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Poesia & Contos Infantis

 

 

 


O VALE ENCANTADO DO VELHO BILLY / Bruce Peardon
O VALE ENCANTADO DO VELHO BILLY / Bruce Peardon

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

O VALE ENCANTADO DO VELHO BILLY

 

Este é o terceiro livro infantil que Mice Peardon escreveu e ilustrou. As suas outras obras são “Charlie the Chimneysweep and Sooty" e “Teddy's Night Lost in the Busíi", ambas sucessos internacionais traduzidos em cinco idiomas.

Já em criança Bruce Peardon demonstrava grande interesse em arte, mas só aos 17 anos, após um acidente de automóvel que o deixou completa-mente paralisado, começou a sua carreira como artista. Foi então que começou a pintar com o pincel na boca.

Bruce Peardon tornou-se membro da Associação dos Artistas Pintores com a Boca e os Pés, (VDMFK), em 1972. Não só foi um autor e ilustrador de sucesso, como também criou nome pelo seu trabalho artístico como pintor. Os seus quadros podem ser encontrados em numerosas colecções privadas por todo o mundo. Foi casado e vivia com a sua mulher Christine e o filho Ben em Queensland no sudeste da Austrália.

Faleceu a 13 de Maio de 2001, deixando muitas saudades a todos aqueles que o conheciam e também a todos os que admiram o seu trabalho artístico.

 

Ninguém se lembra exactamente quando é que o Velho Billy apareceu pela primeira vez na região que é hoje conhecida pelo vale do Velho Billy. Haja muitos anos que existia ali uma quinta com uma casa abandonada e em ruínas, quando o Velho Billy apareceu de repente, renovou a casa, plantou árvores e fez soar a sua linda música por toda a vizinhança."

Um bebé canguru escutava com os seus olhos grandes bem abertos, enquanto o seu avô canguru lhe contava a história do vale encantado do velho Billy.

“Mas o que aconteceu ao Velho Billy, avozinho? Porque é que ele já não está aqui?"

“Tens que ter paciência meu pequeno, deixa-me contar a história desde o princípio", disse o avô suavemente.

“Sabes, este vale foi sempre maravilhoso... fora o tempo em que quase foi destruído. O meu avô contou-me como ele, no tempo em que era ainda um pequeno canguru, observou os homens que por pouco não destruíram o vale para sempre, com os seus machados e serrotes."

“Queres dizer homens como o velho Billy?" interrompeu o bebé canguru.

“Não. Nem todas as pessoas são iguais. Muitas delas sempre se preocuparam com o milagre da natureza; muitas outras aprendem devagarinho a apreciar a natureza, porque existem pessoas como o velho Billy... Onde é que eu ia mesmo agora?"

“Tu querias-me contar como o nosso vale quase foi destruído", disse o bebé canguru ansiosamente.

“Ah pois", disse o avô. “Estas pessoas vieram para cultivar a terra..."

“O que significa cultivar a terra?", perguntou curioso o canguru bebé.

“Significa fazer crescer alimento... Tu sabes que todos os seres vivos da terra precisam de comer e que todos conseguem a sua comida de maneira diferente.

As pessoas necessitam de quintas para plantarem os seus alimentos. Mas", disse o avô cansado, “é exactamente aí que fazem muitas coisas erradas."

“Mas porquê?", perguntou o canguru bebé.

“Bem, como já te disse, todos nós somos criaturas desta terra e devemos partilhar aquilo que a mãe natureza nos dá. Mas quase todas as pessoas tomam para si mais do que a sua parte."

“Como assim avozinho?"

“Porque elas destroem tudo aquilo que consideram inútil. Mas devagarinho lá vão aprendendo que todos os seres vivos da face da terra têm o seu lugar e que acabam por perder tudo se intervirem demasiado na natureza... E foi precisamente isto que quase aconteceu neste vale."

“Até que o Velho Billy o salvou", gritou o bebé canguru maravilhado.

“Certo! Lembro-me do meu avô contar, como os primeiros lavradores quando aqui chegaram, quase deitaram abaixo e queimaram todas as árvores."

“Mas então, onde é que os pássaros fizeram depois os seus ninhos?", perguntou o pequeno canguru preocupado.

“Não havia mais nenhum sítio para os seus ninhos. Também não havia mais folhas de eucalipto para os koalas e nenhum alimento para os opossums e centenas de outras criaturas que aqui viviam. Então foram-se todos embora."

“E os cangurus? Também tiveram que ir embora?"

“Bem", suspirou o avô. “Por algum tempo, os cangurus puderam alimentar-se da pouca erva que os agricultores não tinham destruído com os seus arados e dormiam protegidos pelos escassos grupos de árvores que ainda restavam nas colinas. Mas logo que deixou de chover o resto de erva secou e não havia mais nada para comer."

“O que fizeram depois os cangurus, avô?"

“Primeiro tentaram comer aquilo que os agricultores tinham cultivado. Mas estes ficaram furiosos e dispararam com as suas armas contra os cangurus para os expulsarem. Assim não tiveram outra solução senão procurar comida noutro lugar."

“Mas se não chovia, do que é que viviam as pessoas?", perguntou o bebé canguru.

“Essa é uma boa pergunta meu pequeno... Sabes, com a seca é que os problemas realmente começaram. Primeiro os lavradores deitaram as árvores abaixo. Depois, por não existirem mais pássaros para afastarem os insectos famintos das plantações, os insectos destruíram quase tudo o que os lavradores tinham cultivado!"

“Então os insectos devoraram a comida das pessoas", disse o bebé canguru, que escutava atentamente.

“Não só os insectos! Também os ratos... porque não existiam mais falcões, mochos ou outros predadores, que caçassem os ratos. Eles reproduziram-se aos milhares e acabaram com o pouco cereal que ainda restava."

“E depois os agricultores tiveram que se mudar para achar comida noutro lugar", concluiu o canguru bebé.

“Não imediatamente... Primeiro tentaram cultivar outras terras férteis. Mas então eles entenderam verdadeiramente, porque é que as árvores são tão importantes."

“E porque é que elas são tão importantes?"

“Porque, meu pequeno... sem as árvores e as suas flores, as abelhas e outros insectos não são atraídos para que possam polinizar os campos. E assim, também nada cresce. E o pior de tudo foi quando começou uma longa seca. Não havia árvores para servir de protecção contra o vento quente do norte e uma grande parte da terra das culturas foi pura e simplesmente arrastada por este vento." Mas a situação ainda piorou. Quando finalmente chegou a chuva, foi arrastada ainda mais terra, porque não tinha nenhum apoio ou barreira que a segurasse."

“E então os agricultores foram-se embora?" perguntou o bebé canguru.

“Sim. Eles mudaram-se para cultivar a terra noutro lado. E felizmente foram espertos o suficiente para aprenderem com os seus erros."

“Talvez se não existissem pessoas na terra, nada seria destruído", ponderou o bebé canguru.

“Não, não. Eu já te tinha dito que todos os seres vivos têm aqui o seu lugar. As pessoas precisam de quintas para se alimentarem. Olha bem, agora há novamente cercas no vale, mas os agricultores não ficam com mais do que é a sua parte; repartem com a natureza. As árvores crescem, pássaros e outros animais vivem aqui, o rio está limpo e claro, patos e outras aves que vivem do rio regressaram para cá."

“E está novamente tudo bonito à nossa volta, graças ao Velho Billy...", disse feliz o canguru bebé.

“Sim... ele veio, e pôs em ordem aquilo que outros tinham arruinado."

“Tu lembras-te dele, avô?"

“Mas com certeza! Eu era ainda um pequeno canguru como tu, quando pela primeira vez espreitei da bolsa da minha mãe e vi o Velho Billy. Naquela altura o meu avô contou-me a história que hoje eu te estou a contar a ti."

“E é também a tua história", disse o bebé canguru.

“Sim, pelo menos uma parte dela." O avô riu baixinho para si próprio. “Então tanto quanto sei, o tempo ficou seco durante muito tempo e embora houvesse muito pouco para comer, o bando de cangurus que o meu avô liderava sabia que aqui o rio levava sempre água. Foi quando se encontraram com o Velho Billy pela primeira vez."

“O que é que ele estava a fazer?"

“Estava a recuperar a casa de uma quinta. Naquele tempo, o que chamou a atenção do teu bisavô e dos outros cangurus foram as pequenas árvores ao longo das margens do rio e isso fê-los ficar muito curiosos."

“E o que é que fizeram?"

Absolutamente nada. Eles olharam-no por um tempo, beberam água e procuraram por alimento. Pouco tempo depois chegou finalmente a chuva e eles ficaram muito tempo sem voltar ao vale. Tu podes imaginar como ficaram espantados quando finalmente regressaram. Por todo o lado cresciam árvores, a erva estava verde e tenra, e o Velho Billy continuava a plantar pequenas árvores."

“Desde então, nunca mais te esqueceste dele, avô?"

“Não. E lembro-me especialmente dele quando penso em todos os pássaros que voavam por todo o lado... os cucaburra, os lori-arco-íris, a catatua rosada e muitos outros. O vale ecoava com o som maravilhoso do seu cantar. À noite, quando o Velho Billy acabava o seu dia de trabalho, ouviam-se os acordes da sua música por todo o vale. Ele sentava-se na varanda da frente e tocava violino ou acordeão ou ainda a sua flauta de lata."

“O que é um acordeão e essas outras coisas?" perguntou o bebé canguru intrigado.

“Vais aprender isso no tempo certo", disse o avô com um piscar de olhos. “Nenhum dos animais tinha medo do Velho Billy. Quando ouvíamos a música, aproximávamo-nos devagarinho e ficávamos a ver e a escutar... Alguns pássaros, a catatua rosada e o picanço-cinzento, tornaram-se tão descarados que se penduravam em cima do Velho Billy guinchando e cantando com ele ao ritmo da música. E ás vezes, tenho de confessar, eu e uma ema entretínhamos o grupo todo com danças engraçadas", disse ele com um risinho disfarçado.

“Tu a dançar?", gritou o canguru bebé espantado.

“Palavra de honra... Eu em jovem, até era bastante ágil e flexível ," disse o avô timidamente.

“Mas tu ainda não me contaste o que aconteceu ao Velho Billy", insistiu o bebé canguru.

“Estou quase a chegar a essa parte", respondeu o avô carinhosamente. “Não sejas tão impaciente. Onde é que eu ia mesmo agora... ah sim. Um dia, alguns de nós viram o Velho Billy a abrir um par de caixas muito grandes... e o que é que pensas que espreitou cuidadosamente cá para fora?"

“O que foi?", perguntou o canguru bebé cheio de curiosidade.

“Bem - eram opossums, koalas, ouriços-cacheiros, bandi-cuts - todo o tipo de animais! Eles cumprimentaram-se um pouco retraídos, mas depois ganharam coragem e decidiram investigar o seu novo lar. Nessa altura, nós, os cangurus, fomos ao seu encontro para os conhecermos. Eles tinham vindo de um jardim zoológico que teve de fechar e o Velho Billy tinha-os comprado para depois os poder libertar. Agora já podes imaginar que a pouco e pouco, o vale foi ficando como já tinha sido um dia."

“Mas sem as pessoas", acrescentou o bebé canguru.

“Sim, é verdade! Mas não te esqueças, que há mais do que espaço suficiente para todos, quando tratamos da natureza com cuidado. Mas só assim!"

“Entendo", disse o bebé canguru mais tranquilo.

“Depois aconteceu o seguinte... Outras pessoas viram o que o Velho Billy estava a fazer, e também quiseram ajudar. Em breve já eram muitos, aqueles que plantavam árvores e limpavam o rio, para que as águas pudessem de novo correr livremente. Isso fez o Velho Billy muito feliz e ele tocou a sua música melhor do que nunca. O vale inteiro parecia estar cheio da sua magia."

“Mas porque é que o Velho Billy já cá não está, avô?"

O avô canguru falou com uma voz suave.

“Sabes meu querido, há uma parte da história que só os cangurus conhecem... algo que tu irás contar a outros pequenos cangurus, quando tu próprio já fores velho..."

“E o que vai ser, avô?", perguntou o bebé canguru.

“O meu avô conheceu o Velho Billy quando este ainda era um rapazinho. Ele era filho de um dos primeiros lavradores que veio para o nosso vale..."

“Os lavradores que deitaram abaixo todas as árvores?"

“Exactamente... O Velho Billy sabia que estava errado, aquilo que tinha acontecido neste lindo lugar. Assim, ele regressou para curar as feridas. Quando completou a sua missão, já era um homem de muita idade. E tal como qualquer outra criatura que ficou velhinha ou muito doente, o Velho Billy morreu. Os seus amigos do vale deitaram-no na terra e puseram nesse lugar uma pedra."

O canguru bebé reflectiu um instante e perguntou depois com uma voz triste:

“Avô, tu também vais morrer?"

“Sim meu pequeno, todos morremos um dia, quando somos velhos...Por vezes também se pode morrer em novo. Mas sabes, nós não morremos realmente. O nosso corpo já não está aqui, mas nós continuamos a viver nas recordações dos outros... O Velho Billy nunca irá morrer, porque as pessoas e os animais irão sempre lembrar-se como ele fez despertar de novo este vale para a vida e porque irão sempre ouvir a sua música."

“E eu vou-me lembrar sempre de ti, avô, porque tu me contaste esta história", disse feliz o bebé canguru.

“Isso deixa-me muito contente", riu o avô.

De repente, o bebé canguru enrugou a testa e perguntou perplexo:

“Mas avô, se o Velho Billy está morto, como podemos então ouvir a sua música?"

O avô riu alegremente.

"Vem comigo, vou mostrar-te algo..."

O velho canguru conduziu o pequeno canguru a uma árvore com um buraco no tronco.

“Quando o Velho Billy morreu, as pessoas deixaram a sua casa exactamente como estava. Ninguém parecia querer os seus instrumentos musicais. Por isso foram conservados pelos seus amigos, os animais."

O avô meteu a mão dentro do tronco e puxou um saco cá para fora. De dentro do saco tirou um violino, um acordeão e uma flauta de lata. A seguir, ergueu a cabeça, e assobiou na direcção do mato que ficava ali por perto.

No mesmo instante, desceram das suas árvores um koala e um opossum que vieram para perto do velho canguru.

O bebé canguru observava fascinado a maneira como o trio segurava nos instrumentos. O avô canguru pegou no violino, o koala no acordeão e o opossum na flauta.

Ao sinal dado pelo avô com um inclinar de cabeça, começaram a tocar. O canguru bebé estava deleitado. Os pássaros começaram a esvoaçar e a dançar e a clareira estava repleta de sons alegres e festivos.

De pouco a pouco todos os pássaros se juntaram à graciosa melodia que ecoava pelo vale. E assim se preserva a memória de um velho senhor, que amava as árvores e as criaturas da natureza. É que sempre que um pássaro canta, seja uma pega a saudar o dia com o seu melódico cantarolar, ou um sonoro pássaro-chicote que chama da clareira do bosque, está a contar a história do vale encantado do Velho Billy.

 

                                                                                Bruce Peardon  

 

                      

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