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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


OS ASTROS NÃO SE ENGANAM / Franklin Dixon
OS ASTROS NÃO SE ENGANAM / Franklin Dixon

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblio "SEBO"

 

 

 

 

   

Uma sucessão de estrondos ecoou como um tiroteio nas ruas sossegadas de Bayport. Uma velha car-ripana dobrou a esquina e parou em frente da casa de Fenton Hardy, o famoso detective particular. O condutor era um rapaz gordo e sardento.

Frank Hardy, um jovem de 18 anos e cabelo escuro, e o irmão Joe, louro e um ano mais novo, adivinharam quem era o visitante antes de o ver.

- É o Chet Morton de certeza - exclamou Joe, espreitando pela janela. - E vem excitado!

Chet chamou-os com um aceno.

- Há grandes novidades no porto - disse, quando os dois irmãos já vinham a descer os degraus da entrada. - Venham.

- Que sucedeu? - Perguntou Frank.

- Metam-se no carro e eu explico-lhes no caminho.

Acomodaram-se os três à frente e Chet pôs o carro em andamento. O veículo arrancou com um solavanco e lá foi sacudindo os passageiros ao mesmo tempo que ganhava velocidade. Dirigiram-se para o porto de Bayport. Joe apoiou uma mão no tablier para se segurar.

- É melhor contares o que sabes antes que esta velha carripana decida descansar um bocado.

Chet riu.

- O senhor está a referir-se à menina dos meus olhos, mas deixarei passar essa observação, dadas as circunstâncias. Agora, a sério, há mesmo sarilho ali em baixo. Tem que ver com o hydrofoil.

Joe mostrou-se surpreendido:

- O Flying Express? Julguei que estivesse preparado para fazer a sua viagem inaugural depois de amanhã.

Chet virou para a rua principal de Bayport.

- É verdade. Deve começar nessa altura o serviço de transporte de passageiros para Providence. Gostava de ter um bilhete, mas estão todos vendidos.

Providence era uma cidade portuária situada no extremo do cabo Cutlass, cerca de cem quilómetros a sul de Bayport. Os três jovens iam até lá frequentemente, no barco a motor dos Hardy, o Vedeta.

- E o que é que se passa com o Flying Express? - Quis saber Frank. - Alguma avaria mecânica?

- Creio que não - respondeu Chet. - Qualquer coisa relacionada com as relações públicas. Parece que há gente que gostaria de desacreditar o hydrofoil!

- Que embrulhada! - exclamou Joe.

Chet parou num sinal vermelho, perto da Fotos Condor.

- Ei, Frank, vamos num instante buscar as fotografias, já que estamos aqui - lembrou Joe.

- Boa ideia. Chet, encosta aí por um minuto, enquanto lá vamos, está bem?

Fenton Hardy e o seu assistente, Sam Radley, tinham tirado fotografias para renovar os passaportes, que mantinham sempre actualizados. Chet estacionou e os Hardy entraram na loja. Frank guardou as fotografias de Sam, enquanto Joe fazia o mesmo com as do pai e pagaram ao dono do estabelecimento. Em breve seguiam a caminho do cais.

Quando se aproximaram da doca onde o Flying Express se encontrava ancorado, chegou-lhes aos ouvidos o tumulto da multidão ali reunida. Eram proprietários de pequenas embarcações que gritavam e gesticulavam em direcção ao reluzente barco branco de fibra de vidro. Chet parou o carro ali perto e apearam-se todos.

De casco esbelto, o barco tinha cabinas, na popa e na proa, e um aspecto todo hidrodinâmico. O convés, atrás da ponte, destinava-se aos passageiros e tinha um corrimão de tubo metálico branco a toda a volta.

- É um belo barco - murmurou Frank com admiração.

- Tem trinta metros de comprimento e transporta sessenta passageiros - explicou Chet. - A velocidade máxima é de setenta milhas por hora.

- Não percebo o que é que eles têm contra uma beleza destas - disse Joe, apontando para um grupo que exibia cartazes.

Um dos cartazes tinha escrito em grandes letras:

DETENHAM O FLYING EXPRESS

QUEREMOS SEGURANÇA NA BAÍA

DE BARMET - É incompreensível - replicou Frank. - Não vejo que mal poderá fazer o hydrofoil se abrandar a velocidade ao entrar na baía. Ela é suficientemente grande para todos.

Chet tinha estado a observar a multidão.

- Aqueles rapazes, perto do cais, estão a pintar cartazes. Creio que me vou aproximar para ver de mais perto as suas produções artísticas... Ei! O que é isto?

Um dos pintores de cartazes metera repentinamente um cartaz na mão dele. Frank e Joe sofreram o mesmo tratamento da parte de dois adolescentes sujos de tinta. Antes de se terem apercebido do que se estava a passar, os Hardy e o amigo empunhavam cartazes com frases de protesto contra o hydrofoil.

- Nós não temos nada a ver com isto! - gritou Chet, zangado.

- Olhem! - avisou Joe. - Ali vem uma carrinha da televisão! Vamo-nos embora daqui!

Os rapazes largaram apressadamente os cartazes. Mas era demasiado tarde! A carrinha passara e as câmaras tinham apontado directamente para eles!

- Com mil diabos. Apanharam-nos! - resmungou Joe.

Algumas pessoas gritavam pedindo que se fizesse um assalto ao barco.

- Vamos afundar o hydrofoil! - gritou um dos manifestantes. - Vamos afundar o hydrofoil! - repetiram vozes de todos os lados.

Estavam prestes a passar à acção quando chegou um carro da polícia que parou no meio da multidão. O chefe da polícia de Bayport apeou-se e observou a desordem.

- Recebemos uma queixa contra o facto de este cais estar a ser ilegalmente bloqueado - trovejou o chefe Collig, usando um megafone. - Quero explicações. Vamos começar por vocês dois... Olha! São o Frank e o Joe Hardy! Também estão metidos nisto?!

O chefe Collig conhecia bem os dois irmãos, que ajudavam frequentemente o pai no seu trabalho de investigador. A habilidade dos jovens detectives era bem conhecida de todos em Bayport e eles cooperavam com a polícia sempre que podiam.

Enquanto Frank falava com o chefe da polícia, Chet afastou-se e começou a pintar qualquer coisa num cartaz.

“Isto é que é um amigo. Afastou-se e deixou-nos a nós a enfrentar a situação!” - pensou Joe.

- Nós não estamos metidos nisto, chefe - explicou Frank. - Somos os observadores mais inocentes que alguma vez viu.

Uma mulher de meia-idade dirigiu-se para eles e apontou de modo acusador.

- Não são nada inocentes. Eu vi-os empunhar cartazes como os outros!

Chet, com um cartaz atrás das costas, abriu caminho em direcção ao grupo onde se encontravam Frank e Joe.

A mulher estava sem fôlego. Acabou por apontar para um cartaz caído no chão e exclamou triunfante:

- Aqui está um dos cartazes que eles empunhavam! Veja!

- Eu apanho-o - ofereceu-se logo Chet. Inclinou-se e trocou habilmente o cartaz, de modo que levantou aquele que trouxera. Meteu-o na mão de Frank e empurrou-lhe o braço para cima. Toda a gente leu as palavras que ele tinha pintado:

FRANK HARDY PARA MAYOR

A multidão rompeu às gargalhadas. Nem mesmo o chefe Collig conseguiu disfarçar um sorriso.

Frank olhou para o cartaz e piscou o olho a Chet.

A irritação dos manifestantes desvanecera-se. As pessoas começaram a afastar-se do cais. Vendo que tudo estava sob controle, a polícia voltou para a esquadra.

Frank, Joe e Chet regressaram a casa. Quem lhes abriu a porta foi a tia Gertrude, a irmã do senhor Hardy, que vivia com a família havia um certo tempo. Era alta, de feições angulosas e tinha em geral um olhar reprovador, acentuado pelos óculos. Apesar de ralhar constantemente com os rapazes, porque, segundo ela, corriam demasiados riscos, a tia sentia a mais profunda afeição pelos sobrinhos.

- Ouvi dizer que houve sarilhos no cais - disse com severidade. - Sem dúvida que vocês lá estiveram!

- Claro que estivemos, tia - respondeu Joe, sorrindo. - Mas passámos a maior parte do tempo com o chefe Collig, do lado da lei.

Chet olhou, sorridente, para a tia Gertrude.

- Como está a situação alimentar hoje? Não haverá por aí alguma das minhas tartes preferidas?

- Talvez, Chet, talvez haja. Venham à cozinha! Enquanto a tia punha grandes fatias de tarte de morango em três pratos, Frank tirava leite do frigorífico. Depois, o trio levou tudo para a sala.

- Sabem - observou Chet enquanto ia comendo -, ainda não sei como funciona um hydrofoil.

- A pouca velocidade flutua sobre a água como um barco qualquer - explicou Frank. - Quando aumenta a velocidade, o casco ergue-se acima da água e desliza como um avião em voo rasante. Foi uma invenção de Enrico Forlanini em 1906.

- Queres dizer que levanta voo? - perguntou Chet.

- Não. Na verdade, nunca perde o contacto com a água. O casco tem por baixo uns suportes que terminam numa espécie de placas, os foils, que se mantêm submersos. Estes têm a forma de asas para dar o equilíbrio necessário.

- Creio que já compreendi.

- Quando a velocidade aumenta - prosseguiu Frank -, a água que passa sobre a parte de cima dos foils, que é arredondada, corre mais depressa do que a água que vai por baixo. Isso causa menor pressão à superfície e faz com que o casco se erga. O mesmo princípio que faz com que o avião se mantenha no ar.

Chet engoliu o último pedaço de tarte.

- E a propulsão?

Joe continuou a explicação.

- A Marinha dos Estados Unidos tem feito muitas experiências, utilizando tudo, desde a gasolina aos motores a jacto. O Flying Express é movido a diesel. O motor faz girar os propulsores na popa. Um hydrofoil faz viagens suaves, calmas e não provoca grande ondulação.

- Exactamente - concordou Frank. - Por isso não vejo razão para os proprietários de pequenas embarcações protestarem contra a presença do hydrofoil na baía de Barmet. Não vai prejudicá-los. Claro que podem suceder acidentes, mas isso pode suceder com qualquer embarcação. O protesto de hoje é incompreensível para não dizer mais.

Joe suspirou.

- É verdade. De qualquer modo tenho muita pena de não estar a bordo na primeira viagem. Tínhamos planeado ir com a Callie e a Iola, mas fomos comprar os bilhetes demasiado tarde.

Frank tinha um “fraquinho” por Callie Shaw e Joe sentia o mesmo por Iola Morton, a irmã de Chet. Chet pousou o copo ruidosamente.

- Com mil demónios! Podia ter-lhes dito que poupassem o vosso tempo e energia. Tu e a Callie são ambos Carneiro. Os vossos horóscopos indicam que proximamente só podem esperar aborrecimentos, dada a conjunção dos astros!

Frank e Joe entreolharam-se, sorrindo. Chet estava sempre a arranjar novos centros de interesse. O que o prendia agora era a astrologia. Estudava os horóscopos, para descobrir a influência que as estrelas e os planetas poderiam ter sobre a vida das pessoas.

- Estás então a ler o destino de Joe nas estrelas? - brincou Frank.

- Não rias - avisou Chet com ar solene. - Tu és Escorpião. Este mês os planetas também não estão na conjunção adequada para ti!

- Acreditas de facto em tudo isso?

- Claro que sim. O que era bom para os antigos Egípcios também é bom para mim.

Chet adoptou o tom de um professor a dar uma lição a estudantes pouco inteligentes. Eram uma pose que ele gostava de fazer.

- Ouçam com atenção. Um Escorpião gosta de pensar bem nas coisas, levando em conta todos os factores de um problema. É hábil na análise de pistas e motivos. Trata-se de um chefe nato. És tu, Frank.

Chet pigarreou e prosseguiu:

- Um Carneiro é sobretudo um activista. Lança-se em todo o género de situações sem se preocupar muito com as consequências. É cheio de entusiasmo e de bom humor. Tu és assim, Joe. Faz sentido, não faz?

Os Hardy concordaram que sim. Em muitos dos casos tratados por eles, Frank era geralmente o chefe porque era capaz de imaginar as diligências lógicas a serem feitas. Joe, por outro lado, era impetuoso e recusava-se a admitir que qualquer coisa fosse impossível.

- No entanto - murmurou Frank -, há alturas em que eu sou mais impulsivo e...

- Olhem. Parece que vamos ter visitas - exclamou Joe, interrompendo o irmão.

Os outros dois rapazes juntaram-se a Joe à janela. Um homem parara e olhava para a casa dos Hardy. Passou adiante, parou e voltou-se, e olhou outra vez para o número. Depois dirigiu-se para a porta.

- Aqui vêm mais aborrecimentos - murmurou Chet, ansioso.

 

A campainha tocou. Joe foi abrir a porta ao desconhecido.

- Procuro Frank e Joe Hardy - disse o homem.

- Eu sou o Joe. Faça favor de entrar.

Joe acompanhou o visitante até à sala e apresentou-lhe o irmão e Chet. O homem pareceu um pouco nervoso. Apoiava-se ora num pé ora no outro e retorcia as abas do chapéu de feltro que tinha na mão.

- Chamo-me Spencer Given - começou. - Venho aqui pedir-lhes que viagem umas quantas vezes no Flying Express, a partir de depois de amanhã!

Os Hardy olharam um para o outro com surpresa.

- Está a brincar? - disse Frank. - Já tentámos arranjar bilhetes. Está tudo vendido!

- Não é brincadeira - retorquiu Given. - Sucede que sou eu o proprietário do hydrofoil e quero contratá-los como detectives!

Frank ergueu o sobrolho.

- Espera sarilhos?

- Bem, os donos de barcos de recreio de Bayport, o caminho de ferro e as empresas de transportes rodoviários mostram-se irritados com a concorrência, por isso espalharam boatos de que o Flying Express não é seguro. Foi esse o motivo da manifestação de hoje no cais.

Frank disse que sim com a cabeça.

- Nós sabemos.

- É perfeitamente injusto! - exclamou Given, colérico. - As embarcações na baía de Barmet continuarão em segurança com o meu barco. Além disso, não vou tirar muitos passageiros aos autocarros e comboios. Mas não me querem dar ouvidos. Estão decididos a afastar-me do negócio do transporte para o cabo Cutlass.

Os rapazes ouviam-no com interesse crescente.

- Parece-me que nada os deterá de qualquer maneira - prosseguiu Given. - O que me preocupa é a possibilidade de sabotagem, pois os cabos e os propulsores são vulneráveis. Por essa razão é que os quero a bordo, para circularem entre os passageiros e manterem os olhos bem abertos. Se virem alguém a agir de modo suspeito, poderão deitar-lhe a mão.

Frank mordeu o lábio inferior.

- Não sei - disse, hesitante. - Visto estar a procurar um detective, porque não contactou o meu pai? Ele é mestre em casos de sabotagem.

- Fenton Hardy seria o ideal - admitiu Given. - Mas a verdade é que os vencimentos dele são demasiado elevados para esta missão. Creio que poderá ser resolvida por amadores. Quero contratá-los porque estou a par do que têm feito. Vocês são bons detectives e têm resolvido bastantes casos.

Os sucessos dos rapazes na investigação eram quase tão conhecidos como os do pai. O seu primeiro êxito fora na solução de O Mistério da Casa Abandonada e a sua mais recente aventura ficara conhecida como Os Assaltantes Invisíveis.

Frank voltou-se para o irmão.

- Que dizes, Joe?

- Por mim, estou pronto - declarou entusiasticamente Joe, que se voltou para Chet. - Queres dar-nos uma ajuda?

Chet mostrou-se duvidoso.

- Essa ideia da sabotagem não me agrada. Não farão ir o barco pelos ares, ou qualquer coisa drástica do género?

Frank soltou uma pequena gargalhada.

- Para isso é que nos contratam. Para impedirmos qualquer coisa do género. Bem, Chet, queres vir ou não?

- Claro que quero. Alguém terá de olhar por vocês!

- Outra coisa - interrompeu Joe. - As nossas namoradas nunca nos perdoariam se fôssemos ao cabo Cutlass sem elas. Acha que nos pode arranjar mais dois bilhetes, senhor Given?

Given respondeu com um gesto de assentimento.

- Não é má ideia! Se levarem as vossas namoradas ninguém desconfiará de que se encontram lá com qualquer outro propósito que não o de se divertirem. Mas não quero que dediquem toda a vossa atenção a essas meninas. Lembrem-se que têm trabalho a fazer.

- Não se preocupe - respondeu Frank. - Estaremos atentos.

Given suspirou de alívio e estendeu-lhe a mão.

- Está então combinado.

Nessa altura ouviram passos na escada e logo a seguir a tia Gertrude entrou na sala. Quando viu Given, parou.

Frank apresentou o visitante.

- Tia Gertrude, este é o senhor Given, o proprietário do hydrofoil.

- Como está? - disse a tia Gertrude. - Vinha agora mesmo ver o noticiário das cinco, a ver se mostram alguma coisa do que se passou no cais. Não se importa, pois não?

- Claro que não - respondeu Given.

Frank e Joe entreolharam-se, apreensivos, ao lembrar-se de como a câmara da televisão os focara no meio dos manifestantes que protestavam contra o hydrofoil. Que pensaria Given disso? O melhor era conseguir que ele saísse rapidamente!

- Não queremos fazê-lo perder mais tempo, senhor Given - declarou Frank.

- Aqui tem o seu chapéu, senhor Given - acrescentou Chet, todo prestável.

- Eu acompanho-o à porta, senhor Given - disse Joe o mais calmamente que lhe foi possível.

O visitante dirigiu-se para a saída, mas voltou-se de novo para a sala.

- Pensando bem, é melhor ver também o noticiário. O que se passou no cais tem grande importância para mim. Vou ver se eles mostram o Flying Express!

- Estamos tramados! - murmurou Joe entre-dentes de maneira a que só Frank o ouvisse.

Era demasiado tarde para fazerem fosse o que fosse. A câmara focava a multidão que se encontrava no cais e logo a seguir apareceu um grupo destacado de três rapazes: Frank, Joe e Chet! Cada um deles empunhava um cartaz.

Spencer Given ficou vermelho de cólera.

- Vocês encontravam-se entre aqueles que se manifestavam contra o meu negócio! - gritou. - Pensar eu que lhes ofereci trabalho. Bem, enganaram-me, mas isso não voltará a suceder. O nosso acordo fica sem efeito!

- Senhor Given - tentou explicar Frank -, a culpa não foi nossa. Alguém meteu esses cartazes...

A televisão mostrava agora Chet a apanhar o cartaz do chão. Daí a um momento erguia o braço de Frank. As palavras escritas no cartaz liam-se claramente:

FRANK HARDY PARA MAYOR

A tia Gertrude riu ao ver a cena com os sobrinhos e o amigo.

- Creio que deve pedir desculpa aos rapazes, senhor Given - disse.

- Bem, talvez sim - respondeu, mais calmo, Given. - Por momentos pensei que estivessem a apunhalar-me pelas costas. Pronto, se estiverem de acordo, a minha proposta continua de pé.

Os rapazes disseram que sim com a cabeça. Entretanto Chet tinha estado a observar o visitante. De repente, interrogou:

- Senhor Given, qual é o dia do seu aniversário? A pergunta apanhou o proprietário do barco de surpresa.

- O que é que isso tem a ver com o meu hydro-foil?

- Pode ter muito - replicou Chet. Given mostrou-se impaciente.

- Acaba com essa brincadeira - exclamou, voltando-lhe as costas.

A tia Gertrude soltou uma risadinha.

- Agora estou com curiosidade, Chester! Senhor Given, diga lá ao rapaz a data do seu aniversário!

- Um de Março - resmungou Given.

- É pena - replicou Chet, num tom fatalista. - Muita pena. O senhor é Peixes. Tudo lhe corre mal nesta fase da lua!

- Oh! Que disparate!

Given abanou a cabeça aborrecido, despediu-se da tia Gertrude, pôs o chapéu e saiu.

- Não creio que ele leve a tua astrologia muito a sério, Chet! - observou Joe com uma gargalhada.

- Não tão a sério como o seu hydrofoil, com certeza - comentou Frank.

- Mas uma coisa está relacionada com a outra! - protestou Chet. - A conjunção desfavorável dos corpos celestes relaciona-se com tudo o que ele faça. E isso inclui o serviço de transporte de passageiros para o cabo Cutlass. Given tem pela frente muitos sarilhos.

Gertrude Hardy ouvia-os com interesse crescente.

- Chet Morton, que interesse é esse pela astrologia? Sabes de facto fazer horóscopos? Que dizes do meu?

- Sabe que é preciso tempo para ler as estrelas. No entanto, posso dizer-lhe já umas coisas. Dia e mês do nascimento, por favor.

- Bem, visto que não queres saber o ano, não me importo de te dizer que nasci no dia 25 de Agosto. A que signo pertenço?

Chet engoliu em seco, corou e evitou o olhar da tia Gertrude.

- É... é... uma linda e jovem deusa! - murmurou.

A tia Gertrude corou.

- Chet Morton, és impossível!

- Bem, pertence ao signo da Virgem - declarou Chet timidamente.

A tia Gertrude alisou o cabelo com uma das mãos.

- Continua! Chet prosseguiu:

- Os nativos da Virgem possuem grande habilidade analítica. Vão direitos ao âmago das questões importantes, sem perderem tempo com detalhes inconsequentes. São também pessoas sensíveis, que gostam de conviver e que preferem uma vida simples. Falam muito, o que está certo, porque o que costumam ter para dizer merece a pena ser ouvido.

Gertrude Hardy mostrou-se satisfeita.

- As estrelas dizem que pode ser uma boa crítica ou talvez alguém que trabalhe em reparações! - continuou Chet.

A tia dos rapazes olhou para ele através dos óculos de aros metálicos e riu.

- Muito obrigada, Chet. Não posso dizer que tenha ficado encantada com a ideia de trabalhar em reparações, mas o resto é bastante satisfatório. Se os horóscopos que fazes são todos tão lisonjeiros como o meu, vais ter mais amigos do que aqueles de que precisas.

Chet sorriu.

- Vou ver se te arranjo uma grande fatia de bolo dos anjos para te recompensar - concluiu a tia Gertrude, passando pelas portas de vaivém para a cozinha.

- E o teu horóscopo, Chet? - perguntou Joe, gracejando.

- Eu pertenço ao signo do Caranguejo. Como devem calcular, estou destinado a ser um bom cozinheiro! A sorte não tem estado do meu lado ultimamente, mas posso dizer-lhes que em breve haverá uma mudança. A Lua e o Caranguejo...

A campainha do telefone interrompeu-o. Joe atendeu. Ouviu uma voz que não lhe era familiar.

- Hardy?

- Fala Joe Hardy.

- Tenho uma mensagem para si e para seu irmão.

- Diga.

Joe fez sinal a Frank e a Chet para se aproximarem do auscultador.

- Ouvi falar dos vossos projectos. Aceitem um aviso amigável. Se são espertos, não queiram ter nada a ver com o Spencer Given. Recusem qualquer proposta que ele lhes tenha feito e abandonem o caso enquanto ainda estão inteiros.

- Quem fala? - perguntou Joe.

- Não importa. E, a propósito, não viajem no Flying Express. É perigoso!

E desligou.

 

- Com mil demónios! - exclamou Chet. - Quem era?

Joe pousou o auscultador no descanso.

- Não temos maneira de o saber - murmurou, franzindo o sobrolho. - Alguém que não gosta dos Hardy e companhia.

- Contudo não estava realmente interessado em nós - disse Frank. - O propósito dele foi avisar-nos a respeito do Flying Express. Tenho um palpite de que se trata de um dos inimigos do Spencer Given.

- Pode ser - admitiu Joe. - Provavelmente seguiu o Given até nossa casa e tomou a iniciativa de nos telefonar antes de nos aproximarmos do hydro-foil. Deve ter telefonado de qualquer sítio aqui perto depois de ter visto o Given partir.

- Há uma cabina telefónica ali adiante. Pode ser que ainda lá esteja! - Saíram os três de casa a correr e desceram a rua. Encontravam-se ainda a um quarteirão de distância quando viram a porta da cabina abrir-se. Distinguiram de longe uns cabelos louros e um vestido castanho no vulto que num abrir e fechar de olhos entrou num carro de desporto estrangeiro que logo se pôs em marcha.

- Macacos me mordam! É uma mulher! - exclamou Joe. - Mas pareceu-me uma voz de homem!

- Talvez seja uma mulher com voz grave - lembrou Frank. - Vamos ver se deixou alguma pista para chegarmos à sua identidade.

Os Hardy passaram uma rápida busca à cabina sem nada encontrarem. Então Chet entrou, abriu o dispositivo onde a máquina devolvia o troco e tirou de lá uma moeda de dólar.

- Júpiter está alinhado com Urano! - exclamou com uma gargalhada. - Não admira que a minha sorte tenha mudado! Se continuar assim vou precisar apenas de um bilhete de ida para o cabo Cutlass!

- Que significa isso? - perguntou Frank.

- Não posso dizer ainda - replicou misteriosamente Chet. - O meu horóscopo diz que devo ficar calado por enquanto. Só lhes direi o que se passa quando os signos estiverem mais favoráveis.

Joe, que estivera a observar a área circundante, inclinou-se e apanhou qualquer coisa da valete. Mostrou o objecto com um sorriso significativo. Era um charuto ainda aceso. A outra extremidade estava manchada de bâton.

- Não era nenhuma senhora - disse. - Tratava-se de um homem apreciador de charutos negros.

Frank fez um gesto de concordância.

- Arranjou uma maneira inteligente de seguir o nosso amigo Given. Ele está preocupado com os donos dos barcos e os homens dos autocarros. Claro que não desconfia de uma loura num carro de desporto.

Chet mostrou-se preocupado. Percebia que a ameaça era real. Ele sentia uma verdadeira aversão pelo perigo, apesar de os Hardy poderem sempre contar com a ajuda dele quando era necessária.

- Talvez ele, ou ela, queira mesmo fazer o Flying Express ir pelos ares - disse. - Acham que devemos meter a polícia nisto?

- Não. Certamente o Given não quererá tal coisa. Seria má publicidade para o barco. Além disso não temos nada de definido em que basear uma queixa - fez notar Frank.

- Estás a ficar com medo, Chet? - brincou Joe.

- Quem? Eu? Claro que não.

- Está bem. Então continuemos com o jogo. Nessa noite, quando Fenton Hardy chegou a casa, ficou surpreendido ao saber que os filhos tinham sido contratados por Spencer Given para vigiar o Flying Express.

- Já ouvi falar nele - disse o senhor Hardy. - É um homem de negócios muito hábil. Está também metido na compra e venda de propriedades e espera conseguir com o seu hydrofoil uma grande valorização dos terrenos no cabo Cutlass. Percebe-se por que motivo está preocupado. Tem uma fortuna em jogo, apostada no sucesso do Flying Express.

- Deve ter muito dinheiro - disse Frank.

- Tem. Mas parece que é bastante avarento.

Frank e Joe riram.

- Reparámos nisso. Ele declarou-nos que não tinha posses para o contratar a si. Por isso é que nós ficámos com o trabalho.

O senhor Hardy sorriu.

- Bem, vocês sabem o que fazem. Sem dúvida que terão uma viagem excitante até Providence. No entanto, tenham cuidado com o indivíduo que viram disfarçado, pois a viagem poderá tornar-se demasiado excitante.

- Teremos - prometeu Joe.

- Entretanto eu vou para a ilha do Tubarão. A polícia pediu-me que descobrisse a pista de um bando especializado em roubar pequenas embarcações. Trata-se de profissionais inteligentes com um negócio muito lucrativo.

- O que é que eles fazem?

- Parece que primeiro andam de um lado para o outro a receber encomendas de motores, rádios e todo o género de equipamento indispensável para manter um barco a flutuar - explicou o detective. - E em seguida vão roubar essas coisas aos barcos que se encontram desprotegidos.

- Mas que espertalhões! - exclamou Frank. - Satisfazem as encomendas com os artigos roubados!

- É mais ou menos isso! - concordou o pai. - Por enquanto ainda não vieram para estes lados, por isso vou à ilha do Tubarão para ver se descubro alguma coisa.

- A ilha do Tubarão fica a cerca de oitenta quilómetros para lá do cabo Cutlass, não fica? - perguntou Joe.

- Isso mesmo. Parece-me um esconderijo lógico para o bando, visto que desenvolvem a maior parte da sua actividade à volta dessa zona.

- Talvez nós o possamos ajudar, pai - sugeriu Frank. - Só estamos comprometidos com o Given para fazer umas viagens a bordo do Flying Express!

- Nesta altura pouco podem fazer para me ajudar. Não conto ter uma ideia muito clara do caso antes de ir à ilha do Tubarão. No entanto, é boa ideia manterem-se em contacto comigo. Este é o meu número do telefone. - E Fenton Hardy entregou a Frank uma tirinha de papel.

- Além disso - continuou -, é bom que liguem o alarme electrónico do Vedeta. Apesar de, por enquanto, não ter havido roubos por aqui, o bando pode resolver alargar o raio de acção em qualquer altura.

Frank concordou com um gesto.

- É claro que nós não queremos perder o nosso barco!

A senhora Hardy preparava a mala do marido. Era uma mulher bonita, e com uma figura elegante, habituada havia muito a saber o que um detective precisava quando partia em trabalho. Disfarces, rações de reserva, dispositivos de escuta, tudo isso entrou na mala antes de ela a fechar.

Pouco mais tarde, Fenton Hardy já ia a caminho da ilha do Tubarão.

Enquanto tomavam o pequeno almoço, no dia seguinte, o telefone tocou. Joe correu a atender, procurando esconder a sua excitação.

- Se for o pai, talvez já tenha algum trabalho para nós fazermos!

Mas era Chet Morton, que falou com entusiasmo.

- Adivinhem o que me sucedeu. A sorte está realmente a sorrir-me hoje. Arranjei um emprego!

- A sério? Como astrólogo? - perguntou Joe.

- Claro que não. Queria trabalhar durante as férias de Verão e por isso inscrevi-me na marina Estrela do Mar, no cabo Cutlass. Claro que não esperava uma resposta enquanto as conjunções de Caranguejo não estivessem certas.

Joe soltou um assobio.

- Compreendo. E agora estão?

- Sim, senhor. A Lua passa através do Zodíaco. O proprietário da marina telefonou-me e disse-me para me apresentar imediatamente. Era a isso que eu me referia ontem quando disse que talvez só precisasse de um bilhete de ida.

- Bem, isso é óptimo, Chet. Mas o nosso trabalho no hydrofoil? Se te vais já embora...

- Quem disse que eu não esperava até amanhã? - Chet fingiu-se ofendido. - Se prometi ir com vocês, vou. Sou um homem de palavra.

- O. K. Então até amanhã de manhã.

No dia seguinte, os dois irmãos saíram cedo, para ir ter com as amigas. Callie e Iola esperavam-nos ao portão da quinta dos Morton.

- Chet já se foi embora - disse Iola. - Declarou que precisava de fazer trabalho de detective por conta própria!

As duas raparigas eram atraentes de maneiras diferentes. Iola Morton, morena, tinha feições expressivas, olhos brilhantes e muita vitalidade. Vestia um vestido cor-de-rosa. Callie Shaw era loura, alta e delgada. Trazia uma saia amarela e um casaco às riscas.

Quando se dirigiam para o cais, Iola observou:

- Acho que foram muito simpáticos em nos convidar para esta viagem a bordo do Flying Express.

- Estou de acordo - afirmou Callie. - Como é que conseguiram arranjar bilhetes?

Joe foi-lhes explicando, enquanto Frank, ao volante, se mantinha atento à estrada. Callie sentou-se, muito direita, com as mãos no colo, e disse friamente:

- Eu logo vi! Sempre que vamos a algum sítio com os manos Hardy acabamos por nos ver metidas numa investigação!

- Eu não me queixo - declarou Iola, rindo. - Uma viagem no Flying Express vale bem um mistério!

Frank estacionou o carro e dirigiram-se os quatro para a fila de pessoas que se preparava para entrar a bordo do hydrofoil. Joe mostrou os bilhetes que Spencer Given lhes dera e subiram para o convés.

Tudo era novo e reluzente, numa atraente combinação de fibra de vidro, cromados e madeira envernizada. O piloto, um homem de cerca de trinta anos, estava sentado ao volante. Given encontrava-se de pé, junto dele, sorrindo de satisfação.

- Espero que o Chet chegue a tempo - observou Joe. - Ele não lhes disse aonde ia?

Iola abanou a cabeça.

- Não. Disse que vinha ter connosco ao Flying Express. Estava certo de não ter qualquer dificuldade em entrar a bordo, visto o Given o ter convidado.

Frank e Joe ficaram no pequeno convés da popa enquanto Callie e Iola entravam na cabina. Ali dentro havia umas poucas de filas de cadeiras de aspecto confortável, tendo um corredor central. Os passageiros conversavam animadamente. Chet não se encontrava entre eles.

Dali a instantes, os Hardy vieram ter com as duas raparigas.

- Chet não apareceu - avisou Frank.

Ainda ele falava quando o motor começou a trabalhar com um ruído abafado e o Flying Express começou a mover-se. Lentamente, foi-se afastando do cais e avançou para o largo.

- Estou preocupado com o Chet - murmurou Joe ansiosamente, vendo as ondas passarem por eles mais rapidamente.

O casco ergueu-se acima da superfície da água e os suportes por debaixo dele ficaram à vista. Em breve o Flying Express avançava a toda a velocidade através da baía, a caminho de Providence.

- Não houve obviamente sabotagem à partida - comentou Iola com voz emocionada.

- Até aqui tudo bem - concordou Joe. - Se o resto da viagem for assim, o senhor Given será um homem feliz na altura em que chegarmos ao cabo Cutlass.

Frank coçou o queixo - Aí é que nós entramos. É nosso dever fazer com que o Flying Express faça uma viagem sem acidentes. A partida é só o começo. Haverá muitas outras oportunidades para fazer sabotagem durante o caminho.

Voltou-se para as raparigas.

- Vocês podem apreciar o passeio enquanto nós vamos dar uma vista de olhos. Joe, é melhor tu ires até lá à frente ver o que se passa. Eu sigo para o lado contrário. No fim fazemos o ponto da situação.

Iola e Callie recostaram-se nos seus lugares. Joe afastou-se. Tudo no barco parecia agradável.

Frank avançou por uma pequena ponte na popa. O vento fustigava-o e teve de se agarrar ao corrimão. Viu um dos foils, agora quase à superfície. Por baixo, as hélices levantavam espuma branca. Fascinado pelo funcionamento do hydrofoil, Frank inclinou-se para ver melhor.

Subitamente, Frank sentiu alguém atrás de si. Tentou voltar-se. Demasiado tarde. Duas mãos agarravam-no com força pelo pescoço lançando-o pela borda fora!

O rapaz mergulhou em direcção ao foil e à hélice que girava por baixo dele!

 

Frank estendeu instintivamente os braços. As suas mãos agarraram uma barra da armação de suporte dos foils, interrompendo assim a queda.

Durante momentos ficou quieto, com todos os músculos tensos para evitar cair sobre a hélice, que girava velozmente pouco abaixo. Conseguiu aguentar-se! Reunindo todas as suas forças, elevou o corpo até à barra de metal, abraçando-se a ela, e levantou os pés, para não tocar na água espumosa que, mesmo assim, o molhava bastante. Os seus gritos de socorro não se ouviam no meio do ruído.

Quanto tempo iria aguentar-se naquela posição? A barra metálica estava escorregadia. Frank tentou desesperadamente aguentar-se mas sentia-se perder as forças! Começou a deslizar pela barra em direcção à água! Dentro de momentos seria apanhado pela hélice!

Desesperado, olhou para cima e, no meio da névoa dos salpicos, julgou ver uma rapariga a olhar para baixo. De facto, uma jovem dera com Frank quase a chegar à água. Após um momento de surpresa, ela gritou por socorro.

- Homem ao mar! Homem ao mar!

Joe vinha direito à popa, à procura de Frank. Acabara de subir ao convés quando ouviu o grito de alarme. Instintivamente, percebeu que Frank estava em perigo e correu a avisar o piloto, que imediatamente desligou o motor.

As hélices pararam e o Flying Express pousou suavemente sobre a superfície das águas a meio da baía. Joe e o piloto lançaram uma corda e Frank foi içado para o convés.

- Mesmo a tempo - murmurou Frank, ofegante e exausto.

Spencer Given abriu caminho por entre os passageiros que observavam a cena. O seu rosto tinha o mesmo tom avermelhado que os rapazes tinham notado no dia em que ele fora a casa deles. - Que significa isto? - perguntou, furioso. - Podia ter danificado o barco!

- Senhor Given - protestou Frank -, o seu barco podia ter-me danificado a mim. Foi por pouco.

- Não é altura para brincadeiras! Em que estado ficaram o foil e a hélice? - perguntou Given.

Quando lhe disseram que se encontravam em perfeito funcionamento, virou costas e dirigiu-se para a ponte.

- Está danado - observou Joe.

- Creio que, em parte, tem razão - disse Frank em voz baixa. - Como detective, devia ter-me acautelado e não ir sozinho para aquele sítio isolado, tanto mais se suspeitamos que se encontra um sabotador a bordo. Estamos aqui para impedir que haja sarilhos e não para colaborar neles.

Levantou-se, ainda trémulo, ao mesmo tempo que o barco começava a vibrar, ganhando velocidade.

- A propósito, onde está a rapariga que deu o alarme? Gostaria de lhe dizer como estou agradecido.

Perguntaram aos passageiros mas ninguém sabia de quem se tratava.

- Era bonita? - quis saber Callie, parecendo um pouco ciumenta.

- Não tive tempo para reparar nisso - replicou Frank.

Os mirones dispersaram lentamente e os jovens detectives entraram na cabina da popa.

O Flying Express recuperara a velocidade. Os passageiros sentiam-se aliviados depois de o rapaz que caíra ao mar ter sido salvo tão rapidamente. Mas ficou no ar uma certa inquietação e ouviam-se comentários e críticas. Chegariam ao cabo Cutlass a horas? Ninguém sabia. Nem podiam dizer sequer se lá chegariam...

O hydrofoil passou por dúzias de pequenas embarcações que velejavam na baía ou ali se encontravam ancoradas. O aparecimento do grande barco causou sensação. Rapazes e raparigas aplaudiam e havia quem agitasse lenços coloridos. Mas algumas pessoas erguiam os punhos ao ver o Flying Express passar como um relâmpago.

Spencer Given aproximou-se dos dois rapazes enquanto eles observavam tudo isso.

- Estão a ver aqueles, ali na lancha, a ameaçarem com o punho? É esse género de atitude que eu receio. Estejam alerta. A viagem ainda vai no princípio. Não podemos confiar em ninguém que navegue na baía de Barmet!

- E que diz de quem anda a voar sobre a baía? - perguntou Joe, apontando para um pequeno avião que os sobrevoava. - Aquele tipo anda sem dúvida a espiar-nos. Segue-nos já há um grande bocado. Parece um míssil teleguiado atrás do seu alvo.

- Que será que pretende fazer? - murmurou Frank.

O piloto deu-lhe a resposta. Fez subir o aparelho e afastou-se até cerca de uma milha. Depois, apontou à popa e lançou-se em voo picado.

- Aquele avião vai chocar connosco! - gritou alguém, aterrorizado. Generalizou-se o pânico. As pessoas precipitaram-se para a saída.

Cerrando os maxilares, Frank e Joe prepararam-se para o impacte, agarrando firmemente Callie e Iola.

- Oh, Joe, estou com tanto medo! - disse Iola, estremecendo.

No último momento, o piloto endireitou o aparelho. O avião passou a rasar por cima do hydrofoil, da popa para a proa, e o ruído dos motores era ensurdecedor.

- Não tem identificação. - Joe registou o facto instantaneamente. - Deve tê-los tapado de propósito, pois, caso contrário, viam-se perfeitamente a esta altitude!

Frank deu-lhe uma cotovelada e apontou para a parte inferior da fuselagem, à qual estava preso pesado tronco de árvore, logo atrás das rodas. Num instante, as garras que seguravam o tronco abriram'' -se e deixaram-no cair mesmo na frente do veloz hy drofoil!

O piloto do Flying Express torceu o volante e desviou o barco para o lado. Alguns passageiros foram atirados ao chão, outros projectados para fora dos seus lugares.

O grande barco estremeceu, mas evitou à justa o tronco, que ainda roçou num dos lados e depois desapareceu nas águas.

- O homem que dirige o barco tem reflexos rápi' dos! - exclamou Frank. - Se tivéssemos batido no tronco, o casco poderia ficar com um rombo.

- Lá vai o avião. Agora já não temos esperança de o identificar! - disse Joe. - Bem, creio que o melhor é contar ao pai o que se passou. Vou entrar em contacto com ele através do rádio-telefone do barco.

O senhor Hardy atendeu a chamada. Joe relatou' -lhe o acidente de Frank e o que sucedera com o avião e o pai concordou que o caso estava a tornar-se perigoso. Aconselhou os jovens a manterem-se alerta e a não correrem riscos desnecessários.

- Há dúzias de aviões desse tipo nos campos de aviação perto de Bayport - fez notar Fenton Hardy. - Mas também pode ter vindo de outro lado para fazer esse trabalho.

- Isso é verdade - concordou Joe. - Talvez o piloto seja um lobo solitário contratado para atacar o Flying Express.

- Se assim for, pior um pouco. Significa que há alguém por detrás que não hesita perante nada. É melhor avisarem o Given. Acautelem-se e vão-me dando notícias.

Joe foi contar a conversa ao irmão.

- O senhor Given pode contar com sarilhos - disse Frank. - Grandes sarilhos. E não preciso de conhecer os signos, como o Chet, para fazer esta profecia!

Joe concordou.

- Vamos falar com o nosso cliente.

Foram encontrar Given na cabina de trás. O homem, enervado, explicou que ficaria arruinado se o Flying Express sofresse mais atrasos.

- Sarilhos! - resmungou com ar cínico. - Claro que já há sarilho! Mas pode ser que tenha menos se vocês fizerem um verdadeiro trabalho de detectives. E não se esqueçam de que temos uma viagem de regresso logo à tarde! Espero que trabalhem melhor na viagem de regresso do que nesta.

- Estaremos atentos, senhor Given. Fique descansado.

Quando iam a subir as escadas estreitas para o convés da popa, aparentemente deserto, Joe disse gravemente:

- Temos de apresentar resultados palpáveis para mostrar ao Given que ele não cometeu um erro ao contratar-nos. Mas o quê?

- Acabar com aquela luta, por exemplo! - exclamou Frank. - Olha!

Junto da amurada encontravam-se duas mulheres envolvidas em luta, como gatas.

- Oh! - exclamou Joe. - Que despropósito! Vamos separá-las antes que fiquem sem cabelo!

As duas contendoras davam pontapés e socos uma à outra. Uma era loura e usava um vestido verde escuro, a outra, morena e algo corpulenta, tinha um vestido azul, já rasgado em vários sítios.

Subitamente a morena desferiu um soco na loura que a atingiu mesmo em cheio. A loura cambaleou, foi bater na amurada e caiu à água.

Frank e Joe agarraram a morena. O vestido dela acabou de se rasgar quando o puxaram e a cabeleira preta foi parar ao chão. Os Hardy soltaram uma exclamação de assombro.

Em frente deles, a arfar e apertando um dos nós dos dedos, que tinha esfolado, estava Chet Morton!

 

Chet tinha uma expressão aborrecida no rosto geralmente bem disposto. Resfolegava como um porco-do-mar e o vestido rasgado revelava uma camisa de quadrados e uns jeans azuis. Explicou então que viera para bordo do Flying Express disfarçado, para fazer um trabalho de detective por sua conta.

- Mas estavas a lutar com uma senhora, Chet - protestou Joe com indignação.

- Senhora? Estás a brincar? Era o homem que vimos a sair da cabina telefónica em Bayport. Nessa altura trazia um vestido castanho.

- Oh! Que parvos temos sido! - exclamou Joe. - O melhor é começarmos imediatamente a operação de salvamento!

- Poupa as tuas energias - retorquiu Frank. - É demasiado tarde!

Apontou para o homem na água, o qual, evidentemente, não tinha qualquer intenção de ser apanhado pelo hydrofoil. Enquanto a peruca loura era arrastada pela corrente, ele despia o vestido e começava a afastar-se do barco com braçadas vigorosas.

- É perito em crawl australiano - comentou Frank. - Mas vai ter problemas para chegar a terra, ido de tão longe.

- Não precisará de o fazer - disse Joe. - Vejam!

Um barco a motor aproximava-se velozmente cortando as ondas. Descreveu uma curva fazendo um círculo de espuma branca e o piloto atirou uma corda ao náufrago fugitivo. Este agarrou-a e momentos depois estava dentro do barco. Logo a seguir dirigiram-se para terra.

- Aquele barco deve ter vindo a seguir-nos - observou Frank. - Se calhar o condutor viu a nossa luta através de uns binóculos.

- Como é que te interessaste por aquela “dama”? - quis saber Joe.

- Hoje de manhã fui à farmácia aviar uma receita para a minha mãe - explicou Chet. - A lourinha estava na farmácia a comprar comprimidos para o enjoo. Falou no hydrofoil. Então pensei que seria divertido seguir o disfarce com outro disfarce.

Joe riu.

- Considerando o pouco tempo que tiveste, fizeste um bom trabalho com o teu traje.

- Trouxe emprestado um dos vestidos da minha mãe e essa cabeleira da Iola. Mas elas não sabem, claro.

- Quando a tua irmã descobrir não vai gostar nada da graça.

Frank apanhou a peruca desgrenhada e entregou-a a Chet, que a escondeu por debaixo da camisa. Depois reuniu os restos do vestido da mãe, fez um embrulho e atirou-o ao mar.

- Julgámos que tinhas perdido o barco - disse Frank enquanto olhava os restos do vestido a desaparecerem nas ondas.

- Não, pelo contrário. Cheguei aqui cedo e, como vi a lourinha a bordo, embarquei logo. Perdi-a de vista uma vez, por pouco tempo. Depois dei com ela, vinha como que a fugir da popa. Fui espreitar e descobri-te agarrado à armação dos foils. Por isso gritei por socorro.

Frank soltou um assobio.

- E a Callie queria saber se a minha salvadora era bonita! '

Os rapazes riram.

- Vamos comer alguma coisa - sugeriu Chet. - O ar do mar e o trabalho de detective abriram-me o apetite!

Foram encontrar Callie e Iola comodamente instaladas. Enquanto comiam as sanduíches que tinham levado com eles, Chet explicou às duas raparigas as suas investigações particulares, não falando contudo do disfarce.

- Olhem, estamos a perder velocidade! - exclamou Joe passado um bocado.

Os motores pareciam ronronar apenas e o casco do hydrofoil baixou gradualmente até tocar na água e continuar a navegar como um barco normal.

A voz do piloto trovejou através do altifalante:

- Senhoras e senhores, estamos prestes a chegar ao cais de Providence! Tenham cuidado ao sair.

Os cinco jovens desembarcaram, para ir visitar a cidade, um curioso aglomerado de casas de madeira. Ao longo da rua principal havia inúmeros restaurantes, cuja especialidade eram os mariscos, e lojas para turistas. Via-se gente de todos os tipos, desde raparigas bonitas de calções, com os cabelos soltos ao vento, até homens queimados pelo sol, barbudos e de sandálias.

Callie e Iola ficaram encantadas com as lojas de artesanato. Arrastaram os rapazes e entraram numa após outra, até que Chet protestou:

- Esta caminhada está a ser demais para mim. Vocês parece que estão a treinar-se para a maratona. E se continuassem sozinhas?

Frank e Joe concordaram. Encontravam-se nessa altura em frente de uma loja chamada Vestimenta, um pronto-a-vestir de senhora que vendia também diversíssimas bugigangas. Tinha a montra cheia de bijutaria à mistura com peças de madeira esculpida e manequins envergando fatos de banho coloridos, roupões de praia e alguns vestidos simples de Verão.

- Está bem - respondeu Iola. - Desapareçam durante uma ou duas horas enquanto nós damos uma volta pelas lojas.

- Podemos encontrar-nos na pizzaria que fica nesta mesma rua, ali em baixo - acrescentou Callie.

Os rapazes afastaram-se e as duas raparigas entraram na Vestimenta.

- Que fazemos agora? - perguntou Joe. Chet olhou para o relógio.

- Está quase na hora de me apresentar na marina. Não querem acompanhar-me? Iam conhecer o meu novo patrão.

O proprietário da marina Estrela do Mar era Al Hinkley, um homem de pele tisnada pelo sol, pelo vento e pelo ar marítimo, com os olhos franzidos de tanto olhar para os horizontes distantes quando navegava no mar alto. Recebeu calorosamente os Har-dy e explicou que Chet ia trabalhar como seu assistente.

Caber-lhe-ia tomar conta dos barcos alugados e mantê-los sempre abastecidos, alugar canas de pesca e redes e ajudar os donos das embarcações que ali ancorassem.

- É um lugar de responsabilidade - gabou-se Chet aos amigos.

- Os mareantes dificilmente manobrarão os barcos aqui na baía sem a minha ajuda e perícia!

Al Hinkley corrigiu-o, prazenteiro:

- Não será bem assim, Chet. Temos muita concorrência. No entanto, o meu negócio aqui é lucrativo e tenciono aguentar-me. Deves ter o cuidado de contar os barcos todos os dias. Não quero perder nenhum.

Frank e Joe deram um passeio pela marina e admiraram os barcos ali ancorados.

Joe reparou num homem que se encontrava a cerca de cinquenta metros de distância. Estava sentado em frente de um cavalete e empunhava um pincel. Mas havia nele algo de estranho. De cada vez que uma pessoa se aproximava dele de modo a poder observar o seu trabalho, ele tapava-o com um pano preto.

- Frank, olha para aquele homem! Que estará ele a pintar tão em segredo?

Frank observou o artista durante um tempo e encolheu os ombros.

- Não sei. Talvez seja tímido.

- Vou dar uma volta por ali a ver se percebo que obra-prima está ele a pintar - disse Joe.

Quando o rapaz se aproximou, o homem pegou rapidamente no pano preto e cobriu a tela, lançando um olhar zangado. Surpreendido, Joe foi juntar-se ao irmão.

- Sei que os artistas são muitas vezes sensíveis - disse -, mas aquele homem parece demasiadamente nervoso para ser autêntico. Estou cheio de curiosidade de saber o que ele está a pintar.

Pediram uns binóculos muito fortes a Chet, que estava já no seu posto, e foram colocar-se num ponto estratégico, por detrás de uma pilha de redes de pesca, de onde podiam ver claramente a tela do estranho artista.

Joe focou o binóculo, observou atentamente e, sem dizer uma palavra, passou o binóculo ao irmão. Este espreitou por sua vez e exclamou:

- Mas é um desenho detalhado da marina! Desde o molhe até aos barcos ancorados!

- Não se trata de uma pintura, é quase a planta do local. E ele esconde o que está a fazer. Não é estranho?

- Sem dúvida. Vamos falar com ele.

Nesse preciso momento, o homem desarmou o cavalete, meteu-o debaixo do braço juntamente com as telas e saltou para um barco a motor, amarrado ali perto. Um minuto depois já ia a sulcar as águas.

- Demasiado tarde! - resmungou Joe.

Dirigiram-se para o escritório da marina. Chet ouviu a história a respeito do misterioso pintor e prometeu observá-lo se ele voltasse a aparecer por ali.

- Sabem que descobri que o senhor Hinkley é uma pessoa interessante? É Leão.

- O que é que isso tem? O pai é rotário - respondeu Joe.

- Não era a isso que eu me referia. O senhor Hinkley nasceu sob o signo do Leão. O mal é que por isso mesmo ele é fogo!

Joe franziu o sobrolho.

- Acaba com esse palavreado, Chet. Trata-se de mais alguma lição de astrologia?

Chet respondeu com ar autoritário:

- Cada signo do Zodíaco é terra, ar, fogo ou água. O senhor Hinkley é fogo por ser Leão. Eu, como Caranguejo, sou água. Não é uma combinação muito boa! A água liga melhor com a terra. Se ele fosse terra! Entre nós cresceriam as sementes de...

- Um relvado! - interrompeu Joe.

- Não, senhor. Boas notas de dólar! Um de nós nasceu na altura errada. - Chet suspirou desanimadamente. - Bem, até logo.

Saiu para atender um cliente e os Hardy foram de novo para a cidade, onde iam encontrar-se com as raparigas. Mas Iola e Callie não estavam na pizzaria.

- Ainda devem andar nas compras! - queixou-se Frank. - Vamos ter com elas ao sítio onde as deixámos!

A Vestimenta estava fechada.

- E agora? - perguntou Joe, irritado. - Temos de percorrer a cidade toda à procura delas?

Frank espreitou pela montra. Subitamente teve um sobressalto, como se não pudesse acreditar no que via.

- Elas estão lá dentro! - disse. - Eu vejo-as daqui, mas passa-se algo de grave. Estão sentadas em bancos e têm as cabeças encostadas a uma prateleira! Parecem inconscientes!

Os dois rapazes bateram na porta e gritaram. Mas apenas ouviram o eco das suas vozes como resposta. As duas jovens não se mexiam.

Alarmado, Frank disse a Joe.

- Fica aqui e faz o que puderes! Eu vou chamar a polícia.

Correu pela rua abaixo, pelo meio da multidão que enchia agora a rua, depois de as lojas fecharem. Na pizzaria ouvia-se música, as pessoas entravam nos restaurantes e nos cafés.

Ao fundo da avenida, Frank viu um uniforme azul. Correu para o polícia.

- Oh, como estou satisfeito por o encontrar! - exclamou.

Explicou rapidamente o que sucedera, que as duas raparigas não tinham comparecido ao encontro combinado e como as tinham ido encontrar fechadas na loja Vestimenta.

- Vamos ver o que se passa - respondeu o polícia, começando a subir rapidamente a rua.

Quando chegaram junto de Joe, que ficara em frente da Vestimenta, o polícia forçou a porta e abriu-a.

O alarme começou a tocar com um barulho terrível, atraindo a atenção de inúmeros transeuntes que se aproximaram, tentando espreitar para o interior da loja. Chegaram então mais polícias num carro-patrulha e formaram um cordão para isolar a área.

Os Hardy não quiseram saber da confusão que os rodeava. Correram para os vultos imóveis e pararam, assombrados.

Eram manequins - manequins com os casacos de Callie e Iola!

 

Frank e Joe revistaram rapidamente o estabelecimento à procura de Iola e de Callie. Frank espreitou para debaixo dos balcões, abriu armários e examinou filas de vestidos pendurados em cabides. Joe foi primeiro ao escritório e em seguida ao armazém, revistando caixotes e barris.

Voltaram novamente à loja e abanaram a cabeça com desânimo. O polícia inspeccionara portas e janelas. Não havia qualquer indicação de uma entrada forçada.

- Frank - disse o polícia para um dos outros que tinham vindo no carro-patrulha -, vá chamar a senhora Lane. É ela a dona da loja.

- Muito bem.

Frank entrou no carro e afastou-se. Quinze minutos depois estava de volta, acompanhado por uma senhora de meia idade, de cabelo grisalho. A senhora Lane soltou uma exclamação de assombro ao ver os dois manequins com os casacos de Iola e Callie.

- Estes manequins estavam na montra quando eu fechei a loja - declarou ela. - Não faço ideia do que possa ter levado alguém a fazer uma coisa destas. Eram duas raparigas?... Não, não me recordo de as ter visto. Mas a verdade é que vejo tantas jovens durante o dia. Espero que nada lhes tenha sucedido!

- O mesmo digo eu! - exclamou Frank, ansioso. - Temos de encontrá-las rapidamente. Caso contrário será preciso lançar um alerta geral, pois elas foram raptadas!

Enquanto o polícia falava com a senhora Lane, Frank chamou Joe à parte.

- Falta apenas uma hora e um quarto para a partida do Flying Express para Bayport. Prometemos estar a bordo. Que havemos de fazer?

- Não podemos ir sem elas - replicou Frank. - Espera! A senhora Lane não se lembra da Iola e da Callie, mas talvez uma das empregadas se recorde delas. Se as interrogássemos a todas pelo telefone?

Disseram ao polícia o que tinham pensado.

- Boa ideia - concordou ele. - Vão para o escritório telefonar enquanto eu faço o meu relatório.

A dona da loja forneceu a lista das suas empregadas e os rapazes começaram a fazer as chamadas.

- Nada! - declarou Joe depois de ter desligado pela primeira vez.

- O mesmo se passa comigo! - respondeu o irmão, desconsolado. - Talvez tenhamos mais sorte com as restantes.

Prestes a desanimar, Joe chegou ao último número da lista. Era de uma empregada que trabalhava ali em part-time. Atendeu-o a própria.

- Sim - respondeu à pergunta do rapaz. - Lembro-me dessas duas raparigas.

Fazendo sinal a Frank para ouvir pela extensão Joe pediu à empregada que continuasse a falar.

- Pouco mais há a acrescentar - disse a voz. - Tudo quanto sei é que estavam a conversar com um homem. Depois saíram os três juntos.

- Quem era ele? Conhecia-o?

- Sim. Era Rance Nepo, o dono da loja de fotografia que fica na esquina.

- Muito obrigado - disse Joe, desligando. - Já temos uma pista, Frank.

Agarraram nos casacos e correram ambos para a loja do fotógrafo. Era uma loja pequena, com máquinas cobertas de pó, rolos de filme e livros de arte nas montras. Quando entraram soou uma campainha.

De um compartimento das traseiras surgiu um homem de cabelo ruivo e barba crescida.

- O senhor é Rance Nepo? - perguntou Frank. O homem fez estalar os nós dos dedos de uma mão contra a palma da outra.

- Sou, sim. Desejam alguma coisa?

Frank apresentou-se rapidamente, a ele e a Joe. Depois perguntou pelas raparigas.

- Soubemos que esteve a falar com elas e que saíram juntos da Vestimenta - acrescentou.

Nepo admitiu que saíra da boutique com Callie e Iola.

- Não têm nada contra isso, pois não?

- Claro que não, senhor Nepo. Mas por favor tente recordar-se. Talvez elas tenham dito para onde iam a seguir?

- A loura estava interessada em lâmpadas miniaturais de flash. Acabara de comprar qualquer coisa decorada com elas. Ouvi-a perguntar onde poderia arranjar mais. A empregada disse-lhe que não sabia e eu então apresentei-me e disse-lhe que tinha esse género de informações na minha loja.

- Então vieram aqui consigo? - perguntoik Frank, surpreendido.

- Sim. Deixei-as ver o Guia do Fotógrafo e depois de encontrarem o que procuravam foram-se embora. Disseram que iam à pizzaria encontrar-se com umas pessoas que provavelmente se iriam atrasar.

- Obrigado. Somos nós! - explicou Frank.

- Boa sorte! - gracejou Nepo. - Creio que vão precisar dela!

Frank e Joe agradeceram uma vez mais e saíram.

- Vamos novamente à pizzaria - murmurou Joe, tenso.

Entraram e olharam para todos os lados ansiosamente.

- Ali estão elas! - exclamou Joe. Descobriram Callie e Iola sentadas numa mesa para quatro.

- Por onde é que vocês andaram a vagabundear este tempo todo? - perguntou Callie, zangada.

- Não sabem - acrescentou Iola - que o Flying Express parte dentro de pouco tempo?

- Calma aí! - retorquiu Joe. - O Frank e eu chegámos aqui a horas. Vocês não se encontravam à vista, por isso fomos procurá-las.

- Devemos ter chegado logo a seguir - disse Callie, sorrindo.

- Que preocupados! - murmurou Iola.

A jovem fez sinal a um criado, que imediatamente lhes levou as pizzas que elas tinham encomendado. As de Frank e de Joe estavam cheias de pimentão.

- É a vossa recompensa - troçou Callie. Antes de começar a comer, Frank foi ligar para a

Polícia para lhes comunicar que as duas raparigas tinham aparecido. Depois voltou para a mesa.

- Tem sido um dia mau! - lamentou-se Iola. - Enquanto estivemos na loja do fotógrafo alguém roubou os nossos casacos. Nem percebemos como!...

Calou-se quando Frank mostrou os dois casacos que tinha escondido atrás das costas.

- Como é que...

- Depois lhes dizemos. Vamo-nos embora ou ainda perdemos o barco!

Joe pagou a conta e dirigiram-se rapidamente para o cais.

O Flying Express estava pronto a largar. Dois minutos mais tarde já ia em águas mais fundas e ganhava velocidade, erguendo gradualmente o casco. Rumou a Bayport.

Spencer Given aproximou-se de Frank e de Joe com uma expressão aborrecida.

- Notam alguma coisa diferente nesta viagem?

Frank olhou à volta.

- Obviamente não temos tantos passageiros.

- É isso mesmo. Muitas pessoas acharam que o Flying Express não é seguro. Resolveram regressar a Bayport de autocarro. Compreendem o que tenho de enfrentar?

- Compreendemos, senhor Given - disse Joe -, e faremos todo o possível por restaurar a confiança no seu serviço de transporte.

- Também nós - declarou Callie. - A Iola e eu vamos recomendar o Flying Express a toda a gente!

O senhor Given esboçou um leve sorriso.

- Obrigado. Agora, vamos a ver o que os vossos namorados fazem nesta viagem.

Instalaram-se os quatro nos seus lugares e os Hardy contaram o que se passara na Vestimenta.

- Confundiram-nos com manequins! - exclamou Callie. - Que havemos de pensar disto, Iola?

- Não teve graça - lembrou Frank. - Julgámos que estivessem feridas e ficámos preocupados.

- Nós sabemos - murmurou Iola, apoiando a cabeça no ombro de Joe.

- Têm a certeza de que não se esqueceram lá dos casacos? - perguntou Frank.

- Foram roubados! - afirmou peremptoriamente Callie. - Levávamo-los no braço quando entrámos na loja do Rance Nepo e, enquanto procurávamos o endereço da empresa de lâmpadas de flash, desapareceram. Pensámos que algum cliente os roubara.

- Bom - conjecturou Iola -, também pode ter sido o senhor Nepo. Não estivemos a reparar no que ele fazia enquando folheávamos o Guia do Fotógrafo.

- Tens razão. Não reparámos, não.

- Parece tudo tão infantil - disse Iola. Frank abanou a cabeça.

- Não creio que se tenha tratado meramente de uma brincadeira - observou. - Há mais alguma coisa por detrás disto.

- Pode ter sido uma espécie de aviso - lembrou Joe.

- Ou então alguém queria que não apanhássemos o barco. Talvez tenham planeado “alguma” para esta viagem!

O grupo ficou calado, pensativo, até que finalmente Frank quebrou o silêncio.

- Tudo quanto podemos fazer agora - disse, levantando-se - é circular por aí e não perder de vista os passageiros.

- E se nos separarmos? - sugeriu Callie. - A Iola e eu vamos para a proa e vocês para a popa.

Começaram a passear, parando ocasionalmente para conversar com outros passageiros. Frank e Joe passaram duas vezes pelas raparigas, mas nenhum deles teve qualquer coisa para relatar. A certa altura Joe comentou para o irmão:

- Estamos quase em Bayport, e, até agora, nada sucedeu.

- Faz figas! - retorquiu Frank.

O crepúsculo começava a cair quando o Flying Express se dirigiu para o porto de Bayport. As luzes da cidade cintilavam ao longe e a lua que subia no céu lançava os seus raios prateados sobre a água. Pequenas embarcações convergiam de todos os lados para as docas.

O piloto do Flying Express diminuiu a velocidade, prosseguindo o seu caminho mais lentamente, pois o cais encontrava-se apenas a algumas centenas de metros.

As pessoas começavam a agitar-se, reunindo as suas coisas ou simplemente esperando pelo momento em que a prancha seria descida.

Os Hardy estavam no convés, perto do piloto e de Spencer Given e observavam a actividade do porto. Notaram então no lusco-fusco dois barcos a motor, um atrás do outro, que fizeram uma curva de 90°, que os colocava no trajecto do hydrofoil.

- Espero que aqueles tipos tenham o bom senso de mudar de rumo! - murmurou Joe.

Um momento mais tarde Frank gritou, alarmado:

- Não se vão desviar! Devem ser doidos! Agarra-te bem. Vamos chocar!

Era demasiado tarde para o piloto fazer qualquer coisa, a não ser olhar, horrorizado e incrédulo, para o que se estava a passar. Given inclinou a cabeça como se não suportasse presenciar o que ia suceder.

O primeiro barco a motor passou como um raio junto da proa do hydrofoil, quase a roçar por ele mas sem lhe tocar, e desapareceu na escuridão da baía.

O segundo barco não teve tanta sorte. Quando o hydrofoil o atingiu, mesmo ao meio, ouviu-se o ruído assustador de madeira estilhaçada!

 

O apito do Flying Express tocou estridentemente quando o hydrofoil fez marcha atrás. Os passageiros gritaram, assustados, e as perguntas choveram de todos os lados.

- Como é que isto sucedeu?

- Morreu alguém?

Frank e Joe não esperaram pela resposta. Em vez disso correram para as bóias salva-vidas penduradas nas paredes da cabina e atiraram algumas ao mar

Depois, descalçaram rapidamente os sapatos e mergulharam na água fria.

Os rapazes perscrutaram a superfície escura da baía à procura de uma cabeça. Nada. Nem sequer um destroço se via na semi-obscuridade.

- Não é trabalho para nós! - gritou Frank para Joe. - Têm de chamar a Guarda Costeira!

Quando os rapazes finalmente subiram para o barco, já fora enviado um pedido de socorro. Pouco depois duas lanchas rápidas da Guarda Costeira sulcavam a baía de Barmet. Com holofotes potentes iluminaram o sítio onde o barco pequeno fora atingido. Um oficial dirigia as pesquisas a partir da cabina de pilotagem do Flying Express. Ordenou aos seus subordinados que percorressem a baía em ziguezague.

Os Hardy tinham trabalhado com a Guarda Costeira em casos anteriores. Sabiam que aqueles homens eram marinheiros experimentados e encontrariam qualquer coisa que estivesse a flutuar. As suas esperanças em breve se concretizaram.

- Aqui há destroços - avisou uma voz vinda da escuridão. - A popa e parte do lado do barco. Rebocamos isto para terra?

- Exactamente. Vamos segui-los já para examinar os destroços.

Spencer Given andava de um lado para o outro, desesperado.

- Ainda bem que deu essa ordem! Os meus passageiros ameaçam nadar para terra se os continuarmos a manter aqui à espera. Felizmente que o hy-drofoil não foi danificado. Creio que tem apenas um pequeno rombo, que será facilmente reparado. Gostava que os meus nervos pudessem ser reparados com a mesma facilidade!

O oficial da Guarda Costeira fez sinal ao piloto, que ligou novamente os motores e conduziu o Flying Express lentamente para o cais. Lançaram as grossas amarras para terra e, mal ficaram atadas aos postes metálicos, colocaram a prancha de desembarque. Os passageiros começaram a sair, muitos deles resmungando que iam atrasados para o jantar.

Frank sugeriu às raparigas que fossem para casa no carro deles, pois os dois jovens detectives iam ao gabinete da Guarda Costeira para assistir ao exame dos destroços.

A proa do hydrofoil apanhara o barco a motor a meio de um dos lados e partira-o em dois. A popa estava toda torcida e rebentada devido à força da colisão.

- Os senhores fazem alguma ideia de quem será o dono do barco? - perguntou Joe.

- Não. E se isto é tudo o que resta dele, provavelmente nunca o saberemos. Desapareceu a matrícula!

- E agora?

- A polícia terá de enviar homens-rãs para verem o que está no fundo da baía.

- Nós somos mergulhadores experientes - disse Joe. - Talvez possamos ajudar.

- Boa ideia! Tragam o vosso equipamento e estejam aqui às seis em ponto.

- Sim, senhor!

A lancha da polícia já estava a postos quando os dois irmãos chegaram na manhã seguinte. Dois mergulhadores verificavam o seu equipamento; um terceiro preparava ganchos. Receberam a seguir todas as indicações a respeito do local da busca e partiram.

- A água não parece tenebrosa ao nascer do Sol, como durante a noite - comentou Frank.

Joe bocejou.

- Talvez sim, mas hoje não estou nos meus dias.

Frank riu.

- Vamos, acorda. A baía é bastante profunda neste sítio e vamos precisar de toda a nossa energia para examinar o fundo.

Os rapazes despiram-se, ficando apenas de calções de banho, calçaram barbatanas, equiparam-se com garrafas de oxigénio e mergulharam ao mesmo tempo que três homens-rãs. Penetraram nas águas iluminadas pelo sol e desceram até às profundezas lodosas.

Quando já viam o fundo, Joe deixou-se ficar para trás. Sentia-se tonto. Não conseguia concentrar-se. Invadiu-o uma sensação agradável, que apetecia gozar.

Joe fechou os olhos, descontraiu os braços e as pernas e deixou-se arrastar pelo movimento suave da corrente. Porque estava ali? Não conseguia lembrar-se e não se importava. Só queria cair num sono profundo.

Subitamente uma mão sacudiu-lhe o braço com violência. Frank olhava-o fixamente.

“Bonito serviço! - pensou Frank. - Êxtase da profundidade. O Joe está com narcose de nitrogénio!”

Ele e Joe tinham lido a respeito deste assunto.

Tratava-se de um dos maiores perigos para mergulhadores que vão até grandes profundidades sem fato de borracha. Estes casos ocorrem geralmente a mais de 40 metros, mas podem dar-se também a profundidades menores, se o mergulhador se encontra num estado de pouca vitalidade.

Frank agarrou o irmão pelos cotovelos e deu um forte impulso com os pés. Os dois subiram no meio de uma nuvem de bolhas de ar.

O espírito de Joe foi-se desanuviando à medida qíle subiam. Percebendo o que lhe sucedera, sentiu um arrepio na espinha. Quando chegaram à superfície, Joe tinha recuperado o autodomínio.

Os dois rapazes agarraram-se aos lados do barco, respirando com força.

- Obrigado pela ajuda - murmurou Joe.

- Entra no barco - ordenou Frank. - Já chega.

Apesar dos protestos do irmão, Frank ajudou-o a entrar para o barco e depois mergulhou novamente. Perto do fundo da baía descobriu o motor, meio escondido no lodo.

A um aceno de Frank, os homens-rãs aproximaram-se, prenderam o motor com cordas, fizeram sinal para cima e o motor foi içado para a superfície. Os mergulhadores subiram também e entraram para a lancha.

- Não tem número de série - disse Frank com pena, depois de ter examinado o motor. - Foi raspado.

- Sem dúvida que se tratava de um barco roubado - concluiu o oficial encarregado do caso. - De qualquer modo encontrámos a peça que procurávamos e visto que não encontrámos nenhuns corpos, podemos voltar para o porto. A partir daqui o caso pertence à polícia.

No seu gabinete, na esquadra, o chefe Collig brincava com um lápis enquanto Joe e Frank contavam o que sucedera. Contudo ouvia-os atentamente e de testa franzida.

- É um verdadeiro mistério. Têm algumas ideias, rapazes?

- Tenho cá um palpite de que o barco a motor que o hydrofoil abalroou ia vazio - disse Frank.

- Vazio? Porque é que dizes isso? - perguntou Collig.

- Tudo leva a crer que ia a reboque do outro.

- Hmmm! - O chefe da polícia, assentiu com a cabeça. - Quer dizer que achas que o acidente foi planeado?

- Parece-me o mais provável. Isso explicaria que não encontrássemos nem sobreviventes nem vítimas mortais. Não estava ninguém na água porque não ia ninguém no barco.

- É muito possível. Talvez vocês consigam descobrir uma prova do que dizem. Estão metidos no caso desde o início.

- Temos muito gosto em ajudar - respondeu Joe.

- Bom - continuou Collig -, para já gostaria que falassem com as pessoas que se opõem ao hydro-foil. Comprem o Notícias de Bayport no quiosque da esquina e verão o que eu quero dizer!

- De acordo!

Os dois rapazes despediram-se e foram comprar o jornal.

Trazia um título sensacionalista, em grandes letras: HYDROFOIL AFUNDA BARCO A MOTOR NA BAÍA DE BARMET. O subtítulo dizia: NÃO HÁ SOBREVIVENTES. O artigo não explicava que o barco se tinha metido deliberadamente na rota do hydrofoil e o jornalista insinuava que o Flying Express entrara no porto esperando que todos os outros barcos se afastassem para ele passar.

Os inimigos do hydrofoil chamavam-lhe “uma ameaça para os cidadãos de Bayport” e “um negócio sem escrúpulos que é preciso impedir”. Um homem entrevistado dizia amargamente: “Já perdemos um barco a motor. Quantas vidas será necessário perder antes de nos vermos livres do hydrofoil?”

- Estão a atacar o Given por todos os lados! - exclamou Joe. - Tenho pena dele. Não foi com certeza o barco dele que teve a culpa do acidente. Vamos falar com os donos das pequenas embarcações que neste momento estão reunidos no Clube Naval.

Os Hardy chegaram ao Clube mesmo a tempo de ouvir um orador encolerizado denunciar o hydrofoil.

- Aqui está a prova! - exclamava brandindo um jornal. - O Flying Express deve ir...

- Para o cabo Cutlass amanhã de manhã! - gritou Frank do fundo da sala.

- E regressar a Bayport! - concluiu Joe. Quase todas as cabeças se voltaram para ver quem estava a interromper o discurso.

- Não sei quem são aqueles senhores - disse o orador zombeteiramente -, mas calculo que sejam co-proprietários do Flying Express!

- Quem nos dera que fôssemos! - respondeu Joe. - Teríamos a certeza de receber bons lucros do nosso investimento. A ligação a Providence vai ser um sucesso!

- Espero que acreditem em ti - murmurou Frank em voz baixa, antes de declarar com firmeza: - Nós somos apenas dois passageiros que se encontravam a bordo a noite passada. Vimos o acidente. Quantos de entre vós o presenciaram?

- Ele tem razão - disse uma voz. - Estavas lá, Charlie?

O orador corou e recusou-se a responder. Aproveitando a oportunidade, Frank subiu ao estrado e explicou os acontecimentos da véspera.

- Suspeitamos de que se trate de um acidente preparado - declarou. - Alguém quis danificar o Flying Express, lançando o barco a motor contra ele.

Ouviu-se um murmúrio na audiência.

- Certos grupos receiam a concorrência do hydrofoil e querem pô-lo fora de acção - continuou Frank. - Começaram por espalhar boatos a respeito do perigo. Fazem alguma ideia de quem possa estar por detrás disso?

- Parece que nos está a acusar! - disse um homem. - É certo que não gostamos do hydrofoil, mas não somos criminosos! Ninguém aqui seria capaz de o sabotar!

Um coro de anuência partiu do resto da assistência.

- Estou certo disso - respondeu Frank. - Mas vocês têm uma ideia preconcebida contra o hydrofòil. Porque não aceitam dar ao proprietário uma oportunidade para provar que não prejudicará os outros barcos da baía?

Ouviram-se gritos de “É justo!” e a reunião acabou.

Frank limpou a testa e foi para junto do irmão.

- Achas que os convenci?

Joe disse que sim com a cabeça.

- Pelo menos momentaneamente. Mas esta gente poderá esquecer tudo quanto disseste se houver mais algum incidente. É preciso esclarecer o caso de vez para os convencer.

Os rapazes tinham acabado de chegar a casa quando o telefone tocou. Joe atendeu.

- É Chet. Está a falar do cabo Cutlass - disse para o irmão. - Que se passa, Chet? Parece que sucedeu algum desastre!

- É isso mesmo! Um desastre inacreditável! Perdi o meu emprego! Roubaram um barco da marina e o senhor Hinkley despediu-me por negligência. Que faço agora?

- Espera um minuto - disse Joe, que se voltou para Frank: - Pode ter sido roubado pelo bando que o pai anda a perseguir. Talvez estejam a vir para estes lados.

- Merece a pena investigar - concordou Frank. - Diz ao Chet para não fazer nada até nós lá chegarmos!

Pouco depois, os Hardy seguiam velozmente pela baía no seu barco a motor, o Vedeta. A viagem para Providence decorreu sem incidentes e Chet estava à espera deles no cais.

Reuniram-se os três em conselho de guerra. Se Joe e Frank conseguissem encontrar a embarcação desaparecida, talvez Chet pudesse recuperar o seu emprego.

- Vamos ver o senhor Hinkley - disse Frank. - Queres vir connosco?

- Oh, não. Eu espero aqui por vocês. Venham buscar-me depois - respondeu Chet.

Os Hardy dirigiram o Vedeta para a marina Estrela do Mar. Al Hinkley recebeu-os na doca.

- Estão de volta outra vez, então? Bem, não encontram aqui o vosso amigo. Não serve para o trabalho.

- Já sabemos o que se passou - disse Frank, indo logo direito ao assunto. - Senhor Hinkley, se descobrirmos o seu barco volta a aceitar o Chet?

- Talvez - hesitou Al Hinkley. - Mas como esperam reaver o meu barco?

- Vamos fazer umas investigações por aqui. Hoje já não há tempo, mas ficamos cá para amanhã.

- Hmmm! - Hinkley olhou-os atentamente. - Façam isso. Era um barco muito valioso. Há uma cabana aqui perto... Olhem! Vê-se daqui - e apontou.

Os Hardy olharam para o casebre, que pouco mais era do que a cabana de um pescador.

- Pertence a um amigo meu que se encontra agora fora da cidade. Podem lá dormir.

- Obrigado - disse Frank. - Faremos da cabana o nosso quartel-general.

Deixaram o Vedeta ancorado e voltaram a pé para o cais público onde puseram Chet ao corrente do que se passava. - Obrigado, amigos - disse Chet.

- Queres ir ficar connosco na cabana? - perguntou Frank.

- Com certeza - replicou Chet.

Quando se dirigiam para a cabana, aproximou-se deles um rapaz. Era magro e alto e tinha cabelo louro.

- Olá - disse ele. - Eu sou o Skee. Estão interessados em comprar algum equipamento náutico em segunda mão? É barato!

Frank e Joe entreolharam-se.

- Talvez. Se nos arranjares uma buzina para o nevoeiro para o nosso barco.

- Está bem. Como é que te chamas?

- Joe Hardy. Quando é que entregas a mercadoria?

- Brevemente.

- E como é que nós entramos em contacto contigo? - perguntou Chet.

- Não se preocupem. Eu encontro-os.

Skee afastou-se, desaparecendo na obscuridade, e os três amigos dirigiram-se para a cabana. Quando a viu de perto, Chet comentou:

- Não é propriamente o Hilton! Não achaste o Skee suspeito? - atalhou Joe.

- Não. Porquê? - retorquiu Chet.

Antes de Joe ter tempo de responder, Frank falou:

- Pensas que está envolvido com os ladrões da marina que o pai procura?

- É uma hipótese. Foi por isso que encomendei a buzina de nevoeiro. Talvez possamos descobrir mais qualquer coisa a respeito dele.

Como Chet dissera, a cabana estava longe de ser luxuosa, mas os rapazes, extenuados, deixaram-se cair nos divãs desengonçados e daí a pouco dormiam profundamente.

Quando Frank acordou o Sol já ia alto. Espreguiçou-se e preparava-se para sair da cama quando ouviu um ruído forte e arrastado fora da cabana, mas muito próximo. Acordou Joe e Chet.

- Mas o que é isto?

Frank deu um salto no momento em que um dos lados da cabana desabava com estrondo.

- Olhem! - gritou Joe. - É um bulldozer!

 

Frank puxou Chet para fora da cama uns segundos antes de a pá do bulldozer fazer o divã em dois. Saltaram os três rapidamente pela janela.

O homem que trabalhava com o bulldozer fitou-os de olhos esbugalhados e fez parar a máquina.

- Desculpem, rapazes. Não fazia ideia de que a cabana estivesse ocupada!

Explicou-lhes então que recebera ordens para deitar a casa abaixo e alisar o terreno porque ali iam construir prédios.

- Quem lhe disse que a cabana se encontrava vazia? - perguntou Frank.

- A Fidelo Corporation. Alguém sabia que estavam aqui?

- Al Hinkley, da marina Estrela do Mar. Disse que podíamos alojar-nos na cabana.

- Onde poderemos encontrar o senhor Fidelo? - perguntou Joe.

- Não existe nenhum senhor Fidelo. É o nome da empresa.

- Quem é o patrão?

- O Malarky Grande. Tem um escritório em Providence.

O homem esperou que os rapazes tirassem da cabana a sua escassa bagagem antes de fazer recuar a máquina para prosseguir o seu trabalho de demolição da pequena habitação.

Frank, Chet e Joe dirigiram-se apressadamente para a marina, onde falaram com Al Hinkley. Este abanou a cabeça incredulamente ao saber como tinham escapado por pouco.

- Ouvi dizer ontem que a cabana iria ser demolida - confessou. - Mas ninguém me disse que seria tão cedo.

Convencidos de que Hinkley não sabia dizer-lhes mais nada, os rapazes deixaram as malas na marina e meteram-se no Vedeta para uma volta de reconhecimento pelas docas.

- Quanto mais depressa encontrarmos o barco desaparecido, mais depressa o Chet recupera o seu emprego - disse Frank.

Andavam a procurar há mais de uma hora quando Chet se pôs de pé e apontou para a costa.

- É aquele o barco roubado! - gritou.

A embarcação roubada balouçava suavemente à deriva mas estava a ser arrastada pela corrente em direcção a um promontório rochoso.

- A toda a velocidade, Joe! - ordenou Frank. O irmão dirigiu-se imediatamente para o ponto indicado.

- Não há ninguém a bordo! O barco foi abandonado! - gritou Chet.

Uma rápida inspecção mostrou que o barco não sofrera quaisquer danos.

- Que peso me saiu de cima! Devem ter sido alguns brincalhões que resolveram dar um passeio e depois abandonaram-no.

A pequena embarcação de recreio estava sem combustível, por isso os rapazes rebocaram-na até à marina. Al Hinkley cumpriu a sua palavra e aceitou novamente Chet como seu assistente.

Enquanto os dois irmãos ajudavam Chet a encher o depósito do barco recuperado repararam numa lancha que andava para trás e para diante em frente da marina.

- Estás a reconhecer o homem que ali anda? - perguntou Frank a Joe.

- Claro que reconheço. É o artista que não deixava ninguém aproximar-se do seu trabalho. O que andará ele a fazer agora?

- Queres ir ver?

- Ainda não. O Chet pode vigiá-lo. Primeiro vamos fazer uma visita a Malarky Grande. Ainda não estou convencido de que a demolição desta manhã tenha sido por acaso.

Joe concordou.

- Até logo, Chet!

Frank e Joe depressa encontraram o escritório da Fidelo Corporation. Ficava instalado no único edifício alto de Providence. Uma secretária conduziu-os a um gabinete com as paredes forradas de painéis de carvalho, uma carpete espessa no chão e uma secretária enorme de design moderno.

Sentado à secretária encontrava-se um homem alto e corpulento. Tinha pelo menos 1,90 m de altura e devia pesar uns 120 quilos, calculou Frank.

Malarky levantou-se.

- Em que lhes posso ser útil?

Frank contou o que sucedera.

- Lamento imenso - respondeu Malarky. - Sim, fui eu que ordenei a demolição. Mas não fazia ideia de que a cabana estivesse ocupada.

Frank mudou de conversa.

- O senhor negoceia em compra e venda de terrenos para habitação?

- É verdade. E estamos a desenvolver uma grande área nesta cidade.

- Conhece o Spencer Given?

- Claro que sim. É o meu único concorrente. Um de nós dois vai conseguir obter grandes lucros. Olhem - acrescentou abruptamente -gostaria de lhes oferecer a minha hospitalidade. Tenho umas vivendas e uma delas está vazia e ninguém a vai demolir!

- Obrigado, senhor Malarky - disse Frank. - Temos muito prazer em aceitar.

O construtor entregou-lhes a chave.

- A vivenda fica perto da marina Estrela do Mar, não muito longe da cabana que foi demolida. Fiquem lá o tempo que desejarem.

Quando iam a sair do edifício viram entre os transeuntes uma cara conhecida.

- O nosso amigo misterioso, o artista! - sussurrou Joe. - Vamos atrás dele!

O homem seguiu pela rua principal em direcção à loja de fotografia de Rance Nepo. Entrou e falou com o dono. Os rapazes pararam diante da montra, mas suficientemente ao pé da porta para ouvirem o que se dizia dentro da loja.

- Queria alugar uma máquina para fotografia aérea - dizia o artista. - E também preciso de um rolo.

Nepo respondeu:

- Tenho uma velha Speed Graphic algures. Vou ver no armazém.

Fazendo sinal a Joe para o seguir, Frank entrou na loja. Visto de perto, o artista parecia simpático. Tinha cabelo alourado, olhos azul-claros e um sorriso agradável. Respondeu prontamente quando Frank começou a falar de fotografia.

Frank apresentou-se a si e ao irmão. O desconhecido estendeu-lhes a mão.

- Chamo-me Henry Chassen. Sou fotógrafo profissional e pintor nas horas livres. Agora espero ter muito êxito na minha missão actual, tirar fotografias aéreas do cabo Cutlass, do género das que podem ser reproduzidas em bilhetes postais.

Frank e Joe trocaram um olhar. Seria aquele homem tão inofensivo como parecia?

Frank não estava convencido. Queria saber mais acerca de Chassen. Ocorreu-lhe uma ideia.

- Digo-lhe uma coisa - declarou, dirigindo-se a Chassen. - Nós vamos alugar um avião para dar uma volta, logo à tarde. Quer vir connosco e tirar algumas fotografias? Ambos temos brevet.

Chassen agarrou a oportunidade.

- Será uma grande ajuda. Poupo os honorários de um piloto!

- Óptimo! Encontramo-nos às duas horas no aeródromo de Providence.

Nesse momento apareceu Nepo com uma máquina na mão. Olhou para os Hardy e sorriu.

- Encontraram as vossas namoradas?

- Claro que sim - respondeu Joe jovialmente. - Até logo, Chassen.

Frank e Joe foram almoçar antes de voltar para a marina, onde deram com Chet a acabar de comer uma grande pizza. Contaram-lhe o seu plano.

- Não podem fazer isso! - protestou Chet mesmo com a boca cheia. - Não é dia para fazerem uma viagem aérea!

- Porquê? - perguntou Joe. - O céu está prestes a cair?

- Saturno afastou-se de Carneiro e...

- Oh, deixa-te disso! - protestou Frank, irritado. - O sistema solar não pode estar assim tão interessado naquilo que cada um faz no cabo Cutlass. Saturno está a milhões de milhas de distância. Duvido que vá interferir com o nosso avião.

Chet abanou tristemente a cabeça.

- Ouçam bem o que vos digo. Saturno domina os vossos passos hoje e não podem fugir a isso. A vossa viagem de avião será malfadada.

- Correremos o risco - retorquiu Joe. Deixando Chet a resmungar a respeito de amigos incrédulos, os Hardy foram depositar a bagagem na casa que Malarky lhes emprestara e em seguida foram juntar-se a Chassen,que os esperava no aeródromo, uma pista curta destinada apenas a bimotores. Alugaram um modelo de quatro lugares e partiram. Frank tomou os comandos.

Enquanto o avião sobrevoava o cabo Cutlass, Chassen foi tirando uma série de fotografias.

- És um bom piloto - disse Chassen, num cumprimento a Frank. - Estou a tirar exactamente as fotografias de que preciso.

Passado um bocado Joe observou como por acaso:

- Vimos-te a pintar perto da marina. Um quadro a óleo?

Chassen sorriu.

- Era apenas um esboço para um quadro que hei-de completar mais tarde. É difícil trabalhar nas docas. As pessoas aproximam-se constantemente para verem o que estamos a fazer. Eu não suporto isso.

- Compreendo - respondeu Frank. E para comsigo pensou: “Parece que fizemos mal em desconfiar deste tipo. É pessoa honesta!”

- Podemos voar ao longo da costa? - perguntou Chassen. - Preciso de fotografias de enseadas e angras.

Frank fez o que ele pediu e sobrevoou a costa muito recortada. Tudo parecia correr bem até o motor começar a falhar.

- Falta de combustível! - exclamou Joe, olhando para o painel dos comandos.

Frank ficou preocupado. Avistou uma faixa arenosa plana e começou a descer. As rodas embateram com força no chão fazendo o aparelho oscilar terrivelmente até que parou.

Os três ocupantes ficaram muito abalados, mas sem qualquer ferimento. Saíram da carlinga para a areia e estudaram a situação. Frank reparou numa mancha de ambos os lados da fuselagem, por onde o combustível tinha escorrido dos depósitos das asas.

- Alguém sabotou o nosso aparelho - afirmou.

- Tivemos sorte em este terreno ser suficientemente firme para aterrarmos - observou Chassen.

- E tivemos pouca sorte em ficar tão longe da cidade mais próxima - retorquiu Joe.

Chassen pôs a mão em pala sobre os olhos e fixou um determinado ponto no mar.

- Não é um barco a motor que ali vem? - perguntou.

- É verdade - respondeu Joe. - Devem ter-nos visto aterrar.

- Vêm socorrer-nos - disse Frank.

O barco chegou a terra e três homens saltaram para fora. Subiram a praia, sorrindo. Usavam calças de ganga e botas de cano alto, como pescadores em férias.

- Chegaram mesmo a tempo, meus senhores - exclamou Chassen. - Tivemos um acidente. Podem ajudar-nos a voltar para Providence?

Um dos homens fez um gesto rápido e os Hardy abafaram uma exclamação de assombro. Tinham na frente o cano de um revólver!

 

- Revistem-nos! - ordenou o homem que empunhava a arma. - E vocês nada de truques!

Os dois companheiros dele revistaram Frank, Joe e Chassen.

- Não trazem armas - informou um deles.

- Isto é um assalto? - perguntou Frank.

- Eles julgam que estão na televisão - disse Joe.

- Engraçadinhos, não são? - retorquiu o do revólver com voz dura. - Queres experimentar isto? - E aproximou-se como se fosse bater em Joe com a coronha da arma.

- Não percas a calma, Spike! - avisou o homem mais alto. - Não ganhamos nada em arranjar sarilhos com eles por enquanto.

Frank, Joe e Chassen foram amarrados e vendados. Seguidamente levaram-nos até ao barco, que logo a seguir se pôs em movimento, afastando-se da praia.

Os três, sentados no chão da cabina, lado a lado, comentavam o sucedido em voz baixa.

- Que nos irão fazer? - murmurou o fotógrafo. Frank mexeu os pulsos para aliviar a pressão da corda.

- Quem são eles? Essa é que é a questão.

Joe endireitou os ombros magoados e esboçou um sorriso.

- Saturno é directamente responsável pelo que nos aconteceu.

- Como é isso? - perguntou Chassen.

- Temos um amigo que percebe dos signos de Zodíaco e que nos avisou de que não devíamos voar hoje.

- Que fazemos agora? - lamuriou Chassen.

- Vamos ficar de ouvido à escuta - sugeriu Frank. - É tudo quanto podemos fazer por agora.

Depois do que lhes pareceu uma longa viagem, dois dos homens tiraram-lhes as vendas e as cordas e conduziram-nos para o convés. Estava a escurecer. O barco parou numa doca batida pelas ondas, na costa rochosa.

- Saiam! - ordenou o chefe, empurrando os rapazes para uma velha casa de barco.

Frank tentou orientar-se. Ao longe, acima do barracão, do lado da estrada, viu uma luz vermelha aparentemente de um letreiro de néon. No momento seguinte levou um safanão que o fez entrar. Estava tudo cheio de pó e de teias de aranha. Joe começou a espirrar.

- Para o armário! - bradou o chefe.

Os prisioneiros foram rapidamente metidos dentro do pequeno espaço. A porta fechou-se com estrondo. Ouviram a chave girar na fechadura e ficaram na escuridão. Momentos depois ouviram o barco afastar-se.

- Não temos muito ar aqui - disse Joe, começando às apalpadelas.

- É melhor arranjar maneira de escapar e depressa - avisou Frank. - Sufocamos se não o fizermos!

Henry Chassen estava aterrorizado.

- Têm alguma ideia? - perguntou com voz trémula.

- Ainda não - respondeu Joe. - Vamos ver o que há aqui dentro além de nós!

Baixou-se e começou a examinar minuciosamente o fundo do armário. Frank seguiu-lhe o exemplo.

- Tenho qualquer coisa debaixo do meu calcanhar - disse Chassen. - Esperem um minuto... Oh, uma carteira de fósforos!

- Óptimo! - exclamou Frank. - Acende um, Henry!

Chassen acendeu um fósforo e ergueu-o de modo a que pudessem ver o local onde se encontravam. Olhando à volta, Joe e Frank repararam em duas chapas de matrícula pregadas na porta.

- São muito antigas - comentou Joe. Frank leu a data nas placas.

- Têm vinte anos.

Graças ao seu treino, os dois rapazes decoraram as matrículas.

- Ui!

Chassen deixou cair o fósforo, cuja chama lhe queimara os dedos. Frank acendeu logo outro.

Chassen começou a remexer nas prateleiras existentes dos dois lados do armário. - Isto pode ser útil - disse. - Um maçarico!

- Boa coisa! - exclamou Joe. - Talvez se consiga abrir a porta com ele.

Acendeu o maçarico, ajoelhou e aplicou a chama azul em redor da fechadura. Saiu fumo do metal aquecido.

Joe limpou a transpiração da testa e continuou a trabalhar.

Pouco depois sentiu dificuldade em respirar. A voz de Frank soou-lhe aos ouvidos como se viesse de muito longe.

- Joe, estou a sentir-me desmaiar! Estamos a gastar todo o oxigénio! Nunca conseguiremos sair daqui vivos! Nós...

Os dois irmãos caíram no chão do armário, inconscientes!

Mais tarde - quanto tempo se passara não sabiam - recuperaram os sentidos. Alguém lhes deitava água fria na cara. Ouviram uma voz através do zumbido que lhes enchia os ouvidos.

- Estão bem? Estão bem?

Abriram os olhos e viram Chassen debruçado sobre eles! A porta do armário estava aberta. Já respiravam à vontade!

Joe levantou-se, muito trémulo.

- Henry, salvaste-nos a vida! -. Frank ergueu-se também.

- É verdade, amigo. Teríamos morrido se não tivesses aberto aquela porta. Como é que conseguiste?

- O maçarico não resolvera nada, por isso passei os dedos pela porta numa última tentativa de encontrar um ponto fraco e... de repente, dei com um fecho, em cima.

Frank deu-lhe uma palmadinha nas costas.

- Estamos fora do armário - disse -, mas não fora do barracão. Vamos examinar as portas!

- Já sabemos que estão fechadas à chave.

- Podemos nadar por baixo delas - sugeriu Frank. - Eu vou primeiro.

Meteu-se na água, respirou fundo e mergulhou tateando a porta de madeira. Passou-lhe por debaixo e emergiu do lado de fora da casa.

Estava tudo escuro e silencioso. A superfície da água agitou-se outra vez e a cabeça de Joe apareceu junto dele.

- Falta um - murmurou Frank. - Temos de fugir daqui.

- É bom que o Henry venha depressa! - disse Joe. - Ali vem a lancha! Que havemos de fazer, Frank?

- Não nos podemos ir embora sem o Henry depois do que ele fez por nós. Não sei por que se estará a demorar tanto. Devia vir logo atrás de mim.

- Provavelmente não foi capaz de passar por debaixo das portas. É difícil para qualquer pessoa. Bem, não o ajudamos nada por ficar aqui. Escondamo-nos até o barco se afastar e depois tiramo-lo de lá.

Frank nadou devagarinho para o lado do cais mais afastado. Joe imitou-o. Aí ficaram muito quietos, só com a cara fora da água. A escuridão era total e ninguém os veria. Puseram-se à escuta. O barco parou do lado oposto àquele em que eles se encontravam, provocando ondulação. Joe inspirou fundo e engoliu água.

Tossiu aflitivamente, quebrando o silêncio tenso como um tiro de canhão. Os três homens saltaram do barco e lançaram-se sobre os rapazes como tubarões. Dois deles apanharam Joe, dominaram-no e arrastaram-no para o barco.

Frank, que se debatia na água, sentiu uma garra de aço frio apertar-lhe o pulso como um torniquete e também ele foi içado para o barco. Quando o soltaram, caiu ao lado de Joe.

O barco manteve-se parado enquanto os três homens avaliavam a situação.

- Eram três. Onde está o terceiro?

- Calculo que não tenha conseguido sair do barracão.

- Óptimo. Trataremos dele mais tarde.

- O que é que havemos de fazer com estes dois pássaros que apanhámos? O fundo da baía está perto e resolveria o problema de uma vez por todas.

- Não é a melhor solução para já - disse o que parecia mandar. - Vamos antes fazer o seguinte.

- A voz dele tornou-se um murmúrio. Passados uns instantes, puseram o barco em andamento e dirigiram-se para o largo. O chefe falou com os rapazes, que não o conseguiam ver por causa da escuridão.

- Desta vez vou-lhes dar uma oportunidade, rapazes. Mas lembrem-se de que é este o último aviso. Afastem-se do cabo Cutlass! Para a próxima será diferente!

Quando o barco chegou a um ponto de onde, mesmo de dia, mal se avistava terra, um dos bandidos aproximou-se dos rapazes.

- Levantem-se, patifes! - resmungou. - Vá, ponham isto!

Enfiou-lhes uns coletes de salvação e, a seguir, cada um deles levou um empurrão e caiu à água. O barco afastou-se velozmente, na escuridão.

- Não vale a pena tentar nadar - disse Frank, pondo-se a flutuar. - Não conseguimos orientar-nos e podíamos dirigir-nos para a Europa!

- Felizmente em breve será dia - respondeu Joe. - Será mais fácil saber onde nos encontramos.

Os primeiros alvores estenderam-se sobre o mar, uma claridade difusa, e dali a pouco os contornos da terra começaram a tomar forma a meia milha de distância.

- O cabo Cutlass! - Joe mal podia crer no que via.

- Mais do que isso! - gritou Frank. - Estamos ao largo da marina Estrela do Mar.

Parecia-lhes fácil chegar até lá. Os rapazes tiraram os coletes salva-vidas e começaram a nadar para terra.

Quase logo, Joe viu uma coisa que lhe fez gelar o sangue nas veias: três barbatanas cortando a superfície da água!

- Tubarões! - gritou.

Frank também já dera por eles. Ambos desataram a nadar furiosamente num esforço desesperado de evitar o ataque daqueles tigres do mar. Era uma corrida que não se podiam dar ao luxo de perder!

 

Um dos tubarões andava em círculo entre os dois nadadores, cortando-lhes o caminho para a margem! De repente ergueu-se e deu um salto no ar. O sol iluminou o animal. Tinha um focinho pontiagudo e a boca repuxada nos cantos, como se sorrisse; os olhos grandes eram redondos.

Joe descontraiu-se e sorriu.

- Ei, Frank, é um golfinho!

Frank afastou a água salgada dos olhos.

- Graças a Deus!

Tinha começado a nadar outra vez quando Joe gritou:

- Olha, vem ali um catamarã! Talvez nos dêem uma boleia.

A embarcação à vela oscilava com a brisa forte. O jovem que ia ao leme, a um sinal da rapariga que o acompanhava, veio até junto dos Hardy.

- Vocês aí! Precisam de ajuda?

- Claro que sim - respondeu Frank.

A rapariga atirou-lhes uma bóia e ambos subiram para bordo do catamarã e estenderam-se no fundo da embarcação, a arquejar.

- Obrigado - disse Frank, a custo.

- Não tem de quê - respondeu o rapaz. - Ainda bem que os vimos. O que é que vos aconteceu?

- Nós... nós íamos num barco e caímos borda fora - explicou Frank.

A rapariga sorriu.

- Nós viemos ver o golfinho.

- Ainda bem que o fizeram - retorquiu ele.

- Se quiserem - ofereceu o rapaz -, podemos deixá-los na marina. Foi ali que alugámos este catamarã.

- O rapaz que lá trabalha é muito simpático - confidenciou a rapariga. - Um pouco pesado, mas amoroso. Mostrou-se muito prestável e preparou o nosso barco num instante.

Frank respondeu simplesmente:

- Sim, também o conhecemos e também o achámos prestável!

O catamarã foi deixar os dois rapazes no cais e voltou de novo para o mar, à procura do golfinho brincalhão.

Chet Morton veio a correr pela doca fora ao encontro deles. Repararam então num homem que o seguia em grandes passadas.

- Olha! É o pai! - exclamou Joe.

Fenton Hardy sorriu abertamente ao ver os filhos aproximarem-se.

- Julgávamos que estava na ilha do Tubarão - exclamou Frank.

- E estive até o Chet ter telefonado para casa a dizer que vocês tinham desaparecido. A tua mãe passou-me a informação e estava muito preocupada. Eu não fiquei menos.

- Vimo-nos metidos em sarilhos, de facto - confessou Frank.

- Mas conseguimos umas boas pistas - acrescentou Joe.

Contaram de seguida tudo o que se havia passado.

- Participaremos às autoridades que o Chassen desapareceu - disse o senhor Hardy. - Entretanto, o avião foi encontrado, sabem?

- Eu não lhes disse para não andarem de avião?! - exclamou Chet. - Coitado do Henry.

- Eu também tenho novidades - anunciou Fenton Hardy. - A semana passada o bando que eu procuro roubou o equipamento de várias embarcações na ilha do Tubarão. Tenho uma lista daquilo que foi roubado.

O detective tirou um bloco-notas do bolso e leu um longo rol de apetrechos variados. A certa altura Joe interrompeu-o.

- Disse uma buzina para o nevoeiro, não foi? Encomendámos uma a um rapaz, que nos propôs a compra de artigos em segunda mão. Disse que se chamava Skee.

O senhor Hardy fez que sim com a cabeça.

- Desconfiei que os ladrões vendiam a mercadoria por aí, ao longo da costa. Vejam se o rapaz aparece. Talvez consigam saber quem são os associados dele.

- Havemos de conseguir - prometeu Frank.

- Agora digam-me, qual é a melhor pista para descobrirmos os homens que vos raptaram?

- Um deles agarrou-me com uma garra quando eu estava na água - disse Frank.

- Uma garra?

- Isso mesmo. Senti uma garra de aço à volta do pulso.

O pai ficou silencioso durante alguns instantes.

- Parece-me tratar-se de Zigursky Garra - disse lentamente. - Se assim é, todo este caso se torna mais sinistro do que eu imaginava!

- Quem é esse Zigursky? - quis saber Frank.

- Um dos criminosos mais duros desta parte do país. Contrabandista e ladrão de bancos. Ficou sem uma das mãos da última vez que tentou abrir um cofre com uma carga de nitroglicerina.

- Livra! - exclamou Chet.

- Sim, um acidente horrível - concordou o detective -, provocado por ele próprio. Desde então usa uma garra mecânica, com a qual tem apertado a garganta a muitos homens e a outros bate até os deixar inconscientes.

- Oh! - exclamou Joe. - Agora ele é mais perigoso do que nunca!

- É, e também por outra razão - acrescentou o pai. - Eu fui o responsável pela prisão dele. Nesse caso a garra foi a pista que me levou até ele. Apanhou uma pena severa e jurou vingar-se um dia. Cumpriu a quase totalidade da pena e agora encontra-se em liberdade condicional.

- Estou a perceber - interveio Frank. - Se ele está a preparar algum golpe no cabo Cutlass e nós estamos a atrapalhar-lhe os planos, tem dois motivos fortes para nos liquidar pela nossa interferência e por vingança!

- Mas por que razão não nos matou quando teve oportunidade de o fazer? - murmurou Joe.

- Talvez queira vigiar-nos a partir de agora na esperança de localizar o pai.

O senhor Hardy concordou e acrescentou:

- Aconselho-vos a contactarem o senhor Given imediatamente. Devem avisá-lo de que é provável que o bando tente roubar equipamento do hydrofoil. Olhem, ali está ele prestes a acostar. Vão lá agora. Eu espero aqui.

O hydrofoil tinha chegado à hora marcada. Quando os Hardy lá entraram já os passageiros tinham desembarcado. Frank e Joe notaram um cheiro acre no ar e viram Given a andar para trás e para diante, obviamente agitado.

- Onde estiveram? - gritou. - Quando eu mais precisava de vocês, desapareceram.

- O que é que sucedeu? - perguntou Frank.

- Fogo posto. Alguém tentou lançar-lhe fogo, ainda na doca. Não chegou a ser perigoso, mas o suficiente para assustar os passageiros. Agora está apagado - e apontou para uns pedaços de madeira queimada.

- Lamento - disse Joe -, mas ficámos detidos sem querer e não pudemos fazer nada.

Frank avisou-o a respeito dos ladrões de barcos e disse-lhe que ele e Joe viajariam no hydrofoil sempre que tivesse tempo, o que não seria muito frequente.

Given olhou-os atentamente.

- Estão a trabalhar noutro caso? - perguntou. Frank preferiu não responder directamente, falando apenas de um encontro.

Quando saíram dali dirigiram-se rapidamente para junto do pai, que os esperava, sozinho no cais da marina.

- Telefonei ao Sam Radley e mandei-o investigar os números das placas de matrículas que encontraram na casa do barco. Desta maneira, talvez consigamos descobrir o sítio onde vocês estiveram presos.

Sam Radley era um detective hábil e pessoa de grande confiança.

- Nós vamos continuar a trabalhar no caso - disse Frank. - Para começar, quero procurar um letreiro de néon vermelho que brilhava na estrada por detrás do barracão onde estivemos presos. Reparei nele antes de nos fecharem lá dentro.

- É uma boa ideia. Entretanto eu vou voltar para a ilha do Tubarão e prosseguir as investigações.

Os rapazes dirigiram-se então para a vivenda que lhes fora emprestada, para tomar um duche e vestir roupa lavada e seca. Após um rápido pequeno almoço voltaram à marina e perguntaram ao senhor Hinkley onde poderiam alugar um carro. Mas ficaram surpreendidos ao ver aproximar-se um carro familiar. Eram Callie e Iola.

- Finalmente apareceram! - disse Callie jovialmente ao mesmo tempo que Frank e Joe as cumprimentavam com grandes sorrisos. - É um grande alívio vê-los. Não foi nada divertido estarmos sem saber onde vocês se tinham metido.

- Contem-nos o que sucedeu - pediu Iola. Quando Frank e Joe relataram o que se passara, Callie franziu o nariz.

- Creio que estão a esquecer uma das pistas mais importantes. Porque é que não investigaram a Vestimenta? Gostava de saber quem roubou os nossos casacos e preparou aquele cenário.

- A Vestimenta - exclamou Joe. - Nem pensar nisso! É dirigida por uma senhora de meia idade muito simpática que de certeza não está implicada neste caso.

Frank ficara pensativo.

- Creio que a Callie tem razão. Não tiremos conclusões apressadas. Eu voto por irmos observar mais de perto a Vestimenta.

- Está bem - concordou Joe. - Mas primeiro o principal. Creio que, antes de mais, devemos ir procurar o letreiro de néon vermelho.

- Há apenas um problema - lembrou Frank. - Precisamos de transporte.

Callie sorriu.

- Estou a perceber. Está bem, fiquem com o meu carro. Nós voltamos no hydrofoil.

- Obrigado, Callie. És fantástica!

Uma hora depois, Frank e Joe estavam a 50 quilómetros do cabo, perto do local onde tinham estado presos.

Frank quebrou o silêncio.

- Creio que foi por aqui. Olha! Está ali um letreiro de néon vermelho e por detrás fica um barracão para guardar barcos!

Em grandes letras, lia-se o nome de um restaurante: O Caldeirão. O local encontrava-se deserto.

Frank saiu da estrada, estacionou o carro e dirigiu-se para o barracão atrás do restaurante. As portas não estavam trancadas e entraram facilmente.

- Espera um momento, Joe -- disse Frank. - Está muito escuro. Há um interruptor perto da porta. Acende...

Nisto, o rapaz tropeçou e caiu dentro de um tanque cheio de água. No mesmo instante sentiu qualquer coisa mordiscar-lhe as pernas!

Joe acendeu finalmente a luz e exclamou:

- Olha! Não foi aqui que estivemos, Frank! - Mas, de repente, largou a rir. - Frank, estás dentro de um tanque de lagostas!

 

Frank saiu do tanque com lagostas penduradas nas calças. Joe ria perdidamente.

- Vá! Continua a rir-te à minha custa! - exclamou Frank, sacudindo as lagostas das pernas - Tive sorte em escapar vivo destes monstros devoradores!... - E sorriu. - Creio que na verdade nos enganámos no local.

Descalçou os sapatos e despejou a água que tinham dentro. Pô-los de lado enquanto descalçava as meias e espremia a extremidade das calças.

- É melhor sairmos daqui o mais depressa possível - lembrou Joe. - Se aparece alguém podemos ter dificuldade em explicar porque andavas a nadar com as lagostas.

- Tens razão!

Frank pegou nos sapatos e nas meias e voltaram para o carro de Callie.

Continuaram o seu percurso ao longo da costa, guiando ora um, ora outro. Passaram por vários letreiros de néon vermelho, mas nenhum lhes pareceu familiar.

- Com certeza não nos encontrávamos tão longe quando tivemos o nosso encontro com o Zigursky! - murmurou Frank, desanimado. - Estamos quase na ilha do Tubarão.

Joe concordou.

- Mas visto que chegámos até aqui porque não vamos fazer uma visita ao pai?

- Boa ideia. Falta pouco até à ponte.

Fenton Hardy estava instalado num pequeno motel na ilha do Tubarão, uma estreita faixa de terra paralela à costa e que se estendia por cerca de 15 quilómetros. O detective não se encontrava no quarto. O empregado da recepção informou os dois rapazes de que o senhor Hardy fora à esquadra da polícia, que ficava perto.

Foram encontrar o pai com uns agentes da polícia a inspeccionar cerca de 50 peças de equipamento náutico. O senhor Hardy fez as apresentações.

- Que grande colecção que arranjaram - observou Joe.

- É apenas uma pequena parte daquilo que foi roubado - disse um detective. - Tudo isto foi encontrado numa casa abandonada.

Fenton Hardy apontou para uma buzina para o nevoeiro.

- Isto interessa-lhes.

Frank pegou na peça. Alguém escrevera num dos lados, em letras toscas, uma única palavra: Hardy.

- Deve ser a buzina que eu encomendei ao Skee outro dia! - exclamou Joe.

- Skee? - repetiu outro detective. - Também "conhecemos um Skee. Digam lá então o que têm a dizer.

Frank descreveu o adolescente que lhes oferecera equipamento barato, em segunda mão.

- O Joe encomendou-lhe uma buzina para o nevoeiro e nunca mais voltámos a ver o tipo.

- A vossa descrição condiz perfeitamente com o nosso Skee - declarou o detective. - É o chefe de um bando de rapazolas que operam ao longo desta costa como uma alcateia de lobos.

- Isso pode ser uma pista para nós! - exclamou Frank. - O Skee não sabe que andamos atrás dele e provavelmente aparecerá com outra buzina. Tanto quanto ele sabe, o Joe continua a ser um cliente dele.

- Se o apanharmos com a boca na botija - acrescentou Joe -, poderemos destroçar todo o bando! E se por acaso Skee está ligado aos outros que o pai persegue, podemos conseguir um autêntico jack-pot.

- E talvez encontremos o Henry Chassen - acrescentou Frank.

Um dos polícias assentiu com a cabeça.

- Creio que os seus filhos têm razão, Fenton. A estratégia deles parece-me boa. Agarramos o caso por ambas as extremidades - ilha do Tubarão e cabo Cutlass - e veremos se as duas linhas de investigação convergem numa única solução para todos os roubos.

Frank e Joe dirigiram-se para Providence no dia seguinte de manhã cedo e foram logo à marina Estrela do Mar. Encontraram Chet muito abatido, estendido numa cadeira de praia.

- Agora é que estou metido num grande sarilho, amigos!

- Que sucedeu desta vez? - perguntou Joe.

- Um bando de ladrões assaltou a marina - explicou Chet. - Entraram em meia dúzia de barcos e tiraram-lhes tudo o que podiam levar. Fugiram num barco veloz antes de a polícia chegar. E a patrulha do porto diz que vai ser muito difícil encontrá-los - acrescentou. - Existem nesta parte da costa demasiadas enseadas e angras onde eles se podem esconder.

- Provavelmente foi o Skee e os seus rapazes - disse Frank.

- Ora a nossa pouca sorte! - queixou-se Joe. - Voltámos para Providence preparados para enfrentar o bando, mas eles anteciparam-se e fizeram o trabalhinho enquanto nós dormíamos na ilha do Tubarão.

- Não há dúvida de que fomos ultrapassados - declarou Frank.

A expressão de Chet tornou-se ainda mais sombria.

- Bem podes dizê-lo, Frank. Os gatunos levaram também o Vedeta e um grande bote de borracha.

- O quê? - explodiu Joe.

- Sim, levaram o Vedeta - repetiu Chet. - Tens de admitir que foi um roubo importante.

- Joe, accionaste o sinal electrónico como o pai sugeriu antes de sairmos de Bayport?

- Com certeza. E o receptor está na minha mala, na casa que nos emprestaram.

- Bom, vamos buscá-lo e procuramos ao longo da costa. Se captarmos o sinal do Vedeta, talvez dê para descobrir o esconderijo do Skee.

Vinte minutos mais tarde contornavam o cabo Cu-tlass, indo Frank ao volante e Joe a accionar os instrumentos do receptor, num esforço para captar o sinal electrónico.

- Olha! - exclamou Frank, olhando para o porto. - O Flying Express está rodeado por uma flotilha de barquitos pequenos.

- Vamos ver o que se passa! - propôs Joe. Dirigiram-se para o cais e estacionaram o carro.

Caminharam até junto do ancoradouro do hydrofoil onde viram uns homens que falavam e gesticulavam. Joe acotovelou o irmão. - Olha quem ali está! O nossso generoso amigo da Fidelo Corporation!

- É mesmo o Malarky Grande, sim, senhor - replicou Frank. - Vê-se acima de todos os outros. Deixa ouvir o que é que ele pretende daqui.

Como que em resposta à curiosidade de Frank, Malarky disse:

- Já ouviram falar de vigilantes do velho Oeste?

Eles sabiam como lidar com os ladrões de cavalos. Pois bem, nós somos os vigilantes do cabo Cutlass e sabemos como lidar com os ladrões de barcos!

- Mas a sua flotilha não parece ir a perseguir os ladrões dos barcos - comentou Joe. - Colocaram-se à volta do Flying Express e vá lá saber o que pensam que estão a fazer.

A cara larga de Malarky corou.

- E como é que eu hei-de saber o que eles querem fazer?

- Sei eu - declarou uma voz lá atrás. E Spencer Given encaminhou-se para o construtor. - Você é que os mandou porque quer arruinar-me, Malarky!

Os dois homens iniciaram uma discussão acalorada, cheia de denúncias mútuas. Preparavam-se para chegar a vias de facto.

- É melhor acabarmos com isto! - murmurou Joe, metendo-se logo a seguir entre Spencer Given e Malarky Grande. Foi no momento em que o último estendia o braço para atingir Given e Joe é que apanhou o soco, cambaleou e caiu.

Malarky ajudou-o a levantar-se e disse:

- Desculpe. Espero não o ter magoado!

- Não magoou nada!... - retorquiu Joe sarcasticamente. - Sentir-me-ei muito melhor, em todo o caso, se acabarem com isto!

- Já disse o que tinha a dizer! - resmungou Malarky, afastando-se com os seus homens.

- Mas eu tenho mais para dizer! - gritou Given.

- E di-lo-ei na próxima vez que tenha oportunidade para isso! Obrigado pela ajuda - disse, dirigindo-se a Joe. - Eu devia ter juízo e não me meter a lutar com aquele palhaço. Bem, até logo.

Frank e Joe foram almoçar e em seguida voltaram à estrada para prosseguir a sua busca. Era quase noite e estavam prestes a desistir quando soou um bip-bip no receptor do aparelho electrónico.

- Localizámos o Vedeta! - exultou Joe.

Os sinais aumentaram de intensidade à medida que eles se aproximaram do alto de um monte íngreme. Os rapazes saíram do carro e perscrutaram a escuridão.

- O Vedeta deve estar na base desta falésia. Vou buscar as lanternas.

- Não, não podemos utilizá-las. O bando pode ter deixado alguém de guarda. É melhor apanhá-lo de surpresa. Eu vou primeiro.

- O. K.

Frank deixou-se escorregar devagarinho pelo declive até encontrar um ponto de apoio para o pé na raiz de um arbusto. Então começou a descida. Cautelosamente apoiou o outro pé numa rocha, verificou que era firme e passou o primeiro pé para um arbusto que saía da rocha.

Mas o peso do rapaz foi demasiado. Os galhos cederam e ele rolou por ali abaixo!

 

Frank foi cair sobre algo fofo; foi atirado ao ar e caiu de pé. Instintivamente flectiu os joelhos e os braços, pronto para o ataque.

Nada sucedeu.

Então Joe chamou lá do alto:

- Estás bem, Frank?

- Sim. Vai buscar uma lanterna.

O feixe luminoso incidiu na base da penedia, deixando ver o Vedeta e um grande barco de borracha, amarelo, que se encontrava voltado para o ar, sobre a faixa de areia que acompanhava a base da falésia.

- Caí em cima do barco de borracha - disse Frank. - Desce, mas tem cuidado.

Joe desceu rapidamente até à praia e diminuiu a intensidade da luz. Os dois rapazes começaram então a empurrar o Vedeta para a água.

Subitamente Frank parou.

- Ouve. Vem aí alguém.

Esconderam-se atrás do barco e esperaram. À fraca claridade da lua, viram aparecer um vulto que arrastava algo pesado pela areia.

Frank e Joe levantaram-se de um salto e apontaram a luz da lanterna ao rosto do desconhecido. Era Skee!

- Olá! - cumprimentou Joe jovialmente. - Nunca mais te vimos!

O adolescente esboçou um leve sorriso.

- Assustaram-me! - Pousou a sua carga na areia e esfregou as mãos. - Estive fora uns tempos. E vocês, por onde andaram?

- Oh, por aí - respondeu Joe evasivamente.

- Onde está a buzina de nevoeiro que disseste que nos arranjavas, em segunda mão e barata? - perguntou Frank.

- Ainda não a tenho. - Olhando-os de soslaio, perguntou por sua vez: - Como é que souberam onde me encontrar?

- Talvez os vigilantes do Malarky Grande nos tivessem dito - replicou Frank.

O rosto de Skee não revelou coisa alguma.

- Não sei de quem estão a falar. Nunca ouvi tal nome.

- E este barco? - perguntou Joe. - É teu?

- Claro que sim.

- Está à venda?

- Sim.

- Bem, nós andamos à procura exactamente deste modelo. Mas não queremos ser enganados. Deixa-nos dar uma volta nele pela baía e se andar bem talvez cheguemos a acordo.

- São doidos? - protestou Skee com ar carrancudo. - Quem é que já ouviu falar em experimentar um barco a estas horas da noite? Não faz sentido!

- Porquê? - retorquiu Frank. - Não há melhor altura que o presente. Tu tens algo para vender e nós estamos dispostos a comprar.

- Para dizer a verdade - continuou Joe astutamente -, não me parece que este barco seja grande coisa. Provavelmente tem um mau motor.

Skee mordeu a isca.

- Funciona que é uma maravilha. Eu vou-lhes mostrar!

Empurraram o Vedeta para a água e subiram para bordo. Joe sentou-se ao volante. Tudo trabalhou bem, por isso ele aumentou a potência do motor e o barco deslizou suavemente em direcção ao largo.

- Vejamos o que ele pode fazer! - cantarolou. O barco respondia ao seu toque como um potro cheio de vivacidade. Entrou numa enseada, virou paralelamente à praia envolto em espuma e aumentou ainda a velocidade. Contornou várias pequenas angras, diminuiu a velocidade, fez marcha atrás e lançou-se velozmente para a frente, outra vez. Skee estava impressionado.

- Sabes manobrar este barco melhor do que eu próprio.

- É muito fácil de manobrar! - disse Joe. - Sentado ao volante sinto-me nas minhas sete quintas.

Percebendo que a atenção de Skee se concentrava no barco, que esperava vender por um bom preço, Joe manobrou em direcção ao cabo Cutlass e descreveu uma longa curva para se dirigir para a marina Estrela do Mar.

Skee ficou alarmado e levantou-se.

- O que é que se passa? Ah, não, não me vão tramar!

Atirou-se para o lado numa tentativa de saltar borda fora, mas Frank segurou-o, mantendo-o no fundo do barco. Lutaram num emaranhado de pernas e braços.

Skee acabou por libertar-se e conseguiu saltar para o cais... indo quase cair nos braços de Chet Morton.

- Agarra-o, Chet! - gritou Frank.

Um soco no estômago e outro no queixo derrubaram o fugitivo, apanhado de surpresa. Chet obrigou-o a levantar-se.

- Caramba! - exclamou Joe com admiração. Entretanto, Frank foi fazer um telefonema para a polícia. Um carro-patrulha apareceu quase a seguir no local e Skee foi algemado, mas calou-se obstinadamente quando lhe fizeram perguntas a respeito do bando.

- Ele falará mais tarde! - disse um dos agentes, ao partir com o preso.

- Foi bom eu estar de guarda à marina esta noite! - declarou orgulhosamente Chet. - Que dizes àquele directo que lhe tirou o fôlego todo de uma vez?

- Foste formidável, Chet.

Os Hardy contaram ao amigo tudo o que se havia passado a seguir e foram os três deitar-se.

Na manhã seguinte, Chet teve algum tempo livre, por isso Frank e Joe levaram-no no Vedeta até ao ponto da costa onde tinham deixado o carro de Callie.

- Podes regressar nele - disse Frank -, enquanto nós procuramos mais algumas pistas.

- Está bem - respondeu simplesmente Chet.

A primeira coisa que os Hardy fizeram foi examinar o aparelho eléctrico que Skee deixara caído na areia. Era uma máquina de lixar e amolar.

- Aposto que o Skee ia tirar o número de série do Vedeta - deduziu Joe.

- Lembras-te do motor que apanhámos no fundo da baía? - perguntou Frank. - Também lhe tinha sido tirado o número! Bem, o Skee já não volta a precisar disto. Vamos levá-la connosco.

Meteram a máquina no barco e preparavam-se para sair dali quando alguém os chamou do alto da falésia.

- Com mil demónios! - exclamou Joe. - Parece-me o Henry Chassen!

- E é! - replicou Frank, excitado.

- Fiquem onde estão, amigos - gritou o artista. - Eu vou descer!

- O que te traz aqui? - perguntou Joe.

- Esta manhã muito cedo vi neste local um carro abandonado. Mas agora já não o encontrei. Para onde vão?

- Para a marina.

- Levam-me convosco?

- Sobe - disse Joe.

Daí a instantes rumavam à marina.

- Agora conta-nos o que te sucedeu? - pediu Frank.

- Para começar - disse Chassen -, não consegui nadar por baixo daquelas portas de madeira do barracão dos barcos. Por isso voltei para dentro e esperei. Os três bandidos voltaram, meteram-me à força no barco deles, levaram-me para o mar e atiraram-me pela borda fora.

- Exactamente o que nos fizeram a nós - disse Frank.

- Pensei que eles fossem deixar-me afogar - prosseguiu Chassen -, mas um deles atirou-me um salva-vidas para a água. Se não fosse isso não estaria agora aqui. Acabei por ir dar à costa uns bons quilómetros para sul do cabo Cutlass. Que experiência! Passei uns dias metido em casa só para descansar!

- Ficámos preocupados contigo - disse Joe. - Temos de avisar a polícia de que estás vivo.

Chassen prosseguiu o seu relato:

- Depois de chegar a terra ouvi dizer que vocês dois tinham sido recolhidos por um catamarã ao largo da marina. Também soube que o vosso pai tinha aparecido por lá. Tive esperanças de o conhecer. Seria muito excitante travar conhecimento com o grande Fenton Hardy. Onde está ele? Em Providence, espero?

- Lamento desapontar-te - respondeu Joe, manobrando o barco para acostar na doca. - O pai encontra-se na ilha do Tubarão.

- Bem, um dia terão de mo apresentar. Agora tenho de me ir embora. Vou à Vestimenta. A proprietária encomendou-me uns quadros. Acha que se irão vender muito bem. Espero voltar a vê-los em breve. Adeus.

Chassen afastou-se e subiu a rua.

Frank olhou para o irmão com ar reprovador.

- Joe, não devias ter dito ao Chassen onde o pai se encontra!

- Porquê? Não concluímos já que o Henry Chassen é um tipo honesto?

- Talvez seja. Mas supõe que ele diz a outra pessoa qualquer que fala com uma terceira e assim por diante até metade da população local ficar a saber quais são as actividades do pai.

- Lamento - disse simplesmente Joe. - Devia ter tido mais cautela.

Frank pegou na máquina eléctrica e voltou-a.

- Está aqui o nome da loja onde ela foi comprada. A morada é na Rua Central. Podemos investigar esta pista já de seguida.

- Certo. Vamos lá agora.

O empregado da loja examinou a máquina e procurou nos registos.

- Vendemo-la à Garagem Atlas. Fica na esquina da Rua Bayshore com a Rua Halibut.

Na Garagem Atlas reinava grande azáfama. Havia ali carros de todos os tipos; um deles fora levantado sobre o poço e estava a ser examinado por baixo; outros encontravam-se desmanchados e os mecânicos trabalhavam neles; à entrada, junto das bombas, estavam dois veículos a abastecer-se.

Frank e Joe dirigiram-se para o escritório do gerente. Cumprimentaram e explicaram que vinham inquirir de uma máquina de lixar comprada recentemente.

O gerente deixou o sorriso fingido e tornou-se carrancudo:

- Não tenho tempo para responder a perguntas dessas!

- Mas não pode simplesmente dizer-nos o que sucedeu à máquina? - insistiu Frank.

- Como hei-de saber? Ponham-se a andar!

Ao voltar as costas, Joe fez uma careta.

- Este não está com certeza ansioso por conquistar amigos.

- Bem, talvez ele de facto não saiba - disse

Frank. - Mas isto requer uma investigação mais funda. E se voltarmos aqui logo à noite para revistar a garagem?

Joe sorriu.

- E o que faremos entretanto?

- Prometemos à Callie investigar a Vestimenta.

- Está bem. Vamos lá fazer uma visita à loja.

A rapariga que se encontrava ao balcão era faladora. Respondeu prontamente às perguntas de Frank e Joe. A senhora Lane, a proprietária da loja, era um pilar da sociedade local e tinha uma reputação imaculada.

- E a respeito do Rance Nepo? - interrogou Joe. - Ele vem muito aqui?

- Por que não há-de vir? É um cliente.

- Há também o Henry Chassen, o artista - disse Frank. - Sabe dizer-nos alguma coisa a respeito dele?

- A senhora Lane gosta dele e do trabalho dele. A verdade é que todos gostamos. Ficámos satisfeitas quando a patroa comprou alguns dos seus trabalhos.

A rapariga afastou-se para atender um cliente impaciente. Frank e Joe voltaram para a casa que lhes fora emprestada, onde ficaram a fazer horas para a sua “expedição de reconhecimento”.

À meia-noite já se encontravam na Garagem Atlas.

- Isto tem um aspecto sombrio! - sussurrou Joe. Deram a volta ao edifício e, nas traseiras, deparou-se-lhes uma janela aberta. Entraram por ali.

- Esquece os carros - avisou Frank, acendendo a lanterna. - Olha só para o resto das coisas.

A luz rasgou as trevas e foi incidir sobre uma fila de motores, todos alinhados a um canto.

- Motores de barcos! - sussurrou Joe.

- Qual será a razão...

Subitamente a garagem pareceu encher-se de estrelas. Frank e Joe ficaram estendidos no chão, sem sentidos!

 

A imagem dupla no cérebro de Frank finalmente convergiu numa só e a névoa dissipou-se, deixando ver um escritório luxuoso. Joe, estendido ao lado dele, no sofá, estava também a recuperar os sentidos.

Frank pestanejou ao reconhecer as paredes forradas de carvalho e a carpete fofa aos seus pés. Em frente deles, sentado à secretária, encontrava-se Malarky Grande.

Joe despertou imediatamente e ficou alerta. Olhou para Frank e depois para o magnate da construção.

- O... o que é que sucedeu? - perguntou, levando a mão à nuca.

- Foram neutralizados por dois dos meus homens da segurança. Eles viram-vos a rondar à volta da Garagem Atlas à meia noite, foram atrás de vocês e depois... pimba!

Frank abanou tristemente a cabeça.

- Mas que coisa! Nós estávamos ali porque tínhamos seguido a pista dos ladrões de barcos até um dos seus esconderijos!

Malarky franziu o sobrolho.

- Têm provas?

- Claro que sim - respondeu Frank. - Vimos uma série de motores de barco nas traseiras da garagem!

Malarky mostrou-se impressionado.

- Vou dizer-lhes mais: que acham de pedir à polícia que vá lá ter convosco? Temos de deslindar este caso.

Malarky pegou no telefone e ligou para a polícia.

- Tudo combinado - disse no fim. - Um agente estará lá à vossa espera.

O polícia encontrou-se com os Hardy em frente da garagem. Levou-os directamente ao escritório do gerente, que também fora chamado.

- Não me oponho de modo algum a que vá dar uma vista de olhos - disse o gerente. - Estes rapazes vieram maçar-me ontem, mas agora, que é uma coisa oficial, façam favor de ir ver.

Os rapazes dirigiram-se para o compartimento das traseiras, acompanhados pelo polícia. Sem sequer olhar, Joe apontou para um canto.

- É ali!

O agente coçou a cabeça.

- Onde? Frank murmurou:

- Joe, os motores foram retirados dali. O canto está vazio!

- Se não fossem filhos de Fenton Hardy – disse secamente o polícia -, desconfiaria que era brincadeira. Mas admito que se trata de um engano e ficam as coisas assim!

Muito desanimados, Frank e Joe voltaram para casa, onde Chet já os esperava.

- Que se passa? - perguntou. - Não me parecem muito felizes.

- Alguém nos pregou uma partida - respondeu lentamente Frank.

- E eu desconfio do Malarky - acrescentou Joe e contou a Chet o que se passara.

- Também acho o mesmo - declarou Chet. - Fui ver o dia do aniversário do Malarky numa lista das pessoas influentes do cabo Cutlass.

- O que é ele? - quis saber Frank.

- Virgem! Governado por Mercúrio, e Mercúrio domina as mãos. Por isso será bom vigiar o que esse Malarky faz com as mãos.

Joe concordou com um aceno de cabeça.

- Temos de ser extracuidadosos desta vez. Podem resolver fazer-nos dar um passeio só de ida. Talvez venham rondar esta casa durante a noite!

- Não há problema - declarou Chet. - Preparamos um sistema de alarme. Trouxeste o teu aparelho de escuta, Frank?

- Claro que sim.

Frank foi à mala e tirou de lá um estojo. Em seguida os três dirigiram-se para a doca da marina. Depois de colocarem um microfone de detecção debaixo de uma rede de pesca, estenderam um fio até à casa, fizeram-no entrar por uma janela e chegar até à mesinha-de-cabeceira entre as camas. Aí colocaram o receptor.

Chet observou a engenhoca com satisfação.

- Pronto! Nada poderá mexer-se lá fora sem nós sermos avisados electronicamente. Tão seguro como um bom horóscopo!

Não apareceram visitas até se deitarem, mas, quando já dormiam profundamente, o receptor começou a emitir estalidos assustadores.

Frank acordou sobressaltado.

- Joe! Chet! Anda alguém no cais! Vestiram-se apressadamente, saíram em silêncio pela porta das traseiras e dirigiram-se para o sítio onde tinham deixado o microfone.

Subitamente um quac quebrou o silêncio. Ouviu-se um rocegar de penas, seguido por um chapinhar na água.

- Um pato! - exclamou Chet aborrecido. - Foi o que nos fez sair da cama a estas horas da noite! - Abanou a cabeça e voltaram os três para casa.

Na manhã seguinte Frank e Joe encaminharam-se para a doca do Flying Express. Spencer Given parecia perturbado.

“Dormiu menos do que nós” - pensou Joe.

- Tenho uma ordem do tribunal - anunciou Given -, que mantém os vigilantes do Marlarky afastados do hydrofoil. Mas o homenzarrão não deixa de me perseguir. Os meus planos para um desenvolvimento urbanístico no cabo Cutlass estão a esvair-se em fumo. As pessoas recusam os lotes que eu ofereço com desconto. Receiam comprar mesmo a baixo preço!

- Porquê? - perguntou Joe.

Given mostrou-lhe um jornal de Bayport.

- Leiam isto!

Tratava-se de um anúncio, posto por Malarky, que dizia: “Venha ao cabo Cutlass em segurança, de carro, comboio ou autocarro. De que serve um desconto se não estiver vivo para o gozar?”

Joe dobrou o jornal e devolveu-o.

- É de uma grande falta de ética, senhor Given, mas julgo que não é ilegal.

- Não, não é ilegal - respondeu Given nervosamente -, mas põe o meu investimento em perigo, não acham?

- Não há dúvida a esse respeito - concordou Frank. - Malarky pretende eliminar a concorrência. Faremos o possível para o impedir de conseguir os seus intentos.

- É disso mesmo que eu preciso! Não desistam!

Os Hardy trocaram impressões sobre o que fariam a seguir.

- Vamos falar outra vez com o Chassen - sugeriu Frank. - Talvez haja algo que nos dê uma pista, mas que ele se tenha esquecido de nos contar quando ontem descreveu a maneira como se salvou.

- Nunca lhe perguntámos onde vivia - lembrou Joe ao irmão.

- É verdade. Talvez o possamos saber na Vestimenta.

Quando Frank e Joe ali chegaram, Chassen e Rance Nepo encontravam-se em frente da porta, a conversar.

- Olá, amigos - disse Chassen. - O Rance está a tentar vender-me outra máquina fotográfica.

Nepo sorriu cordialmente e estendeu-lhes um modelo recente de máquina fotográfica.

- Está aqui um material de primeira. Vejam com os vossos olhos.

Frank ergueu a câmara e começou a observar o que o rodeava, enquanto Joe conversava com Rance e Chassen. Falaram a certa altura das vantagens de se tirar um instantâneo e revelá-lo imediatamente.

- Já percorremos um longo caminho em fotografia - observou Nepo. - Hoje não há necessidade de tirar fotografias no exterior e de as revelar numa câmara escura.

Havia algo em Nepo que desagradava a Frank, algo que ele não era capaz de definir.

- Posso experimentar a máquina? - perguntou. - Tiro uma fotografia aos dois, está bem?

- Com certeza - respondeu logo Nepo, que estava ansioso por exibir o modelo que acabara de receber do fabricante.

Frank tirou uma fotografia a Nepo e a Chassen juntos. Sessenta segundos depois a máquina apresentava-lhe uma fotografia muito nítida. Frank mostrou-a aos dois homens e Nepo sorriu.

- Já viram fotografia mais nítida?

- Confesso que não - retorquiu Frank. Entregou a máquina ao dono e enquanto os outros três falavam animadamente sobre as técnicas fotográficas, meteu a foto no bolso.

- Vocês têm algumas fotografias da vossa família? - perguntou Chassen. - Bem gostaria de ver uma do vosso pai.

- Talvez tenha uma - replicou Joe. Levou a mão à algibeira para tirar as fotografias tipo passe que fora buscar e que se esquecera de entregar ao pai.

Frank acotovelou-o discretamente.

- Espera Joe. Tu deste-ma. Aqui está.

Tirou da carteira a fotografia de Sam Radley e mostrou-a a Nepo e a Chassen. Estes observaram-na atentamente antes de a devolverem.

- Parece um homem de acção - comentou Nepo. - Bem, agora tenho de ir. Até outra altura. - E com estas palavras afastou-se.

Frank e Joe interrogaram novamente Chassen sobre a maneira como se tinha salvo, mas ele não conseguiu esclarecê-los mais a respeito dos seus captores. Disse aos rapazes que vivia numa pensão em Maple Street e em seguida despediu-se.

Quando se dirigiam de novo para casa, Joe perguntou, intrigado:

- Para que foi a troca de fotografia? Mostraste a do Sam Radley como se fosse a do pai.

- Desconfio do Nepo. Não quero que ele seja capaz de identificar o pai.

- Por que é que suspeitas do Nepo?

- Não sei bem.

Quando chegaram a casa, Frank tirou o instantâneo do bolso, colocou-o sobre uma mesa e ficou a observá-lo atentamente. Joe e Chet vieram olhar por cima do seu ombro.

- Não sei porquê mas este tipo parece-me familiar - murmurou Chet, que logo exclamou: - Já sei! Frank, depressa, dá-me uma caneta!

Frank obedeceu e Chet começou a desenhar sobre a fotografia de Rance Nepo. Com alguns rabiscos hábeis, contornou o rosto com caracóis e esboçou um vestido rodado.

Joe olhava-o, fascinado.

- Que estás tu a fazer, Chet?

- Não vêem? É a senhora metida no caso. A que lhes telefonou em Bayport e a que atirou Frank para fora do hydrofoil!

Frank soltou um assobio.

- É claro! O Rance Nepo é a nossa falsa loura!

 

- Chet, tu és um génio - disse Joe. - Tens cá um olho!

Chet inclinou modestamente a cabeça.

- Obrigado pelo cumprimento. Mas a verdade é que eu tinha uma grande vantagem, Joe. Fui o único que viu a loura de perto. Devíamos avisar a polícia.

- Não, ainda não - respondeu Frank. - O Nepo julga que nos enganou, o que nos dá uma hipótese de lhe trocar as voltas. O Joe e eu vamos à loja dele amanhã fazer-lhe mais algumas perguntas encobertas numa conversa a respeito de máquinas fotográficas.

A loja de Nepo estava fechada quando os dois irmãos lá chegaram. Uma espessa cortina verde cobria o vidro da montra e na porta havia um aviso que dizia: “ENCERRADO PARA FÉRIAS”.

- É estranho ele não nos ter falado nisto - observou Joe.

- Não será assim tão estranho se ele estiver a tramar alguma coisa. Mas o Henry Chassen talvez nos possa dar uma ideia do que ele está a preparar.

Chassen não se encontrava no seu quarto na pensão e na Vestimenta ninguém o voltara a ver desde a véspera.

- Ele disse que ia de férias com o Rance Nepo?

- perguntou Joe.

O empregado disse-lhe que não.

- Há aqui algo de estranho - murmurou Frank quando pararam à esquina.

- Devíamos avisar o Henry a respeito de Nepo - disse Joe. - Se vai viajar com ele devia saber que o companheiro não é pessoa de bem. É melhor avisarmos a polícia agora.

Frank abanou a cabeça.

- Não temos provas de que o Nepo tenha cometido um crime. Precisamos de provas concretas antes de ir à polícia.

De volta à marina, os jovens detectives foram encontrar Chet novamente aflito e Al Hinkley furioso.

- Mais roubos! - gritava o homem. - Vieram aqui e roubaram os motores fora de borda de dois dos meus barcos.

- Percebo tanto o que se passou como o senhor Hinkley - murmurou Chet, impaciente. - Mal tinha acabado de voltar costas e os motores desapareceram.

- Não voaram - disse Joe. - Não viram ninguém a rondar por aqui?

- Ninguém.

- Não te aflijas, Chet - consolou-o Frank. - Joe e eu vamos dar uma volta para ver se descobrimos alguma coisa.

Chet continuou deprimido.

- Como sou Caranguejo é possível ter agora um pouco de falta de sorte. É bom ter um Carneiro e um Escorpião do meu lado. Vocês estão este mês na casa certa do Zodíaco. Podem fazer descobertas e revelar conspirações.

- Espero que sim! - riu-se Frank.

Joe pôs o Vedeta em andamento e Frank sentou-se à ré, observando a área da marina com um binóculo potente.

Viu um barco a remos com dois homens a pescar à linha. Não se via outra embarcação em meia milha de distância, por isso Frank ficou a observá-los durante alguns minutos.

- Mais devagar, Joe. Quero ver melhor aqueles pescadores. Anda cá e dá uma olhadela.

O Vedeta diminuiu a velocidade para um quarto. Joe ligou o piloto automático e foi ter com Frank à popa. Pegando no binóculo examinou o barco a remos de cima a baixo.

Os dois homens puxaram apressadamente as linhas de pesca, arrumaram tudo debaixo dos bancos, pegaram nos remos e começaram a remar em direcção à costa.

Frank pegou de novo no binóculo.

- Estão a avançar muito devagar - murmurou com perplexidade. - Aquele barco não pesa assim tanto. É como se estivessem a arrastar uma âncora.

Joe exclamou de repente:

- Frank, descobriste a resposta! Eles estão a arrastar motores roubados. Aposto que é isso!

Joe voltou aos comandos do Vedeta e conduziu-o em direcção ao barco a remos. Quando se aproximaram, pediu a Frank que tomasse conta do barco. A seguir despiu-se, ficando apenas com os calções, e atirou-se à água num mergulho em profundidade que o levou até debaixo da embarcação a remos.

Viu então duas correntes que se estendiam dos dois lados do casco. Segurando-se a uma das correntes seguiu ao longo dela até chegar à outra extremidade - à qual estava amarrado um motor fora de borda.

Joe precisava de respirar! O coração batia-lhe apressadamente e sentia um zumbido nos ouvidos! Necessitava de ar!

Reunindo todas as suas forças, puxou a corrente e subiu para a superfície.

Respirando, ofegante, observou a cena. O barco a remos voltara-se e os seus ocupantes tinham caído à água.

- Socorro! - gritou um deles. - Socorro! Salvemos!

Joe nadou rapidamente para um dos homens, agarrou-o, passando-lhe o braço debaixo do queixo, e arrastou-o para o Vedeta. Frank debruçou-se do barco e puxou o outro para cima.

Ambos se deixaram cair sem forças. Frank amarrou-lhes rapidamente os pulsos.

- Não esqueçamos os motores - disse Frank. - Foi por causa deles que aqui viemos.

Joe pegou numa corda muito grossa, nadou até junto da embarcação voltada, prendeu a corda a uma argola existente na popa e voltou a nadar para o Vedeta.

Frank pôs o barco em movimento mal Joe subiu para bordo. A corda esticou-se e o Vedeta dirigiu-se para a marina levando o barco a remos a reboque

Quando atracaram na marina Estrela do Mar, Frank gritou para Al Hinkley:

- Chame a polícia! Encontrámos os seus motores roubados.

Chet apareceu a correr. O seu rosto redondo abriu-se num sorriso ao ver Frank e Joe puxarem os motores para o cais.

- Bem, isto livra-me de culpas, não é assim, senhor Hinkley? - disse quando o patrão saiu do escritório depois de ter telefonado à polícia.

- Naturalmente, pelo menos no que me diz respeito. Agora o que é preciso é olear bem esses motores, depois do mergulho que deram na baía!

Quando o carro da polícia chegou, os dois homens já estavam de pé. Frank e Joe foram à esquadra fazer uma declaração acerca da recuperação dos dois motores roubados.

Os presos receberam roupas secas e foram depois interrogados. Foram avisados do seu direito a um defensor oficioso e em seguida o sargento perguntou ao primeiro homem:

- Como se chama?

- Eric Anderson.

- Onde vive?

- Em nenhum local em particular. Trabalho aqui e ali, onde quer que me encontre.

O sargento da polícia voltou-se para o segundo homem, que afirmou chamar-se Robert Meyer. Também ele não tinha emprego fixo.

- São ambos vagabundos?

- Sim. E não vamos falar.

Anderson remexeu-se na cadeira, com nervosismo.

- Dêem-nos uma oportunidade, sim? - lamuriou-se. - O nosso patrão afoga-nos se abrirmos a boca!

Frank encheu um copo de água e estendeu-o ao homem. Este pegou-lhe e mal ele começou a beber o jovem detective perguntou repentinamente:

- O seu patrão é o Zigurski Garra?

Anderson engasgou-se com a água que estava a beber. Cuspiu-a, aflito, tossindo um bocado, e depois pegou no lenço, assoou-se e pareceu ter recuperado o fôlego.

- Não importa quem é o nosso patrão! - resmungou. - Queremos um advogado.

- Está bem - disse o sargento. - Estão presos por se encontrarem na posse de valores roubados. Irão ter advogado.

- Creio que nada mais temos a fazer aqui - comentou Frank.

Saíram e dirigiram-se para a casa emprestada, onde Chet já os esperava. Descobriram com grande surpresa que Fenton Hardy também lá se encontrava.

- Olá, pai! - exclamou Joe. - Ainda bem que veio.

- Passa-se alguma coisa? - perguntou Frank. O detective parecia muito preocupado. Foi direito ao assunto.

- O Sam Radley desapareceu! - disse com ar sombrio.

 

Sam Radley desaparecera! Frank e Joe entreolharam-se, perplexos.

- Julgámos que estivesse a fazer investigações sobre as placas de matrícula que encontrámos no tal barracão - disse Frank.

- E estava - afirmou Fenton Hardy. - Com efeito, tinha-me informado de que tinha uma pista que nos interessaria a todos.

- Talvez tivesse descoberto quem é o dono das placas! - exclamou Joe, excitado.

O pai fez que sim com a cabeça.

- É possível. O pior é que não chegou a transmitir-me a informação.

- Conte-nos o que sucedeu, pai - pediu Frank.

- Não há grande coisa a dizer. Devíamos encontrar-nos na ilha do Tubarão. O carro do Sam foi encontrado no parque de estacionamento do motel onde eu estou. O empregado lembra-se de o ter visto deixar ali o carro. A partir daí, não há sinais do Sam!

Frank ia falar quando Chet o interrompeu:

- Com mil demónios! Qual é o signo do Sam?

Joe voltou-se para o amigo, aborrecido:

- E que diferença faz isso? Não estamos a ler horóscopos. Trata-se do caso de um homem que desapareceu em circunstâncias misteriosas!

- Os mistérios são a minha especialidade - retorquiu Chet. - Em que data nasceu o Sam Radley?

Frank respondeu, resignado:

- Mais vale acabarmos com isto. O Sam nasceu em princípios de Dezembro.

- Então é Sagitário, o signo do archeiro. Geralmente são pessoas inteligentes. Mas os astros parecem não os favorecer este mês!

Chet tirou do bolso um livrinho que folheou até encontrar o signo desejado e leu pomposamente:

- “É altura de sofrer devido a um grande engano. É devida uma retaliação!”

- Isso é capaz de andar perto da verdade - disse Frank, que contou rapidamente ao pai que Rance Nepo era a “dama” do caso. - Se calhar cometi um erro ao mostrar a fotografia do Sam ao Nepo. E raptaram-no, por engano, julgando que o raptavam a si, pai.

Chet olhou-os com um ar de grande autoridade.

- Bem, quem quer que o raptou está metido em grandes sarilhos este mês. O livro diz que haverá retaliação. Vai pagar caro por ter raptado o Sam.

Fenton Hardy concordou.

- A questão é saber para quem trabalha o Nepo. Obviamente está ligado ao bando que tenta sabotar o hydrofoil. Mas não devem estar interessados no Radley. Nem em mim, visto que eu não estou a trabalhar no caso do Given. O meu único inimigo parece ser o Zigurski, que jurou vingar-se quando o enviei para a prisão. Talvez tenha apanhado o Sam para chegar a mim!

Chet pigarreou para aclarar a garganta.

- Senhor Hardy, não pode ter sido o Zigurski Garra quem capturou o Sam!

- Porquê?

- Porque ele não se encontra perto da ilha do Tubarão. Está em Miami, na Florida!

- E como é que soubeste essa informação vital?

Chet pareceu querer desculpar-se.

- Não quis pisar o risco, sabe? Mas precisava de saber em que dia nasceu o Zigurski para descobrir o que ele anda a tramar. Por isso, utilizei o seu nome como referência para me dirigir às autoridades prisionais. Eles informaram-me também de que o Zigurski se encontra na Florida. Espero que não fique zangado comigo.

Fenton Hardy soltou uma gargalhada.

- É difícil alguém zangar-se contigo, Chet. E que mais te disseram a respeito do Zigurski?

- Disseram-me que ele nasceu no dia 20 de Julho. Portanto, é Caranguejo.

- Então tu pertences ao mesmo signo que ele, Chet! São parecidos, não?

- De modo algum, Frank. O Zigurski nasceu na ponta da lua!

- Na ponta da lua?!

- Isso significa três dias antes ou depois do último dia de um signo do Zodíaco. As pessoas nascidas nessas alturas têm as características de ambos os signos.

- Tais como?

- Tal como no caso de Zigurski, que nasceu entre o Caranguejo e o Leão. Pode parecer Caranguejo exteriormente, mas por dentro é Leão. Tenho a certeza disso!

- E isso é bom ou mau? - quis saber Frank.

- Neste caso é mau. Um Leão gosta de dar ordens. Tem o hábito de deitar a mão ao que deseja... Não é mais ou menos assim o retrato do Zigurski, senhor Hardy?

- Exactamente, Chet. Se o Zigurski se encontra na Florida, deve ter delegado noutra pessoa o trabalho de me raptar. Ele conhece-me e nunca teria cometido o erro de capturar o Sam julgando que era eu.

- O que nos faz voltar ao Nepo - concluiu

Frank.

- É verdade.

- Em primeiro lugar não percebo por que razão o Garra foi para a Florida - murmurou Joe.

- Talvez para garantir um álibi - sugeriu Frank. Fenton Hardy disse que sim com a cabeça.

- Pode ser - concordou. - Se soubéssemos que patifaria anda ele a planear agora!...

Joe parecia desesperado.

- Talvez esteja ligado aos ladrões de barcos e às tentativas de sabotar o hydrofoil! Como poderemos detê-lo, pai?

- Não será fácil. Mas para começar alertamos todas as marinas do cabo Cutlass. Até agora ninguém se tem precavido, mas, se tivermos sorte, quem sabe se não apanhamos o bando em acção?...

O detective levantou-se da cadeira e foi espreitar para fora.

- Vim aqui em segredo para lhes comunicar o que sucedeu ao Sam. Agora é melhor voltar para a ilha do Tubarão, a ver se descubro o rasto dele.

- E nós? O que fazemos? - interrogou Joe.

- Tentem vigiar de perto o Nepo e o Zigurski. Qualquer deles pode ser a chave para a resolução deste caso.

Subitamente, Frank levou um dedo aos lábios.

- Chiu! Ouçam! Está alguém lá fora!

De facto, andava alguém em volta da casa. Ouviam-se passos muito leves, como se a pessoa que ali se encontrava não quisesse que dessem por ela.

Fenton Hardy bichanou:

- Não posso deixar que me vejam aqui. Vou esconder-me debaixo da cama - e, dizendo isto, baixou-se e desapareceu.

Frank dirigiu-se, pé ante pé, para a porta e abriu-a repentinamente. Um vulto, que estava encostado à porta, desequilibrou-se e entrou por ali dentro aos tropeções.

- Senhor Malarky! - exclamou Joe, enquanto o homem recuperava o equilíbrio.

- Que agradável surpresa - disse Frank com um sorriso. - Gostaria de lhe apresentar Chet Morton.

Apertaram as mãos e Frank continuou:

- Julguei que se tinha esquecido que nos emprestou a casa, mas afinal lembrava-se!

Malarky Grande estava embaraçado.

- Quase me esqueci de vocês - confessou. - Quando a minha secretária me lembrou que se encontravam aqui, vim ver se se acham confortavel-mente instalados. - Com um leve sorriso acrescentou: - Viram mais alguns motores de barcos?

Os Hardy riram e Joe protestou:

- Todos nos podemos enganar, senhor Malarky. Frank assegurou-lhe que estavam muitíssimo bem acomodados. Falaram um pouco mais a respeito de barcos e, por fim, Malarky despediu-se.

- Este é Virgem - observou Chet. - Tem um espírito minucioso.

- Acha que Malarky está a fazer jogo duplo, pai? - perguntou Joe quando Fenton Hardy saiu de debaixo da cama.

O senhor Hardy sacudiu as calças com a mão e endireitou-se.

- Não tenho a certeza. Na verdade, parecia estar a espiar. Por outro lado esta casa é dele e vocês são convidados. Tinha uma razão suficientemente plausível para aqui vir.

- Continuo a suspeitar dele - declarou Joe. - Pode ser Virgem e picuinhas, como o Chet diz. Mas conhecemo-lo como um homem de negócios duro, que não quer concorrência. Praticamente confessou que está disposto a arruinar o Spencer Given e a destruir o hydrofoil.

- Concordo - disse Frank. - Porque havia o Malarky de se preocupar com o nosso conforto? Se calhar, veio aqui para ver se conseguia descobrir qual a nossa ligação com o Flying Express.

- Deixo essa questão para vocês resolverem - declarou Fenton Hardy - e vou-me embora enquanto a costa está livre.

Abriu a porta das traseiras, olhou à volta para ter a certeza de que não estava ninguém a espreitar e desapareceu rapidamente.

Os rapazes deitaram-se cedo e dormiam profundamente quando o sistema de alarme soou. Frank foi o primeiro a despertar.

Abanou Joe e Chet e reuniram-se os três em volta do receptor.

- Desta vez não são patos - murmurou Chet. - São homens que se encontram ali na doca.

- Escutem - murmurou Joe. - Talvez eles se denunciem se nós não formos interromper a sua conferência de alto nível.

Ouviam-se várias vozes ao mesmo tempo, até que uma, que parecia ser a do chefe, pediu silêncio.

- Ponham os barcos em andamento! - ordenou.

- E o Flying Express? - perguntou outra voz. - Não vai também dar o “salto”?

Ouviu-se um tumulto, como se o homem que falara tivesse sido agredido.

- És doido! - regougou o chefe. - Fala nisso outra vez e vais fazer companhia aos peixinhos!

- Está bem! Está bem! Deixa-me em paz! Foi um deslize! Não voltará a suceder!

- É melhor não!

- Deixem-se disso - disse uma terceira voz. - Há muito que fazer esta noite. É disparate pormo-nos a lutar uns com os outros quando temos de enfrentar os Hardy!

Os homens calaram-se. Ouviu-se o som de motores.

- Provavelmente vão assaltar a marina Estrela do Mar - bradou Chet, precipitando-se para a porta.

Joe seguiu-o, enquanto Frank se dirigia para a cabina pública mais próxima e chamava a polícia. Depois correu para a marina e juntou-se a Chet, Joe e Al Hinkley, que contavam os barcos ali ancorados.

- Estão aqui todos - disse Hinkley, admirado. - Têm a certeza de que ouviram o bando combinar?

- Eu gostaria de lhes fazer a mesma pergunta - interrompeu uma voz austera atrás deles. Era um polícia. - Disseram que estavam a roubar barcos aqui. Bem, quantos desapareceram?

Frank engoliu em seco.

- Parece que nenhum.

- Mas há nisto algo de estranho - exclamou Joe. - Ouvimos uma meia dúzia de motores a arrancar.

Frank bateu na testa com a palma da mão.

- Uma táctica de diversão foi o que foi. Fizeram com que viéssemos todos para aqui, enquanto iam dar o golpe noutro sítio.

- Mas onde? - perguntou Chet.

- Ora bolas! - gritou Joe. - O Flying Express! Vamos depressa para lá.

Meteram-se nos carros e partiram velozmente para o ancoradouro do hydrofoil. Spencer Given encontrava-se lá, de ombros caídos, a olhar tristemente para a água. Voltou-se para o grupo que corria para ele. - Chegam demasiado tarde! - Given tinha as feições contorcidas de raiva. - O Flying Express foi roubado!

 

- Encontrava-me no meu escritório, aqui na doca, quando ouvi os motores do hydrofoil começarem a funcionar - explicou Given. - O barco tinha estado na doca durante todo o dia por causa de pequenas reparações. Acendi as luzes e corri para o ancoradouro... mesmo a tempo de ver o Flying Express desaparecer.

- Viu os ladrões? - perguntou Frank. - Será capaz de os identificar?

- Não. Iam na cabina do piloto e eu mal tive tempo de me aperceber do que se estava a passar.

- Vamos enviar um alerta para todos os pontos da costa - prometeu o polícia. - Um hydrofoil não é fácil de esconder. Alguém há-de dar por ele e não deve ir muito longe.

O polícia dirigiu-se para a esquadra para dar o alarme, pondo em movimento uma intensa acção de buscas levadas a efeito por carros-patrulha e lanchas da Guarda Costeira. De madrugada, contudo, o barco ainda não fora descoberto.

- Não fazemos ideia de onde estará - informaram Given pelo telefone. - Mas vamos prosseguir as buscas - acrescentou o polícia.

Frank, Joe e Chet, que tomavam parte nas buscas de carro, regressaram com as mesmas notícias desanimadoras. Given, muito abatido, resolveu-se finalmente a ir descansar um bocado. Os rapazes permaneceram sozinhos no cais até o Sol já ir alto.

- Será obra do Malarky? - interrogou-se Chet em voz alta.

- Nada é impossível no que diz respeito ao Malarky - respondeu Frank -, mas não temos quaisquer provas de que esteja envolvido nisto. Precisamos é de provas, e vamos procurá-las!

- Têm alguma ideia daquilo que há que procurar? - quis saber Chet.

- Uma coisa qualquer. Certamente que os ladrões não deixaram um cartão de visita, mas talvez uma pista, sem darem por isso.

Joe inclinou-se e apanhou um papel esverdeado de entre as tábuas do cais. - Aqui está qualquer coisa... Uma nota de dólar! Pode não nos ajudar a solucionar este caso, mas servirá para encher o meu mealheiro. Achei-a, é minha!

A nota estava muito bem dobrada. Joe abriu-a, alisou-a e preparava-se para a guardar no bolso quando algo lhe atraiu a atenção.

- Frank! Chet! - disse para os outros. - Tem aqui qualquer coisa escrita. Parecem-me letras.

Debruçaram-se os três sobre a nota e Joe apontou para as palavras ONE DOLLAR (um dólar), escritas em grandes maiúsculas em baixo.

- Olha para o e de one. Por baixo alguém escreveu um i deitado e, por baixo, ainda a letra gê.

- Repara nisto - acrescentou Frank -, o primeiro esse de states está dentro de um círculo. O mesmo sucede com o erre de América. Joe, já percebi. São as iniciais esse-erre.

- Sam Radley! - exclamou Joe. - Deve ter deixado cair a nota para nos dar uma pista!

- E o resto da mensagem? - perguntou Chet. Frank examinou cuidadosamente a nota.

- Talvez estejamos a ler na posição errada. Deixa experimentar de lado. Ora, cá está, o ene de one deixa de ser um ene e passa a ser um zê. Não é isto?

- Exactamente - concordou Joe. - E com o i e o gê lemos zig!

- Zigurski! - exclamou Frank, excitado. - O Garra e o seu bando apanharam o Sam Radley!

Joe estava galvanizado.

- Vamos procurar melhor por aqui. Talvez encontremos qualquer coisa! Ele deve ter querido deixar-nos uma pista bem clara.

Como não encontraram mais pistas no cais, os rapazes desceram uma escada de madeira até à altura em que a água chegava aos pilares do molhe. Papéis, pausinhos e outros detritos flutuavam à superfície.

- Parece-me que estou a ver ali qualquer coisa - disse Frank.

Desceu até ao último degrau da escada e agarrou-se firmemente ao corrimão. Depois inclinou-se e retirou um objecto castanho da água.

- Olha, Joe, uma carteira!

Voltaram novamente para o cais. Frank abriu a carteira para examinar o conteúdo. Num dos lados viu as iniciais SR em letras de ouro.

- Sam Radley! - murmurou Chet.

- Não há muitas dúvidas a respeito disso - replicou Frank. - Mas esta vai ser a prova final.

Tirou cuidadosamente os papéis que se encontravam no interior da carteira. Estavam empapados de água, mas continuavam a ser legíveis. Frank pegou numa carta de condução e mostrou-a aos outros.

O nome Radley era perfeitamente claro!

Frank mostrou-se preocupado.

- Agora temos a certeza de que o Sam se encontra em poder do bando do Zigurski! E eles julgam que é o nosso pai!

- Isso significa que o Sam corre grande perigo! - concluiu Chet. - Sem dúvida - concordou Joe. - Mas para onde o terão levado?

- Palpita-me que está no hydrofoil - disse Frank. - O Sam deve ter deixado cair a carteira antes de entrar para o barco, para evitar que os raptores descobrissem a verdadeira identidade dele. Pode ter-se dado o caso de lhe chamarem Fenton Hardy e ele ter decidido deixá-los continuar nesse erro.

- Isso significa que precisamos de descobrir o Flying Express o mais depressa possível para libertar o Sam antes que seja tarde.

O sol estava quente. Espalhara-se em Providence a notícia do desaparecimento do hydrofoil e começaram a afluir ao cais curiosos, que murmuravam entre si, informando-se do que tinham ouvido dizer.

- Era aqui que ele estava - dizia um homem, olhando para o ancoradouro do Flying Express.

- Deve estar enfeitiçado! - sugeriu outro. - Tem tido tantos acidentes!

- Voltará a fazer viagens para Bayport ou terá desaparecido para sempre? - dizia outro.

- Estas conversas desanimam-me - murmurou Frank. - Parece que o senhor Given voltou. Vamos ver se ele já soube mais alguma coisa das autoridades.

Era óbvio, ao vê-lo, que Given não dormira. Tinha grandes olheiras e uma expressão tensa.

- Não - respondeu ele à pergunta dos rapazes -, não voltei a ter qualquer contacto com a polícia ou a Guarda Costeira! Parece que o Flying Express desapareceu da face da terra!

- Ainda só estão a tratar do caso há umas horas - fez notar Frank.

- E foi durante a noite! - acrescentou Joe. Chet começou a dizer algo sobre a conjunção dos planetas em Peixes - o signo de Given - mas Joe deu-lhe uma cotovelada e sussurrou:

- Não é altura de falar de astrologia!

Nessa altura apareceu Malarky Grande, rodeado de um grupo dos seus vigilantes mal encarados. De pernas afastadas e com as mãos na cintura, olhou para Given com um sorriso trocista.

- Então? O Flying Express bateu as asas? Mas que pena!

Given ficou vermelho de raiva.

- Você não ficará a rir-se por muito tempo, Malarky! Vou mandá-lo prender sob a acusação de danos e roubo. O Flying Express foi roubado por si!

Malarky deixou de sorrir.

- Está a insinuar que sou um ladrão? Seu patife, devia atirá-lo para a água!

- Experimente! Experimente! - exclamou Given, esquecendo a sua decisão de não enfrentar um adversário maior do que ele.

Malarky empurrou-o até à borda do cais. Chet interpôs-se entre os dois e apanhou o soco de Malarky em cheio no peito.

O rapaz caiu para trás, bateu com a cabeça na beira do molhe e mergulhou na água.

- Ele está inconsciente! - gritou alguém. - Vai afogar-se!

Frank e Joe saltaram os dois para a frente, mas um homem que se encontrava entre a multidão lançou-se à água ainda antes deles. Emergiu rapidamente e agarrou Chet pelos ombros, puxando-o para a escada. Com a ajuda de uma dúzia de mãos, o rapaz foi içado para o cais. Um polícia que ali se encontrava prestou-lhe os primeiros socorros. Quando o salvador de Chet saiu da água, os Hardy soltaram uma exclamação de assombro. Era Henry Chassen!

- Parece que ficamos com outra dívida de gratidão! - disse Joe.

Chassen sorriu modestamente.

- Não tem importância. Vocês também iam para o salvar. Eu apenas cheguei primeiro porque estava mais perto. Ainda bem que o Chet já está a recuperar os sentidos!

- Julgámos que tinhas saído da cidade, visto não teres aparecido mais na Vestimenta nem onde estavas hospedado. A dona da pensão disse que não sabia onde te encontravas.

- Fui pintar umas paisagens do cabo. Um dia de viagem para sul, nada mais.

- Não foste por acaso com o Rance Nepo?

- Não. Creio que ele está de férias. Porque perguntam?

Frank e Joe explicaram-lhe porque suspeitavam de Nepo. Chassen mostrou-se surpreendido e acrescentou:

- Realmente não o conheço muito bem. Comprei algum equipamento na loja dele, mas foi tudo.

- Oh, a minha cabeça! - gemeu Chet, sentando-se.

Ficara apenas com um galo na cabeça, mas a cara redonda tinha uma expressão de dor.

- Estás bem, Chet? - perguntou ansiosamente Chassen.

- Estou, e a ti o devo, se bem entendi. Foste tu que me pescaste. Lembra-me de fazer o mesmo por ti um dia!

Frank, Joe e Chet voltaram para casa para o último vestir roupa seca. Joe telefonou para a ilha do Tubarão para falar com o pai.

- Pai, tinha razão a respeito do Zigurski! Contou o desaparecimento do hydrofoil e das pistas que tinham descoberto no cais.

- A nota de dólar e a carteira do Sam Radley apontam para a conclusão de que...

- O bando do Zigurski tem o Sam Radley em seu poder! - exclamou o detective de Bayport. - Não merece a pena voltar a dizê-lo. Agora temos de agir depressa. Vou pedir à polícia da Florida que ponha o Zigurski sob vigilância, se ele ainda lá estiver.

- O que é que nós podemos fazer?

- Vão à prisão estatal e falem com o director. Visto o Zigurski ter cumprido pena ali, o director é capaz de fornecer informações preciosas.

- Está bem, pai - disse Joe. - E que fazemos a respeito do Sam?

- Mantenham-se calados durante um tempo. Deixem que o bando do Zigurski pense que me apanhou, Isso talvez venha a estragar-lhes os planos.

- É tudo, pai?

- Por agora, sim. Os meus cumprimentos para ti e para o Frank pelo trabalho que têm feito!

Frank e Joe dirigiram-se logo a seguir à esquadra para saberem se havia alguma novidade. Não havia. Preparavam-se para ir embora quando ouviram uma grande algazarra. Era uma escolta da polícia que trazia Malarky Grande. Fora detido sob acusação de ter intimidado Given.

O director da Fidelo Corporation ouviu ler as acusações que lhe eram feitas de sobrolho franzido. Subitamente ergueu os braços, bateu nos dois polícias que o ladeavam e fê-los cair como dois pinos do jogo do bowling!

Malarky correu para a porta, mas Frank atingiu-o com um soco e Joe pendurou-se-lhe nos ombros. Os agentes ajudaram o homenzarrão a levantar-se e ele ficou ali parado a espumar de raiva.

Voltando-se para os Hardy gritou:

- Hei-de ajustar contas com vocês, nem que seja a última coisa que eu faça na vida!

 

Os Hardy meteram-se no carro de Callie e dirigiram-se ao estabelecimento prisional, que ficava situado numa região acidentada a cerca de 80 quilómetros de distância.

- Detestaria tentar evadir-me de uma prisão como esta - comentou Joe, apontando para os muros altos com torres de vigia onde se viam sentinelas armadas.

- Nem mesmo o Zigurski se arriscou - disse Frank. - Cumpriu grande parte da pena e só saiu em liberdade condicional.

O guarda de serviço junto do portão exterior examinou as credenciais deles.

- Vocês são filhos do Fenton Hardy? Isso vale por um passe. Um dia o vosso pai ajudou-nos a capturar um fugitivo.

Indicou-lhes a porta do edifício da administração. Um secretário acompanhou-os ao escritório do director da prisão, Scott Ogburn, que lhes apontou duas cadeiras, convidando-os a sentar-se.

- Em que lhes posso ser útil? - perguntou o director.

Frank explicou:

- Vimos cá por causa de um ex-presidiário que cumpriu pena aqui.

- Nome?

- Zigurski.

Ogburn sorriu sombriamente.

- Vocês andam metidos em altas cavalarias! O Zigurski é um dos criminosos mais perigosos que por aqui passou. Tenho pena de não me ser possível apresentá-lo. Está em liberdade condicional.

- Nós sabemos disso. Mas a verdade é que ele é um dos principais suspeitos no caso que estamos agora a tratar. No entanto, pouco conseguimos adiantar se não tivermos mais informações.

O director dirigiu-se para um arquivo, tirou de lá uma pasta e começou a folhear os papéis que continha.

- É o dossier do Zigurski - disse, lendo para os dois rapazes os antecedentes de Zigurski. - Quando saiu da prisão foi para Miami, na Florida - concluiu.

Nada do que o director da prisão lhes contou foi novidade para os Hardy e Frank mostrou-se desapontado.

- Pode dizer-nos alguma coisa a respeito da personalidade dele? - perguntou. - Ou sobre os amigos dele, por exemplo.

- Bem - disse Ogburn, pensativo. - O Zigurski tinha um passatempo com que se entretinha aqui na prisão: astrologia.

Os jovens detectives entreolharam-se, divertidos. “Se o Chet aqui estivesse!...” - pensou Joe. E em voz alta disse: - Astrologia, senhor director?!

- Sim. O Zig estudava as estrelas e as influências planetárias. Estava tão interessado nos signos do Zodíaco que os outros presos lhe puseram a alcunha de Zig Zodíaco. Dizia que não fazia coisa alguma sem consultar o seu horóscopo.

- Levava realmente tão a sério a astrologia? - perguntou Frank.

- Venham comigo e eu mostro-lhes até que ponto ele levava isso a sério.

Ogburn conduziu os dois irmãos pelo edifício da administração e entraram num bloco de celas. Os presos olhavam-nos por detrás das grades, vendo-os seguir pelo corredor.

O director levou os Hardy até uma cela vazia.

- Esta não voltou a ser ocupada desde que o Zigurski daqui saiu. Ele deixou-nos uma recordação. Vejam neste canto.

Na parede havia uma série de desenhos a tinta preta.

- Os signos do Zodíaco! - exclamou Frank.

- Estão tão bem desenhados - observou Joe. Ogburn concordou.

- O Zigurski mostrava um interesse excepcional pelo assunto e, é claro, tinha muito tempo para se documentar. Vamos à biblioteca. Podem ver os livros que ele lá ia buscar.

O ajudante do bibliotecário, que era quem ali se encontrava na altura, parecia mais um professor universitário do que um falsificador condenado.

- Zigurski? - disse o homem. - Lembro-me bem dele. Vinha aqui regularmente e queria só livros sobre astrologia. Cheguei a pedir livros emprestados a outras bibliotecas para ele.

- Tinha algum livro preferido que lesse mais do que os outros? - perguntou Joe.

- Sim, sim. É verdade. Era este!

O homem tirou um volume de uma prateleira e entregou-o a Joe.

O rapaz olhou para o título: Astrologia Básica. Folheou o livro.

- A que signo disse o Chet que o Zigurski pertencia?

- Caranguejo - respondeu Frank.

Joe abriu no capítulo sobre o signo do Caranguejo. Perto do título estava escrito a lápis: “ZIG, Mil-waukee, 20 de Julho, 23.00 h.”

- É a caligrafia do Zigurski - disse o bibliotecário secamente, como que para mostrar o seu desagrado por ele ter escrito nos livros da biblioteca.

- Estes devem ser os dados de ele próprio - observou Joe. - O sítio onde nasceu, o dia do mês e a hora.

Frank concordou.

- Lê o capítulo para ver que género de conselho ele tirou daí.

Joe leu em voz alta:

- “Um indivíduo do signo do Caranguejo não é impulsivo. Planeia cuidadosamente as suas acções futuras, por mais tempo que demore. Sendo dominado pela Lua, o signo do Caranguejo é favorável a empreendimentos relacionados com a água, especialmente baías e angras onde a Lua governa as marés. Leva o seu tempo a decidir-se mas depois actua vigorosamente.”

Joe fechou o livro.

- Isto pode explicar por que motivo o Zigurski nunca tentou evadir-se. Esteve à espera da altura de sair em liberdade condicional.

Frank fez que sim com a cabeça.

- E o horóscopo dele previa êxito para os seus empreendimentos quando saísse da prisão. Dirigiu-se logo para a costa para iniciar novas actividades ilegais.

Enquanto os rapazes falavam, outro preso que ali trabalhava foi-se aproximando deles. Fingindo ler, ficou a ouvir atentamente os comentários a respeito de Zigurski Garra.

Joe reparou nele e estava prestes a dizer qualquer coisa quando o director da prisão falou:

- Quando acabarem de ver o livro, vou mostrar-lhes o resto da prisão, para o vosso famoso pai ficar a saber que os criminosos que ele apanha estão em boas mãos!

Saíram da biblioteca e atravessaram o refeitório e a lavandaria para chegar à área de recreio. Joe olhou de relance para trás e notou que o preso que estivera à escuta os seguia de longe, mas, percebendo que fora visto, o homem entrou noutra sala.

No entanto, quando o grupo prosseguiu, ele reapareceu e andou perto deles durante toda a volta pela prisão.

Por fim, Joe achou que devia avisar o director.

- Estamos a ser seguidos - disse, apontando para o preso.

- O Martin? - perguntou Ogburn. - Não lhe preste atenção. Ele era amigo do Zigurski, mas nunca nos causou qualquer problema. Provavelmente tinha que fazer para este lado da prisão.

O director empurrou outra porta e anunciou:

- Este é o sector de que muito nos orgulhamos: a oficina.

Entraram numa sala enorme que fervilhava de actividade. Os presos manejavam ferramentas eléctricas, quase todas modelos industriais, pesados e bem sólidos. Alguns esculpiam peças de madeira para decoração de interiores e exteriores. Outros cortavam as diferentes partes de mesas, cadeiras, estantes e armários.

- Estão a aprender um ofício para poderem trabalhar quando saírem daqui e precisarem de ganhar a vida honestamente.

Frank foi observar uma guilhotina gigantesca que ninguém estava a usar. A comprida lâmina mantinha-se suspensa por cima de uma folha de metal colocada sobre a base. O rapaz admirou as belas linhas da máquina e inclinou-se para a frente. Nisto, a lâmina estremeceu.

- Cuidado, Frank! - gritou Joe.

Agarrou o irmão por um braço e deu-lhe um puxão que o fez cair. Não apanhando por pouco a cabeça de Frank, a lâmina foi cortar a folha de aço que tinha por baixo.

Enquanto Frank, trémulo, se levantava, Joe olhou em redor para os presos que se encontravam mais perto da máquina.

O director voltou-se e fitou-os.

- Quem pôs a máquina a funcionar? - perguntou.

Ninguém respondeu. Ouviu-se barulho do lado de fora da porta e logo a seguir apareceram dois guardas trazendo Martin.

- Vimo-lo destravar a máquina e depois sair a correr - explicou um dos guardas.

- Diga-me porque fez isso! - ordenou Ogburn. O preso deitou-lhe um olhar encolerizado.

- Não direi nada - respondeu com mau modo.

- Levem-no para o meu gabinete - disse o director para os dois guardas. - Lamento o sucedido - continuou, voltando-se para Frank e Joe. - Parece que me enganei a respeito do Martin. Pelos vistos, ele continua a estar do lado do Zigurski. É mais uma informação que levam convosco.

- Espero que o Martin não saia em liberdade condicional dentro em breve - comentou Frank.

- Não tenha receio disso - replicou enfaticamente o director. - Ainda lhe falta muito tempo para sair daqui!

- Sempre é algum conforto! - retorquiu Joe. Os Hardy saíram da prisão e dirigiram-se para Providence.

- O Martin tem demasiada imaginação para andar à solta. Quem se lembraria de utilizar a guilhotina como arma?

Frank concordou.

- A propósito, lembra-te de me dizeres para te ajudar quando te encontrares numa situação assim perigosa.

- Claro, maninho. Agora vamos à marina para pormos o Chet ao corrente daquilo que soubemos de Zig Zodíaco.

Chet ficou excitadíssimo quando soube as notícias.

- Com mil demónios! Isso altera tudo. Agora sei o que o Gancho irá fazer!

Joe mostrou-se céptico.

- Como é isso?

- Olha. O aniversário de Zigurski aproxima-se. Nenhum nativo do signo do Caranguejo no seu perfeito juízo se lembraria de empreender qualquer acção agora. Aposto dez para um que o Zig Zodíaco está escondido até passar a altura do seu aniversário. Logo a seguir será uma boa ocasião para agir e...

- Está bem - interrompeu Joe -, imaginemos que vai estar tudo sossegado até ao dia dos anos dele. O que sucederá então?

- Pode suceder qualquer coisa! - declarou Chet. Frank estava muito sério.

- Isso permite-nos fazer uns cálculos. O Zigurski nasceu às onze da noite. Poderá então atacar por volta da meia-noite. Nessa altura o signo do Zodíaco torna-se favorável e ele não é do tipo de esperar mais do que o necessário.

Frank dirigiu-se para o telefone, ligou para Spencer Given e foi informado de que o Flying Express ainda não fora encontrado. Em seguida ligou para o pai, na ilha do Tubarão.

- O Zigurski desapareceu - informou Fenton Hardy. - A polícia seguiu-o até ao aeroporto de Miami e perdeu-lhe a pista. Tu e o Joe devem dirigir-se para lá para ver se conseguem descobrir alguma coisa.

- Para Miami?

- Sim. E o mais depressa possível.

Os Hardy meteram-se no carro de Callie e foram estacioná-lo na marina Estrela do Mar, onde ela poderia ir buscá-lo. Em seguida apanharam um táxi para o aeroporto de Providence e tomaram um avião para Miami.

- Primeiro vamos inquirir das reservas nos diferentes balcões - lembrou Joe quando o avião deslizava já pela pista do terminal. - Tu ficas com os voos internos que eu trato dos internacionais.

Depois de várias tentativas, Frank chegou junto do balcão da Coastal Airways, uma companhia que fazia voos entre Miami e o Canadá. O funcionário abanou a cabeça ao ouvir o nome de Zigurski, mas a descrição do indivíduo fez-lhe lembrar qualquer coisa.

- Um homem com uma mão de aço? - exclamou o homem. - Embarcou um senhor chamado John Read.

- Para onde foi?

- Comprou um bilhete para Boston.

Frank apressou-se a ir contar a Joe o que soubera.

- É melhor irmos já atrás dele! - disse Joe, entusiasmado.

- Vamos! Devemos ter o tempo à justa para apanhar o próximo voo para o Massachusetts!

Dali a pouco, o avião elevava-se no ar e dirigia-se para norte. Os Hardy desapertaram os cintos de segurança, bocejaram e instalaram-se confortavelmente para a viagem.

Um momento depois a voz do piloto soou no altifalante.

- Lamento, senhoras e senhores, mas vamos regressar a Miami. É favor apertarem os cintos e não fumarem.

Não houve mais explicações mas generalizaram-se as conversas entre os passageiros num tom de excitação contida. Mal aterraram, todos tiveram que deixar o aparelho. Foram encaminhados para o edifício do terminal, onde um representante da companhia aérea lhes falou. Pediu desculpa pelo atraso e explicou:

- Recebemos a informação de que havia uma bomba escondida a bordo. O avião será revistado imediatamente.

Os passageiros mostraram-se assombrados. Joe virou-se para Frank:

- Achas que um dos homens do Zigurski nos terá seguido?

 

- Creio que sim - respondeu Frank com expressão preocupada. - Agora somos nós os perseguidos. O Garra conseguiu deter-nos.

- Sim. Se não fosse a ameaça da bomba, estaríamos agora a caminho de Boston em vez de ficarmos aqui parados.

- É melhor isso do que explodir no ar - retorquiu Frank. - No entanto pode ter sido um falso alarme. O Zigurski provavelmente quis demorar-nos para ter tempo de realizar os seus intentos.

- É verdade, Frank. Vejamos primeiro se encontram alguma bomba a bordo do aparelho.

A bagagem fora toda retirada do avião e os peritos revistavam minuciosamente o grande jacto. Carros da polícia e dos bombeiros enchiam a pista. Um camião do aeroporto esperava com o depósito cheio de espuma química para o caso de vir a dar-se uma explosão.

- Descobriram alguma coisa? - perguntou Frank daí a pouco ao chefe dos peritos que procediam às buscas.

- Até agora nada. Mas não podemos dar a este aparelho um certificado de garantia até termos examinado cuidadosamente cada centímetro quadrado.

Os Hardy voltaram para a sala de espera.

- Vamos telefonar ao Chet - sugeriu Frank. - Sempre dá para saber o que se está a passar na marina Estrela do Mar.

- E podemos informá-lo sobre o que está a suceder aqui - acrescentou Joe.

Entraram numa cabina telefónica. Joe marcou o número. Passado um momento ouviram a voz de Chet do outro lado da linha. O rapaz ficou surpreendido por ouvir a voz dos amigos.

- Julgava que estivessem a voar em pleno azul. Por aqui tudo calmo. A excitação toda deve ter ido convosco!

- Excitação é a palavra adequada - retorquiu Joe, passando a contar como tinham recebido um aviso de bomba no avião.

Chet soltou um assobio.

- Isso significa que vão na direcção certa! Estão a aproximar-se do Zig Zodíaco e ele quer mantê-los longe.

- Também julgamos isso - declarou Frank. - Mas tencionamos continuar a persegui-lo.

- E se me deixassem dar-vos uma ajuda? Vou ter uns dias de folga, devido a ter feito horas extraordinárias. E se eu fosse ter com vocês a Boston, como reforço?

Os Hardy concordaram, satisfeitos, e Joe avisou:

- Arriscamo-nos a ficar com uma batata quente nas mãos quando encurralarmos Zigurski.

Chet riu.

- Não se esqueçam de que sou perito em lidar com batatas quentes, embora prefira batatas fritas. Mas talvez seja melhor reduzir essa a puré.

Joe soltou uma gargalhada.

- Puré de Zigurski era um prato que eu gostava de ver. Mas isto não é brincadeira, Chet. Trata de vir preparado para um trabalho difícil.

Chet respondeu com gravidade:

- Com certeza. Onde é que nos encontramos? Joe e Frank trocaram impressões e acharam que deveriam encontrar-se no motel do aeroporto de Boston às 7 da manhã seguinte. Chet prometeu estar lá.

O aparelho acabara de ser revistado, as bagagens voltaram para bordo e os passageiros reocuparam os seus lugares. O avião partiu finalmente para norte.

- Chet faz-nos falta - disse Frank, depois de ele e Joe se encontrarem de novo instalados. - Se o Zig está em Boston, é provável que o Flying Express se tenha dirigido para lá, levando o Sam Radley a bordo, e nós não sabemos quantos homens o Garra tem com ele.

- Se calhar arranjaram um ponto de encontro ao longo da costa - observou Joe. - Podemos ter de enfrentar um bando de duros. Nessas ocasiões é que é giro ver o Chet utilizar o seu peso.

Passado um bocado, Frank apontou pela janela.

- O tempo está óptimo para viajar de avião, Joe. Olha para o cabo Cutlass lá em baixo.

Por baixo deles, a terra e o mar estendiam-se em cores suaves. Nem uma nuvem no céu. Distinguia-se cada curva e meandro da costa em todas as direcções. A paisagem ia mudando à medida que o avião rumava velozmente a norte.

Joe instalou-se mais confortavelmente para passar pelo sono.

- Acorda-me quando chegarmos a Boston - disse.

Logo que o avião aterrou, os Hardy dirigiram-se para o motel do aeroporto e deitaram-se cedo.

Na manhã seguinte, muito cedo, ouviram bater à porta.

Frank olhou para o relógio.

- O Chet vem cedo. Ainda são só seis horas.

Joe foi até à porta e abriu-a.

- Henry Chassen! - exclamaram os dois irmãos ao mesmo tempo.

O artista sorriu como que a desculpar-se e entrou.

- Lamento desapontá-los. Sei que estavam à espera do Chet Morton. Vim substituí-lo.

- Sucedeu alguma coisa ao Chet? - perguntou Joe.

- Nada. Ele contactou comigo e disse-me que andava a perseguir os ladrões de barcos. Achou que não devia abandonar o caso.

Frank coçou o queixo.

- É o melhor a fazer realmente. Se os criminosos se encontram à vista, há que não perdê-los de vista.

- E como é que vieste substituí-lo? - perguntou Joe.

Chassen abriu os braços como para dizer que a explicação era muito simples.

- Acabei o meu trabalho para a Vestimenta. Por isso, quando o Chet me pediu que o substituísse junto de vocês, não tinha qualquer impedimento. Ah, é verdade, ele deu-me um recado para vocês.

Os Hardy até se inclinaram para a frente, cheios de interesse.

- Aqui está. A pista conduz a uma cidade na costa do Maine. Um sítio chamado Penedo Alto. Há-de lá estar um tipo da polícia à vossa espera com uma informação vital!

Frank ficou entusiasmado.

- Dá a impressão de que o Chet descobriu o rasto do Flying Express!

Joe parecia céptico. Apesar de ter afastado as suas primeiras suspeitas de Chassen, sentiu subitamente que algo podia estar mal. Dizendo que precisava de fazer um telefonema, dirigiu-se para a recepção e marcou o número da marina Estrela do Mar. Nem um som se ouviu do outro lado. Nem mesmo a telefonista conseguiu estabelecer a ligação. Desistindo, Joe voltou para o quarto.

- Está preocupado com alguma coisa? - perguntou Chassen, vendo a expressão sombria de Joe.

- Bem, tentei falar com o Chet para saber se ele tinha mais notícias a dar-me, mas não consegui obter ligação.

O artista sorriu com ar entendido.

- Não estejas alarmado. Houve ontem um grande temporal na área do cabo Cutlass. Uma valente trovoada e ventos ciclónicos. Muitos fios telefónicos e eléctricos foram deitados abaixo.

- Sim?! - exclamou Frank. - O tempo estava perfeitamente claro quando sobrevoávamos toda a zona em direcção a Boston!

- O temporal surgiu mais tarde - explicou Chassen.

- Bem, o melhor é partirmos quanto antes para o Penedo Alto - sugeriu Frank. - Não percamos tempo.

Saíram os três do motel e encaminharam-se para uma garagem que alugava carros e que ficava logo à esquina. Frank parou repentinamente.

- Esperem um minuto - disse. - Esqueci-me de uma coisa. Volto já!

Entrou no edifício do motel e subiu os degraus dois a dois até chegar ao quarto. Pegando num talão de lavandaria que achou ali, escreveu nas costas: “Chet - Penedo Alto, Maine.” Deixou o papel em cima da mesa, preso por um cinzeiro. Depois telefonou ao gerente e pediu-lhe para deixar Chet Morton entrar no quarto deles logo que chegasse.

“Serve, no caso de a história do Chassen ser falsa” - pensou Frank.

Depois juntou-se aos outros e todos se dirigiram para a garagem.

Frank sentou-se ao volante do carro alugado. Joe instalou-se do lado oposto e Henry Chassen ao meio. Fizeram um bom tempo no percurso do Massachusetts para o Maine.

- É uma experiência nova para mim esta de seguir a pista de criminosos até ao seu esconderijo - comentou jovialmente Chassen, quando retomaram a estrada depois de uma paragem para almoçar. - No entanto, para a família Hardy deve ser rotina.

- Temos trabalhado nalguns casos - admitiu Joe.

- De tempos a tempos damos uma ajuda ao pai - acrescentou Frank.

- Como está ele agora?

Frank concentrou-se na estrada, pisou o acelerador e ultrapassou um tractor que seguia devagar, rente à berma da estrada.

- Nos últimos dias perdemos o contacto com ele - respondeu.

- Ainda se encontra na ilha do Tubarão, não é?

Frank franziu o sobrolho.

- Talvez sim ou talvez não. Não sabemos nada.

- Talvez tenha sido ele a descobrir a pista do Maine - insistiu Chassen.

- É possível.

- Não tiremos conclusões precipitadas - disse Joe. - Recordemos o aviso do Chet! As estrelas não propiciam apreciações apressadas.

Uma tabuleta com o nome “PENEDO ALTO” surgiu na frente deles.

- Vira aqui - indicou Chassen. - Esta estrada secundária leva-nos ao desvio que vai dar ao celeiro onde o tipo da polícia estará à nossa espera depois do escurecer.

Meteram pela estrada estreita e andaram cerca de oito quilómetros até que o artista apontou um caminho de terra batida que seguia para a esquerda. Frank, sem comentários, obedeceu às instruções de Chassen e estacionou junto de um pequeno pinhal. Desligou o motor e guardou as chaves do carro no bolso.

- O Joe e eu vamos dar uma vista de olhos por aqui - disse Frank. - Queremos ver isto antes que escureça totalmente.

- Está bem - respondeu o artista. - Eu fico no carro.

Quando se encontravam a uma centena de metros, no meio do arvoredo, Frank fez parar Joe e murmurou:

- Nós não vamos voltar para o carro. Podemos ficar a saber mais coisas sozinhos. Além disso já não confio no nosso amigo.

- Nem eu - respondeu Joe.

Esperaram que escurecesse e então avançaram cautelosamente pelo meio da mata até um velho celeiro. Era um edifício em ruínas rodeado de ervas altas e cujas paredes, de tábua, estavam todas roídas na base.

Uma claridade súbita dentro do celeiro mostrou-lhes que alguém acendera um candeeiro de querosene. Fazendo sinal a Joe para o seguir, Frank aproximou-se silenciosamente de uma janela. Contendo a respiração, os dois rapazes espreitaram por cima do parapeito.

À fraca luz do candeeiro viram dois homens em frente um do outro. Um deles tinha uma garra metálica no lugar da mão - Zigurski! O outro era Henry Chassen!

- Então, meu caro irmão - disse Zigurski rudemente -, onde está a mercadoria?

Chassen falou em tom defensivo:

- Escaparam-se. Não sei onde estão, mas não podem ter ido longe.

A resposta veio como um trovão.

- Seu estúpido Capricórnio!

 

Frank e Joe entreolharam-se. Chassen era aliado de Zigurski! Mas este chamara-lhe irmão! Seriam parentes?

Chassen falou em voz alta.

- Não me chames estúpido! Cortei os fios telefónicos com a marina e trouxe os dois rapazes aqui para podermos deitar-lhes a mão, não foi?

- Estás a dizer que os trouxeste aqui? Onde é que eles estão? Não te devia ter entregue o caso.

- Então que fazemos agora?

- Provavelmente os Hardy trazem cá a polícia local e caçam-nos, se não andarmos depressa. Temos de nos pôr a andar daqui. Tens a chave do carro?

Chassen fez que sim com a cabeça.

- Guardei o duplicado que nos deram no sítio onde o alugámos.

- Está bem. Vamo-nos embora - resmungou Zigurski.

Apagou o candeeiro e a escuridão foi completa. Ouviram-se passos e a porta rangeu ao abrir-se.

Frank e Joe afastaram-se precipitadamente da janela. Correram pela mata, querendo chegar ao carro primeiro, para fugir. Ouviam Chassen e Zigurski atrás deles, pisando o restolho.

- O carro está ali! - murmurou Joe, ofegante. - Depressa! Eles ouviram-nos! Sabem que estamos aqui!

Frank resfolegava.

- Onde está a chave?

Procurou desesperadamente nos bolsos até a achar e, com um suspiro de alívio, tirou-a para fora. Nisto soltou uma exclamação abafada, pois deixara cair a chave. O pequeno objecto desapareceu no emaranhado de ervas.

- Não adianta procurá-la no escuro. Temos de fugir!

Os seus perseguidores aproximavam-se a correr. Frank e Joe ouviram então o ruído de uma motocicleta que se aproximava.

Vendo-os à luz dos faróis, o motociclista veio apressadamente ao encontro deles. Os pneus chiaram quando o velocípede parou de repente e o condutor tirou o capacete e apeou-se.

Chet Morton!

O rosto redondo e sardento do amigo abriu-se num sorriso.

- Encontrei o teu recado! Vim direito aqui nesta “maquineta” alugada! Parece que cheguei mesmo a tempo! Que se passa?

- Apaga essa luz! - ordenou Frank. Chet ficou sem compreender.

- Que diabo...

- Vamos embora daqui! - interrompeu Joe, saltando para o lugar de trás.

Frank sentou-se também, colado ao irmão, e Chet, percebendo que a situação era grave, tentou freneticamente pôr a motorizada em andamento. O motor não pegava!

- Tenta outra vez! - disse Frank.

Mas antes que Chet conseguisse pôr o motor a trabalhar, Zigurski e Chassen caíram sobre eles. Atacados pelas costas, Frank e Joe foram algemados antes de poderem defender-se.

Chet lançou-se sobre os atacantes. Atirou-se a Chassen e estava a dar boa conta do recado, quando a garra de aço de Zigurski se apertou em redor do pulso do rapaz e lhe torceu o braço atrás das costas até ele gemer de dor.

Mantendo Chet imobilizado, o ex-presidiário começou a dar ordens. Chassen pegou na motocicleta e foi escondê-la atrás de uns arbustos. Depois, tirando o duplicado da chave do carro, sentou-se ao volante e ligou o motor.

- Pronto, irmão - disse. - Estou pronto para partir quando quiseres.

- Meio-irmão - emendou Zigurski. - Não tornes o nosso parentesco mais chegado do que é!

- Então, trata-se de uma discussão de família? - disse Joe.

Chassen olhou-o com rancor.

- Talvez devesse ter-lhes tratado da saúde mais cedo. Na altura em que fiz um buraco no depósito de combustível do aparelho e os obriguei a aterrar na praia. Ou quando perderam os sentidos no barracão dos barcos.

- Por que não o fizeste? - retorquiu Frank.

- Os nossos planos exigiam que eu me mostrasse vosso amigo até estarmos prontos para entrar em acção - explicou Chassen.

- E foi por isso que me tiraste da água - disse Chet.

- É verdade. Agora já não faz mal contar a verdade.

Zigurski voltou-se para Frank:

- Entra para o banco de trás.

Em seguida Zig Zodíaco obrigou Chet a sentar-se ao meio e sentou-se ao lado dele. Joe tomou lugar à frente.

Chassen pôs o carro em andamento. Meteram pelo caminho de terra batida e dirigiram-se para a estrada principal.

Chet quebrou o silêncio.

- Agora já sei o que um peixe sente quando uma lagosta o prende com as suas garras - queixou-se.

- Foi o que ganhaste por meter o nariz nos meus negócios - retorquiu Zigurski. - Só trouxe duas algemas, destinadas aos Hardy. Tenho que te segurar eu próprio.

Enquanto falava apertou mais o pulso de Chet, que fez uma careta de dor.

- Já agora gostava de conservar o meu braço, se não se importa - disse Chet, tentanto gracejar. - Sou-lhe muito dedicado.

Zigurski esboçou um riso de troça. Os rapazes podiam agora examinar atentamente o seu captor.

Tinha uma farta cabeleira loura e uma grande cicatriz na testa. Os olhos azul-claros estavam em constante movimento, indicando que não confiava em ninguém. Os ombros e os braços eram musculosos. Abria e fechava a mão boa constantemente. A certa altura recostou-se para trás, com uma expressão de satisfação no rosto.

- Até aqui tem corrido tudo de acordo com o livro - disse, exultante.

- O livro sobre astrologia básica? - perguntou Joe.

- Como é que sabes isso? Bem, está tudo ali. Os astros estão favoráveis mas não para ti. É óptimo ser Caranguejo!

Chassen virou para a estrada e olhou para Zigurski pelo espelho retrovisor.

- Tem cuidado com o Morton! Ele também é Caranguejo!

- Sim? - Zigurski pareceu impressionado e ficou a pensar no assunto durante uns minutos antes de se descontrair. - Não se pode confiar nas estrelas para tudo - disse a Chet. - Tem de se trabalhar com elas. Deve ter feito asneira para se encontrar nesta embrulhada. Chet assumiu uma expressão solene.

- E se voltássemos ao cabo Cutlass para eu ir consultar o meu horóscopo?

- Está a brincar? O cabo Cutlass está fora de questão. Tenho os Hardy em meu poder e tenho-o a si como bónus.

- Onde vamos então? - perguntou Frank.

- Para o Flying Express. Tenho uma surpresa à vossa espera.

Chassen aumentou de repente a velocidade ao passar por um carro-patrulha. Joe podia ver pelo retrovisor lateral que o carro os ia seguindo.

“Vou aproveitar esta oportunidade - pensou. - Pode ser que seja a última!”

Atirou-se violentamente contra a porta, levando a mão ao fecho com a mão algemada, ansioso por atrair as atenções dos polícias que iam no carro-patrulha.

Chassen agarrou-o pelo colarinho e puxou-o com força, até ele não poder respirar.

Teriam os polícias reparado na luta dentro do carro? Aparentemente não. Viraram num desvio e saíram da estrada.

Joe recostou-se no assento, desanimado.

Zigurski riu.

- Percebem o que eu quero dizer? Os astros não se enganam!

Depois disto, reinou o silêncio enquanto rodavam velozmente para norte, pela estrada que seguia pela costa oriental do Maine. Finalmente, Chassen virou para um atalho que ia dar à praia. Aí, apagou as luzes e continuou o caminho à luz da lua cheia.

- Devemos estar perto - disse.

- Pois estamos - respondeu Zigurski. - Está ali.

Apontou para uma elevação que parecia um grande rochedo a erguer-se da água, não muito longe da praia.

Chassen parou o carro. Os cinco ocupantes saíram e caminharam sobre a areia. Quando se aproximaram do que lhes parecera um rochedo, perceberam que se tratava de uma inteligente obra de camuflagem, feita com madeira e lona! Por baixo da camuflagem encontrava-se ancorado o hydrofoil.

- Localizámos finalmente o Flying Express! - murmurou Joe.

- É pena não podermos transmitir a informação ao senhor Given - replicou Frank.

Uma lancha transportou o grupo para o barco. Henry Chassen inclinou-se diante dos três prisioneiros quando eles entraram no convés.

- Bem-vindos a bordo! - troçou.

Os Hardy repararam noutros membros do bando que andavam por ali e pareciam fazer preparativos para levantar a âncora.

- Antes de partir temos uma surpresa – disse Chassen, com a mesma expressão de troça. - Desta vez é obra minha. Identifiquei-o a partir da fotografia que tão estupidamente me mostraram.

- Tragam cá esse maldito Hardy! - ordenou Zi-gurski. - Rapazes, aqui têm o vosso famoso pai!

Dois homens corpulentos arrastaram um homem que se encontrava na cabina do piloto. Estava pálido e magro do mau tratamento, mas ergueu a cabeça sem vacilar.

- Olá, Sam - disse Frank calmamente. Zigurski ficou assombrado. Esforçou-se por dizer alguma coisa. Finalmente conseguiu murmurar - Co... como... é?...

- Muitos parabéns, senhor Zigurski! - exclamou Chet Morton.

 

Zigurski largou Chet e voltou-se para Chassen, furioso. A garra de ferro brilhou e o último gemeu quando sentiu o braço apertado.

Rugindo como um touro enraivecido, Zigurski arrastou o meio-irmão, que gritava aflitivamente, até à amurada e atirou-o pela borda fora.

- O que sucedeu? - perguntou alguém.

- Aquele idiota apanhou o homem errado na ilha do Tubarão. Não foi o Hardy que vocês estiveram a guardar. Foi o tipo que trabalha para ele.

Havia uma certa agitação na água, ou de Chassen se esforçava por voltar para bordo. Um dos membros do bando correu a ajudá-lo.

Esses momentos de distracção deram a Chet oportunidade para fugir. Saltou por cima da amurada, do lado oposto àquele em que Chassen caíra, mergulhou e nadou por baixo de água até à margem.

Zigurski ouviu-o mergulhar.

- Detenham-no! - gritou, quase fora de si. - Atirem sobre ele quando vier à superfície para respirar!

Trouxeram rapidamente espingardas da cabina do piloto e três dos homens começaram a disparar.

- Estão a aproximar-se demais para que Chet esteja seguro! - sussurrou Frank para Joe enquanto as balas choviam sobre a água. - Vamos tornár-lhes as coisas um pouco mais difíceis.

Dando um passo em frente, puxou o cotovelo de um dos atiradores.

- Desculpe estragar-lhe a pontaria - disse em tom sarcástico.

Imitando Frank, Joe e Sam atiraram-se para cima dos outros dois bandidos que tinham as armas. Os tiros perderam-se na água. Praguejando, os homens voltaram a carregar as armas.

Demasiado tarde! Chet saiu da água, correu para a margem e foi esconder-se atrás de uns arbustos.

Joe desafiou Zigurski:

- Era esta a sua grande surpresa? Arranjar um encontro com Sam Radley?

Zig franziu a testa.

- Eu ia enviar o vosso velho metediço para a Sibéria. Agora será o Radley a fazer a viagem levando os Hardy filhos como escolta!

- Nunca conseguirá tal coisa! - retorquiu Frank. - A Sibéria fica muito longe daqui.

Zigurski teve um sorriso malévolo.

- Sim, mas está uma traineira da Sibéria a pescar a poucas milhas daqui, em águas canadianas. Esta noite faremos a vossa transferência do hydrofoil para a traineira. E amanhã de manhã já irão a caminho!

Um feixe de luz rompeu as trevas.

- Morton chegou ao carro! - gritou Zigurski. - Acendeu as luzes de emergência. Partam-lhe os faróis, senão daqui a pouco teremos a Guarda Costeira em cima de nós!

Soaram tiros e as balas fizeram erguer tufos de areia em volta do carro. Chet conduziu o carro para a praia e parou-o junto de um enorme rochedo.

“Aqui é mais seguro! - disse para si próprio. - Vou ligar as luzes de emergência. Pode ser que a Guarda Costeira venha ver o que se passa.”

Zigurski correu pelo convés do hydrofoil, amaldiçoando Chassen, os prisioneiros e os homens do bando. A camuflagem foi retirada e o motor começou a funcionar. Quase logo, o Flying Express afastou-se da costa, ganhando velocidade.

Joe acotovelou Frank e apontou para um barco a motor que se via ao longe.

- Virão salvar-nos?

- É quase certo - respondeu Frank. - Não podem ter deixado de ver as luzes do Chet.

- Mas nunca nos apanharão! - disse uma voz triunfante por detrás deles. Era Zigurski, que ouvira a conversa. - Este barco não se deixará apanhar por nenhum outro - declarou. E, espreitando para dentro da cabina do piloto, gritou uma ordem: - A toda a velocidade!

O Flying Express aumentou rapidamente a distância entre si e o seu perseguidor. A atenção do grupo ficou momentaneamente concentrada na fuga e os três detectives foram esquecidos. Frank sussurrou para Sam e Joe:

- Precisamos de fazer parar o hydrofoil. Tenho uma ideia. Vamos tentar atingir os foils com os coletes de salvação.

- Já percebi - exclamou Joe, excitado. - Vamos tentar inutilizar os foils.

Sam meneou a cabeça.

- Tens razão. Eles estão mesmo à superfície, visto que o barco vai muito vazio. Eu vou criar uma diversão - propôs - enquanto vocês dois fazem pontaria aos foils.

Correndo para o convés da frente, Sam atacou um dos homens do grupo. Os outros caíram-lhe em cima. Daí a pouco estavam todos envolvidos numa luta desenfreada.

Tão depressa quanto lhes permitiam as algemas, Frank e Joe tiraram os coletes, com as respectivas cordas, dos nichos em que se encontravam. Apontaram para a água que se agitava lá em baixo... e falharam.

Freneticamente agarraram mais coletes. Os dois seguintes falharam e ainda outro. Não podiam perder tempo. Os homens do bando, percebendo o que queriam fazer, correram para eles.

Com mais um esforço, Frank atirou mais um projéctil. Uma corda foi prender-se na hélice e um segundo depois uma das pás partiu-se.

O hydrofoil perdeu velocidade e o seu casco pousou na água. O barco a motor aproximava-se rapidamente. Nesse momento viram também um helicóptero, e uma voz falou através de um altifalante, avisando que a Guarda Costeira ia descer para o barco.

Zigurski e os seus homens renderam-se sem oferecer resistência.

- Não se pode lutar contra as estrelas! - queixou-se amargamente Zigurski. - O que estará errado no Zodíaco?

- Nada - respondeu Joe. - Mas muita coisa está mal no Zig Zodíaco.

Um homem-rã da Guarda Costeira substituiu a pá partida da hélice por uma outra, que encontraram no armário das peças sobressalentes. Depois, o oficial que dirigia as operações deu ordem ao seu piloto para se dirigir para Portland.

Entretanto, os malfeitores foram algemados e informados dos seus direitos legais. Vendo que perdera a partida, Zigurski respondeu prontamente às perguntas dos rapazes.

- Sim, tenho sido eu que tenho dirigido os roubos feitos ao longo da costa. O Skee só agia quando eu lho ordenava!

- E como é que o hydrofoil entrou nos seus planos? - quis saber Joe.

- Perguntem ao meu inteligente irmão! Chassen falou num tom completamente derrotado:

- O Malarky queria o hydrofoil fora de acção. Pediu-me para o fazer desaparecer!

- E você apresentou o problema ao Zig? - disse Frank.

Chassen encolheu os ombros.

- O Zig é o homem forte da família!

- Eu pensei matar dois coelhos com uma cajadada - declarou Zigurski. - Ansiava por apanhar o Fenton Hardy, para me vingar de me ter feito prender. Quando os meus homens roubaram o Flying Express dei-lhes ordens para raptarem o Hardy.

- Tudo no mesmo embrulho e muito bem atado - observou Sam Radley.

No dia seguinte, Frank, Joe e Chet, acompanhados de Sam, voaram para o cabo Cutlass. O senhor Hardy esperava-os na vivenda, perto da marina Estrela do Mar, com Callie e Iola. Ficara muito aliviado ao saber que Sam Radley estava salvo.

Frank e Joe descreveram rapidamente como fora feita a recuperação do Flying Express e a captura de Zig Zodíaco e do seu bando.

- Excelente trabalho - elogiou o senhor Hardy.

- Entretanto consegui apanhar o grupo do Garra que fazia os roubos na ilha do Tubarão e aqui, e foi com a ajuda engenhosa e inesperada da Callie e da Iola.

Frank e Joe ficaram surpreendidos.

- Como foi isso? - perguntou Frank.

- Vimos o Rance Nepo sair da cave da Vestimenta - explicou Callie. - Ninguém na loja sabia que ele estava ali. Mas nós demos o alerta e o polícia de serviço da área apanhou-o quando ele tentava fugir.

- Foi o Nepo que vestiu os nossos casacos nos manequins - acrescentou Iola. - Julgou que ficaríamos todos tão desorientados que perderíamos o hydrofoil para Bayport. E, sem vocês a bordo, os homens deles estariam mais à vontade para danificar o Flying Express.

Fenton Hardy continuou a narrativa:

- O Malarky foi o responsável pelo avião que deixou cair o tronco em frente do hydrofoil e pelo barco que ficou partido ao meio. De facto pesam graves acusações sobre ele!

- Tais como o ter enviado o bulldozer que quase nos soterrou na cabana? - perguntou Frank.

- E o fogo que tanto assustou Given e os passageiros? - disse Joe.

- Sim. Foi ele que mandou fazer ambas as coisas.

- E a respeito dos motores de barco que desapareceram da garagem? - perguntou novamente Frank.

- Isso foi obra do Zigurski. Ele é que fez todos os planos para os roubos. Foi também ideia dele colocar o Chassen do nosso lado para nos espiar.

- E pensar que ao princípio acreditámos nesse palhaço! - exclamou Joe.

Frank levantou-se.

- Isso faz-me lembrar que devemos ir ao escritório do senhor Given contar-lhe as boas novas acerca do Flying Express.

Joe pôs-lhe a mão no braço. - Espera. Há um mistério que ainda não foi esclarecido. Sam, o que é que apurou sobre as placas de matrícula de há vinte anos, que encontrámos no barracão dos barcos onde estivemos aprisionados?

Sam Radley sorriu.

- É inacreditável, mas foram passadas para a vossa tia Gertrude!

Os dois irmãos ficaram assombrados.

- Deve estar a brincar - disse Joe.

- Não, é a pura verdade - retorquiu Sam. Fenton Hardy começou a rir.

- A tia Gertrude vai ficar admirada quando souber que esteve envolvida neste mistério. Nem vai acreditar!

- Imaginem! Nós a fazermos investigações por causa da tia! - exclamou Frank. - Essa tem graça!

O senhor Hardy abanou a cabeça:

- A minha irmã gostava muito de conduzir o automóvel dela, nos seus tempos. De uma forma muito senhoril, claro. Tinha um carro verde. Uma vez até foi multada.

- Por excesso de velocidade? - perguntou Joe.

- Não. Ia a conduzir com demasiada lentidão na auto-estrada.

Quando todos pararam de rir o senhor Hardy perguntou:

- Diga-nos, Sam, como é que seguiu a pista das chapas de matrícula?

- Bem - começou Sam -, primeiro fui à secção de veículos motorizados, mas não tinham lá qualquer registo sobre as placas. Perderam-se todos os registos num incêndio, há anos. Finalmente, por intermédio de um amigo, localizei um homem cujo passatempo é coleccionar chapas de matrícula. Quando era rapaz, tinha encontrado aquelas num caixote de lixo onde a vossa tia as deixara.

- Não era ele o dono do barracão? - sugeriu Joe.

- Bom, foi durante um certo tempo. Foi ele que colocou as placas na porta do armário onde vocês as encontraram. Deixou-as lá quando vendeu o barracão e ninguém se incomodou em tirá-las dali.

Frank tinha uma última pergunta a fazer.

- Foi você que encontrou o barracão dos barcos, não foi, Sam?

- Sim, fui eu.

- Há ali ao pé algum letreiro de néon vermelho?

- Não é um letreiro de néon, mas sim um sinal com lâmpadas vermelhas, daqueles que as empresas construtoras de estradas utilizam. Está a ser feita uma nova estrada naquela zona. O aviso é grande e por isso é que viram o seu brilho por detrás do barracão dos barcos.

- E o que dizia o aviso?

Sam riu.

- Dizia “Fim da estrada”.

 

                                                                               Franklin Dixon 

 

 

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