Criar uma Loja Virtual Grátis
Translate to English Translate to Spanish Translate to French Translate to German Translate to Italian Translate to Russian Translate to Chinese Translate to Japanese

  

 

Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


PARA DOMAR UM CORAÇÃO / Cathy Williams
PARA DOMAR UM CORAÇÃO / Cathy Williams

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

PARA DOMAR UM CORAÇÃO

 

Francesca Wade jamais se deixara abater pelo nervosismo. Ao contrário, tinha a segurança natural das pessoas bonitas e poderosas.

Entretanto, naquele exato momento, tentando concentrar-se na revista institucional da Kemp International, não conseguia esconder a tensão. Afinal, aquele era o último lugar onde gostaria de estar, e a tentação de sair correndo era enorme.

Voltou a consultar o relógio. Estava aguardando há quarenta minutos sem que ele se dignasse a atendê-la. Quando a porta se abriu, ergueu os olhos ansiosos e tentou disfarçar a crescente impaciência.

— O Sr. Kemp irá recebê-la agora.

A mulher sorridente, de meia-idade, cabelo grisalho e tailleur azul-marinho gesticulou para que Francesca a seguisse pelo longo corredor que terminava numa intimidante porta de mogno. Com o corpo em estado de alerta, ela sentiu a garganta seca.

O conjunto estruturado que decidira usar para aparentar eficiência e seriedade tornou-se repentinamente desconfortável. Francesca não costumava vestir-se com tanto apuro, pois preferia roupas mais descontraídas. Desamparada, alisou a saia e olhou ao redor, detendo-se no homem sentado na poltrona, de costas. Atrás dela, a porta se fechou com um som abafado. O homem na poltrona se voltou.

Ela não sabia exatamente o que esperar. Quando o pai a advertira de que já era hora de abandonar a vida folgada e procurar um emprego, mencionara que conhecia alguém, o filho de um velho amigo, um sujeito formidável.

Fora um jogo de persuasão gradual até que ela, finalmente, colocou os pés naquele escritório para a entrevista com o "formidável" Oliver Kemp.

— Kemp venceu na vida com o próprio esforço — dissera-lhe o pai, entusiasmado, tentando minar-lhe a resistência em procurar trabalho. — Começou do nada e trabalhou como um mouro até se tornar o empresário poderoso e milionário que é hoje.

Por causa desse tipo de comentário, ela alimentava a fantasia de encontrar um Oliver Kemp jovem, de cara amarrada, gordo de tanto alimentar-se com a própria fortuna.

Mas o homem que a fitava não era gordo, nem parecia estar de cara amarrada. Era sem dúvida atraente, mas sua aparência não se assemelhava à dos jovens de seu meio. As linhas do rosto eram fortes e agressivas, e seus olhos azuis-claros tinham um quê hipnotizante.

Oliver Kemp a contemplou, sem piscar, até que Francesca baixasse os olhos.

— Sente-se — ordenou num tom frio.

Francesca acomodou-se diante dele. Não havia nada sobre a grande mesa de madeira polida, exceto um computador, numa das pontas, e uma pequena pilha de papel.

— Como soube a respeito deste emprego? — ele perguntou, sem preâmbulos. — Não anunciei em todos os jornais.

— Meu pai me falou nele — Francesca confessou com relutância, já na defensiva por razões que não conseguia identificar.

— Ah, sim. — Oliver Kemp a fitou com uma expressão neutra, deixando-a desconcertada.

— Papai mencionou que você é amigo dele e que está precisando de uma secretária. — Ela se irritou ao se dar conta de que estava dando explicações. — Sugeriu que eu viesse vê-lo.

— Almocei com seu pai há algumas semanas — Oliver informou friamente. — Como explica que, estando interessada no emprego, somente agora tenha decidido aparecer para uma entrevista?

— Como?

Entrevista? Que entrevista? Aquilo mais parecia um interrogatório! Só faltava descobrir de que estava sendo acusada!

— Tem estado ocupada com outras entrevistas?

Ele deixou a questão no ar de propósito, fitando-a com polida indiferença.

— Não exatamente — admitiu Francesca, detestando-o mais a cada minuto.

— Poderia ser mais específica?

— Esta é a primeira — ela murmurou, tentando se consolar com o fato de que, de qualquer forma, não queria aquele emprego. Estava ali apenas por insistência do pai.

— E há quanto tempo se formou? — Ele sorriu, mas seu sorriso era apenas formal.

— Há alguns meses.

— Então, se não estava procurando emprego, o que andou fazendo esse tempo todo? Descansando?

— Ouça, Sr. Kemp — ela disse entre os dentes —, vim aqui para uma entrevista. Mas todas as perguntas que me faz não vão indicar se estou ou não capacitada para o trabalho.

— Srta. Wade — ele se inclinou sobre a mesa com uma ameaça velada na voz —, sou eu que decido se está apta ou não para o trabalho. Se não gostar, é só sair.

Oliver a encarou e, por um milésimo de segundo, Francesca sentiu-se tentada a partir. Mas o desafio de enfrentá-lo falou mais alto.

— Ficarei.

— Então — ele manteve o mesmo tom polido e desconcertante —, vamos continuar.

— Está bem.

— Quer que eu diga por que não procurou emprego mais cedo, Srta. Wade? Porque seu pai é um homem rico e garotas ricas não precisam de trabalho. Afinal, isso não combina com noitadas, festas, programas…

Francesca ergueu a cabeça, irritada.

— Considero isso um insulto, Sr. Kemp. Não tem o direito de julgar meu caráter.

Oliver deu de ombros e levantou-se. Ela o observou caminhar até a janela, a mão direita no bolso da calça. Havia uma característica felina naquele homem. O corpo era esbelto, musculoso. O rosto e as mãos, bronzeados. Mas Francesca o detestava.

— Você precisa dar um rumo à sua vida — dissera-lhe o pai, na noite anterior. — É uma garota inteligente demais para passar os dias em festas, viagens e shoppings.

Pela primeira vez, ela notara um certo desespero na voz de Gerald Wade. Mas dera-lhe razão. Completara o segundo grau com a graduação máxima. Fizera o curso mais caro para secretárias apenas porque não estava disposta a enfrentar uma faculdade e, desde a conclusão, não se esforçara para conseguir um emprego.

Sabia que não era uma pessoa fútil, mas ainda não conseguia entender por que navegava ao sabor dos acontecimentos, sem dar um rumo definido a sua vida.

Oliver Kemp voltara-se para encará-la.

— Srta. Wade, não sei por que está aqui, mas, se veio apenas para se livrar da pressão de seu pai, está no lugar errado.

— Certamente não estou aqui por causa de meu pai — ela protestou, mas corou em seguida, ciente da própria mentira.

— Verdade? — Ele a fitou com uma expressão desaprovadora.

— Sinto muito por ocupar seu tempo, Sr. Kemp — disse Francesca, levantando-se. — Sinto que cometi um erro ao procurá-lo. Receio não estar em condições de me candidatar ao emprego.

— Sente-se, Srta. Wade, e por favor nem pense em sair enquanto eu não terminar.

— Não quero me sentar de novo, Sr. Kemp — ela retrucou com igual frieza — e, por favor, não me trate como se eu fosse uma criança.

— Eu não faria isso se você se portasse como adulta. Seu pai está muito preocupado com seu estilo de vida, sabia? Quanto a mim, não dou a mínima para o que faz. Minha empresa não é uma clínica de reabilitação e…

Francesca recusou-se a ouvir aquele sermão até o final.

— Não sou um problema social, Sr. Kemp. Não estou aqui sob pressão e o senhor certamente não tem obrigação alguma de me dar este emprego.

— Nisso estamos de acordo. — Ele apontou para o computador, com indiferença. — Preciso saber se está qualificada para o emprego. Quero que digite o documento ao lado do computador. Depois ditarei algumas cartas.

— Pois não. — Francesca sorriu polidamente e circundou a mesa, segura de que poderia fazer o teste. — De qualquer forma, posso ter esquecido tudo o que aprendi no curso de secretariado. Afinal, depois de seis meses de festas, noitadas e… ahn… programas, nunca se sabe, não é verdade?

Ele não retribuiu o sorriso, mas houve uma mudança sutil em sua expressão, um quê encantador que a deixou levemente perturbada.

Francesca desviou o olhar rapidamente e começou a digitar, os dedos ágeis sobre o teclado. Oliver, sentado na outra ponta da mesa, a observava atentamente.

Ela procurou concentrar-se no teste. Sim, submetera-se à entrevista por vontade própria, mas o pai tivera uma forte influência na decisão.

Franziu o cenho e perguntou-se se estaria ali, sentada diante do computador, se não fosse aquela malfadada noite com Rupert. Seu querido amigo Rupert, alto, loiro e despreocupado, tinha mais dinheiro do que juízo, e a levara para casa quando o dia já estava nascendo. Nessas circunstâncias, como convencer o pai de que, para ela, Rupert era tão atraente quanto uma batata assada?

Fitou Oliver com o canto dos olhos. Pelo menos o velho poderia tê-la recomendado a alguém mais humano, amigável e fácil de lidar. Oliver Kemp, constatou, era tão agradável quanto um ciclone.

Imprimiu as cinco páginas do documento e as entregou, com uma expressão cortês e neutra. Reparou que os frios olhos azuis examinaram o documento duas vezes, na certa procurando erros. Talvez devesse ter incluído alguns intencionalmente, só para vê-lo balançar a cabeça.

— Nada mau. — Oliver colocou as folhas sobre a mesa e caminhou até a porta, esperando que ela o seguisse. Atravessaram a sala onde Francesca o aguardara por quarenta longos minutos e dirigiram-se ao escritório privativo do empresário, uma sala grande com duas mesas. Uma era a de trabalho; a outra abrigava um terminal de computador e uma impressora. Estendendo-se de parede a parede, num dos lados da sala, havia uma estante que subia até o teto, cheia de livros sobre eletrônica.

A Kemp International dominava o mercado de equipamentos eletrônicos sofisticados. Era a pedra no sapato de suas rivais.

Francesca contemplou os livros e ficou imaginando se refletiriam o gosto pessoal de Oliver Kemp. Seria ele um daqueles homens que dormiam, comiam e respiravam trabalho?

— Se vier a ocupar o cargo — ele disse, seguindo a direção dos olhos de Francesca —, espero que se familiarize com o conteúdo da maioria desses livros. Trabalhar, para mim, não significa apenas datilografar bem.

— Então decidiu que sou boa o suficiente para o cargo, Sr. Kemp?

Oliver sentou-se na poltrona giratória e entrelaçou os dedos.

— Sarcasmo não é uma qualidade que admiro numa secretária.

— Desculpe-me.

— Você apenas provou que sabe digitar.

— E ler — ela observou. — Posso consumir o conteúdo desses livros avidamente.

Ele ergueu uma sobrancelha.

— Isso é bom. Assim, quando nossos clientes telefonarem, com dúvidas, você poderá respondê-las de maneira coerente.

— Diga-me, o que aconteceu à sua última secretária?

— Emigrou para a Austrália há três anos. Foi morar com a irmã. Desde então, tenho me sujeitado a profissionais que não fazem jus ao título.

— Percebo — ela respondeu, imaginando que não deveria ter sido fácil, para as pobres moças, enfrentar um sujeito implicante como aquele.

— Você, ao menos, sabe ler e digitar. — Estreitou os olhos. — E isso me leva a uma pergunta óbvia: por que está aqui?

— Já sabe por que estou aqui — ela respondeu, irritada com a indagação. — Sou uma garota mimada que…

— Por que está aqui, sinceramente? — ele a interrompeu, impaciente. — Poderia ter procurado outras empresas. Seu pai me contou que você se graduou com nota máxima. Por que não foi para a universidade? Gerald teria gostado.

Francesca não apreciou a sensação de estar sendo acuada.

— É verdade.

— Ele gostaria que tivesse cursado economia, se não me engano.

— Será que vocês só falaram sobre mim naquele almoço? Creio que já sabe até o número do meu manequim e minha cor favorita.

Oliver fitou-a meticulosamente, os olhos percorrendo o corpo esbelto e bonito.

— Manequim quarenta. E provavelmente sua cor favorita é o azul. Azul-real.

Francesca corou ante aquele olhar avaliador e procurou mudar o rumo da conversa.

— Não fui para a universidade porque queria dar um tempo a mim mesma.

— Tempo para quê?

— Para me divertir — ela murmurou, sentindo-se encurralada.

— Ah, agora estamos chegando ao âmago da questão!

— Estamos? — ela perguntou, sentindo a raiva aumentar.

— Você pode ter todas as qualificações para o emprego, mas não permitirei, sob hipótese alguma, que sua vida pessoal interfira na profissional. Trabalhar para mim não será apenas um passatempo para deixar seu pai satisfeito. Não quero vê-la chegando a este escritório atrasada, ou com o rosto pálido porque passou a noite na farra. Estou sendo claro?

— Como água.

— Nem quero que faça tudo às pressas, só para ter mais tempo para ficar ao telefone com seus inúmeros admiradores.

— Não tenho inúmeros admiradores, Sr. Kemp — ela retrucou. — Certamente não ouviu isso de meu pai.

Oliver deu de ombros.

— Ele mencionou um rapaz que está sempre atrás de você. E rapazes andam sempre em bando, não é?

— Estou vendo que não aprova minha conduta, Sr. Kemp.

— Não, não aprovo. — As palavras foram ríspidas. Ele não era o tipo de homem que falava com rodeios. — Nasci pobre, Srta. Wade, e consegui o que tenho às custas de meu trabalho. Não aprovo gente que só pensa em se divertir. Quanto a você, percebo que tem inteligência, mas não parece disposta a usá-la num emprego. Entendo isso. O trabalho não tem atrativo algum para alguém que não precisa dele.

Francesca sentiu-se magoada, mas nada falou. Já nascera rica e, como a mãe morrera cedo, o pai a tratara com mimos, realizando todos os seus desejos. Era a forma que encontrara para dizer que a amava, apesar de estar ausente a maior parte do tempo.

Mas talvez Oliver Kemp tivesse razão. Talvez o conforto material a houvesse privado da garra que faz com que as pessoas lutem pela vida.

— De qualquer maneira, esta é apenas a minha opinião pessoal — ele continuou, tirando-a da introspecção —, e opiniões pessoais não têm lugar num ambiente de trabalho. Portanto, enquanto estiver desempenhando suas tarefas satisfatoriamente, creio que nos daremos bem. Abuse de sua posição, garota, e logo descobrirá os limites de minha tolerância.

Ambos entreolharam-se e Francesca experimentou uma sensação de pânico. Não daria certo, percebeu. Oliver Kemp não gostava dela nem daquilo que seu estilo de vida significava.

— Obrigada por me fazer sentir tão bem-vinda à sua empresa, Sr. Kemp — ela disse intencionalmente, fazendo-o dar um arremedo de sorriso.

Oliver se levantou, para mostrar o escritório que Francesca ocuparia.

— Percebo que terei que tolerar essa sua língua afiada — murmurou, virando-se para trás e fitando-a. — Nesta empresa — continuou, encaminhando-se à sala contígua — não é necessário usar roupas de grife. — Sentou-se no canto da mesa de Francesca, esperou que ela se acomodasse e então acrescentou: — Digo isso para seu próprio benefício. As pessoas com quem lidamos não têm um nível tão diferenciado quanto o seu. — Tocou na gola da blusa de Francesca. — Se usar apenas isto, vai se distanciar de pessoas que podem ser muito interessantes.

Ela não se afastou do toque, mas não se sentiu à vontade. Viu Oliver retornar à sua sala, retesou-se e só descontraiu-se digitando as cartas que lhe foram entregues.

Ao meio-dia, ele saiu e informou que passaria o dia fora. Francesca observou-o vestir o paletó e ajustar a gravata. Ao vê-lo partir, respirou aliviada.

Havia algo em Oliver Kemp que a deixava em estado de alerta. Era como se corresse perigo a cada minuto. Olhou para a pilha que ele lhe deixara, certa de que aquilo a manteria ocupada até as cinco da tarde. No entanto, decidiu permanecer no escritório até as seis e meia familiarizando-se com o sistema de arquivo e com o conteúdo de alguns dos livros que teria que ler.

Quando voltou para casa, não encontrou o pai. Sentia-se cansada, mas estranhamente feliz por ter passado o dia fazendo algo produtivo. Entretanto, Rupert a estava aguardando. A governanta o deixara entrar, e Francesca o avistou na sala de estar, tomando o segundo copo de gim-tônica.

— Corre o boato de que você arranjou um emprego.

Francesca o fitou e sorriu. Gostava muito de Rupert Thompson. Conhecera-o há dois anos, mas apenas nos últimos sete meses haviam se tornado amigos, para desespero de Gerald Wade, que o considerava um desocupado.

Ela tirou o casaco, jogou-o sobre uma cadeira e foi até o bar, onde se serviu de água mineral.

— O boato está correto. — Tirou os sapatos e sentou-se no sofá. — Por que não segue meu exemplo?

— E estragar minha reputação? Jamais!

Bem, Rupert tinha uma profissão, ao estilo dele. Na verdade, herdara uma grande fortuna dos pais e tudo o que fazia era cuidar para que os empregados fossem regiamente pagos. Com isso, recebia em troca total lealdade. Alguns dias por semana visitava suas propriedades, no campo, para certificar-se de que tudo ia bem.

— Então conte-me tudo — ele pediu.

Francesca o atendeu, mas omitiu as partes desagradáveis da entrevista.

— Kemp… — murmurou Rupert, circunspecto. — Kemp, Kemp, Kemp. Já ouvi esse nome.

— Seus artigos eletrônicos estão no país todo. E a empresa está crescendo. Já tem filiais na Europa e espera conquistar o Extremo Oriente em pouco tempo.

— Não, não é isso. Já ouvi falar do homem pessoalmente.

— É mesmo? — Sem querer, ela se sentiu curiosa. Kemp era um arrogante e sua vida pessoal não lhe dizia respeito, mas mesmo assim o assunto a intrigava.

— Oliver Kemp… Já o vi por aí.

— Você já viu todo mundo por aí. Rupert riu, satisfeito.

— Ele é um cara bem-apessoado — disse, olhando para o copo vazio.

Francesca entendeu a insinuação.

— Por que não toma água mineral?

— Em excesso faz mal, sabia? — ele disse quando a viu entregar-lhe o copo com a água.

— Conte outra.

— Uma taça de vinho, segundo os médicos, faz maravilhas para o coração.

— Você teria meu apoio, caso se limitasse a um copo por dia.

Ignorando o comentário, ele prosseguiu:

— Oliver Kemp estava nas colunas sociais há pouco tempo. É por isso que o nome não me é estranho. Não costuma ler as colunas sociais?

— São muito superficiais — ela respondeu, fazendo-o rir.

— Fale a verdade! Você não as lê desde que anunciaram que estávamos noivos!

— Gente estúpida.

Ela riu ao lembrar-se da confusão. Bastou ser fotografada ao lado do amigo, ao saírem juntos de uma discoteca, para que o circo fosse armado. Fora um custo explicar ao pai que tudo não passara de fofoca.

— Bem, mas os colunistas estavam certos em relação a Oliver Kemp. Ele está noivo de uma moça chamada Yvonne.

— Oliver Kemp é noivo?

— Sattler! — ele exclamou, encantado com a própria memória. — Yvonne Sattler. É uma das empresárias mais bem-sucedidas da cidade. — Ergueu-se, pronto para partir. — Que tal jantar comigo amanhã? Agora, que está trabalhando, espero que pague a sua parte.

— Sempre pago minha parte, querido. E sugiro que esqueçamos os dias em que você deixou a carteira em algum lugar…

Riram e combinaram um encontro para a noite seguinte. Às sete horas, para que ela tivesse tempo de sair do trabalho às seis, correr para casa e trocar-se rapidamente. Não queria dar chance para que Oliver Kemp criticasse sua vida pessoal.

Enquanto subia para o banho, Francesca percebeu-se interessada demais no fato de Oliver estar noivo. Não tinha ideia de como era Yvonne Sattler, mas sua imaginação já lhe fornecera todos os detalhes: alta, olhos impiedosos e intolerantes. O tipo de mulher que só fica feliz discutindo as flutuações do mercado financeiro. O tipo de mulher adequada para Oliver Kemp.

Gerald Wade chegou em casa justamente quando Francesca terminava o jantar e se preparava para tomar café. Não disfarçou a satisfação ao saber que a filha conseguira o emprego.

— Kemp é um homem muito respeitado — disse-lhe, procurando não demonstrar a alegria.

Francesca concordou, meneando a cabeça. "Respeitado por quem?", perguntou-se. "Por vampiros e outras criaturas da noite?"

Ao deitar-se, ponderou que, afinal, Oliver Kemp não era totalmente desalmado; afinal, estava noivo. Tentou imaginá-lo como um homem passional, o que não foi muito fácil. Ao adormecer, já não tinha mais tanta raiva. No entanto, sentia-se estranhamente inquieta.

 

— Ora, viva! Conseguiu chegar no horário!

Foram as primeiras palavras que Francesca ouviu ao entrar no escritório, às cinco para as nove. Planejara chegar mais cedo, mas não fora capaz de persuadir seu corpo a despertar antes das sete e meia.

Olhou para Oliver, tentando se controlar, mas ele já estava concentrado em outros assuntos.

— Percebo que conseguiu terminar todo o trabalho que deixei em sua mesa. A que horas saiu, ontem?

Francesca sentou-se à mesa, empertigada. Vestia algo um pouco mais conservador naquela manhã: um vestido reto azul-marinho, sem grife.

— Por volta das seis — murmurou vagamente.

— Não há necessidade de trabalhar tanto. — Depositou sobre a mesa de Francesca os dois livros que trouxera de sua sala. — Quero apenas empenho; não espero que tenha uma crise nervosa por causa da empresa.

— Não costumo ter crises nervosas — ela assegurou, dando uma olhadela nos livros.

— Não desejo que fique aqui além do expediente e comece a reclamar de exaustão a semana toda.

— Não costumo reclamar, Sr. Kemp.

Oliver apenas meneou a cabeça. Não parecia interessado nela, o que era uma situação nova. Francesca sempre atraíra a atenção dos homens, com seu longo cabelo loiro contrastando com sobrancelhas e olhos castanhos. Ao fitá-lo com o canto dos olhos, constatou que, para Oliver Kemp, era tão atraente quanto o porta-chapéus do canto da sala.

— Quero que comece com estes dois livros — pediu ele, colocando as mãos nos bolsos. — Eles lhe darão uma ideia geral do que faz nossa empresa. Mas antes venha até meu escritório; quero falar sobre minha agenda para os próximos seis meses.

 

Depois de ter falado sobre seus compromissos para o semestre seguinte, Oliver recostou-se na poltrona e olhou-a fixamente. "O que há nos olhos desse homem?", ela se perguntou. "São frios, mas há neles um quê inegavelmente sensual."

— Ainda não perguntei se tem alguma dúvida sobre a empresa, ou sobre seu papel dentro dela. Alguma questão?

— O que fazia sua última secretária? Estou me referindo àquela que partiu há três anos. Que tarefas desempenhava?

Ele a fitou com um traço de ironia.

— Pretende seguir o exemplo dela? — indagou, surpreso. — É uma tarefa quase impossível.

— Quero tentar — ela respondeu sem pestanejar. — Sei que não me tem em alta consideração…

— … Mas admito que suas habilidades como secretária são surpreendentemente boas.

— Obrigada.

Francesca procurou se controlar. Normalmente era uma pessoa tranquila, mas até então nenhum homem como Oliver Kemp cruzara seu caminho.

— Irene era meu braço direito — contou ele. — Conhecia o funcionamento da empresa. Quando eu pedia alguma informação sobre um cliente, ela costumava fornecê-la praticamente sem consultar os arquivos.

— Que exemplo de eficiência! — Francesca comentou, com uma ponta de sarcasmo.

— Era mais que eficiência; era devoção — ele corrigiu. — As inúmeras secretárias que tive depois de Irene queriam o emprego apenas pelo dinheiro.

— Bem, a mim você não pode fazer esse tipo de acusação.

— Tem razão. Mas o fato de você não ter necessidade de ganhar a vida me preocupa.

— Não está disposto a me dar uma chance? — ela o desafiou, mas Oliver apenas continuou a fitá-la, os olhos frios. — Como sua empresa começou? — ela perguntou, tentando mudar de assunto. Não queria sentir-se desconcertada outra vez.

— Com um empréstimo no banco — ele respondeu secamente, como se isso já fosse do conhecimento de todos.

— E o que aconteceu depois do empréstimo?

— Comecei com uma pequena distribuidora, no centro da Inglaterra. Como nossos produtos são bons, alcançamos uma posição surpreendente no mercado. Mais alguma pergunta?

Ela se levantou, fazendo um gesto negativo com a cabeça. Ao sair da sala, fitou-o uma vez mais; entretanto, ele já se concentrara no gráfico que a tela do computador exibia.

Francesca fechou a porta silenciosamente, sentindo que, pela primeira vez na vida, fora gentilmente desprezada. Ao pensar nisso, notou que era até engraçado não ser o centro das atenções. No entanto, não tinha vontade de rir. Francamente, não era uma sensação agradável, por menos que gostasse de Oliver Kemp.

Às dez e meia, a porta que dava para o corredor se abriu e um dos gerentes entrou. Era um homem com cerca de trinta e cinco anos, loiro, que ergueu as sobrancelhas ao vê-la.

— Bem — disse, sedutor, após um olhar furtivo na direção da porta de Oliver —, onde se escondeu esse tempo todo, meu anjo?

Francesca parou de digitar e respondeu calmamente:

— É o Sr. Robinson? O Sr. Kemp o está aguardando. Vou avisar que chegou.

— Pode me chamar de Brad. Mas ainda não precisa avisá-lo, pois estou cinco minutos adiantado. — Olhou para a porta novamente e ajeitou a gravata colorida.

Francesca observou-o sentar-se no canto da mesa, inclinando-se na direção dela. Já conhecia aquele tipo de homem.

— Que vento a soprou até aqui? — ele perguntou, sorrindo.

"Provavelmente casado", ela deduziu. Era o tipo que precisava se insinuar para toda mulher que encontrasse pela frente.

— Estou aqui desde ontem — Francesca respondeu friamente —, e não foi o vento que me trouxe.

— Não, mas com esse tipo etéreo, com esse cabelo… — Ergueu a mão para tocar-lhe o cabelo, e nesse momento ela viu Oliver Kemp parado à soleira.

— Sr. Kemp — disse, levantando-se. — Já ia avisar que o Sr. Robinson chegou.

Brad Robinson enrubesceu e ergueu-se rapidamente.

Oliver não disse palavra, a expressão insondável. Deu as costas e o gerente, agora numa postura humilde, seguiu-o, fechando a porta do escritório. Francesca soltou um longo suspiro, com a involuntária sensação de que fizera algo errado.

Uma hora e meia mais tarde, Brad Robinson saiu da sala, sem olhar para os lados. Quanto a Oliver, aproximou-se da mesa de Francesca, fazendo-a corar.

— Por favor, me desculpe — ela começou, insegura. Ele a fitou com as sobrancelhas arqueadas, intrigado.

— Está desculpada. Mas por quê?

— Não convidei o Sr. Robinson a sentar-se em minha mesa — continuou, cada vez mais ruborizada. — Ele…

— Ele é um paquerador inveterado, Srta. Wade — Oliver a interrompeu, sorrindo. — No entanto, é um excelente vendedor.

— Creio que sim — ela murmurou, aliviada.

— Mas isso não significa que tolero gente que mata o tempo durante o expediente.

— Claro. E não se preocupe, sei lidar com homens como Brad Robinson.

— Certamente. Estou falando com uma especialista no assunto.

"Tenho a sensação de que não foi um elogio", Francesca constatou intimamente enquanto Oliver consultava o relógio.

— Algum compromisso urgente, Sr. Kemp?

— Quero que examine algumas pastas. — Ele se apoiou na mesa de Francesca, que ficou momentaneamente fascinada com os antebraços musculosos que as mangas dobradas revelavam.

— Sim, senhor — murmurou, desconcertada com a própria reação.

— Pode me chamar de Oliver. Não acredito em sistemas hierárquicos. São ruins para o moral.

— Também estuda psicologia? — Francesca perguntou, fazendo-o erguer as sobrancelhas.

— Você com certeza não quer parecer sarcástica o tempo todo, não é mesmo? — Sentou-se num canto da mesa. — Creio que nunca precisou moderar seu linguajar, estou certo?

— O que quer dizer com isso?

— Estou dizendo, Srta. Wade, que seu berço privilegiado lhe abriu muitas portas. Imagino que a subserviência dos outros seja parte do seu dia-a-dia.

— Não é verdade — ela respondeu. Não passara a vida exigindo tratamentos especiais. Isso lhe fora dado naturalmente.

— Este é seu primeiro emprego. E provavelmente, pela primeira vez na vida, ninguém a tratará de maneira preferencial.

— Não quero mesmo isso — defendeu-se Francesca, grata por Oliver desaparecer em seguida, para retornar logo depois com uma pilha de pastas.

— Aqui dentro há cartas que precisam ser digitadas. Nelas, destaquei algumas providências que você terá que tomar. Terá que ligar para os gerentes regionais e marcar reuniões aqui em Londres. Alguma pergunta?

— Não.

Ele esboçou um leve sorriso.

— Você é muito confiante.

— Não me diga que há algo errado nisso!

— Absolutamente, mas confiança demais é quase tão ruim quanto confiança nenhuma. Tenho certeza de que não gostaria de se dar mal só porque é orgulhosa o bastante para fazer perguntas.

— Sei fazer perguntas quando é necessário.

— Ótimo. — Com exasperada fascinação, Francesca acompanhou o caminhar solto de Oliver, que já voltava para sua sala. — Estarei fora o resto do dia — ele disse, por sobre o ombro. — Se precisar de mim, poderá entrar em contato pelo telefone celular até às sete. O que acontecer depois disso terá que esperar até amanhã.

Assim que o viu sair, Francesca voltou-se para o computador e pôs-se a trabalhar, ligando para os gerentes regionais e marcando as reuniões.

Mas, a todo o momento, pensava em Oliver. Irritava-a muito o tom superior e paternal com que ele se expressava, como se ela fosse um caso perdido de imaturidade.

 

Trabalhou arduamente, inclusive durante o horário do almoço, e somente quando a porta se abriu percebeu que já eram mais de quatro da tarde.

— Oi!

Bastou essa simples palavra para que Francesca percebesse que não gostava da garota que parara ao lado de sua mesa.

— Posso ajudar?

— Pode dar estes documentos para seu chefe assinar? Ele está?

— Não. Qual o seu nome?

— Helen. Trabalho na contabilidade.

— Muito prazer — foi a resposta polida, mas mentirosa. Helen Scott parecia uma balconista de loja de cosméticos.

O cabelo, pintado de preto, estava preso num rabo-de-cavalo sofisticado, e o rosto, cuidadosamente maquiado, dava-lhe a aparência de uma boneca de porcelana.

— Na verdade — disse Helen, puxando uma cadeira para perto de Francesca —, estamos curiosas a seu respeito. Como conseguiu o emprego?

— Oh, pelo método normal — mentiu Francesca, mas a garota não arredou pé.

— De qualquer forma, estamos morrendo de inveja — prosseguiu a moça, estreitando os olhos azuis. — Eu faria qualquer coisa para trabalhar com Oliver, mas minha digitação é péssima. — Pegou um peso de papel, com o qual ficou brincando.

— Bem, tenho certeza de que seu trabalho é muito interessante — comentou Francesca gentilmente, provocando uma gargalhada em Helen.

— Oh, empolgante, queridinha. — Colocou o peso de papel no lugar e levantou-se. — Bem, estou indo. Apenas passei para ver como anda a concorrência.

— Concorrência?

— Oh, sim. — Ela arregalou os olhos, com ar astuto. — Pensei que você fosse o tipo intelectual que Oliver adora, mas não é. Cá entre nós, ele não é imune a um rostinho bonito…

— E, caso ele não seja imune, você quer ter certeza de que será a primeira da fila, certo?

— Acertou na mosca. Daria meu braço direito para passar uma noite com ele.

— Está falando sério?

— Você não?

— Não — respondeu Francesca friamente. — Agora, se não se importa, tenho muito o que fazer.

— Claro. — Helen caminhou até a porta e perguntou: — Ele volta amanhã?

— Sim.

— Diga-lhe que passarei para recolher os documentos pela manhã. — Com isso, partiu, deixando Francesca com uma sensação desagradável.

Ela conseguiu sair às cinco e meia e foi com alívio que encontrou o descomplicado Rupert às sete.

— Você parece cansada — ele disse, enquanto entravam no Jaguar vermelho. — Cansada, mas extraordinariamente elegante, considerando que vamos apenas jantar. Não quer mudar de ideia e me acompanhar até uma discoteca?

Francesca riu. Rupert era incorrigível, além de uma companhia deliciosa. Foram até um bistrô francês, na região dos teatros, onde ele a distraiu com uma conversa leve e interessante.

O restaurante era parcamente iluminado, condizente com a noção de que pouca luz e atmosfera romântica andam sempre de mãos dadas.

O proprietário, que os conhecia, conduziu-os até uma pequena mesa de canto. Rupert adorou a localização. Dali, podiam ver a movimentação das pessoas que entravam ou saíam do restaurante, gente com dinheiro suficiente para pagar o preço da comida naquele lugar.

Privilégios, Francesca pensou, que o dinheiro podia pagar. Jamais tivera que restringir sua escolha a lanchonetes por falta de dinheiro, e estranhou estar tendo esse tipo de reflexão pela primeira vez na vida.

Durante a refeição, limitou-se a ouvir Rupert. Ele era como seus outros amigos, dispostos a buscar diversão em lugares caros. Mas todos pareciam carecer de algo. Era como se estivessem sempre distanciados da realidade.

Inadvertidamente, pensou em Oliver Kemp e ficou irritada. Ele não era nenhum modelo de homem atencioso, mas possuía mais substância do que todos os seus amigos reunidos.

Rupert estava dizendo algo. Ela concordou gentilmente, distraidamente, deixando o olhar perambular pelo restaurante cheio. Viu Oliver no exato momento em que ele a avistou. Horrorizada, percebeu que o chefe e a acompanhante se aproximavam da mesa. No princípio, mal viu a mulher que estava com ele.

— Por Deus, Rupert — sussurrou, nervosa —, meu chefe está vindo em nossa direção!

Observaram Oliver se aproximar. Rupert, sempre com uma saudação descontraída na ponta da língua, sorriu abertamente:

— Então você é o linha-dura de quem tenho ouvido falar! — E se levantou, indiferente à expressão fria de Oliver. — Puxem mais duas cadeiras e sentem-se conosco!

— Certamente o Sr. Kemp tem uma mesa reservada — disse Francesca, aterrorizada, enquanto a mulher ao lado de Oliver observava o restaurante com um sorriso divertido.

— Adoraremos ficar com vocês — ela disse e, pela primeira vez, Francesca a contemplou por completo.

Então essa era Yvonne Sattler! Baixinha, de cabelo curto e encaracolado, possuía uma expressão viva e inteligente.

— Imagino que estejam saindo do teatro — comentou Rupert enquanto todos se sentavam.

— Exatamente — Oliver confirmou, e fitou Francesca com o canto dos olhos.

— A propósito, meu nome é Rupert Thompson. Um perdulário de marca maior, mas com um coração de ouro.

A mulher sorriu e disse animadamente:

— Que apresentação mais original! Sou Yvonne Sattler. — Olhou para Francesca. — Muito prazer em conhecê-la. Espero que se dê bem como secretária de Oliver. Parece que ele provocou crises nervosas nas anteriores. — Fitou ternamente o noivo, provocando uma emoção confusa em Francesca.

— Também espero que sim — concordou ela, contemplando timidamente o chefe.

— A Srta. Wade ainda está na fase do entusiasmo — comentou ele com frieza. — Está tentando provar a si mesma que tem capacidade.

O comentário interessou Rupert, que sorriu.

— Ora, essa é uma novidade. Você jamais precisou se esforçar para fazer algo, não é, Fran?

Oliver fitou Francesca com sagacidade, deixando-a na defensiva.

— Acontece que fui contratada para trabalhar, e quero realizar isso com eficiência.

— Boa resposta! — aplaudiu Yvonne. — Não deixe Oliver pisar em você. É famoso por abusar das secretárias.

— Ora — murmurou ele, voltando os olhos para a noiva —, até parece que sou um monstro!

O garçom se aproximou para anotar os pedidos. Rupert falou por todos:

— Queremos apenas a conta. Nossos amigos concordaram em ir à discoteca conosco! — Olhou para Yvonne e murmurou: — Seria uma pena desperdiçar um traje tão elegante num restaurante mal iluminado.

Ela ficou encantada, mas Oliver interveio:

— Não creio que seja uma boa ideia.

— Eu gostaria de ir para casa, Rupert — disse Francesca, em pânico.

— Bobagem. Só porque arranjou um emprego, não precisa renunciar a todos os prazeres da vida.

— Seria divertido — incentivou Yvonne, voltando-se para o amuado Oliver.

Francesca percebeu que havia um sentimento real entre os dois, pelo modo como se olhavam. Seria amor? A ideia a fez terminar rapidamente seu cálice de vinho. Sentiu-se um pouco estonteada.

Rupert levantou-se e estendeu a mão para Yvonne.

— Posso acompanhar sua adorável noiva até a porta?

Levemente irritado, Oliver perguntou, com voz baixa e ríspida, ao aproximar-se de Francesca:

— Não pode dar um jeito em seu namorado?

— Rupert não é meu namorado! — ela protestou, ao que ele deu de ombros.

— O que seja.

Estavam passando pela porta e, à frente deles, Yvonne ria, encantada com as coisas que Rupert lhe falava.

— A culpa não é minha se Rupert se apoderou de sua noiva.

— Ora, Yvonne é uma garota crescida e inteligente o bastante para não se deixar levar pelo charme grudento de seu amiguinho.

Chegando à calçada, Rupert imediatamente acenou para um táxi, enquanto Yvonne lançava para Oliver um sorriso sedutor:

— Nunca fomos a uma discoteca. Será divertido!

Francesca ponderou que dormir seria um programa mais adequado.

— Sinto muito por tudo isso — murmurou a Yvonne, já dentro da boate.

— Por quê? Para mim é uma mudança saudável. Estou sempre tão envolvida com o trabalho que mal consigo relaxar. — Oliver fora até o bar, pegar bebidas, e Yvonne segurou Francesca pelo braço, num gesto confidencial. — Imagino que venha aqui com frequência.

— Ah, a toda a hora — respondeu Francesca, afetada. — Como não tenho nenhuma preocupação, acho muito fácil relaxar.

— Não pretendia ser indelicada — disse Yvonne com gentil sinceridade, provocando rubor no rosto de Francesca.

— Não, é claro que não. Eu apenas…

— Oliver está lhe dando muito trabalho por causa de sua origem? Ele contou que seu pai é muito rico.

— E o que mais ele contou?

— Ele é durão, mas espero que o compreenda. Creio que será um pouco difícil, se está acostumada a homens como Rupert.

— Rupert é…

— Um tipo de pessoa que jamais encontrei na vida! — Yvonne riu e Francesca começou a sentir alguma simpatia por ela.

Pouco depois, Rupert levou-a para a pista. Com relutância, Francesca sentou-se num lugar sossegado, ao lado de Oliver. Com o canto dos olhos, percebeu que as outras mulheres o fitavam com interesse. Quanto a ele, parecia ignorá-las.

— Agora entendo por que seu pai está preocupado com seu estilo de vida. — Em meio ao som e à aglomeração, a voz rouca soou-lhe estranhamente íntima.

—Jamais pretendi levar a vida dessa forma por muito tempo.

— Então apenas se deixou levar por ela nos últimos meses?

— Por que insiste em me criticar? Você mal me conhece.

— Conheço o suficiente. — O modo como ele a fitou a fez corar.

— Sua noiva parece adorar esse tipo de vida — ela ironizou.

— Novidades passam depressa.

— Parece que você jamais se divertiu…

— É o que pensa? — Ele a fitou intensamente, o que a deixou mais aturdida.

— Você é que vai me dizer.

— Não passei a vida estudando e trabalhando — ele respondeu, a voz grave impondo-se à música.

— Então simplesmente decidiu, um belo dia, que poderia passar sem diversão? — Segurou o copo com as duas mãos mas não bebeu, temendo sentir-se mais tonta.

— Não. Apenas decidi que isso tudo é um exercício de futilidade.

— O que, suponho, é outra crítica a meu estilo de vida.

Ele deu de ombros.

— Pode supor o que quiser.

— Você não se importa? — Por algum motivo, o comentário a magoou.

— Nem um pouco.

Ele se recostou e consultou o relógio.

— Esteja certo de que não me atrasarei amanhã — disse Francesca, abandonando seus princípios e bebendo um grande gole.

— É claro que não se atrasará. Nem que seja para provar que pode levar esse tipo de vida e ainda assim trabalhar direito.

— Não tenho que provar nada a você.

— E a si mesma? — ele perguntou, sem encará-la.

 

— Estou deixando esta casa!

Gerald Wade arregalou os olhos, sem saber o que dizer à notícia que a filha lhe dava.

— Como?

— Encontrei um apartamento — ela prosseguiu, sem conseguir encarar o pai. — É pequeno, mas suficiente para mim. Pretendo me mudar durante o fim de semana. Como você ficará quinze dias fora, não irei incomodá-lo.

— Qual é o problema?

— Problema? — Ela se levantou, atravessou a sala e foi até a janela. Depois voltou-se para o pai, as mãos nos quadris. — Papai, como pôde fazer isso?

Dois meses, ela pensou, furiosa. Dois meses trabalhando para Oliver Kemp… E para ouvir aquilo! Tudo começara ao entrar no escritório, na manhã anterior. Percebeu, assim que colocou os olhos em Oliver, que o chefe estava de péssimo humor.

Ele se debruçara sobre a mesa de Francesca e, num tom arrogante, dissera que o documento que ela passara horas digitando teria que ser refeito, pois algumas das informações não eram precisas. Algo que, segundo Oliver, uma secretária deveria saber muito bem.

David Bass ditara os dados. Como Francesca poderia saber que não estavam corretos?

— Eu disse a seu pai que teria problemas ao contratá-la. — E bufara, balançando a cabeça.

Fora o suficiente para Francesca entender tudo.

— De que está falando? — perguntou-lhe o pai.

Ela o fitou, a lembrança humilhante do que Oliver lhe dissera ainda clara em sua mente.

— Você subornou Oliver Kemp para que ele me contratasse! — acusou, zangada com o pai, consigo mesma, com o chefe e com o mundo.

Passara os dois últimos meses dando o máximo de si, acreditando piamente que conseguira o emprego por seu próprio mérito, mas a verdade enfim se revelara.

Gerald Wade, desconcertado, tentava acalmá-la, mas Francesca não estava disposta a perdoar.

— Agi pensando em sua felicidade, minha querida.

— Você conhecia o pai dele muito bem, não conhecia? — ela esbravejou, amarga. — Oliver não é apenas um conhecido. É filho de um velho amigo de infância! Estudaram juntos na mesma escola. A diferença foi que, quando você se matriculou numa escola particular, o Sr. Kemp teve que trabalhar para sustentar uma família de nove pessoas!

— Hector Kemp era um homem muito inteligente — Gerald murmurou, pesaroso.

— Nem que fosse um gênio! — exclamou Francesca, a ponto de chorar. — Oliver contou que você custeou os estudos dele, depois da morte de Hector. Você me entregou numa bandeja, sabendo que ele não teria outra opção a não ser me empregar!

— Você o procurou por vontade própria, não se esqueça.

— E você o colocou numa posição horrível, sem saída. Na verdade, sou um débito que deve ser saldado!

— Eu sabia que você tinha aptidão para o cargo.

— Nesse caso, deveria ter deixado que eu provasse isso por mim mesma.

— Minha querida…

— Agora já está feito. Mas jamais o perdoarei por isso.

— Você está fazendo tempestade em copo d'água. Se Oliver a considerasse incompetente, não a teria empregado, tendo ou não uma dívida para comigo.

— Mas você não deveria tê-lo subornado! — Ela se dirigiu à porta. — Por favor, diga a Bridie que passarei por aqui no fim de semana para pegar minhas coisas.

Na manhã anterior, humilhada com as revelações, Francesca comunicara sua decisão a Oliver:

— Não posso continuar trabalhando com você.

Ele respondera, irritado:

— Não seja tola. Não aceitarei sua demissão.

— Por quê? Porque é uma questão de honra manter-me aqui?

— Pare de agir como uma criança!

Ela se sentia como uma criança. Mas de que outra forma poderia se sentir? Estava com o orgulho ferido, vulnerável, e nada que seu pai dissesse iria demovê-la da decisão de ir embora de casa.

Furiosa, bateu a porta e saiu. Bridie, a velha governanta, desceu a escada correndo, para ver o que estava acontecendo.

Francesca ainda estava possessa na manhã seguinte. Assim que Oliver a viu, disse, impaciente:

— Pelo amor de Deus, pare com isso!

— De que está falando? — ela perguntou, enquanto o via tirar o casaco.

— Quero deixar algo muito claro. Se não a considerasse capaz, não a teria contratado.

— Tem certeza?

Exasperado, Oliver a segurou pelo queixo.

— Não suporto gente que sente pena de si mesma! — esbravejou, recebendo um olhar zangado.

— Já que não gosta de mim, por que perde seu tempo me criticando?

Ele olhou para o teto, como se estivesse implorando aos céus um pouco de paciência. Em seguida, entrou em sua sala e bateu a porta.

 

Na sexta-feira, Francesca estava com os nervos em frangalhos, consequência direta da atmosfera agressiva que se instalara no escritório. Contraía-se sempre que o chefe se aproximava. Ele, por sua vez, andava com um humor péssimo, o que não ajudava em nada.

Ela já estava prestes a sair, no final do dia, quando comunicou, sem encará-lo:

— Creio que ainda não mencionei, mas decidi sair de casa.

— Por quê?

Francesca deu de ombros e caminhou até a porta, mas Oliver antecipou-se, bloqueando-lhe a passagem.

— Aceitar sua caridade é ruim, mas aceitar a de meu pai é muito pior.

— Quer dizer que ficou abalada com o que falei? Ainda não está madura o bastante para acreditar que não me arrependi por tê-la contratado?

— Sim, é isso — ela respondeu, petulante. — Ainda não estou madura.

— Seu pai certa vez me fez um favor. Agora pude retribuir. Deixe como está.

Como Francesca permanecesse calada, Oliver balançou a cabeça, impaciente.

— Agora vai me dizer que estou agindo como uma criança, não vai?

— Também consegue ler pensamentos?

— Apenas o seu — ela retrucou, dizendo a primeira coisa que lhe veio à cabeça. Uma surpreendente sensação de intimidade pairou no ar.

— Não culpe seu pai. Ele agiu pensando no seu bem. — Depois de uma pausa, pediu: — Preciso de seu novo endereço. Para entregar ao departamento pessoal. — O tom era suave mas o olhar tinha o brilho imperturbável de sempre.

— À vontade.

Francesca informou o endereço, sabendo que Oliver o guardaria em sua prodigiosa memória.

— Tire dois dias de folga — ele sugeriu, dando-lhe passagem.

— Não, obrigada.

— Sei. É claro que não.

Oliver então voltou para o trabalho, deixando Francesca com uma única preocupação: a mudança.

 

Foi um procedimento rápido. Às sete e meia da noite seguinte, ela já havia transferido para o apartamento tudo o que era seu e que estava na casa do pai.

Agora, pela primeira vez, sentava-se no pequeno sofá de dois lugares, colocado diante da bay window, e olhava ao redor. Precisaria de algum tempo para se acostumar à nova vida. Comparado à mansão do pai, o apartamento não passava de uma casa de boneca.

A geladeira, na cozinha minúscula, tinha espaço para uma embalagem de ovos e pouca coisa mais. A porta do pequeno dormitório, com um banheiro conjugado, abria-se para a sala, onde se viam um sofá surrado, duas poltronas e um tapete persa que ela trouxera do próprio quarto.

Era a primeira vez que vivenciava a verdadeira liberdade. E, era obrigada a reconhecer, sentia-se bem.

Uma batida forte à porta a assustou. Não podia ser Rupert. Os demais amigos nem sabiam que havia se mudado.

Oliver Kemp era a última pessoa que esperava encontrar. Assim que viu a silhueta alta no corredor, sentiu o coração bater mais rápido.

Ele observou a surpresa no rosto de Francesca e encostou-se ao batente.

— Não vai me convidar para entrar? Ou prefere que fiquemos aqui, olhando um para o outro?

Francesca deu um passo para o lado e ele entrou, o porte atlético contrastando com as pequenas dimensões da sala.

— O que está fazendo aqui? — ela quis saber, fechando a porta. Sentia-se em desvantagem com seu jeans desbotado e a velha camisa de flanela xadrez.

— Pensei em trazer um presente para aquecer a casa — ele disse, olhando ao redor da sala. Em seguida, depositou duas garrafas de champanhe sobre a mesa diante do sofá.

— Você é muito gentil.

— Posso me sentar? — Ele se acomodou sem esperar resposta, jogando o casaco e o paletó sobre uma das poltronas e dobrando as mangas da camisa. — Quando me contou que ia se mudar, admito que não esperava um lugar como este.

— Imaginou que eu fosse procurar algo maior e mais luxuoso?

— Foi o que passou pela minha cabeça.

— Posso ter nascido em meio ao luxo, mas não sou viciada nisso.

— Touché. — Ele se ergueu, foi até a cozinha e, depois de algum tempo, retornou trazendo dois copos com champanhe.

— Não precisava ter vindo… — ela começou, cuidando para não tocar nos dedos de Oliver ao pegar o copo.

— Quer que eu saia?

— Não, claro que não.

— Está esperando alguém?

— Não.

— Só queria certificar-me de que estaria bem.

— Por que não haveria de estar? — Ela tomou um pequeno gole.

— Porque você tem estado um tanto arisca, com preocupações exageradas.

— Obrigada pelo voto de confiança — ela retrucou, ao que Oliver riu, inesperadamente.

Francesca tomou um gole maior. Jamais tivera predileção por champanhe, mas precisava admitir que a bebida a estava deixando mais descontraída.

— Por que veio, afinal? Onde está Yvonne?

— Saiu. Com aquele seu amiguinho, para ser mais exato.

Francesca ficou boquiaberta.

— Com Rupert?

— Acaso você tem outro amiguinho além dele?

— O que ela está fazendo com Rupert?

— Os dois foram a uma discoteca.

— A uma discoteca?

— Você parece chocada.

— Então é por isso que você está aqui — ela constatou, balançando a cabeça lentamente. — Não se preocupou com meu bem-estar. Veio apenas porque sua noiva está saindo com Rupert.

Ele arqueou as sobrancelhas e riu.

— Não seja infantil. Yvonne tentou me arrastar para aquele maldito lugar, mas decidi que poderia passar sem o prazer duvidoso daquele som bate-estaca.

— Mas você não se importa? — inquiriu Francesca, estendendo o copo para mais uma dose de champanhe.

— Com o quê?

— Com o fato de sua noiva estar por aí com outro homem.

— Não sou ciumento e, como já disse, confio em Yvonne. Não pretendo mantê-la amarrada ao pé de minha mesa.

— Quanta liberalidade! — Francesca não tomava álcool há semanas, e o champanhe fazia efeito com velocidade alarmante. — Você deve imaginar que estou desesperada ao pensar em Rupert com outra mulher, não? — Riu alto. — Impossível. Não somos namorados.

Ele estreitou os olhos, mas não comentou nada. Apenas mudou de assunto:

— Como seu pai reagiu à mudança?

— Ele não tentou impedir — respondeu Francesca, circundando a borda do copo com um dedo.

— Teria conseguido, se houvesse tentado?

— Não.

— Então ele é um homem sábio.

— Quando eu disse a você que queria me demitir, estava falando sério.

— Não podia estar falando sério. Você gosta de trabalhar para mim, apesar de não querer admitir.

— E quanto a você? Gosta do meu trabalho? Não me aprova e teve mil motivos para se livrar de mim.

— Posso não aprovar seu modo de vida, mas seria obrigado a ter algo pessoal contra você para demiti-la.

"Por que não fiquei feliz ao ouvir isso?", ela se perguntou, e uma vozinha interior lhe respondeu: "Porque você gosta de ser admirada. Na verdade, quer ser desejada". Sentiu a pele queimar à constatação.

— Quer que eu abra a outra garrafa? — ela perguntou, e, sem esperar resposta, entrou na cozinha, servindo mais dois copos.

Sentiu as pernas fracas, mas não se importou. A última semana fora traumática. Agora, queria descontrair. Em vez de voltar para a poltrona, sentou-se no sofá, perto de Oliver. Era sua imaginação ou ele ofegava? Fitou-o, mas nada pôde perceber na expressão imperturbável.

— Não creio que seja uma boa ideia continuar a beber — ele murmurou. — O que comeu durante o dia?

— Deixe-me lembrar… — Ela franziu a testa ao notar que seu joelho quase tocava a coxa de Oliver. — Comi fruta no almoço e um prato de sopa mais tarde.

— Só isso?

— Só isso — ela confirmou, sorrindo, contemplando-o, à luz fraca da sala, com secreto prazer.

— Já terminou a mudança? — Ela não respondeu. O silêncio na sala a deixava arrepiada. Estendeu a mão para pegar o copo, mas Oliver segurou-lhe o pulso. — Não creio que deva beber mais.

— Por que trouxe champanhe se não quer que eu beba?

— Eu deveria ter pensado melhor — ele respondeu, sem soltar a mão de Francesca.

Ela deu de ombros e abaixou os olhos. Oliver soltou-a e respirou fundo.

— Creio que já é hora de ir.

— Por quê?

Ele a fitou intensamente.

— Você sabe muito bem por quê. Venha. — Levantou-se e ela ergueu os olhos, confusa.

— Para onde?

— Para o seu quarto, garota. Creio que está precisando dormir.

Antes que ela tivesse tempo para protestar, Oliver se inclinou e pegou-a no colo, levando-a para o quarto como se carregasse uma pluma.

Francesca também sabia que se portava de maneira estranha. Com um pequeno suspiro resignado, repousou a cabeça no peito de Oliver.

Ele a colocou sobre a cama e acendeu a luz da cabeceira. Com isso, o quarto ganhou um brilho pálido e aconchegante. Francesca deitou a cabeça no travesseiro e contemplou a mobília. Parecia mais bonita na penumbra.

— Quer me trazer um copo d'água, por favor? — pediu, sentando-se na cama. — A cozinha fica… — Acenou vagamente e ele sorriu.

— Creio que não preciso de mapa e bússola para encontrar a cozinha.

Oliver saiu do quarto e retornou antes que ela tivesse tempo de coordenar os pensamentos.

— Sente-se — disse Francesca, bebendo a água em seguida. Depois de alguns segundos de hesitação, Oliver acomodou-se a seu lado, na cama.

— Como encontrou este lugar? — perguntou, muito à vontade. Era como se estivesse na sala de visitas.

"Mas que homem controlado!", ela pensou. Como seria vê-lo perder o controle?

— Com um pouco de sorte e muita raiva. Fiquei com raiva de meu pai, de você. Mas agora não quero mais pensar nisso. — Depois de alguns segundos, indagou: — Onde você mora?

— Em Hampstead. Não muito longe daqui, a propósito.

Ao perceber que Oliver estava se levantando, pediu:

— Não vá… ainda não. — No silêncio, sua voz era pouco mais que um sussurro.

A maioria dos homens sonhava com a oportunidade de ficar a sós num quarto com ela. Por que Oliver se esquivava?

— Está com medo? — ele perguntou. — É a primeira vez que fica sozinha?

— Sim.

— Bem, sempre há uma primeira vez. Agora tente dormir. A porta tranca automaticamente ou preciso de chave? Não gostaria de deixá-la destrancada.

— Por que não? Acha que alguém vai entrar na calada da noite e se aproveitar de mim?

— Ou roubar sua televisão e seu aparelho de som — ele disse secamente, erguendo as sobrancelhas. — Melhor prevenir do que remediar.

— Estou surpresa com sua preocupação!

— Eu me preocuparia com qualquer mulher que ficasse sozinha num apartamento aberto, especialmente no estado em que você se encontra.

— Se for apenas para roubar, é melhor que me encontrem dormindo.

— Mas se não quiserem apenas roubar…

— De que está falando? — Ela começou a sentir a cabeça rodar.

— Vai me dizer que sou o primeiro homem que lhe diz quanto é atraente? — Ele sorriu levemente e consultou o relógio.

— Mas não atraio você.

— É esse o efeito que o champanhe tem sobre sua língua?

Ela deu de ombros. Sentia que algo muito importante estava por acontecer. Seu pulso se acelerara e sua pele parecia mais quente e sensível. Ergueu a mão. Embora tivesse a sensação de estar flutuando nas nuvens, sabia que estava por cometer uma loucura.

Começou a desabotoar a blusa, os olhos cravados nos de Oliver. Jamais percebera quantos botões havia naquela roupa. Finalmente, desabotoou o último e abriu a camisa, expondo os seios redondos e cheios, os mamilos eretos.

— O que está fazendo? — ele perguntou, aturdido. Francesca tomou-lhe a mão e fez com que tocasse seus seios. Tomada de um instinto primitivo, deixou escapar um gemido quando Oliver a tocou.

Ele se aproximou, os olhos ardentes, a respiração arfante. Francesca percebeu, encantada, que o chefe começava a perder o controle.

Quando suas bocas se encontraram, ela arqueou o corpo e se apertou contra ele, entreabrindo os lábios e permitindo um beijo devastador. Com uma das mãos, Oliver a segurava pela nuca, enquanto a outra amoldava um dos seios frêmitos.

Acariciou um mamilo, provocando mil pequenos choques elétricos no corpo de Francesca. Ela o observou levar a boca até o mamilo róseo e fechou os olhos quando o sentiu sugado vorazmente, torturado com a ponta da língua hábil.

Ainda tinha os olhos fechados quando ele ergueu a cabeça para contemplá-la. Francesca precisou de alguns segundos para perceber que Oliver se afastara, sentando-se na beira da cama.

— O que houve? — perguntou, sentindo um frio repentino.

— Pelo amor de Deus, feche essa sua camisa!

Francesca sentou-se, embaraçada, e enrolou-se na peça.

Oliver se levantou. Dando-se conta da situação constrangedora, ela desejou vê-lo partir de imediato. Mas ele permaneceu ao pé da cama, o peito arfante.

— Foi a bebida ou você tem o hábito de se atirar nos braços de todo homem que lhe aparece pela frente?

As palavras a feriram como uma faca.

— Não sou nenhuma leviana!

— Tem certeza? Não foi a impressão que tive.

— Jamais dormi com homem algum em minha vida!

Era a primeira vez que confessava isso a alguém. No entanto, tinha consciência de que, se Oliver tivesse continuado, não teria feito nada para impedi-lo. Desejara-o com uma intensidade assustadora e, pior, percebera que há muito tempo o desejava. Portanto, não fora apenas a bebida que a instigara.

Ele balançou a cabeça e passou os dedos entre o cabelo.

— Está olhando para o homem errado, se quer ganhar experiência — disse, apoiando-se no pé da cama.

Francesca permaneceu calada e, como não conseguisse encará-lo, desviou o olhar. Não queria um homem para ganhar experiência. Queria Oliver.

— Você é uma garota atraente e admito que fiquei tentado a aceitar o que me ofereceu. Mas não é meu tipo, assim como acredito não ser o seu.

— E que tipo de homem você acha que me agrada? — ela perguntou, sentindo um nó na garganta.

— Você não passa de uma criança, Francesca. Não tenho tempo para crianças.

Entreolharam em silêncio. Então Oliver deu as costas e saiu do quarto. Ela ouviu a porta da sala bater e, desesperada, cobriu o rosto com o travesseiro. Jamais fora rejeitada. Sentia um misto de confusão, raiva e dor.

— Odeio você, Oliver Kemp! — exclamou, e sua voz reverberou no silêncio.

 

Ao entrar no prédio da Kemp International, na manhã de segunda-feira, Francesca sentia-se cansada e nervosa. Depois de passar o final de semana arrependida pelo que fizera, chegara a uma conclusão: oferecera-se a Oliver Kemp, mas nunca voltaria a cometer o mesmo erro.

Procurou não pensar na interpretação que ele estaria dando ao fato. Contanto que não desconfiasse, por um minuto sequer, da enorme atração que exercia sobre ela, Francesca tentaria levar sua vida como se nada tivesse acontecido.

Para seu azar, encontrou-o no elevador.

— Está se sentindo melhor?

— Sim, obrigada — ela respondeu, com um sorriso forçado. — Ontem levantei como se um caminhão tivesse me atropelado, mas duas aspirinas resolveram o problema. — Esperou que entrassem no corredor vazio para acrescentar, desconcertada: — Quero me desculpar pela noite de sábado.

Oliver segurou a porta do escritório para que ela passasse, e o leve contato entre os dois corpos a deixou em estado de alerta.

— Vamos esquecer o que houve — ele começou, num tom impessoal.

— Concordo em que não adianta remoer o que aconteceu, mas preciso esclarecer tudo.

— Nesse caso, vá em frente.

— Sei que você deve estar pensando o pior de mim, mas acredite: aquele episódio jamais se repetirá. Eu estava muito deprimida pela discussão que tive com meu pai e encontrei no champanhe uma saída rápida para esquecer tudo.

— Todos nós cometemos erros — ele a tranquilizou, dando de ombros e examinando a correspondência.

— Entenderei perfeitamente se quiser me despedir.

— E por que eu faria isso? Creio que o melhor é esquecer o que aconteceu. — Ele se dirigiu à sua sala. — Já concluiu o trabalho de Peterborough?

— Sim, já. Aqui está — ela respondeu, entregando-lhe uma pasta.

— Esse homem telefona a todo momento, querendo saber quando completaremos seu estoque. Não entende que, ligando de hora em hora, não conseguirá acelerar o processo.

Ela riu, mas sentiu que o relacionamento entre os dois já não era o mesmo. Antes daquele fatídico final de semana, vinham se comportando de maneira mais descontraída. Oliver começara a confiar na competência de Francesca, algo que ela apreciara bastante. Haviam estabelecido uma boa rotina de trabalho.

Mas, agora, tudo isso desmoronara.

 

Oliver saiu da sala às onze horas para dizer que ficaria fora o resto do dia. Francesca estava sentada diante do computador, por volta do meio-dia, quando o telefone tocou. Era Yvonne.

— Aceita almoçar comigo? — ela convidou, com o tom caloroso e animado das pessoas que estão de bem com a vida.

"Meu Deus", Francesca suplicou intimamente, "faça com que Oliver não tenha contado tudo à noiva!"

— Claro — ela respondeu, limpando a garganta e anotando o local do encontro.

Às cinco para a uma, entrou, ansiosa, num bar próximo ao escritório. Quando Yvonne finalmente chegou, dez minutos atrasada, Francesca estava a ponto de confessar tudo. Mas a outra mulher, trajando um impecável tailleur preto, parecia não saber de nada.

Dez minutos depois, já sentada a uma mesa de canto, Francesca sentia a boca dolorida de tanto forçar o sorriso.

Somente conseguiu concentrar-se na conversa quando Yvonne contou que precisava de alguns conselhos.

— Sobre o quê? — perguntou Francesca, e Yvonne a fitou, circunspecta.

— Roupas. Quero mudar meu guarda-roupa e creio que você é a melhor pessoa para me ajudar, pois seu modo de vestir é encantador.

— Por que deseja mudar seu guarda-roupa? — perguntou Francesca, intrigada. — Na sua posição…

— Ah, eu sei! Apenas quero fugir um pouco dessa imagem de executiva poderosa. — Deu um riso nervoso, como se tivesse medo da própria decisão. — Preciso de cores mais alegres, de mudanças.

— Por quê? Oliver não a ama do jeito como é?

— Ora, uma mudança é tão boa quanto um descanso, não acha? — respondeu Yvonne num tom ambíguo, bebericando seu suco de laranja.

— Acredita que ele esteja precisando de uma mudança? — insistiu Francesca, com um pequeno sorriso.

— Quem sabe? Ele pode ter uma agradável surpresa.

Dando de ombros discretamente, Francesca contou onde comprava suas roupas. E não pôde deixar de imaginar Yvonne vestida de maneira sedutora, fazendo amor com Oliver. Foi um alívio quando se despediram para voltar ao trabalho.

Durante dois dias Francesca manteve a cabeça baixa e mal fitou Oliver nos olhos. O que sentia por aquele homem não a levaria a lugar algum. No entanto, sempre que ele se aproximava, tinha que esconder as mãos para não demonstrar quanto tremiam.

— O que está acontecendo com você? — perguntou Oliver na quarta-feira, vendo-a prestes a sair.

— Não venho me sentindo muito bem — ela se apressou em responder. — Deve ser um resfriado.

— Você anda trabalhando muito. Não costuma parar para almoçar?

— Ocasionalmente. Almocei com sua noiva há alguns dias.

— Sim, ela me contou.

— Yvonne queria alguns conselhos sobre moda e veio até mim. A quem mais poderia recorrer? Qualquer pessoa percebe que o meu forte são as roupas… — A voz soou surpreendentemente amarga.

Oliver franziu a testa.

— É isso que pensa de si mesma?

— Creio que não. — Ela soltou uma risada seca e levantou-se. — Se está bem para você, vou encerrar o dia. A menos que queira que eu digite estas cartas imediatamente.

— Elas podem esperar.

Francesca desviou o olhar e se encaminhou para a porta. Estava tão desanimada ao sair da sala que ficou quase feliz ao encontrar Brad Robinson perto de sua mesa. Já se acostumara aos flertes e atenções do rapaz. E já sabia que não era casado.

— Você não está bem — ele comentou, contemplando-a de cima a baixo, como sempre fazia.

— Estou me sentindo péssima — ela admitiu, guardando suas coisas. — Minha cabeça, minhas costas, meus olhos, tudo dói.

— Que tal uma massagem? — Ele flexionou os dedos e ergueu as sobrancelhas, numa expressão maliciosa.

— Bem — ela disse, sem encará-lo, mas rindo —, essa foi a cantada mais inusitada que já escutei.

— Sério? Então preciso incorporá-la a meu repertório. — Antes que Francesca pudesse reagir, Brad já se postara atrás dela e começava a lhe massagear os ombros. — Está bem assim?

— Enquanto suas mãos se limitarem a meus ombros, tudo bem — ela respondeu, quase fechando os olhos.

— Tentarei me comportar.

— Que delícia… — murmurou Francesca, flexionando os ombros.

Nenhum dos dois ouviu a porta se abrir. Quando Oliver falou, sua voz reverberou na sala como um trovão:

— Que motivo especial o trouxe até aqui? — perguntou a Brad, o rosto crispado. Cruzando os braços, prosseguiu:

— É melhor dizer, e já.

— Estávamos de saída — interveio Francesca, corando.

Oliver se aproximou, a postura ameaçadora.

— O Sr. Robinson está de saída. Quanto a você, garota, vá para minha sala. Agora!

Furiosa, ela o seguiu.

— Aquilo foi desnecessário! — explodiu, fechando a porta.

— Não me diga o que é necessário dentro de minha própria empresa!

— Brad Robinson só queria conversar um pouco.

Oliver se aproximou e segurou-a fortemente pelos ombros.

— Isto aqui não é um parque de diversões — rosnou, as sobrancelhas negras franzidas perigosamente. — Não admito que meus funcionários se divirtam durante o expediente! Estou sendo claro?

— Mas Brad flerta com todo mundo! Você mesmo disse.

— Isso não é desculpa para abusar de minha confiança! Só falta encontrá-la aos beijos com esse sujeito!

Francesca ergueu a cabeça.

— Isso foi injusto! E me solte! Está me machucando!

Oliver soltou-a abruptamente, mas não se afastou. Ficou onde estava, as mãos enfiadas nos bolsos.

— Como espera ser levada a sério? Se pretende continuar a agir como uma adolescente, diga-me. Assim poderei devolvê-la a seu pai. E de bom grado!

Entreolharam-se e, estranhamente, Oliver foi o primeiro a desviar a vista. Caminhou até a janela e voltou-se para Francesca.

— Isso não voltará a acontecer — ela murmurou, trêmula.

— Ótimo. Mas saiba que, se acontecer, você está fora. E ele também.

— Não! Brad é um bom vendedor. Você mesmo disse.

— E reitero. — Oliver deu-lhe as costas e olhou através da janela, esperando que ela saísse.

Foi o que Francesca fez. Jamais o vira tão furioso. O que o fizera reagir daquela forma? Estaria procurando uma desculpa para despedi-la?

Ainda pensava nisso quando entrou no hall de seu prédio. Por causa da luz fraca, não percebeu o guarda-chuva caído à sua frente. Num minuto, estava estatelada no chão. Tentou se levantar, mas sentiu uma pontada lancinante no tornozelo.

Olhou para o guarda-chuva com ódio. Depois de alguns minutos, procurou erguer-se novamente. Percebeu que teria que subir até seu apartamento mancando e segurando-se à balaustrada, muito lentamente.

Preparou um jantar leve. Às oito, ligou para o médico da família, que explicou tratar-se de uma torção e garantiu que a dor passaria. No entanto, pela manhã, Francesca ainda sofria com o tornozelo inchado. Com um suspiro resignado, ligou para Oliver.

— Sinto muito, mas hoje não poderei ir trabalhar.

— Por que não? — Ele não demonstrou preocupação alguma, algo que Francesca já esperava.

— Torci meu tornozelo. Mal posso andar.

— Que descuido! Logo agora que preciso analisar alguns casos pendentes com você…

— Realmente sinto muito, Sr. Kemp. Da próxima vez, tentarei planejar meus acidentes para ocasiões mais oportunas.

— Seria muito útil. Entretanto, nem tudo está perdido. Irei visitá-la esta noite, depois do expediente. Está bem às seis e meia?

— Visitar? — ela perguntou, horrorizada com a perspectiva, mas ele já desligara.

 

Francesca passou o resto do dia em tensa ansiedade. A visita de Rupert, na hora do almoço, foi quase irritante. Não o via há algum tempo e agora começava a considerá-lo um tanto superficial. Ao levantar-se para partir, ele disse:

— Sinto muito por tê-la incomodado, Fran. Quando telefonei para o escritório e soube do acidente, pensei que estivesse precisando de companhia.

— Desculpe-me, mas estou com a cabeça cheia de problemas.

— Eu também — ele confessou, hesitante. Francesca percebeu que o amigo estava indeciso quanto a confiar-lhe, ou não, um segredo.

— Quer me contar algo?

— Não, nada. Problemas com mulheres, como sempre.

— Como sempre? Rupert, você nunca teve problemas com mulheres!

Ele riu.

— Eu sei. Não é uma vergonha tê-los agora, com essa idade?

Sem pretender estender o assunto, ele saiu, com um breve aceno.

 

Oliver não chegou antes da sete e, com isso, a tensão de Francesca deu lugar à raiva. Ao ouvir batidas à porta, atravessou a sala mancando, os lábios crispados.

Ele a fitou lentamente, do pé ao rosto e, então, de volta ao pé inchado. Em seguida, ignorando os protestos de Francesca, segurou-a no colo.

Fez com que se sentasse na poltrona e tirou a capa de gabardine. Estava chovendo forte e as gotas batiam regularmente no vidro da janela.

— Trouxe o jantar — ele anunciou. — Comida chinesa. Espero que goste.

Algo no comportamento de Oliver deixou-a alarmada, embora não conseguisse identificar exatamente o quê.

— Você foi muito gentil — ela respondeu, lembrando-se de como fora desastrosa na última visita do chefe.

— Imaginei que não conseguiria cozinhar nesse estado — ele comentou e, sem pedir licença, foi até a cozinha, voltando com dois pratos e talheres. Francesca observou-o servir a comida. — Sei que não parece muito apetitoso — disse Oliver, entregando-lhe o prato.

— Mas o aroma é uma delícia.

Ela o fitou com um leve sorriso, encantada com a sensualidade viril daquele homem.

— Como está se virando?

Entre uma garfada e outra, Francesca respondeu às perguntas de Oliver. Surpreendentemente, foi uma conversa descontraída. Ele tinha o dom de saber ouvir e, depois de alguns minutos, ela falava com mais liberdade.

— Agora você conhece tudo a meu respeito — disse, ao colocar o prato sobre a mesinha. — E só Deus sabe o que mais meu pai lhe contou…

— Ele só quer seu bem.

— Por que não começamos a trabalhar? Se deixar os pratos sobre a pia, posso lavá-los mais tarde.

Ele concordou e, com isso, passaram a hora seguinte analisando as pastas. Francesca anotou as providências que deveria tomar assim que voltasse ao trabalho. Quando terminaram, Oliver se recostou na poltrona e disse:

— Caso esteja imaginando o motivo de minha visita, informo que estarei no exterior nas próximas três semanas, tratando de assuntos urgentes.

— Ah… — Ela não conseguiu decidir se a notícia lhe provocava alívio ou desapontamento.

— Certamente manterei contato todos os dias, mas você terá que passar sem minha ajuda. Pode fazê-lo?

— O que acha?

Ele a fitou, pensativo.

— Não tenho dúvidas de que pode — murmurou, lançando-lhe um sorriso sensual. — Eu estava errado a seu respeito. Tenho que admitir que seu trabalho tem sido irrepreensível.

— Será que estou ouvindo bem? — ela indagou, fazendo-o rir.

— Juro que está.

Oliver se levantou, e Francesca imaginou que estivesse de saída. No entanto, ele foi até a cozinha, preparou café e trouxe duas xícaras fumegantes

— Ora, eu não sabia que você tinha um lado doméstico!

— Fazer café não é tão difícil — ele respondeu, ao sentar-se. — Consigo até preparar uma refeição decente, se não houver outra saída.

— Certamente aprendeu a cozinhar na universidade — comentou Francesca, evitando encará-lo.

— Antes. Minha mãe ficou muito doente. Por causa disso, tornei-me mestre em cozinhar e passar aspirador de pó enquanto estudava. Um olho no livro e outro no fogão.

— Deve ter sido muito difícil…

— Aprendi muito cedo a caminhar com meus próprios pés. — Deu de ombros. — Não foi uma lição ruim.

Imaginando que Oliver não perderia a oportunidade para fazer mais críticas, Francesca inclinou-se para pegar as xícaras de café vazias. Ele a segurou pela mão.

— Você devia repousar.

Ela percebeu o coração pulsar com mais força ao sentir a excitação que a proximidade do chefe provocava. Procurou fitá-lo com tranquilidade, mas não teve muito sucesso.

— Meu tornozelo… já está bem melhor — gaguejou. Suavemente, Oliver fez com que se sentasse a seu lado, no sofá.

— Deixe-me dar uma olhadela.

Francesca o fitou, em pânico.

— Não há nada para olhar — protestou. — Está apenas um pouco machucado.

— Como aconteceu? Não tive oportunidade de perguntar. — Com toda a delicadeza, ergueu a perna de Francesca e depositou-a no colo, afastando a saia comprida para melhor examinar o tornozelo. Aturdida, ela se lembrou da última vez que Oliver a visitara e tentou libertar-se. Foi segura com firmeza.

— Oh, eu… tropecei num guarda-chuva.

— Sei…

Ele inclinou a cabeça e, cuidadosamente, tocou o local ferido.

— O que está fazendo? — Francesca perguntou, a voz alterada.

— O que disse o médico?

— Que estarei melhor amanhã e que, provavelmente, não sentirei mais nada depois de amanhã.

— É uma boa notícia.

Fitou-a lenta e languidamente. Francesca, por fim, entendeu que Oliver Kemp estava flertando com ela. Foi uma descoberta ao mesmo tempo surpreendente e aterrorizante. Por um lado, sentia-se nas nuvens com a repentina atenção do chefe. No entanto, aquele sofisticado jogo de sedução não lhe provocava desejo ou excitação. Ao contrário, deixava-a vulnerável.

Tentou se desvencilhar e Oliver perguntou, envolvente:

— Quer que eu vá embora?

O silêncio que se seguiu foi tão profundo que todos os pequenos sons da sala pareceram amplificados.

— Que horas são? — ela se ouviu perguntar, na falta de saída melhor.

— Hora de partir ou hora de ficar. Você é que vai dizer.

— Na última vez em que esteve aqui…

— Você tinha bebido muito — ele completou, e Francesca teve a desconcertante sensação de que não dissera toda a verdade.

— É verdade.

Tirou a perna do colo de Oliver e baixou-a suavemente até o chão. Estava tão consciente da presença daquele homem que mal conseguia respirar.

— Por que não olha para mim? — ele quis saber, acariciando-lhe o cabelo.

Então segurou-a pela nuca e fez, gentilmente, com que ela o fitasse. Francesca sentiu-se magnetizada pelos olhos claros e profundos.

— Devo estar sonhando — ela sussurrou. — Nada disso está fazendo sentido.

— Muitas coisas não fazem sentido. Está com medo? — Como Francesca não respondesse, ele prosseguiu: — Quer fazer amor comigo?

 

— Como? — ela balbuciou. Oliver não repetiu. Apenas continuou a fitá-la intensamente, aguçando-lhe todos os sentidos. — Mas… e Yvonne?

Ele respirou fundo.

— Yvonne e eu decidimos que nosso relacionamento não estava no rumo certo.

— Quer dizer que romperam? Por quê?

— Por que as pessoas rompem? — ele perguntou, com uma ponta de impaciência.

— Mas vocês pareciam feitos um para o outro!

— Desde quando me conhece tão bem? — Ele tinha um brilho divertido nos olhos.

Francesca retribuiu o olhar, surpresa. O que sabia a respeito de Oliver Kemp?

— Tem razão.

— Você ainda não respondeu à minha pergunta — ele insistiu. Mas, antes de ouvir a resposta, ergueu a mão. — Não, não fale nada. Ainda não.

Aproximou o rosto e Francesca fechou os olhos. Seus lábios se tocaram num beijo quente, lento, persuasivo. Ela gemeu e tentou se afastar.

— Você… não sente atração por mim.

— O problema é que a considero atraente demais — ele murmurou, os olhos toldados pelo desejo. Percorreu com os dedos a coluna de Francesca, fazendo-a estremecer, e voltou a beijá-la. — Preciso ouvi-la dizer que me deseja — sussurrou roucamente.

— Eu te desejo.

Oliver a ergueu no colo e a levou até o quarto. Dessa vez, ao depositá-la sobre a cama, havia paixão em seus olhos.

— Você é tão jovem…

— Não sou jovem e sei o que estou fazendo.

— Oh, não estou falando de sua idade — ele respondeu, aprisionando-a com os braços.

— De que está falando, então?

— Você é muito ingênua. — Ele suspirou e balançou a cabeça. — Não corresponde à imagem que seu pai pintou a seu respeito. Pode ter experiência social, mas, no fundo, é uma criança.

— E você é tão experiente! — ela ironizou. — Um velho com uma fachada jovem.

— Às vezes me sinto mesmo um velho.

— Velho e com uma fileira de amantes no currículo — ela completou, com uma risada. Por dentro, no entanto, torcia-se de ciúme. Sequer podia pensar nas amantes que Oliver tivera.

— Não foram muitas — ele murmurou, afagando-lhe o rosto. O toque era como o de uma pena, mas intenso o suficiente para fazê-la ofegar. — Jamais tive o hábito de saltar de uma cama para outra.

— Não? — ela perguntou, baixando os olhos.

— Não — ele assegurou, sorrindo.

— Mas com certeza já teve inúmeras propostas.

— Oh, inúmeras. Mais alguma pergunta? — Voltou a sorrir e então a beijou no pescoço.

Se havia mais alguma pergunta, Francesca não foi capaz de fazê-la. Na verdade, já nem conseguia raciocinar.

Depois de um beijo tórrido, Oliver tirou-lhe a camiseta. Em seguida, levantou-se e despiu-se lentamente, os olhos cravados nos dela, adorando a forma como a via contemplar seu corpo másculo.

A nudez de Oliver deixou Francesca ardendo de desejo. Fisicamente, era perfeito, longilíneo e musculoso como um atleta, embora mal tivesse tempo para se exercitar. Viu-o deitar-se a seu lado.

— Você está protegida?

— Protegida? Contra o quê? — Atordoada pela paixão, Francesca custou a entender o significado da pergunta.

— O que acha? Contra a gravidez, claro.

— Claro. Sim, estou.

— Perfeito. — Oliver fez com que ela tirasse a saia lentamente. E, ao perceber que ela ia se livrar da calcinha de renda, impediu o movimento. — Ainda não.

Ainda não? Ela o queria tanto!

Inclinando a cabeça, ele sugou-lhe os seios. Brincou com eles, acariciou os mamilos e então deslizou a mão para baixo, para o ventre. Extasiada, Francesca abriu as pernas com um pequeno gemido de prazer.

Quando Oliver a tocou, por cima da calcinha, ela sentiu o corpo todo estremecer. Moveu-se espontaneamente contra a mão forte e gemeu quando os dedos experientes alcançaram sua feminilidade.

Mas ele não a permitiu alcançar o auge da satisfação. Diminuiu o ritmo das carícias e ajudou-a a despir a calcinha. Então, guiou a mão trêmula de Francesca até o próprio corpo.

Ela o fitou, os olhos enevoados pelo desejo. Oliver inclinou-se, para que sua boca explorasse os caminhos traçados por seus dedos. Francesca fechou os olhos, sentindo o corpo alçar voo para lugares inimagináveis.

Ele finalmente a penetrou, fazendo-a experimentar sensações incomparáveis com o ritmo alucinante de seus movimentos. Francesca somente conseguiu voltar a pensar com clareza quando se viu deitada lado a lado com Oliver, ambos satisfeitos e ofegantes. Ainda estava extasiada com a intensidade de seu prazer, do prazer daquele homem.

— A que horas você parte, amanhã? — ela perguntou, já temendo a separação.

— Cedo — ele respondeu, afagando-lhe o cabelo. — Por quê?

— Por nada. — Ela acariciou o tórax de Oliver, imaginando se ele sentiria saudade. Certamente não. Afinal, não dissera em momento algum que a amava. Sentindo-se repentinamente chocada, trêmula, Francesca perguntou-se o que tinha o amor a ver com aquilo. Nada? Tudo? — O que acontecerá quando você voltar?

Ele franziu a testa, intrigado.

— De que está falando, exatamente?

— De nós.

Ele estreitou os olhos, mas continuou a acariciá-la.

— Dirijo meus negócios… você trabalha para mim… nós fazemos amor.

— Você faz o caso parecer tão simples…

— E não é?

— Nada na vida é simples — ela disse, fazendo-o sorrir levemente.

— Agora você parece uma adulta falando.

— Eu sou adulta.

— Então deve saber como ficará nossa situação. Não quero compromissos.

— Apenas diversão?

— É uma filosofia com a qual você já deveria estar acostumada.

Francesca ponderou que passara meses divertindo-se, evitando responsabilidades, mas nada disso envolvera sexo.

— Creio que sim — respondeu, sentindo-o relaxar. — E com Yvonne? Foi apenas uma brincadeira?

— Yvonne foi… é uma pessoa especial. Aparentemente formávamos um par ideal, o que só faz provar que nada na vida é certo. Somos feitos da mesma matéria, mas isso não foi suficiente.

— Está triste por isso?

— Por que deveria estar triste? Aconteceu e, como em todas as experiências, aprendi uma lição.

— Qual?

— Que casamento é para os outros. — Riu, mas sem o menor humor. — Bem, há coisas melhores a fazer do que conversar.

— O quê, por exemplo?

Oliver acariciou um dos seios de Francesca, que suspirou. Dessa vez, ele riu com vontade.

— Você é uma criaturinha passional, sabia?

Fizeram amor lenta, intensamente. Excitaram-se com carícias que pareciam não ter começo nem fim. De onde vinha tanto desejo?

Para Francesca, não se tratava apenas de atração física. Sentia algo forte, poderoso, incontrolável. Um amor ardente, um fogo que jamais voltaria a se apagar.

Deitou-se sobre Oliver, oferecendo-lhe os seios tentadores. Ele abocanhou um dos mamilos e o sugou avidamente, enquanto as mãos a seguravam pela cintura fina. Francesca o recebeu, arqueando o corpo e entregando-se a um ritmo que a levou incontáveis vezes às nuvens.

Mais tarde, quando Oliver disse que era hora de partir, ela olhou para o relógio de cabeceira. Meia-noite.

— Tenho que fazer a mala — ele disse, levantando-se. — Gostaria de convidá-la para tomar um banho, mas receio que terminaria me atrasando.

Ela sorriu languidamente e deitou-se, ouvindo o som distante do chuveiro.

Oliver não queria nenhum tipo de compromisso. Isso deveria desesperá-la, mas Francesca se conteve. Não queria quebrar o encanto do momento com pensamentos negativos. Por enquanto, aceitaria o que ele lhe oferecia. Do contrário, teria que sair da vida daquele homem.

Talvez, se não tivessem feito amor, pudesse ter forças para se afastar. Mas agora era tarde. Entregara-se àquele sentimento de corpo e alma.

Oliver saiu do banho, enxugando vigorosamente o cabelo, e Francesca desejou que ele ficasse menos no exterior. Três semanas era muito tempo! Viu-o aproximar-se da cama, inclinar-se e beijá-la na testa, um suave beijo de boa-noite que a fez sorrir.

— Manterei contato todos os dias — prometeu ele.

—E se aparecer algum problema que eu não puder resolver?

— Mande-me um fax. Se for preciso, eu volto, mas prefiro que você procure solucioná-lo.

Ela desejou desesperadamente perguntar se Oliver sentiria saudade, mas sabia que tais perguntas não deveriam ser feitas. Observou-o partir silenciosamente. Permaneceu deitada, olhando para o teto, recordando os acontecimentos daquela noite e torcendo para que as três semanas passassem depressa.

Ao voltar para o trabalho, na semana seguinte, Francesca estranhou muito a sensação de estar sozinha no escritório.

Depois de três dias, percebeu que a única coisa que a deixava animada era os telefonemas diários de Oliver.

— Sentindo minha falta? — ele perguntara languidamente no dia anterior.

Ela rira levemente e respondera:

— Claro! Os clientes têm feito uma série de consultas, e eu preferiria que você as respondesse.

Não queria mostrar seus verdadeiros sentimentos, embora torcesse para que aquele relacionamento, com o passar do tempo, se transformasse em algo mais profundo. No entanto, não precisava ser nenhum gênio para deduzir que um romance baseado somente em sexo teria vida curta.

Evitou dar muita atenção a essa consideração. Disse a si mesma que tudo na vida era possível com esforço e empenho.

 

Duas semanas depois, estava se preparando para sair quando Helen apareceu. Nas últimas semanas, vira-a apenas no toalete, e só haviam trocado cumprimentos breves. Por isso, fitou-a com cautela, mantendo as mãos ocupadas e deixando claro que estava de saída.

Não deu certo. Helen a contemplou com seus grandes olhos maquiados e perguntou:

— Como está se dando com o grande chefe?

— Muito bem.

— Estão correndo rumores sobre ele… — Helen pegou uma caneta e pôs-se a examiná-la.

— Verdade? — respondeu Francesca, já em estado de alerta.

— Verdade. — Helen colocou a caneta sobre a mesa.

— Que espécie de rumores?

O rosto da garota, como sempre, apresentava uma maquiagem pesada, o que deixava seus olhos ainda mais perigosos. Ela vestia uma saia curta, preta, e uma blusa colante de manga comprida que marcava as formas de seu corpo. Sem dúvida, os homens deviam apreciar aquilo.

— Dizem que ele rompeu com a noiva.

— Isso é um fato?

— Fato comprovado. Também corre o boato de que eles teriam rompido por causa de outro homem.

— Não acredite em tudo o que ouve, Helen.

— Ela foi vista numa discoteca com um cara loiro.

— Loiro? — Francesca retesou-se. — Quem lhe disse isso?

— Um amigo de um amigo. Bem que eu gostaria de estar lá para ver. Não consigo imaginar a poderosa Yvonne Sattler caindo na gandaia.

— Claro. — "Eu posso", pensou Francesca.

— Esse amigo de um amigo conhece alguém que conhece o cara com quem ela estava. Vagamente. Parece que se chama Rupert. Um antigo namorado seu, creio. — Os olhos maquiados brilhavam. — Como Oliver terá enfrentado tudo isso?

Sem raciocinar, Francesca respondeu:

— Ele não me pareceu muito abalado. — No momento em que disse isso, arrependeu-se e sentiu o sangue subir ao rosto.

— O chefe tem feito confidências?

— Claro que não. Bem, agora preciso ir. Está precisando de alguma coisa?

— Como sabe sobre a vida pessoal de Oliver? — Helen a seguiu até o cabide e perguntou, à queima-roupa: — Está dormindo com ele? — Em vez de protestar, Francesca hesitou, e aquela breve hesitação a denunciou. — Decidiu remendar um coração partido?

— Não seja tola! — retrucou ela, mesmo sabendo que já era tarde.

— Está se aproveitando porque Oliver está sozinho? Ou foi ele que resolveu que você serviria para ajudá-lo a esquecer da dor?

— Estou indo embora. — Francesca começou a caminhar para a porta, esperando que a outra não a seguisse pelo corredor.

— Vou cuidar para que todos saibam o que está acontecendo — a garota ameaçou, com um sorriso frio.

— Se abrir sua boca, pode ter certeza de que Oliver saberá de quem partiu o boato. Isso significa que, se alguma fofoca se espalhar, você terá que procurar um novo emprego.

Ela, que nunca ameaçara ninguém, tremia muito. Encarou Helen por alguns segundos, até perceber que vencera aquela parada.

— Você ainda vai pagar por isso — a garota prometeu. — De alguma forma, vai pagar!

Quando Francesca chegou ao apartamento, ouviu o telefone tocando. Atendeu enquanto tirava o casaco. Era Oliver.

— Vou permanecer aqui por mais uma semana além do previsto — anunciou, sem preâmbulos. — Tudo está lento demais para meu gosto.

— Não se preocupe — ela o animou, apesar de decepcionada com a notícia. — Estou me saindo bem. Entrei em contato com Ben Johnson a respeito da concorrência e amanhã cedo mandarei um fax com as informações que ele está pedindo.

— Muito bem. E você, como está?

— Gentileza sua perguntar — ela respondeu, surpresa com a observação. — Estou ótima.

— Bom. — Havia uma certa rispidez na voz de Oliver.

— Devo adiar as reuniões que já estavam marcadas?

— Certamente. Não posso estar em dois lugares ao mesmo tempo, posso?

Francesca ainda conversou mais alguns minutos sobre o trabalho e, ao desligar, já estava se sentindo muito melhor. Assim, decidiu ligar para Rupert e convidou-o para jantar.

— Quer comer alguns hambúrgueres comigo?

— É um convite irresistível. — Ele riu. — Já estou indo.

 

Mais tarde, entre um copo de vinho e outro, Rupert abriu o coração:

— Há tempos quero lhe contar que estou saindo com alguém que você conhece: Yvonne Sattler.

— Verdade? — Ela ergueu as sobrancelhas, como se não soubesse de nada.

— Queria ter lhe contado há mais tempo, mas sabe como é… — Ele hesitou e Francesca sorriu.

— Seu malandro! Yvonne Sattler é comprometida.

— O noivado terminou. Nenhum de nós quis que isso acontecesse, Fran. Quando eu a conheci, não senti nenhuma atração especial. Sim, achei-a muito bonita, mas…

— Mas não era como Linda Baker — observou Francesca, referindo-se a uma antiga namorada do amigo. Bonita, mas não tinha nada na cabeça.

— Acertou. Até pensei que ela estivesse brincando comigo ao dizer que gostara da discoteca.

Francesca sorriu, compreensiva.

— E tudo começou ali?

— Ela me telefonou. Nós conversamos. Eu telefonei para ela. Certa vez nos encontramos casualmente na rua e saímos para tomar um drinque. Não foi nada planejado, acredite.

— Você não precisa me convencer de nada — ela disse amigavelmente. — Não estou aqui para julgá-lo.

— No entanto, não me sinto bem em relação a Oliver Kemp. Simplesmente descobri que tinha muito em comum com Yvonne. Mas ainda não consigo entender o que ela viu em mim.

Havia uma perplexidade tão genuína na voz de Rupert que Francesca não pôde deixar de sorrir. Ele jamais se dera conta da pessoa preciosa que era: amigo, disposto e atencioso, apesar de desocupado e cabeça-fresca.

— Você é ótimo, acredite.

Ele sorriu.

— Comecei a pensar em Yvonne o tempo todo. Parei de sair. Senti que precisava ficar ao lado do telefone, caso ela ligasse. Mas ainda não estávamos dormindo juntos.

— E como o namoro aconteceu?

— Yvonne me contou que ela e Oliver eram amigos há muitos anos, e que o noivado fora um erro. A amizade jamais se transformara em amor, pelo menos da parte dela. — Deu um sorriso de satisfação. — No final, foi Oliver quem rompeu, dizendo que ela merecia ir atrás da felicidade.

Francesca passou as duas horas seguintes ouvindo Rupert falar sobre Yvonne. Quando o amigo partiu, começou a arrumar a sala devagar, a cabeça trabalhando rapidamente.

Oliver rompera o noivado. Yvonne decidira ser livre e ganhara a liberdade antes mesmo de pedi-la. Quem podia adivinhar o que se passava pela mente de um homem decepcionado? Talvez, deduziu Francesca, sem saber o que fazer com sua dor, ele a tivesse procurado em busca de alívio momentâneo. Oliver Kemp decerto ainda amava Yvonne.

— Ele jamais poderá me amar. Fui criada em berço de ouro e jamais tive que lutar por nada. Não tenho a força de Yvonne.

Mesmo em meio ao desespero, ela conseguiu percebeu que finalmente recuperara o juízo. Ainda tinha tempo para tomar a única decisão possível: afastar-se de Oliver Kemp.

 

— Você não parece nada bem — comentou Helen, sem disfarçar a satisfação. Estavam no toalete, e Francesca olhava para seu reflexo no espelho.

— Estou ótima — mentiu.

Na verdade, sentia-se péssima. Nos últimos quinze dias, vinha passando muito mal, pensando em Oliver e na carta de demissão que ele encontraria sobre a mesa ao retornar na manhã seguinte.

— A mim, você não engana. — Helen parou atrás de Francesca, de forma que seus olhos se encontraram no espelho. — Deveria estar radiante, uma vez que seu amante volta amanhã.

— Pare com isso — pediu ela, olhando para os lados de modo a assegurar-se de que o toalete estava vazio. Ao perceber o gesto furtivo, Helen riu cinicamente.

— O caminho está livre — escarneceu. — Somos apenas nós duas e nosso segredinho.

Francesca sentiu-se mal novamente e teve tempo apenas para correr até um dos banheiros. Ao sair, lavou o rosto e lentamente retornou a sua sala, pensando na carta de demissão. Guardada na primeira gaveta de sua mesa, parecia uma bomba prestes a explodir.

Dos males, o menor: não deixara que Oliver descobrisse quanto estava apaixonada. Desde que tomara a decisão de afastar-se, tratara de manter um tom neutro ao falar com ele ao telefone. Era uma forma de preparar-se para o inevitável.

Francesca chegou tensa ao escritório. Deixara a carta sobre a mesa de Oliver na noite anterior para que ele pudesse lê-la logo de manhãzinha.

"Sei que posso esquecê-lo", garantiu a si mesma enquanto se aproximava da sala. Mal guardara seu casaco quando a porta se abriu. Ela se voltou, experimentando uma sensação angustiante ao vê-lo parado à sua frente, os olhos gélidos.

Foi um impacto enorme reencontrá-lo após um mês de ausência. Estava um pouco mais magro, porém ainda mais atraente. Ela o fitou e voltou a perceber que aquele homem despertava todos os seus sentidos.

Com isso, veio a perturbadora lembrança do último encontro: ambos nus sobre a cama, após a noite mais maravilhosa que Francesca passara em toda a vida.

— Venha até meu escritório — disse Oliver, impassível. Ela respirou fundo para se controlar e o seguiu. Fechou a porta e sentou-se na poltrona, cruzando as mãos sobre o colo.

— Deu tudo certo na viagem? — perguntou para disfarçar o nervosismo.

Oliver encarava-a fixamente, os cotovelos apoiados na mesa.

— O que significa isto? — Pegou a carta de demissão e mostrou-a.

— Então você já leu…

Oliver se levantou e caminhou até a janela. Apoiou-se no parapeito e a fitou, os braços cruzados. Francesca ensaiara essa cena mil vezes, mas sentia agora que nada a preparara para o que teria que enfrentar.

— Posso perguntar por que está pedindo demissão?

— Bem… — Ela umedeceu os lábios e tentou lembrar-se da fala que ensaiara. — Porque este não é o tipo de trabalho que estou procurando.

— Muito desinteressante?

— Não. É muito estimulante.

— O salário é muito baixo?

— Claro que não! Não imagino onde encontrar um emprego com uma remuneração maior.

— Então quer explicar por que está abandonando um trabalho estimulante, com um contracheque tão atraente?

"Boa pergunta", ela pensou desalentada.

— Apenas não é o que estou procurando.

— Vamos parar de brincadeiras, está bem? Por que não admite que está se demitindo porque dormimos juntos?

Em meio ao silêncio, Francesca sentiu o sangue subir para o rosto.

— Uma coisa não tem nada a ver com outra.

Oliver reagiu inesperadamente, batendo o punho fechado sobre a mesa.

— Chega!

— Está bem! — ela vociferou, erguendo a cabeça. — Eu admito. Estou me demitindo porque dormimos juntos.

— Bem, ao menos estamos chegando a algum lugar. — Afundou-se na poltrona. — Que diferença faz, ao seu trabalho, o fato de fazer amor comigo?

— Não consigo trabalhar com você e…

— Ora, cresça! Acha que vou agarrá-la sempre que colocar os pés em minha sala?

— Não! — ela protestou, sabendo que estava prestes a cair numa armadilha verbal.

— E então? — ele instigou, fitando-a com frieza.

— Apenas descobri que não me sinto atraída. Quando nos conhecemos, você deixou claro que não sou seu tipo, e creio que o sentimento é recíproco.

— Estou entendendo — ele observou com uma formalidade glacial. — Mas ainda não percebi o que isso tem a ver com sua demissão. Decidiu que sou tão repulsivo que não suporta ficar perto de mim? — Francesca não conseguiu encontrar uma resposta convincente. Simplesmente baixou os olhos e deu de ombros. — Ouça, você é uma boa secretária e levei muito tempo até encontrar alguém que me satisfizesse. Acredite ou não, não pretendo me aproveitar de você. Dormimos juntos uma vez, mas isso não me dá o direito de fazê-lo sempre que desejar. — Inclinou-se na direção dela. — Abra os olhos e desperte para a realidade. Homens e mulheres dormem juntos por muitas razões. E cometem erros. Mas a vida segue.

Então era isso: ela era um erro. Oliver não a teria ferido mais se usasse uma faca e lhe atravessasse o coração.

— Eu…

— Terá que encontrar uma substituta — ele continuou, sem dar-lhe chance de se expressar.

Francesca pensou que devia estar satisfeita, uma vez que a situação estava sendo resolvida. No entanto, mordia o lábio para não chorar.

— Certamente. — Ela meneou a cabeça, enfatizando a resposta, e procurou dizer algo que a ajudasse a recuperar o autocontrole. — Alguma exigência em especial?

— Quero apenas alguém que esteja preparada para considerar o trabalho como um compromisso a longo prazo.

— Sinto muito.

— Esqueça. Se soubesse que você reagiria de forma tão negativa ao que aconteceu entre nós, nem teria me aproximado.

— Mas você nem procurou resistir!

Ele estreitou os olhos.

— De que está falando?

— Yvonne rompeu o relacionamento e você não resistiu à tentação de dormir comigo para se consolar!

— Ah, então é sobre isso que estamos falando… — Ele se recostou na poltrona, mostrando-se tão gentil quanto uma cobra preparando-se para o bote.

Francesca corou e desviou o olhar.

— Ninguém gosta de ser usado.

— Mas parece que você adorou cada minuto que passamos juntos. Ou será que interpretei mal a situação?

— Fui uma tola!

— O que estava esperando? Achou que depois daquela noite eu declararia meu amor e a pediria em casamento?

— Não. Mas naquela noite eu não sabia que estava substituindo alguém.

— Eu a desejava e o sentimento era mútuo. Dormimos juntos. Ponto final.

— E agora acredita que podemos continuar a trabalhar como se nada tivesse acontecido?

— Nada aconteceu. Mas de que adianta falar nisso? Não conseguirei convencê-la a ficar. Preciso que termine algumas cartas. Assim que terminar, e depois de ter encontrado uma substituta, pode partir.

— Obrigada — respondeu ela, sem saber por que agradecia. Por Oliver ter-lhe arruinado a vida? Por tê-la tratado como um objeto descartável?

Levantou-se, saiu da sala e dirigiu-se ao toalete, onde permaneceu alguns minutos lutando contra a náusea. Novamente.

Ao retornar a sua sala, percebeu que Oliver havia saído e que lhe deixara um bilhete, com algumas instruções e três cartas.

Francesca nem os pegou. Telefonou para a agência de empregos e marcou quatro entrevistas para a tarde. "Mantenha-se ocupada", ordenou a si mesma.

Com algum alívio, constatou que duas das candidatas eram promissoras. Uma delas, de trinta e poucos anos, voltava a trabalhar depois de ter criado os filhos. A outra, uma mulher de meia-idade, mudara recentemente para Londres com o marido.

Assim que Oliver retornou, às cinco e meia, Francesca contou sobre as candidatas.

— Contrate a que considerar melhor — ele disse, deixando-a boquiaberta.

— Não quer entrevistá-las pessoalmente?

Ele parou à porta e voltou-se na direção de Francesca.

— Confio em seus instintos — respondeu, com um sorriso frio, antes de entrar e fechar a porta.

Ela ligou para a agência e pediu que chamassem uma das mulheres. Depois, entrou em contato com o departamento pessoal e trabalhou por mais uma hora, deixando o máximo de tarefas prontas.

Saiu às seis e meia, tonta e morta de fome. Antes de chegar ao apartamento, parou numa pequena mercearia e comprou mantimentos para o jantar.

Mais tarde, na cama, deu um novo rumo a seus pensamentos. No momento em que adormeceu, já havia decidido que precisaria sair da empresa no dia seguinte, se fosse possível.

Pela primeira vez chegou atrasada ao trabalho. Dirigiu-se de imediato à sala de Oliver. Bateu à porta e entrou. Ao telefone, ele apontou a poltrona à sua frente. Ela se sentou e observou-o com o canto dos olhos.

— Pois não? — ele falou, ao desligar.

— Já encontrei uma substituta. É uma jovem senhora com dois filhos. Está sem trabalhar a algum tempo, mas saiu-se muito bem no teste. É inteligente, interessada e creio que irá se adaptar sem maiores dificuldades.

— Qual é o nome dela?

— Jéssica Hines. E começa amanhã. — Francesca fez uma pausa e o fitou diretamente. — Como já terminei todas as minhas tarefas, creio que sexta-feira será meu último dia.

— Claro.

Ela se levantou, pronta para sair. Porém, antes que alcançasse a porta, Oliver se postou a seu lado. Apoiou-se na soleira e a fitou, fazendo-a estremecer.

— Como vou estar fora a maior parte da semana, quero lhe falar agora, caso não tenha a oportunidade de fazer isso depois.

— Sim?

— Não quero que parta pensando que só fiz amor com você porque estava com dor-de-cotovelo.

— Não é preciso explicar nada.

— Sim, é preciso. Você ainda não amadureceu o suficiente e o que aconteceu entre nós pode assumir proporções incontroláveis em sua cabeça.

— Obrigada pela compreensão — ela redarguiu sarcasticamente.

— O que fizemos naquela noite foi espontâneo. Enquanto a tive nos braços, não pensei em Yvonne.

— Mas você a amava.

— É uma pergunta ou um fato?

— Uma observação.

Ele não respondeu. Ao contrário, desviou o olhar.

— Por mim, você não partiria — comentou, embaraçado. Ela sentiu o poderoso impulso de permanecer no emprego que tanto adorava, de deliciar-se com a presença de Oliver. Mas isso já não era possível.

— Não posso ficar — respondeu simplesmente, vendo-o dar um passo para trás e colocar as mãos nos bolsos.

— Muito bem. Nesse caso, não quero prendê-la mais do que o necessário. — Voltou para a mesa e se sentou. — Você tem a lista dos meus compromissos para a semana — disse, sem encará-la. — Ficarei fora o resto do dia, mas, se precisar falar comigo, estarei com o celular. Quero almoçar com a Sra. Hines amanhã.

— Claro.

— É só — ele disse, erguendo o olhar.

Francesca saiu da sala e, enquanto se sentava diante do computador, procurava se convencer de que a vida era assim mesmo e que o tempo curava todas as feridas. Mas o que via pela frente não era a vida seguindo adiante, tampouco o tempo curando feridas. Via apenas um túnel escuro. O que aconteceria agora?

Não queria pensar nisso, não naquele momento. Teria muitos meses, talvez anos, para refletir.

Mais uma vez desejou que a mãe estivesse viva. Compartilhava muitas coisas com o pai, mas o que estava por vir necessitava da compreensão de uma mulher. De um apoio de mãe.

 

No dia seguinte, Jéssica chegou determinada e disposta como uma lufada de ar fresco. Oliver a recebeu rapidamente, pois estava de saída. Depois de deixá-lo, a moça sentou-se ao lado de Francesca e comentou, num tom levemente chocado:

— Ele é terrivelmente dominador, não é?

— Você vai se acostumar — respondeu Francesca, pegando uma das pastas e abrindo-a.

— Você conseguiu?

— Sim — ela disse sem emoção, imaginando se teria se acostumado efetivamente se precisasse do dinheiro tanto quanto Jéssica. — Ele exigirá muito de você. Mas é um homem justo.

As duas trabalharam juntas até o final do dia, parando apenas na hora do almoço. Na sexta-feira, tudo estava preparado para a partida de Francesca.

Às cinco e meia, relutante, ela deu uma última olhadela no escritório, esperando que Oliver aparecesse para despedir-se. Em vão.

Mal o vira a semana toda. Reuniões o haviam mantido fora do escritório a maior parte do tempo e, quando permanecera em sua sala, despachara apenas com Jéssica. Desanimada, ela já estava saindo do edifício, apressando-se na direção do metrô, quando Helen apareceu.

— Como está? — quis saber a moça.

— Muito bem — respondeu secamente. Isso nem chegava perto da verdade, pois jamais se sentira pior.

— Sério? Não acredito!

— O que posso fazer?

Ao chegarem à estação, as duas entraram na fila para comprar tíquetes. Naquela noite, com o lugar repleto de gente, a presença de Helen só piorava as coisas.

— Soube que está saindo da empresa. Por que a decisão tão repentina?

Francesca desejou que a fila andasse mais rápido.

— Porque decidi que era hora de sair.

— Uma decisão sábia. Eu teria feito o mesmo. Vocês só transaram porque você estava no lugar certo, na hora certa. — A garota não disfarçava o tom de inveja. Sabia que Oliver jamais se interessaria por ela, mas isso não a impedia de menosprezar um relacionamento que gostaria de ter tido. — Uma mulher deve ter amor-próprio. O que fará agora?

— Procurarei outro emprego.

— Mas conseguirá? — indagou Helen, arqueando uma sobrancelha.

— Há muitas vagas para secretárias — respondeu Francesca, sentindo-se alarmada com a pergunta. Pagou o tíquete, voltou-se e, levada por um impulso, disse rispidamente: — Oliver Kemp não está interessado em você. Jamais estará. Não perca seu tempo. Esqueça-o.

— Então somos mais parecidas do que você imagina — retrucou Helen, os olhos duros como pedras. — Gostará de saber que sua saída abriu uma porta para mim.

— De que está falando?

— Ora, nada importante. Ou melhor, nada que a afete. Ocorre que hoje encontrei Oliver e consegui persuadi-lo a me aceitar como sua nova secretária. Jéssica será transferida para meu velho departamento. Ele irá avisá-la na segunda-feira. — Fitou Francesca por detrás dos cílios carregados de rímel. — O homem não foi um doce ao me oferecer essa chance?

Francesca não conseguiu falar. Apenas deu as costas e quase saiu correndo pela plataforma. Sentia um calor insuportável, estava com náuseas e desejava ardentemente voltar a seu apartamento.

Saber que Oliver empregara Helen Scott sem lhe dizer nada fora a estocada final. Aquela garota também terminaria na cama dele?

Francesca passou a semana seguinte descansando, abatida demais para fazer o que quer que fosse. Não queria pensar em Oliver, mas era impossível. Não queria pensar em Helen Scott, mas isso era igualmente impossível. Como se não bastasse, tinha outras preocupações desgastantes: como viveria dali para diante? Como daria a notícia ao pai?

Estava com a televisão ligada, tentando acompanhar a trama de um filme de suspense, quando bateram fortemente à porta.

Ela franziu a testa, irritada com a intrusão. Mas, ao abrir, sua irritação transformou-se em choque.

— O que está fazendo aqui?

Os olhos claros de Oliver mostravam-se frios, mas seus lábios sorriam.

— É assim que recebe seu ex-chefe?

Francesca não fez menção de deixá-lo entrar.

— O que está fazendo aqui? — repetiu.

— Quero saber como você anda — ele respondeu num tom descontraído, embora os olhos permanecessem frios e incisivos.

Depois empurrou a porta e entrou na sala. Caminhou até a janela, para contemplar uma paisagem cinzenta e desinteressante.

— Aceita uma xícara de café? — ela perguntou, desconcertada, e Oliver acenou afirmativamente.

— Se não for incômodo.

— Incômodo algum.

Pareciam dois estranhos tentando manter uma conversa cortês.

Ela preparou o café, entregou uma xícara a Oliver e depois se sentou numa das poltronas, com os pés sobre a mesa. Contemplou-o detidamente, a cabeça erguida. Afinal, encarar um problema não era o primeiro passo para resolvê-lo?

— Então, como tem passado? — ele indagou, tomando um gole do café e fitando-a com aquele olhar devastador.

— Estou ótima — ela respondeu, ainda sem entender o que Oliver fazia em sua casa.

— Já contou a seu pai que se demitiu? — Ele tinha uma expressão cínica, como se estivesse se divertindo com a situação.

Francesca balançou a cabeça.

— Não tenho falado com ele desde que saí de casa. Bem, de qualquer forma irei visitá-lo na semana que vem.

— É difícil dar más notícias, não? — Ele sorriu friamente, deixando-a irritada. Não planejava vê-lo. Apenas queria esquecê-lo. — Já começou a procurar outro emprego?

— Começo a procurar na semana que vem.

— É, você terá uma semana cheia pela frente — foi a resposta sarcástica.

— Tem razão.

— Há uma vaga na empresa. Edgard Fox, um dos diretores financeiros, está procurando uma secretária. O emprego é seu, se quiser.

— Não.

— Não? — Oliver balançou a cabeça, mas não se mostrou nem um pouco surpreso.

Francesca desejou que ele fosse embora. Estava tão nervosa que começava a sentir-se zonza.

— Maria decidiu sair? — quis saber, tentando manter um tom natural. — Pensei que gostasse de trabalhar na empresa.

— Oh, gostava, mas precisou ajudar o cunhado. Em troca, não pagará aluguel. Situações desesperadoras exigem soluções desesperadas, não é? — Ele se levantou e colocou a xícara suavemente sobre a mesinha. — Você parece muito cansada — disse, aproximando-se. — Quer que eu vá embora?

— Sim, por favor.

— Não voltarei, se preferir.

— Não volte — ela respondeu, e fez menção de se levantar.

— Não se levante, por favor. — Ele inclinou-se sobre Francesca, apoiando as mãos nos braços da poltrona. — Não queremos deixá-la ainda mais cansada, não é?

— De que está falando?

— Ora, pensou que eu jamais fosse descobrir? Você está grávida, não está?

 

Por alguns segundos, Francesca não soube o que dizer. Oliver tomou-lhe as mãos e fitou-a no fundo dos olhos. Ela empalideceu.

— Como descobriu?

Ele suspirou e deu um arremedo de sorriso.

— Helen Scott, uma das garotas que trabalham na empresa, mencionou que você passou mal nas últimas duas semanas e que isso poderia ser sinal de gravidez.

Céus, não! Francesca fechou os olhos e ficou imaginando onde Helen teria feito a confidência. Na cama?

— Por que não disse isso assim que entrou em minha casa? Por que a charada?

— Pensei em lhe dar um tempo. Queria que você mesma tomasse a decisão de me contar, mas não foi o que aconteceu.

— E por que eu deveria contar? O problema não é seu.

Ao encará-lo, Francesca entendeu que escolhera as palavras erradas.

— É melhor colocar nessa sua cabeça, desde já, que o problema é meu.

— Não quero nada de você. Na verdade, só quero que suma de minha vida.

Com um aperto no peito, Francesca imaginou seu futuro: Oliver aparecendo regularmente para ver o filho, às vezes acompanhado de outra mulher… Como enfrentar tudo aquilo?

Se Helen queria feri-la, não poderia ter encontrado melhor maneira. Usurpara seu emprego e revelara sua gravidez.

— Bem, mocinha, se pensa que vai se livrar de mim, está muito enganada. — Ele soltou-lhe as mãos e aprumou-se, os braços cruzados.

— Mas por quê?

— Por quê? Pensa que sou algum bastardo para engravidar uma mulher e depois lhe dar as costas?

Ele passou os dedos pelo cabelo e deixou-se afundar no sofá. Depois se inclinou para frente e apoiou os cotovelos nos joelhos, com as mãos entrelaçadas.

"A ironia, nos sonhos", Francesca pensou, "é que eles raramente se parecem com a realidade". Sempre sonhara em se apaixonar, casar-se e começar uma família. E, agora, lá estava ela: apaixonada, sem dúvida, mas pelo homem errado. Começando uma família, mas com um relacionamento sem amor. Que piada!

— Você disse que estava usando anticoncepcional — ele comentou, apoiando o rosto nas mãos.

— Eu menti. Pensei que não fosse acontecer nada. — Percebeu o olhar impaciente de Oliver e procurou se defender: — Por que deveria estar usando anticoncepcionais se não tinha uma vida sexual ativa? Quando poderia imaginar que engravidaria na única vez em que fiz amor?

— Bem, aconteceu. E agora precisamos decidir o que fazer.

— O que está tentando dizer? Se pensa que vou me livrar do bebê, está muito enganado!

— Não seja tola! Não é disso que estou falando.

— Então de quê? É cedo demais para discutir direitos de visita.

Ele ignorou o sarcasmo.

— Quer goste ou não, sou o pai da criança. E há apenas uma solução para o caso: teremos que nos casar.

— Não!

— Por que não?

— Não nos amamos.

— Pare de viver na fantasia! Isto é a realidade, e o casamento é a saída mais sensata que temos. Daremos a notícia a seu pai pela manhã.

— Não e não. Casamentos apressados nunca dão certo — ela argumentou, o que o fez rir.

— Onde conseguiu essa informação?

— Todo mundo sabe disso. Posso sobreviver muito bem sozinha. Voltarei para a casa de meu pai e…

— Você não voltará para a casa de seu pai. E não usará o dinheiro de seu pai para criar o meu filho.

— Não me diga o que posso e o que não posso fazer!

Ambos confrontaram-se silenciosamente e, depois de alguns instantes, ele disse, ao levantar-se:

— Vou fazer mais café. Aceita uma xícara?

— Parei de tomar café.

— Um suco, então?

Ela deu de ombros e por fim aceitou. Esperava que ele demorasse um pouco, para colocar os pensamentos em ordem. Depois de alguns minutos, Oliver voltou para a sala e entregou-lhe um copo de suco de laranja.

— Está se sentindo melhor?

— Sim.

Francesca percebeu que já não havia mais raiva no rosto de traços marcantes. Ele voltara a se controlar e a fitava por sobre a xícara.

— Podemos continuar a conversa? — indagou com calma. — Concordo em que você não precisa que eu a ajude financeiramente, mas o que seu pai dirá sobre a situação?

— Ele não vai exultar, tenho certeza — Francesca murmurou, olhando para o copo. — Ficará infeliz e desapontado. Na melhor das hipóteses.

— Pois ficará ainda mais infeliz e desapontado quando souber que você não quer se casar comigo.

— Ele haverá de entender.

— Tem certeza?

— Sim. Prefere que eu me case por amor.

Oliver umedeceu o lábio e disse suavemente:

— Então apenas terei de convencê-lo de que a amo?

— Oh, pare com isso! — Francesca desviou os olhos, embaraçada.

— Há coisas piores do que casar-se por causa de um bebê. Um casamento pode começar nas nuvens e terminar em semanas. Ao menos, já nos conhecemos um pouco.

— De certa forma — observou Francesca num tom sarcástico. — Entretanto, ao olhar em meus olhos, papai logo saberá que não estou apaixonada.

— Eu não teria tanta certeza. As pessoas acreditam naquilo que querem acreditar. E, convenhamos, não sou exatamente um monstro, sou?

— Quanta modéstia! — ela ironizou, fazendo-o rir. Embora Francesca jamais fosse admitir, Oliver estava certo: já se conheciam um pouco. Talvez mais do que ela imaginava. Bem, ao menos acreditava que o conhecia. Não fora por isso que se apaixonara?

Sabia que, no início, Oliver não se sentira atraído. Talvez, fisicamente, tivesse mudado de opinião, mas ainda assim Francesca sentia que não era o tipo dele. Não fosse pelo bebê, aquele homem jamais a teria pedido em casamento.

— Seu pai ficará mais tranquilo ao saber que alguém a está protegendo. Pelo amor de Deus, você ainda é uma criança!

— Lá vem você de novo!

— Pense a respeito. — Ele colocou a xícara sobre a mesa e levantou-se. — Virei vê-la amanhã cedo.

Depois que Oliver saiu, Francesca afundou-se na poltrona, pensando no que ele dissera. Não se considerava uma criança, mas entendia aquele ponto de vista. Agira impulsivamente e, com sua ingenuidade, entrara numa situação que a estava lançando para a maturidade a uma velocidade impressionante.

Quanto ao pai, certamente ficaria muito preocupado ao saber que ela traria uma criança ao mundo sem a segurança de uma família. Além disso, como reagiria com um recém-nascido em casa? Ele ainda não era velho, mas certamente não suportaria passar noites insones por causa do choro de um bebê.

Quando Oliver bateu à porta, às oito horas da manhã, Francesca sentia-se mais cansada do que nunca.

— Conseguiu dormir?

— Não muito — ela admitiu. — Como poderia, depois da conversa que tivemos ontem à noite?

— Já tomou seu café da manhã?

— Não.

— Então está agindo exatamente como os médicos não recomendariam: pouco sono, pouca alimentação… Venha — ele disse, puxando-a pela mão. — Vou preparar algo para você comer.

Fez com que Francesca se sentasse numa das poltronas, onde ela permaneceu inerte, fraca demais para protestar. Depois de alguns minutos, retornou com um prato de omelete e torradas. Em seguida, sentou-se e observou-a comer.

— Obrigada. Estava muito bom. — Ela foi até a cozinha e olhou ao redor, embasbacada. — Quantas panelas usou para preparar isso? — perguntou sem crer no que via.

— Eu disse que sabia cozinhar — ele murmurou, próximo demais para a tranquilidade de Francesca. — Jamais disse que era um cozinheiro organizado. — Tirou o prato da mão dela e o lavou, espirrando água por todos os lados. Ao terminar, anunciou: — Vista-se. Vamos fazer uma visitinha a seu pai.

— Ele vai sair.

— Não, não vai. Já telefonei para avisar que estamos a caminho.

Ela o fitou, exasperada.

— Como pôde fazer isso?

— Terá que contar a ele, mais cedo ou mais tarde, sobre a gravidez.

— Naturalmente! É o que pretendo fazer. Mas não preciso ser pressionada.

— Precisa, sim. Precisou ser pressionada para conseguir um emprego e terá que ser pressionada para falar com seu pai.

Francesca rangeu os dentes. O fato de ele ter razão deixava-a ainda mais zangada.

Por que sua vida tornara-se tão complicada? Talvez a imensa riqueza de seu pai a tivesse protegido demais. Jamais enfrentara situações difíceis e agora não sabia o que fazer. No entanto, isso não dava a Oliver o direito de pressioná-la.

— É bom que saiba que ainda não me decidi sobre… sobre o que conversamos ontem à noite — ela disse, assim que entraram no carro. — Portanto, não vejo nenhum motivo para você me acompanhar até a casa de meu pai.

— Preciso certificar-me de que contará tudo a ele.

— Pare de interferir na minha vida!

— Você abriu a porta, mocinha.

— Está dizendo que a culpa é somente minha? — ela perguntou, com lágrimas nos olhos. — Oh, isso é bem típico de um homem!

— Não seja tola! — ele disse, estendendo-lhe o lenço.

— Prefiro contar tudo sem você por perto. É algo muito pessoal.

— Mas que diz respeito a nós dois.

 

O carro subiu a trilha de cascalho que levava até o jardim da mansão. Oliver ajudou Francesca a descer. O Sr. Wade os aguardava na sala de visitas. Bridie levou-os até lá, lançando olhares furtivos na direção do recém-chegado.

— Olá, querida — disse-lhe o pai, hesitante. — Estou tão feliz por ter vindo! — Aproximou-se e Francesca sorriu de maneira automática, nervosa. — Oliver — disse o Sr. Wade ao lhe apertar a mão —, o que está acontecendo? Sentem-se, por favor.

Indicou o sofá e Oliver se sentou, dando um tapinha na almofada para encorajar Francesca a se acomodar.

— Obrigado.

O Sr. Wade ergueu as sobrancelhas, surpreso.

— Querem chá? Café?

Não aguardou resposta. Foi até a porta, chamou Bridie e pediu que ela providenciasse café com croissants. Depois de alguns minutos de conversa amena, a governanta entrou com uma bandeja.

— Papai… — começou Francesca, a voz insegura. — Sinto muito pelo que aconteceu. Eu o acusei de coisas terríveis e quero pedir desculpas.

— Ora, já esqueci — ele disse, mas havia lágrimas em seus olhos. — Agora — continuou, depois que todos já haviam se servido —, não querem contar o que está acontecendo?

— Creio que a própria Francesca quer lhe dar as notícias — observou Oliver, permanecendo em seu canto no sofá, tomando o café, sem demonstrar o mínimo abalo.

"Ele é feito de aço?", pensou Francesca.

— Notícias? Que notícias?

— Nada muito animador, papai. É que… bem… O que estou tentando dizer é que…

Lançou um olhar desamparado na direção de Oliver, que disse, imperturbável:

— Francesca pediu demissão.

— Como?!

Ela sentiu-se perdida no meio do oceano, sem salva-vidas.

— Sim… pedi demissão.

— Por quê?

— Bem… por quê? — ela repetiu, tentando ganhar tempo. — Não sei como lhe contar, mas sei que ficará triste e desapontado. É que fiz algo muito tolo…

— Não do meu ponto de vista. — Oliver estendeu o braço por detrás de Francesca e o apoiou no encosto do sofá.

O Sr. Wade não pareceu infeliz, nem desapontado, com a cena.

— Papai… estou grávida.

Depois de um silêncio sepulcral, Francesca arriscou um olhar na direção do pai. Ele estava, literalmente, de boca aberta.

— E antes que o senhor tenha um colapso — interveio Oliver prontamente —, comunico que vamos nos casar.

Beijou Francesca no rosto, ruborizando-a.

— Eu não…

Oliver a interrompeu abruptamente.

— Não, ainda não marcamos a data, mas será o mais breve possível. Está bem assim, querida?

Gerald Wade olhou para Francesca, que finalmente parecia ter voltado à Terra, conseguiu dizer:

— A minha Fran grávida? Vai se casar?

— Ainda estamos surpresos com o desenrolar dos acontecimentos, mas também estamos encantados, não é, querida?

Repentinamente, Francesca sentiu que perdera as rédeas da própria vida. Tudo acontecia como num filme em ritmo acelerado, do qual era apenas espectadora.

— Bem — disse o Sr. Wade, soltando um suspiro. — Nem sei o que dizer. Certamente estou perplexo. É tudo tão repentino, não é?

— Certas coisas são imprevisíveis, não, Francesca? — disse Oliver, descontraído.

— Naturalmente — interveio o pai. — A mãe de Francesca e eu soubemos, no minuto em que nos conhecemos, que fôramos feitos um para o outro. Creio que aconteceu o mesmo com vocês.

— Exatamente — disse Oliver, com um sorriso.

— Fran, querida, fico feliz por você.

Ela percebeu que Gerald Wade começava a assimilar a ideia e constatou, horrorizada, que Oliver estava certo. A perspectiva do casamento atenuara sensivelmente o drama em que a problema poderia ter se convertido.

Por outro lado, aquilo também a deixava numa situação complicada. Como dizer ao pai que não desejava casar-se?

Durante a meia hora seguinte, ouviu, estonteada, a conversa entre os homens. Assim que Gerald saiu da sala, voltou-se para Oliver e disse, num tom irônico:

— Muito obrigada! — Levantou-se e caminhou até as portas de vidro que davam para o pátio. Ficou olhando, desolada, para os jardins impecáveis. — Eu jamais disse que pretendia me casar com você! — protestou, com lágrimas nos olhos. — Isto não está certo!

Ele se ergueu e apoiou-se na lareira.

— Por que não está certo?

— Você não me ama — ela respondeu, amargurada. — Nós não nos amamos! E hoje em dia já não se casa mais por causa de uma gravidez.

Ele se aproximou, fitando-a severamente.

— Realmente acredita que uma criança deva pagar por nosso erro?

— Não — ela respondeu, sentindo-se acuada. — Porém, mais cedo ou mais tarde, você sentirá raiva de mim por tê-lo colocado nessa situação.

— Não tente adivinhar o futuro — ele disse rispidamente, e segurou-a pelo ombro.

Desesperada, ela imaginou como seria casar com Oliver, morar com ele, criar seu filho e sufocar diariamente o amor que sentia. Impossível suportar tanto sofrimento.

— Será um erro — ela sussurrou. — Não temos nada em comum.

— Ainda é muito cedo para fazer uma lista do que temos ou não em comum — ele disse, dessa vez com mais calma. — Você e Rupert tinham muito em comum. Preferia ter cometido o erro com ele?

— Rupert? — Aquilo quase a fez rir. — Eu não seria tão tola.

— Agora não adianta mais remoer o assunto. A menos, claro, que tenha decidido dizer a seu pai que vai levar a gravidez adiante… sozinha.

— Você não deveria ter me forçado a isso.

— Foi o que a deixou mais perturbada? O fato de eu tê-la pressionado?

— Ninguém gosta de ser pressionado.

— A vida nem sempre fará o que você quer, lembre-se.

— É verdade. Infelizmente.

Francesca sentiu os olhos molhados. Oliver prontamente segurou-a pela mão e fez com que se sentasse no sofá, ao lado dele.

— Tente me ouvir. — Tirou um lenço do bolso e enxugou os olhos marejados. — Você precisa parar de procurar segundas intenções em tudo o que digo.

— Sei o que sente a meu respeito. Você não gosta de mim nem das coisas que represento. — Francesca tinha o queixo trêmulo, a voz embargada. — Sei que não tenho muita experiência em enfrentar as coisas que outras pessoas são obrigadas a enfrentar, mas não posso encarar a ideia de casar com você.

— Por que fez amor comigo? — ele perguntou gentilmente.

— Porque… — Ela tentou dizer algo que não comprometesse seus sentimentos. — Porque você é um homem atraente.

— Se não consegue encarar a ideia de se casar comigo, então não irei pressioná-la.

— Ora, obrigada!

Contrariamente às expectativas de Francesca, as palavras de Oliver não lhe trouxeram alívio. Só fizeram aumentar o aperto em seu peito.

— Mas tente se acalmar e pensar na alternativa. Criar uma criança sozinha não será nada fácil.

— Estou consciente disso.

— Procure considerar nosso casamento como um acordo entre duas pessoas razoáveis. O que aconteceu, aconteceu. Temos que aceitar o fato e fazer o que for melhor para a criança.

— Como consegue permanecer tão calmo? — ela indagou, a voz angustiada.

— Não acredito em saídas desesperadas. Você está grávida e eu sou o pai. Não vou abandonar minhas responsabilidades.

Francesca o ouviu, com os pensamentos voltados para a responsabilidade enorme de criar um filho sozinha. Precisava pensar unicamente na criança.

— Muito bem — decidiu, cansada, vencida. — Eu me casarei com você.

— Providenciarei tudo.

— Não desejo um casamento luxuoso. Papai haverá de querer uma grande festa, mas não é isso que pretendo. Quero apenas me casar no civil, e não usarei branco.

— Ninguém está lhe pedindo isso — murmurou Oliver, os olhos baixos. — Por mim, pode até usar vermelho.

— Ótimo — ela respondeu, como se tivesse marcado um ponto. Ao levantar-se, ele perguntou:

— Quer que eu a deixe em seu apartamento?

— Ficarei aqui mais um pouco. Voltarei para casa sozinha.

Ele hesitou por alguns instantes mas, finalmente, deu de ombros e informou que entraria em contato na segunda-feira.

— Providenciaremos tudo para o final da semana que vem. Aturdida, Francesca ergueu os olhos.

— Tão cedo?

— Exatamente. E você irá morar comigo. Com quanto tempo de antecedência precisa avisar seu senhorio?

— Duas semanas. Mas não preciso me mudar tão depressa.

— Sim, precisa. Se não o fizer, poderá mudar de ideia no meio do caminho.

— Queria apenas que não me tratasse como uma criança idiota! — ela irrompeu, enraivecida.

Oliver tentou não rir.

— Mas é isso que você é: uma criança que queria crescer nas mãos de um homem por quem se sentiu temporariamente atraída. Uma criança que está tendo dificuldade em entender conceitos como causa e efeito.

Fitou-a de uma forma estranha e então partiu, deixando-a desolada, com vontade de chorar.

Oliver poderia lhe dar tudo: aliança, casa, uma família para seu filho. Mas não poderia lhe dar a única coisa que desejava: amor.

 

Na noite de segunda-feira, Oliver apareceu no apartamento de Francesca e anunciou que iriam sair para jantar.

— Para quê? — foi a primeira coisa que ela perguntou, ao vê-lo trajando um elegante terno cinza-escuro.

— Precisamos discutir algumas coisas e comer. Não é uma solução simples? — Por isso, dirigiram-se a um pequeno restaurante francês, em Hampstead. — Voltou a conversar com seu pai? — ele perguntou, depois de tomar um gole de vinho branco.

— Muito — admitiu Francesca, contemplando o copo de suco de laranja. — Passei a noite na casa dele. Pudemos conversar durante horas.

— Você imaginou que ele teria uma reação terrível. Esqueceu que o amor tudo perdoa e esquece.

Como Francesca não estivesse com a menor disposição para falar sobre amor, desviou o olhar e balançou a cabeça.

— Não sei se estamos tomando a decisão certa.

Quando o jantar chegou, um apetitoso peixe com molho cremoso, ela não se mostrou muito entusiasmada.

— Coma — ele a incentivou.

— O fato de eu haver concordado em casar não o faz ter o direito de me dar ordens!

— Só um homem com muita coragem faria isso — ele murmurou, rindo.

— O que quer dizer?

— Que, se sua mordida for tão forte quanto sua língua é afiada, estou perdido.

— Não sei se gostei do elogio.

Francesca franziu a testa, mas não se sentiu ferida com o comentário. Provavelmente porque Oliver sorrira, e aquele sorriso a deixara imensamente feliz. Começou a comer e descobriu, após algumas garfadas, que estava com mais fome do que imaginara.

— Já tomei todas as providências para o casamento — Oliver disse ao vê-la terminar o prato. — Será depois de amanhã.

— Depois de amanhã?! — Francesca arregalou os olhos, aturdida.

— Agora já está feito. Você poderá convidar alguns amigos, mas creio que é melhor nos restringir a poucas pessoas. Ah, e ainda há a questão da lua-de-mel.

— Lua-de-mel?! — Ela ficou horrorizada. Luas-de-mel, pensou, eram para amantes apaixonados! — Não precisamos de lua-de-mel.

— Como se nada importante tivesse acontecido?

Apesar da consciência de que sua atração por Oliver a jogara numa situação que mudara sua vida dramaticamente, Francesca deu de ombros.

— Exatamente.

— Mas vamos nos casar e viajaremos em lua-de-mel. O que seu pai diria se não o fizéssemos?

— Oh, então você decidiu que precisamos de uma lua-de-mel para que todos pensem que nossa vida é só flores e sonhos?

— Pare de discutir! Que mal há em tirar umas férias?

— Eu prefiro…

— Você já disse o que prefere — ele a interrompeu rispidamente, ignorando o garçom com o menu de sobremesa na mão. — Passaremos uma semana no exterior, em algum lugar ensolarado. No Caribe, talvez, ou na Oceania. O que prefere?

— Oh, o Caribe, suponho — ela disse com má vontade, recebendo em troca um olhar arrevesado.

— A maioria das mulheres não precisaria de muita persuasão para passar uma semana ao sol, longe da nublada Inglaterra.

— Bem, não sou como a maioria das mulheres.

— Não, definitivamente não é — ele disse, fitando-a de forma intrigante.

 

Francesca passou o dia seguinte remoendo o que acontecera e pensando no que tinha pela frente: um casamento, uma lua-de-mel e um filho dentro de sete meses. Isso era a realidade, uma realidade que lhe sugara todo o otimismo juvenil e que lhe mostrara quanto fora tola ao imaginar que poderia controlar a própria vida.

 

O casamento foi uma espécie de anticlímax. Num minuto, ela era Francesca Wade e, no seguinte, Francesca Kemp, com uma aliança no dedo, diante de todos os presentes.

Ela e Oliver haviam convidado alguns poucos amigos, mas Gerald Wade não se conformara e convidara alguns outros que, segundo ele, não poderia deixar de lado. No final da cerimônia, voltaram para a mansão, onde um elaborado bufê os aguardava.

Entre os convidados, estavam Yvonne e Rupert. Francesca se esforçou ao máximo para não encarar a ex-noiva de Oliver porque, toda vez que o fazia, imaginava em que o marido estaria pensando.

— Anime-se! — ordenou Oliver, em voz baixa, envolvendo-a com um braço.

— Estou sorrindo o mais que posso.

— Francesca…

— Ninguém notou nada.

Ela apontou a grande sala com um gesto de cabeça. Todos estavam animados, rindo, e Gerald Wade ia de um convidado a outro sem disfarçar o orgulho.

— Tem razão. Quanto a mim, estou começando a aprender a interpretar seus… hum… sinais secretos.

Quando os convidados começaram a sair, ela se viu frente a frente com Yvonne.

— Quase não tivemos chance de conversar — disse-lhe a outra, puxando-a para um sofá. Sorria calorosamente, e Francesca tentou retribuir.

— Mal tenho tido tempo para pensar — comentou vagamente. Além do pai, ninguém mais sabia que estava grávida.

— Tudo aconteceu tão depressa, não? Como comigo e com Rupert. Estamos planejando nos casar até o final do ano. Portanto, largarei meu emprego para ajudá-lo a cuidar de suas propriedades.

— Desejo-lhe boa sorte.

— Também estou muito feliz por Oliver. Éramos tão unidos… Não queria que ele ficasse com uma impressão muito ruim das mulheres depois do que aconteceu entre nós.

— Não se sente um pouco…

A própria Yvonne completou a frase:

— Surpresa? Não, nem um pouco. Há tempos achava que seria um erro me casar com Oliver, mas não conseguia identificar o motivo. Só percebi o que estava faltando em minha vida quando me apaixonei por Rupert.

Francesca meditou por alguns segundos e então fez a pergunta que martelava em sua mente:

— Acha que você e Oliver teriam tido filhos, caso se casassem?

— Oh, sim. — Rupert acenava do outro lado da sala, apontando teatralmente para o relógio. Yvonne se levantou e disse, sorrindo: — Oliver sempre quis uma família. Creio que faria o impossível para ter um filho logo.

Nos minutos seguintes, Francesca acenou e sorriu para os convidados, apesar de, por dentro, estar mais consciente do que nunca do verdadeiro motivo que levara Oliver a lhe propor casamento: o bebê!

Viu-o aproximar-se e segurá-la pela cintura. O casal feliz, pensou, ao menos aos olhos dos outros! Quem poderia imaginar que era apenas uma encenação, em nome do filho que ela carregava?

Os dois partiram para o aeroporto. No carro, ela apoiou a cabeça no banco e ficou apenas pensando, calada. Estava cada vez mais certa de que, se Rupert não tivesse entrado em cena, seria Yvonne a mulher que teria recebido a aliança das mãos de Oliver.

Ela, Francesca, fora apenas uma moça atraente que o ajudara a superar um período difícil. Mas a gravidez mudara tudo. Transformara uma malfadada noite de paixão numa obrigação para a vida toda.

Fechou os olhos e, quando voltou a abri-los, já estavam no aeroporto. Oliver a tocava gentilmente no ombro, para que despertasse.

— Está pronta? — perguntou, um leve sorriso nos lábios. — Ou devo carregar as malas e colocá-la no carrinho para que possa continuar a soneca?

— A culpa não é minha — ela respondeu, irritada, bocejando. — São os hormônios.

Ele deixou escapar uma risada.

— E até quando seus hormônios serão responsáveis pelas coisas que você faz?

Francesca o fitou com o canto dos olhos. Ele parecia descontraído e sexy, muito sexy. Usava uma calça verde-oliva e uma camisa bege que o deixavam atraente demais.

— Meses — ela respondeu, abrindo a porta. — Talvez anos.

Oliver tratou de tudo com a segurança de quem está acostumado a viajar, e foi tratado com a cortesia exagerada dispensada aos passageiros de primeira classe.

Francesca observou tudo a certa distância, imaginando se era a única no aeroporto que não estava empolgada com a perspectiva de ir para uma terra ensolarada.

A viagem, de oito horas, normalmente iria deixá-la apreensiva. No entanto, ela dormiu a maior parte do voo e, nos poucos momentos em que ficou acordada, percebeu-se relutantemente entusiasmada com a perspectiva de uma semana na praia.

Ao saírem do avião, Francesca e Oliver foram recepcionados por um sol forte, num céu azul sem nuvens. Havia já algum tempo que ela não ia ao Caribe e lembrou, com prazer, como as cores eram vivas naquele lugar. O verde parecia mais verde; as flores, muito mais coloridas e vibrantes.

Quando chegaram ao hotel, Francesca transpirava muito e não via a hora de tomar um banho forte e frio. No entanto, quando foram levados até o quarto, lembrou, estremecendo, que estavam em lua-de-mel e que iriam compartilhar o mesmo quarto. Com a correria dos últimos dias, praticamente esquecera o que um casamento acarretaria.

Da porta, contemplou a cama com um misto de ansiedade e medo, enquanto Oliver tirava a camisa.

— Entre de uma vez — ele disse. — Até parece que há um monstro aqui dentro.

E desapareceu no banheiro, sem importar-se em fechar a porta. Com isso, Francesca pôs-se a desfazer a mala, ignorando a cama.

Quando ele reapareceu, estava nu, exceto pela toalha presa à cintura.

— Não pode vestir uma roupa? — ela esbravejou.

— Já passou por sua cabeça que agora estamos casados? — O charme descontraído desapareceu instantaneamente do rosto viril.

— Apenas no papel — ela retrucou, ao que Oliver franziu as sobrancelhas escuras.

— É isso que você pensa?

— O que mais poderia pensar? Nós dois sabemos que só estamos casados por causa do bebê.

Francesca enrubesceu, parcialmente porque estava calor mas, principalmente, porque ele se aproximava. Sem saber o que fazer, pôs as mãos para trás e o fitou.

— O que sugere, então? — Havia uma perigosa candura na voz de Oliver.

— Cada um faz o que quer — ela respondeu, desviando o olhar.

— E às vezes nos encontramos a caminho do restaurante? — Como ela não respondesse, Oliver a segurou pelos braços. — Agora ouça. — Sua voz era lenta, controlada. — Estamos casados, e não pretendo brincar de marido e mulher.

— O que está tentando dizer?

— Quero dizer que este será um casamento real, em todos os sentidos.

— Não e não.

— Se pensa que nosso casamento significará compartilharmos o mesmo teto enquanto saio com outras mulheres, está muito enganada!

— Está pretendendo ser fiel? — ela perguntou, estreitando os olhos. — Fiel a uma mulher a quem não ama? Espera que eu acredite nisso?

— Naturalmente você só acreditará naquilo que quiser.

— E quando a tentação aparecer?

Ele a fitou, perplexo.

— De que está falando?

— De Helen! — Francesca sentia-se um trapo por dentro, e controlou-se muito para não trair seus sentimentos. — Helen Scott! Você deu a ela meu emprego sem me contar! O que mais lhe deu?

Ele retesou o maxilar.

— Foi isso que aquela encrenqueira lhe contou? Ela não está trabalhando para mim! Por que acredita em tudo o que lhe contam?

Ao constatar o modo sensual com que ele a fitava, Francesca sentiu o pulso acelerar.

— Eu…

— Vá em frente — ele pediu, a voz rouca. — Toque-me.

— Não posso.

— Sim, pode. Ainda sente atração por mim, não sente?

— Não, não sinto — ela mentiu, fitando os olhos claros como se fosse um animal acuado. — Eu me odeio pelo que aconteceu. Sei que agora estamos casados, mas não quero nada com você.

— O que acha que acontecerá se voltar a dormir comigo? — ele perguntou, a voz suave, segurando-a pelo queixo. — Que o céu cairá sobre sua cabeça?

— Não quero falar nisso. É uma conversa inútil.

— Goste ou não, teremos que conversar a respeito. Jamais precisou enfrentar uma situação desagradável, não é? Por isso acha difícil encarar o que está acontecendo.

— E Yvonne estaria em melhores condições de enfrentar a situação? — ela indagou, amargamente. — Você não perde uma oportunidade para me dizer como sou um fracasso. Será que não está me comparando com padrões impossíveis? Jamais serei como sua ex-noiva!

— Eu alguma vez disse que você é um fracasso? — ele perguntou, a sobrancelha arqueada.

Com os sentidos em alerta, Francesca percebeu que deveria controlar-se, ou terminaria revelando todos os seus sentimentos.

— Você insinuou. Sei que tive uma educação privilegiada. Não pude evitar.

— Está com ciúme de Yvonne? Assim como tem ciúme de Helen Scott? O que acha que isso significa?

Por medida de segurança, Francesca se afastou e parou diante da grande janela, com vista para o mar. Como poderia negar que estava morrendo de ciúme? Sim, Helen era uma encrenqueira, mas Yvonne ficaria sempre pairando sobre eles, como uma nuvem escura.

— E então? — ele perguntou, aproximando-se por detrás. — Não vai me responder?

— Você sente ciúme de Rupert?

— Você não estava noiva de Rupert. Tampouco dormiu com ele.

— E se tivesse dormido?

— É uma pergunta hipotética.

— Então finja que não é.

— Muito bem. — Oliver se calou e Francesca imaginou o que ele estaria pensando. — Como posso ter ciúme de um homem tão inadequado para você? Se tivesse ficado noiva dele, seria apenas uma questão de tempo até perceber o erro. Ouça, tome um banho e tente dormir um pouco.

Francesca atravessou o quarto, pegou algumas roupas e foi até o banheiro, cuidando para não olhar na direção dele.

Em seguida, tomou um bom banho e ao sair, cerca de meia hora mais tarde, não viu o marido no quarto.

Ele tirara as roupas de cima da cama e colocara-as dentro das gavetas, em pilhas desordenadas, o que a fez rir. Francesca voltou a dobrar as peças e as organizou, pensando que não conseguiria voltar a dormir. No entanto, adormeceu assim que encostou a cabeça no travesseiro.

Ao abrir os olhos, viu Oliver parado, com short e camiseta, sorrindo.

— Há quanto tempo esta aí, espionando? — ela perguntou, sentando-se e esfregando os olhos. — É muito feio fazer isso, sabia?

Sentia-se melhor depois do sono e percebeu, surpresa, que dormira mais de doze horas.

— Você arrumou as gavetas — ele comentou e, com um olhar provocante, sentou-se na beirada da cama.

— As roupas precisam ser dobradas — ela disse, sonolenta. Para falar a verdade, estava gostando muito de vê-lo sentado a seu lado.

— Obrigado pela informação. Posso dizer honestamente que isso vai mudar minha vida.

Francesca riu e perguntou, desconfiada:

— Por que está sendo tão gentil?

— Não é melhor do que ficar mal-humorado? Agora, venha — disse, puxando-a pela mão. — O mundo lá fora está nos esperando, com piscinas, plantas exóticas, um mar calmo e azul, almoço…

— Almoço! — Ela passou correndo por Oliver e voou para o banheiro, a fim de se trocar. — Estou morrendo de fome!

Bateu a porta do toalete e fez um grande esforço para fechar o zíper do short, que já estava ficando justo.

— Planejei um almoço na praia — Oliver anunciou assim que saíram do quarto.

Francesca o fitou com o canto dos olhos e notou novamente que todos os seus sentidos estavam em alerta. Ele tinha razão. Não adiantava levar o caso a ferro e fogo, como se fossem eternos adversários.

— É uma ideia maravilhosa — ela concordou de bom grado.

Os dois caminharam pelos jardins, passaram pelas piscinas e então se dirigiram à praia, descendo oito degraus irregulares de pedra. Oliver voltou-se para segurar a mão de Francesca, num gesto amigável.

— Aqui está — ele disse, voltando-se na direção dela. — O que acha?

— É lindo!

Francesca contemplou a praia de ponta a ponta. A água estava calma, perfeita em seu azul luminoso. Exceto por alguns banhistas em espreguiçadeiras, a orla estava vazia.

Caminharam na direção de uma pequena mesa redonda, protegida por um enorme guarda-sol em tom cru. Atrás deles, um pouco mais à direita, havia um bar com um garçom impecavelmente vestido em costume vermelho e preto, e um chef em uniforme branco imaculado e chapéu característico.

Francesca puxou uma das espreguiçadeiras e deitou-se nela, com uma toalha sob a cabeça. Fechou os olhos e disse a Oliver para pedir o que quisesse para o almoço.

— Eu poderia comer um boi!

— Vou descobrir o cardápio da casa. E cubra seu rosto com alguma coisa. Não vá deixá-lo vermelho.

Jogou um jornal sobre ela, o que a fez reclamar. Mas aceitou o conselho e cobriu o rosto. Sentia-se descontraída. Ficou deitada, quieta, imaginando-se como uma fatia de pão numa torradeira.

— Não me diga que os hormônios a estão fazendo dormir novamente!

— Sol e hormônios são uma péssima combinação — ela informou, sem tirar o jornal do rosto.

— Venha.

— Para onde? — Francesca ergueu o jornal e viu-o puxar uma espreguiçadeira para debaixo de alguns coqueiros.

— Para um canto mais tranquilo. O almoço estará pronto em quinze minutos — anunciou, despindo a camiseta. — Dois hambúrgueres enormes com batatas fritas.

— Muito saudável. — Por algum estranho motivo, Francesca sentiu-se repentinamente tímida. — Não queremos ensinar ao bebê maus hábitos alimentares, queremos?

Entreolharam-se em silêncio, um silêncio carregado de significados.

— É claro que não. Não queremos que o bebê nasça implorando um prato de colesterol.

— Cheio de batatas fritas!

Francesca sorriu, mas intimamente experimentara uma sensação inédita. Pela primeira vez pensara na criança como um milagre e não como um problema.

— Agora se deite. De bruços, enquanto pode.

— O que pretende fazer?

Oliver não respondeu. Apertou um dos tubos de loção bronzeadora e Francesca se ajeitou, semicerrando os olhos, enquanto ele espalhava o creme em sua pele. Primeiro os ombros, depois as costas, a cintura, para então descer para as coxas e pernas. Ela começou a experimentar uma deliciosa sensação.

— Muito bem — ele disse. — Pode virar.

Ela se deitou de costas. Ao abrir os olhos, percebeu que o ventre crescera levemente e, além dele, viu Oliver, que recomeçava a espalhar a loção.

Quando as mãos hábeis começaram a fazer movimentos rítmicos em suas coxas, Francesca percebeu que sua própria respiração se acelerou. Tratou de juntar as pernas, mas ele já estava espalhando a loção em seu ventre.

— Você está começando a ganhar peso — observou, surpreso. — Eu ainda não havia percebido.

— Só está aparecendo por causa do biquíni.

Havia uma intimidade nas atitudes de Oliver que Francesca não notara antes.

— Mas fica bem em você — ele comentou, massageando-lhe o estômago, sem fitá-la. — Deixa-a com as formas arredondadas.

— Obrigada!

Francesca, fascinada com a dança de sol e sombras no corpo de Oliver, sentia-se enfeitiçada.

— Seus seios também estão maiores — ele observou, com o mesmo tom surpreso.

Seus olhares se encontraram, silenciosos, inquiridores.

— Onde foi parar nosso almoço? — ela indagou, numa tentativa desesperada de quebrar aquele encanto.

Oliver então começou a massagear-lhe os seios arredondados. Francesca sentiu os mamilos rígidos, como resultado da carícia.

— Oliver…

— Sim? — Ele ergueu uma sobrancelha, provocando-a. — Oliver, continue a fazer o que está fazendo? Oliver, quer fazer amor comigo?

 

Percorreu com os dedos o vale entre os seios de Francesca e depois lhe fustigou os mamilos demoradamente.

— Pare! — ela suplicou, e, ao olhar para o lado, empertigou-se. — Lá vem nosso almoço.

Ele riu e contemplou o garçom que se aproximava.

— Salva pelo gongo!

Ignorando-o, Francesca aguardou que o almoço fosse servido: dois enormes e suculentos hambúrgueres, com batatas suficientes para um batalhão.

Ainda sentia o corpo em chamas, implorando para que aquelas carícias fossem levadas às últimas consequências. Fitou Oliver furtivamente e imaginou se teria força suficiente para rejeitar o homem que fora seu amante e que, agora, era seu marido.

 

Francesca sabia muito bem quais eram as pretensões do homem com quem se casara. Mesmo que não estivesse apaixonado, Oliver não via motivos para não fazerem amor. Mostrara-se encantador o dia todo, como se estar juntos fosse a coisa mais natural desse mundo.

Ela não queria perder o controle das emoções, pois sabia que, mais cedo ou mais tarde, quando o fogo do sexo tivesse baixado, Oliver perceberia que, com ou sem filho, jamais a amara. E Francesca tinha certeza de que nenhum casamento sobrevive sem amor.

Sentia-se entre a cruz e a espada, sem saber que direção tomar. Se contasse dez anos a mais, já teria experiência suficiente com o sexo oposto para tratar aquele relacionamento com o mesmo cinismo com que Oliver o encarava. Mas, por ora, tudo o que conseguia era perceber quanto fora ingênua em permitir que sua atração a levasse a uma situação tão delicada.

Parou no meio do quarto, olhando através da janela para a noite escura. Quase saltou ao ouvir a voz enrouquecida, quase impaciente:

— Qual é o problema, agora?

— Nenhum — ela se apressou em responder. — Só estava pensando.

Oliver suspirou e caminhou até Francesca, que precisou controlar-se para não recuar… ou para não se atirar nos braços dele.

— Você é a pessoa mais ilógica que conheci. Há dez minutos, estava à beira da piscina, rindo e brincando; no quarto, porém, está portando-se como se tivesse chegado o dia do Juízo Final.

— Estou com um pouco de dor de cabeça.

— Arranje outra desculpa. — Oliver não disfarçou a impaciência.

— Você sempre acha que procuro significados secretos naquilo que diz — ela reclamou, irritada. — Será que não pode simplesmente acreditar no que digo?

Ele lhe acariciava sensualmente os ombros.

— Você consegue conversar alegremente sobre livros, música e cinema, mas, no minuto em que entramos no campo pessoal, entra em colapso.

— Não sou um ser irracional. Sou apenas uma mulher grávida!

— Apenas aqui. — Ele tocou o ventre de Francesca com a mão espalmada, fazendo-a estremecer. — E aqui — murmurou, deslizando a mão para baixo e alojando-a sobre a feminilidade da jovem esposa.

Ela afastou-se rapidamente e esbravejou.

— Quer parar com isso? — Francesca aproximou-se da janela e fechou as cortinas, tentando ocupar-se para quebrar o clima íntimo que se instalara no quarto. Depois se voltou, abraçando o próprio corpo. — Não posso dormir com você. Simplesmente não posso.

Ele franziu a sobrancelha.

— Por que não?

— Jamais poderia voltar a me olhar no espelho se o fizesse. Sei que não consegue entender, porque já dormimos juntos, mas…

— Mas quando dormiu comigo, pensou que depois tudo seria maravilhoso. Entretanto, não foi o que aconteceu. Estou certo?

— Chegou perto — ela admitiu, trêmula.

— Então, em outras palavras, nosso casamento não será consumado?

Depois de um longo silêncio, Francesca ergueu o queixo e o desafiou:

— Você não me ama. A mulher que deseja chama-se Yvonne. Sou apenas um prêmio de consolação.

— Deixe Yvonne fora disso! — ele vociferou, aproximando-se com andar felino. — Olhe bem nos meus olhos e diga que não sente atração por mim!

Tocou-a no rosto e, embora sua voz estivesse carregada de ódio, seus dedos eram ternos.

— Não é esse o ponto. Dormir com uma pessoa só por atração é um instinto animal.

— Na sua boca, o desejo soa como pecado. E não estamos falando a respeito de dormir com qualquer um. Por Deus, somos marido e mulher!

— Infelizmente.

Ele praguejou algo ininteligível e depois disse, num tom controlado:

— Vou tomar um banho. Não quero forçá-la a nada, fique certa disso. Você pode ser uma mulher desejável, mas seus encantos têm limite.

— Não tenho a menor dúvida.

Ela poderia ter retrucado que o desejo tinha seus limites. Sem amor para sustentá-lo, não havia nada que mantivesse a chama acesa.

Assim que ficou sozinha, despiu-se rapidamente e vestiu uma camisola de renda branca em estilo vitoriano que, se não a deixava sensual, pelo menos era confortável.

Estava quase adormecida quando sentiu Oliver deitar-se a seu lado. Retesou-se imediatamente, os sentidos aguçados. Entretanto, ele virou para o lado oposto e, minutos mais tarde, ressonava suavemente.

Francesca despertou por volta das três horas da madrugada e, paulatinamente, percebeu o que a despertara: o peso de um braço ao redor de sua cintura. Quanto mais tentava se desvencilhar, mais se prendia. Estavam, ela e Oliver, com os corpos encaixados.

Quando se voltou, percebeu que ele tinha os olhos abertos. E a fitava, o rosto parcialmente oculto pela escuridão. Ofegou.

— Você está acordado!

— Eu nem havia percebido — ele disse, retirando o braço e preparando-se para virar-se.

— Está frio aqui — ela comentou, imaginando por que decidira prolongar a conversa, às três da manhã.

— Quer que eu desligue o ar-condicionado?

— Não. Ficará muito quente e não quero abrir as janelas. Os mosquitos são terríveis por aqui.

— Está bem.

— Trouxe algum repelente?

— Não. Por que estamos tendo essa conversa maluca às três da madrugada?

Francesca não sabia. Sabia apenas que adorara sentir o corpo de Oliver colado ao seu. Fora delicioso.

— Não era uma conversa. Fiz apenas uma pergunta.

— Bem, é uma hora muito estranha para falar sobre repelentes. Boa noite. Se eu me aproximar novamente, basta me empurrar.

— Oliver…

— O que foi agora?

"Se eu soubesse…", ela pensou. "Apenas desejo você. Não me importo com o que acontecerá amanhã."

Estendeu o braço e passou a mão ao longo do corpo do marido, percebendo, extasiada, que estava nu. Ele segurou-lhe o pulso e disse friamente:

— Não estou disponível para esse tipo de jogo.

— Não é um jogo.

— Você não sabe o que quer. Num minuto, está me repelindo; no outro, quer fazer amor. Não conte comigo. Não sou nenhum garoto e não tenho paciência para esse tipo de comportamento.

— Não, não tem.

Aproximando-se mais, Francesca tocou-lhe os lábios com os seus, traçando-lhes o contorno com a língua. Tentou ganhar acesso ao interior da boca sensual, mas ele não correspondeu; apenas aumentou a pressão ao redor do pulso dela, fazendo-a afastar-se.

— O que aconteceu a seu orgulho? — perguntou, soltando-a em seguida. — Decidiu, afinal, que, no calor desta cama, na escuridão deste quarto, poderá sobreviver se fizermos amor?

— Não pensei em nada! — ela respondeu, a voz embargada.

— Parece que esse é seu problema, não é?

— Ora, não amole!

Ela virou-se e, irada, escorregou para fora da cama. Não pensara mesmo em nada, exceto que o desejava desesperadamente e que precisava tocá-lo.

— Droga, para onde está indo?

Francesca sentia-se confusa. As perguntas pipocavam em sua mente, como peças de um grande quebra-cabeça. Se ao menos conseguisse juntar as peças, refletiu, chegaria a uma solução.

— Preciso pensar — ela respondeu, e Oliver só ergueu-se da cama ao perceber que a esposa saía do quarto.

Francesca correu e, ao imaginá-lo vestindo-se rapidamente, correu ainda mais. Passou como um raio pela recepção vazia, atravessou os jardins e foi direto para a praia.

A noite estava quente, o ar pesado e, ao redor dela, abundavam os ruídos noturnos dos grilos, sapos e insetos desconhecidos.

Francesca olhou em volta e não viu nada. Correu mais depressa, os pés mal tocando a grama. Com a escuridão da noite, havia apenas a espuma das ondas a guiá-la na direção do mar. O silêncio da praia proporcionar-lhe-ia a calma necessária para pensar.

Uma última olhadela para trás mostrou-lhe que Oliver chegava cada vez mais perto. Assustada, ela pisou em falso, caindo por sobre os degraus de pedra como em câmera lenta.

À luz do dia, eram apenas degraus irregulares. À noite, tornaram-se uma armadilha perigosa. Incapaz de mover-se, ela fechou os olhos, esperando que Oliver chegasse. Não esperou muito.

— Você está bem? — ele indagou, a voz desesperada. Tentou ajudá-la a levantar-se, mas ela gemeu de dor.

— Não consigo me mexer.

— O que estava fazendo? Onde está doendo? É a perna? — Não esperou resposta. Pegou-a no colo e a levou de volta ao hotel. Ela fechou os olhos e segurou-se a Oliver, ouvindo vozes indistintas ao fundo. Ele falava com alguém, a voz decidida e autoritária. — Vamos chamar um médico. Não se preocupe, tudo vai ficar bem.

— Não vi os degraus. Sabia que estavam ali, mas tropecei logo no primeiro.

— Já passou.

Ele a levou até o sofá da recepção, onde procurou acomodá-la com toda a cautela.

— Estou melhor agora — ela o tranquilizou, a voz baixa. — Não é preciso chamar um médico. Posso esperar até amanhã.

Entretanto, estava apavorada. Sentia uma espécie de cólica, algo cujo significado preferia não cogitar.

— Ouça, você está sangrando levemente e não quero esperar até amanhã para resolver isso. O recepcionista já foi chamar o médico do hotel.

— Sangrando? — Ela sentiu as lágrimas aflorarem em seus olhos.

— Sinto muito. Droga! A culpa foi minha.

Ela abriu os olhos e o fitou.

— Eu é que não devia ter corrido como uma louca — ela balbuciou, mas o marido colocou-lhe um dedo sobre os lábios.

O médico chegou e pediu a Oliver que a levasse até o consultório, no final de um corredor. Através da camisa fina, ela ouvia os batimentos cardíacos acelerados. De alguma forma, era um som tranquilizante, do qual não queria se afastar.

— Então, o que aconteceu, mocinha?

Francesca olhou para o rosto inteligente do médico negro e disse:

— Sinto por tê-lo tirado da cama no meio da madrugada.

— Não teria me tornado um médico se não estivesse preparado para essas eventualidades — ele respondeu, examinando cuidadosamente os ferimentos. — Soube que você está grávida. Tenho que examiná-la para me assegurar de que está bem. — Olhou para Oliver. — Vai ficar aqui?

Oliver confirmou silenciosamente, segurando-a pela mão. Francesca agarrou-se a ele, temerosa. Tudo acontecera tão depressa! Num momento, estava no quarto, pronta para entregar seu corpo e seu amor àquele homem; no seguinte, rolava pelos degraus, sem conseguir proteger-se.

O médico fazia perguntas e ela as respondia, desatenta. Finalmente ele se empertigou, o semblante sério.

— Foi uma queda perigosa. Você não quebrou nenhum osso, o que já é muito bom, mas está sangrando e há uma possibilidade de que venha a perder o bebê.

Era o que Francesca mais temia ouvir. Ouviu Oliver perguntar:

— O que quer dizer com uma possibilidade? Não pode ser mais preciso?

— Normalmente, uma queda na gravidez não é preocupante — explicou o médico, com calma e paciência. — O bebê está bem protegido dentro do saco amniótico, Mas, se a queda é forte, pode ocorrer um aborto. Sua esposa está sangrando, mas só teremos certeza de que está bem com um ultrassom.

— Agora! Queremos um ultrassom agora!

— É impossível, mas vou providenciar para que ela seja atendida pela manhã. — Começou a arrumar a maleta e, depois de escrever algo no bloco, entregou a folha a Oliver. — Procurem pelo Dr. Girot. Vou avisá-lo de que irão vê-lo. — Voltou-se para Francesca. — Enquanto isso, mocinha, procure dormir.

Eram quase cinco horas da manhã quando voltaram ao quarto, com o dia rompendo no horizonte. Oliver colocou Francesca sobre a cama e tirou a camisa. Depois, sentou-se ao lado dela, a expressão inescrutável.

— Você precisa dormir.

— Não tenho sono. — O médico lhe dera dois analgésicos suaves para as contusões, que começavam a latejar. — Fui uma tola. Você tem razão. Não penso antes de agir.

— Pare de se culpar. Está feito. Temos apenas que esperar e ver o que acontece pela manhã.

— Se perder o bebê, jamais me perdoarei.

Oliver tomou nas suas as mãos entrelaçadas de Francesca, confortando-a.

— Não pense no pior.

— Infelizmente, precisamos pensar. Casamo-nos para o bem do bebê, e se não houver bebê… — Calou-se, tentando se controlar. — Se não houver bebê, de que adianta continuarmos casados?

Oliver permaneceu calado. Levantou-se e caminhou pelo quarto, as mãos nos bolsos.

— Não trabalho com hipóteses — ele disse, por fim, parando ao pé da cama e fitando-a intensamente.

— Não podemos fingir que não há uma possibilidade de isso acontecer. Você sempre diz que não gosto de enfrentar o que é desagradável e creio que tem razão. Não possuo sua força.

— Você se subestima.

— É mesmo? — Ela sorriu tristemente. — Não creio. Sinto que só estou crescendo agora. É como se tivesse passado a vida dentro de um casulo. Agora sou obrigada a rompê-lo à força.

— Em seus lábios, isso soa como algo trágico e inevitável — ele comentou, voltando a sentar-se ao lado de Francesca. — Não há nada errado em viver dentro de um casulo, ou em rompê-lo.

— Não brinque comigo.

— Quando eu era jovem, costumava imaginar como seria não ter que lutar por nada. Às vezes, pensava em você.

— Em mim?

— Em você. Sabia a seu respeito por intermédio de minha mãe. Soube quando nasceu. Imaginava que tipo de vida levaria.

— Uma vida muito diferente da sua — Francesca concordou, a voz baixa, desejando tê-lo conhecido quando criança. — Viemos de mundos diferentes, para onde devemos retornar. Se perdermos o bebê, não há nada que nos mantenha juntos.

— Você pode ser livre, com ou sem bebê — ele disse abruptamente, levantando-se e caminhando inquieto pelo quarto.

— Posso? — Não havia esperança na voz de Francesca, nem júbilo. Sua liberdade não era nada se Oliver não estivesse ao seu lado.

— Agora vai dormir mais descansada? — ele indagou, passando os dedos pelo cabelo. — Vou nadar um pouco.

— Nadar?

— Foi o que eu disse. Você adormecerá mais depressa se eu não estiver na cama, ao seu lado.

— Mas você deve estar cansado!

— Passei a vida toda trabalhando tanto, que o sono é um passatempo às vezes inatingível. — Acariciou-lhe o cabelo. — Voltarei logo. Descanse um pouco.

Quando Oliver partiu, Francesca permaneceu deitada, as mãos espalmadas sobre o ventre, olhando para o teto. Ainda havia o ultrassom para confirmar seu estado, mas de uma coisa estava certa: a preocupação ante a perspectiva de viver com um homem que não a amava estava prestes a terminar. Ficaria livre. Poderia enfim retornar para a Inglaterra sem Oliver torturando seus dias com a falta de amor.

 

Mas não se sentia aliviada. Tentou imaginar sua vida sem ele e não conseguiu.

Finalmente adormeceu. Despertou poucas horas mais tarde, com Oliver afagando-lhe o rosto. Usava uma calça lisa e uma camisa listrada de manga curta.

— Preciso tomar um banho.

— Então seja rápida. O táxi chegará em quinze minutos.

Ao se despir para o banho, Francesca percebeu que ainda sangrava e preparou-se emocionalmente para o que estava por vir.

— Estou com medo — ela confessou, ao sair. — Não sou forte o suficiente para isso.

— Sou forte o suficiente por nós dois — ele murmurou, segurando-a pela mão e fechando a porta do quarto.

Ao chegarem ao hospital, descobriram que a sala de espera não estava cheia. Duas grávidas em estado avançado conversavam. Perto deles, havia uma garota com cerca de quinze anos que deveria estar numa escola e não na maternidade de um hospital.

Quando o médico chamou seu nome, Francesca agarrou a mão de Oliver e, juntos, entraram no cubículo escurecido.

— Relaxe. Estenda as pernas. Não precisa se assustar, pois não vai doer.

— Está bem.

O médico posicionou o visor de forma que todos pudessem ver as imagens. Lá estava ele, o bebê. Indistinto, pequeno, mas movendo-se vigorosamente. Francesca mal ouviu o que o homem lhe disse, de tão fascinada.

— Está tudo bem — assegurou o médico.

— Não vou perdê-lo?

Ele sorriu pela primeira vez.

— Não. Mas, se eu fosse você, evitaria rolar em degraus nos próximos meses.

Fora do hospital, quinze minutos mais tarde, o sol brilhava radiante. O motorista do táxi fora instruído a esperar, e estava se abanando com um jornal, as janelas abertas.

Francesca olhou ao redor. O mundo, pensou, era um lugar maravilhoso.

— Precisamos conversar — disse Oliver, assim que entraram no táxi.

 

Francesca e Oliver não se falaram dentro do táxi. Fizeram o percurso em silêncio e, embora ela parecesse absorta pela paisagem tropical, sua cabeça não parava de dar voltas.

Sabia que o marido desejava conversar sobre providências. Teriam que discutir como o casamento seria anulado. Precisariam assinar alguns documentos para terminar tudo rapidamente. Exatamente como haviam começado.

No entanto, para Francesca, tudo começara há muito tempo. Para ser mais exata, no momento em que pusera os olhos em Oliver Kemp. Naquele instante, acendera-se dentro dela uma chama, que não se extinguiria apenas com um pedaço de papel.

O táxi fez o percurso até o hotel lentamente e, no assento de trás, a distância entre os dois era enorme. Entretanto, não era apenas uma distância física. Oliver estava ocupado com seus pensamentos, assim como Francesca tinha uma série de ponderações a fazer.

Quando o motorista finalmente parou, os dois desceram e Francesca ficou indecisa quanto ao que fazer em seguida.

— Há um bar à beira da piscina — ele disse, sem fitá-la, e segurou-a pelo braço.

Caminharam até lá, sentaram-se a uma pequena mesa e, quando as bebidas chegaram, ela desabafou:

— Sei o que quer discutir: providências para acabar com tudo isso e para formalizar as visitas ao bebê, quando ele nascer. Por que não deixamos tudo para quando voltarmos à Inglaterra?

Era uma incongruência monstruosa discutir algo tão terrível sob um sol resplandecente, com o barulho das ondas, diante dos passarinhos que pululavam nas árvores floridas.

Oliver não respondeu. Levantou-se, como se sua energia precisasse de uma válvula de escape, e debruçou-se na balaustrada. Então se voltou para Francesca e disse rispidamente:

— Não quero esperar até voltarmos para a Inglaterra. Não posso.

Ele pedira um suco de frutas, do qual tomou um bom gole, depositando em seguida o copo sobre a mesa. Francesca, olhando para o próprio copo, desejou que o marido se sentasse. Ao vê-lo imenso, à sua frente, seu nervosismo aumentava.

— Ouça, não podemos falar aqui. — Ele pegou o copo novamente e o bebeu até o fim.

Ao fitá-lo, entretanto, Francesca sentiu mais curiosidade do que nervosismo. Havia algo estranho no comportamento de Oliver, algo que não conseguia identificar claramente.

— Mas…

— Vamos caminhar pela praia.

— Com estes sapatos?

— Deixe os malditos sapatos numa das mesas da praia!

— Não precisa gritar!

— Às vezes, penso que é a única forma de fazê-la reagir.

— Muito obrigada! Mais algum cumprimento antes de sair?

—Você sempre me faz agir como alguém que não reconheço.

— Então agora a culpa é minha? E quer parar de correr?

Ele não respondeu. Dirigiu-se até uma das mesas cobertas com guarda-sol e descalçou os sapatos. Então levantou a barra da calça, tirou a camisa e a fitou. Instintivamente, Francesca desviou o olhar e também tirou os sapatos.

Oliver começou a caminhar para a ponta mais distante da praia. Ela o seguiu silenciosamente.

— Eu não disse que tudo estaria bem com o bebê?

— Por que quer brigar comigo, Oliver? Não podemos resolver tudo de maneira civilizada?

— Não, não podemos!

Ele encaminhou-se até um tronco tombado e sentou-se, rabiscando na areia branca com um graveto. Isso reavivou uma série de lembranças em Francesca: as férias na praia com o pai, as horas que passava desenhando na areia, fascinada com o fato de o mar apagar tudo…

Oliver, constatou, seria um ótimo pai. Desolada, tentou ignorar a constatação e sentou-se ao lado dele no tronco, formando montes de areia com os pés.

— Meu pai poderá nos recomendar um bom advogado…

— Não precisaremos de advogado.

— Quer dizer que faremos tudo sozinhos?

— Não quero que isso aconteça — ele respondeu, com uma expressão melancólica. — Será que não percebe? Não haverá divórcio algum!

— Mas você disse…

— Sei o que disse. Mas mudei de ideia. Não quero o divórcio.

— Por quê?

— Porque você pertence a mim e não pretendo deixá-la partir. Nunca. Se quiser o divórcio, terá que lutar por ele. Mas aviso que vai perder.

— Por que isso agora? Porque Rupert tirou Yvonne de você? Porque não pretende ficar sozinho?

Ele riu, um som seco e sem humor.

— O que Rupert e Yvonne fazem não me diz respeito.

— Tem certeza? Afinal, você ainda a ama!

Oliver balançou a cabeça, incrédulo.

— O que senti por Yvonne pode ter sido tudo, menos amor.

— Então por que planejava se casar com ela? Porque a detestava?

— Porque fui um tolo. Um idiota que pensava que amizade e semelhanças superficiais podiam ser a base para um compromisso duradouro.

— E julga que um bebê justifica esse compromisso?

— Não.

— Então…

Francesca começou a sentir uma mudança de rumo naquela conversa, mas não se permitiu contagiar pela esperança que começava a crescer em seu coração.

— O que mais quer que eu diga? — ele indagou, atirando o graveto na direção do mar.

— Só quero que seja claro.

— Como posso ser claro com você se não consigo ser claro comigo mesmo? — Ele se levantou, contemplou o mar por alguns segundos e então voltou a sentar-se. — Você não é exatamente o tipo de mulher por quem eu sentiria atração, no passado — recomeçou, sem saber quanto a magoava com aquelas palavras.

— Eu sei. Você nunca fez segredo disso.

— Você cresceu com todos os confortos do mundo. Nunca soube o que era a necessidade, a ambição. Tudo caiu em suas mãos, sem que fosse necessário pedir.

— A culpa não foi minha.

— Ah, sim, e também teve a sorte de nascer linda — ele prosseguiu, a respiração ofegante. — Quantos homens ficaram enfeitiçados por você?

— Oh, milhares! — ela ironizou.

— Pensei que eu fosse imune aos seus encantos. — Ele a fitou, e o brilho ardente em seus olhos fez o sangue de Francesca ferver. — Eu estava errado — reconheceu, segurando-a pelo queixo. — Quando começou a trabalhar para mim, eu a fitava, dizendo a mim mesmo que só estava observando se você tinha potencial para o cargo. Mas, depois de algum tempo, tive que encarar a verdade. Queria fitá-la porque me sentia cada dia mais atraído.

— Não é possível! Você jamais demonstrou!

— Se não queria admitir para mim, como poderia admitir para você? Estava noivo de uma mulher que eu imaginava admirar. Então você entrou em minha vida e nada mais fez sentido. Eu vivia me dizendo que não era esse o meu tipo de mulher, mas já estava enfeitiçado.

— Oliver…

— Quando fui até seu apartamento, naquela primeira noite, não pretendia ser atencioso. Precisava vê-la, e então… Quando você me convidou para ir até sua cama, quando se despiu, percebi que era a mulher mais encantadora que já vira.

— Você me rejeitou — lembrou Francesca.

— Tive que fazê-lo. Você tinha bebido muito e eu precisava pensar para entender o que estava acontecendo comigo. Foi uma bênção para minha paz de espírito quando Yvonne se envolveu com seu amigo Rupert.

— Eu não fazia ideia!

Francesca acariciou o rosto de Oliver. Ele segurou a mão delicada e a abriu, para beijar-lhe a palma.

— Quando voltei, naquela segunda noite, já sabia que precisava possuí-la. Eu a desejava como jamais desejara alguém. Queria sentir sua pele, possuir seu corpo, sua alma. Mas, em seguida, tudo começou a dar errado. Viajei para o exterior e comecei a senti-la cada vez mais distante, ao telefone. Quase enlouqueci.

— Que escolha eu tinha? Descobri que estava grávida e comecei a suspeitar de que você só dormira comigo para se vingar de Yvonne.

— Como isso pode ter lhe ocorrido, se é você que eu amo?

Ao ouvir a declaração, Francesca sentiu um calor delicioso invadir seu corpo.

— Meu amor… Meu adorado Oliver. Pensei que estivesse sofrendo sozinha. Por que imagina que me afastei? Porque já o amava, porque não conseguia suportar a ideia de que você jamais retribuiria meu amor.

— Fui até o inferno por sua causa. Voltei para a mulher que eu imaginava ter prendido em minha armadilha e descobri que ela não apenas descobrira a isca, como estava fugindo na direção oposta. — Balançou a cabeça, rindo. — Mas, quando descobri que você estava grávida, percebi que o bebê a traria. Então fiz o possível para conseguir o que queria.

— Desculpas aceitas — ela disse, feliz. Oliver, no entanto, arqueou as sobrancelhas.

— Quem está pedindo desculpas? Diga, Francesca, diga que me ama. Diga muitas vezes. É sua punição pelo que me fez passar.

— Eu o amo, Oliver Kemp — ela murmurou ternamente. E deixou escapar um gemido quando ele deslizou a mão pelo decote do vestido, para acariciar-lhe os seios.

— Não imagina quanto desejei ouvi-la dizer essas palavras. Quando me acusou de ter contratado Helen Scott como secretária, desejei que admitisse estar com ciúme.

— Eu estava com ciúme. Não imagina o que senti quando ela disse que conseguira o emprego.

— Não sabe o que senti quando imaginei que poderíamos perder o bebê — ele falou carinhosamente. — Quando você disse que não queria mais ficar casada comigo…

— Você concordou!

— O orgulho me fez concordar. Mas eu sabia que jamais a deixaria partir.

Ela riu, deliciada, e permitiu que o marido lhe beijasse o pescoço. Lentamente, os dois deslizaram para a areia e Oliver abriu-lhe os botões do vestido, expondo os seios que ardiam por ser tocados. Ousadamente, fustigou com a língua cada mamilo, fazendo-a gemer, fazendo-a querer mais.

— Você é tão diferente… — ele disse, contemplando os olhos castanhos enevoados pelo desejo. — Quanto mais a conheço, mais me surpreendo. Não tinha ideia de como minha vida era sem graça até você aparecer. — Beijou-a, terna e apaixonadamente. — No começo, tentei ignorar, mas, por fim, não pude mais escapar à verdade: sem você, minha vida não tem sentido.

— É bom que seja assim. — Ela suspirou ao sentir a mão de Oliver em suas pernas, em seu ventre, em seus seios.

"Como pude ter pensado que jamais seria feliz?", perguntou-se. "Como pude ter-me visto num túnel sem saída?" Olhou para o rosto viril e soube que, daquele momento em diante, a vida que crescia dentro dela nasceria em meio ao amor e à felicidade. Exatamente como deveria ser.

 

                                                                                Cathy Williams  

 

                      

O melhor da literatura para todos os gostos e idades

 

 

           Voltar à Página do Autor