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PAIXÕES PROIBIDAS / Brenda Scot
PAIXÕES PROIBIDAS / Brenda Scot

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

PAIXÕES PROIBIDAS

 

         O velho Ford do Dr. Woodlite atravessou o caminho que conduzia a Royal Crest. Uma fila de sicômoros ladeava o caminho proporcionando aos viajantes uma sensação de frescura. Woodlite lembrou‑se de ter feito esse percurso várias vezes nos últimos trinta anos. Era médico dos Thompson e, na verdade, também do resto da população de Mere. Orgulhava‑se de ter trazido ao mundo a maior parte dos actuais habitantes. Jessie era um exemplo. Contudo, recordava o ar de infelicidade de Andrew Thompson quando lhe comunicaram que a sua mulher tinha tido uma menina. Pouco tempo depois, Dons, a mulher, morreu sem lhe deixar o herdeiro varão por que tanto ansiara. Jessie, porém, desempenhara as obrigações de filho. Desde pequena ajudava a organizar os rodeios e a varejar os puro‑sangue que eram o orgulho de Thompson. E satisfizera os desejos do pai, casando‑se com Bili Wider, um vaqueiro.

Um velho saiu‑lhe ao caminho.

‑ Olá, doutor.

‑ Como vai isso, Fred, como estão todos?

‑ Parece‑me que o senhor Bill não está muito bem.

O Dr. Woodlite imaginou as intermináveis queixas que Jessie teria ouvido do seu marido inválido. Há quase um ano que Bili estava imóvel da cintura para baixo, devido a uma bala que ficara alojada na coluna vertebral. O prognóstico era quase irreversível...

         Os travões do Ford rugiram ao estacionar em frente à casa. Uma jovem esbelta desceu as escadas.

‑        Olá, Dr. Woodlite, que bom vê‑lo.

‑        Como estás, pequena?

‑        Bem. Hoje chegou um novo reprodutor que promete sangue novo para o rodeio.'Gostaria de o ver?

As alegres palavras de Jessie contrastavam com o seu aspecto pálido. O Dr. Woodlite olhou‑a, procurando ler os seus pensamentos. Sabia que era infeliz.

‑        Mais tarde, Jessie. Agora vou ver o Bill.

         ‑Hoje queixou‑se um pouco mais que o costume.

Entraram no vestíbulo.

‑        Espere aqui, não me demoro ‑ disse Jessie.

Poucos minutos depois, chegava acompanhada de Bill, sentado na sua cadeira de rodas.

‑        Este tempo do Kansas está a matar‑me, doutor.

‑        Tem calma, Bili, tens de ser um pouco paciente.

‑        Paciente? Há quase um ano que estou nesta cadeira ferrugenta.

‑        Bem, pelos vistos não estás num dos teus melhores dias. O que achas se te examinar?

‑        Estou pior do que nunca. E, sabe uma coisa? Já não consigo ver a Jessie ao meu lado.

Esta última frase foi dita quase como um sussurro, para que ela não ouvisse.

‑        Jessie, poderias trazer‑me uma bebida fresca? - disse Woodlite. Depois, olhou para Bill. ‑ O que estavas a dizer‑me sobre a Jessie?

‑        Não consigo estar perto dela. Tenho vontade de a possuir, Acho que vou enlouquecer.

‑ Tem calma, vais recuperar a tua virilidade. Prometo‑te. A propósito, venho comunicar‑te que chegou à aldeia um fisioterapeuta. Um tal Jeremy Stone.

‑ E depois?

‑ Este fisioterapeuta é especializado em lesões da medula. Pode ajudar‑te a recuperar a mobilidade.. - Woodlite aproveitou a ausência de Jessie para examinar Bill. Tirou‑lhe cuidadosamente as botas e, com a chave do velho Ford, tocou‑lhe na planta dos pés.

‑ Hum, sentes alguma coisa?

‑ Absolutamente nada.

‑ Tens a certeza?

‑ Bolas, doutor, acha que lhe mentiria?

‑ Está bem, acredito em ti, mas...

‑ Aqui está o seu sumo, Dr. Woodlite.

Jessie aparecera com um jarro de sumo de laranja.

‑ Queres um pouco, Bill?

‑ Sabes que não bebo sumos. Quero um whisky.

Jessie olhou para o médico.

‑ Tudo bem, Jessie, mas só um.

Jessie preparou um whisky para o marido.

‑ Esqueceste‑te de que o bebo com gelo? ‑ Bili atirou o copo para o chão.

O Dr. Woodlite, com visíveis sinais de reprovação e constrangimento, levantou‑se e despediu‑se de Bill. Silenciosamente, dirigiu‑se à saída. Já no alpendre, falou com Jessie sobre a chegada do fisioterapeuta.

‑ Bill não concorda, mas sei que lhe fará bem.

‑ Acha que poderá melhorar?

‑ Não tenho a certeza, mas é possível.

         Woodlite retirou‑se.

         No dia seguinte, um descapotável azul estacionou em frente à entrada de Royal Crest. Jessie afastou a cortina da janela da sala para ver quem era o recém‑chegado. Era um homem jovem e vestia calças e jaqueta de couro. Parecia um vaqueiro. Jessie pensou que talvez se tratasse de alguém interessado na compra de um cavalo e dirigiu‑se para a porta. Bíanche, a criada negra, foi à frente e recebeu o forasteiro. Antes de Jessie atravessar o salão, correu a avisá‑la:

         ‑ É para o senhor Bill. Diz que éo fisioterapeuta.

         ‑ Está bem, Bíanche, diz‑lhe que entre.

         Bianche mandou o homem entrar.

         ‑ Pode entrar.

         ‑ Boa noite. Eu sou Jeremy Stone.

         Jessie estendeu a mão ao forasteiro. Sentiu‑a aprisionada entre os dedos do senhor Stone.

         ‑ Chamo‑me Jessie Wider. Suponho que foi mandado pelo Dr. Woodlite, não é assim?

         ‑ Ele falou‑me do seu marido. Lamento o que lhe aconteceu. Mas tenho esperanças de conseguir recuperá‑lo. Tive bons resultados na maioria destes casos.

         ‑ O senhor acha que ele voltará a andar?

         O olhar interrogativo de Jessie era penetrante. Jeremy pensou que era uma pena que uma mulher bela e jovem estivesse presa à cadeira de um inválido. Se pudesse, tentaria alterar essa situação. Segurou novamente na pequena mão e olhou‑a com ternura.

         ‑ Farei todo o possível, prometo‑lhe.

         Jessie sentiu‑se enrubescer. Retirava a mão quando ouviu o inconfundível barulho da cadeira de rodas.

                   ‑        Jessie? Desculpa, não sabia que estavas ocupada.

                   ‑        Oh, não. É o fisioterapeuta que o Dr. Woodlite mandou. Chama‑se... perdão, qual éo seu nome?

                   ‑        Jeremy Stone.

         - Jessie, traz uma bebida para o doutor. Deseja beber um whisky?

         - Beber Não, prefiro chá gelado. Está muito calor.

         - Bem, já ouviste, vai buscar.

         Jessie saiu, rumo à cozinha. Evocava mentalmente

         a imagem de Jeremy. Era a primeira vez que via um

         homem tão interessante. Tinha cabelos escorridos e

         negros e enormes olhos verdes. Transbordava saúde.

         Jessie apressou o passo. Embaraçava‑a ter reparado

         com tanta atenção naquele homem e perceber que o

achara interessante. Nunca tinha sentido nada semelhante. As longas noites de sexo a que Bill a submetera no passado foram sempre tediosas.

         - Precisa de alguma coisa, menina?

                   A voz de Bianche fê‑la voltar à realidade.

                   ‑        Sim, Bíanche, um chá gelado ou, melhor, dois.

                   Jeremy e Bill conversavam sobre o tratamento.

                   ‑        Acha que só com massagens vou recuperar?

                   ‑        Sim, já vi resultados surpreendentes.

                   ‑        E o que vai acontecer se continuar paralítico?

                   ‑        Pelo menos, terá tentado.

                   ‑        Oh, será inútil, eu sei.

                   Jessie pôs os copos e o jarro sobre a mesa. Olhou para Bill à espera de uma ordem.

                   ‑        Jessie, já sabes que considero o chá uma bebida para doentes. Traz‑me o costume. - E virando‑se para o médico: ‑ Onde estávamos, Stone?

‑ Dizia‑lhe que tem uma oportunidade. Só depende de si aproveitá-la ou desperdiçá‑la.

         ‑ O que achas, Jessie?

         Jessie aproximou‑se, levando o copo de whisky.

         ‑ Jessie, será que não ouviste a minha pergunta?

         ‑ Desculpa, Bili. O que disseste?

         ‑ Perguntei qual era a tua opinião.

         ‑ Eh... penso que será muito útil fazeres um tratamento para recuperar, claro, se também concordares.

         Bill dirigiu‑se de novo a Stone.

         ‑ Está a ver, amigo? As mulheres são todas iguais. Quando se lhes pede uma opinião, dizem asneiras.

         O sonoro riso de Bill ecoou na sala, mas não conseguiu contagiar Jeremy, que se levantou e se despediu com cortesia. Tinham combinado que Jeremy começaria as sessões na semana seguinte.

         Jessie acompanhou o médico até à porta.

         ‑ Obrigada pela sua visita, senhor Stone. Acho que conseguiu reconfortar Bill.

         ‑ Em breve o verá ainda melhor, senhora Wider.

         Uma vez mais, quando Jeremy lhe estendeu a mão, Jessie estremeceu. Fechou a porta e dirigiu‑se à sala. Bill olhou‑a com os olhos turvos pelo álcool.

         ‑ Com que então tu e esse malandro, eh?

         ‑ Bill, por favor, que estás a dizer?

         ‑ Sabes bem do que estou a falar. Não tenho pernas, mas os meus olhos ainda vêem bem.

         ‑ Mas, Bill...

         ‑ Nada de mas, hipócrita. Vi‑os quando segurava a tua mão entre as dele. Que romântico! Imbecis!

         ‑ Bill, por favor ‑ Jessie começou a soluçar.

         ‑ Continua a chorar. Assim todos acreditarão que és a vitima. Mas não sairás com vantagem. Ouçam todQs, a minha mulher namorisca qualquer forasteiro e todos têm de saber. É uma mulherzinha vulgar.

         Jessie correu a refugiar‑se no quarto. Sentia‑se só e não tinha a quem recorrer. No entanto, a ajuda já estava a caminho e tinha nome e apelido: Jeremy Stone.

 

         O rio Ohio passava mansamente rumo ao Mississípi. Alguns barcos encontravam‑se na margem enquanto os tripulantes, à sombra, fumavam calmamente os seus cachimbos de espiga de milho.

         O local era familiar para Jessie. Passara parte da sua infância e adolescência acompanhando os primos a pescar, ou descalçava‑se para sentir a água correr sob os pés. Havia poucos lugares onde se sentia tão bem. Ali ninguém a incomodava e podia imaginar, deitada sobre a relva, como seria o seu futuro. Sonhava ter uma quinta e criar os melhores cavalos do país. O seu lugar favorito era um arbusto com ramos espessos, sob o qual costumava esconder‑se para desespero de Bíanche, que procurava não a perder de vista.

         Nunca tinha tido uma boneca para brincar. O pai dizia que as bonecas eram parvoices de mulheres e preferia ensinar‑lhe as tarefas rústicas do rancho.

A índole dócil de Jessie não permitia contestações e passava horas nos estábulos a escovar os cavalos. Mas o que mais prazer lhe dava era correr pela margem do rio. O rio era o seu refúgio, a sua verdadeira casa, o lugar sonhado onde se sentia livre e feliz. No entanto, ao lado de Bill, até as águas pareciam turvas, e já não tinha vontade de correr. O dia estava luminoso, e Jessie observava um grupo de pescadores da região a pescarem um enorme peixe. Fred e BIanche tinham preparado um lugar à sombra para Jessie e Bill almoçarem. Bill observava o horizonte. Jessie sabia que o Dr. Woodlite tinha aconselhado Bill a mudar de ambiente, sair para apanhar sol e respirar ar fresco, mas ele teimava em não se aproximar dos estábulos e preferia ir até à margem do rio.

         ‑ Estás bonita, Jessie.

         O elogio inesperado sobressaltou Jessie.

         ‑ Achas, Bill?

         Jessie procurou arranjar os cabelos, que se desalinhavam com o vento. Há muito tempo que não reparava que era realmente uma mulher. Por diversas vezes, ao olhar‑se no espelho, via os seus seios firmes, as suas ancas onduladas, e pensava que, longe de serem uma virtude, eram uma desvantagem para as tarefas do rancho. O seu desejo desaparecera na noite do casamento ante a brutalidade de Bill. A pergunta que Jessie fez com tom de galantaria estimulou Bill.

         ‑ É claro que és bonita, ou achas que teria casado com uma bruxa? Anda, aproxima‑te, mulher.

         A atitude lasciva de Bill era para Jessie pior do que

         ouvir os seus insultos quando estava bêbado. Sentou‑se ao lado dele e deixou‑o acariciar‑lhe o cabelo.

         Uma profunda repugnância invadiu‑a quando os

         grosseiros dedos macilentos deslizaram pela sua nuca.

         ‑ Tens saudades minhas tal como tenho tuas?

         ‑ É claro, Bill.

         ‑ Tenho vontade de te mostrar quanto te desejo.

         Bill meteu uma mão no decote de Jessie, procurando acariciar‑lhe os seios, e ela afastou‑se.

         ‑ Vem cá, quem te julgas? És a minha mulher, estúpida. Posso fazer contigo o que quiser.

         A cara de Bill começava a inflamar‑se de ira.

         A oportuna intervenção de Bíanche interrompeu

         o acesso de ira de Bill.

         ‑ Senhor Bill, já está na hora.

         ‑ Estás a falar do quê, maldita negra?

         Bíanche engoliu em seco. Fred veio em seu socorro.

         ‑ O fisioterapeuta, senhor Bill. Está a chegar.

         Bill murmurou um palavrão e, depois, com um

         gesto, indicou a Fred que o levasse para a carrinha

         especialmente preparada para transportar a cadeira.

         Tinham apenas percorrido metade do trecho que

         os separava da casa quando ao longe se começou a

         avistar um carro que se aproximava. O coração de Jessie começou a bater fortemente. Jeremy Stone aparecia pontualmente para a sessão de massagens.

 

Uma vez em casa, Fred acompanhou Bill e Stone à sala de jogos, que se tornara o quarto de Bill desde que sofrera o acidente. Depois de uma hora de massagens, Stone acabou o seu trabalho.

‑        Amanhã voltarei à mesma hora, senhor Wider.

‑        Está bem. Quero acabar com isto rapidamente, o senhor está a ver, a minha mulher é tão jovem que... - Bill fez um sinal cúmplice como se ambos soubessem do que estava a falar. Jeremy teve vontade de lhe dar um murro na cara. Pareceu‑lhe abominável falar de um assunto tão Intimo com ele, um desconhecido.

‑        Farei tudo para que recupere, senhor Wider.

Jeremy deu meia volta e saiu em direcção ao salão. Ao sair, esbarrou em Jessie, que vinha carregada com uma pilha de toalhas e lençóis acabados de secar.

‑        Desculpe, não o vi.

‑        Não tem importância. Deixe‑me ajudá‑la.

Jessie e Jeremy baixaram‑se ao mesmo tempo apanhando a roupa. Quando só faltava uma toalha, ambos esticaram o braço, e as suas mãos ficaram uma em çima da outra. Sem conseguir levantar‑se, Jessie olhou‑o nos olhos. Jeremy devolveu o olhar a Jessie do fundo da sua alma. Os seus instintos cresciam e, se ela não se tratasse de uma mulher casada, tê‑la‑ia beijado. Jessie notou que uma onda de calor lhe percorria o corpo. Como se uma parte dela, selvagem e primitiva, tivesse despertado, sentiu desejos de ser abraçada por Jeremy. Endireitou‑se com a ajuda de Jeremy, que a segurou pelo braço. Colocou a roupa sobre uma cadeira e acompanhou-o à saída.

‑ Quando regressámos do passeio, não tive tempo de lhe oferecer uma bebida. Quer um chá gelado?

O olhar de Jessie dizia tudo. Desejava estar junto dele nem que fosse só mais um instante. Jeremy achou que estava angustiada pela doença do marido e que queria conversar sobre as suas preocupações.

         - Aceito, obrigado. Ainda está muito calor para sair de novo para a estrada.

         Jessie não teve tempo de chegar à cozinha, pois Bíanche já trazia um jarro de chá e dois copos. Olhou para um e para outro e sussurrou:

         - Fred está a acomodar o senhor Bill na cama.

         - Jeremy sentou‑se num dos cadeirões do alpendre, disposto a ouvir Jessie, mas ela olhava para o horizonte, com o olhar perdido.

‑ Jessie, sente‑se bem?

A voz de Jeremy fê-la voltar à realidade. Tinha procurado afastar‑se da estranha sensação que se apoderava dela quando o via. Ao voltar a olhá‑lo, sentia que a sua excitação ia crescendo.

"Notar‑se‑á no meu rosto o que estou a sentir?", pensou, preocupada.

‑ Jessie, sente‑se bem? ‑ Jeremy repetiu a pergunta.

‑ Sim,o melhor possível com Bill neste estado.

‑ Refere‑se ao facto de não ser fácil vê-lo sofrer?

‑        Por vezes, penso que teria sido melhor...

         - Que teria sido melhor o quê?

Uma sombra de dúvida passou pela cabeça de Jeremy. Talvez a jovem não fosse tão pura como parecia.

‑ Quero dizer, que a bala poderia ter‑me acertado a mim. Teria preferido em vez de o ver sofrer tanto.

         Ele achou prudente mudar o rumo da conversa.

‑        Parece que gosta disto. Há pouco pareceu‑me que olhava para os cavalos com autêntica admiração.

         ‑ Quer conhecê‑los mais de perto?

         Jessie ficou feliz ao comprovar que só o facto de estar perto daquele homem a deixava mais animada. A sua timidez habitual converteu‑se em desenvoltura e ficou contente por levar Jeremy ao estábulo.

         ‑ Esse éo Red Buli, um pouco teimoso. Aquele éo munuer, um verdadeiro relâmpago nas pistas, e além está a minha nova aquisição, Snow Cat.

         ‑ Está treinado para correr ou para o rodeio?

         Jessie corou. Não sabia como contar a Jeremy a função do novo cavalo.

         ‑ É um reprodutor. Temos de conseguir os melhores cruzamentos, e acho que este animal não tem defeitos. As suas crias serão perfeitas.

         Jeremy olhou‑a melhor. Era uma mulher de coragem e muito bela. O seu perfume a violetas deixava‑o paralisado. Não era lícito desejá‑la, mas considerava algo inevitável. Para afastar os pensamentos de desejo, continuou a conversar sobre cavalos.

         ‑ É um belo potro. Não tenho dúvidas de que terá uma boa descendência.

         ‑ Sim, assim o espero.

         ‑ Sabe montar a cavalo?

         ‑ Faço‑o desde criança. Posso, inclusive, montar um potro selvagem sem cair.

         ‑ Hum, gostava de ver.

         ‑ De certeza que quer ver? Pois um dia terá oportunidade de ver, e então acreditará em mim.

         Jeremy perguntou‑se quão habilidosa seria a fazer

amor e surpreendeu‑se a pensar que gostaria de saber. A tarde caía sobre Royal Crest quando Jeremy se despediu de Jessie. Bill, entretanto, dormia sem suspeitar que o desejo, que ele se encarregara de adormecer tinha começado a renascer em Jessie.

 

         O episódio que culminou na invalidez de Bill era um mistério e aconteceu quatro meses depois da morte de Andrew Thompson, o pai de Jessie.

         Bill era então frequentador de uma taberna de Merryville, conhecida pela sua má reputação.

         Uma noite, Bill e os seus amigos, em avançado estado de embriaguez, montaram os cavalos e partiram em direcção ao rio. Ninguém conseguiu identificar os seus acompanhantes. A verdade é que Bill, na manhã seguinte, foi encontrado nas margens do rio. Estava inconsciente e tinha uma perfuração de bala nas costas, afectando a coluna e deixando‑o paralítico.

         Dos seus lábios nunca saiu o nome do agressor e de nada valeram os pedidos do advogado dos Thompson nem as ameaças do delegado do distrito para o convencer a revelar o nome do autor do disparo. Como resposta, assegurava que, na escuridão da noite e com bebida a mais, tinha sido impossível distinguiro seu atacante.

         O episódio foi esquecido e novos acontecimentos passaram a ser o tema de conversa em Merryville. Jessie nunca se atrevera a tocar no assunto a Bill, com receio de o irritar, e Bill começou a beber mais para esquecer o sucedido. Porém, se alguém tivesse conseguido penetrar na sua mente, teria encontrado, escrita com sangue, uma palavra: "Vingança".

 

         O consultório do Dr. Woodiite era um expoente de velhas gerações. A maca de couro com buracos, a velha secretária de carvalho e uma biblioteca de livros amarelecidos eram todo o mobiliário.

         ‑ Stone, como está o paciente?

         ‑ Tive algumas sessões com ele, mas ainda não noto nenhuma melhoria. No entanto...

         ‑ Ah, estou a perceber. Notou o mesmo que eu. O homem responde a alguns estímulos.

         ‑ Precisamente, isso é o que me intriga. Uma vez que tem uma bala alojada na zona dorsal, não deveria ter nem o mínimo sinal de sensibilidade.

         ‑ Olhe, Stone, a bala alojou‑se na apófise medular, mas acho que a medula não foi afectada.

         ‑ É provável que consiga recuperar totalmente.

         ‑ Foi o que pensei quando percebi que respondia a certos estímulos. E provável que se trate de um hematoma que, juntamente com a lesão medular, tenha provocado a paralisia.

         ‑ E acha que o hematoma pode vir a desaparecer?

         ‑ É possível. Se assim for, Bill recuperará a mobilidade. É preciso esperar. Está inválido há quase um ano.

         ‑ Como aconteceu o acidente?

         ‑ Foi atingido à queima‑roupa. Um ajuste de contas.

         ‑ Compreendo. Bem, doutor, vou andando. Tenho de chegar a horas a Royal Crest. Avisá‑lo‑ei imediatamente se houver alguma novidade.

‑ Não deixe de o fazer, por favor. Até breve.

         Jeremy atravessou a rua e entrou no carro. Sentia um misto de euforia e medo ao saber que dentro de instantes veria Jessie de novo. Desde que a conhecera não conseguia deixar de pensar nela. Muitas das suas noites eram passadas a imaginar que a tinha nos braços e que a podia acariciar e beijar á vontade. Estaria a apaixonar‑se pela jovem? Só a possibilidade de isso ser verdade o deixou aterrado.

         ‑ Maldição, por que tinha de ser ela?

         Jeremy maldizia em voz alta enquanto se dirigia ao rancho. Talvez essa mulher amasse realmente o marido. Talvez apenas lhe parecesse que o olhava com desejo. E certamente ele estaria só a responder a um instinto selvagem e primitivo que se apoderava dele.

         "Sim, deve ser isso. Um desejo para lá de toda a lógica. Deves entender, amigo, que ela é intocável."

         Tentando convencer‑se, Jeremy continuou a falar sozinho, até avistar a entrada para Royal Crest.

         Tinha chegado o momento de trabalhar para Bill Wider, um homem cruel e insensível. Um gesto de decepção esboçou‑se no rosto de Jeremy ao ver Bíanche do outro lado da porta.

         ‑ Por aqui, senhor Stone.

         Jeremy olhou para os lados, mas Jessie não estava.

A sessão durou mais do que o esperado. Bill queixava‑se de dores nas costas e pediu a Jeremy que parasas massagens. Eram quatro e meia quando Jeremy saiu do quarto. O corredor conduzia de um lado á cozinha e de outro á sala. Tentou encontrar a saída sozinho. Saiu para o alpendre e desceu as escadas. Viu‑a então. Jessie tinha um chicote na mão e tentava sem êxito dominar Snow Cat. O valente potro arqueava‑se, até que conseguiu livrar‑se dela. A jovem caiu e foi embater nas estacas da cerca. Jeremy desatou a correr. Ajoelhou‑se a seu lado e tentou reanimá‑la.

‑ Jessie, Jessie!

         Pouco a pouco, a jovem abriu os olhos e recuperou os sentidos.

         ‑ Senhor Stone, o que faz aqui?

         ‑ Isso pergunto eu. Que fazia em cima desse potro?

         ‑ Disse‑lhe que iria ver‑me a montar um potro, mas ainda tenho de lhe mostrar que sei domá‑lo.

         ‑ Por acaso quer partir alguns ossos?

         ‑ Devo ter partido algum. Dói‑me todo o corpo.

         ‑ Vejamos.

         Jeremy examinou ao pormenor o corpo de Jessie, sentindo que o calor e o contacto com a pele dela o faziam estremecer de desejo. Ela deixou‑se tocar.

         ‑ Parece que está tudo no lugar.

         ‑ Ainda tenho dores nas costas ‑ disse Jessie.

         Jeremy não hesitou. Pegou‑lhe ao colo e dirigiu‑se a uma cabana próxima. Jessie estava tão perto dele que podia sentir as batidas aceleradas do seu coração. Estremeceu de prazer ao perceber a sua vigorosa masculinidade e agradeceu a Snow Cat pela queda.

         Entraram na cabana. Havia vários arreios e um equipamento completo de montar. Jeremy deitou Jessie sobre um monte de feno e sentou‑se ao seu lado, procurando descobrir a proveniência da dor.

         - Desculpe, deixe‑me levantar um pouco a blusa. Tenho de examinar as costelas com cuidado.

         Jeremy foi passando os dedos quentes sobre a pele de Jessie. Jessie desfrutou intensamente e em silêncio o roçar dos dedos na sua pele. Involuntariamente, emitiu um gemido. Jeremy sentiu que não ia conseguir conter‑se e tapou o corpo de Jessie, dizendo:

         ‑ Não tem nada, foi só um golpe.

         Jessie olhou‑o nos olhos sem dizer nada. Os seus olhos cor de mel reflectiam o desejo e a sua boca entreaberta convidava Jeremy a beijá‑la. Ele não conseguiu conter‑se mais. Beijou os seus lábios com suavidade. Jessie correspondeu‑lhe com a boca húmida de desejo. Beijaram‑se longamente. Ela começou a acariciar‑lhe o rosto com os dedos e, finalmente, abraçou‑o pelo pescoço. Ele segurou‑a com firmeza pela cintura e colocou‑a sobre o feno. Abriu um pouco a blusa e começou a beijar‑lhe o pescoço.

         ‑ Por favor, Jeremy, não ‑ suplicou Jessie.

         ‑ Desejo‑te muito, Jessie. Quero que sejas minha.

         Jeremy percorreu as coxas de Jessie com a mão.

         ‑ Por favor, não o faças ‑ insistiu Jessie, sentindo‑se fraquejar. Só o medo de pensar que Bill a olharia e perguntaria onde tinha estado deu‑lhe forças para afastar a mão de Jeremy. Beijou‑lhe a face enquanto lhe acariciava o cabelo e falou com voz sussurrante.

         ‑ Desculpa, Jeremy, talvez devêssemos ter‑nos conhecido antes. Seria maravilhoso podermos estar juntos livremente, mas assim não é possível.

         Jeremy sabia que ela tinha razão, mas os seus impulsos cegavam‑no. Uma vez mais, segurou‑a pela cintura e deitou‑a. Antes de ela poder contestar a sua atitude, um beijo selou os lábios da jovem. Depois, deslizou a lingua húmida pelo pescoço de Jessie. Jeremy aproximou o seu sexo até roçar nas coxas dela e ela sentiu‑o com toda a intensidade. Foi então que conseguiu reunir todas as suas forças e deu um salto. Ao fazê‑lo, sentiu que lhe doía o corpo e voltou a cair sobre o feno. Não sabia se ria ou chorava, tão absurda se tornara a situação.

‑ Oh, Jeremy, sou uma mulher casada.

‑ Entendo, mas o que sinto é mais forte do que eu.

‑ Mas, é que...

‑ Não digas mais nada. Compreendo e não quero incomodar‑te, mas deixa‑me ficar um pouco mais a teu lado. Juro que não vou tocar‑te. Acreditas?

         Jessie agradeceu a sua compreensão com um suave beijo no rosto. Sabia que estava a travar os seus impulsos e tinha sido tão difícil para ele como para ela. No entanto, ficou contente de saber que podia simplesmente passar mais algum tempo junto dele.

         Jeremy começou a falar‑lhe de assuntos relacionados com a sua actividade. Embora o seu olhar lançasse faiscas de paixão, a sua atitude correcta fizera com que Jessie tivesse confiança nele. Anoitecia em Royal Crest. Jeremy e Jessie continuavam a conversar animadamente. De repente, ela começou a chorar.

         ‑ Jessie, o que tens?

         ‑ Oh, Jeremy, de repente pensei no que esteve prestes a acontecer. Nunca me teria perdoado.

         ‑ Tem calma, Jessie, não aconteceu nada.

         ‑ Nunca me aconteceu nada semelhante.

         Jessie levantou‑se e compôs o cabelo, que ainda tinha restos de feno. Sentia‑se confusa e nervosa.

         O perfume de Jessie misturado com o forte cheiro de feno fizeram despertar de novo a paixão de Jeremy. Parou junto dela e abraçou‑a com ardor.

         ‑ Jessie, é melhor ires para casa. Se calhar, Bill já acordou da sua sesta.

         ‑ Bill, oh, nem sequer pensei nele. Percebes até que ponto estou perturbada?

         Jessie alisou a roupa.

         ‑ Espera, deixa‑me despedir.

         Jeremy apertou‑a contra si com intenção de a beijar.

         - Não. Jeremy, isto não passou de um erro. Não se repetirá. Não podemos ser amigos?

         Jessie beijou com doçura o rosto de Jeremy e fugiu a correr, rumo a casa. Ao aproximar‑se, viu que a luz do quarto de Bill estava apagada.

         "Algo corre mal", pensou. E não estava enganada.

 

         ‑ Olá,, menina, onde se meteu? O senhor procurou‑a por toda a casa. Até mandou o Fred dar uma vista de olhos nas cavalariças.

         Jessie ficou sobressaltada. Tinha de pensar numa boa desculpa ou Bill faria a sua vida num inferno:

         ‑ Bíanche, porquê tanto alvoroço? Será que ninguém notou que caí do cavalo?

         ‑ A menina cair de um cavalo? Que o diabo me leve! Esse cavalo não existe.

         ‑ Existe sim. É Snow Cat. Atirou‑me contra a cerca do estábulo e fui para a cavalariça pequena recompor‑me. Olha como fiquei com a queda.

         A roupa de Jessie tinha visíveis fibras de feno.

         ‑ Maldita leviana, onde te meteste?

         Bill irrompeu na sala arrastando a sua cadeira e dando encontrões nos móveis.

         ‑ Acalma‑te, Bill, posso explicar.

         ‑ Não tens nada que explicar. Está tudo claro. Sais e deixas‑me aqui sozinho. E, olha para ti...

         Jessie baixou os olhos. O olhar de Bill era penetrante e malévolo. Bill continuou a insultá‑la.

         ‑ Olha para ti, estás toda desalinhada. Com quem estiveste a rebolar‑te?

         Jessie desejou que a terra se abrisse e a engolisse. Há cinco anos que se casara com aquele sujeito bruto e estivera sempre ao seu lado.

         Mas nessa tarde tinha sido diferente. Sentia‑se culpada mas, ao mesmo tempo, tinha consciência de que o momento de felicidade que acabava de viver tinha sido o único em anos. Apeteceu‑lhe gritar que já era altura de ele deixar de a agredir, que não tinha o direito de a dominar com as suas ameaças, mas a ira de Bill assustava‑a. Lembrou‑se de Jeremy e do seu olhar franco. Isso deu‑lhe coragem. Levantou a cabeça e conseguiu responder sem tremer.

         ‑ Caí do cavalo. Snow Cat é mais difícil do que eu pensava, e distraí‑me.

         ‑ E o que aconteceu ao cavalo? Caiu também?

         ‑ Não, atirou‑me, e saí projectada, batendo contra

as estacas da cerca. Depois, desmaiei e...

‑ Já chega de contar coisas desnecessárias. Não respondeste à minha pergunta: como ficou Snow Cat?

‑ O potro está bem. De todas as maneiras, se quiseres, amanhã de manhã vou vê‑lo.

         - É cClaro que quero. E, se vires que coxeia ou que

                   tem algum problema, diz‑me de imediato, percebes?    - Está bem, assim farei.

         Jessie aproximou‑se do marido e, como todas as

noites, deu‑lhe um beijo na testa. Sentiu repulsa ao fazê-lo e, curiosamente, pensou que estava a trair Jeremy. Desde que ele a beijara, sentia‑se sua e soube que nunca mais poderia tocar noutro homem.

         - Até amanhã, Bill.

         - Da próxima vez não sejas desajeitada.

         Fred acompanhou Bill ao quarto e Jessie subiu as escadas com Bíanche, que levava um jogo de lençóis para o quarto. Uma vez no quarto, Bíanche fechou a porta devagar e aproximou‑se de Jessie.

         - Menina, não pense que estou a meter‑me onde não sou chamada, mas, por favor, tenha cuidado.

         ‑ O que queres dizer‑me, Bíanche?

         ‑ Esta tarde, vi o senhor Bill colocar a pistola no cinturão. Tinha uma expressão assustadora.

         ‑ Não te preocupes, Bíanche. Ele gosta de carregar e limpar as armas.

         ‑ Sim, menina, mas Fred sabe.

         ‑ Fred sabe o quê?

         ‑ Hoje, o senhor foi à sua procura ao estábulo, nas cavalariças e também deitou uma olhadela na cabana.

         Jessie sentiu que o sangue se lhe gelava nas veias. Olhou para Bíanche com espanto, mas a criada já abandonava o quarto. O que se tinha passado com Jeremyjá não era segredo. Fred e Bíanche sabiam‑no, e de certeza que Bill também suspeitava. Jessie jurou esquecer o que tinha acontecido e não voltar a vê‑lo.

         Deitou‑se. Sentiu que o seu corpo fervia de desejo. Procurou conciliar o sono, mas foi em vão. Ondas de excitação faziam‑na sentir‑se cada vez mais inquieta. Pensou em Jeremy segurando‑a pela cintura e beijando‑a. Imaginou‑o acariciando‑a. Sem conseguir acalmar‑se, pegou no roupão e desceu para apanhar ar fresco. Sentou‑se no alpendre, onde tinha estado a conversar com Jeremy, e não conseguiu evitar novamente a recordação. A noite estava quente e calma.

         ‑ Precisa de alguma coisa, menina?

         Fred apareceu de repente, da escuridão.

         ‑ Não, Fred. Ah, a propósito, por que não me chamaste quando foste à cabana à minha procura?

         ‑        Menina, estes velhos olhos vêem muito e não vêem nada. Boa noite e procure descansar.

         Jessie respirou de alívio. Jessie tinha estado durante anos ao seu cuidado e Fred nunca iria atraiçoá‑la.

 

         A brisa suave soprava pela pradaria. O sol da manhã estava radioso. Eram sete horas. Jessie espreguiçou‑se, desanimada. Mais outro dia em que teria de

lidar com Bill. Felizmente, existiam os cavalos. Vê‑los em pleno estado selvagem, seguindo apenas o instinto, dava‑lhe uma sensação inexplicável de liberdade.

         Umas batidas suaves na porta eram a forma de Bíanche avisar que o pequeno‑almoço já estava preparado. Vestiu‑se rapidamente e desceu para a cozinha.

         ‑ O senhor Bill está na sala. Vou já levar a comida.

         ‑ Deixa, Bíanche, eu levo.

         ‑ Porque não me deixa ir, menina?

         ‑ Está bem, Bíanche, tu mandas...

         Jessie saiu da cozinha saltitando. Bíanche abanou a cabeça. "Ainda é uma menina", pensou. "E, no entanto, também é uma mulher."

         E era inegável o facto de Jessie se ter tornado uma mulher. O cabelo espesso demarcava um rosto senssual. As suas curvas disfarçavam‑se sob a roupa folgada e em cada movimento deixava transparecer a sua essência feminina.

         Quando Jessie chegou à sala, ouviu a voz de Bill.

         ‑ Jessie, lembra‑te de ir ver Snow Cat esta manhã. Esse cavalo foi muito caro.

         Jessie mordeu o lábio para não lembrar que esse dinheiro era da herança do seu pai. Decidiu ficar calada enquanto servia uma chávena de café.

         Acabou de tomar o pequeno‑almoço e saiu silenciosamente. Aproximou‑se de Fred.

         ‑ Bom dia, Fred. Podes levar‑me à aldeia?

         ‑ Com prazer, mas primeiro vou lavar as mãos.

         Jessie deu uma vista de olhos pelo estábulo. Lá estava Snow Cat, com o seu ar altivo e o olhar distante, talvez sentindo falta da liberdade de quando era potrinho. No fundo, o potro era parecido com ela. Ambos desejavam correr livremente pela vida. E ambos sabiam que isso era impossíveL Jurou voltar a montá‑lo nessa mesma tarde, para tentar amansá‑lo.

         Pouco depois, Fred regressou. Para acompanhar Jessie à aldeia, preparara a camioneta de tracção dupla. A camioneta partiu rumo a Merrvville. Fred estacionou em frente ao supermercado.

         ‑ Demoro cerca de uma hora, Fred. Se quiseres, podes ir fazer uma visita ao Louis.

         Louis era o mecânico da aldeia. Tão velho como o Dr. Woodlite, a sua paixão era reparar automóveis e recordar os velhos tempos. Fred dirigiu‑se á oficina e Jessie entrou no supermercado. As compras incluiam comestíveis, artigos de limpeza e algum novo complemento para a cozinha que adquiria sempre para desespero de Bíanche, que já não sabia onde guardá‑los. Jessie surpreendeu‑se a si mesma detendo o olhar na secção de Lingerie.

         Hesitou por instantes. Não era o que tinha vindo comprar. Sentia vergonha por se interessar por aquelas peças. Disfarçadamente, pegou num conjunto de soutien e calcinhas cor de lavanda e pô-lo no cesto.

         Mudou de sector e foi para a secção dos enlatados. Parada em frente às latas, olhava sem conseguir decifrar o que estava nas etiquetas. Sentia‑se agitada, como se tivesse feito uma coisa inconcebíveL Para quem pensava exibir a roupa que tinha comprado? Bill nunca poderia vê‑la. E se a empregada da caixa a olhasse com um ar de reprovação? Todos na aldeia conheciam a sua situação, pensou, e, decidida a colocar as peças na prateleira, atravessou o corredor central.

‑ Jessie, que bom voltar a ver‑te!

         Jeremy dirigia‑se para ela. Ao vê‑lo, ficou petrificada.

         ‑ Queres um doce?

         Jeremy mostrou uma tablete de chocolate a Jessie.

         ‑ Senhor Stone, o que faz aqui?

         Jessie sentiu‑se corar de vergonha pelo simples facto de estar na sua presença.

         Supõe‑se que o mesmo que tu: compras.

         ‑ Sim, claro. Foi uma pergunta idiota.

         Jessie riu e sentiu‑se aliviada. Estava tão preocupada que alguém notasse que Jeremy a atraía que já tinha pensado no que aconteceria se ocasionalmente se encontrassem num lugar público. Tinha receio de que os outros descobrissem os seus sentimentos.

         Finalmente, tinha acontecido. E o encontro casual não tinha sido tão grave. Ali estavam os dois a fazer compras, e era lógico que parassem, a conversar.

         ‑ Ias buscar alguma coisa? Acompanho‑te.

         ‑ Oh, não. Já tenho tudo o que preciso.

         ‑ Bem, eu também já não tenho nada para comprar. Podemos sair juntos.

         Não havia tempo para devolver o conjunto de roupa interior e Jessie lamentou tê‑lo escolhido, sobretudo quando chegou o momento de passar pela caixa registadora. Quando a empregada registou o código de barras do conjunto, Jeremy olhou‑a com um ar de interrogação, esforçando‑se para não rir.

         Tinham acabado de sair da loja, e Jessie começou a repreendê‑lo, procurando ser severa.

         ‑ Jeremy Stone, não vejo onde está a graça pelo facto de eu ter comprado roupa interior.

         ‑ Oh, Jessie, não leves a mal. Pareceu‑me simplesmente engraçado ver surgir um soutien e umas calcinhas no meio da comida. Devias ter visto a tua cara quando a empregada pegou neles.

         ‑ Estás a gozar comigo?

         ‑ Pelo contrário, divertes‑me, mas não estou a gozar. Adorei o conjunto que escolheste e, para falar a verdade, gostaria ainda mais de ver como te fica.

         ‑ Jeremy, não brinques.

         ‑ Asseguro‑te de que não é brincadeira. Gostaria de ver como te fica.

         Jessie teve medo de que alguém o tivesse ouvido. Nervosa, procurou Fred com o olhar.

         ‑ Estás à espera de quem?

         ‑ Do Fred. Já devia ter chegado. De certeza que ainda está a conversar com Louis.

         ‑ Posso levar‑te a Royal Crest.

‑        Não me parece conveniente. Bill não iria gostar de me ver chegar contigo.

         ‑Achas que tem ciúmes demim?

         ‑ Ele tem ciúmes de toda a gente. Sempre foi assim, mas ultimamente os seus ciúmes são exagerados.

‑ Sinto muito, não foi minha intenção...

‑ Eu sei e agradeço a oferta.

A camioneta travou ao lado de Jessie e Jeremy de forma violenta. Fred mostrava‑se preocupado.

         ‑ Desculpe, menina, mas Louis pediu‑me ajuda. A nora está prestes a ter obebé e tem de ir para o hospital de Sutternhall. Importa‑se que os leve?

         ‑ Não se preocupe, Fred, eu levo a senhora Wider.

         ‑ Obrigado, senhor Stone, fico a dever‑lhe esse favor. - Concorda, menina, ou prefere esperar até eu voltar do hospital?

         ‑ Sim, Fred, é melhor. Espero por ti aqui.

         ‑ Nem pensar. Não podes ficar um tempo interminável à porta do supermercado. Levo‑te para minha casa. Quando o Fred voltar, pode ir lá buscar‑te.

         Jeremy tirou do bolso do casaco papel e lápis e escreveu a morada onde Fred deveria ir buscá‑la.

         Fred pegou no papel e, pondo a camioneta a trabalhar, afastou‑se a toda a velocidade.

         ‑ Devias ter‑me perguntado.

         Jessie olhava para Jeremy com ar de reprovação. Tivera o cuidado de manter a distância enquanto conversavam para que ninguém suspeitasse. E agora ia com Jeremy directamente do superrnercado para sua casa.

         ‑ Pensei que gostarias de conhecer a minha casa.

         Jeremy começou a andar pela rua e Jessie seguiu‑o. Uns quarteirões adiante, parou.

         ‑ Não posso ir a tua casa, entendes?

         ‑ Jessie, não sejas criança. Pensa um pouco. Podes ter vindo a uma consulta por causa da tua queda do outro dia, ou devido ao estado de saúde de Bill.

         ‑ Mas isso não é verdade...

         ‑ E também não é verdade que vais tornar‑te uma mulher infiel só por entrares em minha casa. Sabes que te respeito e isso deveria ser suficiente para ti.

         ‑ Mas o que dirão as outras pessoas?

         ‑ Jessie, deixa de pensar nos outros. Eles não vão ajudar‑te a manter o rancho nem querem saber se estás triste ou contente. Ninguém tem o direito de te julgar. Só tu sabes como agir correctamente e, na realidade, é o que tens feito.

         ‑E se Bill ficar a saber?

         ‑ Ele também não tem o direito de desconfiar de ti. Jeremy tinha razão. Nunca tinham falado assim com ela. Diante dos seus olhos passou toda a sua infância, a sua adolescência e os anos decorridos ao lado de Bill. Nunca tinha pensado que fora educada sentindo‑se, injustamente, culpada. Suportou as censuras do pai e de Bill como se fosse culpada das falhas que lhe atribuíam. Os dois tinham conseguido destruir a sua auto‑estima a tal ponto que nunca pusera em questão a sua injustiça. No entanto, ela nunca merecera semelhante atitude deles.

         A casa de Jeremy ficava a poucos quarteirões do supermercado. Era pequena mas confortável. No andar superior encontravam‑se os quartos.

         ‑ Mudei há pouco tempo para cá. Os meus pais vivem no Missouri e eu viajei muito, tentando aperfeiçoar os meus conhecimentos de fisioterapia.

         ‑ Eo que podes encontrar aqui para te aperfeiçoares? Não há universidades nem hospitais famosos.

         ‑ Oh, neste caso foi diferente. Vim para cá a pedido dos Ostrid. Eles têm no rancho uma senhora de idade, inválida, a mãe de James Ostrid, e solicitaram

         os meus serviços em troca de uma boa remuneração.

                   ‑        Quer dizer que não ficas cá por muito tempo?

                   ‑        Depende ‑ disse Jeremy e olhou intensamente para Jessie. ‑ Anda, vou mostrar‑te o andar superior.

                   Jeremy abriu a porta do quarto de hóspedes e depois a do seu quarto. Jessie teve vontade de voltar para baixo, mas ele deteve‑a. Precisava de a ter mais uma vez nos braços. Jessie resistiu até poder. Sabia que era ela que controlava a situação, uma vez que Jeremy não seria capaz de a forçar a nada. Olhou‑o nos olhos, como se estivesse a pedir‑lhe para não continuar a seduzi‑la, mas ao fazê‑lo sentiu que todo o seu corpo se electrizava. Ele foi‑se aproximando ao mesmo tempo que ela retrocedia até ficar junto ao vão da porta. Olhou uma vez mais para Jeremy com olhos suplicantes, mas, simultaneamente, carregados de uma voluptuosidade que desmentia a recusa. Ele encostou‑se ao corpo dela e começou a beijá‑la com ternura. O prazer que a invadia levou‑a a consentir a atitude de Jeremy. Ele abraçou‑a pela cintura e, depois, acariciou‑lhe os seios. Jessie conteve um gemido de prazer, enquanto sentia que o calor invadia o seu corpo e o desejo era cada vez mais forte.

         Jeremy deixou um dos seios descoberto e beijou‑o.

         Depois, beijou‑a na boca com ardor.

         Jessie abraçou‑o e, ao fazê‑lo, notou que Jeremy estava excitado. Isso encheu‑a de prazer e assustou‑a. Sabia que, se não parasse naquele preciso momento, as suas forças fraquejariam e deixaria que ele a possuisse. Procurou afastá‑lo.

         ‑ Sinto muito, Jeremy, não posso.

         Jeremy, com muito esforço, afastou‑se um pouco dela e olhou‑a directamente nos olhos.

         ‑ Jessie, daria qualquer coisa para que fosses minha, mas sei que não é possível. Diz‑me, como posso parar de pensar em ti? Desde que te conheci, a tua lembrança acompanha‑me em cada minuto.

         ‑ O nosso amor é proibido e sem futuro.

         Jessie começou a chorar. Gostaria de poder dizer‑lhe que o amava, que ele era o único homem que tinha conseguido inquietá‑la, mas não podia. O seu dever de esposa estava acima dos seus desejos.

         A buzina da camioneta soou várias vezes, antes de Jessie perceber que era Fred. Olhou para o relógio. Eram quatro da tarde. Uma expressão de espanto desenhou‑se no seu rosto. Tinham passado mais de seis horas desde que saíra de Royal Crest. Bill estaria á espera enfurecido. Desceu as escadas a correr. Tinha medo, sentia‑se culpada e, ao mesmo tempo, sentia‑se totalmente mulher.

         ‑ Aonde vais tão depressa?

         ‑ É Fred, está a chamar‑me. Não ouves?

         ‑ Sim, já ouvi. Mas pode esperar uns segundos.

         Beijou‑a docemente, e ela não conseguiu resistir. Estava envolvida numa história inexplicável de desejo, numa paixão selvagem que lhe tirava o sono. Porém, apesar dos obstáculos intransponíveis que a separavam dele, sentia‑se capaz de suportar tudo, até a feroz perseguição a que Bill a submeteria inevitavelmente assim que chegasse a Royal Crest.

‑ Vejo‑te amanhã no rancho ‑ disse Jeremy

                   ‑        Acho que não é conveniente verem‑nos juntos. Na verdade, não sei se deveríamos voltar a ver‑nos.

                   ‑        Jessie, achas que conseguiria estar muito tempo longe de ti? Preciso de ti ao meu lado.

                   ‑        Sinto muito, Jeremy, mas sou a mulher de Bill.

                   ‑        Se quisesses, talvez pudesses deixá‑lo e...

                   ‑        Não prossigas. É impossível. Sabes que nunca abandonarei alguém em semelhante situação. Nem

sequer o Bill. O meu lugar é ao lado dele.

‑ Isso significa um adeus?

         - Não, Jeremy, mas também não posso voltar a ver-te, Pelo menos nestas circunstâncias.

         - E o que pretendes de mim?

         - Não sei. Quem me dera saber a melhor maneira de resolver isto, mas não encontro saída.

         - Bem, acho que por hoje é melhor descansares. Encontraremos uma solução.

                   Fred começou a ficar impaciente. Voltou a buzinar, e Jessie saiu apressadamente da casa.

         - Finalmente, menina! Que grande confusão vai haver quando chegarmos a Royal Crest.

         - Ouve, Fred, peço‑te que não digas a Bill que estive à tua espera em casa de Jeremy.

         - Acha que seria capaz de fazer uma coisa dessas? Nunca, menina. Dir‑lhe‑ei que a camioneta se avariou e que Louis me ajudou a concertá‑la.

         - Obrigada, Fred.

                   ‑        Ah, menina... Por favor, tenha cuidado.

         - É a segunda pessoa a dizer‑me isso. Está a acontecer alguma coisa que eu não saiba?

         ‑ Não, menina. Mas é meu dever alertá‑la que, embora o senhor Bill não consiga andar, pode estar em todo o lado. Lembre‑se de que ainda tem alguns amigos na aldeia. Tenha cuidado.

         Jessie lembrou‑se de que os velhos amigos de Bill, da altura dos rodeios, por vezes iam ao rancho. Eram vaqueiros rudes. Talvez Fred tivesse razão. Talvez fosse boa ideia começar a ter cuidado de futuro.

         O sol ainda se reflectia nas paredes de Royal Crest quando Jessie atravessou o alpendre da casa, decidida a ouvir qualquer coisa da parte de Bill. Ficou surpreendida ao verificar que não estava à sua espera à entrada e ficou ainda mais inquieta quando não o viu na sala. Correu à cozinha.

         ‑ Bíanche, onde está o Bill?

         Bíanche virou‑se, sobressaltada.

         ‑ Olá, menina, não me pregue esses sustos. O senhor Bill esteve no seu quarto toda a tarde. Acho que o almoço lhe caiu mal, pois não voltou a chamar‑me.

         ‑ Estás a dizer‑me que está lá desde o meio‑dia?

         ‑ Sim. Só fui lá para o avisar de que tinha uma chamada telefónica.

         ‑ Quem telefonou?

         - Não sei. Acho que era um amigo do senhor. Pediu apenas para falar com ele.

         Jessie lembrou‑se do que Fred tinha dito. De certeza que algum dos amigos de Bill os tinha visto na aldeia e tinha corrido a informá‑lo. Com medo, rodou a maçaneta da porta da sala. Bill estava deitado, quase inconsciente de tanto que bebera.

         ‑ Bill, estás bem?

                   Bill só conseguiu balbuciar algumas frases sem nexo.

         ‑ O maldito está aqui. Agora terá o seu fim.

         ‑ Que estás a dizer?

         ‑ Ele vai terminar o seu trabalho, não duvides.

                   Bill voltou a mergulhar num sono profundo e Jessie retirou‑se do quarto. Procurava entender as frases de Bill. Estaria a falar de Jeremy?

         A Lua Cheia iluminava o céu. Jessie dirigiu‑se ao alpendre e sentou‑se a contemplar a paisagem.

                   O estábulo parecia uma enorme pista de circo com a sua areia branca. Jessie lembrou‑se de que fizera uma promessa a si mesma. Montaria mais uma vez Snow Cat. Era como uma espécie de desafio. Esse potro tinha sido o único a fazê‑la comer poeira.

                   Jessie dirigiu‑se à boxe onde se encontrava Snow CaL O cavalo aproximou a cabeça da porta, e balançou‑a para cima e para baixo, como se estivesse a alertar Jessie para que não o montasse.

                   ‑ Estou a ver que não queres nada com as pessoas. Tens razão para te mostrares cauteloso connosco, mas espero que nos tornemos amigos.

                   Jessie foi à cabana buscar os arreios. Depois, suavemente, pô‑los no potro, que começou a correr à volta da cerca. De vez em quando, dava coices para demonstrar a sua força. Depois de o potro se cansar de saltar e correr, Jessie aproximou‑se e pós‑lhe o freio. Antes de acabar de amarrar as correias, o potro começou a recuar. Jessie suportou de pé os continuos estirões e lamentou não ter um chicote para dominar melhor o animal. Uma lanterna ao longe indicou a aproximação de alguém. Era Fred.

         ‑ Não está a pensar em montar Snow Cat, pois não?

         ‑ Deixa‑me, Fred, consigo fazê‑lo.

         ‑ Nem pensar. à noite, não. É muito perigoso.

         Fred entrou no estábulo e segurou Snow Cat pelas rédeas. Jessie'ficou zangada.

         ‑ Não fique zangada, menina, é para o seu bem.

         Zangada, Jessie correu para casa. Sentia que tudo corria mal e já não conseguia conter o desgosto e a angústia. Subiu para o quarto e atirou‑se para cima da cama. Antes de adormecer, pensou em Jeremy apertando‑a contra o peito e mergulhando com ela num interminável abraço. Estava longe de imaginar as trágicas horas que se aproximavam.

 

         A porta de grades fechou‑se com estrondo atrás de Frank. Finalmente, estava livre. Acabava de cumprir uma pena que considerava injusta. Mas era o preço a pagar por ter tomado uma decisão arriscada. Uma decisão que ainda estava por acabar. Ao sair da prisão, tinham‑lhe dado, juntamente com os objectos pessoais, dez dólares. Comprou um jornal. Na primeira página, as notícias locais misturavam‑se com as de outras cidades e estados. Respirou o ar quente da manhã e procurou um café que tivesse telefone. Deixou o jornal sobre uma mesa e dirigiu‑se ao telefone. Sabia o número de cor.

 

                   Apesar de ser domingo, Fred estava a tratar do velho tractor, tentando pó‑lo a funcionar.

                   Jessie também tinha acordado cedo. Com uma

         escova e cera, tentava polir Snow Cat para estar mais

         perto dele e conseguir ganhar a sua confiança. Na cozinha, Bíanche preparava o pequeno‑almoço. O telefone tocou várias vezes antes de a criada dar conta. Resmungando pela inoportuna chamada, andou pelo corredor à procura do telefone sem fios que, como sempre, ficara esquecido entre as almofadas da sala. Do outro lado da linha, uma voz grave e arrastada pediu para falar com BiU Wider. Bíanche

         tremeu só de pensar que tinha de ir acordá‑lo.

                   Bateu na porta do quarto. Como resposta, ouviu um ressonar. Ganhou coragem e entreabriu a porta.

                   ‑ Senhor Bill, tem uma chamada telefónica.

                   Sem abrir os olhos, Bill tirou uma mão debaixo dos lençóis e esticou‑a á procura do telefone. Bíanche entregou‑lho e saiu do quarto o mais depressa possível.

         - Quem fala!?

                   ‑ Sabes bem quem sou, não sabes, Bill?

                   ‑ Maldito, tu outra vez? Diz‑me o que queres.

                   ‑ Dir‑te‑ei pessoalmente, Bill. Hoje mesmo.

                   Um suor frio correu pelas costas de Bill. Se fosse verdade o que suspeitava, o homem do outro lado da linha sabia bem o que queria.

         ‑ Ouve, sabes muito bem que não podes vir até aqui. Não estás em condições de o fazer.

         ‑ Pelos vistos, não lês os jornais.

         O pânico começou a apoderar‑se de Bill, mas ainda lhe restava uma cartada.

         ‑ Escuta, maldito, não tenho nada a ver com os teus problemas. Tu tens a ver com os meus e, no entanto, procurei esquecer‑me do sucedido.

         ‑ Eu não.

         ‑ Que queres dizer?

         ‑ As nossas contas ainda não estão saldadas.

         O homem desligou o telefone. Pela primeira vez na vida, Bill não pensou nele mas em Jessie. Apesar da sua maldade, não lhe restava outra alternativa senão aceitar que amava a sua mulher.

 

         O domingo era um dia muito ansiado em Merrvville, e este era particularmente especial para toda a população. Tratava‑se do concurso de tartes de abóbora. As mulheres da região faziam com esmero os seus bolos de abóbora, que depois eram premiados e vendidos na feira. Royal Crest não era alheio a este festejo. Bianche preparava o seu bolo. Jessie entrou na cozinha para ir buscar a bandeja do pequeno‑almoço e viu Bíanche com a cara suja de farinha.

         ‑ Gostaria de ver como fica o teu bolo na mesa. De certeza que será o mais vistoso.

         ‑ Não quer ir comigo para ver o concurso?

         ‑ Sabes que Bill nunca permitirá.

         ‑ Sinto muito, menina.

         ‑ Não te preocupes, Bíanche. Talvez um dia...

         Jessie saiu da cozinha com um jarro fumegante de café acabado de fazer, mel e algumas torradas.

         Bill esperava‑a à mesa. Não estava a ler o jornal e olhava para Jessie com olhos inquiridores.

         ‑ Bianche esmerou‑se, o bolo vai ficar espectacular.

         ‑ Queres acompanhá‑la para veres o concurso?

         A pergunta deixou Jessie gelada. Olhou para Bill com incredulidade, pensando que se tratava de uma brincadeira; mas não era. Pelos vistos, a proposta era a sério. Bill estava irreconhecível. Não só não lhe chamava a atenção por coisas mesquinhas, como também permitia que ela fosse á aldeia distrair‑se. E ainda mais, nos últimos dias tinha deixado de beber. O que o teria motivado a semelhante mudança?

         Jessie bebeu o café e levantou‑se para levar a louça para a cozinha. Ao fazê‑lo, notou que um objecto sobressaía de um dos lados da cadeira de rodas. Tratava‑se da espingarda de Bill. Pensou em perguntar‑lhe por que a tinha preparado, mas desistiu da ideia.

         ‑ Está bem, Bill, vou ao concurso das tartes.

         Bill pareceu não ouvir a resposta de Jessie. Tinha o olhar fixo na janela.

         Por breves momentos, Jessie receou que o marido estivesse a preparar‑lhe uma armadilha. Talvez o telefonema referido por Bíanche tivesse a ver com tudo isso. Quem sabe se não contratara um dos seus amigos para a seguir. Dirigiu‑se á cozinha com uma expressão de felicidade no rosto.

         ‑ Menina, traz‑me uma boa notícia? Por acaso já ganhei o prémio antes de fazer a tarte?

         ‑ Não, Bíanche, mas tenho a certeza de que ganharás. E eu estarei ao teu lado.

         ‑ O que está a dizer? Não quero contrariar o senhor Bill...

         ‑ Ele deixou‑me ir convosco. Não é fantástico?

         ‑ O senhor Bill disse‑lhe que sim? Hum, é estranho.

         Bíanche abanou a cabeça, preocupada. A atitude de Bill era boa demais para ser verdade.

         Jessie correu a avisar Fred de que ia com eles.

         ‑ Tem a certeza de que entendeu bem, menina?

         ‑ Se quiseres, podes perguntar‑lhe pessoalmente.

         ‑ É estranho, não acha?

         ‑ Sim, na realidade é estranho. Sabes, Fred, também acho estranho que Bill tenha a espingarda carregada. Não há razão para a ter a seu lado.

         ‑ Nem debaixo da almofada.

         ‑ Por acaso costuma guardá‑la ali à noite?

         ‑ Sim, menina. É como se estivesse á espera do momento certo para a usar.

         Jessie sentiu um calafrio. Talvez Bill estivesse a planear matá‑la, ou a Jeremy. Era preciso impedi‑lo, mas como? Jessie pensou no seu velho amigo, o Dr. Woodlite. Só ele podia chamar Bill à razão, caso se preparasse para cometer uma loucura.

         ‑ Fred, sairemos mais cedo. Tenho de falar com o Dr. Woodlite imediatamente.

         Fred foi preparar a camioneta. Ao passar pela sala, Bill fez‑lhe um sinal para se aproximar.

         ‑ Fred, tenta regressar o mais tarde possível.

                   ‑ Sim, senhor, mas não acha que pode precisar de

nós? No seu estado...

 

‑ Não quero ver nem sinal de vocês antes das oito.      - Compreendido, senhor Bill.

                   Fred saiu a correr. Bíanche sentou‑se na parte de

trás da camioneta. Levava a tarte de abóbora ao colo. sentou‑se à frente e partiram rumo à aldeia. Porque seria que Bill não quisera acompanhá‑los?

         A pergunta atormentava Jessie, que pensava que era melhor não o deixar só durante tanto tempo. Mas

ele teimara em não ir.

         à entrada de Royal Crest, encontraram um homem com cerca de cinquenta anos, de aspecto rude. Jessie reparou que a cara lhe era familiar. Fazia lembrar o tipo dos vaqueiros que costumavam visitar Bill noutros tempos. Fred parou e o homem saltou do cavalo.

                   ‑ Posso ser‑lhe útil, senhor?

                   ‑ Oh, não. Estava simplesmente a observar o local. Posso seguir por este caminho?

                   ‑ Acho que não, senhor. É propriedade privada.

                   ‑ Bem, nesse caso, seguirei por outro caminho.

                   O homem montou novamente e seguiu na direcção contrária. Fred arrancou com a camioneta e afastou-se rumo à aldeia. Jessie olhou para trás. Poderia jurar que o homem entrara em Royal Crest. Jessie levava o seu vestido cor‑de‑rosa e prendera o cabelo com um laço. Tinha posto o conjunto cor de lavanda que comprara no supermercado. Antes de chegar à praça, Jessie pediu a Fred que passasse pela casa do Dr. Woodlite. Estava preocupada com a mudança dehumor de Bill. Bíanche e Fred esperaram‑na na camioneta e, logo que regressou, retomaram o caminho rumo à feira. Jessie sentia‑se livre. Queria divertir‑se, conversar com amigos e ver Jeremy. Iria ao concurso? Uma voz tirou‑a dos seus pensamentos.

         ‑ Jessie, fico contente por te ver. Há algum tempo que queria conversar contigo.

         Mary Jo, a filha mais nova dos Ostrid, tinha sido colega de escola de Jessie. Embora com gostos diferentes, tinham partilhado confidências na adolescência.

         ‑ Olá, Mary Jo, estás óptima!

         ‑ Achas que sim? Fui fazer compras a Nova Iorque. Lá sim, é que se sabem vestir! E tu, o que contas?

         ‑ Tenho muito trabalho no rancho. Estou a tentar obter novos exemplares para o rodeio.

         ‑ Na verdade, adquiriste um bom...

         ‑ Referes‑te a Snow Cat? Como soubeste?

         ‑ Não, refiro‑me aJeremy Stone. É um belo macho.

         Jessie corou. Sabia que podia haver segundas intenções nas palavras de Mary Jo.

         ‑ Sim, tem bom ar. Está a tratar de Bill. Acho que também está a tratar da tua avó, não é?

         ‑ Oh, sim, e espero ansiosamente pela sua visita. Porém, parece que está interessado noutra jovem.

         Jessie começou a zangar‑se. Odiava as indirectas.

         ‑ Escuta, Mary Jo, se queres dizer‑me alguma coisa, fá‑lo directamente, como nos velhos tempos.

         ‑ Está bem. Na aldeia, comenta‑se, ora, tu sabes...

         ‑ Não, não sei, e por isso estou a perguntar‑te.

         ‑ Diz‑se que és a amante de Jeremy.

         ‑ Meu Deus, é o cúmulo.

         ‑ Sabes como são as más‑línguas da aldeia.

         ‑ Sim, e também sei que tenho um marido inválido, mas isso não justifica que lhe falte ao respeito.

         ‑ E sei que não o farás. Basta verem‑te ao lado de outro homem para tecerem comentários.

         ‑ E o que devo fazer? Fechar‑me em Royal Crest?

         Mary Jo olhou para Jessie. Tinha de reconhecer que era uma mulher muito bela e que não tinha tido sorte ao casar‑se com Bill. Teve pena dela.

         ‑ Não ligues aos comentários. Jeremy é um bom tipo e ninguém tem o direito de manchar essa relação.

         ‑ Estás a falar a sério?

         ‑ Claro. As pessoas tecem os mais variados comentários e não vêem com simpatia determinadas coisas, mas eu sei que deve ser penoso estar na tua situação.

         ‑ Obrigada, Mary Jo, fez‑me bem falar contigo.

         Jessie convidou Mary Jo para a acompanhar à mesa onde estavam expostos os bolos. Alguém assobiou nas suas costas. As duas viraram‑se e depararam com Jeremy que, divertido, lhes fazia uma vénia.

         ‑ É um prazer encontrar‑vos. Aceitam uma cerveja?

         ‑ Oh, tenho de ir ter com o meu pai ‑ disse Mary Jo.

         Jessie olhou para ela sem compreender. Não se via o senhor Ostrid em lado nenhum. Mas reparou no característico gesto malandro da amiga.

         ‑ Até logo, Jessie. Vemo‑nos depois.

         ‑ Até breve, Mary Jo. Cumprimentos à tua família.

         Jeremy ofereceu o braço a Jessie.

         ‑ Não sei se devo. Esta gente conhece‑me e...

         ‑ E vão pensar que em plena luz do dia estamos a namoriscar? Acho que estás a ficar paranóica.

         Jessie apoiou a mão no braço de Jeremy. Afastaram‑se da multidão e foram beber uma cerveja.

         ‑ Jessie, preciso de te ver.

         ‑ Estás a ver‑me.

         ‑ Não brinques, preciso de te ver a sós.

         ‑ Jeremy, sabes que isso é impossível.

         ‑ Eu sei, mas se não o fizer vou eulouquecer.

         ‑ Não, é uma loucura. Todos saberão que há algo entre nós. Não quero ser motivo de conversa.

         ‑ Nem serás. Falarei com Fred. Dir‑lhe‑ei que tens de ir a minha casa buscar uma coisa para Bill.

         ‑ Pensas que Fred é idiota?

         ‑ Nesse caso, dir‑lhe‑ei a verdade.

         ‑ Estás a gozar?

         ‑ Não! Além de que precisamos de um cúmplice.

         ‑ Desculpa ‑ disse Mary Jo ao apanhar a bola que caíra sobre a mesa. ‑ Espero não interromper nada.

         ‑ Não interrompeste nada. Falávamos de Bill.

         ‑ Imaginei ‑ disse Mary Jo, afastando‑se.

         ‑ Aqui não se consegue estar tranquilamente. Vamos embora. Conheço uma pastelaria aqui perto. Vamos tomar um café longe do olhar desta gente.

         ‑ Espera, vou avisar Fred.

         Jessie percorreu o trecho que a separava de Fred. Não parecia mal aceitar o convite de Jeremy, excepto num pormenor. Custava‑lhe comportar‑se como se nada tivesse acontecido entre eles. Contudo, poder estar um momento a sós com ele excitava‑a. Para sua

surpresa, Fred recebeu com agrado a proposta.

         ‑ Não tem nada de mal, menina. Vá sossegada que ficaremos aqui até regressar. Faz bem em sair um pouco das quatro paredes de Royal Crest. Ah, e não se preocupe com a hora. Regressaremos a casa tarde.

         Jessie surpreendeu‑se ao ouvir este último comentário, mas pensou que Fred decerto teria as suas razões para adiar o regresso a Royal Crest.

         Jessie partiu com Jeremy no carro, rumo ao café. O seu entusiasmo não a deixou ver como Mary Jo e as suas irmãs se entreolharam ao vê-los passar. Também não imaginava quanto iria lamentar ter dado rédea solta ao seu desejo de partilhar uns momentos a sós com o homem que amava.

 

         O carro percorria velozmente os escassos quilómetros em direcção à pastelaria. Jeremy carregou num botão e uma música romântica invadiu o carro.

         ‑ Gostas? ‑ perguntou Jeremy.

         A pergunta sobressaltou Jessie.

         ‑ Quebraste o encanto. A música levou‑me a pensar que estava a viajar com um príncipe, numa maravilhosa carruagem em direcção a um castelo encantado. E agora percebo que estou num automóvel com um homem que quer saber se gosto da música.

         ‑ Então, tem cuidado porque, se continuas a pensar que tudo é encantado, posso, a qualquer momento, transformar‑me num sapo e terás de me beijar.

         Jessie sorriu. Gostava deste homem com gestos rudes e olhar terno. Não era fingido e falava com franqueza, olhando sempre nos olhos. Contudo, tinha mais alguma coisa. O seu corpo não lhe obedecia quando estava à frente dele. Sentia arrepios e ficava inquieta. Embora lhe custasse reconhecer, Jeremy tinha tocado no fundo do seu coração e, além disso, desejava‑o ardentemente. Observou‑o enquanto conduzia. Sentiu um impulso de o abraçar e beijar. Jeremy pareceu adivinhar os seus desejos, e o carro nunca mais chegou à pastelaria.

         Com rapidez, fez um desvio no trajecto, entrando por um caminho lateral. Estacionou debaixo de um álamo. O local estava deserto e o calor do Verão fazia‑os transpirar. Jessie tirou uma fita do bolso e prendeu o cabelo. A nuca ficou descoberta, tornando‑se uma enorme tentação para Jeremy, que se inclinou para a beijar. Depois, abraçou Jessie e beijou‑a apaixonadamente. Ela rendeu‑se. Jeremy acariciou a pele de Jessie, introduzindo as mãos na camisa húmida da transpiração. Começou a desabotoar os botões até que Jessie ficou apenas com o soutien. Com um rápido movimento, Jeremy desapertou‑lho, deixando os seios de Jessie à mostra. Jeremy beijou‑os, sentindo como os mamilos endureciam enquanto as suas mãos desciam pelo corpo de Jessie. Com um puxão, fez deslizar as calcinhas e acariciou as coxas de Jessie. Ela gemia e semicerrava os olhos para poder desfrutar em pleno o prazer que Jeremy lhe causava.

         Ele levantou‑lhe a saia e deitou‑se em cima dela. Os seus instintos avisavam‑no que esse era o momento ideal para a possuir, pois ela não oporia resistência.

         - Não, por favor, não - suplicou Jessie.

         Bastava vê‑la com o cabelo revolto e os olhos cegos de desejo para pressentir que podia fazer com ela o que quisesse. Mas não queria magoá‑la. Beijou‑a apaixonadamente e depois pediu‑lhe que se vestisse.

         Jessie obedeceu‑lhe em silêncio. Sabia o que tinha custado a Jeremy dominar os seus impulsos e não o culpava por se comportar de modo um tanto rude.

         O carro regressou, como eles, em silêncio. Já não se ouvia música e nenhum dos seus ocupantes tinha muito que dizer. Estancar de repente a paixão tinha sido um golpe duro para ambos, mas era melhor assim. Desse modo, não haveria arrependimentos.

         Tinha chegado o momento tão esperado por todas as donas de casa de Merrvville.

         Ali se encontravam expostas para todos os habitantes da zona as mais deliciosas tartes de abóbora.

         O júri era composto pelas pessoas mais importantes da região. O velho Dr. Woodlite declinara o convite para participar. Louis, ao contrário, exibia orgulhoso a insígnia alaranjada que o identificava como membro do júri. A directora da escola, o veterinário e o juiz eram algumas das personalidades mais notáveis. Também fazia parte da comitiva Nelly Simpson, proprietária de restaurante e conhecedora dos segredos culinários dos pratos típicos do Kentucky.

         ‑ Eh, Joseph, a tua mulher fez um bolo fantástico.

         ‑ O vosso também está lindo. Boa sorte.

         à medida que iam colocando os bolos com os respectivos cartões identificativos na grande mesa, cada família gabava o bolo da outra, embora, secretamente, todos desejassem ganhar o prémio. A sua importância não era o seu valor monetário, uma vez que se tratava de um pequeno alfinete de ouro em forma de abóbora e um diploma, mas a honra de ter conseguido o reconhecimento do júri era o mais importante.

         Mary Jo Ostrid e a irma Jane aproximaram‑se da mesa para ver melhor o desenrolar do concurso.

         ‑ Tens a certeza do que ouviste, Mary Jo?

         ‑ Absoluta. Nunca confiei em Jessie.

         ‑ E não é possível que te tenhas enganado?

         ‑ Pode ser... No entanto, ouvi‑os dizer que precisavam de um cúmplice. Sabes o que isso significa?

         ‑ Sim, acho que sei. Significa que fazes da vida uma eterna novela, hem, Mary Jo? Jane piscou‑lhe o olho e deu a conversa por terminada.

         O escrutínio terminara e em breve seria conhecida a escolha do júri. Alguns minutos depois, anunciaram o número do cartão vencedor.

         ‑ O vencedor é o número... cinco!

         ‑ É o meu, ganhei! Fred, ganhei o prémio!

         Bíanche, eufórica, surgiu entre a multidão e dirigiu‑se ao júri. Alguém murmurou que era apenas uma criada negra, mas a maioria aplaudiu a vencedora. Com lágrimas nos olhos, Bianche recebeu de Louis o alfinete e o diploma. Esse dia tornar‑se‑ia o dia mais feliz da sua vida e também um dos mais tristes.

         O Dr. Woodlite pegou na sua velha maleta e entrou no velho Ford. Faltava pouco para as cinco da tarde, mas na aldeia os festejos prosseguiam e assim continuariam pela noite dentro. Jessie tinha dito que Bill estaria sozinho em casa. Era o momento ideal para ir visitá‑lo. Se tivesse um problema por resolver, possivelmente o Dr. Wbodlite poderia ser seu confidente.

         O velho Ford levou uma hora a chegar a Royal

Crest. Apesar de ir devagar, Woodlite esteve prestes a

chocar contra um cavaleiro que, veloz, cruzou o

caminho, seguindo em direcção oposta à da aldeia.

         Woodlite parou a camioneta. Tinha apenas pisado o primeiro degrau da escada da entrada quando reparou que a porta estava aberta. Um instinto especial, próprio da sua profissão, indicou‑lhe que alguma coisa de anormal estava a acontecer. Ao entrar, confirmou as suas suspeitas. Havia sinais de luta. Alguém tinha entrado na casa, talvez para roubar. Woodlite dirigiu‑se ao quarto de Bill. O homem jazia no meio da cama, banhado em sangue. Ao seu lado estava a arma que Jessie tinha referido.

         Rapidamente, abriu a camisa para ver a ferida. Tratava‑se de uma ferida profunda, que atravessava o peito, feita com arma branca. Woodlite tentou estancar a hemorragia, mas já era tarde. Bill estava morto.

         O médico levantou‑se e olhou para o quarto. A cadeira de rodas encontrava‑se longe da cama. Alguém tinha levado Bill até à cama com o intuito de o assassinar. Também havia outra possibilidade, mas Woodlite afastou‑a. Não, não era possível, Bill não conseguia andar...

         A verdade era que Wider tinha sido assassinado e já não havia nada a fazer. Woodlite sentou‑se para meditar sobre o sucedido. O móbil do crime poderia ter sido o roubo, no entanto, era pouco provável, uma vez que era óbvio que Bill estava à espera do agressor. Poderia tratar‑se, também, de um ajuste de contas, mas há um ano que Bill se encontrava indefeso na cadeira de rodas. Porquê esperar tanto tempo para o matar? E, o mais enigmático, porquê avisá-lo da sua morte para que estivesse prevenido e com uma arma carregada ao seu lado? As coisas não faziam sentido. Woodlite pegou no telefone para ligar à Polícia.

         Eram oito horas quando Fred, Jessie e Bianche chegaram a Royal Crest. O rancho estava irreconhecível. Havia vários carros na entrada e reflectores acesos indicavam que havia câmaras de televisão no local. A carrinha da Polícia estava estacionada à porta de casa. Pred foi à frente e encontrou o Dr. Woodlite.

         ‑ O que aconteceu, doutor?

         ‑ Foi o Bill. Está morto.

         ‑ O senhor Bill está morto? Devia ter imaginado que estava prestes a suicidar‑se, eu...

         ‑ Não, Fred, não foi suicídio. Foi assassinado.

         Fred conseguiu reprimir um grito de espanto. Virou‑se e interceptou Jessie.

         ‑ Menina, espere.

         ‑ O que está a acontecer?

         Os olhos de Jessie procuraram os do Dr. Woodlite.

‑ Jessie, lamento. O Bill morreu.

‑ Mas, como aconteceu?

‑ Não sabemos. Alguém entrou na casa.

‑ Isso significa que foi morto? Bill foi assassinado?

‑ Lamentavelmente, sim.

         Jessie deu um grito e depois desatou a chorar, abraçando‑se ao Dr. Woodlite.

         Um homem robusto apareceu à frente deles.

         ‑ Chamo‑me Marshall, detective James Marshal da divisão de homicídios. Lamento, senhora Wider, mas vou ter de lhe fazer algumas perguntas.

         Jessie olhou‑o com espanto. Sentia‑se culpada por ter partilhado umas horas com Jeremy e notava‑se‑lhe no rosto. Se tivesse ficado em Royal Crest, talvez nada tivesse acontecido. E agora, para cúmulo, no meio da sua dor, aproximava‑se dela um detective que faria todo o tipo de perguntas embaraçosas.

         ‑ O seu marido tinha inimigos?

         ‑ Não, que eu saiba.

         Jessie pensou que mais do que uma pessoa desejaria vê‑lo morto. Sabia que durante os cinco anos de vivência em Merryville ele conquistara inimigos, mas não conseguia pensar quem poderia tê‑lo morto.

         ‑ Aparentemente, o móbil do crime não foi o roubo. Agora tenho de saber, havia valores guardados ou cofres nalgum lugar da casa?

         Jessie entrou em casa com o detective, atravessou a sala e dirigiu‑se à parede onde se encontrava o quadro com o retrato do pai. Apertou um enfeite da chaminé e o quadro subiu, deixando ver um cofre.

         Dentro havia papéis, titulos e algumas acções, mas tudo estava no lugar. O móbil, tal como tinha dito o detective, não tinha sido o assalto.

         Marshall pediu a Jessie para se sentar na sala para prosseguir com o interrogatório. Jessie viu passar a maca e desmaiou. Uns segundos mais tarde, o Dr. Woodlite fazia‑a voltar a si.

         ‑        Detective, receio que a senhora Wider não esteja em condições de responder a mais perguntas. Sofreu um golpe muito duro e, como médico da família, vou dar‑lhe um sedativo para que possa descansar.

         - Ainda preciso de lhe fazer mais algumas perguntas, mas vou deixá‑la descansar. Dentro de alguns dias passarei por cá, se concordar.

         ‑        Sim, claro ‑ balbuciou Jessie.

         O detective despediu‑se dela com um cordial aperto de mão e dirigiu‑se à saída. Antes de se retirar, virou‑se para Jessie.

         ‑        Uma última pergunta. Poderia dizer‑me onde esteve hoje entre o meio‑dia e as seis da tarde?

        ‑ Eu, oh, sim, estive na feira da aldeia.

         Jessie sentiu as faces a arderem. A sua voz balbuciante levou o inspector a pensar que estava a esconder alguma coisa. E não se enganava.

         ‑        Está bem, espero que tenha testemunhas. É uma pergunta de rotina, mas,. como deve saber, a mulher é a primeira suspeita ‑ sorriu cinicamente e partiu, deixando Jessie a chorar.

‑ Dr. Woodlite, não é possível. Bill teve uma morte horrível e ainda por cima suspeitam de mim.

‑ Eu sei, Jessie, mas tens de colaborar. Ninguém desconfia de ti. O detective está a fazer o seu trabalho. E tu sabes que não tens nada a esconder, não é?

         Woodlite segurou no queixo de Jessie; ou muito se enganava, ou os olhos dela diziam‑lhe o contrário. Para se certificar, decidiu mandá‑la ao consultório.

‑ Está bem, doutor, como quiser. A que horas?

‑ às cinco da tarde é uma boa hora.

         O Dr. Woodlite dirigiu‑se a Fred e entregou‑lhe alguns comprimidos, indicando que desse um à jovem antes de ela se deitar.

         ‑        Fred, tenta descansar esta noite e amanhã não te esqueças de a levar à aldeia. Estarei à espera dela no meu consultório às cinco da tarde.

         ‑        Lá estaremos, doutor. Boa noite e obrigado.

         à medida que a noite decorria, foram desaparecendo de Royal Crest os inúmeros carros que se encontravam ali estacionados. Bianche, Fred e Jessie sentaram‑se no salão.

         ‑        Menina, quero falar‑lhe sobre o senhor Stone.

         ‑        Oh, Fred. Fiz mal em ir com ele tomar um café. As pessoas fizeram comentários, não é?

         ‑        Não se trata das pessoas. Na aldeia arranjam sempre um tema de conversa. Mas o que aconteceu ao senhor Bill vem alterar as coisas.

         ‑        Não entendo. O que estás a querer dizer?

         ‑        Menina, as pessoas podem dizer coisas que realmente a prejudiquem...

         ‑        Fred, não entendo indirectas. Fala claramente.

         ‑        Na verdade, acho que ninguém sabe quem matou o senhor Bill.

         Jessie raciocinou ao ouvir estas palavras. Bill estava morto e ela tinha um amante ou, pelo menos, era o que todos pensavam. O mais provável seria que as coscuvilheiras da aldeia tecessem as suas intrigas e chegassem à conclusão de que ela e Jeremy tinham morto Bill. Daí a serem julgados por assassínio era um passo. E tudo porque ela não tinha sabido manter‑se a uma distância prudente. A única maneira de se salvar era descobrir o assassino, mas não tinha a menor ideia de quem podia ser. E até que se descobrisse o assassino, a sua vida transformar‑se‑ia num inferno.

 

         O Dr. Woodlite mandou Jessie entrar no consultório. Depois de ter cumprido as formalidades, tentou abordar o assunto.

         ‑ Jessie, quero lembrar‑te de que te trouxe ao mundo e tive a felicidade de conhecer os teus pais. Eles queriam o melhor para ti e eu também. Em sua memória, vou fazer‑te uma pergunta íntima: sabes alguma coisa sobre a morte de Bill que eu não saiba?

         Jessie sentiu‑se decepcionada. Pelos vistos, até o médico desconfiava dela. Sentiu que explodia de tanta pressão e começou a falar descontroladamente.

         ‑ Ouça, doutor, não tive nada a ver com a morte de Bill, se o senhor acha que só porque Jeremy e eu... não fiz nada de mal, e se esse detective acha que...

         ‑ Eh, Jessie, mais devagar. Acho que começo a entender. Tu e Jeremy...

         ‑ Mentiras, são só mentiras.

                   ‑ Ainda não disse nada.

                   Bem, imagino que o dirá. E enganar‑se‑á.

‑ Calma, Jessie. Vamos ordenar as ideias. De tudo

                   o que disseste, chego à conclusão de que tu e Jeremy gostam um do outro, não é?

                   O silêncio de Jessie confirmou a suspeita.

                   ‑ E então ‑ disse Woodlite ‑ aconteceu o inevitável. Espera, espera. Quero dizer que se apaixonaram.

                   Jessie hesitou um pouco antes de responder.

                   ‑        Bill sabia alguma coisa dessa paixão inocente?

                   ‑        Não, penso que não. Nunca lhe dei motivos.

                   Jessie mordeu o lábio para não continuar a falar. Na realidade, pensava que se alguém os tivesse visto na pequena cabana teria motivos de sobra para imaginar que eram amantes.

                   ‑        Sentes‑te culpada e pensas que é assim que toda

                   a gente te vê. Vou dizer‑te uma coisa: nem por todo

                   o ouro do mundo me convenciam de que tu e Jeremy

                   tiveram algo a ver com a morte de Bill.

                   ‑        Oh, obrigada, doutor.

                   Jessie comoveu‑se e lágrimas começaram a rolar pelas suas faces.

                   ‑        Se me permites, jovenzinha, vou dar‑te um conselho. Tenta guardar os teus sentimentos a quatro chaves por algum tempo. As pessoas da aldeia são boas, mas gostam de um bom assunto. Não te submetas a ficar malvista sem necessidade, entendes?

                   ‑        Compreendo e agradeço a sua confiança.

         -        É preciso que tenhas cuidado com a maldade das pessoas. Sei que os sentimentos são impossíveis de mudar, mas de momento não os exteriorizes. É para o teu próprio bem. Este assunto cheira mal e atribuirão a morte de Bill a qualquer pessoa, inclusive a ti.

         ‑ Quer dizer que a opinião das pessoas pode ser relevante na acusação de homicídio?

         ‑ Tem cuidado contigo, Jessie. Não tens de recear nada. Amar não é crime.

         Jessie beijou a face do médico e, depois de lhe agradecer os seus conselhos, saiu à procura de Fred.

         Woodlite olhou pela janela até se certificar de que a camioneta partira rumo a Royal Crest. A seguir, pegou no telefone e marcou o número de Jeremy.

         ‑ Olá, Jeremy, fala o Dr. Woodlite. Preciso de falar consigo. É sobre Jessie.

         ‑ O que aconteceu?

         ‑ Ainda não ligou a televisão? Veja as últimas notícias.

         ‑ Aconteceu alguma coisa má?

         ‑ Bill Wider foi assassinado ontem à tarde.

         ‑ Que está a dizer?

         ‑ Mataram o marido de Jessie. Não sabia?

         ‑ É claro que não. Vou já para aí.

         Woodlite desligou e ficou pensativo. Como era possível que Stone tiyesse vivido vinte e quatro horas numa aldeia tão pequena sem ficar a saber o que acontecera a Bill? Ao longo da sua carreira, Woodlite tinha‑se tornado céptico por ver tanta maldade e estupidez humana. Jeremy tinha‑lhe causado boa impressão e não ia mudar a sua opinião da noite para o dia, mas era impossível que não soubesse dos

acontecimentos da tarde anterior. Felizmente, logo que chegou ao consultório, Jeremy esclareceu as dúvidas do doutor. Depois de ter passeado com Jessie pelo campo, regressara a casa, exausto. A frustração por não conseguir resolver a situação e o orgulho ferido por permitir que um tipo como Bill continuasse ao lado de Jessie tinham sido de mais para ele. Uma garrafa de whisky ajudou‑o a adormecer.

         ‑ Está na hora de acordares, Jeremy. Tens de pôr os teus cinco sentidos a funcionar. Jessie corre sério perigo, e tu e eu somos as únicas pessoas que podemos fazer alguma coisa por ela.

 

         Os dias que se seguiram ao assassínio de Bill foram agitados. As visitas do detective e a espera dos jornalistas levaram Jessie a fechar‑se no quarto. A única coisa que Jessie desejava era pôr fim a esse pesadelo que tinha entrado de um modo intempestivo na sua vida, tal como Jeremy. O delegado médico tinha referido que a morte de Bill fora por volta das três da tarde, no momento em que Jessie e Jeremy se encontravam num descampado, sem uma única testemunha que pudesse afirmar que os tinha visto. Mesmo que a Polícia ainda não se tivesse pronunciado, era óbvio que a maioria das pessoas da aldeia suspeitava de Jessie.

         Os rumores já se tinham tornado do domínio público e daria mau aspecto se Jessie não acompanhasse os restos mortais do marido até à sepultura.

‑        Diz a Bíanche para vir cá. Preciso da ajuda dela.

Fred saiu do quarto quando Bianche entrou.

‑        Menina, estou aqui para a ajudar a escolher a roupa. Desculpe, mas fui ao sótão.

‑        Ao sótão?

‑        Sim, menina, tomei a liberdade de abrir o baú. Isto deve ficar‑lhe bem, não acha? Era da sua mãe.

‑        Diz‑me, Bianche, conheceste a minha mãe?

‑        Claro que sim, Era tão bonita como a minha menina. Elegante, sorridente e, além disso, muito boa. Ela estaria muito orgulhosa de si.

Existir alguém que tivesse conhecido a mãe deu‑lhe forças para se levantar e experimentar a roupa. A manhã cinzenta parecia ter‑se preparado para o acontecimento. Jessie, acompanhada por Fred e Bíanche, partiu na camioneta rumo ao cemitério. Ali, os vizinhos da região e alguns amigos aguardavam a sua chegada. O caixão encontrava‑se junto á sepultura e sobre ele estava um ramo de rosas vermelhas que tinham sido encomendadas por Fred&. O padre Fox leu uma oração. Depois, rezou pela alma de Bill e deu por terminada a breve cerimónia. Jessie notou um rasgo de frieza no olhar das pessoas que se aproximavam para lhe dar os pêsames. Ninguém sentia pena pela sua dor. Todos achavam que ela, de alguma forma, era responsável pela morte de Bill. E, lamentavelmente> não havia forma de demonstrar o contrário.

         O Dr. Woodlite foi o único que se aproximou dando mostras de carinho.

‑ Sofreste muito, pequena, mas já falta pouco.

‑ Não sei, doutor. Acho que o meu calvário nunca terá fim. Imagino que esta gente esteja a pensar que eu tive alguma coisa a ver com a morte de Bill e não tenho como provar a minha inocência. Até vi o detective. Não era necessário seguir‑me até aqui, não acha?

‑ Oh> o que realmente acho é que estás a exagerar. Ele só está a fazer o seu trabalho. Há uma teoria segundo a qual o assassino vai ver como enterraram a sua vítima.

‑ Pois, a menos que desconfie do padre ou de outra pessoa conhecida, é impossível. Acho que nenhum dos presentes tinha pretensões de matar BilL

‑ Eu também acho que não

O Dr. Woodlite apressou o passo para cumprimentar Fred e Bíanche, e Jessie viu os dois partirem sem ela.

‑ Eh, Fred, espera por mim!

         Os astutos olhos do Dr. Woodlite sorriram.

         ‑ Tenho uma surpresa para ti. Há uma pessoa que quer cumprimentar‑te.

         O doutor convidou‑a para entrar no Ford. Partiu rumo à aldeia e estacionou na garagem do consultório.

         ‑ Deixo‑te aqui. Volto dentro de pouco tempo.

         Jessie viu‑o trancar a porta. Virou a cabeça sem acreditar no que via. O velho médico tinha‑a deixado sozinha e fechada na garagem.

         ‑ Será uma brincadeira? Não compreendo...

         ‑ O quê?

         A voz de Jeremy soou suave e terna nas suas costas.

         ‑        Pedi ao doutor que te trouxesse. Queria ver‑te, mas era impossível diante de tanta gente.

         Jessie sentiu que tudo à sua volta desaparecia. Só conseguia ver Jeremy perto dela. Não estava sorridente, mas o seu olhar era franco e apaixonado.

         ‑        Então, convenceste o pobre Dr. Woodlite a trazer‑me até aqui... Como o fizeste?

         ‑        Disse‑lhe que estava loucamente apaixonado por ti e que se não te trouxesse iria buscar‑te.

         ‑        Não é o melhor momento para brincadeiras.

         ‑        Não estou a brincar. É verdade.

         ‑        Jeremy, não sabes quanto precisei de te ter ao meu lado. Foi horrível.

         ‑        Eu sei, por isso quis ver‑te, nem que seja só um momento, para poder abraçar‑te. Como sofreste! - Jeremy abraçou Jessie, apertando‑a contra si. Ela apoiou a cabeça no peito musculoso e ele começou a acariciar‑lhe o cabelo. O toque de Jeremy fez com que Jessie tivesse vontade de se estreitar ainda mais ao corpo do homem que amava. A seguir, afastou um pouco a cabeça para o fitar nos olhos.

         ‑        Pensam que participei na morte de Bill.

         ‑        Eu sei. Também suspeitam de mim.

         ‑        De ti?

         ‑        Sim. Acho que, de certa forma, é lógico. Agimos de maneira irresponsável, seguindo os instintos.

         ‑        O que queres dizer com isso?

         ‑        Oh, bem, que aparecemos juntos em público

         e, como é óbvio, devemos ter dado mostras da nossa reacção mútua.

                   ‑        Sim, mas daí a pensar que somos assassinos...

                   ‑        As pessoas gostam de inventar histórias. Vais ver e quando tudo isto terminar esquecerão o que dise cumprimentar‑te‑ão na rua como se nada

tivesse acontecido.

                   ‑        Se se esclarecer, sim... mas, se nunca se descobrir quem matou Bill?

                   ‑        Mais cedo ou mais tarde saber‑se‑á a verdade.

Jeremy consultou o relógio.

‑ O Dr. Woodlite voltará precisamente dentro de uma hora. Temos pouco tempo...

‑ Pouco tempo para quê?

‑ Para estar juntos, Jessie.

                   Jeremy segurou‑lhe o queixo e começou a beijá‑la. Jessie sentia que o seu corpo começava a aquecer e um desejo incontrolável apoderava‑se dela. Como se o estranho lugar não tivesse importância, os dois fundiram‑se num abraço e beijaram‑se até ficarem exaustos.

                   Jeremy começou a mordiscar‑lhe o pescoço, ao mesmo tempo que percorria palmo a palmo o pequeno corpo com as mãos. Os seus dedos ágeis e fortes foram desabotoando um a um os botões do vestido preto, que caiu aos pés de Jessie.

                   ‑        Sabia que o tinhas comprado para mim ‑ disse Jeremy ao vê‑la com o conjunto cor de lavanda. Também o tinhas vestido no dia da feira de Merryville.

                   Jessie não respondeu Secretamente, sempre esteve pronta para Jeremy, mas só na sua imaginação. Nunca lhe tinha passado pela cabeça a possibilidade de poder concretizar os seus desejos e só a remota possibilidade de isso acontecer atemorizava‑a.

         ‑ Jeremy, não devíamos fazer isto.

         ‑ Jessie, já não és uma mulher casada. És livre.

         A simples menção da palavra levou Jessie a pensar que, se era livre para fazer o que quisesse, o seu desejo naquele momento era que Jeremy a fizesse sua.

         Ele pegou‑lhe ao colo, sentou‑a sobre a maca e tirou‑lhe o soutien. Jessie gemia enquanto Jeremy beijava os seus mamilos como se estivesse a saboreá‑los. Depois, foi descendo até beijar o suave ventre de Jessie. Ela deitou‑se para trás para poder sentir melhor esses instantes de prazer que a faziam estremecer. Experimentava sensações que nunca sentira antes. Desejava cada vez mais unir‑se definitivamente a Jeremy e, por fim, implorou:

         ‑ Jeremy, faz‑me tua, por favor, meu amor.

         ‑ Ainda não ‑ foi a resposta de Jeremy, que queria desfrutar um pouco mais do belo corpo seminu.

         Jessie sentiu que não conseguia conter a sua excitaÇão. Pegou em Jeremy pelos cabelos e com suavidade levou‑o até si, beijou‑o e pediu‑lhe que a possuísse. Abriu‑lhe o fecho das calças. Jeremy tirou as calças e a roupa interior, ficando apenas com a camisa. Então, pegou‑lhe na mão e conduziu‑a directamente até ao seu sexo para lhe mostrar quanto a desejava. Um gemido de prazer de Jessie levou Jeremy a perceber que não podia fazê‑la esperar muito mais tempo.

         Com suavidade, deitou‑a na maca e inclinou‑se

sobre ela. Primeiro, acariciou os seios, depois o ventre e, finalmente, segurando‑a pelas ancas, tirou‑lhe com delicadeza as pequenas cuecas. Tinha chegado o momento tão desejado para ambos. Os olhos húmidos de Jessie falavam por si, mostrando o desejo mais profundo. Penetrou‑a com suavidade. Jessie segurou‑se a ele abraçando‑o e levantou o corpo para sentir plenamente como ele chegava até ao mais intimo do seu ser. Ondas de prazer percorriam‑na a todo o momento, e os seus lábios entreabertos em busca dos de Jeremy mostravam o seu desejo incontrolável. Sem perceber, começou a respirar ofegantemente. Era uma respiração firme e rítmica que a punha totalmente fora de controlo, desfrutando do prazer de estar com o homem da sua vida.

         Jeremy acelerou os seus movimentos, tornando‑os cada vez mais violentos. Jessie começou a desabotoar a camisa de Jeremy para poder sentir o contacto directo dos seus seios contra o peito musculoso. Depois, sentiu que tudo girava à sua volta. A sensação era tão intensa que parecia não ter fim. Jeremy seguiu Jessie no seu climax e continuaram a beijar‑se até que o desejo de ambos ficou saciado.

         Ela levantou‑se da maca. Sentia‑se estranha. Por um lado, era invadida por um sentimento de plenitude, como se finalmente conseguisse sentir‑se mulher. Por outro lado, as sombras da culpa ainda pairavam à sua volta. Jeremy percebeu que alguma coisa estava a acontecer.

         ‑ O que está a passar por essa cabecinha, Jessie?

         ‑        Desculpa. Penso sempre que estou a fazer uma coisa imprópria.

         ‑        Ouve, meu amor, não fizemos nada de mal.

         ‑        Eu sei, mas sinto que alguma coisa não está bem. Repara no meu vestido, por exemplo.

         ‑        Que tem o teu vestido?

         ‑        Não vês? Não notaste, mas é de luto. Hoje foi o funeral de Bill. Não achas que fomos longe demais?

         ‑        Acharia se não te conhecesse bem ou se não soubesse como foi a tua vida com Bill, mas não desonraste uma memória sagrada.

         ‑        Chega, não falemos mais dele.

         ‑        Jessie, sei que te desejo, e tu a mim, mas não quero ocupar o lugar de ninguém na tua memória. Amavas realmente Bill?

         Com um gesto afectuoso, Jessie acariciou o cabelo de Jeremy enquanto falava lentamente.

         ‑        Es o único homem com quem passaria o resto da minha vida. Nunca amei o Bill, e tu sabes disso. O que acontece é que esta situação fugiu ao meu controlo e não sei se estou disposta a enfrentar as pessoas.

         Ele olhou‑a, procurando compreendê-la. Sentia‑se capaz de enfrentar qualquer situação para estar a seu lado; no entanto, via que Jessie não se atrevia a defender o seu amor.

         ‑        Meu amor, tens medo de te enfrentar a ti mesma. Sabes que deixarás de ser uma menina e terás de pensar como uma mulher. Acho que isso te aterroriza. Jeremy segurou Jessie pela cintura e beijou‑a na boca. Ela correspondeu‑lhe com ardor e depois afastou‑se para lhe dizer, com um sorriso sincero:

         - Tens razão. Prometo mudar, mas dá‑me tempo. - A palavra tempo despertou Jeremy. O tempo tinha passado tão rapidamente que se esquecera de que o Dr. Woodlite estaria de volta em breve.

         ‑ Ajuda‑me a ver se há alguma coisa fora do lugar

‑ disse Jeremy.

         ‑ Ah, agora és tu a criança que procura esconder as suas traquinices, não é?

         ‑ Não brinques, Jessie, não é o momento. O doutor está prestes a chegar e não queria que...

         ‑ Sim, não seria correcto... ou seja, não gostarias que o doutor pensasse que...

         Jeremy não pôde evitar sorrir ao beijá‑la:

         ‑ Não queremos que pense que fizemos amor, não é?

         O portão da garagem rangeu. Jessie alisou os cabelos e Jeremy acabou de abotoar o último botão da camisa precisamente antes do médico entrar no consultório.

         ‑ Espero que tenham tido tempo para conversar?

         Jeremy olhou para Jessie com um olhar cúmplice e ela teve de reprimir o riso para que o médico não suspeitasse de nada.

         ‑ Sim, doutor. Já esclarecemos algumas coisas. Acho que me vou embora agora mesmo. Penso que é melhor o senhor levá‑la a Royal Crest. Não é conveniente que me vejam por lá, pelo menos por agora.

         ‑ Estou totalmente de acordo. Boa noite, Jeremy.

         Jeremy despediu‑se do médico e beijou Jessie.

         ‑ Até breve, Jessie.

         ‑ Vemo‑nos depois, Jeremy.

         Algo dizia a Jessie que voltariam a ver‑se em breve. Esperava que fosse realmente em breve. Ansiava estar junto dele, fazendo amor ao longo de horas.

         ‑        Pronta para voltar? - a voz do médico tirou‑a das suas divagações. Tinha de voltar ao rancho. Lá estariam, certamente, Bíanche e Fred à sua espera com uma reconfortante chávena de café.

         O velho Ford interrompeu o canto dos grilos com o forte ruido do seu motor e partiu rumo ao rancho. Ao chegarem, encontraram a casa completamente às escuras, excepto a cozinha. Aí, Fred e Bíanche conversavam sobre o enterro de Bill.

         ‑        Acho que a menina está metida num sarilho, Fred.

         ‑        Eu sei, Bianche, e imagino que esteja na altura de ela enfrentar o assunto.

         ‑        O que significa isso? Por acaso achas que podes esclarecer esta confusão?

         ‑        Talvez sim. Pelo menos, uma parte dela. Sabes, há algum tempo que quero esclarecer alguns pontos obscuros. Não é simples ver e calar. Tem de se falar.

         ‑        Deixa de falar em tom misterioso e vai abrir a porta. Creio que ouvi o Ford do doutor aproximar‑se.

         Fred dirigiu‑se à porta. Minutos depois, Jessie e o médico entravam na sala.

         ‑        Há café quente, Fred? ‑ perguntou Jessie.

         ‑        Sim, menina, vou dizer à Bíanche que o sirva. E o senhor, Dr. Woodlite, o que deseja beber?

         ‑        Um bom café éo suficiente.

         Woodlite e Jessie sentaram‑se, à espera de Bíanche. Jessie não se atrevia a mencionar o encontro com Jeremy. O médico iniciou a conversa, como se se tratasse de um tema já conhecido.

                   ‑        Espero que tenhas ficado mais confortada por veres Jeremy. Sei que a simpatia entre os dois é

         mútua e, se souberem esperar o momento oportuno, acho que terão um final feliz. Conversei com ele e

considero que tem boas intenções.

                   ‑        Fico contente por se mostrar tão optimista, doutor. Estou bastante confusa. às vezes, penso que nunca sairei deste pesadelo. Outras, basta‑me ver Jeremy para ser feliz.

                   ‑        Estás apaixonada por esse jovem. E as mudanças de humor são frequentes nas mulheres apaixonadas.

                   ‑        Mas o nosso amor é impossível. Trata‑se de uma coisa proibida. Ninguém verá com bons olhos o nosso casamento. Não acha?

                   ‑        Eu conheço‑te, Jessie, e sei que mantiveste a tua honra apesar de te teres apaixonado por Jeremy com o Bill ainda vivo. Mas agora tudo é diferente.

                   ‑        Quer dizer que o senhor aprova esta relação?

                   ‑        Por acaso não to demonstrei? Contudo, peço‑te que vás devagar. É certo que não serias bem‑vista se te casasses logo. A propósito, Jeremy fez‑te a proposta?

                   ‑        Na realidade, não, mas...

                   Jessie percebeu que se tinha entregue a Jeremy sem ele sequer falar numa vida em comum. E se ela fosse apenas um capricho para ele? A angústia levou‑a a perguntar ao velho médico:

                   ‑        Diga‑me, doutor, o senhor acha que ele sente por mim o mesmo que eu sinto por ele?

         ‑ Ah, Jessie, gostaria de ser adivinho para poder dizer‑te, mas sou apenas um pobre médico. No entanto, acho que está completamente apaixonado.

         Depois de terminarem de saborear o café, Woodlite levantou‑se para se ir embora. Jessie foi para o quarto e Fred acompanhou o médico à porta.

         ‑ Doutor, eu sei coisas que podem servir para resolver este caso ­- murmurou Fred.

         A expressão de Woodlite mudou, e o seu olhar penetrante enfrentou Fred. Bastou olhá‑lo durante alguns instantes para perceber que realmente se tratava de uma coisa muito séria.

         ‑ Está bem, Fred. Amanhã às três da tarde, no meu consultório. Não faltes. Estou muito interessado em saber o que tens para me dizer. Boa noite.

         ‑ Boa noite, doutor. Descanse.

         A frase pareceu uma brincadeira. Woodlite não conseguiu pregar olho durante toda a noite. A possível confissão de Fred sobre uma coisa muito particular tirava‑lhe o sono. O fiel criado nem sequer imaginava quão importante poderia ser o dado que ia revelar para esclarecer o enigma da morte de Bill.

 

         O detective atirou o casaco com brutalidade.

         ‑ Hoje não éo teu melhor dia, Marshall.

         ‑ Não diga nada. Este caso do Bill Wider preocupa‑me. Ainda não encontrei uma explicação que me satisfaça. Os móbiles do crime não São claros.

         O chefe O'Brian olhou fixamente o detective. Achava‑o mais preocupado do que habitualmente.

         ‑ Diz‑me: o que não te agrada?

         ‑ Tudo parece demasiado óbvio. Uma mulher presa a um energúmeno inválido. Um homem jovem que cruza o seu caminho e lhe dá a volta à cabeça. E ambos decidem despachar o fulano só porque estão mutuamente atraídos. Não seria mais fácil tornarem‑se amantes em vez de se envolverem num crime do qual serão os primeiros suspeitos?

         ‑ A mente humana por vezes é incompreensível. Há pessoas que matam simplesmente por prazer.

         ‑ Ou por vingança. Além disso, reparou na arma que Bill tinha ao lado? É impensável que a tivesse preparado para atacar a mulher. Com um simples golpe ela desmaiaria.

         ‑ Esqueces‑te de que era inválido? Isso colocava‑o em desvantagem perante qualquer pessoa.

         ‑ Se não respeitasse a opinião do Dr. Woodlite, até duvidaria disso.

         ‑ Que estás a dizer?

         ‑ Os sapatos do fulano estavam sujos. Como é possível que um inválido saia para o exterior e fique com os sapatos cheios de terra? Este caso cheira‑me mal. Há muitos fios soltos.

         ‑ Sugiro‑te que não te embrenhes nos teus famosos fios. Lembra‑te de que estamos na mira do FBI há algum tempo e não quero ver demasiados homens de preto vadiando por aí.

         ‑ Mas, chefe, não acha que precisamos de algum tempo para descobrirmos o assassino?

         ‑ Tens o tempo que quiseres, mas entretém a imprensa com algumas notícias até esclarecermos tudo. Marshall, lembra-te de que tens de resolver isto rapidamente e pouco me interessa os meios utilizados. Se for necessário, acusa o mordomo.

         Marshall murmurou algo incompreensíveL. Aborrecia‑o não conduzir a investigação à sua maneira.

         A porta do gabinete abriu‑se.

         ‑        Quem achas que és para entrar assim no meu gabinete, Smith?

         ‑        Desculpe, chefe. Só vinha avisá‑lo de uma coisa...

         ‑        Fala de uma vez.

         ‑        Viram entrar a senhora Wider no consultório do Dr. Woodlite.

         ‑        E então?

         ‑        Também lá se encontrava Jeremy Stone.

         ‑        Bingo. Precisas de mais alguma coisa, Marshall?

         Sim, Marshall precisava de muito mais para resolver este caso. No entanto, aborrecia‑o que esse casal de jovens se tivesse exposto tanto. "Idiotas", pensou.

 

         A campainha anunciou a chegada do detective Marshall. Apareceu na sala no preciso momento em que Jessie terminava o pequeno‑almoço.

         ‑        Deseja uma chávena de café, detective?

         ‑        Sim, sem açúcar, por favor.

         Bianche foi buscar um café quente. Marshall aproximou‑se de Jessie e olhou‑a fixamente nos olhos.

         ‑        Isto é um assunto sério, senhora Wider. Pelos vistos não está predisposta a colaborar muito e, de certo modo, compreendo que ainda esteja impressionada com a notícia, contudo, tenho de saber mais dados.

         ‑        Detective, eu quero colaborar, só não me ocorre quem possa ter querido assassinar Bill.

         ‑        A senhora não tem ideia nenhuma das actividades do seu marido, nem do passado dele?

         ‑        Bill sempre foi reservado. Quando cá chegou, tornou‑se amigo de um grupo de vaqueiros que costumava reunir‑se na taberna de Joe Caprio. Não conheço os amigos dele e muito menos os inimigos.

         ‑        O seu marido costumava ausentar‑se frequentemente de Royal Crest?

         ‑        às vezes, ausentava‑se por uns dias para participar nos rodeios, mas na maior parte do tempo dedicava‑se aos cavalos no rancho. Eram a sua paixão.

         ‑        E como é que entrou na vida de Bill?

         ‑        Suponho que o destino estava traçado. O meu pai gostava de juntar vaqueiros no rancho para organizar rodeios. Foi assim que conheci Bill.

         ‑        E, sem mais nem menos, conheceu‑o e casou‑se?

         ‑        Sei que é difícil compreender, mas o meu pai tinha muita influência nas minhas decisões. Foi ele praticamente que decidiu o meu casamento.

         ‑        Ou seja, casou‑se com alguém que não amava

         ‑        Visto desse ponto de vista, sim. Mas eu gostava muito do Bill, apesar de ele ser um pouco rude.

         ‑        Suficientemente rude para decidir matá‑lo?

         ‑        Detective, como se atreve a dizer isso?

         ‑ Desculpe, senhora Wider, não quis ofendê‑la.

         O detective tentou forçar um sorriso.

         ‑ Por agora é tudo. Até outro dia, senhora Wider.

         Marshall levantou‑se e ia sair no preciso momento em que Bíanche trazia uma chávena de café.

         ‑ Não se incomode, de todas as maneiras já tinha tomado o pequeno‑almoço.

         Bíanche entregou‑lhe o chapéu e abriu a porta no momento em que Jeremy ia tocar a campainha.

         ‑ Que surpresa encontrá‑lo aqui, senhor Stone!

         ‑ O mesmo digo eu, detective.

         Jeremy olhou com fúria para o homem que lhe sorria com sarcasmo. Marshall retribuiu‑lhe o olhar, mantendo o seu ar irónico. Jeremy soube naquele momento que a acusação de Jessie seria uma questão de tempo. Tinha de actuar rapidamente.

         Jessie ainda se encontrava na sala, preocupada. Quando viu Jeremy entrar, exclamou:

         ‑ Jeremy, por que vieste a Royal Crest? Por acaso não sabes que alimentas os rumores?

         ‑ Acalma‑te, Jessie. Não vim para piorar as coisas, mas sim para tentar resolvê‑las.

         ‑ E como achas que conseguirás?

         ‑ Escuta, tenho de encontrar a pessoa que matou Bill ou a Polícia acabará por culpar a primeira pessoa que aparecer, só para calar a imprensa.

         ‑ E porque achas que faria isso?

         ‑ As pressões são enormes. Este era um local calmo até algum tempo, mas, segundo o que descobri, é o segundo crime por resolver no espaço de um ano.

         ‑ A que te referes?

         ‑ Há meses, assassinaram uma jovem que vivia do outro lado do rio. Nunca se descobriu o assassino.

         ‑ Sim, acho que tenho uma ideia disso. Houve um grande alvoroço na aldeia.

         ‑ Pois bem, a Polícia decidiu averiguar por que razão em Merrvville morria gente sem haver um responsável, compreendes? Isto significa que Marshall precisa de um culpado e, se for possível, responsabilizá‑lo‑á pelos dois crimes para encerrar o caso.

         ‑ E que temos nós a ver com tudo isso?

         ‑ Jessie, não entendes? Marshall não tem dados e a única suspeita és tu, por seres a mulher de Bill.

         ‑ Queres dizer que tentará culpar‑me?

         ‑ De momento, duvido, mas tenho a certeza de que a Polícia fará o impossível para te acusar, e é por isso que estou aqui. Preciso que penses em alguém que quisesse assassinar Bill. Tem de existir alguma coisa que me possas dizer para começar a investigar.

         ‑ Sinto muito, Jeremy. Bill não me dava satisfações.

         ‑ Tens de fazer um esforço, é muito importante.

         ‑ Vou tentar, prometo‑te. Se quiseres, podes revistar o quarto dele. Talvez encontres algum dado relevante, embora a Polícia já tenha verificado tudo.

         Depois de procurar, sem êxito, nas gavetas e nos armários, pegou numa pasta. Estava cheia de recortes de jornais, nos quais Bill aparecia num rodeio a montar um potro. Ia fechar a pasta quando um recorte lhe chamou a atenção. A notícia não tinha nada a ver com cavalos.

                   "Crime misterioso no rio Ohio

                   O corpo sem vida de uma jovem de apenas dezasseis anos foi encontrado na madrugada de ontem nas margens do rio Ohio. Desconhecem‑se as causas do assassínio, embora se suspeite de crime passionaL. A jovem foi reconhecida pelo irmão, Frank Brown. A Polícia local está a desencadear uma operação de caça ao assassino e pensa‑se que dentro de poucas horas se encontrará o seu paradeiro."

         Jeremy guardou o recorte e saiu à procura de Jessie.

         ‑ Bianche, sabe onde está Jessie?

         ‑ Oh, sim, senhor Stone. Está no estábulo. Fred vai pôr Preffy Star ao pé de Snow Cat. Julgo que em breve teremos mais um potro em Royal Crest.

         Jessie olhava, absorta, o cortejo que Snow Cat fazia à égua. A sua paixão por cavalos era talvez o único motivo que a mantinha ligada a Royal Crest e até conseguia que se esquecesse momentaneamente das suas preocupações. Jeremy aproximou‑se e abraçou‑a pelos ombros. Jessie virou‑se. Estava radiante.

         ‑ Não os achas lindíssimos, Jeremy?

         ‑ Formam um casal esplêndido... como nós.

         Jessie sorriu ao ouvi‑lo. A comparação não tinha sido assim tão má. Nos dois casos, a força do instinto lutava para se libertar.

         Snow Cat mordiscou o pescoço de Pretty Star e continuou a roçar o focinho no lombo, até ficar precisamente atrás dela. Como se estivessem a brincar, o cavalo e a égua continuaram naquele jogo e a fazerem breves corridas. Finalmente, Snow Cat distanciou‑se e depois atirou‑se à Pretiy Star. Penetrou a égua, e ambos ficaram algum tempo unidos no abraço sexual. Nesse preciso momento, Jessie sentiu‑se perturbada. Tinha necessidade que Jeremy a possuísse mais uma vez. Nunca tivera semelhantes sentimentos. Quando tinha relações com Bill, fechava os olhos para não olhar para ele. Com Jeremy, pelo contrário, tudo era diferente. Queria olhá‑lo no momento em que começava a possuí‑la e perder‑se nos olhos verdes que se iluminavam de paixão quando a viam.

                   Jeremy também se sentia excitado, embora tentasse disfarçar para não perturbar Jessie, pois achava que ela não sentia o mesmo que ele. No entanto, quando os olhares se cruzaram, perceberam que precisavam de estar de novo juntos.

                   ‑ Jessie, preciso de estar contigo.

                   ‑ Eu também quero estar contigo, mas agora é impossível. Não aqui em casa.

                   ‑ Lembras‑te quando caíste do Snow Cat? Fomos para uma pequena cabana. E se fôssemos para lá?

                   Dirigiram‑se para a pequena cabana e Jeremy teve o cuidado de trancar a porta. Jeremy começou a tirar a roupa a Jessie. As suas hábeis mãos iniciaram um lento percurso pelo corpo de Jessie. Roçou nos pequenos e firmes mamilos e prosseguiu acariciando o ventre, as coxas e as partes mais intimas de Jessie. Jeremy ajoelhou‑se para lhe beijar as coxas, desencadeando ondas intensas de prazer. Ele sentiu as mãos de Jessie a desabotoarem, um a um, os botões da sua camisa. Depois, tirou a blusa revelando os seios ainda cobertos pelo soutien. Jeremy desapertou‑lho para poder beijar melhor os seios. Com suavidade, deitou‑a sobre um monte de feno e, enquanto a beijava com ardor, tirou‑lhe as calcinhas. Ela não resistiu. Instantes depois, Jeremy acariciava‑lhe as pernas. Jessie sentia todo o corpo a tremer. Jeremy parou para a observar, mas ela pediu‑lhe que continuasse.

         ‑ Faz‑me tua, por favor ‑ o pedido de Jessie foi atendido de imediato. Com um vigor extraordinário, Jeremy penetrou‑a dando‑lhe prazer de um modo incrível, até atingirem o climax em simultâneo.

         A noite tinha caído sobre Royal Crest. Jessie e Jeremy repousavam sobre o feno.

         ‑ Queria ficar aqui para sempre ‑ comentou Jessie.

         ‑ Um dia, faremos desta cabana o nosso refúgio.

         ‑ Isso significa que estás a pensar em instalares‑te em Royal Crest?

         ‑ Talvez, um dia...

         Jeremy deixou de sorrir e a sua expressão alterou‑se. Os seus pensamentos voltavam a escurecer‑se ao lembrar‑se das ameaças que pairavam sobre ela. Tinha de fazer algo para a proteger, mas o quê? Levantou‑se de um salto e pegou na mão de Jessie para a ajudar a levantar‑se. Depois, beijou‑a com ardor.

         ‑ Ver‑nos‑emos em breve, Jessie. Sê paciente.

         Jessie sabia que ele só estava a tentar reconfortá‑la, mas nesse momento era‑lhe indiferente. Queria ouvir tudo o que saísse dos lábios de Jeremy. Poderia passar muito tempo antes de voltarem a estar sozinhos e, até isso acontecer, viveria das recordações dos momentos que passara com ele. Percorreram o caminho de casa, e depois Jeremy seguiu no seu carro. Da janela, Bíanche viu‑o afastar‑se e abanou a cabeça. De certeza que o jovem era bem‑intencionado, mas tambem atrevido. Até ela percebia que não era aconselhável estar perto de Jessie. Não agora.

         A cozinha de Royal Crest parecia uma simulação de um incêndio. Fred entrou em casa à procura do incêndio, mas só encontrou torradas queimadas e Bianche, a chorar desconsoladamente.

         ‑ Bianche, o que aconteceu? Não me digas que estás a chorar por teres queimado as torradas.

         ‑ Não, Fred, não estou preocupada com isso. Sabes, ultimamente, não faço nada em condições. Estou sempre com a cabeça noutro lugar.

         ‑ O que se passa, mulher chorona?

         ‑ Cala‑te. Fazes‑te de distraído para não me preocupar, mas sabes o que tenho. Trata‑se da menina.

         ‑ Sabes tão bem como eu que Jessie só pode contar connosco. Não há ninguém que goste mais dela, nem sequer Jeremy Stone. Ela é como se fosse nossa filha e vamos defendê‑la até à morte.

         ‑ E como? Somos apenas um casal de velhos.

         ‑ Velha és tu. Ainda me sinto com forças e vou lutar por ela.

         ‑ Estou a falar a sério, Fred, que podemos fazer pela menina? Não sabemos nada que possa ajudá‑la.

         ‑ Isso éo que tu pensas.

         Fred ficou com um ar sério. Por momentos, pensou em contar a Bianche o que sabia, mas preferiu ficar calado, pois o pior defeito da criada era falar de mais. Tinha um trunfo na manga, que funcionaria a favor de Jessie. Não havia tempo a perder. A jovem estava em perigo e, pelo que havia notado, nem sequer tomara consciência disso. O pensamento de Jessie estava ocupado com um único homem: Jeremy Stone. Fred pensou momentaneamente se aquele homem não teria sido o autor do crime. Gostava de Jessie, e Bill era um obstáculo no seu caminho. No entanto, o seu álibi era perfeito. Estava com Jessie na altura do crime, só que não podia demonstrá-lo. Não sem desmascarar Jessie e expô‑la perante a aldeia.

         ‑ Tudo se resolverá, Bianche.

         - Confio em ti, Fred.

         ‑ Precisarei de muita coragem para poder ajudar Jessie. Sabes que no fundo sou um velho tímido.

         ‑ Eu sei, mas és valente e orgulho‑me de ti.

 

         Na manhã seguinte, Fred apresentou‑se no consultório do Dr. Woodlite.

         ‑ Bem, Fred, sou todo ouvidos.

         ‑ Nunca me meti nos assuntos da família, mas..

         ‑ É importante que me digas tudo o que sabes.

         ‑ Trata‑se do senhor Bill, que descanse em paz. Ele não era boa pessoa, mas merece estar no inferno.

         ‑ A que se deve tanto ódio por Bill?

         ‑ Não é ódio, doutor. Seria incapaz de odiar alguém, mas detesto a injustiça. O senhor Bill manteve Jessie presa à sua cadeira de rodas quando, na

realidade, andava.

‑ Que estás a dizer?

‑ Vi com os meus olhos. Nunca pensou que eu soubesse, mas quando a menina ia aos estábulos ele espiava‑a. Vi‑o levantar‑se e andar até à janela.

‑ Por que não disseste à Jessie ou a mim?

         ‑ Acha que teriam tido a oportunidade de verificar? Ele diria que não andava, não iam conseguir demovê‑lo nem um centímetro. A única coisa que teriam conseguido era o meu despedimento e, então, nunca mais poderia tomar conta da Jessie.

         ‑ Bem, Fred, isso é tudo?

         Fred não queria continuar a falar no assunto, mas lembrou‑se de que era importante para Jessie.

         ‑ Não, há mais. Ultimamente, ele foi ameaçado por alguém. Sei, porque Bíanche ouviu uma conversa sem querer.

         ‑ "Sem querer"?

         ‑ O senhor sabe como as mulheres são curiosas. A verdade é que alguém o queria matar e fê‑lo.

Tens ideia de quem possa ter sido?

         ‑Não... espere. Acho que uma vez ele tratou‑o por Frank, enquanto discutiam ao telefone.

         ‑ Está bem, Fred. Obrigado por me teres informado. Não odivulgarei, será o nosso segredo.

         ‑ Obrigado, doutor. Guardar esse segredo era um peso para mim. Espero que sirva para alguma coisa.

         ‑ Não tenhas dúvidas, Fred.

         Woodlite ficou sozinho. Tentava decifrar um difícil quebra‑cabeças. Bill não era inválido e tinha inimigos. Um deles tinha conseguido vingar‑se, mas porquê? Essa era a peça principal do quebra‑cabeças e, para a encontrar, precisaria de ajuda. Pegou no telefone e marcou o número de Jeremy Stone. Se havia alguém que podia ajudá‑lo, esse alguém era ele.

 

         A campainha da casa de Jeremy tocou cedo, acordando‑o. Abriu a porta e viu a irmã.

         ‑ Alice, que surpresa! Aconteceu alguma coisa?

         A pergunta era oportuna. Alice era uma famosa artista plástica e viajava pelo mundo para expor em galerias de arte. Tal como Jeremy, não estava enraizada a nenhum lugar e, apesar dos seus trinta anos, não se imaginava a viver com alguém. Através das cartas e dos telefonemas para a casa dos pais, estava sempre informada sobre o paradeiro de Jeremy. Alice não era muito expansiva, mas Jeremy sabia como o amava. Tanto, que tinha adiado uma exposição em Londres com o objectivo de viajar até Kentucky para o ver. Achou‑o preocupado e apressou‑se a responder‑lhe:

         ‑ Acalma‑te, Jeremy, não aconteceu nada. Vim só cumprimentar‑te. Vim visitar uma velha amiga e...

         ‑ Alice, estás a mentir. Acho que não existe nenhuma amiga e que vieste apenas para me ver.

         ‑ Está bem, confesso. Apeteceu‑me ver‑te pessoalmente porque soube que estás envolvido numa confusão.

         ‑ Quem disse isso?

         ‑ O mundo é mais pequeno do que imaginas. O pai é amigo dos Ostrid e, de vez em quando, encontra‑se com o velho Ostrid para falar do passado.

         ‑ E qual éo problema?

         ‑ Estás a gozar? Sabes muito bem. Houve um assassínio em Merryville e Ostrid contou ao pai que se comentava que de certa maneira estás envolvido.

         Jeremy reflectiu sobre a sua resposta. Não queria assustar Alice, mas também não podia mentir‑lhe.

         ‑ Alice, não tive nada a ver com tudo isso, mas mantenho uma relação com uma pessoa que está envolvida no caso, embora seja inocente.

         ‑ Como é que sabes? Ah, deixa‑me adivinhar. A pessoa envolvida é mulher e bonita, acertei?

         ‑ Não exageres. Sabes que jamais me envolveria em algo obscuro, mas tenho de estar a seu lado.

         ‑ Estás apaixonado?

         ‑ Suponho que sim. Na realidade, acho que a amo.

         ‑ Então, segue em frente. Estou a ver que a minha visita não serviu de muito, ou serviu?

         ‑ Claro que sim.

         Jeremy e o Dr. Woodlite encontraram‑se nessa tarde. As revelações de Fred dificultavam as coisas. Era impossível descobrir a razão que levara Bill a preterir de uma vida normal, optando por estar preso a uma cadeira de rodas. Também não parecia haver ligação entre o facto de Bill andar e o seu assassínio.

         ‑ Eu sabia. Os reflexos indicavam que tinha sensibilidade nas duas pernas. Como pôde enganar‑nos?

‑ comentou Woodlite.

         ‑ Parecia muito hábil. Não lhe era difícil fingir.

         Pelos vistos não foi assim tão habilidoso, pois não conseguiu fugir do seu assassino - murmurou Woodlite e acrescentou: - Estamos pior do que antes.

         ‑ Jessie tambem não sabe nada que ajude a esclarecer as coisas. Parece que o tipo se preocupava em esconder todos os assuntos. A única coisa de que se lembra é de que ele tinha alguns amigos que se juntavam nos rodeios para competir e beber uns copos.

         ‑ Diabos! Como pude ser tão cego? ‑ a exclamação de Woodlite impressionou Jeremy. Finalmente, parecia que tinha ocorrido uma ideia ao velho médico.

         ‑ Tem um pressentimento?

         ‑ Lembrei‑me agora do cavaleiro que vi sair de Royal Crest no dia do crime. Tem de ser o assassino!

         ‑ Magnífico! Conseguiria identificá‑lo?

         ‑ Vi‑o ao longe e não prestei atenção. Achei que se tratava de alguém que saía de Royal Crest rumo à feira. Penso que não há maneira de saber quem é.

         ‑ Pelo menos, lembra‑se do aspecto físico dele?

         ‑ Vagamente. Era alto, de aspecto robusto. Acho que tinha o cabelo comprido e escuro.

         ‑ Não é muito para começar, mas podemos tentar. Sei onde começar a procurar ‑ afirmou Jeremy.

         ‑ Está a falar a sério?

         ‑ Sim. Tenho de regressar a Royal Crest. A resposta está lá. Talvez percamos muito tempo a averiguar, mas se existe um lugar onde se pode investigar os amigos e inimigos de Bill, esse lugar é Royal Crest.

         ‑ Como sabe?

         ‑        Volto à noite e prometo trazer‑lhe novidades.

         - Espero que sim. Não fique muito tempo. O círculo aperta‑se perigosamente à volta de Jessie.

         Jeremy, saiu do consultório rumo a Royal Crest.

 

         O telefone tocou às dez da manhã. Jessie, nervosa, atendeu. Era o deteective Marshall.

         ‑        Estarei à sua espera. às oito da noite está bem.

         ‑        O que aconteceu, menina? ‑ perguntou Bíanche.

         ‑        É esse detective horríveL. Diz que tem de falar comigo esta noite sem falta.

         O telefone voltou a tocar. Jessie atendeu. Sentia‑se encurralada e começava a enfurecer‑se perante a perseguição do detective Marshall.

         ‑        Já lhe disse que pode vir. Não me pressione mais.

         Do outro lado da linha fez se um silêncio. Depois, Jeremy começou a falar.

         ‑        Não quis incomodar‑te. Fiz alguma coisa que te tivesse deixado tão zangada?

         ‑        Oh, Jeremy, desculpa. É esse detective... acho que vou enlouquecer.

         ‑        Acalma‑te, Jessie. Tenho de ir a Royal Crest. Telefonei‑te antes de sair para saber se estavas sozinha. Não queria voltar a encontrar o Marshall.

         ‑        Mas disseste que não era conveniente vires...

         ‑        Esquece. Vale a pena ir, mesmo correndo o risco de o detective Marshall aparecer sem avisar.

         ‑        Disse‑me que viria à noite....

         ‑        Bem, tenho tempo de encontrar o que procuro antes da sua chegada. Não me demoro.

         ‑ Está bem, fico à espera.

         Jessie fez questão de o receber pessoalmente. Logo que ele entrou, abraçou‑o. Precisava de se sentir protegida por Jeremy. Jeremy afastou‑a ternamente. Não queria magoá‑la, mas sabia que era inoportuno mostrarem‑se demasiado efusivos à frente dos criados. Talvez o astuto detective os obrigasse a testemunhar e, conhecendo‑os minimamente, sabia que iam dizer a verdade sem ocultarem nenhum pormenor.

         ‑ Jessie, desculpa, mas não é o melhor momento.

         Jessie ficou melindrada.

         ‑ Está bem. Nunca mais te abraço. Prometo.

         ‑ Não sejas criança. Teremos muito tempo para estar juntos. Vim à procura de um dado muito importante para poder esclarecer o caso.

         ‑ Sabes de alguma coisa realmente importante?

         ‑ Não sei, mas é uma possibilidade.

         Jessie acompanhou Jeremy ao quarto de Bill. Encontrou logo o que procurava. Tratava‑se do velho álbum de recortes de jornais.

         ‑ Para que precisas do álbum? São só papéis velhos.

         ‑ Precisamente. A chave deve estar aqui.

         ‑ O que queres dizer?

         ‑ Jessie, prefiro deixar‑te fora deste assunto. Quanto menos souberes, menos te engasgarás com as perguntas do detective Marshall. Confia em mim.

         ‑ Sempre confiei ‑ disse Jessie.

         Jeremy tinha vontade de a abraçar e beijar, mas conteve‑se e limitou‑se a roçar os lábios nos dela.

         ‑ Não te vás embora. Preciso de ti ‑ disse Jessie.

‑ Está bem, mas promete‑me que vais controlar‑te. Os dois saíram em direcção à cozinha. Bíanche

e Fred estavam ocupados a desentupir o lava‑louça. Fred, sentado no chão e com a cabeça debaixo do

lava‑louça, não viu entrar Jessie e Jeremy.

         ‑        Menina, senhor Stone, posso servir‑vos alguma coisa? ‑ perguntou Bíanche.

         ‑        Oh, não, só vínhamos beber algo fresco, mas vejo que estão com problemas ‑ respondeu Jessie.

         ‑        Sim, menina. O lava‑louça está entupido.

         ‑        Bíanche, não te preocupes. Fred vai desentupi‑lo.

Então, ouviu‑se um grito, e Fred deu um salto.

         ‑        Maldição, quase que perco uma vista por causa dessa maldita coisa.

         Ao abrir o ralo do lava‑louça, caira sobre Fred um pequeno e afiado estilete.

         ‑        De onde apareceu semelhante coisa?

         Jeremy olhou para a arma.

         ‑        Larga isso, Fred! Não lhe toques.

         ‑        O que aconteceu, senhor Stone?

         ‑        Peço‑te para não lhe tocares. ‑ Fred colocou o estilete sobre a bancada da cozinha. ‑ Jessie, temos de chamar o detective Marshall. Acho que Fred encontrou a arma do crime.

         ‑        Oh, não. E o que fazia aqui na cozinha?

         ‑        De certeza que o assassino preferiu não a levar e decidiu deitá‑la pelo lava‑louça.

         ‑        Jeremy, vão pensar que foi um de nós. Não nos podemos livrar dela?

         ‑        Lamento, querida, mas é impossível. Estaríamos a ocultar a prova do crime e tornar‑nos‑íamos cúmplices só pelo facto de não a entregarmos.

         ‑ Compreendo. Bem, nesse caso...

         Fred estava exausto. Sentou‑se e pôs‑se a folhear o álbum de recortes que Jeremy colocara em cima da mesa. Um rosto chamou‑lhe a atenção.

         ‑ É ele ‑ exclamou.

         Jeremy e Jessie voltaram‑se, surpreendidos.

         ‑ Quem dizes que é?

         ‑ É ele. É o ginete que no dia do festival queria entrar em Royal Crest.

         Jeremy debruçou‑se sobre o recorte. Lá estava Bill com dois homens de aspecto austero. O dedo de Fred assinalava um deles. Jeremy leu a legenda da fotografia: "Bul Woder, Frank Brown e Harry Mc Crawley obtiveram os três primeiros prémios em domação."

         ‑ Tens a certeza do que estás a dizer, Fred?

         ‑ Sim, senhor Stone, absoluta. Nunca esqueceria esse rosto. Pensei que se tratava de um ladrão, e agora vejo‑o nesta fotografia. É estranho.

         ‑ Vamos à aldeia, mas antes vou telefonar ao detective. Temos de o avisar sobre a arma que encontraste. Jeremy segurou o telefone antes de marcar o número da Polícia. Sabia que ia condenar Jessie e talvez envolver‑se, mas não havia outra saída. Estava nas suas mãos a remota possibilidade de esclarecer a situação. Decidiu adiar a chamada por um dia e pediu a Fred que deixasse a arma sobre a bancada, sem lhe tocar. Vinte e quatro horas poderiam ser suficientes para evitaro que, até então, parecia inevitável.

 

         A visão empresarial de Nelly transformara o seu restaurante numa agradável sala. às cinco da tarde, as mesas ficavam lotadas. Mary Jo encontrava‑se numa dasmesas, com a suairma Jane e outras amigas.

‑ Achas que Jessie tem a ver com a morte do marido?

‑ Custa a acreditar. Porém, no concurso das tartes, ouvi uma coisa que me perturbou.

         ‑        Mary Jo, já te disse para não inventares coisas.

         ‑        Também os vi no supermercado. Pareciam muito apaixonados.

         ‑        Jessie não pode tornar‑se uma assassina de um dia para o outro. Se fosse outra, já teria morto Bill. O tipo agredia‑a e ela suportava‑o com paciência.

         ‑        Ter‑se‑ia cansado de tanto sofrimento?

         ‑        Não.

         Jane sentiu‑se incomodada. Gostava de se reunir com as amigas porque era o único passatempo que havia na cidade, mas a conversa tornara‑se malévola.

         ‑        Acho que nunca ninguém se pôs no lugar de Jessie. Está sozinha e condenada por todos como a assassina do marido sem terem provas. Acho que ela está a passar um mau bocado.

         As mulheres calaram‑se. Nenhuma queria estar na pele de Jessie.

 

         A camioneta de Fred e o carro de Jeremy saíram simultaneamente em direcção a Merryville. Não havia tempo a perder. O novo dado descoberto por Fred coincidia com o que o Dr. Woodiite dissera. Alguém chegara a Royal Crest no domingo para matar Bill e, depois, fugira na direcção contrária à aldeia. Tinham visto o assassino de Wider, e ali estava, no velho álbum, a sua fotografia. Faltava identificá‑lo, dar osdados à Policia e encerrar o caso. Jeremy repassava mentalmente os passos que teria de dar. A obsessão de salvar Jessie de qualquer suspeita ocupava‑o tanto que negligenciara o seu trabalho. No gravador de mensagens amontoavam‑se chamadas de pacientes. Minutos depois, Fred e Jeremy entravam no consultório do médico.

         ‑        Conseguiu o que procurávamos, Jeremy? ‑ perguntou o velho médico.

         ‑        Encontrei mais do que esperava. Aqui tem o assassino de Bill Wider.

         Jeremy colocou o álbum sobre a secretária. Woodlite olhou várias vezes para Fred e Jeremy sem compreender. Fred, pelo contrário, percebeu que tinha encontrado casualmente a chave para salvar Jessie.

         Woodlite observou a fotografia. Depois, abanou a cabeça, e com um gesto ríspido entregou‑a a Jeremy.

         ‑        Foi isto que trouxe, papéis amarelecidos? Não compreende que o futuro de Jessie está em perigo? Precisamos de provas, é disso que precisamos.

         ‑        Doutor, Fred sabe quem é o assassino.

‑ O que disse?

‑ Sim, doutor. É este. Tenho a certeza de que foi ele que entrou em Royal Crest no dia do crime. Ia montado num alazão.

‑        Mas, então, é o mesmo que vi afastar‑se quando fui ver o Bill. Sim, tem de ser ele. Vejamos.

Uma velha fotografia e alguns nomes era tudo o que os três homens tinham para resolver o caso.

‑        Jeremy, tens de ir a Washington. Irás ter com uma pessoa que há muito tempo foi o meu melhor amigo. Hoje ocupa uma alta posição, mas saberá atender‑te, sobretudo se levares uma coisa que te vou dar ‑ disse Woodlite, entregando‑lhe um bocado de chumbo. Era um pedaço de metal retorcido.

‑        Quer que lhe entregue isto em troca de ajuda?

‑        Exactamente, é isso que vais fazer. Nesta bala estava a vida do meu amigo. Deve‑me um favor e sei que posso confiar nele.

‑        E quando devo partir?

         - Falarei com ele por telefone para que esteja à tua espera. Ele conhece gente do FBI e poderás ter acesso a dados que sem a sua ajuda seria impossível obter. Já sabes que tens de agir com rapidez.

‑        Sim, eu sei.

Jeremy pensou em Jessie, lembrou‑se da sua alegria ao recebê‑lo, ao abraçá‑lo e do pedido dele para não o fazer. Lamentou ter tido de agir daquela maneira. Teria gostado de a beijar durante horas. Será que a vida lhe daria a oportunidade de poder estar com ela?

‑ Doutor, partirei depois de me despedir de Jessie. - Jeremy tinha apenas quatro horas para estar com Jessie antes de viajar para Washington.

Jessie recebeu‑o surpreendida. Não esperava ver Jeremy de novo nesse dia. Ele abraçou‑a e beijou‑a sem se importar com a presença de Bianche.

         Os olhos de Jessie interrogavam‑no e sentiu‑se acobardado. Tinha medo de ainda não conseguir dar‑lhe respostas concisas e preferiu não fazer comentários sobre a sua missão.

‑        Jessie, vim despedir‑me porque vou viajar.

‑        Viajar? Queres dizer que vais ausentar‑te precisamente no momento em que mais preciso de ti?

‑        É importante. Disseste que confiavas em mim.

‑        Sim, mas nunca imaginei semelhante atitude. Acho que me enganei a teu respeito. És um egoísta. - Jessie ficou furiosa. Jeremy pensou que era preferível vê‑la assim do que deprimida. Aparentou indiferença.

‑        Está bem, se é isso que pensas, irei agora mesmo.

Jessie mordeu os lábios para não lhe pedir que ficasse. O seu orgulho estava ferido. A porta da sala bateu e Jessie correu para a cozinha para contar a Bianche o que tinha acontecido. Agora estava só.

Os altifalantes avisavam que o voo para Washington ia partir. Jeremy ainda conseguiu telefonar.

‑        Departamento da Polícia.

‑        O detective Marshall, por favor.

‑        Saiu. Quer deixar algum recado?

‑ Sim, diga‑lhe que vá a Royal Crest. Encontraram a arma com a qual mataram Bill Wider.

‑ Quem fala?

‑ Isso não importa. Diga‑lhe que vá já a Royal Crest.

Jeremy desligou e correu para o avião.

 

         A campainha tocou com insistência. Bíanche foi abrir a porta. Surpreendeu‑se ao ver quatro pessoas vestidas de preto e com óculos escuros. Atrás delas, o detective Marshall olhava‑a.

‑ Estamos à procura do objecto encontrado ontem

‑        disse um dos homens e, sem mais comentários, entrou na sala e perguntou: ‑ Onde está?

Bíanche tremia e, sem poder disfarçar o susto, acompanhou‑os à cozinha. Tal como lhes tinha dito Jeremy, a arma estava sobre a bancada da cozinha.

‑        O caso está encerrado ‑ disse um deles.

‑        Precisamos de uma ordem ‑ comentou Marshall.

‑        Já tratei disso ‑ disse um dos homens.

‑        Deixe‑me vê‑la. Não quero perder o caso por causa de pormenores técnicos.

A ordem era para prender Jessie por assassínio do marido. Só o facto de ter encontrado a arma do crime dentro da casa tornava‑a a principal suspeita.

‑        E o móbil? ‑ perguntou um dos homens.

‑        Há motivos de sobra. Uma mulher jovem presa a um inválido e apaixonada pelo fisioterapeuta que cuida do marido.

Marshall ficou pensativo. A sua profissão tornara‑o céptico e sem escrúpulos. Via em cada pessoa um possível culpado, mas, como velho sábio que era, tinha conseguido desenvolver um instinto especial e, desta vez, não estava seguro de estar a prender a pessoa certa, apesar de ter encontrado a prova do crime.

‑ De todas as maneiras ‑ disse ‑, é provável que o juiz a absolva. A meu ver, não encontraremos impressões digitais da senhora na arma.

         - E se as houver?

Marshall não quis pensar nisso. Sabia que ia prender uma inocente, só para encerrar um caso que já estava a aborrecer demasiado os seus superiores.

‑ Então, Marshall?

Contrariado, James Marshall chamou a criada.

‑ Por favor, diga à senhora que preciso de a ver já.

Bíanche foi prevenir Jessie, que estava no quarto.

Desde a intempestiva partida de Jeremy, já nada tinha sentido para ela. Gostaria de conseguir odiá‑lo, mas era impossível. Amava‑o até ao mais íntimo do seu ser. Desejava voltar a experimentar a emoção de se sentir nos seus braços e não acreditava que tudo tivesse terminado. Talvez ele não quisesse envolver‑se num episódio tão tortuoso como a morte de Bill. Fugira para não fazer parte da lista de suspeitos de Marshall e assim livrar‑se de uma possível acusação. Isso tinha um nome: cobardia. Jeremy era um cobarde, apesar de ser carinhoso. Ao bater‑lhe à porta, Bíanche distraiu‑a dos seus pensamentos.

‑ Desculpe, menina, o detective quer vê‑la agora mesmo ‑ disse Bianche, angustiada.

‑ Vou descer já ‑ respondeu Jessie.

Estranhou ver tantas pessoas à sua espera. Talvez trouxessem notícias, a julgar pelas caras tão sérias.

"Oxalá seja alguma boa nova", pensou e estendeu

a mão para cumprimentar o detective. Marshall deu‑lhe um aperto de mão e depois disse:

‑        Senhora Wider, está presa. É suspeita do assassínio de Bill Wider. ‑ Dirigindo-se a um dos homens, acrescentou: ‑ Francis, lê‑lhe os direitos.

Jessien ão esperou que terminassem de lhe ler os direitos. Saiu disparada para a porta e correu para o estábulo. Os oficiais tentaram segui‑la em vão.

‑        Vamos, não pode fugir.

                   Os cinco homens saíram a correr e encontraram o velho Ford do Dr. Woodlite, que acabara de chegar.

‑        Um momento ‑ gritou o velho médico ao ver que os homens saíam armados. Sabia que estavam à procura de Jessie. ‑ Parem. Não a persigam mais, não foi ela. Tenho aqui todas as provas de que precisam.

Os homens viraram‑se para Woodlite. Marshall, num gesto de tréguas, aproximou‑se dele e arrancou‑lhe os papéis da mão, avisando‑o:

‑        É bom que não seja um estratagema para proteger

a senhora Wider, pois acusá-lo‑ei de cumplicidade. Contudo, ao ler o fax que Woodlite levava, o seu rosto transformou‑se. Chamou os outros homens e leu‑lhes o fax. Jessie estava inocente.

 

                   O grito de Bíanche soou como um uivo de dor. Do alpendre, apontava para o campo. Dali podia ver‑se Jessie montando Snow Cat, que corria descontrolado.

‑        Façam alguma coisa! A menina corre perigo!

                   Marshall subiu com o Dr. Woodlite no seu carro e, deixando os outros homens em terra, dirigiu‑se para o caminho principal, procurando alcançar Jessie, que tentava, sem êxito, dominar o cavalo descontrolado. Por momentos, o carro ficou ao lado de Jessie, e o Dr. Woodlite gritou‑lhe que apertasse as rédeas. Jessie virou a cabeça para ouvir o que o médico dizia e perdeu o equilíbrio. Snow Cat aproveitou o momento e, com um coice, atirou a cavaleira pelos ares. Jessie caiu e perdeu os sentidos. Woodlite e o detective apearam‑se. Viram que Jessie estava inconsciente. Transportaram‑na para o automóvel de Marshall e dirigiram‑se ao hospital de Sutternhall. Marshall sentia‑se culpado por ter acusado uma jovem inocente que talvez não resistisse a um acidente evitável.

Jessie jazia semi‑inconsciente no assento de trás. Os seus pensamentos eram confusos e misturavam a realidade com o delírio próprio do choque produzido pela queda. No meio de grande angústia, debatia‑se agitada no assento, murmurando frases incoerentes.

‑ É provável que esteja prestes a ter uma convulsão. Por favor, acelere ‑ pediu Woodlite a Marshall.

‑ Vai sobreviver, doutor? ‑ perguntou Marshall.

Woodlite não respondeu. A sala de espera do hospital estava repleta de pacientes, mas o Dr. Woodlite e Jessie entraram imediatamente para a sala de raios X. Fizeram‑lhe os mais diversos exames médicos, até que o médico foi falar com Fred e Bíanche.

‑ Está fora de perigo. Aparentemente, está bem.

‑ Que quer dizer com aparentemente?

‑ Hum, acho que a única coisa que posso fazer por ela é curar‑lhe o coração.

                   ‑ Mas, então, sofreu um ataque?

                   ‑ Bíanche, achas que estaria aqui a sorrir se Jessie tivesse tido um ataque cardíaco? O que quero dizer é que está desfeita por tudo o que aconteceu. É só um estado de choque passageiro. ‑ Woodlite voltou a entrar no quarto de Jessie. ‑ Jessie, és livre e ninguém poderá acusar‑te de nada. Encontraram o assassino de Bill. Compreendes?

‑        Já nada tem sentido.

                   ‑ Claro que sim. Graças a Fred e a Jeremy conseguiram encontrar o culpado.

                   Jessie arregalou os olhos. Não compreendia como podia ter ajudado a resolver o caso.

‑        Dr. Woodlite, que aconteceu na realidade? - Woodlite começou a falar. Antes de casar com ela,

         Bill era assaltante de bancos. Juntamente com os seus cúmplices, tinham escondido dinheiro, à espera

que passassem alguns anos para poderem utilizá‑lo

sem riscos. Frank Brown, um dos cúmplices que vivia

         em Merryville, sugeriu guardar o dinheiro na aldeia.

                   ‑ Foi quando Bill te conheceu e casou contigo. Passaram quatro anos e Bill decidiu, com o outro assaltante, exigir a Brown a sua parte. Tiveram uma discussão, porque Brown gastara parte do dinheiro. Brown disparou contra ele deixando‑o paralítico. Bill jurou vingar‑se, mas Brown foi preso por assaltar um supermercado. Pouco depois, Bill melhorou.

        ‑O que está a dizer, doutor? Bill conseguia andar?

         - Sim, mas nos seus planos o mais importante era a vingança. Uma noite, foi à casa de Frank Brown, que estava preso, e assassinou a irmã de Frank. Foi um crime brutal que nunca se esclareceu. Ninguém suspeitou de Bill, pois era impensável que um inválido pudesse ir ao outro lado do rio. Mas Frank sabia quem assassinara a irmã e, assim que saiu da prisão, telefonou a Bill.

‑        E Jeremy, o que tem a ver com tudo isto?

‑        Fred reconheceu Brown num album de fotografias. Era ele que rondava Royal Crest no dia do crime. Jeremy, seguindo as minhas indicações, foi a Washington esclarecer tudo. Brown foi preso por delitos menores e confessou o crime e o assalto ao banco.

‑        Quer dizer que Jeremy viajou para me ajudar... Por que não me disse?

‑        Tinha receio de alimentar falsas expectativas...

                   Umas batidas na porta anunciaram visitas. Jeremy entrou, olhando para Jessie com carinho e malícia.

‑        Disseram‑me que havia aqui uma pessoa que precisava urgentemente de reabilitação. aqui?

                   Jessie estendeu os braços.

                   ‑ Meu amor, precisei tanto de ti.

                   ‑ Aqui estou e estarei o resto da vida ao teu lado.

                   ‑ Como fisioterapeuta?

                   ‑ Não, meu amor, como teu marido.

                   Um beijo apaixonado foi a resposta de Jessie.

                   O Dr. Woodlite foi à procura de Bíanche e Fred. Tinha de lhes contar a fantástica recuperação de Jessie.

 

                                                                                Brenda Scot  

 

 

                      

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