Donovan O´Roark é um vampiro solitário e atormentado, pela traição de sua gente, sua família e sua cidade, e pela perda do único amigo que havia conhecido, assassinado pela traição da mulher amada.
Rachel Sullivan é uma irlandesa que volta para casa depois de estudar nos Estados Unidos, para elaborar sua tese sobre uma antiga lenda local, que fala de um monstro, um vampiro. Porém ela, desde pequena, não compartilha a visão dos que a rodeiam, enamorando-se desse misterioso personagem, que ela considera seu protetor.
Donovan regressa a seu castelo na cidade de seus ancestrais, sentindo seus temores, empurrado pelo desejo de rever aquela pequena convertida em uma total mulher.
Campina irlandesa, 1808
Caminhava através da trilha essa noite como fazia sempre. Cansado de trabalhar nos campos de meu pai e coberto por uma capa de terra irlandesa que se estendia por minha pele e impregnava meu suor. Meus músculos estavam doloridos, mas era uma dor boa. Daquelas que vinham de desfrutar a força e o vigor próprios, só que não havia isso ultimamente. Havia estado padecendo ataques de debilidade, minha cabeça começava a girar até que algumas vezes desmaiava frio como um cadáver. Mas hoje havia sido diferente. Hoje me sentia bem, seguro de que minha enfermidade havia acabado.
E para prová-lo, trabalhei como um cavalo nos campos de meu pai. Durante todo o dia dei alento a meus irmãos e primos para manterem o passo, desafiando-os a seguirem meu ritmo e rindo-me deles quando não conseguiam. Ao final, mantive empunhada minha enxada até muito depois de que os outros deram por terminada a sua jornada.
Assim que agora caminhava só.
O outono estava no ar, trazendo consigo a colheita. Correu por baixo dos meus pés e enviou seus aromas enquanto caminhava pelo pomar de abóboras cinza-azuladas tão grandes como o pote de estufa da mãe e as laranjas que se aferravam regularmente a suas folhas. Tínhamos que recolhê-las amanhã. A avó nos disse que viria uma geada terrível antes do próximo sábado.
Uma geada terrível.
Um pequeno calafrio percorreu minha nuca enquanto, por alguma razão, as palavras se repetiam por si só em minha mente. Era uma tontura, claro. Passei muitas noites quando era menino aninhado sobre uma almofada de malha em frente ao fogo escutando os contos de minha vó. Nesta época do ano, gostava de contar histórias cheias de medo, fantasmas e monstros. Suponho que alguns destes relatos ficaram em minha mente. Embora seja agora um homem de vinte e tantos anos, ainda me estremeço com suas histórias. O modo como sua voz mudava enquanto falava e a maneira em que seus olhos azuis se entrecerravam como se estivesse compartilhando algum segredo escuro, enquanto a luz do fogo projetava sombras que bailavam sobre seu querido e assoberbado rosto.
― Ocorreu em uma noite igual a esta, criança. Quando tudo parecia estar bem e tranqüilo. Até um tonto evitaria caminhar depois do anoitecer durante a temporada da colheita. Por que o véu entre o mundo dos vivos e dos mortos torna-se fino... e se rompe... e...
- Silêncio avó! – sussurrei. Mas uma brisa fria acariciou meu pescoço e fiquei arrepiado enquanto me apressava. Afundei minhas mãos dentro dos bolsos, baixando os ombros e apertando o passo. Algo avançou pelo caminho e movi minha cabeça rapidamente para a direita.
- É só o vento – disse e então comecei a assoviar.
Até um tonto o evitaria. És um tonto, Donovan O’Roark?
Sacudi a mim mesmo e agilizei o passo. Senti uns olhos sobre mim... alguém, ou talvez algo, me observava dentro da fresca e escura noite.
Um lobo ou talvez uma coruja. Disse-me que não era nada e que não havia razão para ter medo, mas minha respiração começou a se aglomerar em minha garganta antes de sair e formar grandes nuvens. Meu coração começou a bater rapidamente.
Então chegou a tontura.
O solo se movia ante mim, embora sei que nunca se fez na realidade. Comecei a cambalear, haveria caído sobre as ervas daninhas a um lado do caminho se não tivesse conseguido firmar minha mão contra uma árvore fechada. Com a palma apoiada contra o suave e cálido tronco e minha cabeça pendurando, lutei para recuperar o fôlego e não perder a consciência.
A árvore falou.
- Que vergonha pequeno, pensei em esperar... mas vejo que a tarefa deve ser realizada esta noite.
Levantei a cabeça e apartei minha mão, não era árvore e sim um homem. Embora... não era um homem. Seus olhos negros eram um turbilhão de infinita escuridão na noite, seu cabelo era negro como a fuligem e ficava azul escuro quando iluminado pela luz da lua. Seus lábios eram grossos e de um roxo cereja. A palidez de sua pele me impactou. Não se via enfermo, nem como um morto, senão formoso e refinado como se fosse uma delicada obra de arte feita de granito branco. Parecia como se fosse parte da luz da lua.
Retrocedi um passo, as folhas rachadas e a brisa acariciaram meu cabelo. Prontamente o vento se intensificou... quase como se supusesse que algo terrível ia acontecer nesta noite de outono...
... o véu entre o mundo dos vivos e dos mortos torna-se fino... e se rompe...
Me afastei rapidamente.
A criatura só sacudiu sua cabeça.
- Não fuja. Não te ajudará.
- Quem é você? – lhe perguntei – O que quer de mim?
Seu sorriso era triste e amargo.
– Muitas coisas, Donovan. Muitas coisas. Mas agora... só uma. – Estendeu seu braço, embora não tenha visto suas mãos se moverem. Simplesmente estavam aí em um momento, movendo-se expressivamente enquanto me falava e no momento seguinte agarravam minha camisa simples. Lutei contra ele, mas me arrastou facilmente perto dele e minha luta deu em nada. Eu não era um homem pequeno nem débil, apesar de minha recente enfermidade. Era uma cabeça mais alto que meu pai e o homem mais alto de nossa aldeia. Meus ombros eram largos e bem formados por uma vida de trabalho duro. Nunca havia conhecido um homem ao que não pudesse vencer até o momento.
Contudo, este homem, esta coisa, me arrastava para ele como se fosse uma criança. Aproximou-me mais, me cercou mais inexoravelmente, mesmo quando me retorcia e lutava por minha liberdade. Ele se curvou sobre mim. O medo se apoderou do meu coração, quase detendo seus frenéticos batimentos. A dor se disparou em meu peito, por baixo do meu braço esquerdo e eu não pude respirar.
Então senti sua boca em meu pescoço... seus lábios separando-se e a imensa dor quando seus dentes se afundaram profundamente na pele de minha garganta. A dor desapareceu quase tão rápido como apareceu enquanto desaparecia também tudo o mais. Tudo o que me rodeava, desde a suave melodia dos grilos ao cheiro das folhas em decomposição. Já não sentia o ar frio do outono.
Houve três coisas das quais permaneci consciente, três coisas que encheram todos os meus sentidos. Escuridão. Silêncio. E a sensação de sua boca em minha garganta, drenando-me a vida.
Então, inclusive essas coisas desapareceram.
- Donovan! Donny, pequeno! Desperta! Desperta!
Alguém me agarrou pelos ombros e me agitou. Os gritos de meu pai chegaram aos meus ouvidos, mais fortes que nunca, mas, com pânico e temor. Havia um sabor em minha boca, era salgado e saboroso. Limpei meus lábios com a palma da minha mão ao tempo em que tentava abrir os olhos. Quando olhei minha mão vi sangue, resplandecendo a luz da lua.
- Que havia feito? Que...?
Pai me tomou em seus velhos braços, os que não deveriam ter a força para levantar-me. E cambaleando-se por meu peso, me carregou para a aldeia gritando por ajuda. Um momento depois vieram outros, meus vizinhos e amigos, Alicia, a moça com quem sonhava todas as noites, com seus cachos cor âmbar e seus olhos de gato tão verdes como a própria Irlanda, minha mãe e minhas irmãs. Meu corpo era agora carregado por um vizinho que aliviou a carga a meu pai enquanto me colocavam na casa. Recostaram-me sobre um estrado, enquanto minha mãe fazia muitas perguntas. Mas ninguém pode contar. Ninguém sabia o que me havia acontecido na trilha esta noite. Só eu e outra alma. Um monstro, uma criatura de pesadelo e dos contos da avó.
A avó. Ela poderia saber o que havia passado, o que significava isto. Busquei sua voz entre as outras, mas passou um momento antes de poder ouvi-la. E seu tom lúgubre não fez nada para tranqüilizar-me.
- Só pode ser o diabo – sussurrou ela -. Estamos nas vésperas do dia de Todos os Santos. Rapaz tolo, caminhar só esta noite dentre todas as noites.
Mãe a silenciou impacientemente, mas eu vi a maneira em que se enrijeceu com as palavras da avó. Ela pegou uma lâmpada, colocou a um lado do homem com uma cotovelada e se inclinou sobre mim para me ver por si mesma. Então minha mãe lançou um grito apagado e se retirou um pouco, seus amorosos olhos se alargaram.
- Deus bendito, há sangue em seus lábios.
- Sim – disse meu pai -, mas o que quer dizer isso?
Minha mãe não disse nada. Gentilmente suas mãos colocaram minha camisa a um lado em busca de lesões. Obriguei a meus olhos a manterem-se abertos, embora o sono... Ou era a morte? ... me chamava, me atraía rumo a ela igual tinha feito o estranho. Logo não podia seguir lutando.
Mãe baixou o olhar para mim, o medo crescia em seus olhos, embora pudesse ver como tratava de ocultá-lo de mim.
- Estarás bem, meu pequeno. Encarregarei-me de fazê-lo. Vais estar...
Enquanto falava, retirava meu cabelo para um lado. Era tão largo que me pesava nos ombros, grossos e castanho-escuros. Minha mãe levantou as pesadas mechas e seus olhos mudaram. Como se a chama do amor cintilasse... uma chama intermitente. Mãe agarrou um trapo de pano, murmurando uma oração na antiga linguagem enquanto limpava o sangue de minha garganta com uma manto e com a outra levantava a lâmpada. E então, gritou:
- O diabo! Monstruosidade do diabo! Tirem as crianças da casa, tem a marca de Satã!
Senti que meus olhos se alargaram enquanto sua cara se enchia de ódio. Levantei uma mão para ela e ela retrocedeu.
- Mãe? O que passa contigo? Sou eu, teu filho, Donovan...
Mas ela negou com a cabeça, seus olhos estavam fixos em um lugar de minha garganta onde a criatura havia se alimentado e continuou retrocedendo.
- Morre, Lucifer – me sussurrou. Era seu filho, seu primogênito. Não podia acreditar que me havia dito isso, não podia crer no ódio que via em seus olhos
-. Tu não és meu filho e tampouco és digno de estar em seu pobre corpo. Morre ou prometo que te matarei eu mesma.
Lutei para conter-me. Mas suas palavras... a impressão que me causaram. Bastou isso para que deixasse de me aferrar à vida. E me entreguei a escuridão. A morte.
Esta vez a escuridão durou muito mais, embora não fui consciente de quanto tempo passou. Somente sabia que me sentia limpo quando comecei a regressar a vida. Meu corpo, minha roupa... estavam frescos. Cheirava a brisa e a madressilva. As roupas que vestia não eram ásperas como os tecidos que vestia no dia-a-dia. Mãe me vestiu com um fino traje que ela mesma havia feito e que só me permitia usar em ocasiões importantes.
Ouvia vozes, sentia as familiares fragrâncias das ceras das lâmpadas e candelabros. E flores, muitas flores. Alguém tocava um violino, deslizando o arco sobre as cordas em um lento e fúnebre choro. Ouvia o tilintar dos vasos e cheirava uma boa cerveja e comida. Lentamente, consegui abrir os olhos. Nunca devia have-lo feito. Porque me dei conta de que estava dentro de um caixão. Estava feito a mão, provavelmente por meu pai. O caixão havia sido colocado em cima de uma mesa na taberna de O’Connor. As mulheres passavam com a cabeça baixa e as lágrimas umedecendo as bochechas. Os homens permaneciam quietos bebendo cerveja. Sean Ryan estava em uma esquina com seu violão embaixo de sua barba e os olhos cerrados. Alicia, a moça que eu frequentemente beijava quando seu pais não estava olhando, estava sentada em uma cadeira com o olhar perdido.
O padre Murphy estava em frente ao caixão dando-me as costas e tinha um livro de orações aberto. Clareando sua garganta, chamou a atenção de todos.
- Donovan O’Roark foi um homem bom, mas o diabo o atacou em sua juventude...
Por piedade, estão me dando um funeral!
- Não padre – falei tão forte como pude -. Estou vivo... pai, mãe, sou eu...- lutei para poder sentar-me.
Alguém gritou na habitação e se fez um silêncio sepulcral. O padre Murphy me enfrentou, branco como um espectro e se persignou horrorizado. Alice se pôs de pé num salto e gritou:
- Matem-no! Matem-no antes que destrua nós todos.
- Não – falei -. Não sou um demônio. Sou eu, Donovan O’Roark, alguém quer me escutar?
- Levem as crianças e as mulheres para fora – disse o padre Murphy e pela primeira vez pensei que se via como um poderoso profeta da antiguidade. Sua voz quase sacudiu as paredes ou talvez para minha audição que estava alterada, porque todas as vozes me soavam mais fortes e claras. E o violino...
Não havia tempo para pensar nisso porque Sean, meu melhor amigo, e outros jovens começaram a tirar as mulheres da taberna. Minha mãe ficou atrás olhando-me e depois a meu pai.
– Sabes o que temos que fazer.
Pai assentiu e minha mãe correu para fora. Pus minhas mãos em cada lado do ataúde, para poder sair dele e pensando em como todos ririam uma vez que se dessem conta dos tontos que estavam sendo e ...
Pai me empurrou para dentro. Forte e cruelmente. Nunca me havia tocado de forma tão brutal. Pisquei impressionado. Então me congelei, literalmente senti o gelo correndo por minhas veias enquanto via o padre Murphy pegar uma estaca de madeira de algum lado fechado, murmurando.
- Sua esposa tinha razão, O’Roark.
Graças a Deus que estávamos preparados para isto. – Pressionou a ponta da estaca sobre meu peito e meu pai, meu próprio e querido pai, lhe entregou o maço. Lá fora eu podia ouvir minha mãe soluçando suavemente e a moça com quem planejava casar-me algum dia gritar.
– Mata-o, mata-o agora!
O padre Murphy levantou o maço. Não sei de onde tirei força ou não sabia nesse momento. Suponho que o atribuí ao pânico ou ao medo em vez de a qualquer coisa sobrenatural. Mas quando empurrei contra as mãos que me sustentavam – as de meu pai – senti muita pouca resistência. Saí desse caixão com a força de um maremoto e aterrisei sobre meus pés longe deles dois. Meu fiel confessor e meu próprio sangue. Os que desejavam executar-me.
- Pai, como pode me fazer isto? Que tenho feito para merecer...?
Ele não é seu filho – disse o padre Murphy -. Ele é o diabo, o demônio que levou a teu filho. Não lhe faça caso.
- Mas sou teu filho! Pai, olha-me!
Pai me olhou. – Afasta-te de mim satanás.
- Pai, sou eu, teu primogênito...
Voltou a enfrentar-me com os olhos injetados de sangue. Tomando a estaca e o maço das mãos do sacerdote acercou-se de mim e não deixou dúvidas de que queria matar-me. Girei e corri para a porta principal, a única porta, e para a multidão de rezadeiras que se haviam chamado, meus amigos, família e mulher.
- Atrás dele! – alguém gritou - Não pode escapar!
Eu escapei. Empurrando-os a um lado facilmente, corri mais rápido do que me achava capaz enquanto ouvia a perseguição. Alguns haviam ido buscar seus cachorros e outros estavam montando seus cavalos. Vi o piscado das tochas alaranjadas acercando-se enquanto corria por minha vida. E eles seguiam acercando-se. Alguém me pegou pelo pé e me introduziu nos arbustos que estavam junto do caminho. Levantei meu olhar e percebi que era a mesma criatura que havia provocado tudo isto. Abri a boca para maldizer sua existência. Ele a cobriu facilmente, me aquietando e arrastando-me mais para dentro da vegetação. Um segundo mais tarde passou a estrondosa multidão disparando, maldizendo-me e prometendo destruir-me da forma mais horrível que se possa imaginar. Chamando-me de “Satan”.
Meu captor já não necessitava mais me sujeitar, porque não me moveria. Relaxei no chão, baixando a cabeça enquanto as lágrimas queimavam meus olhos. Meus perseguidores se haviam ido. Meu assassino ainda estava ali, mas isso não mais me importava.
- Mate-me se assim queres – ofereci -. Não tenho razão para viver.
-Estás completamente equivocado, Donovan – disse, e atirou de meus braços para me por em pé. Suas fortes mãos me sujeitaram bruscamente, mas não senti medo algum -. Estavas morrendo anteriormente. A debilidade, a enfermidade, os desmaios.
Levantei o olhar abruptamente.
- Oh, sim estive te observando. Estaria morto em uns dias. Mas tu... não querias morrer – baixou sua cabeça e a sacudiu -. Raramente tenho conhecido a um homem com tanta vontade de viver e tão enamorado da vida como tu, meu amigo.
Franzi o cenho e sacudi a cabeça.
- Então por que trataste de matar-me?
- Não estava tratando de matar-te, Donovan. Estava dando-te a vida. Agora não morrerás. Não podes.
- Eu... não posso...?
- Bom, há certas maneiras, mas... escuta-me rapaz. Tomei teu sangue, te drenei ao ponto de morrer. E então, te alimentei de minhas próprias veias e te enchi uma vez mais. É assim como um presente escuro compartilhado, como uma entrega.
- Presente escuro. Não sei...
- Imortalidade – contestou-me.
Fiquei ali, piscando confundido e olhando fixamente a este homem. Sua cabeça negra estava perfilada por uma lua de Halloween e rodeada pelos ramos sem folhas e com forma de garras das adormecidas árvores. Havia um pomar de abóboras às suas costas e uma coruja cantava a minha morte desde longe. E creio que foi então quando finalmente compreendi o que ele estava a ponto de me dizer.
- Meu nome é Dante, e eu sou um vampiro.
Eu fiquei sem alento, mas ele tomou minha mão firmemente e a sacudiu. – Teu nome é Donovan – me disse pacientemente, como se fosse um professor ensinando a um estudante lento
- E desde esta noite, tu também és um vampiro.
Rachel Sullivan entrou de maneira despreocupada no pub de O'Mallory como se nunca tivesse ido e ignorou o silencio que recaia por onde ela passava. Os copos deixaram de tilintar e os homens deixaram de contar suas histórias. Vários pares de olhos a seguiram enquanto se deslizava a parte traseira da habitação e tirava um avental branco de um gancho. Por trás do deslumbrante bar de mogno, Mary cruzou os braços sobre os peitos e sorriu. Rachel ajustou seu avental e deu a volta, passando uma olhada pelas mesas redondas de madeira e os rostos familiares em cada uma delas.
- Por que estão tão emudecidos? – Perguntou sacudindo a cabeça - Eu disse que regressaria e o fiz. Assim, cerrem a boca bebam sua cerveja. – Girou agilmente para a barra, agarrou uma bandeja com duas espumosas canecas de cerveja que havia em cima, olhou para os homens cujos copos estavam vazios e se acercou para repor suas bebidas. A fala recomeçou e estava principalmente dirigida a ela. Homens sem barbear que haviam conhecido a seu pai lhe davam as boas vindas pelo seu retorno. Mulheres de cabelos cacheados lhe perguntavam acerca dos Estados Unidos enquanto ela ia e vinha com sua bandeja carregada. Rachel soltou um largo suspiro e, pela primeira vez no que pareceu uma eternidade, sentiu que a tensão abandonava seu corpo. Estava em casa, realmente em casa. E se sentia bem. Melhor que a licenciatura que lhe havia custado tanto conseguir. Melhor que tudo desde... Desde antes de ir-se.
Havia estado assustada e meio esperando que os aldões se sentissem receosos com ela agora, mas o rápido regresso a normalidade no pub lhe dizia que seu medo era infundado. Certamente os habitantes de Dunkinny não gostavam dos forasteiros. Oh, e ocasionalmente chegavam turistas a esta isolada aldeia, particularmente aqueles com apelidos irlandeses que vinham descobrir suas raízes. Os aldeões eram dos mais amáveis, mas sempre reservados. Precavidos. Embora Rachel tenha nascido e se criado aqui, havia ficado órfã neste lugar e os aldeões a tomaram sob sua proteção. Se entristeceram quando ela os deixou, mas não se enraivaram. Com uma exceção, - Marney Neal – que insistia em casar-se com ela. Mas ele não se encontrava aqui esta noite, observou com alívio. E os demais a haviam acolhido sem pensar duas vezes. Haviam passado oito anos, mas não a considerava uma forasteira.
- Bem vinda a casa, Rachel. – Mary, que era a dona do lugar e da pensão contigua desde que Rachel se lembrava, lhe deu um forte abraço, dando-lhe pequenos golpes nas costas com entusiasmo. – Te reservei tua velha habitação. Vejo que retornarás ao antigo trabalho.
Rachel não tinha coração para dizer-lhe que era por pouco tempo. Só até que houvesse escrito sua tese, o passo final para ganhar o doutorado. E logo ela...
O que? Se converteria na antropóloga social mais destacada do mundo? Ensinaria cadeiras em uma universidade Ivy League nos Estados Unidos? Cerrou os olhos e inalou a essência do fumo do charuto de Russel Finnegan, a cerveja fresca e o esterco de ovelha nas botas de Mitch Marley. Quando voltou a abri-los, olhou em direção a janela e observou o desgastado caminho que fazia às vezes de estrada na pequena vila, as colinas ondeantes de cor esmeralda e mais distante o castelo em ruínas – O Castelo Dante -. Este estava situado no meio de um nevoeiro fantasmagorico tão inquietante com a lenda que acompanhava o lugar. A história na que basearia sua tese. Mais além do castelo estava às rochas e abaixo o mar verde azulado. Era essa a razão por que havia regressado. Para ver o castelo uma vez mais.
Quando era uma menina, havia acreditado nas histórias. Mas no fundo do seu coração, nunca havia aprovado a censura dos aldeões para com os homens que uma vez viveram ali. Podia jurar que um desses homens havia vindo a ela. O havia encontrado em duas oportunidades durante sua infância ou nisso havia acreditado durante muito tempo. A primeira vez aconteceu uma noite anos atrás quando quase se afoga no rio. Um desconhecido escuro a havia tirado da água, lhe havia feito respiração boca a boca, tinha cuidado suavemente até que chegaram os demais, logo havia desaparecido antes que pudesse lhe agradecer. A segunda vez aconteceu depois da morte de seus pais. Encontrava-se recostada em sua cama, desperta e assustada, incapaz de conciliar o sono e sentindo-se mais só mais do que ninguém havia se sentido jamais. Ele havia vindo a ela, havia sustentado sua mão e lhe havia dito que não estava só absolutamente, tinha um guardião que velava por ela, sempre protegenria, e que nunca devia temê-lo. Apenas havia visto seu rosto na escuridão, mas em sua mente, havia acreditado que se tratava de Donovan O’Roark ou seu fantasma. E se apaixonou por ele.
Sempre o havia amado. Inclusive depois de dar-se conta de que as recordações de sua infância eram sonhos e que não existiam coisas como vampiros. Ela havia reservado um lugar em seu coração para a fição da lenda. E enquanto estivesse na vila, visitaria o castelo uma vez mais... talvez só para assegurar-se de que ele não estava realmente ali, esperando seu regresso.
Estava há duas semanas na vila quando ele apareceu. O ar era fresco, com o frio sabor do inverno nele. Ainda assim, as portas do pub se mantinham abertas, para deixar sair a fumaça dos charutos e entrar ar fresco. O fogo rugia na lareira de Mary e mantinha o frio fora. Nesse momento, fez-se um silêncio incômodo, diferente do amigável silêncio gerado pelo inesperado retorno de Rachel. Então, ela havia percebido o sorriso em seus olhos e sentido que lhe davam a boa vinda. Agora sentiu algo gélido deslizando-se por sua coluna vertebral. E quando se voltou para seguir os olhares curiosos, viu o estranho caminhando pelo caminho escuro. Ela se deteve e olhou fixamente na distância, rumo à gigantesca e escura silhueta do castelo. Mitch Marley fez um som ordinário, Russell Finnegan ficou boquiaberto e seu charuto caiu de sua boca na mesa, sem ele o notasse.
A tensão que encheu a habitação, e a ela também, era ridícula e desnecessária.
- Havia esquecido – murmurou -, os supersticiosos que são todos vocês. Olhe-os, observando a esse homem como se fosse Donovan O’Roark que regressou de entre os mortos! Mary se benzeu.
— Disseste que não crê nas velhas histórias agora que é estudada, Rachel sullivan?
- As velhas histórias são só isso. Velhas histórias e nada mais. Provarei. – Rachel deu um passo em direção a porta aberta com as mãos nas costas e saiu. – Não sei onde te diriges estranho, mas se é comida e uma cama quente que buscas, não o encontrará em outro lugar que não seja este.
- Senhor, protege-nos de nossa criança desavergonhada - murmurou Mary.
—Intrépida como sempre — concorsou alguém.
Mas Rachel os ignorou, porque o homem estava girando para olhá-la. A noite estava escura, sem o resplendor da lua para ajudá-la a estudar o seu rosto. Só pôde ver uns olhos escuros refletindo o brilho da luz suave que vinha do pub; o resplendor do fogo e da luz das lâmpadas. Mary detestava o brilho das lâmpadas elétricas na noite, mas Rachel suspeitava que o que realmente Ela detestava eram as faturas.
—Venha para dentro — repetiu Rachel, desta vez mais baixo porque acreditou que podia escutá-la perfeitamente - esquenta-te com o fogo. E mostra a estes meus amigos que não és o monstro do seu conto popular favorito.
Fiquei parado ali, pasmado até os ossos. Assombrado de que ela me houvesse falado, já que sabia os supersticiosos e desconfiados que eram os habitantes de Dunkinny com os forasteiros. Ou ao menos assim eram quando veio pela primeira vez, quase uma centena de anos atráz, e o seguiam sendo cada vez que havia regressado. As pessoas das aldeias solitárias como esta não tendem a mudar de maneira excessiva, mas ela era diferente. Sempre havia sido diferente. Me pareceu irônico. Eu havia sido um deles e essa cautela, essa desconfiança com os forasteiros, todavia permanecia em mim. Contudo, me haviam traído muitas vezes para deixar ir. Este fato, o fazia cada vez mais forte. Então por que me detive? Por que me voltei para olhá-la quando me falou? Minha reação natural houvera sido continuar caminhando, nunca me deter.
Mas me detive. Em parte por causa de sua voz, pura e sedosa, como o ritmo da Irlanda e este povo. Um acento tão familiar e querido para mim. E aterrador ao mesmo tempo. Essa era a voz de minha gente, aqueles que me chamaram demônio e trataram de me matar. Os mesmos que logo mataram ao melhor amigo que tinha tido. Mas também era a voz da pequena menina pela qual havia velado muito tempo atráz, mas agora havia crescido. E de alguma maneira, seguia sendo a mesma. Ela voltou a falar com seu tom altaneiro, travesso e tentador. E então a olhei, vi sua silhueta na entrada, rodeada de um resplendor dourado. Sua pele era negra, larga e selvagem. Havia visto ciganas menos fascinantes.
- Vem – disse.
E como se suas palavras tivessem alguma espécie de poder sobre mim fui. Apertou minha mão quando estive ao seu alcance e me levou para dentro. Tinha umas unhas largas e vermelhas, me agradaram, e também o calor de sua pequena e forte mão. O comichão erótico que sentiu percorreu seu corpo. Também gostou disso. Sabia que era melhor não sucumbir a ela estando tão perto, seria iniciar tudo... outra vez. Mas de todas as formas me agradou.
Com o passar dos anos, havia mudado, embora não drasticamente. Sim, minha pele era mais pálida. Depois de tudo, não havia sentido o toque do sol desde quase dois séculos. Contudo, depois de me alimentar minha pele recuperava sua saúde e o brilho rosado durante algumas horas. E havia me alimentado bem esta noite. Assim, quando me levou para dentro, não houve chiados de baderna por minha aparência. Me acomodou em uma cadeira de madeira perto do fogo e então notei que este pub estava exatamente no mesmo lugar onde havia estado o outro. A taberna de O'Connor. No lugar de meu funeral. No lugar onde meu pai tratou de matar-me. Fez um nó na garganta, mas o forcei a desaparecer.
- Aqui, o vêem? – dizia a garota com as mãos apoiadas nas cadeiras, as que ondulavam atrativamente cada vez que se movia. Agitou uma mão em minha direção. – É só um turista, não uma lenda voltando a vida. – Voltou a me enfrentar – Diga-nos estranho, qual o seu nome?
Esclareci a garganta.
—O'Roark —disse. E esperei, curioso para ver suas reações.
A mulher roliça deixou cair uma jarra de cerveja que se estrelou contra o solo, espalhando o líquido ambarino e a fragrante espuma ao redor de seus pés. A menina me olhou fixamente, inspecionando meu rosto com uma intensidade que me sacudiu. Mas não pode me reconhecer. Ela nunca havia visto meu rosto o suficiente bem para distinguí-lo agora. E finalmente sorriu com um brilho em seus olhos e inclinou a cabeça a um lado.
—O'Roark, certo? Outro mais? Diga-me senhor O'Roark, acaso tem viajado desde os Estados Unidos em busca da história de sua família?
Sorri levemente, incapaz de conter-me. Era uma mocinha tão divertida...
- Acaso meu acento se atenuou tanto que pareço com um americano para você? – lhe perguntei.
Ela encolheu os ombros descaradamente.
- Só sei que não é de Dunkinny, já que conheço a todos no povo.
- Tem vivido aqui muito tempo, certo?
- Nasci aqui, também meus pais e os teus, por cinco gerações.
- Também os meus.
Ala franzou o cenho e aproveitei este tempo para estudar seu rosto. Tinha traços delicados e osso finos. Embora seus lábios fossem cheios e seus olhos grandes para seu rosto pequeno.
- Está dizendo que é descendente de nossos O'Roarks?
- Tanto é que herdei o castelo.
Por fim a havia surpreendido. Os demais haviam estado incômodos desde o momento em que entrei, mas ela não. Embora agora o visse. O alargamento de seus profundos olhos verdes, a repentina palidez em suas bochechas.
- Está mentindo – me acusou, embora o fez suavemente.
Neguei com a cabeça.
- Então quere saber da lenda – anunciou Mary.
- Isso, fala-lhe da lenda, Rachel! Pode ser que seja um forasteiro, mas nenhum homem deveria perder o tempo naquele lugar sem haver sido advertido.
Rachel. Ela havia convertido em seu nome. Um nome tão indômito e tentador como a mulher que era.
Ela inclinou a cabeça para um lado.
- Ele já o sabe – aventurou me estudando, observando minha reação.
- Como pode estar segura? – lhe perguntei -. Diga-me Rachel. Qual é essa lenda que parece pô todos tão nervosos? A todos... exceto a você, ou isso é o que parece.
Ela se recuperou rapidamente, recobrando o dinamismo em seus passos, tomou duas jarras de cerveja da barra e as trouxe para a mesa. Depositou uma diante de mim. A outra, a bebeu até o final, limpou a boca com as costas da mão e se inclinou na cadeira que havia trazido.
Detrás dela o fogo rugia e dançava.
- Faz muito tempo, Donovan O'Roark, o filho de um granjeiro querido por todos, caminhava para casa vindo dos campos. Ia só pelo caminho depois do pôr-do-sol, na véspera do dia de Todos os Santos.
Senti que um calafrio percorria minha coluna e recordei breve e vividamente a minha avó, a forma em que ela interpretava suas histórias diante do fogo, na noite. Histórias nas quais nunca acreditei.
- Mas o pobre Donovan não chegou ileso em casa essa noite, já que uma criatura o atacou. – Ela se deteve, observando a habitação. Eu também o fiz, vendo a atenção refletida em cada rosto. Embora estou seguro de que todos já haviam escutado a história centena de vezes. – Um vampiro – disse, soltando um largo suspiro.
Elevei as sobrancelhas exageradamente, com a intenção de mostrar meu ceticismo.
- Um vampiro – repeti.
- Com efeito. O jovem morreu essa noite, mas não permaneceu morto por muito tempo. Levantou-se do seu caixão em seu próprio funeral! Já não era um mortal, mas uma criatura como aquela que o criou. Os aldeões trataram de matá-lo, mas era demasiado forte, e escapou na escuridão da noite e se sumiu.
Levei a jarra até minha boca fingindo beber a cerveja e a saboreei lambendo meus lábios quando baixei a jarra novamente.
- Ainda não entendo o que tem o castelo a ver com isto.
- Ah, é um tipo impaciente certo?
Me limitei a encolher meus ombros e a deixei continuar.
- Donovan não foi visto outra vez. Não durante cem anos. Mas todos conheciam sua história. Então, algo aconteceu. O senhor do castelo - Então disse o endereço do castelo -, era um italiano rico, alguns dizem que era um nobre. Seu nome era Dante, então como se supõe que esse castelo terminou nas mãos da família O'Roark?
Sorri, porem não disse nada. Rachel deixou passar.
- Ninguém nunca havia suspeitado nada mal de Dante. Ele era reservado e assim gostavam os aldeões.
- Apesar de que era um outro forasteiro – ele adicionou.
Ela me olhou com curiosidade.
- Uma noite uma jovem mulher, que havia sido contratada para trabalhar no castelo em algumas ocasiões, saiu correndo de lá de acima, histérica. Gritava e chorava. Dois fios de sangue provenientes de duas pequenas perfurações em seu pescoço desciam por sua formosa garganta.
Não a interrompi, apesar de que suas palavras fizeram com que me sufocasse frente ao desejo de escapar. Dante nunca havia feito mal a moça. Ele a havia adorado, amado até a distração e ao final, tinha feito a única coisa que me advertido repetidamente a não fazer. Havia confiado nela.
Rachel bebeu de sua cerveja.
- A moça disse que Dante era um monstro que dormia em um caixão durante o dia e se alimentava de sangue durante a noite. Que a tinha atacado, tentado deixá-la seca, mas ela escapou.
- Alguém se perguntou – disse incapaz de permanecer em silêncio por mais tempo – como uma jovem com ela pode escapar de uma criatura como ele?
Ela franziu o cenho.
- Quer escutar o resto ou não?
Assenti. Ela continuou.
- A moça disse que Dante não estava só ali em cima. Disse que havia outro com ele e esse companheiro não era outro senão Donovan O’Roark.
Na habitação todos assentiram, murmurando em acordo.
- Os aldeões discutiram o que teria que se fazer enquanto a jovem Laura lhes rogava que destruíssem os monstros. Finalmente, entraram em acordo e justo antes da madrugada, foram em direção ao castelo, armados com tochas e azeite, e queimaram o lugar. – Quando ela disse, me pareceu que havia sufocado um calafrio.
Recordava tudo muito bem. As chamas e a repugnante compreensão de que a mulher que Dante tinha amado o havia traído da pior maneira possível e sua expressão aflita quando ele também compreendeu. Eu conhecia essa dor muito Bem, porque a tinha sentido quando minha própria família e a mulher que amava me haviam feito o mesmo.
- Os vampiros foram forçados a escapar, e quando o fizeram o sol já tinha saído. E o castelo tem pertencido a um O'Roark desde então. –Ela se deteve. Senti sua mão em meu braço. - senhor O'Roark?
Abri os olhos, compreendendo que os mantivera cerrados.
- Se encontra bem?
- É... é uma história aterradora. Espantosa.
- Mas é só uma lenda, como tenho tratado de dizer a estas boas pessoas.
Assenti.
- Adiante, termina-a. o que aconteceu com as vítimas?
Ela alargou o pescoço.
- Vítimas? – baixou o olhar e suavizou a voz, então disse -. Pensei que ninguém os veria dessa forma. Mas está certo, isso é exatamente o que foram. – Seus olhos encontraram aos meus outra vez, sua voz se normalizou. – Em qualquer caso, eles escaparam em diferentes direções, mas podia ver a fumaça brotando de suas roupas quando se foram. Os aldões acreditaram que ambos tinham morrido, queimados e reduzidos a cinzas pelo sol – Sacudiu a cabeça, quase tristemente -. Mas não muito depois, uma equipe de homens chegou para trabalhar no castelo e quando se perguntava só diziam que um homem chamado O'Roark os havia contratado. Os aldeões acreditaram que era Donovan que tinha regressado da morte pela segunda vez. Todos diziam que ele regressaria algum dia para vingar-se dos aldeões de Dunkinny pela morte de seu amigo.
Ela respirou fundo e durante um largo momento ninguém falou, ainda enfeitiçados pela história. Mas Rachel rompeu o silêncio um instante depois.
- Estou segura de que a maioria dos lugarejos estão especulando sobre a possibilidade de que você seja ele. Diga-lhes seu nome, O'Roark. Alivie suas supersticiosas mentes.
Sorri gentilmente e depositei o dinheiro sobre a mesa para pagar minha cerveja sem terminar. Logo me pus em pé e caminhei em direção a porta.
- Meu nome – disse suavemente -, é Donovan.
E logo entrei na noite, afastando-me de todos eles e do temor em seus rostos.
Alguém me seguia. Apressei o passo levemente, permanecendo nas sombras e me movimentando em completo silêncio. Minha mente alerta, sondando, buscando e um tonto curioso. Era um só. Não oferecia ameaça alguma para mim.
Nunca devia ter feito isso, provoca-los desse modo em que o fiz. Eu sabia que não deveria e nesse dia não sei o que me levou a dizer-lhes meu nome e vê-los empalidecer para depois me ir. Havia assustado aqueles tolos. O tinha feito deliberadamente. Mas não era menos do que mereciam. Acumularam uma dívida importante durante gerações. Atacando a um deles como o fizeram comigo. Assassinando ao Dante...
Me detive a um lado do caminho, onde floresciam as últimas urzes e seu aroma se espalhava no ar, baixei a cabeça quando a dor se estendeu por meu corpo junto com o vento outonal. Eles tinham rodeado o castelo e deixado cair brutalmente suas tochas sobre nossa casa, nosso santuário, nos forçando a correr por nossas vidas. Só para nos encontrar com o nascer do sol aguardando nosso desesperado vôo. Seus raios dourados tão bonitos e tão mortíferos. Recordo as queimaduras, minha carne abrasada, o sentimento de horror que senti ao ver finos espirais de fumaça elevando-se de meu próprio corpo. Havia sido o único afortunado naquela fria manhã. Penetrando profundamente entre as plantas do campo seco – um campo em que tinha trabalhado junto a meu pai – encontrei refúgio. Mas Dante... supunha que ele tinha morrido já que não voltei a lhe ver depois desse dia e não tenho dúvida de que me teria me contatado de algum modo se houvesse sobrevivido.
Levantei a cabeça e despejei meus sentidos, advertindo que com a torrente de recordações que evocava este lugar tinha perdido a pista de meus rastreados. Mas o assediador tinha se detido também e permanecia agora a várias jardas de distância, só olhando e acreditando estar protegido pela escuridão. Quase sorri ante sua inocência; girei e comecei a caminhar de novo, perguntando-me quão longe levaria sua valentia. Tinha abandonado este lugar depois do ataque. Viajei, vi o mundo e vivi em tantos lugares que apenas podia recordá-los. Mas no que diz respeito às pessoas, que não são mortais assim como eu, havia visto poucos. Posso enumerar o nome de cada uma dessas pessoas com as quais havia trocado palavras nos últimos duzentos anos; de tão poucos que haviam sido.
Dante me perfurava os ouvidos um e outra vez. Não confies em ninguém, Donovan.em ninguém. E muito menos em um mortal.
Já podia ouvir o mar ao longe, a estrada se distanciava dos campos dos granjeiros e começava a inclinar-se bruscamente, entre pendentes demasiado abruptas e demasiado escarpadas para ser cultivadas. Ela ainda me seguia. Se nos tivéssemos atado as palavras de Dante, ainda estaríamos bem. Era uma vida solitária, mas segura, pacífica. Satisfatória de muitas maneiras diferentes. O tempo eterno que tínhamos– ou nisso acreditávamos – para aprender música, ler e escrever, para experimentar e saborear aquelas coisas que em nossas vidas mortais não tínhamos podido.
Mas então Dante de tinha enamorado e tudo terminou. Ele confessou à verdade a moça, e me pareceu que esta correu todo o caminho de volta para a multidão de ignorantes do povoado, muito impaciente para revelar nosso segredo e nos ver destruídos. Dante havia estado certo desde o princípio. Não confies em ninguém e muito menos em um mortal.
Quando cheguei em cima da colina, o vento soprava ferozmente desde o mar e adorei a sensação. Meu vento, meu mar. Tão familiar apesar da amargura que conheci naquele lugar. Me sentei em meio ao monte de pedras a margem da estrada... não porque estivesse cansado.
O castelo se elevava ante mim, sem rastros do fogo que tinha estado a ponto de me matar um século atrás. Dante me deixou este lugar como herança e eu o havia restaurado, ou ao menos parcialmente. O mantive sempre pronto para seu regresso. Fazia muito que tinha perdido a esperança de revê-lo... mas pro alguma razão não podia me esquecer deste lugar. Meu melhor amigo se havia ido e eu estava só neste mundo.
Não restava dúvida disso. Mas algum absurdo impulso sentimental me havia atraído de novo ao lugar onde havia sido brutalmente assassinado. De volta a estas paragens, ao castelo, a meu antigo lugar, a ela. Eu tinha vindo para vê-la outra vez, para me assegurar de que ainda estava a salvo. Ela estava em volta agora, o vento revolvia seu cabelo em um caos selvagem. Seus olhos se entrecerraram ao escrutinar a escuridão enquanto tratava de me encontrar.
Pensava que caminhava com ligeireza, mas eu podia ouvir cada pisada. Não que isso importasse. Ela possuía um aroma único que era definitivamente diferente ao de qualquer outro mortal que eu houvesse conhecido. Dante me havia falado sobre isso, me havia dito o que significava. Entre outras coisas de vital importância, significava que me estava proibido fazer-lhe dano. A razão eu nunca soube. Por outro lado nunca fui dos que bastam as regras. Mas não teria podido machucá-la ainda que tivesse intenção. Ela se aproximou. Sua saia larga se ondulava com o vento do mar, fustigando seus tornozelos. Sua blusa... pecaminosamente apertada, se ajustava a seus seios como se tratasse de apertá-los. Permaneceu ali um momento, tão perto que podia senti-la. Depois de me procurar inutilmente, baixou a cabeça derrotada. Mas ficou ali, deixando que o vento golpeasse seu corpo e me pareceu que ela desfrutava completamente desse abraço impiedoso. De repente se girou para ir. Me pus em pé em lentamente, em silêncio.
- Estás procurando alguém?
Ela chiou, abriu a boca e se virou violentamente para mim, suas mãos seguraram seus seios como tratando de controlar os batimentos de seu coração. Depois de deteve, piscando para mim na escuridão e inalando várias vezes com a boca aberta.
- Céu Santo, quase me mata de susto!
Então sorriu. Seu sotaque não era marcado como devia ser, e compreendi que era porque tinha estado fora durante um tempo. Não obstante, me resultou encantador. Meu próprio sotaque se tinha desvanecido até chegar a ser praticamente indetectável.
- Tinha começado a crer que nada te assustava – lhe disse.
Ela cabeceou e encolheu os ombros.
- Bom, se requer muito mais que uma lenda local antiga e um estranho que aparece no povo afirmando ser um fantasma.
- Nunca disse ser um fantasma.
- Disseste que era Donovan O”Rouark.
- Porque o sou.
Ela entrecerrou seus olhos de esmeralda e me olhou. Rachel Sullivan, tinha olhos de feiticeira.
- Pode provar?
Minha olhada descendeu para a pálida e delgada coluna de sua garganta e impulsivamente pus meus dedos ali para sentir o sangue se agitando embaixo de sua pele.
- Poderia...
Seus olhos cintilaram. Era certo, nada a assustava. Sorriu e isso me deixou sem fôlego.
- Vai me morder o pescoço, verdade?
- Se o fizesse irias correndo e chorando aos aldeões e voltaria com uma multidão com intenção de me matar?
Jogando a cabeça para trás sorriu suavemente com um som profundo e rouco. Seu pescoço estava tão perto e tão lustroso... Nivelou seu olhar ao meu, evidentemente divertida.
- O mais provável é que te devolveria a mordida, Donovan O’ Roark. Nunca o esqueças.
Não pude dizer nada. Ela me deixou sem palavras, sem poder falar ou pensar com coerência, com aquela réplica ligeira.
- Mas a prova que tinha em mente – prosseguiu - está mais em um papel. Uma permissão para conduzir, sabes? Ou algo pelo estilo.
Tragando com força, recuperei minha carteira do bolso traseiro, tirei minha identidade e a mostrei. Um homem em minha situação fazia bem em manter aquelas coisas em dia, havia múltiplas formas de levá-lo a cabo e nenhuma demasiadamente complexa. Ela a pegou e seus dedos me roçara, quem sabe deliberadamente. Quase podia ver, assim que finalmente tirou uma lanterna do fundo do seu bolso e, dando as costas ao vento, a usou para vê-la.
Afirmando com a cabeça me devolveu.
- Assim realmente é um descendente com nome igual a teu mais infame antepassado, nada demais. – mordeu o lábio inferior. – Então... esta é sua primeira visita a Dunkinny?
Me perguntou como se tratasse de ocultar quão relevante era essa pergunta para ela. Pensei que seria melhor não responder.
- Por que estava me seguindo Rachel? É Rachel não?
- Correto, Rachel Sullivan, com um montão de célebres antepassados próprios.
A parte superior de meu pescoço ficou tensa ante a menção de seus ancestrais. Mulheres traiçoeiras, mulheres que havia conhecido muito bem. Ela prosseguiu.
- As mulheres Sullivan são conhecidas por seus escândalos. Talvez seja melhor é que o advirta desde já. Foi uma delas que a quatro gerações soltou acusações contra lorde Dante e conseguiu que o matassem, ou isso é o que as lendas dizem.
Era verdade, Laura Sullivan tinha sido seu nome. Minha garganta secou.
- E também dizem que outra Sullivan esteve prometida em matrimônio com o Donovan O’Roark – o primeiro -. Mas quando ele se levantou de seu caixão, ela clamou por seu sangue.
- Sim – disse suavemente, escutando de novo aquela voz estridente em minha mente. Mata-o! Mata-o, antes que nos destrua todos! - Alicia – murmurei.
- De verdade? Nunca tinha ouvido seu nome antes.
Me limitei a encolher os ombros.
- Assim regressaste para completar o que teus antepassados começaram Rachel? Para me destruir?
Entrelaçou seu braço com o meu, e nos fez girar para orientarmos em direção ao castelo, caminhando lentamente.
- É um homem divertido, Donovan. Mas sabes tão bem quanto eu que essas são só histórias tontas. Não há nada de verdade nelas, e qualquer delas é tão pequena que é praticamente irreconhecível. Não, eu tenho uma missão muito diferente. Mas para ela necessitarei tua ajuda.
- Minha ajuda? – Havia atiçado minha curiosidade. E ainda assim a temi. Era demasiado estranho para ser uma simples coincidência, um estremecimento subiu por minha coluna enquanto me perguntava se talvez o meu destino fosse ser destruído pelas mulheres Sullivan, se seguiriam chegando geração após geração até que vissem completo seu trabalho.
E agora estava pensando tão estúpida e superticiosamente como minha gente.
- Fala-me dessa missão. Em que consiste?
Ela me olhou e sorriu, com seus olhos grandes e verdes como o mar, cheios de inocência e malícia como os olhos de uma menina que eu recordava.
- Eu vim para descobrir todos os seus segredos, Donovan. Todos os segredos do castelo de Dante e a verdade oculta por trás da lenda.
Meu coração se paralisou literalmente. Com voz rouca disse:
- Se te contar tudo isso, linda Rachel, temo que tenha que te matar.
Apertando-se ainda mais contra mim, cerrou suas mãos sobre meus braços, apoiou a cabeça em meu ombro e sorriu. Um som rouco e profundo de genuína diversão ressoou em sua voz.
- Gosto dos homens com senso de humor – disse -. Vamos nos entender muito bem, Donovan. Seremos os melhores amigos antes que tenhamos terminado.
Ela estava cálida ao meu lado e demasiado perto de mim. E eu desfrutei sua proximidade... a ausência de companhia humana esgota a um homem através dos anos.
Estava aqui para me destruir. Não tinha dúvidas a respeito. E apesar disso, não era capaz de distanciá-la de mim. Ela não pode me obrigar a contar algo, disse a mim mesmo. Não podia descobrir nada que eu não quisesse que soubesse. Que dano iria fazer deixá-la me acompanhar ao castelo?
Ouvia a voz de Dante em meu interior advertindo-me: Não o faças, Donovan. Não desperdice nem outro segundo com ela. É perigosa! É uma Sullivan, maldita seja. Envia-a longe, mata-a agora e acaba com isto.
Nos detivemos, a imponente infra-estrutura do castelo bloqueava o vento. Frente a nós estavam duas sólidas portas feitas de largas travessas unidas por bandas de ferro negro, como das sentinelas aguardando a senha.
- Desde que era pequena ela queria ver o interior deste castelo – Lhe disse tão suavemente que parecia aquela menina outra vez, justo agora -. Mas meus pais me proibiram, me encheram a cabeça com um monte de velhas e tolas histórias que durante um tempo me aterrava a idéia de chegar perto e olhar tudo por aqui como faziam as crianças maiores.
- Durante um tempo?
- Sim! Depois deixei de pensar assim. O homem que viva aqui não era um monstro. Frequentemente andava a esmo pelos arredores deste lugar, depois de me dar conta disso. Que infantil, esperar vislumbrar a um homem que estava morto há tanto tempo.
- Mas nunca entraste?
- Não podia. Sempre sentia... – fez uma profunda inalação, soltando todo o ar de uma só vez - Vai rir de mim.
- Não – disse. – Não o farei. Conta-me.
Levantou o olhar e seus olhos encontraram os meus, os seus eram honestos, sinceros, belos...
- Sempre pensei que este lugar era como... sagrado, de alguma forma. E...e minha própria família o havia refutado, arruinado. Assim que para mim, entrar teria sido... um sacrilégio.
- E agora?
Ela observou as portas do castelo, tremendo ligeiramente.
- Posso estar equivocada. Pode ser que eu esteja destinada a reparar o dano. – Deixou cair à cabeça suspirando. – Sou diferente dos demais sabe?
- Sim, sei.
- Eles contam a história uma e outra vez e se estremecem por medo das criaturas que afirmam ter vivido uma vez. – Depositou sua palma contra a pedra cinzelada, e fechou os olhos. – Mas eu não. A primeira vez que ouvi a história tinha três anos e chorei. Durante horas, ninguém podia me consolar. Para mim não era uma história horrível, era uma tragédia. Um homem escapando da morte só para ser expulso da cidade por sua própria família. Outro, assassinado somente porque se arriscou a amar – encontrou meus olhos e sorriu -. Para dizer a verdade, quando ainda era tão infantil que acreditava nas velhas histórias, pensava em teu ancestral como... como um amigo. Meu próprio anjo da guarda.
- E agora? – lhe perguntei.
- Agora sou uma adulta, que sabe que é melhor na crer nos contos de fadas.
- Mas é estranho que esteja aqui agora. Justo quando voltei para casa dos Estados Unidos. Justo quando estou planejando escrever minha tese baseada na lenda, sua origem e efeitos na comunidade atualmente. Justo quando me pergunto como aprenderei tudo o que necessito saber sobre o Castelo de Dante e o Donovan O’Roark original, aqui está você. Creio que é um sinal.
Estava me encantando, hipnotizando, com sua fragrância e sua beleza, mas, sobretudo com esse entusiasmo e carisma, e seu ponto de vista um tanto desviado do universo. Ela tinha o antígeno da beladona, isso era parte de seu atrativo e sempre me havia atraído até ela e instigado a observá-la. Podia cheirá-lo e senti-lo em seu sangue. Todos os imortais tinham o antígeno antes de receber o presente escuro. Senão não se transformariam... simplesmente morreriam. Dante me tinha contado essas coisas e me tinha advertido bem sobre o encanto que os mortais que possuíam o antígeno tinham sobre nós... a atração. E se dizia que funcionava em ambos os sentidos. Eu sabia tudo isso. Mas sabê-lo não fez nada para diluir seu efeito sobre mim.
Como criança tinha sido inofensiva e não havia representado uma ameaça para mim em absoluto, era só uma pequena criança que necessitava de um protetor. Mas agora... Ela me olhava fixamente com seus olhos verde-esmeralda.
- Me levará lá dentro, Donovan? Cumprirá os sonhos de minha infância e me mostrará teu castelo?
Como um homem enfeitiçado pelo encantamento de uma cigana, assenti com a cabeça, peguei minha chave e abri meu refúgio ao inimigo.
Havia algo nele... Não, sua imaginação lhe jogava uma ilusão. Sim, estava pálido mas só um pouco. Além do mais, esta era a graça nele, a maneira em cada movimento parecia fluir como se fosse parte de uma dança... era simplesmente sua maneira de ser. Não significava nada. Ele não era o guardião que havia imaginado. Seu salvador.
Pegou os aros metálicos das portas e as abriu, permitindo a ela entrar primeiro. Depois de ter dado só um passo ao interior da ameaçadora e retumbante escuridão, se deteve e combateu o inquietante calafrio que lhez cócegas na coluna.
- Não posso ver nada – disse ela, enquanto buscava o isqueiro em seu bolso.
O escutou entrar atrás dela. Parou próximo as suas costas enquanto ela buscava o acendedor em seu bolso. O profundo rangido da porta se fechando detrás dela parou seu coração por um momento. Fechando sua mão ao redor do isqueiro, o tirou e deixou cair ao solo.
- Tudo bem – disse ele -. Espera aqui.
- Como se pudesse fazer outra coisa – lhe respondeu, esperando que não tivesse detectado o tremor em sua voz.
Ele passou por diante dela, mas não pôde escutar suas pegadsas. Apesar de que deveria ter ressoado eternamente, igual ao que faziam seus murmúrios. Houve um lampejo de luz, um brilho que iluminou seu rosto por um momento, pondo luz e sombra, como se fosse algum tipo de demônio ambulante. Logo ele se inclinou enquanto acendia com uma cerilla uma a uma as velas do candelabro de prata, a luz se espalhou. Ele se moveu através do quarto levantando o candelabro e acendendo outras velas. A Raquel pareceu que tinha velas por toda parte. Quando ele voltou ao seu lado, toda a habitação brilhava com a luz que emanava delas. As sombras brincando e dançando; a suave e brilhante luz amarela derramando-se sobre tudo.
Ele tomou sua mão e a guiou. Rachel o seguiu, seu medo ia desvanecendo-se ao mesmo tempo a sua curiosidade aumentava. A habitação era enorme e se elevava sobre ela, alta como uma granja. Então viu algo que se iluminava com a luz das velas.
- Essa é uma lâmpada á gas?
Donovan levantou a vista e logo assentiu.
- Todo o lugar está equipado com luzes a gás. Contudo, é necessário conectar o gasoduto principal e abrir as válvulas para poder utilizá-las.
- O que eu daria por ver este lugar a luz do dia – suspirou ela. Sentiu que ele ficava tenso e se perguntou por que. Havia duas chaminés idênticas em muros opostos, cada uma preparada e esperando ser acesa. Ambas possuíam paredes de pedra e sobre elas desciam assombrosos tapetes. Ela se dirigiu a que estava mais perto e cobriu a mão de Donovan com a sua para levantar o candelabro. – Devem ser antiqüíssimos – murmurou.
- Dante disse que eram bastante antigas, medievais ou algo pelo estilo.
Ela sentiu um calafrio na coluna.
- Dante disse?
Donovan baixou rapidamente seu olhar para ela rapidamente.
- Algo assim. Só estou repetindo o que me contaram.
Ela o olhou de lado, estudando seu rosto na suave luz.
- A sério?
Assentiu e a fez se mover para a esquerda da chaminé, levantou novamente o candelabro e indicou o muro em que sependurava duas espadas cruzadas.
- As espadas também são medievais, embora irlandesas, enquanto que os tapetes são italianos.
- Esse Dante devia ser um grande colecionador.
Donovan encolheu os ombros e continuou avançando enquanto mostrava outras relíquias expostas nas paredes, uma armadura em um canto – que parecia absurdamente baixa – e o mobiliário. Agrupadas ao redor das chaminés, se encontravam largas cadeiras com almofadas bordadas e respaldos retos elaboradamente talhados. No centro da habitação havia uma grande mesa adornada que tinha pernas do tamanho de uma árvore pequena. Estava todeada por cadeiras menores e menos elaboradas. Ademais, havia armas por todos os lados. Lanças, maços e escudos com insígnias pintadas na frente.
A cada certo tempo atravessavam uma abóboda escura que os levava a alguma outra parte do castelo. Cada vez, ela ambientava os olhos rumo à escuridão, entrecerrando-os; desejando poder ver mais. Entretanto, em nenhum momento viu nada. Quando tinham atravessado toda a habitação, ele a guiou em direção das alcochoadas cadeiras e deixou as velas sobre a mesinha a seu lado. Logo, girou, e se agachou frente ao fogo e em um segundo este se encheu de vida, apesar de que ela nunca o viu acender nenhuma cerilla. Ela deixou o calor se entender por seu corpo, espantando o frio do outono. Donovan se sentou na cadeira junto a ela.
- Te ofereceria algo para beber, mas...
- Sei – lhe respondi -. Acabas de chegar. Não poderia esperar que tua despensas estivessem cheias tão logo – lhe sorriu -. Será frio... solitário, viver aqui. Não acredita?
Ele assentiu.
- Sim, mas tem uma história que necessito... sentir. Tinha que regressar.
- Regressar? Então já estivesses aqui antes?
Ele piscou lentamente, desviando o olhar.
- Faz muito tempo.
- Durante sua infância?
- Algo assim.
Ela assentiu, não queria pressiona-lo mais, embora fosse totalmente consciente de que na realidade não havia lhe dado uma resposta. Não podia tratar-se do mesmo homem que a havia salvado no rio. Isso havia acontecido vinte anos atrás e ele era demasiado jovem.
- Então, o único que está disposto a me mostrar é este enorme salão, Donovan?
- Por agora – lhe disse – não seria seguro lhe levar mais longe... – Se produziu uma larga pausa quando seu ardente olhar encontrou o dela. – Sem uma melhor iluminação.
Lhe secou a garganta. Tratou de tragar, mas se deu conta de que não podia. Ele tinha um olhar ardente, um olhar predatório que a fazia estremecer.
- Talvez eu devesse ir. Dar um tempo para que te instales.
- Talvez – disse ele.
Assentindo, ela se pôs em pé. Ele fez o mesmo.
- Eu... eu gostaria de regressar. Para falar contigo acerca da lenda.
- Não sei muito acerca disso. Ficará decepcionada.
- Tenho o pressentimento de que sabes mais que ninguém a respeito, Donovan O’Roark. – Ela girou e caminhou em direção a porta, enquanto ele a seguia. Teve o pressentimento de que ele ansiava que se fosse.
Entretanto, quando ela abriu a enorme porta, um lampejo cegador abriu um caminho irregular através do céu. A chuva fustigava contra eles e um trovão ressou à distância. Estando trancados dentro dos enormes muros de pedra, não haviam observado a mudanca do clima e pela primeira vez, ela notou que não havia nenhuma ventania na habitação.
Ele parou imóvel. Não disse nada. Bem, não havia nada a fazer.
Ela inclinou a cabeça e deu um passo para fora... só para sentir como suas mãos se cerravam sobre seus ombros, atraindo-a em direção ao interior. Ela quase suspirou de alívio.
- Não podes caminhar até o povoado nestas condições – lhe disse como se arrependesse profundamente.
- Poderia. Não sou feita de açúcar, Donovan, e não me derreterei por um pouco de chuva.
Ele fechou a porta, levantou uma mão e secou as gotinhas de seu rosto e cabelo.
- Não derreterás, mas ficarás ensopada e adoecerás, no mínimo. Ou pior, poderias ser amassada por uma árvore ou ser derrubada por um raio. Não, não posso deixar que vá.
- Soa como te lamentasses.
Ele assentiu e ela se surpreendeu que não negasse.
- Eu gosto de minha privacidade, Rachel. Você faz bem em ter isso em mente.
- Oh.
Ele franziu o cenho. – O que?
Ela enconlheu os ombros e franziu as sbrancelhas.
- Supus que havia outra razão para que minha presença te perturbe tanto. Embora não tenha importância. – Ela só brincava e pensou que ele o sabesse. Se sentia atraída por ele, de uma maneira que não entendia. Era como se houvesse lançado algum feitiço que a fizesse... Fechou os olhos e sacudiu a cabeça. – Creio que tenho mais sono do que pensei.
- Deve haver algumas habitações preparadas – disse ele com voz amável. Acaso ela tinha detectado uma nota de temor em sua voz?
- Então, ensina-me o caminho.
Ele assentiu e voltou a recolher as velas tremulantes. – Será melhor que fique próxima a mim, Rachel. Não sei até que ponto é seguro p castelo, só algumas partes foram restauradas. Ademais, poderia te perder facilmente nestes corredores.
Ela esteve de acordo e à medida que ele a guiava através da escuridão, segurava cada vez mais forte em seu braço, consciente de que com cada passo que dava se distanciava mais da segurança. Não que é que o temesse. Oh, espera sim lhe temia.
Os corredores giraram e se desviaram em incontáveis direções. Ele a guiou por escadas espirais que pareciam túneis eram muito estreitas e escuras. Logo avançaram por mais corredores.
- Donovan?
Ele se deteve e girou para olhá-la na escuridão.
- Está me fazendo dar voltas deliberadamente só para que não possa encontrar a saída?
Ele sacudiu a cabeça solenemente.
- Ao contrário, Rachel. A habitação está próxima de uma saída traseira, de modo que pode te retirar amanhã na primeira hora.
- E por que deveria fazer isso se tu mesmo pode me indicar a saída?
- Eu... não estarei aqui. Temo uma reunião importante. Muito cedo. Já terei ido para quando despertes.
Ela lançou a cabeça para trás e o estudou.
- Isso é verdade?
- Sim. Rachel quero que prometas que fará o que te peço. Saia pela manhã. Sem bisbilhotar ou explorar. Já te disse que pode ser perigoso.
Depois de estudá-lo por um largo tempo, lhe disse.
- Há algo que não quer que eu veja?
Ele sacudiu a cabeça.
- Tua imaginação é tão grande como as dos aldeões do pub, não é assim?
Ela sorriu.
- Maior. Não estaria duvidando se soubesse o que estou pensando agora.
- E no que está pensando?
Ela levantou os ombros e as sobrancelhas ao mesmo tempo.
- Que talvez a razão pela que não estará aqui amanhã é que tem uma reação adversa a luz do dia. E talvez a razão que não me queiras bisbilhotando é que não quere que tropece com o ataúde em que dormes. – Lançou a cabeça atrás e riu-se de sua própria estupidez, os sons fizeram eco muito depois dela se ter calado. – Creio que depois de tudo ainda me restou algo da crença infantil. Ou talvez, simplesmente viver em Dunkinny me tenha feito tão imaginativa.
Ela mordeu o lábio e sua mão tremeu ligeiramente quando a levantou para tocar seu rosto.
- Feri teus sentimentos, não foi? Realmente não creio que seja um vampiro, Donovan. Somente um homem... um homem bonito. – Baixou o olhar, sem acreditar no que estava a dizer. – Mas não penses que sou uma atrevida por te dizer isto, mas eu... eu gostaria de te ver outra vez. Não devido a lenda, e sim porque... só porque sim. – Ainda assim ele nada disse. Ela deixou cair sua mão e olhando o céu soltou um curto e marcado suspiro. – Por Deus, Donovan, diga algo. Estou me comportanto como uma tonta ou...?
- Não. – Estirou a mão para afastar um cacho de sua fronte. – De fato, durante toda a noite tenho tratado de te evitar com todas as minhas forças... Sentir algo por ti.
Ela sentiu que o sangue subia a seu rosto.
- Oh. – Logo, umedeceu os lábios, voltou a encontrar seu olhar novamente e sussurrou: - Por que tem tratado de evitá-lo com todas as forças, Donovan?
- Porque nada de bom pode resultar de mim.
Seu coração se apertou.
- Então está casado.
- Não, claro que não. É só... – ele sacudiu a cabeça -. Confia em mim, Rachel. Nada pode resultar disso. Eu... provavelmente fique pouco tempo e além do mais – suspirou profundamente -, não importa.Esta é o seu quarto.
Ele abriu a porta e deu um passo para dentro.
Rachel o seguiu e inalou profundamente quando a luza das vela se derramou sobre uma cama com dossel acortinado com gase de uma suave cor marfim.
- É bonita.
- Foi restaurada. Este é o quarto que Dante preparou para Laura Sullivan, a mulher que o traiu.
- Minha impiedosa antepassada dormiu aqui?
- Não. Ela o matou antes que pudesse conhecê-lo.
Rachel girou para ele, uma nova idéia chegava a sua mente.
- Me alojas aqui para não esquecer o sangue que corre por minhas veias? – Ele não respondeu, só baixou a cabeça. – Não pode me culpar pelo que fizeram meus antepassados.
- Não. E não o faço. Simplesmente pensei... – ele sacudiu a cabeça – honestamente não sei o que estava pensando.
Ela deu um passo adiante, atraída por ele muito além da razão e impulsionada por algo mais que seu usual atrevimento. Sentia como se o conhecesse, como se sempre o houvesse conhecido. Além do mais, não havia nenhum indício de timidez, nenhuma razão terrestre que moderasse suas ações. Só o fato de estar próximo a ele parecia eliminar suas inibições.
- Te direi o que acredito, Donovan O’Roark. – Quando ele levantou o olhar, ela se aproximou ainda mais. – Não acredito que tenhas coragem para me dar um beijo de boa noite.
Fez um arreganho com os lábios, como se quisesse sorrir.
- Está me desafiando Rachel Sullivan?
- Certamente que o estou fazendo. Não me agrada a idéia de que te esforce por me desagradar. E sei que se me beijares uma vez, esquecerá todas as besteiras que meus antepassados fizeram aos teus e simplesmente verás a mim. Não a Alícia ou Laura, senão a mim. Rachel Sullivan.
Ele começou a negar com a cabeça.
- Te desafio – sussurrou ela -. Não acredito que tenhas coragem.
Quando seus olhos obscureceram, ela supôs que havia se enganado. Ele deixou o candelabro no criado mudo e se aproxiomu dela. Um claro e único propósito brilhava em seus olhos cor de meia-noite.
Acerquei-me mais dela, impulsionado por alguma força que não conseguia compreender. Contudo, meus lábios roçaram aos seus de forma leve e fugaz. Sua boca não era meu objetivo, ainda não. Creio que uma parte de mim queria assustá-la, mas tinha algo mais. Queria saboreá-la. O desejava com uma fome mais poderosa que a sobrenatural sede de sangue com a que vivia durante tanto tempo. Por um momento, só um momento, talvez esquecesse onde me encontrava. Talvez parte de minha mente retrocedeu no tempo, ao momento em que Dante e eu vivíamos como reis e éramos temidos pelos aldões. Um tempo em que nós nos atrevíamos a caminhar pela noite, antes que entedessem o que éramos realmente. Aqueles tempos quando se gostávamos de uma criada, tínhamos a liberdade de tomá-la, beber sua formosa garganta até saciarmo-nos e utilizar o nosso poder vampírico para fazer suas mentes recordarem o acontecido como se fosse só um sonho. Aqueles tempos anteriores em que fomos completamente conscientes do perigoso que era interagir de algum modo com os mortais.
Creio que revivi essas noites em minha mente. Meus lábios roçaram os seus, baixaram através de sua bochecha e sua delicada mandíbula. Então ela sabia, ela sabia até certo ponto. Inclinou sua cabeça para trás para me dar acesso ao que eu desejava. Sua mente se elevou até o teto enquanto exalava tremulamente. Meus lábios encontraram a pele de seu pescoço, o ponto onde um rio de sangue corria justo abaixo da superfície. Sua torrente se acelerou, sobrepujando meus sentidos. Sua essência, sua textura... Fazia com que minha cabeça desse voltas. Logo, separei os lábios e a saboreei. O sal de sua pele se sentiu quente em minha língua e seu pulso se acelerou sobre meus lábios. Então, tomei sua pele em minha boca, só um pouco a chupando e pressionando meus dentes muito ligeiramente.
Tremendo, se aproximou mais de mim. Seu corpo se colou ao meu desde o ponto onde minha estimulava sua garganta, passando por seus seios tensionando-se contra meu peito, até seus quadriz que se arqueavam para adiante se roçando suavemente com os meus, me enrijecendo de desejo.
Meus braços a rodeavam, uma mão segurava sua inclinada cabeça e a outra se fechava sobre uma suave e redonda nádega enquanto a apertava mais fortemente contra mim. As suas estavam em minha cabeça, enroscando e puxando meu cabelo enquanto eu lambia sua garganta. Desejava perfurar sua carne. Ela o desejava também, podia senti em todas as suas ações e em cada suave suspiro que saía de seus lábios. Contudo, ela não sabia o que estava cortecendo. Embora eu soubesse. Eu sabia.
A mordi um pouco mais forte, com meus incisivos succionando e empurrando contra a suave carne, me preparando para atravessar a sensual superfície para chegar ao néctar que ali se escondia. Ela gemeu. Um leve e sobressaltado som foi mais forte que a explosão de um canhão em meus ouvidos, tão concentrado estava em saboreá-la. Contudo, foi suficiente para me fazer recobrar o controle e me dar conta do que tinha estado a ponto de fazer.
O desejo me atravessou como uma lâmina e estremeci completamente como um tremor que atormentou totalmente enquanto me forçava a me separar dela, afastar minha cabeça de sua garganta, deixar cair meus braços aos lados e dar um passo atrás.
Ela não teve reação imediata. Eu sabia demasiadamente bem o que lhe acontecia. Podia vê em seu aberto e perturbado olhar. O encanto do vampiro. Contudo, havia algo mais. Talvez ela tivesse sentido o impacto desta força entre nós tão poderosamente como eu. Inclusive eu não a entendia completamente. Para ela, devia ser ainda mais incompreensível. Recobrou-se em um instante, piscou para clarear a sua visão e logo me olhou.
- Não acredito ter sido... beijada... dessa maneira anteriormente. – Levantou uma mão (de maniera inconsciente) e passou a ponta de seus dedos suavemente no lugar onde minha boca tinha estado.
- Não deveria ter feito isso.
- Por que? – me perguntou.
Sacudi a cabeça.
- Não estou seguro, Rachel. Talves pela mesma razão pela qual permitisse.
Ela inclinou a cabeça para um lado para me estudar franzindo o cenho. Seu cabelo se deslizou me revelando seu pescoço novamente, fazendo me sentir um renovado e arrebatado desejo enquanto via a vermelhidão que formava ali, a umidade e a forma em que seus dedos seguiam tocando esse lugar e se retirando.
- Vá dormir – lhe murmurei, embora fosse mais que um murmúrio. Flexionei o músculo astral, o que não existia fisicamente, mas que estava aí de todos os modos. O que envia meus desejos a mente dos outros.
- Esquece que isto ocorreu. – Capturei seus olhos com os meus enviando-lhe a força, a ordem que devia ser obedecida. – Esquece o beijo, Rachel. Nunca ocorreu. Vá dormir e quando despertares...
- Duvido que possa dormir, Donovan O’Roark. – murmurou ela com um suave e inseguro sorriso. Uma faísca de pirraça regressou a seus formosos olhos. – Mas esquecer esse beijo não é certamente uma opção. Mas certo é permancer desperta pensando nele ou dormir e sonhar com ele novamente – seu sorriso se ampliou -. Fou um beijo bem agradável não?
Dei um passo para trás. Mais por um ato instintivo que pela impressão, pensei mais tarde. O controle mental não surtiu efeito nela. Nem sequer... nem sequer a tinha feito duvidar.
Dei-me conta de que agora estava parado no corredor, então ela tomou o candelabro e me ofereceu.
- Deverias levá-lo para não se perder.
- Não – disse impulsivamente, ainda tratando de entender sua falta de reação as minhas ordens que foi suficiente para me deixar sem falar. Que tonto fui. – Vejo perfeitamente na escuridão. – Poderia ter batido em mim mesmo no momento em que essas palavras saíram da minha boca.
- É sério? – Ela devolveu as velas a seu lugar. – Deixarei que te vá então. Boa noite, Donovan.
E fechou a porta. Parei ali de pé tremendo. Nunca me havia sentido tão atraído assim por uma mortal anteriormente. E nuncca, nem uma vez em cem anos, tinha sido tão pouco efetivo ao influenciar os pensamentos de um deles ao pretender modificar suas recordações. Isto me disse duas coisas: que sua vontade era muito forte e que não queria esquecer.
Ela estava aqui em meu lugar, meu paraíso. Deus, que aconteceria se ela descobrisse mais do que deveria? Que passaria então?
Rachel fechou a porta, recostou-se contra ela, baixou a cabeça e fechou os olhos. Tremia com tanta força que apenas podia manter-se em pé. Havia estado aterrorizada de que ele o tivesse notado antes de ir. Ela o tinha ocultado, pensou. O ocultei a tempo. Assumi a conduta de uma taberneira coquete, irreverente e um pouquinho arrogante para esconder a profundidade de minhas reações por ele. Por Deus. A maneira que ele a tinha beijado... a maneira em sua boca tinha não só acariciado senão devorado e as sensações que senti...Pelas suas presas!
Ficou paralizada e ainda estremecendo, embora já não tão débil. Suas mãos voltaram a seu pescoço uma vez mais; seus dedos buscando, sentindo. O temor lhe invadiu a alma. A tinha...?
Procurou em seus bolsos e puxou um espelho. Empurrou para abri-lo, o deixou cair. Finalmente, se inclinou sobre a chama das velas para observar no pequeno e redondo espelho a marca roxa em seu pescoço. Contudo, não se viam feridas de presas nem tampouco sangue. Só uma pequena área de pele arroxeada, o que suas amigas americanas chamariam de chupão.
- Senhor tem piedade – murmurou fechando o espelho e suspirando uma vez mais -. Não sei se me sinto aliviada ou questiono minha saúde mental por estar pensando...
Sacudindo a cabeça, se pôs ereta e regressou a cama levando as velas consigo. As depositou sobre o criado mudo, bem distante das cortinas que caíam desde o dossel envolvendo a luxuosa cama. Mais além da fina cortina, um ededron de cetim vermelho se elevava com os montes de almofadas que tinha debaixo e quando o retirou encontrou forros do mesmo material, só que negros e roxos.
O pulso em sua garganta se acelerou um pouco. Não tinha pijama, embora a cama dificilmente parecesse ser feita para tais coisas. Dando uma rápida olhada à porta, viu a fechadura que esperava ser trancada. A olhou umedeceu os lábios e voltou à cama. Desta vez começou a se desnudar. Deslizou despida no esquisito tecido de cetim, sentiu sua fresca suavidade acariciando sua acalorada carne e a envolvendo dentro de si. E quando dormiu teve sonhos mais carnais que do que tivera nunca.
Despertou com a luz da manhã entrando pela janela, banhando seu rosto e muito mais curiosa acerca desse homem do que nunca tinha estado.
Afastou o forro da cama e se pos em pé, ainda desnuda na fria habitação. Suas roupas estavam dobradas sobre uma cadeira tal e como ela tinha deixado. Olhou para a porta sem ferrolho. Ele tinha dito que se iria antes que despertasse. Mas ainda era cedo. Talvez... Vestiu-se rapidamente. Uma e outra vez sua voz repetia em sua cabeça. Não bisbilhote. Vá pela porta traseira tão logo deperte. Valorizo minha privacidade.
Seria ruim ir contra seus desejos depois de ter sido tão amável com ela ao lhe permitir ficar quando obviamente não o desejava. Ao permitir ficar quando parecia lhe assustar.
Por que?
Terminou de se vertir, passou os dedos pelos cabelos como se fosse um pente e revistou sua aparência no seu pequeno espelho, pois não havia nenhum outro na habitação.
Sem espelhos?
Rejeitou a idéia e examinou seu reflexo. Via-se desastrosa, selvagem, dificilmente intelectual, muito menos virginal e provavelmente mais como uma teberneira do que nunca.
Por que?
Ele. Seu beijo, e a noite passada se remexendo embaixo da carícia dos lençóis de cetim que recordavam seus olhos.
- Maldição – murmurou e rapidamente fez a cama entes de sair pela porta em direção ao corredor.
Agora havia luz. Estava escuro por falta de janelas, embora houvesse suficiente claridade para ver aonde ia. A porta que levava a saída era óbvia. Ao final do corredor e a sua direita havia uma porta alta de madeira com luz brilhando através do grosso painel de vidro. Tragando com força e dando de ombros, aumentou seu poder de auto-convencimento e se dirigiu para a porta, notou que não tinha chave e a abriu.
O suave sol irlandês banhou seus rosto e seus olhos. Estendendo-se frente a ela como torcidos e cinzas dentes de um crocodilho velho, estavam as deterioradas escadarias que se curvavam intimimamente para baixo do muro exterior da torre e despareciam por seu lado oposto. Desde ali podia ver o mar com seu brilho verde-azulado e branca espuma agitando-se quando as ondas estalavam contra o costão rochoso. As rochas estavam quase diretamente abaixo dela. Provavelmente as escadarias eram perfeitamente seguras.
- contudo, ele havia insistido que esse lugar podia ser perigoso – murmurou para si mesma -. Não, realmente creio que ele tivesse preferido que saísse pela porta dianteira. Em efeito, se ele estivesse aqui seguramente insistiria.
Voltou a entrar e fechou a porta. Logo recostou as costas contra esta, olhando para o largo e retorcido corredor cheio de portas e abertos corredores abobadados que levavam a outros corredores ou a escadas que subiam ou se retorciam abaixo. Encolhendo os ombros e combatendo um excitado sorriso, sussurrou.
- Suponho que terei que procurar até que encontre uma saída mais segura não é certo?
Estava perdida. Deseperada e alarmantemente perdida. Céus! Antes não tinha notado o enorme que era o castelo ou a forma em que seus corredores se retorciam sobre si mesmo como serpentes em êxtase. E havia tão poucas janelas! Não conseguia se orientar, nem sequer tinha idéia de em que piso se encontrava. O único que lhe ocorreu para se orientar foi caminhar próxima as áreas iluminadas e se distanciar das escuras. Mas inclusive esse plano tinha suas falhas, já que não podia distanciar demasiadamente antes que a luz começasse a diminuir. Então, sua única opção consistia em aprofundar na escuridão ou regressar ao lugar de onde vinha. E voltar atrás não a ajudaria em seus propósitos.
Tinha feito muitas descobertas esse dia. Algumas prazerosas, mas a maioria extremamente desagradáveis. Descobriu a sedenta que podia chegar a sentir-se em um só dia, o horripilante que era caminhar e dar de cara com uma pegajosa teia de aranha em meio à escuridão e o muito que valorizava um bom pequeno almoço quando não o tinha disponível.
Algumas de seus mais agradáveis descobrimentos a isolaram de sua miséria por breves períodos de tempo. Passou horas explorando habitações, repletas de fascinantes antiguidades e, quando cansou, tirou uma soneca em uma poltrona de cetim própria de uma rainha. Mais tarde, tropeçou com a sala de música, onde havia um empoeirado e velho clavicordio (S. m. Mús. 1. Um dos mais antigos instrumentos de cordas e teclado, de forma semelhante à do virginal ).
O suave alcochoado dos assentos junto à janela se embutia na parede de pedra. Sentou-se em um para descansar e sua respiração se deteve ao contemplar através da janela o que seguramente era a Irlanda completa. Encontrava-se no mais alto. Tinha subido e descido tantas escadas que tinha perdido a orientação e realmente não tinha nenhuma pista sobre onde tinha terminado. Agora o sabia, embora não a ajudava demasiado, exceto para lhe fazer saber que deveria estar descendo. Bem para baixo. E se dar pressa, já que desde sua vantajosa posição podia observar que o sol se punha na ponta do horizonte e já despareceria. Seu cochilo devia ter durado mais do que ele pensava.
Demou só um momento. Poderia haver ficado mais tempo, apesar da hora tardia, mas cometeu o erro de destapar o velho instrumento. Seus dedos acariciaram levemente as teclas e este emitiu um grunhido que quase lhe paralizou o coração. Imediatamente depois, teve que sair da habitação. Era ridícula a sensação que lhe havia provocado, mas não tinha sentido nega-la. Tinha a intuição de que devia se retirar antes que Donovan a ancontra-se ali. E aquela explosão do clavicórdio poderia have-la delatado, inclusive haver dado a ele uma idéia exata do lugar onde se encontrava, se a tivesse escutado.
Correu para fora da sala, de regresso ao ninho de serpentes que eram os corredores e seguiu as primeiras escadas que encontrou que a conduziam para baixo.
Mas só a conduziram a escuridão. Ou talvez fosse porque estava anoitecendo. Ela continuou descendo, enquanto as escadas seguiam se retorcendo, girando e enroscando mais e mais à medida que descia. Manteve suas mãos apoiadas na parede em ambos os lados para evitar cair enquanto continuava sua interminável descida. E parecia não ter fim. Começou a sentir aflita, constrangida pelos muros em suas costas e inclusive imaginou que estes estavam estreitando. Aprisionando-a. asfixiando-a como se tivesse caído dentro de um funil.
Um degrau de pedra abaixo de seus pés se desabou e ela se afastou agilmente, enquanto olhava para os destroços que caiam com estrondo e retumbavam na escuridão. Já não podia ver nada. Isso só podia significar que a noite havia caído completamente, ou talvez só era a luz que não penetrava nessa estreita escada espiral, completamente revestida de pedra.
- É suficiente – murmurou. – Darei a volta.
E virou, mas seu pé resvalou sobre outro pedaço enorme da escada de pedra que havia caído. Rebolou para baixo, estrondando-se como se se tratasse dos pés de um gigante. E depois houve outro som. Suave em princípio, leve. Como o ritmo ligeiro de umas asas e um tímido choro. Que logo se tornou mais ruidoso. Como um guincho.
O ar sobre ela se carregou rapidamente com a agitação rítmica e os chiados agudos quando os morcegos que se penduravam na parede despertaram assustados sobre sua cabeça. Bestas cegas! Seus gritos se uniram a essas vozes sobrenaturais quando ela agitou seus braços, mas eles a derrubaram, chocando-se contra ela e uns nos outros, só para sair disparados em outra direção. Os sentiu golpeando-a. seus pequenos e peludos corpos meneando-se e aquelas asas elásticas movendo-se rapidamente acima e abaixo num frenesi. Diminutos pés com garras lhe arranharam o rosto e seguiram avançando. Úmidos – só Deus sabia o que era aquilo.
Ela gritou e os golpeou, girando em grandes círculos e cobrindo a cara com os braços. Então caiu. Caiu rodando; seu corpo foi jogado com violência, rebolando e chocando-se contra a pedra escarpada uma e outra vez. Colidindo contra as paredes curvas, só para rebolar nelas e seguir descendo em espiral. Não havia morcegos agora. A queda a havia distanciado deles e seu desenfreado vôo. E por um momento pensou que a queda seria eterna. Mas antes de dar-se conta, havia sido detida. Sua cabeça ainda estava torcida e seu corpo gritava de dor por causa de umas centenas de nódoas negras, cada uma das quais palpitava como se estivesse sendo golpeada de novo. Pouco a pouco, a sensação de movimento se desvaneceu e ela observou que estava imóvel. Tombou sobre um lado, mais ou menos, já que seus membros estavam retorcidos e dobrados em ângulos sobrenaturais.
Lentamente se incorporou, e ficou sentada. Cada movimento doía. Cada parte do seu corpo chorava em protesto pela crueldade que supunha o mais leve movimento. Mas o fez paulatinamente; devolveu seus braços e pernas a seu estado natural, comprovando-os para assegurar-se de que ainda funcionavam corretamente. Nada parecia quebrado. Ao menos, podia mover tudo.
Mas Deus, como doía!
Devagar, centímetro a centímetro, com suas mãos apoiadas na parede acerca dela, se pos em pé. O problema constatou, não de havia resolvido só porque sua queda havia acabado. Ainda necessitava encontrar o modo de sair do castelo. Pela primeira vez, lhe ocorreu que poderia estar presa aí para sempre. Poderia morrer de fome ou sede antes que alguém a encontrasse. E, de algum modo, pensou que nada a assustava tanto com a possibilidade de ser encontrada.
O que era um disparate. As escadas tinham terminado e agora se encontrava no solo, ou algo que lhe parecia, embora tivesse rachaduras e gretas na pedra que faziam o seu caminhar mais precário. Imóvel, percorreu o caminho com o olhar. Não desejava nada com tanta intensidade como uma vela para ver onde ia.
O queimador. Rápidamente meteu a mão no bolso e louvou sua boa estrela: ainda estava ali. O acendeu, sustentando-o em frente a ela e viu que se encontrava em um largo e amplo corredor de pedra em meio da escuridão absoluta. Se parecia bastante a uma cova. Mas ao longe haviam portas fechadas e só se ouvia o silêncio. Talvez alguma conduzisse a alguma parte.
Suas passadas ressoaram – desiguais, já que havia perdido as forças - quando começou a andar através do vestíbulo e se deteve ante a primeira porta. A empurrou para abri-la, e só encontrou uma habitação vazia, outro quarto vazio a recebeu. Só faltava uma porta mais. Sentiu um nó em sua garganta e lágrimas de frustração começaram a brotar de seus olhos quando tocou lingueta. Estava trancada. Lhe escapou um soluço que obstruiu sua respiração e apoiou a cabeça na madeira para chorar. Porem então se ouviu um ruído. Um suave ranjido... um eco que vinha mais além da porta.
Como o de qualquer porta comum e corrente abrindo lentamente. Esforçando-se para ouvir, se aproximou mais, escutando com todo o seu ser. Pequenos golpes sobre o solo. Alguém se movendo ao redor. Logo um raio de luz desde abaixo, que ia aumentando de intensidade.
Os passos se fizeram mais perto. E algo... algo a fez retroceder. A porta de abriu com um profundo e ameaçador rangido de protesto.
Olhou os olhos de Donovan O’Roark, os viu alargar com espanto e algo que poderia ter sido temor, inclusive pânico. E então, os ajustou para afastar a vista dele e olhar além, dentro da habitação, onde brilhavam as velas.
Não havia nada ali... nada, exceto um enorme e reluzente caixão, cuja tampa permanecia aberta. Estava revestido de cetim e resplandecia a luz das velas.
Negro e roxo era o cetim dentro da caixa. Negro e roxo como o cetim em que ela havia dormido.
Retrocedeu.
Ele a alcançou.
Ela deu a volta, o isqueiro caiu de suas mãos e logo começou a correr.
- Rachel! Rachel, espera!
O pânico borbulhava em seu peito, incrementando cada vez mais, estendendo-se até que sentiu que a borbulha estalaria e ela morreria, ali mesmo, pela força do medo que a possuía. Ela corria precipitadamente, sem ter idéia de aonde se dirigia, nem o que faria. Supôs que ele a caçaria. Supôs que a agarraria, e que o Senhor a ajudasse, que faria ela então? Que faria?
O vestíbulo acabaou-se bruscamente e sem um toque de alerta na escuridão. Ouviu a voz de Donovan disparando uma advertência – uma que ela ignorou – e depois sentiu o sólido e abrasivo muro de pedra freiando seu descuidado vôo com um só sopro. Sua cabeça, seu corpo. O impacto a sacudiu desde os dentes até os ossos.
Mas a cabeça levou a pior parte e pode sentir o calor do sangue correndo por suas feridas e escorrendo em seus olhos enquanto desabava lentamente no solo.
—Meu Deus, Rachel…
Se lançou sobre ela como um lobo sobre uma ovelha ferida e ela supôs que não tinha mais a mínima oportunidade. Morreria aqui, nesta masmorra ou o que fosse. Morreria aqui, ensanguetada e pálida, e o vampiro cobraria finalmente sua vingança sobre todas as mulheres do clã Sullivan. Ele se acocorou ao seu lado, acolhendo-a em seus braços e inclinando-se sobre ela. Rachel sentiu sua respiração no rosto. Seus dedos comprovando o pulso e ferida em sua fronte.
- Maldita idiota, podia ter se matado!
Como se não estivesse planejando concluir esse trabalho ele mesmo, pensou ela, agora aturdida, enquanto desmaiava. Ele se pos em pé e a levou de volta para o vestíbulo, atravessando uma das outras portas, onde ela não tinha visto nada e caminhou para a parede. Ela tentou debilmente escapar de seu abraço, o que provavelmente teria provocado que rompesse a cabeça novamente. Estava outra vez contra o solo, o que não aconteceu por seus braços que se endureceram ao redor dela.
- Fica quieta, Rachel.
- Deixe-me ir... deixe-me ir... – Se retorcia, lutava contra ele, mas sues braços eram como aço. Ele se deteve junto à parede, levantou uma mão enquanto a sustentava facilmente a sua cativa com a outra. Tocou algo e a parede se moveu, retrocedendo e deixando um buraco de dois pés de largura a cada lado. Donovan a transportou através desse buraco e ela conteve a respiração quando o muro se fechou outra vez.
Moveu-se para a esquerda, suviu um só lance de largas e sólidas escadas, mais sólidas que aquelas estreitas e arruinadas em que ela havia caído. Então, ele tocou outra parede localizada em cima da escada e esta se abriu como uma porta.
A atravessou e a depositou sobre um sofá suave, para logo voltar à parede e procurar algo. Momentos depois uma tênue luz banhou a habitação desde cima, fazendo-se mais brilhante até que o lugar esteve perfeitamente iluminado.
A luz sobre ela era, observou, a de um candelabro a gás. E a habitação ao seu redor era um grande vestíbulo.
- Tão próxima... estava... tão próxima...
- De que Rachel? De escapar?
Ela fechou os olhos e levou a mão à dor pussante em sua cabeça. Ele a ignorou por um momento, absorto em acender primeiro um fogo e depois outro, enquanto ela permanecia recostada. Ela sentiu o calor, viu a luz.
- Se o que queria era escapar, por que não saíste pela porta traseira quando despertastes esta manhã? Por que insistisses em fazer a única coisa que te pedi para não fazer?
Ele se voltou para enfrentá-la e ela o viu enquanto o observava com curiosidade, mas a visão das chamas na chaminé, refletidas no seu cabelo escuro e seus profundos olhos azuis só conseguiu que a cabeça lhe doesse mais, assim que rapidamente voltou a fechar os olhos.
- Não estava bisbilhotando. Eu... a escada traseira parecia insegura. Só tratava de encontrar um caminho mais seguro para sair destas ruínas.
Ele estava mais perto agora. Justo ao seu lado.
- Mentira – susurrou.
- Não.
A agarrou pelos ombros, obrigando-a a levantar a vista e se preparando, pensou, para acabar com ela. Mas suas mãos se fecharam sobre sua pele machucada e ela fez uma careta de dor. Donovan parou completamente quieto. Logo, carrancudo, afastou seu cabelo para um lado, observando seu rosto, seu pescoço.
- Meu Deus, esta mais ferida do que pensava.
Que estivesse decidido a ignorar o fato de que ela o havia visto se levantar de um caixão poderia resultar divertido, se ela não tivesse estado tão segura de que sua morte era iminente.
- Cair – lhe disse -. De um largo treixo de escadas... os morcegos me assustaram e perdi o equilíbrio...
Mordeu os lábios como a recordação do que havia passado sufocando as suas palavras.
Suspirando profundamente, ele segurou sua camisa pela barra e, sem sequer pedir-lhe permissão, tirou-a por cima de sua cabeça. Depois a tocou, com seus olhos como com suas mãos, examinando as contusões e arranhões que havia sofrido.
- Estou muito bem – disse ela -. Não quebrei nada.
Ele assentiu com a cabeça, mas tomou um pano imaculadamente branco de um bolso e o apertou contra sua cabeça ferida.
- Trarei algo gelado para isto.
- Não quero gelo. Só queri ir-me. Por favor...
Ele sacudiu a cabeça lentamente.
- Por que? Pensei que queria conhecer todos os meus segredos.
Rachel fechou firmemene à boca, tragando com força. Seu olhar se moveu sobre seu corpo, aquecendo-a. Ela se sentia desnuda, vestindo unicamente sua roupa de baixo e sua saia. E depois a olhou aos olhos, fazendo-a sentir-se ainda mais vunerável e exposta.
- Eu mudei de opinião. Encontrarei algum outro tema sobre o que escrever. Só... só quesro abandonar este lugar.
- E a mim, não é assim, Rachel? Por que descobriu o monstro de teus pesadelos. O demônio de tua infância. A lenda que negavas a crer. Tudo é verdade, tudo é real. Tudo está vivo... em mim.
Ela fechou os olhos.
- É certo, não?
- O que é que pensa?
Limitou-se a sacudir a cabeça.
- Nunca acreditei que fosse malvado. Diga-me que não estou equivocada.
Não disse nada, só a olhou fixamente.
– Não me mates – sussurrou -. Juro que nunca o direi a ninguém.
Seu sorriso foi lento e quase triste.
- Não vou te matar, Raquel. E já sei que não dirás meu segredo.
Ela piscou a esperança a inundou como uma torrente de calor e luz solar.
- Pode confiar em mim, Donovan. Eu juro.
- Não – disse ele -. Não posso confiar em ti. Por isso vai ficar aqui.
Suas sobrancelhas se elevaram, os olhos se arregalaram.
- Ficar aqui? Mas... mas... – Ela não entendia, não podia compreender. – Quanto tempo?
Ele não disse nada mas ela pode ler a resposta em seus olhos, podia ouvir sua profunda voz estremecendo sua coluna embora nunca pronunciou as palavras. As ouviu em sua alma. Para sempre.
Estava tão magoada e maltratada que parecía que a tinham golpeado. Sentí sua ador, com muita pena minha, como se estivesse me banhando em agua gelada.
Mas ela se afastou, seus olhos mostraravam um pouco de fúria, mais que isso, terror.
- Não me toques. Não quero ficar, me ouves? Tens que deixar ir.
Ficou imóvel, mantendo seu olhar glacial, enquanto eu continuava presionando sobre os machucados com um pano frio.
- Ficarás – disse.
- Vão se preocupar comigo no povoado. Virão me buscar.
Seus seios se tensionaram contra o corpete que vestia. Um pequeno hematoma púrpura se havia formado em um deles, eu pressionei o pano com gentileza em cima dele, sem aproximar a mão, mas mantendo-a aí. Sentía seu calor se filtrando dentro de minha palma e o calor do desejo se incendiando entre nós. Ela estava completamente quieta, olhava fixamente o lugar onde minha mão repousava sobre sua ferida. Sua respiração se voltou superficial e rápida.
- Seja honesta, Rachel. Não disse a ningupem aonde irias.
Ela piscou e soube que estana certo.
- Enviarás uma nota… ao pub para Mary, dizendo que tens que viajar e que não sabe quando voltará.
- Não farei semelhante coisa. – Então se libertou de mim, se pondo em pé em um salto, agarrou sua blusa do sofá e lutou para pô-la.
- Fará exatamente o que eu te disse.
- Nunca. – Avançou a toda pressa para a porta; eu permaneci quieto, deixando terminar a sua inútil tentativa. Quando deu um puxão encontrou a entrada selada herméticamente. Fechada com chave. Ficou quieta, me dando as costa, todavía com as mãos na porta e lentamente baixou a cabeça. Suavemente sussurrou:
- Que é Donovan O´Roark? E o que vai fazer comigo?
- Creio que já sabes o que sou.
Ela se voltou muito lentamente e senti seu olhar ardendo dentro de mim, buscando minha alma.
-Não. Isso é impossível. Isto é... alguma classe de engano muito elaborado.
-Não só não é impossível, como é certo. E creio que sim, que sabes.
Seus olhos se estreitaram, o temor os abandonou parcialmente. Se aproximou, me estudando com cuidadp e eu me senti exposto até os ossos. Mas se deteve entes de chegar até onde eu estava.
- Os vampiros não existem – sussurrou -. E a história Donovan O´Roark é só uma lenda. Não é real.
Eu permaneci muito quieto. Estava assombrado porque me sentia vunerável, porque em segredo me aterrava sua possível reação quando finalmente descobrisse a verdade.
- É isso, verdade? Esta é tua idéia de uma brincadeira. Pretende me dar uma lição. – Deu um passo, depois outro, e se deteve muito perto de mim. – Só está tratando de me assustar, e por um momento, o conseguiu. Mas eu voltei aos meus eixos, Donovan. Por que não me diz a simplesmente a verdade, em lugar de jogar a este jogo de pretender não me deixar ir?
Levantei as mãos e as deixei descansar gentilmente sobe seus ombros.
- Não é um jogo, Rachel. Diga-me, por que deveria te deixar fazer o mesmo que Dante deixou a Laura Sullivan fazer um século atrás? Para que possas assim correr até o povoado gritando igual ao que fez ela? Para que possas guiar uma multidão de volta aquí ao romper da aurora e por fim a minha miserável vida? — Fechando os olhos suspirei muito devagar -. Talvez se fosse mais sábio faria justamente isso.
Mas imediatamente me arrependi de tão impulsiva declaração. Quando abri meus olhos a vi franzindo-me o cenho.
- Não quero acreditar em nada disto. Se é um vampiro, demonstra.
Baixei a cabeça e a sacudi lentamente.
- Conhece os falatorios dos aldões do povoado. A maneira em que olham quando me vêem… como se estivessem diante do próprio diabo. Mocinha, que mais prova necessita?
Ela encolheu os ombros.
- Converte-te em vampiro. – sugeriu.
Elevei o olhar lentamente, percebendo o tom nervoso em sua voz.
- Deus, de verdade acredita que é uma brincadeira? Temo que essa não é uma habilidade que domine. Tenho ouvido que para os anciões da nossa espécie realmente é possível se moldar. Mas eu só tenho dois séculos de idade.
- Apenas idade suficiente para conduzir. – se burlou.
Fechei os olhos e suspirando profundamente, murmurei:
- Tens um espelho, Rachel?
- Um espelho?
Assenti com a cabeça, sem olhá-la. Ela vacilou. Então disse:
- Olha, não acredita que estás levando esta brincadeira bastante longe? Sabias que não ia iria embora tal como me pediu, por isso inventou essa bobeira com o caixão que colocou em cena e foi perfeita. Embora como podia estar seguro de que te encontraria nesse labirinto de rocha desmoronada?...quero dizer, poderia ter-me matado, e isso não seria realmente divertido, e...
- Pega o espelho. - Nossos olhares se encontraram e a olhei fixamente -. Pega o espelho, Rachel, e enfrentemos a isto de uma vez, que te parece?
- És um lunático. – Ela fuçou em seu bolso -. Isto não vai provar nada. Te juro, ganhou a primeira rodada. Aprendi a lição, meus dias de bisbilhoteira se acabaram e eu... – Extraiu um estojo de pó-de-arroz de seu bolso, o manipulou lentamente, e soube que voltava a sentir medo. Lutava contra ele, mas começou a temê-lo a pesar de seu ceticismo.
- Abre-o – lhe disse -. E depois, poderá me aborrecer como fazem os demais.
- Não sejas tonto – disse ela -. Nem sequer te conhecem. – Abriu o estojo.
- Me conhecem fazem dois séculos – lhe disse -. Eu era um deles antes. – Peguei o espelho de suas mãos, meus lábios tremeram ligeiramente -. Olha, Rachel, conhece ao monstro que todo mundo vê. – Eu sustentei o espelho junto a minha cara.
Ela respirou profundamente e se moveu ao meu redor para ficar detrás de mim. E então ofegou e voltou ao ponto de partida.
- Não pode ser... não pode ser verdade.
Eu permaneci quieto onde estava, fechando de um golpe o desprezível espelho e jogando-o sobre o sofá.
- Oh, é verdade.
- E a lenda? A história de como te levantou de teu próprio caixão e como o sacerdote tentou...
- Tentou me assassinar. Meu próprio pai lhe entegou o martelo e a estaca. Minha própria mãe me chamou demônio. E a mocinha com a qual ia me casar gritava pedindo meu sangue.
Percebi suas tentativas de tragar e maneiras em que lutava por respirar.
- E o resto? A crença de que voltaria um dia para destruir o povoado e se vingar das mulheres Sullivan?
Eu baixei a cabeça.
- Acredita que eu voltei a casa por isso, Rachel?
Piscou e me olhou diretamente aos olhos.
- Disse que eu não podia ir. Que pretendes fazer comigo?
- Não sei.
- Corro perigo aqui?
- Se te disser que não acreditaria?
Sua garganta convulsionava.
- Deixe-me ir, Donovan.
- Não estavas ansiosa por me deixar a noite, Rachel. Ou já esqueceu o beijo que nos demos em tua habitação?
-Isso foi antes de...
-Antes de que?Antes que soubesses a verdade? Que eu sou um monstro, empenhado na destruição e vingança? Não sabe nada sobre mim e contudo de boa vontade pensa o pior.
Por um momento ela guardou silêncio. Então, suspirando, disse:
- Tens razão, estou me comportando do mesmo modo que os demais. te Julgando, apesar de que jurei nunca fazê-lo. Exatamente da mesma maneira em que acreditas no pior sobre mim.
E suas palavras me sacudiram
-. Que seria capaz de te trair somente porque meus ancestrais o fizeram. Que se me deixas ir, gritarei teus segredos ao mundo.
Baixei a cabeça. Tinha razão, isso era exatamente o que eu pensava.
- Pois estamos em um “impasse”.
Irritou-se. Cruzou os braços sobre o peito.
- Vai matar-me?
- Não. – A olhei diretamente nos olhos -. Acredita em mim?
- Não deveria, mas por alguma estranha razão, acredito.
- Bom. – Suspirei de alívio.
- Não festeje, Donovan. Parte da razão porque acredito é porque quero muito fazê-lo. Somente sou demasiada consciente de que posso brincar comigo mesma.
- Não te machucaria, Rachel, tens minha palavra.
- Quando me deixará ir?
- Nãoposso. Não... apesar de tudo.
- Quando?
- Não sei. – pressionei a cabeça com ambas as mão desenhando lentos círculos -. Tenho que pensar.
Ficou imóvel durante um largo momento. Logo piscou e olhou ao teto.
- Devo ter algum problema por crer em tudo isto. Deveria estar gritando, ou fugindo para salvar minha vida, ou desmaiando, não?
- Na realidade já fizeste todas essas coisas.
Sua boca tremeu ligeiramente. Um trêmulo sorriso se insinuou nela.
- Então como reage a maioria das mulheres quando lhes diz que é um vampiro?
- Nunca o contei a nenhuma outra mulher.
Não a olhei quando disse isto. Em troca, girei e caminhei para a ardente lareira, onde me sentei numa cadeira próxima buscando o calor.
- Mas se o fizesse, imagino que reagiriam igual a você. Primeiro com horror, depois com incredulidade, e agora... - Girei para olhar atrás; para olhar a ela, que ainda permanecia imóvel -. Que sente agora, Rachel?
- Estou furiosa como o inferno contigo, por me manter aqui conra a minha vontade. Por outro lado... – Meneou a cabeça de um lado a ouro, encolhendo os ombros -. Não estou segura de saber o fazer. E tem outra coisa que estou sentido, Donovan O´Roark.
Um começo de pânico me escorregou pela nuca.
- O que?
- Fome.
Observou-lhe, enquanto seguía lutando com a horripilante sensação de estar caindo em um mundo de sonhos. Incomodada pelo peso de suas revelações, não muito segura de acreditar no que seus olhos haviam mostrado… Ela estaba deslumbrada. Mas não aterrorizada, ou não tanto como no princípio.
Ele partiu, deixando para explorar à vontade, e ela fez, passando a mão através dos livros na biblioteca, estudando as tapeçarias nas paredes. Recordou a noite anterior. O beijo. A maneira em que seus lábios se arrastaram por sua garganta e a forma em que ele havia provado o sabor de sua pela. A incrível sensação que o toque de sua boca provocava nela. Sensações que nunca tinha sentido antes. Só com um beijo. O que estaria pensando ele? Teria estado lutando contra alguma classe de furiosa luxúria por sangue? Apenas conseguindo se refrear para evitar tomar sua vida? E por que ela não estava paralisada pelo terror? Mas não estava. Estava intrigada, agora que o medo começava a enfraquecer. E mais ainda. Todavia lhe atraía, tanto como o tinha feito sempre. E só agora começava a dar-se conta de o tinha acreditado quando pequena... Poderia muito bem estar certo. Não era de todo impossível, ou sim? Nunca tinha sentido medo da figura escura que ela via como seu protetor quando era pequena. E não sentia agora. Estava nervosa, indecisa, aborrecida curiosa. Mas não aterrorizada. Poderia estar perdendo sua compreensão da realidade, de verdade que sim.
Então, ele apareceu com uma tigela de sopa fumegando em suas mãos e um copo com um líquido roxo. Como seu olhar se alargou e ficou fixo no líquido roxo, lhe ouviu murmurar: - Vinho – e imediatamente se sentiu estúpida. Certamente que era vinho. Que outra coisa poderia ser?
Deixou a sopa em um suporte de mármore e o aproximou a sua cadeira. Ela voltou a seu lugar, olhando a comida.
- Foi o melhor que pude encontrar. Os operários deixaram uns poucos víveres nos armários quando se foram.
Ela inclinou a cabeça a um lado.
_ E... tu?
Ele baixou a cabeça.
- Não faças perguntas sem que esteja preparada para ouvir as respostas, Rachel.
- Não me ocorre nada que possa me preparar para algo como isto. A você sim?
Levantou a cabeça lentamente.
- Que quer dizer?
-Bom ... Quer dizer, quando você entrou pela primeira vez .... O que aconteceu com você?
- Por que quer saber?
Ela encolheu os ombros.
- Eu... eu só quero saber. Você me mantém prisioneira aqui, o mínimo que pode fazer é conversar comigo.
- Isto não é conversar, é um interrogatório.
O olhou carrancuda.
- É curiosidade, nada mais.
- É uma mulher atrás de uma história. Essa tese, meus segredos, como disse. – Clareou a garganta -. De qualquer maneira, pode ser a melhor coisa, que todos saibam. Creio que enconrei uma solução para nosso mútuo problema. Um compromisso.
- Oh! – Ela bebia a sopa da colher, e voltava buscando mais. Estava quente, saborosa. – Um pacto, quer dizer?
- Sim.
- Bom, isso é interessante. Como pretendes fazer um trato comigo quando me deu a entender que estarei presa aqui, queira ou não?
- Ao menos desta forma terá ganho algo.
- E que é?
- Tudo o que quiser saber, Rachel. Fica comigo, me dê um tempo para fazer certos... preparativos, e te contarei minha história. E quando fizer as coisas que necessito fazer, te deixarei ir.
Ela inclinou a cabeça para um lado.
- De que classe de preparativos está falando, Donovan?
Encolhi os ombros, incapaz de olhar seus olhos, abertos pela curiosidade; seu temor acabando-se pouco a pouco.
- Necessitarei mudar meu nome, estabelecer uma nova identidade, preparar um lugar para viver, um novo lugar onde ninguém tenha me visto antes.
Sacudindo letamante a cabeça de um lado a ouro, ela sussurrou:
- Mas, por que?
- Porque tu saberás todos os meus segredos. E quando escrever sua tese, outros saberão. Virá uma multidão, alguns meramente curiosos, outros... outros com intenção de me destruir.
- Creio estás tendo uma reação exagerada. Ninguém acreditará que é verdade...
- Os aldões todavia o acreditam.
Ela baixou a cabeça.
- Isto não é 1898, Donovan. A furiosa multidão perseguiu só existe na sua imaginação.
- Não. – Disse suavemente -. Está em minha recordação. Vi como meu melhor amigo caminhava para sua própria morte, Rachel. Não tenho intenção de terminar minha vida dessa maneira. Não quero.
Levantou seu olhar para o meu, estudando meus olhos.
- Não posso imaginar te culpando- por isso. – Depois, afastou o caneco a um lado, ainda meio cheio, como se tivesse perdido a fome -. Parece que tens um montão de motivos.
- Os tenho.
- Acredito que tem uma coisa que não levou em consideração, Donovan.
A olhei, esperando. Ela levantou e passeou pelo lugar. Apoiando os braços na plataforma da chaminé, olhou fixamente as chamas. A luz banhou seu rosto, iluminou seus olhos.
- Não está dando o mínimo crédito a minha humanidade. Portanto, será uma grande surpresa para ti descobrir que sou, efetivamente, humana. Ou você acha que eu sou aparentemente o mesmo tipo de monstro que sustenta ser você.
- Eu nunca insinuei...
- Nunca escreveria uma tese que obrigaria um homem a abandonar sua casa, forçando-o a deixar sua vida inteira. Por que faria algo assim? Por um título universitário? Não vale a pena em absoluto.
Examinei seus olhos, buscando a mentira. Mas não encontrei.
- Nada disto é necessário, Donovan. Simplemente buscarei outro tema para minha tese.
Meus olhos se estreitaram. Quase quis acreditar nela.
- Por Deus!, pensa que estou te mentindo, não é assim, Donovan?
Tive que desviar olhar.
- Poderia estar mentindo – contestei -, ou poderia estar dizendo a verdade. Não posso estar seguro e temo que não possa arriscar em levar em consideração sua palavra.
- Nunca em minha vida faltei com minha palavra!
Ela fez essa declaração com tal ferocidade que quase conseguiu me fazer fraquejar minha resolução. Baixei a cabeça incapaz de olhar o rsoto, e sussurrei:
- Sinto muito.
Se colocou em frente a mim, então joguei um olhar na direção da porta e quando meu olhar voltou para ela, as lágrimas enchiam seus olhos.
- Realmente vai me reter aqui, como uma prisioneira, verdade?
- Não tenho outra opção, Rachel.
- O inferno que não, Donovan O'Roark. O inferno que não. Você tem razão numa coisa, eu admito. Você realmente é um monstro. E não porque você é um vampiro, mas porque você não tem coração. Nem confiança. Nem te preocupas por nada exceto por ti mesmo. Faz teus preparativos se deves fazê-los. E quando estiver pronto para me deixar ir, venha me buscar.
Sua ira caiu sobre mim como uma tempestade, e literalmente cambaleei para trás por sua força. Em seguida, elase virou e começou a subir a escada, em uma tentativa, tinha certeza de encontrar o seu quarto, fechar de um golpe a porta e, passar o ferrolho. E teria sido uma partida muito dramática se não tivesse se detido, ofegando, a meio caminho de um degrau de pedra. Sem se tornar disse:
- Pode amavalmente me guiar ao meu quarto, O'Roark? Não tenho nenhum desejo de tornar a me perder neste mausoléu.
Concordei e lentamente subi as escadas. Quando cheguei ao lado dela, acariciei seu cotovelo, agarrando com a mão, e ela se afastou com um puxão.
- Eu sou o caminho. Eu sou o porquê. Eu tenho que ser. - Me disse devagar, enquanto descia as escadas.
-É o instinto de preservação. Se Dante tivesse me ensinado uma coisa diferente ... mas ele me ensinou isso. Existimos para estar sozinhos. Viver sozinho. Não confiar em ninguém. É a única forma de podermos sobreviver. Ele esqueceu sua própria e mais importante lição. E ele morreu por isso.
Ela parou de caminhar e quando baixei a vista para saber por que, eu encontrei o seu olhar fixo em mim, ainda zangado, mas havia algo mais profundo em seus olhos.
- Só – sussurrou - E exatamente, quanto tempo faz que vive conforme as palavras de Dante?
- Desde que Dante morreu – contestei suavemente.
- Cem anos... – Encolhi meus ombros e comecei a caimnhar outra vez, tomando seu cotovelo e empurrando-a para cima. – Acostuma-se a isso.
- Não, não acredito. Não me assombra que não tenhas a mínima idéia de como se comportar com os demais.
Girei para as escadas e me detive ante uma grande porta.
- Acredito que gostará mais deste quarto, Rachel. Eu...o decorei eu mesmo.
Ela piscou.
- Para quem?
A olhei.
- Eu... para ninguém. Foi um capricho. Um estúpido capricho.
Vire o parafuso para a parede, abri a porta de um empurrão e vi como as luzes a gás acendiam lentamente. Ele tinha ligado a linhas enquanto ela dormia, acendeu todos os pilotos, e até mesmo limpou o vidro dos globos de cristal. Eu realmente não tinha contado em deixá-la presa. Mas também não se esperava encontrá-la se retirando.
Ela deu um passo atrás de mim para entrar no quarto que eu havia construído para o motivo mais impensável de todos. Ele lembrou mais do que nunca a traição de Dante às mãos de uma mulher, e sua posterior morte. Também recordava a felicidade de seu amigo, o brilho ao seu redor quando ele havia se apaixonado e se acreditou correspondido. Então não me consegui expressar minhas dúvidas a Dante a respeito da lealdade de Laura Sullivan em voz alta. Não devia haver felicidade no mundo comparável ao amor.
E enquanto a minha existência foi gasta em completa solidão, a minha mente tinha tido a oportunidade de divagar. Perguntar. Sonhar. Como seria? O que aconteceria se acontecesse comigo? E este fantástico sonho me inspirou para criar essas salas. Havia criado a suite para a ausente fantasia que nunca haveria de conhecer. Estadias que gostaria de lhe dar, se ela fosse real. As salas de que teríamos de compartilhar. Vazias. Permaneciam vazias, como estariam sempre. Exceto por Rachel.Por algumas noites, estariam ocupadas com uma mulher cuja beleza era digna delas.
- Por Deus! Isto sim é precioso... – Deu um passo para dentro girando em um lento círculo para abarcar por completo o diáfano tecido de cor malva que caía desde o dossel da cama até formar cortinas.
O tapete de cores semelhantes era tão espesso que seus pés não desejavam mover-se jamais. As portas de vidro, que se abria para um balcão de pedra digno de uma princesa. A madeira trabalhada a mão, pintada em ouro para combinar com o papel de parede e os laços a eles vinculando cortinas cor de malva.
Seu sorriso chegou, apesar da situação. E eu secratamente o saboreei. As estâncias estavam desperdiçadas sem ninguém que as desfrutasse. Que lhe proporcionasse esse prazer e ela me satisfazia em um nível muito pessoal.
- Há mais – lhe disse, tomando sua mão e conduzindo-a a uma das portas -. O banho, aqui.
Ela deu um grito sufocado ante a banheira fundida no solo, as instalações douradas. Espessas toalhas de um verde profundo se alinhavam em todas as estantes, e grossos tapetes da mesma tonalidade cobriam o piso. Garrafas de caros azeites e fragrâncias ocupavam as estantes.
- A quem pensavas receber aqui, Donovan? A uma rainha?
A minha amada. Aquela que nunca conhecerei. Mas não o disse a ela.
- Além do mais há uma sala de estar – lhe disse, voltando ao quarto e empurrando para abrir a segunda porta e revelando um quarto ocupado por estantes cheias de livros, dois assentos na janela, uma pequena mesa de pé com duas cadeiras alcochoadas, um sofá e uma cadeira de balanço. Havia também uma chaminé preparada, mas apagada e lâmpadas de gás alinhadas nas paredes de pedra.
Mas ela não olhava a habitação. Estava olhando a mim.
- A quem se deve tudo isto? – sussurrou -. Por que haveria de te dar ao trabalho se realmente estás destinado a viver tua vida só, Donovan O’Roark?
Sacudi a cabeça.
- Como disse antes, se trata de um estúpido capricho.
- Não, não acredito – se aproximou, levantando a cabeça, buscando meus olhos – Estás só. E cansado de está-lo. Isso é no que acredito.
- Isso não tem nada a ver com... – baixei os olhos, minha voz se dissipando.
- Com o que? Com o motivo pelo qual me retém aqui? – Piscou e olhou ao redor -. Isto é no que acredita você, Donovan, mas eu não acredito que seja verdade. Acredito que criaste este lugar com a intenção de trazer alguém aqui para preenchê-la. Para ... te preencher.
Girei completamente nesse momento, olhando fixamente a lareira, como se me fascinasse, e tentando não tremer pelo pânico que me causavam suas palavras.
- Pensando dessa forma só conseguirá te confundir,Rachel. Não necessito ninguém. Não necessito compartilhar minha vida com ninguém. Tu estás aqui porque não posso te deixar ir. Mas o farei, quando meus assuntos estiverem resolvidos e seja seguro para mim faze-lo. Isso é tudo. Não há nada mais.
Te senti se mover em minhas costas.
- De acordo. Se você o diz.
Me voltei para sair. Ela permaneceu em silêncio enquanto eu dava um passo para o corredor e fechava a porta. E então fiquei ali, tremendo.
Deus poderia ela estar certa?
- Todas as comodidades modernas – resmungou a sós em seu quarto. Ele tinha ido, a deixando só e provavelmente acreditando que ela assim preferia. Estava equivocado. O lugar era muito grande, estava vazio e silencioso. Como uma tumba. Entrou em uma bacia cheia de água quente e colocou alguns azeites aromáticos dentro. Seus machucados necessitavam cuidados e o calor aliviou um pouco suas dores. Mas quando saísse, teria que voltar a colocar suas sujas e rasgadas roupas, e a idéia não era atrativa. Supondo que ele não lhe daria tempo suficiente para voltar a seu quarto sobre o pub e recolher o resto de seus pertences. Acaso esperava que ela passase todo o tempo que estivesse ali usando a mesma roupa? Ainda pior, esperava que ela estivesse sempre só nesse quarto? Ele não podia esperar isso. Ela não resistiria.
Quando a água começou a esfriar saiu, se envolveu em uma toalha grossa de cor verde e voltou ao dormitório. As portas duplas de um armário embutido na parede a atraíram, se aproximou lentamente até elas e, ainda vacilando, estirou a mão para abri-las.
-Senhor... – O armário estava cheio de roupas. Cetins, sedas e encaixes em cem tonalidades diferentes penduravam dos cabides.
Em um lado tinham estantes embutidas na parede e quando as abriu encontrou camisolas – quase frágeis demais para serem tocadas – e roupa interior.
- Mas por que? – Tocou as peças de vestir, deslizou um a um os cabides ao largo de onde penduravam, observando que havia variedades tanto de tamanhos como de cores e tecidos. Fez uma pausa quando viu uma saia bastante ampla, emparelhada no cabide com uma blusa branca de ombros descobertos. Parecia a vestimenta de uma cigana.
- Pegue tudo o que goste.
Ela conteve o fôlego e deu a volta, apertando automaticamente a toalha que a envolvia.
- Donovan. Não te ouvir entrar.
- Esperava que a porta estivesse fechada com chave.
Ela piscou, sem dizer nada. Mas desta vez, ao buscar seus olhos, viu dor neles. A solidão. Ele havia construído esses quartos por um capricho, havia dito. Mas era óbvio que o havia preparado para uma mulher. Ela era real? Se perguntou. Ou algum desejo distante que se tinha permitido ter em segredo? Como ela permanecia em silêncio, ele retrocedeu um passo, com sua mão ainda apoiada no trinco da porta.
- Sinto muito. Te deixarei só.
- Não, não vá.
Ele se deteve bruscamente, olhando-a. Ela viu como seu intenso olhar descia para além de seu rosto, apenas tocando o seu corpo, coberto só pela toalha. Ela sabia que seus machucados se viam, seu cabelo estava úmido e enredado, caindo sobre seus ombros. E ainda assim, sentiu uma reação profunda ante esse olhar. Como se em seus olhos houvesse verdadeira admiração e não só surpresa.
- Quer... que eu fique?
Ela se voltou para o armário, pegando as roupas que a tinham atraído, sem olha-lo.
- Se pensas me alojar aqui, Donovan, pelo menos o que pode fazer é me distrair. Ficarei louca se passar todo o tempo só nesse quarto. Embora sejam bonito, prontamente morreria pelo aborrecimento.
Ele inclinou a cabeça.
- Eu... pensei que querias descansar.
- É demasiado cedo para descansar. Além do mais, se devo dormir toda a noite e tu deves dormir todo o dia... – Piscou e inclinou sua cabeça para um lado -. O fazes, não?
Ele se limitou a assentir com a cabeça.
- Pois bem, então como cumprirá nosso trato? Quando terás tempo para me contar todos os seus segredos, Donovan?
Rapidamente, ele nivelou seu olhar com o dela e um cenho apareceu em sua frente.
- Se decidiu escrever o artigo depois de tudo?
Ela encolheu os ombros, acomodou a roupa sobre seu braço e se encaminhou para o banheiro.
- Pode acreditar no que quiser. O fará de qualquer maneira. A verdade é que sou curiosa.
- Isso é tudo? – perguntou.
Ele parou na entrada pára olhar a ele.
- Sim. Isso é tudo. Estarei pronta em um minuto. – E fechou a porta. Rapidamente colocou a saia, larga e solta, que se movia a seu redor como uma brisa primaveril. Depois a blusa, as mangas caiam por debaixo de seus ombos e aferrou a cintura elástica o suficiente alta para que uma porção de seu abdomem ficasse visível. Penteou o cabelo, franzindo o sobrolho ante a falta de um espelho no quarto.
Nenhum espelho. Como se nem sequer, em suas melhores fantasias, ele se houvesse permitido imaginar uma mulher mortal preenchendo sua solidão. Senão somente a outra criatura como ele. Ela não encaixava de nenhuma forma, ou sim? Piscou e logo franziu o cenho com força. Não importava! O que lhe havia feito pensar nisso? Oh, mas ela o sabia. O sabia mais com cada momento que passava. Ele era essa alma amável que a tinha retirado do rio, esse anjo escuro que a tinha confortado quando ela chorava em sua cama, só e assustada. E a quem ela tinha amado durante toda a sua vida.
Ele não confiava nela. Nem sequer estava segura de poder culpá-lo por isso. Ela era uma Sullivan. Mas estava destinada a consertar as coisas, estava segura. Tinha nascido para isso.
Finalmente, clareou a garganta e, quando colocou em ordem os pensamentos, regressou ao dormitório.
Donovan a olhou de cima abaixo, piscando com surpresa.
- Não é nada moderno – disse ela acariciando o tecido da saia.
- É adorável. Você é adorável.
Ela desviou o rosto, sentindo como o calor avançava lentamente por suas bochechas.
- Estes quartos são tão diferentes ao resto do castelo... também o do grande vestíbulo.
- Na realidade, só falta reparar a ala norte. Desafortunadamente, foi ai onde você acabou antes. A maior parte do lugar havia sido restaurada, modernizada. – Estendeu a mão para afastar o cabelo da sua testa e examinou a contusão com cautela, que era o resultado de seu impacto contra a parede -. Inclusive tem eletricidade.
- Mas usas as lâmpadas de gás?
- Prefiro-as. Dói muito, Rachel?
- Estou dolorida, mas só um pouco. Estarei bem – lhe disse.
Olhou o suave resplendor dourado que emanava das lâmpadas do quarto e assentiu com a cabeça
-. Estou de acordo, as lâmpadas de gás são muito mais agradáveis. Me mostrará os arredores, então? Um... as partes restauradas quero dizer. Não tenho interesse em ver a ala norte outra vez.
- Isso é bom. Mas temo que esta ala estar proibida durante tua estada aqui, Rachel.
Ela procurou seu rosto.
- Assim que há alguns segredos que não compartilharás comigo?
Ele revirou os olhos e negou com a cabeça.
- A ala norte não é segura, como podes observar. Se mantenha longe dali, Rachel.
Sua curiosidade de elevou até as nuvens.
- De acordo – disse.
Não pensou que ele acreditaria nela.
- Vem. – Lhe ofereceu seu braço.
Ela o pegou. Fechou a mão ao redor de seu antebraço e o sentiu. Quente, não frio como seria de se esperar. Sentia-se real. Sentia como um homem. Não como um monstro. Ela reparou que ele tinha os olhos mais azuis que já tinha visto e o cabelo de um suave tom castanho escuro, quase negro. No princípio tinha sentido incrivelmente atraída por ele. E ainda estava.
A guiou pelo vestíbulo principal daquela ala. Mostrando a ela outros dormitórios, nenhum em uso, mas preparados para receber visitas. Estranho, para um homem que pretendia estar só para sempre. Depois a conduziu de volta as escadas debaixo, onde lhe mostrou a biblioteca, uma habitação grande com livros ordenados em estantes que se apilavam até o teto. Cadeiras de couro colocadas de duas em duas junto a altíssimas janelsa.
- Esta é uma sala triste – disse, falando em um tom tão baixo como se estivessde num funeral.
- Triste? Por quê?
Ela avançou lentamente, se detendo entre as cadeiras ao lado de uma alta janela qu estava completamente coberta por uma cortina de veludo grosso.
- Os assentos... estão colocados de par em par. Todos eles. Mas não tem ninguém que sente junto a ti. – Quando se voltou para olhá-lo, ele se limitou a encolher os ombros. Ela voltou a girar e acariciou o suave e grosso veludo. – É como se o mundo fosse um lugar que preferia não ver. Mas é muito bonito lá fora para ficar, sabe?
Ele deu um passo adiante, tirou o cordão e abriu as cortinas.
- Sim, eu sei.
Ela deu uma olhada fora, logo ofegou por causa da surpresa. As janelas mostravam a um caminho de rosas que serpenteavam em meio a um exuberante arbustos e silvados que não pôde identificar. No meio, o luar refulgiu uma fonte de pedras completamente restaurada. Uma imagem de pedra de uma deusa pagã estava em pé sobre um pedestal, despejando água clara de suas palmas estendidas que salpicavam na lagoa que se estendia a seus pés.
- è lindo – sussurrou, mas então desviou o olhar, observando fixamente com desconcerto o resto das cortinas que estavam firmemente fechadas.
- Só estão fechadas durante o dia, Rachel. As abro quando cai à noite. – Olhou ao longe, ao jardim -. Amo a noite.
- E a luz do dia? – perguntou, e sua voz soou como um mero sussurro.
- Me mataria. Do mesmo que matou ao Dante. – Girou para enfrentá-la -. Gostaria de passear no jardim?
- Sim. Sim, gostaria muito.
Ele tomou sua mão. Aquilo parecia ter se convertido em um costume. Ainda assim, ela o permitiu, e o seguiu enquanto a conduzia ao extremo oposto da biblioteca, a outro conjunto de cortinas. Quando se abriram, revelaram uma porta francesa que se abria para o jardim.
- É maior do que pode ver desde a janela.
Ele assentiu e apertou sua mão na sua, talvesz de maneira inconsciente. Ou talvez não.
- Se estende sobre este lado e ao redor do castelo, chagando quase aos escarpados.
Ela apalpou uma videira de aspecto delicado que se agarrava as paredes do castelo. Brotos verdes e apertados se balançavam pesadamente dela.
- Nunca tinha visto isto antes.
- Espera – ele disse -. Nos sentaremos... aqui. – apontou um banco de pedra com pernas em forma de garras e cabeça de leão como braços. Caminharam até lá e sentaram.
- É por isso que descansas durante o dia? Por que não pode te expor a luz do sol?
Ele se voltou para ela.
- Não é só por isso.
Ela ficou esperando, lhe dando tempo para responder ao mesmo tempo em que observava seu rosto buscando... algo. Suas verdadeiras malignas intenções, supus.
- Quando a luz do dia se aproxima nossas funções começam a ficar lentas. Ao amanhecer geralmente estamos inconscientes, seja ou não nossa vontade. E não é o tipo de sono que pode ser despertado.
- Como... a morte?
- Não tão profundo como a morte, suponho. Mas muito mais profundo que o sono de qualquer mortal.
- Assim se alguém de espetar, te sacudir ou te gritar no ouvido...
-Ou me colocar fogo ou cravar uma estaca em meu coração – concluiu por ela -. Eu sentiria, mas seria incapaz de ter alguma reação o suficiente para me defender.
-Isso deve dar medo.
- É a razão para termos caixões, ocultos nas entradas no castelo.
Sou mais vulnerável enquanto descanso... e o motivo porque estou te contando isso... desconheço.
- Talves começa a confiar em mim?
- Não confio em ninguém, Rachel. Em lindas mulheres mortais muito menos.
Ela piscou.
- Me... acha linda?
Ele a olhou fixamente durante um longo momento e seus olhos pareciam subir de temperatura enquanto desciam, percorrendo-a lentamente antes de voltar a encontrar-se com os dela. Então simplesmente endireitou as costas olhando o castelo e para as curiosas videiras. – Observa.
Ela o fez. Depois conteve o fôlego enquanto um por um os brotos verdes pareciam romper-se. Pouco a pouco abrira, suas pétalas leitosas se despregaram, suas caras se voltaram para a luz da lua como se lhe dessem boas vindas. Saudando a noite.
- Nunca tinha visto nada igual.
- São muito peculiares. Lírios da lua. São importados.
- São formosos. – A medida que olhava ao redor, observou outras plantas em flor.
- Não tenho flores que se fecham à noite. Tudo permanece aberto nas horas escuras e só florescerem a noite.
- Tem sentido. Os lírios diurnos ou bons-dias estariam desaproveitados aqui.
Ele concordou com a cabeça. Rachel bocejou, cobrindo rapidamente a boca com a mão.
- É tarde – disse ele -. Teve um dia esgotador. Deveria ir descansar.
Ela inclinou a cabeça para um lado.
- Sempre posso dormir até tarde amanhã. Não perderei nada.
Ele concordou, se pondo de pé junto a ela e a guiando de volta através das veredas. Ela deslizou uma mão pela água da fonte quando passaram junto a ela e a observou com curiosidade. Então chegaram à porta e Ele a guiou ao interior. Fechou as portas trazeiras. Passou o ferrolho, um que requeria uma chave para abrir.
- Donovan – perguntou; ele fez uma pausa e girou para enfrentá-la.
- Tens estado só todo este tempo?
Ele franziu o cenho.
- Falo com outros só quando me vejo obrigado.
- Bom, eu não me referia a isso exatamente.
- A que então?
Ela baixou o olhar.
- Eu... quero dizer.. tens estado... já sabes. Sem mulher? Todo este tempo? Um século inteiro?
Ele piscou, e sacudiu a cabeça.
- Que pergunta mais estranha fazes, Rachel – disse -. Por que quer saber?
Ela encolheu os ombros e se deu conta de que tinha estado contendo a respiração enquanto esperava sua resposta.
- Eu... talvez não deveria ter perguntado algo tão pessoal - . o olhou nos olhos, enquanto combatia um torvelinho em seu ventre -. Mas antes disse que me contarias tudo que eu quisesse saber.
- Disse, não? – sua voz já não era amável. De fato parecia zangado. A agarrou pelo braço, seu toque foi cuidadoso, mas firme e possessivo, e a obrigou a andar. E ela percebeu que parecia ter-se esquecido completamente de fechar a porta com chave.
Mas não estava segura de que a idéia tinha ocupado seus pensamentos e isso lhe provocou mais medo do que jamais tinha sentido.
Eu sabia o que era desejado. Tentava me comover. Tentava me fazer sentir algo por ela. Desejo e talvez algo mais. Porque se conseguisse, eu a abadonada. Me afetaria e eu a deixaria apesar do que me custaria. Ela estava errada, claro. Eu tinha treinado muito bem ao longo dos séculos que passei sozinho. Não ia me afetar. Nem ela nem ninguém.
Mas sim a queria. Ela tinha sido bem sucedida em termos disso. Mas não por causa de sua inteligente tática enganosa. Tinha acontecido a partir do momento em que a tinha visto novamente, virou uma bela mulher, parada na porta do bar me convidando a entrar.
Eu abri a porta do quarto dela mas não me detive educadamente quando ela entrou. Em vez disso, fui dentro e fechei a porta atrás de mim.
Ela virou quando ouviu o golpe do fechamento da porta e alargou os seus olhos, mas rapidamente tentou esconder o choque.
-Não me respondeu, Rachel. Porque me fez essa pergunta?
Ela levantou o queixo.
-Eu já pedi desculpas por isso, disse ela. Só estava curiosa.
- Acho que isso foi algo mais, - me aproximei um passo em direção a ela, mas parei quando ela retrocedeu.
- Eu não sei o que você quer dizer.
- Sim, você sabe. Você está jogando um jogo perigoso, Rachel. Talvez você não saiba como ele é perigoso.
Ela sacudiu a cabeça dela.
-Eu não disse ...
-Já que é tão curiosa em relação ao sexo, eu te direi. Sexo com um vampiro é muito diferente.
Baixou a cabeça com suas bochechas em chamas. Ela fechou os olhos.
-Eu não quero ouvir.
-Você perguntou. Ouça a resposta. Olhe para mim, Rachel.
Pressionando o maxilar, fez o que pedi. Entrei profundamente em sua mente e ordenei minha vontade. Eu assumi o controle. Dessa vez foi tão fácil como apagar um interruptor.
-Vem.
Ela abriu a sua boca como se estivesse disposta a protestar e, em seguida, piscou com surpresa quando seu corpo a desobedeceu. Seus pés a impeliram adiante arranhando o piso.
-Mais perto - Eu lhe disse, e ela aproximou.
Parou muito perto de mim, com a cabeça erguida e olhos assustados, mas muito abertos, cintilando com uma mistura de excitação por causa do medo e do desejo enquanto esperava. E então eu soube por que ela tinha reagido desta vez, quando não tinha feito antes. Foi porque desta vez ela queria.
Estendi a mão para tocar seu rosto, muito gentilmente acariciei a sua face e, em seguida, meus dedos escorregaram para baixo. Passando por seu maxilar, queixo, em seguida, suavemente no seu pescoço, parando para sentir o ritmo do seu pulso. O desejo excursionou por todo o meu corpo. Supunha que não tinha que ser assim. Eu não tinha planejado isso. Meus dedos caíram sobre seu corpo, tocando levemente sua clavícula, traçando seu desenho, e então se movendo um pouco sobre um dos seios dela. Eu senti sua resposta, um gemido suave, o endurecimento de seu mamilo sob meus dedos. Mas ainda mais, senti a minha própria reação. Ela me excitava ... o seu poder sobre mim, e o perigo que esse poder representava. A minha aparente incapacidade para ficar indiferente a ela, resistir a seu charme. Minha intenção era mostrar o quão perigoso que poderia ser, que ela tentasse me seduzir com os seus olhos e palavras. E, com cada maldita respiração que emitia. Em vez disso, só estava piorando a situação.
-Por favor ...
Era um sussurro, uma súplica. Afastei a mão, mas a ponta dos meus dedos ainda formigava. A desejava.
- Jogar com os meus desejos é um assunto arriscado, Rachel,- disse-lhe-. Porque eu posso controlar sua mente com a minha - olhei fixamente a seus olhos -. Beija-me, Rachel.
Ela se esticou, seus lábios tremiam mas foram separados logo tocou os meus. Então voltou a me tocar. Eu fiquei sem se mexer por um momento, mas depois eu tremia, e me inclinei sobre ela, tomando a sua boca, possuindo-a, invadindo-a, enquanto ela pressionava fortemente o seu corpo contra o meu.
Ela tinha gosto de mel. Seu efeito foi igual ao de uma droga e minha ânsia por ela era mais poderosa do que qualquer coisa que já conheci.
Quando finalmente afastei a minha boca, fiquei sem fôlego e meu coração batia mais rápido. Mas o dela também. Inalando profundamente, eu dei-lhe a última lição.
- Quer saber qual é o pior de tudo isto Rachel? Um pequeno conhecimento que te assustará ainda mais?
Ela assentiu, só uma vez.
-Mesmo com esse poder, não posso te obrigar a fazer algo que realmente não quiser. Sua vontade é muito forte. - E com isso, a liberei, fechei a minha mente novamente e quebrei a ligação.
Ela ficou calada, me olhando fixamente, mas o fogo dos seus olhos ainda estava lá, pensei, tanto pela raiva como pelo desejo que ainda persistia.
-Você é um bastardo. - Foi um sussurro.
-Eu pensei que estava atuando com mais tato para me conter. Não é o que eu queria, Rachel. E acredito que você também.
Ela desviou seu olhar.
- Desfruta disto, Donovan? Tentando me humilhar?
- Tentava apenas esclarecer os fatos. Não tente me seduzir para que lhe permita sair, Rachel. Não deixarei brincar comigo dessa maneira. Eu não serei manipulado. Talvez queira, mas nunca vai me afetar. Nunca. Sou incapaz de sentir isso. Mas se você insistir em despertar meu desejo, não me oporei. Te possuirei.
Ela me olhou fixamente, os olhos dela chamejaram com um fogo que eu pensei que já teria sido extinto.
-Se a única maneira em pode possuir a uma mulher é se apoderando de sua mente, então tenho pena de ti, Donovan O'Roark.
Eu abri minha boca para responder, só para me encontrar incapaz de pronunciar qualquer palavra.
- E se você acha que o seu logro é muito impressionante é que você está cego.
Sem dizer uma única palavra, agarrou a túnica pela parte elástica da cintura a removeu deslizando por sua cabeça. E então ela ficou lá paralisada, com o seu seio e nu perfeito, inchando-se ante mim como um fruto proibido do Éden.
Ela aproximou-se.
- Adiante - sussurrou. Toca-me.
Agarrou a minha mão e levantou, pressionando minhas palmas contra o seu seio. Fechei os olhos quando o calor do seu corpo invadiu minha mão. O ar assobiou entre os meus dentes e senti como calor se aumentava, borbulhando dentro de mim como um vulcão inativo durante muito tempo, agora à beira da erupção. Disse a mim mesmo para me afastar, sair da sala, mas eu não poderia fazê-lo. Minha mão estava em movimento, acarinhado, apertando e depois a minha outra mão foi levantada para fazer o mesmo e os meus olhos se abriram quando o desejo me ultrapassou.
Ela estava respirando entrecortadamente e tinha a cabeça atirada para trás. Expondo seu pescoço, macio e suave, bastante tentador. Posava à minha frente como uma oferta para um deus escuro. Uma oferta que eu queria tomar.
- Agora você vê? – me sussurrou -. Este poder que tens sobre mim não só você dirige. Eu também posso fazer isso. E se estivesse planejamento seduzir-te, Donovan, então teria feito muito mais do que uma simples pergunta.
Dito isto, ela retrocedeu dando um passo atrás rápido e enfático, longe de mim, me deixando parado lá, ofegando, excitado à beira da loucura, me perguntando se ela tinha idéia do que estava a provocar em mim.
-Você é uma idiota - agarrei sua cintura e a puxei, aproximando-a, atirando-lhe a cabeça para trás com uma mão enquanto meus lábios se separavam.
Seu corpo se esmagou contra o meu, me arqueei sobre ela e afundei meus dentes em sua delicada grarganta. Ela gritou debilmente, ficou rígida, mas então enquanto eu sugava, extraindo o precioso líquido de seu corpo, ela relaxou. Seu corpo se derreteu em meus braços e sua cabeça caiu mais ainda. Ela arqueou seu pescoço pressionando-o contra minha boca.
- Sim – sussurrou -. Oh, siiiimmmm......
Me pus a um lado, ainda não estava saciado, apensa tinha tomado uma mostra de seu nu sabor... desejando mais. Ofegando pelo desejo.
Sua mão me roçou acariciando a ereção entre minhas pernas e eu me arqueei contra seu toque. Mas não podia fazê-lo. Não podia tomá-la da maneira em que meu corpo gritava que fizesse. Porque havia algo mais que desejo aqui, algo que me assustava. Toda minha demonstração tinha escorrido de minhas mãos, acaso não era ssim? Supunha que ela era a única que teria que estar assustada. Baixei o olhar para encontrar os seus e soube que ela não estava. Não realmente. Oh, sim tinha um pouco de medo em seus olhos, mas só servia para aumentar o desejo. Como se ela pudesse ver minha indecisão, minha vacilação e a necessidade imperativa de abandonar o quarto, alcançou sua saia, a desabotoou e começou a baixá-la lentamente.
Fechei os olhos e lhe dei as costas.
- Isso... não vai acontecer.
- Tu também o desejas.
- Sim desejo penetrar teu corpo com o meu e te tomar. Do mesmo modo em que desejo drenar cada gota de sangue de tua suculenta garganta, Rachel.
- Serias incapaz de machucar-me.
Dei a volta.
- O que passaria se te ferisse mesmo sem querer?
- Não o fará.
Empurrou a saia para o solo, tirou a roupa de baixo e voltou a se aproximar de mim, deslizando as mãos pela frente da minha camisa.
Segurei seus pulsos e a olhei diretamente aos olhos. Desnuda, excitada, praticamente rogando que a tomasse. Tão excitada que era apenas consciente do que fazia. Imóbilizei suas mãos quando começou a me desabotoar a camisa.
—Basta, Rachel.
Ela parou gelada, piscando. Quando liberei suas mãos as deixando cair para os lados e notei que tremia da cabeça aos pés. Ela me deu as costas e, sem saber o que fazer, abandonei o quarto.
Que havia feito?
Oh, Deus. Rachel se jogou na cama, escondendo seu rosto na colcha acetinada, lutando contra as lágrimas de absoluta vergonha.
- Foi ele – murmurou -. Ele me fez atuar dessa maneira. Ele... - mas ela sabia que não era verdade.
Ele não a tinha forçado a fazer nada. Ela tinha atuado por conta própria. Exceto por esse breve interlúdio em que ele quis lhe demonstrar seu poder sobre ela e se viu obrigada a dobrar a aposta – para salvaguardar seu orgulho e demonstrar a ele qu ela também tinha poder. O poder feminino para obrigar a um homem a fazer sua vontade. E o tinha. Talvez em demasia, ja que ele tinha perdido o controle. O tinha tocado, o tinha sentido. E o entendia, porque ela também tinha perdido o controle.
Tinha se comportado como uma prostituta experiente. Quem era esta mulher dentro do seu corpo? Não era ela, não era Rachel Sullivan. Ela nunca tinha se comportado dessa maneira com nenhum homem. Nunca. Mas ele não era só um homem. Ele era seu guardião. O era? E se estivesse equivocada? Ela tinha que sair daqui. Agora, essa noite. Não podia confiar em seus próprios atos se permanecia perto dele, não podia pensar coerentemente quando ele estava perto. O que era isto que sentia esta certeza de que estava destinada a ser sua, agora e para sempre? O que era esta necessidade? Um sonho infantil? Sentou-se lentamente, enxugando os olhos e vasculhando o quarto em busca de suas roupas. O calor inundou seu rosto quando as viu espalhadas no solo. O tinha feito ela. Tinha se desnudado para ele, desavergonhadamente, com desfaçatez. Não, não tinha sido ela, mas sim alguma mulher selvagem que tinha vivido silenciosamente dentro dela. Escondendo-se, e que tinha escolhido este momento para sair à luz – era o pior momento possível.
Não, ela tinha que ir. Vestiu-se, se aproximou da porta e a briu só um pouco. Ele não estava à vista. Mas uma música forte e estrondosa se ouvia no grande salão no primeiro piso. Beethoven pensou. Violento em seu poder.
Moveu-se sigilosamente até o corredor e caminhou para as escadas, para descê-las só em parte. O suficiente para poder vê-lo no grande salão. Estava de pé perto da ardente lareira, com a cabeça baixa e os olhos fechados. Permanecia completamente imóvel enquanto a música se derramava sobre ele.
Ela umedeceu os láios e desceu lentamente até alcançar o pé das escadas, sem tirar os olhos de cima dele até desaparecer dobrando uma esquina. Ele não se moveu em nenhum momento. Não se alterou, nem sequer levantou a cabeça. Ela se movia em silêncio, mas esperava que ele se desse conta, de algum modo. Que estivesse consciente dela, como se tivesse algum sexto sentido, que ele provavelmente não...Ou talvez pudesse. Mas não o tinha notado.
Ela tinha planejado escapar pela manhã, enquanto ele estivesse dormindo. Mas não podia esperar, não agora. Ele era demasiado confuso... e estava muito zangado com ela por provocar seus sentimentos. Sua mão levantou para tocar o lugar em sua garganta onde ele tinha se alimentado e sentiu uma pequena ferida. Não doía, mas lhe coçava com sensual reconhecimento, sensibilizado. Só o fato de tocar-se aí despertava recordações de seu beijo, de suas carícias... sua boca movendo-se aí.
Teve que se deter, apoiar-se no frio muro de pedra e aspirar profundamente para encher seus pulmões. Ela o desejava. Desejava a um homem que certamente não conhecia, apesar de que sentia que o conhecia desde sempre. Um vampiro, mas isso não fazia nenhuma diferença. Não podia ficar, porque só o Senhor sabia do que seria capaz de fazer se ficava. Se ele voltasse a seu quarto, se a beijava outra vez...
Mes ele não o faria. Não queria que ela o afetasse, tinha deixado isso claro. Endireitando-se, levantou os ombros e seguiu pelo corredor para a biblioteca. Então passou uma última vista atrás para assegurar-se de que ele não a tinha seguido e entrou. As portas francesas permaneciam igual a antes. Estavam fechadas mas sem o ferrolho e, em um instante, estava fora do castelo. Livre, em seu formoso jardim noturno.
Vacilou um momento. Era toda uma contradição que um homem como ele tivesse um lugar como esse. Como se fosse capaz de apreciar a beleza pura. Como se tivesse a alma de um poeta e não a de um decidido ermitão.
Desconectou esse pensaento e rodeou o castelo. Cada passo era mais rápido que o anterior até que, finalmente, estava correndo. Seu cabelo se alvoroçava no vento da noite enquanto ela empurrava seus músculos ao limite, atravessando a escuridão ao longo do caminho, cada vez mais longe do castelo e mais perto da estrada que estava à frente. Um caminho que serpenteava entre os bosques, logo entre os campos e até mesmo a vila.
Liberdade. Finalmente, era livre.
E foi então quando ouviu os cachorros.
Cachorros? Ela não entendeu; à princípio. Mas então escutou as vozes na distância, as dos homens do povoado, que foram silenciados pelos cães de caça gritalhões e barulhentos, uma horrenda cacofonia de ruído que clamava por sangue.
Os cachorros de Marney Neal, pensou vagamente, sabendo que os animais eram caçadores treinados. Mas não em caça esportiva, e sim em homens. Marney os tinha treinado para esse propósito. Assim que iam sair essa noite, seguramente estavam atrás de um criminoso. Então por que se dirigiam ao castelo? Donovan?
Ela tragou com força, mas sua garganta estava seca. E então parou ali, congelada pelo medo, enquanto os cães faziam uma curva do caminho e apareciam ante seus olhos, correndo, lançando-se em cima. Uma horda de morte galopante, uivante. Ela girou, presa do pânico, enquanto penetrava no bosque, ainda que soubesse que não lhe oferecia proteção alguma. Os cães eram muito rápidos, muito decididos. Um salto e suas patas lhe arranharam as costas, impulsionando-a para diante. Instintivamente, deu a volta sobre suas costas, mas a besta estava sobre ela, com os dentes brilhando. E então, repentinamente o cão parou.
Donovan. Se encontrava de pé frente a ela, rodeado pelos cães e segurando um garrote, enquanto eles se lançavam sobre ele e tentavam morde-lo.
- Corre —gritou ele -. Ao castelo. Vamos!
Um deles o mordeu no braço com seus terríveis dentes. Ela ouviu o som do tecido ao se rasgar, viu o sangue, enquanto Donovan golpeava ao animal com o garrote inutilmente. Tremendo, suja e aterrorizada, se esforçou para se colocar de pé. E então cambaleou para o caminho, mas se deteve quando viu Donovan cair e aos cães ficarem em cima dela para matá-lo. Gritando, se agachou, encheu as mãos de pedregulhos e os jogou aos leonados corpos para atrair sua atenção.
- Aqui, bestas asquerosas! Aqui, venham!
Um cão girou para ela grunhindo.
- Venham por mim – gritou, e então começou a correr, sabendo que a seguiriam.
E o fizeram. Regressou ao caminho com os cães agora atrás dela. Mas os homens estavam a vista e ela gritou.
- Marney Neal, chama teus cães! Chama-os!
- Meu Deus, Rachel! —disse alguém. Mas então os cães estavam sobre ela e voltaram a atirá-la ao chão.
Um dos homens se aproximou correndo, gritando ordens aos cães. Afortunadamente, tinham sido suficientemente bem treinaos para obedecer no mesmo instante. Os cães se afastaram dela como se fossem um só, e se sentaram dóceis como mascotes, esperando a ordem de seu amo. E então Marney mesmo, com cheirando a cerveja, se inclinou sobre ela e a ajudou a levantar-se.
-Rachel, pelo amor de Deus, onde estava? Já estávamos preocupados até a morte por você! Te fizeram algum dano, menina? Te machucou?
Ela deixou que a ajudasse a se levantar.
-Em nome de Deus, o que estava pensando? Tornar esses assassinos a cair em cima de mim assim, Marney Neal. Deveriam te encerrar!
-Não, eu fiz por você, menina. Desapareceu, e ficamos com medo de que o assassino O'Roark te tivesse tomado para o seu covil!
- O que uma completa estupidez! Sacudiu a poeira e os galhos de suas roupas, e levou um olhar furtivo em direção onde estava Donovan. Talvez ele houvesse sido morto.
- É mesmo, Rachel? Marney a olhou com desconfiança. Conduzi aos cães nesta floresta cada noite desde que o bastardo vive aqui, só para me certificar que ele fica atrás das paredes do seu castelo, para não se tornarem vítimas dele meus vizinhos.
-Você é um bobinho supersticioso. Donovan O'Roark é inofensivo.
Então, o que tens andado a fazer aqui vagabundeando por estas terras deixadas pela mão de Deus? E onde você esteve ao longo das duas últimas noites, Rachel?
Ela levantou o queixo e olhou nos seus olhos.
- Recusei-me a casar com você, como você queria. Penso que não é seu assunto, Marney Neal, desde que te rejeitei não tenho nada a dizer.
-Você esteve no castelo, como sua amante? - perguntou ele.
-Como convidada, Marney. Só como isso. Mary está bem ciente do meu interesse nas lendas associadas com os antepassados de Donovan. Ele ofereceu para me ajudar na minha pesquisa.
- Sim, é verdade! - Marney disse com raiva, olhou ao castelo como se fosse algo demoníaco. Bem, já te encontramos. Vem comigo de volta para o povo. Mary estará aliviada em vê-la segura.
Ela olhou novamente dentro da floresta e, em seguida, Marney.
-Não. Vou voltar para o castelo esta noite. Diz a Mary que eu estou bem e me comunico com ela em breve.
Ele ficou com as mãos em seu quadril.
-Não o permitirei.
-Você não tem nada a dizer. Agora, leva gentilmente a seus cães para casa, Marney, antes que me decida a informar as autoridades sobre esta mortal matilha que foi lançada contra mim. Quase me matou. Não há dúvida de que as autoridades puderiam fazer algo com eles para preservar a segurança dos cidadãos.
-Não te atrevas ...
- Sim, eu juro pela memória de minha mãe. A menos que você vá agora, que o farei.
A olhou por um momento e depois baixou os olhos dele.
-Você mudou, Rachel Sullivan. Estados Unidos te tem feito isto, sem dúvida. Ou talvez tenha sido o monstro do castelo.
- Já cresci... E não deixarei que nem você nem qualquer outra pessoa conduza minha vida. Nunca mais.
-Bom. Você merece tudo o que te reserve o destino. Mas se lembre de minhas palavras, Rachel, o homem que habita esse castelo não é um ser humano. É um monstro e é mais perigoso para você do que nunca poderiam ser meus cães.
Voltou-se para ir, seus cães o seguiram, movendo o rabo como inofensivos animais de estimação. Rachel esperou até que eles estavam fora da vista e, em seguida, fugiu para a escuridão das árvores, caindo de joelhos ao lado da sombra negra que estava deitada no chão.
- Donovan?
Ele abriu seus olhos, seu rosto estava pálido e atormentado pela dor, sob a noite.
-Você poderia ter ido com ele, sussurrou.
-Ah, sim, eu poderia,
Ela arrancou tiras de sua saia e amarraou em torno da ferida para parar o sangue. Eu nunca tinha visto tanto sangue. Consegue levantar? Caminhar? Ele tentou se levantar, mas não podia. Rachel o sustentou rapidamente e ajudou-o a levantar-se. Então, ele colocou o braço sobre seu ombro, a fim de se segurar e ela levou-o através da floresta em direção ao castelo. Teria sido mais fácil se eles tivessem tomado o caminho, mas ela não quis ser vista por olhos indiscretos, especialmente se eles pertenciam ao Marney Neal.
- Existe um caminho para a esquerda, - disse ele, enquanto mantinha os dentes apertados. - Um atalho.
Ela o guiou, encontrou o rastro e levou-o, mas sentia os olhos masculinos fixos em seu rosto.
- Por quê? – perguntou-lhe sem fôlego, ainda sangrando.
- Não faça perguntas tolas, Donovan O'Roark.
Ele apoiou-se fortemente sobre ela, e quando voltou a falar, arrastava as palavras.
- É bobagem perguntar porquê? Você estava livre. É o que você disse que queria.
-Eu quero a minha liberdade, sim – concordou -. Mas não à custa de sua vida - curvou a cabeça. -Te colocau no meio desses cães como se acreditasse ser invencível. Poderiam ter te matado.
Ele não disse nada, e ela apressou para ir mais rápido.
-Não me diga novamente que você não pode tomar conta de ninguém além de si próprio, Donovan O'Roark, porque isso é uma mentira descarada e você sabe disso.
- Não ...
- Não? Não, você disse? Por que, então, arriscaria a sua vida para salvar minha?
Ele agitou a cabeça. Ela não podia ver o rosto dele porque ele manteve a posição oblíqua. Ou talvez ele não tivesse outra opção porque a debilidade impediu-o de levantar o rosto.
-Você não é mais egoísta do é um ermitão – disse -. Você é desinteressado e mais solitário do que você pode dar conta. E não tolerarei mais suas mentiras sem sentido. Te vi através da máscara que usa, Donovan, e você não pode fazê-lo novamente.
- Estás vendo o que quer ver.
Sua mão caiu e ela viu como brotava sangue justo do lugar onde mantinha sua mão.
- Maldição, por que sangras tanto?
- É... é parte do que sou. Ficar sem sangue é uma das poucas formas em que posso morrer. Falta muito tempo para o amanhecer, Rachel. O que é uma lástima, já que só dormindo durante o dia posso sanar estas feridas. Até então...
- Até então estarei a teu lado e não deixarei que sangres – lhe assegurou.
Fiquei surpreendido. Fiquei muito chocado, mas foi precisamente o que ela fez. Minha cativa involuntária, rebelde, tinha desaparecido. Sua feroz determinação, a sua energia infinita estava concentrada em me ajudar, não em escapar. Me acomodou em um sofá na sala e correu para a porta. Por momento pensei que escaparia agora, depois de verificar se ele estava seguro no castelo. Fiquei completamente aturdido quando, em vez disso, ela fechou o ferrolho.
- O que...
-Eu faço isto por Marney Neal e todos aqueles tolos de mente estreita como ele - disse ela e retornou ao meu lado -. Esses cães foram enviados para atacar você, e não a mim, Donovan. Você precisa saber. E todos esses homens teriam sido muito felizes em deixá-los rasgar o seu coração se tivesse sido tu e não eu que tivesse estado nesse caminho.
Ela acocorou no chão próximo a mim, colocando suas mãos entre seus cabelos, suas bochechas coradas pelo esforço, a frustração e a raiva.
-Oh, meu Deus, como pode viver assim?
Não era uma questão que exigia resposta da minha parte. Ela tinha se abaixado junto ao sofa e abria a camisa dele para descobrir as feridas dentadas do meu lado. Ela rasgou a saia até que não ficaram mais que tiras, e envolveu a ferida, enrolando sinuosa bandanas em torno de minha cintura, atando-as tão forte que mal podia respirar. Toda vez que me tocava eu sentia a dor mais intensa – e o prazer mais insuportável - que ele nunca tinha experimentado. Tremeu sob as suas mãos, sem importar qual foi o motivo.
- Por voltou aqui, Donovan? – Indagou -. Tem de haver lugares no mundo onde se pode estar seguro.
-Algumas- olhei ao redor da sala, os meus olhos se desviaram em direção à lareira, contra o qual Dante e eu costumávamos sentar e conversar durante horas, ou ler em um silêncio enquanto o fogo dançava -. ... Mas este lugar significa muito para mim.
- Leve-o então com você.
Eu lhe lancei um olhar interrogativo.
- É algo que é feito o tempo todo. Os ricos compram castelos e levam pedra por pedra para o lugar de sua escolha.
Fiz um movimento de negação lentamente com a cabeça.
-Não seria a Irlanda.
-Não.
-Você voltou Rachel, não obstante a estreiteza de espírito, as atenções dos indesejados ...
Levantou a cabeça imediatamente.
- Como é que sabes isso?
-Eu sei. Marney Neal sabia bem quando te rendeu - sorri ligeiramente apesar da dor em queimação do meu lado -. Antes que o machucasse fisicamente.
-Oh, sim, e tem muita sorte de que não o tenha feito esta noite.
Ela olhou para a minha pele e sacudiu sua cabeça ao ver tanto sangue.
-Você me viu, não é?
Então sabia. Tinha sentido antes, que ela estava consciente de alguma maneira da minha presença todas as noites quando eu estava ao seu redor, empurrado por alguma força irresistível.
- Foi a muito tempo -sussurrou, lavando o sangue com um pedaço de pano seco, amassado -, quando eu estava prestes a me afogar no rio que estava próximo de minha casa. Alguém surgiu de repente, encheu meus pulmões de ar e me salvou. Mas ainda estava engasgada, quando desapareceu - deixou de estancar o sangue e me olhou nos olhos. Foi você, certo?
Eu abaixei a cabeça.
- E, mais tarde, quando meus pais morreram. Quando eu estava acordada, com medo e só, alguém veio para mim no escuro. Foi como um sonho, eu pensava quando eu era maior. Mas ele não era um sonho, verdade Donovan? Você era o homem que me disse que ser meu anjo da guarda, que estaria segura eternamente.
Deixei sair um longo e lento suspiro.
- Era.
- Imagina o que isso significava para mim? Sabia como dormia profundamente, como acreditava, como resistir a isso? Meus pais tinham morrido, mas ainda havia a alguém, alguém que cuidava de mim tal como tinha feito a minha querida mãe, que me protegia como o meu pai. Foi a segunda vez que me salvou, sabe?
-Não - disse. - Não sabia.
- Agora você sabe. Boa coisa para um monstro egoísta, não acha, Donovan?
-Você não entende - iniciei, mas certamente não poderia explicar. - Também não compreendia, não inteiramente.
- Faça-me entender então.
Concordando com a cabeça, virei para um lado, para que ela pudesse se sentar à beira do sofá. Eu vi os olhos dela se voltarem para a ferida, como se quisesse ter certeza de que meu movimento não me tinha feito sangrar novamente.
- Dante disse-me sobre a nossa natureza há muito tempo. Ele me disse que só alguns mortais podem tornar-se aquilo que somos.
Sua intensa expressão disse a ele que ela estava interessada em ouvir mais.
-Como um mortal, tinha um raro antigénio no meu sangue. É conhecido como beladona. Isso me faz ser como um dos poucos, um dos eleitos, como nos chama eles.
- Isso é fascinante. Eu não tinha idéia ...
-Eu sei. Os vampiros estão consciente dos mortais que têm o antígeno. O percebemos como Dante fez comigo. E ainda há mais. Existe uma... ligação. Para cada um vampiro há um mortal em algum lugar, alguém com o antígeno, com quem a ligação é mais forte, tão forte que estamos unidos com eles.
- E ... você era esses mortal para Dante?
Assenti.
- Sim. Eu não sabia, mas ele me cuidou a maior parte da minha vida. Se tivesse algum problema, ele vinha para me ajudar. E se eu precisava de ajuda, ele o sentia onde quer que estivesse, e vinha até mim.
Ela curvou a cabeça, a garganta fez um som de descrença.
-Não me acredita - eu disse.
Lentamente, ela levantou os olhos dela em direção a mim.
- Se as lendas são verdadeiras, Donovan, ele atacou-o enquanto caminhava sozinho à noite. Se você chama a isso proteção, então ...
- Eu estava morrendo.
Ela piscou rapidamente. Seus olhos se abriram.
-Eu não sabia, é claro, mas Dante sim. Vinha sentindo os sintomas durante semanas. Fraqueza, tontura, desmaios sem razão. Eu não fazia ideia do que estava errado e pensei que era algo que passaria em breve, mas não era.
- Como você sabe?
Não respondi a isso. Eu não poderia, ainda não. Seria demasiado cruel fornecer muita informação ao mesmo tempo. Eu nao poderia lhe dizer que mortais com antígeno sempre sofrem o mesmo destino, uma morte precoce. Ele havia estado muito próximo ao seu fim.
- Simplesmente eu sei – disse -. Sem sombra de dúvida.
Ela olhou para mim.
- Então ... teria morrido se não ...não te tivesse feito isso.
- Sem dúvida.
Ela assentiu, atolada em seus pensamentos.
- Mais ele poderia ter-lhe dado uma escolha. Ele nunca permitiu decidir.
Sorri ligeiramente, lembrando.
- Dante não era de perder tempo pensando, se pudesse agir. Era impulsivo, agindo antes de pensar, mas houve outras razões também. Se ele tivesse me contado, eu teria dito que os meus pais ou ao padre da aldeia. E alguns segredos simplesmente devem ser mantidos escondidos, Rachel.
Ela afastou a minha camisa ensanguentada, pensativa. Percebi o momento exacto em que ele tenha feito contato, porque os seus olhos estavam abertos e buscaram os meus.
- Tenho o antígeno, certo?
Assenti.
-Você é o mortal que eu tenho que cuidar, Rachel. É parte de quem do que eu sou. Não acrescenta qualquer motivação nobre. É simplesmente um impulso que eu não posso resistir. Eu não podia te ignorar, embora tenha tentado.
- Então me salvou dos cães ...
- Foi uma ação mecânica. Nada mais.
Ela baixou nos olhos.
- Não tenho certeza se te acredito.
- E por que não?
Ela encolheu seus ombros.
-Acho que existe um elemento de escolha envolvido, Donovan. Você não pode me dize que era impossível para você escolher não te por face a face com os cães ─ moveu a cabeça para um lado -. Ou não regressar. Mas você fez. Você voltou para mim, não é isso, Donovan?
Eu abaixei a cabeça.
- Talvez, em parte, mas também regressei por Dante.
-Dante está morto.
- Sim, mas eu não sei onde ...
Ela olhou-me franzindo o cenho.
- Onde? Onde está enterrado, você quer dizer?
Suspirando, passei uma mão de maneira ausente pela ferida do meu lado.
-Quando eles vieram até nós, trazendo as suas lanternas as paredes do castelo, o sol estava para nascer. Não tínhamos escolha a não ser correr. As chamas ... Acabam conosco muito rapidamente, como você vê. Ambos sabíamos que a nossa única esperança era o relativo abrigo da floresta, onde a luz solar não poderia penetrar tão cedo. E, talvez, isso teria nos permitido tempo suficiente para encontrar um refúgio. Poucos minutos, talvez, mas teria sido suficiente – ela assentiu – incitando-me com seus olhos a continuar -. Quando saímos, estavam nos esperando. Poderíamos ter saído e lutado, e, provavelmente, teríamos vencido todos eles.
-Mas ... pensei que eram dezenas ...
Assenti com uma inclinação da cabeça.
-Nós somos muito fortes, Rachel. Poderíamos ter lutado, mas o sol não nos deu tempo. Nós tivemos que correr. Eles nos perseguiram, portanto não havia mais escolha que nos separar. Eu corri em uma direção, Dante noutra. A multidão... correu atrás dele.
- Que te aconteceu?
-Entrei no interior da floresta, no campo de feno. Salvei-me escondendo nas sombras e fiquei lá até anoitecer. Oferecia uma pequena proteção, mas sobrevivi. Fraco, com queimaduras em várias partes do corpo, mas sobrevivi.
-Dante não - disse ela suavemente.
-Voltei para as ruínas do castelo todas as noites ... durante semanas, sabendo que ele ia me buscar aqui se estivesse vivo. Mesmo depois de sair do país, regressei regularmente para esperar aqui. Reconstruí o lugar só no caso, mas nunca retornou. Agora, tudo o que quero saber é quando ele morreu.
- Colocarás um sinal? - Indagaou em uma baixa voz.
- Um jardim - disse-lhe -. Algo com tanta vida como a que ele tinha.
- O queria muito. E ainda declara que não se importa com ninguém.
- O queria – concordei -. Ele era a última pessoa que eu deixei que me importasse. A lição que me ensinou sua morte foi muito difícil de aprender para logo esquecer.
Sentia-me pesado, cansado.
-Se você não consegue amar – acrescentou -, então como pode viver?
- Isso não é assim tão difícil.
Ela fechou os olhos.
- Sou como tu - disse -. Em mais formas de que pensava.
- Como?
Mas ela só moveu a cabeça enquanto eu afundava no sono.
Ela não estava ciente do tempo que tinha decorrido do momento em que ele dormiu. Seu sono não parecia à morte, mas sim um sono muito profundo. Ela tinha dito a ele que ela era igual. Que só agora tinha percebido o quanto. Ela também não tinha amado. Com uma exceção. Desde que seus pais haviam morrido, só havia uma pessoa que realmente amou. E enquanto crescia, ela mesma tinha convencido de que o amor tinha sido apenas um sonho. Mas o amor por este anjo dos seus sonhos havia permanecido.
E agora ela sabia que era real. Seu salvador, seu sonho era real. E estava encharcado pelo seu próprio sangue, com roupa rasgada e suja. Ele foi cuidadoso quando ela era criança. Tinha-a cuidado quando era menina. Ela não poderia fazer menos por ele. Mas nunca poderia lhe dizer. Ele nunca deveria saber o quanto ela o tinha amado durante a sua infância. As fantasias que tinha tido. Porque ele tinha medo de amar. Ela nunca tinha conhecido alguém tão assustado. Lentamente, Rachel se levantou do conjunto de estofados e foi para seu próprio quarto. Ela encontrou esponjas limpas e suaves toalhas, e preparou uma tigela de água morna. Então ela retornou junto com Donovan. S e estive acordado teria se oposto a que o cuidasse dessa maneira. Mas não estava. Ela removeu a camisa dele, com cuidado, meio assustada de alertá-lo e acordá-lo, ou pior, faze-lo sangrar novamente. Analisou a bandagem da ferida. Não encontrou manchas vermelhas. Bem. Mas seus olhos lentamente subiram em seu corpo, seu estômago e o seu peito de músculos lisos. Seus mamilos escuros a intrigavam. Ela secou a garganta. Desviou o olhar. Mergulhou o pano macio na água, escorreu e pressionou contra sua pele. Mas ainda podia senti-la debaixo do tecido. Esticado e firme. A masculinidade era como uma aura emanada de seu corpo. Quase uma fragrância que atraía ...
Inclinou-se mais de perto em seu peito, seu rosto estava tão perto que podia sentir o calor que dele emanava, acariciando-a. Fechando os olhos, inalou profundamente. Algo se despertou na boca do seu estômago. Algo que conhecia, ela admitiu, porque tinha sentido antes. Quando este homem estava perto, ela o sentia. Mas ela não tinha nenhum interesse em querer um homem incapaz de sentir nada mais que desejo em resposta. No entanto, ela o queria.
-Que Deus me ajude, murmurou, porque te desejo, Donovan O'Roark. -Ela fechou os olhos tentou se controlar. Mergulhou o pano na água agora tingida de rosa, o escurreu novamente e cuidadosamente retirou as ataduras para limpar a ferida adequadamente.
Em seguida, olhou de perto, removeu ligeiramente o sangue e voltou a olhar
Era ... era menor. Estava encolhendo. Espantada, constatava em câmara lenta, as bordas da ferida se encolhendo como uma espécie de experiência de fotografia em slides. Demorou alguns minutos, mas pareceu gradualmente regenerar a pele, deixando uma ruga, e então isto se suavizou e desvaneceu.
Piscando por causa da impressão, limpou a área, procurando sinais de corte, mas ele tinha desaparecido. Ele tinha ido embora. Surpreendida, colocou os dedos sobre a nova pele saudável.
- É inacreditável -sussurrou, e alargou a sua palma contra a pele quente.
Quando ele apoiou a sua mão sobre a dela, ela saltou e olhou para o rosto dele rapidamente. Mas seus olhos se mantiveram fechados, sua respiração era superficial, mal discernível. Então a mão fechada em torno da dela enaquanto ele ainda estava dormindo. Um sono, no qual ele afirmou, seria incapaz de responder a qualquer estímulo. Ele estava errado.
E agora a mão desse homem, que proclamava que não precisava nem queria ninguém na sua vida, agarrava a sua, e por sua própria vida, ela não seria capaz de fugir.
Eu acordei com uma sensação de calor distribuído por meu peito. E enquanto meus sentidos despertavam, eu sabia o que era esse calor. Rachel estava no chão, com as pernas dobradas sob seu corpo e sua cabeça repousando sobre o meu peito. Seus lábios apenas tocavam a nudez da minha pele. Um braço em volta de mim e sua mão em meu ombro. Sua outra mão estava acomodada embaixo de sua cabeça e era sustentada com forç a pela minha. Flexionei e relaxei os dedos, para confirmar aquilo que parecia improvável. Mas era real. Era eu quem sustentava sua mão como um amante, não o contrário. Eu não poderia ficar na cama desse jeito não por muito tempo. Sua suave respiração sussurrando sobre a minha pele iria me levar para os limites da sanidade. Eu estava faminto. E ela estava perto. Demasiado ...
Seus dedos em torno de meu ombro, então me roçaram como as garras de um gato feliz. Moveu seu rosto, como se estivesse fuçando, só que meu peito não cedeu e seus lábios o roçaram como o fogo. O gemido que emergiu das profundezas do meu ser era como um rugido. O mesmo rugido que poderia se escutar de um vulcão, enquanto a tensão crescia. A erupção estava perigosamente perto.
Ela se moveu, o seu brilhante cabelo estava me fazendo cócegas enquanto ela sentava, abrindo os seus grandes olhos escuros para mim, desenfocados até que pestanejou para repelir o nevoeiro do sono e foi capaz de se concentrar. Em seguida, sorriu.
-Se curou – me disse.
-Eu disse que faria.
-Eu sei, mas vê-lo com os meus próprios olhos. Foi incrível, Donovan.
Assenti, tratando de ignorar o brilho de seu doce despertar nas bochechas e a humidade que fez seus sonolentos olhos cintilar. Seu cabelo estava despenteado. Ela deveria se ver exatamente assim, depois de ter sido totalmente preenchida por um hábil amante, eu pensei. Assim mesmo.
Tentou sentar. Ela notou e se afastou de modo que ele pudesse fazê-lo, e instantaneamente lamentei perder o toque do seu corpo. Mas, quando se pôs em pé, as suas mãos se apoiaram nas minhas costas e se arqueou. Espreguiçou-se, gemeu e se esfregou então eu percebi que ele havia passado um dia horrivelmente inconfortável no chão, quando dispunha de uma cama digna de uma rainha a poucos metros de distância.
-Rachel, por que diabo não foi para o seu quarto?
Ela manteve as suas mãos onde estavam massageando a si mesma com os dedos. Mas sua cabeça se levantou rapidamente.
- E te deixar aqui na soleira da porta, inconsciente e desprotegido? Nem em sonhos!
Eu abaixei a cabeça. O sorriso queria escapar de meus lábios e eu sabia que era perigoso. Não havia nenhum sentido incentivar suas ideias tolas.
-Você tinha passado o ferrolho da porta.
- Marney Neal poderia manipular e desbloquear rapidamente. Não seria a primeira vez.
Eu fiquei sem me mexer, procurei seus olhos, mas manteve os seus separados.
- Diz como se soubesse.
-Eu sei. O sacana ...
- Que fechadura manipulou rapidamente, Rachel?
-O meu quarto, no pub. Oito anos atrás, antes de eu ir para os Estados Unidos.
A sua voz não falhou. A minha o faria se voltasse a falar. Falharia ou emergeria como o rugido que sentia crescer. Mataria o desgraçado. Lhe arrancaria o coração e ...
-Tem um olhar assassino Donovan - disse suavemente, estudando a minha cara -. E é realmente desnecessário. Marney é uma chatice, mas um inofensivo incômodo. Ele nunca teria ousado tanto se não tivesse bebido tanta cerveja. E me atrevo a dizer que a farra desapareceu mais ou menos ao mesmo tempo em que eu o empurrei pela janela.
Pisquei confuso, e depois estendi a minha mão para apoiar um dedo em seu queixo. Então eu levantei a cabeça para ver seu rosto. Mostrou dizer a verdade.
- Empurraste-o pela janela fora?
-Não era para tanto. Marney não tinha muito equilíbrio naquela noite, se bem me lembro. Então, ele chutava a minha porta e começou a me buscar com a mão como uma espécie de “macho no cio”, falando sobre casamento, amor e esse tipo de disparate. Eu simplesmente me girei de forma que ele iria estar de volta à janela e eu dei-lhe um pequeno empurrão.
Eu não poderia ajudá-lo. Sorri.
-Mas o seu quarto é no segundo andar.
- Sim. Quebrou o braço em dois, quando ele aterrizou. Foi sorte que a nossa principal estrada não é pavimentada. Não acha?
Senti que no centro do meu peito surgiu uma estranha sensação por Rachel Sullivan.
-Nenhum homem tem conseguido mais que me beijar, sem o meu consentimento Donovan. Não é algo que estou disposta a tolerar.
Meus olhos vacilaram.
- Tentando descolar a responsabilidade por aquilo que fiz antes?
-Eu só estou dizendo que você estava perfeitamente certo quando disse que se eu não tivesse desejado que acontecesse não teria acontecido. E não só porque eu teria evitado, se não, porque você teria feito.
Encontrei seus olhos, ao redor dos meus.
-Não comece novamente hoje à noite, a me dar crédito por qualidades que não possuo.
Ela encolheu seus ombros.
-Eu estou morrendo de fome. Você não? – interrompeu ali, mordeu o lábio e me deu um olhar rápido e quente. Sua mão tremente se disparou para o seu pescoço, mas as feridas já tinha desaparecido. Elas tinham desvanecido na luz solar. Como se nunca tivessem estado lá.
- Você ... faria?
-Não. - Me forçei a olhar para longe do seu pescoço delicado. - Por que você não vai para seu quarto, Rachel? Você há de querer se banhar, mudar de roupas..
-Mas ... ... como conseguirás... quero dizer onde ...?
A olhei novamente, não consegui evitá-lo.
-Eu não sou um assassino, se é isso que você está tentando me perguntar. Tenho reservas. Fria, bolorenta, seladas em sacos de plástico. - Engoli com dificuldade, enquanto que uma das minhas mãos se levantou para acariciar o cabelo dela, acomodando-o atrás de seu ombro. Meus dedos tocaram sua pele macia. Eu senti o pulso batendo infinitamente, o rio de sangue fluindo. Morno, sangue vivo.
-Você ...você bebeu de mim... antes.
-Eu não deveria ter feito.
- Foi ... - engoliu duro, mas seus olhos subiram de temperatura e a chama me queimou.
- Foi um êxtase. -Eu terminei por ela. -Eu sei. Esse é o perigo, Rachel. Essa é a tentação. O que nos torna tão perigoso para você. Você deseja. Anseias o que poderia significar sua própria destruição.
Ela levantou o queixo.
-Você nunca me faria dano.
-Não tenha tanta certeza disso, Rachel. Dei a volta.
- Mas sim, tenho certeza. –Falou às minhas costas.
Tinha começado a caminhar em direção a cozinha, mas eu parei e permaneci sem me mexer.
-Talvez você é quem precisa ser convencido. - Ela se aproximou muito lentamente. Quando as suas palmas lentamente deslizaram pela extensão das minhas costas até enlaçar seus dedos nos meus ombros, tensionei e inalei bruscamente -. Não é medo, Donovan. Não tenho nenhuma razão para fazê-lo e você sabe disso, creio eu. Mas você me tem medo, ou não?
-Não seja boba.
- Só seria tola se te pedisse que confie em mim - disse, e moveu lentamente suas mãos acarinhando meu pescoço, mergulhando seus dedos no meu cabelo. Ou que me ames. Mas não o estou fazendo, Donovan. Não estou pedindo nada disso.
O sabia, ela o sabia. Había sonhado com esse hommem durante toda sua vida. Ele nasceu para ela, o sabia. No mais profundo do seu ser, sempre tinha sabido. Nunca tinha estado com um homem. Mesmo quando ela acreditava que seu anjo da guarda, o seu imortal Donovan O'Roark era uma fantasia, tinha se guardado para ele. Só para ele.
Ele não deu a volta, não disse nada.
Ela deixou cair os braços para os lados. Derrotada. Talvez seus sonhos eram bobos como tinha convencido de si mesma algum dia. Talvez tivesse se enganado depois de tudo.
-Desculpe. Eu pensei ... Pensei que você também me desejava. -Ela virou-se e saiu em direção a escada, subiu lentamente e encontrou seu refúgio nas salas que ele tinha criado para a mulher de suas fantasias, uma mulher com a que deveria ter sonhado. Uma mulher que nunca deixaria persegui-lo.
Eu fiquei onde estava todo um minuto. Não mais. Sofria por ela. A almejada com uma força para além daquilo que é suportável. E ela tinha razão, também a temia. Ela poderia me destruir, ele lhe deu esse poder. Eu andei até o pé das escadas, e olhei para cima, desejando com todo meu ser ir atrás dela. A desejava. Não era amor. Não era confiança. Era só necessidade. Uma necessidade que sabia que ela também sentia.
Fiquei em pé no primeiro degrau. Fechei os olhos, engolindo a sensação de incerteza que brotava em minha garganta. Eu disse para mim mesmo que era uma má idéia. Muito ruim. Subi outro degrau. E outro. Já podia ouvir o barulho do chuveiro. Na minha mente, eu poderia e vê-la sob a ducha, molhada e bela, completamente nua, minha para tomá-la.
Apenas um morto poderia rejeitá-la.
-Eu não - murmurei, as palavras surgiram profundas e guturais -. Não, não eu.
Subi o resto dos degraus de dois em dois.
A porta estava aberta ... um convite, eu pensei. Suas roupas, feitas em tiras e dispersas no chão, me fez lembrar os cães de caça rodeando-a. O medo em seus olhos. A coragem súbita, apesar deste. Meus dedos se moveram torpemente na minha calça. Os tirei e fui para o banheiro. Agora nada se interpunha entre nós, exceto o chuveiro e a cortina translúcida. Ela, nua sob o contundente chuveiro. Ela, nua, do outro lado da cortina.
De repente a água deixou de fluir. Seus dedos estavam fechados na ponta da cortina e esta se deslizou até que ficou totalmente aberta. Ela ficou lá, quieta e silenciosa. Excursionou meu corpo com os olhos muito abertos, até que finalmente o seu olhar encontrou com o meu e o sustentou.
Ela deixou o chuveiro, levantando um pé na ponta da banheira e, em seguida, depositou-o no chão e, em seguida, fez o mesmo com o outro. Nenhuma tentativa de alcançar as toalhas que estavam empilhados nas proximidades. Pelo contrário, simplesmente ficou ali, com a cabeça erguida e olhos obscurecidos e tempestuosos.
Lhe retornei o olhar, bebendo-a com meus olhos. A água gotejava sobre sua pele, ombros e braços. Em seu ventre se formavam canais estreitos que surgiam a partir de seu largo e molhado cabelo, baixando para seus magníficos e perfeitos seios. Ela esperava. Por mim? Eu sabia. Relamente pensava que poderia me deixar atrás depois de chegar a esse ponto?
Estiquei a mão e a toquei. Deslizei devagar uma mão sobre o cabelo dela, escorrendo a água para baixo para absorvê-la em minha palma enquanto roçava seu delicado pescoço, o seio sensível, sua estreita cintura e seu arredondado quadril. Puxei-a para te-la mais perto. Cedeu facilmente com o simples encorajamento da minha mão. Pressionou contra o corpo seu corpo, emitindo um suave suspiro, enlaçou os braços à volta do meu pescoço e lançou a cabeça para trás para receber o meu beijo.
Estremeci em resposta sensação de te-la entre meus braços, úmida e quente, enquanto unia minha boca a dela. Meus braços estavam fechados em torno dela, acerquei uma mão sobre suas nádegas enquanto segurava sua cabeça com a minha.
Quando seus lábios se abriram foi como saborear o paraíso e o fogo em meu interior chamejou rapidamente. Cavei mais fundo sua boca com minha língua, tocando e massageando a dela. Senti-a agitar-se. Aquecida até a ebulição entre as minhas mãos. Febril. Me arqueei pressionando-a e ela empurrou contra mim. Sem hesitação, sem timidez.
Minhas mãos percorreram seu corpo molhado por causa da ducha de acima a abaixo, incapaz de se saciar desse contato enquanto me alimentava de sua boca. Era doce. Minha mente estava em branco até que tudo o que restava eram sensações, o seu desejo e gosto. Afastei os lábios para lamber a umidade do seu queixo e pescoço. Ela arqueou as costas e me movi para baixo, para beber cada gota de sua pele e dos seus seios. Introduzi o mamilo duro na minha boca para sugá-lo, primeiro suavemente, e mais fortes quando suas mãos se emaranharam no meu cabelo. A arranhei e mordisquei com os meus dentes fazendo-a gemer de desejo, um som que avivava as chamas como combustível.
Eu a queria... completamente, cada parte do seu ser. Baixei mais ainda, descendo até ficar de joelhos e beijei o rastro molhado até sua barriga. Acariciei com meu rosto o ninho de cachos úmidos e então me afundei profundamente. Separei suas pregas escondidas com a língua, a saboreei e ela gritou, seus punhos se cerraram em meus cabelos puxando-os, acariciando-me tão deliciosamente que os meus joelhos quase cederam.
Em seguida, se afastou, só um pouco, me incitando a levantar novamente até que eu estevesse de pé. Seus braços se encerraram à volta do meu pescoço e se impulsionou para cima. Eu ajudei, segurando a parte de trás de suas coxas e elevando-a para acomodá-la em torno de minha cintura. Eu a senti quente e pronta, provocadora, contra a ponta de meu membro.
Fechei os olhos perante a centelha de desejo que quase me cegou. Então ela desceu em mim, me tomou lentamente, muito lentamente dentro dela. Mais fundo... e ainda mais, e quando eu senti a resistência, hesitei, mas ela empurrou com mais força. Um chiado suave, um pequeno som de dor.
Eu fiquei sem me mexer. Vibrando dentro dela, sentindo a estreiteza de seu corpo pressionando o meu e meabraçando. Eu fechei os olhos e soube o segredo que não tinha me contado. O presente que tinha acabado de me entregar.
-Rachel ...
-Shh - sussurrou, em seguida, se moveu, subindo para voltar a descer. Lentamente, dolorosamente, os seus seios se deslizando contra o meu peito, minha pele acarinhando os esticado mamilos.
-Lentamente - eu disse. - Com cuidado.
Acomodou a cabeça na curva do meu pescoço, beijou-me lá, chupou minha pele. Moveu-se mais rápido. Senti seus ofegos cálidos e breves sobre minha pele. A pressionei contra a parede segurei suas nádegas e a sustentei, empurrando-me profundamente dentro dela uma e outra vez. Ela ofegou e se agarrou a mim, com a sua cabeça atirada para trás e a boca aberta. A beijei tomei sua boca como estava toamando seu corpo, mas o desejo não estava saciado. Mesmo quando a minha paixão estava quase aliviada eu sabia que não seria suficiente.
Foi como se ela soubesse ou o adivinhasse de alguma forma, porque ela sustentou minha cabeça e a moveu para baixo, pressionando o meu rosto contra o pescoço dela e elevando o queixo para que a pele macia se pressionou contra os meus lábios. Eu sentia o pulso do seu batimento cardíaco, e provei a calidez e o sabor salgado da sua pele, eu sabia que seria tão bom para ela como seria para mim e me disse que não havia motivo para rejeitar o que ela me oferecia.
-Toma-me Donovan – sussurrou -, prova-me...
Estremeci. E a desejei. Com cada ataque ficava mais perto da libertação e a ansiei como nunca tinha feito antes. Com um suspiro trôpego, separei meus lábios, os fechei sobre seu pulso latejante e perfurei seu pescoço rapidamente. Ela deixou escapar um ofego arquejante, mas suas mãos sobre minha cabeça fizeram me aproximar, agarrando-se a mim e pressionando o seu pescoço contra a minha boca faminta. Eu me alimentei. Chupei, devorei sua própria essência e escutei seus curtos gemidos destacados enquanto ela se aproximava do clímax. Então eu não escutei outra coisa, mas o som do meu próprio coração bater em uníssono com o dela enquanto eu explorava dentro dela. Gritou o meu nome, se sacudiu envolvendo-me ainda e foi se relaxando e lentamente entre meus braços. Levantei a cabeça, beijei-lhe a ferida aberta no pescoço, então sua bochecha, seus cabelos e lábios.
Ela abriu suas pálpebras pesadas e me olhou fixamente. E algo nesse olhar assinalou a enormidade do meu erro. O que eu sentia não era apenas paixão. Não era necessidade ou desejo físico. Eu sentia algo mais por ela, algo poderoso e mais velho que o meu próprio ser. Sempre o havia sentido.
Então estava feito. Tinha posto o poder de me destruir diretamente em suas mãos. Tudo o que me restava fazer era ver o que ela faria com ele.
Mas não agora. Ainda não.
Enquanto lentamente a retornei sobre seus pés, ela me olhou fixamente e seus olhos verdes como esmeraldas brilharam sob o luar. Sussurrou "Vem" e tomou a minha mão. Guiou-me ao chuveiro com ela, abriu a torneira e ficou comigo sob a ducha. Estremeci em seus braços e beijou-me. Lentamente ... Quase... amorosamente.
Ela não poderia dizer o que sentia, não estava certa de ser capaz de encontrar as palavras adequadas ainda que tentasse. Completa, de algum modo. Como se tivesse finalmente atingido um objetivo para o qual tinha lutado ao longo de sua vida. Como se seu próprio coração havia sido tocado, partilhado, derramado dentro de outra alma. ela era feliz, realmente feliz pela primeira vez em sua vida.
Ele não se sentia o mesmo. Ele não poderia amá-la. Não confiaria nela. Mas se recusou a pensar nisso neste momento. Haveria tempo. Muito tempo. Tinha obtido o seu desejo, o seu sonho. O homem que tinha amado em toda a sua vida. Baixou o olhar, tentou acreditar que ele também a amaria. Finalmente.
- O que acontece? -Sussurrou, acariciando meus cabelos enquanto me abraçava. Tinham saído da ducha para a cama, onde se aconchegaram como amantes. Era difícil acreditar que ele não sintia nada por ela. Na verdade, era impossível.
Sacudiu a cabeça.
- Nada, Donovan. Só pensava ...
- E no que você pensou?
Encolheu os ombros e espantou suas dúvidas
- Gostaria de ir para uma caminhada – disse -. Sob o luar.
- Sempre tem sido uma pessoa tão noturna, Rachel?
Ela sorriu, ignorando a reserva e a incerteza nos olhos dele.
- Estou me acostumando. - Sentou, sentindo o seu desconforto crescente ante a intimidade que implicava abraça-la na cama dessa maneira, agora que o desejo havia sido consumado. Se dependesse dela, teria passado a noite inteira assim, mas ...
Caminhou para o armário, tateou as roupas e escolheu cuidadosamente. Um vestido branco, para que ele não pudesse evitar olha-la na escuridão. Com uma longa e macia saia para dançar com a mais leve brisa, e um profundo decote para recordar o quanto ainda a desejava. Ela esperava que fosse assim.
- Sempre me tenho perguntato o que está por trás dessa tua cerca - disse, enquanto caminhavámos lado a lado, sob a claridade da noite. Seu cabelo, que tinha se secado durante o ato de amor e não tinha sido penteado, caia naturalmente em descuidados caracóis, dando-lhe a aparência de uma criatura selvagem da floresta. Uma fada ou uma ninfa. Eu estava enfeitiçado.
Eu nunca deveria ter feito amor. Nunca.
- Eu posso te mostrar – me ouvir dizer.
-Mas... não há acesso.
Franzindo o cenho, ergui a cabeça, para observá-la estudar a elevada e sólida.
- E como você sabe, Rachel?
Ela me olhou um pouco e depois olhou para o outro lado.
-Eu... costumava vir aqui. Quando eu era criança.
- Quantas vezes?
Seus olhos entrecerraram ao encontrar-se com os meus, então encolheu os ombros.
- Tantas vezes como podia escapulir. Ainda nesse tempo, eu sabia que eras você, sabe? Meu protetor secreto.
Baixei a cabeça para ocultar minha reação ante suas palavras. Meu estômago se contraiu, se sacudiu e repuxou.
- Ainda assim quere ver o que há lá dentro? – Ela concordou. – Vamos, então.
Franzindo o cenho, se aproximou. A elevei em meus braços, dobrei os joelhos e saltei a elevada cerca. Ouvi seu gemido de prazer quando descemos do outro lado. Logo permaneceu em silêncio, aparentemente feliz de se encontrar em meus braços enquanto escrutinava o bosque o bosque a sua esquerda e logo a ondulante pradaria sobre a que estávamos parados. Antigas trilhas serpentavam entre os exuberantes e aprazíveis prados e através do grupo de árvores.
- Olha – sussurrei, me girando com ela para mostrar-lhe o lugar.
Ao longe um cervo ergueu a cabeça para mirar-nos brevemente. Logo continuou ruminando.
- Donovan, alí. Detrás do cervo – sussurrou Rachel.
- Sim – lhe disse -, os vejo.
Dois filhotes de cervo brincavam nos espessos pastos. Suavemente, depositei Rachel no solo.
- A cerca mentém os caçadores – homens como Marney Neal e seus cães – longe. Os cervos podem saltar facilmente. Ir e vir tanto como queiram. A maioria parecem felizes de ficar por aqui.
- Assim que tem criado um refúgio para os cervos. – Ela seguiu observando, rindo suavemente – um som inquietabtemente formoso como o canto dos pássaros – ante as palhaçadas dos pequenos cervos.
- Não só os cervos. – Me voltei para a cerca, fiquei de cócoras e separei as espessas forragens. – Há lugares ocultos como este onde as pequenas criaturas podem se esconder das aves de caça que sobrevoam, para ficarem seguros. Vem – disse, estirando a mão. Seu encantamento por este lugar me comprazia tanto que não pude resistir a lhe mostrar mais.
Quando fechou sua mão na minha me envolveu uma sensação de calor. E por um momento pareceu perfeito e natural. Até que obriguei a mim mesmo a recordar que era efêmero. Ela iria embora um dia, era certo.
A guiei até a pradaria, o lugar onde as flores silvestres se espalhavam em todas as direções como uma almofada de mosaicos. E mais além, havia o reservatório alimentado por dois rios Reluzia sob a luz da lua. Os gansos nadavam nas águas prateadas, indiferentes a nossa intrusão. Rachel se sentou na beirada do tanque e, apesar de mim mesmo, me sentei junto a ela. Mais perto do que o necessário, e ainda assim, não era suficientemente perto.
- É como se soubessem que não representa ameaça alguma para eles.
- Deveriam – disse -. Têm estado a salvo aqui, durante gerações.
Senti seus olhos sobre mim.
- Por que, Donovan?
Encolhi os ombros.
- Por que não?
- Diga-me
A olhei, tinha se recostando. Parecia uma deusa no paraíso.
- De acordo – disse suavemente -. Criei este refúgio para os animais porque os entendo. – voltei a olhar os gansos, que se afastavam nadando desde a borda enquanto uma raposa entrava na água, movendo-se sigilosamente para beber da beirada.
- Sei o que se sente sendo caçado – disse.
A olhei nos olhos. Ela concordou como se entendesse. Mas não podia. Ou... me negava a acreditá-lo.
- Realmente é um homem especial, Donovan O’Roark.
Sacudi a cabeça lentamente, mas enquanto ela se aconchegava em meu braço e descansava sua cabeça em meus ombros, me senti especial. Apreciado.
Deus, era um idiota ao permitir sentir o que ela me fazia sentir. Ficamos aí, em meu próprio paraíso privado durante a maior parte da noite. Caminhando de mãos dadas, descobrindo e observando a vida silvestre. Como jovens mortais enamorados. Como uma fantasia idealista. E eu me deleitei com cada momento, apesar de saber que ao fazê-lo me convertia num bobo iludido. Só sugeri regressar ao castelo quando senti que se aproximava o alvorecer e Rachel não tinha comida ainda. Mas no momento em que atravessamos as portas da biblioteca, escutamos o ruído de apressados golpes e chamados na porta da frente. E ainda antes de me dirigir ao grande vestíbulo para atender as ruidosas chamadas, pressenti que o meu breve período no paraíso tinha chegado ao fim.
Mary O’Mallory se encontrava de pé diante da porta, sem fôlego e com a face arroxeada. Seu frenético olhar se moveu de mim para Rachel e logo se suavizou ligeiramente aliviada.
- Rachel – disse com um suspiro -. Deus Santo, pequena, por que tens demorado tanto?
Rachel franziu o cenho, fazendo entrar a mulher enquanto a sustentava em um abraço, e eu soube imediatamente o afeto que ela sentia por Mary. Afeto genuino. Via preocupação em seus olhos.
- Estávamos fora – explicou Rachel -. Vem, senta antes de caias inconsciente. Qual é o problema?
Mary se sentou, mas na ponta do sofá como se estivesse se preparanto para saltar e começar a correr se as circunstâncias requeriam.
- Necessito falar contigo Rachel. A sós. – Me olhou se soslaio e em logo soube o que pensava de mim. Que eu era um monstro. Todos acreditavam.
Todos... menos Rachel. Ela nunca me tinha visto desse modo, ou sim?
- Não há nada que não possa me dizer diante do Donovan.
Mary franziu os lábios.
- Mary, ele é meu amigo.
- Esqueça. As deixarei a sós – sugeri. Mas dirigi um estreito olhar para Rachel. Fugiria agora? Deveria trancar a porta?
Não. Não havia necessidade de causar pânico em Mary. Elas não demorariam muito.
- Te aviso quando tivermos terminado – disse Rachel. E soube que era sua maneira de prometer-me que não escaparia. Mas o faria, enfim. Era inevitável. E seria doloroso.
Me limitei a concordar e as deixei a sós.
Rachel sentou ao lado de Mary e segurou as mãos da mulher.
- Agora me diga, o que acontece?
- Eu sempre achei que você estava aqui, com essa... esse
- Ele é um homem, Mary. Somente um homem. E não tem sido mais que amável comigo.
- Santo Deus, pequena, me diga que não está apaixonada por ele!
Rachel se limitou a baixar o olhar.
- Não é melhor me dizer por que veio?
- É pelos aldões, pequena. Principalmente Marney Neal. Os tem alvoroçado tanto que temo qua a história volte a se repetir. Eu te quero a salvo, longe deste lugar antes que isto aconteça.
Uma onda de temor se agitou no peito de Rachel.
- O que está me dizendo?
- Marney alega que a besta te tem sob algum feitiço, menina. Que é tua prisioneira, mas estás muito hipnotizada para se dar conta. Os convenceu de que necessita ser resgatada, Rachel e, neste mesmo momento, os homens estão se reunindo no bar. Tudo o que pude fazer foi escapulir de mansinho para te alertar.
- Rachel baixou a cabeça e entrecerrou os olhos.
- Então virão aqui.
- Assim é – disse Mary -. E temo que a violência reine esta noite, menina. Deve ir agora mesmo comigo.
Olhando diretamente em seus olhos, Rachel concordou.
- Irei. Mas primeiro falarei com Donovan.
- Rachel, não deve...
- Sim devo. Não posso deixá-lo aqui, desprevenido, sem alertá-lo. Não posso ir sem me despedir ou sem lhe explicar... Não, vá você. Irei em seguida, prometo.
Mary a olhou como se pretendesse discutir, mas quando seus olhos encontraram os de Rachel, pareceu trocar de idéia.
- Posso ver que estás decidida. O que há entre vocês Rachel?
- Nada pelo que tenha que se preocupar. Agora vá. Tenta deter os homens até que eu chegue.
Suspirando, Mary se foi. Rachel parou na entrada, para olhá-la partir. Logo se voltou e perambulou pelo vestíbulo que levava à biblioteca, então chamou ao Donovan. Escutou seus passos aproximando-se, sentiu sua essência tocando-a ainda antes de poder divisá-lo. Ele só a olhou aos olhos, e parou imóvel, então assentiu.
- Vai embora esta noite, não é Rachel?
- Devo fazê-lo. Tens que me deixar ir, Donovan. Es...
Ele levantou a mão.
- Não vou detê-la. Meus... preparativos estão prontos, a maioria. Posso ir imediatamente depois de que você parta.
Ela estirou o pescoço, franzindo o cenho severamente.
- Meu Deus, Donovan, ainda acredita que é necessário? Depois de tudo o que temos compartilhado? Do que temos falado... Realmente acredita que me parto para revelar seus segredos para o mundo?
Ele baixou a cabeça.
- O que acredito – sussurrou -, é que tenho sido tão tonto como o foi Dante. Mas não tenho desejo algum de suportar um destino igual ao seu.
Ela levantou a vista e o olhou fixamente nos olhos. O que viu neles foi dor.
- Se partir... eu jamais poderei voltar a te encontrar. Certo?
Ele desviou o olhar.
- Assim são as coisas.
- Não – disse ela suavemente -. Nem sequer se aproxima do mínimo de como estão as coisas.
- Então o que?
Ela se aproximou um passo, segurou a frente de sua camisa com seus punhos tremulos.
- Devo jogar meu coração a teus pés e esperar que o aparta a pontapés? Pois então o farei. É muito mais importante para mim do que meu orgulho.
—Rachel, não…
—Te amo, Donovan O’Roark. Tenho te amado durante toda a minha vida e te amarei até morrer.
Sua cara pareceu se contrair de dor.
- Estou te deixando esta noite sim. Porque devo fazê-lo. Mas só por esta noite. Eu teria regressado. Teria regressado aqui, por você.
—Rachel…
- Faria bem em partir também, Donovan, porque corre perigo aqui esta noite. Mas depende de você decidir aonde irá. Se muito longe, onde ja não possa voltar a te ver, ou perto daqui, o suficiente para que eu possa te encontrar... ou você possa encontrar a mim.
Sacudiu a cabeça lentamente.
- Não o entende. É a maldição de minha espécie, ter que viver nossa vida em solidão, Rachel. É como deve ser.
- Não. Isso é o que você acha. Agora tem outra opção, Donovan. Mas depende de você.
As lágrimas a afogaram. Deus, ela não queria deixá-lo. Perdê-lo. Não voltar a vê-lo jamais. Mas se não o fazia o perderia de qualquer modo para a multidão enfurecida, igual a ele tinha perdido ao Dante. Involuntariamente, as lágrimas começaram a correr por suas bochechas, pressionou os lábios contra os seus e segurou seu pescoço para um breve e apaixonado beijo. Logo deu a volta e andou, atravessando a porta principal para mergulhar na noite minguante.
Quando ela foi embora senti que meu coração se rompia em pedaços. Eu também devia partir, sabia. Devia empacotar os poucos pertences que poderia necessitar e procurar a maneira de sair deste lugar. Desconhecia o tinha dito Mary, mas quando Rachel me disse que corria perigo se ficava aqui esta noite, não pude evitar acreditar nela. Devia me apressar. Devia. Mas não podia.
Ela disse que voltaria e maldita seja minha insensatez ao acreditar. Pior ainda, eu queria que fosse verdade. Este lugar nunca tinha tido tanta vida – eu nunca tive tanta vida – como quando ela estava aqui. Iluminando minha escuridão. Como um sol resplandecente que me brindava com seu calor na minha interminável noite.
Era possível que ela me traísse. Passei o tempo me convencendo de que assim seria. Se o fizesse, eu estaria condenado. Mas não podia ir até sabê-lo.Me aproximei do sofá e me recostei, inclinei a cabeça e permaneci imóvel.
A quem queria enganar? Ela não me trairia. Tinha entregado meu coração a essa garota e quando ela regressasse, eu ainda estaria aqui, esperando-a. E por fim lhe diria que meu coração estava em suas mãos.
Rachel entrou no bar toda prosa, como se não tivesse nada que se preocupar, apesar de que tinha o coração rompido. Quando regressasse ele teria ido. Teria ido e nunca mais voltaria a vê-lo.
Ainda assim, fingiu surpresa ao ver o lugar tomado de homens e Marney parado na frente de todos.
- Deus – sussurrou -. Parece que o negócio vai muito melhor quando não estou aqui, não é? O que celebramos hoje para contar com a assistência do povoado inteiro?
- Isto não é uma celebração, Rachel. – Marney deu um passo à frente e lhe agarrou as mãos como se ela fosse sua propriedade. – Mas me alegra que esteja de volta. Estará fora de perigo quando invadirmos o castelo do abominável.
Ela franziu o cenho e puxou as mãos.
- E por que planejaria atacar uma ruínas desabitadas?
- Desabitadas?
- Sim – fez um gesto afirmativo com a cabeça -. Donovan foi embora. Voltou somente para olhar pela última vez o lugar antes de partir para sempre. É uma pena que não o tenha feito se sentir bem vindo aqui sabe? É um bom homem.
- É uma besta! – gritou alguém.
- Oh, eu não acho isso. Foi suficientemente amável ao me ajudar com a minha investigação antes de partir. – Passou por trás da barra para alcançar seu avental.
- Acredito que está mentindo, Rachel – disse Marney olhando-a fixamente -. Acredito que tem intenção de protegê-lo e não estaria fazendo se não estivesse sob o seu encantamento.
- Encantamento? – lhe perguntou com os olhos muito abertos -. Não me diga que é tão bobo para crer que ele é algo mais que um homem comum e correto.
- Tú sabe que ele é.
Ela sabia. Ele estava muito além do comum e correto e era dez vezes mais homem que qualquer um dos presentes nesse lugar, mas em lugar de dizer-lhe isso, limitou-se a encolher os ombros.
- Eu não sei tal coisa. Mas sei o seguinte, Marney: Não permitirei que lhe faça mal.
- Então ele ainda está lá! – gritou Marney golpeando a mesa com o punho.
- Eu não disse...
- Não foi necessário que o dissesse. Tem sido muito fria comigo desde teu regresso, Rachel. E todo mundo sabe que planejava se casar comigo antes de ir embora. Essa besta se apoderou de tua mente.
- Nunca planejei casar contigo. Os planos eram só seus – disse -. Com efeito, foi uma besta que me fez trocar de opinião, Marney, mas esta besta é tu, não Donovan O’Roark.
- Subiremos até ali e quando abandonarmos o lugar não deixaremos mais que escombros. Ele não escapará... ao menos, não com vida. Girou sobre os calcanhares e os demais homens se puseram em pé. Fizeram fila para a porta, com Marney encabeçando. Rachel começou a correr atrás deles, mas avançavam rápido demais e apesar de segurar a vários, chamando-lhes a atenção, suplicando-lhes, estavam muito frenéticos para escutá-la. Quando giraram para retornar ao serpenteante caminho do castelo, Rachel entrou no bosque e andou a toda pressa pelo atalho que Donovan lhe tinha ensinado, para poder adiantar-se a eles.
Mas quando alcançou novamente aos frenéticos homens, divisou as portas do castelo abertas de par em par, e a Donovan saindo através das mesmas.
Ele olhou a multidão e sacudiu a cabeça lentamente. Se via completamente tranquilo, mas ela conhecia seus pensamentos. Ele pensava que isto era obra sua. Que tinha feito o que suas antepassadas tinham feito a seu melhor amigo. Que ela o tinha abandonado para guiar e essa multidão até o castelo. Que o tinha traído.
Então ele levantou a cabeça.
- Onde está Rachel? – perguntou - Lhe fizeram algum mal?
Ela piscou surpreendida, incapaz de pronunciar uma palavra. Ele pensava que lhe tinham feito mal? Então...
- Rachel já não é assunto teu – lhe disse Marney -. Sabemos que a enfeitiçou de alguma maneira ou ela não o teria defendido com o fez. E quando você desaparecer, ela voltará a estar bem.
- Me defendeu? Fez isso? Não me surpreende – disse Donovan e ela podia jurar que lutava para conter um sorriso -. E quando eu desaparecer, você disse – continou Donovan - Então, está disposto a me assassinar estou certo?
- Assim é – grunhiu Marney.
- Sempre que seja honesto sobre tuas razões – prosseguiu Donovan - quer que eu desapareça por causa de Rachel. Porque ela ama a mim e não a você.
Os homens grunhiram e alguém gritou:
- É verdade isso, Marney?
- Então me deixará fora até o amanhecer, Neal? – prosseguiu Donovan -, ou simplesmente matará-me aqui e agora?
-Aqui e agora – sussurrou Marney.
- Tem certeza que consegue?
Marney estreitou os olhos e levantou a sua espingarda. Rachel soltou um gemido e se precipitou fora das árvores, arremetendo com o corpo dela contra o do Marney e procurou tirar-lhe a arma. Mas nunca conseguiu agarra-la. Marney se desequilibrou pela força do seu ataque e o disparo irrompeu tão forte que lhe machucou os tímpanos. Então ela sentiu a queimação... o calor. O pulso rápido da vida batendo em seu corpo.
Ela teria caído ao chão, ainda piscando pela colisão, se Donovan não tivesse se apressado para a pegar em seus braços.
- Maldito seja – gritou. – Maldito seja, olha o que você fez! Rachel? Rachel!
Ela abriu seus olhos para estudar o rosto dele. Em seguida, olharam ao Marney.
-Vá embora - disse-lhe -. Vá embora daqui. Se você o voltar ver ...
Marney se distanciou. Os outros homens estavam chocados ante a sua fúria e começaram a dispersar, talvez, por perceber o que eles estavam prestes a fazer. E o que tinha acontecido por causa de sua insensatez.
Donovan a segurou em seus braços e se inclinou para lhe beijar o rosto. Mary apareceu entre a multidão e abriu caminho através dos homens que estavam em retirada, enquanto Marney permaneceu quieto na estrada, piscando em choque. Ela se inclinou sobre Rachel e lhe abriu a camisa para olhar seu tórax, onde a dor vibrava e queimava. Mary levantou os olhos com uma expressão de seriedade, para encontrar os olhos de Donovan.
-Pode ajudar - sussurrou. Não pode?
Com sua visão desaparecendo, Rachel viu ele concordar. Em seguida, Mary voltou o rosto.
-É só uma ferida superficial, disse a Marney. Mas eu juro que, a menos que marche agora, vou avisar as autoridades e farei você ser preso por tentativa de assassinato. E se você tentar perturbar essas pessoas de novo, também o farei. Agora sai!
Assentindo e murmurando que não era culpa dele, Marney girou em seus calcanhares e começou a correr como o covarde que era. Mary retornou para enfrentá-los simultaneamente.
-Eu imagino que não voltarei a te ver, certoi?
Rachel não disse nada, não muito segura do que Mary quis dizer.
- Adeus pequena. Seja feliz.
Então ela foi embora.
Rachel olhou para os olhos de Donovan.
- Tinha medo que pensasse que o tinha traído...
- Te conheço melhor que isso.
- Está certo disso?
- Tu sabes que sim. Continuava lhe dizendo que não podia confiar, que não podia importar-me... ainda quando o fazia. Duvidei de ti Rachel, desde o começo, e estou mais envergonhado do que as palavras podem explicar. Não te merecias. Mas jamais te deste por vencida comigo não é certo?
- Como poderia? Você está na minha alma, Donovan O'Roark. Tem estado desde que eu era apenas uma criança.
-E você está na minha, disse. Me fez acreditar em você, Rachel. Me fez... me fez te amar apesar de que jurei que jamais faria algo assim. Eu amo você, Rachel Sullivan. Está a me ouvir? Eu te amo.
- Claro que o fiz – sussurrou -. Sempre me amou.
Sorriu afetuosamente.
- Estou morrendo - sussurrou.
- Sim.
-Mas você pode evitá-lo, verdade Donovan? Pode fazer-me ... como você.
-Essa não é uma vida fácil, pequena. Nunca mais ver a luz do sol. Sempre haverá aqueles que te perseguem para te caçar, para te assassinar só por ser o que é.
-Passearemos de mãos dadas sob o luar, passarei cada momento entre seus braços - ela disse fracamente -. Essa é a vida que eu quero, sempre que possa viver ao seu lado. É o sonho que tenho desde sempre, Donovan. Estar com você... estamos destinados a ficar juntos.
- Então nós vamos estar juntos, Rachel. Sempre. Ele baixou a cabeça e a beijou, então ela percebeu que seu sonho finalmente se tornou realidade.
Maggie Shayne
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