Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites
PRAZER ESPECIAL
Cristiano De Angelis se surpreende ao ver as curvas tentadoras de Bethany Maguire em um vestido sedutor. Acostumado a receber tratamento especial das socialites de Roma, conquistar aquela mulher seria um prazer! No entanto, Bethany não pertence ao mundo milionário de Cristiano, e após ceder ao desejo não tem escolha senão abandonar o homem que conquistara seu coração. No entanto, ele não a deixará escapar tão facilmente...
Metido no caixote frio que era o seu Mercedes preto, Cristiano De Angelis observava a agitação das ruas calorentas que o cercavam, por trás de óculos escuros de grife. Aquela área de Roma era familiar para ele, assim como a cobertura londrina onde vivia grande parte do ano, de vez em quando reservando um tempo para visitar sua família, na Itália. Cresceu lá, onde também frequentara a escola, e aproveitou muito bem a vida como membro da elite italiana, mas finalmente abriu suas asas ao sair de casa para cursar a universidade na Inglaterra. Voltar era uma delícia, mas também um pouco claustrofóbico, mesmo que apenas por uma semana, e sempre era um alívio retornar ao relativo anonimato que as ruas de Londres ofereciam.
Franziu a testa ao pensar na conversa que acabara de ter com a mãe e o avô durante um almoço suntuoso, servido com formalidade desnecessária na opulenta sala de jantar da casa do avô. Falaram sobre a passagem do tempo, e de como isto o afetava.
Fora um assalto, duplo, com precisão militar. Sua mãe de um lado, quase retorcendo as mãos ao discorrer sobre seu desejo materno de que ele assentasse, fosse feliz, parasse de levar a vida na brincadeira; enquanto seu avô atacava por outro lado, falando sobre sua saúde frágil e sua velhice, como se fosse um decrépito senhor centenário, não o homem de 78 anos em ótima forma, capaz de atrair a atenção de todos, sem dizer uma palavra.
— Conheço uma menina muito interessante... — disse a mãe, tentando imaginar se aquela informação casual fora semeada em solo fértil.
Mas Cristiano não entendia. Mesmo sabendo que um dia poderia se casar com alguém interessante, aquele dia ainda não chegara. Foi firme na sua resposta e, claro, sentiu-se mal ao ter de encarar os rostos desanimados dos dois. Mas, obviamente, logo que tivessem chance, eles se provariam mais implacáveis que um trem à velocidade máxima. Caso tivessem percebido um mínimo de abertura por parte de Cristiano, teriam lhe apresentado várias candidatas em poucos minutos.
Um sorriso relutante e irônico fez curvar a sua boca ao mesmo tempo em que movimentava as mãos tentando livrar-se da lembrança da conversa familiar. Observava as centenas de compradoras que se amontoavam nas ruas de lojas elegantes, como se ninguém nesse lado do mundo tivesse medo de gastar.
Sem tempo para pensar, bateu no vidro que o separava do motorista e se curvou para dizer a Enrico que desceria ali mesmo.
— Leve o carro de volta para casa — disse Cristiano, fazendo uma careta ao perceber que teria de enfrentar o terrível sol de verão, mas reconhecendo que, se não fizesse isso, ficaria parado no trânsito ainda por um bom tempo. Mesmo que o interior do Mercedes fosse muito confortável, não poderia perder tempo sentado mais meia hora. — Tenho que entregar isto para a minha mãe e irei mais rápido a pé. Para voltar, eu pego um táxi.
— Mas, senhor, o sol...
Enrico, motorista da família desde que Cristiano se conhecia por gente, olhou preocupado para o seu passageiro, que estava aponto de mesclar-se ao sol escaldante, mas Cristiano forçou um sorriso.
— Não sou uma moçoila vitoriana prestes a desmaiar, Enrico — respondeu, seco. — Acho que posso aguentar meia hora nas ruas. Olhe só para tantos compradores. Ninguém parece a ponto de morrer de calor.
— Mas, senhor, elas são mulheres. Foram feitas para as compras, seja qual for a estação do ano, e nunca são afetadas...
Cristiano ainda sorria ao sair para o sol inclemente, com os óculos de sol de volta ao seu lugar. Ele notava, mas preferia ignorar, os olhares das mulheres que passavam perto. Sabia muito bem que, caso diminuísse o passo, não demoraria muito até que uma linda mulher de longas pernas, rica, de cabelos negros se aproximasse.
Mesmo não morando na cidade, seu rosto era bem conhecido em certos círculos. Suas visitas a Roma eram repletas de convites, muitas vezes não aceitos, de mulheres que adoravam sua companhia, pois, ao contrário do pensava sua mãe, ele sabia muito bem fazer suas escolhas. Ao sair do quarteirão de compras lotado, começou a pensar nas escolhas que ela fizera para ele.
Não tivera qualquer envolvimento sério com mulheres. Não tinha nada contra o casamento. Nem pensava em ter uma vida sem filhos, mesmo que antes tenha tentado livrar-se deste pensamento com um movimento brusco de mão. Cristiano só pensava no quanto fora afetado pelo casamento feliz de seus pais. Seria possível? Não deveria funcionar de outra maneira? Os dois foram muito unidos enquanto era criança, combinavam perfeitamente, como se fossem personagens de um conto de fadas, e viveram vidas completamente felizes, até que seu pai morreu, há cinco anos. Sua mãe ainda se vestia de preto, carregava fotos do marido na bolsa e costumava se referir a ele usando o tempo presente.
Em uma época de divórcios rápidos, alpinistas sociais e mulheres com bom olho para não perder a oportunidade de se casar com um homem rico, que chance ele teria de conseguir um casamento parecido com o dos pais?
Não tardou vinte minutos e estava em pé na frente de um lindo edifício de apartamentos onde deveria entregar uma delicadíssima orquídea a uma mulher que, duas semanas antes, ajudara em um evento de caridade. Era um presente atrasado em agradecimento à sua contribuição. Sua mãe saíra de Roma para passar um tempo na casa de campo e a orquídea, ela mesma dissera, não esperaria pelo seu retorno. Mas não confiaria em outro mensageiro, pois aqueles meninos desastrados eram inúteis para entregar qualquer objeto de natureza frágil.
Mas Cristiano enxergava aquilo como uma forma encontrada pela mãe de revidar sua negativa de se encontrar com qualquer pretendente que tivesse escolhido. Caso fosse verdade, era um preço baixo a pagar por escapar tão facilmente. E a caminhada não fora tão desconfortável quanto ele imaginara. Pouquíssimas vezes caminhava, onde quer que fosse, pensou. Sua vida em Londres comportava o luxo de ter um motorista particular todas as horas do dia. Além do mais, andar por andar era uma perda de tempo em sua vida tão agitada.
O porteiro do edifício lhe indicou o caminho do elevador sem nada perguntar. Mesmo vestindo roupas casuais, Cristiano exalava uma aura de riqueza, poder e confiança que lhe possibilitava entrar em qualquer local. O porteiro não pediu que se identificasse, e Cristiano se incomodaria caso seus passos fossem questionados.
Em vez de usar o elevador, decidiu subir a pé os três andares até o apartamento. Não era uma escada qualquer. Estava coberta por um carpete turquesa e o papel de parede era sofisticado e delicado. Imaginou que o apartamento seria parecido. Mas, após tocar a campainha várias vezes, não teve resposta. Nem quando ele ligou para o celular de sua mãe, não conseguiu avisar que a missão fora perda de tempo.
O que deveria fazer? Estava ali, com uma flor caríssima nas mãos, em busca de uma casa.
Irritado consigo mesmo por ter caído naquela armadilha, finalmente decidiu bater na porta. Como em todos os apartamentos luxuosos do mundo, o hall estava em silêncio absoluto. Sabia, por experiência própria, que as pessoas ricas não costumam dividir seu tempo com os vizinhos. Ele mesmo não tinha tempo para conversas furadas nas escadas ou em elevadores, e ficou feliz ao ver que contava com um elevador privativo para a sua cobertura.
Bateu mais uma vez na porta, desta vez bem forte, e foi recompensado com o som de passos.
Sob circunstâncias normais, Bethany, ao ouvir aquelas batidas ridiculamente altas e incrivelmente rudes, teria corrido para a porta, pronta a dar à visita indesejada um bom passa-fora, mas de alguma maneira ela sabia que não era uma circunstância normal.
Na verdade...
Olhou o que vestia e ficou nervosa. O vestido, que deve ter custado o preço de um carro popular a quem o comprou, moldava-se perfeitamente ao seu corpo, dando-lhe leveza e graça. Era extremamente bonito, tão bonito nela quanto no armário, onde estava há apenas 15 minutos.
Ah, meu Deus, por que, por que sucumbira à tentação de vesti-lo? Conseguira resistir por três dias, por que justo agora? A verdade, ela pensou, frenética, é que fazia tanto calor lá fora, que quando voltou ao apartamento tomou um longo e luxuriante banho na esplêndida banheira de mármore e depois passara ao closet, três vezes maior que o quartinho que alugava na universidade. Então passou a mão naqueles tecidos maravilhosos, nos vestidos, casacos, jaquetas, e parou naquela espetacular criação. Foi incapaz de resistir ao impulso.
Tendo ignorado a campainha, o insistente visitante passou a bater como louco na porta, e ela sabia que não poderia ser Amy, que fora à Florença passar o fim de semana com o namorado. Nem poderia ser um vendedor, pois não eram permitidos além do hall do prédio. Portanto, só poderia ser um... morador, ou pior, um amigo.
A quarta batida a fez voltar à realidade, interrompendo seu pensamento de que seria despedida do trabalho, e que isto poderia gerar uma perseguição por raivosos policiais italianos e uma temporada na cadeia.
Parou atrás da porta e abriu-a muito lentamente, assegurando-se de que nenhuma parte do seu corpo vestido naquela roupa roubada seria visto. Seus olhos o observaram de baixo para cima, duas vezes. Dos caros óculos escuros à calça e camisa pólo cor de creme, observou seus braços morenos com pelos negros coroados por um relógio de prata muito caro... além do rosto mais bonito que já vira em toda a sua vida. Na verdade, o estranho do lado de fora da porta era tão incrivelmente bonito que, por alguns segundos, Bethany ficou sem ar.
Mas logo voltou à realidade e lembrou-se de onde estava. Aquele apartamento não era seu, e a roupa que vestia também não. Escondeu-se ainda mais atrás da pesada porta, em busca de segurança.
— Sim. Posso ajudá-lo?
Não queria encarar o homem, mas era quase impossível resistir. Não apenas por sua altura, devia ter mais de l,80m, nem pela perfeição de seu rosto nem pelos músculos esculpidos de seu corpo. Era a aura de poder e incrível segurança que faziam dele um homem com sex appeal potente, quase sufocante.
Cristiano, no início assustado com a mulher que lhe abrira a porta — uma jovem, quando esperava uma senhora de idade —, estava ocupado olhando para o rosto em forma de coração, de linhas delicadas, para os lábios carnudos, os brilhantes olhos e cabelos longos que caíam até quase a cintura.
— Está se escondendo! — ele perguntou e ficou fascinado ao perceber que suas bochechas coraram. Ela não reagia como as mulheres costumavam fazer à sua presença, com sorrisos e piscadelas, dando todos os sinais de interesse.
— Se estou me escondendo? — A voz de Cristiano era muito parecida com ele: profunda, tranquila e confiante.
— Não estou me escondendo. — E deslizou um pouco mais para que nenhum pedacinho do vestido ficasse à mostra. Não conhecia aquele homem, mas caso vivesse ali ou fosse um amigo, saberia que ela não era Amélia Doni, a dona do apartamento, já com quarenta e poucos anos. No entanto, notaria que aquele vestido incrivelmente caro não poderia pertencer a uma menina de 21 anos que trabalhava na casa. — Estou só um pouco surpresa... pela visita... Sinto muito, não sei qual o seu nome...
— Cristiano De Angelis — ele respondeu, esperando um sinal de reconhecimento, pois qualquer mulher que fosse dona daquele apartamento já teria ao menos ouvido falar na família De Angelis. Ficou imaginando por que nunca antes a vira em um dos eventos da alta sociedade dos quais inevitavelmente participava sempre que vinha a Roma visitar sua família. Certamente se lembraria daquele rosto. Não era a beleza italiana clássica, mas seu italiano era fluente. Ela parecia... Logo percebeu porque nunca antes a vira, e sorriu, mudando imediatamente do italiano ao inglês.
— Agora que já me apresentei, talvez você possa me dizer se toquei no apartamento certo... Signora Doni?
— Sinto muito. Você não me disse o que está fazendo aqui.
Cristiano mostrou a orquídea, de cuja existência se esquecera por um tempo.
— São por parte da minha mãe.
Bethany ficou olhando muda para ele enquanto os nervos do seu cérebro começavam a voltar à vida. Neste momento, percebeu que não ele tinha ideia de como seria o rosto de Amélia Doni. Portanto, não perguntaria nada sobre o que estava fazendo ali, usando aquelas roupas. Relaxou e esticou o braço para pegar a planta.
— Ótimo. Obrigada.
Ótimo? Obrigada? Não deveria convidá-lo a entrar? Pelo menos demonstrar algum interesse em saber de quem se tratava?
— É um pouco ridícula esta conversa — disse Cristiano. — Por que não me convida para entrar? Afinal de contas, passei os últimos 25 minutos sob um sol de rachar caminhando até aqui para entregar essa orquídea. Adoraria aceitar algo refrescante para beber.
Cristiano não acreditava ao ver que ela continuava debatendo consigo mesma se deveria ou não abrir a porta e deixá-lo entrar.
— Talvez nunca tenha ouvido falar de mim, mas posso garantir que De Angelis é uma família muito conhecida na Itália. Não precisa temer por seus objetos.
Desde quanto dava explicações a alguém sobre sua família? Na verdade, quando foi a última vez que se viu na companhia de uma mulher que o olhava como se ele fosse capaz de atacar a qualquer momento? Na verdade, jamais acontecera antes.
— Não posso — ela disse, respirando um pouco mais aliviada. — Fui instruída a não abrir a porta para estranhos.
— Eu me apresentei. Sendo assim, já não sou um estranho. E você deve conhecer a minha mãe, mesmo que de forma casual...
Ele sorriu e todo o sistema nervoso de Bethany pareceu derreter-se. Seus pelos ficaram eriçados, sua garganta seca e seus seios hipersensíveis de um momento a outro; sentia os mamilos rígidos e a respiração ofegante ao mesmo tempo.
Não era uma reação costumeira em seu corpo. Na verdade, sempre se sentia confortável frente ao sexo oposto. Podia conversar com os homens, brincar, e mesmo avaliá-los sem aquela sensação estranha. Encurralada entre a sua irmã mais velha, inteligente, e a mais nova, cuja beleza radiante deixava os garotos permanentemente pendurados na porta de casa, Bethany se acomodou muito bem no meio, sendo razoavelmente inteligente e, pelo menos aos seus olhos, medianamente atraente.
De sua posição confortável, pode observar Shanni a, em seu mundo elitista de livros e namorados altamente intelectuais, e Melanie, que alternava de um rapaz a outro com a mesma rapidez que outras mulheres trocam de roupa. Aprendera a conversar com os dois tipos de homens. Por isso estava um pouco chocada e paralisada pela forma como aquele italiano alto, moreno e maravilhosamente lindo conseguia tirá-la do sério.
— Tudo bem, acho que você pode entrar um momento — disse, nervosa. — Está muito quente aqui. Posso oferecer um copo de água, se quiser... — Abriu a porta e afastou-se para que ele passasse. Olhando para baixo, percebeu que usava sandálias nos pés. Uma pena que a dona da casa não calçasse o mesmo número que ela.
— Que bonito — disse Cristiano, observando o apartamento. Fora criado em ambientes em estilo palaciano, por isso as casas de outros ricos nunca chegavam a impressioná-lo. — Há quanto tempo mora aqui?
Deu uma volta e ficou olhando-a, e o impacto de tal visão foi tamanho que o mundo pareceu deixar de girar por um milésimo de segundo. Seus olhos eram do verde mais claro que já vira em sua vida e seus cabelos castanhos soltos faziam um contraste enorme com a palidez de sua pele. As sardas, paradoxalmente, adicionavam frescor à sua beleza, salvando-a de ser apenas mais um rosto atraente. Não entendia por que se escondera atrás da porta. Seu corpo era maravilhoso. Magro, mas com seios fartos e, julgando pelo vestido, era uma mulher de muito bom gosto.
— Há quanto tempo moro aqui? — ela repetiu, como um papagaio. — Não muito. Vou pegar um pouco de água para você. Se quiser... me esperar aqui. Não demoro...
— Você parece vestida para sair. Cheguei na hora errada? — perguntou, olhando-a com olhos brilhantes, tentando entender seu comportamento estranho e ao mesmo tempo pensando que gostaria de transformar o encontro casual em algo mais recompensador. Poucas vezes se via no papel do caçador. E quase nunca se sentia atraído tão rapidamente. Estava gostando das duas experiências.
— Vestida para sair? — ela fez um grande esforço e tirou os olhos dele, tentando dar impulso aos joelhos e seguir para a cozinha.
— Você é sempre assim, nervosa?
Bethany, que pegava água na geladeira, percebeu sua aproximação e teve um sobressalto.
— Você se importaria de não me seguir assim? Tome, a sua água — disse, estendendo o copo. Depois cruzou os braços.
— Posso saber o seu nome, srta. Doni? — Conseguir arrancar alguma informação daquela mulher era tudo o que Cristiano queria; seus dentes rangiam de irritação.
— Por que quer saber o meu nome?
Várias possibilidades passavam por sua mente, sempre ideias claras. Perderia o trabalho ao ser descoberta por um parente da dona da casa. Bethany não sabia muito bem por que tinham deixado toda a responsabilidade nas mãos de Amy, mas Amy repassara tudo a Bethany, pois encontrara um namorado e não queria perder uma semana de seu verão presa em Roma. Bethany gostou da ideia. Poderia praticar italiano na cidade mais bonita do mundo, com acomodação grátis num tipo de casa que nunca vira igual, onde jamais imaginou que poderia viver. E ainda seria paga por tudo isso. Revelar sua identidade seria o primeiro passo para muitos problemas, grandes para ela e ainda maiores para Amy. Sentiu-se mal e fechou os olhos, apoiando-se na pia da cozinha.
— Você está bem? — Quando abriu os olhos, percebeu que ele estava muito perto, e ficou sem ar, corada.
— Tudo bem. Estou bem — disse, afastando-se um pouco.
Cristiano franziu a testa ao perceber sua tentativa de fugir.
— Você não parece bem. Está sem cor. Talvez seja culpa do calor. As mulheres italianas estão acostumadas ao calor de Roma no verão, mas você não é italiana, certo? Fala italiano fluente, mas... — disse, olhando para a cozinha perfeitamente montada, com sinais de ser um lugar pouco usado. — Este é um apartamento de férias?
Bethany mal podia olhar para ele. Quem teria um apartamento de férias como aquele? Com mármore por todo lado? Pinturas pelas paredes que custavam o olho da cara? Um closet lotado de roupas de costureiros famosos?
— Eu tenho várias.
— Várias? — ela perguntou e ficou aliviada quando ele afastou os olhos para tomar um gole de água.
Cristiano deu de ombros.
— Aqui. Em Paris. Nova York. Barbados. Claro, as de Paris e Nova York são as mais usadas, pois viajo muito a trabalho para lá. É ótimo não ter que depender de reservas de hotel quando estou fora — disse, deixando o copo na pia, determinado a retomar a conversa sobre ela. — Então... qual é o seu nome?
— Amélia — respondeu, cruzando os dedos por trás do corpo.
— E mora aqui, Amélia Doni?
— Em Londres.
— Não é uma pessoa muito receptiva, certo, srta. Amélia Doni? Imagino que seja uma senhorita... Não vi nenhuma aliança na sua mão...
— Se já terminou de beber sua água...
Mais do que afastá-lo, ela parecia querer fazer com que saísse do apartamento, e ao notar isso, Cristiano trincou ainda mais os dentes.
— Há quanto tempo está aqui? — ele perguntou, pois, quanto mais desinteressada ela parecia em prosseguir com a conversa, mais ele se mostrava determinado a tentar quebrar sua invisível barreira de silêncio.
Bethany respirou fundo e murmurou algo como não muito.
— Imagino que tempo suficiente para envolver-se em uma campanha de caridade.
— Campanha de caridade?
— A orquídea? A que está neste momento na mesa do hall? É um presente de agradecimento da minha mãe. Você deve conhecer os trabalhos que ela faz por caridade, e acho que o último levantamento de fundos foi um sucesso. Ela mesma queria trazer a orquídea, mas vai para o campo hoje à tarde e demora um pouco para voltar.
— Para o campo... — ela repetiu, sabendo que começava a soar como alguém com problema mental.
— Temos uma casa de campo — explicou, intrigado com a total falta de interesse que ela demonstrava em tudo o que dizia. — É bem mais fresco nas montanhas que na cidade...
— Sei, sei. Imaginei que fosse. Peço que lhe agradeça pela... pela... planta...
— Qual foi o seu papel no evento de caridade?
— Eu... bem... na verdade, prefiro não falar sobre o que já passou. Sou o tipo de pessoa que gosta de viver o dia de hoje...
— O meu tipo de mulher. Só volto amanhã para Londres. Jante comigo hoje.
— O que? Não! Não, não, não...! — Bethany ficou perdida com a sensação de estar sendo descoberta e a vontade de aceitar o convite. Não sabia se era por estar na Itália, longe do conforto familiar, mas tudo o que sentia e fazia não tinha nada a ver com o seu caráter habitual.
— Você tem que ir embora — disse, com urgência.
— Por quê? Está esperando alguém? Um homem? Está envolvida com alguém?
— Não — ela respondeu, e começou a andar em direção à porta de entrada. Mentir não era algo natural para ela, e sabia que seria questão de tempo até que começasse a se enrolar.
— Então vamos direto ao assunto. Você não está envolvida com ninguém. Não está esperando ninguém. Por que não aceita jantar comigo?
— Eu... eu... Acho que é um pouco rude da sua parte entrar aqui e me convidar para jantar...
— Você quer dizer que não está lisonjeada?
— Quero dizer que não lhe conheço...
— Então o jantar será uma ótima oportunidade de resolver esse problema!
Cristiano notou que, de alguma maneira, fora levado em direção à porta, e que a pálida e pequena mão daquela menina estava firmemente agarrada à maçaneta. Ficou olhando, incrédulo, enquanto ela abria a porta. Ela estava, literalmente, colocando-o porta afora!
— Não tenho tanta certeza, mas ainda assim muito obrigada pelo convite. E... também pela planta. Vou cuidar dela, apesar de nunca ter sido muito boa nisso.
— Engraçado. Nem eu — Cristiano disse, apoiando-se contra a porta, para que ela não conseguisse abri-la. — Já lemos algo em comum.
— Você faz isso muitas vezes? — ela perguntou, com o coração batendo forte, pois havia algo nele que deixava seu sistema nervoso a mil. — Entra na casa de estranhos convidando para um jantar? Certo, talvez não seja uma atitude tão rude, mas você tem que admitir que é um pouco estranho. Quero dizer... você não me conhece. Eu poderia ser qualquer pessoa!
— Certo — ele respondeu, pensativo —, você poderia ser qualquer pessoa. Uma assassina, psicopata... — e abriu um pequeno sorriso que lhe tirou o fôlego. — Pior, poderia ser uma mulher em busca do meu dinheiro... Mas você tem certas credenciais, especialmente o seu contato com minha mãe e... — deu uma olhava em volta, depois para ela... — o fato de ser dona de um lugar como esse. Assassinos, psicopatas e alpinistas sociais não costumam participar de eventos de caridade nem têm apartamentos nas melhores áreas de Roma. Por isso, deixarei meus medos de lado.
Bethany começava a sentir-se mal com tudo o que a estava envolvendo.
Credenciais? Conhecia sua mãe? Dona do apartamento?
— E, diga a verdade, você vai ter que comer alguma coisa.
— Eu... na verdade, eu não gosto de jantar fora. Prefiro comer em casa. Cozinhar. Tenho tanta coisa boa aqui. Adoro experimentar.
— Ótimo. Eu venho aqui, então.
— Você não pode — ela respondeu, olhando para aquele rosto perigosamente lindo que a encarava, e em seu corpo brotou a sensação de estar andando à beira de um precipício. A vista era linda, mas cair era uma possibilidade real.
— Claro que posso — ele disse, dando de ombros. Abençoado com uma mistura letal de beleza, inteligência e riqueza, já vencera várias mulheres que tentaram resistir ao seu charme, e se recusava a acreditar que aquela menina à sua frente seria uma exceção. — Posso vir aqui ou passo para lhe pegar às oito.
— Por quê? Por que quer me levar para jantar? Sua mãe pediu que fizesse isso?
— E deveria? — perguntou Cristiano, franzindo as sobrancelhas. — Minha mãe não tem qualquer envolvimento na minha vida pessoal; na verdade, já estará na casa de campo quando eu vier aqui, esta noite. — E afastou-se da porta, olhando fixamente para ela. Tinha uma pele maravilhosa. Translúcida, mesmo sem maquiagem. Nada a ver com das outras lindas morenas com quem costumava flertar. Sua pele clara falava pouco sobre ela, mas deveria ter dito algo? Provavelmente seria a amiga da amiga de uma amiga que fora sequestrada ao evento de caridade. Por isso a orquídea, uma demonstração de agradecimento cara, mas ainda assim bastante impessoal. De qualquer maneira, foi melhor não saber nada, pois talvez tivesse perdido o interesse de antemão.
— Todas as mães estão envolvidas com as vidas dos filhos — disse Bethany, pensando na própria mãe, que ainda enviava comida pelo correio da Irlanda para o caso de a filha estar a ponto de morrer de fome.
— Quando o assunto é mulher, mantenho as rédeas nas minhas mãos — ele disse, abrindo a porta, não deixando chance para que ela começasse um debate no qual poderia vencê-lo. Nunca fora vencido nesse sentido. Além do mais, tinha ótima antena e percebia certo interesse por parte dela. Não entendia por que tentava lutar contra algo tão inocente quanto um jantar, mas, seja qual fosse sua razão, seus olhos arregalados o intrigavam. Claro que podia apenas estar bancando a difícil, mas de alguma forma ele duvidava que fosse esse o motivo. Na verdade, nunca vira um rosto tão expressivo desde... francamente, não se lembrava de ter visto algo assim. — Devo avisar que normalmente consigo o que quero — disse, sem uma pitada de vaidade.
— E quer jantar comigo, antes de ir embora amanhã.
— Finalmente! — Ele olhou para Bethany, abrindo mais um daqueles sorrisos incríveis. — Chegamos a um ponto comum — disse, pegando uma de suas mãos e virando a palma para que pudesse dar um beijo rápido na pele suave. Gesto aparentemente puro, mas muito italiano, que fez com que Bethany tremesse.
— Acho que sim. Mas... preciso dormir cedo... — disse, nervosa.
— Você quer dizer que gostaria de voltar para casa antes da meia-noite, antes de se transformar em abóbora?
Bethany ficou vermelha. Honestamente, não sabia dizer o que a levara a aceitar o convite para jantar, mas estava muito nervosa, dos pés à cabeça, e seus olhos verdes o encaravam, fascinados. Nem mesmo aquela história sobre meia-noite e abóbora a fez relaxar, e ainda se sentia meio tonta, mesmo que ele já tivesse ido embora.
Mas quando se viu refletida no espelho do quarto percebeu o seu estado e ligou para o celular de Amy.
Precisou conter a frustração quando a voz animada de Amy atendeu a chamada, falando sem parar sobre sua última conquista e sobre as lindas paisagens de Florença, que ainda não tinha visto bem porque a cama estava provando ser um lugar muito acolhedor.
Bethany esperou que parasse de falar e disse, honestamente:
— Tenho um pequeno problema por aqui.
Ainda usava o vestido que fora testemunha de seu momento de loucura.
— Meu Deus! Não me diga que o apartamento está em chamas!
— Ainda não. Mas um homem esteve aqui... este é o problema... — O vestido, que antes parecia tão bonito, tão tentador, olhava para ela no reflexo do espelho enquanto contava à amiga o que se passara. Estava um pouco perdida, pois não saía de sua cabeça a imagem daquele homem estranho, moreno, com rosto incrivelmente sexy, algo invasivo e ao mesmo tempo muito excitante, nada a ver com os outros homens que costumavam olhar para ela.
— Então você vai sair para jantar com ele... Meu Deus, deixa eu ver... certo, certo... talvez seja melhor mesmo... Por quê?
Meia hora depois tirou o vestido e colocou-o sobre a cama, pois deveria ser lavado a seco na manhã seguinte, e pensou nas várias mentiras que contara. Catrina, a verdadeira governanta da casa de Amélia Doni — que partira em um cruzeiro, a quilômetros de distância de Roma —, estava em Londres, em um tratamento de reabilitação. Por isso a tarefa de cuidar da casa caiu nas mãos de Amy, mas, sendo como era, permitiu que o amor invadisse sua mente e deixou a missão de lado. Por sorte, Bethany estava por perto, sempre confiável. Era o tipo de menina que adorava ler livros em italiano à noite e para quem três taças de vinho de qualidade significavam uma festança.
Olhando o vestido na cama, imaginou o que poderia acontecer a ela. A maior loucura que fizera nos últimos tempos fora vestir aquilo, e o fez porque realmente gostava de se sentir bem algumas noites, às vezes lendo um bom livro e tomando uma caneca de chocolate quente.
Mas aceitara o convite para jantar vindo de um homem extremamente sexy e ultra sofisticado. Seria apenas uma noite, e se antes agira como uma personagem, como a dona de um apartamento de luxo que usa roupas caras, se fingira ser o tipo de mulher incapaz de usar algo mais barato que aquilo, por que não deveria aceitar o convite? E não haveria problema para Amy, pois ninguém poderia entrar em contanto com Catrina em seu leito de hospital na Inglaterra. E, acima de tudo, a última coisa que queria era ver um italiano bem relacionado começando a fazer muitas perguntas.
Sentiu uma onda de excitação em seu corpo. Claro, qualquer coisa que usasse aquela noite seria lavada a seco. Não era tão irresponsável. Só passaria algumas horas se divertindo... o que poderia haver de errado nisso?
— Então... por que não me fala de você...
Era um pedido inevitável, mas ainda assim deixou Bethany nervosa porque, após a euforia inicial de pensar em como seria viver a vida de outra pessoa por uma noite, veio a realidade de que, na verdade, passaria algumas horas na companhia de um deus do sexo, mas usando identidade falsa. Entre a saída de Cristiano do apartamento e sua voz no interfone, horas mais tarde, teve tempo suficiente para pensar que um homem como ele — sofisticado, lindíssimo — nunca olharia para uma garota como ela, em circunstâncias normais. Na verdade, sob circunstâncias normais nunca teriam se encontrado.
Bethany antes procurou algo entre suas coisas. Sair de casa com roupa de outra pessoa seria demasiado luxo? Teve de pensar em como responder essa pergunta.
Finalmente encontrou uma resposta vaga e sem sentido, aliada à ideia de ser um espírito livre.
— E o que isso significa? — perguntou Cristiano, olhando para ela, intrigado.
Por isso desejava aquele jantar mais do que qualquer outro encontro em sua vida. E ela não o estava desapontando. Quando as portas do elevador se abriram e Bethany cruzou o piso de mármore na sua direção, ele literalmente ficou paralisado. Talvez tivesse todo o dinheiro do mundo à sua disposição, mas deixara de lado as pérolas e diamantes, o costumeiro vestido preto que grita o nome do estilista e os saltos altos mortíferos. Em vez disso, usava jeans e mocassim rasteiro de bronze, além de um lenço azul sobre os ombros. Cristiano gostou. Parecia uma mulher confiante, que preferia o conforto a um visual sexy.
— O que isso significa? — ela repetiu, e o calor humano transpareceu em seu sorriso. Ela falava, não apenas balbuciava como uma adolescente perdida, e começou a relaxar um pouco e aproveitar o momento. — Você parece ter passado grande parte de sua vida numa bolha.
— Viver numa bolha... — Cristiano olhava para ela, pensativo. — Acho que realmente cresci numa espécie de bolha. Nascer em um ambiente privilegiado tem seu preço. Mas você deveria fazer certas coisas...
— O quê? — perguntou Bethany.
— Não me diga que não viveu o mesmo. Que não teve que encaixar-se em certo estilo de vida, de uma forma ou de outra...
Bethany pensou em sua criação irlandesa, na casa sempre cheia de amigos e familiares, namorados, nos dois cachorros e três gatos e no caos, em geral feliz, que marcou seus anos de formação. Conformar-se era um conceito distante em sua vida.
— Sou mais do tipo não conformista — respondeu, sendo sincera. — Quero dizer, não sou rebelde, nem nada parecido, mas nunca me disseram que deveria me comportar dessa ou daquela maneira.
— Talvez as coisas sejam diferentes na sua parte do mundo — ele murmurou. — Aqui, na Itália, sempre soube que o meu futuro já estava escrito.
E os dois foram para a rua, numa quente noite de verão.
— Deve ter sido duro.
— Duro? Por quê? — ele estava fascinado ao ver que uma mulher era capaz de empregar o adjetivo duro para qualquer aspecto de sua vida. Mesmo a mais rica que já namorara ficara impressionada com o seu poder e privilégio. — Desde quando é ruim ter o mundo à sua disposição?
— Ninguém tem o mundo à disposição! — respondeu, sorrindo, e os dois começaram a andar lentamente em direção ao carro, que ele estacionara na única vaga livre, no final da rua.
— Você vai se surpreender.
Por trás do seu timbre suave de voz, ela foi capaz de detectar a rude marca de um homem acostumado a conseguir tudo o que quer, e estremeceu.
— Você imagina ter o mundo aos seus pés porque todos ao seu redor estão dispostos a concordar com o que diz. É uma das desvantagens de ter tanto dinheiro...
— Tanto dinheiro? Não acredito que estou ouvindo isso da boca de uma mulher — ele disse, espantado ao ver alguém com provavelmente muito dinheiro falando de forma lírica sobre os problemas da riqueza, uma pessoa que parecia ter consciência social.
Bethany pensou que, se ele estava se abrindo, por que não abrir-se um pouco? O que poderia perder? Instintivamente, percebeu que não se tratava de um homem com muita experiência em ter suas opiniões questionadas. A forma como a convidara para jantar e sua recusa em aceitar uma negativa indicavam que a tal crença em ter o mundo aos seus pés era absoluta.
— Com que tipo de mulheres você se envolve? — perguntou, fascinada ao ver que aquele homem lindo, dono de uma beleza exótica, olhava-a, perdido. Seus olhos eram negros, com os cílios mais longos que já vira, e a forma como seus cabelos negros se encaracolavam junto à gola da camisa, num corte um pouco longo demais para ser convencional, mas não tão longo a ponto de parecer desleixado, a deixava louca.
Cristiano sorriu e se aproximou, tocando um fio de seu cabelo.
— Sempre morenas — ele murmurou. — Por que será? Esta é a cor verdadeira do seu cabelo?
— Claro que sim! — respondeu, nervosa após o toque casual, com seus olhos verdes arregalados. — Não é qualquer uma que consegue esta cor comprando um tubo de tinta!
— Mas muitas tentam — ele disse, sentindo aqueles cabelos como seda entre os seus dedos.
— Então, em outras palavras, você só sai com morenas que pintam o cabelo?
— Elas costumam ter outras características além do cabelo pintado... — respondeu, com uma vontade louca de se aproximar e deixar o acaso tomar conta do que poderia acontecer. —... pernas longas. Rostos bonitos. Boa família.
— Boa família?
Cristiano deu de ombros.
— É importante — ele admitiu. — A vida pode ser muito estressante, e não seria legal ficar duvidando se a mulher com a qual divido a cama está interessada no meu dinheiro ou na minha companhia.
Bethany sentiu o estômago se revirar, mas estava certa de que não se encontrava ali pelo dinheiro.
— Talvez você seja um pouco inseguro.
— Um pouco inseguro? — Cristiano ficou olhando para ela, incrédulo. — Não. Insegurança nunca foi um problema para mim — ele disse, satisfeito. — E, por favor, não me diga que vai passar toda a noite tentando me analisar.
— Onde vamos jantar? — perguntou, mudando de assunto. E quando ele disse o nome de um restaurante muito famoso por seus preços astronômicos, bem como pela qualidade dos pratos, ela deu uma olhada para a calça jeans. Lição número um sobre como os super ricos se comportam: esqueça as convenções sociais. Cristiano claramente não dava a mínima para como ela estava vestida. Ele mesmo usava calça escura com camisa branca, que poderia ser uma roupa comum em qualquer outro homem do planeta, mas que parecia incrivelmente sexy em seu corpo.
— Mas eu estou vestindo jeans, sapato baixo e um lenço — disse Bethany. Também suspeitou que entrar em um lugar desse tipo de braço dado com um homem como ele atrairia todos os olhares, e ela jamais gostou de estar sob os holofotes, especialmente quando tais holofotes tinham uma carga a mais de intensidade. E se a apresentasse a outra pessoa? O mundo rarefeito dos ricos e famosos é pequeno. Em Roma, seria provavelmente do tamanho de uma quadra de tênis. Em pouco tempo seu segredo seria revelado.
— Você está tão... charmosa.
— Não o suficiente para entrar nesse restaurante — disse Bethany, culpando a si mesma por ter aceitado o convite.
— Não se preocupe. Eu conheço o dono. Acredite em mim, ele não se importaria se eu levasse uma mulher para jantar vestida com um saco de lixo.
— Simplesmente porque você consegue resolver tudo, não significa que tem direito de seguir em frente sozinho...
Ele não entendeu, e deixou isso claro em sua expressão perdida.
— Por que não?
— Porque é importante respeitar os demais — ela respondeu, repetindo o mantra que escutou toda a sua vida.
Cristiano a olhava como se estivesse se transformando em um ser de outro planeta, e Bethany ficou corada, desconfortável. Estava começando a entender outra norma não escrita dos ricos: não deveria ficar corada como uma criança.
— Uma socialite com princípios — ele murmurou, com um sorriso que a deixou sem ar e ainda mais insegura sobre o que estava fazendo. — Gosto disso. É muito raro encontrar alguém assim no meu mundo, uma mulher que não está preparada para dizer tudo o que pensa...
Na verdade, sempre saía com mulheres que não ligavam a mínima para o que acontecia ao redor. Eram ricas e tinham vivido entre paparicos, acostumadas a aceitar a adulação de homens e a subserviência de todos.
Mas essas mulheres não ousariam pôr os pés em Chez Nico se não estivessem vestidas para matar. Na verdade, essas mulheres não seriam capazes de ir a nenhum lugar se não estivessem vestidas para matar, pois aparência, para elas, era Indo.
— Não sou uma socialite — retrucou, desconfortável.
— Não? E aquele apartamento monstruoso no centro de Roma, que usa para passar férias? Você participa de projetos de caridade. Tem menos de trinta anos. Odeio dizer isso, mas são as qualidades perfeitas de uma socialite.
— Eu já disse, as coisas nem sempre funcionam assim... lá de onde eu vim.
— E de onde veio?
— Ah... talvez você nunca tenha ouvido falar — ela respondeu, sendo sincera. — Uma pequena cidade da Irlanda... no meio do nada...
— Unia cidade pequena, mas com um palácio ancestral?
— Sim, tem um palácio ancestral por lá... — Onde, anos aliás, sua mãe trabalhara fazendo limpeza para conseguir um dinheiro extra para o Natal. Era uma linda mansão cinza com torres e aparência desolada, caída no esquecimento.
— Então você deve ser metade italiana... que metade?
Bethany sorriu.
— Você sempre se interessa tanto pelas companhias que escolhe para jantar?
— Não. Não costumo cavar informações de minhas companhias. Mas é fato que grande parte das mulheres adora falar sobre si mesma.
— Para impressioná-lo, você quer dizer?
— Quer ouvir a verdade ou prefere que a trate como uma princesinha da falsa modéstia?
— Você tem um ego enorme, certo?
— Prefiro chamar senso de realidade — ele disse, adorando tudo aquilo. Fora trabalhoso conseguir que aceitasse o convite, e agora descobria que se tratava de uma companhia muito diferente. — Você não sente necessidade de me impressionar? — murmurou, e suas palavras demonstraram uma intimidade sensual que fez um calafrio percorrer a espinha de Bethany.
— Deveria? — ela perguntou, sentindo outro arrepio na espinha. Não era uma simples e excitante noite com um estranho. Era como se estivesse abrindo portas que nem sabia que existiam.
— Eu sinto uma vontade louca de impressionar você — ele disse, e pensou que também tinha uma vontade louca de saber mais sobre ela. Louca porque essa vontade não existia quando a convidou para jantar. Ele a vira, sentiu-se curiosamente atraído, e não pensou em nada mais, além de uma noite de amor. Não costumava fazer isso, mas seria um completo hipócrita caso se deixasse levar por uma série de razões para não se entregar a uma noite de paixão com uma mulher que talvez nunca mais voltasse a ver. No entanto, o seu objetivo de vida, até então, nunca fora encontrar um amor eterno.
— Por que não me conta...
Sua voz era uma carícia, bem como a expressão questionadora de seus olhos, mas ela notava certa distância. Ele permanecia meio encostado na porta, com suas pernas longas marcando um espaço entre os dois. Bethany não começou a noite imaginando que poderia terminar numa cama, e caso ele tentasse invadir seu espaço, saberia como afastá-lo, mas a verdade é que havia algo selvagemente erótico nele. Era interessante perceber que provavelmente não se aproximaria caso conhecesse a sua vida real. Talvez considerasse a si mesmo um homem do mundo, e sem dúvida era um homem do mundo: um animal fantasticamente sofisticado, mestre em tudo o que vivera. Mas não tinha vivido tanto, certo?
— Podemos caminhar... — ela disse. — Roma está cheia de lugares magníficos. Depois poderíamos ir a um lugar simples e acolhedor para comer. Uma pizzaria. Eu conheço uma maravilhosa, não muito longe do Coliseu.
— Claro! Por que não? Não como nessa área da cidade desde a adolescência. Na verdade, acho que conheço essa pizzaria. Tem um toldo de listras azuis e brancas do lado de fora? Um interior escuro? Garrafas de vinho vazias e com velas nas mesas, estilo anos 1960? Um dono acima do peso com um bigode generoso?
— Deve ter perdido um bom peso ao longo dos anos — disse Bethany, sorrindo. — Mas o bigode continua lá. Você costumava frequentar esse lugar? Com os seus amigos?
— Antes de a vida real tomar conta de tudo — disse Cristiano, seco.
— O que você quer dizer com vida real?
— Universidade e depois assumir a vida do meu pai. Pizzarias não costumam fazer parte da vida de um homem de negócios. — Ele sorriu, era bom estar ao lado de uma mulher tão franca. Os jogos femininos costumavam cansar depois de certo tempo.
— Então agora você só pode ir a bons restaurantes.
— Onde a pizza não faz parte do menu.
— Pobre Cristiano — ela disse, sorrindo, e seus olhos se encontraram. Sentiu um calafrio, pois foi capaz de enxergar um convite sexual naqueles olhos negros.
— Eu sei... — e fez uma cara de pena, mas sem nunca desviar os olhos dela —... estou condenado a nunca mais comer pizza. Imagino que sinta pena de mim. Certo, eu entendo. Aceito a pizza, mas não o passeio. Enrico ganha muito bem, como eu mesmo sempre digo a ele. E por que pagar para alguém que não faça nada?
— Quem é Enrico?
— O motorista da minha mãe, claro. Não me diga que você não tem um motorista em Londres?
— Vários — disse Bethany, pensando nos motoristas dos ônibus entre o seu apartamento e a universidade.
— Certo. Então estamos combinados.
Bethany se sentiu como uma princesa ao entrar no banco de trás daquele Mercedes preto. Uma princesa cujas roupas não combinavam muito bem com os luxuosos bancos de couro, mas e daí? Teve de conter-se para não passar as mãos pelos bancos. Deveria estar acostumada a tudo aquilo, não?
Vista daquela perspectiva, através das janelas de um carro que as pessoas seguiam para ver se conduzia alguém conhecido, a cidade parecia sua. Por isso Cristiano carregava aquele sentimento de ser dono de tudo nos ombros, como um manto invisível! Quinze minutos naquele carro e ela já começava a se sentir da realeza!
Mesmo instalados numa mesa nos fundos da agitada pizzaria, ela ainda se surpreendia com os olhares de todas as mulheres, tentando ver quem era aquele homem tão sexy e sua companheira.
Cristiano parecia não notar nada. Estava ocupado percebendo as mudanças sofridas pela pizzaria desde a última vez que estivera por ali, quase duas décadas antes, e ela se contentava em concordar com tudo o que dizia, finalmente concluindo que era um esnobe ao informar que o mínimo que o proprietário poderia ter feito seria trocar as toalhas de mesa, pois aquilo soava como uma tola recusa em aceitar a passagem do tempo.
— Eu? Esnobe? — perguntou, revigorado ao ver que ela argumentava, pois as mulheres não costumavam argumentar com ele, e ficou surpreso ao ver como resumira seu caráter em uma única palavra. Ela sorria ao dar seu veredicto, e seus olhos verdes lançavam sinais que o deixaram ainda mais louco por ela.
— Sim, você! — Naquele momento ela já bebera uma laça do vinho que fora servido. — Muita gente vem a este lugar em busca de comida simples, feita com coração e muito, muito boa...
— Que poderia ser melhorada com um investimento na decoração...
— Você gosta de garçons impecavelmente vestidos e de linho branco, mas nem todos no mundo compartilham o mesmo gosto...
— Mas gostariam, caso tivessem a chance de provar...
— Eu prefiro ambientes rústicos...
— Quão rústicos? Tenho certeza que reconheço algumas dessas garrafas de vinho com velas, devem estar aqui desde a última vez... cem anos atrás.
— Estou jantando com um senhor de idade! — retrucou, com cara de asco, enquanto ele servia mais vinho em sua taça, demonstrando que gostava daquele jogo.
— Você ficaria surpresa com o que este senhor de idade é capaz de fazer — disse Cristiano, em tom suave, com um sorriso nos lábios ao perceber a face rosada de sua acompanhante.
— O quê, por exemplo...? — ela perguntou, sem fôlego. Seus pelos estavam eriçados e ela se sentia muito diferente, como se tivesse assumido uma nova vida, uma vida onde as regras habituais de comportamento não serviam. E ela, de certa maneira, agia dessa forma, teve de admitir. Ainda que só um pouco.
— Ah... administrar um império com sedes nas principais cidades do mundo... desgasta. Além dos meus interesses por esportes. A rotina normal de ginástica, sem falar no esqui, pólo e nas vigorosas partidas de squash aos fins de semana.
— Sim, é impressionante, sobretudo para um paciente geriatra... — comentou, despreocupada... pelo menos era como pretendia soar; mas por dentro crescia uma atração sexual que nunca sentira antes por homem algum. Na verdade, nunca fora muito sexual, não se permitia nada além de uns beijos em encontros casuais. Nunca entendeu por que deveria desperdiçar sua virgindade, jogando-a pela janela simplesmente porque todas as pessoas da sua idade já tinham feito aquilo. Mas, com Cristiano, essa tentação invadia todo o seu corpo e a fazia se sentir como seja não fosse capaz de controlá-lo.
— E, além disso tudo, está o sexo... — disse, sem nunca tirar os olhos dela. — Nunca reclamaram...
— Credo... — ela disse, com as bochechas coradas e pegando nervosamente a taça de vinho, que bebeu. — Estávamos falando sobre o fato de você ser um esnobe... — ela o lembrou, e Cristiano baixou os olhos, em uma retirada técnica.
— E eu estava lutando para provar minha inocência. Seria complicado encontrar alguém menos esnobe! — ele declarou.
O sistema nervoso de Bethany ficou um pouco mais calmo, pois já não estava sob a mira daqueles olhos fabulosos.
— Certo. Então você jamais come em lugares baratos?
— Você está falando dessas redes de fast food onde as pessoas comem carne reconstruída com molho? Não.
— Cinema?
Cristiano franziu a testa.
— Recentemente, não — ele admitiu, surpreso ao perceber que, na verdade, não ia ao cinema há anos. Talvez quando ainda estava na universidade.
— Mas vai ao teatro? A ópera?
— Certo — disse, levantando as duas mãos, como quem se rende. — Sou um esnobe idiota.
E a comida chegou à mesa sem que ele percebesse. Nem ela. Na verdade, o farto prato de massa cheirava muito bem, mas era um intruso naquela conversa.
— Mas, sério... — ele disse, provando o espaguete, que não tinha nada a ver com as pequenas porções servidas nos restaurantes caros. Era uma porção generosa, coberta com o melhor molho de frutos do mar que já comera —... você está querendo me dizer que é complicado ser uma liberal de esquerda quando se tem o conforto do dinheiro para apoiar seus ideais?
— O que você quer dizer?
Por um segundo, Bethany quase se esquecera do seu personagem. Mas logo se lembrou quando ele começou a explicar.
— É fácil assumir o papel de espírito livre, não atado ao mundinho dos ricos e privilegiados... mas você sabe, lá no fundo sabe, que poderia recorrer ao outro lado, sempre que quisesse. Sim, você frequenta uma pizzaria como esta, mas se ficar entediada, poderá ir no primeiro táxi a um restaurante com estrelas do guia Michelin mais próximo. E não vamos esquecer o seu apartamento. O dinheiro pode comprar o luxo de pretender ser uma pessoa comum, sem o peso da realidade que isso acarreta.
Bethany abriu a boca para contradizê-lo, mas fechou-a rapidamente. Entendeu a ironia em sua observação, mas não poderia responder, então disse, envergonhada:
— Não sou uma radical de esquerda. Acredite em mim.
— E eu não sou esnobe. Acredite em mim — disse, abrindo mais um daqueles sorrisos que a deixavam sem ar. — Boa comida. Devo voltar mais vezes aqui.
— Você acha que o tipo de mulheres com as quais sai gostariam de vir aqui? — perguntou, percebendo que não se importaria de vê-lo com outra companhia. Com uma daquelas mulheres com pernas longas, morenas glamourosas de cabelo tingido, do tipo que ele mencionou antes. Na verdade, o tipo de mulher que se encaixa muito melhor no seu perfil.
— Talvez não — ele respondeu. — E é isso que a faz tão única.
— Não creio... Você deveria vir outras noites aqui, tem sempre fila para conseguir mesa. Se eu sou única, também são únicas as centenas de pessoas que tentam entrar aqui em todos os dias do ano.
— Você sabe do que estou falando.
Ela sabia.
— Você diz que não é esnobe... mas se sentaria na minha frente caso eu não fosse única!
— O quê?
— Vamos supor que eu fosse... uma mulher comum. Uma menina comum, filha da classe trabalhadora, como todas as outras aqui presentes... ainda estaria sentado no mesmo lugar?
Parecia uma hipótese estranha, mas Cristiano aceitou a brincadeira, pois, francamente, jamais conhecera ninguém como ela. Uma mulher perfeitamente intocada por sua riqueza e com uma conversa imprevisível, mas ainda assim dona de um apelo irresistível.
Além do mais, ninguém conversara sobre essas coisas com ele antes. Cristiano franziu a testa, refletindo sobre a pergunta.
— Provavelmente não, para ser honesto.
— Porquê...?
— Porque, como eu disse, um homem rico precisa tomar muito cuidado. Nunca me envolveria com uma mulher que não fosse financeiramente independente. Quem se arrisca a um casamento assim pode terminar num tribunal, fazendo a partilha do dinheiro que juntou trabalhando duro. Mas por que vamos perder um tempo valioso conversando sobre uma situação nada relevante?
— Concordo totalmente — ela disse. Já que vestira a fantasia de princesa, não perderia a noite com argumentos que não chegariam a lugar nenhum. Era uma Cinderela no baile, por que insistir em transformar-se em abóbora se ainda não era meia-noite?
Cristiano tinha opiniões fortes e estava decidido a proteger sua fortuna, mesmo que à custa de se privar de muitas experiências.
— Então — disse Cristiano, mantendo os olhos fixos nela enquanto pedia a conta a um garçom —... terminamos nossa conversa filosófica? Podemos passar a algo mais leve? Ou então, por que não vamos...
— Para onde? Não conheço muitas casas noturnas em Roma — e provavelmente não teria dinheiro para frequentá-las, caso conhecesse.
— Estava pensando em um lugar mais... aconchegante. Minha casa está a menos de dez minutos daqui.
Seu semblante era quente e faminto, e não deixava qualquer dúvida que terminariam a noite na cama. Uma noite e nada mais. Suas irmãs ficariam chocadas. Os pais horrorizados. Seus amigos pensariam que extraterrestres a teriam sequestrado e tomado o seu corpo, falando com a sua voz, mas vivendo uma vida completamente diferente. Tudo o que sempre defendeu seria perdido ao render-se àquele sentimento novo e irresistível.
Ele a fazia sentir-se sexy ao olhar para ela, como se fosse a única mulher na face da Terra. Seus mamilos ficaram rígidos por baixo do sutiã.
— Claro que também posso pedir a Enrico que a deixe na porta do seu apartamento — disse Cristiano, que nunca foi o tipo de homem que força mulheres relutantes, mesmo tendo dado todos os sinais possíveis, desde que a buscara em casa.
— Você ficaria muito chateado?
— Precisaria de uma chuveirada fria.
Bethany imaginou aquele homem tomando uma chuveirada, com seu corpo grande e musculoso sob a água, seu lindo rosto erguido, os olhos fechados. Era complicado respirar ao mesmo tempo em que pensava nisso.
— Não quer dormir cedo? — ela perguntou e Cristiano sorriu.
— Eu nunca durmo cedo. Durmo pouco, quando durmo...
E Bethany pensou nos dois fazendo amor várias vezes seguidas, deitados em uma cama enorme, com lençóis de algodão egípcio finíssimos, não os tecidos baratos a que estava acostumada. Parecia transformada em uma criatura sexual. Nunca precisou lutar contra tais urgências, por isso fora fácil manter o celibato entre os seus maiores princípios.
— Mas... só uma coisinha...
Cristiano podia sentir o cheiro da rejeição. Porém, mesmo sabendo que não seria o fim do mundo, surpreendeu-se ao perceber que seu desapontamento era muito maior que o esperado. Ainda assim, a noite fora ótima. Normalmente conversas com mulheres eram apenas um falatório ao qual ele não prestava muita atenção, apenas o necessário. Mas naquela noite conversara com ela, gostara do prazer de sentir uma parceira que o podia fazer sorrir e questioná-lo com perguntas que o levavam a pensar.
— Sou todo ouvidos — ele disse, pegando a conta, dispensando a oferta de Bethany de pagar sua parte e oferecendo toda a sua atenção. A noite fora cheia de imprevistos, a começar pela forma como a convidara a jantar. Ser dispensado também seria uma novidade.
— Eu... eu não... não sou a pessoa mais experiente do mundo...
Cristiano ajeitou-se na cadeira, pois não era exatamente o que esperava ouvir.
— Não entendo.
— O que você não entende? — ela perguntou, na defensiva.
— Não entendo o que está querendo me dizer.
— Não entende porque não está me ouvindo com atenção suficiente. — E o nervosismo deixou sua voz ainda mais grave. — Certo. Imagino que tenha uma ideia sobre quem sou eu... um apartamento caro em Roma, casa de campo na Irlanda, vários motoristas que não fazem nada além de dar voltas em carros de luxo para que eu não estrague meus dedos... mas não tenho nada a ver com as outras mulheres com as quais você se envolveu.
Respirou fundo e por alguns segundos pensou em contar a verdade. A confusão com as roupas, as mentiras bobas... Ele terminaria sorrindo? Ele a perdoaria? Não. Seria a resposta imediata. Ficaria horrorizado; Cristiano não se aproximaria de mulheres como ela. Mulheres que não são do mesmo mundo privilegiado dele. Mas Bethany não queria perder a oportunidade. Não sabia muito bem por que sentia tão intensamente, mas não destruiria sua noite com aquele homem. Ele conseguira entrar no seu corpo e ela queria mantê-lo ali.
— É o seguinte — Bethany anunciou, falando claramente. — Eu sou virgem.
— Eu sou virgem...
Estas foram provavelmente as únicas três palavras verdadeiras que lhe disse ao enganá-lo completamente com a sua história.
Cristiano, estacionado no Land Rover verde-escuro que alugara em Limerick, observava friamente o entorno, vendo um rancho ao melhor estilo cartão-postal no final da estrada.
Já se passaram cinco meses desde que ela fora embora sem avisar, e cinco semanas desde que descobrira que tudo fora uma grande mentira. Amélia Doni não era aquela menina inocente, de olhos verdes e cabelos castanhos, com vontade de brincar com ele a ponto de fazer com que cancelasse seu retorno a Londres e a levasse a Barbados por duas semanas. A verdadeira Amélia Doni, que acidentalmente conhecera na casa de sua mãe, no Natal, era uma loira de quarenta anos que, como lhe contou em detalhes, estivera fora num cruzeiro, recuperando-se de uma desilusão amorosa. Era o retrato fiel de uma mulher rica, dona de um apartamento no edifício mais afamado de Roma; a típica dondoca que o faria morrer de tédio em poucos minutos. E daquela vez também fez com que sentisse ainda mais raiva, ao perceber que a mulher que encontrara em seu apartamento não passava de uma impostora. Não fora apenas enganado, mas levado pela mão, numa história mirabolante, que aceitou por completo.
Bastou uma semana para que descobrisse o endereço de uma certa Bethany Maguire, e passou outras duas tentando se esquecer de tudo aquilo, dizendo a si mesmo que não valeria a pena. Mas por fim se deu conta de que não descansaria até encontrar aquela mulher e verbalizar toda a sua raiva.
Não sabia o que pretendia ganhar confrontando-a, o que seria completamente oposto à sua personalidade, pois sempre fora capaz de controlar suas emoções com facilidade, era um homem orgulhoso de seu autocontrole. Na verdade, nunca antes fora enganado tão profundamente por uma mulher capaz de virar sua cabeça.
Com o carro desligado, começava a ficar frio enquanto o sol de inverno desaparecia. Mais dez minutos e a linha de casas à sua frente, pintadas em cores fortes, se transformaria em uma imagem cinzenta. Ainda havia tempo de voltar ao hotel, jantar e tomar o primeiro avião da manhã para Londres. Por outro lado, fazendo isso, resolveria a dor profunda que consumia o seu estômago feito um tumor?
Saiu do carro e começou a caminhar pela estrada, entrando na vila de conto de fadas. Não fazia o seu gênero. O local parecia ter sido projetado por uma criança que recebera uma tela e carta branca para enlouquecer. Chegou mesmo a imaginar que poderia entrar em uma casa de açúcar a qualquer momento.
A casa no final da rua não era exceção. As árvores estavam sem folhas e o jardim sem cor, mas imaginou que no verão estaria repleto de estereótipos perfeitos para livros infantis. Macieiras, flores por toda a parte, um muro de pedra através do qual os vizinhos conversariam ou pendurariam suas roupas cantando cantigas. Engoliu em seco ao ignorar a campainha e bater com força na porta da frente.
Bethany, buscando ingredientes na geladeira para cozinhar para os seus pais a receita que, de forma entusiasta, prometeu que faria três horas antes, estava sem fôlego, pois deixara tudo para a última hora e não poderia sair para conversar com ninguém. Tendo morado os dois últimos anos em Londres, ela se esquecera como a vida funciona em pequenos vilarejos, mesmo que tenha passado toda a sua vida em um deles. As pessoas ficavam paradas nas ruas. Conversavam. Tomavam intermináveis xícaras de chá. Fora pior nos primeiros meses após sua volta, mas ainda era surpreendida por velhos vizinhos que apareciam e ficavam ofendidos caso não se sentasse para tomar chá com biscoitos por horas.
Imaginou se poderia fingir não estar em casa, talvez se escondendo debaixo da mesa da cozinha até que a pessoa desistisse, mas não valeria a pena, pois metade do lugarejo sabia que seus pais estavam na associação local e que ela escapara dizendo não estar se sentindo bem aquela manhã. A vida era assim naquele lugar, e ela teria de se acostumar, pois ficaria ali um bom tempo.
Deixou os ingredientes na mesa da cozinha e correu para a porta antes que o estranho batesse mais uma vez.
Na sua cabeça, ficou imaginando quem poderia ser. Vários de seus ex-companheiros de escola nunca deixaram o vilarejo no qual cresceram, casando-se ridiculamente cedo, e já tinham família. Era grata pelo apoio que lhe ofereciam e tentava com todas as forças não se sentir claustrofóbica. Sentira falta de Shanie e Melanie, que voltaram às suas casas em Dublin, após duas semanas no Natal. Talvez fosse a sra. Kelly, que morava algumas casas mais adiante, uma visita frequente que normalmente se arrastava por todo o dia.
Bethany segurou um grito de desespero ao abrir a porta, depois ficou olhando para a visita, paralisada, descrente.
Piscou os olhos, pensando que poderia ser uma alucinação, mas quando voltou a abri-los ele ainda estava ali; não fora uma loucura de sua mente.
— Você! — disse, num tom esganiçado que mal reconhecia como seu. — O que está fazendo aqui? — perguntou, tapando a boca.
— Nem pense em desmaiar na minha frente — disse Cristiano entredentes. Deu um passo à frente e abriu a porta, entrando na casa enquanto ela permanecia em estado de choque. Seus olhos estavam arregalados e imaginou estar à beira de um colapso.
Bethany ouviu a porta bater ao ser fechada com força, o que pareceu o som do seu carrasco. Ocupada tentado organizar seus pensamentos, ao ver a imagem agressiva daquele homem alto, ficou sem ação.
— Cristiano — disse, finalmente. — Que surpresa.
Somente a parede, contra a qual pressionava o corpo, mantinha Bethany de pé.
— A vida é cheia de surpresas. Eu mesmo descobri isso, sozinho.
— O que está fazendo aqui? — perguntou, querendo seguir a conversa por outro caminho.
— Ah... estava aqui perto e achei que seria interessante passar um tempo com você... Amélia. Não, Amélia não, Bethany, certo?
— Estou me sentindo mal, de verdade — disse, colocando a mão na testa e respirando fundo. — Acho que vou ficar doente.
— Tudo bem. Eu espero aqui até você ficar boa outra vez — ele disse, aproximando-se, fazendo o coração de Bethany acelerar a cada passo.
— Como... como você... me encontrou?
— Depois, depois — disse Cristiano, em tom de ameaça. — Não é um pouco rude da sua parte não me oferecer nem uma xícara de café? Estamos aqui, de pé, quando poderíamos estar sentados, conversando sobre os bons tempos, em um lugar mais confortável... Após a viagem longa que fiz para vê-la...
Ele não tinha pressa. E a deixava sem ar ao ficar tão perto, mesmo percebendo que destroçava seu sistema nervoso.
Bethany se lembrou que estava em casa sozinha naquele momento, mas que seus pais voltariam dentro de uma hora, e até lá, ele teria que desaparecer. Quanto mais tempo ficasse em estado de choque, mais tempo ele permaneceria ali, e não pretendia que ele encontrasse seus pais.
Outra onda de náusea ameaçou levá-la diretamente ao banheiro, mas ela se controlou e limpou a garganta.
— Certo. Vou pegar uma xícara de café, mas se você veio até aqui para que eu me desculpe, dispenso seu esforço. Sinto muito, peço desculpas. Está satisfeito?
— De maneira nenhuma. Por que não começamos com o café e depois conversamos calmamente? Aliás, você sabe que fingir ser outra pessoa é crime?
Bethany ficou pálida e Cristiano, que pensara aquilo no momento, abriu um sorriso ameaçador.
— Do que mais se apropriou quando esteve no apartamento de Doni? Além de assaltar seu armário? Sua mão era mesmo tão leve? Pelo que me lembro, aquele lugar estava cheio de preciosidades.
— Como você ousa...?
— Eu sei. Sou mau, certo? Mas pensaria duas vezes antes de me culpar se eu fosse você.
Esperava que ela ficasse perdida ao vê-lo chegando ali, na sua porta. Mas não. Também imaginou que ficaria na defensiva, chocada, mas nunca imaginou ver tamanha apreensão em seus olhos, ela parecia em pânico. Mais uma vez, demonstrava ser uma mulher de reações inesperadas, e suas palavras e ações não poderiam ser facilmente avaliadas.
Bethany se sentia como um ratinho, acuada por um predador cujo objetivo era torturá-la antes de esmagar seu corpo. Quando fugiu, mais por covardia que qualquer outra coisa, não esperava ser assustada dessa forma. Imaginou tratar-se de um homem que nunca se rebaixaria correndo atrás de uma mulher que o enganara sem qualquer explicação. Seu orgulho o impediria de fazer isso. Mas, infelizmente, ela não pensou no que Cristiano poderia fazer caso descobrisse que a mulher que o deixara plantado era tão falsa como uma nota de três. Pelo menos aparentemente. Sim, ele partiu para o ataque.
— Não estava tentando apelar para a moral — respondeu Bethany, presa contra a parede, pois Cristiano estava tão perto que ela podia sentir seu hálito quente e raivoso. — Só estava querendo dizer que não sou uma ladra.
— Agora entendo porque é sempre tão complicado acreditar no que você diz...
Como não havia como argumentar e tentar provar sua inocência parecia inútil, ela decidiu que era hora do café. Merecia aquela raiva e a aceitaria com a cabeça baixa, culpada. Depois ele iria embora e sua vida voltaria à mesma rotina de sempre.
— O café... Vou preparar uma xícara... Se... se quiser esperar na sala... é por ali...
— E deixar você fora do meu campo de visão? Nem pensar. Você poderia ser capaz de escapar pela janela dos fundos. Parece ser boa nisso.
— Sinto... muito. Já lhe disse. — E olhou para o chão, mas nem assim escapava à sua presença, pois via o couro polido de seus sapatos. Mesmo quando postou-se atrás dela, Bethany pôde sentir sua presença, como se estivesse agarrando seu corpo tenso para que parasse de sacudir como vara verde ao vento.
— Bonita casa — ele disse, mas em nenhum momento Bethany pensou que poderia estar diminuindo sua raiva em favor de uma aproximação mais razoável, e assim ter finalmente suas perguntas respondidas. Estava apenas desfrutando o momento, brincando com ela. — É divertido, você me disse que morava em Londres.
— E morava — disse, de costas para ele enquanto ligava a cafeteira. Infelizmente, não poderia se refugiar nessa tarefa. Em algum momento teria de virar o corpo e, mesmo que de forma relutante, perceberia que Cristiano estava sentado em uma das cadeiras de pinho da mesa da cozinha. Era uma cozinha razoavelmente grande, o bastante para aquela mesa enorme, mas ainda assim ele conseguira reduzi-la ao tamanho de uma cela de cadeia.
Pousou a xícara na frente de Cristiano e sentou-se na cadeira mais distante. Aquele estranho, que a olhava com olhos frios e forte antagonismo, não se parecia nada com o homem sexy, divertido e inteligente que a tirara do sério, a ponto de arrastá-la a uma noite de amor que durou duas semanas, numa viagem a um paraíso tropical.
Martelava em sua cabeça a insinuação de que poderia ser presa por fingir ser outra pessoa. Seria verdade? Isso poderia acontecer? Não podia seguir pensando assim, e tentou focar a mente na humilhação que lhe esperava.
Claro que a merecia. Pensou várias vezes em contar toda a verdade, mas sempre desistia, pois não queria terminar o caso que estavam vivendo. Driblava perguntas capciosas, mascarava a verdade e normalmente se saía bem, dando todos os indícios que poderia ter sido uma grande artista. Houdini estaria orgulhoso dela.
Mas ele acabou roubando seu coração, e se a tivesse pedido que ficasse na ensolarada Barbados por mais uma noite, ela saberia estar simplesmente adiando o fim inevitável.
Sua punição foi taxativa e conclusiva. Cristiano tomou conta de seu corpo e não havia um único dia no qual não pensasse nele e no fato de que nunca mais o teria de volta. Nunca.
— Pare de me olhar assim — Bethany murmurou.
— Assim como? Como gostaria que olhasse para uma ladra mentirosa?
— Eu já disse que não roubei nada de Amélia Doni!
— Mas certamente conseguiu arrancar algo de mim nos jantares, roupas, passagens de primeira classe para o outro lado do mundo...
— Você não está entendendo...
— Então me explique — pediu, inclinando-se na cadeira, fazendo com que ela se afastasse instintivamente, mordendo os lábios, nervosa, com um olho preso ao relógio acima da porta da cozinha.
— Eu queria contar a verdade...
— A estrada até o inferno está cheia de boas intenções — disse, repetindo o provérbio em tom frio. — Quando foi que as boas intenções desapareceram? Quando percebeu que seria muito mais recompensador aproveitar-se de minha generosidade? Sexo com todas as despesas pagas?
— Não seja cruel!
— Quando decidiu sair de Londres?
— O quê...?
Confusa com a repentina mudança de assunto, Bethany o olhava abobada, mas logo sua mente voltou ao normal e ela entendeu o que ele estava querendo dizer. Em vez de a pegar para matar, ele a torturaria, deixando-a quase morta antes de partir, para depois voltar exatamente quando ela estivesse se recuperando. Tentava invadir suas defesas e deixá-la sem tempo para reconstruí-las.
— Londres... Por que decidiu sair de lá? Largou a universidade? E voltou para cá, para o meio do nada? Imaginou que Londres seria muito pequena para nós dois? Ou tinha a consciência pesada, achando que poderia esbarrar comigo a qualquer momento, em qualquer lugar?
Bethany ficou pálida ao ouvir aquelas perguntas inesperadas.
— Como... como você me encontrou, Cristiano? — perguntou, voltando à questão original. — E por quê?
Cristiano deu de ombros, de forma elegante. Mesmo no nível mais alto de sua raiva, quando seu rosto era uma máscara fria de desdenho, ela ainda era capaz de notar seu magnetismo. Tudo o que vinha dele era gracioso, muito masculino, e sua memória não fizera justiça ao seu sex appeal abundante. Ficou envergonhada ao ver que tinha isso marcado em sua mente, em um lugar no qual poderia voltar uma e outra vez, no futuro. Estava sendo encurralada pelo homem que um dia lhe dissera nunca ter sentido o que sentia por ela frente a outra mulher, e ainda assim, ela permanecia refém de sua beleza.
— Por quê? — ele devolveu a pergunta, usando um tom de voz que fez um arrepio percorrer a espinha de Bethany. — Boa pergunta. Eu não queria. Você deve ter feito algo comigo, mas acho que sou homem suficiente para lidar com um caso de orgulho ferido... — Queria dizer como ela o fizera sentir, o impacto que causara. A sua imagem invadira a vida de Cristiano, o fizera perder a concentração naquele encontro casual, mas a esqueceria, tinha certeza de que a esqueceria em alguns meses. E se não sentira vontade de olhar para nenhuma outra mulher desde que a encontrara, tudo fazia sentido. Na verdade, isso sinalizava uma certa sabedoria, pois só um idiota voltaria a pular na água tão rapidamente após ter sido duramente atacado por um tubarão. — O que vem fácil, vai fácil... — disse. — Mas agora, veja bem... Há uma diferença entre a mulher que vai embora e a mulher que me faz de bobo.
Bethany ficou em silêncio, já tinha se desculpado o bastante para saber que suas palavras não aplacariam a raiva de Cristiano.
Outro pensamento tomou de assalto sua mente. E se ele tivesse ido até lá por algo mais que uma explicação? E se fosse para recuperar todo o dinheiro que gastara com ela? Sim, comeram e compraram roupas. O que ela aceitou, alegando ter precisado enfiar tudo na mala sem pensar, porque a viagem a Barbados fora inesperada. Chegou à praia sem uma roupa de banho, e quando ele sugeriu comprar algo, Bethany, mesmo culpada, concordou e chegou a oferecer-se a pagar.
Sexo com todas as despesas pagas. Suas palavras reverberavam na cabeça de Bethany como ácido e a faziam sentir-se mais barata que banana na feira. Claro que levou consigo todas as roupas quando voltou a Londres, e deu muita coisa à caridade, mas nunca imaginou que ele acreditaria nisso, e como poderia revidar dizendo algo tão insignificante quando estava sendo culpada por uma fraude muito maior? O remorso a atingiu diretamente.
Também havia a questão dos voos. Primeira classe. Não tinha ideia dos preços, mas sabia que seriam caríssimos.
Ficou pálida ao pensar quanto lhe devia. E nem tinha emprego! Em duas semanas começaria a trabalhar numa escola local, cobrindo uma licença maternidade, mas aquilo não seria suficiente para conseguir o dinheiro que precisava. A caixa registradora em sua cabeça bateu com tanta força que ela escondeu o rosto nas mãos e gemeu, em desespero.
— Sim, eu sei — disse Cristiano, sem qualquer traço de compaixão. — Os pecados normalmente voltam para nos assombrar.
— Não entendo como descobriu onde vivo...
— Você fez questão de que fosse um segredo? Encontrei a verdadeira Amélia Doni na casa da minha mãe. Imagine a minha surpresa quando descobri que era uma loira de quarenta e tantos anos e com um punhal levantado em direção ao sexo masculino.
— O que você disse a ela? — perguntou Bethany, imediatamente pensando em sua amiga Amy. Olhava para ele, com os olhos arregalados e nervosa.
— Nada. Claro. Não comentei sobre isso com ninguém. Mas consegui descobrir quem deveria estar cuidando da casa, e desenrolar a linha com a ajuda do meu pessoal foi se uma questão de tempo.
— Seu pessoal?
— Você ficaria surpresa com a eficiência que eles demonstraram ao me trazer as respostas que buscava. Farejadores natos.
— Amy pediu que eu cuidasse da casa — disse, imediatamente. — E Catrina... estava em Londres...
— Em tratamento de reabilitação. Eu sei.
— Não queria que Amélia descobrisse. E não há nada de errado no que fizemos.
— Você acha que eu me preocupo com uma viciada?
— Não, mas só estou tentando lhe dizer que... bem...
— Vamos direto ao ponto? Quando eu cheguei no apartamento, por que não me disse imediatamente quem você era?
Cristiano ficou vermelho de raiva ao lembrar-se o quão rapidamente fora envolvido por ela, como um adolescente que cai de amores pela rainha do baile de formatura, a mesma menina que juraria ter encontrado nele o centro do seu mundo e ao mesmo tempo em que saía com vários outros garotos.
— Você chegou na hora errada... — ela murmurou, em tom triste. — Eu estava... estava...
— Deixe que eu a ajude. Brincando de ser a dona da casa? Usando um vestido emprestado? Fingindo?
— Não!
— Não o quê? Ah, claro, esqueci que você tem um problema com a verdade.
— Eu... certo, eu tinha saído naquele calor, voltei ao apartamento e tomei um bom banho, e imaginei que seria divertido experimentar algum daqueles vestidos. Fiquei tentada. Você nunca ficou tentado a fazer algo que não deveria?
— Mesmo que pareça estranho, sei diferenciar o certo do errado!
— Não me parecia errado naquele momento!
— Não? Então me diga... quando começou aparecer errado? Ou nunca pareceu?
— Não imaginei que apareceria alguém — murmurou Bethany. — Até que você se convidou para entrar...
— Nem pense em jogar sua culpa para mim!
— Não estou fazendo isso! — ela retrucou imediatamente. Olhou para o relógio da cozinha e percebeu que, nos últimos meses, as horas tinham passado lentamente, e que naquele momento pareciam voar.
— Vai a algum lugar? — perguntou Cristiano, sem perder nenhum detalhe. — Algum encontro interessante com rapazes que pensam que você é quem na verdade não é?
Bethany cruzou as mãos e ignorou a interrupção sarcástica.
— Só estava tentando explicar... você entrou e eu não sabia como explicar por que estava usando a roupa de outra pessoa. Na verdade, nem deveria estar ali! Não queria ver minha amiga em perigo e nem conheço Catrina, mas imagino que, caso Amélia, sua madrinha, soubesse que ela estava em tratamento...
— Então, como você é uma pessoa tão bem intencionada, imaginou que seria inteligente manter...
— Nunca imaginei que as coisas terminariam assim — disse Bethany, numa explosão de defesa. Mais cinco minutos tinham se passado desde a última olhada no relógio. E ele tomara apenas alguns goles do café que fizera questão de pedir!
— Você quer dizer... na cama...?
— Sim.
— Naquele momento, não deve ter pensado que eu, um dia, gostaria de saber a verdadeira identidade da mulher que levava para a cama...
— Eu não fingia quando estava ao seu lado.
— Outra vez a mesma história?
— Sinto muito, sério... Você tinha de saber a verdade, mas eu fiquei com medo de que... que...
— Que poderia nunca ter a chance de provar o gostinho de uma vida luxuosa?
— Não! Eu não sou assim!
— Perdoe-me caso esteja me obrigando a pensar outra coisa.
— Eu era... virgem! — ela murmurou, tremendo.
— E...? O que isso significa, exatamente? — Ficou nervoso ao ver que aquele processo lógico o afastava do ataque planejado. Ela era uma mentirosa, mas ainda tinha o poder de atraí-lo com sua voz melosa e mãos trêmulas. — Sua virgindade deveria servir como desculpa para o fato de ter mentido para mim duas semanas? Talvez, na verdade, trocar sua virgindade por um momento de diversão com um homem rico tenha parecido um bom negócio.
— Se você é capaz de dizer isso, é porque não me conhece!
— Os acontecimentos sugerem outra coisa. Por que não me disse a verdade quando tudo terminou? Por que desapareceu?
Bethany abriu e voltou a fechar a boca. Como poderia dizer que teria sido capaz de confessar tudo caso não estivesse tão envolvida? Se tivesse sido capaz de deixar tudo para trás, oferecendo-lhe o papel de conquistador barato, teria dito tudo, pois a sua reação não seria importante para ela. Mas se apaixonara e a reação de Cristiano teria sido importante. De qualquer forma teria ido embora, mas não quis ficar com uma imagem ruim dele. Nunca perdoaria a si mesma.
Por isso escolhera partir na calada da noite. Literalmente. Já estavam outra vez na Itália e, após o jantar, de volta à pizzaria onde tiveram seu primeiro encontro, e onde ele lhe disse que percorreria toda a cidade de Londres atrás dela, Bethany arrumou suas malas e fugiu.
— Deveria ter deixado um bilhete — ela disse, triste. — Deveria ter explicado tudo em um bilhete.
Cristiano sentiu um espasmo de raiva.
— Claro, claro... já falar na minha cara seria um trabalho muito duro.
— Eu sabia como você iria reagir. Desta forma.
— Diga, estou curioso. Quanto da sua verdadeira personalidade precisou esconder para montar o seu personagem?
— Não escondi nada.
— Só adaptou, para se ajustar à trama.
— Não!
— Então você realmente é... doce, única, tem bom papo... Sabe... é difícil acreditar nisso...
— Não vamos chegar a lugar nenhum assim — ela disse, levantando-se e passando a mão na testa. Os ingredientes para o jantar prometido aos pais continuavam esquecidos por ali. — Foi um erro terrível e não posso dizer nada mais do que sinto muito. Eu entendo a sua raiva. — Uma lágrima ameaçou escapar, mas ela pressionou os dedos contra os olhos, mandando-a de volta ao lugar de onde viera.
Era um pesadelo. Nunca imaginou que Cristiano fosse aparecer naquele cantinho do mundo onde vivia.
— Vai continuar olhando para o relógio? — perguntou Cristiano, de repente. — É a quarta vez em 15 minutos. — E ficou imaginando se a história do encontro que ele mesmo inventara não seria certa. É preciso confiar na própria imaginação, especialmente com as mulheres, e cravou os dentes ao pensar nela com outro homem. Alguém daquele vilarejo, que certamente esperara pela sua volta. Alguém que, pelo menos, conhecia a mulher com quem se envolvia, que não estava nas mãos de um personagem fictício fabricado com uma mistura de mentiras e teatro.
— Sério? Não percebi.
— E para quem é essa comida? — perguntou, apontando com a cabeça na direção da pilha de vegetais. — Está se divertindo? Por isso deixou a universidade e voltou para cá? Ele sabe de nós dois?
— Do que está falando? — ela perguntou, mas um tom nervoso em sua voz sabotou qualquer tentativa de soar genuinamente inocente, e Cristiano franziu a testa.
Um pressentimento ruim passou pela sua cabeça como veneno. Nunca perca a cabeça com as mulheres, pensou, e ficou imaginando que aquela menina virgem o poderia ter usado como trampolim para conseguir outra coisa. Um rompante de ciúme deixou-o com uma série de imagens de Bethany oferecendo seu corpo para o prazer de outro homem.
— Fico imaginando o que o seu queridinho local diria sobre uma mulher que passa duas semanas ao lado de um homem... antes de voltar aos seus braços... Hã? Poucos homens perdoariam algo assim. Na verdade, acho que nenhum. Então, você contou a ele sobre as suas aventuras do outro lado do mundo? Ou simplesmente me usou para ganhar experiência na cama?
— Não seja ridículo! — Bethany explodiu, com o rosto vermelho frente a tantas acusações loucas e às imagens que ele fazia reviver em sua mente. Imagens deles dois juntos em sua aventura no paraíso. Fora até lá virgem, mas no final de duas semanas se transformara em uma mulher explorada meticulosamente em cada centímetro do corpo, e que também provara o prazer de explorar cada centímetro do corpo de Cristiano. Na verdade, todas as noites recriara tais lembranças mentalmente.
— Estou sendo ridículo? Por que outro motivo voltaria? Por que deixar Londres e sua carreira? Só mesmo por um homem...
Um silêncio reinou quando ele se calou, tal como um elástico estirado ao limite.
— Nem tudo o que as mulheres fazem é motivado por homens — ela disse, lutando para soar o mais natural possível, mas sua voz estava embargada.
— Na maior parte do tempo, sim. Pelo menos sempre foi essa a minha experiência.
Ela resistiu e não voltou a olhar para o relógio. Mas era difícil.
— Certo, eu conto, prometi fazer o jantar para os meus pais. Eles foram ao centro cultural... uma espécie de levantamento de dinheiro para campanhas com crianças africanas. Voltarão logo. Imagino que não queira estar por aqui quando eles voltarem...
Ele não se moveu. Bethany nem ao menos sabia se acreditara no que ela tinha dito. Mas não importava, pois o som da porta da frente se abrindo teve o impacto de uma bala nos seus pensamentos revoltos e ela ouviu a voz familiar de sua mãe dizendo:
— Querida? Bethany? Chegamos!
Por alguns segundos desesperadores, Bethany ficou imaginando se poderia esconder Cristiano, que se levantara e a deixava sem fôlego. Poderia colocá-lo em um armário ou no quintal e trancar a porta, deixando seu rosto, agora curioso, longe dali.
A única vantagem da chegada dos seus pais foi ter conseguido provar que não esperava um homem.
Correu para recepcioná-los e os encontrou tirando os casacos e reclamando do tempo, que aparentemente estava piorando. Poderia nevar.
— Mas o evento foi um sucesso — disse Eillen Maguire, sorrindo para a filha. — Conseguimos quase quinhentos. Não parece muito, mas ajuda. Havia um sujeito interessante lá, Bethany. Ele falou sobre o destino do dinheiro. Não era interessante, John? Fiquei com vontade de convidá-lo para jantar, pois o pobre homem teria de se alimentar com sanduíches na pousada, já que a dona foi visitar sua filha...
A mãe parou no meio de uma frase, o que não acontecia muitas vezes, e Bethany nem precisou procurar saber o que estava acontecendo. Podia sentir a presença de Cristiano na sala, logo atrás dela. Por que não ficou na cozinha mais um minuto? Por que não dera tempo de explicar a visita surpresa aos pais?
— Mãe... pai... — disse, relutante, enquanto Cristiano se aproximava.
Ela não mentira. Não havia qualquer homem a ponto de chegar, como ele suspeitava. Pelo menos não naquele momento. Só não entendia por que tanto drama, quando poderia ter dito que seus pais estavam por vir. Deveria ter ido? Não sabia. Após ter sido envolvido por uma mentirosa tão experiente, deveria estar curioso para conhecer seus pais. Mas, na verdade, não poderia estar na companhia de duas pessoas mais normais. Pareciam ter seus cinquenta e muitos anos, talvez um pouco mais.
— Eu...
— Sabemos quem você é, meu filho, e estamos felizes por finalmente conhecê-lo. Certo, Eillen? Ela também está contente — disse John Maguire, sorrindo e estendendo a mão. — Ela mesma vai dizer quando parar de engolir em seco como um peixe fora d’água. — E apertou a mão de Cristiano afetuosamente, piscando para a filha, paralisada e com o rosto corado. — Na verdade, deveríamos ficar contentes ao ver Eillen sem palavras. Como Beth provavelmente já lhe disse, isto é muito raro.
Na verdade, mais estranho para Bethany era ver Cristiano sem palavras, e ele estava assim, embora não o pudesse culpar. Nem poderia imaginar o que estaria passando em sua cabeça, ainda que respondesse ao aperto de mão de seu pai com segurança, e tivesse levado a mão de sua mãe à boca para um beijo, puro gesto de cavalheirismo italiano, deixando aquela senhora corada como uma adolescente.
— Meu Deus — disse, olhando para Bethany. — Você nos disse que era elegante, mas não que era tão cavalheiro!
— Elegante? — perguntou Cristiano, olhando-a de uma forma que deve ter parecido inocente aos olhos de seus pais, mas na verdade era um olhar repleto de questionamentos de natureza altamente desconfortável.
— Acho que não vou conseguir terminar o jantar... — disse Bethany, mudando de assunto para ouvir um coro de não se preocupe, nós entendemos perfeitamente vindo de seus pais.
— Você deveria ter ligado para a gente, querida! — disse Eillen, movendo-se em sua saia cinza, aproximando-se de Cristiano e tomando suas mãos. — Viríamos mais rápido para casa! Não. Não seria boa ideia, certo, John? — E olhou para o marido como se ele tivesse feito a sugestão tola, e John deu de ombros, resignado. — Acho que vocês dois, que são jovens, têm muito o que conversar! Bethany, fique aqui com Cristiano... que nome adorável... Não, melhor, porque não leva Cristiano à sala de estar... John, querido, você toma conta do fogo...? E...
— Boa ideia, mamãe!
— Não se preocupe com a comida, Beth... — disse John, olhando para Cristiano e sorrindo. — Eu já disse mil vezes a essa menina que...
— Pai! Por favor. Tenho certeza de que Cristiano não quer ouvir essas histórias chatas...
— Chatas? Se já descobri alguma coisa sobre a sua filha, foi que chata não é uma palavra que possa ser aplicada a ela. Certo, Bethany? — Sua voz era aveludada, mas teria soado sempre tão cortante como desta vez? Talvez fosse impressão só dela.
— Vamos à sala de estar agora, e por que você e mamãe... não se trocam... e podemos...
— Nos conhecer melhor! — disse o pai, e Bethany sorriu para ele.
— Vou preparar algo para comermos. Algo rápido, simples... — disse, olhando para Cristiano, que ganhou mais pontos convidando todos para jantar fora. Mas lhe responderam que estava a ponto de nevar. Seria melhor ficar em casa.
— Neste caso, nada melhor que uma comidinha simples. Sua filha deve ter dito que sou um homem de gostos simples.
O pai de Bethany bateu nas costas de Cristiano e, para seu horror, agora que pensava que aquela situação não poderia ficar pior, disse:
— Claro, os riscos que você corre com o que faz talvez o obriguem a ser assim, certo?
Cristiano sorriu e não disse nada. Sua vida, até encontrar a mulher ao seu lado, fora completamente organizada. Trabalho. Mulheres. Tudo em seu devido lugar. Era um desses homens que imaginam que, tendo tudo em ordem e controlado, podem limitar as surpresas desagradáveis. E até então acreditava na sua filosofia. Mas no final das contas ficara mal preparado para a sensação de pisar em terreno movediço, o que estava fazendo naquele exato momento. Riscos? Claro, assumia vários em seu trabalho, mas de alguma forma imaginava que os riscos a que se referira o pai de Bethany não se aplicam aos associados às suas finanças. A que poderia estar se referindo? E como sabiam seu nome antes mesmo de serem apresentados?
Bethany, de pé atrás dele, pigarreou e Cristiano se virou quando seus pais desapareceram nas escadas, conversando em voz baixa, animados.
Mesmo em seu próprio território, naquela casa modesta a milhares de quilômetros de qualquer loja de estilista famoso e bares modernos, ainda poderia ser uma mulher capaz de estar ao lado de qualquer homem sofisticado sem que este notasse que não nascera em berço de ouro. Bethany nunca olharia torto para alguém que tivesse ar inferior, o que sempre lhe pareceu irritante em muitas das mulheres que conhecera. Bethany, por sua vez, parecia apenas refinada. Algo nela exalava essa sensação. Talvez fosse a cor vibrante de seus cabelos que caíam sobre os ombros. Ou seus olhos perfeitamente claros. Ou quem sabe a maciez de sua pele, intocada pela maquiagem que revestia o rosto de várias mulheres, loucas para camuflar seus complexos. Poderia também ser a forma como levava a vida. Equilibrada, orgulhosa e assertiva, mas de forma suave, silenciosa.
Ficou nervoso consigo mesmo por ter enxergado em Bethany mais do que uma mulher que não temera brincar com a sua vida, e olhou-a com ar ameaçador. Como sempre, o silêncio provou ser seu aliado e Bethany abriu a boca, desviando os olhos enquanto o guiava à sala de estar. Ele ouviu, sem dizer uma palavra, enquanto ela falava sobre seus pais, que aparentemente eram pilares daquela comunidade, envolvidos em todas as causas de caridade possíveis, praticamente uns santos.
Enquanto ouvia, percebia tudo ao seu redor, da profusão de fotos de família aos ornamentos colecionados durante toda uma vida e obviamente muito queridos. Ainda que fosse uma casinha de interior, era bem espaçosa, e na parte de baixo contava com vários cômodos pequenos que se intercomunicavam. Em um deles, deitado em uma cadeira, um gato malhado tirava uma soneca. Mas não saía de sua cabeça a imagem da casa familiar que ela descrevera.
— Então — ele disse, em tom tranquilo, ao chegarem à sala de estar, já sentando em uma poltrona confortável. — Muito charmosa a casa dos seus pais. Tão diferente da mansão que você descreveu...
Bethany corou. Não fora completamente tocada por aquele lado frio de Cristiano, embora soubesse que existiria, pois todos os homens poderosos são invariavelmente rudes. Era complicado unir as duas personalidades: o homem lindo e sexy que a sequestrara até uma ilha paradisíaca e o estranho de olhar frio que a encarava com uma curva cruel estampada nos lábios. Lembrou a si mesma que nunca teria conhecido aquele homem lindo e sexy caso tivesse sido apresentada como Bethany Maguire. Provavelmente não teria sido tão frio, mas ela poderia apostar que não passaria de um Senhor Indiferente.
— Nunca disse que a tal mansão pertencia aos meus pais. Apenas disse que havia uma delas em minha cidade natal, e existe.
— Sinto muito, mas não consigo apreciar a fina distinção entre uma mentira sincera e o uso econômico da verdade.
— Não consegue porque nunca tentou.
— E por que deveria tentar? Você tinha razão quando disse que não valeria a pena remover histórias antigas. Não nos levaria a lugar nenhum. Então vamos mudar de assunto, certo? — perguntou, abrindo um sorriso gélido que enviou uma espiral de medo por todo o seu corpo.
Cristiano, percebendo isso, abriu ainda mais o sorriso e relaxou. Precisava vê-la cara a cara para que pudesse exorcizar sua fúria por ter sido enganado e caído em sua armadilha. Também passou a sentir necessidade de terminar o que considerava um assunto deixado em aberto: a relação que tiveram.
As duas semanas que passaram em Barbados levaram a uma perda total do seu autocontrole. Agira como um aluno exemplar que, de um momento a outro, passava para o lado dos bagunceiros. Naturalmente, ela não percebera isso, não sabia que fora a primeira vez em sua vida que saía das rígidas fronteiras por ele mesmo impostas. Cristiano não sabia muito bem como ela conseguira tudo aquilo, mas a verdade é que fora capaz. Quando voltaram à Itália, ele não estava pronto para vê-la longe de sua vida. Ao se reencontrarem, sentiu um efeito negativo ao perceber que ainda se sentia atraído por ela. Imaginava que não sentiria nada, apenas desilusão e desprezo, mas as revelações não foram tão fortes a ponto de extinguir um sentimento que não alimentara nem buscara, mas que permanecia muito vivo.
Ao olhar para ela, no outro lado da sala, mergulhada na poltrona como uma criança, com seu enorme suéter cobrindo as mãos, sentia-se ao mesmo tempo excitado e enfurecido.
Como um matemático diante de um complicado problema, Cristiano levou sua mente fria e lógica à uma situação completamente ilógica. Que melhor maneira de pôr um fim em sua raiva e frustração que conseguindo o que lhe fora negado? Seria capaz de fingir ter tolerado a enorme decepção levando-a para a cama e saciando o desejo que ainda corria em suas veias, sabotando todos os esforços para que sua vida voltasse aos trilhos?
Teria que pensar, mas relaxou pela primeira vez desde que chegara ali. Pelo simples fato de vislumbrar uma solução ao caso, mesmo que decidisse não pô-la em uso, foi capaz de restabelecer o controle sob aspectos que, com a chegada repentina dos pais, parecia ter perdido definitivamente.
Além do mais, gostava da natureza dessa solução. Não conseguira apagar o rosto de Bethany da memória, não se esquecera de como ela gemia sob ele, em cima dele, na enorme banheira de sua casa em Barbados, na piscina, em vários lugares, e também na praia particular onde apenas as estrelas e a lua testemunhavam sua interminável paixão. Seria uma vingança doce tomá-la outra vez nos braços, mas só no momento certo, e quando ele dissesse.
Desviou-se de seus pensamentos inesperados e percebeu que ela estava sentada na beira da poltrona, olhando-o intensamente.
— Você me ouviu?
Cristiano franziu a testa.
— Repita. Estava pensando em outra coisa.
Bethany imaginou que, após destilar toda a sua fúria, ele devia estar desejando ir embora, voltar para a sua vida privilegiada e maravilhosa — a mesma vida que erroneamente imaginara que ela estivesse acostumada.
Bethany adoraria levá-lo para dar uma volta fora de casa... mas o que diria aos seus pais? A rede de mentiras que começara a tecer ao aceitar o convite para aquele jantar, meses atrás, só crescia à sua volta.
Também estava descobrindo que a ideia de vê-lo mais uma vez, pela última vez, começava a parecer interessante para ela. Tentou afastar este pensamento de sua mente e disse, firme:
— Eu estava dizendo que preciso lhe contar uma ou duas coisas antes que mamãe e papai voltem.
A antena de Cristiano ficou alerta, imediatamente.
— Além de explicar como os seus pais pareciam me conhecer antes mesmo que qualquer apresentação fosse feita?
— Bem... eu... falei sobre você com eles.
— Sério? E o que disse exatamente? Eu gostaria de saber, considerando sua enorme capacidade de mascarar a verdade...
E seus olhos baixaram do rosto de Bethany em direção aos seus seios, que ele conhecera intimamente. Não fazia qualquer diferença que estivessem bem escondidos sob o pesado suéter. Sua memória era boa o suficiente para recriar a imagem daquele corpo saboroso por baixo de todo o pano.
A mente de Bethany ameaçou entrar em colapso.
— Eu disse a eles... você sabe... que nos encontramos quando eu estava na Itália...
— Ah, então eles sabem que você esteve na Itália. Isso é um início promissor. Também sabem que esteve cuidando da casa de uma pessoa e que resolveu se passar por ela?
— Sim, eles sabem que estive cuidando de uma casa!
— Deixe de lado este tom de santa, Bethany. Ele não cai muito bem em você. E posso imaginar que não tenha dito nada sobre a história de se fazer passar pela srta. Amélia Doni... Certo?
Bethany sentia a palma de suas mãos suadas, mas as manteve cobertas pelas mangas do suéter.
— Não — admitiu.
— Eu já imaginava. Seus pais não parecem o tipo de pessoas que aprovariam essa brincadeira. Então o que exatamente contou a eles sobre mim?
— Certo. Tudo bem — ela disse, limpando a garganta, e esticando o corpo. — Sei que deve parecer estranho o falo de eu ter falado sobre você com eles, pois as coisas não terminaram bem.
— Foi a história do ano, não acha?
— São pessoas de forte moral. Acreditam na santidade das relações...
— Obviamente um traço de personalidade que não passaram à filha.
— Você não vai deixar barato, não é?
— E deveria?
— Só acho que não é uma hora apropriada para discutir — disse, e olhou para a porta, mas os pais continuavam no andar de cima. Conhecendo-os como os conhecia, estariam fazendo hora para que ficasse sozinha com Cristiano. Sentiu-se mal ao lembrar-se de sua louca mentira.
— O que os valores morais dos seus pais têm a ver com tudo isso? — ele perguntou, de repente. Perito em ler nas entrelinhas, sabia que neste caso dois e dois talvez não somassem quatro. Mesmo sendo Bethany mentirosa, provavelmente ladra, oportunista de marca maior e imprevisível, havia coisas em sua conversa que não se encaixavam, e ele não entendia.
— Acredita que nunca imaginei que você apareceria aqui desta maneira, saindo do nada? — perguntou Bethany, com o coração quase pulando do peito, a ponto de explodir. — Quero dizer que você é um homem sofisticado, imaginei que olharia para trás e não veria nada, além de um caso sem importância. Nunca pensei em como poderia reagir se alguma vez descobrisse... você sabe...
Cristiano farejava uma trapaça, mas esperava, pois mais cedo ou mais tarde ela teria de responder às suas perguntas. As mesmas que driblava naquele momento.
— Elegante.
— O quê?
— Elegante. Não foi esta a palavra que sua mãe usou para se referir a mim?
— Sim. Foi. Elegante. E aventureiro.
— Elegante e aventureiro?
Ela fez que sim com a cabeça, triste.
— Por que tudo isto está começando a parecer surreal para mim? — ele perguntou, levantando-se e começando a andar pela sala, parando para olhar as fotos de uma família feliz em molduras dispostas na mesa, na estante, na mesinha ao lado da janela. Mostravam pais orgulhosos de sua filha. Em poucos metros quadrados, estavam representadas as felizes memórias de uma família.
— Sei que pode soar um pouco louco...
— Um pouco? — ele repetiu, virando-se e olhando para ela, deixando-a cravada à poltrona com uma intensidade brutal. Era complicado lembrar-se da versão anterior de Cristiano. E ela percebeu que lidar com a realidade era muito difícil.
Enquanto lutava para colocar seus pensamentos em ordem e encontrar uma forma de explicar aquela situação surreal, Cristiano aproximou-se e se curvou, apoiando-se nos braços da poltrona e fazendo com que cada terminação nervosa do corpo de Bethany ficasse alerta.
Seu cheiro limpo, masculino, penetrou em suas narinas e inflamou seus sentidos. Elegante não fazia justiça àquele rosto bronzeado, lindo, de feições perfeitas. Cheia de medo e em pânico, sentiu seu corpo reagir à proximidade de Cristiano, seus mamilos se excitaram ao lembrar-se de todo o prazer que sentira ao seu lado. Sua boca ficou seca. Olhou imediatamente para baixo, mas Cristiano pôde perceber a reação inconsciente de seu corpo.
Sentiu uma pontada de satisfação. Algo fora real. Poderia ter mentido sobre todas as outras coisas, mas não mentira ao demonstrar sua atração por ele. Quando caiu em seus braços, fora verdadeira. Além do mais, se ele ainda a quisesse, ela acabaria cedendo.
— Então, sou elegante — ele disse, com uma voz que demonstrava satisfação consigo mesmo —... e aventureiro.
— Por favor, poderia parar de se inclinar para cima de mim? — pediu Bethany, mas Cristiano ancorou-se com ainda mais força contra a poltrona.
— Por quê? Isto faz com que você se sinta pouco confortável? Sua consciência culpada a incomoda quando chego assim tão perto? Ou quem sabe... — E sentiu um desejo selvagem, nada bem-vindo naquele momento, ao ver que sua libido tomava conta da situação —... você está horrorizada ao perceber que gostaria de ter seu ex-amante elegante e aventureiro ainda mais perto?
Foi recompensado com um olhar direto, olhar que confirmou o que já suspeitava. Satisfeito, levantou-se e voltou à sua poltrona. Se aquilo era um jogo, tinha acabado de marcar o primeiro ponto.
— Então... você estava me contando por que sentiu um desejo louco de falar sobre o nosso curto caso aos seus pais...
Desta vez foi Bethany quem se levantou. Caminhou até a porta entreaberta e fechou-a. Seus pais estavam fazendo hora, mas a qualquer momento desceriam para um momento em família, e não precisava que ouvissem aquela conversa.
Quando voltou sentou-se no sofá ao lado da poltrona de Cristiano, próximo o suficiente para falar sem precisar levantar a voz, apesar de seu corpo temer tanta proximidade. Não queria insistir no mortificante fato de que ele entendera tudo, que percebera o seu desejo. Teria notado o quão profundo era este desejo? Na verdade, era tão forte que vencia tudo: sua hostilidade, reprovação e postura fria. Não poderia culpá-lo, dadas as circunstâncias, por usar suas fraquezas a seu favor, contra ela.
Caso tivesse tentado beijá-la, Bethany provavelmente não resistiria. Mas o fato de ter chegado àquele ponto para depois retroceder, deve ter oferecido ao menos um pouco de orgulho ao seu ego ferido, e ela tentou com todas as forças focar-se neste ponto de vista. Era justo, no final das contas.
O que não significa que Bethany não tenha notado a rejeição.
— Sim. Certo.
— E, fale a verdade, que história é essa de aventureiro?
Bethany respirou fundo.
— Você não acreditaria.
— Fico surpreso ao ver que seria capaz de pintar um quadro de nossa vida sexual aos seus pais — ele disse, irônico.
— O quê?
— Bem... — disse Cristiano, dando de ombros, ainda se sentindo superior por ter uma prova irrefutável do que Bethany sentia por ele, e também por ter exercido seu poder contra ela. — Se os seus pais são tão cheios de moral quanto me disse, fico surpreso por você poder contar sobre sua vida sexual a eles. Ou na verdade se trata de uma mãe acolhedora ou de um papo entre irmãs?
— Claro que não falei sobre nossa vida sexual com a minha mãe! Ela ficaria chocada!
— Então sobre o que estiveram conversando?
— Sobre o que você faz!
Naquele momento, Cristiano olhou-a, desorientado. Mesmo para ele, aquilo era demais.
— E o que eu faço?
— Muito dinheiro — ela respondeu, fervorosa. — Controla o seu império, mas claro, você sabe, isto não é suficiente...
— Não? — perguntou, e sua mente estava mais perdida que nunca. Tampouco gostava da forma como Bethany evitava olhar diretamente para ele. Deve ter mentido todo o tempo que estiveram juntos, mas nunca antes evitara o contato olho no olho. Agora, passara a evitá-lo a todo custo.
— Não — ela suspirou, e pensando que era inevitável, seguiu falando em tom mais natural. — Você não estava satisfeito construindo impérios, por isso resolveu embarcar em um projeto de boas ações.
— Projeto de boas ações? Sinto muito, mas estou confuso.
— Eu sei. Imaginei. E também sei que não vai gostar de ouvir o que tenho a dizer, mas não posso evitar. Bem, isso provavelmente poderia...
— Vá direto ao ponto, Bethany!
Ficou olhando para ele um momento. Queria guardar aquela imagem em sua cabeça. Não era uma ótima imagem porque ela estava com muita raiva dele, embora não tanto quanto no momento em que ele chegou ali. No entanto, provaria ser uma imagem muito mais reconfortante do que a que teria quando ela terminasse de falar.
— Disse aos meus pais que você estava envolvido na construção de todo o tipo de coisas... em... lugares perigosos... lugares nada amenos... por exemplo, a África profunda ou zonas destruídas por guerras... você sabe, fazendo a sua parte para diminuir o sofrimento das vítimas do mundo...
Cristiano balançou a cabeça, pois imaginava que assim entenderia a história confusa de Bethany. Depois passou os dedos pelos cabelos e ficou olhando para ela, perplexo.
— Eu construo todo o tipo de coisas em lugares perigosos? Que tipo de coisas?
— Não sei! Coisas. Escolas! Centros comunitários! Facilidades médicas!
— Na África profunda?
— Algumas das coisas, sim. E outras em áreas de conflito, por assim dizer.
— Não entendo. Você ficou louca? Deve ser uma mentirosa compulsiva, mas com o que imaginava estar brincando?
— Você não deveria descobrir nada disso!
— Talvez eu não esteja entendendo bem, mas qual o objetivo de me transformar em uma espécie de salvador da pátria? Não, espere, quero perguntar algo mais fundamental. Por que falou sobre mim com os seus pais? Eles nunca descobririam nada, e mesmo que descobrissem, estamos no século XXI. Por mais moralistas que sejam, devem entender que homens e mulheres se relacionam, e que alguns relacionamentos não duram para sempre! Você tem duas irmãs! Vai me dizer que as duas passaram toda a vida esperando pelo cara certo e até então nunca se relacionaram com ninguém?
— Não, claro que não!
— Então por que inventou uma confissão tão elaborada para duas pessoas que poderiam ter ficado sem saber de nada? Por que não apenas maquiou os fatos? Você conheceu um cara. Se divertiram por algumas semanas. E acabou.
Um silêncio se seguiu à fala de Cristiano, e nesse meio tempo Bethany ficou vermelha enquanto rezava para que um buraco se abrisse no chão e ela fosse engolida pela terra. Ou melhor: queria fechar os olhos, e quando voltasse a abri-los, que ele já não estivesse ali, e todos os meses passados não fossem nada além de um sonho ruim.
— A sua obsessão com a mentira é mesmo tão descontrolada? — perguntou Cristiano, olhando-a com a testa franzida enquanto tentava entender suas loucuras. — Se for assim, você precisa buscar ajuda. — E se levantou. — Não quero continuar ouvindo tanta mentira.
Bethany se levantou e agarrou a mão de Cristiano. O contato físico fez um calafrio percorrer todo o seu corpo e ela imediatamente soltou sua mão.
— Espere! Não terminei!
— Não? — ele perguntou, e sua boca se curvou em um sorriso zombeteiro. — Ainda tem mais? Além do serviço missionário em lugares do mundo onde nunca estive? O que estará por vir? Eu poderia usar como boas recomendações em meu currículo?
— Podemos nos sentar outra vez? Por favor? Você deve estar imaginando que entrou em uma casa de loucos... mas tem mais que... você precisa saber...
Só pelo fato de ela estar particularmente atraente com aquele olhar desesperado estampado no rosto... e, enfim, como esta mulher nasceu para ser uma espécie de montanha russa, por que não oferecer-lhe mais alguns minutos...?
Bethany ficou aliviada ao ver que Cristiano a escutava. Após ter olhado várias vezes para o relógio antes de seus pais chegarem, olhou mais uma vez, percebendo que poderiam descer as escadas a qualquer momento, entrando na sala de estar e levar aquela conversa para Deus sabe onde. De repente, o tempo passou a ser um bem muito escasso em suas mãos.
— Falei tudo isso porque... o que tivemos foi muito mais importante para mim do que a reação dos meus pais. Mas, antes de explicar o que estou querendo dizer...
Bethany esperava que Cristiano a interrompesse dizendo qualquer coisa, acusando-a, e não que ficasse observando-a em silêncio, esperando apenas. Suas mãos, mais uma vez protegidas na manga do suéter, estavam suadas.
— Antes de explicar o que estou querendo dizer... — ela repetiu, demorando o máximo possível para terminar a frase — quero que saiba que o enviei a todos esses lugares...
— África central, por exemplo? E áreas de guerra?
Bethany fez que sim.
— Mandei você para esses lugares, pois seria mais fácil que desaparecesse assim...
— Fácil... para... que eu desaparecesse.
— Quero dizer. Poderia ter dito que você estava em Nova York, Tóquio ou mesmo do outro lado do planeta, na Nova Zelândia, talvez, mas isto complicaria a situação...
Cristiano ficou chocado ao saber que as coisas poderiam ser mais complicadas do que já estavam. Bethany, olhando para outro ponto na sala, aliviada por estar contando tudo, o que sempre soube que uma hora teria de fazer, desde o momento em que abriu a porta de casa para ele, não deve ter notado sua expressão de choque.
— Se você estivesse baseado, vamos dizer... no Congo... nossa relação poderia ter terminado. Quero dizer, que casal sério conseguiria manter uma relação tão distante?
— Casal sério!
Mais uma vez Bethany olhou para ele, fez que sim com a cabeça e esticou a mão para mostrar um discreto anel de noivado.
— Não é verdadeiro, claro, mas eu precisava mostrar algo aos meus pais.
Ele não notara o anel. Na verdade, não prestara muita atenção às suas mãos e agora pensava no quanto ela estava tentando escondê-las nas mangas do suéter. Cristiano ficou olhando-a, incrédulo.
— Você acha que estou louca, certo?
— Louca? Isso é pouco.
— Certo. Escute. Sei que pode estar com um pouco de raiva... — Ela notou a aproximação dos pais. Era agora ou nunca, e nunca não seria uma opção válida. — Precisei contar essa mentirinha...
— Mentirinha! Por favor, é uma mentira bem grande, seja sincera!
— Porque, como eu já disse, meus pais são muito conservadores e teriam ficado altamente desapontados se soubessem que sua filha, após passar duas semanas com um cara no exterior, acabava de voltar grávida para casa.
Cristiano finalmente soube o que era ver uma bomba sendo detonada no epicentro de sua vida. Ficou olhando para ela em silêncio, estarrecido, e podia sentir a cor desaparecendo de seu rosto. Para Bethany, era como se fosse um homem que acabara de pular de um avião, mas que se esquecera de vestir o para-quedas. Sentia-se assim: em queda livre. Deixava de ser desimpedido, solteiro, transformando-se em noivo, com um filho a caminho. Tudo no espaço de algumas horas. Pior: estava noivo de uma mulher que considerava uma mentirosa compulsiva de olho em uma grande oportunidade. Poderia ser pior?
Naquele exato momento, os pais surgiram em cena, adiando o final da história. Bethany ficou aliviada, ainda que tivesse sido melhor resolver tudo de uma vez. Estariam nas mãos dos seus pais, que tinham várias histórias para contar sobre a sua infância, quando o dinheiro precisava ser esticado ao limite, especialmente com três filhas e vários bichos de estimação. Quando a mãe desapareceu para buscar algo para comerem, o pai convidou Cristiano para tomar um drinque e contar-lhe sobre suas viagens.
— África — ele disse, sentando-se no sofá para uma longa conversa. — Nunca estive por lá. Deve ter sido uma experiência dura para você. Mas fico feliz por ainda haver jovens preocupados com a situação...
Bethany engoliu em seco quando seu pai tombou a cabeça para um lado, olhando para Cristiano com muito interesse.
— O Cristiano... — ela disse, limpando a garganta e sorrindo ao pai. — Ele... ele não gosta de falar sobre esses trabalhos... na África... e em outros lugares... É muito modesto... você sabe.
E deu uma risada alta, um sorriso que morreu no silêncio da sala. Graças à crença de seus pais de que estavam noivos, ela acabou sentada ao lado de Cristiano no sofá, o que era muito irônico, considerando que ele só estaria assim tão perto dela se fosse para estrangulá-la. Mas pegou sua mão e até acariciou-a um pouco.
— Isso é muito gentil de sua parte, Bethany... — disse, olhando para ela e percebendo que estava como um gato numa bacia de água fria. Seu pai culparia tanto nervosismo pela chegada inesperada do noivo. — Mas você não se lembra das fotos que lhe mostrei...?
— Fotos? — ela perguntou, virando-se para ele e tentando sem sucesso soltar sua mão.
— Sim, as fotos... as fotos do meu álbum, meu álbum da África.
— Ah, claro.
— Por que não dá uma dica para o seu pai sobre o que eu fazia lá...? — perguntou, apertando outra vez a sua mão e sentindo as unhas de Bethany cravadas em sua palma. Finalmente soltou-a, para depois pousar a mão na sua coxa, num típico gesto de demonstração de afeto. Seu sorriso de encorajamento demonstrou o quando queria ver como se sairia entre tantas mentiras.
Bethany percebeu tais intenções no seu olhar e naquele sorriso que era tudo, menos encorajador. Respirou fundo e cruzou os dedos atrás das costas ao começar uma floreada descrição do centro comunitário. Na verdade, totalmente baseado em um programa que vira recentemente na televisão. Quando parou de falar, ouviu Cristiano dizer, em tom suave:
— Acho que mo merece um aplauso! — E olhou para John. — Sua filha é muito persuasiva com as palavras. Poderia vender neve a esquimós... certo, querida!
Bethany encarou seus olhos, tão frios quanto o seu sorriso. E abriu um sorriso forçado em retribuição. Pelo menos enquanto estivesse na frente dos pais deveria fingir estar feliz pela aparição repentina do noivo.
Vista de outro ângulo, a farsa poderia ser muito divertida. Infelizmente, como estava no meio do furacão, era muito mais tragédia que uma comédia.
— Não sei — murmurou Bethany, mas Cristiano estava determinado.
— Quero dizer... — ele falou, olhando para o pai de Bethany, com a mão firmemente agarrada à sua coxa, num lembrete gentil de que estava ali, ao seu lado no sofá, e que não a deixaria escapar até que estivesse satisfeito... —... quando ela descreveu esta casa, aqui na Irlanda, eu quase tive a impressão de que se tratava de um castelo!
— Nada mais distante da realidade, como você pode ver! — disse John, balançando a cabeça e sorrindo para a filha.
— Mas você tem razão. Sei que ela vai fazer uma careta para o que vou dizer, mas Bethany sempre foi a primeira da turma em inglês!
— Eu imagino.
— Mas agora as circunstân...
Bethany ouviu a mãe chamando da cozinha e respirou aliviada. Seu pai foi na frente, o que lhe deu uma chance de se afastar de Cristiano ao levantar-se do sofá.
— Pare! — ela murmurou.
— Parar? O quê?
— De me tocar!
— Por que está pedindo isso agora? — A voz de Cristiano era tão dura quanto seus dedos. — Você é uma mentirosa profissional e eu devo fazer o papel de noivo feliz.
— Eles não deveriam esperar contato físico? E, corrija-me se estou errado, mas nada foi dito sobre a sua tal gravidez. Interessante, né?
— O que está querendo dizer?
Mas ficou sem resposta, pois os seus pais os chamaram para entrar na cozinha. De mãos dadas, como um casal amoroso. Bethany se lembrou que não deveria confiar nas aparências, nunca. E sabia que o homem ao seu lado pensava o mesmo.
— Só esquentei um frango que estava na geladeira — disse Eileen, quando todos se sentaram à mesa, cuja superfície estava marcada pelo trabalho do passado. — Diga o que você acha, Cristiano... — E olhou-o ansiosa, muito feliz quando ele começou a elogiar educadamente enquanto, ao seu lado, Bethany se torturava imaginando o que ele estaria querendo dizer com nada foi dito sobre a sua tal gravidez. Interessante, né?
Estaria pensando que era mentira? Que Bethany inventara tudo aquilo? E se ele deixasse escapar um comentário infeliz como nunca pensei em ter filhos! Ficou revolvendo a memória para se lembrar se alguma vez Cristiano dissera algo parecido. Nunca sentira tanta falta de um pouco de bebida alcoólica, nem que fosse apenas para sobreviver às perguntas de sua mãe sobre onde tinham se encontrado, e como. Nenhuma tentativa de desviar a conversa a outro tema aplacou a curiosidade da senhora. Bethany agradecia por seu pai já não perguntar sobre suas ações maravilhosas na África.
O que parecera ser uma boa ideia em algum momento, uma forma de evitar o desapontamento e a angústia dos pais ao receber de volta sua filha grávida e solteira, retornava agora para assombrá-la.
Quase pior era a realidade: Cristiano estava ganhando seus pais. Tirava histórias divertidas da cartola como um mágico. Mas quando estavam limpando a louça, Bethany teve um lampejo de inspiração e disse, em voz alta:
— Agora vocês entendem o que eu queria dizer com elegante!
— Ah, querida. Estou muito feliz por você. Claro, é uma pena que não tenha podido terminar a universidade, mas ele parece um rapaz adorável. Acho que não se importaria se, em algum momento, você resolvesse terminar seus estudos, certo?
Bethany se apoiou na pia da cozinha, com os ouvidos em alerta para localizar os passos do homem elegante em questão, que fora à sala com o seu pai.
— Bem, eu deveria mesmo...
— O quê? — perguntou Eillen, olhando para a filha, preocupada.
— Quero dizer... — E o som de outra mentira, amontoando-se na pilha das várias que já contara, chegou como um cavalo galopante, sem controle, fazendo-a suspirar. — Nada. Só queria dizer que... é sempre bom ter um diploma debaixo do braço.
— Mas não se esqueça que agora você tem outras obrigações, querida.
Bethany fez uma careta.
— Impossível esquecer isso.
Na verdade, gradualmente se acostumara à ideia de ter um filho. O que no início fora um choque enorme, depois se acomodou, quando finalmente percebeu que não se livraria da gravidez, teria de lidar com ela. Foi uma benção ter seus pais como apoio, pois seguir na universidade estava fora de questão e ela não gostaria de continuar morando em Londres sendo mãe solteira.
— Falei ao seu pai que não mencionasse nada sobre o bebê — disse Eileen, mais feliz que pinto no lixo. — Imaginei que gostaria de discutir isso com Cristiano a sós, e não tinha certeza se ele já sabia...
— Obrigada, mamãe.
— Você não parece tão animada com a chegada de Cristiano como eu pensei que ficaria, Beth — disse sua mãe, preocupada. — Sei que imaginava que permaneceria preso vários meses, terminando seu projeto de construção...
— Mas estou aqui!
Por trás delas, deixando escapar essa observação certeira, surgiu a voz de Cristiano. Ele parou atrás de Bethany e passou o braço sobre os seus ombros, aproximando-a de seu corpo. Relutante, Bethany abraçou a cintura de Cristiano. Por trás de sua camisa, pôde sentir seu corpo musculoso, e um calafrio percorreu sua espinha.
— E, como disse a John na sala, sou portador de boas notícias, minha querida.
— O quê? — perguntou Bethany, olhando para ele, horrorizada, pois seus pais os observavam com olhos de águia. Podia ouvir o silêncio de expectativa de sua mãe, que praticamente não respirava.
— Se acabaram os projetos...
Bethany ficou perdida, e somente quando sua mãe bateu palmas percebeu o que ele estava dizendo.
— Que bom! — disse, tentando colocar um pouco de entusiasmo na voz ao ver que as últimas desculpas por tê-lo afastado de sua vida caíam por água abaixo.
— É isso mesmo — disse Cristiano, para deixar claro que todos tinham entendido muito bem o que dizia. — Minhas prioridades agora estão aqui. Certo, querida? Aqui, com você... e com o nosso filho.
De repente o mundo ficou cor de rosa. Pelo menos para os seus pais. Sua mãe mal podia conter a emoção, e enquanto as vozes ressoavam ao seu redor, Bethany sentiu perder o controle de tudo. Teria imaginado que seria capaz de persuadi-lo a desaparecer de seu mundo? Ele não a amava. E ainda por cima descobrira que seria pai de uma criança que já tinha quatro meses, contra a sua vontade, com uma mulher que desprezava, que considerava uma mentirosa profissional e sabe-se lá mais o quê.
Quem diria que Bethany terminaria grávida de um homem que não sentia nada além de desprezo por ela? Que mulher sonharia com isso?
— Não sei se Bethany mencionou que...
— Ficamos chocados quando ela nos contou...
— Mas agora que o conhecemos, não poderíamos pensar em um genro melhor...
— Papai!
— Claro que não vamos invadir a vida de vocês — disse Eillen. — Mas terão de nos desculpar, pois somos antiquados nesses assuntos...
— Minha mãe é igual...
Estaria Cristiano pensando que a gravidez era uma mentira? Bethany mentira sobre muitas coisas, sobre quase tudo, mas nesse ponto estava sendo sincera. Duas semanas de diversão sob o sol e ele pagaria a conta pelo resto da vida. Que escolha teria? Era uma contusão, mas não poderia livrar-se dela. Tentou imaginar como sua mãe e seu avô reagiriam, e por alguns segundos entendeu a necessidade de Bethany de fabricar tais mentiras. Sua mãe ficaria louca caso aparecesse em Roma com uma criança, sendo pai solteiro.
— Você precisa nos contar sobre ela... sobre sua família... Bethany foi um pouco econômica nas informações...
Sua filha, ele pensou, foi econômica em muitos assuntos.
— Mas agora... — disse John, passando o braço em sua esposa, demonstrando afeição —... Eillen e eu vamos para o ninho.
— Podemos ser um pouco antiquados — disse Eillen, sorrindo para Cristiano — mas não a ponto de colocar vocês dois em quartos separados...
— Mas, mãe! — E a voz de Bethany saiu esganiçada. — Você nunca deixou Shania e Melanie trazerem seus namorados para casa e dormirem no mesmo quarto!
— A situação agora é um pouco diferente. Certo, querida?
— É verdade, mas não há motivo... Quero dizer, não quero desrespeitar...
— Ainda bem que nos livramos daquela sua cama de solteira há alguns anos! Lembra como você ficou chateada ao perder aquele espaldar? — disse, agora olhando para Cristiano. — Ela tinha uma coleção de adesivos colados nele desde muito pequena! Acredita que descolou todos e pôs em um álbum!
Bethany estava ficando vermelha. Será que sua mãe, de alguma maneira, imaginava que assim ela pareceria mais doce? Não enxergava que, na verdade, Cristiano a via como uma fruta amarga? Não, Bethany respondeu a si mesma, triste. Por que sua mãe pensaria que sua filha amada e agora noiva não gostaria de dividir um quarto com seu sexy, elegante e aventureiro noivo, que provavelmente não via a hora de arrancar suas roupas?
Ainda rindo e conversando um com o outro, seus pais saíram, deixando para trás um silêncio brutal.
— Então... — disse Cristiano, postando-se à sua frente. — Por onde começamos...
— Podemos começar pelo fato de que não vou dividir um quarto com você. Pode ficar no quarto da Shania. Meus pais nunca vão saber, basta eu levantar cedo e arrumar tudo.
— Seria um ótimo começo — disse, andando em direção à cozinha e fechando a porta. Depois, assegurando-se de que ela não poderia fugir, ficou de pé em frente à porta fechada, determinado. — Aliás, você ficou grávida de propósito?
Bethany ficou horrorizada com o insulto. Cerrou os punhos, olhando firme para Cristiano.
— Isso é a coisa mais idiota que já ouvi!
— Então a sua vida sempre foi muito tranquila — disse Cristiano, cortante. — Aqui onde estou, vejo alguém que conseguiu entrar na minha vida...
— Entrar na sua vida? Foi você quem bateu na minha porta, lembra-se?
— Na sua porta?
— Certo, na porta! — disse, tirando o cabelo do rosto.
—... e, ao chegar na minha cama, notou que aquela era uma chance muito boa para deixar escapar. E existe melhor maneira de agarrar um homem que ficando grávida?
Bethany riu, incrédula.
— Você acha que eu planejei isso? Realmente acha que eu queria abandonar os estudos, a minha independência, para ter um bebê?
Seus olhos estavam arregalados, sua boca seca; sentia-se à beira de um ataque de nervos. Mal se notava sua barriga, mas aquilo não saía de sua cabeça. Viva cada dia, sem ousar pensar no futuro. O sonho de sair da cidade em que nascera se arrumara, e por isso não conseguia pensar em mais nada. Era como se o plano A, em torno do qual construíra sua vida, tivesse se transformado em outro, e já não pudesse fazer nada. Onde estaria nos próximos seis meses? Um ano? Onde estaria vivendo? Não poderia ficar para sempre na casa dos pais, com um bebê, morando no mesmo quarto de sua infância. Mas para onde iria? Como pagaria as despesas de duas pessoas?
E ouvir aquela pergunta de Cristiano foi o fim!
— Você se acha irresistível, não é? — E, raivosa, afastou-se da pia onde até então se apoiava. — Arrogante, cruel, esnobe! — disse, levantando um dedo para ele. — Você honestamente acha que eu seria capaz de jogar fora o meu futuro para viver com um homem que me despreza, que me considera uma mentirosa? — perguntou, limpando uma lágrima do rosto. — Pareço ser tão triste... tão desesperada!
— Calma! Você está começando a ficar histérica. — Arrogante, cruel e esnobe? Não era ela quem deveria estar sendo atacada? Afinal, Cristiano fora completamente honesto, como ousava acusá-lo?
— É impossível conversar com você — disse Bethany, ainda mais enfurecida pelo fato de Cristiano ser tão frio. Percebeu que, se não desaparecesse naquele momento, explodiria, e essa explosão acordaria seus pais, e talvez toda a cidade.
— Você não está falando. Está ficando histérica.
— Você me deixa histérica! — disse, cruzando seu olhar com o dele e sentindo-se tonta. Por que provocava isso? Por que balançava seu coração quando tudo o que queria era sentir nojo dele?
— Você não parece grávida.
— O quê?
— Não deveria estar mais gordinha?
Bethany ficou desconcertada com a mudança brusca de assunto.
— Algumas pessoas não engordam tão rápido, e eu sou uma delas. Por que mudou de assunto?
— Porque você não deveria ficar tão nervosa na sua... condição.
— E como deveria me sentir quando você fica aí, parado como um bloco de gelo, me acusando de ter armado tudo isso?-— E respirou fundo, pensando. A histeria não resolveria nada. — Se eu fosse louca o suficiente para engravidar de propósito, não deveria ter entrado em contado com você desde o primeiro momento?
— E por que não fez isso?
— Pela mesma razão que... esqueça. Não sou a mulher rica e conhecedora do mundo que você imaginou que eu fosse. Não sou ninguém, sou o tipo de pessoa para quem você nunca olharia duas vezes numa situação normal.
— Não se menospreze — disse Cristiano, censurando-a e franzindo a testa.
— Não estou me menosprezando, Cristiano. As coisas são assim. Você me disse que não sairia com uma mulher que não viesse do mesmo mundo, pois nunca saberia se ela estaria apenas correndo atrás do seu dinheiro.
— Nunca disse isso! — Cristiano parecia ter perdido o controle sobre a conversa, e não sabia para onde Bethany o conduzia.
— Disse!
— Certo. Talvez tenha dito, mas não estou convencido.
— Então, quando descobri que estava grávida, logo percebi que não poderia dizer nada a você. Como teria se sentido se eu aparecesse na sua porta... uma certa Bethany Maguire, grávida, sem ter para onde ir e sem um centavo no bolso? Não me diga que soltaria fogos de tanta felicidade!
— Mas essa não é a questão.
— Qual é a questão, pode dizer?
— Eu tinha direito de saber. Quando se trata de uma criança, não se pode pensar no que vamos sentir, a única coisa que importa é essa criança. Você alguma vez pensou em me ligar para dizer que eu seria pai?
Bethany desviou os olhos. Sempre que pensava em ligar para ele, para explicar a situação, desistia imediatamente.
— Eu, por exemplo, teria contado. Na hora. Provavelmente. — Foi a resposta de Cristiano, imediata.
Não poderia seguir aquela linha de ataque, mas na sua mente imaginou uma história na qual a criança cresceria sem a sua presença, transformando-se no filho adotado de outro homem, que em algum momento entraria na vida de Bethany. Isso o deixou louco. Só de pensar em Bethany nos braços de outro homem, ficava louco. Tirou essa imagem da cabeça e resolveu ser mais prático.
Fora complicado entender suas razões para mentir. Mas isso, naturalmente, não era desculpa para aquela manipulação da verdade. No entanto, tentaria esquecer, pois havia coisas muito mais importantes a serem discutidas.
— Fico surpreso por não ter me matado — disse, brincando, e Bethany olhou para ele, mais uma vez chocada com a mudança de tom. De fria e raivosa, sua voz ficou mais aveludada e doce. Isso fez com que os pelos de sua nuca se eriçassem e algo dentro dela se retorcesse, deixando-a vulnerável, exposta.
— Não sou tão ruim — ela disse, já sem poder respirar. — Além do mais, melhor assim, já que você apareceu aqui. Explicar a aparição repentina de um noivo que está longe já é complicado. Explicar a ressurreição seria impossível. — Com sua raiva um pouco diluída, Bethany percebeu o quanto estavam próximos. Praticamente se tocavam. Deu alguns passos para trás e disse que iria para a cama.
— Onde estão suas roupas? — ela perguntou.
Seus pais não notaram a ausência de mala, e ela só notou naquele momento.
— Estão em um hotel, a poucos quilômetros daqui.
— Ah, certo. A mansão convertida em hotel, claro. Teria dito que voltasse para lá, mas o que isso resolveria?
Seria estranho aos pais que o casal recém-reunido passasse a noite separado, especialmente quando eles demonstraram um liberalismo incrível, permitindo que ficassem no mesmo quarto.
— Então você não tem roupa aqui... Posso saber como vai dormir?
— Toe, toe. Não me diga que sua memória é tão curta?
Suas bochechas ficaram vermelhas ao lembrar-se das noites que passaram juntos. Sem roupa. Para ela, era uma novidade. Nunca antes dormira nua, e ficou muito envergonhada na primeira vez, pois era algo quase mais íntimo do que fazer amor. Mas Cristiano, por sua vez, nem tinha pijama.
— Não. Por favor, ande. Vou subir agora.
Cristiano não hesitou em segui-la. Não estava muito certo sobre qual fora a conclusão da conversa. Ela poderia ser Bethany Maguire, Amélia Doni ou a rainha da Inglaterra, mas permanecia sendo a mulher que argumentava, imprevisível, exatamente como ele se lembrava. Sentia-se metido em uma lavadora de roupas ligada na velocidade máxima.
Além do mais, estava interessado em ver o que aconteceria quando chegassem ao quarto. Olhou sua bunda pequena, arredondada, enquanto ela subia a escada. Nunca esquecera sua delicadeza. Movia-se com a graça de uma bailarina, mesmo que nunca tenha ido a uma aula de bale na vida. Era difícil julgar se guardava alguma barriginha debaixo daquele suéter, mas de costas seu corpo parecia exatamente igual.
Pela primeira vez, Cristiano enxergou o bebê que ela carregava como um grande crédito à sua flexibilidade e força de caráter, pois não se sentia mal ou acorrentado. Sua mãe e seu avô ficariam perdidos, isto é certo. Talvez não tenha acontecido da melhor maneira, como eles teriam gostado, mas o resultado final seria bem-vindo, de braços abertos.
Chegaram ao topo da escada e Bethany olhou-o, apontando para o corredor.
— Meu quarto é o último à direita — disse, num tom rascante. — Volto em um minuto, nesse meio tempo, prepare sua cama no chão. Vou trazer um cobertor e você poderá usar um dos meus travesseiros.
Cristiano não disse nada. Seguiu até o quarto, lentamente, aproveitando para olhar os outros quartos pelos quais passava, sem dúvida pertencentes às irmãs, e poderia dizer onde dormia cada uma delas. Aquele com vários livros era o de Shania, e o repleto de potes de maquiagem e cremes, de Melaine. Mais um detalhe sobre o qual Bethany não mentira. Seu quarto era o maior de todos, com grandes janelas nas paredes e decorado em tons pastéis. A mobília era velha e pesada, não combinava com o gosto de Cristiano, mas tinha a ver com o quarto, e a cama era grande, com quatro travesseiros gordos, mas nenhum deles acabaria no chão.
Tirou os sapatos, livrou-se das meias e deitou-se na cama, aliviado, com as mãos atrás da cabeça; pensava qual seria a reação de Bethany ao vê-lo assim.
Não teve de esperar muito. Cinco minutos mais tarde ela entrou no quarto, parando na porta para acender a luz, o que ele não fizera. E imediatamente viu que estava deitado na cama. Sentiu vontade de bater a porta, mas resistiu ao impulso e fechou-a com um clique.
— O que você está fazendo? — perguntou, jogando o cobertor para ele, que por sua vez, atirou-o ao chão.
— Estou aproveitando este maravilhoso colchão. Muito mais confortável que o do hotel, o que demonstra que o dinheiro nem sempre compra o melhor.
— Certo, agora que já o experimentou, levante-se e comece a arrumar sua cama. Peguei um pijama do meu pai também. Vista.
— Por quê? Você já me viu nu.
— Antes, agora não quero.
— Pense em cavalos, portas de estábulo...
— Eu não ligo a mínima para o que você está pensando! — gritou, quase chorando de frustração. — Ande... vista este pijama... — e Bethany respirou fundo. — O banheiro fica ao lado...
— Certo — disse Cristiano, levantando-se e esticando o corpo. — Mas no chão eu não durmo.
— Então durmo eu!
— Não, você não. — E Cristiano não sorriu ao aproximar-se dela. — Você vai dormir nesta cama, assim como eu. Não quero ver você grávida dormindo no chão.
— Então durma você no chão.
Eles cruzaram os olhares e ela perdeu a respiração.
— Nenhum de nós dois vai dormir no chão, e se eu voltar aqui e notar que fez algo com esse cobertor além de guardá-lo no armário, vou ficar chateado.
— Ah, e a sua chateação é importante, naturalmente!
Ele abriu um sorriso falso e pensou que já tinha se esquecido como ela ficava linda com os olhos raivosos, toda corada.
— Então concordamos em um ponto. Já é um começo.
Quando saiu do quarto, levando a toalha que ela trouxera e tropeçou em uma cadeira, Bethany passou três segundos enfurecida. Depois se moveu como se fosse dirigida por um foguete. Já com o rosto lavado e os dentes escovados, ela vestiu seu pijama velho, de flanela, do tipo que ninguém gostaria de ser vista usando, e se deitou na cama, certificando-se de puxar as cobertas até o queixo e posicionou um dos travesseiros como barreira entre os dois. Depois virou as costas à porta e fechou os olhos, com força. Mas nada a protegeu de escutar a porta se abrindo, dez minutos depois. Ele se movia tão lentamente que ela só notou que já deitava na cama quando o colchão afundou, quase fazendo com que o seu corpo caísse para o outro lado.
— Sei que não está dormindo — ele disse, em tom informal — e gostaria que aceitasse o fato de que nenhum de nós dois vai dormir no chão, como um adolescente em concerto de rock. Não gosto desse travesseiro entre nós — disse, pegando-o e atirando ao chão. — Está bem melhor assim. Agora precisamos conversar.
E rolou na cama, fazendo com que Bethany tremesse ao sentir sua pele nua contra seu corpo. Estava na ponta da cama, olhando na direção dele, mas mal podia ver seu rosto.
— E o pijama do meu pai?
— Está no chão. Estou de cueca, não se preocupe.
Reinou o silêncio entre os dois, e a cada segundo Bethany sentia seus nervos mais e mais estirados.
— Você sabe que precisamos ter uma conversa séria, não é? — disse Cristiano, calmo. — Quero dizer, uma conversa nada histérica.
Mesmo notando a barreira que ela impusera entre os dois com o seu pijama de flanela, Cristiano percebia que seu corpo seguia ferrenho em suas intenções.
— Este não é um bom lugar para conversar.
— Não...? Imaginei que todos os casais conversassem assim. Na cama.
— Não somos um casal.
— Então defina o que somos, e não se esqueça que estamos noivos.
Quando seus olhos se acostumaram à falta de luz no quarto, Bethany pode vê-lo com mais clareza, e sentiu seu corpo dolorido pela tortura de estar a poucos centímetros dele. Sua cama poderia ser grande para uma pessoa, mas parecia mínima quando Cristiano ocupava mais da metade do colchão.
— Gostaria que parasse de me lembrar isso — ela murmurou.
— Certo. Vou mudar de assunto. Até porque não quero causar dano à sua frágil consciência... então, posso fazer uma pergunta? Seu corpo mudou?
— O quê?
— Seu corpo — ele murmurou, com voz rouca. — Mudou? Quero tocar sua barriga. Quero sentir meu bebê — disse, esticando o braço e metendo-o sobre a parte de cima do pijama de manga comprida, muito quente para ser usado naquela cama. — Deve concordar que tenho direito...
— O que você está fazendo? — perguntou Bethany, com uma ponta de protesto, tentando fugir daqueles dedos longos, mas havia pouco espaço para manobras, por isso teve de contentar-se com uma luta inútil.
— Você a esconde bem — disse Cristiano ao sentir seu ventre arredondado e liso. Não acreditava que não percebera antes que ela lhe contasse, mas a verdade é que não chegou a olhar muito bem.
— Não... — disse Bethany, ficando sem ar, com o corpo corado e arfando enquanto ele continuava a acariciar sua barriga com a palma da mão.
— Não? Mas eu tenho todo o direito, certo? Afinal de contas, sou o futuro pai pródigo que acaba de voltar de sua aventura perigosa nos confins da África.
— Isso não tem graça.
— Não, você tem razão. Não tem mesmo. Vinte e quatro horas atrás eu era um homem sem qualquer responsabilidade sobre ninguém, exceto comigo mesmo... — disse, tirando a mão da barriga arredondada, tomado pela magnitude da situação.
— Vinte e quatro horas atrás você era um homem que corria para esta casa querendo jogar na minha cara todas as mentiras que contei!
— E mal sabia a profundidade de tais mentiras.
— Mas nunca teria me procurado se não soubesse de nada; certo, Cristiano?
Estaria esperando que ele negasse? Suas bochechas coraram ferozmente ao perceber que, sim, ela era uma boba, pois ainda queria ouvir algo indicando que o caso deles fora mais que um interlúdio de duas semanas em sua agenda complicada.
— E você esperava que eu viesse?
— Claro que não! Mas será que isso lhe dá o direito de me culpar simplesmente por ter aparecido aqui quando eu descobri estar grávida? Será que pode me culpar por não ter entrado em contato com você ao receber a boa notícia?
— Não tenho qualquer intenção de me transformar em cúmplice justificando seus atos.
— Você é tão... superior. — ela disse, cerrando as mãos cm punhos, rangendo os dentes, evitando falar alto, o que acabaria atraindo seus pais ao quarto.
— Se com isso você quer dizer que confronto as pessoas, sim, é verdade.
— Você nunca fez algo que não deveria, Cristiano?
— Claro que fiz. Passei duas semanas em Barbados com uma mulher que mal conhecia. Olhando para trás, posso dizer que foi um dos meus maiores erros.
— Que horror!
Cristiano sabia que foi horrível o que dissera. Também sabia que era mentira, mas jamais confessaria que aquelas duas semanas roubadas estavam entre as melhores de sua vida. Não daria espaço àquela voz na sua cabeça que lhe dizia que sim, poderia ter tentado entrar em contato com ela, fossem quais fossem as circunstâncias de sua fuga. Afinal, que tipo de homem persegue uma mulher que foge dele? Não se colocaria nessa categoria.
— Peço desculpas.
— Ah, claro, então tudo bem — disse Bethany, dando uma risada, com a respiração pesada. Ela deitou e ficou olhando para o teto, percebendo a respiração de Cristiano e o fato de o seu braço estar a poucos centímetros.
No pesado silêncio, Cristiano sorriu ao ouvir aquela resposta. Certo, sua vida mudara de cabeça para baixo. E a dela também. Qualquer outra mulher, frente a um raivoso ex-amante, um homem com poder e dinheiro para mover montanhas, um homem que fora enganado e abandonado, teria ao menos tido a decência de ser humilde. Mas Bethany, não. Como sempre, estava botando lenha na fogueira, e aquilo não resolveria nada.
— Então agora que eu apareci em cena, sem qualquer sinal de malária, fome ou ferida de arco e flecha, o que pensa em fazer comigo?
Como ele esperava, um silêncio terrível seguiu-se à questão, e Cristiano deixou que o silêncio se prolongasse até que pudesse sentir a tensão subindo em ondas.
— Felizmente, estou preparado para fazer a coisa certa.
Bethany virou o corpo, olhando para ele, surpresa.
— A coisa certa? Do que você está falando?
— Você está grávida de um filho meu, e eu sou um homem honrado... um homem que assume suas responsabilidades com seriedade. Naturalmente, não tenho outra opção além de me casar com você.
— Casar comigo? Você ficou louco? — perguntou Bethany, liberando uma espécie de risada.
E por que ele deveria imaginar que Bethany aceitaria sua oferta generosa por se tratar de um homem honrado, que assume suas responsabilidades com seriedade e que por isso chegava à conclusão de que poderia colocar um anel em seu dedo por não haver outra opção!
— O que você está dizendo?
Com uma das mãos Cristiano alcançou a mesa de cabeceira e acendeu a luz. Imediatamente, o pequeno espaço entre eles ficou maior. Ele se levantou e olhou-a com cara de fria incompreensão.
— Estou dizendo... — Ela se levantou, pois era muito estranho seguir aquela conversa deitada —... que não vou me casar com você! Não vivemos no século XIX, Cristiano!
— Mas considerando que você precisou inventar um noivo imaginário para os seus pais quando voltou para casa... grávida...
Era difícil para ele acreditar que Bethany não aceitava sua proposta! Pelo que sabia, era um em um milhão!
— Fabricar um noivo imaginário é muito diferente de sair de uma igreja casada com um homem que nem mesmo gosta de mim!
— É inútil tentar colocar sentimentos nessa situação.
— Inútil? Como assim?
— Mantenha o tom de voz baixo ou seus pais virão aqui ver o que está acontecendo!
Bethany contou até dez, bem lentamente.
— Certo. Vou falar baixo, pois não quero fazer uma cena e preocupar meus pais. Mas não vou me casar com você, Cristiano. Nunca. Fizemos uma coisa estúpida... não tomamos o cuidado que deveríamos, mas seria mais estúpido ainda sacrificar nossas vidas pelo bem deste bebê.
Com olhos flamejantes, Cristiano saiu rápido da cama e caminhou até a janela. E a visão de um homem lindo e seminu atraiu o olhar de Bethany como um ímã.
— Não entendo por que reage assim. Grande parte das mulheres teria adorado sua proposta... mas aonde isso o levaria? Terminaria preso em um casamento que se transformaria em uma prisão para você... para nós dois...
Cristiano era um homem de muita libido, e não é preciso ser gênio para saber que dois e dois inevitavelmente somavam quatro. Não sentia nada por ela e não sentiria nunca. Bethany não seria nada além da mãe de seu filho; fidelidade não estaria em jogo.
— Então — ele disse, em voz suave: — O que você sugere?
Cristiano percebeu que era importante manter um tom prático naquela conversa, mas lhe custava toda a disciplina do mundo não se deixar levar pelo temperamento. Quase no exato momento em que soube de toda a história chegou à conclusão do que deveria ser feito. Ficara chocado ao ver que sua oferta de casamento fora recusada. Ela obviamente não estava pensando com clareza, e ficou inclinado a culpar os hormônios, que aparentemente afetam algumas mulheres na gravidez, mas foi forçado a admitir que sua mente realmente não funcionava como a dele. Nem como de grande parte da raça humana, pelo menos do contingente feminino. Bethany recuou no momento em que qualquer mulher teria aceitado imediatamente.
Bethany não foi capaz de evitar. Sentiu uma pontada de desapontamento ao ouvir o plano de Cristiano. Teria proposto casamento como forma de limpar sua consciência? Um cara decente, que cumpre seu dever, mas vê que a oferta não é aceita: hora de ir embora. Ela foi quase capaz de prever um sinal de alívio no ar.
— Bem, você terá de ficar por aqui um dia ou dois, eu acho. Ou seria um pouco estranho...
Cristiano cruzou os braços e inclinou a cabeça para um lado. Era de sua natureza contradizer a estupidez do que ela estava dizendo, mas também era inteligente o suficiente para saber que verbalizar suas opiniões poderia provocar outro drama e seu afastamento imediato.
Bethany mordeu os lábios e ficou olhando-o, em busca de um encorajamento verbal. Sem encontrar nada, continuou, falando devagar:
— Então você terá que voltar para Londres... você sabe, não poderá ficar aqui para sempre... Meus pais sabem que é um homem de negócios, antes de mais nada...
— E onde você entra nessa história?
— Eu fico aqui, claro.
— Claro? E seus pais não achariam estranho que eu a deixasse para trás?
Havia mais buracos nas histórias de Bethany do que num queijo, e ele teve de driblar o sarcasmo que lutava para sair de sua boca.
— Eu poderia dizer que é mais... que é melhor tê-los ao meu lado, já que o seu trabalho o leva a várias partes do mundo, a qualquer hora.
— Mas eu já disse que os projetos estão encerrados, não?
— Certo... mas você viaja, não é? — ela perguntou, irritada. — Por que não me ajuda? Não vê que estou tentando fazer o que é certo para nós dois?
— Acho que é hora de dormirmos.
Ele começou a andar de volta até a cama, e Bethany seguia seus movimentos com o olhar, ansiosa.
— Mas não resolvemos nada.
— Estou cansado. Vou dormir. Sinta-se livre para dar asas à sua imaginação fértil sobre o que será dessas pessoas.
E se deitou na cama, virando-se para o seu lado, dando as costas para ela, ignorando seus movimentos frenéticos enquanto tentava conseguir um pouco mais do lençol para si mesma.
Cinco minutos mais tarde, Bethany começou a sentir a respiração suave de um homem que caíra no sono. Demorou uma hora para que suas pálpebras começassem a pesar, e neste meio tempo lutou para manter-se acordada o máximo possível.
Quando voltou a abrir os olhos viu que estava cara a cara com Cristiano, praticamente tocando seu nariz no dele. Enquanto dormiam, tinham se aproximado. Sua perna estava entre as coxas dele e o braço de Cristiano envolvia seu corpo.
Os olhos de Cristiano estavam fechados e seu rosto de ângulos marcados mal podia ser visto na escuridão. Como um ladrão, Bethany aproveitou a oportunidade para observá-lo. Ele não a via.
Sentiu vontade de tocar e traçar o contorno de sua boca e nariz. Costumava fazer isso quando eram amantes. Para ele, era divertido, gostava da forma como ela o olhava, como se fosse o homem mais incrível da face da terra. Ela nunca vira ninguém tão bonito.
Estava pensando em tudo o que lhe parecia tão atraente nele quando Cristiano abriu os olhos. Depois dormiu outra vez. Para voltar a abrir os olhos, alerta, no minuto seguinte. Bethany engoliu em seco e tentou se afastar, mas ele se aproximou.
— Está acordado! — ela murmurou, em tom acusador, e Cristiano abriu um sorriso forçado.
Ele passou os dedos nos cabelos e aproximou-se ainda mais. Bethany já não tentava se afastar, ele percebeu. Mas até então não notara o quanto era calmo aquele lugar, no meio do campo. Estava acostumado ao barulho constante, mesmo nas primeiras horas da manhã. Era tudo tão tranquilo que ele podia ouvir a respiração de Bethany.
A excitação veio rápida e forte, e notou que ela percebeu, pelo lamurio que soltou. Mesmo que tivesse passado apenas uma noite em sua companhia, fora uma experiência intensa e ele parecia capaz de ler suas mínimas reações. Como a forma com que aproximou seu corpo um milímetro dele. Ficou surpreso ao ver que prendia a respiração, pois não queria desperdiçar aquele momento.
— Senti sua falta — ele confessou, em tom rude. — Desde que foi embora, não consegui tirar você da minha cabeça.
Bethany sentiu como se uma lufada de ar a tivesse tirado do lugar. Suspirou, contorceu o corpo e fechou os olhos, jogando a cabeça para trás com um leve gemido quando a mão de Cristiano tocou sua barriga, recomeçando a gentil exploração do dia anterior, mas desta vez chegando aos seus seios.
— Sonhei várias vezes em tocar seu corpo — disse Cristiano, tomando um dos seus seios na mão, sentindo seu peso, agora mais pronunciado. — Eles cresceram.
— Sim — disse Bethany, quase sem voz.
— E os mamilos também, não? Estão maiores?
— Cristiano...
As suas palavras faziam a pulsação de Bethany aumentar. Sentia-se como alguém pego de surpresa. Era um fogo que aumentava de tamanho desde o momento em que ele entrara pela porta daquela casa.
— Quieta... — ele pediu, caindo sobre ela e vendo que seus lábios se abriam. O beijo foi profundo, urgente, e ela imediatamente quis livrar-se daquele pijama idiota que vestira como barreira protetora entre os dois, como forma de frear sua sexualidade.
— Quero ver você — ele disse, com voz rouca. E não deu tempo para que ela respondesse. Sua reação era doce e submissa, e ele não queria lhe dar nenhuma oportunidade para que mudasse de ideia e assumisse posição de ataque. Tirou a parte de cima de seu pijama e se perdeu olhando para aqueles seios.
Ficou pensando em como sua vida voltaria ao normal quando estivesse outra vez em Londres. Aquilo estava gravado em sua mente há meses. Qual era o poder daquela mulher? Fazia com que perdesse o controle, já não lutava contra o seu desejo.
Ao contrário, passou a língua em seus mamilos excitados, mais escuros e grandes que antes. Seu corpo se preparava para o nascimento do bebê, e pensar naquilo só fazia aumentar o desejo de Cristiano. Sua boca tomou o lugar da língua quando sugou um dos mamilos, adorando a forma como ela se contorcia embaixo dele. Com uma das mãos tocou o outro seio e com a outra explorou mais abaixo, na área da barriga, que antes estivera praticamente invisível debaixo do pijama, mas que se mostrava decididamente arredondada agora que estava nua. Passou a mão pelo elástico da cintura da calça do pijama, que desceu.
Bombardeada por sensações, Bethany arqueou o corpo. Sentir que Cristiano lhe sugava os seios parecia algo de outro mundo. Passou os dedos entre seus cabelos negros e grossos, forçando a cabeça de Cristiano em direção ao outro seio. Era como se não pudesse aguentar tudo aquilo. Quando ele levantou a cabeça para perguntar se era seguro fazerem aquilo ali, ela fez que sim com a cabeça, na verdade pedindo: não pare. Fez comentários sobre o seu corpo, as alterações, e as palavras murmuradas eram tão eróticas como as mãos que o percorriam. Ela ofegava enquanto ele lambia sua barriga. Depois, a língua entrou em seu corpo, contorcendo-se até que ela chegasse ao limite. Já fizera isso com Bethany, levando-a à beira do prazer para depois retroceder, mas não seria capaz de parar naquele momento e, antes que pudesse fazer qualquer coisa, Bethany sucumbiu às sensações. Ondas de prazer enviaram tremores para todo o corpo, e quando ela se acalmou, Cristiano postou-se em cima dela e perguntou:
— Tudo bem?
Bethany murmurou algo parecido com um choramingo, e ele sorriu ainda mais.
— Não deveríamos ter feito isso — ela disse, fraca.
— Por que está falando no passado?
Não permitiria que ela voltasse a si. Já estivera pensando muito. Silenciou-a com a boca, beijando-a profundamente.
— Você fica muito sexy grávida — ele murmurou.
— Não é verdade.
— Para mim é — disse, separando suas coxas com as mãos, sentindo o calor que emanava dali, numa indicação de quanto estava excitada. — Nós, homens, somos criatura simples — ele murmurou, tentando-a com sua virilidade, fazendo com que ela se aproximasse, tocando-a em seu ponto sensível. — A evidência da nossa virilidade é uma prova satisfatória. Se preferir, pode chamar de loucura de macho.
Nunca antes se sentiu tão liberado como quando a penetrou, primeiro gentilmente, depois mais fundo e mais duro, aumentando o ritmo. Desde a primeira vez que fizeram amor, seus corpos se mostraram extremamente compatíveis, e nada mudara naqueles meses em que estiveram separados. Moviam-se como um único corpo. Talvez por isso, fazer amor com ela sempre fora uma experiência tão maravilhosa.
O clímax atingido naquele momento foi imediatamente parar entre uma das melhores experiências de sua vida. Cristiano rolou de costas, feliz ao ver que tudo funcionava bem entre eles.
— Foi um erro.
As palavras dela bateram de frente com o bom humor de Cristiano, que demorou certo tempo para processá-las, depois virou-se para ela, talvez pensando que poderia não ter entendido bem.
— No que está pensando?
— Não deveríamos ter feito amor. Agora vou tomar um banho e morrer de frio porque o aquecimento central está desligado.
Fez um movimento indicando que sairia da cama, mas a mão de Cristiano alcançou sua cintura, detendo-a.
— Não tão rápido — ele disse. — Não fuja da nossa conversa. Que diabos você quis dizer com não deveríamos ter feito amor? Não me lembro de ter ouvido qualquer reclamação cinco minutos atrás.
— Não estou negando que sinto atração por você — ela murmurou, mas não ousou olhar diretamente em seu rosto.
— Mas isso não significa nada.
— Você não sabe o que está falando.
— Não pretenda me conhecer melhor do que eu mesma — Bethany disse, dura, profundamente envergonhada por ter caído em seus braços. Quando mais precisava manter a cabeça fresca, deixou-se levar pelas emoções e voltou àquela montanha-russa, como seja não tivesse tido o suficiente.
— Mas eu realmente a conheço melhor — Cristiano disse, seguro. — Sei, por exemplo, que não tem ideia de como lidar com esta situação.
— Como ousa dizer isso?
— Preciso pensar por nós dois — ele completou, tranquilo. — E não me diga nada. Eu ouvi tudo o que você tinha a dizer. Agora vai deitar e me escutar, escutar a voz da razão e do bom-senso.
— Não acredito no que estou ouvindo.
— Pois trate de acreditar. E vou deixar as coisas claras. Você está grávida e, goste ou não, eu não vou desaparecer em uma viagem longa a lugar nenhum. Não vou convenientemente desaparecer no Afeganistão para construir um centro médico. Não vou voltar à África central para ver como uma comunidade imaginária está se saindo. Nem vou me transformar no ex-amante que não se importa em deixar sua noiva grávida sozinha por meses, com a desculpa de que só assim a relação poderia funcionar, pois quem gostaria de viver com um idiota? Encare estes fatos e talvez nós chegaremos a algum lugar.
— Certo. Talvez você não tenha que desaparecer. Só espero que se envolva...
—Ah, não, isso é muito generoso da sua parte — disse Cristiano, com um tom de sarcasmo. — Você está sugerindo que eu venha até aqui uma vez ao mês para ver como vão as coisas?
— Isso não é complicado. As conexões por terra ou ar são bem simples.
— Não são simples o suficiente. Eu moro em Londres, e é lá que você tem que estar, goste ou não — Cristiano disse, passando os dedos pelos cabelos e suspirando, frustrado. Qual era o problema dela? Por que tentava com tanta força lutar contra ele, em todos os sentidos?
— Você acha que conseguirá algo me carregando pela mão, Cristiano?
— Carregando pela mão? Eu ofereci casamento e você não aceitou, mesmo que esta seja a única solução razoável, pelo menos do meu ponto de vista. E não é verdade que não existe atração entre nós dois. Ela existe. Você pode dizer o que quiser, pode dizer que foi um erro fazermos amor, mas fizemos o que duas pessoas fazem quando se desejam.
— E, de acordo com o seu ponto de vista, sexo prazeroso e dever são razões suficientes para realizar um casamento? Então, se você, digamos, acidentalmente, engravidar outra mulher, a solução seria a mesma? Casamento de conveniência pelo bem do bebê?
— Está é uma pergunta hipotética, e não estou interessado em responder perguntas hipotéticas.
Mas de alguma maneira aquilo ficou gravado em sua mente. Mesmo que não estivesse acostumado a ser auto indulgente, nem a fazer introspecções inúteis, ficou um pouco chocado ao perceber que tinha dúvidas se, em circunstâncias similares, teria se comprometido a casar-se com outra mulher que conhecera no passado, mesmo com as mais finas credenciais. Talvez porque nenhuma delas fora tão desafiadora, talvez porque tal relacionamento não tenha tido tempo de seguir seu curso natural. Mas pensar nisso não adiantaria nada. Estavam envolvidos em uma situação especial, e fim de conversa.
— Você me ataca quando a peço em casamento. Já parou para pensar que nosso filho se beneficiaria tendo os pais por perto? Eu venho de uma família extremamente convencional, tive o benefício de ter sempre meu pai e minha mãe por perto. E me parece inconcebível que você julgue a falta de um dos pais como algo positivo.
— Nunca disse que se trata de algo positivo. Você está colocando palavras na minha boca...
— Estou colocando ideias sensatas na sua cabeça...
Bethany ficou pensando em como seria ter crescido sem seu pai, e percebeu que Cristiano tentava fazer com que se sentisse egoísta. Egoísta por querer uma vida que não envolvia estar casada com um homem que não gostava dela nem a respeitava, um homem que a enxergava somente como uma obrigação. Ele casualmente concordou que o sexo era bom, e talvez tenha visto a criança como um bônus temporário. Se não estivesse apaixonada, quem sabe aceitaria a proposta? Mas ela estava apaixonada, e aceitar ser trocada como uma mercadoria por conta de um tradicionalismo seria como abrir uma ferida e jogar sal dentro.
— Não é sensato jogar fora a sua vida em nome de uma tradição. Duas pessoas infelizes não formam um ambiente saudável para uma criança. Sim, ter os dois pais é a cena ideal, mas um casal feliz.
— Estávamos muito felizes alguns minutos atrás — disse Cristiano — e tenho certeza de que, caso tivéssemos chance, poderíamos voltar a ser felizes outra vez.
— Não, poderíamos fazer amor outra vez! O que não vai acontecer. Foi um momento de loucura e...
—... tivemos muitos desses momentos em Barbados, se me lembro bem. Tudo tem um preço.
— Espero que a possamos ser... amigos... — disse, deitada na cama, após ter feito amor com ele, e quase caiu numa gargalhada histérica. — Espero... que você possa fazer o possível para satisfazer sua consciência.
Cristiano trincou os dentes, mas não respondeu nada. Aquele raciocínio altamente feminista não dizia nada a ele. Tinham um problema. Ele apresentara a solução, e não via razão para que ela não aceitasse, ainda mais com aquela série de argumentos sem sentido. Sempre com aquela história de amizade. O fato de os dois sentirem atração um pelo outro anulava essa possibilidade.
Bethany esperou que Cristiano dissesse algo, mas ele não disse nada, e ela continuou:
— Quero dizer... não vamos negar a nós mesmos a chance de sermos felizes com outras pessoas... — disse, e fez um esforço enorme para tentar imaginar a si mesma sendo feliz com outra pessoa, mas na sua cabeça só via o rosto lindo de Cristiano.
— O que isso significa?
— Pode haver um cara lá fora me esperando, alguém que queira se casar comigo por quem eu sou, não por dever...!
Cristiano sentiu sua habilidade para pensar de forma racional sendo ferozmente agredida. Era um esforço permanecer deitado naquela cama, ao seu lado, com os olhos fixos no teto, as mãos presas atrás da cabeça. Pensar nela com outro homem era completamente inaceitável.
— Que tipo de homem? Alguém daqui?
— Talvez...
Bethany tentou pensar friamente, ainda conhecia alguns dos caras que frequentaram o colégio com ela, que continuavam morando ali, ou por perto. Mas eles nunca se aproximariam de uma mulher com um filho, e isto era depressivo. Porém, ainda mais depressivo era saber que não seria capaz de olhar para outro homem. Por que se preocupar com peixes pequenos quando um tubarão predatório ronda as águas? Por que preocupar-se em ser sensata quando ela sabia que por ali tudo estava à flor da pele?
— Apenas um santo se comprometeria com uma mulher grávida de outro homem — disse Cristiano, tentando controlar a raiva para manter o tom de voz.
Naquele momento, mais do que nunca, parecia impossível que ela não aceitasse a proposta de casamento. Ele não ficaria sentado vendo alguém usurpar seu papel de pai. Ciúme e possessão eram dois sentimentos muito caros, mas Cristiano sabia, com os instintos de uma pessoa experiente, que tentar impor sua personalidade a ela seria péssima ideia. Bethany devia estar pensando em alguém dali disposto a assumir tudo. Mas se enganava, pois Cristiano não permitiria isso. Teve de se conter para não falar o que, para ele, era uma verdade absoluta: Bethany era uma cabeça-dura, explosivamente imprevisível. Assustaria muitos homens, mas tinha sorte por Cristiano não ser um homem comum.
Porém, Bethany não escutaria a voz da razão, e Cristiano teria de adotar um tom diferente. Queria atingir o mesmo resultado, mas com técnica diferente. E sentiu certo orgulho do nível de tolerância que — ultimamente — vinha demonstrando.
— Sabe... — disse, afastando-se dela, ficando em área mais escura —... eu concordo com a história da amizade. Goste ou não, vamos ser pais e não vou permitir que sejamos pais em guerra. Agora vou dormir um pouco.
E afastou-se um pouco mais. Mas quando sentiu a pressão da perna de Bethany sobre as suas costas notou que fizera um movimento admirável. Ao ver que seu mundo caía, ele rapidamente voltou a si e enxergou as vantagens da instituição do casamento, que antes não lhe despertava qualquer interesse.
Ofereceria o ambiente ideal para a criação do seu filho, que poderia ser feliz e bem balanceada. Também satisfaria todos os membros da família, inclusive sua mãe, que receberia a notícia com entusiasmo, ele teve certeza absoluta.
E teria Bethany. Detalhe que parecia vital para ele, provavelmente porque seu desejo só crescera após ver recusada sua proposta de casamento. Após uma longa história ao lado de mulheres que fariam tudo por ele, finalmente encontrara uma que, aparentemente, não abriria mão de nada só para agradá-lo. Exceto na cama, onde perdia todo o controle. Ao pensar nisso Cristiano quase destruiu a calma que reinava em sua mente.
Considerando todos esses detalhes, ele se sentia bem no momento em que caiu no sono.
Quando acordou, havia uma luz tênue que mal conseguia atravessar as cortinas pesadas; a cama estava vazia. Dormira profundamente e sentia-se renovado. Acostumado a nunca aventurar-se sem seu computador, BlackBerry e sem nenhum acesso ao mundo exterior, percebeu que estava distante da civilização, pelo menos até que voltasse ao hotel no final da manhã. Mas, surpreendentemente, não se sentia mal.
Virou-se na cama e notou que Bethany estava na porta, usando uma saia longa e um suéter grande, desta vez de outra cor. Ficou pensando em como conseguia fazer com que uma roupa sem forma ficasse tão tentadora. Lembrou-se vividamente do que sentia ao ter os seios de Bethany em suas mãos, e do gosto de seus mamilos em sua língua, e de como o seu corpo respondia a tudo aquilo.
— Vejo que já está acordado — ela disse, entrando no quarto e fechando a porta bem devagar, pois sabia, por experiência própria, que as paredes da casa de seus pais tinham ouvidos.
Adiara o máximo possível sua volta ao quarto. Na verdade, esperou até o momento em que sua mãe pediu que acordasse Cristiano para que pudesse servir o café da manhã irlandês preparado especialmente para ele.
Cristiano evitou a brincadeira de admitir que estava acordado em mais de um sentido. Em vez disso, disse que há muito tempo não dormia tão bem. Bethany, que se sentia um pouco tonta pela noite mal dormida, fez uma careta.
— Você não tem roupa — ela disse, observando aquele torso bronzeado, que ele não fazia qualquer tentativa de esconder. — O que vai vestir?
— Posso voltar ao hotel e pegar minha roupa.
— Já olhou pela janela?
Cristiano saiu da cama, deixando-a atenta ao fazer isso. Nevara e a vista era espetacular. Os campos nos fundos da casa eram de um branco total. O céu estava cinzento, ameaçador, ainda muito pesado. Fechou a cortina e olhou para ela.
— Então... — Cristiano disse, abrindo os braços, nem um pouco perturbado, pela expressão de seu rosto —... o que você quiser fazer. Você manda...
Logo descobriu o que fariam. Após um café da manhã completo, do tipo que não tomava desde a adolescência, com um apetite insaciável e muito tempo livre, percebeu que tinha muitas coisas a fazer, e que Bethany provavelmente fora a responsável por aquela lista, que montara com satisfação. A maior parte das tarefas necessitava que estivesse fora de casa, mas como não tinha outra roupa além da que trouxera consigo, e que estava sendo lavada, teria de encarar o frio com a roupa do pai de Bethany, que era muito curta nos braços e nas pernas, e muito folgada na cintura.
— Dirija com cuidado... e compre sal... leite e pão na loja da esquina... — ele disse, lendo a lista, depois apoiou-se na porta, olhando para ela. — Tem certeza de que é tudo? Talvez eu deva fazer mais alguma tarefa lá fora...
Bethany estava ocupada lavando a louça. Uma imagem de vida doméstica normal, exceto pela expressão em seu rosto. Ela se aproximou, pegou a lista, que leu atentamente, com a testa franzida, e depois lhe devolveu, dizendo:
— Não. Por enquanto, isso é tudo. Por quê? Você acha que a imagem do Sr. Perfeito pode sair um pouco arranhada após tanto trabalho na rua?
Na verdade, seu charme fora um êxito no café da manhã. Demonstrou-se útil na cozinha, mesmo com a mãe de Bethany dizendo que não precisava de ajuda, e conquistou pai dela com o seu conhecimento sobre política irlandesa, corrida de cavalos e investimentos em fundos de pensão, que parecia ser sua mais recente preocupação.
Nesse processo praticamente ignorou Bethany, e ela teve de lembrar a si mesma que isso era um ponto positivo, pois naquele momento não passavam de amigos. Falou tudo que quis e virou as costas. Situação perfeita. Fabulosa. Claro, teria de pensar como explicaria aos pais que o casamento não aconteceria, mas se ocuparia disso depois. Era hora de aproveitar. Tinha tudo o que queria. Seu respeito! Ele entendera a situação e não voltaria a insistir para que sucumbisse a todas as suas vontades. Cristiano estava mantendo distância, e se os seus pais não pareciam notar a mudança de ares, ela notava, e muito. Já não haveria trocas de olhares, mãos entrelaçadas nem nada parecido.
— Sr. Perfeito...? Devo considerar isso como um elogio, certo?
Bethany, por um momento, gostaria que seus pais estivessem por perto, pois o olhar de Cristiano era inacreditável. Ela precisou fincar os pés na terra e trancar uma porta em sua mente para espantar o desejo de passar seus dedos por baixo da camisa de Cristiano, para sentir o calor de sua pele.
A roupa que arrumara para ele, após dizer aos seus pais que se esquecera das malas no hotel em que se hospedara, pois ela talvez não estivesse em casa quando ele chegou, deveria ter reduzido seu sex appeal a zero. Era uma camisa velha do pai. Algo que ele usava para jardinagem, de mil anos atrás. Uma camisa de flanela com dois botões faltando. Tão gasta que era impossível saber a cor original. Nada a ver com as camisas italianas feitas à mão que sempre usava. A calça era quase tão antiga quanto, e precisava de um cinto. Seus sapatos de couro foram trocados por outros verdes, e a roupa impermeável era pesada e sem forma. Ela também insistiu, como uma namorada preocupada, que usasse um gorro de lã para combater a neve e o frio penetrante.
— Não vai querer morrer aí fora — disse, sorrindo ao entregar-lhe todas aquelas roupas. — Andamos protegidos neste lado do mundo. Não temos tempo para brincar com roupas.
— Entendido — ele respondeu, curvando-se, de forma que ela pôde sentir seu hálito quente na bochecha. — E eu entenderia tudo sobre roupas de estilistas fúteis caso tivesse passado tanto tempo na África, não é?
Bethany olhou para ele e cruzou os braços.
— Sei que provavelmente nunca teve um dia de trabalho duro em sua vida...
Mas ele a cortou antes que pudesse terminar a frase:
— E suas suspeitas são baseadas em que... exatamente?
—Você é um homem de negócios, Cristiano — Bethany disse, levantando o queixo. — Vive sentado atrás de uma mesa.
— Todos os verões, quando estava na universidade, trabalhava num canteiro de obra — informou-a, sucinto. Ele se aproximou, afastando-se da porta. — Sempre pensei que os trabalhos que mexem com o corpo são bons para a mente e ótimos para manter a saúde balanceada. Mesmo hoje, tento me assegurar que minhas visitas à academia sejam tão duras quanto. Por favor, poupe-me de seus julgamentos. — E vestiu o chapéu, fazendo com que Bethany pensasse que jamais ficaria tão bem em seu pai. — Na verdade, quando resolver tudo isso, quero ajudar seu pai nos campos. Por que você não banca a boa menina e vai ver se as minhas roupas estão bem lavadas?
— Como você ousa...
— O quê? — Cristiano perguntou, sorrindo zombeteiro. — Julgá-la?
Algumas horas mais tarde, quando passava a roupa, ela ainda ruminava a forma como ele conseguira virar a mesa.
— As mulheres já não fazem isso — reclamou com a mãe, dando por certo que as roupas deveriam ser entregues a Cristiano passadas, como se tivessem acabado de sair da loja, do alfaiate ou de onde quer que as tivesse comprado.
— Se você estiver cansada, eu não me importo e continuo passando — disse sua mãe, tranquilamente, parando um pouco o tricô que fazia.
— Tudo bem — murmurou Bethany. — Só estava dizendo que os dias de passar camisas e calças de homens ficaram para trás.
— Ah, não me parece pedir muito que Cristiano saia daqui com a roupa limpa, bem passada, certo? Ele está sendo tão prestativo, e agora quando provavelmente deve estar muito cansado após passar tudo que passou. Seu pai disse que lhe deu o melhor conselho que já ouviu até hoje sobre suas economias, muito melhor que os conselhos do contador de Limerick.
Bethany rangeu os dentes ao ouvir o que a mãe dizia. Por isso deixou o ferro um momento em cima da camisa, fazendo uma marca indelével.
— Ele certamente é ótimo em finanças — disse, e tendo terminado de passar a roupa, deixou o ferro esfriar.
— Parece ser ótimo em tudo — concordou sua mãe, sorrindo. — Um sujeito raro. Eu ficaria muito feliz se suas irmãs trouxessem alguns desses como candidatos a genro.
Em pouco tempo, estaria falando sobre casamento e lua de mel. Bethany podia sentir o assunto pairando no ar.
— Mãe... estou com algumas dúvidas... você sabe... sobre me casar com Cristiano... — disse, sentindo seu rosto corar, ainda mais quando sua mãe largou o tricô e ficou olhando-a, de boca aberta.
— Eu não ia dizer nada...
Mas aquilo tinha de ser feito. Quanto mais tempo a história continuasse de pé, mais complicado seria sair desta situação, e o que faria quando ele retornasse a Londres? Voltaria com ele? E onde viveria? No seu apartamento? Como trabalhariam sua amizade se ela estava cada dia mais atraída? Teria de ficar sentada vendo-o com outras mulheres? Fingindo que não se incomodava, porque a única coisa importante no mundo era aquele filho que geraram juntos, acidentalmente?
— Sente-se Beth, vou preparar um chá para nós.
— Estive pensando — ela disse, aquecendo as mãos na xícara de chá. — Tudo aconteceu muito rápido com Cristiano. Sei que vai me dizer que com papai foi igual, mas é diferente hoje. Casamento não é a única opção. Acho que não o conheço o suficiente para... — Bethany dizia, e percebeu a expressão de sua mãe, que passava de preocupada a desapontada.
— Mas vocês se amam...
Bethany optou por evitar qualquer comentário.
— Só acho importante evitar maior envolvimento apenas porque estou grávida...
— Mas ele é o pai... O que poderia ser mais natural...?
— Eu sei, eu sei, e nunca negaria seus direitos como pai, mas ficamos tão pouco tempo juntos que agora seria melhor manter a calma que forçar uma situação... eu... nós... sinto muito se desapontamos você e o papai... — disse, dando de ombros, triste.
Dissera o que queria. Sem a obrigação do casamento, Cristiano voltaria a Londres, pois já não poderia chantageá-la frente aos pais. Sentia o alívio de tirar um grande peso das costas, mas ao mesmo tempo um vazio a invadia. Seu êxito ao driblá-lo fora muito menos satisfatório do que esperava.
Além do mais, sua mãe não entendia como podia ter dúvida frente a alguém tão espetacularmente perfeito. Bethany podia ver no seu rosto. Cristiano pusera um pé na sua frente, e era terrível pensar que sua própria mãe a poderia culpar por ser tão pouco razoável.
A atmosfera pesava no momento em que a porta se abriu e Cristiano entrou, junto a uma lufada de ar frio e neve.
Bethany estava pronta, esperando. Vestira seu suéter mais grosso, que passava de sua cintura, seu chapéu de lã e botas de couro, e sequestrou Cristiano antes que entrasse na cozinha, já invadida por um cheiro maravilhoso.
— Preciso falar com você — Bethany disse, vestindo as luvas e pousando sua pequena mão no ombro dele.
— Não pode esperar um pouco? Preciso tomar um banho.
— Não, não posso — disse, contagiada pela vitalidade do corpo de Cristiano, que talvez, antes de chegar ali, não tenha imaginado tudo o que aconteceria, mas se adaptara bem. Apresentara uma solução que poderia ser apropriada a ela, e muito mais comprometedora do que a maioria dos homens poderia ter proposto sob as mesmas circunstâncias. E ganhara seus pais com o explosivo dom da palavra, que sempre era muito bem visto na Irlanda.
Deus sabe o quanto lhe custou familiarizar-se com tudo aquilo, e mesmo com a neve que, ainda caindo forte, ele conseguira limpar da frente de casa, abrindo um caminho seguro.
Cristiano franziu a testa. Sentira-se bem nas horas anteriores. O desafio proposto pela terra era mais recompensador e imediato do que imaginara, e teve uma ideia sobre o que era voltar para casa após um longo dia de trabalho. Lareira, esposa devotada, filhos. Naturalmente, teria de se esquecer de tudo aquilo, pois Bethany nunca seria uma esposa clássica.
— Vou ajudá-lo com a lenha, que está nos fundos da casa, depois conversamos.
— Por que tenho a sensação de que o papo será sobre sua curiosidade acerca da minha manhã?
A casinha que guardava a lenha era surpreendentemente grande, mas com apenas um ponto fraco de luz. Ainda assim, Cristiano percebeu a expressão dura de Bethany.
— Passei bem nas primeiras provas? Ou vou precisar de outras para atestar meu valor?
— Você não precisa provar nada.
— Certo, você tem razão. Não preciso mesmo. E fico feliz ao ver que finalmente entendeu isso.
Ela se apoiava em uma das paredes, com as mãos por trás do corpo, com várias camadas de roupa, todas grandes para ela. Parecia pequena e indefesa, mas Cristiano sabia que era uma falsa impressão. Era a mulher que mentira para ele, para os pais, guardara uma gravidez em segredo, que descobrira por puro acaso. Era a mesma Bethany que lutava com unhas e dentes desde que ele chegara ali, e mesmo sua cumplicidade na cama, fora curta. Momentos após terem feito amor, negara seu afeto com recriminações e toda aquela bobagem de serem amigos. Ele lhe propusera uma solução aos problemas, fora capaz de passar por cima de sua decepção; mesmo assim, ela atirou tudo de volta em sua cara. Ele dizia uma coisa e ela imediatamente dizia o contrário. Ele seguia numa direção, ela girava o volante e tomava o caminho oposto.
— Tive uma longa conversa com minha mãe — disse, quebrando o silêncio. Teria sido mais confortável conversar em casa, mas queria dar tempo para seus pais digerirem o que ela dissera antes. A casa de lenha era o lugar menos confortável do mundo, pois estavam muito perto um do outro, e ela sentiu seus olhos caindo nos dele. Adoraria saber como fora sua manhã, adoraria ter podido preparar um chá para ele na cozinha enquanto lhe contava tudo, mas em vez disso tinha a mandíbula cerrada, e depois disse:
— Disse a eles que não vai haver casamento algum.
Cristiano não esperava por isso. Estava tão focado no êxito que não pensou que ele poderia não se concretizar.
— Por que fez isso? — perguntou, mantendo o tom baixo, doce e interessado, o que Bethany não gostou nada, pois por baixo da calma exterior notava que Cristiano estava pronto a recusar todas as suas considerações, jogando-as no lixo.
— Você sabe por quê. Já expliquei que ter um bebê não é razão suficiente para duas pessoas se casarem.
— E sua mãe não se espantou com esta decisão tão repentina?
— Eu expliquei que... talvez tenha sido um erro, nos envolvemos rápido demais...
— E livrou-se da mentira, em outras palavras.
— Você vai ter que voltar a Londres, Cristiano, e seria loucura se eu fosse com você. Como poderia dizer aos meus pais que tudo estava perfeito, que tudo é cor-de-rosa entre nós?
Ele não disse nada. Mas manter-se tranquilo não resolveria. E deixaria claro que não abandonaria seu filho a visitas esporádicas enquanto Bethany tentava encontrar o cara certo.
Aproximou-se e Bethany sentiu os pelos da nuca eriçados.
— O que... está fazendo?
— Não vou lutar contra você.
Ela tentava esconder seu desejo mas, ele notava, era um desejo que vinha em ondas. Pousou os braços na parede, olhando diretamente para ela.
Bethany tentava imaginar como ele era capaz de fazer com que sentisse tudo aquilo, e suspirou fundo.
— Então você concorda que nós... podemos discutir... quero dizer... como adultos? Não vamos fingir que... somos um casal feliz frente aos meus pais... — disse, mal reconhecendo sua voz.
— Claro que podemos discutir como adultos... se você quiser.
O cheiro masculino de Cristiano entrava por suas narinas e ela fechou os olhos por um momento, embriagada, até ficar com a cabeça rodando.
Os olhos de Cristiano estavam um pouco tapados por seus pesados cílios negros. Seu olhar era perigosamente erótico. E o corpo de Bethany respondeu imediatamente. Seus seios pesaram só de pensar em tudo que sentira na noite anterior, quando foi tocada, sugada. Sentiu um calor no corpo, mesmo com tanto frio lá fora. Queria voltar, mas não sabia para onde.
— Claro que eu... quero falar sobre isso... você sabe... — disse, tentando controlar a respiração, mas sua pulsação era muito forte.
— Então... quando vai voltar a Londres?
— Com tanta neve caindo é complicado pensar nisso — disse, coçando a nuca. — Diga, por que você quer que eu vá embora?
Frente a uma pergunta tão direta, Bethany corou e olhou para os pés. Ele lutava pelo bebê.
— Você deve estar querendo voltar para casa — ela respondeu, olhando para longe, com meio sorriso.
— Você não respondeu minha pergunta.
— Bem... eu adoraria voltar agora. Mas a neve... quando neva aqui... é complicado prever...
Ela ficou horrorizada ao perceber que poderia perdê-lo para sempre. Claro que faria visitas de vez em quando, e seria corretíssimo com a pensão, disto ela tinha certeza, mas...
— Você quer que eu vá embora, certo?
Como ela hesitou em responder, Cristiano pousou as mãos em sua cintura. Ignorou seu pesado suspiro. Tentara ser um cara legal, esperaria o tempo que fosse necessário, mas se ela nem pensava em admitir o que sentia, caberia a ele refrescar sua mente. Bethany não teria chance de construir outra barreira entre eles.
— Sim... você sabe que sim...
— E você poderia ficar no seu mundinho perfeito, aqui...
Enquanto falava, suas mãos invadiam o suéter de Bethany, entravam por baixo de sua camiseta, sentindo o calor das camadas de roupa que usava. Quantas seriam?
Bethany emitiu um som entre um grunhido e um gemido. Enquanto Cristiano permaneceu um pouco mais distante do corpo dela, ele pode mais ou menos manter a cabeça fria e o bom-senso, mas no minuto que a tocou, entrou em chamas. Conseguira vencer todas as camadas de roupa e seus dedos estavam contra a pele de Bethany, quentes e insistentes, sob as costelas e seios. Ela não usava sutiã... os antigos tinham ficado apertados e não se preocupara em comprar novos.
— Nós poderíamos... ser amigos... — ela disse, sem fôlego, quando os dedos de Cristiano encontraram seus mamilos rígidos e começaram a acariciá-los em movimentos circulares.
— Acho que essa história de amizade não serve para mim. Cheguei a pensar no caso, mas não consigo tirar a imagem de você, nua e excitada, da minha cabeça. Eu a desejo...
E, para enfatizar, levantou as várias camadas de roupa e agarrou seus seios com as mãos, ainda acariciando os mamilos e levando-a a um frenesi de paixão e desejo.
— Pare — ela pediu, tremendo. — Você não está sendo justo...
— Eu sei... — disse, virando o rosto e começando a beijar sua nuca ao mesmo tempo em que ela se arqueou para encontrar sua boca. — Essa era outra coisa que não vinha funcionando bem para mim ultimamente.
Bethany deixou cair um pouco a guarda e buscou sua boca de olhos fechados, colapsando quando ele a beijou, movendo sinuosamente sua língua contra a dela. Não deu tempo para que mudasse de opinião, o que Bethany não pensou em fazer. Mal podia ficar de pé e suas mãos balançavam no ar, aproximando-o de seu corpo.
Ele murmurava palavras em italiano, sem dúvida, muito sexies, mesmo que sua voz fosse baixa e rouca a ponto de ela mal poder ouvir.
Quando ele parou um pouco com sua fome de desejo, uma voz que ela não reconhecia, martelou em sua mente.
Só mais uma vez, Bethany pensou, mas tal pensamento logo foi reduzido a nada pela dura realidade: sucumbiria muitas vezes mais. Ele sugava toda a sua força, mental e física. Cristiano claramente podia separar sentimentos e deveres, mas para ela tudo estava mesclado, e se odiava por não conseguir manter-se distante de seu forte apelo, mesmo sabendo que não seria nada bom.
— O que foi isso? — Cristiano perguntou, com a boca curvada em um sorriso conquistador.
— Não quero que pare e o odeio por me fazer dizer...
— Você não me odeia. Eu apenas a desafio, e você acha que deve lutar contra isso, mas não deve. Caso sirva de consolo — ele continuou, em tom rude —, você também me desafia, e já percebi que lutar contra isto não é bom. Por que não paramos de negar o que queremos?
— Você não sabe o que eu quero — ela protestou, enfraquecida.
— Sei exatamente o que você quer. Confie em mim — disse, tirando o gorro e mergulhando o rosto em seus cabelos abundantes. Bethany sempre teve cheiro de flores, fresca e limpa, e de certa forma inocente, e ele se deixou levar, feliz, por aquele cheiro.
Com uma das mãos por trás da sua cabeça, conseguiu aproximar-se de sua boca, e com a outra mão acariciava as curvas femininas do seu corpo, chegando ao final da saia, que depois levantou, abrindo suas pernas, para que pudesse deslizar os dedos para dentro do corpo.
Cristiano não entendia o poder que aquela mulher tinha sobre ele. Desde a primeira vez que fizeram amor, sentiu-se como um faminto frente a um banquete. Tocá-la parecia a coisa certa a ser feita.
— Cristiano, não... por favor... — ela disse, enquanto os dedos dele mergulhavam, enviando todo o tipo de sensações ao seu corpo. Tinha os olhos fechados, a cabeça caída para trás e a boca semiaberta — Não pare...
Poucos minutos depois, estava de joelhos frente à suplicante. Bethany olhou para ele, perdida, passou os dedos entre os seus cabelos e gemeu só de imaginar o que Cristiano estava a ponto de fazer. Sentiu-o abrindo suas pernas, depois tremeu compulsivamente quando sua boca substituiu os dedos exploradores.
Ela perdeu o ar e queria gritar, mas não podia. Em vez disso, deu pequenos grunhidos de satisfação e encorajamento, remexendo-se sobre a sua boca ao mesmo tempo em que ele a testava com um ritmo de parar e recomeçar que a levava à beira do êxtase, retrocedendo no último minuto.
Bethany soltou um grunhido de frustração quando ele parou, pressionando seu corpo contra o dela para que pudesse sentir sua excitação. Caso tivesse alguma dúvida, levou a mão de Bethany à sua calça e ela mordeu os lábios ao sentir sua virilidade.
— Eu a quero inteira — ele murmurou, enquanto Bethany tentava abrir seu zíper. — Mas não aqui. Não me entenda mal. Nunca fui o tipo de cara avesso a uma aventura, mas aqui seria um pouco exagerado...
— Não podemos entrar...! Meus pais estão lá e eu... nós...
— Não temos muita escolha, querida. Não podemos ficar nus aqui e eu, pelo menos, preciso disso... preciso de você...
Ele não deu tempo para que Bethany pusesse os pensamentos em ordem. Em vez disso, ficou relembrando o que queria e desejava — o que os dois queriam e desejavam —, passando a mão mais uma vez sobre o seu seio e os dedos nos mamilos.
Ele sabia que estava voltando a táticas antigas, mas nem ligava.
— Podemos entrar pelos fundos... mas não sei por quê... não deveríamos estar fazendo isso... — disse Bethany, com as mãos trêmulas e se levantando, sentindo um raio de excitação em seu corpo. Como uma adolescente que usa a casa dos pais enquanto estão fora, queria chegar ao quarto o mais rápido possível. Queria tirar a roupa de Cristiano... ficou tonta só de pensar nisso, e a sensação piorou ao se lembrar que esta deveria ser a última coisa que poderiam fazer juntos. Acabara de contar à mãe uma longa história sobre reconsiderar o casamento, dera uma lição a Cristiano sobre a bobagem que seria sacrificar suas vidas pelo bem do bebê, fora quase lírica ao insistir na história da amizade. Mas desde quando amigos fazem sexo como adolescentes desesperados?
Nada disso a impediu de caminhar de mãos dadas com ele ao voltarem para casa, entrando pela porta de serviço, que sempre era mantida destrancada para acesso rápido em dias de frio, pois era o caminho mais curto para buscar lenha.
Na verdade, sentir seus dedos entrelaçados aos dele era incrível.
Ao longe, podiam ouvir vozes na sala de estar; tiraram suas botas na entrada, caminharam sem fazer barulho. Subiram as escadas. Mal fecharam a porta do quarto e já estavam um sobre o outro. As roupas, no chão.
— Não se meta nas cobertas — disse, antes que ela pudesse buscar refúgio.
— Estou gorda!
— Está linda.
E estava. Ela o emocionava. Ali, deitada, com seus braços pálidos esticados e seus cabelos revoltos sobre o travesseiro. Seu estômago estava decididamente arredondado, seus seios cheios, seus mamilos maiores e mais escuros. Naquele momento ele pode ver tudo bem melhor. Era a experiência mais erótica de sua vida. Quando pensou no bebê que crescia dentro dela, ficou louco.
— Você também — ela admitiu, imediatamente.
— Um elogio... — ele disse, com um meio sorriso que a deixou louca. — Eu gosto. Muito.
— Culpa do seu ego do tamanho de uma casa — ela respondeu, com os olhos arregalados e a respiração entrecortada ao vê-lo cruzar o quarto em direção à cama.
— Agora — ele disse, mergulhando ao seu lado —, quero que me lembre onde paramos.... Ah, claro... Como poderia esquecer? — disse, abrindo suas pernas e posicionando-se entre elas, prendendo-as em seus ombros para que a tivesse por todos os lados. E quando respirou, foi diretamente ao ponto mais feminino. A forma como ela gemeu suavemente, como se já não pudesse controlar os sons que emanavam do seu corpo, o deixou louco. Como poderia pedir que fosse embora quando os dois sabiam exatamente o que queriam?
Provou todo o seu corpo, depois, temporariamente saciado, voltou a postar sua cabeça entre os seios de Bethany, que arfavam, pesados.
Ela precisou colocar um pequeno travesseiro na boca para evitar um grito no momento em que ele levou um mamilo à boca, sugando-o, deixando-o, depois voltando a sugar. No momento em que Bethany tocou o outro seio, ele afastou sua mão para que pudesse seguir com a boca até ali. Olhando-o com desejo, pôde ver a trilha deixada pela boca de Cristiano ao sair de um seio em direção ao outro, e voltou a fechar os olhos, entregando-se à luxúria enquanto ele devotava sua atenção ao segundo mamilo e brincava com os dedos entre as suas pernas.
— Você está bem? — perguntou, olhando para cima e cruzando seus olhos com os dela.
Bethany parecia uma marionete seguindo o controle de seu mestre. Pior: não sabia o que estava fazendo.
Tudo o que queria era tê-lo com ela, dentro dela, ao seu lado.
Agarrou-a quando seu corpo já não podia mais aguentar e deixou-a em cima dele. Cristiano, perdendo o controle, gemeu no momento em que ela começou a se mover sobre a sua virilidade. Seus seios balançavam enquanto ela se movia, cada vez mais rápido, até o momento em que ele não aguentou mais e soltou um grunhido de satisfação. Sentiu o corpo de Bethany arquear quando uma onda de orgasmo a invadiu. Olhando-a neste momento, vendo a cor que tomava conta de seu rosto e seus olhos fechados com força, ele voltou a se aproximar, e ela perguntou, sorrindo e com um dedo apontado para o seu peito:
— Nunca fica satisfeito?
— Quando o assunto somos nós dois, acho que não. E você, sente o mesmo? — perguntou, com voz lenta, mas com olhos afiados para ela, que mantinha o rosto contra o seu peito.
Bethany fez que sim, e aquilo para ele foi uma descarga de adrenalina.
— Ótimo. Fico feliz porque é assim que deve ser. Quando parar de lutar contra mim, começará a gostar do fato de que serei um elemento permanente na sua vida. Se não quiser se casar comigo, vou respeitar, mas ainda assim seguiremos juntos.
— Seguirei sendo a sua amante grávida? — perguntou, engolindo em seco.
— Prefiro não usar rótulos quando o assunto são relacionamentos — disse Cristiano, beijando seus cabelos. — Especialmente quando essa etiqueta é de "amigo". Acho que você concordará comigo: trata-se de um rótulo completamente irrelevante...
No seu tedioso passado, Cristiano nunca se envolvera pessoalmente com a compra de presentes para mulheres. Primeiro, porque não tinha tempo para perder em lojas, buscando jóias e pedindo ajuda a vendedores. Depois, porque não podia pensar em nada mais triste que buscar o presente mais adequado a qualquer mulher. Para esta tarefa tinha sua secretária pessoal. Uma mulher comprando presente para outra. Fazia sentido.
Nos últimos seis meses, no entanto, deixara de lado a secretária em troca de um toque mais pessoal, e a tarefa passou a ser menos árdua do que ele esperava. Na verdade... descobriu o quanto era bom andar pelas lojas em busca de algo que colocaria um sorriso no rosto de Bethany, que tinha gostos bem originais. Tendo cometido o erro de comprar jóias num primeiro momento, algo que a maior parte das mulheres adora, jóias caríssimas com diamantes, mas que ela aceitava com um sorriso para depois devolver, educadamente, ele mudou de estratégia. Bethany disse que não ligava para jóias, especialmente as caras.
— Imagino que seja o tipo de coisa que está acostumado a dar de presente às suas namoradas — disse, e fez uma cara de desgosto quando ele se defendeu dizendo que nunca antes alguém lhe devolvera um presente.
— Por quê? Os homens ricos nunca sentem a necessidade de serem imaginativos?
Cristiano, que nunca abrira mão de um desafio, teve de exercitar a imaginação.
Levou-a para assistir peças alternativas em festivais de teatro, comprou a primeira edição de um livro em italiano com mais de quinhentas páginas, mesmo que tenha sido obrigado a assegurá-la que nunca o leria, ainda que falasse italiano fluentemente, mas que se um dia tivesse problemas para dormir usaria o livro como sonífero. Ela adorou o presente, e Cristiano adorou ver sua cara de satisfação.
Aceitara sua paixão repentina por um cachorro de pelúcia do tamanho de um sofá e não ficou ofendido quando ela riu, dizendo que ele era um velho ranzinza.
Quase nada parecia capaz de ofendê-lo, exceto porque seguia se recusando a casar-se com ele. E tampouco aceitara viver com ele, mesmo que mais uma vez Cristiano tenha enumerado todas as razões de ser uma decisão inteligente. Pelo menos já não falavam mais sobre serem somente amigos. Cristiano não entendia. Se ele estava preparado para fazer um sacrifício, por que ela não estava? Quanto mais argumentava, mais ela dava mostras de que não desistiria. Resolveu seguir um caminho mais tortuoso.
Como nunca antes precisou agradar uma mulher, suas tentativas nem sempre tiveram êxito. Vários jantares caros também bateram em um muro. Ficar em casa era a opção preferida. E a cozinha, ela dissera, deveria ser um local compartilhado. Bethany comprou um livro de receitas e ele muitas vezes se viu cozinhando, pensando no que sua mãe acharia disso.
Detalhes como esses foram taticamente omitidos quando contou a novidade à família. Não comentara a falta de casamento, dizendo vagamente que era algo que poderia acontecer a qualquer momento, mais adiante. Talvez tenha dito que Bethany poderia chegar ao altar após ter o bebê, quando tivesse recuperado sua forma. Sua mãe acreditou em tudo, mas ele ficou pensando o que Bethany diria se soubesse dessa pequena mentirinha. E não importava se o volume e o tamanho de suas mentiras colocassem o pequeno pecado de Cristiano no sapato.
Ele ficou muito preocupado porque Bethany estava carregando o seu filho. Sob circunstâncias normais não havia dúvida de que tudo seria bem diferente. Ele a teria confrontado, como qualquer homem que não gosta de ser enganado. Caso não estivesse grávida, nunca alcançaria o luxo de ganhar moral por si mesma. A gravidez fora sua salvação. Sem ela, teria sido duramente repreendida, caído de joelhos frente a Cristiano pedindo perdão e, dali em diante, quem sabe o que poderia acontecer? Muito provavelmente ele a teria expulsado de seu mundo e voltado à vida de sempre.
Mas, naquele momento, as memórias dessa tal vida de sempre pareciam muito distantes.
Ficou fascinado com a rápida expansão da barriga de Bethany e com os jogos de futebol que pareciam acontecer lá dentro. Leu, de uma ponta a outra, um livro sobre gravidez, algo bem mais divertido que as várias noites passadas no trabalho. Pensava nela quando não estavam juntos. Não parecia nada natural, mas se acostumara a isso.
Além da mudança total em seu estilo de vida, Cristiano estava orgulhoso com a forma como manejava a situação.
Tocou a campainha do apartamento de Bethany. A cada dia, parecia mais incrível que tivesse concordado com essa situação. Mesmo colocando-a no apartamento mais próximo possível, o fato de não apenas ter se recusado a casar com ele, por razões que desafiam a lógica e que ele já nem procurava entender, mas também a insistência em viverem em casas separadas eram uma constante fonte de insatisfação.
Ninguém poderia dizer que ela não gostava de dormir com ele, fazendo amor em posições francamente engenhosas, especialmente com o grau avançado de sua gravidez, nem sempre envolvendo penetração. Ele conhecia as mulheres, e ela não fingia nada.
Taticamente, parou de insistir por uma resposta que fizesse sentido. Mas as perguntas martelavam todo o tempo em sua mente. Seria sua forma de manter as opções em aberto? Estaria tão enganada a ponto de não perceber que sua vida estava ligada à dele? Realmente pensava poder enganá-lo temporariamente, ter o bebê, e depois desaparecer da frente do Sr. Perfeito?
Estava tão ocupado em seus pensamentos que demorou um tempo para perceber que ela não atendera a porta. E não era capaz de pensar em uma única razão para que estivesse fora de casa.
Ele estivera longe nos dois últimos dias, mas falaram várias vezes ao telefone e Bethany sabia que Cristiano viria. Onde estaria? Tocou mais uma vez a campainha, desta vez sendo mais insistente, e na falta de resposta, imediatamente ligou para o seu celular. Era o aparelho mais moderno do mercado, que lhe comprara assim que chegaram a Londres, pois estava preocupado que seu antigo celular poderia ficar ruim a qualquer momento, exatamente quando um precisasse se comunicar com o outro.
Deixou tocar algumas vezes. Desligou e tentou outra vez. Começava a ficar preocupado. Passou os dedos pelo cabelo. Seu instinto pedia que derrubasse a porta, mas se freou ao notar que não seria capaz. Na verdade, ele mesmo trocara a porta antiga por outra, mais robusta, pois em Londres nunca se sabe... Franziu a testa, telefonou mais uma vez e estava a ponto de partir para o plano B quando ela atendeu, num tom de voz que Cristiano mal reconhecia.
— Onde você está? — ele perguntou, imediatamente.
— Estou aqui! — ela respondeu. Não acordara com o som da campainha, mas o insistente telefone fizera esse trabalho.
Olhou para o relógio e percebeu que caíra no sono por grande parte do dia e da noite.
— Aqui onde?
— Aqui! Em casa!
— Então por que não abriu a porta? E o que aconteceu com a sua voz?
Percebeu as trancas sendo abertas ao terminar de perguntar tudo aquilo, e a preocupação que viera do nada e diminuíra no momento em que ela atendeu ao telefone voltou com toda a intensidade ao vê-la tão pálida, com os olhos semi-fechados e o cabelo despenteado.
Olhou-a em pânico, um sentimento nada familiar o atingiu como um trem em alta velocidade.
— Não me sinto muito bem — ela respondeu, dizendo o óbvio ao virar-se e voltar a caminhar em direção ao quarto.
Vindo diretamente do aeroporto, Cristiano pegou sua maleta e a seguiu. Seu coração batia forte, muito forte.
— Só preciso dormir — ela disse, deitando-se na cama e puxando a coberta, deixando apenas sua cabeça visível.
— Nada de dormir, você precisa de um médico — disse, abrindo o celular e baixando um pouco a coberta, para ver melhor o seu rosto. — Está queimando. Por que não me ligou? — E disse algo em italiano ao telefone, depois desligou e devotou toda a sua atenção a ela.
— Estava bem quando conversamos ontem à noite — disse, em tom acusatório. — Não preciso de médico, Cristiano.
— Eu decido isso, certo?
— É só um resfriado, passará em 24 horas — ela disse, grunhindo e voltando a se aninhar no cobertor, mas ele não a deixou. — Preciso descansar, só isso. Eu estava bem ontem, mas hoje me levantei meio mal...
— Falamos hoje de manhã e você não me disse nada.
— Você estava em Nova York, Cristiano. O que poderia ter feito? Talvez pense ser capaz de fazer qualquer coisa, mas você não é o Super-homem. Não teria vestido uma capa vermelha e cruzado o oceano.
— Esse não é o tema.
Bethany grunhiu.
— Mereço saber como vai a sua saúde todo o tempo.
Só de pensar nela sozinha naquele apartamento, tão fraca a ponto de não conseguir sair da cama, ficou ainda mais nervoso.
— Você está grávida — terminou, levantando-se e andando pelo quarto, xingando o amigo por ainda não ter chegado. Não lhe dissera para vir imediatamente?
Claro que estava preocupado! Estava preocupado porque ela estava grávida, carregava sua carga mais preciosa. As quatro semanas anteriores deram a Bethany a impressão de uma falsa segurança, chegara a pensar que ele estava tão solícito por sua causa. Mas Cristiano deixava claro que só pensava em uma coisa: fazer com que ela entendesse seu ponto de vista, que concordasse com o que propusesse. Insistindo, ela conseguiu ter o seu espaço, imaginando que assim garantiria algum distanciamento entre eles. Mas não percebeu como ele conseguira driblar tudo aquilo.
Ia fazer compras com ela sem reclamar. Comprara alguns presentes, e ela percebia que pensava antes de comprar. Por duas vezes cozinhou com um livro de receitas que ela lhe comprara, ainda que os resultados finais não fossem tão bonitos e coloridos quanto nas fotos. Mas ele tentava. Como sempre, sem reclamar. Mais importante: estava sempre perto. Não poderia fazer comparações nesse sentido, mas apostaria que Cristiano sempre fora do tipo que coloca seu trabalho à frente de tudo e de todos. Porém, estava sendo tão pontual quanto um relógio com ela, passando pelo apartamento no início da noite, exceto um par de vezes quando esteve fora do país, mas ainda assim, sempre ligava com regularidade.
Foi preciso força de Hércules para que Bethany mantivesse suas defesas frente a tão forte e silenciosa agressividade, mas ela se convencera de que venceria. Que tola! Quando percebeu que Cristiano fazia tudo aquilo por causa de sua gravidez, e não por ela, percebeu que seu amor não serviria para nada.
Ela o adorava, só de olhar para ele ficava sem ar. Era duro admitir, mas ele trouxera à tona seu lado obsessivo. Depois de muito caminhar pelo quarto, Cristiano parou e ficou olhando-a.
— Vejo que minhas viagens ao exterior terão de ser suspensas até o nascimento do bebê.
Nunca pensou que algum dia seu trabalho seria deixado de lado por uma mulher, mas este dia chegara. Precisava saber que ela estava bem, e sabia que, caso colocasse os pés fora do país, ficaria martelando em sua mente a possibilidade de uma catástrofe, algo sobre o que ela manteria silêncio para que ele não se preocupasse.
Era tão obstinada e independente que, mesmo tendo concordado com a mudança para Londres, por alguns segundos Cristiano pensou que tais tratos com ela eram menos que o ideal.
Não queria sua obstinação nem valorizava sua independência. Jamais gostou de mulheres submissas, mas naquele exato momento não poderia haver nada melhor que tê-la nesta posição, que o procurasse sempre que surgisse algum problema.
— Não seja ridículo.
Imediatamente, Cristiano se aproximou da cama. Não queria ficar muito em cima dela, mas era importante que entendesse suas preocupações, suas muito razoáveis preocupações.
— Não sou ridículo, Bethany. Estou sendo racional. Um de nós tem de ser.
Bethany abriu a boca e terminou num bocejo.
— E ser racional cai muito bem em você.
Cristiano abriu um sorriso amarelo e sentou-se na beira da cama, para que pudesse se debruçar sobre ela. Tirou alguns fios de cabelo do seu rosto e disse:
— Dois minutos fora do país e olha só o que acontece.
Bethany lembrou a si mesma que aquela aparência de preocupação só tinha uma razão de ser: ela carregava o seu filho. Sem energia para responder, contentou-se em dizer, triste:
— Como eu já disse, Cristiano, você não é o Super-homem nem opera milagres. Caso estivesse por aqui, eu teria ficado resfriada da mesma maneira. Acho que peguei isso no supermercado, outro dia, quando estivemos lá. Parei para conversar com aquela menina que estava com o nariz pingando. Acontece.
— Deveria ficar o mais longe possível de qualquer pessoa com germes!
— E o que você me sugere? Talvez devesse me enclausurar nos próximos meses.
Cristiano foi interrompido pela campainha, e por isso não respondeu imediatamente, embora aquela talvez fosse uma sugestão muito sensata. Apresentou seu amigo, o dr. Giorgio Tommasso, de trinta e poucos anos, a Bethany. E rapidamente Cristiano passou ao italiano para reclamar da demora.
— Não ligue para ele — murmurou Bethany quando o médico se sentou na cama, ao seu lado.
— Por fim surgiu uma mulher capaz de desafiar meu amigo, esse homem tão bruto. Agora vou ouvir o bebê, para me assegurar de que está tudo bem...
Como um guarda-costas, Cristiano ficou parado na porta, observando seu amigo, que fazia perguntas em voz baixa a Bethany, e deve ter dito algo divertido, pois ela sorriu. Neste momento, Cristiano sentiu vontade de lembrar-lhe que estava ali para examiná-la, não para bancar o piadista. Finalmente, quando terminou a consulta, caminhou em direção à cama.
— Então? Diagnóstico?
— O bebê está bem, Cristiano — disse Tommasso, sorrindo e tocando seu amigo gentilmente no braço. — Não precisa ficar assim.
— Acho que você não está entendendo: estou preocupado, só isso — respondeu friamente. Era óbvio que, mesmo grávida, ainda era capaz de atrair as pessoas. Giorgio sorria. O que poderia ser tão divertido?
— Erro meu, então — disse, lutando para não rir enquanto seguiam para a porta. — O que Bethany tem é um simples resfriado. Vai ficar assim alguns dias, mas é forte e se recuperará. A pressão está normal e o coração do bebê bate perfeitamente. Não precisa se preocupar com nada. Que tal uma sopa?
E levantou as sobrancelhas, espantando, quando Cristiano respondeu que poderia experimentar, já que suas habilidades na cozinha melhoravam a cada dia.
— Queria ver a reação da sua mãe, Cristiano. Ela não vai acreditar na domesticação do seu filho!
Aquilo o fez ficar atento. Um passo para frente, sem que ele notasse, transformavam-se em dois para trás com Bethany.
Ao voltar, encontrou-a no quarto, sentada, pois acabara de tomar um remédio receitado por Giorgio, e que segundo ele a deixaria melhor e não afetaria o bebê.
— Eu não disse? — ela perguntou, deixando o copo de água na mesa, e depois cruzou os braços. — Nada mais que um simples resfriado. Descansar por alguns dias. E tudo voltará ao normal.
Ele não respondeu. Em vez disso, foi ao seu armário, abriu as portas e passou os olhos nas roupas ali dependuradas. Numa prateleira acima estava sua mala, que pegou em silêncio. Bethany o observava com a boca aberta.
— O que está fazendo?
— O que você acha? — perguntou, olhando-a um momento. — Nem pense em se levantar. Repouso absoluto.
— Você não vai fazer a minha mala!
— Não? — disse, abrindo uma gaveta e pegando um punhado de calcinhas, que empilhou com roupas na mala. Depois guardou alguma maquiagem, ainda que não houvesse muita coisa, pois ela não era adepta da maquiagem pesada. Tarefa cumprida, ele se virou e olhou para ela com os braços cruzados, dizendo em tom gélido:
— Quero que me escute bem. Aceitei o nosso acordo, mas não está funcionando.
— Eu não tenho culpa por ter ficado resfriada!
A pílula que tomara fizera efeito rápido ou a adrenalina que corria em suas veias a estava deixando em melhor estado. Cristiano ignorou, e continuou:
— Antes de mais nada, goste ou não, você não poderá se cuidar sozinha aqui. Mal pôde chegar à porta para me atender. E se cair quando estiver sozinha? Pense nas consequências...
— Eu nunca... nunca faria nada — disse, mas ficou pálida ao imaginar a cena descrita por ele.
Cristiano não tinha a chave da porta. Ela se recusara, pois queria manter sua independência, mas e se alguma coisa acontecesse e ele não pudesse entrar no apartamento? Estaria tão determinada a ponto de arriscar-se a perder o bebê? Estaria realmente protegendo a si mesma ou penalizando-o por não a amar?
— Não posso confiar em você — disse, fechando a mala com força. — Em vez de me ligar no momento em que começou a se sentir mal, você foi para a cama, puxou o cobertor e fingiu que o mundo exterior não existia. Se tivesse me ligado, talvez eu não pudesse mesmo ter vindo de Nova York em minutos, mas poderia ter ligado para Giorgio, que chegaria rápido, quando ainda pudesse se levantar para atendê-lo. Entende o que quero dizer? Estou sendo claro o suficiente?
— Eu o odeio! — ela gritou, e lágrimas rolaram de seus olhos. Já não estava ali o homem delicado que cuidava dela. Voltara o homem frio e estranho que aparecera na porta da casa dos seus pais com um caminhão de acusações.
— Mas isso não é o que sinto quando estamos juntos na cama.
— O sexo é a única coisa que importa para você?
— O sexo simplesmente me diz que você não me odeia — disse, dando de ombros e pegando o celular.
Ligou para o seu motorista. Bethany escutou quando pediu que fosse buscá-los e que dali em diante ela ficaria no seu apartamento. Disse a si mesma que seria por um período mínimo, o menor possível, mas nem assim conseguiu aliviar a sensação de estar sendo aprisionada.
— O motorista chegará em uma hora. Acho que você poderia tomar um banho. Assim vai se sentir melhor.
— Não quero tomar banho.
— Esqueça o mau humor, isso não muda nada — disse, seguindo em direção ao banheiro.
Bethany rangeu os dentes ao ver que ele ligava a água.
Voltou alguns minutos mais tarde e sem fazer cerimônia tirou-a da cama, ignorando seus protestos, carregando-a até o banheiro.
Ela gostava de banheiros grandes. Talvez porque crescera tendo de dividir o banheiro com as irmãs, que sempre parecia estar ocupado quando precisava usá-lo. Ele concordara em encontrar um apartamento com um banheiro ridiculamente grande, o suficiente para abrigar uma grande cadeira acolchoada onde a sentou.
— Sua febre diminuiu e a cor está voltando ao seu rosto. Mas ainda não sei se poderia entrar no chuveiro sem cair....
— Não seja ridículo! — disse Bethany, ainda com raiva de sua decisão de dar-lhe um banho e com a história de que não poderia odiá-lo, pois eram amantes. Olhou-o com ressentimento. Ele ignorou.
Sua cabeça girava. Fechou os olhos com força quando ele começou a abrir os botões de sua camisola, na verdade, uma das duas únicas camisolas nas quais ainda se sentia confortável. Podia sentir o cheiro da lavanda do banho, mas não admitiria que sim, queria tomá-lo, longamente.
Também disse a si mesma que era loucura ter pudores com o corpo quando ele a conhecia perfeitamente. A quem queria enganar? No entanto, quando ele a ajudou a entrar na banheira com gentileza incongruente a um homem tão grande e poderoso, ela tomou consciência do peso de seus seios e da sensibilidade de seus mamilos.
Entrou na água morna com os olhos ainda fechados, mas percebeu que Cristiano aproximava a cadeira para ficar ao seu lado.
— Estou bem agora — ela disse.
— Certo, mas não vou lhe dar nenhuma chance.
Além disso, ele gostava do que fazia. Sem alternativa, Bethany fora encurralada, mas não sentia culpa alguma, pois ele fazia apenas o que deveria fazer.
Sua barriga, debaixo da água, estava incrivelmente sexy, e também seus mamilos, pontiagudos. Cristiano observava tudo aquilo pensando que ela não percebia, pois tinha os olhos fechados.
Bethany poderia dar todos os sinais exteriores de desaprovação, mas ele sabia que era apenas fachada. Apostaria sua enorme fortuna que, caso se curvasse e tomasse um dos seios nas mãos ou um dos mamilos na boca, ela se dissolveria mais rápido que uma vela em combustão.
— Como se sente? — ele perguntou, perdido em seus pensamentos e notando que seu corpo se enrijecia ao vê-la naquela banheira.
— Não vou continuar na sua casa quando melhorar deste resfriado — ela disse, decidida, mas quando abriu os olhos e olhou para ele, Cristiano deu de ombros, de forma elegante.
— Deixe que eu a ensaboe. Meu motorista chegará em pouco tempo.
— Melhor não.
— Por quê? Não gosta de fazer o que dizem que deve ser feito? Mesmo sendo para o seu próprio bem? Sente-se.
Bethany olhou-o duramente, e ele levantou as sobrancelhas, divertindo-se com a cena e pegando o sabonete.
— Aproveite... pois da próxima vez que eu a ensaboar será um prelúdio...
Ele poderia tomar um banho frio? Não teria tempo, mas seria a primeira coisa a fazer quando chegasse em casa.
Começou a ensaboá-la, lentamente, deslizando as mãos pelos ombros e seios.
— Isto é a coisa mais arrogante que... que jamais ouvi em minha vida... — e sentiu um arrepio quando ele tocou seus mamilos, que se enrijeceram imediatamente, deixando sua fala totalmente sem sentido.
— Será? — ele murmurou, deixando o sabonete de volta no lugar e levantando-se para buscar uma toalha. — Você não gosta de ser cuidada? — Sua voz, quando começou a secá-la, era como uma melodia doce, fazendo com que a mente de Bethany se fundisse. — Posso ser um dinossauro, mas este não é o sonho de qualquer mulher?
— Não sei qual é o sonho da maior parte das mulheres. Mas sei que não é o meu — disse, pegando a toalha felpuda que ele colocara ao lado da banheira e enrolando-a bem firme em volta do seu corpo, mantendo os olhos bem longe dos dele.
Estaria sendo tola ao esperar ser amada? Era pedir demais? Pensou que se largasse esse sonho para trás talvez terminasse sem nada. Sim, ele seria um marido responsável e um bom pai, mas, para ela, seria triste. Não queria um casamento baseado em obrigações, ou um homem que cedo ou tarde a veria como um fardo.
— Eu me recuso a morder a isca, Bethany — disse, lembrando a si mesmo que ela não estava se sentindo bem, que seus pensamentos poderiam estar um pouco fora de lugar. Sentia uma raiva de frustração nascendo dentro dele, louca para escapar.
— Como preferir — disse, permitindo que a ajudasse a sair da banheira, tarefa que estava se tornando cada dia mais complicada.
— Você — ele disse, entredentes — pode ser a mulher mais chata da face da terra. Cheguei ao ponto da insanidade ao seu lado, e ainda assim você insiste em atirar tudo na minha cara.
Bethany sentiu uma pontada de culpa, mas pensou que não queria um homem acomodado, queria um homem adorável, que subiria a montanha mais alta e desceria aos abismos mais profundos por ela.
Mas argumentar não os levaria a nenhuma parte, e ela não queria brigar, então não disse nada.
— Por que quer se casar comigo se posso ser tão chata? — ela perguntou.
Para Cristiano, ela parecia perguntar com uma falta total de lógica, algo bem feminino. Ficou olhando-a em silêncio enquanto se vestia, de costas para ele, depois ela se virou e o encarou com uma expressão desafiadora no rosto.
— Por quê? — ela pressionou, odiando-se por persistir neste assunto, mas não querendo deixar escapar a oportunidade.
— Como você está se sentindo?
— Você não me respondeu.
— E não pretendo responder.
— Por quê?
— Porque sua pergunta não merece resposta — disse, pegando a mala sem fazer esforço, como se não pesasse nada e caminhando em direção à porta. Depois esperou por ela e gentilmente segurou-a pelo braço enquanto desciam, pois o motorista os esperava.
— Não lhe incomoda que você não seja o meu sonho? — ela perguntou, sentindo os olhos cheios de lágrimas. Era inútil, mas ela queria machucá-lo da mesma forma como, mesmo sem saber, ele a ferira.
— Pode me chamar de prosaico, mas sonhos românticos nunca foram meu forte — disse, levando-a para o carro, estacionado na frente do prédio. — Somos obrigados a enfrentar certas situações na vida, e isso é tudo. Fim de papo.
Mas quem seria o homem dos seus sonhos? Era difícil para ele lidar com a raiva que nascia com as críticas injustas que ouvia.
Lidou com a última com particular graça e consideração.
— Estou começando a ficar cansada — ela disse, sentando-se no banco de trás do carro, já sem energia, que fora usada para argumentar com ele.
— Meu ombro está aqui — ele disse. — Pode se apoiar.
E apoiou. Fechou os olhos e depois caiu em mais um de seus sonos leves. Sua mente ficara cansada e perdida. Cristiano queria que se apoiasse nele, e ela também queria tanto que, por alguns momentos, antes que se apoiasse, Bethany ficou pensando por que se dava ao luxo de lutar tanto com ele.
Seria seu ponto de vista mais importante que o dele nesse assunto? Ele oferecia a presença de ambos os pais ao seu filho e um acordo estável. Como mencionara várias vezes, eram ótimos na cama. Quanto tempo duraria, ela não sabia, mas não seria melhor aproveitar um pouco, ainda que a oferta não fosse um pacote completo?
Ainda revolvia aqueles pensamentos confusos quando o carro finalmente parou e ela foi ligeiramente perturbada em seu sono nada confortável.
Piscou os olhos, sonolenta, e olhou para ele. Por alguns segundos, ficou sem fôlego ao ver que a encarava.
— Você caiu no sono — ele disse. — Pode me dizer o que sonhava?
Bethany ficou vermelha, mas manteve o silêncio. A porta foi aberta e ela saiu do carro com a ajuda do atencioso motorista de Cristiano.
As perguntas que estivera fazendo a si mesma ao cair no sono ainda estavam vivas, atrapalhando suas convicções. Junto a isto, pensava em seus pais, que adorariam que cedesse e se casasse com o homem que aceitaram como seu próprio filho... sua mãe estaria na fila de várias pessoas felizes, que incluía suas irmãs, que também ficaram encantadas ao conhecê-lo e depois desapontadas com sua decisão de esperar um pouco, e não se casar imediatamente com um homem que talvez não fosse o ideal para ela...
— Precisamos conversar — ela murmurou, demonstrando certa incerteza na voz.
— Você acabou de dizer as duas palavras menos desejadas no meu vocabulário — ele disse, ameaçador. E mantinha a mão ao redor do seu corpo quando entraram no elevador em direção à sua cobertura, no alto.
— Acho que essa conversa não será tão ruim para você...
— Nada de papo até você estar na cama — ele disse, apressando para que ela entrasse na sua cobertura, que fazia o bom apartamento de Bethany parecer uma casinha de boneca.
O piso importado da Itália, que cobria todo o chão, era interrompido sem cerimônia pelas cores vibrantes de caríssimos tapetes. Com quase nenhuma porta quebrando o limpo espaço do vasto apartamento, a vista era de tirar o fôlego.
Mesmo sentindo-se tão mal, Bethany parou, como todas as vezes que entrou ali, para absorver o impacto do lugar.
Nunca deixou de se maravilhar com a forma desinteressada como ele aceitava aquele nível de opulência. Parecia não notar as lindas pinturas originais nas paredes, cada uma valendo mais dinheiro do que a maior parte das pessoas poderia juntar em uma vida inteira de trabalho duro.
Ele não era esnobe. Sua riqueza fabulosa era um fato aceito por seu passado privilegiado e uma prova de por que sempre fora tão importante para ele conhecer o pedigree das mulheres com as quais se relacionava. Até a chegada de Bethany, deixando tudo fora de controle.
O quarto era tão impressionante quanto todo o resto da casa. Persianas de madeira o isolavam do resto do mundo, e dominando a cena estava a cama, feita à mão, pois queria algo maior que uma king-size normal. Cada lençol de linho fora desenhado especialmente e suas cores creme e chocolate impregnavam o espaço com uma estampa decididamente masculina.
Quando, de forma obediente, ela se colocou debaixo das cobertas, percebeu um buquê de flores que, de forma impulsiva, comprara para ele três dias antes, dizendo que sua cobertura era muito masculina. As flores foram parar no seu quarto, num vaso acima da cômoda.
Ver aquelas flores fez com que seus pensamentos se ordenassem.
Lutou muito tempo por sua independência. Recusou o casamento simplesmente porque seria guiado por seu tradicionalismo, e imaginou ter a disputa ganha, já que ele não falava mais no assunto, mas estava cansada e duvidava dos próprios argumentos.
Sentira sua falta quando ele esteve fora, mesmo que preferisse morrer antes de assumir este fato. Também sentira falta de sua presença quando começou a passar mal, da forma como ele sempre tomava conta de tudo, fazendo-a sentir-se a salvo. Uma sensação falsa, claro, pois a salvo era a última coisa que sentiria ao lado dele. Conseguira driblar sua insistência de que o casamento seria a única forma de lidar com as circunstâncias, mas, na verdade, quando pensou em Cristiano concordando com os seus termos, foi tomada por um sentimento de pânico.
As flores lhe deram a esperança de que, se ele não a amava, deveria sentir o carinho necessário para tratá-la com respeito quando a novidade da explosão sexual entre os dois se transformasse em algo rotineiro. Agarrou-se a esta frágil esperança quando ele saiu, para voltar minutos mais tarde com um copo de água, pois a última coisa que ela precisava, segundo ele, era ficar desidratada. A verdade era que, talvez, e só talvez, havia uma chance de que passasse a sentir algo por ela. E esse tipo de coisa acontecia, claro que sim! Mas, se não acontecesse com eles, o banquete prometido ao casamento se transformaria em migalhas e ela teria de aprender a lidar com isso.
— Então... — disse Cristiano, sentando-se na cama perto dela, abrindo espaço para mais uma daquelas conversas que o fariam trincar os dentes e gritar até que ela enxergasse tudo à sua maneira — ... você disse que queria conversar.
— Vi que as flores estão aqui.
Cristiano virou os olhos para a cômoda e ficou corado.
— Não me lembro de nenhuma mulher que me tenha comprado flores — disse, encolhendo os ombros.
— Mas posso apostar que já comprou muitas rosas para mulheres na sua vida.
— Era sobre isso que queria conversar? Se for, acho que o assunto pode esperar.
— Eu... eu queria conversar sobre... sobre o seu cuidado comigo. Caso eu tenha parecido pouco grata...
— Você quer dizer que sente muito... Desculpas aceitas.
Percebeu que era estranho ela estar pedindo desculpas.
Claro, já pedira antes, quando Cristiano apareceu pela primeira vez na sua porta, mas naquele momento o pedido de desculpas tinha algo de desafio.
Agora parecia sincero. Ele gostava do que ouvia. Na verdade, gostava tanto que tentou dirigir a conversa em benefício próprio. Sempre oportunista, considerava um crime não aproveitar a chance.
— É duro ter que ficar sempre sozinho — ele murmurou, persuasivo, pegando uma das mãos de Bethany e brincando distraidamente com seus dedos enquanto tentava pensar em como transformar aquele momento, quando ela parecia ter baixado a guarda, em uma vantagem.
— Veja bem o que está acontecendo esta noite — ele continuou, numa voz suave, sexy, que invadia seus ouvidos como ondas do mar. — Você não estava bem, e eu admito que chamar um médico talvez não fosse tão necessário. Mas não é bom saber que cuido de você?
— Eu não dependo de você...
— Claro que não! E nunca pediria isso... — Ainda que a ideia fosse interessante, mas ele não admitiria. — Porém, isso não quer dizer que aceitar uma mão amiga seja prova de fraqueza. — A conversa parecia ficar frouxa, e ele resolveu tomar as rédeas. Não voltaria ao velho papo de serem amigos. — Já estivemos nesta situação antes, Bethany, mas acho que chegou a hora de você enxergar que seria muito mais fácil enfrentarmos isso como um casal.
Ficou encorajado com a falta de reação de Bethany. Esqueceu-se do desconforto por ele, acostumado a ter sempre tudo nas mãos, mesmo que tivesse de usar todos os truques disponíveis para dobrar aquela mulher.
Subestimara, e muito, o impacto que ser pai solteiro causaria nele!
— E pense em nosso bebê — disse, com voz grave. — Se não formos homem e mulher, o que ele pensará quando souber que lhe negamos o privilégio de ter os dois pais juntos, simplesmente porque você não aceitou esta ideia?
Bethany franziu a testa e disse:
— Não sou capaz de pensar num futuro tão distante.
— E nem precisa. Eu sou capaz.
Sentia como se estivesse sendo cercada quando, após dez minutos, ele pintou um quadro no qual ela aparecia como uma mulher sem consideração, sem razão e egoísta. Mas, desta vez, não sentiu vontade de lutar contra as acusações ditas pela língua ácida de Cristiano.
— Não tem nada a dizer? — ele perguntou, frente ao silêncio de Bethany.
— Estou cansada.
— Deveria estar descansando — ele disse, imediatamente. Cristiano sabia o momento certo de sair bem de cena. Plantara a semente e desta vez ela parecia ter caído em solo fértil. No tempo certo, regaria e tinha certeza que um dia germinaria. Na verdade, germinaria mais rápido do que ele imaginava. — Vou pedir comida. O que gostaria de comer?
— Esta é a sua maneira de me lembrar o quanto preciso ter você ao meu lado, Cristiano?
Ele pareceu afrontado e se levantou.
— Só estou tentando fazer o melhor possível. E sinto fome, caso você não sinta — disse, mas foi obrigado a pontuar: — Ainda assim, mesmo sem fome, você vai ter que comer. É bem provável que tenha comido mal enquanto eu estive fora. O que você quer? Comida chinesa? Indiana? Posso pedir ao meu motorista que traga algo do Savoy Grill. Quer saber? Eu mesmo vou providenciar. Você não pode comer porcaria. Uma sopa e pão fresco, pode ser?
— Você não precisa...
— Não preciso o quê? — ele perguntou, cortante, pois algo no tom de voz de Bethany o fez sentir-se desconfortável.
— Pedir comida. Aceito o que tiver na sua geladeira.
— Estive fora por dois dias e, antes disso, mal ficava nesta casa. Não quero comprometer sua saúde com o que tenho na minha geladeira.
Ali estava ele outra vez, ela pensou: sempre o bebê em primeiro lugar.
— Na verdade, o que eu quis dizer, o que quero dizer... é que você tem razão e não deve se aproveitar das minhas necessidades para atingir o que realmente quer. Já entendi. Casar-se é a atitude mais sensata. Então, se a sua oferta permanece de pé...
Tendo manobrado a situação para chegar a este ponto, Cristiano ficou reduzido a alguns segundos de puro choque.
— Em outras palavras... — ela disse, dando de ombros, para deixar claro que era apenas uma concessão —...você venceu.
Considerando que era o vencedor, Cristiano não ligou para aquela fraseologia, mesmo sem antes parar e pensar o que realmente aquilo tudo queria dizer.
— Fico feliz.
Na verdade, ficara ridiculamente feliz, o que era perfeitamente compreensível, sendo ele um homem que não gostava de situações-limite. Olhou para ela, sorrindo.
— Na verdade, estou muito mais do que apenas feliz.
— Fico surpresa de que não tenha dito nada nas entrelinhas, algo sobre saber que eu recuperaria minha sã consciência, no final das contas.
— Eu sabia que no final das contas você recuperaria sua sã consciência.
Para alguém que escutara mil e uma razões emocionais e ilógicas sobre por que eles não poderiam se casar, Cristiano ficou desconcertado com aquela súbita mudança de opinião. Sabia que era melhor não tocar no assunto, mas sentou-se ao seu lado na cama, franzindo a testa, tentando organizar seus pensamentos.
— O que a levou a mudar de ideia?
— E isso importa?
— Provavelmente não, mas por que você não sacia minha curiosidade?
Bethany deu de ombros. Era a sua oportunidade de mostrar que poderia ser tão fria quanto ele no que se referia àquela situação.
— Acho que, ao ficar doente, percebi que sou mais vulnerável do que imaginava. Talvez tenha chegado ao ponto no qual é preciso deixar as minhas loucuras de lado. Esta é a minha vida. Estou grávida, para o bem e para o mal. Você foi honrado ao me propor casamento. Seria a saída mais sensata, então...
Bethany repetia tudo o que ele dissera no passado, quase com as mesmas palavras, mas Cristiano sentia-se nervoso com aquela resignação.
— Certo... — ele disse baixinho. — Mas fico pensando no que teria acontecido todas aquelas ideias românticas de não querer se casar com o homem errado. — O homem errado. Nunca três palavras soaram tão ácidas para sua língua.
Ele não entendia por que estava tão nervoso. Passara um bom tempo buscando aquele resultado. Mas gostaria que ela demonstrasse um pouco mais de entusiasmo. Ele passara várias semanas tentando fazer tudo para agradá-la e nada daquilo parecia ser considerado.
Bethany curvou o lábio inferior. Cristiano, cuja personalidade agressiva o levara a aferrar-se à necessidade de casar-se com ela, respondia deixando-a mais e mais nervosa. Ele dissera que estava feliz, mais que feliz. Mas não parecia.
Ao pensar que Cristiano poderia ter mudado de ideia, que poderia ter passado a encarar a situação como ela, apesar de tudo o que dissera no passado, Bethany ficou mal. Ou tudo o que ele queria era manter a pressão pelo casamento, para desta forma seguir insistindo no seu papel moralista? Insistira que fosse à sua casa. Talvez enxergasse a mudança como necessária naquele ponto de sua gravidez. Ou talvez, mesmo sem perceber, ele já aceitara que a mudança seria temporária, até que o bebê nascesse, e toda aquela conversa de Bethany sobre manterem suas independências poderia ter surtido algum efeito.
Bethany queria voltar atrás, dizer a Cristiano que, caso mudasse de ideia, não haveria qualquer problema.
Mas o que disse foi:
— Não estou pensando em uma saída prática. Se ainda está interessado no casamento, tudo bem, estou pronta a aceitar, mas com algumas condições.
Pronta a aceitar? Algumas condições? Ela parecia estar sujeita à tortura, não a uma vida tendo tudo o que sempre desejou.
— E que condições seriam essas? — Cristiano perguntou.
— Sei que seria um casamento de conveniência, mas... mas... — Baixou as cobertas e ficou olhando fixamente para os próprios dedos enquanto tentava controlar a respiração e soar o mais normal possível. Dois adultos sendo racionais. — Espero que você... não mude de comportamento tão rapidamente caso se canse de brincar de família feliz.
Os olhos de Cristiano ficaram gelados. Caminhou até a janela, tentando ganhar um pouco de tempo para controlar a fúria que crescia dentro dele.
— Que tipo de pessoa você acha que sou? — perguntou, num tom de voz cortante. — Acha que sou tão sórdido?
— Não acho que seja sórdido — Bethany respondeu, levantando o queixo e olhando para ele. — Eu considero você um homem com... necessidades... e quando se cansar de mim, talvez seja tentando a...
— Então cabe a você não deixar que a vida fique chata, certo?
Aquela foi uma pergunta sórdida, mas Cristiano não sentia vergonha dela. Nada estava acontecendo como ele esperava.
— Isso é uma ameaça? — ela perguntou, firme. — Quer fazer o que lhe der na telha, inclusive encontrar-se com outras pessoas?
— Você está colocando palavras na minha boca, e eu não gosto disso.
— Peço desculpas por tentar derrubar algumas barreiras por aqui, mas elas afetam a minha vida!
— Você não está derrubando nenhuma barreira. Está se protegendo para o caso de algo dar errado.
— Eu não vejo desta forma, e caso não concorde com o meu pequeno pedido, talvez fosse melhor nos prepararmos para um acordo de custódia para o bebê.
Cristiano não acreditava: estava ouvindo exatamente o que não queria ouvir. Aquelas palavras — acordo de custódia — fizeram reviver em sua mente as imagens de Bethany com outro homem. Fez um esforço brutal para controlar seu temperamento. Ela concordara em se casar, mesmo que sem entusiasmo, e ele trabalharia aquilo.
— Nós nos casaremos — ele disse, sendo direto. Não falei bobagens, nem você. Além do mais, sei que fará tudo o que puder para que o nosso casamento funcione. Não vou tolerar nada que possa atrapalhar.
Ela percebeu que, frente ao mundo, apresentariam a imagem de um casal perfeito. Ela sabia que era agora ou nunca. Caso concordasse, seu destino estaria selado. Caso negasse, ele nunca mais tentaria convencê-la a seguir ao seu lado. Se veriam durante a gravidez e depois ele se afastaria. Não do filho, mas dela.
Bethany ficou nervosa ao admitir para si mesma que não gostaria de vê-lo com outra mulher. Não podia sequer pensar em que ele poderia olhar para outra pessoa, provavelmente fantasiando como seria fazer sexo com ela.
Ela gesticulou um sim e não disse nada. Quando voltou a olhar para ele, Cristiano parecia mais relaxado. Pegou o celular, discou um número e ofereceu-lhe o aparelho.
— Seus pais. Chegou a hora de espalhar a boa notícia. Depois eu ligo para a minha mãe.
— Já? — ela perguntou, em voz alta, porém nervosa, mas podia sentir uma excitação percorrendo seu corpo. Suas mãos tremiam quando pegou o telefone.
Quinze minutos mais tarde, devolveu o aparelho. Ele permanecera no quarto, de pé, com as pernas um pouco afastadas, os braços cruzados, dando a impressão de que estava ali para assegurar-se de que ela não fraquejaria no último momento.
— Sua vez.
Cristiano fez uma careta. Bethany aceitara seus desejos, mas havia uma tensão entre eles que desaparecera desde a chegada a Londres. Cristiano sentia como se ela tivesse desistido, aceitado o inaceitável e que agora tinha aquela história atravessada na garganta. Graças a ele, fora forçada a abandonar seus sonhos românticos em favor da praticidade. A felicidade não parecia presente em seu horizonte, mesmo que tivessem sido perfeitamente felizes antes, na cama e fora dela.
— Vou ligar mais tarde. E não precisa ficar com essa cara de miserável frente ao casamento. Vou lhe oferecer toda a segurança que um dia poderia ter sonhado — disse, olhando-a com grande frustração.
— Eu sei.
Segurança! O casamento, que deveria ser uma troca de amor, chegava até ela como uma oferta de segurança. Odiava a si mesma por amá-lo tanto a ponto de ser capaz de abrir mão de seus princípios. Odiava a si mesma por saber que, por mais errado que fosse este casamento com Cristiano, ainda seria melhor que uma vida longe dele, vendo-o em dias combinados, observando-o com outras mulheres, esperando o dia que se apaixonaria por alguém. E odiava outra terrível verdade: se não se casasse, Cristiano mais cedo ou mais tarde se cansaria, e neste momento ela não teria mais qualquer peso em sua vida.
Seria sempre fiel a ele porque não tinha escolha. Era prisioneira de seus sentimentos. Cristiano, por outro lado, insultado por ela ter simplesmente pensado em confiná-lo a ser fiel, não se prenderia a tais laços emocionais. Estaria condenada a uma vida desconfiada. Quantos homens com libido tão poderosa como ele, capazes de atrair qualquer mulher a qualquer momento, aceitariam a monogamia quando a esposa com a qual se casara deixasse de ser uma novidade? Ele a queria naquele momento, sua gravidez parecia sexy naquele momento, mas no que dizia respeito a calendários, aquele momento passaria mais rápido que um piscar de olhos.
E ali estava ele, franzindo a testa, exigindo que fosse feliz! Pior que isso, Bethany tinha vontade de acariciar seu rosto, mas precisava lutar contra essa tentação.
— Você estava feliz — disse Cristiano, como se fosse uma verdade absoluta.
Bethany ficou corada porque sim, estava feliz. Fora feliz na pequena bolha que criaram desde a chegada em Londres. Recebia devoção total 24 horas por dia. Mas passou a sentir-se confusa com a sua decisão.
— O que mudou? — ele perguntou. Era difícil entender seu novo estado de ânimo. Tinham bom sexo, ela aceitara sua proposta de casamento. Então por que parecia tão perdida? Cristiano passou os dedos pelos cabelos e começou a caminhar no quarto.
— Nada — Bethany murmurou, triste. Deitou-se e fechou os olhos, pois simplesmente olhar para Cristiano era desolador.
Passado um tempo, forçou-se a abrir os olhos e dar um sorriso amarelo.
— E a tal sopa com pão que tinha me prometido?
Cristiano não queria interromper a conversa, embora não tivesse ideia de onde poderiam chegar. Ele a forçara para que aceitasse o casamento, quanto a isso não havia dúvida, e abrira mão de uma ou duas coisas. Caso parecesse um tirano, fazia isso pelo bem dela, como Bethany descobriria em pouco tempo. Disso ele tinha certeza. Qualquer pensamento de que se comportara de outra forma não poderia vir à tona, pois quanto mais tempo passasse ao seu lado, mais convencida estaria de que terminaria desejando-o só para si. Permitiu-se retribuir o sorriso de Bethany, pois não havia motivo para criar uma situação desconfortável. Ela já admitira que fora feliz ao seu lado, e não havia razão para que não voltar a ser.
— Vou providenciar — ele disse, em tom suave, feliz por ter conseguido sair daquele humor ruim. — Um casamento simples... certo? Mas, claro, caso prefira algo mais tradicional, eu ficaria feliz em aceitar.
— Vestida de branco e a ponto de ter um bebê? Isso não combina, não é?
— Para mim, sim — ele respondeu, seco. — Qualquer coisa combinaria...
O rosto de Bethany ficou vermelho. A nuvem negra que pairava sobre Cristiano parecia ter desaparecido. Voltara ao normal. Estaria realmente feliz com o casamento? Ele escondia muito melhor seus sentimentos que ela.
— Agora — ele disse, antes que seus olhos fossem atraídos por Bethany, o que sempre acontecia quando estava na sua presença —, vamos comer e dormir.
Bethany tomava seu café olhando para o cenário londrino de pessoas fazendo compras na hora do almoço e trabalhadores tentando aproveitar ao máximo sua hora longe do escritório. Com apenas mais umas poucas semanas de gravidez pela frente, estava muito pesada para fazer compras ou algo parecido. Mas mantinha a determinação de caminhar tudo o que pudesse, o que a fez chegar rotisserie da pracinha logo após a King's Road, onde ela desenvolveu o hábito agradável de tomar um café e lanchar. De seu ponto de vista privilegiado, atrás do vidro, pensava em seu casamento, que aconteceria três semanas após o nascimento do bebê. Enquanto isso, o mundo seguia seu curso natural.
Cristiano, que preferia fazer tudo um pouco mais rápido que a velocidade da luz, decidira que se casariam assim que arrumasse alguém que os pusesse casar, mas Bethany se manteve firme. Só pensava se casar uma vez na vida e não se submeteria à pressa, mesmo num casamento de conveniência. Fingia para si mesma que tudo acontecia normalmente. E desde quanto isso era crime?
Um casal discutia na rua, e Bethany ficou observando a cena, perdida em seus pensamentos.
Já desistira de qualquer defesa contra Cristiano. Com sua personalidade dura, ele se provou indispensável. Era atencioso, apoiava tudo, um sonho, e mesmo que nunca, nenhuma vez, tenha dito que a amava, poderia se tratar de um caso de omissão. Ela, por sua vez, mantinha suas emoções contidas, e assim, silenciosamente, aceitou a esperança de que ele, milagrosamente, de um momento para o outro, mudaria, aceitando estar apaixonado.
Era a impressão que Cristiano dava ao mundo. No recente final de semana que passaram na Irlanda com seus pais, mostrou-se a perfeita imagem do marido devotado, e Bethany tinha certeza de que, ao encontrar-se com a mãe dele, duas semanas mais tarde, agiria da mesma forma.
Mas ela não queria seguir o mesmo caminho. Quando pensava na real situação, entrava em uma espiral de pânico. Por isso desenvolveu uma prática de jogar tudo para a parte traseira de sua mente.
O casal que discutia fora embora. Bethany olhou para o relógio, pensando nas várias reuniões que Cristiano teria naquele dia, enquanto ela saboreava seu chocolate quente com bolo. Ele voltaria tarde, pois sua agenda estava lotada.
Levantou os olhos, com um meio sorriso, pois só de pensar nele ficava feliz como uma adolescente apaixonada. Mas, ao focar os olhos, curvou o corpo para frente e deixou o bolo cair no prato.
Seu coração acelerou ao reconhecer Cristiano, lindo em seu terno italiano impecável, com uma das mãos no bolso da calça, onde estaria brincando com uma moeda perdida, como sempre. Ele sorria, curvando seu corpo em direção à loirinha à sua frente, totalmente concentrado no que ela dizia. Outro hábito seu.
Bethany foi ficando sem ar. Olhou para a mulher que o acompanhava. Tinha um rosto delicado, olhos grandes e os cabelos loiros cortados rente ao pescoço. Vestia roupas casuais.
Cristiano disse que estaria em reuniões. Não teria nenhum tempo livre. Beijou aquela mulher no nariz, divertindo-se, pois sabia que seria um gesto provocador, dizendo que não deveria se preocupar com nada, depois passaria à sua boca, dizendo como gostaria de driblar as convenções, levando-a diretamente à cama.
Estava claro que teria o dia ocupado, só não lhe dissera exatamente como.
Bethany ficou olhando para a cena que se desenrolava no mesmo local onde antes o casal discutia. Estava tão concentrada que só percebeu o quanto seus punhos estavam cerrados quando a palma de suas mãos começou a doer sob a pressão dos dedos. Esteve a ponto de se levantar quando ele agarrou o braço daquela mulher de forma tão familiar, depois começou a andar, ainda sorrindo, parecendo muito feliz consigo mesmo.
O monstro que ela conseguira espantar voltara a assombrá-la. Exatamente como sempre temera. Com Bethany já convencida sobre o casamento, Cristiano voltava a notar as várias outras mulheres que existem no mundo. Trabalhariam juntos? Trabalharia para ele? Não importava. Tudo o que importava era que Cristiano mentira para ela, uma mentira com grande significado. Que tipo de reunião acontece próximo a um café chique ao lado da King's Road? Que tipo de mulher de negócios se vestia como ela estava? Seria uma dessas reuniões secretas, pensou, do tipo que ele não poderia contar com detalhes.
Passou as horas seguintes arrasada. Mas quando, pouco depois das dez, ouviu a porta da frente se abrir e ser batida com força, seu corpo tremeu inteiro.
Ele tirava a gravata quando chegou ao quarto. E se aproximou, como se nada estivesse errado, como se simplesmente acabasse de chegar de mais um dia duro no trabalho, abrindo um sorriso lindo, sua marca registrada, do tipo que fazia todo o seu corpo tremer.
— Você está acordada — ele disse, confirmando o óbvio. Curvou-se e deu um beijo na boca de Bethany, que deixara o livro que estava lendo comicamente aberto em cima de sua barriga.
O cheiro de Cristiano era tão bom que ela quase retribuiu o beijo.
— Teve um bom dia?
— Um dia cheio. Vou tomar um banho. Não se mova. Volto em 15 minutos.
Não fechou a porta do banheiro nem foi modesto ao tirar a roupa na frente dela, que ficou observando a cena com desejo, até virar-se de lado, a única posição que a deixava confortável naqueles dias.
Cristiano, já de banho tomado, voltou ao quarto com a toalha amarrada à cintura e parou na porta. Sua antena sinalizava que algo estava errado. E ele não gostava do que sentia. Seus dias de indiferença total sobre como as mulheres interpretavam seu comportamento eram coisa do passado.
Caminhou lentamente até a cama, que circundou, até que Bethany estivesse completamente sob seu campo de visão. Ela percebeu suas pernas se aproximando e também a ponta da toalha branca, que mal podia tapar sua impressionante masculinidade.
Tivera algumas horas para decidir o que faria quando o visse. Pensou em não dizer nada, mas rejeitara tal opção porque não saber exatamente o que estava acontecendo seria terrível, acabaria com ela. Mas não ficaria histérica. Cristiano não fazia dramas. Sentou-se na cama.
— Você comeu? — ela perguntou, mantendo os olhos afastados do seu lindo corpo, que ainda tinha o poder de fazer com que se sentisse tonta, mesmo lutando com todas as forças para evitar tal sensação.
— Tínhamos alguns sanduíches na mesa de reunião esta noite — respondeu, olhando para seu rosto preocupado, para a forma como tentava não olhar para ele. — Você está pensando em algo. Por que não me diz logo, em vez de ficar ruminando aí na sua cabeça?
— Como passou o seu dia?
Cristiano balançou a cabeça, impaciente, e caminhou até a cômoda, deixando cair a toalha e vestindo uma cueca boxer.
— Trabalhei. É o que faço. Sento na frente de homens chatos vestidos em ternos e discutimos vários assuntos. No meio tempo, fico de olho em relatórios para ver se tudo anda bem, se não há alguma crise a caminho. Às oito e meia uma das secretárias saiu para comprar sanduíches. Eu comi dois. E voltei para casa. Você estava bem quando saí esta manhã. Não imaginei que ao voltar estaria com outro humor.
— Não estou com outro humor, só estou perguntando como foi o seu dia.
— E já disse. A menos que queira um relatório mais detalhado.
— Talvez só um detalhe — ela disse, respirando fundo.
Cristiano ficou olhando-a, seco. Não tinha ideia de onde queria chegar, mas descobriria. Era grandinha, estava a ponto de se casar e ter um filho.
— O quê?
— O que você fazia na hora do almoço com outra mulher? E não tente negar, pois eu o vi.
Cristiano ficou louco. Teria de manter-se calmo, pois não queria estressar Bethany. Até então, nenhuma mulher jamais questionara seus movimentos.
— Não tenho razão para negar nada — ele disse. Não permitira ser questionado por ninguém. Já tinha conversado muito com Bethany, mas chegara ao limite. As linhas tinham sido demarcadas, fronteiras essenciais estabelecidas.
Suas palavras destruíram qualquer esperança de que haveria uma explicação razoável para o que ela vira. Para Bethany, foi como receber um soco na cara.
— Você é demais, Cristiano — ela murmurou. — Demais.
— E o que isso significa?
— Significa que não posso seguir em frente com essa história de casamento.
— Isso é ridículo — ele disse, mantendo a voz baixa e razoável, mas demonstrando poder. — E você não precisa ficar assim a esta altura do campeonato.
— Fico assim quando eu quiser!
Ele só se preocupava com a sua saúde por conta do bebê. Lágrimas de tristeza, frustração e desapontamento rolavam em seu rosto, e Bethany mordeu os lábios para evitar a desvantagem de deixar-se levar pelo lado emocional.
Cristiano rangeu os dentes, e disse:
— É isso, Bethany? Vou ter que aceitar suas mudanças de planos sempre que ficar um pouco chateada com algo?
— Não estou um pouco chateada, Cristiano! Só estou pedindo que me explique por que mentiu para mim sobre o que faria hoje. Isso é pedir muito?
— Isso é dizer que não confia em mim — ele respondeu, tranquilo. — Você está me acusando de ter um caso, e eu estou lhe dizendo que não tenho. E não vejo por que seguir com essa história.
Então por que, ela pensou, por que não lhe dizia exatamente o que fazia com aquela mulher ao seu lado? Talvez tecnicamente estivesse dizendo a verdade. Talvez não estivesse envolvido em uma situação de rompante sexual com aquela mulher, mas... e se estivesse pensando na possibilidade? Talvez ele não contasse um flerte como infidelidade, mas ela contava. Bethany não queria que olhasse para nenhuma outra mulher. Nunca.
Aqueles pensamentos ecoavam na cabeça de Bethany como centenas de vozes. Tentou entender algo. Sabia que Cristiano tinha razão, que não poderia ficar mudando de ideia sobre o casamento todo o tempo. Mas ele não a amava, então como poderia confiar nele?
— Certo — murmurou Bethany, triste.
Ela desistira, pensou Cristiano, mas não por muito tempo. Conhecia aquela mulher como nenhuma outra, conhecia sua determinação em obter as respostas que queria. Na verdade, eram bem parecidos nesse aspecto. Mas ele não daria o braço a torcer. Disse a si mesmo que se responsabilizaria enquanto ela estivesse naquele estado, e não se deixaria levar por seus pedidos de explicação para que Bethany pudesse, enfim, satisfazer sua imaginação fervilhante.
Não fizera nada de errado, e fim de papo.
Tendo chegado a essa conclusão, deveria estar se sentindo melhor, mas Cristiano permanecia fora de si.
— É tarde — ele disse. — E discutir até as primeiras horas da manhã não vai fazer bem para você, que precisa dormir.
— Pare de me dizer o que devo ou não fazer.
— Por quê? Eu tenho razão — ele respondeu, como se tratasse de uma verdade absoluta.
— Arrogante!
Como poderia ficar ali, de pé, tratando-a como uma criança? Seria assim no futuro? Para cada preocupação de Bethany, Cristiano diria apenas: confie em mim, eu tenho razão.
Bethany não parava de pensar na mulher que sorrira para ele. Caso estivesse vestida como uma mulher negócios qualquer, talvez não fosse complicado acreditar nele, mas que mulher de negócios sai à rua com aquela calça?
Essa imagem não desgrudava de sua cabeça, sentia vontade de se afogar em lágrimas.
Cristiano a observava. Seu corpo estava rígido. Não entendia por que ela fazia tanto barulho por nada, mas recusou-se a dar o braço a torcer. Em vez disso, disse, em voz conciliatória:
— Vou ao escritório, trabalhar um pouco. Assim você poderá se acalmar.
— Não quero ficar calma, quero conversar!
— Tudo o que pode fazer é confiar, ou não, em mim. Sim, eu me encontrei com uma mulher no almoço. Mas não, não fui para a cama com ela. Agora vou deixá-la sozinha para que possa descansar um pouco. Não fique preocupada se acordar e eu não estiver aqui. Acho que deveríamos dormir em quartos separados hoje.
Logo que saiu do quarto, Bethany caiu em lágrimas.
Estava errada? Queria respostas e ninguém poderia dizer que se tratava de um pedido pouco razoável. Mas, se estava com a razão, por que se sentia como se o seu mundo tivesse virado de pernas para o ar?
Resistiu à tentação de segui-lo ao escritório e retomar a conversa onde tinham parado. O orgulho a prendeu à cama. Mas a verdade é que ele não diria nada além do que já dissera. Cristiano era muito independente e seguia sua vida de acordo com as próprias leis. Abrira mão de muita coisa por ela. Lembrou-se que suas visitas frequentes deveriam ser um eterno choque com sua agenda de workaholic. Acusara-a de falta de confiança e ela pensou que sempre seria assim, enquanto não a amasse. E isso terminou levando-a de volta aos mesmos medos e questionamentos de sempre.
Junto a esse terrível mix, havia um elemento extra: dúvida. Quantas vezes Cristiano mentira para ela? Na verdade, quanto a isto, é justo dizer que ela era especialista. Mas ainda assim, não hesitava em chamá-lo de mentiroso ou, pelo menos, encobridor da verdade.
Finalmente caiu no sono, perdida, pois em algum momento a conversa falhara e ela acabou se sentindo culpada.
Acordou às sete e meia da manhã e notou que estava sozinha na cama.
Ficou em pânico e lavou rapidamente o rosto e escovou os dentes, o que naquele momento era uma operação lenta, muito lenta, graças à gravidez avançada.
Onde estava Cristiano? Mesmo com seus pensamentos confusos, ela dormira como um bebê. Não o ouvira entrar no quarto em nenhum momento. Teria realmente dormido num dos quartos de hóspedes? Mas não havia qualquer sinal naqueles quartos. Talvez tenha saído cedo para o trabalho.
Discava seu número com dedos trêmulos ao sair do quarto, e quase morreu de susto quando ele atendeu ao primeiro toque.
— Onde você está?
Cristiano notou certa urgência na voz, e ficou satisfeito. Todo aquele questionamento fora chato, mas conseguira manter-se firme, para que seus movimentos não passassem a ser monitorados constantemente. Na verdade, passara a noite sentindo como se alguém tivesse dado um soco perfeito. Em certa hora ridícula da madrugada, entrou no quarto para observá-la. Queria deitar-se na mesma cama, mas preferiu não arriscar despertá-la. Talvez voltasse com a mesma história de antes.
— Você está de pé.
— Onde você estava? Por que não me respondeu?
— Um minuto.
Bethany ouviu o barulho de um telefone desligado e fechou imediatamente o seu aparelho. Seu coração batia como um tambor. Olhou para o celular na sua mão e, quando voltou a olhar para Cristiano, ele estava de pé na cozinha. Não o ouvira, provavelmente porque teria passado a noite trabalhando no escritório, que ficava no final do corredor. Aliviada por vê-lo, ela ficou sem ar. Queria correr para ele, cair nos seus braços, dizer o quanto o amava. Mas tudo o que fez foi perguntar:
— Dormiu bem?
E ficou olhando enquanto ele se aproximava. Estava simplesmente lindo. Ficou imaginando se algum dia se acostumaria com o enorme impacto físico que ele sempre causava nela. Cristiano não sorria, o que a deixou nervosa, pensando se ainda estava remoendo suas perguntas do dia anterior. Estivesse ou não com a razão, ela percebeu que não queria aquilo.
Até onde iria, ela ficou imaginando, ao aceitar tudo o que Cristiano pedia que fizesse? Comportava-se dessa maneira porque o amava?
— Não.
Aquela resposta simples a deixou sem ar.
— Você não parece um homem que teve uma noite mal dormida.
— Eu me saí bem...
— O que... você estava fazendo?
Não queria fazer essa pergunta, mas ela saiu sem pensar.
— Trabalhei grande parte da noite. Bem aqui, caso queira saber. Sozinho.
Cristiano tivera horas para pensar nas perguntas de Bethany, horas para analisar sua resposta imediata, e em poucos minutos chegou à conclusão de que, mesmo tendo sido encurralado, gostava daquilo. Gostava do fato de ela ter se mostrado ciumenta, pois do ciúme vem a necessidade, o que seria positivo. O hábito o levara a dar aquela primeira resposta, imediata. Era hora de dizer adeus aos hábitos, mesmo aos mais antigos, que demoram mais a morrer.
— Venha e sente-se — ele disse, fazendo com que Bethany entrasse na cozinha. — Vou preparar o café da manhã.
— Por quê?
— Você não tem fome?
— Por que não está chateado comigo? — perguntou. Imaginava que ele estaria com medo de que o bebê nascesse antes do tempo, se pressionasse Bethany. Cristiano sempre só se preocupava com a gravidez.
— E deveria estar?
— Sim, por que... por que... — e sentou-se em um dos bancos da cozinha, observando-o enquanto ele preparava uma deliciosa torrada.
— Você tem todo o direito de me perguntar o que eu estava fazendo na companhia de outra mulher — disse Cristiano, deixando um prato com a torrada na frente dela, e pegando uma cadeira para que se sentar. Bethany pegou a faca, não olhava para Cristiano, até que ele gentilmente levantou seu rosto. — Escolha entre comer ou olhar para mim.
Bethany resolveu concentrar-se na torrada. Ele estava ficando muito bom na cozinha.
— Eu confio em você — ela murmurou, com voz trêmula. — Mas estava...
— Com ciúme? — ele perguntou, interrompendo a busca de Bethany por um adjetivo que casasse com seus sentimentos.
Houve um momento de silêncio e ela deixou a torrada no prato, olhando para baixo, para o que parecia o único ponto a focar. Cristiano pegou sua mão e Bethany arriscou um rápido olhar.
— Eu também ficaria com ciúme de você — ele admitiu, com voz áspera.
— Sério?
— Sim, claro.
— Está dizendo isso porque você é o tipo de cara que enxerga as mulheres como objetos de posse.
— Posso dizer que a sua opinião está muito longe da verdade — Cristiano retrucou, levantando-se abruptamente e tirando o prato da mesa. Não queria que ela se distraísse com nada, mas que estivesse concentrada apenas nele.
— Não vou fingir que não tive as mulheres que quis... — disse, de costas para ela enquanto lavava o prato, depois alguns talheres, esfregando-os com força. Ao terminar se virou e olhou-a diretamente, apoiando-se na pia, com os pés cruzados na altura do calcanhar. Deu de ombros ao perceber o olhar de Bethany pousado no seu, mais uma vez com aquele ar de ciúme. Por muito que tentasse negar, era mais forte que ela.
— ... e nunca permiti que nenhuma delas ditasse a minha vida.
— Eu não estava...
— Tudo bem. Mas me deixe terminar — Cristiano disse, fazendo um gesto em direção à sala de estar, esperando até que ela se instalasse confortavelmente no sofá. Depois sentou-se e continuou:
— Sempre governei a própria vida. As mulheres tinham uma escolha: aceitar ou ir embora. Minhas regras eram simples. Primeiro o trabalho, e nada de dramas. Nada de esperar mais do que eu estava preparado a oferecer.
Falando sobre todas as regras que ela quebrara, Bethany ficou um pouco tonta. Ela chegou a quebrar a chamada regra número um: nada de trapaças. Antes ele aceitara tudo isso, mas será que Cristiano se cansara de ter paciência com ela? Passou os dedos entre os cabelos e olhou-a, deixando-a muito nervosa.
— Certo. Acho que quebrei uma ou duas regras.
— Esqueceu-se de outra: não me interrompa. Muito menos quando eu estiver pensando no que devo dizer.
— Que é...? — A voz de Bethany saiu como um fraco sussurro.
— Que é... — ele repetiu, encarando-a. Havia uma sensação estranha dentro dele. Sentia-se horrorizado, animado, absolutamente convencido de qual seria o seu destino. — Que é... você pode quebrar as regras que quiser. Na verdade, se não estou enganado, já quebrou quase todas, e eu não ligo.
— Não precisa me dizer essas coisas.
— O que você quer dizer?
— Sei que não quer me chatear porque estou grávida, mas isto não significa que você deva... deva...
Cristiano abriu um sorriso cálido e deixou Bethany sem fôlego.
— Você é linda. Eu já lhe disse isso? Eu me envolvi completamente, desde o primeiro minuto que coloquei os olhos em você. Até mesmo quando cheguei na Irlanda, pronto para destruí-la, você pareceu irresistível.
Bethany nada disse. Na verdade, não queria interromper aquela torrente de informações emocionadas. Não queria que aquele momento terminasse. Ficou imaginando se estragaria tudo, caso dissesse que ele também era lindo.
— Deveria ter perdido a cabeça quando você me disse que estava grávida. Nunca pensei em mudar meu estilo de vida. Nas poucas vezes que pensei em casamento e filhos, imaginei que poderia seguir minha vida sem qualquer grande alteração. Bobagem! Imaginei que teria uma mulher doce sempre por trás, fazendo o que era preciso em casa, e me deixando livre para viver como sempre vivi.
Bethany estava fascinada com a vulnerabilidade que enxergava no rosto de Cristiano. Aproximou-se para tocá-lo, e ele agarrou sua mão.
— Quando me ofereceu a opção de não nos casarmos, no entanto, logo pensei que nunca aceitaria. Queria você por inteiro — disse, encarando-a. — Não queria ser pai apenas meio período, nem participar de metade de sua vida. Certo, é duro para mim dizer isso, na verdade, jamais disse isso antes:
— Eu a amo. Acho que me apaixonei naquelas duas semanas em Barbados. Mas como saber ao certo? Jamais tinha me apaixonado antes, e para dizer a verdade, nunca imaginei que o amor poderia ser assim tão complicado, imprevisível, turbulento. Imaginei que fosse apenas desejo, algo passageiro. Depois chamei a nossa situação de dever. Dei todos os nomes a ela, menos o correto.
— Você me ama?
— Não fique tão chocada — Cristiano respondeu, defensivamente. — Tudo o que fiz nos últimos meses prova isso.
Era verdade. Bethany o abraçou e teria repetido mil vezes que também o amava, caso ele não a tivesse interrompido, sorrindo.
— Sinto muito por não ter falado nada sobre Anita — ele disse, sem dar muita importância.
— Você se sentiu encurralado — disse Bethany, em tom suave. — Não queria soar como uma mulher ciumenta.
— Você tinha todo o direito. Prefiro isto a saber que não se importaria ao me ver com outra, porque eu até mataria, caso visse você com outro homem. Daria um soco na cara dele.
Ainda nas nuvens, Bethany soube que a mulher com roupas casuais pela qual fizera tanto drama, Anita, era coordenadora de projetos de caridade na África.
— Queria que fosse uma surpresa. Estou envolvido no projeto de construção de um vilarejo na África profunda... será o primeiro de muitos — disse, sorrindo ao ver a expressão no rosto de Bethany. — Não fique tão maravilhada — Cristiano disse, dando um beijo caloroso em seus lábios. — Afinal de contas, você não contou aos seus pais que estou envolvido em projetos de caridade mundo afora? Acho que poderá decidir onde será o próximo... Sei que é boa instigadora... E não se preocupe com Anita... Ela é homossexual.
A filhinha de Cristiano e Bethany nasceu sem problemas, duas semanas mais tarde. Cristiano anunciou, com uma sinceridade que fez Bethany sorrir, que se apaixonara mais uma vez. Helena Grace era gorducha, com os cabelos fartos da mãe e os lindos olhos escuros do pai, com incríveis cílios. Os avós ficaram loucos com a primeira neta de ambos os lados, os planos de casamento foram discutidos em detalhes, com Cristiano e Bethany observando, animados, e contribuindo com tudo o que fosse necessário, mas sempre loucos para voltar à sua cama, todas as noites.
Com a filha entre os dois, antes de ser cuidadosamente transferida ao moisés, que era sempre deixado ao lado da cama, discutiam sobre deixar Londres e viver em um lugar não muito distante, mas menos agitado.
— Nunca imaginei — disse Cristiano, pensando alto mais de uma vez — que algum dia pensaria em escapar da vida frenética do meu trabalho em Londres. A culpa é sua, minha bruxinha querida...
Bethany estava tão feliz, que assumiu essa culpa.
Cathy Williams
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