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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


RECLAMANDO A CORTESÃ / Anna Campbel
RECLAMANDO A CORTESÃ / Anna Campbel

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

RECLAMANDO A CORTESÃ

 

Ele iria se casar com ela, e a possuiria de cada modo possível.

O Duque de Kylemore conhece-a como Soraya, a cortesã mais famosa de Londres. Os homens duelam para passar uma hora em sua companhia. E somente ele conseguiu abrir caminho e se aproximar dela. Diante de toda a sociedade londrina, ele decide fazê-la  sua noiva; então, de repente, ela desaparece no ar.

As circunstâncias horríveis forçaram Verity Ashton a trocar a sua inocência e mudar o seu nome por causa da sua família. Mas Kylemore destrói seus planos de uma vida respeitável quando ele descobre seu porto seguro. Ele rapta-a, levando-a para sua isolada cabana de caça na Escócia, onde ele jura curvá-la à sua vontade.

Lá ele a seduz novamente. Verity passa noite após noite em sua cama… e embora ela ainda planeje fugir, ela sabe que nunca poderá abandonar o amor inesperado e mal acolhido pelo seu amante orgulhoso e poderoso, que reclama tanto o corpo dela quanto a sua alma...

 

Londres, 1825.

      Justin Kinmurrie, Duque de Kylemore, olhou através dos lençóis molhados onde sua amante havia se deitado, aparentemente esgotada. Sua graça suspeitava que esse esgotamento fosse fingido, mas ele havia tido uma perfeita performance dela para discordar disso.

      Ele parou de fazer o laço em seu lenço dele para admirar o corpo inerte dela nu, cremoso e incandescente na luz de tarde. As pernas longas os quadris delicadamente arredondados, o estômago ligeiramente côncavo, os peitos magníficos que almofadavam o pendente de rubi de sangue em forma de pombo, que ele tinha dado há duas horas, para marcar o fim do primeiro ano deles juntos.

      Por um momento longo e encantador, a atenção dele demorou nesses montículos brancos luxuriantes com os mamilos rosados. Então os olhos dele viajaram para cima, para a face dela, pálida e pura como qualquer Madonna pintada.

      Mesmo depois de todo esse tempo, o contraste entre o corpo de meretriz e a face de santa enviava uma vibração muito masculina para ele.

      Ela era bonita. Ela era a mulher mais notória em Londres. E pertencia a ele, uma parte do prestígio que possuía assim como sua vestimenta impecável, os estábulos famosos ou as ricas propriedades dele. Ele se permitiu um sorriso leve, enquanto voltava a se vestir em frente ao espelho dourado e grande.

— Devo chamar Ben Ahbood para ajudá-lo, Sua Graça?

Os olhos extraordinários dela, um cinza iluminado e claro como água, estavam, como sempre, inexpressivos na máscara deslumbrante de sua face. Ele às vezes se perguntava, se isto era o âmago de sua fascinação — o natural desinteresse dela apesar de sua habilidade como amante.

Não, era mais que isso. Era a promessa de que pelo toque certo, a palavra certa, o homem certo, mundos de calor, sentido e significado estariam esperando atrás daquele olhar sereno. O duque, para sua consciência, nunca se enganou pensando que ele havia quebrado esta reserva formidável. E depois de um ano como protetor dela, ele estava começando a entender que ele nunca iria alcançá-la.

      Ela sabia o quão intrigante se tornava por conta dessa distância? Ele seria pego de surpresa se ela não o fizesse. Sua restrição emocional jamais significou que ela não era tão inteligente quanto um vale cheio de raposas.

      — Meu senhor?

      Ele balançou a cabeça.

— Não. Eu posso cuidar disso.

Na verdade, o criado dela mudo e enorme, com muitos rumores de que fosse eunuco, o fazia se sentir incômodo, embora antes fosse submetido a um castigo a ter de confessar esse fato vergonhoso.

      Ela estirou seu corpo flexível, o corpo que o enlouqueceu e lhe deu mais prazer que ele alguma vez houvesse imaginado. Kylemore reconheceu o retorno da excitação. E pelo reflexo nos olhos dela, ela também retornava a tal estado, condenando sua alma conhecedora.

      — Não é tão tarde. — Uma mão esbelta deslizou para cima para brincar com o rubi. O movimento chamou a atenção dele, percebendo que ela estava perfeitamente ciente de seus peitos cheios que ele achava fascinante.

      — Eu não estarei de folga nesta tarde, senhora.

      — Isso é uma vergonha —, ela disse em tom neutro, levantando-se para tirar um penhoar azul do chão. Kylemore ignorou deliberadamente suas costas nuas e o modo que os traseiros dela se apertaram quando ela se dobrou. Ignorando assim, tal visão tanto quanto qualquer homem vigoroso poderia.

      Sempre foi assim entre eles, desde o momento em que ele conheceu seu olhar fresco e avaliador num salão abarrotado. Isso foi há seis anos. Ela tinha sido, até então, amante de outro homem, tendo desse modo, outro guardião, apesar dos esforços de Kylemore para capturar o interesse dela. Ela só tinha consentido em dar-lhe atenção, depois da troca de uma pequena fortuna e contratos bastante detalhados, que foram suficientes para manter um grupo de advogados em agitação durante um mês.

      Mas se ele acreditava que possuindo esta mulher terminaria a sutil batalha pela dominação, ficaria tristemente desapontado. Acima de tudo, o jogo entre eles era mais intenso do que nunca. E enquanto o mundo considerava as vantagens dele, ele sabia que sua amante possuía armas tão fortes quanto as dele: sua beleza, seu descaso, e acima de tudo, o fato de que ele a tinha desejado há seis anos e, maldita seja, ele ainda a queria!

      Com relutante pesar, Kylemore assistiu-a encobrindo-se com o penhoar; não que a seda diáfana fizesse muito para esconder as glórias debaixo dele.

      Ela sacudiu seu cabelo preto e longo, que ia até a cintura, para longe de sua face e veio se postar atrás dele. Os olhos deles se encontraram no espelho onde ele levou, lamentavelmente, longo tempo para se vestir.

      — Eu não posso te persuadir a mudar de idéia? — Ela entrelaçou os braços ao redor dele e apertou-se contra ele, enchendo a cabeça dele com as essências de uma mulher recentemente satisfeita e o perfume de âmbar gris sensual que a favorecia. Ele fechou os olhos enquanto os hábeis dedos dela remexia no fecho de suas calças, então deslizou sua mão para dentro e começou a acariciar seu pênis endurecendo-o. A velocidade e vigor da resposta dele foi retirar com vigor as mãos dela. Um homem à mercê dos apetites sexuais era não mais que um animal bruto.

— Da próxima vez.

Ela não mostrou nenhum pesar. — Diabo a leve! — Somente encolheu os ombros, caminhou até o suporte da cama para se encostar nele, enquanto o observava arrumar os estragos que ela fizera em sua roupa. Ele colocou seu casaco e virou-se.

      — Eu agradeço, Sua Graça, por sua bondade contínua. — Ela foi para ele e o beijou.

      Eles raramente beijavam-se, e um beijo com um gesto de afeto era um evento sem precedentes. Isso é o que parecia a Kylemore. Ela não estava tentando seduzi-lo. Depois de um ano, ele reconheceria sedução. E ele já havia lhe dado o extravagante pendente de rubi. Mesmo gananciosa como era, ela não podia esperar conseguir outra bugiganga de seu bolso. Não, ele só poderia assumir que ela o beijara porque tinha desejado fazê-lo.

      Tal idéia revolucionária apenas se fixara quando ela se afastou. Os lábios róseos e macios que tinham se agarrado tão docemente aos dele e doce era a única palavra em que ele poderia pensar em curvaram-se em um sorriso lânguido. — Tenha um bom dia, Sua Graça.

      Ele pegou a mão dela e, ainda perdido na memória de seu beijo -o que era absurdo, considerando toda devassidão daquela tarde levando os dedos esbeltos dela aos seus lábios com uma reverência digna de uma princesa.

      Quando ele ergueu a cabeça, percebeu a confusão de seus próprios olhos nos olhos prateados dela.

— Um bom dia para você também, madame.

      Ele a liberou e andou a passos largos para fora do quarto. Ele comprou para ela o local e a parte de fora da vila há uma ano. Mas não importa o quão longe ele fosse, pois não poderia banir a memória da sua doce boca na dele, em um beijo quase que... inocente.

      Sua infame, perigosa e enigmática Soraya. E ele não estava mais perto de entendê-la agora, do que há seis anos.

      Ela ouviu os passos determinados do duque levarem-no para sair da pequena casa limpa. Ele sempre se movia como se soubesse exatamente aonde ia. Era uma das primeiras coisas que ela tinha notado nele.

      Mas durante um momento, quando ela tinha o beijado, ele havia parecido jovem e inseguro, nada parecido com o frio e autoconfiante Duque de Kylemore. Pensativamente, ela foi para detrás de um pomposo, e extremamente luxurioso, biombo chinês, substituindo o penhoar por uma manta clara de algodão. Houve uma batida na porta, no mesmo instante em que ela se arrumou.

      — Entre —, ela disse, enquanto pegava os artigos de vestuário descartados distraidamente do chão. A casa tinha uma equipe completa de criados, todos contratados pelo duque, mas antigos hábitos são difíceis de serem evitados.

      Uma figura grosseira em roupões Orientais listrados entrou e a observou através de olhos marrons escuros perceptivos.

      — Eu tenho essas moças lá embaixo aquecendo água para o seu banho, Verity —, ele disse no acento de Yorkshire grosso que ela havia tentado, mas falhara em erradicá-lo.

      — Obrigado.

Verity Ashton, familiar ao mundo como a incomparável Soraya, deu uma olhada ao redor da destruição do quarto.

— Eu mal posso acreditar que meu tempo como Soraya, enfim acabou.

      O homem suspirou e arrancou a touca corrente dele. Imediatamente, o inescrutável Ben Ahbood, o mudo guardião árabe mudou para o mais escandaloso devasso de Londres, se tornou Benjamim Ashton, rapaz das fazendas do norte do país e um incontestável inglês, tanto quanto as tortas de carne de porco ou os precipícios brancos de Dover.

— Você disse adeus a ele?

      Verity ignorou a sugestão de hostilidade para o duque. O irmão mais jovem dela não tinha aprovado nenhum dos protetores dela, mas por alguma razão, ele tinha uma afronta particular para com Kylemore. Uma antipatia, ela suspeitou, que o duque havia compartilhado, se ele pudesse admitir qualquer sentimento para uma criatura tão baixa quanto um servo de uma mulher decaída.

      — Não, você e eu concordamos que é melhor apenas desaparecer.

      Ben fez um som de desaprovação do fundo da garganta.

— Mas agora você está se sentindo mal por isso. Eu não sei como um patinho manso como você sobrevive neste mundo cruel. — Ele pegou uma bandeja da cômoda e começou a empilhar os pratos espalhados e os artigos de vidro. O quarto desordenado, ela soube, havia ofendido a mente dele, que anotava tudo.

      Nos quatro anos em que viviam juntos, Ben nunca conseguira se conciliar com a profissão dela. Se ele não tivesse sido uma mera criança de dez anos quando ela tinha se lançado a essa carreira, ele a teria parado, e ela sabia disso. Entretanto, se ele não tivesse sido tão jovem, se a irmã dela não tivesse sido ainda mais jovem, talvez ela teria tido alguma outra opção de vida.

      — Eu acho... eu acho que o duque é um homem infeliz —, disse ela suavemente, dispensando as velhas recordações. Ela raramente pensava no passado, mas hoje era um fim, então inevitavelmente, ela contemplou o começo de Soraya.

      Ben lançou-lhe um olhar pouco impressionado.

— Tão infeliz quanto a grande fortuna, a bonita cara e tudo aquilo que um homem poderia querer ser. Ele é um grã-fino mimado, isso sim. Ele não gosta de perder seu brinquedinho. Mas toda aquela grana adorável comprará outro logo para ele. Não se aflija por causa de um pretensioso bastardo.

      — Não dizer adeus parece tão ordinário. Nós não temos que ir embora furtivamente. Quando eu me tornei a amante do duque, ele sabia que o arranjo só era de um ano. Ele assinou um contrato que dizia isso.

      — Ele estava tão louco pela luxúria naquele época, que ele teria dado sua alma para você se você o tivesse pedido, e ainda sorriria por tê-lo feito. Marque minhas palavras, moça: um acordo escrito não significa nada para um duque estúpido. Quando ele a te teve, ele já a havia desejado durante cinco longos anos. Ele pretendia te ter, não importasse o preço.

      Ela inclinou a cabeça, enquanto estudava o fino tapete turco em baixo de seus pés. Na realidade, era o único artigo genuíno do Oriente Médio no quarto.

      — Eu suponho que sim.

      Não pela primeira vez, ela desejou nunca ter beijado o duque. Qualquer contratado com reputação duvidosa como a dela, acabaria dando problemas.

      — Você tem vinte e oito anos, Verity. Logo estará velha demais para essas travessuras. Então verá se Kylemore alto e poderoso pensará duas vezes antes de te trocar por um pedaço mais fresco de musselina.

      Verity riu brevemente. — Que velha ressecada você me faz parecer!

      O irmão dela sorriu de volta. — Oh, eu não acho que você esteja pronta para os compradores de materiais usados, ainda. Mas você planejou isto há muito tempo. Não deixe nenhuma piedade inapropriada mudar sua mente.

      — Você tem razão. — O duque sempre tinha sido um meio para um fim, era a chance dela para abandonar esta vida artificial para sempre. Ele logo se recuperaria de qualquer dano que sua partida causaria no orgulho dele.

— Soraya não mais!

      O sorriso de Ben se alargou. — Isso é maravilhoso, moça. Sim, e eu não me importo em te contar mais essa: eu ficarei muito contente em deixar Ben Sangrento Ahbood, o castrado favorito do sultão, para trás também!

     

      Uma hora depois de deixar a amante, o Duque de Kylemore estava de pé em sua grande biblioteca, envolvido numa disputa com a mãe.

      Isto era sem dúvida um fato excepcional. Kylemore e a duquesa compartilhavam uma relação difícil nas melhores épocas; e essa épocas eram passageiras e raras. Mas o conflito de hoje era ainda mais severo do que o habitual.

      — Você se casará, Justin! Você deve isto ao seu nome e à sua família. Você deve isto a mim. Você deve isto ao título.

Este não era um conflito novo, mas a mãe dele estava particularmente mais firme nesta tarde. Ela estava de pé em frente a ele, alta e esbelta, e fortemente inclinada a fazer seus desejos prevalecerem.

      — Há tempos eu acredito que o mundo seria um lugar melhor, se o título afundasse em esquecimento permanente, — Kylemore disse cansativamente, enquanto apoiava um cotovelo no consolo da lareira de mármore esculpido e fitando abaixo a lareira apagada.

      — Justin! O que diria seu querido defunto pai se ele pudesse ouvi-lo?

      — Meu pai também era viciado em bebida, ópio e nos pecados mais vis da carne para se preocupar.

      — Como você ousa dizer isso?

      — Porque é verdade. — Kylemore observou. Com um senso de inevitabilidade, ele olhou sua mãe sacudir um pedaço de seda para golpear levemente seus próprios olhos.

      — O que em nome dos céus eu fiz para merecer um filho tão insensível?

      — Eu não creio que essa seja uma linha de argumento a qual você queira adotar, senhora —, ele disse friamente.

      A mãe dele poderia produzir lágrimas de crocodilo à vontade. A visão dela apertando um lenço apenas evidenciava seu enfado.

      — Letitia seria a esposa perfeita, Justin.

      Kylemore suprimiu um tremor.

— Ela seria a tua espiã perfeita, você quer dizer. — A mãe dele tinha empurrado sua protegida, Lady Letitia Wade, para ele durante anos. Mas ultimamente, os esforços dela se mostravam demasiadamente desesperados, talvez porque estivesse percebendo que qualquer poder que tivesse sobre ele estava definhando.

      Margaret, Duquesa de Kylemore, só se importava com uma coisa: poder. Em sua perseguição, ela tinha seduzido metade do governo, mentido, conspirado e manipulado. Sem um fragmento de remorso, ela era capaz de destruir tudo e todos que a impedissem de alcançar seus fins egoístas. Ele havia visto o suficiente das freqüentes ações dela. Mas os dias dela de influência estavam fadados e ela sabia disto. Plantando a cara-de-leite Letitia, sempre sua criatura incondicional, na casa dele era seu último recurso.

      O queixo delicado da duquesa assumiu uma linha teimosa.

— Pessoas estão falando. Se você não fizer isto corretamente, a reputação da pobre criança estará além da redenção.

      — Se houver fofoca, terá apenas uma fonte. E essa será você. — Kylemore se aproximou. — Eu nunca levarei essa pequena ovelha em exibição furtivamente para minha cama. Se as más línguas estão falando sobre ela estar dormindo sobre meu teto, que está muito bem acompanhada de sua aia, eu devo chamar atenção, e isso poderia ser facilmente remediado. A propriedade no campo está pronta para ocupação.

      O ganido da mãe dele de afronta não possuía nenhum artifício.

— Deixar a cidade? No meio da estação? Você deve estar louco. Todo mundo o condenará como cruel e negligente se você me obrigar a este ato monstruoso.

      Kylemore tinha tido o bastante. Ele talvez não tivesse ódio por sua mãe no decorrer de seus vinte e sete anos, mas, Deus, ele sentia como se tivesse. E a vingança perfeita estava tão perto como um esticar de mão; o momento de mostrar para a duquesa o quão cruel ele poderia haver chegado.

      Ele se permitiu um sorriso frio.

— Eu não acho. O mundo considerará minhas ações perfeitamente razoáveis para um homem que se casou recentemente.

      Claro que, a mãe dele não entendeu imediatamente. A face angulada dela, com seus olhos azuis fundos e negros, analisaram-no ligeiramente - um rosto parecido ao dele que ele via e detestava toda vez que ele passava em frente a um espelho - claramente aliviada.

— Oh, Justin! Você está brincando, eu deveria ter adivinhado. Letitia estará em um transporte. Ela sempre esteve pronta para você.

      Kylemore não teve nenhuma dificuldade em mantém o sorriso no lugar.

— Eu duvido disto. — A tutelada da duquesa tinha pavor dele, e ele sabia. Ele duvidava que aquela criança o contemplasse como marido sem sair correndo gritando para o convento mais próximo e falar tudo aquilo para que Margaret mudasse de opinião.

— Mas eu temo que você se equivoque, Mãe.

      A duquesa era uma mulher astuta, embora a vaidade e o egoísmo, por vezes, nublasse seu julgamento.

— Não faça nada precipitado para me ofender, Justin. Lembre-se da honra dos Kinmurrie —, ela disse, repentinamente sombria.

      — Oh, a honra de Kinmurrie é predominante em minha mente, querida Mãe. — Ele a viu vacilar à extremidade selvagem que ele emprestou a estima. — Eu pretendo trazer para casa uma noiva digna dessa honra.

      — Justin.— Ela o alcançou para tocá-lo, mas ele se esquivou dela. Ele ficou satisfeito ao notar que sua mãe estava sinceramente amedrontada agora.

      — Eu não espero um noivado longo, Mãe. Minha esposa desejará cumprir seus deveres o mais cedo possível. Dada a situação, você e Letitia deveriam fazer arranjos para uma remoção precoce. — Ele se curvou brevemente em direção a ela.

— Com sua licença. — Ele saiu da biblioteca, sua mente estava inflexível com uma determinação tão clara quanto um diamante.

     

      Verity estava na cozinha quando a criada a encontrou. — Perdoe-me, senhorita, mas Sua Graça está no quarto de desenho procurando por você.

      — O quê? — Ela girou muito depressa e bateu o castiçal de cerâmica que estava empacotando nas caixas.

      — Oh, senhorita!— Elsie agitou-se ao redor dela, enquanto torcendo as mãos dela diante da bagunça de cacos quebrados no chão. — Oh, senhorita, não se mova ou você se cortará.

      — Está tudo bem, Elsie. — Embora, na realidade, Verity adorasse o robusto castiçal marrom. — Você disse que o Duque de Kylemore está aqui?

      — Sim, senhorita. Eu vou pegar uma vassoura para varrer os pedaços.

      Os batimentos apavorados do coração de Verity bloquearam todo o rebuliço que a criada fazia. Por que Kylemore estava aqui? Ele a chamava com uma regularidade quase militar nas segundas, terças e quintas-feiras. Ele chegava, obtinha prazer e partia. Ocasionalmente, enviava uma carruagem para levá-la à cidade, ao teatro ou a uma festa. Mas uma vez que partia de Kensington, ele nunca, jamais retornou no mesmo dia.

      Seria uma coincidência, justo nessa noite em que ela pretendia desaparecer da vida dele? Ele deveria ter descoberto. Mas como? Ela tinha sido tão discreta, tão cuidadosa.

      As mãos dela tremiam enquanto tirava o avental sujo e passava por Elsie, que estava cuidando dos restos do castiçal. Verity dificilmente faria justiça à lendária Soraya com aquela musselina cinza clara, mas irritar o duque fazendo-o esperar, parecia menos inteligente. Se ele tivesse descoberto os planos dela, ela precisaria de todo fragmento de benevolência que pudesse juntar.

      Embora ela fosse encontrá-lo com a cabeça erguida, o coração dela batia descompasadamente. As intenções dela não eram definições estritamente ilegais, mas rígidas de legalidade e ficariam irrelevantes, se o inimigo fosse um homem poderoso. E um duque era sobretudo tão poderoso quanto um homem pudesse ser.

      — Sua Graça? Que... prazer inesperado.

      Lentamente, ele saiu de sua contemplação dos espaços vazios nas paredes. O negociante de quadro havia partido na última hora com as obras de arte pouco notáveis que Kylemore tinha julgado satisfatórias para o domicílio de sua amante.

      Verity apressou-se, antes que ele pudesse falar. — Eu devo pedir chá ou Sua Graça talvez prefira... subir para os aposentos? — A objetividade era desmerecedora da grande Soraya, pois ela falara muito rápido.

      O olhar confuso do duque reafirmou seus pensamentos com a mesma expressão que ele usara quando contemplara as paredes em branco.

— Você parece... diferente.

      Verity poderia imaginar que sim. Soraya nunca aparecera diante de seu protetor com menos que seu melhor vestido, a não ser que ela não estivesse usando absolutamente nada.

      Kylemore considerou o quarto vazio.

— O que está acontecendo aqui?

      Verity deu uma risada baixa, típica de Soraya, rouca e extremamente sugestiva.

— Sua Graça me pegou em um momento doméstico. Nós estamos limpando a casa.— Com uma elegância estudada, ela sentou-se no chaise longue e gesticulou para o duque sentar-se.

      — Nós? Eu não espero que minha amante brinque de serva doméstica. Se você precisar de mais pessoal, é só pedir.— Ele sentou-se em frente a ela, com toda sua magnificência, cabelos negros, nariz altivo. Os olhos azuis dele a inspecionaram criticamente.

      Ela encolheu os ombros.

— Eu gosto de conferir que as minhas normas são obedecidas, Sua Graça. Afinal de contas, a casa é minha.— Ela esperava que ele se recordasse disso, depois que ela tivesse ido embora.

      — Você tem uma mancha em sua bochecha.

      Incrivelmente, ela corou. Ela, que tinha comercializado sua castidade pelo sustento aos quinze anos. Hoje, parecia, que estava cheia de singularidades.

      O beijo. A segunda visita do duque. E agora o rubor.

      Talvez fosse realmente o tempo de Soraya se aposentar.

      — Eu o desagradei com minha aparência —, ela disse inalterada. — Eu irei e mudarei a roupa e colocarei um vestido mais apropriado para receber Sua Graça. — Ela começou a subir.

      — Não, eu estou sendo descortez. Eu peço desculpas.

      O assombro trouxe Verity de volta ao seu lugar.

      Sem precedente realmente! Ela não poderia ter acabado de ouvir seu orgulhoso e difícil amante se desculpar.

      A expressão do duque era ilegível.

— Você nunca poderia ser menos do que empolgante.

      — Obrigado —, ela disse, embora a observação dele não parecesse um elogio completamente.

      — Você fará uma duquesa espetacular.

      Se ela não o conhecesse melhor, ela teria dito que ele passara o dia na amargura. O medo dela tinha baixado o suficiente para achar o humor estranho de Kylemore irritante.

      — É o prazer de Sua Graça fazer brincadeiras, eu vejo.

      Os olhos de Kylemore brilharam com uma luz severa.

— Eu estou longe de brincar, madame.— A voz funda dele assumiu seu tom habitual de comando. — Eu estou aqui para informá-la que nós nos casaremos, assim que eu obtiver uma licença especial.

      O choque forçou um riso genuíno dela.

— Agora eu realmente sei que você está zombando de mim. — Ela estava de pé, pretendendo servir-lhe uma taça de vinho, mas ele a alcançou e pegou seu pulso, antecipando-se a ela.

      — Esta é uma resposta estranha à minha proposta.

      — Eu não ouvi uma proposta —, ela disse antes que pudesse se deter.

      — Eu quero que você seja minha esposa.

      Ela fitou com olhar baixo à face dele, enquanto notava o músculo tenso de sua bochecha. Ele estava tomado por uma forte emoção, ela percebeu. Não só isso; ele parecia falar sério sobre esta louca idéia.

      — Sua Graça, estou lisonjeada pelo seu interesse, mas você tem que ver que o que sugere é impossível. — Quando a mandíbula dele assumiu uma linha teimosa, ela continuou em uma voz mais dura. — Mesmo se o mundo, seu nome e sua família apoiassem seu casamento com uma pessoa de nível inferior, eu temo que meu próprio orgulho o negaria.

      — Orgulho? — Ele falou como se a palavra fosse inconcebível com relação a uma criatura decaída como ela. — Esta é uma promoção além de seus sonhos mais selvagens.

      — Meus sonhos são surpreendentemente humildes.

      Sob um senso crescente de irrealismo, Verity estava brava. Só um dominador arrogante poderia esperar que ela agradecesse esta oferta lunática. Ela era bastante sagaz para ver que ele estava desenvolvendo algum esquema, embora ela não pudesse compreender o propósito dele.

      Uma mulher mais convencida atribuiria a oferta do duque a um súbito de paixão. Mas Verity sabia que não. Ele estava tramando algo para seu próprio benefício. E ela não tinha nenhuma intenção de se envolver com o que quer que ele estivesse fazendo.

      Ela, uma duquesa? A idéia era cômica em seu irrealismo.

      Ela manteve sua voz fria.

— Rogo que me solte. É provável que sua galante proposta me deixe uma marca de machucado.— Não era precisamente verdade. Sua mão era firme, mas sem a ferir de fato.

      — Eu a deixarei ir quando me responder.

      — Eu pensei que já o tivesse feito. — Por necessidade, ela havia dedicado a maior parte de sua vida se submetendo a homens egocêntricos. Agora ela tinha alcançado o seu limite. — Mas como insiste Sua Graça, aqui está minha resposta. Eu me submeti a tornar-me sua amante, meu senhor, porém nenhum poder na terra poderia compelir-me a que me tornasse sua esposa.

      Talvez, se ele tivesse fraseado sua proposta de um modo menos arrogante, ela poderia ter sido mais suave em sua recusa. Ou talvez, com uma fuga tão próxima, ela não pôde se conter em sua franqueza natural, escondida tanto tempo na pretensão de ser Soraya.

      Uma coloração de fúria floresceu nas maçãs do rosto dele.

— Você responde apressadamente, madame e com um desdém que não posso acreditar que mereço. Eu vim aqui para te tirar da sarjeta e levá-la a um estado honrado de matrimônio.

      — Pelo menos eu sou grátis na sarjeta.

      Ele aproximou-se e olhou com ferocidade para ela. Mesmo em seus momentos mais extremos de paixão, eles nunca tinham tido tanta emoção genuína.

— Você fala muito ligeiramente de sarjetas. Você esquece que eu poderia destruí-la com apenas uma palavra.

      O duque pareceu crescer sobre ela, alto, poderoso, o corpo magro, mas musculoso dele irradiando força. Mas Verity recusou-se se encolher ante dele. Verity, não Soraya. Em algum lugar deste encontro, Soraya havia desaparecido.

      — Muito bem, senhor. Eu quase me acho tentada a aceitar seu pedido.

      Verity pensou que ele poderia golpeá-la, ele que nunca tinha erguido a mão para ela, mas estava com raiva dela até naquele momento. Ela firmou-se. Ela tinha suportado violência no passado. Ela poderia suportar isto novamente.

      Mas incrivelmente, ele dominou sua raiva. Ele abriu os braço para ela com um gesto irônico.

— Não há propósito em continuar com isso agora. Você está alterada e não está pensando claramente.

      Verity se reprimiu para mostrar que ele dificilmente seria um modelo de tranqüilidade. Ele finalmente a tinha libertado e disse que iria embora. Depois desta tarde, ela não pretendia vê-lo nunca mais.

      Para ela, no momento, falar era um esforço. — Como desejar, Sua Graça.— Vá embora, o coração dela chorou. Apenas vá e me deixe em paz.

      Secretamente, ela sempre gostara do Duque de Kylemore, sentindo a batalha solitária dele para manter sua fachada perfeita. Mas sua surpreendente, inadequada e angustiante proposta de matrimônio e seu comportamento nos últimos minutos a fez se lembrar dos velhos rumores de loucura que atravessava a linhagem dos Kinmurrie.

      Seu alto rubor indicava que ele ainda estava longe da calma.

— Eu devo retornar amanhã para sua resposta. Enquanto isso poupe alguma consideração pelas jóias da Duquesa de Kylemore. Elas fazem os rubis de hoje parecerem quinquilharias de parque de diversões.

      Assim você acredita que não sou mais do que um jade ávido, Verity pensou ressentidamente. Ela não tinha disfarçado seu sarcasmo.

— Eu o asseguro, minha mente não pensará em nada mais que diamantes e esmeraldas.

      Isso não o agradou, ela podia ver.

— Amanhã as quatro, madame. Eu espero seu consentimento.

Nenhum beijo suave na mão agora. Aparentemente, a amante dele merecia uma cortesia, que a noiva em perspectiva não merecia.

      Kylemore ignorou a mesura que ela lhe direcionou e andou a passos largos para a porta.

— Como você já deveria saber, eu sempre consigo o que eu quero. E não duvide que eu quero este matrimônio.

Ele enviou um aceno gelado na direção dela, o quadro da onipotência masculina aristocrática, e se foi.

      Mas quando Kylemore chegou à pequena vila no dia seguinte, tudo estava quieto e vazio. A notória Soraya, sua arma escolhida contra sua odiosa família, havia sumido.

 

      Kylemore entrou na casa, e em questão de segundos percebeu que não só não havia ninguém, como também nenhum dos objetos de valor estava lá.

      A proposta de matrimônio dele tinha amedrontado sua amante para uma viagem precipitada? Ele não diria que Soraya era o tipo de mulher que se assustava facilmente. Ontem, ela parecera mais enfurecida do que apavorada.

      Talvez a ameaça que ele havia lançado, a tivesse feito sair correndo para qualquer esconderijo que ela pensasse estar segura. Mas ele duvidava disto.

      Como de costume, ele reprimiu seu temperamento. Era insensatez desabafar sua fúria agora. Não, muito melhor seria conservá-la para quando alcançasse a prostituta enganosa. E ele a alcançaria.

      Ele parou na sala de estar. Ele deveria ter percebido qual era o propósito disso ontem, quando notara que muita coisa estava faltando.

      Realmente limpando! Ele apostaria que aquela rapina nunca na vida havia se encontrado com um esfregão. Embora para ser justo, ela tinha se vestido para isto. Ele teve uma súbita visão penetrante do último encontro com ela naquela túnica notavelmente rota.

      Bela, é claro, e malditamente atraente como sempre. Mas alta, ereta e desdenhosa, como se ela já fosse a duquesa que ele planejava fazê-la. E sutilmente, não a mesma cortesã complacente da qual ele havia se despedido no começo de tarde, quando ela o tinha beijado. Condenada seja a duplicidade da alma dela ao inferno. O beijo de Judas.

      Ele se lembrou do seu ar de pânico suprimido quando ele lhe propôs casamento. Não, ela maquinou a traição muito tempo antes que ele a pedisse em casamento. A solidão da casa abandonada cheirava a uma partida cuidadosamente executada.

      Ele começou a subir as escadas, quando ouviu um baque surdo na parte detrás da habitação.

      Então, ele não estava sozinho no final das contas. Com ânsia triunfante, ele correu até a porta da sala de estar e se achou em um corredor totalmente desconhecido. O coração dele bateu com expectativa, incluindo uma dose de envergonhando alívio.

      Ele andou a passos largos no corredor sombrio abaixo, a bota dele fazendo barulho no assoalho. As cozinhas tinham sido limpas como o resto da casa. Mas aqui, nem tudo estava intocado. Os olhos dele viram algumas esmigalhas espalhadas ao longo da pia.

      — Saia. Eu sei que você está aqui.— A voz dele ecoou no quarto vazio. — Isto é infantil.

      Ele começou a bater as portas abertas, friamente divertindo-se ao pensar na magnífica Soraya encolhendo-se em um armário.

      Mas quando ele escancarou a porta da despensa, descobriu uma pequena menina criada, quase catatônica com medo e apertando os restos de um pão.

      — Jesus!— ele amaldiçoou. — Pelo amor de Deus, o que você está fazendo? Saia imediatamente!

      A menina choramingou e para o horror dele, os olhos dela se encheram de lágrimas.

      — Pare com isso! — ele estalou. — Onde está sua patroa? — E minha amante, ele pensou severamente.

      Ela mal balançou a cabeça e se apertou para mais longe dele.

      Kylemore respirou profundamente. Aterrorizar a menina a faria inútil como fonte de informação.

      Mas embaixo da impaciência dele havia uma indolente memória de como é se sentir só, indefeso e assustado pela sua vida. Ele recolheu a inoportuna lembrança num canto escuro de sua alma, onde enroscou-a com outros eventos que ele não tinha nenhum desejo de relembrar, nunca mais.

      — Venha, criança. Eu não te farei nenhum dano.

Ele moveu-se da porta como se provasse suas boas intenções.

      A empregada não se moveu, mas pelo menos falou.

— Por favor, senhor! Por favor, Sua Graça, não me machuque. O Sr. Ben demitiu todos ontem à noite, mas eu não tinha nenhum lugar para ir, então eu me escondi aqui embaixo. Por favor, não me machuque.

      — Eu não tenho nenhuma intenção de feri-la —, ele disse com aspereza. Então imediatamente lamentou isto, quando ela se precipitou mais uma vez para a parede. Ele deliberadamente suavizou seu tom. — Você tem minha palavra. Saia onde eu posso vê-la.

      Ele se afastou enquanto a menina emergia relutante. — Eu a conheço, não?

      A mesura que ela fizera fora vascilante. — Sim, Sua Graça. Elsie. Eu o deixei entrar ontem. Eu não quis causar nenhum dano ficando. O Sr. Ben disse que nós deveríamos ir para a casa da cidade de Sua Graça amanhã para pegarmos nossos salários. Os compradores não virão até semana que vem. Eu não quis causar nenhum dano, senhor.

      Kylemore falou tão amavelmente quanto era capaz, dada a tempestade que o enfurecia por dentro.

— Eu estou seguro que você não fez nada de mal, Elsie. Isso ficará como nosso segredo, se você concordar em responder minhas perguntas. Nosso segredo e eu lhe darei uma moeda de ouro para ajudá-la.

      Os olhos de Elsie se arregalaram ante a oferta, embora ainda tremesse. Ele assumiu que conversas particulares com a nobreza estavam fora do alcance dela.

      — Sim, senhor. O-obrigada, senhor. — Ela subiu e desceu em outra mesura.

      — Em primeiro lugar, onde está sua patroa?

      Elsie sacudiu a cabeça dela. — Eu não sei, Sua Graça. Ela e o Sr. Ben entraram ontem à noite em uma carruagem contratada. Eu fui à única que ficou para trás, mas eu não ouvi em que direção eles foram. Entretanto, os dois estavam vestidos para uma viagem. — Elsie, quando não temia por sua vida ou virtude, claramente não era estúpida.

      — Eles levaram todas as coisas da casa com eles?

      — Não, senhor. Só algumas caixas na carruagem. Todas as outras coisas forma vendidas, até as roupas da senhorita Soraya. O que era estranho. Ela ainda precisa se vestir, não?— Elsie relaxou contando mais histórias. — Vi muitos homens entrando e saindo da casa durante toda semana carregando quadros, a mobília e outras coisas.

      — E você acredita que a casa também foi vendida?

      — Oh, sim, senhor. Um ricaço está se mudando para cá. Eu dei uma olhada nele na semana passada, ele é todo moreno e queimado de o sol, senhor. Bastante sórdido. Por que, o Sr. Ben, disse...

      De repente Kylemore percebeu o que o esteve aborrecendo desde cedo. — Sr. Ben? Você quer dizer Ben Ahbood, o criado? Ele falou? — ele perguntou sarcasticamente.

      A confiança de Elsie hesitou e ela olhou para Kylemore com nervosismo renovado.

— Claro, senhor.

      — E ele falou todo este tempo? — Uma suspeita horrível cresceu em sua mente. Uma suspeita de que o mistério do desaparecimento de Soraya não era um mistério afinal, mas a história mais velha no mundo.

      Elsie claramente pensou que a pergunta dele era insana.

— Sim, senhor. Como ele poderia nos dizer o que fazer?

      — E como este Sr. Ben soa? — ele perguntou em um tom perigoso.

      — O que o senhor quer dizer?

      Ele restringiu sua impaciência antes que ele a apavorasse novamente e voltasse para o armário.

— Ele falou como eu faço? Como faz você? Ele soou estrangeiro?

      Ela carranqueou. — Eu não sei sobre estrangeiro. Ele não soava como eu, ou como o senhor.

      Dado que Kylemore falava com os acentos cortados das classes altas e Elsie tinha um som nasal típico dos desafortunados de Londres, ele não podia dizer que suas chances se limitariam.

      — E ele e... e a senhorita Soraya. — Ele quase sufocou no nome. A amante dele tinha sorte de não se encontrar ali naquele momento ou ele poderia estrangulá-la. — Eles pareciam íntimos, amigáveis?

      — Oh, sim, senhor! — Elsie disse com entusiasmo.

      Então ela deve ter percebido a reação hostil dele àquela informação, porque ela continuou. — Não de qualquer modo desfavorável, senhor. Apenas amigável. Como afetuoso. Por favor, não adquira a idéia errada da senhorita Soraya, senhor. Ela sempre foi extremamente boa com o pessoal, não importando o que ela era, se me desculpa. Ela deu a todos nós um mês de pagamento extra e deixou boas referências antes que partisse. Embora ela dissesse que estava segura de que Sua Graça acertaria tudo de qualquer maneira, considerando que nós realmente estávamos trabalhando para você.

      Kylemore não estava com humor para escutar elogios à sua amante fugitiva. Mas Elsie tinha estado claramente fascinada por Soraya e além dos elogios adicionais ao caráter de jade, ele poderia descobrir pouca coisa pela menina. Eventualmente ele a dispensou com a moeda de ouro que prometera e com instruções para se que encontrasse com seu mordomo para trabalhar na cozinha de Kylemore House.

      Então ele, furioso, vasculhou cada canto daquela vila, embora ele já soubesse que aquela meretriz astuciosa, que ele tinha mantido em alto estilo, teria tido certeza que nada aqui pudesse lhe ajudar a localizá-la. Ela não tinha deixado nem mesmo um otário para ele esmurrar, e no final de sua busca, ele realmente precisava esmurrar alguma coisa. Preferivelmente a cara do presunçoso Ben Ahbood.

      Todo o tempo, a mente dele ficou ocupada com o problema de Soraya e o quão tolo ela o tinha feito no dispendioso e atordoante ano que passaram juntos.

      Ben Ahbood não era mudo, afinal de contas. Se ele não era nenhum mudo, era altamente improvável que ele também fosse castrado. E nenhum homem poderia conhecer Soraya sem a querer.

      Assim ela havia jogado com Kylemore o havia traído com seu criado?

      Eles estavam morando juntos, que o Diabo os leve. Só um tolo com cabeça-de-vento poderia imaginar que a relação deles era inocente.

      A idéia daquele bruto grosseiro grunhindo em cima da beleza nua e pálida de Soraya era demais de imaginar. Amaldiçoando, Kylemore saiu precipitadamente para o jardim. Ele respirou profundamente e lutou para ordenar a confusão que se instalara em sua cabeça.

      Ele era o insensível Kylemore, famoso pelo seu autocontrole. Nenhuma maldita prostituta sem valor e seu extravagante amante poderiam romper a calma dele.

      Onde infernos ela poderia ter ido? Por que em nome de tudo aquilo que é sagrado, ela o tinha deixado? Ela realmente o tinha abandonado por outro amante?

      Procurando ao redor desesperadamente por pistas do desaparecimento dela, o duque se lembrou do que ele pouco sabia da mulher que tinha compartilhado a cama com ele no último ano. Surpreendentemente pouco, ele percebeu.

      Agora, futilmente, ele desejou ter tido mais tempo para descobrir mais. Mas ele tinha se perdido na paixão física.

      Ele retrocedeu invisivelmente para a casa que tinha testemunhado algumas das poucas horas felizes de sua vida adulta. Com a noite se aproximando, parecia como ele. Escuro. Perdido. Abandonado.

      Se aquela traiçoeira vadia pensava que podia deixar o Duque de Kylemore em semelhante estado de desolação, ela não tinha aprendido nada durante os encontros furtivos deles. E se ela imaginava que o tinha iludido com suas mentiras e suas fugidas noturnas, ela estava enganada quanto a isso também.

      — Condenada seja. —, ele sussurrou na noite invasora. — A condeno ao inferno.— Ele já não agüentava ficar ali, onde Soraya havia estado e agora tão abruptamente não estava mais.

      A casa vazia parecia zombar dele enquanto ele montava o cavalo. Ignorando o bufo de protesto do animal, ele deu a volta e galopou para Londres em um ruído furioso de cascos de cavalo. Ele cavalgava rígido e cavalgava cegamente, sem se importar com o cavalo embaixo dele. E todo o tempo, a mente dele batia no ritmo da perseguição.

      Soraya, Soraya, Soraya.

      Só quando ele chegou na cidade, a necessidade forçou-o a aliviar o passo. Quando o cavalo dele quase pisoteou uma mulher que cruzava a rua, ele inspirou profundamente e puxou as rédeas.

      Ele sacudiu a cabeça para clareá-la e deu uma olhada na cidade escura. Como era estranho que a vida continuasse normalmente para as outras pessoas, quando o mundo dele havia virado de tal maneira irrevogável num espaço de uma tarde. Ao redor dele, lojas fechavam, crianças brincavam com arcos e bonecas, famílias respiravam o ar de fim de primavera. Tudo perfeitamente costumeiro. Todas as coisas que ele tinha visto dez mil vezes antes.

      A atenção dele focalizou-se em um casal que se concentravam em uma vitrine. Um jovem alto e uma bela moça loira.

      Como ele os odiou. Como ele os quis mortos. E ele queria gritar que morressem.

      Uma mulher de gorro elegante passou por eles, uma mulher pequena com uma cintura em bom estado e um ar de bom gosto. Uma mulher que se movia com uma graça peculiar.

      A respiração dele parou na garganta.

      Ele se arremessou da sela. Nesta multidão, ele tinha melhor chance de pegá-la a pé. E pelos céu, ele pretendia pegá-la.

      A mulher virou a esquina saindo de seu campo de visão.

      Soraya o tinha subestimado, se pensava que ele não a acharia assim tão perto de casa.

      Sem pensar no cavalo, se pôs a correr. Ele tratou as pessoas na rua como meros obstáculos inanimados, lançando-os fora de seu caminho sem nem se desculpar, não parando nem mesmo quando bateu no arco que uma criança lançava ou quando um cachorrinho quase o derrubou no caminho. Só uma coisa importava, que a prostituta traiçoeira não escapasse dele.

      Quando ele virou a esquina, deslizou e quase caiu. Quando se firmou contra a obra de alvenaria inacabada, avistou a jade em frente a ele, olhando para todo mundo como se ela estivesse desfrutando do passeio numa noite agradável.

      Oh, ela pagaria pelo que tinha feito a ele. Ela pagaria com tudo que ela tivesse para dar. E então ele exigiria mais. E ela nem sabia que a oferta efêmera dele por liberdade tinha terminado.

      Como era delicioso. Como ele riria quando visse o rosto dela.

      Os lábios dele se encurvaram em um sorriso feroz, enquanto ele contemplava seu triunfo inevitável em cima daquela mulher presunçosa.

      Ele num movimento rápido a agarrou, não se preocupando se os dedos dele machucariam aquele ombro esbelto. A mulher ofegou e virou.

      Mas ele já sabia.

      — Posso ajudá-lo?— ela estalou em afronta.

      A mão de Kylemore pendeu, enquanto um peso terrível recaía sobre seu coração. Não era Soraya. Soraya era muito inteligente para arriscar-se a ser descoberta depois que ele descobrisse seu plano.

      — Eu me enganei, senhora. Minhas desculpas. Eu pensei que fosse outra pessoa.

      — Mantenha suas mãos quietas, senhor, até que esteja seguro de quem você está abordando!

Ela era um pedaço atraente, primeira mocidade passada, mas com uma agradável boca sensual e olhos escuros flamejantes. Antigamente, ele poderia ter gasto um tempo para acalmar o temperamento dela e descobrir se aquela figura bem formada era só produto de um espartilho.

      Kylemore se desculpou novamente, mas de verdade, ele já tinha se esquecido da mulher. Ele a tirara da mente como se tivesse sido simplesmente um fiapo no casaco dele. Menos importante ainda, de fato. A costura dele era sempre uma das mais altas prioridades.

      Ele voltou para onde tinha saltado tão precipitadamente da sela. Só Deus sabia se seu cavalo ainda estaria lá.

      Mas algum cidadão ajuizado o tinha amarrado a um poste fora de uma hospedaria. Pelo menos ele não teria que andar todo o caminho para Mayfair, apesar de que no humor em que se encontrava, estaria mais seguro se ele o fizesse.

      Ele montou e se pôs a trotar, mas a atenção dele estava longe das ruas ocupadas da capital.

      Onde Soraya poderia estar? Ele a conhecia há seis anos. Algo durante aquele tempo deveria indicar o paradeiro dela.

      Com uma pontada de dor ele não quis averiguar e recordou a primeira vez que a viu. Como um raio no céu claro de verão, ela tinha acabado de chegar a Londres de Paris. O protetor dela tinha sido então Sir Eldreth Morse, um rico e envelhecido baronete que tinha ocupado algum cargo na embaixada da capital francesa. Sir Eldreth era um solteiro apaixonado por coisas belas. E sem dúvida a coisa mais bela em sua famosa coleção era a jovem amante dele, a incomparável Soraya.

      Kylemore, francamente curioso por esta criatura que tinha prendido a atenção de tantos homens sobre ela, conheceu-a logo depois, por breves momentos, na casa de Morse, na cidade. Ele estava despreparado para sua própria reação, embora o nível de furor o deveria ter posto em alerta.

      Porque, claro que, Londres tinha visto mulheres bonitas antes.

      Mas Soraya era... mais.

      Um olhar nela ela e pelas pinturas de Sir Eldreth,... e Kylemore conhecera a mesma ânsia por possuir e conquistar, o que havia levado seus ancestrais, proprietários das terras baixas das Highlands, a duques do reino.

      Mas a frieza e a falta de interesse no olhar dela havia sido insultantemente claro. Nada ele fez ou disse, nenhuma persuasão material ele pôs aos pés dela que pudesse separá-la de seu amante ancião.

      Naquela estação, todos os homens pareciam planejar em como roubá-la. Até que finalmente ficou óbvio que ela estava, incrivelmente, perfeitamente disposta a permanecer leal ao guardião dela. E foi aí que sua real notoriedade começou.

      Três jovens, todos grande esperanças de suas gerações, se atiraram em amor a ela. Houve duelos, vários casos de assassinatos, embora os sobreviventes tenham percebido que a vitória deles não os deixavam nem um pouco mais perto do que desejaram tão desesperadamente.

      A poucos meses da chegada dela, a amante de Sir Eldreth Morse se tornara a mais odiada, mais idolatrada e mais escandalosa mulher na Inglaterra.

      Kylemore observou o caos com uma crescente frustração. Seguramente ele poderia fazer algo que a fizesse ser dele. Mas todo seu poder, toda sua fortuna, todas suas atrações não puderam trocar a maldita devoção inexplicável que ela tinha para com o corpulento baronete.

      Secretamente, ele enviou investigadores à França para achar o que pudessem sobre ela. Mas ela tinha sido tão famosa, fiel e evasiva em Paris, quanto ela era em Londres.

Claro que, rumores abundaram, mas tudo era muito difícil de ser provado. Alguns disseram que Sir Eldreth a tinha salvado de um harém turco - ou um harém do Egito ou Síria ou Pérsia. Um ato heróico muito improvável para um baronete notavelmente sedentário, embora a evidência do nome da moça indicasse uma origem em algum lugar exótico, se o nome dela fosse realmente Soraya, o que Kylemore sempre duvidara.

      Outras pessoas acreditavam que ela era uma lavadeira, que Morse tinha pegado nos becos de Les Halles. Ou que ela era uma prostituta novata, que tinha visto a chance dela no milord inglês rico e o tinha fisgado.

      Kylemore sempre ouviu essas histórias - e muitas outras ainda mais estranhas com o passar dos anos - com ceticismo. A própria suposição dele sobre ela, se ela realmente fosse francesa, era de que ela viera de uma alguma família respeitável que havia caído desonrada da Revolução ou de Bonaparte. Ele apostava que havia qualquer descendência furtiva no passado dela. A autoconfiança sem esforço dela sobrepujava qualquer fina lady que ele conhecera.

      Talvez ela fosse inglesa. Ela falava sua língua tão bem quanto ele.

      — Preste atenção, milorde!

      O grito trouxe Kylemore de volta para o presente. Um compatriota que estava próximo apertou as rédeas de seu cavalo, enquanto tentava se salvar de ser derrubado.

      O famoso olhar penetrante dos Kinmurrie assustou o companheiro, embora Kylemore soubesse que o grosseirão só era culpado de vagar involuntariamente em seu caminho. Ele se forçou a se concentrar em chegar em Grosvenor Square sem causar dano a ele, sua montaria ou tráfico de Londres.

     

      No momento em que Kylemore bateu a porta de entrada, a mãe dele apareceu no topo da escadaria. Desde a discussão deles no dia anterior, ele a tinha evitado deliberadamente. Ele desejou saber com discreta diversão por quanto tempo ela tinha estado rodeando a entrada, esperando por sua voltar. Ele gostaria que tivessem sido horas.

      — Justin, eu tenho que falar com você.

      Ele tirou as luvas e as entregou ao criado auxiliar. — Não agora, madame.

      Ela desceu a escadaria marchando com uma elegante determinação.

— O que você está planejando? O que é esta conversa ridícula de compromisso?

      — Eu a informarei do progresso.— Ele se virou em direção à biblioteca.

      A mãe dele chegou a esquecer sua própria presunção a ponto de correr atrás dele.

— Isso não é o bastante! E você realmente não pode esperar que eu deixe Londres!

      Ele girou para ela quando alcançou a porta.

— Eu já falei, madame. E como chefe desta família, eu espero ser obedecido. Você e sua protegida deverão sair dessa casa até o fim da semana.

      — Justin, isto é cruel. Isto é...

      Ele não soube o que ela leu em seu rosto, mas a expressão dele deve ter sido amedrontadora o bastante para a convencer que a retirada era o curso mais sábio. E a duquesa era o tipo de mulher que não cedia a nada.

      — Como deseja —, ela disse em um tom brando que ele nunca ouvira dela antes.

      — Sim, como desejo —, ele disse grosseiramente, sabendo que nada, na realidade, era como ele desejava.

      Ele entrou na biblioteca sem nem olhar para trás. Soraya não sabia o que ela tinha soltado no amante dela abandonando. Mas ela descobriria. E ela sentiria muito por isso.

      Kylemore se serviu com conhaque e o bebeu de um só gole. Ele normalmente era um homem de hábitos moderados. O exemplo patético de seu pai estava sempre ali como uma advertência contra os perigos do comodismo. Mas agora, ele encheu novamente o copo e desmoronou em uma cadeira em frente ao fogo. Ele tinha combinado se encontrar seus camaradas em seu clube, mas não estava com humor para agir como um cavalheiro civilizado essa noite.

      O calor do licor não pôde derreter o frio dentro dele. O que estava fazendo Soraya agora? Ela o tinha deixado por outro protetor? A humilhação dele já era conhecimento público? O mundo ria silenciosamente essa noite ante o pensamento da amante de Kylemore estar sob os cuidados de algum outro rico cabeça-dura?

      Como os rivais dele se regozijariam ante sua rejeição. Como eles adulariam o companheiro afortunado que era agora o guardião de Soraya.

      Ele jurou e arremessou o copo vazio no fogo.

      Ela já tinha outro amante? Ou os favores dela tinham se tornado a prerrogativa exclusiva do criado musculoso dela? O pensamento incitou outro explosão de raiva doentia. Desde quando Ben Ahbood tinha se tornado uma parte inseparável do mistério de Soraya?

      Kylemore não conseguia se lembrar da primeira vez que ele tinha notado o bruto. Ele certamente deve ter estado com Soraya depois da morte de Sir Eldreth há três anos, quando a metade masculina do mundo praticamente foi à loucura, tentando assegurar o interesse dela. Dois outros duques tinham estado na corrida, assim como um príncipe italiano e um dos primos do czar, sem mencionar uma boa parcela de homens de menores títulos.

      Soraya levou seis meses para considerar seu próximo passo, houve mais duelos especialmente entre os suplicantes mais irritáveis. Embora felizmente, dessa vez, o elemento autodestruidor entre os ramos da sociedade controlou as inclinações deles para terminar tudo.

      Kylemore tinha estado seguro de si mesmo - e dela - e tinha permanecido além das exibições vulgares de competitividade masculina que mantiveram Londres cochichando toda aquela estação. Ele sempre soube que mais cedo ou mais tarde ela seria dele. E ela também sabia. Ela montou um grande espetáculo de indiferença, mas alguma ligação, alguma linha invisível a arrastava implacavelmente para ele.

      Assim ele se manteve longe das rixas e esperou pela escolha inevitável dela, até ver Soraya fazer algo totalmente inesperado.

      Da sua legião de admiradores, ela escolheu James Mallory. Nem o cheiro de um título. Um mero senhor, um jovem tímido recém-chegado da Índia. De bem, mas de uma família pouco notável. E rico. Pelo menos nisso ela tinha satisfeito as expectativas de Kylemore.

      Se a fascinação inconveniente dele para com a moça o tivesse permitido, Kylemore teria renunciado ao jogo naquele momento. Ela tinha tido a melhor chance para ser grandiosa, mas ao invés disso tinha se voltado para um covarde comum sem nenhum refinamento, porém com bolsos bem fundos.

      Embora para ser justo, James Mallory tinha evitado uma grande colisão depois que Soraya se separou dele. Ele tinha fomentado bastante bronze para cidade para enganar uma das mais bonitas herdeiras da estação. Incrivelmente, a quem, então, ele mostrou todo sinal de fidelidade.

      O que significava que Soraya estava buscando um outro protetor.

      Não que ela tenha dado alguma indicação de que sua inesperada liberdade a incomodasse. E por esta fase, Ben Ahbood, ou qualquer que fosse o nome do bastardo, tinha estado muito em evidência.

      Claro que ela nem se desculpara ou se explicara. O legendário ajudante geral de Soraya era um musculoso árabe mudo. Se o mundo desaprovasse, ela encolhia os ombros em indiferença, seus retos e esbeltos ombros, e prosseguiria do modo que a agradasse.

      Desta vez, Kylemore não deixou chance alguma. Nenhum hesitação de cavalheiro, nenhum problema de autoconfiança expressando seu interesse. Na manhã em que o compromisso de Malloy com a Lady Sara Coote foi anunciado, Kylemore apresentou seu cartão na casa de Soraya. Ele tinha esperado cinco anos. E não tinha nenhuma intenção de esperar um momento sequer.

      Soraya não pareceu nem encantada, espantada ou desconcertada em achar um duque na sua sala de estar à uma hora mais apropriada para o café da manhã do que para visitas. Ao invés, ela escutou calmamente e, Diabo a tivesse, tinha dito que ela pensaria no que ele proporá. O protetor dela não estava em evidência, embora Kylemore teria estado feliz em derrotá-lo se ele estivesse.

      Mas, Kylemore se lembrou com um frio na barriga, que Ben Ahbood o tinha admitido na casa, então o enviou no modo dele. E a maneira do tolo para com ele não fazia jus a seu título de duque.

      A resposta de Soraya tinha vindo uma semana depois, envolto num embrulho de legalidades. A oferta original de Kylemore tinha sido extravagante. Ela pediu que ele aumentasse o valor para o de um resgate de um rei, incluindo a propriedade de todos os bens que ele desse a ela.

      E, ele se lembrava agora com outra dor desagradável, que depois de um ano, se qualquer uma das partes estivesse insatisfeita, o arranjo cessaria.

      Oh, ela tinha sido inteligente, agarrando-o, amante esperta. Inteligente e desleal. E ele tinha sido culpado desse fatal desvanecimento.

      Ela tinha sido abertamente verdadeira aos seus dois guardiões anteriores. Ele deveria saber – que ele pegou todas as iscas para persuadi-la a se afastar. Mas talvez ela tinha enganado todo mundo e a sua real dedicação fosse para aquele salafrário que vivia secretamente com ela.

      As sutis alusões dela sobre a incapacidade sexual de Ben Ahbood tinham sido um golpe de mestre. Kylemore sempre tinha admirado Soraya, mas a audácia dela tirara seu fôlego dessa vez.

      O cérebro excelente dele - como ele considerava, herdado de sua desprezada mãe - deu um clique para se reordenar. Friamente, calmamente, ele jurou localizar essa mulher traiçoeira e seu amante.

      O sangue de gerações de homens cruéis correu nas suas veias. Soraya não tem nenhuma idéia do que ela tinha começado quando fez o Duque de Kylemore de bobo. Ele sorriu com fria antecipação do dia em que ela descobrisse o erro que tinha cometido traindo Justin Kinmurrie.

     

      Uma tardia tempestade de verão tinha agitado o Mar do Norte na altura da cidade de Whitby Sands em fúria. Verity lançou o véu para trás do gorro preto e fitou o mundo varrido pelo vento ao redor dela. A praia estava quase deserta e ninguém notaria a viúva Symonds ficar com o rosto na direção do vento forte e frio ou sorrir para o oceano inquieto.

      Ela tinha estado em Whitby durante três meses e ainda assim quase não podia acreditar que a transição para sua vida nova tinha sido tão fácil.

      A escandalosa Soraya tinha deixado Londres com o criado dela. Vários dias depois, a viúva respeitável, Sra. Charles Symonds, tinha adquirido uma casa em Yorkshire numa cidade de pesca com o irmão dela, Benjamim Ashton.

      Eu estou livre, eu estou livre, o coração dela cantava, enquanto a água acinzentada açoitava a costa.

      Eu estou livre. Eu sou independente. Minha vida é só minha afinal.

      Na euforia da liberdade, sentiu-se incomodamente úmida, então percebeu as gotas de água que molhavam o tecido preto. Ela riu e se afastou da borda.

      O povo da cidade, todo o povo robusto e bom de Yorkshire, tinha estado ligeiramente curioso sobre a chegada dela com o irmão, mas os tinham aceitado logo. Verity Symonds ainda estava em profundo luto pelo jovem marido que perdera para uma febre há seis meses. O jovem marido que a tinha deixado perfeitamente bem provida, para manter a aparência.

      Sr. Benjamim Ashton, também, parecia um bom rapaz, claramente de família local, já que ele, diferentemente da irmã, não tinha perdido seu acento. Na realidade, os rumores sobre aquele Mr. Ashton, que buscava uma propriedade satisfatória onde ele poderia estabelecer uma criação de ovelha, foi breve.

      Enquanto ela subia passo a passo para sua casa no topo do cume, Verity considerou se ficaria em Whitby. Ela amou o mar, a velha cidade e as ruínas da antiga abadia da colina. O lugar estava longe dos olhos da sociedade e convenientemente perto dos pântanos, onde o irmão dela sempre tinha querido se assentar.

      Ben tinha odiado Londres. Ela sentiu uma imensa satisfação em testemunhar a felicidade transparente dele em retomar sua verdadeira identidade. Finalmente, ele seguia as próprias ambições depois de brincar de ser o silencioso guarda-costas dela por tanto tempo. Ajudá-lo a concretizar seus sonhos, era o mínimo que ela podia fazer.

      Não pela primeira vez, ela desejou poder tirar sua irmã da escola perto de Winchester onde ela tinha estado desde seus cinco anos de idade. Como seria maravilhoso reunir a família Ashton. Mas o risco era muito grande de que a notoriedade de Soraya manchasse o futuro de Maria.

      Onde quer que Verity fosse, Soraya sempre seria uma sombra. Esse pensamento sombrio a tinha acompanhado desde sua última residência temporária.

      Ela entrou na casa e pausou no limitado corredor para remover o gorro e as luvas. A voz do irmão dela estava elevada e com raiva em alguma parte dos fundos da casa.

      Isto era estranho o bastante para fazê-la correr em direção ao som. Mas enquanto ela se aproximava da cozinha, foi à segunda voz que ela ouviu - macia, porém clara e cortante como uma espada cortando a carne - que a fez parar.

      O Duque de Kylemore a tinha achado.

 

Por quanto tempo Verity ficou parada naquele corredor escuro, enquanto o senso tolo de segurança dela a tirava para o nada? Depois, perdeu seu bom senso em poucos segundos. O medo a segurou imóvel. Ela teve uma premonição de destruição tão inexorável, quanto essas as ondas que chegavam na praia onde ela tinha estado tão estupidamente segura.

      Quando sua consciência voltou, ela estava a meio caminho de volta à porta. Se ela corresse para longe e rápido o bastante, seguramente Kylemore não a seguiria. A Inglaterra tinha milhares lugares para se esconder. Ou ela poderia ir para o estrangeiro. Ele nunca a localizaria na América ou na Nova Gales do Sul, ou até mesmo o selvagem Bornéu, se chegasse a isso.

      Com um estender de mãos, ela alcançou seu gorro, então percebeu o que estava fazendo. Ela não podia fugir somente com as roupas que estava e as poucas moedas que tinha na bolsinha. O som de um estrondo, provavelmente uma cadeira esmagando as lajes da cozinha, fez com que ela voltasse a si.

      O duque não tinha nenhuma reivindicação legal contra ela. Ela tinha se submetido a ele como Soraya. Verity Ashton não era nenhuma criatura inferior. Ela respirou profundamente, virou-se e foi em direção à cozinha.

     

      O duque fixou o Ben em uma parede, sua bengala atravessada na garganta do irmão dela. A visão de seu amante depois de tanto tempo fez com que Verity segurasse a respiração de medo quando ela parou na entrada.

      — Venha, seu bastardo mentiroso. Bata em mim! Você sabe que você quer —, Kylemore escarneceu em voz baixa e zombeteira. — Bata em mim, pelo amor de Deus.

      — Você gostaria disso, não é? — Ben, graças a Deus, manteve seus punhos juntos ao corpo. — Mas os magistrados não encorajam as ordens inferiores a bater na maldita nobreza. Eu não serei enforcado por causa de sua bela estúpida cara, Sua Graça.— Essas últimas palavras ditas com desprezo absoluto.

      Um puxão do bastão contra o pomo-de-Adão de Ben o fez silenciar.

— Se você não for enforcado por isso, Deus sabe, você será por qualquer outra coisa.

      — Pare —, Verity disse firmemente. A tranqüilidade aparente dela escondeu seu tremor de terror. — Por piedade, não há nenhuma necessidade disto!

      Nem um dos dois olhou para ela.

      O duque continuou, ainda naquele mesmo tom macio, provocantemente e ameaçador.

— Como se sente em saber que ela deu tudo a mim por tanto tempo? Saber que você mendigou pelos restos de outro homem? Você escutou atrás da porta todo doce pequeno gemido e suspiro que ela fez enquanto eu fazia o que eu quisesse com ela?

      — Eu disse pare com isto! — Verity insistiu mais nitidamente. O duque tinha descoberto a maioria dos segredos deles, de que outra maneira ele os teria achado? E ele estava claramente enganado e furioso, sobre a relação dela com o criado.

      O sorriso de Ben era desdenhoso. — Você é nada para ela, mas com uma abundante e agradável fortuna. Todo gemido e suspiro significavam ouro. Ouro para ela e ouro para mim. Assim, meu senhor, ainda se sente tão malditamente alto e poderoso?

      Verity olhou para onde sua empregada-de-todos-trabalho assistia do canto com uma mistura de avidez e horror. Tudo o mais foi resultado desta tarde, as chances dela de permanecer em Whitby como uma viúva respeitável tinham acabado de se desintegrar. Mas antes de se preocupar sobre isso, ela tinha que evitar que seu amante assassinasse seu irmão de alguma maneira.

      Kylemore sorriu de volta para Ben com uma distinta curva astuta em seus lábios.

— Talvez fosse a você quem ela enganou. Enquanto suas mãos imundas sujavam aquela carne perfeita e branca, ela se deitava lá desejando por um homem de verdade.

      A face de Ben se torceu com repugnância. — Você? Um homem de verdade? Você não é mais que um cara melancólico e vaidoso embusteiro em trapos caprichosos. Quando a moça queria um homem de verdade, ela sabia onde ir.

      Pelos céus, se ela não fizesse algo depressa, haveria derramamento de sangue. O vestígio de violência iminente subiu outro grau. Enquanto Ben poderia exceder em peso o duque, o corpo magro de Kylemore era flexível e forte, como ela estava intimamente consciente.

      — Escute, seus idiotas! — Com mãos instáveis, ela agarrou uma travessa azul e branca grande da cômoda perto da porta.

      — Eu o matarei. — Incrivelmente, a voz de Kylemore não aumentou, embora Ben, ela viu, lutou para conter sua vontade de revidar. Ela sabia que se o irmão dela fizesse a menor desforra, o duque o destruiria sem piedade alguma. Aquela bengala escondia uma espada. Ele tinha lhe mostrado o mecanismo numa tarde em Kensington.

      — Então quem será enforcado, Sua Graça? — Ben perguntou maliciosamente.

      Isto tinha ido longe demais. — Você dois estão agindo como garotos de colégio! — Ela ergueu a travessa e deliberadamente jogou contra o piso.

      O som de louça de barro quebrado ecoou no quarto repentinamente silencioso.

      O gesto dela finalmente capturou a atenção deles. O duque se virou em sua direção, os olhos azuis dele encobertos pela raiva. Também, Ben olhou na direção dela, embora a vara do duque o mantivesse preso. Ela percebeu que durante toda a disputa dos dois sobre ela, nem um deles tinha prestado atenção no fato de que ela tinha estado no quarto com eles.

      Ela se aproximou e falou com toda a autoridade da mulher que uma vez tivera sido a grande Soraya poderia reunir.

      — Benjamim Ashton, pare de provocá-lo. Nós já estamos encrencados o bastante.— Ela virou-se para o duque. — E você, Sua Graça, o deixe ir.

      O lábio de Kylemore se ergueu em zombaria. — Suplicando pelo seu amante, madame?

      Ela resistiu ao desejo de lançar mais uma louça de barro. — Ele não é meu amante. — Então, esquecendo do respeito momentaneamente devido ao grau exaltado dele, ela cuspiu, — Ele é meu irmão, seu maldito idiota.

      — Seu irmão. — Estranhamente, Kylemore fez nem mesmo considerou questionar a afirmação dela.

      Ele encarou a mulher que finalmente encontrara, então ao redor da pequena cozinha. Não tinha notado muito sobre isto quando ele entrara com um temporal para achar o detestado Ben Ahbood, que mostrava todos os sinais de estar em casa. Tudo que ele tinha querido então tinha sido matá-lo. A incongruência deste adequado, mas dificilmente luxuoso lar como uma locação para sua jóia Soraya, não tinha prestado atenção.

      Mas prestaria agora enquanto ele olhava todos os detalhes do ambiente ao redor dele.

      — Sim, meu irmão. — Ela avançou e arrumou a cadeira que ele tinha derrubado quando se lançara ao seu rival.

      Exceto que seu rival não parecia ser se rival em absoluto. Ele tinha se atormentado noite e dia em cima de uma quimera.

      — O deixe ir. Sua disputa é comigo —, Soraya disse. Apesar de todo o ódio que ele despendera nela desde seu desaparecimento, aquela voz rouca chegou em sua alma torturada e solitária como a chuva em terra ressecada.

      Ele abaixou a bengala e Ben Ahbood - Ben Ashton, ele supunha - baixou ofegante contra a parede. Os olhos pretos hostis, tão familiar agora como os que tinham estado no criado árabe, focalizando-o.

      — Cai fora —, o jovem grunhiu.

      — Oh, fique quieto, Bem —, Soraya disse cansativamente. Ela olhou para a empregada. — Marjorie, por favor, limpe esta bagunça. — Ela se virou. — Se Sua Graça puder me seguir... Ben, fique aqui. Eu desejo falar a sós com o duque.

      Kylemore quase riu. Ela fez um maldito bom trabalho em transformar um drama de proporções Shakespearianas em uma comédia doméstica. Ele até mesmo se achou seguindo aquela costas retas revestidas de preto corredor abaixo até uma sala de estar limpa. Descobrindo sua exótica amante oculta como uma pessoa de classe média e aparentemente inocente - decência seria a última coisa que ele teria imaginado.

      Ela virou para ficar de frente para ele, com o queixo levantado. Ele poderia dizer a ela que estava desperdiçando seu tempo tentando se misturar num ambiente sem brilho como esse. Ninguém - em particular, nenhum homem - jamais acreditaria que ela tivesse sido feita para nada menos do que o pecado.

      A besta uivante que tinha fixado residência no coração dele desde que ela tinha partido e se aquietou quando ela elevou seus frescos olhos cinzas nele.

— Eu lhe devo desculpas, Sua Graça.

      Isso era a menor coisa que ela lhe devia, mulher sem escrúpulos. Ele a preferiria de joelhos, implorando por perdão. Mas esse não era o estilo de Soraya, como ele deveria já saber.

      Ela continuou na mesma voz imparcial.

— Eu quis lhe falar que estava tudo acabado, mas meu irmão insistiu que você dificultaria e eu lhe permiti me persuadir contra meu julgamento.

      O irmão dela tivera razão, Kylemore pensou severamente.

— Protetores ricos não nascem em árvores e muito menos estão neste lugar atrasado, se não me engano.

      Uma faísca de aborrecimento iluminou os olhos dela.

— Isso é de nenhuma relevância, Sua Graça. Eu não busco um protetor rico. Eu me aposentei. Minha vida será de agora em diante um decoro de inocência e de bons trabalhos.

      Ele gargalhou ante isso. Ele não pôde se conter.

— Que encantadora e absurda noção, minha querida Soraya. — Ele pausou.— Exceto que você se chama Verity Symonds, não é? Será que tenho permissão de saber seu verdadeiro nome depois de tanto tempo de... encontros íntimos?

      Ela pareceu incômoda, embora ele não pudesse dizer se era por conta de sua ilusão ou da referência dele à ligação que houve entre eles.

— É Verity Ashton. E eu não vejo por que minhas idéias são absurdas. Embora sua briga na cozinha tenha destruído qualquer futuro que eu poderia ter tido em Whitby. Eu não consigo imaginar Marjorie ficando de boca calada sobre um duque que brigou com o irmão da senhora Symonds.

      — Eu te achei uma vez, eu posso te achar novamente, — ele disse calmamente.

      Ela pareceu desinteressada à ameaça dele - que se exploda ela.

— Por que você se aborreceria? Um homem como você não tem nenhuma dificuldade em adquirir alguém para esquentar sua cama. Não há nada especial sobre mim.

      Incrivelmente, ela não estava sendo modesta nem esperando adulações, ela sempre foi marcante pela falta dos habituais ardis femininos. Mas seguramente ela sabia que era uma mulher além da chamada comum. Ela era a incomparável Soraya, ou qualquer nome maldito que ela escolheu se chamar agora.

      Com dificuldade, ele manteve a voz num tom neutro.

— Assim, depois de toda dificuldade que eu tive para te achar, eu devo seguir meu caminho sem um murmúrio de protesto?

      — Você estava bravo. Você pensou que eu o tinha enganado. Agora você percebe que esse não é o caso. Eu não tomei outro amante e não tenho nenhuma intenção de fazê-lo.— Ela avançou até porta, tentando claramente terminar a entrevista. — Assim você vê, não há nada aqui para Sua Graça. Soraya já não existe. Verity Ashton e o irmão dela não devem ser de nenhum interesse a você. Você satisfez sua curiosidade sobre o que restou de sua amante.

      — Sim —, ele disse, embora, é claro, ele mentia. A curiosidade dele, se qualquer outra coisa, o estava consumindo mais do que nunca. — Esta vida nova vai tornar-se insípida. E você não nasceu para obscuridade.

      — Depois de meus anos de notoriedade pública, obscuridade será uma bênção —, ela disse. Ele poderia ver a criatura sincera e iludida que ela era. — Eu não espero que você entenda.

      — Oh, eu entendo —, ele disse. — Mais do que você possa saber.

      Não tinha ele desperdiçado toda sua infância ansiando ser apenas um garoto comum de uma família ordinária? Mas a maturidade trouxera o conhecimento de que alguns fardos nunca seriam postos de lado, não importa quão relutante, quão impróprio, quão ressentido fosse o portador.

      A amante espetacular dele ainda precisava aprender esta lição.

      — Eu acredito que nós não temos mais nada a dizer um ao outro. Você foi um amante generoso e amável, Sua Graça. Por favor, não me faça lembrar de você de outro modo.— A presunçosa mulher tinha tido a audácia de sorrir para ele quando ela abriu a porta, como se despedindo de um visitante inconveniente. — Tenha um bom dia.

      Ele inclinou a cabeça em forma de reconhecimento, embora em realidade ele fizesse isto para esconder uma onda de feroz necessidade.

— Pelo menos me faça a cortesia de me acompanhar à minha carruagem.

      Com avidez predatória embaixo de seus cílios, ele a viu olhar nervosamente ao redor do quarto, como se buscando uma desculpa para recusar. Ela não era totalmente tão autoconfiante quanto desejou aparentar, mas a compulsão dela para fazê-lo ir embora depressa substituiu sua precaução sensata.

— Como desejar.

      Com falso decoro, ele esticou o braço. Depois de uma hesitação minúscula e reveladora, ela o aceitou. A luz, irritantemente relutante ao contato a queimou. O toque dela teve o efeito que ele sempre sentia quando a tocava. De qualquer modo, a fome dele só tinha ficado mais feroz, depois se tanto tempo sem alimentar seu desejo.

      Logo, ele acalmou seus apetites perturbadores. Logo tudo o que você desejou será seu.

      Enquanto eles caminhavam para o minúsculo hall, o cheiro dela o cercou. Rapidamente, o desorientou... Verity e não Soraya.

      Sua amante mundana sempre tinha flutuado em uma nuvem de almíscar e âmbar gris. A mulher ao lado dele cheirava a sabão de violeta. Embora longe de desagradável, estava vagamente perturbador, como se ele de algum modo fixara sua vingança no objetivo errado. Mas em baixo do cheiro fresco de flores permanecia a essência persistente da mulher que ele almejou tão eternamente.

      O irmão dela esperou fora da sala de estar. Ele claramente suspeitava das intenções de Kylemore. Um mocinho sagaz, Benjamim Ashton, Kylemore admitiu.

      — Sua Graça está partindo —, Soraya-Verity disse.

      Ashton pareceu pouco impressionado. — Assim, sem mais nem menos?

      — Eu descobri o que queria.— Kylemore deu uma olhada ao redor da habitação pobre com menosprezo. Bom Deus, Soraya pertencia a um palácio, não a esta choupana.

      — Você não voltará, então —, o jovem disse de modo claro. Não era uma pergunta.

      — Não —, Kylemore falando sério.

      — Eu apenas levarei Sua Graça ao seu transporte. — Ela pareceu preocupada. Ele não podia culpá-la. A atmosfera de aversão e desconfiança era mais densa que as névoas impenetráveis do mar, que regularmente vinham ao longo da costa de Kylemore.

      — Eu irei com você —, o companheiro disse.

      Silenciosamente, eles deixaram a casa e escalaram a distância curta ao cume da colina. Kylemore tinha deixado a carruagem dele perto da abadia, não querendo arriscar seu bom veículo ou seu caro cavalo nas ruas escarpadas.

      — Bem, aqui estamos nós —, Verity disse.

      Ele achou condenadamente difícil se acostumar ao novo nome dela. Mas como fosse que se chamasse, nada mudava o fato de que ela era dele. Ele olhou para a face perfeita dela e leu o alívio lá. Ela deve ter esperado o pior quando o achou na cozinha. Agora se felicitaria em guiar os eventos a uma conclusão favorável.

      Favorável a ela de qualquer maneira, a jade manipuladora.

      Kylemore acenou com a cabeça aos seus dois criados musculosos, antes de segurar o braço dela de forma que ela não pudesse escapar.

— Você não pode pensar que eu deixarei nossa sociedade terminar deste modo, minha querida. Ou ter mudado de nome fez com que perdesse todo juízo?

      Ela tentou puxar seu braço para ficar livre.

— Termina deste modo porque eu digo que assim o é, Sua Graça —, ela disse nitidamente.

      Ele sorriu, enquanto admirava a energia dela. Infelizmente para ela, não lhe traria nenhum bem essa energia para onde ele planejava levá-la.

— Eu temo que os desejos de uma mulher de reputação duvidosa não tenham nenhum valor.

      Ele se deleitou ao ver a confiança dela se esvair quando ela percebeu o tom implacável dele. Freneticamente, ela olhou além dele para o irmão. — Ben, faça algo! —

      Kylemore moveu-se rapidamente dando um comando em Gaelic e o musculoso Ben Ahbood se achou retido ante dois Highlands ainda mais musculosos, trazidos precisamente para este propósito.

      — Solte-a, bastardo!— Ashton gritou. — Eu te mato por isto!

      Ela arrastou-se e ziguezagueou para tentar se livrar, mas a força dela não se comparava a dele.

— Não o machuque! Nada disto é culpa dele.

      Kylemore estreitou-a nele e focalizou um olhar ardente nas feições distraídas dela.

— Não, é sua. E você pagará. Agora, se você deixar de se debater e entrar na carruagem, eu prometo que seu irmão não será prejudicado.

      — Não faça isto, Verity! — Alguns pés à distância, Ashton fez um trabalho respeitável ao se defender, até mesmo ante tais desvantagens.

      Kylemore virou sua cabeça para o cocheiro que não tinha deixado o poleiro.

— Rogo sua atenção para meu homem, madame. Eu estou seguro que você concordará que cooperação é o mais indicado.

      Os olhos cinzas voltaram-se para cima e se alargaram no momento em que ela viu a arma do motorista apontada diretamente ao irmão cativo dela. Imediatamente, ela se acalmou nos braços de Kylemore.

— Eu irei —, ela calmamente disse. Todo o rastro de emoção abandonou a voz dela.

— Você pode deixar o Ben ir.

      — Não só isso —, ele disse, preparado para ajudá-la a subir na carruagem e nem mesmo fingindo esconder sua exultação. Ele a tinha, e dessa vez, nada no céu ou na terra o impediria de mantê-la para si. Ele falou em Gaelic rápido sobre o ombro. — Segure-o na abadia até o anoitecer. Em um dia tempestuoso assim, não deve haver muitas pessoas para se perguntar o que vocês estarão fazendo. Deixem-no desacordado se preciso.

      — Verity, não vá com ele! — Ashton lutou inutilmente para se livrar de seus raptores e alcançar sua irmã para ajudá-la.

      A irmã tremeu a cabeça somente e lhe deu um sorriso triste. — Eu ficarei bem, Ben.

      — Entre —, Kylemore rosnou, recusando ser movido pela coragem dela. Ela tinha trazido este desastre para si quando o traiu. Qualquer coisa que ele fizesse a ela era mais do que merecido.

      Ela lançou um relance desdenhoso na pistola nivelada e então ao duque.

— Como desejar, Sua Graça. — Ela não fez nenhuma tentativa para esconder a ironia de suas palavras.

      Kylemore a seguiu e bateu a porta atrás dele. As sombras tomaram conta, mas até mesmo na escuridão, ele viu que o olhar que ela direcionou a ele era frio. O controle formidável, tão familiar depois de um ano juntos, estava de volta em seu lugar. Ela pretendia fazê-lo congelar para que a deixasse ir.

      Muito tarde, minha dama, ele pensou com um jato triste de humor. Eu estive congelado por toda minha vida. Este demônio em particular só está em casa em neve e gelo. Ele ouviu o cocheiro gritar aos cavalos e o protesto blasfemo de Ashton e a carruagem se pôs em movimento. O esquema tinha procedido com suavidade perfeita. Entretanto, os planos dele normalmente o faziam.

      Kylemore pegou vários metros de corda no banco ao lado dele.

— Coloque suas mãos.

      — Eu não serei amarrada.

      Deus, que mulher ela era. A maioria das fêmeas estaria gritando até agora aos céus, mas a amante dele soou como se ela assistisse a um chá de tarde, não ao próprio seqüestro. Ele se ajoelhou ante ela, enquanto se equilibrava contra o balanço constante da carruagem.

— Eu a amarrei antes. Você desfrutou disto.

      Claro que, a zombaria barata dele não a afetaria. Ele não imaginara que fosse. Ela meramente fixou seu olhar cinza-claro nele.

— Eu consenti esses jogos, Sua Graça. Uma diferença importante.

      — Não para mim. — Ele deixou um sorriso superior aparecer em seus lábios. Na verdade, ele se sentia bastante superior. Tendo adquirido o que ele quis, ele jogaria felizmente sua cabeça para trás e gritaria sua vitória. — Dê-me suas mãos.

      Ela encolheu os ombros e fez como licitou ele.

— Eu suponho que se eu não fizer, você ordenará que seu motorista assassino atire em mim.

      Ele apertou os nós. — Eu poderia amordaçá-la também, você sabe. — Negligentemente, ele sacudiu as saias dela para cima dos joelhos. — Eu me acho menos que seduzido por seu guarda-roupa, madame.

      Com desgosto, ele inspecionou as meia-calças de algodão grossas dela e as botas robustas de cano curto. Prático, mas longe de fascinante. A Soraya que ele conheceu só tinha usado seda próximo à pele.

      Seda. Ou ele.

      — Eu não estava fora para seduzir — ela estalou enquanto ele amarrava os tornozelos dela juntos.

      Ele baixou as saias dela e voltou ao assento com uma urgência e esperou que ela não tivesse notado. Esta mulher era em muitas formas uma estranha, mas ela ainda exercia a mesma vontade impetuosa nos desejos dele, condenada seja. Mas ele tinha algum controle, o Diabo a leve. Ele não a lançaria de costas e entraria nela quando a tivesse em seu poder, não importando como os sentidos esfomeados dele gritassem para que o fizesse.

      Um silêncio caiu enquanto ele lutava e ganhava contra suas incontroláveis paixões. Ele se ressentiu ante essa forte influência que ela exercia sem esforço sobre ele. Ele sempre a sentiu. Mas nada em seis anos o tinha quebrado de seu vício desta mulher primorosa. Ele a almejou, assim como seu pai tinha almejado o ópio. A obsessão particular dele se provaria tão fatal quanto fora para seu antepassado?

      Meditativamente, ele a encarou, levando em conta a expressão enigmática dela e o modo como ela suportava graciosamente o balançar do veículo, até mesmo forçada como ela estava. Ela claramente pretendia negar as lágrimas, os protestos e os acessos de raiva. Talvez ela os reservasse para um momento mais revelador.

      Mas quando, passado um longo tempo, ela falou, usou a mesma voz calma anterior.

— Apenas, o que você quer de mim, Kylemore?

      Ele se acomodou contra as almofadas com um sorriso lânguido.

— Nada muito oneroso para uma mulher de seus talentos. — Ele deixou o sorriso alargar enquanto se intoxicava de satisfação, mais rápido que o mais forte licor. — Você me deu três meses de miséria e aborrecimento, madame. Agora só é justo que você recompense meus esforços com prazer sensual.

 

— Seqüestrar é uma ofensa importante —, Verity disse serenamente. Nunca o deixe ver que você está amedrontada, a mente dela cantou a tempo com o rangido da carruagem. Nunca o deixe saber que você é fraca.

      Kylemore permaneceu desinteressado, condenado seja.

— Nenhum magistrado erguerá um dedo para salvar uma prostituta comum de prover o acordo pelo qual o protetor dela pagou. Especialmente se o protetor dela é um dos maiores homens no reino.

      A descrição insultante dele sobre ela não deveria irritá-la, pois vendeu seus favores por dinheiro. Mas a falta de interesse dele a machucou e amedrontou-se ao perceber o quanto isso doeu.

      Ela lutou para esconder a reação mal recebida dela. O autocrata cruel que sentasse em frente a ela queria que ela jogasse a fêmea histérica, lamentando e implorando clemência, mas ela prometera a si mesma, no dia em que deixara Londres, que ela nunca mais seria desse homem – ou de qualquer outro – um fantoche. O Duque de Kylemore ainda não tinha percebido que aquela Soraya complacente, com a sensualidade sedosa, tinha sumido. Ao invés, ela se tornaria uma criatura de ferro e gelo que não se submeteria às demandas de nenhum homem.

      Ela tinha chorado, só e amedrontada e aflita, quando os pais tinham morrido. Ela tinha se enfurecido e tinha lamentado quando, por necessidade, se compelira a se tornar a amante de um homem velho. Lágrimas não tinham ajudado nessas ocasiões. E não ajudariam agora. Ao contrário, ela deveria ser esperta e observadora. Ela tinha que pensar, planejar e esperar. Nesse momento ela era como Kylemore: Controle era seu refúgio e sua arma.

      Circunstâncias a tinham forçado a interpretar os homens. Este espécime particular poderia ser mais opaco que os demais, mas ela poderia dizer que o duque estava obstinado a manter-se no curso de seus planos, mesmo que os céus soubessem que nada de bom poderia vir disto.

      Ela umedeceu sua garganta seca.

— Meu irmão terá a lei em cima de você.

      — O mesmo irmão que alcovitou para você em Londres?

      Ela defenderia Bem, até mesmo se ela nunca se inclinasse para se defender.

— Isso não é verdade. Ele me protegeu.

      O monstro teve coragem de sorrir novamente para ela. A curva graciosamente daquela boca moldada carregou-se de uma mistura de condescendência e desdém.

— Você dificilmente precisa se proteger do homem que foi seu amante reconhecido durante o último ano. Não, minha querida Soraya, você se engana ao esperar um resgate daquele trimestre.

      — Não me chame assim! — Nos laços odiados, as mãos dela enrolaram nos punhos. Ela levou uma respiração funda para suprimir sua reação tempestuosa. Nunca o deixe ver. Nunca o deixe ver, ela repetiu silenciosamente. Ela mais calmamente falou. — Meu nome é Verity Ashton.

      — Como desejar —, ele disse sem qualquer grande interesse. — Mas não pense que qualquer outra coisa tenha mudado, porque não mudou.

      O sorriso desenvolveu um tom de presunção. Por causa do rumo da conversa, ele percebera. Ele era um homem astuto com uma habilidade misteriosa para a ler. Desde o começo, ele tinha sabido que em baixo da compostura dela, ela estava assustada e confusa e furiosa.

      Nada a faria admitir a derrota. Ela endireitou a coluna, enviou-lhe um olhar mortal, mas totalmente impotente, com aversão virou sua cabeça.

      Eles cobriram várias milhas em silêncio crescente e opressivo. Ela tentou se concentrar em suas aflições físicas. Mas enquanto as cordas que a seguravam estavam apertadas, a seda não esfolou nada exceto seu orgulho. Era mais incômodo tentar equilibrar-se contra o movimento do veículo, mas até mesmo isso eventualmente se tornou automático.

      O duque a estudou com intensidade sem vacilar. Ela suportou a inspeção dele enquanto a carruagem balançava ao longo da estrada, roubando-a para longe de Whitby e os sonhos quebrados dela de satisfação. Em cada segundo, a tensão entre eles ficava mais e mais sólida. Uma tensão pesada com o medo dela e o propósito inflexível dele. E qualquer outra coisa que ela não queria reconhecer. A consciência sexual que sempre existiu entre eles era quase tangível dentro da vagamente luminada carruagem.

      Verity não tinha nenhuma ilusão sobre o último castigo dela.

      Ele a quis. Ele a levaria. Ele estava bastante bravo para feri-la. Nem ela tinha perdido o significado desses poucos momentos quando ele tinha se ajoelhado aos pés dela. A captura na respiração dele. O tremor rapidamente escondido nessas mãos elegantes enquanto ele a atava.

      Ele ainda era escravo de sua luxúria. Claro que ele era. Por que se lançar, caso contrário, neste caminho lunático?

      A necessidade dele era uma fraqueza que a grande Soraya teria explorado imediatamente. Mas até que ela não tivesse nenhuma outra escolha, Verity se recusou a descer aos truques de uma meretriz barata, não importando quão odiosos fossem os nomes que ele a chamava.

      O duque era forte e cruel. Qualquer verniz de decoro que existiu entre eles em Londres tinha agora se desintegrado a nada. Ela sentia que ele tinha chegado tão perto de seu limite, que ele faria qualquer coisa. Qualquer coisa.

      Mas ele não prevaleceria, ela jurou corajosamente.

      E desejou pelos céus acreditar nisto.

      — Eu não o traí —, ela disse, muito mais para quebrar o silêncio gritante entre eles do que pelo desejo de se comunicar com ele.

      Os olhos dele no interior escuro nem mesmo piscaram.

— Sim, você fez.

      — Nosso contrato era durante um ano. Tudo o que você me deu era legalmente meu. Você sabe agora de Ben. Eu nunca fui infiel.

      — Felizmente para você - e para ele - vocês não eram. — O duque falou com uma indolência, na qual ela não confiou, enquanto ele estirava as pernas entre os dois bancos. Se alguém olhasse e desconsiderasse o fogo aterrado debaixo dessas pálpebras preguiçosamente abaixadas, ele seria a visão do controle relaxado.

— Você fala de discussões. Secundárias. Em seu coração, sabe você que me traiu quando partiu. Em seu coração, sabia que eu buscaria reparação.

      Ela já conhecia o problema. Por causa deste conhecimento, ela tinha se envolvido com o esquema de Ben para desaparecer na noite com ele, como se eles fossem um par de arrombadores de casas. Ela não tinha feito nenhuma promessa a Kylemore, mas toda vez que eles tinham feito amor, toda vez que ele lhe presenteava com uma jóia de imperatriz para a adorná-la, ela se comprometia a ficar. Legalmente, ela tinha sido livre para ir. Em um nível pessoal, ela o tinha enganado, e depois abandonado.

      Sua culpa a tinha importunado desde que ela partira. Mas ela percebia agora que ela tinha sido sábia em fugir dele e de seu desejo obsessivo. O que tinha sido imprudente fora ter permitido que ele a achasse.

      — Se eu admitir que isso é verdade e implorar seu perdão, você me deixará ir? — ela perguntou sem qualquer expectativa que ele concordaria.

      Ele riu suavemente e o som profundo enviou um frio de apreensão ao longo da espinha dela. — Não, isso é muito fácil, madame. Embora eu juro que você fará ambos, antes de eu ter acabado com você.

      Infelizmente, ela estava segura de que ela o faria também. Ela falou rapidamente antes que o pensamento se instalasse em sua mente e lascou fora a que pequena coragem que ela tinha partido.

— Como você me achou?

      — Com mais dificuldade do que eu esperava, eu devo dizer. Eu a saúdo pela sua inteligência.

      Não pareceu um elogio. Ela tremeu embora não estava frio dentro da carruagem fechada.

      Ele continuou.

— No princípio, eu tentei todos os lugares óbvios. Mas se você tivesse tomado um amante novo, todos os interessados mantiveram-se malditamente discreto sobre isto. Minhas investigações não resultavam em informação alguma sobre seu paradeiro, nada.

      — Isso deveria ter sido...

      — Humilhante? Sim, era. — Ele a lançou um olhar nivelado debaixo de suas sobrancelhas agudamente marcadas. — Eu já disse que você tem uma grande percepção para juntar as coisas.

      — Eu não te devo nada —, ela disse com uma firmeza que até mesmo ela não achou convincente.

      Ele ignorou a interjeição dela. — Enquanto isso, meus agentes procuraram pelo país, se concentrando nas cidades da moda. Nunca me ocorreu que você não planejava continuar em sua profissão.

      — Por quê? — ela perguntou acidamente. — Você acreditou que eu estava tão loucamente apaixonada por meu criado que eu fugi com ele.

      O sorriso aborrecedor que tinha ido e vindo desde que ele a tinha a pego, reapareceu.

— O que eu entendi ser seu caso com Ben Ahbood não a tinha impedido de me fazer sangrar até que eu secasse. Por que você pararia de perseguir seus palhaços para seguir um outro tipo de fonte de renda?

      — Você não me tem em melhor estima, não? — ela perguntou por lábios duros.

      — Pelo contrário, minha querida. Eu tenho o maior respeito por seu tino para os negócios —, ele disse secamente. Ele cruzou os braços, seus impenetráveis olhos azuis escuros a fitaram sondando cada segredo. — Seu único ato verdadeiramente tolo foi recusar minha proposta de casamento e fugir. Você deveria saber que não poderia achar um provedor mais generoso.

      Em seu interior, ela recuou ante o desprezo naquela voz arrastada dele. Oh, ele a quis, certo, mas ele se menosprezou para isto. E ele a faria pagar pela fraqueza dele.

      — Eu só tive uma coisa para vender. Você não pode me culpar por querer ter o melhor preço que eu podia —, ela disse.

      — Não. E você não pode me culpar por dar valor ao meu dinheiro.— Sentindo claramente ele se sustentaria em qualquer insubordinação nas ordens inferiores, ele procedeu com a explicação. — Eu comecei a pensar em testamentos e legados. Senhor Eldreth era um homem rico e um solteiro. Provavelmente ele fez uma provisão para você. Especialmente considerando sua exibição de lealdade. E eu me lembrei de que você esperou seis meses, antes de tomar seu próximo amante. Deduzi que você deveria ter uma renda independente de algum tipo.

      — Talvez tenha deduzido com discriminação —, ela replicou, enquanto se ressentia com esta contabilidade fria da vida dela.

      — Não quando Mallory era sua próxima escolha. O homem é uma nulidade.

      — Ele sempre foi amável comigo —, ela devolveu da mesma maneira mordaz.

      Sobrancelhas pouco impressionadas arquearam sobre os olhos azuis fundos de Kylemore.

— Uma mulher como você precisa mais que bondade. Nós dois sabemos disto.

Ele abriu a cortina para um mundo cinza.

      A luz era implacável na bela face dele, marcas revelavam a fadiga e tensão. Ele parecia como se estivesse atormentando a si próprio, próximo à loucura desde que ela tinha desaparecido. Ela achou a idéia mais espantosa que lisonjeante à sua vaidade.

      Ele deixou a ponta da cortina cair, envolvendo-os mais uma vez na luz fraca.

— Está chovendo novamente. Nós teremos um viagem molhada até o norte.   

      — Norte? — ela perguntou, embora dificilmente se importava para onde a levava. O destino eventual dela às mãos dele seria o mesmo que em Londres como se estivesse na Mongólia.

      — Sim. Nós visitaremos uma de minhas propriedades nas Highlands. É o único lugar em que tenho certeza que não seremos perturbados. É o único lugar onde eu posso confiar no pessoal para não espalhar uma palavra sobre sua presença. — Dessa vez, o sorriso dele tinha apenas um regozijo de antecipação. — Minha vingança é uma preocupação puramente privada.

      Uma mulher mais fraca teria começado a gritar naquele momento. Mas Verity aferrava-se com certa dificuldade à sua autoconfiança. Ele estava determinado a intimidá-la, isso era óbvio.

      Uma pena que ele tivesse conseguido.

      Ele parou, como se esperasse pela reação dela. Quando ela negou-lhe uma resposta, ele pareceu um pouco desapontado.

      Você enfrentará mais dessas decepções, ela lhe falou silenciosamente com a primeira satisfação que ela tinha desde que este pesadelo começara. Acostume-se a isto.

      Ele fez um gesto de rejeição com uma mão pálida e elegante, como se negando a capacidade dela para o afetar silenciosamente.

— Onde eu estava? Ai, sim. À vontade de Sir Eldreth. Eu adquiri seu testamento e notei uma grande pensão anual para uma Senhorita Verity Matilda Ashton. Algumas investigações nas propriedades dele e entre seus camaradas revelaram que a Senhorita Ashton não era parente nem empregada da família. Na realidade, ninguém sabia quem era ela. A propósito, Matilda não lhe faz justiça. É difícil o bastante ver você como Verity - particularmente dado que verdade não é exatamente seu ponto forte. Mas Matilda!

      — Era o nome de minha mãe —, Verity disse, enquanto tentava não deixar as alfinetadas dele arranhar seu controle.

      — Ah. — Ele libertou um lufada zombeteira de respiração. — Eu espero que ela tenha sido uma cidadã mais merecedora do que a filha dela se mostrou ser.

      — Ela era.

      Graças a Deus que a mulher suave e devota tinha morrido antes de ver no que Verity havia se tornado. A mãe dela acreditava que um fogo infernal e perpétuo esperavam as meretrizes no final do caminho delas. Verity não tinha nenhuma intenção de confiar um pedaço que fosse disso em frente aquele tirano dominante em frente a ela.

      — Era então um problema secundário organizar alguns contatos menos escrupulosos com o propósito de arrombar o escritório do procurador de Sir Eldreth e roubar a direção da Senhorita Ashton. Você desfruta do resultado encantador de meu empreendimento.

      Como ela odiava a voz lisa e superior dele, com suas consoantes duras e vogais claras. O covarde que se escondeu na alma dela sussurrou que ela nunca poderia ter sucesso contra alguém com uma voz assim.

      Coragem, Verity, ela disse a si mesma, fechando as mãos amarradas dela no colo. Ele ainda não ganhou. Embora ele vá indubitavelmente se você se convencer que ele é invencível.

      — Você cansará logo de estupro e compulsão. — Desafiá-lo era arriscado, mas ela tinha que estabelecer um pouco de poder nessa competição cruel e desigual.

      — Você se equivoca, senhora —, ele replicou suavemente. — Meu desejo é para uma parceria no senso mais completo da palavra.

      Apesar de todo seu medo, ela deu uma desdenhosa risada.

— Se desejos fossem cavalos, os mendigos montariam.

      A intensa expressão dele não se iluminou.

— Eu penso que você achará que nós somos mendigos quando começar a desejar.

      Afinal, ele lhe ofereceu um pouco de vantagem e ela estava bastante desesperada para levar isto.

— Eu era prostituta, Sua Graça. Prostitutas copulam por dinheiro, não pelo prazer. Você me confunde com alguma lady fina que escolhe onde ela se deita. Eu abri minhas pernas para homens porque eles me pagaram para fazê-lo. Como você, me pagaram uma fortuna.

      Até mesmo na luz pobre, ela viu ele embranquecer debaixo dos insultos dela.

— Mais que aquela situação entre nós, você sabe.

      Era à volta dela para soar superior agora.

      — Eu me alegro que Sua Graça pense assim. Eu temeria que minhas habilidades falhassem se você não tivesse.

      Sim! Isto era o que ela tinha que fazer. Combatê-lo. Insultá-lo. Fazê-lo brigar para manter-se. Logo, ele cansaria da língua ácida dela e de sua obstinação. Ele quis Soraya excitante, complacente, não a reprodução da assinatura obstinada dela, Verity.

      Ele deve ter adivinhado a intenção dela.

— Fazer com que eu fique com raiva não fará com que eu a liberte. Embora poderia me fazer menos... cuidadoso.

      Raiva surgiu, limpa e poderosa como as ondas que ela tinha visto na orla marítima naquela tarde.

— Eu não quero seu cuidado! Eu não quero nada de você. Eu o menosprezo.

      Estranhamente, a explosão dela só o fez mais tranqüilo.

— Tenha um pensamento para sua segurança, madame. Aonde nós vamos, eu poderia sumir com você e nem uma alma proferiria uma palavra de protesto.

      Ela encolheu os ombros de mau humor. — Assim me mate, me mate agora e salve-se da inconveniência de uma longa viagem. Ameaças não mudarão o modo como me sinto.

      Como ela deveria ter esperado, o desafio não diminuiu a autoconfiança dele.

— Talvez não. Mas eu odiaria terminar com este drama particular agora que está ficando interessante.

      Se equilibrando no jogo com uma facilidade que ela ressentia, ele cruzou a carruagem para compartilhar o banco dela. Verity encolheu-se no canto antes que ela pudesse evitar. O assento era estreito e mesmo não sendo um homem pesado, tinha bastante força para encher o espaço disponível. As pernas dele se emparelharam com as dela e o calor dele vazou pelas saias pretas grossas dela.

      Mas ela era uma lutadora. Ela tinha que ser.

      — Então você decidiu me assassinar afinal de contas. — Ela esperou que a declaração dela fosse mero desafio.

      Ele virou a cabeça escura dele e a analisou fixamente. Ela suspeitou que ele entendeu quão enervada ela achava essa concentração meditativa dele nela.

      — Não, não ainda. — Os lábios dele mudaram para uma diversão gelada. — Embora você poderia desejar antes que eu tivesse acabado.

      Ela avançou lentamente mais adiante no couro acolchoado do coche, mas não houve diferença em como o duque dominava o espaço. A carruagem de impacto constantemente o moveu contra ela, criando fricções sugestivas. Cada roçar do braço dele ou da coxa queimava-a com as importunas lembranças de prazer.

      — O que vai fazer? — ela perguntou em uma voz que lutou para manter firme. Amaldiçoado seja por tê-la amarrado. As mãos atadas dela eram inúteis para tentar afastá-lo dela.

      — Você não gosta de surpresas? — ele perguntou suavemente. Por toda a conversa deles de assassinato e do ataque mais cedo dele em Ben, ela não sentia agora nenhuma violência nele.

      — Não, eu não gosto —, ela estalou, zonza com uma mistura repugnante de nervos e raiva. O que ele estava jogando?

      — Que triste —, ele murmurou. — Isso é algo que nós deveríamos arrumar. — Ele levantou a mão de longos dedos e acariciou seu rosto de cima abaixo até seu queixo.

      Todos os segundos daquela carícia zombeteira queimavam-na. Ela tentou e falhou em repelí-lo.

— Eu não erguerei minhas saias para você em uma carruagem em movimento.

      O toque dele era suave, mas inexorável.

— Você erguerá suas saias quando e onde eu diga. Você renunciou qualquer direito para me comandar quando escapou.

      — Eu o combaterei. — Ela rezava para que fosse verdade.

      — Eu conto com isto. — Ele se inclinou para esfregar a bochecha dele contra a face dela. A sombra de barba dele picou fracamente contra a pele dela. O cheiro morno, almiscarado dele, familiar de cem tardes em Kensington, envolveu-a.

      Ela endureceu, enquanto rejeitava a falsa ternura até a ameaça de força.

— Pare! — ela rangeu fora.

      Kylemore riu suavemente.

— Shh —, ele respirava na orelha dela enquanto se aninhava em sua garganta.

      Eu posso agüentar isto, ela jurou. Eu posso agüentar isto.

      — Verity — Ele mordiscou o caminho até o ombro dela, enquanto ignorava o vestido de decote alto dela. — Verity, você é tão deliciosa quanto Soraya era.

      — Eu espero que eu te asfixie.— Ela ficou horrorizada ao ouvir o desafio rouco dela. Ele riu novamente, as respirações curtas e rápidas que passavam pela clavícula dela a esquentaram.

      — Essa é minha menina. — Ele a virou completamente na direção dele e se concentrou em um nervo sensível entre o pescoço e o ombro dela. Doze meses de intimidade tinham-no ensinado que a atenção para aquele ponto em especial a levavam a loucura com prazer.

      Porque é lógico que os dois sabiam que os insultos dela eram vazios. Ela reprimiu um gemido. O Duque de Kylemore era um amante hábil que sempre tinha tirado uma resposta dela. Uma resposta genuína, não os ardis cansados de uma amante que aplaca o guardião rico dela. Ela tinha desfrutado a forma de fazer amor dele, tinha achado isto até mesmo excitante se ela alguma vez tivesse se permitido tanto sentimento enquanto eles tinham estado juntos.

      Era apenas uma resposta natural de uma mulher jovem e saudável a um amante vigoroso, ela sempre tinha se dito.

      O primeiro amante vigoroso dela.

      Com mais esforço que ela quis reconhecer, ela se distanciou do que ele estava fazendo com ela agora. Em Londres, o sexo tinha acontecido em uma atmosfera estranha de confiança. Desde a deserção dela, ele já não confiava nela. E certamente ela não confiava no louco que a arrebatou da estrada pública e tentou matar seu irmão. A memória ajudou a abafar qualquer resposta ao toque dele.

      Eventualmente, o duque se sentou e a estudou com uma expressão de desgosto no rosto mimado e belo dele.

      Bom, ela pensou.

— Você não pode escapar de mim, nem mesmo em sua mente. Não há nenhum ponto em desejar estar em outro lugar —, ele disse em um tom completamente diferente do murmúrio sedutor de alguns segundos atrás.

      — Infelizmente, você faz com que seja impossível eu ir a qualquer lugar, Sua Graça. — Ela elevou as mãos amarradas em um gesto irônico. — Eu me acho menos que arrebatada com sua hospitalidade.

      O aborrecimento aristocrático dele derreteu e deu um bufo de risada. — Você está, por Deus.

      — Desamarre-me — ela disse, de repente achando os nós dela de repente insuportáveis. — Eu não posso saltar de uma carruagem em movimento.

      — Você poderia arrancar meus olhos fora.

      — Minhas ambições se relacionam a danificar outras partes de você. —, ela disse com prazer, embora não estivesse segura de ser capaz de fazer qualquer dano real. Em Whitby, ela poderia ter virado a pistola do cocheiro nele e atirado sem hesitação. Mas agora essa forçada intimidade corroeu a resolução dela em fazê-lo sofrer pelo que tinha feito.

      Talvez ele soubesse disso.

      Ela se endireitou. Que tipo de ratinho era ela para deixar que umas poucas carícias indiferentes de um amante rejeitado a amolecessem? Um amante rejeitado determinado a afirmar o que ele via como seus direitos.

      Bem, ela decidia quem tinha direitos sobre dela. E ela negou ao Duque de Kylemore a propriedade que ele reivindicava.

      — Você está fazendo isto novamente —, ele disse suavemente.

      Ela piscou.

— O quê?

      — Deixando sua mente vagar.

      Ela encolheu os ombros como uma mostra forçada de indiferença.

— Se apenas eu pudesse evitá-lo. Mas nada aqui chama minha atenção.

 

      No momento em que Verity falou, ela percebeu seu engano.

      Ela quisera fazer o desafio para cortar e ferir. Ao invés, tinha soado como um convite sexual. E claro que, Kylemore não deixou de lado a ofensa mal humorada que ela tinha dito para provocá-lo.

      Um sorriso voraz se iluminou no rosto dele.

— Eu terei apenas que morder um pouco mais duro, então, não?

      Ela fechou os olhos e tentou não ouvir a ênfase que ele colocou em “mais duro”.

— Não faça isto —, ela sussurrou. — Por favor.

      Ele deu uma risada macia.

— Já implorando clemência, Soraya? Eu pensei que você duraria muito mais tempo contra mim do que isto.

      — Eu não sou Soraya — ela disse, um pequeno desafio era tudo que ela poderia invocar.

      Porque ele tinha razão. Ela faria qualquer coisa, incluindo sacrificar seu orgulho, para evitar a sedução lenta que ela sabia que era o intento dele.

      — Sim, você é. — Ele enrolou a mão dele ao redor da cabeça dela, enroscando os dedos dele nas tranças da viúva decorosa e puxando a face dela em direção a sua.

      Ela suportou a investida. Mas o duque era muito sutil para isso. Com lentidão tentadora, ele acariciou sua boca com a dele. Não poderia nem ser chamado de um beijo. Não realmente. Estava como uma extensão do aninhar suave dele, exceto que agora ele tocava seus lábios. Ele tão raramente a beijava e nunca o tinha feito com tanta concentração e propósito.

      Ela tentou se afastar, mas a mão na parte de trás da cabeça dela era implacável. Dessa vez quando o duque tocou sua boca com a dele, ele demorou um segundo mais longo, moveu os lábios em um beijo fantasma, terminando antes que ela tivesse percebido que começara.

      Ela deu uma choradeira que não segurou nenhum desejo, só medo.

— Por favor, pare.

      Ele elevou a outra mão e alisou alguns pâmpanos de cabelo longe da testa dela.

— Por quê? Eu só a estou beijando. Depois de tudo fizemos um com o outro, isto dificilmente poderá significar qualquer coisa, ou pode?

      Claro que podia, ele sabia que podia. Ela podia ver aquele conhecimento nos olhos de genciana dele. Conhecimento e nenhuma real ternura, embora o toque mentisse e contasse uma história diferente. Ele estava fixo em dominá-la, e sorte ou percepção significavam que ele seguiria na estratégia que a derrotaria.

      Ela poderia combater força, mas a vida dela tinha sido destituída de ternura desde que ela tinha quinze anos. Até mesmo sua falsa semelhança tinha o poder para abrir uma brecha no coração dela.

      Em algum lugar, entretanto, ela achou a vontade para resistir.

— Certo, me leve —, ela disse de modo insípido. Ela olhou lateralmente. — Se você desamarrar minhas pernas e me levar para o seu colo, nós poderíamos fazer algo para levá-lo ao extremo. Pelo menos o bastante para fazê-lo parar de me aborrecer por um momento.— Estava deliberadamente cru, mas ela estava frenética para quebrar o desejo trêmulo que pairava entre eles.

      Ele deu outros desses risos macios que fazem os pêlos do braço dela se elevarem.

— Talvez depois, madame. Agora mesmo eu estou bastante contente com as alegrias inocentes de beijar.

      — Mas eu não gosto ser beijada —, ela disse sem saída.

      Ele passou os dedos pela bochecha dela até que ele segurou sua cabeça com ambas as mãos.

— Você me beijou quando me deixou, se recorda?

      — Um engano —, ela disse inseguramente.

      Ela tinha sabido que o era mesmo na ocasião. Como ela desejou que ela o tivesse deixado ir naquela tarde. Como ela desejou que tivesse seguido seus instintos e nunca tivesse tomado o Duque de Kylemore como amante.

      Desde que ela o conhecera, uma voz interior tinha insistido que ele, só ele, poderia penetrar a concha protetora que era Soraya. Mas calamitosamente, ela tinha ignorado a advertência estridente dos instintos dela. Como amante dele, ela tinha suportado um ano armando-se contra a empatia que sempre tinha sentido por ele. Uma empatia que era absurda. Um Cyprian e um duque do reino não poderiam ter coisa alguma em comum.

      Diante da rendição dela, ele tinha procurado, ela tinha resistido. Toda isca que ele lançou no caminho dela era um movimento no jogo. Parte dela tinha apreciado a competição, até mesmo o jogo final que ela havia armado era deliberadamente um desafio - ela exigiu uma fortuna impossível por sua complacência, uma quantia que nenhum homem são pagaria por uma mulher.

      Mas nenhum Kinmurrie era completamente são.

      O duque tinha aceitado a oferta dela e ela inesperadamente encontrou-se diante do pagamento das dívidas desse jogo. Ela tinha se assegurado que poderia viver um ano, apenas um ano, com ele e sair com a separação intacta. E ela quase conseguiu.

      Quase.

      E o desastre que essa pequena palavra - quase - prometia instalou-se junto a ela, tramando distruí-la.

      Bem, ela não estava acabada, ainda. O Duque de Kylemore precisava aprender isso. Dessa vez, quando os lábios dele encontraram os dela, Verity permaneceu tão inflexível quanto uma pedra. Ela fechou os olhos e, deliberadamente, enumerou todas suas razões para odiar este homem.

      A arrogância dele. O egoísmo dele. O modo como ele a arrancou da vida que ela tinha planejado durante tanto tempo e tinha, finalmente, ganhado a chance de alcançá-la.

      As mãos em seus cabelos começaram a se mover em círculos calmantes, achando e afrouxando cada nó de tensão. E todo o tempo, ele beliscava, lambia e chupava os lábios dela.

      Ela o odiou.

      Suas mãos presas apertaram-se enquanto ela lutava para permanecer quieta.

      Ele foi despertado em sua fome, apesar da sua falta de encorajamento. A qualquer momento, ele jogaria para cima suas saias e entraria nela. Ela quase desejou que ele o fizesse, pois assim ela não teria nenhuma escolha que não o detestar.

      Pelo menos o estupro terminaria com esta tortura que pairava tão perto do prazer entorpecente. Ela tentou chamar o desgosto, mas na verdade, ele era dolorosamente gentil.

      Ele sabia que a gentileza era a maior arma dele, maldito.

      E ele tinha um cheiro maravilhoso. Limpo, de macho forte e saudável, livre das colônias nauseantes que tantos homens usavam. Ele cheirava a ar livre. Por um momento, ela ansiou aquele cheiro atraente antes que ela se lembrasse de que era feita de pedra e pedra não ansiava.

      Mas ele, tão profundamente colado a ela, tão perto, neste espaço limitado, notou sua fraqueza momentânea.

— Eu posso fazer isto durante todo o percurso até a Escócia, você sabe —, ele murmurou contra sua boca.

      — Eu não sou um brinquedo —, ela replicou.

      — Você é o que eu digo que você é. Esse é o preço da traição.

Com alguns hábeis movimentos, o cabelo dela cascateou ao redor dos ombros. Ele correu os dedos pela massa caída, endireitando as formas.

— Assim está melhor. Agora você se parece com a minha amante. Embora confesse que acho a sedução da viúva virtuosa bastante picante. Nós temos que deixar isto para outra ocasião.

      A confiança tranqüila dele a irritou, e ela estava segura de que ele o fizera exatamente para isto.

— Eu não sou mais sua amante. Eu te disse: Soraya se foi para sempre.

      As mãos que seguiam penteando pausaram, depois retomaram. Ela tentou dizer para si mesma que as carícias não a perturbavam, mas cada movimento era uma promessa de deleite.

      Promessas mentirosas, ela se lembrou.

      — Soraya está apenas escondida, é só. — A certeza dele fez com que ela desejasse bater nele.

      — Você se cansará disto. — Ela esperava estar certa.

      — Talvez. Mas você realmente duvida qual vontade é maior? — As mãos dele deslizaram para descansar ao redor dos ombros dela.

      Se ele mudasse essas mãos uma polegada, elas poderiam estar ao redor da garganta dela. Ele já a tinha ameaçado com violência. Ela lutou para despertar seu medo como uma barreira contra ele, mas era impossível, quando o toque era somente possessão tenra.

      Possessão tenra?

      Que a amaldiçoassem, mas ela era uma boba.

      Ele conspirou incessantemente pela destruição dela, enquanto ela se enganava em pensar que o conde lhe teria alguma consideração. Ela merecia estar nesta dificuldade, se acreditasse em tal conversa sentimental fiada.

      Verity ouviu o suspiro de Kylemore.

— Eu farei um trato com você, Senhorita Ashton.

      Ela ergueu o queixo.

— Eu já sei que você não mantém os seus acordos, Sua Graça.

      Pelo menos, enquanto ele falava com ela, não a estaria beijando. Embora a voz funda dele deslizasse junto às suas veias, como mel aquecido e o movimento da carruagem fazia com que seus corpos se esfregassem num ritmo incessante, erótico.

      — Bem, esta é minha oferta. Beije-me corretamente e você estará protegida das minhas atenções, até que alcancemos minha casa de caça.

— Corretamente — significa exatamente o quê? — ela perguntou com suspeita.

      Ele riu.

— Isso é familiar. Você se protegendo atrás de definições legais. A proteção delas é espúria, como já deveria saber.

      Que o Diabo levasse essa confiança dele.

— Se eu cooperar, você me desamarrará?

Ela não tinha nada com que pechinchar. Os dois sabiam que ela estava sob poder dele.

      — Depende de como genuinamente você coopere.

      Enquanto ele se recostava no banco, ela respirou profundamente. E de má vontade inalou a essência dele. Ele parecia ter penetrado no tecido da carruagem. Ela desejou saber desesperadamente, se ele tinha penetrado na vida dela de modo semelhantemente. Poderia ela, alguma vez, ver-se livre dele, mesmo que essa provação acabasse? Seguramente isto teria que acabar um dia.

      A face angulada dele indicou irritação com as dúvidas dela.

— Eu não preciso te oferecer nada. Você é minha prisioneira. Você não tem voz para me impedir de fazer o que eu quiser contigo.

      O bastardo estava certo. Dessa vez, odiá-lo lhe tomava nenhum esforço.

— Então eu permito que me beije, e em troca, você não me maltratará até que nós alcancemos nosso destino?

      Outra curva apareceu nos lábios dele.

— Se você participar completamente do beijo, eu juro não lançá-la de costas e te espancar com a eficácia que você merece.

      Ela engoliu nervosamente.

— Isso não é o que eu disse.

      — Não, mas essa é a proposta na mesa. Pegar ou largar.

Ele dobrou os braços e esperou pela decisão dela com impaciência mal escondida.

      A decisão inevitável dela. Um beijo em troca de um espaço sem dor? Um espaço no qual, seguramente, ela acharia um pouco de chance para escapar. Ela não teve nenhuma alternativa, a não ser concordar.

      Verity encontrou olhos dele na escuridão.

— Certo.

      — Bom.

      Ela esperou que ele a pegasse nos braços, mas ele não se moveu da relaxada pose contra o couro escuro e brilhante da tapeçaria. Embora ela agradecesse essa atitude, mesmo breve, a falta de ação dele começou rapidamente a aborrecê-la.

      — Eu estou pronta —, ela disse nitidamente.

      Essas sobrancelhas orgulhosas subiram.

— Eu acredito que o arranjo era que você me beijasse.

      Esta humilhação nunca terminaria?

      Não, estava apenas começando, uma voz dentro dela sussurrou.

— Condenado—, ela disse em um tom baixo e duro. — Condenado ao inferno.

      — Muito tarde, eu temo. — Ele lhe deu um sorriso reservado. — Você está rejeitando? Pensar que um mero beijo derrotaria a grande Soraya.

      Ela tinha passado sua boca em todo o corpo dele. Ela o tinha levado à boca, levando-o ao clímax. Mas ela nunca tinha lhe dado um beijo sequer. Era uma reflexão inoportuna e melancólica.

      Ele se apoiou contra o lado acolchoado da carruagem, endireitando-se na direção dela. Seria um pouco difícil virar-se para ele, aproximar-se e se equilibrar com as mãos atadas nas coxas dele. Os músculos longos das pernas dele se estiraram debaixo dos dedos dela. Ele não estava tão composto quanto quis parecer. Aquela perspicácia lhe deu o ímpeto para continuar. Ela poderia fazer isto....Sim, ela poderia fazer isto.

      Pelo amor de Deus, era só um beijo. Ela era a notória Soraya. Seguramente ela poderia beijar um homem e sobreviver à experiência.

      Tentadoramente, ela pressionou sua boca contra a dele. Ele tinha um gosto familiar. Deveria. Eles tinham sido amantes durante um ano. Ele permaneceu impassível quando ela esfregou os lábios dela nos dele, testando gosto e textura. Os lábios dele eram firmes em baixo dos seus, firmes e lisos. E totalmente indiferentes.

      Claramente, o duque pretendia fazê-la trabalhar nesse interlúdio.

      Claro que ele faria. Ela tinha que se lembrar que isto era uma vingança e nada mais. A pechincha para o beijo dela era apenas um plano preparado no labirinto tortuoso da mente dele.

      Bem, se ela pôde se tornar a maior cortesã de Londres, certamente poderia beijar um homem e fazê-lo esquecer das ordens cruéis do dia.

      Verity respirou profundamente, tentando ignorar o maldito cheiro evocativo dele e usou a imaginação. Ela começou a copiar o modo como ele a tinha beijado mais cedo, persuadindo-o a se unir. Os músculos das pernas dele se endureceram em baixo das mãos dela. Ela não olhou para baixo para conferir se qualquer outra coisa estava endurecendo.

      Mas o duque ainda não a tinha beijado de volta.

      — Qual o problema, Sua Graça?— ela escarneceu suavemente contra a pele dele.

— Esta era sua idéia, se você recorda.

      — Você ainda tem que fazer crescer meu interesse o suficiente —, ele disse em um tom negligente.

      A resposta dele a teria enfurecido, se ela não tivesse sentido oscilação na voz dele. Fazer com que ela o servisse, era, aparentemente, parte da sua penitência. Serví-lo sem ter a participação dele, parecia.

      Exceto que ele estava longe de ser impassível. Ela brevemente considerou pôr suas mãos mais adiante, nas coxas dele para confirmar isso.

      Soraya não teria hesitado. Verity era mais cautelosa. Este era para ser somente um beijo, no final das contas. Ela não queria terminar com isso de costas enquanto o duque a “espancava”.

      Ela voltou à sua tarefa com determinação renovada. E ainda assim, ele não se rendia.

      — Eu sei que você está tentando me ensinar uma lição —, ela arquejou contra a bochecha dele.

      Ele não se importou em negar.

— E você está aprendendo qualquer coisa?

      — Eu estou aprendendo que você não é o único teimoso como uma mula.

      Ela podia dizer que ele riu contra sua vontade, e ela lutou para não achar aquele vislumbre súbito de humanidade desarmá-la.

— Você sabe, Verity ou Soraya, ou quem quer que você seja neste momento, às vezes seu fel me faz perder a respiração.

      Apesar de tudo, ela sorriu.

— Eu espero que não somente meu fel o faça, Sua Graça.

      Ele começou a responder, mas ela pressionou a boca dele com a sua e começou a usar a língua em um beijo boquiaberto, apaixonado. Dessa vez Kylemore lhe respondeu com desejo. Não porque ele quisesse, Verity sabia, mas porque ele não teve nenhuma outra escolha.

      Aquele foi o último pensamento racional dela por um bom tempo, enquanto o beijo a elevava a uma conflagração de escuro prazer, que ela nunca conhecera antes. Estava quente nessa tempestade de fogo, quente e perigosa, mas ela se lançou nas chamas se sequer pensar em sua própria proteção. Os braços dele se fecharam ao redor dela, enquanto ele a arrastava para seu colo.

      Vergonhosamente, no fim, foi Kylemore quem se retirou. Ele se ergueu ligeiramente para longe dela. Ela se deitou no banco. Em algum momento daquele beijo tempestuoso, ele a tinha trazido para baixo dele. Alguns momentos mais e ele teria estado dentro dela. O peso dele, duro e quente contra sua barriga, até mesmo pelas saias, indicou que isso ainda era uma possibilidade.

      Nem sequer isto era o bastante para lhe devolver a sanidade. Sem um grito de protesto, ela se deitou em baixo dele perdida no prazer.

      — Se eu não parar agora, eu não vou...—, Kylemore disse tensamente. A expressão dele estava cansada. Os braços que lhe prendiam eram como uma gaiola, onde ela não poderia ter nenhuma grande ânsia para escapar. — ...a menos que isso seja o que você queira.

      — Queira? — ela repetiu estupidamente, piscando para ele. Verity sentia a boca inchada e seu coração bateu, como se ela corresse dele em vez de se render descuidadamente a importunidade dele.

      — Devo tomar esse abraço como uma conclusão natural? — Logo, ele era o amante elegante que ela tinha conhecido em Londres.

      Ela puxou uma respiração trêmula para firmar suas perturbadas respostas. O rangido do coche era alto nas orelhas dela, enquanto ela voltava a si para organizar os pensamentos e defesas espalhados. Rapidamente, ela se lembrou do duque descrevendo o beijo dele como inocente. Tinha sido tão inocente, quanto Lúcifer vigiando uma orgia no inferno.

      — Madame? — ele perguntou, então muito deliberadamente apertou a ereção dele no estômago dela.

      O gesto cru a trouxe de volta a si como nada mais poderia tê-lo feito. Todo o adorável corpo dele se afastou, quando ela se endureceu em uma rejeição silenciosa.

      — Não. — ela conseguiu coaxar. Então, em uma nota de descuido desesperadamente buscado, — mas eu acredito que meus esforços esterlinos tenham merecido o fim de minha escravidão.

      Ele olhou estranhamente para ela.

— Eu desamarrei suas mãos enquanto você me beijava.

      — O quê? — ela perguntou duvidosamente, então percebeu que era verdade. Pior, os braços dela o cercavam e ela acariciava a parte detrás dele.

      Ela estava apenas a um segundo de puxá-lo para baixo a fim de ter mais desses beijos devastadores. Ela se lembrou dele vagamente arrastando as mãos dela durante o abraço tempestuoso deles. Ele a deve ter libertado então.

      Um calor diferente arranhou seu caminho até a face dela. De todas as humilhações envolvendo seu seqüestro, ela tinha odiado mais as amarras. Ela estivera tão perdida no vendaval do beijo dele que nem mesmo notou que não estava mais presa.

      — Saia de cima de mim —, ela rosnou, arrebatando as mãos para longe dele.

      O duque não se moveu. Ela deveria ter sabido que ele não responderia a uma ordem.

— Eu nunca tive sexo em uma carruagem antes —, ele disse pensativamente.

      Nem ela, mas se recusava admiti-lo.

— Eu prefiro uma cama.

      Um sorriso lento cruzou a face dele evocativamente como os movimentos do veículo que a empurravam contra ele. Por um momento, ele pareceu quase acessível.

— Isso significa você considerou em voltar pra mim?

      Oh, maldiçoada por dizer bruscamente estes comentários sugestivos. Soraya nunca seria tão fácil de surpreender. Verity não estava com as melhores palavras e muito provavelmente se lançaria em mais problemas a cada palavra.

      Em um sentido de autoproteção atrasado, ela falou ironicamente, da mesma maneira que Soraya o faria.

— Eu tenho qualquer outra opção, Sua Graça?

      Não poderia ser decepção nos olhos dele, poderia? A expressão passageira desapareceu quando ele saiu cima dela e voltou a sentar-se.

— Não, você não tem —, ele disse.

      Ela se sentou de modo trêmulo, finalmente capaz de suportar o bamboleio do veículo e começou a endireitar a roupa. Surpreendentemente, além de alguns botões desfeitos no colarinho, tudo estava em seu lugar. Ela deixou o cabelo solto. Sem alfinetes ou escova de cabelo, era impossível trazer qualquer coisa próximo à ordem.

      Ele se apoiou para subir as cortinas. Até mesmo depois da intimidade escura, o brilho da noite chuvosa a chacoalhou. Ela estreitou os olhos e olhou para o duque.

      Ele era um estudo em elegância amarrotada. Como tal criatura do inferno poderia estar tão bonita? Quando ela o viu pela primeira vez, há seis anos, ele tinha vinte e um anos, acabando de sair mocidade. Ela pensou que ele era a criatura mais perfeita que Deus já criara. Mas até mesmo então, aquela autoconfiança tímida já se mostrava em seu rosto inteligente. Com uma honestidade desesperadora, ela admitiu que aquela maturidade meramente acrescentava-se aos atrativos dele.

      Ela o assistiu lutar para recuperar sua maneira calma habitual. Mas ele estava corado e a boca estava cheia e mais macia que o habitual.

      O mundo que o chamou Kylemore, o Frio, não o conheciam realmente. Um inferno de paixão brilhou em baixo da indiferença do duque. Ela só podia imaginar o esforço que era necessário par manter essa emoção em segredo. Só que não era mais um segredo – pelo menos não para ela. Ele estava bravo, ele estava amargo, ele estava ferido, embora ela soubesse que ele enfrentaria qualquer tortura antes de admitir o último. Ele também era tão barulhento quanto uma lebre em primavera. Ele a surpreendeu quando manteve sua promessa e não a tomou. Ela o conhecia o suficiente para perceber algumas coisas que o inquietavam, como a luxúria insatisfeita.

      Quando ela o tinha deixado, pensou que ele acharia outra amante depressa e, se não esquece Soraya, pelo menos faria o melhor para ignorar sua rejeição. O duque tinha um forte apetite sexual. Ela sempre supôs que nos dias em que ele não ia a Kensington, era porque se aliviava com outras mulheres. Alguém como ele sempre atrairia os olhares femininos. Ela nunca tinha se enganado em acreditar que ele era fiel a ela.

      Mas o homem sentado oposto a ela, que tinha voltado a encará-la, estava quase febril pelo desejo. Ela podia cheirar a luxúria nele. A inacreditável idéia de que ele não tinha tido uma mulher há muito tempo, ganhou força em sua mente. Talvez até mesmo desde o dia em que ela fugiu.

      Era absurdo. Não podia ser verdade.

      Embora ela pensou, enquanto se abaixava para desamarrar seus pés, isso poderia explicar o que o levou a tão apressado seqüestro.

      Assim por que ele não estava bombeando três meses de frustração agora mesmo nela? Ela não podia fazê-lo manter-se na barganha de não a tocar. E ele logo teria o bastante dela de qualquer maneira.

      Nada disso fazia sentido. Da mesma maneira que aquele beijo furioso não fazia sentido, se ele pretendesse deixá-la em paz só naquele momento. Incrivelmente, o que parecia que ia fazer.

      — Sobre o que foi tudo aquilo? — ela perguntou muito tempo depois.

      Ao crédito dele, ele não fingiu não entender a pergunta.

— O beijo? Você mesma disse. Era para lhe ensinar uma lição. — Ele usou a fria e cortante voz cortante novamente, e apesar de se segurar, ela tremeu.

      — Que você pode me tocar sempre que você quiser? — Ela colocou como um desafio. — Eu já sabia disso.

Ele sorriu ligeiramente.

— Sim. Mas agora você sabe que quando eu te toco, você não é imune. E esse pensamento te corroerá como ácido.

      Ele tinha razão. Condenado. Pela primeira vez neste longo e deprimente dia, ela estava verdadeiramente apavorada.

 

      Beijá-la havia sido um engano fatal.

      Kylemore se recostou nas almofadas e se esforçou para manter uma aparência desinteressada. O tempo todo, uma batalha impiedosa e enfurecida acontecia contra seus desejos mais fundamentais. Os músculos dele se apertavam a ponto de doerem por ele ter se segurado para não se lançar sobre ela e terminar o que tinham começado. A promessa que ele tinha lhe feito não significava nada. Mas a própria habilidade dele para dominar as paixões animais o fez.

      Ela tinha estado deliciosa nos braços dele, a concretização de cada sonho que o atormentou durante os últimos três meses.

      Ela tinha estado muito deliciosa. Se ele a tomasse agora, onde estaria a vitória dele? Ele estaria irrevogavelmente se pondo como escravo dela e ela sabia, gatinha inteligente. Ele a tinha arrebatado da proteção do irmão para mostrar o poder dele sobre ela, não para se tornar seu adorado escravo mais uma vez.

      Mais uma vez, ela confundiu os planos cuidadosos dele. Um beijo relutante de Verity Ashton, com o provocador e ilusório inocente perfume de violeta dela, e ele voltava exatamente a estar onde estivera com Soraya. Ansiando. Desejando. Necessitando.

      Inferno.

      Ela o tinha trazido aos joelhos sem ao menos tê-lo tentado, condenada. Ele se esforçou para manter a extensão do tumulto de emoções longe de sua expressão. Então ele percebeu que não precisava se preocupar onde as emoções conturbadas dele se mostravam.

      Soraya-Verity não estava olhando para ele, mas sim a janela. Ela olhava a paisagem escurecida. A luz efêmera a revelava frenética com medo e com penúria.

      Ele rebateu a pontada de piedade que emergiu do oceano escuro de luxúria dentro de si. Ela estava nesta situação desagradável por culpa dela mesma. Se ele a fazia se curvar em submissão a poucas horas da partida deles, tudo certo. A moça merecia se preocupar com a iniqüidade dela. Talvez o beijo não tivesse sido, afinal de contas, um desastre puro.

      Ele se remexeu para aliviar o desconforto. Inferno, ele tinha que tê-la. O desejo ameaçou chamuscar a resolução dele a cinzas. Três meses de abstinência agonizante uivaram para que ele a tomasse. Especialmente quando, por vários momentos aquecidos, ela tinha querido o ato tanto quanto ele.

      Bem, talvez não totalmente.

      Ele se mexeu novamente e tentou acalmar a tempestade no sangue dizendo a si mesmo que logo a teria.

      Mas ele não a queria depois. Ele a queria agora.

      Ele tinha a intenção de provar as vantagens que agora eram dele. O que ele tinha provado de fato, era que ele estava tão vulnerável a ela quanto jamais estivera, com os diabos. Humilhantemente depressa, o beijo tinha mudado completamente de um ato de dominação a qualquer outra coisa, algo que ele não queria pensar sobre.

      A ironia era que o encontro devastador inteiro foi, no final, notavelmente puro. Eles tinham se beijado. Isso era tudo. Ele mal tocara o corpo perfeito dela. O corpo cujo cada curva e linha foram impressos na memória dele. Com um gemido abafado, ele se remexeu novamente.

      Ele tinha jurado que não a tomaria até que eles chegassem à Escócia. A demora foi projetada para estender a tortura dela, de forma que, quando ele de fato a levasse para cama, ela já teria sofrido dias de apreensão e autorecriminação.

      Assim por que parecia que a única vítima estirada agora no jogo era Sua Graça, o Duque de Kylemore?

      O beijo tinha sido extraordinário.

      Encantado. Intoxicante Subjugado. Enigmático.

      Ele diria até que ela não tinha muito conhecimento de como fazê-lo a princípio. O que era ridículo. A boca inteligente e qualificada de Soraya já tinha provado cada polegada dele. A estimulação dele atingiu outro excruciante grau quando se lembrou de algumas coisas que ela tinha feito nele.

      Bom Deus, a esta taxa, ele seria uma destruição tagarelante, antes mesmo de cruzarem a borda.

      Ele arremessou um relance bravo a ela.

      Verity. Senhorita Ashton.

      Ela estava próxima o suficiente para fuderem e, no entanto, ela poderia estar em Timbuc. Ele não podia arriscar tocá-la novamente. O autocontrole dele tinha apenas sobrevivido na última hora.

      Ia ser uma viagem muito longa.

     

      Quando a carruagem entrou na aldeia de Hinton Stacey depois de várias horas, a noite já tinha caído. A prisioneira de Kylemore ainda estava calada. Entretanto, a amante dele nunca tinha sido a mais tagarela das mulheres. Ele pensou que não se importava – ele não a tinha seqüestrado pela conversa dela.

      — Dê-me suas mãos. — Ele alcançou as cordas. Ele não a tinha amarrado depois daquele beijo ardente, embora ele quisesse.

      A face dela era um vislumbre pálido na escuridão, quando ela se virou em direção a ele.

— Não.

      Então seria assim, ele pensou e com um pesar ele se recusou a ponderar. Aparentemente, ela tinha dedicado as horas, desde que ele a tinha beijado, para reconstruir as defesas.

      O que tinha esperado ele? Que aquele abraço a transformaria em uma massa tremulante de aquiescência? O olhar dele caiu na linha infeliz dos lábios dela. Ele renunciaria à última esperança dele para provar aquela boca de novo, o que era estranho, dado que beijá-la nunca fora nenhuma obsessão particular dele, quando ela era uma amante disposta.

      — Eu temo que a palavra “não” tenha perdido o poder entre nós quando você fugiu. — Com uma aspereza paciente e com mais raiva dele do que dela, ele se esticou para agarrar as mãos dela.

      — Eu não serei amarrada! — ela chorou, enquanto deslizava pelo assento de couro para evitá-lo.

      A idéia de lutar com ela era muito indigna para ser sustentada. Ou pelo menos isso foi o que disse para si mesmo. Ele certamente não tinha medo das próprias reações a ela em uma luta.

      — Se eu tiver que feri-la, eu o farei —, ele disse, longe de ser verdade.

      Ela tratou a ameaça com o respeito que mereceu.

— Oh, encantador.

      Meu Deus, mas ela era valente. Por toda sua vida, coragem era a qualidade que ele tinha admirado mais. Estava assustado ao perceber neste momento, que uma prostituta humilde mostrou mais nervos que qualquer homem que ele conhecesse.

      Ele injetou um tom razoável na voz, reconhecendo que a violência nunca sucederia ou não sem que ele a prejudicasse de verdade. E o gabador desumano dele recuou ante tal idéia.

      Um grande vilão ele se provava neste drama.

      — Há uma refeição quente, um banho e algumas coisas necessárias esperando por nós, madame. Eu estou seguro de que você está tão ansiosa quanto eu em sair deste coche. Eu estou perfeitamente disposto a deixá-la aqui sob guarda, enquanto eu vou lá dentro. Mas advirto que você, nós, viajaremos o resto da noite e não vamos parar por qualquer razão.

      O duque sentia que ela ainda estava digerindo a informação. Finalmente, ela falou baixinho.

— Eu odeio ser amarrada.

      A consciência que ele desejava ter deixado em Londres com a casa extravagante da cidade dele e com os companheiros dissolutos o atormentava novamente. Ele lutou para embrulhá-la e jogá-la de volta para o coração preto dele, antes que lhe causasse mais problemas à frente.

      — Dê-me sua palavra que você não tentará escapar e você poderá ir livre. — Estranhamente, ele acreditou que ela manteria qualquer promessa que fizesse, apesar de que já o havia enganado e usado.

      — Eu não posso fazer isso —, ela disse tristemente.

      — Então me dê suas mãos. Eu não tenho nenhum desejo de coagi-la à submissão, mas eu vou, se tiver fazê-lo.

      — Muito bem.

      Ela esperou em quietude trêmula, enquanto ele amarrou as mãos dela e tornozelos. Apesar de sua conversa desafiante, ela estava amedrontada. Dessa vez, a consciência dele não somente atormentou, também protestou.

      — Você não quer me amordaçar também? — O tom zombador dela não fez nada para esconder a penúria dela.

      Ele manteve a voz fria.

— Se você continuar me atacando verbalmente, eu posso fazê-lo. Assim tenha cuidado.

      Ele sentou, lutando contra a compulsão de silenciá-la não com uma mordaça, mas com a boca. Quando ele se ajoelhou aos seus pés, o cheiro de provocação dela o volveu mais uma vez, um convite astuto para pegá-la nos braços e beijá-la novamente, então do beijo iria à satisfação completa.

      Os quebra-luzes de fora da carruagem ofereciam luz o bastante para ele ver as sobrancelhas dela se contraírem com confusão. Kylemore entendeu sua confusão diante da sua aparente concessão. Mas ela, sua amante geniosa, descobriria logo que nenhuma ajuda a esperaria para onde eles seguiriam ao anoitecer.

      Verity continuou sentada em silêncio, trêmula, depois que Kylemore a amarrou. De acordo com os comentários dele, ela adivinhou que eles iriam agora a uma hospedaria. Uma hospedaria que não era respeitável, onde mulheres seqüestradas não tinham chance alguma de revolta, não precisamente incomum em qualquer estrada do norte para Gretna Green.

      Mas quando a carruagem virou a estrada, e se viu ante um portão com dois postes esculpidos com a águia dourada dos Kinmurrie. Era muito escuro para ver qualquer coisa; a chuva tinha parado, mas o céu permanecia nublado. Os quebra-luzes da carruagem iluminaram arbustos grossos que cresciam ao longo da estrada. Para uma mulher que oscilava na beirada do pânico, a visão estava longe de ser tranqüilizadora.

      Eles pararam ante uma grande casa rural e um homem apressou-se para abrir a porta da carruagem.

— Bem-vindo, Sua Graça. Madame. Eu espero que sua viagem não tenha sido muito árdua.

      O homem tinha um sotaque escocês distinto. Seguramente eles não poderiam estar ao norte da fronteira. Os cavalos de Kylemore eram rápidos, mas eles precisariam voar para alcançar aquele feito.

      — Teve seus momentos —, Kylemore disse com um acesso de ira irritante de risada enquanto ele saia.

      Um rubor nas bochechas dela apareceu à lembrança deliberada de como ela tinha sucumbido a ele. Aquele derretimento ante o beijo manipulado violou-a de um certo modo, que nunca o sexo fizera ao ego dela. E pior, ela suspeitava que o atormentador dela sabia disso.

      O homem continuou.

— Tudo está preparado como você pediu.

      — Obrigado, Fergus.— Kylemore virou para o coche e alcançou Verity tomando-a em seus braços.

      Ele realizou a manobra desajeitada sem dificuldade. Ela queria menosprezá-lo como nada mais, além de um tirano grosseiro. Mas infelizmente, a destreza física do conde, impressionante como era, empalidecia em comparação à agilidade mental dele. Se ela tivesse que fazer um inimigo, pensou em um jato severo de humor, ela tinha escolhido um, pelo menos merecedor do nome.

      Debaixo do olhar impassível do criado de meia-idade, Kylemore segurou-a com mais firmeza contra ele. Quatro tochas iluminavam o círculo de entrada na frente da casa, assim ela viu o escocês olhar aos laços dela, então olhou para o nada sem mudar a expressão.

      Não haveria nenhum salvamento daquele lado. Nenhuma maravilha por Kylemore não a ter amordaçado. Ela poderia gritar até ficar rouca de tanto gritar, que Fergus sequer lançaria um olhar a ela.

      Os braços do duque estavam mornos e seguros ao redor dela e, de forma intolerável, lembrou-a de como ele a tinha segurado quando a beijou. Embora soubesse que não seria conveniente, Verity endureceu o corpo, tornando mais difícil para ele carregá-la.

      — Pare —, ele disse nitidamente, trocando a forma de carregá-la. Maldito, ele não soou nem ofegante, enquanto subia as escadarias largas até a porta principal da casa.

      — Eu não vou me importar, se você me deixar cair —, ela disse desafiadoramente. O ar fresco e a liberdade da carruagem juntamente com suas recordações penetrantes de como eles tinham se beijado, combinavam-se para que seu espírito sentisse um novo despertar.

      — Palavras valentes, mas eu duvido que você apreciaria ser ferida no mármore duro e frio. — A firmeza do tórax dele apertou o lado dela quando ele a estreitou em seu peito.

      Nessa distância, ele parecia grande, cruel e poderoso. Mas ele cheirava como paixão, prazer e paz. Diabo o levasse por tê-la beijado. Ela começou a lutar, mas estando atada, não lhe permitia muito espaço para o movimento.

      — Se você não se comportar, eu a colocarei sobre meu ombro.

      — O criado humilde de Sua Graça nunca buscaria tal honra —, ela disse acidamente.

      — Certo. — A exalação alta dele indicou uma irritação masculina infindável. — Se lembre, você pediu isto.

      Ele a colocou de pé, ainda amarrada e curvou-se para colocá-la em cima do ombro. Era exatamente como um trabalhador de fazenda erguia um saco de trigo. A imagem súbita da infância dela a manteve imóvel no momento em que Kylemore pegou-a para acomodá-la como um fardo desamparado. O cabelo solto dela caiu ao redor do rosto, em uma cortina preta enrolada. Ela empunhou as mãos oscilantes e fez uma tentativa ineficaz para golpeá-lo para que a deixasse ir.

      — Eu não pedi isto —, ela sufocou contra o casaco extrafino dele. Ela sentia os músculos poderosos das costas dele flexionando-se através da camisa, enquanto ele se movia.

      — Muito tarde —, ele disse, andando a passos largos para a porta que o criado segurava aberta.

      Kylemore era tão alto, que o chão parecia de fato muito distante. Ela tragou com uma combinação de terror e afronta. Não que ela pensasse que ele a deixaria cair. Os planos dele para feri-la não incluíam jogá-la ao chão.

      Eles estavam agora em um corredor iluminado pela luz das velas. Ladrilhos brancos e pretos elegantes substituíram o chão de mármore. Infelizmente, parecia igualmente duro e o padrão geométrico a atordoou enquanto ela o cruzava nos ombros do duque.

      — Bem-vindo, Sua Graça.

      Os cabelos caídos de Verity a impediram de ver a mulher que os cumprimentou.

      — Boa noite, Mary —, o duque disse tão urbanamente, como se ele estivesse em um baile em Mayfair e não carregando uma cativa, para sabe Deus aonde, a um canto obscuro do reino.

      Verity grunhiu e ziguezagueou para clarear a visão dela, mas era inútil. Ela estava humilhada por saber que sua Ancara e os seus tornozelos e panturrilhas expostos. Ela tentou chutar o duque, mas o braço dele permaneceu seguro nas coxas dela.

      — O quarto rosa foi preparado —, a mulher, também escocesa, disse. Ambos os criados soavam absurdamente calmos, considerando que o mestre deles trouxera num coche, uma mulher amarrada e claramente pouco disposta. Talvez eles estivessem acostumados a ajudar Sua Graça com seqüestros.

      — Excelente. Nós tomaremos banho. Então ceiaremos, eu acho.

      — Muito bem, Sua Graça. — Verity ouviu o criado se afastar quando o duque começou a dar mais alguns passos. Ela tentou chutá-lo para aliviar algumas das frustrações dela novamente.

      Ele retaliou depressa com um tapa em seu traseiro.

      — Ow! — Ela ziguezagueou em protesto, embora as saias e anáguas dela impedissem que ele de fato a machucasse. Não, o golpe tinha alfinetado apenas seu orgulho.

      — Fique quieta —, ele rosnou e começou a levá-la pelas escadarias, de modo que, do ponto de vista precário dela, parecia despreocupado.

      Até que ele a colocou em pé em um quarto luxuoso, ela se sentia desorientada e um pouco doente. Mas isso não a impediu de lutar.

      — Você realmente é um selvagem, não? — ela disse amargamente. Ela balançou a cabeça para retirar os cabelos dos olhos dela.

      — Apenas se lembre disso —, ele disse, não intimidado pelo insulto. — Aqui. — Impacientemente, ele a alcançou e alisou o cabelo dela para trás, então sorriu ironicamente quando ela o olhou. — Por que você não se senta? Há uma cama logo atrás de você. Seu banho não deve ser longo.

      — Eu prefiro ficar de pé. — Ela quase estava fora de seu juízo com a necessidade de contrariá-lo de qualquer modo que pudesse.

      Ele encolheu os ombros, pouco impressionado.

— Como desejar.

      Então incrivelmente, ele se virou para ir. Ela tinha esperado que ele ficasse e continuasse a atormentá-la. — Eu a acompanharei na ceia.

      No momento em que ela ficou só, jogou-se na cama. Como, ela suspeitava, maldito, ele sabia que ela o faria.

      Verity estudou cuidadosamente o quarto procurando um modo de escapar. Esta foi à primeira vez que ficava sozinha desde o seqüestro. Ela tinha que usar a oportunidade. Não que ela pudesse fazer muito agora mesmo, amarrada como estava. Mas o duque tinha mencionado um banho e uma refeição. Seguramente ele não a manteria amarrada por muito tempo, a não ser que ele pretendesse lavá-la e alimentá-la.

      Ela sentiu um calafrio, não, mais do que ela queria admitir, completamente desgostosa, ante a idéia dessas grandes mãos hábeis que ensaboariam o corpo nu dela.

      A vila em Kensington ostentava o mais moderno dos banheiros. Ela e Kylemore tinham explorado o potencial sensual do quarto em várias ocasiões. Sua respiração parou na garganta, quando ela se lembrou da sensação do seu corpo molhado e nu deslizando contra o dele, enquanto a água morna fazia ondas ao redor deles.

      Mas aquela era Soraya. Agora ela era Verity. E a alma rigorosa de Verity não carregava tais prazeres decadentes.

      Para se distrair de recordações que ameaçaram provar uma fraqueza desastrosa, uma fraqueza que ela estava determinada a dominar ou morrer tentando, ela voltou a inspecionar o quarto. Era grande e confortável, com um papel de parede delicado, rosa-padronizado. Mobília de mogno. Uma cornija de lareira, elaboradamente esculpida sobre uma grelha. Cortinas de brocado cobriam as duas janelas.

      Tudo desconcertantemente normal, pelo menos para os ricos. A própria criança que ela fora, teria ficado estupefata com o maravilhoso tapete grosso padronizado e os lençóis de seda na cama, mas a mulher que ela tinha se tornado reconhecia o ambiente como nada excepcional, um quarto para a filha da casa talvez.

      Ela deveria ser grata a Kylemore por não tê-la jogado no porão. Tinha sido uma possibilidade distinta. Ele estava determinado a humilhá-la, afinal de contas.

      Talvez ele tenha escolhido este quarto com um propósito mais específico. Talvez ele pretenda aliviar o desejo dele por ela nesta colcha rosa, antes de voltarem a viajar. Ele tinha dito que não a tocaria, mas ela não confiou na palavra dele, especialmente quando todo seu gesto proclamava a fome dele por ela.

      Ela tremeu nos laços, apavorada com o que ele faria com ela, apavorada se corresponderia tão descuidadamente, quanto àquele beijo deslumbrante. Então que esperança ela teria em prevalecer contra ele?

      Ele exigiu aquele beijo para escarnecer e atormentá-la, e, que Deus a ajudasse, assim o fez. Quando ele a seqüestrou, ela teria rido, se qualquer um tivesse sugerido que o duque tinha qualquer poder sexual sobre ela. Agora, ela sabia o quão fácil ele poderia tê-la na cama e o conhecimento disso a encheu de um medo irritante.

      A porta robusta que Kylemore tinha fechado atrás dele - ela já tinha considerado e tinha descartado aquela particular via de escape - abriu. Fergus e um jovem musculoso puxavam uma banheira. Uma mulher que ela assumiu ser a Mary que lhes deu boas-vindas escada abaixo e os seguiu, levando sabões e uma pilha de toalhas.

      A porta aberta atrás deles acenou, mas amarrada como estava, não havia nenhum meio de escapar. Ainda.

      Ela assistiu silenciosamente como os três criados, um que era claramente o filho de Fergus, se a aparência amarelada dele e a mandíbula quadrada fossem qualquer indicação, encheram a banheira. O quarto se encheu agradavelmente com perfume, como se o papel de parede realmente florescesse com massas de botões de rosas. O doce perfume emprestou um ar destonante de inocência à provação dela.

      Ela esperou Kylemore reaparecer, mas quando a porta finalmente fechou, só Mary permaneceu. Quando a mulher veio para ela, Verity refletiu que com os olhos azuis amáveis dela e cabelo acinzentado desalinhado, ela fazia uma cúmplice criminal improvável.

      Suavemente, ela desamarrou as cordas ao redor dos pulsos de Verity.

— Eu sou Mary Macleish, a esposa de Fergus e a governanta aqui. Permita que eu a ajude, madame —, ela disse em um - r - áspero junto com o escocês macio.

      Ela endereçou a Verity o mesmo título francês que Fergus tinha usado na chegada deles. O que era mais condizente com uma amante fugitiva, do que qualquer coisa, ela supôs. O inglês da palavra equivalente, minha dama, era comicamente impróprio.

      Quando ela se ajoelhou para libertar os tornozelos de Verity, algo nas características cuidadosamente controladas da mulher indicou censura. Sabendo que a chance dela para fazer um aliado poderia terminar a qualquer segundo com a chegada de Kylemore, Verity reuniu coragem para falar.

      — O duque me seqüestrou. Eu estou aqui contra minha vontade. Por favor, você tem que me ajudar a escapar —, ela disse urgentemente em uma baixa voz.

      Ela duvidou que o duque se rebaixaria a escutar em buracos de fechadura. Mas quem saberia? Ela nunca o teria imaginado seqüestrando ninguém também.

      As mãos ocupadas da mulher pausaram, então ela retomou removendo os sapatos de Verity e as meia-calças.

— Minha família e eu devemos tudo a Sua Graça. Eu sinto muito pela sua condição, madame, mas eu, verdadeiramente, não posso acreditar que o duque queira realmente te machucar. — Mary se levantou. Ela manteve os olhos dela abaixados, como se não pudesse agüentar ser testemunha de ver Verity sofrendo, pois, se ela se envolvesse, ela teria que fazer algo sobre isto. — Eu a ajudarei a tirar o seu vestido.

      — Mas ele quer me fazer dano. Ele disse isso. Você viu como ele me trata. — Verity olhou para aquela face impassível. Freneticamente, ela se inclinou para frente e agarrou o pulso de Mary com as mãos recentemente soltas. — Por favor, eu imploro. Me ajude! Pelo amor de Deus, você tem que me ajudar.

      — Não há nenhuma necessidade de dizer o nome de Deus em vão —, Mary disse com mais desaprovação, do que seu ortodoxo rival Kylemore, que estava escada abaixo.

— Eu lhe falei eu nunca poderia ir contra o duque.

      Verity podia ver que, por muito que a criada estivesse preocupada, nada mais deveria ser dito. Mas ela não podia se render, não quando este poderia ser o único momento dela longe de seu carcereiro. A emoção fez com que sua voz tremesse.

— Ele me amarrou. Ele me roubou para longe da minha família. Ele está ameaçando me estuprar. Seguramente, você como mulher...

      Mary olhou nervosamente para o lado, como se Kylemore pudesse aparecer do ar e enviar a bagagem dela sem uma referência.

— Eu não ouvirei nada contra ele, madame. Sua Graça salvou minha família inteira da pobreza e da fome. Não há um Macleish nesta casa que não morreria por ele. — Dessa vez quando ela olhou para Verity, os olhos dela continham uma simpatia genuína. — Eu realmente sinto muito que você esteja passando por isso, mas eu não posso ajudar. Agora, por favor, se levante e eu a ajudarei com seu banho.

      — Se você não me ajudar a escapar, você será tão culpada quanto seu mestre —, Verity disse causticamente, embora já soubesse que estava desperdiçando seu tempo. A mulher era cegamente dedicada a Kylemore e nada poderia subornar a lealdade dela.

      Um rubor penoso avermelhou a face de Mary.

— Isso é como pode parrecerr, madame. Mas eu... eu não possa ajudarr. Eu não sei mais o que te dizerr.— Na angústia crescente dela, seu sotaque escocês se tornou mais forte. — Porr favorr, não me peça para falarr mal de Sua Graça.

      Uma frustração furiosa subiu para sufocar Verity e muito desgostosa com mulher, ela retirou a mão dela que desabotoava a frente do seu vestido preto.

      Ela estava sozinha. Novamente. — Deixe-me —, ela disse de modo chato.

      Mary pareceu preocupada. — Sua Graça me disse que a assistisse.

      — Então me assista me concedendo privacidade —, Verity estalou.

      A mulher curvou a cabeça em relutante reconhecimento.

— Muito bem. Mas eu ficarei perto da porta no caso de você precisar de mim.

      No caso de eu me transformar em um bolo de fumaça e flutuar através do buraco da fechadura, Verity pensou amargamente. Mary partiu com os ombros curvados em pesar, mas isso não a impediu de fechar a porta com firmeza atrás dela.

      Verity tratou de suas necessidades mais imediatas, então lançou as cortinas para os lados das janelas. Após abri-las, começou a investigar o lado de fora. A luz do quarto se refletiu lá fora, permitindo-lhe avaliar as chances de adotar este modo de fuga.

      Nada bom, ela decidiu desoladamente. Ela estava a dois andares do chão e nenhuma árvore conveniente crescia perto da casa. Se ela saltasse, quebraria o pescoço, o que oferecia uma solução para seus problemas - ela supôs.

      Então, apoiou-se para fora, procurando um cano de esgoto, uma sacada ou borda, mas o edifício fazia jus à pureza de suas origens de Palladian e era totalmente limpo de decorações sem sentido. Verity desejou saber se teria tempo para amarrar os lençóis de cama e fazer uma corda, antes que alguém entrasse no quarto.

      — Nem mesmo pense nisto. — O duque passeou no quadrado de luz debaixo da janela dela e ergueu um charuto para os lábios.

      — Eu estava apenas...— ela começou nervosamente. A última coisa que queria era que ele invadisse sua preciosa privacidade por suspeitar dos planos dela.

      Ele riu suavemente e exalou uma nuvem de fumaça. O cheiro de tabaco bom se elevou até ela, misturado com o frescor do jardim úmido. — Eu sei o que você “apenas” estava fazendo. Vá e tome banho. Eu não me arriscarei a perdê-la tão cedo no jogo. Isso realmente seria um esporte infeliz.

      Ele falou como se apreciasse vê-la brigar contra a rede que havia tecido ao redor dela. A repugnância surgiu tão fortemente nela, que ela teria atirado nele naquele momento, se tivesse uma pistola.

      — Eu estou contente por divertir Sua Graça tão poderosamente. — A voz dela gotejou sarcasmo.

      — Oh, eu também —, ele disse ligeiramente. — E pensar que o entretenimento está só começado.

      Infantilmente, a única resposta dela foi bater a janela, trancando-a.

      Quando Kylemore entrou no quarto rosa, ele achou sua amante mais uma vez vestida como uma viúva virtuosa. O vestido preto estava abotoado até o pescoço e o cabelo dela havia sido penteado num nó severo. Uma expressão proibitiva escureceu os olhos prateados dela. Claramente, desejou que o duque acreditasse que ela fosse imune aos ardis dele.

      Infelizmente para ela, ele ainda não tinha nem começado a exercitar seus ardis.

      De todas as reações que ele tinha esperado sentir durante essa louca fuga - raiva, ódio, satisfação - não tinha esperado sentir essa alegria furiosa. Só a visão de Soraya sentada ante o crepitar do fogo, rebelde e pronta para rosnar para ele sob seu conhecimento, alegrou-o como nada há meses.

      Ele realmente era tão lunático quanto os antepassados dele.

      O duque sentou-se à mesa, frente a ela, e verteu vinho tinto para ambos. De uma cômoda perto, um banquete coberto pelas louças exalava cheiros tentadores. Claro que nada o aborrecia e observou a linda mulher que fazia carranca para ele como se quisesse matá-lo.

      Ela provavelmente o faria, ele pensou com um mental encolher de ombros.

      — Eu deveria remover aquela faca de seu alcance? — ele perguntou preguiçosamente. Encostando-se, levou o copo aos lábios.

      Verity olhou para baixo com surpresa e ele percebeu que ela não havia pensado em usar os talheres como armas. Mais uma vez, ele suspeitou que ela, no fundo, era uma criatura suave ou pelo menos mais suave do que queria que o mundo percebesse.

      Suave? Ha! Esta era a mulher que o tinha usado e traído sem hesitar um momento. Ela poderia se assegurar em uma cova de víboras. Ele não devia deixar a beleza dela enganá-lo, fazendo-o acreditar que ela não era mais do que uma jade ávida.

      Embora, por Deus, ela era linda, até mesmo num vestido impróprio e com aquele penteado desfavorável. Sua rigidez enfatizava o rosto oval perfeito, a claridade dos olhos notáveis e a abundância macia da sua deliciosa boca.

      Sua boca.... realmente deliciosa....

      Ele desviou os olhar, antes que o pensamento de beijar aquela boca o dominasse. Novamente, o duque teve que se lembrar de que ele não a raptara para ser seduzido por ela. Ele a tinha raptado para mostrar-lhe que não se pode fazer de bobo o Duque de Kylemore, sem pagar o preço pela traição.

      Ele ficou de pé, em parte para não tocá-la. — Devo servi-la? Mary é uma excelente cozinheira.

      Surpreendentemente, aquela maldita boca suculenta se tornou amarga.

— O prisioneiro condenado pode comer uma refeição amável?

      Ele começou a encher o prato dela. — Você pode enfrentar seu destino de estômago vazio, se preferir.

      — Não —, ela disse. — Eu prefiro manter minha força.

      Ele riu suavemente. Ele queria que ela mantivesse sua força também, mas para um propósito completamente diferente. Ele deslizou um prato abarrotado na frente dela e voltou para se servir.

      Retificando sua palavra, ela comeu tudo que foi colocado diante dela. Ele notou, entretanto, que ela bebeu com cautela. Claramente, ela estava determinada a se manter com as faculdades mentais desanuviadas do álcool. Ele poderia ter dito a Verity que tinha desperdiçado seu tempo planejando uma fuga. Uma vez que havia conseguido pegá-la, ele pretendia mantê-la.

      — O vestido não a agradou? — Ele indicou vários artigos de vestuário vermelho-vivos espalhados pela cama. Ele tinha enviado isto para cima pela Mary, para que sua amante usasse depois do banho.

      Era exatamente um vestido para Soraya: estiloso, extravagante e sutilmente exótico. Ele tinha escolhido isto com grande prazer na modista, que regularmente provia o guarda-roupa de sua amante. Ele teve ainda mais prazer ao imaginar-se tirando lentamente o vestido, revelando o corpo deleitável de Soraya.

      — Não, eu prefiro usar minha própria roupa. — Ela sequer olhou para o extravagante vestuário.

      Estranhamente, ele teve que concordar que o vestido era impróprio para a mulher que se sentava como uma tábua de madeira, com uma dura compostura frente a ele. Era o vestido de uma prostituta, embora um vestido de prostituta calamitosamente caro. Enquanto a falta de artificialidade de sua determinada companheira quase conseguia convencê-lo de que ela realmente era uma viúva pura.

      Mas claro que, ele sabia bem. A lembrança dessas tardes longas de pecado em Kensington contradiziam qualquer imagem de decoro que ela se esforçava para carregar agora.

Mais uma vez, a perturbadora idéia de que ela não era a mesma mulher que tinha sido, então penetrou a mente dele. E pela primeira vez, ele pensou nela como Verity, antes de pensar nela como Soraya.

      — Você se achará horrível nesses trapos pretos, antes que nós tenhamos terminado —, ele disse. — E qual seria o propósito desse pequeno desafio?

      Ela mexeu a cabeça e não respondeu, mas ele sabia que ela havia entendido. Cada acordo era outro passo na estrada para a derrota final. E ela nem desconfiava que já estava nesta inexorável estrada. Ou talvez ela soubesse.

      Ele ficou de pé e notou que ela recuava rapidamente surpresa. Algum demônio fez com que ele se movesse, até ficar atrás dela e colocar suas mãos nos ombros dela. Ela gritou com ele, e então sentiu o desejo dela de empurrá-lo para longe.

      — Você prometeu que não me tocaria —, ela disse nitidamente.

      — Uma oferta que eu decidi ser um engano —, ele disse suavemente. Ele firmou os dedos em cima dos ossos esbeltos dela, enquanto testava sua fragilidade e força.

      — Eu não o deixarei fazer isto! — ela gritou. Torcendo-se para se livrar do agarre dele, ela mergulhou desajeitadamente para os ferro do fogo. Foi à primeira ação desajeitada que ele alguma vez a tinha visto fazer. — Eu o matarei, antes que o deixe me levar novamente —, ela arquejou, enquanto elevava o atiçador. A face primorosa dela estava branca pela tensão.

      Sem sair de onde se encontrava, atrás da cadeira dela, ele escarneceu.

— Não seja uma boba, Verity. O que vai você fazer? Bater até que meus miolos saiam?

      — Se eu tiver que fazê-lo, sim —, ela disse. Os peitos perfeitos dela se levantavam debaixo do bombazine (tecido de algodão que imita a seda) preto e alguns fios de cabelo soltaram-se do penteado severo, tocando suas bochechas.

      O desafio dela não era uma surpresa. Afinal de contas, ele a tinha irritado desde o seqüestro.

      — Você sabe que eu posso tirar esse atiçador de você num piscar de olhos.

      — Você pode tentar —, ela disse inseguramente.

      — Abaixe isso. Você não acertará nada, a não ser o meu desgosto. — Ele pisou para ela e estendeu a mão em um gesto de comando. A voz dele ficou mais dura quando continuou. — E considerando que você está completamente à minha mercê, isso poderia ser insensato. Até agora, eu fui notavelmente contido em minhas ações. As coisas poderiam ser muito, muito piores.

      — Você não me amedronta.

      — Bem, deveria —, ele murmurou, começando a rodeá-la.

      O atiçador permanecia em pé e ele não duvidava que ela pretendesse usá-lo. Ele supôs que deveria estar nervoso enfrentando esta valquíria furiosa brandando uma clava de ferro, mas ao contrário, ele se sentia mais vivo do que estivera em três longos meses.

      — Eu nunca deveria ter confiado em você —, ela disse, rodando para poder mantê-lo sobre sua vista.

      — Não finja que alguma vez você o fez —, ele disse suavemente e com pesar inesperadamente genuíno.

      A resposta dele deve tê-la confundido, porque ela franziu as sobrancelhas e por um momento esqueceu de olhá-lo nos olhos. Suavemente, ele se abaixou ao redor dela. Com facilidade, ele evitou o atiçador que ela mirou um pouco tarde para sua cabeça. Agarrando os braços dela por trás, o duque deixou-a de costas contra ele.

      — Solte-me, seu patife infrator!

      Ele ignorou o insulto dela e desejou que pudesse ignorar quão morna ela era. Ela estava tão perto que ele podia senti-la tremer. O medo espreitava muito perto da aparência de resistência dela. Ele entendeu isso imediatamente.

— Solte isto, Verity.

      Ela lutou no aperto dele. — Não, seu bastardo!

      — Tut, tut, que língua. — O aperto dele deslizou até o pulso dela e ficou bem perto da dor. — Dê-me ou terei que machucá-la.

      Algo na voz dele tê-la convencido porque, com uma exalação desesperadora, ela derrubou a arma provisória e esta caiu com um som seco no tapete, aos pés deles.

      Ele a virou para que ela pudesse encará-lo de frente.

— Isto é um absurdo —, ele disse suavemente. — Qualquer um pensaria que você é uma virgem amedrontada. E você tem que saber que eu sou o último homem na terra que cairia nessa farsa. Durante um ano, eu a tive de todos os modos. Que segredos seu corpo ainda pode ter guardado de mim?

      Os olhos dela estavam desolados com a derrota e uma linha mal-humorada transparecia em sua boca.

— Eu não sou mais sua amante —, ela disse estupidamente.

      Kylemore arremessou-a fora com uma exclamação de desgosto.

— Se nós não tivéssemos que continuar a viagem, eu demonstraria quão falso isso é.

      Ela franziu a sobrancelha em óbvia confusão.

— Continuar viagem? — ela perguntou depois de uma pausa carregada.

      — Sim. Eu lhe falei na carruagem que nós seguiríamos para o norte sem demora. — Ele falou sobre o ombro, enquanto saía do quarto. — Eu voltarei em meia hora. Use seu tempo para decidir que meio é o modo mais seguro para proceder.

      A consciência deprimente de ter fracassado e o conhecimento mais irritante de que ela tinha se comportado como uma tola, acompanhou Verity enquanto Kylemore a escoltava de volta à carruagem, meia hora mais tarde.

      Alto, pensativo, estranhamente quieto, ele espiou ao lado dela enquanto eles deixavam o quarto rosa e desciam as escadarias. Ela não tinha nenhuma idéia do que ele estava pensando por trás daquela máscara aristocrática de arrogância. Depois do ataque dela, Verity supôs que ele deveria estar encolerizado. Sua mão grande segurou-lhe o braço com um aperto implacável, indicando-lhe que ele não tinha nenhuma intenção de deixá-la ir, até que tivesse saciado sua cruel vingança..., até que se sentisse satisfeito.

      O que ela tinha esperado alcançar com aquela atitude exagerada com o atiçador? A fúria de uma mulher nunca amedrontaria o duque. Ela tinha tido tanto medo sobre a possibilidade dele violá-la naquela cama de brocado que o medo tinha desordenado toda a razão dela.

      Se ela fosse levada a assassiná-lo, seria enforcada – o que colocaria um final permanente para os planos a longo prazo dela e qualquer coisa que Kylemore inventasse. Se Verity o prejudicasse, ela só o faria ficar mais bravo do que ele já estava, esta verdade machucou-lhe o coração. E mesmo que ele cansasse dela, nada, exceto a morte, poderia terminar com esta perseguição.

      Desde o princípio, ela fatalmente interpretara mal os verdadeiros sentimentos que o duque tinha sobre ela. Em Londres, ela tinha assumido que ele a quisera porque ganhando a notória Soraya, complementaria o prestígio dele. O contato íntimo de um ano com o duque a tinha ensinado que ele taxava sua posição realmente alta no mundo.

      Mas agora ela olhou para trás e teve uma visão muito diferente dos seis anos de perseguição e da fortuna que ele tinha pagado para ganhá-la: a obsessão do Duque de Kylemore por ela.

      Ela tinha ouvido rumores da loucura em Kinmurries nos primeiros dias dela na capital. Ela sempre tinha considerado a conversa como fofoca demasiado floreada. Até agora.

      Ela tremeu, mais amedrontada do que alguma vez estivera na vida. Pior, ele era perceptivo o bastante para notar seu terror e usar isto contra ela.

      Quando eles estavam fora do solar, ela viu porque ele não a tinha amarrado novamente. Macleishes cercou-a. As expressões fixas deles indicavam que eles não hesitariam em agir, se ela mostrasse o mais leve sinal de motim.

      Mas sua humilhação no quarto rosa significava que os impulsos rebeldes a tinham abandonado temporariamente. Brigar contra a força física de Kylemore tinha sido um engano. Ela ainda se encolhia de medo da maneira fácil com que ele a tinha desarmado.

      Mais dois filhos de Macleish viajavam com o duque. Sem grande interesse, ela os assistiu subir próximo ao motorista. O grupo de carcereiros eram todos iguais. O único carcereiro que realmente importava era o homem poderoso que estava tão perto dela.

      Kylemore colocou-a no coche sem uma palavra. Ele a seguiu dentro, sentou-se oposto a ela, bateu no capô, e eles se foram. Ele não libertou o agarre proprietário do braço dela, até que eles tivessem ganhado velocidade.

      Como ela desejava ter controlado seu temperamento na casa. Agora ele estava mais cuidadoso que nunca para impedi-la de iludi-lo.

      Passou muito tempo, antes de Verity finalmente perguntar algo que a vinha intrigando desde a chegada deles no solar.

— Nós já chegamos à Escócia?

      O duque despertou de sua abstração. Ele não tinha falado desde que tinham começado a ir para o norte novamente, o que pareciam horas. Esperou que ele soasse hostil ou bravo, dado que ela há pouco tinha tentado esmagar o crânio dele, mas ele falou com a tranqüilidade gentil habitual dele.

      — Não. Nós ainda estamos em Yorkshire. Por quê?

      — Os Macleishes.

      — Eles são os vigias em Hinton Stacey. Eu só abro a casa algumas semanas no ano durante as caçadas. Caso contrário, os Macleishes cuidam disto para mim.

      — Eles parecem notavelmente dedicados a você —, ela disse acidamente. A arma de fogo automática de Mary Macleish e o elogio sincero do duque a tinham chocado e desnorteado. A mulher tinha descrito alguém que Verity não reconhecia.

      Pela luz dos quebra-luzes da carruagem, ela viu a luz bruxuleante de um sorriso cínico dele.

— Eles sabem de qual lado é untado com manteiga o pão deles.

      Mas Verity pensou que era mais que isso. Os Macleishes tratavam o duque como um herói. Ele escondeu um homem melhor dentro de si do que aquele que deixou o mundo ver? E aquele homem melhor cederia na indagação dele para retribuir contra sua amante?

      Infelizmente, ela duvidou disto.

      Ele se inclinou e pegou as mãos dela.

— Nós dois precisamos dormir. — Ele atou as mãos dela juntas e amarrou um fim da corda no próprio pulso.

      Verity estava muito cansada e desanimada para protestar. O que conseguiria de qualquer maneira? O duque faria o que quisesse com ela. Essa era a realidade não envernizada de ser cativa dele.

     

      Depois de quatro dias na estrada, Verity viu sua curta permanência em Hinton Stacey com uma nostalgia que ela nunca teria acreditado possível. Ela não tomou mais nenhum banho perfumado, mais nenhuma refeição recém-preparada foi servida na boa porcelana que vira à luz de velas. E quanto a grande cama que a tinha aterrorizado, a ponto de atacar seu raptor, estava comicamente longe dos momentos de sono que ela suportou naquela viagem infinita.

      Eles viajaram dia e noite. O ódio dela cresceu pelo constante ruído e movimento da carruagem quase tão intensamente quanto o ódio dela por Kylemore.

      Kylemore, que não a tocou, mas que desejava que cada momento entre eles fosse tão afiado e cortante quanto uma faca nova. Kylemore, com os nervos férreos, a indiferença e a eterna vigilância dele. Até mesmo quando ela ia se aliviar em alguma moita isolada, ele e os cúmplices dele patrulhavam a área ao alcance da voz.

      Era mortificante. Era enfurecedor. Era claramente destinado a quebrar o espírito dela.

      O espírito de Verity Ashton era mais duro de quebrar do que de outros. Ela se recusava a sucumbir à fraqueza, à fadiga ou à ansiedade. Odiar Kylemore com todo fragmento do seu ser dava-lhe forças para suportar.

      O bastante de Soraya restou para ela considerar subverter um dos Macleishes. O menino mais jovem que ela achava ter mais ou menos dezesseis anos, lançando olhares admiradores e tímidos na direção dela quando ele sabia que ninguém estava olhando.

      Mas à parte dela, que se lembrava de ter trabalhado como criada, se revoltou ante a perspectiva de destruir o meio de sustento de alguém para seus próprios propósitos. Os Macleishes estavam auxiliando em um crime, mas eles eram só os ajudantes do Diabo. A culpa se destinava ao mestre deles. Tal criança não merecia enfrentar a destituição por causa de sua lealdade para um mau empregador.

      Ela tinha esperado que algum rústico Lancelot poderia aparecer e salvá-la quando eles trocassem os cavalos, mas Kylemore tapava sua boca com a mão toda vez que eles paravam. E ele sempre enviava alguém na frente para fazer os arranjos, assim as mudanças aconteciam suavemente, e com uma notável velocidade.

      Na quarta noite, eles acamparam na cabana de um arrendatário que estava abandonada. Verity estava tão cansada do ruído do transporte duro, que ela não questionou esta mudança na rotina pesada deles.

      Eles tinham cruzado a fronteira há um dia, e a cada milha, as estradas pioravam. Hoje, a carruagem tinha balançado e tinha batido tão violentamente, que ela estava surpresa que nenhum dos dentes dela tivesse tremido até terem se soltado.

      Enquanto a escuridão se aproximava, ela se sentou nos tapetes da carruagem, que os Macleishes tinham esparramado para o conforto dela no chão gramado. Ela assistiu silenciosamente eles prepararem a refeição da noite. Bolos de aveia e arenque de sal novamente.

      Verity, você está amolecendo, ela disse a si mesma. Houve uma época em sua vida, que bolos de aveia e arenque teriam parecido um banquete. Mas sua própria repreensão não a impediu de pensar que ela venderia a alma dela por um banho quente e uma refeição que ela comesse com faca e garfo.

      Pelo menos o telhado estava inteiro e ela estava, misericordiosamente, seca. A temperatura tinha caído e uma chuva horrível caía lá fora. O vento úmido passava pelas janelas não lacradas e era uma desanimadora lembrança de quão norte eles tinham penetrado. Poderia ser agosto, mas ela tinha frio.

      Desejando saber onde Kylemore estava, ela foi para mais perto do fogo. Ele nunca a tinha deixado só e a tinha desamarrado antes. Ela não desperdiçou o que ainda tinha da energia fazendo planos de fuga. Até mesmo, se ela conseguisse se evadir dos Macleishes, onde ela poderia ir neste lugar improdutivo e despovoado? O que um lugar brutal como esta Escócia de Kylemore era?

      Ela ouviu vozes e o som de cavalos lá fora. O duque andou a passos largos para dentro, ele alisou para trás da testa o cabelo escuro à maneira mais determinada do que nunca. Ela o olhou ressentida. Até mesmo depois de sair da chuva, ele não parecia como se tivesse sido arrastado por uma cerca barrenta.

      Oh, não. Sua Graça tinha tirado proveito das habilidades de vale de seus lacaios. O linho de Sua Graça era branco e imaculado.

      Sua Graça fez com que quisesse gritar.

      — Andy e Angus chegaram. — Ele falou para os Macleishes. — Nós dormiremos aqui hoje à noite. Vocês podem levar o coche até o Castelo de Kylemore amanhã.

      Mais planos de viagem. Ela perdeu o interesse. Ela não sabia onde eles estavam. Ela não soube onde eles foram. Até mesmo se ela soubesse, a opinião dela era de nenhuma importância.

      Kylemore trouxe a refeição dela e sentou-se próximo, estirando as pernas calçadas com as botas longas para o fogo. Ela se acostumaria ao silêncio dele. Quando partiram Whitby, o humor dele tinha sido de escárnio e censura. Mas desde que ela o tinha ameaçado com o atiçador, ele quase não tinha lhe dirigido a palavra. Quão mais longa se tornava a viagem, mais ele se fechava em si próprio.

      Ela não se enganou em pensar que a falta de comunicação indicava que ele já não tinha mais desejo por ela. Ele tinha desejo, certo. Ele apenas não fez nada sobre isto. E a demora estava fazendo com que ficasse mais exasperada a cada momento.

      Por que ele apenas não a tomava? O que ele estava esperando? Certamente não o consentimento dela. Se ele preferia privacidade, seria bastante fácil enviar os Macleishes à frente, enquanto ele desfrutava do seu prazer.

      Quando eles tinham deixado Hinton Stacey, ela ficou segura que o duque pretendia usá-la sem demora. Aquele beijo apaixonado, lamentava mais do que ela pudesse falar, tinha feito nulo qualquer protesto dela. Mas, à parte de atá-la e desatá-la a ele, ele mal a tocara.

      Ela estava livre agora, mas sabia que ele a amarraria antes de dormirem. Verity alcançado tal estado de esgotamento, que ela já não podia emitir nem mesmo um murmúrio de objeção.

      Ela baixou a cabeça e começou a comer, embora apenas provasse a humilde comida. Estava tão cansada, que queria se deitar e nunca mais se mover novamente. Todos os ossos e músculos doíam. Talvez uma cama no chão proveria mais descanso, do que sentada no coche, mas ela duvidava disso. Sua carne doída sentia cada inchaço e buraco no chão embaixo dos tapetes.

      Dois recém-chegados se uniram ao redor do fogo - claramente, Andy e Angus, que Kylemore tinha mencionado.

      Então ela reconheceu os assassinos enormes que tinham ajudado tão eficazmente no seqüestro dela. O jantar dela caiu no chão quando ela se pôs sobre suas pernas, que tremeram depois tanto tempo na carruagem.

      — O que vocês fizeram com meu irmão? — ela chorou agudamente. — Diga-me o que vocês fizeram ao Ben.

      — Acalme-se, mulher!— Kylemore ficou de pé e logo estava atrás dela. Ele deslizou os braços ao redor da cintura dela, antes que ela pudesse se lançar aos dois homens.

      Como se uma criatura fraca como ela pudesse danificar essas duas montanhas. Embora ela adoraria fazê-lo. Sua raiva em ebulição fazia contraste com sua apatia anterior.

      — Deixe-me ir! — ela rosnou, enquanto lutava contra as mãos do duque que a prendiam.

      — Não tem nenhuma utilidade você ficar gritando para eles. Eles não sabem inglês.

      Kylemore se dirigiu aos homens e ela supôs que fosse Gaélico. Um deles respondeu prontamente, enquanto mantinha um olho incerto nela.

      — Seu irmão está bem. — A voz funda de Kylemore estrondeou perto da sua orelha. Ela tentou ignorar o cheiro limpo e masculino dele. Ele ainda cheirava como o ar livre, embora agora fosse um ar livre lavado e limpo pelo frescor da chuva. — Eles o libertaram na abadia e nos seguiram desde então.

      Verity renunciou a luta fútil. A experiência amarga dela lhe falou que ele só a deixaria ir quando ele quisesse.

      — Eles apenas o deixaram lá sem fazer-lhe mal? — ela perguntou, sem se importar em esconder sua desconfiança.

      Outra troca em Gaélico, antes que Kylemore lhe respondesse, ainda, condenada, sem se mover. A respiração dele esbarrou na bochecha dela e fez o sangue surgir quente em baixo da sua pele.

— Aparentemente.

      — Eu não acredito em você —, Verity disse friamente, abafando sua inquietante consciência sensual. — Ben viria atrás de mim.

      Mais Gaélico. Um estouro exasperante de risada masculina. Até mesmo o Macleishes mais jovem se uniu a eles. O sorriso de Kylemore era um flash de branco brilhante, enquanto ele a liberava e andou a frente dela, elegante, bonito, impenetrável.

      Como ela o odiou.

      — Eu estou seguro que ele teria vindo, se tivesse tido qualquer coisa com que pudesse se cobrir —, ele disse.

      A raiva surgiu tão forte, quanto esteve no momento em que ele a arrebatou dos cuidados de seu irmão, em Whitby.

      — Você, senhor, é um membro de uma raça bárbara —, ela disse com desprezo. — Todos vocês desgraçam o nome dos homens.

      O sorriso do duque congelou na face.

— Pelo menos nenhum de nós é um ladrão ou um mentiroso, madame —, ele disse na voz frígida, que sempre a cortava rapidamente. Era uma voz que ele nunca tinha usado quando falava com Soraya. Não até o dia em que ela tinha rejeitado a proposta de matrimônio dele.

      Ela elevou o queixo e lançou-lhe um olhar desdenhoso.

— Eu era uma prostituta honesta. Uma pena que nem você nem seus homens podem pôr reivindicação a tanta virtude como esta.

      Orgulhosamente, ela voltou ao canto. Encolhendo as pernas, ela fitou sem olhar para frente e tentou não assistir a alegria triunfante dos escoceses. Ela piscou as primeiras lágrimas que ela derramava, desde que esta provação tinha começado.

      Pobre Ben. Ele não sabia se ela estava viva ou morta. O coração dela se afligiu pela humilhação do irmão e a angústia dele quando não a achara. Não tinha passado despercebido para ela que Kylemore só usara estradas laterais. Nem que agora, eles estavam na selva, qualquer um acharia impossível achá-los.

O irmão dela era diligente e inteligente. Ele a acharia, se qualquer um pudesse. Como fez tantas vezes, desde que ela tinha deixado Whitby, a esperança delicada voltou e bateu a fraqueza dela.

Os carcereiros dela se divertiram até tarde ao redor da fogueira do acampamento, enquanto bebiam alguma bebida asquerosa, que os recém-chegados tinham trazido com eles. Verity sentou nos tapetes nas sombras, mas ela não se enganou que os homens, parecendo distraídos, pusessem a liberdade ao seu alcance. A cada movimento que ela fazia, os olhos frios e azuis de Kylemore se fixavam nela.

      O duque não participou da festança, embora ela estivesse surpresa com o nível de familiaridade dele com seus cúmplices. Ele nunca tinha sido um modelo de sociabilidade, mas ela o conhecia o bastante para reconhecer o laço forte que ele compartilhava com estes homens. Ela não pôde imaginar um grupo de criados ingleses que se comportassem com tal facilidade na presença do mestre aristocrático deles.

      Eventualmente, Kylemore deixou os companheiros dele e veio para onde ela estava. Na luz dourada, a expressão dele era ilegível. Qualquer licor que ele tivesse absorvido, não tinha feito nenhuma invasão no misterioso controle dele. Ela suprimiu um calafrio, que não tinha nada a ver com o ar frio e tudo com o que ele poderia querer dela.

      Ele ainda estaria bravo com o insulto dela? Ele pretendia castigá-la? Ela tinha aceitado há muito tempo que nenhum dos Macleishes interferiria se o duque a castigasse fisicamente. Em Londres, ele nunca a tinha maltratado. Aqui além dos alcances da civilização, quem sabe o que ele faria, se ela testasse o temperamento dele ao limite? Ele poderia matá-la. Às vezes, nesta viagem infinita, ela desejava que ele o fizesse.

      Ele se ajoelhou ante ela, numa pose que não tinha nada de súplica. — Dê-me suas mãos.

      O tom da voz dele não permitiria nenhuma argumentação. Silenciosamente e com um desprezo que ela queria que ele visse, ela obedeceu. Ela fez o melhor que podia para esconder o medo, assim como vinha fazendo, desde que ele reaparecera e interrompera a busca dela pelo anonimato. Uma pena que seu falso desafio não o enganara nem um pouco.

      Ele a atou, então amarrou o fim da corda ao redor do próprio pulso. O padrão era familiar, depois das noites na carruagem, quando ambos tinham dormido o que conseguiam sentados um em frente ao outro. Mas nesta noite, claro que, era diferente. Pela primeira vez, eles não viajavam durante a noite.

      Embora ela pensou que fosse improvável que ele a violasse na frente dos homens dele, ela não pôde deixar de sibilar.

— Lembre-se de sua promessa.

      A face dele permaneceu impassível.

— Não se preocupe. Você está segura o bastante por agora.

      Às vezes, ela desejava saber se era imaginação dela a chama de desejo dele, mas nesta ocasião ela não tinha nenhuma dúvida. A luxúria transbordava de todo o corpo dele.

      Estranho considerar que, enquanto ele era de várias maneiras como um quebra-cabeça para ela, ela nunca teve dificuldade de precisar o nível de excitação dele. Quando ela o tinha visto no abarrotado quarto de desenho de Sir Eldreth, soube imediatamente que ele a queria. Soubera antes mesmo de saber quem era ele.

      Verity desejava aos céus que ela nunca o tivesse conhecido.

      O duque se deitou, Verity se sentou o mais longe que conseguiu, mas no final, o esgotamento a fez se estender próximo a ele. Ele grunhiu cansativamente e arrastou um dos tapetes para cima para aquecê-los. Ela achou que ele iria puxá-la para seus braços, mas ele se deitou separado dela e fitou as vigas ásperas do telhado. Os homens pelo quarto se assentaram gradualmente. Tudo estava quieto, a não ser a chuva que tamborilava no telhado, quando Kylemore falou.

      — Não fixe suas esperanças em seu irmão para salvá-la.

      Verity não respondeu, mas moveu-se para longe dele, o máximo que a corda permitia. Infelizmente, não era longe o bastante para esquecer que ele estava lá.

     

      Verity despertou com um sentimento delicioso de calor e conforto. Estava escuro, mas de algum modo ela sabia que a noite já estava acabando. Para confirmar aquela impressão, o primeiro pássaro matutino chamou das árvores de fora da cabana.

      Os braços poderosos de Kylemore entrelaçavam-se ao redor dela e ele dormia pesado e ainda ao lado dela. O cheiro dele e seu calor a cercaram como um miasma sensual. Debaixo da manta que os cobria até cintura, ele tinha arremessado uma perna longa sobre a sua em uma reivindicação inconfundível de propriedade.

      Era muito para ela agüentar. Sufocando de afronta, ela lutou freneticamente para pôr alguma distância entre eles.

      Ele gemeu meio acordado.

— Jesus, mulher! O que é?

      — Solte-me! — ela disse em um sussurro feroz, perfurando-o de modo selvagem numa tentativa de se ver livre.

      Ele sentou e rapidamente trabalhou na corda que os prendia juntos.

— Maldição, Verity. Acalme-se —, ele estalou.

      Graças a Deus ele já não a apertava mais. Ela respirou profundamente pela primeira vez, desde que ela acordara.

— Amarre-me a qualquer outra coisa —, ela disse, ainda com um rastro da histeria. — Eu não quero dormir com você.

      — Você está sendo absurda —, ele disse em uma voz entediada, ajustando a corda nodosa.

      — Está tudo certo aí, Sua Graça? — Um dos meninos Macleish ergueu a cabeça e esfregou os olhos turvos na luz do fogo expirado.

      — Nada que eu não possa controlar. — Então um estouro curto de Gaélico fez o outro homem rir sonolento.

      Verity não teve nenhuma dificuldade em interpretar a diversão masculina deles, ante a tolice dela. Ela desejou que todo macho na terra fosse para o Inferno naquele momento. Com o lugar mais quente reservado para o demônio ao lado dela.

      Eventualmente, Kylemore endireitou os nós. Com um suspiro de resignação, ele deitou mais uma vez. Ela estava grata por notar que ele manteve um espaço entre eles desta vez.

      — Não me toque novamente! — ela disse veementemente, deitando-se de costas e fitando cegamente as sombras no telhado.

      — Como desejar, madame —, ele disse cansado. Ele rolou e voltou a dormir com velocidade aborrecida.

      Verity escutou a respiração calma de Kylemore, enquanto o coração dela batia com medo e insegurança. Como ela podia se aconchegar para ele com a confiança de uma criança? Ela o odiou. Ela o temeu. E se ela tivesse aprendido qualquer coisa, era nisso que ela tinha que constantemente estar em guarda. Desta vez, o desprezo dela focalizou-se somente na própria fraqueza dela, e não no libertino dormindo ao lado dela.

 

      A chuva parou antes de amanhecer e o dia prometeu ficar bonito. Verity estava próximo ao duque no sol incerto e assistiu o chacoalhar do detestado coche colina abaixo.

      — É este nosso destino final? — ela perguntou incredulamente. — Eu imaginei algo mais próprio à posição de Sua Graça.

      Ela saiu - sob a escolta dele, é claro - para se lavar num curso d’água atrás das ruínas. Agora ela achava o transporte deles os abandonando. Duvidosamente, ela olhou para a cabana prestes a cair. Estava inteira, mas dificilmente era luxuosa.

      — O coche não pode ir mais adiante nestas colinas. Agora nós vamos de pônei.— Ele gesticulou com uma mão elegante para um fio previamente amarrado de cavalo debaixo de uma árvore.

      Esta era a maior informação que ela tinha conseguido dele em dias.

— Mas você não disse que nós iríamos para o Castelo de Kylemore?

— Não. Eu disse que os Macleishes iriam. Minha casa não é nem perto de privada o bastante para o que eu pretendo. — A voz dele parou, como se percebesse que ele a tinha tratado brevemente como um ser humano da mesma categoria e agora tinha lamentado isto. Ele andou a passos largos para onde estavam Angus e Andy, aparentemente tudo restou da escolta deles, assim esperava.

      Ela cambaleou depois dele, enquanto arriscava outra seca réplica mordaz.

— Está tudo muito bem, com exceção de uma coisa.

      Ele se virou para ela. Uma impaciência doentia escondida sombreou o rosto anguloso dele e a face inteligente.

— Eu já te disse: o que você deseja não tem importância.

      Ela friccionou os dentes.

— Mas é de grande importância que eu não monto.

      O olhar em branco de assombro genuíno que perseguiu o aborrecimento dele, a teria feito rir em outras circunstâncias. Obviamente, o pensamento nunca tinha ocorrido a este descendente da aristocracia, que o mundo inteiro não foi lançado a um cavalo, antes mesmo que pudesse andar. Mas Verity nunca tinha montado. Ela tinha medo de cavalos, um legado de um acidente de infância quando um time de desenho do pai dela a tinha pisoteado.

      — Você aprenderá logo —, ele disse de modo chato depois de uma pausa. Deixou-a e foi em direção aos pôneis, como se o pronunciamento dele resolvesse o assunto. Quando ela não seguiu imediatamente, ele parou e virou a cabeça.

— Venha.

      — Não —, ela disse de mau humor.

      Nada na Terra - nobres perigosos com temperamentos incertos incluídos - a coagiriam a ficar perto dessas bestas assassinas e bufantes.

      Ele suspirou com irritação e espiou atrás na direção dela.

— Nós não podemos ficar aqui. Você tem que perceber isso. O coche se foi. Os pôneis são o único meio em que nós poderemos proceder.

      — Então eu caminharei.

      Ele lançou um olhar que falava à figura leve dela.

— Você desfaleceria a meio caminho da primeira colina.

      — Então me deixe aqui para morrer de fome —, ela estalou. — Isso deveria ser vingança o bastante para você.

      — Nem perto. — Ele falou ligeiramente, embora ela não tivesse nenhuma dúvida de que ele disse o que quis dizer.

      — Eu não vou montar.

      A mandíbula dele se firmou de um jeito que ela acharia amedrontador, se ela já não estivesse ante a perspectiva de montar num cavalo.

— Sim, você vai.

      Ela se moveu para o lado, mas não rapidamente o bastante. Ele pegou o pulso dela e a arrastou junto de si.

— Você não vai a lugar algum.

      Sem a libertar, ele baixou e a pegou nos braços. Ele não a tinha carregado, desde que eles tinham deixado Hinton Stacey. Por um momento, surpresa e recordações importunas de como ele a tinha beijado na carruagem a seguraram imóvel.

      Então ela começou a se mexer.

— Coloque-me no chão!

      Ele riu, condenado. — Comporte-se ou eu a lançarei novamente em cima do meu ombro. Nós não temos tempo para esta tolice. Se o tempo mudar, você pensará que nossa viagem até agora foi o paraíso em comparação.

      — Eu não monto! — ela protestou.

      — Agora você monta. — Ele pausou e lhe deu um olhar minucioso. — Você está tremendo como uma folha.

      Ela pensou ter visto preocupação nos olhos dele. Então ela dispensou a impressão, como um tipo de pensamento tendencioso que ela tinha abandonado com a castidade dela tantos anos atrás. Enfurecida com ela mesma, acrescentou rispidez extra à réplica.

— Claro que eu estou tremendo, seu grande tolo.

      Ele riu novamente, o tirano sem coração, confirmando que o momento breve de compaixão nunca tinha existido.

— Você está dando para Angus e Andy grande entretenimento. Eles estão convencidos de que todas as mulheres Sassenach são malucas.

      — Eu não me importo —, ela murmurou.

      Ela estava tremendo violentamente, até que Kylemore parou em frente ao pônei de dianteira. Apesar de tudo, ela se encolheu contra seu atormentador.

      — Por favor, Sua Graça, me coloque no chão. — Nem mesmo a orelha mais simpatizante ouviria qualquer coisa menos que um argumento choramingado nas palavras dela.

      Claro que ele não cedeu. Ele a tinha arrebatado da casa dela para torturá-la, afinal de contas.

      Ela se agüentou esperando pelo escárnio, mas ao invés, ele falou com uma firmeza quieta que penetrou o medo dela tão seguramente, quanto uma faca em uma manteiga macia.

— Eu pensei que você não tinha medo de nada, Verity.

      Eu tenho medo de você, ela admitiu desesperadoramente no coração dela, então ofegou quando ele a colocou sem cerimônia na sela para senhoras. Só com o maior esforço ela se impediu de gritar. Ela gelou trêmula.

      O cavalo não era grande, mas ela sentia vertigens por estar longe do chão. Então, respirou profundamente para controlar as náuseas que a perturbavam e apertou-se à sela para se equilibrar.

      — Angus! — Kylemore gritou ao gigante mais próximo, enquanto o cavalo mostrava todos os sinais de fuga debaixo de seu fardo desajeitado.

      O gigante agarrou as rédeas e falou ternamente com o demônio embaixo dela. Kylemore colocou as mãos enluvadas dele nos dois lados dela. A proximidade iminente dele derreteu a paralisia que a segurava imóvel e ela tentou sair.

      — Pare com isso —, ele disse suavemente, inclinando-se para mantê-la na sela. — Você amedrontará os cavalos.

      O desaforo dele penetrou o pânico difundido dela. Como ela o detestou. Terror e ódio lutaram para dominar a tremente alma dela. Se ela apenas tivesse arrancado a pistola dele em Whitby e tivesse atravessado uma bala no coração preto dele. Ela chicoteou a cabeça para olhar para ele.

      — Eu vou amedrontar os cavalos? — ela repetiu em afronta.

      — Sim. Eles são criaturas simples. Mulheres histéricas os enervam. — Firmemente, ele enganchou os pés dela nos estribos e ajustou o comprimento. Ele colocou uma mão na parte de trás dela para segurá-la na vertical. Ela tentou e falhou em ignorar o apoio morno.

— Você está tão dura quanto uma tábua. Relaxe.

      — Isso é fácil para você dizer—, ela disse ressentida enquanto permanecia tão firme quanto fosse possível.

      Em que ela se agarraria quando a maldita besta se movesse? Ela cairia e os cascos a esmagariam em pedaços. Ela fechou os olhos e engoliu outra onda de náusea.

      Kylemore suspirou e suavemente começou a acariciá-la. Todos os nervos no corpo dela se focalizaram nos círculos que a mão dele fez nas suas costas. Apesar dos tremores de medo que ruíam a armação dela, ela adotou uma pose mais natural.

      — Eu não posso levá-la comigo —, ele disse suavemente. — Meu pônei mal aguentará o meu peso. E a ida é muito dura e desigual para nós montarmos Tannasg.

      Ela sentiu que a cor deixava suas bochechas. Abrindo os olhos, ela olhou para Tannasg, o castrado cinza enorme do duque amarrado perto, que parecia pelo menos dez vezes maior que o habitante do inferno embaixo dela.

      Ele deve ter lido a expressão dela.

— Exatamente. Agora, seja valente. Nós continuaremos com os pôneis. — Com a mão livre dele, ele soltou os dedos dela da frente da sela e os colocou na juba grossa do animal. O pônei se mexeu impaciente debaixo dela.

      Kylemore sussurrou confianças em Gaélico ao cavalo. Ficou mortificada ao ouvir exatamente o mesmo tom que ele tinha usado para convencê-la a ficar na sela. Ela ficou ainda mais mortificada quando o animal provou da mesma maneira flexível que ela debaixo da persuasão dele.

      — Eu não posso fazer isto —, ela disse desigualmente.

      — Sim, você pode. Eu o conduzirei. Você estará bastante segura. Segure firme e reze, se isso a fizer sentir melhor.

      — Nada me fará sentir melhor —, ela disse com um rastro de enfado.

      Ele se esticou para tocar a bochecha dela. — Seja forte, Verity. Nunca lhe faltou coragem antes.

      A amizade descomplicada do gesto a surpreendeu tanto que levou alguns momentos para compreender algo ainda mais surpreendente. Ele acabara de elogiá-la em algo que nada tinha a ver com a beleza enfadonha de Soraya, mas tinha haver com as qualidades vigorosas de Verity.

E ele já não parecia pensar primeiro nela como Soraya e depois como Verity. Aquela voz funda tinha falado o nome dela sem hesitação.

      Até que ela voltasse a si depois daquela revelação surpreendente, a pequena caravana já tinha se posto em marcha e ela trilhou humildemente no rastro de Kylemore.

      A beleza era mais traiçoeira do que qualquer lâmina. Não importa o quanto Kylemore tentasse, ele não podia impedir o corte dentro do coração dele, fazendo escárnio da armadura que ele construíra durante anos de carência.

      Do lombo de seu pônei, ele olhou para as Highlands nas glória do fim de verão e tentou manter recordações de gritos de terror e miséria à distância. Mas elas oprimiram sua defesa em desmoronamento e possuiu sua alma. Ele fechou os olhos em angústia calada.

      Ele não tinha estado tão ao norte desde seus sete anos. Ele tinha esquecido do ar limpo, as cadeias infinitas de montanhas que desapareciam no azul, os céus largos, o vermelho dos frutos de rowan, a púrpura do urze, a música macia do correr de água. Ele tinha esquecido desta beleza indescritível tecida como uma linha rica dourada pela miséria da infância dele.

      Beleza.

      A única fraqueza que ele nunca conquistara até encontrar Soraya e ter caído vítima de uma fraqueza ainda maior. Embora originalmente, claro que, a beleza dela era o que o tinha puxado para ela e a própria destruição dele. Ele tinha olhado brevemente para ela, primorosa, perfeita, orgulhosa, através da sala de desenhos de Sir Eldreth e sabia que tinha que possuí-la e mantê-la dele para sempre.

      O que ele descobriu agora só aprofundou a fascinação insaciável dele. Estranho admitir que ele tinha aprendido mais sobre ela durante estes dias de viagem árdua, do que ele já teve quando ela jogava como amante cooperativa dele.

      Ele viria a perceber que Soraya era em muitas formas uma falsidade. Soraya era à vontade com o corpo deslumbrante dela e com o prazer sexual. Soraya era uma criatura viciada ao luxo que recuaria em horror às privações desta viagem. Soraya era eternamente complacente às demandas de um amante. Pedido uma palavra para definir sua amante, ele teria escolhido sibarita (pessoa devotada à luxúria e ao prazer).

      Por outro lado, Verity era feita de um material mais duro.

      Verity guardou sua castidade como um avaro vigiando o tesouro dele. Nada da sedutora amoleceu aquela alma intransigente. Toda vez que Kylemore a tocava, parecia que ela queria chorar. Ou morder e arranhá-lo como um gato selvagem. Soraya tinha mordido certamente e tinha arranhado em ocasiões, mas só como parte do repertório dela de jogos de amor.

      Verity tinha suportado a viagem sem reclamação. Quando ele partiria nesta migração, uma raia infantil nele tinha apreciado a idéia de sua amante lamentando e sutilizando o sofrimento. A fraqueza dela justificaria de alguma maneira como ele a tratou. Mas contra o julgamento dele, cada dia que passava, cresceu o respeito invejando dele para a mulher que ele tinha seqüestrado. Era um maldito inconveniente, mas ele não poderia fazer nada sobre isto.

      Ela levou tudo que ele dera a ela e ainda voltou lutando. Ele até achou uma diversão perversa percebendo que ela ficara mais próxima de quebrar não por causa de algo que ele fizera, mas pela perspectiva de andar a cavalo.

      Ele não queria respeitá-la, queria nutrir a raiva que o tinha enviado nesta precipitada busca. Ele queria a odiar como a tinha odiado em Londres, até mesmo enquanto ele não pudesse esquecer o quanto a queria a cada respiração.

      Meditativamente, ele inspecionou totalmente a paisagem magnífica que o cercava. Havia uma verdade nesta paisagem que pulverizava as decepções de seu ego sobre quão longe ele tinha ido do covarde choroso que uma vez fora. Ele nunca pretendera voltar ao local da agonia vergonhosa e do medo dele.

      De novo, estava óbvio que o que ele queria não contava. Ele só esperava que sua crueldade durasse. Talvez ele pudesse combater as lembranças de infância. Mas poderia ele combater contra a mulher que trilhava atrás dele, a face sem defeito dela, pálida, enquanto ela se agarrava ao pônei desajeitadamente?

Naquela noite, eles pararam em outra cabana deserta. Verity notou que não havia escassez de edifícios abandonados para abrigar viajantes. Vários edifícios, mas nenhum habitante. Eles não tinham encontrado uma alma durante todo o dia. Mesmo contando com o desejo do duque pelo segredo, isto parecia estranho.

      A zona rural ficava mais selvagem a cada milha. Yorkshire, onde ela cresceu, era mais áspero que o sul, mas estas colinas escocesas dramáticas e precipícios e lagos estavam fora da experiência dela. Ela suprimiu uma noção supersticiosa de que Kylemore a carregara para além de qualquer ajuda humana.

      Porém, uma coisa que ela estava segura – Ben não poderia localizá-la ali. A afirmação confiante de Kylemore de que o irmão dela nunca a acharia, estava completamente correta, condenado. O labirinto confuso de cumes e vales significava que ninguém teria chance em rastrear a festinha deles.

      O cavalo dela ainda a deixava nervosa, embora ela tivesse conseguido controlar isto depois de se moldar. Durante o longo dia na sela, tinha decidido que o papel principal da besta era como um instrumento quadrúpede de tortura. Ela gemeu e mexeu a anca dolorida, tentando achar uma posição mais confortável no chão. Havia um tapete debaixo dela, mas não ajudou muito.

      Kylemore cruzou o quarto e se sentou em seus quadris antes dela. Se ela já não o tivesse odiado, ela o odiaria agora. Como os rigores de viagem não o afetavam? Era antinatural. Ele não parecia cansado ou usado, embora algo lhe falou que a mente dele estava preocupada.

      Não que ela fosse ingênua o bastante para imaginar que ele se afligia com o que fez a ela. Não, qualquer outra coisa perturbava a calma vaidosa dele. Ela baniu qualquer curiosidade com um encolher de ombros. Por ela tudo bem que ele guardasse seus segredos.

      — Dolorida? — ele perguntou suavemente. Nas poucas ocasiões que ela tinha visto a expressão dele de dia, observara seu jeito rígido. Mas agora mesmo, se ela não o conhecesse, acreditaria que ele estava genuinamente preocupado com o conforto dela.

      Ela dispensou aquela conclusão insensata e lhe enviou um olhar fulminante.

— Você amaria que eu admitisse isso, não?

      Um sorriso lânguido chamejou pela face dele.

— Comporte-se ou eu não farei minha magia para que se sinta bem.

      Ela o inspecionou acidamente.

— Como você vai fazer isso? Atirando em mim?

      — Se tudo falhar, eu me lembrarei disso. — Ele virou a cabeça e falou em Gaélico. Os dois gigantes surgiram do canto onde eles sentaram, falando em baixos tons e deixaram a cabana para o duque e à cativa dele.

      O tempo tinha chegado. Finalmente depois de toda a preocupada espera, ele pretendia reafirmar os direitos dele de posse sob o corpo dela. Ela fora muito usada para chamar qualquer coisa mais que uma raiva sombria. Ela pensava que sobreviveria a isto, como tinha sobrevivido a todas as outras coisas. Depois de horas naquele cavalo miserável, ela já estava tão dolorida que provavelmente nem o sentiria batendo dentro dela.

      Mas sob a fadiga e o desafio sem sentido, seu coração lamentava em miséria.

      — Deite-se.

      — Isto não ajudará — ela disse sem tom, enquanto o obedecia.

      Qual era o ponto de lutar? Este momento tinha sido inevitável desde o princípio, e por todas as imposições de desafio dela, ela não queria que ele a machucasse.

      Ele riu brevemente.

— Senhorita Ashton, você tem uma mente sórdida e receosa. — Por uma vez, ela não sentia hostilidade. A mudança só aumentou o medo dela. Quando ele era amável, estava em seu mais perigoso aspecto.

      Ele começou a desenlaçar as botas dela. Ela não pôde despertar a vontade para afastá-lo. Ele a pegaria facilmente se ela tentasse correr com as pernas duras da equitação de um dia de alguém desacostumado.

      As mãos dele estavam frescas nas pernas nuas dela. Ela tinha enxaguado as meias-calças e elas adornavam um arbusto de espinheiro discreto lá fora. Ela enrijeceu. Talvez ela não estivesse totalmente acostumado ao destino dela como tinha pensado.

      — Relaxe, — ele murmurou — ou eu poderia esquecer minhas boas intenções.

      — Como se você tivesse alguma, — ela murmurou — Como se alguma vez a teve. Ohhh!

      Tudo que ela pretendia dizer desvaneceu em um longo suspiro de prazer quando esses dedos firmes começaram a moldar os músculos nos tornozelos dela.

      — Isso é o bastante —, ela se forçou a insistir eventualmente, embora pensou que se ele deixasse de tocá-la, ela lamentaria.

      — Em um minuto —, disse ele e ela não pôs nenhuma objeção.

      — Vire-se —, ele disse depois de um intervalo feliz.

      Sem pensar em protestar, ela virou sobre o estômago e ainda se deitou, quando ele subiu as saias dela para revelar suas pernas ao ar de noite. Por muito tempo, a cabana a luz de velas ficou quieta, com exceção da crepitação das chamas e o som do funcionamento das mãos dele na carne dela.

      Ela tinha flutuado em um mundo de prazer cansado, quando o sentiu alcançar embaixo dela para libertar a frente do vestido. Como os dedos dele roçavam os peitos dela, os instintos dela a cutucaram em uma enevoada cautela.

      — O que está fazendo? — ela perguntou roucamente.

      Ele arrastou o vestido dela abaixo, enquanto descobria os ombros, e apanhando os braços dela efetivamente.

— Eu estou seguro que suas costas estão tão doloridas quanto o resto de você — ele disse neutro.

      De fato, a anca dela tinha levado o pior castigo durante as horas naquele pedaço de ferro. Mas apesar do seu estado atual de exausta estupidez, ela sabia melhor que o convidar a tocar os traseiros dela. Até mesmo permitindo que ele esfregasse suas costas, era estar procurando por problemas.

      — Você deveria...

      Ele começou a misturar os ombros apertados dela. Ela levou um momento para se lembrar do que ela pretendia dizer.

— Você deveria parar agora. Eu me sinto melhor muito.

      Esses dedos diabolicamente competentes não pausaram. Ela tentou se dizer que não estava contente.

      — Você tem outro dia de montaria amanhã, Verity.

      — Oh.

      Ela supôs que já sabia disso. Claro que esta pobre ruína era só outro acampamento temporário. Mas na verdade, a mente entorpecida dela não tinha ido tão longe para registrar que mais tortura a cavalo a esperava. Ela fechou os olhos e deixou que as mãos curadoras do duque continuassem.

      Qual a finalidade de resistir? Ele sempre ganhava no fim.

      Ela tinha vagueado num torpor sonolento, quando o sentiu vestindo-a em decência e então, uma manta em cima dela.

      — Durma, Verity — ele disse suavemente.

      Ela se aconchegou no calor, enquanto desfrutava do relaxamento glorioso nos membros dela. Ela estava muito letárgica para se surpreender com o cuidado dele.

      — Obrigado —, ela sussurrou, mas ele já tinha ido.

      Só pela manhã percebeu que esta foi à primeira noite durante um purgatório infinito de uma viagem que ele não a tinha amarrado.

     

      No final da tarde do dia seguinte, eles pausaram em um precipício. O duque retrocedeu para Verity.

      — É para lá que estamos indo. — A voz funda dele soou até mais fria que o habitual.

      Talvez a viagem estivesse abalando até mesmo a paciência dele, finalmente. Hoje, ela tinha visto alguns pequenos rastros de um bom samaritano nele na noite anterior, com a condescendente bondade dele e suas mãos suaves.

      Ela estava da mesma maneira cansada e mal-humorada como tinha estado ontem, depois de um dia na sela. Era impossível despertar algum interesse onde eles pararam à noite. Ela jurou que ela nunca, depois disto, levaria os confortos mais prosaicos da vida como certos. Água morna. Roupas limpas. Uma refeição quente em uma mesa. Ela saborearia cada um destes luxos humildes e enviaria graças ao fabricante deles por provê-los.

      Quer dizer, se ela tivesse a chance de desfrutar novamente de tais prazeres.

      Sem hesitar, o pônei dela andou a passo lento para ficar ao lado de Kylemore. Verity olhou em cima da extremidade um vale como tantos ela já tinha visto. Bosques. Um fluxo de água abastecendo um grande lago, ilustre. Nenhum sinal de pessoas.

      Então ela percebeu que este vale não era exatamente igual aos outros. Este vale continha uma casa significativa ao redor com um agrupamento de outros edifícios. Além disso, uma casa em bom estado. Uma casa que estava até mesmo habitada, se a fumaça que vinha da chaminé fosse qualquer indicação.

      Ela esperou Kylemore dizer qualquer outra coisa, mas ele somente guiou o pônei dele sobre o caminho cume abaixo. A montaria dela, amarrada à sela dele, seguiu.

      A pequena e estranha caravana – um nobre, uma prostituta, dois gigantes, uma fila de pôneis cheios de pacote e um animal de puro sangue que valia mais que um pequeno estado – fizeram seu caminho abaixo. A promessa do duque de deixá-la só terminou, quando eles chegaram a casa, claramente a casa de caça que ele tinha mencionado há uma eternidade em Whitby.

      A exaustiva viagem acabara. Agora o real castigo dela começava.

 

      Kylemore guiou-os no remendo áspero da grama na frente da casa. Estranhamente, tudo era exatamente como ele se lembrava. Fora, depois de tantos anos a memória dele deveria estar jogando com ele, mas cada detalhe correspondia às totalmente lembranças dele.

      A criança escondida dentro dele desejou para correr e gritar. O nobre auto-suficiente que ele havia se tornado se sentaria no seu monte deselegante e esperaria por Angus para anunciar a chegada deles. Ele não olhou para Verity - talvez porque esses olhos cinzas perceptivos veriam muito se ele fizesse.

      — Sua Graça! — Hamish Macleish abriu a porta e correu para fora. — Sua Graça, eu não sabia que você chegaria hoje.

      Ao contrário a casa, Hamish tinha mudado. Quando eles tinham se encontrado na última vez, Hamish tinha sido um homem vigoroso no início da vida. Ele ainda era alto e reto, mas o cabelo dele era branco e vinte invernos severos tinham mudado a face dele em rochedos e linhas.

      — Sua Graça, venha para dentro para ficar fora do ar da noite. Sua senhora gostará de um bom fogo e uma xícara de chá, eu estou certo disso.

      — Seguramente —, Kylemore disse, desmontando e retrocedendo para Verity.

      De fato, a expressão dela indicou que esta senhorita provavelmente preferiria que dentro do chá tivesse misturado um pouco de cicuta (planta venenosa). Ele não precisava se preocupar com ela tentando adivinhar seus segredos pelo comportamento dele. Ela parecia muito petrificada para contemplar qualquer coisa além do destino que a espera nesta casa.

      Ele quisera esmagar o orgulho de Soraya. Agora ele não achava satisfação no silêncio de pavor dela.

      — Eu irei, pelo menos colocá-la lá dentro, antes de tê-la ao meu modo —, ele atirou por baixo da respiração, esperando que a irritação derretesse o medo congelado da face dela. Mas as mãos dele eram suaves quando ele a tirou da sela.

      Ela parecia apenas ouvi-lo, mas tremeu debaixo do aperto dele enquanto se equilibrava.

      Ele carranqueou. Qual era o problema com a moça atrevida, pelo amor de Deus? Ele sabia que ela estava com medo – ele tinha arranjado para que fosse assim. Mas não era como se ele planejasse fazer qualquer coisa a ela que ele já não tivesse feito antes. Ou ela imaginou que ele realmente pretendia machucá-la? Se ele quisesse assassiná-la, teria sido mais conveniente que o fizesse em Yorkshire.

      Enfurecido com Verity – fúria que parte dele reconhecia não ser culpa dela – carregou-a pela soleira da porta, enquanto a puxava para dentro. Havia um bom fogo realmente na sala de estar, como tinha prometido Hamish, e a mobília feia e antiquada estava exatamente onde esteve quando ele tinha sido um menino. Vinte anos tinham passado e o desenho da casa fora imprimido na mente dele como se os tormentos que passara ali tivessem acontecido ontem.

      Ele libertou Verity e avançou para ficar ao lado de uma poltrona volumosa de carvalho esculpida onde os criados tinham contido freqüentemente o pai dele com correias grossas de couro. Era a única cadeira na casa robusta o bastante para segurar o sexto duque quando a loucura dele surgia. Com uma respiração tremente, Kylemore baniu a imagem horrorosa do pai babando e gritando e chorando com as mãos atadas com longos dedos idêntica a sua próprio.

      Quando Kylemore partira como um gritante de sete anos, ele tinha jurado que nada em terra o faria voltar a este lugar. Ele não tinha contado com a paixão dele pela conivente garota de reputação duvidosa, que pairava indecisamente no tapete ante a grelha.

      Embora fosse difícil de enxergar a harpia avarenta das acusações dele na menina pálida, amedrontada ante ele. Difícil de enxergar a grande Soraya.

      O vestido preto impróprio dela estava usado, sujo e molhado. O belo cabelo dela, apesar dos seus esforços valorosos na estrada, precisava da atenção de uma empregada. Ela parecia cansada, assustada, derrotada.

      Inferno. Tinha que ter alguma coisa errada com ele. Ele ainda a achava a criatura mais linda que alguma vez ele tivesse visto. Nada que ele tinha feito a ela tinha diminuído seu encanto.

      Hamish os seguiu para dentro. — Devo servir o chá, Sua Graça?

      Kylemore olhou para Verity. Ela parecia pronta a ter um colapso. Ele tinha querido derrotá-la, mas o aspecto dela, abatida aos pés dele por esgotamento, definitivamente não parecia muito com uma vitória.

      — Não. Bandejas em nossos quartos, Hamish. Talvez, traga o chá para madame, enquanto o banho dela estiver sendo preparado.

      Hamish se curvou.

— Como desejar Sua Graça.

      Quando ele partiu, Kylemore tentou não se lembrar que a última vez que eles tinham se encontrado, Hamish tinha o chamado de Justin – não de Sua Graça. Naquele tempo, ele tinha estado orgulhoso de chamar Hamish de amigo. Os anos que se passaram tinham alterado aquela proximidade também.

      Verity estava tão parada que poderia ter sido plantada lá. Ele suspirou e cruzou o quarto para erguê-la nos braços. A menos que ele a ajudasse, ele duvidava que ela iria conseguir subir as escadas para ir à primeira cama de verdade, que ela não tinha visto em dias. Outra pontada de consciência, familiar depois de alguns dias na estrada, uniu a mistura nociva de sentimentos dentro dele.

      Quando ela se endureceu, rejeitando o toque dele, o temperamento incerto dele estalou. Os nervos dele estavam no limite – estiveram assim por dias – e a teimosa resistência dela proporcionou as emoções turbulentas dele um foco.

      — Pelo amor de Deus, mulher! Você está segura até que você tenha se lavado pelo menos —, ele rosnou abaixo ante as feições pálidas dela.

      Pálido, não mais. Uma cor subiu nas bochechas dela. A zombaria desmerecedora picaria o orgulho de Soraya. Ele rebateu uma onda indesejável de amparo; ele a tinha trazido aqui para a castigar, não se tornar à babá dela, maldita.

      Apesar disto, o abraço dele era tenro quando ele andou da sala de estar, pelo corredor e para cima nas escadarias. Ele se disse que era só imaginação dele pensar que ela estava mais leve do que quando estiveram em Hinton Stacey. Mas ele tinha percebido que ela havia comido muito pouco na última semana. Ela parecia espantosamente frágil, nada mais que ossos e uma pele branca perfeita.

      Então ele encontrou com os olhos prateados ferozes dela.

      — Eu não me rendi —, ela disse firme.

Ele leu o desafio tão nitidamente, quanto se ela tivesse esculpido isto na carne dele com uma agulha. Kylemore deveria saber que não a conquistaria tão rapidamente. Aquela alma forte não se curvaria só porque estava cansada e amedrontada. Renovado o prazer da competição entre eles submergiu a breve incerteza dele.

      Duas empregadas estavam no quarto enchendo uma banheira e dispondo de sabões e toalhas. Elas fizeram reverência e o cumprimentaram no Gaélico musical que ele ainda achava que era o idioma de seu coração.

      Ele colocou Verity em pé, no centro do quarto. Tudo estava preparado como tinha ordenado. Claro que sim. Ele era o Duque de Kylemore, ele pensou sem satisfação.

      — Eu a verei pela manhã —, ele disse abruptamente.

      Ela piscou para ele com uma surpresa ofuscada. Ela deve ter esperado que ele saltasse em cima dela antes mesmo que ela tivesse a chance de tirar os sapatos. Diabo a leve, afinal de contas este tempo na companhia dela, ele estava certamente tentado o bastante para isto.

      Mas não pronto no modo que importava. Muitos elementos conspiravam para romper o controle habitual dele. A casa. As recordações dele. A necessidade dele por ela. A vulnerabilidade dela, apesar dos esforços galantes dela para continuar lutando.

      Não, ele tinha que sido sábio em se perguntar que descanso ele conseguiria ter dela e de seu rosto desenhado e seus olhos em chama.

      Ele parou na entrada.

— Queimem o vestido preto de madame, assim que ela o tirar —, ele disse em Gaélico às empregadas.

     

      Na manhã seguinte, Verity se espreguiçava, quando uma das criadas lhe trazia uma xícara de chocolate para ela. Qualquer coisa que o duque estivesse planejando para ela, passar fome não estava em seus planos. A bandeja de ontem à noite tinha sido enchida com delicadezas que ela não tinha visto desde que deixara Kensington. Ele enviara até mesmo uma garrafa de fino clarete.

      Kylemore tinha sido verdadeiramente surpreendente com seu adeus. Ela tinha tomado banho, comido e, surpreendentemente, dormiu em paz.

      Sentada, ela respondeu ao que ela assumiu ser uma saudação da empregada, outro escocês, que aparentemente, não falava inglês. Devagar, ela se mexeu no colchão para testar se o desconforto da sela de ontem ainda persistia.

      Um pouco, ela decidiu. Mas uma noite em uma cama tinha feito maravilhas. Talvez Sua Graça deveria voltar a fazê-la dormir no chão. Ela se sentia muito mais pronta para lidar com ele hoje.

      A empregada abriu as pesadas cortinas, que tinham sido tiradas quando Verdade tinha entrado no quarto ontem. No espaço de uma respiração, desapareceu todo seu bem-estar.

As janelas eram barradas.

      Verity pensou que ela seria confinada, mas ninguém a parou quando ela deixou o quarto. Com Angus e Andy nos seus calcanhares, ela começou a explorar a prisão dela. A casa principal era mais uma casa de fazenda decomposta que qualquer outra coisa, como uma versão enorme da casa que ela tinha crescido. O interior era escuro e opressivo e quase apenas decorado com troféus de caça. Cabeças de cervos mortos revestiam as paredes e exemplos tristes da arte taxidermista (arte de montar ou reproduzir animais para exibição ou estudo) se agrupavam em mostruários a encarando com seus olhos inanimados.

      Sair dali fora um alívio. Quando ela olhou ao redor para o jardim desleixado com reprovação, ela esfregou os pulsos. A memória das cordas ainda a irritavam, até mesmo se as cordas de seda não tivessem deixado nenhuma marca.

      Depois de dias infinitos de viagem, ela achou estranho passar um dia inteiro em um lugar. O ar estava fresco para o verão e ela se aconchegava no vestido de merino (tipo de lã de carneiro) que as empregadas tinham feito para ela naquela manhã. Embora ela soubesse que o frio penetrante que sentia não tinha nada a ver com o tempo e tudo a ver com apreensão excessiva.

      A área mais próxima da casa tinha sido convertida em um gramado disperso. Os campos se deitavam atrás do celeiro. O resto do vale era principalmente floresta, embora remendos de urze e samambaia cresciam nas clareiras ao redor das colinas. Um caminho conduzia até um lago. Edifícios de fazenda e um par de cabanas onde os criados viviam completavam o povoado. Ela supôs que a cena era bonita, de um modo ameaçador.

      Ela entendeu logo porque os carcereiros dela lhe permitiram tanta liberdade. A menos que ela se arriscasse na estrada em cima das montanhas ou fosse uma exímia nadadora, a fuga era impossível. E ela não podia pedir ajuda, porque além do homem que os cumprimentou ontem, nenhum dos residentes do vale falava inglês.

      No princípio, Verity ficou aliviada porque o duque a deixou só. Manter sua coragem era mais fácil quando ela não tinha que suportar aquele olhar índigo minucioso fixo. Mas quando o dia se prolongou interminavelmente, ela quase desejou que ele aparecesse. Qualquer coisa para terminar este intervalo terrível, quando todos os minutos pareciam estirar por uma hora.

      Então ela se lembraria como ele a tinha beijado na carruagem e o medo chamejaria novamente. De alguma forma naquele beijo, ele tinha burlado a vontade, o intelecto e o ódio dela. Ele tinha descoberto a real mulher escondida em baixo dos truques e seduções de Soraya. A real Verdade que nunca tinha permitido respirar livre em todos esses anos de cortesã.

      O que ela ia fazer? Como ela iria se proteger de Kylemore? Pior, como ela iria reprimir sua própria resposta?

      Desde seu seqüestro, ela tinha tentado ressuscitar Soraya desesperadamente. Ela precisava da autoconfiança da outra mulher e sua consciente superioridade. Mas a mulher mundana se recusava obstinadamente a emergir das terras das sombras.

      Ao invés, tudo que ela achou dentro dela era Verity encolhendo-se em seu coração. Verity não era forte o bastante para resistir o Duque de Kylemore. Ele a dominaria totalmente e a deixaria com nada depois que isto terminasse.

      Ele não tinha ido para este ponto por causa de uma rápida confusão. Ele ainda não tinha ido nem reclamar o que ele partilhara com Soraya. Não ele pretendia destruí-la. E os dois sabiam disto.

      Conseqüentemente a escuridão penetrante dos pensamentos dela a forçou de volta para a casa igualmente escura. Devia haver algum jeito dela poder evitar seu destino. O destino inevitável e prometido dela. Mas nada surgia em sua mente e não havia ninguém para ajudá-la. Ela estava isolada da ajuda humana como se ela estivesse na lua. Kylemore sabia exatamente o que estava fazendo quando a trouxera para esta isolada casa de caça.

     

      Kylemore admitiu silenciosamente que ele não tinha idéia nenhuma do que o fizera trazer sua amante à casa de sua infância. Ele já tinha suspeitado que manter Verity ali era um erro. Ela só o fazia vulnerável, da mesma maneira que o lugar o fazia. E se alguma vez ele precisara se agarrar rapidamente à crueldade, isso era agora.

      Ele se jogou para fora de sua montaria nos estábulos sombrios e maldito demoradamente. Hamish o tinha seguido desde o virar crepúsculo e ele alcançou as rédeas de Tannasg.

      — Falar o nome de Deus em vão nunca ajudou muito numa situação, mocinho —, ele disse numa macia, mas reprovadora bronca. As lanternas já estavam acesas e lançavam um suave brilho sobre a expressão dura dele.

      Eles tinham montado durante todo o dia. Depois daquela viagem horrorosa, qualquer homem são daria boas-vindas a chance de ficar em um lugar. Entretanto, Kylemore nunca tinha se considerado um homem são. Nem ninguém mais o consideraria se soubessem os fatos por trás deste último desastre, o seqüestro de uma pouco disposta amante.

      Pelo menos as horas na sela hoje tinham alcançado um bom resultado - Hamish Macleish não o chamaria mais de Sua Graça. Kylemore não tinha esperado que eles recuperassem a velha proximidade deles. Mas o dia tinha reavivado um pouco do bem-estar que sentiam quando estavam na companhia um do outro. Sem mencionar que distanciou os dois das torturantes recordações da casa e de sua problemática amante.

      Soraya. Verity. A mulher que ele ansiava com cada respiração.

      A mulher que, até onde a conversação de Hamish se preocupava, não existia. Inferno, Hamish já sabia as blasfêmia de seu empregador de cor. Seqüestrar era só mais um pecadilho.

      Ainda, Kylemore, cruel, insensível como era, não tinha coragem para confessar o porque ele se escondeu nesse remoto canto da Escócia com uma das mulheres mais belas do mundo rebocada.

      — Cuide dos cavalos —, ele estalou, cansado da censura implícita nos modos de Hamish apesar de toda sua camaradagem despertada de novo.

      Talvez por causa da camaradagem despertada de novo.

      Ele também estava cansado de batalhar com as dúvidas inconvenientes sobre sua cativa. Tudo parecia tão claro quando ele a procurara. Soraya o ludibriara para lhe dar uma fortuna. Ela tinha o traído fugindo sem uma palavra. Ela merecia ser castigada.

      E por Deus, ele gostaria de castigá-la. Mas isso era antes de ele testemunhar sua coragem em se queixar da longa e difícil viagem quando estava tão assustada sem saber para onde estava indo. A cavalo. Com ele.

Isso era antes de ele ter visto a vulnerabilidade dela quando a exaustão a tinha forçado ao limite de sua resistência. Quando ela ainda conseguira reunir força para desafiá-lo. Mesmo quando ela sabia que era inútil.

      Agora ele a tomaria.

      O resultado nunca tinha sido uma dúvida. O que ele não tinha esperado quando traçara sua vingança, era que seu corpo e sua mente estariam divididos sobre suas intenções.

      Condenada.

      — Boa noite, Sua Graça —, Hamish disse a Kylemore retirando-se atrás quando ele desarreou o cavalo cinza grande.

      O duque abriu a porta do quarto de Verity com tanta força que as cortinas ondularam e o fogo chamejou de modo selvagem na grelha. Estava tarde e ela se deitou alerta e amedrontada na cama grande. Ela sabia que não havia fuga.

      Nunca houvera qualquer fuga.

      Quão certa ela estava quando se sentiu cautelosa desde o momento em que conhecera o Duque de Kylemore. Ela estava tragicamente errada quando pensou que poderia controlá-lo. Agora ela enfrentava as conseqüências daquele erro calamitoso de julgamento.

      Mesmo assim, ela se recusava a encolher ante ele como um covarde adulatório. Ela se elevou nos cotovelos contra os travesseiros e levantou o queixo.

      — Boa noite, Sua Graça —, que ela disse friamente.

      Nunca o deixe adivinhar quão difícil fora para manter a voz firme, ela rezou silenciosamente. O coração dela trovejou com medo e só os limites exteriores da vontade dela a impediam de elevar os lençóis para cima de seu peito como proteção.

      Ele a encarou através do quarto como se a odiasse. Ela suspeitou que assim o era.

      — Boa noite, Sua Graça —, ele a imitou cruelmente. — Por todos os meios, nos deixe preservar as formalidades, madame.

      Ela não pôde ler o humor dele completamente. Ela estava familiarizada com como ele a olhava quando queria fazer sexo. Como um objeto de desejo dele por mais de um ano, ela deveria.

      Esse não era o modo como a olhava esta noite.

      Ele apoiou um braço no alto contra o batente da porta, uma imagem de poder masculino e beleza na camisa branca solta e nas calças escuras apertadas.

      Ela sempre tinha reconhecido o Duque de Kylemore como um homem extraordinariamente bonito, mas por muitas razões, ela tinha nunca se permitido enfatizar as atrações dele. Hoje à noite, o esplendor físico dele a golpeou com a força de um soco. Ela mordeu o lábio inferior até perceber que era uma admissão fatal de nervosismo.

      Ele endireitou o corpo magro e passeou até ela, enquanto chutava a porta fechando-a atrás dele. Ela vacilou quando bateu-a fechando.

      — Não me aborreça pedindo clemência. Você teve uma semana para se preparar para isto.

      Ela tinha tido uma semana para recordar a perda de controle dela na última vez que ele a tinha beijado. O que era exatamente o que o monstro tinha pretendido. O que quer que acontecesse esta noite, ela jurou para si mesma que não se renderia a ele como naquele tarde tempestuosa em Yorkshire.

      Ele subiu sobre ela ao lado da cama. As sobrancelhas pretas fortemente marcadas se baixaram em cima dos olhos azuis escuros dele.

      — Onde diabos você arranjou isto? — Ele estendeu seu longo dedo e sacudiu desdenhosamente o decote da camisola branca clara dela. — Eu tenho certeza que eu nunca comprei tal trapo de Madame Yvette.

      — Uma das empregadas me emprestou —, ela disse de mau humor.

      Ela tinha sido pega de surpresa ao achar pronto para ela um guarda-roupa cheio de roupas da modista favorita de Soraya. De novo ela pensou no plano do duque de trazê-la para cá. Ela não tinha nenhuma chance.

      Incluído no guarda-roupa camisolas tão luxuosas e tão finas que dificilmente as nomeariam de roupas de dormir. Ela precisou de muita linguagem em sinal para convencer a empregada que ela preferia pegar emprestado algo menos revelador. Ela tinha precisado de uns bons cinco minutos para desviar a atenção horrorizada das meninas dos artigos de vestuário diáfanos em primeiro lugar.

      — Tire isso —, ele disse, ainda carranqueando. — Este jogo já foi longo o bastante. Eu sou seu amante, madame. Você nunca evidenciou desgosto por mim antes.

      Ele tinha razão. E ele estava totalmente errado.

      Kylemore poderia pensar que ele a tinha onde a queria. Kylemore realmente a tinha onde queria, mas ela não ia se entregar de bandeja para a deleitação dele.

      Não, ele acharia pouco prazer hoje à noite na cama dela. Ou nenhum se ela pudesse evitar.

      Ela olhou fora para onde o fogo brilhava na grelha.

— As coisas mudaram. Eu mudei —, ela sussurrou.

      Ela ouviu o ruído de linho e virou a cabeça para vê-lo tirando a camisa. A pele lisa dos braços e ombros vislumbrou dourada enquanto ele derrubava o artigo de vestuário negligentemente no chão.

      — Ninguém muda tanto — ele disse com tal confiança, que ela fechou os dedos nas palmas das mãos para se impedir de atacar.

      Uma meta dela tinha sido a chance de abandonar a carreira detestável, contudo aqui estava ela a ponto de mentir embaixo de um homem em outra junção sem amor.      Ela teve uma visão espantosa de um futuro onde ela nunca seria livre e teria que jogar de Soraya para sempre.

Abruptamente, incapaz de agüentar outro momento deste tormento, ela arremessou o lençol para fora e se deitou de costas.

      — Vá em frente — ela disse duramente, enquanto fechava os olhos. Ela não acrescentaria ao triunfo dele implorando clemência. — Possua-me.

      Condenado, ela deveria saber que ela não o atingia com tal arte dramática. A resposta dele foi um riso suavemente zombeteiro.

      — Oh, não, madame. Isso é muito fácil.

      Ela apertou os punhos aos lados e se falou que suportaria isto, como sempre suportara antes.

      Mas as palavras tinham perdido o poder. Ela escutou o deslizar de tecido em pele quando ele retirou o resto da roupa.

      Ela não olhou para ele. Ela não precisava. Ela já sabia que ele estava nu.

      Alto. Esbelto, com os músculos longos, poderosos de um espadachim. Uns poucos cabelos negros em seu tórax. E o ereto e pesado pênis dele que logo estaria empurrando dentro dela.

      Para um homem magro, o duque era notavelmente bem dotado – ainda uma outra indicação de quão comicamente errado estava seu apelido de frio. O corpo de Kylemore falava sobre compulsivas, até mesmo incontrolável, paixões. Embora ele nunca perdera antes o controle com ela.

      Até esta noite.

      O que estava a ponto de acontecer não levava nenhum brilho enganoso de cortesia ou civilização. Este homem a quis marcar com ferro como seu do modo mais primitivo. Ela sentiu o colchão afundar quando ele ajoelhou na cama, então o calor do corpo dele, chocando apesar da familiaridade, quando ele arreganhou-lhe as pernas.

      — Você mantém a pretensão de relutância —, ele disse secamente.

      — Não é nenhuma pretensão. — Ela ainda se recusava a olhar para ele. Se ela não pudesse vê-lo, talvez pudesse se esconder do que ele fez.

      — Sim, é —, ele insistiu.

      A troca súbita de ar deveria tê-la advertido. Com um puxão poderoso, ele rasgou a camisola do pescoço à barra, deixando-a exposta para o seu olhar, como ela tinha estado tantas vezes exposta antes. Ela combateu o desejo de se cobrir com os fragmentos esfarrapados do vestido, com as mãos dela, com o lençol.

      A face dele estava cansada e determinada à luz de velas. Ela nunca o tinha visto assim. Ele sempre tinha chegado a ela ansioso com antecipação, mas não havia nenhuma alegria agora nele. O pensamento estranho cruzou a mente dela de que ele combatia a própria natureza quando ele veio a ela com raiva.

      Então ela olhou para o sexo dele, duro e ávido e buscando, e ela dispensou a ingenuidade dela com o desprezo que merecia. A natureza dele estava clara. Era conquistar e subjugar. Isso era tudo que havia nele.

      — Qualquer coisa que você tomar, você toma como um ladrão —, ela disse amargamente.

      O insulto dela o enfureceu, ela viu, como se estreitaram os olhos azuis. Mas era muito tarde para reconsiderar a sabedoria de escarnecer um homem que a tinha em tal desvantagem.

      — Eu não sou nenhum ladrão, madame —, ele disse severamente. Então a emoção passageira e turbulenta escureceu o olhar de intenção dele e o tom dele amoleceu em tentação aveludada. — Verity, pense no que você faz. Não tem que ser assim. O prazer que nós compartilhamos foi um milagre.

      Prazer. A palavra a cortou como uma espada, enquanto profundamente dentro, um nó enrolado soltou uma memória inevitável, importuna a despertou sobre o prazer dele se movendo sobre ela. Tantos elementos familiares conspiravam para derrotá-la. O cheiro limpo dele, o calor fascinante dele, sua maldita beleza desnorteante.

      — Isso implica em uma entrega livre — ela disse pelos lábios esticados. — Você sabe que isso nunca foi verdade.

      — Eu sei que isso sempre foi verdade. — O perigo na voz macia dele enviou um calafrio, não totalmente de revolta, de um extremo a outro nela. Oh, como ela desejou que a resposta dela fosse tão simples quanto uma revolta.

      — Nunca. — Deus a ajude, ela mentiu.

      As sobrancelhas dele se contraíram, e bobo como ela era, ela leu tristeza em lugar de fúria na face dele.

— Bem, se eu tiver que tomar como um ladrão, então eu serei um.

      Ele empurrou as pernas dela separando-as, moveu-se entre elas e mergulhou dentro dela.

      Não houvera nenhuma preliminar. Verity enrijeceu, mas o corpo traidor dela já a tinha preparado para a posse dele.

      Ele investiu duro nela e deu um gemido que ecoou na derrota do coração dela. Por um longo e escuro momento, ela se pôs imóvel debaixo dele. O mundo tinha se encolhido ao homem sobre ela. Sentia ele. Cheirou ele. O peso dele a segurou imóvel.

      Ele retirou e mergulhou mais uma vez nela, duas vezes. Então ele empurrou convulsivamente quando o controle dele se quebrou e a essência dele jorrou nela. Ele parecia estremecer continuamente em cima dela antes de gemer mais uma vez, então rolou fora.

      Acabara. Ele a tinha tomado depressa, negligentemente e irrevogavelmente. Ela era mais uma vez a amante do Duque de Kylemore e ela desejou estar morta.

      Ela respirou profundamente pela primeira vez o que pareceu ser uma eternidade. O ar ainda tinha o cheiro de Kylemore. De Kylemore e de sexo. Ela precisava se lavar. Lentamente, como se ela fosse uma mulher velha, ela saiu da cama.

      O movimento dela o despertou o bastante para alcançá-la e agarrar seu braço.

— Aonde você vai? — Ele se ergueu em um cotovelo e olhou para ela. — Se você correr para longe do vale, morrerá nas montanhas. É um país duro lá fora e as pessoas pouco familiarizadas com isto não sobrevivem.

      Ela pensou que agora que ele a tinha tomado, ele soaria vitorioso, se regozijando. Afinal de contas, ele tinha ido para um mundo de dificuldade para a tê-la deitada nesta cama. Mas a voz dele era plana e destituída de emoção.

      — Eu não estou fugindo —, ela disse estupidamente, apesar dela estar apertando as sobras da camisola ao redor dela como se tivesse sido uma virgem violada.

      Uma noção cômica, ela pensou acidamente. Mas ela não tinha vontade de rir. Ela tinha vontade de chorar, como tinha chorado quando se vendera pela primeira vez.

Ela acendeu uma vela com as mãos tremendo e deixou o quarto. Só depois ela pensou como era estranho que ele não tentou pará-la.

      Em pernas instáveis, Verity achou o caminho escada abaixo para a cozinha. A pilha de cinzas iluminava o bastante para ela encher uma chaleira e aquecer um pouco de água. A camisola arruinada dela provia pouca proteção contra o ar noturno, mas ela estava tão entorpecida que apenas notou a friagem. Entre as pernas dela, ela estava pegajosa e molhada com a semente de Kylemore.

      A sensação era incomum. O duque nunca tinha derramado sua semente dentro dela. Em Londres, eles tinham usado envolturas ou ela tinha o satisfeito de algum outro modo. Uma velha cortesã que ela conhecera em Paris tinha lhe ensinado os truques do comércio de uma prostituta. Verity tinha aprendido, até mesmo quando o coração dela tinha se desesperado, porque ela o tinha aprendido.

      Mas esta noite Kylemore não tinha se preocupado em plantar um bastardo no útero dela. Talvez ele quisesse que isso fizesse parte do castigo dela. Ele quis lhe dar uma lembrança permanente dele. Ela poderia ter lhe dito que essa era uma vingança que ele nunca teria.

      Como um autômato, ela verteu água morna em uma tigela e começou a se lavar. A completa banalidade das ações dela persuadiu gradualmente a alma dela voltar do inferno tremente onde ela tinha se retirado. Mas ainda, ela não podia agüentar contemplar o momento em que ele invadiu seu corpo.

      Com mãos trêmulas, ela se esfregou com os restos rotos da camisola, então os lançou no fogo. Para cobrir a nudez, ela puxou a camisa de um homem, provavelmente Hamish, de uma pilha de roupas recém lavadas. Ela lançou a água suja no dreno e acendeu uma vela, então foi à procura de algum lugar para dormir. Aquela manhã, ela tinha notado uma câmara no andar superior que continha uma rústica cama estreita.

      Devagar - ela estava toda dolorida, embora ele não a tivesse machucado - ela subiu as escadas à procura de um lugar que não tivesse o Duque de Kylemore. Ela estava amedrontada, mas o medo estava estranhamente distante, assim como todas suas emoções tinha estado estranhamente distantes desde que ela o tinha deixado. Talvez ele a esperasse no topo das escadarias para forçá-la a voltar para a cama dele. Mas misericordiosamente ela fez isto no quarto humilde sem encontrar ninguém.

      Ela rastejou entre os lençóis e puxou a manta ao redor do corpo tremente dela. Só então, na segurança espúria desta cama estreita, ela começou a chorar, desmedida, tragando soluços que raspavam a garganta dela quando emergiram eles. Soluços muito altos e de coração partido para serem amortecidos nos travesseiros, por mais que ela tentasse.

      Ele a tinha usado friamente, sem se preocupar ou sentir. Ele tinha socado nela como se a possuísse. Quando ela tinha sido sua amante, ele nunca a tinha tratado com tal insensibilidade. Então, quisera que ela compartilhasse o prazer, se tornando a parceira disposta dele como quando eles tinham explorado o mundo da sensualidade.

      Mas o duque a tinha usado esta noite como se ele a detestasse.

      Como se tivesse que detestá-la.

      E a pior traição de tudo?

      Verity tinha reconhecido o desprezo que ele tinha expressado com cada ação. Mesmo assim, o corpo traiçoeiro dela tinha tremulado com o começo da resposta, uma resposta que não devia nada a nenhum dos ardis experientes de Soraya e tudo para a solitária alma de Verity.

     

      Kylemore se mexeu com um grunhido assustado do sono cadavérico no qual tinha mergulhado depois do sexo. Ele estava só na cama de Verity e o cheiro da junção deles o cercava.

      Isto era, claro, familiar.

      Menos familiar era a culpa e pesar que espreitavam o vazio sórdido dentro dele onde a maioria dos homens teria um coração.

      Se fazendo em ruínas, a amante dele sempre o tinha deixado com uma paz interior que nada mais em vida oferecida. Quando ela partira, ela arrebatara a única fonte dele de felicidade. Ele estivera desesperado para ter isto de volta, como uma criança que tinha perdido o brinquedo favorito e tinha chorado até que lhe fosse re-estabelecido.

      Bem, ele recuperou o brinquedo favorito dele e ele ainda tinha vontade de chorar.

      A raiva dele ao desaparecimento dela. Três meses de celibato miserável. Os insultos dela. Tudo isto poderia explicar o que ele há pouco tinha feito a ela.

      Nada poderia desculpar isto.

      Gemendo, ele se sentou. Ele investiu nela como um animal selvagem. Ele tinha perdido controle, simplesmente. Nunca ele tratara uma mulher assim.

      Com um tremor, ele se lembrou de tê-la inundado com sua semente. Naquele momento, ele quisera a submergir na essência dele, a encher totalmente assim nenhum rastro de qualquer outra coisa menos ele permaneceria naquele corpo esbelto.

      A consciência dele estremeceu ao recordar o que ele tinha feito, mas a carne incontrolável dele se alegrou do modo como a tinha tomado completamente, desinibidamente, pela primeira vez. Sempre, ele tomara cuidado para não gerar nenhum bastardo para sofrer a maldição do sangue de Kinmurrie. Mas nesses segundos frenéticos quando ele tinha bombeado toda sua infelicidade em Verity - e para a vergonha dele, realmente tinham apenas alguns segundos - não houve nenhum pensamento de conseqüências futuras. O mundo encolheu para conter apenas ele e aquela mulher a reivindicando do modo mais básico da natureza. Tinha sido glorioso.

      Mas agora ele se sentia doente e triste e cansado do jogo.

      Ele deu uma risada severa. O jogo só tinha começado. Ele não podia se render agora. O desejo dele não permitiria isto, não importasse o que o homem bom dentro dele insistisse que fizesse.

      Iria a fúria dele em possuir essa mulher acabar por destruí-lo? Nesse instante ele pouco se importava.

      Kylemore achou-a facilmente, embora estivesse surpreso que de todos os santuários, ela tinha escolhido o quarto dele. Entretanto, ela provavelmente não sabia. O quarto dela era maior e melhor fornecido, servindo de câmara principal da casa.

      Ele elevou a vela mais alto e estudou a face dela adormecida contra o travesseiro dobrado. Até mesmo na luz bruxuleante, ele viu os rastros de lágrimas em suas bochechas. O pesar e a culpa dentro dele fundiram-se em uma turva massa preta. Ela não tinha chorado uma vez durante todas as provações, mas ele a tinha feito ela chorar esta noite.

      Como ela devia odiá-lo pela falta de jeito dele, por sua necessidade cega e por não poder evitar seu desejo de tê-la. Qualquer homem merecedor do nome a teria deixado ir, mas a perspectiva de perdê-la fez tudo dentro dele uivar em uma angustiada negação.

      Deixá-la ir? Como se ele pudesse. Até mesmo o pensamento dela deixar a cama dele o fez querer quebrar algo.

      O duque apagou a vela e a colocou em um gabinete. Lentamente, abaixou-se para tirar a manta e apanhá-la. Ele pensou que Verity ainda estava com a rota camisola branca, antes de se lembrar que ele a destruíra num momento de raiva. Não, o artigo de algodão áspero debaixo das mãos dele era a camisa de um homem que ela deve ter achado em algum lugar. Ela choramingou, um som quebrado, áspero que estriou o coração dele, e então lembrou-se de que não possuía tal órgão.

      Então ela despertou.

— Não! — ela chorou, lutando imediatamente. — Deixe-me ir! Não me toque, seu diabo!

      Ele apertou o abraço enquanto tentava ignorar o deslizar da pele mal coberta dela em seu corpo e o aroma dela. Ela estava morna e ainda pesada do sono, isso incomodou.

      — Nunca. — Ele sabia que sua condenação estava nessa palavra.

      — Deixe-me em paz — ela sussurrou, finalmente se aquietando nos braços dele.

— Isso é tudo que peço.

      — Eu não posso. — Ela ouviu a tristeza na voz dele. — Silencie agora. — Erguendo-a nos braços alto, ele levou sua prisioneira de volta para a cama.

     

      Na hora deserta, logo antes do amanhecer, Kylemore despertou duro e pronto.

      Um homem amável, um bom homem, deixaria sua amante em paz, a deixaria dormir, daria-lhe um tempo. Mas ela tinha que saber que agora ela não poderia esperar nem benevolência, nem bondade de seu frio amante.

      Embora frio fosse a última palavra que ele poderia aplicar a si mesmo naquele momento.

      Ele se mexeu para aliviar a ereção dolorida, perturbando-a, e ela estava se mexendo inquieta em um sono agitado. Nem ele tinha dormido bem. Esta casa colocaria o descanso genuíno dele sempre fora do alcance. E ele não podia se esquecer da mulher que estava deitada a uma distância cuidadosa longe dele.

      Até mesmo adormecida, ela não queria tocá-lo. Uma memória passageira surgiu daquele momento estranho, quando ela acordou em seus braços na viagem rumo ao norte. Por um breve momento, o mundo dele tinha girado suavemente em seu eixo, antes que tudo estivesse novamente torto. Estava torto desde então.

      Com um otimismo insensato ele deveria ter percebido melhor do que sentido, ele pensara que fazer sexo com ela devolveria tudo à ordem. Mas depois do que ele tinha feito hoje à noite a ela neste quarto, ele se sentia mais perdido e à deriva do que nunca.

      Embora isso não o impedisse de tê-la agora.

      Ele arremessou o lençol à base da cama e colocou sua mão no ombro de Verity, sentindo os ossos delicados e as concavidades. Ela estava nua, pois ele arrebatou a gasta camisa do corpo dela quando a devolveu à cama dele. Agora o doce aroma da pele dela envolveu-o e o instigou a se aproximar. A pele dela era tão branca que até mesmo na escuridão, ele podia seguir a curva graciosa das costas dela e a cintura e o esplendor resplandecente dos quadris dela. Ele precisa elevar alguns graus, isso estava se tornando insuportável. Seu abraço se apertou.

      — Não —, ela disse indistintamente, mantendo as costas dela voltadas para ele e encurvada contra a extremidade do colchão.

      — Sim—, ele disse firmemente e a rodou sobre as costas, libertando outro turbilhão da sedutora essência dela.

      Para ele, seria sempre o cheiro do paraíso.

      Surpreendentemente, ele não sentia nenhuma resistência nela. Ele se moveu em cima dela, apoiando-se nos cotovelos.

— Ponha seus braços ao meu redor.

      Os braços dela obstinadamente não se mexeram.

      Ai, ele entendeu o jogo dela agora. Ela queria manter sua submissão mal-humorada para envergonhá-lo por tomá-la sem que ela o incitasse. Moça tola. Ela deveria saber melhor que isso.

      Ainda, ele não mergulhou imediatamente dentro dela, embora sentisse o calor provocante do sexo dela perto demais de seu excitado membro e o roçar das suas coxas sedosas contra os quadris dele. Isso exigia que ele atingisse os limites mais remotos do seu controle. Mas ele se recusava a agir como um selvagem descuidado novamente, uma vez que tinha feito isso na noite passada. E ele a tinha feito chorar.

      Ele a feriria e, apesar de três meses de sonhar em nada mais que vingança, ele estava profundamente sentido. Lembrando-se das lágrimas que secaram nas delicadas bochechas pálidas dela, a mão ele segurou ao redor do seu seio como uma xícara. Tal gesto se tornou único de ternura dolorida.

      A pele dela estava fresca e lisa sob as mãos dele. Ele testou o arredondamento glorioso do seio dela, então dobrou a cabeça e levou o mamilo à boca. Imediatamente os mamilos ficaram duros nos lábios dele.

      Triunfalmente, ele reconheceu como era familiar – parecia que Soraya não estava totalmente perdida, no final das contas. Ela tinha gosto de framboesas maduras e ele se deliciava na sua doçura de verão, lambendo, molhando e chupando, escutando como a respiração dela falhava com cada carícia que ele roubava.

      Ela não queria responder-lhe, ele soube. Mas ela não pôde evitar.

      Ele virou sua atenção ao outro seio. Demorar prolongadamente estava além da capacidade dele, depois de tantos meses vazios desejando-a e a junção insatisfatória da noite anterior, mas mesmo assim, ele estava desesperado para apagar da memória a brutalidade dele. Algo nele queria apreciá-la. Ela era tão pequena, valente e bonita.

      Assim ele se fez demorar nos seios dela, aprendendo o gosto deles e a textura novamente. E a mão dele fez algumas lentas e golpeantes carícias, viajando abaixo do arco leve desde o estômago até o montículo promissor. Com os dedos enroscados no cabelo macio, ela abafou um gemido de prazer e se moveu impacientemente debaixo dele. Ele deu um gemido inadvertidamente quando a coxa dela roçou o seu pênis. Ele tinha alcançado um grau de excitação onde até mesmo o raspar do lençol na pele dele ameaçava enviá-lo além do limite.

      Ele não pôde esperar mais tempo e enfiou os dedos nos recônditos secretos do corpo dela.

      Um carrilhão de vitória se uniu ao palpitar de desejo pelas veias dele, criando uma sinfonia ensurdecedora de desejo. Ela estava quente e molhada, pronta para ele. Ele quis sentir seu sabor, ver se estava tão suculenta e deliciosa quanto ele se lembrava. Mas a resistência dele estava ruindo e tinha que tomá-la já ou ficaria louco. Ele retirou seus dedos, e equilibrou-se para possuí-la.

      Ela não tinha deixado de lutar, mas ele tinha domínio sobre o corpo dela, e ela não lhe negaria a capitulação física, pelo menos.

      Com um gemido que parecia subir das solas dos pés, ele deslizou nela, enquanto sentia os músculos dela resistir para então relaxar e aceitar sua invasão. A passagem interna dela era lisa e apertada ao redor dele, puxando-o mais fundo.

      Nenhum outro sentimento no mundo rivalizou isto. Jamais rivalizaria isto. Ele a apertou mais íntimo, como se o destino ousasse levá-la dele.

      Contra o tórax dele, os mamilos dela formaram pequenos nós duros. Desajeitadamente, ele agarrou os joelhos dela e os dobrou para cima ao redor dele para aliviar a penetração. Ele estava bastante fundo dentro dela, até mesmo para tocar-lhe o coração.

      Ele esperou que ela gozasse para ele. Ela sempre o fez. Com exceção de ontem à noite.

      Mas ela se deitou parada embaixo dele, a respiração dela emergindo um pouco ofegante. Ele ergueu a cabeça para tentar ler a expressão dela através da escuridão e pegou os prateados reflexos dos olhos dela quando ela encarou o teto fixamente. E não havia nenhuma dúvida na tensão do esbelto e imóvel corpo debaixo do seu.

      Depois de um momento, ele percebeu que ela resistiria qualquer mágica que ele trabalhasse nos sentidos dela. Como ele poderia agüentar as barreiras mentais que ela elevou contra ele neste momento de maior intimidade? Ele tinha que destruí-los ou ficaria louco.

      Ele começou a se mover, estabelecendo um ritmo lento, intenso que ele sabia que a levava à loucura. Ele mostrou cada grama da habilidade para persuadi-la a render-se. Depois de um ano como amantes, ele a conhecia e sabia o que dava prazer a ela.

      Ele a queria tão desesperadamente, que se segurar era uma agonia. A necessidade de buscar a própria liberação ameaçou romper a espinha dele, incinerar seu cérebro dele, rasgar todos os nervo do seu corpo.

      Mas ele persistiu. Friccionando os dentes, ele arreou todo fragmento de seu controle para forçá-la a admitir sua derrota nisto.

      Mas nenhuma mudança no ângulo ou toque ou pressão poderia fazê-la participar da viagem ao êxtase. O corpo dela reconheceu o domínio dele, mas com cada golpe nas profundidades quentes dela, sentia que ela o desafiava.

      Condenada. Ela não o enganaria nisto. Esta, a única parte dela que ele ainda podia alcançar.

      A raiva corroeu seu pequeno comando que ainda mantinha sobre si. Os movimentos dele ficaram mais ferozes quando a força dentro dele se juntou, construiu, acendeu. Ele pretendera ser suave com ela, mas essas intenções se desintegraram sob a força titânica da paixão.

      Ainda assim ela não se moveu para unir-se. Ainda assim ela não deu nenhum reconhecimento de que o queria, que queria isto, embora o corpo dela estivesse escorregadio com a transpiração almiscarada e toda vez que ele mergulhava nela, ela o apertava mais forte.

      Sabendo que não podia se sujeitar mais tempo, ele investiu nela. Através do inferno na mente dele, ele a ouviu gemer, se de desconforto ou de prazer, ele não sabia.

      Até mesmo se o matasse, ele teria que quebrar a resistência dela.

      Ele tinha que esperar...

      Ele não podia esperar...

      Ele não podia esperar...

      Finalmente, finalmente, no mesmo limite do ponto de rompimento dele, ela começou a tremer em seus braços. Ela estava quase lá. Ele patinou a mão até tocar entre as pernas dela.

      Com um grito estrangulado, ela subiu para se agarrar aos ombros dele, cravando-lhe as unhas com força. Ele ignorou a dor pungente. Não significava nada, comparado ao fato de que ela o segurou por vontade própria.

      Ele, tremendo, respirou profundamente, enquanto os músculos internos macios e lustrosos dela se apertavam no prelúdio do clímax feminino.

      Ela finalmente tinha perdido o controle e convulsionou ao redor dele. Ele se manteve quieto, desfrutando do estremecimento do prazer dela.

      Até mesmo no próprio limite dele, ele soube o que isto significou. Ela o queria. Ele não sofreu esta tempestade de desejo só. Enterrando a cabeça na curva do pescoço dela, ele se afogou nas sensações do prazer dela.

      Ela era dele. Ela nunca escaparia. Nunca.

      Mas muito cedo, tinha acabado. Os suspiros exaustos dela soaram quentes contra a face dele.

      Então a consciência de tudo salvo sua própria crise, o abandonou e ele estava perdido. Os tendões e ossos dele apertaram-se, quase a doer, quando ele se derramou dentro dela, em uma explosão ofuscante de êxtase.

      Parecendo eterno, ele esvaziou a amargura e a ânsia da alma dele no corpo propenso dela. Ele estremeceu em cima dela, até que seus membros perderam a força e ele desfaleceu sobre ela, totalmente esgotado. O coração dele bateu como se quisesse fugir do tórax. Seus sentidos firmaram nada mais que o cheiro quente dela.

      Lentamente, a realidade voltou. Gradualmente, a torrente do sangue dele aquietou e acalmou, embora o prazer ofuscante ainda fluía continuamente pelas veias dele.

      Seu peso deveria tê-la esmagado, mas ela não fez nenhum protesto. As mãos femininas e quentes tinham deslizado para fora dos ombros dele, depois do clímax dela e agora, os braços dela se alongavam duramente sobre a cama. Ela estava tremendo.

      Decepção amarga era um gosto enferrujado na boca dele e preocupado às extremidades da satisfação física.

      Ele tinha forçado um clímax dela, mas nos alcances desolados da mente dele, reconheceu que na realidade, ele não a tinha derrotado. Ele quis a rendição completa dela. Ele a queria disposta na cama dele e não esteve nem mesmo perto de qualquer meta.

      Soraya sempre buscara a satisfação dela com uma franqueza que ele achava encantadora. Verity tinha jazido em desdenhoso silêncio embaixo dele, até que ele tivesse terminado.

      Ele rolou para o lado. Ela exalou um soluço surdo e arrastou-se pelo colchão para se enrolar o mais longe possível dele.

      Ele não teve forças para protestar, pois seu tórax se mexia, arfante, como se lutasse por ar, ele se estirou próximo dela. Os músculos dele ainda tremiam do sexo poderoso e o suor esfriou sua pele nua. O duque elevou a mão instável para escovar o cabelo úmido atrás da testa e se perguntou o que inferno seria deles. E então se perguntou se ele se importava.

      Muito tempo depois, ele finalmente reuniu energia para falar. — Sua frieza não me intimidará.

      O som da própria voz estava quase ofensiva depois do coito sem fala deles. A primeira luz penetrou no quarto pelas cortinas tiradas e ele viu como ela voltara a se precipitar para a extremidade da cama.

      — Eu não tenho mais nada do que frieza para você —, ela disse inexpressivamente.

      Ele não pôde vê-la de frente. Ele não precisava, pois sabia o orgulho e o sofrimento que isto carregaria.

— Soraya é uma mulher que entende o prazer.

      — Soraya nunca existiu.

      Ignorando como ela vacilou, ele se apoiou nela, esperando que ela parecesse composta e distante, mas ele leu só vulnerabilidade na boca luxuriante dela e olhos sombreados.

— Você está errada. Você é Soraya.

      Ela fechou os olhos e balançou a cabeça dela.

— Não, eu sou Verity.

      — Você é Verity e Soraya.

      Ele baixou a cabeça para beijar aquela boca macia. Por um momento, os lábios dela moveram-se contra os seus e ele pensou que tinha ganhado. Então, ela o empurrou.

      Na luz crescente, ela parecia exausta. Um homem com qualquer compaixão a deixaria só.

      Inferno, um homem com qualquer compaixão, em primeiro lugar, nunca a tiranizaria na cama dele.

      — Soraya ainda existe em você e eu pretendo achá-la.— As palavras eram um juramento.

      Ela somente balançou mais uma vez a cabeça. Ele rolou para longe dela com impaciência e se sentou. Com um gesto enojado, ele arremessou o lençol para cobrir a nudez dela.

      Na verdade, ele a queria novamente. Depois de tanto tempo sem tê-la, ele estava longe de se sentir saciado. Mas a compaixão que ele se negou possuir, preveniu-o de agir como o libertino egoísta.

      Depois da longa noite, ele a sentia muito perto de quebrar. Uma vez, ele dissera que nada menos que um canhão, poderia chacoalhar a deslumbrante Soraya. Mas esta mulher continuava fugindo dele em rejeição, tinha menos defesas que a amante exótica dele.

      Claro que, um dia ele poderia domá-la.

      Mas ainda não. Querido Deus, ainda não.

     

      Kylemore parou no topo da cachoeira que caia do precipício ao término do vale. A luz de tarde estava deslumbrante na água corrente, mas ele estava cego às belezas da cena.

      Ao invés, ele pensava em sua amante. Isso não era nenhuma novidade. A amante dele tinha dominado seus pensamentos, desde que ela o deixara. E por uma porção considerável de tempo, antes disso,... se a verdade fosse conhecida.

      Seria ele algum dia livre do inconveniente desejo ardente por essa moça? Ela não sabia disto, mas não era a única que lutava contra um cativeiro.

      O duque se sentou contra uma pedra familiar da sua infância e estirou as pernas ao longo do chão quente do sol. O espantava como ele se lembrava claramente de tantas coisas daqui, apesar de ter partido quando tinha sete anos para a estada curta e infeliz dele a Eton. Ele tinha pensado que o tempo amoleceria as recordações dolorosas. A esperança não se realizara.

      Ele tivera um longo passeio para cima para este ponto e precisaria da maioria do resto do dia para voltar. Assim como ele pretendera quando partiria esta manhã.

      Embora ele não tivesse fome, levou um pouco de pão e queijo no bolso e mordeu-o. A Escócia tinha habilidade para matar o apetite dele, descobriu.

      Debaixo dele, via-se um esparramado de mistura desordenada de telhados que compunham a casa de caça e seus edifícios vizinhos. Originalmente, este vale só possuía a cabana de só um arrendatário. O avô dele tinha usado a casa simples enquanto observava os cervos abundantes da propriedade. Claro que, o isolamento significava que este era um lugar lunático para se querer viver. Mas seu avô tinha sido um caçador obsessivo.

      Não pela primeira vez, Kylemore refletiu que todo Kinmurrie parecia ser vítima de alguma mania particular. Em todos os relatórios, seu avô tinha gastado períodos a vez mais longos aqui, matando a vida selvagem local e evitando sua feroz duquesa Calvinista.

      Matrimônios infelizes, outra especialidade de Kinmurrie. No Castelo de Kylemore, imagens de pessoas que claramente se detestavam revestiam a galeria de retrato.

      A casa de caça sofrera constante renovação, claro que, quando o pai dele tinha se tornado um residente permanente. O isolamento da propriedade tinha feito dali, o local perfeito para esconder as inclinações inadequadas e perigosas do sexto duque.

      Essas renovações significaram também que este era o lugar ideal para prender Soraya ou Verity, que lhe tomava o pensamento a todo o momento ultimamente. Maldição! Ele estava pensando novamente em sua amante. Arremessou, então, o resto da refeição fora com um gesto enfadado.

      Com descontentamento, ele considerou a casa. O que estaria fazendo Verity agora? Ainda deitada na cama como um animal ferido, do mesmo modo que ele a tinha deixado?

      O pensamento caiu como uma pedra fria no intestino dele. Ela parecera tão quebrada e perdida nesta manhã. A imagem doeu em seu interior, além da resistência, o que era estupidez, uma vez que ele a carregara até aqui para ensinar-lhe uma lição.

      Mas como odiou ver a grande Soraya tão para baixo, exceto que, de alguma maneira, ela não era mais sua amante desdenhosa e mundana. E nisso estava uma grande parte do problema.

      A mulher que ele mantinha contra a vontade não era a mesma que tinha usado com extrema paixão em Londres.

      No princípio, ele tinha pensado que a recente relutância dela fosse apenas algum truque para fazê-lo ter pena dela, relaxar a guarda, talvez até mesmo deixá-la ir. Mas a angústia dela, ontem à noite e nesta manhã, tinha sido real. Ele apostaria seu ducado nisto. Não que fosse lamentar se tivesse que renunciar a essa herança envenenada.

      Ele percebeu isso, depois de todos estes anos estudando Soraya, caçando-a como o avô dele tinha caçado o cervo do vale. Ele não a compreendia. E até que ele soubesse o que a fizera agir daquele jeito, nunca a possuiria completamente. Ele tinha que possuí-la ou ficaria louco.

      Se ele já não estivesse.

      Claramente, alguma divisão existia na mente dela entre Soraya e Verity. O que era absurdo! Ela era a mesma pessoa. O modo como ele sofria por ela atestava isso. Esta nova versão, mais complexa de sua amante ainda exercia fortemente a mesma fascinação inconveniente sobre ele – mais forte ainda, se possível. Duas cópulas insatisfatórias só o incentivavam a exigir uma maior parte dela. Exigir tudo.

      E ele tinha certeza de que isso era o que ela lhe daria, antes que tivesse acabado. Tudo.

     

      Em um estado de determinação nervosa, Verity sentou-se no assento da janela em seu quarto e esperou pelo duque. Ele tinha estado fora o dia todo. Já havia anoitecido e ela sabia, em seu íntimo, que ele viria até ela.

Durante as infinitas horas tristes desde que acordou, os únicos companheiros dela tinham sido os gigantes silenciosos e alertas e as pequenas empregadas que a ajudaram a se vestir e serviram-lhe o jantar na sala de estar. Como o dia passara sem energia para o crepúsculo sem sinal do seu amante arrogante, Verity tinha abafado sua infelicidade e evocou sua raiva na íntegra.

      Ele não tinha nenhum direito de tratá-la como fez. Ela não podia permitir que esta situação continuasse. O duque não era um selvagem pagão. Seguramente ela poderia achar algum cavalheirismo da sua alma negra e persuadi-lo a libertá-la.

      Ela usou o menos provocante dos vestidos que Kylemore tinha ordenado, um merino de cobalto enérgico estilo exército preto comum conjunto de alamares abotoados na frente - não totalmente impróprio, já que ela tinha intenção de lutar.

      Ela se ressentiu com a perda do traje de luto de viúva, embora o vestido tivesse sido arruinado na viagem áspera desta selva abandonada. Pelo menos tinha sido dela, comprado com o seu próprio dinheiro, não importava se o dinheiro tivesse sido originalmente de Kylemore. Ela abominou o modo como cada minuto que passava neste vale, sentia-se sugada cada vez um pouco mais de sua independência.

      Enquanto ela assistia a luz enfraquecer acima do lago e das montanhas, a magnificência da paisagem golpeou-a de forma misteriosa, quase hostil. Nenhuma maravilha que tão poucas pessoas viveram nesta vacuidade opressiva. Ela tremeu e puxou o manto de casimira de nata mais próximo ao seu redor, embora a noite não estivesse fria e um fogo queimava na grelha.

      Kylemore parou na entrada da porta e ela o viu entrar na cena com um único relance zangado.

      — Qual é o significado disto? — ele estalou. — Tire este vestido, abaixe seu cabelo e entre agora na cama!

      Claramente o desafio dela não tinha escapado. Ela tinha esperado que ele ficasse aborrecido; contava com isto.

      Ele se moveu para se apoiar contra a cômoda. Ela subiu e uniu as mãos em frente ao peito para controlar o tremor.

      — Eu estou cansada de ser conduzida como um cordeiro à matança, Sua Graça —, ela disse firmemente. — Sua reivindicação sob meu corpo cessou ao término de nosso contrato em Londres.

      — Eu lhe falei o que eu quero. — Ele dobrou os braços implacavelmente em cima da camisa feita de linho entreaberta.

      Ele usava roupas rurais: camisa clara, calças amarelas, botas altas. Ele parecia como se tivesse estado fora durante todo o dia, como se ainda levasse o frescor do vento com ele. A luz dourada incerta derramada pelas velas e o fogo iluminou sua clavícula e mostrou sinais do cabelo preto em seu tórax.

      Ela ficou espantada ao perceber que havia se movido, sem perceber para o longe dele, como uma égua que cheira um garanhão. Isto era ridículo. Ela estava deixando a presença física dele distraí-la do que ela precisava dizer. Por todos os jogos decadentes deles em Londres, ela estava mais alerta a ele como homem do que jamais estivera antes.

      — Você teve o que quis. Teve sua vingança. — Ela se forçou em ficar firme. Deixe-me ir. Você tem que parar com... este horror gótico, antes que saia de controle.

      Um sorriso sardônico torceu os lábios dele. — Isso é o melhor você pode fazer?

      Assustada, ela encontrou os olhos dele de forma direta pela primeira vez. Ela tinha esperado ver raiva, mas ao contrário, ele parecia cansado e espantosamente cínico e... profundamente infeliz.

      Como se percebesse os pensamentos dela, ele se endireitou e cruzou o quarto para fitar tristemente a paisagem diante da janela.

      — Eu aceito que você tenha preparado essa pequena fala durante todo o dia. — A voz dele gotejou sarcasmo. — O que você esperava alcançar com isto? A oferta de uma noite calma para que você fizesse uma rápida viagem à sua casa pela manhã? Para tal concessão, pelo menos suplique com uma lágrima ou duas. Um homem realmente seria um monstro para dizer não a uma beleza chorando cheia de angústia aos seus pés.

      Como ela odiou aquela fala arrastada de superioridade. Com esforço, ela manteve a voz firme.

— Se isso funcionar, eu estou certamente disposta a tentar.

      Ele se virou para olhá-la. O cinismo conquistara qualquer outro sentimento nele.

— Não desperdice seu tempo ou o meu. Nós dois sabemos que eu sou um monstro.— Ele balançou bruscamente o vestido dela.— Pare com esta tolice. Eu posso possuí-la ferozmente tirando-lhe esse conjunto elegante, colocando-a debaixo de mim em cinco minutos e nós dois sabemos disto.

      Os olhos dele estavam tão frios que ela tremeu novamente. Mas Verity se recusava a deixar que a ameaça dele, expressa em um tom de entediada indolência, pudesse acovardá-la.

      — Não.

      — Você ainda não entende, não é, Verity? E eu sempre a considerei uma criancinha tão inteligente. Você não tem nenhum poder. Você não tem nenhum direito. Você pertence a mim. Aqui não é Londres. Este é um canto esquecido de um domínio feudal. E eu sou seu senhor. Não há lugar algum para correr. Não há ninguém para ajudá-la. Se eu quero você, e nós dois sabemos que quero, eu a tomo.

      Ela estava impotente para controlar a respiração rápida e rasa, embora soubesse que demonstrava o seu crescente medo.

— Você pensa que, só porque eu sou uma prostituta, eu tenho que aceitar qualquer homem que tenha moedas para pagar por meus serviços? — ela perguntou atrevidamente.

      — Não. Eu penso que, porque você é minha e você sempre será, você deveria se render ao inevitável.

      Ainda assim ela não se rendeu.

— O que quer que eu seja, eu sou uma alma soberana. Eu não sou a criatura de nenhum homem. — Ela tinha repetido essas palavras de novo e de novo para ela mesma todos os dias num esforço inútil para sustentar a pequena coragem que retinha.

      Um sorriso irrisório enrolou a boca expressiva dele.

— Você será minha criatura. Você já é minha criatura.

      Um quê de covardia fez com que ela temesse que isso fosse verdade. Então, aproximou-se e olhou-o com todo o desprezo que ela poderia reunir.

— Nunca.

      Ele arqueou uma sobrancelha de modo ostensivo, como se soubesse quão fino era esse verniz de resistência obstinada. Ele provavelmente sabia.

      Ela continuou. — Eu nunca me deitarei de boa vontade com você. Seguramente o grande Duque de Kylemore tem muito orgulho para perseguir uma amante relutante.

      Ela queria que essas palavras o alfinetassem, mas a expressão dele permaneceu como pedra.

— O grande Duque de Kylemore faz o que ele quer, madame. Eu resisti por três meses, sendo alvo de riso de Londres, me humilhei vasculhando o reino por notícias suas, briguei com um caipira comum e desconhecido, me rebaixei para te seqüestrar! Não se iluda que o orgulho possa me impedir de qualquer ação – qualquer ação – para alcançar os meus objetivos. Meu orgulho esteve no pó, desde que você partiu. Você não achará nenhuma ajuda lá.

      Apesar da ira, ela sentiu um flash de condolência impertinente ante o quadro que ele pintou. O homem que ela conheceu em Londres tinha sido o espelho do perfeito aristocrata – não, talvez, querido, mas certamente admirado, respeitado, temido e invejado. Tê-la perdido abalara seus sentimentos, seu íntimo, seu brio.

      Suavemente, ela disse:

— Kylemore, eu sinto muito ter partido sem te falar. Isso foi muito ruim da minha parte. Aquele último... — Ela pausou. Ela ainda cedeu por se lembrar da despedida, da visita furiosa para Kensington e aquela proposta de lunática de matrimônio. — Naquele último dia que você veio a mim, eu deveria ter explicado, eu deveria ter dito adeus. Então nós poderíamos ter nos separado, pelo menos amigavelmente.

      Ele deu um acesso de riso com um quê de ira sem diversão e as linhas amargas na sua face afundaram.

— E desse modo eu teria permitido que partisse! Ambos sabemos que eu não teria permitido! Você sabia disto! E foi por isso que você fugiu furtivamente.

      Ela tinha dado um passo para ele, antes que percebesse. — Eu reembolsarei o dinheiro.

      Ele possivelmente não podia saber o sacrifício que ela estava fazendo com a oferta, um sacrifício não só dela, mas dos seus irmãos também. Mas ela tinha levado o dia todo tentando inventar algum modo para se ver livre deste pesadelo e, se isso custasse à fortuna que ela ainda acreditava ser legalmente dela, ela pagaria com prazer.

      Os Ashtons dariam um jeito, ela pensou de maneira culposa. Eles já haviam dado um jeito antes.

      Ela o pressionou.

— Se você me der alguns dias para fazer os arranjos, eu devolverei cada centavo.

      Kylemore virou-se para ela. Devido à distração dos seus pensamentos, ela se colocou perto o bastante dele para que seus braços fossem agarrados fortemente por mãos impiedosas.

      — Não seja uma maldita insensata, mulher! Não é o dinheiro. Nunca foi o dinheiro, exceto como um símbolo do que você roubou. — O aperto dele se cavou nos braços dela e Verity suportou um bom tremor. Mas ele apenas a segurou.

      Desesperadamente, ela olhou-o, enquanto buscava algum sinal de que ele poderia ceder. Mas enquanto a face dele carregava angústia e tumulto, não havia a mais leve sugestão de hesitação.

      Ela tomou uma respiração instável.

— Eu não roubei nada.

      Os dedos dele dobraram contra as mangas do vestido dela.

— Você se roubou. Agora eu a roubei de volta. E eu nunca vou deixá-la ir.

      Ela deu um grito quebrado e se torceu livre dele.

— Isto é impossível. Você tem que rever isso.

      — Não. Esta é minha vontade. — Ele se moveu para diante, como se perseguisse um animal selvagem.

      Ela retrocedeu, horrorizada pela maneira como a voz dele soou. Se ela ficasse mais, poderia começar a achar que ele estava certo.

      Então ela notou que ele não tinha fechado a porta atrás dele quando chegou. Com velocidade frenética, ela mergulhou para a entrada. Meio segundo mais tarde, ele saltou atrás dela. Ela sentiu a mudança no ar quando ele se lançou para pegá-la.

      Mas ela alcançou a porta primeiro e bateu esta atrás dela. Ela desceu correndo as escadarias e atravessou o corredor de entrada. Ela teve uma leve impressão de filas de olhos de animais mortos assistindo sua corrida. Logo estava puxando o ferrolho da volumosa porta da frente.

      Chorando, ela lutou com o trinco férreo pesado. O duque estava quase nela. Ela ouviu o baque de passos de madeira do salto da bota se aproximando.

      A porta balançou e abriu na mesma hora em que ele saltou e bateu no chão apenas uma respiração longe dela. Ela se arremessou fora na escuridão sem idéia clara aonde ia, além da necessidade opressiva de escapar do seu perseguidor.

     

Um desordenado amontoado de matagal contra o lado da casa ofereceu-lhe a esperança de santuário. Verity teria ido para os bosques se pensasse que poderia correr mais que Kylemore naquela área aberta, ela precisaria cruzar primeiro. Mas até mesmo no pânico dela, ela sabia disso.

      Deslizando na grama úmida, ela subiu nos arbustos. Ramos e espinhos cortaram seus cabelos e o vestido, enquanto ela ia para o centro, só parando quando os ramos se tornaram uma barreira intransitável.

      Ela se amontoou como uma bola, tentando se fazer invisível, embora ninguém de fora poderia vê-la pela vegetação rasteira e pela escuridão. Ela tentou sem sucesso controlar a respiração entrecortada.

      Ele estava próximo. Ela não podia vê-lo ou ouvi-lo, mas os pêlos arrepiados na pele dela lhe informaram que ele estava olhando, esperando que ela abandonasse a posição.

— Verity, apareça —, ele disse finalmente. Como esperado, ele estava muito perto.

— Não há nenhum lugar para você ir.

      Ele parecia um homem razoável quando usava aquele tom de persuasão. Um dia, ela poderia ter acreditado que isso era o que ele era. Não mais.

      A fofoca era certa. Todo os Kinmurries eram loucos. A sede do duque por vingança ameaçou ser o mais louco de todos eles.

      Ela se encolheu mais profundamente no esconderijo e não respondeu. Uma gota fria de água correu nuca abaixo, mas ela não ousou se movimentar para limpar.

      — A noite ficará fria e vai chover novamente. — Ele não tinha trocado. Maldito, ele deve ter visto a passagem dela para dentro.

      Como se ele lesse os pensamentos dela, ele disse.

— Eu sei exatamente onde você está. Há um buraco no coração do matagal. Eu cresci aqui. Não há nenhum lugar secreto para mim neste vale. É inútil tentar escapar. Não há um recanto ou greta ou toca por milhas que eu já não tenha achado e usado.

      Ela supôs que ele tinha jogado brincadeiras como todas as crianças e tinha achado esconderijos. Estranho imaginá-lo criança. Ela pensou que nunca o fizera antes. A distração momentânea dela terminou abruptamente quando ouviu um sussurro.

— Eu irei e a pegarei, se for preciso. Ou você pode sair por sua própria vontade. Mas você não ficará aqui fora.

      Quando ela acalmou a respiração, o medo cego que a tinha enviado neste vôo insensato baixou. E era um vôo insensato, ela via agora. Onde ela poderia ir? Era o meio da noite. Ela não estava vestida para viajar. Ela não tinha nenhuma provisão ou dinheiro. Ela não tinha uma pista de como sair do vale.

      Kylemore suspirou.

— Certo. Eu estou entrando.

      — Não —, ela disse apagadamente. — Não, espere.— Ela não pôde agüentar o pensamento dele arrastando-a para fora chutando e gritando.

      A derrota substituiu sua fúria louca de mais cedo e ela estava atenta a cada obstáculo e arranhão na saída. Molhada, enlameada e dolorida de muitas escoriações pequenas, ela rastejou para o aberto, mas nada doía mais do que reconhecer sua estupidez fugindo dele desse jeito.

      Ela precisava mais do que histeria para escapar do Duque de Kylemore. Ela não tinha tentado deixá-lo depois de um ano de teimoso planejamento? E isso só a tinha trazido justamente ao seu atual estado.

      Apesar dela obedecer à licitação dele, encarou-o sem se encolher.

— Eu não dormirei com você.

      — Sim, você vai.

      Ele a alcançou e pegou seu braço. O calor do toque dele a queimou pela lã úmida da manga e fez o sangue pulsar de mau humor na carne fria dela. Ele a virou para a entrada e começou a caminhar com ela.

      O aperto dele era firme, mas sem machucar. Por que mostrar o poder dele publicamente? Ele sabia assim como ela que ele tinha sido o vencedor hoje à noite, porém firmemente ela se levantava agora para ele.

      Uma grande onda de miséria varreu-a enquanto Kylemore a conduzia, exteriormente submissa, dentro da casa e para cima das escadarias. Ela nunca escaparia deste homem. Ela nunca escaparia de Soraya. Durante treze anos, o pensamento de ser um dia livre, era tudo o que a mantinha firme. Ela não tinha previsto o desejo obstinado dele para ela.

      Mas seguramente, o desejo morreu quando não recebeu nenhum encorajamento para viver e prosperar. Quando seu objeto não deu nada, não ofereceu nada, não compartilhou nada. Ele estava muito orgulhoso para bater contra as pedras inquebráveis da resistência dela.

      Exceto que ele dissera para ela que ele já tinha abandonado seu orgulho.

      E até mesmo durante os últimos dias, ela não fora sempre indiferente. Vergonha corrosiva a afligia quando ela se lembrou de momentos - mais que momentos, se ela incluísse o beijo dele na carruagem ou este clímax matutino - quando o corpo dela respondera a ele com prazer e não negação.

      Ela queria acreditar que era por hábito. Afinal de contas, ela tinha sido a amante dele durante um ano.

      Ou era a habilidade inquestionável dele como um amante.

      Ou a irredimivelmente natureza pecadora dela.

      Certamente não era porque o toque dele tinha o poder de evitar tudo que ela desejava e acreditava, ela insistiu em desespero. Se ela ficou forte e se esforçou para permanecer como gelo nos braços dele, ele cansaria da sua busca insana.

      Mas até mesmo se ele o fizesse, o quê então? Ele só a jogaria de volta em seu caminho e permitiria que voltasse para a vida que ela desejava? Ela duvidava disto.

      Talvez ele pretendesse matá-la quando terminasse com ela. Neste lugar isolado, ele poderia descartá-la facilmente.

      Porém, ela não pôde imaginar o duque assassinando-a, não importa quão ameaçador ele fosse. Ele poderia dominá-la sexualmente, poderia fazê-la se submeter, mas os instintos dela lhe falavam que ele a preferia viva. Esse pensamento poderia trazer-lhe o mais leve conforto.

     

      Verity estava parada no centro do quarto, tremendo, com frio como reação, enquanto olhava Kylemore alimentar o fogo. Ele tinha que acreditar que era improvável ela fazer outra colisão por liberdade, pelo menos por agora. Ele não tinha fechado a porta. Agora ele parecia contente em demorar-se na grelha.

      Para um dos mais importantes nobres da nação, ele mostrou grande destreza com aparas e fole. Não pela primeira vez, ela refletiu como ela o tinha subestimado em Londres. Então, ela o considerara só um outro aristocrata inútil, mais inteligente e talvez mais cruel que os outros homens que competiram pelos favores dela, mas basicamente feito do mesmo material.

      Desde então, ela o tinha visto perder os efeitos da dura viagem. E ele não agia como se achasse esta casa humilde abaixo da dignidade dele. Enquanto para ela teria parecido o apogeu do luxo em sua mocidade rústica, apenas correspondia aos padrões para que fosse usado por um duque.

      Ela olhou agora para ele, de joelhos acendendo o fogo, uma tarefa para a empregada mais humilde em quaisquer das mansões dele. Ele era forte, inteligente e inquietantemente complicado.

      Oh, como ela desejava que ele realmente fosse o artigo defeituoso que ela julgara que fosse. Mas se esta última semana tivesse demonstrado qualquer coisa, era que ela não conseguia entender o Duque de Kylemore. Ele era mais escuro, mais profundo, mais perigoso que ela alguma vez tivesse imaginado, embora houvera pistas em Londres sobre a verdadeira natureza dele, se ela tivesse se preocupado em saber.

      A perseguição obstinada dele por ela. Certamente, a paixão inextinguível dele quando vinha à cama dela.

      Ela se lembrou que revelação de potente ardor tinha sido. Eldreth tinha sido um homem de hábitos tranqüilos e ela tivera que treinar James que era inepto e desajeitado.

      Como Kylemore riria se ela admitisse que uma das razões pela qual ela o julgara tão desastrosamente mal, era a própria inexperiência dela. A cortesã mais notória de Londres surpreendida pela virilidade poderosa de um homem como qualquer jovenzinha imatura? Ela quase se escarneceu.

      Parte dela sempre tinha considerado Kylemore uma ameaça. Por que resistir aos agrados dele, contanto que ela os tivesse?

      Mas esses vagos instintos não tinham dado nenhuma sugestão do mal que ela tinha cortejado quando se tornou sua amante. O que ela pensara quando seu sensato ego descartou os vagos sentimentos dela de desconfiança e insistira que ela agarrasse a chance de ter segurança financeira.

      Sensato ego? Ela deveria ter pulado para dentro do Thames antes de tê-lo aceitado em sua cama.

      Tudo isso era uma sabedoria difícil de se obter e veio muito tarde. Ela estava envolvida com o homem errado e teria que pagar o preço. Isso seria logo, se a sabedoria refletida nos olhos azuis dele desse qualquer indicação enquanto ele avançava pelo quarto e a rondava.

      — Por que continuar me combatendo? — ele murmurou, ligeiro ao abrir as presilhas de seu corpete com uma destreza que a irritou até mesmo em seu medo.

      O tremor dela se intensificou, mas não se mexeu. Qual era o ponto? Ele só a tomaria novamente.

      — Você sabe por que —, ela disse duramente.

      Um sorriso estranho vagueou pela face dele quando ele baixou o vestido dos ombros dela.

— Acho que estou começando a entender.

      Ela permanecia como uma boneca enquanto ele a despia. Inesperadamente, ele não parecia ter nenhuma pressa para usá-la. Ela tentou não prestar atenção à sua própria nudez, conformando-se por ter estado muitas vezes nua diante dele antes. Mas ela não pôde impedir a vulnerabilidade tremulante que ela sentia estando de pé, nua, em frente a ele.

      Quando ele alcançou a escova de cabelo, um pensamento horrível a ocorreu.

— Você vai me espancar?! — ela perguntou em desânimo. Por alguma razão aquela seria a humilhação final para uma noite cheia de humilhações.

      O riso macio dele irritou os nervos dela.

— Não, embora você poderia desfrutar disto.

      Com dedos seguros, ele alcançou e desfez o que sobrou do nó que tinha torcido os cabelos dela mais cedo. A colisão dela nos arbustos tinha enroscado seus cabelos em uma bagunça impossível. Lentamente e com calma, ele começou a alisar os fios pretos e longos pondo-os em ordem.

      Ela permaneceu imóvel debaixo das atenções dele. Por muito tempo, o quarto ficou quieto, enquanto ele se concentrava naquela tarefa, seu rosto calmo e sério, como se escovar os cabelos dela fosse a coisa mais importante no mundo.

      Eventualmente, ele afastou a escova e suavemente empurrou-a sobre a cama. Ela deitou olhando para o teto, escutando-o retirar as roupas do corpo. Por todas suas negações e recusas, ela estava de volta onde ele a queria.

      Ela combateu o desejo de começar a chorar.

      Era como ontem à noite. Depois de amanhã seria o mesmo. E na noite depois dessa.

      E todas as noites, até que ele se cansasse deste jogo cruel.

      Sem apagar as velas, ele se aproximou dela. Ela esperou que ele separasse suas pernas e a reivindicasse. Mas nesta noite, ele parecia determinado a levar o tempo dele. Talvez porque depois desta manhã, ele soubesse que o prazer era o pior castigo que ele poderia infligir-lhe. Ele queria fazê-la pagar pela tentativa frustrada de escapar.

      Verity virou a cabeça e o viu se levantar em um cotovelo em uma pose característica. Enquanto ele fazia uma inspeção vagarosa na forma predisposta dela, o fantasma de um sorriso apareceu em seus lábios. O quarto estava quieto, com exceção da crepitação do fogo e o sussurrar macio da respiração nervosa dela.

      Ela endureceu em rejeição silenciosa do que aquele sorriso prometia. Depois de tudo o que tinha acontecido, ela poderia permanecer impassível quando ele somente sulcasse em cima dela, buscando a própria liberação e ignorando a sua. Ela tinha a firme certeza de que poderia resistir a um amante irrefletido.

      Mas agora ele prometeu ser qualquer coisa, menos um amante irrefletido. Ele começou a acariciar o corpo dela, aprendendo sua forma e textura. Era como se o toque fosse o único senso disponível para ele.

      Ele suspirou com um prazer que ela não pôde equivocar enquanto ele arrastava os dedos pelos buracos da clavícula dela e abaixo, ao longo dos seus braços. Ele tocou a barriga dela e os ombros dela e as pernas dela. A mão dele estava morna e suave na carne nua dela.

      Contra a vontade dela, seu pulso se agitou depois de cada roçar casual dos dedos dele. O olhar dele estava atento e sério, enquanto estudava os complexos e inexpressivos desenhos que fazia nela, desenhos que faziam cada parte dela cantar.

      Ela fechou os olhos e se disse que ele tinha feito isto antes. Em tantas tardes longas e lânguidas em Kensington.

      A primeira vez que ele compartilhou a cama com ela, ele tivera problemas em despertá-la. Ela tinha estado surpresa com o cuidado dele. Então chocado à reação dela.

      Com Eldreth, ela tinha aprendido tolerar o sexo gradualmente. Ela tinha decidido depressa que, se ela tinha que ganhar a vida dela deitada, ela poderia muito bem fazer sua melhor barganha. Mas o Duque de Kylemore tinha revelado um mundo novo e deslumbrante o da sensualidade - um mundo que a chamava tão fortemente, que ela estivera frenética para escapar desde que o deixara.

      Agora ela lutava para ficar indiferente debaixo do toque de Kylemore. Seguramente, ela sabia todas as armas do arsenal de sedução dele. A familiaridade fazia com que fosse difícil não perceber a efetividade dele contra ela.

      Mas aqui, o toque dele parecia diferente. Da mesma maneira que Kylemore parecia um homem diferente em muitas formas, muito mais sutil, até mesmo para descrever.

      Suavemente, ele amoldou as coxas dela, os flancos, os braços, como se testando o que uma mulher era. O coração dela tremulou em seu interior como um pássaro apanhado. As mãos claras e macias eram tenras e incrivelmente estimulantes.

      Os mamilos de Verity se apertaram. A reação foi imediata e incontrolável e ela não teve nenhuma esperança de esconder isto dele. A respiração desigual dela ficou presa, então retomou em um ritmo muito mais irregular enquanto se enrijecia, esperando por ele tocar nos peitos dela.

      Mas ele se concentrou em partes dela que ela nunca considerara particularmente eróticas. Embora ela soubesse, durante o ano dela como sua amante, que o seu corpo inteiro lhe oferecia a promessa de deleite.

      Só depois de longos minutos de tolerar silenciosamente as atenções dele, percebeu que ele evitou os peitos e entre as pernas dela deliberadamente.

      Nem a tinha beijado.

      Ele pretendia demonstrar a superioridade dele. Claro que ele o fez. Ela nunca tinha se enganado que esta era uma busca por nada mais que supremacia. Aquela compreensão a ajudou a revidar a resposta tremulante que aqueles dedos criavam onde quer que fossem.

      Você me seqüestrou, ela cantou na mente dela.Você pensa que você me possui. Você quer me destruir. Você não é nada mais do que um bruto egoísta.

      A ladainha continuou, eventualmente superando o feitiço das carícias dele. O corpo devasso dela poderia forçar para que se rendesse a ele. A memória de êxtase que ele poderia estimular foi imprimida na pele dela. Mas a cabeça e o coração dela eram mais fortes e eles prevaleceriam.

      Assim que sua excitação enfraqueceu, ela se tornou mais alerta da presença de Kylemore. Ele respirou sem firmeza e o toque dele perdia seu domínio sem esforço. Próximo a ela, ele radiava calor como um grande fogo. A mão dele vagou pelo estômago dela, seduzivelmente perto do sexo dela.

      Então, não havia nada.

     Depois de um momento, ela abriu os olhos. Ele ainda se apoiava em seu braço dobrado, assistindo-a. A face dele estava excitada e os olhos estavam escuros com desejo. Embora ela tivesse abandonado a modéstia há muito tempo como um luxo que uma prostituta não podia dispor, ela combateu o desejo para se cobrir com o lençol.

      — Isto não está dando certo —, ele murmurou, erguendo a mão para roçar alguns fios de cabelo perdidos nas bochechas dela e arrumá-los, retirando-os e com delicadeza, colocando-os de volta para o lugar deles.

      Como ela detestava a falsa ternura do gesto. A aversão emprestou à resposta dela uma ponta ácida.

— Eu lhe falei que não estava disposta.

      Ele ignorou tal interjeição.

— Eu estou muito transtornado e achava que a estratégia que escolhi fosse... atrativa.

      — O que quer de mim? Condolência? — ela friccionou.

      Na luz de vela, ele estava quase pecaminosamente bonito. A face estreita dele estava pensativa debaixo de alguns cabelos pretos caídos na sobrancelha dele e isso emprestou-lhe um ar juvenil, que ela sabia ser falso.

      Os olhos dele ficaram fixos nos dela, como se ela fosse um enigma, um dilema filosófico que ele estivesse compelido a resolver.

— Eu estou tentando estimular um frenesi de luxúria —, ele disse pensando bem.

      A idéia era tão ridícula, que ela não pode conter um riso desdenhoso.

— Você sabe que isso não acontecerá.

      — Você não deve fazer desafios que não pode cumprir. — Ele arrastou uma mecha do cabelo dela em reprovação suave. — Você está longe de ser insensível. Mas eu não posso me concentrar em atrair sua mente, se eu mesmo estou inseguro.

      Parte dela desejou que ele apenas seguisse com isto e a tomasse. Outra parte temia ser tomada por ele. Toda vez que ele lhe dava prazer, ela não queria e ele lascava outro pedaço da alma dela fora. Logo não haveria nada mais.

      — Talvez você devesse ir embora e pensar nisto —, ela sugeriu sem qualquer expectativa de que ele a atenderia.

      O próprio acesso de risada irada dele conteve um rastro de humor genuíno.

— E talvez não.

      Estranho que depois de toda emoção turbulenta, eles estivessem falando quase como amigos. Isto era algo novo. Soraya sempre tinha tratado o duque com uma certa distância devido á posição dele, até mesmo quando ela tinha usado a boca, as mãos e o corpo para levá-lo ao clímax.

      Era duplamente estranho que, a qualquer momento, o duque poderia estar dentro dela. A luz bruxuleante dourou as linhas fortes, magras do corpo dele e a deixou sem nenhuma dúvida da prontidão excessiva dele.

      Quando ele subiu sobre seu corpo, ela procurou o ódio em seu interior desesperadamente. Ambos ficaram sérios, ansiosos, mais cedo do que ela teria acreditado possível.

      Ele se dobrou para beijar um arranhão longo que um espinho tinha deixado no pescoço dela e o ódio e a raiva retrocederam ainda mais.

      — Você está ferida —, ele sussurrou.

      Sim, ela estava, mas não do modo como ele dizia.

      — Não é nada —, ela disse, num tom hostil.

      A intimidade natural da cama morna neste quarto e a luz de velas prejudicava sua intenção em resistir. Se ela deixasse de resistir, ele a destruiria. O cheiro dele a embriagava, fazendo-a lembrar irresistivelmente de outras ocasiões, quando ela tinha sucumbido de boa vontade a ele.

      — Deixe-me beijar melhor seus arranhões. — Ele ergueu uma das mãos dela e deliberadamente apertou a boca em cada marca. As mãos dela tinham ficado bastante feridas com sua fuga selvagem no matagal.

      Por um momento, ela permaneceu quieta. Absurdo, mas os beijos dele acalmaram a dor aguda. Ela percebeu quão próxima ela estava de vacilar, e então arrebatou a mão fora.

      De novo, Kylemore chamou a ternura para derrotá-la. Ela procurou ocultar o quão vulnerável estava diante daquela armadilha de carinhos e beijos suaves, tenros, embora ele já tivesse percebido sua dificuldade em manter-se indiferente – maldito!

      — Pare! — ela estalou. — Não há nenhuma necessidade de você me adular com belas palavras ou gestos, se eu sei o que você quer de mim, nesse exato momento.

      Ele pegou novamente sua mão e esticou de modo suave, mas inexoravelmente os dedos dela. Ele os estudou por muito tempo.

      — Soraya tinha uma pele perfeita. Verity tem calos.

      Ele varreu o dedo polegar pela área áspera da base da palma dela. Até agora, ela estava tão sensibilizada ao toque dele, que a carícia formigou por ela, fazendo com que um calor líquido se agrupasse em suas costas. Ela se mexeu incomodamente contra os lençóis frescos.

      — Eu sinto muito, se isso o ofende —, ela disse com sarcasmo fraco. — Eu nunca fingi ser qualquer coisa além de uma camponesa.

      Ele beijou sua palma e ela experimentou outros desses puxões internos importunos. Seguramente ele não podia seduzi-la com um mero beijo na mão, podia?

      — De fato, eu acho que nós nunca discutimos suas bases. Uma omissão que eu pretendo corrigir muito logo, como também o acento detestável de seu irmão que você traz, uma vez que você é originalmente do norte da Inglaterra.

      Ela carranqueou para ele, tão aborrecida que nem mesmo quis tentar se afastar quando ele se abaixou entre as pernas dela.

— Eu não existo puramente para seu entretenimento, Sua Graça.

      Ele se agüentou sobre os braços e a encarou de cima com uma mistura empolgante de diversão e fome.

      — Entretenimento é uma palavra franzina para o que nós compartilhamos, você não acha?

      Ele voltou a apertar os quadris dela e erguê-los ligeiramente para ele, mas ainda assim ele não a tomou. Ela odiou admitir que a pausa a atormentava, mas... somente devido a querer que tudo terminasse logo....claro.

      Por que ele se dava o trabalho de demorar em cima dela assim? A disponibilidade dela para ele não podia estar mais clara.

      Ela lutou para adotar o tom indiferente de Soraya. Não surpreendentemente, dada sua tremente consciência do maciço corpo equilibrado sobre ela, ela falhou.

— Uma amante é apenas um brinquedo para um homem rico.

      — Esta amante, em particular, parece ser um assunto consideravelmente mais trabalhoso do que isso—, ele disse suavemente.

      Ele enrijeceu e finalmente - finalmente - se deslizou para dentro dela. O suspiro dela se misturou ao gemido profundo dele de prazer.

      Por um longo momento, ele permaneceu imóvel. Então ele começou a investir nela, profundamente, completamente e com uma pressão implacável que ela não pôde menos que se mostrar agradecida por isso. Sua pele contra a dela queimava de tão quente, desmentindo de modo agressivo o limiar das palavras dele com uma ferocidade implacável de posse.

      O corpo dela tinha acabado de se ajustar ao tamanho e calor dele, quando ele deu outro gemido e se perdeu dentro dela.

      Verity estava deitada ofegante embaixo do peso dele. Eles ainda estavam unidos. Ela se sentia incômoda e pegajosa.

      E isso não podia ser frustração covarde no coração dela, podia? Depois de tais preliminares prolongadas, ela tinha imaginado que ele faria mais de um esforço para gozar.    Ele não tinha mencionado que a deixaria louca com luxúria? A alma obstinada dela tinha esperado que ele negasse seu prazer.

      Embora, talvez, esta metódica junção tenha sido uma salvação inadvertida. Por alguns momentos antes de ele possuí-la, a alma dela tinha estado tão obstinada quanto um manjar-branco.

      Ela ergueu as mãos, colocou-as nele e lhe deu um empurrão. A pele nua dele parecia pedra morna sob suas mãos. Era a primeira vez que ela o tocava por vontade própria em toda à noite.

— Saia de mim, Kylemore!

Ele se ergueu em ambos os cotovelos sem quebrar a conexão entre os corpos deles.

— Oh, nós não acabamos ainda —, ele disse suavemente.

      Ele moveu os quadris sugestivamente e ela sentiu a protuberância novamente dentro dela.

      — Oh, sim, nós acabamos —, ela insistiu, se torcendo em protesto.

      — Isso foi agradável. Faça novamente. — Um sorriso faminto, familiar dos dias de Londres, enrugou a face dele. Aquela expressão em particular sempre a avisara que ele pretendia lançar algum incentivo de jogo amoroso.

      E ela sempre tinha ido junto com ele, mas não essa noite.

      Ela estava muito próxima de se entregar. Ela sabia disto.

      Um relance nos intensos olhos índigos dele lhe indicou que ele já se considerava vitorioso.

      Verity forçou-se a lembrar de tudo o que havia em jogo: seu respeito próprio, seu futuro e o futuro de Ben e Maria.

      Ela buscou em seu interior, o centro obscuro de frieza de modo deliberado; o mesmo centro obscuro que a ajudara a sobreviver como uma mulher de reputação duvidosa. O centro onde ninguém podia localizá-la. O centro onde era totalmente Verity e o qual Soraya nunca tinha tocado.

      Fechando os olhos, ela esperou, segura no conhecimento de que o verdadeiro ego dela estava protegido dele.

      Tudo ficou em silêncio. Kylemore deve ter notado e compreendido quão firme ela estava agora, fechada longe dele. Ele poderia possuir o corpo dela, mas a real Verity era tão inacessível quanto as luas de Júpiter.

      Ela o ouviu suspirar. Então ele começou a se mover dentro dela, golpes lentos tão poderosos e infinitos quanto a maré. Depois de alguns segundos, ele agarrou seus joelhos e levantou-os, assim a penetração se aprofundou mais, ainda mais.

      Ela poderia ter-lhe dito que não se importava. Ela estava isolada no santuário inviolável dela.

      Exceto que o centro preto e frio dela não estava nem tão frio nem tão preto quanto ela ansiava que estivesse. Ela estava muito atenta ao cheiro dele e aos sons evocativos do corpo másculo se movendo no dela. Ela fechou os olhos mais firmemente e apertou a fortaleza interna dela.

      O calor de Kylemore chamou-a. Ela teve que tomar sua força de vontade para se impedir de deslizar contra ele, respondendo aquele balançando rítmico do corpo dele com o próprio calor dela.

      Um gemido escapou dos seus lábios. Ela queria que isto parecesse um protesto furioso, mas emergiu como um miado de prazer. Para se impedir de alcançá-lo, ela apertou as mãos no lençol amarrotado sob ela.

      — Abra seus olhos, Verity. — A voz baixa dele arreliou pelos nervos crus com excitação sensual. — Abra seus olhos.

      — Não —, ela disse obstinadamente, sabendo que qualquer rendição, até a menor, a conduziria à última derrota. Ela virou a cabeça para negar a tentação quase opressiva em obedecer-lhe.

      — Abra seus olhos. — Quando isso não teve nenhum efeito, ele continuou quase sonhador, — eu posso manter isso por toda à noite, você sabe.

      Ela virou a cabeça e encontrou o olhar dele. Era escuro, intenso e firme. Ela não pôde duvidar de que ele falava a sério.

      Os lábios dela se separaram em um soluço mudo. Ela não pôde continuar o combate. Como se para sublinhar aquele pensamento, os músculos internos dela se apertaram para puxá-lo mais fundo.

      Desta vez, foi à vez do duque fechar os olhos e o suspiro dele foi um longo — ah — de apreciação. Ele baixou de novo nela e esfregou sua barba saliente contra a bochecha dela, em um gesto quase mais íntimo que o próprio sexo.

      Contra a vontade, ela arqueou contra ele, roçando os seios no cabelo do tórax dele. Ele baixou e golpeou entre as pernas dela. Sem se enganar dessa vez que o grito dela não carregava nada mais além do prazer.

      Com uma quebrada exalação de derrota, ela começou a se mover com ele na dança precipitada da paixão. Quando ela subiu para encontrar o próximo empurrão dele, ela o ouviu dar um baixo resmungo de triunfo.

      E por que não? Que preço tinha o desafio dela e ódio agora?

      Mas o pensamento estava distante, sem conexão à espiral crescente de tensão dentro dela, tensão que subia mais alto com cada empurrão do corpo poderoso dele no seu. Ela entrelaçou os braços trêmulos ao redor dele e jogou a cabeça para trás quando a tempestade dentro dela culminou.

      Nesse momento, o controle desumano de Kylemore hesitou. O passo lento e poderoso dele mudou, ficou mais rápido, mais impiedoso. Ela apenas notou. A própria resposta dela crescia, apertando os músculos dela, compelindo-a a se agarrar nele, até a última investida do seu corpo quente.

      Ela se quebrou nos braços dele no ponto mais alto, mais puro, mais infeliz que qualquer coisa ela alguma vez tivesse conhecido antes. O gemido de liberação de Kylemore sublinhou a escandalosa e primorosa turbulência. O corpo dela lançou-se ganancioso em devorar todos os segundos de êxtase, toda sensação encantadora, sofregamente.

      Ele a arremessou para cima para voar livre entre as estrelas. Enquanto o coração dela ficou para trás, para sofrer.

Quando alguns fragmentos de controle voltaram, as lágrimas secaram nas bochechas de Verity. Ela apertou Kylemore como se fosse morrer por deixá-lo ir. A respiração áspera dele esquentou a orelha dela.

      Ela não tinha nenhuma idéia do que aquele encontro ígneo tinha significado para ele, além de prover ainda mais evidências de que, fisicamente, ela não tinha nenhuma defesa contra ele.

      A atividade sexual deles tinha feito a esperança dela virar pó.

      Apesar da coragem e determinação de Verity, ele só precisou de meros dois dias para tê-la arquejando e implorando em seus braços. Dois dias.

      Como ele deveria rir. Como ele tinha que se regozijar ante a rápida vitória dele. Soraya tinha se segurado contra ele durante um ano. Mas Verity, com muito mais razões para negá-lo, tinha se esmigalhado, antes que metade da semana terminasse.

      Embora ela soubesse que era muito tarde para qualquer pretensão de desgosto ou relutância, ela desenrolou os braços, do corpo dele.

      Ele se elevou, pois assim ele poderia vê-la.

      Ela procurou o triunfo na face dele, mas ele parecia tão abalado quanto ela. Ou talvez a reação dela fosse tão opressiva, que ela imaginou ter visto seu reflexo nele. O corpo dela estremeceu com os tardios tremores e a memória de rachar felicidades correu lentamente em suas veias.

      — Eu te odeio —, ela disse claramente.

      Algo chamejou nos olhos dele, mas ela estava muito cansada e deprimida para tentar decifrar. Ele se ergueu fora dela, então, surpreendentemente, deixou a cama.

      — Não importa —, ele disse de modo indiferente, se abaixando para apanhar as roupas espalhadas.

      Ele tinha razão. Não importava. Ele já tinha demonstrado isso, provando a ela como era vulnerável a ele, como tinha sido uma vez. Mais uma vez.

      Ela encarou as vigas pesadas que cruzavam o teto caiado, dizendo a si mesma que ela não choraria. Embora mais lágrimas não pudessem piorar sua humilhação.

      A porta abriu e se fechou atrás dele.

     

      Era muito, muito mais tarde e ela tinha entrado em um sono transtornado, quando o primeiro grito torturado despertou-a.

 

      A princípio, Verity pensou que o som estrangulado fazia parte dos sonhos confusos dela, mas quando elevou as pálpebras, essas continuavam pesadas e inchadas devido ao choro, então veio o grito novamente.

      Em algum lugar na casa, um homem chamou em agonia inconsolável.

      Um dos criados deveria estar com problemas ou doente, embora ela pensasse que todas as pessoas no vale, além de Kylemore e ela, dormiam nas cabanas.

      Sem conscientemente decidir agir, ela estava em pé e vestindo a primeira roupa que estivesse à mão no guarda-roupa: um roupão de seda. Hábitos instalados há anos por cuidar do irmão e da irmã, nunca a deixaram. Ela não pôde ignorar a necessidade terrível nesses gritos roucos.

      Apalpando, ela acendeu uma vela, então saiu do quarto. Ela parou no corredor, insegura em qual direção tomar.

      O homem gritou novamente, um longo e agudo e diminuiu em soluços quebrados. Veio do final do corredor. Apertando o roupão ao redor do corpo nu, ela foi para o quarto onde havia buscado refúgio do duque na noite anterior.

      Ela empurrou silenciosamente a porta para a câmara simples com sua cama estreita para descobrir que nenhum criado rompeu o silêncio da noite.

      Muito ao contrário, era o Duque de Kylemore.

      Ela permaneceu na entrada, enquanto o ódio subia em uma maré preta para sufocá-la. Pesadelos deveriam infestar um homem com tal mal na alma. Em qualquer universo, ele nunca desfrutaria um momento calmo. Nenhuma outra vingança a movimentou, pois saber, ao menos, que ele batalhava demônios noturnos, era algo.

      O corpo longo, magro na cama trilhada de modo selvagem, parecia como se ele combatesse algum assaltante invisível. Lençóis trançados enroscaram ao redor dele, testemunho mudo das suas lutas noturnas. Seu tórax estava nu e o suor reluziu em sua pele branca debaixo do sutil pelo negro que lhe cobria parte do corpo.

      O duque tinha sonhos ruins. O que isso tinha a ver com ela? Ele a tinha seqüestrado e abusado dela. A consciência dele deveria perturbá-lo.

      Ela se virou para ir. Deixaria que apodrecesse na miséria dele. Deixe as dores deste mundo lhe dar um aperitivo das dores do inferno, que seguramente aguardavam por ele.

      Atrás dela, ele deu um baixo gemido. Ela parou, não querendo ouvir a aflição profunda no som, mas incapaz se ajudar.

      Ela endireitou a espinha. Não, ela deveria ser cruel, como Kylemore. O medo, a súplica e a resistência dela nunca o impediram de tomar o que ele queria. Assim, por que ela deveria se preocupar, se os pecados dele voltassem para assombrar seu sono?

      A agonia do inimigo era a única vingança dela.

      Ele se contorceu novamente no aperto do sonho, tão violentamente, que a cama rangeu ruidosamente no quarto pequeno. Ela tentou se alegrar na angústia dele, mas algo mais forte que os sonhos fúteis de vingança preveniu-a de que tal sentimento estava se esvaindo naquele momento.

      Relutantemente, lentamente, ela retrocedeu.

      Desta vez, ela não pôde evitar de se aproximar. Ele tinha rolado para se deitar de costas, esticando os membros, suportando o ataque imaginário. Ela disse a si mesma que queria somente se luxuriar na angústia dele, enquanto se mostrava muito perdido nos horríveis sonhos, para que pudesse ameaçá-la.

      Mas quando a luz da vela dela se derramou pelo duque adormecido - por todo seu tumulto, ele ainda estava dormindo - ela não se sentiu nem remotamente perto de rir.

      Nenhum rastro agora do aristocrata orgulhoso que ela conhecera em Londres, ou até mesmo o tirano cruel que tinha a seqüestrado. Ao invés disso, o homem estirado em frente a ela estava atormentado no limiar da sanidade.

      Ele lançou a cabeça de lado a lado com seu cabelo escuro úmidos pelo suor, como se em negação violenta. A respiração dele era alta e o poderoso tórax se levantava com cada difícil inalação.

      Apesar de tudo o que ele tinha feito a ela, apesar de como ela queria reagir, seu coração contraiu-se em piedade. Ela não podia abandonar nenhuma criatura, porém desprezível, a sofrer tão obviamente como o duque sofria.

      — Sua Graça —, ela disse suavemente, inclinando-se e tocando o ombro nu dele indecisamente.

      A pele lisa estava fria e úmida sob a mão dela. Alguma crise monumental agarrou-o.

      — Sua Graça, você está tendo um sonho ruim. Acorde.

      Ele a empurrou, como se o toque dela o chamuscasse. As marcas de lágrimas nas bochechas dele chocaram-na. Ele ainda estava profundamente adormecido, perdido no pesadelo.

      Ela enrolou os dedos ao redor do ombro dele e deu um tremor suave.

— Sua Graça, acorde.

      A mão dele se lançou e agarrou o pulso dela com os olhos de genciana bem abertos. Por um momento assustador, ele olhou para ela por aquele nebuloso azul como uma criança perdida. Ela teve outra visão súbita do pequeno menino que ele deveria ter sido uma vez.

      O tempo todo, a força de adulto dele esmagou o pulso frágil dela.

      — Quem é? — ele rangeu, a cortina de olhar dele.

      Ela duvidou que ele estivesse realmente desperto. O sonho ainda cavava suas garras nele.

      — Kylemore, sou eu — Ela tentou fugir, se amaldiçoando por sua estupidez em se aventurar tão próxima assim. Ela nunca aprendia?

      Ele não parecia ouvi-la quando a arrastou inexoravelmente para ele, nem quando a forçou a se agachar, fazendo com que o cabelo solto dela caísse sobre o tórax nu dele.

      — Quem é? — ele perguntou novamente.

      — Verity.

      O quarto estava quieto, com exceção da respiração rota dele. Indecisamente, ele expôs a mão livre para enroscar no cabelo dela. O gesto era quase gentil.

      — Seda preta —, ele disse em maravilha cascuda. Então mais nitidamente,

— Verity? É você?

      — Você está ferindo minha mão, Kylemore —, ela disse firmemente, esperando dispersar o miasma na mente dele.

      O olhar ofuscado dele caiu onde ele a agarrou com tal força de pugilismo.

— Perdoe-me.

      Ele a livrou imediatamente. Ela deveria agarrar este alívio e correr para o quarto dela, mas não fez.

      Ele se empurrou na vertical contra os travesseiros e olhou ao redor, como se estivesse inseguro sobre onde exatamente ele estava.

— Verity —, ele disse em um tom mais normal. — O que está fazendo aqui?

      Ela esfregou o pulso dolorido. — Você gritou em seu sono e eu vim ver se você estava bem.

      — Apenas um sonho ruim —, ele disse com um descuido que ela sabia que era falso.

      Tinha sido mais que apenas um sonho ruim. A angústia horripilante dele ainda ecoava nas orelhas dela. E ele tinha chorado. Ela não pensara que o insensível duque fosse capaz de ter lágrimas, mas esta noite fora provada a injustiça dela.

      — Volte para cama. — Ele falou como se despedisse um criado na casa principal de Londres. — Eu prometo não mais perturbar seu descanso.

      Ela não pôde ignorar esta suspensão. Ela deveria estar aliviada por ele despachá-la incólume, exceto por algumas contusões.

      A cada segundo, ele voltava ao seu ego habitual. E o ego habitual de Kylemore era perigoso, como ela soube a custo. Pegou a vela e começou a se mover para o lado de fora do quarto. Pelo canto do olho, ela tentou não notar como a mão dele tremia, quando ele a levantou para jogar o cabelo para trás.

      Ele não olhou para ela.

— Boa noite.

      — Boa noite, então —, ela disse, e pensou se era sua imaginação ou havia uma nota desolada na voz dele?

      Da porta, olhou impulsivamente para trás e pegou a desolação nua na face angulada dele. Ele sentou como se ele pretendesse ficar acordado o resto da noite.

      Por uma vez, a concha da autoconfiança dele tinha rachado e ela o viu mais claramente do que antes. O esgotamento marcou de repente a face dele e a bela boca estava esticada com sofrimento; ela desejou saber se ele havia conseguido dormir, desde que eles tinham chegado ao vale.

      Amaldiçoando-se por ser boba, ela voltou ao lado da cama.

— Eu posso pegar algo para Sua Graça? Uma taça de vinho? Algo da cozinha?

      Ele focalizou os olhos índigos desertos nela e ela lutou para não reconhecer uma solidão tão forte quanto ela própria sentia.

      — Não — ele disse.

      — Muito bem.

      Mas assim que ela se virou para partir mais uma vez, ele a alcançou e arrebatou a mão dela.

— Sim. Sim, permaneça. — A voz dele era severa, transformando um pedido em um comando.

      — Sua Graça, eu...— Se ela rastejasse entre os lençóis, sabia o que a aguardaria.

      Ele deve ter lido a recusa na face dela, pois largou sua mão e olhou além com uma tentativa de manter a arrogância habitual. — Claro que você tem que ir.

      Ridículo ser movida pelo orgulho tolo dele. Ela se lembrou dele planejando a destruição dela. Mas no momento, era difícil de pensar nele como o Duque inflexível, onipotente de Kylemore. Sem querer, ele a fez lembrar de Ben quando era criança, que sempre se negava a receber afeto quando mais precisava.

      Mas ele não era Ben. Ele era o homem que tinha inventado fazê-la sua escrava. Ele era o homem que, horas atrás, aproximou-se dela para alcançar um determinado fim. Ela estava louca em fingir que um preocupado e aflito Kylemore nunca seria perigoso para ela, como era seu ego durante o dia. Talvez até mesmo mais perigoso.

      A face magra dele indicou desdém aristocrático quando fitou-a estoicamente à distância, porém sombras marcavam seus olhos, rodeando-os e um músculo empurrava espasmodicamente na bochecha dele.

      Ela lamentaria ceder. Até mesmo quando ela colocou a vela na mesa auxiliar, feia de carvalho, e subiu no colchão, ela soube que ela lamentaria isto. Mas o bom senso tinha perdido toda a autoridade em cima das ações dela.

      — Verity?

      Quando ela não respondeu, ele se mexeu para abrir espaço para ela.

      Ela não quis tocá-lo. Embora ela estivesse bancando a boba, ela não era tão boba. Devido a ele ser um homem magro, ela pôde se deitar separada dele na cama estreita, e isso significava que ela estaria apenas se equilibrando na extremidade.

      Ela estava próxima o bastante para o calor do corpo dele envolvê-la e chamá-la para mais perto. Ela esperou que ele a puxasse e esticaria as pernas, assim ele poderia investir nela, mas ao invés, ele se deitou e enrijeceu ao lado dela. Era como se, de alguma maneira, as regras de compromisso entre eles tivessem mudado.

      Por um longo momento, nenhum dos dois falou. Verity ficou mais incômoda. O cheiro almiscarado dele estava em todos lugares, lembrando-a cruelmente de como ela tinha respondido mais cedo a ele.

      Quem era o duque para fazer objeção a ela, quando ela vinha agora de boa vontade à cama dele?

      Isto estava errado. Terrivelmente errado.

      — Eu deveria ir —, ela disse de modo trêmulo, começando a levantar.

      — Não.

      Ele se levantou e chicoteou os braços dele ao redor dela arrastando-a para baixo, assim ela se deitou com as costas apertadas ao tórax dele. Pela seda do roupão, ela o sentia tremer. Trouxe à memória vividamente a maneira como ela o achou. Indecisa, sabendo que estava fazendo um dos piores enganos na vida, ela virou e muito suavemente abraçou-o.

      — Durma, Sua Graça —, ela sussurrou. — Ainda não está de manhã. — Era o mesmo tom que ela tinha usado para acalmar Ben e Maria, quando eles acordavam amedrontados à noite.

      Ela esperou por escárnio ou triunfo. Afinal de contas, como ela poderia acreditar que o odiava, quando ela se deitou aqui, embalando-o como a coisa mais preciosa da terra?

      Mas por uma vez, a cortante língua de Kylemore manteve-se calada. Ele a puxou completamente contra ele e relaxou com um grande suspiro. Sua carne nua debaixo das mãos dela, gradualmente perdeu sua frieza preocupante e até mesmo a respiração dele ficou profunda.

      O Duque de Kylemore dormiu em seus braços aconchegantes.

      Kylemore se mexeu do mais doce sono que ele poderia se lembrar em anos. O sol caprichoso das Highlands penetrava pelas janelas sem cortinas da câmara humilde. Estava morno. Estava tarde. E ele segurou um pacote fragrante de feminilidade dormindo no abrigo do corpo dele.

      Ou de fato, ela o abrigava. A cabeça dele descansou no peito de Verity e os braços dela o cercavam, como se ela o protegesse de todas as ameaças. Curioso e bastante triste refletir que ninguém alguma vez o tinha segurado assim antes.

      E o mais curioso é ele se sentir tão seguro nos braços de alguém que o detestou tão rancorosamente.

      Detestou-o com razão boa.

      O pensamento inoportuno não teve nenhum poder para perturbá-lo. Ele tinha dormido profundamente e bem, pois acordou com a mulher que ele quis acima de tudo.

      Literalmente. Ele estava duro e pronto. Porém o mais curioso de tudo, ele não fez nenhuma tentativa para buscar alívio.

      Ele desejou que fosse bastante impiedoso para tirar proveito dela em sua na cama. Ele poderia estar dentro dela antes que ela despertasse. Antes que ela montasse qualquer barreira. E depois do inferno espantoso de prazer de ontem à noite, essas barreiras seriam perigosamente fracas.

      Então por que ele hesitava?

      Talvez porque ela tinha conquistado o medo e a aversão dela para vir ajudá-lo. Ela se unira a ele de livre vontade e tinha oferecido consolo quando ele merecia apenas ódio. Ela tinha visto a dor dele e tinha se arriscado a aliviá-la.

      À noite de ontem tinha sido uma completa revelação.

      Ele tinha sido um bruto, forçando-a a fugir dele na noite. Ele a pegara e a manipulara em rendição e tinha planejado, gritado e tiranizado. E a recompensa dele tinha sido a melhor experiência sexual da sua vida.

      Mas agora a gentileza dela tinha mudado tudo entre eles.

      A raiva que o dirigia durante os últimos três meses estava ausente esta manhã. A fome pela vingança tinha se retirado.

      Mas, entretanto, ele já não quis castigá-la, ele não podia deixar que ela se fosse. Ela era a única esperança dele por paz e a noite anterior provou que isso era mais verdadeiro que nunca.

      Verity era a proteção dele contra os demônios que o procuravam. Assim, o destino dela estava selado. Ela teria ficar com ele para sempre.

     

      O sol estava morno na parte de trás do pescoço de Verity quando ela arrastava implacavelmente as ervas daninhas que infestavam os canteiros de flores atrás da casa. Kate Macleish, a esposa de Hamish, manteve uma horta medonhamente limpa para prover a casa, mas ela não tinha nenhum tempo para as flores. Verity tinha notado as camas desalinhadas ontem e a camponesa de Yorkshire que ainda vivia dentro dela, tinha se disposto a pôr ordem em tudo.

Ela não tinha visto Kylemore durante o dia - ele já tinha saído, misericordiosamente, quando ela acordou. Ela não teve nenhuma idéia do que poderia ter dito a ele.

      De fato, ela estava surpresa por ter permanecido não molestada. Céus, ela tinha dormido a noite toda abraçada a ele, para todo mundo, soaria como se ela tivesse querido estar lá. Um homem melhor que o duque teria utilizado a mulher tão convenientemente à mão.

      Durante a milésima vez, ela se repreendeu por ser uma boba.

      O que a tinha possuído para ir até Kylemore? Sua única esperança de prevalecer contra ele, era continuar resistente. Ainda quão convincentes as recusas soariam, depois que ela rastejara na cama dele sem um murmúrio de protesto?

      Ela tinha sobrevivido e tinha prosperado como uma cortesã porque tinha usado a cabeça e não o coração. E se aquele coração que ela repudiava doía pela miséria dele? O duque não era nada para ela.

      Mas se ele não era nada para ela, por que a visão das lágrimas dele, lágrimas que ele nem mesmo percebera que derramou, cortaram-na tão profundamente?

      Alguma velha tristeza o infestou. Alguma velha tristeza havia lhe ensinado a esconder os verdadeiros sentimentos dele atrás de uma máscara de autocracia cruel e controle perfeito.

      Ela rosnou pela exasperação dela com ele, com a situação, e com ela acima de tudo. Por que ela deveria se afligir com ele? Tudo que ela queria era ficar livre dele, imediatamente, totalmente e sempre.

      Ela começou a se aborrecer com uma raiz particularmente teimosa.

      Na noite passada, ele tinha lhe dado o prazer sexual como ela nunca tinha conhecido. Ela nunca o perdoaria por isto.

      Mas pior, ele tinha aberto uma brecha no coração dela. Ela poderia combater a força dele e, talvez, até mesmo ganhar. Mas ela não tinha nenhuma defesa contra a necessidade dele.

      Ela tinha que escapar, antes que ela fizesse algo realmente estúpido, como se apaixonar por esse tirano opressivo, que acreditava possuí-la, de corpo e alma. Condenado.

      Ela deu um puxão violento na raiz, mas ainda assim não se moveu.

      — Psiu, moça! Você se fará um dano!

      Ela olhou para além dos pensamentos turbulentos para achar Hamish Macleish que a encarava em consternação. No estranho traje local, ele pareceu grande e capaz e as pernas nuas dele, debaixo do saiote escocês, eram diretas e fortes.

      Mais cedo, Angus tinha estado em dever de guarda. Ele tinha tentado desviá-la do que pensou claramente ser uma atividade imprópria para a senhora da casa. Ela tinha fingido não entender e seguira com a atividade.

      Ela foi pega de surpresa ao ver Hamish. Ele evitava-a deliberadamente, provavelmente porque ele era o único criado que falava inglês. Ela não podia subverter as pessoas que não entendiam uma palavra que ela dizia.

      — Bom dia, Mr. Macleish.

      Os anjos tinham sido, ultimamente, notavelmente surdos aos argumentos dela. Mas talvez eles tivessem ouvido sua última prece desesperada para fugir.

      — Bom dia, minha senhora. — Ele se aproximou. — É uma terra consideravelmente pedregosa para flores. Minha Kate se rendeu.

      Verity se levantou e esfregou as mãos no avental insípido que protegia as saias dela.

— Sr. Macleish, você me ajudará?

      — Sim, minha senhora. Embora você compreenda que faz um tempo que eu fiz qualquer jardinagem.

      Ela moveu a cabeça dela.

— Não, você me entendeu mal. — Ela levou uma respiração profunda e ordenou a coragem dela. — Eu o vejo como um homem de honra.

      Ele olhou-a de forma direta, de um jeito que os rústicos escoceses se protegiam notavelmente dos modos bajuladores das contrapartes sulistas.

— Que o bom Deus possa me manter assim, minha senhora.

      — Um homem que não descansaria e permitiria uma mulher ser seqüestrada e abusada.

      A expressão do homem se tornou fechada.

— Você me pergunta se eu a ajudarei pra lhe a escapar—, ele disse de modo regular.

      Ela deu um passo mais perto e injetou uma nota pedinte na voz.

— O Duque de Kylemore me roubou da minha família. Eu estou aqui contra minha vontade. Meu coração é fixo em uma vida virtuosa, contudo ele me força a interpretar a amante dele. Você tem que acreditar. Como um homem de honra, você tem que me ajudar.

      Ele balançou a cabeça dele.

— Não, minha senhora.

      — Mas você tem que me ajudar! — ela chorou desesperadamente, alcançando o braço dele. Seguramente, ele não podia apenas abandoná-la agora sabendo o que o duque tinha feito a ela.

      — Eu sirvo Sua Graça até a última respiração de meu corpo. — Ele soou lamentável, mas imóvel quando se livrou do aperto pegajoso dela. — Eu sinto pelas suas dificuldades. Mas eu não posso ajudar você. Eu dei meu juramento de obediência ao duque.

      Embora ela soubesse que desperdiçava o tempo dela, não pôde se render. Esta poderia ser sua única chance para persuadir Hamish à causa dela. Se ele a abandonasse, onde mais ela poderia se virar?

      A voz dela tremeu com urgência.

— Eu o pagarei... pagarei bem. Leve-me de volta ao meu irmão. Eu juro que você será recompensado.

      A carranca dele indicou que a oferta o ofendera.

— Não, moça, eu não quero seu dinheiro.

      Ela estendeu as mãos dela em apelo frenético.

— Mas seu mestre cometeu uma grande injustiça.

      — Nenhum Macleish irá contra a palavra de Sua Graça. Sem a do duque, não haveria mais Macleishes nas Highlands. Ele salvou todos da ruína e do exílio. Assim, eu sinto muito, minha senhora. — Os olhos dele amolaram o rosto dela. — E não pense em tentar sair correndo sozinha. Pessoas morrem nessas montanhas, mesmo aquelas que as conhecem. Um conhecimento que uma moça pequenina não saberia o que fazer quando a névoa baixasse ou as rochas esmigalhassem debaixo dos pés.

      O quadro era vívido o bastante e sublinhava o que o duque tinha lhe falado. Necessariamente não significava que era verdade. A face gasta do homem floresceu mais amavelmente:

— Oh, minha senhora, eu servi Sua Graça, desde que ele era um guri. Eu não posso quebrar a fé. Tudo que eu posso dizer é que ele tem razões para o que faz.

      Sim, luxúria, ressentimento e fúria, ela tinha vontade de replicar.

      Mas do que serviria? Esta era a segunda vez que buscara ajuda dos retentores de Kylemore e ela falhara pessimamente, em ambas as ocasiões. O tolo egoísta tinha se cercado, decididamente, com criados leais.

      Hamish sentia obviamente que tinha uma dívida com o duque. Laços feudais ainda eram fortes nesse canto isolado do reino, porém era injusto o particular senhor do solar.

      Os ombros dela caíram e se virou para esconder um ímpeto súbito de lágrimas. Era totalmente aparente que o velho homem não a ajudaria. Derrotada, ela voltou a cavar as ervas daninhas. Se ela fosse escapar, estaria sozinha.

      Inesperadamente, Kylemore se juntou a Verity para o jantar na sala de estar, que também servia como sala de jantar da casa. Quando ela o achou esperando-a, lembrou-se de repente, de quão pouco tempo ele passava na casa. Ela supôs que ele tinha que passar as horas de luz do dia revisitando abrigos de infância.

      Bem, onde quer que ele fosse e tudo que fazia, não o traziam mais fácil. Ela recordou a expressão deserta dele na noite anterior. Novamente, ela desejou saber que tormentos se deitavam em baixo da compostura do duque. Sua fachada normalmente segura de si, nunca a enganaria novamente.

      Ele se virou da janela onde estava de pé. O quarto era direcionado para o lado e o sol do final da tarde brilhou como ouro na água plana atrás dele.

— Verity.

      — Sua Graça.

      Os modos ditavam que ela fizesse uma mesura. Ela os ignorou. O pequeno desafio sustentou a confiança hesitante dela. Um seqüestrador não merecia observações devido ao grau dele.

      Ela estava insegura em como se comportar com ele. A resistência obstinada e mal-humorada habitual dela pareciam deslocadas depois de uma noite nos braços dele.

      Como ela desejou nunca ter ouvido esses gritos terríveis. Era impossível tratar o Duque de Kylemore como um monstro desumano quando ela tinha olhado brevemente a agonia interna dele.

      Ele pisou adiante para acomodar a cadeira para ela à mesa, onde ela normalmente comia em solidão. Embora ainda vestido para o campo, um casaco amarelo cobria as mangas dele e ele usava um lenço amarrado em um nó simples.

      — Hamish me falou que você está se ocupando na jardinagem.

      Ele quase soou sociável. Ela lhe lançou um olhar suspeito debaixo dos cílios dela. Sr. Macleish também lhe contado que ela tinha perguntado se ele a ajudaria a fugir? Ela estudou a face dele quando ela se sentou onde ele tinha indicado, mas ela não podia dizer o que ele pensava.

      Nada novo.

      Kylemore sentou-se frente a ela e alcançou o vinho vertendo-o. A casa de caça foi bem provida com os luxos de vida. Pela primeira vez, Verity refletiu em como tais bens chegaram. Seguramente não ao longo daquela estrada áspera em cima das montanhas. Deveria haver outro modo. O lago talvez.

      — Eu me encontro no meu cativeiro, com o tempo pesado em minhas mãos.—, ela disse sugestivamente, embora ela tinha renunciado a esperança de despertar alguma culpa em cima dos crimes dele contra ela há muito tempo.

      — Eu lhe pedi que a ajude amanhã.— Ele chacoalhou o guardanapo dele para desdobrar e o colocou em seu colo.

      — Você está preocupado que eu cave minha rota de saída, por isso vai colocar um guarda em cima de mim? — ela perguntou acidamente.

      A amabilidade de Kylemore a deixava nervosa. Ela preferia muito mais o inequívoco conflito aberto deles. Ele ergueu o copo dele e se apoiou para trás com uma graça negligente que arrastou os sensos dela. A determinação dela para se libertar endureceu. Se ela ficasse e deixasse a atração indesejada tomar seu rumo, estaria perdida para sempre.

      Kate Macleish entrou com uma terrina de sopa. Quando eles ficaram mais uma vez a sós, Verity voltou ao estado de guerra. Uma língua afiada escondeu a crescente suavidade interna, uma suavidade que ela tinha toda intenção de abafar.

      — Ou talvez você tenha medo de que eu vá atrás de você com uma pá, caso você esteja bastante despreocupado em pôr ferramentas de jardinagem ao meu alcance.

      Ele derrubou a colher dele.

— Verity, você tem uma escolha —, ele disse suavemente. — Nós comemos, nós falamos, nós passamos a noite com uma tentativa de civilidade. Ou nós fudemos. Depende de você.

      Kylemore observou enquanto os notáveis olhos cinzas dela se alargaram. Ele teria dito que nada podia chocar Soraya. Mas Verity fora muito menos endurecida pela vida que ela tinha conduzido.

      Inferno, agora até mesmo ele estava fazendo isto. Ele tinha que deixar de pensar nela como duas pessoas diferentes. Ele adivinhou rapidamente a viagem para o vale que ela formou em sua mente, dividindo-se em entidades separadas. Soraya, a notória cortesã e Verity, a mulher que preservou um estranho ar de inocência apesar das libertinagens que ele tinha cometido em seu corpo.

      Durante os últimos dias, evitando esta casa amaldiçoada, tinha dado a si mesmo muitas horas na solidão, usufruindo do ar fresco durante o dia, para pensar sobre a cativa dele.

      Ele devia estar fora de si, tamanha a luxúria contrariada, quando a achou em Whitby, ou ele teria percebido imediatamente que ela acreditava que a viúva virtuosa era muito mais próxima da realidade , em seu íntimo, que a prostituta brilhante que fora.

      Ele a seqüestrara para ter a amante fascinante de volta e fazer com que ela pagasse por sua dura traição. Agora o problema era que, antes, ele quis achar Soraya em Verity, agora, quer achar Verity em Soraya.

      Deus sabia o porquê. Soraya oferecia a ele tudo aquilo que um homem sensato desejava. Uma parceira disposta na cama. Uma companheira sofisticada, sem qualquer tempestade emocional inconveniente. Enquanto Verity...

      Encare isto, Kylemore, ele disse a si mesmo, Verity é doce e vulnerável como Soraya nunca foi. Ela é galante e honesta e deliciosa como um pêssego suculento, onde você pode afundar seus dentes. Verity bane seus pesadelos. Verity lhe dá paz. Ele queria as duas.

      Na noite passada, ela havia se rendido, finalmente, à fome sensual que existe entre eles. Ele até mesmo se perdeu na própria liberação, pois não se equivocou com a reciprocidade de prazer que obteve. Ele só precisava seduzi-la mais uma vez em um humor maleável. Então, ele a convenceria das vantagens de se tornar a Duquesa de Kylemore. As vantagens?

      A diversão azeda encheu-o. Quais eram as vantagens de um matrimônio com ele? Um marido autodestruído, perturbado, que tinha gastado a vida em seu próprio inferno privado? Séculos de miséria, loucura, vícios em sua linhagem? Um futuro como um pária social?

      Aliança com o tolo sujo, que carregava o título de Kylemore, desgraçaria a mulher que ele conhecesse, qualquer que fosse o pensamento do mundo sobre esse par. Condenada.

      Em frente a ele, notou a inclinação do pescoço gracioso dela. Contra o colarinho Elizabethano do vestido carmesim dela, endureceu e elevou a parte de trás para endireitar o cabelo preso, a face dela estava tão pálida e triste quanto uma efígie em uma tumba marmórea.

      Ela manteve um ar quieto toda à noite. Ele estava acostumado a que ela se irritasse com tudo o que ele dizia. Ele confiava nas reações espinhosas dela para manter o desejo dele inconvenientemente maldito, de modo controlado. Mas hoje, continha um limite desesperado, como se ela se forçasse a atirar e a lutar.

      — Bem? — ele perguntou.

      — Como desejar Sua Graça —, ela disse apagada, apanhando a colher e começando a tomar a sopa.

      Ele resistiu ao impulso de levá-la escada acima e fazer bem sua crua ameaça, qualquer coisa para despertá-la de seu desespero. O fogo interno dela estava imerso e frio esta noite, e a ausência de seu calor deixou-o congelado e só.

     

      Kylemore esperou até depois do jantar, antes de perguntar o que realmente o interessava, nenhum dos dois entrou na categoria de civilidade, apesar do que ele tinha dito mais cedo.

      Ele espreguiçou-se ao lado de Verity, em uma poltrona em frente ao fogo, com um copo de porto balançando em sua mão. A taça de vinho dela descansava intacta na mesa próxima ao seu cotovelo. Ela quase não tinha comido da deliciosa comida que Kate tinha preparado.

      Confuso, ele se preocupava com a moça como uma maldita babá. Onde, infernos, estava o malvado Duque de Kylemore? Ele se lembrou com desespero crescente de que a meta dele neste vale, era vingar-se de sua amante enganadora.

      Ainda, no terceiro mês, desde que ela fugira, o tinha aborrecido o quão pouco sabia sobre ela. Ele tinha explorado cada polegada do corpo deleitável dela, contudo ele não tinha nenhuma idéia sobre onde ela tinha crescido. Ele precisava aprender o que havia atrás desses belos olhos prateados. Aquela curiosidade se tornara suprema na noite anterior.

      Na noite passada, ela tinha insistido que o odiava,depois o abraçou, salvando-o dos pesadelos que o afligiram.

      — Você nunca me falou o que a fez adotar sua profissão —, ele disse com calma deliberada.

      Uma expressão assombrada cruzou a face dela rapidamente. Se ele não estivesse observando-a tão de perto, não teria percebido a reação dela.

      — Eu estou segura de que toda prostituta tem uma história semelhante pra contar —, ela disse em um tom mordente e sem olhar para ele. — Eu não vejo nenhuma necessidade de aborrecer Sua Graça com os detalhes.

      Quão rápido ela preferia referir-se a si mesma como uma prostituta. Se havia uma mulher de reputação duvidosa que se manteria acima de qualquer ofensa, era Soraya.

      — Favoreça-me —, ele disse suavemente, notando o jogo divertido da luz do fogo pela pele cremosa revelada sobre o baixo decote quadrado do vestido.

      Pelo menos a pergunta dele dispersou a derrota dos olhos dela. Ela elevou a cabeça e olhou para ele com a volta do seu habitual desafio ardente.

— Isto é parte da minha punição, reviver cada pecado para seu deleite?

      — Confissão é bom para a alma —, ele disse suavemente. — Por que não me fala? Eu a deixarei saber se a história ficar tediosa.

      Ela se levantou, a face dela dura com o desdém. Ele deveria ter adivinhado que ela nunca renderia os seus segredos, só por uma pergunta.

      — Não.

      Soraya nunca tinha dito que não, mas Verity, sim. Ele pegou a mão dela para impedi-la de partir.

— Eu pretendo descobrir, Verity —, ele jurou.

      Ela arrebatou longe dele.

— Você comprou meu corpo, não minha mente, um ano atrás, Sua Graça.

      Tão imperiosa quanto qualquer duquesa, ela marchou para fora.

 

      Kylemore entrou no quarto de Verity, com a intenção de provar aos dois que ele ainda era seu amante insensível.

      Abandonado para pensar na sala de estar, ele tinha decidido que estava cordialmente doente por debater as essências de Soraya e Verity. Em Whitby, ele soubera exatamente o que queria da amante. Ela aprenderia qual era seu lugar: na cama dele. E depois de aprender, ela ficaria lá, pronta, engenhosa, eternamente disponível.

      Ele estava desesperado para recuperar aquela simplicidade de propósito.

      Depois da saída da moça arrogante, ele não estava surpreso ao descobri-la sentada no assento de janela pronta para a batalha. Ela não removeu o vestido deslumbrante que usou no jantar. A face bela dela indicava resistência teimosa. Ela estava claramente tão disposta a deitar embaixo dele, como estaria de andar em Marrocos descalça.

      Talvez, a falta de atenções dele nesta manhã, a tenha incomodado e ela assumiu então, que poderia persuadi-lo a deixá-la sozinha.

      Era tola em acreditar que isso pudesse ser verdade. Ele estava quente e sensual e tinha sede por alívio, que só ela poderia oferecer-lhe.

      — Sua Graça —, ela disse sem se levantar e sem um rastro de acolhimento.

      — Tire suas roupas e vá para a maldita cama —, ele rosnou suavemente da entrada.

      Um aborrecimento familiar submergiu a vulnerabilidade momentânea que ele pensou ter captado nos olhos dela.

— Eu vejo que Sua Graça está com pressa —, ela estalou. — Por que eu não simplesmente ergo minhas saias e me apóio contra a parede? Desse modo, você só precisa dedicar cinco minutos ao negócio.

      — Não me force, Verity. — Ele arrancou o lenço do pescoço e arremessou-o ao chão ao se aproximar dela. — Você não gostará dos resultados.

      — Eu já não gosto dos resultados —, ela disse friamente.

      Neste momento, ele não teve nenhuma dificuldade em reconhecê-la como Soraya, pois, uma vez que ela o tinha tomado como seu amante, nenhuma recusa fizera parte do repertório dela.

      Ele lhe deu o olhar nivelado que sempre obtinha obediência imediata de todo mundo, a não ser desta esbelta mulher.

— Mentirosa. Você gosta bastante dos resultados. O que eu não posso entender é por que você passa por este minueto elaborado, antes de nós conseguirmos o que queremos.

      — Eu não quero —, ela disse continuamente. — Você sempre confundiu o que eu faço por necessidade com o que eu faria, se estivesse livre para seguir minhas próprias inclinações.

      Ele tirou a camisa por cima da cabeça e a enviou ao chão depois do lenço.

— Eu sei que você é melhor que isso. Você é, no fundo, uma sensualista, minha querida. É o que a fez uma grande cortesã. Você fica viva ao meu toque. Você sempre ficou.

      Ela pareceu mais gelada nesse minuto. Ele se sentou na cama e estendeu uma perna na direção dela.

      — Ajude-me com minhas botas.

      Ela estava de pé e seus olhos reluziram com fúria.

— Tire-as você.

      Com um encolher de ombros, ele arrastou o calçado.

— Se eu tiver que fazê-lo....

      Ele olhou para onde ela esperava, orgulhosa e dura como uma estátua. Verdadeiramente, ela excedia qualquer grande senhora que ele conhecera quando se tratava de agüentar.

      Onde ela tinha aprendido seus formidáveis modos? Um dia ela lhe contaria, ele prometeu a si mesmo.

      — Você está desperdiçando seu tempo, você sabe —, ele pontuou, comprimindo a curiosidade para uma consideração posterior. — Nada do que você diz me fará fazer ficar bravo.

      Surpreendentemente, um sorriso desdenhoso encurvou aquela boca luxuriante.

— Eu já vi Sua Graça em humores mais uniformes.

      — Há outros modos para trabalhar humor doente que um ajuste solene —, ele mostrou de modo lustroso e ficou contente em ver o desânimo expelir a confiança breve dela. Ele aproveitou sua vantagem momentânea. — Eu pedi a remoção de sua roupa.

      — Eu não acredito que qualquer pedido estivesse envolvido —, ela atirou de algum lugar atrás dele.

      Ele atirou as botas no canto onde pousaram com um baque alto. Geralmente, ele era um homem organizado. Fazia parte do controle cuidadoso cultivado há anos. Mas ele queria que ela reconhecesse que tudo nesta casa era dele – inclusive ela – e que ele tratava os bens dele como bem entendia.

      Descalço e ainda usando as calças, ele andou com ares de superior para onde ela estava de pé. Ela se retirou com um passo para trás antes que tomasse coragem e ficasse firme.

      Coragem fútil. Muito melhor para ela, se ela estivesse com seus saltos. Mas claro que, ela tinha tentado isso na noite anterior e apenas tinha demorado seu destino inevitável.

      Como ele tinha lhe dito, ele conhecia todos os esconderijos nesta propriedade. Quando a loucura tomava o pai dele, a vida de Kylemore dependia da sua habilidade para desaparecer. Ele tinha usado freqüentemente o buraco no matagal, só porque era próximo o bastante da casa para uma fuga rápida.

      Ela elevou o queixo e olhou para ele.

— Kylemore, não faça isto.

      Ele ficou aliviado ao notar que as palavras dela continham mais demanda que solicitação. Ele a preferia quando ela agia como a amante insolente dele. Quando ela estava triste, ele se sentia como a pior lombriga que já rastejou na terra.

      Deus, ele estava fazendo isto novamente. Ela era uma mulher, não duas. Mesmo se ela lhe desse trabalho suficiente por cem.

      — Argumentos são fúteis e você sabe disto—, ele disse uniformemente.

      — Você não está cansado de se forçar em mim? Que satisfação há nisso?

      Ele riu zombeteiro.

— Você não é tão ingênua. Nós dois sabemos que satisfação não é o problema. Eu poderia dizer até mesmo que acho sua resistência excitante. Soraya era sempre tão... submissa.

      Algo que poderia ter sido vergonha fluiu nos olhos cinzas dela, mas não oscilou.

— Então se eu abrir minhas pernas sem argumentar, você renunciará este jogo?

      Era um jogo? Neste preciso momento, parecia como vida e morte.

      Entretanto, ele sempre tinha sido um escravo do desejo por ela. A tê-la, inacreditavelmente, apenas dobrara o peso das correntes dele.

      — Vamos tentar e ver, que tal? — Ele a tomaria do jeito que pudesse, embora não fingira que não adquirira até agora a rendição que ele almejava.

      — Maldito —, ela disse baixo e tremendo a voz, com os pulsos apertados aos lados do corpo. Ela girou em um alvoroço de saias carmesins.

      Ele agarrou o braço dela, sentindo a força flexível nela e a balançou para ficar frente a ele. Ela não era nenhuma fraca, a mulher dele. Mas ela precisava entender que ele sempre seria o mais forte.

      — Oh, não. Eu não a estou perseguindo pelas carreiras de arbustos hoje à noite, minha querida —, ele disse demoradamente. — Nós guardaremos essa diversão particular para alguma outra ocasião.

      — Eu não sou nenhum objeto inanimado —, ela protestou.

      — Ultimamente quando você esteve debaixo de mim, eu fiquei desejando saber —, ele disse cruelmente.

      A inalação afiada dela era a única advertência a ele. Ela ergueu a mão e o esbofeteou no rosto.

      A racha do sopro arremedou no quarto repentinamente silencioso.

      Então ela libertou a respiração em um soluço e começou a lutar determinada. Kylemore, sua face picando, agarrou-a asperamente com ambas as mãos.

      — Você sentirá muito pelo que fez —, ele rangeu fora.

— Eu sinto muito tê-lo conhecido! — ela gritou de modo selvagem.

      — Você não está só nesse sentimento.

      — Então por que você não me deixa ir? Termine este mal antes que arruíne nós dois.

      Ele sentia um sorriso manhoso esparramando pela face dele.

— Você sabe por quê. — Ele enterrou os dedos na massa grossa de cabelos pretos dela, que estavam presos em um penteado elaborado. — Por causa disto.

      Ignorando o torcer dela, ele forçou a cabeça dela para trás e mergulhou para tomar sua boca. Pelo espaço de um segundo, os lábios dela se esticaram em rejeição. Então ela respondeu à fúria dele com sua fúria própria e o beijou de volta, viciosamente, esfomeadamente. Apaixonadamente.

      Ele inclinou as mãos pelos cabelos dela, até que caiu em abandono pródigo, descendo por suas costas, enquanto todo o tempo, a boca dele arrebatava a dela, numa capitulação exigente, que ela não podia evitar em dar. Aquele beijo desesperado, infeliz indicou a necessidades dela mesma nadando próximo à sua escassa resistência.

      Ofegante, ele elevou a cabeça, o gosto dela afiado e rico em sua língua. Ele procurou nela algum sinal que lhe mostrasse que o desejo de ambos havia se fundido. Mas enquanto a boca de Verity estava inchada e molhada com os beijos dele, os olhos dela estavam brilhantes com raiva.

— Se Entregue, Verity —, ele implorou roucamente, com seu orgulho sufocado pela fome esmagadora do seu desejo por ela.

      — Nunca —, ela insistiu.

      Então espantosamente, ela o alcançou e o arrastou para baixo para outro beijo. As bocas deles duelavam e se separavam, então se encontravam novamente, desta vez pelo que pareceu uma eternidade.

      Isto não era como nenhum beijo que ele alguma vez tivesse compartilhado. Isto falava de paixão e raiva e miséria e uma batalha infinita por supremacia.

      E prazer. Prazer tão intoxicante que fez a cabeça dele girar.

      Enrolando seu braço ao redor da cintura esbelta dela, ele a curvou para trás para colar sua boca na garganta pálida dela. O pulso de Verity batia de modo selvagem sob os lábios dele. O sangue temerário batia num ritmo inexorável de tentação que o chamava como o ópio tinha chamado seu pai para a ruína.

      Ele provou cada respiração tremente que ela tomava. A sensação era insuportavelmente íntima, como se ela vivesse só pelos beijos dele. O cheiro quente da pele feminina rodeou-o, atraindo-o a importunidades adicionais. As narinas dele chamejaram quando testou a estimulação crescente da excitação dela do modo mais primitivo.

      Os dedos dela apertaram convulsivamente a carne dele. As unhas dela rasparam pelo cabelo encaracolado do tórax másculo, arreliou um mamilo. Ela esfregou seu corpo flexível, ainda no vestido de seda, contra o torso nu dele como se ela quisesse sentir a textura da pele dele. A excitação do duque saltou outro nível para alcançar um lance insuportável.

      Afinal, ele tinha tocado a superfície segura de Verity, talvez até mesmo fundo o bastante, para revelar Soraya, muito embora a cortesã nunca cairia vítima de tal necessidade violenta. A mulher nos braços dele tremia à beira de seu controle.

      Se ele pudesse continuar a penetrar a superfície de Verity, talvez pudesse chegar à extremidade de Soraya.

      Com um riso instável, ele a rodou e a arremessou sobre a cama. Ela deu um grito estrangulado quando saltou no colchão. Antes que ela pudesse rolar para fora, ele lançou-se a ela, empurrando-a com seu corpo necessitado de desejo.

      — Eu o odeio —, ela assobiou.

      — Você já disse isso. A repetição está se arriscando a ficar cansativa.—, ele disse num tom deliberadamente entediado, mesmo sentindo o sangue quente trovejando nas veias dele.

      — Repetição não faz isto menos verdadeiro —, ela disse barbaramente. Os olhos dela brilharam com fúria e por lágrimas não derramadas quando o fitou.

      Deus sabia o que ela via. Certamente, ele tinha abandonado qualquer sobra do homem civilizado que tinha se considerado uma vez. Ele a tinha tratado brutalmente antes, mas isso tendia para algo mais escuro e eles dois sabiam disto. Escarranchando-a, ele colocou seus dedos ao redor do colarinho elaboradamente bordado do vestido dela.

      Ele recordou o prazer que havia sentido ao escolher o vestido adorável da modista. Tinha valido o resgate de um sultão, mas ele não se preocupou. Ele fora cativado, ao imaginar a cor vívida do vestuário contra a pele sem defeito de sua amante.

      — Eu não agüentarei isto.— A respiração dela emergiu em suspiros ofegantes e sua boca brilhou úmida dos beijos ferozes.

      — Oh, sim, você vai —, ele grunhiu. — Você me agüentará.

      Uma torcedura volumosa. O vestido extravagante e a troca debaixo se dividiram até a cintura dela. Os peitos magníficos dela se derramaram livres.

      Os mamilos dela estavam duros e enrugados, tentadores como frutas maduras. Ele baixou a cabeça e lambeu um cume róseo. O gosto do seu seio imediatamente inundou a boca dele, aumentando a excitação excessiva dele. Ela gemeu e até mesmo pela estimulação cega dele, ele ouviu desespero no som surdo.

      Ele rodou o mamilo dela nos lábios e puxou duro. Ela era primorosa. Perfeita. Perfeita para ele. Ele deslizou as mãos dele ao longo dos flancos dela e deu a atenção ao outro seio.

      Ele tinha que tomá-la. Nenhuma demora. Nenhuma hesitação. Agora. O demônio nele estava cansado de se encontrar equilibrado, demônio esse que ela atara dentro dela.

      — Eu não quero feri-la —, ele murmurou por último, com um rastro de afogante consideração.

      — Você me fere só por existir! — ela chorou.

      Em negação muda do que ela disse, ele reivindicou seus deliciosos lábios em outra exploração urgente.

      Pelo frenesi de rejeição, as mãos dela encurvaram ao redor como garras nos ombros nus dele. O selvagem que espreitava dentro dele exultou em saber que carregaria a marca dela. Ele a beijou novamente, usando a língua e compelindo a participação dela.

      Ele empurrou para cima as saias do que era agora o trapo caro que ela usava e acariciou entre as pernas dela. Ela já estava molhada. Logo ele sentia a pressa da resposta dela contra os seus dedos sonantes.

      Ela gemeu na boca dele e finalmente o beijou. Ele rasgou as calças para se livrar e mergulhar todo seu comprimento nela.

      Ela ofegou e se deitou parada. O calor vivificante dela o cercou. Os músculos macios e lustrosos da passagem interna dela o apertou como se ela pretendesse mantê-lo para sempre dentro dela.

      Ele pretendia marcá-la do modo mais básico. Ele pretendia mostrar para ela, que ele realmente era a besta insensível que ela acreditava que fosse. Mas quando ela ergueu os quadris para acomodá-lo, a doçura brilhante do momento derrotou-o. O desejo velho de possuí-la e o prazer que vazou pelo frenesi dele, temperou sua luxúria ávida.

      O toque dele automaticamente se tornou gentil e, em vez da saquear como um conquistador, ele se segurou sobre ela, se aquecendo no momento primoroso.

      Ela era tudo o que ele alguma vez tinha querido. Isto, isto era o porquê de ter vivido até aqui. Isto valia a danação eterna que ele cortejava com os pecados dele contra ela. Ele lutaria contra o fogo do inferno, se esta ligação inefável fosse o seu prêmio eventual.

      Ele se agarraria ao êxtase glorioso enquanto pudesse. Então ele começou a se mover, cada golpe profundo era deliberado para enfatizar o domínio dele. Ela suspirou e libertou o aperto forte que manteve nos ombros dele e deslizou os braços ao redor das costas dele.

      Ridículo achar aquele abraço relutante tão afetuoso. Mas realmente o afetou. Mais do que as carícias experientes dela em Londres. As mãos dela começaram a acariciá-lo a tempo com os empurrões dele, localizando a espinha de tensão dele, indo para baixo, misturando-se com os músculos tensos do traseiro masculino. Ele soube que ela estava perdida na atração sensual liberta entre eles e que ela não tinha nenhuma idéia que estava tocando-o.

      O calor incendiário nos lombos dele ameaçou explodir, mas ele batalhou para se conter. Ele precisava que ela cedesse ao êxtase, quase mais do que ele mesmo precisava de sua própria liberação, até mesmo demorando na própria maldita satisfação, quase o matando.

      Ele empurrou o passo. E desta vez, ela se uniu. Ela gemeu novamente, o som soou doce nas orelhas dele, e embrulhou as pernas dela ao redor dos quadris dele, urgindo-o mais íntimo. Então ele ficou cego e surdo a tudo, menos à fricção deliciosa de entra e sai do corpo dela.

      Logo, ele sentia o tremor dela como o começo do momento decisivo do prazer feminino. Ele tentou arrear o momento desesperadamente quando ela cedeu a ele, quando ele segurou o balanço final em cima dela.

      Mas era impossível. O vendaval familiar o arrebatou para cima e o rodou aos céus.

      E como já na conflagração de desejo, perguntas de propriedade e dominação se dissolveram a ruínas.

     

      Kylemore voltou gradualmente à consciência para achar Verity deitada, silenciosa e submissa, embaixo dele. Lágrimas marcaram rastros prateados por suas bochechas de marfim e se acumularam nos cílios pretos e grossos junto ao redor dos olhos cinzas ofuscados. Ela não precisava falar que o menosprezava pelo que tinha acontecido há pouco.

      Se a meta dele tivesse sido devolver as interações deles ao nível mais simples, ele tinha falhado totalmente. Ela ainda o tinha como um escravo. Toda vez que ele a tomava, duro, rápido, ou lentamente, ternamente, os laços os uniam cada vez mais apertado.

      Ele era um bárbaro, mas passaria de boa vontade novamente por todo o tumulto e dificuldade, só por estes momentos preciosos nos braços dela.

      Ele não tinha achado Soraya no fim. Ele não tinha despertado de novo a ousadia, a desinibição da amante que ela mantinha fechada dentro de si, a amante da qual ele se lembrava em Londres.

      Ainda quando ele fez amor com esta mulher que o opôs com toda força da alma dela, ele tocou profundidades emocionais as quais ele nunca tinha sondado antes.

      Ele quebrou lentamente longe dela, relutante. Ela deu um grunhido macio de desconforto.

      Ele tinha sido brutal. Mas ele não tinha perdido, pois ela tinha alcançado o próprio cume. Não tinha sido a explosão deslumbrante noite anterior, mas na plenitude da tempestade, ela o tinha abraçado. Ele tinha feito com que ela confrontasse a verdade que ela não podia mais negar.

      O corpo dela tinha se aberto ao seu, mesmo querendo manter a mente e o coração dela fechados.

      Ele disse a si mesmo que o corpo dela era tudo o que ele desejava.

      A declaração soou comicamente vazia. O encontro febril tinha mordido mais profundamente que as demandas passageiras de carne podiam, porém ele desejava muito o contrário.

      Ela tomou uma respiração tremente quando ele se estabeleceu ao seu lado. Ele combateu o desejo de acariciar o cabelo preto úmido atrás da sobrancelha dela. Ela não daria boas-vindas à ternura dele, ele sabia com penetrante pesar.

      Eles se deitaram em tenso silêncio por um longo momento. Então, sem olhar na direção dele, ela se levantou da cama, juntando seu arruinado vestido ao redor dela.

      Ela parecia triste, moída, usada. Ela parecia bonita e tão necessário a ele quanto a própria respiração.

      Exausto como estava, ele a alcançou e pegou as saias moídas dela.

— Aonde você vai?

      — Vou me lavar —, disse ela desoladamente.

      — Fique comigo.

      — Sim.

      Ele carranqueou. Tal acordo fácil parecia improvável.

— Sim?

      Ela olhou para ele. Os olhos dela estavam planos e inanimados, como ele nunca tinha o visto antes.

      Ele tinha chamado a paixão dela. Mas a que custo?

      — Se eu correr, você me achará. Assim eu ficarei.

      — Bom. — Ele a deixou ir, enquanto se odiava de ver como ela o odiou, porém firmemente ela tinha se agarrado a ele, quando alcançou o clímax dela.

      Quando ela elevou a mão para escovar o pesado cabelo caído para trás, ele notou um anel de contusões que circulavam no pulso esbelto.

      — Eu a feri —, ele disse, se detestando ainda mais.

      Ela olhou as marcas sem interesse.

— Elas são de ontem à noite. Não importam. — Ela se virou, a cabeça dela se curvou deixando cair uma massa de cabelos. — Nada importa.

      Ele tinha lutado como um louco para esmagar o desafio dela. Por que, agora que ele tinha tido sucesso, tal aflição fatiou o coração que ele negava possuir?

 

Kylemore rastejou no buraco escuro dos arbustos onde ele tinha estado sempre seguro. Fora, o monstro fez alvoroço mais e mais próximo, então isto começou a cortar a parede protetora de ramos e espinhos.

      Quando o achasse, o mataria.

      Ele encolheu na escuridão, enquanto tentava não respirar. O monstro já sabia onde ele estava, mas talvez na escuridão, ele poderia desaparecer.

      Mas claro que, ele não pode desaparecer. O monstro alcançou suas mãos brancas espantosas e as torceu na frente da camisa rasgada e suja dele.

      Kylemore choramingou com horror. Espinhos nas costas dele cravavam em sua carne, prevenindo fuga, até mesmo se o impossível acontecesse e o monstro o deixasse ir. Ele choramingou novamente, menosprezando a fraqueza dele, menosprezando a estupidez dele em ser pego.

      O monstro deu sua risada furiosa e o arrastou adiante.

      Mais dor o esperava, ele sabia. O monstro o cortaria em pedaços e o faria alimento para os cachorros, da mesma maneira que tinha prometido tantas vezes antes. Antes, quando ele tinha conseguido escapar.

      Mas dessa vez, ele não tinha tido tanta sorte.

      — Não! Não, papai! Não, por favor! Eu prometo que eu serei bom. Apenas não me machuque! Papai, não!

      Mas as mãos brancas longas que eram maiores, versões cruéis das dele depois de um tempo.

      — Não! — ele chorou. — Por favor.

      As mãos brancas longas tremeram.

      Mas eles já não mordiam como garras na carne dele. Ao invés elas estavam frescas e suaves. Ele abriu os olhos para achar Verity se apoiando sobre ele na escuridão. Por um momento, ele estava muito desorientado para se sentir envergonhado da tremedeira e das lágrimas dele.

      — Kylemore, acorde. Você está tendo outro pesadelo —, uma voz calmante disse.

      Nenhum monstro então. Ele estava seguro.

      Este monstro particular tinha morrido vinte anos atrás. Voltando a realidade, ele piscou e respirou profunda. O tórax dele doeu, como se ele estivesse correndo por horas.

      — Um pesadelo —, ele repetiu e abominou o grunhido na voz dele.

      Ele tinha sofrido com os sonhos ruim durante Eton. Os colegas de escola mais fortes dele o tinham atormentado eternamente sobre a ação de soluçar e gemer a noite. Esses sonhos ruins tinham continuado durante a puberdade. Ele pensou que tinha se treinado para fora deles. As recordações não o tinham pegado durante anos. Kylemore frio, o duque magnífico, não permitia que nenhuma vulnerabilidade sacudisse sua calma.

      Era este vale. Ele nunca deveria ter voltado. Voltar para esta casa tinha sido o teste final para ver se ele se tornara tão impérvio quanto ele queria desesperadamente ser.

      Um teste que ele falhou espetacularmente.

      O corpo dele estava liso com suor e ele tremia. Ele se sentia tão só que ele pensou que morreria.

      Com um gemido mudo, ele embrulhou os braços dele ao redor da mulher que o odiava e enterrou a cabeça dele na suavidade dos peitos dela. Imediatamente, o cheiro que o assombrava dela encheu os sensos dele e o coração de corrida dele acalmou.

      Como ela imaginou que ele poderia algum dia deixá-la ir? Ela era o único ser da criação que lhe dava esta paz. Verity era tudo aquilo que se levantava entre ele e loucura. Era o destino de fardo intolerável e eterno colocado ante ambos.

      Por um momento longo, eles se deitaram enlaçados em silêncio. Ele se antecipou a repulsa dela. Que admissão patética que na vida inteira dele ninguém tinha lhe dado bondade ou tinha confortado ele que não tivesse comprado. Até que ela foi ao quarto dele ontem. Quando ela tinha oferecido a força dela e calor como luzes contra a escuridão.

      Ele não merecia a generosidade dela. Até mesmo na necessidade opressiva dele, ele reconhecia isso. Ele apertou o aperto dele no corpo esbelto dela, preparado para o escárnio e rejeição.

      — Shh, Kylemore —, a mulher nos braços dele murmurou. — Você está seguro aqui. — Ela foi para cima para a cabeceira assim ele se deitou mais confortavelmente contra ela.

      A surpresa o arranhou, baniu a habilidade dele de falar. Ela o detestava, lhe desejava morto.

      Assim por que a voz dela era tão macia? Por que o toque dela era tão suave?

      — Shh. — Ela alisou o cabelo longe da sobrancelha úmida dele com uma ternura que o cortou ao osso. — Era só um sonho.

      Tal consolação realmente era doce da mulher ele quis acima de todos. Mas por uma vez, a apetência dele para calor humano simples excedeu a apetência dele para o sexo.

      A própria mãe dele nunca o tinha segurado assim. A própria mãe dele nunca o tinha tocado com afeto até onde ele podia se lembrar.

      Ele se deitou imóvel enquanto a mão fresca de Verity escovava o cabelo dele. Cada golpe lento tirava um pouco mais do medo do sonho demorado.

      Ela cheirava como tudo de bom no mundo. Pão assado e grama cortada e a zona rural depois da chuva e ao ar limpo sobre a cachoeira no topo do vale.

      Ainda assim ela não cheirava como nenhum destes, mas puramente ela.

      Se ela o despachasse agora, ele pensou que ele gritaria como o menino apavorado que tinha corrido com medo da vida dele do próprio pai dele. Mas ela não o despachou. Ao invés, ela encurvou ao redor dele o protegendo das sombras escuras da casa.

      Ela sussurrou tolices macias na orelha dele. Era o som mais encantador que ele alguma vez ouvira. Ele se apertou contra ela, os dedos dele enroscando na camisola que ela vestiria antes de dormir. Gradualmente o pesadelo retrocedeu.

      Ainda ele não se mudou. Ele escutou o tenor plano da respiração dela, enquanto o calor dela vazava lentamente pela alma fria.

      O que estava pensando ela? Ele não sentia nenhuma condenação ou desprezo, embora ele merecesse ambos depois da paixão selvagem, destrutiva que ele tinha suplicado mais cedo entre eles.

      — Eu nasci em uma fazenda em Yorkshire —, ela começou quietamente depois de um silêncio longo. — Meu pai era um inquilino do Senhor Charles Norton.

      Ela parou, como se esperando por alguma reação, mas Kylemore não falou, amedrontado que se ele fizesse, ela poderia parar.

      Surpreendido para pensar que ela lhe oferecia finalmente uma pista para o mistério dela. Surpreendido que ela oferecesse os segredos dela quando ele menos merecia tais presentes.

      — Meu irmão, Benjamim, é cinco anos mais jovem que eu e eu tenho uma irmã, Maria, cinco anos mais jovem novamente. A saúde de minha mãe não era forte e eu cuidei dos pequeninos.

      Ela devia ter sido boa nisso, ele pensou. O nível mais básico dela era um instinto de cuidado. Testemunha como ela o ajudou agora, até mesmo depois de tudo que ele tinha feito a ela.

      A voz dela estava tranqüila e nivelada, como se ela lesse um conto de fadas a uma criança. A noite aglomerou dentro, confiando confidências.

      — Meu pai não era muito fazendeiro, mas nós administramos bem o bastante até que eu cheguei aos quinze e a febre varreu os pântanos. — Aqui a tranqüilidade hesitou ligeiramente, mas depois de uma hesitação mais longa, ela continuou. — Ambos meus pais morreram dentro de uma semana de um ao outro. Não havia nenhum dinheiro e eu era muito jovem para assumir a fazenda, até mesmo se o Senhor Charles tivesse alugado isto para uma mulher. Nós não tínhamos nenhuma família para vir para ajudar. Então eu achei um lugar para Ben e Maria com uma mulher na aldeia e eu me tornei uma empregada na casa grande. Eu não ganhava muito, mas era o bastante para manter as crianças de ficarem famintas.

      E tinha sido um trabalho penoso e interminável, Kylemore sabia.

      Talvez porque as únicas pessoas que tinham mostrado qualquer bondade com o menino tinham sido os criados, ele estava extraordinariamente atento às condições debaixo das escadarias. Uma jovem de quinze anos deveria ter conseguido o posto mais inferior possível em uma grande casa. E as empregadas juniores faziam o mais áspero, mais duro e a maioria do trabalho desagradável.

      — Eu não estava contente, mas eu fui determinada a suportar. — Outra hesitação, carregada de emoção. Ela deixou de o acariciar. — Até...

      Kylemore elevou a cabeça donde descansou nos peitos dela. Na escuridão, ele apenas discerniu a linha perfeita da bochecha dela e mandíbula sobre ele. As velas tinham queimado completamente há muito tempo restando tocos apagados. A falta de luz enfatizou outros sensos. Toque, cheiro, ouvido.

      — O que é, Verity? — ele persuadiu. — Até o que? — Ele se mexeu para cima assim ela se deitava agora no abraço dele. Ela apenas parecia notar.

      O corpo dela estava tenso onde antes tinha havido só facilidade flexível. Ela balançou a cabeça dela.

      — Isto é estúpido —, ela disse em uma voz que rangeu. — Eu não sei por que eu estou lhe contando. Que interesse pode ter um homem como você na vida de uma prostituta?

      — Não se chame disso! — ele estalou, então ele se forçou a falar mais temperadamente antes que ele despertasse a precaução protetora que ela se escondia normalmente. — Me fale o que aconteceu, Verity. — Ele já não se agarrava a ela como seu único refúgio, mas a segurava com força para lhe dar a força para continuar.

      — Senhor Charles era velho. Um viúvo. Bondoso em seu próprio jeito. A vida era suportável. Até aquele verão. — As orações curtas, agitadas dela revelavam a agitação dela. — O filho John dele veio de Cambridge. Por direito, ele não deveria ter conhecimento que eu existia.

      — Mas ele o quis. — A história velha, Kylemore pensou amargamente, mas isso não se fez mais saboroso.

      Ele podia imaginar Verity aos quinze. Bom Deus, ela deveria estar próxima dos trinta agora e ela ainda o deixava sem fôlego. Apenas emergindo da puberdade, ela deveria ter sido primorosa.

      Primorosa e totalmente indefesa.

      Ela acenou com a cabeça, o cabelo sedoso, solto dela deslizando aprazivelmente contra a pele nua dos braços dele abrigando-a.

— Sim. — Ela tomou uma respiração tremente. — Eu tentei ficar fora do caminho de John uma vez que eu entendera o que ele queria. Eu lhe implorei que me deixasse só. Eu pedi aos outros criados ajuda. Eles fizeram o que puderam. Mas...

      — Mas ele era o filho e o herdeiro e você era um nada sem dinheiro.

      Kylemore desejou que o desconhecido John Norton estivesse aqui assim ele poderia ter reivindicado o privilégio de bater no insensato. Irônico, considerando o próprio comportamento dele para Verity.

      — Sim. Eu era então caipira. Meus pais eram Metodistas rígidos e eu era como um cogumelo rural ingênuo que você poderia encontrar.— Ela deu uma risada sem humor. — Eu tive uma confiança tola na bondade da humanidade que eu não posso acreditar ser possível agora.

      — O bastardo a enganou —, Kylemore disse de modo chato. O que ela disse o feriu, lançou um reflexão cruel no próprio comportamento dele.

      — Ele... ele enviou uma nota dizendo que queria se desculpar. Como se aquele sujeito tolo alguma vez se rebaixasse a tanto. Eu era tão estúpida, eu pedi pelo que aconteceu.

      O abraço de Kylemore apertou ao redor dela.

— Não—, ele disse insinceramente. — Você não pediu isto.

      Ele quis dizer todo mal que tinha acontecido a ela, não só o estupro de um descendente jovem irrefletido da pequena nobreza. Vergonha fluiu preto e acre nas veias dele, e a barriga dele agitou com contrição e pesar.

      — Ele me pediu que o encontrasse uma tarde no quarto de música. E ele... e ele...

      Ela enterrou a cabeça dela contra ele como se escondesse das velhas recordações. Ela sequer percebeu que o homem que a atormentava no presente a segurava a salvo contra os velhos fantasmas dela? Ela sabia como o coração dele se contraia em piedade e maravilha quando ela se virou para ele na extremidade dela?

      — Ele a atacou —, Kylemore disse, adoeceu.

      — Sim. Eu não pude o combater. — A voz cascuda dela era surda no tórax dele. — Eu gritei por ajuda, mas ninguém veio. Ele rasgou a minhas roupas e ele me perfurou. Eu lutei, mas ele era maior e mais forte. Ele me bateu no chão. Quando eu caí, eu bati minha cabeça. Antes que eu pudesse ver novamente, ele estava... ele estava em cima de mim e ele estava tentando... ele estava tentando...

      — Ele a estuprou. — Como ele podia agüentar ouvir mais?

      — Não —, ela disse inseguramente, elevando a cabeça dela e olhando para ele. Os olhos dela tremulavam na face pálida. — Não, ele não me estuprou. Sir Eldreth Morse era um convidado na casa. Ele ouviu o grito e ele entrou antes.

      Ela tomou uma respiração trêmula antes de continuar.

— Ele puxou o John para longe de mim e recusou escutar quando o vira-lata tentou me culpar pelo que aconteceu. Deveria ter estado claro ele tinha me forçado. Eu estava sangrando onde ele bateu em mim.

      — Assim Eldreth só a salvou para ele mesmo a corromper —, Kylemore disse austeramente.

      Por que infernos ele estava tão bravo? Ele não tinha se comportado nem um pouco melhor quando encarou a tentação que essa mulher apresentou. A realidade brutal era que ele e John Norton eram irmãos debaixo da pele. Kylemore pode nunca ter se forçado nos serventes - ele nunca precisou - mas o tratamento dele à sua amante não brilhava na luz mais bondosa.

      — Não, você entendeu mal. Sir Eldreth me ajudou —, ela disse veementemente. — Ele era amável. Ele falou com o Senhor Charles sobre John. Não foi culpa dele eu ter perdido minha posição.

      — Eles a despediram pelo crime de atrair a atenção do filho deles.

      — Eles acreditaram em John no lugar de Eldreth. Eles não deveriam tê-lo feito. Eu não fui à primeira menina criada que tomou a afeição dele e eu não era certamente a última, ou a menos afortunada. Eu percebo agora que ele era um homem que gostava de ferir as mulheres. Sir Eldreth me salvou de tudo aquilo.

      — Cristo —, Kylemore murmurou debaixo da respiração dele.

      Asperamente, ele se rasgou dos braços dela e deixou a cama. A violência na alma dele ameaçou estourar. Ele precisava recuperar o controle antes de se quebrar sob a tempestade de emoções que o esbofetiavam. Culpa. Tristeza. Raiva. Empatia pouco disposta por alguém que teve um passado tão torturado quanto o dele próprio.

      Continuando jurando, ele caminhou a passos largos pelo quarto e arremessou as cortinas para os lados com um estrondo. Ainda estava escuro lá fora. Mas não quase tão escuro quão o tumulto furioso dentro dele.

      Com os dedos trementes, ele firmou os calças que ele nem mesmo se aborreceu em remover antes que ele tivesse a tomado. O ar estava frio nos ombros nus dele quando ele olhou para fora pela janela.

      — Kylemore? — ela perguntou em confusão da cama.

      — Eldreth a salvou para uma vida de vício e degradação —, ele disse com dificuldade, fazendo carranca pelas barras às montanhas esboçadas contra o céu noturno.

      — Era melhor do que ter ido para as ruas —, ela devolveu com calor igual. — Que é onde eu teria terminado. E o que teria acontecido então a Ben e Maria?

      Deus a ajudasse, Deus o ajudasse, ela tinha razão. As mãos dele esmagaram o brocado rico das cortinas. Ela tinha começado a história dela para o desviar do pesadelo dele. Pouco ela soube que o que ela descreveu criou seus próprios pesadelos.

      Esta era uma confissão, mas uma confissão feita a um padre lançado ao inferno com os próprios pecados vis dele.

      — Sir Eldreth me achou na aldeia. Quando ele viu minha destituição e que eu tive o pequeno para olhar depois, ele me pediu que fosse a amante dele.

      — E você disse que sim —, Kylemore disse amargamente.

      Misturado dentro com suas as outras reações corrosivas, o ciúme corroeu como ácido no intestino dele. Ciúme em cima da posse física do baronete ancião, mas ainda mais sob o afeto na voz dela quando ela falava dele. Ela ainda o admirava, respeitava, gostava de Sir Eldreth.

      Ela o amou?

      Por que a pergunta surgiu? Amor não era parte de qualquer pechincha que ele alguma vez tinha feito com Soraya. Ou Verity.

      — Não era o que eu queria —, ela replicou, claramente picada, embora ele não tivesse insinuado que ela se vendera alegremente. — Ele disse que ele sustentaria Maria e Ben. Ele me falou que eu poderia usar minhas vantagens. Ou então se permitir se tornar à vítima deles.

      Kylemore se virou para longe da paisagem para acender uma vela, e só então ele olhou para ela. Ela se suportou alta contra os travesseiros e os olhos dela estavam nublados com tumulto.

      — Ele lhe falou o que os homens sempre a desejariam. — Ele ouviu o cinismo na voz dele.

      — Isso é uma aproximação crua —, ela estalou. — Ele me ofereceu abrigo e segurança. Luxo. Um mundo que eu nunca tinha conhecido. Uma chance para aprender e experimentar e desenvolver.

      — Em troca da qual ele tiraria sua inocência.

      Verdade deu um sorriso mundano para ele, isso era uma lembrança breve que ela tinha tido toda a Londres uma vez aos pés dela.

— Kylemore, você mais que qualquer um sabe que os homens não tomam conta de uma mulher sem exigir nada em troca.

      Ele desejou poder negar isto. Ele desejou poder reivindicar que ele era diferente, mas eles os dois reconheceriam a mentira. Estava muito tarde para ele se tornar o cavaleiro branco de Verity até mesmo se um canalha vil como ele pudesse fazer aquele papel com qualquer convicção.

      Com tristeza penetrante, ele lamentou toda a inocência perdida, a dele e a dela. Circunstâncias azaradas e humano malvados tinham os forçado a amadurecer muito tempo de eles estarem prontos.

      Quando ele não falou, ela encolheu os ombros e continuou. O gesto era tanto a notória Soraya que a respiração parou na garganta.

— Pelo menos Eldreth manteve o lado dele do arranjo fielmente. Com uma generosidade excepcional, na realidade. Ele me levou para Paris, ele contratou os tutores, ele criou a famosa cortesã. Acredite-me, um personagem principal como o Duque de Kylemore não teria gastado nem um momento com uma caipira de Yorkshire.

      Exceto que ele a teria notado.

      Sim, ela agora sabia ter o lustro de sofisticação. Mas o que o puxou, o que sempre tinha o puxado, era alguma essência indefinível que era puramente dela. O que ela o disse poderia responder a permanente curiosidade dele, mas nada temperava a fascinação dele.

Ele estava começando a aceitar que nada o faria.

Ele não lhe falou isto. Ao invés, ele perguntou algo que sempre tinha o intrigado.

— De onde veio o nome Soraya?

      Então ele sentiu ter expressado a pergunta. Um sorriso aficionado cruzou a face dela e a dúvida dele endureceu em certeza. Ela tinha amado o Morse.

      O fez ansiar esmagar algo. Violência poderia aliviar a tempestade na alma dele, uma tempestade que ele não tinha nenhum direito em sentir.

      — Você deve saber sobre a coleção de Eldreth de livros perversos. Era famosa.

      — Sim.

      Durante as investigações dele sobre o passado de Soraya, ele acabou aprendendo muito mais sobre o protetor rico dela do que dela. Mais, na realidade. A coleção célebre de literaturas eróticas obscuras tinha servido a um homem com uma jovem e bela amante, uma grande fortuna e nenhuma responsabilidade problemática em casa ou lar.

      — Soraya era a heroína de um das histórias favoritas dele. Ele costumava ler para mim; ela era uma jovem cativa no harém que restabeleceu a vitalidade de um sultão envelhecido. Eldreth começou a me chamar de Soraya como uma piada logo após nós chegarmos em Paris e o nome persistiu.

      Esta lembrança de brincadeira intimidade provocou outra onda agitada inveja. Indicava a uma relação mais rica que qualquer coisa Kylemore alguma vez alcançara com ela.

      O que compartilharam realmente ele e Verity? Sexo que ele teve que extorquir dela agora. Suspeita. Antipatia.

      Ele fitou invisivelmente a janela e tentou abafar as emoções turbulentas dele. Ele tinha tantas razões para agradecer o protetor morto dela. Morse tinha a salvado da agressão e pobreza. Ele tinha reconhecido as qualidades dela e as tinha nutrido. Poucos homens teriam feito tanto.

      Uma memória vívida surgiu na mente dele do primeiro momento que ele tinha conhecido Soraya.

      Quando Sir Eldreth Morse tinha apresentado a amante dele para aquele quarto abarrotado, Kylemore tinha lido apenas o regozijo de propriedade na face do baronete. Agora ele olhou para trás com os olhos da experiência, de seis anos que desejava aquela mesma mulher. E ele viu qualquer outra coisa.

      Orgulho. Morse tinha estado abertamente orgulhoso da jóia perfeita que ele tinha produzido para deslumbrar a sociedade.

      Sem a intervenção do velho homem, esta mulher incomparável jamais teria se movido na órbita de Kylemore. Qualquer homem sensato amaldiçoaria o Morse ao inferno por aquele fato.

      Sem Morse, ele nunca teria que suportar anos de frustração e miséria. Soraya era a única coisa que alguma vez tivesse chego perto de o destruir. Ela era o tormento dele e o perigo dele.

      Ela era a única esperança dele de salvação.

      A luz do amanhecer o deixou entender a abundância contundida dos lábios dela e a expressão cautelosa nos belos olhos cinzas dela. Seguramente, ela não podia temer que ele a condenasse pelo que ela tinha feito. O dilema dela tinha sido impossível, com a sobrevivência de outras pessoas dependendo das ações dela. Ela tinha tido a coragem para usar a beleza e a inteligência Deus as tinha dado para forjar um futuro. Um futuro brilhante, a isso.

      — Onde John Norton está agora? — Ele focalizou na história dela menos elemento ambíguo.

      — Kylemore, está muito tarde para o convocar pelo que ele fez a uma criada há mais de dez anos —, ela disse quietamente, os olhos cinzas dela não oscilando da face dele.

      Ele soube que ela era inteligente e perceptiva. Mas mesmo assim, o pegou de surpresa por ela ver tanto. Ele tinha tentado esconder a extensão cheia da reação dele ao que ela tinha lhe falado.

      — Nunca é muito tarde —, ele disse severamente.

      Ele quebrou a conexão muda entre eles e retrocedeu à janela. Sem prazer, ele assistiu o vislumbre claro pálido no lago. As barras tinham estado na janela tão longo que ele apenas as notou.

      Ele ouviu o sussurro de roupas de cama quando ela se levantou, então o bloco macio dos pés dela veio para ele. Ela parou atrás dele e o cheiro dela vagueou ao redor dele, o urgindo, como sempre, a pecar.

      Mas por uma vez, ele achou a vontade para resistir a tentação.

      — Está muito tarde para John —, ela disse, ainda naquela voz macia. — Ele foi morto em uma rixa de taverna no York. Ele lutou em cima de uma moça. Ele não tinha mudado.

      Assim o bastardo queimava no inferno e eternamente estava fora do alcance dele. Kylemore socou abaixo a raiva. Então incrivelmente, ele sentia dois braços esbeltos cercarem a cintura dele e uma doce pressão quando ela se apoiou nas costas dele.

      Soraya nunca o tinha tocado com afeto, até se trair no último beijo. E Verity nunca quis tocar nele. Ainda aqui ela o abraçava sem coerção. Ele sentia perdido, como se ele tinha sido arrebatado em algum mundo alternativo enquanto ele tinha dormido. Como eles tinham movido do pugilismo, paixões turbulentas da última junção deles para esta trégua estranha?

      — Você não pode defender minha honra —, ela murmurou no ombro esquerdo dele. A respiração dela roçou morna na pele dele, num contraste sensual ao ar fresco do novo dia. — De qualquer maneira, nós dois sabemos que eu não tive nenhuma honra para defender desde que eu tinha quinze anos.

      Talvez porque ele quis dizer o que ele disse tão intensamente, ele não olhou para ela. Ao invés, ele fixou o olhar dele na superfície brilhante do lago.

— Verity, você tem mais honra que qualquer um que eu conheça.

      Ela soltou um suspiro, um som infeliz e tentou se afastar, mas ele pegou suas mãos e a puxou , fazendo com que ela ficasse frente a ele.

— Você renunciou a tudo o que você acreditava por causa das pessoas que você ama. Então era bastante valente para aproveitar as oportunidades que sua vida nova oferecia.

      Os olhos que ela ergueu para ele estavam desertos com ódio de si mesma.

— Você nem sempre pensou tão bem de mim.

      — Inferno, Verity, eu a queria e você fugiu de mim. Eu estava bravo. Eu sempre a admirei. Agora eu percebo sua verdadeira qualidade.

      Ela vacilou e tentou se retirar.

— Pare.

      Ele manteve-a segura.

— Eu nunca a menosprezei, embora eu a tenha condenado quando você me deixou. Você se sacrificou para manter sua família segura, contudo você não pode se perdoar pelo que fez.

      Desta vez, quando ela puxou suas mãos, ele a deixou ir.

 

      Verity arquejava como se tivesse escalado há pouco uma montanha, quando somente caminhou para o andar de baixo até a cozinha. Apoiou as mãos na mesa velha cheia de marcas e curvou a cabeça. Por um longo momento, manteve-se parada, encurvada e tremendo. O corpo dela ainda doía das horas de sexo vigoroso e ela estava tonta com medo, fadiga e muita emoção.

      Reviver o passado dela tinha doído, mas era o próprio Kylemore quem tinha cortado toda defesa dela, atormentando seu coração.

      Ela amorteceu um soluço. Ela tinha que se afastar dali. Tinha que escapar, mesmo se a matasse. Se ela não tentasse, estaria perdida.

      O nobre bonito que dispensou rubis como se fossem maçãs não era nenhuma ameaça. O libertino sedutor que tirou prazer tremente do corpo dela, tocou a sensibilidade dela, mas não o coração.

      Mas ela não podia combater o homem que gritou à noite e se agarrou a ela como se ela fosse a única esperança dele.

      Nem ela poderia combater a revelação de que ela e o duque não eram assim muito diferentes, afinal de contas. Uma empatia furtiva por ele sempre tinha arruinado a distância emocional que ela lutava para manter. Agora para sua tristeza, ela sabia o porquê.

      Quando tivera que encarar com uma escolha impossível, ela criara Soraya. De um modo semelhante e por razões semelhantes, os terrores da infância do duque tinham-no forçado a se tornar Kylemore, o frio. Os pêlos se elevaram na parte de trás do pescoço dela quando recordou como o pai morto do duque revisitava os sonhos dele.

      Soraya e Kylemore, o frio. Ambas máscaras necessárias e requeriam decepção e mentiras. Ambas exigiam uma coragem desesperada e silenciosa em manter o curioso e rancoroso mundo à distância.

      A alma dele era escura, torcida e atormentada e estava cheia de mal, de dor e de pesar. A alma dele era gêmea da sua.

      Não, ela não deixaria isto ser assim. Ela era uma prostituta comum e ele estava entre os homens mais poderosos do reino. Nada os ligava, a não ser um passado de relações sexuais e a sede infinita dele de vingança.

      A luz clareou com o avançar do dia. Ela ergueu a cabeça e de modo selvagem deu uma olhada ao redor do quarto vazio. Esse lugar amaldiçoada a fez duvidar de si mesma. Se algum dia - por Deus, que fosse – ela voltasse para Ben, esqueceria essa loucura. O isolamento a fez questionar o que ela sempre soubera ser verdade. O Duque de Kylemore era um autocrata egocêntrico, superficial, cruel, imprudente. Ela era uma prostituta que levantou as saias para qualquer homem que a pagasse. O coração dela era de gelo.

      A mão dela fechada em um punho bateu na mesa, batendo esses fatos severos no cérebro dela. A dor pulsou para cima, no braço dela, arrastando-a para o presente.

      Ela respirou profundamente e observou. O amanhecer de verão se infiltrou pelas janelas altas para revelar a surpreendente verdade de que ela estava completamente só.

      Nenhum Hamish Macleish. Nenhum gigante. Nem mesmo as pequenas empregadas risonhas, Morag e Kirsty, que, ela pesquisou por aí, eram as sobrinhas de Hamish. O duque estava escada acima na cama, dormindo quase certamente depois da noite longa e transtornada.

      Esta cozinha vazia apresentava uma chance para escapar. Se ela corresse para fora, ninguém a buscaria por horas. O coração dela começou a galopar com excitação de nervoso e medo.

      Ela não tinha muito tempo. Os criados começariam o trabalho cedo. Com o dia cheio, as paredes do deu cativeiro se fechariam ao seu redor.

      Enquanto isso, ela se levantou na camisola que tinha pedido emprestado de Morag. Estava desesperada, mas não era nenhuma boba - ela precisava de roupas e suprimentos se esperava sobreviver nas montanhas.

      Uma procura rápida na cozinha revelou uma cesta de roupas limpas e suas botas de meio cano, polidas e prontas. Rapidamente, tirou seu traje de dormir e arrastou em um dos vestidos de Kate Macleish. Era usado e estava muito grande, mas estava morno.

      Meia-calças grossas. E um casaco - de Hamish, ela suspeitava - pendurado em um gancho perto da porta. Penteou o cabelo pesado em uma trança longa e o amarrou com um pedaço de trapo.

      Uma olhada na despensa resultou em um pão, um pouco de queijo e alguns recém colhidos damasco, uma fruta para a qual o duque tinha um afeto particular. Ela encheu um frasco de água e amarrou tudo em um pano.

      Se os céus estivessem sendo amáveis, algumas moedas estariam espalhadas sobre o banco, mas os criados das Highlands não deixavam dinheiro jogado por aí.

      Oh, o que ela não daria por uma das bugigangas deslumbrantes que Soraya tinha acumulado em sua longa e escandalosa carreira. Mas ela tinha vendido suas jóias quando deixara Kensington e tinha usado o dinheiro para fundar seus sonhos fúteis de liberdade.

      Talvez não tão fútil no final de contas, ela pensou em uma maré ascendente de otimismo.

      O plano dela era fraco. Ela reconhecia isto até mesmo quando se deixou sair da casa. O tempo poderia mudar, ela poderia se perder, ajuda pode não se materializar.

      Mas qualquer coisa era melhor que ficar esperando por sua inevitável destruição.

      Se ela sucumbisse ao que espreitava silenciosamente em seu coração, Kylemore a deixaria devastada e só quando tudo entre eles terminasse. Como inevitavelmente um dia iria acabar. Ela enfrentava menos perigo nas iminentes distâncias a percorrer do que estando com um homem altamente atormentado.

      Se ela tivesse sucesso escapando, nunca mais veria o duque. Desta vez, quando ela o deixasse, teria certeza de que nem mesmo um anjo rastreador a localizaria.

      Ela afastou algumas lágrimas que ameaçavam escorrer enquanto seguia através da grama ao abrigo das árvores.

      Três dias atrás, ela teria ridicularizado, acaso qualquer um tivesse sugerido que lamentaria deixar Kylemore. As defesas dela tinham levado um tempo angustiantemente curto para se esmigalhar.

      Como ela tinha chego a isto? Ela lutou para despertar a raiva e a aversão que sustentara desde o princípio de sua provação.

      Mas tudo o que ela achou dentro de si mesma era um coração, só, cheio de dor e de saudade.

      Tais fracas emoções a alagavam, quando ela tinha que ser forte. Ela respirou profundamente, jogou para cima seu pacote e começou a entrar rapidamente no vale abaixo, em direção à costa.

     

      Quando Kylemore despertou, o sol brilhava em um céu claro. Ele estava só na destruição da cama.

      À toa, ele desejou saber onde Verity estava. Depois que ela o deixara na noite anterior, a paz nova entre eles o enviara a um sono catatônico.

      A emoção crua que eles tinham compartilhado deveria tê-lo deixado se sentindo vulnerável.

      Mas ao invés ele sentia... seguro.

      Ele tinha estado muito distraído para esconder os terrores da noite vergonhosa dele; ela tinha confiado nele com a triste história dela. O laço que os unia era agora indestrutível.

      Os hábitos dela de autoencobrimento eram familiares. Ele os compartilhava. Ele sabia o que custara a ela revelar tanto, ainda mais a alguém que ela considerava como um inimigo; alguém que ela já não considerava um inimigo.

      Seguramente ela não oferecia tal doce conforto a um homem que odiasse. Seguramente ela não divulgaria o passado trágico dela a alguém que menosprezasse.

      Agora ele queria saber tudo dela. A difícil confissão de ontem à noite tinha apenas afiado sua curiosidade para descobrir mais.

      E ele queria fazer amor com ela.

      Claro que ele sempre queria fazer amor com ela. Mas desta vez, talvez, ela lhe oferecesse o privilégio de seu consentimento.

      As sombras que tinham obscurecido a vida dele tinham se retirado. Verity as tinha banido.

      Ele se sentou, determinado a encontrá-la. Ela deveria gostar um pouquinho dele, para agir como agiu.

      Que reflexão patética do grande Duque de Kylemore que ele ocupava tal importância nesta pequena concessão.

      A esperança tinha sido cortada da vida dele bem cedo na infância. Mas enquanto ele se vestia naquele quarto silencioso, a esperança era a única explicação que ele podia achar para a leveza súbita em sua alma.

      Kylemore entrou na pequena câmara que ele tinha escolhido como sua, mas ela não estava lá, nem a cama estreita tinha sido usada.

      Revivendo a história infeliz dela poderia ter significado que o sono a iludiria e ela tinha ido se sentar escada abaixo no amanhecer. Ele estava desesperado para vê-la, testar se a estranha intimidade deles tinha sobrevivido à luz do dia. Ele estava desesperado para a ver porque longe dela, ele se sentia incompleto.

      Mas a sala de estar escura também estava bem vazia. Predizendo, começou a bater um canto carregado de destruição no coração dele.

      Onde ela estava? Ela não poderia tê-lo deixado. Não depois da noite passada. Diabo a leve, ela tinha confiado nele, cuidado dele, confiado nele.

      Mas antes disto, ele a tinha forçado na cama.

      Claro que, ela tinha sucumbido ao desejo eventualmente, como ela sempre fazia. Um desejo do corpo, não da mente. A mente dela tinha resistido a ele até o fim.

      Então ela o tinha abraçado pelos terrores dele. O que significava que no final eles se moveram além da compulsão e miséria, não?

      A resposta dele para aquela pergunta cresceu mais hesitante enquanto ele procurava as áreas. Deprimido e intranqüilo, ele voltou a casa. Na cozinha, Morag e Kirsty discutiam com Hamish em Gaelic estridente. Aparentemente, comidas e vestido sumiram.

      Em um segundo, as esperanças frágeis de Kylemore se esmigalharam a cinzas.

      — Alguém viu madame essa manhã? — Ele cortou com um argumento, embora já soubesse que resposta receberia.

      Com uma carranca, Hamish olhou para além das sobrinhas volúveis dele. — O moça não estava com Sua Graça? Ela ainda não desceu.

      Os medos de Kylemore fundiram-se em certeza.

      Ela tinha ido. Ela o tinha acalmado para relaxar sua vigilância, então aproveitou a oportunidade para escapar. Maldito bobo que ele era, tinha esquecido que ela tinha uma mente aguçada e não pouco inteligente, fosse ela Verity ou Soraya.

      — Chame Angus e Andy —, ele disse nitidamente, amaldiçoando-a, e se amaldiçoando. — Nós organizaremos uma procura.

      Se ela tivesse ido assim que o deixara - e ele não tinha razão nenhuma para assumir de outro jeito - ela tinha várias horas à frente deles. Ele tinha que achá-la, antes que ela deixasse o vale. Os perigos que este ambiente severo apresentavam eram infernalmente reais.

      Uma viagem rápida para os estábulos assegurou-lhe que ela não tinha levado nenhum cavalo. Dado o medo dela pelos animais, isso não era nenhuma surpresa.

      Pela primeira vez, desde que ele tinha percebido que ela o abandonara novamente, sentia um lânguido otimismo. Se ela tivesse ido a pé, os cavaleiros teriam menos dificuldade em alcançá-la.

      — Angus e Andy, você pegam estrada acima. — Ele não modificou a aspereza do tom da voz. — Hamish e eu seguiremos pelo lago.

      Só duas rotas conduziam fora do vale – a estrada da montanha e o caminho ao longo do lago para a costa. Verity já deveria saber como era difícil viajar por terra. O lago apresentava uma perspectiva mais fácil, até que ela alcançasse a passagem estreita entre as montanhas onde precisaria de um barco. Se assim fosse, certamente ele a apanharia lá.

      — Kate, Morag e Kirsty, confiram se ela estiver em qualquer lugar próximo a casa. Talvez ela esteja apenas pegando um pouco de ar. — Ele já sabia que, se ela tinha uma chance de fugi, já não mais se encontrava ali.

      Maldito cabeça-dura. Desde que ele a sequestrara, tivera certeza de que ela fosse vigiada. Mas ontem à noite o tinha feito um estúpido. Agora ela poderia pagar com a própria vida pela estupidez dele.

      Cristo, ele não podia nem imaginar que ela poderia morrer com essa situação. Melhor seria, se ele a tivesse deixado em Whitby do que isso. O intestino dele apertou-se com culpa e desespero.

      Ele e Hamish montaram para o oeste. O dia estava bom e firme, mas tal calor anunciava que haveria tempestades depois.

      Pelo amor de Deus, ela tinha rejeitado as advertências dele? Até mesmo os homens preparados daqui perdiam suas vidas nestas montanhas quando o tempo ficava úmido – o que acontecia com alarmante regularidade.

      Hamish o alcançou, enquanto ele se dirigia a um posto de Rowans. Kylemore viu os próprios medos refletidos nos olhos do homem mais velho.

      — Se a moça veio por aqui, ela estará segura até alcançar os precipícios, mocinho — Hamish disse de maneira tranqüilizadora.

      — A menos que ela tenha escorregado na água —, Kylemore disse, estreitando os olhos contra a luz solar deslumbrante enquanto ele conferia ao longo do banco íngreme.

      Apesar da placidez aparente do lago, era fundo e cheio de correntes traiçoeiras. Um pescador tinha se afogado em suas águas quando ele tinha seis anos. Kylemore se lembrou dos homens que levaram o corpo pálido, encharcado de volta para a casa e as mulheres que lamentaram em aflição. Tinha havido mais criados, claro, para cuidar de seu pai.

      — Oh, ela é uma moça sagaz. Eu duvido que ela fosse tão próximo da água. Ela usará as árvores.

      Algo no tom de Hamish chamou a atenção de Kylemore.

— Você não soa surpreso por ela ter escapado.

      O homem mais velho encolheu os ombros.

— Ela me perguntou se eu a ajudaria, mas eu não poderia romper minha lealdade a você. Eu a adverti dos perigos. Mas ela é uma pequenina voluntariosa.

      A admiração patente na voz de Hamish quando falava de Verity irritou Kylemore.

— Você nunca aprovou o fato de tê-la trazido para cá —, ele estalou. — Mas você não sabe a história toda.

      Ele deveria ter adivinhado que sua exibição de temperamento ducal não acovardaria Hamish.

— Não, eu não aprovo. Mas você sabe que tem minha obediência. — A voz dele endureceu notoriamente. — Mas eu mantive uma vigilância rígida desde que ela chegou ao vale. E ela é uma elegante moça e bondosa. Eu não posso imaginar o que ela tenha feito para merecer ser mantida como prisioneira.

      Picado à crítica, justa como era, Kylemore replicou.

— Ela não é nenhuma virgem envergonhada, homem. Ela foi minha amante durante o último ano.

      No momento em que as palavras deixaram a boca dele, ele quis apanhá-las de volta. Elas o fizeram se sentir pequeno e roto, especialmente depois do que Verity tinha lhe dito na noite anterior.

      Os olhos de Hamish expressaram igual decepção.

— Psiu, mocinho. Não há necessidade de difamar o nome dela. Se ela voltar ao caminho da virtude, que ela seja louvada. Se a luxúria de Sua Graça a impediu, você carrega a vergonha, não ela. — O velho Highland impulsionou o pônei em um trote e montou à frente como se ele já não pudesse tolerar a presença do seu empregador.

      Kylemore dificilmente o culpou. Ele quase não poderia tolerar sua própria companhia.

      Hamish tinha toda razão em estar repugnado com o comportamento de seu protegido. Mais do que ele sabia.

      Mas era muito tarde para segundos pensamentos. Ou segundas chances.

     

      Verity suspirou com frustração enquanto inspecionava o liso despenhadeiro à sua frente. Ela esfregou as palmas frias e úmidas com irritação no vestido marrom usado de Kate.

      Ela tinha caminhado por horas para chegar ao fim do vale. Agora estava cansada, pegajosa e dolorida, cortesia de um remendo de urtiga no qual ela tropeçara involuntariamente. Ela respirou fundo o ar úmido e tentou reunir coragem, mas essa havia se encolhido em um duro e frio núcleo dentro dela.

      Com cada passo, ela temera que o duque a pegasse. A manhã estava bem avançada e ele agora já devia saber que ela se fora. A náusea subiu em sua garganta, quando imaginou a raiva dele por sua segunda traição. Assim ele estaria pensando.

      Uma coisa era certa: ele a procuraria a cavalo. Ela tinha considerado tomar brevemente um pônei, mas cavalos ainda a assustavam, sem mencionar que se arriscaria a despertar os gigantes que dormiam sobre os estábulos.

      Se a sorte estivesse com ela, Kylemore concentraria sua busca na estrada, no alto das montanhas. Entretanto, notavelmente, a sorte tinha estado ultimamente ausente da vida dela e seu amante era inteligente o bastante para adivinhar que ela tentaria a costa, uma costa que percebia, agora, estava do outro lado deste monólito.

      Seu coração afundou com a derrota. As pedras ante ela não poderiam ser escaladas. Ela já tinha tentado várias vezes e não tinha achado nenhum modo de subir. Nadando pelo lago era muito arriscado, dada a velocidade e profundidade da corrente do desfiladeiro. E qual seria o uso disso? Um outro precipício íngreme assomava do outro lado.

      Agora a única esperança dela, era seguir até base do cume sul, até que ela achasse algum lugar para subir. O plano era incerto, mas o melhor que poderia inventar.

      Ela tomou um gole de água do frasco que levava e disse a si mesma que fosse forte - uma admissão que estava perdendo as forças pela constante repetição - e voltou a caminhar.

      Quando Verity ouviu os cavalos se aproximarem, imediatamente se abaixou. Já havia passado do meio-dia, e ela ainda não tinha achado um caminho para fora do vale.

      O esgotamento tinha entorpecido o medo constante dela. Agora isto jorrava mais violento que nunca, fazendo a cabeça dela girar. Desajeitadamente, ela se enfiou na vegetação rasteira grossa e lutou para controlar a rota respiração.

      Kylemore e Hamish Macleish entraram em sua visão. O duque usava roupas rurais ásperas. Ela teve uma súbita lembrança da apresentação perfeita de seu vestuário em Londres. A costura imaculada dele tinha sido famosa, contudo, aqui, ele parecia contente em não se vestir muito melhor que os cúmplices dele. Embora ninguém confundiria o homem alto, bonito e com o porte dominante com qualquer outra coisa, além do aristocrata que era. Ele virou a cabeça para falar com Hamish. Com desejo ardente, ela encarou o perfil claro, com sua testa alta, longo nariz arrogante e mandíbula forte. O homem mais velho se curvou brevemente e voltou por onde tinha vindo.

      O duque se dirigiu em seu grande cavalo cinza na direção que ela pretendera seguir. Antes que se fosse a galope, ela teve um vislumbre dos brilhantes olhos e da boca em uma linha determinada. Ele parecia resoluto e bravo.

      O estômago dela apertou com terror renovado, enchendo sua boca com um gosto amargo. Mas sob o terror surgiram outras emoções, emoções que uma mulher como ela nunca poderia reconhecer.

Esta era provavelmente – esperançosamente – a última vez que ela veria o Duque de Kylemore. Enquanto escapar nunca fora tão necessário, o pensamento a fez querer lamentar sua mágoa..

      Ela estava enlouquecendo, tinha que estar. Durante o ano em que Kylemore fora seu amante, eles tinham desfrutado de inúmeras aventuras sexuais. E o ego mais fundo dela tinha permanecido completamente intacto. Quando ele a roubara para longe de sua casa, há apenas alguns dias, ela o odiara e temera.

      Assim, quando aquela face inclinada com sua boca controlada e apaixonada se tornara tão preciosa?

      Ele a arrebatou em sua casa, forçando-a a isso. Ignorando tudo o que ela queria. Arrancara à força uma resposta dela, a qual ela estivera determinada a não dar.

      Ela tinha porque detestá-lo – como ela tinha inequivocamente o detestado na viagem de Whitby. Ele era um bruto egoísta que deveria ser enforcado por seus crimes.

      Ele era um homem solitário e atormentado por recordações angustiantes que ela não pôde nem começar a imaginar.

      E na noite passada, ele tinha escutado a história sórdida dela e tinha falado que ela era magnífica.

      — Eu não vou encorajar isso. —, ela sussurrou em voz alta, enquanto rastejava furtivamente de seu esconderijo. — Eu não vou.

      Seus músculos, que ficaram muito tempo tensos, protestaram quando ela se levantou. Ela colocou uma mão trêmula nas costas enquanto se estirava. O tempo todo, os olhos dela a forçavam na direção que o duque tinha tomado.

      Querido Deus, como ela podia se sentir deste modo? E sobre aquele diabo cruel do Kylemore, de todos os homens.

      Pediu aos céus que todo esse incômodo exame de consciência terminasse quando ela estivesse livre. Ela retomaria a vida que tinha planejado e este infeliz interlúdio seria apenas uma memória desagradável.

      Revelar o passado dela tinha sido um engano enorme. Ela e Kylemore compartilharam uma ligação emocional que poderia se provar difícil de romper, embora com o tempo ela quebraria isto.

      Ela tinha que quebrar isto.

      Ela guardara seu pacote de comida atrás dos arbustos. O estômago vazio rosnou, mas ela o ignorou, determinada a conservar suas rações escassas.

      Por um longo tempo, ela encarou o precipício inexpressivamente, tentando despertar de novo o entusiasmo por uma vida dedicada a bons trabalhos e independência. Mas ao invés disso, sua mente se encheu de imagens da batalha corajosa do duque contra os próprios demônios e como aquela coragem se derretia em doce necessidade quando ele descansava nos braços dela.

      Pelo amor de Deus, me deixe em paz, Kylemore.

      Ela inalou profundamente para banir o fantasma persistente do seu amante e os olhos dela se fixaram no lado da montanha. Se ela se arriscasse, poderia achar um caminho para cima. O precipício não oferecia nada tão amigável como um caminho, mas talvez ela pudesse usar as bordas denteadas.

      Ela tinha que tentar. Com o duque à frente e Hamish atrás, esta era sua única chance para deixar este amaldiçoado vale e com isto, a confusão agonizando nela.

      Ela começou a escalar, usando as mãos nas pedras ásperas.

     

      No meio da tarde, a chuva começou, como Kylemore soubera que seria. Chuva escocesa fria, miserável que vazava nos ossos dele. Chuva fria, ensopada que apropriava todos os desesperos que o cercavam.

      De alguma maneira, ela tinha escapado. A maldita complacência dele pode ter sido a assinatura de morte dela.

      Não, ele tinha que continuar acreditando que ela estava viva. Ele exigia que ela estivesse viva.

      — Ela ainda não voltou pra casa—, Hamish disse, cavalgando para cima. Ele passou para Kylemore um casaco grosso e um chapéu semelhante aos que ele usava agora. — Eu circulei pela floresta no caminho para cá. Não há nenhum sinal dela. Essa moça não poderia ter criado asas e voado, poderia?

Kylemore arrastou a bem-vinda roupa seca.

— Eu não poria nada além dela.

      Ele deu uma olhada com raiva desamparada. A menina não percebia o perigo? A temperatura estava baixando. Se ela continuasse lá fora depois de escurecer, quem sabia qual seria seu estado pela manhã?

      — Onde infernos ela poderia estar? — ele rosnou. — Ela não pode ter ido muito longe a pé.

      A voz de Hamish permaneceu tranqüila, como esteve ao longo do dia procurando frenético.

— Angus e Andy estão na Passagem de Kilorton. Se a moça tomar a estrada da colina, eles a pegarão.

      — Nós perdemos algo —, Kylemore disse severamente. Tannasg se mexeu impacientemente quando as mãos de seu mestre apertaram firmemente as rédeas. — Ela não é nenhuma rapariga de cidade calma. Ela cresceu numa fazenda. Talvez ela até consiga escalar fora do vale. Foi um erro tê-la subestimado antes.

      Hamish carranqueou.

— Estas gamas são um labirinto para qualquer um que não as conheça. Ela poderia cair em um precipício e nós não descobriríamos antes do próximo verão.

      A possibilidade horrorizante de Verity ter caído para uma morte solitária tinha assombrado os pensamentos de Kylemore, desde que ele tinha descoberto que ela tinha ido.

— Eu posso continuar até o cume se continuar outra milha. Você passa novamente pelos bosques.

      Hamish acenou com a cabeça.

— Sim. Tenha cuidado lá em cima, mocinho. É uma subida traiçoeira. Eu não quero sair à sua procura também. — Ele girou seu cavalo e partiu.

     

      Ofegando, Verity se levantou em cima da borda e se dobrou para olhar para baixo. Por um longo momento, ela se deitou no chão, arquejando. A chuva fria caía sobre ela, mas ela não tinha respiração para se levantar.

      A ascensão tinha levado horas. As mãos dela estavam raspadas e sujas, mas graças a Deus, ela tinha alcançado o topo. Havia perdido o apoio duas vezes e escorregado ao fundo, e numa das vezes, as próprias pedras tinham se desintegrado embaixo dela. Por um momento repugnante, antes de ela pousar duramente em uma borda, tinha pensado que a sorte - e a vida dela - teria acabado. Mas estando viva agora, havia se ferido e estava fragilisada. Com tudo o que lhe ocorreu, tinha perdido suas provisões.

      A chuva já tinha começado e a subida dela tinha se transformado em uma miséria escorregadia. Só a memória de como o coração dela tinha saltado à vista de Kylemore a manteve seguindo. Se ela voltasse a ele, ele a destruiria mais completamente, que os rochedos cruéis poderiam.

      Ele a destruiria, então iria embora sem dizer uma palavra.

      Apesar da dor que sentia, ela se ergueu nos joelhos. As palmas rasgadas estavam picando e todos seus músculos doíam. Ainda assim, ela tinha conseguido. Afinal, a liberdade lhe acenava.

      Ela ergueu a cabeça, esperando ter alcançado a costa.

      Mas só havia mais montanhas. Linhas e linhas delas, até onde ela podia ver.

      Com um gemido, ela caiu para trás, ignorando a chuva. Ela poderia ficar perdida nesta selva para sempre. Era pior que a rota desolada que ela usara para chegar ao vale. Ela não tinha nenhuma comida, nenhum mapa e nenhuma roupa, além da que ela estava usando.

      — Oh, Deus —, ela choramingou. — Oh, Deus, me ajude.

      Por um longo tempo, ela se deitou imóvel enquanto lágrimas de fraqueza e derrota gotejavam abaixo da sua face suja e se entrosavam com os pingos de chuva. Atrás dela, o duque esperava para apanhá-la com sua alma torturada e sua magia sensual. À frente se punha uma selva irreconciliável onde ela poderia perecer sem rastro.

      Mas eventualmente, ela lutou com os próprios pés. Ela não podia ficar neste cume aberto, até que o inverno a congelasse em uma estátua de gelo. Deveria haver um caminho pelas montanhas. Depois que ela o achasse, teria tudo o que queria. Uma vida independente, um futuro para Ben e Maria e esperança, propósito, liberdade.

      Ela rasgou uma tira fora da anágua, chorando suavemente devido à dor, e a amarrou nas mãos rasgadas e sangrentas. Se ela precisasse escalar novamente com as mãos e os joelhos, ela estaria em apuros. O vento tinha afiado e ela tremia, apertando o casaco grosso mais firmemente sobre si. Ainda era verão, mas neste lugar cruel e terrível, aquela palavra não tinha nenhum poder.

      Ela tinha cometido um erro terrível fugindo? O duque e Hamish tinham-na advertido que pessoas morreram nestas gamas. Só agora, quando era muito tarde, ela os acreditou.

      Com a mão tremente, ela limpou a umidade do rosto. Ela tinha que se lembrar das recompensas que a esperavam. Tinha que se lembrar que o homem que ela tinha abandonado a prometia nada mais que humilhação e degradação.

      Convocando a pequena coragem que ainda tinha, ela respirou profundamente. Não podia voltar e esta ladeira aberta não oferecia nenhum abrigo. Assim, tinha que seguir adiante e rezar para que ela descobrisse algum caminho desta desolação. Após essa decisão, baixou a cabeça e marchou pela grossa chuva.

     

      Hamish seguiu em direção ao pôr-do-sol. Kylemore notou imediatamente o pacote imundo amarrado à sela do Highlander.

      — O que é isso? — Ele falhou em manter a estúpida desesperança sombria em sua voz. Todo o dia, eles tinham procurado sem achar qualquer rastro de Verity. A imagem dela escorregando sem ajuda para dentro do lago se tornara cada vez mais vívida a cada milha que ele viajara.

      Hamish passou o pacote para Kylemore.

— Eu acho que a moça derrubou isto enquanto subia a ladeira.

      Esta era a primeira indicação genuína de que Verity estava viva. Kylemore baixou a cabeça e chorou sobre o pacote, mas os conteúdos humildes não lhe diziam nada, a não ser que ela tinha perdido o pouco que a abasteceria. Hamish ainda estava falando.

— Ela deve ter tido um tempo difícil. Havia rochas recém-caídas à base. Eu não pensei que uma mulher poderia fazer isso... isso é uma escalada que muitos homens recusariam a fazer.

      — Oh, eu nunca duvidei dos nervos dela —, Kylemore disse com uma onda de esperança.

      Ela era valente, inteligente e determinada. Talvez ela sobrevivesse a esta paisagem irreconciliável até que ele a achasse.

      Hamish o estudou.

— Ela deve estar muito ansiosa para se afastar de você, mocinho.— Os olhos azuis fixos se fixaram na face do duque. — O que em nome de Deus você fez a ela?

      Vagamente, Kylemore contemplou à frente, sabendo que ele merecia cada olhar de condenação do companheiro.

— Eu tentei quebrá-la —, ele disse severamente.

      Só agora ele reconheceu que tinha falhado. Como ele tinha merecido falhar. Sacudiu-se para fora de sua abstração, pois a pena de si mesmo era uma indulgência que ele não podia dispor. Com olhos desesperados, inspecionou a paisagem varrida pela chuva. Ele a obteria de volta e então se preocuparia com as reparações que precisava fazer. As compensações que ele seria capaz de fazer.

      Hamish alcançou para tocar em seu braço. Era um ato de presunção terrível que lhe oferecia uma confiança breve que, na angústia dele, o duque notava e apreciava.

      — Não se preocupe, mocinho. Nós a acharemos. — Ele deu uma olhada. — Mas não hoje à noite.

      Kylemore se deu conta que o dia minguara.

— Volte para a casa e traga Angus e Andy aqui, no princípio da luz. Ela obviamente veio por este caminho.

      — E você? Na escuridão, você cairá no precipício.

      — Eu estarei seguro o bastante. — Verity enfrentou os elementos. Era correto que ele compartilhasse o mesmo desconforto e perigo que ela.

     

      A manhã não trouxe nenhuma pausa no chuvisco frio.

      Kylemore tirou um cochilo inquieto. Ele se endireitou contra a pedra úmida que o tinha abrigado do pior da chuva, atento ele merecia cada músculo duro.

      Onde Verity tinha dormido? Ela tinha dormido? Ele rezou para que ela tivesse encontrado abrigo em algum lugar.

      Oh, querido Deus, que ela esteja viva.

      As palavras bateram numa tatuagem agourenta em seu coração quando ele se levantou. Na meia luz do amanhecer, ele pôs a sela em Tannasg que não estava muito melhor que seu mestre. O cavalo tinha uma linhagem mais longa de antecedentes aristocráticos que ele e não estava acostumado a tempos difíceis e a passar uma noite molhada nas Highlands.

      A Escócia poderia ser um maldito lugar, ele pensou, enquanto se estirava para aliviar o corpo dolorido. Ele deveria estar ficando mole. Quando menino, passava freqüentemente uma noite ao ar livre. Uma vez, quando ele não tinha conseguido chegar aos seus esconderijos habituais, ele fugira para a neve para escapar da raiva incontrolável do pai. Naquela ocasião, ele sumira por três dias até que Hamish o tinha achado, sofrendo de fome e azulado com resfriado.

      Não que ele tivesse emergido incólume daquela travessura em particular. A febre furiosa que ele tivera quase o matara.

      Kate cuidara dele, ele se lembrava. O Macleishes falavam do que eles deviam a ele. Ele desejou saber se eles percebiam o que ele lhes devia em troca.

      A chuva aliviou com o progredir da manhã. A cada hora, as esperanças de Kylemore minguavam de achar Verity ilesa. Até mesmo se viva, ela deveria estar com frio, cansada, faminta, confusa.

      Por que, infernos ela não o escutou e ficou a salvo no vale?

      Ele sabia por que. Ela tinha medo de que ele pretendesse forçá-la novamente na cama. Eles dois sabiam que ele não podia evitar não tocá-la, que tudo fosse para o inferno.

      Enquanto ele seguia o cume irregular, ele desejou que tivesse sido o contrário. Ele desejou ter sido outro homem, um merecedor da mulher que procurava. Mas ele era o mesmo canalha miserável que sempre tinha sido. Redenção, reparação e absolvição estavam totalmente além do alcance dele.

      Mas, Deus era sua testemunha, se ele a achasse inteira, estava pelo menos disposto a tentar se reformar.

     

      Ele estava vadeando em um fluxo, no topo de uma cachoeira, quando olhou para frente e a viu escolhendo seu caminho por entre as pedras do outro lado. Por um momento brilhante, um alívio ardente o perfurou e ele só a encarou sem falar.

      Ela estava de costas para ele, enquanto se enfiava pelo caminho das pedras. A torrente cadente amorteceu o som da sua aproximação quando ele esporeou Tannasg para ela. Quando ela virou finalmente, ele estava próximo o bastante para ver os olhos cinzas dela em choque, então em terror.

      Quando ele tinha chegado a isto? Quando um assunto de simples desejo físico tinha se degenerado neste pesadelo de medo e coação?

      — Não! — Ela se arremessou em uma corrida desajeitada pelo pedregulho áspero.

      Ele a perseguiu, ignorando os perigos da superfície desigual. Tannasg bufou em protesto a tal tratamento de seu cavaleiro, mas o coração leal dele respondeu e saltou adiante, corajosamente.

      Nenhum poder na terra poderia impedir Kylemore de pegá-la agora. Ela era dele. Ele morreria antes de deixá-la ir.

      — Verity! — ele gritou atrás dela.

      Ela só tentou mais freneticamente escapar.

      — Verity, você se ferirá! Pare!

      Ela foi apanhada agora em um ponto saliente com um declive abrupto dos dois lados. O cavalo cinza volumoso de Kylemore bloqueou a saída dela. Não havia para onde ir.

      — Deixe-me só! — ela arquejou, retrocedendo. O medo e ódio que ele ouviu na voz dela cortaram-lhe o coração.

      — Eu não posso, — ele disse com perfeita honestidade e pesar penetrante.

      — Eu não irei com você —, ela disse corajosamente, embora ela deveria ter saber que sua tentativa de fuga tinha acabado. Ela elevou o queixo e olhou para ele como uma vez ela olhara através do quarto de pintura de Sir Eldreth.

      Ele quase riu, apesar da gravidade do momento. Quebrá-la? Ele poderia muito bem da mesma maneira tentar pegar a lua e trazê-la até a terra.

      Até mesmo se ele conduzisse tal um feito improvável, ele somente fixaria a lua antes dela para o prazer dela. A paixão dele por esta mulher era seu destino eterno.

      Ele desmontou rapidamente e deu um passo largo para ela. Tannasg era perfeitamente treinado e ficaria onde estava.

      — Verity, acabou. Renda-se. Você nunca achará um caminho por estas montanhas. — Tentando soar amigável, ele estirou a mão dele. — Venha a mim.

      Ela balançou sua cabeça escura e despenteada. Ela parecia cansada, suja, molhada, encharcada. E estonteantemente linda. O sortimento estranho de roupas que ela tinha roubado da casa parecia muito maiores que ela e lhe acrescentavam um ar de fragilidade.

      — Não. — Ela estava amedrontadoramente próxima à extremidade, e ele não queria assustá-la com qualquer movimento súbito.

      Ele fez a voz macia e persuasiva.

— Venha a mim, Verity.

      — Eu não passei por tudo isso para nada —, ela disse amargamente.

      — Eu prometo que eu não a ferirei.— Ele arriscou outro passo. Ela estava quase ao seu alcance.

      Ela riu desdenhosamente.

— Eu sei o que suas promessas valem.   

      — Verity —, ele disse e se lançou pela última distância para agarrá-la.

      Ela o empurrou e a mão dele deslizou inutilmente na pele lisa do braço dela. Ela gritou quando tombou da extremidade.

 

      — Jesus, não!

      Era uma oração ou uma maldição? Kylemore não sabia. O grito de verdade tocou nas orelhas dele quando se arremessou nos joelhos e rastejou a beira do precipício. Todos os segundos pareciam se estirar em horas. Cada pedra cadente soava como um trovão.

      — Graças a Deus —, ele sussurrou quando investigou por cima da borda.

      Ela se agarrara ao declive precário sobre uma dúzia de pés abaixo. O precipício não desabava nenhuma gota fora, mas a superfície pedregosa era instável e ela poderia deslizar a qualquer momento até a base do desfiladeiro em um tombo mortal de pedras.

      — Espere. — Ele olhou diretamente nos olhos apavorados dela, desesperado para instigar qualquer força que ele pudesse.

      — Claro que eu esperarei! — ela estalou de volta.

      Esta reação era tão puramente dela, tão totalmente verdadeira à mulher que ele viera a conhecer, que quase sorriu. Ela combatia o medo dela do único modo que podia: com raiva. Ele entendeu a resposta. Mas um mudo terror aplainava os lábios luxuriantes dela e seus braços enquanto se agarrava às pedras. O próprio terror dele formou espiral como uma naja na barriga. Se ela se soltasse, nada a salvaria.

      Ele lutou para manter a voz firme.

— Eu não tenho uma corda. Mas se eu lhe lançar meu casaco, você pode usá-lo para subir.

      Ele se ergueu o bastante para poder tirar o casaco com as mãos trêmulas. Por todo o tempo, ele segurou o olhar dela, como se a mantivesse só naquele olhar de pedra pelo poder mental.

      — Apresse-se, Kylemore. — Desta vez na voz dela não havia nenhum traço de desafio.

      — Não olhe para baixo —, ele disse urgentemente. — Olhe para mim.

      Ela fechou os olhos, como se juntando vontade. Quando ela os abriu novamente, eles se focalizaram firmemente nele.

      — Confie em mim. Eu a tirarei daí —, ele lhe falou.

      Deixe ser verdade, oh, deixe ser verdade, o coração dele alegou.

      Ele alcançou até onde pôde e lançou o casaco longo, segurando firmemente por uma manga. Até mesmo com o braço dele completamente estendido, o artigo de vestuário ainda pousou uns bons quatro pés sobre Verity. Ele xingou sobre sua respiração e lançou novamente.

      Não era nada bom. O casaco era muito curto.

      — Verity, Hamish deve estar logo aqui. Você pode esperar? Se eu descer, a colina inteira voará provavelmente. — Uma pequena pedra próxima da mão esquerda dela caiu confirmando o que ele disse.

      — Eu não posso estar segura.

      A resposta dela era uma linha de som. Ele viu na face dela que ela não esperava sobreviver.

      Se dependesse de sua determinação completa par tirá-la disto, por Deus e todos Seus anjos, ele a tiraria disto. Ele estudou as pedras desiguais entre o casaco e ela.

— Espere.

      Ele ficou de pé e correu até Tannasg.

      — Firme menino —, ele sussurrou.

      O animal de puro sangue sentia o desespero dele e se moveu para o lado nervosamente debaixo das suas mãos, quando ele removeu a sela. Com destreza nascida da necessidade, Kylemore desmantelou a sela e rapidamente afivelou as correias juntas.

      A tarefa ainda levou muito, muito tempo. Com cada segundo atrasado, a possibilidade do desmoronamento dela para a morte aumentava.

      — Verity? — ele chamou.

      Ela estava lá imóvel?

      — Sim, se apresse! — Ele podia dizer que ela estava próxima ao fim de sua resistência. Poucos teriam contido o pânico por tanto tempo.

      Com um puxão, ele testou o comprimento provisional. Ele esperou desesperadamente que a localizasse e que a corda improvisada dele agüentasse. E que ela tivesse a força para se agarrar quando ele a lançasse.

      Esperança desesperada era tudo o que ele tinha. Como ele sobreviveria, se não a trouxesse seguramente para cima?

      Ele não podia enfatizar o fracasso. Iria salvá-la.

      Respirando roucamente, ele colidiu com a extremidade e ficou de joelhos. Deus seja louvado, ela ainda estava lá, mas estava cansada. As mãos dela, nas bandagens rotas, imundas, tinham se apertado em garras e até mesmo àquela distância, ele podia ouvir sua respiração rápida e desigual.

      Verity observou quando ele apareceu acima dela e administrou um sorriso trêmulo. Não pela primeira vez, a coragem dela o humilhou.

      — Você teve uma inspiração súbita? — Ela ainda se esforçou para soar composta, mas as palavras emergiram em um suspiro.

      — Eu espero que sim —, ele disse fervorosamente. — Inferno, eu espero que sim.

      Tenteando o peso e comprimento, ele balançou a combinação desajeitada de couros abaixo. Pousou logo acima dela.

      O tapa de couro na superfície áspera criou outro rockfall. A barriga de Kylemore amarrou em medo quando percebeu que a ladeira estava a ponto de baixar.

      — Alcance isto, Verity —, ele implorou. Então uma solicitação que veio das profundidades do ser dele. — Alcance, meu amor.

      Viva, meu amor.

      Os olhos prateados dela brilharam com medo e desespero, se alargaram ao carinho sem precedente. Então ele a viu perceber que para agarrar as correias, ela tinha que deixar o buraco na face de pedra que a apoiava.

      — Venha, verdade. Você ficará bem. — Ele esperava do fundo da alma inútil dele que estivesse certo. Pedir a ela para tentar se salvar, fora o maior risco que alguma vez ele tenha corrido em sua vida bastarda. — Não está tão distante.

      A face bonita dela, listrada com sujeira e marcas de lágrimas, se dirigiu para cima, em direção a ele e ele a viu engolir. A expressão dela era rígida com medo.

— Eu não posso fazer isto.

      — Sim, você pode. — Ele injetou certeza na voz dele. — Não falhe comigo agora. Você nunca desistiu antes. — Ele tentou lhe falar com os olhos o quanto acreditava nela.

      Ela mordeu o lábio e acenou com a cabeça. Ele prendeu o fôlego dele quando ela se soltou e se estirou para cima. A troca de peso enviou rios de pedras que escorregam além dela.

      — Só um pouco mais adiante —, ele urgiu. As juntas dele embranqueceram nos couros quando ele se preparou levar o peso dela.

      Ela grunhiu com esforço e se empurrou. Com um grito afiado ele caiu às botas, ela se balançou para cima e arrebatou a linha.

      Não tão cedo. O precipício ao redor dela desfaleceu em um rugido ensurdecedor.

      — Kylemore! — ela gritou enquanto o mundo ao redor dela virou o caos.— Kylemore, me ajude!

      — Eu te peguei. — Ele apoiou para trás com todo o peso dela e a arrastou dolorosamente nos braços dele. Por um longo momento, ela balançou livre. Então ela bateu contra a face de pedra.

      — Espere. Eu a puxarei —, ele disse, depois que o pior dos horrores paralisantes dele tivesse passado. Os músculos dele se forçavam para segurá-la e o couro rangeu em protesto.

      Lentamente, inseguramente, mas, graças a Deus, seguramente, ele a puxou, polegada por polegada. Algumas vezes, bordas ou buracos se desintegraram debaixo do peso da mão ou do pé, mas tendo-a trazido tão longe, ele não a deixaria cair agora.

      Finalmente, ele a puxou para cima da beira. Os braços dele e pernas se sentiam como se estivessem em chamas. Ele estava malditamente aliviado para se preocupar.

      Com um gemido, ele caiu de joelhos e a arrancou para seus braços.

      — Nunca faça isso comigo novamente —, ele rangeu e apertou a face dela em seu tórax com as mãos tremendo incontrolavelmente.

      Queridos céus, ele cheirava bem. Morno. Vivo. O cheiro especial de Kylemore. Chorando, Verity enterrou o nariz na camisa imunda dele e fechou os olhos, enquanto a realidade voltava lentamente.

      Ela não estava deitada, moída e quebrada ao pé do desfiladeiro. Ao invés, ela estava com Kylemore.

      Ela tentou lamentar o fracasso da tentativa de fuga desesperada, mas tudo o que ela sentia era gratidão opressiva por não ter mergulhado para a morte. Gratidão opressiva e alegria vergonhosa por estar com ele. Ela nunca tinha pensado em vê-lo novamente. A dor de deixá-lo tinha pesado em cada passo que dava para sair do vale.

      Enrolando os braços dela ao redor dele, ela escavou nesse abraço. O coração dela batia com as sobras de terror e ela não pôde represar as lágrimas fracas.

      Ela chorou em reação à própria provação. Ela também chorou porque ela tinha lutado tão duro e por tanto tempo contra esta rendição. As mãos dela apertaram na coberta feita de linho que cobriam as costas dele.

      Apesar de todos seus esforços, cada provação que ela tinha suportado, ainda era cativa de Kylemore. Enquanto o calor do corpo tremente dele a cercava, ela percebeu nunca seria livre. Até mesmo se ele a deixasse ir, ela era dele para sempre.

      — Shh, Shh. Está tudo bem —, ele murmurou. Ele acariciou o cabelo enrolado dela, acalmando os soluços convulsivos. — Você está segura agora. Eu te peguei. Nada vai te ferir.

      Exceto você, ela sussurrou silenciosamente.

      Mas mesmo aquela compreensão não pôde afastá-la dele.

      Ela tinha esperado que ele estivesse furioso com ela, como ele tinha estado em Whitby. Ao invés, ele apenas ofereceu conforto infinito. Ela disse a si mesma que a bondade passageira dele não significava nada, mas não pôde impedir seu coração doído de se abrir a cada palavra.

      Ela não soube quanto tempo eles ficaram assim, ajoelhados no chão pedregoso como sobreviventes de um naufrágio. Com a face dela apertada contra o tórax dele, ela escutou como gradualmente a batida do coração dele reduzia a velocidade.

      Ele tinha estado tão tranqüilo, tão seguro quando a tinha puxado ladeira acima. Mas agora ela sabia que ele também tinha estado apavorado.

      — Sua Graça? — A pergunta de Hamish cortou a comunhão silenciosa deles, uma comunhão cheia de gratidão, alívio e emoções que ela nunca ousaria nomear.

      Com surpresa, ela elevou a cabeça. Ela tinha estado tão perdida no abraço de Kylemore, que nem mesmo ouviu a aproximação do cavalo.

      O homem mais velho tinha desmontado e estava de pé assistindo-os. Ela não podia se equivocar do alívio na face enrugada dele.

      — Oh, obrigado ao Senhor. Você a achou.

      — Sim, Hamish.

      Ela esperou Kylemore dizer mais, talvez ostentasse seu heroísmo. Só seu valor, força e inteligência a tinham salvado.

      Mas ele somente disse,

— Ache os outros. Eu vou levar madame. Todos nós podemos ir para casa.

      Casa, sim. A casa isolada se sentia agora como casa. Quão fácil tudo se tornou uma vez que ela deixou de lutar contra o inevitável. Ela calmamente e alegremente poderia flutuar à destruição dela.

      Suavemente, Kylemore se desenroscou dela e se levantou. Só havia mais um sinal da ruína dela,... ela sentiu falta do calor dele, no momento em que ele a deixou. O mundo parecia um lugar frio quando não descansava nos braços dele.

      Ele falou suavemente da grande altura dele até onde ela estava, ajoelhada ante ele como uma suplicante.

— Eu sei que você tem medo de cavalos, Verity. Mas se eu a colocar antes de mim, prometo que nenhum dano acontecerá a você.

      Oh, se fosse verdade, ela pensou dolorosamente.

      Ela aceitou a mão dele e ficou duramente de pé. O corpo dela doía em mil lugares e ela não pôde suprimir um gemido profundo. Estava danificada e contundida e ainda humilhantemente chorosa.

      A docilidade silenciosa dela deve tê-lo preocupado, porque ele olhou de modo perspicaz para ela.

— Você está machucada, Verity?

      — Não.

      Ela estava tremendo e se sentia inquietantemente tonta. Ela começou a balançar.

      Estúpida, realmente. Ela tinha mais autocontrole que isto. Mas não pôde evitar o modo como tudo ao seu redor começou a se aproximar, então retrocedeu, em ondas turvas.

      De longe, ela ouviu Kylemore jurar suave e barbaramente. Então ele a arrebatou para cima, nos braços dele e a carregou por sobre o animal enorme de puro sangue que ele sempre montava. Ela estava muito distraída para até mesmo protestar em subir na besta. Em uma ofuscação, ela sentiu Kylemore passá-la para Hamish.

      — Psiu, moça. Nós logo a teremos em casa.

      Ela de repente deu boas-vindas à pronúncia áspera do - r - típica escocesa de Hamish. Ela, antes, sempre achou isso assustadoramente estrangeiro.

      Vagamente, ela estava atenta a que o duque reajuntou a sela e a colocou de volta em Tannasg. Então, muito cuidadosamente, Hamish a deu para Kylemore. Ternamente ele a comprimiu em frente a ele no cavalo volumoso. Os braços dele a cercaram com uma confiança, que prometia manter todos os perigos à distância.

      Pobre e tola Verity para creditar em tal conversinha sentimental, ela pensou sem qualquer grande emoção.

      Silenciosamente, eles retornaram para a casa, que ela pensou ter deixado para sempre.

     

      Verity se apoiou contra os travesseiros na cama grande onde tinha combatido tantos conflitos com o Duque de Kylemore. Conflitos que ela invariavelmente tinha perdido. Um fogo brilhou na grelha, banindo qualquer frio do quarto.

      Todo mundo a tinha tratado com cuidado exagerado, desde o retorno deles. Um banho longo, quente e perfumado com óleo de rosas tinha aliviado seus músculos cansados. Então Morag e Kirsty ajudaram-na a vestir uma camisola branca clara; as criações escandalosas que Kylemore tinha ordenado ainda estavam no armário contra a parede. Exclamando sua condolência em Gaelico musical, as empregadas tinham untado os arranhões dela e feito bandagens em suas mãos rasgadas, antes de deixá-la para que dormisse.

      Verity teria gostado mais do que tudo, era de uma das massagens de Kylemore, mas ela não o tinha visto desde que ele a tinha levado para cima das escadarias e a tinha fixado tão suavemente na cama, que ela tinha se sentido como uma frágil princesa.

      Agora, e com um coração mais leve do que alguma vez tivesse esperado, ela admitiu derrota. Quando o duque viesse esta noite, ele não a acharia desafiante ou pouco disposta. A mulher que tinha combatido suas carícias estava em algum lugar, perdida nas montanhas.

      Verity tinha mudado. Ela não era mais a cativa intransigente de Kylemore. Ou até mesmo a amante complacente que ele mantivera em tal estilo Londres.

      Ela desejou saber o que restara.

      Havia qualquer coisa sobrando?

      Os dedos nervosos dela preguearam o lençol em cima dos joelhos. Kylemore tinha estado preocupado e atencioso depois que salvou sua vida. Mas agora ele tinha tido tempo para se lembrar que ela fugira novamente.

      O temperamento dele estaria agitado? Que os céus a ajudassem! A última vez ela o abandonara, ele a tinha seqüestrado, a tinha trazido para este esconderijo e a forçara em sua cama.

      Oh, Verity, não pode ser uma leve excitação, ante a idéia dele se forçar na sua cama mais uma vez, pode?

      A porta abriu, salvando-a de examinar este pensamento inoportuno mais de perto. Kylemore estava na entrada, usando sua vestimenta habitual de camisa branca e calças.

      Ele parou, estudando-a. Tentando conter a raiva, ela supôs. O olhar dela tremulou para baixo, então alguma força mais forte que a apreensão dela a fez elevar os olhos.

      Era como se ela nunca realmente o tivesse visto antes.

      Esfomeadamente, ela localizou os ombros retos. A inclinação, o corpo bonito. Os quadris estreitos. As pernas longas, poderosas.

      Ele verdadeiramente era um homem para tomar a respiração de uma mulher.

      O olhar dela moveu pelo tórax dele e para cima, pelo pescoço forte seguindo para a face dele. Sombras calmas demorando lá. A atenção dela se fixou nas características notavelmente autocráticas.

      Essa noite, talvez porque as próprias barreiras dela estavam perigosamente baixas, ela viu mais que apenas o ímpeto dominante e possuidor.

      Ela leu os sinais de velha miséria. Ele poderia esconder os tormentos dele do mundo durante o dia, mas eles emergiam nos pesadelos agudos que quebravam seu sono. Ela leu orgulho e inteligência; leu ainda a paixão que o fez, até ela, sua vítima.

      Estranhamente, ela não pode achar nenhuma raiva na face dele. Ela desejou saber por que.

      Ele suspirou pesadamente e entrou no quarto.

— Você está bem? — Os olhos azuis escuros dele procuraram a face dela. — Kate me disse que não há nenhuma febre.

— Eu estou bem. Eu nunca fico doente. — Os antepassados de Yorkshire robustos dela tiveram a munido com uma constituição férrea. Os olhos dela se fixaram no duque. Ele parecia cansado e infeliz. — Como você está?

      — Eu? — Ele estava claramente surpreso com a investigação dela.

      Afetou-a perceber que ele era um homem que nunca esperava qualquer coisa tão comum quanto bondade.

      — Sim —, ela disse continuamente. — Você também estava lá fora nos elementos.

      O sorriso torto, que em algum lugar nos últimos dias que ela tinha aprendido entesourar, chamejou e morreu.

— A lembrança de meus pecados me manteve morno.

      Com relutância aparente, ele foi adiante ao lado da cama e correu a mão abaixo para a trança resplandecente de cabelo que caía em cima do ombro e pelo peito dela. O gesto carregava uma ternura rara. Mesmo assim, o coração dela começou a correr com excitação e os mamilos dela se apertaram debaixo da coberta de puro algodão. Ele estava próximo o bastante para ela ouvir a respiração dele pegar a resposta rápida.

      Ele se afastou e o calor do toque dele se foi com ele.

— Durma agora.

      O choque a silenciou durante os poucos segundos que ele levou para alcançar a porta.

— Sua Graça?

      Ele não virou.

— Boa noite.

      Boa noite?

      Desajeitadamente, ela saiu da cama, ignorando o protesto agudo dos músculos doloridos.

— Espere, Sua Graça.

      Ele olhou para ela, os olhos opacos.

      — Sim, o que é? — Ele soou calmo, descomplicado, neutro.

      O que estava acontecendo? Ela suportara conhecer a raiva, o desdém, o insulto, a vingança. Mas esta indiferença a desnorteou.

      Na cabeça dela, ela tinha terminado muitas cenas do que poderia acontecer nessa noite. Nenhuma tinha incluído ela tendo que o persuadir a ir para a cama dela. Bom Deus, ela não tinha passado os últimos dias em batalha sem cessar para o mantê-lo longe?

      — Você não... você não vai ficar? — ela perguntou desajeitadamente.

      Soraya teria proposto algo fascinante para dizer. Porém, Verity estava perdida.

      Ele balançou a cabeça, embora pelo menos ele não partira.

— Não.

      Não?

      Ela tinha que estar furiosa. O amante insaciável dela a negava?

      Em pernas trêmulas, ela o perseguiu e pôs a mão no braço dele. Ela teve um momento para registrar a tensão nos músculos dele antes que ele tremesse livre.

      — Sua Graça? — ela perguntou suavemente.

      — Madame, eu estou cansado —, ele disse em uma voz fria. Ainda não olhando para ela.

      Incrivelmente, ele a rejeitou. E doeu. Como doeu.

      Ela tinha o ferido assim cada vez que o tinha negado? Não, claro que não. Ele não era tão vulnerável a ela do modo que ela era vulnerável a ele. Como ele poderia ser? Ela somente tinha sido um desafio ao orgulho dele. Agora ela não era muito.

      — Eu vejo —, ela disse lentamente, lutando para esconder a dor dela desesperadamente. — Eu peço seu perdão detendo-o, então.

      — Cristo, me dai força! — ele mordeu abaixo da respiração. — Você pegará pneumonia, mulher!

      Ele a varreu nos braços dele e a escarranchou na cama. Ela teve um momento para registrar o calor dele e cheirá-lo, antes que ele a comprimisse seguramente debaixo das coberturas e voltasse à porta.

      — Eu a verei amanhã —, ele disse sem olhar para ela.

      — Eu não entendo —, ela sussurrou, pondo-se sentada.

      — Diabos —, ele murmurou debaixo da respiração dele quando girou para estar em frente dela. — O que infernos você quer, Verity?

      Ela não sabia. Ela não tinha pensado que o que ela queria importava para ele. Não tinha certeza de que não importava até agora.

      — Eu imaginei que você estaria bravo comigo por deixá-lo novamente —, ela disse duvidosamente.

      — Eu sei por que você fugiu —, ele disse de modo chato. — Foi minha culpa, não sua. Infernos, toda esta bagunça condenável é minha culpa.

      Nada disso fazia sentido.

— Então, você não está bravo comigo?

      — Não, eu não estou bravo com você. Nós falaremos pela manhã.

      Ela não queria falar pela manhã. Ela não queria falar nada.

      Dragando as palavras corretas para seduzir seu previamente amante exigente, não deveria ter sido tão difícil. Ela não tinha compartilhado o corpo dela com este homem durante um ano?

      Mas a voz dela rachou quando falou.

— Sua Graça, está tudo bem se você.. Eu quero dizer, eu... Eu não contestarei se você quiser...

      — Não. — Ele falou firmemente, como se nenhum argumento mudaria a mente dele.

      O pilar que apoiava a estrutura da vida dela desfaleceu em pedregulhos com um estrondo poderoso. Ruínas se deitavam ao redor dela.

      Claro, ela sabia que este dia viria. Nenhum homem faz compromisso para toda vida com sua amante, afinal de contas.

      Ontem, ele a queria. Hoje, não mais.

      A transição fora muito abrupta. Ela não tinha se preparado para encarar a demissão dela com orgulho e frieza ou autoconfiança.

      — Terminou, então? — ela perguntou totalmente.

      Um músculo se contraiu na bochecha dele. Ele soara tão certo quando a repudiou, mas aquele minúsculo traidor movimento contava uma história diferente.

— Não era o que você queria?

      Uma pergunta carregada que ela não tinha nenhuma intenção de responder.

— Então você já não me deseja?

      O riso curto dele era amargo.

— Madame, não houve um segundo, desde o dia em que eu a conheci, que eu não a desejei.

      Ela tentou interpretar a expressão dele. A única palavra que vinha à mente era perseguir.

      Continuar essa inquisição requeriu cada fragmento de coragem dela. Com as mãos enfaixadas, ela se apertou à manta que ele colocou sobre ela com tal cuidado.

      — Mas isso mudou?

      Um espasmo de forte emoção cruzou a face dele e o fez parecer quase selvagem.

— Pelo amor de Deus, mulher, claro que isso não mudou.

      — Mas eu o estou convidando à minha cama —, ela disse sem saída, desejando saber por que ela não estava dançando ao redor do quarto em alívio.

      Ele se curvou na direção dela, fazendo-a se lembrar momentaneamente da formalidade que tinha prevalecido entre eles em Londres.

— Eu lhe agradeço a oferta, mas pesarosamente, eu tenho que recusar.

      Ela falou depois que ele começou a ir.

— Você está me libertando, então, Sua Graça?

      A mão que ele tinha colocado na porta se fechou em um punho contra a armação de madeira.

— Eu não sei. Eu devo. Eu vou.— Ela viu os ombros dele enrijecerem, como se ele estivesse prestes a encontrar um inimigo poderoso. — Eu vou. Só não hoje à noite.

      Ela carranqueou as costas duras dele.

      Mais estava acontecendo do que um simples descartar de uma amante que permanecera mais do que deveria. Ela podia cheirar a luxúria nele. Pelo menos isso não tinha mudado.

      Então por que ele não a tombou sem mais demora na cama lugar, que fora o campo de batalha deles?

      — Por favor, me fale sobre o que é tudo isto, Sua Graça —, ela disse calmamente.

      — Jesus, Verity! — Ele se virou para confrontá-la novamente e viu que, finalmente despertara a raiva, que ela tinha temido mais cedo. — Meu nome é Justin. Kylemore, se você precisar. Mas enterre esse maldito Sua Graça. Você não precisa martelar essa mensagem.

      — Que mensagem? — ela perguntou confusa, mas estranhamente destemida.

      A boca longa dele se aplainou em automenosprezo.

— Eu a quero. Você não me quer. Mas você aceitou que aquela fuga era impossível, assim você está fazendo o melhor de uma situação ruim me condescendendo. Eu não a posso culpar. É a escolha sensata. Talvez se eu fosse um homem sensato, também seria o bastante para mim.

      — Você pensa que eu estou sendo pragmática?

      — Você não é? — Os olhos notáveis dele estavam assombrados quando eles se fixaram nela.

      Finalmente, ela pensou ter entendido.

— Você quer Soraya de volta. Eu não sou o bastante para você —, ela disse tristemente.

      Ele inalou profundamente, audivelmente.

— Sim, eu quero Soraya de volta. Mas eu também quero Verity. Elas são ambas a mesma pessoa, sua maldita bobinha.

      De repente sob o ataque de uma clemência inesperada, ela vacilou para trás contra os travesseiros.

— Não, elas não são —, ela disse nitidamente.

      Os olhos dele queimaram dentro dos dela.

— Sim, elas são. Você criou Soraya porque quis alguém para culpar por tudo o que fez, tudo o que a pequena virtuosa Verity não pode aprovar em si mesma. Soraya vendeu o corpo dela. Soraya desfrutou do sexo. Soraya não tinha nenhum medo.

      Ele levou outra respiração profunda e o olhar dele não oscilou no dela.

— Bem, aqui está uma revelação, Verity Ashton. Soraya é você. A sensualidade inata de Soraya e o senso de aventura também são seus. Verity é doce e virtuosa e Soraya é uma mulher que vai atrás do que ela quer, sem pesar ou temer. Essas duas mulheres se unem em você. Até que você reconheça que você não é nenhum uso a mim ou para você. — Ele virou-se para ir mais uma vez.

      — O que você quer, Kylemore? — ela perguntou inseguramente às costas dele. As acusações dele chamuscaram um caminho pela mente dela. Ele tinha razão? E se ele tivesse razão, o que poderia fazer ela sobre isto?

      Ele não olhou para ela quando falou de forma lentamente e claramente.

— Eu quero que você me queira do modo como eu a quero. Eu a quero que você venha a mim e me diga isso. E então eu quero que você mostre para mim que é verdade.

      Ela tinha estado preparada render tanto essa noite, mas nunca pensara arriscar o último muro de sua alma. Ele era muito exigente, muito ganancioso.

      — Você pede muito —, ela sussurrou, chocada.

      — Sim, eu faço —, ele disse e a tristeza na voz dele demorou nas orelhas dela quando ele a deixou só no quarto à luz de velas.

 

      Verity ainda ponderava sobre a delimitação extraordinária do duque - como ela não poderia? - na tarde seguinte enquanto estava sentada no jardim á luz do sol. A chuva que feito de sua fuga tão miserável tinha cedido no momento. Ela estava toda dolorida pela provação dela nas montanhas e ela estava cansada depois de uma noite problemática.

      Kylemore ficara fora o dia todo. O qual, ela se disse, era uma bênção.

      O que ela poderia dizer a ele? Especialmente agora, quando ele queria mais que a simples rendição física dela. Ao contrário, ele queria tudo o seu coração, sua alma, seu corpo. Mais do que Verity alguma vez fora capaz de dar.

      Ele viu muito claramente, maldito. De alguma maneira, ele compreendeu os jogos que ela tinha jogado pela sanidade dela.

      Aos quinze, ela criara um ser chamado Soraya que poderia cometer qualquer pecado, quebrar qualquer regra. Verity, o caroço de quem que ela era, permanecia tão puro e intacto quanto tinha sido ela quando ela sentava na capela com seus pais metodistas.

      A ficção era frágil. Mas tinha lhe ajudado a sobreviver.

      Agora Kylemore queria combinar as duas metades da natureza dela em uma. Mais, ele queria que ela apresentasse tudo isso unificado incondicionalmente a ele.

      Tudo isso era só mais um truque da vingança dele?

      Se ela desse tudo que ele desejava e ele a rejeitasse, ele a destruiria. Ela sabia disso lá no fundo.

      A rejeição dele cortaria a alma dela porque ela já não tinha Soraya para se esconder. Ela arriscaria o real e vulnerável ego dela.

      O ódio dela tinha se retirado impossivelmente longe, considerando o quanto ela tinha se enfurecido quando ele a seqüestrara, a arrastara para a Escócia, e se forçara nela.

      Ela tinha perdido Soraya. Ela a tinha perdido ao sustentar ressentimento contra ele. Ela tinha perdido o desejo dela pela liberdade.

      O que restava? Ela dificilmente ousava descobrir.

      Em algum lugar nos últimos dias ela o tinha perdoado. Talvez quando ele tinha lamentado nos braços dela. Ou quando ele tinha escutado a história arrependida dela sem a julgar.

      Ou talvez ela o tinha perdoado finalmente durante aquele momento desolado na cozinha antes dela escapar. O momento que ela tinha admitido que ele e ela compartilhavam muito mais que apenas paixão carnal.

      Certamente, no momento em que ele furiosamente tentava salvar a vida dela no dia anterior, ela não o tinha odiado.

      Como ela poderia odiar um homem que agiu como se, sem ela, ele perderia toda esperança de felicidade? Durante um estranho segundo naquele precipício, ela tinha reconhecido que ele teria mudado alegremente de lugar com ela se isso significasse que ela ficaria segura.

      Oh, por que ela sequer pensou nisto? Ela não tinha querido que ele se mantivesse longe dela? Afinal ela tinha conseguido o persuadir em um acordo indiferente para a deixar ir.

      Mas ela não podia esquecer como ele a tinha olhado quando ele partira ontem à noite.

      Ele tinha sido um homem nos limites de sua resistência. Ela o tinha visto no aperto do desejo físico, mas havia algo mais, algo infinitamente mais poderoso.

      Não pela primeira vez, ela desejou saber se eles acabariam aniquilando um ao outro antes que esta competição terminasse.

      — Oh, moça, está muito radiante o dia para parecer tão aborrecida. — Hamish veio do canto da casa.

      Os gigantes não estavam a vista em nenhuma parte. Claramente, Kylemore pensou que tinha derrotado o impulso dela de escapar. Por que não? Ele tinha.

      Ela dirigiu um sorriso para o homem mais velho. Perseguindo seus medos e dúvidas ao redor de sua cabeça a estavam levando a loucura. Pelo menos companhia prometia distração.

      — É um lugar estranho, este vale. Ontem, era miséria absoluta. Hoje, é o Jardim do Éden.

      Hamish parou em frente a ela, os olhos brilhantes dele considerando enquanto descansavam nela. Ela se perguntou o que ele viu. Nada de Soraya estava segura. A maneira dele era despreocupado e pela primeira vez, ele soou genuinamente amigável.

      — Sim, é um país de extremos —, ele disse. — Muito como as pessoas nascidas aqui.

      A curiosidade de Verity adquiria o melhor dela agora que o normalmente taciturno escocês parecia com humor para conversar.

— Isso inclui o Duque de Kylemore?

      Hamish balançou a cabeça grisalha.

— Não, minha senhora. O herdeiro sempre nasce mais adiante no castelo abaixo da costa. O jovem Kylemore cresceu neste vale, entretanto, pelo menos até seus sete anos e despacharam-no para alguma escola de Sassenachs para aprender a ser um cavalheiro pequenino. — O tom sarcástico de Hamish indicou o que pensava daquele plano.

      Verity olhou ao redor no vale isolado. Era um local improvável para se criar um dos maiores proprietários de terras do reino.

      — E você estava aqui na época?

      — Sim, eu trabalhei para o pai dele, o sexto duque. O Macleishes sempre estiveram a serviço dos Kinmurries.

      — Eu entendo sua lealdade ao duque —, ela disse suavemente.

      Hamish olhou nitidamente para ela.

— Eu duvido que o faça, moça. Eu duvido que o faça. Justin Kinmurrie é um homem melhor do que aquele que ele permite a você ou a qualquer outra pessoa ver.

      Outrora, talvez ela tivesse rido com escárnio de tal declaração, mas recentemente, o duque não tinha se comportado como o vilão não remido que ela tinha acreditado que fosse na estrada do norte. E até mesmo naquela viagem árdua, ele não tinha sido tão cruel para ela, quanto ela estava segura que ele tinha pretendido.

      Luz e escuridão batalhavam pela supremacia na alma de Kylemore. Ocasionalmente, ela ficava lunática o bastante para imaginar que a luz poderia emergir vitoriosa.

      Oh, você é uma teimosa boba e cega, ela se castigou. Ele a seqüestrou e abusou de você. Nunca se esqueça disso. Não cometa o erro de imaginar que, só porque ele salvou sua vida, ele é algum tipo de herói.

      Ela mordeu o lábio. Ela realmente queria saber mais sobre Kylemore? Ela já estava muito confusa. Agora mesmo, precisava de uma cabeça clara e de um coração frio. As reminiscências de um criado dedicado sobre a infância do duque só nublariam seu pensamento, fazendo-a perceber que Kylemore era humano e não o monstro que ela queria tão desesperadamente que fosse.

      Mas a oferta de informação que Hamish lhe ofereci a atraia. Esta poderia ser a única chance dela para responder às suas perguntas.

      Ela encontrou o olhar fixo do velho escocês com olhos igualmente firmes.

— Você o conhece tão bem —, ela disse.

      Era aprovação que ela lia no rosto dele? Seguramente não. Uma mulher que tinha conduzido a vida que ela teve, seria anátema a este homem duro.

      — Sim, se conheço! Desde que ele era um menino pequenino.— Ele apontou para o banco dela. — Eu posso unir-me a você, minha senhora?

      Ela acenou com a cabeça.

— Claro.

      — Obrigado.— Ele tomou o espaço próximo a ela e estirou as pernas nuas debaixo do saiote escocês para o sol.

— Eu não sou tão jovem quanto costumava ser.

      Ela não disse nada, com medo de que pudesse desencorajar suas confidências. E confidências estavam a ponto de fluir, ela sabia.

      Depois de uma pausa, ele continuou.

— Eu fui muito sortudo. Eu sempre tive trabalho na propriedade. A maioria dos outros arrendatários não foram tão afortunados. Eles foram todos jogados fora de suas terras quando a mãe do duque decidiu que havia mais ouro em ovelhas do que em pessoas. Famílias que tinham servido os Kinmurries por séculos foram jogados fora como lixos para morrer de fome, para emigrarem ou achar qualquer trabalho que conseguissem longe daqueles que conheciam e amavam.

      Verity estava intimidada. — Seguramente você exagera.

      — Não, moça —, ele disse tristemente. — Eu deseja que sim. É uma história comum desde que os proprietários de terras começaram a esmagar violentamente o sul. As liberações chegaram tarde às propriedades de Kinmurrie. Mas quando ela decidiu agir, a duquesa era cruel. O povo tentou resistir, mas não havia nada que pudessem fazer. E quando os cavalarianos atiraram em John Macleish, meu sobrinho, a maioria de nós ficou quieto o bastante. Nós não podíamos combater a lei.

      Era uma história terrível, mais terrível que Verity suspeitava Hamish omitira – a destruição de todo um modo de viver.

— No caminho para cá, eu achei estranho não ver ninguém, só cabanas arruinadas.

      — Sim. Isto aconteceu em toda Highlands —, ele disse com uma amargura que ele não escondeu.

      — Ainda assim você não culpa o duque? — Seguramente este conto trágico proporcionava outro pecado a amontoar na cabeça de Kylemore.

      — Oh, ele era apenas menino. Ele poderia ter herdado o título, mas ele não teria nenhum poder de fato até que alcançasse a maior idade. A duquesa tinha toda palavra, e ela não é o tipo de mulher que coloque nada à frente de seus desejos mesquinhos...

      — Mas Kylemore continuou lucrando com o que ela fez.

      Hamish olhou para frente para as colinas nubladas. A expressão dele estava distante, como se ele revivesse esses eventos trágicos.

      — Não, ele fez o melhor para compensar. Quando Sua Graça assumiu, ele partiu para encontrar todos que pudesse. Mas na época, quatorze duros anos já tinham passado. O pessoal morreu ou estava perdido. Muitos atravessaram as águas para a Nova Escócia. Ainda assim, ele encalçou os que pôde e os convidou a voltar. Aqueles que tinham novas vidas, ele lhes deu dinheiro para compensar as dificuldades deles.

      — Fergus e sua família —, ela disse, se lembrando o zelo e, na ocasião, a devoção inexplicável para Kylemore.

      — Sim. Fergus é meu irmão. Procure o quanto quiser, minha senhora, você não achará uma alma em qualquer lugar da propriedade Kinmurrie que lhe dirá uma palavra contra Sua Graça.

      Outrora ela poderia não ter acreditado em Hamish. Mas enquanto os últimos dias tinham revelado um Kylemore mais escuro, mais complexo, eles também tinham lhe mostrado o homem honrado escondido dentro dele. Ela não tinha nenhuma dificuldade em imaginar aquele homem honrado movendo céus e terras para recompensa para a dor que a mãe dele tinha causado.

      O duque os detestaria discutindo assim. Ele queria que ela o visse como Kylemore, o Frio impossivelmente seguro de si.

      Mas ela tinha o segurado muito freqüentemente nos braços. O segurou quando ele tinha estremecido com a liberação sexual. O segurou quando ele tinha chorado com miséria.

      Ele nunca seria novamente aquele aristocrata impérvio para ela. As revelações de Hamish só moveram aquela falsa perfeição fora de alcance.

      — Por que você está me falando isto? — ela perguntou.

      Ele virou a cabeça e olhou direto para ela.

— Eu assisti você, moça. Eu assisti o mocinho com você. Eu sei que ele errou com você. Eu acho que na alma dele, ele admite isso. Mas há bondade nele, se você olhar. E por todos seus privilégios, ele não teve nenhuma vida fácil.

      — Ele é bastante rico e bonito —, Verity disse, ecoando a recusa que o irmão dela lhe dizia, quando ela fracamente tentou descrever as profundidades atormentadas que ela tinha sentido, até mesmo então, na alma de seu amante.

      — Sim, bem, também não a faz feliz. Pergunte sobre o pai dele algum dia.

      Ela já sabia que Kylemore tinha temido o pai. Ela tremeu quando o recordou implorando ao papai que o deixasse só. O grito de uma criança na voz de um homem dormindo e sonhando.

      — Você não vai me falar?

      O homem mais velho sorriu sentidamente abaixo a ela.

— Oh, eu fofoquei bastante por um dia e o povo pode falar.

      Kylemore certamente concordaria, mas Hamish tinha apenas afiado sua curiosidade.

      — O duque tem pesadelos —, ela disse abruptamente.

      Hamish não olhou surpreso.

— Sim. Ele os tem desde que era só uma criança. — Ele lhe deu outro desses olhares diretos, como se buscasse algum comprometimento dela. — Mas você pode ajudá-lo. Se você se sente pronta o suficiente para pegar essa tarefa. E a moça que escalou Ben Tassoch ontem é a moça mais corajosa que eu alguma vez encontrei.— Ele se levantou e a encarou.

      — Eu estava tão amedrontada —, ela admitiu, se lembrando do pânico que tinha ameaçado paralisá-la ao longo da sua tentativa extraviada para fugir. Ela não tinha sido valente. Ela estivera totalmente apavorada.

      O sorriso de Hamish não enfraqueceu.

— Sim, mas você ainda fez isto, minha senhora. — Ele baixou a cabeça a ela, uma das poucas vezes que ela o tinha visto demonstrar qualquer respeito convencional por qualquer um, até mesmo com o duque. — Um bom dia para você.

      Claramente, ele não lhe falaria mais nada. Preocupada, ela o assistiu caminhar em direção aos estábulos.

      Ele tinha razão? Ela tinha coração para assumir Kylemore e os demônios que o perseguiam?

      Ela ainda tinha um coração?

      O ultimato que Kylemore tinha exigido na noite anterior, uma rendição que já estava tão precariamente perto.

      A rendição miserável dela tinha sido a meta dele desde o começo. Ela não era tola o bastante para imaginar qualquer outra coisa.

      Oh, por que ela não podia ter se apaixonado por alguém simples e direto? Alguém que pelo menos lhe prometesse uma esperança minúscula de felicidade.

      Ela nunca tinha pedido muito da vida. A experiência tinha lhe ensinado a sobreviver com o que estava ao seu alcance e nunca uivar depois da lua. Ela estaria contente com bondade e alguns interesses compartilhados. Companhia. Consideração.

      Ela não queria um homem difícil, brilhante, mercurial, atormentado como o Duque de Kylemore.

      Mas ela o quis.

      Soltou um suspiro horrorizado e cambaleou os pés em negação. A verdade devastadora martelou-a como a inevitabilidade severa da chuva escocesa fria que ela tinha suportado nas montanhas ontem.

      Ela tinha lutado contra este destino desde que tinha visto um belo jovem através de uma sala de pinturas em Londres. Algo dentro dela a tinha advertido imediatamente do perigo. Mas ela mantivera sua cabeça no lugar, penosamente como isso às vezes tinha se provado.

      Até que ele alterou radicalmente o jogo entre eles.

      Em Londres, ela pudera manter a imparcialidade que a manteve salva. Aqui nesta pequena casa, onde Kylemore recusava-se a encorajar as barreiras entre eles, ela não pôde fingir que não sentia nada pelo amante dela.

      Era esta a vingança que ele tinha planejado desde o princípio? Ele tinha lutado para ficar na cama dela porque tinha sabido que eventualmente ela cairia vítima do amor?

      Amor.

      Uma palavra tão pequena para o que ela sentia.

      Ainda assim que outra palavra poderia estar lá?

      Ela amava o Duque de Kylemore. E aquele amor só poderia conduzir ao desastre.

      Kylemore se deitou desperto no pequeno quarto estéril que ele tinha reivindicado como dele nesta casa odiosa. Não era o quarto que ele tinha usado quando menino. Nem o orgulho nem à vontade o fariam dormir naquela câmara em particular: Permaneceria vazia e abandonada no fim do corredor.

      Vazia, quer dizer, de tudo, menos dos fantasmas penetrantes que voltavam para romper o sono dele.

      Ele sonharia novamente essa noite, sabia disto. E na extremidade dele, não acharia nenhum conforto macio, nenhum braço morno para abraçá-lo, nenhuma palavra sussurrada de confiança.

      Verity não viria a ele. Por que ela iria?

      Ele não a tinha visto desde que a tinha deixado dormir sozinha na noite anterior. Talvez fosse melhor se ele nunca mais a visse. Hamish poderia levá-la de barco ao longo do lago até Oban, onde ela poderia organizar uma passagem a Whitby. Hamish empreenderia a tarefa com vivacidade. O velho mentor dele sempre desaprovara o tratamento de Kylemore à sua amante.

      Com boa razão.

      Ele se mexeu impacientemente. Fisicamente, ele estava exausto, pois partira para Tannasg logo após amanhecer e ficara fora até anoitecer com precisamente aquele intento. Mas a mente dele recusou a se resolver. Se sentia tão errado ficar ali sozinho, enquanto a mulher que ele queria dormia logo no final do corredor. A mulher que quase tinha morrido por causa das transgressões dele.

      Não importa quão duro ou quão distante ele tivesse agido, não podia mais viver das recordações infestadas de culpa, culminando no seu desespero enegrecido quando Verity caiu, no terror puro nos olhos dela quando tinha se agarrado ao lado da montanha, o colapso dela em inconsciência depois que ele a salvara.

      Ele tinha dito a Hamish que ele queria quebrá-la. Condenado, esse fora o ponto de todo esse exercício desgovernado. Mas ao contrário de toda expectativa, ele não achara nenhuma satisfação em vê-la humilhada na noite passada.

      Quando ela deixara claro que toleraria a presença dele em sua cama porque ela não tinha alternativa.

      Outrora, uma amante disposta e cooperativa era tudo que ele teria buscado. Outrora, ele não teria hesitado em tomar o que ela oferecia. Mas isso era quando ele só conhecia Soraya.

      Soraya toleraria as atenções dele.

      Verity, a Verity que ele conhecera nos últimos dias, sofreria quando se deitasse embaixo dele. Como tinha sofrido desde que a tinha trazido para o vale.

      Ele estava cansado da ilusão. Já não podia fingir que ela mascarava o desejo por ele com uma falsa relutância.

      Não, ela tinha lhe dito repetidamente que o menosprezava. Estava na hora dele tomar coragem e aceitar isso como verdade.

      Oh, sim, ele deu prazer a ela, mas aquele prazer a feriu como uma faca. Ela o odiou pela sedução. Pior, ela se odiou por ser fraca o bastante para responder.

      Ele sempre tinha temido que essa paixão o conduziria à devastação.

      Estava muito tarde para ele. Tinha estado muito tarde no momento em que a tinha visto há seis anos. Ele nunca deveria tê-la procurado quando ela deixou Kensington. Mas se ele a deixasse ir agora, seguramente ela poderia escapar da obsessão catastrófica dele.

      Ele tinha que deixá-la ir.

      Libertá-la seria a coisa mais difícil que ele faria. Mas se mantê-la significava por em risco a vida e a sanidade dela, ele tinha que deixá-la livre.

      O grito dela quando caiu no precipício ainda ecoava na mente dele e fazia seu intestino apertar com horror. Ele estivera tão perto de perdê-la. E agora parecia que ele realmente a perderia.

      Ontem, ele tinha aprendido várias lições saudáveis. Nenhuma bem-vinda. Todas atrasadas. Entre elas, que ele saltaria daquele precipício antes de causar a mínima dor que fosse nela.

      Vagamente, ele fitou a escuridão e jurou faria a coisa certa. De uma vez.

      Ele não tinha escolha.Maldição! Tudo para o inferno!

      A horrível decisão feita, ele tentou dormir pela milésima vez naquela noite. Mas conhecer tardiamente o que deveria ter feito, se provava uma perturbante companhia. Especialmente quando a mulher que ele sempre quis estava fora de alcance.

      Para sempre.Que palavra desanimadora.

      Cristo, se apenas ele pudesse dormir. Até mesmo ter sonhos ruins seria melhor que ficar deitado contemplando sua vida sem ela.

      Ele abafou um gemido. A dor era muito afiada. Ele não podia agüentar isto... - Mas, sim, eu posso agüentar isto... Por ela -.

      Ele rolou com outro gemido. Os lençóis esfolaram a pele nua. Os músculos dele estavam doloridos dos esforços da busca e o longo passeio de hoje. Ele precisava de descanso, mas a noite infinita se alongou à frente dele como um relógio desolado.

      A primeira de muitas. A única consolação dele era que finalmente, muito tarde e depois que o dano estava feito, ele achara a vontade para agir como um homem.

      Se só o amanhecer viesse.

      Mas quando o amanhecer viesse, ele teria que dizer adeus para Verity.

      Deus, deixe que a noite nunca acabe.

     

      Já passava da meia-noite quando Kylemore ouviu o chocalho do trinco. Ele rolou e assistiu como lentamente a porta balançava aberta.

      A luz bruxuleante, dourada iluminou a escuridão. Deslumbrado, descrendo, ele observou Verity no limiar. A vela fez os olhos dela brilharem escuros e misteriosos na face pálida. Um roupão de seda estava frouxamente amarrado à cintura esbelta e o cabelo glorioso dela caia solto ao seu redor.

      Ser forte era difícil o bastante quando ele tinha apenas seus pesares por companhia. Com o foco de todo seu desejo pairando assim tão perto, dissolução ficava bem perto do impossível.

      Então ele percebeu que só uma emergência a forçaria a procurá-lo. Em um segundo, a preocupação o empurrou contra a cabeceira.

      — Verity, você está bem? — ele perguntou, a voz dele afiou com urgência. Ela estava com febre?

      — Perfeitamente, obrigada.

      Ele não pôde duvidar de que ela quisesse dizer isto. A voz dela estava tranqüila, até mesmo levava uma sugestão de diversão e a face dela estava séria, mas estranhamente calma. Ela segurou a vela tão firme, que a chama apenas oscilava no ar imóvel.

      A surpresa dele montou. Se ela não estava doente, o que em nome do Diabo ela estava fazendo?

      Surpresa e confusão o fixaram à cama quando a porta clicou fechando-se atrás dela. Ela colocou a vela na plana cômoda. Quando ela se moveu, ele viu o esboço sombrio do peito e da coxa pelo fino roupão dela. Sua feroz necessidade se fez mais alta.

      A consciência dele insistiu que ele não tinha direito de tocá-la. O corpo dele discordou enfaticamente. Para confirmar isto, seu pênis subiu, ansioso, pronto, incontrolável. Graças a Deus, as roupas de cama esconderam a estimulação dele. Ele era mais que um animal bruto, ele disse a si mesmo sem convicção.

      Ela vagueou para ele com um sussurrar de seda. A luz incerta revelou um sorriso que era puro de Soraya. Sedutor. Astuto. Confiante. Em outra mulher, ele teria interpretado o vislumbre nos olhos dela como desejo.

      Mas esta era Verity e ele a conhecia melhor.

      — O que infernos você quer? — ele perguntou nitidamente, chamando a raiva como única defesa.

      Ela tinha vindo aqui para fazê-lo sofrer? Nesse caso, ela estava tendo sucesso, condenada.

      — Eu o quero —, ela disse roucamente.

      Ele fechou os olhos em angústia. Como ele tinha desejado ouvi-la dizer essas palavras. Mas as circunstâncias tinham mudado - ele tinha mudado - nos últimos dias.

      — Eu não acredito —, ele estalou, ressentido porque ele desejava tão desesperadamente que o que ela dizia fosse verdade.

      — Você deve.

      A voz dela tocou com sinceridade quando se acolchoou mais perto. Os pés esbeltos e elegantes dela tocavam as tábuas do assoalho. A noite não estava fria, mas ainda assim ele combateu o impulso para apanhá-la e levá-la de volta para a cama dela. O controle dele era tão delicado, que se ele a tocasse, estaria perdido.

      — Você não tem que fazer isto —, ele mordeu, enquanto a batida temerária do sangue dele comandava que a tomasse, tome-a, tome-a.

      — Sim, eu tenho —, ela disse sem uma sugestão de hesitar.

      Deus, por que ela permanecia tão perto? O maldito cheiro evocativo dela o envolvia e o atraia a pecar.

      Deus, por que ela não ficou parada mais perto, assim ele poderia rasgar o dissimulado roupão e arrastá-la debaixo dele?

      — Você não me deve nada. Você tinha razão em me chamar de ladrão.— O tom dele rangeu como se ele fizesse uma difícil confissão. Ele olhou além para um canto escuro e falou em uma voz entorpecida com seu duro autodomínio retido.

      Ela se apoiou nele, libertando outro redemoinho sedutor de cheiro de sabão de rosa sutil e de mulher.

— Você fala muito —, ela sussurrou. — Para onde foi meu amante feroz? Onde está o endemoniado Duque de Kylemore?

      — O quê?

      Ele chicoteou a cabeça para ela. Incrivelmente, ela ainda sorria. O aperto das mãos dele nos lençóis mostrava a batalha interna contra o desejo de agarrá-la.

      Ela estava tão próxima, que ele sentia o calor dela. Mas os pecados dele contra ela o exilaram para sempre a um inferno frio.

      — Pare —, ele rosnou. — e me escute! Eu a libertei.

      A presença dela era o mais completo tormento.

      Ele pensou que morreria, se ela o deixasse sozinho.

      Ele falou com uma onda de autoaversão.

— Eu nunca deveria ter começado esta tolice cruel, em primeiro lugar.

      — Está muito tarde para pesares —, ela disse suavemente.

      — Sim.

      Muito tarde para se redimir e ser merecedor dela, certamente. Havia um universo de tristeza em seu pensamento.

      A mente dele ensaiou a infinita ladainha. Ele nunca deveria tê-la caçado até Whitby. Ele nunca deveria tê-la forçado a entrar em sua carruagem, na mira de uma arma, ele recordou com uma vergonha corrosiva. Ele nunca deveria tê-la tiranizado na cama dele.

      Embora sem o seqüestro, ele nunca a teria conhecido realmente. Ele passaria pelo fogo do inferno antes de abandonar esse privilégio.

      Mas ela, não você, passou pelo fogo do inferno. Ela quase perdeu a vida no dia anterior.

      — Eu a estou deixando ir. — A voz dele tremeu com desespero.

      — Você está? — ela perguntou à toa.

      Depois da longa luta dela para escapar, ele teria esperado que ela soasse mais que meramente interessada quando ele concedesse sua liberdade. Confuso, ele fitou a face primorosa que o tinha assombrado durante tantos anos.

      — Não me atormente.

      — Você merece isto —, ela disse sem calor.

      E sem se mexer, condenada.

      — Sim, eu mereço. Mas, o Diabo, se eu mentirei aqui e a deixarei afundar suas malditas garras em mim, pequena gatinha.

      A boca deliciosa dela enrolou para cima.

— Eu penso que você pode.

      A penetrante tensão dele apertou, a ponto de quebrar, enquanto se esforçava para banir as imagens sensuais que as palavras dela enviavam pela mente dele. Ela jogava um jogo perigoso para o arreliar assim. Ele se deslocou mais alto contra os travesseiros, até que os olhos dele se nivelaram com os dela.

      — Vá embora, Verity —, ele disse com dificuldade.

      Fique, Verity, o coração dele alegou.

      — Isso não é o que você quer —, ela sussurrou.

      Ele não podia agüentar muito mais do que isso.

— É o que você queria que importa.

      Ela se inclinou mais perto e ele ouviu a inalação trêmula dela antes de falar.

— Eu acho...— Ela hesitou, então continuou. — Eu penso que isso é por que eu posso estar agora aqui com você.

      Então impossivelmente, ela o beijou.

      Era um beijo diferente de qualquer coisa que ele tivesse provado. Sua boca era macia, persuadindo, convidando. Ela chamou as artes que Soraya tinha tão cuidadosamente cultivado, contudo, embaixo pairava a inocência pungente que ele sempre reconheceria como Verity.

      Ele estava desamparado em tentar evitar devolver o beijo com todo o anseio que havia no coração dele. Ele mergulhou a mão na massa sedosa dos cabelos dela. Deslizou fria e fragrante contra os dedos dele enquanto a boca feminina marcava a dele como ferro com o seu calor. Ela se deslizou para baixo, assim ela se deitou no tórax nu dele, e entrelaçou os braços ao redor do pescoço dele, o trazendo mais íntimo.

      Antes de ele se afogar em arrebatamento escuro, ele arrancou sua boca da dela.

      — Pelo amor de Deus, eu estou tentando fazer o que é certo —, ele arquejou, fitando abaixo na face excitada dela. Ele se agarrou aos seus escrúpulos por uma fina linha.

      — Oh, Kylemore. — O riso esfumaçado dela roçou como tortura primorosa por todos seus nervos.

      Desesperadamente, ele pensou que daria tudo que ele possuía se ela o chamasse Justin só uma vez.

      — Por que você está fazendo isto? — ele rangeu até mesmo enquanto os braços dele se enrijeciam para mantê-la no abraço dele. — Por quê, Verity?

      Os dedos dela se enroscaram no cabelo da nuca dele.

— Você não sabe? Você não pode ver? — Os olhos dela estavam claros quando encontraram os dele. — A guerra acabou. Eu baixei minhas armas. A vitória é sua.

      — Tão facilmente? — Ele não confiou na capitulação dela. Apesar do beijo, apesar de que ela oferecia a este pecador um paraíso que ele pensou que nunca atingiria. — Você disse que me odiava. Você deveria me odiar pelo que eu fiz a você.

      A expressão dela se escureceu à lembrança.

— Sim, eu o odiei. Mas eu não o posso odiar mais. Eu quase morri ontem. E eu não quero morrer antes que eu me dê abertamente ao homem que eu quero. Você é o homem que eu quero, Kylemore.

      Ele estava estupefato com maravilha. Ela era sem dúvida valente, mais valente que ele. Ela era bonita. E apesar dos crimes dele contra ela, ela se comprometera a se manter com ele.

      O coração dele se contraiu. Afinal de contas à miséria e violência, a dor e fúria, ele dificilmente acreditaria que um porto seguro o chamava. Porto seguro onde a mulher, a qual ele ansiava, o queria também.

      A concessão parecia tão simples. A concessão mudou a vida dele.

      Ela contemplou a face dele. Lágrimas brilharam nos olhos dela e a expressão dela era totalmente com necessidade.

— Você quer que eu implore, Kylemore? Eu farei se for preciso.— A voz dela rachou.

      — Por piedade, não!

      Como ela poderia duvidar depois dos anos da fome incessante dele? Ele a apertou tão perto, que as lágrimas dela fluíram úmidas contra o ombro dele.

      A voz dele tremeu com uma emoção turbulenta.

— Não chore, mo leannan. Eu sou seu gratuitamente. Eu sempre fui seu. Você não poderia me dar presente melhor que você.

      Ela se afastou e esfregou a mão trêmula pelo rosto, surpreendentemente, ela deu uma risada quebrada.

— O que você está esperando, então?

      Ela tinha lhe falado que o queria e ele definitivamente a quis. Realmente, pelo que ele estava esperando? Ele a alcançou para desamarrar o roupão dela e deslizá-lo sobre os ombros.

      — Meu Deus —, ele respirou. — O que você tem posto?

      Ela olhou abaixo ao négligé completamente de seda azul-gelo. A intensidade vazou pela expressão dela e sorriu com humor súbito.

      — Você não reconhece isto? Eu suspeito que tenha custado uma fortuna na Madame Yvette.

      — Valeu cada centavo —, ele disse roucamente.

      Na luz de vela, o material escorregadio escondia, então revelava, a curva de um quadril, a saliência de um peito, o ápice sombrio das coxas dela. Ela se moveu e a seda denteou um mamilo enrugado. A respiração dele pegou na garganta à visão.

      Ele a puxou para baixo e a beijou novamente.

      Ele nunca tinha sido um homem que tinha se interessado em beijar. Ele sempre tinha considerado isto uma distração de satisfações mais térreas. Agora ele não podia adquirir o bastante do gosto dela, a exuberância suculenta da boca sedutora.

      Quando ele a rodou para baixo dele, o calor cintilou ao longo do corpo. Ele se deitou entre as pernas dela, posicionado para a união. A estimulação dele clamou para tomá-la, mas ele prolongou o momento. Ele pretendia saborear a felicidade dele antes que o destino maligno arrebatasse isso.

      — Nós deveríamos nos transferir para seu quarto, se você estiver se sentindo particularmente aventureira, mo cridhe. — Ele riu suavemente. — Esta cama não permitirá muito mais que o alívio tradicional.

      Ele empurrou o sexo dolorido dele contra a barriga dela. Ele esperou fervorosamente que ela não planejasse uma sedução elaborada, ou ele nunca duraria à distância.

      — Mo cridhe?— ele incitou.

      — O quê? — ela perguntou em uma voz ofuscada.

      — Seu quarto. Nós iremos?

      Ela deu uma olhada e ele a viu se apertar no espaço limitado.

      — Um de nós terminará no chão se ficarmos aqui.

      Ela deu um gargarejo encantador de diversão.

— Isso não sentaria bem com a dignidade ducal.

      — Isso não sentaria bem com a anca ducal.

      Esta risada era uma experiência nova precipitada. Ele e Soraya tinham compartilhado prazer, mas nunca alegria. E a paixão dele por Verity tinha sido escura e tinha sido dirigida pela destruição.

      Que descoberta maravilhosa que, depois de durante um ano com esta mulher, ele ainda tinha novos mundos para percorrer.

      Ele se ergueu dela e se levantou, oferecendo-lhe a mão. Não há muito, ela teria tratado o gesto com suspeita. Hoje à noite, ela levou a mão dele de boa vontade e se levantou em um ondular de seda azul transparente.

      — Deixe-me ter meu modo mau com você —, ela sussurrou, libertando-o para pegar a vela e se orientar à porta.

      Ele a seguiu e a balançou para estar em frente a ele. O homem que ele tinha sido uma vez teria aceitado esta generosidade sem dúvida. O homem que ele se tornara precisava de uma confirmação final de consentimento.

      Assustados olhos prateados flamejaram para os seus. A chama da vela oscilou de modo selvagem.

— Sua Graça?

      O abraço dele firmou.

— Kylemore. Ou Justin. Eu prefiro Justin.

      O sorriso que ela lhe deu era pura tentação.

— Talvez quando eu o conhecer melhor.

      Ele deixou aquele argumento para outro dia. Ao invés, ele falou sombriamente.

— Você está segura, Verity?

      — Sim, eu estou segura. — Ela elevou a mão para o lado da face dele com um gesto tenro, então ela pegou a mão dele mais uma vez. O calor do toque dela fluiu nas veias dele como conhaque. — Venha comigo. Eu prometo afugentar os sonhos ruins.

 

      Enquanto ela fazia o caminho ao longo do corredor, Verity estava assustadoramente consciente que mais de seis pés de macho magro e forte a seguiu só uma respiração atrás.

      Magro, forte e desperto macho. Ele estava nu e o interesse dele nela estava descaradamente claro.

      Estava enervando.

      Era excitante.

      Uma excitação a arrepiou toda, atando a potência focalizada totalmente nela. Tão recente quanto uns meros dois dias atrás, aquela potência a teria aterrorizado. Agora ela desfrutava de seu poder.

      Ela não era mais a mulher de reputação duvidosa relutante que compartilhava a cama dela em troca de sustento. Ela não era mais nenhuma Verity perdida pobre e amedrontada que se rendesse aos impulsos mais fundos dela, ela perderia a alma eterna.

      Mas ainda assim, quando eles chegaram ao quarto dela, ela hesitou na extremidade da cama.

      Este parecia de repente ser um passo irrevogável.

      Kylemore andou atrás dela e a cercou com os braços. O calor imediatamente a cercou.

— O que é? — ele murmurou.

      Isso era novo, o modo como ele estava conectado ao mais mero pensamento dela?

      Não. Por qual outro meio ele teria conseguido conduzi-la ao longo do difícil, mas inexorável caminho da redenção?

      Ela riu suavemente, nervosamente.

— Você acreditaria se eu me sentisse tímida? Você pensará que eu sou ridícula.

      — Eu penso que você está perfeita. — Ele a libertou e se moveu para se estirar na cama. A ereção dele se sobressaiu, contradizendo a paciência externa dele. — Eu sou todo seu.

      Essa noite, ela sabia, isso era verdade. Ela já tinha aceitado que não seria verdade para sempre. Uma mulher como ela nunca poderia tê-lo para sempre.

      Ainda, esta noite, por agora era o bastante.

      Com um movimento suave, ela arrastou o négligé membranoso por cima da cabeça e o deixou flutuar ao chão. O sexo dele se contraiu e a boca dele assumiu uma linha cansada.

      — Eu não estou seguro que seja uma boa idéia —, ele disse roucamente. — Não, se você quiser que eu mantenha minhas mãos paradas.

      Ela deu a risada de Soraya, exceto que dessa vez emergiu perfeitamente espontânea.

— Eu o amarrarei se for preciso. Tem que ser sua vez.

      Como ela podia zombar sobre o seqüestro dela? Mas de alguma maneira, quando ela reconhecera que amava o Duque de Kylemore, toda a dor e o rancor anteriores tinham enfraquecido.

      Se ele não a tivesse seqüestrado, ela ainda seria uma criatura aleijada que se conformaria com uma meia vida. Bons trabalhos, celibato independente, o dever familiar não deveria competir com a riqueza abundante da emoção que rondava essa noite ao redor deles.

      A possibilidade de desgosto também pairava, mas ela enfrentou isto. Ela pretendia agarrar a alegria e agüentar tão firmemente quanto ela pudesse. Não importa quanto tempo durasse. Não importa que a dor a esperasse no futuro.

      Ela escalou sobre a cama e se ajoelhou sobre ele. Os joelhos dela apertaram nos flancos magros dele e o cabelo dela fluiu abaixo, ao redor deles. Ela sorriu lentamente, lascivamente, quando ele enrolou as mãos fortes ao redor da cintura dela como se nunca a deixasse ir.

      Soraya tinha sido poderosa, mas Soraya tinha sido uma mentira. O que ela sentia agora vinha do interior dela, que estava pesado e fundido com desejo para este difícil e amado homem.

      Os olhos índigos dele escureceram quando ele leu a expressão dela. Estimulação mútua era familiar. Este nível incendiário de excitação não era, qualquer fosse as alturas estelares que eles tinham escalado no passado.

      Ela se dobrou para correr sua boca abaixo do centro do tórax dele, demorando, provando, desfrutando. O cheiro almiscarado dele já a intoxicava como nenhum vinho poderia. Gradualmente, inevitavelmente, ela localizou a seta de cabelo sedoso que conduzia à base da barriga dele.

      Com grande satisfação, ela o sentia lutar para tomar fôlego. Ela quisera que a exploração vagarosa dela rompesse o autocontrole vaidoso do amante dela. Aparentemente, ela teve sucesso.

      Ela imergiu a língua dela no umbigo dele e colocou a mão muito deliberadamente no sexo dele. Ele estremeceu quando ela o acariciou, testando o calor e o vigor dele.

      Oh, ela tinha escolhido um homem maravilhosamente viril para ela. E toda aquela masculinidade robusta era sua, toda sua, que menina afortunada ela era.

      Logo, tão logo, ela o provaria lá. Com um suspiro, ela deslizou para baixo, onde ele se elevava em glória orgulhosa debaixo dos dedos exploradores dela. Ele gemeu e as mãos dele se enroscaram no cabelo dela.

      Lentamente, ela lambeu o comprimento dele, sentindo a construção da tensão nos músculos da coxa dele para onde ela tinha movido a mão para se equilibrar. Então, com uma concentração que ela sabia que o torturaria, ela sacudiu a língua pela cabeça, saboreando a estimulação dele. Embaixo da outra mão, a barriga dele apertou dura. Quando ele gemeu mais uma vez, ela sentiu bem o som da parte mais funda dele.

      Claro que, ela dera prazer a ele com a boca antes. Freqüentemente. Mas nesta noite, o ato celebrava uma liberdade jovial que ela nunca tinha experimentado durante todas as tórridas tardes em Londres.

      Ela tentou prolongar esta proposta provocante. A visão dele esticado em uma tortura sensual satisfazia alguns elementos naturalmente femininos dela. Ele empurrou debaixo dos beijos seduzíveis dela, implorando silenciosamente por mais.

      E ela queria dar mais. A necessidade arrastou insistentemente no sangue dela, ditando um fim para a demora. Quase sofregamente, ela o levou na boca.

      Ele esta quente, tão quente. Quando ela começou a chupar, ele tremeu embaixo dela como se sofresse de febre. Quão intoxicando era tê-lo assim à clemência dela. Ela aumentou a pressão, iniciando um ritmo que lembrava o ato do amor.

      — Mo cridhe. — ele rangeu, inclinando os quadris dele para cima, para ela.

      Ela se inclinou mais íntima para levar mais dele e os dedos dele se apertaram convulsivamente contra o couro cabeludo dela. Ele estava muito perto de quebrar, ela sabia. A própria excitação dela faiscava como raio, enquanto ela sentia a fútil, mas frenética luta dele para arrear o desejo.

      Ela queria que ele perdesse o controle. Ela queria que ele perdesse o controle para ela.

      Mas antes de ela alcançar sua meta, ele a arrastou para cima com mãos trementes. Ela soltou uma queixa frustrada quando ele a rodou destramente embaixo dele. O peso dele a apertou no colchão, e o pensamento de que toda aquela força magra sobre o ela a fez tremer com antecipação.

      — Eu quero lhe dar prazer —, ela protestou em uma voz que ela quase não reconheceu como sua. Ela lambeu os lábios dela e provou a pele dele. Ela queria provar mais dele.

      Ele elevou a cabeça e por uma vez, o sorriso dele não continha escuridão. Mesmo ressentida do objetivo dela, ela não pôde evitar pensar com um golpe de desejo quão bonito ele era.

      — Desta vez é para você —, ele disse suavemente.

      O desespero selvagem de arrebatar este momento e guardá-lo como um avaro vigiava seu ouro vazou dela enquanto o desejo dela brilhou mais alto, mais brilhantemente.

      — Sim —, ela sussurrou. E viu a última sobra do rosto dele ir embora, quando finalmente ela lhe deu seu consentimento.

      Kylemore se mexeu em cima dela muito suavemente. Os quadris dela o embalaram e o pênis dele cutucou avidamente a suavidade da barriga dela. Depois do passado decadente deles, isto deveria estar tão familiarizado.

      Mas ele não pôde rejeitar a idéia extraordinária de que fazia amor a uma virgem. Apesar de todo o prazer que eles tinham compartilhado. Apesar do que ele tinha feito a ela nesta casa. Apesar do frenesi que a boca inteligente dela e as mãos o enviaram.

      Suavemente, como se a tocando pela primeira vez, ele explorou o corpo dela. O padrão instável da respiração dela o guiou aonde o prazer dela se deitava.

      Ele levou o tempo dele, lutando contra a necessidade que fervia como um remoinho de água dentro dele. O coração dele bateu tal uma tatuagem furiosa no tórax que ele pensou que poderia estourar. Mas ele segurou a fome e se concentrou nela. Afinal de contas pelas transgressões dele contra ela, ele lhe devia isto.

      Ele acariciou e beijou os peitos dela até que ela ofegou e tremeu nos braços dele. Os mamilos dela estavam tão sensíveis, que ele soube que poderia levá-la ao clímax assim.

      Mas ainda não era o bastante. Ele tinha prometido o prazer para ela e, por Deus, ele pretendia dar prazer a ela como ela nunca recebera antes. A dor nos lombos dele apertavam em agonia, mas de alguma maneira ele conteve o desejo para entrar e possuir.

      Ele tocou o centro orvalhado dela e sorriu com satisfação quando ela resistiu e gemeu debaixo da mão dele. Ele sempre tinha amado a receptividade dela. O cheiro da estimulação dela invadiu os sensos dele quando ele acariciou as dobras rechonchudas, úmidas até que estivessem inchadas e molhadas sob os dedos dele.

      Ele empurrou dois dedos nela e dobrou a cabeça dele para afundar os dentes na curva onde o pescoço dela encontrava o ombro. Ela gritou e estremeceu, recompensando-o com um fluxo quente de umidade contra a mão dele.

      Imediatamente, ele de forma gentil, enroscou-se nos buracos fragrantes do pescoço dela quando começou a trabalhar os dedos dentro e fora dela. Ela tremeu e golpeou os braços ao redor das costas nuas dele. Logo, ela tremeu como uma árvore nova no vento forte e a respiração dela emergiu em gemidos ofegantes.

      Mas a desumanidade dele não tinha desaparecido completamente. Ele continuou, até que ela se quebrou e se agarrou a ele, chorando. Ela ainda estava tremendo, quando ele se posicionou entre as coxas dela.

      Ele lutou para respirar e pela força de vontade para fazer isso bem para ela. Cuidadosamente, com uma restrição que quase o matou, ele deslizou nela. O suspiro dela enquanto ele penetrava completamente era o mais doce som que ele alguma vez tivesse ouvido.

      Ele tinha sido um poder no grande mundo. Ele tinha comandado o destino de multidões. Ainda, apesar disso, ele conheceu este soldado raso, momento silencioso era o mais importante da vida dele.

      Para um momento longo, ele permaneceu imóvel, suspenso em conexão perfeita.

      Eles eram um só.

      Ele sempre tinha rejeitado aquela idéia como conversa oca sentimental. Mas durante alguns segundos transcendentes, ele não sabia onde ele terminava e ela começava.

      Mas ele era, afinal de contas, meramente um humano. O desejo para se mover ficou irresistível. Ele retirou e empurrou mais uma vez.

      Imediatamente ele sentiu de novo aquele senso de volta ao lar.

      Ela suspirou com delícia e se ergueu a ele. O arco gracioso do corpo dela lhe falou tudo que ele precisava saber sobre o que ela queria.

      O famoso controle dele se quebrou em mil fragmentos brilhantes. De modo selvagem, ele mergulhou nela de novo e de novo, indo à força vulcânica de um clímax e outro até mesmo mais turbulento. Então, enquanto os tremores ainda a sacudiam, ele mergulhou duro pela última vez. Com um gemido poderoso, ele soltou a paixão dele na escuridão de boas-vindas do útero dela.

     

      Verity vagava de volta dos reinos deslumbrantes do último prazer para achar Kylemore caído em cima dela, a cabeça dele enterrada no ombro dela. Ele era pesado e estava quente, apertando-a no colchão, mas ela não o agüentava para tirá-lo. Os braços dela se apertaram gradualmente ao redor das costas dele enquanto a respiração rota dele reduzia a velocidade.

      Duro acreditar que ela, a grande perita em carnalidade, não tinha sabido absolutamente nada. O que ela há pouco tinha experimentado revelou que os encontros prévios que ela tivera eram como imitações pálidas de algo raro e real.

      Ela teve vontade de rir com alegria. Ela tinha vontade de se debulhar em lágrimas sob o que ela tinha perdido. O que ela nem imaginou que existisse.

      Ela fechou os olhos, se lembrando do flash atordoado dela de reconhecimento quando o corpo dele tinha finalmente se uniu ao seu.

      Pela primeira vez na vida dela, ela tinha se sentido completa. A menina rural ignorante. A provedora de Ben e Maria. A criada amedrontada. A amante de Eldreth, tão filha quanto amante, especialmente depois do começo da doença dele. A tutora mundana de James. A obsessão de Kylemore. Então a ressentida cativa brava dele.

      Filha. Irmã. Concubina. Prisioneira. Amante. Unidas na mulher que amava Kylemore. Após todas as tempestades dolorosas, ela se aquecia agora em uma paz diferente de qualquer coisa que ela alguma vez tivesse conhecido.

      As palavras Eu te amo tremularam nos lábios dela.

      Mas ela nunca poderia lhe falar. Não pelo bem dela – ela nunca deixaria de amá-lo. Mas pelo dele.

      Os últimos dias tinham revelado que ele estava longe do monólito insensível que ele se esforçava a apresentar tão diligentemente. Ele já carregava tanta dor. Ela não se permitiria acrescentar a isto.

      Kylemore se mexeu. A respiração dele era mais firme e o coração dele já não trovejava contra ela.

      Quando ele elevou a cabeça e olhou para baixo nos olhos dela, ela viu que ele também tinha mudado. O olhar dele estava claro e seguro. O cinismo que sempre tinha ocultado as características dele tinha desaparecido. Pela primeira vez, ele verdadeiramente se pareceu com um homem um ano mais jovem que ela.

      O coração dela estava tão cheio, ela levantou a mão para tocar a bochecha dele. Uma sombra de barba eriçou embaixo dos dedos dela.

      — Eu tenho um urso em minha cama. — Ela buscou alívio com leveza.

      Debaixo dos dedos dela, ela sentia a prega da bochecha dele em um sorriso.

— Eu deveria ter raspado.

      — Mmm.

      — Eu sou muito pesado para você.

      — Talvez um pouco.

      Ela arrastou os dedos dela para cima e escovou o cabelo enrolado e escuro dele para trás de sua têmpora. Ela nunca antes se permitira às explorações tentativas de um amante novo. Ela conhecia tão bem o corpo dele, contudo estes gestos simples de afeto eram totalmente pouco conhecidos.

      Ele se empurrou no toque dela, fazendo-a lembrar um gatinho que ela tivera quando criança. A memória era inocente, relembrar de algo há tempos que ela quase tinha esquecido.

      Ela riu suavemente.

— Logo você começará a ronronar.

      — Ai, mo cridhe. Eu já estou ronronando. Seguramente você me ouve. — A até a voz dele soava diferente, mais macia, indicando uma canção alegre das Highlands.

      Ela poderia se apaixonar por um homem com uma voz assim.

      — Do que você me chama? — ela perguntou à toa, continuando a acariciar os contornos da face dele, o nariz arrogante, as orelhas, as sobrancelhas.

      Até mesmo mais gracioso debaixo dos carinhos dela, ele fechou os olhos.

— Oh, é só um termo local para uma mulher.

      Quando ele elevou as pálpebras e olhou para ela, ela notou o brilho azul de divertimento. Claramente, havia mais do suave agrado que ele pretendia lhe falar.

      O que isso importava em tal momento perfeito? As mãos dela deslizaram até a parte de trás dele, localizando músculos e ossos.

      Ela poderia tocá-lo assim para sempre. E ainda pedir por mais.

      Quem podia saber que o corpo de um homem oferecia tais prazeres? Certamente não a cortesã mais infame de Londres.

      Ele dobrou a cabeça para beijá-la - curtos, beliscões brincalhões e bicadas que logo a teve dando risadinhas e lutando com em ele em uma confusão extática de membros nus.

      Ela se sentia novamente como uma criança. Uma criança com o melhor amigo dela no mundo.

      Uma criança que logo se viu tragada em um distinto desejo de adulto quando o jogo foi ficando mais propositado. A boca dele a tocava em todos os lugares, o pescoço, as costas, os traseiros, os peitos, entre as pernas dela. Era como se ele apostasse a posse dele com beijos. Beijos que construíram um grau cada vez maior para o calor até que ela se queimou com necessidade.

      Dessa vez, o clímax foi cataclísmico. O mundo dela se fragmentou em um estouro de branco fundido. Ofegando, ela se agarrou a Kylemore como o único objeto sólido no universo despedaçado. Mas um brilho mais duradouro demorou em baixo da explosão violenta de prazer. E quando ela flutuou de volta à realidade, era do brilho que ela se lembrou.

      Posteriormente, eles dormiram brevemente.

      Ela despertou para achar Kylemore elevado em um cotovelo, observando-a com uma expressão sonolenta nos olhos índigos. Olhos índigos, que pela primeira vez, desde que ela tinha o conhecido, estavam tranqüilos, como um mar tranqüilo ao pôr-do-sol. Ele deve ter se levantado enquanto ela dormia, porque uma floresta de velas iluminava o quarto a ouro.

      A expressão dele era tenra quando ele amoldou o peito dela. Ele roçou o polegar contra o mamilo rechonchudo e este endureceu em resposta imediata.

      — Isto é o que eu queria em Londres —, ele murmurou, se dobrando para colocar um beijo onde o polegar dele arreliou. Os lábios dele estavam quentes na pele tenra dela e ela se mexeu debaixo de uma onda renovada de desejo.

— Por que você me fez esperar tanto tempo, Verity?

Ela não fingiu desentendê-lo.

— Você parecia... você parecia ser mais do que eu pudesse controlar. Eu preferia homens mais fáceis. — Como ele esperava que ela se concentrasse nas perguntas dele enquanto ele a tocava?

      — Assim você tomou Mallory como seu amante.

      O nome do último protetor dela colidiu com a harmonia entre eles, com a força de uma faca lançada em uma porta. O excitar aprazível dela de estimulação desapareceu em um segundo.

      — Eu não posso evitar o que eu era —, ela estalou. Ela tentou se afastar, mas ele pegou o ombro dela e a parou.

      — Eu só estou tentando entender. Eu sei por que você devia lealdade a Eldreth. Mas Mallory era uma piada.

      — Ele era doce. Eu pensei que eu pudesse ajudá-lo.— Ela sorriu, então desejou não tê-lo feito quando uma carranca escureceu a face de Kylemore.

      — Você o amou —, ele rosnou.

      Ela mordeu uma negação veemente quando olhou mais de perto para Kylemore. Ele não estava furioso. Ao invés, ele parecia incômodo, envergonhado, aborrecido.

      Ciumento.

      Céus, como era maravilhoso. Ele tinha ciúmes. Por causa dela!

      A ligação dele com ela não era a partida desigual que ela sempre tinha acreditado ser. Quando ele mencionou James, ele não a escarneceu sobre seu horrível passado. Ele buscou confiança de que ela não queria a mais ninguém a não ser ele.

      A resistência dela vazou fora. Ela se deitou ao lado dele.

      — Não. Eu não era capaz de amar qualquer pessoa então.

      Com horror, ela percebeu o que tinha dito. Querido céu, não permita que o astuto amante dela captasse o uso do tempo passado.

      Mas ele ainda se afligia com o homem que tinha ocupado a cama dela tão brevemente.

— Ele a amou. Ele deve tê-la amado.

      Ele parecia indevidamente interessado com a noção de amor.

      Ela tinha pensado no amor como um conceito estrangeiro para o Duque de Kylemore. Claramente, ela estava enganada.

      — Muito lisonjeiro, Sua Graça —, ela disse secamente. — Mas em verdade, ele não sabia o que fazer comigo uma vez que me tinha. Ele ra um tipo casa-e-comida. Eu lhe ensinei como se comportar socialmente, lhe dei conselhos sobre como galantear a Sarah dele e renunciei a ele alegremente quando terminou. Ele é amável, um precioso homem que se casou com a amada dele. Ele não vale seu ódio.

      — Exceto que ele a teve quando você deveria ter sido minha.— O braço poderoso dele se apertou ao redor dela. — Você me deixou furioso durante anos, você sabe. Fale-me sobre os outros.

      — Que outros?

      Ele arrastou uma mecha longa do cabelo dela em repreensão suave.

— Não me tome como um bobo, Verity. Você era a mulher mais notória em Londres. Você teve mais amantes que um baronete ancião e um novo-rico efeminado.

      — Sim —, ela disse em um resmungo, tentando se livrar do abraço dele mais uma vez. — Havia um escocês presunçoso que deveria ter tido as orelhas dele encaixotadas.

      Kylemore se ergueu sobre ela, a face dele branca com o choque.

— Três amantes? — ele perguntou em descrença patente.

      — Não há nenhuma necessidade para soar tão presumido —, ela disse com desgosto genuíno.

      — Shh —, ele sussurrou e começou a beijá-la. Ela quis resistir, mas como sempre, era impossível.

      Quando ele a tinha subjugado em um monte agitado de prazer, ele riu retorcidamente.

— Você nos seduziu, mo cridhe. A mulher mais escandalosa do reino é pura como a neve acumulada.

      — Não me escarneça, Kylemore —, ela protestou, irritada novamente.

      — Eu não estou. Mas você precisa reconsiderar seu papel como uma mulher escarlate. Você pôs a maioria das senhoras da moda vermelhas.

      — Você esquece que eu dirigi todos esses homens ao suicídio com meus ardis quando eu vim pela primeira vez para Londres —, ela disse amargamente. A velha ferida ainda se inflamava.

      — As mortes deles não foram sua culpa, Verity —, ele disse suavemente. Ela procurou na face dele por censura, raiva ou desgosto, mas os olhos azuis fundos estavam sérios e não continham nenhuma condenação.

      Ele soou tão seguro. Mas o pesar dela tinha ferido muito profundamente para meras palavras oferecerem absolvição. Ela respirou com um soluço.

— Em minha alma, eu não os encorajei. Ainda assim eles se mataram por causa de mim. Por quê?

      Ignorando a dureza do tremor dela, Kylemore se arrumou mais alto até que ela se deitou no tórax nu dele. A pele nua dela deslizou contra a dele quando ele comprimiu a cabeça dela debaixo do queixo dele.

      Ele entendia a culpa fútil melhor do que ninguém. Ele sabia como corroia a alma. Ele não tinha sofrido porque ele não podia parar a mãe dele de desapropriar as propriedades para fundar as ambições políticas dela?

      Verity tinha suportado anos de ódio e conversa maliciosas sobre os charmes supostamente fatais dela. A fofoca a tinha condenado à frieza e a tinha acusado de desfrutar do poder dela sobre o sexo masculino, que não desconfia e é crédulo.

      As matronas não tinham sabido nada da verdadeira mulher.

      — Eles sofriam um tipo de loucura. Você era só a desculpa —, ele disse lentamente, procurando as palavras corretas para acalmar a dor dela. — Havia algo febril no ar daquela estação. Eu me lembro da selvageria, o jogo mais libertino, o womanizing libertado, os duelos para a morte. Soraya, com a beleza dela e o mistério dela, faziam parte disto. Mas nada que ela fez levou esses homens a finalizarem com suas vidas.

      — Eles morreram por minha causa —, ela sussurrou, escondendo a face dela no ombro dele. — Por causa do que eu era e o que eu fiz.

      A alma cobiçosa de Kylemore exultou por ter sido ele a quem ela buscou por conforto.

      Então ele sentiu as lágrimas quentes dela contra a garganta dele. A ganância dele para ser o centro eterno do mundo dela enfraqueceu como piedade o subjugou.

      O abraço dele nela apertou.

— Está na hora de se perdoar assim como eu tenho certeza que os fantasmas daqueles jovens preocupados a perdoaram há muito tempo. Os suicídios foram uma tragédia e um desperdício cruel, mas eles nunca foram sua culpa.

      — Realmente acha isso? — A pergunta hesitante dela era um murmúrio contra o tórax dele.

      — Mais do que eu posso dizer.

      Ela se deitou calma e exausta nele, frágil nos braços dele, contudo mais forte que qualquer um que ele conhecesse. Ele ansiou fazer promessas extravagantes, jurar fidelidade eterna, ficar de joelhos e lhe oferecer o mundo em uma travessa de ouro.

      Mas ele se conformou com um simples:

— Durma agora, mo cridhe. Eu a manterei segura.

 

      Verity ainda estava nadando em um torpor de felicidade e no recentemente desperto amor na tarde seguinte, quando ela e Kylemore comeram uma refeição atrasada na sala de estar. Diga-se de passagem, ele tinha sido uma liberação extraordinária.

      Embaixo da letargia que demora depois de uma noite de paixão, floresceu uma nova autoconfiança. No momento, o ardor deste homem extraordinário, inteligente, corajoso, belo era totalmente dela.

      O que quer que o futuro reservava, nada poderia alterar o que tinha acontecido entre eles. Ela nunca seria a mesma. Nem Kylemore seria.

      Eventualmente, ele partiria para tomar seu lugar no grande mundo. Mas ele nunca seria livre dela.

      Nunca.

      O dia tinha começado com chuva, provendo a desculpa ideal para deter o duque na cama. Agora ela contemplava os abusos que ela pretendia cometer nele quando eles voltaram para o quarto. O que seria logo, ela esperava.

      Ela definitivamente tinha fome, mas não necessariamente por comida.

      — O que é? — Ele ergueu a mão até o prato dele e a alcançou em cima da mesa para brincar com os dedos dela.

      Toda a manhã, ele a tinha tocado assim. Gestos minúsculos de conexão a pegaram de surpresa. Ele sempre tinha sido um amante vigoroso, mas ela nunca o considerou como um homem demonstrativo.

      Ele olhou pelos restos do almoço deles para ela.

— Você está se ruborizando —, ele disse de modo convencido.

      Presunção era um das características permanentes dele hoje. Ela deveria realmente estar mal para achá-lo charmoso em lugar de irritante.

      Mas ele não estava tendo tudo do seu próprio modo.

— Eu estava pensando em como foi senti-lo em minha boca esta manhã —, ela disse ligeiramente, olhando-o por sobre os cílios dela. Ela sorriu à própria satisfação, quando ele se engasgou com um bocado de clarete.

      Soraya reteve suas especialidades, apenas o suficiente para manter a complacência de seu amante.

      Ainda sorrindo, ela tomou um gole do próprio vinho e estudou o quarto. Um veado particularmente feroz da parede capturou a atenção dela.

— Você sabe —, ela disse distraidamente, — estas decorações sempre parecem fora de caráter. Eu nunca o imaginei como o tal caçador se vangloriando.

      Embora ele a caçara efetivamente o bastante, ela admitiu, por uma vez sem um rastro de ressentimento.

      Ele fixou o copo dele, trouxe o guardanapo aos lábios e olhou ao décor fúnebre sem interesse.

— Os troféus eram do meu avô.

      — Você não os acha opressivos quando vem aqui de visita?

      — Eu não visito. Eu vivi aqui com meu pai até os sete anos. Eu não voltei desde então,.... Porém, agora, voltei porque precisei esconder uma amante problemática.— A expressão dele era como sempre cuidadosa quando ela sondava o passado dele.

      — É certamente inconveniente.— Ela usou uma voz neutra.

      — É extremamente desconfortável —, ele disse de modo chato. — E não —, ele continuou quando ela abriu a boca, — eu não quero discutir isto. Voltemos para cama.

      Assustada por ouvi-lo ecoar os próprios pensamentos temerários dela, ela baixou seu copo.

— Nós só descemos há uma hora.

      As sobrancelhas pretas dele abaixaram em uma carranca.

— Isso é um não?

      — Não. — Então, quando a carranca escureceu, — Isso não é um não.

      Ele riu suavemente e o som fundo deslizou espinha acima dela como raio quente. Ele contornou a mesa depressa para tirá-la da cadeira.

      — Eu não sei o que eu fiz para a merecer —, ele disse fervorosamente.

      Ela lhe enviou um olhar demolidor.

— Nem eu. E não pense você pode sempre usar sexo para me distrair.

      — Por que não? Dá certo.

      Presumido novamente, condenado. Ele estava tão enganadamente agradado com ele mesmo.

      Mas se ele achava que ela tinha abandonado a curiosidade dela, ele estava errado. Noite passada, ele a tinha forçado a se acertar com ela mesma e era o que ela tinha feito. O amor dela a fez determinada em ajudá-lo a conquistar os demônios em volta dele. Se esta determinação instigasse sua necessidade puramente feminina em aprender sobre o homem que ela amava, que assim fosse.

      Algo terrível estava enterrado no passado dele. Ele nunca estaria livre até que ele confrontasse isto.

      Ela estava pensativa quando deixou a sala de estar nos braços dele.

     

      Kylemore cruzou os braços dele atrás da cabeça relaxado contra os travesseiros enquanto estudava Verity. Para o pesar letárgico dele, ela tinha há pouco colocado um vestido de dia verde em cima da delicada camisa bordada. A troca não tinha feito nada para esconder o esplendor do corpo dela. O vestido lhe exigia que usasse um pouco mais de imaginação.

      Ela se sentou à penteadeira e começou a escovar os longos e brilhosos cabelos. O habitual puxa e liberta da escova prateada era sensivelmente soporífero.

      O corpo dele doeu aprazivelmente no resultado de paixão e satisfação pouco conhecida que acalmou a mente dele. A tarde guarnecia para noite. Lá fora, a chuva caia, enchendo o quarto de fria e cinza luz.

      Ele sempre a tinha assistido. Desde a primeira vez, quando ele tinha estado desesperado para tê-la e o caráter evasivo dela tinha se provado frustrante. Mas depois de ontem à noite, era como se ela tivesse lhe dando permissão para fitar. O passatempo nunca se tornaria insípido.

      Um sorriso felino encurvou a boca luxuriante dela quando ela pegou o olhar dele no espelho. Ela sabia que ele não podia adquirir bastante dela, bruxa.

      Ela era a mistura mais intrigante de sofisticação e inocência. Durante as últimas horas, tinha dominado a pessoa sofisticada. Mas na plenitude do prazer deles, ele tinha pegado um flash nos olhos dela que tinham perfurado diretamente à alma que ele tinha jurado que ele não possuiu.

      Até agora.

      No espelho, ela o considerou com a expressão pensativa que ela tinha usado escada abaixo.

      Inferno, ele deveria saber que ela não esqueceria das perguntas condenáveis dela. Talvez ele deveria ter tentado mais para desviá-la. Incrivelmente, dado o que tinha acontecido há pouco, o corpo dele expressou seu entusiasmo pela idéia.

      — Sr. Macleish disse que eu deveria lhe perguntar sobre seu pai —, ela disse uniformemente.

      A raiva ardente baniu o bem-estar sonolento dele. Ele se empurrou contra a cabeceira e olhou para ela com toda a arrogância que um duque poderia reunir.

— Ele disse? Por Deus!

      — Sim —, ela disse com tranqüilidade notável, considerando o resmungo dele. — Ele quer que eu cultive uma opinião melhor de você.

      — Eu terei a cabeça dele em um prato —, ele murmurou.

      Infernos, ele há pouco não estava furioso; ele se sentia traído.

      Hamish Macleish tinha testemunhado todo humilhante momento em uma juventude cheia de vergonha e dor. Alguém espalhou boatos desses sofrimentos como fofoca inútil e o feriu lá no fundo.

      — Ele presume muito em velhas obrigações. — Ele usou a voz de Kylemore, o Frio, cortou, frígido, afiado. — Como, madame, o faz.

      No espelho, ele assistiu a luz dela enfraquecer nos vislumbrantes olhos cinzas.

— Sim, Sua Graça —, ela disse indiferentemente e voltou a pentear com as mãos o cabelo dela.

      O trato formal picou. Sempre o fazia. Mas isto aborreceu mais hoje. Ele suspirou e subiu da cama. A expressão dela indicou que era improvável persuadi-la sobre isso muito em breve.

      — Verity, me permita meus segredos. Este não é um problema frívolo para uma conversa fiada —, ele disse pesadamente, pondo as calças. Obscuramente, vestindo feltro como armadura contra o ataque dela.

      Ela colocou a escova abaixo na mesa com um estalido agudo.

— Eu não estava fazendo uma conversa fiada. Seus segredos preciosos que lhe dão pesadelos. Quando você grita, você chama por seu pai.

      Com movimentos espasmódicos que indicavam seu temperamento, ela começou a torcer o cabelo preto grosso em um nó. Ele andou a passos largos e pegou as mãos ocupadas dela com as suas. E se ajoelhando, ele a encarou no espelho. As mechas escorregadias caíram em desordem ao redor nos ombros dela.

      — Pare isto, Verity.

      — Eu estou tentando fazer meu cabelo —, ela disse rabugentamente.

      — Isso esperará. Ou não vai fazê-lo. Eu o prefiro solto. — Ele libertou as mãos dela e com as palmas ele acariciou o rosto dela até que segurou a face dela olhando para frente no espelho. Olhos prateados desafiantes encontraram os seus.

      — Nós não podemos apenas desfrutar o que temos? — Era um argumento. — Nós acabamos de achar um ao outro. Não deteriore.

      As sobrancelhas finas escuras dela se contraíram em desgosto.

— Soraya foi paga para fazer o lhe mandavam, Sua Graça. Eu temo que sua próxima amante seja uma mulher de caráter mais independente.

      Ele riu. Ele não podia evitar.

— Soraya também não era nenhuma violeta a murchar. Sua memória a joga em falso, mo leannan.

      — Deixe de usar essas palavras estrangeiras estranhas comigo —, ela estalou, irritou ainda mais pelo humor dele.

      — É inglês que é estrangeiro aqui, mo cridhe. — Ele se dobrou para beijar a cabeça lustrosa dela.

      — Como deseja, Sua Graça —, ela disse inexpressivamente.

      Ela tremeu a cabeça, desalojando o aperto dele. Ele ficou atrás dela por outro momento, então pensou em retirar-se do quarto.

      — Diabo a leve, você não vai jogar comigo. Se zangue o quanto quiser, mas você não me fará seu brinquedo.— Ele não aceitaria isto. A vida inteira dele, ele tinha lutado contra as maquinações egocêntricas de sua mãe. Ele seria condenado antes que aceitasse manipulação semelhante de sua amante.

      — Como desejar, Sua Graça.

      Calmamente, ela voltou a fazer o cabelo. Ela ignorou o pedido dele para deixar solto. O agradar claramente não era prioridade dela. O mais agitado ele se tornou, o mais composto ela se pareceu.

      A moça pretendia provocar. E, condenada, ela definitivamente o provocou.

      Parecendo fresco e remoto, ela se virou no tamborete e esteve em frente a ele quando ela tinha terminado de arregaçar aquela massa exuberante.

— O que agradaria Sua Graça agora?

      Era a voz de Soraya e ele odiou isto. Ele mordeu uma réplica mordaz.

      Porque ele leu o que ela escondeu em baixo da tranqüilidade dela. E o que ele viu fez o coração estéril dele doer.

      Deus, ele a ferira. Ele não pôde agüentar isto.

      Ele tinha jurado que nada a feriria novamente. Ele tinha jurado isso na vida dele quando ele a tinha trazido a casa vinda das montanhas.

      Este momento revelou o valor do juramento dele.

      Para a salvar da dor, ele se prejudicaria, ele prejudicaria outros. Ele lutaria, mentiria, roubaria, mataria. Ele faria qualquer coisa.

      Qualquer coisa exceto revelar a vergonha dele.

      Infernos, isto não valia a pena. Ela não valia isto.

      Ele arrebatou a camisa dele e a arrastou por cima da cabeça. Então ele virou no salto do sapato e marchou à porta. Deixe a lembrança ressaltada de que ele não iria adquirir o modo dela. Quando eles voltassem a Londres, ele compraria alguma bugiganga bonita para acalmar a dor.

      Ele parou no limiar. Oh, Deus, como ele se enganava.

      Soraya estaria contente com tais calmantes. Ele só poderia satisfazer Verity com um tributo mais caro que até mesmo o diamante mais precioso.

      Verity queria a alma tremulante, inadequada, vulnerável dele. E ela o queria de joelhos dele quando ele oferecesse isto.

      Condenada. Condenada ao inferno. Ele não podia fazer isto.

      Mas o que significava o orgulho dele quando ele tinha a feito infeliz?

      Nada. Menos que uma única partícula de pó.

      Ainda, ele não podia olhar para o rosto dela enquanto lhe falava. Uma vez, ela o tinha detestado e tinha menosprezado. Com boa razão.

      Depois do milagre que tinha florescido desde a noite passada entre eles, a coragem dele falhara ante a perspectiva de reavivar o desprezo dela. Lentamente, ele se moveu para a janela e olhou pelas barras sobre o vale varrido pela chuva.

      — Madame, eu falarei isso uma vez e só uma vez.

      A voz dele era baixa com o controle que ele mostrava. As humilhações que ele tinha suportado desde que a amante dele fugiu primavera passada, empalidecia em comparação a este momento amargo.

      Ele esperou por ela dizer algo, talvez um encorajamento para que ele continuasse. Se ela o chamasse de Sua Graça novamente, ele pensou honestamente que poderia golpeá-la. Mas ela permaneceu calada, entretanto ele sentia o olhar treinado dela fixo nas costas dele.

      Ele enrolou uma mão dura contra a armação da janela.

— Meu pai, o sexto duque, era um depravado, bêbedo e um viciado em ópio. Os venenos que ele tinha tomado desde seus dias de escola gradualmente, mas inexoravelmente lhe deixaram louco. Minha mãe o limitou neste vale para evitar o escândalo do comprometimento com um manicômio.

      Ele parou para que ela fizesse alguma expressão convencional de surpresa ou desânimo ou negação.

      Ela não disse nada. Talvez ele já a tivesse chocado em mudez. Pior estava por vir, ele disse severamente e silenciosamente para ela.

      Ele desejou não precisar dizer mais nada. Ele se estimulou a continuar.

— A comitiva que acompanhava meu pai incluía Hamish e uma amante de doze anos chamada Lucy. E eu mesmo criança. Ele tinha alguma idéia que pegar o herdeiro ofenderia minha mãe. — Ele usou a mesma voz plana. — Ele nunca entendeu a esposa dele. Ele a odiou, mas ele certamente nunca a entendeu.

      Mesmo que a aparência de distância o fizesse parecer impassível, na realidade, ele falava depressa. Porque, claro, a dor e o medo ainda se alimentavam dele. Eles eram tão íntimos como a própria pele dele.

      Ainda mais íntimos.

      Ele já não via a pesada chuva que caia lá fora.

      Ao invés, a cabeça dele se enchia das noites longas e escuras de humilhação e prisão nesta casa. Noites longas, escuras que a memória insidiosa misturou em uma noite infinita. Ele tomou uma pronta e tremente respiração, se dando forças para revelar o resto.

      — Quando a obsessão tomava conta dele - e isto se fazia mais constante - ele se tornava violento. Todo os que estavam ao seu alcance estavam em risco, mas ele pegou uma aversão e um rancor particular por mim. Talvez porque eu me pareço tanto com minha mãe. No mais intenso dele, ele tentou me matar. Várias vezes, ele tentou se matar.

      Ele parou, as recordações subindo tão venenosas quanto qualquer víbora. A voz dele estava amarga quando ele continuou.

— Ele morreu nos braços de Lucy quando eu tinha sete anos. A pobre pequena cadela não soube que as doenças sujas dele a terminariam um ano depois. Depois da morte de meu pai, minha mãe me enviou a Eton enquanto ela despejava a maioria dos inquilinos para sofrer de fome ou emigrar.

      Ele pausou novamente. Seguramente, Verity diria algo agora. Protestar, expressar condolência. Até mesmo ridicularizar. Mas o silêncio tenso se estendeu.

      E estendeu.

      Talvez ela se regozijasse por vê-lo trazido tão para baixo. A mãe dele teria apreciado o momento. Ela tinha feito isto o trabalho da vida dela, esmagar o orgulho dele e o transformar em uma das criaturas dela.

      Ela nunca tinha tido sucesso. Mas Verity poderia destruí-lo com uma palavra.

      Cristo, ele estava muito cansado de fingir ser o grande Duque de Kylemore. Ele achou uma triste liberdade em possuir a verdade por trás da magnificência fingida dele.

      O silêncio continuou.

      Cristo, o que estava errado com ela? Por que infernos ela não falava? Seguramente a confissão patética dele merecia alguma resposta.

      Uma rajada de vento respingou chuva fria contra a vidraça.

      Qual foi o uso de se esconder? Ele tinha que estar em frente a ela. Ele não era mais a criança amedrontada que ele fora outrora neste vale. Mesmo assim, fazendo-o testar novamente os limites da coragem dele.

Enquanto se movia, ele mal se atreveu a olhar para ela. O que acharia na face dela?

Desprezo? Piedade? Triunfo?

      Ou pior, indiferença?

      Lentamente, os olhos dele viajaram para cima da bainha verde rastejante do vestido dela. Ela não tinha mudado de vestido e a escova de cabelo pesada balançava em seu colo. Relutantemente, ele encontrou o olhar dela.

      E finalmente, finalmente, compreendeu o silêncio dela.

      Descrentemente, ele procurou a face bonita dela. Os olhos dela estavam totalmente tristes e lágrimas brilhavam nas bochechas dela.

      — Oh, meu querido —, ela disse entrecortadamente. Ela sorriu de modo trêmulo e ofereceu uma mão trêmula na direção dele.

      Seu solitário e desconfiado coração se abriu ao gesto. Ele cruzou o quarto em um par de passos e cambaleou nos joelhos dele ao lado dela.

      — Verity...— ele sussurrou e enterrou a cabeça dele no colo dela, os braços dele se amarrando ao redor da cintura dela. A escova deslizou ao chão quando ela se agachou e o cercou com seu calor.

      — Acabou. Acabou. Eu sinto muito pelo o que você passou. Eu sinto muito, muito.— A voz dela estava áspera de chorar. — Mas você deve ter sido um pequeno menino valente.

      Ela continuou murmurando em cima dele, acariciando o cabelo dele com uma ternura que o fez querer lamentar.

      Mas ele não lamentou. Ao invés, ele se agarrou a ela como a única coisa boa na vida dele. Ele deixou de escutar as palavras dela e há pouco deixou passar o fluxo de compaixão infinito dela por ele e derreter a vacuidade congelada no centro dele.

      Fechando os olhos, ele se rendeu à escuridão de boas-vindas. Uma escuridão cheia de doce Verity.

      E naquela escuridão, finalmente ouviu a verdade que tinha se escondido em seu coração desde o princípio.

      Ele tinha fugido do que ele sentia por tanto tempo, que mesmo agora ele resistia o momento inevitável.

      Mas era muito tarde. A verdade se agarrou na luz. Ele não poderia fazer mais nada para silenciar seu clamando insistente.

      Ele tivera tal fome pelo corpo dessa mulher porque a fome pela alma dela era ainda maior.

      Ela o completava de modos que ele só começava a entender, embora o coração dele sempre a reconhecera como sua outra metade.

      Ele tinha cometido crimes contra ela, a usou, a quis, a odiou, a maltratou.

      O tempo todo, ela tinha sido a única esperança dele de redenção.

      Ele se ajoelhou ao lado dela, apertando-se a ela como um homem perdido numa tempestade no mar. Ela tinha enfrentado sofrimento, perda e violência. Ela confrontou a todos com coragem e uma vontade infinita de se sacrificar por aqueles que ela amava. Ela não tinha recorrido, como ele teve, para as defesas fáceis do cinismo e indiferença.

      Ele a amava com toda fibra do seu ser.

      Ele a amava.

      Os pesos opressivos da solidão e da angústia dele se foram. Não era nem mesmo importante que ela não o amasse. Ao contrário, ele apenas sentiu o jovial alívio de confiança por ela e sabendo que ela não o trairia.

      Ela tinha visto o pior dele. Ainda assim ela o aceitava.

      Um dia, ele lhe contaria os anos longos e difíceis em Eton onde ele tinha chegado como um selvagem pouco alfabetizado depois de herdar o título. Ele tinha sido escarnecido, espancado e tiranizado pelos outros meninos muito rápido para sentir o isolamento essencial nele.

      Graças a Deus ele tinha herdado um cérebro bom extorquidor da mãe. No momento em que foi para Oxford, o brilho acadêmico dele e o não envolvimento calmo tinham sido a inveja dos colegas. Eles nunca tinham adivinhado os anos de treinamento solitário que tinha criado Kylemore Frio para longe do bárbaro amedrontado arrastando, chutando e gritando na única casa que ele tinha conhecido.

      Ele lhe falaria sobre a ruína que a criatura superficial e obcecada que carregava tinha perpetrado no nome dele nos inquilinos enquanto ele tinha estado de pé perto, impotente para impedir a devastação que ela tinha desafogado.

      Ele tinha ameaçado crescer e se tornar uma criatura igualmente superficial e obcecada.

      O que teria restado dele, se ele não tivesse se rendido à curiosidade sobre a mulher que agitara as línguas no ano em que ele receberia sua herança? Se ele não tivesse conhecido um par de olhos prateados cautelosos através de um salão abarrotado de Londres?

      A necessidade dele por Soraya - Verity - sempre fora uma fraqueza dele. Ele tinha gastado anos lutando para se ver livre dela.

      Graças a Deus que ele não conseguira.

      Sim, um dia, ele lhe contaria tudo isto.

      Ou talvez ele já não precisasse. Ele já tinha a compreensão e o perdão dela. Ele sentia isto no toque dela, na voz macia quando ela sussurrava um conforto tenro sobre ele.

      E ele tinha o privilégio de amar.

 

      Verity notou a mudança imediatamente no duque. O amante cruel dela não se transformou exatamente em um homem ordinário, mas a maneira dele assumiu uma facilidade nova e leveza.

      Pesadelos já não interrompiam o sono dele.

      Se ao menos os horrores da infância dele a assombrassem, esse era o preço de amor. Ela deveria ter adivinhado imediatamente as ações monstruosas que tinham acontecido neste lugar, mas ela estivera muito envolvida em seu próprio sofrimento para notar aqueles sinais.

      As barras nas janelas, obviamente instaladas anos antes da chegada dela. A notável inconstância do duque e a relutância para passar tempo dentro da casa. O ar da casa de longa negligência e miséria muda.

      Os sonhos dele.

      Oh, sim, os sonhos dele a deveriam ter alertado. Até mesmo em Londres, ela deveria ter suspeitado que qualquer um que mantivesse tal controle desumano tinha que esconder feridas supuradas internas.

      Ela não se enganava acreditando que as feridas estavam prestes a serem curadas. Mas ela rezou que esse novo cavalheiro e mais aberto homem tivesse a chance de se tornar inteiro finalmente.

      O novo Kylemore estava inclinado a jogar de preguiçoso. Ela não notou. Recompensada o bastante por assistir o esgotamento e a tensão enfraquecerem da face angulosa dele. Todas as noites, ele dormiu com confiança plena nos braços dela, enquanto ela lamentava sobre as agonias que ele tinha agüentado tão corajosamente e em tal isolamento. Lamentado em silêncio de coração partido. Se ele a pegasse chorando, esses olhos sobrenaturalmente perceptivos adivinhariam seu amor secreto.

     

      Uma semana depois das revelações devastadoras sobre a infância do duque, Verity desceu as escadas em uma manhã e o achou no corredor. Ele equilibrava uma cabeça de veado debaixo de cada poderoso braço.

      — O que está fazendo? — ela perguntou em surpresa.

      — Fazendo uma pira de nossas aias duras. — Ele derrubou os fardos sem cerimônia e veio para tomá-la nos abraço. — A menos que você queira nos manter —, ele murmurou no cabelo dela.

      — Que os céus não permitam. — Ele estava sem casaco e os longos músculos das costas se flexionaram sob as carícias das mãos dela.

      Andy entrou na casa e agarrou uma pele de animal e um texugo particularmente lúgubre de uma pilha que ela notou agora perto da porta. Ele apenas olhou ao par entrelaçado. Ela supôs que ele, como todo mundo no vale, estava acostumado à visão dela nos braços de Kylemore.

      Ainda assim, ela se ruborizou. Era absurdo. Ela tinha sido uma cortesã durante treze anos, contudo durante estes últimos dias, apesar das devassidões mais selvagens da vida dela, parte dos sentimentos dela eram puro e renascidos. Quase virgem.

      Uma virgem com seu primeiro amor.

      Bem, ela pensou com outro sorriso escondido, ela estava angustiadamente longe de uma virgem, mas ele era definitivamente o primeiro amor dela.

      — Eu posso ajudar? — Desde a confissão de Kylemore, ela desejou retirar as recordações miseráveis da casa. Talvez, então, ele acharia paz.

      Relutante, ela se afastou dele para ver Andy arremessar a carga dele em um carrinho de mão na porta.

— Kylemore? — ela incitou suavemente.

      Ele tinha lhe pedido que usasse o nome de batismo dele, mas ela não se sentia confortável com a intimidade. Era absurdo, quando ele tratava o corpo dela como seu local privado de prazer.

      — Você não tem que trabalhar como minha empregada, mo leannan.

      — Eu estou segura de que se um duque do reino pode sujar as mãos, uma camponesa como eu também pode —, ela disse secamente.

      Sem esperar pelo acordo dele, ela entrou na sala de estar e ofegou ante ao caos. Hamish e Angus estavam de pé em tamboretes em frente à parede adjacente, arrancando a exibição de cabeças animais abaixo com alavancas e força bruta. Eles a cumprimentaram, e então retornaram à tarefa deles.

      — Seu avô claramente quisera que seus troféus ficassem pendurados até o final dos dias —, ela disse e prontamente espirrou quando a maior das cabeças bateu no chão em uma nuvem de pó.

      — Aqui. — Kylemore lhe passou um lenço que valia mais do que ela teria ganhado por um ano como criada.

— Eu não estava brincando sobre a sujeira.

      — Aparentemente não —, ela disse depois de assoar o nariz. — Eu cuidarei das coisas menores.

      Ela se virou aos casos de espécime de mogno e vidro volumosos que exibiam exemplos da vida selvagem do vale. Ela tinha odiado estes animais pobres, duros, mortos do primeiro momento que os tinha visto. Ela os alcançou com grande satisfação e arrastou para fora uma doninha.

      Limpar o quarto tomou a maior parte do dia. Outrora, ela nunca teria acreditado que o magnífico duque de Kylemore se rebaixaria a tal trabalho servil. Muito menos, que ele sujeitaria sua costura perfeita a tal despojamento. Mas agora, ela não se surpreendia em vê-lo trabalhar diligentemente e sem reclamar ao lado de seus criados.

      Como ela tinha o entendido mal em Londres. E ela sempre tinha se considerado uma mulher inteligente!

      Quando Hamish, Angus e Andy levaram a cabo cabeças de veado atrás de cabeças de veado, algo novo vazou na atmosfera. Algo que parecia com a felicidade.

      Mas para ela, era uma felicidade tingida com pesar. Era uma felicidade que não podia suportar.

     

      Verity endireitou a estante cuidadosamente. Ela pôs uma mão nas costas dolorida. Pensar, que ela uma vez trabalhara diariamente assim como empregada no solar de Sir Charles Norton. Ela devia estar envelhecendo.

      Ela virou a cabeça e pegou Kylemore estudando-a do canto. Os olhos azuis escuros dele tinham um brilho familiar que faziam que o sangue fluísse fraco e pesado na barriga dela.

      Talvez ela não estivesse tão velha afinal de contas.

      Eles estavam a sós pela primeira vez naquela tarde. Depois de uma discussão murmurada com o duque, os outros tinham desaparecido para despachar as últimas decorações horríveis à fogueira.

Ele pisou nos últimos detritos, um quarteto de cenas de caça notavelmente sanguinárias, e cruzou a sala para ficar ao lado dela. Ele, com uma mão elegante, inclinou o queixo dela para a luz clara provindas janelas grandes à esquerda dela.

      — Você tem sujeira em sua bochecha, mo cridhe. — Um sorriso suave chamejou pela face dele. — Soraya teria se envergonhado de você.

      Outrora, a referência a Soraya a teria machucado. Algum dia, ele teria utilizado disso para machucá-la. Eles estavam longe desses dias, mas mesmo assim, ela teve uma pontada de insegurança.

      Ela olhou para ele examinando sua face.

— Você sente falta dela?

      Ele elevou a outra mão dele e alisou os cachos que escapavam pelas tranças torcidas ao redor da cabeça dela.

— Por que eu teria? Ela está aqui. Ela é Verity. — Uma satisfação muito masculina intensificou o sorriso dele. — E ela é minha.

      Verity não se importou em discutir. Eles dois sabiam que era verdade. Assim como eles também sabiam que enquanto durasse esse idílio, ele era dela.

      Quando a rendição era tão igual, que vergonha estaria na derrota? Ela lhe lançou um olhar quente sob os cílios. Ela tinha aprendido depressa que aquele olhar em particular o deixava louco com desejo.

      De maneira previsível, os dedos no queixo dela apertaram e a voz dele engrossou com urgência.

— Eu a quero agora.

      Não era a sedução mais sutil, mas o calor do corpo dele e o brilho de intenção em seus olhos eram o bastante para ela. Às vezes, ele galanteava com doces palavras e elogios extravagantes. Às vezes, ele a arrebatava com uma paixão forte que fazia com que o coração dela disparar.

      Agora mesmo, ela leu a chama de safira nos olhos dele e viu que ele estava muito impaciente para perder tempo com preliminares. Ela não se importava.

— Vamos para cima.

      Ele balançou a cabeça e o sorriso dele assumiu uma ponta diabólica.

— Não, eu quero dizer agora.

      Ela sentiu seus olhos se alargarem.

— Mas qualquer um poderia entrar.

      — Eles não vão. Eu os dispensei durante o dia.— Ele a deixou e caminhou a passos largos para fechar a porta. — Tire suas roupas de baixo e se deite no tapete.— A voz dele era inflexível.

      Verity sentiu um calafrio de antecipação ante a descarada exigência, mas não obedeceu imediatamente.

— Apenas minhas roupas íntimas, Sua Graça?

      — Por agora. — Ele se virou para estar de frente a ela e bateu a chave do quarto na palma, toda impaciência aristocrática. Só a protuberância dura que apertava contra as calças dele desmentia a aura de controle.

      Ela baixou a cabeça para esconder a excitação que se juntava nela.

— Como desejar.

      Ela ouviu a respiração dele se dificultar quando ela levantou as saias para alcançar as fitas. Alguns puxões rápidos e as roupas íntimas dela caíam ao chão. Ela saiu delas e as dobrou com provocação deliberada em cima da cadeira de carvalho volumosa que tinha notado no primeiro dia ali.

      A seda creme, com seu bordado elaborado de violetas e lírios pareceu incongruente contra a madeira pesadamente esculpida. Como uma bandeira de desafio. O que, é claro, era.

      Os olhos dele estavam ávidos enquanto assistia cada movimento que ela fazia de onde ele estava, perto da porta. Ela se sentia como um coelho vigiado por uma raposa. Mas neste caso, o coelho estaria mais que feliz em ser devorado.O pulso dela se acelerou quando viu o olhar dele nas roupas íntimas dela, descaradamente exibidas para deleite dele.

      — O tapete —, ele disse roucamente.

      Ela escondeu um sorriso de regozijo. A maneira autocrática dele já se tinha quebrado. Não necessitara muito esforço da parte dela.

      Sem uma palavra, ela cruzou o quarto e reclinou no tapete persa em frente ao fogo apagado. Ela dobrou um joelho na direção dele e separou as pernas ligeiramente. Ele não poderia resistir ao convite audaz.

      Oh, que má, muito má ela era para escarnecer dele. Ele realmente deveria castigá-la.

      Ela fechou os olhos e esperou à beira de uma emocionante expectativa por ele vir a ela.

      Ela não teve que esperar muito. A chave retiniu sobre a mesa e, de repente, ele estava de joelhos entre as pernas dela. Ele tinha se movido tão rápido que ela nem mesmo o ouviu cruzar o quarto.

      — Você acha que eu estou em suas mãos, não é? — ele rosnou. Ele não a estava tocando. Mas logo iria, ela sabia.

      Verity fingiu um bocejo, sabendo que isso o empurraria para o limite de seu controle. Como ela adorava arreliá-lo assim. — Sim.

      Ele deu uma risada pesarosa. — E você tem razão, condenada.

      Sobre a respiração desigual dele, ela ouviu o sussurro lânguido da roupa dele enquanto ele abria a frente das calças dele. Ela não se equivocara sobre a ânsia dele. O coração dela saiu de um trote inquieto a um galope alucinado que seguramente ele podia ouvir. Ela elevou a outra perna apenas uma fração, assim ele saberia que ela ainda não tinha terminado de atormentá-lo.

      Ele brutalmente juntou as saias e anáguas à cintura dela. A excitação dela subiu enquanto o ar fluía esfriando a pele nua dela. Ela deveria estar parecendo totalmente depravada, deitada em tal abandono ante ele. Mas ela não se sentia depravada, ela se sentia livre. 

Ela deixou as pernas caírem um pouco mais abertas. Até mesmo sem abrir os olhos, ela sentia a inspeção aquecida que ele fazia nela. O quarto estava quieto, tirando o ruído acelerado da respiração dele.

      Ele colocou as mãos nos joelhos dela e cruelmente os separou. O calor das palmas dele pela seda fine da meia-calça dela a fez tremer de excitação.

      Com os olhos fechados, todos seus outros sentidos ficaram mais aguçados. Ela podia cheirar a estimulação dele e podia ouvir o agitar instável das inalações dele quando ele lutava para se conter. Ela se mexeu sinuosamente contra o tapete grosso e esperou que ele investisse nela. Ele devia saber que ela estava pronta para a posse dele.

      Mas ele não a tomou imediatamente como ela tinha esperado que o fizesse. Ao invés, a cabeça dele se empurrou entre as pernas dela e o cabelo sedoso dele esbarrou na pele sensível das coxas dela. Ela se surpreendeu com o calor da respiração dele quando tocou no centro de sua umidade. Então a boca dele a tomou e ela gemeu baixinho em êxtase. Ele chupou e lambeu-a até que ela estivesse tremente embaixo dele.

      Ele era um diabo. Ele era um diabo lavador.

      A espinha dela arqueada em uma curva rígida enquanto a tensão dentro dela subia a um nível insuportável. Ele deu um aperto firme nos quadris dela e a puxou para que pudesse prová-la mais completamente. Quando a língua dele a penetrou, ela estremeceu em resposta. Mas ela queria mais.

      — Por favor —, ela implorou com voz desigual, os dedos dela se apertando e soltando nos cabelos grossos dele. Ela se apertou contra a boca dele, suspensa na beira. Mas ainda assim ele jogou com ela, forçando-a a ir mais e mais alto.

      Então ele chupou duro na fonte do prazer dela e ela gritou como se cem sóis explodissem atrás dos olhos dela. Fogo cascateou ao longo das veias dela e todos seus músculos se contraíram violentamente com o prazer.

      O cume ardente parecia durar para sempre. Ela ficou suspensa no esplendor que só ele poderia criar nela. Ele a fez dançar entre as estrelas. Como ela o adorou.

      Quando a alegria ígnea tinha baixado em ondulados abalos secundários, ela abriu os olhos para encontrá-lo observando-s entre as esparramadas pernas dela. Ela se deitou exposta e deslizou uma mão para ajustar as saias dela em modéstia como na sua mocidade. Até mesmo aquela ação simples testou a força dela. Ela sentia como se os ossos tivessem se transformado em musselina molhada.

      — Nós ainda não acabamos —, ele murmurou, impedindo-a de se cobrir.

      — Eu não acho que eu possa mover um músculo —, ela protestou.

      Não era verdade. Já, o interesse dela se mexeu. Só por ele olhá-la como se ela fosse um milagre enviado para ele dos céus. Às vezes o domínio que ele exercia sobre ela a amedrontava.

      — Eu acho que você pôde. — Os lábios dele se desenrolaram em um sorriso de promessa.

      Ele enganchou os braços ao redor dela e a puxou na vertical assim ela se ajoelhou de frente a ele quando ele se sentou em seus pés. Ela descansou uma mão no tórax dele. Os dedos dela apertaram a camisa dele enquanto ela sentia a batida furiosa do coração dele em baixo do linho branco e elegante. Então ele a ergueu em cima dele até que as saias verdes escuras dela se envolveram ao redor deles, dando um decoro espúrio à libertinagem deles.

      Mas, embaixo disso, estava escondido o essencial, ela o escarranchou, aberta e pronta para a entrada dele. A ereção dele apertou imperiosamente contra os cachos úmidos à base da barriga dela, fazendo seu útero apertar com uma pontada de desejo.

      Ela queria todo aquele calor e poder. Ela o queria dentro dela.

      Ela agarrou os ombros musculosos dele com as mãos, se levantou e desceu. O abraço dele nas costas dela se apertou convulsivamente e ela viu os olhos dele ficarem opacos, enquanto ela se deslizou lentamente nele. Até mesmo molhada como estava, havia uma resistência deliciosa, um momento antes que ela o tomasse inteiro. A respiração dele se libertou em um suspiro áspero quando ela se acomodou ao redor dele. Ela deu um miado de prazer quando se estirou para acomodar o tamanho dele.

      Os olhares deles se encontraram, entrosaram-se, fixaram-se. Ela leu nos olhos dele que por agora, ele estava disposto a deixar fixar o passo. Um conhecimento do poder dela a emocionou quando ela estabeleceu um ritmo ondeante nele, quase retirando, e então descendo para aceitá-lo completamente. Cada empurrão ia mais profundamente.

      Em momentos como este, o laço entre eles parecia irrompível, embora ela soube que isso nunca seria verdade. Ela o amava, completamente, lentamente atentamente, dando-lhe tudo dela com cada elevação e queda de seu corpo. 

Ele a segurou em cima para um beijo longo e apaixonado. Ele usou a língua e dentes na boca sedutora dela, tal qual ele tinha usado a língua e dentes na intimidade dela. Ela provou os sucos dela no beijo dele.

      A idéia era incrivelmente excitante. Os músculos interiores dela se contraíram para agarrá-lo e ela se moveu mais depressa.

      O cume dela estava muito próximo. Tão próximo. Ela apertou as mãos na frente da camisa dele quando ela estalou para o abismo.

      Ele terminou o beijo escandaloso e sedutor e arremessou a cabeça dele para trás enquanto a puxava. Todo o vestígio de controle se desintegrou no frenesi. Ela o mordeu e arranhou como um animal e se divertiu na selvageria dela.

      O clímax dela bateu com força ofuscante da mesma maneira que ele arrancou para cima e jorrou nela. Até mesmo pela crise dela, ela sentiu o calor fervente da semente dele inundá-la. Durante a eternidade de uma chama, ela se agarrou a ele enquanto seu mundo oscilava ao redor dela.

      Quando acabou, eles desfaleceram no tapete. Verity se espreguiçou no poderoso tórax de Kylemore e escutou gradualmente como o coração dele se acalmava. O corpo dela doía com um glorioso esgotamento. Ela não tinha certeza se teria energia para se mover novamente.

      Seguramente um dia ela morreria deste prazer. Mas não agora.

      Depois de um longo silêncio, cheio de emoção, ele elevou uma mão tremente para tocar o cabelo dela. Ela sentia a ternura da carícia dele em todo seu corpo.

      — Agora não há mais nenhum fantasma —, ele disse suavemente.

      Seguindo com a destruição dos troféus horríveis do avô dele, Verity pensou que Kylemore finalmente tinha se livrado das misérias do passado dele. E com cada dia que passava em uma neblina de alegria, ela começou a criar uma frágil esperança de que ele tinha derrotado seus demônios.

      Infelizmente, os demônios dela clamavam mais e mais próximos.

      E eles queriam sangue.

      Neste vale secreto, o mundo não se intrometia. Dificilmente importava se Kylemore era um dos maiores nobres do reino ou que ela fosse uma meretriz vinculado a cada taverna de John O'Groats ao Fim da Terra.

      Mas ela não podia esquecer que o duque tinha responsabilidades ignoradas. Ele tinha que casar e gerar um herdeiro. E era brutalmente aparente que ele não podia se casar com a amante dele, apesar da proposta insana dele em Kensington. Ela percebia agora que aquilo fora um ataque contra a família dele. Graças a Deus que aquele homem confuso e bravo já não existia.

Cada momento com Kylemore, toda vez eles que eles faziam amor tão docemente, toda vez que eles riam ou discutiam ou falavam baixinho ante o fogo depois de um longo dia, ela sabia que contanto que ela ficasse, ele nunca buscaria uma esposa.

      Ele não tinha dito que a amava, da mesma maneira que ela não tinha dito que o amava. Mas cada olhar, cada gesto, cada palavra dizia que o envolvimento dele com ela era do tipo que fazia a terra tremer.

      E uma mulher arruinada como ela não merecia.

      Amá-la o destruiria. Ela não agüentaria vê-lo humilhado, arruinado e zombado, porque ele era valente e bom o suficiente para vê-la além da notoriedade dela e ver a mulher de verdade. Ela tinha que fazê-lo livrar-se dela.

      Mas a cada dia que amanhecia e ela acordava em seus braços, sonolenta, feliz, completa, ela se prometia deixá-lo no dia seguinte.

      Mas quando o tempo chegou, golpeou-a com a força de um ataque físico.

     

      A esta latitude, o outono começava depressa e o ar noturno carregava um frio até mesmo enquanto as ladeiras ainda estavam púrpura com urze. Kylemore entrou na sala de estar carregando o cheiro fresco do fim de tarde com ele.

      Verity teve dificuldade em se lembrar do protetor elegante dela. Depois de um mês na Escócia, o cabelo dele crescera e ele parecia relaxado e bronzeado. Nas roupas ásperas dele, as pessoas poderiam facilmente o confundir com um fazendeiro próspero. Até que a pessoa notasse a autoridade natural da posição dele.

      — O quê? — ele perguntou quando a pegou olhando para ele da janela.

      — Eu estava pensando que amante bonito que eu tenho —, ela disse com honestidade perfeita.

      Nunca falhava de surpreendê-la o quão desacostumado ele era a elogios. Ele lhe deu um sorriso meio envergonhado.

      — Oh, mas você é uma pequenina moça tola.

      Ela riu ante o falso sotaque.

— Bem, se você duvida de mim, pergunte a Morag ou a Kirsty. Eu juro que essas meninas ficam vermelhas como frutas rowan ao som de sua voz.

      Era verdade. O temperamento aprimorado do duque tinha impregnado pela casa inteira até mesmo as empregadas, outrora totalmente apavoradas ante ele, as tinha levado a seguí-lo como cordeiros perdidos.

      Não que ele notasse. Outrora ela o imaginara presunçoso, mas vaidade pessoal tinha sido apenas um outro elemento no disfarce complexo que ele tinha cultivado em Londres.

      — Elas são tão tolas quanto você, mo cridhe.

      Hamish tinha contado que mo cridhe significava — meu coração — e que mo leannan significava — minha amada.— Ela sabia que não deveria tremer toda deliciada cada vez que Kylemore usava essas estimas, mas ela não podia evitar.

      Ele tinha razão. Ela definitivamente era uma moça tola.

      Kylemore cruzou a sala para pegar a mão dela e conduziu-a para o sofá em frente à grelha. Um fogo era agora uma característica constante nessa época do ano.

      — Eu quero falar com você.

      Ele não soou como se tivesse qualquer coisa séria na mente dele. Ele espreguiçou-se contra as almofadas como um jovem sultão que contempla sua concubina favorita.

      — Pela última vez, eu não quero aprender a montar.— Ela se sentou próximo a ele.

      — Não, é outra coisa.— Ele elevou a mão que segurava e colocou um beijo na palma dela. — Eu senti falta de você —, ele murmurou.

      Ela deu uma risada rouca e se inclinou para dar-lhe um breve beijo. Como ela amava esta facilidade física. Borbulhava debaixo da superfície da vida nova dela como uma fonte corrente de alegria.

      — Você só esteve fora durante à tarde.

      — Eu sei, mas eu ainda senti sua falta. — Suavemente, ele dobrou os dedos dela fechando-os como que para manter o beijo dele seguro.

      — Agora quem é tolo? — Ela acariciou o cabelo escuro sedoso e colocou-o para trás da face dele. — Corto o seu cabelo hoje à noite? Você está se transformando em um Montanhês felpudo. Eu me acho bastante aterrorizada com isso.

      — Meu criado no Castelo de Kylemore cuidará de tal tarefa.

      — Sim, mas... — Então, como se ela cambaleasse debaixo de um ponche, ela entendeu a significação do que ele há pouco tinha dito. — Castelo de Kylemore —, ela repetiu, embora ela o tivesse ouvido perfeitamente bem.

      — O outono está chegando, Verity. Nós não podemos ficar durante o inverno. O lugar é inabitável e totalmente inacessível. Sem mencionar que faz mais frio que uma caverna de gelo no Inferno.

      Ele falou como se o que dissera fosse razoável, enquanto em realidade, ressoava o som fúnebre da morte de toda sua felicidade.

      — Eu... Eu sei —, ela disse de modo trêmulo.

      E claro que ela sabia.

      O idílio deles tinha durado um pouco mais de três semanas. Vinte e dois curtos dias. Uma recompensa vil pelos anos solitários de luta dela.

      Não era justo, ela quis se enfurecer embora ela tivesse se deparado com os termos de injustiça da vida aos quinze.

      Apenas mais uma semana. Mais um dia.

      Eu não estou pronta para o renunciar.

      E o tempo todo, ela soube que nenhuma prorrogação seria o bastante se não fosse para sempre. E para sempre não poderia ser.

      — Assim você pode estar pronta para partir amanhã? — Com aquela mesma voz calma como se ele não a esmagasse com cada palavra medida. — Angus e Andy partiram para velejar e trazer o barco da costa. Eles e Hamish viajam conosco. Os outros prepararão a casa para nossa ausência e seguirão quando o barco voltar para pegá-los.

      — Tão logo? — ela sussurrou. Quando ela tinha detestado cada folha de grama deste vale. Agora quebrava o coração dela partir.

      Oh, Verity, uma voz dentro dela sussurrou. Não está deixando o vale quebrar seu coração e você sabe disto.

      — Tão ao norte como estamos, o tempo pode virar em um instante. Eu quero ter certeza de que estou te tirando daqui em segurança.

      — Sim —, ela disse estupidamente. — Claro que eu estarei pronta.

      Ao lado dela, escondido dos olhos dele, sua mão livre se apertou em um punho enquanto ela lutava por controle.

      Ele carranqueou e ela o viu finalmente registrando a angústia dela. Ele era normalmente tão rápido para apanhar a reação mais leve dela, mas assuntos práticos o distraíram esta tarde.

      — O que está errado? — Ele apertou outro beijo aos dedos tensos dela. — Não se preocupe, mo gradh. Você gostará do castelo. Tem vista para o mar e tem acres de jardins para você devastar.

      Ela não pôde convocar um sorriso. Não quando o mundo dela se despedaçava ao seu redor.

— Sim —, ela disse inexpressivamente.

      Ele parou, estudando-a com uma expressão confusa. Ela não duvidava de que tinha toda a atenção dele agora.

      — E o castelo é mais próximo à atenção médica, se você precisar —, ele disse lentamente.

      Aquilo a despertou de sua miséria ofuscada.

— Eu não estou doente. Eu nunca fico doente.

      Ele sorriu como se ele fosse o homem mais feliz no mundo.

— Não, mas você já pode estar levando a minha criança.

      Arrancando a mão da dele, ela lutou com seus pés. Ela girou para estar de frente a ele com as costas para a lareira. Ela tremeu com calafrios, como se não notasse o calor das chamas.

      — Não. Não, isso não é possível.

      Os olhos azuis escuros dele permaneceram fixos.

— Eu diria que é mais que possível.

      Ela respirou profundamente para acalmar a agitação dela.

— Você não entende. Eu sou estéril.

      Era tola por estar envergonhada em admitir algo que ela tinha aceitado tão rápido, contudo ela estava envergonhada.

      — Você não pode saber —, ele disse uniformemente.

      Ela apertou as mãos aos lados tão duramente, que as unhas se afundaram nas palmas.

— Sim, eu posso. Até mesmo quando eles usam preventivos, as mulheres são pegas. Eu dormi com homens desde meus quinze anos. Eu tenho vinte e oito anos e eu nunca concebi. — No princípio, a infertilidade dela tinha parecido uma bênção, mas com o passar dos anos, ela viera a detestar o estado antinatural dela. — Eu... Eu ainda tomei precauções, mas mais por hábito que por necessidade.

      — Você está adivinhando —, ele disse firmemente.

      — É bastante certo —, ela devolveu com firmeza.

      Ele levantou-se para ficar de pé em frente a ela. Graças a Deus, ele não a tocou. Ela não podia agüentar isto, se ele a tocasse agora. A determinação dela para deixá-lo era trêmula bastante como era.

      — Verity, Sir Eldreth estava bem passado de seu primeiro vigor. Mallory, do que eu sei, não era ardente nas atenções dele. Você e eu sempre tínhamos cuidado em Londres. Nós estivemos apaixonados e descuidados nesta casa.— Os olhos dele estavam acesos com alegria. — Um presente para a próxima primavera é muito provável.

      Era verdade? A criança de Kylemore já poderia estar crescendo dentro dela?

      Ela não tinha tido o fluxo mensal dela em semanas. Entretanto, o ciclo dela sempre tinha sido irregular.

      Oh, deixe que seja! Ela daria qualquer coisa para sentir o movimento da criança dele dentro dela. Ela esbanjaria no filho dele ou filha todo o amor que supriria a própria infância dele, a qual lhe foi tão cruelmente arrancada.

      Ele continuou como se não tivesse acabado de quebrar uma das certezas que ela tinha fundado em sua própria vida.

— Eu não quero você presa aqui no meio do inverno se algo der errado.

      O coração que tinha surgido com esperança se afundou de volta à miséria.

      Se por algum milagre ela tivesse o bebê dele, ela teria que criar a criança sem ele, porque a possibilidade de gravidez não mudava o dilema essencial deles. Acrescentava apenas um tempero cruel à angústia dela.

      Ela lutou para esconder a extensão da devastação dela. Outrora ela poderia ter tido sucesso. Agora, ela duvidava que o enganasse.

      Mas ela tinha que tentar. Por ele, ela tinha que tentar.

      Ela tomou outra respiração profunda.

— Eu não seguirei para o Castelo de Kylemore.

      Ele não entendeu imediatamente. Por que deveria ele?

      — Você preferiria ir a outro lugar? Eu tenho outras casas. Ou nós poderíamos viajar. Ou voltar para Londres, se você quiser.

      Céus, isto era difícil. Ela umedeceu os lábios secos.

— Não, eu voltarei para meu irmão em Whitby. Por um momento, pelo menos.

      — Whitby? — ele ecoou e ela testemunhou o momento exato em que ele compreendeu. A face dele endureceu em choque. — Você quer me deixar. — As palavras emergiram tão totalmente que ela quase cedeu.

      Vendo como penosamente esta rejeição súbita o feria, ela quis morrer. Então ela se lembrou que fazia isto por ele. Em algum lugar nos anos penosos que a esperavam, ela poderia achar auxílio naquele pensamento.

      — Sim.— Peça a Deus que ele não tenha ouvido o oceano de desespero embaixo da mentira dela.

      Ela se firmou para manter a calma. Uma vez, ela tinha o enfurecido a ponto de cometer um crime capital. Isto, ela sabia, essa era uma traição pior que a de abandoná-lo em Londres. Ela não tinha feito nenhuma promessa nestas semanas, mas cada momento tinha sido a prova da fé dela.

      Mesmo que os céus a ajudasse, cada momento tinha sido a prova da dele.

      Ele permaneceu tranqüilo, embora sua face tivesse empalidecido a uma desolação desumana.

— Você pretende me falar o porquê?

      Como ela o feria. Ela sabia e odiou. Mas ela tinha que fazer isto. Um duque e uma prostituta não poderiam ter nenhum futuro. Ou nenhum futuro onde eles pudessem viver em honra. Cada dia que eles gastaram juntos, só tinha feito a inevitável separação mais doloroso e o atrasá-lo para o que ele deveria fazer. Ou assim a mente dela lhe falou.

      O coração dela insistiu que nenhuma dor pudesse ser pior do que aquela que ela sofria agora.

      Ela tomou a coragem dela em um nó apertado. Agora ela tinha que se tornar toda em Soraya. Orgulhosa, determinada, fria. O coração de Verity ansiava não incliná-la a fazer o que ela devia fazer.

— Em Londres, nós tínhamos um acordo. Se qualquer associado quisesse terminar a ligação, estaria acabado. Bem, eu quero terminar isto, Sua Graça.

      Ele estremeceu ante o uso do título dele como se ela o golpeasse.

— Isso é o melhor você pode fazer? Adeus e boa sorte e tomamos caminhos separados? — ele disse cortante. — Maldita, eu acho que você me deve mais do que isso. O que diabos está havendo, Verity? Por que tudo mudou quando eu mencionei deixar o vale?

      Ela deveria ter sabido que ele não aceitaria a decisão dela de abandoná-lo sem questionar ou argumentar. Ela não podia contar a verdade; ele nunca aceitaria as razões dela para ir. Ele acreditava que nada seria melhor que uma prostituta para uma duquesa.

      Mas ela pensava diferente. Ela veio a ele com uma alma arruinada, quando ele precisar de alguém bom e puro e inteiro.

      Alguém que era tudo o que Soraya não era.

      Ela virou a cabeça, pouco disposto a assistir a dor e a confusão dele.

— Eu soube que tinha que partir a muito tempo. — Ela lutou para manter o tom controlado. — Está na hora de você levar sua vida e eu a minha.

      — Você é minha vida! Eu não lhe permitirei ir —, ele disse de modo selvagem, a puxando e abraçando-a. — Não faça isto, mo cridhe!

Ela estava de pé imóvel no aperto de pugilismo dele e contemplou sua face atormentada.

— Em honra, você não pode exigir nada de mim. Você disse que nunca me forçaria novamente. Seu palavra não vale nada? Se você verdadeiramente mudou do homem que me seqüestrou, você não prolongará esta discussão.

      Ela era cruel por usar os pecados dele como influência para ganhar a liberdade dela, da mesma maneira que ela era cruel em fazê-lo lembrar daquela noite mágica quando ela finalmente tinha se entregado com todo seu coração.

      A face dele estava pálida quando a libertou.

— Então novamente, você me abandona sem explicação? Pelo menos desta vez suponho que eu esteja grato por você me dizer para onde está indo.

      — Oh, tente e ache isso em você para me perdoar! — ela chorou, a resolução dela estava falhando quando ela tentou tocar o braço dele.

      Ele se retirou, antes que ela fizesse o contato. Ela lamentou as carícias espontâneas só minutos atrás.

      — Madame, é sua prerrogativa partir e a minha para sentir o rancor que desejo.

      — Assim... assim você não me compelirá a ficar com você? — ela perguntou inseguramente. Ela tinha sido bastante má para esperar que ele o fizesse?

      Ele balançou a cabeça.

— Meus crimes contra você são imperdoáveis. Por causa do que eu fiz, eu pus sua vida em perigo. Eu reconheço que não tenho nenhum direito para a manter. Eu...— O coração dela contraiu em miséria quando a voz plana dele quebrou brevemente, revelando a agonia devastadora em baixo da fachada tranqüila dele. — Eu tinha esperado que você ficasse por sua próprio vontade. Mas claramente isso é impossível depois de tudo que eu fiz.

      A formalidade dele a fez lembrar do amante auto-suficiente em Kensington. O contraste com o homem que ela veio a conhecer a fez querer gritar. Ele tivera uma vida inteira para abafar suas reais emoções. Ela se sentia como o pior tipo de traidor ao forçá-lo de volta para seu isolamento congelado.

      — Eu sinto muito, Kylemore —, ela disse infelizmente, o amando, se odiando.

      Uma raiva rapidamente mascarada escureceu os olhos dele antes que assumissem uma expressão coberta de que ela nunca gostaria de ver novamente.

      — Eu também, madame. — Ele andou em direção a porta. — Nós partiremos amanhã como planejado. Do Castelo de Kylemore, eu a escoltarei a Whitby.

      Um prolongado adeus excederia os limites delicados dela.

— Você não tem que fazer isso.

      — Sim, eu farei —, ele estalou com um ressurgimento de raiva. — Eu a removi de sua casa à força. Eu sou obrigado a vê-la retornar com segurança. — Ele se curvou friamente na direção dela e deixou o quarto antes que ela pudesse formar um argumento.

      A mão de Verity segurou firme na parte de trás da poltrona para impedi-la de correr atrás dele. Ela não achou que poderia amá-lo tanto.

 

      O vale nunca tinha parecido tão belo quanto o fez na manhã seguinte. As árvores há pouco tinham começado a mudar de cor e na ladeira aberta, urze ardia púrpura rica. A brisa soprava fresca e forte enquanto o barco deslizava suavemente pelas águas claras do lago.

      Kylemore deu uma olhada ao esplendor e desejou que tudo fosse ao inferno.

      Alguns metros adiante, Verity estava à grade. Ela estava pálida e silenciosa e ela parecia não ter conseguido dormir muito mais do que ele ontem à noite pela primeira vez, desde que ela fora a ele se oferecer tão docemente...

      Ele arrancou o pensamento com uma parada aguda.

      Só de lembrar os esplendores transcendentes daquela noite o fez querer esmagar algo.

      Ontem à noite, eles tinham dormido separadamente.

      Ou, para ser mais preciso, ele tinha se estirado na pequena cama e tinha fitado o espaço, amaldiçoando-a, amando-a, ansiando por ela. E sabendo que ele não podia fazer absolutamente nada sobre isto.

      Nenhuma persuasão que ele pudesse reunir cancelaria o direito dela à liberdade. Assim ele sofreria só e em silêncio como ele tinha sofrido tantas vezes antes.

      Ele deveria ser condicionado a um tormento isolado. Exceto que dessa vez, ele tinha se elevado do inferno ao paraíso, depois tão abruptamente ele voltara para o inferno.

      Ele suportaria. Ele sempre iria.

      Embora agora mesmo, o significado de tudo lhe escapava.

      Ele se estendeu para acalmar um Tannasg inquieto que nunca tinha gostado de viagem na água. Enquanto ele esfregava o nariz cinza enorme, os olhos dele fitaram Verity. Para uma mulher que tinha feito tudo no poder dela para deixar este vale, ela não parecia feliz.

      Na realidade, ela parecia completamente triste.

      Não fazia sentido. Nada disto fazia sentido.

      Ontem, eles tinham estado juntos. Hoje, bastante claramente, eles não estavam. E ele não tinha nem idéia do porquê.

      As últimas três semanas tinham sido as mais felizes da vida dele. Ele até mesmo começara, imprudentemente, a fazer planos.

      Por causa daquela proposta estúpida em Londres – sem dúvida que ela o tinha despachado, deixando-o com uma pulga atrás da orelha; ele tinha sido um vaidoso cabeça dura – ele tinha sido averso a falar de matrimônio. O plano dele tinha sido integrá-la na vida dele, a acostumar à idéia de ficar com ele e a persuadir em aceitá-lo como marido.

      Era muito tarde para ele mudar o passado, por mais que desejasse. Depois do modo que ele a tratara, ele nunca poderia esperar que ela o amasse como ele a amava. Mas eles compartilharam desejo e amizade. Ele poderia estar satisfeito com isso. Se ele tivesse.

      Uma criança seria uma adição santificada à vida que ele planejava.

      Uma criança que carregasse legitimamente, é claro.

      Ele não tinha nenhum desejo desmedido em perpetuar o sangue envenenado dos Kinmurries, mas uma miniatura de Verity, agora que seria um presente glorioso para o mundo.

      Quão orgulhoso ele estaria em que ela carregava a semente dele dentro dela. Se ela não o fizesse, não era por desejo nem por tentativas da parte dele. O prazer dele ao pensamento dela portar a criança dele evaporou, quando percebeu que ele nunca faria novamente amor com ela.

      O sonho insensato dele de uma vida com ela enfraqueceu como a névoa matutina que tinha encoberto a partida deles. O fato brutal era que ela não o amava.

      Ele poderia sobreviver nos calmantes de desejo e amizade se ele tivesse. Claramente e justamente, ela não estava preparada para se conformar com tal uma vil barganha.

      O punho dele se fechou contra a pele lustrosa de Tannasg e o cavalo relinchou suavemente, como se sentindo a angústia e a raiva dele.

      Por Deus, ele não deixaria isto acontecer. Ele a faria ficar. Quando eles alcançassem Kylemore, ele a prenderia na torre mais alta até que ela tornasse ao bom senso. Até que ela prometesse se casar e ser a duquesa dele e manter os fantasmas distantes para sempre.

      Da mesma maneira que ele a tinha trancado na casa de caça.

      O suspiro dele foi pesado. Ele não a podia prender. Ele já tinha usado força física para a manter com ele. Ele não podia fazer isto novamente.

      Honra nunca tinha sido uma planta particularmente forte no jardim fedorento da alma dele, mas em algum lugar nas últimas semanas, tinha fixado raízes que ele não podia erradicar. Depois do que ele tinha feito a Verity, depois do que ela tinha suportado antes de se tornar sua amante, ele não tinha nenhum direito para negar o que ela queria.

      Mas doeu. Feriu como o inferno.

     

      Antes do meio-dia no segundo dia, eles chegaram à casa ancestral de Kylemore. Severamente, ele assistiu a confusão de torres e torres de conto de fadas na visão ao longo da costa.

      Este era o lugar onde ele tinha planejado estabelecer uma vida com Verity como a duquesa não convencional dele. Mas todas suas esperanças tinham se desintegrado a pó.

      O vento tinha soprado tranqüilo e eles tinham viajado em bom tempo até Inverathie, a aldeia que cresceu em aglomerados ao redor do castelo. Mesmo assim, ele tinha desejado que o barco pudesse ter criado asas e tivesse voado. Qualquer coisa para salvá-lo da presença silenciosa e infeliz de Verity.

      Então ele percebera que a cada milha viajada era uma milha mais próximo da separação. E ele tinha desejado que a viagem nunca terminasse.

      Hamish andou até onde Kylemore se encontrava à grade. Atrás deles, Angus e Andy levavam o navio ao porto com a habilidade de longa prática.

      — Eu continuo tendo que voltar para o vale amanhã, Sua Graça? — Hamish perguntou.

      Até mesmo o velho mentor dele tinha voltado a tratá-lo formalmente. Só tinham lhe permitido sentir humanidade por um momento passageiro.

      — Sim —, ele disse. — Leve Angus com você. Andy vem comigo quando eu escoltar madame de volta para Whitby.

      — Whitby? — Hamish carranqueou em confusão. — A moça não ficará em Inverathie?

      — Ela não lhe falou? — Havia uma mordida na pergunta. — Você tem cacarejado ao redor do dela como uma galinha tempo o bastante nesta viagem para trocarem algumas de confidências.

      Ele soou ciumento, ele sabia. Mas Verity o tinha evitado - um feito difícil nesse pequeno barco - enquanto aceitara prontamente a companhia de Hamish.

      Hamish o olhou com uma desaprovação familiar desde que eles tinham deixado o vale.

— A moça não me contou nada. Até mesmo quando eu a peguei chorando.

      O intestino de Kylemore contorceu de angústia. Ele não podia agüentar muito mais disso. Ainda assim ele precisava. Ele ainda tinha a longa jornada por terra a Whitby à frente. Ele devia isto a ela, devolvê-la seguramente ao irmão.

      — Eu estou seguro de que as lágrimas da senhora são preocupações dela — ele disse por dentes friccionados.

      — Dela e sua, Sua Graça.

      — Você toma liberdades demais —, ele disse friamente.

      As características gastas de Hamish expressaram uma decepção igual à desaprovação dele.

— Sim, bem, eu presumo que você é um jovem bobo que não sabe apreciar o belo tesouro que está para perder. E, sim, Sua Graça, não há necessidade de me colocar em meu lugar. Eu irei antes que eu tome a liberdade de atirá-lo ao mar para um bom mergulho.

      Kylemore não perdeu tempo reprovando o homem mais velho por sua insolência. Claro que ele sabia o valor do que ele perdia. O conhecimento doloroso ameaçou quebrá-lo. Mas com toda sua inteligência, ele não descobriu como atrair Verity de volta.

     

      Enquanto Kylemore escoltava Verity passagem abaixo para o pequeno cais, ele notou uma perturbação entre a multidão ao redor da doca. Ele prestou pouca atenção e se concentrou na mulher que segurava ligeiramente seu braço.

      Esta era a primeira vez que ela o tocara, desde que ela tinha terminado o caso deles. Ele resistiu ao desejo de agarrar esses dedos frágeis e pô-la em algum lugar onde ela nunca escaparia. Tê-la assim tão perto e ao mesmo tempo inalcançável era o castigo mais severo que ele já passara até mesmo no cume da raiva vingativa dele.

      A algazarra lá embaixo cresceu mais insistente. A presença do duque ao assento familiar dele era uma ocorrência rara o bastante para justificar a curiosidade dos habitantes, ele supôs. O olhar dele foi além das mesuras dos aldeões imediatamente adjacentes para o que causava essa comoção.

      — Nós devemos partir imediatamente para Whitby, Sua Graça? — Verity perguntou com uma voz rouca.

      Essas foram às primeiras palavras que ela tinha dirigido a ele no dia. Ela soou como se tivesse estado chorando. Hamish disse que ela tinha estado. O nó de dor na barriga de Kylemore apertou em agonia.

      Imediatamente ele esqueceu o barulho da doca e se focalizou nela. Ela parecia pálida e cansada e triste, mas determinada.

      Ele se perguntou o que tinha dado na cabeça dela. Por um intervalo cruelmente curto, eles estiveram tão próximos que ele deveria ter sabido imediatamente.

      — Você não preferiria descansar aqui hoje?

      Eles estavam agora no cais. Ele a esperou se mexer. Quando ela não o fez, ele não pôde suprimir o alívio dele. Ela tinha se mantido tão longe nos últimos dias que até mesmo esta pequena concessão parecia importante.

      — Eu ainda não acho que seja necessário você me acompanhar —, ela disse em uma voz mais forte.

      — Bem, eu faço.

      Outrora aquela afirmação arrogante teria despertado um argumento. Agora ela meramente baixava a cabeça em aquiescência silenciosa. A mão que ela tinha colocado na manga dele tremia.

      Todo sentimento de briga não estava mais lá. Ele não entendia isto. Ela conseguira o que queria: a chance para deixá-lo. Ela deveria estar alegre de antecipação ante a nova vida. Uma nova vida, maldição, livre da interferência dele.

      Talvez ela estivesse doente afinal de contas. A preocupação o fez carranquear quando ele tentou vê-la sob a aba do gorro elegante dela. Quando ele se baixou sobre ela com uma proteção que ele sabia com pesar que ela não queria, ele estava vagamente alerta de alguém atrás dele.

      — Seu bastardo!

      Uma mão poderosa o agarrou pelo ombro e o virou. Kylemore teve um segundo para registrar um par de olhos pretos furiosos, antes que um punho enorme fosse em direção a face dele.

      — Jesus! — Ele libertou Verity e cambaleou para trás.

      — Melhor chamar por Satanás, seu mestre!

      Benjamim Ashton o esmurrou novamente na face e desta vez ele se abaixou contra as pedras do pavimento em um tropeção desajeitado. Alvoroço vibrou a multidão, mas ninguém se atreveu a ir para cima do assaltante ou ajudá-lo a ficar de pé.

      — Ashton...— Kylemore disse, tentando sentar. Ele balançou a cabeça para clareá-la e elevou uma mão tremente à mandíbula contundida para conferir se estava quebrada.

      Aparentemente não, embora doía como diabo.

      — Ben, pare! — Verity gritou de algum lugar da multidão.

      — Eu pararei quando ele for um homem morto —, Ashton rosnou. — Levante-se, seu filho de uma cadela, maldito! Levante-se ou o chutarei enquanto está caído.

      — Ben! — Pelo som nas orelhas dele, Kylemore ouviu Verity defendê-lo. — Ben, ele está me devolvendo a você.

      Inseguramente, Kylemore colocou-se de pé.

— Saia do caminho, Verity.

      — Sim, saia do caminho, Verity —, Ashton disse severamente. — Eu preciso ensinar à Sua Graça uma lição. Ele fechava seus punhos para outra agressão, acertando-o no estômago. Embora Kylemore tenha se preparado para se defender, o coração dele não estava nisto. Ashton tinha todo o direito em bater nele.

      Inferno, ele esperava que o bruto o matasse.

      Ele balançou a cabeça novamente para devolver a ordem ao mundo. Ele teve dificuldade em focalizar os olhos e as orelhas dele zumbiam como mil abelhas bravas.

      Em um giro da fina lã de merino vermelho, Verity se lançou em frente a ele.

— Ben, se você quiser feri-lo, você terá que passar primeiro por mim —, ela estalou.

      — Então ele agora está se escondendo atrás das saias de uma moça —, Ben zombou.

      — Você me ouviu, Benjamim Ashton —, ela disse firmemente.

      — Verity, fique longe —, Kylemore disse cansativamente. O zumbir gradualmente na cabeça dele baixou, mas o lado da face dele picou como inferno alegre. — Ele não me ferirá.

      — Sim, ele vai —, ela obstinadamente disse e sem mover. — Ele o matará. Você o ouviu.

      — Verity, deve haver cem pessoas a nos assistir. Alguém o parará antes que ele faça muito dano.

      Agora que ele era capaz de pensar, estava realmente surpreso que ninguém tivesse tentado conter o assaltante até agora.

      Ai, sim. O alívio estava a caminho.

      Seu beleguim correu com um par de trabalhadores da propriedade da mesma maneira que Angus e Andy saltavam sobre a doca. Hamish tinha observado a cena inteira, impenetrável do barco.

      Kylemore supôs que todos aqueles músculos de Yorkshire bravo intimidara os aldeões. Uma reação justificada, ele admitiu, turvamente olhando a forma musculosa do assaltante dele.

      A raiva de Ashton permanecida aterrada nos olhos pretos dele, mas afinal ele olhou à irmã que permanecia como uma barreira entre ele e o seqüestrador dela.

— Você está bem, moça? Por Deus, se ele a tiver ferido, eu o matarei de verdade.

      — Sua Graça! — O beleguim chegou, arquejando no casaco preto pesado e calças de joelhos antiquados. — Este vilão está fazendo alvoroço ao redor da propriedade e o acusa de crimes terríveis. Eu o adverti que iria para o pelourinho por difamação.

      — Sim, e eu verei este vagabundo pendurado por estupro e seqüestro —, Ashton rosnou. — Moça Verity, conte-lhes o que ele fez a você.

      — Ben...— ela disse inseguramente.

      — Vá, conte-lhes. Fale a eles como ele fixou esses tiranos enormes em mim e a seqüestrou sob a mira de uma arma. Eu não tive nenhum descanso durante semanas imaginando o que você sofreu.

      Kylemore se preparou para a fervente condenação que ele merecia. Se ela escolhesse denunciá-lo, ele não teria nenhuma defesa.

      Ela ergueu o queixo em um gesto que ele achou dolorosamente familiar. A face dela estava pálida e com orgulhosa determinação.

      — Eu sou amante do Duque de Kylemore e eu estou com ele por minha própria e livre vontade —, ela disse alto o bastante para aqueles que estavam ao redor a ouvissem. Então, suavemente e em uma voz quebrada, ela adicionou, — Eu sinto muito, Ben.

      Kylemore foi movido além das palavras ao ouvi-la clamar inequivocamente que ela era amante dele. Como ele a amava. Ele faria qualquer coisa para ela. Qualquer coisa. Inclusive deixá-la ir, se isso fosse o que ela realmente queria. Apesar da alienação deles, ele a tomou nos braços. Sem hesitação, ela se apoiou nele.

A confusão substituiu a violência na expressão de Ashton.

— Moça Verity?

      Kylemore se viu sentindo pena da confusão do homem. Benjamim Ashton não era o vilão aqui. Ele só estava protegendo a irmã. Não era culpa dele que o jogo tivesse se tornado consideravelmente complicado depois daquele dia tempestuoso em Whitby.

      Kylemore falou sobre a cabeça de Verity, que descansava com uma confiança que ele não pode evitar apreciá-la em seu peito.

— Venha a casa, homem. Não dá nenhum crédito à honra de sua irmã ficarmos aqui em plena rua pública brigando.

      Os protestos de Ashton — Você não dá nada pela a honra de minha irmã —, colidiram com os de beleguim.

— Sua Graça, este tolo é uma ameaça pública. Seguramente você o quer em custódia.

      Kylemore suprimiu as objeções do beleguim com um olhar.

— Não, eu não acho.— Ele deu uma olhada e achou o que ele queria. — Nós levaremos sua carruagem. Eu a mandarei de volta para você.

      O beleguim torceu as mãos em nervosismo.

— Sua Graça, há outra coisa que devo lhe falar.

      O homem sempre minucioso estava inclinado a exagerar. Detalhes da administração da propriedade poderiam esperar.

      — Depois, McNab —, Kylemore estalou.

      — Mas, sua Graça...— O homem cacarejou com ansiedade.

      — Eu disse depois, homem. Andy dirigirá. Ashton, montará conosco?

      O tom de autoridade ducal teve o efeito exigido em todo o mundo, inclusive no Senhor zangado, em Ashton e no Senhor tremulante, McNab. A turba se dispersou quando Kylemore ergueu Verity muito suavemente em seus braços.

Imediatamente, o cheiro luxuriante dela encheu os sentidos dele, fazendo-o lembrar penetrantemente de outros tempos em que eles tinham estado tão íntimos quanto agora, tempos em que eles tinham sido ainda mais íntimos e ele pensou que morreria em puro êxtase.

      — Eu posso caminhar —, ela protestou.

      — Eu sei, mo cridhe. — A estima escapou, embora ele soubesse que já não tinha nenhum direito em usar isto. — Mas me permita fazer o serviço.

      Ela acenou com a cabeça e enrolou os braços ao redor do pescoço dele, enquanto ele mancava pelas lajes à carruagem de McNab. O corpo dele doía depois da pancadaria sob as mãos de Ashton, mas não havia nenhum modo, nem céu nem inferno, que o fariam pô-la no chão. Ter Verity em seus braços era muito agradável.

      Ele nunca a seguraria assim novamente.

      O que ela tinha dito ao irmão ainda ecoava em sua mente – sempre ecoaria em sua mente.

      Ele olhou para trás, para Ashton, a fim de ver se ele pretendia cooperar. O companheiro hesitou, e então seguiu, a face dele dura com uma raiva pouco controlada.

     

      Verity ainda tremia em resposta quando se sentou próxima a Kylemore e Ben estava à sua frente na carruagem. A carroça não fora desenhada para agüentar dois homens tão largos de uma vez só, e o espaço era espasmódico. Parecia ainda mais restrito por causa da hostilidade que queima em chamas entre os companheiros dela.

      — Parem com isto, os dois! Vocês estão agindo como moleques! — ela estalou quando a porta fechou. — Kylemore, ele tinha todo direito de bater em você. Ben, se eu o perdoei por me seqüestrar, você também pode.

      — Eu corri por todos esses campos procurando por você em toda parte, moça —, Ben devolveu com igual humor. — Eu fui para Londres e para pelo menos uma dúzia das propriedades deste bastardo. Esse pederasta tem suas patas imundas em metade do reino.

      — Preste atenção em sua língua, sujeitinho! — Kylemore rosnou. — Você está na presença de uma senhora.

      — Eu sei disso. Mas você não a tratou melhor que qualquer prostituta que encontrasse em Covent Garden por um xelim.

      — Feche sua boca, homem, ou eu a fecharei para você.

      — A moça está sob meus cuidados há quatro anos. Você não tem autoridade alguma para me ensinar a cuidar dela. —, Ben zombou.

      — Sim, eu sei tudo sobre Ben Ahbood, o famoso castrado árabe —, Kylemore disse com igual maldade.

      — Eu estava lá para mantê-la segura de almofadinhas preocupados em si mesmos como você, Sua Graça. — Ben fez o trato formal soar mais ultrajante que a descrição desfavorável.

      — Bem, você fez um trabalho notavelmente infeliz, então, não o fez? — Kylemore disse friamente.

      — Oh, pare! Por favor, pare! — Verity chorou em angústia. A possibilidade de violência estava a um fio. Ela decidiu interferir, antes que outra briga explodisse. A memória do irmão dela atacando seu amante ainda a incomodava. — Ben, eu estou bem. Você não está alegre em me ver?

      A pergunta incitou o familiar sorriso do irmão dela, talvez um pouco relutante, mas indubitavelmente estava lá.

— Sim, moça. Eu estou. É o mais importante.

      — E é essa recepção que recebo? — ela perguntou e riu entrecortadamente, quando ele se inclinou na carruagem para esmagá-la em um longo abraço.

      Verity fechou os olhos e se aqueceu na presença familiar do irmão dela. Por tanto tempo, ele tinha sido a única proteção dela contra o mundo, a única pessoa que conhecia a verdade por trás de Soraya. Ela tinha sentido tanta falta dele e agora ele estava aqui. Ela abafou um soluço grato contra o casaco escuro dele.

      Eventualmente, Ben apartou e a contemplou, os olhos pretos dele estavam luminoso com lágrimas não derramadas.

— Eu não sabia se você estiva viva ou morta. O que ele fez a você, moça? Onde esteve? Eu não tive notícias de você. Você não podia me contar de alguma maneira? Eu fiquei preocupado com você.

      — Oh, Ben, é uma história longa.— A maioria dela, ela tinha consciência, era imprópria para as orelhas de um irmão. — O mais importante é que nós podemos partir e esquecer que isto aconteceu.

      Kylemore se mexeu ao lado dela em um protesto silencioso, mas o que mais poderia dizer ela? Que ele tinha a seqüestrado, se forçado no dela e agora ela o amava tanto que achava que morreria disto? Até mesmo para ela, isso dificilmente fazia sentido.

      Eles entraram por um portal adornado e em um pátio espaçoso. O que parecia um exército de criados surgiram de uma entrada curva e volumosa para segurar os cavalos, abrir as portas da carruagem e se alinharem para cumprimentar o mestre deles.

      As paredes de pedra cinzas do castelo brilharam na luz solar. Quando Verity saiu da carruagem, eles se elevaram sobre ela, escarnecendo a presunção dela para amar tão grande personagem como o mestre deles.

      Kylemore estava ao lado dela, aparentemente inconsciente à magnificência. Até mesmo com a face contundida e as roupas sujas dele, ele ainda era o homem mais bonito que ela alguma vez tivesse visto.

      Ela pensou que tinha se acostumado com a idéia de o deixar. Afinal de contas, ela tinha aprendido suportar a vida como uma prostituta quando cada fragmento dela se revoltava à idéia. Mas cada vez que ela olhava para ele, a dor de se separar a cortava mais profundamente.

      Cega com as lágrimas que ela lutava para não derramar, ela aceitou o braço de Kylemore. Ela passou sua mão enluvada pelos olhos para clarear a visão e observar o grupo alinhado na escadaria de pedra. Ao topo, as portas se abriram para admitir, o por muito tempo ausente, senhor do Castelo de Kylemore.

      Uma mulher primorosa deslizou pela entrada. Ela era esbelta e excepcionalmente alta e usava um vestido pertubantemente caro para enfatizar sua altura e figura esbelta.

      Até mesmo à distância, não podia se equivocar sobre o ar de posse confiante dela. Ou a afronta incandescente quando ela olhou para baixo aos recém-chegados.

      — Justin, bom Deus! Você está tão totalmente perdido sobre o decoro que traz sua amante aqui? Despache essa mulher de baixa moral imediatamente!

      Verity estava próxima o bastante dele para senti-lo endurecer em reação.

      — Mãe —, ele disse de modo chato.

 

      Embora Verity nunca a tivesse visto pessoalmente, ela imediatamente reconheceu a rainha guerreira que os encarava das escadas como a Duquesa de Kylemore.

      Até mesmo, se mil esboços e retratos não a tivessem imortalizado por sua famosa beleza, ela carregava uma semelhança notável ao duque. Estranho ver as características masculinas do duque refletidas na face delicada da mãe. E a arrogância fria de sua expressão era familiar, após anos reconhecendo-a em seu filho.

      — Sua Graça —, ela disse de modo trêmulo, quando Ben emergiu da carruagem atrás dela. O aperto inflexível de Kylemore no braço dela fez sua fuga impossível, assim ela fez uma profunda reverência.

      A duquesa agiu como se não a notasse. Perfeitamente apropriado. Grandes senhoras não reconheciam mulheres de reputação duvidosa.

      Kylemore puxou Verity para a vertical e a arrastou escadaria acima, deixando Ben em seu rastro. Por um momento, ela pensou que ele pretendia seguir sem se dirigir à mãe, mas ele parou assim que a alcançou.

      Tão perto, Verity pode ver que a idade tinha marcado o rosto da Duquesa de Kylemore. A pintura habilmente aplicada não escondia as linhas de temperamento ao redor da boca e os olhos de genciana eram menos adoráveis, quando a pessoa via a dureza que luzia nas profundidades deles.

      — O que está fazendo aqui? — Kylemore perguntou da maneira mais fria dele.

      A falta dele de acolhimento não fez a duquesa se acovardar. As sobrancelhas aladas dela baixaram em uma carranca à imagem dele.

— Eu sou a Duquesa de Kylemore. Eu posso visitar as propriedades familiares quando me agradar.

      Ele escarneceu sem humor.

— Você não vem à Escócia há vinte anos, madame. A última vez que partiu, você jurou nunca mais pôr os pés nestas terras bárbaras novamente.

      — Despache sua prostituta e eu lhe falarei por que vim —, ela disse com uma voz inconfundível de comando. Atrás dela, o edifício magnífico se elevou aos céus, declarando que a duquesa tinha todo direito de estar aqui e Verity não tinha nenhum.

      — Eu deveria ir —, ela murmurou a Kylemore.

      — Não, você fica —, ele obstinadamente disse.

      — Ben e eu voltaremos à aldeia. Brigar abertamente com sua mãe não resultara nada bom. — Então, em uma nota de solicitação porque ela não agüentaria mais tempestades emocionais. — Por favor, eu imploro!

      Ela deveria ter sabido que ele não responderia mais a favor da súplica dela, do que o fizera à exigência de sua mãe. A mão inflexível ao redor do braço dela não relaxou.

— Você não vai a nenhuma parte.

      A duquesa encarou o filho com antipatia palpável.

— Eu cheguei bem a tempo. É como temia. A loucura de seu pai não morreu com ele. Você é o ramo podre de uma árvore podre.

      O choque percorreu pela linha de serventes ante ao ataque ao mestre deles. Verity não podia deixar esta rixa pública continuar.

      — Eu esperarei por você na aldeia —, ela sussurrou urgentemente. — Você não deve querer que todos os serventes da casa testemunhem esta briga, Kylemore.

      A boca da duquesa se apertou com desdém aristocrático.

— Você permite a esta meretriz ordinária usar seu nome familiar?

      Ao lado dela, Verity o sentiu se elevar a uma pose impressionante usando de toda sua altura. A duquesa era alta para uma mulher, mas ele assomou sobre ela.

— Sim. Eu seria o homem mais afortunado na terra, se essa senhora me chamasse de marido, madame.

      Isto era muito para a duquesa. A aparência perfeita embranqueceu e a mandíbula delicada caiu em surpresa.

      Mas ela quase não poderia estar mais assustada ante a declaração do que Verity estava. Ele não tinha mencionado matrimônio desde Kensington. O conceito dela como uma duquesa ainda era absurdo, mas nada poderia represar o calor traiçoeiro que as palavras dele verteram nela afligindo seu coração.

      — Esta senhora embeleza qualquer residência que ela se preocupa em entrar —, Kylemore disse em uma baixa voz que ainda conseguia ser cortante. — Você, no entanto, há muito tempo tem sido a desgraça de seu nome nobre e elevado. O Castelo de Kylemore pertence a mim. E você não é bem-vinda aqui.

      A duquesa cambaleou para trás. Por um momento terrível, Verity pensou que ela poderia desmaiar. — Justin! Eu sou sua mãe!

      — Ao meu pesar eterno —, disse ele suavemente.

      — Kylemore, você não pode expulsar sua mãe —, Verity ofegou. Ele tinha todo o direito para odiar a duquesa, mas uma ruptura só se abriria para trazer mais escândalos à tona.

      Ela virou à duquesa e tentou manter um tom razoável.

— Sua Graça, meu irmão e eu partimos hoje. Meu arranjo com seu filho terminou. Eu não a incomodarei mais.

      A expressão da duquesa ficou mais proibitiva. Verity esqueceu da beleza legendária e só viu a vontade obstinada e destrutiva.

      Como devia ter sido chamar essa mulher de mãe? Ela estava surpresa que Kylemore saíra de sua infância com ao menos um fragmento de humanidade intacto.

      Como ela tinha esperado, a duquesa ainda se recusava a tratar diretamente.

— Justin, seu comportamento é inaceitável —, ela disse em uma voz autocrática.

— Eu estou aqui para insistir que você aja de acordo com sua posição. Despeça esta mulher imediatamente e volte a Londres para selecionar uma noiva. Rogue, menino, para voltar a si.

      Ele permaneceu impassível.

— Eu sou o Duque de Kylemore. Estes são meus domínios. Se você não estiver hoje à noite fora de minhas terras, Mãe, meus criados a escoltarão a saída.

      Ele se virou para seu pessoal com toda a autoridade à disposição dele.

— A duquesa irá no veículo do Sr. McNab para Inverathie onde ela esperará na hospedaria. Arrumem seus baús e os despachem com ela na carruagem, que ela usará para sua partida imediata.

      — Justin, você não pode estar falando a sério! — a mãe dele protestou, apertando a manga dele.

      — Eu nunca fui mais sério em minha vida, madame. — Ele sacudiu seu braço como se ela fosse uma pedinte indesejável. — Tenha um bom dia.

      Ele virou o olhar para Ben que se levantou espantado à base da escadaria. Verity percebeu que a menção de Kylemore sobre matrimônio deve ter surpreendido o irmão dela. Ela nunca falara para ele sobre o que tinha acontecido na tarde passada em Londres.

      A voz de Kylemore era peremptória.

— Ashton, se você se incomodar em nos unir?

      Ele dispensou à mãe dele com um giro em seus sapatos e andou a passos largos para dentro. Forçosamente, Verity seguiu em um corredor impressionante decorado com exibições de lanças e espadas organizadas em padrões geométricos complicados. Atrás dela, ela estava atenta dos passos de Ben e dos criados impedindo uma duquesa protestando aos gritos de os seguir.

      Ela ainda estava pasma. Como ela guardaria o momento em que ele anunciara que ela era a esposa que ele escolheria.

      Mas a resposta de descrença da duquesa apenas ecoavam a reação zombeteira do mundo se ele prosseguisse e se casasse com sua amante.

      As razões dela para deixá-lo eram mais urgentes que nunca.

      Kylemore não esperou ver o que aconteceu à mãe. O pessoal dele tinha suas ordens e ele sabia que eles as obedeceriam incondicionalmente. Ao contrário, ele puxou Verity a um salão térreo.

      Ele se virou aos seu dois convidados relutantes. Ashton permaneceu misericordiosamente calado, mas Kylemore leu desgosto e choque em sua face quadrada. Verity estava exausta e a tensão deixara escuras marcas sob seus belos olhos. Ele não se preocupou com o irmão, mas ele definitivamente se preocupava com ela. Ele tomou a mão dela suavemente.

      — Eu sinto muita não poder evitar isso —, ele disse suavemente. — Eu não tinha idéia que minha mãe estava na residência.

      — Eu não deveria estar aqui —, Verdade disse inseguramente.

      — Sim, você deveria.— A declaração dele não permitia nenhum argumento. Se eu tivesse feito as coisas certas, você ficaria aqui para sempre, minha alma amada.

      Ele a colocou cuidadosamente em uma cadeira e cruzou ao aparador para verter três copos de uísque local. Depois do que eles tinham passado, todos eles precisariam disto, ele pensou severamente.

      — Aqui, beba isto —, ele disse, dando um a Ashton. Ele não podia dizer que era afeiçoado ao companheiro, mas por Verity, ele estava disposto a fazer um esforço.

      — O que é? — Suspeita atou a pergunta do homem.

      — Cicuta, é claro.— Sem parar para ver o que Ashton fez com a bebida, ele se voltou para Verity.

      — Isto a fará se sentir bem —, ele disse em um tom totalmente diferente quando ele se agachou ante ela.

      — Eu não bebo álcool —, ela disse de modo trêmulo.

      — Apenas desta vez, mo cridhe. Ajudará.

      Ela acenou com a cabeça e ele apertou o copo cristalino nos frios dedos dela. Ele se levantou e bebeu sua própria bebida. O licor acalmou as dores físicas que prolongavam da briga dele com Ashton. Infelizmente, nada exceto uma bala poderia curar a dor no coração dele.

      Ashton devolveu o copo vazio ao aparador com um tilintar. O uísque tinha reavivado o ego combativo habitual dele. Talvez cicuta tivesse sido uma escolha melhor.

      — Você ouviu o que a moça disse. Eu estou levando-a para casa comigo esta tarde. —, ele disse com beligerância familiar.

      — Seguramente essa é a decisão dela —, Kylemore disse neutralmente.

      Lá na doca, ela anunciou a todos que ele a tinha em completa submissão. Como ela poderia deixá-lo agora? Ou era aquilo que entre ele e a liberdade, ela queria mais a liberdade? Angústia apertou com dedos duros o coração dele ante o pensamento.

      Verity elevou a cabeça. Ele esperou com esperança desesperada que ela falasse para o irmão que tinha mudado de idéia, que ela queria ficar.

      Mas ela olhou para Ashton e disse em uma voz firme.

— Sim, Ben, eu irei com você.

      —Não! — Ashton pareceu aliviado, condenado.

— Isso é maravilhoso, moça. Eu tenho uma carruagem contratada pronta. Nós iremos quando você disser.

      Kylemore oscilou para perto das altas janelas para o jardim. Ele não podia deixá-la ir. Não agora. Não, quando ele sabia que ela se preocupava, até mesmo se ela não se importasse muito. Uma mão ergueu-se às cortinas e esmagou a seda tão firmemente, que as juntas dele ficaram brancas.

      Até mesmo de costas para ela, ele sentia os olhos dela nele.

      Ele tinha jurado, quando ela quase perecera, que ele nunca a compeliria novamente a qualquer coisa. Mas isto era impossível.

— Fique e coma algo, pelo menos —, ele disse olhando para os jardins, embora ele apenas visse o sol que brilhava no pátio perfeitamente mantido. Que absurdo ele ainda poder soar como um homem civilizado quando demônios vorazes arranhavam a alma dele.

— E use meu coche de viagem. Estará mais confortável.

      — Nós não o queremos —, Ashton estalou. — Lançar suas moedas não compensará o que você fez. Qualquer estrada, eu preferiria tirar minha irmã bem longe dos tiranos como você, antes que você mude de idéia e decida mantê-la aqui.

      Kylemore não se aborreceu em se defender. Qual era o ponto? Ben Ashton descobriria logo o bastante que ele pretendia cumprir os desejos de Verity, não importava o quanto custasse.

      Talvez um dia, ela se lembraria deste momento e saberia que ela deixou um homem melhor do que encontrara.

      Que epitáfio patético para seu grande amor.

      — Bem —, Verity disse quietamente. — Eu gostaria de ir para a aldeia organizar nossa partida. Eu quero falar com Sua Graça.

      — Eu não a deixarei sozinha com este bastardo desgramado. Ele vai fazê-la sumir, antes que eu volte.

Kylemore não podia culpar o companheiro por não confiar nele. No último encontro deles, ele tinha deixado o homem mais jovem tremendo, nu, em uma ruína fria, enquanto a irmã dele tinha desaparecido para enfrentar quem sabia que tipo de violência e abuso.

      — Ele não vai. — A certeza inconfundível soava na baixa voz de Verity.

      Obrigado, mo cridhe, ele sussurrou silenciosamente, antes que ele falasse com Ashton.

— Os criados podem aprontar sua carruagem e pertences, enquanto você espera no corredor.

      — Você ainda poderia aprontá-la para mandá-la longe sem eu saber —, o grosseiro insistiu com uma expressão teimosa.

      — Ben, não há nada aqui o impedindo de me proteger, enquanto ele me seqüestra —, Verity mostrou suavemente. — Por favor, nos deixe. Há coisas que eu preciso dizer à Sua Graça.

      Kylemore virou-se para ver Ashton olhar a irmã com indecisão. Então ele acenou com a cabeça abruptamente.

— Se este vilão fizer o mais leve movimento, grite.

      Ela tentou sorrir. Kylemore não pôde dizer que ela conseguira com sucesso.

— Ao menor toque dele.

      Kylemore não parou para objeções adicionais. Ele conduziu Ashton para fora e deu as ordens apropriadas ao mordomo.

      Ele teria insistido que eles usam o coche dele, mas viu que a desarmonia entre Ashton e ele chateava Verity. E ela, apesar de que ela ter conseguido exatamente o que queria, claramente chegara ao fim de suas forças.

      Ele deixou Ashton para se apressar ao corredor e voltar para Verity. Ela tinha se levantado, fitando o fogo bruxuleante. O perfil dela estava perfeito e inefavelmente triste contra a mítica folia esculpida na lareira de mármore. Quando ela o olhou, os olhos prateados dela estavam escuros com uma miséria igual à dele.

      Como ele poderia agüentar isto? Ele se apoiou contra as portas fechadas atrás dele e suportou o que viria.

     

      Verity sabia que essa era a última vez que ela estaria a sós com o homem que amava. Esfomeadamente, os olhos dela localizaram a face dele e o corpo. Ele parecia o pior tipo de rufião, com o cabelo arrepiado e as roupas amarrotadas e o escurecimento da contusão na face dele.

      — Eu sinto muito que ele tenha batido em você —, ela disse suavemente sem se mover da grelha.

      — Eu mereci isto. — Kylemore se endireitou e cuidadosamente tocou a bochecha. — Se algum dia seu irmão se encontrar aquém de pronto, ele faria uma boa carreira como pugilista, eu garanto.

      Automaticamente, ela deu um passo para ele e a mão dela subiu para acalmar os danos dele. Então ela se lembrou que tinha se proibido tais gestos tenros.

      — Pelo menos ele te salvou de uma viagem para Whitby —, ela disse, incapaz de esconder o pesar dela. Ela não tinha querido prolongar a dor de se separar, mas agora que o momento finalmente tinha chegado, ela se ressentiu com cada segundo que passava.

      — Teria sido um privilégio.— A expressão dele era sombria. — Verity, o que você falou para todo o mundo lá embaixo na doca, você não precisava tê-lo dito. — Ele pausou, obviamente com um esforço inútil, então terminou grosseiramente, — Obrigado.

      Desta vez, ela não pôde evitar ir para perto dele.

— Bem, eu não podia deixá-lo te ferir.

      Ele levou a mão dela em um aperto áspero.

— Verity, não vá. Pelo amor de Deus, não vá.

      Ela fechou os olhos, lutando contra as lágrimas. A própria infelicidade dela estava sendo devastadora o bastante. Mas a agonia que ele já não se importava em esconder, a fazia querer morrer.

      — Eu devo. — Ela falou muito mais para ela do que para ele.

      — Oh, Cristo, eu não posso engolir isto! Por que você tem que ir? Por que, mo gradh?

      Ele foi para longe dela e rondou impaciente pelo quarto como se ele não pudesse conter a frustração dele quando permanecia imóvel.

— Inferno, eu pensei que estava bastante claro. Você estava contente em ser minha amante durante algumas semanas no vale, mas você sempre pretendeu buscar sua independência. — Furiosamente, ele correu a mão dele pelo cabelo. — Eu aceitaria isto. Deus sabe, depois do que eu fiz, você seria louca para ficar comigo.

      Ele deu uma parada furiosa em frente a ela.

— Mas eu estava errado, não é? Você não está partindo porque você quer. Isto é o que você gostaria que eu acreditasse, mas isto não é verdade, não é?

      — Kylemore, não —, ela alegou, vulnerável a este ataque súbito.

      Ele ignorou a solicitação dela.

— Fale-me, Verity. Lá no vale, você disse que me queria. Era verdade? — Os olhos dele queimavam na face pálida dele e um músculo contraía na bochecha dele.

      — Não há nenhum ponto nisto.

      — Aquilo era verdade?

      — Sim, era verdade. Você sabe que era —, ela disse cansativamente, incapaz de mentir, embora teria sido melhor para ambos se ela o tivesse.

      — Você ainda me quer. Diga-me que eu estou enganado, Verity.

      Ela baixou a cabeça, incapaz de agüentar o tormento tempestuoso nos olhos dele. Por que era tão difícil fazer o que era certo?

      — Não, você não está enganado —, ela sussurrou e ergueu uma mão para o repelir quando ele fez um movimento convulsivo na direção dela. — Mas é mais complicado do que o que nós sentimos. Você é um duque. Eu sou uma prostituta.

      — Pelo amor de Deus! Você teve três amantes. Minha mãe passa por mais homens em uma semana. E ela é recebida em todos lugares.

      Pesarosamente, Verity balançou a cabeça.

— Meus protetores pagaram para usar meu corpo. O mundo inteiro sabe e me condena.

      — Eu não faço —, ele disse continuamente.

      — Talvez não. Mas isso não significa que há qualquer futuro para nós. Você tem que se casar e ter um herdeiro, Kylemore.

      — Você é a única mulher com quem eu quero me casar —, ele disse gravemente. — Verity Ashton, você me concederá a inigualada alegria de consentir em se tornar minha esposa?

      Ela combateu outro ataque queimando de inundação de lágrimas.

— Você me faz muita honra.

      Ele ficou quieto e estranhamente parado como se qualquer movimento desfavorável pudesse assustá-la e fazê-la correr.

— Se seu medo é que eu me cansarei de você e a abandonarei a favor de outra, está errada. — Então em um estouro de sentimentos, — Por minha alma, mo cridhe, eu a quis sem cessar do primeiro momento em que a vi. Seguramente você não pode duvidar de minha firmeza.

      A coisa era estranha, ela não o duvidava. Apesar dos hábitos dissolutos da sociedade em que ele vivia. Apesar do charme dele e atrações múltiplas. Ela tinha aceitado que o que ele sentia por ela estava além do desejo físico, poderoso como era aquele desejo físico. Mas ainda, não era bastante.

      Ela balançou a cabeça.

— Eu não posso me casar com você contigo, Kylemore. Nossas crianças seriam rejeitadas. Você seria um pária.

      — A sociedade pode ir ao inferno —, ele disse brevemente.

      — Você diz isso agora. Mas você se arrependerá ao dar seu nome a uma mulher como eu. Eu não poderia agüentar prejudicá-lo. É melhor nos separarmos agora. — A voz dela quebrou em um soluço, embora ela tivesse prometido que não choraria. — Não me pressione, eu imploro. Eu me contei mil vezes que nós podemos desafiar o mundo e viver só para nós mesmos. Mas nós não podemos! Nós não podemos, Kylemore. Tudo que eu peço é que você não faça disto mais difícil do que já é.

      Ele foi descansar perto das janelas finalmente. Ele parecia forte, controlado, arrogante. Infinitamente querido.

      Como eu posso agüentar deixá-lo? Porque é o que eu tenho que fazer por ele.

      — Eu lhe darei o mundo se você ficar.— A voz dele era baixa e profundamente com sentimento. — Meu Deus, mulher. Você não sabe que eu me deitaria e morreria se você me pedisse?

      Sim, ela sabia agora que ele gostava dela. Ela se achou desejosa que ele não a desejasse muito, até mesmo enquanto o coração dela se abria a cada declaração ardente.

      — Eu não quero nada de você —, ela disse tristemente.

      — Exceto sua liberdade.

      — Sim —, ela disse, utilizando o casco de aço que a tinha ajudado a sobreviver como Soraya.

      — Eu não posso dizer nada para fazê-la mudar de idéia? — ele sussurrou desesperadamente.

      — Nada —, ela confirmou em uma voz rouca. Então, com cada fragmento de sua coragem, ela olhou diretamente para ele. — Não me dê uma despedida decorosa lá fora. Eu... Eu não poderia agüentar. Terminemos tudo aqui. Adeus, Sua Graça.

      Os olhos dele escureceram quando ele a ouviu usar seu título. Mas ela estava determinada a fazê-lo lembrar do abismo que os separava, um abismo tão grande que o amor não poderia atravessar.

      Ela assistiu a aceitação nas características dele, junto com um desabrigo mortal, que fez o estômago dela se contorcer com miséria. Ele baixou a cabeça na direção dela, mas misericordiosamente não a tocou.

      Ela tinha sido bastante valente ao lhe dar um beijo de adeus em Kensington. Ela não poderia beijá-lo agora. Se ela o fizesse, ela quebraria além de conserto.

      Ela deu um último olhar ardente a ele. Adeus, meu amor.

      — Adeus, Verity —, ele disse suavemente, então retrocedeu à janela como se não pudesse agüentar vê-la partir.

 

      — Moça Verity, você vai me contar o que aconteceu? — Ben perguntou suavemente ao lado dela no banco acolchoado do coche de duas rodas.

      O que tinha acontecido? Nada fora do comum. Ela tinha se apaixonado, isso era tudo.

      Quase não valia a confusão que ela fez, ela pensou, fitando com olhos secos os bosques por onde eles passavam na carruagem contratada.

      — Verity? — o irmão dela incitou. Eles tinham viajado durante por várias horas e ele não tinha lhe perguntado por detalhes. Ela apreciava a consideração dele, mas o silêncio paciente de Ben não podia durar para sempre.

      — Eu... Eu prometo que eu lhe contarei tudo. — Mentira. Ela nunca poderia lhe contar tudo o que tinha acontecido no escondido vale de Kylemore nas Highlands. Mas ela poderia dizer o suficiente para fazer Ben entender, ela esperava. Ela virou para ficar de frente para o irmão que suportara tanto por ela. — Apenas, não agora.

      Essas eram as primeiras palavras que ela dizia em uma hora, desde que Ben se baixara para pegar a cesta que o mordomo do Castelo de Kylemore lhes pressionara para levar. Ela tinha se recusado a compartilhar as generosas provisões.

      A idéia de comer ainda enviava náuseas em forma de espiral pela tristeza plúmbea na barriga dela. A parte lógica da mente dela sabia que algum dia ela falaria, riria, e comeria, e dormiria e agiria como uma pessoa normal de novo, mas seu âmago aflito ainda não conseguia acreditar nisso.

      — Apenas me diga uma coisa. — As mãos volumosas de Ben ficaram com as juntas brancas de apertarem as rédias e ele a encarou com a mandíbula rígida. — Ele a machucou?

      — Sim —, ela sussurrou.

      Ela se remexeu desajeitadamente na névoa cinza de apatia que a tinha agarrado, desde que ela deixara seu amante, mas suas extremidades protetoras se tornaram mais atormentadas a cada momento que passava.

      — Deus dos céus! — Ben arrancou o veículo deles a uma parada brusca e girou para estar em frente a ela. — Eu farei acusações contra ele na primeira cidade aonde nós formos. Eu não me importo que ele seja um maldito duque. Se ele a machucou, ele pagará por isto, moça.

      A raiva dele afastou o último sinal do entorpecimento dela. Uma onda volumosa de agonia se apressou na alma dela. Ela puxou uma respiração instável.

      — Não, você não entende, Ben. — Então ela falou à verdade que rejeitara por tanto tempo em voz alta. — Eu o amo.

      — Amor? Que tagarelice maldita é...

      Até mesmo na miséria dela, ela viu a fúria de Ben enfraquecer em uma confusão furiosa, em negação. Então a expressão dele ficou triste inefavelmente. Ele a conhecia tão bem, este irmão que tinha renunciado as próprias esperanças e ambições - e, sim, orgulho em sua masculinidade – para cuidar dela.

      Ele sabia o quanto esse importuno amor custaria a ela. Já custara a ela.

      — Oh, moça, eu sinto muito.

      Sim, ele realmente sabia. Ela lhe deu um sorriso trêmulo.

— Eu também. — Ela pegou a mão dele de onde segurava as rédeas nos joelhos. — Mas pelo menos isso logo se reparará.

      Um das declarações favoritas da mãe deles. Ela viu a última tensão escoar da face dele, deixando só compaixão.

      — Sim, moça é verdade. Eu levarei de volta a Whitby e você esquecerá o que passou logo, logo.

      Ele estava errado, mas ela honrou a tentativa dele de a alegrar.

— Nós não podemos ficar em Whitby, Ben. O escândalo do falso Mrs. Symonds ainda deve ser a conversa da cidade.

      Ele urgiu os cavalos para continuar a caminhar.

— Então nós compraremos um cultivo de ovelhas onde ninguém, nem mesmo o mais sábio saiba nada sobre quem é você. Nós tiraremos Maria daquela escola e a teremos vivendo conosco. Não se aflija, moça. O bom ar de Yorkshire devolverá as cores de suas bochechas. Isto não parecerá tão ruim quando sua família estiver ao seu redor.

      — Sim, Bem —, ela disse, embora ela não acreditasse nisto.

      Ela fitou a cima das orelhas bruxuleantes dos cavalos e disse a si mesma que a dor passaria. Um dia,... quando ela fosse muito velha. Quando ela estivesse morta.

      Eles dirigiram em silêncio, enquanto Verity tentava não se lembrar. Lembrar doía muito.

      Mas ela não pôde evitar isto. E a memória mais forte dela era a face de Kylemore quando ele lhe pedira que se casassem hoje. Ele a olhara como se a recusa dela tivesse esmagado a última esperança dele.

      Ben se intrometeu no inferno privado dela, quando empurrou um lenço branco amassado na direção dela.

      — Para que é isto? — ela perguntou inseguramente.

      — Você está chorando, moça —, ele disse em uma voz suave.

      — Estou? — Ela elevou uma mão de tremor à face e a encontrou cheia de lágrimas que ela nem percebera que derramara.

      Não, ela nunca esqueceria. Nem mesmo quando a idade lhe desse cabelos cinzentos e marcasse sua face. Ela não queria esquecer, porém lembrar de mais a torturava.

      Silenciosamente, ela esfregou a face dela e fitou à frente. Ela renunciou a batalha fútil dela contra ela e começou a revisitar cada momento precioso das últimas semanas.

      A crueldade, a violência, a tristeza, a doçura.

      O amor opressivo.

      Ao lado dela, Ben clicou a língua para encorajar os cavalos a um passo mais rápido.

      — Que diabos?

      A maldição murmurada de Ben tirou Verity de seu estupor de miséria exausta.

      — Oh! — O coche balançou em uma parada desajeitada e a lançou duramente contra o irmão dela. Ela apertou o ombro dele quando os cavalos relincharam e mergulharam nos rastros deles.

      — Alguém bloqueou a estrada, moça Verity —, Ben disse, enquanto investigava a frente.

      — Bloquearam a estrada? — ela repetiu de modo ofuscante.

      Antes que ela pudesse organizar os pensamentos, mãos ásperas agarraram-na e a puxaram da carruagem. Surpresa pelo terror, gritou para o irmão dela, quando o assaltante lançou-a a estrada. Ela pousou dolorosamente em um joelho e colocou as mãos no chão para se salvar do terreno descomposto.

      — Verity!— Ben gritou quando dois homens arrastaram-no do assento e o arremessaram ao chão ao lado dela. Ela lutou para subir, ignorando o modo como suas mãos estavam arranhadas e sangravam com uma dor aguda.

      — Não o fira. Eu irei de boa vontade —, ela disse nitidamente.

      Apesar do tratamento severo, a alegria inundou o coração dela. Este não era algum roubo fortuito. Kylemore deve ter vindo pegá-la e levá-la de volta para o vale.

      Ela não se preocupava se eles não podiam ficar para sempre juntos. Ela não se preocupava que o que eles faziam era errado. Ela agora estaria com ele. Isso era tudo que importava.

      Ela olhou para os homens musculosos em roupas indescritíveis que a cercavam, esperando reconhecer um Macleish ou dois.

      Mas os homens que a cercaram na luz do fim de tarde eram estranhos. Desesperadamente, ela tentou ver além deles onde Kylemore deveria esperar por ela.

      — Eu matarei o bastardo! — Ben cambaleou na vertical. — Eu lhe falei que não podia confiar nele, moça!

      — Baixe! — O maior dos raptores lançou um pontapé às pernas de Ben. O irmão dela desfaleceu com um gemido. — Amarre-o.

      Verity estava confusa. As ordens foram feitas em um acento inglês. Na Escócia, o duque confiava sempre em retentores locais.

      — Kylemore? — ela chamou em uma voz confusa. — Eu não o combaterei. Você sabe disso.

      O homem que tinha falado a alcançou agarrando o braço dela em um aperto de pugilista.

— Feche sua boca —, ele rosnou, jogando-a aos pés.

      — Eu lhe disse que eu não resistirei.

      Ela tropeçou antes de recuperar o equilíbrio. Seguramente, o amante dela sabia que não havia necessidade de forçá-la a ir com ele. Eles tinham evoluído tanto desde Whitby.

      Não tinham?

      Tola em ser amedrontada. Ele nunca a feriria. Ele tinha jurado, e ela acreditou. Mas indiferentemente, ela se lembrou da raiva dele quando ela o recusara e o abandonara em Londres.

      Ela não tinha feito exatamente o mesmo esta tarde?

      O coração dela trovejou com selvagem apreensão. Tremendo e finalmente completamente alerta, os olhos dela vasculharam a extensão deserta da estrada. Abandonada com exceção de quatro homens, o veículo contratado, uma barricada provisional de pedras e ramos, e uma carruagem fechada elaborada a algumas jardas de distância.

      Ben ainda lutou para se livrar, mas, como em Whitby, os números fizeram isto completamente impossível. Ele soltou imprecações barbaramente, mas os diabos que o seguravam não prestaram nenhuma atenção, enquanto eles o amarravam e o deixavam inclinado debaixo das árvores que se aglomeravam a margem de estrada.

      Um dos homens que deixaram Ben apressou-se a abrir a porta da carruagem pintada com a familiar águia dourada dos Kinmurries. No momento em que o ocupante emergiu da carruagem, as faculdades mentais de Verity tinham voltado e ela experimentou uma brusca surpresa.

      — Bem feito, Smithson. — A Duquesa de Kylemore enviou um sorriso dolorosamente amável para o bruto enorme que estava ao lado de Verity.

      — Meu prazer, Sua Graça.— O homem se curvou brevemente. — Nós disporemos deles? Parecerá com um ataque de salteadores.

      — Não! — Verity ofegou, começando a lutar a sério. Isto não podia estar acontecendo. Não agora, quando ela tinha renunciado ao poderoso amante dela para que ele pudesse seguir as ordens do dever.

— Ben não fez nada para merecer isto!

      — Aquiete, cadela. — Smithson bateu o braço livre dele na garganta dela e a puxou para trás contra a camisa de linho grossa dele. A cabeça dela rodou com o fedor de suor e ela deu um gemido involuntário que rangeu no silêncio quando apertou o braço dele.

      A frieza da duquesa, olhos frios se pousaram nela. Verity tremeu ante o ódio absoluto nas profundidades índigo.

      — Você tem sido um espinho em minha vida, desde a primeira vez que meu filho a viu. —, a duquesa disse, o tom dela era tão impiedoso quanto o olhar.

      — Mas eu o estou deixando. Você sabe que eu o estou deixando —, Verity ofegou, lutando para respirar.

      Ela se torceu para se soltar do aperto de Smithson, mas sem resultado. Ela elevou a mão para arranhar a mão dele. Ele deu um grunhido satisfatório de dor, então empurrou duro contra a garganta dela, fazendo-a silenciar.

      — Pare com isso, sua prostituta repugnante —, ele murmurou. — Fique quieta ou eu a machucarei de verdade.

      Ele libertou a pressão punitiva na via aérea dela e a negridão retrocedeu gradualmente da visão dela. Assim que o sangue voltou a correr em sua carne machucada, ele pulsou dolorosamente.

      Ela puxou ar de revivificação aos pulmões e focalizou a duquesa. Smithson somente era um tirano. O real perigo estava ante ela, na pessoa desta bela mulher, perfeitamente vestida com olhos congelantes. O medo fez a cabeça de Verity girar, mas ela lutou para esconder a espiral de terror.

      — Eu não verei nunca mais Sua Graça —, Verity falou estridente. Falar fez com que sua garganta raspasse dolorosamente.

      As sobrancelhas da duquesa arquearam com evidente descrença.

— Eu conheço meu filho. Justin não aceitará sua destituição tão facilmente. Eu estremeço ao recordar o alvo de riso que ele se tornou quando você o deixou em Londres. Eu quase não pude sustentar minha cabeça na sociedade. — A voz dela soou com afronta.

— Eu temo que você já despertou meu desgosto, Soraya. E você deve pagar.

      Verity ficou perfeitamente parada no apertou de Smithson e elevou o queixo dela.

      — Mate-me se você quiser —, ela disse em uma voz baixa e tremente. Não haveria fuga. Ela poderia ver que a alma calcificada da duquesa não tinha nenhuma clemência por uma meretriz obstinada. Ainda assim, ela tinha que tentar salvar Ben. — Mas meu irmão não lhe fez nenhum mal. Por favor, deixe-o ir, Sua Graça.

      Os lábios manchados da duquesa se encurvaram em um sorriso desdenhoso.

— Oh, muito comovente, minha querida. Eu deveria ter adivinhado não tinha sido apenas sua bela face que atraíra meu filho. Ele sempre tivera uma admiração patética pela coragem.

      — Não há nada patético sobre o duque —, Verity estalou imprudentemente.

      A duquesa pisou adiante e esbofeteou Verity na face.

— Você me tratará com respeito, mulherzinha.

      Verity teria caído se Smithson não tivesse agarrado os braços dela tão firmemente. Assim sendo, o lado esquerdo do rosto dela parecia estar em chamas. Ela ergueu uma mão tremendo à bochecha e adotou um tom mais conciliatório por mais que a irritasse.

      — Eu sinto muito, Sua Graça —, ela disse, quando cada partícula dela queria cuspir desgosto na face primorosa da mulher.

      — Assim está melhor. — A expressão da duquesa mudou de desgosto a regozijo de expectativa. — E você me equivoca. Eu não tenho nenhuma intenção de matar você ou seu cafetão. Eu só quero que você se lembre do dia em que você cruzou com Margaret Kinmurrie. E viva para lamentar isto.

      — Deixe-a ir, sua maldita bruxa! — Ben rolou na sujeira, chutando e puxando enquanto os músculos poderosos dele se puxavam contra as cordas.

      — Silencie o companheiro —, a duquesa disse negligentemente aos cúmplices dela. O olhar brilhando dela não saiu de Verity. Ela parecia cruel. Ela parecia entusiasmada. A violência tinha ativado algo primitivo e incontrolável nela.

      Enojada, Verity fechou os olhos.

      A duquesa continuou no mesmo tom inativo.

— Mas não o faça insensível. Eu quero que ele testemunhe as conseqüências de presumir sobre a posição social de alguém.

      Um grito se apertou na garganta de Verity, mas ela lutou para contê-lo.

      Gritar não faria nenhum bem. Não havia ninguém para ajudar, da mesma maneira que não havia ninguém para ajudar Ben. Os homens que se aglomeraram ao redor de Ben esconderam a surra dela, mas os grunhidos de agonia dele se sobressaíam sobre os sons repugnantes de punhos em carne vulnerável.

      Ela se estendeu e torceu contra o aperto de Smithson para ver o que eles fizeram ao irmão dela. Náusea subiu quando ela instintivamente, mas inutilmente tentou se livrar e correr em ajuda.

      Eventualmente, ela se rendeu em esgotamento ofegante e caiu no aperto do capturador dela. A força fraca dela não era par para o assassino da duquesa.

      — Não, por favor. Sua Graça, Ben não fez nada para prejudicá-la —, ela alegou, a garganta dela ainda áspera. Então, embora o orgulho dela se revoltasse às palavras, — Eu imploro, Sua Graça. Deixe sua raiva cair em mim, não em meu irmão.

      Incrivelmente, a duquesa sorriu, até mesmo quando seus tiranos chutavam e batiam em um homem inocente à inconsciência.

— Eu tenho raiva para poupar para ambos, prostituta.

      Os gemidos de Ben ficaram mais macios e mais intermitentes. Novamente, a duquesa falou sem olhar na direção dele.

      — Não esqueça, eu o quero atento. Ele tem que ver cada detalhe do castigo da irmã dele.

      Graças a Deus que a surra acabara. Parecia ter durado uma eternidade. Verity se forçou a levar uma respiração instável. Uma certeza agonizante crescia dentro dela sobre as intenções da duquesa.

      — Você quer dizer que estes vilões irão me estuprar —, ela sussurrou.

      Horror se expandiu sufocando-a. Ela precisava das mãos cruéis de Smithson para a impedir de desfalecer com as imagens de dor insuportável e vergonha que inundavam a mente dela.

      — Sim. Eventualmente. Um amante extra ou quatro para uma prostituta como você não faz diferença —, a duquesa disse ligeira, então a voz dela endureceu. — Mas diante disso, eu terei certeza de que você nunca mais encantará meu filho – ou qualquer outro homem – de novo.

      — Eu renunciei minha vida como cortesã —, Verity disse, embora ela viu que nada balançaria o propósito da duquesa.

      — Oh, eu posso garantir isso. — Finalmente, a duquesa olhou para onde Ben se deitava com dor estremecendo. — Um de vocês, o sustente assim ele poderá assistir. Os outros, eu preciso aqui.

      Verity deu um grito quebrado quando os brutos se moveram longe do irmão dela e ela viu o que eles tinham feito finalmente. A face dele estava ensangüentada e inchada e as roupas dele estavam rasgadas e imundas.

      Que danos adicionais se escondiam à luz do desvanecimento? O dano que ela podia ver feito a fez querer vomitar.

      — Oh, Bem —, ela chorou, esperando desesperadamente que ele tivesse perdido a consciência, apesar das ordens da duquesa. Mas a cabeça dele se empurrou inseguramente na direção dela quando ela falou o nome dele.

      A angústia dela significou apenas que ela nem notara quando a duquesa mandou Smithson entregá-la para dois dos homens que tinham batido em Ben. Eles permaneceram um de cada lado agarrando seus braços, enquanto Smithson se dirigia à sua empregadora.

— Quais são seus desejos, Sua Graça?

      Os olhos da mulher estavam brilhantes quase com estimulação sexual quando ela tirou uma faca prateada da pequena bolsa dela.

— Corte a face dela. Faça uma cicatriz, assim nenhum homem poderá olhar para ela sem repugnância.— A voz dela tremia com ânsia.

      — Não! Você não pode fazer isto! — Verity chorou, lutando futilmente. Seu orgulho tinha fugido e ela já não podia esconder o terror dela. — É selvagem.

      — Sua Graça...— Smithson se retirou da lâmina que a duquesa estendia. Até mesmo pelo pânico dela, Verity ficou surpresa ao ver a face impassível dele em repugnância.

      — Você estava contente o bastante para matá-la —, a duquesa disse irrisoriamente, como se ela criticasse um dândi sobre uma gravata caída. — Seja um homem, pelo amor de Deus.

      Smithson balançou a cabeça.

— Matar é rápido. Mas fatiar uma face bonita de uma moça só por despeito? Não, Sua Graça, eu sinto muito, mas eu não posso fazer isto.

      — Você está despedido de meu serviço —, ela disse em uma voz frígida que contrastou grotescamente com a alegria na face dela. Os olhos dela se fixaram avidamente nos bandidos que seguravam Verity. — Esta mulher é uma meretriz e uma ladra. Ela deveria ser chicoteada, e então enforcada. Há algum homem o bastante para realizar minha ordem?

      Verity esperou cansada em silêncio e ofegante para ver se qualquer um levaria o desafio.

      A beleza dela sempre tinha sido mais uma maldição que uma bênção, mas ela detestou o prospecto de se tornar um objeto de piedade. E a coragem dela falhou, quando ela imaginou aquela pequena lâmina brilhante perfurar sua carne.

      Ela puxou uma respiração rota, lutando contra a histeria. Estupro seguiria depressa à deformação. Como ela poderia suportar o que estava a ponto de acontecer?

      — Cem guinés para o homem que levar a faca —, a duquesa disse claramente, quando ninguém se moveu para obedece-la.

      Ficou escrita a irritação dela com seu bando em linhas austeras no rosto em que uma vez Verity pensara ser belo.. Agora tudo que podia ver era ódio obsessivo e crueldade obscena.

      O medo de Verity cresceu, ameaçando sufocá-la, quando ela estudou o círculo de faces ao redor dela. Cem guinés era uma fortuna, mais dinheiro que estes homens veriam em suas vidas. Não fazia sentido nenhum que eles esmagariam o irmão dela a nada, contudo ficassem melindrosos à idéia de fazer-lhe uma cicatriz para toda a vida.

      Eles também se recusariam a estuprá-la?

      — Eu farei, Sua Graça. — O homem ao lado direito dela libertou-a e andou para pegar a faca prateada da mão tremente da duquesa. O tremor da mulher não se originava da incerteza, Verity sabia, mas de excitação.

      — Corte bem fundo. — A respiração da duquesa soava audivelmente enquanto sua vingança monstruosa chegava mais perto de ser concretizada.

      Ben fez um protesto ininteligível e se jogou aos joelhos, antes que o guarda o derrubasse com um soco.

      Verity conseguiu orgulhosamente permanecer em pé, até que o homem com a faca começou a caminhar em sua direção, mas quando ela olhou em seus olhos, o nervo dela falhou. Ela se contorceu nas mãos impiedosas que a seguravam.

      — Não! Não, por favor. Não faça isto. Em nome dos céus, por favor, não faça isto —, ela alegou. Ela se virou enquanto lágrimas vertiam nas bochechas dela.

      O homem pegou o queixo dela em um aperto firme e a fez ficar na frente dele. Ela se segurou esperando o golpe da faca, a dor excruciante e rios de sangue.

      — Por favor, — ela sussurrou de modo trêmulo, procurando algum rastro de compaixão nele.

      Ele era tão jovem. Mais jovem que Ben. Que absurdo que um mero menino pudesse perpetrar tal afronta.

      — Você não pode fazer isto e se chamar um cristão.— Ela pegou um flash de incerteza nos olhos dele e por um momento, pensou que tinha ganho.

      — Duzentos guinés! — a duquesa urgiu arás.

      O moço elevou a faca e a apertou contra a maçã do rosto de Verity. Houve uma breve picada e morna umidade gotejou abaixo de seu rosto.

      — Que Deus o amaldiçoe para sempre —, ela sussurrou e fechou os olhos novamente. Ela esperou pela dor.

      E esperou.

      — Bom Deus, e eles chamam as mulheres de sexo frágil! — A raiva da duquesa rangeu pelos nervos tensos apertados a ponto de quebrar. — Eu deveria saber que isso eu teria que fazer sozinha.

      — Sim, bons criados são tão difíceis de adquirir hoje em dia, não são? — Verity disse fracamente. Ela abriu os olhos para ver a duquesa agarrar a faca do menino.

      Kylemore tinha falado que esta mulher não empalidecia ante nada. Ela não vacilaria à humilhação e degradação de uma prostituta humilde. Qualquer alívio havia passado.

      O homem que ela amou a tinha chamado de pessoa valente, a mais valente que ele conheceu. Ela recusara enfrentar seu destino como uma mulher fraca cheia de queixas. Ela gritaria e choraria e imploraria por clemência há tempos. Ela sabia disso. Até mesmo o arranhão na bochecha dela doía como chama, e coisa pior estava por vir. Mas ela se agarraria ao orgulho o tempo que conseguisse.

      Orgulho não a salvaria do que estava a ponto de acontecer, mas era tudo que ela tinha. Ela se forçou a ficar reta, se a duquesa e a mãe de seu amante seria sua alcoviteira barata.

      Algo que poderia ter sido admiração chamejou nos olhos vítreos da mulher, os mesmos olhos de profundo e belo azul como Kylemore. — Você é uma oponente merecedora, eu lhe darei isso.

      — Isto não tem nenhum propósito —, Verity disse tão calmamente quanto pôde. Alegando que nunca poderia ter sucesso. Talvez o desafio. Ela amaldiçoou a extremidade rouca de sua voz, mas não pôde fazer nada sobre isto. — Eu te contei, Sua Graça e eu nos separamos para sempre. Ele jurou que não me procuraria.

      — Até mesmo se isso for assim, eu mereço alguma recompensa pela dificuldade que você me deu. — A voz da duquesa era triunfante.

      — Causando-me tortura e estupro?

      — Estas coisas são todas relativas. — A mulher acariciou a extremidade da lâmina e considerou a vítima dela na luz efêmera. — Eu prefiro pensar que eu lhe tirarei um olho. —      O estômago subiu na garganta de Verity.

— Você me deixaria cega? — ela ofegou em reação.

      — Não. Só um olho. Eu quero que você veja o que eu faço. É perigoso se meter contra seus superiores, minha menina.

      — Você não é superior a mim —, Verity brigou. A fúria arranhou o medo dela. A fúria lhe deu força para ficar de pé duramente enquanto esperava a descida da lâmina. — Você nunca escapará ilesa disto. Eu trarei toda a força da lei contra você.

      Incrivelmente, indiferentemente, a duquesa riu, o som tiniu doce no ar imóvel.

— Eu sou a Duquesa de Kylemore. Você é descarte de meu filho, uma amante de baixa classe. A lei não lhe prestará nenhum cuidado. A menos que, quer dizer, eu decida mandá-la desterrar para alguma colônia por prostituição.

      — Você é um diabo do inferno —, Verity ofegou em horror.

      Que seja rápido, ela rezou, embora ela soubesse que a duquesa pretendia tirar até a última gota de sofrimento. Coragem era tudo que restara a Verity. Por favor, não deixe isso a abandonar agora. Ela fechou os olhos e esperou.

      A duquesa estava tão próxima, que Verity ouviu o deslizar de uma manga de seda até o corpete quando ela retirou a mão, pronta para golpear.

      Então, na pausa ofegante, uma fria, dominante e amada voz perfurou sua cerca de névoa de medo.

— Derrame uma gota do sangue dela e eu atirarei em você onde está.

      As palavras cortantes de Kylemore arrancaram Verity do torpor sem luz pra onde ela tinha se retirado.

      Não podia ser verdade. Ele não podia estar aqui para salvá-la. Tais incomuns atos heróicos só aconteciam em contos de fadas. Medo e aflição deviam tê-la deixada louca.

      Mas quando ela abriu os olhos ofuscados, ele andou a passos largos, arrogante como era, para fora das árvores andando em direção a ela. E como ela podia duvidar que ele era real quando a força da raiva dele fazia o ar tremer?

      Ele estava completamente vestido de preto, da camisa de seda dele até o casaco longo que chegava ao chão. Até mesmo as botas que faziam barulho com cada passo determinado eram pretas.

      Contra a escuridão completa da roupa dele, a face dele estava pálida e esticada com fúria mal encoberta. Uma mão elegante descansava negligentemente no cabo da espada que estava pendurada na cintura dele e a outra apontava uma pistola pesada à mãe dele e Smithson.

      Com um suspiro, a duquesa girou ao redor.

— Justin, não seja ridículo. Você não pode ameaçar sua própria mãe.

      Ela soou perfeitamente razoável. A harpia vingadora de alguns momentos atrás tinha desaparecido. Depressa, ela escondeu a faca mortalmente prateada nas saias dela.

      A selvageria tingia o sorriso do duque quando ele parou há alguns pés longe dela.

— Eu posso e a ameaço, madame. — Ele olhou para onde o criado da mãe dele segurava Verity. — Eles a prejudicaram, mo cridhe?

      — Não —, Verity sussurrou. Tremendo com a reação, ela focalizou um olhar cheio de lágrima em Kylemore.

      Ela estava segura agora. Ele nunca deixaria qualquer um feri-la. Ela sabia disso como sabia que era preciso respirar para viver.

      — Sua face está sangrando —, ele mostrou com uma bondade contida que enviou um calafrio frio abaixo a espinha dela.

      — É só um arranhão. —, ela disse inseguramente.

      Comparado ao que a duquesa tinha planejado, o escuro corte vazando pouco importava. Ainda, ela viu chamas de angústia nos olhos dele quando eles descansaram no dano.

      — Eu espero. Ou alguém pagará caro. — Ele mascarou o flash de emoção e devolveu o foco inexorável à mãe dele.

      A face da duquesa apertou em desafio desdenhoso quando ela encontrou o olhar fixo dele.

— Você não me prejudicaria. Você não tem estômago para isto.

      Claramente, ela tinha decidido que o desafio era a melhor estratégia. Verity poderia lhe ter falado que ela estava errada. Quando Kylemore ficava daquele jeito, nada o balançava.

      — Teste-me —, ele disse na mesma voz espantosamente moderada.

      Ainda assim a duquesa não acatou a advertência. Um sorriso triunfante desenrolou nos lábios dela.

— Você esquece que eu tenho quatro homens e você está só.

      A maneira grandiosa de Kylemore não hesitou.

— Quatro homens que logo estarão sob custódia e serão incriminados com cada palavra do testemunho deles.

      Ele sinalizou com uma mão a alguém atrás dele. Oito homens armados surgiram dos bosques que guarneciam a estrada. Verity reconheceu Hamish, Andy e Angus entre os recém-chegados.

      — Justin, pense no escândalo! — a duquesa mordeu.

      — Sim, pense nisto —, ele disse com satisfação.

      Com eficiência taciturna, os companheiros de Kylemore levaram, sob a mira de armas, o menino que chegara tão perto de cicatrizar Verity e o tirano que vigiava o corpo agouramente imóvel de Ben.

      O duque olhou ao homem que ainda segurava Verity.

— Se você espera viver pelo próximo minuto, deixe-a ir.

      A voz dele soou com autoridade absoluta. Imediatamente, ela estava livre. A rudeza da ação a desequilibrou. Ela cambaleou e tomou fôlego para combater a tontura súbita dela.

      Kylemore se lançou para pegá-la, antes que ela caísse.

— Cristo, mo leannan, o que eles fizeram a você? — ele murmurou debaixo da respiração.

      Ela sentiu o braço dele serpentear ao redor da cintura dela para mantê-la em pé. Ao toque dele, a fraqueza dela retrocedeu. Ela se dirigiu à força e ao calor dele como uma flor se abre para o sol.

      Ele está aqui, ele está aqui.

      O cântico alegre vibrando de alívio e maravilha a permitiu tomar a primeira respiração de verdade no que sentia como se fossem horas. Era uma respiração cheia da essência persistente de Kylemore. Ela combateu ao impulso de enterrar o nariz dela no tórax dele e fingir que todo o perigo tinha passado.

      Porque, é claro, não tinha.

      Até mesmo quando ele a abrigou contra o corpo dele, Kylemore manteve a pistola nivelada. Há alguns pés Angus e Andy tomaram conta do raptor dela e o uniram aos seus dois comparsas. Os três assassinos que a aterrorizaram acovardaram e estavam em silêncio apertados na margem da estrada.

      Ela olhou para longe deles, para o homem que ela pensara que nunca mais veria novamente. O coração dela floresceu com alegria difícil. Como ela desejou que ela pudesse ficar para sempre no abraço dele, mas os desejos dela eram tão impossíveis agora quanto alguma vez fora.

      A reação sobre a situação que ela passara penetrou e ela tremeu nos braços dele como se ela estivesse febril. Ela abafou o desejo de se agarrar a Kylemore e banhá-lo de lágrimas de gratidão.

      Lutando por controle, ela inalou uma outra respiração profunda. Agora mesmo, ela precisava inspecionar seu irmão. Ele tinha estado por muito tempo calado.

      — Eu tenho que cuidar de Bem —, ela disse urgentemente. — Ele está ali, palpitando num fio de vida.

      — Hamish, vá com ela —, Kylemore disse, a libertando.

      Ele manteve a pistola apontada à mãe dele enquanto Verity se apressava para seu irmão. Ben se deitou no chão, ainda amarrado. Ele deve ter finalmente, e misericordiosamente, perdido a consciência, antes que a duquesa tivesse agarrado a faca.

      Com um soluço quebrado, Verity se ajoelhou ao lado dele.

      Ele está vivo? Por favor, que assim seja.

      Ela se curvou sobre o pobre e danificado corpo dele, embalando-o em seu peito. Até mesmo no crepúsculo está perdoando luz, ela viu o quão machucado ele estava. Graças aos céus, ele ainda estava respirando. Dessa proximidade, ela podia ouvir a passagem desigual do ar pela boca triturada dele.

      — Oh, Bem —, ela murmurou, lágrimas corriam incontroláveis abaixo as bochechas dela quando ela o balançou como quando ela o balançava quando era criança. — Meu pobre querido irmão.

      Ele não a ouviu. Talvez ele nunca a ouviria novamente.

      O espancamento tinha sido prolongado e espontâneo. Quem sabe o dano que ele tinha agüentado? Muito suavemente, ela elevou a cabeça contundida e rasgada dele sobre o colo dela, enquanto Hamish o rodava de lado para cortar as amarras que o prendiam com uma faca.

      — Eles fizeram um trabalho consideravelmente bom nele, minha senhora. — O escocês correu as mãos dele sobre o corpo amedrontadoramente indiferente de seu irmão.

      — É tudo minha culpa —, ela sussurrou, procurando desajeitadamente na manga dela o lenço que Ben tinha lhe dado mais cedo.

      Hamish olhou para ela com uma carranca.

— Och, não, você não tem que se culpar. Aquela banshee (fada que prediz a morte de algum membro da família) perversa ali que trouxe isto a você.

      Não era verdade. O conhecimento se deitava como uma mancha na alma dela que Ben tinha pagado pelos pecados da irmã dele hoje.

      Mas se arrepender de seus crimes teria que esperar. Ignorando a dor das palmas raspadas, ela tentou usar o lenço para limpar a sujeira e o sangue da face inchada e marcada de Ben. Mas a severidade das feridas dele a venceu e o quadrado de linho logo estava vermelho encharcado.

      O nariz dele estava torto e a boca dele não era mais que uma ferida profunda sangrenta. Se não fosse pelo choque do cabelo loiro quase branco dele, até mesmo imundo e emaranhado como estava, ela teria tido dificuldade em reconhecê-lo.

      — O que você acha, Sr. Macleish? — ela perguntou roucamente.

      — O nariz dele está quebrado e eu não ficaria surpreso se algumas costelas estivessem quebradas. Nós o levaremos de volta para o castelo e um doutor de verdade poderá vê-lo.

      O toque de Hamish era seguro e bondoso, quando ele testou os danos do irmão dela, como seguro e bondoso era quando atendia os cavalos do duque. O pensamento era estranhamente tranqüilizador. Ela dobrou a cabeça e sussurrou conforto a Ben, da mesma maneira que ela tinha sussurrado quando ele fora uma criança aos cuidados dela.

      — Não, Justin! Você zomba!

      A negação enfática da duquesa arrastou a atenção de Verity do irmão inconsciente. Mãe e filho quadraram para cima alguns metros de onde ela estava ajoelhada. As faces bom-desossadas que proclamaram o sangue compartilhado deles eram totalmente com ódio nu.

      — Eu definitivamente sou sério, senhora. — A voz de Kylemore fora a mais cortante que Verity alguma vez já ouvira. Era a voz de um homem que extorquia obediência imediata ao mais mero comando dele. — Você vai se retirara a casa herdada pela sua viuvez em Norfolk. Você levará sua protegida odiosa com você. Uma escolta a acompanhará até lá e eu fixarei guardas dia e noite na casa. Se você se aventurar um pé além de Norwich, eu deixo de ser responsável por seus gastos e você terá que fiar-se puramente em seu dote.

      — Isso é selvagem! Eu sou sua mãe! — A raiva na voz da duquesa fez as mãos de Verity parar de acariciar o cabelo enrolado da testa de Ben.

      — Porque você é minha mãe, só eu posso terminar a devastação que você descarregou. — As palavras de Kylemore gotejaram tal gelo que Verity tremeu. — Eu deveria tê-la restringido há muito tempo. Tolamente, eu acreditei que ficaria impotente sem acesso à bolsa ducal. Hoje aquele grave erro quase me valeu tudo o que eu prezo.

      O coração de Verity saltou com felicidade proscrita. Era a mais coisa próxima a uma declaração aberta de amor que ela já teria dele.

      Kylemore elevou uma mão elegante para evitar qualquer protesto da mãe.

— Não, madame, não desperdice sua respiração. Eu estou determinado. Você está sendo destinada a uma vida rústica inofensiva.

      A mulher mais velha se atraiu para cima à altura cheia dela.

— Muito impressionante Justin —, ela zombou. — Mas eu ainda tenho uma arma em meu arsenal.

      — Sim, e o que é isso? — ele perguntou tão à toa como se ele discutisse uma aposta insignificante em uma corrida de cavalos ou uma partida de boxe.

      — Meu marido estava indubitavelmente louco. A minha angústia, meu filho é muito nervoso e difícil. — Tristeza insincera infundia as palavras cruéis dela. — Seu recente comportamento indica que você herdou a aflição trágica de seu pai. Proceda com seu plano vil para me exilar e eu o comprometerei como um lunático.

      — Não! Não é verdade! — Verity chorou em angústia. As mãos dela se apertaram na camisa suja e rasgada de Ben.

      Kylemore olhou para ela e incrivelmente, sorriu.

— Não preocupe, mo leannan. Esta tigresa em particular já não tem dentes.

      A duquesa carranqueou à afirmação dele.

— Você pensa assim, Justin? Londres está impaciente para saber minuciosamente o fez para recuperar sua amante espalhafatosa. Os fofoqueiros sempre especularam sobre sua sanidade. Será preciso muito pouco para excitar esses rumores, querido menino, muito pouco. — Ela tinha fel para alcançar e bater na bochecha dele como se ele fosse realmente uma criança problemática. — Assim não teremos mais nenhuma conversa sobre a casa.

      O sorriso de Kylemore enfraqueceu quando ele retrocedeu à mãe dele.

— Os mesmos fofoqueiros apreciarão os relatórios de seus criados domésticos, madame. Os contos sórdidos de seu apetite insaciável por criados jovens musculosos. Ou para rufiões de ruas pagos com um guinéu pelos prazeres sujos que você extorquia.

      Até mesmo a certa distância, Verity viu a duquesa embranquecer.

— Justin? O que está dizendo você? — ela ofegou, cambaleante para trás.

      Ele ainda mantinha aquele controle misterioso. Quão mais composto ele soava, mais perigoso ele se tornava, Verity sabia.

      — Eu possuo declarações juradas que detalham seus excessos sexuais. Talvez seus romances infindáveis com membros da alta classe sejam negligenciados. Mas seu gosto por indivíduos violentos não encontrará tanta compreensão. Smithson, seu alcoviteiro, estava ao seu lado. Eu duvido que ele mantivesse a boca dele fechada, se ele pudesse se salvar da forca. Considere cuidadosamente, antes de você me ameaçar novamente com seus estratagemas patéticos.

      — Você tem me vigiado, seu pequeno miserável bastardo? — ela rosnou. O tom desprezivo enviou um abalo secundário enjoado de terror por Verity e ela segurou o corpo imóvel do irmão dela mais firmemente.

      — Realmente —, Kylemore disse, impassível pelos insultos dela. — Eu sabia que algum dia você ultrapassaria seus limites generosos assim eu me fixei em seu comportamento.

      A voz da mulher tremeu quando falou, e o rugir dela se salientava anormalmente luminoso nas bochechas pálidas dela.

      — Não, Justin! Isto é muito cruel. Se você não pensa em mim, pense em você. Você não pode arrastar o nome dos Kinmurrie pelo lodo!

— Eu só fiz o que me foi mandado, Sua Graça —, Smithson insistiu atrás da duquesa. — Era mais do que meu trabalho valia contradizer as demandas da senhora.

      — Você é um assassino e um tirano —, Kylemore disse acidamente. — E eu verei você e seus comparsas enforcados pelo trabalho de hoje.

      — Não, Kylemore —, Verity disse firmemente. Lentamente e com grande ternura, ela colocou a cabeça de Ben na beira da grama grossa.

      A intervenção dela criou um silêncio curto. Kylemore olhou para ela mais em surpresa do que raiva.

— Não? Você não sabe o quão perto eu estou de atirar neles aqui e agora e deixar a lei ir para o Diabo.

      — Acredite-me, eu sei —, ela disse suavemente, lendo a tensão vibrante no corpo magro dele.

      Ela levantou e aprumou os ombros antes de cruzar ao lado do duque. Devagar, ela o alcançou, depois da resistência de um momento dele, pegou a pistola. Que descansou fria, dura e pesada na palma dela.

      — Sua Graça tem razão. Um escândalo público o danificará tanto quanto aqueles que você processar —, ela disse calmamente, enquanto dentro dela, o coração galopava com apreensão. Peça aos céus que ela pudesse lhe fazer se curvar às argumentações. — Deixe-a ir para Norfolk. Deixe-a levar seus companheiros de crime – a ameaça de apreensão deve mantê-los lá seguramente o bastante.

      — Ela tentou te matar.— A voz funda de Kylemore era um cordel de chicote de fúria. — E estes animais, que ainda podem ter matado seu irmão, a ajudaram.

      — Eu não esqueci de Ben. — Ela lançou um olhar para onde Hamish ainda trabalhava metodicamente nos danos de Ben. — Mas se você puser estes homens no banco de réus, a história inteira sairá, e isso não fará bem para ninguém.

      — Você é mais generoso que eu, mo cridhe —, Kylemore disse suavemente.

      Ele alcançou e pegou o braço da mãe dele em um aperto punitivo.

— Assim o que diz você? Norfolk? Ou prisão em um asilo para mania carnal insaciável? E condenada ao escândalo.

      Lágrimas brilharam nos olhos azuis profundos da duquesa, lágrimas de contrariada fúria no lugar de remorso, Verity estava segura.

      — Justin, você está me ferindo! — a mãe dele lamentou.

      A mudança de ameaças para fraqueza miserável não balançou o duque.

— Firo-a? Deus, eu gostaria de desmembrá-la.

      Ele visivelmente controlava seu temperamento que faiscava.

— Bem, madame? Eu espero sua resposta.

      A duquesa estava pálida e indecisa e ela finalmente percebeu sua idade. Só os vestígios mais lânguidos da beleza notável dela permaneciam, quando ela lambeu os lábios nervosos e encontrou a expressão cruel do filho dela.

— Eu irei para Norfolk.

      — Bom. — Ele não soltou a mão dela. — Antes de você ir, implore o perdão desta senhora.

      A face da mulher endureceu em abominação, enquanto o choque trovejou por Verity e a deixou estupefata. Uma grande senhora da nata da sociedade se desculpando com uma prostituta? A idéia era inconcebível.

      A duquesa tentou se livrar, mas falhou.

— Condenado, Justin, eu nunca me humilharei a esta meretriz.

      — Você vai, madame. Ou você enfrentará as conseqüências.

      — Esta mulherzinha deveria ser lançada à sarjeta onde ela pertence —, ela estalou. Rastros da confiança anterior dela retornaram. — E não me ameace com prisão em um asilo. Aquele pássaro em particular não voará, senhor. Você não tem sua mãe mais comprometida do que a idéia de nadar até à Irlanda. Termine esta atuação absurda imediatamente e me solte. Eu irei para Norfolk e você tem minha palavra como Duquesa de Kylemore que sua prostituta está segura. Isso é concessão o bastante.

— Nenhum pouco —, ele disse em uma voz que fez Verity estremecer. Ele se virou aos homens a serviço dele que estavam de pé segurando os cúmplices da duquesa. — Duncan, Sir John Firth ainda é o magistrado local?

      — Sim, Sua Graça —, um homem que Verity não conhecia respondeu.

      — Então vá para Claverton Hall e o informe que eu tenho prisioneiros para acusação.

      — Sua Graça. — Duncan baixou a pistola e andou a passos largos para as árvores.

      Verity esperou em silêncio, trêmula, enquanto o suor frio alisava o aperto dela na pistola. Seguramente a duquesa não permitiria o orgulho dela trazer desastre a tudo.

      Mas o orgulho da duquesa era uma força imprevisível e espantosa, como Verity tinha há pouco descoberto nesta estrada.

      Só quando Duncan estava quase fora do alcance da voz a velha mulher cedeu.

— Não! Condenado ao inferno, Justin. Pare. Eu farei isto.— A voz dela era baixa e desigual quando ela fez carranca ao filho dela. — Eu amaldiçôo o dia em que meu útero lhe deu vida.

      Kylemore se curvou ironicamente para ela e com força implacável puxou-a para enfrentar Verity ao redor.

— A vida está cheia de pequenas decepções, madame. Eu assumirei que esta explosão injuriosa seja uma forma de introdução à sua desculpa. — Sem tirar os olhos da mãe, ele convocou Duncan. — Espere um momento.

      A duquesa fitou acima da cabeça de Verity, o rosto dela dissimulado. A voz dela estava baixa com aversão.

— Eu peço perdão pelos danos que fiz a você e aos seus.

      — Talvez novamente com sinceridade —, Kylemore disse de modo lustroso.

      Verity tinha tido bastante.

— Kylemore, você não precisa humilhá-la mais —, ela disse entre duros lábios. — Você ganhou. Ela não vale seu despeito. Deixe-a ir. Ben precisa de um médico.

      Kylemore olhou para baixo à duquesa com repugnância pura.

— Eu me curvo aos desejos desta senhora. Apenas lembre, quando estiver de mau humor em Norfolk, que somente a intervenção de minha amante salvou-a do manicômio. Aquele pensamento deverá azedar, satisfatoriamente, sua existência o bastante.

      Ele se virou aos homens dele quando libertou sua mãe.

— Desarme os criados da duquesa, então os leve a Oban e ache um tabelião. Eu quero declarações juradas sobre o que aconteceu hoje. Então os escolte para Norfolk. Eu escreverei ao meu administrador e ele terá um guarda no lugar, assim que você chegar. —

      A duquesa inalou com um longo assobio.

— Não, eu não agüentarei isto! — Ela apalpou nas saias dela e de repente, a faca prateada brilhou na mão dela. Ela se lançou a Kylemore. — Você não tem nenhum direito para fazer isto, seu bastardo infeliz!

      — Cuidado, Kylemore! Ela está armada! — Verdade gritou, elevando a pistola automaticamente.

      Ele deu um solavanco para além do alcance de sua mãe, então se esticou para contê-la. Ela bateu a mão dele aparte com uma varredura da lâmina, um ato longe de lhe tirar sangue.

      — Condenada, madame! — Ele não tirou o olhar dela. — Você perdeu. Está muito tarde. Você quer realmente ser enforcada?

      — Eu não serei enforcada. Eu voltarei para a vida que eu sempre levei —, ela ofegou, os olhos dela febris na face pálida.

      — Largue a faca, Sua Graça —, Verity disse com uma voz dura. O medo de antes tinha evaporado no momento em que a duquesa ameaçou o homem que amava. — Largue, ou eu juro que atirarei. E se você pensa que eu não sei usar esta arma, você está tristemente enganada. Autodefesa conta entre as artes das cortesãs. — E para provar o que dizia, ela ergueu a arma com a segurança que as lições de Eldreth lhe dera.

      A duquesa fixou um olhar desprezivo em Verity.

— Você não me matará. Você sabe o que aconteceria a você.

      — Talvez eu não me preocupe. Você me ameaçou com tortura e estupro hoje, Sua Graça. E lembre-se, nós temos uma série de testemunhas aqui para jurar que eu só protegia o Duque de Kylemore. Eu duvido que veria o interior de uma cela.

      O olhar fixo da duquesa ardeu com malevolência, quando ela o lançou a Verity.

— Como eu queria tê-la destruído.

      Verity inclinou a cabeça dela em imitação à saudação irônica de Kylemore.

— Eu estou feliz o bastante que não o tenha feito.

      — Sua cadela arrogante! Eu a matarei, antes que você se vanglorie sobre mim!

      A mulher se arremessou para Verity, à faca se elevou. Automaticamente, o dedo de Verity apertou o gatilho.

      Houve uma explosão ensurdecedora. O cheiro acre de pólvora encheu o ar.

      A duquesa gritou e cambaleou para trás no agarre de Kylemore. Ele a segurou na vertical com um braço ao redor da cintura dela, enquanto ele arrancava a faca dos dedos frouxos dela.

      Com as orelhas ressoando, Verity deixou a pistola cair inutilmente ao lado dela.

— Eu a... eu a machuquei? — ela perguntou inseguramente, se sentindo enjoar.

      Ela nunca antes disparara uma arma com raiva, e, porém por muito que a duquesa merecesse sofrer, era difícil aceitar que ela tinha atirado uma bala em outro ser humano.

      — Não, ela está bem. O que ainda é mais deplorável —, Kylemore proferiu de uma inspeção superficial.

      — Graças a Deus —, Verity sussurrou, a vertigem dela retrocedendo.

      — Você atirou em mim, sua mendiga condenada —, a duquesa disse em choque. — Você atirou em mim!

      A frieza sobrenatural de Kylemore voltou quando ele falou com a duquesa.

— Nem mais uma palavra, madame. Suas artimanhas acabaram. Agora saia da minha visão. — Ele olhou para Duncan que tinha se apressado na direção deles quando a arma disparara. — Escolte Sua Graça à carruagem dela e veja se ela fica lá.

      Verity esperou argumentos, ameaças, protestos da duquesa, mas a mulher permaneceu calada. Contra a magreza alta e dominante do filho dela, ela parecia encolhida, como se a derrota de hoje tivesse dissolvido o veneno dela.

      Mas Verity sabia que esta cobra em particular golpearia novamente, se a oportunidade surgisse.

      Enquanto Duncan escoltava a duquesa para o veículo de espera, Kylemore se virou para Verity com preocupação nos olhos.

— Você está bem? — ele perguntou suavemente.

      — Sim —, ela disse, embora o coração dela ainda batesse com a onda repugnante de terror que a tinha varrido quando ela pensara que tinha matado a duquesa. Ela ainda conseguiu fazer um sorriso incerto quando ela passou a arma para ele. — Isto pode estar mais seguro com você.

      Kylemore aceitou sem comentário.

— Hamish e eu acompanharemos você e seu irmão de volta ao Castelo de Kylemore.

      — Obrigado —, ela sussurrou, exausta gratidão para o homem que tinha salvado sua alma. Ela se virou para esconder uma súbita corrente de lágrimas. — Eu tenho que ver meu irmão.

      Ela se forçou da imobilidade trêmula e cruzou para se ajoelhar ao lado de Ben. Ele estava esticado na grama exuberante e um casaco fora dobrado em baixo da cabeça dele.

      — Como ele está, Sr. Macleish? — ela perguntou em uma voz instável. Se o irmão dela morresse por causa do que tinha acontecido hoje, ela nunca se perdoaria.

      — Oh, ele superará. Mas ele estará muito dolorido amanhã.

      A confiança no tom dele garantiu até mais que as palavras dele. Próximo do anoitecer, ela viu que Hamish tinha feito um trabalho maravilhoso de enfaixamento nas feridas de Ben. Ela desejou saber onde ele achara linho, mas ela não perguntou.

      Na face contundida do irmão, um enegrecido olho aberto focalizou-a na luz efêmera.

— Moça Verity —, ele disse indistintamente pela boca inchada.

      Ele estava acordado. Ela não tinha estado segura se ele recuperaria consciência. Ela baixou a cabeça e começou a chorar o alívio opressivo e a culpa amarga em grandes soluços solavancados.

      — Oh, moça! Não fique assim. — A face de Ben contraiu com a dor quando ele lutou para alcançá-la, a fim de confortá-la.

      — Não, não se mova. Eu apenas estou tão contente que você esteja vivo —, ela lamentou, pegando a mão dele cuidadosamente, assim ela não feria as pobres juntas, contundidas dele. — Eu pensei que o tinha perdido.

      — Precisa de um pouco mais de um bando de caras covardes para terminar com Benjamim Ashton. Não chore, moça. Não há porque chorar.

      — Eu sei —, ela disse em um suspiro tempestuoso que produziu mais lágrimas. — Eu não sei o que... o que está errado comigo.

      — Hamish, você vai com Ashton na carruagem deles. — Sem ela notar, Kylemore já estava ao lado dela. — Eu levarei a madame comigo em Tannasg.

      De modo ofuscante, Verity conferiu a estrada rapidamente escurecendo e viu que só eles quatro permaneceram. A duquesa e os homens dela tinham ido, assim como o resto do grupo de Kylemore.

      — Eu preferiria ficar com Bem —, ela disse. Ela não podia arriscar ficar a sós com Kylemore quando a resolução dela em deixá-lo estava tão perto de se rachar.

      Submissa, ela permitiu que a ajudasse a ficar de pé.

— O coche contratado só leva dois, Verity, e alguém precisa tratar dos cavalos. Seu irmão ficará melhor com Hamish, até que chegue ao castelo. Eu me assegurarei de que você nunca fique muito longe. — O tom autoritário dele amoleceu quando ele fez a promessa na última oração.

      — Como desejar —, ela disse estupidamente, também cansada para discutir.

      Entorpecidamente, ela assistiu Kylemore e Hamish erguerem Ben no veículo. Eles tinham sido cuidadosos com o fardo que carregavam, mas a expressão apertada do irmão indicou a dor dele. O sacolejar da carruagem só pioraria seu desconforto, mas eles não tinham escolha.

      Ela se apressou adiante e segurou a mão do irmão novamente.

— Eu o verei no castelo —, ela murmurou. Então olhou para Hamish que tinha escalado sobre o banco ao lado de Ben. — Cuide dele, Sr. Macleish.

      — Sim, minha senhora eu vou. Um dos rapazes foi procurar pelo doutor. Nós teremos o jovem Sr. Ashton de volta, certo como a chuva, num instante.— Hamish pegou as rédeas e clicou a língua para os cavalos.

      — Ele ficará bem. — Kylemore andou para ficar ao lado dela quando a carruagem entrou em movimento. — Não se preocupe, mo gradh.

      O cavalo volumoso dele assomou atrás deles. A besta já não a amedrontava. Comparado às tribulações desta tarde, o medo dela de cavalos parecia infantil, fraco, sem importância.

      Ela esfregou a face com dedos trementes. Malditas lágrimas. Soraya nunca tinha chorado. Verity estes dias parecia fazer só isso.

— Como aconteceu de você estar aqui?

      — Eu prometi a escolta a Whitby. Eu sou um homem de palavra. Eu pretendia seguí-la com uma distância discreta. — A tensão escureceu o tom dele e seu olhar era sério e muito profundo, quando ele a encarou. — Graças a Deus que o fiz. A memória de minha mãe segurando aquela faca na sua face adorável me assombrará para sempre.

      A lembrança das ameaças sujas da duquesa fez o ventre dela se inquietou novamente.

— Depois que ela me cicatrizasse, ela pretendia me entregar aos cúmplices dela para a diversão deles —, ela sussurrou.

      Raiva assassina flamejou nos olhos dele.

— Eu deveria ter matado a cadela—, ele rangeu ferozmente.

      Ela forçou um pouco de força em sua voz.

— Gratamente seu bom senso predominou sobre sua raiva.

      Os lábios dele se viraram para baixo em automenosprezo.

— De uma vez.— Um pouco da intensidade escoaram da expressão dele. — Venha aqui, mo leannan. Sua provação acabou.

      Boba e fraca que ela era, ela não pôde resistir. Ela entregou-se aos braços dele e o mundo se iluminou com calor e segurança. Os anos que se estiravam à frente lhe pareciam vazios e frios, quando vistos do círculo dos braços dele. Porque a perspectiva estava tão deserta, ela ainda forçou novamente as intenções dela em palavras.

— Eu ainda estou te deixando, Kylemore —, ela disse tristemente. — Você tem que fazer sua própria vida. Você tem que se casar e ter as crianças.

      — E você vai fazer o quê? — Ele pausou pensativamente, como se ele considerasse as alternativas disponíveis para ela. — Tomar um protetor novo e esquecer do duque mau que a seqüestrou?

      Como ele podia ser desumano o bastante para escarnecer? Deixá-lo era a coisa mais difícil que ela alguma vez fizera, mais difícil sem dúvida do que virar as costas para sua formação e se vender a Eldreth. Mais difícil que encarar a vingança doentia da duquesa.

      — Eu nunca tomarei outro amante —, ela disse entrecortadamente, enterrando a face dela no casaco dele para esconder as lágrimas frescas.

      — Não, eu não acho que você vá —, ele disse suavemente. — Fique quieta agora. Você está muito cansada para brigar. Eu ganharia muito facilmente. Vamos para casa.

      Ela estava muito deprimida para protestar à palavra — casa.

      O castelo nunca seria a casa dela. Ela não tinha nenhuma casa além do homem que suavemente a erguia sobre Tannasg.

      E aquela casa estava trancada para ela para sempre.

      Kylemore deslizou na sela atrás dela e envolveu os braços com firmeza ao redor da cintura dela. Se ele pudesse apenas segurá-la fortemente assim para sempre... Mas até mesmo quando eles partiram para o castelo, ela sabia que nada tinha mudado.

      Ela ainda era uma prostituta. Ele ainda era um duque.

      E ela ainda tinha que deixá-lo.

 

      Documentos cobriam desordenadamente a escrivaninha de mogno na bela biblioteca de Kylemore. Estava muito tarde, mais de meia-noite, e ele fez uma tentativa sem propósito de separar a correspondência que tinha se acumulado na ausência dele.

      Mas era impossível focalizar cartas ou declarações sobre seus investimentos. Ele ergueu o copo cristalino de uísque, então o repôs, sem experimentar. Ele alcançara um grau de desesperança amarga, além do conforto que um mero licor poderia prover.

      O intestino dele apertou quando recordou a tortura que a mãe dele planejara para Verity aquele dia. A duquesa sempre tinha sido egoísta e destrutiva, mas o mal dela tinha se inflamado incontrolavelmente e alcançou um cume de vício, que até mesmo ele não tinha reconhecido.

      Margaret Kinmurrie tivera sorte por ele não ter atirado nela como se esta fosse um cachorro enraivecido.

      Ele não estava seguro por que não o fizera. A raiva e o medo que o tragaram naquele solitário pedaço de estrada, ainda martelavam como selvagens trovões pelas veias dele.

      E se ele tivesse chegado muito atrasado? A mão dele apertou, as juntas embranqueceram, o copo.

      E se ele tivesse consentido aos desejos de Verity e não a tivesse seguido?

      Não, ele nunca teria aceitado isso. Ele tinha jurado que nenhum dano ocorreria a ela. Ele tinha jurado em sua alma negra.

      Ainda assim poucas horas depois dela deixar os cuidados dele, ela encarou deformação e estupro, até mesmo a morte.

Ele nunca perdoaria a mãe dele. Ou a si próprio.

      Atormentava-o pensar que a duquesa estava afastada na casa adorável de viúva. Ela estaria perfeitamente confortável lá, embora ela considerasse os ambientes bárbaros.

      Ele poderia tirar um pouco de satisfação ao contemplar como ela se irritaria em sua quarentena dos centros de poder. Ela poderia foder por horas com quantos criados robustos ela quisesse, mas nada compensaria a perda de influência.

      Ele suspirou pesadamente e deixou outra carta que implorava por um pouco do patronato dele não lida na escrivaninha. Terrível como os eventos do dia tinham sido, eles não eram o que o mantinha aqui, sem sono e sofrendo.

      A miséria boba que o roia esta noite, se originava de um velho sofrimento. Velho sofrimento, tão afiado e fresco quanto quando a amante dele o tinha abandonado tantos meses atrás em Kensington.

      Na ocasião, ele tinha culpado o frenesi furioso dele em orgulho e luxúria.

      Agora ele sabia. Verity tinha infligido uma ferida mortal nele aquele dia.

      Durante as últimas semanas, ele tinha acreditado tolamente que a ferida tinha começado a curar. Mas o idílio momentâneo deles no vale só tinha afiado sua presente angústia.

      Ela tinha mergulhado uma lâmina no coração dele, retirado-a, e então empurrado novamente para dentro, mais fundo e mais forte.

      Estupidamente, ele olhou para o triunfo romano esculpido ao redor de Adão na cornija de lareira. Moças dançantes em túnicas fazendo redemoinhos levavam um touro adornado para ser sacrificado no pequeno templo delicado no distante canto direito.

      Como sutilmente ele invejou a ignorância da besta bruta. Como ele desejou que ele enfrentasse o destino dele com semelhante tranqüilidade. Mas ele compreendia cada parte da miséria que o esperava.

      Perder Verity era atormentador agora, mas com o passar dos estéreis e longos anos, a dor ficaria mais e mais pesada, esmagando lentamente a vida dele.

      Ela o consignou a uma morte lenta, agonizante com a ausência dela. Um castigo apropriado para o que ele fizera a ela.

      — Maldição que tudo vá para inferno —, ele gemeu e enterrou a cabeça dele nas mãos.

      Ele não podia viver sem ela.

      Ele tinha que viver sem ela. E ele não tinha nenhuma idéia de como ele poderia fazer isto.

      — Maldição que tudo vá para o maldito inferno.

      Em um excesso de sentimentos, ele arremessou o braço dele e fez tudo que estava na escrivaninha voar. O copo delicado de uísque pousou com força contra a lareira de mármore e quebrou em fragmentos.

      — Sua Graça? — Verity pairou na entrada ante ele, como se a imaginação dele a tivesse chamado.

      Ele se levantou e a encarou com desejo desamparado. Esfomeadamente, ele observou demoradamente cada detalhe dela. Ele reconhecia o vestido de flores rosa do vale. Ela tinha laçado o cabelo atrás em um nó solto, revelando a forma perfeita da mandíbula e do pescoço. As mãos dela estavam enfaixadas e a garganta esbelta estava contundida. Na face pálida, o corte de faca se salientava como uma linha vermelha. A raiva e a culpa surgiram novamente à lembrança do que ela tinha agüentado por causa dele.

      — Verity?

      Suavemente, ela fechou as portas elaboradamente esculpidas atrás dela, mas não se arriscou a entrar mais no quarto. As mãos dela entrelaçadas juntas nervosamente na altura da cintura.

      O gesto perfurou se íntimo. Seguramente ela sabia que não precisava mais ter nenhum medo dele.

      — Eu pensei que você estivesse adormecida. Você estava exausta.— A luta por controle fez a voz dele soar insípida.

      Como ele às vezes sentia falta do homem que tinha sido. Aquele homem a teria animado a servir os prazeres dele, sem nem pensar se era certo ou se ela queria. Aquele homem a tomaria e a manteria e nunca a deixaria ir.

      — Eu tenho cuidado de Ben. O doutor disse que ele pode viajar amanhã, se nós formos lentamente e acharmos um transporte apropriado.

      — Fique aqui, até que ele esteja recuperado.

      Fique aqui para sempre.

      Mas ela já estava balançando a cabeça dela. As puras linhas da face dela se fixaram com determinação.

— Kylemore, eu tenho que partir. Nada mudou entre nós.

      — Não, nada mudou.— As palavras mais tristes do idioma. Ele quis discutir, contestar, insistir que esperasse, mas qualquer prorrogação apenas adiava o inevitável. — Leve uma das minhas carruagens assim vocês viajarão com conforto.

      Ela dobrou a cabeça em reconhecimento.

— Obrigada.

      Surpreendido ao consentimento ligeiro dela, ele assistiu como ela chegava mais perto da luz. O brilho iluminou marcas de cansaço e infelicidade sob os olhos translúcidos dela.

      Cortou-lhe o coração vê-la parecer tão derrotada. O olhar dele focalizou a bochecha dela, onde alguns cachos escaparam do penteado simples.

      — Seu rosto dói? — ele perguntou em preocupação. — Cristo! Eu deveria ter estado lá para impedir que acontecesse qualquer coisa com você.

      Ela sorriu com uma ponta de ironia. Por um momento, o conhecimento de Soraya, o fantasma sofisticado andou sem destino. Então ela se foi.

      — Dado o que você preveniu, eu penso que posso conseguir perdoar. É só um arranhão. Poderia ter sido muito pior.

      Ela andou até a parede e passou a mão ao longo do topo de alabastro de uma mesa auxiliar. Quando ela elevou os olhos, eles estavam sombrios. Ela tinha estado pálida quando entrara no quarto; agora todo rastro de cor de sua face tinha escoado, deixando-a branco como pergaminho novo.

      — Eu vim dizer adeus —, ela disse suavemente, mas implacavelmente.

      Em uma batida do coração, ele circulou a escrivaninha para a alcançar. Então ele se lembrou que já não tinha o direito de tocá-la.

      — Oh, mo leannan —, ele disse grosseiramente, embora ele soube que não alcançaria nada. — Não faça isto.

      — Eu tenho. — Então, com esforço visível, ela adicionou, — Acabou e eu devo ir. Que os céus o abençoe, Sua Graça.

      O coração dele carregado com desespero a observou partir de novo. Ela endireitou as costas, como se ela se preparasse para enfrentar um inimigo invencível.

      Era um ato de galantaria. Era um ato de graça excitante. Quando ela caminhou para fora, ele não teve nenhuma dificuldade em se lembrar de que essa mulher outrora tivera o mundo como seu servo.

      Na luz de vela bruxuleante, ele viu que o controle dela não era tão completo quanto ela queria que ele pensasse. A mão que ela estendeu ao trinco tremeu como se ela estivesse com febre.

      — Covarde —, ele disse suavemente, mas bastante claro atrás dela.

      Por um momento, ele pensou que ela não tinha ouvido.

      Então ela curvou a cabeça, revelando a nuca vulnerável debaixo do cabelo densamente amontoado. A garganta dele fechou com aflição enquanto esperava que ela abrisse a porta e partisse.

      Este foi o último jogo arriscado desesperado para mantê-la. Ele não tinha nenhuma expectativa de vencer.

      — Do que você me chamou? — ela perguntou inseguramente.

      Ele se apoiou na escrivaninha e se suportou com as mãos.

— Eu a chamei de covarde —, ele disse implacavelmente. — Meu Deus, você era mais valente aos quinze.

      — Aos quinze, eu não tive nenhuma escolha —, ela sufocou, ainda sem estar em frente a ele.

      — Sim, você tinha. Sempre há uma escolha. E daquela escolha, você teve a coragem e a inteligência para criar algo maravilhoso. De freqüentadora de rústicas capelas para cortesã mais famosa da Europa? Eu estou assombrado.

      Os ombros elegantes dela enrijeceram sob do ataque dele, mas misericordiosamente, ela não fugiu.

      — Eu lhe falei por que eu faço isto. É por você —, ela disse em uma baixa voz.

      — Bobagem. Você está fazendo isto porque você tem medo. — O tom dele perdeu alguma de sua aspereza. — Você me ama, Verity?

      Ela girou à pergunta. Se ele não estivesse lutando por sua própria vida, ele já teria cedido. Sofrimento calado estava cauterizado profundamente na face adorável dela.

      — Isso não é justo —, ela protestou em uma voz trêmula.

      Não, não era justo. Mas se ele tivesse, ele jogaria sujo para ganhar o prêmio dele. Ele faria qualquer coisa se significasse que ela ficaria.

      Na verdade, quando ele olhou nos olhos dela, teve a resposta à pergunta.

      Mas ele continuou desumanamente.

— Você me deu tanto: seu corpo, sua confiança, seu conforto, sua absolvição, tantos de seus segredos. Ainda assim isso é algo que você nunca disse.

      Braços estendido contra a marchetaria incrustada, ela se apertou contra a porta. No vestido esvoaçante rosa, ela parecia com uma borboleta apanhada. Ele abafou outra onda de compaixão.

      — Você também nunca me disse que me amava —, ela desafiou.

      Ele encolheu os ombros.

      — Eu te amo —, ele disse.

      Emergiu com tal naturalidade que até mesmo ele não tinha esperado.

      Por um momento, os olhos cinzas dela brilharam com luz quando descansaram nele. Tão simples – e tão significativo – o ato de confessar seu amor venceria a batalha para ele finalmente?

      Mas claro, não era tão rápido.

      Ela balançou a cabeça e olhou além.

— Amor não é o bastante.

      — Maldição, é muito. Você me ama, Verity?

      Ela fez um gesto desamparado que rasgou o coração dele, mas ele se lembrou que ele devia ser impiedoso. Pelo bem dos dois.

      — Você deve saber que sim —, ela admitiu tristemente.

      Até um momento atrás, ele nunca tinha estado seguro.

      Ela me ama, ela me ama, o coração dele cantou em triunfo. Certamente agora ele não poderia perdê-la.

      Ele lutou para esconder o triunfo germinando. Ele ainda não tinha ganhado.

— Eu sei que você está abominavelmente pronto para se sacrificar pelas pessoas que ama. Mas neste caso em particular, você está desencaminhada.

      Ele respirou profundamente e lutou para dizer às palavras que a persuadiriam a ficar.

— E se você tiver que se sacrificar, faça isso se casando comigo. Eu não sou um homem fácil. Você ganhará sua coroa de mártir, antes que tenha acabado. Não condene nós dois a uma eternidade de infelicidade, só porque você é muito teimosa para enfrentar a censura de sociedade.

      — Você me faz soar tão insignificante —, ela se opôs furiosamente. — Mas eu sei quão altamente você avalia seu prestígio. E você sempre teve seu próprio orgulho de Lúcifer. Você fala ligeiramente do que perderia se você se casasse comigo. Mas a censura da sociedade é mais cruel do que você imagina. Você nunca teve que sofrer por ostracismo. Eu sim.

      — Eu posso viver com fofoca e insinuação. Eu não posso viver sem você —, ele disse pesadamente.

      O que ela disse sobre sua vaidade e seu superficial interesse por assuntos mundanos era verdade. Ou tinha sido outrora.

      Mas comparado à perspectiva de perder a preciosa mulher que aqui estava, nada mais significava.

      A face dela se contraiu com desordem.

— Você é igual ao Diabo. — Quando se virou, ela soou como se não estivesse longe de chorar. — Você diz coisas atrativas e me tenta ao que eu sei está errado.

      Ele se menosprezou por feri-la deste modo, mas teve que perseverar na desumanidade dele ou os dois estariam perdidos.

      — Case-se comigo, torne-se minha duquesa. O que importa para qualquer um? Nós podemos montar uma casa nas Highlands, longe dos rumores e da desaprovação do mundo. Nós criaremos uma vida que será rica, comprida e útil. E baseada no amor.

      Os olhos que ela lançou-lhe eram escuros e tão atormentados, que a alma dele torceu em agonia culpada.

— Pare com isto, Kylemore. Você é um duque. Você deve uma obrigação ao seu título.

      Ele carranqueou com uma raiva súbita. Toda sua vida, o título dele tinha sido uma maldição e um fardo. Agora sua posição poderia privá-lo da única coisa que ele alguma vez quisera.

      — O meu dever para comigo? E quanto ao seu dever? — ele perguntou ferozmente.

      Ele se levantou e andou um passo em direção a ela. A voz dele ficou profunda e seguramente sua raiva breve retrocedeu ante a angústia na face dela.

— Você me resgatou, Verity. Você me fez um homem melhor, criou honra onde não havia nenhuma.

      — Sempre houve honra —, ela sussurrou, enquanto lágrimas inundavam seus belos olhos, fazendo-os brilhar deslumbrantemente prateados.

      — Se havia, só você poderia ter achado isto. Você não pode deixar a tarefa inacabada. — Ele esticou as mãos em atração. — Não me exile para me tornar o Duque de Kylemore mau novamente. Agora que você começou o processo, é seu dever cristão terminar de me arrastar para a luz.

      — Pare com isto —, ela protestou entrecortadamente. — É cruel. Você sabe que só um arranjo ilícito é possível entre nós. E eu não posso ser sua amante depois que você se casar, Kylemore. Eu cometi muitos pecados, mas eu não cometerei esse.

      — Se eu não me casar com você, eu nunca me casarei —, ele disse calmamente. — Não existirão mais Kinmurries depois de mim. O título morre quando eu morrer.

      — Por favor, não diga isso —, ela implorou, vacilando. — Você tem que ter um herdeiro para tomar seu lugar de direito no mundo. Até mesmo, se nós nos casarmos e, por um milagre eu engravidasse, nossas crianças nunca seriam aceitadas.

      — Nossas crianças serão bonitas, como a mãe delas. E forte o bastante para combater ao seu próprio modo. Você não pode culpá-los pela obstinação deles.

      A última vez que ele mencionara um bebê, ela tinha tido certeza que nunca poderia conceber. Ela soou menos certa agora, ele notou. Inconscientemente, a mão dela vagueou ao diafragma, como se ela já levasse a criança dele.

      Talvez ela já a tivesse.

      Ele combateu os desejos primitivos que o pensamento despertou e se esforçou para manter um tom razoável. Tirania e força bruta nunca a balançariam. Ele só ganharia seu consentimento, quando ela reconhecesse que nenhum deles tinha o poder ou o direito de negar o que o amor exigia.

      — De qualquer maneira, eu estou segura de que sou estéril —, ela disse amargamente.

      — Se isso for verdade, então será somente o duque louco e a esposa primorosa dele a sós no ninho das Highlands. — Ele deu outro passo para ela. Ela poderia correr, mas ele duvidava disto. — Você diz que a sociedade ridicularizará. Eu acredito que você está errada. Todos os homens, pelo menos da alta classe, invejarão minha boa fortuna.

      Ele injetou cada gota de sinceridade séria que ele podia reunir na voz.

— Verity, seja valente mais uma vez. Seja valente para nós dois. Eu a amo. Seguramente isso vale mais que o desprezo do mundo.

      — Não me toque. — Ela recuou, embora ele tivesse parado a vários pés de distância. — Quando você me toca, eu não consigo pensar.

      Pela primeira vez, ele sorriu.

— Eu sei. Você tem que alcançar esta decisão por conta própria. Veja a aflição em que você me deixou quando suplicou pela honra da minha alma.

Ela não sorriu de volta. Ao contrário, a face dela estava fechada com miséria.

      — Seria tão fácil de dizer sim —, ela disse desoladamente.

      — Então diga que sim —, ele persuadiu, furtivamente mais próximo. — Nós temos trabalho a fazer para consertar o dano que minha mãe forjou em minhas propriedades. Nós temos amor para compartilhar. Nós temos, com a vontade de Deus, crianças para criar e escolher o caminho delas. Como o pai delas escolhe o próprio caminho dele. Como fará a mãe delas.

      Ele pausou, mas ela não falou. Assim, ele investiu com toda a certeza desesperada que ele sentia.

      Ele estava tão seguro. Por que diabos ela não estava? Ele atraiu uma respiração tremente.

— Seja valente, Verity, por elas, por mim. Acima de tudo, por você. — Então, em uma baixa e intensa voz, — Não me deixe, mo cridhe. Feri-me o coração pensar que está me deixando.

      Ele estirou a mão. A humilhação dele tremeu. Mas o que significava o orgulho dele agora?

      Ela olhou, lutando contra as lágrimas. Freneticamente, ele procurou na mente qualquer outra coisa a dizer, algo que a convenceria a ficar.

      Mas palavras provaram ser uma arma delicada contra a vontade dela. Ao invés, ele estava de pé, aflito, em agonia, lutando em não aceitar que ele tinha falhado.

      — Oh, inferno —, ele gemeu e desviou. Ele não podia vê-la partir novamente. E desta vez, seria para sempre.

      Toda sua esperança se esvaiu. Ele a tinha perdido.

O silêncio entre eles se esticou infinitamente.

      A respiração dele parou quando ouviu a porta se abrindo. Quando fechasse, fecharia com toda sua felicidade. Ele parou para ouvir o passo macio dela se enfraquecer na distância, enquanto ela o abandonava à desolação.

      Porém ela ainda não se movera.

O que ela estava esperando? As mãos dele se apertaram em punhos ao lado.

      Ele se ajoelharia e imploraria, se achasse que isso serviria para algo bom, mas ele sabia em seu coração que nenhum argumento a faria mudar de idéia.

      Ele não duvidava agora que ela o amasse. A tragédia era que ela apenas não o amava o bastante.

      — Não. — A voz dela rachou na palavra.

      Claro que era isso que ela diria. Infernos, ela não tinha tentado escapar dele desde a primeira vez que ele a vira?

      Ela o tinha jogado de volta ao seu gelo perpétuo. Ele supôs que deveria se acostumar com isto, mas por um segundo, o amor tinha acenado com falsas promessas de vida e calor. Agora o destino dele era impossível agüentar.

      Com uma crepitação macia, um tronco esmigalhou as cinzas quentes na grelha. O som o esporeou a se movimentar, qualquer coisa para quebrar este êxtase agonizante.

      — Que os céus a protejam também —, ele disse roucamente, tentando achar seu caminho de volta para a escrivaninha.

      — Não —, ela disse mais forte. — Não vá.

      Ele a sentiu apalpar a manga dele como um mendigo inoportuno. Ele parou em trêmula confusão.

      O toque dela o queimou como fogo pelo fino casaco dele. Seu calor era contraditório à morte crescente e fria que se movia lentamente por ele.

      — Você realmente me ama, Kylemore? — ela sussurrou.

      Por que ela o torturava assim? Ela tinha que ver a miséria opressiva dele.

      Vergonhosamente, a voz dele quebrou quando respondeu.

— Eu morro de amor por você, mo leannan.

      A mão dela apertou-lhe o braço.

— Então que Deus me ajude. Que Deus nos ajude —, ela disse roucamente. — Mas, sim, eu serei sua duquesa.

      O que ele ouvira não fazia nenhum sentido.

      — O que você disse? — A pergunta dele emergiu de forma rouca e confusa.

      Ele a ouviu respirar profundamente antes de falar.

— Eu amo você, Justin Kinmurrie e me casarei com você —, ela disse claramente.

      Por Deus, isto não pode ser verdade. Ele tinha ganhado, afinal de contas?

      Ele se virou e agarrou os ombros dela severamente, porque naquele limite, a bondade estava além dele.

— Diga novamente.

      Lágrimas brilhavam nas bochechas dela, mas o olhar que encontrou era de certeza.

— Eu me casarei com você.

      A força pugilista do aperto dele se aliviou.

— E o resto.

— Justin Kinmurrie, eu o amo. — Ela deu uma risada quebrada que soou estranha como um lamento. — Eu o amo e fixarei residência em seu país bárbaro e, se eu puder, eu lhe darei um bando de pirralhos Highlands selvagens para atormentá-lo, até que fique velho. E se isso não o aterrorizar, quer dizer que você é tão valente a ponto do descuido.

      Ela tentou fazê-lo sorrir. Mas ele estava além da leviandade.

      — Oh, Verity —, ele raspou enquanto a tomava nos braços. Ela deu um soluço surdo contra o ombro dele e se agarrou a ele com a mesmo possessividade.

      Eventualmente, ele ergueu a cabeça e olhou a face dela. Nenhum rastro da mulher pálida e infeliz que tinha vindo mais cedo a ele. Com uma pele corada e sem defeitos, os olhos prateados dela arderam com alegria incandescente, até mesmo pelas lágrimas que escorriam por seu rosto.

      A beleza dela o prendera e segurara desde o princípio. Mas agora ele via muito mais. Força. Honestidade. Lealdade. Confiança.

      E amor. Tanto amor baniu o frio da alma dele para sempre.

      — Eu pensei que a tinha perdido —, ele disse numa voz emocionada. — Eu pensei que você ia me deixar.

      — Nunca —, ela disse fervorosamente. — Nunca. Nunca.

      Ela puxou a cabeça dele até a sua para um beijo desajeitado, apaixonado que continha lamento e felicidade. Quando ela se afastou, ele pegou a face dela nas mãos e olhou fixamente nos olhos claros cinzentos.

      Finalmente, nenhuma sombra espreitava nessas profundidades brilhantes.

      A paixão acenou, como sempre acenava, quando ele estava com ela. Mas no momento, ele resistiu aos seus desejos.

— Eu juro que a farei feliz, Verity —, ele disse gravemente.

      A face dela se encheu de um amor tão poderoso que o atingiu.

— Apenas me ame, Justin.

      — Sempre —, ele jurou.

      — Sim, sempre.

      E ele o fez.

 

                                                                                Anna Campbel  

 

                      

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