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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


PASSION ON PARK / Lauren Layne
PASSION ON PARK / Lauren Layne

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

Biblio VT

 

 

 

 

Naomi Powell percebeu que não havia uma boa maneira de descobrir que o homem com quem esteve namorando pelos últimos três meses era casado com outra pessoa. Mas de todas as possibilidades, aprender sobre a existência de uma Sra. Brayden Hayes através do obituário do babaca traidor?
Pior maneira possível.
O táxi parou em frente à Igreja Presbiteriana, e Naomi quase perdeu a coragem, seus instintos gritando para ela dizer ao taxista para levá-la de volta ao Lower East Side.
Em vez disso, ela entregou ao motorista uma nota de vinte dólares, abriu a porta e pisou na luxuosa Park Avenue como se pertencesse ali. Ela tirou os óculos escuros Gucci da bolsa e colocou-os no rosto – o dia nublado de julho não justificava muito as lentes escuras, mas ela estava a caminho de um funeral. Esperançosamente, as pessoas pensariam que o propósito dos óculos de sol era esconder olhos vermelhos e inchados, e não o que realmente eram:
Um disfarce.

 


 


Foda-se, Naomi pensou, furiosa, empurrando os óculos de sol de volta para seu cabelo ruivo escuro e marchando com determinação em direção à imponente igreja de estilo gótico. Ela não precisava de um disfarce. Aos vinte e nove anos, Naomi havia passado a maior parte da vida lidando com pessoas que tentavam fazê-la se sentir inferior, e ela preferia morrer a deixar um playboy babaca ter sucesso mesmo no túmulo.

Ela tinha tanto direito de estar aqui quanto qualquer outra pessoa. Não é como se ela soubesse que ele era casado. Ela nem sabia que ele morava em Manhattan. Naomi não tinha certeza se sabia absolutamente qualquer coisa sobre o verdadeiro Brayden Hayes, mas mesmo com toda a sua raiva, ela ainda queria a chance de dizer adeus.

O homem havia tornado sua vida melhor, pelo menos por um tempo. Mesmo que ele estivesse tornando tudo muito pior agora.

Ela suspirou e colocou os óculos de sol de volta no rosto. Não para se proteger, mas para proteger a esposa de Brayden. Naomi não tinha ideia se Claire sabia da existência dela, mas se por acaso ela soubesse, Naomi não queria tornar isso mais difícil para a mulher do que já era.

Naomi subiu os degraus da igreja enquanto o obituário de Brayden sacudia em seu cérebro, como fazia havia dias. Vítima de um trágico acidente de iate, Brayden Hayes deixa sua esposa, Claire Hayes...

Um acidente de iate. Sério? Sério?

Morrer num barco de luxo não era um pouco bom demais para um mulherengo com a moral de um pedaço de carvão?

A única parte boa da situação, e Naomi teve que procurar muito para encontrar uma, era que Claire e Brayden não tinham filhos. Graças a Deus por isso. Foi a única coisa que impediu Naomi de quebrar completamente quando soube da vida dupla de Brayden. Ela sabia muito bem a destruição que um idiota mulherengo podia causar na vida de uma criança.

Naomi entrou na igreja escura e silenciosa e caminhou em direção a um dos bancos de trás. Várias pessoas se viraram e olharam em sua direção, e seus passos vacilaram.

Logicamente, Naomi sabia que eles estavam apenas virando instintivamente por conta do clique agudo de seus saltos altos Louboutin contra o chão da igreja. Alguns talvez possam até ter reconhecido ela como a Naomi Powell dos 30 mais influentes com menos de 30 anos da lista da Forbes, ou de sua entrevista no noticiário

Mas para onde quer que olhasse, Naomi via apenas desdém. Como se eles pudessem ver além do vestido conservador Chloé chegando às suas raízes do Bronx. Como se soubessem que ela era a outra. A própria identidade que destruiu sua mãe e que Naomi jurou evitar.

Ela prendeu a respiração, tentando reunir a audácia que a transformou de uma ninguém em uma das mulheres mais ricas da cidade. Ela tentou reunir a confiança que lhe rendeu um lugar em todas as listas de “mulheres para se observar” no país. Mas hoje, ela não se sentia como uma pessoa promissora no mundo dos negócios. Hoje ela se sentia pequena. Pior, ela se sentia suja.

Naomi observou uma mulher franzir os lábios e se virar, como se não pudesse mais olhar para a prostituta de Brayden Hayes. Isso é no que ele a transformou. Uma vida inteira tentando evitar os passos de sua mãe, e um canalha do Upper East Side a transformou em seu pior pesadelo.

Naomi nem percebeu que tinha se virado e deixado a igreja até que sentiu a brisa quente de verão soprar em seus cabelos. Não registrou em que direção ela estava caminhando até chegar à borda leste do Central Park.

Só então ela se permitiu respirar verdadeiramente, engolindo grandes lufadas de ar. Mas ela não chorou. Naomi havia prometido a si mesma há muito tempo que nunca choraria por causa de um homem.

Ela não estava vestida apropriadamente para um passeio, mas as árvores e o caminho sinuoso a acalmaram quando ela entrou no parque. Uma pausa bem-vinda da vizinhança próxima e todo o seu esnobismo. No Central Park, não importava em que rua você morava, de que bairro você vinha. O Central Park pertencia a todos os nova-iorquinos, um glorioso quintal compartilhado.

O parque estava basicamente vazio. A maioria dos turistas entrava pelo lado sul, então ela viu apenas alguns corredores, alguns casais idosos passeando, duas mães em um encontro de carrinho e...

Naomi olhou duas vezes para a loira sentada sozinha em um banco do parque e seu estômago embrulhou. Você está zoando comigo agora, Deus?

A primeira coisa que Naomi fez depois do choque de ler que Brayden Hayes era um canalha casado foi pesquisar no Google sua esposa, desesperada por uma indicação de que o jornal Times estava errado sobre seu estado civil. Que foi um erro de impressão ou que ele era divorciado. O papel não estava errado. Realmente havia uma Sra. Brayden Hayes.

E ela também havia escolhido o Central Park ao invés do funeral de Brayden.

Quase em frente a Claire Hayes agora, e com os óculos de sol ainda proporcionando a Naomi o anonimato, ela se atreveu a dar uma olhada na outra mulher com o canto do olho.

A viúva de Brayden se parecia muito com a imagem que Naomi tinha achado na internet: nata da burguesia do Upper East Side de trinta e poucos anos. Como Naomi, ela usava óculos de sol enormes, o logotipo da Chanel brilhando na lateral. O olho treinado de Naomi identificou o vestido de tricô preto básico como St. John, e os sapatos pretos básicos como Louboutins – idênticos aos de Naomi.

Mas, ao contrário de Naomi, Claire tinha uma postura gentil. Como se ela nunca tivesse dito merda, muito menos soltado a palavra com F. Naomi apostava muito que Claire Hayes não comia Macaroni & Cheese industrializado direto do pote quando estava estressada e que Claire nunca tinha sido tão pobre a ponto de pensar em levar para casa o colchão que um vizinho jogou no lixo, ácaros que se danem, simplesmente porque era de graça.

A expressão plácida de Claire não revelava nada quando Naomi passou por ela, os óculos muito grandes para revelar qualquer emoção em seu rosto. Por falar nisso, Naomi se perguntou se as mulheres como ela tinham emoções. Não parecia. A mulher era a imagem da calma, exceto por...

Suas mãos.

As mãos da viúva de Brayden estavam cerradas com força em seu colo, os dedos da mão direita em torno do punho esquerdo. Mas não foi a manicure rosa claro que chamou a atenção de Naomi. Foram as luas crescentes vermelhas brilhantes sob as unhas.

Naomi tinha o péssimo hábito de agir antes de pensar, que foi o que ela fez, indo até a outra mulher e sentando-se ao lado dela no banco do parque.

— Já chega — disse Naomi, usando sua voz de CEO, calma e autoritária.

Claire não se moveu. Naomi nem tinha certeza se a outra mulher a tinha ouvido.

Naomi hesitou apenas por um momento antes de lentamente estender a mão e tirar as unhas da mão direita de Claire de sua mão esquerda. Pequenas faixas de sangue foram deixadas no rastro.

Claire olhou para baixo em confusão, como se só agora estivesse registrando a dor.

— Essa Givenchy tem algum lenço de papel? — Naomi perguntou, apontando para a bolsa de Claire no banco.

Claire não se moveu por um longo momento, então respirando fundo, ela calmamente pegou sua bolsa, puxando um pacote de lenços para viagem.

— Estamos usando os mesmos sapatos. O mesmo vestido também, — Claire disse, enxugando o sangue nas costas de sua mão com um lenço, usando a mesma indiferença casual de alguém enxugando uma gota de água derramada.

Naomi concordou com a cabeça, embora o vestido St. John de Claire tivesse mangas compridas e gola rolê até a altura dos joelhos, e o Chloé de Naomi tivesse um decote canoa, indo até o meio da coxa.

Por um longo momento, nenhuma das duas disse nada.

— Eu deveria estar em um funeral, — Claire disse, enrolando o lenço e colocando as mãos de volta no colo.

— Por que você não está?

Naomi estava genuinamente curiosa. Ela sabia porque ela não estava naquele funeral. Mas a viúva não aparecendo... aquilo era digno da seção de fofocas do jornal.

Claire abriu a boca para responder, mas fechou novamente quando uma jovem bonita com cabelo castanho escuro passou por elas. Naomi esperou a passagem da outra mulher e, ao olhar mais de perto para a morena, percebeu que a outra mulher caminhava um pouco devagar demais, como se estivesse tentada a se aproximar. Ela parecia vagamente familiar. Naomi tinha quase certeza de que elas tinham se cruzado em alguns eventos, embora Naomi não conseguisse identificar o rosto.

A viúva de Brayden, no entanto, conseguiu. Claire ficou rígida ao lado de Naomi, mesmo enquanto chamava a outra mulher, — Audrey.

Ao contrário de Claire e Naomi, a morena não estava usando óculos escuros, e Naomi viu seus olhos redondos ficarem ainda mais arregalados. — Você sabe quem eu sou?

— Você é Audrey Tate. Eu fiz uma pequena pesquisa depois que você ligou para minha casa naquela noite, — Claire disse calmamente. — Eu sei que você estava dormindo com meu marido.

A cabeça de Naomi virou de surpresa, e então a surpresa se transformou em choque quando ela percebeu que Claire não estava falando com ela.

O que...

Audrey deixou escapar um soluço e foi até o banco, e Naomi quase riu ao ver os sapatos da outra mulher. Sapatos pretos Louboutin idênticos aos dela e de Claire.

— Eu não sabia —, Audrey estava dizendo apressadamente enquanto se sentava ao lado de Claire e a encarava com uma expressão suplicante. — Eu não sabia, até você atender o telefone naquela noite, que ele era casado. Juro para você, ele me disse que sua esposa tinha largado ele, que ele estava separado... Eu nunca teria – você tem que acreditar em mim. Eu não sabia...

— Oh, querida, — Naomi interrompeu, meio solidária, meio horrorizada. — Você tem que se recompor.

Audrey parou de fungar e deu a Naomi o que ela provavelmente pensava ser um olhar frio, mas o impacto foi diminuído pelo nariz vermelho e olhos inchados. — Com todo respeito, você não sabe nada sobre o que está acontecendo aqui.

— Bem, essa é a questão —, disse Naomi, olhando para sua manicure. — Eu meio que sei.

Ambas as mulheres estavam estudando-a agora.

— Quem é você? — Claire perguntou.

Naomi estudou a outra mulher por apenas um momento antes de agir com o mesmo instinto que a transformou de alguém que largou a escola no Bronx a superstar empreendedora; ela sentiu que Claire Hayes era o tipo de mulher que merecia a verdade. Toda a verdade.

Naomi colocou os óculos de sol no topo da cabeça e olhou para Claire. — Eu sou Naomi Powell. A outra mulher.

A boca de Audrey se abriu, mas Claire não reagiu além de um piscar um pouco longo demais. — O que?

Droga. Ela pensou que tinha sido muito clara.

— Seu marido estava colocando salsichas em cachorros-quentes demais —, anunciou Naomi com clareza. — Bem, dois a mais se você for contar ela. — Ela apontou com o queixo em direção a Audrey.

— Você acabou de comparar... salsichas... oh meu Deus, cachorro-quente—, disse Audrey, levando a mão à testa.

A cabeça de Claire caiu para frente, o queixo apoiado no peito, e Naomi estremeceu. Talvez ela pudesse ter formulado de maneira um pouco diferente... enfiar o macarrão na caçarola errada? Pepino em várias saladas?

Mas Claire Hayes a surpreendeu. Seus ombros tremiam, não com lágrimas, mas com uma diversão silenciosa. Então ela jogou a cabeça para trás e olhou para o céu, deixando escapar uma risada audível.

— Eu odeio ser quem vai te dizer isso, — Audrey disse a Claire, — mas eu não acho que ele esteja lá.

Agora foi a vez de Naomi soltar uma risada surpresa ao perceber que havia subestimado a morena. Ela pode parecer uma Hepburn esguia, mas essa Audrey tinha veneno sob a aparência doce e olhos de boneca.

— Não deveríamos estar no funeral? — Claire perguntou. Provavelmente mais para si mesma, mas Naomi respondeu de qualquer maneira.

— Nah. Eu apareci principalmente para dizer a Deus para não permitir que aquele homem atravessasse os portões perolados, e como Audrey apontou, eu acho que Ele provavelmente já percebeu isso.

— Eu nunca pensei que estaria aqui, — Claire disse cansada, levando os dedos às têmporas e esfregando distraidamente.

— Você quer dizer sentada em um banco de parque com as amantes de seu marido enquanto o funeral dele acontece a apenas alguns quarteirões de distância? — Naomi perguntou.

Claire riu. — Sim. Isso. Só fico pensando que sei que deveria estar triste, mas, em vez disso, só consigo pensar em como fui estúpida, e isso antes de saber que vocês existiam. Como eu não vi isso?

— Nós fomos tão estúpidas quanto — Audrey disse, colocando a mão no braço de Claire. — Ele foi meu namorado por um ano. Eu só pensava que ele viajava muito.

— Três meses —, disse Naomi, apontando para si mesma. — Ele me disse que a maioria de seus negócios eram em Hong Kong e que tinha que trabalhar quase todas as noites. Eu acreditei piamente.

Todas ficaram em silêncio, perdidas em suas próprias memórias do homem, e Naomi ficou impressionada que, apesar do fato de que este era talvez um dos encontros mais estranhos na história dos encontros femininos, não parecia tão estranho quanto deveria. Longe de se ressentir das outras mulheres, ela se sentiu quase consolada com a presença delas. A própria existência de Claire e Audrey era a prova de que Naomi não era a única iludida. Que ela não estava sozinha sendo vítima dos jogos de um homem sem coração.

Quem teria pensado que o ditado “a união faz a força” se aplicaria às traições de um homem morto?

Naomi se endireitou ligeiramente e se virou para os outras.

— Eu tenho uma confissão.

Claire ergueu as sobrancelhas. — Pior do que o fato de você ter feito festas do pijama de adulto com meu marido?

— Que eu não sabia que era seu marido, — Naomi esclareceu, acenando com o dedo para Claire. — Mas não, minha confissão é que, embora eu esteja realmente irritada com Brayden, estou ainda mais irritada comigo mesma. Por deixá-lo me enganar.

Audrey concordou com a cabeça. — Eu também. Quer dizer, é um pouco mais de autodepreciação do que raiva, eu acho, mas... Eu simplesmente não consigo parar de pensar em como não percebi isso. E se eu não o vi sendo sacana, como eu vou perceber qualquer outro homem sendo sacana?

Claire olhou para suas mãos, passando a ponta do dedo ao longo dos pequenos cortes causados por seus próprios dedos bem cuidados. — Não estou preocupada com isso. Depois de tudo isso, estou decidida a me tornar a velha senhora solitária com gatos.

— Não. — disse Naomi com firmeza. — Não vamos deixá-lo fazer isso conosco. Não sou realmente uma garota que goste de relacionamentos a longo prazo, mas gosto de companhia masculina e não tenho a intenção de deixar Brayden me traumatizar com...

— Salsichas? — Audrey sugeriu.

— Eu ia dizer sexo, mas sim. Isso também.

O sorriso de Audrey foi fugaz. — Mas eu sou a garota que procura relacionamentos a longo prazo. Eu quero o anel e os bebês, e a...

— Por favor, não diga cerca branca.

— Oh, Deus, não. — Audrey estremeceu e apontou para os sapatos. — Esses solados vermelhos foram feitos para a Quinta Avenida, não para os subúrbios. Mas ainda quero o conto de fadas, e simplesmente... — Ela engoliu em seco. — É mais difícil de acreditar hoje em dia.

— Então deixe-me ver se entendi. — Naomi se virou para Claire. — Você vai se transformar na solteirona dos gatos e você está desistindo de seus sonhos de princesa da Disney —, disse ela, virando-se para Audrey. — Tudo por causa de um cara.

Claire e Audrey trocaram um olhar, e Naomi continuou.

— Senhoras, sei que acabamos de nos conhecer, mas caiam na real, temos os mesmos sapatos e fomos sacaneadas pelo mesmo cara, então, no que me diz respeito, avançamos alguns passos no processo de amizade feminina.

— Perfeito, vou convidá-las para uma festa do pijama, — Claire disse, começando a se levantar.

— Aguarde. — Naomi colocou a mão em seu braço. — Não estou sugerindo que façamos tatuagens iguais, apenas que podemos ajudar umas às outras.

Claire olhou para ela, mas se sentou novamente. — Você quer que eu ajude as amantes do meu marido a... fazer o quê, exatamente?

— Observamos os pontos cegos umas das outras no que se refere aos homens. Deixadas por nossa própria conta, obviamente não somos boas em enxergar um cara pelo que ele realmente é. Mas e se uníssemos forças? Ajudando umas às outras a identificar outro possível Brayden.

Naomi sabia que era aleatório, um pouco autoritário, e muito doido, mas parecia certo. E Naomi construiu seu nome ao confiar em seu instinto.

— Com todo respeito, eu nem conheço você —, disse Audrey, passando a mão pelo rabo de cavalo escuro. — Eu entendi seu ponto, mas por que eu teria duas estranhas fazendo um estudo sobre um cara que eu gosto em vez de meus amigos?

— Porque quem melhor para identificar outra mulher sendo enganada do que três mulheres que acabaram de passar por isso?— Naomi apontou.

Audrey mordeu o lábio e olhou para Claire. — Sabe, eu não odeio esse plano?

Claire mexeu no relógio e o olhar de Naomi rastreou o movimento. — Cartier.

Claire ergueu os olhos. — Sim. Como você sabe?

— Eu conheço designers. Eu também sei porque tenho exatamente o mesmo relógio em casa.

Os olhos de Claire se arregalaram. — Brayden...?

Naomi concordou.

— Eu também —, disse Audrey, quase inaudivelmente.

Claire olhou para o relógio em seu pulso esquerdo, e Naomi sabia que tinha a conquistado.

Naomi estendeu a mão direita. — Coloquem as mãos, meninas, estamos fazendo um pacto, estilo colegial. Que nenhum de vocês nunca mais seja vítima de um babaca traidor novamente. Não enquanto eu estiver de guarda.

— E que ajudemos umas às outras a encontrar o homem certo. Essa é a minha função, — Audrey disse, colocando a palma da mão em cima da mão de Naomi.

Após um momento de hesitação, Claire colocou a mão em cima da de Audrey. — Ah, que diabos. Estou dentro. Idiotas nunca mais.

Naomi nunca tinha sido uma garota feminina e certamente não era do tipo que ficava toda alvoroçada sobre o destino. E embora ela estivesse meio que brincando com a coisa toda do pacto, algo estranho aconteceu no momento em que as três mãos se encontraram. Como se elas estivessem ligadas agora não por Brayden, mas por algo maior. Algo importante.

E Naomi de repente teve certeza de que aquele momento com Claire Hayes e Audrey Tate de alguma forma mudaria tudo.

Quando todos deixaram as mãos caírem, Audrey soltou um longo suspiro e olhou para o leste, na direção da igreja. — Acho que devíamos fazer uma aparição, hein?

Naomi se levantou e colocou os óculos de sol de volta no rosto com um dedo. — Dane-se. Vamos fazer compras.


Capítulo Dois


DOIS MESES DEPOIS - SEGUNDA-FEIRA, 24 DE SETEMBRO


No momento em que os sapatos Manolo Blahniks de Naomi Powell saíram do elevador na sede da Maxcessory, um par de saltos Nordstrom na promoção começou a andar ao lado dela. O clique sincronizado de seu ritmo combinado era tão familiar – e querido – tanto para Naomi quanto para a mulher que calçava os outros sapatos.

— É melhor que isso não seja o que eu acho que é — disse Deena Ferrari, estreitando os olhos para a caixa rosa da padaria nas mãos de Naomi.

— Bolo de aniversário de duplo chocolate para minha assistente favorita, — Naomi disse, fazendo um barulho de beijinho na direção de Deena.

— Rejeito —, disse Deena.

— Você não pode rejeitar seu aniversário, — Naomi argumentou enquanto Deena abria a porta de vidro do escritório de canto de Naomi e a seguia para dentro.

— Bem, tendo em vista que eu venho rejeitando por cinco anos consecutivos agora —, disse Deena, cruzando os braços sob os peitos e mostrando uma quantidade impressionante de decote levantando em seu vestido de estampa de oncinha, — Eu me tornei muito boa nisso.

— Mas espere, você ainda nem viu a melhor parte —, disse Naomi, colocando o bolo na mesa, jogando a bolsa Hermès na cadeira e abrindo a caixa com um floreio.

Os pés de Deena permaneceram firmes no lugar, seus braços teimosamente cruzados, e ela esticou o pescoço para ver o que dizia.

Feliz 35 anos!

Deena, que Naomi sabia muito bem que não tinha menos de quarenta e sete anos, sorriu. — Aniversário aceito.

— Foi o que pensei —, disse Naomi, fechando a caixa para que pudesse ser levada para a sala de descanso para os funcionários compartilharem.

— Mas sem cantar parabéns — disse Deena, levantando uma unha pintada de vermelho com glitter dourado. — E sem velas.

— Presentes? — Naomi perguntou.

— Presentes eu vou aceitar. Mas primeiro, tenho presentes para você...

Naomi resmungou quando Deena ergueu uma pilha de post-its e os balançou um pouco.

— Você está fugindo —, disse Deena enquanto Naomi tirava a bolsa da cadeira e se jogava nela.

— Não de propósito —, disse Naomi, colocando os dedos nas têmporas. — Da próxima vez que eu decidir colocar o prazo final do contrato de aluguel do meu apartamento e do escritório no mesmo mês, me dê um tapa. Bem na cara. Estilo dondoca.

— Ficarei feliz em fazer isso —, disse sua assistente, folheando suas anotações.

Deena provavelmente queria dizer isso. A mulher sempre afirmou que em outra vida ela teria sido um membro do elenco de Jersey Shore. E embora fosse verdade que Deena amava drama, ela era loucamente eficiente, embora ninguém percebesse ao olhar para ela. Quatro anos atrás, depois que a primeira assistente de Naomi deixou o mundo corporativo para criar seus dois filhos no Brooklyn, Deena tinha entrado na sede da Maxcessory sem reunião marcada, sem currículo e com muito perfume.

Deena nunca tinha trabalhado em um escritório e definitivamente não sabia nada sobre digitar – mesmo se ela soubesse, suas unhas com quilômetros de comprimento teriam dificultado. Mas a garota nascida e criada em Jersey tinha algo que Naomi respeitava mais do que experiência. Ela tinha estilo.

Deena Ferrari havia entrado no escritório com o queixo erguido e brilho labial brilhante. Seu vestido preto estava ajustado e fabuloso, os saltos de suas botas de cano alto altos como o céu. E embora a mulher fosse extraordinária em quase todos os aspectos, o olho de águia de Naomi, sempre preparado para avaliar como os outros usavam acessórios, percebeu que o pulso de Deena tinha a quantidade perfeita de pulseiras. Notou que ela havia pulado o colar para permitir que seus brincos compridos tivessem a atenção que mereciam.

E depois de uma série de recém-formados em seus ternos de entrevista, brincos de brilhante, sapatos de salto médio e respostas engessadas, Deena tinha sido a lufada de ar fortemente perfumado de que Naomi precisava. Ela contratou Deena na hora e nunca se questionou.

— Como a equipe está se sentindo sobre a mudança? — Naomi perguntou, girando lentamente em sua cadeira.

Deena encolheu os ombros. — Animada. Por mais que eles adorem você e acreditem na Maxcessory, o compartilhamento da mesa e a luta pelas duas salas de reunião estavam desgastando a todos.

— Eu só me sinto mal por termos esse hiato estranho de um mês entre os escritórios —, disse Naomi.

Deena lançou para ela um olhar incrédulo. — Sério? Você acha que seu chefe lhe dizendo que você terá que trabalhar em casa não é o sonho de todos?

— Sério? — Naomi perguntou, assustada.

— Absolutamente. Videoconferências de pijama e não ter que lidar com a linha F de metrô às seis da noite de segunda-feira? Eles estão animados.

— Sim, bem, acredite em mim, o brilho se esvai — Naomi murmurou. — Dois anos trabalhando em meu minúsculo apartamento tentando fazer esse negócio decolar quase me matou.

— Claro, mas você tem que admitir que às vezes gostaria de trabalhar vestindo calças de moletom e sem sutiã.

Naomi deu uma olhada em Deena. — Quando foi a última vez que você ficou sem sutiã?

Deena balançou seus peitos enormes na direção de Naomi, mas ela reconhecia uma das táticas de protelação de Naomi quando a via.

— Fique quieta e ouça seus recados. — Deena mergulhou de cabeça. — A equipe de mudança está tentando adiar a realocação em três dias, mas não me deram um bom motivo. Presumo que posso dizer a eles para manter a data contratada ou ir direto para o inferno?

— Reformule, mas sim.

— A lavanderia ligou. Eles não conseguiram tirar o wasabi da sua blusa branca com o laço.

— Droga, — Naomi murmurou. — Eu amo essa blusa.

— Você tem sua consulta médica anual com a ginecologista na próxima sexta-feira, massagem na terça, sua cabeleireira precisou mudar seu horário de quarta para sexta-feira... tudo isso está no seu calendário...

Deena colocou as notas adesivas na frente de Naomi enquanto as lia, tendo aprendido a esse ponto que Naomi tinha mais probabilidade de absorver as coisas quando elas estavam literalmente bem na frente de seu rosto.

— Claire ligou, — Deena continuou. — Disse para te lembrar que você vai se encontrar com elas na casa de Audrey às seis da noite antes do filme...?

Houve uma ligeira dúvida no tom de Deena, e Naomi sabia que sua assistente estava extremamente curiosa sobre as duas mulheres que haviam entrado na vida de Naomi durante o verão, aparentemente do nada, e se tornado suas amigas próximas em apenas alguns meses.

Naomi não respondeu à pergunta não feita. Ela confiava em Deena implicitamente, considerava sua assistente uma amiga leal. Mas havia algumas coisas que você simplesmente não conseguia explicar para outras pessoas. O fato de você ter se tornado amiga da esposa e da namorada de seu falecido amante era uma delas.

Naomi, Claire e Audrey podiam não saber da existência uma da outra até o dia do funeral de Brayden, mas elas compensaram o tempo perdido com brunches frequentes e noites de vinho. Naomi gostava de imaginar que saber que as três mulheres que ele traiu haviam se unido era uma grande tortura para Brayden Hayes em seu banco da frente no inferno.

Deena passou para sua próxima nota. — Dylan Day ligou de novo, nome idiota, mas...

Naomi bateu a cabeça contra o encosto da cadeira repetidamente em agitação. — Esse cara não vai desistir!

— Se vale de alguma coisa, acho que você deveria tentar — disse Deena.

— Você pensaria de forma diferente se fosse a sua vida que eles quisessem transformar em uma série de TV — Naomi murmurou.

— Au contraire — disse Deena, balançando as sobrancelhas. — Estou contando com eles para incluir sua assistente diva italiana como parte essencial do seu sucesso.

— Você sabe que eles não vão deixar você interpretar você mesma, certo? Eles estão buscando uma dessas séries 'inspiradas em uma história verdadeira', não um documentário.

— Espere até que ele me conheça — Deena disse com confiança. Então ela franziu a testa. — Espere, ele não é gay, é? Isso vai prejudicar minhas chances.

— Não faço ideia.

— Bem, o que o seu gaydar diz a você? Não é tão bom quanto o meu, mas se ele for um dos óbvios...

— Não sei porque não o conheço.

A boca de Deena escancarou. — Mas a emissora está atrás de você há semanas por conta disso.

Naomi encolheu os ombros. — Estou fugindo.

—Mas por quê ? É assim que as lendas são feitas, querida. Você poderia ser maratonada na Netflix.

Talvez. Mas a história de Naomi Powell dificilmente era o conto de fadas que eles esperavam. Ou talvez fosse. Acontece que os episódios iniciais foram muito mais corajosos do que Cinderela. E os episódios finais não tinham nenhum Príncipe Encantado à vista.

— Eu vou ligar de volta, — Naomi disse com firmeza, pegando o bloco de notas e deixando Deena saber que a conversa estava encerrada. Por enquanto.

— Último recado — disse Deena, lendo o último Post-it rosa em sua mão. — E é estranho. Uma senhora ligou dizendo que você foi aprovada para uma entrevista com o conselho. Achei que você já tinha encontrado seu novo apartamento?

Naomi franziu a testa. — Eu encontrei. Assinei o contrato de aluguel naquele prédio em Tribeca na semana passada. Ann falou que houve algum tipo de problema?

— Não era Ann. Essa mulher era Victoria, e o apartamento de que ela estava falando era Upper East Side, não Tribeca.

Naomi torceu o nariz. — Upper East Side?

Depois de sua experiência com Brayden, ela não queria nada com a parte arrogante e antiga de Manhattan.

Os olhos castanhos de Deena examinaram a nota. — Sim. O prédio fica no número 517 da Park Avenue?

Naomi estava girando ligeiramente em sua cadeira, mas ela ficou paralisada ao ouvir o endereço. O endereço familiar. — O que você disse?

Naomi ouviu a agressividade em seu tom, e Deena aparentemente também, porque ela deu a Naomi um olhar assustado. — Você conhece?

Sim, ela conhecia, conhecia bem.

E era exatamente a parte sinistra de seu passado que Dylan Day adoraria colocar as mãos.

E exatamente a parte que Naomi passou uma década tentando esquecer.


Capítulo Três


QUARTA-FEIRA, 26 DE SETEMBRO


Naomi poderia ter resolvido por telefone, mas no final sua curiosidade ganhou.

O que era estúpido. Ela deveria estar arrumando seu escritório e seu apartamento, se preparando para uma mudança dupla. Sem mencionar o fato de que eventualmente ela teria que lidar com a produtora que queria transformar sua vida em um especial em horário nobre. E isso sem contar todas as outras coisas que vinham junto com a administração de sua própria empresa de bilhões de dólares.

Mas?

Em vez disso, Naomi silenciosamente saiu do escritório ao meio-dia da quarta-feira, e em vez de pegar seu sushi de costume ou salada Niçoise favorita em seu bistrô favorito do Lower East Side, ela se viu indo para a parte alta da cidade.

Para um prédio de apartamentos em que ela não pensava há anos.

Bem, isso não era totalmente verdade. Ela havia tentado não pensar nisso por anos. Ela tinha tido muito sucesso, exceto nos momentos em que a amargura implacável de sua mãe se apoderou de Naomi, forçando-a a se lembrar.

Naomi parou do lado de fora do prédio e estudou a fachada do número 517 da Park Avenue. Parecia... igual. O que provavelmente era a intenção. Aqui no Upper East Side, a arquitetura pré-guerra não era considerada velha; era digna. O maior elogio nesta parte da cidade.

E assim, como se uma nuvem tivesse passado sobre ela, Naomi sentiu-se diferente. Era como se o vestido Stella McCartney, os sapatos e a bolsa que custavam sozinhos mais do que o aluguel do seu primeiro apartamento, tivessem desaparecido.

Como se ela não fosse mais Naomi Powell, a “girl boss” que atingiu a América corporativa como um tornado.

Em vez disso, ela era Naomi Fields. A menina ossuda de nove anos com roupas de segunda mão que não pertencia a esta parte da cidade e era lembrada disso todos os malditos dias.

Rangendo os dentes contra a memória, Naomi endireitou os ombros e marchou escada acima, com o queixo erguido.

O salão tinha um cheiro familiar, mas ela ignorou a familiaridade quando se anunciou ao porteiro e foi apontada em direção ao pequeno escritório à direita por onde ela sempre havia passado quando era uma menina. A mulher de cabelos grisalhos atrás da escrivaninha antiquada de secretária estava em algum lugar entre a meia-idade e a terceira idade e provavelmente já estava há muito tempo.

Ela olhou para Naomi por cima dos óculos. — Posso te ajudar?

— Eu sou Naomi Powell. Eu tenho um horário marcado?

— Sim, claro, — a mulher murmurou, virando-se em direção a uma pilha de pastas à sua direita e entregando a de cima para Naomi.

— Sua entrevista está marcada para o meio-dia e meia. Sente-se no escritório à sua esquerda e reserve um momento para revisar seu arquivo. Recebemos pelo correio, por isso está um pouco amassado.

A censura no tom da mulher estava clara, mas Naomi a ignorou. O que ela deveria ter perguntado era por que ela tinha uma pasta em primeiro lugar, enviada pelo correio ou de qualquer outra forma.

Em vez disso, assentiu e pegou o arquivo, indo para o escritório indicado – uma salinha fedendo a mofo com móveis fedendo ainda mais a mofo, e sentou-se em uma cadeira de chita em frente a uma grande mesa de madeira. Ela abriu a pasta.

A respiração dela disparou. Não pelo arquivo em si – ele era comum –, mas pela escrita à mão no arquivo. A caligrafia de sua falecida mãe sempre foi a coisa mais digna nela. Curvas elegantes e envolventes que desmentiam as tatuagens de Danica Fields, o jeito de fumante inveterado e sotaque grosseiro.

— Ah, mãe — sussurrou Naomi baixinho, passando o dedo pelo nome. — O que você fez?

Uma rápida olhada na pilha de papéis confirmou os temores de Naomi: sua mãe havia se candidatado em nome de Naomi para morar aqui, no mesmo prédio que sua mãe chamava principalmente de Boca do Inferno.

Os olhos de Naomi encontraram a assinatura no final da página. Como esperado, era seu próprio nome, mas escrito na letra cursiva precisa de sua mãe. Ela olhou para a data ao lado da assinatura: 21 de março.

Seis meses atrás. E apenas duas semanas antes da morte de sua mãe.

Engolindo o nó na garganta, Naomi fechou a pasta, colocou as mãos no colo e esperou.

E esperou.

Depois de cinco minutos, ela começou a observar o relógio antiquado na parede que tiquetaqueava quase que como a insultando. Depois de dez minutos, ela começou a encarar o relógio.

Quem quer que fosse “entrevistá-la” estava atrasado.

Naomi se levantou, com a intenção de dizer à mulher na recepção que ela não tinha tempo para isso. Caramba, ela nem queria isso em primeiro lugar. Naomi não precisava de um apartamento. Principalmente um que, dada a data no formulário da mãe, tinha uma lista de espera de seis meses.

E mesmo se ela precisasse de um lugar para morar, ela não teria vindo para um local indigesto como este, que provavelmente usava a palavra pedigree no momento de decidir quem aceitar.

Mas também, se Naomi fosse honesta consigo mesma, o que ela desdenhava nessas pessoas era a razão pela qual ela estava aqui em primeiro lugar. Ela tinha uma curiosidade quase mórbida para ver se eles aceitariam sua ficha.

Porque embora seu pedigree fosse mais vira-lata do que de raça, ela era uma vira-lata com colar de diamante. Nos oito anos desde o seu lançamento, a Maxcessory passou de um pequeno trabalho de uma mulher em seu estúdio no East Village para um negócio próspero com financiamentos de sete dígitos, centenas de funcionários e escritórios em Nova York e San Francisco e em breve em Los Angeles.

Se o conselho quisesse rejeitar sua inscrição, ela os obrigaria a fazer isso na cara dela, os faria dizer em voz alta que seu sangue não era azul o suficiente. Porque Deus sabia que o dinheiro dela certamente era verde o suficiente.

Mas antes que pudesse dizer à recepcionista onde enfiar, ela ouviu vozes. A primeira pertencia à recepcionista Victoria, mas a segunda era um estrondo rouco de um homem. Seu entrevistador, talvez?

Quem quer que fosse, ele aparentemente não sabia – ou não se importava – que a porta estava entreaberta e ela podia ouvir cada palavra da conversa.

— Encontre outra pessoa para fazer isso, — o homem exigiu. — O processo que o conselho impõe é arcaico.

Naomi ergueu as sobrancelhas. Ela não discordou, mas dificilmente era a atitude que ela esperava.

— Não seja infantil, — a mulher disse em um tom mandão. — Vá lá e entreviste a garota.

— Peça a Doreen para fazer isso. Ela adora essas coisas.

— Ela está em Miami com seu último brinquedinho. O italiano.

Os olhos de Naomi se ergueram. Mandou bem, Doreen.

Houve um xingamento suave. — E quanto a Janet? Ou Ned? Ambos gostam de perguntar aos candidatos quem é seu 'povo'.

— Eles já fizeram mais entrevistas do que o suficiente. Tínhamos centenas de candidatos e mais de cinquenta passaram na triagem inicial. Todo mundo tem que se revezar nas entrevistas, e eles me disseram para lhe dar esta.

— Por quê? — o homem grunhiu.

— Não faço a menor ideia, mas a pobrezinha está aí há quase vinte minutos. Aqui está o arquivo dela. Apenas finja que a considera, e então todos podemos continuar com o nosso dia.

Os olhos de Naomi se estreitaram. Fingir considerá-la? Como ela já estava fora da corrida?

Porque você é um lixo. E eles podem sentir isso.

Naomi fechou os olhos contra a voz. Ela pensou que havia sufocado aquela parte de seu subconsciente anos atrás, mas algo sobre este maldito prédio...

Naomi teve apenas uma fração de segundo para virar a cabeça e fingir ignorância antes que a porta fosse aberta. Ela esperou com as mãos cruzadas quando o homem entrou, batendo a porta novamente com força suficiente para deixar claro que ele não queria estar aqui.

Naomi cruzou as pernas, olhando recatadamente para a frente enquanto o homem caminhava até o outro lado da mesa. Ela viu quando ele deixou cair uma pasta ao lado dos seus pés e jogou a pasta sobre a mesa antes de se sentar na cadeira de couro em frente a ela.

Ele abriu a pasta impacientemente, examinando até que aparentemente encontrou o nome dela, porque disse isso em voz alta com irritabilidade áspera. — Naomi Powell.

Naomi inalou levemente e forçou sua expressão no que ela esperava ser uma polidez plácida e ergueu os olhos para ele.

Sua respiração falhou novamente quando seu olhar colidiu com um outro ardente.

Não que o homem fosse bonito, embora fosse – a ponto de distrair qualquer um. Cabelo castanho espesso, um rosto sem nenhum indício de barba para melhor mostrar o contorno masculino de sua mandíbula, ombros largos...

E olhos azuis claros que ela conheceria em qualquer lugar.

Principalmente em seus pesadelos.

E memórias.

Naomi pensou que ela viria hoje preparada para qualquer coisa. Qualquer um.

Mas ela nunca se permitiu considerar a possibilidade de que sua entrevista seria com Oliver Cunningham. Ela nunca tinha imaginado que o garoto que a atormentou impiedosamente durante sua infância, mais uma vez teria seu destino nas mãos.


Capítulo Quatro


QUARTA-FEIRA, 26 DE SETEMBRO


Oliver olhou com perplexidade e irritação para a ruiva que atualmente o encarava ferozmente do outro lado da mesa como se ela estivesse tentando esmagar sua traqueia ao estilo Darth Vader.

Naomi... qual era o sobrenome dela mesmo? Ele olhou mais uma vez para o arquivo. Powell. Primeira impressão? Um pouco assustadora. Bem não. Essa foi a segunda impressão. Sua primeira impressão da mulher foi gostosa. Muito, muito gostosa.

Independentemente disso, Naomi Powell não era o que ele esperava quando Vicky o forçou a conduzir esta entrevista de merda. Para começar, o cabelo estava todo errado. Ele estava preparado para grisalho, não vermelho vibrante. O resto dela era vibrante também. As pessoas neste prédio não eram exatamente propensas a explosões de sentimento, mas ela parecia tremer de emoção.

Na maior parte do tempo, Oliver Cunningham não se importava de morar no número 517 da Park Avenue. Claro, a maioria das pessoas agia como se sua colher de prata tivesse sido enfiada onde o sol nunca brilhava. E sim, ele era o residente mais jovem por uns bons trinta anos.

Mas havia vantagens. O conselho concordou em deixá-lo derrubar a parede entre a cozinha e a sala de estar para criar uma casa de conceito aberto, coisa rara na Park Avenue. A mudança abriu espaço para sua cozinha de primeira linha e uma televisão de tela plana de 70 polegadas. E embora ele particularmente não usasse o “direito de se gabar” por morar no mesmo prédio em que cresceu, ele gostava de poder cuidar de seu pai enquanto ainda mantinha sua própria vida. Mais ou menos.

Em outras palavras, seu local de residência era tolerável. A maior parte do tempo.

Mas então, havia momentos como este. Momentos em que uma rara vaga aparecia e todo o maldito prédio ficava mais ridículo do que uma irmandade durante o início do semestre. Na opinião de Oliver, o processo de entrevistas do conselho não era nada além de uma oportunidade para os octogenários do Upper East Side afirmarem sua linhagem perfeita, deliciando-se em fazer aqueles que não tinham alguma conexão obscura com um Vanderbilt ou Rockefeller se sentirem inferiores.

Oliver tentava não se envolver nisso, mas ele cedeu pelo bem de Vicky. Não era culpa da recepcionista de longa data que, com a morte da mãe de Oliver e seu pai fora de serviço, as obrigações dos Cunningham perante o conselho recaiam sobre ele. Gostando ou não, ele tinha que fazer. E para ser claro, ele não gostava. Mas já que seria a cabeça de Vicky na forca se Oliver não obedecesse às ordens e conduzisse a maldita entrevista, aqui estava ele.

Ainda assim, Oliver não estava esperando por ela.

Além do cabelo ruivo e da estranha antipatia emanando dela em ondas, seu rosto era... cativante. Ela era atraente daquele jeito intrigante se você prestasse atenção. Seus olhos eram grandes e azuis e inclinados nos cantos, seus lábios fartos e exuberantes e um pouco mal-humorados no momento. Muitas sardas que, pelo que ele podia ver, ela não fazia nenhum esforço para cobrir com maquiagem pesada. Diferente dos traços perfeitamente simétricos e maquiados que ele costumava ver.

Ainda assim, nada disso explicava o olhar mortal que Naomi estava dando a ele. De modo geral, Oliver não costumava provocar fortes reações emocionais nas mulheres. Em geral, ele recebia muitos suspiros exasperados antes de longas e calmas dissertações sobre sua incapacidade de demonstrar emoções, seguidas por uma separação insípida.

Não havia nada de insípido nesta mulher.

O instinto assumiu o controle, e anos seguindo as regras sociais formais exigiram que Oliver estendesse a mão sobre a mesa. — Sra. Powell. Sou Oliver Cunningham.

A hesitação dela era clara e, por um momento desconcertante, ele pensou que ela iria realmente recusar seu aperto de mão.

Eventualmente, ela colocou a palma da mão na dele, e embora o aperto firme fosse rotineiro, sua reação foi tudo menos comum. Seu estômago apertou quando a palma da mão dela roçou a dele, e Oliver cerrou os dentes.

Bom Deus, fazia tanto tempo assim desde que ele esteve com uma mulher que apertos de mão estavam o deixando excitado?

Ele recolheu a mão e pigarreou.

— Tudo bem, Sra. Powell —, disse ele, sua voz apenas um pouco fria para conter o calor dentro dele. — Presumo que, se você chegou até aqui, suas verificações de crédito e antecedentes serão aprovadas, então vamos direto ao assunto. Por que você quer morar aqui?

Ele a ouviu inalar como se estivesse tentando controlar seu temperamento, embora o que ele tinha feito para irritá-la, ele não tinha a menor ideia.

— É um edifício adorável. A arquitetura pré-guerra é requintada —, respondeu ela.

Seu estômago se apertou ainda mais. Aquela voz. Baixa, rouca e sedutora como o inferno.

Controle-se, Cunningham.

Ele se forçou a se concentrar em suas palavras, que eram tão maçantes quanto a voz era convincente. Arquitetura pré-guerra?

Ele sabia que muitas pessoas se importavam com essa merda, mas ele não era um deles. E por alguma razão, ele não pensou que ela seria também. Droga. Decepcionante.

Oliver se recostou na cadeira, pegando a pasta e batendo na palma da mão enquanto pensava no melhor método para mandá-la porta afora o mais rápido possível. Mais tarde, um filé de costela maturado a seco, um coquetel gelado e o jogo dos Yankees o aguardavam. Sem mencionar o quebra-cabeça de duas mil peças que ele estava morrendo de vontade de montar. Não que ele fosse mencionar isso no escritório, ou, bem, nunca. Como sua ex-noiva havia apontado, havia algo um pouco estranho em um homem adulto que gostava de quebra-cabeças.

Oliver discordou. Não era como se ele emoldurasse os quebra-cabeças finalizados para algum tipo de exibição estranha. Ele apenas gostava de resolver as coisas. Quebra-cabeças. Sudoku. Palavras cruzadas... Pessoas.

— Onde você mora agora? — Oliver perguntou, percebendo que o silêncio tinha se estendido por muito tempo.

— Tenho certeza que consta no meu arquivo, — ela disse com um sorriso duro.

Oliver não disse nada, e eles tiveram uma competição de olhares – encaradas? – que foi tão estimulante quanto infantil.

Ele venceu, apenas porque os olhos dela reviraram rapidamente em irritação. — Lower East Side.

Oliver concordou. Ele não passava muito tempo no Lower East Side desde os tempos de faculdade, mas o bairro lhe agradava. Vibrante, jovem e apenas um pouco corajoso.

Também era um longo caminho até o Upper East Side, na vibe, se não na distância.

Oliver ergueu as sobrancelhas deliberadamente provocando e disse isso. — Viagem longa.

— Sim, a viagem de táxi de três quilômetros é absolutamente exaustiva.

A pasta fez uma breve pausa ao bater na palma da mão. Estranho. Algo sobre sua expressão e aquele sarcasmo seco era... familiar. Ele escaneou sua memória, mas não conseguiu. Ele não conhecia muitas ruivas. Ele teria se lembrado dela.

— Três quilômetros é muito em Manhattan —, disse ele.

— Verdade, — ela disse com outro daqueles “sorrisos” que não eram nem remotamente amigáveis. — Três quilômetros nesta cidade podem significar a diferença entre pessoas reais e falsas.

A mandíbula de Oliver apertou. Ele não perdia a paciência com frequência, mas essa mulher o estava levando ao seu limite.

— Tudo bem, eu desisto, Sra. Powell. Qual é o seu problema?

— Meu problema?

— Você está mirando em minha jugular desde que entrei pela porta.

Ele esperou que ela negasse. Em vez disso, ela inspecionou sua manicure. Um azul marinho profundo, ele notou, e não o recatado rosa pálido ou vermelho clássico que ele estava acostumado a ver. E, ainda assim, todo o resto, o vestido de aparência cara, a bolsa de marca, o penteado elegante, era como o esperado, assim como todas as outras mulheres que ele conhecia.

Mas havia algo mais ali, algo mais interessante que ele não conseguia identificar. Quase como se ela fosse uma mistura de autoconfiança e vulnerabilidade, tudo em um pacote agressivo e atraente.

Ela era uma contradição.

Talvez Oliver não precisasse começar aquele quebra-cabeça hoje à noite, afinal. Ele tinha um grande quebra-cabeça bem na sua frente.

— Você sabe que sou eu que decide quem vai para a próxima rodada, — ele cutucou novamente.

Ela esticou o pescoço, fingindo olhar para as mãos dele. — Oh, há um anel que eu deva beijar? Sou nova em todo esse processo. Devo me curvar?

Lá estava novamente. O lampejo de familiaridade. Quem era esta mulher?

— A gente se conhece? — ele perguntou, jogando a pasta sobre a mesa enquanto a estudava.

Ela desviou o olhar e os olhos de Oliver se estreitaram. — Nos conhecemos. Como eu te conheço?

Naomi olhou para trás, seus olhos cautelosos. — Você não conhece.

— Tem certeza?

Em vez de responder, ela o recompensou com seu primeiro sorriso genuíno. E caramba, que sorriso. Sedutor e letal ao mesmo tempo.

Ele ainda estava se recuperando do impacto quando ela o assustou ao se levantar.

— Nós não terminamos, — ele disse, então escondeu um estremecimento com o quão pomposo ele soou. Ele parecia muito com o pai.

— Oh, eu acho que terminamos, — ela murmurou. — Acho que ambos sabemos exatamente o que você vai escrever na minha ficha de inscrição assim que eu sair.

— Sim, nós sabemos —, ele retrucou, levantando-se também. — Abandonou a entrevista.

Ela olhou para ele, e Oliver ficou um pouco surpreso ao perceber que os dois estavam respirando com dificuldade.

Naomi Powell não era particularmente baixa, mas com um metro e oitenta, ele tinha a vantagem física. Pela primeira vez desde que atingiu seu pico de crescimento no colégio, ele apreciou sua altura. Essa mulher teimosa o irritava como ninguém fazia há muito tempo, e ele precisava de todas as defesas que pudesse obter.

Assim que ele começou a se preparar para a réplica dela – já imaginando com antecedência – ela se virou.

Oliver a chamou. — Você entende que não vou recomendá-la para a próxima rodada de entrevistas, certo?

— Sem problemas, Sr. Cunningham. E veja pelo lado bom. Com a minha partida, haverá mais espaço para o seu complexo de imperador aqui. Vou mandar sua secretária entrar. Você parece estar um pouco atrasado para o seu lanche.

Naomi saiu pela porta do escritório sem sequer olhar para trás.

Oliver ficou olhando para a porta, sentindo-se algo entre estupefato e surpreso. E o mais irritante de tudo...

Intrigado.

Quem diabos era essa mulher?


Capítulo Cinco


SEXTA-FEIRA, 28 DE SETEMBRO


Naomi pegou seu grampeador, um sofisticado com estampa de tartaruga da Kate Spade, com a intenção de colocá-lo em uma caixa de papelão ao lado do aplicador de fita com a mesma estampa. Em vez disso, ela apertou rapidamente, agitada, olhando ao redor para a zona desastrosa que estava seu escritório.

Então era isso que se ganhava ao procrastinar o empacotamento de coisas de quatro anos até a última tarde antes da chegada dos caminhões de mudança. Caos.

Não que Naomi se importasse com a bagunça. Ela fez alguns de seus melhores trabalhos em meio ao caos. Mas ela estava rapidamente lamentando o fato de não ter seguido o conselho de Deena e deixado os carregadores cuidarem do empacotamento. Naomi pretendia usar a mudança de escritório como uma oportunidade para organizar os arquivos por ano, talvez alcançando esse sonho indescritível de organização que sempre foi um pouco fora de alcance.

Em vez disso, ela deixou tudo para o último minuto, terminando mais desorganizada do que nunca.

E se ela fosse perfeitamente honesta consigo mesma, sua procrastinação pode ter tido um componente emocional. Embora estivesse animada como estava com o crescimento de sua empresa, por mais que soubesse que seus funcionários precisavam de mais espaço para fazer seu trabalho melhor, ela sentiria falta desse lugar. Ou pelo menos o que ele representava. A Maxcessory pode ter nascido em seu minúsculo apartamento há anos, mas passou seus primeiros anos aqui.

Agora a empresa estava crescendo. Ainda era seu bebê, mas mais velho agora. Mais madura. Um pouco menos dependente de quem a gerou.

— Não torne isso estranho, Naomi, — ela murmurou para si mesma.

— Como?

Sua cabeça se ergueu e ela piscou surpresa para o homem desconhecido de pé em sua porta. — Perdão?

— Como você estava tornando isso estranho? — o homem perguntou com um sorriso fácil. Um sorriso encantador, e deliberante.

Alerta vermelho.

Naomi conhecia homens assim. Aqueles que sabiam que tinham uma aparência acima da média e usavam a dita aparência para conseguir o que queriam. Naomi não o julgava por isso. Inferno, ela era bastante a favor de usar todas as vantagens possíveis para conseguir o que queria.

Mas ela foi esperta o suficiente para reconhecer uma cantada quando via uma, e sua guarda subiu. Seus olhos percorreram brevemente as paredes de vidro em direção à mesa de Deena, já sabendo que sua assistente não estava lá. De jeito nenhum Deena deixaria alguém chegar ao escritório de Naomi sem hora marcada, não importa o quão grande fosse o sorriso.

E era um sorriso realmente ótimo, Naomi teve que admitir. Um pouco perfeito demais para o seu gosto, mas combinava muito bem com o corte caro de sua camisa social e calça e o gel excessivo em seu cabelo loiro escuro.

— Posso te ajudar? — ela perguntou.

Seu sorriso nunca perdeu seu tom confiante quando ele veio em sua direção, a mão estendida. — Dylan Day. Prazer.

Naomi soltou uma risada assustada ao reconhecer o nome do produtor de TV que a vinha perseguindo há semanas. — Parabéns, Sr. Day. Você atingiu um novo nível de insistência.

— Pensei que talvez todas aquelas mensagens de voz e e-mails pudessem ter se perdido —, disse ele com uma piscadela. — Parece que não estou totalmente errado.

Ele olhou ao redor para a bagunça. — Se mudando?

— Sim.

— Quando?

— Amanhã. É por isso que intencionalmente não tenho nenhuma reunião marcada para hoje — acrescentou ela incisivamente.

— Entendi. E nas últimas semanas em que você esteve se esquivando de mim, você esteve... empacotando? — ele disse, olhando ao redor para as caixas meio cheias, pilhas de plástico bolha e a desordem geral ameaçando explodir para fora de seu escritório.

Não havia dúvida na mente de ninguém de que sua organização havia começado, hm... duas horas atrás.

Mas ela não estava prestes a se explicar a um homem cuja missão atual era transformar sua vida em entretenimento. Ela precisava que ele fosse embora, com o sorriso sexy e tudo.

— Sr. Day. Agradeço o interesse da sua empresa em minha história...

— Então você recebeu minhas mensagens.

— Bem, sim. Você usou todos os métodos, menos pombo-correio.

— Só porque ouvi dizer que eles não tratam bem os pássaros.

Ela sorriu apesar de ter tentado esconder, e ele percebeu. Aumentou sua vantagem. — Deixe-me levá-la para jantar. Me dê uma chance de explicar o que estamos pensando. Por que achamos que o mundo precisa da sua história.

Ela revirou os olhos. — Se as duas dúzias de rosas que você enviou não funcionaram, as frases clichês definitivamente não funcionarão.

— Anotado. — Ele estendeu seu cartão de visita. — Suas condições. Você escolhe a hora, o lugar, eu pago a conta.

Ela disse a si mesma para ignorar o cartão, que aquele homem tinha ‘problema’ escrito no meio da testa, seu interesse por ela sendo claramente pessoal, tanto quanto profissional.

Ela pegou o cartão de qualquer maneira. Desde o confronto desconfortável com seu passado na forma de Oliver Cunningham, Naomi estava ansiosa por uma distração.

Da mesma forma que algumas mulheres recorriam à terapia, à bebida ou aos comprimidos quando a vida ficava desconfortável, Naomi buscava distrações. E não havia nada mais divertido do que um flerte. Ainda melhor se levasse a sexo. Foi por isso que ela se envolveu com Brayden Hayes. Ele tinha sido o antídoto perfeito para a perda de sua mãe. Ou pelo menos ele era antes de ela perceber que seu jeito playboy era na verdade um disfarce para o pior tipo escória da terra.

Ela olhou para Dylan. — Você não é casado, é?

Ele riu. — Objetiva. Eu gostei disso. Não sou.

Ele olhou em volta para a confusão de caixas. — Sabe, trabalhei para uma empresa de mudanças durante o verão nos anos da faculdade.

Naomi ergueu as sobrancelhas. — Isso explica a força muscular.

As sobrancelhas de Dylan se ergueram de volta. — Ora, Sra. Powell. Fico lisonjeado.

— O que? — ela brincou. — Você está me dizendo seriamente que não comprou sua camisa um tamanho menor de propósito?

Houve um pigarro. — Naomi?

Ela olhou para a porta do escritório e seu sorriso congelou.

Normalmente Naomi ficaria emocionada com uma visita surpresa de Claire Hayes e Audrey Tate. Mas se havia alguém que ela não queria que soubesse de sua conexão com essas duas mulheres, era o homem que adoraria nada mais do que expor sua roupa suja.


Capítulo Seis


SEXTA-FEIRA, 28 DE SETEMBRO


Alheio à agitação de Naomi, Dylan sorriu ao ver as duas mulheres paradas na porta do escritório. — Nenhuma reunião marcada, hein? Estou magoado. Entrem, senhoras, eu já estava saindo.

Audrey sorriu. — Não, foi erro nosso. Claire e eu pensamos que seria divertido surpreender...

— Você pensou, — Claire murmurou. — Eu achei que nós devíamos ligar primeiro.

Audrey desdenhou da fala de Claire. — Champagne não precisa de hora marcada. Achamos que um pouco de espumante poderia tornar a mudança um pouco mais fácil.

— E cupcakes, — Claire disse, segurando a caixa. — Eu ia assar muffins, mas Audrey me fez comprar cupcakes.

— Nããão, eu fiz você comprar muffins com glacê — Audrey argumentou.

Dylan olhou para Naomi. — Droga. Champanhe e cupcakes. Duas coisas com as quais nenhum homem jamais será capaz de competir. Eu vou embora, mas vou esperar você me ligar para o encontro.

Naomi viu Claire e Audrey se animarem, e suas amigas olharam Dylan mais de perto. Curiosidade da parte de Audrey, ceticismo da parte de Claire.

Ela deixou escapar um leve suspiro com o uso da palavra encontro por Dylan, mas a etiqueta exigia que ela fizesse uma introdução superficial. — Dylan Day, estas são Audrey Tate e Claire Hayes. Senhoras, Dylan.

— Você é de alguma empresa de acessórios? — Claire perguntou educadamente.

Dylan balançou a cabeça. — Não. Eu sou um produtor de TV, tentando atrair sua garota aqui para me deixar levá-la de subcelebridade para super celebridade.

— Hmm. — Claire não parecia impressionada.

— Como vocês duas conhecem Naomi? — Perguntou Dylan. — Talvez haja espaço para a história de vocês no filme. Um cara pode ter esperança, de qualquer maneira.

— É, não. Claro que não. Minhas amigas estão além dos limites, — Naomi disse antes que Claire ou Audrey pudessem responder. Ela deu um passo à frente e fez um gesto incisivo em direção à porta.

Ele aceitou sua dispensa graciosamente. — Te vejo em nosso encontro.

— Nossa reunião de negócios —, corrigiu Naomi.

— Claro —, disse Dylan, com uma piscadela.

— Senhoras. — Ele acenou em despedida para Audrey e Claire.

Suas amigas conseguiram segurar a língua até que ela fechasse a porta do escritório. Os olhos castanhos de Audrey estavam arregalados de curiosidade, os olhos castanhos de Claire se estreitaram em suspeita.

— Esse era o grande produtor de televisão que você vinha evitando? — Audrey disse.

— Sim. — Naomi prendeu o cabelo em um coque bagunçado. — Achei que ele tivesse desistido, mas ele é mais persistente do que eu esperava.

— Ele estava super sedutor — disse Audrey.

— Ele estava, não é? — Naomi meditou pensativamente, olhando através das paredes de vidro para as costas de Dylan.

— Você não pode estar falando sério — disse Claire.

— Por que não? Ele é bonito — disse Naomi, estendendo a mão e puxando a caixa de cupcakes das mãos de Claire e levando-a para a mesa, onde vasculhou a bagunça e tirou uma pilha de guardanapos.

— O que. Você não achou ele bonito? — Ela fez uma pausa no processo de retirar a embalagem do cupcake.

— Ele é —, disse Audrey hesitante. — Mas... — Ela olhou para Claire em busca de ajuda.

Claire não mediu suas palavras. — Ele é um Brayden.

— Não. — Naomi balançou a cabeça e limpou o glacê do lábio. — Ele não é casado. Eu perguntei.

— Sim, porque caras como eles sempre falam a verdade.

— Caras como o quê? — Naomi perguntou com um leve tom de irritação na voz. — Você o conheceu por sete segundos.

— E você o conheceu por quantos, dez? E você tem um encontro marcado.

Irritada, Naomi olhou para Audrey em busca de uma aliada. — Dylan não parece com Brayden. Parece?

Audrey hesitou.

— É difícil saber. Quero dizer, ele parecia gente boa, mas Brayden também...

— Por que estamos falando sobre isso? — Naomi disse, empurrando o resto do cupcake na boca. — Ele é só um cara.

— Talvez, — Claire disse, seu tom mais gentil do que antes. — Mas não vamos esquecer como nos conhecemos, por que nos tornamos amigas. Eu não seria uma boa amiga se não te dissesse que aquele cara quer te pegar. Eu não teria problemas com isso se ele também não estivesse tentando fazer você assinar um contrato para transformar a história de sua vida em um programa de TV.

— Ela está certa, querida — disse Audrey com um sorriso simpático. — Talvez ele seja mesmo um cara super legal, mas estamos apenas dizendo para você ter cuidado, ok? Certifique-se de que ele não está usando todo aquele charme atraente para conseguir o que quer.

Naomi suspirou. Elas não estavam erradas. Se havia uma linha entre profissional e bajulador, Dylan Day andava por ela.

— Terei cuidado — disse ela obedientemente.

— Bom — disse Audrey concordando com a cabeça. — E agora, devo dizer, Naomi, seu escritório é exatamente como eu imaginei.

— O quê, uma bagunça completa? — Naomi perguntou, em dúvida se comia outro cupcake, mas decidindo não pegar.

— Não, quero dizer, é assim que o escritório de uma empresária da moda em Nova York deveria ser —, proclamou Audrey. — Parece que você pertence aqui.

Naomi supôs que ela soubesse exatamente o que Audrey queria dizer, porque deixando de lado a desordem da mudança, ele era exatamente o que a própria Naomi tinha imaginado que o espaço seria. Tinha pisos de madeira gloriosamente desgastados e paredes externas de tijolos que pareciam já existir há séculos. A única coisa moderna sobre o lugar era o Wi-Fi e as paredes de vidro, que ela escolheu principalmente para garantir que os funcionários que trabalhavam nos cubículos no centro do escritório ainda pudessem desfrutar da mesma luz natural que os escritórios de canto.

— Vocês duas também se encaixam perfeitamente — disse Naomi.

— Ela sim, — Claire disse, acenando para Audrey em um suéter verde-floresta de gola alta, largo cinto preto e botas acima do joelho.

— E você também, — Naomi insistiu. O guarda-roupa de Claire era mais clássico do que moderno, mas a mulher conhecia as regras básicas de estilo e, ainda mais importante para o olhar crítico de Naomi, conhecia bem seus acessórios.

Naomi acreditava piamente que o único crime pior do que nenhum acessório era usar acessórios demais, e o colar de ouro de Claire com um minúsculo pingente de diamante e brincos combinando eram as escolhas perfeitas para sua roupa. Qualquer coisa a mais teria sobrecarregado a blusa de seda branca e as calças cinza.

— Então, eu pretendia chegar aqui dizendo que eu esqueci de colocar brincos, esta manhã —, disse Audrey, mexendo descaradamente em algumas amostras sobre a mesa — mas eu posso ter, tipo, esquecido de propósito que por um acaso, sua seleção era melhor do que a minha, o que é verdade.

— Aproveite —, disse Naomi, apontando com a mão. — Essas são amostras grátis. Eu realmente não tive a chance de vê-las ainda, então eu adoraria sua opinião.

— Oooh, ouro rosa, — Audrey disse com um aplauso animado. — Está tão na moda.

Enquanto Audrey mexia nos brincos, Naomi voltou sua atenção para Claire, estudando a mulher de um jeito cuidadoso. Ela conhecia a mulher há apenas dois meses, mas fiel à sua premonição no parque naquele dia, a amizade delas estava crescendo rápido. Elas já tiveram incontáveis lanchinhos, festas e o mais revelador de tudo, aqueles tipos de mensagens profundas tarde da noite, que faziam você se sentir como se conhecesse a outra pessoa.

Talvez fossem essas mensagens, talvez fosse a história compartilhada com Brayden, ou talvez a amizade delas fosse apenas uma daquelas amizades que deveria ser. Seja qual fosse o motivo, Naomi sabia que conhecia bem Claire e Audrey, apesar de sua pouca convivência, e ela sabia que nenhuma das mulheres estava indo tão bem quanto elas queriam que as pessoas pensassem que estavam.

Claire ainda tinha as mesmas sombras sob os olhos que ela tinha no dia do funeral, embora ela possuísse uma habilidade decente com corretivo e escondesse o pior de um observador casual.

— Então, quando você tem que terminar de encaixotar? — Claire perguntou, olhando para a bagunça como se estivesse se coçando para ajudar.

— Ah, não —, disse Naomi, abrindo a rolha. —Você não é uma daquelas aberrações organizadas que realmente gosta de limpar, é?

—Limpar? Não. Eu abriria mão de esfregar os banheiros qualquer dia, mas arrumar... Eu gosto de organizar as coisas. — Ela esfregou as mãos.

— Isso é perturbador —, disse Audrey, voltando para Naomi e segurando dois pares de brincos, um com cacho de pérolas falsas cinza, o outro um pingente de flor rose gold. — Qual?

— Pérolas — disse Naomi automaticamente, vasculhando uma caixa onde tinha quase certeza de que havia alguns copos de plástico.

— Você nem olhou.

— Eu vi no segundo em que você os pegou. — Naomi encontrou as xícaras e se virou para Audrey. — Você tem olhos grandes, mas o resto de seus traços são pequenos. Os brincos compridos vão deixar sua aparência carregada.

Audrey olhou para os brincos, então deu de ombros e começou a colocar as pérolas.

— E quanto a Claire? — Audrey disse. — Ela também precisa de algo novo e bonito.

Naomi olhou para Claire enquanto servia o champanhe. — Fique à vontade. Eu tenho algumas bolsas e lenços novos por aqui, se jóias não forem a sua praia.

— Não, eu estou bem, — Claire disse, distraidamente brincando com seu relógio. O relógio Cartier que Brayden havia lhe dado. O mesmo que ele deu a Naomi e Audrey. Na opinião de Naomi, esse tinha sido o pior crime de Brayden Hayes: pensar que o mesmo relógio poderia ser a escolha certa para três mulheres muito diferentes.

Claire pareceu perceber o que ela estava fazendo e olhou para a pulseira de ouro e congelou.

Naomi e Audrey trocaram um olhar.

— Você ainda está usando? — Naomi perguntou, tentando manter a incredulidade fora de sua voz. Ela destruiu o dela. Desperdício? Sim. Mas necessário.

Claire ainda estava olhando para o relógio, brincando com o fecho mais uma vez. — Eu sei. Eu sei. É só que... — Ela ergueu os olhos. — Ele era meu marido. E ele se foi. E...

Ela pressionou as mãos nos lábios e não terminou a frase.

Naomi vasculhou seu cérebro procurando a coisa certa a dizer e não encontrou nada. Ela era boa em muitas coisas. Palavras reconfortantes e tranquilizadoras não estavam entre elas.

Felizmente, Audrey era melhor nisso. Ela pegou as mãos de Claire nas dela. — O que podemos fazer?

Claire suspirou, então olhou para cima. — Sirva-me um pouco desse champanhe?

Naomi sorriu, aliviada por ser útil. — É pra já.

Ela serviu três copos, depois um quarto para Deena, que havia reaparecido em sua mesa e brigava ao telefone. Naomi levou um copo para a mesa da recepção principal e entregou-a à sua assistente, que lhe deu um sorriso agradecido enquanto ela discutia com quem Naomi presumiu que fosse a empresa responsável pela mudança pelo telefone.

Naomi voltou para seu escritório e percebeu que embora Claire estivesse sorrindo com o que quer que Audrey estivesse dizendo, sua mão tremia um pouco enquanto ela levava o champanhe aos lábios.

O brilho do ouro no pulso esquerdo de Claire chamou a atenção de Naomi novamente.

Esse maldito relógio.

A inspiração a atingiu. Naomi foi até os armários que se alinhavam em uma das paredes de seu escritório. Ela mandou construir eles no mesmo ano em que se mudou para esse prédio e percebeu que as unidades de armazenamento convencionais não eram adequadas para empresas de acessórios. Os acessórios, por natureza, eram pequenos, e Naomi precisava de dezenas de espaços minúsculos para armazenar os produtos, não poucos espaços grandes. Como resultado, a parede estava quase coberta por gavetas pequenininhas, cada uma etiquetada com um número que correspondia a uma planilha que catalogava o vendedor, o item e se Naomi queria ou não encomendá-lo para as caixas de acessórios mensais.

Depois de alguns palpites errados, ela encontrou a gaveta que procurava. Ela puxou a bolsa de veludo rosa com o monograma dourado. Ela tinha conseguido a amostra no ano passado e adorou tudo sobre a empresa, a embalagem, o objetivo de projetar relógios com silhuetas clássicas e um toque moderno.

Naomi não tinha feito nenhum pedido deles – ainda. O preço era um pouco alto demais. Mas o produto ficou gravado em sua memória entre centenas, senão milhares, de peças, e ela as manteve em seu radar.

Ela entregou a bolsa para uma Claire aparentemente confusa.

— Abra, — ela pediu.

Claire puxou a fita e deslizou o relógio na palma da mão.

— Oooh —, Audrey respirou.

Naomi sorriu para Audrey. — Você realmente ama ouro rosa, hein?

— Brilhante e rosa? — Audrey disse reverentemente. — Alguém me segura. Mas isso... esse é a cara de Claire.

— Oh, eu não sei, — Claire disse. — É muito... jovem para mim?

Naomi revirou os olhos. — Eu diria que ainda temos alguns anos antes de precisarmos começar a decorar seu andador com strass. Mas se você não gostou...

— Não, é lindo — Claire disse rapidamente, segurando o relógio para olhar mais de perto.

Ele era bonito. Os elos finos ouro rosa da banda eram apenas a quantidade certa de brilho, sem serem exagerados.

— O mostrador do relógio ligeiramente maior está na moda agora —, explicou Naomi. — Antes as mulheres pensavam que quanto menor melhor, já que, você sabe, devemos ser delicadas e tudo mais. Mas, na verdade, acho que o tamanho um pouco maior acentua os pulsos menores das mulheres.

Mas a pulseira e o tamanho do mostrador do relógio não eram os destaques. A minúscula taça de champanhe na posição das cinco horas era.

— O champanhe realmente deveria estar na posição das doze —, disse Audrey, inclinando a cabeça para apontar. — É a minha hora apropriada para champanhe.

— Um brinde a isso, — Naomi disse antes de voltar sua atenção para Claire. — O que você acha?

Claire respirou fundo e abriu o fecho de seu relógio atual. — Acho que não quero ver este relógio de Brayden por um tempo.

Naomi deliberadamente não olhou para o acessório ao jogá-lo na mesa. O relógio merecia um tratamento melhor. Mas um presente de Brayden Hayes não. Ela notou que os olhos de Claire rastrearam o relógio descartado, e percebeu que a outra mulher ainda não estava pronta para se despedir completamente. Mas ela colocou o novo relógio. Progresso.

— Oh, Claire, — Audrey anunciou, olhando para o pulso de Claire. — É perfeito.

— Não está ajustado com a hora certa, — Claire apontou.

— O que importa não é a hora certa —, insistiu Naomi. — Mas sim o momento.

Audrey concordou com a cabeça. — Absolutamente. Isso marca a fase dois de nosso recomeço.

— Qual foi a fase um? — Claire perguntou com um sorriso.

— Nós descobrindo se poderíamos ser amigas, — Audrey disse como se isso fosse óbvio.

Ela tinha razão. Depois daquele dia no Central Park com essas senhoras, Naomi se perguntou se talvez fosse uma coincidência. Uma pequena bolha estranha de realidade alimentada por luto e raiva e a necessidade de vencer o homem que as venceu.

Não, não venceu. Enganou.

Mas nos últimos meses, Naomi percebeu que por mais diferentes que as três fossem, elas tinham algo em comum além de terem transado com Brayden. Elas eram fortes. Resilientes. Mais importante de tudo, elas gostavam uma da outra. Naomi nunca teve muito tempo para amigas. Claro, ela considerava Deena uma amiga. Ela era próxima de um grupo de sua equipe sênior. Mas, para Naomi, o trabalho sempre vinha em primeiro lugar. Acima do romance e acima da amizade. Mas essas mulheres deram esperança a ela... deram a ela a sensação de que talvez ela pudesse ser algo mais do que uma garota bem sucedida e mandona.

— Então, qual a fase dois? — Claire perguntou, ainda parecendo um pouco cética.

— Seguir em frente. Naomi foi a primeira. Seu escritório está mudando de lugar. Ela está mudando de apartamento. Ela tem um encontro...

— Reunião de negócios, — Naomi corrigiu exasperada.

— Tanto faz. Você está indo em frente.

Estou?

Os pensamentos de Naomi voltaram para o número 517 da Park Avenue, para os olhos azuis glaciais de Oliver Cunningham. Para pessoas que não se importavam com quanto dinheiro você tinha, mas com a idade dele. Pessoas que, mesmo agora, estavam fazendo-a se sentir inferior. Menos.

E então, como se o destino estivesse olhando para ela e lendo seus próprios pensamentos, Deena bateu na porta e colocou a cabeça para dentro. — Desculpe interromper. A Sra. Gromwell daquele prédio da Park Avenue está na linha um. Diz que é um assunto urgente. Palavras dela.

Hã. Bem, pelo menos eles queriam dar a ela a notícia por telefone, em vez de rejeitá-la por e-mail. Era mais do que ela esperava.

— Dê-me um segundo —, disse ela a suas amigas, inclinando-se sobre a mesa e pegando o telefone. — Naomi Powell.

— Sra. Powell? Aqui é Victoria Gromwell, do 517 da Park Avenue. Estou ligando para verificar sua disponibilidade na próxima semana. Sabemos que é de última hora, mas o conselho espera tomar uma decisão no fim de semana seguinte.

Naomi demorou um pouco para registrar as palavras da mulher e, quando o fez, sua resposta não foi exatamente eloquente. — O que?

Houve um longo momento de silêncio, e Naomi ouviu em alto e bom som como desaprovação, mas ela não se importou.

— Você foi aprovada para a segunda rodada de entrevistas —, disse Gromwell rigidamente, como se ela mesma não conseguisse imaginar por quê. — Existem apenas três candidatos restantes para o apartamento, e você está entre eles.

— Ah bem... — Naomi tentou resolver isso em sua cabeça, mas não fazia sentido. A única pessoa a entrevistá-la na primeira rodada foi Oliver Cunningham, e não havia nenhuma maneira de ele a colocar na rodada final, exceto... que aparentemente, ele a colocou.

Naomi abriu a boca para explicar o mal-entendido, que ela já tinha um lugar para morar.

Mas as palavras de Audrey voltaram à sua mente.

Você está indo em frente.

Ela estava tentando. Ela queria. Mas se sua reação a Oliver Cunningham essa semana a ensinou alguma coisa, foi que talvez ninguém pudesse seguir em frente até que enfrentasse o passado.

Para o bem de sua mãe. E dela própria.

— Estou livre em qualquer horário da semana que vem —, disse Naomi sem se preocupar em verificar o calendário. Quaisquer reuniões que ela tivesse poderiam ser remarcadas.

Porque Naomi estava prestes a alcançar algo que sua mãe havia desejado por toda a vida:

Um pedido de desculpas de Walter Cunningham – o pai mulherengo e sem coração de Oliver que fazia até Brayden Hayes parecer um dos bons.


Capítulo Sete


QUARTA-FEIRA, 3 DE OUTUBRO


Oliver abriu a porta do apartamento de seu pai e imediatamente se abaixou quando um ovo voou por cima de sua cabeça e caiu no corredor.

Ele estremeceu e olhou para Janice Reid, a cuidadora de seu pai. Janice lhe deu um sorriso tranquilizador. — Cozido.

— Ah. — Oliver imaginou que fosse. Seu pai estava animado com os pedidos de ovos cozidos recentemente. Isso, e salsão e manteiga de amendoim. Era como se o Walter de 61 anos estivesse canalizando seu eu da educação infantil.

Oliver supôs que isso fazia sentido. A natureza do Alzheimer significava que as memórias de seu pai estavam bagunçadas, às vezes na década certa, às vezes não. Por que não voltar à infância? Só Deus sabia como Oliver gostaria de poder fazer isso hoje em dia.

Oliver pegou o ovo do corredor. A casca tinha partido, mas felizmente, por ter pousado no carpete vermelho, não fez uma bagunça. Ele entrou no apartamento, colocou sua pasta ao lado da porta e jogou o ovo na lata de lixo. Oliver olhou para a mesa onde Janice estava sentada com seu pai, arrancando um ovo de sua mão antes que também fosse jogado contra a porta.

— Walter —, disse ela com uma voz calma e objetiva. — Você disse que queria ovos cozidos. Você mudou de ideia?

Walter sentou-se na cadeira e cruzou os braços, parecendo ter seis anos em vez de seis décadas.

Desde os primeiros dias do diagnóstico de Walter, os médicos advertiram Oliver que a doença afetava a todos de maneira diferente e que mudanças dramáticas de humor não eram incomuns. Oliver achou que estava preparado. Experimentar essas mudanças, no entanto, acabou sendo muito diferente de ouvir sobre elas.

O pai de Oliver estava sob as garras do Alzheimer há quase três anos, e Oliver ainda lutava para reconhecer o homem velho, muitas vezes ranzinza e com tendência ao acesso de raiva, em vez do exemplo forte e rígido durante sua juventude.

— Walter — Janice perguntou de novo, sua voz paciente. — Você pode, por favor, comer uma mordida do ovo que você pediu?

Walter estendeu a mão e pegou um ovo já descascado e comeu metade com uma única mordida. — Eu gosto de descascar sozinho.

— Você me pediu para descascar este para você, mas com certeza deixarei para você descascar na próxima vez.

Ela não acrescentou: Você não se lembra? Janice e Oliver sabiam que Walter não se lembrava.

Walter olhou por cima, finalmente parecendo registrar a presença de Oliver. — Filho.

— Oi, pai, — Oliver disse, satisfeito porque apesar do ataque de ovo, era um daqueles momentos cada vez mais raros em que seu pai o reconhecia. — Como tá indo?

— Ela descascou meu ovo —, disse Walter, apontando acusadoramente para Janice.

— Eu vi. Legal da parte dela, não foi? — Oliver afrouxou a gravata e tirou o paletó. — Você está pronto para assistir o jogo dos Yankees comigo?

Não muito tempo atrás, eles teriam adicionado um quebra-cabeça à rotina noturna, talvez feito palavras cruzadas juntos. Nos estágios iniciais, os médicos encorajavam qualquer coisa para manter seu cérebro focado na tarefa em mãos, mas, à medida que a doença progredia, os quebra-cabeças foram esquecidos. As peças do quebra-cabeça inevitavelmente eram jogadas no chão em um acesso de irritação, as palavras cruzadas eram coisa do passado.

Walter já estava arrastando sua cadeira para trás. — É melhor eles fazerem melhor do que ontem à noite. Jeter está em crise.

Oliver acenou com a cabeça agradavelmente, apesar do fato de que Derek Jeter não jogava há várias temporadas, muito menos noite passada. Se Oliver tinha aprendido alguma coisa nos últimos dois anos, era a escolher suas batalhas, e que corrigir o pai era inútil e frustrante para todos.

— Dia difícil? — Oliver perguntou a Janice baixinho depois que seu pai se aproximou da TV e se acomodou em sua poltrona. Era o tipo de poltrona reclinável de couro que a mãe de Oliver nunca teria permitido em sua casa perfeitamente decorada. Mas Margaret Cunningham faleceu há quatro anos. Bem a tempo de perder a demência tomar conta do seu marido e a adição da temida poltrona reclinável.

— Não tão ruim — disse Janice, tirando o prato de Walter e levando-o para a pia. — Jogar o ovo foi o primeiro momento ruim. Demos uma boa caminhada. Ele tem gostado de cachorros ultimamente, então passamos mais de uma hora no parque de cachorros, apenas assistindo.

Oliver sorriu com a ironia. Enquanto crescia, tudo que Oliver queria era um cachorro. Mas apesar do fato de ele ter pedido por quatro Natais consecutivos e todos os aniversários durante o mesmo período, sua mãe literalmente estremeceu e ignorou o pedido completamente. Seu pai declarou impacientemente que os cães eram “uma perda de tempo valioso”. Até hoje, Oliver nunca teve um cachorro.

Ocorreu-lhe que, como um jovem independente de trinta anos com seu próprio apartamento e livre arbítrio, ele certamente poderia ter um agora, mas cuidar de seu pai era praticamente tudo que ele conseguia no momento. Deus abençoe Janice. Oliver não sabia o que faria sem a cuidadora confiável em tempo integral.

Bem, não. Isso não era verdade. Ele sabia... ele teria que colocar seu pai em uma casa de repouso.

E, eventualmente, provavelmente chegaria a esse ponto. Até agora, seu pai não tinha estado sujeito às explosões violentas frequentemente associadas à sua doença – um desenvolvimento particularmente alarmante para pacientes do sexo masculino com Alzheimer, uma vez que tendiam a ser maiores e mais fortes do que suas cuidadoras mulheres.

Janice tinha conseguido lidar facilmente com o pior dos acessos de raiva de Walter, mas se eles progredissem além de jogar ovos cozidos, Oliver sabia que mesmo a robusta Janice não seria páreo para o Walter de um metro e oitenta.

Por enquanto, porém, seu sistema funcionava. Janet morava no segundo quarto do apartamento de seu pai, e Oliver pagava muito bem para ela cozinhar, limpar e ficar de olho em Walter.

Ela tinha folga dois dias por semana, durante os quais Oliver assumia o controle de seu pai e, sempre que possível, Oliver ia lá depois do trabalho para dar a Janice algum tempo para si.

— Eu pretendia ir para a casa da minha irmã por uma hora ou algo assim —, disse Janice enquanto lavava o prato de Walter. — Você quer que eu espere até você ter a chance de jantar?

— Nah, vou pedir uma pizza ou algo assim. Quem sabe, talvez isso reviva a fase de pepperoni do mês passado.

Ela sorriu. — Eu juro, em todas as vezes, era como se ele nunca tivesse comido um pedaço de pizza antes. Sua felicidade era uma alegria de assistir.

Oliver sorriu com a memória recente, embora tenha optado por não mencionar que pizza não era exatamente uma ocorrência comum na casa dos Cunningham enquanto Margaret estava viva. Sua mãe acreditava piamente nos méritos de uma refeição caseira e balanceada. Contudo, Oliver secretamente pensava que por equilibrada sua mãe na verdade queria dizer insossa.

Poucos minutos depois, Janice saiu e Oliver tinha acabado de fazer o pedido de pizza e se acomodado no sofá para assistir ao jogo com seu pai quando alguém bateu na porta.

Walter nem desviou o olhar da tela.

Com um olhar atento para ter certeza de que seu pai não estava à beira de uma birra ou ataque destrutivo, Oliver reconheceu que Walter estava completamente perdido em sua cabeça e parecia perfeitamente contente em ficar em sua cadeira.

Oliver se levantou e abriu a porta para Ruth Butler, sua vizinha de longa data e ex-melhor amiga de sua mãe.

— Oi, — ele disse, sorrindo para a mulher pequena enquanto se curvava para beijar sua bochecha. — Quer entrar?

— Oh, não, querido. Você sabe que eu não me importo com atletismo televisionado, — Ruth disse, cruzando as mãos na frente dela enquanto olhava para a TV. — Como está Walter esta noite?

Oliver encolheu os ombros. — Está sendo uma boa noite, considerando todas as coisas.

— Passei mais cedo com alguns muffins, mas ele e Janice deviam ter saído. Vou trazê-los mais tarde, agora que sei que você está aqui. Eu não queria deixa-los na porta. Você sabe como Chantzy fica.

— Eu sei. — Chantzy era o cachorrinhoi idoso que morava no apartamento ao lado e uma vez devorou um prato de biscoitos que Ruth deixou no chão do lado de fora da porta dos Cunninghams.

— Agora, Oliver, — Ruth disse, usando o mesmo tom que ela usava quando ele era um menino e saía correndo pela sala de estar, perturbando a hora do chá de Ruth e Margaret. — Eu sei que você tem estado muito ocupado no trabalho.

— Não mais do que o normal —, disse ele, apoiando-se na porta, sabendo que ela não dava a mínima para sua firma de arquitetura. — O que foi?

— A reunião do conselho esta tarde...

Oliver gemeu. — Eu faltei.

— Sim, querido.

— Sabe, sempre que vocês quiserem me chutar para fora desse treco...

Ele deu a ela seu melhor sorriso, e ela deu a ele um olhar de reprovação. — Um Cunningham está no conselho do condomínio há três gerações. E com seu pai incapaz...

— Sim — disse ele, apenas um pouco brusco. — Eu sei. O que eu perdi?

— Fizemos a votação final sobre o 2B.

— Certo. Quem vocês escolheram?

— Bem, ninguém, ainda. Foi um empate.

Ele silenciosamente gemeu, percebendo agora por que ela estava aqui. Oliver, e seu voto perdido, seria o desempate.

— Tudo certo. Em quem vou votar? — ele perguntou, sabendo que Ruth tinha opiniões fortes sobre quase tudo, e os residentes de seu prédio estavam no topo de sua lista.

Seus lábios se estreitaram. — Bem, tenho certeza de que não posso te dizer quem escolher. E eu achei que, com você morando ao lado do apartamento vago, você teria um pouco mais de interesse...

— Quem são minhas opções? — ele perguntou, de repente imaginando uma cerveja junto com sua pizza e quebra-cabeça lá embaixo em seu apartamento. Talvez algumas cervejas.

— Bem, há aquele casal legal de Connecticut. Os Newman. Ou então aquela jovem. A ruiva.

O olhar de Oliver estava esquadrinhando a cabeça de Ruth, esperando que o entregador tivesse chegado em tempo recorde para afastar Oliver da conversa, mas sua atenção voltou para a mulher mais velha. — A ruiva? Aquela Naomi?

Sobrancelhas cinzentas se ergueram em censura.

— Mulher —, ele emendou. — Ela estava concorrendo até agora?

— Sim, porque você a deixou passar —, disse Ruth.

— Eu acho que sim, — ele murmurou. A ruiva mal-humorada passou por seus pensamentos um pouco nos últimos dias, de uma forma meio irritante, meio qual o problema dela?

Se ele fosse honesto, ele a aprovou para a próxima rodada principalmente para incomodar o conselho formado por idosos. Como o membro mais jovem em pelo menos trinta anos, ele gostava de fazer sua parte para ultrapassar um pouco os limites.

— Não achei que ela chegaria à última fase —, disse ele. Pelo que ele viu, a mulher era volátil demais para o conselho sóbrio, que preferia comportamentos sutis, cabelos grisalhos e velhos ricos.

Naomi Powell não cabia em nenhuma dessas caixas.

— Sim, bem, um dos outros candidatos desistiu. Um apartamento maior no Upper West Side abriu vaga. — Ela fungou, para indicar seus pensamentos sobre o outro lado do parque. — O outro tinha alguns parceiros de negócios questionáveis. E embora eu não possa dizer que entendo a graça do pequeno negócio de joias da Sra. Powell, não há como negar que é bem-sucedido. Mas você não acha estranho alguém tão jovem se candidatar a morar aqui?

Oliver deu de ombros e olhou para trás para ter certeza de que seu pai ainda estava sentado pacificamente em sua cadeira. Ruth era astuta o suficiente para perceber o gesto.

— Eu não vou te atrapalhar. Apenas me diga seu voto e eu deixarei você e Walter voltarem para sua noite, — Ruth disse com um sorriso gentil. Por mais esnobe que a velha pudesse ser, ele sabia que Ruth gostava dele. De Walter não tanto. Ruth era muito próxima da mãe de Oliver para ter qualquer sentimento afetuoso em relação ao homem que havia tornado a vida de Margaret um inferno.

Ainda assim, Oliver apreciou que na maior parte do tempo Ruth não culpava Walter pelos pecados de seu passado – e eram muitos – depois que ele foi diagnosticado.

— Lembre-me mais uma vez das minhas opções. É a ruiva – Srta. Powell – ou...

— Os Newman —, disse Ruth, com certa exasperação por ele não levar isso tão a sério quanto o resto do conselho. — Eles são um adorável casal de idosos de Connecticut, com filhos crescidos, procurando viver seus anos dourados aqui no coração da cidade.

Não havia dúvida quanto à mudança de tom quando Ruth falou dos Newman em comparação com Naomi. Ela podia respeitar o direito de Naomi de se candidatar, mas claramente os Newman eram a escolha apropriada.

— Ah, eu acho que...

Estava na ponta da língua de Oliver fazer a escolha de menor resistência. Os Newman seriam como todos aqui. Eles ofereceriam conselhos amorosos não solicitados, embora divertidos, apreciariam a festa de Natal extremamente chata considerada obrigatória para o “desenvolvimento da comunidade” e provavelmente teriam opiniões fortes sobre o fato de ele não receber a versão impressa do Wall Street Journal e do New York Times entregue em sua porta como todo mundo. Oliver também sabia que nenhuma explicação poderia convencer alguém com mais de cinquenta anos de que a versão digital e a versão em papel eram a mesma coisa.

Por outro lado, eles nunca colocariam música muito alta, nunca trariam para casa idiotas detestáveis e, dada sua própria idade avançada, provavelmente seriam compreensivos quando Walter saísse para os corredores vestindo apenas roupas íntimas, pois era propenso a fazer isso se Oliver ou Janice o deixassem sozinho por um momento.

— Espere, você disse que era um empate, — Oliver disse, registrando tardiamente o que isso significava. Isso significava que metade do conselho tinha votado em Naomi, o que era uma surpresa. Oliver teria pensado que os Newman seriam um sucesso. Ele conhecia essas pessoas. Eles praticamente o criaram. E o fato de que metade estava disposta a aceitar alguém tão jovem e “sem pedigree” como Naomi Powell o surpreendeu.

— Sim, bem. — Os lábios de Ruth se apertaram. — Não quero ser rude, mas muitos dos membros masculinos do conselho se deixaram persuadir pela aparência ousada da Sra. Powell.

Ousada. Não era uma palavra que ele usaria para descrevê-la. Ela se vestia de maneira conservadora; não havia tatuagens, saias muito curtas ou piercings incomuns. Então ele imaginou o fogo em seus olhos, tão brilhante quanto seu cabelo. Sim, ela era... alguma coisa.

Ruth olhou diretamente para o relógio. — Oliver, querido, eu realmente preciso da sua resposta. Quem você escolher será bom.

Ele queria dizer os Newmans. Para dar a Ruth a resposta que ele sabia que ela queria, sabendo que seria mais fácil para todos, e ainda assim...

— Sra. Powell.

Ela olhou para cima, os olhos azuis arregalados e indignados. — Perdão?

— Naomi Powell. Eu voto nela.

A boca de Ruth caiu aberta. — Mas, Ollie. Certamente você pode ver que...

— O que posso dizer, Ruth? — Oliver deu seu melhor sorriso, ignorando o uso de seu odiado apelido de infância. — Eu também sou um homem no conselho.

— Você não pode estar falando sério, — ela disse quando ele começou a fechar a porta. — Você não pode escolher sua vizinha simplesmente porque ela é suculenta.

Ele sufocou uma risada. — Suculenta?

— Ou como vocês jovens chamam hoje em dia. Gostosa.

— Boa noite, Ruth, — Oliver disse gentilmente, mas com firmeza, enquanto fechava a porta.

Ele ouviu o estalo familiar do controle remoto batendo na parede atrás da TV, seguido por seu pai murmurando obscenidades para o árbitro da segunda base.

Oliver deixou sua testa cair contra a porta apenas por um momento.

Apesar do que a ex-melhor amiga de sua mãe pensava, ele não tinha escolhido Naomi porque ela era um colírio para os olhos. Ele a escolheu porque ela era interessante. Um quebra-cabeça que ele tinha toda a intenção de resolver.

Porque o que Oliver realmente precisava mais do que tudo?

Uma distração de sua própria vida.


Capítulo Oito


SÁBADO, 6 DE OUTUBRO


— Ainda estou confusa. Eu achei que você estava se mudando para a parte baixa da cidade, — Claire disse, manuseando cuidadosamente um vaso de vidro barato que provavelmente tinha custado menos do que o material em que estava embrulhado.

— Eu também achava —, disse Naomi, abrindo outra caixa de mudança e deslizando o estilete de volta para o bolso de trás de seu jeans mais antigo, reservado para horrores como mudança

Ela não contou à amiga que na verdade comprou este apartamento e assinou um contrato de aluguel no arranha-céu em Tribeca. Ter mais dinheiro do que se sabia como gastar era um problema fácil de se ter. A maior parte do tempo.

Aparentemente, também permitia que ela tomasse decisões muito, muito estúpidas. Como se mudar para um prédio antigo, com vizinhos ainda mais velhos, em uma parte esnobe da cidade, apenas para que ela pudesse ficar cara a cara com o homem que quase destruiu sua mãe. Para fazer Walter Cunningham ver que ele a derrubou, mas não a tirou do jogo.

E talvez para terminar o que ela começou com Oliver Cunningham. O que quer que tenha sido.

— Vocês realmente não tinham que vir — disse Naomi pela terceira vez, ao começar a desembrulhar alguns pratos.

— Você está de brincadeira? — Claire disse, mergulhando na caixa que ela estava desempacotando. — Isso é meio que minha fantasia.

— O quê, embalar bugigangas? — Audrey perguntou, tomando um gole de vinho branco e franzindo o nariz para a caixa de objetos que ela estava desempacotando em velocidade recorde.

— Não, eu adoro lugares novos.

— Eu não sei bem se novo é a palavra que eu usaria para descrever esse prédio. — Naomi disse, começando a colocar sua coleção de canecas com frases motivacionais em um dos armários. — Poderíamos somar as nossas três idades, e acho que o prédio ainda nos venceria.

— Você sabe o que quero dizer —, disse Claire. — Novo para você. É um novo começo. Um lugar totalmente novo para morar.

— Por que este prédio? — Audrey perguntou curiosamente. — Quero dizer, não me entenda mal, é lindo de uma forma imponente, tipo pré-guerra, mas você parece moderna demais para o Upper East Side. E como alguém nascida e criada na Madison Avenue, eu sei do que estou falando.

— Eu compartilho desse sentimento, — Claire disse, pegando o vinho de Audrey de sua mão e tomando um gole. — Sou uma garota de Connecticut de sangue, mas moro no Upper East há seis anos e você é muito estilosa para nós.

— Acredite em mim, eu realmente não sou estilosa —, disse Naomi. — Posso citar quase todos os personagens de Star Trek, de todos os tempos, e isso inclui a muito difamada série Enterprise.

— Ok, eu realmente não sei o que isso significa —, disse Audrey, indo até a geladeira para pegar a garrafa de chardonnay. — Mas até isso é estiloso. Sua confiança sobre isso. E olhe o que você está vestindo.

Naomi olhou para seu jeans preto rasgado e a camiseta preta justa com Slay escrito na frente. — Sério? Isso?

— Estilo — Audrey repetiu, apontando a garrafa de vinho para ela. — Agora, onde estão suas taças de vinho?

— Parece que apenas desempacotei aquela —, disse Naomi, olhando em volta para a massa de caixas e lenços de papel. — E eu dei a você.

Audrey puxou duas canecas e as encheu generosamente com vinho, entregando uma para Naomi e levando a outra para Claire antes de encher sua própria taça.

— Então? — Claire perguntou enquanto Audrey colocava a garrafa de volta na geladeira.

— Então o que? — Naomi deu um gole na caneca e sorriu, lembrando-se de seus vinte e poucos anos, quando vinho em uma caneca de café era praticamente o status quo porque seus utensílios de cozinha eram compostos por cerca de três copos, no total, e uma taça de vinho não era um deles.

— Por que aqui? — Claire repetiu a pergunta de Audrey, que Naomi ainda não tinha respondido.

Naomi colocou a caneca de lado e enfiou a mão na caixa para tirar uma pequena jarra que costumava usar para fazer suco. — Eu morava aqui.

Audrey e Claire ergueram os olhos de suas respectivas caixas. —O que?

— Aqui? — Audrey disse, usando seu copo para apontar para o espaço bagunçado.

— Bem, não este apartamento em particular. — Naomi colocou a garrafa em uma prateleira com mais cuidado do que o necessário. Ganhando tempo e se perguntando se ela estava pronta para essa história. Ou se suas amigas estavam.

— Você não precisa falar sobre isso se não quiser, — Claire disse, aparentemente notando a apreensão de Naomi.

Audrey concordou com a cabeça.

— Tsc. É melhor eu acabar com isso, — Naomi disse com um encolher de ombros. — É melhor vocês saberem agora com o que estão lidando do que mais tarde.

Ela pegou sua caneca de vinho e apontou para a pequena mesa da cozinha perto da janela. Muitos de seus móveis ainda estavam cobertos com o plástico protetor, mas as cadeiras da cozinha eram acessíveis.

Naomi empurrou algumas caixas e se sentou em uma das cadeiras, dobrando a perna direita embaixo do corpo.

Audrey e Claire se juntaram a ela, taça de vinho e caneca na mão.

— Espere, precisamos de queijo para isso? — Audrey perguntou enquanto se jogava na cadeira. — Porque eu posso pedir alguns, tipo, quase imediatamente.

— Quer dizer que você simplesmente pede queijo? — Claire perguntou, dando a ela um olhar incrédulo. — Tipo, um bloco de cheddar?

— Não, tipo... — Audrey apontou para a mesa com as mãos. — Um prato. Um prato de queijo. Chique. Meu lugar favorito é logo depois da esquina, e eles entregam.

— Deus, eu amo Manhattan. Peça, então —, disse Naomi— Eu tenho muito mais vinho... em algum lugar.

Audrey, ocupada, começou a digitar algo em seu telefone. — Eeee... pronto. — Ela colocou o telefone na mesa, tela para baixo. — O queijo estará aqui em trinta minutos, mais ou menos. Agora. Fale.

— Eu nem sei por onde começar com isso — disse Naomi, mergulhando os dedos no cabelo e puxando levemente em agitação, tentando acalmar seus pensamentos.

— Tudo bem, — Claire disse calmamente. — Você disse que morava aqui. Quantos anos você tinha?

— Nove quando me mudei, — Naomi disse sem hesitação.

— Qual apartamento?

— Cinco E. Há apenas cinco unidades em cada andar, de A a E. E é o maior, com quatro quartos, três banheiros e um lavabo, área de jantar separada...

— Então, Nova York chique —, disse Audrey com um aceno compreensivo.

— Muito. Infelizmente, minha família não era rica.

— Mas se você morava aqui... — Audrey parou de falar em confusão.

— Um daqueles quatro quartos que mencionei? Eu compartilhava com minha mãe. Que era a governanta da família que morava lá.

— Naomi, — Claire disse suavemente. — Por favor, me diga que você não tem vergonha disso. É perfeitamente respeitável.

— Não tenho —, disse Naomi, usando o dedo para virar a alça de sua caneca de vinho de um lado para o outro. Indo e voltando.

— Mas... — ela olhou para cima — ...essa também não é a pior parte. Quer dizer, não me interpretem mal, uma menina teimosa e cheia de energia com nove anos ter que dividir um quarto minúsculo com sua mãe igualmente teimosa e cheia de energia não era exatamente uma imagem bonita. Mas às vezes gosto de imaginar que ela e eu poderíamos ter seguido o caminho de Gilmore Girls. Melhores amigas ou o que quer que seja.

— Vocês não eram? — Claire perguntou.

— Definitivamente não. — Ela soltou um suspiro e tomou outro gole de vinho. — Ok, versão curta? Minha mãe era uma governanta medíocre e tenho certeza de que, se a mulher que a contratou ficasse em casa, seu trabalho não duraria uma semana. Mas, a senhora da casa, como ela se chamava, sem brincadeira, passava a maior parte do tempo cuidando da mãe doente em Newport ou em algum outro lugar chique.

— Eita —, Audrey disse suavemente.

— Não é? — Naomi disse, seu sorriso frágil. — Tem todos os elementos de um filme totalmente sem imaginação.

— Espere, o que perdi? — Claire perguntou.

— Suponho que Naomi vai nos dizer a seguir que, enquanto sua patroa estava fora o tempo todo, seu patrão estava muito presente.

— Ah. Ahhhh — Claire disse, olhos castanhos se arregalando em compreensão.

— Sim. No mais clichê de todos os clichês, ele estava transando com a empregada. E a empregada era uma participante muito disposta.

— Você sabia? Quero dizer, enquanto estava acontecendo?

Os ombros de Naomi se ergueram.

— Eu acho, mais ou menos? Eu tinha nove anos e não me importava o suficiente com sexo e relacionamentos para realmente entender que minha mãe muitas vezes me colocava para dormir e só voltava para o nosso quarto muito tarde da noite. Quando voltava. Acho que talvez tenha dito a mim mesma que ela estava dormindo no sofá ou algo para me dar um pouco de espaço. Não sei se foi autopreservação ou o quê...

Naomi parou e reuniu seus pensamentos antes de seguir em frente.

— De qualquer forma. Quer minha ignorância fosse intencional ou não, perdi toda a capacidade de fingir que não estava acontecendo quando os peguei juntos.

— Putz — Audrey disse com um estremecimento.

— Sim. Apenas, você sabe, transando na cozinha como se não fosse grande coisa.

— Enquanto você estava lá? No apartamento?

— Para ser sincera, eles pensaram que eu tinha ido ao parque para brincar. Na verdade, eles tinham me mandado ir ao parque para brincar.

— Sozinha? — O nariz de Claire enrugou. — E você tinha nove anos?

— Não. Embora eu desejasse estar sozinha. Em vez disso, eles me mandavam com o filho do patrão da minha mãe. Ele era um ano mais velho e nunca nos demos bem. Ele era o pirralho rico e mimado que era mais velho e mais alto do que a filha idiota da governanta. Eu também era uma pirralha, exceto que eu era do tipo tagarela e defensiva que estava muito ciente de suas roupas de segunda mão, dentes tortos e livros escolares doados. Além disso, vamos ser honestos. Mesmo nas melhores circunstâncias, meninos e meninas não se dão bem nessa idade, e essas não eram boas circunstâncias. Quer dizer, ele me chamava de Cenoura.

— Oh, quão Anne de Green Gables! — Claire disse.

— Não, — Naomi disse, levantando um dedo, sabendo exatamente a quem Claire estava se referindo. Todas as meninas ruivas estavam familiarizadas com sua sósia Anne Shirley. Pippi Meialonga também. — Eu garanto a você, este não é um cenário com um Gilbert Blythe.

— Espere, hein? — Audrey perguntou, olhando entre elas. — Quem é Gilbert Blythe?

— Noite de filmes, minha casa, — Claire disse. — Você simplesmente morrerá com o romance. Mas desculpe, Naomi. Continue. Você e o atormentador não-Gilbert estavam no parque...

— Certo —, disse Naomi, perdida em pensamentos ao voltar para aquele dia longínquo. — Eu não acho que nenhum de nós percebeu que eles estavam apenas tentando nos tirar de casa, então quando nossas instruções para 'ir chutar a bola de futebol' se transformaram em eu jogar na cabeça dele e ele jogar de volta e quebrando meus óculos, fui para casa em lágrimas que tentei desesperadamente esconder. Ele me seguiu, porque mesmo depois de tudo isso, ele não poderia me deixar ter minha dignidade.

— Ou talvez ele se sentisse culpado, — Claire ofereceu.

Naomi deu a ela um olhar feroz.

— Ou não, — Claire murmurou em sua caneca.

— E vocês pegaram seus pais no ato, — Audrey disse em um tom ligeiramente pasmo.

— Bingo —, disse Naomi, atirando em sua têmpora com uma pistola de dedo. — Com cicatrizes para o resto da vida.

— O que eles fizeram? — Claire perguntou. —Sua mãe e o pai dele?

— Tiveram muitos palavrões da parte dele. Lembro-me vagamente de gritar, enquanto minha mãe apressadamente enfiava os seios de volta na camisa e me arrastava para o quarto, implorando para não contar a ninguém.

— Você contou?

— Não! Eu estava muito envergonhada. Eu tinha visto os seios da minha mãe e as coisas do patrão dela. Eu só pensei até aí. Mas não importa. A esposa dele de alguma forma descobriu, de qualquer maneira, alguns dias depois disso.

— Oh, querida.

— Essa não é nem a pior parte —, disse Naomi, segurando a caneca com tanta força que ficou surpresa por ela não se estilhaçar. — Essa mulher, sua esposa, estava gritando suas suspeitas para o marido e minha mãe, o que, você sabe, eu acho que era de se esperar. Mas em vez de lidar com isso como um homem e contar à esposa o que realmente aconteceu, o idiota negou tudo.

— Não —, disse Audrey com os olhos arregalados.

Naomi concordou. — Sim. Ele alegou que minha mãe era uma prostituta – essa foi sua palavra precisa – que tentou ao máximo seduzi-lo, mas que ele nunca tocaria no lixo.

— O mentiroso! — Audrey respirou indignada. — Aquele idiota!

— Sim, — Naomi respondeu, a voz plana. — Foi o que eu disse. Mas eu fui a única na sala que falou a verdade. Mesmo minha mãe não disse uma única palavra em sua defesa. Ela apenas ficou lá, olhando para ele, e foi como... foi como se ela tivesse morrido por dentro naquele exato momento. Acho que ela amava o cara. — Naomi estremeceu. — Implorei ao filho dele que contasse à mãe o que tínhamos visto, mas ele apenas ficou parado e disse que não sabia do que eu estava falando.

Naomi encolheu os ombros. — Não é preciso dizer que estávamos na rua no dia seguinte.

— Isso é terrível. Por que você gostaria de voltar? — Claire disse.

Naomi soltou uma risada. — Eu não quis. Mas minha mãe nunca desistiu. Essas pessoas a colocaram na lista negra, o que significava que ela nunca poderia conseguir outro trabalho doméstico. Não que ela fosse tão boa no começo, mas depois disso ela simplesmente parou de tentar tudo.

Ela tomou um gole de seu vinho e continuou. — Eu sabia que ela tinha guardado seu rancor, mas não sabia o quanto até que o prédio me ligou sobre meu pedido de morar aqui.

— O que eu acho que você não preencheu —, disse Audrey.

Naomi balançou a cabeça. — Minha mãe fez isso antes de morrer. Ela sempre disse que queria que eles vissem o que eu me tornei. Nunca tive a intenção de seguir em frente com o pedido, mas a próxima coisa que eu sei é que passei por entrevistas e depois estava assinando a papelada...

Ela não tinha certeza do que era mais misterioso: que Oliver Cunningham a havia deixado passar para a próxima rodada após sua reunião desastrosa, ou que ela havia seguido em frente com o processo.

— Você queria um encerramento — Claire disse suavemente. — É compreensível.

Naomi encontrou os olhos da amiga e viu o que Claire não estava dizendo. Que ela entendia porque ela também queria um encerramento. Embora a julgar pelas sombras ainda presentes sob os lindos olhos castanhos de sua amiga, Claire estava muito longe de fazer as pazes com a traição e morte de Brayden.

— Eu acho. — Naomi encolheu os ombros em concordância. — Eu sei que é estúpido estar presa a algo que aconteceu há vinte anos, mas isso sempre me assombrou. Não tanto quanto assombrou minha mãe, mas as pessoas não deveriam agir assim.

Houve um longo momento de silêncio, interrompido por uma batida na porta que fez as três mulheres pularem ligeiramente. Audrey saltou. — Ooh. Aqui está o nosso queijo!

Audrey foi até a porta, Louboutins clicando na madeira quando ela abriu a porta da frente. Era preciso admirar uma mulher que usava saltos de dez centímetros no dia da mudança e mandava entregar um prato de queijo composto.

— Oh. Olá! Você não é queijo.

Uma risada masculina veio do outro lado da porta, então uma voz baixa e irritantemente familiar. — Não, senhora. E se é isso que você esperava, este champanhe pode ser uma decepção.

— É Dom —, disse Audrey ao homem alegremente, com um rápido olhar para a garrafa. — Isso nunca é uma decepção. Você deve estar aqui para ver Naomi?

Naomi se levantou quando Oliver Cunningham entrou na sala dela, parecendo obscenamente caro em um terno cinza elegante, uma garrafa de champanhe de duzentos dólares na mão.

Ela engoliu em seco, de repente muito consciente de seus jeans surrados e camiseta. Era irritante como o inferno que este homem pudesse fazê-la se sentir como uma criança de nove anos de novo, querendo desesperadamente pertencer a seu mundo.

— Eu não queria interromper —, disse ele com um leve sorriso. — Só queria dar as boas-vindas ao prédio. Será bom ter gente nova por aqui.

Então era assim que ia ser. Ele estava fingindo ser gentil, como se eles não fossem como óleo e água em sua entrevista para este apartamento. Como se ele não tivesse tornado sua infância completamente miserável.

Naomi não sorriu de volta.

E precisou de todo o seu autocontrole para não retrucar que ela não era sangue fresco nesse prédio, e se alguém deveria saber disso, deveria ser Oliver Cunningham. Afinal, tinha sido sua mentira casual que amaldiçoou Naomi e sua mãe todos aqueles anos atrás.

Mas a julgar por seu sorriso ameno? Ele ainda não tinha ideia de que estava cara a cara com a inimiga de infância que uma vez jogou uma bola de futebol em seu rosto.


Capítulo Nove


SÁBADO, 6 DE OUTUBRO


Oliver não tinha irmãs, mas teve namoradas suficientes ao longo de sua vida para saber quando agir com cuidado. Invadir involuntariamente uma noite de garotas era uma dessas ocasiões.

A morena bonita que atendeu a porta parecia bastante amigável. Alta e magra, ela tinha uma beleza refinada que o lembrava das garotas com quem ele frequentou a escola particular. Felizmente, porém, seu sorriso era genuíno e revigorante, livre do esnobismo que ele tantas vezes via entre o que considerava o “conjunto tiara”: garotas cujo objetivo principal era manter o cabelo brilhante, Ivy League e casar com alguém rico.

Mas enquanto a morena era amigável, a ruiva que ele tinha vindo ver em primeiro lugar parecia... bem, pronto para esmurrá-lo.

Se Naomi Powell parecia surpresa e irritada com a existência dele quando ele a conheceu na semana passada, parecia que ela havia tido algum tempo para pensar sobre isso e passou a não gostar dele ainda mais.

O pensamento era intrigante. E um pouco estranho. Verdade seja dita, Oliver não estava acostumado com as pessoas não gostando dele. Ele ouvia sua mãe dizer a Ruth uma vez que ela estava quase grata por ele ter sido uma peste quando criança, porque ela descobriu todas as partes ruins de sua personalidade desde o início. Ele supôs que provavelmente era verdade. Ele tinha sido um pouco idiota quando menino, mas no ensino médio ele meio que descobriu quem ele era, ou quem ele queria ser, e parou de ser o pesadelo do parquinho, por assim dizer. Agora ele se considerava perfeitamente afável, embora talvez um pouco reservado e sarcástico.

Naomi Powell não parecia concordar. Seus olhos azuis estavam estreitos, os braços cruzados, como se ele tivesse trazido um rato do metrô em vez de um champanhe bastante caro.

— Oliver?

Ele arrastou seu olhar para longe da ruiva irracionalmente irada quando ele finalmente registrou a terceira mulher na sala. Ele piscou em reconhecimento, folheou rapidamente seu arquivo mental e encontrou um nome. — Claire. Como você está?

Então ele estremeceu, quando seu cérebro percebeu o que ele sabia sobre Claire Hayes. Que pergunta ruim para fazer a uma viúva recente.

— Lamento o que aconteceu com Brayden —, disse ele, indo até ela e, colocando o champanhe na mesa, pegou as mãos dela nas suas.

Ela apertou e deu um sorriso breve e forçado. — Obrigada.

— Vocês dois se conhecem? — Naomi perguntou, parecendo severamente descontente com o fato.

— Vagamente, — Claire explicou. — Oliver e eu... — Ela olhou para ele. — Bem, como é que nos conhecemos?

Oliver coçou a bochecha e pensou sobre isso. Claire e seu marido, Brayden, não eram amigos dele, propriamente falando, mas eles eram amigáveis o suficiente quando se viam nos mesmos bailes e feriados. O conjunto de elite de Nova York poderia ser um pouco incestuoso em suas conexões – todo mundo conhecia todo mundo, mas você raramente sabia como conhecia alguém.

— Rob Eagel? — Oliver disse, dando seu melhor palpite.

Claire estalou os dedos em confirmação. — Sim. Ele trabalhava com Brayden.

Oliver apontou para si mesmo. — Rob é meu parceiro de pôquer.

Ele não acrescentou o fato de que Brayden havia se juntado a eles algumas vezes para a noite de pôquer também. Ele duvidava que uma viúva recente quisesse ouvir que seu falecido marido geralmente perdia grandes somas de dinheiro antes de anunciar, bêbado, que estava indo para a casa de sua amante.

— Como todas vocês se conhecem? — ele perguntou educadamente, mas também com curiosidade. Ele e Claire nunca foram muito além de uma conversa fiada em seus vários encontros, mas ele tinha dificuldade em imaginar a calma e gentil Claire sendo próxima de Naomi. Uma era amigável e socialmente apropriada, a outra ranzinza e volátil, pelo que tinha visto até agora.

Houve um longo momento de silêncio, e Oliver foi astuto o suficiente para notar que o olhar que as três mulheres trocaram era carregado. Ele não conseguiu decifrar sua comunicação silenciosa, mas aparentemente Claire sim, porque ela acenou levemente para Naomi, que deu a ele o sorriso mais doce que ele já tinha visto.

Oliver imediatamente ficou nervoso. Um doce sorriso dessa mulher de alguma forma parecia uma arma.

— Audrey e eu estávamos dormindo com o marido de Claire.

Enquanto Oliver piscava, tentando absorver isso, o sorriso de Naomi ficou ainda mais açucarado. E mais perigoso. Ela acenou com a cabeça para o champanhe, batendo os cílios. — Isso é para mim?

Ele olhou para o Dom Pérignon, ainda muito surpreso com a bomba para fazer qualquer coisa além de segurar a garrafa, sem palavras.

— Como a alta sociedade funciona com isso? — Naomi disse com um ar afetado em seu tom, pegando a garrafa e segurando-a levemente. — Devo abri-la agora para que todos possamos desfrutar ou é uma gafe não guardá-lo para uma ocasião especial?

— Abra — Oliver ordenou um pouco ríspido. Rude, na verdade. Mas, inferno, ele precisava de uma bebida.

Brayden Hayes e Naomi estavam tendo um caso? E a mulher que atendeu a porta?

E todas as três mulheres eram... amigas?

Certamente Naomi estava brincando com ele. Mas um rápido olhar para Claire e a morena mostrou que ela não estava. A morena teve pena dele e avançou com a mão estendida. — Olá, sou Audrey Tate. Brayden e eu namoramos por quase um ano antes de ele morrer. Achei que ele era o amor da minha vida – descobri que ele era a escória da terra.

Oliver soltou uma risada involuntária quando Naomi abriu a rolha do champanhe. — Só tenho canecas de café para servir. Seria um problema?

Era mais um desafio do que uma pergunta, e Oliver estava irritado porque ela obviamente esperava esnobismo dele. Então ele deu a ela.

— Dom Pérignon em uma caneca? Eu acho que não. Fico feliz em correr até o apartamento ao lado para obter as taças adequadas.

Sem palavras, ela sustentou o olhar dele enquanto lentamente, deliberadamente virava a garrafa e sem a menor cerimônia despejava uma quantidade generosa de champanhe na caneca de porcelana. Suas sobrancelhas ruivas se ergueram em desafio, desafiando-o a comentar.

Em vez disso, ele a ignorou completamente e se voltou para Audrey. — Eu sou Oliver Cunningham. Eu moro na casa ao lado e não estava transando com Brayden Hayes.

Ela riu. — Bem, isso faz de você o único na sala.

Sem querer, Oliver olhou para Naomi, que vasculhava uma caixa, achando mais canecas, mas nenhuma taça de vinho. Ele suspeitava que mesmo se houvesse taças de vinho por perto, ela as teria ignorado para irritá-lo.

— Sim, — ela disse sem olhar para cima. — Eu era a vadia de Brayden.

Claire exalou. — Naomi.

— Bem, não era? — Naomi perguntou, olhando para cima. — Quero dizer, você foi casada com ele. Ele pelo menos levava Audrey em encontros. Mas eu? — Ela encolheu os ombros e, embora Oliver soubesse que não era da sua conta, ficou mais intrigado do que deveria com a forma como ela terminaria a frase.

A ideia de Naomi Powell e Brayden Hayes estando juntos era... não. Ele não queria chegar a esse ponto.

E o pensamento de Naomi Powell nua...

Não, ele também não queria chegar a esse ponto. Ela era exatamente o oposto de seu tipo. E mesmo que ele tenha votado nela para vir morar no prédio com a esperança de que ela fosse uma distração, ele não tinha a intenção de que fosse a distração do tipo sexual.

Embora, se ela continuasse usando aqueles jeans justos, ele teria que reconsiderar.

— Bem, agora que tiramos a pedra do sapato, — Audrey disse, batendo palmas e indo pegar as canecas de champanhe que Naomi tinha acabado de servir. — Vamos brindar? Para a nova casa de Naomi e seu lindo vizinho novo? Há quanto tempo mora aqui, Sr. Cunningham?

— Oliver, — ele disse com um sorriso, aceitando a caneca branca volumosa e percebendo que era a primeira vez que ele bebia champanhe em qualquer coisa que não fosse cristal. De repente, ele se sentiu muito parecido com o arrogante esnobe que Naomi pensava que ele era. E suas próximas palavras quase o confirmaram. — E, na verdade, vivi aqui a maior parte da minha vida.

A compreensão foi um pouco chocante. Oliver nunca se considerou um esnobe, mas se vendo através dos olhos cheios de ódio de Naomi Powell, ele teve que admitir que era um pouco... conservador

— Sério! — Audrey disse. — Naomi estava apenas nos dizendo que ela...

Audrey se interrompeu no meio da frase e não precisava ser vidente para ver o porquê. E por mais refrescante que fosse ver o olhar mortal de Naomi direcionado a alguém além de si mesmo, ele estava curioso para saber o que Audrey iria dizer.

Claire abriu a boca e disfarçou o momento estranho.

— Muito obrigada pelas flores que você enviou após a morte de Brayden.

Oliver puxou levemente sua gravata.

— Honestamente, se eu soubesse como ele tratou você, eu poderia ter enviado algo um pouco menos luxuoso. E eu... Bem, inferno, isso é estranho, não é?

Claire riu.

— É, embora egoisticamente também seja revigorante. Além de Naomi e Audrey, não fui capaz de discutir a verdadeira natureza de Brayden com ninguém. Tenho certeza de que muitas pessoas têm suas suspeitas, mas ninguém vai falar de outra coisa senão da tragédia comigo. Não que eu fale mal dos mortos, mas...

— Ah, vá em frente —, disse Naomi. — Eu falo.

— Bem, que surpresa, — Oliver murmurou.

Ela o ignorou.

— Sério, Claire, você não tem que deixar as pessoas falarem com você como se você fosse uma vítima. Você tem sua vida de volta.

—Sim, mas às custas da dele, — Claire disse suavemente.

Naomi suspirou e caminhou até Claire, colocando o braço em volta dos ombros dela.

— Você está certa. Estou sendo uma vaca.

— Não, — Claire disse, assim que Oliver pensou sim. — Você está, bem, digamos que eu estou com ciúmes. Você tem seus negócios para mantê-la ocupada, um novo apartamento para distraí-la...

Claire olhou para Oliver.

— Eu sinto muito. Provavelmente não era isso que você esperava quando veio dar as boas-vindas à sua nova vizinha.

— Definitivamente não, — ele admitiu. — Mas estou grato por você estar aqui. Receio que, sem testemunhas, a Sra. Powell estaria colocando aquele estilete no bolso para uso letal.

Audrey riu.

— Naomi não machucaria uma mosca.

— Uma mosca, não — Naomi disse, olhando em sua direção de modo a deixá-lo ciente que ele não estava tão seguro como a dita mosca.

— Tudo bem, eu desisto. — disse ele, espalhando as mãos para o lado. — O que eu fiz, Sra. Powell? O que sobre mim me colocou em sua lista negra antes mesmo de eu saber seu nome?

Ele viu Audrey e Claire trocarem um olhar, e então Claire bateu em seu relógio. — Ai meu Deus. Já está na hora? Audrey, temos que ir se quisermos ver aquele filme.

— Sério? — Naomi disse, seu tom deixando claro o que ela pensava da desculpa esfarrapada de suas amigas para saírem do apartamento. — Que filme?

Claire e Audrey nomearam dois filmes diferentes ao mesmo tempo, e Naomi revirou os olhos. — Achei que vocês iam me ajudar a desfazer as malas.

Audrey deslizou a bolsa sobre o ombro e ergueu os dedos. — Eu tentei, eu juro, mas fiz o máximo que pude sem lascar uma unha.

Claire agora parecia um pouco menos segura de deixar Oliver e Naomi sozinhos, mas Audrey a estava arrastando em direção à porta.

— E quanto ao seu champanhe!? — Naomi disse. — Tenho certeza de que é um crime real deixar Dom para trás neste bairro. Você pode ser presa. Oliver provavelmente tem a polícia da etiqueta na discagem rápida.

— Vocês dois podem terminar. Talvez as bolhas chiques lembrem você de suas boas maneiras. — Audrey disse com um olhar penetrante para Naomi.

— Oh, você tem maneiras? — ele perguntou, virando-se para Naomi.

— Bem, não é como se você tivesse sido convidado, — ela retrucou, virando-se para ele. — Você acabou de entrar aqui com sua bebida chique e seu pau enfiado...

A porta se fechou quando Audrey e Claire saíram.

Naomi apontou para a porta acusadoramente. — Olha o que você fez.

— Eu? — Ele colocou sua caneca em cima de uma pilha de caixas e, com as mãos na cintura, se virou para encará-la totalmente. — Você tem agido como uma criança irracional desde o momento em que te conheci. Me diga exatamente o que foi que eu fiz para te ofender.

Ela abriu a boca, mas ele não tinha terminado e continuou falando.

— Foi o champanhe de presente? O fato de eu ter tentado receber uma nova vizinha? Que sem meu voto você não estaria morando aqui? Por qual desses muitos crimes estou sendo punido?

Ela tomou um grande gole de Dom Pérignon como se fosse uma Bud Light no bar da esquina e, colocando a caneca de lado, estendeu a mão para trás e puxou o estilete laranja.

Seu polegar sacudiu a lâmina aberta, e ele deu a ela uma olhada. — Sério? Isso deveria ser ameaçador?

Em vez de responder, ela se virou para a caixa mais próxima e arrastou a lâmina pela fita com mais força do que o necessário. — Se você me der licença, eu preciso me instalar.

Retraindo a ponta afiada do estilete, ela o enfiou de volta no bolso da calça jeans e se virou de costas para ele. Sua indiferença era clara. E isso o irritou. Agindo por instinto, Oliver caminhou em direção a ela e puxou o estilete de seu bolso, não tão arrependido que as costas de seus dedos roçaram seu traseiro vestido de jeans enquanto ele fazia isso.

Naomi girou de volta para ele, olhos incrédulos e zangados, mas desta vez foi ele quem abriu a lâmina. Representando uma mudança de poder, e ambos sabiam disso.

Ele tomou um gole de seu champanhe, colocou-o na pequena mesa da cozinha ao lado das canecas descartadas de Audrey e Claire, e então lentamente, tomando seu doce tempo, abriu uma das caixas escrito COZINHA.

— O que você está fazendo?

— Você disse que precisava se instalar. Para que servem os vizinhos?

— Recolher jornais quando se está fora da cidade e não tocar música alta depois das dez da noite —, disse ela, pegando o estilete de volta.

— Eu também posso fazer essas coisas — disse ele, pegando um pesado maço de papel de seda e desembrulhando-o para encontrar um monte de garfos. — Onde você vai colocar a prataria?

— Vá embora — disse ela com os dentes cerrados.

— Não até que você me diga por que você me odeia, — ele disse, contornando-a até a cozinha, abrindo gavetas até que encontrou uma que parecia ser um organizador de talheres novinho em folha. Ele colocou os garfos em uma das fendas e voltou à caixa, retirando um pacote de formato semelhante.

— Esta é a conversa mais juvenil que tive em décadas —, disse Naomi, passando a mão pelo cabelo e olhando-o com raiva enquanto ele colocava as colheres de sopa ao lado dos garfos.

Oliver encolheu os ombros. Ele não discordava. Embora, por mais ridícula que fosse a situação, ele ficou um pouco surpreso ao perceber que estava se divertindo. Ele votou em Naomi Powell para entrar no prédio na esperança de uma distração, e até agora a mulher estava o entregando maravilhosamente.

— Sabe que eu nunca estive nesta unidade? — disse ele, olhando em volta.

— Não estou surpresa. É a menor planta do prédio, certo?

— Sim, e as paredes não são feitas de ouro nesta aqui, — ele disse, vagando na direção das outras salas. — E nenhuma árvore de dinheiro, também. Vergonha.

Descaradamente, ele entrou em um dos quartos, a suíte dizendo a ele que era para ser o quarto principal. Ela o seguiu, parada na porta, e ele ergueu as sobrancelhas. — Cama grande de casal. Muita cama para uma mulher solteira — disse ele, só para provocá-la.

Ela deu um sorriso que o lembrou de um gato satisfeito. — Quem disse que sou solteira?

A menção de sua vida amorosa o lembrou da bomba que Claire havia jogado antes. — Então. Brayden Hayes, hein?

Seu sorriso caiu. — Não está aberto para discussão.

— Foi você quem tocou no assunto — ressaltou ele.

Ela deu a ele um olhar gelado e se virou, mas ele agarrou o braço dela, um pouco surpreso com sua própria ação. Ainda assim, ele não a deixou ir. — Eu não sou um cara ruim, Naomi.

Naomi permaneceu teimosamente em silêncio antes de deixar seu olhar cair deliberadamente para onde ele segurava seu braço.

Oliver suspirou e desistiu, soltando-a. — Bem. Já se passaram alguns anos desde que tive um inimigo imaturo, mas posso entrar no jogo. Só para eu saber as regras, isso é uma guerra fria, uma guerra de pegadinhas, uma guerra barulhenta... eu apenas lanço cuspe em você quando estiver buscando sua correspondência?

Algo cintilou em seu olhar, mas antes que ele pudesse identificá-lo, ela se virou.

Oliver a seguiu de volta para a sala, mas em vez de voltar a desempacotar os talheres dela, ele se dirigiu para a porta.

— Aproveite sua solidão, Sra. Powell.

Ele saiu para o corredor e fechou a porta antes que ela pudesse responder, embora tivesse quase certeza de que ela não tinha nenhuma intenção de responder.

Oliver voltou para seu próprio apartamento, sentindo-se mais irritado e também mais vivo do que há meses. Qual diabos era o problema da mulher, ele se perguntou, abrindo a geladeira apenas para fechá-la novamente quando percebeu que estava vazia.

Ele tinha encontrado seu quinhão de odiadoras de homens, mas isso parecia pessoal de alguma forma.

Oliver pegou seu telefone e estava pensando em pedir algo por delivery quando ouviu uma batida forte e profissional em sua porta. Ele verificou o olho mágico e, não vendo ninguém, abriu a porta.

Bem a tempo de ouvir a porta da vizinha fechar.

Oliver olhou para baixo. A seus pés estava uma caneca de café branca com champanhe – ela deve ter completado porque estava mais cheia do que quando ele a deixou – bem como um prato com uma pilha alta de uma variedade de queijos sofisticados.

Ele olhou para a direita no corredor deserto, então sorriu um pouco enquanto se curvava e pegava os itens. Ele colocou a caneca e o prato no balcão da cozinha e abriu o cartão dobrado que ela usou como uma nota.

Não cuspi no champanhe. Provavelmente. — N.

Oliver sorriu para a oferta de paz relutante, e levou o prato de queijo e o champanhe para sua mesa de café, onde ligou a TV. Por uma fração de segundo, ele considerou colocar o Dom Pérignon em uma das taças de champanhe Waterford que sua mãe havia lhe dado como presente de casa nova quando ele se mudou para seu apartamento.

Ele decidiu não colocar. Acontece que o gosto era melhor na caneca.


Capítulo Dez


SEGUNDA-FEIRA, 8 DE OUTUBRO


Se houvesse um prêmio por se instalar em um novo apartamento em tempo recorde, Naomi gostaria de pensar que ela seria uma candidata. Ela trabalhou duro por três dias seguidos para desempacotar e desmontar cada caixa, pendurar cada peça de roupa e encontrar um novo lar para cada bugiganga e bolsa.

Ela até pendurou cortinas.

Não que alguém tivesse vindo para ver seu trabalho, e... bem, era tudo culpa dela, não era?

De alguma forma, Naomi conseguiu fazer com que duas amigas e um novo vizinho saíssem correndo de seu apartamento no espaço de trinta minutos.

Nenhum deles tinha voltado desde então.

Não foi um dos melhores momentos de Naomi, com certeza. E embora ela tenha se desculpado para Claire e Audrey por seus modos grosseiros, não tinha ainda chegado a ficar cara a cara com Oliver Cunningham novamente. Por um lado, ela provavelmente lhe devia um pedido de desculpas. Seu gesto tinha sido de boa vizinhança – amigável, até. E ela não tinha sido nada além de rude. Por outro lado, ela estava passando pelo inferno ao tentar separar suas memórias do jovem Oliver Cunningham. A versão cujas maneiras não eram tão bonitas.

Era justo punir um homem pelos erros de um menino? Talvez não.

Mas eles não tiveram apenas xingamentos em sua história. Eles também tinham a mentira descuidada de um menino que literalmente arruinou vidas.

Ela não estava pronta para perdoá-lo por isso, não importava o quão charmoso o homem fosse. Ou quão bonito.

Se ela fosse honesta consigo mesma, sua irritação com a presença dele tinha sido dirigida a ela mesma, por notar o homem. Quando ela ficou cara a cara com ele pela primeira vez em sua entrevista, ela estava muito esgotada por sua presença para registrar corretamente o quão bonito ele era.

Mas outro dia, ela notou. Ela notou como ele perdeu os contornos suaves de seus traços de menino. Percebeu como o nariz, que era um pouco longo demais quando criança, agora estava perfeitamente equilibrado por uma mandíbula forte e um olhar penetrante.

Até suas sobrancelhas eram sensuais. Retas, grossas e escuras, especialmente em contraste com os olhos azuis claros.

Por mais bonito que ele fosse, ela estava um pouco surpresa com o quão reservado Oliver havia se tornado. O menino de que ela se lembrava era barulhento e turbulento, adorava vermes, esportes e terra.

O Oliver adulto parecia não ser capaz de identificar terra nem se ela batesse em seu rosto (agora, esse era um pensamento tentador), e havia uma frieza nele que ela não se lembrava.

Irritada consigo mesma por pensar em Oliver – de novo – Naomi se levantou e, colocando as mãos sobre a cabeça, começou a se alongar enquanto olhava para a tarde chuvosa.

Seu novo apartamento tinha dois quartos e, como ela não precisava de um quarto de hóspedes, ela tinha planos de transformar o segundo em um escritório. Mas os novos móveis que ela encomendou não chegariam até amanhã, o que significava que ela estava trabalhando na mesa da cozinha.

Deena estava certa sobre o amor da equipe pelo arranjo temporário de “trabalhar em casa”. Durante a habitual teleconferência de segunda-feira de manhã, Naomi notou menos maquiagem e mais coques bagunçados e, embora todos tivessem colocado roupas adequadas na parte de cima, ela não ficaria surpresa em saber que, abaixo da visão da câmera, todos vestiam calça moletom.

Ou talvez fosse apenas ela.

Ainda assim, por mais luxuoso que fosse não ter que deixar sua casa e ir para um escritório nas próximas semanas, ela estava aprendendo da maneira mais difícil que sua cadeira de cozinha não tinha sido feita para uma bunda e coluna de quase trinta anos se sentar por longos períodos de tempo.

Naomi pressionou os dedos na parte inferior das costas, arqueando-se para trás enquanto mentalmente começava a escrever um e-mail para um anunciante em potencial cujas táticas agressivas estavam começando a irritá-la. Ela tinha acabado de estabelecer suas frases quando ouviu uma comoção do lado de fora da porta da frente.

Ela ignorou a princípio. Um de seus vizinhos tinha um cachorro que adorava sair do apartamento e se envolver em uma batalha de vontades de cinco minutos com seu dono para decidir se um “ biscoito canino gostosinho” era incentivo suficiente para voltar para casa.

Mas o som continuou, e finalmente ela registrou que isso era diferente. Não houve nenhum tamborilar rápido de patas de cachorro minúsculo ou a voz bajuladora do proprietário idoso prometendo frango.

Este era mais um arrastar de pés lento e murmúrios de juramento ocasionais.

Naomi foi até a porta e verificou o olho mágico. Nada. Lentamente ela a abriu e saiu para o corredor, seus olhos se arregalando de surpresa com a fonte do barulho.

Um homem mais velho estava vestindo um suéter de aparência cara sobre o que parecia ser uma camisa de colarinho perfeitamente engomada.

E na parte de baixo? Cuecas boxer azul claro e meias sociais.

Calças? Não presente.

Ela observou por um momento enquanto ele se arrastava alguns metros e fazia uma pausa. Golpeou a parede levemente com o punho, depois encostou o ouvido na parede como se estivesse escutando alguma coisa. Ele murmurou algo e então repetiu o processo.

— Senhor? — Naomi perguntou timidamente.

Ele ficou imóvel, então lentamente girou sobre os pés ligeiramente instáveis para encará-la.

Naomi ofegou.

Ela tinha imaginado este momento dezenas de vezes. Talvez centenas de vezes. Ela imaginou, em detalhes muito vívidos, o momento em que ficaria cara a cara com Walter Cunningham, o homem que teve um caso com sua mãe e, em seguida, jogou ela e sua mãe na rua como se fossem lixo. Inferno, ele as chamou de lixo.

Ela se imaginou entrando em seu escritório confortável no centro da cidade, o queixo erguido. Ela se imaginou batendo em sua porta e ele com raiva perguntando quem diabos ela era, apenas para desmaiar em choque quando ela contasse a ele.

Ela imaginou vê-lo em um bar, comprando para ele o uísque mais caro do menu e, em seguida, observando sua surpresa ao perceber quem acabara de pagar por sua bebida.

Não tinha sido um punhado de cenários mais vingativos, mas não se tinha chegado perto da realidade do presente.

Naomi não esperava que ele a reconhecesse à primeira vista. Ele mal tinha prestado atenção nela vinte anos atrás, e ela estava muito longe de ser ela mesma com nove anos. Seu cabelo estava vários tons mais escuros do que o laranja neon de sua infância. Sua primeira compra “grande” depois que Maxcessory começou a decolar foi o aparelho, então seus dentes horrivelmente tortos eram coisa do passado. Ela ainda usava óculos, mas apenas à noite e de manhã cedo. E mesmo sem tudo isso, ela simplesmente cresceu.

Mas enquanto ela não esperava que ele a reconhecesse como filha de sua ex-amante, Naomi não estava preparada para a possibilidade de que ele talvez não reconhecesse ninguém.

Seu olhar estava vazio e confuso, e embora ela quisesse desesperadamente odiá-lo – mesmo assim o odiava em algum nível – seu coração torceu um pouco em simpatia.

A névoa em seus olhos clareou ligeiramente, substituída por irritação. Suas mãos foram para seus quadris, sobrancelhas grossas levantadas em uma carranca. Foi um movimento que ela lembrou como sendo extremamente intimidante quando ela acidentalmente derrubou um copo de água quando era menina. O efeito foi diminuído agora pela falta de calças.

— Posso ajudá-la, mocinha?

Oh Deus. Naomi estava completamente perdida aqui. Ela não tinha passado muito tempo com idosos e certamente não com alguém que ela suspeitava ser afetado por demência.

Ela agia como se nada estivesse errado? Ela assumia o controle da situação?

Ela olhou para a porta de Oliver, se perguntando se o homem estava em casa, embora ela suspeitasse que à uma da tarde de uma segunda-feira, ele provavelmente estava no trabalho.

— Você está procurando por Oliver? — ela perguntou timidamente.

A carranca de Walter Cunningham se aprofundou, parecendo perdido em pensamentos. — Oliver... — Sua expressão clareou ligeiramente. — Oliver é meu filho.

— Sim, e ele mora bem ali, — ela disse hesitantemente enquanto caminhava mais para o corredor, apontando para a porta de Oliver. — Você estava procurando por ele?

— Não, eu acho que não, — Walter analisou, olhando para a parede oposta à porta de Oliver. — Eu pensei ter ouvido algo. Uma pessoa.

— Nas paredes? — Naomi perguntou, mantendo sua voz leve.

— Sim.

— É um prédio antigo. Talvez os canos? — disse ela, aproximando-se ainda mais.

— Talvez, talvez. — Ele bateu novamente, então pareceu perder completamente o interesse pelas paredes, virando-se para ela. — Quem é você?

— Meu nome é Naomi. Acabei de me mudar —, disse ela, apontando para a porta aberta.

Walter franziu a testa. — Essa é a casa de Harriet.

— Sim — disse Naomi, aliviada por ele estar mentalmente presente o suficiente para saber disso. A mulher que tinha acabado de desocupar o apartamento de Naomi realmente se chamava Harriet. — Ela se mudou para a Pensilvânia para ficar mais perto de sua filha.

— Vergonha. Todo mundo está indo embora. — Ele a olhou atentamente. — Você viu minha Margaret?

Margaret. A esposa dele. Sua esposa morta. Lá estava novamente. Esse toque de simpatia por um homem que ela passou toda a vida desprezando. Ela franziu os lábios, agora oficialmente em pânico. Ela contava a ele que sua esposa havia falecido? Ou isso apenas o confundiria ainda mais?

— Você mora lá em cima?

Ela manteve o controle sobre os Cunninghams ao longo dos anos e tinha certeza de que eles nunca se mudaram, mas ela não tinha certeza.

— Lá em cima? — Ele franziu a testa. Ele começou a andar além dela. Não em direção às escadas, mas em direção ao próprio apartamento de Naomi.

— Você gostaria de entrar? — ela perguntou desnecessariamente, já que ele já estava entrando em seu apartamento. — Eu poderia fazer um café para nós? Ou chá?

Ela esperava que ele não dissesse chá. Ela não bebeu e não tinha em casa.

— Eu aceitaria um uísque, — ele já estava dizendo, entrando em sua sala em passos mais estáveis do que antes.

Um uísque? Oh céus.

Ela o seguiu até seu apartamento, sorrindo um pouco quando o viu já sentado em seu sofá, puxando um de seus cobertores sobre o colo e pegando o controle remoto. — Tem algum uísque?

— Hmm, vou verificar —, disse ela, ganhando tempo.

E agora? Certamente alguém ficava com ele durante o dia, mas ela não queria deixá-lo sozinho enquanto subia ao apartamento dele para verificar. Ela não tinha o número de telefone de Oliver Cunningham. Ela tinha o número da Sra. Gromwell, a mulher que havia facilitado o processo de mudança, mas não parecia certo ligar para ela sobre assuntos pessoais dos Cunningham ainda.

Espera! Os idosos às vezes não usavam essas pulseiras? As de emergência médica, com um número de contato?

O polegar de Walter pressionou o controle remoto com deliberação, obviamente procurando um canal específico. — Queria que houvesse um jogo de hoje, — ele murmurou antes de parar no History Channel.

— Você gosta de beisebol? — Naomi perguntou casualmente, sentando ao lado dele no sofá, seu olhar examinando seus pulsos. Ela fechou os olhos de alívio quando viu a pulseira de prata em seu pulso esquerdo. Era elegante, em comparação com a pulseira frágil em sua imaginação, mas ela tinha certeza de que o símbolo vermelho era algum tipo de indicador médico.

— Posso ver sua pulseira? — ela perguntou com o que esperava ser um sorriso calmo e amigável.

Não amigável o suficiente, aparentemente. Walter tirou a mão do alcance dela, lançando-lhe um olhar desconfiado. — Quem é você?

Naomi manteve o sorriso no lugar enquanto repetia sua apresentação. — Eu sou Naomi, Sr. Cunningham.

Ele estreitou os olhos e a estudou. — Eu conheço você?

De maneiras que você nem consegue imaginar.

— Nós somos amigos, — ela mentiu suavemente, porque ele estava começando a parecer um pouco assustado sob a relutância. — Eu queria ver sua pulseira.

Ele puxou seu braço ainda mais longe de seu alcance, sua agitação aumentando junto com sua suspeita.

A inspiração atingiu.

— Você sabia que tenho uma empresa de acessórios? — ela perguntou, fingindo perder o interesse em ver a pulseira dele e puxando as pernas para baixo dela no sofá.

— Uma empresa? — Seu olhar se aguçou com atenção, e ela viu um flash do cruel Walter Cunningham em suas memórias.

Ela assentiu. — Eu mesma fundei. É chamada Maxcessory e é por assinatura. Os membros pagam uma taxa anual para receber uma caixa de acessórios selecionados para eles todos os meses. Brincos, pulseiras, colares. Às vezes, um lenço ou óculos de sol.

— Bijuterias femininas.

Naomi não pôde evitar uma risada rápida com a descrição. Era uma coisa masculina antiquada de se dizer, mas seu tom não tinha sido tão depreciativo, mais como tentando entender.

— A maioria dos nossos membros são mulheres —, ela admitiu. — Mas no ano passado introduzimos uma opção para os homens também. Abotoaduras, cintos, lenços de bolso. Vimos um crescimento tremendo.

Ele pareceu pensar sobre isso. — Você deveria colocar alguns suspensórios na mistura. Não consigo encontrar nenhum bom hoje em dia.

— Vou falar disso para a equipe —, garantiu Naomi. E o faria, porque cumpria as promessas, embora tivesse quase certeza de que os suspensórios não eram um nicho de mercado apropriado para os clientes da Maxcessory.

Ela continuou, mantendo sua voz casual e calma. — Não sei se tenho algum dos acessórios masculinos aqui no meu escritório em casa, mas gostaria de ver o que estamos enviando para as mulheres?

Walter não parecia convencido. — Você tem lucro com isso?

Naomi citou a receita astronômica da Maxcessory do ano anterior, e as sobrancelhas grossas de Walter subiram. — Tudo bem. Eu gostaria de dar uma olhada. Eu costumava investir em negócios, sabe.

Ela sabia, mas o dinheiro do investimento dele, real ou imaginário dado seu estado atual, não era seu objetivo.

Naomi entrou em seu escritório. Ela ainda não tinha os móveis de sua mesa, mas havia organizado seu inventário da melhor maneira possível em caixas ao longo da parede. Ela escolheu uma variedade de itens com ênfase em um tipo de jóia em particular.

Voltando para a sala, ela colocou as peças na mesinha de centro e Walter se ajeitou no sofá para dar uma olhada. Ele deu um tapinha no bolso direito do peito, onde ela imaginou que ele costumava manter seus óculos. — Droga, — ele murmurou. — Esqueci meus óculos.

Ele se contentou em trazer as peças bem perto do rosto, estudando cada item com mais interesse do que ela esperava, já que eram todas “bugigangas femininas”.

— A qualidade parece muito boa —, admitiu.

— Sim, estou de olho nos produtos de alta qualidade que podem ser facilmente dimensionados, já que precisamos de milhares de cada peça. É por isso que eu estava tão interessada em sua pulseira, — ela disse casualmente. — É um péssimo hábito meu estudar praticamente qualquer joia que eu possa encontrar.

Ele olhou para o pulso por um momento, como se estivesse surpreso ao ver a pulseira ali. Então ele encolheu os ombros. — É melhor do que a última que me deram. Melhor qualidade. Metal bom, vê?

Ela fechou os olhos de alívio quando o viu agarrar o fecho.

— Você precisa de ajuda? — ela perguntou. — As pulseiras são sempre difíceis de colocar e tirar com uma só mão.

Sem dizer nada, ele estendeu o pulso para ela, e os dedos de Naomi rapidamente encontraram o fecho e o removeram antes que ele pudesse mudar de ideia novamente.

Num piscar de olhos, a atenção de Walter se desviou dela e das joias, e voltou para a TV, onde o narrador monótono estava descrevendo os detalhes horríveis de uma batalha da Primeira Guerra Mundial.

Naomi olhou para a pulseira.

Walter estava correto – a pulseira em si era bonita. Adorável para uma peça masculina, com metal grosso e excelente acabamento nos elos.

A inscrição, entretanto...

Mesmo que ela tivesse uma boa noção do que veria ali, as duas primeiras linhas da inscrição ainda causaram uma pontada de tristeza.

Walter Cunningham. Alzheimer.

Ela exalou.

Abaixo disso havia um nome e um número de telefone.

Com um rápido olhar para ver se Walter não iria pirar com ela, ela se levantou e foi até o balcão onde havia conectado o celular.

— Você tem uísque? — Walter perguntou novamente, sem se virar.

— Vou dar uma olhada em um minuto —, disse ela, digitando o número do telefone da pulseira de Walter e, com um olho na nuca cinza de Walter, levou o telefone ao ouvido quando ele começou a discar.


Capítulo Onze


SEGUNDA-FEIRA, 8 DE OUTUBRO


Não era a primeira vez que Janice ligava para ele para informá-lo com calma e se desculpando de que seu pai havia saído de casa, mas nunca ficaria fácil ouvir essas más notícias.

Oliver mordeu o interior da bochecha para não gritar com o motorista do táxi para ir mais rápido. Não era culpa do motorista que o tráfego de Manhattan geralmente fosse uma droga. Não era culpa do motorista que seu pai tivesse saído de casa.

Nem mesmo era culpa de Janice. Ela já havia se desculpado demais, mas ele sabia muito bem que era um risco ter uma pessoa sozinha cuidando do seu pai. A mulher tinha que usar o banheiro em algum momento, e ela não poderia trancar seu pai enquanto o fazia. E considerando que Walter frequentemente deixava de comer alegremente seus ovos cozidos e decidia dar uma caminhada em cinco segundos...

Oliver só esperava que seu pai não tivesse ido muito longe. Na maioria das vezes, ele ia para o andar de um dos vizinhos ou para o apartamento de Oliver. Janice verificou todos os lugares habituais e, em seguida, procurou a opção mais alarmante: o Central Park.

Ironicamente, seu pai sempre recusou os pedidos infantis de Oliver para ir ao parque jogar bola, mas em seu estado atual, ele amava o parque. O problema era que o Central Park tinha mais de três quilômetros quadrados. Walter não se movia muito rápido, mas era muito difícil tentar localizar um homem.

Oliver estava parado em um semáforo a duas quadras de seu apartamento, debatendo se seria mais rápido sair e andar o resto, quando seu celular tocou.

Era um número desconhecido, mas Oliver respondeu sem hesitar, mesmo enquanto se preparava para más notícias.

Seu tom foi seco. — Oliver Cunningham.

— Oliver, oi.

Ele franziu a testa. A voz era feminina e rouca. Distintamente rouca. — Naomi?

— Sim. Oi. Hum, bem, ok, não há maneira não-estranha de dizer isso... Estou com seu pai aqui?

Sua mão caiu da maçaneta da porta do táxi, seu corpo caiu para trás de alívio. — Aqui? Tipo, ele está no seu apartamento?

— Sim. Eu o encontrei vagando pelo corredor fora de sua porta. Ele está bem, — ela disse suavemente, antecipando sua próxima pergunta. — Ele está assistindo TV e exigindo uísque?

Oliver sorriu levemente. Levando tudo em consideração, os dias de uísque eram bons no mundo de Walter Cunningham. Uma conexão com seu antigo eu, que tinha afinidade com Macallan.

— Não me julgue por perguntar —, disse Naomi lentamente, — mas ele pode?

— Ele pode o quê? — Oliver perguntou, pescando algumas notas da carteira e entregando-as ao motorista do táxi. Ele saiu do táxi sem esperar pelo troco.

— Eu tenho um pouco de uísque... — Ela parou.

Seu alívio por saber que seu pai estava seguro e confortável em vez de perdido na cidade estava se estabelecendo agora, e Oliver sorriu quando saiu para a calçada. — Sra. Powell. Você está sugerindo dar álcool ao meu pai doente no meio da tarde?

— Certo, — ela disse rapidamente. — Esqueça. Eu não sei o que...

— Um dedo com gelo e um pouco de água. Um grande pouco. Ele vai reclamar, mas se você disser que é isso ou nada, ele vai se acalmar.

Houve um momento de hesitação. — Verdade?

— Sério, — Oliver garantiu a ela. — Escute, a cuidadora ainda está procurando por ele. Eu preciso ligar para ela. Mas estarei aí em alguns minutos. Você está bem até então?

— Estamos bem.

— Bom. Obrigado. Vejo você em alguns minutos.

Ele desligou o telefone e ligou imediatamente para Janice, que atendeu ao primeiro toque, um pouco ofegante. — Você o encontrou?

— A vizinha encontrou. Ele estava fora do meu apartamento.

Sua respiração saltou de alívio. — Graças a Deus. Qual vizinha? Por que ela não me ligou?

— A vizinha nova, — Oliver esclareceu enquanto subia a Park Avenue. — Ela não tem o seu número de telefone, mas vou garantir que ela o receba.

— Sinto muito, Sr. Cunningham, não vai acontecer de novo...

— Sim, vai, — Oliver disse gentilmente. — Nós dois fazemos o nosso melhor, mas somos humanos, Janice. E pela centésima vez, me chame de Oliver.

— Sim. Oliver, — ela disse rigidamente, claramente desconfortável. — Mas eu realmente sinto muito. Eu fui ao banheiro, ele não ficou fora da minha vista por mais de um minuto.

— Eu sei —, disse ele, sentindo uma onda de arrependimento. Não por causa de Janice, ele quis dizer o que disse. Mesmo uma cuidadora em tempo integral não poderia estar com Walter a cada segundo de cada dia. Mas triste pela doença. Porque, embora esses momentos assustadores fossem raros agora, é possível que nem sempre sejam.

— A nova vizinha é no 2B, certo? — ela disse, seu tom voltando ao seu modo normal e direto. — Posso chegar lá em menos de dez minutos para encontrar o Sr. Cunningham.

— Não se preocupe com isso. Estou mais perto.

Ela bufou em desânimo. — Você saiu do trabalho.

— Eu saí. Não é grande coisa, eu não tive nenhuma reunião que não pudesse ser remarcada. Por que você não tira a tarde de folga?

— Oh, eu não poderia.

— É uma ordem, Janice — disse ele ao entrar pela porta principal do prédio. — Papai e eu veremos você mais tarde esta noite.

Ela aparentemente o conhecia bem o suficiente para saber que discutir neste ponto era inútil. — Tudo bem. Obrigada, Sr. Cunningham.

Ele revirou os olhos. Ele não sabia por que se incomodava em dizer me chame de Oliver. Oliver subiu as escadas de dois em dois degraus até ficar do lado de fora do apartamento de Naomi Powell.

Ele ouviu o som inconfundível do History Channel tocando suavemente do outro lado da porta e cedeu a um momento de fraqueza, apoiando a testa levemente na parede do lado de fora do apartamento dela, reconhecendo seu alívio por seu pai ter sido encontrado por alguém gentil.

Ele puxou a cabeça para trás com isso. Gentil não era uma palavra que ele jamais pensou que pudesse ser aplicada à espinhosa Sra. Powell, mas não havia como se enganar quanto à gentileza em seu tom ao telefone. Isso deu ao tom rouco de sua voz um novo nível de intriga.

Ele ergueu a mão e bateu.

Naomi abriu a porta, e a boca de Oliver ficou seca, sua língua grudando no topo da boca por um longo e humilhante momento. Ela não parecia glamourosa. Longe disso. Seu cabelo estava liso e preso atrás das orelhas, seu rosto sem maquiagem, ou pelo menos qualquer coisa que ele pudesse notar.

Foi o traje que o pegou.

Calças pretas justas o suficiente para ele saber o formato exato de suas coxas, cortadas no meio da panturrilha, e até este momento ele não tinha entendido por que era escandaloso para mulheres mostrarem seus tornozelos naquela época.

Era porque tornozelos e pés descalços podiam ser sexy.

Graças a Deus ela usava um suéter largo, porque ele achava que não conseguiria lidar com nada justo acima da cintura. Embora o suéter caísse um pouco em um ombro, revelando a alça fina de um sutiã ou top e...

Naomi deu a ele um olhar irritado. — O que há com você?

Ele balançou sua cabeça. Certo. — Desculpe —, disse ele, passando a mão pelo cabelo. — É sempre um pouco enervante quando meu pai sai. Acho que ainda estou desequilibrado.

A consciência de Oliver estava balançando a cabeça em desaprovação. Ele realmente tinha usado seu pai doente para evitar admitir que estava encarando Naomi?

— Compreensível, — ela disse, hesitando por apenas um breve momento antes de se afastar. — Entre.

O olhar de Oliver foi direto para a TV, na frente da qual seu pai estava, sentado no sofá branco de Naomi. Sua consciência estava ligeiramente apaziguada pelo fato de Oliver realmente estar aliviado ao ver seu pai sentado pacificamente. Seguro e confortável.

— Oi, pai, — ele disse, mantendo sua voz alegre e casual enquanto caminhava até a sala de estar.

Os olhos de Walter se afastaram relutantemente da tela da televisão para Oliver. Walter ergueu o copo na mão. — A garota me deu uísque. Um muito bom, mas ela diluiu demais.

— Hmm, vou falar com ela sobre isso —, disse ele, observando o rolar de olhos de Naomi pelo canto do olho, embora ela não o chamasse a atenção sobre como ela estava apenas seguindo suas instruções.

— Diga, pai, o que você acha de irmos terminar de assistir esse programa lá em cima para que possamos deixar a Sra. Powell voltar para a sua programação?

A atenção de seu pai já estava de volta na TV. — Não acabei minha bebida.

— Aposto que ela nos deixaria levar conosco e devolver o copo depois, — Oliver disse. Então ele olhou para Naomi para confirmação.

— Vocês, homens Cunningham, gostam de ficar com minha porcelana.

— Sentindo falta daquela caneca, não é? — ele perguntou, referindo-se à xícara de café cheia de champanhe que ela deixou no fim de semana.

— Era uma das minhas favoritas.

— Como ela era?

Ela franziu os lábios. Ela não tinha a mínima ideia de como era, e os dois sabiam disso. — Era única.

Oliver entrou na cozinha, abriu o armário à direita da pia – adivinhando corretamente da primeira vez – e se virou para encará-la, com as sobrancelhas erguidas.

Seus lábios franziram ainda mais. Havia quase uma dúzia de canecas no armário, que ele conhecia, já que ele a viu desempacotando-as no dia da mudança.

— Mas com certeza, — ele disse friamente, fechando o armário mais uma vez. — Com certeza vou me apressar em devolver a que você me emprestou.

Em vez de responder, ela contornou o balcão da cozinha em direção a ele, abrindo o armário que ele acabara de fechar. Seus dedos se roçaram, apenas por um momento, e ela ficou perfeitamente imóvel antes de empurrar a mão dele e puxar duas canecas do armário.

Ela colocou as duas no balcão e, em uma pergunta silenciosa, ergueu a garrafa de uísque de onde servira a bebida de seu pai.

Ele acenou com a cabeça em resposta silenciosa. De modo geral, ele não costumava beber durante o dia, mas também não estava acostumado a batalhas verbais com mulheres atraentes que moravam ao lado.

— Gelo?

— Por favor — ele disse enquanto ela abria o freezer. — Um cubo.

Ela jogou um cubo de gelo no dele, dois no dela e entregou-lhe uma caneca.

O dela dizia Trabalhe, Brinque, Mate em letras rosa choque, o dele tinha um gatinho idiota de desenho animado. Ele apostava dez dólares que a seleção não foi acidental.

— Um brinde, — ele disse antes que ela pudesse tomar um gole.

Naomi olhou para sua caneca com ceticismo. — A quê?

— Bem, eu não estou morto ainda, — Oliver disse ironicamente. — Mais do que eu esperava com base no nosso encontro no sábado. E na sua entrevista.

Ele quis dizer isso de brincadeira, mas ela estremeceu ligeiramente, e tarde demais ele se lembrou: Brayden Hayes. Ela pode não ter sido casada com o homem, mas provavelmente ela se importava com ele se eles estivessem dormindo juntos.

— Merda, — ele murmurou. — Eu não estava pensando.

— Esqueça —, disse ela. — Falando nisso, antes que eu esqueça... — Ela pegou a pulseira médica de Walter do balcão e entregou a Oliver.

Ele aceitou o peso da pulseira masculina. Ele a comprou para seu pai depois de cerca de uma dúzia de brigas sobre a antiga ser “muito metida”. Quando o pai era lúcido, ele dizia isso o suficiente para saber que na realidade de Walter Cunningham os homens não usavam joias.

— Estou surpreso que você tenha conseguido arrancar dele, — Oliver disse, balançando a pulseira em sua mão.

— Oh, jogamos aquilo de ‘você me mostra o seu, eu te mostro o meu’.

Oliver engasgou com seu uísque. — Desculpe?

Ela gesticulou para a mesa de centro, onde uma variedade de peças de joalheria estavam espalhadas. — As vantagens de administrar um negócio de acessórios. Tenho muitas peças disponíveis.

— Maxcessory, — Oliver disse distraidamente.

Naomi deu a ele um olhar curioso.

— Estava na sua inscrição —, explicou ele.

— Falando naquele dia, por que você me colocou na próxima fase?

— Você quer dizer depois que você saiu do escritório sem motivo?

— Oh, eu tive motivos, — ela disse em sua bebida.

— Se importa de me dizer quais?

Ela largou a caneca com um baque surdo. — Você é muito...

Naomi acenou com a mão em direção a ele, franzindo o nariz enquanto tentava pensar na palavra certa.

— Educado? Profissional? — ele perguntou, relembrando a entrevista de sua perspectiva.

— Desdenhoso. Arrogante. Você deixou claro que eu não me encaixava.

— Arrogante? E você acha que eu sou esnobe.

— Eu não disse esnobe —, disse ela, tomando um gole de uísque. — Eu disse arrogante.

— Você é impossível, — Oliver murmurou, tomando o resto de sua bebida, saboreando a queimadura. — Pai, vamos embora.

Walter não respondeu.

— Pai. — A voz de Oliver estava um pouco mais áspera do que normalmente usava com seu pai, mas ele precisava sair daqui antes que fizesse algo absurdo. Como beijar a mulher de quem ele nem tinha certeza se gostava. E quem definitivamente não gostava dele.

Walter lançou-lhe um olhar cruel por cima do ombro. — O que?

— Vamos.

Seu pai estava com uma expressão rebelde no rosto, e Oliver suavizou seu tom. — Janice disse que gravou o jogo dos Yankees de ontem. Eu não vi ainda.

Walter encolheu os ombros e voltou para o History Channel. — Você pode ir assistir, então. Eu já vi isso. Cinco a quatro para os Angels.

Claro, isso ele se lembra. Oliver imediatamente se arrependeu do pensamento frustrado e baixou o queixo contra o peito, derrotado. Cansado.

Ele quase esqueceu que Naomi estava lá, até que sua voz baixa veio, mais baixa do que o normal. Mais suave. — Quando ele foi diagnosticado?

— Alguns anos atrás.

— Tenho certeza de que foi um choque.

Oliver deu de ombros. — Houve alguns sinais de alerta, então uma parte de mim estava preparada para isso, mas... sim. Ainda foi um choque, especialmente logo após a morte da minha mãe.

— Sinto muito, — ela disse genuinamente, embora um pouco rígida. — Isso deve ter sido difícil.

Ele exalou. — Até então, eu pensava que câncer era o pior diagnóstico que alguém poderia receber. Foi o caso da minha mãe. Ela se foi onze meses depois que o médico nos deu a notícia. Mas isso... — Oliver inclinou a cabeça em direção ao pai. — É um outro nível de dificuldade. É lento, é inconsistente. Alguns dias é quase como se eu tivesse meu pai de volta, outros dias ele se perdeu completamente para mim.

Naomi olhou para a nuca de Walter, rolando a caneca entre as mãos pequenas. — Quem cuida dele enquanto você trabalha?

— Uma cuidadora em tempo integral. Ela é ótima, mas os pacientes com Alzheimer são imprevisíveis. Um segundo eles estão assistindo TV e você acha que está tudo bem fazer uma pausa rápida para ir ao banheiro, no momento seguinte...

— Isso acontece muito?

— Não. Ainda bem. Mas se aumentar, terei de considerar uma casa de repouso para ele. Só estou grato por ele não ser violento.

Seus olhos se arregalaram. — Ele era... antes...

— Não, — Oliver disse rapidamente. — Quer dizer, ele podia ser um filho da puta frio antes da doença, mas nunca levantou a mão para mim ou para minha mãe. Principalmente ele era só... indiferente. Mas os pacientes com Alzheimer podem se frustrar facilmente e atacar. Não é tão importante quando é uma mulher frágil de um metro e meio, mas um homem de sessenta e poucos anos com uma vida inteira de jogos regulares de squash atrás dele...

Oliver exalou e afrouxou a gravata. — Não sei por que estou lhe contando tudo isso. Mas, novamente, obrigado.

— Qualquer um teria feito o mesmo.

Ele balançou sua cabeça. — Convidar um homem estranho para a casa de uma mulher solteira? Acho que não.

Suas sobrancelhas vermelho-escuras se ergueram. — Não tenho certeza se o diferenciador “solteira” era necessário.

— Uma mulher morando sozinha, — ele emendou.

— Melhor, eu acho, — ela disse relutantemente. — Mas por que você continua presumindo que estou solteira? Brayden faleceu há alguns meses, e eu não namorei com ele por muito tempo. Tempo suficiente para seguir em frente.

Por algum motivo, a ideia de ela não ser solteira tornava seu mau humor ainda pior. — Desculpe ser presunçoso. Quem é o sortudo?

Ele colocou apenas a menor ênfase sarcástica no sortudo de provocá-la.

Ela se esquivou da pergunta. — E você? Alguma senhora morrendo pelo papel de Sra. Cunningham?

Havia uma nota de interesse sob seu tom sarcástico? Ou apenas um pensamento positivo da parte dele? E então, chocado com o que estava prestes a fazer, mesmo enquanto esperava que seu pai ficasse de boca fechada, Oliver assentiu. — Há alguém.

— Oh sim? Qual é o nome dela? Não, deixe-me adivinhar...

— Lilah, — ele deixou escapar. Foi o primeiro nome que ele pensou, cortesia de sua recepcionista, sempre tentando arranjar para ele uma prima de mesmo nome.

— Mmm. E o que você e Lilah fazem para se divertir? Ópera? Degustação de caviar?

— Obviamente. Quando não estamos em nossa visita ao Met três vezes por semana ou discutindo sobre Tolstói durante o chá. A menos que seja nossa noite de xerez e poesia às sextas.

Seus lábios se contraíram em um sorriso revelador que ela puxou de volta na hora certa. — Agradável.

— E você e... Bob? — disse ele, fornecendo o primeiro nome que lhe veio à cabeça.

— Não é o seu tipo de cara. Muito Stock Car. Corrida de touro. Competição de cuspir.

— Competição de cuspir.

— Quando ele não está se tatuando.

— Como você sabe que eu não tenho uma tatuagem?

Ele quis dizer a pergunta provocativamente, mas a maneira como o olhar dela rapidamente vagou sobre ele parecia provocador de uma maneira totalmente diferente.

Seus olhos azuis voltaram para os dele. — Caveira?

— Palhaço.

— Da variedade bizarra de Stephen King?

— Claro. Existe algum outro?

Por uma fração de segundo, eles sorriram um para o outro, a diversão substituindo a animosidade. Mas antes que pudesse florescer em algo mais, Walter decidiu que já tinha assistido History Channel o suficiente, entrando na cozinha e indo direto para a garrafa de uísque.

Oliver o tirou de seu alcance e seu pai lançou-lhe um olhar exasperado. — Me dê isso.

— Não é nosso, pai. É da Sra. Powell.

Ela abriu a boca, provavelmente prestes a oferecer mais para ser hospitaleira, mas fechou-a antes de dizer qualquer coisa. Ele ficou grato por ela ter visto seu comentário como era: menos educação, mais limites ao consumo de álcool do pai.

Oliver deixava seu pai beber às vezes. Os médicos franziam a testa, mas o homem já havia perdido muito. Oliver não suportava tirar esse prazer simples também.

Mas ele era cuidadoso com isso. E ele queria ver como a bebida que Walter já havia tomado se misturaria com seu humor atual.

Walter olhou para Naomi. — Quem é ela?

— Eu sou Naomi, Sr. Cunningham, — ela disse, provavelmente não pela primeira vez naquele dia.

Ele lançou-lhe um olhar severo, para cima e para baixo de uma forma degradante que era muito Walter antes de sua doença, mas não houve alívio ao ver o velho Walter. O velho Walter, para dizer a verdade, tinha sido um asno mulherengo.

Walter sorriu para Naomi. — Você se parece com sua mãe.

Oliver respirou fundo para ter paciência, sabendo que não adiantava dizer ao pai que Walter não conhecia a mãe de Naomi.

— Tudo bem, pai, hora de ir — Oliver disse com firmeza, pegando sua pasta.

Seu pai não se mexeu. Nem Naomi – eles pararam, travados em um estranho concurso de olhares. Ele esperava que Naomi parecesse nervosa, e ela ficou um pouco, mas também parecia zangada, o que não era justo. Não era culpa de Walter ele estar doente.

— Ele não sabe o que está dizendo, — Oliver disse rigidamente. Ele odiava ter que explicar a condição de seu pai na frente de seu pai, mas ele tinha que dizer algo para tirar aquele olhar de seu rosto.

Ela engoliu em seco e deu a Oliver um olhar fugaz, mas o flerte anterior tinha acabado.

Em vez disso, ela assentiu rigidamente e, um momento depois, ele e o pai foram conduzidos para o corredor como lixo indesejado.

Walter baixou os olhos para o corpo e franziu a testa. — Onde estão minhas calças?

— Ótima pergunta, — Oliver murmurou.

Ele colocou a mão no ombro do pai. — Vamos. Vamos pegar uma calça para você.

— Eu poderia comer alguns ovos, — Walter estava murmurando. — E talvez um pouco de uísque. Onde está minha pulseira?

Oliver obedientemente respondeu às perguntas do pai, entregou a pulseira e começou a seguir o pai até o elevador.

Mas não antes de lançar um último olhar pensativo para a porta fechada de Naomi Powell, mais certo do que nunca de que estava faltando uma peça crucial do quebra-cabeça.

E mais determinado do que nunca a resolvê-lo.


Capítulo Doze


QUARTA-FEIRA, 10 DE OUTUBRO


— Ok, você não pode esperar que eu ouça tudo isso e não implore para você assinar um contrato.

Naomi deu um sorriso evasivo e tomou um gole de seu cabernet. Era medíocre, mas o produtor insistiu em escolher o vinho e ela não era especialista o suficiente para se importar.

— Sério, Naomi. — Dylan Day inclinou-se para a frente e deu-lhe um sorriso muito mais sincero do que o dela. — Você tem uma história de vida e tanto.

Essa era uma maneira de dizer.

— Agora, qual parte foi mais cativante, — disse Naomi, colocando os cotovelos sobre a mesa e apoiando o queixo nos dedos entrelaçados enquanto olhava para ele. — A parte em que não havia figura paterna? O fato de que minha mãe era uma bagunça cujos talentos principais eram ser demitida e despejada? Ou que minha ideia de viver bem era poder comprar manteiga de amendoim de marca para acompanhar meus jantares de bolo de arroz?

— Ouro. Tudo isso, — Dylan disse sem hesitação. — Você é uma lutadora. Uma oprimida. As pessoas adoram essa merda. Sua história tem quase tudo.

— Quase? — Naomi não conseguia deixar de perguntar.

Dylan ergueu a garrafa de vinho e encheu a taça dela, depois a própria. — Romance, bebê. Definitivamente, sua história carece de homens.

— Talvez porque estou focada em construir um império —, disse ela com um pouco de nervosismo. Honestamente, ainda havia pessoas que pensavam que a vida de uma mulher não era completa sem um homem?

— Claro, claro, — Dylan concordou prontamente. — E Maxcessory será o coração da história. Só estou dizendo que há uma lacuna aí. Ninguém vai acreditar que alguém que se parece com você não deixou para trás uma série de corações partidos.

Havia um elogio ali, mas também havia uma pergunta. Onde estava o Príncipe Encantado desta história? O Mr. Big? Por que não havia nenhum Ross para sua Rachel, nenhum Jim para sua Pam?

Não era uma pergunta que ela particularmente queria responder. Tinha sido estranho o suficiente compartilhar o funcionamento interno de sua vida profissional. A única razão pela qual ela estava considerando assinar o contrato e dar sua história para a rede de televisão era a esperança de que talvez sua história pudesse inspirar alguém.

Se pelo menos uma garota, em algum lugar, soubesse que era possível superar uma infância seriamente horrível, a invasão de privacidade valeria a pena. Se Naomi empoderasse outra mulher a saber que ela não precisava da casa com cerca branca ou da mãe assadora de biscoitos ou de um diploma de uma prestigiosa faculdade para fazer algo que se orgulhe, então Naomi poderia tolerar a ideia de “se vender”.

Sua vida pessoal, no entanto... isso era diferente. Para começar, não havia inspiração ali. Qualquer menina que sonhasse em ter tudo – o marido amoroso e uma carreira próspera – teria que encontrar outro modelo, não Naomi Powell.

O problema não era que ela não tivesse homens em seu passado. Era que ela tinha mais do que se importava em contar. Homens que entraram em sua vida e partiram, sem nenhuma das partes feridas, ou mesmo afetadas, pelo encontro. A exceção, talvez, sendo Brayden Hayes, cuja partida foi da variedade mais trágica.

Esse tipo de porta giratória romântica tinha sido exatamente como Naomi queria, mas havia algo nitidamente desconfortável em ter que dizer, em voz alta, que ela nunca tinha se apaixonado. Que ela não tinha certeza se era mesmo capaz disso. Parecia vagamente espalhafatoso confessar que ela tratava o romance mais como uma diversão, especialmente para alguém que ela tinha quase certeza de que não se importaria em ser uma dessas distrações.

— Vamos lá — disse Dylan com um sorriso bajulador. — Apenas me dê uma dica. Algo para trabalhar. Um amor de infância. Um estranho misterioso com o qual você sempre se cruza. Um caso ilícito?

A mão de Naomi congelou ligeiramente no último lugar da lista. Como ele...

Ela olhou atentamente para ele, procurando por quaisquer sinais de que ele sabia sobre Brayden, que sua lista de possíveis homens tinha sido mais do que sua imaginação no trabalho.

Ele balançou as sobrancelhas. — Ou se você me dissesse que estava esperando que um produtor de TV muito bonito e charmoso viesse em sua direção e te surpreendesse, eu não ficaria chateado.

Ela relaxou ligeiramente. Naomi não tinha vergonha de seu relacionamento com Brayden – não é como se ela soubesse que ele era casado. Mas ela se importava o suficiente com Claire para querer manter seu caso o mais longe possível de Dylan Day.

— Você está perguntando em nome da StarZone? — Ela perguntou, referindo-se à produtora que pretendia produzir o show. — Ou como Dylan Day?

Ele sorriu, rápido e sem remorso, seus olhos sorrindo e abertos. — Posso perguntar como ambos?

Naomi riu enquanto examinava o salão, querendo se apressar para pagar a conta. — Você é persistente.

— Eu quero o que eu quero, — ele disse, levantando um dedo para sinalizar para o garçom. Dylan pagou o jantar em seu cartão corporativo e, alguns minutos depois, ajudou-a a vestir o casaco enquanto saíam para a noite de outono.

— Há um ótimo bar de coquetéis ao virar da esquina. A saideira? — Os dedos dele roçaram seu pescoço sob o pretexto de libertar uma mecha de cabelo presa em seu brinco quando ele perguntou, e Naomi esperou pelo formigamento. Até quis.

Nada.

Ela ficou aliviada e decepcionada. — Na verdade, eu deveria ir para casa — disse ela, apontando na direção de seu apartamento.

Para seu crédito, ele sabia quando recuar. — Vou chamar um táxi para você.

— Moro a apenas alguns quarteirões de distância. Eu posso ir andando.

— Eu mencionei que sou do Alabama? — Dylan perguntou, adicionando um pouco de sotaque sulista à sua voz.

— E?

— E fui criado para deixar uma mulher em casa, caminhando ou não —, disse ele, gesticulando para que ela guiasse o caminho.

Naomi deu de ombros, aprendendo rapidamente que a melhor maneira de lidar com Dylan Day era escolhendo bem suas batalhas. Meio quarteirão depois, ela estava lamentando sua decisão. O que ela esperava que fosse uma caminhada semi silenciosa, saboreando o início do ar de outono, rapidamente se transformou em uma nova negociação.

— Não é minha intenção forçar você —, disse Dylan pela terceira vez. — É que realmente queremos fazer isso para a temporada de outono e garantir que tenhamos o elenco certo, o time certo...

Ele falou monotonamente por mais dois quarteirões sobre a oportunidade, como a exposição era exatamente o que poderia levar o negócio dela para o próximo nível, como era a chance de uma vida...

Finalmente seu prédio apareceu e ela pôde dizer sem hesitar que nunca tinha ficado tão feliz em ver o número 517 da Park Avenue. Eles pararam em frente ao prédio dela e ela o encarou. — Quanto poder eu terei?

— Desculpe?

— Se eu concordar com esse programa, posso revisar o roteiro? Posso dar minha opinião no elenco? Nas histórias que vocês contam?

Ele hesitou. — Bem, você iria trabalhar diretamente com a nossa equipe para acertar os detalhes de Max...

— Max?

— É assim que pretendemos chamar o show. Uma abreviação cativante do nome da sua empresa, fácil de lembrar.

Naomi concordou. Ela não odiou

— Eu quero fazer isso, — ela disse a ele honestamente. — Mas há partes da minha vida que estão fora dos limites.

— Quais partes?

Ela sorriu lentamente. — Aquelas que eu não te contei.

— Os homens?

Ela riu de sua persistência. — Entre outras coisas.

Ele balançou sobre os calcanhares, as mãos nos bolsos. — Que tal um cara? Deve haver um sobre o qual possamos conversar. Investidor sexy em sua empresa, talvez um pouco fora dos limites?

Naomi balançou a cabeça novamente. — Mirei especificamente em investidores do sexo feminino que entenderiam minha visão.

— Que tal um charmoso produtor de TV?

Naomi revirou os olhos. — Boa noite, Dylan.

Ele segurou o braço dela. — Olha, Naomi. Há um conflito de interesses aqui, eu entendo. E se eu entregar a proposta do seu programa ao meu chefe? Sou apenas o produtor adquirente, de qualquer maneira. Dessa forma, você não estará tecnicamente misturando negócios e prazer saindo comigo.

— Não sabia que íamos sair.

— Eu estava chegando lá —, disse ele, seu sorriso arrogante e a lembrando desconfortavelmente da noite em que ela conheceu Brayden em um bar de vinhos do West Village. O sorriso de Brayden era igualmente arrogante, seu nível de confiança era incrível, e ela acreditou. Cada pedacinho dele. E talvez não fosse justo comparar Dylan a Brayden apenas porque eles eram rápidos com um sorriso e uma fala, mas tudo que ela conseguia pensar era que não parecia o suficiente.

Pela primeira vez na vida, ela teve a sensação de que talvez ela quisesse mais, merecesse mais, do que um caso com um cara bonito. Perceber isso foi... irritante. Ela nunca havia analisado em excesso casos com caras antes. Normalmente, ela escolhia aqueles que eram descomplicados, a faziam rir e não a faziam sentir nada muito profundo.

Em outras palavras, Dylan Day era exatamente o tipo dela. E ainda...

— Dylan, fico lisonjeada, mas...

Sua rejeição congelou em seus lábios quando outro casal se aproximou de sua direita. Ela olhou na direção deles, então de volta para Dylan, então seu olhar voltou para o casal novamente. Para a metade masculina do casal, de qualquer maneira.

Oliver Cunningham encontrou seu olhar firmemente antes de olhar para Dylan, sua expressão ilegível.

Bem, merda.

A mulher com Oliver estava tagarelando, sem saber da atenção de Oliver em Naomi. Desconhecendo Naomi e Dylan completamente. Oliver disse algo que fez a mulher rir, e ela pegou a mão dele.

O estômago de Naomi apertou e foi nesse momento que ela percebeu:

Lá estava.

A sensação de que ela tinha sentido falta a noite toda com Dylan Day acabara de ocorrer com Oliver Cunningham, de todas as pessoas. Essa consciência, esse desejo. Certamente a razão para de repente achar que precisava de uma relacionamento duradouro, não tinha haver com seu inimigo de infância.

Mas então ficou muito pior, porque enquanto ela observava Oliver sorrir para a outra mulher, outra emoção tomou conta. Ciúmes.

Seus olhos se fecharam. Isso não estava acontecendo. Ela não estava realmente com ciúmes... qual era o nome da namorada de Oliver? Layla? Lana?

— Naomi? — A voz de Dylan estava confusa.

Ela abriu os olhos. — Desculpe. Devo ter bebido muito vinho.

A namorada de Oliver deu uma risadinha, mas Naomi manteve seu olhar propositalmente em Dylan, ignorando o outro casal.

— Devíamos sair de novo. Definitivamente — ela disse.

Dylan piscou surpreso, inteligente o suficiente para ter percebido que apenas alguns momentos atrás ela estava se preparando para rejeitá-lo.

Ele se recuperou rapidamente. — Certo. Sexta-feira?

— Feito —, disse ela antes que pudesse mudar de ideia. — Te mando uma mensagem?

— OK...

— Ótimo. Ansiosa por isso. — Naomi deu um passo à frente e lhe deu um beijo rápido na bochecha para encerrar a conversa.

Ela manteve o ritmo deliberadamente lento enquanto caminhava em direção à porta da frente, casualmente procurando as chaves em sua bolsa, mesmo com o coração batendo forte, muito mais ciente de Oliver e seu par do que de Dylan Day.

Ainda assim, ela não olhou para trás, e uma vez dentro do prédio, encostou-se na parede, apenas por um segundo.

Isso tinha acabado de acontecer?

Ela acabou de concordar em um encontro com Dylan simplesmente porque ela não podia suportar a ideia de que ela poderia realmente querer sair com ele... A porta da frente se abriu, e ela abriu os olhos para ver Oliver Cunningham, portando seu costumeiro terno azul marinho conservador com um brilho impermeável.


Capítulo Treze


QUARTA-FEIRA, 10 DE OUTUBRO


Do jeito que Naomi quase correu para dentro do prédio, Oliver presumiu que ela estaria na segurança de seu apartamento antes que ele chegasse à porta principal.

Em vez disso, ele parou, surpreso ao encontrá-la ainda parada ali.

Por um longo momento, nenhum dos dois disse uma palavra enquanto trocavam um olhar cauteloso.

— Então, — ela disse, levantando-se diretamente de onde estava encostada na parede com o mesmo papel de parede feio que estava lá desde que ele era um menino. — Aquela era...?

— Lilah, — ele forneceu.

Sim. A Lilah. Depois que ele estupidamente disse a Naomi que ele estava saindo com ela, sua consciência chutou sua bunda até que ele finalmente discou o número que estava definhando em um nota em sua mesa há semanas. Ele pensou em agendar algo para a próxima semana. No próximo mês, mesmo.

Em vez disso, Lilah deu meia dúzia de dicas sobre uma degustação de vinho esta semana, óbvio o suficiente para que ele não pudesse descobrir como dizer não sem soar como um idiota.

Tinha sido... bem.

Lilah era gentil. Doce. Ria muito. Tipo, muito.

E embora ele gostasse de uma taça de vinho decente tanto quanto qualquer outro cara, passar a noite toda discutindo se ele estava percebendo mais gosto de frutas vermelhas ou escuras no final do vinho Barolo de 2003 não era exatamente como ele havia imaginado uma noite rara longe do trabalho e Walter.

— Então, — Naomi disse quando os dois começaram a subir as escadas. — Ela parecia legal.

— Bastante, — ele disse, tentando não notar a maneira como os quadris dela se moviam de um lado para o outro enquanto ela subia os degraus na frente dele. — E seu acompanhante. Muito...

Ela deu a ele um olhar sombrio por cima do ombro. — Sim?

— Deixe-me adivinhar, — Oliver disse, enquanto eles pisavam no patamar do segundo andar. — O nome dele tem um Y.

— O que? — ela retrucou.

— O nome dele, — Oliver disse, encostando um ombro na parede ao lado da porta dela enquanto ela pegava as chaves como se estivesse debatendo se deveria abrir seu apartamento ou esfaquear sua jugular. — Tem um Y ? Ryan. Myron. Bryson.

— Diz o cara chamado Oliver.

— O que há de errado com meu nome?

— Nada, se você é um órfão do século XIX.

— Então, qual é o nome dele? — Oliver empurrou, inclinando-se levemente na direção dela.

Ela bufou. — Dylan.

Oliver sorriu. — E, como se escreve?

— Com um Y, sim, e agora me diga, como está Dickens atualmente? Você o chama de Chuck, ou...

— Convide-me para uma bebida —, interrompeu ele.

Naomi piscou. — Você está se convidando para entrar no meu apartamento?

— Você pode servir a bebida em uma caneca. Estou começando a gostar desse jeito.

— E quanto a Lilah? — ela disse, cantando a palavra enquanto cruzava os braços, as chaves tilintando em sua mão esquerda.

— Bem, veja só. De vez em quando, ela me permite consumir uma bebida sem ter que obter permissão primeiro. E quanto a Dylan com um Y ? Vocês estão ficando sério?

— Na verdade, — disse ela, enfiando a chave na fechadura e abrindo a porta, — ele está tentando fazer um programa sobre mim.

— Tipo pornô?— Oliver perguntou, seguindo-a, embora ele não tivesse sido especificamente convidado.

Naomi riu, uma risada genuína, e jogou a bolsa no sofá. — Não. Deus, não. Uma série de TV sobre minha vida.

— Tão interessante assim, você? — Oliver perguntou. Sua voz estava provocativa, mas secretamente ele pensava que não era uma ideia ruim. A mulher o fascinava, embora irritasse saber que ele não era o único cativado. Ele tinha visto a maneira como Dylan com Y olhava para Naomi, e o homem queria muito mais do que um programa de televisão dela.

Naomi deu de ombros e abriu o armário acima da geladeira, que aparentemente servia como armário de bebidas. Ele observou enquanto ela puxava uma pequena garrafa de algo que ele tinha visto barmans usar, então foi até a ponta dos pés, pegando uma garrafa de Woodford Reserve.

Mesmo nos saltos pretos, o bourbon estava fora de alcance. Oliver foi para o lado dela, esticando o braço para pegar a garrafa. Ele não queria – não conscientemente – mas o gesto o fez se apertar contra o lado dela, só por um momento.

Ambos congelaram. Droga. Isso era o que estava faltando com Lilah esta noite. Essa coisa distinta. Por falar nisso, ele estava sentindo falta há muito mais tempo do que isso. Ele limpou a garganta e entregou-lhe a garrafa de uísque, que ela aceitou com um aceno de agradecimento. Ainda assim, em vez de se afastar, os olhos dela deslizaram da gravata para o rosto dele, dando-lhe um olhar suspeito.

Oliver sorriu tristemente. — Por que você faz isso?

— Fazer o que?

— Parece que você está sempre se preparando para o momento acabar e eu fazer algo miserável.

Ela riu baixinho e olhou para o bourbon em sua mão, traçando o rótulo com uma unha vermelha. — Vamos apenas dizer que fui meio condicionada.

Oliver sentiu uma pontada de raiva por quem a tratou mal, mesmo sentindo alívio por estar progredindo, por ela finalmente mostrar um pouco as cartas.

— Ah, — ele disse suavemente, não querendo assustá-la. — Peça de canto.

Sua cabeça se ergueu. — O que?

— Você é como um quebra-cabeça —, disse ele com um sorriso. — E acabei de encontrar uma das peças do canto.

— A peça de canto? — Ela parecia genuína e adoravelmente perplexa.

— Você nunca fez um quebra-cabeça antes? — ele perguntou, estendendo a mão lentamente. Seus dedos roçaram seu pescoço e ela cambaleou para trás.

Oliver ergueu a mão em um movimento fácil, como faria com um animal arisco, um pouco alarmado com a reação dela. — Desculpe. Você ainda está vestindo seu casaco. Seu colarinho estava... — Ele fez um movimento para indicar que estava torto e que ele estava tentando consertar.

Sua mão voou até o pescoço e ela piscou rapidamente antes de deixar escapar uma risada forçada, como se sua reação ao toque dele não tivesse sido grande coisa. Ela colocou o bourbon no balcão e tirou o casaco.

— Aqui —, disse ela, empurrando-o para ele.

Ele olhou para o sobretudo feminino que estava segurando. Então ela ainda estava colocando barreiras entre eles. Literalmente. Ainda assim, ela não o estava expulsando, e aquele bourbon parecia esperançoso. Ainda mais quando ela puxou dois copos.

Ela olhou para ele e parou por um momento. Seu coração afundou quando ela se virou para guardar os copos. Em seguida, levantou novamente quando ela puxou duas canecas em vez disso.

— Ah —, disse ele com um sorriso. — Uma coisa nossa.

— Nós não temos uma coisa, — ela murmurou irritada, puxando uma caixa de cubos de açúcar de um armário.

— Claro que temos, — Oliver rebateu, atravessando a sala e abrindo a porta do armário dela. Ele pendurou seu casaco e voltou. — Bebida alcóolicas em canecas.

— Como você sabe que esta bebida é para você? — ela perguntou, medindo os ingredientes nas canecas sem olhar para ele.

— Porque você deixou Dylan com Y lá fora na calçada, puto.

Sua cabeça se ergueu. — Ele não estava

— Puto? Claro que sim. Eu conheço um cara com bolas azuis quando vejo um. Ele pensou que teria sorte.

— Não era assim. Ele só quer que eu concorde com seu programa.

— Você quer fazer isso?

Sua atenção estava de volta às bebidas. — Hmm?

— A série de TV, — Oliver disse, voltando para o balcão. — Você quer fazer ela?

Uma pequena ruga apareceu entre suas sobrancelhas, e ela colocou uma mecha de cabelo vermelho escuro atrás da orelha. — Ninguém tinha me perguntado isso.

— Bem, eles deveriam —, disse ele, afrouxando a gravata antes de perceber que estava no apartamento dela, não no dele. Estranho que ele se sentisse tão em casa na cova dos leões. Ele decidiu atribuir isso ao fato de que seus apartamentos eram vizinhos um do outro, e não que aquela mulher espinhosa pudesse ser... reconfortante.

Como se ela fosse a casa.

Ele empurrou o pensamento de lado. — Então, você quer fazer isso?

— Não sei — disse ela, retomando a preparação da bebida colocando um punhado de cubos de gelo em cada caneca. — É estranho.

E era estranho. Ele não conseguia se imaginar tendo sua vida traduzida em uma tela grande, pequena... qualquer tela. Mas ele não era um empresário bilionário com um histórico fragmentado. Sim, ele fez sua pesquisa no Wikipédia, embora não houvesse muito sobre seus dias pré-Maxcessory além de ela ser do Bronx.

— Estou pensando nisso —, disse ela em resposta, empurrando a caneca sobre o balcão em direção a ele. — Gosto da ideia de incentivar meninas e mulheres jovens a construir suas próprias coisas, perseguir seus sonhos e tudo mais.

— Uma coisa imensa que você construiu, — ele disse, falando sério.

Ela assentiu em agradecimento. — O que você faz?

— Eu sou arquiteto, — Oliver disse, levantando a caneca.

Naomi pareceu surpresa. — Sério?

Ele riu. — Sim, sério. Eu não tenho cara?

— Nem um pouco, — ela disse honestamente. — Você é mais do tipo que assume os negócios da família.

As palavras dela causaram uma pontada, e Oliver olhou rapidamente para sua bebida para esconder, mas ou ele não foi rápido o suficiente ou ela foi mais perceptiva do que ele esperava.

— Sinto muito, — ela disse calmamente. — Acho que com seu pai...

— Estou quase feliz por ele não se lembrar — Oliver disse baixinho, sem querer dizer as palavras até que estivessem lá fora. — Foi a nossa maior luta, eu dizendo a ele que queria ir para a faculdade de arquitetura em vez de tomar as rédeas da empresa dele. Ele me disse que era uma fase. Então, nós tivemos uma briga ainda maior quando eu disse a ele que queria abrir minha própria empresa e ele percebeu que não era uma fase, que eu realmente ousei desafiá-lo. E eu não sei por que estou te contando isso, — ele murmurou, um pouco envergonhado.

— Tenho certeza de que ele estava orgulhoso, — Naomi disse, seu tom mais gentil do que o normal.

— Tenho certeza de que ele não estava. — O relacionamento dele e do pai, sempre difícil, nunca mais se recuperou de verdade depois disso. E então Walter adoeceu e tudo foi redefinido. Não que Oliver estivesse feliz que seu pai tivesse perdido uma parte de si mesmo. Alzheimer era uma verdadeira doença de merda. Mas, de forma egoísta, Oliver ficou aliviado por colocar algumas de suas velhas lutas para descansar, por poder assistir a um jogo de beisebol, pai e filho.

Ele tomou o primeiro gole de sua bebida e olhou para baixo surpreso. — Isso é bom. Muito bom.

— Eu sei —, disse ela, sorrindo sem modéstia. — Eu faço um excelente à moda antiga. Cozinhar não é meu forte, mas coquetéis? Eu não sou ruim

Ele acenou com a cabeça em concordância, tomando outro gole. — Porque aqui?

— Por que aqui o quê? — ela perguntou, tomando seu próprio coquetel e olhando para ele.

— Por que este edifício? Você tem trinta anos e não quero ser grosseiro, mas seu sucesso financeiro não é segredo. Você poderia viver em qualquer lugar.

— Ah, sim, mas esta é a Park Avenue —, disse ela.

Oliver suspirou. — E assim, as peças estão por todo o chão novamente.

— O que? — ela perguntou com uma risada.

— As peças do quebra-cabeças. As peças do seu quebra-cabeça. Você poderia muito bem tê-las espalhado por todo o chão.

— Como assim?

— Porque, Naomi, — ele disse, seus olhos se aguçaram quando ele disse seu nome. — Você não se importa com o prestígio da Park Avenue. Você mentiu.

— Eu estou autorizada.

— A mentir?

— A não compartilhar todos os detalhes da minha vida e motivações com um homem que mal conheço.

— E, no entanto, aqui estamos, tomando uma bebida juntos, em vez de com nossos respectivos encontros, — ele ressaltou.

Ela abriu a boca, depois fechou, franzindo a testa em confusão. — Você está certo.

Seu tom mal-humorado deveria tê-lo incomodado, mas em vez disso ele se viu sorrindo, aliviado por não ser o único tentando resolver um quebra-cabeça e achando-o difícil.

Ele ergueu sua bebida. — Posso pegar isso emprestado? A caneca?

— Por que não, pode muito bem aumentar sua coleção —, disse ela, referindo-se à caneca de café que ele ainda tinha desde o dia da mudança. — Você já está indo?

Ele escondeu cuidadosamente o sorriso após o tom intrigado e quase petulante de sua voz.

— Eu quero ver meu pai. Janice está lá, mas ele estava tendo uma noite difícil antes de eu partir. Quero ter certeza de que está tudo bem.

— Claro, claro —, ela disse.

Oliver acenou um adeus e saiu para o corredor, sentindo-se um pouco mal por sua verdade parcial depois de acusá-la de mentir. Ele de fato queria ver seu pai, mas Janice já mandou uma mensagem dizendo que Walter tinha ido dormir sem problemas. Mas não foi a verdadeira razão pela qual ele partiu.

A mulher não tinha gostado dele desde o primeiro dia. Ele ainda não sabia por que, mas ele sabia que, para redefinir sua opinião sobre ele, ele tinha que desequilibrá-la. Tinha que surpreendê-la.

E se o olhar avaliador dela enquanto ele se afastava tinha sido qualquer indicativo, ela pensaria nele esta noite.

Da mesma forma que ele pensaria nela.


Capítulo Catorze


SEXTA-FEIRA, 12 DE OUTUBRO


Apesar de sua infância bem pobre, com o sucesso de Maxcessory, Naomi já tinha visto uma boa parte da riqueza de Manhattan, de bailes de arrecadação de fundos a elegantes coquetéis em museus e jantares caros com investidores em potencial. Ela achou que finalmente havia entendido como era a vida para aquele 1 por cento.

Mas entrar no apartamento de Audrey? Ela percebeu que existia um outro nível.

Ela já havia sido convidada para o apartamento de Audrey antes, para uma noite de Sex and the City, mas teve que faltar de última hora para lidar com uma crise de estoque no escritório de San Francisco. Portanto, ela não estava totalmente preparada para o fato de que estava prestes a comparecer a uma festa no que era certamente o prédio mais caro da cidade de Nova York.

O saguão, com seus tetos altos, piso de mármore e aquário do chão ao teto que parecia maior do que o apartamento de Naomi, deveria tê-la preparado. O fato de o porteiro, formalmente vestido com um terno, a ter direcionado a um elevador privativo para a cobertura realmente deveria tê-la preparado.

E ainda assim, de alguma forma, ela ainda soltou um suspiro de choque quando saiu do elevador para a entrada privativa do apartamento de Audrey, completo com papel de parede de damasco dourado e um lustre enorme.

É aqui que sua amiga morava? Dizer que estava muito longe do prédio de apartamentos quarto-sala e quartos de hotel de beira de estrada em que Naomi cresceu era um eufemismo. Naomi balançou a cabeça sem acreditar que essa era sua vida agora. Que ela era amiga de pessoas que viviam assim.

Dylan Day parecia igualmente impressionado com o ambiente. Ele estava abertamente boquiaberto enquanto Naomi tocava a discreta campainha ao lado da porta da frente. Audrey os cumprimentou com um vestido preto frente única, sandálias de tiras e um sorriso largo e acolhedor.

— Você veio!

— Claro que sim — disse Naomi com uma risada. — Embora você possa ter mencionado que mora em um palácio suspenso.

— Eu sei, né? Dinheiro da família, muito dinheiro. Meus pais compraram este apartamento, então decidiram se mudar para Hollywood para ficar perto de minha irmã e seu namorado produtor um mês depois. Eles me deram o apartamento, e se eu tivesse algum tipo de orgulho, teria dito não, mas...

— Se você tivesse algum tipo de cérebro, teria dito sim —, concluiu Naomi por ela. — Audrey, você se lembra de Dylan?

— Claro que sim, nos encontramos naquele dia em seu escritório —, disse Audrey. Seu tom era acolhedor, mas Naomi percebeu o jeito como o sorriso de sua amiga ficou um pouco falso quando ela o direcionou para Dylan.

— Obrigado por me receber —, disse ele educadamente enquanto Audrey gesticulava para que entregassem os casacos.

— Claro —, Audrey disse brilhantemente. — Os grupos sociais de Manhattan podem ficar tão pequenos tão rápido que estou sempre tentando trazer novas pessoas para o rebanho.

Dylan riu. — Bem, então, estou feliz que você pensou em mim.

Naomi desviou o olhar, não querendo dizer a ele que ele era o segundo homem em quem ela havia pensado, e apenas porque eles já haviam se comprometido com algum plano para a sexta-feira. Ela não queria admitir nem para si mesma que a primeira pessoa em quem tinha pensado foi seu vizinho mimado e inesperadamente charmoso.

— Dylan, a cozinha é logo ali. Sirva-se de uma bebida. Posso roubar Naomi aqui por um segundo? Conversa de garotas.

— Claro, — ele disse, indo na direção que ela indicou.

Audrey esperou até que Dylan estivesse fora do alcance da voz antes de virar um olhar acusador para Naomi.

— Ele?

— Não comece —, disse Naomi, levantando o dedo. — Você disse para trazer um acompanhante. Ele é companhia.

— Ele é um cara tentando tirar suas calças para você concordar em fazer o programa de TV dele.

— O que não seria o fim do mundo, — Naomi apontou. — O programa de TV é uma grande oportunidade, e no que diz respeito a ele tirar minhas calças, vamos apenas dizer que tenho necessidades que não vem sendo atendidas... há um tempo.

— Sem picles em seu sanduíche desde Brayden? — Audrey perguntou.

— Não. Você?

— Nem perto, mas para ser sincera, eu realmente não pensei sobre isso. Ter meu namorado de mais de um ano morrendo mexeu com meu coração. Saber que ele era casado mexeu com minha cabeça. Sexo tem sido a última coisa em minha mente ultimamente.

— Hmm. — Naomi não poderia dizer o mesmo. Só nos últimos dias, isso esteve em sua mente mais do que ela gostaria de admitir. Por motivos que ela temia não ter nada a ver com Dylan Day.

— Ok, bem, se você gosta dele...

— Gosto de quem?

Audrey revirou os olhos. — Dylan? Seu acompanhante?

Certo. Certo.

— Ok, então eu posso tomar uma taça de vinho, ou...?

Audrey gesticulou em direção ao som de vozes, e Naomi deu apenas alguns passos quando tropeçou e parou com uma risada masculina familiar. O que...?

Sem dizer uma palavra, Naomi agarrou a mão de Audrey e puxou sua amiga não muito gentilmente por uma porta à sua direita, que acabou por ser um banheiro.

— Sério? — Naomi sibilou, fechando a porta. — Você convidou Oliver?

— Não explicitamente. Claire o trouxe como seu par!

A cabeça de Naomi estalou ligeiramente para trás com isso. Pensar em Claire e Oliver era... bem, certo, em um nível intelectual. Ambos tinham aquele tipo de classe do velho mundo. Claire tinha estudado em Smith, então os dois pareciam a seção de ex-alunos de um folheto de escola particular. E embora ela quisesse desesperadamente pensar em Oliver como um verdadeiro pé no saco, ela não podia negar que talvez, apenas talvez, uma pequena parte dele fosse um cara bom que trazia champanhe caro para novos vizinhos e cuidava de seu pai doente.

E quanto a Claire, ninguém merecia um cara legal mais do que ela, e ainda assim... e mesmo assim... Seu cérebro estalou, tentando lutar contra o ciúme quase sufocante. Enquanto uma parte de Naomi sabia que Oliver e Claire eram perfeitos juntos, outra parte dela ficou em pânico com a ideia de que poderia haver interesse romântico ali.

— Claire está interessada nele? — Ele está interessado nela?

Audrey encolheu os ombros. — Eu acho. Quer dizer, ela não estava usando o anel dele nem nada, mas se ela o trouxe para uma reunião casual, ela deve estar carregando o bebê dele...

— Audrey!

— Qual é o problema? Por que você o odeia tanto?

Ela respirou fundo. — Lembra da minha história sobre minha mãe e o caso com o patrão dela que acabou com a demissão dela?

— Claro.

— Ok, lembra do garotinho que mentiu para proteger seu pai?

— Sim... — Os olhos de Audrey se arregalaram quando entendeu. — Não.

— Sim.

— Oliver era aquele menino? — ela assobiou.

— Sim.

— Você tem certeza?

— Sim, Audrey, tenho bastante certeza. Além disso, ele tem uma namorada e ainda assim veio esta noite com Claire, — Naomi disse, ainda preocupada com o pensamento de Claire e Oliver juntos.

O nariz de Audrey enrugou. — Ele não parece o tipo com vida dupla.

— Certo, porque todas nós somos muito boas em identificá-los —, disse Naomi.

— Merda. Você está certa. Ainda assim, ele parece tão legal...

— Ele não é legal.

— Bem, talvez ele não fosse quando tinha dez anos, — Audrey disse exasperada. — Mas ele é um adulto perfeitamente educado. E estou feliz que ela o trouxe. Quando o conhecemos naquele primeiro dia, ele parecia um pouco... solitário.

Naomi puxou suavemente sua argola de ouro, odiando a pequena torção em seu estômago ao pensar em Oliver Cunningham solitário. Odiava, quase tanto, que Audrey tivesse se interessado o suficiente para notar.

— Eu realmente sinto muito, Naomi, — Audrey disse, seu tom sincero. — Se eu pudesse tirá-lo daqui sem ser incrivelmente rude, eu o faria.

— Não, não faça isso —, disse Naomi, deixando cair as mãos e sacudindo rapidamente os braços, tentando se recompor. — Eu sou uma adulta. Eu posso lidar com isso.

— Sim, você pode —, disse Audrey enfaticamente, estendendo a mão e alisando uma mecha no cabelo de Naomi como uma mãe cuidadosa. Pelo menos Naomi presumiu que isso é o que uma mãe cuidadosa faria. Ela não tinha muita experiência com esse tipo de figura materna.

— Vamos fazer isso —, disse Naomi, abrindo a porta do banheiro.

Naomi seguiu Audrey até a área da cozinha, sua atenção não mais no apartamento deslumbrante da amiga, mas no inimigo que ela sabia que a esperava.

— Sinto muito, galera —, disse Audrey ao se juntarem ao pequeno grupo reunido em torno do balcão da cozinha. — Esta é Naomi Powell, a superestrela empreendedora de quem eu estava falando. É a primeira vez dela aqui. Então eu tive que mostrar o apartamento a ela.

O olhar de Naomi procurou e imediatamente encontrou Oliver. Ela só o via de terno, e esta noite não seria diferente, embora ele tivesse desistido da gravata e deixado sua camisa azul clara aberta no colarinho. Ela ficou irritada ao perceber que ele ficava tão bonito com um visual um pouco mais casual quanto com o traje formal completo.

Naomi esperou por seu choque de surpresa ao vê-la, mas ele apenas ergueu as sobrancelhas ligeiramente em reconhecimento à presença dela. Seu olhar foi para Dylan, parado ao lado de Oliver, mas seu par parecia mais interessado em dar uma olhada no apartamento de Audrey, um olhar vagamente avaliador em seu rosto. Irritada, ela se perguntou se Dylan estava alguma vez presente no momento, ou se ele estava sempre procurando por sua próxima vitória, seja uma mulher ou uma nova ideia de produção.

Naomi olhou distraidamente para o outro homem na sala, então imediatamente olhou duas vezes. Ele era absurdamente bonito. Nível George Clooney e Hugh Jackman. Wow. Cabelo escuro, olhos castanhos dourados e covinhas gêmeas em cada lado de um sorriso bastante fantástico.

— Dree não deve ter lhe dado o tour completo —, disse o homem mais gostoso do mundo. — Neste mausoléu, é uma aventura de duas horas.

— Dree? — Naomi repetiu, seu cérebro finalmente alcançando as palavras dele, mesmo enquanto ela olhava boquiaberta para seu rosto perfeito.

— Audrey. Ela adora o apelido, — ele explicou com um sorriso. Os ovários de Naomi desmaiaram.

— Sério? — Audrey disse secamente enquanto servia uma taça de champanhe e entregava a Naomi. — Porque eu poderia jurar que passei os últimos vinte e poucos anos implorando para você parar de usá-lo.

— Vinte e poucos anos —, disse Naomi surpresa. Audrey tinha apenas vinte e sete anos. — Você é um... irmão?

— Poderia ser — respondeu o homem, estendendo a mão. — Clarke West. O amigo mais antigo e mais querido de Dree.

— Mais antigo sim — disse Audrey. — Mas o uso persistente do apelido coloca você em uma situação difícil.

O olhar de Naomi passou rapidamente entre eles, em busca de qualquer sinal de que o papo de apenas amigos era um eufemismo para complicado, mas para sua surpresa, os dois pareciam completamente à vontade perto um do outro e, bem, amigos.

Clarke piscou rapidamente para ela, como se lesse seus pensamentos, e Naomi ficou chocada ao se sentir corando.

— Ugh, Clarke, guarde isso —, disse Audrey com um aceno de desprezo.

— Guardar o quê?

— Você sabe exatamente o quê. Minhas amigas estão fora do alcance de seu charme duvidoso.

— Vou tentar manter minha aparência trancada a sete chaves.

Boa sorte com isso.

Naomi deu ao amigo de Audrey outro sorriso antes de olhar para Claire e sorrir em saudação.

O suéter roxo de Claire deveria ter complementado perfeitamente seus olhos castanhos, mas Naomi ficou consternada ao perceber que as sombras sob os lindos olhos eram ainda mais escuras do que da última vez que ela a viu.

— Acho que você conhece todo mundo —, disse Audrey a Naomi. — Não é bem o jantar para conhecer novas pessoas que eu esperava, mas pelo menos podemos pular um pouco da conversa fiada.

A atenção de Dylan finalmente voltou para a conversa, e ele olhou para Naomi surpreso. — Você conhece Owen?

— Oliver —, Audrey corrigiu rapidamente.

Oliver, por sua vez, ignorou Dylan completamente, ainda observando Naomi.

— Olá, — ele disse suavemente quando ela encontrou seus olhos.

— Oi. — Ela desviou o olhar para olhar para Dylan. — Oliver e eu somos vizinhos.

Dylan estalou os dedos. — É por isso que você parece familiar. Não te vimos na outra noite? Você estava com outra...

Ele olhou para Claire, então de volta para Oliver, e embora ele tivesse evitado dizer que Oliver tinha estado com uma mulher diferente naquela noite, seu silêncio entregava tudo. Pelo menos, teria sido, se Claire parecesse se importar um pouco que Oliver tivesse tido um encontro com outra pessoa. Em vez disso, ela parecia muito mais interessada nas bolhas de sua taça de champanhe.

Ainda assim, Naomi interiormente se encolheu porque seu acompanhante não parecia envergonhado, muito menos arrependido pelo momento estranho que ele causou. Na verdade, uma pequena parte dela se perguntou se ele tinha feito isso de propósito para fazer Oliver aparentar mal.

—Ai, Deus —, Audrey murmurou baixo o suficiente para os ouvidos de Naomi, mas de mais ninguém. Então ela deslizou de volta para o modo de anfitriã, movendo-se em direção à geladeira. — Vocês devem estar morrendo de fome. Farei uma bruschetta adorável bem rápido. Clarke, seja útil pelo menos uma vez e venha me dar uma ajuda?

Audrey entregou uma baguete ao amigo, que a pegou e a usou para apontar para a pequena TV montada discretamente em um dos armários da cozinha. Não, era embutida no armário, Naomi percebeu. Todo um novo nível de riqueza.

— Corto isso se eu puder ligar —, disse Clarke, balançando a baguete como uma arma.

— Não. Sem TV. É um jantar.

— São os Yankees —, rebateu Clarke.

— Clarke.

— Audrey.

Os olhos de Audrey se estreitaram em advertência, e Clarke deu a ela um sorriso que Naomi suspeitou que deixaria a maioria das mulheres com os joelhos fracos. Audrey apenas ergueu a grande faca de cozinha em sua mão em advertência.

Clarke se voltou para o grupo. — Vamos votar. Jogo dos Yankees em pano de fundo? No mudo — ele adicionou, quando Audrey fez um ruído baixo parecido com um rosnado.

A mão de Dylan imediatamente subiu. — Desculpe, Audrey. Os Yankees jogando contra Atlanta, e como torcedor do Braves, tenho um bom pressentimento sobre a vitória deles...

— Bem, isso não vai acontecer —, disse Clarke antes de apontar sua baguete para Oliver. — Posso contar com o seu voto?

— Você não pode fazer assim — protestou Audrey. — Ele sentirá que terá que entregar sua carteirinha de homem se disser não.

— Perfeito. Pressão para a vitória. O que vai ser, Cunningham, carteirinha de homem ou Yankees? — Clarke perguntou.

Naomi já sabia o que Oliver iria dizer. Mesmo sem a ameaça da carteirinha de homem, quando criança, ele era obcecado por todas as coisas dos Yankees. Aparentemente, o homem também era, porque levantou a mão em um voto a favor do jogo, embora tenha dado a Audrey uma piscadela de desculpas, o que causou algo desagradável no estômago de Naomi.

Ele estava aqui como o par de Claire, estava flertando com Audrey... era como o maldito fertilizante da semente do ciúme que foi plantada no fim de semana passado quando ela o viu com Lilah.

Naomi franziu a testa. Onde estava Lilah?

— São três para o jogo —, disse Clarke, virando sua baguete para Naomi e Claire. — Senhoras?

Audrey engasgou de indignação quando Claire relutantemente levantou a mão a favor dos Yankees. — Claire Hayes!

— Desculpe, — Claire disse, não parecendo sentir nada. — Eu sou meio louca por beisebol.

Audrey lançou um olhar suplicante para Naomi. — Você está do meu lado, certo?

— Eu não acho que isso importe, amor, — Naomi disse com um sorriso. — Já são quatro contra dois — Além disso, Clarke já tinha ido direto para a gaveta que continha o controle remoto da TV e a ligou.

— Ceeeerto — disse Audrey com um suspiro exasperado enquanto olhava para Clarke. — Mas eu quero aquela baguete cortada perfeitamente.

— Sim, aguarde sentada —, disse Clarke, de olho no jogo enquanto colocava a baguete na tábua de cortar sem cerimônia e começava a fazer cortes grosseiros no pão.

Audrey aceitou sua derrota graciosamente enquanto colocava um avental sobre a cabeça e começava a fatiar tomates ao lado de sua amiga. Mesmo perdendo a batalha na TV, ela parecia suspeitamente feliz, e os olhos de Naomi se estreitaram ligeiramente pelas costas da amiga. A pequena sorrateira. Ela organizou um jantar para casais, mas garantiu que ela tivesse a segurança de plástico de seu melhor amigo, enquanto ela e Claire colocaram a cara a tapa e trouxeram alguém de verdade.

Exceto que isso também não estava indo exatamente como planejado. Dylan se juntou a Claire na frente da TV, e embora Claire ainda parecesse um pouco cética em relação ao cara, ela realmente era uma louca por beisebol, pelo jeito que eles estavam falando de estatísticas e prêmios Golden Gloves e um monte de outras porcarias que Naomi realmente não se importava.

O que a deixou com... Oliver.

Naomi olhou por cima do ombro e o encontrou olhando para ela. Ela pegou sua taça de champanhe, aproximando-se para ficar ao lado dele.

— Por curiosidade, qual teria sido o seu voto? — ele perguntou, apontando para a TV.

Ela ergueu um ombro. — Eu não tenho uma preferência forte para qualquer um dos lados, mas vou dizer que foi bem feito para Audrey.

— Por?

Naomi apontou a base de sua taça para Clarke e Audrey. — Ela fez eu e Claire trazermos um acompanhante. Parte de toda a nossa história de superar Brayden, e ela vai e traz seu amigo mais antigo. Fraca.

— Então, você e Dylan com Y. Ainda uma coisa? — Ele manteve a voz baixa para combinar com a dela.

Naomi deu de ombros, sem querer dizer a ele que seu acordo em sair com Dylan em primeiro lugar tinha sido apenas uma reação instintiva ao vê-lo com Lilah. E ela definitivamente não estava disposta a dizer a ele que ela havia usado especificamente esta noite para cumprir aquela obrigação de encontro porque um jantar parecia preferível a passar um tempo cara a cara com Dylan.

— Em aberto, — ela respondeu evasivamente. — E você e Claire?

Seus olhos se arrastaram para a loira. — Ela conseguiu meu número através de uma amiga. Disse que precisava de uma companhia sem compromisso para tirar uma amiga casamenteira de cima dela. Não percebi que ela se referia a Audrey até chegarmos aqui.

— Como Lilah se sente sobre isso? — Naomi perguntou casualmente, estendendo a mão e pegando uma cenoura do elaborado prato de crudités de Audrey.

Ele não disse nada até que ela se forçou a encontrar seu olhar.

— Lilah e eu não demos certo.

O coração de Naomi fez algo estúpido e ela desligou mentalmente o órgão idiota. Lembre-se de quem ele é. Lembre-se de que ele tornou sua vida miserável. Lembre-se de que ele mentiu para salvar o pai e arruinou a vida da sua mãe.

Mas estava ficando mais difícil conectar este homem que parecia fisgá-la a cada encontro ao menino que tinha sido um idiota. Além disso, Naomi já não sabia há anos que sua mãe tinha escolhido como missão de sua vida culpar outras pessoas por sua situação? Se não fossem os Cunninghams, teria sido outra pessoa.

— Audrey sabia que você estava trazendo Dylan?

— Sim, claro. Por quê?

Ele acenou de volta para a mesa de jantar atrás deles. Ela viu imediatamente o que ele queria dizer. — Oh, Audrey.

Ele riu. — Sim.

Audrey havia colocado a si mesma e Clarke em uma das pontas da mesa – Naomi apostaria que não era a primeira vez que Clarke servia como seu acompanhante platônico em um jantar. Os cartões em frente de Naomi e Oliver diziam Claire e Dylan, o que significava que Naomi e Oliver estavam sentados no lado oposto da mesa.

Lado a lado.

Naomi iria matar Audrey.

— Poderíamos trocá-los —, disse ele, olhando para Naomi com o canto do olho. — Realmente bagunçar a organização dela.

— Tentador, mas ela nunca deixaria eu esquecer disso.

— Verdade, e minha mãe se reviraria em seu túmulo. A mulher costumava passar horas planejando sua mesa de jantar.

Naomi estremeceu com a menção de Margaret Cunningham, mas Oliver estava bebendo seu champanhe e não viu..

— Claire me mencionou no convite? — Naomi perguntou curiosamente.

Ele olhou para ela, seus olhos azuis pousando em sua boca por um segundo muito antes de encontrar seus olhos. — Mencionou.

— E você ainda assim veio?

— Claro —, disse ele com um encolher de ombros. — Que cara não quer passar o sábado à noite sentado ao lado de uma mulher que o odeia?

Oliver olhou para baixo com um sorriso irônico quando ela não respondeu. — Sem negar, eu vejo.

— Desculpe. — Ela desviou o olhar de onde estava olhando distraidamente para a mesa. — Só queria saber como vamos administrar o vinho com o jantar. Sem canecas.

— Ah, percebe? — Oliver disse levemente. — Nós temos uma coisa.

— Pare de tornar isso estranho.

— É difícil para você, hein? — ele disse com falsa simpatia.

— O que?

— Lidar com sua atração por mim.

— Sim. Sim, muito. É por isso que, quando Audrey me pediu para trazer um acompanhante esta noite, liguei para Dylan em vez de você.

— Sim, você parece muito interessada nele, — Oliver disse com um olhar deliberado para Dylan do outro lado da sala.

— E você parece interessado em Claire.

— Eu nunca disse que estava interessado em Claire.

O coração de Naomi despencou em seu peito, mas quando ela esperava que ele falasse mais, Audrey veio na direção deles. — Ok, chegamos! — ela anunciou com orgulho, trazendo uma travessa de bruschetta para o balcão. — Eu apresento meus lindos tomates, bem como o pão horrível de Clarke.

— É pão. É pra ser gostoso, não bonito — protestou Clarke.

— Pode ser os dois..

Clarke balançou a cabeça e pegou um pedaço de pão, dando uma enorme mordida e encarando o grupo. — É minha culpa, pessoal. Dei para ela uma aula de culinária no Natal, e ela tem sido insuportável desde então.

A conversa voltou brevemente para os Yankees, depois alguma exposição no Met com a qual Naomi não poderia ter se importado menos, e então, quando o grupo começou a se soltar com o vinho fluindo um pouco mais livremente, para tópicos mais interessantes. A história mais embaraçosa com a segurança do aeroporto (Claire ganhou, com uma história sua aos quatorze anos tendo um segurança do sexo masculino vasculhando sua mochila cheia de absorventes noturnos), e então de volta ao tópico de museus, momento em que todos confessaram que não davam a mínima para a nova exibição.

No momento em que Audrey tirou uma lasanha de abóbora do forno e colocou Claire e Dylan para trabalhar levando comida para a mesa, Naomi estava apenas um pouquinho tonta, um pouco relaxada, e se divertindo mais do que em anos.

Ela pulou com o toque de dedos em sua nuca, levantando a cabeça para dar a Oliver um olhar assustado.

— Calma, — ele murmurou. — Eu só ia consertar o seu vestido. A etiqueta está para fora.

— Ótimo. Muito elegante, Naomi — ela murmurou para si mesma. Honestamente, esta era a segunda vez em uma semana que este homem tinha que consertar suas roupas.

Ela começou a levantar a mão, mas a mão dele já estava lá, deslizando por baixo de seu cabelo mais uma vez, seus dedos roçando levemente a pele sensível de sua nuca enquanto ele gentilmente ajustava a etiqueta. E demorou.

A respiração de Naomi ficou presa com o toque, assim como na outra noite. Quando o toque de Dylan não tinha feito nada, e o toque de Oliver a manteve acordada metade da noite.

Ela se convenceu de que tinha sido um acaso.

Não foi.

Ela olhou ao redor para ver se alguém havia notado, mas Dylan e Claire pararam para assistir a mais um jogo de beisebol na TV, e Clarke e Audrey estavam discutindo sobre se a abóbora contava ou não como um vegetal.

A única pessoa que prestava atenção em Naomi era... Oliver. E ela viu que ele sabia. Ele sabia exatamente o que seu toque fazia com ela. E ainda assim não havia vanglória em seu olhar, nem triunfo, apenas consciência. Dela. Deles.

Ele lentamente tirou a mão de debaixo do cabelo dela. — Pronto, — ele disse calmamente. — Melhorou.

Não. Não, nem tudo melhorou. Seu pulso estava acelerado, sua respiração um pouco falhada e ela nem se reconhecia.

Naomi sempre foi a sedutora, nunca a seduzida, e ainda assim aqui estava ela, sentindo-se distintamente fora de equilíbrio por causa do homem que ela estava determinada a desprezar.

— Tudo bem — disse Audrey, — hora do jantar. TV desligada. Minha casa, minhas regras.

— Sim, mãe, — Claire disse, obedientemente desligando a televisão.

O grupo ocupou seus lugares à mesa e Naomi percebeu que talvez ela estivesse errada sobre a colocação dos cartões de Audrey. Talvez ela não tivesse sido colocada ao lado de Oliver, e sim em frente a Dylan, tornando mais fácil falar com seu acompanhante.

Ela sabia disso, não porque ela estava realmente falando com seu acompanhante, mas porque Oliver estava conversando com a dele. Independentemente de por que Claire convidou Oliver esta noite, ou por que ele concordou, era difícil não ver que eles se davam maravilhosamente bem. Aparentemente, os dois tinham ido para o mesmo treinamento de liderança quando mais novos, e Claire, alguns anos mais velha, tinha sido a líder do grupo dele. Aparentemente, eles tinham uma amiga em comum que havia sido presa recentemente por cultivar maconha em sua casa nos Hamptons. Aparentemente, os dois adoravam filmes de espionagem.

O resto do grupo riu da viagem pelas lembranças. E assim como Naomi estava falando para si mesma que ela não estava com ciúmes, que ela não se importava que ele nem parecesse estar ciente dela, Oliver olhou e chamou sua atenção. E piscou.

E ela soube, com aquela piscadela, que deveria-ter-sido-brega-mas-foi-insuportavelmente sexy, que ele estava certo.

Ela estava atraída. Eles tinham uma coisa.

E ela não tinha ideia do que fazer sobre isso.


Capítulo Quinze


SEXTA-FEIRA, 12 DE OUTUBRO


— Você não tinha que me acompanhar até em casa —, disse Naomi, puxando a gola da jaqueta até as orelhas e enfiando as mãos nos bolsos.

— Provavelmente não, — Oliver disse, inclinando a cabeça levemente para olhar o céu noturno.

Ela soltou uma risada assustada. — Acho que já ultrapassamos a necessidade de banalidades gentis?

— Naomi, você não me ofereceu nada nem perto de uma gentileza desde que te conheço.

— Bem, isso é verdade. — Seus ombros arquearam ligeiramente. — Então, por que você fez isso?

— Por que eu o quê?

— Se ofereceu para andar comigo.

— Ofereci? — ele ponderou. — Ou suas amigas nos lembraram oitocentas vezes que estávamos indo na mesma direção?

Naomi riu. — Sim, desculpe por isso. Eu achei que era só Audrey, mas Claire parece ter se juntado a ela nos esforços casamenteiros.

— Elas se preocupam com você.

— Sim. Bem, isso e nós meio que fizemos um pacto.

— Um pacto? — Ele olhou para ela.

— Então, você sabe que estávamos todas... envolvidas com Brayden?

Ele assentiu.

— Nós não sabíamos disso. Obviamente. Não até o dia do funeral.

Jesus. Oliver estremeceu. — Vocês se conheceram no funeral dele?

— Mais ou menos. Todas pretendíamos ir ao funeral, mas, em vez disso, nos encontramos no Central Park. Tínhamos os mesmos sapatos e, bem, tanto faz, isso não importa. Estávamos todas um pouco à deriva depois de perceber quanto Brayden tinha nos usado, e concordamos em ajudar umas às outras a não cair na mesma armadilha.

— Isso parece um esquema anti-casal. Claire e Audrey quase juntaram nossas mãos antes de nos empurrar para fora da porta.

— Não se iluda, eu suspeito que isso foi mais para me afastar de Dylan do que para me aproximar de você.

Isso o incomodava mais do que gostaria de admitir, mas suas amigas estavam certas. Dylan não era bom para ela. Oliver quase disse isso a ela, mas ela falou primeiro.

— Quem está com seu pai esta noite? — Naomi perguntou.

Oliver respirou fundo enquanto a realidade voltava ao seu redor. Fazendo-o perceber que ele não estava em posição de iniciar um relacionamento. Não com Lilah. Não com Claire. Definitivamente não com Naomi.

Ele tentou, uma vez, conciliar uma mulher e seu pai. Funcionou por um tempo. Sua ex era doce e educada... e completamente desinteressada em estar com um homem que tinha um pai doente.

— Janice —, respondeu ele, respondendo à pergunta dela. — Ela geralmente tira os fins de semana de folga, mas de vez em quando eu pago a ela por uma noite nos fins de semana.

— Com que frequência acontece?

Ele olhou para ela enquanto caminhavam, surpreso com a pergunta. — Por que a pergunta?

Seus ombros se ergueram. — Só parece ser difícil. Desistir de todas as suas noites e fins de semana.

Eles estavam perto de seu prédio e, ele não estava totalmente pronto para o fim da noite, embora soubesse que ela se afastaria dele no segundo em que chegasse perto da segurança de seu apartamento, então Oliver diminuiu a velocidade até parar na calçada vazia.

Ela parou também, dando a ele um olhar questionador.

Oliver enfiou as mãos nos bolsos, imitando a postura dela em sua frente, protegendo-a contra o forte vento do outono.

— Nem sempre é fácil — ele admitiu. — Eu nunca imaginei que minhas noites de fim de semana aos trinta anos seriam gastas pegando ovos cozidos do chão e respondendo às perguntas repetidas de meu pai sobre se seu filho – eu – já voltou do treino de futebol ou não. Mas....

Ele olhou por cima do ombro por um momento, organizando seus pensamentos. — O que posso fazer, sabe? Ele é meu pai.

— Você sente falta dele? Quer dizer, de como ele era antes?

Oliver soltou um suspiro com a pergunta, e ela rapidamente descartou a pergunta. — Eu sinto muito. Nós não precisamos...

— Ele era um idiota, — Oliver deixou escapar.

Ele tinha ouvido muitas banalidades desde o diagnóstico de Walter, mas mesmo os amigos mais próximos dos Cunninghams não ousaram falar a verdade real.

Que talvez não fosse a pior coisa do mundo que o velho Walter Cunningham tenha se perdido para sempre.

— Ele era difícil, — Oliver corrigiu levemente. — Frio. Exigente. Egoísta.

Naomi piscou. — Uau. Isso é...

— Honesto? — ele disse com uma risada rápida.

— Incomum — ela disse suavemente. — A maioria das pessoas que conheço idolatram seus pais, pelo menos um pouco.

— Eu costumava. Quando eu era criança, queria ser ele.

— O que aconteceu?

Os ombros de Oliver se ergueram e caíram. — Eu cresci. Comecei a me desenvolver como minha própria pessoa e percebi quem eu queria ser.

E com certeza não era um viciado em trabalho mulherengo que tinha tido mais amantes do que Oliver conseguia se lembrar, muitas vezes bem debaixo do nariz de sua esposa.

— E ainda assim, você ainda está cuidando dele, — Naomi disse, uma nota de pergunta em sua voz.

— Sim, bem. A pessoa que decidi ser não se afastaria de um membro da família que precisava dele.

— Nobre.

Ele sorriu e deu um passo em direção a ela. — Isso quase soou como um elogio.

— Foi? — ela perguntou, franzindo os lábios. — Você deve ter ouvido errado.

Ele se aproximou ainda mais, querendo comemorar quando ela não recuou. — Por quê? — ele perguntou.

— Por que o que?

— Por que você está tão determinada a se lembrar que não gosta de mim? — Ele olhou seu rosto, atingido novamente pelo fato de que ela parecia familiar, embora soubesse que não a conhecia. Homens não se esqueciam de mulheres com rostos como este.

Naomi encontrou seu olhar firmemente. — Eu tenho motivos. Estou trabalhando neles.

Ele soltou uma risada surpresa com sua honestidade. — Posso saber os motivos?

Ela ergueu o queixo e respondeu a sua pergunta com outra pergunta. — Por que você me deixou passar para a próxima rodada? Do conselho. Fui rude com você e você me ajudou a morar no prédio de qualquer maneira. Por quê?

Oliver sorriu e se aproximou ainda mais, apenas alguns centímetros os separando agora. — Eu tenho motivos. — Seu olhar caiu para sua boca carnuda. — Estou trabalhando neles.

O rosto de Naomi inclinou-se para o dele e por um momento Oliver prendeu a respiração com uma sensação desconhecida. Querer, sim. Desejo, com certeza. Mas este momento foi diferente. Maior, de alguma forma, como se essa mulher pertencesse a ele não apenas por agora, não apenas por uma noite, mas para sempre.

Ela sentiu isso também. Ele sabia que sim, porque por um momento seus olhos se arregalaram de surpresa e então se estreitaram ligeiramente em cautela.

Não, ele pensou em frustração. Não se afaste disso.

— Ele não é bom para você, — Oliver deixou escapar, porque era falar o que pensava ou beijá-la, e embora a última opção fosse muito mais atraente, o instinto lhe disse que não era o momento.

— Quem?

Ele olhou para ela. Ela parou e olhou para ele. — Você nem conhece Dylan.

— Nem você.

— Eu...

— Ele passou metade da noite rondando suas amigas para obter informações sobre você. E então, quando ele não conseguiu o que queria, ele foi para o aeroporto ao invés de te trazer em casa, — Oliver apontou.

— Ele tem uma gravação em Dallas amanhã à tarde.

— Então ele poderia ter ido amanhã de manhã.

— Eu nunca pediria a um homem para mudar uma passagem de avião por mim.

Você não deveria ter que pedir. Ainda assim, sua admissão era outra peça do quebra-cabeça. Não uma peça de canto, uma importante. Isso dizia a ele que ela não estava acostumada a homens fazendo dela uma prioridade.

— Por que você chamou ele para ir com você esta noite?

Seus ombros se ergueram. — Audrey me mandou levar alguém.

Droga, Naomi, abra os olhos. Eu estive bem aqui.

— Ele ainda está tentando fazer você concordar com a série de TV?

— Sim.

— Você está cogitando?

Ela assentiu com a cabeça, mas o momento de hesitação falou muito.

Normalmente, Oliver teria mordido a língua, mas ela apenas... o irritava. E não é como se ele tivesse algo a perder – mesmo quando ele era o cavalheiro perfeito, ele não a conquistava.

— Você está com medo —, disse ele.

Ela ficou rígida. — O que?

Oliver não recuou. — Você é covarde. É por isso que você está pensando em namorar alguém como Dylan Day, enquanto ao mesmo tempo, está hesitante quanto ao programa de TV.

— Do que você está falando? — Ela começou a se afastar, mas ele estendeu a mão e agarrou seu braço, puxando-a suavemente.

— Esse cara não vai exigir nada de você. Nem seu cérebro, nem seu coração. Ele é fácil e é o que você pensa que deseja. Por outro lado, o programa de TV que o cara está procurando é exatamente o oposto de fácil. É um risco. É se expor totalmente. Não apenas seu trabalho. Você. Isso te assusta.

Naomi tinha ficado muito quieta, olhando para ele com olhos azuis arregalados e ilegíveis. E então ela balançou sua cabeça. — Você não sabe do que está falando. Você nem me conhece.

— E ele conhece?

— Você não me conhece, — ela repetiu, enunciando cada palavra claramente enquanto puxava seu braço de seu aperto. — Portanto, não se meta na minha vida.

Naomi começou a se afastar, mas voltou com um último tiro de despedida. — Eu vou fazer aquela série de TV. E caso houvesse alguma dúvida, você não será parte da história da minha vida.


Capítulo Dezesseis


TERÇA-FEIRA, 16 DE OUTUBRO


Embora às vezes ela tivesse dificuldade em acreditar, de alguma forma, nos últimos anos, Naomi havia se tornado uma daquelas mulheres que gostava de correr.

Em seu vigésimo quinto aniversário, alguns anos antes, ela teve uma conversa franca consigo mesma sobre o fato de que uma mulher saudável não tinha nenhum bom motivo para não prestar atenção às inúmeras recomendações de que o movimento era uma parte crucial da boa saúde. Principalmente para uma empresária cujas longas horas de trabalho significava muito tempo sentada atrás de uma mesa, ao telefone e em táxis. Na academia? Não tanto.

Como acontece com a maioria dos novos hábitos, os exercícios começaram irregulares. Ela tentou de tudo, Yoga, Hot Yoga1, pilates, aulas de dança hip-hop, Crossfit e aulas de ciclismo. No final, as tendências de lobo solitário de Naomi não gostavam de nada que exigisse uma programação ou, bem, interação social. Sua necessidade de exercício passou a ser tanto sobre o desejo de clarear a cabeça quanto sobre os benefícios para a saúde, e correr aconteceu naturalmente.

Ela corria alguns dias por semana, na rua se o clima permitia, na esteira em sua academia se não. A manhã fria e fresca de hoje exigiu uma corrida ao ar livre, mas em vez de se controlar com sua habitual corrida longa e constante, seu ritmo tinha sido quase frenético pela velocidade implacável.

Depois que ela correu pelo Central Park em um ritmo quase punitivo para queimar a energia extra reprimida devido ao trabalho em casa, ela finalmente se permitiu uma caminhada para relaxar, ofegante por ar enquanto se forçava a reconhecer a verdade:

Ela estava fugindo de demônios.

Naomi havia passado os últimos dias revivendo seu quase beijo com Oliver.

Tinha passado as últimas duas noites sonhando com isso. Querendo isso.

E se odiando por isso.

Ela teve seu quinhão de namorados, amantes, como você quisesse chamá-los. Ela até gostou da maioria deles, incluindo Brayden, embora isso obviamente não falasse exatamente sobre seu julgamento de caráter.

Mas nunca antes ela havia sentido isso. Essa atração por outra pessoa, não apenas no nível físico, mas no emocional, quase no nível da alma. E então ele pisou em um calo.

Droga.

Naomi acelerou novamente, como se um ritmo extenuante fosse ajudar a tirar Oliver Cunningham da cabeça.

Querer ele não fazia parte do plano. Nem mesmo perto do plano. O plano era simples, não emocional.

Passo um: se mudar para o prédio para honrar os desejos de sua mãe.

Passo dois: confrontar os Cunninghams, deixando-os saber que a garota que eles haviam tratado como descartável agora era igual a eles.

Passo três...

Bem, o segundo passo foi até onde ela planejou. Se ela estivesse sendo honesta consigo mesma, seu plano era mais sobre uma necessidade incômoda de encerrar esse capítulo do que qualquer outra coisa. Não apenas pelo bem de sua mãe, mas para que Naomi finalmente sentisse que havia deixado Naomi Fields para trás.

Ela não queria vingança, apenas reconhecimento. Ela queria que os Cunninghams ficassem cara a cara com as ações de seu passado, para serem lembrados do que sua negligência havia feito. Para se desculparem.

Mas Margaret Cunningham, aquela mulher fria que tão impiedosamente ignorou os apelos da mãe de Naomi por apenas mais uma noite para que ela pudesse planejar situações alternativas para sua filha, estava morta.

Walter Cunningham estava, bem... mesmo que Naomi quisesse confrontá-lo sobre suas ações passadas, ela não tinha certeza se poderia ser tão cruel ou se ele se lembraria do incidente, muito menos sentiria remorso.

E quanto a Oliver Cunningham...

Naomi gemeu alto na calçada quase deserta e, colocando as mãos nos quadris, parou no meio do caminho e inclinou a cabeça para trás em direção ao céu.

Por quê? Por que ela tinha que desejá-lo?

Novo plano, disse Naomi a si mesma, ao retomar a caminhada pelos quarteirões finais de volta ao apartamento. Evitar os homens Cunningham.

Obviamente, eles bagunçavam sua cabeça, e Naomi não se sentia bem em se sentir fora de controle. Ela precisava voltar para onde estava há apenas alguns meses.

Três meses atrás, ela se sentia como a mulher mais controlada do planeta. Sua vida profissional tinha sido perfeitamente estruturada. Ela tinha tido um amante cuja companhia gostava e com quem se via potencialmente engatando um relacionamento. E ela tinha um plano sólido para deixar seu passado desagradável de uma vez por todas.

Avançando para o presente, seu amante estava morto e era idiota, e os fantasmas de seu passado eram complicados. E ela nem mesmo tinha um escritório para onde fugir por mais algumas semanas.

Era como se o universo estivesse dizendo que ela poderia correr tão rápido quanto quisesse, mas mais cedo ou mais tarde ela teria que resolver sua confusão emocional. E por mais que doesse admitir, até para si mesma, suas emoções estavam envolvidas no que dizia respeito aos Cunninghams.

Para desfazer isso, ela precisava de alguma distância. Para recuperar a perspectiva.

E nem mesmo mencione a afirmação estúpida de Oliver de que ela estava evitando a série de TV porque estava com medo. Dane-se isso. Ela acordou esta manhã tão determinada a provar que ele estava errado que ela mandou um e-mail para Dylan dizendo que aceitava.

O contrato estava a caminho de seu advogado, e Naomi sentiu... bem, ela negaria até o último suspiro se Oliver perguntasse, mas ela estava nervosa. Animada. Confiante de que era a decisão certa, mas ela estava vulnerável como o inferno. De alguma forma, ela tinha que descobrir como manipular a história para revelar a verdade inspiradora sobre começar uma empresa de bilhões de dólares a partir de um pequeno apartamento, ao mesmo tempo em que protege as pessoas com quem ela se importava.

A vida pessoal de Naomi poderia ser um livro aberto, mas ela iria para o túmulo protegendo a memória de sua mãe. A privacidade de Claire e Audrey também.

Naomi estava quase de volta ao apartamento, mas seus passos diminuíram quando ela avistou um homem vários metros à frente dela descendo a Park Avenue vestindo apenas uma camiseta branca e cueca boxer azul. Pelo menos ele estava usando sapatos neste momento.

Seu familiar cabelo cinza despenteado balançava contra a brisa fria de outono, e Naomi estremeceu. O ar frio tinha sido perfeito para sua corrida matinal, mas ela estava usando luvas, legging, duas blusas e uma faixa para manter as orelhas aquecidas.

Walter não estava vestido para a temperatura quase negativa. Naomi olhou esperançosa para a porta da frente do prédio deles, desejando que Oliver ou Janice viessem buscá-lo.

Nada.

Naomi soltou um suspiro. Tudo bem então.

— Ei, Walter! — ela gritou. Começou bem o plano de ficar longe dos homens Cunningham.

Ele não se virou, então ela começou a trotar lentamente para alcançá-lo, o que não foi difícil, considerando seu andar lento.

— Olá, — ela disse, batendo em seu braço.

Walter lançou-lhe um olhar assustado. — Olá.

— É Naomi —, disse ela com o que esperava ser um sorriso tranquilizador, já que ele não parecia reconhecê-la. — Eu moro no seu prédio. Nós somos amigos.

Ele sorriu. — Eu gosto de amigas bonitas.

Aposto que sim, seu velhote.

O pensamento era sem qualquer animosidade real, e... droga. Ela estava começando a sentir um pouco de afeto pelo homem?

— Onde você vai? — ela perguntou casualmente quando ele começou a andar mais uma vez.

— Vou? — O vento aumentou novamente e Walter estremeceu, depois olhou em volta, parecendo profundamente confuso. Onde quer que ele planejasse ir quando ele começou, ele claramente se esqueceu.

Ela manobrou para ficar na frente dele, bloqueando seu caminho. — Estou com vontade de tomar café da manhã. Você quer comer comigo?

— O que você vai comer? — ele perguntou cético.

— Panquecas?

Ele fez uma expressão de desgosto.

— Ou ovos? — disse ela, tentando convencê-lo de qualquer forma. Ela tinha certeza que estava sem ovos em casa, mas esperava que Oliver tivesse alguns. Do contrário, ela os encomendaria de um dos vários serviços de entrega de comida de Nova York. Qualquer coisa para colocar o homem em segurança de volta para dentro de casa.

Ele encolheu os ombros. — Ok.

— Perfeito —, disse Naomi com alívio, enganchando o braço no dele.

Ele deixou que ela o conduzisse de volta ao prédio. Ela manteve o ritmo lento para corresponder ao dele, para que ele não pensasse que estava sendo manobrado e recuasse.

Walter olhou para o traje dela. — Você tem se exercitado. Minha esposa gosta de Jazzercise2.

— Ah, é? — Naomi perguntou. — E você, algum exercício?

— Muito bom em squash. Você joga?

— Definitivamente não. Eu mal sei o que é squash — ela disse, apertando o botão no elevador do andar de Walter em vez do dela. Ela mataria por um banho quente, tanto para se aquecer quanto para se livrar do suor seco, mas ela precisava levar Walter de volta para seu apartamento antes que Oliver e Janice enlouquecessem.

Caramba, Oliver provavelmente já estava pirando.

Walter havia mudado de assunto de squash e estava divagando algo sobre a bolsa de valores ter caído duzentos pontos, e ela não tinha ideia se ele estava falando sobre hoje, ontem ou vinte anos atrás, então ela apenas fez ruídos mm-hmm enquanto o levava para seu apartamento.

— Você tem uma chave? — Ela perguntou a ele.

— Chave?

— Deixa pra lá. — Ela ergueu a mão e bateu.

A porta se abriu no meio do movimento, sua mão suspensa no ar quando ela ficou cara a cara com Oliver.

Um Oliver semi nu.

A boca de Naomi estava de repente muito seca, seu pulso um pouco... desregulado.

E ela definitivamente não estava mais com frio.

— Pai, — Oliver disse, seus olhos fechando em alívio. — Pai, você não pode fazer isso!

— Não posso fazer o quê? — Walter disse, entrando. — Por que você está usando uma toalha?

— Porque eu estava no banho, — Oliver disse exasperado. — Você ainda estava dormindo e – deixa pra lá. — Ele interrompeu um suspiro murcho, passando a mão pelo cabelo molhado.

Ele ainda não tinha reparado em Naomi, o que provavelmente era uma coisa boa, considerando que ela parecia estar com dificuldades em lembrar como respirar. E era ainda mais difícil desviar o olhar de seu peito nu.

Ele era... bem, esculpido. Ela suspeitava disso pela maneira como ele preenchia o terno, mas a realidade era ainda melhor do que o esperado. Ela se pegou imaginando o que ele fazia para se exercitar, porque suspeitava que não era Jazzercise ou squash, e a definição de seu bíceps lhe dizia que ele fazia mais do que correr.

Parecia não haver gordura no homem – seu torso era estreito, uma vez que se estreitava na toalha azul-marinho amarrada em torno de sua cintura, e...

Oliver desviou os olhos para ela sem mover a cabeça, e seus olhares colidiram.

Ops.

Ela definitivamente foi pega cobiçando o homem que ela praticamente expulsou de sua vida.

— Obrigado, — ele disse, sua voz áspera e um pouco hesitante. — Eu fiquei no banho por menos de cinco minutos, eu pensei que – então ele simplesmente sumiu...

— Está tudo bem — ela disse baixinho, tranquilizando-o. — Walter está bem. Eu o alcancei antes que ele se afastasse mais de um quarteirão.

Seus olhos se fecharam. — Eu estava ligando para os vizinhos. Normalmente ele fica dentro do prédio, mas se ele está começando a sair...

O coração dela se compadeceu dele com a angústia genuína em seu rosto. Não apenas por causa da magnitude do terror que ele deve sentir ao pensar em seu pai vagando sozinho pela cidade de Nova York, mas porque ele sabe que os dias de seu pai morando em casa estavam talvez contados.

E mesmo com o momento antagônico de sexta-feira fresco em sua mente, mesmo com as memórias de sua infância sempre à espreita, ela percebeu que queria ajudar. Ela não conseguia retardar a progressão do Alzheimer, mas talvez pudesse ajudar um pouco.

— Você quer que eu fique com ele enquanto você termina de se vestir? — ela perguntou, mesmo percebendo que ficar com Walter significaria entrar no apartamento – o mesmo apartamento onde a vida de sua mãe tinha saído completamente dos trilhos.

Encerramento. Lembra? É isso que você quer.

Oliver deu a ela um olhar assustado, então olhou para seu corpo e gemeu, obviamente apenas agora percebendo seu estado de nudez. — Deus.

Ela deu um pequeno sorriso hesitante. — Se isso faz você se sentir melhor, tenho alguns quilômetros de suor comigo.

Naomi imediatamente se arrependeu da admissão descuidada, porque o olhar dele a percorreu, e ela sentiu. Claro, ela estava mais vestida do que ele, mas seu sangue ainda estava bombeando da corrida, suas emoções ainda fervendo da outra noite, e havia uma sensibilidade no ar.

Não, isso era muito vago. Havia sensibilidade entre eles. Um calor que ela não queria, e com certeza não sabia o que fazer com ele.

Um baque forte vindo de dentro do apartamento arruinou o momento, assim como os xingamentos murmurados de Walter. Oliver fechou os olhos, como se pedisse paciência. — Foi uma daquelas manhãs. Se você pudesse ficar de olho nele por cinco minutos. Dois minutos...

— Com certeza, — disse ela, já entrando, seus olhos indo para Walter, que estava perto da mesa de centro. O baque que ouviram foi uma pilha de livros, e Naomi foi imediatamente buscá-los.

— Você não tem que fazer isso, — Oliver disse, fechando a porta do apartamento.

— Melhor eu do que você enrolado em uma toalha —, disse ela com um sorriso malicioso por cima do ombro.

Ele estremeceu. — Certo. Eu já volto.

— Eu cuido disso, Walter —, disse ela ao outro homem. — Você pode ir em frente e se sentar.

— Quem é você? — ele perguntou irritado, fazendo o que ela sugeriu e se abaixando na poltrona.

— Eu sou Naomi.

—Você está aqui para vê-lo? — ele perguntou, apontando na direção do cômodo em que Oliver tinha desaparecido.

— Não, estou aqui para ver você. — Ela empilhou os livros na mesa de centro, observando que, embora a maioria fosse livros de mesa genéricos com cores extravagantes e lindas fotografias, havia também um romance de Stephen King que, embora parecesse novo em folha, não parecia combinar com os outros.

— É seu, Walter? — ela perguntou, segurando o livro.

Ele olhou para ele inexpressivamente. Se fosse dele, ele obviamente não se lembrava. Embora pudesse ser de Janice com a mesma facilidade. Ou de Oliver.

Ela correu um dedo pela lombada. Era um de seus títulos mais recentes que ela ainda não tinha lido.

— Eu costumava adorar Stephen King —, disse ela a Walter, enquanto ele pegava o controle remoto e ligava a TV, ignorando-a completamente.

— O que aconteceu?

Naomi virou a cabeça para onde Oliver estava saindo do banheiro. Seu cabelo ainda estava úmido, mas ele se havia se barbeado e vestia um suéter preto e jeans. A primeira vez que ela o via sem terno, ela tentou não notar que ele parecia tão bem vestido em um estilo casual sofisticado quanto em um formal.

— O que? — Ela forçou seus olhos de volta para os azuis dele.

— Você disse que gostava de King. O que aconteceu para mudar sua mente?

— Ah, nada —, disse ela, pondo-se de pé, o livro ainda na mão. — Simplesmente não tenho mais muito tempo para ler. — Ela se conteve e olhou para o livro. — Isso não é verdade. Eu acho que eu não crio tempo para ler.

— Não se culpe. A idade adulta faz isso com todos nós. Vai aumentando nossa agenda pouco a pouco, até que nem percebemos que todo o nosso tempo livre simplesmente... sumiu —ele disse, vindo em sua direção e alcançando o livro, correndo um dedo pela lombada da mesma forma que ela havia feito momentos antes.

O gesto ausente disse a ela tudo que ela precisava saber. — É seu.

Ele sorriu tristemente e colocou o livro de volta em cima dos outros. — Eu também sou fã. E eu também não consigo encontrar um minuto para começar a maldita coisa.

— Por que está aqui em vez de no seu apartamento?

— É para as noites em que Janice está fora e eu fico com meu pai. Ele geralmente vai para a cama cedo, e sempre pretendo finalmente começar o livro.

— O que você faz em vez disso? Assiste à televisão?

— Sim. E trabalho, principalmente.

Ela acenou com a cabeça em compreensão, mas não disse nada.

Oliver pigarreou. — Bem. Obrigado por ficar de olho nele. Normalmente ele fica bem enquanto eu tomo banho, me visto ou atendo um telefonema, mas ele tem estado inquieto e irritado a manhã toda.

— Não fale de mim como se eu não estivesse aqui — Walter reclamou, aparentemente não tão interessado em seu programa de televisão quanto parecia.

— Claro, agora você preste atenção em mim —, Oliver disse bem-humorado ao pai enquanto acenava para Naomi segui-lo até a cozinha, fora da escuta de Walter.

— Onde está Janice? — Naomi perguntou.

— O pai dela teve um ataque cardíaco ontem. Ela voou ontem à noite para Birmingham para ficar com ele.

— Ele está bem?

— Ainda é grave — disse Oliver, esfregando o pescoço. — Eu disse a ela para ficar com ele o tempo que ela precisar, e acho que vai demorar pelo menos uma semana.

O toque estridente do interfone na parede perto da porta da frente o interrompeu. Ela saltou com o som, lembrando-se dele desde a infância. Ele zumbia sempre que alguém discava o número da unidade dos Cunninghams no andar de baixo.

— Quantos anos tem essa coisa? Cem?

— Praticamente — disse ele com uma careta. —Não fazia sentido para este lugar ser atualizado com a opção mais recente de ligar apenas para telefones celulares dos moradores, visto que meu pai não tem telefone, e Janice e eu dividimos nosso tempo aqui.

Ele foi até a parede e apertou o botão de chamada. — Olá?

A resposta foi tão estática quanto Naomi se lembrava quando a voz do porteiro estalou. — Olá, Sr. Cunningham, estou com Serena Grogan aqui para vê-lo?

— Claro, mande-a subir, — Oliver respondeu, antes de soltar o botão.

— Cuidadora temporária para substituir Janice, — ele disse como explicação para Naomi.

— Ah. — Ela cruzou os dedos frouxamente na frente dela.

Oliver olhou diretamente para o relógio. — Olha, Naomi. Agradeço por ter ajudado meu pai esta manhã. Verdade. Mas você não escondeu exatamente o fato de que não quer nada comigo, então...

Ela deu um meio sorriso. — Então... saia?

Ele cruzou os braços. — Foi uma manhã difícil. Eu tenho uma reunião à distância em meia hora, não tenho ideia se Serena vai entrar na lista de ódio instantâneo de meu pai...

— Ele tem uma dessas?

— Deus, sim. Ele não consegue se lembrar de muito, mas uma vez que ele decide que não gosta de alguém, ele parece se lembrar disso muito bem.

— Sério? Ele tem sido muito doce comigo — ela disse, olhando para o aparentemente dócil Walter.

— Sim, bem, ele gosta de você. Provavelmente porque ele não percebe que o sentimento não é mútuo. — Oliver abriu a porta da frente ao dizer isso, uma clara rejeição, e Naomi ficou surpresa com a pontada de arrependimento.

Ainda assim, o que ela poderia dizer? Ele estava dando a ela exatamente o que ela pensava que queria. Ele estava tentando dar o fora de sua vida, então por que ela ainda estava de pé aqui? Naomi conseguiu dar um aceno rígido com a cabeça, depois passou por ele e saiu para o corredor. Ela se virou.

— Eu poderia ajudar.

Oliver olhou para ela. — O que?

— Eu poderia ajudar com Walter. Ainda estou sem escritório por algumas semanas, então estou trabalhando em casa. Minha agenda é flexível, então, se você precisar de alguém para ficar com ele...

Oliver olhou para ela com surpresa estampada em seu rosto.

Somos dois, pensou Naomi. Ela não tinha ideia do que estava oferecendo. Ou por quê.

Ela não tinha acabado de dizer a si mesma que, já que não obteria as desculpas de Walter Cunningham que planejava, era hora de deixar tudo para trás?

E aqui ela estava se oferecendo para brincar de cuidadora?

— Naomi, eu não posso...

Mas antes que ele terminasse a frase, o elevador apitou, e uma pequena mulher loira saiu para o corredor.

Ela deu um sorriso agradável quando viu Oliver e Naomi. — Esta é a residência dos Cunningham?

Naomi forçou um sorriso de volta e fez um gesto em direção à porta aberta.

A mulher assentiu educadamente enquanto ela e Naomi se cruzavam, e Naomi ouvia entorpecida enquanto Oliver e Serena Grogan se conheciam.

Ela não resistiu a um rápido olhar por cima do ombro, mas Oliver já tinha fechado a porta, deixando-a do lado de fora.

Era exatamente como ela queria, e ainda... nem perto.


Capítulo Dezessete


TERÇA-FEIRA, 16 DE OUTUBRO


Oliver vinha lutando contra – e perdendo – uma dor de cabeça iminente desde as três da tarde, e o som agora inconfundível de um ovo cozido batendo no papel de parede da cozinha era como uma britadeira em sua têmpora.

Ele montou um escritório improvisado no quarto de hóspedes da casa do pai durante o dia de hoje, querendo ficar por perto e trabalhar um pouco enquanto Walter e Serena se acostumavam um ao outro.

Pelo menos essa era a intenção. Na verdade, ele não teve mais do que cinco minutos de tempo ininterrupto para ler e responder um único e-mail, e quanto a Walter e Serena se acostumarem... houve pouco ou nenhum progresso.

Oliver foi até a porta aberta e olhou para a cozinha, observando enquanto Serena calma e silenciosamente retirava o prato e o copo d'água que havia colocado na frente de Walter para o jantar.

— Que tal um pouco de TV, Walter? Seu filho disse que você gosta do History Channel? — ela perguntou, sua voz nunca perdendo o zumbido agradável, mesmo quando ela foi pegar o ovo do tapete e jogá-lo no lixo.

Ela parou ao ver Oliver, aparentemente notando sua tensão, porque ela deu a ele um sorriso tranquilizador.

Ele não ficou tranquilo. Ele sabia que não precisava se desculpar. Sabia que seu pai não sabia o que estava fazendo, mas mesmo assim sentiu vontade de se desculpar.

Seu pai havia sido uma ameaça o dia todo. Não apenas as oscilações de humor usuais e a imprevisibilidade da demência, mas algo diferente. Por alguma razão, ele decidiu que não gostava de Serena, e sua antipatia por ela parecia transcender todos os humores e ondas de memórias.

Para o bem da mulher, ela não parecia se importar. Sem dúvida ela lidou com isso antes, se não pior. Na opinião de Oliver, mulheres como Serena e Janice eram santas. Sim, elas eram pagas por seu trabalho, mas era preciso ser uma pessoa especial para tratar Walter com uma paciência inabalável. Os ex-amigos de Walter não fizeram isso. Seus irmãos não fizeram isso. Inferno, Oliver estava suscetível a perder a calma com seu pai em um dia particularmente difícil.

Janice e Serena, porém, nunca pareceram perturbadas.

Naomi nunca parecia perturbada.

Oliver encostou o ombro na porta, observando distraidamente Serena persuadir Walter a ir para a sala de estar, mesmo que sua mente estivesse em uma mulher completamente diferente.

— Deixe-me em paz — Walter resmungou para ela enquanto ela tentava cobrir suas pernas com um cobertor.

Oliver entrou na sala, sorrindo, se desculpando para Serena enquanto ia até o pai, mas Walter persistiu em seu mau humor.

Ele empurrou Oliver, — Você está na minha frente. — Ele lançou um olhar desconfiado para a cozinha, onde Serena havia começado a lavar a louça. — Quem é aquela?

— Aquela é a Serena, pai. Ela vai lhe fazer companhia nas próximas semanas, enquanto eu vou trabalhar.

— Eu não quero companhia.

— Não tem opção — Oliver disse, ouvindo o cansaço em sua própria voz.

— Onde está Janice?

— O pai dela está doente. Ela está cuidando dele.

—Achei que a tivéssemos pagado para cuidar de mim. Não gosto dela. — Ele apontou para Serena acusadoramente.

— Pai, dê uma chance a ela.

— Onde está a outra? — Walter exigiu.

— A outra o quê?

— A garota. A que você gosta, com o cabelo laranja.

Oliver congelou, um pouco surpreso por seu pai lembrar de alguém que ele viu apenas duas vezes. — Naomi?

Walter deu a ele um sorriso conspiratório, e Oliver teria gostado da rara tentativa de seu pai de se conectar como pai e filho se não fosse pela única pessoa em quem Oliver estava tentando desesperadamente não pensar.

— Onde ela está? — Walter perguntou novamente. — Eu gosto mais dela do que dessa. — Ele disse em voz alta, depois apontou para Serena novamente.

Não havia como a cuidadora loira não estar ouvindo isso, e Oliver deu a ela um estremecimento de desculpas do outro lado da sala, mas ela sorriu e acenou rapidamente com a mão enquanto continuava a limpar o balcão.

— Naomi não é sua cuidadora, pai. Ela é apenas nossa vizinha.

A expressão de Walter tornou-se amotinada e derrotada, Oliver ergueu as mãos em resignação. Naomi tinha oferecido, e Oliver estava cansado. Tão cansado.

— Que tal assim, pai? Vou perguntar se Naomi pode ajudar às vezes, se você for legal com Serena o resto do tempo.

Walter deu a Serena um último olhar sujo, depois um aceno desafiador.

Oliver exalou de alívio. Provavelmente foi uma discussão fútil, já que seu pai provavelmente esqueceria quem eles eram amanhã, se não no momento seguinte, mas Oliver estava determinado a tornar os momentos de lucidez de Walter o mais suportáveis possível, e se isso significasse Naomi...

Oh, quem ele estava enganando. Seu desejo de ter Naomi por perto tinha muito pouco a ver com seu pai. Ele iria entender aquela mulher mesmo se isso o matasse. E poderia. Ou ela poderia.

Oliver voltou para a cozinha com Serena. — Me desculpe por isso.

—Não se desculpe. Venho fazendo isso há tempo o suficiente para não levar qualquer coisa para o lado pessoal.

— Por que você faz isso? — ele perguntou curiosamente. Era intromissão, mas Serena era amigável e aberta de um jeito que Janice não era.

O sorriso de Serena era triste. — Minha avó sofria de demência. Ela ajudou a me criar, e quando ela começou a perder suas memórias, foi... duro. Decidi muito cedo que queria fazer tudo o que pudesse por aqueles que passaram pelo que minha avó passou. E para suas famílias.

— Você é uma pessoa melhor do que eu, — Oliver disse, esfregando as mãos no rosto.

— Você está indo muito bem — disse Serena baixinho. — Embora eu pudesse sugerir algo...

Ele olhou para ela e esperou.

— Você precisa de uma pausa — disse Serena gentilmente. — Para o bem dele, assim como o seu. Seu pai precisa que você tenha a mente tranquila para cuidar dele. Estou programada para ficar até às nove da noite. Por que você não vai tirar uma ou duas horas para você?

Ele hesitou, pensando na antipatia instantânea, embora infundada, do pai por Serena.

— Nós vamos ficar bem, — ela disse, lendo seus pensamentos.

— Talvez eu vá para casa apenas por algumas horas. Eu moro lá embaixo e posso subir em segundos se você ligar.

— Absolutamente. — Ele sabia que ela não ligaria, a menos que fosse uma emergência.

— Sobre o horário de amanhã, se você puder, gostaria de trabalhar em meio período, conforme necessário, talvez à noite. Mas preciso verificar algo primeiro. Podemos conversar sobre isso depois?

— Claro —, disse ela com um sorriso. Então ela acenou com a cabeça em direção a Walter, que tinha começado a cochilar em sua cadeira. — Ele parece bastante apegado a essa tal de Naomi.

— Sim, ele está, não é?— Oliver disse cansado.

Irracionalmente. Tal pai tal filho.

— Volto daqui a pouco —, disse ele a Serena. — Terei algumas respostas sobre seus horários.

Ela acenou para ele se afastar, e Oliver foi para o segundo andar do prédio.

Mas não para seu próprio apartamento.


Capítulo Dezoito


TERÇA-FEIRA, 16 DE OUTUBRO


Naomi não ficou surpresa ao ver Oliver Cunningham pelo seu olho mágico. Ela ficou surpresa com o salto em seu estômago com a simples visão dele. Como uma colegial apaixonada.

De repente, ela estava feliz por ter tido tempo para colocar maquiagem e roupas de verdade hoje, em vez da calça de moletom e do coque bagunçado que ela tinha usado nos últimos dias trabalhando em casa.

Naomi abriu a porta e por um longo momento, nenhum dos dois disse nada.

—Eu vou te pagar — disse ele, terminando o silêncio cobrado.

Ela piscou. — Perdão?

— Para cuidar do meu pai. Eu te pagarei. Ele não suporta sua nova cuidadora, e isso é muito ruim, porque eu vou precisar que ela fique com ele à noite, mas durante o dia... sua oferta ainda está de pé?

Ela deveria dizer não. Ela deveria acabar esse envolvimento com os Cunninghams antes que ficasse mais complicado.

Em vez disso, ela deu um passo para o lado, sem palavras, convidando-o a entrar.

— Você comeu? — ela perguntou, apontando para o fogão. — Eu estava apenas fazendo... bem, fazer é uma palavra forte. Estou esquentando um pote de molho de tomate e fervendo água para o macarrão.

Ele deu a ela um olhar surpreso. — Você acabou de me convidar para jantar?

— Aparentemente — ela murmurou, levantando a tampa da água fervente no fogão e adicionando um punhado generoso de sal como ela tinha visto no Food Network3, não a pequena pitada de sal que sua mãe adicionava nas raras ocasiões em que ela tentava cozinhar.

— Eu não tenho que ficar. Eu só estava... meu pai decidiu que gosta de você.

— Isso te surpreende? — ela perguntou, tomando um gole do vinho tinto que ela se serviu.

— Bem, como eu disse, ele não gosta de muitas pessoas.

— Por causa da doença?

Oliver encolheu os ombros.

— Porque é ele.

Ela o observou por um momento, percebendo as sombras sob seus olhos, o conjunto cansado de seus ombros.

— Então, — ele disse, enfiando as mãos nos bolsos. — Sua oferta para cuidar do meu pai durante o dia ainda está de pé? Só até Janice voltar. E, falando sério, deixe-me pagar você.

— Eu não preciso do seu dinheiro.

A voz dela estava afiada e ele deu a ela um olhar perplexo. — Eu estou ciente disso. Mas também estou ciente de que não posso tirar vantagem de seu tempo.

Ela deu um gole no vinho e considerou isso.

— Mas há outra coisa em jogo —, disse ele calmamente.

— Ahá. — Ela apontou para ele em acusação.

Ele deu um sorriso fraco. — Eu preciso que você decida.

Ela deu a ele um olhar assustado. — Decidir o quê? O que isso significa?

— Isso significa —, disse ele, contornando o balcão para ficar ao lado dela, — que você não pode me atacar em um momento e me convidar para jantar no próximo.

— Você está me dizendo como me comportar, Sr. Cunningham? — Naomi queria que sua voz fosse enérgica e profissional e ficou chocada ao ouvi-la sair um pouco ofegante.

Ele estava tão perto.

Oliver sorriu levemente, seus olhos nunca deixando os dela. — Eu não tenho certeza se alguém ousaria dizer a você como se comportar. Estou simplesmente avisando você.

— Me avisando sobre o quê?

Seu olhar caiu para a boca dela antes de subir lentamente para os olhos mais uma vez. — Na próxima vez que você olhar para mim como se quisesse um beijo, eu te darei.

Ela tossiu, embora temesse que saísse mais nervoso e incomodado do que qualquer coisa. — Quando eu olhei para você como se quisesse que você me beijasse?

— Sexta-feira à noite. Antes que você ficasse com medo e fugisse.

Suas bochechas se encheram de calor e ela não tinha certeza se era raiva ou vergonha por ele estar certo.

Ela decidiu escolher a raiva. Era mais seguro. — Eu sou a única mulher que nunca caiu aos seus pés? É por isso que você fica farejando?

— Farejando por aí? — ele perguntou incrédulo antes de balançar rapidamente a cabeça. — Droga, meu jogo está pior do que eu pensava.

— Não estamos jogando —, disse ela, aproveitando a oportunidade para se afastar. — Não foi você quem me disse no dia da mudança que eu deveria tentar ser uma boa vizinha? É o que estou fazendo, oferecendo ajuda. Não interprete isso como algo mais.

Oliver fechou os olhos e inspirou, parecendo tão exausto que ela teve a estranha vontade de pressionar a mão na bochecha dele, para oferecer... conforto. Se ela estivesse sendo honesta, era um sentimento um pouco estranho. Ela raramente se sentia afetuosa com as pessoas. Isso havia mudado um pouco depois de Claire e Audrey. Ainda mais com ele.

Finalmente, ele abriu os olhos e parecia mais determinado do que nunca enquanto a fitava com um olhar firme.

— Você tem que decidir, Naomi. Decidir o que seremos um para o outro. Não posso confiar os cuidados de meu pai a alguém tão instável. Portanto, decida o que você sente por mim. Sobre meu pai. Sem mais jogos.

Ela queria argumentar que não estava jogando, mas... ele estava certo. Dizer que ela era inconsistente em seu comportamento em relação a ele seria um eufemismo, e isso não era do feitio dela. Naomi sempre foi uma pessoa decidida. Ela decidia como se sentia sobre algo e se mantinha firme.

O que era complicado com os Cunninghams. Ela havia decidido seus sentimentos: Ódio. Ressentimento. Algumas fantasias de vingança se misturaram.

Só que eles não eram o que deveriam ser. Walter não era o patriarca frio e sem coração que merecia um castigo. E Oliver não era um idiota petulante jogando bolas de futebol no rosto das meninas e quebrando seus óculos.

Eles mudaram, forçando seus sentimentos sobre eles a mudar, e ela não era boa nisso. Uma admissão difícil de fazer, até para si mesma, mas era a verdade brutal. Mas talvez ela pudesse ser melhor. Talvez ela tivesse que ser.

— Sinto muito —, ela disse em voz baixa, seu olhar na maçã em vez dos olhos de Adão, porque ela não era tão corajosa.

— Por?

— Pela confusão —, disse ela. — Eu não culpo você por estar frustrado

Oliver acenou com a cabeça em reconhecimento ao seu pedido de desculpas. — Então o que vai ser? Vizinhos raramente civis ou...

Esse ou era intrigante.

O que aconteceria se ela se apoiasse nele agora? Se ela ficasse na ponta dos pés e roçasse os lábios nos dele?

Sem aviso, uma imagem de sua mãe passou pela mente de Naomi.

Ela podia ser civilizada com Oliver e Walter Cunningham, mas não se apaixonaria pelo homem que ajudou a colocar sua mãe no caminho da autodestruição. Ela não iria.

Mas também não podia continuar a permitir que o ódio a consumisse. Possivelmente...

Naomi ergueu os olhos. — Ou podemos tentar ser amigos.

Sua cabeça se inclinou ligeiramente. — Amigos.

Ela assentiu. — Faz sentido, certo? Vivemos ao lado um do outro. Amigos e vizinhos que se emprestam uma xícara de açúcar quando surge a necessidade.

Oliver sorriu levemente. — Você faz doces?

— Vinho, — ela emendou rapidamente. — Nós poderíamos dividir vinho.

— Amigos, — ele disse lentamente. — Eu posso tentar isso. Na verdade, que tal colocarmos em prática aquela coisa do vinho agora?

— Eu acho que isso pode ser arranjado, — ela disse, recuando para pegar uma taça. Ela serviu e entregou a ele um copo do Zinfandel.

Ele aceitou com um sorriso. — Sabe, uma vez conheci uma mulher que me detestava tanto que só me servia bebidas em canecas.

— É mesmo? — Naomi disse, levantando a colher de pau e mexendo o molho. — Ela parece encantadora.

— Essa é uma palavra para descrevê-la

— Que palavra você usaria? — Naomi perguntou.

Ele encostou o quadril no balcão, observando-a se mexer. — Complicada, — ele disse finalmente. — Eu diria que ela é a mulher mais complicada que já conheci.

— Está com poucas peças de canto, não é?

— Estou. Mas chegando mais perto.

— Você também não é exatamente um quebra-cabeça fácil de resolver — murmurou Naomi, jogando um punhado de espaguete na água fervente e acrescentando um pouco mais, sem ter certeza de quanto um homem como Oliver comia.

Oliver. Ela estava fazendo o jantar para Oliver Cunningham.

— Você está sorrindo —, disse ele.

— Hmm? Ah, acho que estou —, disse ela. — Nunca imaginei que a primeira refeição que eu cozinharia para um homem seria para você. — Ele piscou surpreso, e ela o olhou fixamente. — Eu não sei por que você está tão chocado. Eu pareço o tipo domesticada?

Oliver gesticulou com sua taça de vinho para o fogão, e Naomi xingou a água fervente que ameaçava borbulhar enquanto ela tentava abaixar o fogo.

— Muito domesticada.

Ela soltou uma risada. — Suponho que você não cozinhe?

— Eu costumava cozinhar. Não muito, mas em meus vinte e poucos anos eu coloquei na minha cabeça que eu poderia ser um sucesso no mercado se eu fosse familiarizado com a cozinha.

— Você estava certo, — ela disse. — Então o que aconteceu?

— Hmm? — Ele pegou a colher e mexeu o molho do macarrão.

— Você disse que costumava cozinhar. Você não cozinha mais?

Uma expressão sombria se alojou em seu rosto. — Minha mãe ficou doente e toda a minha atenção foi para ela. Então ela faleceu. Então meu pai adoeceu... — Ele encolheu os ombros com pesar. — Festival de miséria, eu sei.

— Justificado —, disse Naomi, virando-se para encará-lo. — Então funcionou? — ela perguntou. — Seu grande plano de se destacar dentre os solteiros por saber cozinhar?

— Eventualmente. Eu cometi alguns erros de julgamento no início.

— Tal como?

— Tal como camarão scampi, que embora delicioso, tenha grandes quantidades de alho, o que não é necessariamente a opção mais amorosa. Além disso, passei muito tempo aperfeiçoando um ragu com fettuccine antes de perceber que é muito difícil ficar sexy com macarrão pendurado na boca.

—Bem, então, prepare-se para ficar completamente não-seduzido, — Naomi disse, apontando para a panela de espaguete fervente.

Por um momento, os olhos de Oliver pareceram esquentar enquanto passavam por ela, e Naomi ridiculamente desejou ter feito algo mais sexy para o jantar. Algo sofisticado e fácil de comer, como vieiras grelhadas, ou um prato de queijos, ou qualquer tipo de massa que não precise ser enrolada, ou...

Não. Não. Ela não ia começar a pensar em Oliver e sexy na mesma frase. Certo, tudo bem. Ela não ia continuar pensando nele dessa maneira.

— Pratos — ela deixou escapar, apontando para seu armário. — Se você puder pegar os pratos, isso ficará pronto em apenas um minuto.

Oliver deu a ela um sorriso conhecedor enquanto colocava sua taça de lado. — Não fica mais amigável do que receber ordens para pôr a mesa.

— E se eu adicionar por favor? — Naomi perguntou. — Então é um pedido, não uma ordem.

— Verdade —, disse ele, pegando dois pratos. — Mas ainda assim, exclusivamente amigável.

— Melhor do que ser inimigos, Ollie — disse ela, deixando escapar o apelido de infância que ela claramente lembra dele odiar.

Ele ficou imóvel, seus olhos cintilando como se lembrassem, e por um segundo ela congelou, perguntando-se se seria isso. O momento em que Oliver conectaria a Naomi Fields de nove anos a Naomi Powell de vinte e nove anos.

Em vez disso, ele deu a ela um olhar vagamente ameaçador. — Não vou responder a isso.

— O quê, Ollie? — ela perguntou inocentemente. — Combina com você.

— Continue assim e terei que pensar em um apelido para você —, disse ele, colocando os pratos na mesa.

Você já pensou. Cenoura.

— Você já assistiu Anne de Green Gables? — ela deixou escapar, e pegou um fio de espaguete para ver o ponto.

— Claro, o tempo todo. Eu costumava receber os caras no meu dormitório na faculdade, e nós assistíamos isso.

Naomi deu uma risada sufocada com o sarcasmo dele, enquanto abanava a boca para a massa quente demais. — Então isso é um não.

— Isso é um não definitivo. Nunca ouvi falar. Por quê?

Naomi colocou uma peneira na pia para escorrer a massa. É um livro, que virou filme, sobre uma garota ruiva e um idiota de um menino chamado Gilbert Blythe, que a atormentava com o apelido de Cenoura.

— Nada. Deixa pra lá — ela disse, misturando o macarrão com o molho e trazendo a travessa para a mesa.

Ela ergueu os olhos com surpresa quando ele puxou a cadeira para ela. — Boas maneiras, Ollie.

— Tinha que fazer algo para compensar a perda de minhas habilidades culinárias. Achei que deveria aprender a ser um cavalheiro.

— Você realmente não cozinha mais? — ela perguntou quando ele se sentou, pegando a tigela de macarrão.

— Não tenho tempo — disse ele, colocando o guardanapo no colo e tomando um gole de vinho.

Naomi estendeu a mão e despejou macarrão em seu prato. — De cozinhar ou namorar?

Ela olhou para ele quando ele não respondeu, e ele deu um sorriso torto, recostando-se na cadeira. — Essa é a sua maneira sutil de perguntar se estou saindo com alguém?

— O que te deu a impressão de que sou algo remotamente próximo a sutil?

Ele riu. — Bom ponto. Mas, para responder à sua pergunta, eu namoro com a mesma frequência que cozinho hoje em dia, o que é... bem, vamos apenas dizer que já faz um tempo.

Naomi polvilhou uma quantidade generosa de queijo no prato e empurrou o recipiente na direção dele. — Intencionalmente? Ou apenas o resultado das circunstâncias?

— A última opção. Alzheimer é uma espécie de circunstância permanente, 24 horas por dia, sete dias por semana. Janice já cuida do meu pai das nove da manhã às cinco da tarde e durante todas as vezes que trabalho até tarde. Não posso pedir a ela para ficar também em compromissos sociais – a mulher nunca teria folga.

Naomi começou a responder, mas pensou melhor, comendo um pedaço de macarrão. Oliver estava dando a ela um olhar astuto. — A autocensura parece ser fisicamente dolorosa para você. Desembucha.

Ela colocou o garfo de lado e pegou o vinho. — Tudo bem então. Eu ia dizer que entendo. Realmente eu entendo. Mas você tem certeza de que isso é sustentável?

Ele encolheu os ombros. — Quais são as minhas opções? Ele é meu pai.

— Sim, e tenho certeza de que ele não gostaria que você parasse de viver sua vida por ele.

— Sério? — Oliver perguntou, uma rara nota ácida perceptível em sua voz geralmente calmo. — Eu acho que isso é exatamente o que o bastardo teria desejado.

Ela brincou com o garfo, tomando cuidado para não revelar que o Walter Cunningham de quem ela se lembrava era o tipo de bastardo egoísta que esperava que a vida dos outros girasse em torno dele.

— Então ele e Serena não se entenderam, hein? — ela perguntou.

— De jeito nenhum, — Oliver disse, depois de engolir. — É por isso que vim aqui em primeiro lugar. Por alguma razão, ele parece apegado a você.

— Por alguma razão? — ela perguntou com um sorriso.

— Sim, bem. Ele não conhece você como eu.

Oliver piscou quando disse isso, e isso causou um friozinho no estômago dela que não teve nada a ver com o macarrão.

— Fico feliz em ficar com ele durante o dia até que Janice volte, mas não vou aceitar seu dinheiro.

Ele colocou o garfo de lado. — Naomi, não posso pedir a você para cuidar dele em troca de nada.

— Eu não serei uma cuidadora contratada, — ela estalou, seu próprio garfo fazendo barulho no prato.

— Uau —, disse ele lentamente, recostando-se na cadeira.

Ela respirou fundo para se acalmar e pegou o copo. — Se eu fizer isso, faço como uma igual.

Oliver franziu a testa. — O que te deu a impressão de que eu não penso em você como uma igual?

Diga a ele! Apenas diga a ele quem você é!

E o fato de ela não poder contar demonstrava o verdadeiro problema. Ela temia que, se contasse a ele, se revelasse seu passado e por que estava morando no prédio em primeiro lugar, ela realmente não seria igual a ele.

Ele pararia de vê-la como Naomi Powell confiante, e começaria a vê-la como a filha da governanta prostituta que seduziu seu pai.

— Deixa pra lá, — ela disse irritada, pegando o garfo novamente.

— Naomi.

— O que?

Ele esperou até que ela olhasse para ele, então sorriu levemente. — Você poderia, por favor, cuidar do meu pai enquanto eu estiver no trabalho amanhã? Prometo não tentar insultá-la com dinheiro, mas vou insistir que me deixe pelo menos levá-la para jantar depois. Oferta final.

Ela o estudou, procurando uma pegada, mas viu apenas... bondade.

— Ok.

Seu sorriso cresceu mais amplo e ele voltou a comer. — Bom.

Depois de um momento, ele disse: — Pergunta.

— O que? — ela perguntou com cautela.

— Você é tão irritadiça com amigas quanto é com amigos homens? — Ele colocou a menor ênfase na última palavra.

Ela encolheu os ombros. — Difícil dizer. Eu não tenho muitas.

— E quanto a Claire e Audrey?

— Elas são amigas, — ela admitiu. — Mas só nos conhecemos há alguns meses.

— Você não acha que vai durar?

Ela brincou com o garfo, pensando sobre isso. — Honestamente? Eu não sei. Por um lado, combinamos. Quase imediatamente. Por outro lado, as circunstâncias de nossa amizade são... incomuns.

— Talvez vocês tenham combinado tão bem por causa das circunstâncias. O mesmo homem estava interessado por vocês três. Vocês devem ter algo em comum.

— Eu não sei o quê, — ela resmungou. — Claire é gentil e responsável. Audrey é doce e divertida.

— E você é...?

Ela sorriu. — Ambiciosa e irritadiça?

— Focada e desconfiada — ele rebateu.

— O primeiro eu considero um elogio. Quanto ao segundo, não posso evitar. Você também não seria se você descobrisse que a pessoa com quem você estava dormindo era casado?

— Possivelmente. Mas também suspeito que você já mantinha as pessoas distante muito antes disso.

Ela empurrou o prato. — O macarrão realmente não está bom, hein?

— Não, — ele disse, parecendo querer pressioná-la por uma resposta em sua última pergunta, mas decidiu deixá-la se esquivar. — Tem sorvete?

— Agora estamos falando a mesma língua, Ollie —, disse ela, levantando-se e indo para o freezer. Então ela se voltou. — Você precisa voltar para Walter?

Ele hesitou, e ela viu a batalha interna sendo travada. A necessidade compulsiva de cumprir seu dever para com o pai versus seu desejo de ficar.

— Vou verificar com Serena — disse ele, tirando o telefone do bolso e balançando-o para ela. — Última chance para desistir de sua oferta.

Naomi tirou a tampa do pote Ben & Jerry's e olhou para o homem que uma vez havia feito sua vida totalmente miserável através da cozinha. E quem também a fazia sentir-se mais viva em anos.

— Não vou desistir — ela deixou escapar antes que ela pudesse repensar o fato de que ela estava voluntariamente se envolvendo com uma família que ela passou a vida odiando.

— Bom —, disse ele, voltando sua atenção para o telefone. — Ah, mais uma coisa.

— Hmm? — Ela enfiou uma colher no pote e colocou uma colherada de sorvete de cookies na boca.

— Você ainda está namorando Dylan com um Y?

A pergunta a pegou de surpresa, e um pedaço de chocolate se alojou em sua garganta.

— Não tenho certeza se isso é da sua conta.

Oliver se levantou e colocou o telefone de volta no bolso. — Talvez ainda não.

— O que isso deveria significar? — Ela perguntou, enquanto ele se dirigia para a porta da frente.

Ele deu a ela um sorriso enigmático por cima do ombro, abrindo a porta da frente. Mas ele não disse nada.

— O que isso deveria significar!? — Foi um quase grito agora.

A porta da frente se fechou e ela abriu a boca para dizer que ele havia esquecido o sorvete.

Droga. Melhor assim. Se ela e Oliver Cunningham vão continuar na mesma órbita, ela precisaria de todo o pote para ela.


Capítulo Dezenove


QUINTA-FEIRA, 18 DE OUTUBRO


— Uau. Você sabe que somos só nós três, certo? — Audrey perguntou ao abrir a porta da frente para Naomi e ver a grande quantidade de garrafas de vinho que ela segurava.

— Era mais barato comprar seis —, respondeu Naomi, entregando as garrafas e tirando a jaqueta. — Além disso, confie em mim, preciso de pelo menos metade disso só para mim.

— Eita. O que aconteceu? — Audrey perguntou, levando Naomi para a cozinha.

— Vamos esperar até que Claire chegue aqui, então eu só preciso explicar o pesadelo uma vez.

— Presente. — Claire anunciou, levantando o braço de onde ela estava sentada no sofá de Audrey.

Naomi esticou o pescoço para olhar o que estava assistindo na TV. — Droga, você realmente é fanática por beisebol.

— Sim. Mas por você, vou desligar. — Ela pegou o controle remoto e parou, observando algo no campo que fez os locutores gritarem. — Correção. Por você, vou deixar no mudo.

— Se Brayden não tivesse espetado seu pauzinho em nossos bolinhos, você teria desligado por nós? — Audrey perguntou.

Claire torceu o nariz, e Naomi deu uma olhada para Audrey e balançou a cabeça.

— Droga — disse Audrey. — Eu tenho trabalhado nisso. Ok, o que vamos comer?

— Chinês não — Claire murmurou, juntando-se a elas na cozinha e verificando os rótulos das várias garrafas que Naomi havia trazido. — Naomi pode escolher.

— Você não quer que eu escolha. Minha comida favorita costumava ser comida congelada. O tipo sem marca.

— Não, escolha! — Audrey protestou. — Exceto que talvez não congelado.

— Você está se perdendo, mas vou deixar passar. Que tal pizza?

— Pronto —, disse Audrey, puxando o telefone. — Há uma pizzaria na esquina que faz essa borda napolitana clássica, com mussarela defumada caseira e...

— Não, não pizza chique — interrompeu Naomi. — Queijo caseiro? Você está me zoando?

— Bem, onde você compra sua pizza?

— Vamos apenas dizer que não é o tipo de lugar que tem um sistema de pedidos online — disse Naomi, já discando um número da lista de favoritos de seu telefone.

— Ei, Claudio — disse ela no momento em que um estrondo quase ininteligível de italiano soou em seu ouvido.

— Naomi! Mia Bella. O de sempre?

Ela sorriu com a saudação familiar. — O pedido de sempre, vezes três. Estou prestes a apresentar a duas amigas a melhor refeição da vida delas. Pegue uma caneta, ok? Eu preciso que Jorge venha para a casa da minha amiga.

Um minuto depois, ela colocou o telefone de volta no balcão. — Feito. Eles devem estar aqui em uma hora. Por aí.

— Uma hora? É quinta à noite. A mussarela defumada do meu vizinho poderia ser feita do zero mais rápido do que isso!

Claire entregou a Audrey uma taça de vinho tinto. — Provavelmente não. A mussarela, sim, pode ser feita em trinta minutos. A parte defumada demoraria mais.

— Você está inventando isso?

— Não. — Claire bebeu da sua taça de vinho. — Brayden e eu tivemos aulas de fabricação de queijo uma vez. Antes de eu saber que ele estava, você sabe. Mergulhando em outras panelas de queijo quente.

— Agradável. — Naomi ergueu a mão e Claire deu-lhe um toque, enquanto Audrey fez beicinho.

— Como isso é melhor do que a minha de pauzinho! — ela protestou.

— Bem, para começar, ninguém enfia um pauzinho em um bolinho. Em segundo lugar, a palavra bolinho é... não. Continue trabalhando nisso.

— Tudo bem —, Audrey murmurou. — Mas, sério, Naomi, a sua pizza vem da Itália?

— Não. Belmont.

— Oh, Deus, alguém está tentando criar algum novo bairro em Manhattan de novo? — Claire perguntou.

— Não. Belmont fica no Bronx.

Os olhos de Audrey saltaram. — Você pede pizza do Bronx?

— E eles entregam? — Claire acrescentou.

— Eles entregam quando eu pago a eles cinquenta dólares a mais, mais o dinheiro extra para o entregador.

— Cinquenta dólares a mais por uma pizza. Deve ser incrível.

— Na verdade, não —, disse Naomi. — Mas quando eu estava na sétima série, minha mãe passou por uma rara fase de conseguir manter não apenas um emprego, mas dois. Claudio me alimentou praticamente todos os dias naquele ano, enquanto ela trabalhava em turnos consecutivos. Esta é a minha maneira de retribuí-lo.

— Bem, então mal posso esperar para experimentar —, disse Audrey com um aceno de aprovação enquanto todos iam para a sala de estar e se sentavam no sofá. — Agora, que tal você nos dizer por que sua taça de vinho está cheia até a boca. Dia ruim?

— Não muito — Naomi disse, girando seu vinho. — Acabou sendo... esquisito.

— Como assim?

— Estou meio que ajudando a cuidar de Walter Cunningham.

— Quem? Espera aí. O pai de Oliver? O mesmo que dormiu com sua mãe e depois a expulsou? — Claire perguntou incrédula.

Naomi fez uma careta. — Tipo isso?

— Por quê? O que você quer dizer com estar cuidando dele?

— Ele tem Alzheime, quanto ao porquê, não sei bem. É como se em um momento eu estivesse me lembrando que me mudei para o prédio para mostrar a eles que a garota que eles chutaram para as ruas poderia comprar o prédio inteiro em que moram e mais um pouco. E em seguida... eles não são os mesmos. Quer dizer, Walter, obviamente não, por causa da demência. Mas Oliver também. E antes que eu percebesse, senti uma necessidade estranha de ajudar um velho que está doente, mesmo sabendo que ele é um idiota. Costumava ser um idiota. Tanto faz. E agora vocês acham que sou louca.

— Não louca, — Claire disse lentamente. — Mas você está fazendo isso por Walter? Ou pelo filho dele?

Os olhos de Naomi se estreitaram. — O que isso significa?

Claire misturou seu vinho. — Significa que vimos a maneira como Oliver Cunningham olha para você, como se ele não soubesse se ele quer beijá-la ou empurrá-la contra a parede, ou empurrá-la contra a parede para beijá-la...

— Por favor, pare —, disse Audrey, enxugando a testa dramaticamente. — Eu nunca fui empurrada contra a parede. Mas sério. O que está acontecendo com vocês dois? Vocês pareciam muito amigáveis saindo da minha festa no fim de semana passado.

— Nós? — Naomi disse sarcasticamente. — Ou talvez parecíamos amigáveis porque vocês duas conspiraram para nos armar.

— Claire foi quem o trouxe.

— Foi você quem fez com que Naomi sentasse ao lado dele — Claire rebateu.

— E vocês duas praticamente empurraram Dylan em um táxi para que Oliver tivesse que me acompanhar até em casa.

— Não queríamos que Dylan se atrasasse para o voo, — Claire disse inocentemente.

Audrey concordou com a cabeça de modo solene. — O trabalho dele é muito importante. Super exigente. Ele não te disse isso uma ou mil vezes?

Naomi concordou com uma risada. — Ok, vou admitir que Dylan era um pouco...

— Pretensioso? Invasivo? Cheio de si? — Claire disse.

— Ele é um bom produtor —, ressaltou Naomi.

— Nisso eu vou acreditar. Ele certamente estava determinado a descobrir coisas sobre você.

Naomi estremeceu. Dylan tinha sido um pouco óbvio em sua tentativa de obter informações sobre ela de seus amigos naquela noite. Mas ele ligou mais tarde para se desculpar, e Naomi também poderia ser um pouco agressiva quando ela queria algo.

— Algum arrependimento por ter assinado o contrato do programa de TV?

— Estranhamente, não. Quer dizer, as coisas estão indo rápido, mas até agora não tive que fazer muito — disse Naomi, tomando um gole de seu vinho. Eles estavam certos, ela tinha dado a si mesma uma dose generosa.

Não era a maneira mais responsável de lidar com o fato de que ela não conseguia parar de pensar em Oliver Cunningham, mas era eficaz.

— Vou te oferecer um trato —, disse Naomi, olhando para trás para Audrey para mudar de assunto. — Eu te dou o resumo completo sobre Oliver se você me falar sobre Clarke.

Audrey piscou surpresa e depois riu. — Clarke? Clarke West? Tipo... Clarke?

Naomi riu. — Sim, tipo Clarke. O Clarke. Qual é a história aí? Gay?

— Definitivamente não.

Os olhos de Claire se estreitaram. — Você tem um melhor amigo hétero que tem aquela aparência há vinte anos? Como isso funciona?

— O que ela disse, — Naomi disse, apontando para Claire. — Espere, não, deixe-me adivinhar. Vocês ficaram juntos e não tiveram química, mas decidiram ser amigos ao invés de ex. Ahhhh, ou você está secretamente apaixonada, mas não está pronta para admitir para si mesmo?

Audrey ergueu as sobrancelhas. — Essas são minhas únicas duas opções?

— Basicamente.

— Quem disse? — Audrey exigiu.

Naomi encolheu os ombros. — Filmes?

— Todos os programas de TV adolescente já escritos, — Claire entrou na conversa.

— Bem, isso é verdade — admitiu Audrey. — Mas eu odeio dizer isso a vocês, senhoras, Clarke e eu não nos encaixamos em nenhuma dessas categorias.

— Ele não é gay. E não é um ex? E você não está secretamente apaixonada? — Naomi perguntou ceticamente.

Audrey sorriu. — Nenhuma das alternativas acima. Nós realmente somos apenas amigos. Quando eu estava na primeira série, uma menina malvada da terceira série roubou o medalhão que minha avó me deu de aniversário. Ele a fez devolver, depois brincou de amarelinha comigo até eu parar de chorar.

— Como você não se apaixonou naquele momento? — Claire perguntou um pouco sonhadora. — Isso é tão romântico.—

— Eu tinha seis anos, então nem tanto — disse Audrey. — Eu o idolatrava, mas mais como um irmão mais velho, já que meu irmão mais velho era muito mais velho.

— Ok, mas e depois que você desenvolveu hormônios? — Naomi perguntou. — Certamente então você percebeu que seu melhor amigo era ridiculamente lindo.

— Sim, mas ele é alguns anos mais velho, então ele desenvolveu os hormônios primeiro. No momento em que descobri a coisa toda entre meninos e meninas, ele já era galinha, e eu era inteligente o suficiente para reconhecer um destruidor de corações, mesmo que ele fosse meu melhor amigo.

— Espere, ele virou um destruidor de corações, com o quê, doze anos?

Audrey deu a Claire uma olhada em suas taças de vinho. — Você o viu.

— Eu vi. É por isso que não posso acreditar que não aconteceu nada. Uma aventura bêbada? Paixão secreta? Me dê algo. Ele é muito sexy para não haver uma história ali.

— Sem história — disse Audrey com firmeza. — Sua vez.

— Minha vez de quê?

— Você sabe o quê. Oliver Cunningham.

— Bem, como vocês já sabem, Oliver não foi meu herói de infância. Muito pelo contrário. Ele faz aquela vadia que roubou seu medalhão parecer uma fofa — disse ela a Audrey. — Fim da história.

— Hmm, não é o fim da história. Vocês são vizinhos com uma animosidade realmente deliciosa. Você já disse a ele quem você é?

Naomi balançou a cabeça.

— Naomi. Você tem que dizer a ele —Claire disse.

— Que bem isso faria?

— Bem, a mulher pela qual ele tem um abismo não estaria mentindo para ele, para começar.

— Ele não tem uma queda por mim.

Claire e Audrey trocaram um olhar.

— Ele não tem! Ele está só... intrigado.

Como ela estava com ele.

— Acredite em mim, não sou o tipo de Oliver Cunningham.

— Qual é o tipo dele?

— Vocês duas, — ela disse, apontando entre elas.

— Bem, obviamente você tem algo em comum conosco. Brayden certamente gostava de nós três — Claire disse, seu tom um pouco cáustico.

— Ele se casou com você —, retrucou Naomi. — E ele pelo menos deixou Audrey pensar que algum dia ele se casaria com ela. Ele nunca fez tais promessas para mim. Brayden me via pelo que sou. A verdadeira eu. Assim como Dylan me vê.

— O que isso significa? A verdadeira você?

— Vocês sabem. — Ela acenou com a mão com desdém. — Um pouco imprudente. Diversão. Aquela com quem você toma doses de tequila na sexta à noite, não aquela que você leva para conhecer a mãe.

— Bem, você teve sorte. A mãe de Brayden era um pesadelo — disse Claire.

— Ainda assim. Você sabe o que eu quero dizer.

— Na verdade, nem um pouco — protestou Audrey. — Não fale sobre você como se fosse...

— Lixo? — Naomi disse por ela.

— Pare, — Claire disse bruscamente. — Se você quer saber quem realmente vê você, sou eu e Audrey. E goste ou não, Oliver também, se você conseguisse ver além do seu rancor de infância e dar uma chance a ele.

— Ei! — Naomi disse, um pouco magoada. — Só para constar, jantamos juntos.

Audrey bateu palmas. — Isso é tão fofo.

— Mais fofo do que Clarke brincando de amarelinha com você? E foi apenas um jantar.

— Que tipo de jantar? — Claire exigiu.

— Foie gras4 e caviar, o que mais? Comemos espaguete, Claire. Por que isso importa? Eu fiz para ele um macarrão realmente ruim.

— Você fez para ele? Oh meu Deus. Você gosta dele.

— Eu não. — Naomi estava se sentindo cada vez mais perdida. — Ou eu não sei se gosto. O que eu sei é que jantei com um cara essa semana, e você não. Já estabelecemos que Clarke não conta — disse Naomi, levantando um dedo em advertência a Audrey, que estava prestes a protestar. — Posso estar confusa, mas pelo menos estou tentando.

— Hmm, eu preciso de mais vinho, — Audrey ponderou, começando a se levantar.

— Você consegue mais vinho depois de concordar em sair em um encontro. Qualquer encontro — disse Naomi.

— Eu não conheci ninguém com quem eu queira sair, — Audrey disse afetadamente.

— Nem eu —, disse Claire, com mais ênfase.

— Bem, isso é muito ruim —, disse Naomi. — Nós concordamos em ajudar umas às outras a evitar os homens ruins de Manhattan, não evitar todos os homens.

— Existe tal coisa como um homem que não é ruim? — Claire bateu em seu queixo.

— Ah, pare. Não estou dizendo que você precisa pedir algo do cardápio. Experimente todo o buffet — disse Naomi. — Só vai ficar mais difícil quanto mais você esperar.

Audrey recostou-se no sofá. — Eu odeio que ela esteja certa. Eu juro, todos os dias, eu acordo com mais uma ruga de amargura.

— Uma o quê?

— Aqui — disse Audrey, apontando para o canto dos olhos. — Amargura.

— Ela tem razão — disse Naomi. — Minha mãe se alimentava de amargura e tinha pés de galinha enormes.

A mão de Claire ergueu-se para o rosto. — Então, o que você está sugerindo?

— Só que todas nós concordemos em ir a um encontro. Apenas um. Sem sofrimento.

— Diz a mulher que tem dois homens atrás dela.

Naomi não dignificou isso com uma resposta.

— Tudo bem — disse Audrey após um momento. — Eu topo. Vou até deixar vocês escolherem o cara, já que confesso que foi uma bobagem da minha parte trazer Clarke para o jantar quando insisti que vocês trouxessem um encontro de verdade.

— E eu vou deixar você escolher alguém para mim também, — Claire disse. — Já que o acompanhante que eu trouxe foi na verdade para Naomi.

— Que Naomi não queria.

— Você tem certeza disso? — Audrey balançou as sobrancelhas. — Com quem você vai sair?

— Dylan. Obviamente.

— Tem certeza?

Naomi abriu a boca, mas nenhuma palavra saiu.

Droga. Ela não tinha certeza.


Capítulo Vinte


SEGUNDA-FEIRA, 22 DE OUTUBRO


— Este gloss é muito chamativo?

Naomi nem mesmo ergueu os olhos do telefone ao responder à assistente.

— Deena, não há nada sobre você que não seja chamativo.

— O que normalmente considero um elogio...

— Era pra ser um. — Naomi continuou a digitar em seu telefone.

— Mas estou preocupada que o brilho fique muito extravagante na câmera.

— Espere, o que? — Naomi finalmente ergueu os olhos. Ela e sua assistente estavam sentadas em uma mesa de uma sala de reunião na sede da StarZone no Flatiron Building enquanto esperavam por Dylan e o resto da equipe se juntar a eles. — Você sabe que não vamos realmente filmar hoje, ou em breve, certo? Eles mal começaram o roteiro.

— Mas o diretor de elenco estará aqui, certo? — Deena perguntou, adicionando uma camada extra de brilho que realmente parecia ter mais brilho do que um projeto de arte do jardim de infância.

— Quero que ele saiba que a melhor pessoa para interpretar Deena é, de fato, a Deena de verdade. Não uma fingida idiota.

— Entendido. Mas tenho quase certeza de que a primeira temporada será toda sobre minha infância. Pré-Deena.

— Droga. — Deena colocou o gloss de volta na bolsa e tirou um pacote de chiclete. — Trident?

Naomi balançou a cabeça.

Sua assistente enfiou um palito em sua boca e estudou Naomi. — Então. Esse produtor. Dylan Day. Ele é gostoso, certo?

— Não me faça lamentar por ter convidado você — Naomi murmurou, voltando sua atenção para o telefone.

— Você precisa de mim. Vou fazer anotações.

— Onde? — Naomi olhou incisivamente para a falta de notebook, laptop ou tablet.

Deena bateu em sua têmpora. — Tudo aqui em cima. Cabelo grande, cérebro grande. Então ele é gostoso ou o quê? Ele parecia sexy naquele dia no escritório, mas eu só vi a bunda. Você sabia que ele namorou a atriz daquele programa sobre a irmandade? Ela era bonita, mas tinha metade da idade dele.

Naomi acenou com a cabeça, mesmo enquanto ampliava uma foto de Audrey e Clarke no Instagram. Droga, aquela mulher tinha uma pele boa, mesmo com as rugas de amargura.

— Então, vocês estão namorando?

Naomi cedeu e riu. — Deena!

— Não pense que não percebi que ele é basicamente a única pessoa que tem o número direto do seu escritório.

— O que deve significar que casamos escondido, certo?

— Seu sarcasmo está extremamente acentuado, o que significa que estou no caminho certo.

— Bem. Ok. Fomos a um jantar que era meio encontro meio reunião de negócios, e ele foi meu acompanhante na festa de uma amiga

— Mas ele quer sair de novo. — Deena não fez uma pergunta e ela não estava errada. Dylan não escondeu seu interesse em vê-la novamente agora que ele estava de volta de Dallas, mas ela estava se esquivando, dizendo que estava ocupada.

O que era verdade. Seu trabalho ocupava a maior parte de seus dias, e isso antes de ela concordar em cuidar de Walter Cunningham. Ainda assim, ela não se arrependia de ter oferecido ajuda. Walter ficou com ela o dia todo na quarta-feira passada e a maior parte desta manhã antes de Serena assumir o cargo para que Naomi pudesse comparecer a essa reunião. E por mais que Naomi tivesse gostado de seu tempo com Walter, ela ficou ainda mais surpresa e alarmada ao perceber que tinha gostado ainda mais do momento em que Oliver voltou para casa à noite.

E a sensação de que parecia tão certo eles estarem jantando – pela segunda noite consecutiva – foi absolutamente aterrorizante.

— Você já o beijou? — Deena perguntou, mascando seu chiclete.

— Não! Só estou ajudando com o pai dele por alguns dias.

A mandíbula de Deena parou de mascar seu chiclete por um momento. — Você conhece o pai de Dylan Day? Droga, mulher, você trabalha rápido.

Ela foi salva de ter que explicar – ou tentar explicar – a confusão em que se meteu com seu novo vizinho e ex-inimigo quando as portas da sala de reunião se abriram.

— Desculpe pela demora — disse Dylan, cumprimentando-as com um sorriso. — Você deve ser Deena.

— Em carne e osso —, disse Deena, apertando sua mão e dando-lhe uma olhada descarada. — Sim. Sexy.

Naomi grunhiu, mas Dylan apenas riu e deu uma piscadela rápida para Naomi.

Como que uma piscadela de Oliver Cunningham conseguia mantê-la acordada a noite toda, mas uma piscadela desse cara, que era exatamente o tipo de cara que ela sempre se interessou... nada.

O grupo tomou seus lugares ao redor da mesa, e uma mulher alta e magra que se apresentou como Libby, a diretora de elenco, foi direto ao assunto.

— Já achei nossa pequena Naomi.

Naomi piscou. — O que? Já?

— Bem, nós ainda teremos chamadas de elenco completo para ter certeza, mas eu garanto que você vai adorar essa garota. Ela mora em Los Angeles, mas seu sotaque do Bronx é perfeito.

Naomi assentiu, tentando não se prender à ironia de que ela havia passado anos tentando se livrar de seu sotaque de Nova York, apenas para ver alguma estrela infantil de Hollywood usar esse mesmo sotaque para fins de entretenimento.

Não, não apenas entretenimento, Naomi lembrou a si mesma. Precisão. Em primeiro lugar, a razão para fazer tudo isso era para que as garotas que crescessem como Naomi soubessem que havia mais do que trabalhos como cabeleireiras e garçonetes em seu futuro, se quisessem.

— Tenho certeza de que ela é perfeita — disse Naomi com um sorriso. — Mas quando abrirmos as chamadas para o elenco, podemos também procurar nos bairros mais afastados? Pode ser um tiro no escuro, mas eu adoraria se pudéssemos encontrar uma garota realmente do Bronx.

— Absolutamente. Faremos isso —, disse Dylan. Naomi pensou ter visto Libby revirar os olhos ligeiramente, mas a outra mulher assentiu e anotou algo em seu caderno preto.

— Naomi, Caleb Davis, roteirista-chefe — um cara careca à sua direita disse, se levantando para apertar sua mão. — Estou muito feliz em dizer que já temos alguns trabalhos de casa para você.

Caleb empurrou uma pilha grossa de papel sobre a mesa. — O episódio piloto. Vou enviar um PDF para você também, mas às vezes acho que a maneira antiga é a melhor.

— Uau. — Naomi piscou para ele.

— Eu disse que estávamos andando rápido nisso — disse Dylan.

— Leve o tempo que precisar revisando isso, — Caleb disse. — E, por tempo que precisar, quero dizer, se você puder dar algum feedback até a próxima segunda-feira, esse é o meu prazo.

Naomi riu enquanto Deena puxava o roteiro em sua direção e dava uma olhada nas primeiras páginas. — Entendi. Algo que eu deva procurar?

— Na verdade, sim. — Caleb lançou um olhar rápido para Dylan, que assumiu.

— O roteiro é bom — disse Dylan, inclinando-se para a frente com um sorriso. — Caleb é um gênio e reuniu uma história muito convincente de sua infância a partir de dezenas de entrevistas que você fez ao longo dos anos, além de entrevistas com pessoas que a conheciam naquela época...

— Espere. — Naomi ergueu a mão. — O que?

Um homem à sua esquerda vestindo o conjunto de terno azul, camisa branca e gravata azul mais chato do planeta se assustou com seu tom incrédulo. — Estava no contrato. Na página vinte e três, seção 5C, nos autoriza especificamente a entrevistar todas as fontes que consideramos relevantes.

— Não sei se você poderia dizer, mas alerta advogado — Dylan sussurrou alto, acenando com a cabeça em direção a Terno Azul.

Todos riram, e Naomi forçou um sorriso educado. — Eu li o contrato. Acho que não esperava que as pessoas que me conheciam há vinte anos fossem consideradas relevantes.

— Bem, eles não foram, realmente, — Caleb admitiu. — Nós reunimos alguns ex-colegas de classe, mas embora não houvesse falta de pessoas que quiseram nos contar sobre como eles 'conheceram você', ninguém parece realmente conhecê-la.

— Eu era uma criança tímida.

Era sua resposta padrão, mas não era realmente verdade. Ela tinha sido apenas uma criança inteligente. Esperta o suficiente para saber que a maioria das pessoas jogaria você da ponte para salvar a própria pele. Ela poderia agradecer a Oliver Cunningham por essa lição.

— Há uma lacuna que esperamos que você possa preencher — disse Caleb, folheando um bloco de notas amarelo até encontrar o que procurava. — Um de nossos pesquisadores descobriu que você foi transferida brevemente do distrito escolar do Bronx quando cursou a terceira série no Distrito Escolar dois?

Naomi ficou imóvel. Ela não sabia nada sobre zonas escolares, mas sabia exatamente onde havia passado a terceira série.

— O que isso significa? — Deena perguntou.

Dylan estudou Naomi por um momento, depois olhou para Deena. — Isso significa que Naomi estudou a terceira série em Manhattan.

Deena balançou a cabeça. — Não. Eles acharam errado.

Dylan olhou para Naomi, e ela percebeu que deveria ter previsto isso.

Que eles não ficariam satisfeitos resumindo sua infância com uma série de anedotas inspiradoras sobre como, em vez de uma barraca de limonada, ela vendeu suas próprias jóias feitas de clipes de papel e botões, ou como ela fez suas próprias roupas de Barbie de pedaços de pano que ela roubou da costureira malvada que morava no andar de cima. Claro que eles iriam querer o drama.

E ela tinha que dar crédito a eles. Eles foram farejar e encontraram a jugular da infância de Naomi em menos de uma semana. Poderia muito bem admitir o mínimo agora para impedi-los de cavar mais.

— Eles não estão errados, — ela disse a sua assistente calmamente.

Deena deu a ela um olhar assustado. — Verdade? Você cresceu em Manhattan?

Naomi bufou. — Não conta. Eu morei lá por um ano. Menos.

— Por quê? Onde? — Caleb já tinha sua caneta pronta.

— Park Avenue.

O chiclete de Deena parou de ser mascado por um momento, então recomeçou um momento depois, e ela sabiamente evitou mencionar as ligações do número 517 da Park Avenue e o fato de Naomi ter tomado a decisão de última hora de comprar aquele apartamento depois de assinar um contrato de aluguel no condomínio em Tribeca.

Caleb franziu a testa, folheando suas anotações. — Você mora na Park Avenue atualmente, certo?

— Certo. — Ela recostou-se e cruzou as pernas, esperando que seu tom cortante e comportamento frio sinalizassem nada para ver aqui, seguir em frente.

— O que trouxe você e sua mãe para o Upper East Side?

Naomi engoliu em seco. — Minha mãe foi meio que governanta/cozinheira/babá de uma família na Park Avenue por um tempo. Nós morávamos com eles.

Caleb acenou com a cabeça, anotando algo em seu caderno. — Bom, isso é bom. Coisas meio Cinderela. Você disse que ficou lá por cerca de um ano?

— Sim.

— Por que vocês foram embora para voltar para o Bronx?

Você e sua filha são um lixo, e vocês sempre serão um lixo. Saia da minha casa antes que eu chame as autoridades.

Era engraçado que o que Naomi mais se lembrava daquele dia horrível era a maneira como Margaret Cunningham nunca usava contrações, escolhia palavras como autoridades em vez de policiais, polícia ou qualquer outro termo menos lisonjeiro que Naomi estava acostumada a ouvir, mesmo aos nove anos.

— O trabalho tinha que acabar algum dia, certo? — Naomi disse, mantendo a voz leve.

— Claro, eu acho, — Caleb disse, soando um pouco desanimado. Novamente, ele folheou suas páginas, franzindo a testa. — Você disse que ela era uma governanta?

— Sim.

— Você não mencionou isso antes. Você disse que ela era garçonete. Um barman. Manicure...

— Ah, elas são chamadas de nail artists5 agora — Deena entrou na conversa.

Caleb deu a ela um sorriso fugaz, então se voltou para Naomi, clicando com a ponta de sua caneta esferográfica. — Ela teve algum outro trabalho doméstico?

— Não.

Os Cunninghams se certificaram disso. Naomi não se lembrava muito daqueles dias após o incidente, exceto do cheiro horrível de mofo dos abrigos para sem-teto em fevereiro, mas ela se lembrava de ver o rosto de sua mãe ficar cada vez mais furioso enquanto ela era sistematicamente rejeitada de todos os empregos de governanta que tinha aplicado, residente ou não.

— Tudo bem — disse Caleb, jogando a caneta para baixo e colocando a cabeça entre as mãos, a expressão pensativa. — Isso é bom. Isso ainda é bom. Se os seis primeiros episódios forem sobre a infância de Naomi, estou pensando que este ano em Park Avenue pode ser um episódio inteiro, pelo menos...

— Não —, interrompeu Naomi.

Caleb franziu a testa. — Não?

— Esse ano está fora dos limites. Você pode se referir a isso, ou qualquer outra coisa, mas eu não quero mostrar.

— Mas é uma grande parte da sua infância...

— Eu disse não —, Naomi rangeu os dentes.

Oliver, isso é verdade? Você e Naomi viram seu pai com aquela mulher? Olhos azuis furiosos perfuraram os de Naomi naquele dia enquanto a mentira derramava de sua boca. Não sei do que ela está falando.

— Fora dos limites, — ela repetiu, sua voz um pouco áspera quando a memória da traição de Oliver a rasgou.

Houve um longo silêncio na sala, e outro cara cujo nome ela já havia esquecido falou. — Respeitosamente, Sra. Powell, nosso objetivo aqui é mostrar a história completa...

— Cara. — Desta vez foi Dylan quem interrompeu. — Ela disse que está fora dos limites. Deixe de fora.

A cabeça de Naomi se ergueu de surpresa e ela encontrou o olhar do produtor do outro lado da mesa. Ele deu a ela um sorriso e um breve aceno de cabeça, e Naomi se decidiu naquele momento.

Dylan Day merecia uma chance.


Capítulo Vinte e Um


SÁBADO, 27 DE OUTUBRO


Droga. Era oficial. Ela estava quebrada.

Pré-Brayden, Naomi adorava namorar. Especificamente, ela adorava se arrumar para o encontro. A preparação, a antecipação. A dúvida.

Mas vinte minutos antes de seu primeiro encontro oficial com Dylan, ela não conseguia encontrar nem um lampejo de excitação. Ela pensou que parecer bonita a faria se sentir bonita, mas não. Apesar de usar calças de couro Alexander McQueen que faziam coisas excelentes por sua metade inferior, uma blusa Trina Turk assimétrica combinada com pulseiras de ouro e pequenos brincos de ouro – ela se sentia... murcha.

Onde estava o brilho? A dúvida, o e se. E se ele a beijasse? E se ela o beijasse? E se ela agisse como uma mulher independente do século XXI e dormisse com ele no primeiro encontro simplesmente porque queria?

Ela já sabia que não queria.

Porque quando ela pegou seu melhor conjunto de calcinha e sutiã pretos, ela não estava pensando em Dylan. Quando ela cuidadosamente enfeitou os olhos com um pouco de delineador preto e sombra cinza que ela sabia que fazia seus olhos azuis se destacarem, ela não estava pensando em Dylan. E agora, enquanto ela estava na frente de sua sapateira, debatendo entre Manolo Blahniks vermelhos e Jimmy Choos pretos, ela não estava pensando em Dylan.

— Maldito — ela murmurou para um homem que sequer estava presente. Um homem que, apesar de suas amigas garantirem, Naomi nem tinha certeza se estava interessado.

Ela não tinha visto Oliver o dia todo, o que não deveria ser grande coisa, exceto pelo fato de que ela se acostumou com ele. Ela se acostumou a ouvir o som de sua chave na porta. Se acostumou a discutir se pedir pizza contava ou não como cumprimento adequado de sua parte no trato de alimentá-la. Acostumada a sentar com uma taça de vinho, observando-o cozinhar, quando ela inevitavelmente vencia a discussão de que pizza não contava.

E ela negaria até o dia de sua morte que ela geralmente escolhia refeições caseiras em vez de delivery porque tendia a estender seu tempo juntos.

Mas hoje era sábado, o que significava que ela não cuidava de Walter, e já que seu papel como cuidadora era aparentemente a única utilidade que ela tinha para ele...

— Chega, — Naomi retrucou, enojada de si mesma. Ela agarrou os stilettos vermelhos. Bom o bastante.

Não, melhor do que isso. Perfeito. Era exatamente os sapatos que as boas garotas que Oliver Cunningham gostava de namorar não usariam.

Em seguida, ela vasculhou sua bolsa de maquiagem em busca de um tom de batom combinando, um olho no relógio enquanto o fazia. Muito tempo.

Ela e Dylan se encontrariam num bar. Ideia dela. Naomi nunca tinha acreditado em toda aquela prática cavalheiresca, de acompanhar a pequena dama até o local do encontro e de volta para casa. Se o encontro fosse um fracasso, o tempo de transporte do seu apartamento até o local do encontro apenas aumentaria a agonia. E se o encontro fosse bom – muito bom – eles acabariam na casa dele. Nunca na dela – isso era apenas pedir por grude.

Além disso, veja o que aconteceu da última vez que Dylan a acompanhou até sua casa. Ela encontrou Oliver e seu encontro, e foi assombrada por dias.

Seu telefone tocou e Naomi revirou os olhos para a mensagem recebida.

Audrey

Foto. Agora.

Naomi

Isso parece um pouco com o 'o que você está usando'. Estranha.

Audrey

É EXATAMENTE isso. Eu PRECISO saber sua roupa.

Naomi obedeceu, indo até o espelho de corpo inteiro no quarto e tirando uma foto, que ela mandou para Audrey.

Um momento depois, seu telefone tocou novamente.

Audrey

Tive que incluir C nisso. Não poderia estar sozinha no meu ciúme por você poder usar essas calças.

Naomi

Ajuda saber que mal consigo respirar e definitivamente não consigo me curvar?

Claire

Isso ajuda um pouco. Muito pouco.

Audrey

Ainda te odeio. Do que estamos falando, fanática por Pilates?

Naomi

A doida da corrida.

Audrey

Te odeio ainda mais.

Claire

Você corre? Amizade oficialmente cancelada.

Naomi

Não. Nenhuma de vocês pode cancelar nada até que TODAS nós passemos por isso.

Naomi mordeu o lábio e hesitou apenas um momento antes de enviar a pergunta que ela realmente queria fazer.

Naomi

Eu cometi um erro ao escolher Dylan?

Suas respostas foram imediatas.

Audrey

Sim.

Claire

Definitivamente.

Ela revirou os olhos, arrependida por ter perguntado.

Naomi

Saindo. Me desejem sorte.

Claire

Você teve que usar uma cinta modeladora para colocar essas calças?

Audrey

Você contou ao Oliver?

Naomi balançou a cabeça enquanto colocava o celular na bolsa sem responder.

Não havia espaço para nada além de sua menor calcinha por baixo dessas calças, e quanto a dizer a Oliver que ela estava indo para um encontro? Não. Apenas não.

Com uma última olhada no espelho, Naomi passou um dedo nos dentes da frente para remover qualquer mancha de batom e saiu para o corredor.

Ela estava fechando a porta quando a porta ao lado dela se abriu.

A porta de Oliver.

Não! ela implorou silenciosamente. Não não não...

— Ei, vizinha.

Droga.

Ela se virou para Oliver quando ele entrou no corredor, com o saco de lixo na mão.

— Você usa óculos? — ela deixou escapar.

Ele cruzou os braços e encostou-se à porta enquanto a fechava, conseguindo parecer incrivelmente sexy, mesmo com um saco de lixo pendurado em sua mão direita.

— Se vamos começar a discutir aparências, Ms. Powell, a sua é a única que vale a pena mencionar.

Sua avaliação foi lenta e deliberada, e ela sentiu isso, desde o sutiã preto que ele não conseguia ver até os saltos vermelhos de dez centímetros que ele podia.

— Mas para responder à sua pergunta —, disse ele quando ela se sentiu com a língua presa demais para responder, — sim, eu uso óculos.

— Desde quando?

Ele deu um sorriso torto. — Você me conhece há um mês. Certamente, tenho permissão para ter alguns segredos.

Oliver não usava óculos quando criança. Ela sabia porque ela usava, e ele a chamava de quatro olhos, quando não a estava chamando de Cenoura. E ela estaria mentindo se dissesse que aquele xingamento de muito tempo atrás não teve nada a ver com sua decisão de fazer a cirurgia a laser três anos atrás.

Tardiamente, ela percebeu que os óculos não eram a questão mais importante. — Onde está Walter?

Oliver apontou o queixo para cima. — Casa dele. Tivemos um dia difícil, então pedi a Serena que passasse a noite aqui e ficasse com ele. Ele e eu precisávamos de uma pausa.

Naomi acenou com a cabeça porque ela entendia. No geral, ela não se importava em cuidar de Walter, mas quando ele queria, ele era realmente frustrante. Ela imaginou que seria ainda mais difícil para um membro da família lidar com os altos e baixos voláteis.

— Ah, entendi —, disse ela, enfiando a bolsa YSL ainda mais em sua axila e fazendo malabarismos com as chaves na mão. — Bem, tenha uma boa noite.

— Naomi, — ele disse enquanto ela se virava.

Ela suspirou e se virou. —Sim?

Oliver se afastou da porta, caminhando lentamente em direção a ela, seus olhos a penetrando por trás das lentes de seus óculos sem aro. Sem terno hoje, mas ele poderia muito bem estar usando um. Suas calças eram perfeitamente ajustadas, com uma costura imaculada descendo na frente como se tivessem vindo direto do alfaiate ou da lavanderia, a camisa branca de botão engomada com perfeição...

Ela engoliu, só que sua boca parecia ter ficado seca, fazendo com que o movimento fosse quase dolorosamente audível no corredor silencioso.

Ele parou a alguns passos dela. Sua expressão nunca mudou de descontraída, mas seus olhos brilharam para ela. — Para onde você vai?

— Sair

Seu olhar caiu para sua boca vermelha, então de volta para seus olhos. — Noite das meninas?

— Não é da sua conta, — ela disse asperamente.

Sua mandíbula ficou tensa. — Então é um encontro.

— Eu não disse isso.

— Não, mas se fosse uma noite das meninas, você teria dito.

— Tudo bem —, disse Naomi, cedendo. — Vou a um encontro. Satisfeito?

A maneira como seus olhos se estreitaram levemente disse que não estava nada satisfeito . Mas então ele ergueu os ombros em um encolher de ombros casual. — Legal. Se divirta.

Naomi começou a abrir a boca para dizer a ele que ela poderia namorar quem ela quisesse, quando ela quisesse, mas então suas palavras reais afundaram e sua boca se fechou.

— Ah. Obrigada.

Ele sorriu. — Certo.

E então ele passou por ela, assobiando em seu caminho para a rampa de lixo. Assobiando!

Tanto trabalho para ela se preocupar em contar a ele – ou pensar que ele se importaria.

Naomi respirou fundo para organizar seus pensamentos antes de girar nos calcanhares e se dirigir para as escadas.

Oliver estava saindo da sala de lixo quando ela alcançou a escada, e ele deu a ela um sorriso cordial superficial quando eles se encontraram. Ela retribuiu o sorriso com os dentes cerrados, sem ter certeza de por que estava com raiva dele, mas seu temperamento fervia ao mesmo tempo quando ela alcançou a porta da escada.

— Oh, ei, Naomi — ele disse, estalando os dedos como se estivesse se lembrando de algo.

Ela se virou, assustada porque ele estava bem ali. — O que?

— Só uma coisa — disse ele.

Em seguida, a mão dele deslizou por baixo de seu cabelo, segurando a nuca dela, enquanto sua boca descia sobre a dela.

Seus olhos se arregalaram de surpresa com o beijo inesperado, então se fecharam porque também era um beijo muito bom. Firme, mas provocador, cheio de posse e promessa e...

Então acabou. Muito rápido.

Atordoada, Naomi levou quinze segundos inteiros para abrir os olhos depois que ele se afastou, outros dez para se lembrar de seu próprio nome. — O que – o que foi isso?

Em vez de responder, ele estendeu a mão e roçou suavemente a ponta do polegar sob seu lábio inferior. — Seu batom está manchado.

— De quem é a culpa? — ela murmurou, sua voz um pouco trêmula.

Sua mão caiu de seu rosto e ele enfiou as duas mãos nos bolsos, balançando para trás sobre os calcanhares. — Desculpe.

— Você está arrependido?

— Nem um pouco.

Ela procurou freneticamente por alguma réplica espirituosa, mas em vez disso encontrou seu olhar fixo em sua boca. Querendo repetir. Uma longa repetição.

Finalmente ela ergueu o olhar de volta para ele. — Quer explicar o que aconteceu?

— Nem. — Ele continuou a balançar nos calcanhares, parecendo infantil e dolorosamente atraente.

— Mas...

— Naomi. — Ele parou de se balançar e deu a ela um olhar que a aqueceu profundamente. — Descubra.

Com isso, ele se virou e voltou para seu apartamento, retomando seu assobio e parecendo não ter ideia de que havia conseguido virar o mundo de Naomi Powell de cabeça para baixo com um simples e inesquecível beijo.


Capítulo Vinte e Dois


SEGUNDA-FEIRA, 29 DE OUTUBRO


Oliver pegou seus óculos e lápis pela décima vez em uma hora, apenas para jogá-los de volta em sua mesa. Também pela décima vez em uma hora.

Não adiantava. Não importava o quanto ele quisesse conseguir o projeto de Gabe Green, ele não seria capaz de desenhar uma única linha reta até que pudesse tirar uma certa ruiva sedutora de sua mente.

Não era uma tarefa fácil, considerando que ele agora tinha a memória de seu gosto e toque para enfrentar.

Beijá-la no sábado foi... um erro.

Não, não um erro, porque ele faria de novo em um piscar de olhos.

Foi um passo em falso – o que ele deveria ter feito era beijá-la e não parar.

Ele deveria tê-la apoiado contra a parede, enrolado as pernas dela em sua cintura e dito para ela esquecer o encontro. Para esquecer o outro cara. Para ser dele.

Em vez disso, ele a deixou ir embora, esperando como o inferno que sua aposta valesse a pena, que ela percebesse que, se estivesse pronta para começar a namorar novamente depois de Brayden, que o cara certo estava bem aqui...

Oliver enterrou as mãos sobre os olhos ao perceber sua linha de pensamento. Ele era o cara certo? Para alguém? Havia um motivo para sua noiva ter fugido dele anos antes.

Ele mal tinha tempo de tomar banho entre o trabalho e as obrigações com Walter, muito menos para ir a academia. Menos ainda ir em um encontro. Muito menos ainda ter namorada.

Principalmente uma namorada como Naomi, que não era exatamente do tipo fácil, dócil e tranquila. A mulher era fogo e energia, e no auge da carreira. Ele fez seu dever de casa. Sua empresa, que ela tão modestamente descreveu como uma “start-up”, estava avaliada em quase um bilhão de dólares.

Um bilhão! E ainda assim a mulher não tinha nenhum traço de esnobismo. Na verdade, sua antipatia por ele parecia ser por causa de seu esnobismo presumido. Oliver nunca tinha estado tão ciente do estigma de nascer com dinheiro, que ele poderia entender se fosse de alguém que não tinha dinheiro, mas Naomi Powell tinha de sobra.

Pelo que ele poderia dizer, a vida dela tinha sido uma longa sequência de entrevistas e sessões de fotos e capas da Forbes Under 30. Ela era frequentemente fotografada nos restaurantes mais novos, vista dançando nas baladas mais famosas, muitas vezes com algum rosto bonitinho ao seu lado.

Oliver não se encaixava nessa figura. O velho Oliver talvez pudesse ter se sentido balançado. Ele nunca tinha gostado de ficar na rua até tarde e baladas, mas também não era enfadonho. Ele gostava de sair, tomar uns drinks, talvez uns a mais. Ele gostava da satisfação de surpreender uma mulher com reservas em algum lugar chique. Inferno, ele nem mesmo se importava com o ocasional evento formal, necessitando de um terno de pinguim e conversa fiada.

Mas essa não era sua vida agora. Não poderia ser. Ele tinha sorte se conseguisse uma noite de folga por semana, e essas geralmente eram gastas em trabalho, tentando manter as poucas amizades que ele ainda tinha, ou apenas conseguindo um pouco de paz e sossego.

Oliver não sabia se Naomi já tinha ouvido falar do conceito de paz e sossego.

Porém, talvez isso não fosse justo. Na última semana e meia que ela se ofereceu para cuidar de seu pai, ela parecia estranhamente feliz em relaxar em seu apartamento...

Até que ela ficou entediada, aparentemente. Até ela sair em um encontro.

— Eu conheço essa cara. Você está remoendo um problema.

Oliver se virou para a porta aberta de seu escritório para ver um de seus melhores empreiteiros e amigo passar pela porta.

— Ei, cara, — Oliver disse com um sorriso genuíno enquanto ia dar um abraço de lado em Scott Turner. — Onde diabos você esteve?

— Seattle. Acabei de voltar, quinta-feira passada, — Scott disse, pegando uma das cápsulas de café que o assistente de Oliver mantinha em uma mesa de canto antes de colocá-la na máquina do outro lado da sala.

— Entendi — Oliver disse, se largando na cadeira ao lado da mesa de canto que mantinha em seu escritório. Ele gostava de ficar em pé enquanto trabalhava, então sua mesa era alta e de frente para a janela. A mesa de canto estava reservada para reuniões com clientes ou, neste caso, para conversar com amigos. — Como foi? Valeu a pena ter recusado meu projeto?

— Seu projeto era um hotel chique. Você sabe que não é minha praia.

— E museus estranhos são?

— Basicamente — Scott disse, pegando sua caneca de café e se juntando a Oliver na mesa. — Porém, a piada fui eu. O projeto era legal na teoria, mas a cliente era uma diva.

— Intrometida?

Scott grunhiu em confirmação, e Oliver deu um único aceno em compreensão.

Ele e Scott Turner se conheceram em Columbia, ambos com o objetivo de conseguir um mestrado em arquitetura. Scott desistiu após o primeiro ano, percebendo que sua paixão era construir, não desenhar. Ele fundou sua própria empresa de construção e, embora a mantivesse pequena, ele era conhecido como perfeccionista e podia escolher seus projetos.

Oliver sempre recomendava a Turner Construction para seus projetos, sabendo que Scott entendia os projetos de Oliver de uma forma que as empresas maiores nem sempre entendiam. Mas Scott era exigente. Se um dos projetos de Oliver não combinasse com seu humor, ele pegava outro projeto.

Seattle, neste caso.

— Como foi, além do cliente idiota? — Oliver perguntou.

— Bom. Tão chuvoso quanto dizem, mas meu guarda-roupa certamente se encaixa melhor lá.

Oliver acreditava nisso. Embora Scott tivesse um apartamento no West Side, ele não era nenhum jovem executivo de Manhattan. Pensando bem, Oliver não conseguia se lembrar da última vez que tinha visto seu amigo usar qualquer coisa além de jeans e camiseta. Mesmo agora, no final de outubro, Scott tinha colocado uma camisa azul marinho de manga curta sobre uma camisa branca de manga longa. Não havia sinais dos óculos aviador de costume, mas Oliver apostava que estavam enfiados na jaqueta que Scott colocou no encosto da cadeira.

— Então o que vem agora? — Oliver perguntou.

— Veremos, — Scott disse, tomando um gole de café e estudando-o. — Eu preciso de um limpador de palato. Alguma coisa... simples. Básica. Você às vezes sente falta de seus primeiros projetos? Antes de sabermos como fazer coisas sofisticadas e simplesmente dar as costas para as coisas normais?

— Não, — Oliver admitiu. — Mas considerando que a primeira coisa que vi você esboçar foi uma cabana de madeira, acho que sei o que você quer dizer.

— Sim, bem. — Scott girou os ombros em irritação impaciente. — Eu quero algo assim. Quero esvaziar algo pequeno e, em seguida, demorar para acertar os detalhes.

Ele acenou com a cabeça na direção da mesa de Oliver. — No que você está trabalhando?

Oliver inclinou a cadeira para trás, inclinando-se quase a ponto de tombar, para pegar seu bloco de desenho antes de largá-lo na mesa na frente de Scott.

Scott o pegou e esfregou a palma da mão distraidamente sobre sua sempre presente barba por fazer. — Bom e velho pau e bolas. Agradável.

Seu amigo jogou o bloco de lado – era realmente um pau e um par de bolas que Oliver havia rabiscado no bloco em total tédio sem inspiração – e o estudou. — Bloqueio?

— Não. Estou pensando que um prédio exatamente com esse design seria perfeito ao lado do High Line. O que acha?

— Muita gente se divertiria com isso —, disse Scott, apoiando uma bota no joelho oposto. — Eu também acho que você está evitando minha pergunta. Como está o Walter?

— Bem, — Oliver disse. — Quero dizer, não bem, mas... nenhuma mudança.

— Aqueles fãs de Tribeca escolheram seu projeto para a monstruosidade de uso misto no centro da cidade?

— Sim — Oliver disse distraidamente, puxando o lápis de trás da orelha e brincando com ele.

— Tudo bem, então não é família. Não é trabalho. Mulher.

O olhar de Oliver subiu e encontrou o de Scott antes de se afastar novamente.

— Acertei em cheio — disse Scott, sem se preocupar em esconder o orgulho. — Quem é? Você não voltou a ficar com aquela vadia da Bridget, não é?

— Ah, pronto, seja honesto, — Oliver resmungou.

— Eu fui. Muitas vezes. Qualquer mulher que fosse embora um mês após o diagnóstico de seu pai não valeria um segundo a mais de seus pensamentos.

Oliver quase lembrou a Scott que ele também estava noivo. Ao mesmo tempo que Oliver. Os dois casais eram quase inseparáveis na época, embora nenhum deles tivesse chegado ao altar. Por mais que Bridget tenha machucado Oliver ao abandoná-lo, não era nada comparado ao que Scott tinha passado quando Meredith o traiu.

— Dado o devido crédito, Bridget ficou durante a doença da minha mãe — disse Oliver. — Não teria sido justo pedir a ela para lidar com tudo isso de novo.

— Por que não? Você tem que lidar com isso.

— Podemos não falar disso?— Oliver disse cansado, esfregando a testa. — Não se trata de Bridget. Eu nem falo mais com ela.

— Ah. Alguém novo. Bom. Já faz muito tempo.

— Sim, já que você é um cara cheio de relacionamentos de verdade — Oliver disse sarcasticamente. — Sabe, além de Meredith, eu nunca conheci uma mulher com quem você estava saindo? Garotas aleatórias que você leva para casa dos bares não contam.

— Que bom que não estamos falando sobre minha vida amorosa, então, — Scott disse, tomando outro gole de seu café. — Fale com o seu amigão Scotty. Quem é a garota que fez você desenhar isso? — Ele folheou o bloco de notas.

— Nova vizinha.

As sobrancelhas de Scott se ergueram em surpresa. — Diga-me que ela tem menos de sessenta anos.

Oliver riu. — Ela tem mais ou menos a nossa idade. Não tenho ideia do porquê ela se mudou para um prédio onde a média de idade é de cerca de setenta e quatro anos.

— Você já perguntou a ela?

— Eu... — Oliver ficou boquiaberto. Ele perguntou? Talvez durante o processo de entrevista. Mas como pessoa? Como amigos? De homem interessado para mulher?

— Verdade seja dita, não sei muito sobre ela além do que encontrei na Wikipedia.

— Inferno, isso soa como um problema.

— Não o tipo que você está pensando. Ela é uma empresária, começou um império de joias. Maxcessory?

Scott balançou a cabeça. — Nunca ouvi falar.

Chocante.

— De qualquer forma, Naomi é minha vizinha, e ela é...

— Gostosa?

— Gostosa. Frustrante. Uma pedra no meu sapato.

— Parece um verdadeiro sonho tornado realidade. Alguma boa qualidade além da gostosa?

— Ela é boa com meu pai.

Scott acenou com a cabeça em compreensão. Uma mulher ser boa com seu pai pode não ser a base mais sexy para qualquer relacionamento, mas desde que Bridget o abandonou quando ele mais precisava dela, Oliver prometeu a si mesmo que nunca se envolveria com uma mulher que não pudesse lidar com Walter – que não entendia que ele e seu pai eram um “pague 1 leve 2”.

— Ok, então ela é gostosa, — Scott disse, estendendo o polegar. — Ela gosta de Walter, e isso não é uma tarefa fácil... — Ele estendeu o dedo indicador. — Ela construiu seu próprio império, então não está presente pelo dinheiro — disse ele, esticando outro dedo.

— Tudo verdade, — Oliver murmurou.

— Então qual é o problema?

— O que você quer dizer?

Scott encolheu os ombros. — Me parece uma situação bastante clara. Você se sente atraído pela sua nova vizinha e ela não saiu correndo por causa da situação da sua família. Nenhuma dessas razões explica por que estou recebendo ondas depressivas vindas de você agora.

— Tudo bem, — Oliver disse, decidindo colocar tudo para fora. — Que tal o fato de que desde o segundo em que me viu – literalmente, no primeiro segundo – ela decidiu que não gostava de mim.

Scott fez uma careta, balançando a mão. — Para ser honesto, cara, eu também não gostei muito de você da primeira vez que te vi.

Oliver olhou feio para o amigo. — O que?

— Você é meio que... — Scott estreitou seus olhos castanhos e estudou Oliver. — Pomposo.

— Perdão?

— Você sabe. Como alguém que a mãe obriga a se trocar antes do jantar, e não tem camisas sem colarinho e tem uma coleção de abotoaduras que remonta a quatro gerações.

— Eu não tenho uma coleção de abotoaduras.

Embora sua mãe o fazia se trocar para o jantar quando criança. E sua quantidade de camisas sem colarinho não era exatamente grande.

— Pergunta, — Scott disse, colocando sua caneca de lado e juntando seus dedos. — Você trabalha para si mesmo, certo?

— Sim, — Oliver disse impaciente. — Você sabe disso.

— Então você é o chefe.

— Significa que...?

— Você não precisa usar terno. — Scott olhou diretamente para o terno risca de giz de Oliver. — Ninguém está obrigando você.

— Correto, — Oliver disse, alisando a mão sobre esta gravata cinza, — Eu apenas prefiro não parecer um...

Scott fez um gesto contínuo com a mão. — Lenhador? Boêmio? Vagabundo? Trabalhador braçal?

— Eu não vou cair nessa armadilha, — Oliver murmurou.

— Olha, cara, eu superei isso. Vi que você não era realmente pomposo, apenas se veste como um. Mas demorei um pouco. Pessoas como você geralmente não se associam com pessoas como eu, e eu não estava exatamente preparado para que você fosse decente.

— O que diabos você quer dizer com 'pessoas como você'? — Oliver perguntou, genuinamente confuso.

— De onde eu sou? — Scott perguntou.

— Ah... — Oliver quebrou a cabeça, ficou um pouco envergonhado ao perceber que não fazia ideia.

— Exatamente. Nunca te contei. Por quê? Porque você nasceu e foi criado e ainda mora na Park Avenue. Eu? Uma cidadezinha de merda em New Hampshire, da qual você nunca ouviu falar, em uma casa de dois quartos que dividia com meu pai e três irmãos. Dois dos meus irmãos ainda moram lá. Inferno, provavelmente eu também moraria, se não tivesse decidido abrir caminho com os cotovelos, mas isso não significa que não estou preparado todos os malditos dias para que alguém me olhe e enxergue minhas raízes..

Oliver olhou para seu amigo. Foi um discurso monótono e desapaixonado, mas suas palavras foram... significativas. Foi mais do que Scott jamais disse a ele. Mas antes que pudesse pensar no que dizer, Scott estava tirando o telefone do bolso.

— Vamos testar essa teoria. Qual é o nome dessa garota?

Oliver disse a ele, e Scott digitou em seu telefone. — Aqui vamos nós. “Naomi Powell, mais conhecida como” blá, blá, blá. Ah. “Nascida e criada no Bronx, Powell citou sua infância pobre como uma grande motivação...”

Scott olhou para Oliver ao telefone. — Você nunca leu isso?

— Não, eu li, — Oliver disse, se mexendo na cadeira. — É uma história de plebeia que vira princesa.

Scott balançou a cabeça e guardou o telefone, confirmando sua teoria. — Claro, mas aposto com você, há uma parte dela que ainda se vê plebeia, e enquanto isso você É...

— Pomposo, — Oliver disse, percebendo o que seu amigo queria dizer.

Scott estendeu as mãos para o lado. — Meu trabalho aqui está feito.

Oliver riu. — Até parece. Você apenas me insultou e me deu literalmente zero conselhos.

— Você sabe quando foi que eu percebi que você não era um idiota completo? — Scott perguntou, inclinando-se ligeiramente.

— Mal posso esperar para ouvir.

— Grupo de estudos, pouco antes de eu largar. Lembra, era na sua casa, e deveria ser com aquela linda garota loira com cabelo longo, mas ela adoeceu no dia e nunca apareceu, então fomos apenas nós dois?

Oliver encolheu os ombros. — Vagamente?

— Bem, eu estava morrendo de medo disso, esperando que você servisse sanduíches de pepino em pratos de porcelana.

— E?

— E você atendeu a porta segurando um rolinho primavera, vestindo uma calça da Nike e uma camiseta manchada de molho de soja na frente.

— Jesus, — Oliver disse com uma risada.

— Foi quando eu soube que poderíamos ser amigos. Quando eu soube que você era real. Quando eu soube que havia um homem sob o terno, — Scott disse, se levantando e pegando sua caneca.

— Acho que vai ser preciso um pouco mais do que molho de soja derramado para conquistar Naomi.

— Tudo bem, então evolua seus métodos — Scott disse com naturalidade. — Mas se você quer uma chance, Cunningham, você tem que mostrar a essa mulher que há um homem sob essa risca de giz.

— Acho que essa conversa acabou de ficar estranha.

— Diz o homem rabiscando pênis.

Oliver pegou o bloco de desenho e o virou. — Talvez eu possa apenas mostrar isso a ela?

Scott deu a ele um sorriso infantil. — Se você seguir meu conselho, eu diria que você tem uma chance bastante decente de mostrar a ela a coisa real.

Eeeee convencido.


Capítulo Vinte e Três


SEGUNDA-FEIRA, 29 DE OUTUBRO


— Walter, eu juro por Deus, não vou lidar bem se você jogar esse ovo em mim — disse Naomi, levantando um dedo em advertência.

O homem mais velho lançou-lhe um olhar malicioso, mas para sua surpresa – e alívio – optou por dar uma mordida no ovo em vez de jogá-lo nela, como tinha feito com os dois últimos. Ela se esquivou deles bem a tempo, mas ele os jogou com força suficiente para espalhar os pedaços por todo o tapete.

— Ok, vou limpar isso — disse ela, apontando para os ovos. — E você vai pedir desculpas.

Ele mastigou, olhando para ela de forma rebelde. — Quem é você? Onde está Margaret? Dê o fora da minha casa.

Naomi respirou fundo e fez uma anotação mental para perguntar se Janice era católica, porque se fosse, Naomi iria seriamente indicá-la para santidade por lidar com isso todos os dias.

— Meu nome é Naomi. Estou cuidando de você enquanto Janice está cuidando do pai dela.

— Janice — disse ele lentamente, semicerrando os olhos como fazia quando tentava juntar as peças.

— Sim. Você se lembra dela? — Naomi perguntou, pegando a lata de lixo debaixo da pia e carregando com ela enquanto ela começava a pegar os pedaços de ovo.

— Claro, eu me lembro de Janice. Brutamontes.

— Walter! — Naomi disse, olhando feio para ele. — Seja gentil.

Ela nunca conheceu Janice, então não tinha ideia se Walter estava se lembrando dela ou de outra pessoa, mas ela não estava com humor para ouvir uma de suas fúrias idiotas.

— Eu gosto de mulheres curvilíneas —, ele murmurou.

— É? Margaret era uma verdadeira ampulheta, hein? — ela perguntou, pegando cuidadosamente um pedaço de clara de ovo.

Ele bufou. — Margaret? Ela era uma vara.

Naomi se levantou lentamente. — Então, quando você disse que gosta de mulheres curvilíneas, você quis dizer outras mulheres além de sua esposa?

Mulheres como minha mãe?

Ele tomou outro gole de água e não disse nada.

— Walter?

— Hmm?

Naomi abriu a boca para forçá-lo, depois fechou os olhos com aversão a si mesma. Ela estava realmente fazendo isso? Usando a confusão de um homem para obter respostas para seu próprio bem.

Não. Ela era melhor do que isso. Melhor que ele.

Ela percebeu que os olhos dele tinham uma aparência vazia e sonolenta e suspirou, colocando o lixo de lado.

— Venha, vamos te arrumar para dormir.

Ele acenou com a cabeça, e ela ficou grata por não ser uma grande batalha fazê-lo vestir o pijama.

Ela o acompanhou até o quarto e, como sempre, recusou-se a olhar para a cama, sabendo muito bem o que tinha acontecido ali entre ele e sua mãe décadas antes.

Naomi tirou uma calça de flanela e uma camiseta, entregando-as a ele. — Aqui está. Avise-me se precisar de ajuda com os botões.

— Onde está Oliver? — Seus olhos azuis estavam turvos e um pouco assustados.

— Ele estará em casa logo, ok? — ela disse, dando um aperto tranquilizador na mão dele, aliviada quando o medo dele pareceu diminuir ligeiramente. — Você pode esperar ele chegar antes de dormir, se quiser.

Ele acenou com a cabeça, mas quando Naomi bateu na porta e entrou alguns minutos depois para ver como ele estava, ele já estava na cama, com as cobertas até o queixo, os cabelos grisalhos espalhados em tufos contra a fronha branca.

Naomi sorriu um pouco ao desligar o abajur da mesinha de cabeceira, reconhecendo que seus sentimentos em relação a este homem eram complicados.

Isso para não falar dos sentimentos dela por seu filho.

Ela estava esguichando um pouco de limpador de carpete em uma mancha teimosa de gema de ovo quando Oliver entrou pela porta da frente. Ele imediatamente estremeceu quando a viu de joelhos. — Um dia daqueles?

— Daqueles, — ela disse, usando seu antebraço para tirar um fio de cabelo errante de seu rosto.

— Luvas sexy, no entanto — ele disse.

Ela ergueu as mãos, cobertas de borracha amarela. — Você gosta disso, querido?

— Pare. Não provoque — ele disse, colocando sua pasta no chão ao lado da porta da frente.

Por um momento, eles apenas se entreolharam, um impasse silencioso para ver se algum deles mencionaria o beijo de algumas noites antes.

Em vez disso, ele desviou o olhar, de volta para as mãos dela. — Mas, falando sério, tire isso. Vou terminar de limpar.

— Tudo bem —, disse ela, levantando-se e tirando as luvas. Ela inclinou a cabeça, pegando o saco plástico branco em sua mão. — Comida?

— Chinês. Provavelmente muita comida, considerando que papai já está dormindo. Ele olhou para a porta fechada do quarto. — Quão ruim ele estava?

— Atacado mais do que o normal —, disse ela, colocando o limpador de carpete e as luvas embaixo da pia junto com o material de limpeza. — Jogou ovos, gritou para a TV, latiu para alguns estranhos no parque, fez alguns comentários atrevidos sobre gostar de suas mulheres curvilíneas.

Oliver deu a ela um olhar penetrante. — Ele não... ele nunca... deu em cima de você?

— Hmm? — Naomi estava tentando desatar o nó da sacola de comida chinesa, e demorou um momento para que as palavras dele fossem assimiladas. Sua cabeça se ergueu quando isso aconteceu. — Oh. Não, não. — Ela engoliu em seco. — Ora, ele fez isso... com Janice? —

— Não com Janice, — Oliver disse calmamente. — Mas ele não era... ele não era fiel à minha mãe. Às vezes, ele tinha casos bem debaixo do nariz dela.

Naomi estava muito quieta. Foi a abertura perfeita. Diga à ele. Diga a ele quem você é. Quem era sua mãe.

E ela ia, ela realmente queria, mas seus olhos estavam tão sombreados, ele parecia totalmente exausto. E pela primeira vez, Naomi percebeu que ela não era a única impactada pelas ações de Walter Cunningham. Seu filho também pagou o preço.

— Você quer falar sobre isso? — ela perguntou suavemente.

Ele olhou por um longo momento para a sacola antes de balançar a cabeça rapidamente. — Não. Não agora. Eu quero uma cerveja e um rolinho primavera e...

Ele se interrompeu, sorriu e riu abertamente.

Ela ergueu as sobrancelhas. — Tem uma piada interna aí, Cunningham?—

— Uma piada interna, embora não minha. — Então ele olhou para cima, seus olhos um pouco mais claros do que antes. — Na verdade, você fica bem se eu deixar você por apenas cinco minutos? Eu volto já. Eu só preciso pegar algo na minha casa.

— Claro, sem problemas —, disse ela, abrindo o nó quando ficou impaciente em tentar desatá-lo. — Só não ache que eu vou esperar antes de começar a comer. Estou morrendo de fome.

— Fique à vontade. Volto logo.

Fiel à sua palavra, Oliver voltou em cinco minutos, e Naomi deu uma segunda olhada, a boca cheia de macarrão —Você está vestindo... moletom?

Ele pegou um prato e começou a colocar comida nele. — Você parece surpresa. O que você acha que eu visto no meu tempo livre?

— Suéters?

Ele olhou para ela.

— Ok, não —, disse ela, tomando um gole de água. — Mas eu imaginei que você tivesse algum tipo de pijama com um monograma.

De novo com aquele sorriso torto que era quase dolorosamente atraente. Combinado com a camiseta preta justa, a calça de moletom cinza de cintura baixa que fazia maravilhas para ele, hmm...

Ele sorriu mais largo agora, dando uma mordida no rolinho primavera. — Sra. Powell. Você está me secando?

— Culpa sua —, disse ela, apontando seus hashis para ele. — Você que me beijou na outra noite.

— Beijei —, disse ele casualmente, caindo na cadeira ao lado dela.

— Por quê?

Ele mastigou o rolinho e engoliu, em seguida, serviu-se de um copo d’água. — Você já descobriu?

— Não! — ela disse, empurrando o prato para o lado. — Você me beija antes de eu ir a um encontro. Eu pergunto o que aconteceu. Você me diz para descobrir e eu passo o encontro inteiro com outro cara pensando sobre isso, e... por que você está sorrindo?

Ele apenas sorriu mais largo e deu outra mordida no rolinho de ovo. — Você já descobriu. Você simplesmente não percebeu ainda.

— Não, — ela disse, apontando seus pauzinhos na direção dele. — Chega de conversas enigmáticas. Explique.

— Você disse que passou todo o seu encontro com outro cara pensando em mim —, disse ele, cavando em uma caixa de camarão agridoce.

— Sim, e... espere. Esse era o seu plano? Isso é tão... tão... você me sabotou. E Dylan!

Oliver estremeceu. — Então era ele.

— Você já sabia que eu estava saindo com ele.

— Estava passado, ou estava particípio?

Ela parou de mastigar. — Hein?

— Você ainda está saindo com ele?— Sua voz era de alguma forma paciente e exigente. E muito atraente.

— Não sei — respondeu ela.

— Você vai sair com ele de novo?

— Eu não sei!

Ele continuou a observá-la, então jogou os palitinhos de lado. — Eu quero uma cerveja. Você quer uma cerveja?

Ela ficou olhando para ele horrorizada quando ele foi até a geladeira e tirou as tampas de duas garrafas antes de trazê-las de volta à mesa. Naomi recostou-se na cadeira e o estudou enquanto tomava um gole de cerveja. Essa versão de Oliver era... estressante. O Oliver de terno, ela podia lidar. Mais ou menos. Ou pelo menos ela estava trabalhando nisso. Porque Oliver de terno era fácil de associar a um Cunningham.

Mas esse Oliver, com sua garrafa de cerveja, sua camiseta velha que caía muito bem... Ele limpou a boca sem cerimônia com um dos frágeis guardanapos de papel que vinham com a comida para viagem, e Naomi reprimiu um gemido.

— Você está fazendo isso de propósito.

— O que?

Ela desviou o olhar. — Nada.

Sua garrafa de cerveja congelou a meio caminho de sua boca enquanto ele a estudava, então ele soltou uma risada incrédula. — Eu não acredito. O filho da puta estava certo.

— Quem estava certo?

— Não importa —, disse ele, colocando a cerveja de lado e virando-se para encará-la. — Por que Dylan?

— Por que Dylan o quê?

Ele deu a ela um olhar que dizia você sabe o quê.

Ela hesitou, desconfiada da intensidade de sua expressão. — Porque ele é...

Ela quase disse fácil, então lembrou que foi exatamente disso que Oliver a acusou na noite do jantar. Namorar Dylan não representava um risco. Droga. Ele esteve certo o tempo todo?

— Permita-me ser mais claro, — Oliver disse em voz baixa, estendendo a mão e agarrando a perna da cadeira dela e arrastando-a, junto com ela, para mais perto.

— Por que — sua mão deslizou para trás de seu pescoço como na noite do beijo — se você estava pronta para namorar novamente depois de Brayden, por que ele?

— Ao invés de? — Naomi pretendia que soasse como um gracejo atrevido para manter o controle, mas ela estava perdendo a batalha.

Especialmente quando seu polegar acariciou lentamente ao longo da pele sensível de seu pescoço. Como ele podia saber o quanto ela gostava disso? Como uma mão escorregando sob seu cabelo para a pele sensível de seu pescoço sempre a deixava um pouco fraca dos joelhos? Ele tinha feito isso primeiro no jantar, e novamente com o beijo, e agora a rodeava em volta da mesa da cozinha de seu pai, a mesma mesa onde...

Naomi recuou. Essa mesa da cozinha. Aquele em que ela assistiu por uma fresta na porta do quarto de hóspedes enquanto os três Cunninghams se sentavam com sua postura perfeita em seus “trajes de jantar” comendo coisas como confit de pato e aspargos com beurre blanc, enquanto ela devorava um burrito frio do Taco Bell que sua mãe comprara para ela horas antes.

— Fale comigo, — Oliver disse, seu aperto permanecendo firme mesmo enquanto ela tentava se afastar. — Fale comigo sobre o que aconteceu agora mesmo, Naomi. Por que você continua lutando contra isso?

Sua voz era suave, mas autoritária, seu toque na nuca suave, mas determinado.

— Isso nunca vai funcionar —, disse ela. — Somos muito diferentes.

— Apenas de acordo com os esqueletos em seu armário.

O que?

— Ei, você não sabe...

— Não —, disse ele, balançando a cabeça. — Não sei, porque você não me conta o que está acontecendo na sua cabeça, mas aqui está o que eu sei, Naomi. Tem algo rolando aqui. Você quer trazer sua bagagem, tudo bem, nós lidaremos com isso. Porque é hora de você começar a admitir que poderíamos ser muito bons juntos se você apenas der uma chance.

Ela se sentou perfeitamente quieta, querendo acreditar nele, confiar nele...

Oliver estudou a expressão dela por um longo momento antes de soltá-la lentamente.

Ele pegou seus palitos. — Como está o trabalho?

Ela piscou com a mudança abrupta de assunto e humor, dizendo a si mesma que não estava decepcionada, mas sentindo a ausência de seu toque agudamente. — O que?

Ele abriu uma caixa de arroz frito e despejou um pouco no prato. — Trabalho. Maxcessory. Como tá indo? Como é trabalhar em casa?

— Ah...

Ele ergueu os olhos e sorriu. — O que, você pensou que eu só queria você por sexo? Eu definitivamente quero isso. Mas também gosto de conhecer as mulheres com quem estou dormindo. Então me conte.

Ela respirou fundo e moveu a cadeira para mais perto de sua posição original enquanto ela também pegava seus palitos novamente. — Bem. Vamos apenas dizer que não sou exatamente o modelo de produtividade quando se trata de trabalhar em casa.

— Por causa do meu pai? — ele perguntou, olhando por cima. — Você sabe que posso conseguir um cuidador em tempo integral a qualquer momento.

— Não, não isso. Quero dizer, sim, ele exige muito do meu tempo, mas muito do meu tempo sem Walter tem sido focado em outra coisa.

— Seu vizinho bonito?

—Talvez, — ela murmurou irritada.

Ele sorriu e pegou o prato. — Eu vou reaquecer isso. Você quer que eu aqueça o seu primeiro?

Ela balançou a cabeça. —Eu já terminei, na verdade.

Os dois se levantaram e foram em direção ao balcão, ele para colocar o prato no microondas e ela para lavar o dela. Bem. Isso era sexy.

Ela era a única que ainda pensava no beijo de sábado?

O micro-ondas apitou e Oliver abriu a porta, mas ao invés de pegar o prato, se virou para ela.

— Dane-se, — ele murmurou, dando um passo em direção a ela.

Ela instintivamente deu um passo para trás, mesmo enquanto seu coração batia forte.

— Espera. Espera. Você nem gosta de mim — disse Naomi rapidamente.

Ele sorriu. — Errado. Você não gosta de mim. Eu nunca disse uma maldita coisa sobre não gostar de você.

Sua respiração se acelerou com o olhar intenso em seu rosto. — Você não deveria gostar de mim.

— Me chame de louco, — ele murmurou enquanto se aproximava dela, movendo-se lentamente como se não quisesse assustá-la. — Mas sempre tive um fraco por mulheres bonitas que me fazem ter trabalho.

Ela deu uma risada nervosa enquanto recuava. — Confie em mim, não é isso que está acontecendo aqui.

— Não? — Suas mãos se levantaram lentamente, descansando em cada lado do balcão enquanto ele se inclinava em direção a ela, quase tocando, mas não exatamente.

— Eu não consigo respirar quando você faz isso, — ela sussurrou.

— Quando eu faço o quê? — Seus lábios vagaram sobre sua mandíbula, um quase beijo leve.

— Quando você olha para mim assim, — ela disse, sua voz rouca enquanto os lábios dele se moviam para baixo em seu pescoço. — Quando você me toca.

— Eu recuo se você quiser, — ele disse contra sua pele, sua boca voltando para pairar sobre seus lábios. — Diga a palavra e podemos voltar a ser vizinhos antagônicos que soltam fogos de artifício sempre que estão na mesma sala.

Ela queria. Ela queria dizer a ele que isso nunca iria funcionar, que eles estavam todo errados de maneiras que ele nem sabia. Que ele a odiaria se soubesse quem ela realmente era, que ela era a filha da governanta que ele tanto desprezava...

E aí estava o ponto crucial de seu problema. Ela começou isso impulsionada por seu ódio pelos Cunninghams, mas ela estava cada vez mais cara a cara com uma realidade mais alarmante:

Que sua raiva era na verdade medo. Que ela tinha se apegado ao ódio por tudo que Oliver representava, não por causa de antigos rancores, nem mesmo por causa da promessa que fez à mãe, mas porque estava com medo de nunca ser boa o suficiente. Que a qualquer minuto, a vida que ela construiu com tanto cuidado poderia desabar, levando tudo embora. E se ela deixasse Oliver entrar e o perdesse...

Ele pareceu ver sua indecisão e, embora seu olhar tremulasse de frustração, ele começou a se afastar.

Era isso. O fato de que este homem não só conseguia lê-la, mas parecia se importar com o que ela queria.

A mão de Naomi se esticou, agarrando-se à frente de sua camiseta, e Oliver congelou. Seus olhares se encontraram e se sustentaram por um segundo. Ela o puxou para frente ao mesmo tempo que ele se inclinou, suas bocas colidindo em um beijo que era de alguma forma doce e frenético, uma batalha de vontades que nenhum deles estava disposto a perder.

A palma da mão de Oliver espalmou amplamente contra suas costas, os dedos dela lentamente liberando sua camisa para que seus braços pudessem se enroscar em seu pescoço.

Se o beijo no sábado tinha sido uma promessa, este era a recompensa. O tipo de beijo que arruinaria uma garota para todos os outros beijos no futuro.

Sua outra mão encontrou o quadril dela, seus dedos cavando na carne macia, inclinando-a em direção a ele de modo que ambos estavam ofegantes.

A boca dele se moveu mais uma vez pelo pescoço dela e a cabeça de Naomi caiu para trás. Algo caiu no chão quando ele a ergueu sobre o balcão, mas nenhum dos dois parou na exploração inquieta do gosto e do toque do outro.

As pernas de Naomi envolveram sua cintura, sua mão encontrando seu traseiro, puxando-a para perto...

— Quem está aí?

Ambos congelaram.

Lentamente Oliver se afastou, seu olhar preso no dela por um momento antes de fechar os olhos em resignação. Ele pigarreou. — Oi, pai. Sou eu.

— Ollie? O que diabos você está fazendo aí, garoto?

Naomi sorriu um pouco com o apelido de infância, e a testa de Oliver desceu para descansar em seu ombro com a menor risada. — Nada. Você precisa de algo?

— Onde está sua mãe?

Oliver enrijeceu sob seus braços, e o coração de Naomi se compadeceu por ele. Ela se perguntou se isso ficaria melhor. Se algum dia doeria menos ter seu pai perdido no tempo, forçando seu filho a reviver o fato de que seus pais estavam essencialmente perdidos para ele, continuamente...

Sabendo que o momento havia passado, as pernas de Naomi lentamente caíram de sua cintura, embora ela tenha se surpreendido ao ceder ao desejo de acariciar seu cabelo para confortá-lo.

Ele pegou a mão dela um pouco antes de escapar, segurando seu olhar enquanto pressionava um beijo rápido em sua palma.

Então ele a ajudou a descer enquanto Walter se arrastava para a cozinha, e ela enviou um agradecimento silencioso pelo bem de todos por ele não estar com aquele humor de tirar as calças.

— Quem é você? — ele perguntou, olhos azuis sonolentos, cabelo rebelde.

— Oi, Walter —, disse ela, ajustando a barra da blusa e se recusando a se sentir envergonhada.

— Pai, esta é Naomi. Você conhece ela.

A confusão no olhar de Walter desvaneceu ligeiramente, substituída por algo um pouco... mais malvado. — Dormindo com a empregada, hein, filho?

Naomi se encolheu e Oliver ficou tenso ao lado dela. Walter não percebeu ou não se importou com a reação deles. Ele soltou uma risada enquanto foi até a geladeira. — Não se preocupe com isso. Não vou contar para sua mãe. Nosso segredinho.

Naomi engoliu em seco contra a súbita amargura em sua boca ao lembrar de outro segredinho que esses dois homens haviam guardado, também envolvendo “a empregada”. Os papéis foram invertidos, mas o dano foi o mesmo.

Não, não foi o mesmo, ela silenciosamente emendou. Ela não era sua mãe.

E ela não deixaria nenhum desses homens tratá-la da maneira que Danica sempre deixou os homens tratá-la.

Oliver agarrou o pulso dela enquanto ela se virava. — Naomi.

Ela balançou a cabeça. — Cuide de seu pai.

Ela puxou o pulso suavemente de seu aperto, mas se virou mais uma vez antes de sair. — Estarei aqui amanhã de manhã para cuidar dele, mas depois disso... você precisa encontrar outra cuidadora até que Janice volte.

Ele procurou seu rosto e franziu a testa, antes de dar um único aceno de cabeça em confirmação.

Ele a deixou ir.


Capítulo Vinte e Quatro


QUINTA-FEIRA, 1º DE NOVEMBRO


Três dias após sua fracassada sessão de amassos com Oliver, Naomi finalmente tinha um motivo para sorrir.

Ela e Deena tinham acabado de sair da primeira visita ao novo escritório, e era absolutamente perfeito.

Verdade seja dita, ela estava preparada para fazer o novo escritório ganhar um lugar em seu coração, mas ela se apaixonou em segundos. Naomi achou que tinha dado à equipe de design uma tarefa impossível – fazer o espaço parecer aberto enquanto ainda garantia que todos tivessem privacidade para se concentrar.

Ela sabia que projetos de “plano aberto” eram a última moda e ela era totalmente a favor da colaboração, mas também respeitava o fato de que nem todo mundo trabalhava bem olhando para a pessoa em frente a eles ou ouvindo o vizinho tagarelar em seus ouvidos. A equipe de design que ela contratou valeu cada centavo. Cada andar era centralizado em torno de uma área comum com mesas de reunião, sofás e mesas para várias pessoas, enquanto o perímetro de cada andar abrigava “micro-escritórios” – espaços individuais para os funcionários fecharem a porta e trabalharem em silêncio ou atenderem uma ligação telefônica, mas com paredes de vidro garantindo que até mesmo a área de trabalho central fosse iluminada por luz natural.

O escritório de Naomi era um pouco menor que o antigo, a pedido dela, mas não parecia. A mesa de vidro e os armários brancos pareciam novos e descontraídos, assim como o toque dos detalhes em coral para combinar com o logotipo distinto da Maxcessory.

Nas últimas semanas, Naomi havia deliberadamente diminuído seu ritmo frenético. Parcialmente para ver como sua equipe lidava com isso, parcialmente para lidar com o estresse da morte de Brayden e, em seguida, Walter entrando em sua vida.

Mas agora ela estava mais pronta do que nunca para voltar ao trabalho. O dia da mudança para o novo escritório era segunda-feira, o que a deixava ansiosa. Ela precisava de algo para distraí-la, precisava de distância – literalmente – de Oliver Cunningham.

Naomi estava cantando uma música das Spice Girls que grudou em sua cabeça desde que tocou em sua playlist Tbt naquela manhã, mas ela parou de repente quando chegou ao seu andar no prédio.

Havia flores em sua porta. Não um buquê luxuoso, mas pequeno e elegante com rosas brancas e pequenos ramos verdes.

— Olá, minhas lindas —, disse ela, agachando-se. Ela procurou cautelosamente entre os botões, à procura de um cartão. Não encontrando nenhum, ela pegou a caixa de papelão que cobria a base.

— Aniversário?

A cabeça de Naomi girou para ver Oliver subindo as escadas. Ela não o via desde terça-feira à tarde, quando ele chegou em casa do trabalho e disse friamente que Janice voltaria na quarta-feira e que ela estava livre das obrigações com Walter.

Então, agora, ele estava de volta a seus ternos habituais. Todos os indícios do Oliver casual e provocativo se foram há muito tempo, e ela disse a si mesma que era melhor assim, mesmo quando um pequeno pedaço de seu coração se perguntou o que ela estava perdendo. O que eles estavam perdendo.

— Não —, disse ela em resposta, de pé com as flores nas mãos. — Na verdade, não sei quem foi..

Ela não mencionou que por um momento idiota ela pensou – esperou – que elas poderiam ser dele. Mas sua expressão dizia o contrário.

— Talvez sejam do encontro do último fim de semana, — ele disse casualmente, encostando-se na parede ao lado da porta dela. — Ou o do próximo fim de semana?

Havia uma pergunta clara em sua voz, que ela ignorou. — Eu não sei de quem são, — ela disse honestamente. — Não consigo encontrar um cartão em lugar nenhum.

Ele franziu a testa ligeiramente e estendeu a mão para procurar dentro das flores. — Você está certa. Talvez na caixa?

— Provavelmente. — Ela começou a fazer malabarismos com as flores em um braço para pegar as chaves da bolsa, mas quase deixou cair o buquê. Ela empurrou para Oliver. — Aqui, segure isso?

— O sonho de todo homem, segurar flores para uma mulher.

— Elas provavelmente são de Claire ou Audrey.

— Amigas mandam flores umas para as outras?

— Às vezes. Se eles precisarem de um ânimo extra, — ela disse, encontrando as chaves no fundo da bolsa. — Digamos, caso a vida amorosa dela estivesse realmente complicada.

— Ei, — ele disse, sua voz afiada o suficiente para fazê-la olhar para cima. — Foi você quem saiu, Naomi.

— Porque seu pai nos viu e me chamou de empregada, — ela retrucou.

— Ele está doente! Ele não sabe o que está dizendo!

— Sim, bem, tive a impressão de que ele estava muito lúcido naquele momento.

Os olhos de Oliver ficaram com raiva. — O que isso deveria significar?

— Isso significa que acho que o Walter que vimos naquela noite foi o verdadeiro Walter.

Ele desviou o olhar, dizendo que ela estava certa. Não que ela precisasse da confirmação. Ela já conhecia o verdadeiro Walter, e não era o menino petulante que adorava ovos cozidos e o History Channel.

— Você sabe o que? — disse ela, cansada, enfiando a chave na fechadura. — Eu nem me importo com o que seu pai disse. Seja por causa da doença ou apenas porque ele é um idiota. Mas me importo que você não tenha dito uma palavra em minha defesa. A empregada?

Ele passou a mão pelo rosto, parecendo tão exausto quanto ela. — O que isso teria importado? Ele teria esquecido em trinta segundos de qualquer maneira.

— Sim, mas eu teria me lembrado, Oliver. Eu teria me lembrado.

Ela estendeu a mão para pegar as flores, mas ele as manteve longe dela. Naomi deu uma olhada nele. — Sério?

— Eu estava noivo —, disse ele do nada. — Você sabia disso?

Suas mãos caíram lentamente e ela ajeitou a bolsa no ombro. — Eu não.

Oliver deu um aceno brusco. — Alguns anos atrás. Adiamos o planejamento do casamento quando minha mãe adoeceu. Conversamos sobre tentar adiantar a cerimônia, para que minha mãe pudesse estar lá, mas minha mãe recusou. Disse que preferia perder nosso casamento a morrer sabendo que tínhamos nos apressado. Então esperamos. Bridget segurou minha mão durante o funeral. Esperou o tempo apropriado antes de mergulhar de volta no planejamento do casamento. Então papai começou a apresentar sintomas...

Naomi engoliu em seco, não gostando de nada para onde isso estava indo. E não gostando nem um pouco dessa noiva.

— Nós nos revezamos cuidando dele, e eu pensei, ok, isso é uma merda, mas estamos nisso juntos. Mas quanto pior ele ficava, mais ela ficava relutante em marcar uma data ou até mesmo discutir os detalhes do casamento. Quando recebemos o diagnóstico dele e ficou claro que não era um problema a curto prazo, ela simplesmente... cansou. Disse que me amava, mas que não era para isso que ela servia, que era demais.

Oliver deu de ombros como se não fosse grande coisa, mas a maneira como ele não encontrou os olhos dela demonstrava que era. Claro que era. Que tipo de pessoa concorda em se casar com alguém e depois foge quando as coisas ficam difíceis?

— Por que você está me contando isso? — ela perguntou suavemente.

Desta vez, ele encontrou seus olhos. — Eu disse a mim mesmo que se e quando me envolvesse com alguém novamente, teria de ser alguém que entendesse que Walter e eu éramos um pacote completo. Alguém que não desistiria quando as coisas ficassem difíceis.

Bem... merda..

— E eu desisti, — ela disse suavemente.

Ele ergueu um ombro. — Eu não culpo você. Mas ele não vai melhorar, Naomi. Aquilo que ele disse para você na segunda-feira? Nem perto do pior que já o ouvi dizer. Não sobre você, apenas... em geral. Ele não era um homem bom antes, e agora que está confuso, ele está... difícil. Eu estou me sentindo mal pelo que ele disse, mas eu também não posso evitar. Ele não pode evitar. Eu entendo perfeitamente se você não quiser fazer parte disso... você mal nos conhece, mas... eu não posso...

— Estar com alguém que não consegue lidar com seu pai?

Ele acenou com a cabeça bruscamente. — Mas sou grato pelo que você fez por ele nas últimas semanas. E por mim. Já faz muito tempo que não tenho alguém para quem voltar para casa que não jogue ovos cozidos em mim. Alguém com quem conversar sobre o meu dia...

Ele parou e balançou a cabeça rapidamente. — De qualquer forma. Aqui estão suas flores. — Ele as devolveu. Ele acenou com a cabeça, então voltou para seu próprio apartamento.

Naomi mordeu o lábio, avaliando a sabedoria do que estava prestes a fazer.

— Ei, Oliver.

Ele fez uma pausa antes de entrar em seu apartamento.

— Você quer entrar? Se você não tiver que substituir Janice agora? Eu poderia fazer uma bebida para nós. Café? Chá?

Ele estreitou os olhos ligeiramente, claramente tentando entendê-la.

— Também gostava de falar com alguém sobre o meu dia —, admitiu ela, surpresa com o quão vulnerável a confissão a fez se sentir. E como era verdade.

Ele hesitou. — Eu não sei se...

— Como amigos, — ela disse rapidamente. — Eu entendo que você não está procurando... mais. Pelo menos não comigo. Mas você ainda precisa de amigos, certo?

Ele a estudou por um longo momento, então deu a ela um sorriso que derreteu seu interior. — Sim. Ok. Deixe-me trocar de roupa bem rápido e já estarei aí.

Naomi acenou com a cabeça, depois foi para o apartamento, colocando as flores no balcão, retomando o cantarolar da música das Spice Girls enquanto puxava delicadamente o arranjo da caixa de papelão.

Sua pausa zumbiu quando a caixa caiu para revelar a base do buquê. Não um vaso, como ela pensava.

Uma caneca.

Como esperado, o cartão escorregou para o fundo da caixa e, embora ela já soubesse de quem eram as flores, a mensagem a fez sorrir do mesmo jeito.


Não é Dom Pérignon, mas também é um bom uso para uma caneca.

—Ollie

As flores eram muito melhores do que champanhe caro.


Capítulo Vinte e Cinco


SÁBADO, 3 DE NOVEMBRO


— Eu não posso acreditar que eu deixei você me convencer disso, — Claire disse, olhando para o espelho de corpo inteiro em seu quarto, olhando para seu reflexo. — Achei que meus dias de encontro às cegas haviam ficado para trás.

— Não acredito que estou sentada na cama onde você transava com meu ex-namorado —, disse Naomi, dando um pequeno pulo no edredom azul claro.

Claire deu uma olhada no espelho. — Sério?

— Ah, pera aí —, disse Naomi. — Como podemos não brincar com isso? Ele nem era bom, não é?

— Naomi!

— O que! Ele não era! A menos que fosse apenas comigo...

Claire estendeu a mão e pegou um rímel da cômoda, aproximando-se do espelho para adicionar outra camada, antes de murmurar: — Não foi só com você.

— Tá vendo! Sabia! —, disse Naomi, caindo de costas na cama. — Pensando bem, não sei por que fiquei com ele por tanto tempo. Ele parecia o tipo de cara certo, sabe? Agradável. Puxava cadeiras. Educado. Refinado.

— Sim, estou ciente. Eu casei com ele, — Claire disse, aplicando o rímel levemente ao longo de seus cílios inferiores.

— Certo.

Claire se virou para Naomi. — Se eu vou fazer isso, você vai me dizer o que está acontecendo com Oliver? Estou sem séries de TV para assistir, preciso de casais para torcer, e decidi que serão vocês.

— Bem, desculpe, bebê, você terá que encontrar outra pessoa. Não há nada para contar.

— Mas ele beijou você. Duas vezes.

— Sim, e concordamos que seria melhor se fôssemos apenas amigos.

Claire ergueu as sobrancelhas.

— Certo, tudo bem... Eu me apavorei depois que o pai dele me chamou de 'empregada' e tive um momento de horror em que estávamos nos transformando em nossos pais, e acabaria na rua como minha mãe...

— Calma, querida, — Claire disse, vindo para a cama e sentando ao lado dela. — O que?

— Eu sei. — Naomi pressionou os dedos nas têmporas. — Foi um verdadeiro momento de filme ruim, deixe-me te dizer. Dei um passo para trás, pensando em me recompor. Mas enquanto isso, ele percebeu que não queria alguém como sua noiva...

— Oliver está noivo?

— Ex-noiva. Ela o abandonou quando soube como as coisas iam ficar difíceis com Walter, e agora ele está, tipo, protegendo a si mesmo e ao pai provavelmente. E eu entendo, porque Alzheimer é o pior, e...

— Ok, vá devagar, — Claire disse, pressionando a mão no joelho de Naomi. — Vamos recuar um minuto. O que você quer?

— Não sei —, disse Naomi com um suspiro, puxando as pernas para cima da cama e apoiando os cotovelos nos joelhos cobertos pela calça jeans. — Eu não sei mais.

— Bem, o que você queria no início de tudo isso?

— Você não tem um encontro para ir? — Naomi perguntou mal-humorada.

— Eu tenho tempo para isso, — Claire disse, olhando para o relógio que Naomi tinha dado a ela algumas semanas antes. — Por que você se mudou para o prédio?

— Porque prometi à minha mãe que faria os Cunninghams enxergarem o que fizeram conosco.

— E você fez?

Naomi torceu o nariz. — Não.

— Por que não?

— Porque Walter não está bem o suficiente para entender nada disso. E Oliver...

— E Oliver? — Claire cutucou pacientemente quando Naomi parou.

— Ele não é o mesmo, — Naomi disse, brincando com um fio solto no edredom de Claire. — Ele não é como eu me lembro.

— Claro que não, — Claire disse, em um tom sério. — Ele tinha dez anos, Naomi. A maioria dos meninos é horrível aos dez anos. Meninas também. E sem desrespeito à sua mãe, mas não sei se foi em seu melhor interesse envenenar seus ouvidos sobre os Cunninghams todos esses anos. Sim, o pai dele fez uma coisa terrível. Oliver também. Mas isso foi há vinte anos. Talvez seja hora de esquecer isso, mesmo que sua mãe nunca tenha conseguido. Como você disse, você não vai conseguir o que quer de Walter. E pergunte a si mesmo o que você vai tirar disso se continuar a guardar rancor de Oliver?

— Então você não acha que eu deveria dizer a ele?

— Ah não. Você definitivamente deveria contar a ele, — Claire disse.

Naomi torceu o nariz. — Tive a sensação de que você ia dizer isso.

— Porque sou muito sábia.

— Você é, mas também vai se atrasar, — Naomi disse, estendendo a mão e girando o relógio de Claire em sua direção para que ela pudesse ver as horas.

— O que vamos escolher para o batom? Neutro? Brilhante?

Claire encolheu os ombros com indiferença. — Você escolheu o cara. O que você acha?

Naomi tamborilou os dedos na bochecha enquanto pensava no assunto. Sua contribuição para o pacto de namoro do trio foi um corretor perfeitamente legal com quem ela saiu uma ou duas vezes e não teve nenhuma química. Ele havia perdido a esposa há vários anos em um acidente de carro, então Naomi imaginou que ele respeitaria a necessidade de Claire de ir com calma.

— Ainda não consigo acreditar que vou sair num encontro logo depois de perder meu marido. As pessoas vão pensar o pior de mim.

— As pessoas não precisam saber. Além disso, seu marido era uma cobra traidora. Independentemente do que aconteceu com ele, ele não merece sua lealdade, — Naomi disse, saindo da cama. Ela estava prestes a entrar no banheiro de Claire para avaliar as opções de batom.

Claire estudou suas mãos, sem olhar para cima enquanto falava. — Naomi. Você acha que... você acha que... eu sou boba?

Naomi se voltou. — Você é um monte de coisas, Claire, mas não boba.

— Eu não quero dizer no sentido de... inocente. Quero dizer boba por pensar que vou conseguir me refazer. Uma segunda chance.

— No casamento? — Naomi perguntou.

Claire hesitou, então assentiu.

— Claro que não. Eu não acredito em almas gêmeas. Ou pelo menos, acredito que cada um de nós tem muitas almas gêmeas. Você encontrará alguém muito melhor para você do que Brayden.

Claire torceu sua pulseira e não encontrou os olhos de Naomi.

— O quê mais? — Naomi cutucou.

— E se eu não quiser?

— Não quiser...

— Nada disso. Amor. Relacionamentos. Inferno, nem tenho certeza se sinto falta de sexo. E se eu tiver trinta e quatro anos e resolver fechar esse capítulo da minha vida?

— Se você quiser, pode ser —, disse Naomi, indo até a amiga e apertando sua mão. — Mas até você decidir... talvez mantenha suas opções em aberto?

Claire ergueu a cabeça, deu um sorriso hesitante. — Ok. Vou tentar, se... você disser a Oliver Cunningham quem você realmente é.

— Passo.

— Tudo bem. Mas você pelo menos tem que parar de sair com Dylan, Naomi. Oliver merece mais.

Naomi franziu a testa. — Do que você está falando? Eu não o vi desde aquele encontro morno, e todas as coisas relacionadas à série foram tratadas por e-mail.

— Mas eu o vi em seu prédio. Outro dia, quando mandei uma mensagem, eu estava bem perto de sua casa, perguntando se você estava lá e queria tomar uma xícara de café. Você disse que estava em seu novo escritório, o que parece incrível, a propósito...

— Sim, sim. — Naomi girou o dedo para continuar a conversa. — Sobre Dylan...

— Certo! Bem, tenho quase certeza de que era ele. Ele estava conversando com um cara mais velho. Eu pensei no começo que talvez fosse o pai de Oliver, mas então minha cabeça explodiu ao pensar em um dos seus namorados conversando com o pai do outro namorado...

Claire continuou, alheia ao sentimento ligeiramente nauseado que tomou conta de Naomi.

— Tem certeza que era ele? — ela interrompeu. — Dylan?

— Bem, agora que você mencionou, eu meio que acenei, e ele não acenou de volta, e apenas foi embora. Então, talvez não fosse ele.

Ou talvez ele não quisesse que ninguém soubesse que ele estava lá.

Naomi pegou seu telefone. — Dê-me um segundo, ok?

Com um braço em volta da barriga, o outro segurando o telefone no ouvido, Naomi entrou no quarto de hóspedes de Claire enquanto esperava Dylan atender. Ela entrou apenas cerca de trinta centímetros no quarto, estava tão cheio de coisas. Naomi se encolheu quando percebeu que eram coisas de Brayden, empilhadas descuidadamente na cama, jogadas com raiva em caixas.

Ela se encolheu novamente quando um homem que a lembrava muito de Brayden atendeu o telefone. — Naomi! Oi! Eu tenho que dizer, eu tinha certeza que você tinha decidido me ignorar, — ele disse com uma risadinha.

— É por isso que você estava no meu prédio?

Ela não se incomodou em perguntar se era ele. Seu instinto lhe disse que ele tinha estado lá – e que era Walter com quem ele estava falando.

— Ah... — Sua risada nervosa o denunciou. — Passei por aí quando estava na vizinhança.

Naomi revirou os olhos. — E acabou decidindo conversar com meus vizinhos?

— Isso é um crime? — Sua voz estava na defensiva. Um pouco como um adolescente petulante que foi pego fumando. Ou, neste caso, foi pego bisbilhotando.

Ela inspirou profundamente e depois soltou o ar lentamente. — Você descobriu.

Dylan deu um suspiro irritado. — Que você atualmente mora no mesmo prédio onde sua mãe trabalhava como governanta? Sim, nossos pesquisadores descobriram isso cerca de cinco minutos depois daquela reunião com você e sua assistente de Jersey Shore.

Seu tom era sarcástico, e ela fechou os olhos, perguntando-se como podia ser tão cega. Ainda assim, ela se agarrou à esperança...

— Mas você disse a eles para recuar. Nessa reunião...

— Porque eu não queria a versão filtrada do que aconteceu. Eu queria o que realmente aconteceu. Olha, eu sei que é uma merda, mas boa TV acontece nas coisas confusas. Além disso, você assinou o contrato.

— Sim? — ela perguntou docemente para mascarar a raiva que estava crescendo com a traição dele. — E você encontrou o que estava procurando?

— Não, — ele admitiu depois de uns segundos. — Não consegui entrar no prédio, e a única pessoa que saiu foi um velho maluco que não conseguiria diferenciar ninguém de um poste...

O olhar de Naomi ficou branco de raiva.

— Como faço para conseguir um novo produtor? — ela perguntou, interrompendo sua divagação mesquinha.

— O que?

— Um novo produtor para Max. Como faço para conseguir um?

Ele deu uma risada incrédula. — Você não pode estar falando sério. Que tipo de hipócrita...

— Eu não trabalho ou me associo com pessoas que me apunhalam pelas costas. Vou mandar meu advogado cuidar disso. — Ela desligou antes que ele pudesse dizer outra palavra.

Ela fechou os olhos e colocou o punho na testa, fazendo um esforço consciente para desacelerar a respiração, apesar da raiva pura que a percorria.

— Tudo certo? — Claire perguntou suavemente da porta.

Naomi baixou a mão e abriu os olhos. — De verdade? Sim.

Claire franziu a testa. — Você parece com raiva. E chateada.

— Ah, eu estou. Mas também tive uma epifania.

—Ahhh, eu amo essas! De que tipo?

Naomi sorriu. — O tipo em que você percebe que sua história tem um final diferente. E você estava lutando contra o vilão errado o tempo todo.


Capítulo Vinte e Seis


SÁBADO, 3 DE NOVEMBRO


Oliver estava sentado em seu sofá, uísque na mão, futebol americano ao fundo, curvado sobre a mesa de centro enquanto procurava pela peça do quebra-cabeça que ele estava procurando há 15 minutos.

Normalmente, ele procurava com determinação implacável por uma peça capciosa, recusando-se a desistir até que a encontrasse. Em vez disso, ele se jogou de volta nas almofadas do sofá.

Não adiantava. Ele estava tentando se convencer de que estava gostando de ter uma noite para si mesmo. Tentando lembrar que costumava gostar de noites iguais a esta, com uma bebida, um quebra-cabeça, o jogo...

Mas o que ele realmente queria era estar com a ruiva da porta ao lado.

De preferência nua.

Seu telefone tocou e ele pegou, estremecendo ao ver que era uma mensagem de Janice dizendo que, embora Walter finalmente tivesse ido dormir, estava mais difícil do que de costume.

Oliver disse a ela para avisá-lo se Walter se levantasse de novo e não se acalmasse, embora ele tenha feito uma rápida oração para que isso não acontecesse. Ele ficou com Walter ontem à noite, e tinha sido mais exaustivo do que o normal. Ultimamente, nada parecia agradar a seu pai, e ele deixou seu descontentamento ser conhecido por meios cada vez mais violentos. Jogando, chutando, empurrando...

Oliver puxou os lembretes em seu telefone, fez uma anotação para ligar para o médico de Walter na segunda-feira para discutir as recentes mudanças de comportamento.

O jogo foi para o comercial, e Oliver estava se levantando para tomar mais uma dose de uísque quando alguém bateu na porta. Não Walter ou Janice. Ele conhecia as pancadas de Walter e as batidas rápidas de Janice.

Isso foi mais... inseguro.

Ele abriu a porta e piscou, perguntando-se se a tinha conjurado. — Naomi?

Ela estava vestindo jeans e uma camiseta preta justa, o cabelo puxado para trás em um rabo de cavalo, parecendo muito bonita... bem... garota da porta ao lado. Literalmente.

— Entre, — ele disse, esperando que sua voz não traísse o quão feliz ele estava em vê-la. A última coisa que ele queria fazer era assustá-la quando finalmente estava perto de romper suas paredes.

Ela entrou e olhou em volta. — Sabe, esta é a primeira vez que venho aqui?

— É mesmo? Não pode ser.

Ela assentiu. — Você esteve no meu apartamento, mas o resto do tempo estamos sempre na casa de Walter.

— Ah. Bem... Pode explorar.

— É muito...

— Apartamento de solteiro?

— Bem, parece que você acabou de se mudar —, disse ela, olhando para as paredes nuas, os móveis mínimos.

Ele esfregou a mão no pescoço, tentando ver através dos olhos dela. Era deprimente estéril. O que era ainda mais deprimente é que ele nunca tinha realmente notado. Era um lugar para comer e dormir entre o trabalho e as obrigações de Walter.

— Acho que decoração não é realmente o meu forte.

Ela acenou com a cabeça em reconhecimento, vagando ao redor. Ela fez uma pausa quando olhou para a mesa de centro, para o quebra-cabeça, então lançou a ele um olhar perplexo. — Sério?

— Eu disse que gostava de quebra-cabeças.

— Achei que você estava brincando —, disse ela, curvando-se para ver melhor a paisagem londrina. Ou, pelo menos, o que seria a paisagem londrina. Ele ainda não tinha terminado as peças da borda ainda.

— Como você sabe por onde começar? — ela perguntou, pegando uma peça, passando um dedo pela borda enquanto a estudava.

Ele a observou por um momento, imaginando que tipo de infância resultava em alguém nunca resolver um quebra-cabeça.

— Bem, — ele disse lentamente, dando a volta para ficar ao lado dela. — É como eu disse há pouco: você começa com as peças de canto.

Ela sorriu e olhou para ele. — Eu lembro. Você pensou que tinha encontrado uma das minhas.

— Eu sei que eu encontrei.

— O que você descobriu?

Ele sustentou seu olhar. — Que você não confia nas pessoas. E que você definitivamente não confia nos homens.

— Sim, bem. — Ela largou a peça de volta na mesa de centro. — Isso se aplica à maioria das mulheres de Manhattan.

— Por causa de Brayden?

Ela encolheu os ombros levemente. — Por causa de muitas coisas. Na minha experiência, os homens geralmente não são... bons.

— Eu sou.

Ela olhou para ele novamente. — Sim, — disse ela lentamente, como se estivesse surpresa. — Você é.

Seu olhar caiu para os lábios dela.

Apenas amigos, ele lembrou a si mesmo. Ele falou sério sobre o que disse a ela no outro dia. Ele não achava que poderia sobreviver a outra Bridget. Não conseguia lidar com outra mulher que não conseguia lidar com seu pai. Não podia arriscar se apaixonar por ela apenas para vê-la ir embora.

Ela se curvou para a mesa novamente, desta vez para pegar seu copo. Ela cheirou o conteúdo. — High West?

A mulher conhecia seu uísque favorito pelo cheiro?

Era tarde demais. Ele já estava se apaixonando por ela. Por cada um de seus humores, e havia muitos. Por sua força e vulnerabilidades, pelo fato de que ela era gentil mesmo quando ela não queria ser...

— Por que você está olhando assim para mim? — ela disse com uma risada nervosa. — Você pode voltar para o seu jogo de futebol. Eu posso ler ou talvez descobrir como resolver esse enigma nerd...

Oliver deslizou a mão atrás da cabeça dela, levantando o rosto dela para ele.

— Espere, — ela disse um pouco sem fôlego, colocando as mãos contra o peito dele quando ele inclinou a cabeça em direção à dela. — Eu só vim para te ver. Achei que não estávamos fazendo isso.

— Eu não sei o que diabos estamos fazendo, — ele disse, sua voz um pouco mais baixa do que o normal. — Você sabe?

Sem palavras, ela balançou a cabeça, e as mãos contra o peito dele se moveram ligeiramente, indo de pressionar em resistência a puxar levemente sua camisa até...

Seus lábios roçaram os dela, provocando, testando, desejando.

Seus lábios se suavizaram sob os dele, trazendo-o, afogando-o em seu sabor doce e picante de canela, seduzindo-o com cada movimento sexy contra sua boca.

Ele pretendia ir devagar – saciar os dois com um beijo para acalmá-la, mas sua força de vontade começou a enfraquecer no segundo em que colocou as mãos sobre ela.

Oliver queria isso – queria ela – de uma forma que ia além da necessidade física.

Desde o dia que ele a conheceu, ela o afetou, o irritou, o confundiu profundamente e ele estava muito grato por isso. Naomi Powell o trouxe de volta à vida, o fez perceber que ele não tinha morrido com sua mãe, ou com o diagnóstico de seu pai; ele apenas estava vivendo como se tivesse.

Ele tinha trinta anos. Ele era um homem.

E agora, ele era um homem que precisava de uma mulher – essa mulher.

As mãos dela deslizaram sob sua camisa, as unhas cravando em suas costas enquanto ele beijava seu pescoço. — Você gosta disso, — ele murmurou contra o oco de sua garganta.

Em resposta, ela arqueou-se ainda mais contra ele, pressionando suas suaves curvas femininas em tudo que era duro e masculino.

— Me mande parar, — Oliver disse, mesmo quando sua palma encontrou a plenitude de seu seio. — Me lembre que...

Ele perdeu a linha de pensamento quando Naomi deu um pequeno passo para trás e, segurando seu olhar, puxou a bainha da blusa para cima e sobre a cabeça para que ficasse diante dele toda pele branca e sutiã preto liso.

A língua de Oliver ficou presa no céu da boca. Ela era bonita. Impressionante. Mas não foi isso que o desfez. Foi a vulnerabilidade suave em seus olhos, o calor tranquilo que dizia a ele que isso era mais do que apenas físico para ela também.

Ele ficou parado por muito tempo, porque as bochechas dela começaram a corar e ela começou a pegar sua camisa descartada.

A mão de Oliver disparou para a cintura dela. — Não.

Lentamente, deliberadamente, ele abaixou a cabeça, trazendo sua boca mais uma vez para a dela enquanto a puxava para mais perto. Naomi suspirou contra seus lábios enquanto sua mão deslizava por suas costas esguias. Sua respiração ficou presa quando os dedos dele desabotoaram seu sutiã. Ela gritou quando as mãos dele encontraram sua carne nua.

Ele estava perdido. Totalmente perdido por essa mulher.

Oliver se curvou levemente, pegando-a em seus braços, o gesto antiquado parecendo extremamente certo com essa mulher completamente moderna.

Ele a carregou para o quarto e a colocou na cama. Ele viu algo cintilar em seus olhos, algo quase familiar que lhe disse que ele estava perdendo algo crucial.

Então Naomi se aproximou dele, calorosa e disposta, muito parecida com seu futuro.


Capítulo Vinte e Sete


DOMINGO, 4 DE NOVEMBRO


Naomi acordou lentamente, percebendo primeiro que a janela havia mudado de lugar. Ela estava deitada sobre o lado direito, como sempre fazia, mas a janela não estava onde deveria estar. Ela estava olhando para uma parede nua.

E o travesseiro também era diferente. Estava quente e... se mexendo.

Ela congelou quando Oliver se mexeu embaixo dela.

Oliver.

Ela dormiu com Oliver Cunningham.

Naomi fechou os olhos com força, preparando-se para a onda de auto-aversão, para o ataque de culpa. O que sua mãe pensaria?

Mas... nada veio.

Pela primeira vez em muito tempo, os pensamentos principais de Naomi não eram sobre o passado, mas o presente. O Oliver do presente. E o Oliver do presente, ou pelo menos, Oliver de ontem à noite foi...

Perfeito.

Ela inclinou a cabeça ligeiramente, querendo correr um dedo ao longo da barba naquela mandíbula afiada, mas não querendo acordá-lo. Ela gostava dele com um pouco de pelos faciais. Também gostava dele sem eles. Gostava dele de moletom, gostava dele de terno. Somente... gostava dele.

Ele falou sem abrir os olhos. — Por que você está me observando?

Ela riu. — Tão óbvio assim?

Oliver olhou para baixo, olhos azuis suaves e um pouco sonolentos. — Bom dia.

— Bom dia, — ela disse suavemente.

Seu braço a puxou mais para perto, e ela se aconchegou. Ela nunca foi muito carinhosa, mas por alguma razão ela não conseguia chegar perto o suficiente. Talvez porque ela soubesse que provavelmente teria vida curta, porque uma vez que ele descobrisse quem ela era... que ela estava mentindo.

Claire estava certa. Ela tinha que contar a ele.

— Ei, — ela disse suavemente, arrastando o dedo em padrões preguiçosos em seu peito. — Então...

Oliver gemeu ligeiramente. — Naomi, algo que você deveria saber sobre mim, eu não sirvo para conversar antes do café.

Uma prorrogação.

Ela não sabia se estava aliviada ou desapontada.

— Anotado —, disse ela, levantando-se ligeiramente para que ele pudesse deslizar para fora da cama. — Nunca fique entre um viciado em cafeína e seu café.

— Você não bebe.

— Não, eu bebo —, disse ela, caindo de volta no travesseiro. — Contanto que seja metade café, metade creme doce.

Ele estremeceu enquanto tirava a calça de moletom de uma gaveta da cômoda. — Vou fingir que não ouvi isso. Onde está sua chave?

— Hmm?

— A chave do seu apartamento. Acho que nem tenho leite, mas se você tiver os ingredientes para estragar o café em sua casa, posso ir buscar.

— Bolso de trás da minha calça jeans —, disse ela, sentando-se e puxando o lençol sob as axilas. — Que estão...

Oliver as pegou na porta, onde elas haviam caído. Ou foram arremessadas? Hmm.

— Eu vou, — ela disse enquanto ele erguia a chave.

— Você vai ficar. Acho que estou gostando muito de te ver na minha cama.

— Isso é bom, porque estou muito feliz de estar aqui.

Naomi se jogou nas almofadas enquanto ele desaparecia.

Vários minutos depois, ele reapareceu com duas canecas fumegantes e seu fiel companheiro de café debaixo do braço.

— Ok, eu coloquei um pouco —, disse ele, colocando uma das canecas na mesa de cabeceira e entregando-lhe a outra. — Eu estava assumindo que você não quis dizer literalmente meio a meio, mas...

— Não, eu quis dizer isso —, disse ela, balançando os dedos para a garrafa de creme de baunilha.

— Eu não acho que posso assistir isso, — ele murmurou, entregando-lhe a garrafa e puxando uma colher do bolso.

Ela acrescentou mais uma quantidade generosa e mexeu. — Você sabe que está certo quando está quase todo branco com apenas um pequeno toque de marrom.

Ele olhou para ela, horrorizado. — Acho que quero terminar.

Naomi enfiou a colher na boca e a chupou.

Oliver piscou. — Ou não.

— Terminar. Para mim, para terminar, primeiro teríamos que estar... juntos? — ela perguntou, tomando um gole do café perfeitamente adoçado.

Oliver se sentou na beira da cama. — Parece que sim.

Nós estamos? ela queria perguntar.

Ela não disse. Porque ela não podia, em sã consciência, pedir-lhe que pensasse nela como uma namorada quando ele nem a conhecia. Não conhecia sua história.

Droga, ela fez aquela coisa.

Aquela coisa em que você espera muito tempo para dizer algo importante a alguém, e o que teria sido apenas uma conversa estranha agora parecia monumental.

— Oliver...

— Naomi. — Sua voz estava firme. Calma. Porque ele estava firme e calmo. Ele era uma rocha. Para sua mãe quando ela estava doente, por seu pai agora. Ele era aquele cara. Aquele com quem as pessoas podiam contar. Aquele que ficava por perto quando a merda ficava difícil.

Ela o estudou, tentando se lembrar do menino monstruoso que ele tinha sido e... não conseguia. O Oliver adulto tinha substituído todas as memórias do Oliver mesquinho. O menino que ela odiava se tornou um homem que ela...

— Você quer sair para comer algo? — ela deixou escapar. — Há um lugarzinho ótimo no Village com as mais incríveis torradas francesas e ovos Benedict. É impossível entrar sem reservas, mas um dos meus funcionários está namorando o proprietário, então eu provavelmente poderia conseguir uma vaga para nós no bar...

Mesmo enquanto balbuciava, ela viu a luz sair de seus olhos, viu quando ele se desligou.

— Você não gosta de torradas?

Nunca antes ela vira alguém ficar tão confuso com a menção de torradas francesas.

— Não, eu gosto. — Ele esfregou a mão no cabelo, parecendo repentinamente exausto. — É só que não é realmente um luxo que tenho conseguido me dar nos últimos dois anos.

Ah. Walter.

Ele olhou para ela, os olhos cansados. Pedindo desculpa. — Janice sai para o almoço e vai à igreja com a família de sua irmã todos os domingos. Tenho que ficar com Walter. Se eu souber com antecedência, às vezes posso fazer funcionar, mas...

— Não, claro — interrompeu Naomi, erguendo a mão. — Eu deveria ter percebido... Eu sei que você geralmente está com ele nos fins de semana. E à noite.

— Repensando essa coisa de estarmos juntos? — ele perguntou, seus olhos sombrios enquanto olhava para ela.

Sim, mas não pelo motivo que você pensa.

— Talvez você tenha razão — disse Naomi, baixinho. — Essa coisa toda é complicada. Aconteceu rápido. Se pudéssemos desacelerar por um segundo...

— Naomi. Eu entendo — disse ele. — É como te disse outro dia, não me culpo por ninguém querer fazer parte disso, mas esta também é a minha vida. Você é jovem, linda e bem-sucedida. Você merece os encontros e as festas elegantes e os jantares de fim de noite. Mas isso nunca vai acontecer comigo. Não tão cedo.

Ela assentiu porque era mais fácil deixá-lo pensar que essa era a razão pela qual ela estava indo embora do que a verdadeira razão.

Naomi tomou outro gole de café antes de entregar a caneca a ele. — Vou me vestir.

Ele ficou parado por um minuto, olhando para ela com pesar indisfarçável antes de se levantar e levar as duas canecas para a cozinha. Naomi saiu da cama, encontrando sua calcinha e jeans, então estremeceu ao perceber que seu sutiã e sua camisa ainda estavam na sala.

Decidindo que pegar uma camiseta emprestada sem pedir era decididamente menos embaraçoso do que sair do quarto seminua, ela pegou uma camisa da Universidade de Columbia que encontrou em uma gaveta.

Oliver ficou surpreso quando ela saiu do quarto vestindo-a, mas não disse nada enquanto ela pegava o sutiã e a camisa o mais calmamente possível, envolvendo o sutiã por dentro da camisa para o caso de ela encontrar outros vizinhos no caminho de volta para ela apartamento.

— Então. — Ela se virou e olhou para ele. — Hmm.

Ele sorriu. — Você não precisa.

— Você nem sabe o que eu ia dizer.

— Eu só quis dizer que você não precisa dizer nada, — ele disse, colocando sua caneca de lado e vindo em sua direção. — Eu não sou um namorado em potencial. Não agora. — Ele parou, colocando a mão em sua bochecha. — Sem arrependimentos sobre a noite passada. Me prometa.

— Eu prometo, — ela sussurrou, virando sua bochecha em sua mão e fechando os olhos, saboreando seu perfume. O calor dele.

Ele a beijou suavemente, antes de recuar. — Vejo você por aí, Naomi.

Ela engoliu em seco, um pouco confusa ao perceber que havia um nó na garganta. — Até logo.

Naomi saiu de seu apartamento e caminhou rigidamente pelo corredor. Cegamente, ela entrou no chuveiro, esperando que a água quente pudesse lavar a sensação de que tudo estava errado. Que ela estava sendo uma idiota.

E talvez ele também estivesse, por não ter coragem de pedir a alguém que ficasse com ele. Para dizer a ele que valeria a pena os sacrifícios que vinham com sua situação.

Quando ela percebeu que estava sendo uma idiota, Naomi rapidamente fechou a torneira. Ela secou o cabelo em tempo recorde, vestiu calças de ioga e a camiseta da faculdade de Oliver mais uma vez.

Dois minutos depois, ela estava fora da porta, cinco minutos depois, ela estava no supermercado, então voltou para seu apartamento para pegar a garrafa de champanhe barata que ela mantinha na geladeira.

Faltava pouco para as dez quando ela bateu na porta de Walter com a ponta do tênis, pois seus braços estavam cheios de sacolas de compras e um buquê de rosas que ela comprou por capricho.

Oliver abriu a porta, sua expressão perplexa. — Naomi? O que você está fazendo aqui? — Automaticamente, ele estendeu a mão para pegar uma das sacolas. — O que é tudo isso?

— Ovos. Batatas. Bacon. Uma espécie de pão de canela que parecia delicioso demais para deixar passar. Suco de laranja e espumante, porque o que é um café da manhã sem mimosas — disse ela, passando pelo homem atordoado.

Ela ficou na ponta dos pés e beijou sua bochecha. — Você não podia sair para comer um café da manhã, então eu trouxe o café da manhã até você. E para Walter. Bom dia, Walter —, disse ela, virando-se e vendo-o em sua poltrona favorita perto da TV.

Ele olhou por cima e ergueu a mão em saudação. — Naomi.

Ela sorriu para Oliver. — Está vendo? Um bom começo. Ok, como são suas habilidades com ovos mexidos? Os meus são medíocres, mas sou muito boa com bacon...

Oliver a puxou em sua direção, cortando a fala dela com um beijo ardente.

Foi longo, intenso e cheio de emoção. Ambos estavam respirando com dificuldade quando ele se afastou, apoiando a testa na dela. — Obrigado.

Ela roçou a boca na dele suavemente. — De nada. Agora me alimente?

Ele sorriu em resposta, descarregando o resto das sacolas enquanto ela procurava um vaso para as flores. — Walter, como você gosta do seu bacon? Você é o tipo de cara crocante?

— Salsicha. Você tem salsicha?

— Me ajude, Walter —, disse ela, dando ao homem um olhar exasperado.

Ele olhou e sorriu, e Naomi ficou surpresa ao se sentir sorrindo de volta.

Isso não era nem remotamente perto de como Naomi havia imaginado seu relacionamento com os homens Cunningham.

E ela não conseguia se lembrar da última vez que ela tinha estado assim... feliz.


Capítulo Vinte e Oito


SEGUNDA-FEIRA, 5 DE NOVEMBRO


— Sim, eu sei que é de última hora. Sim, eu entendo – não, entendo perfeitamente que sua agência prefere ser avisada com 24 horas de antecedência... Sim, e agradeço por ter feito uma exceção. Sim, seis horas da noite seria perfeito.

Oliver passou mais um minuto rastejando ao telefone com a agência de cuidadores antes de fazer outro telefonema, desta vez para um de seus restaurantes favoritos que ele não tinha ido... em muito tempo.

Claro, as noites de segunda-feira não eram as noites de encontro mais populares, mas ele queria surpreender Naomi. Para mostrar a ela que ele poderia encontrá-la no meio do caminho, para encontrar uma maneira de fazê-los funcionar.

A mulher foi muito além. Primeiro com o café da manhã de ontem, nem mesmo pestanejando quando se transformou em uma birra de Walter. Então, esta tarde, quando Oliver tinha de encontrar com um cliente ao mesmo tempo que Janice teve uma dor de dente súbita e forte, Naomi casualmente se ofereceu para ficar com Walter para que Janice pudesse ir ao dentista.

Simples assim, como se não fosse grande coisa. Como se fossem parceiros nisso, embora ele não tivesse o direito de pedir isso a ela tão cedo no relacionamento.

Oliver sabia que estava perigosamente perto de se apaixonar pela mulher, e a única coisa que o impedia era a sensação incômoda de que ela estava se segurando.

Era para isso que servia esta noite. Apenas os dois. Bom vinho. Roupas chiques. Sem ovos cozidos. Nem mesmo quebra-cabeças.

Para dar a eles uma chance, ele precisava levá-los para além dos muros do número 517 da Park Avenue, para mostrar a ela – para mostrar a si mesmo – que eles poderiam fazer isso no mundo real.

Depois de fazer as reservas para o jantar, ele fez mais uma ligação, desta vez para Naomi. Ela não atendeu, o que não foi tão surpreendente, considerando que seu pai frequentemente exigia toda a atenção de alguém.

Ele quase enviou uma mensagem de texto, informando-a de que conseguiu um cuidador alternativo para aquela noite, já que Janice – tomando analgésicos após um tratamento de canal de emergência – provavelmente estaria mal equipada para lidar com Walter.

Ele decidiu, em vez disso, surpreendê-la, parando no caminho de casa para pegar flores para ela. Ela insistiu em deixar as rosas de ontem em sua casa para “alegrar”, e ele queria algo para a casa dela – como parabéns pelo novo escritório.

Oliver escolheu um buquê de rosas em uma loja da esquina, então foi para casa, subindo as escadas de dois em dois até o quinto andar.

Antes de Naomi, Oliver sempre parava em sua casa para recuperar o fôlego, trocar de roupa, mudar a marcha de arquiteto para filho de paciente.

Pós-Naomi, chegar à casa do pai e vê-la lá era o ponto alto de seu dia. Semana, até.

A mulher estava se tornando o destaque de sua vida.

Oliver puxou as chaves e parou derrapando ao ver que a porta do apartamento de seu pai estava aberta.

Seu coração batia forte enquanto ele caminhava lentamente em direção à porta, abrindo-a com uma combinação de urgência e medo.

Nada.

— Naomi? Pai?

Sem resposta. O único som que ouviu foi o History Channel no volume máximo.

Oliver começou a suar frio. Eles poderiam ter saído para dar um passeio, mas de jeito nenhum Naomi deixaria a porta destrancada, muito menos aberta.

— Pai! — ele chamou, mais urgente agora, indo para o quarto. Vazio.

Distraidamente, ele pegou o controle remoto para desligar a TV, o silêncio apenas aumentando sua sensação de que algo estava muito errado.

Um telefone celular zumbiu contra uma superfície dura e ele examinou a sala até que viu o telefone de Naomi no balcão da cozinha, distinto em sua capa coral.

Oliver foi até ele, estendendo a mão para ele, quando ele parou.

Seu coração parou.

— Naomi, — ele disse apressado.

Ela estava caída no chão da cozinha, uma pequena poça de sangue sob sua cabeça.

— Naomi! — Ela não se mexeu.

Ele se agachou ao lado dela, passando a mão em seu lado, mesmo quando seu treinamento de primeiros socorros o lembrou de não movê-la.

Oliver suavemente tocou sua bochecha, mas ela não se mexeu. Ele pegou seu telefone e discou 911 com a mão trêmula.

— Sim, eu preciso de uma ambulância na 517 Park Avenue. Há uma mulher inconsciente.

Ele mal reconheceu sua própria voz ao responder às perguntas da operadora.

Não, ele não sabia o que aconteceu.

Sim, havia sangue.

Ela estava respirando?

Oliver engoliu em seco. Ele não tinha verificado, porque não tinha ocorrido a ele – ele não permitiria que fosse verdade.

Com a mão trêmula, ele colocou os dedos no pulso de Naomi. Encontrou pulso. Para acalmar o coração, ele colocou a mão sob o nariz dela, sentiu sua respiração.

— Sim. Ela está respirando.

— Ok, uma ambulância está a caminho. Você pode ficar na linha e me ajudar a dizer aonde ir quando chegarem lá?

Ele começou a dizer sim, claro, quando se lembrou. Walter. Walter estava sumido.

E de repente Oliver se deparou com a pior decisão de sua vida: ficar com o corpo inconsciente e ensanguentado da mulher que amava, ou tentar encontrar seu pai perdido e doente.


Capítulo Vinte e Nove


TERÇA-FEIRA, 6 DE NOVEMBRO


As primeiras palavras de Naomi ao abrir os olhos foram as que ela aprendera nos conjuntos habitacionais do Bronx e, definitivamente, não eram adequadas para a igreja.

Mas porra, sua cabeça doía.

Ela ergueu a mão para a dor, apenas para congelar quando notou os tubos saindo das costas de sua mão.

— O que...

Ela sentiu uma onda de náusea de pânico e fechou os olhos novamente, tanto para tentar afastar a dor quanto para se lembrar.

Ela estava em um hospital, obviamente.

Mas por que?

As memórias voltaram. Lentamente. Turvas. Walter. Ele estava em um de seus ataques. Ela pediu a ele para desligar a TV, ele gritou... Bem, vamos apenas dizer que ela não era a única com uma boca suja.

Ele exigiu uísque, ela disse não, sabendo que o álcool só pioraria seu estado atual, e ele...

Bateu nela. Empurrou ela?

Ela não conseguia se lembrar dos detalhes. Ela só lembrou o medo de ver um corpo muito maior vindo em sua direção, os olhos desfocados e furiosos, lembrou-se de ouvir o estalo de sua própria cabeça contra os armários...

Naomi sentiu um toque suave em sua mão e virou a cabeça ligeiramente, abrindo os olhos para ver Deena preocupada.

Os olhos de Deena se arregalaram. — A enfermeira tinha razão! Você gritou!

— Bastante atrevida, também, — veio uma voz masculina à sua esquerda. Naomi girou lentamente o pescoço e olhou para um homem corpulento de uniforme ajustando algo com sua intravenosa.

— Como está se sentindo? — ele perguntou.

Ela tentou falar, mas sua boca estava seca. Ela engoliu em seco e tentou novamente. — Como se fosse melhor você aumentar a morfina nessa coisa.

Ele sorriu. — Alguma tontura? Náusea?

Ela considerou, então balançou a cabeça. A náusea que sentiu quando abriu os olhos pela primeira vez havia passado, e ela não estava vendo o dobro de ninguém. — Apenas a dor de cabeça.

— Vou mandar o médico vir imediatamente para examinar você. Dei a sua amiga alguns pedaços de gelo, se você precisar.

Deena balançou um copo de papel, mas Naomi balançou a cabeça negativamente. Ela não queria gelo. Ela queria respostas.

— O que aconteceu?

— Esperávamos que você pudesse nos dizer —, disse Deena com um sorriso.

— Quem são nós? — Ela examinou a sala, mas era apenas Deena.

— Oh, você sabe, apenas todo mundo do escritório. Todos eles estão clamando por uma visita, mas eles terão que entrar na fila.

— Na fila atrás de... ? — Naomi perguntou, seu coração desesperado por um nome, e apenas um nome.

— Eu. Aquelas garotas elegantes que estavam dormindo com seu ex.

— Claire e Audrey estão aqui? — Naomi perguntou, sentindo-se um pouco culpada por seu coração afundar por Deena não ter mencionado Oliver.

Deena assentiu. — Elas estarão de volta a qualquer minuto. Era a vez delas de ir ao Starbucks, e espero que eles tenham anotado meu pedido direito. De que adianta um Frappuccino se não há chantilly extra?

— Deena, — Naomi perguntou suavemente. — Você viu um cara aqui? Um...

Ela foi interrompida por uma batida na porta quando uma mulher de uniforme verde-claro entrou sem esperar por uma resposta. — Olá, Naomi, sou a Dra. Estrada. Ouvi dizerem que você tem um galo na cabeça..

Sim, um desses médicos.

Deena apertou a mão dela para tranquilizá-la e então saiu da sala para que Naomi pudesse falar com o médico em particular.

A Dra. Estrada verificou algo na bolsa de soro, rabiscou algo em sua prancheta e então puxou uma pequena lanterna do bolso.

Vários minutos irritantes depois, depois de ter a luz brilhando em seus olhos e ser instruída a seguir o dedo e fazer matemática básica e descrever seu nível de dor em uma escala de um a dez, a médica anunciou que ela não estava mostrando nenhum sinal de concussão, mas que eles queriam fazer uma tomografia computadorizada para ter certeza.

— Quando posso sair? — Naomi perguntou.

A Dra. Estrada deu um sorriso impessoal enquanto rabiscava em sua prancheta. — Depende do que disser a tomografia. Virá alguém em breve. Você precisa de alguma coisa?

Uma rota de fuga. Oliver. Respostas

— Não, eu estou bem.

Dra. Estrada assentiu e saiu. Houve outra batida, e Naomi resistiu ao impulso de dizer a quem quer que fosse para ir embora para que ela pudesse pensar por um minuto, mas seu protesto morreu quando ela viu quem era.

— Oliver.

Ela sorriu, mas ele não sorriu de volta. Na verdade, ele estava... diferente. Não apenas por causa do jeans e do suéter no lugar do terno usual, mas ele parecia... frio. Distante.

— Oliver, sinto muito, — ela disse, tentando se sentar. — Walter... ele está...?

Oliver gentilmente a empurrou de volta para os travesseiros, embora fosse um toque impessoal, não um toque prolongado de um ente querido.

— Ele está bem. Eu o encontrei no parque para cães do Central Park.

— Oh, bom —, disse ela, um pouco confusa com a raiva em seu tom. — Ele ama aquele lugar.

Oliver não acenou em reconhecimento. Não sorriu. Era como lidar com um robô.

— Você se lembra do que aconteceu? — ele perguntou, cruzando os braços.

Naomi hesitou. Como você dizia a alguém que estava em uma cama de hospital porque o pai doente ficou violento?

— Não exatamente. Ele ficou bravo e empurrou... bateu? Não tenho certeza.

Oliver suspirou e seus braços caíram. — Achei que fosse algo assim. Walter não conseguiu nos dizer nada, mas – peço desculpas.

— Você pede desculpas,— ela disse, imitando seu tom gelado. — Não foi sua culpa. Nem foi culpa de Walter, ele não sabia...

— Não, foi culpa dele, — Oliver interrompeu. — E minha, eu suponho, por não reconhecer antes que alguém do tamanho dele, em sua condição, precisava mais do que atendimento domiciliar.

— O que você quer dizer? — Ela procurou seu rosto, tentando lê-lo.

Ele engoliu em seco, o movimento tão estranho e tenso que ela ouviu.

— Eu o deixei em uma casa de repouso esta manhã.

— Oliver, — ela disse, pegando a mão dele.

Ele não segurou de volta. — É perto de Westchester. Um pouco mais longe do que alguns lugares da cidade, mas é melhor. Mais espaço ao ar livre. Ele não... — Ele engoliu novamente. — Ele não pareceu odiar.

— Você não precisava fazer isso só por causa disso – foi um acontecimento isolado...

— Não, foi uma coisa pela primeira vez, — ele disse calmamente. — Eu já sabia há um tempo que chegaria a isso. Mais cedo do que eu pensava, mas... é melhor assim.

— Não, não é. Você está obviamente chateado, você...

— Eu vim aqui assim que encontrei meu pai, — Oliver interrompeu. — E minha vizinha Ruth estava com você o tempo todo até então.

— Oh. Ok. Obrigada...

— Eles não conseguiram falar com seu contato de emergência. Fui o primeiro a chegar, antes de sua assistente ou de seus amigos. Eles perguntaram se eu sabia como entrar em contato com ela.

— Com quem? — ela perguntou, sua cabeça latejando mais forte, sabendo que ela estava perdendo alguma coisa, mas muito desorientada para descobrir o quê.

— O seu contato de emergência. Sua mãe.

— Oh, — Naomi disse, estremecendo. — Acho que nunca atualizei...

Ela ficou imóvel, sua mão caindo de onde estava explorando a bandagem no lado de sua cabeça.

A mãe dela. Oliver tinha ouvido o nome da mãe dela...

— Danica Fields, — ele disse, sua voz fria. — Eu reconheci assim que ouvi, mas demorei um pouco para identificar. Demorou para as memórias de minha mãe cuspindo aquele nome como se fosse um adjetivo voltarem com força.

Naomi fechou os olhos. — Oliver.

— Eu não tinha ideia de que você era a Naomi, mas você sabia que eu era o Oliver, não é? Cenoura?

O uso de seu apelido de infância poderia tê-la feito sorrir em outras circunstâncias, mas não agora. Agora ela era apenas a Cenoura para seu Ollie, e ele a odiava tanto agora quanto naquela época.

O problema era que ela não o odiava de volta. Não mais.

— Eu ia te contar, — ela disse, ainda sem abrir os olhos.

— Quando? — Sua voz falhou apenas um pouco, e ele limpou a garganta. — Quando?

— Eu tentei, um monte de vezes, mas...

— Mas nada. Como você poderia simplesmente – como você não poderia...

Ela abriu os olhos, assim como ele fechou os dele, e a dor cansada em seu rosto a atingiu.

— É por isso que você se mudou para o prédio? — ele perguntou, encontrando o olhar dela friamente mais uma vez. — Era algum tipo de plano de vingança? É por isso que você me odiou imediatamente?

— Sim —, ela sussurrou. — Quer dizer, eu não queria machucar você ou seu pai, eu só queria... fechar o capítulo.

— Por algo que aconteceu há vinte anos? Quando eu era criança? Quando nós dois éramos? Cresça, Naomi.

— Ei, — ela retrucou, sentindo-se arrependida, mas também não preparada para assumir toda a culpa. — Esses vinte anos passaram de uma forma um pouco diferente para você e para mim. Você sabia que não tínhamos para onde ir depois que você mentiu para encobrir seu pai? Dormi na rua com minha mochila como travesseiro. Dali, fomos para um abrigo para sem-tetos e, em seguida, para um motel nojento. E então muitos outros motéis nojentos, e apartamentos ainda mais nojentos...

— Isso não é meu...

— Não é o seu problema? — ela adivinhou. — Não é seu problema que minha mãe saiu dos trilhos depois de ser expulsa por seus pais? Eles a colocaram na lista negra. E quando ela não conseguiu outro trabalho doméstico, ela simplesmente desistiu, Oliver. Então não, talvez não tenha sido seu problema, mas com certeza foi sua culpa. Sua mãe nunca teria deixado minha mãe manter o emprego, mas talvez pudéssemos pelo menos ter recebido o pagamento final. Talvez pudéssemos ter tido tempo de encontrar algum lugar para ficar se seu pai não tivesse jogado ela e eu debaixo do ônibus.

O olhar de Oliver piscou com pesar, e ele a encarou por um longo momento. — Você está certa.

Ela abriu a boca, preparada para outra briga, mas suas palavras simples a pegaram desprevenida, e em vez disso, ela deu um aceno estranho que fez sua cabeça doer ainda mais.

Ele se aproximou. — Naomi. Eu não sabia. Realmente não sabia, e não posso dizer o quanto estou arrependido. Não estou orgulhoso de como lidei com isso naquela época. E eu sei que não faz nada melhorar, mas embora não tenha sido a última vez que meu pai traiu minha mãe, foi a última vez que o cobri. Eu era uma criança de merda, mas melhorei.

— Eu sei, — ela sussurrou.

— Cristo —, disse ele, passando a mão sobre o rosto e olhando para ela. — Naomi Fields. Eu não pensei nesse nome em... Onde estão seus óculos? Seu cabelo está mais escuro. Você não é tão...

— Atrevida?

Ele deu um sorriso relutante. — Não, você ainda é definitivamente isso. Eu ia dizer frustrante, mas você ainda é isso também.

Seu sorriso desapareceu enquanto ele sustentava seu olhar. — O que você fez foi muito ruim. Posso entender o desejo de encerrar o que aconteceu. Talvez até algum tipo de ajuste de contas. Mas, entrar em nossas vidas, você deve ter ficado emocionada ao ver o que aconteceu conosco. Minha mãe está morta. Meu pai, mal ciente de quem ele era. Eu, caindo de pernas para o ar por você. Era esse o plano, Naomi?

— Não, não foi assim! — ela protestou, tentando se sentar novamente, afastando a mão dele enquanto tentava mantê-la imóvel. — Sim, me mudei para o prédio porque uma parte de mim queria que vocês vivessem lado a lado com a filha da empregada, com a filha da mulher com quem seu pai traiu. Mas eu não sabia... Eu não sabia a condição de seu pai. Eu não sabia que você tinha... mudado.

— E ainda quando você descobriu, você não exatamente se apressou para confessar. Em vez disso, você nos deixou – me deixou – droga, Naomi, nós nos importamos com você. Quero dizer, sim, a forma de gostar de Walter é complicada, mas você me deixou trazê-lo para nossas vidas. Inferno, eu deixei meu pai com alguém que o odeia.

— Eu não... Ok, eu odiava — ela admitiu. — Muito. Mas eu não o odeio agora, Oliver, eu juro para você. Eu quero que ele fique bem. Eu quero que você seja feliz...

— Você terá seu primeiro desejo realizado. Walter vai ficar bem. Provavelmente melhor agora que ele terá atendimento 24 horas por dia melhor do que eu posso dar a ele. E quanto a eu ser feliz... Eu vou chegar lá também. Eventualmente. Mas não com você, Naomi.

Ela resmungou um pequeno som de consternação enquanto seus olhos lacrimejavam. — Oliver.

Ele acenou com a cabeça para a bandagem em sua cabeça. — Eu cuido das contas do hospital. É minha culpa você estar aqui. E estou feliz que você esteja bem, mas Naomi... — Seu olhar voltou para o dela, frio e duro. — Acabou.

— Não! — ela disse, recebendo um olhar preocupado de uma enfermeira no corredor.

Ele começou a se virar, mas voltou. — Se vale de algo, eu realmente sinto muito por aquela época. Não estou orgulhoso de mim mesmo. Ou de meus pais. E se eu pudesse mudar, eu mudaria.

— Eu sei que você mudaria. Oliver...

— Mas, — ele continuou concisamente, interrompendo-a, — eu encontrei outra de suas peças de canto, Naomi. Aquela que mostra que você é desonesta e talvez um pouco faminta por vingança.

Não sendo mais capaz de contê-las, suas lágrimas escorreram pelo seu rosto. — Talvez. Mas também tenho outras peças.

Ele encolheu os ombros. — Você não é mais um quebra-cabeça que estou interessado em resolver.

E então ele se foi.


Capítulo Trinta


DOMINGO, 18 DE NOVEMBRO


— Desligue isso — Walter resmungou para ela de sua cama.

— Tudo bem — Naomi disse facilmente, embora ele tivesse pedido a ela para ligar a televisão apenas alguns momentos antes.

— O que você quer fazer?

— Onde diabos está Margaret? Provavelmente foi fazer compras de novo. — Ele puxou o moletom e olhou para baixo como se estivesse surpreso ao vê-lo.

— Não estou com fome — ele gritou, embora ela não tivesse dito uma palavra.

— Ok, sem problemas — disse ela.

Ele deu a ela um olhar suspeito por um longo momento, então ele pegou o livro em sua mesa de cabeceira e o estendeu para ela.

Seus olhos encontraram os dela em um pedido silencioso, e ela sorriu. — Certo. Vamos ler.

Ela se sentou na cadeira ao lado dele, abrindo a enorme biografia de Benjamin Franklin no local marcado. Ela não estava lendo isso para ele, então deve ter sido Oliver.

Seu estômago torceu um pouco com o pensamento. Ela não tinha falado com ele desde aquele dia no hospital. Ela nem o tinha visto, o que não era tarefa fácil, considerando que eles ainda eram vizinhos, pelo que ela sabia.

Não que fosse durar muito. A primeira coisa que Naomi fez depois de sair do hospital foi tomar providências para se mudar para o local em Tribeca. E por mais fabuloso que soubesse que o condomínio era, a essa altura, ela ficaria tão feliz por estar de volta em um dos vários quartos de motel nojentos de sua infância em Belmont. Em qualquer lugar, menos no 517 da Park Avenue.

Ela se mudou por todos os motivos errados, e era como ela sabia todos aqueles anos atrás – ela não pertencia lá. Nem naquela época nem agora, embora os motivos fossem diferentes.

Antes, porque pessoas como Margaret e Walter Cunningham provavelmente nunca pensariam em pessoas como Danica e Naomi Fields como algo além de menos que eles.

Agora, porque Naomi sabia que as pessoas não estavam acima das outras. Em caráter, talvez, mas não em status. E seu comportamento nas últimas semanas tinha faltado muito.

Ainda assim, mesmo que Oliver tivesse ignorado suas mensagens de texto, ligações e a carta que ela deslizou por baixo da porta, ela estava segurando a leve esperança de que ele não a odiasse totalmente.

No fim de semana passado ela apareceu no único asilo de Alzheimer em Westchester com o grande espaço ao ar livre que ele mencionou e pediu para ver Walter Cunningham. Só que estupidamente, ela não havia pensado nisso para perceber que é claro que eles não permitiriam um acesso de visitante aleatório e não planejado a seus pacientes.

Depois de muita conversa doce e teimosia, ela conseguiu convencê-los a ligar para os parentes mais próximos de Walter e pedir permissão para ela vê-lo.

Mesmo sabendo muito bem que Oliver seria o ponto de contato. E que suas chances de ele dar seu aval eram mínimas.

Mas ele a surpreendeu. Ele deu permissão a Naomi para visitá-lo sempre que ela quisesse, desde que as visitas fossem supervisionadas por um membro da equipe. Aquilo doeu, mas ela conseguiu. E era melhor do que nada.

Ela pretendia ir apenas uma vez. Para fazer as pazes ou algo assim, mas esta era sua terceira vez para vê-lo, e ela descobriu que gostava de passar tempo aqui. Claro, o homem era a razão de ela ter uma pequena área careca na cabeça onde eles tiveram que raspar o cabelo para costurar o ferimento na cabeça, mas uma pequena parte dela achava que talvez ela merecesse por esconder a verdade de Oliver e Walter.

Como se talvez eles estivessem quites de alguma forma estranha e distorcida. Ou talvez não fosse sobre ser equilibrado.

Era sobre perdão. E compreensão. Talvez fosse sobre escolher a gentileza, independentemente do que tivesse acontecido antes.

— Não esse, — ele retrucou quando ela começou a ler. — Seu livro.

— Meu livro?

— O que você leu antes.

Naomi sorriu com o fato de que ele se lembrou de sua última visita, embora ela tenha ficado um pouco surpresa. Ela não era uma leitora muito assídua, exceto por seu fetiche por Stephen King, e já que ela praticamente pôde sentir o julgamento do cuidador quando ela sugeriu It, sobrou o único outro livro no Kindle – um favorito da infância do qual ela nunca se cansou.

— Você gostou de Anne de Green Gables, hein?— ela perguntou, encontrando o capítulo que terminaram na última vez.

Ele deu de ombros e olhou pela janela, mas não pediu que ela parasse quando começou a ler.

Naomi perdeu a noção de quanto tempo leu, consumida pela história de uma órfã ruiva e sua maioridade na Ilha do Príncipe Eduardo.

Por fim, ela ergueu os olhos e viu que Walter havia adormecido, parecendo em paz e contente quando um raio de sol bateu em seu rosto.

Naomi colocou o telefone de lado, puxou um cobertor do pé da cama e o colocou sobre os joelhos dele.

— Vejo você na próxima semana, ok, Walter? — ela disse baixinho para o homem adormecido.

Sem perceber que estava fazendo isso, ela alisou uma mecha errante em seu cabelo grisalho e esperou pelo autodesprezo instantâneo, a culpa por estar traindo sua mãe.

Nunca veio.

Ela engoliu em seco, um nó na garganta ao perceber que ela finalmente tinha paz.

E quanto isso custou a ela.

Naomi pegou sua bolsa, virando-se para dizer à funcionária do estabelecimento que tinha acabado seu turno como babá..

Ela congelou. Não era a pequena mulher loira que a acompanhou até o quarto de Walter parada na porta.

Era Oliver.

Ele estava vestindo uma camisa azul que fazia seus olhos parecerem ainda mais claros do que o normal, e seus pés estavam cruzados na altura dos tornozelos enquanto ele se apoiava no batente da porta com um ombro.

— Oi, — ela disse nervosamente. — Eu não – há quanto tempo você está aqui?

Ele encolheu os ombros. — Algum tempo.

— Eu sinto muito. Eu não tive a intenção de interromper seu tempo com ele. Você poderia ter me expulsado.

— E perder a hora da história? — ele disse com um leve sorriso.

Ela olhou para baixo, sentindo-se envergonhada. — Ah sim. É um dos meus preferidos. Ele parece gostar. Bem, pelo menos até ele adormecer.

Oliver assentiu, mas não disse mais nada.

Ela forçou um sorriso. — Bem. É bom te ver. E obrigada, de verdade, por me deixar vê-lo. Eu teria entendido se você tivesse dito não.

Ainda assim, ele não disse nada, sua expressão vigilante.

Naomi forçou outro sorriso e caminhou em direção à porta. Ele se endireitou, abrindo caminho para ela passar, com cuidado para não tocá-la.

— Se cuide, Oliver, — ela disse, mantendo a voz leve.

— Você também.

Ele a deixou ir até a metade do corredor antes de chamá-la de volta. — Ei, Naomi?

Ela se virou.

Ele apontou com o queixo para a bolsa dela. — Aquele livro que você estava lendo. A garota – Anne. Seu apelido era Cenoura. Soa familiar.

Ela riu. — Você estava ouvindo por um bom tempo. E sim, era apenas seu apelido na mente de Gilbert, que era meio que a pedra no sapato dela.

— Ah. O que aconteceu com eles?

— Eles quem?

— Anne e Gilbert.

— Eles acabaram se tornando amigos —, disse ela, escolhendo as palavras com cuidado. Ela estava um pouco perdida sobre por que eles estavam discutindo os personagens fictícios Anne Shirley e Gilbert Blythe, quando eles tinham grandes questões não resolvidas entre eles.

Oliver a estudou por um momento, então acenou com a cabeça e entrou no quarto de seu pai sem dizer outra palavra.

— Hum, ok, — Naomi murmurou para si mesma.

Ainda assim, ela estava um pouco orgulhosa de si mesma ao sair do prédio. Pelo menos ela não desabou e disse a ele o quanto ela sentia falta dele.

Seu coração pode pertencer a Oliver. Mas seu orgulho ainda era seu.


Capítulo Trinta e Um


SÁBADO, 1º DE DEZEMBRO


— Só quero salientar que somos amigas há menos de seis meses, mas ajudei você a se mudar duas vezes. Certamente deveria haver um prêmio por isso.

Claire fez uma pausa no processo de desembalar uma travessa e deu a Audrey um olhar incrédulo. — Você percebe que ajuda é uma palavra forte no seu caso, certo?

— Ei, estou fazendo coisas —, disse Audrey, levantando sua caneca de vinho de onde estava sentada no novo balcão da cozinha de Naomi. — Eu disse àqueles meninos bonitos onde colocar a cômoda.

— Você é uma verdadeira salva-vidas, querida — disse Naomi, dando um tapinha no joelho da amiga.

— Não é? Mas eu amo esse lugar. Quer dizer, o outro lugar também era bom, mas eu achei que tinha sido uma escolha meio estranha para você. Cheirava a naftalina no corredor.

— Um pouco, — Naomi concordou, abrindo outra caixa escrito COZINHA e puxando seu pote de macarrão.

— Isso é muito mais a sua cara — disse Audrey, pulando do balcão e girando em um círculo.

— Quanto vinho você bebeu? — Claire murmurou.

— O suficiente. — Audrey foi até a janela que dava para o rio Hudson. — Sabiam que quase nunca vou para o lado oeste?

— Não — Claire disse, parecendo escandalizada. — Estamos chocadas. Apenas chocadas, não é, Naomi?

Naomi apenas sorriu, saboreando o som das discussões bem-humoradas de suas amigas, porque isso significava que ela não tinha que lidar com seus próprios pensamentos.

Não que ela não amasse seu novo apartamento. Audrey estava exatamente certa. Ele era mais a cara dela. Um arranha-céu novinho em folha no lado oeste de Manhattan, em um bairro moderno, o novo apartamento de Naomi talvez fosse o oposto do 517 na Park Avenue, com seu pedigree impecável e velhos podres de ricos.

Naomi pode ser uma riquinha moderna. Ela pode não ser do tipo casaco de pele e uísque. Ela pode beber vinho barato em copos baratos e deixar de apreciar o “bom café”, o que quer que isso signifique, porque tudo era bom com açúcar suficiente...

Mas ela era bem sucedida. Ela estava financeiramente segura, e muito mais. Ela estava feliz.

Bem. Feliz boa parte do tempo.

Ela estava meio feliz.

Ela estava chegando lá, droga.

Ela sentia falta de Oliver.

Enquanto desembrulhava uma frigideira, ela notou Claire checando seu relógio. Pela quinta vez em menos de vinte minutos.

— Claire.

— Hmm?

— Precisa ir a algum lugar?

— Não! Não, de forma alguma, na verdade.

— Bem, talvez você tivesse, se tivesse dado uma chance ao rapaz do encontro às cegas.

— Já te disse, ele foi simpático, me diverti bastante. E não tenho intenção de sair com ele ou qualquer outra pessoa por pelo menos um ano — disse Claire.

— Por que um ano?

— Eu decidi que é a quantidade de tempo adequada para uma viúva chorar antes de voltar a sair.

— Me mata dizer isso, mas você estava certa o tempo todo —, disse Naomi com tristeza. — Eu deveria ter esperado um ano. Talvez então eu fosse inteligente o suficiente para não me envolver com Oliver...

Droga! Quanto tempo isso duraria? O frio angustiante em seu estômago toda vez que ela pensava em seu nome.

Claire checou o relógio novamente, e Naomi jogou o estilete no balcão e cruzou os braços. — Fala. Qual o motivo da contagem?

Bem na hora, a campainha de Naomi tocou e Claire deu a ela um sorriso inocente. — Não sei quem poderia ser.

— Nem eu, já que não adicionei ninguém à minha lista de convidados autorizados e o porteiro não ligou para anunciar um visitante.

— Bem. — Claire tirou um fiapo imaginário da manga de seu vestido de malha. — Hipoteticamente, uma amiga sua poderia ter mencionado ao porteiro que você estava esperando uma visita e mandá-lo subir..

Ele...

Naomi ficou imóvel. — Claire.

Sua amiga já estava se movendo em direção à porta e, antes mesmo de abri-la, Naomi sabia quem estava do outro lado.

— Oliver, oi, — Claire disse.

— Ora, ora,— Audrey disse, com um olhar astuto para Naomi. — Não é um episódio interessante de déjà vu.

Ainda mais quando Oliver entrou no apartamento carregando...

— Dom Pérignon! — Audrey anunciou animadamente, já pegando a garrafa de champanhe. — Pelo menos vamos aproveitar desta vez... — Ela percebeu o olhar de Claire. — Ou, você sabe... não.

— Ouvi dizer que é excelente quando servido em uma caneca de café, — Oliver disse em voz baixa.

Lentamente, Naomi se forçou a olhar para ele, amaldiçoando mentalmente Claire por não dizer a ela para vestir algo diferente de uma calça de moletom surrada e a camiseta de Columbia de Oliver, que ela “esqueceu” de devolver.

Seus olhos caíram para a camiseta, depois voltaram para os dela. — Bela camisa.

Ela colocou a mão na barriga para acalmar as borboletas, acabou agarrando a camisa, parecendo uma adolescente nervosa e desajeitada e não a mulher fria e composta que ela imaginou ser na próxima vez que o visse.

— Você mentiu para mim — Oliver disse baixinho.

Claire estava ocupada arrastando Audrey em direção à porta, embora ambas tenham dado um olhar alarmado ao ouvir isso.

Naomi tentou acenar para elas com os olhos. Tudo o que Oliver tinha para dizer a ela tinha que sair. Quanto mais cedo eles fizessem isso, fosse o que fosse, mais cedo ela poderia enfrentar o fato de que havia arruinado as coisas entre eles.

Audrey estava claramente relutante em sair, mas entregou a Oliver a garrafa de champanhe ao passar por ele, junto com um sussurro que parecia muito com “ela é mais frágil do que parece”.

Naomi queria negar. Queria insistir que ela não era do tipo frágil, especialmente por causa de um homem, mas era difícil negar que ela estava incrivelmente perto de quebrar.

Oliver inclinou a cabeça levemente, pegando a garrafa de champanhe, mas ele não olhou para as amigas dela enquanto elas saíam pela porta da frente, parando apenas o tempo suficiente para fazer gestos gêmeos para Naomi de “me ligue”.

Em seguida, a porta foi fechada e eram apenas Naomi e Oliver e um apartamento grande e vazio.

Ele olhou ao redor. — Lugar legal.

— Sim.

Ele olhou para ela. — Mudança repentina.

Ela se recusou a se desculpar. Ela teria dito a ele que estava se movendo se ele tivesse se preocupado em aparecer. Ou responder a qualquer uma de suas dezenas de mensagens.

— Eu não sei se eu pertencia lá.

— Não? — Ele perguntou casualmente, olhando para a garrafa enquanto o fazia. — Eu também não sei se pertenço.

Naomi franziu a testa em confusão. — Mas você é de lá. Você sempre morou lá.

Ele não disse nada, apenas olhou para o rótulo antes de segurar a garrafa levemente.

Naomi respondeu silenciosamente, puxando duas canecas do balcão que ainda não tinham encontrado uma prateleira, e as estendeu enquanto ele abria a rolha.

Oliver encheu as duas xícaras, colocou a garrafa em uma pilha de caixas e ergueu sua xícara. — Para sua nova casa.

Ela bateu sua caneca contra a dele e tomou um gole, mantendo seu olhar o tempo todo.

Então ela foi em frente. — O que você está fazendo aqui, Oliver?

— Você mentiu, — ele disse novamente.

Ela fechou os olhos. — Olha, eu só posso me desculpar um número limitado de vezes. Eu deveria ter dito a você quem eu era...

— Você disse que Gilbert Blythe e Anne Shirley se tornaram amigos.

Naomi piscou rapidamente, tentando seguir. — Hum, o quê?

— Na outra semana, você leu Anne de Green Gables para meu pai. O menino chamava Anne de Cenoura, assim como eu a chamava.

— Certo?

— Bem, eu li.

Naomi deu uma risada assustada. — Você leu Anne of Green Gables?

— A série inteira — disse ele, tomando um gole do champanhe. — Você mentiu.

— Sobre...

— Gilbert e Anne. Eles não eram amigos.

— Bem. — Ela mexeu em sua caneca. — Eles eram, eles apenas...

— Eles eram muito mais do que isso.

— Sim. Ok — ela cedeu. — Gilbert chamava Anne de Cenoura porque estava apaixonado por ela o tempo todo, essa era a única maneira de chamar sua atenção. Mas certamente você não está comparando essa história com... a nossa. Você não me chamava de Cenoura porque estava apaixonado por mim aos dez anos.

— Oh Deus, não, — Oliver disse, colocando sua caneca ao lado da garrafa nas caixas. — Eu odiava você.

Ela sorriu com o tom enfático.

— Mas acho que estou apaixonado por você agora.

O sorriso de Naomi diminuiu, mesmo enquanto seu coração disparava. — O que?

Ele pegou a caneca da mão dela e a colocou de lado também. — Vou precisar de um tempinho para confirmar com certeza. Um tempo sem roupa. Mas tenho quase certeza absoluta. Na verdade, não, risque isso. Tenho certeza. Parece que não consigo parar de pensar em você. Nem meu pai consegue parar de falar sobre você, e isso é alguma coisa.

— Oliver...

— Por que você foi vê-lo? — ele perguntou, se aproximando.

Naomi engoliu em seco. — Eu não sei. Eu só... bem, acho que senti um pouco a falta dele. Não tenho família e ele precisa de alguém, e acho que preciso de alguém também.

— Alguma chance de você precisar de duas pessoas? — Oliver perguntou, sua mão deslizando sob seu cabelo para segurar seu pescoço da maneira que ela amava. — Um como uma figura paterna difícil e tentadora, o outro como... um amor?

— Não diga se não for verdade — sussurrou ela, erguendo as mãos para agarrar a lapela de seu terno. — Não posso te perder duas vezes.

— Ah, mas é verdade, — ele rosnou, roçando seus lábios contra os dela. — Cenoura.

Naomi sorriu contra seus lábios. — Você realmente está pensando em se mudar?

— Eventualmente, — ele disse, suas mãos subindo ao rosto dela para beijá-la mais profundamente. — Eu preciso de um novo começo.

— Tenho uma proposta que pode parecer meio maluca.

— Estou ouvindo, — Oliver disse, ainda beijando-a enquanto lentamente a apoiava, manobrando ao redor das caixas, até que seus quadris atingissem o balcão da cozinha.

— Fique no seu apartamento, — ela disse, suas mãos deslizando por seu peito, seus braços indo ao redor de seu pescoço. — Mas passe algum tempo aqui. Muito tempo aqui. E talvez quando você estiver pronto para se mudar, talvez queira uma colega de quarto?

— Essa colega de quarto teria cabelos ruivos, olhos azuis e um pouco de temperamento? Talvez seja propensa a guardar rancor?

Ela sorriu contra seus lábios. — Possivelmente.

— Você acabou de me pedir para, talvez, algum dia, morar com você?

— Acho que sim. Romântico, certo?

— Você sabe o que seria mais romântico? — ele perguntou, levantando-a para que ela sentasse no balcão. Ela tentou beijá-lo novamente, mas ele segurou seu queixo entre o polegar e o indicador. — Se você me dissesse o que sente por mim.

— Ah, — ela disse, colocando levemente as mãos nos ombros dele e roçando os lábios em sua têmpora antes de mover a boca perto de sua orelha e sussurrar — Eu te amo, Oliver.

Seus braços se apertaram ao redor dela, puxando-a para mais perto. — Eu também te amo, Naomi.

Mais tarde, muito mais tarde, um Oliver nu e ofegante beijou o lado da cabeça dela, que descansava em seu ombro enquanto eles deitavam no chão de madeira dela.

— Mulher, nós temos de parar de desperdiçar bom champanhe.

— Quem disse alguma coisa sobre desperdício —, disse ela, afastando-se para pegar as canecas. Ela entregou um a ele enquanto ele se sentava contra o balcão.

Naomi se sentou na frente dele, com as costas apoiadas em seu peito. — Champanhe quente e caixas —, disse ela, tomando um gole de espumante e inclinando a cabeça para trás para olhar para ele. — É tudo o que você sempre quis?

Oliver sorriu para ela, passando o dedo em sua bochecha. — Tudo que eu sempre quis e muito mais.


Epílogo


OITO MESES DEPOIS


— Ok, então, é grande o suficiente para vocês dois, — Audrey disse, gesticulando com seu biscoito para o apartamento de Naomi. — Mas o que acontece quando vocês tiverem bebês?

Naomi engasgou com o vinho. — O que?

— Calma, — Oliver disse a Audrey, colocando a mão nas costas de Naomi e dando um tapinha leve. — Eu nem consegui convencê-la a entrar em uma joalheria ainda.

— Porque é muito cedo! — Naomi insistiu. — Uma mulher cautelosa não fica noiva de um homem que ela conhece há um ano – e está namorando há menos do que isso. Pelo menos essa aqui não.

— Não? Que tal um homem que ela conhece há vinte anos? — Ele balançou as sobrancelhas.

— Não conta. Qualquer coisa pré-puberdade está fora dos limites.

— Eu concordo com Naomi, — Clarke disse enquanto enchia suas taças de vinho. — Todas as coisas boas começam quando os hormônios entram em ação.

— Seus quadris não se cansam? — Audrey perguntou.

Clarke encolheu os ombros. — Na verdade não. Claire, amor, mais vinho?

— Eu não deveria.

— Você deveria —, disse ele, completando o vinho. — Estamos celebrando essas duas crianças apaixonadas morando juntas.

Naomi olhou para Oliver e sorriu. — Eu disse que meu plano funcionaria.

— Na verdade, era meu plano, Cenoura. Além disso, tecnicamente não nos mudamos para seu apartamento. Mudamos para o seu prédio. Mas um apartamento maior.

— Estou com ciúmes, — Claire disse melancolicamente. — Minha casa está tão cansada.

— Ahh, mas seus planos para ela são tão perfeitos!— Audrey disse. — Como está indo a busca por um empreiteiro?

— Não está — Claire disse tristemente, puxando um pedaço de salame de uma travessa e mordiscando a borda. — Todo mundo está fora do meu orçamento ou tem suas próprias ideias estúpidas sobre como modernizar o lugar de uma forma que eu não quero. Eu quero clássico, mas melhor. Como isso é tão difícil de entender?

— Na verdade, — Oliver disse pensativo, apontando o copo para ela. — Eu posso conhecer alguém. Um dos meus empreiteiros faz principalmente coisas comerciais de ponta, mas ele está procurando uma mudança. Algo simples.

— Não consigo imaginar que uma casa antiga de pedra seja o que ele tem em mente.

Oliver encolheu os ombros. — Vou perguntar a ele.

— Clarke. — Audrey estava o repreendendo. — Você não pode simplesmente ligar a TV de outra pessoa sem pedir.

— Oliver, posso assistir ao jogo dos Yankees sem perguntar?

— Ahhh, sim — Claire disse, indo para o sofá e se jogando.

Clarke começou a mudar de canal quando Audrey arrancou o controle remoto de sua mão. — Você se lembra por que estamos aqui, certo?

Ele deu um suspiro fingido e pegou um pouco de pipoca. — Tudo certo. Bem. — Ele olhou para Naomi. — Só para constar, esta é a única coisa pela qual eu sacrificaria o jogo.

— Não precisamos assistir —, disse Naomi, mordendo o lábio e apoiando o quadril no braço do sofá. — Assistir isso foi ideia do Oliver, mas...

Claire a puxou para o sofá. — Calada. Vamos assistir isso.

Naomi gemeu e fechou os olhos com força. — Eu não acho que consigo. Vocês sabiam que eles começaram o programa quando eu era um bebê?

— Aposto que você era fofa! — Audrey protestou.

— Eu era laranja.

Oliver se inclinou nas costas do sofá e beijou a cabeça dela. — Não, Cenoura. Você era perfeita.

Em seguida, ele se juntou aos outros no sofá, e juntos esperaram pela estreia de Max: The Naomi Powell Story.

Uma história da qual Dylan Day não participou, muito obrigado.

Uma vez que Dylan fez uma saída inglória do projeto, a série não foi tão dolorosa quanto ela esperava. Claro, a emissora pressionou pelos detalhes interessantes, mas seu novo produtor respeitou sua decisão de deixar sua história com Oliver e os Cunninghams fora disso. E, na verdade, a série era boa, ela admitiu, um pouco envergonhada. Muito boa. Ela teve permissão para contar sua história, mostrar às meninas que elas poderiam conseguir ser bem sucedidas com muito trabalho e determinação. Dizer a elas que ela estaria lá para ajudar a abrir as portas para elas.

Oliver encontrou a mão dela e apertou quando o braço de Claire se uniu ao dela, e Naomi sorriu.

Porque, não importa o quão boa a série seja?

A vida real era melhor.

 

 

                                                                  Lauren Layne

 

 

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