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"Não te disse que ele apareceria?" Matthew disse.
Sr. Vaughn pegou no bolso uma moeda e a lançou em direção a Matthew que a pegou. Matthew piscou para Sam. "Ele apostou comigo uma moeda que você não viria." Ela não entendeu por qual motivo a piscada dele fez com que ela sentisse como se eles estivessem compartilhando um segredo muito íntimo ou por que ela tinha achado a leve curva dos lábios dele intrigante. Ele não estava olhando para ela do mesmo modo que um garoto olha para uma garota na qual tem interesse. Mas ela, de repente, percebeu que poderia estar olhando fixamente para ele como uma garota faria... porque ela pôde perceber com uma claridade surpreendente que Matthew Hart era tão bonito quanto o pecado.
CAPÍTULO UM
Faithful, Texas - 1866
PROCURA-SE! GAROTOS DE QUATORZE ANOS OU MAIS PARA CONDUZIR GADO PARA SEDÁLIA, MISSOURI. SERÃO PAGOS US$100 NO FIM DA VIAGEM.
SE INTERESSADO, VER O CHEFE da TRILHA ÀS 7H DA MANHÃ, EM FRENTE AO ARMAZÉM GERAL.
Com seu coração aos pulos, Samantha Reynolds lê o anúncio que alguém colocou no muro do armazém geral. Cem dólares pareciam uma fortuna. O que ela não daria para ser um garoto, pois assim poderia ter
a oportunidade de ganhar aquele dinheiro para sua família! Aos dezesseis anos, ela mal podia se lembrar da última vez em que as moedas tinham tilintado nos seus dedos. Sr. Thomas, o dono do armazém geral,
permitiu que sua família comprasse a fiado. Ele mantinha uma grande quantidade de provisões e anotava os débitos. Samantha não queria pensar no enorme tamanho em que estava se tornando seu caderno de débito.
Já fazia meses que sua mãe não conseguia dar nenhum dinheiro ao Sr. Thomas. Neste exato momento seu irmão mais velho, Benjamin, estava colocando suas compras mais recentes na carroça. Com vinte anos, ele
era velho o suficiente para ser contratado para conduzir o gado. Mas ela sabia que seria quase impossível convencê-lo a ir. Desde que ele tinha retornado da guerra que tinha devastado muitos dos estados
do sul, ele estava relutante em fazer qualquer coisa que o levasse para longe de sua fazenda.
Sua irmã Amy tinha quatorze anos, tinha idade suficiente também. Mas, assim como Samantha, ela não era um garoto. Seu irmão mais jovem, Nate, tinha apenas doze. Não estava qualificado. Samantha pensou
no tecido que tinha visto dentro da loja. Ela queria costurar um vestido novo mas o material era caro. Ela estava perdendo tempo desejando o tecido e querendo qualquer uma das outras roupas elegantes que
o armazém geral estava aos poucos começando a estocar, agora que a guerra tinha terminado.
Ainda assim, ela desejava coisas. Ela queria a mesma vida que tinha antes da Guerra contra a Agressão do Norte, como a maioria do povo nestas bandas chamava. Ela desejava que as pessoas começassem a
rir novamente. Ou, mesmo que elas não pudessem rir, que pelo menos sorrissem de vez em quando. Cem dólares não fariam a vida voltar a ser do jeito que era antes, mas pelo menos compraria vários tecidos,
comidas enlatadas que durariam o inverno, uma nova enxada, algumas galinhas, uma vaca e muitas outras coisas importantes. Ela ficava atordoada com as possibilidades que passavam por sua mente.
- Eu acho que a gente devia ter uma dança da primavera. - A menina de pé ao lado dela disse.
Perdida em pensamentos, Samantha quase esqueceu que Mary Margaret Anderson tinha vindo com ela. Elas sempre foram às eternas melhores amigas. Elas se sentavam uma ao lado da outra na casa-escola de apenas
uma sala até que, aos quatorze anos, elas passaram pelo exame que dizia que elas sabiam tudo que o tinha para saber. Elas compartilhavam confidências e sonhos.
- Nós finalmente temos alguns violinistas na área e a maior parte dos garotos aprendeu a tocar gaita enquanto estava fora - Mary Margaret acrescentou.
- Você ao menos sabe dançar? - Samantha perguntou distraidamente, mais interessada no anúncio do que em dançar. Se ela olhasse fixamente para ele, talvez as palavras mudassem e passassem a incluir meninas.
- Esse não é o problema, Samantha Jane, eu posso aprender. - Mary Margaret disse a ela. - Assim como você.
- Por que eu ia querer aprender a dançar?
- Porque nós estamos crescendo! - Mary Margaret deixou claro.
Samantha sabia que deveria estar excitada com a possibilidade de participar de uma dança, mas ela tinha pouquíssimo interesse em garotos. Ela se lembrou de um tempo quando corria com eles, subia em árvores
com eles, até em algumas ocasiões em que tinha lutado com eles, mas isso tinha sido há anos atrás.
Antes da maior parte dos garotos na área se alistarem no exército quando se tornaram velhos o suficiente para bater um tambor.
Ela se tornou uma jovem mulher sem homens ao redor para conversar, com exceção daqueles que eram muito velhos para lutar ou aqueles que eram muito jovens para segurar uma arma. Ela não tinha experimentado
nenhuma dança nos piqueniques aos domingos ou ficado olhando de rabo de olho para algum garoto jovem através da sala de aula. A guerra os levou da sala de aula e os colocou nos campos de batalha.
Embora muitos tenham retornado para casa, nenhum deles atendia aos seus caprichos. Mary Margaret constantemente falava sobre garotos. De como Jeremy era bonito, ou como eram lindos os de Luke.
Se tiverem algo que Samantha notava nos garotos, era se eles pareciam fortes, mentalmente calculando quantos acres de terra eles podiam arar em um dia. Ela certamente não desejava nenhum deles pisando
em seus dedos enquanto eles dançassem.
Ela não queria falar sobre os garotos locais ou a possibilidade de uma dança. Ela preferia falar sobre meios de aliviar o fardo da sua mãe, mas quando Mary Margaret botava uma coisa na cabeça, só falava
disso.
- Você acha que o Benjamin me chamaria para dançar? - Mary Margaret perguntou.
Samantha virou-se bruscamente para Mary Margaret. Agora ela tinha sua completa atenção.
- O Benjamin?
Ela ficou surpresa em ver um tom vermelho aparecer nas bochechas de Mary Margaret.
- Eu acho que seu irmão tem boa aparência. - Mary Margaret admitiu.
- Ele te atrai? - Samantha perguntou.
Ela nunca pensou que seu irmão atraía a atenção das garotas muito menos de Mary Margaret.
- Sim, ele me atrai. Mas isso não quer dizer nada. Até onde eu sei, eu sou invisível para ele.
A frustração estava visível através do som das palavras.
- Benjamin não está notando nada nesses últimos dias. - Samantha disse amavelmente.
Benjamin tinha retornado da guerra sem um braço. Ela não o culpava por ele se ressentir da perda, mas parecia que a raiva que ele sentia o machucava mais do que qualquer outra coisa tinha machucado.
- Ele ainda está se ajustando ao fato de não ter voltado para casa inteiro.
- Muitos rapazes perderam partes do corpo. - Mary Margaret disse. - Mesmo assim, Benjamin ainda é forte.
- Ele precisa de algo que o ajude a trazer sua confiança de volta. - Samantha refletiu.
Ela tocou no anúncio.
- Eu queria fazê-lo pensar sobre isto.
Mary Margaret deu uma olhada no anúncio.
- Quanto tempo leva para transportar o gado daqui para Sedália?
- Alguns meses, eu acho. - Samantha disse em voz baixa.
- Então eu desejo que ele não faça isto. Ele ficaria longe de mim, e ele já se foi por tempo suficiente.
- Mas cem dólares. - Samantha disse melancolicamente. - Nós podíamos fazer muitas coisas com aquele dinheiro. Eu iria se pudesse.
Os olhos de Mary Margaret se arregalaram.
- Estão pedindo garotos. Não garotas.
- O que não é justo - Samantha disse a ela. - Eu sou tão capaz quanto qualquer rapaz.
- Samantha Jane! - Benjamin gritou. - A carroça está carregada. Vamos.
Samantha tirou os olhos do anúncio.
- Benjamin, você viu isto?
Vestindo sua carranca habitual, o irmão mais velho veio andado pesadamente.
- Oi, Benjamin. - Mary Margaret disse recatadamente.
Samantha nunca tinha visto sua amiga piscar os olhos tão rapidamente.
- Tem algo no seu olho? - Benjamin perguntou.
Mary Margaret piscou novamente.
- Não.
Samantha sentiu uma pontada por sua amiga. Por que Benjamin não podia notar Mary Margaret do jeito que ela queria ser notada? Ela se perguntava se teria tanta dificuldade em conseguir a atenção de um
homem que a atraísse.
Fazendo beicinho, Mary Margaret disse.
- Acho que vou ver se meu pai está pronto para ir.
Mary Margaret desapareceu no armazém geral.
- Você podia ter sido gentil com ela, Benjamin. - Samantha ralhou.
- Eu mostrei preocupação com os olhos dela. Se ela não tinha algo neles, qual era o problema? Ela desenvolveu um tique nervoso durante a guerra?
Ela não sabia se ria ou se lamentava. Ela estava com muita pena de Mary Margaret por ela estar de olho no Benjamin.
- Ela estava te paquerando.
Ele enrugou a testa.
- Paquerando? A mim?
- Tem algum outro homem aqui?
- Por que eu?
- Porque ela não tem nenhum um pouco de bom senso, - Samantha disse enquanto suspirava.
Ela bateu no anúncio da parede, chamando a atenção dele para o motivo pelo qual ela o tinha chamado.
- Você viu isso?
Ela esperou impacientemente enquanto ele lia o anúncio, então ela disse sem pensar.
- Você pode fazer isto, Benjamin - pega suas coisas e vai conduzir o gado.
- Eles precisam de homens com dois braços. - ele murmurou e se virou. - Vamos.
A decepção girava na mente dela, deu ainda uma última longa olhada no anúncio. Por que ela não podia ter nascido um garoto?
- Samantha Jane! - Benjamin ralhou. - Pare de viajar!
Ela correu para a carroça e subiu no assento ao lado do irmão. Deslizando o gorro pela cabeça, ela empurrou as tiras formando um arco em baixo do queixo. Por que ele não considera a possibilidade de
que pode fazer isto? Se ela não fosse uma garota, assinaria num piscar de olhos. Que droga, ela já estaria esperando na fila. Com um estalido rápido do pulso, Benjamin colocou os cavalos e a carroça em
movimento.
Ela ficou apavorada com o fato de que Benjamin talvez não retornasse da guerra e, de certa forma, ele não voltou. O reservado jovem sentando ao seu lado, a deixava desnorteada. Ele parecia não se importar
com nada nem com ninguém. Ele recebeu uma ferida muito grande em Shiloh. Ele perdeu o braço durante uma batalha da qual ele nem conseguia falar. Mas era saudável e forte e trabalhar conduzindo o gado traria
muito mais dinheiro para eles do que as colheitas.
Ela olhou por cima do ombro a quantidade pequena de suprimentos que o Sr. Thomas tinha permitido que eles comprassem a fiado hoje. Farinha. Açúcar. Nada além do essencial. Ela não se considerava avarenta,
mas não era difícil perceber que todo seu trabalho duro nunca dava a eles suficiente para algo extra. E o que eles fariam quando Sr. Thomas ficasse cansado de deixá-los levar as coisas para pagar depois?
- Eu achava que os caubóis apenas montavam cavalos e mantinham o gado marchando em linha reta. - ela disse em voz baixa enquanto eles passavam em frente ao banco. Era o único prédio de tijolo construído
na cidade.
- Normalmente. A menos que haja um estouro, uma inundação, ou que o gado esteja agitado. Um homem precisa ter dois bons braços. Isto é necessário. - ele disse.
- Você não podia pelo menos tentar? - Ela perguntou.
- Não.
Ela pensou nas linhas de preocupação no rosto de sua mãe. Linhas que tinham ficado mais profundas desde que seu pai tinha ficado doente e morrido de pneumonia três anos antes. Por que a vida tinha que
ser tão dura? Por que ela não podia ter nascido um garoto?
Mais tarde naquela noite Samantha se sentou na cama ao lado de sua irmã mais nova. Amy adormeceu logo depois de Samantha ter apagado a chama da vela. Mas o sono não estava vindo com facilidade para Samantha.
Olhando fixamente através da janela para as estrelas que reluziam no céu da meia-noite, Samantha tentava achar uma estrela cadente para que assim pudesse fazer um desejo. Um desejo de tempos melhores.
Um desejo para que sua mãe não parecesse tão cansada. Para que os círculos escuros em baixo de seus olhos desaparecessem. Para que suas rugas de preocupação não fossem tão profundas. Que Benjamin não
fosse tão infeliz. Que ele percebesse que estava vivo, e que só isso, já era motivo suficiente para se alegrar. Que ele pudesse entender o porquê de Mary Margaret querer sua atenção.
Para todos esses desejos, ela precisava de mais do que uma estrela cadente. Ela desejava que Amy pudesse ter um vestido novo em vez de sempre ter que usar um vestido gasto que tinha sido de Samantha.
Ela desejava que seu irmão mais jovem, Nate, não tivesse que deixar a mesa faminto. Aos doze anos, ele estava entrando em fase de crescimento. A mãe deles vivia dizendo que ele deveria ter um buraco
no estômago porque ele comia muito e continuava faminto. Samantha tinha notado que a mãe deles ultimamente não estava comendo muito. Ela tinha começado a dar a maior parte de sua comida para Nate. Samantha
tinha começado então a fazer a mesma coisa. Agora mesmo, as colheitas eram abundantes, mas o que eles fariam quando o inverno chegasse? Eles teriam o suficiente para se manter?
Ela simplesmente não conseguia parar de pensar nos promissores cem dólares. Se Nate fosse um pouco mais velho, ele provavelmente iria conduzir o gado. Ela se perguntou se sua mãe mentiria a idade do
irmão para que ele pudesse ir. Uma mentira parecia algo tão pequeno comparado a tudo que eles poderiam ganhar. Nate sairia daqui com bolsos vazios e voltaria com eles cheios de moedas tilintando. Nesse
caso, uma mentira seria assim tão terrível?
Eles conseguiriam saldar a dívida com o armazém geral. Eles poderiam estocar latas de comida e lenha para todo o inverno. Talvez eles pudessem até comprar uma nova vaca leiteira. A velha Bess estava
realmente envelhecendo. Mas Samantha não conseguia imaginar sua mãe dizendo uma mentira-ou deixando Nate ir sozinho. Ele era seu bebê, afinal.Samantha suspirou tristemente. "Eu tenho idade suficiente e
não tenho medo de trabalho duro. Se eu fosse um garoto.Se eu fosse... "
Seu coração começou a bater, enviando o sangue para suas têmporas. Ela tinha idade suficiente. Ela não teria que mentir sobre a idade. Não precisaria inventar outro nome, bastava reduzir o seu. O seu
pai sempre não a chamava de Sam quando ela trabalhava nos campos com ele?
Fitando sua irmã dormindo, ela escorregou para fora da cama. O luar que fluía pela janela a guiou para a cômoda. Cuidadosamente, ela pegou um fósforo e acendeu uma vela. A chama minúscula estremecia
como se lesse os pensamentos dela. Ela olhou por cima do ombro para Amy para ter certeza de que não a tinha perturbado. Ela ainda dormia ruidosamente.
Samantha trouxe a vela para mais perto do espelho para olhar seu reflexo. Ela não considerava suas feições delicadas. Não como as da Mary Margaret. Mas ela também não se considerava sem graça, comum.
Só não tinha aparência delicada.
Samantha sabia que as únicas coisas que a faziam parecer uma mulher eram seu longo cabelo avermelhado e o suave volume de seus seios. A tesoura poderia livrá-la de suas longas madeixas e uma bandagem
eliminaria a evidência de seus seios. Ela poderia achatá-los com uma faixa comprida, algum retalho da cesta de sua mãe, e enrolá-la firmemente ao redor do tórax. Colocar um pouco de terra nas bochechas
e no queixo para esconder o fato de que ela não tinha barba...
Ela passou as mãos pelo rosto. Sentiria falta do cabelo. Sua mãe dizia que ele era como uma coroa esplendorosa. Mas ele voltaria a crescer. Eventualmente.
Cem dólares. Só para conduzir o gado para o norte. Essa tarefa seria tão difícil assim? Ela pensou em esconder o cabelo debaixo do chapéu, mas se um vento forte viesse e levasse o chapéu pelos campos
afora, seu segredo seria revelado. Ela não podia arriscar deixar que isso acontecesse. Ninguém queria uma mulher conduzindo o gado.
E mesmo assim, ela sabia que era tão capaz quanto qualquer garoto. Depois que Benjamin foi para a guerra, Samantha calçou as botas dele e fez o papel de primogênito. Fazendo o que tinha que fazer sem
questionar. Arando os campos, colhendo a colheita, remendando cercas, cuidando do gado doente. Ela teve até que sacrificar um animal ou dois.
Então quando seu papai morreu, ela se tornou a pessoa em quem sua mãe poderia se apoiar. Samantha se acostumou a ser independente, a tomar decisões. Ela não perguntava a sua mãe sobre as tarefas que
precisavam ser feitas. Simplesmente as fazia.
Que droga! Ela queria tanto ganhar aqueles cem dólares com um desespero que era quase assustador. Ajudaria a diminuir um pouco os fardos de sua mãe. Ela não era tola o suficiente para pensar que resolveria
todos os problemas deles. Mas seria o início de um longo caminho para aliviar a pesada carga que havia sobre eles.
Ela colocou a vela sobre a cômoda. A luz trêmula da vela era como uma áurea fantasma em volta dela. Lentamente ela desfez a trança longa. Quando ela terminou, o cabelo caiu ao seu redor como uma cortina
pesada. Ela penteou seus cabelos espessos que iam além da cintura. Sua coroa esplendorosa. Cresceria de novo com o tempo.
Ela se ajoelhou em frente à cesta de costura e ergueu a tampa. Ela pegou a tesoura. Sentiu a sensação fria do metal contra os dedos.
Ela tentou reunir toda a coragem que tinha. "Nós precisamos do dinheiro. Desesperadamente." - Pensou
Se levantando, ela deu uma última olhada em direção ao espelho. Usando o polegar e o indicador, ela pegou várias mexas do cabelo e levantou. O coração dela batia tão alto que ela achou que deveria ser
parecido com o som que os cascos do gado fazem durante um estouro. É só cabelo, ela pensou. Fechando os olhos e estremecendo, ela deu o primeiro corte. Ela sentiu o cacho cortado escorregar contra sua
camisola antes de cair no chão com um silêncio agourento. Abrindo os olhos, ela se encolheu ao ver as mexas curtas enroladas em sua testa.
Não era tarde para voltar atrás. Para se afundar na cama e esquecer esta idéia sem pé nem cabeça. Para deixar o resto do cabelo em paz.
Mas, de certa forma, ela sabia que era muito tarde, desde o momento em que ela tinha lido o anúncio que tinha sido postado do lado de fora do armazém geral. Ela ofereceu a Benjamin a chance de ajudar
a família mas ele tinha virado as costas.
Nada é possível se a pessoa acha que não consegue fazer. Samantha sabia que ela era capaz. Agarrando mais as mexas do cabelo, ela suspirou e voltou ao trabalho. Corta, corta e corta. Seu estômago doía
a cada mordida da tesoura.
Olhando no espelho, os contornos de seu rosto pareceram mudar. As linhas suaves sumiram, como se lamentassem a perda do cabelo. Os olhos pareciam ter alargado, as maçãs do rosto pareciam mais ásperas.
Quando ela cortou as últimas mexas, ela afundou numa cadeira próxima, seus joelhos tremendo, sem forças para suportá-la. Com lágrimas brotando nos olhos, ela olhou fixamente para seu reflexo no espelho.
O que ela tinha feito?
Samantha tinha desaparecido. E, no lugar dela, no espelho olhando para ela, estava Sam.
CAPÍTULO DOIS
Samantha-Sam, ela tinha que lembrar que seu nome agora era Sam - estava do lado de fora do armazém geral, seus joelhos tremendo. Ela sentia como se seu estômago estivesse amarrado e sendo apertado por
uma corda cheia de nós.
Dois homens estavam na frente dela. Homens, não garotos. Alguns homens e garotos faziam fila atrás dela.
Várias pessoas pareciam desesperadas para ganhar cem dólares. Felizmente, ela não conhecia nenhum destes rapazes. Desde a guerra, tantos homens estavam se mudando sem rumo de lugar em lugar, nunca parando
tempo suficiente para criar raízes. Os homens que ela conhecia eram fazendeiros que não podiam arriscar deixar suas terras.
Ela sabia que existia a possibilidade de a colheita piorar já que ela não estaria cuidando dos campos. Mas sua mãe tinha Nate e Amy. E embora Benjamin murmurasse que era inútil, ele fazia o que podia,
e ela achava que ele fazia um bom trabalho ao cuidar dos campos.
No tempo frio, longo antes do amanhecer, ela entrou furtivamente pela casa e foi ao quarto de Nate e pegou um par de calças curtas, uma camisa de flanela, e um casaco velho. Nate era só um pouco maior
que ela, embora ele fosse quatro anos mais jovem. Ela achou um chapéu preto surrado que tinha pertencido a seu pai. Isto a fez se sentir mais próxima dele, achando que ele aprovaria o seu plano.
Deixando uma nota explicando a sua mãe que precisava ir à cidade, ela selou sua égua marrom, Cinnamon, e partiu. Mil vezes durante o caminho ela se perguntou sobre a própria sanidade. Por cem vezes ela
quase voltou atrás. Mas as necessidades de sua família eram maiores do que seus medos.
Seu desejo de ajudar a família em muito excedia seu temor do desconhecido, dos perigos que poderiam estar adiante.
Benjamin podia ter deixado a guerra derrotá-lo, mas ela não iria permitir que a guerra levasse o que ela tinha de melhor.
Sua boca ficou seca quando o primeiro homem da fila se moveu de lado e o próximo rapaz começou a dar seus dados para um homem sentado atrás de uma escrivaninha. Ela ouviu um cochicho de que aquele homem
era o chefe da comitiva. Aquele que ela teria que impressionar. Aquele que poderia esmagar seus sonhos com uma simples palavra-ou dar asas a ele.
De repente, os cabelos da nuca de Sam começaram a se arrepiar. Ela sentia um mal-estar ao seu redor. Lentamente ela deixou o seu olhar viajar... e então parou violentamente.
Um homem jovem estava debruçando em uma parede do prédio, a uma distância pequena da mesa. Por que ela não o tinha notado mais cedo? Ele tinha estado lá desde o princípio? Será que ele queria fazer parte
da equipe? Nesse caso, por que ele não estava de pé na fila? Talvez ele tivesse sido contratado antes de ela chegar e ele estava marcando o lugar onde os outros homens contratados deveriam aguardar.
Ele estava com os braços cruzados sobre o peito, a aba de seu chapéu estava abaixada e ela não conseguia olhar nos olhos dele, mas ela sabia que aqueles olhos a estavam estudando. Ela podia sentir o
seu olhar fixo nela, ele a estava intensamente observando. Ele tinha algo de severo, como se tentasse achar algum defeito nela. Será que o disfarce dela não estava tão bom quanto ela achava?
- Próximo.
A respiração dela começou a vir entrecortada devido ao medo que ela sentia que o rapaz percebesse que ela era uma garota. Ela mandou para longe o pensamento da mesma maneira que ela mandaria embora a
sujeira de suas bochechas e queixo mais tarde. Ela estava preocupada por nada. Tenha santa paciência, ele provavelmente nem estava olhando para ela. Ele estava tão quieto que parecia até uma estátua...
ou talvez estivesse dormindo. Ele provavelmente estava
- Próximo!
Ela se sobressaltou com o grito. O homem atrás da escrivaninha bamba olhava para ela enquanto batia os dedos impacientemente no tampo da mesa. Engolindo seco, ela foi para frente.
Ele olhou com interesse a parte de baixo do chapéu dela antes de, lentamente, inspecioná-la, debruçando-se em cima da mesa para que pudesse ver até a ponta de suas botas desgastadas. Com a camisa e jaqueta
do seu irmão, ela estava certa de que nenhuma de suas curvas estava à mostra, nada daria para perceber que ela era uma garota. Mas saber e aceitar eram duas coisas diferentes. E não importava a sua aparência,
ela ainda se sentia como uma garota.
Ela cerrou os dentes, tentando parecer não tão amigável, assim como o rapaz de pé contra a parede fazia. O que fosse preciso fazer para ser contratada, ela faria.
- Eu sou Jake Vaughn. Você tem nome? - Ele perguntou bruscamente enquanto se sentava de volta na cadeira.
Ela rapidamente disse que sim com a cabeça.
- E, é?" - Ele alfinetou.
Ela se sentiu como uma tola.
- S-Sam. Sam Reynolds.
- Quantos anos você tem?
- Dezesseis.
Ele se inclinou para frente.
- Bem, Sam, você já teve alguma experiência conduzindo gado?
- Sim, senhor. - ela respondeu depressa, confortável com sua resposta. Não era uma mentira, exatamente. Ela levava a velha Bess para pastar toda manhã e a trazia de volta ao celeiro todas as noites.
Ele estreitou seus olhos.
- Por que eu tenho a impressão de que você está mentindo para mim?
O rapaz de pé contra a parede trocou sua posição ligeiramente como se estivesse interessado em ouvir a resposta. Ignorando ele, ela focou toda sua atenção no Sr. Vaughn.
- Eu não estou mentindo. Eu juro. - Com o dedo, ela fez uma cruz em cima do coração.
Ela quase repetiu o refrão infantil, "Faço uma cruz no meu coração e que eu morra se..." mas percebeu que um caubói de verdade não faria isto.
Lentamente ele a olhou durante mais um tempo para ver se achava algum defeito que poderia ter passado despercebido na primeira vez. Então ele sacudiu a cabeça.
- Que pena Sam, mas você está um pouco esquelético.
Só que o olhar dele não demonstrava pena nenhuma.
- Mas eu sou forte - ela insistiu.
- A maior parte daqueles rapazes atrás de você são mais forte. Desculpe filho.
Sam sentia como se seu estômago fosse sair pela boca. Ela não tinha achado que eles poderiam dizer não pra ela. Na escuridão da noite, com apenas ela e as estrelas, ela tinha achado que seu plano era
infalível. Ela não tinha considerado que havia uma falha no plano.
- Vá andando, filho, nós estamos queimando com a luz do sol aqui - o homem mandou.
Ela quase respondeu dizendo que não era filho dele, não era filho de ninguém. Em vez disso, ela reuniu toda sua dignidade, empinou o queixo, e marchou para longe da fila de homens e garotos que provavelmente
seriam contratados.
Ela não tinha contado a sua mãe sobre seu magnífico plano porque ela não queria que ela tentasse fazê-la mudar de idéia. Ela buscava conforto no fato de que sua família não ficaria desapontada ao saber
que ela tinha fracassado.
Seu fracasso. As lágrimas ardiam em seus olhos enquanto ela andava furiosamente na ruela abaixo entre os edifícios. Ela precisava estar só. Só por alguns minutos. Antes que ela voltasse para a para casa
com sua vergonha.
Assim que ela estava atrás do armazém geral, tirou o chapéu de sua cabeça.
- Que droga! - Ela chutou um engradado vazio. - Que droga!
Ela tinha cortado o cabelo para quê? Era apenas um sonho tolo que nunca se realizaria. Ela chutou o engradado novamente, se confortando com o barulho da madeira rachando.
- Se sente melhor? - Alguém provocou.
Ela se virou e seu coração martelava contra as costelas. Era o garoto que a tinha olhado fixamente enquanto ela estava esperando na fila. Ele estava novamente inclinado contra a parede, com os braços
cruzados em cima do peito. Diferentemente dela, ele não era esquelético. Mais alto que ela, ele tinha ombros largos e um peito forte que diminuía até chegar aos quadris estreitos. Ele era o tipo de pessoa
que o chefe da comitiva queria contratar, e saber disso a irritava.
- Você não sabe que é rude tripudiar da desgraça alheia? - Ela perguntou.
- Não queria tripudiar. Só pensei que talvez eu pudesse ajudar você.
- Não pode, a menos que você tenha um rebanho e esteja tentando me contratar. - ela disse acidamente enquanto enfiava o chapéu na cabeça. Ela ralhou consigo mesma. Não era culpa dele que os sonhos dela
tinham se acabado e seu cabelo tinha sido perdido.
Mudando radicalmente a posição do chapéu em sua cabeça, ele olhou para o sol fraco da manhã. O coração dela quase parou. Os olhos dele eram de um azul atordoante. Mas o que mais chamou a atenção dela
não foi à cor, foi o fato dos olhos do jovem parecer com os olhos de um homem velho. Um jovem que viu muito mais coisas do que desejava ter visto. Uma cicatriz branca fina que enrugava sua sobrancelha
esquerda, separando os pequenos pelos pretos no local. A cicatriz fazia-o parecer misterioso, perigoso.
Ele nivelou seu olhar no dela. E o estômago dela estremeceu.
- Você não devia ter mentido para Jake. - ele disse baixinho.
A respiração dela parou. De alguma maneira ele percebeu que ela era uma garota. Jake provavelmente também tinha percebido. Essa era provavelmente a razão real pela qual ele não a tinha contratado. Porque
ele pensou que ela era uma garota esquelética.
- Dizer a ele que você sabe conduzir o gado quando na verdade você não sabe, fez com que ele não gostasse de você. - ele acrescentou.
O alívio a inundou com a certeza de que seu segredo ainda estava seguro, que ele não tinha percebido nada. Ela também percebeu que já que ele sabia tanto sobre Jake Vaughn, ele já devia estar trabalhado
com ele durante algum tempo. Ele não tinha acabado de ser contratado como ela tinha pensado. A inveja a consumiu. Poderia ter a oportunidade de ganhar dinheiro decentemente... não era justo. "Eu sei conduzir
o gado."
Ela se sentiu desconfortável debaixo do olhar intimidante dele.
- Certo. - Ela cedeu. - Eu sei como conduzir uma vaca. Nossa vaca leiteira. Levar para pastar e voltar.
Seus lábios se contraíram, e por um instante, ela pensou que ele iria sorrir.
- Não é exatamente o mesmo. - ele disse.
Ela empinou o queixo.
- Mas eu podia aprender.
- Por que você mentiu?
- Eu preciso dos cem dólares. Pior. Eu faria quase qualquer coisa para ser parte da equipe.
E essa era a mais pura verdade.
- Além disso, eu aprendo rápido.
Concordando com a cabeça, ele colocou seu chapéu preto no lugar.
- O acampamento do rebanho está mais ou menos a dezesseis quilômetros ao norte da cidade. Apenas siga a estrada e você não errará. Amanhã ao amanhecer, fale com o Jake, se você estiver realmente falando
sério sobre se tornar parte da equipe.
Surpresa, ela deu um passo para trás. Ele não podia estar dizendo o que ela achava que estava. Ele não poderia estar contratando ela.
- Mas ele disse não - ela o lembrou.
- Deixe o chefe da comitiva comigo. Se você realmente quiser, o trabalho é seu. Apenas não minta nunca mais. Nós não aturamos mentirosos. Se Jake descobrir que você não estava sendo honesto, ele vai
te dar um chute no traseiro e te entregará para os urubus sem te dar um centavo. Entendido?
Ela concordou vivamente com a cabeça. Ela iria mentir durante toda a jornada o fato de que era um garoto. Desde que eles não descobrissem, onde estaria o problema em sua mentira?
- Dou a minha palavra de que não mentirei para você novamente.
- E você vai ter que aprender por conta própria tudo o que precisar. Eu não tenho nenhuma vontade de ser seu professor - ele disse.
Com certeza ela iria achar algum peão experiente que não se importaria de tomar um garoto como aprendiz e ensiná-lo o básico. E se ela não pudesse achar um, ela podia aprender apenas observando todo
mundo. Será que seria tão difícil assim conduzir o gado?
- Eu aprenderei tudo o que preciso sem te incomodar - ela prometeu.
- Então, nos vemos amanhã. - Ele se virou para ir embora.
- Espere! - Ela gritou.
Ele olhou para ela por cima do ombro.
- E-eu nem ao menos sei seu nome.
- Matthew Hart.
Matthew Hart. Ele desapareceu na esquina, e Sam afundou no chão quando suas pernas finalmente perderam a força. Ela realmente tinha conseguido dessa vez. De alguma maneira ela tinha conseguido ser contratada
para dirigir o gado. Agora ela só tinha que convencer a mãe a deixá-la ir.
Tiiin, tiiin, tiiin.
Inclinada contra a abertura da porta, Matthew Hart lutou para não estremecer toda vez que o ferreiro batia seu martelo contra o ferro incandescente. Desde a guerra, ele tinha ficado tão sensível a barulho
alto quanto um potro recém-nascido. Até quando ele sabia que vinha o som, seu corpo se contorcia rápido e ele se surpreendia com essa reação involuntária.
Fazia com que ele se sentisse como um garotinho e não como um homem completamente crescido aos dezoito. Mas, na verdade, ele percebeu que tinha se tornou homem aos quatorze, quando ele marchou em sua
primeira batalha batendo um tambor para sinalizar as ordens do oficial comandante.
O rugir dos canhões e morteiros fez com que o chão tremesse embaixo de seus pés. Ele bateu as varetas no tambor com tanta força que as juntas dos seus dedos ficaram brancas. Ele pensou que poderia ter
até chorado na primeira vez que ouviu a chuva de balas e os gemidos dos homens que o cercava.
Mas tinha tanta fumaça preta ao redor e sujeira voando, que ninguém notaria se ele chorasse. Ele percebeu que alguns dos garotos mais velhos provavelmente tinham chorado também. A guerra era uma coisa
infernal.
Ele lembrou de um tempo, quando ainda achava que lágrimas eram sinal de covardia. Antes da guerra terminar, ele teria vendido o rancho de seu pai só para não desejar ir para casa, para ser capaz de sentir
qualquer coisa, menos o cansaço e a vontade de chegar em casa.
- Fique só mais alguns minutos - o ferreiro disse, trazendo Matthew de volta de seus devaneios. Ele acenou com a cabeça.
- Estou sem pressa.
A pressa não tem vez num lugar onde as pessoas cuidam de gado. Eles já estavam guiando o gado desde a parte sul do Texas há mais ou menos quatro semanas. Eles precisavam agora de poucas semanas para
alcançar o Forte Worth.
Jake ouviu rumores de que os fazendeiros do Kansas não tinham muito sucesso em criar gado. Alguns entravam sorrateiramente no rebanho de noite e começavam estouros. Então Jake decidiu que precisa de
ajuda extra. Se o cavalo do Matthew não tivesse tido um problema na noite anterior com as ferraduras, ele não teria a chance de assistir o chefe de trilha contratar os novatos. Jake teria deixado ele para
trás cuidando do gado.
Não que ele teria se importado. Ele se sentia confortável com a solidão que acompanha o homem enquanto ele cuida do rebanho. Mas, se ele tivesse ficado com o gado, não teria conhecido o garoto.,Ele ainda
não entendia o porquê de ter seguido o garoto depois que Jake o tinha despedido. Talvez porque ele lembrava Matthew os garotos que ele tinha conhecido durante a guerra. Assustado. Com saudade de casa.
Fingindo ser valente, achando que se conseguisse convencer os outros, poderia convencer a si mesmo. Os garotos que como ele - cresciam muito rápido, e morriam muito jovens.
Um garoto que tinha no rosto a mesma expressão que os outros antes de sua primeira batalha: o olhar inocente, cheio de esperança. Cheio de sonhos que já tinham enfraquecido diante da dura realidade.
Aos quinze anos, quando um morteiro estourou o tambor que estava em suas mãos, Matthew teve que pegar um rifle abandonado no qual tinha tropeçado no campo de batalha. Daquele momento em diante, ele não
era mais um garoto da bateria, era um soldado. Ele tinha lutado em mais batalhas do que se importava em lembrar. Caminhado mais quilômetros do que ele queria lembrar. Tinha ficado com frio, molhado, e
faminto. E tão assustado que mesmo agora o terror podia voltar quando ele menos esperava.
No princípio, ele tinha medo de que a guerra pudesse terminaria antes que ele tivesse uma chance de lutar. Depois ele desejava que nunca tivesse começado. E não só porque o Sul perdeu, mas porque ele
sentia como se tivesse perdido uma parte de si mesmo. Ninguém mais parecia perceber a verdade que o assombrava noite e dia.
O Matthew Hart que retornou para casa não era mais o mesmo Matthew Hart que tinha saído para guerrear quatro anos antes. Carregar os amigos mortos para fora do campo de batalha fez com que ele parasse
de fazer amigos. Ele preferia enterrar estranhos a enterrar alguém com quem tinha jogado cartas na noite anterior. Ele preferia a solidão, não se aproximando de ninguém. Fez com que a vida fosse menos
dolorosa.
Mas o garoto parecia tão devastado depois de ser demitido por Jake que Matthew foi atrás dele antes de perceber o que estava fazendo. Ele decidiu confortar o garoto dizendo que outras oportunidades para
trabalhar apareceriam em seu caminho que não haveria necessidade de se apressar para crescer. Mas ele viu a frustração do garoto pelo modo como ele chutou os engradados. Matthew entendia o sentimento de
desamparo do garoto por não ter nenhum controle sobre o seu destino. Quando o garoto se voltou, com lágrimas brotando nos olhos, seus dentes trincados, ele parecia um soldado derrotado.
E Matthew já tinha visto tantos soldados derrotados, tantos garotos no passado que tinham precisado de ajuda. Então ele ofereceu ao garoto um lugar para dirigir o gado. Ele podia apenas desejar que o
garoto não aparecesse, mas ele duvidava que existisse essa possibilidade. Matthew também conhecia o olhar de determinação, e o garoto tinha isto também. Agora, tudo o que Matthew tinha que fazer era arrumar
um jeito de contar a novidade para Jake. E ele desejava que não fosse despedido no processo.
CAPÍTULO TRÊS
- Samantha Jane Reynolds, você perdeu a cabeça?
De pé na sala da casa, com o chapéu de caubói surrado do seu pai apertado nas mãos, o que tinha sobrado do cabelo em volta do rosto, Sam endireitou os ombros e apenas enfrentou sua mãe. Se curvar agora,
só daria mais munição para que a sua mãe pudesse provar que Sam não tinha nenhuma condição de continuar com esse negócio de conduzir gado.
- São cem dólares, mamãe - Ela arregalou os olhos.
- Cem dólares. Pense no que nós poderíamos fazer com todo aquele dinheiro.
- O que eu estou pensando é no que poderia acontecer a você se dirigisse o gado. Você seria a única mulher e ainda por cima jovem. Não está certo - A mamãe dela balançou a cabeça. - Não está certo.
- São homens e garotos, mamãe. E eles pensam que eu sou um garoto. Eu tive uma conversa longa com um rapaz. Ele estava me olhando de cima a baixo.
Quase tanto quanto ela o examinava. Ela não entendia por que ela tinha sido incapaz de tirar os olhos dele. Normalmente os garotos não prendiam sua atenção por tanto tempo.
- Ele não percebeu que eu sou uma menina - ela continuou. - E eu não planejo contar a ninguém, então eu vou ficar bem. Além disso, você deixou o Benjamin sair para a guerra quando ele tinha a mesma idade
que eu. - ela lembrou.
- Isto é diferente. Ele é um garoto! - A mãe de Samantha disse.
- Eu consigo fazer isto, mamãe
Ela deu um passo para mais perto.
- Por favor, me deixa ir. Eu prometo que vou ficar bem.
- É fácil falar, Samantha Jane, quando você não sabe o que te espera no futuro.
A mãe apertou a bochecha dela
- Eu sei que você tinha boa intenção, mas tudo o que você vai fazer é me causar preocupação.
- Você já não está preocupada agora, mamãe? Você não fica preocupada com o quanto mais de crédito o Sr. Thomas vai nos dar no armazém geral? Você não está preocupada com as colheitas? Como você vai comprar
as sementes para o próximo ano? E Nate. Ele está crescendo. Como você vai continuar alimentando ele? Ficando sem comida suficiente para você? Até você ficar doente, assim como o papai?.
Ela não pretendia chatear a mãe lembrando da morte de seu pai, mas ela tinha que fazer o possível para que sua mãe entendesse seus motivos e a deixasse ir conduzir o gado. Sua mãe se virou.
- Nós daremos um jeito.
- Como, mamãe? Só me diga como.
Sua mãe enxugou as mãos no avental que sempre vestia. Remendado como estava, parecia mais com uma colcha de retalhos.
- Eu pensarei em alguma coisa.
Mas Sam percebeu o desespero na voz de sua mãe.
- Benjamin não irá conduzir o gado porque ele não acha que é capaz. Eu não só acho que posso, eu sei que posso. Nate até iria, mas ele não tem idade suficiente. Eu tenho. Eu quero tanto ir que meu peito
dói só de pensar que a senhora pode não me deixar ir. Eu sei como cuidar de mim mesma.
A mãe a encarava. Lágrimas brilhavam nos olhos dela enquanto abria os braços. Sam correu para o abraço e sentiu os braços de sua mãe se fecharam ao redor dela.
- Eu esqueço que você cresceu durante a guerra - sua mamãe murmurou. - O dinheiro seria mais do que bem-vindo e certamente iria fazer a vida um pouco mais fácil.
Ela se debruçou sobre Sam e com muito carinho tocou nos seus pequenos cachos.
- Você tem certeza de que quer ir?
Sam concordou com a cabeça.
- Se não tivesse, não teria cortado meu cabelo, mamãe. Eu não estou assustada. É uma boa equipe. Será uma aventura.
Sua mãe a abraçou bem forte.
- Então vá com a minha bênção, e volte para casa assim que puder.
- Você fez o quê?
Inclinado contra a árvore, Matthew deu uma olhada rápida para Jake Vaughn.
- Você vai começar um estouro com tudo esse berro, Jake.
Ele olhou enquanto Jake fazia um caminho no chão com seus passos agitados. Matthew, de propósito, esperou até que eles tivessem retornado ao rebanho para dar a notícia. Ele não queria que Jake tivesse
tempo para perseguir o garoto e o informar que Matthew tinha dado a ele uma falsa promessa. Jake parou.
- Ele é um garoto esquelético.
Matthew encolheu os ombros.
- Para mim, apenas parecia faminto. Eu estive faminto.
Mais vezes do que ele gostaria de pensar, quando a União cortava os suprimentos deles. Ele não queria lembrar das coisas que tinha comido quando não tinha mais nada disponível. - Além disso, ele tem
coragem.
Matthew pensou no modo como o garoto tinha empurrado o queixo para cima de uma forma desafiadora. Embaixo da sujeira, não parecia que ele já tinha pelos crescendo. Que droga, ele provavelmente também
tinha mentido sobre a idade. Ele percebeu que Jake também deveria ter notado isto.
- Ele não sabe nada sobre conduzir gado. - Jake assinalou.
- Ele sabe cuidar de uma vaca leiteira.
- Uma vaca leiteira? Nós temos duas mil cabeças de Longhorns. Seu pai me contratou para seguir com eles para Sedalia."
Matthew esfregou o lado do nariz e observando Jake disse:
- Meu pai, meio que fez deste o meu rebanho.
Embora seu pai tivesse deixado claro que Matthew não poderia dar ordens. Ele tinha só que seguir com eles.
- Não podemos ter dois chefes. - seu pai tinha explicado.
Este passeio foi o primeiro que eles iniciaram desde a guerra. Matthew tinha crescido ao redor do gado, mas ele era apenas um garoto quando tinha ajudado seu pai a conduzir o gado antes da guerra. Os
chefes de comitiva eram bem pagos porque sabiam tudo o que existia para saber sobre o gado, a trilha, e o mais importante, sobre como lidar com os homens. Matthew ainda era aprendiz. Ele não era tolo o
suficiente para pensar que era mais do que isso.
- Eu devia ter o direito de opinar sobre quem trabalha para nós, - Matthew acrescentou.
Embora na verdade, ele soubesse que não tinha o direito de dizer. Se chegasse a esse ponto, Jake poderia mandá-lo de volta e facilmente poderia colocar outro homem em seu lugar. E considerando o jeito
como Jake estava carrancudo com ele, não ficaria surpreso se ele o despedisse aqui e agora.Jake concordou com a cabeça devagar.
- Certo. Nós daremos ao garoto uma chance de nos mostrar se ele consegue. Mas se ele mentir para mim mais uma vez ...
- Ele não irá, - Matthew se apressou em assegurar. - Eu já o adverti sobre sua antipatia por mentirosos. Você não vai se arrepender.
Jake tomou um passo ameaçador em direção a ele.
- Eu prometo a você, Matthew Hart. Se eu me arrepender, você ficará ainda mais arrependido.
Jake deixou sua advertência pairando no ar. Matthew trocou de posição, estremecendo por causa da pressão inesperada na perna direita. Ele tinha levado um tiro em Gettysburg. Seu andar manco quase não
podia mais ser percebido, apesar de que as pontadas eram irritantes. Mas não tão irritante quanto pensar em desapontar seu pai fazendo algo que os impediria de conseguir levar o gado para comercializar.
Ele só podia desejar não ter cometido o maior erro de sua vida oferecendo ao garoto um lugar na comitiva.
Ele ainda não conseguia entender porque ele tinha interferido na contratação. Ele sempre foi um dos que seguia as ordens - e não interferia neles. E mesmo quando ele tinha entrado em atrito com o homem
que estava no comando, ele sempre fazia o que mandavam.
O garoto teria que aprender a fazer a mesma coisa-sem qualquer ajuda de Matthew. Ele fez sua boa ação do dia. De agora em diante, o garoto estava sozinho.
CAPÍTULO QUATRO
Enquanto o sol se elevava acima do horizonte, cobrindo o céu em vários tons de laranja e rosa, Sam ouviu o gado mugindo e levou Cinnamon para fora da estrada principal em direção à subida. Ela estava
tão nervosa quanto um gato enrolado em baixo de uma cadeira de balanço. Ela colocou alguns pertences preciosos dentro de um saco de aniagem e num alforje. Ela abraçou sua família e deu adeus antes do sol
indicar um novo dia. Ela não tinha pregado o olho na noite anterior, estava muito ansiosa para seguir caminho.
Ela guiou o cavalo acima da subida e o rebanho surgiu. O gado pontilhava a paisagem, criando sombras marrons, ruivas e castanhas. Ela tentou não pensar no estrago que o longo chifre dos touros causaria
sem muito esforço. Este gado era completamente diferente da velha Bess. Eles pareciam valentes e destemidos.
Ela respirou fundo tentava se confortar com a idéia de que o gado provavelmente não era tão difícil de administrar, já que o chefe da comitiva aparentemente tinha contratado só um punhado de caubóis
para vigiá-los. Sam guiou sua égua em direção à carroça que tinha visto ao longe. Ela se perguntou onde Matthew estaria. Do jeito que o rebanho era grande, ela achava que seriam necessários vários peões
para manter os animais na linha. Aquela tática seria boa para ela. Quanto maior a distância entre ela e os outros peões, melhores suas chances de não ter seu segredo descoberto.
Claro que a parte mais difícil seria aprender tudo o que ela precisava para poder continuar na viagem, mas ela estava determinada a fazer sua parte. Quanto mais rápido ela aprendesse, menos ela dependeria
dos outros.
Matthew Hart deixou claro que não tinha nenhum interesse em ensiná-la, o que para ela estava tudo bem. Ele tinha sido bom com ela ontem, e ela não queria dever mais nada para ele. Além disso, ela precisava
manter certa distância para proteger seu disfarce.
Ela parou o cavalo. Um sujeito com aparência desmazelada, uma costeleta branca e um avental sujo estava empilhando panelas atrás da carroça.
- Olá! - Ela gritou assim que desmontou.
O homem se virou e olhou para ela.
- Você está muito atrasado. Você deveria estar aqui às cinco e trinta. - Ele voltou para sua tarefa.
Ele obviamente pensou que ela já era um dos peões-um fato que ela supôs ser um bom presságio para o seu disfarce.
- Você poderia me dizer onde eu acho o Sr. Vaughn?
- Eu não sou o patrão dele, - o grosseirão deu de ombros.
Ela lutou para não parecer abatida. Obviamente ela estaria completamente sozinha aqui. Matthew Hart não tinha nenhum interesse nela, e agora, nem este homem. Ela percebeu que o modo de vida do caubói
baseava-se em fazer tudo contando apenas consigo mesmo.
Ela voltou sua atenção para o rebanho. Ela podia ver o gado começar a se mexer e os caubóis começarem a montar. Tinha muito mais peões do que eles tinham contratado em Fiel. Ela ficou rodando pelo armazém
geral para ter certeza de que eles não tinham contratado ninguém que ela conhecia, alguém que a pudesse reconhecer.
Julgando pelo número de homens que ela os viu contratarem e o número que ela podia ver agora, eles devem ter trazido um monte de peões com eles. Ela se perguntava se alguns tinham deixado o emprego antes
deles chegarem a Fiel ou se eles só tinham decidido que precisavam de mãos extras. Indiferentemente, Matthew disse apenas que ela deveria estar aqui ao amanhecer e o sol estava apenas começando a surgir.
Ela ouviu o bater dos cascos surgirem atrás dela. Ela se virou. Seu estômago se apertou ao ver Jake Vaughn e Matthew Hart se aproximando. Sentados no alto das selas davam a impressão de que eram figuras
imponentes. Enquanto eles puxavam as rédeas e paravam os cavalos, ela disse a si mesma que não se permitiria intimidar por eles.
- Não te disse que ele apareceria? - Matthew disse.
Sr. Vaughn pegou no bolso uma moeda e a lançou em direção a Matthew que a pegou. Matthew piscou para Sam.
- Ele apostou comigo uma moeda que você não viria.
Ela não entendeu por qual motivo a piscada dele fez com que ela sentisse como se eles estivessem compartilhando um segredo muito íntimo ou por que ela tinha achado a leve curva dos lábios dele intrigante.
Ele não estava olhando para ela do mesmo modo que um garoto olha para uma garota na qual tem interesse. Mas ela, de repente, percebeu que poderia estar olhando fixamente para ele como uma garota faria...
porque ela pôde perceber com uma claridade surpreendente que Matthew Hart era tão bonito quanto o pecado.
Suas feições eram muito firmes, como se fossem marcadas pelo vento e o sol. As linhas de seu rosto demonstravam caráter e força. E seus olhos eram tão azuis que ela podia facilmente se afogar neles.
Ela se deu uma sacudida mental e botou em ordem seus pensamentos errantes. Ela era apenas um garoto e tinha que olhar para os homens do mesmo modo como Nate olhava para Benjamin. Parecia que com a menor
provocação ele o morderia. Ela frisou as sobrancelhas para ficar com um ar mais sério.
- Disse a você que eu viria. Mantenho as minhas promessas.
- Filho, sua voz ainda nem engrossou. Se você tivesse dezesseis - Jake começou.
- Eu tenho dezesseis anos!
Ela interrompeu, recusando perder esta oportunidade para ganhar dinheiro. Ela respirou fundo. Muito tarde para mudar a voz, então ela tinha que mentir mais um pouco. Ela se prometeu que esta seria a
sua última mentira.
- É só que os homens da minha família demoram mais que os outros para amadurecer.
Sr. Vaughn fechou a cara.
- Matt já te explicou sobre a questão das mentiras.
- Ele disse. - Ela fez o sinal de uma cruz imaginária em cima do peito.
- Eu juro que tenho dezesseis anos, Sr. Vaughn.
- Chefe - ele disse.
- O quê?
- Os homens que trabalham para mim me chamam de chefe.
Ela não conseguiu esconder o sorriso através do rosto. Ela estava trabalhando para ele! Ele poderia não ter dito isto, exatamente, mas era nisso que implicava. Ele virou o dedo polegar em direção a Matthew.
- Você montará ao lado de Matt.
Seu coração deu um pulo. Ela não queria montar ao lado de Matt. Ele era muito bonito, chamava muita atenção. Ela montaria melhor ao lado de algum rústico e aprenderia com ele tudo o que precisasse. Matthew
obviamente também não estava pulando de alegria com o rumo dos acontecimentos e seus olhos se arregalaram.
- Por que ele tem que montar comigo?
- Porque você o contratou, e você precisa perceber o que ele sabe e ensinar o que ele não sabe.
Aquela resposta pareceu irritar Matthew ainda mais. A última coisa que Sam queria era causar sofrimento para a pessoa que a tinha ajudado.
- Tudo bem se ele só disser para mim o que eu preciso fazer, e então eu faço sozinho?
Jake olhou para ela como se ela fosse muito ignorante por não saber que não devia questionar as ordens dele.
- Não, - ele disse com uma voz que continha uma advertência. - E não questione minhas ordens.
- Sim, senhor - ela humildemente respondeu.
Ela tinha comandado uma fazenda por tanto tempo que tinha esquecido que não estava mais no comando. Ele olhou para Matt.
- Você dois vão ficar no final da trilha.
Matthew moveu a mandíbula para a lateral antes de perguntar,
- Por que nós temos que ficar no final da trilha?.
- Porque assim você aprenderá a não contratar alguém sem falar comigo primeiro.
Jake se virou para Sam.
- Cookie pode guardar suas coisas na carroça de provisão. Matt mostrará a você o básico. Eu quero que você seja a sombra dele.
Não era exatamente onde ela queria estar. Ela não queria ficar assim perto de ninguém. Para ter sucesso, ela precisava manter distância. Mesmo assim, Sam afirmou com a cabeça que entendia a ordem e que
estava grata pela oportunidade de fazer parte da equipe.
- Você não se arrependerá.
- É melhor que você não me desaponte, caso contrário você que irá se arrepender. E Matt também vai se arrepender - Ele montou no cavalo e foi embora.
Seu estômago doía com a dupla advertência. Ela certamente não queria causar mais dificuldades para Matt. Discretamente ela o observou. Ele estava com uma cara de quem queria tirar a arma do coldre e
dar um tiro no chefe da comitiva. Seus dentes estavam trincados firmemente e seus olhos tinham se reduzidos a duas fendas estreitas de raiva, aqueles olhos azuis pareciam agora uma tempestade turbulenta.
Ela estava determinada a aprender depressa porque assim ambos poderiam salvar suas posições na equipe.
- É difícil ficar no final da trilha?
Ele se virou para ela como se só agora tivesse lembrado de que ela estava lá. Ele botou o braço em cima da sela. Ela trocou de posição devido ao olhar intenso dele. Com o dedo polegar, ele empurrou o
chapéu para cima da sobrancelha.
- Não é difícil, mas é horrível. Você acaba sufocando debaixo de todo o pó provocado pelo gado. Dê suas coisas para Cookie, então monte. Quanto mais cedo nós iniciarmos, mais cedo você aprenderá, e mais
cedo eu posso voltar para a minha posição anterior.
Ele fez isto soar como se fosse a pior coisa na trilha. Ele estava certo. Ela tinha muito que aprender. Inclusive quem era quem.
- Quem é Cookie? - Ela perguntou.
Ele balançou a cabeça em direção à carroça de provisão.
- O cozinheiro. A maioria das equipes chama seu cozinheiro de Cookie (Biscoito).
- Por quê?
Ele encolheu os ombros.
- Apenas chamam. Vamos, estamos queimando com a luz do sol.
Ela desatou o saco de aniagem em torno da sela e cautelosamente abordou o homem que agora colocava as coisas na carroça.
- Meu material. - ela ofereceu a ele.
Ele resmungou, os pegou, e colocou em um canto atrás da carroça.
- Obrigado. - ela disse a ele.
Ele murmurou algo sobre "cuidado" antes de se virar. Sam retornou ao seu cavalo e puxou a sela. Matt foi observá-la novamente, fazendo com que ela se sentisse que ele estava se perguntando se ela era
realmente um garoto. Ela estava confiante de que por fora ela parecia um garoto, mas pelo lado de dentro ela ainda se sentia como uma garota. Ela realmente não queria ser um garoto mas ela tinha de ter
cuidado para não agir como uma garota.
- Nós estamos indo ou não?
Ela bruscamente perguntou, sabendo que o quanto menos ele olhasse para ela, seria menos provável que ele compreendesse a verdade sobre ela.
- Você tem um bandana? - Ele perguntou.
Ela notou que ele tinha amarrado uma vermelha em volta do pescoço. Ela lembrou que Jake estava usando uma também. De fato, o cozinheiro também. Ela balançou a cabeça.
- Não.
Ele pegou sua sacola, pegou uma e deu para ela.
- Você vai precisar de uma.
Assim que ela pegou a bandana, ele pegou a que usava, puxou para cima e escondeu a boca e o nariz. Seguindo o exemplo, ela segurou a sua em cima do rosto e amarrou atrás do pescoço.
- Você não quer ficar no final da trilha?
Ela perguntou e sua respiração balançou a bandana acima de seu rosto.
- Ninguém quer. - ele disse a ela.
- Então você está sendo castigado por me ajudar.
Ele encolheu os ombros infelizmente.
- Assim eu sou lembrado do meu lugar na equipe.
O coração dela balançou. Parecia que ela não conseguia evitar causar dificuldades para ele, causando problemas antes mesmo que a viagem deles começasse.
- Eu sinto muito.
- Não sinta. Só se torne o melhor caubói do grupo, assim Jake vai morder a língua.
Com isto, ele chamou o cavalo. Sam fez o mesmo, com sua excitação aumentando. Ela estava começando sua viagem. Uma aventura... isso a deixava tremendo até as botas.
Até onde Matt sabia, a única coisa pior que ficar no final da trilha, era marchar em batalha. O gado levantava tanto pó que seria possível enterrar um homem se ele permanecesse parado um pouco mais de
tempo. A sujeira irritante e o cheiro do gado aquecido pelo sol não parecia aborrecer seu companheiro. O garoto quieto, sentado com as costas retas, os olhos verdes grandes e redondos que observavam com
atenção por cima da bandana como se temessem perder algo importante. O garoto lembrava a Matt demais dele mesmo quando ele tinha se alistado e marchado para a guerra. Antes de ele vivenciar coisas horríveis.
Antes de ele aprender que guerra não era um jogo ou uma aventura excitante.
Matt odiaria assistir este garoto murchar como o dia que progride em direção à noite com seus sonhos esquecidos devido à dura realidade, os dias longos, monótonos.
Se o garoto estava dizendo a verdade sobre sua idade, então Matt era só dois anos mais velho que Sam. Mas ele se sentia vinte anos mais velhos. Ele se sentia como se tivesse crescido e envelhecido ao
mesmo tempo. Como se sua mocidade desaparecesse como uma flor murchando.
Ele certamente não podia se lembrar de um tempo quando ele saltava na sela com ânsia ansiosa para ver o que o aguardava na frente. Estava se esgotando só de ver a energia do garoto.
- Quantos animais têm aqui? - Sam perguntou de repente.
Matt achou que o garoto poderia ter estado sentando tão reto porque tinha tentado contar o gado, mas eles estavam espalhados por vários quilômetros.
- Pouco mais de dois mil. - Matt respondeu.
- O que indica a marca no gado? Parece com a parte de baixo e de cima de um coração, só que separado.- o garoto disse.
O garoto era observador. Matt teve que dar a ele crédito por ter prestado atenção. A juventude do garoto era percebida através de sua ânsia, suas perguntas.
- Isto é exatamente o que a marca é. Um coração partido. Este gado pertence ao rancho dos Corações Partidos. - ele explicou.
- Este nome é tão triste. Por que tem esse nome?
Matt balançou a cabeça. Sim, era um nome triste para um conto triste. A maioria dos caubóis escolhia o símbolo e o nome do rancho de acordo com sua história.
- Eu direi a você esta longa e chata história mais tarde. Tem pó demais aqui.
Seus olhos verde-claros cintilaram com antecipação, Sam olhou para Matt e concordou com a cabeça. Nada parecia abater o entusiasmo do garoto. Nem o calor, nem as moscas, nem o tédio. Ele lembrava Matt
dos outros garotos que ele tinha conhecido. Talvez eles fossem a razão pela qual Matt tinha seguido Sam na véspera. Porque ele lembrava Matt dos amigos que ele tem sido incapaz de salvar. E agora ele relutantemente
tinha este garoto sob seu cuidado. O que ele tinha pensado em fazer com Sam?
Ele achava que Jake seria o responsável pelo jovem peão. Ele achava que o dever de ensinar a tarefa ficaria para ele.
Ele tinha seguido as ordens, era muito bom em seguir ordens-mesmo quando ele não concordava com elas. E por causa de sua determinação obstinada em obedecer aos comandos durante a guerra os garotos sob
seu comando sofreram. Muitos até morreram.
O seu objetivo agora era fazer com que Sam não se juntasse a eles.
CAPÍTULO CINCO
O sol estava a pino quando Sam notou que o gado começava a diminuir a velocidade se é que se podia dizer que os animais que mal se moviam poderiam diminuir a velocidade. Ela achou que seria muito se
eles tivessem andado uns vinte e quatro quilômetros hoje.
Na manhã toda, ela e Matt simplesmente montaram atrás dos animais, mantendo um olhar atento. De vez em quando, Matt levava seu cavalo na direção de alguma vaca errante. Ele usava a corda solta livremente
na mão para que espantasse o animal e o levasse de volta em direção ao rebanho. Ele a mostrou como segurar sua própria corda, como gentilmente batê-la para comandar os animais. O trabalho não era difícil,
mas era cansativo. E tão monótono que ela não conseguia entender por que o Sr. Vaughn não quisera contratá-la logo de cara. Até onde ela podia perceber, o maior perigo era acabar adormecendo em cima do
cavalo. O gado parou. Dois caubóis vieram na direção deles e pararam seus cavalos.
- Nós ficaremos no primeiro turno. - um disse.
- Por mim, não tenho nada contra. - Matt respondeu - Sam, estes são Jeb e Jed.
Sam não podia dizer muito sobre eles, os chapéus protegiam o topo de suas cabeças e suas bandanas escondiam a parte mais baixa de seus rostos. Ela podia ver que os dois tinham olhos turvos.
- Eles são gêmeos. - Matt explicou. - Se você não conseguir perceber quem é quem, só grite, Gêmeos. Que ambos responderão.
. -Por que você está aqui ao invés de lá na frente onde estava antes? - Um gêmeo perguntou.
- Digamos que eu tenho que ensinar a Sam o básico. - Matt disse a ele secamente. - e o chefe não deixou ele começar lá na frente.
A culpa atormentava a consciência de Sam. Matt explicou as várias posições para ela. O mais distante estavam os caubóis que dirigiam o flanco. À frente deles, os caubóis estavam montando na posição de
líder. Esse ponto era obviamente um lugar desejado, na frente do rebanho, à frente do pó sufocante. Matt tinha sido forçado a desistir do lugar porque ele tinha oferecido a ela um lugar nesta viagem. Ela
definitivamente faria tudo o que pudesse para se tornar o melhor peão que Jake Vaughn ou Matthew Hart já tinham visto. Ou morreria tentando.
. -Vamos, Sam. Cookie colocou a carroça na frente do rebanho e nós temos uma hora antes de colocar estes pequenos touros se movendo novamente. E nós precisaremos voltar aqui para que Jeb e Jed tenham
a chance de comer.
Seguindo Matt, ela colocou o cavalo a meio galope. Ela não podia lembrar da última vez que em que tinha estado tão faminta.
Matt explicou que a carroça tinha saído na frente do rebanho e viajado para um lugar que Jake tinha determinado na noite anterior. Quando Cookie alcançou esse lugar, ele parou e começou a preparar o
almoço. A comida estaria pronta quando o gado chegasse até ele. Ele faria a mesma coisa durante a tarde. Onde Cookie parasse seria o local onde eles ficariam pela noite. Enquanto eles se aproximavam do
acampamento do meio-dia, ela podia ver vários caubóis agachados próximos à carroça de provisão, enfiando a comida goela abaixo.
Ela desmontou. Matt tomou as rédeas da égua e a amarrou num arbusto próximo de seu cavalo.
- Vá e pegue alguma comida para você. - ele ordenou.
Ela caminhou cautelosamente em direção ao cozinheiro. Ele estava afundando uma concha em uma enorme panela e pegando um pouco do guisado.
- Eu quero um pouco, por favor. - ela disse.
Ele virou a concha de lado para descarregar seu conteúdo. O suco espirrou na tigela quando o guisado bateu nela.
- Filho-da-mãe. - ele disse.
- Tudo bem. - ela disse. - Não fez tanta sujeira assim.
Ele enxugou o rosto, e ela podia jurar que viu uma costeleta branca em seu rosto.
- Eu estava dizendo a você o nome do guisado. O nome do guisado é filho-da-mãe.
- Oh. - Ela ligeiramente sorriu. - Eu nunca tinha ouvido falar desse tipo de guisado. O que tem aqui?
- Qualquer coisa que seja fácil de pegar.
Ela achou que isso não soava muito apetitoso. Ela pegou a tigela e se dirigiu para uma árvore próxima. Ela pensou em se sentar com os outros caubóis, mas ela decidiu que quanto menos tempo ela ficasse
na companhia deles, menos provável seria que eles descobrissem que ela era uma garota. Cuidadosamente ela trouxe uma colherada de guisado para os lábios e tentou tocar a ponta da língua no molho. Não era
ruim. Não era nada parecido com qualquer coisa que ela já tivesse provado antes, mas não era ruim.
Pelo rabo de olho, ela viu Matt pegar sua tigela e se sentar debaixo da carroça, apertando suas costas contra a roda de madeira. Ela percebeu que ele estava feliz por estar longe dela durante algum tempo
assim como ela parecia estar evitando ele. Ele não tinha sido indelicado durante o tempo em que tinham estado juntos, mas ele também não tinha sido amigável, nenhum nem outro.
Ela só tinha terminado o guisado quando Jake se abaixou na frente dela. Ela não o tinha visto entrar no acampamento. Ela desejava que ele não a visse. Ele estava segurando uma corda de mais ou menos
sessenta centímetros de comprimento e a estendeu em direção a ela.
- Tome isto e dê um nó. - ele ordenou.
Lambendo os lábios, ela colocou a tigela de lado, pegou a corda, e com habilidade fez um nó no meio. Movimentando a cabeça, Jake pegou a corda e puxou as pontas, apertando seu laço.
- Esse é um bom nó. - ele murmurou.
Ela estava começando a sorrir porque tinha passado no teste, mas ele se virou para ela e seu olhar severo faz o sorriso dela murchar.
- Você pode fazer um nó de meia-volta duplo? - Ele perguntou.
Ela lentamente negou com a cabeça.
- Nó de vaqueiro?
Novamente ela negou com a cabeça, desejava não ter comido o guisado tão depressa. Seu estômago estava começando a se revirar e ela percebeu que não tinha impressionado ele em nada.
- Eles são o mesmo.- ele disse a ela. - Nós usamos eles para segurar nossos cavalos porque os laços podem se desatar depressa. Se um cavalo puxar a corda depressa com seu tipo de laço, só vai apertar
mais e você não vai conseguir soltar depois.
- A Cinnamon é treinada para não puxar.
- Eu não me importo se seu cavalo é treinado, os cavalos vão disparar se dois mil bois começarem a correr. Além disso, você nem sempre vai montar no seu cavalo. Nós temos cavalos treinados para montar
de noite. E nós temos pôneis que servirão para você quando seu cavalo estiver descansando. Matt!
Ela se virou, surpresa por ele ter gritando o nome Matt. Aparentemente Matt também estava surpreso, porque ela viu sua virada rápida e a tigela que tinha saindo voando. Ela poderia ter rido de sua reação
se Jake não estivesse com um olhar tão sério. Fazendo careta, Matt se levantou, pegou a tigela, deu para Cookie, e marchou em direção a eles.
- O quê?
Ele perguntou quando se aproximou o suficiente para ser ouvido sem gritar. Jake se levantou e lançou a corda para Matt que a pegou.
- Ele não sabe fazer nenhum outro tipo de laço a não ser aquele. Ensina ele. - Jake comandou.
Matt revirou os olhos.
- Jake, você está sendo insensato.
- Eu? Eu não sou a pessoa que o contratou. Ensina ele ou manda embora. A escolha é sua.
O coração de Sam estava aos pulos. Apenas metade de um dia? Ela teria somente esse tempo para passar no teste? Com passos largos, Jake foi embora. Matt jogou a cabeça para trás e fechou os olhos. Sam
podia perceber a batalha que ele travava internamente. Ela tinha o sentimento desconfortável de que a vontade de ensinar não estava ganhando da de despedir. Quando ele se ofereceu para contratá-la, ele
não tinha achado que ficaria responsável por ela. E ela também não tinha pensado nisso.
- Eu aprendo rápido.- ela disse depressa.
Com um suspiro fundo, ele abriu os olhos e olhou para ela.
- Vejamos.
Ele se agachou na frente dela. Ela assistiu os dedos dele desatando o laço apertado. Ele tinha tirado as luvas para comer e ela podia ver agora que ele tinha dedos longos, bronzeado. As mãos dele pareciam
muito mais fortes que as dela. Suas veias pareciam cordilheiras minúsculas. Quando ele girou as mãos, os calos ficaram visíveis. Ela não conseguia entender por que estava tão fascinada com o movimento
dos dedos e das mãos dele. Ela nunca tinha perdido tempo reparando as mãos dos garotos ou como eram firmes seus braços. Mas sentada aqui com Matt, assistindo ele trabalhar, ela achava que ele tinha as
mãos mais capazes que ela já vira. Ela se perguntava como se sentiria se aquela mão estivesse ao redor da sua, com suas palmas apertadas juntas.
- Quantos tipos diferentes de laços existem? - Ela perguntou, tentando mudar rumo de seus pensamentos.
- Usamos mais ou menos uma meia dúzia.
Ele respondeu distraidamente. Ele esticou a corda, o nó desfeito, antes de erguer seu olhar para ela.
- Nó corda de arco, nó do cravo, nó do oito, nó do pescador, nó de emenda, nó do ladrão e nó comum.
Seus ombros largos acompanhavam o movimento das mãos.
- Nós faremos um por dia até que você aprenda todos. Nós começaremos com um nó cego. Agora, olhe.
Ela observou. Ela gostava do modo como as mãos dele se moviam, tão capazes, tão firmes. Ela nunca tinha pensado que acharia aquele aspecto de um homem tão interessante. Ele teve que mostrar para ela
três vezes antes dela lembrar que deveria olhar a corda e não os dedos dele. Quando ele deu a corda para ela, ela respirou fundo e imitou seus movimentos. Ela conseguiu dar o nó cego.
Ele então sorriu, um sorriso que chegava até os olhos azuis formando um clarão que pareciam jóias brilhando em um colar.
- Impressionante. Vamos voltar para o rebanho, assim Jed e Jeb poderão vir comer. Traga a corda. Você pode praticar um pouco se o gado estiver tranqüilo.
Ela ficou de pé.
- Obrigado, Matt.
Ele acenou com a cabeça e foi caminhando vagarosamente, deixando-a com a sensação de que havia algo que ela não tinha percebido ou entendido bem. E, mesmo assim, ela não conseguia deixar de pensar que
ele parecia estar mais chateado consigo mesmo do que com ela. No começo ele sempre parecia estar impaciente, mas enquanto ele ia explicando as coisas parecia ficar mais... amigável. Então, ele se virava
de costas e andava através de uma linha imaginável da qual ele planejava não ultrapassar. Ela não entendia muito bem por que ele tinha esse tipo de atitude. Ela entendia que ele não queria ficar no final
da trilha. Mas ela tinha o pressentimento de que o verdadeiro problema era ela. E ela só não conseguia entender o porquê.
CAPÍTULO SEIS
A gratidão do garoto importunava a consciência de Matt. Contratar o garoto tinha sido uma idéia estúpida. Ficar amigo dele seria era algo ainda mais estúpido. Se Matt tivesse qualquer generosidade com
ele, o mandaria de volta para casa antes que eles estivessem ainda mais distantes. O problema era que Sam tinha olhos tão inocentes... e Matt não queria ser aquela pessoa que acabaria com a inocência dele,
que ensinaria ao garoto que a vida e que crescer são coisas difíceis. Dar a Sam menos que um dia para provar sua capacidade mostraria isto. Sam olhou para Matt como se ele fosse algum tipo de herói só
por tê-lo ensinado a dar um nó cego. E ele estava muito distante de ser um herói.
Ele lançou um olhar furtivo para Sam enquanto os cavalos caminhavam juntos lentamente. Ele tinha decidido ensinar ao garoto outro tipo de nó, e Sam estava agora ocupado tentando dominar o nó do cravo.
O garoto tinha mãos pequenas quase delicadas. Jake estava certo. Sam com certeza não estava nem perto de ter dezesseis anos. Mais próximo de quatorze, talvez muito mais jovem. Por que mentir sobre a idade
quando eles estavam contratando garotos de quatorze anos? Obviamente o garoto queria crescer, e crescer depressa. ~
O corpo franzino de Sam fez com que Matt quisesse protegê-lo, do mesmo modo que ele tentou proteger os garotos mais jovens que ele durante a guerra e esse era um compromisso complicado de assumir enquanto
conduziam o gado.
Todo homem tinha que ser capaz de cuidar de si mesmo, e o mais cedo Matt conseguisse ensinar a Sam tudo o que ele precisasse saber, o mais cedo Matt poderia parar de se preocupar com ele. Ele odiava
se preocupar com outra pessoa quase tanto quanto odiava ficar no final da trilha.
Durante a guerra, os soldados iam ficando cada vez mais jovens. Ele foi promovido a tenente aos dezesseis porque ele era o mais velho na equipe. Ele achava que era um motivo bastante lamentável que o
tinha colocado no comando. Às vezes ele achava que a guerra era mais uma briga entre garotos do que qualquer outra coisa.
E conduzir o gado estava virando a mesma coisa. Tantos homens saíram para lutar. Os garotos deixados para trás começaram a conduzir o gado. Eles eram a razão pela qual eram também chamados de cowboys
(garotos que conduzem gado).
Matt travava uma batalha interna para não se preocupar com Sam. Ele ensinaria a ele tudo o que ele precisasse aprender e o garoto ficaria bem. Ele estava falando a verdade quando disse que aprendia depressa.
Matt voltou sua atenção para o rebanho. Ele achava que não faria nenhum mal ser legal com o garoto. Sam raramente falava, então Matt não tinha que se preocupar com o garoto tentando criar uma amizade
entre eles. Havia perigos em conduzir o gado não tantos quanto na guerra mas não era incomum perder um homem ou dois. Se Matt mantivesse distância, não se machucaria tanto se alguém morresse perto dele.
Ele faria um favor para Sam só para aliviar sua própria culpa por querê-lo por perto. Então ele poderia apenas ensiná-lo apenas o que fosse necessário e depois poderia evitá-lo o resto do tempo.
Sam tinha arado os campos, plantado sementes, feito a colheita, caçado, remendado cercas, trabalhado do amanhecer até o crepúsculo. Ela tinha achado que ficar montada num cavalo o dia todo conduzindo
o gado seria fácil. Não tinha sido nada disso. Ela estava coberta de pó dos pés a cabeça. Além disso estava entediada. Haviam apenas nuvens espessas no céu e a batida ritmada dos cascos. Ela tentou falar
duas ou três vezes com Matt mas ele parecia relutante em falar mais que duas palavras por vez. Ele tinha a mania de parar todas as tentativas dela dizendo que eles falariam sobre aquilo mais tarde. E provavelmente
era melhor assim. Toda vez que ela praticava o nó, ela lembrava das mãos dele e pensava na maravilha que seria sentir o toque delas.
Ela não entendia por que seus pensamentos sempre mostravam imagens dela junto com Matt juntos e ele sabendo que ela era uma garota. Sorrindo para ela. Segurando sua mão.
Nenhum dos garotos que tinha retornado da guerra fazia ela perceber que tinha crescido, que ela estava começando a ter sonhos de mulher. Ela pensou que até teria interesse em dançar se Matt estivesse
no local. De onde essas idéias estranhas estavam vindo? Era assim que a Mary Margaret se sentia toda vez que se aproximava de Benjamin? Seu coração batia mais rápido, suas mãos ficavam úmidas, e sua boca
seca?
Sam se perguntou se tudo aquilo era o resultado de sua atração por Matt. Ela queria muito que não estivesse à beira de ficar doente, porque com certeza Jake a enviaria para casa se ela não estivesse
bem.
O gado começou a diminuir a velocidade quando já estava próximo do meio-dia. Matt moveu a mão formando um círculo.
- Nós vamos começar a juntar o gado, temos que arrumar o descanso da noite. - Ele moveu a cabeça em direção ao oeste. - Será noite logo e nós não podemos relaxar.
Relaxar. Ela pensou em relaxar em casa, sentada na frente do forno, entretida lendo um bom livro. Sua família possuía só seis, mas ela nunca se cansava deles. Ela sempre notava algo novo na história,
alguma pequena coisa que ela podia ter omitido da vez anterior.
Levou mais ou menos uma hora para conseguir juntar o rebanho. No acampamento Sam deixou Cinnamon com outro peão que veria se o cavalo necessitava de algo. Sam precisaria da égua mais tarde para a vigília.
De pé ao lado dela, Matt tirou a bandana. A sujeira estava até nas pregas de seu rosto e nos cantos de seus olhos. Mas a bandana cumpriu sua função e manteve a parte mais baixa do rosto dele protegido
do pó. Sam deu um sorriso brilhante.
- O que é tão engraçado? - Ele perguntou.
- Você parece com um guaxinim irritado.
- Eu posso ficar realmente irritado quando quero. Acho que eu estava assim de manhã quando eu descobri que tinha que montar com você. Venha, quero me desculpar com você.
Ele se mexeu rápido. Ela seguiu os passos dele.
- Onde nós estamos indo?
"Vamos relaxar um pouco, como eu prometi."
Eles seguiram através do mato alto por baixo das árvores de carvalho.
- O que você achou de conduzir o gado? - Matt se virou.
- Foi divertido.
Matt parou no meio do caminho e a encarou, com o olhar fixo no dela. Quando ele não estava bravo, tinha os olhos lindos, com cílios longos, escuros. Por um minuto, Sam desejou não estar vestindo a camisa
velha e as calças curtas de seu irmão. Ela queria estar usando um vestindo bonito. Porque se ela estivesse, em um segundo ele perceberia que ela era uma garota.
- De verdade? - ele cutucou.
Ela suspirou.
- Um pouco entediante.
Sua boca fez aquele pequeno tremor, como se ele estivesse tentando sorrir mas não conseguisse.
- Assim que é o gado. Dias de tédio, com alguns minutos de excitação. - Ele continuou a marchar adiante.
- Quando nós teremos excitação? - Sam perguntou.
- Quando acontecer um estouro.
Hesitando, ela quase tropeçou numa raiz exposta.
- Estouro?
- Sim. O gado Longhorn estoura com quase qualquer coisa: um ramo estalando, um raio relampejando, barulho de trovão. Não precisa muito. Quando isso acontecer, você apenas fica fora do caminho deles.
Ele disse "quando" e não "se".
- Você alguma vez esteve em uma viagem que não teve estouro?
- Não.
Ele parou. Atrás dele, um rio fluía. As sombras das árvores enfileiradas balançavam suavemente na água marrom. Ela assistiu com assombro ele desabotoar a camisa e tirar. Ele tinha ombros largos. Os músculos
do peito bronzeado ondulavam com seus movimentos.
Sobre apenas um pé, ele pulava enquanto tirava a bota.
- Vamos. - ele ordenou.
- Vamos? - Ela repetiu.
Ele tirou a outra bota.
- Tire suas roupas.
Antes de ela entender o que ele pretendia, ele tirou suas calças curtas, ficando com o traseiro à mostra e outras partes que ela nem se importou de olhar. Sam se virou de costas, seu rosto ardendo com
o calor do embaraço. Sua respiração vinha aos pulos.
- O que há? - Ele perguntou.
Ela agitou a cabeça de um modo selvagem. Quando Nate era pequeno, ela costumava ajudar sua mãe a dar banho nele. Mas seu irmão mais jovem certamente não se parecia com Matt. O corpo de Matt era de um
homem, não de um bebê. E existia um mundo de diferença entre os dois.
- Você é modesto? - Matt perguntou, claramente confundido pelo comportamento dela.
Quando ela não respondeu, ele riu. Realmente riu. Aquele pequeno estrondo ecoou entre as árvores, passeou pela brisa, e tocou o coração dela. Há quanto tempo ela tinha ouvido um riso?
- Sam, você não tem nada que eu não tenho.
Isso era certamente uma mentira, e ela não tinha nenhuma vontade de corrigir a falsa suposição dele.
- Eu achei que você gostaria de nadar depois de ficar no pó o dia todo. - ele acrescentou.
Ela adoraria nadar, mas não se tivesse que tirar as roupas. Ou olhando para ele do jeito que veio ao mundo. Porque se ela olhasse para ele, veria algo que nunca tinha visto antes.
- Aêêê! - Alguém gritou da moita antes de quatro homens jovens saírem de dentro das árvores.
- Estava o dia todo esperando por isso! - Jed gritou. Ou seria ele o Jeb?
Sam não sabia. Ela só sabia que eles estavam tirando a roupa tão depressa quanto Matt tinha tirado.
- Sam, diga olá para Slim e Squirrel. - Matt ordenou. - Eles montam no flanco.
Só que ela não conseguia dizer nada. O nó em sua garganta não a deixava falar.
- O que tem de errado com o novato? - Slim perguntou.
- Eu acho que ele é tímido. Sam, você não gosta de mergulhar por que é magro? - Matt perguntou.
Sem responder, ela voltou pelas árvores em direção ao acampamento, com o riso ecoando atrás dela. Fuja! Sua mente gritava. Corra, ecoava a cada passo que ela dava. Ela ouviu o barulho dos homens saltado
no rio. Saltado nus como tinham vindo ao mundo.
Ela tropeçou em uma raiz nodosa e caiu no chão. Os ramos e folhas secas esfolaram as palmas de suas mãos e os joelhos. Ela se pôs de pé e se apressou. Ela não tinha achado que os garotos eram assim tão...
exibidos.
Só que eles só estavam sendo exibidos porque não sabiam que tinham uma garota no meio deles. Eles simplesmente achavam que ela era um deles o que era exatamente o que ela queria que eles acreditassem.
Só que ela queria que eles permanecessem com a roupa no corpo! Diminuindo a velocidade do passo ela finalmente parou, se afundou no chão e se debruçou de costas contra uma árvore. Sua respiração rápida
fazia o peito doer.
Ela ouviu passos, e então Matt estava abaixado diante dela. Ele estava vestindo suas calças curtas agora mas ele não tinha tido tempo de colocar as botas. Seus dedões nus estavam cheios de sujeira. Pequenos
galhos estavam grudados no pé dele. Parecia tão incrivelmente íntimo estar olhando para os dedos de um homem. Ela ergueu o olhar e percebeu que olhar para o pé não era tão íntimo quanto olhar para o peito.
O peito de Matt levantava a cada respiração que ele dava. Ela viu uma gota solitária de suor escorrer no centro do peito dele.
- Sam?
Ela olhou para ele, para aqueles hipnotizantes olhos azuis. Suas sobrancelhas enrugadas demonstravam sua preocupação. Mechas escuras do cabelo caíam na testa. Sem pensar, ela começou a levantar sua mão
para colocá-las de lado, para sentir se elas eram tão macios quanto pareciam.
- Está tudo bem, Sam. - ele disse baixinho. - Eu sei seu segredo.
CAPÍTULO SETE
Sam parecia completamente apavorada com todo o sangue que rapidamente se esvaia do rosto dele, fazendo com que parecesse um fantasma.
- Co-como você percebeu? - Sam gaguejou.
- É simplesmente tão óbvio.
- Mas co... como você percebeu a verdade?
Havia pânico absoluto na voz de Sam.
- Está tudo bem, Sam. - Matt disse tranquilamente. - Jake não fará você partir.
Descrença estava evidente no rosto de Sam.
- Sim, ele vai.
- Não, ele não vai. Muitos caras não sabem nadar.
Ela olhou para Matt como se nunca o tivesse visto antes.
- Nadar? - Sam perguntou incrédula.
Matt confirmou com a cabeça. No riacho, as bochechas do garoto pareciam pegar fogo, queimavam tanto que Matt achava que ele poderia ter começado um incêndio. Matt nunca tinha visto um garoto reagir daquela
maneira antes. Ele se lembrou da primeira vez em que tinha tirado as roupas no exército. Ele se sentia tímido, ao lado de homens que ele mal conhecia, mas ele percebeu que isso não era tão diferente quanto
nadar com seus amigos no riacho perto de casa.
O garoto olhou para ele como se nunca tivesse visto um corpo nu antes. Ele parecia...meio...assustado. Isso não fazia nenhum sentido para Matt, a menos que Sam temesse algo. Então Matt entendeu como
um raio: O garoto tinha medo do rio. Ter medo assim só podia significar uma coisa o garoto não sabia nadar. Sam tinha orgulho. Talvez demais. Ele certamente mostrara isto na véspera, atrás do armazém geral.
- Eu posso ensinar a você, se quiser.
Matt ofereceu. Ele não queria muito ensinar mas ele também não queria que o garoto se afogasse. O garoto ainda parecia pronto para sair voando a qualquer minuto.
Sam concordou com a cabeça.
- É, é... eu tenho muito medo de água.
Matt fez careta e esfregou o lado do nariz. Essa era a última coisa que ele queria ouvir.
- O que você vai fazer quando nós chegarmos ao Rio Vermelho e o gado tiver que passar por ele?
- Desde que eu fique em cima do cavalo, tudo bem.
Mas Matt já tinha visto um caubói cair do cavalo cruzando o rio. E ele já tinha visto muitos caubóis se afogarem.
- Eu acho que você devia me deixar te ensinar a nadar.
- Não, vai dar tudo certo, eu juro.
- Certo. Então quando nós chegarmos ao Rio Vermelho você vai ficar do meu lado para que eu possa te ver o tempo todo.
- Tá.
Matt ouviu o retinir do ferro o que significava que Cookie já tinha preparado a comida.
- Vá e coma. Nós vigiaremos o gado a partir da meia-noite.
Sam ficou de pé e Matt esticou seu corpo alto, magro.
- Você não vai dizer para ninguém, vai? Sobre meu segredo. - Sam perguntou.
- Não.
- Me dá sua palavra de que você não dirá nada.
- Dou minha palavra, Sam, mas isso não é para ter vergonha.
- Eu sei. Eu só não quero que os outros caras fiquem rindo de mim.
- Eles teriam que se ver comigo se fizessem isso.
Agora, por que ele tinha dito isto? Ele não deveria estar protegendo Sam. Ele deveria ensinar o garoto a cuidar de si mesmo. Ele puxou o chapéu de Sam para cima dos olhos.
- Vá jantar.
Inclinado contra a árvore, ele assistiu Sam ir andando em direção ao acampamento. Matt não tinha um irmão mais novo, mas ele se sentia como um irmão mais velho para Sam. O garoto parecia incrivelmente
cauteloso das coisas, com medo de fazer tudo errado. Ele queria saber um modo de passar confiança para o garoto. Sua falta de fé em si mesmo parecia estar em conflito com sua coragem. Matt voltou em direção
ao rio. Ele só se molharia rápido agora, qualquer coisa que pudesse lavar a memória do terror que ele viu nos olhos verdes e pálidos de Sam. Ele estava contente que o garoto não queria ter lições de natação.
Matt não queria ser um irmão mais velho para o garoto. Ele não queria nem que ele fosse seu amigo. Machucaria demais perder um amigo.
Tinha sido um erro trazer Sam para o rio. Não porque ele não podia nadar, mas porque por um momento enquanto o garoto o seguia, Matt tinha apreciado sua companhia, tinha esquecido que a última coisa
ele queria era criar uma amizade.
Assim que ela terminou de comer, Sam agarrou seu saco de dormir e foi para a parte de trás da carroça de provisão e ficou a uma boa distância da fogueira de acampamento, longe de onde os outros peões
passavam a noite. Enquanto ela alisava seu saco de dormir em cima do chão, ela lutava contra as imagens do corpo Slim de Matt, mas era uma batalha que ela estava perdendo. Matt a tinha assustado demais
quando disse: "Eu sei o seu segredo."
Seu coração por muito pouco não parou. Ela achou que ele tinha percebido que ela era uma garota. Ela agora só podia agradecer por ele ter achado que sua saída rápida tinha sido porque ela não sabia nadar
e não porque ela estava embaraçada, lá de pé, confusa, olhando fixamente para seu traseiro branco e sua batata da perna cabeluda. E coxas tão firmes que pareciam feitas de pedra, mas mesmo assim não era
tão imponente quanto seu peito.
Ela nunca em sua vida tinha imaginado que um homem podia ser tão... bonito. A lembrança da visão de Matt iluminado pelo crepúsculo fazia com que ela prendesse a respiração.Ela sabia nadar na verdade,
ela amava água-mas ela não podia dizer a verdade pois não teria outra razão para o modo como tinha reagido antes. Além disso, ela não achava que Matt ou outros caubóis gostariam de saber que tinham tirado
as roupas na frente de uma garota.
Ela se sentou, tentando ficar confortável. Parecia que toda vez que ela tirava uma pedra de debaixo de seu saco de dormir outra aparecia no lugar. Ela olhou para o fogo que queimava no centro do acampamento.
Várias pessoas estavam sentadas próximas do fogo, inclusive Matt.
Os outros estavam rindo e conversando. Matt estava simplesmente olhando fixamente para os clarões das chamas, suas mãos apertando uma xícara. Ela se perguntou no que ele estaria pensando, como ele parecia
estar tão longe dos outros embora estivesse sentando do lado.
Ela dobrou os joelhos até a direção dos peitos e os enlaçou com os braços, segurando firme. Matt não estava usando chapéu. Os cabelos pretos escovados chegavam ao colarinho da camisa. O desejo forte
de tocá-los a pegou de surpresa. Ela não se lembrava de alguma vez ter desejado tocar o cabelo de um garoto.
O que estava acontecendo com ela? Por que ela estava notando coisas em Matt como a espessura do cabelo, a força das mãos, o timbre profundo da voz, o som do riso, os incríveis azuis dos olhos que nunca
tinha reparado em nenhum garoto antes?
Ela tentava se convencer de que estava fascinada por Matt só porque ela tinha conhecido poucos garotos nos últimos quatro anos. Mas se era só pelo fato de Matt ser um garoto, por que ela não conseguia
se lembrar da cor dos olhos dos gêmeos? Por que ela tinha que olhar para Squirrel para lembrar que a cor de seu cabelo era marrom e para Slim para saber que seu cabelo era loiro? Por que parecia que a
face de Matt estava marcada com ferro em brasa na mente dela e toda vez que fechava os olhos ela conseguia ver claramente?
Ela achava que isso acontecia porque ela tinha passado o dia inteiro na companhia dele. Mas em um canto secreto de seu coração ecoava uma voz que dizia que ela estava mentindo para si mesma. Mesmo que
eles só tivessem se encontrado ontem, aquela única vez, ela com certeza se lembraria dele até o dia da sua morte. Ela virou rápido a cabeça quando Jake se ajoelhou ao lado dela.
- Você se sentou bem longe dos outros. - ele disse tranquilamente.
Sam concordou com a cabeça, tentando ganhar tempo enquanto pensava em uma explicação que não causaria suspeita. Depois do que ela tinha visto no rio esta tarde, ela se sentia desconfortável em dormir
perto deles. Além disso, ela achava melhor manter uma certa distância toda vez que pudesse.
- Eu não estou acostumado a dormir com um monte de homens e garotos.
Interiormente ela sorriu. Isso era a verdade.
- Muito destes caras roncam, mas a maior parte dos peões está tão cansada que nem percebe, quando a bate a cabeça no chão, dorme.
Ele colocou o cotovelo nas coxas e se apoiou nas pontas dos pés, como se fosse levantar a qualquer momento.
- É mais provável ter um estouro de noite. O que você fará se isso acontecer?
Ele estava olhando para ela como se dissesse que ela deveria saber a resposta. Ela agitou a cabeça ligeiramente e tentou lembrar o que Matt tinha dito mais cedo. Em uma voz tímida, ela disse.
- Quando isso acontecer, eu apenas fico fora do caminho deles. Certo?
Ele virou um pouco o corpo e olhou por cima do ombro.
- Matt!
Sentando próximo ao fogo, Matt se mexeu igual a uma marionete que alguém tinha puxado as cordas. Lentamente Matt ficou nas pontas do pés e andou através do acampamento.
- Que coisa, Jake, pare de ficar me gritando.
- Você está estranho hoje. Matt.
- Eu estava pensado, só isso. - Ele se abaixou ao lado de Jake e deu uma olhada para Sam antes de dar sua completa atenção a Jake. - O que você quer?
- Sam não sabe os detalhes do que se deve fazer durante um estouro.
- Eu explicarei os detalhes para ele antes do meu turno.
- Suas coisas estão do outro lado do acampamento?
Matt estreitou os olhos, e Sam se perguntou se ele estava pensando em mentir. Ela tinha impressão de que nenhum dos dois estava gostando do rumo daquela conversa.
- Sim, está. - Matt disse devagar.
- Junte suas coisas. Você vai dormir ao lado de Sam esta noite.
Com um gemido, Matt soltou a cabeça para trás.
- Jake, o garoto ficou na minha cola o dia todo. Nós podemos ficar um pouco de tempo separados. Nada irá acontecer.
- Você tem certeza? - Jake perguntou.
Matt suspirou.
- Eu sei que você ordenou Sam ficar perto de mim como uma sombra, mas você sabe que eu durmo longe do acampamento.
- Devia ter pensado nisso antes de contratar o garoto. Ou você gruda nele feito cola ou manda ele de volta para casa. Se eu tiver que dizer isso a você novamente, você é quem vai para casa. - Jake ficou
de pé. - Eu falo sério, Matt. Pare de tentar negar sua responsabilidade sobre o garoto.
Sam viu a mandíbula de Matt recuar, os músculos do rosto apertarem enquanto ele olhava fixamente para as costas de Jake.
- Levante. - ele disse entre os dentes cerrados.
- Por quê?
- Nós vamos entrar no bosque. Eu tenho algo a fazer.
Os olhos de Sam se arregalaram.
- Oh, não, Matt, eu estou certo de que Jake não queria dizer que eu deveria ir junto quando você fosse fazer suas necessidades.
A última coisa que ela queria era se intrometer em seu isolamento.
- Siga-me, ou junte suas coisas e vá para casa. - ele ordenou.
- Você fala igual ao Jake.
- Você acha, é?
Ele bufou e foi andando furiosamente em direção as árvores. Ele era contraditório e difícil de entender. Ele tinha sido amável e tinha tido consideração depois do que tinha acontecido no rio, e agora
estava todo mandão. Ela não o entendia. Num minuto era agradável, no outro era implicante. Se ela não precisasse tanto do dinheiro...
Sam não esperou nenhum segundo para ir correndo atrás dele.
CAPÍTULO OITO
Não eram suas "necessidades" que Matt precisava fazer; ele precisava lidar com suas frustrações. Por que ele estava sendo castigado? Ele não conseguia entender e ia pensando enquanto abria passagem entre
as árvores. Por causa de sua generosidade, ele tinha oferecido ao garoto um lugar na viagem... e Jake estava determinado a fazer com que ele lamentasse suas ações. Não fazia sentido. Não mesmo. Por que
ele tinha que grudar no garoto como cola? Ele alcançou a beira do rio e começou a andar para um lado e para o outro. Ele pensou em mandar tudo para o inferno e ir para casa, mas se ele fizesse isto, então
Jake com certeza mandaria o garoto embora. Então sua atitude não daria em dada, exceto deixar Jake com duas pessoas a menos em vez de uma. Ele estava pensando no benefício dele mesmo enviar o garoto para
casa quando Sam se juntou a ele na beira do rio.
O garoto estava sem fôlego e coçando as mãos nas coxas de cima a baixo, obviamente um sinal de nervoso.
Matt jogou a cabeça para trás e passou a mão no cabelo. Ele não conseguia mandar o garoto ir empacotar suas coisas, não quando ele olhava para Matt como se ele fosse o dono das estrelas.
- Eu... eu não ronco. - o garoto disse.
Ele parou de andar, passou os dedos no cabelo mais uma vez, girou, e olhou para o garoto.
- Não é que eu esteja preocupado se você ronca ou não. Eu só estou acostumado a... dormir sozinho.
Até no luar, ele podia ver o garoto observando o rosto dele.
- Você faz muitas coisas sozinho.
- Não, eu não faço.
O garoto deu um passo firme para frente.
- Sim, você faz. Você come na carroça de provisão
- Por que levar para longe a minha comida quando eu posso comer lá e dar o prato de volta para o Cookie de uma vez?
Era uma péssima desculpa. Até ele achava. As amizades se desenvolviam durante a comida e ele não tinha nenhuma necessidade de fazer amigos.
Sam agitou a cabeça.
- Eu acho que é mais do que isso. Na frente do fogo você estava sentando próximo o suficiente para parecer que você era parte do grupo, mas você não estava realmente escutando o que eles diziam. E toda
vez que Jake te grita, você dá um pulo.
- Quem não iria?
Ele perguntou com a voz tão alta que parecia um trovão. Tão alta quanto um tiro de rifle ou o estrondo de um canhão. Pensou
- Você não acha que falar assim me faria pular, acha?.
- Bem, mostra que você não se assusta fácil.
Ele se virou e olhou para o rio, com raiva de si mesmo por ter soado tão jovem quanto o garoto. Ele podia ouvir a água murmurante batendo contra a orla, um peixe que pulava em algum lugar. Rãs que coaxavam
e cigarras que cantavam.
Ele não queria ficar muito tempo com o garoto. Se ele fizesse, poderia acabar gostando dele... se Sam se afogasse ao cruzarem o rio ou se fosse pisoteado durante um estouro ou mordido por uma serpente
ou fosse atingido por um raio. Eles contavam com Deus apenas. Os perigos eram infinitos. E quando alguém que você gosta, morre, isso machuca. Uma dor feroz, como se uma parte de você estivesse morrendo
também. Ele aprendeu durante a guerra que deveria fechar a porta de suas emoções. Parar de se importar.
Por que esse garoto tinha que fazer ele se sentir como um irmão mais velho? Pior, por que ele fazia com que ele quisesse ser um irmão mais velho, botá-lo debaixo de sua asa e protegê-lo? Para mostrar
a Jake que Matt era bom em reconhecer o caráter das pessoas?
Ele se virou e o garoto deu um salto para trás.
- Certo. É assim que vai ser. Você vai fazer exatamente como Jake disse e será a minha sombra. Você fará tudo o que eu disser, exatamente como eu disser... e você vai parar de ficar me olhando tão de
perto.
- Como eu vou parar de te olhar de perto se eu vou ficar do seu lado o tempo todo?
- Se vira. Nós não vamos ser amigos ou fazer um pacto de sangue
- Eu não te pedi para ser nada meu. Por que está bravo comigo?
- Eu não estou bravo.
Mas ele percebeu que tinha soado bravo. Ele suspirou.
- Olhe, Sam, quando eu contratei você, eu não sabia que ia ter que ficar dia e noite com você. Eu estou tentando fazer o que posso nessa situação chata.
Sam concordou bruscamente com a cabeça.
- Certo. Apenas me ensine o que for necessário. Eu posso ser tão hostil quanto você.
Matt viu o garoto girar e começar a ir embora.
- Espere, garoto. Você não pode voltar ao acampamento até que eu esteja pronto. Ordens do Jake.
Sam parou, e Matt viu o garoto cruzar os braços na direção do peito.mMatt sentia o garoto encarando ele na escuridão. Ele não sabia porquê estava sendo tão implicante quando Sam estava somente preocupado.
O garoto não tinha pedido a Matt para ele ser seu amigo. Era Matt o intrometido, botando o nariz onde não devia, tentando salvar o garoto. Quando ele aprenderia que as pessoas não podem ser salvas? Que
não importa o que se faça, no fim, nada faz diferença. Ele andou.
- Certo, nós podemos ir.
- Eu não gosto disso tanto quanto você - Sam murmurou.
Sam tentou ignorar o tremor em seu estômago quando Matt colocou seu saco de dormir ao lado do dela e se deitou. Ela sabia que dormir ao lado dele era completamente diferente de dormir ao lado de Amy.
Amy não era musculosa. Matt parecia sempre ter trabalhado duro. Amy cheirava a violetas. Matt cheirava a cavalo e couro.
Amy não tinha barba no rosto. Ela não sabia mexer num saco de dormir como ele que já estava acostumado a dormir sob as estrelas várias vezes antes.
Sam passou os dedos nos cachos cortados. Ela se assustou quando percebeu que eles estavam pinicando. Por que ela sentia a necessidade de parecer apresentável? Ela deveria ser um garoto, e não uma garota
querendo a atenção de Matt.
Matt tinha tirado as botas. Pelo menos agora ele estava usando meias, mas ela não conseguia se esquecer de como eram seus pés nus. As mangas de sua camisa estavam fechadas nos cotovelos, expondo os músculos
firmes de seus antebraços.
Matt tinha colocado a blusa para fora da calça, se esticado no chão, e dobrado seus braços por trás da cabeça. Um par de botões tinha saído de suas casas e Sam podia ver seu peito. Era tão diferente
do dela.
Embora seu peito parecesse duro, ela imaginava que seria bom estar confortavelmente apertada contra ele. Queria que ele dissesse que ela não era louca por estar nesta viagem. Dando as costas para ele,
ela virou de lado, e puxou os joelhos em direção ao estômago e os envolveu. Ela não deveria estar pensando em ser abraçada por Matthew Hart. Ela não conseguia atinar porquê ela queria ser abraçada por
ele. Ela nunca tinha desejado antes ser abraçada por um garoto. Antes da guerra, ela gostava de correr com eles, subir em árvores, superar a esperteza deles, e ignorá-los quando estavam de mau humor.
Ela estava tentando ignorar Matt. Toda vez que ela fechava os olhos, o via deitado naquela pose convidativa. Ela se via saindo de onde estava e indo se aninhar no peito dele. O abraço dele a cercando
com carinho. Ela se retorceu. Certamente não precisava daqueles pensamentos. Ela podia ouvir as chamas que crepitavam na fogueira do acampamento, o distante mugido do gado, as folhas nas árvores sussurrando
com a brisa leve. Estava tudo muito calmo, incrivelmente pacífico.
Mil estrelas brilhavam no céu da noite. A lua cheia derramava sua luz pálida sobre a paisagem. E um jovem no qual ela não conseguia parar de pensar estava dormindo ao seu lado. Ela se moveu.
- Sam, pare de se mexer - Matt disse. - Está me incomodando.
- Eu não consigo achar uma posição.
Ela ouviu ele levantar o corpo um pouco acima do chão. Ela olhou por cima do ombro. Ele se apoiou com o cotovelo, olhando para ela com tal intensidade que ela temia que ele pudesse examinar seus pensamentos.
- Você nunca dormiu no chão antes? - Ele perguntou.
Ela se virou para encará-lo.
- Não. Nunca tinha estado longe de casa, também.
- Você não lutou na guerra? - Ele perguntou.
Ela negou com a cabeça.
- E você?
- Sim, eu fui.
Ele ficou de costas para o chão, e empurrou as mãos para baixo da cabeça, e olhou para o céu. Ela respirou fundo, não queria perguntar mas estava incrivelmente curiosa.
- Quantos anos você tinha?
Ele mexeu a mandíbula de um lado para outro daquele jeito que mostrava que estava aborrecido.
- Quatorze, quando eu saí no princípio da guerra. - ele finalmente respondeu, não olhando para ela.
- Você era muito jovem. - ela sussurrou. Ela conhecia garotos que tinham ido aos doze.
- Você estava assustado?
Ela podia ver os músculos do rosto dele se contraírem.
- Vá dormir, Sam.
Ela se lembrou que Benjamin nunca tinha conversado sobre a guerra. Matt parecia ser do mesmo jeito.
- Não é vergonha nenhuma dizer que estava assustado. - ela disse baixinho.
- Eu não tenho vergonha. Eu só não tenho nada para dizer sobre esse assunto - ele disse cortante.
Ela sabia que não conseguiria dormir direito se ele estivesse chateado com ela. Ele poderia enviá-la para casa tanto quanto Jake podia. Ela queria acabar com a dor dele, e abraçá-lo causaria suspeita,
tudo que ela podia fazer era conversar.
- Meu irmão mais velho lutou na guerra - ela disse a ele.
Novamente ele hesitou como se realmente não quisesse saber qualquer coisa sobre ela ou sua família.
- Ele voltou para casa?
- Sim.
Ele olhou de volta para ela.
- Eu fico feliz.
- Eu, também.
Ela lambeu os lábios, se perguntando o quanto poderia revelar. Matt não queria sua amizade, mas ela imaginava que ficar meses fora sem conversar com ninguém seria algo solitário.
- Ele perdeu o braço em Shiloh. Se não fosse por isto, ele estaria trabalhando nesta viagem, não eu. Ele acha que não tem condições de pegar esse trabalho."
Ele enrugou a testa.
- Poderia precisar de um pouco de esforço, talvez tentar e errar, mas eu acho que ele seria capaz.
Ela sorriu, agradecida por ouvir seus próprios pensamentos altos.
- Foi isso que eu tentei dizer a ele, mas ele é muito teimoso para me ouvir.
- Não vai dar certo se ele não estiver com vontade de fazer - Matt disse.
- Eu também acho
Ela sentiu um pouco de esperança, sabia que a amizade que ele queria evitar estava começando a surgir. Ela sentia falta de Mary Margaret como amiga apesar de Matt não ser nada parecido com ela.
- Você se feriu? - Ela perguntou.
Ela podia sentir a dúvida antes dele vivamente concordar com a cabeça.
- Em Gettysburg. Tomei uma bala no quadril. Eu manco um pouco quando fico cansado.
- Você deve ter sentido medo - ela falou suavemente.
- Até o último fio de cabelo.
De repente ele fez uma carranca ao perceber que tinha admitido.
- Vá dormir, garoto.
Ele se virou, dando as costas largas para ela. Ela dobrou os dedos para não cair na tentação de tentar tocá-lo. Algo dentro dela estava desabrochando, uma emoção que ela não conhecia. Ela apreciava conversar
com Matt. Simplesmente olhar para ele lhe dava prazer. Ela gostava de tê-lo por perto. O que estava acontecendo com ela?
Ela tinha dito para sua mãe que nenhum dos peões perceberia que ela era uma garota. O que ela não entendia era o porquê de sua vontade desesperadora de que Matt descobrisse que ela não era um garoto.
- Está na hora.
Matt despertou, embora a voz de Sam tivesse sido baixa e calma. Jake insistia que ninguém no acampamento tocasse ou agitasse alguém que estava dormindo. A maior parte deles tinha ido para a guerra e
automaticamente pegavam suas armas de fogo quando ouviam algum barulho muito alto. Alguns tinham o hábito de atirar antes até de estarem completamente acordados. Com as névoas do sono começando a desaparecer,
Matt podia ver Squirrel rindo para ele, revelando o porquê do apelido (Squirrel = esquilo).
- Seu relógio está tocando - Squirrel disse a ele.
Bocejando, Matt se ajoelhou e foi engatinhando em direção a Sam o mais devagar possível, tentando não surpreendê-lo. Ele pensou em deixar o garoto dormir. Eles tinham demorado demais para dormir. Ele
tinha revelado mais do que tinha pretendido. Como o garoto tinha conseguido ultrapassar as barreiras que ele tinha construído?
Ele era jovem, nenhuma dúvida sobre isto. Existia uma maturidade nele que parecia estar em conflito com sua mocidade. Matt não conseguia realmente entender. O garoto tinha percebido coisas que a maioria
dos caubóis ignorava. Ele parecia olhar o mundo e as pessoas mais profundamente. Tentando enxergar por dentro. Ninguém mais parecia notar que Matt preferia ficar à parte do grupo. Se ele fosse esperto,
ele deixaria o garoto para trás. Mas ele não queria entrar em confronto com Jake. E isso significada levar o garoto com ele.
- Sam? - Ele sussurrou.
Sam abriu os olhos, claramente desorientado.
- É hora de nosso turno. Temos quer vigiar o rebanho - Matt explicou.
Fazendo careta, Sam se sentou em cima do catre e colocou o casaco grande em volta dos ombros. Tinha feito frio durante a noite e Matt tinha sua própria jaqueta para vestir. Mas ele não vestiria uma roupa
tão justa quanto Sam. Ele gostava de ter mobilidade.
- Sacuda suas botas antes de colocar de novo
Matt ordenou e ele ergueu a própria bota, virou de cabeça para baixo, e bateu a parte inferior e os lados.
- Por quê? - Sam perguntou, enquanto abria a boca em um bocejo largo.
- Escorpiões, serpentes, centopéias... eles gostam de entrar em uma bota morna durante a noite.
Os olhos do garoto arregalaram tanto quanto a sua boca.
- O quê?
Matt não conseguiu conter um sorriso leve.
- Não me diga que você tem medo de insetos.
- Não tenho medo. Eu só não gosto deles.
O garoto levantou a bota só com o polegar e o indicador como se ela achasse que ela fosse mordê-lo. O garoto era uma contradição: num minuto era determinado, no outro afeminado. Ele tinha que ser mais
jovem do que dizia ser... Matt pegou a bota de Sam e a bateu no chão. Ele deu a bota para o garoto e pegou o outro e fez a mesma coisa.
- Pegue para nós dois uma xícara de café da carroça de provisão enquanto eu busco nossos cavalos.
Ele não ficou esperando Sam fazer o que ele tinha pedido, mas seguiu pelo meio do mato, onde escolheu dois bons cavalos noturnos. Ele começou a arrumá-los enquanto pensava sobre sua conversa com Sam
mais cedo. Havia algo no garoto que fazia Matt conversar, isso fazia ele se lembrar das amizades que ele tinha feito antes da guerra. As amizades que a guerra tinha roubado dele. Ao mesmo tempo em que
Matt tinha terminado de aprontar os cavalos, Sam se aproximou e estendeu a xícara de lata em direção a ele. Ele bebeu o café.
- Obrigado.
- Quanto tempo nós temos que cuidar deles?
- Um turno tem duas horas. Você saberá que o nosso turno acabou quando o Sol se mover a sudoeste da Estrela Norte.
O garoto olhou para a imensidão do céu.
- É assim que os caubóis sabem a hora?
- Sim, a maior parte não usa relógio. O caminhar do Sol ao redor da Estrela Norte mostra o caminho.
Ele decidiu que o quanto mais ele explicasse agora, o mais cedo Jake deixaria ele se separar de Sam. Ele montou no cavalo e viu Sam fazer a mesma coisa.
- Então o que nós fazemos?
Sam perguntou enquanto seus cavalos iam em direção ao rebanho.
- Nós vamos dividir os bois em três seções. Nós seremos responsáveis por vigiar o grupo do norte. Só caminhe em torno do perímetro. Cante uma canção do Texas que talvez eles fiquem quietos.
- Você quer dizer cantar uma canção sobre o Texas? - Sam perguntou.
Matt continuou esquecendo que a experiência do garoto era limitada a apenas uma vaca leiteira.
- Uma canção do Texas é quando os caubóis ficam assobiando uma melodia sem palavras.
- Eu gosto de canções com palavras. Eu costumava cantar para a Velha Bess - Sam disse com tom saudoso.
- Quem era a Velha Bess?
- Nossa vaca leiteira.
Uma vaca era uma vaca. O garoto definitivamente se importava demais, e isso o levaria a ficar angustiado. Quando eles juntaram o rebanho, Matt mudou de direção indo para o norte e Sam o seguiu.
- Você mencionou que você nunca tinha estado longe de casa. Desse jeito é normal ficar com saudade
Matt disse em tom baixo, quase um sussurro. A última coisa ele queria fazer era começar um estouro no seu primeiro turno com Sam.
- Nós não vamos ficar tanto tempo assim - Sam disse.
Matt virou a cabeça, apesar de achar que era improvável que o garoto pudesse ver seu rosto daquela distância, apesar do luar.
- É mais a distância do que o tempo que faz você sentir saudade de casa. O mais distante você viaja, o menos provável parece que você vai retornar para casa. E quando você finalmente... - sua voz foi
diminuindo.
- O quê? - Sam perguntou.
Ele não conseguia explicar para o garoto que quando ele finalmente chegava em casa, ele não se sentia como se realmente tivesse retornado.
- Eu não sei porquê quando você está por perto, minha língua começa a se mover... Eu normalmente não converso muito.
- Nós podemos acabar nos tornando amigos afinal,
Sam disse, e Matt teria jurado que ele ouviu uma nota esperançosa na voz de Sam.
- Será melhor se nós não ficarmos.
- Por quê? - Sam perguntou.
- Porque eu fui carregado de ser seu professor, não seu amigo.
- Nunca gostei muito de escola - Sam replicou em uma voz petulante.
Matt não conhecia nenhum garoto que gostasse de sentar em uma classe. De fato, muitos dos homens na equipe não sabiam ler ou escrever. Felizmente, ele não era um deles. Ele tinha terminado seus estudos
aos quatorze. Seu pai tinha insistido que ele terminasse tudo antes de assinar os documentos dando a permissão para Matt se alistar. Mas Matt sempre tinha pensado que receberia uma educação de verdade
depois disto.
- Matt, você prometeu dizer pra mim como o rancho tinha ganhado esse nome - o garoto lembrou.
Ele achava que Sam tinha esquecido a promessa, mas ele devia ter percebido, o garoto era igual a um cachorro que não larga o osso. O que teria de mal em contar a história?
- Bem, a lenda veio da história da esposa do dono original da fazenda que ficava tão solitária que isso acabou partindo o coração dela. Ela partiu. E a partida dela fez o coração dele se partir também.
- Por que ele não foi atrás dela? - Sam perguntou.
- Dizem que ele a amava demais para ver ela infeliz ao lado dele, mas seu coração nunca mais foi o mesmo depois disso.
- Eu não gosto dessa história - Sam disse.
Matt também não. Como Sam, Matt nunca tinha entendido por que seu avô não tinha corrido atrás de sua avó e a trazido de volta para o Texas com ele. Ele também nunca tinha entendido por que ela tinha
deixado seu filho para trás.
- Matt, está tudo bem se eu cantar uma canção com palavras para as vacas? - Sam perguntou.
- Certo, garoto. Só mantenha um tom baixo e relaxante. Nós não queremos as vacas agitadas.
Ela começou a cantar "Amazing Grace" e as palavras começaram a flutuar através da brisa. Sam tinha uma voz agradável, um som jovial que lembrava a ele de tantos garotos das baterias, cantando de noite,
procurando pela coragem para marchar e batalhar no dia seguinte. Existia uma inocência na canção de Sam que era como um bálsamo para o coração ferido de Matt. O tocava. Fazia ele ficar contente por ter
oferecido sua ajuda ao garoto. Ele sabia que Jake o estava observando bem próximo. Jake ordenou que ele ficasse no final da trilha para que assim ele percebesse uma coisa: neste passeio, Matt não era melhor
do que qualquer outro ajudante. Ele tinha que seguir as ordens ou seria despachado.
Matt estava agradecido por Sam parecer que trabalhava duro. Juntos talvez eles pudessem limpar a barra que estava suja com Jake. Matt não gostava muito de admitir que o canto de Sam o tocava tanto quanto
parecia que tinha acalmado as vacas. A ânsia de Sam pelo aprendizado e o prazer que sentia o lembrava dele mesmo da época em que era muito mais jovem. Ele estava contente por Sam não ter ido à guerra.
Às vezes ele desejava que ele não tivesse também, e nem qualquer outra pessoa. As horas passavam devagar e monotonamente. Eventualmente, à distância, Matt via os cavaleiros abordando o próximo grupo que
vigiava o rebanho dormindo.
- Certo, garoto - ele disse baixo. - Está na hora da gente voltar.
No luar, ele podia ver o sorriso cansado do garoto.
- Dessa vez eu não vou ter nenhuma dificuldade em dormir- Sam murmurou.
Matt sabia que com ele não aconteceria o mesmo. Ele não tinha tido um sono tranqüilo desde que tinha ido para a guerra.
CAPÍTULO NOVE
O tinir do ferro contra ferro acordou Sam com um susto. Todos os músculos e ossos do corpo doíam; Sua cabeça latejava. Seus olhos estavam inchados e pareciam cheios de areia. Embora ela tivesse tido
um sono profundo, ela não tinha dormido o suficiente para sonhar.
Ela piscou na escuridão. O sol ainda não tinha levantado. Então por que ela deveria levantar? Rolando no chão, ela esmagou o chapéu contra o rosto.
- Venha, garoto - Matt falou.
- Vá embora - ela murmurou.
Ele se debruçou próximo e ela pôde sentir a respiração dele roçando ao longo da nuca dela, causando arrepios deliciosos até o fim da espinha. Por que seu corpo estava reagindo desse modo estranho? Só
por que ele estava perto? Nada disso tinha acontecido com ela antes. Era quase tão assustador quanto conduzir o gado, ir cada vez mais e mais distante de casa, longe da família. Porque até onde Matt sabia,
os pensamentos dela eram só sobre a família.
- Se você não se levantar, os outros caras provavelmente vão te arrastar e jogar no rio- ele advertiu.
Ela se sentou tão rápido que bateu no ombro dele.
- Ai! - Ele disse.
- Desculpe.
- Tudo bem. Você realmente tem medo d'água, não é?
Até mesmos nas sombras de antes do amanhecer, ela viu a preocupação claramente refletida nos olhos dele. Ela lamentou não poder ser sincera.
- Eu estarei bem quando cruzarmos o rio. Eu prometo.
Ele concordou com a cabeça, apesar de seus olhou não mostrarem que acreditavam.
- Já que você diz. Coloca seu saco de dormir atrás da carroça de provisão, pega um pouco da gororoba, e vem pra junto do fogo com os outros.
Ela notou então que o saco de dormir dele já tinha ido. Ele já tinha movido as coisas? Como os caubóis faziam isso dia após dia? Ela achou que quando seu corpo tivesse acostumado, ela ficaria bem.
Mas neste momento, entretanto, ela queria um banho quente e uma cama suave e nenhum dos dois estava disponível. Da mesma maneira que Matt a tinha ensinado, ela cautelosamente verificou as botas antes
de colocar. Então ela enrolou a sua atual cama e levou para a carroça. Ela estava envergonhada por notar que era a última a levantar. Ela não queria que Jake pensasse que ela era frouxa, não queria dar
motivos para ele substituí-la na próxima cidade. Cookie estendeu um prato de lata com uma espécie de panqueca em direção a ela.
- Coma - ele disse bruscamente.
Ela se perguntava se alguma vez ele já tinha sorrido. Ela agarrou um par de panquecas e uma xícara de café antes de passar para perto do fogo e sentar no chão ao lado de Matt.
Os gêmeos estavam lá, como também os dois caras que ela tinha visto rapidamente antes: Slim e Squirrel. Seus apelidos eram perfeitos. Slim (esbelto) era tão fraco que ele parecia que poderia correr pela
chuva sem se molhar. Até quando não estava sorrindo, os dentes de Squirrel (esquilo) saíam da boca. Ela achava que isso o fazia parecer adorável, atraente e fofo - apesar de que ela duvidava que ele ia
querer saber que ela pensava desse modo.
Os outros pareciam incrivelmente diferentes de Matt. Matt parecia mais velho e mais inteligente do que sua idade. Matt, tinha linhas de expressão que se estendiam até o canto dos olhos. Ela desejava
não gostar tanto de ficar olhando para ele. Nenhum dos homens jovens sentados em volta do fogo estava olhando um para o outro. E daria na pinta se ela continuasse olhando fixamente para Matt. Ela precisava
imitar os garotos. Eles todos pareciam muito diferentes entre si, mas ainda assim eles estavam cuidando do rebanho junto, todos trabalhando com a mesma meta em comum.
- Por que todo mundo está tão quieto? - Sam perguntou a Matt com a voz baixa.
- Não tem nada para dizer- Slim falou antes que Matt pudesse responder.
Sam concordou com a cabeça, realmente fazia sentido.
Matt sorriu ligeiramente, e o coração de Sam tremeu como uma folha ao vento.
- A maioria dos caubóis não fica fofocando - ele disse. - Se eles acham que um cara deve saber algo, ele dirá.
- Esse é o lema - Jed disse. Ou seria ele Jeb? Sentado do lado dele, o irmão concordou vivamente com a cabeça.
Ela se perguntou se parte da irritação de Matt no dia anterior tinha sido por causa de suas constantes perguntas. Mas se ela não questionasse coisas, como ela iria aprender tudo o que precisava?
- Todo mundo aqui já conduziu gado antes? - Sam perguntou.
- Mais ou menos - Squirrel respondeu.
- Não tinha muito serviço durante a guerra, mas o Chefe disse que no Norte eles estão pedindo muita carne de boi. É bom para nós que temos experiência. Significa que teremos uma outra viagem no ano que
vem e depois no outro.
A respiração de Sam engasgou quando Jake Vaughn se abaixou ao lado dela. Falando do diabo...
- Você vão ficar tagarelando o dia todo? - Ele perguntou.
- Não, senhor
Eles todos responderam ao mesmo tempo em que ficavam de pé como se tivessem acabado de tentar sentar num formigueiro. Sam começou a levantar, mas Matt colocou seus dedos ao redor do braço dela. Por que
ela tinha que gostar de sentir o braço firme e seguro dele? Ela achava que ele tinha a habilidade de consolar uma mulher quando ela estava se sentindo mal e aumentar ainda mais sua alegria quando ela estava
se sentindo feliz.
- Já que ele se agachou ao seu lado, Jake provavelmente quer conversar com você. Ele apenas queria que os outros fossem embora primeiro, certo, Jake?
- Está certo.
A respiração de Sam começou a ficar difícil. O homem tinha uma figura imponente e a estudava.
- O que você achou de ficar no final da trilha? - Ele perguntou.
- Eu gostei. - Uma pequena mentira. Ela achava que conseguiria até plantar sementes na poeira que cobria seu rosto.
- Bom, já que você está gostando, fará novamente. - Ele se levantou.
- Como você acha que Sam se saiu? - Matt perguntou.
Sam queria que o chão se abrisse e a tragasse por inteiro. Por que Matt não tinha deixado passar? Um canto da boca de Jake se ergueu, e Sam percebeu que ele não era tão velho quanto ela tinha pensado.
- Eu acho que ele se saiu bem, para um novato. - Ele se virou e foi.
- Sr. Vaughn? - Sam perguntou.
Ele parou e olhou fixamente para ela.
- Chefe.
Ela concordou com a cabeça depressa.
- Certo. Chefe. Já que eu me saí bem, não vejo razão para que Matt tenha que ficar do meu lado. Eu queria dizer que acho que ele podia voltar para a função anterior.
Qualquer coisa para conseguir ficar longe dele, para conseguir dar um rumo nos pensamentos . Jake movimentou a cabeça devagar.
- Sim, ele poderia.
Ela ficou aliviada.
- Só se eu achasse que é melhor assim... o que eu não acho. Não saia de forma nenhuma do lado de Matt. - Ele se dirigiu a passos largos em direção a carroça.
- Não é justo, ele castigar você só por ser legal e ter me trazido. - Sam jogou o resto do café de lado e se levantou.
- Tudo que nós temos que fazer é ensinar a você tudo o que você precisa aprender.
- Tudo?
- Tudo.
- Quanto tempo você acha que isso vai levar?
- Você aprende rápido - ele disse.
A esperança surgiu dentro dela. Um dia mais, talvez dois e ela estaria sozinha.
- Eu acho que dois ou três anos.
- Anos?" - Ela repetiu incrédula.
Ele puxou o chapéu para baixo e seu rosto virou apenas uma sombra.
- Sim. Temo que sim.
Os dias foram passando, um após o outro. Dias monótonos com nada além do barulho dos cascos do gado e uma rotina que raramente mudava.
Sam e Matt estavam procurando gado desgarrado, ela não podia dizer que levar o rebanho era fácil. Seu corpo doía e ela estava mais cansada do que ela achava que era possível e ainda assim estava acordada.
Ela pegava Matt dormindo sobre a sela enquanto eles levavam o rebanho e ela não entendia como ele não caía do cavalo. Tinha que ser experiência. A experiência que ela não tinha, mas que ele tinha. Ele
gastava muito tempo junto dos cavalos, enquanto ela tinha gastado a maior parte do tempo no campo.
Ele tinha desenvolvido uma relação de confiança com o cavalo. Uma confiança que ele não estendia a ela. Ele ficava sempre calado e raramente revelava qualquer coisa sobre si mesmo. Ela quase tinha inveja
do cavalo.
Ela desejava que Mary Margaret estivesse aqui porque ela desesperadamente queria conversar com ela sobre os sentimentos que ela tinha em relação a Matt. Quando ele estava próximo ela não conseguia tirar
os olhos dele. Quando ele não estava ela pensava nele constantemente. E quando ela dormia sonhava com ele.
Ela não conseguia ainda confirmar o que eram essas emoções. Ela gostava dele, ela definitivamente gostava dele... quando ela não estava preocupada que ele pudesse perceber que ela era uma garota. Ele
não estava só tomando cuidado com ela. Ele parecia tomar cuidado com todo mundo.
Nem Slim nem Squirrel sabiam escrever. Eles recitavam as cartas que mandariam para casa, e Matt escrevia para eles. Um rapaz devia a Matt um par de calças. Ele tinha ido se agachar perto do fogo e uma
faísca voou em cima dele. Matt tinha um par de calças extra e deu para o rapaz.
Além de sua bandana, Matt tinha dado a ela um par de luvas. E um pequeno caderno onde ela poderia anotar o que ela devia para os outros, e coisas que os outros deviam para ela. Até agora, ninguém devia
nada a ela. Mas a sua dívida com Matt crescia cada vez mais.
Ele a ensinou como trazer uma vaca errante de volta para o rebanho sem uma palavra. Como eles estavam fazendo agora. Parece que não importa o quanto os homens vigiem o gado de noite, sempre um ou dois
davam um jeito de fugir.
Jake contava o gado pela manhã e pela noite. O homem era obcecado por não desapontar o fazendeiro que o tinha contratado. Sam supôs que ela não podia culpa-lo pelo zelo. Afinal, ela estava determinada
a não desapontar Matt. Até para ela mesma, tinha que admitir que estava aprendendo muito mais rápido do que tinha esperado. E ela achou que já estava montando bem.
- Tem um ali - ela disse apontando em direção a uma moita.
- Você tem bons olhos, garoto.
Ela olhou para ele. Ele estava olhando para ela e a estudando como tinha mania de fazer, com uma mão em cima da sela e a outra no chapéu empurrado em cima da sobrancelha.
- Nós podíamos ter usado você quando estávamos reunindo o gado lá no sul- ele disse.
- Você estava no rancho?"
- Sim. É situado entre San Antonio e Austin.
Ela tinha visto um mapa do Texas na parede na escola, então ela tinha uma boa idéia do contorno do estado.
- Você viajaram bastante até contratar mais pessoas - ela disse.
- Muitos são novos. Jake decidiu que seria melhor ter mãos extras neste passeio porque já tinha bastante tempo desde que a maior parte deles tinha conduzido o gado.
- Mas ninguém puxou seu saco para entrar, né? - ela perguntou.
Ele sorriu, o primeiro sorriso verdadeiro que ela tinha visto no rosto dele. Fez ela sentir como se algo estivesse bailando no peito.
- Você foi o único que eu mesmo contratei - ele disse.
- Você queria não ter feito isso?
Matt colocou o chapéu para trás de forma que seu rosto ficou nas sombras.
- Não. Você está se transformando em um peão de primeira linha."
Ele desenganchou a corda da sela.
- Vamos pegar aquele boi."
CAPÍTULO DEZ
Sentada próxima do fogo, Sam assistia Squirrel, Slim, Jed, e Jeb jogando pôquer. Eles não a pediram para se juntar a eles, e ela tinha orgulho demais para se aproximar. Matt foi conversar com Jake que
tinha ido inspecionar o rebanho.
Duas semanas se passaram e a confiança em sua habilidade de parecer um garoto tinha crescido. Ela estava conversando com os homens e não mantinha mais tanta distância. Ela sabia que devia ter cautela
mas se sentia incrivelmente solitária.
Conseguir tirar uma ou duas palavras de Matt era como tirar leite de pedra. Os sorrisos raros que ele dava a assombrava. Ela imaginava o quanto as outras garotas gostariam de ver um sorriso tão devastador
quanto aquele. Ela queria ver mais sorrisos dele. Queria que ele confiasse mais nela.
E ela sabia que querer isso era perigoso. Porque se ela se aproximasse demais dele-ou de qualquer um -seu segredo poderia ser descoberto.
E ela estava tão cansada de sempre ficar andando pelos campos, vendo as amizades dos outros começando a se fortalecer e sabendo que em nenhuma delas ela estava incluída.
Ela trocou de lugar no tronco em que estava sentada. Jeb olhou para ela. Embora fosse noite, eles todos ainda estavam usando seus chapéus.
- Talvez a gente devesse convidar o Sam a ficar aqui com a gente - ele disse para ninguém em particular.
- Apenas um verdadeiro peão pode jogar - Slim disse.
- Eu sou um bom peão - Sam gritou, irritada que eles achavam o contrário.
Squirrel olhou para Slim antes de encolher os ombros.
- Sam está bem próxima de se tornar um verdadeiro peão.
- Não tão próximo assim, eu acho - Slim disse. - Eu não vi Sam pegar uma narceja.
- O que é narceja? - Sam perguntou sem pensar.
Todos os quatro olharam para ela como se fosse louca.
- Com certeza você sabe o que é uma narceja - Jed disse.
- Todos os caubóis sabem o que é uma narceja - Jeb disse.
- Pense, Sam, - Squirrel alfinetou - lá no fundo, você sabe o que é uma narceja, não?
- É algo que todo caubói sabe sem que ninguém precise falar - Slim acrescentou.
Sam respirou fundo. Ela queria responder com algo rude. Mas ela concordou com a cabeça.
- Sim, sim, eu sei o que uma narceja é. Eu só não estava pensando
- Bem, para você realmente ser chamado de peão, tem que pegar uma. É um rito de passagem. Todos nós fizemos isto antes de você entrar - Slim disse.
Os outros sorriram amplamente e concordaram com a cabeça.
- Então, o que eu faço? - Sam perguntou.
- Vá dizer pro Cookie que você está indo caçar uma narceja. Ele dará a você um saco de aniagem. - Slim continuou. - Eu arranjarei os cavalos e levarei você para onde eu vi um buraco de narceja mais
cedo.
- Talvez eu devesse esperar pelo Matt - Sam disse indecisa.
- As narcejas são tímidas - Slim explicou. - Eles não saem se existe mais de uma pessoa ao redor. A caça de narceja é um esforço solitário.
- Além disso, Matt não te levaria para caçar. Ele tem medo de narcejas - Squirrel disse.
- Se você quer ser considerado um peão de verdade, você tem que fazer isso - Slim disse. - Eu posso levar você lá antes do Matt retornar.
Sam se imaginou vendo a raiva de Matt. Ele disse para ela ficar aqui, mas ela precisava mostrar a Jake que podia cuidar de si mesma. Ela concordou com a cabeça antes que perdesse a coragem.
- Certo, eu farei.
Ela foi para a carroça onde Cookie estava lavando as panelas e potes.
- Cookie, eu podia pegar emprestado um saco de aniagem?
- Para quê? - Ele perguntou resmungando.
- Eu vou caçar narceja.
Suas sobrancelhas brancas se fecharam rapidamente realçando sua cabeça calva.
- Os rapazes falaram para você fazer isso?
Ela concordou com a cabeça. Ele agitou sua cabeça.
- Não acredito que demorou tanto assim. Eles enviam a maioria dos novatos logo na primeira noite.
- Você sabe me dizer com o que se parece uma narceja? - Ela perguntou.
- Ah, você saberá quando encontrar - Cookie a assegurou. Ele repetiu: - Você vai saber quando encontrar.
Matt notou no momento em que caminhava pelo acampamento. Havia expectativa pairando no ar. Ele não gostava disso. Não gostava nenhum pouco. Ele olhou ao redor. Sam não estava em nenhum lugar visível.
O medo o trespassou. Ele andou a passos largos para o fogo onde os quatro estavam ocupados jogando cartas.
- Onde está Sam? - Ele exigiu.
Squirrel gargalhou enquanto o resto deles riu discretamente.
- Onde ele está? - Matt insistiu.
- Mandaram ele caçar narceja - Esbelta disse, rindo igual a uma abóbora esculpida no Dia das Bruxas.
Matt devia ter adivinhado. A brincadeira mais popular entre os caubóis era enviar os novatos para a trilha para caçarem de um lugar escondido. Apenas os largar no meio do nada e dizer que eles deveriam
caçar uma narceja. Ele nunca entenderia por que os caubóis achavam que era engraçado enviar alguém para caçar uma criatura imaginária. Ele devia ter pensado em advertir o garoto, mas ele tinha estado mais
preocupado em se manter emocionalmente distante já que ele não podia fazer isto fisicamente. Ele tinha ensinado ao garoto como ser um peão de primeira linha. Ele não tinha pensado em ensinar o menino a
ser um caubói.
- Por que você tinha que fazer isto? Ele é só um garoto - Matt disse.
- Isso não vai fazer mal a ele - Jed disse. - É parte de ser um caubói.
- Onde você o levou? - Matt perguntou.
Slim empurrou a cabeça para o lado.
- Longe o suficiente do gado para que ele não comece um estouro.
- Vamos, Matt. Não me olhe com essa cara - Jed disse. - Nós estávamos só nos divertindo com o garoto.
- Mas aquele garoto é minha responsabilidade. Ele nunca esteve nem longe de casa.
Ele examinou a escuridão. As árvores se enfileiraram sobre o rio, mas uma vez que ele se moveu além das árvores, nada existia além do vazio e o gado que dormia.
- Seus idiotas - ele murmurou enquanto se dirigia ao seu cavalo.
- Ah, Matt, o garoto ficará bem - alguém disse atrás dele.
Mas e se ele não estivesse? O coração de Matt estava pulando. E se ele não estivesse? Sam levou quinze minutos para compreender que tinha sido enganada. Ela tinha suspeitado quando Slim não conseguia
se lembrar exatamente de onde ele tinha visto o buraco de narceja, mas ele tinha certeza de que ela o acharia assim que fosse deixada sozinha. No luar, ela viu um tatu correr através da terra. Ela ouviu
o mugir do gado distante. Ela nunca tinha ouvido falar de uma narceja, e quanto mais ela pensava sobre os olhares astutos que os rapazes trocavam uns com os outros, falando sobre a caça de narceja, mais
ela percebia que ela estava sendo enganada. Ela deveria estar furiosa magoada, até. Mas ela tinha o pressentimento de que atirar de lugar escondido era exatamente o que Slim indicava um rito de passagem.
Ela não teria se importado tanto se a brincadeira não fosse no escuro e ela não estivesse só. Ela tinha uma arma de fogo que nunca tinha usado. Um cavalo que ela nunca tinha montado antes. E um saco de
aniagem vazio.
E quando ela retornasse para o acampamento, ela se depararia com a raiva de Matt. Ou sua decepção por ela ter sido tola o suficiente para acreditar nos outros.
Ela viu uma silhueta emergir da escuridão e imediatamente reconheceu o dono pelo modo como se sentava na sela e pelo formato dos ombros. Ela ficou perturbada por conhecer tão bem o perfil dele. Ele parou
o cavalo na frente dela, e ouviu o suspiro de aborrecimento dele.
- Garoto, o que você estava pensando quando deixou eles te largarem aqui sozinho? - Ele ralhou.
Ela sentiu o início de lágrimas nos olhos. De todas as coisas que ela temia quando tinha decidido se disfarçar como um garoto, era ficar sem nenhum amigo. Mas garotos não choram, então ela tinha que
esconder suas emoções e o modo mais rápido era com raiva.
- Será que dá para você parar de me chamar de garoto? Meu nome é Sam.
- Eu sei o seu nome - ele murmurou.
- Então fale - ela quase cuspiu. - A menos que você tenha medo.
- Por que eu teria medo?
- Usando meu nome poderia fazer com que nós parecêssemos amigos. Mas me chamando de garoto você tenta manter distância entre nós, que é justamente o que você está tão ansioso e preocupado em manter.
- Olhe, garoto, eu disse a você que nós não iríamos ser amigos.
- Você disse a todos os outros que eles não deveriam ser meus amigos, também?
- Claro que não, - ele disse. - Foi essa a razão pela qual você deixou eles trazerem você até aqui? Para que você pudesse ser amigo deles?
- E se eu fiz?
- Essa é um razão estúpido.
Mais lágrimas apareceram. Ele estava certo ela tinha sido crédula. Ela se virou depressa para que o luar não refletisse as lágrimas dela. A sela rangeu quando ele desmontou. Ela sentiu que ele estava
muito próximo, embora não a estivesse tocando.
- Eu só queria fazer parte. Eu trabalho tão duro, Matt, mas eu me sinto muito só. Eu não esperava que não fizesse nenhum amigo. - Com o dorso das mãos, ela secou bruscamente as lágrimas que rolavam sobre
suas bochechas. Ela não podia explicar a solidão que era ser a única menina cercada por um bando de homens. Não quando ela era, supostamente, um garoto.
- Droga, Sam, não chore - ele disse baixinho.
- Eu não estou chorando. - Ela mentiu.
Era tão difícil manter a promessa de ser honesta. Ela foi para longe dele, irritada por ser fraca, mas ainda mais irritada por ele ser tão forte.
- Sam, você prometeu que não mentiria mais.
Ela se virou e foi andando na direção dele.
- Certo, então. Aqui está a verdade.
Ela firmou o dedo no peito dele, e não se surpreendeu que isto a fazia se sentir como se estivesse batendo contra uma parede de tijolo.
- Eu estou centenas de quilômetros longe de casa, e qualquer um aqui não se importa comigo. Eu podia morrer...
- Não diga isso! - Ele interrompeu. - Você não vai morrer aqui.
- Eu poderia. E ninguém se importaria.
- Eu me importaria.
- Não, você não iria. Os amigos se importam, Matt. Você disse a mim que nós não vamos ser amigos. Eu estou tentando mas é realmente difícil. Não ter um único amigo e acordando com a sua cara carrancuda.
Indo dormir sem ter ouvindo um boa noite.
Ela saiu andando. Ela tinha falado como uma menina agora e isso era a última coisa que ela pretendia. Ela não se importava com os calos em suas mãos, mas ela estava começando a sentir que também estavam
se formando calos em seu coração. Ela não queria ser tão firme quanto Matt, Jake ou Cookie.
- Os caubóis não são bons amigos, Sam. A maioria deles está fugindo de algo.
Ela olhou por cima do ombro para ele.
- Do que você está fugindo, Matt?
Ele baixou o olhar para o chão e começou a dar pequenos chutes com a bota. Ele vivia dizendo para ela não mentir mas esse silêncio dele o fazia parecer tão culpado quanto ela por não estar sendo sempre
honesta. Mas ela nunca o convenceria disto.
- Eu me sinto um idiota, - ela admitiu. - Caçar um animal que não existe. Os outros nunca me respeitarão, não agora que eu fui tão estúpido - ela acrescentou.
- Você não foi estúpido - ele disse, erguendo o olhar para ela. - Eu foi caçar quando tinha doze anos.
- Você foi?
- Sim. Todo cowboy vai. Você não pode ser chamado de caubói se nunca tiver ido. Eu acho que até o Jake foi caçar um dia.
- Então por que você está bravo comigo?
- Eu me sinto responsável por você, Sam, e eu tenho medo de que acabe te desapontando. Mas parece que é exatamente isso o que estou fazendo. Vou tentar ser um pouco mais amigável.
Ele disse "amigável" como se fosse algo que ele tivesse medo de pisar em cima ou algo que tivesse que raspar do fundo da bota. Ela queria dizer a ele que não fizesse mais favores, mas a verdade era,
que de todos os homens na comitiva, Matt era o que ela mais queria que fosse seu amigo.
- Ajudaria se Jake não ficasse olhando a gente tão de perto - ela disse.
- Eu concordo. Na verdade, é sobre isso que eu fui conversar com ele. Mas ele ainda não se sente confortável comigo dando opiniões, então eu acho que nós estamos os dois um com o pé atrás com o outro.
Ele montou no cavalo.
- Vamos. Vamos voltar e eu ensinarei você a jogar pôquer com aqueles caras.
CAPÍTULO ONZE
Alguns dias mais tarde, Matt se sentou em baixo de uma árvore enquanto Sam segurava um espelho pequeno na frente dele. Matt com cuidado raspou a barba sedosa que crescia no queixo. Seus pêlos tinham
começado a crescer quando ele tinha quinze anos. Mas aos dezessete mais ou menos foi que eles começaram realmente a engrossar. Sam ainda não tinha nem sinal de pelo. Ele se perguntava se o garoto estava
ansioso para ter pêlos no rosto assim como Matt tinha ficado.
- O que você acha, Sam? Acha que eu tenho pêlo suficiente aqui para deixar um bigode decente?
Sugando o lábio superior para dentro da boca, ele observou os pêlos que cresciam em cima do lábio. Ele realmente estava começando a gostar de ser amigo de Sam. O garoto prestava atenção a cada palavra
que Matt dizia como se elas fossem preciosas. Ele ergueu o olhar acima do reflexo no espelho e viu duas manchas vermelhas apareceram nas bochechas de Sam. Antes de se encontrar com Sam, Matt não estava
certo de já ter visto um rapaz ficar vermelho antes.
- O que você acha? - Ele perguntou novamente. - Falando sério. Não importa o que você diga, não vai me chatear.
- Eu acho que você fica melhor sem o bigode.
Matt virou o rosto e voltou a se olhar no espelho.
- Eu acho que você está certo.
Ele barbeou o bigode e tirou o resto do sabão. Ainda com a navalha na mão, ele tirou os pêlos que ainda restavam. Não queria ter pêlos hoje à noite. Quando ele terminou, olhou satisfeito o próprio reflexo.
Ele passou os dedos pelo cabelo.
- Você fez um bom corte no meu cabelo. Você tem certeza de que não quer que eu corte o seu?
- Tenho certeza - Sam disse apressadamente.
Rindo, Matt pegou a bolsa com suas coisas. Ele despejou um pouco de água-de-colônia na palma da mão antes de bater levemente nas bochechas e queixo.
- Quer um pouco? - Ele perguntou a Sam.
Sam negou com a cabeça. O garoto realmente parecia assustado.
- Sam, tudo estará perfeito hoje à noite - ele o assegurou.
- Eu realmente não quero ir, Matt.
Matt se debruçou para frente e colocou os cotovelos apoiados nas coxas.
- Olhe, Sam, não é todo dia que nós encontramos casualmente uma cidade que nos convida para uma dança. Mais ou menos uma semana e então nós estaremos no Rio Vermelho. Não há nenhuma cidade do outro lado
por quilômetros e quilômetros. Um caubói tem que se divertir quando pode.
- Mas eu me sinto mal em ir.
- Jake colocou o nome de todo mundo no chapéu- ele lembrou a Sam. - Ele tirou os seis que tinham que ficar para trás e cuidar do rebanho.
- Não parece justo.
- Mas sempre é feito assim. O gado vem em primeiro lugar. Um caubói sabe disse quando entra. Nós não podemos deixar o gado sozinho. Alguém tem que tomar conta deles. Tirar os nomes de um chapéu para
ver quem fica para trás, é o melhor modo - ele pacientemente explicou.
Ele já tinha explicado isto antes quando Jake tinha anunciado que eles tinham sido convidados. Matt não podia entender o porquê de Sam ser contra eles saírem e se divertirem, especialmente quando podia
haver algumas moças para fazer companhia. Matt poderia preferir não ser amigo dos homens com quem ele trabalhava mas ele não tinha nenhum problema em ficar amigo de uma ou duas jovens.
- Mas eu não quero ir - Sam insistiu.
- Se você quiser ficar para trás, um daqueles seis homens vão querer ir dançar no seu lugar. Nós teríamos que ter um novo sorteio. Não acho que o Jake gostaria.
Na verdade, ele não achava que Jake se importaria. O único medo era que se Sam não fosse, Matt seria ordenado a ficar para trás também. Ele estava a fim de dançar e ele queria que Sam se divertisse um
pouco. O garoto não parecia saber como se divertir. Ele nunca mergulhava no rio já que não podia nadar. Ele raramente jogava cartas porque não gostava da idéia de perder o dinheiro que ele tinha ganhado
com muito trabalho. Ele nunca pregava peças nos outros caubóis. Até onde Matt percebia, ele ainda era tão sério quanto o primeiro dia em que entrou. Mas o garoto tinha sonhos... Sonhava com todas as coisas
que ele poderia comprar com o dinheiro que ganharia no fim do passeio. E Matt certamente não podia reclamar da rapidez com que o garoto aprendia uma nova tarefa. Ele não estava certo de já ter conhecido
algum cara que tivesse aprendido a pastorear o gado com a habilidade que Sam tinha aprendido.
- Vamos, Sam. Jake pegou duas vacas mais cedo para abater e assim nós vamos ter muita carne de boi para comer hoje à noite. Alguma esposa de fazendeiro vai assar uma torta de maçã. Você não pode ir embora
sem ter comido uma fatia de torta de maçã fresca. Além disso, provavelmente teremos várias filhas de fazendeiros por perto. Cookie pegou o violino então nós teremos música e dança. Será divertido.
Mas Sam estava olhando as luvas como se nunca as tivesse visto antes. Matt tinha dado a ele as luvas, e elas praticamente engoliam as mãos pequenas de Sam. Como um garoto conseguia ter as mãos tão delicadas?
Matt percebeu que elas eram um motivo de vergonha para ele. Sam tinha ido correndo até Cookie para pegar emprestado agulha e linha para arrumar a costura das luvas para que ficassem melhor. Ele se perguntava
se Sam já tinha quatorze. Ele certamente não conseguia acreditar que ele estava próximo de ter dezesseis.
- Eu não conheço nenhuma dessas pessoas - Sam murmurou.
- Você me conhece. Slim, Squirrel, Jeb.
Coitado do Jed. Seu nome tinha sido retirado do chapéu. Matt tinha o pressentimento de que Jake, de alguma forma, tinha feito um esquema para que um dos dois gêmeos ficasse para trás. Na noite passada,
os garotos tinham tentado fingir um ser o outro.
- Vamos, Sam, esta pode ser a nossa última chance de ter alguma diversão durante algum tempo.
Sam hesitou, e Matt decidiu mostrar seu trunfo final. Com um suspiro fundo, ele se sentou contra a árvore.
- Certo. Você ganhou. Nós não vamos.
Os olhos de Sam se arregalaram.
- O que você quer dizer com nós? Você pode ir sem mim.
- Não, eu não posso. Jake disse que você teria que grudar em mim como cola. Então, já que você não quer ir, então eu tenho que ficar para trás também para que você obedeça a ordem dele.
Ele sentiu uma pontada de culpa quando viu a decepção no rosto de Sam. Ele não conseguia entender o porquê de Sam não querer ir, mas ele estava certo de que se Sam fosse dançar, ele se divertiria.
- Oh, certo. Eu irei - Sam disse petulantemente.
- Você vai gostar, Sam. Eu prometo que você vai se divertir muito.
Sam estava tendo o pior dia de sua vida. De pé sobre as sombras de um canto no celeiro, ela assistia todo o movimento, tentando memorizar os vários aspectos da noite para que depois ela pudesse compartilhar
com Mary Margaret. A carne de boi, o feijão, e as tortas estavam deliciosas. Eles tinham feito ela se lembrar de casa e estava se sentindo um pouco nostálgica. Os violinistas tocavam uma melodia alegre
e depois eles terminaram em uma melodia mais lenta. Rápida. Lenta. Rápida. Lenta. Por mais que ela quisesse evitar, seu pé batia junto com a música. As pessoas eram amigáveis. As jovens, para seu aborrecimento,
eram especialmente amigáveis. Para alguém que dizia não querer fazer amigos, Matt certamente não estava seguindo seu próprio conselho esta noite. Ele estava praticamente virando "o melhor amigo" de várias
garotas. Ele também parecia ser um bom dançarino.
Desde o momento em que a música tinha começado, ele não tinha deixado de dançar uma única vez. As garotas piscavam tanto os olhos e esticavam tanto os lábios que Sam se perguntava se elas queriam ter
certeza de que ele sabia que elas possuíam todos os dentes.
Ela não queria ter esse tipo de pensamento indelicado. Só que ver as garotas darem em cima de Matt a fazia se sentir completamente miserável. Vestida com uma roupa de garoto, Sam nunca tinha parecido
tão sem-graça e ela queria muito poder usar um vestido. Ela se odiou por invejar os vestidos das outras garotas e seus cabelos longos. Cabelos que desciam até a cintura ou que era cortado curtinho. Ela
detestava ver o modo como Matt sorria para todas as meninas, como se cada uma fosse especial.
Seus olhos azuis tinham um calor mágico, um calor que ele nunca daria a ela. Mas por que iria ele? Em seus olhos, ela era um garoto. Ele não tinha nenhuma idéia de que sua imagem estava presente nos
sonhos dela. A música parou e ela o viu caminhar junto com a sua mais recente companheira de dança em direção a mesa e colocar um pouco de limonada em um copo para ela. A menina deu a ele um sorriso promissor.
Matt respondeu com um sorriso radiante, como se eles estivessem compartilhando algo especial. Sam odiava assistir mas ela não conseguia parar de olhar. O que ela não daria para que Matt a olhasse assim.
- Ei, Sam
Squirrel disse a ela enquanto se debruçava contra uma viga.
- Por que você não está dançando?
Desde sua expedição à caça de narceja, os outros estavam aceitando mais a sua presença. Ela supôs que isso era como eles tinham dito a ela um rito de passagem. Algo que ela precisava fazer para poder
pertencer ao grupo.
- Não quero dançar.
O que não era exatamente verdade. Ela queria dançar mas ela queria dançar com Matt, e o único modo para que isso acontecesse seria se ela revelasse seu segredo. Sua experiência na equipe acabaria no
mesmo instante em que ela fizesse isso.
- Cookie toca muito bem violino, não é? - Squirrel perguntou.
- É.
- Eu gosto das danças rápidas. Acho que Matt gosta das lentas.
- É o que parece - ela disse breve.
A próxima melodia tinha começado. Ela viu a menina colocar o copo de lado. Matt pegou na mão dela e a levou para a área de dança. Sam não sabia por que ela estava tão triste. Matt estava se divertindo.
Ela deveria estar feliz por ele.
- As garotas com certeza preferem o Matt. - Squirrel disse.
Com certeza que sim. Ela suspirou.
- Quanto tempo você acha que nós vamos ficar aqui?.
- Até o Chefe dizer que está na hora de ir. Parece que uma viúva gostou dele, então pode ser que demore.
Ela estava pensando se não tinha um jeito de ir atrás do rebanho sozinha. Não havia nenhum marco para mostrar onde ela estava e ela também não conhecia a área. Ela não queria se arriscar a perder a chance
de conseguir aquele dinheiro.
- Eu vou pegar qualquer coisa para comer. Quer vir? - Ele perguntou.
Ela negou com a cabeça.
- Não. Mas obrigado, Squirrel. - Ela virou a cabeça pensativamente. - Qual é o seu nome real, de qualquer maneira?
- Você rirá.
Ela riu.
- Não, eu não irei.
- Rupert. - Ele agitou sua cabeça. - Não saiba o que minha mãe estava pensando.
- Ela estava provavelmente pensando que amava você.
Ele riu.
- Pense. Você não quer mesmo vir comer? Nos estábulos, o povo é doido por maçãs. Eu acho que vou tentar pegar algumas.
Ela bateu levemente no estômago.
- Eu estou cheio, mas obrigado pelo convite.
Ele foi para longe. Ela deslizou novamente para a sombra e procurou a área de dança onde achou Matt novamente. Incrivelmente lindo, ele segurava a menina como se ela fosse uma jóia preciosa. Ouvindo
com atenção, Sam permitiu que a música entrasse por seus ouvidos. Ela permitiu que sua imaginação voasse, que tivesse rédeas livres. Ela imaginou que ela era aquela menina, cercada pelos braços fortes
de Matt. As chamas das lanternas iluminando os dois. Ela não estava mais usando calças. Ela estava usando um vestido novo, feito de um tecido azul. Ela não estava calçando botas. Ela estava calçando sapatos
pretos abotoados até o tornozelo. E seu cabelo não estava curto e enrolado na cabeça. Ele estava caindo como uma cascata através das costas até a cintura, escovado e com um lindo brilho.
E Matt.
Ele estava olhando para ela como se ela fosse a única menina no celeiro com quem quisesse valsar. Seus passos começavam a diminuir a velocidade. Em sua mente, ele abaixava a cabeça e os lábios iam na
direção dos dela...
A música parou de tocar e ela voltou de seu devaneio. Com uma grande decepção, ela viu ele sair do celeiro com o braço em volta de uma menina. Ela não queria pensar sobre o que eles poderiam estar fazendo
do lado de fora. Ou o quanto ela queria que ele estivesse fazendo isto com ela. Meu Deus! O que havia de errado com ela? Vários minutos mais tarde ela viu Matt voltar ao celeiro. A menina vinha longe dele.
O cabelo dela parecia ter sido bagunçado por dedos. Machucava demais pensar nisso. Matt começou a procurar alguém. De repente, os olhos dele se iluminaram e ele andou a passos largos em direção a Sam.
O coração de Sam começou a bater forte e as palmas da mão ficaram muito úmidas. Ele estava incrivelmente bonito hoje à noite com seu rosto barbeado, seu cabelo lavado e cortado. Ela tinha feito um bom
trabalho cortando o cabelo dele e sabia exatamente o que a outra garota tinha sentido quando passou os dedos naquele cabelo.
Como todos os homens, ele tinha tomado banho no rio e colocado um conjunto de roupas novas.
- Por que você está parado aqui, Sam? - Ele perguntou.
Porque ela estava apavorada pensando que talvez pudesse fazer ou dizer algo que a entregaria.
- Eu realmente não me sinto confortável aqui, Matt. Eu realmente quero voltar para o rebanho.
Ele balançou a cabeça.
- Eu não entendo. Todo mundo é tão legal.
- Especialmente as meninas, certo? - Ela desejava ter mordido a língua antes de dizer isto.
Ele sorriu amplamente.
- Sim, elas são. Você devia tentar conversar com uma delas.
- Então, eu posso dar uma de bobo como você está fazendo? Você vai acabar com as solas de suas botas do jeito que está dançando.
- Sam, eu não entendo o que está aborrecendo você.
Ela também não sabia. Ela só sabia que não gostava de ver ele conversando com, sorrindo para, ou dançando com as outras garotas.
- O que está me aborrecendo pode ser resolvido indo embora.
Matt chegou perto, e o cheiro de sua colônia flutuou ao redor ela.
- Tem pelo menos um punhado de garotas aqui que estão livres para dar uns beijos. Você devia dar um passeio com elas.
- Não, obrigado. Quando eu beijar alguém, será porque essa pessoa é especial
- Ela passou por ele levantando poeira. Ela não queria ouvir sobre os beijos que ele estava dando nas meninas. Beijos que ele nunca daria nela.
Ela saiu do celeiro, indo para a noite. Matt provavelmente achava que ela estava maluca, mas ela não queria ter vindo aqui de qualquer forma. Sua primeira dança... sua primeira dança, e ela estava aqui
fingindo que era um garoto. Ela estava assistindo a dança dos garotos com as garotas, paquerando elas, conversando com elas. Ela nunca tinha experimentado qualquer uma daquelas coisas excitantes, divertidas.
Ela não estava só com ciúme de Matt, ela tinha ciúme de toda menina que não tinha que cortar o cabelo ou colocar roupas velhas do irmão.
Ela parou ao lado do curral e deu uma sacudida na cabeça. Ninguém a tinha forçado a cortar o cabelo. Ela que quis fazer isto. E vestir as roupas do Nate não era tão ruim. Elas davam mais liberdade. Ela
gostava das roupas quando não estava em uma dança.
Ela colocou os pés no primeiro degrau da grade da cerca e dobrou seus braços através do topo. Todos os cavalos se mexiam dentro do cerco. Se ela tivesse sorte, Jake chamaria todos com o fim da diversão
e eles voltariam ao acampamento logo.
- Sam?.
Ela apertou os olhos ao ouvir o som da voz preocupada de Matt.
- Matt, só me ignore. Eu não sei o que há de errado comigo hoje à noite.
Abrindo os olhos, ela girou o rosto na direção a ele. Estando em cima do degrau, ela estava no mesmo nível de visão que ele.
- Volte e vá se divertir.
- Eu não posso fazer isto, Sam. Não quando você está se sentindo tão mal.
- Matt, só por hoje à noite, esqueça as ordens do Jake. Esqueça que eu sou sua responsabilidade - ela disse a ele.
- Eu posso esquecer isso, Sam, mas eu não posso esquecer o fato de que você está se tornando meu amigo. E eu percebi o que está aborrecendo você - ele disse.
- Matt, não tem como você saber - ela disse honestamente.
- Não, eu tenho. Você nunca cortejou uma menina, não é? - Ele perguntou baixinho.
Ela voltou sua atenção na direção dos cavalos.
- Matt
- Não é? - Ele insistiu.
- É. - Isso, pelo menos, era verdade.
- Eu lembro de como fiquei nervoso da primeira vez que eu dancei com uma menina. Você só tem que perceber que está fazendo a menina um favor em dançar com ela
Sam olhou para ele e estreitou seus olhos.
- Talvez ela esteja fazendo um favor dançando com você.
Ele riu no luar.
- Você não vai conseguir ganhar de mim nessa questão. E se for sobre beijo então
- Eu definitivamente não estou pronto para beijar - ela soltou.
Ele riu baixinho.
- Tudo bem, Sam. Só vá devagar. Se você não quiser dançar, só ache uma menina com quem conversar.
- Talvez eu vá - ela disse, sabendo que ela não iria.
- Eu vou voltar lá para dentro, então. Ache uma moça para rodopiar no salão
Ele passou a mão no cabelo de Sam.
- Honestamente, Sam, você devia tentar dançar. As meninas são suaves e cheiram tão bem. Uma vez que você chega a conversar com elas, não é tão difícil dançar e depois beijar.
Ela viu ele ir embora, então ela se debruçou contra o celeiro. Ela não queria dançar com uma menina.Ele também não queria dançar com nenhum outro cara, quem quer que fosse. Ela só queria dançar com Matt.
Ela colocou os braços em volta do corpo, como se tentando segurar todos os sentimentos bem firmes dentro dela. Ela tinha medo de dar um nome a ele, de ficar pensando demais nele. Ela tinha medo de estar
se apaixonando por ele.
E ele nunca responderia ao seu amor. Ele achava que Sam era um garoto. E se ele descobrisse que Sam era uma menina... ele também não a amaria. Como ele poderia amar alguém que o tinha enganado?
CAPÍTULO DOZE
As gramas da pradaria rolavam diante deles como se gostasse da imensidão vazia. O cavalo de Sam caminhava lentamente ao lado de Matt, ela não conseguia fazer nada quanto a dor que sentia.
Nos dias que se passaram desde a dança, Sam repetidamente tentou estabilizar suas emoções. Mas elas não cooperavam. Desde então ela se imaginava dançando com Matt, ela percebia que estava se apaixonando
perdidamente por ele. Para ela, o mais inocente dos momentos era qualquer coisa exceto tranqüilo. Ela escutava até a respiração dele todas as noites enquanto eles deitavam um ao lado do outro. Isso não
significava nada para ele, claro. Eles estavam apenas dormindo. Mas às vezes, ela ficava olhando ele. E ficava imaginando como teria sido entre eles se ela nunca tivesse cortado o cabelo e se disfarçado
como um garoto. Ela teria chamado sua atenção na dança? Ele a teria abordado? Teria tirado alguns minutos para conversar com ela? Ele a teria pedido para dançar? Ele a teria levado para fora do celeiro
e dado um beijo apaixonado?
Ela pensava em beijo acima de tudo. Ele lentamente a beijaria, faria seus cabelos ficarem em pé? Ele sussurraria em sua orelha que a amava?
- Sam?
Sam voltou do devaneio com o som suave de sua voz. Agradecido por sua bandana esconder suas bochechas em chamas, ela olhou para Matt.
- Sim?
Ele trouxe o cavalo para mais perto dela.
- Parece que você está saindo da trilha, preste mais atenção. A menor coisa pode começar um estouro.
Ela deu um suspiro e mentiu.
- Eu estava prestando atenção.
- Alguma garota na dança te agradou?
Seus olhos estavam cintilantes e ela imaginava que embaixo da bandana ele estava rindo.
- Não - ela respondeu firme. - Por que você acha isto?
- Porque foi logo depois daquela dança que você começou a ter esse olhar distante. E normalmente quando um cara fica olhando para o nada, é porque ele está pensando em alguma mulher.
- Alguém na dança chamou sua atenção? - Ela ousou perguntar.
- Eu achei algumas meninas bonitas
Agora era a vez de ele estar com um olhar distante.
- E tinha umas duas garotas que certamente beijavam bem.
Ela tinha necessidade de pisar forte em seu pé por causa da frustração, mas isso estava um pouco difícil de fazer quando seus pés estavam nos estribos. Ele não sabia que todas as vezes em que ele falava
sobre garotas estava atormentando ela.
Uma semana depois Sam estava olhando fixamente as águas do Rio Vermelho. Ela estava à beira de deixar o Texas... entrando no Território de Indiana e indo além do Kansas e Missouri.mSe ela tinha qualquer
dúvida sobre ir adiante, ela sabia que precisava resolver isso agora. Uma vez que ela cruzasse o Rio Vermelho, ela não teria nenhuma oportunidade para voltar pelo menos, não sozinha. Mas assim como ela
podia cheirar o rio barrento, ela podia cheirar ainda mais o dinheiro. Só mais algumas semanas e ela teria completado a jornada. Ela estaria indo para a para casa e nunca mais veria Matt. A excitação de
estar com a família escureceu quando ela pensou em deixar Matt.
Ela sentiria falta dele. Eles tinham uma amizade muito legal, um laço que seria desfeito se ele descobrisse a verdade sobre ela. O gado estava cruzado o rio há mais de um dia. Eles pareciam se orgulhar
de sua habilidade em nadar. Seus corpos afundavam no rio. Tudo o que ela podia ver eram suas cabeças e chifres. Tanto gado nadando.
E como sempre, ela e Matt estavam próximos do fim do rebanho.
- Se você quiser, nós podemos esperar até que todo o gado estejam do outro lado antes de nós irmos em nossos cavalos
Matt disse enquanto ele se sentava em seu cavalo ao lado dela. Nenhum deles estava com a bandana cobrindo o rosto. O gado não estava levantando pó. Estavam levantando água.
- Eu não tenho medo da água. Além disso, um caubói não deveria atravessar com o gado? - Ela perguntou.
- Sim, mas...
Ela olhou de lado para ele, esperando se ele iria ousar dizer que ela precisava de tratamento especial simplesmente porque ela era sua responsabilidade.
- Só lembre de manter um nó forte na corda da sua sela - ele disse. - Aperte bem as rédeas. A sela ficará escorregadia mas você ficará bem desde que você se mantenha sentado.
Ela desejava poder aliviar a preocupação dele confessando que ela sabia nadar, mas nesse caso ela teria que explicar por que ela não mergulhava nos rios próximos do acampamento com eles. Eles não tiveram
que cruzar os outros rios antes porque eles corriam de norte a sul. Mas este aqui corria de oeste a leste.
- Eu ficarei bem, Matt.
- Fique perto de mim, Sam - ele ordenou antes de chutar seu cavalo e levá-lo rio à frente.
Ficar perto dele. Eles tinham estado juntos por seis semanas. Ela sabia o que tinha que fazer. Ele achava que ela era um garoto que precisava ser protegido. Isso a irritava demais.
Ela sabia que a atenção dele não deveria irritá-la. Mas irritava.mCinnamon empacou na extremidade da água. A água estava rodando em volta do gado. Ela cutucou os flancos da égua.
- Vamos, garota, nós precisamos ir.
A égua entrou na água, mas agora várias vacas separavam Sam de Matt. Ela não estava preocupada, entretanto. Ela estava confiante de que ela podia lidar com a égua. A água começou a chegar na canela dela.
Então passou para as coxas. A força da água a surpreendia. Da margem, não parecia estar tão forte. O gado gritava. Parecia que alguns queriam voltar para a beira de onde tinham vindo. Outros estavam se
movendo muito próximo, seus chifres se batendo e emaranhando.
Uma vaca foi contra ela. Cinnamon relinchou. O gado girou a cabeça, seus chifres enormes pareciam um arco largo. Sam se equilibrou precariamente na sela escorregadia.
Com seus braços batendo, ela perdeu o equilíbrio e acabou caindo na água. Ela desceu na profundidade escura. Algo bateu nela de um lado, qualquer outra coisa bateu do outro lado. Era peludo, morno. Bois.
Tinham que ser bois. Ela tentou fazer caminho e voltar para a superfície buscando ar. Cercada por bestas enormes, ela estava sendo nocauteada. Ela não conseguia ver Cinnamon. A água começou a arrastá-la
para baixo. Ela voltou para baixo. Enquanto ela lutava e chutava, tentava tirar o casaco. Sem ele, achava mais fácil golpear, arranhar e tentar subir. Ela subiu à superfície, tomou um trago de ar precioso,
e imediatamente foi puxada de volta para baixo pela forte ressaca criada pelo gado. Algo duro a chutou no lado, e um raio branco explodiu diante de seus olhos fechados. Ela tinha que ficar livre. Tinha
que ficar livre. Mas em todos os lugares que ela girava, estava envolta por barrigas, pernas, e ancas. Não existia nenhuma fuga.
- Sam! - Matt gritou.
Sua barriga se contorcia enquanto ele via Sam surgir e depois afundar na água vermelho-escura do rio. O gado gritava em conjunto. De pé nos estribos, Matt balançava a perna na sela antes de saltar para
a água. Os chifres batiam ao redor dele enquanto ele tentava subir nos bois enquanto ficava o tempo todo tentando manter Sam dentro de seu campo de visão. Ele podia ver Sam tentando chegar até a égua,
desesperadamente tentando remar na água.
Ele saltou para o próximo boi. Ele viu Sam subir e afundar de novo, a roupa encharcada devia estar atrapalhando. A besta em Matt começava a despertar. Ele subiu no próximo touro, e então ele achou um
buraco entre os animais. Respirando fundo, ele mergulhou.
Abrindo caminho entre as barrigas e pernas, ele nadou para onde achava que iria encontrar Sam. Ele atravessou a superfície da água, respirando pesado. Ele viu Sam batendo os braços.
Com braçadas firmes, nascidas do desespero, ele nadou em direção ao garoto. Ele lutou contra a correnteza, e mergulhou para evitar um chifre afiado. Ele não iria deixar o garoto se afogar. De jeito nenhum,
de forma nenhuma. Ele não iria perder Sam do mesmo modo que ele tinha perdido tantos amigos durante a guerra.
Quando ele chegou perto, Sam afundou. Se apoiando na égua, ele agarrou o braço de Sam e a puxou para cima. Branca como uma folha, Sam estava com a respiração ofegante, as linhas ao redor da boca apertadas.
Com certeza um sinal de dor. Será que tinha levado uma chifrada? Matt sabia que isso já tinha acontecido antes.
- Está tudo bem, Sam, eu estou com você!
Ele deslizou o braço em baixo das axilas de Sam e começou a remar na água o melhor que podia com apenas um braço. Ele se voltou para o lado Texano do rio já que era a parte que ele mais conhecia. Eles
podiam cruzar para o outro lado mais tarde, já que ele acreditava que, com certeza, Sam estava intacto. Ele podia sentir Sam tremendo, estremecendo.
Ele se aproximou da beira do rio, suas botas já encostavam no fundo do rio. De pé, ele arrastou Sam para perto. Ele já tinha notado como Sam era leve? O quanto era magro? O garoto não tinha ganhado corpo.
A lama entrava nas botas de Matt enquanto ele arrastava Sam para a orla. Suavemente colocando Sam no chão, ele se curvou em cima dela, colocou a mãos em suas coxas, e pensou em tentá-lo ajudar a respirar.
Sam rastejou para uma árvore, sentou ligeiramente, se debruçou contra ela respirando com dificuldade.
- Você deveria - ele ofegou buscando ar - ter ficado perto de mim.
Sam concordou com a cabeça. Ela estava de costas, segurando os braços.
- Sam?
- Eu estou...bem.
- Algum boi provavelmente te chutou. Deixa eu dar uma olhada nas suas costelas.
Ele se abaixou ao lado do garoto, colocando a mão nos ombro de Sam, ele se virou ligeiramente. E congelou. As roupas encharcadas de Sam estavam grudadas no corpo, esboçando duas pequenas colinas e um
vale. Colinas? Vales?
Vários botões da camisa de Sam estavam soltos. O tecido aberto revelava uma pele molhada que brilhava, um pequeno volume onde deveria haver nada, apenas um local plano. Matt levantou de um pulo como
se seu traseiro estivesse em chamas.
- Meu Deus! Você é uma menina!
CAPÍTULO TREZE
Lívido, Matt ficou atônito. O solado se sua bota bateu no chão um após o outro. Uma menina. Sam era uma garota!
O tempo inteiro ele tinha comido com Sam e dormido ao lado dele dela, ela Sam sempre tinha sido uma garota. Matt montou ao lado dela durante o dia e a noite, ensinou ela a jogar pôquer e amarrar bezerros.
Ele se sentiu um idiota. Como ele não tinha percebido?
Ele preferia enfrentar o Exército da União do que Jake quando ele descobrisse que Matt tinha contratado uma mulher! Matt era o responsável por trazer uma garota para conduzir o gado!
O que seu pai diria quando ele descobrisse? Ele se perguntaria se Matt tinha esquecido o bom senso na guerra! Alguma coisa poderia ser mais humilhante... ou exasperante? Ele tinha sido enganado! Enrolado.
Feito de otário. Ele se virou e olhou para Sam.
Só dessa vez -pela primeira vez-ele não estava olhando para Sam o garoto, moleque, ele estava olhando fixamente para Sam a garota. Aquele rosto que não tinha pelos e parecia delicado, com as bochechas
e nariz minúsculo, atrevido e suave. Pestanas longas que emolduravam olhos verdes incríveis. O fato de que ele de repente parecia uma garota, parecia irritá-lo ainda mais.
- Você mentiu para nós! Desde o começo, você só fala mentiras.
Viu que Sam estava concordando com ele. Sua cabeça foi para cima e para baixo rapidamente. Ma então ele percebeu que Sam estava tremendo incontrolavelmente. Que droga!
- Matt!.
Ele ouviu a voz apressada de Jake da outra extremidade da água. Ele viu Jake na margem oposta. Todo o gado tinha passado e já estava no distante Território Indiano. Todo mundo estava lá longe do outro
lado do rio. Todo mundo exceto Sam e ele.
- O que está acontecendo aí? - Jake gritou. - Vocês estão bem?
Ele colocou as mãos em formato de cone perto da boca para estar certo de que seria ouvido.
- Nós estamos bem!
- Quer que eu vá até aí?
Isso, com certeza, era a última coisa que Matt queria neste momento.
- Não. Sam está um pouco agitado, mas eu posso lidar com isto. Nós alcançaremos vocês em um instante!
Ele soltou um suspiro de alívio quando Jake acenou com as mãos sinalizando para Matt que ele deixava a situação nas mãos dele. Jake girou com o cavalo e foi para longe.
Vou voltar para o caminho, Matt pensou. Encontrarei com eles, mas Sam vai voltar de onde veio.
Assim que ela parou de tremer como alguém que tinha ficado mergulhada numa tina de gelo, ele entrou na água e agarrou as rédeas de seu cavalo. Ele tinha sorte de o animal ter retornado para a beira.
Ele passou a mão no focinho de Robert E. Lee.
- Bom garoto.
Ele o levou de volta para a moita onde Sam ainda estava parada. Que droga! Os lábios de Sam estavam ficando azul. Matt tirou seu alforje da sela. Ele pegou os cobertores e se ajoelhou na frente de Sam.
- Aqui. - Ele colocou os cobertores úmidos ao redor Sam.
Ele queria ter cobertores secos para oferecer a ela, mas ele teria que cruzar o rio e ir direto para a carroça. Como a carroça de provisão tinha cruzado o rio antes do rebanho, ela estaria quilômetros
longe. E ele não podia deixar Sam sozinha. Por mais que ele não quisesse, ele se sentia na obrigação de cuidar dela até que ela estivesse fora de sua visão. Então ele poderia tirá-la de sua mente.
Sam continuava a tremer. Os olhos dele -não, dela-os olhos verdes dela eram grandes e redondos, mas não olhava como se realmente estivesse vendo alguma coisa.
- Choque. Você está provavelmente em estado de choque. - Ele tinha visto isso acontecer freqüentemente durante a guerra-depois de uma batalha. Sempre que um cara não conseguia compreender que ele tinha
realmente conseguido sobreviver-e se ele tinha, como?
- Tudo bem, Sam, você está me ouvindo?
Sam concordou com a cabeça.
Se Sam fosse um garoto, Matt teria tirado toda sua roupa molhada. Ela puxou um cobertor para mais perto do corpo, então embrulhou outro ao redor das pernas.
- Eu vou fazer um fogo.
Resmungando baixo, amaldiçoando sua credulidade, ele depressa juntou ramos pequenos, alguns galhos caídos maiores, e madeira seca. Então ele agarrou seu alforje e ficou fuçando até achar a caixa de metal
onde ele guardava fósforos. Durante a guerra ele tinha aprendido o valor de manter os fósforos secos. Depois de acender a chama, ele a levou para a pilha pequena de folhas e ramos. Ele podia ouvir os dentes
de Sam batendo. Matt estava louco o suficiente para xingar e estava mais preocupado do que já tinha estado em toda sua vida.
Ele aceitava ser responsável pelo Sam garoto... só que ele não podia descarregar sua raiva porque tinha descoberto que Sam era uma menina. Agora ele se sentia muito mais responsável. E enganado. A chama
pegou e as folhas começaram a crepitar enquanto acendiam e espalhavam o fogo.
Ele não queria lembrar de todas as coisas que ele tinha compartilhado com Sam, o garoto. Ele tinha começado a abaixar suas defesas, permitindo que uma amizade se desenvolvesse com o garoto-só que a relação
tinha sido falsa, fundamentada em uma mentira. Matt sempre tinha sido honrado com Sam, e Sam nunca tinha sido honrada com ele.
Descansando sobre as coxas, Matt se enrolou. Uma sombra azul estava circulando seus lábios. Os cobertores não aqueciam o suficiente e o fogo não conseguiria aquecê-lo depressa. Ele se esticou e tirou
a camisa. Ele a espalhou em cima de um arbusto perto do fogo pois assim ela estaria seca quando ele estivesse pronto para usá-la.
Ele andou para o lado dela e se abaixou. Ele queria mandá-la embora.
- Eu estou fulo o suficiente para pensar em te mandar embora daqui.
Ela mexeu a cabeça para cima e para baixo.
- Eu entendo. O-o-o que v-v-você vai fazer?
- Nós precisamos te esquentar. Temperatura corporal é o jeito mais rápido.
Sentando, ele se encostou contra a árvore. Ele a colocou sobre seu colo, apertou ela contra seu peito, apertando seus braços firmemente ao redor ela. Ela se aconchegou com a cabeça no ombro dele.
- Eu s-sinto m-muito, Matt - ela falou baixinho.
- Você ainda vai sentir - ele prometeu.
Vivamente ele esfregou suas mãos de alto a baixo nos braços dela, fazendo fricção tentando criar calor. Ele ouviu seus dentes batendo juntos. A água estava fria, mas ele suspeitou que tinha sido mais
o mergulho horripilante no rio que a fazia tremer tão forte.
Ele nunca tinha se sentido tão furioso a sua vida inteira. Ou se envergonhado por todas as coisas privadas que ele tinha revelado. Inclusive seu traseiro nu! Não é de espantar que Sam tenha fugido. Deus
todo-poderoso!
- Eu-eu sei como n-nadar - ela disse, como se ela soubesse a direção que a mente dele estava seguindo.
- Então você estava mentindo quando disse que não sabia.
Seu corpo inteiro se aquecia com a memória de tirar suas roupas na frente dela. Se suas roupas úmidas não estavam entre eles, ele achava que conseguiria queimá-la com o calor do embaraço dele.
Ela concordou com a cabeça.
- Quando eu... c-caí no r-rio... a correnteza estava muito forte, e o gado ficava entrando no meu caminho - ela gaguejou.
- Você mentiu em tudo?
Ele perguntou, incapaz de conter sua raiva. Sua voz saía escorregadia como uma serpente pronta para dar o bote. E ele não se acalmou com a palidez dela.
- Não meu nome.
- Seus pais chamam você de Sam? - Ele perguntou, não mais disposto a acreditar em qualquer coisa que ela dissesse a ele.
- Samantha.
Ele a podia ver como uma Samantha. E, por algum motivo, aquela imagem o irritava ainda mais.
- Eu não menti sobre a minha idade, também.
Então ela tinha dezesseis anos. Pelo menos agora ele sabia por que ela não tinha nenhum pêlo. Sua idade não tinha nada a ver com suas bochechas suaves ou sua voz doce.
- Ou a razão que fez você querer conduzir o gado.
Ela balançou a cabeça e segurou o olhar dele. Era estranho como sabendo agora que ela era uma mulher seus olhos pareciam muito mais suaves, muito mais verdes. Gotas da água agarravam seus cílios eriçados,
e ele lutou contra o desejo de juntá-los com os lábios.
Ela parecia tão vulnerável e impotente. Ainda que ele soubesse que ela tinha determinação e coragem. Irritava o fato de ele ter aceitado muito facilmente as coisas quando ele achava que ela era um garoto.
Agora ele tinha que colocar os pensamentos em ordem, mas algumas coisas simplesmente não queriam ficar no lugar.
- Eu preciso desesperadamente do dinheiro - ela disse.
Ela não mais tremia. De fato, ele estava começando a sentir o calor do corpo dele e suas roupas estavam se enroscando. Seus dentes não mais batiam e os calafrios minúsculos já não existiam mais. Suas
razões para segurá-la tinham acabado.
- Você já está bem? - Ele perguntou rudemente.
Ela ligeiramente concordou com a cabeça.
- Bom. - Ele a soltou e se levantou. - Tire sua camisa.
- O quê? - Ela perguntou, com som de alarme na voz.
Ele pegou a própria camisa e colocou em cima de um arbusto. Ela ainda estava umedecia em alguns lugares mas a maior parte já estava seca. Ele lançou a blusa sobre o colo dela.
- Coloque isto. Eu vou procurar o seu cavalo.
Ele começou a andar a passos largos.
- Matt?
Ele parou e olhou para trás por cima do ombro. Com seu cabelo emplastrado na cabeça, e o rosto pálido, ela lembrava um gatinho molhado.
Ela lambeu os lábios.
- Você deu sua palavra que não diria a ninguém meu segredo.
- Isso foi quando eu pensei que seu segredo era não saber nadar!
Ele estava tremendo quase tanto quanto ela tinha estado.
- Eu não tenho nenhuma escolha agora que sei a verdade. Eu tenho que dizer a Jake. Você ser uma menina põe toda a comitiva em perigo. - Ele andou a passos largos para longe, deixando apenas o barulho
da bota.
Toda vez que ele olhava para Sam, ficava bravo de novo. Mas ele sentia alguma outra coisa também. Algo que não conseguia identificar direito. Ele tinha desenvolvido uma amizade com Sam. O pensamento
de perder essa amizade machucava tão profundamente quanto sua traição.
Com os pés nus, Sam se sentou em um tronco em frente ao fogo. Ela tirou as botas e colocou perto das chamas. Sua camisa estava agora esticada em cima do arbusto onde Matt tinha colocado a dele mais cedo.
Ela pendurou suas calças lá também e se embrulhou firmemente com o cobertor.
Iria ser ruim o suficiente quando eles retornassem ao acampamento e todo mundo descobrisse que ela era uma menina. Ela não queria estar úmida e tremendo quando enfrentasse Jake. Tinha sido terrível ficar
tremendo nos braços de Matt.
Também tinha sido reconfortante. Ela tinha se sentido segura. Seu rosto tinha se ajustado ao ombro dele como se pertencesse àquele lugar. Seus braços ao redor dela confirmavam o que ela sempre tinha
suspeitado. Ele era forte e também gentil.
Ela sabia que ele estava bravo, entendia que ele tinha o direito de estar. Ela tinha mentido para ele desde o início. Ela tinha cortado o cabelo, gastado quase seis semanas conduzindo o gado-para quê?
Eles, com certeza, não pagariam a ela pelo tempo que ela tinha estado com eles. O pagamento viria no fim do passeio. E ela nunca veria aquele dia.
Além disso, ele tinha dito que Jake não aceitaria nenhuma mentira. E ela tinha mentido o tempo todo... não com palavras mas com seu disfarce. Ela sabia que, sem sombra de dúvida, Jake a mandaria empacotar
suas coisas... a menos que ela, de alguma forma, conseguisse convencer Matt de manter seu segredo. Ela ouviu passos e olhou para Matt, que estava trazendo Cinnamon.
- Achei
Ele disse sem qualquer emoção na voz. Ele levantou uma jaqueta.
- Achei isto também.
Ele a lançou em cima do arbusto onde suas outras roupas estavam. Ele amarrou Cinnamon na parte baixa da árvore e foi andando para perto do fogo. Ele se agachou ao lado dela e olhou fixamente para as
chamas que se retorciam. O peito dele ainda estava nu, e ela se lembrou de como tinha estado morno, tão firme. Ela queria ficar naquele abraço até anoitecer. Sentindo sua força, seu vigor.
Mas ele a tirou do abraço assim que tinha sentido o calor dela. E ele tinha falado que contaria a Jake a verdade e ela seria excluída da equipe. Ela tinha que apelar para o pouco de amizade que eles
tinham.
- Matt?
- Você tem alguma idéia do que fez? - Ele ficou de pé e começou a andar de um lado para outro. - Jake confiou em mim.
Ele se virou e olhou para ela.
- Confiou na minha palavra. Eu disse a ele para te deixar entrar.
Ele passou as mãos pelo cabelo.
- Ele vai achar que eu não tenho capacidade o suficiente para tomar decisões quando descobrir que você me enganou fazendo se passar por um garoto.
- Então não diga a ele - Sam comandou.
- Você levou uma pancada na cabeça enquanto estava dentro d'água? - Ele perguntou.
Lentamente ela veio para perto dele.
- Eu estou aqui há seis semanas. Ninguém percebeu. Eu posso continuar assim por mais algumas semanas.
Ela deu a ele um sorriso torto.
- Desde que eu fique longe dos rios.
Ele obviamente não tinha gostado nada da desculpa arrependida com piadinha e fez uma careta para ela.
- Você não pode ficar. Você é uma menina.
- O que eu tenho sido desde o começo!
Ela foi na direção dele e ofereceu a mão. Ele olhou para a mão dela como se ela estivesse oferecendo uma serpente. Ela abaixou as mãos de novo.
- Matt, eu estou desesperada. Eu não menti para você sobre a necessidade dos cem dólares para minha família. - Ela agarrou as mexas de cabelo cortadas. - Eu cortei o cabelo. Eu comi gororoba e fiquei
no final da comitiva até o pó quase me sufocar e nenhuma vez eu reclamei. Eu dou duro, Matt.
- Eu nunca disse que você reclamava. Mas você é uma menina! Você mentiu para mim, Sam. Todo esse tempo você mentiu para mim.
Sua raiva era palpável. Ela deu um passo para trás.
- Você teria tentado convencer Jake de me deixar entrar se soubesse que eu era uma garota? - Ela perguntou.
- É claro que não!
- Foi exatamente o que eu pensei. Então você não me deu nenhuma escolha a não ser esconder o fato de que eu sou uma menina. Meu pai morreu três anos atrás, a colheita quase não é suficiente. Eu tenho
um irmão e uma irmã mais jovem... e minha mãe. As linhas de preocupação no rosto dela estão cada vez mais fundas. Eu estava desesperada, Matt, desesperada para entrar na equipe. Eu estava disposta a mentir
para todo mundo, eu precisava disso para alcançar meu objetivo. Faria qualquer coisa.
Ele se aproximou e disse num tom mais íntimo.
- Ninguém tem que saber que eu sou uma garota.
- Eu sei - ele grunhiu.
- Por favor, Matt.
- Eu não posso, Sam. É má sorte ter uma garota na viagem. Eu não vou ser responsável por isso.
- Covarde! - Ela cuspiu.
Ele respondeu de volta como se ela o tivesse agredido fisicamente.
- Eu não sou um covarde.
- Sim, você é. Você tem medo de Jake, do que ele pode fazer. Talvez ele mande você embora também.
- Ele não me deixará ir. Infelizmente, ele não pode deixar você ir também. Pelo menos, não imediatamente. - Ele parecia derrotado. - Eu estava pensando sobre ele enquanto eu estava procurando por seu
cavalo. Nós estamos a quilômetros de qualquer cidade. Não existe nenhum lugar próximo o suficiente para ele largar você."
Um alívio injustificado percorreu o corpo dela. Ela estava conseguindo um prazo. Ela teria um pouco mais de tempo para convencer Matt a manter seu segredo.
- Então você não vai dizer a ele?
- Se a equipe souber que você é uma garota, só vai causar dificuldade. Eu manterei seu segredo até a gente chegar numa cidade, mas quando eu disser, você vai partir.
Ele veio para mais perto, até que os pés dos dois se esbarraram.
- Até lá, você ficará o mais distante possível de mim. Você está por conta própria.
CAPÍTULO QUATORZE
Assim que o sol começou a se pôr, Matt levou seu cavalo em direção ao rebanho principal e o acampamento que ele podia ver que estava perto. Ao lado dele, Sam montava em silêncio. Ela não tinha falado
uma única palavra desde que ele tinha exigido que ela o deixasse sozinho. O que era exatamente o que ele queria. Ele não queria que ela conversasse com ele, olhasse para ele, fosse amiga dele.
Como ele tinha sido tão crédulo? Como ele não tinha visto que ela era uma garota?
Porque agora ele estava intensamente ciente do fato. Pela abertura em sua jaqueta, ele podia ver as curvas leves que ele nunca tinha notado antes. Podia lembrar como tinha sido bom sentir o peito dela
apertado contra o dele enquanto ele a estava aquecendo.
- Seria melhor você abotoar sua jaqueta - ele ordenou.
Ela pulou com o susto e depressa fez como ele disse.
- Você tem que cortar seu cabelo logo, também. Com aqueles cachos ficando mais longos, você parece... - delicada, ele pensou; Ela parecia delicada e adorável - você não se parece tanto com um garoto.
Ela concordou com a cabeça.
- Eu cortarei hoje à noite. Obrigada, Matt.
- Não me agradeça - ele gritou. - Eu não quero que Jake descubra que você é uma menina até que eu esteja pronto para dizer a ele, isto é tudo. Eu não planejo perder o respeito que ele tem por mim. Eu
trabalhei muito duro para conseguir esse respeito.
- Eu também.
Ele a encarou.
- Eu não estou dizendo que você não tem o respeito dele, mas você é uma menina.
- Ainda assim você pode me respeitar.
- Não em uma comitiva de gado, não quando você mentiu para mim o tempo todo.
- Matt, eu disse a você verdades também. Nem tudo em mim é falso.
- Até onde me interessa, é.
Ele viu um cavalo levantando poeira e reconheceu seu cavaleiro, Jake. Matt respirou fundo para se acalmar enquanto o chefe da trilha parava o cavalo. Matt sabia que deveria contar a Jake toda a verdade,
mas ele tinha percebido que Jake não só devolveria Sam como ele também faria Matt ir com ela. E ele precisava ficar longe dela o máximo possível, o mais depressa possível. Pelo menos até que sua raiva
passasse e ele pudesse pensar com calma.
- Demoraram muito - Jake disse. - Sam, quebrou alguma coisa?
- Nada, - Matt respondeu antes de Sam. Nada quebrado exceto a confiança. - Sam estava só um pouco agitado, então nós demoramos a voltar.
- A melhor coisa a fazer é sentar de volta na sela, - Jake disse a Sam.
Sam concordou com a cabeça.
- É isso que eu pretendo fazer, senhor.
Matt se perguntou se a voz de Sam sempre tinha sido assim tão suave. Ou se ele estava simplesmente escutando Sam de outra maneira, olhando para ela de um modo mais claro. O modo como suas bochechas ficaram
vermelhas quando Jake falou com ela, o arco gentil de suas sobrancelhas... e aquela boca, aquela boca mentirosa que definitivamente tinha sido feita para beijar. E agora, de onde tinha vindo esse pensamento?
- Matt?
Ele virou seu olhar para Jake.
- O quê?
- Você parecia que estava olhando fixamente para o nada. Você se machucou? Talvez tenha levado uma pancada na cabeça?
Olhando fixamente para o nada? Ele achou que estava olhando para a garota mais adorável que ele já tinha visto. Ele agitou a cabeça com força.
- Não, senhor. Apenas me molhei um pouco.
- Bom. Você dois podem ir vigiar um pouco - Jake disse.
- Jake, eu estava pensando que talvez Sam devesse... -. Devesse o quê? "Montar com algum outro cara" estava na ponta da língua dele, mas que tipo de peão seria ele colocando outra pessoa em perigo? Sam
era sua responsabilidade, agora mais do que antes.
Além disso, Jake estava encarando ele, esperando por uma desculpa que Matt não conseguia pensar.
- Eu acho talvez que Sam deveria descansar esta noite. Eu farei duas vigias para me desculpar por outra pessoa ter que montar comigo.
- Certo. Essa é provavelmente uma boa idéia. - Jake chutou os flancos do cavalo e o animal começou a andar.
- Por que diabos você fez isso? - Sam perguntou.
"Eu achei que você poderia ainda estar tremendo. Um cavaleiro nervoso pode assustar uma vaca e começar um estouro.
- Eu não estou nervosa - Sam protestou.
- Apenas descanse essa noite - Matt ordenou, - ou eu direi a Jake a verdade neste mesmo minuto.
- Eu não quero que você faça a minha parte do trabalho.
- Eu não farei. É só que hoje está sendo um dia longo. Todo mundo entenderá se você não estiver lá hoje à noite. Vamos pegar algo para comer. - Ele levou o cavalo adiante.
- Matt?
Ele olhou por cima de seu ombro e percebeu que não existia nenhum detalhe em Sam que lembrasse um garoto. Ele só podia desejar que Jake não percebesse a verdade antes dele ter uma chance de dizer.
- Eu nunca agradeci você por ter me salvado, por não me deixar afogar.
A única coisa que ele conseguiu fazer foi acenar com a cabeça bruscamente e pensou em quem iria salvá-lo de se afogar dentro daqueles profundos olhos verdes.
A parte favorita da noite de Sam veio logo depois da ceia. Os peões começariam a descansar pela noite. Dois deles trouxeram suas gaitas. Órgãos de boca, como eles chamavam. Às vezes eles tocavam uma
melodia familiar e alguns peões começavam a cantar. Sam freqüentemente pensava em cantar, mas ela tinha medo de que um dos homens pudesse prestar atenção em sua voz como Matt tinha feito quando eles estavam
conduzindo o gado. Alguém poderia perceber que ela era uma garota.
Alguém além de Matt. Ele tinha dado a ela um pouco de tempo e ela pretendia fazer bom uso dele. Ela não tinha intenção de deixar esta comitiva quando Matt finalmente revelasse seu segredo. Ela estava
determinada a continuar se fazendo útil e se provando. Eventualmente, ela seria tão necessária que Jake não pensaria que poderia continuar sem ela. Ela não tinha trabalhado tão duro ou sofrido tanto para
simplesmente largar tudo sem lutar.
Que tipos de perigos poderiam existir? Ela não tinha causado nenhum problema durante as seis semanas anteriores a esta tarde. Por que alguma coisa aconteceria agora?
Com suas costas contra a árvore, ela colocou os joelhos contra o peito e embrulhou seus braços ao redor das pernas. Ela ficava olhando os homens do acampamento. Alguns eram apenas um pouco mais velhos
do que ela. Outros pareciam muito velhos. Todos a respeitavam - porque ela trabalhava duro, e porque eles achavam que ela era um garoto. Será que os aborreceria saber que ela era uma garota?
Ela sabia que iria. Se ela achasse o contrário, não teria entrado no grupo baseada em mentiras. Ela não teria cortado o cabelo.
Ela achava que Matt tinha o direito de estar bravo. Sua reputação com os homens -especialmente com Jake - estava em jogo. Eles provavelmente achariam que ele tinha sido muito ingênuo quando eles descobrissem
que ela tinha convencido ele de que ela era um garoto-convencido todos eles.
Ela tentava não se lembrar de como tinha sido bom sentir seu corpo apertado contra o dele esta tarde. Seu corpo estava morno, seus braços fortes. Ela tinha lutado dentro da água, quase em pânico. Até
que ela tinha ouvido a voz dele, e, por um momento, o viu subindo através das vacas a procurando. Vindo salvá-la. Ela sabia, sem sombra de dúvida, que ela estaria salva. Matt a salvaria.
Ela tinha uma dívida com ele. Ela percebeu que a coisa decente a se fazer seria juntar todos os pertences dela e silenciosamente ir embora, pacificamente, antes dele ter que dizer a todos, antes dele
ter que se envergonhar. Ela poderia ir embora junto com o vento da noite, para que nunca mais se ouvisse falar dela novamente. Daqui a anos, em outras comitivas de gado, os caubóis conversariam sobre aquele
garoto Sam que tinha se transformado em um peão de primeira linha... E então tinha ido embora. Como fumaça levada pela escuridão.
Se ela não precisasse tanto dos cem dólares, ela poderia partir. Se a família não dependesse tanto dela, ela poderia partir. Então, talvez ela pudesse evitar o embaraço de Matt.
Como as coisas estavam, ela teria que se arriscar, arriscar tudo, na esperança de que quando toda verdade fosse dita, Jake, e até Matt, a vissem como um caubói em quem pudessem confiar - em vez de uma
menina inoportuna.
O Sol estava começando a se pôr e passava embaixo da Estrela do Norte enquanto Matt vagava pelo acampamento logo depois de seu segundo turno. Ele estava morto de cansaço. Salvar Sam tinha exigido mais
dele do que tinha imaginado. Ele estava contente por ter sugerido que ela ficasse no acampamento hoje. Ela deveria estar mais exausta que ele. Seu pânico tinha sido evidente, seu medo óbvio. Ele puxou
o saco de dormir para fora da carroça e lentamente deixou seu olhar passear, vendo os peões que estavam dormentes. Ele olhou para Sam e sua respiração ficou presa.
Ela lembrava um pequeno gatinho solitário, enrolada e longe dos outros. Ele entendia agora por que ela se mantinha indiferente. Ela devia ter ficado constantemente preocupada em ser descoberta.
Ele tinha pensado em dormir no lado oposto do acampamento, mas as pessoas perguntariam o que tinha acontecido entre eles, por que ele de repente a estava evitando. E ele não saberia o que responder.
Ele tinha que erguer um muro de aço contra ela. Ele teria que fazer de conta que ela era um garoto.
Mas quando ele cruzou o acampamento e se abaixou ao lado dela, ele percebeu que aquela tarefa seria impossível. Deitada de lado, ela tinha uma mão apertada em baixo da bochecha e a outro descansava em
cima do estômago. As mãos dela eram tão delicadas.
As mãos dela o intrigavam porque ele também sabia que elas eram muito capazes. Ela podia andar a cavalo, conduzir o gado. Um par de unhas estava quebrada. Deveria ter acontecido enquanto ela trotava
no cavalo ou enquanto estava juntando madeira para a fogueira. Como que ela tinha conseguido selar o cavalo?
Durante o sono, ela abria um pouquinho a boca, mas ela não roncava como os outros caras. Ela estava quieta. Se qualquer respiração passava entre os lábios, não fazia barulho. Ele se perguntava se aqueles
lábios eram tão suaves quanto pareciam.
Seus cílios se mexeram, e então ela abriu os olhos. As sombras da noite esconderam a profundidade do verde deles, mas ele sabia que eles estavam lá, sabia o formato exato deles.
- O que você está fazendo?
Ela perguntou com uma voz sonolenta que o atingiu como um raio.
- Achei que seria melhor se eu deitasse perto de você senão os caras vão começar a perguntar por que eu estou fulo da vida com você - ele explicou enquanto depressa arrumava o saco de dormir. - Nós temos
que fingir que nada mudou.
E isso seria próximo do impossível, ele pensou enquanto se esticava ao lado dela. Ele foi tirar as botas e congelou. Estar ao lado de uma menina e mostrar as meias parecia algo incrivelmente íntimo,
embora ele já tivesse feito isso quase umas quarenta vezes. Por algum motivo, ele não conseguia fazer isto esta noite.
Ele olhou para os pés. Ela estava calçando botas também. Ele colocou as mãos embaixo da cabeça e olhou para o céu. Ele estava tão cansado que não deveria ter nenhuma dificuldade em dormir. Do jeito como
as coisas estavam, ele se sentia mais apertado do que um bezerro fugitivo laçado.
- Matt, eu sinto muito - ela disse suavemente.
A voz dela foi direta a ele, preenchendo todos os lugares solitários. A habilidade que ela tinha de fazer com que ele a quisesse proteger o deixava furioso.
- Está um pouco tarde para desculpas.
- Você nunca fez algo que não queria fazer, mas sabia que tinha que fazer?
Ele trincou os dentes, tentando não pensar na guerra, nas muitas coisas ele tinha feito e não queria. Os campos nos quais ele tinha marchado, as balas que ele tinha atirado, os inimigos que ele tinha
matado.
- Matt, eu sei que você é honrado e que qualquer coisa que você tenha feito foi porque, na hora, você achou que era o melhor.
Ele girou a cabeça e olhou fixamente para ela.
- Sam, você não vai conseguir me fazer mudar de idéia com essa conversa mole. Eu estou tentando cuidar de você e é por isso que eu tenho que dizer a Jake a verdade quando for a hora certa.
- Minha irmã Amy nunca usou um vestido que eu não tenha usado antes. Meu irmão Nate vai para a cama faminto. Minha mãe está ficando com os ombros curvados por causa dos fardos que ela carrega.
Ele voltou sua atenção para as estrelas. Ele não queria ouvir o apelo mudo que ela tinha colocado em palavras para que ele mantivesse seu segredo guardado e não dissesse a ninguém.
- Matt, você disse a mim várias vezes que eu estava fazendo um bom trabalho. Eu não vou parar de trabalhar duro. Eu não virei simplesmente uma garota esta tarde.
- Até onde eu sei, foi isso mesmo que você fez. - Ele virou de lado e a encarou. - Sam, uma comitiva de gado não é lugar para uma garota. Veja o que aconteceu hoje.
- Você está dizendo que nenhum peão nunca caiu de seu cavalo no rio?
- O que eu estou tentando dizer é que Jake fez de você minha responsabilidade e cuidar de uma garota não foi o que eu concordei em fazer!
Ele falou com raiva por entre os dentes trincados.
- Agora, vá dormir antes que eu decida contar a Jake a verdade antes do nascer do sol.
Os olhos dela soltavam faíscas enquanto ela girou e deu as costas para ele. Costas esbeltas. Ele lembrou como elas eram delicadas e como ele tinha sentido o calor delas. Ele não queria pensar na fragilidade
dos ossos ou no calor da pele dela.
Ele não queria lembrar de como tinha sido segurá-la... e que droga, ele não queria pensar em como se sentiria ao beijá-la, como seria colar as duas bocas...
Frustrado com seus pensamentos, ele rolou para o lado e ficou olhando o fogo pequeno no centro de acampamento. O corpo dele estava ficando tão quente quanto às chamas.
Se o rio estivesse próximo, ele iria até ele e mergulharia de ponta-cabeça.
Do jeito como as coisas estavam, ele ficaria acordado a noite toda pensando em Sam, a garota, e desejando que ele não tivesse que dizer a Jake a verdade.
Mas ele tinha. Manter a verdade somente para ele mesmo não era justo com Jake ou com o rancho dos Corações Partidos.
CAPÍTULO QUINZE
Sam empurrou seu saco de dormir na carroça de provisão. Lutar contra as águas turbulentas do rio a tinha deixado cansada e machucada. Lutar com Matt a tinha deixado inexplicavelmente triste.
Ela gostava de montar com o rebanho, sentia uma sensação de realização muito maior do que quando ela trabalhava na fazenda. Não devia importar para Matt ou Jake o fato de que ela era uma garota. Contanto
que ela pudesse fazer as tarefas dela, não deveria importar de maneira nenhuma que ela fosse do sexo oposto. Certamente não fazia nenhuma diferença para as vacas.
Ela tinha que achar um jeito de convencer Matt a não revelar seu segredo. Ele precisava dar a ela a oportunidade de terminar esta viagem.
Assustada, ela se virou com um salto. Matt estava lá, com ambos os cavalos.
- Aprontei seu cavalo - ele disse enquanto dava as rédeas para ela.
- Eu posso cuidar do meu cavalo - ela falou em voz baixa enquanto pegava as rédeas da mão dele.
- Eu sei. Eu só estava cuidando do meu e assim eu pensei que podia aproveitar e selar o seu também.
Ela estreitou os olhos.
- Matt, você não pode me tratar diferente só porque sabe que eu sou uma garota.
- Eu não pretendo, mas nem por isso vou tratar você como um garoto! - Ele sussurrou.
- Você está me irritando, sabia?
Ela montou no cavalo, e deu um pontapé gentil nos lados do animal e Cinnamon foi na direção do rebanho. Ela colocou a bandana em cima do nariz. Hoje ela ficaria contente se tivesse que ficar no final
da trilha e não tivesse nenhuma oportunidade de conversar com Matt.
O gado estava começando a andar lentamente para o norte. Eles normalmente pastavam devagar pela manhã e começavam a se mover um pouco mais depressa enquanto o dia ia passando lentamente.
Pelo canto do olho, Sam viu por um momento Matt trazendo seu cavalo para o lado dela. Ela não queria notar a largura dos ombros ou a força das mãos dele.
- Não existe nenhuma razão para que você fique do meu lado - ela disse para ele. - Eu já estou aqui há mais de seis semanas. Eu estou bem assim. Diga a Jake para mudar você de posto.
Embaixo da borda do chapéu, os olhos azuis de Matt se arregalaram.
- Você está louca? Você é minha responsabilidade.
- Eu posso cuidar da volta do gado sem sua ajuda - ela insistiu.
- Até Jake me mandar trocar de posto, eu montarei ao seu lado.
Ela assistia a bandana balançar com a respiração dele toda vez que ele falava. Os dias eram normalmente longos e árduos. Ela tinha o pressentimento de que eles iriam piorar.
De repente Matt se sentou mais reto na sela, e seu olhar foi para o horizonte distante.
- O que é aquilo? - Sam perguntou.
- Pareça fumaça.
Ela olhou ao redor.
- O que tem aqui para queimar? Pensei que você tinha dito que não existia nenhuma cidade.
- Existe grama. Sem isto, nós não poderíamos voltar para casa porque o gado não teria o que comer. Você fica aqui.
Ela detestou a ordem dele mas obedeceu. Ela olhou enquanto ele galopava em direção à fumaça que subia ao leste. Ela viu outros peões irem arás dele. Então ela viu a carroça de provisão se dirigir para
aquela direção.
Jeb e Jed se juntaram a ela.
- O que está acontecendo? - Eles perguntaram juntos.
- Matt acha que é fogo na pradaria - ela explicou.
- Com certeza é o que parece, com aquela fumaça negra subindo - Jed disse. Ou seria ele Jeb? Ela nunca sabia.
- Ainda bem que o vento está levando o cheiro para longe da gente. Se o gado sentisse, começaria a debandar. Você e Jed devem ir lá e ajudar eles a apagarem o fogo, - Jeb disse. - Eu tenho mais experiência
com o rebanho. Eu posso manter eles na linha.
Ela pensou em falar que Matt tinha mandado ela ficar, mas Matt não era seu guardião. Ele achava que era mas ela não concordava. Ela conseguia se virar sozinha. Além disso, ele poderia não ter percebido
o tamanho do problema quando ele tinha mandado ela ficar.
Dando Jeb um aceno com a cabeça rápido, ela chutou os flancos do cavalo e seguiu o cavalo de Jed, que não tinha perdido tempo tentando se decidir se deveria lutar contra o fogo ou não.
Quando eles chegaram na carroça de provisão, Cookie já estava mergulhando os sacos de aniagem no barril da água de chuva e passando para os homens. Pelo que Sam podia perceber enquanto desmontava, parecia
que mais ou menos três - quartos dos homens estavam aqui. Ela podia ver Matt bater nas chamas.
- Este é pequeno, pessoal - Cookie disse a eles enquanto passava para cada homem um saco encharcado. - Vamos manter deste jeito. Batam no fogo pelos lados e abram caminho pelo meio.
Com excitação inesperada, Sam agarrou o saco que Cookie estendeu em direção a ela. Ninguém tinha perguntado por que ela estava aqui. Matt poderia ter dúvidas a respeito de suas habilidades, mas nenhum
dos outros peões tinha. Para assegurar de que Matt não iria interferir, ela foi para o lado oposto e lá permaneceu. A fumaça espessa se elevava; Faíscas dançavam de modo selvagem na névoa. Ela ouvia o
crepitar do fogo enquanto devorava as gramas da pradaria seca e a pancada dos sacos de aniagem que batiam no chão torcendo as chamas.
Ela seguiu a sugestão dos homens ao redor ela, periodicamente voltava para a carroça para imergir o saco depressa na água antes de voltar para o fogo com ele gotejando. Seus braços começaram a doer enquanto
ela batia a terra do saco. A fuligem e as cinzas entravam em seus olhos e cobriam suas roupas.
Mas ela continuou batendo nas chamas repetidas vezes, recusando admitir derrotada, perguntando-se se este breve momento de alegria e temor era o que os soldados experimentavam enquanto marchavam na guerra.
Precisavam dela, ela fazia diferença. Matt iria destruir tudo o que ela tinha trabalhado duro para atingir. E quando ele fizesse isso, qualquer afeto que ela poderia ter por ele morreria. E ela o desprezaria
até seu último suspiro.
- Confirmem que todas as faíscas se apagaram! - Matt gritou enquanto batia nas últimas chamas que restavam. Ele sabia muito bem o quão depressa uma única faísca podia acender um fogo terrível.
Este fogo não tinha sido o pior que ele já tinha visto. Ele percebeu isto porque tinha queimado apenas um quilômetro e meio mais ou menos. Ele estava extremamente agradecido de que o vento tinha levado
para longe o cheiro e por causa disso não tinha havido um estouro.
O que começou o fogo podia ter sido a falha de alguém. Um caubói descuidado que tinha dirigindo um rebanho à frente dos seus poderia ter deixado cair um fósforo ainda aceso. Em um segundo uma faísca
poderia resultar em um fogo enorme. Ele sabia que isso já tinha acontecido antes.
Ele olhou para a terra enegrecida que estava ainda queimando sem chamas. Uma fumacinha continuada a subir. Junto com a tarefa penosa de ter vigília dobrada e, além disso, ter salvado Sam no rio no dia
anterior tinha o deixado morto. E o sol ainda nem estava no topo.
- Bom trabalho! - Jake gritou enquanto montava em torno da região queimada, inspecionando as faíscas.
Os homens mal falaram enquanto eles marchavam em direção à carroça e os cavalos que esperavam. Acima das bandanas, os rostos estavam cobertos com fuligem. Alguns estavam apenas reconhecíveis. Ele sorriu
à vista de Sam. Ela parecia um guaxinim.
Sam!
O que ela estava fazendo aqui?
- Ei, Sam! - Ele gritou.
Ela parou de caminhar. O coração dele tinha dado um pulo louco como se ele ainda estivesse lutando para apagar o fogo. Ele sabia dos perigos de um fogo no campo. Fora de controle, ele podia destruir
tudo no caminho, inclusive o rebanho. Se o gado tivesse se espalhado e a grama queimado toda... eles não teriam nada para comer. Os animais morreriam e todas as suas semanas de trabalho teriam sido em
vão.
Durante a batalha do homem contra natureza, enquanto Matt tinha tentado apagar o fogo, ele não tinha tremido. Não como ele estava tremendo agora. Apenas pensar nos perigos que ela tinha se exposto fazia
os joelhos dele enfraquecerem.
- Eu mandei você ficar com o rebanho! - Ele gritou, quando ele ficou próximo o suficiente para ver o verde dos olhos dela.
- Eu era necessária aqui! - Ela replicou.
- Eu disse para você ficar longe, droga! - Ele deu uma parada abrupta. Ele não sabia se a estrangulava por ela ter desobedecido uma ordem ou se a abraçava por ela não ter se machucado.
- Eu achei que você não tinha percebido a extensão do fogo - ela disse.
- Eu sabia exatamente. Foi por isso que eu não quis que você viesse aqui.
- O que está acontecendo? - Jake perguntou, enquanto trazia o cavalo para perto, parando entre eles. Um caubói nunca caminhava quando ele podia montar.
Matt apontou o dedo para Sam.
El-a... EU disse para Sam ficar com o rebanho. - Que droga! Ele quase tinha dito, "Ela deveria ficar com o rebanho."
- Sam estava certo em ter vindo para cá. Nós precisamos de tantos homens quanto forem possíveis para conseguir apagar o fogo. Nós não podíamos arriscar que queimasse o suficiente para que a gente perdesse
o controle ou causasse um estouro.
- Mas Sam não é um homem! - Ele gritou e viu o medo em Sam enquanto ela arregalava os olhos. - Ele... ele é um garoto.
- Não existe nenhum garoto neste passeio. Sam fez um ótimo trabalho - Jake disse.
Matt achou que Sam ia arrebentar os botões da camisa de tanto que o peito dela tinha inchado com orgulho. Se aqueles botões saltassem, com certeza causariam problemas.
- Mas ele desobedeceu uma ordem.
- Você esteve na guerra, Matt. Você sabe que às vezes o homem que dá as ordens nem sempre dá as melhores ordens - Jake disse.
Matt lançou seu olhar de volta para Jake. Jake balançou a cabeça ligeiramente.
- Deixe o garoto, Matt. Ele fez o que era melhor para a equipe. Você precisa respeitar isto. - Ele sorriu para Sam. - Você está virando uma grande surpresa.
Matt pensou que Jake não tinha nenhuma idéia de quão próximo ele estava de falar a verdade absoluta. Enquanto Jake colocou seu cavalo em meio-galope, Matt lançou seus olhos atrás de Sam. Ela tinha tirado
a bandana e deixado solta ao redor do pescoço, e ela estava irradiando satisfação com o elogio que Jake deu a ela.
Ela deveria parecer ridícula com metade do rosto preto e aquele sorriso tonto... em vez disso, ele achava que ela estava adorável. E ele finalmente compreendeu que ele não queria estrangulá-la nem abraçá-la.
Ele queria beijá-la.
Sam permitiu que a tranqüilidade do céu da meia-noite aliviasse sua alma. Estes momentos em que ela ficava de guarda durante a noite eram seus favoritos. O gado mugindo parecia muito com a canção que
ela tinha cantado para eles.
Sentados no chão, eles não levantavam poeira. Nem mesmo quando eles se levantavam de vez em quando meio atrapalhados, giravam, e deitavam de novo no chão.
A pradaria de noite era empolgante. Depois de arrastar por quilômetros o gado de maneira monótona durante o dia, ela ficava ansiosa com a vigia noturna. Até o mau humor de Matt não conseguia irritá-la.
Ela tinha provado seu valor hoje. Talvez Jake não se importasse tanto quando descobriu a verdade sobre ela. Por um minuto assustador esta tarde, ela tinha achado que Matt quase tinha entregado o fato
de que ela era uma menina. Com certeza ele quase tinha tropeçando na língua. Ela nunca o tinha visto tão furioso, nem mesmo no rio ontem.
Montando ao lado dela, ele ainda estava resmungando. Ele não tinha falado uma única palavra desde que Jake a tinha elogiado, e eles tinham reunido todo o rebanho.
Matt levou sua comida para longe da fogueira do acampamento, fazendo com que os outros olhassem para ele de um modo estranho. Eles estavam provavelmente tentando compreender por que ele estava tão aborrecido.
Squirrel disse que o fato de Sam ter desobedecido uma ordem não podia ser o que estava deixando ele fora de si. Os outros começaram a comentar, se perguntando se ele estava com carrapato ou uma bolha no
pé.
Ela achava que enlouqueceria se ele continuasse com este tratamento de silêncio. Estava uma noite tão pacífica, uma boa oportunidade para remendar cercas.
- Eu adoro pastorear o gado de noite - ela disse baixo. - Eu acho relaxante.
Silêncio. Pesado, palpável. Espesso o suficiente para se poder cortar o ar com uma faca.
- Eu acho que nós tivemos realmente muita sorte do gado não ter feito um estouro esta manhã.
Nada dele. Nem mesmo uma virada de cabeça.
- Você está surdo? - Ela provocou.
A única coisa pior do que levar um grito era ser ignorada.
- Quanto tempo você planeja ficar bravo? - Ela perguntou.
- Para sempre.
A dor a cortou como um punhal. Ela não queria admitir o quanto estava gostando dele, o quanto se importava com ele.
No fundo, ela sabia que a tentativa dele mantê-la longe do fogo era para tentar protegê-la. Não que ele achasse ela incapaz; ele estava preocupado que ela se machucasse.
- Se eu tivesse confessado que era uma menina quando nós estávamos lá atrás do armazém geral, você nunca teria me aceitado e falado com Jake. Eu preciso desta chance, Matt, eu preciso trazer alguma esperança
para minha família para que esse tempo ruim vá embora.
Através das sombras da noite, ela o viu virar a cabeça em direção a ela. A esperança começou a crescer porque ele a estava escutando, porque ele viria a entender o porquê de ela ter feito tudo o que
fez.
Ela podia sentir seu olhar chateado nela. Lambendo os lábios, ela engoliu em seco.
- Se você disser a Jake a verdade sobre mim, ele mandará eu arrumar as minhas coisas. Eu não me importo comigo, mas eu me importo com minha família, me preocupo com a minha mãe se preocupando com a enorme
dívida do armazém geral. Eu sei que você me detesta por ter enganado você. Mas, por favor, não desconte seu ódio na minha família. Por favor, não diga a Jake que eu sou uma garota.
Debruçando-se de lado, ele esticou as mãos e a puxou pela nuca. Então a boca de Matt cobriu a de Sam, de uma forma firme, com desespero, quente. Incrivelmente quente. Como as chamas que eles tinham apagado
esta tarde. O calor saía do corpo de Sam como se ela estivesse em chamas. Com a respiração ofegante, ele a largou.
- Essa é a razão pela qual você não pode ficar. Eu não consigo parar de pensar em você. Quero te abraçar, quero desesperadamente te beijar.
Com seus lábios ainda inchados e formigando, ela olhou fixamente para ele. Ele queria beijá-la?
- Desde o momento em que nós montamos hoje, eu pensei somente em você. Eu não pensei no gado. E isto é muito perigoso. Se os outros homens começarem a fazer a mesma coisa, alguém vai sair machucado.
Ou pior, morto.
CAPÍTULO DEZESSEIS
Três dias mais tarde, Matt ainda estava pensando naquele beijo. Ele não ficou surpreso que os lábios de Sam fossem tão incrivelmente suaves. Enquanto ele selava o cavalo, percebeu que o que o tinha deixado
surpreso foi o fato de que ela não o tinha empurrado para longe.
Ele ajeitou a sela no lugar. Ela era uma dama. Ele podia perceber isso no modo delicado como ela comia, lentamente levando a colher do guisado até a boca. Não empurrando a comida, como os outros peões
faziam. Ela não falava de boca aberta. Nunca tinha arrotado para mostrar a sua satisfação com a comida.
Ela era tão perigosamente feminina que ele se sentia grato pelos peões ficarem tão cansados com o rebanho que não notavam nada além do passar lento dos minutos.
O som estridente das esporas fez com que ele olhasse por cima do ombro. Jake estava vindo em direção a ele como se fosse questão de vida ou morte.
- Há algum motivo para Sam não arrumar o próprio cavalo? - Jake perguntou bruscamente.
Matt encolheu os ombros.
- Sam é meu companheiro. Eu tenho que aprontar meu cavalo. Aproveito e arrumo o dele também.
- Não é uma boa idéia mimar um rapaz - Jake preveniu.
- Só estou fazendo uma boa ação.
- Então você pode fazer uma outra boa ação. Eu quero que você monte até o rio mais próximo, dê uma olhada, e veja se precisamos conduzir o gado lenta ou rapidamente. Se tiver neve pesada lá em cima no
Colorado, elas devem estar derretendo agora e vai afetar os rios daqui. Se a água estiver com nível alto, nós espalharemos o gado e iremos devagar. Se o nível estiver baixo, nós juntaremos todos e passaremos
rápido. Você deve ser capaz de chegar lá antes do anoitecer. Acampe na beira do rio e volte no primeiro raio de luz. Isso deve nos dar tempo suficiente para determinar como mover o gado.
Matt concordou com a cabeça, apesar de não gostar do fato de ter de deixar Sam. Ele considerou sugerir a Jake que desse a tarefa para outra pessoa, mas ele deveria estar aprendendo nesta viagem para
que pudesse ser chefe na próxima na comitiva.
Sam o estava distraindo de sua missão. Ele deveria estar gastando mais tempo conversando com Jake, aprendendo com ele.
- Eu vou.
- Leve Sam com você.
O estômago do Matt se revirou. Ele e Sam a sós... na pradaria... de noite? Não, mesmo que sua vida dependesse disso.
- Eu não estou certo de que isto é uma boa idéia.
Jake levantou uma sobrancelha.
- Por que não?
- Sam é um novato
- E ele vai continuar um novato enquanto não começar a andar com as próprias pernas.
- El-a-a... ele - ele anda com as próprias pernas. Você disse isso quando Sam lutou contra o fogo.
- E desde aquele dia tem alguma coisa acontecendo entre você e Sam.
A respiração de Matt ficou presa nos pulmões fazendo seu peito doer. O que sua atitude em relação a Sam estava revelando?
- O que você quer dizer?
"Eu não posso ter certeza olhando de fora. Mas parece que ele olha para você como se você fosse uma cascavel pronta para dar o bote e você olha para ele como se a qualquer momento ele fosse voar em cima
de você. O modo como vocês dois estão rodando um ao redor do outro está fazendo com que os homens e o gado fiquem nervosos. Seu pai quer que você aprenda como lidar com o grupo. E você deve começar resolvendo
as diferenças que você está tendo com Sam.
Matt ficou plantado no mesmo lugar enquanto Jake andava a passos largos para longe. Era a diferença entre ele e Sam que estava causando problemas. O problema era o fato de Sam ter curvas onde Matt não
tinha.
Sam tentou ignorar o seu companheiro de montaria - o tratou da mesma maneira que ele a tinha tratado quando a estava ignorando. Fechando os olhos, ela levantou a cabeça para que o sol pudesse tocar em
seu rosto. Ela quase esquecera de como era montar um dia inteiro sem um bandana cobrindo o rosto. Sem o pó a cobrindo dos pés à cabeça que subia dos mais de dois mil bois que pastavam. Ela se sentia tonta.
Ela não iria deixar Matt estragar seu dia longe das bestas perigosas. E hoje à noite não teria vigília. A noite parecia que seria calma e ela não queria acordar com um murmurado, "Está na hora".
- Pare de fazer isto - Matt ordenou.
Ela abriu os olhos e se virou para ele.
- Fazer o quê?
- Assim como... eu não sei. Como se você tivesse acabado de pisar no paraíso.
- Só porque você foi criado com leite azedo não significa que eu tenho que ser azeda como você - ela replicou, arrebitando o nariz.
- O leite que me deram não tem nada a ver com meu humor. Eu estou assim por causa das suas mentiras.
- Você não se cansa de me martirizar só porque eu não falei a verdade? Por que você não pode me perdoar por não ter dito a você que eu não era um garoto?
- Porque sua mentira nos coloca em perigo.
- Honestamente, Matt, eu não vejo como o fato de eu ser uma garota está atrapalhando alguém. Ninguém está doente ou sangrando. Ninguém está morrendo. Eu estou fazendo meu trabalho. E fazendo bem, de
acordo com o Jake.
- O problema, Sam, é que eu não estou fazendo o meu.
- O problema então é seu. Apenas pare de pensar em mim como uma garota - ela disse.
Ele a encarou.
- Isto está um pouco difícil de fazer.
- Difícil é não ter o que comer e ficar faminto no inverno.
Ele evitou o olhar dela.
- Eu sou responsável por você, Sam.
- Eu não preciso de você tomando conta de mim. Eu posso ser responsável por mim mesma.
Por que isso não podia entrar naquela cabeça dura? Ela achava que deveria admirar a determinação que ele tinha em cuidar dela, mas essa obsessão a estava atrapalhando de alcançar o objetivo principal.
- Assim que nós estivermos próximos o suficiente de uma cidade e você esteja segura, você vai pegar uma diligência para casa, e eu direi a Jake a verdade - Matt disse.
- Eu te odiarei quando você fizer isto.
Ele deu um sorriso triste.
- Então isso fará com que eu me odeie também. Mas se eu aprendi uma coisa durante a guerra, Sam, foi que eu tinha que fazer o que eu achava melhor para os garotos sob meu comando. Caso contrário, eles
me assombrariam. Eu nunca me perdoaria se qualquer coisa acontecesse com você... ou se qualquer coisa acontecesse a qualquer um dos peões porque eu não fiquei cara a cara com Jake e disse que você era
uma garota.
Ela deu um suspiro pesado.
- A que distância está a cidade mais próxima?
- Isso eu não tenho certeza.
Ela achava que era Sedalia. Se eles levassem o gado para Missouri, então seguramente eles pagariam a ela. E isso era tudo o que ela realmente queria. Ser paga. E se ela nunca mais colocasse os olhos
em Matt novamente - teria sido tão rápido.
O rio não parecia traiçoeiro mas Matt sabia que as coisas não eram sempre como pareciam. Sam tinha ensinado a ele aquela lição dolorosa.
Com o sol começando a se esconder e a noite começando a lançar suas sombras pela terra, Matt se aproximou da beira do rio. Ele estudou o fluxo do rio. Ele sabia que devia testar as águas montado no cavalo,
mas ele não estava com humor para ficar a noite toda com as calças encharcadas. E ele não podia tirar as calças com Sam montando ao lado dele.
- Você acha que está seguro? - Ela perguntou.
- Parece que sim, mas eu preciso verificar mais de perto para ter certeza. Feche os olhos.
- Por quê?
Ele a encarou.
- Porque eu vou tirar as calças.
As bochechas de Sam queimaram e ficaram com um vermelho brilhante enquanto soltava um minúsculo "Oh".
- Eu não quero ficar com minhas roupas molhadas - ele explicou.
Ela vivamente concordou com a cabeça.
- Eu entendo.
- Entende, Sam? Você percebe que eu não teria este problema se você fosse um garoto?
- Você não tem esse problema. Eu já vi seu traseiro nu!
O rosto de Matt ficou quente.
- Bem, você não teria visto se eu soubesse a verdade. Agora, feche os olhos - ele ordenou enquanto desmontava.
- Farei ainda melhor. Vou sair da sua frente. - Sam virou o cavalo e foi para fora do campo de visão dele.
Matt agarrou as rédeas do cavalo e foi para trás da árvore achando que se sentiria mais confortável. Mas ao contrário, ele sentia sua pele ficar três vezes mais vermelha enquanto se lembrava de como
ele tinha tirado a roupa naquela primeira noite. Ele certamente tinha mostrado tudo para ela. Ele tirou as roupas se sentindo tão vulnerável quanto um bebê recém-nascido. Ele montou no cavalo e deu um
pontapé firme para que ele fosse adiante. O mais depressa possível ele entrou no rio, para que o mais rápido possível ele pudesse sair e colocar suas roupas de novo.
Quando ele estava com as canelas afundadas na água ele percebeu que Sam não tinha concordado em fechar os olhos. Ela só tinha saído do caminho.
Sam não queria espiar Matt. Ela tinha desmontado e estava caminhando para o mais distante possível quando Cinnamon, simplesmente, cutucou o traseiro dela com o nariz. Sam girou para advertir a égua -
e viu por um momento Matt sentado no cavalo. Ele parecia com as estátuas de mármore que ela tinha visto nos livros da escola. Com os traços firmes e músculos esculpidos.
Ela não podia o culpar por não querer ficar com suas roupas molhadas. Aparentemente ele não tinha trazido roupas reservas, e ela só pensava em estar próxima de um rio com ninguém ao redor exceto Matt.
Matt, que sabia que ela era uma garota. Depois que ele tivesse seu tempo sozinho no rio, ela queria ter alguns momentos para ela também. Ela tinha trazido roupas limpas pensando nisso.
Matt ainda usava o chapéu de caubói. Causava sombras nas costas bronzeadas dele. O rio parecia tranqüilo, mas algumas centenas de gado fariam a água ficar agitada. E eles tinham perto de dois mil.
Ela tinha pensado em se virar e dar a Matt seu isolamento, mas agora que ela estava olhando para ele, tinha decidido que era melhor assim. E se ele escorregasse da sela? Ela precisava estar preparada
para salvá-lo. Jake provavelmente esperava que eles tomassem conta um do outro.
No meio do rio, a água estava batendo nas coxas de Matt. Lentamente, ele girou com o cavalo e se voltou em direção à orla.
Com um suspiro de alívio, ela se virou e começou a prestar atenção no próprio cavalo. Não havia nenhuma necessidade de ele saber que ela o estava olhando.
- Por que você não começa a juntar alguma madeira seca para a gente fazer um fogo? Matt gritou por detrás de uma árvore.
- Eu vou pegar um coelho para a gente jantar.
- Como estava a corrente? - Ela perguntou assim que ele atravessou os arbustos com o cavalo a reboque.
- Não muito forte. Nós não vamos ter tanta dificuldade como nós tivemos no último transcurso. - Ele olhou firme para ela. - Você ficará bem quando cruzarmos o rio?
- Certo. - Se seu estômago parasse de revirar...
- Eu vou cuidar dos cavalos antes de procurar algo para a gente comer.
- Matt, eu posso cuidar do meu próprio cavalo - ela disse a ele.
Ele esfregou o nariz de lado.
- Eu sei que você sabe, mas já que nós estamos longe dos outros, eu não tenho que fingir que você é um garoto. E já que é assim, eu decidi tratar você como uma dama. Então eu cuidarei de ambos os cavalos.
- Você precisa ser cuidadoso para não pegar nenhuma mania enquanto nós estamos aqui. Eu não quero que percebam que eu não sou um garoto, - ela disse.
- Eu já peguei uma mania se você quer saber - ele admitiu.
- Qual?
- Deitar toda noite e ficar pensando naquele maldito beijo. - Ele se virou e saiu andando a passos largos.
Infelizmente, ela também tinha desenvolvido esta mania.
CAPÍTULO DEZESSETE
Estranha. Sam se sentia terrivelmente estranha enquanto afundava no rio. Desde que Matt tinha dito a ela que eles iriam verificar o próximo rio-e acampar ao lado dele - ela tinha pensado em mais nada
além de tirar a roupa e se livrar da sujeira.
Ela mergulhou. Apenas dessa vez ela estava agradecida por seu cabelo estar curtinho e não estar rodando ao redor dela no rio. Voltando para a superfície, ela começou a se ensaboar com a pequena lasca
de sabão perfumado que ela tinha juntado durante a guerra. Ela tinha trazido com ela, esperando usar no fim da jornada. Ela só o usava em ocasiões especiais. Em outras épocas ela usava o sabão que sua
mãe fazia. Ela tinha decidido que hoje pedia um sabão especial.
Hoje à noite ela não tinha que prestar atenção no seu modo de caminhar, o modo de falar, o modo como suas roupas estavam no corpo, ou o modo como ela olhava para Matt. Hoje à noite ela podia ser uma
menina.
Durante a maior parte de sua vida, ela tinha se ressentido do fato de que ela não podia fazer todas as coisas que seus irmãos podiam. Não podia ir guerrear ou trabalhar com o gado. Não deveria subir
em árvores ou cuspir.
Agora que ela estava fingindo ser um garoto, ela sentia falta de ser uma menina. Ela sentia falta de usar vestido, fazer trança no cabelo longo, cabelo esse que tinha cheirinho doce.
Ela esfregou o topo da cabeça. Todos aqueles cachos curtos pareciam estranhos. Os homens da comitiva não pareciam muito preocupados com limpeza, o que até era vantagem para o disfarce dela, mas ela não
podia dizer que era um estilo de vida que ela queria manter por um longo tempo. A maior parte dos homens agiam como se não tivessem muita intimidade com a água e o sabão.
Matt parecia ser uma exceção. Todo sábado à noite ele pegava uma navalha e raspava a barba - não que ele tivesse muito para raspar. Mas isso a intrigava. Na verdade, tudo nele a intrigava.
Ela molhou a cabeça e enxaguou o sabão antes de submergir e voltar à superfície. A lua estava refletida nas ondulações da água. O vento sussurrava por entre as árvores que tinham crescido enfileiradas
na beira do rio.
Levantando os pés, ela começou a boiar. Ela não conseguia se lembrar de já ter se sentido assim tão relaxada, como se de alguma maneira, de algum modo, tudo daria certo.
- O que raios você pensa que está fazendo? - Matt gritou.
Sam ficou de pé, seus pés bateram no fundo barrento com força e ela deslizou perdendo o equilíbrio e escorregou. Ela surgiu de novo, tirando a água dos olhos, e viu um movimento rápido na água. Matt
obviamente pensou que ela estava em apuros e estava indo salvá-la novamente.
- Pare! - Ela gritou.
Encharcado, Matt parou abruptamente e ficou assim. A água estava na altura de sua cintura.
- Você está bem? - Ele perguntou.
- Sim - ela respondeu, tentando tranqüilizar as batidas de seu coração. Ele estava muito perto.
Ela manteve os ombros submersos.
- O que você está fazendo aqui?
- Você disse que viria se lavar. Eu comecei a ficar preocupado. Eu não pensei que você levaria tanto tempo para lavar os rostos e as mãos. Mas agora eu vi que você planejava lavar mais do que isto -
ele disse zombando.
Um arrepio de prazer veio junto com a confissão dele. Ele estava pensando nela. Ela se perguntou se os pensamentos dele iam no mesmo rumo que os dela.
- Você não tem com o que se preocupar. Eu apenas queria parecer limpa, - ela disse. Ela juntou as mãos rapidamente na superfície da água, e jogou um pouco de água nele.
- Ei! - Ele gritou.
Ela nadou um pouco para trás.
- Eu não sei como vocês caubóis podem ficar tanto tempo sem se banhar.
- Fique aí mesmo, - ele ordenou e começou a marchar para longe dela.
- O que você vai fazer? - Ela perguntou.
- Vou tirar as minhas roupas e me juntar a você.
- Você não pode fazer isto! - Ela gritou retrocedendo de volta.
- Claro que eu posso. Mas não se preocupe. Eu ficarei na minha metade do rio.
Ele se perdeu nas sombras. De repente ela se sentiu muito, muito maliciosa. Antes da guerra, ela estava certa de que Benjamin tinha ido nadar com garotos e garotas da idade dele. Eles ficavam a uma certa
distância respeitosa um do outro. Sem maldade alguma.
Ela ouviu um splash e abruptamente Matt atravessou a superfície da água e ficou alguns metros longe dela. Ele tirou os cabelos dos olhos antes de sacudir a água.
- Eu não quero brigar, Matt, - ela disse baixinho.
- Nem eu.
Ela nadou para longe dele.
- Nós provavelmente não deveríamos estar fazendo isto.
- Provavelmente não, - ele admitiu. - Eu não posso ver qualquer coisa, Sam. Exceto sombras.
- Você já nadou com uma garota antes? - Ela perguntou.
- Uma ou duas vezes.
Ciúme era uma coisa horrível. Ela não queria pensar nele na água com outras garotas.
Ele nadou em direção ao meio do rio.
- Você já tinha nadado com algum cara antes? - Ele perguntou.
Ela pensou em mentir mas ela estava cansada das mentiras entre eles. Ela queria fortalecer a frágil amizade deles com verdades.
- Não. - Ela mergulhou e voltou. - E eu sempre tinha inveja quando vocês ficavam na água.
Ele replicou.
- Eu nunca tinha pensado em como era duro para você nunca poder nadar sem medo de ser vista... ou pega.
Ela viu através das sombras que ele estava passando a mão no cabelo.
- Isso não me chateia, - ela explicou. - Eu entendo que é assim que deve ser.
- A maioria dos caubóis não toma banho até o fim do passeio - ele disse.
- Por que você não espera? - Ela perguntou.
- Não consigo ficar com toda essa sujeira, me faz lembrar da guerra. Porém, não tanto quanto um rio faz.
- O que você quer dizer? - Ela perguntou.
- Durante a guerra, nós acampávamos freqüentemente perto do rio. De noite, ficava tranqüilo. Nós ficávamos de um lado e os Yankees do outro. Alguns caras começavam a tocar gaita, então alguém do outro
lado do rio começava a cantar. Nós nos esquecíamos durante algum tempo de que éramos inimigos. Assim como você e eu estamos fazendo agora.
O estômago dela deu um nó.
- Eu nunca pensei em você como meu inimigo, Matt.
- Mesmo eu dizendo que vou contar a Jake a verdade... quando for a hora certa? - Ele perguntou.
Ela respirou fundo. Ela pensou em pedir, implorar, oferecer a ele uma parte do que ela ganhasse... mas em vez disso ela ofereceu a ele a verdade.
- Eu admito que desejo que você não conte a ele. Minhas razões que me fizeram entrar aqui não mudaram. Eu acho que sou um bom peão. Eu sei que eu não estaria aqui se você não tivesse se intrometido e
eu devo isso a você. Eu queria não ter mentido para você, mas às vezes a gente não tem nenhuma escolha. Às vezes, nós temos que fazer coisas que não queremos fazer.
Ele socou o rio com o punho e levantou água.
- Por que você tem que dizer coisas que me fazem gostar de você? Por que você não pode ser uma inútil? Assim eu ficaria contente de me livrar de você.
Um arrepio de alegria passou por ela, e ela ligeiramente sorriu.
- Eu pensei que você já estava contente em se livrar de mim.
- Eu gosto de você, Sam. Eu quero dizer, você aprende rápido, você trabalha duro, você nunca reclama... exceto quando eu peço para você não fazer algo. Você é o tipo de garota que faz um cara pensar
que seria bom ter as câimbras do Cupido.
O sorriso dela cresceu.
- Câimbras do Cupido - é o nome que os caubóis dão para o amor. Ela não entendia por que os rapazes agiam como se gostar de uma garota fosse a pior coisa que poderia acontecer com eles.
- Falando em câimbras do Cupido - ele disse, com tom de especulação na voz, - aquela noite quando nós fomos naquela dança... você estava com um humor estranho. Você não gostou de me ver dançando com
aquelas meninas, não é?
- Particularmente, não. Eu queria que você dançasse comigo, - ela admitiu.
Ela tremeu quando uma brisa soprou. Ela realmente não queria conversar sobre o ciúme que ela tinha sentido naquela noite. Fazia ela parecer pequena e insignificante depois de tudo que ele tinha feito
por ela.
- Eu estou começando a enrugar aqui - ela anunciou.
- Pode sair. Eu não vou olhar, - ele disse, logo antes de mergulhar na água.
Ela andou no rio, em direção à orla, não exatamente certa do que estava acontecendo entre eles. Ou por que estava acontecendo.
Mas, de repente, ela tinha sentido como se ela e Matt fossem amigos novamente... mais íntimos do que eles tinham sido antes.
Matt esperou o quanto ele achou que era suficiente para Sam sair da água e colocar umas roupas. Então ele nadou para a orla e colocou sua calça e camisa úmida. Quando ele viu Sam deslizar dentro d'água,
seu coração tinha saltado na garganta ao mesmo tempo em que ele mergulhou no rio.
Aquela garota ainda o mataria do coração. A coisa engraçada era que ele não se importava de vir ajudá-la. Ele sabia que iria realmente sentir falta do jeito dela quando ela fosse embora.
Pegando as botas, ele voltou para onde estavam acampados. Jake estava certo. Ele e Sam precisavam resolver suas diferenças, mas Matt não estava certo de que Jake percebia exatamente o que ele estava
pedindo a Matt.
Matt andou a passos largos. Sam tinha colocado os catres nos lados opostos do fogo. Ela já estava deitada. Ele sorriu. Para olhar para ela durante a noite, ele teria que olhar através das chamas.
- Você não tinha que arrumar um lugar para mim.
- Por que não? Você arrumou meu cavalo- ela disse com aquele pequeno queixo em um ângulo obstinado.
Ele abaixou na frente do fogo para tirar o frio causado pelas roupas úmidas. Ele esfregou as mãos juntas.
- Eu decidi que não irei dizer a Jake, - ele disse baixinho.
Ela se sentou de uma vez, como se estivesse com uma cascavel no colo.
- O quê?
Ele concordou com a cabeça e respirou fundo.
- Você é boa. Você precisa do dinheiro. Nós só temos mais algumas semanas até chegarmos a Sedalia. Eu vou guardar seu segredo até lá.
- Oh, Matt!" Ela lançou os braços ao redor dele e ele voou para trás, dando uma pancada no chão duro enquanto o corpo pequeno dela caía sobre o dele.
O peito dela estava apertado contra o dele. Ela estava tão quente. Através das roupas, ele podia sentir o calor dela. Ela se levantou. Suas bochechas queimavam tão vermelhas quanto às chamas do fogo
que subiam da pequena fogueira.
- Eu estou muito agradecida. Por que você mudou de idéia? - Ela perguntou.
- Eu não sei. Eu acabei de perceber que você tem sido uma menina desde que nós deixamos Faithful e nada de ruim aconteceu. Nós só desejamos que a sorte continue.
Além disso, ele não queria vê-la partir. Mas ele não podia dizer isto a ela. Ele tinha que manter alguma distância entre os dois - por ela e por ele. Ele se levantou e juntou as coisas.
- O que você está fazendo? - Ela perguntou.
- Indo para o seu lado. - Ele caminhou ao redor do fogo e sentou ao lado dela.
- Por quê?
- Com o fogo, é improvável que os animais ataquem, mas se eles fizerem, eu quero estar entre eles e você.
Ela revirou os olhos.
- Matt
- Não discuta comigo, Sam, ou eu direi a Jake a verdade.
Ela estreitou os olhos e então cedeu.
- Certo.
Ele se esticou ao lado dela. Não é incomum as pessoas dormirem lado a lado. Pessoas que vão a uma festa podem ficar durante a noite e se esticarem no chão juntos, mesmo quando eles não eram casados com
a pessoa do lado. Até pousadas às vezes colocavam estranhos juntos.
Uma fragrância chegou ao nariz dele. Ele se apoiou nos cotovelos e olhou para Sam.
- O que é esse cheiro de flores?
Ele viu as bochechas de Sam ficarem rosadas, e ele não achava que o calor do fogo era responsável por isto.
- É um sabão que eu uso em ocasiões especiais. Eu estava cansada de cheirar como o gado... então decidi usar isto hoje à noite. O cheiro terá ido embora amanhã. Ninguém notará.
- Na primeira noite em que eu fui despertar você, notei que você tinha cheiro de flores. Eu achei que você tinha abraçado sua mãe e pego o cheiro dela quando você disse adeus. Mas agora eu acho que este
é apenas o seu cheiro normal, não é?
- Fazia semanas que eu não tomava um bom banho quente.
- Aquele cheiro podia espantar o gado - ele pensava enquanto passava rapidamente os dedos pelo cabelo. Realmente tinha espantado ele, quando no fundo ele estava tentando ignorá-la.
- Qual era o tamanho do seu cabelo antes de você cortar?
- Até minha cintura. Mas ele vai crescer de novo.
- Eu aposto que era bonito. - Ele podia ver as chamas do fogo dançando sobre os cabelos dela.
- Minha mãe a chamava de coroa esplendorosa.
- Eu quero ver quando tiver crescido de volta.
Ele passou o dedo na testa dela até a bochecha. Ela parecia tão feminina. Como ele já tinha achado que ela era um garoto?
- As pessoas te chamam de 'Sam'?
- A maioria me chama de Samantha Jane. Todo mundo te chama de 'Matt'?
Ele sorriu.
- A menos que esteja com raiva. Então me chamam de Matthew.
- Eu devia te chamar de Matthew já que você me deixa com raiva várias vezes.
Seu sorriso cresceu enquanto ele segurava o olhar dela.
- Eu gosto como soa quando você diz Matthew.
- Matthew, - ela repetiu, com um sorriso tímido pairando nos lábios.
As faíscas do fogo crepitavam e estalavam no ar, valsando de volta para o chão. Uma tranqüilidade pairava sobre eles. Ele não tinha se sentido assim desde muito antes da guerra. Como se tudo fosse dar
certo.
Ela tinha olhos tão bonitos. O olhar dela vagava pelo rosto dele como se estivesse tentando memorizar as curvas e as linhas. Ele desejou ter trazido a navalha com ele, mas tinha ficado junto com seu
material na carroça. Ele tinha feito a barba há três dias. Não estava muito grande ainda. Mas fazia sombra no rosto.
Impulsivamente, ele segurou o rosto dela com uma mão e com a outra começou a passear o dedo polegar em cima dos lábios dela. Ele ouviu a respiração dela vacilar.
- Samantha Jane. - Ele gostava do modo como o nome dela dançava na língua dele
- Quando eu te beijei antes, estava com raiva porque queria te beijar.
Ela ligeiramente movimentou a cabeça, seus olhos nunca deixando os dele.
- Eu percebi.
- Eu não estou com raiva agora.
Ele a viu prender a respiração.
- Não está?
Ele abaixou a cabeça e beijou um canto da boca de Sam e então o outro.
- Não estou mesmo.
Ele ligeiramente tocou os lábios dela. Então ele colou a boca mais firmemente na dela. Depois, lentamente ele circulou com a língua ao longo dos lábios dela formando um oito como um nó de corda.
Ela suspirou enquanto jogava os braços ao redor das costas dele. Ele pediu com a boca que ela separasse os lábios, e quando ela concordou, ele colocou a língua naquele abismo de boas-vindas. Uma chama
acendeu nele como um fogo no campo. Ele aprofundou o beijo e deu um abraço apertado fazendo com que ela gemesse.
Respirando pesado, como se tivesse perseguindo o rebanho, ele arrastou a boca pelo pescoço dela.
- Ah, Sam, eu estou tão contente que você não seja um garoto, - ele disse numa voz que não conseguia reconhecer como sua.
- Eu também.
Erguendo a cabeça, ele riu para ela. Seus lábios estavam inchados, o rosto corado. Ele passou os dedos pelos cachos dela.
- Eu certamente sei que não estou olhando para um garoto agora.
A boca de Matt foi de novo em direção à boca de Sam. Ele a beijou profundamente, faminto, como o homem esfomeado que encontra um banquete.
Recuando, ele beijou a extremidade do queixo dela, a ponta do nariz, a sobrancelha.
- Você ainda está sob minha responsabilidade. Descanse um pouco.
- O que você vai fazer? - Ela perguntou.
- Vigiar.
- Me acorde quando for minha vez.
Ele deu um selinho nela.
- Certo.
Ele a viu dormir ao seu lado com a mão dobrada embaixo da bochecha. Ele decidiu que a vez dela não viria até o amanhecer.
CAPÍTULO DEZOITO
Os primeiros raios do sol matutino dançavam através das pálpebras de Sam. Com um bocejo vagaroso, ela abriu os olhos.
Matt estava deitado ao lado dela, a mão dele apertando a dela. Ele não a acordou para a vigia. Ela se perguntou quando ele tinha sucumbido ao sono. Ele parecia tão sereno, as linhas do rosto não estavam
fundas como sempre.
Com um sorriso, ela se lembrou do beijo que eles tinham compartilhado. E a promessa de que ele não iria revelar o segredo dela a Jake. Esta manhã, ela achou que o sol brilhava mais e o vento estava ainda
mais suave. Tudo daria certo.
Ela soltou a mão da dele. Caminhou até o rio. Ajoelhou-se na beira da água e lavou o rosto para tirar o sono. Então ela se sentou sobre as botas.
Nadar em um rio sem gado passando não a assustava. Ela se lembrou de que o que tinha acontecido no Rio Vermelho não deveria voltar a acontecer. E se acontecesse, ela estaria preparada.
Pelo canto do olho, ela viu Matt caminhar em direção a ela. Ele a tomou pela mão, a fez ficar de pé, e a segurou nos braços.
Ela respondeu o beijo com vontade. Seus joelhos se enfraqueceram e seus pés formigaram enquanto ela colocava os braços ao redor do pescoço dele. Um calor passou pelo corpo dela, afugentando o frio matutino.
Ele cessou bruscamente o beijo e a abraçou de volta.
- Eu vou sentir falta disso quando nós voltarmos para o rebanho.
A chama dos olhos dele deu um frio no estômago dela.
- Eu, também - ela admitiu.
Um grupo de caubóis se sentou ao redor Sam, Matt tinha um desejo incrível de beijar aqueles lábios que estavam recitando as palavras de Charles Dickens no "Um Conto de Duas Cidades". Os outros caras
estavam absortos com o livro que Cookie tinha retirado da carroça e tinha dado para Sam ler. Matt percebeu que eles prestariam ainda mais atenção se soubessem que estavam escutando uma garota. Ele ainda
não conseguia entender o fato de ninguém parecer notar como Sam era delicada. Claro, ela usava uma camada de poeira para cobrir o rosto. Mas ele sabia que debaixo daquela poeira tinham sardas que pontilhavam
o nariz e as bochechas.
Era um tormento montar ao lado dela todo dia e toda noite, e não poder abraçá-la, beijá-la, ou só tocá-la. Até dormir perto era uma tortura. Sua respiração gentil como uma canção de ninar o acalmava
e fazia dormir. Mas ao longo da noite ele acordava assustado com medo de acordar e a estar abraçando. Com medo de que ele pudesse estar fazendo na vida real o que estava fazendo nos sonhos - segurando-a
bem forte e a beijando como se o mundo estivesse acabando.
Ele desviou o olhar ligeiramente quando Jake se sentou ao lado dele.
- Você e Sam pareciam ter acabado com a diferença que havia entre vocês - Jake disse com voz baixa, já que sabia que os homens iriam se irritar por ele perturbar enquanto Sam lia.
- Cumprir aquela missão de observação com certeza ajudou - ele admitiu, rindo interiormente com a memória de quanto ele tinha gostado de estar longe de todo mundo só com ela. - Se você precisar de mais
alguma missão, conte com a gente.
- Eu prefiro fazer a observação eu mesmo. Eu ouvi um rumor de que os fazendeiros do Kansas estão descarregando seus rifles e tentando parar o gado - Jake murmurou.
Matt sentiu a ansiedade passar por ele. O gado Longhorn tende a carregar a febre do carrapato. Eles nunca ficam doentes mas o gado que entra em contato com eles fica. Kansas e Missouri emitiram leis
de quarentena proibindo o gado de vir durante os meses do verão quando os carrapatos estão ativos. Mas eles seriam doidos se tentassem conduzir o rebanho no inverno.
- O que nós vamos fazer?
Jake encolheu os ombros.
- Vamos ver o que vai acontecer. - Ele deu um tapinha nas costas de Matt. - Nós alcançaremos o rio amanhã.
Matt concordou com a cabeça. Levava muito mais tempo para mover o rebanho de gado do que para viajar a cavalo. E era muito mais duro passar com o gado através de um rio do que montado num cavalo. Desta
vez, ele se certificaria de que Sam ficaria do seu lado.
O rio que parecia tão pacífico três dias antes, agora com a passagem do gado estava com a água revolta e marrom. Mesmo conduzindo com muito cuidado não havia garantia de que não aconteceriam problemas.
Matt olhou por cima do ombro para Sam. Ela estava olhando fixamente para a água com sua sobrancelha enrugada e os olhos verdes escurecidos. Sua bandana estava solta ao redor do pescoço. Os cantos daquela
boca deliciosa estavam contraídos.
- Você vai ficar bem? - Ele perguntou.
Ela virou a cabeça ligeiramente e deu a ele um sorriso trêmulo.
- Sim.
Mas ela parecia pálida e o suor brilhava em cima de seu lábio superior. Este rio foi o primeiro que eles tinham que cruzar com o gado desde que ela quase tinha se afogado e ele tinha descoberto que ela
era uma garota.
- Você quer montar comigo? - Ele perguntou.
Ela negou com a cabeça ligeiramente e empinou o queixo.
- Não. Eu sou um peão, e um peão guia o gado através do rio.
Seu respeito por ela cresceu. Ela tinha fibra, isso ele tinha certeza. Ele desesperadamente queria apertar a mão dela ou dar um beijo naquela boca tentadora.
- Eu não deixarei você se afogar, Samantha Jane.
- Um dia destes, Matthew Hart, eu ainda vou te salvar. - Ela gritou em desafio enquanto levava o cavalo para o fundo do rio.
Matt a seguiu, se perguntando se ela já não o tinha salvado tirando seu coração de um auto-imposto exílio.
Durante a guerra, tinha sido tão ruim ver tantos feridos, mortos, tantos tinham virado prisioneiros. Ele achava que era melhor não se importar... mas ele tinha encontrado Sam.
E, por mais que tivesse tentando não se importar, ele se importava com Sam.
CAPÍTULO DEZENOVE
Muito depois que eles tinham cruzado o rio, quando a noite começou a descer, Sam finalmente sentiu a tensão se aliviar enquanto ela se sentava próxima à fogueira do acampamento. Ela não estava assustada
em cruzar o rio, apenas cautelosa. Apreensiva. Um pouco preocupada que ela pudesse tombar do cavalo. Mas foi tudo bem. Nada de errado. Como Jake tinha falado, era realmente raro.
O que ela não podia entender era a razão pela qual todo mundo parecia estar incrivelmente cauteloso, como se eles não confiassem na sorte. Como se a qualquer minuto algo fosse dar errado.
Ela olhou para as cartas que ela segurava nas mãos. Sua mãe nunca aprovaria que ela jogasse pôquer, mas o tédio entre os homens era quase tão perigoso quanto um boi selvagem. Ela tinha visto brigas surgirem
simplesmente porque uma sombra de um homem tocou na do outro.
Ela dava boas-vindas a qualquer forma de entretenimento, e se ela fosse muito cuidadosa não perderia muitos de seus ganhos. Ela tinha a intenção de ser muito cautelosa.
- É, está muito quieto - Squirrel disse com a voz baixa, como se temesse perturbar o silêncio.
- Não está quieto - Slim sussurrado. - É a calmaria.
Ela esperava que alguém risse ou fizesse uma piada sobre eles estarem se preocupando como umas velhas. Em vez disso, Jed e Jeb apenas concordaram com a cabeça. Até Matt parecia nervoso.
- Vai jogar ou tagarelar? - Sam perguntou, fingindo irritação. O ar da noite de alguma forma parecia diferente. Espesso, quase opressivo. Um ar de mau augúrio pesava sobre eles.
- Eu estou fora - Matt disse largando as cartas.
Todos fizeram o mesmo. Sam juntou seus ganhos. Todos os doze centavos.
- Por que vocês estão tão irritados?
- Estouro - Matt disse, segurando o olhar dela.
- Por que se preocupar com algo que não aconteceu ainda? - Sam perguntou.
- Não estou me preocupando - Matt disse. - Só quero estar preparado."
- Como você se prepara para isto? - Sam perguntou.
O olhar dele foi para os lábios dela antes dele abruptamente se colocar de pé.
- Vamos dar uma volta, Sam, que eu te explico.
Ela colocou as cartas de lado e ficou de pé. Ele foi em direção ao campo e ela foi atrás dele. A terra era estéril. Nenhuma árvore sequer. Quilômetros com apenas grama.
Eles caminharam até não conseguirem mais ouvir Cookie batendo nas panelas ou ouvir o murmúrio dos caubóis. A fogueira do acampamento estava lá atrás deles. Ao lado dela, Matt era apenas uma silhueta.
Ela ainda podia sentir seu intenso olhar enquanto ele percorria os olhos por ela.
- Achei que você queria explicar alguma coisa - ela disse baixinho.
- Sim. - Ele parou de caminhar e a encarou. - Eu tenho um desejo ardente de beijar você, Samantha Jane.
O prazer a formigou, da cabeça até os dedões do pé. Ela ouviu seu suspiro flutuar na brisa gentil.
- Mas alguém com bons olhos poderia ver o que nós estamos fazendo
- E compreender que eu não sou um garoto - ela terminou por ele.
- Sim.
Um canto da boca de Sam se curvou.
- É isso que você queria explicar para mim?
- Eu só queria ficar sozinho com você um pouco. Eu nunca cortejei ninguém. Não estou certo de como se faz isto.
O coração dela bateu contra o peito.
- Você está dizendo que quer me cortejar?
- Eu estou dizendo que estou pensando nisso.
Ela certamente não tinha vindo para essa comitiva esperando achar um galanteador, e ela não estava completamente segura de que tinha achado.
- Matt, você já experimentou olhar por uma vitrine de loja e ver algo que você queria mas não podia ter?
- Sim.
- E o fato de que você não podia ter fez com que você quisesse isto mais?
- Aonde você está querendo chegar? - Ele perguntou.
- Eu estou só me perguntando se você quer me beijar ou cortejar somente porque você não pode ter - ela disse suavemente. - Eu sou como uma fruta proibida. Tentadora porque você não pode me ter.
- Você acha que se eu pudesse te beijar, então eu não iria te querer mais? - Matt perguntou.
As palavras soaram tão tolas quando Sam as ouviu vindo dele.
- Eu não sei.
- Então vamos descobrir. - Ele a puxou para perto dele.
- Matt! Alguém pode nos ver
A boca de Matt acabou com o protesto dela da mesma forma que um tornado acabaria com um piquenique de domingo. Ele a beijou, lentamente, provocantemente. Ela realmente imaginava ter escutado um violino
zumbindo, mas era apenas o sangue dela circulando. Passando os dedos pelos cachos, ele virou a cabeça dela ligeiramente e aprofundou o beijo.
Ela ouviu seu gemido gutural e respondeu com um gemido próprio. Respirando pesadamente, ele deu um passo para trás e a soltou.
- Para seu governo, eu te quero mais agora do que queria há um minuto atrás. - Ele se virou e saiu andando.
- Aonde você está indo? - Ela perguntou.
- Vou olhar o gado e tentar tirar você da minha mente.
Ela viu a sombra dele ir se misturando com a sombra da noite até desaparecer. Um raio distante brevemente iluminou o céu, esboçando a silhueta dele. Com sua cabeça curvada, ele parecia uma figura tão
solitária. E ela se perguntou se ele percebia o que ela finalmente tinha compreendido. Sempre que ele a beijava, uma faísca minúscula de paixão acendia uma enorme chama. Uma chama que poderia ser tão perigosa
quanto um fósforo queimando perto da pradaria, destruindo tudo no caminho. Ela tinha que evitá-lo. Se ela não conseguisse frear a paixão que queimava entre eles, poderia destruir todos os sonhos dela.
Acordando com um susto, Sam sentiu o trovão longo antes de ela o ouvir. O chão tremeu debaixo dela, tremendo como se a qualquer momento o chão racharia, abriria e sugaria tudo ao redor.
- Estouro! - Alguém gritou.
Ela se sentou no catre. Ao lado dela, Matt já estava colocando as botas.
- Você fica aqui - ele disse por cima do ombro enquanto saía correndo.
Todo mundo corria em torno do acampamento; Aqueles que tinham tirado suas calças curtas antes de ir dormir não se preocupavam em colocá-las agora. Eles se contentavam em correr de calção.
Sam estava certa de que a ordem de Matt significava que ele estava aprontando o cavalo dela. Ela pegou as botas e correu para onde estavam os caubóis rapidamente selando os cavalos. Ela agarrou a corda
e manteve Cinnamon em linha. Matt agarrou o braço dela e a puxou.
- Eu disse para você ficar!
Ela se soltou do braço dele.
- Temos um estouro. Eu posso arrumar meu cavalo.
- Você não vai montar. Vai ficar na carroça com Cookie.
Boquiaberta, ela olhou fixamente para ele.
- O quê? Matt, você precisa de todo mundo
- O que eu preciso é não ter que me preocupar com você!
- Eu posso cuidar de mim mesma - ela garantiu.
Ele agitou a cabeça com força.
- Não durante um estouro.
- O que está acontecendo aqui? - Jake perguntou, seu rosto uma máscara de preocupação, irritação, e medo.
- Sam vai ficar - Matt disse a ele.
- Não, eu não vou.
- Eu não tenho tempo para discutir, Sam, - Matt disse. - Você fica.
- Ele vai - Jake disse.
Matt se virou para olhar Jake.
- Sam não tem nenhuma experiência com estouro de gado.
- Então ele aprenderá isto hoje à noite. Monte. - Ele se virou para ir embora.
- Sam é uma garota! - Matt gritou.
Sam sentiu seus sonhos demolirem ao redor dela enquanto todos pararam de bocas abertas, olhos arregalados. Jake virou tão rápido que quase perdeu o equilíbrio.
- O que você disse?
Matt respirou fundo.
- Eu disse que Sam é uma garota.
Jake praguejou por baixo da respiração ofegante.
- Cookie, mantenha ela na carroça. - Ele apontou um dedo trêmulo para Matt. - Você vai se ver comigo mais tarde.
Jake saiu como um furacão. Ela bateu o punho no ombro de Matt.
- Você me traiu. Você prometeu
- Nós discutiremos isto depois que nós conseguirmos acalmar o gado, - ele disse enquanto puxava o cavalo.
- Eu vou te odiar até o dia da minha morte! - Ela gritou enquanto ele montava.
Ele respondeu com desprezo.
- Pelo menos eu não vou ter que me preocupar com você morrendo hoje à noite.
Ele girou com o cavalo e saiu galopado pela noite.
E tudo que Sam sentia era a destruição de seus sonhos e o seu coração se partindo.
CAPÍTULO VINTE
Sentada no chão com as costas contra uma roda da carroça, Sam assistia a tempestade avançar pela terra. As folhas brilhavam com os raios e depois deles seguiam trovões assustadores. Embora não estivesse
ainda chovendo, o ar estava carregado com a expectativa de uma chuva arrasadora.
Ela entendia o porquê do gado ter decidido estourar esta noite. Ela também queria desesperadamente fugir. Ela tinha trabalhado até seus dedos ficarem em carne viva, todos os músculos e ossos de seu corpo
doíam. Ela tinha enfrentado o rio.
E para quê?
Para ser traída. Ela tinha ganhado o direito de ser respeitada, de ser considerada capaz de manipular o rebanho. Em vez disso, ela tinha sido deixada pensando, esperando e se preocupando.
Embaixo do traseiro, ela sentia o chão tremendo com o bater dos cascos.
- Horripilante, não é? - Cookie perguntou enquanto ele pegava outro bule junto com as pedras que ele carregava para acender o fogo.
Ela olhou para ele. Ele estava enxugando as mãos no avental.
- O único som que o gado faz é o trovejar dos cascos. Eu acho que o silêncio é ainda mais preocupante - ele disse.
Por alguma razão inexplicável ela sentiu um arrepio.
- Eu não sei por que eu tive que ficar para trás.
- Para que você fique segura.
- Eu achava que nenhum lugar era seguro durante um estouro - ela falou num tom abafado. Ela sabia que deveria ficar agradecida por Matt ter se importado, mas ela estava com raiva porque ele não tinha
achado que ela era capaz de fazer o trabalho.
- Uma carroça é normalmente um lugar seguro. Eu não sei porquê, mas o gado não passa por cima. Se eles vierem para este lado, você simplesmente vai para o outro. Eles vão passar. Não importa quantos
peões existam, não importa se eles estão indo muito rápido. - Ele riu.
- Eu já fiquei tremendo com as costas voltadas contra uma carroça e vi eles passarem como uma divisa de águas.
Sentar aqui, imaginando o que estava acontecendo lá fora a estava deixando louca. Ela ficou de pé.
- O que eu posso fazer para ajudar?
Ele riu.
- Esse é o espírito. Vamos botar água para ferver. Provavelmente teremos que limpar alguns cortes e arranhões. E os homens vão querer café. Uma vez que o gado se espalha eles são duros de acalmar. Não
precisa de muita coisa para fazê-los correr novamente.
Ela pegou uma panela na carroça bem organizada e com uma concha pegou água do barril.
- Você já viu muitos estouros, Cookie?
- Sim. Antes da guerra eu trabalhei conduzindo gado na Califórnia. Durante a guerra trabalhei para as equipes que levavam carne de boi para a Confederação. - Ele fechou os braços em forma de arco. -
Agora, estou aqui.
Ela colocou o bule em uma madeira que Cookie tinha enganchado na terra.
- Você já viu uma mulher em uma comitiva de gado?
- Não até este aqui. - Ele a olhou com os olhos entreabertos. - O que você estava pensando, moça?
- Que os cem dólares aliviariam o fardo da minha mãe.
Ele concordou com a cabeça.
- Há quanto tempo Matt sabia?
Ela lambeu os lábios, tentando decidir se deveria responder. Que mal poderia haver?
- Desde que nós cruzamos o Rio Vermelho.
Cookie resmungou alguns palavrões. Então suas bochechas ficaram vermelhas.
- Peço desculpas. Jake vai tirar a pele dele e pendurá-lo de cabeça para baixo.
Bom. Ele merecia. Não por manter o segredo, mas por contá-lo. Ela ouviu o som de alguns cavalos e se virou. Alguns peões tinham voltado para trocar seus cavalos cansados por outros descansados. Ela correu
para eles.
- Como estão as coisas?
- Eles estão espalhados pelos quatro cantos - Squirrel disse.
- Talvez eu devesse montar e ajudar - ela sugeriu.
- Eu acho melhor você não fazer - Slim disse. - Jake nos mandaria embora num piscar de olhos.
Desapontada, ela concordou com a cabeça. Squirrel montou no cavalo.
- Para um iniciante, eu te achava um bom peão.
Ela sorriu enquanto ele chutava o cavalo e saía galopando.
- Tenha cuidado!
Se virando, ela voltou na direção do acampamento para ver o que ela podia fazer para ajudar Cookie. Ela achou que estava sendo um ajudante confiável também.
Inferno de cascos.
Isto era tudo em que Matt podia pensar enquanto ele galopava pela pradaria, tentando chegar ao líder que conduzia o rebanho. Um homem não podia cair do cavalo senão seria pego por aqueles cascos.
Matt tinha ouvido histórias de homens que tinham caído no chão e lá ficado até que a única coisa visível era o chapéu. Provavelmente nada além de um conto do Texas. Mas ele não tinha vontade de fazer
um teste para saber se aquilo realmente acontecia ou se era só lenda.
Os homens estavam tão mudos quanto o gado. O gado não gritava e os homens também não gritavam. Não havia nenhuma necessidade de assustá-los ainda mais do que já estavam assustados. Além disso, os homens
sabiam o que tinham que fazer sem que precisasse ser dito.
Os peões formavam grupos e começavam a girar em torno do gado formando um círculo até que os homens gradualmente reduziam o gado em número cada vez menor, até que eles não tinham nenhuma escolha a não
ser parar de correr. E uma vez que eles estivessem reunidos, ainda estariam nervosos e inquietos.
Ao menor som eles começariam a debandar de novo.
Um grupo se desviou do rebanho principal. Matt praguejou. Uma vez que eles começassem a se separar, ficaria mais difícil fazê-los voltarem a ficar em linha. Um homem tinha que ficar do lado de fora e
não ser pego no meio do tumulto.
Ainda que Sam não fosse uma menina, Matt teria discutido com Jake sobre deixá-la vir ajudar. A quietude da caçada aos bois deixa uma clima pesado no ar. Fazia os cabelos de trás da nuca de Matt se arrepiarem.
Sam. Ele entendia que ela estava mais louca que um touro enlaçado. E ele não a culpava. Ele a tinha traído, mas em sua mente ele não tinha tido nenhuma escolha. Ele não tinha tempo para discutir com
ela ou a convencê-la dos motivos pelos quais ela deveria ficar para trás.
Com ela aqui, os dois estariam em risco, porque ele a teria em mente, tentaria protegê-la. Se o sacrifício que ele faz, causaria a perda do afeto dela, que assim fosse. Ele preferia que ela o odiasse
a que ela morresse.
Ele fez o cavalo galopar mais rápido já que o gado mais uma vez tinha mudado de direção. Ele sentiu uma gota cair no chapéu. Bom. Se a chuva vinha, talvez a tempestade passasse.
Uma tempestade elétrica era pior. Ele via a dança de raios através do céu e uma dança chifres na terra. Era uma visão assustadora.
Um abismo apareceu do nada. Ele ouviu o gado gritando enquanto mergulhava de sua extremidade.
Ele ouviu o alto relincho de seu cavalo enquanto ele parava. Ele caiu para frente no abismo. Matt ficou livre no caos. Na escuridão, ele nada enxergava. Ele apenas podia sentir uma dor agonizante que
o rasgava.
Antes que a paz misericordiosa do esquecimento o chamasse.
Algo estava errado; Sam sentia isto claro até os ossos quando a chuva começou a cair como uma torrente. Matt não era um covarde. Nem era um tolo.
Ele tinha que saber que seu cavalo não podia se manter galopando a noite toda. Ele tinha que entender que encarar a ira dela era preferível a exaurir o cavalo. Além disso, ela não achava que ele iria
tão longe só para não confrontá-la.
Ele a encontraria com a cabeça mais calma. Ele com certeza não tinha dúvida de que eles trocariam algumas palavras assim que o gado tivesse se aquietado.
Então por que ele não tinha retornado ao acampamento para conseguir um cavalo descansado?
Os outros homens tinham vindo, alguns mais do que uma vez. Eles bebiam um gole do café que ela oferecia a eles, e então eles saltavam sobre os cavalos e montavam de volta na noite tendo trocado apenas
algumas palavras.
- Eles devem ter corrido entre vinte e quatro e trinta e dois quilômetros mais ou menos.
- Tínhamos acalmado eles durante algum tempo, então eles começaram a se mexer como se tivessem visto um espírito.
- Acho que nós perdemos provavelmente uns cem.
- Alguns não perceberam que tinham que sair do caminho. Encontrei algumas carcaças.
Este último comentário foi o que a preocupou mais. Ela percebeu que duas mil cabeças de gado correndo causariam um grande estrago. Embora Cookie continuasse a assegurar que eles não passariam por cima
da carroça, isso não queria dizer que eles não pisoteariam um homem e seu cavalo.
- Preciso de ajuda aqui! - Alguém gritou. - Jeb está machucado!.
Sam voltou de seu devaneio. Jed estava puxando as rédeas, fazendo seu cavalo parar. Jeb estava sentando atrás do irmão. Com um grunhido ele deslizou pela parte de trás do cavalo.
Seu chapéu tinha sumido, sua roupa estava puro barro, e seu braço estava pendurado como o braço de um espantalho num campo de milho. Jed desmontou e levou seu irmão em direção ao fogo.
- Jeb caiu do cavalo.
- Que droga, garoto -. Cookie resmungou enquanto se movia pesadamente para o lado dele.
Jeb se sentou no chão e embalou o braço no colo. Sam se ajoelhou ao lado dele.
- Está quebrado? - Ela perguntou.
Movimentando a cabeça, ele recuou a manga. O estômago de Sam revirou ao ver o osso empurrando a carne.
- Pode voltar. - Cookie ordenou Jed. - Eu e Sam podemos cuidar disto.
Jed concordou com a cabeça e se foi. Sam segurou a mão de Jeb e enxugou sua testa enquanto Cookie fixava o osso quebrado em lugar.
- Como você caiu? - Sam perguntou baixinho, tentando distrair Jeb da dor.
- O cavalo pisou em um buraco na pradaria. Jed teve que deitá-lo. Ele quebrou a perna. Eu quebrei o braço.
"Isso acontece freqüentemente, dos homens ficarem assim muito machucados?" Sam perguntou.
- Não é incomum perder um homem ou dois quando o gado fica aborrecido como eles estão hoje à noite. Eu sabia que estava uma noite fantasmagórica. Podia sentir no ar - Jeb disse.
- Você viu Matt enquanto estava lá fora? - Ela perguntou.
Ele negou com a cabeça.
- O gado está espalhado por todos os lugares. Nós estamos fazendo o melhor que podemos.
Ela olhou a tala que Cookie tinha colocado.
- Acho que nós podemos esperar mais feridos a partir de agora - ele murmurou.
E ele estava certo. Sam serviu café e gentis conselhos. Ela colocou um pano úmido num enorme galo na cabeça de um dos peões. Homens estavam espalhados em torno do acampamento. Mais homens começaram a
chegar no acampamento, informando que o gado estava espalhado mas calmo. Alguns homens caíram sobre seus catres e imediatamente começaram a roncar. Outros beberam o café e comeram os biscoitos de leite
que ela ofereceu a eles. Mas Matt não tinha retornado nenhuma vez ao acampamento.
O amanhecer era ainda apenas uma linha ao longo do horizonte, empurrando a noite de lado. Ela levou os cavalos restantes e começou a preparar Cinnamon.
- O que você está fazendo? - Squirrel perguntou.
- Tem algo de errado. Matt não retornou ao acampamento - ela disse a ele.
- Muito caras ainda estão lá fora - Squirrel disse.
Como ela podia explicar este sentimento de medo que a estava sufocando?
- Mas eles retornaram ao acampamento de vez em quando. Até Jake retornou. Não tão freqüentemente quanto alguns dos homens, mas ele voltou pelo menos duas vezes que eu vi.
- Eu irei com você - Squirrel disse.
Ela não sabia se sentia confortável com a presença dele ou se preocupava por ele ter pensado, assim como ela tinha, que havia necessidade de ir à procura de Matt.
CAPÍTULO VINTE E UM
A chuva torrencial tinha diminuído e virado um chuvisco irritante. As gotas caíam da borda do chapéu de Sam. Seu rosto e ombros estavam protegidos e isso a fazia se sentir melhor. Como a maior parte
dos caubóis, ela utilizava o poncho quando sentia o início da chuva. Em baixo do poncho ela se sentia seca e vazia. Sentia-se miserável. Ela não conseguia escapar deste terrível pressentimento. Quando
o sol começou a subir, ela podia ver o gado separado em pequenos grupos. Ela percorreu uma extensão tão grande que a tinha feito perder o fôlego mas tinha sido uma tarefa desencorajadora. Matt poderia
estar em qualquer lugar aqui. Em qualquer lugar mesmo. Ela não tinha nenhuma idéia de onde deveria começar a olhar... até que viu urubus formando círculos no céu.
Lentamente, dolorosamente, Matt rastejou em direção ao barranco. Ele tinha que voltar ao acampamento, tinha que ter certeza de que Sam estava bem. Seu cavalo estava morto, assim como a maior parte do
gado que tinha mergulhado no abismo. Através da névoa de dor ele podia ouvir alguns gritando. Ele queria ajudá-los, realmente queria. Mas ele não estava certo nem de que podia ajudar a si mesmo. Sua perna
doía como se ele tivesse levado um tiro e suas calças estavam encharcadas com sangue. O chifre de um dos touros deveria ter rasgado sua coxa. Ele estremeceu com a memória da dor agonizante. Era tudo o
que ele se lembrava. Da escuridão. E do medo paralisante. Respirando com dificuldade, ele desmoronou no topo do barranco. Quanto sangue ele tinha perdido? Quanto tempo ele tinha ficado deitado lá inconsciente?
Sam estaria bem? Sam. Seu nome era uma bênção doce ecoando por sua mente. Ele tinha que chegar até ela. De alguma maneira, ele sabia que se conseguisse chegar até ela, ele ficaria bem. Com as mãos trêmulas,
ele desfez o laço da bandana no pescoço e a tirou. Ele a colocou em volta da coxa. Ele precisava fazer um torniquete. Mas estava incrivelmente fraco. A escuridão ia e voltava. O que não fazia nenhum sentido.
Parecia ser dia. A terra e o céu se inclinavam e rodavam. Que sede, ele estava com uma sede incrível. Será que seu cantil ainda estava preso na sela do cavalo. Será que estava embaixo de seu cavalo ou
do gado? Ele teria força suficiente para recuperá-lo se tentasse?
As perguntas, as dúvidas, o assombravam cruelmente. Ele não conseguia pensar claramente. Ele só conseguia se preocupar com Sam. O que aconteceria com ela se Matt não conseguisse voltar ao acampamento?
Ele ouviu um trovão. Em baixo de sua bochecha apertada contra a sujeira, o chão se agitou. Não outro estouro. Por favor, não outro estouro.
Ele não achava que teria qualquer sorte em se salvar desta vez. Ele tinha perdido o chapéu. Ninguém saberia onde ele tinha sido pisoteado.
- Oh, Matt!.
Levantando a cabeça, ele olhou com olhos entreabertos pelo suor e pela sujeira. Sam! Um canto de sua boca se arqueou.
- Você certamente é um bálsamo para olhos doloridos.
- O que aconteceu? - Ela perguntou enquanto se agachava ao lado dele.
- Azar.
Sam pensava que era mais do que má sorte enquanto ela erguia a cabeça de Matt e colocava uma xícara na sua boca. Ela ajudou Squirrel a colocar Matt sobre o cavalo e assim eles puderam voltar ao acampamento.
A jornada tinha sido lenta e árdua, com Matt trincando os dentes durante todo o caminho. Ele gemeu somente uma vez-e foi quando Squirrel o colocou no cavalo. Ela desejava que ele não permanecesse assim
tão estóico. Ficava muito difícil para ela permanecer com raiva dele. Estava ainda mais difícil de ficar brava quando ela estava tão aliviada por ele estar vivo. Agora ele estava deitado no catre respirando
com dificuldade por entre os dentes. Os peões o tinham cercado como se eles nunca tivessem visto um homem ferido antes. Sam se sentou ao lado dele. A mão dele segurava a dela com força. Estava fria e úmida.
Um suor frio encharcava a testa e a parte de cima dos lábios dele.
Cookie cortou o lado da calça que estava sobre a ferida de Matt, colocou o pano de lado, expondo a profundo ferimento na coxa. Sam deu uma olhada rápida no ferimento. Parecia que um touro tinha cravado
os chifres sem dó. Ela só conseguia imaginar que o touro tinha estado louco com o susto e Matt tinha sido pego nessa loucura.
- Deus todo poderoso - Cookie deixou escapar.
- Tá ruim, é? - Matt perguntou, sem nunca desviar seu olhar do rosto de Sam como se ela fosse seu colete salva-vidas numa tempestade. Ela não o podia culpar por não querer ver.
- Precisa costurar - Cookie disse, e ninguém podia chegar a outra conclusão.
- Eu farei isto - Sam disse tranqüilamente.
Ela tinha visto Cookie tratar os outros. O homem era qualificado para fazer curativos, e os caubóis poderiam todos reconhecer que ele era o doutor de acampamento mas ele não era gentil. Ela não podia
agüentar o pensamento de Matt passar por ainda mais dor do que já estava passando. Ela ouviu o retinir de esporas. Os homens que estavam ao redor se afastaram depressa e Jake se ajoelhou ao lado de Matt.
- O que aconteceu? - Ele perguntou.
- Não vi o barranco - Matt disse. - O gado estava enlouquecido. Sam me achou.
Jake virou sua atenção para ela.
- Você foi procurar por ele?
Ela não estava certa se a descrença na voz dele era porque ela tinha desobedecido a uma ordem dele de ficar no acampamento ou se era porque ela tinha tido o juízo de não esperar ele voltar.
- Ele não voltou ao acampamento, nenhuma vez - ela explicou. - Todo mundo voltou para beber café ou trocar de cavalo. Você tinha saído há muito tempo quando eu comecei a ficar preocupada. Eu tinha medo
de ser tarde até você voltar para ir procurar por ele se ele estivesse em apuros.
- O que eu estava - Matt disse.
- Acho que ele é sortudo já que você não me esperou, então - Jake disse e ela quase pensou ter ouvido admiração na voz dele.
- Nós precisamos dar um jeito na perna dele, Chefe - Cookie disse.
- Certo. Nós vamos levar a maior parte do dia para reunir o gado. Faça o que puder pelo Matt. Eu o olharei de novo quando anoitecer.
Ele se levantou e saiu andando a passos largos.
Cookie colocou uma tigela com água morna na frente de Sam. Ela depressa lavou as mãos.
- Morda isto
Cookie ordenou e Sam viu ele colocar uma tira de couro entre os dentes do Matt. Então ele despejou uísque em cima do ferimento. Batendo violentamente os olhos, Matt se sacudiu e gemeu por entre os dentes.
Lágrimas queimavam os olhos de Sam. Ela queria ficar brava com ele por causa da traição, mas tudo que conseguia era desejar que o sofrimento dele acabasse. Desviando os olhos de Matt, ela deslizou uma
linha preta grossa por uma agulha grande. Então, com a respiração estremecendo, ela se preparou para o que tinha que fazer. E foi trabalhar.
No meio da noite Matt teve febre alta. Ela tinha ido e voltado à maior parte do dia. Toda vez que Sam passava um pano úmido em sua testa ou próximo da garganta, ela sentia através do pano um ardor sob
a pele maior do que o calor normal do corpo. Ela o alimentou com caldo durante o dia e deu bastante água para beber. Ela o limpou com esponja, várias vezes, tentando mantê-lo fresco. Ela mudava as roupas
dele todas as vezes que precisava mas mesmo assim tinha medo de que uma infecção aparecesse. Ela não queria que ele perdesse a perna. Mais ainda, ela não queria que ele morresse. Um por um, os homens viam
ver como ele estava. Mudando constantemente o apoio dos pés e com as mãos dobradas atrás do cós das calças, eles todos pareciam desconfortáveis em relação a Matt como se eles, de alguma maneira, tivessem
falhado em não perceber que ele estava faltando.
- Como ele está indo? - Jake perguntou enquanto se agachava ao lado dela.
- Ele está com febre - Sam disse baixinho.
- Isto não é incomum. A infecção pode aparecer rápido. Ou o corpo dele pode estar apenas lutando. Mas ele é forte e teimoso. Nós esperaremos aqui o quanto for necessário.
Ele se virou ligeiramente e olhou para ela.
- Eu não consigo acreditar que Matt contratou uma garota.
- Na época ele não sabia que eu era uma garota - ela admitiu.
- Mas ele percebeu depois.
Ela concordou com a cabeça.
- No Rio Vermelho.
Ele suspirou.
- Ele deveria ter dito para mim aquele dia.
- Ele queria, mas eu o convenci - ela apressadamente disse. - Ela estava disposta a assumir a responsabilidade pelo fiasco inteiro.
- Você não tem família? - Jake perguntou.
- Claro que tenho. Por que você acha que eu estou fazendo isto? Nós precisávamos do dinheiro. Ainda precisamos.
- A próxima cidade é Baxter Springs. Lá você vai nos deixar.
Ela pensou em discutir, pedir para que ele a deixasse ficar, mas ela não achava que era a hora certa para isso. Ele estava cansado; Ela podia ver isto nos olhos dele. Ele tinha juntado o gado noite e
dia. Talvez se ela esperasse o humor dele melhorar... mas ela não conseguia se lembrar de alguma vez tê-lo visto de bom humor.
- Eu estarei fora com o gado. Envie alguém para ir me buscar se febre do Matt piorar - Com aquele comando final, ele se levantou e saiu.
Ela tentou não pensar que teria que deixar a equipe quando eles chegassem na próxima cidade. Era só um pulo de Baxter Springs até Sedalia. Se ela não fosse até Sedalia com a equipe, ela não conseguiria
seus cem dólares. Não importava que distância ela tinha percorrido ou o quanto ela tinha trabalhado duro. Ela ficaria com nada além de sonhos destruídos. Mas pelo menos ela não estava ferida, como Matt
estava. Ela imergiu o pano na tigela com água. Ergueu, torceu com cuidado e começou a enxugar o suor que cobria o peito de Matt. Cookie tinha tirado a camisa de Matt logo depois de Sam ter terminado de
costurar o ferimento na coxa dele. Ele queria verificar as costelas. As costelas de Matt estavam intactas, mas era óbvio pelos hematomas na pele que ele tinha batido no gado ou no barranco. Um lado estava
quase completamente roxo e verde. O resto era uma série de contusões.
Ela odiava pensar nele no barranco. Ela poderia ter feito algo se eles tivessem montado juntos. Ela não teria saído de seu lado como os outros tinham. Ela sabia que esses pensamentos eram injustos. Ninguém
intencionalmente o tinha abandonado. Eles todos estavam só fazendo o que eles podiam para acalmar o rebanho e conseguir colocá-los de volta na linha.
Lentamente ela arrastou o pano até a garganta, passou em cima dos ombros largos e através do peito. Seus músculos estavam tensos devido ao esforço. Cuidadosamente, ela moveu o pano de cima das costelas
até o estômago. Depois foi novamente para a garganta. Para baixo. Fazendo um círculo largo. Então um menor.
- Eu tive que dizer a Jake, Sam - Matt sussurrou.
Com um susto, ela olhou para ele, se perguntando há quanto tempo ele tinha estado acordado, há quanto tempo ele poderia a estar observando.
- Você não vê? - Ele continuou. - Podia ser você deitada aqui.
Lágrimas brotaram nos olhos dela.
- Eu preferia que fosse. Não morra, Matt.
Um canto da boca de Matt se arqueou.
- Eu não sonharia em fazer isso... mas eu certamente estou sonhando com isto...
Ele passou os dedos pelo cabelo dela e desceu as mãos pela nuca. Ele a trouxe para mais perto, mais perto, até que suas bocas se tocaram.
O beijo estava cheio de desespero, o desespero que ele tinha em comprovar que ambos estavam vivos. Que tinham sobrevivido. Quando ele terminou o sonoro beijo, ele trouxe o rosto dela para seu ombro.
- Durma - ele ordenou com a voz cansada.
- Eu preciso cuidar de você - ela murmurou.
"- Mais tarde - era tudo que ele disse antes de descansar.
A respiração dele ficou mais alta e a pele parecia menos aquecida. Ela cedeu à tentação e se juntou a ele no sono.
CAPÍTULO VINTE E DOIS
- Você tem alguma idéia do tipo de perigo que você expôs esta comitiva quando a trouxe?
Jake perguntou.
Matt achava que Jake esperaria até que ele estivesse completamente recuperado para dar uma bronca nele. Em vez disso, ele só tinha esperado até Matt estar forte o suficiente para caminhar sozinho.
- Eu não acho que tenha colocado ninguém em perigo - Matt disse sem mudar de tom.
- Ela é uma garota!.
- Que sabe se cuidar sozinha.
- Ela vai deixar a equipe na próxima cidade - Jake disse, pontuando cada palavra com o dedo no ar.
- Nós não estamos longe de Sedalia. Deixe ela ficar.
Jake começou a andar de um lado para o outro.
- A parte mais dura está adiante. Conseguir passar com o gado pelos bravos fazendeiros do Kansas - Ele parou abruptamente. - Como você vai se sentir se ela tomar uma bala?
Como se uma bala tivesse acertado seu próprio coração, Matt passou as mãos pelo cabelo. Este gado era legado de sua família, uma chance de se reconstruírem depois da guerra. Ele tinha que colocá-los
em primeiro lugar. Mas ele não conseguia suportar o pensamento de desapontar Sam.
- Vá em frente e pague a ela o salário completo na próxima cidade.
- Se eu fizer isto, então todos os homem nesta equipe vão querer o mesmo tratamento e sairão. Por que enfrentar os perigos se o chefe da trilha está disposto a dar o dinheiro antes? Então quem vai conduzir
o gado? - Jake perguntou.
- Tem que ter algum jeito...
- Ela nunca deveria ter se alistado! Desde que eu sou chefe de trilha, desde que eu cuido de comitivas, as mulheres podem se sentar em casa e esperar que nós retornaremos para elas. Na próxima cidade,
Matt, ela vai se separar da gente, de uma forma ou de outra. Ela vai ou eu vou.
Matt não tinha experiência em cuidar de equipes. Se a parte mais difícil já tivesse passado, ele achava que poderia administrar tudo. Mas Jake estava certo: eles vieram até agora, mas ainda tinham muito
que percorrer, e eles precisavam de um homem que conhecesse não só o terreno, mas que soubesse lidar também com o gado e com os homens. Ele moveu lentamente a cabeça e aceitou com sabedoria as palavras
de Jake. Agora Jake cutucava o dedo contra o peito de Matt.
- E você não só vai dar a notícia a ela, como também vai fazer um acordo para ela ir para casa. E essa pequena despesa vai sair do seu bolso.
Matt viu ele ir embora como um furacão. Deveria ter imaginado que seria impossível argumentar com Jake. O estouro tinha custado a eles perto de duzentas cabeças e a ferida de Matt os tinha atrasado.
Com o coração pesado, ele mancou cuidadosamente através do acampamento para onde Sam permanecia ao lado de seu cavalo.
- Ele disse que eu tenho que ir - ela disse.
- Sim. Na próxima cidade.
Ela movimentou a cabeça bruscamente. Ele podia ver seu queixo tremendo.
- Ele está só repetindo o que você tem me dito desde que descobriu que eu sou uma garota - ela disse.
- É melhor assim, Sam.
- É, Matt? - Ela perguntou. O olhar fixo na perna dele. - Talvez seja, nisso.
Ela montou no cavalo.
- Agora que todo mundo sabe que eu sou uma garota, eu não acho que você tenha que ser minha sombra. Eu ficarei bem até chegarmos a Baxter Springs.
Ele viu o cavalo dela ir a meio galope em direção ao rebanho, levando junto com ela um pedaço do seu coração.
Eles estavam fazendo acampamento pela noite a mais ou menos trinta e dois quilômetros de Baxter Springs. Matt permaneceu na extremidade do acampamento próximo à carroça de provisão. O clima entre os
homens estava sombrio. Eles todos sabiam o que ele faria no dia seguinte. Levaria Sam para cidade e faria um acordo para ela voltar para o Texas com um tipo de escolta. Veio sem nenhuma surpresa para ele
que sua tarefa não tinha sido bem aceita entre a maior parte dos homens. Ele não aceitava também.
Durante a guerra, ele tinha seguido ordens mesmo quando não concordava com elas. Ele marchou em batalha mesmo quando sabia que as chances de vitória eram mínimas.
Ele não tinha o direito de discutir sobre com quem eles lutariam, quando lutariam ou onde eles lutariam. Ele perdeu todos com quem ele já tinha se importado. Perdendo todos que importavam, ele parou
de dar importância às pessoas.
Ele construiu uma parede de gelo ao redor do coração, uma casca fria atrás da qual ele poderia se esconder. Era mais fácil cavar sepulcros para aqueles que ele mal conhecia, mais fácil escutar os gritos
dos homens cujos nomes ele não sabia. Ele se tornou firme e insensível porque era o único modo que ele tinha achado de sobreviver. Ninguém importava.
Até Sam aparecer. Sam era importante. Sam era tão importante que machucava vê-la vagando em volta do acampamento. Dava agonia ver o ar de indiferença que ela exibia enquanto fazia as tarefas sem sentido
que Jake dava a ela.
Mas não importava onde ela estava ou o que ela estava fazendo, ela perseguia Matt.
Ele a tinha decepcionado. Assim como ele tinha desapontado os garotos sob seu comando-antes de ele se tornar frio.
Ela tomou a dianteira para procurar por ele quando teria sido mais seguro esperar. Ela tinha aceitado a decisão de Jake da viagem para Baxter Springs porque ela era uma garota vivendo com um monte de
caubóis. Uma garota... por quem ele tinha se apaixonado.
Sentada ao lado do fogo, Sam sabia que assim que chegasse a luz do dia, seu tempo como peão terminaria. Ela não queria pensar em tudo que ela tinha sacrificado, em tudo que ela tinha que abandonar. Ela
não queria ver o desapontamento de sua família quando ela retornasse de mãos vazias. Ou o quanto ela mesma ficaria desapontada ao retornar sem ter nada para demonstrar o quanto tinha trabalhado duro.
Ela não tinha falado uma palavra com Matt desde a manhã que ele tinha dito a ela a decisão de Jake. Ela sabia que não deveria jogar a culpa nele... mas se ele tivesse mantido a maldita boca fechada,
se não tivesse tentado protegê-la, ela poderia ter tido uma chance de fugir desta decepção. Como estavam às coisas, ela não tinha mais nada.
Matt continuava a montar no arrasto, mas Jake a tinha movido para frente. Não como uma recompensa, mas como um castigo. Para tê-la mais perto, para que ele pudesse vigiá-la.
Matt não mais colocava seu catre próximo ao dela. Eles não mais ficavam juntos na vigília da noite. Ele sempre achava alguém com quem negociar.
Ela ficava agradecida; sinceramente. Mas ela também ficava desapontada. Às vezes, ela não sabia como se sentia sobre Matt. Ela queria conversar com ele, mas a machucava muito pensar na traição.
Ela olhou para Jake que trazia o cavalo para perto da carroça de provisão. Ele parecia extremamente infeliz enquanto desmontava e andava a passos largos no meio de acampamento.
- Escutem todos! - Ele gritou, e todos os homens chegaram mais perto.
Sam esperava que ele fosse anunciar que eles tinham que escrever os nomes para determinar quem iria fazer a escolta dela para a cidade. Mas ela depressa percebeu pela expressão sombria dele que não era
um assunto tão insignificante quanto a sua viagem para a cidade.
- Os fazendeiros dos Kansas estão fazendo um alvoroço por causa da febre do carrapato que o gado Longhorn carrega. Os rumores são de que eles vão levantar seus rifles e tentar parar qualquer gado que
tente cruzar o Kansas ou o Missouri. - Jake disse.
Sam olhou para os homens ao redor. Eles estavam enrugando as sobrancelhas e apertando os lábios. O olhar dela se encontrou com o de Matt, e ela se perguntou no que ele estaria pensando. Estaria lembrando
de seus beijos, de quão próximos eles tinham ficado no rio?
- O que exatamente isso quer dizer, Chefe? - Slim perguntou.
- Nós precisamos nos mover e mover rápido se nós quisermos levar nosso gado para Sedalia antes destes fazendeiros estarem completamente organizados e esperando nas rotas - ele disse.
- Se é assim como você diz, é necessário que todo homem trabalhe mais duro do que já tem trabalhado - Matt disse.
- Está certo - Jake concordou.
- Nós vamos sair uma hora mais cedo de manhã e vamos andar até duas horas mais tarde da noite.
- Você vai precisar de todos os peões que você tem - Matt disse tranqüilamente.
Um silêncio desceu sobre os homens, o coração de Sam dava chutes. Ela achava que podia até ouvir o som de uma folha caindo no chão enquanto Matt e Jake se encaravam.
Jake finalmente mexeu a cabeça.
- Você está certo mais uma vez. Eu irei. Você precisará voar de volta tão rápido quanto puder assim que você deixar Sam em Baxter Springs amanhã.
Matt trocou um olhar com ela. Os olhos dele tinham uma tristeza que ela não sabia interpretar. Ele voltou sua atenção para Jake.
- Eu não vou levar Sam para Baxter Springs.
- Você foi a pessoa que a contratou. Você é a pessoa que vai escoltá-la daqui.
- Eu a contratei e estou muito feliz que tenha feito isso. Ela é um caubói de primeira linha Jake, e você sabe disso - Matt disse. - Ela nunca fugiu de suas responsabilidades, mesmo quando nós jogamos
nossas responsabilidades em cima dela. Ela cruzou o rio quando estava apavorada, lutou contra o fogo na pradaria quando ela sabia que era mais seguro ficar para trás-quando ela tinha sido ordenada que
ficasse para trás. Ela cuidou de nossos ferimentos e continua a ajudar até mesmo quando sabe que não será paga.
O peito de Sam se apertou ao ouvir as palavras de Matt, e mais, com a realização de saber que ele estava reconhecendo tudo o que ela tinha feito pela equipe. Jake agitou a cabeça.
- Eu estou ciente de tudo que ela fez. Mas nós temos fazendeiros armados e temos que mover o gado rapidamente. É um risco grande demais para ela e para nós. Eu não estou disposto a arriscar ter uma garota
na comitiva.
- Então eu acho que você não me terá também - Matt disse tranqüilamente.
Sam estava à beira de protestar quando alguém disse.
- E eu.
- E eu - Slim disse.
- E eu - Squirrel completou.
- E eu - Jeb e Jed disseram ao mesmo tempo.
Um por um, todos os caubóis falaram a mesma coisa, e davam passos para trás deixando apenas Jake de pé no centro do acampamento. Jake tirou o chapéu da cabeça.
- Olha, rapazes, eu aprecio como vocês todos se sentem sobre Sam, mas se saírem agora, não serão pagos.
- Então eu também acho que não serei pago - Cookie disse - já que eu sairei também.
Nesse pequeno período como peão, Sam tinha aprendido que se um homem era quase tão importante quanto o chefe da comitiva-e alguns discutiam que talvez fosse o mais importante-era o cozinheiro.
Lágrimas ardiam nos olhos dela enquanto pensava em tudo que eles estavam dispostos a desistir por ela.
- Rapazes, vocês não têm que fazer isso por mim.
- Por que não, Sam? Você não faria o mesmo por um de nós? - Matt perguntou.
Claro que ela faria, e ele sabia disso.
O olhar dela se encontrou com o de Jake e se manteve firme.
- Você me disse para que eu nunca mais mentisse para você, então eu vou dizer a verdade nua e crua. Se eu achasse que não poderia contribuir para a equipe, você não teria que me escoltar até Baxter Springs.
Eu continuaria meu caminho sozinha. Mas Sr. Vaughn, eu acredito honestamente que posso ajudar vocês a conduzirem este gado até Sedalia antes do problema com os fazendeiros começar.
- Eu não tenho reclamações com seu trabalho, Sam - Jake disse. - Se você fosse um garoto
- Não faria nenhuma diferença - ela interrompeu.
- Talvez você esteja certa - ele concedeu. - Eu sei que eu não vou conseguir levar o gado se não tiver uma equipe. Já que esses boiadeiros parecem tão leais com você assim como você é com eles... eu
deixo você ficar.
Os caubóis lançaram seus chapéus no ar enquanto seus gritos ecoavam ao redor dela. Sam piscou com os olhos cheios de lágrimas de alegria. Não faria mal um peão chorar.
E é isso o que todos eles estavam reconhecendo que ela era. Um peão.
CAPÍTULO VINTE E TRÊS
Faithful, Texas.
Seis semanas depois.
Samantha afundou na água quente que batia nos lados da tina de madeira. O vapor entrava por seu nariz e o calor aliviava a dor em seu corpo cansado. Ela tinha chegado em casa menos de uma hora atrás
e imediatamente tinha repartido seus presentes.
Um vestido novo para Amy. Chapéus de abas largas para Nate e Benjamin. Um medalhão para sua mãe.
Mas o melhor presente tinha sido a nota do Sr. Thomas do armazém geral, dizendo que a dívida tinha sido paga por completo. Com todas as suas compras Samantha ainda tinha dinheiro sobrando para dar a
sua mãe. O dinheiro que ajudaria eles a passarem o outono e o inverno.
Levou três semanas para que o rebanho chegasse a Sedalia. Ela os viu contarem e alocarem o gado nos vagões. Era difícil acreditar que seus dias como peão tinham terminado. Retornar a Faithful tinha sido
muito mais depressa porque não tinham mais que, lentamente, guiar o gado.
Alguns dos caubóis seguiram seu próprio caminho depois de Sedalia, mas seus favoritos viajaram de volta para o Texas: Matt, Slim, Squirrel, Jed, e Jeb. Jake e Cookie tinham voltado com eles também pois
iriam retornar ao rancho dos Corações Partidos.
Ela ainda não acreditava que estava em casa. Parecia que sua mãe também. Com a bainha do avental, ela continuava enxugando as lágrimas dos olhos.
- Não deveria ser você nos sustentando- sua mãe disse, apertando a bolsa que continha o restante dos cem dólares.
Com os olhos semicerrados, Samantha olhou para a mãe.
- Mãe, eu queria fazer isso.
- Você parece mais madura, não é mais a minha menininha.
- Eu acho que cresci um pouco - Usando o sabão cheiroso que ela tinha comprado no armazém geral, ela começou a lavar as semanas de sujeira do corpo. - Foi uma aventura, mãe.
- Você sempre quis fazer uma aventura - sua mãe a lembrou.
Samantha sorriu.
- E eu direi a meus netos sobre isso.
Sua mãe levantou a pilha de roupas imundas que estava no canto.
- Eu acho que a gente devia queimar isso.
- Eu estava ansiosamente para colocar um vestido de novo. Parecer com uma menina", Samantha admitiu.
- Terá uma dança na cidade hoje à noite. Eu acho que Amy vai querer usar o vestido novo", sua mãe disse.
- Acho que vou vestir o meu também.
- Eu vou deixar você terminar de se arrumar - A mãe deu um beijo no topo da cabeça dela. - É tão bom ter você em casa novamente.
Depois que sua mãe deixou o quarto, Samantha se debruçou de volta contra a tina e fechou os olhos. Ela realmente não queria ir dançar. O único rapaz com quem ela queria dançar estava indo para casa,
em algum lugar ao sul.
Matt tinha ficado do lado dela em Baxter Springs. Mas uma vez que ela tinha sido aceita como um verdadeiro membro do grupo, ele a tinha tratado mais como um garoto do que nos dias anteriores. Como um
irmão mais jovem-se é que ele realmente tinha prestado alguma atenção nela. Ele nunca mais a tinha beijado. Ela só podia achar que aquele último beijo que ele tinha dado nela tinha sido causado pela febre.
Talvez ele estivesse delirante. Até depois de eles terem entregado o gado para Sedalia e quando ela tinha segurado os cem dólares na mão, ele tinha ficado indiferente.
Ele tinha sido educado quando disse adeus a ela naquela manhã, mas ele a tinha deixado sem promessas. Somente memórias. As memórias de sua primeira viagem com gado, seu primeiro beijo... seu primeiro
amor.
Com sua família a reboque, Samantha caminhou para dentro da quadra. Ela olhou para todas as escrivaninhas enquanto Benjamin colocava sua carroça ao lado das outras. Eles sempre usavam a escola para as
reuniões. No dia dos professores, Sr. Thomas do armazém geral sempre tocava seu violino. Lanternas penduradas nas paredes lançavam uma luz pálida no local. Ela viu sua melhor amiga de pé num canto.
- Mãe, eu vou lá na Mary Margaret.
Sua mãe sorriu suavemente.
- Acho que eu posso te deixar um pouco livre hoje à noite.
Samantha se apressou através da quadra e lançou seus braços ao redor de Mary Margaret. Com um grito, sua amiga a abraçou com força.
- Você finalmente voltou! - Mary Margaret disse. - Poxa, Samantha Jane, eu não acredito que você não me disse nada sobre este seu plano maluco.
- Não deu tempo de dizer nada para ninguém
Além disso, Samantha teve medo de que, de alguma maneira, o plano chegasse ao chefe antes que ela tivesse começado a jornada. E seus dias de gado teriam um fim abrupto.
- Como foi ficar com todos aqueles... aqueles homens... todas essas semanas? - Mary Margaret perguntou. Ela estava ansiosa esperando a resposta da Samantha.
- Foi duro no começo - Samantha admitiu. - Tentando disfarçar para que eles não percebessem que eu não era um garoto.
- E como foi quando eles perceberam?
- Eles me trataram como tinham tratado desde o princípio-como um dos rapazes.
- Caramba, Samantha
Com um suspiro dramático, Mary Margaret apertou a mão em cima do peito.
- Eu estou à beira de desmaiar só com o pensamento de você ter ficado sozinha na companhia de homens por tanto tempo. Eu quero saber todos os detalhes.
Um dia ela compartilharia com Mary Margaret todos os detalhes relativos a Matt, mas hoje à noite ainda era muito cedo. Ela queria saborear as memórias, guardá-las no seu coração, e durante algum tempo
mais, mantê-las só para si mesma.
- Na maior parte do tempo, eu apenas fiquei com o gado - Samantha disse.
- Os homens falavam palavrões?.
- Não que eu me lembre - Ah, eles resmungavam e ficavam rabugentos, mas isso era só de vez em quando.
- Eles bebiam álcool? - Mary Margaret avidamente perguntou.
- Eu duvido. Você tem que ficar alerta. Um homem pode morrer se alguém se descuidar.
- Você deve ter ficado apavorada - Mary Margaret disse.
Sam deu de ombros.
- Às vezes. Na maioria das vezes eu ficava agradecida por poder ser útil. Ficava agradecida por saber que estava fazendo a minha parte, me virando sozinha.
- Não soa como uma grande aventura - Mary Margaret disse.
Dentro do coração de Sam tinha sido uma aventura maravilhosa. Mary Margaret apertou a mão de Samantha.
- Você pode acreditar que nós estamos tendo nossa primeira dança? Eu estou tão contente que você está aqui junto comigo. Espero que algum rapaz venha me chamar.
- Talvez Benjamin chame você para dançar.
Mary Margaret balançou a mão no ar.
- Oh, eu desisti de Benjamin. - De repente, ela agarrou o braço de Samantha e o trouxe para mais perto. - Ah, Samantha, nossa! Ele não é de tirar o fôlego?
Samantha olhou por cima do ombro e seu coração deu um salto. Matt estava parado na entrada. E, meu Deus, como ele estava lindo. Ele tinha obviamente tomado banho, se barbeado, cortado o cabelo. Ele estava
vestindo roupas limpas. Não, ela percebeu. Mais do que limpas-elas eram novas. Suas botas estavam tão polidas que chegavam a brilhar.
Ela achava que ele tinha ido embora, que estava em seu caminho para casa. O que diabos ele estava fazendo aqui? Ela soube o momento em que ele a viu. Um sorriso lento, preguiçoso, se estendeu pelo seu
rosto.
- Ele deve ser o rapaz mais bonito que eu já vi - Mary Margaret sussurrou.
Oh, sim, Samantha pensou. Ele, com certeza, era. Seu coração batia desesperadamente contra as costelas e sua boca estava ficando seca. Com o olhar fixo nela de propósito, ele andou a passos largos cheio
de confiança através da quadra até que a alcançou.
- Oi, Samantha Jane - ele disse em um tom lento, sensual.
- Eu achei que você tinha continuado viagem. - Ela estava surpresa de sua voz ter soado ofegante.
O sorriso dele cresceu.
- Você sabe como caubóis são. Nós nem pensamos em perder uma dança.
Mary Margaret puxou o braço de Samantha pedindo atenção. Ela queria ser apresentada.
- Matt, esta é minha melhor amiga. Mary Margaret.
- Prazer. Tem alguns caras vindo pela porta ali atrás que ficariam honrados em dançar com você - ele disse a ela.
O rosto de Mary Margaret se iluminou.
- Bem, então eu irei me apresentar.
Ela deu a Samantha um olhar especulativo e foi através da quadra para a entrada onde Slim, Squirrel, Jed, e Jeb estavam chegando. Samantha podia vê-los fazendo introduções precipitadas e ela percebeu
que Mary Margaret dançaria a noite toda.Quanto a ela...
- Matt, o que você está fazendo aqui?
- Eu queria te ver. Para explicar por que eu me distanciei de você depois do estouro
Ele esfregou o nariz de lado.
- Jake disse a mim que se ele me pegasse beijando você ou até olhando para você como eu queria... ele mesmo levaria você até Baxter Springs e a colocaria em uma diligência. Eu jurei para ele que eu deixaria
você em paz até que eu te entregasse segura em casa.
Um calor começou a surgir de dentro dela.
- Por que você não disse pra mim? Eu pensei que você ainda estava chateado comigo!
- As ordens dele não admitiam conversa. Na balança dele eu estava mais para o lado ruim do que bom. Eu não queria arriscar fazer você ficar sem os cem dólares. As últimas seis semanas foram as mais duras
da minha vida, Sam, não podendo dizer a você como eu me sinto.
A respiração dela quase parou.
- E como seria isto, Matt?
- Eu fui para a guerra quando eu tinha catorze anos... eu parei de me importar com as pessoas... até você aparecer.
O violino começou a soar sua melodia solitária pela quadra.
- Nobody's Darlin, Samantha sussurrou o nome da música.
- Você é minha querida (darlin). Dance comigo, Samantha - Matt disse enquanto colocava as mãos dele em volta das dela.
A mão dele tinha um toque familiar. Enquanto ele a levava para a área de dança ela lembrava a noite em que eles tinham ido explorar o rio. Ele a levou pelos braços e começou a valsar. Ele a segurou muito
próximo até que suas coxas estavam juntas. Ela prendia os olhos azuis dele enquanto eles se moviam no ritmo da música. Que jornada incrível eles tinham vivido junto. Tudo por causa de um anúncio colado
na parede do armazém geral e a determinação dela em ganhar o dinheiro que estava sendo oferecido.
- Você vai continuar conduzindo gado? - Ela perguntou, desejando que ele continuasse e assim viesse para esses lados novamente.
Ele riu.
- Acho que sim, já que era o rebanho de meu pai que estávamos levando para vender.
Ela arregalou os olhos.
- Aquele rebanho era seu?
- Do meu pai. Eu era apenas um peão contratado nesta viagem. Eu deveria aprender com Jake. Talvez eu leve meu próprio rebanho no próximo ano. Nós temos bastante gado no rancho.
- Esta é a razão pela qual você se sentia responsável em relação a mim. Por isso que você tentou me proteger.
- Talvez no princípio, mas com o passar do tempo, quando eu comecei a conhecer você...
A voz dele diminuiu, o clima esquentou e eles trocaram olhares.
- Venha dar uma volta comigo.
Segurando a mão de Samantha, ele a levou para fora da quadra. A luz que vinha das janelas iluminava o caminho até que eles ficaram debaixo dos galhos de uma enorme e antiga árvore. Iluminados pelo luar,
ele segurou o rosto dela entre as mãos.
- Na verdade, Samantha, eu estou assustado.
- Assustado? Por quê?.
- Quando eu achei que você era um garoto, eu tinha medo de que desapontaria você como eu tinha feito tantas outras vezes durante a guerra. Eu seguia as ordens, Sam. Sempre. Até quando eu não concordava
com elas. Quando o oficial comandante me ordenou como chefe da minha unidade de batalha, eu fiquei. Quando eu fui ordenado para avançar, eu fui. Até quando eu pensei que retirada teria sido o melhor. Muitos
garotos morreram. Eu não queria que você morresse.
- E quando eu descobri que você era uma garota... quando Jake ordenou que eu levasse você para Baxter Springs... eu não podia fazer isso porque sabia que estava errado-como tantas daquelas ordens que
eu tinha seguido durante a guerra. Foi muito bom desobedecer uma ordem que eu sabia que estava errada.
- Eu estou tão contente que você tenha desobedecido, Matt. Você devia ter visto o rosto da minha mãe quando eu dei o dinheiro pra ela.
- Eu não precisava ver o rosto dela, Sam. Eu vi o seu... quando nós chegamos em Sedalia e Jake deu a você os cem dólares. Ver o seu rosto feliz fez cada quilômetro valer à pena.
Levantando os braços, ela tocou o rosto de seu amado.
- Eu sinto muito por todos os problemas que causei a você por ter mentido, Matt.
- Não precisa, Sam. Você não virou apenas um bom caubói, mas também a menina que eu vim a amar.
Ele abaixou a boca até a dela e a beijou com ternura. Seis semanas de paixão laçada que poderia ser solta agora, lentamente. Eles tinham a noite toda. Ou talvez o resto de suas vidas.
E Samantha percebeu, que mais do que o caminho do gado, ela tinha seguido o caminho de seu coração.
Lorraine Heath
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