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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


POR DINHEIRO OU POR AMOR / Carol Marinelli
POR DINHEIRO OU POR AMOR / Carol Marinelli

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

POR DINHEIRO OU POR AMOR

 

- Não vão acreditar - disse Tabitha agarrando em Aiden pela mão e saindo do carro.

Ao ver todos os convidados que os esperavam nas escadas da igreja, ficou com a boca aberta.

- Porquê? - perguntou ele absolutamente surpreendido e cumprimentando várias pessoas conhecidas.

- Não vão acreditar - repetiu Tabitha respirando fundo - porque não pareço uma namorada da alta sociedade.

- Graças a Deus - murmurou Aiden. - De qualquer modo, não o és. A única coisa que tens de fazer é passar-te por minha namorada. Se te servir de consolo, podes mostrar-te sexy. Assim, acreditarão que és a minha última aventura antes de assentar a cabeça.

- Vão perceber - protestou Tabitha. - Aiden, sou bailarina, não actriz. Como diabo me meti nisto?

- Não tinhas outra escolha - recordou-a Aiden.

- Devias-me isto por me teres feito passar por teu namorado na reunião com os teus colegas de escola, à qual fui porque me tinhas acompanhado ao casamento do meu primo. É simples.

- Não - protestou Tabitha. - O mais simples seria dizeres aos teus pais que és homossexual. Estamos no século XXI, por amor de Deus, é uma coisa normal.

- Explica isso ao meu pai. A sério, Tabitha, é impossível. Não te preocupes com isso. É verdade, estás fabulosa.

- Graças ao teu cartão de crédito - respondeu Tabitha. - Não deverias ter gasto tanto dinheiro, Aiden.

- Claro que sim. Tu mereces. A minha familia vai querer coscuvilhar sobre ti, por isso, pelo menos, tens um bom vestido e uns sapatos maravilhosos. Anda lá, Tabitha, vamo-nos divertir. Sempre gostaste de casamentos!

Ao entrar na igreja, Tabitha passeou os seus olhos cor de jade pelos diversos convidados e alegrou-se por Aiden lhe ter comprado aquele vestido.

Os que tinha vestido para os inumeráveis casamentos aos quais tinha ido naquele ano não teriam servido.

Os convidados destilavam dinheiro e estilo por todos os poros da pele.

Ainda bem que tinha um vestido de um estilista e umas lindas sandálias vermelhas com tacão alto e uma carteira a condizer.

Uma mulher incrivelmente alta com um enorme chapéu sentou-se à sua frente; o que fez com que não albergasse demasiadas esperanças de ver alguma coisa.

Quando a noiva entrou e todos se voltaram para a observar, Tabitha apercebeu-se que a mulher que estava à sua frente era nada mais nada menos que Amy Dellier, uma das modelos mais famosas da Austrália.

O órgão começou a tocar a Marcha Nupcial e toda a gente se levantou. A noiva entrou avançando devagar para o altar. Os convidados seguiam-na com o olhar, mas Tabitha não podia deixar de olhar para Amy Dellier.

Era realmente bonita.

- Desculpe, posso passar?

Aquela voz, realmente muito bonita, tirou-a dos seus pensamentos. Voltou-se à espera de se encontrar com um homem mais velho e deu de caras com o símbolo da beleza masculina. Era igual ao modelo feminino, mas na versão homem. A perfeição.

Tinha o cabelo da cor do azevinho e estava penteado para trás, realçando um rosto de traços fortes e olhos muito escuros. Cheirava a aftershave e tinha uma presença tão masculina que causava impacto.

- Sim, perdão - respondeu nervosa.

Mas os bancos estavam muito unidos e a sua carteira estava no chão. Era impossível afastá-la, pois Aiden, que estava completamente absorto na cerimónia, tinha-a entrelaçado no pé.

Se aquele semideus não quisesse cair teria de se apoiar no seu braço. Ao sentir a sua mão sobre a pele, Tabitha apercebeu-se que estava a prender a respiração. Enquanto passava junto a ela, corou.

Aiden voltou-se e, ao reconhecer o desconhecido, cumprimentou-o encantado. A noiva estava a passar naquele preciso momento e o homem não teve outra opção a não ser ficar entre Aiden e Tabitha.

Foram apenas uns segundos, mas a Tabitha pareceu-lhe uma eternidade.

Nunca tinha sentido uma atracção tão forte. Sentia a pele quente e todos os músculos do corpo tensos.

 

Era uma pena que a noiva tivesse acabado de passar e o desconhecido tivesse ido, por fim, para o banco da frente. Claro, sentou-se junto a Amy e, da forma como ela lhe agarrou na mão, estavam contentes por se verem.

O que pensava eu? ", ralhou para si Tabitha.

Um homem como aquele não podia estar só. Era impossível.

- Queridos irmãos...

Todos os convidados prestaram atenção ao padre, mas Tabitha estava mais concentrada no lindíssimo homem que tinha à sua frente. Tinha o cabelo perfeitamente cortado e penteado e não tinha nem um cabelo branco.

A cabeleira acabava num pescoço forte e bronzeado e o fato realçava uns ombros maravilhosos. Quando se levantaram novamente para entoar o primeiro canto, reparou que era tão alto que Amy Dellier parecia baixa ao seu lado.

- Nem penses - sussurrou Aiden ao seu ouvido.

- Como? - disse Tabitha corando de vergonha.

- É o meu irmão Zavier - aclarou Aiden.

- Não sei a que te referes - tentou dissimular Tabitha.

- Sabes perfeitamente - insistiu Aiden, que a conhecia muito bem. - Não te aproximes dele. Esmagar-te-ia sem pensar duas vezes.

Tabitha fez uma expressão de desagrado.

- Porquê?

- Por nada em especial. É muito bonito, mas é um pesadelo.

- Tanto me dá, não me interessa - sussurrou Tabitha.

- Faz o que quiseres - disse Aiden encolhendo os ombros, - mas depois não digas que não te avisei.

Tabitha continuou a cantar, mas a verdade era que Zavier a distraía constantemente. Estava farta de ir a casamentos naquele Verão, mas aquele estava a ser o mais interessante de todos. Gostou inclusive do eterno momento em que os noivos e as testemunhas demoraram a assinar. Assim, teve a oportunidade de continuar a observá-lo.

Nunca se tinha sentido fisicamente atraída por um desconhecido. De qualquer forma, estava fora do seu alcance. Aquele homem jogava num outro clube.

Enquanto o fotógrafo fazia o seu trabalho no Jardim Botânico de Melbourne, os convidados esperavam, conversando e bebendo champanhe acompanhado de fruta. Era o que tinham de bom os casamentos dos ricos, até o mais ínfimo detalhe estava tratado.

Tabitha sorriu ao conhecer os pais de Aiden. Apesar dos avisos do filho, a sua mãe, Marjory, causou-Lhe muito impacto desde o primeiro momento por ser uma mulher com extremo glamour e muito elegante.

- Foi uma cerimónia maravilhosa, não acha? Apesar de achar que o vestido de Simone não foi o mais acertado. Não se deve ir a uma igreja com saias acima do joelho. O que achas, Jeremy?

Jeremy Chambers não tinha a efervescência da sua esposa. O seu rosto era muito parecido ao do seu filho predilecto, e os seus olhos, igualmente escuros.

- Estava exactamente igual às outras noivas deste ano - respondeu sem se preocupar em baixar a voz.

- A verdade é que sim - disse Tabitha arrependendo-se no mesmo instante. - Fui a muitos casamentos este ano - acrescentou para explicar.

A seguir, bebeu um bom gole de champanhe. Estava nervosa e desejou não ter dito nada, mas para sua surpresa Jeremy sorriu-Lhe.

- A quantos foste?

- A dez - respondeu ela exagerando. - Bom, não, na verdade foram apenas seis - confessou fazendo cálculos. - Casaram-se todas as minhasamigas - concluiu com olhar vazio.

- E apenas começou, vais ver - disse Jeremy por experiência. - Agora vêm os baptizados e em menos anos dos que esperas os filhos das tuas amigas casar-se-ão e volta a começar tudo novamente. Marjory adora casamentos, mas eu não. Tanto faz quem se case, mesmo que seja um primo realmente longínquo, temos de ir. Por falar disso, estou a ver certos familiares que tenho de cumprimentar. Foi um prazer conhecer-te, Tabitha

- despediu-se apertando-lhe a mão.

Mas, de repente, pareceu mudar de parecer e deu-lhe um beijo na face. O seu filho Aiden olhou-o perplexo.

- Santo Deus - comentou quando estava sozinho com Tabitha. - O meu pai nunca gosta de ninguém.

- Eu gostei dele - respondeu Tabitha. - Não acredito em nada do que me contaste sobre ele.

- É encantador se for um filho correcto. Falando do rei de Roma...

- Zavier! - exclamou Marjory beijando o seu outro filho com afecto. - Pensava que não vinhas à igreja. Onde te meteste?

- Onde pensas? Estive a trabalhar.

- Mas é sábado - protestou a sua mãe. - Não deverias trabalhar tanto. Bom, tanto faz. Conheces Tabitha? É a... hum... amiga do teu irmão?

Aiden baixou os olhos para o seu copo, mas Zavier olhou-a nos olhos.

- Sim, na igreja - respondeu estendendo- lhe a mão. Tabitha aceitou-a e reparou que era quente e forte.

- E Lucy? - perguntou Marjory.

- Amy - corrigiu-a Zavier. - Está a retocar a maquilhagem.

- Uma rapariga encantadora - disse a sua mãe.

- Ficaria lindíssima como noiva.

- Tão subtil como sempre.

- Que outra opção tenho? Tenho dois filhos de trinta e tantos anos e nenhum dos dois parece ter planos de casamento - respondeu olhando para Tabitha. - Simone só tem vinte anos. Não me estranha que a sua mãe tenha um sorriso de orelha a orelha.

- Sorri porque a sua filha casou-se com um homem muito rico que os vai tirar da sua penosa situação, não porque Simone vá ser ou não feliz.

- Para que saibas, um casamento com uma boa situação económica tem tudo para que seja feliz.

- Podes ter razão. Em qualquer caso, vendo que não és sequer capaz de recordar o nome de Amy, vê-se bem quais são as tuas intenções. Esquece-as.

- O teu pai ficaria muito orgulhoso.

Ao mencionar o seu progenitor, a temperatura baixou vários graus. Tabitha tinha esperado que Zavier respondesse à sua mãe com algum comentário gracioso, mas tal não sucedeu. Tinha ficado sem palavras.

- Fá-lo-ia muito feliz, Zavier - insistiu Marjory. - É o que o teu pai mais deseja na vida.

- O que é que o teu pai mais deseja na vida? - perguntou Amy unindo-se ao grupo.

 

Zavier olhou para a sua mãe avisando-a que não abrisse a boca.

- Nada, Amy, não tem importância - disse-lhe. Amy tinha-o agarrado pelo braço, mas ele soltou-se e foi na direcção do fotógrafo.

- Creio que é a nossa vez.

Aiden insistiu que Tabitha também fosse fotografada, mas ela negou-se. Não queria que ficasse qualquer vestígio do engano. Fá-la-ia sentir-se ainda pior.

- Também te deixaram de lado?

Tabitha voltou-se e viu que Amy estava ao seu lado.

- Parece-me muito cedo para começar a aparecer em álbuns familiares - respondeu surpreendida.

- E muito tarde para mim. Parece que acaba de me deixar.

- Oh!

- Malditos Chambers - soluçou angustiada. Tabitha observou abatida como duas lágrimas deslizavam por aquele rosto tão famoso. Amy voltou-se para se ir embora, mas o efeito combinado da erva e das sandálias de tacão fizeram com que se estatelasse no chão.

Tabitha fez uma careta de dor, mas Amy afastou-se com muita dignidade.

- É o efeito que tenho nas mulheres. Não perdem tempo para fugir a correr - disse Zavier nas suas costas.

- O que diabo lhe disseste? - perguntou Tabitha apesar do assunto não Lhe dizer respeito.

- Não muito, que não era preciso que ficasse na fotografia porque não íamos estar juntos quando fossem reveladas.

- Que horror - disse Tabitha. - Não a podias ter deixado de uma forma mais delicada?

Zavier encolheu os ombros.

- Tentei, mas ou não me quis entender ou não lhe cabia na cabeça o facto de um homem não querer estar com ela.

Tabitha entendeu que, depois de ter estado com um homem tão perfeito, Amy não tivesse querido entender que a deixava. Aquilo devia criar vício.

Sem se aperceber, estava a observá-lo com olhos escrutadores, mas Zavier parecia não se importar. Ao se dar conta que a conversa tinha parado, Tabitha verificou que o estava a observar e corou.

Ficou aborrecida por ser apanhada de forma tão espantosa e decidiu que, por muito bonito que fosse, a beleza não era tudo.

- Trataste-a muito mal - disse com raiva. Zavier arqueou uma sobrancelha.

- Ena, ena, aborreces-te com facilidade, eh? Então, não creio que essa cor de cabelo seja tinta, pois não? - disse segurando entre os dedos um caracol ruivo e estudando-o.

Tabitha, indignada, apercebeu-se que estava demasiado perto. Tão perto que lhe via as pequenas pintas de cor safira dos olhos.

- Claro que não - respondeu, afastando-se. Tinha sentido uma descarga eléctrica por todo o corpo e corou dos pés à cabeça.

- Não sei como é que as mulheres se apaixonam por ti.

- É fácil de entender.

- Não era uma pergunta, mas sim uma afirmação. Achas que por seres rico e bonito podes tratá-las como... - interrompeu-se ao vê-lo rir.

Estava a rir-se dela?

- Com que então sou bonito?

- Sabes que és e acreditas que isso te dá direito de magoar os outros.

- Tendo em conta que nos conhecemos há apenas uma hora, formaste uma ideia de mim bastante negativa - disse Zavier. - Porquê?

Tabitha não sabia o que dizer. Porque tinha reagido de forma tão visceral? Porque se tinha aborrecido tanto com ele por ter deixado Amy quando, na realidade, não sabia nada sobre a sua relação?

- Não gosto que magoem as pessoas - respondeu.

- Não fiz mal nenhum a Amy - assegurou-lhe.

- Tem o que procurava ao estar comigo. Títulos nas revistas e fama. Além disso, não creio que lhe custe muito conseguir outro homem rico e bonito.

- Magoaste-a - insistiu Tabitha.

Zavier encolheu os ombros.

- Pode ser que tenhas razão. No fim de contas, acaba de perder o melhor amante que jamais vai ter - sorriu.

- És asqueroso - gritou Tabitha.

- Apenas realista. Divertimo-nos enquanto durou. Amy queria mais e eu não.

- Queria casar-se contigo?

Zavier assentiu.

- Pior ainda - disse Tabitha horrorizada. Ama-te e tu deixa-la assim?

Zavier negou com a cabeça.

- Quem falou de amor? Achas que Amy me ama?

- Porque quereria casar contigo se não te amasse? - perguntou Tabitha confusa.

- Vamos, Tabitha, és mesmo assim tão inocente? Pela mesma razão pela qual sais com o meu irmão e vieste com ele a este casamento: por dinheiro e posição social. O amor não deve interferir quando há um bom negócio à vista.

- Não estou com Aiden por causa do seu dinheiro - assegurou-lhe surpreendida.

- Por favor - troçou ele.

- Não é assim - insistiu enquanto procurava Aiden com o olhar.

Estava com a noiva, de forma que não iria poder salvá-la em breve. Ia ter de solucionar as coisas sozinha.

- E tu o que fazes?

- Como? - perguntou Zavier.

- Como ganhas a vida? - perguntou Tabitha, impaciente. - Deves trabalhar, não é?

Zavier franziu o sobrolho.

- Trabalho na empresa da família. Nem isso sabes?

Não, a verdade era que Aiden e ela não tinham falado do curriculum vitae do seu irmão.

- Sim, creio que Aiden me deve ter dito, mas não costumo dar atenção a esses detalhes.

- E como se conheceram?

- Aiden e eu? Numa festa.

- Claro, não podia ser no trabalho, pois não? Sabemos que o meu irmão lhe tem alergia.

- Aiden trabalha - disse Tabitha indignada. De facto, é um artista de muito talento.

- Sim, claro, artista - troçou Zavier olhando para o seu irmão, que estava a beber uma bebida.

- E tu a que te dedicas?

Tabitha engoliu em seco. Normalmente, costumava dizer a sua profissão de forma muito orguLhosa, mas duvidou que Zavier se sentisse impressionado.

- Sou bailarina.

Zavier não disse nada, mas olhou-a de cima a baixo até fazer com que corasse.

- Não de striptease - esclareceu Tabitha.

- Clássico? - perguntou ele num tom snobe.

- Um pouco, mas faço sobretudo dança contemporânea. De vez em quando, inclusive, fazemos versões de cancã - disse com ironia.

- Pareces uma primeira bailarina frustrada - sorriu ele, observando as suas longas pernas.

- Talvez - respondeu Tabitha encolhendo os ombros.

Porque se sentia como uma mera bailarina de striptease de repente?

- Para que saibas, faço muito bem o meu trabalho. Apesar de troçares da forma como eu e o teu irmão ganhamos a vida, asseguro-te que não é necessário ir vestido de casaco e gravata para fazermos com que as pessoas desfrutem. Nós fazemos desfrutar e muito - aclarou.

- Não tenho a menor dúvida - respondeu Zavier voltando a observá-la de forma apreciativa.

Tabitha repreendeu-se a si mesma pelas suas palavras. Terminou o seu copo de champanhe de um gole só e aceitou outro de um empregado.

- Não te preocupes - sorriu Zavier.

Parecia sincero, mas o seu tom frio fez com que levantasse a guarda.

- Quando te casares com o meu irmão, poderás pendurar as sapatilhas de dança.

Tabitha olhou-o iracunda.

- Gosto do meu trabalho, e muito, sabes? Se acreditas que saio com Aiden para passar a fazer parte da sua encantadora família, enganas-te - assegurou-Lhe, sorrindo secamente.

- É o que veremos - disse ele muito tranquilo. Nesse momento, Aiden chegou.

- Estou a ver que se estão a entender bem sorriu. - É bonita, não é, Zavier? - acrescentou beijando Tabitha na face.

- Muito linda - respondeu o seu irmão com um sorriso nos lábios e uma ameaça nos olhos. - Desculpem-me, mas tenho de me ir embora - acrescentou. - Foi um prazer - concluiu, olhando para ela.

Enquanto se afastava, Tabitha pensou que não tinha sido exactamente um prazer, mas sim uma experiência interessante, apesar de não estar muito segura de a querer repetir.

 

Tabitha teve a sensação que o jantar durava anos e os discursos, séculos. Passou a maior parte do tempo a escutar os comentários de Zavier, a brincar com a comida e a beber demasiado.

Odiava Zavier Chambers por ter insinuado que ela era uma oportunista quando a verdade era que estava ali para fazer um favor à sua familia, salvando o seu pai de algo que não queria ouvir.

Aiden estava nervoso, algo que não era normal nele, mas Tabitha entendeu que era por estar com a sua família. De facto, estava tão nervoso que também não parava de beber e, mesmo tendo prometido não se separar dela, não estava a cumprir a promessa.

- Desculpa - sorriu enchendo outro copo. Preciso de mais uns quantos para poder aguentar isto. Como estás tu?

Tabitha encolheu os ombros.

- Deverias ter-me avisado que a tua família é tão rica - respondeu olhando em redor.

O Windsor Hotel era o melhor de Melbourne e o salão no qual se estava a realizar a recepção era, simplesmente, glorioso. Era tudo divinal, desde o champanhe até ao estranho jantar que estavam a terminar, passando pelos canapés das entradas.

- Como te podia dizer isso? Já me custou muito convencer-te a vir. Se te tivesse dito, não terias vindo.

Aiden tinha razão. Rodeada da classe alta australiana, Tabitha encontrava-se deslocada.

- O que se passa contigo, Tab? E não me digas que não se passa nada porque somos amigos há muito tempo e conheço-te muito bem. Não é só por estares rodeada de pessoas assim, pois não?

Tabitha não respondeu. Pôs-se a brincar com os seus caracóis ruivos como uma criança pequena.

- Foi a tua avó? Tabitha assentiu.

- O que fez agora? Vendeu as jóias da famlia?

- Recordo-te que a minha familia não é como a tua - respondeu Tabitha. - Não temos jóias de familia, mas bem, tanto faz. Não, voltou a hipotecar a sua casa para pagar as dívidas do jogo.

- Mas já tinha feito isso... não me contaste isso no mês passado? Foste ao banco com ela para ver como tinha de organizar o crédito e parecia correr tudo bem.

- Pois, já gastou tudo.

- Tudo? - disse Aiden com os olhos muito abertos.

Tabitha assentiu.

- Sim, foi ao banco, levantou tudo e foi directamente para o casino. E tudo por minha culpa.

- A que propósito?

- Não deveria ter deixado que tivesse acesso a tanto dinheiro. Agora tem as dívidas de antes e mais uma. Não creio que seja viciada, creio mais que procura uma companhia... Deveria tê-la obrigado a pagar a dívida.

- Não é uma criança.

- É a única pessoa que tenho - disse Tabitha com lágrimas nos olhos. - Criou-me desde que os meus pais morreram e dedicou-se a mim de corpo e alma. Agora que a vejo sozinha e mais velha aterroriza-me não poder fazer nada por ela. Pedi um crédito, mas quando viram que sou bailarina podes imaginar o que me disseram.

- Posso ajudar-te - disse Aiden.

Tabitha negou com a cabeça.

- Vamos, querida, para mim não é nada. Além disso, não te disse que ontem vendi um quadro?

- Aiden! - exclamou Tabitha encantada lançando-se ao seu pescoço e beijando-o na face. Estou tão feliz por ti!

- Por favor, deixa-me ajudar-te. Se te sentires melhor, podes devolver-mo. Sei que estamos em alta, vais ver - sorriu.

Tabitha voltou a negar com a cabeça.

- Tu pode ser que sim, mas eu asseguro-te que não. Disseram-me que tenho de fazer a audição para o próximo espectáculo - explicou-Lhe.

- E? - disse Aiden. - Serás fenomenal.

- Sim, mas nunca mo tinham pedido antes, sempre tinham contado comigo. É porque estou a ficar mais velha.

- Mas só tens vinte e quatro anos!

- Tenho vinte e nove - corrigiu-o Tabitha a sorrir. - É muito para uma bailarina. Tens de provar continuamente que ainda tens valor. Não posso aceitar o teu dinheiro quando não sei se vou ter trabalho para to devolver.

- Por favor - insistiu Aiden.

- Não, a sério, Aiden - disse Tabitha. - Eu arranjo outra solução.

- De certeza?

Tabitha assentiu decidida e Aiden abandonou o tema.

- Sei que é indecente estar rodeada de pessoas com tanto dinheiro quando a tua avó está arruinada, mas asseguro-te que, às vezes, o dinheiro é uma maldição. Aqui há muita gente que desconfia de todos os que os rodeiam porque acredita que, se pudessem, lhes roubariam a fortuna. É horrível, mas é verdade, que se a família ficasse na ruína noventa por cento dos presentes não estaria aqui.

- O teu irmão pensa que eu estaria entre essa percentagem.

Aiden olhou-a preocupado.

- Tab, lamento se Zavier fez com que passasses um mau bocado, mas de todas as pessoas que aqui estão hoje ele é o mais indicado para ter boas razões para ser desconfiado. Há pouco tempo sofreu uma decepção espantosa.

- Deve ter passado um mau bocado - murmurou Tabitha.

- Aviso-te, Tab, a sério, não aguentarias nem cinco minutos nas suas mãos. Adoro o meu irmão, mas tem o coração gelado. Além disso, vieste comigo. Nem penses seduzir o meu irmão.

Tabitha riu-se.

- Não tens de te preocupar. Já me esclareceu sobre o que pensa de mim e asseguro-te que não é nada bom.

Aiden olhou-a com o sobrolho franzido.

- Crê que saio contigo por causa do dinheiro - explicou Tabitha.

- Santo Deus - disse Aiden servindo-se de outra bebida depois de dizer ao empregado que deixasse a garrafa na mesa. - Se soubesse da verdade, teria um ataque de riso.

Tabitha também se serviu.

- Não desconfia de nada?

Aiden encolheu os ombros.

- Não sei. Uma vez teve uma conversa de irmão mais velho e terminou a perguntar-me se eu era gay.

- E porque não aproveitaste? Voltar-te-ia as costas se soubesse?

- Não, não creio. A Zavier tanto lhe faz. Apesar de usar sempre fato e gravata, creio inclusive que dorme assim, é muito aberto nas suas ideias.

- Então porque não lhe dizes?

- Porque não me parece justo. Não o posso dizer ao meu pai porque teria um enfarte e seria outro motivo de preocupação para o meu irmão. Já tem preocupações suficientes, sabes? Encarrega-se de tudo.

- Em que sentido? - perguntou Tabitha com curiosidade.

- Encarrega-se da empresa. O meu pai está doente. Não parece, mas é uma bomba ambulante. Teria de ser operado ao coração, mas nenhum médico o quer fazer.

- Porquê?

- Por medo de, se correr mal, o queira denunciar - Aiden riu-se. - É velho e não aguentaria bem a anestesia. Operá-lo é muito arriscado. Está delicado, muito delicado, por isso não Lhe posso dizer que sou homossexual e não me parece justo descarregar os meus problemas no meu irmão. É melhor que ninguém saiba.

- Sou um túmulo - assegurou-Lhe Tabitha. Depois daquela conversa, dançaram algumas canções, mas Aiden não estava ali. Só queria beber.

Tabitha perguntou-se quando poderiam ir para o seu quarto. As sandálias estavam a matá-la e doía-lhe a cara de tanto sorrir. Além disso, apetecia-lhe ver televisão enquanto Aiden descansava dos seus excessos.

Decidiu dizer-lhe no dia seguinte que era a primeira e última vez que se fazia passar por sua namorada. Os comentários de Zavier tinham-na deixado bastante desconfortável.

As suas esperanças de se ir embora desvaneceram-se quando Marjory e Zavier apareceram.

- Porque não dançam? - sorriu a mãe de Aiden.

- Aiden está um pouco cansado - respondeu Tabitha sorrindo.

- E depois? Isso não quer dizer que tenhas de ficar sem dançar.

Por um horrível segundo, Tabitha pensou que Marjory lhe ia dizer para dançarem as duas. A verdade foi muito pior.

- Zavier, porque não danças com Tabitha? Tabitha sabia perfeitamente que aquele homem nunca fazia nada que não quisesse fazer, por isso preparou-se para a resposta negativa. Na verdade, ela também não queria dançar com ele. Dez minutos sozinha com ele tinham-na deixado aterrorizada.

- Adoraria - disse Zavier.

Tabitha olhou-o surpreendida e aceitou a sua mão. Assustada, voltou-se para olhar para Aiden em busca de ajuda, mas o seu suposto namorado não estava para ninguém.

A mão de Zavier estava quente e seca. Enquanto a conduzia para pista de dança, Tabitha sentiu vontade de fugir. Como se o sentisse, Zavier apertou-Lhe a mão e não a soltou até chegarem ao centro da pista.

Uma vez ali, Zavier pôs-lhe uma mão na cintura. Tabitha sentia o calor que irradiava e lhe trespassava o vestido. Outro casal empurrou-a e viu-se ainda mais perto dele.

- Estás a passar um mau bocado, não é? - perguntou-lhe Zavier agachando-se.

Ao sentir o seu hálito no pescoço, Tabitha ficou com pele de galinha.

- Claro que não. Todas as pessoas foram encantadoras comigo - mentiu.

- Passaste a noite toda sozinha, sentada, a fingir que não te importavas. Estive a observar-te.

Aquilo pareceu-lhe ser comovedor e perigoso ao mesmo tempo. Não respondeu porque a única coisa que o seu cérebro queria era descansar a cabeça no seu ombro e deixar-se levar pela música.

- É por isso que estás a dançar comigo, por compaixão?

- Não, não faço nada por compaixão.

Tabitha pensou que gostaria muito de acreditar nele, que gostaria de poder pensar que se tinha aproximado dela porque a achava bonita, mas tinha sido Marjory quem o tinha colocado num beco sem saída.

- Lamento - murmurou.

- Porquê? - disse ele.

Tabitha olhou-o nos olhos e viu com assombro que a frieza tinha sido substituída pelo desejo. Tabitha molhou os lábios, confusa.

- Por te ter forçado a dançar comigo - respondeu.

- Não lamentes - disse abraçando-a com força.

- É apenas uma dança.

Aquele homem, que lhe tinha dito que a considerava uma oportunista, estava a fazer com que se sentisse mais mulher que ninguém. Tudo nele a excitava e, por fim, relaxou-se e apoiou a cabeça no seu ombro.

Aspirou e maravilhou-se com a perfeição do momento.

Não, não estava a ser apenas uma dança.

 

- Vamos para cima - disse Tabitha a Aiden batendo-lhe suavemente no ombro. - Vamos, Aiden, as pessoas estão a começar a olhar.

- Problemas? - perguntou Zavier com tom de troça.

- Não, nada disso - respondeu, apertando os dentes.

Não entendia como tinha baixado a guarda daquela forma, como aquele homem tinha conseguido chegar-lhe tão dentro em tão pouco tempo. Estava furiosa, mas não queria que ele se apercebesse.

- Pois não parece - insistiu Zavier.

- Estamos muito bem. Vamos apenas dormir, não é, Aiden?

- Já chamaste a grua? - perguntou ele num tom sarcástico vendo o lamentável estado do seu irmão.

- Está apenas cansado - defendeu-o Tabitha apercebendo-se que era impossível não ver que Aiden estava completamente bêbado.

- Claro, deve ter tido uma semana de loucos no estúdio, não foi? E eu a pensar que estava bêbado. Às vezes pareço um palerma.

Tabitha viu que Jeremy Chambers os estava a observar com curiosidade e decidiu que a última coisa que Aiden precisava era de uma bronca do seu pai.

 

Engoliu o orgulho e aceitou a sua ajuda.

- Dá-me uma mão - disse vendo que Jeremy caminhava na direcção deles.

- Por favor?

Não estava tão desesperada!

- Vais ajudar-me ou não?

Zavier sorriu de forma sincera pela primeira vez.

- Está bem, vamos. Temos de o levar lá para cima.

Foi mais fácil dizê-lo que fazê-lo. Conseguiram tirá-lo do salão de forma mais ou menos digna, mas ao chegar ao elevador Aiden apoiou-se no seu irmão e começou a ressonar a todo o volume.

Tabitha rezou para que o elevador subisse mais depressa. Não se sentia bem ao ter Zavier tão perto. Por outro lado, ainda bem que a tinha ajudado. Caso contrário, não teria conseguido tirar Aiden do salão.

Aiden não acordava, por isso o seu irmão pegou-lhe ao colo com facilidade, algo incrível tendo em conta que media mais de um metro e oitenta. Tabitha abriu a porta do quarto e Zavier depositou o seu irmão mais novo na cama sem nenhum tipo de cerimónia.

- De manhã diz-Lhe como se comportou mal.

- Sim, não te preocupes, dir-lhe-ei - respondeu Tabitha desconfortável com Aiden. - Obrigada pela tua ajuda - resmungou.

- De nada. Ainda bem que teve a brilhante ideia de reservar quarto. Caso contrário, estaríamos num táxi. Como já deves saber, não é a primeira vez que tenho de o salvar e de certeza que não será a última - respondeu Zavier observando- a intensamente. - Pensando que estando com uma boa mulher mudaria...

- Mas eu não sou uma boa mulher - disse Tabitha sem poder evitar.

Zavier olhou-a com uma sobrancelha arqueada.

- Esqueceste o que me disseste na recepção?

- Ah, isso, bom, tenho a certeza que tens coisas boas.

Apesar de estarem numa das maiores suites do Windsor, o quarto de repente ficou pequeno. Aquilo não era uma simples sedução. Tudo em Zavier gritava perigo, devia fugir, mas não tinha para onde e, o mais incrível, Tabitha não estava certa de querer fugir.

Como não sabia o que fazer, descalçou Aiden, tirou uma manta do armário e tapou-o.

Pensava que Zavier se iria embora, mas tal não aconteceu.

- Vou colocá-lo na borda da cama caso queira vomitar - comentou mais para si que para ele.

Segurou em Aiden pelos ombros e puxou-o com força.

- Cuidado, vais magoar-te - disse Zavier aproximando-se e pousando-lhe a mão no braço.

Tabitha retirou-a rapidamente.

Zavier olhou para o seu decote e, em resposta, os seus mamilos ficaram duros como pedras. Tabitha engoliu em seco.

- Tabitha... - disse Aiden tentando levantar-se.

- Desculpa.

- Não te preocupes - respondeu ela. - Dorme.

- Estou a falar a sério, desculpa - repetiu descansando a cabeça na almofada. - Deveria casar-me contigo. Assim ficaria tudo solucionado.

Tabitha sentiu que Zavier ficava tenso e murmurava algo entre dentes. Acreditaria que ela o tinha embebedado para conseguir uma proposta de casamento? Sim, obviamente que sim.

- Não digas palermices - respondeu tentando rir-se.

Mas Zavier queria ouvir tudo.

- Aiden, essas não são maneiras de te declarares a uma mulher. Termina o que começaste - disse incitando-o.

- Assim tudo se resolveria - murmurou Aiden.

- O meu pai ver-me-ia casado antes de morrer e... as tuas dívidas de jogo ficariam saldadas... acrescentou adormecendo definitivamente.

- Posso explicar... - disse Tabitha vendo a cara de Zavier. - Não é o que parece.

Zavier sorriu perverso.

- De certeza que é muito pior.

- Não, as dívidas de jogo...

Zavier fê-la calar levantando uma mão com uma perfeita manicura.

- Importam-me muito pouco os teus problemas, mas ouve-me bem. Não quero que te voltes a aproximar do meu irmão - ameaçou-a. - Se te casares com ele, tornarei público que és uma oportunista. Entendeste?

- Quem não entende nada és tu.

- Pois - exclamou aproximando-se demasiado dela. - Pensas que tens tudo controlado, não é? troçou. - Pensas que a família Chambers te vai solucionar a vida, eh?

- Não - defendeu-se Tabitha.

Tentou pensar, mas a sua proximidade aturdia-a.

- Não - repetiu olhando-o nos olhos e preparando-se para o impacto.

Viu-o engolir em seco. Mesmo odiando a forma como a atacava, aquele homem excitava-a. Isso, unido ao champanhe e à adrenalina do momento, transformava o encontro em algo muito perigoso.

Zavier acariciou-Lhe o pescoço. Tabitha não se moveu. Esperou.

Esperou que a abraçasse e a apertasse contra o seu corpo, que rompesse a tensão com um beijo brutal.

Tabitha molhou os lábios.

- Eu sabia - disse Zavier agarrando com um rápido movimento a etiqueta do seu vestido. - É isto o que custa hoje em dia um encontro?

Tabitha olhou-o confusa.

- Trato dos cartões de crédito de Aiden, sabes?

- explicou Zavier. - O vestido é a única coisa boa que há em ti.

- Fora daqui - replicou ela.

- Sim, òu, mas tu também te vais embora. Quando acordares quero que estejas o mais longe possível da minha família.

Quando ficou sozinha, Tabitha voltou a respirar.

Sentou-se no sofá porque as pernas lhe tremiam. O seu cheiro, que era a única coisa que restava dele, recordou-a da dança que tinham partilhado.

Apesar de ser um homem odioso, inspirava- lhe uma paixão que não sabia sequer que existia no seu interior. Os seus olhos, a sua boca, o seu cheiro...

Não podia evitá-lo.

Deitou-se no sofá e ficou a olhar para o tecto. Aquela situação era tão injusta que teve vontade de chorar.

Já não queria saber da televisão. Para quê? Pequeno substituto do que era realmente importante, do que tinha estado prestes a suceder uns segundos antes morria de vontade de o voltar a ver, mas não podia regressar ao salão. Faria figura de estúpida e ele aperceber-se-ia do que estava a procurar.

Mas a lógica não estava do seu lado naquela noite.

Tabitha abriu a porta e avançou pelo corredor. A poucos metros, viu uma silhueta enorme que avançava para ela. Só podia ser uma pessoa.

- Procuras isto? - disse Zavier dando-Lhe a sua carteira. - Estava em cima da mesa.

- Obrigada - respondeu Tabitha.

Ficou a olhar para ele sem âmago de regressar para o seu quarto.

- Queres beber alguma coisa?

Tabitha assentiu.

O seu quarto era estranhamente pequeno e sobre a mesa estava uma garrafa de uísque. O gelo não estava derretido, por isso não tinha descido ao salão directamente depois de a ter deixado.

Ao ver a direcção do seu olhar, Zavier explicou-se.

- Estava a tentar encontrar uma desculpa para te voltar a ver - confessou. - Apesar do sermão que vou dar amanhã a Aiden, às vezes, a resposta está na garrafa - acrescentou vendo a expressão surpreendida de Tabitha. - Sentei-me um pouco para pensar em ti. Não sabia se deveria telefonar-te e, de repente, lembrei-me que não tinhas a carteira...

- E precisavas de uma desculpa? Quero dizer, para que é que me querias voltar a ver? Não tinhas terminado de me dar o sermão?

- Acabaram-se os sermões.

Aquilo estava mesmo a acontecer? Zavier Chambers desejava-a tanto como ela a ele? Não, não podia ser.

- E para que é que me querias ver? - repetiu.

- É óbvio, não?

Tabitha olhou-o nos olhos e viu o mesmo desejo que tinha visto na pista de dança.

- Não me odiavas?

Zavier negou com a cabeça.

- O que me fazes sentir neste momento não é ódio, mas sim algo muito mais primitivo.

Como era possível? O homem mais sexy e carismático que tinha conhecido na sua vida desejava-a. Aquilo era surrealista. Não estaria a sonhar?

- Vem cá - ordenou-lhe em voz baixa. Tabitha obedeceu.

A cabeça não lhe respondia. Só existia o desejo. Jamais se teria imaginado a actuar assim, mas Zavier atraía-a demasiado. Não podia pensar nas consequências, só em desfrutar do momento.

- Dança.

Apalermada, assentiu e estendeu-lhe a mão.

- Não, dança para mim - disse-lhe ligando um aparelho de música da qual saíram notas de um contrabaixo e de um violino.

- Não - negou-se Tabitha. - Não quero que rias de mim.

- Não me estou a rir. Quero ver-te dançar como danças quando estás sozinha.

Ele sabia! Tinha-lhe lido a mente? Como sabia que, às vezes, retirava a mesa da sala, corria as cortinas e dançava sozinha para recompensar suas aspirações não concretizadas?

Era uma petição ridícula e, noutras circunstâncias, jamais o teria feito, mas deu conta que tinha o poder de tornar realidade uma fantasia do homem a quem desejava. Aquilo motivou-a.

O ritmo da música apoderou-se dela e, de repente, viu-se a dançar como só tinha dançado sozinha, mas para um público muito especial. Ao terminar, sem respiração, olhou para ele e viu o seu desejo acrescentado.

- Vem - repetiu.

Tabitha avançou para ele e teve a sensação de que caminhava para um precipício. Nunca tinha sido uma mulher promíscua nem se tinha deixado apaixonar com flores nem palavras bonitas, mas aquele homem era irresistível.

Fazia com que se sentisse sexy, feminina. Tinha conseguido o que outros demoravam meses a conseguir: fazer com que se sentisse uma mulher a sério.

Zavier não se moveu. Observou-a enquanto caminhava para ele, mas quando a teve ao alcance da mão apertou-a contra o seu corpo como se o mundo fosse acabar.

Os seus lábios eram explosivos, famintos e Tabitha deixou-o entrar rapidamente na sua boca. Sabia a uísque e a homem.

Acariciou-lhe o cabelo e sentiu as suas pernas, poderosas, tal como a sua erecção, urgente e marmórea.

Zavier tirou-Lhe os ganchos do cabelo e atirou-os para o chão quase aborrecido e fez cair os caracóis em cascata sobre os ombros. Deitou-Lhe a cabeça para trás e explorou o seu pescoço.

- Tens a certeza? - perguntou-lhe com voz grave.

Tabitha não tinha a certeza de nada, mas não queria que parasse. A única coisa que sabia era que, se deixasse de a beijar, de a acariciar, de a fazer desfrutar, morreria de frustração, e não o poderia suportar.

- Por favor, não pares - rogou- lhe.

Abriu os olhos e viu que a observava como um animal com cio.

- Não pares - repetiu.

Zavier pegou nela ao colo, levou-a para o seu quarto e deitou-a na enorme cama que estava no centro.

A urgência animal abriu passo, então, a uma lentidão quase cerimonial. Zavier desceu-lhe o fecho do vestido desfrutando de cada milímetro de pele que ficava exposta.

Enquanto lhe beijava os ombros, afastou-lhe as alças do vestido e passou a explorar as suas clavículas com a língua. Tabitha ouviu-o arquejar quando o tecido caiu pelos seus seios e deixou a descoberto uns mamilos rosados que morriam de desejo de serem acariciados.

Não só conseguiram isso, como também, além disso, um rasto de saliva que os deixou maravilhados. Zavier continuou a descer pelo seu corpo até que, colocando-se entre as suas pernas, encontrou o seu triângulo mais apreciado e explorou-o também com a língua.

Tabitha não conseguia deixar de arquejar.

Zavier ergueu-se com a elegância de um felino e desapertou a camisa. Observou-a enquanto descia o fecho e tirava as calças para deixar a descoberto a sua masculinidade presa dentro das cuecas.

Tabitha estendeu o braço para o acariciar, mas ele impediu-a e continuou a despir-se. Era o homem mais sensual que Tabitha tinha visto na sua vida e o seu desejo não deixou de aumentar.

Zavier deitou-se sobre ela e introduziu-se no seu corpo com tanta precisão e força que a fez gritar de prazer.

Apesar da música já ter terminado, os seus corpos dançaram em uníssono a velha dança do amor. Entregaram-se por completo até não poderem mais e alcançaram o orgasmo ao mesmo tempo.

Então, Tabitha abriu os olhos. Não queria perder aquele momento. Queria ver no seu melhor momento o homem que a tinha feito desfrutar como ninguém.

- E Aiden?

Tabitha ouviu a pergunta e desejou não a ter ouvido.

- Tabitha?

Estava impaciente e queria uma explicação. Tabitha enrolou-se no lençol e olhou-o surpreendida ante o seu óbvio desprezo, que contrastava com a forma como se tinha comportado até há apenas uns minutos.

- Posso explicar - começou a pentear-se enquanto procurava uma resposta.

Não a tinha. Contar a verdade a Zavier? Não o podia fazer. Não estava disposta a trair o seu melhor amigo. O seu segredo estava bem guardado com ela.

- Se gostas dele, o que fazes na minha cama? insistiu Zavier. - Suponho que te darás conta de que isto não é decente. Sei que todos podemos cometer erros ou deixar-nos levar pela paixão, mas não resististe. Se gostasses mesmo do meu irmão, terias resistido um pouco, mas nem isso.

Tabitha apercebeu-se de que tudo aquilo para ele não tinha sido mais que uma prova e ela tinha falhado estrepitosamente.

- Enganaste-me? - perguntou com os lábios brancos.

- Pode ser que sim - Zavier riu-se, - mas não resististe muito, eh?

- Enganaste-me - repetiu Tabitha furiosa, surpreendida e magoada. - Puseste-me à prova para ver até onde chegava.

Como um calafrio de horror, recordou as palavras de Aiden. Esmagar-te-ia sem pensar duas vezes".

Era exactamente isso que acabava de fazer. Não tinha escrúpulos e era perigoso e ela tinha caído direitinha na armadilha.

Enrolou o lençol em redor do corpo e levantou-se. Apanhou o vestido e a roupa interior do chão e meteu-se na casa de banho. Fechou a porta com força e tentou dar a volta à chave, mas ele foi mais rápido e conseguiu abri-la.

Estava nua diante de Zavier, e isso envergonhava-a agora. Sem o olhar nos olhos, apertou o lençol contra o corpo e controlou as lágrimas.

- Não te aproximes de Aiden - ameaçou-a agarrando-lhe no braço.

- Larga-me - disse-Lhe Tabitha surpreendentemente calma. - Não fazes ideia do que se passa na realidade. Estou a fazer um favor à tua familia, asseguro-te.

- Impedindo que saibamos que Aiden é homossexual?

- Sabias?

- Claro e, se não o soubesse, ter-me-ia apercebido esta noite.

- Porquê? - perguntou Tabitha confusa. Zavier soltou-a, mas ela não se mexeu. Queria uma resposta e procurou-a nos seus olhos.

- Porque qualquer outro homem se teria sentido orgulhoso de estar contigo - respondeu em voz baixa.

Tabitha riu-se, nervosa.

- Ah, sim? Pois eu não sou Amy Dellier.

- És dez vezes melhor que ela - replicou Zavier. - Se o meu irmão fosse heterossexual, não te teria trocado por uma garrafa de uísque.

- Se sabes que é gay, não entendo por que estás tão aborrecido. Pensas que estou com ele por causa do dinheiro?

- Poupa os teus discursos. Pensas que não sei que existem os casamentos de conveniência? Não é preciso procurar muito, na nossa familia há vários, sabes?

- Não te entendo!

- Por exemplo, o casal que se casou hoje. A minha prima Simone só está interessada no dinheiro - respondeu Zavier enojado. - Queres um exemplo mais próximo? Os meus pais.

- Os teus pais? Mas parecem ser muito felizes.

- Sim, são felizes e estão casados, mas não estão felizmente casados. Se pensas que vou permitir que enganes o meu irmão, enganas-te.

- Mas se Aiden estava a brincar...

- Não, nada disso, Tabitha. Por muito que o meu irmão e tu e os outros como vocês acreditem que vivem acima de certas normas, não é assim. Todos gostamos de ter as facturas pagas, não é? Para isso, há que cumprir certas normas da sociedade. A senhora Tabitha Chambers será muito respeitada uma vez que as suas dívidas desaparecerão, correcto? Poderias jogar bridge em clubes exclusivos, sim, mas o jogo não é a única coisa que sabes fazer bem, pois não? - disse aproximando-se perigosamente.

- Não sabes o que dizes! - exclamou Tabitha sem se poder mover.

- Claro que sim. Deverias procurar um amante, mas claro que terias de ser discreta. Foi por isso que foste para a cama comigo? Querias ver se gostavas o suficiente da minha actuação para me teres como amante?

- Claro que não.

- Penso que terei sido aprovado no exame, não?

- Pensas muito - replicou Tabitha. - Dás-me pena, Zavier. Acreditas que todas as pessoas se aproximam de ti por causa do teu dinheiro. Não acreditas mesmo no foram felizes para sempre.

- Como? - perguntou Zavier perplexo.

- Sabes, como nos finais felizes dos romances.

- Ah! - disse ele confuso.

- Nunca te leram uma história?

Zavier riu-se.

- Imaginas a minha mãe a ler-me histórias idiotas?

Tabitha sentiu verdadeira pena dele. Zavier Chambers tinha tudo, dinheiro, poder, pais, mas não trocaria com ele.

Ela só tinha desfrutado dos seus pais por sete anos, mas recordava-os com carinho e respeito; recordava meter-se na cama com eles e ler história a três vozes, recordava como os três se transferiam para o mundo dos príncipes e das princesas onde vencia sempre o bem.

- Não entendes nada - disse-lhe com amabilidade.

- Não penso o mesmo - disse Zavier atirando-lhe o vestido à cara. - Não te aproximes da minha familia, Tabitha Reece. Dás-me asco.

 

Dançar tinha sido sempre a sua forma de se evadir. Era muito mais que um trabalho, muito mais que um meio para conseguir um fim. A música, o silêncio, a escuridão e o público.

Mas naquela noite não tinha escapatória. Como muito menos a tinha tido nos cinco dias anteriores.

Cinco dias com as suas cinco noites. Dias a correr para o banco e à espera de um telefonema que salvasse a sua avó, morta de medo pelas suas dívidas.

Nada em comparação com a agonia das noites. Noites à espera de um outro tipo de telefonema, dando voltas e vendo a lua a passar.

Não tinha refúgio.

Naquela altura, enquanto dançava, os seus movimentos e emoções estavam vazios, nada comparado com a forma como se tinha sentido com Zavier.

Uma aventura de uma noite. Toda a gente sabia o que aquilo queria dizer. Sexo por sexo e adeus sem olhar para trás.

Para ela, não tinha sido assim. Não podia deixar de o recordar. Zavier tinha-a feito alcançar a glória para, a seguir, a envergonhar e humilhar.

Ainda assim, tinha alcançado a plenitude nos seus braços e tinha-se sentido desejada.

Desejada, sim, desejada.

Desejada por Zavier.

A palavra retumbou-lhe na cabeça. Era uma partida da sua consciência.

Quando desceram o pano, não teve pressa para ir para casa. Não se queria ver novamente sozinha naquela enorme cama.

Enquanto se despia e retirava a maquilhagem, Tabitha teve a sensação que os risos e os guinchos de júbilo que acompanhavam as bailarinas todas as noites depois da representação eram outro idioma.

- Há um tal de senhor Chambers que está a perguntar por ti - anunciou Marcus.

Aiden costumava ir buscá-la frequentemente ao camarim com qualquer desculpa para ir beber um copo com ela. Nunca tinha gostado de beber sozinho.

- Qual é a desculpa de hoje? - Tabitha sorriu. O canário morreu ou...

Interrompeu-se ao ver o rosto de Zavier.

- Nada tão dramático - respondeu e entrou. Os bailarinos observaram-no sem ocultar a sua admiração.

- Vou para os Estados Unidos amanhã e queria falar contigo sobre uns quantos detalhes.

- Detalhes? - repetiu Tabitha, confusa.

De repente, viu que a única coisa que tinha vestida era uma tanga. Era normal que os bailarinos estivessem nus nos camarins, mas o que não era normal era Zavier estar ali.

Tinha pensado que, quando o voltasse a ver, ia estar calma e controlada, mas não pôde evitar corar como uma criança pequena.

- Sobre o casamento... só faltam quatro semanas e temos muitas coisas para decidir. Marcusacrescentou. - Há algum sítio mais privado? Parece que a minha noiva precisa de se sentar.

Como sabia o nome do encenador? Tabitha não conseguia articular sequer uma palavra. Vestiu-se à pressa, mas pareceu-Lhe uma eternidade, pois tinha muitos olhos pousados nela, começando pelos dos seus companheiros e chefe e acabando nos de Zavier, que eram os que mais a irritavam.

- A que propósito vem tudo isto? - gritou mal estavam sozinhos enquanto ele tirava uma garrafa do frigorífico da suite. - Como te atreves a apresentar-te aqui? Como te atreves a dizer uma mentira destas? São os meus colegas de trabalho.

- As mulheres da familia Chambers não trabalham - respondeu Zavier servindo dois copos de champanhe.

- Zavier, o que se passa?

- É muito simples - respondeu Zavier oferecendo-lhe um copo. - Nós.

Nós?

Nós. Tu e eu. Ele e eu. Eu e tu. Os dois.

- O que se passa connosco?

- Vamos casar-nos.

Tinha-o dito com tanta naturalidade que Tabitha teve dificuldade em reagir.

- Vamos casar-nos? - conseguiu dizer.

- Exactamente - assentiu Zavier.

- Queres que me case contigo?

- Voltaste a acertar.

Tabitha abanou a cabeça. Devia estar a sonhar. Sim, seria o sonho de qualquer mulher que um homem como Zavier Chambers a pedisse em casamento, mas tinha-o dito sem qualquer sinal de amor.

- Porque raio queres que me case contigo? quis saber.

- Porque, por uma vez, uma das ideias de Aiden faz sentido.

- Só acedi ir com o teu irmão a um casamento. A proposta de casamento surpreendeu-me tanto como a ti. Porque não acreditas em mim quando digo que não persigo o teu irmão? Nunca o fiz. Aceitei acompanhá-lo ao casamento da tua prima para o ajudar, não para o enganar. Para que saibas, no dia seguinte voltou a pedir-me que me casasse com ele e voltei a dizer-lhe que não.

- Eu sei - respondeu Zavier observando as unhas com tranquilidade. - Admito que me surpreendeu. Querias mais alguma coisa?

Tabitha negou com a cabeça, mas ele nem a viu.

- Não me admira. A final, Aiden não é uma aposta segura - sorriu secamente. - Sabemos que gostas de arriscar, como no jogo, não é? Mas para quê arriscares-te com um pintor sem receitas que se poderia ver deserdado? Porquê arriscares que a sua família soubesse do engano e ficares sem nada?

- Não entendes nada.

- Nada disso, mas ganhaste. Levas ojackpot.

- Que jackpot? - perguntou Tabitha nervosa. Perdi-me - suspirou provando o champanhe para não ter que enfrentar os seus olhos.

- Por uma vez na sua vida, o meu irmão teve uma boa ideia.

Observou-a enquanto Tabitha se sentava diante do espelho, tirava o batom vermelho e soltava o cabelo.

Zavier recordava perfeitamente a textura daqueles caracóis e verificou que estava a apertar os punhos para não atravessar o quarto e ajudá-la a tirar os ganchos.

- A ver se entendes - disse indo para o pé dela com o livro de cheques na mão.

- Estás a brincar, não estás?

- Nunca falei mais a sério na minha vida. Tabitha continuou a tirar os ganchos, cada vez mais rápido, sem afastar os olhos do espelho. Não queria sequer ver o cheque, não queria sequer saber que astronómico valor estava disposto a oferecer pelos seus serviços.

- Olha - instou-a Zavier. - Não é todos os dias que te oferecem semelhante quantidade de dinheiro.

- Não é todos os dias que pensam que sou uma fulana qualquer - replicou Tabitha.

Zavier fez uma expressão de desagrado. Aquela frase tinha-lhe assentado como uma bofetada na cara.

- Não foi essa a minha intenção - disse soando sincero. - É apenas uma solução para o problema.

- Que problema?

- Tens problemas económicos graves e eu tenho um pai que morre de vontade por ver um dos seus filhos casado. Nenhum de nós tem muito tempo. Eu, pela saúde do meu pai e tu, pelo que Aiden me disse, porque estás cheia de dívidas.

- Isso não é verdade! - exclamou levantando-se.

- Ah, não? Então porque é que precisas de dinheiro?

Tabitha abriu a boca para explicar a sua situação, mas decidiu não o fazer. Se lhe contasse que as dívidas eram da sua avó, adeus a Zavier Mesmo que a sua proposta de casamento fosse ridícula, morria de vontade de estar mais dez minutos com ele.

- Não quero falar disso.

- Claro - replicou Zavier. - Estou a oferecer-te uma solução, a forma de solucionar os nossos problemas acrescentou aproximando-lhe o cheque.

Tabitha olhou-o e ficou paralisada.

- É apenas uma parte.

- Uma parte?

- O primeiro pagamento - explicou-lhe Zavier como se estivessem a fechar um negócio. Dar-te-ei o mesmo depois do casamento e o dobro ao fim de seis meses, desde que tenhas sido sempre uma boa mulher.

- Uma boa mulher?

- Nada de escândalos, nada de falar com a imprensa e nenhuma objecção a um divórcio rápido.

- D... divórcio? - repetiu Tabitha começando a sentir-se um logro.

Aquela conversa era ridícula.

Zavier sorriu.

- Não te peço a vida inteira, só seis meses - explicou encolhendo os ombros. - Deram três meses de vida ao meu pai. Seis meses parece-me um prazo aceitável, assim não irão achar que me deixaste justamente depois da sua morte. Não quero arruinar a tua reputação.

- Não, só a minha auto-estima.

- Isso já o fizeste sozinha - disse.

Tabitha corou ao recordar o pouco que tinha demorado a meter-se na sua cama, mas de repente deu conta de que Zavier não se referia a isso.

- Quero que fique bem claro que nada de voltar a jogar. Dado o teu vício pelo jogo e a natureza do nosso casamento, entenderás que não vais ter assinatura nas minhas contas, mas asseguro-te que receberás uma boa quantia por mês. Aiden disse-me que as dívidas que tens são por ires ao casino, por isso não voltarás lá a não ser que seja comigo. Pelo menos, enquanto estivermos casados. O que fizeres depois não me diz respeito. Quando nos divorciarmos, por mim, tanto me dá se deitares tudo a perder, mas não creio que fosse uma má ideia que aproveitasses estes seis meses para fazeres um tratamento. Pagar-te-ei com gosto um especialista.

- Não será necessário.

- Bem - suspirou Zavier. - Os viciados são sempre os últimos a reconhecer que têm um problema. Se mudares de opinião, diz-me. Em qualquer caso, está tudo estipulado no contrato.

Tabitha estava prestes a repetir a última palavra quando o viu tirar dois documentos da mala.

- Sugiro-te que te sentes a lê-lo porque é longo e quero que estejas muito segura de onde te vais meter antes de o assinares.

Falava como se ela tivesse dito que sim.

- Pensas mesmo que vou aceder a uma proposta tão ridícula? - gritou furiosa.

- Claro que sim - respondeu Zavier muito seguro de si. - O dinheiro que te ofereço vai mudar-te a vida.

- Gosto da vida que tenho, obrigada.

- Quanto tempo pensas que vais poder aguentar assim, Tabitha?

Tabitha preparou-se para ouvir outro sermão sobre o jogo, mas as palavras que Zavier pronunciou devolveram-na a uma realidade muito mais crua e horrível.

- Durante quanto tempo vais poder ganhar a vida a dançar?

- Ainda não tenho trinta anos - respondeu indignada.

- Não, mas quase - apontou Zavier sem piedade. - Além disso, pediram-te para fazeres a audição para um espectáculo que até agora tinha sido teu sem qualquer dúvida.

- É só uma formalidade - disse Tabitha. - Aiden não tinha direito de to contar.

- Somos irmãos - respondeu Zavier enco lhendo os ombros. - Não foi mais que uma conversa normal e corrente. Disse-lhe que tinha lido um artigo sobre como é difícil conseguir um bom papel em Melbourne e a quantidade de bailarinas que andam há procura de trabalho...

Tabitha olhou-o com o sobrolho franzido.

- Não me lembro de ter lido nada parecido e, para que saibas, leio os jornais. Não sou inculta.

- Mas o meu irmão sim - disse Zavier. - Tens razão, não foi publicado nenhum artigo deste âmbito, mas bastou inventá-lo para que Aiden cantasse como um passarinho e me confessasse como é difícil dançar para a sua cada vez mais querida Tabitha, e como é duro este mundo para uma criatura delicada como tu.

- Porque te interessas tanto pela minha profissão? - Tabitha riu-se.

- Não me interessa - respondeu Zavier coçando a cabeça. - Tu sabes o que se costuma dizer: saber é poder. Tenho a certeza que antes os agentes discutiam por tua causa, mas agora, não é isso que te coloca numa situação financeira delicada, pois não?

- Poderia trabalhar noutra coisa. Num gabinete, por exemplo.

- Vestida assim? - perguntou-lhe Zavier observando as suas longuíssimas pernas e a sua curtíssima mini-saia. - O vestido que Aiden te comprou serviria para o primeiro dia, mas e depois? Não tens dinheiro para comprar um guarda-roupa novo.

- E porquê eu? - perguntou-Lhe confusa. - Porque arriscas a tua reputação...

- Porque me posso permitir a isso - respondeu Zavier. - Uma bailarina com problemas de jogo não me arruinará, não te preocupes.

- Porque não fizeste a proposta a Amy? Ela queria casar-se contigo.

- Porque ela queria fingir que era por amor - respondeu Zavier irritado. - Pode parecer-te que é muito dinheiro, mas asseguro-te que a minha verdadeira mulher, a mãe dos meus filhos, terá muito mais. Contigo, Tabitha, seria uma relação de negócios. Dessa forma, transformar-te-ias numa divorciada rica e o meu pai morreria tranquilo porque viu um dos seus filhos casado e com possibilidade de ter descendentes.

- Tenho de engravidar? - perguntou Tabitha com sarcasmo.

- Não, claro que não. Nada de crianças. Não vamos brincar com a vida de um bebé. Espero que tomes as devidas precauções e, antes que me digas que sou um chauvinista, dir-te-ei que a atracção que há entre nós é inegável. Na outra noite, quando fizemos amor, deixámo-nos levar e nenhum tomou medidas. Antes de continuar preciso de saber se pode haver consequências.

- Consequências?

- Estás grávida? Se estiveres, muda tudo.

- Já não haveria contrato? - troçou Tabitha.

- Digamos que seria tudo mais complicado. Preferiria que não estivesses grávida, mas se estás estou disposto a encarregar-me das minhas responsabilidades. Estás grávida?

Tabitha corou. Falar do seu período com aquele homem era a última coisa que lhe teria passado pela cabeça. Receber uma proposta de casamento tão estranha também não era muito normal. No entanto, ouvi-lo falar de casamento e de crianças tinha feito com que saltasse para o mundo da fantasia.

A semente de Zavier no seu interior, crianças morenas parecidas com o pai, sentir o corpo de Zavier à noite, acordar ao seu lado e fazer amor sem parar.

- Tabitha, estás grávida? - repetiu.

- Não.

- Tens a certeza?

- Queres ir a uma farmácia para comprar um teste de gravidez?

- Talvez o devêssemos fazer, mas vou confiar em ti. Como vamos partilhar uma cama durante seis meses, repito que teremos de tomar precauções.

- Estás muito seguro, não estás?

- Sim - respondeu Zavier.

Sim", pensou Tabitha. Era inevitável fazer amor com ele durante tanto tempo.

Aquele homem tinha-a amado e tinha feito com que se sentisse mais viva e mais mulher que nunca. Não estava a ser arrogante, apenas realista. Partilhar uma cama com ele e não lhe tocar, não o abraçar, não se apertar contra ele seria como não poder respirar.

- São seis meses, Tabitha. Assina.

Tabitha viu que lhe estava a oferecer uma caneta.

- Queres que assine assim, sem mais nem menos?

- Claro que não - respondeu Zavier irritado. Quero ler o contrato inteiro contigo. Sei que vais querer mudar certas coisas, mas aviso-te que não sou fácil de convencer.

Tabitha apercebeu-se que a conversa tinha mudado. Do horror inicial, tinha passado para a estupefacção para terminar acedendo tacitamente.

Como tinha acontecido?

Tabitha sentiu a cabeça às voltas e tentou ignorar a sua proximidade quando Zavier se sentou ao seu lado disposto a aclarar o documento que ia mudar a sua vida.

- Vamos casar-nos daqui a quatro semanas. A minha família tem uma casa de Verão em Lome, na praia. É muito bonita e o meu pai guarda de lá boas recordações. Se te parecer bem, faremos a cerimónia no jardim. A não ser que sejas muito religiosa e prefiras casar-te numa igreja...

- Mesmo que fosse, dadas as circunstâncias, creio que é melhor não me casar pela igreja - respondeu Tabitha.

- Bem, concordamos em algo.

Tabitha fixou os olhos no contrato.

- Tem vinte páginas - queixou-se. - Temos de o ler todo?

- Sim - respondeu Zavier.

- Não podemos, pelo menos, comer alguma coisa? Estou a morrer de fome.

- Uma última coisa que deves assimilar antes de dizeres que sim: Já não és anónima.

Tabitha olhou-o fixamente e Zavier não disse nada ao vê-la mordiscar pensativa a ponta da sua caríssima caneta.

- Quando estivermos noivos, serás uma Chambers com tudo o que isso significa. Dentro de um mês serás perseguida.

- Como?

- Sim, haverá sempre um jornalista a vigiar-te para ver se metes a pata na poça e poder tirar proveito disso. Se fôssemos agora a um restaurante e nos puséssemos a discutir um contrato pré-nupcial, estaríamos nos jornais daqui a meia hora. Quero que entendas. Vivemos assim.

- Aiden, não.

Zavier meneou a cabeça.

- És muito boa actriz ou és mesmo muito inocente? Aiden está a morrer de medo que o meu pai saiba que é gay. Porque pensas que te levou ao casamento? A imprensa já fez uma série de comentários sobre o facto de não levar uma acompanhante aos eventos sociais. Acreditavas mesmo que te levava porque és delicada?

- Na verdade, sim.

- Por favor.

- Creio que te custará acreditar, mas Aiden aprecia-me tal e qual como sou. Não tentes meter veneno na nossa amizade. Não serias bem sucedido. Se a tua família não tivesse tantos preconceitos e fosse mais tolerante, não teria sido obrigado a levar-me - sentenciou lendo o contrato.

Estava tudo contemplado, mesmo os direitos maritais na página dezoito. Tinha centenas de cláusulas e subcláusulas. Consentimento, protecção, duração da união... as palavras dançavam-lhe na cabeça. Como se podia transformar algo tão bonito em algo tão pragmático?

- Lamento - desculpou-se Zavier como se lhe tivesse lido o pensamento, - mas tinha de o incluir. Seria uma palermice não falar de divórcio quando sabemos que vai acontecer.

Tabitha assentiu.

- Seria uma loucura não deixar tudo escrito.

- Claro.

- Creio que está tudo. Alguma pergunta? Soava tudo tão frio.

- Sim, uma - respondeu Tabitha tentando dissimular o seu nervosismo. - De que signo és?

- Como? - disse Zavier olhando para o contrato.

Tabitha riu-se ao ver a sua reacção.

- A resposta não está aqui - indicou. - Tens de me dizer o teu signo do Zodíaco e tens de saber o meu.

- Para quê?

- Para olhar para o jornal todas as manhãs e saber se o outro vai ter, ou não, um bom dia, se vai ou não ser romântico, essas coisas. Não fazes sequer ideia do que estou a falar, pois não?

Zavier negou com a cabeça.

- Uma das primeiras coisas que a tua mãe te perguntará é qual é o meu signo do Zodíaco.

- Nada disso. Conheço a minha mãe e não dá nenhuma importância a essas palermices.

- Conhece-la como mãe, mas não como mulher. Todas as mulheres gostam dessas coisas. Se te perguntar de que signo sou e não souberes responder, estamos perdidos.

- Balança.

- Ena - disse Tabitha surpreendida. - Foste prematuro? - acrescentou.

As pessoas do signo balança eram carinhosas, ternas e boas.

- Não - respondeu Zavier. - E tu de que signo és?

- Virgem - respondeu Tabitha fazendo-o rir.

- Vês? São palermices.

E, de repente, as páginas do contrato acabaram-se e restava apenas um espaço para assinar e colocar a data.

Tabitha verificou que, se aceitasse, teria de o amar e adorar em público sem o envergonhar, cumprindo sempre à linha o contrato. Poderia ter tudo: o seu dinheiro, o seu respeito, o seu corpo, a sua cama. Tudo menos uma coisa da qual não se falava no contrato.

O seu amor.

- É um contrato mercantil - disse Zavier sentindo as suas dúvidas.

Tinha dito aquilo para a fazer sentir-se melhor. Então, por que é que os seus olhos se encheram de lágrimas?

- Empresto-te o meu coração e tu pagas as minhas facturas?

- Algo assim - respondeu Zavier incrivelmente terno.

Segurou-Lhe na cara entre as mãos e limpou-lhe uma lágrima que tinha deslizado pela face. Aquele gesto, impensável minutos antes, deixou-a ainda mais confusa.

- É um bom contrato, Tabitha. Ninguém perde. Como lhe podia dizer aquilo quando teriam de se separar passados seis meses?

- Não precisamos de testemunhas?

- Não, só tempo.

O homem de negócios tinha regressado. Levantou-se e guardou o contrato na mala. Tabitha deu conta que não tinha que aceitar imediatamente e perguntou para si porque tinha tanta pressa para assinar.

- Reflecte sobre isto na tua almofada - disse Zavier. - Não quero que te sintas obrigada.

Tabitha segurou o cheque e devolveu- o com as mãos a tremer.

- Toma, não vá eu fugir com o teu dinheiro - tentou rir-se.

Zavier negou com a cabeça.

- Não creio que sejas tão estúpida - respondeu.

- Vamos, veste-te que eu também estou a morrer de fome.

- Já estou vestida - disse Tabitha. - Não estou bem?

- Bem pelo contrário - Zavier riu- se, sincero. Estás tão bem que me estava a perguntar como vou aguentar um jantar de três pratos.

 

- O que dizemos a Aiden? - perguntou Tabitha enquanto um dos empregados do luxuoso restaurante lhe enchia o copo de vinho.

- Nada - respondeu Zavier.

Tabitha decidiu telefonar-lhe na manhã seguinte para Lhe contar o que acontecera. Queria que soubesse por ela.

- Diz-Lhe simplesmente que te fizeram uma oferta que não pudeste rejeitar.

- Posso dizer-Lhe a verdade? Posso dizer-lhe que é apenas um contrato mercantil?

Zavier franziu o sobrolho.

- Vai perceber de todos os modos. Afinal, a ideia foi dele.

- Está bem - concedeu Zavier. - Mas só a Aiden. Estou a falar a sério, Tabitha. Nem à tua melhor amiga, nem ao teu cabeleireiro, nem aos teus pais.

Tabitha agarrou no copo com força.

- Estão mortos.

- Assim, pelo menos, não terás de lhes mentir - respondeu Zavier sem um pouco de compaixão. Não me estranha que Aiden e tu sejam amigos. São exactamente iguais.

- Não nos parecemos em nada - protestou Tabitha.

- Como não? Nunca se tiveram de preocupar com a hipoteca. De certeza que a tua casa é herdada, não é?

- E o que é que isso tem a ver?

- Muito. Explica por que tens essa atitude tão indulgente com o dinheiro. Passaram a vida a fantasiar. Deve ser muito bom dedicar-se à dança quando não se têm responsabilidades, nem sequer com a hipoteca de uma casa.

- Que amargurado que estás - replicou Tabitha.

Zavier limitou-se a encolher os ombros.

- Sou realista.

- Um realista amargurado.

- Pode ser que sim - concedeu. - Conhecemo-nos no casamento de Simone e foi amor à primeira vista - acrescentou baixando a voz. - Estamos apaixonadíssimos, de acordo? É o que va mos dizer a toda a gente. Nada de acrescentar detalhes, nada de improvisações. Há que consultar sempre tudo primeiro um com o outro.

- E os teus pais não vão achar estranho? - perguntou Tabitha mordendo o lábio.

- Porquê? Aiden disse que eras uma boa amiga. Recorda-te, conhecemo-nos no casamento.

- Foi amor à primeira vista... - continuou Tabitha enquanto Zavier levantava o seu copo para brindar.

- E estamos apaixonadíssimos - concluiu ele enquanto os seus copos se encontravam. - Muito bem, estás a compreender a ideia.

Sem entender o porquê, Tabitha corou.

- Enquanto fingirmos bem, toda a gente acreditará.

- Estou um pouco nervosa. Nem eu acredito, quanto mais saber o que vou fazer para que os outros acreditem.

- Porque não iriam acreditar?

- Não sei, é normal apaixonar-se tão rápido?

- Quem falou de amor? Os meus pais, por exemplo, o amor não lhes diz nada. O importante é que vou casar-me.

- Falando dos teus pais, como lhe vamos dizer?

Nesse momento, apareceu um homem muito sorridente que se dirigiu a Zavier.

- Senhor Chambers, está tudo a seu gosto? Obviamente, era o dono e gostava de tratar bem a sua clientela.

- Agora que o mencionas, Pierre, a verdade é que não - respondeu Zavier elevando o tom de voz.

Tabitha deslizou-se pela cadeira, corada. Toda a gente estava a observá-los.

Pierre estalou os dedos e apareceram vários empregados.

- Qual é o problema, monsieur? Diga agora mesmo para que o possamos solucionar.

Zavier sorriu encantado e Tabitha corou ainda mais quando lhe agarrou na mão, a beijou e sentiu a sua língua na palma.

Então, esqueceu-se dos presentes e só foi capaz de se fixar nos olhos de Zavier, que não se afastavam dos seus.

- O problema é que...

- Oui - Pierre estava desesperado para poder solucionar o que estivesse mal.

- Não há champanhe. Pierre, o que seria de um pedido de casamento sem uma garrafa do teu meLhor champanhe?

Mais um estalar de dedos, movimento de empregados, garrafa de champanhe aberta e borbuLhas nos copos.

Entretanto, Zavier tinha tirado uma pequena caixa de veludo preta do bolso.

- Ainda não te disse que sim - sussurrou Tabitha aborrecida.

Mas Zavier pôs-lhe a caixa na mão e apertou-a.

- Amanhã podes devolver-ma se quiseres - respondeu-lhe.

Tabitha abriu a pequena caixa e ficou a olhar para o interior com os olhos muito abertos. Era o maior e mais escuro rubi que algum dia tinha visto. Simples e elegante, o mais bonito que tinha visto na sua vida.

- Pareces surpreendida.

Tabitha engoliu em seco e agarrou- Lhe na mão porque sabia que os estavam a observar.

- Não me pagas para isso?

- Tem um colar a condizer - Zavier riu-se. Deveria dar-to no nosso quadragésimo aniversário de casamento.

Inclinou-se para lhe dizer algo ao ouvido. Claro, pareciam um casal de apaixonados com toda a vida pela frente para estarem juntos. Inclusive Pierre ficou com os olhos cheios de lágrimas quando Zavier a abraçou.

- O anel é um empréstimo. Dar-te-ei outro do mesmo valor depois do divórcio. Não me leves a mal querida. É uma jóia de familia e é na familia que vai ficar - disse-lhe.

O único consolo que restou a Tabitha foi a sincera admiração de Zavier quando a viu prestes a chorar.

- Deverias ter sido actriz em vez de bailarinadisse-Lhe.

Quando lhes serviram o primeiro prato e os empregados desapareceram, puderam falar à vontade outra vez.

- Não me respondeste. Como vais contar às pessoas?

- Isso já está arranjado.

- Disseste antes de me fazeres a proposta? Estavas assim tão seguro da minha resposta?

- Não, à primeira pergunta e sim, à segunda.

Tabitha olhou-o perplexa.

- Vais ver.

Apesar de tudo aquilo ser uma grande mentira, estar sentada ali com ele permitiu que visse um lado diferente de Zavier, que podia ser amável e divertido... inclusive sensível.

Talvez fosse o champanhe ou os crepes com chocolate. Talvez, a companhia. Fosse o que fosse, quando viu chegar a conta numa bandeja de prata, Tabitha sentiu-se como uma criança pequena a desmontar a árvore de Natal.

Naquele momento, agarrou na carteira para pagar a sua parte, mas controlou-se a tempo. Zavier apercebeu-se.

- Muito bem, vejo que aprendes rápido - felicitou-a.

Pierre foi despedir-se deles com um sorriso de orelha a orelha.

- Não sabe a satisfação que me deu por ter escolhido o meu restaurante para uma ocasião tão especial. Senhor Chambers, permita-me que lhe diga que tem uma noiva realmente bela. Fazem um casal maravilhoso. Como se conheceram?

- Num casamento da família - respondeu Zavier agarrando-lhe na mão. - Há poucos dias, mas é como se nos conhecêssemos desde sempre. Esta mulher roubou-me o coração.

Pierre estava encantado com a história.

- Que romântico! - exclamou.

-É verdade? - disse Zavier levantando- se e segurando novamente na mão de Tabitha.

Ao sair para a rua, ela deixou escapar um suspiro:

- Pensas que acreditou?

- Porque não acreditaria? Creio que estivemos muito bem. Além disso, correu muito bem.

- Não te entendo.

- Ainda tens muito para aprender.

- Mas o que tem Pierre a ver com tudo isto? Parecia realmente encantado com o nosso casamento.

- Realmente encantado com a publicidade, quererás dizer.

Tabitha abriu a boca para continuar a perguntar, mas sentiu o peso do corpo de Zavier contra o seu que, literalmente, a golpeou contra a parede.

Naquele instante, sentiu a sua boca procurando os seus lábios e o corpo a apertar-se contra o seu. Não sentiu medo apesar da sua actuação não estar a ser nada subtil.

Sabia a champanhe, a decadência e a perigo. Tabitha teria adorado não o desejar, poder afastá-lo, mas não foi assim. De facto, foi tudo o oposto. Passou-lhe os braços pelo pescoço e beijou-o com paixão.

A sua erecção revelou que estava tão excitado como ela. Por um segundo, acreditou que ia cometer a loucura de a possuir ali mesmo, e o mais louco de tudo era que o teria deixado fazê-lo.

Aquele homem tinha terminado com os seus preconceitos e com os valores que regiam a sua vida, mas afastou-se da mesma forma inesperada como se tinha lançado sobre ela.

- Está tudo controlado - arquejou com um sorriso triunfal.

Caminharam pela margem do rio, em silêncio. Tabitha ainda sentia o seu beijo e o seu corpo era um armazém de puro desejo.

A cada passo, parava e observava o fabuloso anel que luzia na sua mão. Precisava de saber que não estava a sonhar.

- Olha - disse maravilhada.

Zavier parou e olhou para um desenho a giz que estava no chão. Era um auto-retrato e o autor estava sentado ao lado, com os mesmos olhos tristes e o corpo esquelético, horrível recordação do mundo tão injusto no qual viviam.

Tabitha pensou que ia fazer algum comentário pejorativo, mas surpreendeu-se.

- É muito bonito - ouviu-o a dizer de forma sincera. - Poderias pintar a minha noiva?

O jovem assentiu e indicou a Tabitha que se sentasse também.

Tabitha quis ir-se embora, mas o pintor já estava a trabalhar e pensou que seria injusto negar-lhe o dinheiro suficiente para poder jantar.

Enganava-se. Quando Zavier viu o desenho terminado, deu-lhe tal quantidade de notas que aquele homem ia ter jantar para vários dias.

- Posso vê-lo? - perguntou Tabitha.

Zavier desenrolou-o.

- É lindo - admirou ela. - Não quero dizer que eu o seja, mas sim a obra - apressou-se a rectificar corada.

- A obra é bonita porque tu o és - sentenciou Zavier.

- Aiden vendeu um quadro.

Ao mencionar o seu irmão, Zavier acelerou o passo e Tabitha quase teve de correr para o alcançar.

- Tem muito talento, sabes?

- Palermices. De certeza que a pessoa que lho comprou não percebe nada de arte.

- Porque és tão duro com ele?

- Porque odeio que perca tempo, que passe a vida a sonhar, sem enfrentar as suas responsabilidades.

- Porquê?

- Porquê? - disse voltando-se e agarrando-Lhe no braço. - Pensas que não tenho sonhos, Tabitha? Pensas que gosto de estar todo o dia metido num gabinete a olhar para a mesa?

- Mas adoras o teu trabalho...

- Quem disse? Aiden? A minha mãe? Enganam-se.

- Então, por que o fazes? Zavier riu-se amargurado.

- O meu pai deu a vida por essa empresa. Quando se reformou, alguém tinha de se encarregar dos casacos de pele, das jóias e mansões da minha mãe ou do uísque e dos fatos de grandes estilistas do meu irmão. Transformei a empresa familiar num império para que a minha família pudesse continuar a viver como estavam acostumados. Se me tivesse desinteressado, como Aiden fez, não teríamos morrido à fome, claro, mas não viveríamos tão bem como agora.

- E depois? O dinheiro não é tudo. Sei que pensas que só procuro isso na minha vida, mas não é verdade. Para mim, o dinheiro é secundário. Se não o quisesse fazer, não o teria feito.

- O que podia fazer? Deixar que o sonho do meu pai se evaporasse e, com ele, o seu casamento?

- Não me digas que estão juntos apenas por dinheiro.

- Não sei, mas a minha mãe nunca olhou para o preço de um vestido nem perguntou preços para voltar a decorar a casa quando teve vontade, nem para construir uma piscina ou um campo de ténis. Não a imagino a sobreviver com pouco dinheiro. Se Aiden me tivesse ajudado, indo ao escritório por exemplo duas vezes por semana, talvez ambos pudéssemos ter uma vida fora do trabalho.

Tabitha verificou que tudo na vida tinha duas versões. De repente, a vida de Aiden pareceu-Lhe menos romântica e boémia.

Perseguir o seu sonho, tinha acabado com os do seu irmão. Pensou que o seu amigo era um pouco egoísta, mas...

- Tem talento, Zavier - insistiu. - Não é só um sonho.

- Diz a bailarina ao analista financeiro - comentou Zavier com sarcasmo.

Tabitha não deixou que a espezinhasse.

- Sou uma boa bailarina - respondeu, - mas não sou brilhante - acrescentou perplexa. - posso acreditar no que acabei de dizer. Sempre me enganei dizendo-me que uma noite alguém viria ver-me dançar e me descobriria. Agora sei que isso não vai acontecer. Dói, mas é assim.

Zavier olhou-a com expressão sombria.

- Mas Aiden é diferente, tem mais talento no dedo mindinho que eu em todo o corpo. Pinta quadros de tal forma bonitos que as lágrimas caem. Não só a mim - assegurou. - Deverias ir à galeria para os veres, observar as reacções das pessoas quando os vêem. Deverias levar o teu pai de passagem - acrescentou. - Talvez o teu irmão tenha actuado de forma egoísta para cumprir o seu sonho, mas tendo tanto talento, creio que não tinha escolha.

Zavier não respondeu.

O apaixonado discurso de Tabitha flutuava no ambiente. Não era necessário comentá-lo. Enquanto continuavam a andar, Tabitha perguntou-se se se teria importado com o que lhe dissera. Zavier estava tão calado que soube que o serão estava a chegar ao fim.

Aterrorizada, deu conta que não queria que terminasse.

Ao passar em frente ao casino, olhou para a porta, repleta de gente, e Zavier interpretou mal o seu interesse.

- É ali que gastas o dinheiro?

- O que se passa? Pensas que venho a correr para cá depois de me deixares em casa? - brincou Tabitha.

Mas Zavier não estava para brincadeiras.

- Vamos - disse dirigindo-se para o interior.

- Pensava que era território vedado - objectou Tabitha não querendo entrar por medo que Zavier visse que não tinha sequer vontade de jogar.

Por outro lado, aquilo significava passar mais tempo com ele, e isso alegrava-a.

- Ainda não assinámos o contrato. Em qualquer caso, nele está que podes vir ao casino desde que eu esteja contigo.

- E porque me quererias trazer? E porquê esta noite? E outra das tuas provas?

- Temo que sim! - Zavier sorriu. - Muitos clientes gostam de vir e vai tocar-te acompanhar-me de vez em quando.

- Ah, entendo. Queres ver se sou capaz de me controlar ou se, pelo contrário, vou tirar um baralho de póquer durante o jantar ou cair rendida ante as máquinas automáticas.

- Parece-me que as máquinas automáticas não os satisfazem. Os meus clientes apostam mais alto.

- Zavier sorriu. - Jogas nas máquinas? É lá que deixas o dinheiro?

Tabitha assentiu. Na verdade, só tinha jogado uma vez e tinha perdido vinte dólares. Não era a viciada que Zavier pensava que era. Só nos sapatos.

Entraram no casino e passaram diante das melhores lojas de moda da cidade.

- Quando não têm etiqueta é porque são caríssimos - comentou Tabitha colando o nariz a uma montra. - Que maravilha.

Zavier olhou-a, ligeiramente rosada por causa do champanhe, com aqueles maravilhosos olhos verdes e aquele cabelo que lhe caía sobre o delicado pescoço, e esteve quase a concordar, mas então verificou que Tabitha falava de outra coisa.

- Mas são apenas uns chinelos para andar por casa - troçou.

- Não - respondeu Tabitha indignada. - São umas socas... e são lindíssimas.

- Gosto do vestido - disse Zavier. - Ficava-te bem.

- Não mo posso permitir.

- Onde queres ir? - perguntou Zavier. Tabitha não fazia ideia, mas aceitou a sua mão e deambularam um pouco entre as pessoas. Olhou-o de lado e viu que, dada a sua graça e natural elegância, toda a gente se voltava para o observar.

Estava a passar um bom bocado, sim, era verdade. A noite continuava e ela estava a divertir-se.

- Porque sorris?

- Porque me estou a divertir.

- Claro. É o efeito do casino, não é? - disse Zavier.

Tabitha largou a sua mão e parou.

- O que se passa agora? - disse ele voltando-se irritado. - Gostaste de um anel de Tiffany ou algo assim?

- Não, estava a pensar que corre tudo muito melhor quando és amável.

- Ah - respondeu ele envergonhado.

- Se queremos que isto funcione, Zavier, deveriamos tentar, pelo menos, ser amáveis um com o outro e não apenas quando estivermos com mais pessoas. Vão ser seis meses muito longos se passarmos o dia inteiro a fazer com que a vida do outro seja impossível.

- De acordo - murmurou Zavier.

- Sei que és o rei do sarcasmo, mas não é preciso que me recordes os meus defeitos, pode ser? Sim, é verdade que não há amor na nossa união e que vou sair dela com um bom beliscão, mas recordo-te que tudo isto foi ideia tua, não minha.

- Sim, sim - respondeu Zavier.

- Isso não é amável da tua parte - apontou Tabitha.

O efeito do champanhe e a euforia de ter os problemas da sua avó solucionados tinham-lhe dado audácia suficiente para dizer tudo aquilo e queria, já que tinha tomado balanço, continuar, mas encontrou-se novamente com a sua boca.

- E isto? Parece-te melhor? - perguntou Zavier depois de a beijar com paixão.

Sem esperar uma resposta, agarrou- lhe na mão e misturaram-se entre a multidão. Tabitha entendeu como tinha começado o problema de jogo da sua avó. As luzes, o ruído, as pessoas... era emocionante. Tabitha entendeu o efeito que aquilo tinha numa mulher sozinha.

Enquanto Zavier ia buscar as bebidas, Tabitha sentou-se diante de uma máquina de póquer e tentou disfarçar que controlava o esquema quando, na realidade, não sabia sequer onde estava a ranhura das moedas.

Quando ele voltou, Tabitha apressou-se a carregar em todos os botões e os vinte dólares evaporaram-se em dois minutos.

- E agora? - perguntou sorridente.

- Pensava que ias passar horas a jogar - respondeu Zavier. - Estás a tentar demonstrar-me que consegues controlar- te?

- Mais ou menos - mentiu Tabitha perguntando-se como é que as pessoas conseguiam passar, efectivamente, horas diante daquelas máquinas.

Claro que nem toda a gente tinha uma distracção tão maravilhosa como aquele homem.

- Vamos já para casa? Zavier olhou-a atónito.

- Contava ter de te tirar daqui a gritar e a discutir - respondeu.

- Pois, lamento - disse ela perdendo-se entre as pessoas.

Zavier seguiu-a e agarrou-lhe na mão para a conduzir a uma zona restringida do casino onde ninguém perguntava nomes nem pedia bilhetes de identidade.

- Para que me trazes aqui? - perguntou Tabitha.

- Para te ensinar uma lição - respondeu Zavier.

- Aqui, a aposta mínima são mil dólares. Vou ensinar-te como é fácil perder dinheiro.

- Não, Zavier, não - negou-se Tabitha.

Mas Zavier não lhe largou a mão.

- Já gastei vinte dólares. Isto está fora das minhas possibilidades.

- O que são vinte em vinte mil? Tudo nesta vida é relativo - disse Zavier.

Sentaram-se num sofá e por magia apareceram dois copos diante deles.

- O truque está em marcar um ponto e não o perder.

- Muito controlado da tua parte - troçou Tabitha. - Deve ser difícil ser sempre tão perfeito.

- Eh, pensava que tínhamos dito que nos íamos tratar bem - recordou-a Zavier.

- Sim, menos quando me dás sermões.

- Não te estou a dar nenhum sermão. Bom, talvez um pouco - admitiu, - mas é para o teu bem.

A diferença entre ser viciado no jogo e não o ser é saber parar, Tabitha.

- Muito bem, faz o que quiseres, mas não esperes que jogue contigo - respondeu ela nervosa ante a ideia de que fosse perder dinheiro para lhe explicar a sua ideia.

- Gostas mais das máquinas? - troçou Zavier.

- Vamos, não gozes comigo. Não queres jogar comigo porque não sabes.

- Olha, quero que entendas uma coisa. Não sou viciada no jogo - disse mesmo sabendo que ele não iria acreditar. - As dívidas que Aiden mencionou não são minhas, mas sim... da minha avó. Só vim aqui uma vez!

- Então, porque é que os teus olhos brilharam quando entrámos? Porque é que estás tão contente? Não negues agora que estás contente. Vê-se na tua cara.

- Porque pensas que será? Não é todos os dias que me propõem casamento. Não é todos os dias... - interrompeu-se ao compreender que não podia falar de amor.

- Tens um problema e sabes disso - insistiu Zavier. - Continua a negá-lo, muito bem, mas estás a enganar-te.

Tabitha ficou sentada enquanto ele se dirigia para a mesa de jogo. Ali, perguntou-lhe com os lábios se estava bem e ela assentiu.

Apesar do que parecia à primeira vista e dos sinceros esforços da sua parte para o parecer, Zavier Chambers não era uma má pessoa. De facto, era um bom homem.

Viu-o apostar sem esboçar qualquer expressão enquanto uma mulher se afastava a soluçar. Devia ter perdido uma fortuna.

De repente, verificou que se poderia ter ido embora sem perder nada. Deu um gole nervoso na bebida.

Levantou-se e caminhou na direcção de Zavier.

- Pensava que não gostavas - respondeu ele ao senti-la atrás de si.

- Deves ter razão - sussurrou Tabitha sentindo a sua embriagadora proximidade. - Não sei parar.

 

- Obrigada pela lição - disse Tabitha rindo-se enquanto Zavier parava o carro em frente da sua casa. - Definitivamente, curaste-me.

- Foi incrível, não foi? - riu-se ele também. Mesmo sem querer, hoje teria perdido até as chaves de casa. Mas ganhei uma fortuna! E isso aconteceu por tentar demonstrar-te que ages mal ao jogar.

- Lição aprendida - disse Tabitha com voz solene irrompendo às gargalhadas.

- És tão má... - disse ele num tom que fez com que ela parasse de rir imediatamente.

Zavier olhou para ela e Tabitha sentiu que o seu coração parava.

- Pode ser que sim, mas faço um café estupendo - disse. molhando os lábios nervosa. - Queres entrar? - acrescentou vendo-o agarrar o volante com força.

- É melhor não - respondeu Zavier.

De repente, o bom ambiente desapareceu e a tensão apoderou-se do interior do carro. - Diverti-me - acrescentou.

- Não - disse Tabitha. - Não é preciso fingires. Dize-lo apenas por amabilidade.

Zavier olhou-a detidamente.

- Pensava que era isso que querias - disse por fim.

- Sim...

- Então, não te queixes - disse Zavier. - É melhor ires-te embora. Os teus vizinhos estão a começar a olhar pelas janelas.

- Como sabias onde vivo? - perguntou apercebendo-se que ela não lho tinha dito. - Fizeste com que me seguissem? Estiveste a espiar-me?

- Não, temo que tenha sido muito menos emocionante. Procurei na lista.

- Oh! - Tabitha riu-se.

Zavier sorriu enquanto tamborilava com os dedos no volante, recordando-a que o serão tinha terminado.

- Quando nos vamos voltar a ver? - perguntou Tabitha demasiado nervosa. - Quero dizer, o que fazemos agora?

Zavier deixou de tamborilar e olhou-a muito sério.

- Isso depende de ti.

- Passei na prova do casino?

Zavier sorriu e Tabitha sentiu um poderoso desejo de lhe acariciar o rosto.

- Sim - respondeu tirando o contrato da mala. Tabitha observou-o a assinar.

- Se decidires ir com isto para a frente, dá o contrato ao meu advogado - indicou-lhe.

- E já está? Só tenho de fazer isso? Tanta simplicidade aterrorizou-a.

- Já está - respondeu Zavier encolhendo os ombros. - Amanhã vou para os Estados Unidos numa viagem de negócios. Assim será melhor, porque isto de fingir ser o noivo devoto não é nada fácil. Telefonar-te-ei para te contar os detalhes quando os tiver resolvido. O meu motorista virá buscar-te para fazeres as compras do casamento e para te levar a Lome. Enquanto isso, sê boa. Estaremos em contacto.

- E não tenho de fazer nada? E quanto ao vestido de noiva e convites e...

- Eu ocupo-me de tudo.

Tabitha abriu a porta e saiu do carro. Rezou para que Zavier a fizesse voltar a entrar e a beijasse com paixão para colocar um bom final numa noite que tinha sido maravilhosa, mas não o fez.

Uma vez dentro de casa, olhou pela janela e viu o seu carro a afastar-se. Aquele anel pesava, não estava acostumada a usá-lo.

Já sozinha, deu-se conta da enorme carga da proposta de Zavier e soube que ia passar a noite em claro, mas não foi assim. Pela primeira vez

desde o casamento, dormiu placidamente. Foi como se o facto de o ver a tivesse tranquilizado. Na manhã seguinte, quando ouviu as estridentes vozes das crianças que passavam debaixo da sua janela para ir para o colégio, acordou. Estavam a bater à porta?

Estava tonta, tinha a boca seca do champanhe e o coração batia muito depressa.

De certeza que tinha sido um sonho. Não podia ser verdade.

Vestiu o roupão e foi abrir a porta. De certeza que era Zavier para lhe dizer que tinha sido uma brincadeira.

- Entrega para a menina - anunciou o mensageiro dando-lhe uma enorme caixa branca.

Enquanto assinava como podia, viu Aiden a avançar para sua casa. Parecia aborrecido, não tinha nada a ver com o homem amável e carinhoso que ela conhecia.

- O que fizeste? - gritou passando diante do mensageiro e fechando a porta com força. - Página quatro - acrescentou. Casamento celestial no reino do dinheiro - leu.

A tremer, Tabitha deixou a caixa no chão e agarrou no jornal, no qual estava uma fotografia dela e de Zavier a beijar-se.

- Conheceram-se num casamento! - continuou a ler Aiden. - Foi amor à primeira vista! Meu Deus, Tabitha, em que te meteste?

Pierre devia ter telefonado para a imprensa quando saíram do restaurante. Era a isso que Zavier se referia quando tinha dito que estava tudo controlado.

- Em nada - respondeu tentando ganhar tempo.

- Não é isso que diz aqui - gritou Aiden. Queres que continue a ler?

- Ia contar-te - explicou Tabitha. - Ia telefonar-te hoje mesmo, agora, pela manhã.

- Para me dizeres o quê? Estás a dizer-me que é verdade? Vais casar-te com o meu irmão?

- Não sei...

- Passaste a noite com ele no casamento da minha prima?

- Como sabes que passei a noite com alguém?

- Acordei para beber água, tão simples como isso. Na altura, não te perguntei nada porque pensei que não me dizia respeito, mas se estavas com Zavier sim, é - acrescentou atirando o jornal contra a parede. - Estavas com ele, não era?

Tabitha assentiu sem poder olhar para o seu amigo nos olhos.

- Lembra-te do que te disse, Tabitha. Olha que te avisei que não te interessasses por ele. É meu irmão, mas é um canalha.

- Não é. A sério, Aiden, ontem à noite saí com ele e pareceu-me um encanto...

- Não te apercebes que é assim apenas porque fazes o que ele quer?

- Eu sei - respondeu Tabitha engolindo em seco.

- Vais sofrer, Tab - disse Aiden à beira das lágrimas. - Vai fazer com que sofras muito.

- Porque tens tanta certeza?

- Porque o conheço. Como te pudeste meter em semelhante confusão? Por favor, não me digas o que o jornal diz porque eu não acredito.

- Porque me ofereceu dinheiro.

- Eu também.

- Ele ofereceu-me mais.

Aiden não conseguia acreditar.

- Conheço-te, Tabitha, e conheço-o a ele. Ofereci-te o suficiente para cobrir as dívidas da tua avó e rejeitaste a minha proposta.

- Zavier ofereceu-me muito mais do que tu me ofereceste - respondeu Tabitha envergonhada.

- Mesmo que te tivesse oferecido as jóias da Coroa, tê-lo-ias rejeitado - insistiu Aiden sentando-se no sofá. - Apaixonaste-te por ele, não foi?

- Não tem nada a ver com amor.

- Palermices. Apaixonaste-te por ele e acreditas que, com o tempo, ele também se apaixonará por ti - gritou Aiden furioso.

- Não o amo, Aiden. Mal o conheço - respondeu Tabitha não muito convencida.

- Isso não te impediu de ires para a cama com ele - recordou-a o seu amigo. - O que se passa exactamente entre vocês? E não me venhas com a desculpa do dinheiro porque não acredito.

- Sentimo-nos atraídos - confessou Tabitha tentando pôr em palavras o que não podia explicar nem a si mesma. - Não sou tonta, sei que um casamento não funciona baseado apenas no sexo. É muito dinheiro, Aiden. Vai mudar a minha vida. Vou poder ter a minha própria escola de dança. Sim, ofereceste-me dinheiro e casamento, mas quanto tempo teria durado? Pelo menos, assim...

Aiden ficou perplexo a olhar para a sua mão.

- Deu-te o rubi?

- Deixou muito claro que era apenas um empréstimo - respondeu Tabitha nervosa.

- Disse que jamais o ia voltar a dar, que da próxima vez seria a definitiva.

- Próxima vez?

- Esteve quase a casar-se há alguns anos - explicou Aiden. - Ela era um anjo ou foi isso que nos fez acreditar. Duas semanas antes do casamento, o seu advogado apresentou um contrato pré-matrimonial do mais enviesado que possas imaginar. Deve ter pensado que Zavier não ia voltar com a palavra atrás quando faltava tão pouco tempo para o casamento.

- Mas fê-lo...

- Sim - Aiden sorriu. - Não conhecia bem o meu irmão, não contava com a sua forte moral. Quando viu que se tratava mais de dinheiro do que de amor, deixou-a. Ela, por seu lado, denunciou-o por incumprimento de contrato e trauma emocional. Mas tu não és assim. Por muito que mo digas, não te casas com ele por dinheiro. Conheço-te.

- O teu irmão pensa que as dívidas de jogo são minhas. Tentei contar-lhe a verdade, mas não acreditou. Por favor, Aiden, não lhe digas a verdade.

- Vai saber de todas as formas - gritou Aiden.

- Talvez já o saiba. Está a utilizar-te, Tabithaacrescentou vendo-a chorar - Ainda estás a tempo - tranquilizou-a. - Diz que não. O teu nome não aparece nos jornais. Zavier poderia acabar com o rumor em cinco minutos... comigo foi o que fez. Não precisas de passar por esta farsa.

Tabitha sentiu pânico e fechou os olhos.

- Por favor, Aiden, não me odeies. Não poderia aguentar.

- Não te odeio, Tabitha. Simplesmente, preocupo-me contigo e comigo.

- O que queres dizer?

- És a minha melhor amiga e ele é o meu irmão. Quando as coisas ficarem mal, e ficarão, não quero ter de escolher.

- Não creio que cheguemos a tal ponto - assegurou-lhe Tabitha preocupada.

- Espero bem que não.

- Vais voltar-me as costas?

- Vais seguir com isto, então?

- Se seguir em frente, voltar-me-ias as costas? Por favor, Aiden, vou precisar de ti.

- Muito bem, podes contar comigo - respondeu por fim o seu amigo, - mas aviso-te que não vos vou dar nada. Vou guardar o dinheiro para comprar lenços de papel e bombons. Vou precisar deles quando isto acabar.

- Não te preocupes comigo. Sei o que faço - assegurou-lhe Tabitha.

- Espero bem que sim - respondeu Aiden beijando-a e rindo-se.

Uma vez sozinha, Tabitha lembrou-se da caixa e abriu-a com as mãos a tremer. Ao ver o que tinha no interior, as lágrimas rolaram-lhe pela face.

Eram o vestido e os sapatos da noite anterior, mas não pretos e sim violetas.

Provou tudo num abrir e fechar de olhos e procurou entre os papéis em busca de uma nota. Quando a encontrou e viu a sua assinatura, sentiu-se feliz. A nota escrita à pressa e sem beijos no final fez com que se sentisse muito mais feliz que com o conjunto, que devia custar milhares de dólares. Incrível!

Seis meses - murmurou sentando-se. Seis meses a dormir com ele, a acordar com ele, a mostrar-lhe como o amor é maravilhoso, se ele o permitisse.

Seis meses para o convencer a amá-la. Acurralada? Talvez.

Um grande erro? Seguramente.

A aposta mais arriscada da sua vida? Sem dúvida.

Decidida, agarrou numa caneta e colocou a sua assinatura junto à de Zavier no contrato.

Tinha um milhão de razões para lhe dizer que não e só uma para casar-se com ele: amava-o.

 

- Este é o teu quarto - disse Marjory Chambers abrindo as persianas. - Sei que te vai parecer antiquado, mas até que se casem, vão dormir em quartos separados. Jeremy acharia mal se fosse de outra forma - sorriu a sua futura sogra. - Como verás, o de Zavier é ao lado; por isso o que fizerem durante a noite já é assunto vosso.

Aquilo tudo era surrealista. A casa era uma maravilhosa mansão decorada delicadamente. E aquela era a sua casa de Verão? Como seria a sua residência habitual?

Do quarto de Tabitha via-se o mar.

- Jeremy está a descansar, mas tomaremos uma bebida juntos às sete no terraço. Morre de vontade de te ver, sabes? Claro, se quiseres descer antes, desce. Sente-te como se estivesses em tua casa. Sei que este mês, com Zavier longe, deve ter sido muito duro para ti, mas já passou. Deve estar quase a chegar. Queres que me ocupe do teu vestido de noiva? O meu filho não o deve ver sob nenhum pretexto.

Marjory era tão amável que, enquanto Lhe entregava o vestido e os sapatos lilases que Zavier lhe tinha comprado, Tabitha sentiu-se muito culpada.

- Trouxe-te uns bombons - disse dando- Lhe a caixa.

Não sabia o que lhes levar porque tinham tudo. Vinho? Não, de certeza que tinham uma espectacular reserva. Flores? Com um jardim tão magnífico?

Por fim, tinha escolhido os bombons que tinha encontrado. De facto, tinham-Lhe custado uma fortuna.

- Oh, Tabitha, obrigada - disse Marjory com os olhos brilhantes. - És magnífica.

- É só uma coisa sem importância - disse envergonhada.

- São perfeitos - respondeu a sua futura sogra, abraçando-a, - como tu... Aiden acaba de chegar!

- acrescentou ao ouvir um carro sobre a gravilha

da entrada. - Acompanhas-me para o receber? Tabitha declinou educadamente a proposta.

Não lhe apetecia que Aiden lhe voltasse a ralhar.

- Se não se importa, prefiro desfazer a bagagem - desculpou-se.

- Os empregados encarregam-se disso - respondeu Marjory. - Ah, entendo, queres preparar-te para Zavier, não é?

- Uma vez sozinha, Tabitha desfez a bagagem; penteou-se, retocou a maquilhagem e pôs perfume. E ficou sem ter mais nada para fazer.

Só lhe restava esperar e ouvir outro carro sob a gravilha, o que traria o seu futuro esposo. Há um mês que não o via e tinha sido uma autêntica tortura. Apesar de ter tido muito trabalho e de ter estado ocupada a tomar conta da sua avó e a explicar aos seus amigos, boquiabertos, a razão pela qual se casava de repente, não tinha deixado de pensar nele nem um segundo.

Tinha contado os dias e as horas que faltavam para o voltar a ver.

Sabia que o seu avião chegava às quatro e sentiu-o perto antes de ouvir o motor do seu carro. Aquele momento tinha-a mantido viva durante todos aqueles dias, mas à medida que se aproximava custava-lhe cada vez mais e mais controlar os nervos.

Estava a brincar com o fogo e tinha muitas possibilidades de se queimar. Aproximou-se da janela e viu-o a sair do carro.

Por alguma estranha razão, Zavier olhou para cima, para o quarto onde ela estava. Tabitha apressou-se a sair da janela e sentou-se na cama. Como ia reagir ao vê-lo? Como ia encará-lo depois de tantos dias sem trair o seu coração?

O amor não fazia parte da equação.

Ainda.

- Tabitha! - gritou Marjory emocionada. - Já chegou!

Tabitha sorriu e saiu do seu quarto justamente quando a mãe de Zavier estava a abrir a porta principal.

O mês que tinha passado não lhe tinha tirado nem um pouco o seu poder atractivo nem a sua elegância. Adeus às suas esperanças de poder controlar a situação.

A sua beleza deixou-a sem palavras e, quando Zavier a olhou, sentiu que Lhe faltava a respiração.

- Não me dás um beijo de boas-vindas? - disse ele.

Tabitha desceu as escadas lentamente, mas a meio o desejo foi mais forte e correu para os seus braços.

Zavier abraçou-a com força e beijou-Lhe as lágrimas que tinham brotado inesperadamente dos seus olhos.

- Ena, vou ter de me ausentar mais frequentemente - brincou.

- Nem penses - disse a sua mãe. - Tens que aprender a delegar, filho. Agora vais ter uma esposa para cuidar e não a podes deixar sozinha.

- Alguém tem de trabalhar - respondeu Zavier. Tabitha nunca tinha bebido muito, mas agradeceu de coração a bebida alcoólica com água tónica que Marjory lhe deu.

- Estás linda, Tab - disse Aiden apertando-lhe a mão.

- Obrigada - ela sorriu, sabendo como aqueles momentos eram difícéis para ele.

- A noiva perfeita.

Quase se sentia assim.

Tinha tido uma semana frenética de salões de beleza e lojas. O motorista de Zavier tinha-a ido buscar e tinha-lhe entregado discretamente um cartão de crédito e uma lista das melhores lojas da cidade.

- Onde está o papá? - perguntou Zavier.

- A dormir.

- Como está?

Marjory sorriu.

- Bem - mentiu. - Só está a descansar um pouco. Descerá para jantar connosco, não te preocupes. Porque não vamos beber qualquer coisa?

- Ainda não - respondeu Zavier. - Vou descansar também um pouco.

Tabitha ficou gelada. Esperar tanto para aquilo? O que esperavas? reprovou-se a si mesma.

- Levas-me uma bebida? - disse agarrando-a pela cintura e beijando-a novamente.

Tabitha sentiu que o seu coração acelerava. Aquele beijo tinha sido desnecessário pois todos já tinham visto como estavam felizes por se voltarem a ver.

Aquela prova de sensualidade tinha sido única e exclusivamente para ela. Tabitha sentiu prazer e medo.

Depois de lhe servir um uísque, bateu à sua porta e entrou. O quarto estava às escuras e, ao sentir a mão de Zavier na sua, metade da bebida foi derramada.

- Calma - disse ele. - Estás nervosa, eh?

- Aterrorizada - admitiu Tabitha.

- Porquê? Todos acreditaram. Inclusive o meu irmão começa a duvidar.

- Bem - disse Tabitha aterrorizada por o ter perto e não por causa da sua família. - Que tal os Estados Unidos?

- Muito bem. Não recebeste o meu postal? Conversa de treta. Zavier nunca escrevia postais, bastava olhar para ele para o saber.

- Deves estar cansado.

- Dormi dezasseis horas no avião.

- Ah - riu-se Tabitha, - claro, de certeza que viajas em primeira classe, não é? Ou tens um jacto privado?

- Shiu, não o digas nem a brincar. Se a minha mãe te ouve, vai querer um - brincou fazendo-a sorrir. - Assim estás muito melhor - acrescentou tocando-lhe os lábios. - Tinha-me esquecido de como ficas bonita quando sorris.

Tabitha não soube o que responder.

- Deita-te na cama ao meu lado.

- Para quê?

- Para praticar. Vamos ter que nos acostumar, não?

- Não creio que o deva fazer.

- Porquê?

Tabitha engoliu em seco.

- A tua mãe instalou-nos em quartos separados - desculpou-se.

Os antigos costumes da casa não lhe interessavam. O que a deixava aterrorizada era tê-lo tão perto. Temia abrir o coração e confessar-lhe o que sentia por ele. Estava quase a chorar e o desejo das semanas passadas estava a cobrar-lhe a factura.

E, para cúmulo, estava a portar-se com infinita ternura com ela. Aquilo estava a deixá-la completamente descontrolada.

- Vem - disse-Lhe Zavier, tal como na primeira noite que tinham passado juntos.

Tabitha descalçou-se e deitou-se ao seu lado.

- Não devemos...

- Eu sei - disse ele abraçando-a. - Que tal passaste estas semanas?

Tabitha não respondeu. Estava rígida.

- Como é que a tua famíllia recebeu a notícia?

- A minha avó?

- Sim, a tua avó.

Tinha uma voz tão grave e bonita que Tabitha sentiu vontade de adormecer.

- Está contente, apesar de surpreendida, como os meus amigos.

- Porque ficaram surpreendidos?

- Bom, porque foi tudo muito rápido - respondeu Tabitha voltando-se para ele. - No princípio, todos me disseram que tinha enlouquecido. Creio que é porque as pessoas já não acreditam no amor à primeira vista. E tu?

- Eu o quê? - disse Zavier meio adormecido.

- Acreditas no amor à primeira vista?

- O amor não existe.

Tabitha esperou que dissesse mais alguma coisa, mas tal não aconteceu.

- Não acreditas no amor?

- Acredito no desejo, na cumplicidade, na amizade, mas no amor como nos filmes? Isso não existe, Tabitha.

- Claro que sim - protestou ela.

- Claro que não - insistiu Zavier. - Uma vez acreditei estar apaixonado - acrescentou tenso, mas de repente descobri que era tudo mentira. Ela nunca gostou de mim. Sentia-se atraída por mim, isso sim, mas não é a mesma coisa.

- Com ela não era amor, não quer dizer que não te possa acontecer com outra pessoa.

Zavier riu-se.

- O que queres dizer? Ainda estou a tempo de encontrar a minha cara-metade? Parece-me que viste demasiados filmes, Tabitha. Digo-te que isso não existe.

- Sei que essa mulher fez com que sofresses, Zavier, mas não me parece justo que generalizes. Não somos todos iguais. Não é um pouco exagerado da tua parte?

- Não. Na minha família, por exemplo, todos se casam por dinheiro. Nós, para começar - disse espreguiçando-se. - É curioso. Senti a tua faltaacrescentou.

Tabitha engoliu em seco.

- Sentiste a minha falta?

Mas Zavier não respondeu. Tabitha olhou para ele e viu que tinha os olhos fechados e a boca ligeiramente aberta. Tinha adormecido.

Tabitha tentou levantar-se para ir para o seu quarto, mas ele impediu-a. Passou-lhe um braço pela cintura e meteu a cara entre o seu cabelo. Tabita não se mexeu com medo de romper o encanto do momento.

Se aquele era o inferno que a esperava, bem-vindo fosse. Mesmo pomposo, arrogante e duro, Tabitha sabia que Zavier também era uma outra pessoa.

Não podia estar enganada.

 

Tabitha vestiu-se a toda a pressa para descer para jantar, temerosa de que o feitiço acabasse quando Zavier tomasse um duche.

Enquanto vestia um vestido amarelo com sandálias a condizer, os seus antigos medos voltaram a apoderar-se dela.

Zavier estava a comportar-se amavelmente com ela porque queria que aquilo corresse bem e essa era a única forma de enganar todos os outros.

Enquanto desciam as escadas, Zavier agarrou- lhe na mão e apertou-a ao entrar na sala de jantar. Ao olhar em seu redor, Tabitha verificou que não tinha sido para a animar, mas sim pela impressão que lhe tinha causado ver o seu pai na cadeira de rodas.

Jeremy Chambers tinha envelhecido séculos. Já não era o homem forte e poderoso do casamento da sua prima, mas continuava a portar-se com dignidade.

- Tabitha - cumprimentou-a beijando-Lhe a mão, - estás linda - acrescentou soltando-Lhe a mão e fazendo uma careta.

Tabitha viu que tudo lhe doía, mas não lhe perguntou nada, pois o seu instinto disse-lhe que a última coisa que aquele homem queria era a compaixão.

- Como estás, filho? - acrescentou olhando para Zavier. - Que tal estavam as coisas nos Estados Unidos? - concluiu fazendo um grande esforço.

Zavier contou-lhe detalhadamente a sua visita, com valores e números, como se estivesse a fazer uma apresentação de negócios. Não perguntou ao seu pai como se encontrava nem olhou para a cadeira de rodas. Como se tivesse estado sempre ali...

- Como estás, papá? - perguntou Aiden, no entanto.

Tabitha apercebeu-se que o seu pai não lhe respondia. Jeremy limitou-se a franzir o sobrolho e a lançar-lhe um olhar de despeito. Uma pena. Aiden foi ter com ela, procurando uma companhia mais amável.

- Que tal os preparativos para o casamento? perguntou forçando um sorriso.

- Não faço ideia - respondeu Tabitha.

- Não me digas que está tudo controlado - sorriu o seu amigo.

Aquilo fez com que Tabitha se risse.

- Pelos vistos, a única coisa que tenho de fazer é estar aqui.

- Estás nervosa? Tabitha assentiu.

- O que disse a tua avó?

- Foi uma surpresa - Tabitha sorriu.

- Solucionaste os seus problemas?

- Até ao momento, sim.

- Vais procurar-lhe uma terapia ou algo do género? - aconselhou Aiden.

Tabitha não respondeu.

- O vício do jogo é uma doença e não se cura assim de um dia para o outro - continuou o seu amigo. - Pagaste-lhe as dívidas, mas isso não quer dizer que não o vai voltar a fazer.

- Não o vai voltar a fazer - respondeu Tabitha indignada.

- Foi o que disseste da última vez - recordou- a Aiden. - Porque acreditas que esta vez vai ser a definitiva?

- Porque da próxima vez que os seus credores me telefonarem não vou ter um milionário disposto a tirar-me do apuro.

- Essas respostas fazem com que cada dia que passa goste mais de ti - disse Aiden agarrando-a pela cintura e beijando-a na face.

Ao aperceber-se que Zavier os tinha ouvido, sentiu que o mundo lhe caía aos pés. Ambos sabiam que o seu casamento era apenas por dinheiro, mas aquilo colocava um ponto final às tréguas que ela mesma tinha pedido.

- Para tua informação, querida - disse, - não sou milionário, mas sim multimilionário. Claro que a ti tanto interessa mais zeros que menos, não é verdade? No final, gastas tudo nas máquinas...

- De que falam tão sérios? - disse Marjory aproximando-se.

- Do problema da minha noiva - respondeu Zavier.

Tabitha ficou paralisada. Ia dizer:

- Que problema? Posso ajudar em algo?

- Sim, na verdade sim - respondeu o seu filho.

- Diz a alguém que encha o copo de Tabitha. Está com ele vazio há já cinco minutos. Vais ter de falar com os empregados.

Nesse momento, soou a campainha que anunciava o jantar, que acabou por ser um horror. A comida estava perfeita, o vinho delicioso e a conversa animada, mas o jantar em si foi um horror.

Zavier não olhou para ela e a única vez que Lhe tocou na mão fê-lo com frieza. Todos os avancos que tinham conseguido tinham-se evaporado por causa de um comentário inoportuno.

Inevitavelmente, a conversa centrou-se no casamento. Tabitha tentou concentrar-se, rir-se nos momentos adequados e fimgir entusiasmo.

- Guardei todas as prendas que foram chegando no salão. Temos de decidir onde as vamos pôr - disse Marjory. - É uma pena que não tenhas feito uma lista de casamento, querida...

- Quantas torradeiras nos deram? - brincou Tabitha.

- Nenhuma - respondeu Zavier. - Pelo menos, da parte da minha familia. Mamã, quantas torradeiras nos chegaram da parte de Tabitha?

- Não lhe ligues - riu-se Marjory. - São os nervos do casamento. Como estás, Tabitha?

- Um pouco nervosa - admitiu tentando fazer ver que se importava. - Ainda bem que é um casamento pequeno.

- Bom, não sei se o que entendes por pequeno é o mesmo que a minha mãe - comentou Zavier com malícia. - Não é, mamã? - acrescentou muito mais carinhoso.

Tabitha verificou que, quando falava com alguém a quem amava de verdade, a sua voz não era tão cortante e a sua expressão não era tão ameaçadora como quando falava com ela.

- Bom, não sei se vai ser pequeno - confessou a sua mãe, - mas asseguro-vos que vai ser maravilhoso.

- Vês? De certeza que encomendaste balões e esculturas, não foi?

- Não, os balões passaram de moda - respondeu Marjory indignada. - Preferi montes de flores frescas.

- Muito bem - disse Zavier. - E quantas esculturas?

Tabitha pensou que era uma brincadeira, mas de repente verificou que não era.

- Só uma - admitiu Marjory.

Tabitha ficou gelada e Zavier, apercebendo-se, olhou para ela durante um segundo. Sorriu levemente dando-Lhe a entender que estava perdoada e Tabitha tentou sorrir também. Como era possível que um simples sorriso daquele homem a envolvesse como uma manta numa noite fria?

Falando de noites, naquele dia estava uma noitt maravilhosa e Tabitha decidiu sair para o terraço:

- Marjory, importas-te que saia para o terraço para beber o Porto? - perguntou educadamente.

- Claro que não, querida. Estás em tua casa, por isso faz o que quiseres.

Agradecida, Tabitha agarrou no seu copo e saiu através das portas que estavam abertas. Uma vez fora, no terraço, pousou o copo e olhou para o mar. A superfície era de cor anil, como os olhos de Zavier.

Imaginou os casais que estariam a jantar nos restaurantes românticos do passeio marítimo e a dançar nos seus terraços e sentiu ciúmes.

- A sonhar? - disse Zavier nas suas costas.

- Não, estava a olhar para aqueles restaurantes ali - respondeu Tabitha.

- E que tal? A comida é boa?

- Não, horrível - brincou ela.

- Desculpa-me por aquilo que disse antes. Tabitha voltou-se, surpreendida. Jamais tinha esperado que Zavier se desculpasse.

- Porquê? - perguntou-lhe.

- Por ter feito que passasses um mau bocado antes de jantar fazendo com que acreditasses que ia falar do teu vício. Foi um golpe baixo, reconheço. Não costumo fazer isto, asseguro-te.

- Eu também lamento - disse Tabitha. - O que disse antes a Aiden não o disse a sério...

- Sim, disseste-o a sério.

Tabitha não respondeu. Bebeu um gole do seu vinho do Porto confusa ante a sua mudança de conduta.

- Mas isso não me dá o direito de me aborrecer contigo. Ambos sabemos que é um assunto de negócios. Creio que, às vezes, me esqueço disso. O que se passa é que fazes realçar o pior que há em mim. Bom, ou o melhor. Depende da noite da qual falemos.

Tabitha sentiu que os seus olhos a despiam e soube que Zavier estava a recordar com todos os detalhes a fantástica noite que tinham passado juntos.

Tabitha teve de se controlar para não o abraçar e se perder no seu peito. Ela também recordava aquela noite especial.

- Não te deixa nervoso? - perguntou- lhe.

- O quê?

- Tudo isto - respondeu Tabitha. - Toda esta enorme mentira.

- Não, porquê?

- O que aconteceria se soubessem?

- Não vão saber - tranquilizou-a Zavier.

- E se descobrissem? - insistiu ela.

- Se isso acontecer, eu tratarei disso. Os Chambers não se vão escandalizar com outro casamento sem amor na família. O meu pai só quer que eu me case, nunca falou de estar apaixonado.

- E se eu não for à cerimónia? Se fugir com o teu dinheiro?

- Encontrar-te-ia - advertiu-a. - Além disso, de certeza que já o gastaste.

Tabitha olhou para ele, indignada.

- Olha, estou acostumado a trabalhar em ambientes com muita pressão e sobrevivo. Se apareceres, casamo-nos e, se não, sobreviverei - assegurou-lhe aproximando-se.

Tabitha tinha-o tão perto que sentiu uma perturbadora sensação de desejo.

- Casamo-nos dentro de dois dias - disse nervosa molhando os lábios e sabendo que esse gesto inocente o tinha excitado. - Não deveríamos esperar?

- Queres esperar?

Não, o que Tabitha realmente queria era que a beijasse e a levasse para o seu quarto para a recordar da sua destreza na cama.

Zavier segurou-lhe na mão e traçou com a língua a sua linha da vida. Tabitha sentiu que as pernas lhe tremiam e temeu desmaiar. De repente, Zavier pôs-lhe a mão sobre a sua erecção e Tabitha notou-a em todo o seu esplendor.

- Vão ver-nos - disse tentando afastá-la.

- Está muito escuro, não te preocupes - respondeu Zavier gemendo de prazer quando a mão de Tabitha começou a mover- se. - Sei que vais aparecer porque vais sair beneficiada - acrescentou. - Quem sabe? Talvez sejas a primeira noiva da História a chegar mais cedo - brincou, fazendo com que ela se aborrecesse e retirasse a mão.

 

Tabitha estava esgotada, mas passou uma boa parte da noite acordada a pensar em Zavier. Por um lado, desejava que fosse ao seu quarto e, por outro, sentia-se aterrorizada com essa possibilidade.

Por fim, conseguiu dormir até amanhecer. Ficou deitada na cama, a ouvir as ondas do mar.

Tudo parecia tranquilo e sereno quando, na realidade, era tudo uma grande mentira. Um passo em falso e a situação explodiria.

No entanto, parecia que Zavier não se importava. Não se preocupava com nada? Nunca perdia as estribeiras?

Vestiu uns calções, uma camisola e calçou umas sapatilhas e, em silêncio, saiu para a rua.

Caminhou para a praia e, uma vez ali, descalçou-se e foi para a margem tentando desvelar o grande mistério que era o seu noivo. Acabou por se sentar na areia, que estava fria, e meteu os pés na água.

Zavier viu-a ali sentada, com os reflexos do sol nos caracóis vermelhos, como uma sereia.

Apesar de lhe ter dito que sim, na noite anterior não tinha dormido no avião e a diferença horária unida ao uísque tinham feito com que a achasse atraente e tentadora. Não, Tabitha não era uma sereia, mas sim uma víbora, uma ladra.

É melhor que não te esqueças disso", disse-se a correr para ela.

Contudo, ao chegar ao seu lado e olhar para os seus olhos, puras piscinas de jade, sentiu-se sem respiração.

- Não conseguias dormir, eh? Tabitha negou com a cabeça.

- Nervosa por causa do casamento?

- Mais ou menos - sorriu.

Zavier sentou-se ao seu lado e estiveram em silêncio durante um bocado. Não foi um silêncio incómodo.

- Como será trabalhar numa fábrica de chocolate? - disse Tabitha olhando para o mar.

- Como?

- Penso que se trabalhasse numa fábrica de chocolate, poderia comer todo o chocolate que quisesse. Creio que, no princípio, abusaria e mais tarde ou mais cedo ficaria cansada, não?

- Lamento, mas não te estou a seguir.

- Estava a perguntar-me se, se vivesse aqui, alguma vez me cansaria de olhar para o mar.

- Entendo-te.

Já não eram as únicas pessoas que estavam na praia. Havia úmas quantas pessoas a correr e a passear os cães.

- Olá, Zavier - cumprimentou um casal mais velho.

Iam de mãos dadas e respirava-se paz na sua presença. Zavier cumprimentou-os com afecto e apresentou-lhes Tabitha. Fê-lo com tanto orgulho que até ela acreditou nele durante uns segundos.

- Tínhamos lido no jornal - disse o homem a sorrir. - Parabéns aos dois. Deixa que te diga, Zavier, que és um homem muito sortudo. A fotografia do jornal não lhe fazia justiça.

- O casamento vai ser apenas para a família, mas adoraria que viessem depois para beber uma bebida connosco.

- Encantados.

Um cão chegou até eles e deu-lhes um pau.

- Então, até sábado - despediram-se afastando-se com o seu cão.

- Aí tens a tua resposta - disse Zavier. - Vêm todas as manhãs à praia desde há trinta anos - sorriu. - E dizem sempre que está um dia maravilhoso, quer chova ou faça sol. Estão sempre de mão dada e desfrutam de cada momento que passam juntos.

- Porque se amam - disse Tabitha pensativa.

Então, apercebeu-se do muito que o amava.

Olhou para o anel de noivado. Também queria o colar e os quarenta anos de casamento, e passear com ele e com os seus filhos pela praia.

Queria ver crescer os seus netos e continuar com ele, vê-lo envelhecer, vê-lo com rugas e cabelos grisalhos. Queria ser a definitiva.

- Em que pensas?

Tabitha engoliu em seco. Como dizer-lhe que o amava com toda a sua alma? Como dizer-lhe que desde que o tinha visto na igreja, o seu nome tinha ficado gravado no coração? Como podia um homem cuja vida se regia por números, valores e estatísticas entender algo tão simples e inexplicável como era o amor?

- Tenho de te dizer uma coisa - conseguiu dizer.

- Parece sério - respondeu Zavier.

- E é - assegurou-lhe aterrorizada.

Apesar da manhã estar quente, Tabitha sentiu um calafrio dos pés à cabeça. Sabia que o que lhe ia dizer ia mudar tudo.

Zavier queria uma mulher de quem se pudesse desfazer facilmente quando o momento chegasse. O amor não fazia parte do seu plano e falar-lhe dele podia terminar com tudo ali mesmo.

Ainda assim, tinha de dizer alguma coisa.

- Não sou viciada em jogo - declarou. Certo. Não era o que tinha pensado dizer-lhe, mas pelo menos era verdade.

Zavier deitou-se na areia e ficou a olhar para o céu. Ao fim de um segundo, fechou os olhos.

- Outra vez com isso, Tabitha?

- A sério, não sou...

- Sei que é difícil admiti-lo, mas deverias fazer um esforço. De qualquer forma, os outros não vos podem obrigar a assimilar o vosso problema - riu-se. - Nota-se que andei a ler sobre este assunto, eh?

- É a minha avó quem é viciada em jogo.

- Ainda bem que no contrato deixámos muito claro que nada de crianças. Parece que o problema é hereditário - comentou sarcástico.

- Não entendes.

Zavier não lhe estava a facilitar aquela tarefa, mas Tabitha decidiu que tinha de fazer tudo o que era possível para que acreditasse nela.

Apesar de não ter sido capaz de Lhe dizer que o amava, tinha de conseguir casar-se sem que houvesse mentiras entre eles.

- Nunca tive problemas de jogo - insistiu, - se não me ouvires, não me vou poder casar amanhã.

Zavier abriu os olhos, apoiou-se num cotovelo e ficou a observá-la.

- Aiden sabe?

Tabitha assentiu.

- E porque diabo não me disse?

- Porque eu pedi-lhe que não o fizesse - murmurou Tabitha. - Não me pareceu relevante no momento.

- Como não?

Tabitha tinha visto Zavier aborrecido noutras ocasiões, mas nunca fora de controlo.

Até àquele momento.

- Não te pareceu relevante, eh? - disse, olhando para ela iracundo. - E sabes porquê? Porque é outra das tuas mentiras, outro dos teus...

- É a verdade, Zavier.

Zavier continuou como se não a tivesse ouvido:

- No casino... - disse obrigando-a a olhar para ele. - estavas alegre, radiante, viva...

Apaixonada, pensou Tabitha fechando os olhos com força.

Como o ia encarar e ocultar-lhe o que era verdadeiramente importante? Tinha de o fazer se queria estar com ele durante seis meses. Se queria ter aquele tempo para roçar o paraíso, era a sua única opção.

- A minha reacção não teve nada a ver com o casino, Zavier, nada de nada - assegurou-lhe. Estava contente porque tinha tomado meia garrafa de champanhe e tinha um cheque no bolso que me permitia não trabalhar durante anos, além de um contrato no qual me prometias muito mais. É para estar contente, não?

Tinha sido a coisa mais vil que tinha feito na sua vida, a mentira mais tremenda que tinha dito e, se não tivesse estado tão concentrada na sua própria angústia, teria verificado que Zavier a olhava com dor.

- Lamento - disse-Lhe. - Pensava que gostarias de o saber - acrescentou com lágrimas nos olhos.

- Pensava que ficarias contente por saber que não sou uma viciada no jogo.

- O que querias? Aplausos? Ou antes um bonito discurso sobre como és boa por te sacrificares para salvares a tua avó dos credores?

Tabitha olhou-o indignada.

- Nada disso. Simplesmente, pensei que seria melhor para o nosso casamento que soubesses a verdade.

- A verdade é que o nosso casamento é um assunto mercantil - replicou Zavier. - A tua avó e tu, na verdade, não me importam rigorosamente nada, por isso poupa os teus discursos, Tabitha. Não voltes a fazer uma cena de culpa. Tudo isto beneficia-te, por isso não me contes histórias. Além disso, tens razão, não é relevante qual das duas é a viciada.

- Não?

- Foste levantar o cheque no dia seguinte após to ter dado - disse Zavier. - Onde gastaste o dinheiro é assunto teu, desde que cumpras o que vem expresso no...

- Contrato - concluiu Tabitha. - Assim foiassegurou-lhe.

- Bem - concluiu Zavier. - Então, menina a menos que me devolvas o dinheiro antes de amanhã, vais ter de te casar comigo porque assinámos um contrato, entendido?

Tabitha assentiu.

- Mais alguma surpresa? - perguntou ele mais amável. - Há mais alguma coisa que me queiras dizer agora que estamos a falar abertamente?

Tabitha apercebeu-se de que estava a ser sarcástico e mordeu o lábio inferior para não chorar.

- Nada mudou, pois não?

- Creio que não - respondeu ela, brincando com a areia.

Zavier ficou a observá-la. A admirar o seu corpo magro e esbelto. Tinha as unhas dos pés pintadas de branco coral, como no casamento de Simone. Tinha umas pernas longas e bem formadas, salpicadas de sardas aqui e acolá.

Aquelas pernas tinham-no abraçado e tinham-no ajudado a entrar nas profundidades do seu corpo. Naquele instante, Zavier sentiu um desejo incontrolável e, sem poder evitar, estendeu a mão e acariciou-Lhe a coxa.

Tabitha voltou-se de forma abrupta. Estava embrenhada com os seus pensamentos e não se tinha dado conta do curso que os de Zavier tinham tomado, mas ao sentir a sua mão na perna o desejo também disparou nela de forma violenta e esteve prestes a perder a razão.

Quase.

Com um soluço de fúria, sentiu-se prestes a chorar.

- Acabas de me dizer que não te importas comigo - recriminou-o. - Como tens coragem de me tocar? Não é só um contrato mercantil, Zavier, e sabes disso tão bem como eu...

- Não, é prazer - ele riu-se. - Nunca disse que não pudéssemos misturar negócios e prazer. De facto, foi o que assinámos.

Tabitha levantou-se, mas ele agarrou-a pelo tornozelo para que não se fosse embora. Quando viu que se tinha relaxado um pouco, começou a acariciar-lhe a perna e Tabitha entrou em pânico ao sentir que o órgão entre as pernas se contraía e humedecia.

- Faz parte do contrato... - insistiu Zavier.

Tabitha ficou a olhar para ele. Desejava- o, claro, mas naquele momento também o odiava. Tinha-lhe contado o seu maior segredo, que a sua avó era viciada no jogo, que era o que mais a fazia sofrer na vida, e ele não se tinha mostrado nada comovido.

Ainda bem que não Lhe tinha falado de amor. Decidiu que, até se casarem, não deveria saber.

- Pensas que isto é prazer? - perguntou com os lábios lívidos. - Parece-te que me estou a divertir?

Pela primeira vez, viu-o duvidar e acabou por a soltar.

- Pensas que és irresistível, eh? A ver se entendes que, para mim, também é um assunto mercantil, claro. A única coisa que me produz prazer em ti é cobrar os cheques que me dás.

- Desejas-me tanto como eu a ti - protestou Zavier com firmeza.

Mas Tabitha sabia que tinha feito com que ele duvidasse.

- Uma vez disseste-me que era uma boa actriz, recordas-te? Pode ser que, por uma vez, acertasses em algo no que me concerne - acrescentou, voltando-se e começando a correr sem olhar para trás para que não a visse chorar.

Sabia que, se tivesse ficado mais um minuto, Zavier teria lido a verdade nos seus olhos.

- Ena, estão aqui - disse Marjory ao vê-los entrar no terraço. - Estávamos quase a enviar uma equipa de busca para vos procurar. Como demoraram tanto para se mudarem e descerem para almoçar?

- Perdão - desculpou-se Tabitha beijando Zavier na face.

Por muito que lhe custasse, estava decidida a continuar com aquilo até ao final, mas vê-lo fazer uma expressão de desagrado ao sentir os seus lábios não foi agradável.

- E Jeremy?

- Está a dormir a sesta, a ganhar forças para o jantar desta noite. De qualquer forma, não gosta do sol, sabes?

Tabitha viu aparecer ante si um copo com algo fresco e saboroso e agradeceu. Ao sentir o calor no estômago apercebeu-se que a bebida não era tão inofensiva como parecia.

O almoço foi um inferno. Zavier mostrou-se mais cortante e sarcástico que nunca, mas, a julgar pelos risos e conversas da sua mãe e do seu irmão, só ela se estava a aperceber.

Por um lado, Tabitha ficou satisfeita já que aquilo demonstrava que Zavier Chambers não era tão duro e frio como queria fazer pensar aos outros, mas sim um homem com coração que se ressentia quando se punha em dúvida as suas artes sexuais.

Só de pensar nisso, porque na verdade Zavier era um amante excepcional, fazia com que se derretesse de desejo.

No final do almoço, Aiden tinha acabado com o uísque e sua mãe com a genebra. Só Zavier bebia água mineral.

- A esta hora, amanhã, são marido e mulher; Marjory sorriu. - Deves estar emocionada, não é verdade, Tabitha?

- Não acho - respondeu Zavier. - As aparências enganam, pois é, querida?

Nem Aiden nem Marjory se aperceberam do que queria dizer, claro, mas Tabitha afundou-se na sua cadeira.

- Bom, não te conheço muito bem - disse Marjory com voz pastosa, - mas vou nadar para estar um pouco em forma. Vens comigo?

- Encantada - respondeu Tabitha deixando o guardanapo sobre a mesa com as mãos a tremer, mas não me vou meter na água porque comi tanto que de certeza que me afogo.

Felizmente, estar em forma não era muito duro. Marjory acomodou-se num colchão insuflável, estalou os dedos e apareceu um mordomo com mais bebidas.

- Não quero nada, obrigada - disse Tabitha. Bom, sim, água mineral, por favor.

- Pareces Zavier - disse a sua futura sogra. Vamos, anda, bebe algo normal.

- Não, obrigada, a sério. Não costumo beber muito e, além disso, quero estar bem para o casamento - desculpou-se Tabitha.

Aquilo pareceu bem a Marjory que, claro, bebeu outra bebida. Tabitha tirou o vestido e ficou com o minúsculo biquíni amarelo que tinha vestido e que, realmente, consistia em quatro triângulos e uns laços.

Zavier olhou-a de cima a baixo enquanto se despia.

- Tomas banho? - disse-lhe.

Muda, Tabitha negou com a cabeça e recordou a última vez que se tinha despido em frente dele. Sentiu o seu olhar por todo o corpo e sonhou que Zavier estava a recordar o mesmo.

As duas mulheres observaram-no a atirar-se elegantemente para a água e nadar em silêncio. Ao ver como nadava bem, Tabitha decidiu não se meter na água sob nenhum pretexto. Era mais fácil manter a dignidade em terra do que nadar à cão.

- Não deixes que o meu filho te fira com os seus comentários - disse Marjory.

Tabitha olhou-a surpreendida. Tinha-se apercebido?

- Está preocupado por causa do seu paiacrescentou colocando creme na cara e no decote.

Tabitha não disse nada. Claro que Zavier estava preocupado com o seu pai, mas ela sabia que o seu estado de espírito tinha outra causa muito mais básica.

- Estamos muito contentes por se ir casar contigo - continuou Marjory olhando-se num espelho para espalhar o creme. - Sei que pode ser uma pessoa difícil e, para ser sincera, já estávamos preocupados.

- Porquê?

Tabitha sabia que se estava a meter em terreno pantanoso. Saber coisas privadas de Zavier não fazia parte do contrato, mas não pôde resistir à tentação.

- Bom, porque é um homem muito radical. Para ele, só há branco ou preto. Creio que deves ter sabido o que aconteceu com Louise, não?

Tabitha assentiu.

- A rapariga com quem esteve prestes a casar-se?

- Era um espanto de mulher... não tanto como tu, claro. Conseguiu inclusive que se libertasse um pouco, já sabes, que tirasse o casaco e a gravata aos fins-de- semana e coisas assim. Eram felizes, mas a palerma estragou tudo por ser demasiado avarenta. No dia em que apareceu lá em casa com aquele arranjo pré-matrimonial, tudo explodiu. Nunca o admitirá, mas sei que o meu filho sofreu muito por causa disso.

- Não é para menos - disse Tabitha pensativa

- Já é difícil encontrar uma pessoa com quem partilhar a vida não tendo dinheiro, mas, se além disso o tens, creio que estarás sempre a perguntar-te se lhes interessa mais o dinheiro que tu.

- Tabitha, o dinheiro é importante. Gosto muito de Jeremy, mas asseguro-te que não me teria casado com ele se não tivesse dinheiro. A vida, por si só, já é muito dura. Se, além disso, tens de te preocupar com dinheiro, é impossível.

Tabitha olhou-a com olhos esbugalhados.

- Mas parecem muito apaixonados.

- E somos, mas o que te estou a dizer é que, seguramente, não estaríamos juntos se Jeremy não tivesse dinheiro. Vamos ver, Tabitha, estás a dizer-me que o dinheiro do meu filho não te influencia em nada?

Que raio de pergunta e, tendo em conta a opinião da mãe de Zavier, ainda pior. Tinha pensado que tinha exagerado quando lhe tinha dito que a sua mãe se tinha casado com o seu pai por dinheiro, mas a própria Marjory acabava de lho confessar.

-Eu...

Tabitha não sabia o que responder. No fim de contas, o dinheiro tinha-os unido e era o que os ia separar.

Por um momento, pensou que se Zavier a amasse e perdesse tudo o que tinha, não se importaria. levada pela paixão do momento, respondeu.

- O dinheiro não é importante. O casamento deve basear-se no amor, na cumplicidade e na confiança.

Ao ouvir passos nas suas costas, calou- se.

- Bravo - disse Zavier sentando-se ao seu lado.

- Ouviste isto, mamã? Essas palavras devolveram-te a confiança no género humano?

- Maravilhoso, não é verdade? - respondeu Marjory deitando-se e fechando os olhos sem se aperceber do veneno das palavras do seu filho. Querido, põe creme a Tabitha, vai queimar-se para o casamento.

- Eu ponho - disse Tabitha estendendo o braço para agarrar o frasco.

Mas Zavier foi mais rápido.

- Não digas palermices - disse-lhe. - Pareces um camarão. Vamos, deita-te.

Se não queria provocar uma cena desagradá vel, Tabitha não tinha outro remédio a não ser deitar-se. Olhou-o, aterrorizada, nos olhos, e viu que o aborrecimento se transformava em desejo.

- Deita-te - repetiu Zavier mais amavelmente. Tabitha olhou para Marjory, que estava adormecida, e obedeceu.

Quando Zavier lhe desapertou a parte superior do biquíni, teve de agarrar o peito e deu um salto não por sentir o creme frio sobre as costas, mas sim a sua mão quente sobre a pele.

- O que se passa?

- Creio que me queimei um pouco - mentiu Tabitha.

Como lhe ia dizer que só o facto de a tocar produzia nela um efeito tão devastador?

- Claro - comentou Zavier em voz baixa.

Como pensaste em apanhar sol tendo uma pele tão branca?

Naquele momento, o que menos preocupava Tabitha era o sol. Enquanto Zavier lhe espalhava o creme, pensou que se afogava. Não conseguia respirar por causa do desejo. Sentiu os seus mamilos a endurecerem e o centro do seu desejo a palpitar.

Zavier espalhou-lhe creme pelas pernas e uma gota escapou-se e escorreu-lhe entre as coxas. Ao sentir as suas mãos a segui-la pensou que ia enlouquecer.

Nesse momento, um ronco de Marjory rompeu a tensão e Tabitha teve de fazer um esforço sobre-humano para não gemer.

- Assim não te queimarás - disse Zavier levantando-se. Tabitha ficou deitada à espera que as sensações que as suas mãos tinham despertado no seu corpo desaparecessem, mas tal não aconteceu.

Ficou deitada durante mais dez minutos, fingindo que estava a dormir, mesmo sabendo que não estava a enganar Zavier, que sabia perfeitamente como a tinha excitado.

- Está calor - disse por fim quando já não aguentava mais. - Vou para dentro - acrescentou envolvendo-se numa toalha para que não percebesse o estado dos seus mamilos.

- Porquê? Acabámos de começar.

Tabitha imaginou-se com ele na água e sentiu que enlouquecia. Como é que aquele homem a deixava assim?

Porque o amava.

Uma resposta simples e complicada ao mesmo tempo. Desejo, paixão, poder... uma mistura de tudo. Amava-o à forma antiga desde a primeira vez que o tinha visto, amava tudo nele, mas Zavier Chambers não tinha muito boa imagem dela.

Aquilo entristeceu-a e conseguiu travar o desejo.

Uma vez dentro de casa, decidiu tomar um bom duche de água fria. Despiu-se para se meter debaixo do jorro de água, mas antes olhou-se no espelho tentando procurar uma resposta para aquela embrulhada na qual estava metida.

- A culpa é tua e só tua - disse-se.

- Opino o mesmo.

Surpreendida, voltou-se para a porta e encontrou Zavier a observá-la.

- Há quanto tempo estás aí? - replicou aborrecida. - Há quanto tempo estás a observar-me?

- Não tens de te preocupar - riu-se ele sem vontade. - A final de contas, não tenho porque espiar-te pelo buraco da fechadura, não é verdade? Não tenho necessidade porque ambos sabemos que te posso ter sempre que quiser - acrescentou aproximando-se perigosamente dela.

- Como te atreves?

- Um pouco tarde para falsas modéstias - respondeu Zavier acariciando-lhe a face e deslizando a mão até ao seu peito. - Ena, queimaste-te, eh? Não achas que deveria espalhar-te creme à frente?

Aborrecida, afastou-o e saiu da casa de banho tentando encontrar um pouco de paz no seu quarto, mas uma vez ali a única coisa que via era a cama.

- Só negócios, eh? - troçou Zavier acariciando-lhe um mamilo e sorrindo ante a sua reacção. - A fingir, eh?

Tabitha deveria ter-lhe dado uma bofetada, mas não o fez. Ficou muito quieta, a tremer de desejo.

- Posso ter-te sempre que quiser - repetiu Zavier.

Apesar de se estar a comportar como um canalha, tinha razão.

- Desejas-me, Tabitha.

- Não, não te desejo - negou enquanto ele lhe desapertava a parte inferior do biquíni e Lhe acariciava o centro do seu desejo. - Não te desejo.

Estava completamente nua diante dele e Zavier aproveitou para atirar o biquíni para o chão, separar-lhe as pernas e introduzir um dedo no interior do seucorpo.

- Não te espalhei creme aqui, pois não? - troçou ao encontrar o centro húmido e lubrificado.

Tabitha verificou que estava a arquejar de prazer.

- Diz-me para parar e eu paro - disse Zavier acariciando-lhe o clítoris sem tirar o outro dedo do seu interior. - Diz-me para parar - ordenou-lhe deitando-a sobre a cama.

A sua erecção introduziu-se no seu corpo tão facilmente como os seus dedos tinham feito e Tabitha urgiu-o a chegar até ao fundo.

- Diz-me para parar - disse ele novamente. Tabitha negou com a cabeça.

- Não! - exclamou.

- Não, não me desejas ou não, não queres que pare?

- Não pares - gemeu.

Ainda assim, fez com que esperasse e só avançou um milímetro.

- Diz que me queres - ordenou-lhe.

- Quero-te! - gritou.

Então, Zavier investiu-a com força e ambos sentiram que o mundo explodia em seu redor. Gemeu e caiu sobre ela arquejando.

Ficaram ambos quietos, recobrando a respiração e Tabitha não pôde evitar chorar. Seria aquele o momento de lhe dizer a verdade? Não se tinha dado conta que o amava?

Demorou uns segundos a verificar que o telefone estava a tocar. Atendeu enfurecida pela intromissão, mas serenou-se ao ouvir a voz da sua avó.

Zavier observou-a a ficar pálida e a agarrar o auscultador com tanta força que os nós dos dedos ficaram brancos.

- Era o teu corretor de apostas? - tentou brincar Zavier.

Tabitha nem sorriu. Muito pelo contrário, começou a chorar desesperada.

- O que se passou?

- A minha avó vendeu a casa - respondeu Tabitha.

- Para pagar as dívidas?

Tabitha encolheu os ombros e tapou os seios com o lençol.

- Isso já eu tinha feito - respondeu. - Bom, melhor, tu. Não, vendeu-a porque vai viver para uma pequena povoação com um homem por quem se apaixonou como uma adolescente.

Disse que me vai devolver o dinheiro... por isso telefonou-me, para que soubesse antes do casamento.

- Para que não tenhas de te casar por causa dela?

- perguntou Zavier devastado. - Disseste-lhe que o nosso casamento era um fiasco?

- Não - respondeu Tabitha chorando ainda mais ante as suas palavras. - Não, disse-mo porque acredita que, assim, nos será mais fácil. Sabes, um casal jovem recém-casado...

- Não somos adolescentes.

- Foi o que lhe disse, que não havia pressa em devolver-me o dinheiro. Afinal, não creio que voltasse a morrer à fome.

- O que queres dizer?

- Que tens dinheiro de sobra.

- Não, refiro-me ao teres dito voltasse a morrer" no passado. Porque não disseste morramos?

- Porque agora posso devolver o dinheiro do cheque - soluçou. - Já te disse que vendeu a casa... - acrescentou olhando para Zavier, que estava perplexo. - Chama-se Bruce...

- Não quero saber como se chama, não me diz nada - interrompeu-a Zavier apercebendo-se da verdade. - Podia obrigar-te a seguir em frente. O contrato cobre todas as hipóteses.

Não todas", pensou Tabitha brincando com o anel.

Não falava de amor.

- Não me podes obrigar, Zavier - disse- lhe. Agora, posso devolver-te o dinheiro, posso voltar atrás se quiser.

Zavier levantou-se e foi para a janela.

- Mas não quero - declarou. - Quero casar-me contigo.

- Porquê? - perguntou ele.

Zavier estava de costas, tenso e muito sério. Não olhou para ela e Tabitha agradeceu-lho. Aquela situação já era suficientemente humilhante sem ter de olhar para os seus olhos.

Não queria ver como troçava dela quando Lhe dissesse que o amava.

- Porque... não é óbvio? Tenho de o soletrar? disse nervosa.

Então Zavier voltou-se.

- Por dinheiro? - perguntou triunfal. - Santo Deus, estás muito mais desesperada do que pensava.

Tabitha soube que dizer-lhe a verdade não ia servir para nada. Aquele homem estava podre por dentro. Tanto como o seu irmão. Ele não bebia mas tinha a alma igualmente destroçada.

Nem uma só vez lhe tinha passado pela cabeça que tinha ido para a cama com ele por amor e se quisesse casar com ele pelo mesmo motivo.

- Sabes por que me dás tanto asco, Tabitha?

Tabitha não o queria ouvir, mas decidiu ter força.

- Porquê? - perguntou muito digna.

- Porque debaixo dessa fachada amável, debaixo desse sorriso fácil não há mais que uma mulher fria e calculista - replicou olhando para o relógio. - Amanhã a esta hora serás a senhora Zavier Chambers - acrescentou indo para o seu quarto.

Tabitha sentiu vontade de correr atrás dele e de Lhe explicar que o dinheiro não tinha nada a ver com aquilo, mas, para quê?

Tinha pena de Zavier.

Sim, pena porque a vida tinha feito com que fosse tão desconfiado que simplesmente não acreditava no amor.

Seis meses.

Seis meses a dormir com ele, a acordar ao seu lado. Cento e oitenta dias para o amar, para Lhe ensinar que a vida era muito mais agradável quando se ama.

Amanhã àquela hora, seria a sua mulher. Amanhã àquela hora, ia dizer-lhe que o amava.

- Estás linda - Tabitha sorriu a Aiden pelo espelho.

- Estaria muito melhor se ficasse quieta durante cinco minutos - protestou Carla, a cabeleireira, colocando-Lhe outro gancho.

Depois de se assegurar que a tiara estava bem segura, asfixiou a sua cliente com outra rojada de laca e afastou-se para observar a sua obra.

- Tem razão, estás linda - sentenciou. Tabitha concordava. A mulher sofisticada que via no espelho não tinha nada a ver com a tonta ruiva que estava acostumada a ser.

Tinham-lhe apanhado os caracóis, perfeitamente penteados, num carrapito baixo, e levava uma madeixa de cabelo caída sobre um olho, o que Lhe conferia um certo ar misterioso.

Apesar de ter a sensação de ter duas toneladas de maquilhagem, o resultado era muito simples e discreto. Tinham-lhe pintado os olhos em tons castanhos-claros para destacar o verde da sua íris.

A única coisa que tinha um tom forte eram os lábios, cuja cor vermelha framboesa fazia com que parecessem volumosos e suculentos.

- Brindemos - disse Aiden quando Carla saiu.

- Roubei-a de uma mesa - acrescentou tirando uma garrafa de champanhe do casaco.

Abriu-a com mãos de especialista e encheu dois copos.

- Pela minha querida amiga Tabitha que, a partir de hoje, também vai ser minha cunhada. Espero que me continues a dar conselhos fraternais, eh? - sorriu e depois bebeu o líquido com um só gole.

- Claro - respondeu Tabitha.

- Continuas a fazê-lo por dinheiro? - perguntou muito mais sério e preocupado.

Tabitha duvidou. Estava acostumada a contar tudo a Aiden, mas aquilo era algo muito privado e Zavier devia ser o primeiro a saber.

- Claro - mentiu.

- A verdade é que, apesar de no início não ter achado muita graça, este casamento não vai correr assim tão mal. O meu pai está tão satisfeito que se esqueceu de estar aborrecido comigo. Esta manhã levei-o a passear. Não nos pudemos meter na praia com a cadeira de rodas, claro, mas fomos pelo passeio marítimo.

- E que tal? Aiden encolheu os ombros.

- Melhor que outras vezes. Inclusive disse que queria ver os meus quadros. Pelos vistos, Zavier foi vê-los e disse- lhe que ele também deveria ir.

- Zavier foi vê-los?

- Sim. Um mistério, não é verdade? Toda a vida me criticou por pintar e, no entanto, não só foi ver o que faço como também, além disso, animou o meu pai a fazer o mesmo. Não sabes quanto isso significa para mim. Ainda assim, disse-me que devia amadurecer, encarar a vida e ser responsável - contou enquanto a ajudava com o fecho do vestido.

- Não será que está preocupado por beberes demasiado? - sugeriu Tabitha nervosa.

- Também me vais pregar um sermão por causa disso? - protestou Aiden enquanto Tabitha calçava os sapatos. - Pareces uma senhora casada.

- Gosto de ti, Aiden, e...

- Continua.

- Bebes muito.

- Diz a viciada no jogo ao alcoólico - sorriu Aiden.

- E pareces-te com o teu irmão - sorriu Tabitha. - Disse isso há uns dias.

Pousou-lhe a mão no braço e ganhou coragem. Era seu amigo e devia dizer-Lhe a verdade.

- Bebes todos os dias, Aiden, demasiado. Tenho razões para estar preocupada.

- Não, hoje não - respondeu Aiden. - Hoje só te deves preocupar em estar radiante - acrescentou observando-a. - Se não fosse gay, Tabitha, serias a mulher dos meus sonhos.

Tabitha riu-se encantada. O vestido lilás abraçava o seu corpo de forma muito bonita e realçava os seus seios, sobre os quais luzia um colar de diamantes que o seu pai tinha dado à sua mãe.

Tocou-lhe e sentiu-se triste ao pensar no que tinha perdido sendo tão pequena. Como teriam gostado de vê-la casar-se!

Era uma noiva radiante, tal e qual como Aiden tinha dito, e apesar de tudo ser uma mentira não sentia culpa nenhuma.

Nenhuma.

Quando a música soasse e avançasse pelo corredor de braço dado com Aiden para se encontrar com o seu futuro marido, fá-lo-ia com a bênção dos seus pais. Sentia-o no seu coração. E quando fosse a sua vez de ler os votos fá-lo-ia com voz tranquila e sossegada porque estaria a dizer a verdade.

Porque o amava.

- Trouxe-te uma prenda - disse Aiden colocando-lhe no pulso uma pulseira de diamantes.

- É lindíssima, observou Tabitha. - Mas não tinhas dito que não havia prendas?

- Não a encares como uma prenda de casamento, mas sim como uma prenda de amizade. Quando te divorciares de Zavier e não fizeres outra coisa a não ser chorar, continuaremos a ser amigos.

Tabitha não conseguiu evitar que as lágrimas saltassem dos seus olhos.

- Eh, vais estragar a maquilhagem toda...

- Perdão - desculpou-se enquanto Aiden lhe secava uma lágrima. - Obrigada por estares comigo hoje, Aiden.

- Como não ia estar contigo num dia tão especial? - disse, olhando para o relógio. - Vamos, quero terminar com isto quanto antes. Estou a morrer de vontade de beber um uísque.

Tabitha franziu o sobrolho.

- Sei que tenho um problema - confessou Aiden - e prometo que vou procurar ajuda. Dá-me um pouco de tempo para me habituar à ideia. Na verdade, uma vida inteira sem beber não é algo que me atraia muito - sorriu.

Tabitha também sorriu, aceitou o seu braço e atravessou com o seu querido amigo a casa e o caminho do jardim de relva.

A única coisa que a separava dos seus votos era uma arcada de rosas. Ao vê-la, os músicos pararam de tocar e os presentes permaneceram em silêncio.

- Tens a certeza? - perguntou Aiden pela última vez.

Tabitha tinha um milhão de borboletas a revolver-Lhe o estômago, mas ao ouvir a deliciosa música de Wagner a inundar o ar, colocou-se no começo do tapete vermelho e assentiu.

- Sim, tenho a certeza - declarou.

- Então, vamos lá.

Todos os olhares se dirigiram para ela e Tabitha viu os seus seres queridos, os seus amigos e a sua avó. Também lá estava Jeremy, claro, pálido mas orgulhoso.

E, de repente, só teve olhos para Zavier. Quando os seus olhos se encontraram, viu-o engolir em seco. Tinha os punhos apertados em ambos os lados do corpo. Estava nervoso.

Tabitha também, mas estava segura que o amor que sentia era tão grande que era suficiente para os dois.

Avançava devagar pelo braço de Aiden para o homem a quem amava quando o grito de Marjory assustou todos.

Voltaram-se para ela e viram que Jeremy estava no chão, lívido e com os lábios azuis.

Tabitha foi a primeira a reagir. Os outros estavam petrificados. Com o coração na boca, correu para ele e ajoelhou-se ao seu lado.

- Jeremy - chamou-o algumas vezes. Nada.

Estendeu o braço e procurou a pulsação no pescoço.

Nada.

Todos a observavam.

Não foi preciso pedir silêncio para colocar o ouvido sobre o peito em busca de um batiment o, muito débil que fosse, que lhe indicasse que restava um pouco de vida naquele corpo.

Enquanto o fazia, tentou recordar desesperadamente o que lhe tinham ensinado num curso de primeiros socorros há muitos anos.

- Não respira - anunciou. - Creio que o coração parou.

Olhou para os presentes. Ninguém se mexeu excepto Zavier, que se ajoelhou também junto ao seu pai.

- Chamem uma ambulância! - gritou. - Há algum médico?

Inclinou-se sobre o seu pai e fez-lhe respiração boca-a-boca enquanto Tabitha lhe massajava o peito alternando-se com ele. Tinha visto fazer aquilo na televisão e rezou para o estar a fazer bem.

- Querem ajuda? - disse uma voz.

Tabitha voltou-se e encontrou-se com o homem mais velho que tinha visto na sua vida. Marjory arrastava-o por um braço e o pobre ia apoiando-se numa bengala que quase não o segurava.

- Gilbert é o médico da família - anunciou a mãe de Zavier.

Tabitha sorriu ao ver a cara de horror do seu noivo.

- Não é preciso, obrigada - respondeu Zavier olhando para ela e sorrindo também. - Gilbert pode telefonar para Melbourne e entrar em contacto com o cardiologista do papá.

Tabitha tinha o cabelo colado por causa do suor e doíam-lhe os braços por causa do esforço.

- Aiden, ajuda-me - disse olhando para o seu amigo.

Aiden estava tão lívido como o seu pai. Sentia pena por ele, mas insistiu.

- Aiden!

Mas o seu amigo só conseguiu soluçar desconsolado.

- Papá, por favor, respira - rogou.

- Queres trocar? - propôs-lhe Zavier.

Tabitha negou com a cabeça. Sabia que os segundos que perdessem a fazê-lo eram vitais para Jeremy.

Por isso continuou, com o sol nas costas e o olhar nublado pelo suor e pela maquilhagem. Ao fim de uns segundos, ouviu com alívio as sirenes da ambulância.

Quando os médicos chegaram, sentou-se exausta na erva. Puseram uma máscara de oxigénio a Jeremy e anunciaram que o iam desfibrilhar.

- Toda a gente para trás! - gritou o médico com o aparelho em ambas as mãos.

Primeira descarga.

Tabitha tentou levantar-se, mas não conseguiu. Sentiu uns potentes braços que a agarravam e, sem olhar, soube que era Zavier.

- Outra vez - disse o médico.

Segunda descarga.

As pernas de Tabitha tremiam-lhe tanto que pensou que ia cair. Ainda bem que Zavier a tinha segurado. Nunca antes tinham estado mais juntos.

Um leve ruído surgiu do monitor. Dois e depois três. O coração de Jeremy tinha voltado a bater.

- Ainda bem - murmurou para si mesma. Zavier soltou-a como se estivesse a tocar numa brasa incandescente.

- Porque te mostras tão aliviada? Pensavas que já não chegavas ao segundo pagamento? - disse com asco.

Tabitha olhou-o horrorizada. O optimismo de uns momentos antes, quando tinha acreditado que tinham possibilidades de serem felizes, evaporou-se.

Não era o momento, no entanto, de lhe dizer que o amava.

Jeremy tinha prioridade.

- Posso fazer alguma coisa? - perguntou ao médico.

- Nada, lamento - respondeu o homem. - Recomendo-te que bebas qualquer coisa. Não é a melhor coisa que pode acontecer no dia do teu casamento. O helicóptero está quase a chegar. Vamos levá-lo directamente para Melbourne.

- Os médicos estão à espera - disse Aiden depois de falar ao telemóvel.

- Vou com ele - disse Marjory a chorar.

- Lamento, mas está muito mal.

- Vou com ele - repetiu com autoridade. - Se meu marido vai morrer, quero estar com ele. Prometo não incomodar. Só quero estar com ele.

- Eu ocupo-me dela - disse Aiden a tremer: como uma folha. - Tem direito a estar com o seu marido.

Nesse momento, ouviram o motor do helicóptero e todos se afastaram para que aterrasse. Enquanto o fazia, tiveram de segurar os chapéus e vestidos.

- Vemo-nos no hospital - disse Aiden apertando a mão de Tabitha enquanto subia para o aparelho.

- Nada disso - interveio Zavier - Vou levá-la para casa e vou para o hospital.

- Porquê? - disse Aiden confuso.

- Porque todos nós sabemos que não é a querida que a mamã e o papá pensam que é. Agora o que importa são eles. Cuida da mamã. Até logo.

O piloto anunciou que estavam prontos para descolar.

- Mantém a cabeça bem alta - disse Tabitha ao seu amigo. - Vai correr tudo bem.

Oxalá pudesse acreditar nas suas próprias palavras.

Zavier não tirou o olho de cima dela enquanto fazia a mala.

- Podes deixar-me sozinha por cinco minutos? Tabitha precisava de ir à casa de banho, tirar o vestido e a maquilhagem, de acabar com aquela farsa. Assim vestida, tinha asco de si.

- Não - respondeu. - Despacha-te.

- Tens medo que leve alguma coisa?

- Sim, a verdade é que sim - respondeu impaciente.

A seguir, tirou a primeira gaveta da cómoda e despejou-a na sua mala. Devia estar desesperado para a perder de vista porque tirou os seus vestidos do armário e fez o mesmo com eles, com cabides e tudo.

Para terminar, agarrou na sua roupa interior, atirou-a da outra para cima e fechou a mala.

- Se deixaste alguma coisa, depois faço com que te seja entregue. Vamos.

- Por favor, Zavier, quero ir ao hospital. A tua mãe espera que vá.

- Não entendeste, eh? O casamento acabou. Tudo acabou. Não temos que continuar a fimgir.

- Eu sei, mas quero ver como está o teu pai. Não podia conceber a ideia de ir para casa sem saber se Jeremy tinha sobrevivido ou não, mas, sobretudo, queria estar ao lado de Zavier para o ajudar a passar a pior noite da sua vida.

- Não me venhas com lágrimas de crocodilo, de acordo? Vou levar-te a casa agora mesmo.

E não esperou sequer que apertasse o cinto de segurança. Quando entraram no carro, acelerou como se o diabo os perseguisse. Tabitha, assustada e surpreendida, olhou pela janela e despediu-se do mar.

O caminho de ida tinha sido longo, mas aquele estava a ser muito curto, certamente porque não se queria ir embora.

Passado pouco tempo, viu no horizonte Melbourne e apercebeu-se que a aventura chegava ao fim. Apesar de Zavier não Lhe falar, mesmo que olhasse para ela de lado e com ódio, era melhor estar com ele do que não estar. A vida sem ele não fazia sentido.

Não estava previsto apaixonar-se por Zavier. O amor tinha aparecido quando menos tinha espe rado e perdê-lo doía-lhe muito.

De repente, Zavier parou o carro num miradouro. Tabitha, surpreendida, viu-o sair do carro e ficar a olhar para o infinito no meio da noite.

Sem saber muito bem o que fazer, ficou no carro, observando-o, tentando gravar na memória os seus traços para jamais o esquecer.

Zavier voltou-se para ela e fez-lhe um sinal com a mão para que fosse ter com ele.

- Não se passa nada - disse-lhe. - Não te vou empurrar...

Tabitha conseguiu sorrir.

- Ainda bem porque cairia como um peso morto com toda a prata que tenho debaixo da roupa - brincou.

A ira de antes tinha-se evaporado e Zavier estava triste, mas mais próximo.

- Não deverias ir ao hospital? - perguntou-lhe.

- Não quero ir - respondeu ele, sinceramente. Tabitha não soube o que dizer. Vê-lo assim partia-lhe a alma.

- Preciso de um pouco de tempo. Quando chegar lá, vai ser o caos - disse Zavier engolindo em seco.

Tabitha deu conta de que se estava a sentir mal e pensou como seria duro em momentos como aquele ter de ser o forte em quem todos confiavam e se apoiavam.

- Pode ser que se recupere - disse tentando dar-Lhe esperança.

Zavier encolheu os ombros.

- Não creio... Tabitha, o que te disse do contrato... Não falava a sério. Sinto muito. Foste fantástica, de verdade. Se o meu pai sobreviver, deve-te a vida.

Tabitha soube que era agora ou nunca. Aquela era a sua oportunidade. Devia dizer-lho, devia estar ao seu lado naqueles momentos.

Talvez Zavier tivesse razão. Talvez o vício da sua avó fosse hereditário, porque estava prestes a fazer a aposta mais arriscada da sua vida.

- Não o fiz por dinheiro - assegurou-lhe engolindo em seco.

- Eu sei. Não te deveria ter dito o que te disse. De repente, temi que estivesse morto e perdi a cabeça...

- Não me refiro ao enfarte do teu pai - disse Tabitha a tremer. - Amo-te, Zavier. Sempre te amei. Não me ia casar contigo por dinheiro.

Viu-o olhá-la novamente com ódio e percebeu que o seu rosto se endurecia.

- Estava a perguntar-me quanto tempo demorarias a jogar a tua última carta.

Tabitha não tinha imaginado que a ia abraçar sem questionar nada, mas nunca esperara semelhante reacção.

- Como? - disse tentando tocar-Lhe. - Amo- te, Zavier. Amo-te mesmo.

- Por favor - disse ele afastando a mão com crueldade. - Sabes quantas mulheres me disseram isso? "Oh, Zavier, não é por causa do dinheiroH -: troçou. - Claro que é por causa do dinheiro, Tabitha - gritou. - E sabes o pior de tudo isto? Sabes o que é pior? - gritou mais ainda.

Tabitha negou com a cabeça. Não podia acreditar que a sua confissão o tinha deixado assim.

- O mais triste de tudo é que eu te amava - confessou.

- Amas-me? - disse Tabitha surpreendida.

- Amava-te, Tabitha, amava-te. No passado. Já não. Toda a vida a perguntar-me como é que o meu pai podia ser tão débil, como podia suportar estar casado com uma mulher que só estava com ele por causa do seu dinheiro e, de repente, apareceste tu...

Tabitha escutava-o chorando em silêncio.

- E, então, soube que o meu pai não era tão débil. De repente, entendi-o. Na noite que passámos juntos, a minha intenção era levar-te para o meu quarto e beijar-te para te demonstrar o que sabia, que não estavas apaixonada por Aiden, para te exigir que não te voltasses a aproximar dele. Nunca quis... - fechou os olhos. - Não é preciso lembrar-te o que se passou, pois não? Porque caso não tenhas dado conta, nessa noite apaixonei-me perdidamente por ti. Passei cinco dias a tentar pensar numa desculpa para te voltar a ver, para estar contigo, para te tirar da cabeça a ideia de te casares com o meu irmão.

- Não me ia casar com ele - assegurou-lhe Tabitha.

Mas Zavier não a ouvia.

- Podia ter-me casado contigo assumindo que era apenas por dinheiro. Pensei que, quando tivesses experimentado a fantástica vida que ias ter ao meu lado, poderíamos estar quarenta anos juntos como os meus pais. Ontem, quando me disseste que as dívidas de jogo não eram tuas, temi perder-te. Fazer com que cumprisses o contrato era ser um canalha, mas não podia aguentar a vida sem ti. Quando te deste conta de que me podias devolver o dinheiro, pensei que morria. Não podia perder-te.

- Não tens de me perder - disse com lágrimas a correr-lhe pelas faces.

Mas Zavier parecia imperturbável.

- Penso que poderia ter vivido com isso. Poderia ter suportado que estivesses comigo por causa do dinheiro se com isso te pudesse abraçar todas as noites, mas a única coisa que não teria conseguido aguentar era que fingisses que me amavas. Á única coisa que não te posso perdoar é que me mintas.

- Não te estou a mentir, Zavier, a sério. Escuta-me...

- És uma excelente actriz, Tabitha - replicou com veneno. - Enfeitiçaste-nos, um por um. Primeiro, eras a amiga de Aiden, depois a viciada, mais tarde era a tua avó quem tinha problemas de jogo e, para rematar a história, quando já pensas que está tudo perdido, que não vais conseguir casar-te comigo, inventas que me amas:

- Amo-te - implorou Tabitha. - Amo-te desde a primeira vez.

- Fui muito débil contigo, mas não sou tonto - interrompeu-a. - Como posso acreditar em ti?

Tabitha compreendeu de repente a horrível perda. Aquele homem maravilhoso tinha-a amado. Aquele espantoso vazio que, sem dúvida, a teria de acompanhar para toda a sua vida, era o preço que devia pagar pelo seu engano.

O que tinha começado como um jogo estúpido tinha-lhe partido o coração.

Era inútil suplicar e explicar. Zavier já a tinha julgado. Era culpada e devia pagar a sua pena, uma agonia de toda a vida.

Enquanto o mar se tornava asfalto, continuou a chorar.

O carro avançou pelas ruas vazias. Todos os semáforos, claro, estavam verdes. Parecia que tudo conjecturava para que se separassem o quanto antes.

Zavier abriu a mala do carro de dentro e ficou a olhar para ela, apertando o volante, enquanto ela tirava a bagagem e avançava para sua casa.

Apesar de estar aborrecido, continuava a ser um cavalheiro, por isso esperou até que entrasse. Tabitha procurou as chaves, mas não as tinha.

Era o que faltava!

Tabitha rebuscou e rebuscou, mas não as encontrou.

- O que se passa agora? - suspirou Zavier saindo do carro.

- Nada - respondeu ela. - Vai para o hospital.

- É o que quero fazer, mas só quando estiveres dentro de casa.

- Perdi as chaves.

Os olhos de Zavier brilharam de fúria e aquilo foi demasiado para Tabitha.

- Se não tivesses tido tanta pressa em sair de casa... - reprovou-o.

- Perdão - desculpou-se Zavier. - O meu pai acabava de ter um enfarte e não queria ter de denunciar a minha noiva por ter levado as jóias da família - disse com sarcasmo.

E, surpreendentemente, ajudou! Ajudou que Tabitha deixasse de chorar e levantasse o queixo com dignidade.

- Há uma pequena janela na parte de trás. Posso meter a mão e abrir a porta da marquise.

Sem dizer uma palavra, Zavier rodeou a casa.

- Eu faço isso - disse Tabitha orgulhosa.

- Claro. E como vais partir o vidro? Com a mão? Não tinha pensado nisso.

- Se calhar tenho uma toalha ou algo no carro... Zavier tirou o casaco e enrolou-o no braço. A seguir, bateu contra o vidro e abriu a porta.

- Não é difícil roubar em esta casa, eh? - troçou seco. - Deverias instalar um sistema de alarme.

- Basta, Zavier - disse Tabitha. - A minha segurança não te diz respeito. Já o deixaste bem claro.

Ao entrar, tropeçou e Zavier agarrou-a com força para que não caísse. Ao sentir a sua mão, o corpo inteiro tremeu.

O mundo parou de repente. Olhou-a nos olhos e viu pena e paixão.

- Tenho de me ir embora.

- Eu sei - respondeu Tabitha a soluçar. – Toma - disse tirando o rubi.

- Fica com ele.

- Não o quero. Disseste-me que tinha de o devolver, que era da familia... - disse enquanto o tirava e o atirava pela janela que acabava de ser partida.

- Para que diabo o quero agora? - gritou saindo. Surpreendida, ficou às escuras a escutar os seus passos, o bater da porta ao entrar no carro e o motor a afastar-se.

E quando já não havia nada para escutar, quando o vento levara o rasto da sua água-de-colónia, acendeu a luz.

Olhou para o vidro da janela despedaçado e pensou que a sua vida também tinha ficado assim.

Seis meses.

Era a única coisa que queria.

Seis meses para lhe demonstrar como o amor era maravilhoso.

Voltava do trabalho para casa e de casa para o trabalho. Ninguém podia imaginar a pesada carga que carregava, a dor que a invadia.

Devia comprar leite.

A mais mínima tarefa supunha-Lhe um grande esforço.

Ir à loja foi um suplício porque tudo a recordava dele. Desde a água mineral aos jornais a anunciar os progressos do seu pai.

Tinha dado entrada no hospital sem pulsação e os médicos tinham decidido operar.

Amy Dellier sorria numa revista colocada ao lado: Bonita coincidência.

Ao chegar a casa, recordou-o sentado no carro à espera que encontrasse as chaves. Sentia tanto a falta dele que, ao entrar, pareceu que lhe cheirava a ele.

Olhou distraída para o correio e sentiu que o coração explodia ao reconhecer a sua letra. Abriu o envelope com as mãos a tremer e, ao fazê-lo, caiu um cheque.

Leu a nota que o acompanhava.

Como tínhamos acordado. Zavier

Quatro palavras, mas não as quatro que éla queria. Nem de perto nem de longe.

Pensou em pentear-se e maquilhar-se para a ocasião, mas quem se arranjava para o seu próprio funeral?

Uma vez no banco, entregou o cheque e o caixa olhou-a com os olhos muito abertos.

- Não sei se temos esta quantia.

- Pois é melhor que a tenham - respondeu Tabitha de mau humor.

- Um momento, por favor.

Quando chegou à Chambers Financiers, estava a começar uma tempestade. Devia ter chegado muito decidida porque nem a secretária de Zavier lhe colocou entraves para entrar.

E que importava que não tivesse marcação?

Zavier não se levantou quando entrou. De facto, não parecia muito surpreendido de a ver. Fez um gesto para que se sentasse enquanto observava que usava uma saia demasiado curta e um casaco demasiado grande.

O seu gabinete era enorme. Tabitha pensou que poderia meter a sua casa ali dentro e ainda lhe teria sobrado espaço para o jardim.

- Em que te posso ajudar?

Tabitha sentiu-se como se fosse uma cliente.

- Desculpa - desculpou-se Zavier ante tanta formalidade. - Como estás?

- Bem - mentiu. - A trabalhar muito.

- Vens de uma representação? - perguntou- Lhe franzindo o sobrolho.

- Não, estou a trabalhar nos correios. É melhor quando se quer pedir um crédito, sabes?

Zavier continuava a observá-la com o sobrolho franzido.

- O que foi? - disse ela.

- Nada, estás... diferente.

Desiludida", pensou apesar de, claro, não o dizer.

Tinha o cabelo sem brilho e os seus olhos tinham perdido a vivacidade de outros tempos. Além disso, porque andava tão mal vestida?

Não me diz respeito, disse-se.

- E porque deixaste de dançar? Se tiveste problemas por teres estado fora por algum tempo, deverias ter-mo dito. Poderia ter falado com alguém.

- Estás a dizer-me que terias solucionado tudo? Zavier mexeu-se desconfortável.

- Sim, mais ou menos. Não quero que o que se passou entre nós te arruíne a carreira.

Tabitha riu-se.

- Tal como disseste em mais de uma ocasião, não tinha futuro. Em qualquer caso, não importa.

Vou abrir uma escola de dança no ano que vem. Por isso, estou a trabalhar.

Zavier riu-se.

- Não creio que ganhes muito.

- Vejo que continuas tão prepotente como sempre.

Aquilo deixou-o sem palavras o tempo suficiente para que Tabitha abrisse a carteira e respirasse.

- Chegou-me isto - disse entregando-lhe o cheque.

Zavier nem olhou para ele.

- Devia-to - disse. - O contrato assim o estipulava. Não foste tu quem não cumpriu o contrato, mas sim eu.

- Não o quero.

- Como queiras - disse Zavier olhando para o computador.

Tabitha levantou-se a tremer, tirou um monte de notas da carteira e pousou-as sobre a sua mesa.

- O que é isso?

- E és tu o mago das finanças? É dinheiro - respondeu tratando-o como se fosse estúpido.

- Isso posso eu ver, mas o que estás a fazer?

- É óbvio, não? A devolver-to. É o primeiro pagamento que me fizeste - respondeu voltando-se para se ir embora.

- Não faças isto, Tabitha. Não te o podes permitir.

- Claro que posso. A minha avó devolveu-me o dinheiro.

- E a tua escola de dança?

- Vou abri-la - assegurou-Lhe. - Pode ser que não seja tão cedo como gostaria, mas vou fazê-lo.

Dito aquilo, abriu a porta.

- Porque é que não me enviaste um cheque?

- Para quê? - disse Tabitha voltando-se para ele. - Para que me pudesses humilhar mais um pouco se não o quisesses levantar? - replicou olhando-o nos olhos.

- Porque é que estás assim? Ambos sabíamos no que nos metíamos.

- Pode ser que tu sim, mas creio que eu era ingénua pelos dois - respondeu fechando a porta e saindo do seu gabinete.

Já estava. Tudo acabado. Zavier Chambers já não fazia parte da sua vida. O pior era que não tinha saído a correr atrás dela.

- Tabitha, o que fazes aqui? - disse-lhe Aiden saindo do elevador.

- A atar alguns fios que tinham ficado soltos - respondeu Tabitha forçando um sorriso. - Li que já tiraram a respiração assistida ao teu pai.

- Sim, e o que é melhor: hoje transferiram-no para um quarto, tiraram-no da unidade de cuidados intensivos. Os médicos nem querem acreditar. Não sabem como aguentou a operação - explicou-Lhe agarrando-a pelo braço e levando-a para um canto. - O meu pai já sabia de mim, Tabitha. Sabia que sou gay.

- Sabia?

- Sim. Quando o estavam a preparar para o meter na sala de operações, chamou-me. Queria falar comigo porque devia pensar que não ia sair dali vivo. Disse-me que sempre que me pedia para crescer e enfrentar a vida era para que deixasse de viver numa mentira.

- E a tua mãe também sabia?

- Sim - Aiden riu-se. - Encararam-no muito bem, sobretudo ela porque, pelos vistos, está na moda ter um filho homossexual, por isso está encantada. Oficialmente, saí do armário. Deveríamos fazer uma festa para comemorar.

Tabitha não respondeu.

- Pobrezinha. Sinto-me muito culpado...

- Porquê?

- Porque estamos todos bem. O meu pai vai viver muitos anos e eu estou libertado, mas tu... tu saíste-te muito mal. Estás apaixonada por Zavier, não é verdade?

Tabitha não pôde evitar que as lágrimas lhe caíssem pelas faces. Aiden apressou-se a abraçá-la e a oferecer-Lhe o seu lenço.

- Sinto muito.

- Sou eu quem lamenta. Foi por minha culpa que tudo isto começou - desculpou-se Aiden abraçando-a com força. - Avisei-te, disse que te...

- Esmagaria - recordou Tabitha. - Sim, é exactamente como me sinto.

- Vais esquecê-lo - assegurou-Lhe Aiden.

- Não creio - disse Tabitha, encolhendo os ombros.

- Tentei falar com ele, disse-lhe como és maravilhosa, mas não me ouve. Queres que volte a tentar?

- Não - respondeu Tabitha. - Não o vais conseguir convencer. Tem a certeza de que só me interesso pelo dinheiro.

- Muito típico dele - disse Aiden. - No dia em que levantaste o cheque, traçaste esse destino. O meu irmão pensa que todos nós deveríamos ser honestos como ele.

- Eu entendo-o - defendeu-o Tabitha. - Não me estranha que não acredite no amor tendo em conta os exemplos que tem em seu redor. Bom, em qualquer caso, não me interessa.

- Continuamos a ser amigos? Não me atrevi a passar por tua casa com medo que me recebesses com uma frigideira ou algo do género.

Tabitha riu-se sem parar de chorar.

- Claro que continuamos a ser amigos, tonto, mas não vou poder ver-te durante uns tempos. Entende, quando te vejo lembro-me dele. Telefonar-te-ei daqui a umas semanas ou meses...

- Vou sentir a tua falta, Tab.

- Eu também. Tenho de ir.

- Espera. Vou pedir a um motorista para te levar a casa. Está a chover.

- Não, prefiro andar, a sério.

- Mas está um autêntico dilúvio.

- Melhor, assim ninguém se aperceberá que estou a chorar.

Aiden viu-a entrar no elevador e esperou que ela saísse do edifício antes de entrar no gabinete do seu irmão.

Ao ver Zavier sentado à sua mesa, a trabalhar como se nada se passasse, enfureceu-se.

E se não se importava mesmo nada com ela?

- Acabo de ver Tabitha a chorar - disse mudando de canal de televisão.

Em vez de o deixar nas notícias financeiras, que era o que o seu irmão gostava, pô-lo nos anúncios.

- Veio devolver-me o dinheiro - respondeu Zavier sem levantar o olhar. - Deve-lhe ter custado ficar sem ele.

Ao ver que o seu irmão não se ria, levantou a cabeça.

- A verdade é que não a entendo. Porque acedeu a casar-se comigo por dinheiro se pensava devolver-mo?

- Na verdade, às vezes pareces idiota - respondeu Aiden.

Zavier olhou para o seu irmão com o sobrolho franzido. Aiden nunca se aborrecia com nada, estava sempre de bom humor, mas naquele momento parecia estar diferente.

- O que tens?

- Sou gay - gritou Aiden.

- E o que é que eu tenho a ver com isso?

- Eu, que sou gay, entendo.

Zavier observou o seu irmão, confuso.

- Porque achas que o fez? Porque gosta de ti, idiota. Não sei porquê, mas esta é a verdade.

- Foi só por causa do dinheiro - insistiu Zavier.

- Fê-lo por dinheiro.

- Ah, sim? E, então, que é isto aqui? - perguntou Aiden apontando para as notas. - E porque é que estava a chorar com o cabelo molhado e sem vestígios de maquilhagem? Tabitha nunca sai assim de casa. Maquilha-se sempre, sabias? Eu reparo nessas coisas.

- Porque és gay?

- Porque não estou cego - respondeu Aiden furioso.

- O que me estás a dizer? - disse Zavier levantando-se. - Estás a dizer que me ama? Estás a dizer-me que Tabitha me ama mesmo?

- Por fim - disse Aiden sentando-se.

- O que devo fazer? - perguntou passeando-se pelo gabinete.

- Creio que deverias ir atrás dela agora mesmo.

- Está aborrecida? - perguntou Zavier confuso e inseguro.

Queria acreditar no que estava a ouvir, mas estava aterrorizado.

- Talvez - respondeu Aiden encolhendo os ombros e servindo-se de um uísque. - Vamos, vai já, que a minha série preferida começa dentro de cinco minutos e quero vê-la tranquilo.

Tabitha chegou a casa empapada, com a roupa colada ao corpo e o cabelo molhado, mas não se importava.

O sol estava a querer brilhar, mas ela preferia que o mau tempo continuasse para poder continuar a recolher-se na sua dor, na sua perda.

Enquanto avançava para a entrada da casa, viu um brilho na erva e verificou que era o anel.

Baixou-se para o apanhar e, enquanto o limpava, os olhos voltaram a encher-se de lágrimas.

- Tabitha.

Tabitha ficou paralisada.

- Olá, Zavier - disse respirando fundo. - Olha, apanhaste-me justamente quando ia vender o anel.

- Não digas isso.

Tabitha limpou o nariz com a manga do casaco sem se importar se era ou não um gesto educado.

- Vou limpá-lo e de certeza que me dão uns quantos milhares de dólares. Há dias que o procurava pelo jardim e, por fim, encontrei-o.

- Podes calar-te por um momento e olhar para mim?

- Para quê?

- Olha para mim, por favor.

Tabitha voltou-se e olhou para o horizonte porque não podia aguentar olhá-lo na cara.

- Sei que me amas - disse Zavier. Tabitha não respondeu.

- E sei que te amo.

Tabitha continuou sem dizer nada.

- Não vais dizer nada?

- O que queres que te diga? Já te tinha dito que te amava quando o teu pai teve o enfarte e tu disseste-me no carro que também me amavas, bom, perdão, que me tinhas amado. Isso não impediu que me deixasses.

- Tinha medo.

Tabitha olhou-o nos olhos.

- Porquê? Como pode um homem tão poderoso como tu ter medo de mim...

Zavier pôs-lhe um dedo nos lábios.

- Tabitha, o trabalho não me assusta, por isso sou tão bom no que faço - explicou. - Sou capaz de saber quando um negócio vale a pena em dez segundos. Sabes porque sou tão bom?

Tabitha negou com a cabeça.

- É-me fácil porque quase não me importo. Ganho dinheiro e perco dinheiro. É-me igual. É só dinheiro. Mas o amor... - riu-se. - Acreditas ter encontrado a mulher da tua vida, mas podes estar enganado e, então, o que fazes? O dinheiro não me interessa, Tab, mas arriscar o coração e correr o risco de que mo partam, de sofrer, sentir-me usado... não posso. A minha cabeça dizia-me uma coisa e o meu coração, outra.

Tabitha sabia que não tinha terminado, por isso deixou-o falar.

- Tinha a vida construída e sabia que não queria um casamento como o dos meus pais. Então, apareceste tu e estragaste os meus esquemas. Tentei convencer-me que só estava a tentar proteger Aiden e os meus pais, mas, na verdade, estava a proteger-me a mim.

- De quê?

- De me apaixonar por ti - respondeu Zavier beijando-a.

Os seus lábios encontraram-se e as suas bocas moveram-se em uníssono.

- Não o fiz por dinheiro - explicou-lhe Tabitha, - mas tentei convencer-me que sim - acrescentou enquanto Zavier Lhe acariciava o cabelo. Apercebi-me que estava apaixonada por ti praticamente no princípio. Aiden, claro, foi o primeiro a aperceber-se. Sabia que era impossível, que o amor não tinha cláusula no contrato. Tentei contar-te sobre o vício...

- Já sabia - interrompeu-a Zavier. - Sabia disso muito antes de mo dizeres, mas não o queria ouvir - acrescentou tremendo de medo. - A tua conta estava muito bem para quem tinha problemas de jogo.

- Viste a minha conta?

Zavier assentiu. Não era o momento de mentir. Ainda assim, tinha medo.

- Sabias? E a noite do casino? - perguntou surpreendida.

- As minhas suspeitas foram confirmadas. Não sabias nem por onde se metiam as moedas nas máquinas.

- Mas, quando to disse no outro dia na praia enlouqueceste.

- Porque não queria que mo dissesses, não te queria perder e sabia que, se mo dissesses, teria de te dizer para não nos casarmos.

- Mas não mo disseste.

- Não pude - respondeu de forma sincera. Entendes? Não podia suportar a ideia de te perder. Estava a tentar ganhar um pouco de tempo.

- Tempo foi o que perdemos - disse Tabitha com ternura. - O que estás a fazer? - riu-se ao vê-lo ajoelhar-se sobre a erva molhada. - Os vizinhos vão ver.

- Melhor - respondeu Zavier encantado por a ver sorrir novamente. - Vamos fazer as coisas como devem ser feitas - acrescentou muito sério.

- Tabitha Reece, queres casar-te comigo? - perguntou-lhe pondo-lhe o anel.

Tabitha ficou a observá-lo.

- Diz alguma coisa.

- Para quê? Já te disse que sim antes. Faz exactamente seis semanas, dois dias e quinze horas.

- Mas isso foi só temporário - disse Zavier confuso.

- Não, querido. Disse-te que sim e era para

sempre.

 

- É uma vergonha, não é verdade? - disse Aiden com Darcy nos joelhos. - Incrível. Os teus avós enlouqueceram porque hoje é o teu baptismo - acrescentou beijando o seu sobrinho. - Tabitha, por que está a ficar vermelho? Por que cheira tão mal de repente?

Tabitha riu-se e pegou no seu filho ao colo.

- Os teus avós estão apaixonados como uns adolescentes e é maravilhoso - disse-lhe. - Aiden, despacha-te porque vais chegar tarde ao teu encontro e muito obrigada pela prenda. Não devias ter-te incomodado.

- Como não? Não deixes que o parta, eh? Esse quadro vai custar uma fortuna dentro de alguns anos. Na verdade, Zavier, até que isso aconteça.

- Quanto? - perguntou o seu irmão muito sério.

- É que Luigi tem gostos muito caros, sabes? Não podes imaginar como as garrafas de champanhe estão caras.

- Mas tu não podes beber - recordou-o Zavier.

- Mas ele sim.

- Se gostasse mesmo de ti, não beberia na tua presença - avisou-o o seu irmão. - Sei o que digo - acrescentou ao ver que Aiden e Tabitha ficavam muito sérios.

- Diz-me um homem que teve de comprar a sua mulher? - brincou Aiden fazendo com que corasse. - É verdade, nunca me disseste quanto lhe ofereceste.

Tabitha deixou-os a falar e foi mudar e deitar o seu filho.

- Está a dormir? - disse Zavier aparecendo ao fim de alguns minutos.

- Sim, foi um dia muito movimentado.

- Esteve tudo perfeito - observou abraçando-a e olhando para o seu filho. - Na verdade, a tua avó estava radiante. Bruce deve fazê-la muito feliz. Pelo menos, conseguiu que deixasse de jogar. Bom, já basta de falar dos outros. Há uma coisa para ti lá em baixo.

- Mas já abrimos todas as prendas - disse Tabitha seguindo-o. - O que é?

- Abre - disse nervoso.

- Oh, Zavier - exclamou Tabitha ao deparar-se com um lindíssimo colar. - Tantos rubis.

- Quarenta - disse ele. - Um por cada ano de casamento. É o colar que o meu avô fez para a minha avó no seu quadragésimo aniversário de casamento.

- Não mo deverias dar dentro de trinta e nove anos? Vou continuar aqui, sabes? Não penso ir a lado nenhum.

- Eu sei, mas gosto que mo digas uma e outra vez - Zavier sorriu. - Parecia-me que era uma pena tê-lo guardado durante tanto tempo quando o podes fazer brilhar - acrescentou apertando-lho. Não posso acreditar que estive quase a deixar-te escapar.

Tabitha apoiou-se no seu peito e fechou os olhos. Não queria sequer imaginar o que teria sido da sua vida sem Zavier.

- Posso perguntar-te uma coisa?

- Dispara - disse ele.

- Porque não vendes a empresa? Os teus pais estão bem, eu tenho a minha escola de dança, Aiden tem a sua galeria. Porque não aproveitas para fazer com que os teus sonhos se tornem realidade?

- Que sonhos? - disse Zavier, beijando-lhe o pescoço.

- Os que me contaste na noite na qual decidimos casar-nos - respondeu Tabitha tentando concentrar-se na conversa apesar de Zavier lho estar a dificultar ao acariciar-Lhe os seios.

- Não me lembro de ter falado muito naquela noite - disse deslizando o vestido até ao chão.

- Na primeira vez em que fizemos promessas - aclarou-lhe Tabitha.

- Ah, naquela noite... - disse Zavier pegando nela ao colo e levando-a para o quarto. - Falas muito.

- A sério, Zavier, preciso de saber o que aconteceu aos teus sonhos.

- Estão cumpridos - disse-Lhe deitando-a na cama e tirando-lhe a roupa interior.

- A sério?

- Asseguro-te.

 

                                                                                Carol Marinelli  

 

                      

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