrevista com K. iria lhe render muito dinheiro.

Arthur Brown não se julgava um homem bo­nito e conquistador. Era bem modesto em suas pretensões don-juanescas. Sabia dosá-las e dar-lhes o justo valor. Pelo menos, era o que vinha fazen­do até então, porque naqueles momentos, sentado a uma mesa perto da pista de dança, começou a sentir o fogo da vaidade masculina.

Uma loura olhava para ele. Uma loura que... O coração de Brown começou a dar saltos de sofreguidão. Desde que entrara, a loura fixara os olhos nele, e era exatamente do tipo que lhe agradava.

Arthur Brown chegou a esquecer que não tinha ido ao "Salão Tropical" para cobiçar louras ou morenas, e sim para avistar-se com Henry, que deveria apresentá-lo a K.

A loura piscou um olho. Ele também. A loura sorriu. Ele correspondeu. Ela estava sentada e se pôs de pé. Ele, ao vê-la levantar-se, pôs-se de pé também.

Ela caminhou alguns passos na direção dele. Ele também caminhou alguns passos na direção dela. Encontraram-se lado a lado e olharam-se frente a frente.

- Olá - disse a loura, com a voz mais suave e doce que Brown já tinha ouvido em sua vida.

- Olá - respondeu ele, em um tom que quis parecer jovial e despreocupado. - Está... está sozinha?

Naturalmente, a loura estava só. Brown to­mou-lhe a mão cavalheirescamente e levou-a para sua mesa. Esquecera-se totalmente de Henry e de K. Tinha-se esquecido, afinal, para que tinha ido ali.

Por fim, tornou a lembrar a finalidade de sua ida quando a loura, sempre com doçura na voz e uma mansidão de ovelha, pediu ao "maitre" nada menos que uma garrafa de champanhe francês legítimo, que, segundo disse, seria para celebrar seu primeiro encontro com o encantador cavalheiro de "smoking" azul.

O encantador cavalheiro de "smoking" azul le­vou um susto e soltou uma espécie de mugido. Olhou para o "maitre" que sorria servilmente, depois para a jovem que sorria com uma ingenuidade realmente eletrizante, e terminou sorrindo também.

Naquele momento, ao imaginar o preço as­tronômico do "legítimo champanhe francês", como dizia a jovem, lembrou-se de que se enredara nas tramas da organização precisamente pela ne­cessidade de aumentar seu pecúlio com mais alguns punhados de dólares.

E ao se lembrar disso, lembrou-se também de Henry e K. Consultou seu relógio. Já era tempo de Henry estar ali, mas estava certo de que ele ainda não viera. Esticou o pescoço e olhou em volta.

A loura, ao vê-lo esticar o pescoço daquele modo, perguntou cheia de graça:

- A quem está procurando, querido? Será alguma pequena?

Brown voltou a cabeça à posição normal.

- Não, não procuro nenhuma pequena. Já tenho você.

Sem dúvida, estava preocupado. Daquele mo­mento em diante, não fez outra coisa senão olhar o relógio a todo instante. O champanhe chegou. Embora de qualidade duvidosa, beberam-no assim mesmo e Brown ficou com o bigode salpicado da borbulhante es­puma.

A jovem, entusiasmada e um pouco alegre, en­saiou pedir outra garrafa. Apesar da euforia que o vinho lhe dera, Brown continuava pen­sando em Henry e tratou de frear a sede da pequena com um "não" que a deixou surpresa e magoada.

- Que há com você, meu amor?

Brown soltou outro de seus mugidos, esticou de novo o pescoço procurando Henry, e, não o vendo, grunhiu:

- Vá para o diabo!

A hora costumeira de Henry aparecer já soara há muito. Onde teria se metido ele?

- Já está cansado de mim? - perguntou a jovem, vendo que ia perder a comissão da se­gunda garrafa de champanhe.

Brown pensava que algo de grave devia ter acontecido para que Henry não estivesse ainda por ali. Virou-se para a loura e ordenou:

- Vá embora.

Os frequentadores já começavam a sair. Os músicos tocavam com o cansaço característico dos últimos momentos, as jovens que andavam pelo salão começavam também a retirada. Algumas, aborrecidas, bocejavam abertamente; ou­tras, cuja sorte tinha sido mais favorável, con­tinuavam ao lado de seus pares procurando, gastar o mais possível.

A loura estonteante de Brown, vendo que ele não se decidia pela segunda garrafa, e que além disso não lhe dava a mínima atenção, levan­tou-se com um frio "adeus", que Brown nem ouviu.

A ausência de Henry deixava-o preocupado. Se não tinha a intenção de comparecer, por que ti­nha pedido que fosse ao "Salão Tropical"?

Decidiu chamá-lo pelo telefone. De nada adian­tou, pois ninguém atendeu.

Por fim, aborrecido, e quando já os garçons recolhiam os serviços de mesa e ficavam apenas alguns bêbedos dormindo, resolveu ir embora.

Uma noite perdida e alguns dólares a menos na carteira. Saiu mastigando palavrões contra o estúpido Henry e o desconhecido K. Podiam ao menos avisar que não iriam, ao invés de fa­zerem-no esperar horas e horas.

Teria que procurar um táxi para ir para casa. Como tinha sido dos últimos, já não havia ne­nhum nos arredores. Começou a caminhar pela calçada adiante e não viu que poucos metros atrás, um homem seguia seus passos.

Pela calçada oposta, outro homem também o seguia, enquanto um pouco atrás um carro mar­chava lentamente, levando mais dois agentes do FBI.

Um segundo carro vinha em direção contrá­ria e diminuiu a marcha ao chegar perto de Brown. Por mera curiosidade, olhou para o veí­culo e viu com surpresa que nele estava Henry.

Brown levantou o braço e acenou. Henry, po­rém, já o tinha visto de longe e, ao aproximar-se, apontou o cano de uma metralhadora em sua direção. Resmungou algo e apertou o gatilho.

O matraquear ressoou de maneira lúgubre no silêncio da madrugada. Brown foi apanhado em cheio, com o braço ainda no ar, acenando para o amigo retardatário. Caiu sem perceber o que sucedia.

Para os agentes especiais, o ataque contra Brown foi tão inesperado que demoraram alguns segundos a empunhar armas e disparar contra o automóvel que já começava a distanciar-se. Os federais que iam no carro, assim que percebe­ram o que acontecia, tentaram impedir a fuga do assassino.

Rapidamente, Henry voltou a arma contra eles. Uma chuva de balas caiu sobre os homens do FBI e pouco depois o carro da lei espatifava-se contra um poste de iluminação.

Os agentes que iam a pé atrás de Brown cor­reram para auxiliar os companheiros. Dentro do carro a tragédia era quase total. Dois ho­mens estavam mortos. As balas da metralhadora de Henry tinham arrebentado a cabeça de um e varado o coração de outro. Apenas Rocket se salvara.

As afirmações do agente Orson Portier to­mavam agora um vulto maior. A organização terrorista devia existir realmente, e Arthur Brown fora liquidado por se ter tornado perigoso demais para a segurança do grupo, uma vez que co­meçara a ser vigiado pelo FBI.

Agora havia quatro mortos no rasto da or­ganização: três agentes especiais e um próprio membro do grupo terrorista. Também já o FBI tinha por onde começar as investigações. Procura­ria agora localizar o carro assassino, e também agarrar Henry, cujo telefone fora localizado quan­do da conversa com Brown.

Horst Rocket e Eddie Chew, recém-chegados da academia de Quantico, iriam buscar o tal Henry.

- Rapaz - disse Rocket a Chew - tenho a impressão de que este vai ser um caso difícil de resolver. Você já viu tudo.

Era a primeira vez que Chew tinha enfren­tado balas reais. Ali não era como em Quantico, e quando chegasse o momento de disparar sua arma não mais seria contra bonecos, e sim con­tra gente de verdade. E teria de atirar, pois sua vida dependeria disso.

- Sim, já vi tudo - respondeu. - Atiraram para matar.

Rocket sorriu. Aquele rapaz lhe era simpático, tinha envergadura de policial. Precisava, agora, ter sorte também.

- Vamos à rua Setenta Oeste - disse Ro­cket.

O número duzentos e oito era um prédio ve­lho, caindo aos pedaços, com um só pavimento. Duas árvores centenárias ensombreavam a en­trada, a marquise estava meio destruída. Um cão grunhia furioso esfregando-se contra a pa­rede do prédio a fim de se livrar das pulgas.

- É essa a casa - mostrou Rocket. Chew olhou para cima e disse:

- É aí que você pretende encontrar esse Hen­ry dos diabos?

Na verdade, depois do que acontecera, Rocket não tinha muitas esperanças de achar Henry ali. Certamente ele mudara de esconderijo. Aquela casa não era mais um lugar seguro, já que o FBI entrara em ação. Mas Rocket julgou que talvez houvesse algum morador que pudesse lhe dar informações sobre Henry, qualquer coisa que servisse como pista.

- Ainda não sei o que encontraremos - res­pondeu. - Vamos ver.

O cão pulguento latiu furiosamente quando eles se aproximaram da porta, mas parecia que as pulgas o incomodavam mais que qualquer es­tranho, e ele continuou se roçando contra a parede sem dar maior atenção aos dois intruesos.

Rocket apertou a campainha e esperou alguns segundos, porém ninguém atendeu à chamada.

- Será que não há gente em casa? - co­mentou Chew.

Rocket continuou apertando a campainha, que tinha um som tão forte que só não seria ouvida por um surdo.

Nem por isso desanimou. Estava disposto a arrebentar a porta se ninguém atendesse. Pouco lhe importava a lei contra a invasão de domicí­lio.

Chew, no entanto, novato e inexperiente, mantinha-se cauteloso e dentro dos princípios que lhe tinham ensinado.

- Vou tentar outra vez - disse Rocket. - Se não abrirem, entraremos de qualquer maneira.

- Como? - perguntou Chew.

- Ora! A fechadura não parece muito resis­tente.

Chew protestou:

- Pretende forçar a porta?

- Claro! O que mais eu poderia fazer?

- E porquê precisamente isso?

Com a atenção voltada para o interior da casa, Rocket e Chew não notaram a aproximação de uma jovem. Voltaram-se de repente, e ficaram olhando para ela com ar de espanto. Era real­mente uma jovem de extraordinária beleza e que faria parar qualquer trânsito. Ainda sur­presos, ouviram-na dizer:

- Suponho que não vão tentar arrombar a porta.

Diante de uma mulher tão espetacular, Rocket conseguiu apenas gaguejar algumas palavras. Disse:

- Temos que ver o dono da casa.

- Se é só isso - respondeu a jovem - não há nenhum inconveniente. Esperem um pouco.

Tirou uma chave da bolsa e, com gesto tran­quilo, abriu a porta e disse:

- Entrem.

Rocket e Chew olharam-se desconfiados. Não seria uma armadilha? Chew era o mais teme­roso, e por isso levou a mão para perto da pistola.

A jovem passou adiante deles. Era mesmo uma beleza. Teria pouco mais de vinte e cinco anos, olhos grandes e brilhantes, rosto perfeito e cabelos ondeados, presos atrás num grande coque.

Sem prestar muita atenção aos dois, ela entrou e acendeu a luz.

- Não fiquem aí, entrem.

Entraram. No momento, não havia nada sus­peito. A jovem os levou para uma espécie de sala de visitas, onde dois quadros horríveis e mal pintados estavam perfeitamente de acordo com o mobiliário.

Uma paisagem e uma natureza morta. Chew entendia de pintura, e fez um gesto de desagrado ao ver os quadros que julgou serem obra de algum débil mental.

- Eu mesma os pintei - disse a jovem, ao ver o interesse com que olhavam os quadros.

- Formidáveis! - exclamou Chew, mudando rapidamente de opinião. - Têm muita arte - admitiu, sabendo que aqueles abortos jamais po­deriam passar por obras-de-arte.

- Costumo pintar nas horas de folga - disse a jovem, satisfeita por ver que sua pintura era admirada.

- Como está Sinclair Steton? - perguntou Rocket bruscamente, interrompendo a conversa.

- O que querem com ele? - perguntou a jo­vem, encarando Rocket.

O agente deu uma resposta evasiva:

- Negócios. Precisamos conversar com ele. Vamos, beleza, diga-nos logo onde se meteu o bom Sinclair Steton.

Para dar maior força às suas palavras, Rocket tirou sua identificação e mostrou-a à jovem.

- FBI. Diz alguma coisa para você? Depois de alguns segundos, a jovem virou-se para Chew e perguntou:

- Também é do FBI?

- Para servi-la - respondeu o agente.

- Não preciso de seus préstimos para nada. Dirigindo-se para Rocket, disse:

- Pode guardar a carteira. O que querem?

- Onde está Sinclair Steton? - tornou a per­guntar Rocket.

- Esperem aqui um momento. Vou buscá-lo. Rocket e Chew trocaram um olhar desconfiado.

Que mistério havia ali? Se Sinclair Steton estava em casa, por que não viera abrir a porta?

- Um momento - disse Rocket. - Eu irei com você.

- Desconfia de mim?

- De modo algum. Quero apenas fazer-lhe companhia. Sua presença me é muito agradável. Vamos, e cuidado com o que fizer.

A jovem não estava assustada, pelo contrário, parecia até divertir-se com aquilo. Encolhendo os ombros, pôs-se a andar na frente do poli­cial.

Percorreram um longo corredor. De ambos os lados, só portas fechadas. A jovem seguia cal­mamente, sem se preocupar em saber se ele a acompanhava. Parou no fundo do corredor. Ro­cket parou também. Abrindo a porta suavemen­te, ela acendeu a luz.

- Entre - disse, afastando-se para o lado. Por precaução, Rocket levou a mão à pistola.

Parecera-lhe ter ouvido um barulho dentro do aposento, e, além disso, as atitudes daquela moça não lhe inspiravam muita confiança.

- Você na frente - disse.

A jovem, sorrindo, perguntou:

- De que tem medo, "tira"?

Dentro do quarto o estranho ruído continuava. Rocket pensava em seus companheiros mortos: Portier e os outros dois. Talvez tivessem morrido por confiarem demais.

Com a pistola na mão, o agente deu um pon­tapé na porta, terminando de abri-la.

 

Mais uma decepção para o FBI. Dois agentes se divertem. Final­mente, o encontro com Henry! Um novato na boca do lobo.

O homem estava ali, olhando-o com os olhos muito abertos, evidentemente assustado. A brusca aparição de Rocket empunhando uma pis­tola daria para assustar qualquer um.

A jovem passou por ele, sorrindo divertidamente.

- Podia ter avisado - disse Rocket.

- Avisá-lo de quê? Aí está Sinclair Steton; é meu pai.

- Perdoe-me - disse Rocket para justificar-se. - Não sabia que...

O homem continuava com o mesmo olhar as­sustado. Rocket guardou a pistola rapidamente. Que poderia temer daquele pobre inválido, con­denado à imobilidade absoluta em sua cadeira de rodas? Ante o silêncio do homem, Rocket con­tinuou:

- Gostaria de lhe falar, senhor Steton. Pode me ouvir?

Steton, ao ver que a arma fora guardada, pareceu ficar mais calmo, porém continuou em silêncio e com o mesmo olhar de assombro.

- Não se preocupe, senhor agente - disse a jovem, enquanto se aproximava do inválido e lhe afagava o rosto carinhosamente. - Papai não pode lhe ouvir nem responder. É surdo e mudo. Há muitos anos que o trouxeram assim da Europa. Uma bomba dos alemães o deixou inválido e sem fala. Agora pode compreender por que não foi abrir a porta.

- E... vive sozinho?

- Relativamente - respondeu a jovem com uma expressão de tristeza. - Tenho pouco tempo para ficar com ele. Preciso trabalhar para viver, e passo as noites no bar. Só chego em casa a estas horas e...

- E Henry, onde está?

A pergunta pareceu deixá-la surpreendida.

- Não conheço nenhum Henry - respondeu. Para Rocket o assunto já estava começando a ficar desagradável. Viera prender Henry e espe­rava pelo menos encontrar um Sinclair Steton que pudesse lhe dar alguma informação. Da maneira como iam as coisas, começava a perder as esperanças de localizar o assassino. Mas Ro­cket não poderia se dar por vencido, e, com uma expressão rude, questionou:

- Deixe de conversa, beleza, e vamos aos fa­tos. Temos provas de que nesta casa se esconde um indivíduo que atende pelo nome de Henry, e você vai me dizer agora mesmo onde ele está. Ou prefere que nós mesmo o procuremos?

Da porta, Chew olhava alternadamente para o inválido, para a jovem, e para o seu compa­nheiro.

- Já disse que não... - ia dizendo a jovem.

Rocket segurou-a bruscamente pelo braço e obrigou-a a sair do quarto.

- Vamos - gritou. - Revistaremos a casa do teto ao porão. E você, Chew, fique aqui. Não confio muito nesse... inválido surdo-mudo. Pode ser que não seja nem uma coisa nem outra. Ao menor movimento suspeito dê-lhe com o cano da pistola nos rins.

A jovem quis protestar e até mesmo lutar para que Rocket não a arrastasse com -le, mas foi inútil, porque o agente, sem soltar-lhe o braço, obrigou-a a caminhar ao seu lado aos empur­rões.

- Não tem o direito. Darei parte a...

- Dê parte a quem quiser. Henry e seus cúm­plices não deram parte a ninguém para assassi­nar meus companheiros.

A jovem deixou de lutar e protestar.

- Que disse? Não sei do que está falando.

- Talvez saiba melhor do que eu. E agora, feche o bico. Vamos ver quem mais vive nesta casa.

Chegaram à primeira porta do corredor. Rocket empunhou a pistola e abriu-a com um pontapé. O quarto estava vazio, sem mobiliário algum.

Com um rápido golpe de vista, o agente viu que não havia ninguém ali.

Os dois quartos seguintes apresentavam o mes­mo aspecto. No seguinte, também não havia ninguém, mas não estava vazio como os ante­riores. Uma cama, um armário, duas cadeiras e um lavatório completavam o escasso mobiliário. A cama parecia desfeita.

- Quem dorme aqui? - perguntou Rocket. A jovem pareceu surpreender-se por não ver ninguém ali. Rocket desconfiou que a surpresa poderia ser apenas fingimento.

- È aqui que Henry estava? Vamos, boneca, fale de uma vez.

Livrando-se das mãos do agente com um vio­lento puxão, ela protestou:

- Seu bruto, você me machucou! Já lhe disse que não conheço nenhum Henry. Este quarto é ocupado pelo senhor Files, William Files.

- E agora, onde se meteu esse sujeito?

- Devia estar aqui - disse a jovem, manten­do a expressão de surpresa.

Rocket tornou a segurá-la pelos ombros e gri­tou:

- Olhe, pequena, não venha com essa pra cima de mim. Sou macaco velho, ouviu?

Desta vez a pequena não protestou. Começou a chorar, mostrando-se em toda a sua fraqueza feminina. As lágrimas fizeram algum efeito sobre o agente.

- Bem, não tive a intenção de magoá-la - fez uma pausa, acendeu um cigarro e depois de algumas tragadas acrescentou: - Então não há mais ninguém na casa além de seu pai, você e esse William Files?

Entre lágrimas e soluços, a jovem respondeu à meia-voz:

- Aqui em casa não entra mais ninguém além do senhor Files.

- Nesse caso, quem respondeu, ontem, ao tele­fone, foi seu pai? Alguém tocou para cá querendo falar com Henry, e o tal Henry foi quem atendeu.

- Repito que não podia haver mais ninguém além de meu pai e do senhor Files.

Verdade ou não, Rocket viu-se forçado a acei­tar. De qualquer modo, existia a possibilidade de que o senhor Files também atendesse pelo nome Henry.

- Bem, vá lá. Agora conte-me como é esse Files e por que vivia aqui. E já é tempo de saber seu nome também, menina.

- Olga - respondeu a jovem.

A presença de William Files, ou Henry, foi ex­plicada. A casa era grande e sobravam cômodos, a jovem e o pai precisavam de dinheiro e re­solveram alugar o quarto.

O senhor Files estava ali há uma semana e apenas o tinha visto uma vez durante aquele tempo. O senhor Files nunca saía de seu aposento e ela nada sabia sobre ele. Era um homem baixo, magro, calvo, que aparentava trinta e tantos anos.

- Nenhum detalhe mais? - perguntou Ro­cket.

Olga fêz um esforço de memória e respondeu:

- Creio que... sim, isso mesmo. Tinha um tique nervoso, piscava muito um dos olhos.

Embora fosse um detalhe importante, Rocket achou que não seria fácil identificar o senhor Fi­les. Haveria muitos homens com as mesmas características: baixos, magros, calvos e com um tique nervoso igual. O agente deu-se por satis­feito e chamou seu companheiro. Chew atendeu imediatamente, deixando o senhor Steton sozinho.

- Enquanto falo ao telefone, vigie a garota, não confio muito nela. E não toque em nada aqui dentro. O pessoal da Identificação terá mui­to que fazer neste quarto.

Certamente, William Files devia ter deixado suas impressões digitais por ali, pois segundo a jovem, era um sujeito tão estranho que não permitia que seu aposento fosse arrumado e var­rido.

Em pouco tempo a Seção de Identificação re­colheu todo o material possível. Logo as im­pressões digitais foram confrontadas e, exceto as da jovem e as de seu pai espalhadas pela casa, as únicas impressões encontradas no quarto só poderiam pertencer ao senhor Files. No entanto, as impressões de William Files não foram encon­tradas nos arquivos do FBI. O senhor Files não possuía ficha de identificação.

Rocket viu que não seria fácil localizar William Files, agora parecendo ser realmente o misterio­so Henry. Teria sido ele o assassino de Orson Portier? Sua ação contra Arthur Brown dava ao agente Rocket a quase certeza que sim.

Rocket voltou a atenção para o carro usado pelo assassino de Brown. Fora encontrado num terreno baldio, além de Kinsbridge, do outro lado do Harlem. Tinha sido roubado uma hora antes do crime. Seu proprietário era um fabricante de conservas, que só dera parte algumas horas de­pois do roubo. Dentro do veículo não havia nenhuma impressão digital. Possivelmente os as­sassinos tinham usado luvas. Encontraram ape­nas as cápsulas vazias que serviram para ma­tar Brown e os dois agentes especiais. Talvez também servissem para identificar a arma assas­sina e, em conseqüência, aquele que a utilizara.

As buscas na residência de Arthur Brown também não conduziram a nada. A misteriosa organização terrorista descoberta por Portier continuava no anonimato e todas as provas reu­nidas pelo agente assassinado tinham ido com ele para o túmulo.

Horst Rocket julgava que só havia um meio a tentar. Atrair a atenção dos assassinos sobre êle talvez desse algum resultado. Precisava saber os lugares freqüentados por Orson Portier e per­correr os mesmos caminhos trilhados pelo agente desaparecido.

Ele seria a isca que os assassinos poderiam morder. Se desse certo, tudo seria descoberto. Se falhasse, poderia terminar da mesma forma que Portier.

Resolveu que não agiria sozinho, como tinha feito Portier. Chew entraria no negócio. Era um jovem destemido e pronto para ganhar pontos dentro da corporação. Doravante ele teria boas ocasião para isso...

Rocket descobriu que Portier costumava ir a um lugar chamado "Corea Club", cuja frequência era o que pior havia no submundo.

Em suas investigações, Rocket viu que o esta­belecimento era algo semelhante à Torre de Ba­bel. Quem metesse o nariz por ali, a qualquer hora do dia ou da noite, veria gente de todas as raças e tipos. Chineses amarelos como limões, egípcios num tom escuro de verde-oliva; sudaneses com a negrura do betume, malaios, etíopes, russos, mongóis e até mesmo algum tibetano, numa incompreensível mistura com porto-rique­nhos, texanos e um ou outro descendente dos antigos índios apaches e sioux.

Tal variedade de tipos reunidos em um redu­zido cubículo com pretensões a casa de diversões, falando todos de uma vez, dançando ou ingerindo as mais exóticas bebidas com sofreguidão, criava um ambiente que mais parecia a ante-sala do inferno.

Rocket já conhecia o local, mas Chew, que nunca estivera em lugar semelhante, ficou perplexo ante o espetáculo e a qualidade da clien­tela.

Chew observou tudo. Um amarelo gordo, quase redondo, fazia-se acompanhar de duas mulheres, uma ruiva e uma loura côr de palha. Devia di­vertir-se à grande, a julgar pelas risadas que acompanhavam cada trago de um líquido que tanto podia ser uísque como nitroglicerina.

Outro cavalheiro, um negro, adotara uma posi­ção altamente estranha. Com os pés em cima da mesa, a cabeça apoiada no encosto da cadeira e os polegares enfiados nas cavas do colete, can­tava a plenos pulmões sem que ninguém o per­turbasse.

Os que dançavam formavam um quadro tam­bém bastante pitoresco. Os pares procuravam as mais variadas posições imagináveis: de frente, de costas, de lado, enfim, era realmente um es­petáculo grotesco e hilariante.

Chew afastou os olhos de tudo aquilo trazendo no rosto uma expressão de nojo.

Uma mulher aproximou-se provocante e disse:

- Como é, enxuto, vamos dar uma voltinha?

A primeira intenção do agente foi dar-lhe um empurrão, mas pensou melhor e decidiu acom­panhá-la. Rokét estava mais adiante, sentado ao lado de uma morena curvilínea, eufórico como se estivesse no Paraíso.

Tinham ido ali para ver e ouvir. Se Portier frequentara ultimamente o "Corea Club" devia ser em função do que ele tanto se empenhara em descobrir a organização terrorista. Se aquele lugar tivesse alguma conexão com as investiga­ções de Portier, eles não demorariam muito a chegar perto da verdade.

Chew pesou tudo isso, e, virando-se para a mu­lher, respondeu:

- Claro, meu amor. Vamos mandar brasa. Apesar do ambiente estar repleto, conseguiram achar uma mesa e duas cadeiras. A mulher dei­xou-se cair numa delas e pediu uma bebida. Chew observou-a com curiosidade. As olheiras acentuadas e as rugas do rosto denunciavam a vida dura que a infeliz levava. Sentiu pena dela e de todas as outras que vagavam por ali.

- Não bebe nada? - perguntou ela. - O que está olhando com tanta atenção?

- Estou olhando para você que... é muito bonita, sabe?

Ela sorriu com amargura. Sabia que não a olhava por isso, pois sua juventude e beleza já tinham desaparecido com o passar dos anos. Nenhum homem lhe diria sinceramente que era bo­nita.

Chew, de vez em quando, passeava o olhar pelo salão, naturalmente à procura de um tipo baixo, magro, calvo e com um tique nervoso num olho.

- Procura alguém? - perguntou a mulher. Chew, distraído, voltou a cabeça e disse:

- Como disse?

- Perguntei se você procura alguém.

- Tenho um amigo que costuma vir por aqui e gostaria de encontrá-lo. Há muito tempo que não nos vemos.

A mulher sorveu de um só gole a sua dose de uísque com soda e disse:

- Se ele vem muito por aqui, é possível que eu o conheça. Há oito meses que trabalho na casa e poderia contar-lhe a vida de cada um dos caras que vejo aqui quase todo dia.

Chew começou a prestar mais atenção à mu­lher. Rocket lhe tinha dito que se limitasse a ver e ouvir, mas por que não aproveitar a opor­tunidade para averiguar se Henry era ou não frequentador do "Corea Club"?

Rocket agora dançava, conversando e rindo com a morena exuberante que tinha como companheira. Dava a impressão de ter-se esquecido da missão que os tinha levado ali.

- Como se chama o seu amigo? - perguntou a mulher.

- Henry - respondeu Chew.

- Bem, há muitos Henrys por aqui. Olhe, aquele gordo ali se chama Henry...

Chew não se preocupou em olhar e disse:

- Meu amigo não é gordo, pelo contrário. É baixo, magro, e careca. Além disso, ainda pisca muito um olho.

A mulher pensou alguns segundos e respon­deu:

- Claro que conheço o seu amigo Henry; mas não espere vê-lo aqui, quero dizer, neste salão. Henry é homem de confiança da casa. Tem muito interesse em falar com ele?

Chew quase não conseguia dissimular a ale­gria. Se o Henry que a mulher conhecia fosse o mesmo que procurava...

- Claro que sim - respondeu Chew à pergun­ta da pequena. - Já lhe disse que há muito não nos vemos. É um grande sujeito e...

- Pague a conta e venha comigo - disse a mulher, sem deixá-lo terminar a frase.

Chew assim fez e saiu atrás da mulher. Rocket continuava dançando. Ficaria maravilhado quan­do dissesse a ele: "Amigo Rocket, encontrei o tal Henry; que lhe parece?"

Atravessaram o salão, driblando negros, bran­cos e amarelos. Ao fundo, por trás da orquestra, havia uma porta bem disfarçada. A mulher parou diante dela, voltou-se para Chew e disse:

- Espero que queiram abrir para nós. Aí só entram os amigos do dono, e Henry entre eles. É um lugar muito reservado, você vai gostar.

Gostando ou não, Chew queria entrar de qual­quer maneira. Sentia no corpo o formigamento da aventura e do perigo. Seria seu primeiro ser­viço, e queria mostrar a Rocket que, embora novato, era suficiente para agarrar um assas­sino.

A mulher bateu na porta de uma maneira con­vencional. Voltou-se para Chew com um sorriso nos lábios. Entreabiram a porta e do lado de dentro uma voz rouca perguntou:

- Quem é?

- Vamos, Cole, não me conhece? Sou eu, Perla. Um amigo de Henry deseja vê-lo. Acho que ele está aí dentro, não?

Cole fechou a porta sem responder. Chew comentou:

- Acho que não querem abrir.

- Espere um pouco - disse a mulher com muita segurança. - É apenas medida de pre­caução. Aí só entra gente de confiança - baixou a voz e acrescentou: - O jogo é forte, entende?

- Sim - respondeu Chew.

A porta tornou a abrir-se após alguns se­gundos, e um sujeito grande, de cabeça raspada, lábios grossos e olhar penetrante, apareceu na soleira.

- Entre - disse.

Chew teve um instante de indecisão. O que encontraria por trás daquela porta? Não teria sido uma loucura deixar de avisar Rocket sobre o que ia fazer?

- Vamos! - disse a mulher.

Não, não poderia voltar agora. Tinha de se­guir em frente até o fim. Em caso de perigo, ainda tinha a pistola e poderia fazer uso dela.

Cole deu-lhes passagem e disse:

- Quer ver Henry, não é isso?

- Sim, se for possível.

- Entre. E você, Perla, pode retirar-se. Lá fora há poucas pequenas esta noite e sua pre­sença é necessária.

Perla não esperou que Cole repetisse a ordem. Voltou-se para Chew e, depois de dar-lhe dois tapinhas amistosos no rosto, disse:

- Não demore muito com o seu amigo Henry e volte logo para ficar comigo, queridinho. Es­perarei por você, tá?

- É uma boa menina - disse Cole ao mesmo tempo em que fazia um movimento de cabeça convidando Chew a entrar.

Dentro, o ar estava denso, cheirando a fumo e a bebida. Era um lugar pequeno e irrespirável. Chew percorreu todo o ambiente com o olhar. Ao fundo, sentado sobre um tamborete, estava um homem cuja figura fêz saltar o coração do agente.

Era pequeno, magro, calvo e com um tique nervoso num dos olhos. Correspondia perfeita­mente à descrição de William Files dada por Olga. Aproximou-se dele.

- Quer falar comigo? - perguntou o homen­zinho.

- Sim, Henry - respondeu Chew. - Vim aqui pra isso.

A boca de Henry abriu-se num largo sorriso. Tinha os dentes cariados e sujos.

O sorriso de Henry parecia uma ameaça dis­farçada. Chew pensou na pistola que levava sob o braço. Começava a sentir náuseas naquele ambiente tão carregado de fumaça. "Tão espesso que po­deria ser cortado como um queijo" – pensou.

 

Rocket entra em ação. Onde estará Chew? Enquanto a cidade dorme, o FBI fervilha de atividade.

O agente Horst Rocket não estava tão distraído como Chew pensava, nem tão pouco esque­cera sua missão no "Corea Club". Também não perdera de vista o companheiro.

Quando Chew atravessou o salão atrás da pe­quena, Rocket seguiu-os com o olhar. "Aonde iria?" - pensou Rocket. Quando ao fim de alguns mi­nutos a pequena regressava sozinha, Rocket ficou preocupado. Teve vontade de interrogá-la, mas achou melhor que ninguém soubesse da relação entre ele e Chew. Vira quando Chew e a mulher tinham desaparecido por trás da orquestra e por ali iria também, averiguar o paradeiro do rapaz.

- Desculpe-me por um momento - disse para a morena com quem dançava.

- Espere, aonde vai? - disse a pequena, mostrando-se aborrecida por ser largada no meio do salão.

Rocket não estava disposto a perder tempo com explicações. Saiu depressa em direção à orques­tra. A morena saiu atrás dele dizendo:

- Espere, querido, vou com você.

Rocket não lhe deu maior atenção e ficou mais preocupado quando ao chegar por trás do tablado não viu nenhum sinal de Chew. Deu uma volta por ali e descobriu a porta dissimulada. Ao mesmo tempo a pequena chegava por trás dele perguntando:

- O que está procurando, queridinho?

- Deixe-me em paz - disse Rocket, afastan­do-a com a mão. Logo em seguida pensou melhor e acrescentou: - Não, espere. Você deve saber. Aonde vai dar esta porta?

- Não sei, acho que em qualquer lugar. Mas por que você quer me deixar? Vamos continuar dançando. Venha.

- Vá para o diabo! - respondeu Rocket de mau humor.

Pensava em Chew. Teria ele caído em alguma armadilha? Se assim fosse, ainda havia tempo para ajudá-lo.

Atrás dele, a morena insistia para que voltas­sem ao salão. Rocket bateu na porta, e esperou alguns segundos. Ninguém atendeu e o agente bateu com mais força, como se quisesse arrom­bá-la. Imediatamente dois sujeitos enormes e mal-encarados materializaram-se diante dele, como que surgidos do nada.

- Que quer aqui? - perguntou um deles.

A morena, ao vê-los, levou um susto e insistiu outra vez:

- Vamos embora, amoreco. Não vão abrir a porta pra você.

Seu pedido foi em vão, Rocket só tinha um objetivo: encontrar Chew.

- Quero entrar - respondeu o agente dirigin­do-se aos dois gorilas.

Um deles torceu a cara e gritou de maneira incisiva:

- Vá embora, palhaço. Não pode entrar aí. O outro acrescentou:

- Está com a cara cheia, rapaz.

Os dois estavam mesmo dispostos a impedir a entrada de Rocket. O agente, ao contrário, parecia decidido a entrar de qualquer maneira.

- Não bebi, e também não vou embora. Vocês é que vão se mandar, seus macacos.

Vendo a atitude de Rocket, os dois puseram-se em guarda fechando os punhos. Um deles re­petiu:

- Vá saindo, rapaz. Você está sobrando por aqui.

Mas Rocket resolvera entrar de qualquer jeito e achava que nem mesmo meia dúzia de gorilas como aqueles dois iriam impedir que ele atraves­sasse a porta disfarçada. Viu que não adiantaria discutir e que o momento era de ação.

Sem esperar mais nada, o agente arremessou o punho direito para frente e acertou o queixo do que estava mais perto. Aquele direto não seria suficiente para deixá-lo fora de combate, por isso Rocket, em seguida, deu-lhe um soco no fígado, obrigando-o a dobrar-se para a frente. Um outro golpe de direita no queixo fez com que o gorila arriasse no chão.

A ação de Rocket foi tão rápida que o segundo gorila não teve tempo de esboçar qualquer reação. De qualquer modo, pareceu acovardar-se ao ver que o intruso sabia bater. Não se aventurou em medir forças com Rocket e gritou:

- Johnny, Peter, Bob, venham para cá! Atenderam logo ao chamado. A primeira coisa que viram foi o companheiro estendido, desacor­dado. Depois, perceberam a atitude de assombro do outro.

- O que foi? - perguntou Johnny, cujo ta­manho não passava da cintura de Rocket mas que, em compensação era largo de costas e tinha o corpo rijo como se fosse de pedra.

- Quer entrar aqui - respondeu o outro gran­dalhão, assinalando a porta.

- Ah, é? - disse Peter, com expressão irô­nica.

- Ele já vai ver - disse Bob, que tinha um rosto bestial, capaz de assustar qualquer um.

Rocket olhou-o de cima a baixo, calculando qual seria o ponto fraco daquele homem que para o agente mais parecia um animal pré-histórico. E antes que Bob o atacasse, Rocket deu-lhe uma eutelada no pescoço, fazendo com que êle expelisse o ar dos pulmões.

Bob era realmente forte e quase sempre resol­via sozinho qualquer barulho no "Corea Club". Cambaleou com o golpe de Rocket, mas logo se refez e cerrou os punhos para cair sobre o agente. Mas este não esperou ser atacado e, antes que Bob recuperasse o equilíbrio, deu-lhe um soco no estômago que o fêz vacilar e retroceder até chocar-se contra as cortinas que cobriam o tablado da orquestra.

A queda de Bob provocou a confusão. Bateu com o corpo nas pernas do trompetista; o músico perdeu o equilíbrio e caiu sobre o baterista, le­vando mais dois companheiros na queda. Os casais que dançavam pararam bruscamente, as­sustados com o barulho que se misturava ao som dos instrumentos. As mulheres começaram a gritar, aumentando a desordem. Ninguém con­seguia entender nada.

Apenas Rocket entendia tudo, porque a confu­são fora provocada por ele. Mas a luta apenas se iniciava. Quando Bob ficou fora de combate, os outros três atiraram-se sobre ele. Johnny pela direita, o outro gorila pela esquerda, e Peter pela frente.

Rocket levantou Peter no ar e girou-o com vio­lência arremessando-o contra o grandão, que se esparramou no chão com o peso que lhe caiu por cima. Apenas Johnny conseguiu atirar-se con­tra Rocket, pois não tivera tempo de recobrar o equilíbrio e defender-se contra o ataque. Johnny tinha mãos pesadas e idéias assassinas, e aper­tou o pescoço de Rocket com toda a força.

Rocket sentiu que lhe faltava o ar. Num es­forço supremo, o agente abaixou-se bruscamente e agarrou Johnny pela cintura, levantando-o e arremessando-o por cima dos ombros. O bandido foi cair por cima de Bob, ainda desacordado.

Mas ainda havia outros de pé, e Bob, ao re­ceber o choque do corpo de Johnny, recobrou os sentidos e levantou-se o mais rápido que pôde.

- Vou lhe quebrar os ossos - ameaçou, entre vários palavrões.

Bob, porém, não foi muito ligeiro para levan­tar-se, e Rocket, pensando depressa, avançou um passo. O capanga viu seu movimento mas não imaginou o que viria em seguimento.

Rocket deu um pontapé no queixo de Bob, fazendo-o cambalear e cair de costas, sem senti­dos.

O local onde se desenrolava a luta já estava repleto de gente curiosa. Músicos, dançarinos e garçons amontoavam-se por cima e em volta do tablado para assistir àquela luta desigual de um homem contra cinco. Aquilo não podia durar muito.

Rocket já começava a dar sinais de cansaço. Sentia que as forças lhe faltavam e, quando der­rubava um, mais três já estavam se lançando contra êle. Levariam pouco tempo agora para dominá-lo, e não queria ser dominado. Pensou numa maneira de retirar-se.

Retrocedendo de costas, afastou-se do lugar onde estava encurralado. Por trás dele um novo perigo o ameaçava. Não pôde ver um amarelo gordo que o esperava com o braço levantado, segurando o gargalo de uma garrafa de champa­nhe, cujo fundo arrebentara propositadamente.

Mais atrás, um sujeito de tez azeitonada se­gurava uma cadeira, com o firme propósito de baixá-la sobre a cabeça do agente especial. Rocket estava cercado mas ignorava o que havia pela retaguarda e continuou recuando, devagar.

Mais um ou dois passos e seria atingido pelo caco de garrafa que o amarelo gordo segurava; então tudo estaria terminado. Rocket seria dominado e, sem Rocket, Chew talvez estivesse per­dido.

Mas a mão do destino deu o seu toque má­gico em socorro do valente Rocket. Entre os que assistiam à contenda havia um homem cuja fi­gura lembrava um quadro antigo, que se distinguia pelo colarinho impecavelmente engomado. Sua expressão era alegre e tranquila. Parecia divertir-se imensamente com tudo aquilo. Porém, não lhe agradou ver que um homem valente lu­tando contra cinco, o que já era uma desvanta­gem, ainda fosse atacado pelas costas, com uma garrafada, por um amarelo barrigudo e covarde.

Tranquilamente, o homem do colarinho engo­mado apanhou um copo grande e pesado que estava sobre a mesa e, no momento exato em que o gordo ia desfechar seu golpe mortífero, arremessou o projétil improvisado na testa do covarde agressor. O choque foi tão violento que o amarelo gordo tonteou e caiu pesadamente no chão.

Rocket nem mesmo chegou a pressentir o pe­rigo que correra, e levou um susto ao ouvir o baque às suas costas. Mas não perdeu tempo em verificar o que se tinha passado. Com a retaguar­da livre, pôde chegar até a porta, agora empu­nhando uma cadeira com a qual ia afastando os que tentavam detê-lo.

O "Corea Club" transformara-se num pandemô­nio. Mesas e cadeiras viradas, cacos de copos e garrafas espalhados pelo chão, mulheres com ataques histéricos, gritando e chorando, e uma confusão de línguas diferentes que se mistura­vam à correria e à desordem.

De repente, o salão ficou às escuras. Todas as luzes foram apagadas talvez para permitir as fugas que se sucediam. A balbúrdia aumentou, porque ninguém via ninguém, e passavam uns pelos outros aos tropeções. A gritaria cresceu e não sobrou mais nada de pé.

Logo após à saída de Rocket chegou um choque da polícia, cujos homens entraram violentamente no salão, estacando em seguida, quando perce­beram que não podiam ver coisa alguma naquela escuridão. O sargento que comandava os policiais gritou com toda a força de seus pulmões:

- Acendam as luzes, e que ninguém se mova! Fiquem todos onde estão!

Ao cabo de alguns segundos as luzes foram acesas. Os policiais ficaram espantados com o espetáculo, tiveram a impressão que por ali passara um dos famosos furacões da Flórida.

Apenas uma coisa era diferente agora. Como por encanto, o salão ficara quase vazio, e apenas al­guns feridos e bêbedos permaneciam ali. As janelas do "Corea" que davam para a rua, estavam escancaradas, mostrando que por elas tinha es­capado a maior parte dos que tomaram parte naquele carnaval.

O sargento repetiu:

- Que ninguém se mova!

A ordem nem precisava ser dita, pois os que restavam não estavam realmente em condições de fazer nenhum movimento. De pouco adiantaria à polícia qualquer interro­gatório, porque ninguém ali sabia realmente o porquê daquilo tudo, o único que poderia dar uma explicação concreta tinha sido o primeiro a escapulir, e era precisamente Horst Rocket, agente especial do FBI, numa missão importante.

Enquanto isso, Rocket, ferido, rasgado e ofe-gante, conseguia alcançar seu carro, estacionado a boa distância do "Corea Club".

Não pensava em si. No cérebro apenas um pen­samento o atormentava: onde estaria Chew? No coração, um desejo crescia cada vez mais forte: encontrar o companheiro, custasse o que cus­tasse.

Agora, mais furioso que antes, Rocket estava decidido a desvendar todo o mistério da orga­nização terrorista denunciada por Portier. Três agentes especiais já tinham perecido naquele tra­balho, e naqueles momentos talvez Chew esti­vesse sendo o quarto sacrificado.

Dirigiu-se para o escritório do FBI com o propósito de organizar uma busca detalhada para encontrar Chew. Sua entrada na seção causou as­sombro geral. Tinha um aspecto deplorável. O rosto cheio de equimoses, as roupas rasgadas e manchadas de sangue, e uma fisionomia de leão ferido.

- Que é que houve? - perguntaram-lhe, Rocket não fez caso da pergunta e inquiriu bruscamente: - Eddie Chew esteve aqui?

Rocket tinha a esperança de que Chew houvesse saído do "Corea Club" por alguma porta lateral e se dirigido imediatamente para o FBI, mas isso não acontecera. O rapaz não estivera por ali, e ninguém sabia dele.

- Agindo como um calouro que é! Pensa que pode se meter sozinho na boca do lobo.

Apesar de parecer revoltado contra o compa­nheiro novato, sabia que Chew não era nenhum tolo. Sua audácia era uma coisa natural, e Rocket compreendeu isso, pois ele mesmo fora assim anos atrás, quando saíra da academia de Quan­tico.

Deixando-se cair numa cadeira, pediu ao inspetor-chefe:

- Tem um cigarro?

Sem nada dizer, o inspetor estendeu-lhe o maço e Rocket tirou um cigarro. Depois de algumas tragadas, contou rapidamente o que se passara. Após mais uma  baforada,  disse,  preocupado:

- Precisamos encontrá-lo. Pelos menos já sa­bemos alguma coisa, e temos por onde começar uma investigação profunda.

Atirou o cigarro ao chão, levantou-se e disse:

- Preciso de meia dúzia de agentes. Vou vol­tar àquele inferno!

- E ainda espera encontrar alguém por lá? - perguntou o inspetor-chefe, tendo quase a cer­teza de que já não existia no "Corea Club" qual­quer coisa ou pessoa que os levasse à descoberta da organização e também do novato e imprudente Chew.

- Não sei bem o que espero encontrar - respondeu Rocket. - Talvez até mesmo o ca­dáver de Chew, mas se isso acontecer, juro que...

O inspetor interrompeu-o. dizendo:

- Não jure nada. Vá e leve quantos homens quiser. Ficarei aqui esperando notícias suas.

Rocket saiu sem se despedir. Ia pensando em Portier e nos companheiros mortos pelas balas de uma metralhadora nas proximidades do "Sa­lão Tropical". E em Chew.

Também pensava em Olga Steton. Saberia ela mais do que afirmara? Teria ela alguma ligação com William Files, ou Henry? Teria de visitá-la outra vez, mas primeiro vol­taria ao "Corea Club".

Em pouco tempo dois carros carregados de agentes especiais estavam a caminho daquele lugar maldito. Cruzavam velozmente a ilha de Manhattan.

Àquelas horas toda Nova Iorque dormia.

 

Frente a frente com Henry. Um interrogatório promissor, que termi­na em ameaça. Novamente em cena a seringa da morte. Henry levantou-se lenta e penosamente e, . aproximando-se de Eddie Chew, disse:

- Bem, rapaz, estou à sua disposição. Que de­seja falar-me?

O gesto cínico e tranquilo daquele homem dei­xou Chew desconcertado. Esperava alguma reação violenta, no mínimo algumas palavras menos educadas. No entanto, ali estava o misterioso ho­menzinho com a placidez de uma estátua, pronto para ouvir.

- Tenho pouca coisa a dizer - começou Chew, após alguns segundos. - Creio que já sabe para que estou aqui. Você está preso em nome da Lei.

Henry fez um gesto de assombro e disse:

- Preso? Por quê? De que me acusa?

- Não se faça de ingênuo - replicou Chew levantando a voz. - Você matou meu colega Por­tier. Ouvimos sua conversa telefônica com Brown. Você também o matou, talvez por isso.

- O caro amigo tem uma imaginação muito fértil. Não o conheço. Não sei quem é, como tam­bém ignoro quem sejam Portier e esse Brown. E, além disso, se eu os matei, que provas tem para acusar-me?

- A fita magnética. Sua conversa com Brown foi totalmente gravada.

- Minha conversa com Brown? Rapaz, tenho a impressão de que você está enganado.

- Enganado ou não, terá de vir comigo.

Henry viu que não adiantaria discutir com aque­le jovem disposto a tudo. Sorriu, deu um passo à frente e disse:

- Claro que irei com você aonde quiser. Sou um cidadão honrado que não tem medo da lei e da justiça. Agora mesmo...

Enquanto falava, Henry fez um gesto dissi­mulado mas que Chew desconfiou, pois não per­dia nenhum de seus movimentos, sabendo com quem lidava. Imediatamente levou a mão à pis­tola. Se fosse cair numa cilada, defender-se-ia até a morte.

Mas Chew não chegou a sacar a arma. Esque­cera-se de que por trás dele estava o gigantesco Cole, recebeu inesperadamente uma forte pancada no braço e foi obrigado a soltar a arma.

Isso era apenas o princípio. A essa altura Rocket lutava lá fora contra a chusma de "leões-de-chácara" dispostos a impedir-lhe a entrada. E, assim, o inexperiente Chew estava sozinho para enfrentar a sanha assassina de Henry e de Cole.

Tão logo desferiu a pancada no braço, Cole não esperou que o jovem esboçasse qualquer reação e saltou sobre êle, segurando seu pescoço com as mãos enormes, apertando com força para dei­xá-lo logo fora de combate.

Assim, apanhado de surpresa e pelas costas, Chew ficou quase sem fôlego. Mas não estava perdido, pois lembrava bem as lições de jiu-jitsu da academia. Naquela posição, o gigante Cole deixava um ponto fraco, que seria aproveitado. Num movimento rápido, Chew bateu com o coto­velo no estômago do gigante com toda a força que dispunha. O golpe foi certeiro e violento, obrigando-o a soltar o jovem para dobrar-se com a mão na barriga.

Cole refez-se rapidamente, mas sua fúria au­mentou. Cuspiu no chão e gritou:

- Vou acabar com a sua raça!

Mas Cole não teve tempo para outro ataque. Chew agarrou-o e deu-lhe um "balão", fazendo-o cair por cima de uma cadeira que se arrebentou sob o seu peso.

Chew não estava disposto a dar tempo a que Cole se recuperasse da queda e partiu para ele com a intenção de desferir-lhe uma cutelada no pescoço, um golpe tão violento que Chew tinha a certeza que seria o suficiente para terminar com a luta.

Mas Cole era mais ligeiro do que Chew supu­nha, e quando o agente se aproximou o gi­gante recebeu-o com um pontapé que o jogou contra a parede.

Henry, que a tudo assistia com indiferença, deu um sorriso e disse:

- Ei, Cole, parece que desta vez você encon­trou a forma do seu sapato.

Cole, furioso, respondeu:

- É o que você pensa. Já vai ver.

Ainda meio tonto pelos efeitos da patada, Chew viu Cole aproximar-se de mãos abertas, inves­tindo como um touro.

Mas Cole, apesar de forte, não tinha agilidade bastante para jogar-se sobre o jovem Chew antes que este se refizesse do tombo. Quando chegou perto o agente saltou para o lado, deixando-o estatelar-se contra a parede devido ao impulso com que ia.

Henry viu que as coisas estavam piorando para Cole. Naturalmente, já poderia ter tomado parte no assunto, acabando de uma vez com aquilo. Para isso, bastaria apenas segurar a pistola e apertar o gatilho.

Não tinha entretanto nenhuma vontade de man­dar o agente para o outro mundo, pelo menos por enquanto. Se Cole não conseguisse vencê-lo, então pensaria num meio de liquidá-lo. Afinal de contas, Cole não passava mesmo de um animal, agindo mais por instinto que por inteligência.

Enquanto Henry assim pensava, Chew conse­guia agora desferir sobre o pescoço de Cole a cutelada fatal. Um golpe que poria qualquer mortal fora de combate, mas não ao vigoroso Cole, que apenas caiu de joelhos lançando mal­dições.

Henry, ao vê-lo cair, compreendeu que dentro em pouco tudo estaria terminado e achou que chegara o momento de agir, antes de se ver ele mesmo na mesma situação de Cole.

Ocupado em acabar de uma vez com as resis­tências do gigante, Chew não pressentiu a trai­çoeira aproximação de Henry. Além disso, os gritos furiosos do bandido não lhe deixaram ouvir o ruído de passos por trás.

Parado atrás de Chew com a pistola na mão, Henry vacilava entre arrebentar a cabeça do agente com um tiro ou deixá-lo apenas fora de si com uma certeira coronhada.

Por fim, resolveu pô-lo sem sentidos e desfe­chou violento golpe na nuca do rapaz.

Naquele instante, um dos que lutavam contra Rocket no lado de fora entrou correndo, gri­tando:

- Henry, a polícia! - Henry sobressaltou-se Que diabos faria a polícia ali? Em poucas palavras o sujeito explicou tudo e Henry viu que o melhor era sair dali o mais depressa possível. Precisava da ajuda de Cole, porém ele não estava em condições de ajudar ninguém. Virou-se para o outro e ordenou:

- Traga um balde d'água, depressa! Apanhou uma garrafa de conhaque e fez com que Cole tomasse a bebida à força. Quando chegou a água, atirou-a à cabeça do gigante, que des­pertou sobressaltado, perguntando:

- Que foi que houve?

- A polícia - respondeu Henry.

Cole levantou-se num salto, demonstrando que aquela palavra lhe provocava verdadeiro pavor.

- Onde está?

- Lá fora - disse Henry. - Temos que sair depressa.

Cole viu que não era hora de fazer perguntas e disse:

- Então vamos. - Olhando para Chew que es­tava caído no chão, acrescentou: - E ele? Você o matou?

- Não seja idiota. Vamos precisar dele. Apa­nhe-o e vamos embora.

Precisaram ajudá-lo a pôr o agente sobre as costas, pois o gigante já não tinha a mesma força de antes da briga. Chew quase acabara com a resistência do brutamonte.

Entraram em outra sala cujo aspecto dava a impressão de um depósito de coisas imprestáveis. Móveis velhos e sujos e, a um canto, uma máquina de escrever empoeirada.

- Ei, Johnny, ajude aqui - pediu Henry. Ambos deslocaram o armário atrás do qual ha­via uma porta.

- Depressa, Cole - disse Henry.

Cole passou levando Chew nas costas. Depois passaram Johnny e Henry.

- Vamos colocar o armário no lugar, Johnny - disse Henry.

O armário voltou a encobrir a porta, que foi fechada em seguida. Diante deles, estendia-se um corredor comprido e estreito, meio às escuras. Henry e Cole conheciam o caminho, mas para Johnny aquilo era estranho. - Perguntou:

- Onde vai dar isso aqui?

- Cale a boca e ande - disse Henry com mau humor.

Johnny não fez mais perguntas e seguiram em silêncio até o fundo da passagem. Ali, encontraram outra porta, que Henry abriu utilizando uma cha­ve que levava no bolso. Penetraram por uma enor­me sala também mergulhada na penumbra. Do fundo da sala surgiu uma voz perguntando:

- Quem está aí?

- Sou eu, Li, não se preocupe - respondeu Henry.

- Ah, é o senhor Henry? Já vou para aí. Cole depositou Chew no chão, para descansar, enquanto Li encaminhava-se até eles. Os olhinhos oblíquos do japonês brilharam maliciosamente ao ver o corpo do agente especial.

- Já sei, é para atirar no rio, não?

- Desta vez, não, Li - disse Henry com um sorriso. - O homem está vivo e não penso jogá-lo no rio. Talvez nos seja muito útil. O carro está pronto?

- Sim, claro que sim. Está sempre pronto! - exclamou o japonês.

Henry perguntara por perguntar, pois sabia que o fiel oriental mantinha o veículo sempre preparado para casos de emergência. E aquela era uma emergência.

Cole tornou a pôr Chew sobre os ombros, mas desta vez sem a ajuda de ninguém; já tinha re­cuperado as forças. O próprio Li deu partida ao motor. Henry sentou-se ao volante e ordenou:

- Você vai ficar aqui. Não acredito que a polícia encontre a porta, mas se isso acontecer, ainda terá tempo de fugir e avisar-nos.

Para Li a perspectiva de ficar e possivelmente de avistar-se com a policia não era coisa muito agradável, mas Henry era uma autoridade supe­rior dentro da organização, imediatamente abaixo de K, e suas ordens deviam ser cumpridas sem objeção.

- Está bem, ficarei - resignou-se - mas pre­ciso saber onde estarão, para poder avisá-los se acontecer alguma coisa.

- Você tem razão. Espere - disse Henry, ti­rando do bolso um pedaço de papel e escrevendo qualquer coisa. - Tome. Se a polícia descobrir a passagem, chame este número.

Isto também não agradou ao japonês, embora apanhasse o papel resmungando. Ele preferia saber o lugar exato em que estariam os outros, na hipótese de também precisar de um refúgio. Mas não fez nenhum comentário e voltou para seu posto, onde permanecera até a chegada de Henry, Cole e Johnny.

Cole foi o último a entrar no carro. Arremessou Chew no banco traseiro dizendo:

- Você vai ver o que o espera quando reco­brar os sentidos, amiguinho.

Cole era vingativo e jamais perdoaria o ho­mem que lhe dera uma boa surra. Quando Chew abrisse os olhos queria ser a primeira coisa que ele visse. Esperava que o jovem levasse um susto tão grande, que tornasse a desmaiar...

Chew não desmaiou quando recobrou os sen­tidos, mas experimentou uma sensação desagra­dável ao ver Cole à sua frente.

- Olá, já ressuscitou? - foi o zombeteiro cumprimento.

Cole não se fez de rogado e mal o jovem abriu os olhos deu-lhe uma violenta bofetada no rosto. Ainda semi-inconsciente, Chew escutou uma voz dizendo:

- Calma, Cole. Ainda não. Você terá tempo para fazer os "carinhos" que quiser.

Cole pareceu não gostar daquela ordem. Saiu de perto de Chew e Henry ocupou seu lugar, trazendo nos lábios o mesmo sorriso sarcástico de sempre.

- Quer um traguinho, não é verdade? Não, não diga que não, pois só lhe fará bem. Johnny, dê-me essa garrafa.

Johnny entregou a garrafa e Henry, encostan­do o gargalo à boca de Chew, obrigou-o a sorver a bebida, que lhe desceu pela garganta como fogo.

Chew não estava acostumado a beber mas, ao mesmo tempo em que sentia o líquido queimar-lhe as entranhas, sentia também que lhe vol­tava a consciência e começava a ver tudo com mais nitidez.

- Está melhor? - perguntou Henry com uma solicitude que lhe pareceu uma ameaça.

Cole resmungava:

- Vamos, Henry. Ele não é nenhuma boneca. O que quer com ele?

- Pouca coisa. Apenas que nos diga o que o FBI sabe de nós. Assim poderemos nos defen­der, não acha, Johnny?

Mesmo que quisesse, Chew não tinha muito a dizer, e se eles soubessem que o FBI ainda anda­va às cegas naquele caso, zombariam de Rocket, de Chew e de tudo o que tinham temido até então.

A um sinal de Henry, Cole ficou outra vez ao lado de Chew.

- É verdade que vai nos dizer tudo o que o FBI sabe de nós? - disse Henry aproximando-se um pouco. Estava tão perto de Chew que este não resistiu à tentação de cuspir-lhe na cara e dizer:

- Assassino!

Henry era um homem de nervos bem tempera­dos, de modo que apenas limpou o rosto e disse a Cole:

- Vamos, faça-lhe algumas carícias.

- É para já - disse Cole satisfeito. - Pre­pare-se, queridinho.

Primeiro bateu com a mão aberta, mas isso pareceu-lhe muito leve, assim, fechou o punho e acertou em cheio na boca do jovem agente.

O sangue começou a escorrer pelo canto dos lábios e nariz de Chew, sem possibilidades de se defender naquele momento.

- Assassinos! - gritou. - Não vou dizer nada! Vocês serão destruídos. Você, Henry, e também o tal K.

- Também K.? - disse Henry sorrindo. - Tem certeza? Espere, Cole, quero que ele me fale de K. Parece que sabe muita coisa.

Não, Chew não sabia de nada, apenas aquele telefonema gravado da residência de Arthur Brown. Mas o jovem agente não era tão tolo a ponto de deixá-los perceber que por enquanto a organização não corria nenhum perigo.

Henry voltou a insistir, mas desta vez, já res­sabiado, manteve certa distância.

- Que sabe de K.?

Chew, com o rosto ensanguentado, o corpo do­lorido, respondeu:

- Não vão arrancar nada de mim.

Henry observou-o por um instante. Viu que era um tipo obstinado e forte. Mas tipos muito mais obstinados e fortes já tinham sido vencidos por ele.

Se os socos de Cole não o fizessem soltar a língua, empregaria um meio que sabia ser infa­lível.

- Acho que nos dirá tudo que queremos saber, e não vai demorar muito. Vamos, Cole, faça-lhe mais algumas carícias, mas não o estrague muito. Deixe ao menos a língua, para que a solte.

Cole não esperou que a ordem fosse repetida, e sem perder tempo recomeçou a agredir Chew, já bastante ferido e meio inconsciente.

Enquanto isso, Johnny entretinha-se com uma garrafa de uísque. De vez em quando pergun­tava:

- Quer que ajude, Cole?

Cole não precisava de ajuda num trabalho tão fácil e tão de seu agrado. Segurando Chew pela gola do paletó, levantou-o no ar e tornou a ba­ter-lhe no rosto.

- Espere um pouco - disse Henry.

Cole soltou o jovem e este caiu pesadamente no chão. Mas Chew, apesar de tudo, ainda podia ver e ouvir o que se passava à sua volta. Henry abaixou-se e perguntou:

- Como é? Vai continuar calado? Isto é muito mau. Já sabemos que você é valente, mas não temos muita consideração por valentes que são nossos inimigos. Portier também era muito va­lente, e você viu o que aconteceu com ele. Quer que lhe aconteça a mesma coisa?

As palavras de Henry fizeram Chew estreme­cer. Orson Portier tivera um final horrível, e não gostaria de acabar envenenado como o com­panheiro.

Henry continuou:

- Lembra-se como foi, não é verdade? Uma espetadela e... a morte... Ei, Cole, dê-me essa valise.

O gigante Cole entregou o que pedia e per­guntou:

- O que vai fazer, Henry?

- Já vai ver. Você é muito apressado, Cole, e homens como nós devem controlar os nervos.

Lentamente, abriu a valise. Chew procurou ver o que havia dentro. Henry voltou a sorrir. Meteu a mão dentro dela e tirou uma seringa e um pequeno frasco. Sacudiu-o e disse:

- Bastam umas gotas desse líquido para man­dar um homem para o outro mundo.

Henry começou a encher a seringa com o veneno. Chew fechou os olhos para não ver...

 

Rocket faz uma interessante desco­berta. Duelo na escuridão. A morte faz mais uma vítima. Um punhal traiçoeiro sibila entre as trevas.

No antro denominado "Corea Club" a polícia nada tinha averiguado ainda. Para os poli­ciais a batida naquele local já se tornara quase uma rotina, pois eram comuns as brigas ali e em outros lugares semelhantes. Por isso, o sargento que comandava a patrulha estranhou a presença de agentes do FBI.

- Não houve nada de importante - disse, sem que ninguém lhe perguntasse. - Dois ou três vagabundos e uma mulher um pouco ma­chucada.

- Estão presos? - perguntou Rocket.

O agente tinha a esperança de encontrar entre os detidos a mulher que acompanhara Chew. Mas ela não estava ali. Os que não puderam escapar eram apenas bêbedos sem a menor liga­ção com o caso. Após interrogá-los, Rocket de­dicou-se a examinar o local. A porta pela qual Rocket tanto lutara por entrar, ali estava, aberta a pontapés pela polícia. Lá dentro não havia nin­guém, nenhuma pessoa fora detida na misteriosa sala.

Rocket ficou intrigado. Na sala não havia ja­nelas nem outra qualquer porta, e aquela en­trada por trás da orquestra permanecera tran­cada, pelo lado de dentro, portanto, ninguém saíra dali. No entanto êle sabia que pelo menos Chew estivera lá dentro. Por onde teriam saído?

Rocket achou de melhor alvitre dispensar os serviços dos policiais. Feito isso, apenas ele e mais dois agentes continuaram a investigar.

- Não há nada por aqui - disse um deles, ao fim de algum tempo.

- Também não encontrei nada - afirmou o outro.

Mas Horst Rocket não parecia ouvi-los. Algo chamava a sua atenção. Olhava para os armá­rios, ou melhor, para o chão.

- Espere - disse a um deles. - Veja isto.

- O quê? Não vejo nada...

- Olhe bem.

O agente fixou-se melhor e percebeu o que Rocket queria mostrar. Tanto os móveis como o chão estavam cobertos de poeira, mas junto dos armários não havia os mesmos sinais de pó.

- É como se esse armário tivesse sido arras­tado para fora - observou Rocket.

- Sim, é isso mesmo - afirmou o outro.

As conjeturas de ambos levaram à mesma per­gunta: por que precisariam tirar o móvel do lugar?

- Ajude-me a arrastá-lo, Yount. Creio que foi por aqui que fugiram.

O armário foi deslocado e por trás dele surgiu a porta usada para a fuga. Não estava fechado a chave, talvez porque Henry tivesse a certeza de que nunca seria encontrada, mas, se a encontras­sem, ele já estaria muito longe dali.

- Vamos entrar? - perguntou Yount.

- Claro - respondeu Rocket. - Temos de descobrir onde vai dar isto.

Entraram, com a precaução de empunhar as respectivas armas. Percorreram lenta e cautelosa­mente a escura passagem até que chegaram ao final, dando com a outra porta. Rocket experi­mentou-a e viu que também não estava tran­cada.

- Está aberta - disse para o companheiro. - Talvez seja uma armadilha. Preparado?

Yount disse que sim, e Rocket começou a em­purrar a porta vagarosamente, polegada por po­legada. A escuridão não lhe permitia ver nada. Aos poucos, a vista foi-se acomodando e conse­guiram distinguir um pequeno brilho ao fundo, do lado direito. Rocket pensou em acender a lanterna de pilha que trazia sempre consigo. E se houvesse alguém ali? Não, não seria pru­dente acender a lanterna, pois correriam o risco de serem crivados de balas. Avançariam no escuro, em silêncio, até o ponto de onde vinha aquele brilho.

- Cuidado, Yount - murmurou Rocket. Começaram a caminhar, um atrás do outro, com o máximo cuidado para não tropeçar em algo no chão. Qualquer ruído que denotasse sua presença poderia custar-lhes a vida.

Yount ia pensando justamente nisso, e aquela lata estava precisamente no lugar onde ele pôs o pé. O ruído não foi alto, mas bastou para que o japonês Li despertasse, pulando para fora do lugar onde costumava se meter para passar a noite.

- Quem está aí? - gritou o oriental em tom assustado.

Não era ainda o momento de agir, e os dois agentes conservaram-se em silêncio. Se a es­curidão não os permitia ver quem estava ali, da mesma forma não permitiria que fossem vis­tos e, assim, as vantagens e desvantagens eram idênticas.

Li preferiu manter a tradicional paciência ja­ponesa e aguardar que acontecesse algo mais concreto. Era hábil no manejo de um punhal e isso bastaria naquele ambiente. Tinha a certeza de que alguém entrara ali e que esse alguém não podia ser amigo pois, do contrário, já lhe teria dado algum sinal. Conhecendo bem o local, podia mover-se mesmo no escuro, mas os outros, não. Teriam de tatear por muito tempo e, mais cedo ou mais tarde, revelariam onde estavam. Aí então...

O silêncio era aterrador, e o agente Yount começava a desesperar-se naquela incerteza. Pa­recia-lhe estar lutando contra um fantasma, con­tra algo que ele jamais venceria. Queria dizer qualquer coisa, mas era perigoso demais e, além disso, Rocket não estava perto, o que o deixava ainda mais nervoso. Aquela espera poderia ser infindável e talvez não tivesse a paciência neces­sária. Rocket era mais experiente, saberia es­perar quanto fosse preciso, mas êle não. E es­perar o quê? Alguém gritara lá do fundo, portanto o desconhecido estava lá, e era para lá que de­veriam se dirigir. Sim, era isso mesmo, só assim terminaria aquela terrível angústia. Pensou e desandou a correr naquela direção. Rocket tentou mas não pôde detê-lo.

Li, acocorado no canto, parecia uma serpente à espera do momento de dar o bote fatal. Viu a silhueta do agente aproximar-se vertiginosa­mente em sua direção e continuou imóvel como antes, perscrutando as sombras com seus olhinhos frios e rasgados.

Yount chocou-se contra ele. Segurou-o sem per­da de tempo e gritou:

- Aqui está, Rocket!

Aquele japonês pequenino parecia-lhe bastante insignificante para que pudesse oferecer algum perigo. Que receio infundiria um homenzinho, pe­queno e franzino, encolhido como um cão as­sustado?

- Que faz aqui, seu rato? - gritou Yount. Mas Li não era tão fraco e medroso como o agente julgara. Dentro do peito havia um ódio mortal, dentro da manga de seu casaco, um punhal assassino. Como um raio, Li sacou a arma e desferiu um golpe certeiro no corpo de Yount.

Um grito, um corpo batendo contra o chão, e depois novamente o silêncio aterrador. Rocket reconheceu a voz de Yount. Por um momento sentiu-se culpado pela má sorte do companheiro. Acendeu a lanterna e projetou o foco sobre o lugar de onde viera o grito angustiante de Yount. A luz caiu em cheio no corpo mirrado do traiçoeiro inimigo. Por uns segundos, Rocket não soube o que fazer. Logo recobrou o raciocínio e ordenou: - Não se mova!

Agora sim, Li parecia realmente um ratinho indefeso e assustado. Piscava muito os olhos sob a luz da lanterna. Tinha a certeza de que havia uma pistola apontada para ele. Precisava fugir para avisar a Henry, porém aquela luz o revelava como um alvo perfeito.

Rocket disparou quando, subitamente, Li es­capou do foco luminoso, mergulhando outra vez nas sombras para poder fugir.

A bala passou roçando sua cabeça, mas Li percebeu que não haviam atirado para matar. Queriam-no vivo, mas enquanto ele tivesse o punhal, seria uma presa difícil de agarrar.

Rocket correu atrás dele, levando sempre na frente o foco da lanterna. Sabia que o inimigo não tinha arma de fogo, pois do contrário já teria atirado. Alguns metros mais e Rocket tornou a prender o japonês dentro do círculo de luz quando o homenzinho já abria uma porta que dava para a rua. Rocket gritou:

- Quieto, ou irá para o inferno!

Mas a saída estava perto demais e Li não resistiu à tentação; sem dar importância ao aviso, continuou abrindo a porta que o livraria daquele homem em seu encalço.

Rocket, porém, não estava brincando e aper­tou o gatilho com raiva.

Li sentiu uma queimadura na perna direita e, mancando, ainda deu dois passos para a frente.

- Maldito ianque! - gritou.

O ferimento não o deixava prosseguir, ia ser apanhado pela Lei e isso era uma desonra para ele. Antes o americano tivesse atirado para matar.

Rocket gritou furioso:

- Fique quieto, cão amarelo!

"Cão amarelo", palavras que deixaram Li ainda mais cheio de ódio. Por seus olhos passaram num instante as cenas que presenciara em Hiroxima e Nagasáqui, quando os malditos americanos sol­taram a bomba atômica. A destruição total. O ódio total. Li repetiu para si mesmo: "Cão ama­relo". E comprimiu o cabo do punhal enquanto de seus olhos saltavam chispas de raiva.

Rocket aproximou-se do oriental, mas não o bastante para que pudesse ser atacado. Repen­tinamente, Li girou o corpo e arremessou o punhal contra Rocket. A lâmina cortou o ar com o seu brilho sinistro enquanto no rosto do japonês se desenhava. um sorriso de vitória.

 

Uma proposta tentadora adia a mor­te de Chew. Henry começa a ficar com medo. Discussões que a nada conduzem. Um segredo que ninguém pode saber.

Henry preparou a seringa com uma lentidão deliberada, pretendendo aterrorizar  Chew. Enquanto observava as reações do jovem agente, repetiu:

- Seu companheiro Portier também era um valente, mas sabia demais e não tivemos remédio senão matá-lo. Você também parece saber mais do que deve e terei de matá-lo também, a menos que prefira nos contar tudo.

- Vocês não passam de assassinos covardes - disse Chew, com as mãos amarradas para trás, inteiramente à mercê do sádico inimigo.

- Bem - continuou Henry. - As coisas nesta vida são como nós as vemos. Defendemos uma causa digna e lutaremos por ela até morrer.

- É causa digna assassinar friamente e à trai­ção? - disse Chew.

Henry prosseguiu, sem dar atenção ao que dizia o jovem.

- E você? O que defende? Certamente dirá que luta pela pátria. Isso já está muito batido. Ingressou no FBI porque lhe pagam uns miserá­veis dólares por mês, mas se quisesse poderia transformar-se num elemento de muito valor para nós. Vou lhe fazer uma proposta.

- Suas propostas não me interessam. Não vou fazer nenhum trato com vocês. - Balançando na mão a seringa cheia de veneno, Henry aproximou-se mais e disse:

- Como queira. Em seu lugar, eu não vacilaria para salvar a vida. Trabalhando para nós você teria muito mais dinheiro do que o FBI pode lhe pagar. Se não quiser, veja...

E Henry mostrava a seringa de maneira amea­çadora.

A um canto, Cole gritou:

- Acabe com isso de uma vez, Henry!

Mas Henry não queria acabar com Chew. Sem­pre desejara ter na organização um agente espe­cial do FBI como um trunfo para garantir-se de qualquer surpresa por parte do grande serviço de investigações. Aquela era uma boa ocasião para atrair um agente especial; Eddie Chew era jovem demais para sacrificar a vida e talvez acabasse resolvendo trair a pátria em benefício próprio. Com paciência talvez o convencesse.

- Cale a boca, idiota! - gritou Henry para Cole. - Sei muito bem o que faço.

- K. não gostaria que você perdesse tempo - acrescentou Cole.

- Que sabe você de K.? - disse Henry fu­rioso. Sim, exceto ele, ninguém conhecia o misterioso K. Era Henry quem transmitia suas ordens ao bando e jamais alguém lidara diretamente com o chefe da organização. Todos o temiam, suas ordens eram sempre cumpridas sem discussão, mas ele nunca aparecera pessoalmente.

Johnny largou a garrafa de uísque que tinha nas mãos e apoiou Cole:

- Cole tem razão. Faça-o falar ou acabe com ele de um vez. K. não gostaria de saber que es­tamos perdendo tempo com esse cara. Henry olhou-os por alguns segundos e disse:

- Acho que vocês têm razão. K. não gostaria disso.

Depois, virando-se para Chew, acrescentou:

- Ouviu, rapaz? Ainda está em tempo. Fale! Chew manteve-se calado. Como explicar a eles que nada sabia? De um modo ou de outro, sua sorte não seria melhor. Cole voltou a insistir:

- Acabe logo com ele. Não vê que prefere morrer?

Mas Chew não preferia morrer; queria conti­nuar vivendo. Mas como? Chew pensava rápido, devia haver um modo de escapar daquela morte estúpida...

- Espere - disse o jovem. - Estou disposto a contar tudo o que sei, mas como ter certeza de que vocês não me matarão depois? Henry afastou a seringa e respondeu:

- Dou-lhe minha palavra de honra. Vivo e dentro do FBI você terá muito mais valor para nós. E não pense que mais tarde poderá trair-nos, seria impossível escapar com vida.

- Eu sei - disse Chew. - Mas sua palavra não me basta. Prefiro que seja a de K. e também que ele próprio me transmita as ordens. - Henry não pôde conter uma gargalhada.

- Você exige muito, rapaz. É muito difícil avistar-se com K., mas talvez você consiga. Tudo dependerá do seu comportamento. Parou subitamente de rir, franziu o cenho e disse:

- Decida-se de uma vez. Vai falar ou não? Desta vez Henry parecia disposto a acabar com a conversa. Pegou no braço de Chew e en­costou a seringa fazendo com que a agulha lhe atravessasse a roupa.

- Eu falo - disse Chew. - Se quer que eu diga a verdade, a organização está em perigo.

Portier anotou tudo o que sabia num bloco de papel, e esse bloco está em poder do FBI. Cole exclamou assustado:

- Isso é mau!

Henry nada disse. Largou a seringa em cima da mesa e, muito pálido, fez um movimento com a mão para que Chew continuasse. O jovem agente compreendeu que seu truque estava dando certo.

- Brown também fez algumas confissões - continuou Chew.

- Aquele idiota não podia ter dito muita coisa - falou Henry. - Que disse ele?

- Acusou você, Henry, do assassinato de Por­tier e também de ter disparado contra ele no carro.

- Até aí, nada de novo - disse Henry. - Bem, deixemos Brown. O que está escrito no bloco de Portier?

Chew sentiu um estremecimento. O que dizer agora? Já falara de um bloco que não existia, mas como dizer coisas sobre a organização, coi­sas que ele ignorava e que Henry devia estar bem a par?

Após alguns segundos de reflexão, Chew achou a resposta.

- Eu nada sei do que estava escrito no bloco. Enviaram-no para Washington assim que foi en­contrado. Mas... eu poderia descobrir.

Cole respirou fortemente, Johnny, nervoso, tor­nou a apanhar a garrafa, e Henry perguntou:

- Como?

- Em primeiro lugar, você deveria me pôr mais à vontade. Se continuar amarrado desse jeito, vou levar um mês para me endireitar.

- Tem razão - admitiu Henry; ordenou: - Johnny, solte-o.

Johnny cumpriu a ordem sem discutir. Henry insistiu:

- Como pode descobrir o que está escrito no bloco?

- Muito simples: tirando as fotocópias que estão no arquivo.

Henry achou a idéia bastante viável, mas para isso Chew deveria ser libertado, e não confiava muito nele. Cole também não confiava no agente e protestou:

- Não está querendo soltá-lo, não é, Henry?

Henry pensava no que fazer. Se deixasse Chew ir embora, arriscava-se a não vê-lo mais. Por outro lado, se o prendesse ali, nunca conseguiria saber o quanto o FBI já descobrira sobre a or­ganização.

Henry estava em dúvida, mas tinha um trunfo. A organização estava pronta para agir, com todos os membros preparados; bastaria uma or­dem e tudo começaria a funcionar de acordo com os planos já traçados.

- Você deve falar com K. - disse Cole.

- Sim, K. vai dizer o que devemos fazer - acrescentou Johnny.

- Está bem; falarei com K, mas apenas para perguntar se devemos dar a ordem de "ação".

- Você está louco, Henry? - exclamou Cole, aterrorizado. - K. responderá que não, que ainda é cedo.

Henry levantou-se num salto, gritando para Cole:

- Cedo? Por quê? Que quer que esperemos? Que o FBI nos destrua? O maldito Portier sabia muita coisa a nosso respeito e agora Washing­ton  também.  Podem  apanhar-nos  a  qualquer momento e estamos liquidados. Se dermos a ordem agora, não terão tempo de fazer nada...

- Você não vai fazer nada sem consultar K. - disse Cole levantando-se com os punhos fe­chados de maneira ameaçadora. - Chame-o agora mesmo, diga o que se passa e deixe que ele resolva.

Johnny também parecia apoiar o que Cole dizia. Chew ficou mais preocupado do que eles, pois se o misterioso K. desse a ordem fatal, a culpa seria dele. Poderia dizer-lhes que mentira, que não existia nenhum bloco com anotações, mas, acreditariam?

Henry, vendo a obstinação dos comparsas, de­cidiu-se:

- Está bem, vou telefonar para K.

- Assim é melhor - disse Cole.

- É o lógico - acrescentou Johnny.

E Henry, com sorriso de ironia, afirmou:

- K. vai concordar comigo, como sempre. Vo­cês verão.

Eles sabiam que Henry tinha razão.

- Pode ser que sim - disse Cole. - Mas K. é o chefe e você não é mais do que eu ou Johnny.

Ao ouvi-lo, Henry voltou-se bruscamente como se fosse dizer alguma coisa. Considerava-se muito superior a eles e o que Cole afirmava era um insulto para ele. Olhou para o companheiro por alguns segundos. Cole manteve sua atitude desa­fiadora, sabendo que poderia liquidá-lo com um só murro.

- Que é que há? - perguntou Cole. - Quer briga?

- Você sabe que eu não brigo - disse Henry.

- Sim, sei. Você sempre ataca pelas costas, mas comigo...

- Não tenha medo - afirmou Henry sor­rindo - não lhe farei nada. K. ainda precisa de você.

Henry voltou-se e caminhou para o telefone. Chew continuava na expectativa e, de onde es­tava, pôde ver o movimento de Henry ao discar o número de K.

Após um instante, Henry falou:

- Sou eu, Henry. Aconteceu algo que veio alterar os nossos planos.

Fez uma pausa e depois começou a contar o que se passara. Cole, arriado em uma poltrona, com um cigarro na boca, escutava sem muito interesse. Não era a primeira vez que Henry resolvia assuntos da organização com K. pelo telefone. Johnny parecia também não prestar muita atenção.

Já no fim do relato, quando Henry perguntou a K. o que deviam fazer, é que os dois se voltaram com um ar de expectativa. Henry ouviu por al­guns segundos e desligou o aparelho dizendo:

- Sim, senhor. Imediatamente.

Voltou-se para os companheiros com uma ex­pressão de vitória no rosto e disse em tom en­fático:

- Bem, rapazes, eu já sabia! K., como sempre, está de acordo comigo. Começaremos a agir antes que o FBI nos detenha, e nós venceremos. Eu mesmo darei a ordem. Quando amanhecer...

Chew observou sua fisionomia. Tinha nos olhos um brilho estranho e ameaçador. Seus gestos eram agora de prepotência e êle parecia um ditador do mundo. Avançou alguns passos na direção do jovem agente e disse:

- Poderia mandar matá-lo, mas não farei isso. Quero que veja o poder da nossa organização, o meu poder... o poder de K. Viverá para ver como a velha e podre sociedade sucumbirá, dando lugar a um mundo melhor! Você e o FBI nada poderão fazer contra nós.

- Perdeu o juízo, Henry? - disse Chew. - Vocês nunca poderão mudar a face do mundo, nem mesmo pelo crime e pela violência. É uma loucura o que...

- Cale a boca! - gritou Henry, esmurrando-o de repente. - Quero que você viva justamente para isso, para ver do que somos capazes!

- Quando conheceremos K.? - interrompeu Johnny meio embriagado.

Henry, orgulhoso e enraivecido, respondeu:

- Não sei para que quer conhecê-lo. Eu estou aqui, e ele... sempre faz o que digo.

- Chega de prosa, seu idiota! - irritou-se Cole. - Já estou farto de sua gabolice! Sempre se julgando melhor do que K. Talvez ele só lhe dê ouvidos porque ainda não me conhece!

- K. só tem confiança em mim - afirmou Henry.

Chew continuava observando as reações de Henry. Dentro daquele corpo pequeno havia um espirito forte, uma inteligência educada para o mal e um complexo de inferioridade destruidor. Tipos como Henry só causavam dano aos seus se­melhantes. Chew nada podia fazer naquele mo­mento, mas para diminuir a tensão virou-se para Henry e pediu:

- Pode arranjar-me um cigarro?

- Claro - disse Henry estendendo-lhe o maço. E ao abaixar-se para que Chew apanhasse o cigarro, ouviu-o sussurrar:

- Você é um bocado esperto, Henry.

Por alguns instantes Henry cravou os olhos em Chew, mas depois seu rosto torceu-se num sor­riso que acabou numa estrepitosa gargalhada. Parou de rir bruscamente e disse:

- Rapaz, você também é muito esperto. Uma pena, pois me fez mudar de opinião. Você não pode continuar vivendo.

Henry apanhou a seringa e caminhou na di­reção de Chew. Cole perguntou:

- Que vai fazer, Henry?

- Já vai ver. Este cão do FBI é um estorvo e podemos ter sérias complicações por sua causa.

Chew, vendo próximo o seu fim, gritou:

- Contarei a vocês por que êle deseja matar-me. Não quer que saibam que ele...

-             Cale a boca! - gritou. Henry furioso, atirando-se sobre o agente com a seringa em riste, como uma lança mortal...

 

Rocket perde a paciência e aplica o terceiro-grau. Finalmente uma pista prometedora! Mister K levanta a máscara.

O japonês de nada serviria. Tinha de apanhá-lo vivo custasse o que custasse, e fazê-lo dizer tudo o que sabia sobre a organiza­ção, sobre Henry e sobre o desaparecimento de Eddie Chew. Fora por Isso que Rocket atirara apenas para imobilizá-lo.

Ao ver o oriental encolher-se ferido, Rocket avançou, mas sabendo muito bem de quanto um japonês é capaz. Assim, quando viu o movimento repentino de Li, o agente jogou-se para o lado, deixando que o punhal traiçoeiro passasse zunindo aos seus ouvidos.

Rocket não perdeu um segundo e, tão logo esquivou-se ao ataque avançou para cima do ja­ponês que, mesmo ferido, começava a arrastar-se para a saída. Furioso, agarrou-o pelo pescoço como se o amarelo fosse um gato assustado.

Mas o japonês, hábil na arte do judô, segurou os braços de Rocket e, livrando-se daquele aperto, tentou derrubá-lo ao chão. Outro que não fosse Rocket teria caído como um fardo, porém o agente já esperava a reação do oriental e, metendo o joelho em suas costas, deu um contragolpe que o deixou sem ação.

- Não resista, rapaz, ou lhe quebro a espinha - zombou Rocket.

Li sabia que não podia mais suportar, que, naquela situação, o golpe seria fatal.

- Chega, eu me rendo - ofegou.

- Onde Fica o interruptor da luz? - pergun­tou Rocket.

- No lado direito - respondeu Li.

Rocket acendeu a luz e contemplou o corpo sem vida de Yount. Uma chispa de ódio passou por seus olhos, e virando-se para o japonês, gritou:

- Isso lhe custará a cabeça, pode estar certo. Agora, diga onde posso encontrar Henry.

- Não sei - respondeu Li.

Rocket não gostava de extorquir confissões na base de pancada, mas naquele caso não havia outro jeito. Entrou direto no "terceiro grau" e perguntou:

- Vamos, onde está Henry?

Em sua obstinação, Li voltava a repetir:

- Não sei; não sei.

Rocket pareceu convencer-se e fEz outra per­gunta:

- E meu companheiro, o agente que estava com Henry?

- Henry e os outros o levaram.

- Para onde?

- Não sei, juro que não sei.

Rocket viu que não adiantaria continuar a interrogá-lo, mas lembrou-se de revistar-lhe os bolsos. Talvez achasse alguma coisa de interesse.

Realmente. Num bolso havia um papel, o papel que Henry lhe tinha dado. Quando Rocket o segurou, Li tentou arrebatá-lo violentamente, mas o agente pressentiu a intenção do japonês e evitou a manobra.

- O que é isto? - perguntou Rocket. - Um telefone. De quem é?

- De uma amiga - mentiu Li.

- Bem, já veremos.

- Pode chamar se quiser.

Li parecia querer mesmo que Rocket discasse aquele número. Henry atenderia e perceberia tudo. Insistiu:

- Chame e pergunte por Dana, de minha parte. É uma boa moça. Diga que é amigo de Li...

Rocket estranhou a insistência e adivinhou o pensamento do japonês.

- Obrigado, Li. Você é um bom rapaz. Com isto, poderemos fazer uma visita aos seus ami­gos.

Rocket perdera o interesse em interrogar o ja­ponês. Era preciso averiguar depressa de onde era aquele número telefônico. Daquilo poderia depender a vida de Chew e a segurança da na­ção.

Rocket saiu e encaminhou-se para a seção do FBI. Em pouco tempo obteve a informação que desejava. O telefone pertencia ao número tre­zentos e dois da rua Cento e Oitenta e Dois Oeste, em nome de William Files, o mesmo nome do estranho morador da casa de Sinclair Steton. William Files ou Henry.

Sem perda de tempo, Rocket organizou uma batida na nova residência do misterioso persona­gem. Dois carros partiram em grande velocidade para a rua Cento e Oitenta e Dois Oeste, carre­gando agentes especiais dispostos a tudo. Os car­ros pararam em frente ao trezentos e dois e os agentes saltaram rapidamente, cada um levando uma metralhadora, já com o dedo no gatilho.

Rocket avançou resolutamente. Apenas uma janela aparecia iluminada.

Tudo era expectativa e profundo silêncio, que­brado de súbito pelo relógio de uma torre pró­xima, batendo as horas compassadamente...

Henry esquecera-se de que Chew não estava mais amarrado, tinha as mãos livres e podia de­fender-se. Assim, ao saltar sobre o agente foi recebido com um violento soco que o arremessou para trás cambaleante. Terminou caindo no chão, com uma expressão patética no semblante.

Vendo a reação de Chew, Cole correu para ele e dominou-o facilmente. Chew ainda tinha os pés amarrados e não pôde defender-se do gigan­tesco brutamontes.

Depois de esbofeteá-lo até cansar-se, Cole per­guntou:

- Agora, você vai contar o que queria...

- Cale a boca! - gritou Henry, saltando no­vamente para cima de Chew, mas desta vez sem a seringa de veneno.

- Por que não quer que... - ia dizendo Cole.

Nesse momento soou a campainha da porta. Cole soltou o jovem, Johnny largou a garrafa de uísque e Henry, meio aliviado e meio assustado, gritou:

- Vá ver quem é!

Antes de obedecer, Cole avisou:

- Eu vou, Henry, mas cuidado com o que fizer a esse cara. Depois continuaremos a con­versa ...

Cole, antes de descer, chegou à janela para ver quem chegara. Retirou-se bruscamente, lívido e gaguejando:

- Es... estão aí.

- Quem?

- Os do FBI!

Johnny, apesar de meio embriagado, deu um salto e correu à janela. Antes dele, já Henry disparara sofregamente, na mesma direção. Sim, não havia dúvida, a casa estava cercada. Lá em baixo vários homens esperavam com me­tralhadoras na mão.

Mas os bandidos também estavam preparados, e Henry, meio apavorado, gritou:

- Venham comigo!

Cole e Johnny saíram atrás dele. Chew tinha sido completamente esquecido e ouviu o tiroteio com que Henry e seus comparsas recebiam os agentes da Lei.

Com as mãos livres, desatou apressadamente as pernas e saiu para ajudar os companheiros. Estava desarmado e quase nada podia fazer, mas mesmo assim, impulsionado pela audácia da juventude, meteu-se pelo corredor por onde ti­nham desaparecido Henry, Cole e Johnny.

Guiado pelo matraquear dos tiros, avistou os bandidos nas escadas, cada um com uma metra­lhadora, formando uma barreira de fogo que impedia a entrada dos agentes do FBI.

Chew imaginou um meio de combater. De onde estava, não podia ser visto, mesmo porque os bandidos tinham a atenção totalmente voltada para a porta. O mais próximo era Johnny. Se conseguisse dominá-lo e tomar-lhe a arma, po­deria facilmente atacar os outros dois.

Sobre uma mesinha ao lado, o jovem agente viu um pesado castiçal de bronze. Segurou-o firmemente e jogou-se sobre Johnny, que recebeu a pancada na cabeça sem mesmo pressentir o ataque que se avizinhava.

Cole ouviu o baque que vinha mais de cima. Espantado, viu o rapaz apontando-lhe a metra­lhadora. Escalou os degraus a toda pressa, mas Chew apertou o gatilho e uma chuva de balas apanhou o gigante pelo peito fazendo-o dobrar-se e rolar pelos degraus, em direção a Henry.

Henry olhou para trás e ainda teve tempo de encolher-se, dando passagem ao corpo já sem vida de Cole. Quis reagir, mas era tarde, pois acima dele, Chew gritava:

- Largue essa arma e levante os braços!

Henry viu que não teria tempo de atirar pri­meiro. Deixou cair a metralhadora e obedeceu à ordem.

Sem perder o inimigo de vista, o agente gritou para fora:

- Rocket, você está aí?

- Sim - respondeu Rocket.

- Pode entrar agora. Não há mais perigo.

Rocket entrou seguido por mais alguns homens. Não pôde conter a alegria de rever o compa­nheiro.

- De onde saiu você, rapaz?

- Do inferno - respondeu Chew com um sorriso. - Quero apresentar-lhe Henry.

Rocket agarrou-o pela gola do paletó e disse:

- Tinha muita vontade de conhecê-lo. Agora contará onde posso encontrar esse K. diabólico.

Henry sorriu ironicamente, parecendo divertir-se com a pergunta de Rocket.

- Miserável, fale, antes que eu lhe quebre todo os ossos!

- Não é preciso - disse Chew aproximando-se. - K. existe apenas na imaginação. Henry é muito esperto mas não tinha físico para impres­sionar e comandar. Teria fracassado se se me­tesse a chefiar uma organização que exigia au­toridade e pulso firme. Por isso inventou o mis­terioso K., de quem dizia receber ordens.

- Como descobriu isso? - perguntou Rocket.

- Só descobri há poucos minutos, e foi muito fácil. Henry podia enganar Cole e Johnny mas não a mim, não é verdade, Henry?

Henry respondeu com um grunhido de raiva e Chew continuou:

- Henry chamou K. pelo telefone e discou o número CY-2-89. Como vê, só marcou dois nú­meros e, desse modo, ninguém podia responder a uma ligação incompleta.

- Compreendo - disse Rocket. - Que res­ponde a isso, Henry?

O assassino, colhido na própria armadilha, não teve outro remédio senão admitir.

- Você tem razão. Esse K. nunca existiu. Sou eu o chefe da organização, mas nada poderão fazer contra ela e um dia...

- Cale a boca, imbecil! - bradou Rocket. - Claro que poderemos arrasar essa maldita orga­nização que lhe dá tanto orgulho.Numa sociedade bem organizada não há lugar para destruições nem destruidores, e mesmo que nós não agíssemos, seus planos falhariam por si mesmos.

Sem dizer mais nada, Rocket colocou as alge­mas em Henry e obrigou-o a caminhar na frente. O caso não estava encerrado e restava muito a fazer.

 

Henry confessou tudo, foi julgado por crimes de morte e traição e acabou seus dias na cadeira elétrica.

A quadrilha foi desbaratada e o país ficou livre da ameaça do terror e da morte.

Rocket estava feliz com o resultado das inves­tigações. Agora podia descansar e gozar os es­plêndidos dias da primavera. Sair. Ir para longe.

Mas para onde? Pensou em Olga Steton. De­via-lhe uma explicação. Comportara-se brutalmen­te com ela, que parecia uma moça tão delicada e sensível. Precisava pedir-lhe perdão.

Carregando uma enorme caixa de bombons, Rocket apareceu no bar em que a jovem traba­lhava.

- Olá! - disse ele.

- Olá! - respondeu a jovem demonstrando alegria ao vê-lo.

- Trouxe... uns bombons para você.

Olga nada perguntou. Apanhou os bombons e disse:

- Obrigada. Adoro bombons.

Depois de alguns instantes, Rocket falou meio acanhado:

- Faz um lindo dia, não acha?

- Sim - respondeu Olga. - E Rocket: - Gostaria de dar um passeio comigo? Pode­ríamos conversar um pouco. Creio que lhe devo algumas explicações...

Com um sorriso, Olga apanhou outra caixa de bombons e disse:

- Acontece que já tenho um compromisso para esta tarde. Estou sendo esperada por alguém que também quer me dar explicações. Penso que é um amigo seu.

Rocket olhou com espanto para a caixa de bombons e seguiu o olhar da jovem até a ponta do balcão à direita. Lá, com um sorriso, uma dose de Martini na frente, Eddie Chew esperava pacientemente que Olga terminasse seu trabalho. Rocket aproximou-se.

- Ah, então é você?

- Como pode ver - respondeu Chew. - Se quiser, podemos esperar juntos. Olga parece muito mais interessada em você, pois ficou transtor­nada ao vê-lo entrar...

Bem, se é assim... Olga, traga um Martini para mim também.

 

                                                                                            Fel Marty

 

 

                      

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