Biblio VT
Series & Trilogias Literarias
A primeira vez que o vi não fazia ideia de que ele mudaria minha vida para sempre.
Eu queria dizer que Nolan Percy foi uma daquelas tempestades de verão que se formam tão rápidas e inesperadas e, sem que percebamos, estamos no meio da tormenta. Porque foi assim que eu me senti quando tudo desabou sobre mim. Como se tivesse sido pega em cheio num inesperado vendaval.
Mas embora tenha sido essa minha percepção, não foi assim que aconteceu.
Nolan Percy não era uma tempestade de verão. Repentina e efêmera. Ele chegou lenta e sorrateiramente, se alastrando sem que eu ao menos percebesse o perigo. Ou talvez eu tenha percebido. Só não tinha me dado conta das consequências que sua presença teria em minha vida.
Arrepender-se de conhecê-lo foi só o começo.
Capítulo 1
— Amanda, acorde, filha.
Abri os olhos e meu pai estava me sacudindo.
— Chegamos em casa — completou, saindo do carro.
Casa.
A palavra podia ter tantos significados.
Ainda atordoada de sono, saltei em frente a casa que nasci, há 18 anos, em Camden.
A casa em que vivi quase toda uma vida, até que mamãe decidiu que não era o bastante, há aproximadamente um ano.
Relanceei os olhos para a figura do meu pai, que tirava minhas malas do carro, seus cabelos loiros estavam mais grisalhos agora, os sulcos ao redor dos olhos mais acentuados, apesar de ele ter apenas 42 anos.
Perguntei-me se aquelas novas rugas tinham se instalado ali depois que minha mãe partiu.
Eu já sabia a resposta.
— Estou feliz que esteja em casa, filha. — Seu tom carinhoso me surpreendeu.
Pastor Gavin Thomas não era um homem conhecido por ser carinhoso. Não que ele fosse um pai ruim. Apenas se sentia mais confortável com a austeridade.
Cresci com ele assim e talvez por isso não visse como um defeito ou algo a se revoltar.
Porém, minha mãe nunca se acostumou com essa faceta.
Sorri para ele, sentindo-me verdadeiramente feliz de estar em casa.
— Também estou, pai.
Não foi uma decisão fácil. Nem partir e muito menos voltar.
Quando mamãe decidiu ir embora para a ensolarada Califórnia, pareceu certo que eu fosse com ela, mesmo sofrendo por deixar tudo para trás. Meus amigos, minha escola.
Owen.
Mas senti que mamãe precisava de mim.
Só que há mais ou menos um mês papai teve um infarto, o que foi um choque, já que sempre foi um homem muito forte e saudável. E o pior é que só fiquei sabendo uma semana depois, quando ele já estava em casa se recuperando, e foi porque Owen me contou e ainda explicou que papai não queria me preocupar. Fiquei muito brava e, além de tudo, culpada quando ele contou que provavelmente o motivo de ter desenvolvido este problema foi a má alimentação.
Questionei-me, cheia de culpa, se estava se cuidando e em um arroubo de preocupação, decidi que ia voltar, mesmo faltando apenas dois meses para acabar o ano letivo.
Eu o observei agora caminhando para casa, segurando minhas malas e senti um aperto no peito. Papai ainda me parecia um homem forte, mas até quando?
Desfiz as malas e deixei uma mensagem para minha mãe, descendo em seguida para a cozinha e começando a preparar o almoço para meu pai. Afinal era para isso que eu estava ali, para me certificar que ele iria comer direito e ficar bem.
Ele pareceu satisfeito quando nos sentamos para comer.
— Fazia tempo que não comia comida decente.
— Sei bem disso. Mas agora vou cuidar para que seja saudável. Nada mais de porcaria por aqui!
— Lydia deve ter pirado com essa mudança.
Detectei um traço de amargura.
Ignorei.
— Ela entendeu.
— Achei que nunca voltaria para Camden — completou pensativo. — É muito parecida com sua mãe, Mandy.
— Nem tanto — murmurei.
Era esquisito ouvir meu pai dizer que eu me parecia muito com mamãe quando ela muitas vezes dizia o contrário, que eu era parecida demais com meu pai.
— Estou mesmo feliz por ter você de volta, mas ainda não sei se foi uma boa ideia.
— Por quê? Passei minha vida inteira aqui.
— Faltam dois meses para se formar. E vai para a faculdade. Yale, certo?
Rolei os olhos, em vista de sua animação.
— Yale é muito difícil, pai. Não fique bravo se eu não conseguir.
— Sei que vai.
De repente ouvi um carro se aproximando.
Papai riu indo até a janela.
— Já deve imaginar quem é. Ele está eufórico desde que contei que estava voltando.
Aproximei-me da janela também, e um garoto de cabelos escuros e encaracolados saiu do carro e sorriu ao me ver.
Sorri de volta acenando e corri para abrir a porta. Seus braços me envolveram, tirando-me do chão.
— Owen, vai quebrar algum osso desse jeito! — reclamei, sufocada.
Mas me sentia imensamente feliz. Fazia quase um ano que não nos víamos, desde que fui embora com a minha mãe.
Nós crescemos juntos ali em Camden. E sempre fomos amigos. Até que, quando contei que iria partir com a minha mãe, Owen me surpreendeu se declarando e ficamos juntos. Fiquei assustada com essa mudança de status de relacionamento. Amava Owen, éramos bons amigos, mas não imaginei que iríamos nos tornar mais que isso. Mesmo assim, me vi dizendo sim para seu pedido de namoro. Na verdade, achei que em algum momento Owen desistiria de mim, mas isso nunca aconteceu. Mantivemos nosso contato através de e-mail e telefone e a promessa de nos reencontrar.
— Não acredito que está de volta. — Ele me pôs no chão, mas não me soltou.
Sua boca alcançou a minha numa fração de segundos e suspirei.
Papai tossiu as minhas costas e Owen me soltou.
— Melhor não ser engraçadinho dentro da minha casa, hein, mocinho? — Papai o encarou supersério, mas eu sabia que não estava bravo.
Ele adorava Owen e ficou bem satisfeito quando começamos a namorar.
Na verdade, achei que meu pai nunca ficaria feliz com algum garoto me namorando. Ele era o típico pai superprotetor, além de ser um homem religioso e até com uma formação meio antiga, que achava que uma mulher deveria namorar com o intuito de se casar — de preferência virgem.
Talvez por isso eu tivesse tão poucos encontros antes de Owen.
Minha mãe detestava todo esse conservadorismo. O que era um dos motivos das brigas entre eles.
Mas com Owen, papai não implicou. Na época, pedi que ele não se empolgasse com este relacionamento. Afinal, eu moraria na Califórnia. Como um namoro poderia dar certo?
A mesma coisa eu disse a Owen. Mas ele respondeu que iria me esperar.
Eu queria parecer tão confiante quanto ele.
— Desculpa, Gavin — disse Owen. — Mas entenda que estava com saudades. E por isso espero que deixe a Amanda ir à festa na fogueira comigo hoje no fim da tarde.
— Festa na fogueira? — indaguei curiosa.
— Sim, é aniversário da Molly.
Molly era a irmã mais velha de Owen.
— Peter está organizando essa festa para ela. Mamãe tem certeza de que ele vai pedi-la em casamento.
— Nem sabia que o namoro deles era sério assim — comentei. Nossa, Molly tinha apenas vinte anos e já ia se casar? Estávamos em que século, pelo amor de Deus?
— Peter é um bom rapaz — comentou papai. — Sim, podem ir. Mas Amanda tem hora para chegar em casa, hein?
— Pai! — murmurei meio irritada.
Ele se afastou resmungando algo sobre agora estar sob suas regras novamente.
— Tinha esquecido como meu pai podia ser chato — reclamei a Owen, mas ele não pareceu abalado.
— Eu sei que o Gavin me ama.
— Te amava antes! Até você decidir namorar a filhinha dele! — brinquei.
— Gavin me ama ainda mais agora. Ele me disse um dia desses que era melhor eu do que algum marmanjo por aí.
Eu tive que rir.
Gavin não precisava se preocupar então. Nenhum cara despertou meu interesse de verdade até agora. Eu tive alguns encontros antes de Owen, mas nada muito emocionante a ponto de se transformar em paixão ou namoro sério.
E Owen foi uma consequência natural.
— Preciso ir. Tenho que ajudar Peter com uns lances para a festa.
— Tudo bem.
Nós nos encaminhamos para fora e quando chegamos perto do carro, Owen me prensou contra a porta, não sem antes olhar para trás para ver se não havia ninguém nos observando e me beijou.
Confesso que ainda era estranho saber que Owen podia ter essas liberdades comigo. Antes de eu ir embora, ficamos juntos apenas umas três semanas, e em meio aos preparativos para mudanças e despedidas não houve tempo para praticarmos aquela intimidade.
Talvez por isso ainda me sentisse meio sem graça toda vez que ele me beijava.
— Ei, olha quem voltou!
Owen me soltou e olhamos em direção ao grito feminino e reconheci as duas garotas que se aproximavam pulando e gritando animadas.
Em um segundo, uma profusão de braços estavam em volta de mim, me esmagando.
— Não acredito que está aqui — Ellie gritou, empolgada.
Naomi e Ellie eram minhas amigas de escola e embora não fôssemos muito próximas, havíamos nos aproximado nos dois meses antes de eu ir embora. Lembrar do motivo me fez sentir um aperto no peito, mas ignorei.
— Está mesmo de volta a Camden? — Naomi, uma garota com descendência latina e longos cabelos pretos encaracolados, indagou.
— É, sim.
— Mas isso é o máximo! — Ellie exclamou animada.
Ellie era um furacão ruivo, pequena e enérgica, ela era aquele tipo de pessoa que não parava de falar um minuto sequer.
— Vem com a gente, estamos indo ao Café e conversar sobre o baile e...
— Ei, Ellie, acho que a Amanda está ocupada no momento. — Naomi lançou um olhar para Owen.
— Oh... Oi Owen — Ellie finalmente pareceu notar sua presença.
Ellie nunca foi com a cara de Owen. E muito menos ficou feliz quando anunciei que estávamos namorando no ano anterior.
— Entenda, Mandy. Ele está ficando bem gostoso, mas... Acho que merece coisa melhor — comentou na época.
Owen não estudava em nossa escola e Ellie ainda levava a sério aquele lance de querer ser popular e estar com as pessoas certas para isso.
Coisas que eu não estava nem aí.
— Melhor a gente ir... — Naomi disse.
— Tudo bem, Owen já estava indo embora. — Lancei-lhe um olhar de desculpas. Afinal, ele estava mesmo indo embora.
Ellie deu pulinhos, animada, voltando para o carro de Naomi.
Voltei minha atenção para Owen.
— Acho melhor eu dar atenção a elas.
— Não gosto dessas suas amigas...
— Por quê?
— Elas não gostam de mim.
— Impressão sua.
— Tudo bem.
Ele acenou e partiu.
Entrei no carro de Naomi e ela ligou o som.
Por um momento, me senti como antes. Quando ainda éramos amigas despreocupadas conversando sobre os garotos que nos interessavam.
Ellie começou a tagarelar sobre as fofocas da escola, enquanto Naomi consertava seus comentários com “Isso ela inventou.” ou “Para de exagerar, Ellie.”.
Eu ria muito quando entramos na Starbucks, distraída, e não vi a pessoa que estava saindo, acabei colidindo com uma garota loira.
— Ei, vê por onde anda!
Levantei o olhar e surpreendi-me ao reconhecer Stella Agnelli.
E ao que parece ela também me reconheceu, claro, visto que desviou o olhar na hora, me ignorando e passando por mim, jogando os cabelos loiros na minha cara no processo.
Só então notei que havia duas pessoas atrás dela.
Uma delas, uma garota de cabelos castanhos Chanel e doces olhos azuis, era Samantha Carter.
Ela abriu a boca como se fosse me cumprimentar, mas Stella bateu no vidro da porta naquele momento.
— Andem logo!
— Melhor irmos, Sam. — Notei o rapaz atrás dela. Ele era bonito, alto, forte e com cabelos muito loiros. Nunca o vi antes.
Os dois saíram e então Ellie me cutucou.
— Nossa, a Stella realmente te ignorou, hein?
— Ellie, cala a boca — Naomi pediu, lançando-me um olhar de desculpa. — Vamos nos sentar.
Merda. Eu queria não estar abalada pelo gelo de Stella, mas eu estava.
O que era ridículo.
Eu e Stella fomos amigas desde crianças, até pouco tempo antes de eu ir embora com minha mãe. De repente ela mudou completamente. E sem mais nem menos, parou de falar comigo e tomou Samantha Carter como melhor amiga.
Achei que tinha a ver com o fato de Sam ser de uma das famílias mais ricas da cidade. Sua mãe, Helena Carter, era médica e viúva de um senador. Stella sempre foi a menina mais bonita da escola e às vezes eu me perguntava por que ainda andava comigo, a sem graça filha do pastor. No fundo, sempre achei que um dia ela ia me deixar para trás, como acabou acontecendo.
Mesmo assim, eu ainda tentei ligar várias vezes e enviei muitos e-mails depois que fui embora. Todos ignorados por Stella.
— Sabe que Stella e Sam são as garotas mais populares da escola agora, né? — Ellie comentou. — Ainda mais agora que namora aquele gostoso do Jace Percy!
— Quem é esse cara?
— Ele está na faculdade! Mas vem aos fins de semana ver a família. Ele é irmão da Sam.
— Sam não tem irmão, pelo que eu saiba.
— A mãe dela se casou assim que você foi embora, menina! — Ellie exclamou deliciada de estar contando uma grande fofoca.
— Sim, com o pai do Jace, Theodore Percy, um investidor podre de rico! — Naomi completou.
— E ele se mudou com os dois filhos para a cidade. — Ellie sorriu.
— E claro que a Stella não perdeu tempo em pegar o Jace pra ela. — Naomi piscou. — Bem, até eu pegaria se não tivesse namorado!
— Mas ela queria mesmo era o Nolan — Ellie sussurrou.
— Quem é Nolan?
— O irmão mais novo do Jace. Lindo de morrer! Ele estuda com a gente, vai vê-lo na escola em algum momento.
— Então Stella queria namorar este tal de Nolan, mas namora o irmão?
— Isso é invenção da Ellie — Naomi corrigiu. — Na verdade, ela queria ficar com Nolan e levou um fora!
— Não levei um fora!
— Levou sim. — Naomi riu. — Diz a lenda que ele tem uma namorada em Nova York, que era onde eles moravam antes.
— O Carlton faz aula com o Nolan e disse que perguntou se ele tinha namorada e ele falou que não tem! Agora vamos pedir nosso café e nos conte tudo sobre São Francisco!
— Não tem nenhuma novidade.
— Como não? Os caras lá devem ser lindos! — Ellie provocou.
— Ellie, a Amanda tem namorado.
— E daí, não está morta! Vai dizer que não ficou com ninguém lá?
— Não fiquei, como a Naomi disse, eu estava namorando. Mesmo ele estando longe.
— Acho tão estranho isso. Eu não conseguiria... Mas você sempre foi bobinha, né? — Ellie criticou.
— Ellie, para! — Naomi reclamou.
— Eu sei que seu pai é o pastor e tal, mas...
— Chega, Ellie! — Naomi a parou e eu lhe agradeci com um sorriso. — E então, como era a escola lá em São Francisco? Acha que vai conseguir acompanhar?
— Acho que não terei problema. Mas só saberei na segunda, quando for à escola.
— Acredito que estaremos na mesma aula de literatura — Ellie diz — Então teremos um relatório de Orgulho e Preconceito para entregar na próxima semana.
— Eu já li. — Sorri com presunção. — Mas lerei de novo, faz muito tempo que li.
Ellie rolou os olhos.
— Esqueço que é meio nerd quando se trata de livros e tal.
Não me importei com o tom de censura de Ellie.
Sim, eu amava literatura e não ia pedir desculpas por isso.
Mas depois que elas me deixaram em casa, fiquei pensando sobre o assunto. A verdade era que eu sempre fui um pouco tímida, e nunca foi sacrifício aceitar os preceitos que meu pai pregava. Particularmente, eu não me sentia tão religiosa. Isso era culpa da minha mãe de certa forma, que sempre foi liberal e contestadora. E cresci assim, entre a fé e o conservadorismo do meu pai e a rebeldia e racionalidade da minha mãe.
Quando parti com minha mãe, me afastei de vez da fé do meu pai, embora ainda acreditasse em alguma força acima de nós. Porém, achava que muito do que ele me ensinou como certo ainda estava impregnado em mim, pois hesitava em transpor alguns muros. Frequentei uma escola em São Francisco, fiz alguns amigos, e até recebi convites para sair com garotos, mas não me senti tentada, porque havia Owen.
E mesmo às vezes questionando a veracidade dos nossos sentimentos, já que ficamos juntos pra valer por pouco tempo, jamais iria magoá-lo.
Eu queria que desse certo entre nós.
— Ei, está de volta. — Papai abriu a porta para mim. — Vem comigo até a garagem, quero te mostrar algo.
Ele abriu a garagem e não me surpreendi ao ver os amores do meu pai descansando.
Papai era aficionado por carro antigo e, inclusive, nas horas vagas levava muito a sério o ofício de reformá-los.
Eu sempre tive uma paixão por um Dodge Charger 1970, vermelho, que papai nunca me deixou dirigir. Ele ainda continuava ali, reluzente, mas ao lado dele havia um carro do mesmo modelo, porém, preto e não parecia em bom estado. Mesmo assim, era lindo.
— É novo, esse?
— Sim, consegui por uma pechincha, o motor está uma merda, mas tem potencial.
— Acho que sim... Se tem alguém que pode fazer ele ficar maravilhoso é você.
— É seu. — Ele me jogou um molho de chaves.
Arregalei os olhos.
— Sério?
— Sim, sempre gostou do modelo.
— Pai, eu amei!
— Mas ainda tem muito conserto pra fazer. Então acho melhor esperar para começar a usá-lo.
— Tudo bem...
Subi para o quarto e coloquei o celular para carregar enquanto tomava um banho para ir à festa da irmã de Owen.
Observei minha imagem em frente ao espelho enquanto secava meus longos cabelos castanhos que precisavam de um corte.
Nunca me achei uma garota linda, como Stella, por exemplo, havia um pouco de sardas em volta no meu nariz e bochecha e um bronzeado leve da Califórnia destacava meus olhos muito verdes. Eu me perguntei se deveria usar maquiagem, embora fosse só uma festa na casa de Owen. Minha mãe sempre me incentivava a usar maquiagem, ou a fazer um corte moderno no cabelo, ou até mesmo usar roupas mais ousadas, mas meu pai detestava. E achava que ele não ficaria muito feliz de me ver saindo maquiada naquela noite. Talvez não falasse nada, mas sempre haveria algum momento de sermão sobre “a beleza natural ser bem melhor do que melecar o rosto com pintura artificial”.
Então, decidi colocar só meu velho jeans e suéter e descer para avisar que iria até a casa de Owen com meu carro.
Meu pai não curtiu muito que eu fosse sair com o carro.
— É só até a casa do Owen! E na volta eu peço para ele vir comigo, está bem?
— Tudo bem... Owen pode cuidar de você. — Acabou concordando. — Fala a verdade, Mandy, o Owen é o motivo para você ter mudado pra cá de novo, não?
— Não! — refutei. — Sabe que fiquei preocupada com você! E pare com essas ideias casamenteiras! Até posso ver você e o Tom confabulando! — Tom era o pai de Owen e amigo do meu pai.
— Não fazemos isso!
— Sei... Conheço vocês!
Peguei o meu exemplar batido de “Orgulho e Preconceito” e entrei no carro. Parecia uma coisa idiota de se fazer, mas eu tinha mania de seja qual o lugar em que eu ia, sempre levava um livro junto.
Camden era uma cidade de veraneio no Maine e que no verão recebe muitos turistas para curtirem o sol e para atividades, como velejar.
A família de Owen alugava barcos para estes turistas e eu dirigi até a casa da família que ficava próxima a uma das praias. Estacionei o carro e segui para o barulho atrás da casa de Owen, onde várias pessoas estavam reunidas em volta de uma fogueira.
Owen me viu e veio em minha direção ignorando o assovio dos amigos quando me beijou. Eu o afastei, vermelha.
— Ei, te liguei para saber se queria uma carona, mas seu pai me disse que veio dirigindo.
— Sim, ele ficou preocupado porque parece que o motor não está legal, mas eu queria muito estrear meu carro novo.
— Seu carro velho quer dizer? — debochou e eu lhe dei um soco no ombro de brincadeira. — Vem ver o pessoal.
Era bom estar em volta da família de Owen de novo, e todos me receberam muito bem. Molly mostrou seu anel de noivado empolgada e de novo eu me perguntei se ela não estava se casando muito nova. Mas o que eu sabia da vida e anseios de Molly?
Depois de um tempo, Owen me levou para andar na praia. Estava esfriando e lamentei não ter trazido um casaco.
— Você não sente frio? — indaguei ao ver Owen com uma simples malha. — Estou congelando!
— Não trouxe uma blusa? — Olhou criticamente para meu suéter fino.
— Estamos quase no verão, não achei que fosse esfriar!
Ele contemplou as nuvens pesadas no céu.
— Acho que vai chover.
Segui seu olhar, preocupada, mas Owen segurou meu rosto entre as mãos.
— Eu senti muito a sua falta — murmurou antes de me beijar.
Seus braços me envolveram um pouco mais forte me levando para perto e eu me retesei automaticamente, me afastando.
Owen começou a protestar, mas eu insisti.
— Não, Owen...
Ele me encarou meio contrariado.
— Qual o problema, Amanda?
Mordi os lábios, incerta.
— Acho que deveria ir embora. Parece mesmo que vai chover.
— Não é disso que estou falando.
Ele parecia chateado.
Suspirei, desviando o olhar. De repente eu sabia do que Owen estava falando.
— Owen, estamos juntos há tão pouco tempo...
— Estamos juntos há mais de um ano e nos conhecemos a vida inteira.
— Você entendeu o que eu quis dizer!
— Estou apaixonado por você, Amanda.
Havia muita intensidade em suas palavras e isso não deveria me assustar. Muito pelo contrário. Mas assustou.
Porém, eu me vi me aproximando e tocando seu rosto, porque não gostava de ver aquele olhar de frustração em seu rosto.
— Eu também te amo — respondi deixando que ele me beijasse, mas antes que se tornasse mais íntimo, ouvimos a voz de Molly o chamando.
— Owen, precisamos de ajuda.
— Merda! — Ele se afastou olhando para trás, onde Molly tinha surgido.
— Vai chover, precisamos levar tudo para dentro!
— Vá ajudá-la. — Eu o soltei. — Vou embora.
— Espera, eu posso ir com você.
— Não, está ficando tarde. Sabe que tenho horário, né? — Rolei os olhos.
Owen concordou e eu o beijei de leve me despedindo e corri até o carro, pegando a estrada de volta para Camden.
O olhar de frustração de Owen voltou a minha mente. Eu me senti culpada porque no fundo sabia que não estava tão empolgada quanto ele para sermos um casal normal como qualquer outro. Acho que não tinha me dado conta de que Owen tinha expectativas com minha volta.
Antes, era cômodo aquela distância. Eu não precisava analisar nada, mas agora, tudo ia mudar.
E eu não sei como me sentia sobre isso.
Por que eu sentia que alguma coisa não se encaixava na nossa relação?
Owen era perfeito para mim. Eu gostava dele. Senti sua falta enquanto estava longe no último ano.
Talvez eu estivesse me preocupando à toa.
Um raio iluminou o céu e notei que as nuvens estavam mesmo carregadas, precedendo uma tempestade. Esperava que desse tempo de chegar em casa, a uns vinte minutos de distância. Mas o carro começou a fazer um barulho estranho e parou depois de uns cinco minutos.
— Droga — murmurei tentando dar partida e nada.
Ainda tentei mais algumas vezes, mas não teve jeito.
O carro não pegava de maneira alguma.
Procurei meu celular e me dei conta de que tinha esquecido carregando em casa.
Era o que faltava. O carro quebrar no meio de uma estrada e eu sozinha. Estava começando a me perguntar se deveria descer do carro e ir andando, mas as nuvens no céu estavam cada vez mais baixas e escuras.
De repente, um carro se aproximou e parou atrás do meu.
O motorista saltou e veio até mim. Abri a janela e o vento frio assolou meu cabelo.
— Precisa de ajuda?
Eu encarei meu salvador, respirando aliviada.
E por um momento fiquei sem fala. Era um cara jovem, talvez tivesse a minha idade. E era absolutamente lindo. Com seus cabelos castanhos claros bagunçados pelo vento e olhos verdes quase dourados.
— Moça? — insistiu e percebi que devia estar o encarando embasbacada há alguns segundos.
Fiquei vermelha.
— Meu carro não quer funcionar, não sei o que aconteceu... — balbuciei.
— Posso dar uma olhada para você.
— Oh... certo.
Ele foi até a frente do carro, abrindo o capô.
— Amanda... sua idiota, o que deu em você? — murmurei para mim mesma.
Eu não era uma pessoa impressionável. Mas agi feito uma boba com aquele cara.
E daí que ele era bonito? Não era como se eu nunca tivesse visto um cara bonito antes.
O estranho fechou o capô e voltou para o lado da janela.
— Acho que fundiu o motor. Terá que mandar guinchar.
— Droga! Não trouxe um celular...
Ele colocou a mão no bolso e tirou de lá um aparelho.
— Quer que eu chame pra você?
— Faria isso?
Eu não queria ter que chamar meu pai e muito menos obrigar Owen a vir me buscar.
O cara estranho discou rapidamente e escutei a conversa breve que ele teve, antes de desligar.
— Estão vindo.
— Obrigada por ajudar.
— Eu esperarei com você.
— Não precisa.
— Não vou deixá-la sozinha numa estrada.
— Vai cair uma tempestade. — Eu me encolhi de medo com um relâmpago.
— Eu sei. — Ele sorriu, nem um pouco preocupado.
E caramba, ele tinha um sorriso verdadeiramente bonito.
Eu me encolhi de frio e o estranho percebeu.
— Este seu carro é bem legal, mas duvido que tenha aquecedor — comentou.
— Tem razão.
— Está frio aqui, porque não vem para o meu carro, lá estará mais aquecida.
— Não obrigada — recusei um tanto esquiva agora.
Ele riu.
— Não precisa ter medo.
Eu o encarei, levantando uma sobrancelha, deixando claro que não acreditava muito nele.
— Nem de mim e nem da tempestade. Nós dois somos inofensivos.
Eu quis dizer que duvidava muito.
Mas agora, enquanto os primeiros pingos começavam a cair, grossos e ameaçadores, comecei a achar que era uma boa ideia não ficar sozinha.
E sem que eu pedisse, ele abriu a porta e abriu a blusa, com um claro convite para que eu me abrigasse ali.
A hesitação durou por uns três segundos até um raio clarear o céu e foi o que bastou para eu saltar e me aconchegar ao estranho, deixando que ele me levasse pela tempestade.
Em algumas passadas estávamos abrigados em seu reluzente carro preto. Que dava pra ver a milhas de distância que era muito caro.
Dava até dó de tocar no revestimento de couro creme dos bancos.
— Você tem medo?
Eu o encarei, confusa.
— Medo do quê?
— Da tempestade.
— Eu deveria ter mais medo de entrar em carros com estranhos — murmurei e ele riu.
— Meu nome é Nolan. Nolan Percy.
Arregalei os olhos.
Então aquele era “O” Nolan Percy. O novo irmão de Sam Carter.
Certo, eu tinha que concordar com Naomi e Ellie. Ele era mesmo perfeito.
— Pronto, agora já tem um nome para a polícia.
— Precisarei chamar a polícia?
— A pergunta é: estará viva para chamar a polícia?
Desta vez eu tive que rir. Ele estava tirando uma com a minha cara, óbvio.
E eu já não achava realmente que ele fosse um maníaco em potencial.
— E você?
— Eu o quê?
— Não me disse seu nome.
— Amanda. Amanda Thomas.
— Para onde está indo? Ou voltando, Amanda Thomas? — ele indagou curioso, ligando o som.
— Estou voltando da casa do meu namorado — respondi sem hesitar.
Ele sorriu e se inclinou ligeiramente para aumentar o som do carro.
Os acordes conhecidos de uma música de Kings of Leon chegaram ao meu ouvido.
— Quer que eu troque de música?
— Não. Eu gosto.
Ficamos em silêncio, a chuva caindo lá fora e o Kings of Leon nos fazendo companhia ali dentro.
Cadê a porcaria do guincho?
— Acho que o guincho já deveria estar aqui — murmurei impaciente.
— Sim. Vou ligar de novo. — Ele pegou o celular e disse algumas palavras e então desligou. — Más notícias.
— O que foi?
— Parece que eles não têm mais nenhum guincho para mandar. Muitos chamados por causa da chuva.
— E o que eu vou fazer?
— Não se preocupe. Eles mandarão alguém amanhã de manhã. Eu a levo.
— Não precisa...
— Eu levarei — insistiu dando partida.
Mordi os lábios, nervosa, mas concordei e dei meu endereço, que ele colocou no GPS.
— Me desculpa por todo este trabalho.
— Então, Amanda Thomas, acho que nunca te vi aqui em Camden.
— Acabei de voltar à cidade. Vim morar com meu pai. Estava na Califórnia com a minha mãe.
— E já arranjou um namorado? — Levantou a sobrancelha, entre divertido e curioso.
— Nós namorávamos antes de eu ir embora, há um ano.
— Era um namoro à distância então?
Eu me perguntei, já meio irritada, por que ele estava tão curioso.
— Me desculpe. — Ele notou minha irritação. — Estou sendo muito curioso?
— Está sim. Mas tem razão. Era à distância. Agora não é mais.
— Sorte dele.
Eu não falei nada.
Toda aquela conversa já estava começando a ficar estranha.
— Também é novo na cidade — falei e quase mordi a língua.
— Como sabe?
— Cidade pequena, sabe como é. E vi seu irmão e a... namorada dele hoje no Café. Com a Sam.
— É amiga da Stella e da Sam?
— Não, não sou — respondi baixinho. — E de onde eram?
— Nova York.
— Deve achar Camden muito sem graça então.
— Está começando a ficar interessante. — Ele sorriu parando o carro em frente a minha casa.
Antes que eu pudesse impedir, ele saiu do carro e deu a volta para abrir a porta pra mim, não se importando com a chuva.
Abri um sorriso sem graça quando ele abriu de novo o casaco para que eu me abrigasse ali. Mas não recusei a ajuda e saltei, me encostando nele de novo enquanto corríamos até a varanda da minha casa.
Tive que levantar o olhar para me despedir, notando pela primeira vez como ele era alto. Agora seus cabelos estavam totalmente molhados da chuva, mas ele não parecia se importar.
— Obrigada pela carona.
— Foi um prazer ajudar. — Eram palavras gentis, mas sua voz tinha um tom de sarcasmo. Ou era impressão minha?
— Certo... boa noite, Nolan.
Eu me virei para entrar, mas de repente me detive, ao me lembrar de algo.
— Droga! Esqueci meu livro no carro! — Bati a mão na testa.
— Era importante?
— Eu tinha que reler para um trabalho, mas tudo bem, darei um jeito. — Não comentei que já tinha lido, embora quisesse mesmo reler para lembrar os detalhes.
— Amanda, é você? — meu pai chamou de dentro de casa e de alguma maneira eu não queria que ele visse Nolan ali e fizesse perguntas.
— Acho melhor você ir... — falei rápido me apressando em abrir a porta e não olhei para trás, entrando em casa com medo que meu pai viesse ver por que eu estava me detendo.
— Tudo bem? — Meu pai levantou os olhos de onde estava, sentado na velha mesa de carvalho no canto sala, provavelmente preparando algum sermão.
— Sim, tudo bem pai.
— Foi Owen que ouvi? Ele veio te acompanhar?
Eu me vi corando e desviando o olhar.
— Não, ele teve que ajudar a levar as coisas da festa para dentro por causa da chuva.
— Veio sozinha? — Havia censura em sua voz.
— Sim...
Eu tinha que dizer que o carro quebrou, mas sinceramente, não queria ver meu pai preocupado e querendo ir naquela hora rebocar o carro e estava mesmo chovendo muito. Amanhã eu diria a ele o problema.
— Vou subir, estou cansada!
Eu me afastei rápido antes que ele fizesse mais perguntas.
Coloquei meu pijama e escovei os dentes, prendendo meus cabelos em uma trança.
Voltei para o quarto e peguei o celular. Havia mensagens da minha mãe e de Owen, querendo saber se cheguei bem. Menti para ele também, não querendo preocupá-lo e estava me preparando para ir dormir, quando ouvi um barulho na minha janela. Como se alguém jogasse pedrinhas.
Abri, curiosa, e vi Nolan Percy lá embaixo.
A chuva já havia quase parado agora, como uma típica tempestade de verão.
— O que faz aqui? — indaguei surpresa.
Ele mostrou o livro.
— Fui buscar pra você.
— Não precisava fazer isso...
— Você disse que era importante.
Eu não soube o que dizer.
— Tudo bem, eu vou descer — falei meio relutante. Pensava no meu pai ainda na sala e definitivamente ele iria fazer mil perguntas se visse Nolan ali.
— Não precisa — Nolan falou de repente. — Eu subo aí.
E para meu total espanto, Nolan começou a escalar a árvore em frente ao meu quarto.
— Ficou louco?
Ele riu continuando a subir com facilidade até chegar a minha janela.
— Você tem problemas, Nolan Percy? — indaguei boquiaberta.
Ele me passou o exemplar de “Orgulho e Preconceito”.
— Não acredito que fez isso! É perigoso!
— O perigo é bom, Amanda. — Ele riu e olhou para baixo, se equilibrando precariamente como se fosse cair, meu coração veio à boca.
— Pare com isso!
— Está com medo? — Ele estava claramente me desafiando e por um momento eu realmente duvidei de sua sanidade. — Devia sair e se pendurar comigo.
— Não obrigada, não quero quebrar o pescoço!
— Talvez seja isso que eu queira. — Balançou no galho fino e meu coração veio à boca.
— Pare com isso, quer se matar? — Meu Deus, ele era doido ou o quê?
De repente ele riu.
— Estou brincando, Amanda. Como você é ingênua! Está mesmo com medo? Se eu cair, o máximo que quebraria seria meu orgulho.
Olhei para baixo e ele tinha razão.
E então de alguma maneira estranha e bizarra, eu comecei a rir também.
— Obrigada — murmurei por fim. — Foi... legal.
— Não sou legal, Amanda. — Ele continuava sorrindo, mas de novo tive aquela sensação de sarcasmo. — Talvez eu te cobre esse favor... Boa noite de novo! — Ele desceu tão facilmente como subiu e entrou no carro.
Eu ainda fiquei ali. Rindo para a noite escura, feito uma idiota, e pensando que toda aquela situação foi no mínimo bizarra.
E ele me chamou de ingênua.
Sim, ele tinha razão.
Eu só não sabia o quão ingênua eu ainda seria dali pra frente.
Capítulo 2
Consegui terminar a releitura de “Orgulho e Preconceito” graças a Nolan Percy, e quando dormi naquela noite acho que foi natural sonhar com ele. No sonho, eu ouvia as pedrinhas na minha janela e quando a abria, Nolan estava subindo pela árvore até me alcançar, mas em vez de simplesmente entregar o livro, ele pulava para dentro do meu quarto.
E ao acordar e me arrumar para ir à escola me perguntava se ele falaria comigo quando nos encontrássemos por acaso nos corredores ou fingiria que não me conhecia.
— E por que estou preocupada com isso? — perguntei para a minha imagem no espelho.
Peguei minha mochila e desci. Papai ainda dormia e imaginei que ele deveria ter ficado acordado até tarde. Saí para a chuva chata que caía em Camden e estaquei ao ver um reluzente carro preto na porta da minha casa.
E emergindo dele, Nolan Percy.
Será que eu ainda estava em algum sonho?
— Bom dia, Amanda Thomas. — Ele sorriu.
— O que está fazendo aqui? — indaguei estupefata.
— Está sem carro não está? Achei que poderia precisar de uma carona.
— Acho que está sendo...
— Educado? Gentil? Atencioso? — brincou e eu revirei os olhos.
— Exageradamente todas essas coisas que falou.
— Eu vou para o mesmo lugar que você. Por que não aceitar uma carona?
Mordi os lábios, indecisa. Eu tinha mesmo esquecido que estava sem carro.
E a outra opção era entrar e pedir carona a Gavin.
— Tudo bem — acabei concordando e entrei no carro.
O carro seguia quase silencioso pelas ruas molhadas e agora à luz do dia, eu conseguia reparar que era um modelo muito caro.
Geralmente meus amigos que tinham carro possuíam um de segunda mão, e não um carro do ano que devia custar uma fortuna.
Então os Percy eram mesmo podres de ricos.
E eu me perguntava por que perdiam tempo ali em Camden. Eu me recordei de Ellie contando que o pai de Nolan se casou com Helena Carter. Será que não seria mais óbvio que ela se mudasse com a filha para Nova York e não o contrário?
Com certeza um cara rico como o pai de Nolan se mudar com os dois filhos para uma cidadezinha pequena e sem graça era intrigante. Espiei de soslaio Nolan Percy concentrado na estrada. Ele era mesmo muito bonito. Hoje estava usando uma camiseta branca e uma jaqueta de couro preto, parecia um daqueles caras saídos de um filme sobre garotos rebeldes dos anos cinquenta.
— James Dean — murmurei sem pensar.
Nolan tirou o olhar da estrada por um momento me encarando divertido.
— O que disse?
Enrubesci.
— Nada... na verdade, eu estava reparando que você me lembra James Dean.
— James Dean morreu jovem, não?
— Acho que sim. — Credo. Que comparação bizarra.
Chegamos à escola e quando saí do carro, pude perceber todos os olhares em mim.
Ah, que ótimo.
Talvez fosse melhor eu ter vindo de carona com meu pai.
— Está todo mundo olhando para nós ou é impressão minha? — murmurei.
Nolan deu de ombros.
— Não vejo nada.
Eu o encarei.
— Não parece se importar.
— Por que me importaria?
— Eu não gosto de ser o centro das atenções — tentei explicar.
Na verdade, eu nunca tinha sido o centro das atenções.
— Ei, Nolan.
Uma voz masculina o chamou e vi um jeep enorme estacionando ao lado do carro de Nolan e saltando dele o cara que Ellie disse ser o irmão mais velho de Nolan, Jace, acho que era este o nome.
E junto com ele, saltaram Stella e Samantha.
— Então esta é a donzela em perigo? — Jace se aproximou enquanto eu notava Stella e Samanta trocando olhares.
— Jace! — Nolan rosnou, um tanto irritado.
Mas Jace não pareceu se importar.
— Oi, eu sou Jace.
— Oi, Jace.
Stella e Samantha se aproximaram agora também, e não me passou despercebido o olhar de desdém que ela lançou a mim quando abraçou o namorado.
— E esta é minha gata, Stella. — Ele apertou a bunda de Stella que rolou os olhos antes de sorrir pra mim. Mas não era um sorriso amigável.
— Nós já nos conhecemos... Não é, Amanda?
— Sim... — respondi incomodada. Como que Stella podia me tratar assim? Eu não entendi que diabos tinha acontecido para ela mudar tanto comigo. — Costumávamos ser amigas. Antes de eu me mudar.
— Sério? — Jace me mediu e certamente estava tentando entender o que uma garota como eu fazia na companhia da deslumbrante Stella.
— Sim, nós éramos.
— Vocês não parecem ter muito a ver.
— Eu também acho — Stella concordou. — Você sabe, né, que a Amanda é toda santinha. Filha do pastor. Um porre.
O quê?
— Stella, não fala assim. — Samanta me lançou um olhar que parecia ser de desculpa.
Jace estava rindo com deboche junto com Stella.
— Santinha? Aposto que é virgem então.
— Com certeza. E o trouxa do namorado dela ainda a aguenta assim. Mas sabe, ele a trata como uma intocável. Que idiota!
— Isso não serviria pra mim. — Jace mordeu o pescoço da namorada, mas com o olhar malicioso preso em mim. — É sério isso? Vai casar virgem e esses troços religiosos todos?
Enrubesci ainda mais, sem saber o que responder enquanto eles continuavam rindo.
— Não sabe o que está perdendo! — Jace continuou. — Ou é por isso que está andando com meu irmão? E ai, cara , vai traçar a filhinha do pastor?
Ele olhou através de mim e eu acompanhei o olhar. Nolan estava encostado no carro, fumando um cigarro, meio alheio a nossa conversa bizarra.
E ele estava rindo. Como se tudo fosse muito engraçado.
Claro. Para aquele bando de meninos ricos de cidade grande, uma garota como eu devia mesmo ser ridícula para seus padrões.
E eu decidi que já bastava pra mim.
— Com licença, não devo satisfação a vocês!
Eu me virei, quase correndo em direção à entrada do prédio, mas ainda ouvi risadas atrás de mim.
— Jace, você é tão babaca, às vezes!
Ainda escutei Samantha dizer.
— E o que você está fazendo andando com a filha do pastor, Nolan? Ela tem namorado, sabia?
Não consegui ouvir o que ele respondeu, pois já estava dentro do prédio, me apressando a achar minha sala.
Ellie e Naomi me cercaram.
— Estou tendo uma alucinação ou eu vi você saindo do carro de Nolan Percy? — Naomi indagou boquiaberta.
— Nos conte tudo! Tudo! — Ellie parecia que ia desmaiar.
— Não é nada!
— Nada? Aquele é Nolan Percy, pelo amor de Deus!
— E daí? Credo, falam como se ele fosse algum ator de cinema ou algo do tipo.
— Ele é melhor que qualquer ator! Aqui em Camden, os Percy são como a realeza!
— E Nolan nunca é visto com ninguém da cidade, Amanda — Naomi endossa.
— Provavelmente ele se acha muito bom para nós! — Ellie fez uma careta.
— Ou deve ter namorada em Nova York.
— Eu não estou saindo com ele!
— Não?
— Não! Foi apenas uma carona. Ontem à noite...
— Ontem à noite?
— É, estava voltando da casa do Owen e meu carro quebrou. Ele apareceu do nada e me levou em casa, e hoje foi me buscar, porque eu ainda estava sem carro. Apenas isso.
— Mas ele não precisava te buscar — Naomi comentou.
— Claro que não. Ele deve ter algum interesse em você — Ellie parecia que ia ter algum tipo de ataque.
— Estão exagerando! E já estou atrasada para a aula de Biologia!
Marchei para dentro da sala, as ignorando com suas teorias ridículas.
Nolan Percy? Com algum interesse em mim?
— Que absurdo — murmurei.
— O que é absurdo?
Quase dei um pulo na cadeira ao ver quem estava ao meu lado.
O próprio Nolan Percy e seu sorriso bonito.
— O que faz aqui?
— Eu estudo aqui.
— Oh...
Relanceei os olhos pela sala procurando uma rota de fuga, ou seja, alguma cadeira vazia que não fosse ao lado de Nolan.
O professor entrou na sala e começou a aula.
— Conseguiu terminar seu trabalho com Mr. Darcy? — ele cochicha ao meu lado.
— O quê?
— Orgulho e Preconceito .
— Sim, terminei... Era apenas um relatório e eu já tinha lido o livro.
— Levou o livro para um encontro com seu namorado?
— Não! Quer dizer... Não levei o livro para ficar lendo com meu namorado, claro!
— Eu conheço?
— O quê? — Eu fingia que tentava anotar o que o professor falava, mas não estava adiantando para manter Nolan calado.
— Seu namorado.
— Não.
— Ele estuda aqui?
— Não. Os pais de Owen são adeptos ao ensino domiciliar.
— Ele nunca foi para a escola?
Eu o encarei.
— Algum problema?
— Claro que não.
— Porque seu namorado não a levou para casa ontem?
Eu parei de escrever e o fitei, irritada.
— Escuta, por que tanta pergunta sobre meu namorado? Está interessado nele?
— Não é nele que estou interessado.
A resposta baixa, direta, não era o que eu esperava e parei de respirar por um momento, perdida no olhar intenso de Nolan que parecia perfurar os meus à procura de algo em meu íntimo que eu não sabia o que era, mas que ele não me deixaria em paz até encontrar.
— Amanda Thomas!
A voz do professor adentrou no meu cérebro sem oxigênio e eu me obriguei a desviar os olhos de Nolan.
— Sim?
— Eu te fiz uma pergunta.
— Me desculpe, senhor, pode repetir?
Ele repetiu, não sem antes me dar uma bronca por eu estar distraída.
O que não era justo. Porque era Nolan que estava me distraindo. Mas engoli a bronca e respondi a pergunta.
Felizmente, Nolan parou de falar comigo depois disso e assim que o sinal bateu, peguei minhas coisas e praticamente corri para a próxima aula. Era aula de Cálculo, que eu odiava, mas quebrar a cabeça para resolver equações difíceis serviam para me distrair da lembrança insistente dos olhos verdes dourados presos em mim e as palavras desconcertantes na voz perfeita.
Não é nele que estou interessado.
Será mesmo que eu tinha entendido direito?
Nolan Percy. O rico, lindo, perfeito, Nolan Percy tinha algum interesse em mim?
Sem graça, inocente filha do pastor e nem um pouco rica Amanda Thomas?
Devia ser algum tipo de piada.
Era isso.
Ele devia estar zoando com a minha cara.
Era a única explicação.
No refeitório na hora do intervalo, sentei à mesa com Naomi e Ellie, que discorriam sem parar sobre os preparativos para a festa de formatura, mas meus olhos teimam em ir na direção da mesa onde Nolan estava sentando com Stella e Samantha.
Em um determinado momento, Nolan virou-se e me pegou olhando.
Desviei os olhos rápido, corando. Tinha que parar imediatamente com aquilo.
E quando saí da aula no fim do dia, eu já me sentia mais calma e no domínio da situação. Nolan Percy não era nada. E também não estava interessado em mim.
Era simples assim.
Claro que ele estava lá fora, embaixo da chuva fina que caía. Parado do lado do seu carro, os olhos me acompanhando passar.
Mas eu não olhei. Não ia olhar.
Onde diabos se meteram Ellie e Naomi quando eu precisava delas?
— A carona ainda está de pé.
— Eu não preciso de carona, obrigada.
— Suas amigas já foram.
Droga!
Eu cogitei ir a pé. Ligar para o Gavin. Ligar para o Owen.
Nada me parecia uma boa opção no momento.
—Tudo bem — cedi.
Era só uma carona, que mal podia haver?
Ele abriu a porta pra mim e eu entrei.
— É só uma carona, Amanda. — Ele pareceu ler meus pensamentos.
Sua voz chegou até mim, muito suave e persuasiva, através do barulho do motor enquanto dava partida.
Sim, qual era o problema com uma carona?
Ou a terceira em menos de 24 horas?
Mas eu sabia qual era. Bem lá no fundo eu sabia.
E isso me assustava. Muito.
Eu olhava fixamente para frente. Os movimentos do limpador de para-brisa pareciam fascinantes no momento, jogando a água da chuva que aumentava para lá e pra cá...
“ Não é nele que estou interessado. ”
As palavras teimavam em voltar a minha mente como um mantra e lutei desesperadamente para não perguntar o que ele queria dizer com aquilo.
Até que meu tormento acabou quando finalmente o carro parou em frente a minha casa.
Eu voltei a respirar normalmente.
— Obrigada pela carona, Nolan... — falei já abrindo a porta e saltando, ignorando a chuva.
— Ei Amanda, quem é este cara?
Levantei o olhar e lá estava Owen me encarando desconfiado.
— Owen! O que faz aqui? — indaguei tentando não ficar vermelha.
Ou me sentir culpada.
Porque não havia nenhum motivo para eu me sentir culpada.
— O que faz no carro desse cara? — Owen ignorou minha pergunta e encarava Nolan, que tinha descido do carro apesar da chuva, com cara de poucos amigos.
Que ótimo!
— Este é Nolan Percy. — Eu me virei para Nolan. — Nolan, este é Owen Smith... meu... meu... namorado.
Os dois não fizeram nenhuma menção de dar as mãos ou algo do tipo, apenas balançaram a cabeça.
Estava ficando bem estranho.
— Nolan, obrigada pela carona. Vamos Owen, vamos entrar. Estou ficando encharcada.
E saí o puxando pelo braço, rezando pra que ele me acompanhasse e que Nolan fosse embora.
E minhas preces foram ouvidas, pois Nolan entrou no carro e saiu cantando pneus.
Entrei em casa, me sacudindo toda.
— Droga de chuva!
— E posso saber o que fazia dando voltas com aquele cara? — Owen indagou muito sério.
— Não estava dando voltas. Ele me deu uma carona.
— Por que precisava de carona? Você tem carro.
— Meu carro quebrou ontem à noite.
— E por que não me avisou? Eu vinha te dar carona!
— Porque não precisou.
— Não precisava pedir carona a um estranho.
— Não é um estranho, é um colega de escola! Ele é da minha classe de Biologia.
— Eu não gostei nada disso.
— Owen, pare com isso! Foi apenas uma carona! Pelo amor de Deus! Ou está insinuando algo, porque se estiver é melhor parar! Agora sou eu que não estou gostando disso!
Eu dei as costas a ele e subi as escadas correndo, me trancando no quarto.
Realmente Owen me tirou do sério com aquelas insinuações sem sentido.
Troquei as roupas molhadas por outras secas e prendi o cabelo.
E quando desci estava mais controlada.
Owen ainda estava ali e me encarou culpado.
— Me desculpa.
— Desculpas aceitas — murmurei indo para a cozinha preparar algo para comer.
— Fiquei com ciúme de vê-la com aquele riquinho mimado.
— Nolan não é um riquinho mimado.
Assim que as palavras saíram da minha boca, eu me arrependi.
Por que diabos eu estava o defendendo?
— Quer dizer, nós nem o conhecemos, não vamos julgar só porque a família dele é rica.
— Tem razão. Mas todos falam destes Percy desde que chegaram à cidade.
— As pessoas falam demais, ainda mais em cidade pequena.
— Apenas me prometa que não irá andar com essa gente.
Eu o encarei.
— Não se preocupe. Eles são tão ricos e diferentes de nós. Nunca faremos parte da mesma turma.
— Mas sabe que Stella namora o irmão dele, não?
Desviei o olhar, indo para a cozinha, e Owen me seguiu.
— Sim, e eu a vi hoje com ele.
— E aí?
Eu sabia o que Owen queria saber.
— E aí que ela continua me tratando como se me detestasse agora e não faço ideia do porquê! — Meus olhos se enchem de lágrimas, sem que eu consiga evitar e Owen toca meu rosto.
— Stella é uma ridícula. Não fique magoada por causa dela.
— Mas éramos amigas e do nada ela me deu um gelo! Claro que pode ser porque eu decidi ir embora com minha mãe, mas não faz muito sentido. Enfim, agora ela está andando com a Samanta e os Percy e me tratou supermal. Fazendo piadinha e tirando sarro da minha cara...
— Esqueça a Stella. Ela só está se revelando quem ela sempre foi. Uma vaca. Faz bem em se manter longe dela.
— Por que tenho que ir embora? — Owen indagou depois do almoço.
— Porque ainda tenho muitos trabalhos para fazer.
— Ah, Amanda, isso não é justo. — Tentou me abraçar, mas eu não deixei.
— Sério Owen. Só essa semana. Até eu terminar tudo e podemos fazer o que você quiser.
— O que eu quiser? — Ele sorriu devagar.
— Eu prometo.
— Eu vou cobrar, Amanda.
Eu ri e ele me beijou.
Eu o empurrei.
— Tchau, Owen!
Ele foi embora e fechei a porta, subindo para o quarto.
O exemplar de “Orgulho e Preconceito” ainda estava sobre a cama e eu o peguei, abrindo a primeira página.
“É uma verdade universalmente conhecida que um homem solteiro, possuidor de uma boa fortuna, deve estar necessitado de uma esposa. Por pouco que os sentimentos ou as opiniões de tal homem sejam conhecidos ao se fixar numa nova localidade, essa verdade se encontra de tal modo impressa nos espíritos das famílias vizinhas que o rapaz é desde logo considerado propriedade legítima de uma das suas filhas.”
Larguei o livro e me deitei, olhando o teto.
Quanto tempo demoraria para alguém da vizinhança tomar Nolan Percy como sua legítima propriedade?
Ri comigo mesma.
Era um pensamento ridículo. Mas isso iria acontecer, mais dia menos dia.
Não que isso me interessasse.
Nolan Percy era apenas meu colega da turma de Biologia.
E nada mais.
No dia seguinte, quando acordei e olhei pela janela, meu carro estava lá.
Na noite anterior havia finalmente contado a Gavin que meu carro quebrou e é claro que tive que ouvir um pequeno sermão.
— Pai, mandou buscar meu carro na oficina? — indaguei quando desci.
— Não, ele apareceu aí de manhã.
— Nossa, os mecânicos daqui são eficientes.
— Dirija com cuidado.
— Pode deixar.
Entrei no carro e então vi o bilhete preso ao volante.
E de alguma maneira, mesmo antes de abri-lo, eu sabia de quem era.
“Agora oficialmente não precisa mais de carona.
Mas aconselho aposentar este carro velho, pois demorei quase uma semana para chegar até aqui.
E não se preocupe com a conta da oficina.
Meu irmão Jace foi quem consertou. Ele é bom com mecânica.
Até a próxima aula de Biologia.
Nolan Percy”
Amassei o bilhete e só então percebi que tinha parado de respirar enquanto lia.
Fui mesmo uma idiota em nem me preocupar saber onde estava meu carro.
E o tempo inteiro estava na casa de Nolan.
E o que foi que ele escreveu? Que Jace tinha consertado o carro.
Era difícil de acreditar.
Mas pelo menos meu carro estava de volta. Embora lento demais para os padrões de Nolan Percy. Bufei irritada. Não iria mais pensar em Nolan a partir de agora.
Ou até a próxima aula de Biologia.
Será que dá tempo de mudar de classe?
Graças a Deus, naquele dia não estava chovendo. Na verdade, estava até fazendo sol.
E também não vi Nolan pela escola.
Não que eu estivesse procurando, claro.
— Está procurando seu motorista? — Ellie me cutucou na hora da saída e ela e Naomi soltaram risinhos maliciosos.
— Não! E ele não é meu motorista!
— Eles devem ter ido viajar.
— Num dia de aula normal?
— Eles fazem isso de vez em quando. Deve ser coisa de gente rica.
— E os pais não ligam de eles perderem a aula?
— Gente rica nem liga pra isso — Ellie explicou. — Meu pai podia ser assim também. Adoraria ir pra praia num dia como este.
Mas eu nem ouvia sua tagarelice habitual.
Eu me sentia aliviada por não ter que encarar Nolan Percy por uns dias.
Mas meu alívio durou pouco.
Três dias depois, assim que estacionei em frente à escola, eu o vi.
E ele ria. Ria de algo que Samantha falava enquanto passava os braços em volta dos seus ombros.
E algo dentro de mim se remexeu com aquele som.
— Que idiota — murmurei para mim mesma saindo do carro assim que todos eles já tinham desaparecido.
Não que adiantasse alguma coisa, afinal. Hoje era dia da maldita aula de Biologia.
E entrei na sala e Nolan ainda não estava lá.
Talvez eu tenha sorte e ele escolheu aquele dia para cabular.
— Oi, Amanda.
Eu olhei pra cima quando me sentei e vi o rosto sorridente de Carlton.
Carlton era o amigo bonitinho de Ellie. Na verdade, se dependesse dela, seria mais que amigo, mas, sabe Deus porque, ele passou os últimos dias tentando chamar a minha atenção.
— Oi Carlton.
— E aí, se acostumando a voltar a morar em Camden?
— Sim, acho que sim.
— Não prefere a ensolarada Califórnia?
— Na verdade, eu preferia sim.
— É uma garota do sol. — Sorriu mexendo no meu cabelo.
— Mais ou menos...
— Embora não pareça que saia muito ao sol, já que não é tão bronzeada. — E seus dedos passaram de leve por meu rosto.
— Saia do meu lugar, Carlton Cooper.
Tanto eu como Carlton nos assustamos com a voz fria de ninguém menos que Nolan Percy.
Carlton se levantou de um pulo e encaramos Nolan.
Seu rosto era tão frio como seu tom de voz.
— Me desculpe, Percy.
Foi realmente estranho ver Carlton se afastar quase correndo.
E isso me irritou.
— Você foi grosseiro com ele. — Não me contive em reclamar.
Nolan se sentou ao meu lado.
Era incrível como o ambiente parecia subitamente menor agora. Como se somente ele tomasse quase todo o espaço.
— Estava salvando a vida dele.
— O quê?
— Eu já vi o seu namorado. E com certeza ele quebraria o pescoço de Carlton Cooper por ter posto as mãos em você.
Abri a boca várias vezes sem conseguir dizer uma palavra e ele continuou:
— Eu quebraria, se você fosse minha.
— Ah... as mãos dele não estavam em mim! — consegui dizer por fim ainda meio gaguejando. — Que exagero!
Nolan sorriu.
Daquele jeito que me irritava.
Lindo.
E então ergueu a mão e tocou meu rosto.
— Então eu também posso pôr minhas mãos em você?
Desta vez não só as palavras fugiram da minha boca. Todos os pensamentos fugiram do meu cérebro.
E eu só sentia o toque dos dedos de Nolan Percy na minha pele ainda gelada do frio daquela manhã de Camden.
E os dedos dele também estavam gelados de frio e acariciaram meu rosto num toque sutil, tão leve como uma pluma.
Mas foi como se o toque ultrapassasse a barreira da epiderme e adentrasse em meus ossos.
Esquentando.
Se espalhando pela minha corrente sanguínea até meu coração.
Que disparou feito louco no meu peito.
E alguma coisa sobrou para meu estômago também, que revirou como se borboletas dançassem dentro dele e descessem por meu baixo ventre e...
— Espero não estar atrapalhando nada, Senhorita Thomas.
A voz do professor interrompeu seja lá o que fosse que estava rolando dentro de mim, e eu me afastei de Nolan com um safanão.
Respirando por arquejos, como se tivesse corrido uma maratona, eu encarei o professor.
— Não, não atrapalha... eu apenas.... — Tentei buscar uma resposta, mas não consegui.
Meu cérebro parecia ter virado gelatina.
— Tudo bem, Senhorita Thomas. Acho melhor prestar atenção na aula, senão levará bomba. Temos provas na semana que vem. Aliás, pelo seu programa, parece estar atrasada em relação a nossa turma.
— Eu estudarei, não se preocupe.
— Sugiro achar alguém da turma para ajudá-la.
— Farei isso.
— Poderia ser o Senhor Percy.
“ O quê? O quê? ”
— Ele veio adiantado do outro colégio e conhece bastante a matéria.
— Não... — consegui murmurar, aturdida.
— Pode deixar, Senhor Banner. Eu serei o professor da Amanda. Ensinarei tudo o que ela precisar.
— Certo, muito bem, classe, abram o livro na página...
Espera.
O que é que tinha acabado de acontecer ali?
Eu tinha mesmo ouvido Nolan Percy dizer que me daria aulas particulares de Biologia?
— Nolan, esqueça essa história de...
— Shi, Amanda. Presta atenção na aula — ele me interrompeu com um falso tom de seriedade. — Não quero levar bronca por sua causa.
E voltou a atenção ao livro, mas eu podia ainda ver um resquício de sorriso em seus lábios.
Não era possível.
Simplesmente aquilo não estava acontecendo.
Eu abri o livro, ao ver o olhar do Senhor Banner em mim, fingindo que lia. Mas de maneira alguma eu ia concordar com aquela história de professor. Preferia passar o resto da minha vida levando bomba em Biologia.
Por fim, a aula acabou e fui para a aula de Educação Física.
E sem Nolan Percy atrapalhando.
E claro, levei várias boladas, porque estava mais distraída do que o normal.
Maldito Percy e seu sorriso irritante.
E dedos atrevidos.
Atrevidos?
Deus, em que século eu vivia? Ele apenas tocou meu rosto!
“ Mas que diabos foi aquilo? ”. Eu me sentia como se tivesse feito parte de alguma experiência bizarra. O que tinha em Nolan que me deixava daquele jeito?
Continuei me fazendo aquela pergunta enquanto ia para a casa naquela tarde, amaldiçoando o tempo ficando ruim de novo.
Quando cheguei em casa, peguei a correspondência e entrei. Coloquei uma roupa mais confortável e estava descendo para comer algo quando de repente a campainha tocou. Será que era Owen?
Hoje já era sexta e eu tinha prometido que o fim de semana seria com ele. Mas depois daquele papo do Senhor Banner, provavelmente o mais sensato seria ficar estudando Biologia em vez de sair com meu namorado.
Eu me arrastei até a porta, já pensando em como falar isso para Owen, mas não era ele que estava ali.
Era Nolan Percy.
— Oi, Amanda.
— O que faz aqui? — indaguei surpresa.
Ignorando as batidas rápidas do meu coração.
— Aula de Biologia.
Capítulo 3
— Não lembro de ter concordado com isso.
— Eu lembro.
— Não lembra não! Porque eu não concordei.
— Amanda, não seja absurda. Por que não aceita minha ajuda? É apenas uma aula.
Ele falava meu nome agora como se falasse com uma criança birrenta.
E, ok. Talvez eu estivesse agindo como uma.
Respirei fundo.
Sim, era apenas uma aula. E eu realmente precisava.
E daí que era Nolan Percy?
Este cara não era nada. NADA.
— Está bem. Tem uma hora. — Fiz sinal para ele passar e fechei a porta.
— Posso ficar a tarde inteira.
— Uma hora. Vou buscar meu livro.
Subi e na volta dei uma espiada na minha imagem no espelho. Meu cabelo estava uma bagunça. Passei os dedos rapidamente e olhei minha roupa velha.
Mas por que estava preocupada com a minha aparência?
Um pouco irritada comigo mesma, desci e encarei Nolan.
Ele tinha nas mãos um porta-retratos.
— Esta é você?
Ah, Deus.
Desci os últimos degraus quase correndo e arranquei minha foto de bebê de suas mãos.
— É! — respondi entre dentes colocando a foto no lugar. — Veio aqui para me ensinar Biologia ou ficar bisbilhotando?
— Você era bonitinha — elogiou com um arremedo de sorriso nos lábios perfeitos enquanto me seguia para a sala.
Eu nem me dei ao trabalho de responder.
Nós nos sentamos em volta da mesa de centro e ele começou a me explicar a matéria de forma surpreendentemente clara.
Mas que porcaria, ele era mesmo bom em Biologia!
Como se não fosse suficiente ser lindo e rico.
Ele era inteligente.
Eu queria muito, muito mesmo, achar um grande defeito em Nolan Percy.
— Está distraída — comentou.
— Oh, desculpe, continue.
— Está entendendo o que estou dizendo? Posso ir mais devagar.
— Não sou tão burra assim.
— Não te chamei de burra, Amanda.
— Ah tá!
— Por que gosta de ser irônica comigo?
— Não faço isso.
— Faz sim.
— É impressão sua. Vamos, sua hora está acabando, continue.
Ele continuou falando e me fazendo perguntas.
Tudo bem. Às vezes eu me distraía apenas com o som da sua voz e não captava as palavras.
Ou meus olhos ficavam presos no seu rosto perfeito, no simples mexer dos seus lábios. Ele tinha um hálito gostoso, como menta, que chegava até mim por estarmos tão perto. O que não parecia fazer sentido já que o vi fumando.
Ou então me distraia com suas mãos.
Ele tinha dedos bonitos, longos, elegantes... Porém, as pontas eram ligeiramente escuras, como se estivessem sujas, reparava agora. Eu me lembrei do seu toque na sala de aula e uma parte ainda entorpecida do meu cérebro se indagava o que eu sentiria se ele tocasse em outras partes de mim.
— Amanda? Amanda?
— Oh... O quê? Hum?
— Deus, como você é distraída!
— Me desculpe. Acho que estou ficando cansada — inventei vermelha.
Olhei o relógio e me surpreendi ao ver que já estávamos ali há quase três horas.
— Nossa, o tempo passou. Não devia prender você aqui, deve ter outros compromissos.
— Compromissos nesta cidade de merda? — Ele se espreguiçou e eu me distraí um pouco com a sua camiseta branca que se delineou contra o peito forte.
Mas que diabos?...
— Além do mais, meu compromisso hoje é você. — Sorriu.
— Certo... — Por que ele sempre me desconcertava com suas palavras? Eu me levantei, precisando colocar algo no meu campo de visão que não fosse Nolan Percy. — Que educação a minha. Nem te ofereci nada para... posso fazer um chá? — falei rápido, embora não soubesse bem o que estava fazendo. Devia mandá-lo embora, já que disse que ficaria ali somente uma hora.
— Eu aceito. — Nolan me surpreendeu.
Ele me acompanhou até a cozinha. Parecia estranho Nolan Percy ali na minha cozinha simples.
Tinha uma foto minha e da minha mãe em cima do aparador. Desta vez ele não pegou e nem fez nenhuma piadinha, enquanto eu colocava a água para esquentar.
— É sua mãe?
— É.
— Faz tempo que seus pais não estão mais juntos?
— Como sabe disso?
— Cidade pequena. — Ele deu de ombros, usando meu próprio argumento por saber algumas coisas sobre ele.
— Um ano mais ou menos. Aí ela decidiu ir embora para a Califórnia. Camden era pequena demais para ela.
— E você foi junto.
— Sim.
— Por que voltou?
— Meu pai não estava bem de saúde.
— Ah, o magnânimo Pastor Gavin Thomas.
— Agora você está sendo irônico. — Não gostei do tom que ele usou para falar do meu pai.
— Não curto muito esse lance de religião, se quer saber. Fica ofendida? É tipo, super-religiosa como seu pai?
— Não fico ofendida por não ser religioso. Eu respeito as crenças ou a falta delas nas pessoas. Cada um vive como quiser. Minha mãe, por exemplo, não era religiosa.
— Como isso era possível? Se casou com um pastor.
— Eles se apaixonaram. — Sorri, quase tristemente. — E acho que quando as pessoas se apaixonam não importa mais nada, nenhuma diferença. Elas apenas... ficam juntas.
— Mas com certeza dá merda — ele pontuou com uma amargura que não parecia ser só sobre o caso dos meus pais ou alguma situação hipotética. — Duas pessoas que não tem nada a ver, não vai dar certo nunca. Sempre termina em tragédia.
— Talvez tenha razão. Às vezes acho que minha mãe aguentou até demais.
— Mas uma hora ela explodiu e se mandou.
— É, mais ou menos assim.
— Entendo o que quer dizer...
Eu queria perguntar como ele entendia, mas ele continuou:
— E para você? Camden também não é muito pequena?
Eu dei de ombros, colocando o chá na xícara.
— Estou aqui de passagem, acho.
— Por dois meses antes de ir para a Faculdade de Yale?
Levantei o olhar, surpresa, e vi o envelope em sua mão. Havia o selo de Yale.
— Tem costume de mexer nas correspondências particulares das pessoas?
— Estava aqui em cima.
Tomei da sua mão.
— Não vai abrir?
— Não é da sua conta.
— Não está ansiosa para saber se foi aceita?
— Provavelmente não fui, então...
— Por que se deprecia, Amanda?
— Não faço isso.
Ele ficou me encarando. Como se eu fosse um grande mistério e ele tentasse desvendar.
Ou eu já estava começando a ver coisas que não existiam.
Suspirei e olhei o envelope na minha mão.
Só mandei a inscrição para aquela universidade porque minha mãe insistiu.
E acho que estava com medo de abrir e ver o “não”, em frente ao perfeito Nolan. Provavelmente ele foi aceito em todas as grandes universidades do país.
— Ok, eu vou abrir e mostrar pra você. — Decidi que não devia nada a Nolan e também estava muito ansiosa para saber.
Eu fui aceita.
— Fui aceita! — murmurei sem acreditar.
Comecei a pular e não sei como no segundo seguinte, eu estava abraçando Nolan.
E por um momento, em meio a minha euforia, me dei conta que estava realmente abraçando Nolan Percy!
Meus braços estavam em volta do seu pescoço.
Cada centímetro do meu corpo estava grudado nele.
E ele estava me abraçando de volta!
Toda essa percepção deve ter durado segundos, assim como por alguns segundos eu não consegui me mover dali, embora meu cérebro começasse a se dar conta do absurdo da situação.
E chegou ao meu cérebro também o cheiro delicioso que vinha dele. E a textura macia de seus cabelos da nuca que meus dedos tocavam. Eu respirei devagar e...
— Amanda, está em casa?
Dei um pulo para trás ao ouvir a voz do meu pai vindo da sala.
— Oh... me desculpe — murmurei aturdida.
Mas Nolan não parecia aturdido.
Ele parecia ainda diabolicamente lindo.
E sorria.
Sorria!
— Parabéns, Amanda.
— Amanda? — meu pai chamou de novo, desta vez os passos mais próximos.
— Aqui na cozinha.
— Por que não respondeu? — Então ele parou ao ver Nolan.
— Pai, este é Nolan Percy. Ele é meu colega de escola. Veio me ensinar... Biologia.
Eu esperava não estar vermelha, mas duvidava.
Nolan estendeu a mão para meu pai.
— Pastor Thomas.
Talvez qualquer outro estivesse intimidado com meu pai e seu olhar.
Mas não Nolan.
Claro.
Meu pai o cumprimentou.
— Então é um dos garotos Percy.
— Pai, o Nolan já está de saída — comentei, louca para tirar Nolan dali. Porque tinha certeza de que meu pai viria com perguntas inconvenientes.
— Sim, estou. — Nolan me encarou. — Se precisar de mais aulas...
— Eu já aprendi tudo. Obrigada, mais uma vez.
Abri a porta da cozinha.
Nolan foi até a porta e se virou.
— Parabéns por Yale — murmurou antes de sair e fechei a porta atrás dele.
— Yale? O que ele quis dizer? — Papai me encarou curioso.
Eu peguei o envelope e lhe mostrei.
Papai parecia que ia enfartar.
— Você foi aceita?
— Sim!
Ele me abraçou emocionado.
— Provavelmente deve ser um engano, pai...
— Não seja boba!
O telefone tocou. E eu me desprendi de papai pra atender.
Era Owen.
— Oi, Owen.
— Diz pra ele que foi aceita em Yale — meu pai dizia eufórico do meu lado e eu revirei os olhos.
—Tenho boas notícias. Fui aceita em Yale!
— Yale — Owen assoviou. — Isso é grande, hein?
— Deve ser um engano deles e provavelmente levarei bomba.
— Então temos que comemorar. Vou passar aí agora...
— Owen, hoje não, estou cansada, passei a tarde estudando — "com Nolan Percy", quase completei, mas era melhor ficar quieta.
— Está certo. Melhor mesmo fazermos algo especial amanhã.
— Especial é? — repeti.
— Deixa eu falar com ele — meu pai me pediu o telefone.
— Owen? Amanhã leve a Amanda pra jantar num lugar bem chique. Por minha conta...
Bufei, revirando os olhos.
Ele me passou o telefone de novo e eu me despedi de Owen.
— Até amanhã então.
— Até amanhã.
Sábado amanheceu nublado e fiquei decepcionada. Naquela época do ano São Francisco estaria ensolarada e provavelmente eu e mamãe faríamos algo ao ar livre. De repente senti saudade dela. Ontem eu havia telefonado para lhe dizer sobre Yale e ela ficou superfeliz. Pediu que eu fosse passar férias com ela antes do ano letivo, mas eu sabia que talvez papai ficasse chateado.
Então, driblando o desânimo, peguei meu livro de Biologia, depois de tomar café, e fui para o jardim.
Eu podia fingir que estava sol.
Sentei e comecei a ler, tentando memorizar os conceitos. O pior era que eu ficava o tempo inteiro me lembrando da voz de Nolan Percy. Fechei o livro com um baque.
Respirei fundo várias vezes.
Fui até a porta da cozinha e avisei papai.
— Pai, eu vou dar uma volta.
— Não vá muito longe, hein.
— Vou até a praia.
Não tinha sol, mas pelo menos podia sentar em frente ao mar enquanto estudava.
Como o dia estava ruim, não havia muita gente por ali e eu me sentei na Marina e abri o livro.
De repente uma sombra se projetou acima de mim.
— Achei que tivesse aprendido tudo.
Eu levantei o olhar ao ouvir a voz de Nolan.
— O que faz aqui?
Lá estava. De novo.
Aquele sorriso enervante.
E meu coração disparando no peito. Devia ser o susto. Com certeza.
— Estou indo velejar.
— Velejar? Com este tempo?
— Eu gosto de tempestade.
— Credo. Não fica com medo?
Ele riu.
— Infelizmente hoje não vai chover. E, na verdade, em alto-mar, o tempo vai abrir.
— É o garoto do tempo agora?
— Vem comigo que eu te mostro.
— Não, obrigada.
— Eu vou te levar onde tem sol. Achei que gostasse.
E algo no sorriso dele me fez acreditar mesmo que ele falava sério.
— Duvido que haja sol em algum lugar aqui.
— Então venha comigo.
E ele estendeu a mão.
Mordi os lábios, debatendo comigo mesma se deveria acompanhá-lo.
E a parte menos sensata venceu.
Fechei o livro e me levantei.
Ignorando sua mão estendida.
— Certo, Percy. Me leve para onde tem sol.
Capítulo 4
Ele sorriu e pegou minha mão. Eu devia ter puxado de volta, mas não me pareceu nada demais, enquanto ele parava em frente a um barco.
— Você tem um barco?
— Meu pai tem. — Ele pulou para dentro e estendeu a mão.
Hesitei por um momento.
Ah, nossa. Eu ia mesmo fazer aquilo? Ir para alto-mar com Nolan?
Sim, eu ia, me dei conta quando pulei dentro do barco e fiquei observando Nolan preparar o barco para partirmos.
E, simples assim, observei a Marina e a terra firme ficando para trás enquanto o mar se abria à nossa frente.
E tive a assustadora impressão que deixava para trás também toda minha sensatez.
E eu deveria estar com medo, mas me vi sorrindo de volta para Nolan quando ele sorriu pra mim.
Meia hora depois, ainda estávamos velejando mar adentro. Sentia o vento no meu rosto e os pingos de água respingando na minha pele.
De repente Nolan parou o barco e se aproximou.
— Como eu prometi.
Ele olhou para o céu e eu fiz o mesmo.
E lá estava, as nuvens se abrindo. O céu azul e um raio de sol atingiu minha pele como uma carícia.
— Não acredito — murmurei fechando os olhos e levantando meu rosto. — É mesmo perfeito.
— Sim, perfeito.
Abri os olhos e ele estava me fitando.
Eu desviei o olhar.
Então, para meu espanto, ele começou a tirar a roupa.
Mas o quê?
— O que está fazendo?
Ele riu abrindo a camisa e eu sabia que deveria desviar o olhar, mas não consegui.
Havia tatuagens ali. Em seu peito. Em suas costelas. Em seus braços.
— Se tem sol, vamos aproveitar.
— Tirando a roupa?
Em resposta ele tirou a calça e desta vez desviei o olhar, não sem antes notar que ele usava uma cueca boxer preta.
Caramba, isso não estava acontecendo.
— Vamos, tire a roupa também.
— Nem pensar. — Abracei meu próprio corpo, como se Nolan fosse agarrar minhas roupas, um conjunto de moletom branco, e tirá-las ele mesmo.
Mas ele se deitou.
— Vem aqui.
— Estou bem onde estou.
— Deixa de ser boba. Vem aqui e curta o sol. Não era isso o que queria?
Eu suspirei e abri o livro de Biologia.
— Não te trouxe aqui para estudar, Amanda — ele disse entre incrédulo e divertido.
— Mas eu preciso.
— Você é... singular.
Ignorei suas palavras e tentei ler.
Era bem difícil me concentrar. Com o sol me chamando e estava começando a sentir calor.
E Nolan Percy estirado ao meu lado.
De repente mãos impertinentes surgiram fechando o livro e retirando-o de mim.
— Hei!
— Relaxe, Amanda.
Eu bufei.
Ok, talvez ele tivesse razão.
Ainda hesitante, retirei a blusa de moletom e fiquei apenas com uma camiseta velha que estava por baixo. Bem, a camiseta era daquelas grandes. Eu podia tirar a calça que mesmo assim não ficaria indecente.
Então, sem pensar muito no que estava fazendo, tirei a calça e me deitei ao lado de Nolan, fitando o céu.
Por um momento nada se ouvia, a não ser o som de nossa respiração.
— Parece que tem só nós dois no mundo — murmurei, como se pra mim mesma, adorando sentir o sol na minha pele. — Podia ficar pra sempre aqui.
— Então fica.
Eu ri e virei o rosto para encará-lo.
Ele estava tão perto, que se eu mexesse um pouco a mão, poderia tocar a dele.
E por um momento, eu fiz um esforço sobre-humano para não fazer exatamente isso.
— Sabe, você não parece o tipo de cara que se satisfaria em viver longe da civilização.
— E que tipo de cara eu sou, Amanda Thomas?
“ O tipo lindo, inteligente e rico, tão perfeito que nenhum lugar do mundo pareceria tão bom o suficiente. Ou nenhuma garota boa o suficiente. ”
Mas eu não falei nada.
Apenas desviei o olhar para o céu e fechei os olhos.
Ia apenas descansar por um momento. E depois iria pedir para irmos embora...
Acordei de repente.
Por um momento não percebi onde estava.
E então abri os olhos. O sol havia se movido no céu, agora caindo no horizonte. E alguém segurava minha mão.
Eu me sentei rápido olhando para o lado.
E Nolan Percy estava ali, sorrindo pra mim.
— Achei que tivesse morrido.
— Que horas são?
Ele se sentou também dando de ombros.
— Não faço ideia.
— Você me deixou dormir?!
Eu me levantei ainda aturdida e Nolan fez o mesmo, estendendo o dedo, ele tocou meu rosto.
— Você está vermelha.
— Droga! — Levei a mão a minha bochecha imaginando que devia mesmo estar vermelha. E eu estava bem suada de ter ficado exposta ao sol. A camiseta parecia pesada e incômoda contra minha pele. — Estou quente!
— Vamos nadar.
— Nadar aqui? Está louco!
Mas Nolan não parecia achar a ideia maluca e me puxou pela mão até a ponta do barco. Olhei para o mar azul aos nossos pés. Parecia extremamente convidativo e perigoso ao mesmo tempo.
Assim como o cara ao meu lado.
— Está com medo?
— Não deveria ficar? — E eu sabia que não era só pela iminência de pular na água.
Seus dedos apertaram os meus.
— Estou com você. Confia em mim?
“ Claro que não! ”, foi a primeira resposta que veio à minha mente.
Mas também havia mais.
Havia o calor de seus dedos acariciando os meus. O poder do seu olhar que parecia mais tempestuoso e perigoso que o mar.
E aquela vontade de me jogar no desconhecido que começava a se alastrar pela minha pele, aquecendo tudo e bagunçando meus pensamentos.
E meus sentimentos.
E então, ele sorriu.
E eu sorri.
E pulamos juntos.
A água nos alcançou, fria e densa, nos obrigando a separar nossas mãos e nadar, emergindo.
Respirei uma longa golfada de ar. Com o coração batendo forte e a adrenalina me fazendo sentir viva.
— Arrependida? — Nolan parou na minha frente.
Sacudi a cabeça em negativa.
— Não... nem um pouco.
Então, ele parou de sorrir, se aproximando até que seu bonito rosto estivesse tão perto que eu podia contar as gotas de água que escorriam.
— Então talvez se arrependa disso... — E eu soube, naqueles segundos intermináveis, que ele iria me beijar.
E não fui capaz de me mexer mesmo assim.
Acho que poderia passar mil anos.
Que eu nunca me esqueceria do momento em que Nolan Percy me beijou pela primeira vez. Foi como se tudo parasse, o tempo, o vento, o mar.
E só existisse o toque frio dos seus lábios sobre os meus.
Era doce. Intoxicante.
Apenas um leve roçar de lábios. Uma, duas, três... até que eu não estava mais contando. E apesar da água fria à nossa volta, senti tudo esquentando por dentro.
E com um gemido, meus dedos grudaram em seus ombros e eu o beijei de volta.
E desta vez, ele gemeu, o corpo colando mais ao meu até que eu sentisse todo seu contorno. Meu coração disparou no peito loucamente e estremeci numa fraqueza súbita.
Era isso. Nolan lindo, rico e perfeito Percy.
Estava me beijando.
E eu só queria que aquele momento não acabasse nunca.
Porque eu estava totalmente perdida. Nas sensações dos seus lábios. No gosto de sua língua.
Na sua respiração se movendo no mesmo ritmo que a minha.
Mas do mesmo jeito que começou, terminou.
Respirei uma longa golfada de ar enquanto ele me encarava, tão ofegante quanto eu.
E então a realidade me dominou.
Crua. Fria. Intensa.
“ Mas que diabos eu estava fazendo beijando Nolan Percy? ”
Com um som abafado de horror, eu o empurrei e ele se afastou sem resistência.
Nadei quase desesperada até a escada ao lado do barco e subi. Estava tremendo inteira de frio e indignação quando pegava minhas roupas e as vestia apressada, mesmo estando toda molhada.
Nolan surgiu segundos depois.
— Não vou pedir desculpas por isso. — Foi sua resposta controlada. Quase... divertido.
— Isso foi... — Eu nem conseguia definir. — Errado! Nunca mais ouse pôr as mãos em mim — murmurei por fim. — Apenas fique longe!
Virei o rosto para o mar, não conseguindo encará-lo, mas sabia que ele estava ali me fitando.
Se estava bravo ou não, não sabia dizer. Eu só queria ir embora e colocar a maior distância possível entre nós.
— Certo, se vai agir assim... — resmungou começando a vestir as próprias roupas.
— E será que podemos ir? Está tarde. Tenho um compromisso e não devia ter passado tanto tempo aqui com você. — Eu me recordei tarde demais e ainda com mais culpa que tinha um jantar marcado com meu namorado.
— O que tem de tão importante?
Eu me virei e o encarei.
— Um jantar com meu namorado.
Nolan fechou a cara.
Ótimo. Era bom mesmo que ele se tocasse.
— Certo, vamos embora. — Ele ligou o barco. — Não quero que perca seu jantar romântico.
Sua voz era fria e controlada e respirei aliviada.
Enquanto navegávamos de volta, as nuvens foram ficando mais escuras e de repente a chuva desabou.
E foi bom porque isso disfarçou as lágrimas de vergonha que eu não conseguia conter.
Quando Nolan atracou o barco na Marina, pulei apressada para fora, o ignorando totalmente.
Graças a Deus, Nolan não me seguiu.
Ele que fosse para o inferno.
— Amanda, onde se meteu? — papai indagou preocupado assim que entrei em casa, totalmente encharcada.
— Oh, eu... fiquei presa... na chuva.
— Eu não falei para não ir longe?
— Eu sei, mas me distraí e começou a chover... o importante é que está tudo bem agora. Vou subir e tomar um banho.
— Sim, vá se arrumar para o jantar, O Owen deve aparecer daqui a pouco para te pegar.
Tentei sorrir e parecer animada.
— Claro.
— Ei, já ia me esquecendo. Entregaram isso pra você hoje cedo.
Acompanhei seu olhar e vi um enorme buquê de flores.
Gavin piscou.
— Owen está romântico, hein?
Eu me aproximei e peguei o bilhete e abri.
“Parabéns para a garota de Yale.”
Sorri, um pouco mais animada, cheirando as flores.
Eu as coloquei num vaso no meu quarto e fui tomar banho.
Tentei não pensar no que tinha acontecido no mar.
Mas estava difícil.
Pensei em desmarcar com Owen, mas desisti. Ele foi muito fofo em mandar as flores e era melhor que saísse com ele. E esquecesse que Nolan Percy existia.
— Uau, você está linda — Owen elogiou e me beijou de leve quando foi me pegar.
Eu sorri meio sem graça.
Estava vestindo por insistência de Gavin um vestido. Que garantiu que ele mesmo tinha feito uma reserva em um dos restaurantes mais finos da cidade.
— Está tudo bem? — Ele me fitou, ante o meu silêncio.
— Está sim. Só cansada de tanto estudar.
— Está acabando.
— Sim, está.
Chegamos ao restaurante e eu sorri.
— Mas aqui é muito chique. Tem certeza?
Owen riu.
— Por conta do Pastor Thomas, Amanda.
— Acho que eu preferia um hambúrguer.
— Seja boazinha. Seu pai está orgulhoso por ter sido aceita em Yale.
— Eu ainda acho estranho.
Nós nos sentamos e fizemos nosso pedido.
— Ah, já ia me esquecendo de agradecer as flores.
— Flores?
— Sim, o arranjo que me mandou.
— Não te mandei nenhum arranjo, Amanda.
— Oh, não? — De repente uma luz se acendeu em meu cérebro.
Oh Droga.
Só uma pessoa podia ter mandado aquele buquê.
— Quem teria te mandado flores? — Owen indagou desconfiado.
— Acho que foi papai então. Ele está gastando, não é? — desconversei.
Owen pareceu engolir a explicação.
— Estou preocupado com meu carro, acho que vou estacionar aqui mais perto. Já volto.
— Ok.
Owen se afastou e a garçonete se aproximou com uma champanhe.
— Não pedimos champanhe.
A moça sorriu.
— O cavalheiro naquela mesa pediu para entregar aqui os cumprimentos.
Eu acompanhei seu olhar e empalideci ao ver Nolan numa mesa do outro lado do salão.
Acompanhado do irmão, de Samantha e de Stella.
Ele sorriu para mim enquanto os outros pareciam distraídos numa conversa.
Era só o que faltava.
De tantos restaurantes na cidade.
Owen tinha escolhido justamente um em que Nolan estava.
Capítulo 5
Tive vontade de me levantar e ir até a mesa de Nolan Percy e despejar a champanhe na cara dele, desfazendo aquele sorriso enervante.
— Champanhe? — Owen voltou para a mesa.
— Não é uma comemoração? — Eu ri, sem graça. De maneira alguma ia dizer que era cortesia de Nolan.
— Sim, uma comemoração... Aquele não é o Percy? — indagou.
Eu nem levantei o olhar.
— Ah é? Nem reparei.
— Está com a família dele.
— Sei...
O garçom apareceu com nosso pedido e Owen mudou de assunto, esquecendo-se dos Percy.
Juro que tentava não olhar, mas a todo momento eu me via relanceando os olhos para a mesa de Nolan. E o pior de tudo era que sempre pegava Nolan olhando pra mim, e desviava o rosto rapidamente.
Ainda bem que Owen parecia alheio a isso.
Por fim, o jantar acabou.
— Podemos ir? — pedi. — Estou me sentindo bem cansada.
— Claro.
Pedimos a conta e saímos.
— Fique aqui, vou buscar o carro — Owen pediu.
Ouvi umas risadinhas e lá estava Stella e Samantha atrás de mim.
Com Nolan do lado delas.
— Gostei do seu vestido — Samantha comentou com um sorriso que poderia ser simpático, se eu não estivesse tão a fim de detestar todos ao redor de Nolan naquele momento.
Stella soltou uma risadinha, me medindo com desdém.
— Que gosto estranho, Samantha.
— Eu gosto — Nolan comentou com sua voz inconfundível e caí na besteira de olhar e vê-lo me medindo devagar, como se apreciasse uma obra de arte.
Desviei o rosto, queimando de vergonha.
E algo mais que eu nem queria definir.
Owen apareceu com o carro e entrei batendo a porta.
— O que foi? — indagou ao me ver vermelha.
— Stella é uma insuportável!
Era uma meia verdade.
— Ela falou alguma coisa pra você? Posso voltar lá e fazê-la engolir.
— Não. Não foi nada. Esquece.
— Estes Percys se acham os donos do mundo. E Stella agora se acha também por andar com eles.
— Esquece eles. Eu já esqueci.
Claro que era uma mentira deslavada.
Mas Owen não precisava saber disso.
Como não precisava saber daquele maldito beijo.
Deus, a culpa era algo que me esmagava lentamente.
Owen parou o carro em frente a minha casa.
E talvez tenha sido a culpa dos acontecimentos recentes que me fez virar o rosto quando ele tentou me beijar.
— O que foi?
— Nada.
— Amanda, qual o problema com você?
— Nada, já falei.
— Você está estranha comigo.
— Não. É que... — “ Olha, hoje à tarde eu beijei outro cara, então estou me sentindo tão culpada, que estou achando estranho beijar você agora. ”.
— É que?...
— Estou com sono. E cansada. Estudei muito o dia inteiro.
Owen ficou me encarando, como se avaliando se podia acreditar nas minhas palavras. E uma parte minha, aquela que considerava Owen meu melhor amigo, quis contar tudo.
Mas eu sabia que era a chave para o desastre.
— Tudo bem. Não quero que ache que sou um insensível.
Forcei um sorriso.
— Não acho isso.
— Amanhã eu virei passar o dia com você, ok?
— Mas...
— Sei que tem que estudar, mas eu não me importo.
— Tudo bem.
Eu me inclinei e beijei seu rosto.
— Até amanhã.
E saí do carro.
Papai estava cochilando no sofá com a TV ligada, mas despertou quando me ouviu abrir a porta.
— E então, como foi a noite?
— Perfeita. Vou dormir, pai, estou caindo de sono.
— Boa noite, Mandy.
— Devia ir pra cama também.
— Estou assistindo jogo.
Eu ri.
— Sei...
Entrei no quarto e a primeira coisa que eu vi foram as flores. Que estavam ali porque eu achava que eram de Owen.
Mas eram de Nolan Percy.
E ver aquelas flores me fez lembrar do beijo.
E de como o mundo pareceu parar por alguns instantes, apenas para que ele me beijasse.
— Chega, Amanda — murmurei para mim mesma e irritada peguei as flores e joguei todas pela janela.
Seria ótimo se eu também pudesse jogar pela janela as minhas lembranças inconvenientes.
O dia seguinte se arrastou devagar, numa estranha calma e aparência de normalidade.
Fui à missa de manhã e enquanto meu pai pregava, fechei os olhos e pedi perdão por meus pecados. Como minha mãe, eu não acreditava em todas as coisas que a Bíblia pregava. Acho que era uma garota racional demais, mas mesmo assim, achava que tinha um poder acima de nós e que sempre era possível recorrer a ela e tentar fazer o bem para os outros e para nós mesmos. Se talvez o céu fosse uma ilusão, pelo menos poderíamos fazer a nossa parte praticando o bem. Eu acreditava em ser boa e correta aqui na Terra.
Mas o que foi que eu fiz ontem?
Eu traí Owen.
E isso me deixava péssima.
Como prometido, depois da missa, Owen passou o dia comigo. Mesmo eu tendo que estudar.
Ele ficava do meu lado, assistindo TV e tentando me beijar, aproveitando que meu pai tinha saído para pescar com o pai dele.
— Para, Owen.
— Não cansa de estudar?
— Cansar eu canso, mas preciso passar de ano.
— Já entrou na faculdade.
— De nada adiantará se não passar nessas provas.
— Está estudando Inglês? Não era Biologia?
Eu mordi os lábios, desviando o olhar.
— Perdi meu livro.
Claro que eu não tinha perdido. Eu sabia bem onde ele tinha ficado.
No barco de Nolan.
Ou seja, estava mesmo perdido pra sempre.
Não sei ainda como eu ia me virar agora. Como se já não bastasse todos os problemas que Nolan tinha me trazido.
— Vou sentir sua falta quando for para a universidade — Owen comentou de repente e eu o fitei. — Queria que pudesse ficar.
Owen sempre disse que não ia para a faculdade e que ia ficar ali, ajudando no negócio da família.
— Você sabia que eu não podia ficar, Owen.
— Eu sei. Mas mesmo assim eu queria.
Eu sorri.
— Ainda temos alguns meses.
— Sim, ainda temos.
Owen foi embora no começo da noite e minha mãe ligou e continuava eufórica quando eu contei de Yale.
— Eu sabia que ia conseguir e você com todo este pessimismo.
— Não é pessimismo, é realismo.
— Precisa acreditar mais em você! Está feliz, não é? Por que sinto que tem alguma coisa errada com você?
Oh maldito sexto sentido materno.
— Está tudo bem.
— Amanda, Amanda, qual o problema? Alguma coisa com o Owen?
— Ele está triste porque eu vou pra faculdade. — Estava ficando boa em meias verdades.
— Mas ele sabia que você ia! Se não fosse Yale seria outra.
— Pois é, mas entre a teoria e a prática...
— Amanda, não está passando pela sua cabeça alguma besteira, não é?
— Que besteira, mãe?
— Não pode nem pensar em ficar aí em Camden! Não seja como eu, pelo amor de Deus! Pense nas consequências dos seus atos!
— Mãe, está exagerando...
— Estou falando sério! Um passo impensado pode afetar toda a sua vida.
— Já me disse isso milhões de vezes.
— E vou continuar dizendo. Quero apenas o seu bem, querida. Não quero que faça algo sem pensar nas consequências e se arrependa como eu.
— Isso não vai acontecer.
— Eu confio em você.
— Que bom, mãe. Agora vou dormir. Tenho aula cedo amanhã.
— Boa noite, querida.
— Boa noite, mãe.
Dormi mal naquela noite.
Meus sonhos infestados por Nolan Percy.
E acordar e ver a chuva fina caindo não melhorava em nada meu humor.
— Amanda, por que as flores que Owen te mandou estão jogadas no jardim? — papai indagou quando desci.
— Estavam murchas — menti.
— E tinha que jogar ali?
— Eu limpo quando chegar da escola, ok?
Quando cheguei à escola, olhei meu horário de aula e respirei aliviada.
Não tinha aula de Biologia hoje. Mas meu alívio, como sempre, não durou muito.
Assim que entrei na sala de Literatura, Nolan estava lá.
Deus, por que eu estava sendo punida? Respirei fundo e me sentei bem longe dele, o ignorando completamente.
— Então, classe, hoje passaremos o vídeo de Romeu e Julieta. Por favor, não quero ouvir nenhuma conversa.
As luzes foram apagadas.
— Amanda, posso falar com você?
Quase dei um pulo ao ouvir a voz sussurrada de Nolan Percy do meu lado.
— Não.
— Mas eu quero falar com você.
— Pois eu não quero ouvir.
— Quero te pedir desculpas.
Eu o encarei.
E apesar de a sala estar escura, ainda podia ver seus olhos brilhando.
Perto. Perto demais.
— Achei que não ia pedir desculpas.
— Eu não sinto pelo beijo.
— Então do que estamos falando?
— Não deveria ter forçado uma situação.
— Acha que eu teria gostado se tivesse pedido?
— Você gostou. — Não era uma pergunta. Era uma afirmação.
— Ah! — Dei graças por a sala estar escura e ele não ver meu rosto vermelho. — Não gostei, não!
Ele riu.
E aquela risada fazia algo arranhar dentro de mim.
— Olha, Nolan, esqueça que eu existo. Não me interessa o que você acha. Eu tenho um namorado e essa sua atitude é muito inconveniente.
Antes que Nolan pudesse responder, as luzes se acenderam.
— Eu falei que não queria saber de conversa! — o professor chamou a atenção.
Eu me virei, olhando fixamente para frente e mordendo os lábios com força.
O professor apagou as luzes de novo e tentei prestar atenção no filme, mas era impossível esquecer que Nolan estava do meu lado.
Tão perto, com seu cheiro único, que adentrava em minhas narinas e intoxicava meus sentidos.
Fechei meus punhos com força, ignorando a vontade insana de tocar nele.
Com certeza, eu era a mais absurda das criaturas.
Porque eu deveria estar detestando Nolan naquele momento e não com vontade de tocar nele.
E o resto da aula foi um suplício.
Mas para minha paz de espírito, assim que a aula acabou Nolan desapareceu.
E eu não o vi mais naquele dia.
E nos dias que se seguiram eu o via apenas de longe.
E mesmo tentando ignorá-lo, sabia que seus olhos estavam sempre em mim, me seguindo. Onde quer que eu fosse.
E como se isso não fosse suficiente, ainda sonhava com ele.
Todas as noites. Era quase uma obsessão.
— E então, Amanda, estudou para a prova?
Carlton se aproximou assim que eu saí do carro.
— Prova?
— Biologia.
— Oh droga!
Em meio aos meus esforços para parar de pensar em Nolan, tinha esquecido totalmente da maldita prova de Biologia.
— Eu esqueci!
— Olha, posso te ajudar com isso.
— Como?
Ele tirou um papel de dentro do caderno.
— O que é isso?
— Cola.
— Oh... Não posso fazer isso. Sou péssima, o professor vai descobrir com certeza.
— Mas pode tentar. Nunca consigo decorar essas fórmulas malucas e isso sempre ajuda.
— Certo.
Peguei o papel da sua mão e fui para a aula.
Nolan ainda não estava ali.
E se tivesse sorte, ele teria desaparecido da face da Terra. Mas claro que eu não era uma pessoa de sorte.
E ele apareceu minutos depois.
Não era justo.
— Oi, Amanda. — Ele sentou ao meu lado.
— Oi — respondi secamente.
— Boa sorte na prova.
— Obrigada.
Se ele soubesse que tinha perdido tempo passando a tarde me ensinando...
Eu era uma fraude.
O professor entregou as folhas. Eu olhei a prova. E me apavorei, as letras dançando na minha frente.
Pensei na cola no meu bolso.
Não, não podia colar. Eu era péssima.
— Lembre-se do que eu te falei, Amanda.
A voz de Nolan era baixa do meu lado.
E estranhamente tranquilizadora. Respirei fundo várias vezes e voltei a ler a prova. Sim, nem tudo tinha se perdido, eu ainda me lembrava.
E comecei a fazer a prova.
— Posso saber o que é isso?
Levantei o olhar da prova e vi o Senhor Banner me encarando.
Com a cola de Carlton Cooper na mão.
— Caiu do bolso de alguém aqui? — indagou me encarando com o olhar acusador.
Meu rosto queimou.
E agora?
Eu estava perdida.
— É minha, Senhor Banner — Nolan respondeu.
Tanto eu quanto o Senhor Banner o fitamos incrédulos.
— A cola é minha.
— Sua, Senhor Percy? Difícil acreditar. Está acobertando alguém?
— Não, senhor. Não consegui estudar e fiz essa cola.
O Senhor Banner olhava de mim para Nolan, com certeza não acreditando naquela história.
E eu não conseguia abrir minha boca.
— Tem certeza de que é sua?
— Sim, senhor — Nolan respondeu.
— Devolva sua prova, Nolan — Nolan passou a prova para ele. — Agora saia da sala.
Nolan se levantou e saiu da sala sem falar nada.
Saí da sala após a prova ainda me sentindo zonza. Porque Nolan tinha feito aquilo? E por que eu deixei ele fazer?
Mas ainda havia um jeito. Não podia deixar Nolan levar zero por minha causa.
Na hora do intervalo ele estava na mesa habitual com Stella e Samantha.
Respirei fundo e me aproximei.
— Nolan, posso falar com você?
Ele me encarou.
— Fale.
— Em particular? — Podia sentir os olhares de Samantha e Stella em mim.
Ele se levantou e me acompanhou.
— Por que disse que a cola era sua?
— Por que você não desmentiu?
Boa pergunta!
— Não precisava ter feito aquilo. Podemos ir agora no Sr. Banner e desfazer este mal-entendido.
— Não foi um mal-entendido.
— Foi um erro. A cola não era sua. Não é justo que leve a culpa por mim.
— Não se preocupe comigo, Amanda. Provavelmente farei a prova no exame e passarei.
— Eu deveria ficar de exame e não você.
— Está feito, não vou voltar atrás.
— Por que está fazendo isso?
— Talvez porque eu queira que você não me odeie mais.
— Eu não te odeio — murmurei sem conseguir desviar meus olhos dos dele.
Verdes. Dourados. Únicos.
E todo o resto desapareceu ao meu redor.
— Nolan, convide sua amiga para a nossa festa.
A voz suave de Samantha chegou até mim.
Ela estava ao nosso lado sorrindo.
— Daremos uma festa hoje na nossa casa. Está convidada. Pode levar suas amigas.
Eu olhei e vi Ellie e Naomi nos encarando supercuriosas.
Que ótimo!
— É... eu vou ver.
E me afastei sentando na mesa com Ellie e Naomi.
— Por favor, fale que eles te convidaram para a festa — Ellie indagou ansiosa.
— Sim, está todo mundo comentando dessa festa. Dizem que a casa dos Percy é fabulosa. Eu queria tanto ir...
— Na verdade, eles me convidaram sim. E disseram que eu podia levar amigas.
As duas se entreolharam e começaram a gritar.
— Mas eu não vou.
— O quê? Está louca. Claro que vai! — Ellie insistiu.
— Não...
— Amanda, por favor, você foi convidada. Tem que ir e nos levar... — Ellie implorou.
— Não posso, Owen nem gosta do Nolan e da família dele e nem tenho certeza se os Percy gostariam que eu o levasse.
— Não precisa levar o Owen — Ellie disse.
— Ela é meu namorado!
— E daí? É só uma festa, pelo amor de Deus! A festa mais importante que essa droga de cidade já viu em muito tempo! E você não quer ir!
— Vocês não entendem...
— Amanda, por favor. Por nós — Naomi pediu e as duas ficaram me encarando com um olhar de cachorro pidão.
Oh, Deus.
Não era justo.
— Tudo bem, eu posso “dar uma passada” — fiz o sinal das aspas —, levar vocês, mas com certeza não vou ficar.
— Tenho certeza de que quando estiver lá, vai se divertir — Naomi falou animada.
— Sim, nós vamos nos divertir!
Eu duvidava muito.
Sentia meu estômago revirando.
E nem sei se era de medo. Ou de ansiedade.
Ou por estar fazendo algo escondido do meu pai e de Owen.
E nem sei para quem era pior mentir.
— Aonde vai, Amanda? — meu pai indagou da sala. — Vai sair com Owen?
— Não. Vou sair com Naomi e Ellie.
— Não esqueça que tem hora para chegar, hein?
— Claro, pai.
Óbvio que eu voltaria logo.
Iria apenas levar Ellie e Naomi. E assim que possível desaparecia de lá. Festa na casa de Nolan não era minha definição de diversão.
Na minha mente isso só poderia ser chamado de confusão.
Melhor mesmo que eu não tivesse contado a Owen, quando ele ligou à tarde.
— Vamos fazer alguma coisa hoje à noite?
— Eu vou ao cinema com Naomi e Ellie.
— Tudo bem, Keith e Stu me convidaram para dar uma volta.
— Noite de garotos, hein? — brinquei.
— Preferia estar com você.
— Divirta-se.
Eu me senti uma fraude por mentir tão descaradamente.
Mas Owen já mostrara que não ia com a cara de Nolan. Melhor não dizer nada mesmo. E não ia acontecer nada demais. Era apenas uma festa. Que eu só estava indo por causa de Naomi e Ellie.
— Você vai assim? — Ellie indagou horrorizada para meu jeans e suéter normal quando entrou no carro.
— Falei que vou apenas ficar um pouco lá — desconversei.
— Só você mesmo, Amanda! — Naomi riu retocando o batom.
As duas pareciam que iam a uma festa na boate mais badalada do mundo.
— Eu que não ia querer parecer desarrumada na frente de Stella e Samantha — Ellie comentou e eu me arrependi um pouco de não ter me arrumado mais.
Mas agora era tarde.
Estacionei na frente da enorme casa da família de Nolan minutos depois.
— Uau — Ellie exclamou.
A mansão era mesmo um espetáculo de cair o queixo.
— Achei que eles moravam na casa da Helena Carter — comentei.
Eu havia ido a uma festinha quando criança na casa de Samantha quando o pai dela ainda era vivo e a casa dela era uma das mais bonitas da cidade.
— Quando o Sr. Percy e a Helena se casaram, eles compraram essa casa e reformaram. Ouvi dizer que eles queriam mais privacidade.
Realmente a casa era no meio de uma vasta vegetação nativa e não havia vizinhos.
— Ainda acho estranho um cara rico da cidade se mudar pra cá. Não faria mais sentido a Samantha e a mãe se mudarem?
— Vai ver a Doutora Helena não queria deixar o trabalho no hospital — Naomi comentou.
— Tem hospital em todo lugar.
— Quer saber o que dizem. — Ellie abaixou a voz enquanto nos aproximávamos da porta da casa toda iluminada. — Que Theodore Percy queria tirar os filhos da cidade...
— Como assim?
— Então, parece que Nolan e Jace eram bem rebeldes, ou algo assim. E que não foi à toa que ele trouxe os filhos para cá. Parece que eles estavam causando problemas...
— Mas Jace não está na faculdade.
— Não está mais! Ele desistiu porque ia bombar , só vai voltar no próximo ano quando Nolan for para a faculdade.
— Ellie, como sabe dessa história de Nolan e Jace? Está inventando? — Naomi indagou.
— Não! O irmão de Carlton é médico no hospital e tem contato com a Doutora Helena, e parece que ela deixou escapar algumas coisas.
— Que tipo de problema eles causaram? — indaguei intrigada.
Será verdade?
— Não faço ideia! Mas se Nolan ou Jace quisessem me causar problemas, eu não me importaria!
As duas riram.
— Pare de ser má, Ellie. Não estava gostando do Carlton? — Naomi a repreendeu enquanto entramos na casa.
Já havia muita gente ali. Alguns eu conhecia do colégio e outras pessoas eu nunca tinha visto.
— Eles com certeza sabem dar uma festa — Naomi comentou de boca aberta.
E eu tinha que concordar.
A casa dos Percy era fabulosa por dentro. Muito elegante e moderna.
Um garçom passou servindo bebidas e uma taça foi passada para minha mão.
— Isso não é alcoólico? — indaguei e elas riram.
— E daí? Estamos na casa dos Percy, Amanda. Temos que experimentar tudo.
— Olha, não é o Carlton? — Naomi exclamou e nós vimos Carlton Cooper. — Como ele conseguiu ser convidado?
— Eu não sei, mas é minha chance com ele, vamos! — Ela saiu puxando Naomi.
Eu fiquei onde estava.
Sentindo-me superdeslocada. Com meu jeans e suéter velho.
E uma taça de sabe Deus o que nas mãos.
— Olha se não é a filha do pastor!
A voz irritante de Stella chegou até mim com um risinho.
Eu a encarei e hoje ela estava ainda mais linda. Com um vestido preto e justo.
Como se precisasse de mais alguma coisa para ser perfeita.
E mais do que nunca, eu me senti inadequada naquele lugar e cheia de ressentimento por minha melhor amiga ter se transformado naquele ser fútil que me odiava.
— Oi, Stella — balbuciei e bebi o conteúdo da minha taça, que desceu queimando por minha garganta. — Por que está falando comigo agora?
— Estou curiosa por ter vindo. Achei que não frequentava esses ambientes e ainda por cima bebendo! O Pastor Gavin sabe?
— Acho que o que eu faço não é mais da sua conta. Não somos mais amigas.
— Não somos mesmo.
— Por quê? — Eu não resisti em perguntar. — Por que parou de falar comigo, por que me detesta agora, o que eu te fiz?
— Talvez eu tenha cansado de andar com alguém como você. Sempre a filhinha perfeita. A namoradinha inocente e intocável que todos têm que preservar.
— Do que está falando?
— E não é assim? Não é como Owen te trata, como um bibelô intocável? E parece que ele é um trouxa mesmo, né? Se está aqui, eu aposto que não pôde evitar estar caída pelo Nolan.
— Não é verdade!
Ela continuou me medindo.
— O que é que eles veem em você, hein? — murmurou como se para si mesma. — Uma virgem sem graça!
E antes que eu pudesse revidar, Samantha apareceu.
— Amanda, você veio! — Ela me abraçou efusivamente e acho que já estava bêbada.
— Sim, eu vim — murmurei.
— Não deixe Stella te perturbar!
— Ela não está perturbando... — menti, mas sentia-me mais que perturbada. Estava arrasada e triste.
Stella deu uma risadinha e se afastou.
— Fique à vontade, Amanda, e divirta-se. Preciso ver se está tudo bem na cozinha, mas voltarei para conversarmos. Acho que podemos ser grandes amigas, o que acha?
Ela se afastou saltitando.
Eu fiquei ali, aturdida.
Outro garçom passou e eu peguei outra taça. Onde se meteram Naomi e Ellie? Era melhor eu ir embora. Estava me sentindo muito mal pelo confronto com Stella.
E pelo menos tive a sorte de não encontrar Nolan Percy. Embora, lá no fundo eu soubesse, enquanto percorria a casa cheia de gente, ouvindo a batida da música, que procurava encontrar seu olhar dourado em algum lugar.
E lá estava ele.
Eu o vi do outro lado da sala.
Havia pelo menos umas quatro garotas a sua volta.
E todas procuravam chamar a sua atenção, como abelhas em volta do mel.
Deslumbradas.
E eu podia sentir que cada garota naquela sala, esperava sua vez de se aproximar dele.
E quem sabe ser a única para Nolan Percy.
Era decididamente nojento.
E eu me virei para ir embora dali, mas topei com alguém.
— Me desculpe.
Levantei o olhar e um rapaz negro bonito estava sorrindo pra mim.
— Tudo bem, está fugindo?
— Não! — Tentei rir. — Na verdade, sim... não sei.
— Parece meio aturdida, por que não bebe alguma coisa?
Ele pegou um copo do garçom e me passou. Bebi todo o conteúdo de um só gole.
Já nem queimava na minha garganta.
— Cuidado, isso não é água.
Eu ri.
— Acho que não fomos apresentados direito, sou Austin. Namorado da Samantha.
— Muito prazer, Austin. Acho que nunca te vi no colégio.
— Não sou da cidade. Sou de Nova York.
— Eu cuido disso agora, Austin.
Nem precisei virar para saber de quem era aquela voz.
Mas mesmo assim eu me virei e me deparei com os olhos de Nolan Percy em mim.
Capítulo 6
Austin soltou minha mão e se afastou.
— Achei que não viria — Nolan disse.
— Não deveria mesmo ter vindo.
— Então por que está aqui?
— Por que não está com suas amigas? Me pareceu bem distraído.
Ele riu.
— Prefiro estar com você.
Desviei o olhar.
Sinceramente, não dava pra ficar olhando pra ele, quando me encarava daquele jeito.
Porque eu não conseguia respirar direito.
Um garçom passou e peguei um copo de um líquido âmbar.
— Tem certeza de que sabe beber isso? — ele indagou divertido.
E eu fiquei irritada.
— Claro que sim. Não sou tão simplória assim.
— Não disse isso.
Dei de ombros e acabei de beber o conteúdo do copo que desceu fervendo pela minha garganta. Mas não queria parecer boba na frente de Nolan.
— Por que veio, Amanda?
Sua voz chegou bem suave até mim.
Persuasivamente doce.
— Porque Ellie e Naomi insistiram. E, aliás, preciso achá-las e avisar que estou indo embora.
E colocando o copo vazio no primeiro móvel que encontrei, saí procurando.
Nolan me seguiu.
— Por que não fica?
— Não posso.
— Por que não?
Eu continuei a andar.
Sim, qual era mesmo a resposta?
Que Owen não sabia que eu estava ali? Que meu pai também não?
Que eu não queria estar numa festa na casa dele, por que não conseguia lidar direito com o que me fazia sentir?
Eram coisas demais e senti minha cabeça rodando.
Parei, me sentindo tonta e olhei em volta. Percebi que estava num corredor longe da agitação da festa.
— Oh, acho que me perdi...
Nolan riu.
— Está comigo, não está perdida.
— De onde vem essa música?
Por cima da música agitada da festa, eu ouvia claramente uma música clássica.
— Acho que é do meu quarto.
Ele abriu uma porta e entrou.
Eu o segui.
— Esqueci o som ligado — ele disse.
— Oh... Este é seu quarto — murmurei olhando em volta.
Não sei o que tinha imaginado para o quarto de Nolan Percy, mas era mais austero do que poderia deduzir de um quarto de garoto rico. Quer dizer, acho que nunca estive no quarto de um garoto antes. Nem de Owen. Então o que eu podia saber?
O quarto de Nolan tinha grandes janelas que davam para o jardim, uma cama grande que poderia dormir umas cinco pessoas e uma estante com livros em um canto.
Nolan tinha livros. Não consegui me conter e me aproximei.
Eram histórias em quadrinhos. E alguns livros sobre desenho.
Desenho?
— Por que tem um monte de livro sobre desenho?
— Por que é tão curiosa?
Rolei os olhos e deixei meu olhar correr pela estante. Agora havia muitos CDs. Quem ainda escutava CD? A maioria era bandas de rock, muitas antigas das quais eu apenas ouvi falar, mas tinha alguns clássicos, como o que escutava agora.
Nolan Percy gostava de música clássica? Como assim?
— Você ouve música clássica. — Não era uma pergunta. E ele estava sorrindo indulgente quando me virei. — Quão bizarro é isso?
— Quer dançar comigo? — De repente ele estava vindo na minha direção..
— Eu não sei dançar. — Ri bobamente e achei estranho minha língua estar pesada. E minha mente leve.
Ele ignorou meu comentário e sem que eu soubesse como, estava me puxando pela cintura.
— Mas eu sei.
E então, sabe Deus por que, eu estava dançando com Nolan Percy em seu quarto.
Acho que estava ficando definitivamente bêbada.
Eu estava bêbada
Sim, só isso explicava o fato de eu estar dançando com Nolan.
Seus olhos verdes com reflexos dourados fixos nos meus, sua mão presa na minha cintura enquanto a outra segurava meus dedos.
Seu corpo roçava no meu, num suave movimento, com a música.
Estremeci, um arrepio transpassando minha espinha e subi minha mão para tocar sua nuca, me aproximando ainda mais.
O arrepio na minha espinha agora se espalhava por todo meu corpo.
E foi como derreter ao sol. Como naquele dia no mar.
— Então é aqui que se esconderam.
Dei um pulo para trás me desvencilhando de Nolan ao ouvir a voz de Samantha.
Ela entrou no quarto sorrindo.
— Nolan, por que a está escondendo aqui? — brincou.
Mas Nolan não sorria. Encarava Samantha como se quisesse matá-la.
— Vem, Amanda. — Ela me puxou pela mão. — Vamos nos divertir!
E ela saiu me puxando até a sala.
Eu me sentia mais zonza do que nunca.
Outro copo foi colocado na minha mão.
Olhei para um lado e vi Ellie beijando Carlton num canto.
Naomi tinha desaparecido. Samantha me levou para o meio da pista.
Mas eu me sentia tonta demais.
— Samantha, desculpa, preciso ir...
— Ainda está cedo...
— Não, me desculpa...
Saí cambaleando da casa e tentei achar as chaves do meu carro.
— Não vai dirigir assim, Amanda — Nolan falou atrás de mim.
Eu ri, era fácil rir e nem sabia por quê.
— Preciso ir embora...
— Eu te levo então.
Ele abriu a porta de passageiros e me ajudou a entrar, sentando no banco do motorista.
Comecei a rir mais.
— O que é engraçado?
— Você, o perfeito Nolan Percy dirigindo meu carro velho.
Ele sorriu.
— Você está bêbada, Amanda.
— Acho que estou — murmurei.
Saltei do carro assim que chegamos em frente a minha casa.
— Meu pai vai me matar — murmurei rindo.
Ainda podia ouvir o barulho da TV na sala. Se ele me visse chegar bêbada, estava perdida.
— Sabe o que eu podia fazer? Podia entrar pela janela! — De repente parecia uma grande ideia.
— Podia quebrar o pescoço assim — Nolan falou.
Mas eu já me encaminhava para a árvore.
— Você fez parecer muito fácil.
— Amanda, saia daí...
Eu ri e continuei a subir.
Nolan subiu atrás e me segurou quando eu escorreguei.
Eu ri.
Nolan me ajudou a subir na janela e pulei para dentro, com ele me segurando antes que eu fosse ao chão.
— Ops! — murmurei rindo.
Ele riu também e não me soltou.
Levantei o olhar.
E ele estava muito perto.
E pareceu muito natural que eu ficasse na ponta dos pés e o beijasse.
As mãos em volta de mim me apertaram mais.
E eu gemi.
Algo despertando dentro de mim.
Algo que eu não conseguia segurar.
Ou parar.
Mas tinha a ver com Nolan Percy.
E seu hálito doce contra minha língua. Suas mãos queimando através de minhas roupas.
E seu corpo grudado no meu.
E nada daquilo era suficiente.
Eu precisava de mais.
E o encarei, ofegante. Trêmula.
E eu soube o que era.
Era o mais puro e intenso desejo.
— Então essa é a verdadeira Amanda? — ele murmurou contra meus lábios.
— Como assim?
— A Amanda divertida, que ri fazendo bobagens. Que me beija como me beijou.
— Talvez seja...
— Eu gosto dessa Amanda.
— Acho que ela só aparece quando está com você.
— Isso é ruim?
— Isso é péssimo. Mas acho que gosto dela também. A Amanda do Nolan.
E então Nolan Percy estava me beijando de novo.
E de novo. E de novo.
E sem saber como, eu estava na minha cama.
Com o corpo perfeito de Nolan sobre o meu.
Capítulo 7
De algum recanto escondido de minha mente confusa e alcoolizada eu tinha essa consciência. Que a boca sobre a minha, doce, quente, úmida, era a de Nolan.
Mas era uma parte bem pequena da minha consciência, porque eu estava além de qualquer pensamento coerente.
Era como se tudo se resumisse às sensações.
Deus, quantas mãos ele tinha? Parecia que estavam por toda parte, por cima da minha roupa. Quando ele tocou meu rosto, eu tinha me perguntado o que sentiria se aqueles dedos estivessem em outras partes do meu corpo.
Agora eu sabia. Era como se houvesse brasa e me queimava.
Mas era bom. Deliciosamente intoxicante. Como seu cheiro, que aspirei, inebriada, como seu gosto, que eu sentia em minha língua.
Gemidos trêmulos e inéditos escapavam dos meus lábios, enquanto eu passava minha perna por seu quadril, e foi a vez dele gemer, a boca se apartando da minha para traçar um caminho por meu rosto, meu queixo, meu pescoço.
Meus dedos torciam seus cabelos e eu o trazia ainda para mais perto, mas não era mais suficiente.
Precisava desesperadamente de mais. Algo doía dentro de mim. Muito.
Então, levei minhas mãos até a barra da sua camisa e a tirei. Nolan usava apenas uma camiseta branca e eu a tirei também. Meus dedos espalmaram em seu peito e seu coração batia no mesmo ritmo que o meu.
Nossos olhares se encontraram por um instante.
E eu vi a mesma fome que havia em mim.
Sim, ele sentia o mesmo.
O rico, lindo, perfeito Nolan Percy estava ali comigo.
E ele queria o mesmo que eu.
Talvez querer não fosse a palavra certa.
Necessitar. Desejar. Precisar.
Era algo além de qualquer razão.
Meu corpo estava tremendo. Ardendo.
Desejando.
Ele levantou a mão e seus dedos tocaram meus lábios.
Eu ofeguei, perdida.
Algo se enroscando dentro de mim, começando na boca do meu estômago e descendo para meu baixo ventre e mais além.
E sem pensar eu me apertei mais contra ele, nossos quadris se buscando e arquejei.
Era isso. Fechei os olhos, deixando a pura onda de desejo me traspassar.
— Amanda... — Sua voz era como música.
Eu não sei se ele me chamou, ou me avisou de algo. Ou apenas disse meu nome como eu queria dizer o dele.
Eu queria apenas que ele não parasse nunca de fazer o que estava fazendo. Senão eu morreria.
E voltei a beijá-lo. Com uma fome redobrada.
Agora não tinha volta. E quem queria voltar?
Eu não era mais quem eu sempre fui.
A filha do pastor. A virgem sem graça.
Eu era a Amanda do Nolan.
Nolan gemeu roucamente me beijando de volta e lá estavam aqueles dedos por baixo da minha blusa, subindo e tocando meus seios.
E eu parei de beijá-lo e tirei a minha própria blusa de qualquer jeito e seus dedos buscaram meu sutiã.
E quando ele me olhou, era como se eu fosse algo de comer e isso me deixou ainda mais perdida.
E ele não se limitou a olhar, abaixou a cabeça e os beijou.
Mordi os lábios, para não gritar, sentindo a língua quente umidificar minha pele. E naquele momento eu realmente me sentia toda úmida.
Meus dedos se crisparam sobre o lençol enquanto seus lábios desciam por meu estômago, minha cintura, meu umbigo.
E suas mãos em meu jeans, me desfazendo dele.
Acho que fui eu que fiz a mesma coisa com os dele.
E foi tudo tão rápido que não tinha mais certeza de nada. Tudo passava como um borrão sob minhas pálpebras fechadas. Meu coração parecia que ia saltar pela boca de tanto que batia e toda minha pele queimava em contato com a pele de Nolan. Era como se houvesse faíscas e deixei minha cabeça de mente enevoada pender para trás. Eu apenas sabia que tinha que chegar a algum lugar e rápido.
E foi por puro instinto que abri as pernas, quando ele veio, nu e lindo, a pele brilhando com uma camada fina de suor. E prendi a respiração quando o senti escorregando para dentro de mim.
Doeu um pouco e eu gemi, mas nem tanto pela dor.
Era como se sentir completa pela primeira vez na vida.
E abri os olhos, para encontrar os dele presos nos meus, verdes, dourados, intensos.
Nolan se moveu dentro de mim.
E qualquer vínculo que eu ainda poderia ter com a realidade se desfez naquele momento. Eu existia apenas para me mover com ele, para ele. Nossos corpos achando juntos um ritmo, num encaixe perfeito.
Deslizei para uma doce inconsciência enquanto seus dedos se entrelaçaram nos meus sobre o lençol e seus gemidos ecoavam com os meus pelo quarto. Até não restar nada a não ser um prazer que eu nem sabia que existia. Que nem sabia nomear.
E se houvesse um nome com certeza seria.
— Nolan... — Seu nome escapou dos meus lábios enquanto eu me desfazia embaixo dele, e ouvi meu nome dentro do meu ouvido, vindo de sua voz perfeita, no momento em que ele sentiu o mesmo que eu.
Era isso.
Eu tinha transado com Nolan Percy.
E nada mais seria o mesmo.
Eu não era mais a mesma.
Acordei com uma dor de cabeça horrível.
Abri os olhos e a claridade quase me cegou.
Soltei um gemido fraco, sentindo minha cabeça latejar e fechei os olhos de novo, me movendo.
E meu corpo doeu.
Em lugares que eu nem sabia que podiam doer.
E a realidade bateu como um chicote.
Não conseguia mais respirar quando abri os olhos.
Eu o procurei.
Estava sozinha.
Voltei a respirar devagar.
Tentando conter meu pânico. Mas as lembranças iam e voltavam como uma enxurrada, inundando meu rosto de vermelho.
Vergonha. Culpa. Horror.
Eu estava em choque.
Não, não era fruto da minha imaginação.
Eu ainda estava nua para provar.
Tinha mesmo acontecido. Eu tinha transado com Nolan.
— O que foi que eu fiz? — murmurei para mim mesma aterrorizada.
Eu estava bêbada. Era a primeira coisa que me vinha à mente.
Sim, todo mundo sabia que pessoas bêbadas faziam bobagens.
Mas essa já era demais.
Que diabos eu tinha deixado ele entrar no meu quarto comigo?
Agora era tarde.
Não havia volta para o que eu tinha feito.
— Amanda, está acordada?
As palavras do meu pai seguidas de uma batida na porta me tiraram do torpor.
E olhei para os lados para ter certeza de que estava sozinha.
— Estou... estou me trocando — gaguejei.
— Ok, já é tarde! E está sol. Achei que gostaria de aproveitar o dia.
— Certo, já vou descer.
Senti alívio quando seus passos se afastaram pelo corredor e me levantei.
Corri para o banheiro e tomei um banho, tentando não pensar.
Mas era difícil.
Eu me vesti rapidamente e desci, ignorando minha cabeça latejando.
— Até que enfim. — Papai estava na mesa do café. — Vou sair para pescar com Bob. Owen está vindo junto. Podiam sair e fazer algum passeio. Sei que sente falta do sol.
Eu olhei pela janela. Sim, estava sol.
Mas nem isso fazia meu estado de espírito melhorar.
Owen estava vindo. Como é que eu podia encará-lo agora?
Com o coração apertado, ouvi o barulho do seu carro se aproximando.
Da mesa da cozinha, escutei papai recebendo Bob e Owen.
— Amanda está na cozinha, acho que não acordou muito bem. Deviam sair e fazer um passeio.
— Sim, eu vou falar com ela.
O carro de papai se afastou e Owen entrou na cozinha.
— Bom dia!
Ele sorriu radiante. E eu só tinha vontade de sair correndo e não encará-lo.
— Oi, Owen — consegui falar com a voz tensa.
Seu sorriso se desfez.
— O que você tem? — Ele tocou meus cabelos e eu me levantei me afastando.
— Dor de cabeça.
— Como foi ontem com Naomi e Ellie?
— Nós... bebemos um pouquinho. — Senti meu rosto queimar com a mentira. — Na verdade, um pouco além da conta.
— Eu sabia que essas suas amigas não eram boas companhias, Amanda. Seu pai sabe que bebeu?
— Não seja ridículo, Owen. Ninguém me obrigou a beber.
— Por isso está com dor de cabeça? Ressaca?
— Deve ser.
— Tome um comprimido.
— Sim, vou tomar.
— E aí, ainda quer sair? Se estiver mesmo mal podemos ficar por aqui... Aliás, talvez seja uma boa ideia ficarmos por aqui... — Ele se aproximou, e eu virei o rosto.
— Owen, estou enjoada.
— Oh, me desculpe. — Ele se afastou. — Melhor não sair, não é?
— Não! — De repente eu queria mesmo sair dali. — Vamos dar uma volta.
Subi correndo para meu quarto e coloquei uma roupa.
Nós entramos no meu carro e dirigi para a praia em que Owen morava com a família. Meu estômago se contraiu de nervoso enquanto caminhávamos de mãos dadas pela praia.
E não conseguia parar de pensar no que aconteceu.
Por quê? Por que eu deixei acontecer?
Por que estava bêbada?
Então se fosse Carlton Cooper que me levasse pra casa e me beijasse eu também transaria com ele?
Não. Minha consciência fala claramente.
Não era porque eu estava bêbada.
Era ele. Nolan Percy.
Senti vontade de chorar as implicações. Estava mais perdida do que imaginava.
Eu parei e encarei Owen.
— Owen, precisamos conversar.
— Sim?
— Acho que devemos terminar.
Owen ficou confuso.
— O quê?
Soltei sua mão.
Agora que eu disse as palavras, tinha que ir até o fim.
Eu não sabia o que estava fazendo ontem. Mas agora eu sabia.
Pelo menos uma coisa eu tinha que fazer certo. E não era nada justo com Owen o modo que eu estava agindo.
— Acho que devemos terminar este namoro.
— Amanda... Não! — Sua voz é carregada de descrença.
— É o melhor a ser feito.
— Por que está falando isso? Por que está querendo terminar? Não tem sentido!
E se eu contasse a ele. Contasse a verdade?
Ele ia me odiar. Eu não suportaria Owen me odiando.
E a verdade iria doer nele. Iria magoá-lo. Não queria fazer Owen sofrer mais do que eu já estava fazendo.
— Não está dando certo. Nós somos amigos e...
— Eu amo você! Achei que me amasse também!
— Talvez a gente tenha se precipitado.
— Estamos juntos há um ano!
— Estou indo embora, Owen! Daqui a alguns meses eu vou pra universidade.
— Eu falei que ia te esperar!
— Não quero que espere. Quero que viva sua vida.
— Não, não vou aceitar isso.
— Já tomei minha decisão. Eu sinto muito.
Sua mão segurou meu braço.
— É porque eu meio que dei a entender que queria... transar?
Desviei o olhar e ele entendeu errado.
— Amanda, eu quero você. Eu te amo, mas nunca te forçaria a nada. Eu só queria... que tivéssemos mais intimidade. Não precisamos transar. Eu sei que sendo filha do Gavin, você queira ficar virgem até nos casarmos.
Ai meu Deus.
— Owen, não é sobre isso... Eu sei que nunca me forçaria a nada.
Mas Nolan Percy não teve a mesma consideração, pensei com desgosto.
Se é que eu podia culpá-lo totalmente.
— Amanda, por favor, eu te imploro...
Senti meus olhos ardendo de vontade de chorar.
— Eu preciso ir...
Corri para o carro e dei partida. Meus olhos embaçados pelas lágrimas.
Mas estava aliviada, apesar da dor. Owen não merecia o que eu fiz. Se ele descobrir um dia, com certeza me odiará.
E agora, o que eu ia fazer?
Dirigi achando que estava sem destino, mas quando dei por mim estava em frente à suntuosa casa dos Percys.
Saí do carro, admirando a mansão imponente.
Perfeita. Como seus moradores.
Respirei fundo.
E o que eu diria a Nolan agora que estava ali?
Não fazia ideia, mas com certeza tínhamos muito a conversar.
Por que ele foi embora, afinal, sem ao menos uma palavra?
Caminhei até a porta me sentindo nervosa e toquei a campainha.
E quem apareceu foi Stella.
— Oh... Olha quem está aqui. A filhinha do pastor! — Seu sorriso era insuportável.
— Nolan está?
— Nolan viajou.
— Oh. — Tentei conter o meu desapontamento e minha confusão.
Como assim viajou? Para onde? Quando?
— Me desculpe, eu... — balbuciei confusa e me virei para me afastar, mas ouvi as palavras de Stella atrás de mim.
— Oh Meu Deus, ele conseguiu, não é?
Eu me virei.
— O quê?
Ela sorria, entre incrédula e divertida.
— Levar você para a cama!
Eu senti o chão fugir aos meus pés.
Do que ela estava falando? Como ela podia saber?...
Talvez meu rosto vermelho tenha me denunciado.
Stella deu alguns passos em minha direção e agora ria abertamente.
— Ah, a santinha e intocável! Jace vai ficar muito bravo por ter perdido o Jeep.
— Olha, não sei do que está falando...
— Claro que não, pobre inocente! Se bem que agora não tão inocente assim.
A palavra inocente em sua boca pareceu algo bem horrível naquele momento.
— Você era uma aposta. Nolan apostou com Jace que ia te levar pra cama. E ganhou o Jeep do Jace. E se ele não conseguisse, Jace ganharia o carro do Nolan.
Capítulo 8
Não.
Eu não estava ouvindo aquilo.
Aquele absurdo.
Simplesmente não era algo possível.
Aposta? Nolan apostou com o irmão que ia transar comigo?!
Eu sentia o sangue zunindo em meu ouvido.
— Homens e carros! Quem vai entendê-los? — Stella continuou com desprezo. — E eu ainda disse que duvidava que Nolan fosse conseguir, que você era tão santinha que não transava nem com seu namorado! Que provavelmente iria ficar virgem até se casar com algum idiota, como o Owen, que come na sua mão. Mas eu me enganei mesmo. É tão putinha como todas nós.
— Está mentido — murmurei horrorizada.
— Não estou não. Pode perguntar para o Nolan quando ele voltar ou ao Jace! Oh... Não vai me dizer que achou que o Nolan estava apaixonado por você ou algo assim? — Ela riu como se só este pensamento fosse a coisa mais absurda do mundo, e eu começava a perceber que talvez realmente fosse. — Claro, ele deve ter sido um ótimo ator, fingindo que era um cara legal pra conseguir sua confiança não foi? Por que por mais que o Nolan seja lindo, eu aposto que você fugiria correndo se ele mostrasse quem ele é de verdade! Provavelmente você não faz ideia de quem ele seja. E, sinceramente, acho que vou fazer uma caridade e abrir seus olhos. É melhor eu te avisar, embora nem saiba porque você mereça alguma consideração. Nolan é uma bagunça! Uma linda bagunça, claro. Mas não vale esse olhar magoado que está expressando agora. E acho que tem até sorte de ter sido pra ele só uma conquista. Um desafio para ele sair do tédio que é essa cidade para um cara como ele. E se está duvidando, ele é tão escroto, que tem uma namorada. O nome dela é Ashley. Ela mora em Nova York. A família dela é podre de rica, como os Percy. Ele sempre viaja para encontrá-la e neste momento está passando o fim de semana com ela. — Stella ri. — Sim, filho da puta, né?
Oh, Meu Deus.
Eu tentava processar as palavras horríveis de Stella.
Namorada.
Nolan tinha uma namorada.
Lembrava das palavras de Ellie e Naomi. Ele nunca namorou ninguém da cidade.
E eu disse, não foi? Um cara como aquele tinha que ter uma namorada.
Comecei a sentir vertigem.
— Então, para o seu bem, melhor que não tenha se apaixonado por ele. Porque você vai sofrer. Aceite como um conselho de amiga!
Eu a encarei.
Aquele sorriso irônico no rosto perfeito.
E não consegui mais permanecer ali.
— Não é mais minha amiga!
Dando meia-volta, entrei no carro e dei partida. Eu só parei quando estava bem longe.
Não conseguia respirar. Mas forcei o ar a sair dos meus pulmões.
Doía. Doía tudo por dentro.
Nolan Percy tinha me enganado o tempo inteiro.
Uma aposta.
Claro. Fazia sentido.
O lindo, perfeito e rico Nolan Percy. Óbvio que não ia se interessar por alguém tão comum como eu. Era tudo um jogo. Nojento.
E eu caí.
Tinha transado com ele.
Eu me sentia suja agora.
Não sei como consegui chegar até minha casa.
Dando graças a Deus que meu pai estava pescando com Bob e só voltaria à noite.
Passei direto para meu quarto e me deitei sob as cobertas.
E deixei as lágrimas caírem.
Eu me sentia a pessoa mais idiota do mundo. Porque em algum momento entre a hora em que ele apareceu para me ajudar naquela estrada e a noite passada, eu tinha começado a acreditar que Nolan pudesse mesmo estar interessado em mim.
Mas claro que foi um engano.
Não. Eu fui enganada. Pura e simplesmente.
Para satisfazer o ego de um garoto mimado. Sim, era isso que Nolan Percy era. Rico? Lindo? Sim, podia ser. Mas perfeito? Estava longe de ser.
Eu devia ter enxergado. E ter sido mais esperta. Mas não. Eu me deixei levar. Por sua voz macia, seus olhos dourados. Sempre me cercando, me fazendo acreditar no impossível. E eu fui uma aposta. Por um carro.
Um maldito Jeep.
Ele devia estar rindo agora. Enquanto estava em algum lugar de Nova York com a namorada.
Apertei os olhos com força, tentando não chorar mais.
Mas era impossível. Eu me sentia enganada.
E o pior de tudo.
Eu me sentia quebrada em mil pedaços por dentro.
Nolan Percy me quebrou.
Oh Deus, que não queria pensar no jeito em que eu fui tonta e transei com ele. E ainda tinha Owen.
Eu traí Owen e pra quê?
Agora eu não tinha nada. Nada.
Eu me levantei ao cair da noite e tentei agir normalmente.
Lavei o rosto e desci para fazer o jantar para meu pai.
Alegando sono, subi pro meu quarto e tentei dormir. Mas só tive vários pesadelos envolvendo Nolan.
Acordei tarde na manhã seguinte e o sol tinha desaparecido.
Finalmente desci e limpei a porcaria das flores do chão.
Não queria nada para me lembrar que Nolan Percy existia.
Depois do almoço, Naomi ligou e perguntou se eu queria ir ao cinema com ela e Ellie. Não, eu não queria ir para lugar algum, mas do que ia adiantar?
Meu pai já estava me olhando esquisito e não ia demorar para perguntar do Owen. E eu ainda não tinha falado que rompemos.
Não queria responder nenhuma pergunta.
— Tudo bem, Naomi, eu passo para pegar vocês.
Uma hora depois nós estávamos na cidade.
Ellie tagarelava sobre Carlton e como ela queria que as ficadas deles se transformassem em namoro e em como ele parecia não querer o mesmo que ela quando Naomi me cutucou.
— Olha, Nolan Percy!
Eu olhei automaticamente e vi o Jeep de Jace parado no farol.
Mas não era Jace quem dirigia, e sim Nolan. Ao lado dele, estava Samantha.
Eu tive vontade de vomitar.
O sinal abriu e eles desapareceram na estrada.
— Uau, como ele é lindo. — Ellie babou.
— E aí, nunca mais se falaram? — Naomi indagou curiosa.
Não sei se percebeu a minha palidez.
— Não, nunca mais, vamos entrar? — indaguei as puxando para dentro do cinema.
Se me perguntassem que filme era, não saberia dizer. Respirei aliviada quando as deixei em casa e fui embora. Mas meu alívio durou pouco. Porque encontrei Owen sentado na minha cama.
— O que faz aqui?
— Podemos conversar?
— Owen...
— Por favor, Amanda.
— Tudo bem. Como meu pai deixou você entrar no meu quarto?
Ele ficou vermelho.
— Entrei pela janela. Fiquei com medo de você não me receber.
Eu tirei o casaco e o encarei.
— Que bobagem, Owen.
— Eu vim insistir. Implorar se for preciso. Por favor, volte comigo.
Desviei o olhar, me senti péssima e fui até a janela.
Então paralisei. Havia um Jeep estacionado do outro lado da rua da minha casa.
Meu estômago retorceu. O que Nolan estava fazendo na minha casa?
Eu vi o carro de Owen mais pra frente. Era por isso que Nolan não saiu do carro? Por que sabia que Owen estava ali?
O que será que veio fazer na minha casa?
Veio em busca de mais um pouco do que tivera na sexta-feira?
Vamos enganar mais um pouco a filha do pastor?
Senti um ódio frio por dentro. Uma raiva insana por tudo o que ele tinha feito.
Se eu o confrontasse, será que diria a verdade? Ou mentiria na cara de pau? Talvez nem se importasse em dizer que foi mesmo uma aposta.
Provavelmente nem se importava com a minha opinião sobre ele.
Senti algo gelado se fechar em volta do meu coração.
Naquele momento, eu odiava Nolan Percy.
— Amanda.
Estremeci de susto ao sentir as mãos de Owen no meu ombro.
E me virei.
E o beijei.
Owen ficou surpreso e me afastou um pouco me encarando.
— Então a gente vai voltar?
— Sim, Owen, vamos voltar.
— Amanda! — Ele sorriu, feliz e me abraçou.
Eu me afastei e o encarei e levei a mão dele ao meu seio.
— Acho que devemos... ir além.
Ele parecia confuso e surpreso, mas sorriu.
— Tem certeza? — Ele não esperou resposta e começou a me beijar. Meu rosto, minha boca, meu pescoço. Eu olhei por sobre a janela.
Nolan Percy ainda estava lá.
E seu olhar de gelo me observava com Owen.
Eu me afastei o suficiente para tirar a minha blusa e Owen voltou a me beijar.
Ainda lancei um último olhar para a janela antes de Owen me levar para a cama.
Fechei os olhos.
Devia deixar acontecer.
Devia mesmo. Mas não consegui.
— Owen, para.
Eu o afastei.
Owen ficou confuso e frustrado.
— O que foi? Achei que você também queria?...
— Me desculpe...
— Tudo bem, eu amo você, eu posso esperar para que esteja pronta. O tempo que for. Mesmo que seja quando nos casarmos. Você é preciosa demais, Amanda. Eu sempre vou preservar você.
Eu tentei sorrir. Mas comecei a chorar.
Se ele soubesse...
Owen me abraçou.
Deixei que me abraçasse e fechei os olhos.
E rezei para que tudo voltasse a ficar bem.
Acordei desorientada.
A luz fria da manhã entrava pela minha janela aberta. Ouvi o barulho do vento e o cheiro de chuva.
Não queria acordar. Não queria abrir os olhos e enfrentar aquele dia.
Alguém se moveu do meu lado. Meu coração se apertou de angústia.
E de culpa.
— Amanda? — A voz masculina chegou até mim reforçando o sentimento de irrealidade.
— Owen?
— Amanda! — Ele se aproximou e tocou meu rosto. — Você está bem?
Sacudi a cabeça afirmativamente e me afastei.
— Preciso ir pra escola... E acho que não deveria estar aqui.
Eu me levantei e fui para o banheiro.
Nem o chuveiro melhorou meu humor.
Olhei minha imagem no espelho. Meu rosto mais pálido do que o habitual.
Olheiras escuras em volta dos meus olhos. Eu me sentia perdida.
Respirei fundo algumas vezes. Tentando voltar para o foco.
Saí do banheiro e Owen estava vestido.
Ele me encarou, preocupado.
— Está tudo bem mesmo? Ontem à noite... Eu sinto muito.
— Acho que devo sentir mais.
— Eu vou embora. Antes que Gavin me veja aqui.
— Sim, ainda é bem cedo e ele está dormindo.
— Eu te ligo depois da escola.
— Tudo bem.
Owen saiu fechando a porta atrás de si e fui até a janela.
Era segunda-feira de manhã, depois do pior fim de semana da minha vida.
Eu me vesti com qualquer coisa que achei pela frente. Gavin estava acordando quando eu passei pelo corredor. Ele não viu Owen. Um problema a menos para mim.
— Odeio Camden — sussurrei para mim mesma enquanto dirigia até a escola.
Quando estacionei, estava tudo igual.
Ellie sorriu de longe com Naomi. As duas estavam conversando com Carlton. Andei apressadamente para a aula. Meu coração gelando porque era uma maldita aula de Biologia.
Talvez fosse a hora de começar a cabular. Afinal, devia ter ido bem na porcaria da prova.
Antes de entrar, avistei o Jeep de Nolan chegando ao estacionamento.
Por um momento tive vontade de dar meia-volta e sumir dali. Para algum lugar bem longe, onde ninguém me encontrasse. Mas me obriguei a andar para frente, ignorando o resto à minha volta.
Minhas mãos tremiam à espera quando sentei na carteira.
O professor entrou, alguns alunos entraram atrás, atrasados.
E a porta se fechou.
Eu nem respirava.
— Posso sentar aqui?
A voz e o sorriso jovial de Carlton chegou até mim.
Eu acenei positivamente.
— Está se perguntando onde está o Percy?
Sacudi a cabeça em negativa, dando de ombros.
Não sei se conseguia enganar alguém.
— Não...
— Parece que ele mudou de horário. Não está mais nesta turma.
O ar saiu dos meus pulmões lentamente.
Recebi a minha prova corrigida das mãos do professor. Eu passei, claro.
E graças a Nolan Percy.
O dia passou arrastado.
Eu olhava fixamente para Naomi e Ellie na nossa mesa no refeitório. Não queria ver nada ao redor.
Não queria ver ninguém.
Mas de alguma maneira as risadas chegavam até mim.
A risada de Samantha e Stella. Elas pareciam estar se divertindo.
E imaginar sobre o que me deixava enjoada. Eu me levantei e saí quase correndo em direção ao banheiro. Estava toda trêmula quando lavei meu rosto com água fria, tentando me acalmar.
Prendi meus cabelos de qualquer jeito e saí do banheiro.
— Você está bem? — Naomi perguntou preocupada ao me ver.
— Apenas uma indisposição... — Peguei meu celular e digitei uma mensagem para Owen, perguntando se ele podia me buscar no fim da aula.
— Onde conseguiu isso? — Apontei para a moto com a qual Owen me esperava no fim da aula.
— É do Peter, gostou?
— Parece rápida.
Ele me passou um capacete.
— Sempre quis ter uma. Estou tentando convencer meu pai. Vamos?
Coloquei o capacete e subi atrás dele.
Owen acelerou e corri meus olhos pelo estacionamento para avistar Nolan parado sob a chuva fina.
Os olhos pareciam escuros presos em mim.
Por um momento eu o encarei. Owen arrancou com a moto.
E Nolan desapareceu do meu campo de visão.
— Você me deixou preocupado quando me ligou — Owen comentou quando chegamos em casa.
— Eu não estava me sentindo muito bem... Não queria dirigir de volta.
— Depois eu passo lá na escola e pego seu carro.
— Obrigada.
— Amanda, eu queria conversar sobre ontem à noite.
— Não. — Eu o cortei. — Não precisamos.
— Mas...
— Owen, eu realmente acho que ainda não estou me sentindo muito bem. Eu queria descansar.
— Odeio pensar que você pode estar assim por ontem.
— Não estou.
— Talvez eu não devesse deixar as coisas chegarem a este ponto.
— Esqueça isso também. — Minha voz saiu mais gelada do que gostaria.
— Ok, vamos esquecer. Eu vou embora então. Se precisar, você me liga?
— Claro. Eu vou ficar bem.
Assim que ele foi embora, eu subi para meu quarto.
Quando é que ia me sentir bem de novo?
Olhei pela janela, a chuva continuava a cair, fina e incessante.
Fechei a janela com um estrondo e me deitei. Então, antes de fechar os olhos, avistei algo saindo debaixo da cama. Minhas mãos tremiam quando peguei a jaqueta de Nolan esquecida ali.
Ainda tinha seu cheiro. Tão único. Trazendo uma enxurrada de lembranças.
Eu a peguei e a coloquei num canto. Ainda bem que Owen não a encontrou. Eu a devolveria para seu dono. Não queria nada que me lembrasse Nolan ali.
Só queria esquecer.
Era só aguentar mais um tempo até acabarem as aulas. E então eu iria para longe. E nunca mais precisaria colocar meus olhos em Nolan Percy de novo.
Capítulo 9
Eu nunca mais falei com Nolan Percy.
E ficaria feliz de não vê-lo nunca mais também. Mas isso era impossível. Pelo menos enquanto morávamos na mesma cidade, pequena demais. E enquanto estudávamos na mesma escola.
E, embora ele tenha feito o favor de mudar de turma de Biologia, e depois eu descobri também da de Literatura, eu ainda era obrigada a vê-lo em todos os lugares quando tudo o que queria era que ele e seu sorriso desaparecessem da face da Terra.
Não que eu o visse sorrir.
Sempre que inevitavelmente nossos olhares se encontravam, ele estava muito sério, com um olhar frio e impassível.
Como se eu fosse algo a ser combatido, irradiado.
Expurgado.
Como se eu fosse a culpada de algo!
Às vezes, eu tinha vontade de vencer a distância que nos separava e confrontá-lo. De dizer exatamente todas as palavras que estavam presas na minha garganta desde aquele dia fatídico.
Mas apenas virava o rosto, e engolia qualquer sentimento que houvesse dentro de mim. Eu não queria sentir nada por Nolan.
Nem raiva. Nem nojo. Nada.
Queria que ele nunca tivesse existido.
E assim, o tempo passou. Os dias se transformaram em semanas.
As provas finais chegaram e não se falava em outra coisa a não ser na formatura.
— Os Percy darão uma festa de arromba — Ellie comentou no refeitório. — Será que seremos convidadas?
— Duvido, nenhuma de nós aqui tem alguma amizade com eles.
— A Amanda tem. — Ellie cravou os olhos em mim.
Desviei o olhar.
— Ou tinha — Naomi murmurou, incerta.
Embora nunca tenha dito nada sobre o que aconteceu a nenhuma das duas, Naomi tinha uma percepção acurada e com certeza desconfiava que alguma coisa rolou para eu não poder mais nem ouvir o nome dos Percy.
— Se Carlton não tivesse terminado comigo! — Ellie bufou.
Ela não parava de reclamar há mais de um mês do fora que levou de Carlton, embora eu duvidasse que se importasse realmente.
E não sei como Ellie não percebia que Carlton estava me cercando mais do que o habitual.
Claro que eu não o encorajava em nada.
Mas ele sempre estava por perto, todo sorrisos. E não ajudava eu ter começado a trabalhar há duas semanas na loja do pai dele.
Eu queria juntar dinheiro no verão para a faculdade.
Ouvi um riso cristalino e perfeito como sinos e meu estômago se contraiu.
Samantha passava por nossa mesa. Sem querer, levantei o olhar e ela sorriu para mim. Desviei o olhar rápido, sem retribuir.
Ela se sentou à mesa onde já estavam Stella e Nolan. Fiz um esforço sobre-humano para não olhar para lá.
— Samantha não parece tão nojenta como a Stella... Aliás, a Stella até que era legal, até começar a namorar o Jace Percy. Mas lembro que fiz aula de natação com a Samantha há alguns anos, ela sempre foi tão tímida. Mudou um pouco quando começou a andar com a Stella, mas ela sempre está sorrindo para nós. Será que se eu puxar papo com ela... — Ellie continuou sua tagarelice habitual.
Naomi me encarou.
— Você está bem?
— Eu? Claro.
— Está pálida.
— Eu sou pálida. — Tentei sorrir.
Ela sorriu de volta.
— Sabe, se você quiser... conversar.
Desviei o olhar, incomodada. E infelizmente desviei para o lado errado.
Para a maldita mesa dos Percy.
E lá estava ele.
Os olhos verdes de Nolan. Que mesmo àquela distância tinham aquele brilho dourado.
Ele me encarava e desviou o olhar quando eu olhei.
Meu rosto queimou.
Parecia que o ar se tornava rarefeito naquela questão de segundos. Nosso sinal bateu e respirei aliviada. Caminhei até a sala de Biologia.
Carlton e seu sorriso esperançoso estavam me esperando.
Depois que Nolan saiu da turma, Carlton se mudou de vez para o meu lado.
Eu sorri sem jeito e me sentei ao seu lado.
— E aí, Amanda, tudo bem?
— Tudo, Carlton — respondi sem o menor ânimo.
— Vai trabalhar hoje?
— Claro que sim.
— Que bom.
Bati com o lápis no caderno, querendo que o Senhor Banner começasse logo a aula, assim não teria que fingir que estava interessada na conversa de Carlton.
Olhei para fora, através da janela, meus pensamentos voando para longe, enquanto via a chuva fina caindo.
O professor Banner entrou e começou a distribuir uma caixa e dar explicações.
— Hoje iremos dissecar uma rã.
Voltei à realidade e vi o pequeno cadáver do animalzinho à nossa frente.
Minha cabeça rodou.
— Senhorita Thomas, está bem?
Ouvi sua voz através do zumbido nos meus ouvidos.
— Não — murmurei sentindo que ia desmaiar.
— Carlton, pode levá-la até a enfermaria?
Sem pestanejar, Carlton me ajudou a levantar.
— Pode andar?
— Sim... — sussurrei sentindo meu estômago revirar.
Estávamos no corredor e eu lutava para não vomitar quando ouvi uma voz a nossas costas.
— Ela está bem?
Oh Deus, não.
Era o que faltava.
Abri meus olhos e me deparei com Nolan.
E a última coisa que eu consegui pensar, antes de perder os sentidos, foi que hoje não era meu dia.
Acordei na enfermaria da escola. Ainda sentindo uma tontura horrível. Aturdida, olhei em volta e vi Nolan me encarando fixamente.
O que ele estava fazendo ali?
— Amanda? — A voz maternal da enfermeira chegou até mim e eu me fixei nela. — Pode me ouvir?
Sacudi a cabeça afirmativamente.
— Está se sentindo melhor?
— Sim... — Tentei levantar, mas de novo senti tontura. — Não...
A enfermeira sorriu.
— Isso sempre acontece quando o Professor Banner dá essa aula. Nem todo mundo consegue lidar...
— Sim — murmurei sentindo meu estômago se comprimir.
Que eu não vomitasse na frente de Nolan. Era só o que eu pedia.
— Então apenas fique deitada um pouco aqui até melhorar.
— Cadê o Carlton?
— Carlton Cooper? Foi Nolan Percy quem te trouxe aqui.
Gemi involuntariamente de horror.
Por que Nolan tinha me trazido? Por que não Carlton?
A sala da enfermaria se abriu e outro aluno entrou sendo carregado por um colega.
A enfermeira riu e foi ajudá-lo.
— Melhor o Senhor Banner desistir desta aula...
Fechei os olhos, tentando me concentrar no som da minha respiração.
— Amanda?
Abri os olhos ao ouvir sua voz e ele estava ao lado da maca.
— Está se sentindo bem?
— Cadê o Carlton? — indaguei a primeira coisa que veio à minha mente, tomando o cuidado de não encará-lo.
Nolan ficou mais sério ainda.
— Não faço ideia.
— Ele estava comigo no corredor.
— Ele pareceu apavorado quando desmaiou e eu a trouxe. Talvez ele também esteja desmaiado no corredor agora.
— Por que ainda está aqui?
— Queria me certificar de que estava realmente bem. Acho que fiquei assustado quando a vi desmaiar.
Eu o fitei e ele parecia que estava dizendo aquilo para si mesmo, como se estivesse surpreso de ter ficado assustado com meu desmaio.
— Eu não morri, então pode voltar para sua aula — murmurei desviando o olhar.
Era incrível que ainda me sentisse perdida quando olhava para ele.
Fechei os olhos.
Mas sabia que Nolan ainda estava ali, me observando, por um tempo que pareceu interminável.
— Sim, eu vou voltar — murmurou por fim e se afastou.
E só então, abri os olhos e voltei a respirar normalmente.
Consegui ser liberada da enfermaria quando as aulas já tinham acabado.
Naomi pegou meu material e me devolveu na saída.
— Obrigada.
— E você melhorou?
— Sim, estou melhor.
— Quer ir lá em casa hoje à tarde? Tenho vários convites para fazer.
— Não posso. Tenho que trabalhar hoje.
— Tudo bem. A gente se vê amanhã.
Eu me virei para ir para o carro e quase tropecei em alguém.
Levantei o olhar e me deparei com Nolan.
— Podemos conversar?
Abri a boca várias vezes sem saber o que dizer.
Conversar?
Como assim conversar?
Depois de mais de um mês nos ignorando mutuamente, ele agora queria conversar?
— Não temos nada para conversar — afirmei olhando para os lados.
Podia sentir o olhar de cada estudante em nós.
— Eu acho que temos sim.
E eu caí na besteira de encará-lo.
E perdi o ar. Ele estava pensando naquela noite.
Naquela maldita noite.
E era disso que ele queria falar.
Mas eu não queria. Eu queria esquecer.
Eu vinha lutando para esquecer em todos os miseráveis dias desde então.
Embora quando fechasse os olhos, era só isso que via em meus sonhos.
Ou pesadelos.
Sempre Nolan Percy.
— Não acho que precisamos falar sobre... Isso. — Podia sentir meu rosto se tingindo de vermelho.
E tentei fugir, mas ele era rápido e seus dedos seguraram meu braço.
— Amanda, por favor! — Suas palavras eram cheias de uma fria insistência.
— Tire as mãos dela.
Nós dois nos viramos ao ouvir a voz de Owen.
Respirei aliviada.
Nolan soltou meu braço e pude antever que ficariam marcas roxas ali.
— Qual o seu problema? — Owen falou com malcontida fúria indo para cima de Nolan.
Que também deu um passo em direção a Owen com a mesma fúria.
Em um segundo a sensação de briga iminente tomou conta de todos.
Eu me coloquei entre eles.
— Parem com isto, agora!
Pela visão periférica avistei Samantha e Stella se aproximando e se colocando ao lado de Nolan.
— Ele estava te segurando à força — Owen sibilou entre os dentes.
— Não era nada disso — menti e nem sei o porquê. Devia mesmo deixar Owen quebrar a cara de Nolan.
Owen encarou Nolan.
— Se colocar a mão nela de novo...
— Se você quer bater em mim pode tentar agora — Nolan falou baixo.
— Ninguém vai tentar nada! — avisei o encarando e puxando Owen. — Owen, vamos embora!
Owen me seguiu a contragosto.
Entramos no meu carro e Owen foi dirigindo.
— O que foi aquilo, Amanda?
— Nada!
— Como nada?
Respirei fundo.
— Passei mal hoje.
— E o que isso tem a ver com o Percy?
— Ele que me ajudou a ir à enfermaria. Eu desmaiei.
— Desmaiou? — Sua voz agora era cheia de preocupação.
— Sim, não deve ter sido nada, apenas a possibilidade de ter que dissecar uma rã na aula de Biologia.
— E por que ele estava segurando seu braço agora?
— Ele queria ter certeza de que eu estava bem, acho — menti.
Owen não parecia muito convencido.
— Esqueça isso, Owen.
De repente vi que estávamos passando da minha casa.
— Minha casa passou!
— Eu sei, vou levar você ao médico.
— Owen, não!
— Sim, você vai. Não seja teimosa.
Eu bufei.
— Não estou doente.
— Melhor nos certificarmos disso.
— Se os Cooper me demitirem, a culpa será sua — murmurei enquanto esperávamos na sala de espera do hospital da cidade.
Owen apenas riu e beijou meu rosto.
— Ninguém vai te demitir. Está doente.
— Não estou doente! — sussurrei entredentes. — E odeio hospital.
— Amanda Thomas? — uma enfermeira chamou meu nome. — Pode entrar na sala de exame.
Eu fui acompanhada de Owen.
— Este lugar me assusta — murmurei me sentindo tonta.
Hospitais me deixavam assim.
— Amanda?
Eu me virei e Helena Carter, a madrasta de Nolan, me encarou com um sorriso.
Hoje não era mesmo o meu dia.
— Doutora Carter!
— Agora sou Doutora Percy — ela corrigiu. — E então o que aconteceu?
— Ela desmaiou — Owen falou por mim.
— Owen!
A Doutora Percy sorriu complacente.
— Sente-se aqui, Amanda, e me conte o que aconteceu.
Sentei sobre a maca enquanto ela me examinava e fazia perguntas.
— Certo. Vou pedir alguns exames. Será que aguenta um exame de sangue?
Eu fiz uma careta.
— Será rápido. E depois que o exame ficar pronto, volte até minha sala.
— Eu preciso ir trabalhar...
— Está se sentindo bem agora?
— Estou sim.
— Então pode voltar amanhã para pegar os resultados.
— Certo, obrigada.
Eu fiz o terrível exame de sangue e Owen me amparou para fora.
— Não devia ir trabalhar.
— Devia sim. Agora me dê as chaves do meu carro.
Ele me deu.
— Mas terá que me dar uma carona até em casa.
— Seu carro ficou na escola?
— Não, Peter me deu uma carona.
— De moto?
— Não, não te contei? A moto do Peter foi destruída.
— Como assim? — indaguei enquanto entrávamos no carro e eu dava partida.
— Já faz umas semanas, acho que foi na noite seguinte a que te busquei com ela. Simplesmente atearam fogo nela. Sorte que o avô de Peter tem sono leve e ouviu o barulho e conseguiram conter o fogo, mas a moto foi destruída.
— Que esquisito. Acham que alguém fez isso?
— A moto não ia pegar fogo sozinha.
— Mas quem é que ia colocar fogo na moto velha do Peter? Não faz sentido. Não temos gangues aqui em Camden.
— Pois é. Peter ficou tão bravo. Mas minha irmã adorou. Ela odiava a moto.
— Eu preciso ir.
— Amanhã eu te pego na escola e vamos voltar ao hospital.
— Não precisa.
— Amanda...
— É sério, Owen.
Ele se inclinou e me beijou quando estacionei em frente a sua casa.
— Tudo bem. Eu te ligo à noite.
— Tchau.
Fui para a papelaria dos Cooper e Carlton já tinha feito um relatório completo da minha humilhação para seus pais, Laura e John.
— E ela de repente desmaiou... e aquele Percy.
Estremeci ao ouvir o nome.
— Ele simplesmente voou para cima de mim e num minuto carregava Amanda para a enfermaria, como se ela tivesse levado um tiro ou algo assim.
Eu ri, sem graça.
E então a porta da loja se abriu, trazendo um vento gelado.
E Nolan Percy.
Não. Não. Não.
Rapidamente olhei em volta, tentando ver se poderia fugir para algum lugar enquanto ouvia os passos de Nolan se aproximando.
Os pais de Carlton se afastaram para as suas ocupações, mas Carlton permaneceu ao meu lado.
— Olha só quem apareceu aqui... — falou com aquele seu sorriso idiota.
Mas pelo menos ter Carlton ali me poupava de ter que encarar Nolan sozinha.
— Oi, Amanda — ele falou quando chegou ao balcão.
Eu pensei em ignorá-lo.
Mas estava no meu local de trabalho e os Cooper ainda me observavam.
— Oi. Em que posso ajudá-lo? — indaguei tentando soar profissional.
— Oi, Percy, o que traz aqui? — Carlton indagou jovial.
Nolan lhe lançou um olhar frio.
Carlton se encolheu.
— É... vou ali ajudar meu pai.
E se afastou.
E lá se foi o traidor.
— Preciso falar com você.
Respirei fundo. Não era legal isso.
Porque o cheiro dele invadiu meus sentidos.
Cheiro de lembranças inconvenientes.
— Estou trabalhando.
E olhei para os Cooper.
Nolan seguiu meu olhar.
— Certo... — E então foi até os Cooper e trocou algumas palavras com eles.
O Senhor Cooper se aproximou sorrindo.
— Amanda, tire uma folga, pode ir conversar com o Nolan.
Eu abri a boca, incrédula.
Eram todos traidores ali.
Tentando conter minha irritação, peguei minha bolsa e saí da loja.
Na calçada, encarei Nolan.
— O que quer?
— Conversar com você.
— Já falei que não temos nada pra falar.
— Sim, aqui no meio da rua não temos mesmo. Venha comigo.
— Não.
— Quer mesmo ter esta conversa aqui, Amanda?
Eu olhei em volta, mas as pessoas já reparavam em nós.
— Certo. Eu vou.
Entrei no carro dele e reparei que não era mais o Jeep.
E sim o carro antigo.
Nolan dirigiu em silêncio. Fechei os olhos, já começando a me arrepender da decisão nada sensata de acompanhá-lo.
— O que estamos fazendo aqui? — reparei que ele parou em frente a um restaurante na Marina. — Não quero comer.
Nolan me ignorou, seguindo para dentro e eu bufei, mas o segui. Uma garçonete nos acompanhou até uma mesa e Nolan fez um pedido.
— Espero que seja para você.
— Você comeu hoje? — ele falava como se eu tivesse cinco anos de idade.
— Não, não comi. — Eu ainda estava enjoada só de pensar na rã.
— Imaginei. Deve ser por isso que desmaiou.
— Eu desmaiei por causa de uma maldita rã.
— Está muito pálida.
— Por que estamos aqui, Nolan? — interrompi aquela contenda inútil.
Ele me fitou seriamente, como se estivesse pensando no que falar.
— Nunca falamos sobre o que aconteceu.
— O que não deveria ter acontecido, seria a afirmação correta.
— Talvez tenha razão. Mas aconteceu.
— Não posso mudar o que aconteceu, mas posso fingir que não aconteceu e...
— Sim, imagino o quanto queria fingir que nada aconteceu. O que foi que disse para seu namorado depois?
— Não é da sua conta.
— Acho que é sim. Eu fui falar com você no domingo à noite e a vi com ele.
— E daí? Como bem falou, ele é meu namorado.
— E por que você não tinha transado com ele até aquela noite? Por que transou comigo?
— Porque eu estava bêbada! Isso responde a sua pergunta? E você foi bem canalha se aproveitando disso!
Ele me encarava com uma fúria contida. E era a mesma fúria que estava em mim.
— Contou ao Owen que ele pegou o resto que eu deixei?
Senti como uma bofetada na minha cara.
— E contou a sua namoradinha de Nova York que a traiu?
— O que sabe sobre isso?
— O suficiente. Ou é mentira?
Eu esperei a resposta.
Como se de alguma maneira, ele dissesse realmente isso. Que não existia namorada nenhuma.
— Sim, eu tenho uma namorada — confirmou por fim —, mas acho que não devo me sentir culpado, já que você também tem um.
— Sempre soube que eu tinha um namorado, mas eu nunca tive ideia que também tinha uma namorada. Você mentiu!
— Não lembro de você ter perguntado naquela noite.
Certo, outro murro no estômago.
— Sim, eu estava bastante bêbada. Só isso para me fazer transar com você. E você, por que transou comigo, Nolan?
Vamos ver se ele iria contar a verdade.
— Talvez eu tenha apenas pegado aquilo que estava sendo oferecido.
Senti minha garganta queimando.
— Ou queria ganhar uma aposta com seu irmão?
Ele ficou surpreso por alguns instantes.
— Quem te contou isso?
— É mentira?
— Quem te contou?
— É mentira? — quase gritei, nem estava mais me importando onde estávamos. — Diz que não ficou me rodeando o tempo inteiro apenas porque fez uma aposta nojenta com seu irmão por um maldito Jeep?
— Não, não é mentira.
Engoli o nó na minha garganta.
Eu não ia chorar. Não na frente dele.
Lutando para respirar, eu o encarei.
— Tudo bem, Nolan. Que bom que esclarecemos este ponto. Para minha sorte, eu não me apaixonei por você. Aliás, como poderia? Eu amo o Owen. E espero que o Owen nunca descubra o que você fez comigo, porque ele te mataria. Acho que terminamos essa conversa.
Eu me levantei e saí sem olhar para trás.
Nem voltei para a loja naquele dia, inventei que tinha passado mal de novo e fui para casa.
Eu não chorei. Por que ia chorar?
Nolan Percy não valia nem isso.
No dia seguinte, no fim da aula, Ellie e Naomi estavam desoladas porque não iam à festa que aconteceria naquela noite na casa de Nolan.
Eu não me importei.
Estava aliviada que as aulas acabaram e eu não precisaria ver Nolan todos os dias.
Estava indo para casa almoçar quando me lembrei do exame.
— Droga — murmurei, mas dirigi até o hospital.
E para minha surpresa, Owen estava lá.
— Eu falei que não precisava!
Ele sorriu.
— E eu disse que viria.
Eu revirei os olhos.
Alguns minutos depois, fui chamada à sala da Doutora Helena.
A médica sorriu, nos pedindo para sentar, enquanto verificava meu prontuário. De repente percebi que seu sorriso congelou e ela parecia preocupada quando me fitou.
— Amanda, tenho algumas notícias para você — anunciou gravemente.
— Ela está doente? — Owen indagou preocupado.
— Não.
Antes mesmo de ela falar senti algo me gelando por dentro, como um pressentimento ruim.
— Você está grávida.
Capítulo 10
Era um pesadelo.
Um daqueles que vinham me atormentando ultimamente.
Owen, Dra. Carter e aquela notícia bizarra desapareceriam. A qualquer minuto acordaria e estaria segura no meu quarto. Mas nada desapareceu.
Os olhos da médica me encararam com algo que parecia ser... pesar?
Eu parei de respirar.
— Isso tá errado. — A voz de Owen me tirou do transe.
O Dra. Carter voltou a atenção a Owen.
— Não há nada errado. Os testes comprovaram. É positivo.
— Não, a senhora não está entendendo... Fala para ela, Amanda.
Oh, Deus.
Ele queria que eu falasse que era impossível estar grávida. Pelo simples motivo que nunca tínhamos transado.
O que ele não fazia ideia é que passou a ser perfeitamente possível.
Porque eu transei sim.
Mas não com ele.
Minha mente começou a girar num turbilhão alucinante e as ondas escuras começaram a dançar sob meus olhos.
— Olha, eu sei que vocês são jovens e isso deve ser uma surpresa, mas essas coisas acontecem. — A médica e sua voz conciliadora chegaram até mim junto a um zunido.
Eu me obriguei a respirar, o ar inundando meus pulmões, antes que desmaiasse ali mesmo.
Mas o medo continuava a turvar minhas vistas.
Ou era melhor chamar de pavor.
— Não, doutora, é sério — Owen continuou. — Ela não está grávida. Alguma coisa está errada ai. Nós nunca...
Eu segurei seu braço.
— Owen, pare.
Os olhos da médica se prenderam em mim e ela entendeu.
Antes mesmo que Owen.
Eu agora sentia meu rosto inundar de um vermelho sangue.
Vergonha.
— Mas, Amanda, isso aí está errado... — Owen ainda balbuciava.
— Acho que vocês precisam conversar — disse a médica.
— Vamos embora, Owen. — Eu me levantei, saindo quase correndo da sala.
Se eu pudesse continuava correndo eternamente.
Para ninguém mais me achar.
Mas Owen me alcançou no estacionamento, seu braço me puxando.
— Ei, Amanda, calma! Por que está nervosa? Essa médica é uma idiota e esses exames estão todos errados. Não tem porque ficar nervosa.
Deus, como é que eu ia dizer a ele que não estava errado?
Meus olhos queimaram e minha garganta se fechou. Acima de todo meu pavor pela constatação de estar grávida, sentia uma dor horrível porque eu ia magoar Owen.
E ele não merecia.
— Owen, estou mesmo grávida.
Ele riu, como se eu estivesse contando uma piada absurda.
Mas algo no meu rosto o fez parar.
— Mas... não é possível, nós nunca... — Então ele parou, empalidecendo.
Eu vi em seu olhar que finalmente tinha entendido.
E quis morrer.
Uma gama de emoções passou por seu rosto.
Incredulidade. Dor. Revolta.
— Eu sinto muito. Se me deixar explicar...
— Quem? — Sua voz era tão fria como gelo, cheia de uma fúria malcontida.
— Não... Não faça isso...
— Quem, Amanda? Quem foi o cara?
— Não importa! — gritei.
— Não importa? Você transou com outro cara e isso não importa? Há quanto tempo vem acontecendo, há quanto tempo você me trai?
— Não é assim, foi um erro, foi apenas uma vez...
Owen soltou um palavrão, seus punhos fechados batendo no capô do carro.
Tentei tocar seu braço, mas ele se afastou com um safanão.
— Sinto muito. Tem toda razão de me odiar agora. Mas acho que eu me odeio muito mais.
Eu lhe dei as costas e entrei no carro, dando partida.
As lágrimas turvaram meus olhos e nem sei como consegui chegar em casa. Papai não estava, então foi fácil subir direto para meu quarto e me entregar ao desespero.
Eu estava perdida.
As palavras da minha mãe voltaram à minha mente.
“Um passo impensado pode afetar toda a sua vida.”
E por mais que eu tivesse garantido muitas vezes a ela que isso nunca iria acontecer comigo.
Tinha acontecido.
Eu dei o tal passo impensado.
Bebendo além da conta e transando com Nolan Percy.
Um cara que nem era meu namorado. Um cara que apostou que ia me levar pra cama. E conseguiu.
Agora Owen sabia. E me odiava. E quando minha mãe soubesse que eu tinha estragado minha vida também iria me odiar. E meu pai provavelmente iria me matar. Isso se ele não morresse de desgosto antes.
Eu solucei, desesperada.
Querendo voltar no tempo e nunca ter conhecido Nolan Percy.
Não sei quanto tempo passei ali chorando até que não houvesse mais lágrimas.
Mas já era noite quando ouvi passos na escada e achei que fosse papai. Eu me sentei rapidamente, tentando não parecer tão acabada e evitar perguntas que ainda não estava preparada para responder.
Mas não foi meu pai que entrou no meu quarto e sim Owen.
Ele ainda estava furioso, foi a primeira coisa que percebi.
— Eu quero saber o que aconteceu.
— Owen, não... Não quero magoá-lo.
Ele riu sem o menor humor.
— Você não está me magoando, está me matando!
Eu senti como uma punhalada em mim.
— Por isso mesmo...
— Eu quero saber. Eu preciso saber.
Respirei fundo.
— Eu fui em uma festa. E bebi muito. E ele me trouxe em casa e... aconteceu.
— Ele... te forçou?
Fechei os olhos.
Seria muito fácil falar que sim. Mas seria uma tremenda mentira.
— Não, ele não me forçou — confessei num fio de voz.
E a dor nos olhos de Owen acabava comigo. E me fazia ter nojo de mim mesma.
— Quem foi? — insistiu.
— Não, eu não vou dizer. Isso não.
— Droga, Amanda. Eu mereço saber!
— Saber não vai mudar nada! Não adianta insistir.
Ele andava pelo quarto, como um animal enjaulado. Eu queria muito poder amenizar a dor dele. Mas era impossível.
— Por favor, esqueça isso.
— Esquecer? Como vou esquecer, eu... — Então ele parou. Os olhos atraídos por algo numa prateleira.
Eu segui seu olhar e gelei.
A jaqueta de Nolan.
A jaqueta de couro que tinha ficado ali e eu ia devolver.
Ainda estava dobrada no mesmo lugar.
Owen foi até lá e a pegou.
— Isso é dele?
— Owen...
Ele olhava para a blusa.
E por segundos agonizantes eu rezei para ele não se lembrar de nada.
Mas quando me encarou, eu vi que tinha a resposta.
— Nolan Percy estava com uma jaqueta dessas no dia em que veio te trazer em casa.
— Um monte de gente tem jaqueta de couro.
— Com essa marca cara, aqui? — Ele olhou a etiqueta. — Em Camden? Eu duvido muito.
Owen largou a blusa como se estivesse queimando sua mão.
— Ele vai pagar por isso — sibilou antes de sair do meu quarto como um furacão.
— Oi Owen.
Escutei a voz de papai e consegui sair do meu estado de torpor correndo pelas escadas, mas Owen já havia saído de casa.
— O que está acontecendo? — papai perguntou aturdido, mas eu já pegava a chave do carro e corria porta afora.
Tinha que impedir Owen de chegar até Nolan e confrontá-lo.
Enquanto dirigia alucinadamente pela estrada, avistava o carro de Owen não muito longe. Pensei em tentar ultrapassá-lo, mas com meu carro seria impossível. Eu acabaria com o motor fundido no meio da estrada.
E quando cheguei em frente à casa dos Percy, meu coração estava disparado de pavor.
O carro de Owen já estava ali.
— Droga!
Saltei e corri. A casa estava cheia de gente. Música alta. Luzes para todo lado.
Era a noite da maldita festa!
Onde será que Nolan estava? E Owen?
Andei por entre as pessoas, tremendo. E de repente ouvi um barulho de vidro se quebrando e gritos. Corri e lá estava Owen segurando Nolan contra a parede.
— Seu maldito, eu vou matar você por ter posto as mãos nela!
— Owen, para com isso! — consegui gritar.
Nolan se aproveitou disso e empurrou Owen, que voltou para cima dele. Mas Nolan estava preparado e virou um soco. Óbvio que Owen apenas ficou com mais raiva e em um segundo os dois estavam engalfinhados na sala chique dos Percy, trocando socos.
Não demorou para Austin e Jace se intrometerem, Austin segurou Owen e Jace segurou Nolan.
— Gente, o que é isso, pelo amor de Deus? — Samantha apareceu horrorizada.
Possivelmente por terem estragado sua festinha perfeita.
— Não percebeu, Samantha, com certeza é alguma coisa com a filha do pastor — Stella debochou.
— Vou matar você. — Owen se debatia.
— Pode tentar — Nolan sibilou por entre os dentes.
— Vai se esconder atrás do seu irmão? Isso é entre nós dois! Não deveria ter posto as mãos na minha namorada!
— Ops! Ele descobriu que a namoradinha perfeita pulou a cerca. — Stella deu uma risadinha sarcástica.
— Cala a boca, Stella — Samantha murmurou. — Isso não é lugar para vocês resolverem isso. Estamos no meio de uma festa pelo amor de Deus!
As pessoas continuavam em volta, olhando curiosas o escândalo se formando e meu rosto esquentou de vergonha.
— Samantha tem razão — Helena apareceu, para minha vergonha ficar maior ainda. Porque ela sabia. — Por favor, será que podem se retirar? Acho que a festa acabou — pediu e todo mundo começou a sair, cochichando em voz baixa.
— Não é justo — Samantha reclamou.
Mas se calou com o olhar da mãe.
— Owen, por favor, vamos embora — pedi desesperada.
— Não, eu quero me acertar com esse maldito por engravidar você!
Senti o chão fugir aos meus pés. Todos os olhares se voltaram para mim.
— Do que você está falando? — Nolan indagou confuso.
— Não sabe? — Owen se livrou das mãos de Austin encarando Nolan. — Você é um canalha! Que se aproveita de garotas bêbadas! Ela me contou tudo. E eu podia matar você por isso! — Owen empurrou Nolan.
Mas Helena se colocou no meio dos dois e Austin e Jace se colocaram do lado de Nolan, numa clara ameaça a Owen.
— Pelo amor de Deus, parem com isso — Helena falou firmemente.
Nolan olhou para mim.
— Você está grávida?
Engoli em seco, desviando o olhar.
— Não é da sua conta.
— Sim, acho que não é mesmo — ele falou por fim —, mas seu namorado está aqui me acusando de algo que provavelmente é de responsabilidade dele e não minha!
— Seu filho da puta! Se ela está grávida, a culpa é sua! Eu nunca transei com ela!
Ah, Meu Deus.
Eu queria sumir.
A sala se fechou em silêncio.
— Quer que eu acredite nisso? — Nolan murmurou friamente. — Está louco!
Owen foi para cima de Nolan de novo.
— Se tentar pegar o Nolan, terá que passar por cima da gente primeiro — Jace empurrou Owen.
Owen riu sem humor.
— Claro. Se esconde por trás do seu irmão. Não passa de um riquinho maldito. E tenho nojo de você e de toda essa sua família. Se esse filho fosse meu, eu assumiria as minhas responsabilidades sim e não fugiria como você! — Owen deu meia-volta e finalmente saiu da sala e eu o segui.
— Owen, espera.
Ele se voltou com ódio no olhar.
— Fique aí, Amanda, eu não tenho mais nada a ver com você!
— Não deveria ter vindo aqui e contado a ele!
— Realmente, acho que não é mais problema meu, não é?
— Owen — minha voz tremeu —, não sei se um dia vai conseguir me perdoar...
— Por que fez isso comigo, Amanda? Eu amava você. E achei que também me amava.
Meus lábios tremeram.
— Mas eu amo você! Nolan... Foi um erro! Eu me arrependo tanto...
— Chega. Eu não quero mais ouvir.
Ele subiu no carro e foi embora.
Eu me virei e vi Nolan na porta da casa me encarando friamente.
Desviei o olhar e entrei no meu próprio carro, o ignorando, quando ele deu o primeiro passo na minha direção.
Quando cheguei em casa meu pai me esperava.
— Amanda, o que está acontecendo? Você e o Owen estavam brigando?
— Sim, nós terminamos.
— Deve ser apenas uma briga.
Comecei a chorar. Se ele soubesse...
— Não foi só uma briga, pai.
— Oh, filha. Essas coisas acontecem. — Ele me abraçou.
Mas eu me desvencilhei.
— Vou dormir.
— Sim, faça isso. Tenho certeza de que amanhã o Owen aparece pedindo desculpas, seja o que for que aconteceu.
— Eu duvido muito. Boa noite, pai.
Subi como se meus pés pesassem chumbo e me joguei na cama.
O que seria da minha vida, agora?
Eu só queria esquecer tudo e dormir.
Acordei no dia seguinte me sentindo péssima.
Minha cabeça doía e para completar estava com náuseas terríveis. Mas era isso que as grávidas sentiam, não era? Pelo menos não teria mais que ir à aula. Agora era só ir buscar as notas e pronto.
Mas a satisfação que eu devia estar sentindo com isso tinha desaparecido. Porque meu futuro, antes tão certo, agora era incerto.
Eu nem me dei ao trabalho de tirar o pijama e desci as escadas, arrastando meus pés. Ouvi vozes na cozinha, então parei assustada quando vi quem estava com meu pai.
Era Nolan.
— Bom dia, Amanda. — Meu pai sorriu ao me ver. — Olha quem está aqui, seu amigo da escola, disse que queria falar com você.
— Oi, Amanda — Nolan falou sem sorrir.
Eu empalideci, meu estômago dando uma volta.
— Você está bem? — Papai franziu a testa. — Está com cara de quem está enjoada.
— Estou um pouco. — Eu me obriguei a respirar. — Mas estou bem, pai.
— Sente e tome café, então.
— Estou sem fome...
— Venha conversar com seu colega. Ele já está esperando há um bom tempo.
— Nolan — pensei em como poderia me livrar dele —, por que você não volta outra hora? Eu estou... Meio ocupada agora.
— Precisamos conversar — insistiu. Seu olhar era muito sério.
— Não agora — falei devagar lançando um olhar em direção ao meu pai.
— Vamos dar uma volta. Eu te espero lá fora — ele se levantou e completou: — o dia inteiro se for preciso. — E saiu fechando a porta devagar atrás de si.
Papai me encarou desconfiado.
— Amanda, o que está acontecendo?
— Nada, pai.
— Por acaso este garoto Percy tem alguma coisa a ver com a briga com o Owen ontem?
— Não! — respondi rápido. — Eu vou... subir e me trocar.
Subi quase correndo e olhei pela janela.
Nolan ainda estava lá, em frente ao carro.
Ele levantou a cabeça e me viu.
Eu saí da janela.
— Que droga.
Com certeza ele não iria sair dali.
Bufando, vesti logo uma roupa e desci. Era melhor me livrar daquilo logo.
Nolan abriu a porta do carro, mas ignorei e saí andando.
Ele me seguiu.
Quando estávamos suficientemente longe da minha casa, eu virei o encarando.
— O que quer?
— Por que seu namorado foi ontem na minha casa tirar satisfação?
— Acho que ele falou porque, não preciso repetir.
— Está mesmo grávida?
— Infelizmente sim — murmurei.
— E quais as chances de ser meu?
Eu quis mentir. Eu quis dizer "nenhuma".
Mas o que ia adiantar?
— Todas.
Ele apenas me encarou por um momento. Como se avaliasse o que eu dizia.
Seu rosto era uma máscara impassível.
— E seu namorado?
— Você não ouviu o que ele disse ontem?
Mais silêncio. Agora eu podia ver um leve tom de fúria nele, que tentava conter.
— Por que quis que eu pensasse que tinha transado com Owen?
Eu dei de ombros.
— Pode pensar o que quiser, não me interessa.
— Eu vi vocês. No seu quarto. — Sua voz era fria.
— Não te interessa o que eu fiz com o Owen — rebati no mesmo tom que ele. — Pode-se fazer muita coisa sem ter transado! Acho que você não é nenhum ingênuo!
Eu rezava para não estar corando com aquele monte de asneira que estava dizendo. Mas o que eu podia fazer? Confessar que queria mesmo que ele achasse que eu tinha transado com o Owen porque estava com ódio por causa da maldita aposta?
Nolan soltou um palavrão passando a mão pelos cabelos nervosos.
Eu dei meia-volta para sair dali. Não tinha mais nada pra falar com ele.
— Aonde vai?
— Embora.
— Não vai, não.
Eu me voltei.
— Não tenho mais nada para falar com você.
— Você está grávida, como não temos nada para falar?
— Está nervoso? Imagina como eu estou! — gritei. — Acha que eu queria isso? Acha que estou feliz? Eu queria voltar no tempo e nunca ter feito o que fiz! Isso está acabando com a minha vida! Acabou com o meu namoro e não quero nem ver quando meus pais descobrirem. Eu tenho 18 anos, Nolan, e estou indo para a universidade e agora eu não sei de mais nada! — Minha voz se quebrou e pisquei várias vezes para afugentar as lágrimas traiçoeiras.
— Isso também é um problema meu!
— E que pena, não é? Uma porcaria de aposta e olha só o “problema”! — Fiz o sinal de aspas. — Vá para o inferno, Nolan!
Desta vez, consegui correr até minha casa, sem que Nolan me impedisse.
E graças a Deus, papai não estava mais por lá.
Ainda demorou vários minutos até que ouvi os passos de Nolan e o carro se afastando.
E respirei aliviada.
E não demorou duas horas para meu mundo cair de vez.
Quando a porta se abriu e papai gritou meu nome.
Eu o encarei, estava na cozinha e ele parecia furioso.
Oh Deus.
— Por que a cidade inteira está comentando que está grávida?
Capítulo 11
Senti as ondas de pavor tomando conta de mim. Papai me encarava esperando uma resposta.
— Pai, eu...
— Diz que é mentira, Amanda. É apenas um boato, uma fofoca? Porque a cidade inteira está comentando!
Abaixei o olhar. Do que adiantaria adiar o inevitável?
— Não, pai, não é uma fofoca. Estou grávida.
Gavin empalideceu.
E achei que ele fosse ter um enfarto.
— Eu sinto muito, pai — murmurei.
E enquanto ele ficava ali me encarando como se não me conhecesse, senti o tanto que o estava decepcionando.
Qualquer pai ficaria decepcionado com uma filha grávida na minha situação, mas meu pai era um homem religioso. Um homem que acreditava que sexo era algo sagrado, que deveria vir junto com um casamento. E filhos só viriam depois disso. Eu cresci ouvindo suas crenças. Minha mãe mesmo havia me contado como havia se apaixonado por meu pai e ele a persuadiu a se casarem ainda muito jovens para que só assim pudessem transar. Minha mãe disse que se arrependeu, ninguém deveria casar apenas porque queria fazer sexo.
— Achei que o Owen tivesse algum respeito!
— Não... — Hesitei. Isso era difícil. — Não é do Owen, pai.
Os olhos de Gavin se estreitaram.
— Ouvi algo sobre uma briga na casa dos Percy, não me diga que...
— Acho que você não ouviu a fofoca inteira...
— Nolan Percy?! — gritou finalmente entendendo. — Mas como? Eu não estou entendendo nada! Como pode estar grávida de Nolan Percy? E o Owen?
Agora meu rosto estava queimando.
— Eu bebi numa festa, pai... Eu acho que perdi um pouco a noção...
— Aquele safado se aproveitou de você, bêbada?
— Não! Quer dizer... Sim, eu estava bêbada, mas eu quis. Não posso culpar só o Nolan.
— Meu Deus, Amanda! Eu achava que você tinha juízo! O Owen sabe? É por isso que terminaram ontem?
— É sim.
— E como sabe que... — Gavin ficou vermelho. — Que não é filho do Owen?
— Eu nunca dormi com o Owen.
Gavin se sentou, muito pálido. Levou a mão ao peito e eu me desesperei.
— Pai, você está bem?
Ele respirou fundo.
— Acho que nunca mais vou ficar bem...
Corri e peguei um copo de água, entregando em sua mão trêmula.
Ele o bebeu devagar e comecei a chorar.
Eu me senti mais culpada do que nunca. Meu pai já tinha sofrido um enfarto, e se eu lhe causasse outro com o desgosto que estava lhe causando?
— Estou muito desapontado, Amanda, eu confiava em você.
— Eu sei, eu sinto muito. Eu... Não sei o que fazer.
— O Nolan Percy sabe?
— Sabe.
— Por isso ele estava aqui de manhã? O que ele pensa em fazer?
— Nada. Fazer o quê?
Ele se levantou.
— Vou agora resolver este assunto.
— Pai, o que vai fazer?
— Vou na casa dos Percy.
— Não, pai, por favor.
— Isso não vai ficar assim! Você só tem 18 anos e aquele canalha se aproveitou de você! — Saiu andando em direção ao carro.
Eu tentei dissuadi-lo, mas ele não estava me ouvindo, então entrei no carro também.
Torci para que não houvesse ninguém na casa dos Percy. Mas eu definitivamente não estava com sorte, quando meu pai bateu na porta, a própria Helena a abriu.
Meu rosto se tingiu de vermelho ao me lembrar de quando ela deu o resultado na frente de Owen.
— Olá, Pastor Thomas. Entre, por favor — falou educada quebrando um pouco a fúria do meu pai, que entrou na sala chique dos Percy e eu o segui.
— Acho que preciso ter uma conversinha com seu enteado, Nolan — Gavin anunciou muito sério.
— Helena? — Um homem entrou na sala.
Ele parecia uma versão mais velha de Nolan. Muito alto e com distintos cabelos grisalhos.
Este deveria ser Theodore Percy.
— Querido, este é o Pastor Gavin Thomas e sua filha, Amanda.
O homem estendeu a mão ao meu pai de forma educada e meu pai o cumprimentou.
— O senhor já está a par da situação? — indagou de forma grave.
— Sim, já estou a par da situação.
— O Nolan se ferrou — A voz irritante de Stella me fez voltar a atenção para a sala e gelei ao ver que não só Stella estava ali, como Jace e Samantha e seu namorado, Austin.
E Nolan no fundo da sala.
Estava pior do que eu pensava.
— Stella, por favor — Helena murmurou contrariada. — Theodore, acho melhor levar o Pastor Thomas para o escritório.
— Sim, também acho. — Theodore olhou para Nolan, que nos acompanhou.
Eu queria que um buraco se abrisse aos meus pés e eu fosse engolida para sempre.
O escritório do Percys era tão elegante como o resto da casa, e eu me sentei ao lado do meu pai.
Nolan permaneceu de pé perto da janela.
Eu nem ousava olhar em sua direção.
Aliás, eu prendi o olhar no chão e não tirei de lá.
— Então o senhor já está sabendo do que seu filho aprontou — papai começou.
— Sim, eu estou. Sinto muito por essa situação toda. Está sendo difícil para todos nós.
— Duvido que seja mais difícil do que pra mim! A cidade inteira está comentando da minha filha!
— Pai... — eu murmurei vermelha.
— Não, Amanda, isso é muito sério! Minha filha tem 18 anos e me contou que seu filho a embebedou!
— Eu não a embebedei — Nolan interveio.
— Pai, eu não...
— Que seja! Minha filha estava bêbada e provavelmente nem sabia o que estava fazendo e você se aproveitou dela!
— Foi isso que ela disse? — Nolan indagou, mas seus olhos estavam em mim.
— Eu não disse isso — rebati. — Aliás, eu nem queria estar aqui e acho toda essa conversa inútil!
— Você está grávida, Amanda — Theodore interveio calmamente. — E se este bebê é mesmo do meu filho, essa conversa não é inútil.
— Está duvidando da minha filha? — papai indagou nervoso. — Ela diz que nunca teve relações com o namorado! Apenas com seu filho!
Oh Deus, achei que ia explodir de vergonha.
— Não estou duvidando da Amanda, Pastor Thomas — Theodore respondeu.
— Então eu quero que seu filho repare o mal feito a minha filha! Ela tem apenas 18 anos e está grávida! E não é uma qualquer de cidade grande, sem família e que seu filho pode usar e descartar!
— Não fugirei às minhas responsabilidades, Pastor Thomas — Nolan informou, muito sério.
— Sim, eu e meu filho já conversamos sobre isso — Theodore continuou.
E notei que apesar dele parecer calmo, o olhar consternado que lançou ao filho era puro gelo. Como será que ele reagiu ao saber o que Nolan fez?
— É realmente inesperada a situação. Nós iríamos mesmo procurar a Amanda e saber o que ela pretende fazer...
— Pretende fazer? — meu pai repetiu.
— Sim, o senhor mesmo disse que ela é uma garota jovem e meu filho também é. E eles nem têm um relacionamento.
Desviei o olhar, envergonhada. Theodore Percy devia me achar uma vagabunda.
— Imaginei que prefira interromper...
— Interromper? O que quer dizer, se livrar do bebê? Eu não vou permitir. Jamais permitiria que minha filha abortasse, isso é contra os meus princípios.
Theodore respirou fundo trocando olhares com a esposa, que segurou sua mão com um olhar conciliador.
— Nós respeitaremos o que a Amanda decidir, claro — Helena comentou.
Ela buscou meu olhar, mas o que eu podia fazer?
Não fazia ideia.
Se aborto passou pela minha cabeça? Certamente estava passando agora. Mas eu teria coragem de ir contra os preceitos do meu pai? E eu mesma conseguiria viver com aquela decisão?
Eu não sabia dizer.
— Amanda? — Theodore olhou pra mim.
Meus lábios tremeram.
— Eu... — Senti os dedos de aço do meu pai segurando minha mão. Ele estava me encarando também, esperando minha resposta.
E eu soube que não podia decepcioná-lo a este ponto.
— Eu não vou fazer um aborto — balbuciei num fio de voz.
— Certo. É sua escolha — Helena disse. — Vamos respeitá-la.
Theodore não parecia muito satisfeito, mas continuou.
— Sim, tem direito à escolha. Então é isso.
— Então é isso? Acha que é assim? O que pretende fazer? — Ele encarou Nolan. — Minha filha foi usada! E a culpa é sua por deixá-la nessa situação. Grávida e solteira. Não é certo. Tem que assumir isso.
— O que quer dizer? — Nolan indagou friamente e eu não podia acreditar no que meu pai estava insinuando.
— Pai, para...
— Que tem que se casar com ela.
Minha nossa, não!
— Acho que estamos exagerando aqui... — Theodore começou.
— Exagerando? Seu filho tem que assumir a responsabilidade!
— Meu filho não vai deixar essa criança desamparada. Ele vai assumi-la, mas se casar com sua filha?
— O que está dizendo? Que ela vai ter que criar essa criança sozinha? Não, eu exijo que ele repare o mal que fez. Sei que vocês de cidade grande e sem princípios pensam diferente, mas...
— Nós temos princípios!
— Então provem! O que vai ser da minha filha sozinha e com uma criança? — Ele se virou para Nolan. — Acha que não sei que pretende lhe virar as costas e continuar com sua vida como se nada tivesse acontecido? É este tipo de homem? Que age inconsequentemente não se importando com os estragos que deixou para trás?
— Eu vou me casar com ela.
Eu levantei o olhar ao ouvir a voz de Nolan muito clara.
O quê?
Que diabos ele estava dizendo?
— Isso seria o mais certo a fazer mesmo! — meu pai respondeu antes que eu conseguisse me recuperar.
— Não — gritei — Não. Não! — gritei mais alto.
— Amanda. — Meu pai segurou minha mão e eu a puxei.
— Eu não vou me casar!
— Como não? Acha que tem escolha?
— Eu tenho sim. — Encarei Nolan — Por que está fazendo isso? É absurdo!
— Porque você está grávida — respondeu simplesmente.
Mas nada era simples. Claro que ele estava agindo assim porque meu pai estava exigindo.
— Estamos no século XXI, ninguém se casa porque está grávida! Não podem me obrigar. Eu não vou me casar!
— Amanda, sugiro que pense nisso, acho que não precisamos decidir nada agora — Helena tentou ser conciliadora.
— Eu já estou decidida.
— Filha, não me desafie! Você cometeu um erro e agora tem responsabilidades! Já chega de agir como se seus atos não tivessem consequências! — papai ralhou. — Olha a vergonha que está me fazendo passar. A vergonha para você e também para essa criança que ainda nem nasceu! Não pode me dar este desgosto! Não vou apoiá-la se decidir agir assim. — Sua voz se quebrou e algo se quebrou dentro de mim também.
— Será que podem nos deixar a sós? Eu quero conversar com a Amanda — Nolan falou de repente.
— Não quero falar com você!
— Amanda, deixe de ser infantil. — Papai me encarou. — Não adianta agir com teimosia agora que o mal já foi feito, ele apenas pode ser remediado da melhor maneira para todos.
— E a melhor maneira é eu me casar com Nolan Percy?
— Sim, já que ele é o pai.
— Certo, acho que devem mesmo conversar. — Helena se levantou e Gavin também. Theodore não parecia muito satisfeito com o rumo da situação, mas Helena sussurrou algo em seu ouvido e ele aquiesceu saindo do escritório, não sem antes lançar um olhar ameaçador para Nolan.
— Eu espero lá fora, Amanda — Gavin falou com uma ameaça no olhar e eles saíram fechando a porta atrás de si.
— De onde tirou essa ideia ridícula de que tenho que me casar com você? — indaguei irada.
— Acho que seu pai deixou bem claro.
— Como eu falei, não estamos na Idade Média! Então não precisa fazer nada disso! Não quero me casar e tenho certeza que você também não, então caso encerrado!
— Estou apenas tentando fazer o que é certo. Vamos ter um bebê, já pensou nisso? Daqui a alguns meses vai nascer um bebê e será tão meu filho quanto seu.
Eu fechei os olhos.
Não queria pensar naquilo. Era simplesmente demais para mim. Eu só conseguia pensar naquela gravidez em termos de problemas!
Nolan continuou.
— Acho que também devia ser responsável e não pensar só em você!
Como é que é? Ele estava me acusando agora?
— Responsável deveria ter sido você quando transamos!
— Eu não estava lá sozinho. Você tem tanta culpa quanto eu, então que tal deixar de ser absurda e concordar com aquilo que é o mais sensato?
— Sensato? Nolan, mal nos conhecemos. Nem namorados nós somos!
— É este o problema todo, não é? Aposto que se fosse seu precioso Owen você não estaria tão relutante!
— Talvez, não — respondi secamente desviando o olhar.
Eu não queria me lembrar do Owen. Só sentia uma culpa horrível quando pensava nele.
— Sei que não queria estar grávida e muito menos que este filho fosse meu. Mas é. E isso não vai mudar e nem desaparecer. O Owen não é mais uma opção para você, acho que ele deixou bem claro quando disse que não tinha nada a ver com você, mesmo quando falou que o amava.
— Estava ouvindo tudo? — acusei.
— Estavam em frente a minha casa e não estavam sussurrando!
— Sim. Owen me odeia agora.
— Então pense bem. Eu quero me casar com você. Talvez seja mais do que mereça. Mas eu quero fazer isso. Acho que é melhor do que estar sozinha.
Comecei a sentir uma dor aguda no peito.
Nolan estava mesmo falando sério. Como é que eu podia aceitar me casar com Nolan Percy? Depois de tudo o que tinha feito?
Aquela aposta maldita.
Eu só queria sentar, esconder o rosto entre as mãos e chorar.
Pensei em minha mãe. Eu estava praticamente cometendo os mesmos erros que ela.
A decepção seria grande.
Mas eu estava grávida agora. Eu ia decepcionar mais meu pai não aceitando? E o que ia fazer sozinha? E com um bebê?
Sentia meu estômago dando nó de medo. O que seria pior?
Talvez eu não tivesse mesmo saída.
Meu pai estava irredutível e se eu não concordasse, o que aconteceria?
Não fazia ideia do que se passava pela cabeça de Nolan. Ainda era absurdo que ele concordasse assim tão facilmente com aquele casamento bizarro.
Mas em uma coisa ele tinha razão. Eu estando preparada ou não, havia um bebê dentro de mim.
Talvez não houvesse qualquer saída no momento.
Não queria decepcionar meu pai mais. Eu poderia consertar aquela situação concordando em me casar com Nolan. Aquele cara que eu nem conhecia e que só ficou comigo porque estava participando de uma aposta boba.
“ Mas pelo menos ele quer assumir este bebê. ”
Eu me sentiria melhor se ele me virasse as costas?
Não.
— Tudo bem, eu me caso com você — concordei em um fio de voz.
Capítulo 12
Depois que as palavras saíram da minha boca, eu me dei conta do que tinha dito.
E senti mais medo ainda.
Eu tinha mesmo concordado em me casar com Nolan Percy?
Onde eu estava com a cabeça?
Mas antes que eu pudesse voltar atrás, ou algo do tipo, a porta se abriu e meu pai apareceu, seguido de Theodore e Helena.
— E então?
— Amanda aceitou — Nolan respondeu.
Meu pai abriu um sorriso.
Como assim ele podia rir ainda?
O mundo estava enlouquecido?
— Sim, pelo menos isso!
— Pai, podemos ir embora? — pedi, quase implorei, na verdade.
Samantha entrou na sala naquele momento, podia ver Austin atrás dela.
— Então vão se casar de verdade? — indagou animada.
Ela era louca ou o quê?
— Samantha... — Nolan falou seu nome num tom exasperado.
Mas Samantha não parecia se importar.
— Oh, então temos que fazer uma festa de noivado, não acha, mamãe?
— Samantha, menos, querida — Helena falou, me lançando um olhar solidário. Alguém parecia sensato naquela casa. — Acho que um jantar será suficiente.
Ah não!
— Ah, tudo bem. Em três dias? Sim, seria perfeito. Vem Austin, vem me ajudar a aprontar uma lista de possíveis cardápios.
Austin estava encarando Nolan com um olhar grave que eu não entendi. Porém, a namorada já o puxava para fora.
Helena sorriu para mim.
— Não se preocupe, Amanda. Samantha é um pouco exagerada, mas será apenas a família.
— Pai, pronto para ir? — indaguei de novo.
— Sim, vamos, ainda tenho que ir para a Igreja.
Eu saí quase correndo, nem me dando ao trabalho de me despedir de ninguém. Queria apenas me afastar o mais rápido possível.
No carro, meu pai me olhou de soslaio.
— Você está bem?
— Queria que eu estivesse bem depois de tudo?
— Não se faça de vítima, Amanda. Se tivesse pensado antes de agir errado...
— Ah, por favor, pai! Chega!
— Tudo bem. O importante é que o Percy vai remediar.
— Não quero mais falar sobre isso.
Ele ficou em silêncio e não falou mais nada até me deixar em casa.
— Amanda, eu também sinto muito por tudo. Não era o que eu queria pra você. Mas estou contente que tenha tomado a decisão correta.
Eu apenas assenti e entrei.
Passei o dia pensando em como ia explicar aquela situação para minha mãe. Acho que seria a pior parte, sem dúvida.
O telefone tocou o dia inteiro, mas eu não atendi.
Sabia que devia ser Ellie ou Naomi, querendo saber da veracidade das fofocas, mas não me sentia preparada para enfrentar os falatórios ainda.
E à noite, eu liguei para minha mãe.
— Oi querida, tudo bem? Já acabaram suas provas?
— Sim, acabaram.
— E você foi bem em tudo, espero.
— Acho que sim.
Eu me lembrei da prova de Biologia e da mentira do Nolan.
— O que foi, Amanda? Tem alguma coisa errada?
Senti minhas mãos suadas. Era tão duro saber que eu ia decepcionar minha mãe.
Era horrível.
— Não, tudo bem — disse por fim, sem coragem.
Eu era mesmo uma covarde.
Ela começou a falar sobre seu novo trabalho, como massagista, e eu mal ouvia, respondendo por monossílabos.
Até que por fim ela desligou.
Eu me deitei, olhando o teto.
Não poderia esconder pra sempre. Mas ainda não tinha coragem de contar.
Quando meu pai chegou, ele veio até o quarto, mas fingi que estava dormindo.
Naquela noite, não dormi direito e quando dormi, tive pesadelos.
Acordei péssima. Olhei o relógio, era tarde.
Meu pai já deveria ter saído. Imagino-o tendo que lidar com todas as pessoas que iam à igreja. Ter que responder que a filha ia se casar porque estava grávida. Não devia ser fácil pra ele.
Eu me levantei, desci as escadas e quase desmaiei de susto ao ver Nolan Percy sentado calmamente na minha cozinha.
— O que está fazendo aqui?
— Bom dia para você também.
Eu quase gemi, desolada.
Devia estar um horror, de pijama velho e descabelada.
E claro, ele continuava o senhor perfeito de sempre.
— Como entrou aqui?
— Seu pai acabou de sair.
— Oh... Agora ele deixa você entrar aqui sozinho.
— Acho que a mudança de status para noivo ajudou.
Eu rolei os olhos.
Noivo. Aquilo era muito estranho.
— O que veio fazer aqui?
— Preciso de motivos para vir visitar minha noiva?
— Para com isso, por favor. Esta coisa de "noiva" ainda não entrou na minha cabeça — falei dando ênfase com as aspas à palavra noiva.
— Então talvez eu deva falar bastante para você se acostumar.
— Não se dê ao trabalho. Aliás, vai ficar entrando na minha casa sem mais nem menos agora ou vai ao menos bater na porta como as pessoas educadas fazem?
— Posso bater se isso te deixa mais tranquila. — Sorriu.
Não consegui evitar algo se enroscando no meu estômago.
Tinha esquecido do que o sorriso dele fazia comigo.
— Eu vou... me trocar — murmurei meio sem graça com a presença dele ali.
“ Será que seria muito mal-educado pedir que fosse embora? ”
Mas claro que ele não iria.
Eu me afastei e fui para o banheiro, escovando o dente rapidamente. E então senti um enjoo repentino e quase não deu tempo de me inclinar sobre o vaso antes de começar a vomitar.
De repente senti as mãos retirando os cabelos do meu rosto e os prendendo longe até que tudo saísse do meu estômago.
— Está melhor? — Nolan perguntou me ajudando a levantar.
Eu sacudi a cabeça positivamente envergonhada.
— Sim.
— Acho que isso... é normal, não é?
Eu dei de ombros.
— Dizem que é. Será que pode me dar licença? Eu preciso... Tomar um banho.
— Claro.
Ele se afastou fechando a porta atrás de si.
Quando desci, tinha esperança que tivesse ido embora, mas ele ainda estava ali.
— E então? Nada mais de enjoo?
— Não.
— Está com fome?
— Parece estranho, mas acho que sim.
— Eu liguei para a Helena e ela disse que ia sentir.
— Ligou para a Helena?
— Perguntei se isso era normal e ela disse que sim e também pediu que fosse ao hospital quando possível.
— Sei...
— Você fez isso? — indaguei espantada ao ver que havia torradas e chá na minha mesa.
— Sim, a Helena disse que você poderia comer sem passar mal.
— Não precisava se dar ao trabalho — murmurei meio vermelha.
Mas Nolan deu de ombros.
— Trabalho nenhum.
Eu comecei a comer.
— Eu vim te avisar que Helena e Samantha marcaram o jantar para amanhã à noite.
Eu fiz uma careta.
Não me sentia nem um pouco feliz em ter que jantar com os Percy.
— Certo — murmurei desanimada.
— Você... Já falou com a sua mãe?
Eu mordi os lábios.
— Não tive coragem ainda.
— Imagino que deva ser difícil, ainda mais sendo por telefone.
— De qualquer maneira seria difícil. Mas terei que avisá-la, não é? Espero que ela não me mate.
— Seu pai não te matou e acho que ele é mais bravo que ela.
— Você não entende. Minha mãe se casou muito jovem e sempre me deu mil conselhos para que eu não cometesse os mesmos erros.
— Você é uma pessoa diferente da sua mãe, Amanda.
Eu não falei nada.
Nolan nunca entenderia.
— Seu pai parece estar decepcionado com você também.
— Eu decepciono meu pai há muito tempo. — Ele sorriu com sarcasmo e eu me perguntei o que queria dizer.
De repente me lembrei de um detalhe que tinha me passado despercebido.
Ashley! A tal namorada de Nolan.
— E sua... namorada? — indaguei devagar.
Nolan desviou o olhar.
— Esqueça isso.
— Você já contou a ela? Deve ter ficado decepcionada também.
— Esqueça a Ashley — insistiu de forma brusca.
Antes que eu pudesse insistir, alguém bateu na porta e eu fui atender.
E para minha surpresa, era Owen
— Owen!
— Oi, Amanda, podemos conversar?
— Owen, eu...
Então ele olhou através de mim e viu Nolan. Seu olhar se tornou frio como gelo.
— Já entendi. — Ele me fitou com ironia. — Foi rápido.
— Owen, por favor...
— Saquei que estou sobrando.
E ele se afastou sem olhar para trás, entrando no carro que saiu cantando pneu.
— Droga — murmurei fechando a porta.
Quando me virei foi o olhar frio como gelo de Nolan que tive que aguentar.
— O que ele veio fazer aqui?
Eu dei de ombros.
— Não sei.
— Ele ainda vai ficar te rondando?
— Não sou obrigada a ficar respondendo isso.
— Achei que tinham terminado.
— Mas terminamos.
— Espero que ele tenha entendido.
— Acho que já entendeu sim!
— Eu vou embora. Nos falamos no jantar.
E sem mais nem menos, saiu batendo a porta.
Naquela tarde eu tinha que ir trabalhar e fui para a loja dos Cooper.
Era a primeira vez que eu saía depois da confusão e tinha me esquecido que eu era a fofoca do momento. Quando entrei na loja já senti a atmosfera diferente, com todos me encarando e cochichando.
Eu queria que o chão se abrisse aos meus pés.
— Oi, Amanda. — Carlton se aproximou com um olhar ressabiado.
— Oi.
— Você está bem?
— Claro que sim — menti.
— É... Amanda? É verdade o que andam dizendo?
— Qual parte?
— Que você está grávida do Percy? — falou vermelho como pimentão. — Claro que eu não acreditei, óbvio que...
— É verdade.
Eu achei que ele fosse desmaiar.
— Nossa!
— Olha, Carlton, não quero falar sobre isso, ok? É um assunto particular.
— Claro, certo. Mas a cidade inteira está comentando. Dizem que o Owen Smith quebrou a cara do Percy na festa e...
— A cidade devia cuidar da sua própria vida — cortei irritada.
Deus, era um pesadelo.
Como se eu já não tivesse problemas suficientes.
Trabalhei tentando ignorar os olhares furtivos e foi um alívio poder ir embora à tarde.
Quando cheguei em casa, meu pai estava sentado na mesa da cozinha tomando um chá com Samantha.
“ Em que mundo paralelo bizarro eu estava vivendo? ”
— Oi, filha, olha quem veio fazer uma visita. Samantha — falou todo sorrisos.
— Oi, Amanda — Samantha me abraçou animada. — Vim te deixar um presente. Está no seu quarto. É para usar amanhã!
— Samantha, eu não...
— Não precisa agradecer, somos quase irmãs agora! — Ela se levantou. — Nossa, está tarde. Adorei seu chá, Gavin.
— Volte sempre, Samantha.
“ Volte sempre?”
Samantha riu e se despediu com um aceno.
— O que foi isso?
— Ela é bem simpática. Deixou um pacote para você.
— Sei... Eu vou subir então. Já desço para preparar o jantar.
Na minha cama, como avisado tinha um pacote e um vestido azul.
Com uma etiqueta supercara.
— Isso é uma droga — murmurei.
Eu esperava sobreviver àquele jantar.
Eu odiava festas. Definitivamente.
Principalmente aquelas que eram pra comemorar o meu próprio noivado.
Noivado!
Só a palavra já me causava arrepios. Tudo bem que não era uma festa, e sim um jantar. Mas intuía que seria tão desastroso quanto.
E talvez eu tivesse que agradecer por não ser uma festa bem ao estilo dos Percy. Não suportaria ter que olhar na cara de ninguém desta cidade no momento. Nem desconhecidos e muito menos conhecidos.
Estes últimos eram os piores.
E era exatamente nisso que eu pensava na manhã seguinte ao sair do meu carro e andar em direção à secretaria. Chovia um pouco e puxei o capuz sobre a cabeça. Mais para tentar evitar os olhares curiosos do que por precaução.
E já estava me sentindo salva quando me abordaram na porta do prédio.
— Amanda, é você mesmo! — Naomi gritou e gemi involuntariamente.
Lá vinham Naomi e Ellie atrás de mim.
Eu estava fugindo delas como o diabo foge da cruz desde o dia fatídico.
—Oi. — Olhei em volta calculando minhas rotas de fuga.
— Meu Deus, é verdade o que andam dizendo? — Ellie indagou com os olhos brilhando de curiosidade. — A cidade não fala em outra coisa.
— Falei para Ellie que deve ser uma fofoca sem cabimento, mas o Carlton...
Comecei a sentir meu rosto queimar.
— Sim, é verdade.
As duas se calaram, de queixo caído.
Seria engraçado se eu não estivesse ocupada com a minha própria vergonha.
— Mas... Mas... — Ellie balbuciou. — Você e Nolan Percy?! Onde? Quando? Meu Deus!
— E o Owen? Você estava saindo com os dois ao mesmo tempo? — Naomi indagou com os olhos arregalados.
— Olha, gente, eu realmente não quero falar sobre isso...
— Mas você precisa nos contar! Em detalhes! Nós precisamos saber! — A voz de Ellie foi ficando estridente. — Você está grávida do Nolan Percy! Nolan Percy!
Repetia como se eu tivesse engravidado do Príncipe William ou algo assim.
— Ellie, pare com isso — Naomi pediu percebendo meu óbvio desconforto. — Não deve estar sendo fácil para a Amanda isso tudo.
— Ah claro! Ficar grávida com 18 anos. Humpt! É um pesadelo! Devia ter obrigado o Nolan a usar uma camisinha!
Meu rosto agora deveria estar roxo.
— Eu preciso mesmo ir...
— Mas... — Ellie estava inconformada.
— A gente te liga, Amanda — Naomi falou com um sorriso simpático. — Ou se precisar, pode nos... quer dizer, me ligar.
Apenas acenei e fui pra secretaria.
Rezando para não encontrar mais ninguém pelo maldito caminho. Mas hoje não era meu dia de sorte e Carlton também estava lá aguardando suas notas.
Seu rosto ficou ligeiramente vermelho quando me viu.
— Oi, Amanda.
— Oi.
— Tudo bem com você?
Dei de ombros e passei meu nome para a funcionária.
Imaginando se ela também fazia parte da horda de desocupados que tinha a minha vida como diversão. Mas pelo menos ela nem me olhou direito quando me entregou o boletim.
Eu quase respirei aliviada.
Carlton ainda estava ali me olhando e de repente tocou meu ombro.
— Olha, se você precisar de alguma coisa...
— Ela não precisa de nada.
Nós dois nos viramos ao ouvir a voz de Nolan, que nos fitava com um olhar frio.
Claro, meu dia péssimo não estaria completo sem a presença de Nolan.
Meu noivo.
— Oi... Nolan — Carlton gaguejou e eu revirei os olhos.
— Certo, Carlton, vou me lembrar disso. Muito obrigada por seu apoio — respondi e saí andando.
Ouvi passos atrás de mim e nem precisava me virar para saber que era Nolan.
— Amanda, espere.
Eu voltei.
— O que quer?
— O que estava fazendo com o Cooper?
“ O quê? ”
— Ele estava me convidando para ir à casa dele e transar a tarde inteira, não ouviu? — Deus, o que é que eu estava fazendo? Estava mesmo sendo sarcástica com Nolan?
— Está brincando, não é? — Nolan indagou numa voz baixa cheia de tensão.
— Claro que sim! Você fez uma pergunta tendenciosa e eu respondi aquilo que merecia ouvir.
Ele ficou me encarando por um momento e de repente começou a rir.
E foi tão desconcertante que fiquei ali, sentindo um comichão na barriga.
Simplesmente porque Nolan Percy estava rindo.
— Certo, Amanda Thomas, acho que mereci ouvir isso.
— Que bom que eu te divirto. Agora se me der licença, ainda tenho que ir trabalhar.
Ele ficou sério de novo.
— Tem mesmo que trabalhar lá na loja do Cooper?
Eu respirei fundo.
— Olha, vou fazer um favor para mim e para você. Vou fingir que não ouvi isso. Até a noite!
E entrei no meu carro.
Seria tão bom se eu não precisasse mais vê-lo para o resto da vida. Mas agora era uma alternativa impossível.
Hoje tinha o tal jantar.
Com Nolan e sua família.
Acho que Ellie tinha razão. Eu me sentia mesmo num pesadelo.
Capítulo 13
E foi com um embrulho no estômago nada agradável de puro receio que eu desci do carro do meu pai naquela noite, trajando o vestido azul, presente da irmã de Nolan, e observei a casa iluminada.
— Pronta para entrar? — meu pai indagou vestindo seu melhor terno.
Tentei sorrir, não sei se adiantou alguma coisa.
— Sim, vamos.
Acho que as vítimas indo em direção ao sacrifício se sentiam assim.
Quem abriu a porta foi Theodore Percy.
O homem vestia um terno tão bonito que parecia o James Bond. Acho que até meu pai estava um pouco intimidado.
— Olá, Amanda, Pastor Thomas — ele nos cumprimentou educadamente.
— Acho que pode me chamar de Gavin — meu pai falou ao dar-lhe a mão.
— Certo, Gavin, entrem, por favor.
Entramos na elegante sala e toda a família Percy estava lá. Notei que Stella não estava presente.
Será que finalmente eu teria alguma sorte e a minha insuportável ex-amiga não estaria presente?
Todos se aproximaram para nos cumprimentar e senti meu rosto ligeiramente vermelho.
Nolan ficou por último.
— Gavin — ele cumprimentou meu pai e então me fitou. — Oi, Amanda.
E agora?
Como é que eu fazia? Dava a mão também? Abraçava? Beijava?
Este último pensamento me fez ficar mais vermelha.
Mas Nolan resolveu a situação se aproximando e beijando meu rosto.
Foi leve como uma pluma, mas bastou para seu cheiro intoxicar meus sentidos. Trazendo por um momento lembranças que eu julgava enterradas.
— Você está linda com este vestido, Amanda — Samantha falou animada segurando minha mão e me obrigando a girar. — Tenho muito bom gosto mesmo, não acha, Nolan?
Nolan me mediu.
Ele tinha mesmo que fazer isso?
Porque sinceramente o jeito que ele me olhava parecia mais que estava se lembrando como eu ficava sem roupa e não apreciando o vestido.
— Perfeita.
Samantha sorriu, muito feliz consigo mesma.
E ainda segurando minha mão me fez sentar.
Helena ofereceu algo para beber e Theodore foi buscar as bebidas.
Eu percebi que Jace, Nolan e Austin estavam bebendo.
— Espero que não seja nada alcoólico hein, garotos — Gavin comentou.
— Claro que não, Pastor Thomas — Jace falou piscando para mim.
Óbvio que tinha muito álcool ali, mas não falei nada.
— Eu não quero nada — murmurei quando Helena indagou se eu queria beber alguma coisa.
— Tem certeza? Me parece um pouco pálida.
— Eu sou pálida — murmurei.
Ouvi um barulho de salto alto e Stella se aproximou glamorosa com seu vestido vermelho-vivo.
Não tinha como não se sentir intimidada perto de Stella.
Era de uma beleza loura estonteante. E automaticamente eu me virei para Nolan para ver se ele estava a admirando. Mas ele parecia absorto em sua bebida.
E eu senti... alívio?
— Finalmente meu amor chegou! — Jace se aproximou e a beijou.
— Olá para todos — Stella sorriu, mas sem o menor humor e então se virou para Jace. — Já reservei a nossa mesa naquela boate nova, querido. — Jace sorriu a abraçando e sussurrando algo no ouvido dela que a fez dar uma risadinha. — Espero que este jantar chato não demore muito — cochichou, mas alto o bastante para que eu pudesse ouvir.
Eu olhei para meu pai, mas acho que ele não tinha ouvido.
Meu pai costumava gostar de Stella, mas quando começamos a crescer e Stella começou a receber atenção de garotos — e aceitar algumas dessas atenções — meu pai passou a se preocupar que influência isso teria sobre mim e chegou a me alertar algumas vezes. Então quando Stella parou de falar comigo sem mais nem menos, ele ficou mais aliviado do que preocupado.
— Este seu vestido é novo, Stella? — Austin indagou.
— É sim, você notou? É exclusivo — Stella parecia bastante feliz por alguém ter notado.
Eu franzi o olhar. A mãe de Stella era enfermeira e não teria dinheiro para comprar aquele vestido pra ela. Na verdade, as duas sempre viveram de forma simples, já que o pai dela as abandonou quando Stella ainda era um bebê e a mãe se mudou para a cidade.
— Jace tem bom gosto — Samantha piscou deixando óbvio que quem tinha comprado aquele vestido para ela foi Jace.
Bem, não era da minha conta.
— Embora ache este vermelho muito chamativo, Stella, para um jantar em família — Samantha comentou. — Talvez uma cor mais sóbria.
— Talvez se eu tivesse cinquenta anos ou — ela olhou na minha direção — fosse uma coisinha sem graça... talvez usasse... azul.
Ela estava mesmo me provocando?
Naquele momento, eu queria ser uma daquelas pessoas que tinham uma resposta pronta na ponta da língua para tudo.
Quer dizer, eu até podia mesmo responder alguma coisa, mas Stella tinha algo que me deixava totalmente travada.
— Algumas mulheres ficam bem com qualquer cor, Stella — Nolan rebateu. — É uma questão de beleza natural.
Stella rolou os olhos.
— Se você diz.
— Ou talvez não precisem se autoafirmar através de roupas caras. É uma questão de segurança.
Stella não ria mais e o fuzilou com o olhar.
— Sirva uma bebida pra mim, Jace — pediu —, preciso beber hoje.
— Claro, amor. Sem álcool, ok? — Ele piscou para ela rindo, fazendo um gesto para meu pai.
— Ah tá. Que seja!
— E então Gavin, como está a campanha para construir aquelas casas populares? — Helena indagou, certamente para colocar algum assunto em pauta.
Meu pai começou a contar todos os detalhes de sua nova boa ação. Helena e Theodore pareciam interessados, ou fingiam.
Stella e Jace estavam ocupados um com o outro, com risadinhas e sussurros no ouvido.
Samantha e Austin também pareciam meio absortos no próprio mundo, não tão explícitos como Stella e Jace, mas mesmo assim, percebia-se que eles tinham uma ligação profunda.
Meus olhos encontraram os de Nolan. Ele estava olhando para mim, mas eu desviei o rosto rapidamente.
Já estava me perguntando quantos séculos teríamos que ficar ali, quando Helena nos chamou para o jantar.
— Contratamos um buffet fantástico — Helena comentou. — Se eu tivesse tempo teria cozinhado eu mesma. Amo cozinhar, mas o trabalho toma bastante tempo. Por isso concordei com Theodore quando nos casamos de termos empregados.
— Seu marido tem sorte, então — Gavin comentou. — Se não fosse a Amanda, eu morreria de fome. Ainda bem que ela voltou, antes nem sei como sobrevivi.
— Você cozinha, Amanda? — Helena indagou.
Eu dei de ombros, sem graça por a atenção de todos estarem em mim.
— O básico. Meu pai exagera. Porque ele não sabe fazer nada.
— Que prendada! — Stella comentou com veneno.
— Você devia ser assim, Samantha — Helena comentou. — Tento ensinar algo a Samantha, mas é difícil. Talvez quando você estiver aqui Amanda, seja mais fácil.
— Amanda vai morar aqui? — Stella indagou.
— Por enquanto sim, é a casa do Nolan, claro — Helena respondeu.
Eu mordi os lábios com força com aquela informação.
“Quando você estiver aqui.”
Ah Deus, estava mesmo acontecendo, não é?
Eu tinha concordado em me casar com Nolan Percy. E provavelmente faria parte daquela família. Tão rica e exclusiva.
Era demais pra mim até imaginar.
— Aliás, Amanda, precisamos conversar sobre seu vestido, parece que temos tempo, mas nem é tanto assim, porque se esperarmos muito, a barriga pode começar a crescer e aí seria um desastre!
— Samantha, calma — Helena pediu sorrindo.
Eu só queria sumir dali. Sério.
Vestido, barriga crescendo, tempo correndo.
Meu cérebro não conseguia acompanhar tanta coisa.
— Mas ela tem razão — Gavin reforçou. — Precisamos logo apressar, as pessoas já estão falando. Quanto antes este casamento acontecer melhor. Já vou reservar uma data...
— Não pode ser tão rápido também, preciso de tempo pra organizar tudo... — Samantha começou a discorrer sobre listas, convites, decoração e eu juro que comecei a me sentir tonta.
Bebi um grande gole de água.
— Não se preocupe com Samantha. — Eu me virei ao ouvir a voz de Nolan do meu lado. Eu estava tentando ignorar que ele estava ali. Era mais fácil pra minha sanidade. — Ela se empolga fácil com as coisas.
— Estou percebendo.
— Já acabou de comer?
— O quê?
Ele apontou para meu prato, mal tocado.
— Se não vai comer mais.
— Oh... Sim, já acabei.
— Então venha comigo. — Ele se levantou e puxou minha cadeira, me obrigando a levantar.
— Ir onde? — indaguei aturdida.
Nolan se voltou para as pessoas na mesa.
— Eu e Amanda já voltamos.
E sem mais ele segurou minha mão e me puxou pelo corredor.
Eu o segui, confusa.
— Posso saber o que está fazendo?
— Não se preocupe, Amanda, está perfeitamente segura.
— Com você?
Ele se virou quando paramos em frente a uma porta e ele abriu fazendo sinal para eu entrar.
Eu reconheci o lugar.
Era seu quarto.
Acho que foi instintivo dar um passo atrás.
— O que estamos fazendo aqui?
Ele riu.
— Eu falei que estava segura.
— Não sei qual seu conceito de segura.
— Está com medo?
— Não.
— Então por que não entra?
— Por que você não me responde?
— Porque está sendo boba como sempre.
Eu bufei.
Talvez ele tivesse razão.
Ou eu achava que ele ia me atacar ou algo do tipo? Primeiro que não ia fazer nada com meu pai lá embaixo. Segundo que provavelmente não tinha nenhum interesse.
Deixando de ser boba eu entrei no quarto.
Nolan fechou a porta.
Senti meu coração levemente alterado enquanto ele se aproximava.
Controle-se, Amanda.
— Sente-se — pediu e eu me sentei na sua cama.
Por que eu não tinha dado mais alguns passos e me sentado sobre o sofá?
Era algo realmente... íntimo, sentar na cama dele.
Nolan ficou me olhando por um momento e eu esperei.
Sinceramente nem sei o quê.
Mas mal respirava. E então ele sentou ao meu lado e colocou a mão no bolso, tirando de lá uma caixinha preta.
— Achei que ia preferir que eu te desse isso sem toda a plateia, conhecendo você e seu senso de timidez — explicou enquanto abria a caixinha e vi um anel tão brilhante que chegou a ofuscar meus olhos.
Um anel de noivado.
Meu coração parou por alguns momentos.
Eu o encarei, surpresa.
— Dadas às circunstâncias, acho que não preciso fazer um pedido, a não ser que queira que eu ajoelhe.
— Não! — falei rápido, finalmente recuperando a voz. — Tem razão, não preciso. Aliás, não é preciso nada disso, eu acho. Este anel...
— Não gostou? — indagou com uma nota de preocupação. — Samantha disse que ia gostar de algo mais simples, embora Stella...
— Stella?
Ele deu de ombros.
— As duas me acompanharam.
— Entendi — falei um pouco azeda imaginando Stella escolhendo um anel de noivado para mim.
— Enfim, eu escolhi este, embora a Samantha preferisse algo mais ostentoso.
— Foi uma escolha sua?
— Mas pode trocar. Se você preferir algo diferente.
— Não, acho que é bonito.
Era como estar em algum tipo de sonho surreal.
Eu, sentada em frente a Nolan Percy com uma caixinha contendo um anel de noivado dentro.
Ele retirou o anel e pegou minha mão.
Foi como se uma corrente elétrica passasse dele para mim.
E então ele escorregou o anel por meu dedo.
Eu fitei minha mão.
Parecia que pesava toneladas agora.
Era bem real. Eu era noiva de Nolan Percy.
— Isso é tão estranho — murmurei por fim.
E ele deu uma risadinha, mas não era uma risada irônica, ou divertida.
Era... nervosa.
Como se ele também achasse tudo aquilo muito estranho. Ou algo assim.
Eu o encarei, mas ele fitava o anel. Sua mão ainda segurava a minha e passava o dedo indicador pelo diamante.
— Amanda, eu... sinto muito por tudo isso... estar acontecendo assim.
Nolan Percy podia sentir muito? Eu não sei se acreditava.
— Acho que é tarde para alguém sentir muito, não é?
Ele levantou o olhar.
Verde e dourado.
Muito perto.
— Sim, é tarde demais.
— Acho que sim...
— Está arrependida?
— Do quê? — Minha voz saiu carregada de ironia.
Eu podia passar a noite inteira elencando tudo o que eu me arrependia desde que botei os olhos nele.
Mas Nolan tinha razão.
Era tarde demais.
— E você, se arrepende de mim?
Ele sorriu, agora sim, o sorriso perfeito de Nolan Percy.
Eu desejei não sentir aquele arrepio na espinha só porque ele estava sorrindo.
— E para oficializarmos só falta uma coisa.
Ele ignorou minha pergunta e antes que eu sequer pensasse no que estava falando, se inclinou e me beijou.
Nolan Percy estava me beijando enquanto sua mão ainda segurava a minha, a outra se infiltrou no meu cabelo, me mantendo presa ali, enquanto seus lábios deslizavam sobre os meus. Delicadamente, intensamente.
Aspirei o cheiro delicioso que vinha dele, sentindo seu gosto na minha língua, quando entreabri os lábios, ele invadiu e então eu estava perdida. Todo meu corpo sentiu o beijo e acho que gemi contra sua boca, derretendo.
E tudo isso na questão de segundos que durou o beijo, antes dele se afastar e eu abrir os olhos, o encarando meio ofegante.
Duas realidades se debatiam dentro de mim, existia a sensatez que queria abrir a porta e sair correndo dali. Aquele cara era o mesmo que tinha apostado que ia dormir comigo por um Jeep, que tinha uma namorada e nem se dera ao trabalho de me contar.
E a outra parte nem um pouco sensata que queria pedir para ele trancar a porta e se deitar comigo naquela cama e...
Uma buzina lá fora me tirou do devaneio e pisquei me levantando de um pulo.
Nolan fez o mesmo, passando a mão pelos cabelos.
— Acho melhor descermos. Acho que... chegou alguém.
— Sim, tem razão. Vamos descer.
Ele abriu a porta e nós descemos as escadas, diretamente na sala dos Percy.
E naquele momento Theodore Percy abria a porta para o visitante.
Ou melhor, a visitante.
A primeira coisa que notei foi que ela era extremamente bonita, de uma beleza exótica, com cabelos loiros arruivados.
Ela olhou diretamente em minha direção, ou melhor, além de mim. Para Nolan.
— Oi, Nolan.
Talvez eu já soubesse quem era aquela moça antes mesmo de Stella se aproximar dela sorridente.
— Oi Ashley, que bom ter você aqui!
Então aquela era Ashley.
A namorada de Nolan.
Como se tudo já não estivesse suficientemente ruim.
Sempre podia ficar pior.
Capítulo 14
Eu não esperava que o jantar na casa dos Percy fosse algo fácil ou agradável. Mas definitivamente não esperava ter que conhecer a ex-namorada de Nolan justamente hoje.
Na verdade, eu esperava não a conhecer nunca.
Mas, se ela era ex-namorada, que diabos estava fazendo ali, abraçando Stella efusivamente?
Olhei ao redor, todos estavam num silêncio tenso.
Stella se virou para a família.
— Nossa, parece que viram um fantasma!
Samantha foi a primeira a se mexer e cumprimentar a recém-chegada.
— Oi Ashley, que surpresa! Austin, não me contou que sua prima viria?! — ela indagou ao namorado.
— Porque eu não sabia — Austin respondeu.
Opa. Ashley era prima de Austin?
Os outros familiares se adiantaram para cumprimentar a recém-chegada. Menos Nolan.
Ashley nos encarou por fim.
Enquanto ela caminhava em nossa direção, com seus saltos ecoando no chão de madeira, eu sentia como se estivesse sendo cercada por uma cobra.
— Olá Nolan, não vai me cumprimentar?
— Oi, Ashley. — Sua voz era tão tensa como sua postura.
Era para ser tenso mesmo. Afinal, ex-namorada, atual namorada, tudo no mesmo recinto...
Não que eu me sentisse como uma namorada.
Eu me sentia mais como uma intrusa.
Mas Ashley parecia estar alheia à tensão à sua volta e sorriu ficando na ponta dos pés para beijar o rosto de Nolan, as unhas bem cuidadas roçando em seu peito.
E então ela me fitou.
Seu olhar era bem parecido com o que Stella me lançava. Mas o de Stella era cheio de um desdém calculado. Aquele era de um interesse venenoso.
Como se ela fosse me esmagar com seus saltos a qualquer momento. Com certeza era esta sua vontade.
— E você é?...
— Esta é Amanda Thomas — Nolan respondeu. — Minha... noiva.
Era impressão minha ou ele hesitou na palavra noiva?
— Oh... Não sabia que estava noivo.
Não acreditei em nem um segundo naquela informação.
— Até poucas semanas você era solteiro. Ou melhor... Tinha outra namorada. — Ela se voltou para mim. — Você sabia?
— Sim, sabia — respondi sustentando seu olhar.
— Que bom que esclarecemos esta dúvida.
— O que a traz aqui, Ashley — Jace indagou com um risinho.
Como se tudo aquilo fosse muito divertido.
Mas agradeci mentalmente por sua intervenção.
Porque tinha a impressão de que Ashley iria agarrar nos meus cabelos e me jogar porta afora.
— Achei que tivesse chamado Camden de fim de mundo quando nos mudamos para cá.
Ela deu de ombros.
— Saudades dos meus amigos. Achei que seria uma boa hora, agora que acabaram as aulas para uma visita. Espero que não se importem de eu passar o fim de semana com vocês.
— Claro que não, querida — Helena respondeu.
— Amanda, está tarde, precisamos ir — papai anunciou e respirei aliviada.
— Sim, pai.
— Achei que a Amanda fosse sair com a gente — Samantha comentou. — Não íamos naquela boate?
— Oh, vocês vão sair? — Ashley falou animada. — Que ótimo, vou apenas trocar de roupa, então!
— Claro. Eu vou lhe mostrar o quarto de hóspedes — Helena falou.
— Eu vou te ajudar. — Stella as seguiu. — Jace, pegue as malas da Ashley.
Jace fez o que Stella pediu e os quatro desapareceram escada acima.
— Amanda, você quer ir com eles? — papai indagou e antes que eu pudesse responder algo como nem morta , Samantha saltitou em minha direção.
— Ah, Amanda, vamos! Vai ser ótimo! Stella vai ficar grudada na Ashley a noite inteira fofocando e eu adoraria que fosse com a gente! — Ela se virou para o meu pai. — Ela vai com a gente sim, Gavin.
— Não, eu... — balbuciei tentando escapar.
— Certo. Só não volte muito tarde.
— Eu a levo em casa — Nolan respondeu.
Oh Droga, aquilo não estava acontecendo!
Com pesar eu vi meu pai saindo e eu fiquei ali. No meio dos tubarões. Que por acaso muito em breve seriam minha família.
Samantha me puxou pela mão.
— Venha, Amanda, venha retocar a maquiagem.
— Não sei se é uma boa ideia eu ir com vocês... — murmurei enquanto ela me maquiava.
— Claro que é.
— Ashley deve me odiar, afinal era a namorada do Nolan...
— Mas agora não é mais. Não se preocupe com a Ashley.
Eu queria ter a mesma tranquilidade de Samantha. Mas não era ela que tinha transado com o namorado da Ashley.
Mesmo não fazendo ideia que existia uma namorada.
Ela acabou e ficou me encarando.
— Está perfeito. A gente só precisa... trocar este vestido.
— Trocar o vestido? Mas...
Ela me puxou para seu quarto, abrindo o guarda-roupa e tirando vários vestidos de dentro.
— Samantha, sério...
— Este seu vestido está ótimo para um jantar, mas pra ir dançar tem que ser algo... — Ela pegou um preto. — Este aqui.
— Não, não vou vestir isso.
Ela riu.
— Claro que vai. Confie em mim. Eu entendo dessas coisas.
Meia hora depois, desci as escadas usando saltos tão altos quanto os de Stella e com um vestido preto curto de Samantha.
Se não estivesse tão cheia de maquiagem, com certeza daria para ver que meu rosto estava tingido de vermelho.
— Uau. Está muito gata, Amanda. — Jace assoviou e fiquei mais sem graça ainda.
— Isso tudo é um exagero de Samantha.
— Uma obra-prima de Samantha — Samantha corrigiu.
— Tem razão.
Eu voltei e Nolan estava entrando na sala.
— Quem tem razão? — Samantha indagou se enganchando no braço dele. — A Amanda dizer que é um exagero, o Jace dizer que ela está gata ou que é uma obra-prima minha?
— Os três.
— Pronto, estamos prontas! — Ashley e Stella desceram.
Stella ainda usava o mesmo vestido vermelho colado como uma segunda pele em seu corpo e Ashley agora usava um vestido creme solto e quase transparente.
As duas me encararam de olhos arregalados.
— Não está linda? Deem os parabéns a mim — Samantha falou.
Stella se recompôs.
— Sim, lhe dou os parabéns, Samantha. Consegue transformar qualquer sem graça em algo bonito.
Claro que ela tinha que alfinetar.
A notícia boa era que eu já estava ficando acostumada.
— Vamos indo? — Austin indagou.
— Vamos — Jace concordou. — Vamos com dois carros?
— Sim, vou com meu. — Samantha pegou as chaves. — Nolan pode ir com o carro dele.
— Tudo bem — Nolan concordou.
— Jace e Stella vêm comigo?
— Certo, eu vou com o Nolan — Ashley anunciou.
Quase perguntei se tinha um lugar para mim no carro de Samantha.
Nem sei o que seria pior.
Será que ninguém naquela família maluca percebia o absurdo da situação?
Nolan abriu a porta do carro e eu entrei.
Ashley entrou em seguida, se acomodando no banco de trás.
— Achei que agora tinha um Jeep, Nolan — comentou. — Não ganhou de Jace numa aposta?
Não, não era possível que ela soubesse disso.
— Sim — Nolan respondeu simplesmente.
Eu queria realmente abrir a porta e saltar.
Mesmo que eu morresse no processo. Quem se importava?
Só não queria estar no mesmo carro que Nolan e sua ex-namorada falando sobre aquela maldita aposta.
Ashley soltou uma risadinha.
— Vocês não perdem essa mania de ficar se desafiando! Stella me contou o que foi que apostaram desta vez.
Eu olhei pelo vidro, fingindo estar muito interessada na estrada escura.
— Ashley, se não se importa, não estou a fim deste assunto — Nolan a interrompeu.
— Oh, me desculpe. Amanda não deve gostar deste assunto mesmo, não é? Mas acho que nem deve reclamar, se deu bem no final! Vai casar com um Percy! Melhor que ganhar um Jeep!
— Chega, Ashley! — A voz de Nolan era baixa e ameaçadora.
E Ashley se calou.
O resto do caminho foi feito no mais absoluto silêncio.
Eu já estava me arrependendo amargamente de estar ali. Foi um alívio quando paramos o carro em frente à boate iluminada.
Não havia muitos lugares como aquele em Camden, mas quando ia chegando o verão, a cidade enchia de turistas, geralmente algumas boates abriam por alguns meses.
Nolan deu a volta e abriu a porta para mim, me puxando pela mão.
— Você está bem? — indagou baixinho.
Eu dei de ombros.
— Vamos entrar. — Samantha apareceu animada.
Nolan não soltou minha mão enquanto entrávamos no ambiente barulhento. Lancei um olhar para Ashley e ela me encarava com maldisfarçado ódio.
E como não culpá-la?
Eu só estava ali de mãos dadas com Nolan porque estava grávida.
Do contrário, seria esquecida como uma aposta bem-sucedida.
Nós nos sentamos numa mesa VIP.
— Vamos beber — Stella falou animada chamando o garçom. — Claro, menos Amanda, que está bem grávida!
Certo, ela podia gritar um pouco mais alto porque as pessoas do outro lado da rua não tinham ouvido.
As bebidas foram servidas e certamente eu optei por um refrigerante.
— Ashley, adorei que veio passar o fim de semana com a gente — Samantha comentou tomando vários goles de sua bebida como se fosse água. — Podemos ir acampar, lembra como nos divertimos da última vez? Este fim de semana fará um tempo ótimo!
— Sim, seria ótimo — Jace concordou. — Aqui tem muito lugar legal para acampar.
— Eu adoraria. — Ashley sorriu animada.
— Ótimo, vamos todos! — Stella anunciou e me encarou. — Eu te convidaria também, Amanda, mas acho que não vai gostar, não se importa do Nolan ir, não é?
— Não se preocupe com isso, Stella — Nolan respondeu. — Não estarei aqui neste fim de semana e nem Amanda.
Eu o fitei. Do que ele estava falando?
— Nós vamos visitar a mãe dela em São Francisco.
— Vamos?! — indaguei surpresa.
De onde surgiu aquele papo de viagem?
— Sim, vamos conversar com a sua mãe sobre o casamento. Achei que seria mais fácil pessoalmente. Já cuidei de tudo. Viajamos amanhã de manhã.
Eu podia reclamar.
Podia dizer que não iria viajar com ele de jeito nenhum.
Mas na atual circunstância seria bom estar bem longe de Ashley.
— Tudo bem.
— Ah, Nolan, podia adiar essa viagem! Logo agora que Ashley está aqui? Que mal-educado! — Stella reclamou.
— Não será adiado.
Stella e Ashley trocaram um olhar azedo.
— Vamos dançar! Todos nós — Samantha falou, talvez para quebrar o clima. — Vem, Amanda!
— Não, estou bem aqui. Eu não danço.
— Claro que dança, vem!
— Não, é sério.
Stella e Ashley já tinham se levantado com Jace e ido para a pista.
— Eu fico com você — Nolan falou.
— Não, vá com Samantha.
— Eu fico com a Amanda. — Austin piscou. — Também não curto muito dançar.
Samantha revirou os olhos.
— Vocês são dois chatos.
Eles foram para a pista.
— Samantha a deixa tonta, não é?
Eu ri.
— Ela é sempre assim?
— Sempre. Quer dizer, desde que começamos a sair.
— Como foi isso? — Não consegui evitar a curiosidade.
— Bem. — Ele hesitou um pouco. — Já sabe que Ashley e Nolan namoravam.
— Claro que sei. — Sorri com ironia. — Não fazia ideia que eram primos.
— Está achando estranho porque sou negro? — Ele riu. — Minha mãe é negra e meu pai, irmão do pai da Ashley, é branco. Mas enfim, eu às vezes saía com eles, embora sair com os irmãos Percy não fosse meu melhor programa.
— Como assim?
Ele hesitou de novo.
— Estudei no mesmo colégio de Nolan e Jace. Fazíamos parte da mesma turma por assim dizer. Eles eram legais. Mas depois de... — ele hesitou — enfim, depois de um tempo já não era tão legal sair com eles. As coisas mudaram. Eles ficam meio... incontroláveis.
— Ah, tipo, rebeldes?
Eu me recordei dos comentários de Naomi.
Ele riu.
— Isso define. Ashley era igual, por isso se deram bem.
Não sei se gostei de ouvir que Ashley e Nolan combinavam.
— Eu já não estava sempre por perto, mas sabia através de Ashley que os irmãos brigavam muito com o pai. Principalmente Nolan.
— Por que eles eram rebeldes?
— Ao que parece, eles eram assim por causa do pai.
— Como assim?
— Talvez eu esteja falando demais aqui...
— Por favor, Austin. Acho que tudo bem eu saber, né? Vou me casar com Nolan. — Tentei persuadi-lo a continuar.
— Certo. — Ele continuou: — Ao que parece, Nolan culpava o pai pela morte da mãe deles.
— Como ela morreu?
— Ela se suicidou.
Ah, meu Deus. Aquilo foi inesperado.
— Nolan tinha 15 anos e Jace 16. E a partir daí parece que ele mudou totalmente.
— Como o pai dele pode ser culpado da morte da mãe se ela se matou?
— Theodore não era fiel, é o que dizem.
— Oh...
— Enfim, eles começaram a dar bastante problema. Festas, bebidas, drogas, arruaças. Então quando Theodore conheceu Helena em um cruzeiro, se apaixonou por ela.
— Por que Helena não foi morar com ele em Nova York?
Austin hesitou de novo. Como se tivesse que escolher o que contar.
— Por que Theodore queria tirar Nolan de lá. Ele ameaçou mandar Nolan para um colégio interno, caso ele não parasse de se destruir.
— Bem, Nolan parece diferente agora. — Mas o que eu sabia? Nolan não parecia muito contente em viver ali em Camden, pelo pouco que eu entendia. Ele se referia a cidade com tédio. Mas nunca ouvi falar nada realmente horrível sobre ele. Então será que Theodore tinha conseguido controlá-lo?
Não parecia ter muito sentido. Se Nolan aprontava desse jeito que Austin contou, por que ele mudaria só porque mudou de cidade?
“ Talvez por isso ele se sentisse tão entediado que apostou com o irmão que ia te seduzir, para se divertir. Talvez ele não seja mesmo uma boa pessoa, afinal. ”
— Jace foi pra faculdade, mas você deve saber que não estava levando muito a sério e decidiu trancar o curso e ficar aqui até o próximo ano. E acho que isso tem muito a ver com a Stella. Ele se apaixonou por ela assim que botou os olhos nela. Ela já era amiga da Samantha.
— Imagino...
— E eu conheci Samantha no casamento de Helena e Theodore.
— E se apaixonou?
— O que dizer? Caí de quatro. — Ele riu e eu o acompanhei.
Austin parecia um cara muito legal. Tão diferente de Ashley.
— Ashley deve me odiar. Por ter roubado Nolan, ou algo assim.
— Ninguém rouba uma pessoa de outra. Isso é ridículo. Se Nolan quisesse ficar com Ashley, ele ficaria. Nolan não se dobra a nada nem a ninguém.
— Mas se dobrou ao meu pai quando ele exigiu que se casasse comigo.
— Olha, sei que a história de vocês é meio torta, mas se Nolan não quisesse ficar com você, ele não ficaria.
— O que quer dizer?
Ele se calou e tive a impressão que havia mais coisa naquela história do que ele estava me contando.
— Algumas coisas acontecem na nossa vida que fazem com que a gente mude. Ou não queiramos mais cometer os mesmos erros.
— Não entendi.
— Amanda?
Ouvi meu nome e olhei para cima dando de cara com Carlton me encarando embasbacado.
— Oi, Carlton.
— Uau, é você mesma! Você está... uau!
Eu ri, sem graça.
— Ainda sou a mesma Amanda, que trabalha para seu pai, então pare de me olhar assim.
Ele riu.
— É que está... tão bonita e... — Ele olhou e viu Austin, ficando vermelho.
— Olá, eu sou Austin.
Carlton o cumprimentou.
— Carlton Cooper.
— Sente aí, Carlton, se é amigo da Amanda é bem-vindo.
— Obrigado.
Carlton sentou e Austin pediu uma bebida para ele.
E era realmente exasperante que ele continuasse me olhando daquele jeito.
Eu virei minha atenção para a pista e não deveria ter feito isso.
Ashley dançava insinuante para Nolan.
Virei o rosto, enojada.
— Quer dançar, Amanda? — Carlton convidou.
Eu estava com o não na ponta da língua, mas depois da cena ridícula na pista me vi respondendo sim.
Eu não tinha mentido, não era boa dançarina. No entanto, quando chegamos à pista, começou a tocar uma música mais lenta.
Carlton se aproximou ainda meio vermelho.
E deixei que ele me abraçasse e me conduzisse.
— Você de novo, Carlton Cooper. — A voz fria de Nolan chegou até nós.
— Oh, me desculpa, eu não sabia que... — Carlton murmurou.
— Tire as mãos dela — Nolan ordenou e Carlton me soltou no mesmo instante e se afastou.
— Não precisa ser grosso, Nolan — rebati irritada. — Estávamos apenas dançando. Como você e Ashley!
— Achei que não dançasse. Se queria dançar não precisava pedir para o Cooper.
Ele me puxou para si.
— Não quero dançar com você!
— Preferia dançar com o Cooper?
— Preferia não estar aqui, presenciando sua ex-namorada se jogando em cima de você. É nojento.
— Não sabia que a Ashley iria aparecer aqui.
— Isso não torna a situação menos ridícula!
— Vamos viajar amanhã. Não precisa mais chegar perto dela.
— Ela parece ser muito querida pela sua família. Vai ser difícil isso acontecer. E ela era sua namorada. Ou é tão egoísta que não pensa que isso deve ser muito difícil para ela?
Infelizmente não pude tirar a razão de Ashley. Eu me colocava no lugar dela. Se Nolan fosse meu namorado e de repente me largasse pra casar com alguma garota que engravidou.
— Não pedi que ela viesse!
— Mas ela veio. E deve me odiar. E acho que eu nem posso culpá-la por isso!
— Não se martirize por causa de Ashley. Embora ela tenha feito todo o discurso de que não sabia que estávamos noivos, sabia sim. Com certeza Stella e sua boca grande devem ter lhe informado.
— Ela é muito amiga da Stella?
Eu me perguntava quantas vezes Ashley esteve ali em Camden e como tinha se aproximado de Stella.
— Sim, elas se dão muito bem.
— Talvez ela tenha vindo para te reconquistar. Talvez o queira de volta e não se importe que tenha engravidado outra.
— Se veio para isso, perdeu o tempo dela. Nós vamos nos casar, Amanda. Isso é um fato. E Ashley tem que se acostumar com isso.
Olhei em volta e Ashley estava a poucos metros de distância, nos fitando com maldisfarçada raiva.
Nolan acompanhou meu olhar.
— Ela não parece conformada neste instante — sussurrei. Era como se o ódio de Ashley me atingisse fisicamente, me fazendo mal.
Nolan me fitou.
— Talvez isso a convença.
E então ele me beijou.
Pega de surpresa, deixei que ele me beijasse, no meio da pista de dança cheia de gente, os braços me prendendo fortemente e a boca persuasiva sobre a minha.
Eu poderia tê-lo empurrado. Eu deveria tê-lo empurrado.
Mas como é que eu faria isso? Toda vez que Nolan chegava perto de mim era como se meu cérebro deixasse de funcionar. E eu só pensava em como seu gosto era delicioso, em como sua língua procurando a minha me causava arrepios que começavam na minha espinha e se espalhava por meu corpo trêmulo e subitamente fraco e como ele esquentava nos lugares certos... E eu só queria que ele não parasse nunca de me beijar.
Mas ele parou. Eu o encarei, ofegante e então lembrei.
Ele tinha me beijado para provocar Ashley.
Olhei em volta e Ashley ainda estava no mesmo lugar, mas agora Stella estava ao lado dela, cochichando algo em seu ouvido. E seja lá o que tenha dito fez com que Ashley voltasse para a mesa e elas pediram mais bebidas.
Eu me desvencilhei de Nolan.
— Nunca mais me beije para provocar sua namoradinha — murmurei friamente.
Ele passou a mão pelos cabelos.
— Amanda, eu...
— Será que podemos ir embora? — pedi começando a me sentir mal.
Aquele dia estava sendo demais para mim.
— Tudo bem.
Ele segurou minha mão e voltamos para a mesa.
— Cadê seu amigo simpático? — Ashely indagou.
— Carlton? Um partidão hein, Amanda, totalmente apaixonado por você. — Stella se intrometeu. — Não cansa de quebrar corações? Primeiro Owen, agora Carlton... quem diria, a mocinha inocente partindo corações pela cidade. Cuidado hein, Nolan. Talvez ela te largue por outro rapidinho...
— Cale a boca, Stella — Nolan murmurou friamente. — Eu e Amanda vamos embora.
— Mas ainda está cedo! — Stella reclamou e você trouxe a Ashley e...
— Ela pode voltar com vocês. Nos vemos em casa.
Nós saímos e o manobrista trouxe o carro.
Percorremos o caminho em silêncio. Nolan ligou o rádio do carro e começou a tocar Kings of Leon.
Que me fez lembrar da primeira vez que eu tinha entrado ali, percorrendo aquele mesmo caminho. Como é que eu podia imaginar que dois meses depois eu estaria grávida daquele cara que me deu carona?
O lindo, perfeito e rico Nolan Percy.
Ou não tão perfeito assim, se levar em conta as coisas que Austin me contou.
Será que eram mesmo verdades?
Ele parou o carro em frente a minha casa.
— Posso te perguntar uma coisa?
— O quê?
— Austin me contou umas coisas...
O rosto de Nolan se fechou.
— Que merdas ele te contou?
Eu fiquei vermelha.
— Não muito. Ele me contou que você e Jace eram... tipo rebeldes.
Nolan riu, totalmente sem humor.
— Que causavam problemas e que... brigavam muito com seu pai... — Não queria entrar no assunto da mãe dele. Era pessoal demais e talvez ele ficasse bravo por Austin ter contado. — E que por isso se mudaram para cá.
— Parece que Austin é bem fofoqueiro.
— Fui eu que insisti no assunto.
— Curiosa, hein?
— Talvez seja normal. Eu não sei nada sobre você.
— O que gostaria de saber? Que eu era um escroto?
— Era?
— Talvez eu ainda seja. — Ele não negou. — Qual o problema, Amanda? A filha do pastor está com medo de se aliar a um garoto mal?
— Acho que a escolha meio que foi tirada de mim.
— Ainda dá tempo de fugir.
— Você me deixaria ir?
— Você quer fugir?
Desviei o olhar.
Eu queria?
Será mesmo que eu estava surpresa pelas coisas que Austin me contou e por supostamente ter até coisa pior?
Nolan parecia um cara que odiava Camden. Eu deveria saber que ele se sentia preso ali. Por isso mesmo fez aquele joguinho comigo, provavelmente.
Deve ter sido muito divertido pra ele me fazer de idiota até me levar pra cama. E ainda arrematar o carro do irmão. Será que eles riram enquanto Nolan lhe contava como eu fui fácil?
Pensar nisso me deixava sim com vontade de fugir.
Quem era aquele cara com quem eu ia me casar?
Quanto Nolan poderia me odiar por ter que fazer isso?
Talvez ele tivesse razão e eu deveria mesmo querer fugir correndo. Mas como encarar meu pai com mais aquela decepção?
— Pronta para viajar amanhã? — Nolan desistiu de esperar minha resposta.
— Preciso avisar a minha mãe que estamos indo.
Não sabia como é que iria falar para ela que estava viajando com um tal de Nolan Percy, e não com Owen.
— Eu te pego amanhã às 8h, tudo bem?
— Tudo bem.
Ficamos em silêncio e o olhar dele me percorreu por um instante, parando no meu rosto.
— Não posso culpar Carlton Cooper por ficar caído por você.
Engoli em seco, meu rosto vermelho e meu coração começando a bater descompassado.
— Como disse Stella, Samantha consegue transformar qualquer sem graça em...
Eu não consegui terminar porque do nada ele tinha se inclinado e roçado os lábios sobre os meus, engolindo minhas palavras.
Foi rápido, mas serviu para me tirar do prumo.
Seus dedos ainda percorreram meus lábios por um instante e eu estava com dificuldade de me lembrar como se respirava.
E por um momento louco eu me imaginei pedindo que ele não parasse, que continuasse a me beijar e...
— Amanda, é você?
Eu me afastei ao ouvir a voz do meu pai na porta.
— Boa noite, Nolan.
— Boa noite, Amanda.
Saltei e entrei.
Esperava que meu pai não reparasse no meu rosto vermelho e minha respiração ofegante.
Capítulo 15
— E aí, como foi? — papai indagou da sala.
— Ficamos apenas um pouco. Sabe que não curto essas coisas
— Que roupa é esta?
— É da Samantha.
— Nolan te trouxe em casa?
— Claro que sim... Pai, eu vou dormir. Estou cansada.
— Amanda, espera. Preciso falar algo com você.
— Sim?
— Amanhã Bob virá aqui.
Eu mordi os lábios com força.
— Então ainda são amigos, mesmo depois do que aconteceu?
Estava tão envolvida no meu próprio drama que nem tinha parado para pensar como minhas atitudes poderiam afetar a amizade antiga de Gavin e o pai de Owen.
Papai coçou o cabelo.
— Conversei com ele e Owen ontem. Claro que Owen ainda está arrasado.
Senti meu coração apertado ao pensar em Owen sofrendo.
E a culpa era toda minha.
— As coisas estão meio estranhas, mas eu o chamei mesmo assim para vir aqui. Espero que não se importe.
— Ele é seu amigo, pai. E, na verdade, eu tenho que sentir muito pelo que fiz com Owen. Ainda bem que Bob ainda quer vir aqui.
— Você errou, mas não tem como voltar atrás. Sempre ia preferir o Owen para você. Agora isso é impossível.
— Eu sei.
— Então tudo bem sobre amanhã?
— É, pai... eu ia me esquecendo de dizer. Eu vou viajar.
— Para onde?
— Para São Francisco. Vou visitar a mamãe. E contar a ela.
— Quer que eu vá com você?
— Nolan vai comigo. Na verdade, foi ideia dele. Contar tudo pessoalmente.
— Lydia não vai ficar nada contente com isso, mas é melhor falar pessoalmente mesmo. E seria bom que fosse com Nolan.
— Talvez... Eu vou subir. Ainda preciso fazer as malas. Boa noite.
— Boa noite, Mandy.
Acordei levemente enjoada. O dia estava frio e chuvoso.
Mas eu podia me animar por estar indo para São Francisco.
Mesmo assim, imaginar o que eu ia fazer lá já me enchia de angústia e tirava qualquer animação.
Ouvi vozes na cozinha e Nolan e Samantha estavam lá com meu pai.
— Bom dia, Amanda — Samantha me cumprimentou animada. — Pronta para ir?
— Samantha vai nos levar ao aeroporto — Nolan explicou.
— Certo... Estou pronta sim.
— Não vai comer, Mandy? — meu pai indagou.
— Não, estou um pouco enjoada.
Nolan me encarou.
— Tem certeza que está bem para viajar, nós podemos adiar...
— Não, eu vou melhorar.
— Certo, então todos para o carro. — Samantha saltitou.
Era incrível como alguém podia ser tão animada assim a esta hora da manhã.
Assim que entramos no carro, o telefone celular de Samantha tocou e ela atendeu, sem se preocupar que estava dirigindo.
— Oi, Stella... Eu não vou demorar. Não é possível que não tenha nada para ela aí em casa! É a casa de uma médica, pelo amor de Deus! Está bem, eu compro. — Ela desligou. — Ninguém mandou a Ashley beber demais. E agora tenho que comprar alguma coisa para ela tomar porque a Stella não quer pedir para minha mãe. Ou a Ashley não quer, sei lá. Duas folgadas!
Eu olhei o movimento pela janela me abstendo de fazer qualquer comentário.
Não queria saber nada de Ashley.
Nolan também nada comentou.
Samantha nos deixou no aeroporto e me abraçou antes de ir.
— Divirtam-se em São Francisco! E não façam nada do que eu não faria. — Piscou colocando os óculos escuros e se afastando.
— Você precisa comer alguma coisa — Nolan comentou.
— Não quero comer. E nem tente me obrigar, talvez eu vomite em cima de você.
Ele riu.
— Tudo bem, você come no avião.
Eu não disse nada.
Meu estômago dava voltas de ansiedade. Em poucas horas eu veria minha mãe. Ontem à noite enviei uma mensagem de celular contando que iria visitá-la no fim de semana, mas não falei nada de Nolan.
Claro que viajar com um Percy não seria menos do que viajar de primeira classe.
E Nolan insistiu de novo que eu comesse. Eu não estava com a menor fome, mas me obriguei a comer. E enquanto a viagem prosseguia e íamos chegando cada vez mais perto de São Francisco, mais nervosa eu me sentia.
Descemos no calor abafado da cidade e pegamos um táxi. Queria estar feliz por estar de volta, mas era impossível. Eu estava prestes a desapontar minha mãe. E isso era difícil.
Lydia abriu a porta com um sorriso de orelha a orelha e me abraçou.
— Amanda, que saudade!
— Oi, mãe.
E então ela olhou por sobre meu ombro e o viu.
— E quem é este? — indagou com um olhar curioso.
— Nolan Percy.
— Oh... Certo, Nolan Percy, muito prazer — Lydia o cumprimentou e me encarou com um olhar indagador.
— Mãe, acho que temos que conversar.
— Certo, entrem.
Nós nos sentamos à mesa da cozinha da minha mãe e ela serviu chá gelado e sentou à nossa frente.
Eu suava frio.
— E como está Owen? — Foi sua primeira pergunta.
Claro que provavelmente ela já tinha sacado que algo estava errado.
— Nós terminamos.
— Jura? Quando foi isso? Acho que já deve fazer um tempo, não é, já que... — Ela olhou para Nolan significativamente tirando suas próprias conclusões.
— Alguns dias, na verdade.
Ela arregalou os olhos.
— Foi rápido.
— Mãe, escuta. Tem algo sério que preciso te contar.
— Algo sério? Está me assustando, Amanda. — Soltou uma risada nervosa.
Eu olhei para Nolan tentando achar as palavras certas e então ele falou na minha frente.
— Lydia, eu e a Amanda vamos nos casar.
Mamãe abriu a boca várias vezes, estupefata.
— Casar? Como assim casar? — Ela me encarou horrorizada. — Que história é essa? Você está com este rapaz há alguns dias!
— É... mais ou menos.
— Não estou entendendo.
— Mãe, estou grávida. — Minha voz saiu quase num sussurro.
— Grávida?
— Sim. Sinto muito.
— Grávida desse cara? Mas eu entendi que estavam juntos há poucos dias.
— Eu devo estar grávida de quase dois meses.
— Mas o Owen... Oh... Acho que estou entendendo.
Ela encarou Nolan.
— Será que pode nos dar licença? Preciso ter uma conversa privada com a minha filha.
Nolan se levantou saindo da cozinha.
Minha mãe começou a esbravejar.
— Você traiu o Owen?
— Mais ou menos.
— Não existe mais ou menos se está grávida! E como é que sabe que o bebé é deste rapaz? E pelo amor de Deus, eu não te ensinei como usar um preservativo, mesmo seu pai achando absurdo, já que na concepção retrógrada dele, você iria escolher esperar?
— Eu sei, porque nunca transei com o Owen e não me passou pela cabeça usar preservativo porque eu estava muito bêbada quando aconteceu.
— Bêbada? Você nunca bebe, Amanda.
— Bebi esta vez.
Lydia respirou fundo.
— Certo, eu não vou enlouquecer com isso. Só preciso entender essa história direito e então comece a contar do começo. Onde conheceu este Nolan Percy e como é que as coisas chegaram nesse ponto.
Foi a minha vez de respirar fundo e contar tudo a ela.
Algumas horas depois eu estava chorando.
Contei à minha mãe a versão com cortes sobre meu envolvimento com Nolan, deixando de fora a parte que ele apostava que ia transar comigo, porque era capaz da minha mãe pegar uma faca de cozinha e esfaquear Nolan ali mesmo.
Não que ele merecesse alguma consideração, mas não adiantaria nada piorar a situação.
— Então é isso. Me desculpa, mãe. Eu sei que te decepcionei.
— O problema não é me decepcionar, Amanda. É a sua vida.
— Você me avisou tantas vezes... Eu nunca achei que fosse acontecer comigo.
— Todo mundo comete erros. Agora preciso saber se está mesmo certa sobre este casamento, mal conhece este rapaz. Sabe que não precisa fazer isso. E se for coisa do Gavin te obrigando, eu não vou deixar. Você pode voltar para cá.
— Você nem mora mais aqui direito, mãe, está sempre viajando com seu namorado.
Minha mãe namorava um músico há uns meses e vivia viajando com ele.
— Daremos um jeito. Não precisa fazer nada que não queira.
Eu cogitei aquela possibilidade.
Ela estava sendo mais legal do que eu previ. E talvez tivesse razão. Eu não precisava me casar com Nolan.
“ Papai ficaria louco e me colocaria porta afora, certamente. Isso se ele não tivesse um novo infarto. ”, penso com medo.
“ E provavelmente nunca mais falaria comigo. ”
Mas eu queria criar um bebê sozinha? Minha nossa, eu não queria criar um bebê! Com Nolan ou sem Nolan, a verdade é que qualquer opção parecia horrível.
Minha mãe estava sendo muito legal agora, mas eu sabia que ela ia jogar isso na minha cara pra sempre se tivesse que largar a sua nova recém-conquistada liberdade, a vida que sempre sonhou para me ajudar com um bebê.
Não era justo que eu jogasse essa responsabilidade nela.
A responsabilidade era de Nolan.
Meu estômago revirou.
Talvez não fosse mais uma questão do que eu queria, mas sim de fazer o que era certo.
“ Ou o mais fácil? ”, minha consciência sussurrou.
Mas até parece que era uma opção fácil ficar com Nolan.
— Eu quero me casar com ele, mãe. — Tentei parecer convincente.
Porque só assim Lydia ficaria tranquila.
— Certo. Se é isso que quer. É a sua vida.
— Sim, é isso que eu quero.
— Bem, vamos preparar um almoço então e você me conta tudo sobre Camden e os Percy.
Eu tentei rir.
Mamãe era assim. Já tinha passado para a próxima etapa.
Onde tudo estava resolvido.
Procurei Nolan e o encontrei no jardim da minha mãe conversando com o namorado dela, Ross, que me cumprimentou e foi ajudar mamãe.
— E aí?
— Acho que no fim, ela aceitou numa boa — resumi.
— Eu falei que não precisava se preocupar.
— Você não conhece a Lydia...
— Acho que você que precisa aceitar, Amanda, e não sua mãe.
Eu o fitei.
O sol batia em seus cabelos os deixando mais claros e seus olhos verdes continham aquele perturbador brilho dourado.
— Estou aceitando — afirmei como se para mim mesma.
— Meninos, o almoço está pronto.
Ross apareceu nos interrompendo e nós entramos.
Mamãe tagarelou sobre outras coisas, evitando o “assunto” o que ajudou muito.
À tarde, fomos dar uma volta na cidade e à noite jantamos por insistência do Nolan em um restaurante. Ele foi tão educado e gentil, que com certeza ganhou vários pontos com minha mãe e Ross.
Será que aquele era o verdadeiro Nolan? Um cara educado que ria das piadas idiotas de Ross e era gentil com a minha mãe?
Em nada ele se parecia com aquele cara que Austin pintou pra mim.
Acho que, na verdade, nunca tinha passado tantas horas seguidas em sua companhia desde que nos conhecemos.
Claro, sem contar aquele dia no barco...
Ou a noite que transamos? E eu nem sei se ele ficou, ou se depois de conseguir o que queria, não tinha corrido pra contar vantagem ao irmão.
E quando voltamos, eu estava me sentindo bem cansada e indaguei a minha mãe onde Nolan ia dormir.
— No seu quarto, oras. Acho que é tarde para algumas convenções, não é?
“ Como é que é? ”
Eu quis pedir para ela não fazer isso.
Mas como é que eu ia explicar?
Se não conseguia explicar nem a mim mesma?
Ela tinha razão em dizer que era tarde para qualquer tipo de convenção.
Afinal, estávamos noivos e era óbvio que já tínhamos transado se eu estava grávida. Mas não éramos um casal como outro qualquer.
Eu nem conseguia imaginar direito nós dois como um casal.
Quanto mais dormir na mesma cama que ele na casa da minha mãe.
—Tudo bem — concordei sem querer deixar minha mãe preocupada com o fato de eu não querer dormir com o meu suposto noivo.
E quando me virei lutei para não ficar vermelha ao ver Nolan atrás de mim.
— Boa noite, mãe — falei e ele me seguiu até meu quarto.
Fechei a porta e o encarei.
— Eu vou... usar o banheiro — murmurei constrangida e pegando algumas coisas na minha mala e me tranquei no banheiro.
Meu rosto era uma máscara vermelha.
— Controle-se, Amanda — murmurei para mim mesma.
Entrei no chuveiro e tomei um banho tentando não pensar em Nolan do outro lado da porta.
Vesti meu pijama e saí do banheiro.
— Pode usar agora. — Evitei encará-lo e ele entrou fechando a porta atrás de si.
Eu me deitei e apaguei a luz, lutando com minha respiração, enquanto ouvia o barulho do chuveiro.
Nolan saiu algum tempo depois e eu fechei os olhos. Será que ele perceberia que eu estava fingindo que dormia?
— Eu sei que está acordada, Amanda — disse num tom entre exasperado e divertido enquanto eu sentia o colchão se mover ao meu lado. Quase rolei para fora da cama, na ânsia de me afastar mais.
Mas não adiantava eu me afastar, ainda sentia aquele cheiro dele e podia imaginar que sua pele limpa estaria morna do banho.
— Amanda, estou falando com você. — Agora a voz dele só tinha exasperação.
Eu abri os olhos e o fitei.
Ele estava sem camisa e eu quase tive vontade de olhar debaixo das cobertas para me certificar que ele estava usando a calça do pijama.
— Não estou nu — ele explicou divertido.
— Não estou pensando nisso.
— Está agindo como se estivesse dormindo com um estranho.
— Mas você é!
— Nós já dormimos juntos.
— Sinto muito se estou constrangida com isso. Nós mal nos conhecemos.
— Podemos nos conhecer melhor.
— Eu não vou transar com você. Se é disso que está falando sobre “nos conhecer melhor!”
— Por que você complica tudo? Se vamos casar isso não é o óbvio?
— Entenda que há uma semana eu namorava outro cara, acha que é simples assim?
Eu me arrependi no mesmo momento de ter falado sobre Owen.
Mas era tarde.
Nolan fechou a cara.
— O Owen já dormiu aqui com você?
— Não, ele nunca veio aqui.
— Mas dormia no seu quarto na casa do Gavin.
— Apenas uma vez.
— Por que não transava com ele?
— Não é da sua conta.
— Acho que é.
— Não é! Não me obrigue a ficar falando do Owen. Ou quer saber todos os detalhes? Quer que passemos a noite conversando sobre isso?
— Eu preferia passar a noite fazendo coisas que você nunca fez com o Owen.
Meu rosto queimou.
Droga, todo meu corpo queimou.
— Eu já disse que não vou transar com você.
— Quem falou em transar?
E então seu rosto se aproximou do meu e eu senti o hálito quente em meus lábios, minha língua, antes de ele me beijar.
Eu queria muito, muito mesmo, ter forças para empurrá-lo, mas não tinha.
Apenas gemi contra seus lábios, num misto de protesto e prazer enquanto meu corpo derretia lentamente.
E quando eu já nem sabia do que estávamos falando antes, ele parou de me beijar e me encarou.
Lutei desesperadamente para me lembrar qual era o ponto da conversa enquanto meu corpo queimava em lugares estratégicos e minha mente girava.
— Acho que estou um pouco confusa aqui... — falei tentando pensar racionalmente, o que era bem difícil enquanto ele ainda estava tão perto, com seus braços ainda à minha volta.
Arfei quando senti seus lábios deslizando por meu rosto, tocando a pele atrás da minha orelha.
— Não quero obrigá-la a nada — murmurou dentro do meu ouvido e sua mão desceu por minha coxa e passou minha perna por seu quadril e notei que ele estava excitado, praticamente desfaleci, meus dedos puxaram seus cabelos e então sua boca estava sobre a minha de novo.
E enquanto ele me beijava, eu me perguntava se eu parecia uma louca bipolar se falasse para esquecer aquele papo de “não transar”.
Mas Nolan parou de me beijar e me encarou ofegante.
Eu lutei para não o puxar de volta desta vez. Tentei controlar minha respiração e as batidas do meu coração. E a vontade de dizer que não estava me obrigando.
Embora, bem no fundo, não parecesse certo.
Eu ainda não conseguia lidar com tudo o que Nolan Percy implicava.
— Não pareceu ter problemas quando eu estava bêbada.
— Eu sei que me acha um filho da puta e eu fui mesmo, e por isso estamos nessa situação.
Havia amargor e raiva em sua voz e por situação, entendi que ele queria dizer aquele compromisso.
— Você se arrepende?
— Você não?
— Acha que não adianta nada ficarmos batendo nessa tecla agora. — Sim, do que adiantaria ficar discutindo com Nolan por ele ter transado comigo, seja lá quais eram suas motivações, sendo que estávamos juntos agora por causa das consequências daquela noite. — Por que me beijou se não quer transar comigo?
— Quem disse que não quero transar com você? Quem está confuso agora sou eu, Amanda. Você quem disse que não íamos transar. E estou disposto a não forçar nenhuma barra contigo. E porra, acho que tem razão. Fiz várias merdas com você, Não me importei que estava bêbada e nem pensei nas consequências. Não posso culpá-la por não querer transar comigo.
— Não disse que não quero.
Ele levantou a sobrancelha, claramente exasperado.
Como lhe explicar o que eu nem mesmo entendia? Ainda mais quando ele permanecia tão perto e ainda bagunçando meu raciocínio?
— É só que... Nós nem nos conhecemos. Tudo começou tão errado e nenhum de nós esperava estar nessa situação. Ainda é tudo confuso e assustador demais e não acho certo a gente transar. — “ Mas eu quero. ”, pensei com um arrepio. Era este o problema. — Não ainda — completei.
— Então por que está brava?
— Não estou.
Tentei me virar, mas Nolan me puxou de volta e se inclinou sobre mim, me avaliando com os olhos franzidos muito intensos.
— Você está com tesão?
Um sorriso se distende em seus lábios e eu enrubesço.
— Não!
Ele riu e eu me afastei, desta vez conseguindo me virar para a parede.
— Para, Nolan!
— Você é tão boba, Amanda.
— Sim, eu sou boba, já devia saber, né.
— Não disse isso como algo ruim.
— Duvido que seja bom.
— Não sabe o que eu acho bom.
E ele me abraçou se encostando nas minhas costas, os lábios em meu ouvido.
— Você poderia me deixar em paz?
— É isso que quer, de verdade?
Ele depositou um beijo atrás da minha orelha e gemi involuntariamente, todo meu corpo esquentando mais ainda quando sua mão deslizou para baixo da minha camiseta.
— Achei que tínhamos combinado que não íamos transar?
— Eu sei. Mas posso ser um cara legal, se deixar.
— Cara legal?
— Sei que me acha um escroto que toma o que tem vontade, mas deixe eu te provar que eu posso fazer a sua vontade.
— Como sabe a minha vontade?
— Eu sei... — Sua mão deslizou para o cós do meu pijama e hesitou ali.
Meu pulso acelerou e todo meu ventre parecia estar sendo sugado, à espera do que viria a seguir, porque eu podia ser mesmo boba, mas não tanto.
E entendi o que Nolan queria fazer.
E eu queria que ele continuasse.
Ah sim. Eu já sentia tudo pulsando e desejando numa ânsia tão grande que chegava a doer.
— Tudo bem, Amanda — Nolan sussurrou. — Eu só quero tocar você... E depois posso até fingir que nada aconteceu, se isso te deixar mais tranquila.
Ele está debochando de mim, eu sei, mas não consigo evitar minha resposta fraca.
— Sim... — balbuciei fechando os olhos e deslizando para uma doce inconsciência, enquanto a mão de Nolan avançou para dentro da minha calcinha.
Ah sim. Todo meu corpo estremeceu e eu gemi baixinho, me desmanchando em sensações, enquanto os dedos atrevidos de Nolan me acariciavam como se tivesse feito isso milhões de vezes. Como se soubesse exatamente qual a pressão exata para me fazer me contorcer contra ele, começando a arfar e respirar com dificuldade.
Nolan segurou meu queixo e arrastou beijos por meu rosto, minha garganta, e eu respirei ele enquanto seu toque foi mais fundo, dentro de mim e meu coração batia forte contra as costelas. Gemidos incoerentes escapavam da minha garganta e me esfreguei nele, o sentindo excitado e isso me excitando ainda mais. Mas Nolan não fez nenhum movimento de ir além do que já estava fazendo, apenas empurrando os dedos mais rápido e mais profundo para dentro de mim até que eu estivesse convulsionando em um clímax que me fez enterrar a boca no travesseiro para não gritar e acordar a casa toda, enquanto os braços de Nolan me apertavam forte.
Ah minha nossa!
Voltei à realidade, fraca e aérea, um bocejo escapou dos meus lábios e eu mal conseguia ficar de olhos abertos, quanto mais pensar.
Com uma pequena parte coerente do meu cérebro, eu percebi que Nolan não me soltou, que ele continuou me abraçando enquanto eu deslizava para um sono profundo.
Acordei com o sol adentrando pelas cortinas e a respiração compassada de Nolan do meu lado.
Abri os olhos e fiquei olhando para ele.
Meus dedos correndo pelas tatuagens em seu peito e braço. Haveria algum significado, ou apenas foram feitas no calor do momento?
Uma delas me chamou atenção. Havia algumas flores e um nome dentro. Daisy.
E deduzi que aquele só podia ser o nome da mãe dele.
— Passei na inspeção? — Sua voz preguiçosa chegou até mim num tom sonolento e divertido e eu fiquei vermelha.
De repente me lembrando do que tinha rolado antes que eu dormisse.
Ah caramba, realmente aconteceu? Agora a luz do dia parecia parte de um sonho.
Ele abriu os olhos, sorrindo de um jeito preguiçoso.
— Gosto quando você fica vermelha.
E já ia responder quando meu estômago revirou perigosamente e eu gemi me levantando de um pulo e indo para o banheiro, quase não chegando a tempo de me debruçar sobre o vaso e vomitar.
Nolan estava atrás de mim no mesmo segundo, segurando meus cabelos, como da outra vez, até que todos os espasmos passassem.
— Está melhor? — indagou num tom preocupado.
— Eu odeio isso — murmurei.
— Sinto muito.
Ele parecia mesmo sentir. Eu ri jogando água no rosto.
— Acho que é normal, não é?
— Acho que sim.
— Não fica com nojo?
— Claro que não. Era eu que costumava cuidar do Jace em suas bebedeiras e também da... — Ele parou.
— Ashley? — completei.
Ele deu de ombros.
— E quem mais aparecesse — desconversou.
Minha mãe apareceu na porta com o rosto preocupado.
— Está passando mal?
— Apenas enjoo matutino — Nolan respondeu.
— É horrível mesmo, mas passa depois de três meses. Venham tomar café. Sei que vão querer partir ainda de manhã para chegar hoje em Camden.
— Sim, nós vamos — Nolan respondeu.
Tomamos café com Lydia e Ross e eles nos levaram ao aeroporto.
Minha mãe me abraçou forte.
— Tem certeza do que está fazendo?
— Tenho sim — respondi tentando soar uma confiança que estava longe de sentir.
— Se precisar de mim, sabe onde me encontrar.
— Obrigada, mãe. Eu te amo.
— Também te amo, querida.
Dormi boa parte do voo e fui acordada por Nolan quando chegamos ao aeroporto.
Desta vez Samantha e Austin nos esperavam.
— Fizeram boa viagem? — Samantha indagou animada e me encarou com um olhar crítico. — Você está bem?
— Estou apenas cansada.
— Certo, acho que é essa sua roupa que não ajuda. Precisamos fazer compras uma hora dessas e...
Eu já não ouvia, entrei no carro e fechei os olhos.
Acordei de novo quando já anoitecia e Austin estacionava em frente a minha casa.
Nolan pegou minha mala e saltou comigo.
— Amanda?
— Sim?
— Eu sei que esta situação toda é estranha para nós dois, você tem razão quando diz que mal nos conhecemos, mas acho que devemos tentar...
Antes que ele acabasse de falar a porta da minha casa se abriu e Gavin saiu.
E atrás dele estavam Bob e Owen.
Por um momento nenhum de nós falou nada.
Owen olhou de mim para Nolan com um semblante frio, mas eu podia ver a dor em seus olhos.
E isso doeu em mim.
A velha culpa me consumindo.
— O que ele está fazendo aqui? — Nolan murmurou tenso.
— O pai dele é amigo do meu pai — respondi. — Ele deve ter vindo buscá-lo.
Bob me cumprimentou com um aceno de cabeça frio antes de entrar no carro, mas Owen parou ao meu lado.
— Oi, Amanda.
— Oi, Owen — murmurei com vontade de chorar.
Owen não falou mais nada. Entrou no carro e partiu.
Eu encarei Nolan e ele me olhava com raiva.
— Nolan, eu... — Não sabia bem o que dizer.
— Eu já vou indo. — Entrou no carro de Austin, sem dizer mais nada, bem contrariado.
— Como foi com a sua mãe? — papai indagou pegando minha mochila do chão e me guiando para dentro.
— Foi tudo bem. Ela ficou chocada, mas depois aceitou.
Eu não ia falar para ele que Lydia me dera outra alternativa em vez de casar.
Só faria os dois discutirem.
— Não sabia que iam chegar tão cedo. Foi uma situação esquisita Owen e Nolan aqui.
— Eu sei. Pai, vou subir, estou cansada da viagem.
— Ah, espere um minuto. — Foi até a escrivaninha e pegou um papel. — Owen deixou este bilhete para você.
Eu o peguei. Imaginando o que é que Owen poderia ainda querer me dizer.
Subi e me sentei na minha cama abrindo o bilhete.
"Amanda,
Eu sei que depois de tudo o que aconteceu, talvez não queira mais me ver.
Mas quero muito conversar com você.
Será que pode vir a minha casa amanhã?
Eu vou te esperar.
Owen"
Capítulo 16
— A Doutora Percy ligou e disse que marcou uma consulta para você hoje — papai informou quando desci na manhã seguinte.
— Certo — concordei desanimada me servindo de cereal.
Meu pai acabou de comer e se levantou.
— Já liguei no Cooper e avisei que não vai trabalhar.
— Pai!
— Tem que fazer os exames, Mandy.
— Eu mesma podia ter ligado.
— Eu te conheço e era capaz de não ir.
Rolei os olhos, mas não discuti mais enquanto ele saía.
O bilhete de Owen ainda estava no meu bolso. Como se pesasse uma tonelada. Subi e tentei me distrair limpando a casa.
Mas algumas horas depois, acabei entrando na caminhonete em direção à casa de Owen.
Que mal poderia ter em conversar com Owen? Ele era meu amigo apesar de tudo. E eu sentia muita falta dele.
Quando cheguei a sua casa, Bob me atendeu muito sério.
— Oi Bob, Owen está?
— Acho que está na praia com Stu.
— Certo, eu vou procurá-lo.
— O que veio fazer aqui, Amanda? O que fez já não foi suficiente?
— Eu sei que fiz o Owen sofrer e sinto muito. Eu vim apenas... tentar conversar.
— Tente não magoá-lo mais.
— Não quero magoar o Owen, acredite.
Eu me afastei em direção à praia, me perguntando mesmo se era certo eu estar ali.
Se não iria magoá-lo ainda mais como Bob me acusava.
— Olha só quem está aqui!
Eu me virei ao ouvir a voz estridente conhecida.
Stella estava deitada sobre a areia com um biquíni minúsculo e ao seu lado com um biquíni tão pequeno quanto estava Ashley.
Mas que diabos as duas estavam fazendo ali?
— Stella, o que faz aqui?
Ela tirou os óculos escuros.
— Aproveitando o dia de sol na praia. Sabe que onde Ashley mora não tem essas coisas, embora ela goste de chamar aqui de fim de mundo.
Ashley deu um risinho afetado.
— Você também chama de fim de mundo.
— E você, o que faz aqui? — Stella perguntou a mim.
E vi um brilho capcioso em seu olhar. Ela sabia bem que Owen morava próximo.
— Amanda!
Ouvi a voz de Owen atrás de mim e me virei.
Ele se aproximou com Stu.
— Oi, Owen.
— Você veio encontrar com o Owen! — Stella dardejou com a voz venenosa.
— Quem é este? — Ashley olhava pra Owen, curiosa. — É o ex-namorado?
Eu tinha vontade de afogá-las no mar.
Owen neste momento notou com quem eu conversava e sua expressão mudou de feliz para irada.
Eu me senti triste me lembrando de um tempo em que eu, ele e Stella estávamos sempre juntos. Mas quando Stella parou de falar comigo, ela se afastou de Owen também.
Stu estava ocupado em ficar de boca aberta admirando as duas.
— Olá, sou Ashley. — Ashley acenou animada.
Stella estava mais ocupada em lançar olhares gelados a Owen.
Minha nossa, então ela odiava Owen também agora? Eu não conseguia entender de onde vinha todo aquele rancor com nós dois.
— Achei que aqui fosse uma praia sem graça demais para alguém como você, Stella — Owen comentou com um sorriso irônico.
Stella sorriu da mesma maneira.
— E você parece o mesmo cachorrinho amestrado que pula quando a Amanda pede. Que ridículo! Ela transou com outro cara, engravidou de outro cara e você ainda corre atrás dela! Já percebeu que ela não é essa santinha pura no pedestal que a colocou?
Owen fechou a cara dando um passo em sua direção.
— Owen, vamos sair daqui — falei nervosa.
— Stella não pode falar assim de você!
— Esquece ela — insisti.
E como as coisas nunca estavam ruins o suficiente. Um Jeep parou a pouca distância e dele saltou Jace, Austin, Samantha e Nolan.
Juro que a vontade que eu tinha agora era de entrar no mar e nadar até a Europa.
E sair do meio daquela confusão.
Por que eles tinham escolhido justamente hoje para estarem ali?
Meu olhar cruzou com o de Nolan e ele olhava de mim para Owen com um semblante furioso.
— Amanda, o que está fazendo aqui?
— Talvez o mesmo que vocês? Aproveitando o dia de sol? — Decidi ser irônica.
— Com este imbecil?
— Escute aqui, imbecil é você... — Owen foi para cima de Nolan e eu me pus no meio.
Jace e Austin também estavam alertas. Assim como Stu.
Mas aposto que eles gostariam mesmo de começar uma briga.
— Chega, vocês dois! Já está ficando ridículo!
— Ridículo é este cara vir aqui me chamar de imbecil! — Owen sibilou tenso.
— E você podia se tocar e parar de rodear a Amanda. Ela não está mais com você — Nolan falou no mesmo tom.
— Foi ela quem veio atrás de mim, babaca! — Owen provocou com um risinho.
Oh, Deus.
Eu pude ver a raiva fria de Nolan ameaçar extravasar.
— Chega, Owen!
— Eu vou quebrar a tua cara se ousar se aproximar dela de novo — Nolan ameaçou.
— Você pode tentar.
— Ninguém vai quebrar nada aqui — gritei. — Owen pelo amor de Deus, vá embora.
— Eu não vou a lugar algum, aqui é minha casa.
— Certo, então nós vamos.
E puxei Nolan comigo, com medo de que ele ainda fosse para cima de Owen.
Jace e os outros ficaram no mesmo lugar e Stu levou Owen para longe.
— O que você veio fazer aqui, Amanda? — Nolan indagou furioso.
Eu continuei andando.
— Vim conversar com o Owen — falei a verdade.
— Por quê?
— Porque eu precisava.
— Você não precisa de nada desse cara.
Eu me virei e o encarei.
— Ele é meu amigo.
— Ele era seu namorado!
— Mas era meu amigo antes disso.
— E ele se conforma de ter sido traído por você? Ele ainda quer você mesmo assim? Porque foi isso que percebi.
— Cala a boca, você não sabe de nada! — gritei.
Nolan se aproximou com uma expressão de raiva contida até quase estarmos nos tocando, seu nariz emparelhado com o meu, como se estivéssemos numa briga.
— Não quero mais que você venha aqui — rosnou.
E por um momento, eu não sabia dizer se isso me assustou ou me irritou.
— Não manda em mim! — Dei um passo atrás enquanto o empurrava.
Nolan soltou um palavrão baixo, as narinas aspirando forte, parecendo um tigre enjaulado impedido de pular na jugular de alguém.
De Owen?
Ou na minha?
— Qual é a tua, Amanda? Quer voltar com o Owen é isso? Porque se é o que quer, acho que ele te aceita de volta!
— Você é um idiota, Nolan! Acha que porque estou aqui com o Owen, eu quero voltar com ele? Como se algo assim ainda fosse possível! Eu vim conversar com Owen, porque devo isso a ele. Somos amigos desde crianças e namoramos por um bom tempo. E fui eu que pisei na bola e não o contrário. Eu traí! Engravidei de outro cara! Owen não tem culpa de nada!
— Mas ele ainda gosta de você.
— Isso não interessa mais — murmurei com um nó na garganta. — Eu e Owen juntos... Não é mais algo possível. Concordei em me casar com você, não concordei? Então para de me acusar de correr atrás do Owen ou algo assim. Eu não estou fazendo isso! Agora volte lá para seus amigos desocupados e sua namoradinha Ashley, eu tenho mais o que fazer!
Subi no carro dando partida, sem olhar para trás.
Fui uma idiota em ter vindo. Mas como é que eu ia imaginar que Nolan apareceria?
Eu queria apenas conversar com Owen. Pedir desculpas mais uma vez. Se é que isso valia de alguma coisa. E dizer que ainda queria ser sua amiga.
E só o que minha presença causou ali foi mais confusão.
Peguei o caminho para a loja dos Cooper quando me lembrei dos exames.
— Droga! — murmurei mudando a rota e indo para o hospital.
Quando cheguei lá a recepcionista me atendeu muito solícita e me levou para a sala.
A própria Helena Percy apareceu.
— Olá, Amanda, tudo bem?
— Oi — respondi sem graça.
— Espero que não se importe de ser eu a fazer este exame.
— Claro que não — menti.
— Certo.
Uma enfermeira entrou e me orientou a vestir a roupa de hospital e a me deitar para fazer o exame, que já era uma coisa esquisita, e ainda mais sendo a madrasta de Nolan fazendo era mais bizarro ainda.
Respirei fundo e tentei relaxar.
— Vamos ver se está tudo bem com sua gravidez.
Comecei a me sentir nervosa enquanto ela olhava o monitor.
E então a porta se abriu e para minha surpresa Nolan entrou.
— Oi, Nolan — Helena o cumprimentou como se o esperasse ali.
Eu o fitei de onde estava me lembrando que tínhamos brigado e me perguntando se ele ainda estaria bravo.
— Oi, Amanda.
— Não sabia que viria.
— Claro que eu estaria aqui — falou como se fosse óbvio.
Eu dei de ombros.
— Depois do que aconteceu na praia... — murmurei.
Ele passou a mão pelos cabelos.
— Me desculpe por aquilo.
Franzi os olhos, tentando entender o que ia pela sua cabeça.
Ele estava pedindo desculpas?
— Acho que tenho que pedir desculpas também.
— Prestem atenção vocês dois — Helena nos chamou.
— Era para vermos alguma coisa? — Nolan olhava o monitor agora também.
Helena riu.
— Aqui é o saco gestacional e o embrião mede... 6 mm.
Eu e Nolan nos encaramos confusos.
— Não estou vendo nada — respondemos ao mesmo tempo.
— Ainda é cedo. Faremos outro ultrassom quando estiver na décima segunda semana, então poderemos até ouvir o coração — Helena explicou mexendo em alguns botões e então eu ouvi.
Batida de coração? Era tão estranho saber que havia algo vivo dentro de mim
Um bebê.
Eu olhei para Nolan e ele sorriu para mim.
E pela primeira vez eu me senti ligada a ele de alguma maneira.
Não tinha como fugir da verdade absoluta de que íamos ter mesmo um bebê em poucos meses.
E eu me sentia apavorada. Pra dizer o mínimo.
— Isso é... — eu murmurei.
— Assustador? — ele completou e eu ri.
— Sim, assustador.
— Está tudo bem até aqui — Helena disse por fim, dando o exame por encerrado. — Eu lhe passarei algumas vitaminas e só precisa voltar no próximo mês. Está tudo bem com o bebê de vocês.
O bebê de vocês.
Deus, estava se tornando mais real e assustador a cada momento.
Nolan me acompanhou para fora da clínica.
— Helena perguntou se você quer jantar em casa hoje.
Mordi os lábios com força, hesitando.
Eu podia declinar, mas acho que não seria educado.
Estudei Nolan por um momento. Ele parecia tão diferente do cara que brigou comigo na praia que era até assustador.
Quem era o verdadeiro Nolan? Não fazia ideia.
— Tudo bem — concordei por fim.
Entrei no carro e dei partida, indo embora. Quando cheguei em casa Samantha estava sentada na minha porta com várias revistas na mão.
— Oi, Amanda!
— Oi, Samantha, o que faz aqui?
— Como assim o que eu faço aqui? Temos um mês para aprontar tudo para o casamento.
Como assim um mês?
Eu estava zonza enquanto entrava em casa com Samantha tagarelando atrás de mim.
— Olha, você tem sorte por ter a mim, que vou cuidar de tudo para você!
Eu a encarei com uma careta.
— Está passando mal? Está pálida igual papel! Não vai vomitar ou algo de grávida esquisito, não é?
— Você disse um mês? — repeti aturdida.
— Sei que um mês é pouco pra organizar tudo, a fila de espera para um vestido de um estilista decente demora! Mas não precisa se preocupar porque eu darei um jeito em tudo e seu casamento vai ser...
— Mas já? — Não consegui deixar de exclamar com certo horror.
— Queria que esperássemos seis meses? Seria o prazo elegante, mas com a noiva grávida, é o melhor que podemos fazer. Você precisa caber no vestido... e isso me lembra que preciso tirar suas medidas.
E ela tirou uma fita métrica da bolsa e veio para cima de mim.
— O que está fazendo?
— Tirando algumas medidas. São tantas coisas pra fazer. Acho que estarei completamente louca quando tudo acabar! Se pelo menos Stella e Ashley ajudassem...
— Ashley? — Fiquei alerta ao ouvir o nome da ex de Nolan. — Por que Ashley ainda está na sua casa? Achei que ela ia embora depois do fim de semana.
— Devia ir mesmo. Mas resolveu ficar mais uns dias. Eu acho que ela poderia me ajudar, mas ela e a Stella não parecem interessadas.
Tentei evitar a onda de náusea que o pensamento de Ashley na casa de Nolan por um mês inteiro me causava.
O que será que ela pretendia?
A impressão que eu tinha era que Ashley me odiava. O que não era absurdo. Afinal, até poucos dias atrás Nolan era namorado dela e agora ia casar com outra.
Se eu me colocasse em seu lugar podia entender como seria horrível.
Mas com certeza eu não ia querer praticamente me mudar para a casa da família do meu ex e aguentar todos os preparativos para o casamento dele com outra mulher.
— Acho que é isso. — Samantha suspirou guardando a fita em sua bolsa de grife. — Estou vendo que sua distração não vai ajudar em nada hoje. Melhor conversarmos quando for lá em casa à noite.
Quase soltei uma imprecação ao me lembrar que concordei em jantar na casa de Nolan. Será que era tarde para arrumar uma desculpa e não ir?
Mas como é que eu ia ficar um mês arrumando desculpas?
Samantha foi embora e voltei ao meu quarto. Peguei um livro e tentei ler, mas acabei dormindo. Acordei com meu pai batendo à porta e já anoitecendo.
— Está doente?
— Não, peguei no sono tentando dormir.
— Quer que eu faça o jantar?
Eu me levantei.
— Peça uma pizza. Vou jantar na casa do Nolan.
— Ah, claro... — Ele coçou o cabelo, pensativo. — Acho que terei que aprender a me virar sem você.
Ele se afastou e engoli em seco, com um súbito nó se formando na minha garganta. Eu ia embora da casa de Gavin. Para sempre.
Era algo dolorido de se pensar. Todas aquelas mudanças.
Eu queria estar preparada para todas elas. Mas não estava.
Quando fui pegar minha escova de cabelos, vi o bilhete de Owen em cima da penteadeira.
Peguei, coloquei em meio a um bloquinho de anotação em cima da minha escrivaninha abandonada depois que acabaram as aulas.
Dava angústia olhar. Dava angústia pensar em Owen.
Odiava fazer Owen sofrer, mas ele teria que esquecer e talvez a melhor forma fosse eu me afastar dele pra sempre.
O nó na minha garganta ameaçou se romper e eu respirei fundo.
Então joguei tudo para o fundo da minha mente. Certas coisas nunca poderiam ser mudadas. Era fato consumado.
Acabei de ajeitar meus cabelos e peguei a jaqueta de Nolan que ainda estava ali e fui para a casa dos Percy.
O que será que me esperava naquele jantar?
Capítulo 17
Como sempre, senti aquele aperto de ansiedade misturado com aflição ao sair do carro e ver a casa toda iluminada.
Em breve seria a minha casa também?
Era esquisito pensar nisso.
— Me perguntava se você viria mesmo — Nolan disse quando abriu a porta pra mim.
Dei de ombros ignorando as batidas ridículas do meu coração.
— Eu disse que viria. Não daria o bolo na sua mãe.
— Ela não é minha mãe — rebateu irritado e eu me esbofeteei em pensamento.
Que falta de sensibilidade a minha!
— Sua madrasta — corrigi, mas o bom humor de Nolan parecia ter desaparecido.
Pelo pouco que eu havia visto, ele parecia se dar bem com Helena, que era uma mulher muito doce, mas me recordava das coisas que Austin contou.
Sobre a morte trágica da mãe de Nolan e o fato de ele culpar o pai por isso. Como foi que ele aceitou este novo enlace agora? Ele tinha mesmo aceitado?
Entrando na sala elegante, eu não vi ninguém.
— Onde estão todos?
— Meu pai está ajudando Helena com o jantar — ele falou isso com uma cara de escárnio.
— Isso é legal.
— Legal? — Ele riu sem humor algum e não entendi o motivo de sua insatisfação.
Por que ele ia ficar bravo pelo pai ajudar a madrasta a cozinhar ou algo do tipo?
— Samantha e Austin já aparecem por aqui. Stella e Jace foram jantar fora.
— E Ashley? — Tentei soar casual.
Nolan pareceu tenso.
— Não é minha ideia Ashley ficar aqui — rebateu como se estivesse se defendendo de antemão. — Ela foi jantar com Jace e Stella. Não custou barato eu ter que pagar tudo, mas vale a pena para nos livrar.
Então ele tinha pagado para Jace levar Stella e Ashley?
Por que eu viria jantar ali?
Eu não sabia o que pensar.
— Vai pagar sempre para eles a tirarem de perto de mim? — indaguei com ironia.
Ele riu. Desta vez havia certo humor. Mas eu não achava nada engraçado. Mesmo assim, não pude evitar o arrepio na espinha com o som de sua risada.
E sem aviso, ele se aproximou, quase como tinha feito mais cedo na praia, mas desta vez, não havia raiva em sua voz, quando levantou a mão e arrastou uma mecha de cabelo para trás da minha orelha.
— Você vale certos sacrifícios, Amanda Thomas.
Desta vez foi impossível segurar a onda de calor dentro de mim. Ela transbordou por meus poros.
— Oi, Amanda. — Samantha entrou na sala com seu andar saltitante seguida de Austin e Nolan se afastou.
Ela se aproximou e me abraçou.
Austin foi menos efusivo e apenas deu um oi de longe.
— Olá, Amanda.
— Oi.
— Essa jaqueta é sua? — Samantha indagou curiosa e só então eu me lembrei da jaqueta de Nolan em minhas mãos.
— Não, é do Nolan, ficou na minha casa quando... — Ruborizei, sem conseguir continuar. — Enfim, eu trouxe para devolver.
Nolan a pegou da minha mão e nossos olhares se cruzaram rapidamente. Tinha certeza de que na mente dele havia os mesmos pensamentos que os meus.
E isso foi muito perturbador.
— Oi, Amanda — Helena e Theodore entraram na sala e me cumprimentaram.
— Que bom que você veio — Helena falou muito gentil e quando ela sorria assim, eu quase acreditava que aquela casa não era o inferno que eu imaginava.
Mas eu tinha certeza de que era só uma impressão.
Uma casa com Stella e Ashley juntas era o que mais se assemelhava ao inferno mesmo.
— Como foi a visita à sua mãe? Nolan disse que correu tudo bem, mesmo assim eu fiquei preocupada. Talvez se eu e Theodore conversássemos com ela...
— Não! Foi tudo bem sim. Minha mãe entendeu... no fim. — “ Porque não tem outro jeito. ”.
— Eu disse que não precisava que se intrometessem nisso — Nolan resmungou do sofá onde ele tinha se jogado com uma expressão de tédio.
— E você sabe que eu tinha motivos para acreditar que estragaria tudo. Como sempre. — A voz de Theodore sai fria como gelo e eu me assusto.
Nolan estava furioso agora quando troca um olhar com o pai.
— Acho que eu tenho a quem puxar. Como dizem, o fruto não cai longe da árvore — Nolan rebateu com ironia.
— Ei, vocês, parem com isso e vamos jantar? — Helena tocou o ombro do marido que a encarou e sua expressão se suavizou.
— Claro, vamos.
Acompanhei a família à mesa ainda um tanto perturbada com aquele diálogo tenso entre pai e filho.
Durante o jantar, Samantha começou seu monólogo sobre o casamento até que Helena a parasse.
— Samantha, querida, este casamento é da Amanda, acho que deve primeiro consultá-la sobre suas ideias.
Todos me encararam.
Samantha tinha um olhar impaciente.
— Eu tento, mas está difícil!
Nolan riu.
— Imagino como deve ser pra você, Amanda, Samantha é insuportável.
Samantha lançou-lhe um olhar raivoso.
— Vou fingir que não ouvi. E então, Amanda, acho que Helena tem razão.
— Olha, pode fazer o que quiser. Acho que vou gostar de todas suas ideias. Mesmo — respondi, apenas para me livrar daquela conversa.
Os olhos de Samantha brilharam.
— Jura?
— Juro.
Ela bateu palmas, animada.
— Oh, não vai se arrepender, vai ser um casamento que ninguém esquecerá!
E comecei a imaginar se me arrependeria disso depois. Mas, sinceramente, estava aliviada de deixar tudo nas mãos dela, porque no fundo eu não entendia qual a necessidade de se fazer uma cerimônia de casamento.
Ao final do jantar, quando saímos da mesa, ouvi um barulho de carro estacionando.
Meu estômago revirou.
Encarei Nolan.
— Eu já vou embora.
— Ainda está cedo — foi Samantha que disse.
— Pode ser, mas eu prefiro ir. Não quero dirigir tarde sozinha.
—Tudo bem — ele concordou. — Eu te acompanho até lá fora.
Quando saímos, Jace, Stella e Ashley estavam se aproximando.
Eu procurei não ficar tensa. Impossível.
Jace sorriu.
— Olha quem apareceu, a cunhadinha.
— Oi, Jace — eu disse sem graça.
Ele riu mais ainda.
— Adoro fazer você corar!
— Para com isso, Jace — Nolan falou entre dentes e Jace gargalhou.
Ashley e Stella apenas soltavam risinhos irônicos, me medindo.
Eu as ignorei e virei para Nolan, para me despedir e sem mais nem menos ele se inclinou e me beijou.
Com Ashley e Stella de testemunha.
Como sempre, derreti ao primeiro toque dos seus lábios, mas me lembrei de onde estávamos e na frente de quem, e me afastei, vermelha.
Um tanto de excitação. Um tanto de constrangimento e outro tanto de raiva por de novo ele ter feito isso por causa de Ashley.
— Preciso ir — murmurei e entrei no carro.
Virei a chave, louca pra sair dali e nada.
Virei novamente. Nada.
Oh Droga, o carro vai quebrar logo agora?
Tentei de novo falhando.
Nolan bateu no vidro e eu abri.
— O que foi?
— Não está pegando.
— Melhor eu te levar então.
Eu ia protestar, mas o que podia fazer?
Stella e Ashley ainda estavam ali quando saí e Nolan se afastou para buscar o próprio carro.
— Precisa de um carro novo. Este seu é da época da sua vó — Ashley comentou.
Eu dei de ombros.
— Gosto dele.
— Eu jamais andaria com um troço velho deste — Ashley continuou com desdém.
Eu ignorei. Ashley parecia ter prazer em me provocar e eu não ia dar este gosto a ela.
Nolan apareceu e entrei no carro, aliviada por me livrar da presença negativa das duas.
Ele prosseguiu pela estrada.
— Ashley tem razão. Precisa de um carro novo.
— Não acho.
— Eu posso te dar um.
— Me dar um carro novo? — indaguei estupefata.
— Sim, não pode ficar andando com este carro desse jeito, Amanda.
— Nem pensar! Não vai me dar nada! Isso é absurdo.
— Estou sendo prático.
— Está sendo ridículo. Não quero nada seu. Entendeu?
Minha nossa, estávamos mesmo tendo aquele diálogo?
Como assim ele achava normal comentar que queria me dar um carro?
— Prefere arriscar a ficar parada por aí, em meio à estrada só para não aceitar um presente meu?
— Entenda como quiser. Não quero nenhum presente. Ainda mais uma coisa tão cara como um carro!
Será que ele não percebia o que estava falando?
Como é que eu ia aceitar um carro?
Ele não falou mais nada e então eu me lembrei do beijo.
— Por que me beijou? — Não consegui evitar especular.
— Estava esperando por isso a noite inteira.
Não era a resposta que eu esperava. Ele olhava a estrada, mas eu podia ver um risinho em seu rosto.
— E esperou a Ashley aparecer pra ser na frente dela?
— Preferia na frente de Helena e do meu pai? — Ele me lançou um olhar de falsa inocência e o fuzilei. — Minha vida não gira ao redor da Ashley, Amanda — disse por fim.
— Mas a dela gira à sua volta.
Ele ficou sério.
— É uma escolha dela, não minha. — Sua resposta saiu tensa.
O carro parou em frente a minha casa.
— Obrigada pela carona — murmurei colocando a mão na maçaneta.
— Amanda, espere um minuto.
Eu esperei.
— Sobre aquela conversa... de nos conhecermos melhor.
— Sim?
— Acho que podemos começar amanhã com um encontro.
— Encontro?
Ele deu de ombros, com um sorriso.
— Nós nunca tivemos um encontro.
Sim. Ele tinha razão. Nada era convencional em se tratando de Nolan Percy.
— Encontro — repeti a palavra e tive vontade de rir.
Eu, num encontro com Nolan Percy. Se me falassem isso há dois meses eu realmente riria.
Mas também se me falassem que estaríamos noivos ou que eu ficaria grávida seria motivo para eu mandar internar quem falou.
— Ok — murmurei. — Amanhã então.
— Amanda? — ele me chamou novamente quando tentei abrir a porta e agora havia certa suavidade convidativa em sua voz.
— Se eu te beijar agora também ficará brava?
Eu mordi os lábios, um frisson passando por mim enquanto meu coração traiçoeiro disparava contra as costelas.
— Não há ninguém olhando — ele disse com um sorriso de desafio.
Perfeitamente delicioso.
Foi a palavra que me veio à mente. Já entrando no processo de desligamento da realidade.
— Não.
— Não o quê?
— Não ficarei brava — murmurei.
E seus olhos foram para minha boca enquanto os dedos enquadravam meu rosto e ele se aproximou devagar.
Parei de respirar, meu coração falhando e então voltando a bater loucamente quando sua língua fez o traçado dos meus lábios antes de adentrar e se enroscar na minha.
Acho que gemi, meu corpo fraco e trêmulo se inclinando em sua direção e minhas próprias mãos subindo para tocar seus cabelos.
Mas, relutante, Nolan interrompeu o beijo, os dedos acariciaram meu rosto, antes de ele se afastar, me deixando com os lábios entreabertos e uma expressão confusa.
— Está tarde. Já estou vendo a cortina se mexer na sua casa. Melhor entrar antes que seu pai apareça aqui armado.
Claro, meu pai provavelmente estava espiando e eu não queria nem imaginar o que estava pensando. Mas... ele já subira para meu quarto uma vez, não?
Será que subiria se eu chamasse agora?
Eu ainda sentia arrepios quando me lembrava do que havia acontecido na casa da minha mãe. Poderia acontecer de novo.
E de onde estavam vindo aqueles pensamentos insanos?
Respirei uma longa golfada de ar e junto com o oxigênio veio a sanidade.
— Sim, eu já vou. Tchau... mais um vez.
— Boa noite, Amanda.
E eu saí do carro e entrei quase correndo em casa.
Como Nolan falou, meu pai estava ali.
— Como foi o jantar?
— Tudo bem. E você comeu pizza?
— Comi sim, ainda tem alguns pedaços caso queira.
— Não, obrigada. Já jantei, estou cheia. Vou subir, boa noite!
Eu subi e fui dormir.
E quando me deitei, pensei em Nolan.
Em como eu perdia a capacidade de raciocínio quando ele me beijava.
Em como uma parte bem escondida dentro de mim queria que ele estivesse ali agora continuando de onde tínhamos parado...
Joguei as cobertas para longe, subitamente com calor.
A verdade era que desde que pusera os olhos em Nolan minha vida virou de cabeça para baixo. E não parecia mais voltar aos eixos.
Fechei os olhos com força tentando dormir.
Mas não consegui. Cansada de tentar adormecer, eu me levantei e fui até a cozinha. E apesar de ter dito ao meu pai que não estava com fome, devorei o resto da pizza.
Quando me deitei novamente o sono veio fácil.
Um sono agitado repleto da presença de Nolan Percy.
Capítulo 18
Acordei enjoada de manhã, depois de tanta pizza.
Meu pai passou pela porta do banheiro perguntando se eu estava bem. Como se eu pudesse responder com a cara enfiada dentro do vaso sanitário.
Quando finalmente consegui me levantar, escovar os dentes e lavar o rosto me lembrei de todos os sonhos que tive.
Todos envolvendo Nolan.
Senti um frio no estômago que não era de enjoo.
Era medo.
Medo de como Nolan conseguiu se infiltrar nos meus pensamentos e até no meu subconsciente nas horas mais impróprias.
E agora este tal encontro?
Sentia um misto de ansiedade e medo dentro de mim.
— Seu carro já está aí — papai avisou quando desceu para tomar café. — Nolan o trouxe agora de manhã. Ele me disse que não funcionou ontem.
— Mas parece que pegou hoje de manhã, se ele conseguiu trazê-lo aqui — resmunguei.
— Não seja impertinente. Ele acha que não deve andar nesse carro.
— Nolan não tem que achar nada. Eu amo meu carro.
— Vou pedir para o mecânico dar uma olhada mesmo assim.
Papai se despediu e eu estava terminando de tomar café quando bateram à porta.
E fiquei surpresa ao ver Naomi e Ellie.
— Oi, o que fazem aqui?
— Oras, você parece ter esquecido que tem amigas — Ellie reclamou, entrando.
Naomi sorriu sem graça.
— Não liga para a Ellie. A gente sabe que sua vida deve estar uma confusão. Viemos ver se está tudo bem com você.
— E saber de todas as novidades — Ellie completou animada.
Eu ri fechando a porta atrás delas.
Ellie segurou minha mão arregalando os olhos.
— Olha o tamanho deste anel!
— Uau! — Naomi também parecia impressionada.
— Me conta como foi que ele te deu? Achei que os Percy fariam uma megafesta de noivado! — Ellie exclamou.
— Claro que não né, Ellie! Isso não é um noivado normal — Naomi parou de falar ficando vermelha. — Oh, desculpa, Amanda.
— Não, tudo bem. Você tem razão. Eles fizeram apenas um jantar com a família.
— E o Nolan te deu o anel? Ele ajoelhou? — Ellie indagou curiosa.
— Não — respondi com uma careta.
— Mas também com um anel desses quem precisa de mais?
— E quando vai ser o casamento? — Naomi perguntou mais comedida.
Minha barriga doía de pensar na palavra “casamento”.
— Daqui um mês.
— Nossa, já?
— Pois é.
— Então, a gente veio saber se quer sair hoje.
— Hoje?
— É. Não pode dizer não! Já está tudo certo. Vamos chamar mais gente, jogar boliche. Vai ser divertido.
— Sim, Amanda, vamos! Depois que você casar... Não vai ser a mesma coisa.
Eu mordi os lábios, hesitante.
Elas pareciam realmente ansiosas. E eu vinha sendo uma péssima amiga.
Mas o que eu diria ao Nolan?
— Olha, posso responder depois? Porque acho que já tinha um compromisso, tentarei desmarcar, tudo bem?
— Certo! A gente já vai então.
As duas saíram e liguei para o celular do Nolan, mas ele não atendeu. Deixei uma mensagem, mas não disse sobre o que era. Queria falar com ele e não desmarcar assim com uma mensagem seca.
Então liguei para a casa dos Percy.
Infelizmente, tive que ouvir a voz insuportável de Stella.
Tipo, ela morava lá agora ou o quê?
— Oi, é a Amanda, posso falar com o Nolan?
— Nolan não está.
— Ah, tudo bem então.
— Ele saiu com a Ashley.
Meus dedos apertaram o telefone.
— Eu ligo depois.
E desliguei batendo o fone no gancho. Eu não ia ficar nervosa.
Não ia ficar pensando no que Nolan estaria fazendo com a Ashley.
Irritada comigo mesma, fui me arrumar e rumei para a loja dos Cooper. Melhor ocupar minha mente com algo que não fosse Nolan, pra variar.
A movimentação estava grande na papelaria assim que cheguei, mas qual não foi minha surpresa ao ver Nolan entrando? E atrás dele estavam Ashley e Jace.
Por que Stella não disse que Jace estava com os dois?
Tive vontade de sair correndo e me esconder no estoque.
Mas era tarde.
— Oi, cunhada. — Jace se aproximou sorrindo.
— Oi. O que fazem aqui? — indaguei meio nervosa.
— Ashley quer comprar uns cartões. Agora quem é que ainda manda cartão?
— Pessoas educadas! Será que nesta lojinha tem alguma coisa que valha a pena?
— Amanda, precisa de ajuda? — Outro funcionário, Logan, se aproximou e agradeci mentalmente.
— Preciso sim, pode mostrar para ela onde ficam os cartões?
— Claro. — Logan lançou um olhar de apreciação para Ashley a guiando para o fundo da loja e entendi por que tinha insistido em atender.
Jace se afastou atrás deles e Nolan me encarou.
— Me desculpa por isso.
— Pelo quê? Olha, Nolan, não morro de amores pela Ashley e obviamente ela também não gosta de mim, e entendo porquê. Mas não precisa ficar pedindo desculpas todas as vezes que estivermos respirando o mesmo ar. Eu preferia que ela estivesse lá em Nova York, mas já que está aqui, vamos tentar encarar isso da melhor maneira possível.
“ E vou tentar controlar a vontade de puxar seus cabelos loiros toda vez que ela olhar para você. ”, acrescentei mentalmente.
Nolan sorriu.
E eu me perguntei se ele teria me beijado se não estivéssemos no meu local de trabalho.
— Queria mesmo falar com você. Liguei no seu celular e como não atendeu, liguei para sua casa e Stella disse que tinha saído. Sei que combinamos ontem à noite, ou mais ou menos. De sair. Mas eu tenho essas duas amigas, Ellie e Naomi, e eu as tenho negligenciado com tudo o que vem rolando. Elas me chamaram para sair. Jogar boliche ou algo assim. E não queria mesmo dizer não. Podemos, sei lá, marcar pra outro dia?
Uma sombra passou pela expressão de Nolan, mas foi por ínfimos segundos, porque ele deu de ombros em seguida.
— Está me dispensando, Amanda?
— Apenas pedindo para remarcar.
— Pelo visto não estou em primeiro lugar na lista de suas prioridades.
Como é? Tentei interpretar seu tom de voz, mas não consegui.
— Não sei o que quer dizer com isso, mas só estou dizendo que podemos remarcar, porque queria sair com minhas amigas. Não achei que havia estabelecido uma competição aqui. Você e minhas amigas. — Usei um tom de ironia, para disfarçar que estava um tanto contrariada por Nolan estar meio que dizendo que não queria que eu desmarcasse com ele.
— Se eu insistisse para sair comigo, concordaria?
Levantei o queixo.
— Não.
Ele ficou me estudando por um momento, não parecia feliz. E percebi que Nolan Percy não curtia muito ser contrariado, ou ser colocado em segundo lugar, ao que parecia.
E o que ele queria?
Que eu o colocasse no topo da minha lista?
“ Você não vai se casar com ele? Não seria normal? Se fosse Owen, onde estaria? ”, uma voz insidiosa sussurra dentro de mim.
A verdade é que não sei onde Nolan se encaixa na minha vida, mesmo com seu status de “noivo”.
— Eu posso ir com vocês.
Sua sugestão me surpreendeu.
— Você? Ir com a gente?
— Disse que são suas amigas. Acho que conhecer os amigos um do outro faz parte do se conhecermos melhor também, não é?
Hum. Até que tinha algum sentido.
Mas nunca pensei que Nolan gostaria de conhecer meus amigos.
— Pode ser. Se realmente não se importa...
— Então combinado. — Ele sorriu, feliz por ter ganhado aquela contenda.
Como um menino mimado que bateu o pé e conseguiu fazer valer sua vontade.
E eu pensei se deveria sugerir que Jace e Samantha fossem juntos.
Mas aí lembrei que teria que estender o convite a Ashley e Stella.
— Você podia... sair para tomar um café? — ele sugeriu de repente.
— Claro que não. Estou trabalhando.
— Você não precisa trabalhar aqui, Amanda.
— Como é que é?
— Não vai trabalhar aqui depois de nos casarmos, sabe disso.
— Nós ainda não nos casamos — respondi friamente, não gostando nem um pouco dele decidindo coisas por mim — E quem decide se preciso ou não trabalhar sou eu. E, sinceramente, se vamos nos casar, talvez você também devesse arranjar um emprego! — De repente me dou conta de que não chegamos a falar sobre isso.
De como iríamos viver depois que nos casássemos. E senti meu estômago embrulhar subitamente.
A verdade é que todo aquele assunto do futuro me deixava desnorteada e amedrontada. Eu não estava preparada para encarar a minha nova realidade.
Não conseguia nem imaginar minha vida com Nolan.
Então, eu me virei, indo arrumar uma prateleira.
— Se já falou o que tinha que falar, melhor ir embora, tenho que trabalhar.
— Amanda, eu só estou dizendo...
— Estou trabalhando, Nolan — eu o interrompi.
Ele pareceu que ia insistir, mas Jace e Ashley voltaram.
— Que tal irmos tomar um café agora? — Ashley sugeriu aos dois.
— Sim, vamos tomar um café — Nolan disse e eu sabia que ele estava me provocando.
Que fosse para o inferno.
À noite busquei Naomi e Ellie e fomos para o boliche, outros amigos nossos da escola estavam lá, como Ben, o paquera de Naomi, e, claro, Carlton.
— Carlton veio — Ellie falou animada. — Ele disse que não ia vir!
Não quis tirar sua animação, mas desconfiava que a presença de Carlton tinha a ver com o fato de eu ter comentado que também iria.
E eu me perguntei se Nolan realmente viria.
Mas minha dúvida não durou muito quando o vi se aproximar.
— Oi.
Todos à nossa volta o encaravam em silêncio, como se algum ator de cinema tivesse aparecido ou algo assim.
— Oi... Então você veio.
— Eu disse que ia vir.
— Certo. — Tentei conter as batidas do meu coração e aquela boba satisfação por ele estar ali e me virei para meus amigos. — Já conhecem Nolan Percy.
Todos o cumprimentaram, ainda meio intimidados.
Nolan se sentou ao meu lado. Ellie e Carlton estavam jogando e voltaram para a mesa. Percebi que Nolan ficou tenso quando viu Carlton, que enrubesceu desapontado.
Enquanto Ellie encarava Nolan num misto de curiosidade e deleite.
— Olha quem está aqui! Não disse que ele vinha, Amanda!
Eu dei de ombros.
— Agora você sabe.
— Oi, Nolan — Carlton o cumprimentou.
— Oi, Carlton — Nolan falou com a voz fria passando o braço pelo encosto da minha cadeira.
— E então, eu mal posso esperar para a cerimônia de formatura! — Ellie comentou se sentando. — Não sei por que inventei de fazer o discurso. Está difícil achar as palavras certas e...
— Tem uma semana ainda — Carlton comentou.
— Mas já estou tentando há um mês!
— Pior sou eu — Naomi fez uma careta —, tenho que enviar milhões de convites para a família inteira. Um horror.
— É verdade que vocês vão dar uma festa depois da cerimônia? — Ellie perguntou para Nolan.
— Na verdade, é Samantha que vai dar uma festa.
— Acha que pode convidar a gente?
Nolan deu de ombros.
— Quanto mais gente melhor.
Ellie e Naomi trocaram um olhar maravilhado.
— Nossa, preciso ir amanhã achar um vestido...
E ela começou a tagarelar sobre isso. O celular de Nolan tocou.
Ele se desculpou e se afastou para atender.
Eu me perguntei quem seria.
— Vamos jogar? — Naomi se levantou e me puxou junto.
Ellie parou seu monólogo e veio atrás.
Claro que o convite para jogar era apenas desculpas para fofocar.
— Uau, Amanda, ele é mais bonito de perto! — Ellie comentou.
— E ele te olha de um jeito — Naomi suspirou. — Não tinha como resistir mesmo.
Eu fiquei vermelha.
— E ele nos convidou para a festa! Nem acredito que agora somos amigos dos Percy. — Ellie quase pulava de alegria.
— Não exagera, Ellie. — Naomi foi mais comedida. — Eu queria que o Ben me olhasse assim.
Ellie revirou os olhos.
— Não vai olhar nunca com essa cara limpa. Vem, vamos ao banheiro, vou passar uma maquiagem em você.
Elas se afastaram e Carlton apareceu do meu lado.
— E aí, jogando?
Eu ri sem graça.
— Eu nem sei jogar direito.
— Eu te ensino.
Ele pegou uma bola e me passou.
— Segura assim, coloca os dois dedos aqui e se inclina...
Eu fiz o que ele pediu e joguei derrubando algumas bolas.
— Muito bem — ele elogiou e eu ri, satisfeita.
— O que é tão divertido?
Quase dei um pulo ao ouvir a voz de Nolan.
— Estou aprendendo a jogar.
— Com o Carlton Cooper?
— Sim, algum problema?
Já estava cansada das insinuações ridículas dele com Carlton.
Vendo o clima ficar tenso, Carlton murmurou alguma desculpa e se afastou.
— Este Carlton é um idiota.
— Ele é meu amigo.
— Ele está apaixonado por você.
Eu fiquei vermelha. Porque eu queria negar, mas sabia que Nolan podia ter razão.
— Não acho que seja isso... — tentei explicar. — Ele sabe que... eu nunca o encorajei ou algo do tipo.
— Talvez tenha que ser mais convincente.
— O que está insinuando? Que eu gosto disso? Que encorajo essa paixonite do Carlton?
Nolan passou a mão pelos cabelos, tenso.
— Sabe o que eu acho, Nolan? Que você acha que sou algum tipo de garota fácil. Talvez porque eu tinha namorado e dormi com você! É isso? Acha que talvez eu faça a mesma coisa agora com Carlton?
— Você faria?
— Ah, meu Deus! — Joguei a bola que estava em minha mão no chão e me afastei pisando duro.
A vontade que eu tinha era de sumir dali, mas ainda estava com meus amigos, então engoli minha raiva e me sentei de novo entre eles, rezando para que Nolan fosse embora.
Mas ele não foi. Em vez disso, se sentou ao meu lado minutos depois.
— Me desculpa — murmurou.
Eu continuei olhando para frente.
— Não quero mais falar sobre isso — falei entre dentes.
— Eu sinto muito, não deveria ter dito...
— Chega, Nolan.
— Certo. Eu preciso ir embora.
Eu dei de ombros.
— Faça como quiser.
Acho que ele ficou olhando pra mim, por um momento, como se esperando que eu fosse dizer mais alguma coisa, mas mantive minha atenção em algum ponto a minha frente.
Fiquei ali, contendo a vontade de correr atrás dele e pedir para engolir o que tinha dito. Mas estava com medo de que ele percebesse que suas palavras tinham me magoado. Deixar que Nolan soubesse disso era admitir que ele tinha algum poder sobre meus sentimentos. E eu não o conhecia a fundo para confiar a ele minhas emoções ou lhe dar alguma responsabilidade sobre elas. Se é que Nolan se importava.
O que é que eu sabia sobre ele? Sobre as emoções dele?
Eu não conhecia Nolan.
Só sabia que ele me deixava exasperada de uma maneira que me irritava e me amedrontava, porque eu não era uma pessoa dada a confrontos.
E, às vezes, achava que Nolan estava sempre pronto exatamente para isso. Para uma briga.
Será que ele percebia?
Naomi e Ellie voltaram para a mesa e o assunto voltou de novo para a formatura.
Até que bastou para mim.
— Eu vou embora. Vocês vão comigo?
— Claro, vamos.
As duas se despediram dos outros e nós fomos embora. Aposto que estavam morrendo de vontade de perguntar do Nolan, mas minha cara fechada não as encorajava.
Cheguei em casa e meu pai já estava dormindo. Subi as escadas arrastando os pés e quando entrei no quarto e acendi a luz, soltei um grito de susto ao ver Nolan calmamente sentado na minha cama.
Capítulo 19
— Nolan, o que faz aqui? — indaguei assustada, meu coração disparado no peito.
— Me desculpe se te assustei. — Mas ele não parecia sentir de verdade, sinceramente.
Ele parecia... Desafiante.
— Claro que me assustou! Está maluco? Se meu pai te achar aqui...
— Eu entrei pela janela.
Abri a boca e fechei várias vezes sem saber o que dizer.
Então respirei fundo, tentando me acalmar.
— Por quê?
— Queria pedir desculpas.
— Já não pediu?
— Você não estava escutando.
Cruzei os braços enquanto ele se levantava e dava a volta na cama se aproximando.
— Eu disse uma grande bobagem.
— Ainda bem que admite.
— Tem toda razão de estar brava.
— É difícil saber que realmente acha que eu faria algo assim, Nolan.
— Não penso isso de verdade.
— Então por que perguntou?
— Eu estava com ciúme.
Eu o encarei, surpresa.
— Ciúme? Do Carlton?
— Sim — ele respondeu simplesmente.
E eu não soube o que dizer.
— Isso é a coisa mais absurda que já ouvi, Nolan Percy — consegui dizer por fim. — Você não me conhece nem um pouco.
E ele sorriu, um sorriso diferente, meio tímido, como se soubesse que era realmente absurdo ter ciúme de Carlton.
— Eu sei, mas não consigo evitar.
Então ele levantou a mão e tocou meu rosto.
— Você é desejável demais para que fiquem longe.
— Isso não é verdade — murmurei me afastando para perto da janela, meu pulso disparado.
Seu sorriso se alargou. Desta vez era um sorriso de Nolan Percy. Aquele sorriso que ele exibia como um lembrete que sabia coisas que eu não conseguia nem desconfiar que existissem.
Que me fazia eu me sentir boba.
E ao mesmo tempo, atraída como mariposa na luz.
— Você não se vê direito.
— Está sendo absurdo de novo. — Enrubesci.
— Então, não está mais brava comigo? — indagou se aproximando de novo
— Se prometer que vai parar de tratar o Carlton mal pode até ser.
— Carlton Cooper deveria parar de cobiçar o que não é dele.
— O que está insinuando? Que eu sou sua? — Enchi minha voz de sarcasmo para que ele não percebesse que eu estava com o coração disparado.
— Você disse.
— Eu?
— A Amanda do Nolan.
Ah...
Suas palavras abriram uma brecha para dentro das minhas memórias enevoadas da noite em que toda aquela confusão começou.
A noite em que eu deixei de ser eu mesma para ser o que ele me acusava de ser agora.
A Amanda do Nolan.
Era isso que eu era agora?
A Amanda no Nolan?
— Acho melhor ir agora — pedi desviando o olhar e dando um passo atrás. Mesmo uma parte de mim não querendo me despedir.
Mas aquela conversa estava me deixando tonta.
Vulnerável.
Por um momento, tive medo — e esperança — que Nolan se recusasse a ir. Mas ele passou por mim, e subiu na janela.
— Acho que tem razão.
Por que fiquei desapontada?
Eu era mesmo uma boba.
— Então amanhã temos um encontro? — eu me vi indagando antes que ele desaparecesse na noite.
Ele levantou uma sobrancelha.
— Nada de amigos?
— Só nós dois.
Eu me vi prometendo e ele sorriu se inclinando e me puxando pela frente da minha blusa até que seus lábios estivessem me beijando. Mas foi um beijo breve, de despedida, antes de pular para fora e ir descendo pela árvore.
Na tarde seguinte, eu estava trabalhando na loja dos Cooper quando Carlton se aproximou.
— Oi, Amanda.
— Oi, Carlton,
— Quer ajuda aí? — perguntou apontando para os estoques que eu estava arrumando
— Não, pode deixar.
— Eu posso te ajudar e...
Eu o encarei.
Será que Nolan tinha razão e Carlton estava perdendo a noção?
Será que eu tinha que ser mais clara com ele?
— Carlton, acho que precisa parar com isso.
— Parar com o quê? Não estou entendendo...
— Está sim. Está se tornando bem inconveniente. Eu estou... comprometida. — Falar isso era esquisito. — Comprometida com Nolan.
— Eu sei — ele murmurou. — Claro que eu sei. Vai se casar com o Percy, embora eu ache que...
— Não tem que achar nada. — Eu o cortei e Carton ficou vermelho.
— Me desculpe. Eu só... Sempre te vi com o Owen, achei que gostasse dele e então de repente estava com o Nolan e todo mundo falando coisas sobre você.
— Falando o quê?
Carlton ficou sem graça.
— Você sabe, as pessoas falam. Teve a briga na casa dos Percy, com o Owen acusando ele de engravidar você.
Desta vez fui eu que fiquei vermelha.
Óbvio que eu era a fofoca mais suculenta da cidade no momento.
— E acho que ficou óbvio que você passou o Owen pra trás, embora eu ache que Nolan deve ter se aproveitado de você, claro. Eu sempre digo, quando as pessoas te acusam de ser leviana, que é uma menina boa... que provavelmente Nolan Percy te envolveu e você não tem culpa...
Ah, minha nossa!
Meu rosto agora estava pegando fogo ao imaginar tudo o que andam falando de mim pelas minhas costas.
— Enfim, claro que eu sei que está com o Nolan, mas...
— Mas o quê? Se eu fiquei com o Nolan eu poderia estar disponível pra ficar com você também?
— Claro que não! Eu nunca pensei.
“ Claro que sim. ”, pensei irritada.
Aparentemente agora estava escrito “vagabunda” na minha testa.
Respirei fundo dizendo a mim mesma que ficar brava com Carlton não ia adiantar nada.
— Olha, Carlton, só... pare. Ok?
— De novo, me desculpe. Eu não quis...
— Tudo bem. Eu te desculpo, contanto que entenda que não estou disponível.
— Sim, claro.
— Certo, porque não chama a Ellie pra sair de novo? Aposto que ela adoraria.
— Vou pensar nisso...
Ele se afastou cabisbaixo e tentei não me sentir mal por ter me dado conta que todos agora achavam que eu era uma vadia ou algo assim.
E alguns minutos depois eu me surpreendi quando Nolan me ligou.
— Amanda?
— Oi.
— Eu liguei pra te dizer que não podemos mais nos encontrar hoje.
— Não? — Tentei conter a onda de desapontamento.
— Eu tenho que viajar.
Comecei a ficar desconfiada.
— Viajar para onde?
— Vou viajar com Samantha.
— Para onde?
— Nova York. Ela tem que fazer umas compras ou algo assim.
— Tudo bem então. E quando voltam?
— Voltamos até sábado, para a formatura.
— Certo. Boa viagem. Agora preciso desligar, tem um cliente me chamando.
E desliguei rápido. Fiquei olhando para o aparelho por um tempo.
Era esquisito pensar que Nolan iria viajar com a irmã assim do nada.
Ele estava falando a verdade? Não era o fim do mundo.
Eram apenas três dias.
Três longos dias.
Sábado amanheceu ensolarado, um prenúncio do verão. Eu me perguntava se Nolan já estaria de volta.
Mas se tivesse voltado, ele me ligaria, não?
— Pai, já está pronto? — indaguei batendo à sua porta, antes de sairmos para a cerimônia de formatura.
Ele resmungou algo e desci, quando ouvi batidas na porta.
Meu coração disparou com a possibilidade de ser Nolan, mas quem estava ali para minha surpresa era Owen.
— Owen, o que faz aqui?
— Podemos conversar?
Eu hesitei, um tanto receosa.
— Agora? Estou esperando meu pai, para...
— Sua formatura? Eu sei. Mas é rápido, eu prometo.
— Certo — concordei e saí fechando a porta.
— Sempre achei que estaria com você neste dia — ele disse com um sorriso triste.
Fiquei triste também.
— Eu sei.
— Eu só queria... — Ele se aproximou e tinha algo nas mãos. — Queria te dar um presente.
Era uma caixinha.
Eu a peguei e abri, lá dentro havia um colar de prata com um pingente de cruz.
— Oh... é muito bonito.
— Pertenceu à minha mãe.
A mãe de Owen morreu de câncer quando ele era bem pequeno.
— Oh, eu não acho que...
— Por favor, aceite. Meu pai dividiu alguns pertences da minha mãe entre Molly e eu, e este colar ficou comigo. Eu sempre planejei te dar neste dia.
Senti minha garganta se fechando enquanto ele pegava o colar e colocava em meu pescoço.
E eu nem merecia. Mas acho que se não aceitasse talvez o magoasse mais.
Por que as coisas tinham que ser tão difíceis?
— Obrigada. Significa muito. — Segurei sua mão a apertando.
Então os dedos dele passaram pelo anel de noivado.
Eu quis puxar minha mão.
— Amanda... Não precisa fazer isso.
— O quê?
— Não precisa se casar com este cara.
— Owen... — Desta vez eu puxei mesmo a mão.
— É sério. Era eu que tinha que ficar com você! Nos conhecemos a vida inteira! E ainda estaríamos juntos se o Percy não tivesse aparecido! — Ele segurou minhas mãos de novo. — Volta comigo, juro que esquecerei tudo.
Ah caramba, o que estava acontecendo?
— Owen, eu estou grávida...
— Eu posso assumir. Pode ser meu filho. Eu te amo, Amanda. Faria qualquer coisa com você. Apenas fique comigo. Case comigo.
Eu fiquei ali, as palavras desesperadas de Owen reverberando na minha mente enquanto ele me encarava, ansioso, esperando.
Esperando que eu concordasse com ele.
Mas eu jamais poderia fazer isso.
Puxei minha mão, sentindo o nó na minha garganta se romper.
— É impossível. Não seria justo para ninguém.
— Amanda, por favor.
— Não. Tem que me esquecer. Vou me casar com o Nolan. Estou grávida. Sinto muito que as coisas tenham sido assim. Não podemos voltar no tempo. O que aconteceu não tem volta. Me desculpa. Você sempre vai ser meu melhor amigo, mas talvez precise se afastar para sempre.
— Não diga isso!
— Acho que não tem outro jeito...
— Amanda!
Ouvi a voz do meu pai me chamando e sequei as lágrimas respirando fundo.
— Eu preciso ir. Adeus, Owen.
E saí correndo para dentro de casa.
Meu pai me encarou.
— O que foi? Estava chorando?
Dei de ombros, forçando um sorriso.
— Coisas de formatura, nada demais. Fiquei emocionada — menti.
— Vamos embora, não quero atraso.
Tentei esquecer no caminho a visita de Owen.
E quando chegamos e entramos no ginásio, avistei Nolan cercado por seus irmãos e os pais.
E claro, Ashley, a insuportável.
Por que ela estava ali?
Nolan veio em minha direção.
Ele sorria. E descobri mais um sorriso de Nolan Percy.
Um sorriso feliz.
E quando ele sorria era realmente fácil esquecer o que quer que fosse.
Seus lábios tocaram minha testa, para minha surpresa. Eu sabia que meu pai estava acompanhando a cena. Assim como a família dele. E claro, todo mundo à nossa volta.
— Estava me perguntando se faltaria na própria formatura.
— Meu pai não deixaria.
— Venham garotos, já vai começar — Helena chamou.
Nolan segurou a minha mão e me guiou até as cadeiras.
A cerimônia de formatura se arrastou e tentei ficar concentrada, mas ainda estava abalada pela conversa com Owen.
Meus dedos brincavam com o colar.
—Tudo bem? — Nolan indagou quando saímos, me estudando com um olhar intenso.
— Sim, tudo — menti.
— Você vai à festa da Samantha, não?
— Eu tenho escapatória? — Fiz uma careta.
— Acho que não.
— Vou falar com meu pai...
Eu me afastei e avisei papai que iria à festa na casa de Nolan.
— Juízo, hein?
Eu queria dizer que tinha juízo, mas seria uma tremenda mentira.
— Pai...
— Certo, acho que agora é tarde, não é? — Ele parecia meio bravo e triste ao mesmo tempo.
Eu me senti culpada.
Lembrei do que Carlton contou. Das fofocas. Do que diziam de mim.
Como isso deveria afetar meu pai. Ele era um pastor. Um líder religioso que deveria ser exemplo, cuja filha estava grávida de um cara que nem namorado dela era.
E não era por isso que ele tinha praticamente coagido Nolan a se casar comigo? Como uma reparação? Será que quando eu me casasse com Nolan, todos iriam esquecer aquele escândalo e seguir em frente?
Meu pai seguiria em frente?
— Vá. — Ele fez um gesto com a mão. — Mas lembre-se que tem hora para chegar. Enquanto estiver debaixo do meu teto, temos regras.
— Claro. Vou chegar no horário.
— Como foi a viagem? — indaguei a Nolan quando estávamos no seu carro.
— Entediante.
— Por que foi então?
— Samantha insistiu, porque ela queria fazer compras. E eram coisas para você.
Eu arregalei os olhos.
— Pra mim?
— Para o casamento, para você...
— Eu não quero nada.
Eu fiz uma careta, mortificada.
Claro que a família de Nolan tinha muito dinheiro e para eles talvez fosse natural sair por aí gastando com o que quer que fosse.
Mas eu achava meio absurdo.
— Tente dizer isso para Samantha, então. Não é culpa minha. Ela cismou que eu deveria ir junto porque na mente dela eu saberia o que ia gostar.
— Você não saberia... Nem me conhece.
Nolan parou o carro em frente a casa, toda iluminada para a festa e não rebateu minhas palavras, mas antes que eu saísse, sua mão segurou meu pulso e sem aviso, ele me prensou no carro e me beijou.
Eu gemi, surpresa, mas totalmente derretida enquanto seus lábios deslizavam sobre os meus com uma intensidade deliciosamente desconcertante.
— Senti sua falta, Amanda Thomas — murmurou contra minha boca quando finalmente se afastou um pouco, mas suas mãos permaneceram em meus cabelos.
Respirei uma longa golfada de ar. Respirei ele. Meus olhos fechados enquanto os lábios percorriam meu rosto.
— E você sentiu a minha? — Sua voz docemente persuasiva estava em meu ouvido agora.
— Sim — sussurrei, mesmo sabendo que não deveria lhe dar aquela informação.
E ele riu. Era uma risada rouca e deliciosa que causava arrepios em mim.
— Não fique convencido, por favor — eu disse meio sem graça por ter confessado que sentia a falta dele.
— Tarde demais — respondeu e me beijou de novo, desta vez com mais intensidade, a língua procurando a minha e causando um estrago dentro de mim.
Até que alguém chamou seu nome.
Nolan parou de me beijar e soltou um palavrão.
Samantha estava rindo em algum lugar atrás de nós.
Eu fiquei vermelha.
— Odeio interromper, mas a festa é lá dentro, será que dá para continuar seja lá o que for depois?
— Já disse que odeio você, Samantha? — Nolan respondeu e ela riu mais ainda.
— Não hoje, mas é sempre bom ouvir!
Nolan finalmente se afastou, mas continuou segurando minha mão, o olhar intenso fixo no meu.
— Então vamos seguir o conselho de Samantha e continuar depois o que começamos.
Senti meu corpo concordar antes de meu cérebro interferir e sacudi a cabeça afirmativamente enquanto Nolan me puxava para a festa.
Capítulo 20
Enquanto entrava na casa dos Percy, eu me perguntava se um dia pararia de me surpreender com aquelas festas.
Nunca fui uma garota de festas, ainda mais festas estilo Percy. E agora em menos de um mês eles seriam minha família. Só de imaginar tendo que participar daquilo regularmente já me dava dor de cabeça.
Eu me perguntava se a vida de Nolan em Nova York era assim.
Provavelmente. Eu me recordava das coisas que Austin contou. Se fossem mesmo verdade, aquelas festas de Samantha deveriam ser recreio de criança para Nolan e Jace.
— Seu pai não liga para essas festas? — eu me vi perguntando.
— Meu pai aceita qualquer coisa que Samantha peça.
— Então ele acha tudo bem se for ideia da Samantha, mas se fosse você ou Jace ele não aceitaria? — Tateei no escuro.
— Provavelmente ele gostaria que eu e Jace virássemos garotinhos comportados que vão à missa aos domingos.
— Por isso está com a filha do pastor?
Ele me encara, surpreso com minha piadinha.
— Está sendo engraçadinha.
— Até filhas do pastor podem ser divertidas, Percy. — Revirei os olhos. — Seu pai está por aqui?
— Ele está em uma reunião de negócios.
— Eu não sei bem o que seu pai faz.
Sim, eu sabia que eles eram muito ricos e algo sobre Theodore Percy ser um investidor ou algo assim.
— Ele gosta de ganhar dinheiro. É este seu passatempo preferido.
— Não entendo bem o porquê escolher vir para Camden.
Claro que eu estava tentando saber se era verdade a fofoca de Austin.
— Homens como meu pai encontram oportunidades de negócio em qualquer lugar. E claro que aqui não seria diferente.
— O que quer dizer?
— Ele está envolvido com um empreendimento para construir um grande condomínio na área da Marina.
— Sério?
— Ele achou um novo passatempo para brincar. Acho que Helena talvez já tenha perdido o encanto. Sorte dela que o brinquedo é um novo negócio e não uma nova mulher. Quer beber alguma coisa? — Mudou de assunto abruptamente, e sacudi a cabeça afirmativamente.
— Eu já volto. — Ele se afastou e eu me senti meio deslocada ali sozinha.
Até que ouço alguém chamar meu nome.
— Você veio! — Naomi se aproximou, muito arrumada e maquiada e me abraçou.
— Cadê a Ellie?
Naomi rolou os olhos.
— Adivinha. — Ela apontou para um canto e segui sua indicação.
Ellie estava conversando com Carlton, quando me viu acenou e piscou, maliciosa. Carlton desviou o olhar rápido, e eu podia jurar que ele estava amedrontado ou algo assim.
Pelo menos não fez nenhuma menção de deixar Ellie lá e vir conversar comigo. Isso queria dizer que ele tinha entendido o recado. Era um alívio.
— Acha que agora vai? — indaguei e Naomi deu de ombros.
— Pela Ellie sim e talvez o Carlton tenha desistido de correr atrás de certa pessoa que vai casar.
Fiquei vermelha até a raiz dos cabelos.
— Oh, me desculpe, Amanda. Bem, todo mundo sabe dessa paixonite do Carlton, mas acho que agora ele se tocou.
— Espero que sim.
— Vou procurar o Ben. Estou tão de saco cheio de esperar que ele tome uma iniciativa.
— Tome você — eu a encorajei e ela sorriu.
— Acho que tem razão. Me deseje boa sorte.
— Boa sorte.
Ela se afastou e eu olhei em volta procurando Nolan, mas não foi ele que se aproximou, e sim Ashley.
Como sempre, perfeita, num vestido verde-água justo e várias pulseiras nos braços, e nas mãos algo parecido com um Martini.
— Oi, Amanda.
— Oi.
Ela me mediu e me senti meio arrependida de estar de jeans básico.
— Já foi abandonada?
— Nolan foi buscar alguma coisa para eu beber. — Não sei por que estava dando explicação para ela.
Óbvio que estava ali para torrar minha paciência.
Ela inclinou a cabeça e havia um brilho estranho em seu olhar.
— O que ele vê em você?
Respirei fundo. O que eu podia responder?
— Isso terá que perguntar ao Nolan.
Ela soltou uma risadinha. Talvez já estivesse bêbada.
— Ele parece outra pessoa perto de você.
— Como assim?
— É, eu também não entendo — ela falava como se consigo mesma. — Agora ele mal olha na minha cara.
Queria lhe perguntar por que ficava ali então, por que se submetia àquela situação que era claramente um sofrimento para ela?
E de repente me vi meio curiosa sobre o relacionamento dela com Nolan.
Como se conheceram e se atraíram? Como eles eram juntos?
E por que mesmo estando com ela, Nolan entrou naquele joguinho de aposta com Jace para me conquistar.
Pensar na aposta fez meu estômago revirar. E me dei conta que eu não pensava nisso há um tempo. Na maneira em que eu e Nolan tínhamos nos aproximado. No quão horrível ele foi.
E por um momento me senti uma farsa tal qual Nolan tinha sido comigo, por estar ali, com ele, depois de tudo.
Claro que as coisas haviam tomado um rumo inesperado, porque eu engravidei, e desde então era como se eu fosse uma folha ao vento, levada sem rumo, sem saber exatamente onde ia parar.
Mas se houvesse um mínimo de possibilidade de mudar aquele rumo, eu mudaria?
Desceria os degraus da casa da fabulosa casa dos Percy e deixaria Nolan para trás?
— Olha só quem está aqui. — Stella se aproximou tomando a mesma coisa que Ashley e nem sei como estava cabendo em um vestido preto. — Bom, acho que Samantha fez bem gastando o tempo dela comprando coisas para você — comentou me medindo e tentei não ficar vermelha.
— Eu sempre faço bem — Samantha se aproximou. — Você precisa ver tudo, Amanda! Está fabuloso.
— Não precisava comprar nada para mim, Samantha! Isso não parece certo.
— Claro que precisava. É seu enxoval! E tenho certeza de que vai amar tudo. E o vestido de casamento? Está ficando lindo! Mal posso esperar para que veja. E claro, nossos vestidos também estão maravilhosos, Stella vai usar vermelho e eu...
— Chega, Samantha. — Nolan apareceu e eu quase respirei aliviada.
— Mas eu só estou contando para a Amanda...
— Você conta depois. — Colocou algo nas minhas mãos e quase tomei de um gole só.
Uma pena não ter álcool.
— Mas estava tão divertido a Samantha contando em como vai transformar a Amanda numa legítima Percy — Ashley comentou mordaz.
— Ela será uma Percy quando se casar comigo e não pelas roupas que vai usar — Nolan respondeu secamente.
Ashley fechou a cara e os olhos piscaram, como se ela fosse chorar. E a tensão se tornou tão grande que poderia ser cortada com uma faca.
— Não precisa ser tão grosso, Nolan — Stella falou arrastando Ashley dali.
Samantha se desculpou e se afastou também.
— Não precisava ter falado daquele jeito. — E nem sei por que me sentia inclinada a defender Ashley.
Mas algo em seu sofrimento me fazia mal. Fazia eu me sentir culpada.
— Esquece a Ashley. Ela mereceu ouvir porque estava aqui te provocando.
— Eu não ligo — menti.
Ele passou a mão pelos cabelos, parecendo frustrado e então me encarou.
— Vamos sair daqui.
E antes que eu pudesse responder, ele segurou minha mão e foi me levando por entre os convidados até que subimos as escadas e entramos em seu quarto.
Nolan fechou a porta atrás de nós.
Caminhei até o outro lado vendo os jardins e o mar mais além, através das grandes janelas. Dali ainda dava para ouvir os sons da festa, mas era como se estivéssemos isolados do mundo.
Algo dentro de mim dizia que não era para eu estar ali, sozinha no quarto com Nolan. Mas também havia outra parte, aquela bem escondida, que dizia que era certo.
Certo porque eu queria estar ali.
As palavras dele quando saímos do carro voltaram a minha mente.
“ Então vamos seguir o conselho de Samantha e continuar depois o que começamos? ”
Senti um frio no estômago ao me lembrar que eu concordei.
Foi para isso que ele me trouxe ali?
Eu me virei, Nolan ainda estava no mesmo lugar.
O que ele estava esperando?
Senti um arrepio de antecipação e medo.
— Por que estamos aqui? — indaguei por fim.
— Eu queria conversar com você.
“ Conversar?”
Sacudi a cabeça afirmativamente. Minha mente estava com dificuldade de acompanhar qualquer raciocínio lógico, mas eu podia tentar.
— Certo, conversar — murmurei como se para mim mesma, caminhando pelo quarto e me sentei na cama à sua frente.
Ok, não foi um movimento muito inteligente para distrair minha mente.
— O que quer conversar? — perguntei, porque ele ainda continuava em silêncio e eu o vi tirar a mão do bolso e passar pelos cabelos, como se pensasse no que dizer.
E eu esperei.
— Este é o problema. Eu queria mesmo conversar com você, mas basta tê-la aqui, sentada na minha cama, que eu só tenho um pensamento e não tem nada a ver com conversar.
Obviamente eu não esperava por aquilo, mas suas palavras fizeram minha respiração sair mais rápido da garganta e algo quente percorrer minhas veias, queimando tudo por onde passava, meu corpo inteiro despertando enquanto meu cérebro se entorpecia de vez.
E eu nem sei o que me guiava enquanto sem tirar os olhos dos dele, eu me levantei e toquei a maçaneta da porta e a tranquei, ainda sem romper o contato, abri minha calça jeans e me livrei dela e me sentei na cama, um pouco sem coragem de arrancar o resto da roupa, porque sinceramente eu ainda nem acreditava que eu tinha tirado minha calça.
Foi como esperar uma eternidade, os segundos em que Nolan me encarava no mesmo lugar, como se petrificado, os olhos deixando os meus e percorrendo minha pele. E eu achei que meu coração fosse sair pela boca quando num só movimento ele se inclinou por cima de mim, a boca devorando a minha num beijo ávido. Suspirei, o beijando de volta, enquanto nos enroscávamos sobre a cama, minhas mãos percorrendo seus músculos sutis por cima da camisa e sabendo que não era suficiente. Com um suspiro impaciente, eu o livrei da blusa, adorando sentir sua pele sob os dedos e ouvir seu gemido contra meus lábios, que se apartaram dos meus para percorrer meu rosto, meu pescoço, arquejei, enterrando meus dedos em seus cabelos e me apertando mais contra ele, nossos quadris se buscando, se roçando.
Eu tinha certeza de que ia entrar em combustão instantânea, tamanho era o calor que sentia e o puxei para me beijar de novo, seu gosto era infinitamente melhor do que qualquer coisa que já havia provado. Era intoxicante. Era viciante e eu só queria mais um pouco daquilo que ele me dava. A música alta da festa chegava até mim como de muito longe, estávamos totalmente perdidos em uma bolha particular, esquecidos do resto do mundo. Minha mente se enchendo de imagens da primeira vez que estávamos exatamente assim e me deixando mais louca ainda e gemi alto, beijando seu rosto, seu queixo, seu pescoço, me apertando contra ele, minha perna por seu quadril, o querendo mais perto. Sem pensar, desci minha mão e abri sua calça, meus dedos deslizando para dentro de sua cueca, para cingir sua ereção com meus dedos inexperientes.
— Amanda, espere — ele pediu, ofegante, e percebi vagamente suas mãos me afastando.
— O quê? — murmurei, mas Nolan segurou meu pulso acima da cabeça, me obrigando a parar.
— Eu disse espere.
Eu o encarei confusa, tentando respirar.
— Por que paramos? — Meu cérebro voltou à realidade e de repente meu rosto se inundou de vergonha. Eu estava praticamente o atacando e ele me mandou parar? Será que eu tinha me enganado? — Oh... você não quer? Eu achei...
E então ele riu.
— Não tem graça, Nolan — sussurrei, mortificada, tentando me afastar, e ele deixou.
Respirei uma longa golfada de ar quando ele se deitou ao meu lado.
Eu poderia sentir mais vergonha na vida? Definitivamente não.
— Por acaso você se lembrou finalmente qual era o assunto da conversa que queria ter comigo? — indaguei sarcástica.
— Não é isso.
— Então você poderia me explicar, porque é difícil pra mim entender — falei irritada e ele se inclinou sobre mim novamente.
Eu me lembrei que estava quase nua e enrubesci.
— Será que eu posso colocar minha roupa?
— Não.
— Nolan... já não foi suficientemente humilhante o que aconteceu?
E para minha raiva aumentar, ele riu.
— Só queria que você parasse um minuto, porque estava difícil de me controlar.
Eu abri a boca várias vezes para falar, mas as palavras não saíram.
— Como é que é?
— Você tem uma mania enervante de tirar conclusões precipitadas. Isso é realmente irritante, Amanda — reclamou, mas parecia mais divertido do que bravo —, embora divertido.
E agora eu me sentia mais idiota ainda. Este era meu problema. Eu era inocente demais.
— Que bom que eu te divirto — resmunguei ainda me sentindo meio boba e tentei sair da cama, mas Nolan me puxou pela blusa, me fazendo voltar. E não tive alternativa a não ser me sentar no chão com as costas na cama.
— Você não tem ideia de como me diverte — Nolan sussurrou em meu ouvido, eu derreti novamente, mas tentei permanecer séria, enquanto ele se deitava olhando o teto.
— Porque precisava se controlar, achei que íamos...
— Eu não queria... que fosse rápido demais.
— Não estava rápido demais.
— Iria terminar rápido demais se não parasse.
— Oh. — Então eu entendi. — Eu não tenho... muita experiência nisso.
— Eu sei. Mas não fazia ideia quando fiquei com você antes.
— Como não sabia? Você achou o quê?
— Sei que tem todo este lance de ser filha do pastor e o que todos deduziram... Mas porra, você tinha um namorado. Quem ia namorar e não querer foder você.
Eu fiquei vermelha com suas palavras cruas.
— Então, acredito que não deve ter sido legal o que rolou.
— Eu... não, não foi ruim. Eu estava um tanto bêbada, mas... tenho certeza que não tenho que responder isso para você. Deve saber como foi para mim.
— Eu não leio seus pensamentos.
— Ora, Nolan. Você não sabe se uma garota gostou de transar com você?
— Quando a garota em questão não demora nem 24 horas para transar com outro cara...
— Eu não fiz isso.
— Mas achava que sim. Você quis que eu achasse que sim.
— Eu estava com raiva de você.
— Também estava com raiva de você.
Eu me lembrava dele mudando as aulas que tinha comigo. E me lançando olhares raivosos ou me ignorando por semanas até o dia em que pediu pra conversar comigo na loja dos Cooper.
— Você apostou que ia ficar comigo, não sei se tinha algum direito de ficar bravo.
De repente queria contar a ele exatamente como me senti quando Stella revelou os motivos de ele querer ficar comigo. De como me senti devastada porque eu tinha acabado com Owen por causa dele. Para descobrir que não passou de um jogo e que ainda tinha uma namorada.
— Você foi um mentiroso. Ou é um mentiroso — sussurrei.
Nolan se levantou, saindo da cama. Ele foi até uma mesa no canto e pegou algo e vi o brilho do fogo no isqueiro, iluminando seu olhar, antes de se virar para a janela, com o cigarro aceso.
Abracei meus próprios joelhos e observei seus ombros tensos.
Ele parecia de novo como se estivesse se segurando para não explodir. Bem, como eu lhe disse, se alguém tinha o direito de estar bravo, era eu.
Cacei a raiva dentro de mim. E não a encontrei.
Em seu lugar, encontrei um anseio quase feroz de saber quem era aquele cara de verdade.
Eu sabia que não era nada saudável querer qualquer coisa de Nolan.
Mas não conseguia evitar.
— Será que pode não fumar? — pedi.
Ele virou a cabeça em minha direção com um riso de escárnio.
— Eu não gosto.
Por um momento achei que ia continuar fumando e ignorando meu pedido, mas apagou o cigarro e se virou, ainda encostado na janela, os braços cruzados em frente ao peito bonito.
— Não te vejo fumando.
Eu só o vi fumando uma vez na escola.
— Eu só fumo de vez em quando. Para curtir ou quando me sinto frustrado.
Eu me levantei e me posicionei ao seu lado, mas de frente para a janela. Dali dava pra ver algumas pessoas no jardim. O barulho da festa ao longe.
— Eu te deixo frustrado?
— Sim, nunca sei o que se passa pela sua cabeça.
Eu tive que rir.
— Eu sou bem simples, na verdade. Como dizem? Um livro aberto.
— Não sei se concordo.
— Acho que sou um daqueles personagens de livro que já se revelam logo na primeira página. Não sou surpreendente ou misteriosa. Ou tenho várias camadas...
— E eu?
— Você é um daqueles personagens que demoramos o livro inteiro para decifrar.
— E onde estamos, no fim ou no começo?
Nossos olhares se encontram.
— Eu não faço ideia.
— Então não conseguiu me decifrar?
— Não acho que esteja disposto a deixar.
— Não tem nada de bom a ser descoberto, Amanda.
Senti um arrepio de medo.
Tentei lembrar a maneira que Nolan se comportava comigo desde que nos conhecemos. Ele parecia exercer sobre mim uma sedução preguiçosa. Que agora eu poderia deduzir que era premeditada. Afinal, ele queria e precisava me conquistar.
Me manipular. Não sei se eu gostava mesmo daquele Nolan. Eu me sentia atraída? Óbvio que sim.
Muito.
Porém, aquele Nolan devia ser um personagem que ele criou.
E a pergunta que eu me fazia era quem era aquele Nolan agora. O Nolan que concordou em se casar comigo.
Não conseguia entender ainda.
Era como se... ele estivesse sempre se contendo ou tentando se camuflar.
Ele era o cara ciumento com Carlton e Owen. O cara que falava algumas merdas típicas de garoto mimado rico. Que não fazia nada para expulsar a ex-namorada que continuava ali lhe rondando em busca de migalhas ou sabe Deus o quê.
Mas também era o cara que foi educado e gentil na casa da minha mãe. Que disse que não devíamos transar quando dormimos na mesma cama naquela noite porque nem nos conhecíamos.
Ou porque ele no fundo não estava mais tão interessado? Talvez Nolan tenha se atraído por mim em algum momento, mas eu devia ser muito boba perto das garotas com quem ele já ficou. Como Ashley.
Talvez o desafio de conquistar uma garota como eu tenha passado.
Mas ele me beijou hoje.
E eu estava no quarto dele agora.
— Quem é você?
— Não deveria querer saber.
— Ashley disse que está diferente. — Não quis completar que ela disse que ele parecia diferente comigo. — Queria saber quem você era, lá em Nova York.
— Não quer, não.
— Agora vai dizer que não é mais aquele cara?
— Eu posso dizer que não quero ser aquele cara com você.
— O que quer ser comigo?
— O Nolan da Amanda — ele disse isso com aquele sorriso de escárnio, como se fosse uma piada.
Mas meu coração entendeu diferente. Porque queria que fosse verdade.
Que ele fosse mesmo agora o Nolan da Amanda.
Como eu desejava, bem lá no recanto mais escondido do meu coração ser a Amanda do Nolan.
— Me mostre qualquer coisa. Qualquer parte de você. — Havia um tom de súplica em meu pedido.
“Por favor, por favor, por favor.
Não seja o vilão dessa história.
Da nossa história.
Me diga que posso confiar em você como meu coração já começa a confiar, mesmo sabendo que é a última coisa que deveria fazer?”
— Você quer uma parte boa. E se não tiver?
— Eu posso fuçar até achar — rebati com petulância.
Ele fez um movimento abrindo os braços.
Eu corei, como a garota boba que era. Mas ele estava me desafiando ou sendo bobo também. Então abaixei o olhar para seu peito, onde havia algumas tatuagens. Não pareciam ter algum sentido especial nos desenhos, dragão, tribal, flores, frases em latim, que eu não fazia ideia do que poderiam significar, as flores em seu coração com o nome Daisy.
Estendi a mão e a toquei, ouvi seu coração batendo embaixo dos meus dedos.
Então meus olhos foram mais para baixo, assim como meus dedos, descobri que havia um rosto de uma mulher desenhado em sua costela.
— Quem é?
— Minha mãe.
É, talvez eu já devesse desconfiar.
“ Será que eu devia contar a ele que sabia como ela tinha morrido? ”
— Ela era bonita...
— Eu desenhei.
Desta vez eu o encaro surpresa.
— Você desenha?
— Sim.
De repente eu me recordei de um dia ter reparado que seus dedos estavam pretos. Seriam dos desenhos? Provavelmente.
— Me mostre.
— O quê?
— Seus desenhos.
— Não.
— Acho que encontrei algo bonito em você.
— Não sou eu, são desenhos.
— Foi você quem fez. Vamos, me mostre. Ou eu posso fuçar no seu quarto e achar.
Lancei-lhe um olhar de desafio e caminhei até a estante.
Mas ele se antecipou, como se não quisesse que eu mexesse nas suas coisas e pegou um caderno me passando. Percebi que embaixo dele havia uma pilha de outros cadernos.
Eu o peguei e sentei na beira da cama, o abrindo.
Havia muitos desenhos ali. De paisagens. De pássaros. A Marina de Camden. Olhei a data, pareciam recentes.
— São ótimos, Nolan. Onde aprendeu?
— Minha mãe amava desenhar também.
— Ela te ensinou?
— Sim. — Ele sorriu e havia uma nostalgia em seu olhar, que embora triste, também parecia acalentadora.
Não sei se Nolan se permitia falar ou até mesmo se lembrar da mãe dele com frequência.
— E o que mais? — Eu queria que ele mantivesse aquele sorriso.
— Esses CDs na minha estante são dela. Assim, como alguns livros. E ela me ensinou a dançar.
— Sério?
— Eu me lembro de ter dançado comigo quando estive aqui pela primeira vez. Estava se exibindo, claro.
Sem aviso, ele me puxou, do jeito que eu estava, de blusa e calcinha, e me segurou pela cintura e me rodopiou pelo quarto.
— Exibido, agora me solta!
Ele riu e continuou a dançar, me lançando e me puxando, me rodando, até que eu ficasse tonta e estivesse rindo também.
E nós dois caímos na cama, gargalhando e ofegando.
E sem pensar, tratei de passar meus braços em volta do seu pescoço, ele me beijou devagar desta vez e tentei mesmo não pular em cima dele. Era bem difícil.
Nolan gemeu roucamente contra meus lábios quando nossos corpos se roçavam.
Ele me fitou retirando os cabelos do meu rosto afogueado e então segurou meu pulso, e sem desviar os olhos dos meus fez meus dedos deslizarem por sua barriga tanquinho até mergulhar dentro de sua calça.
Ah minha nossa.
Meu rosto queimou de vergonha e excitação enquanto Nolan me fazia acariciá-lo.
Nós dois ofegamos.
— Isso é demais?
— Não. É bom pra cacete.
— Sério? Eu nunca fiz isso, não sei se estou fazendo certo.
— Está fazendo certo pra caralho.
E seus dedos percorreram minha barriga, até a minha calcinha.
De repente ouvi uma batida na porta.
— Nolan, está aí?
Era Jace.
Eu corei, como se Jace soubesse que eu estava ali e exatamente o que estávamos fazendo.
Nolan soltou um palavrão.
— Vá embora, Jace!
— Papai quer falar com você. Agora... E eu sei que a Amanda está aí e o papai também sabe. Melhor sair agora antes que ele venha até aqui. Palavras dele.
— Inferno! — Nolan me soltou, irritado.
— Tudo bem, eu... acho que vou embora.
Cacei minha calça enquanto Nolan colocava a camiseta. Ele parecia quase outro Nolan agora. Sério. Irritado.
Querendo briga.
Estremeci.
Por que o pai dele estaria bravo com ele?
— Acho melhor ir embora mesmo.
Eu assenti.
— Vou pedir que Jace te leve.
— Obrigada.
Ele abriu a porta e eu o segui. Na ponta da escada, encontramos Stella que estava subindo.
Seu olhar malicioso foi de mim para Nolan.
— Olha só a santinha...
— Cale a boca, Stella — Nolan rosnou.
— Esse colar, nunca o vi com ele? É novo? — Stella apontou para o presente de Owen em meu pescoço.
Corei. E tinha certeza de que no meu rosto estava espalhada a culpa.
— Sim, é.
— Hum, me parece um que pertenceu à mãe do Owen.
Como ela sabia?...
Mas claro que ela podia saber. A mãe de Stella era enfermeira. E foi ela quem cuidou da mãe de Owen. Eles brincavam juntos quando criança, assim como eu e Owen.
— Owen te deu.
Não era uma pergunta.
Eu podia mentir. Mas do que ia adiantar.
— Foi sim.
— Quando? — A voz de Nolan era fria como o gelo ao meu lado.
Eu podia mentir, claro.
Mas não consegui.
— Hoje. Foi um presente de formatura.
Nolan soltou minha mão e se afastou descendo as escadas.
Eu fui atrás dele.
Sentia uma necessidade urgente de me explicar, mesmo sabendo que não tinha culpa de nada.
— Ele foi apenas... me dar os parabéns pela formatura.
— Não quero saber, Amanda. — Nolan se virou. — Porque está escrito no seu rosto que não foi só isso.
— Não é como está pensando.
— Não sabe o que estou pensando.
Senti um nó apertar minha garganta.
Como é que eu ia explicar o que Owen havia dito sem piorar ainda mais a situação?
— Nolan! — A voz de trovão de Theodore Percy chegou até nós, vinda de uma sala no corredor.
Ele se virou para alguém atrás de mim.
— Peça ao Jace para levar a Amanda na casa dela.
Eu me virei e vi Stella.
— Jace está bêbado. Eu a levo.
— Não.
— O que foi, Nolan? Está com medo de que eu conte a Amanda os seus segredinhos?
Sem aviso, Nolan se aproximou de Stella, como se fosse um galo de briga. Ela manteve a postura altiva, sem nenhum medo.
— Talvez você queira que eu conte a Amanda os seus segredinhos!
Stella empalideceu e deu um passo atrás.
— Vá para o inferno!
E ela se afastou.
Nolan respirou fundo.
— Me espere que eu te levo em casa. Não vá a lugar nenhum. Muito menos com Stella.
E sem me dar chance de perguntar o que diabos foi aquilo entre os dois, ele se afastou, desaparecendo onde seu pai o chamou.
Mas antes que eu pudesse me afastar de volta, ainda ouvi a voz grave de Theodore Percy gritando com Nolan. Não conseguia escutar o que dizia.
Mas sentia a ira em meus ossos.
Capítulo 21
— Amanda, o que faz aqui? — Helena me abordou, ainda sem saber o que fazer, se voltava à festa ou me escondia em algum canto para esperar Nolan.
— Estou esperando o Nolan, ele está com o pai. — Talvez algo na minha voz um pouco alarmada tivesse alertado Helena, ou ela já estava acostumada a conversas a portas fechadas regadas a gritos de Theodore e Nolan? Percebi certo olhar consternado, antes de ela sorrir e tentar disfarçar.
— Volte para a festa, querida.
— Na verdade, queria ir embora. Mas não sei se o Nolan vai demorar...
— Tudo bem, eu te levo embora.
Eu quis declinar, mas Helena já se adiantava para pegar as chaves do carro no aparador e eu a segui para fora da casa.
Seguimos em silêncio por um momento até que não consegui conter minha curiosidade.
— O pai do Nolan parece muito bravo com ele.
Os dedos de Helena apertaram o volante, denotando sua tensão, embora ela me lançasse um olhar suave.
— Você sabe, pais e filhos. Sempre existem conflitos.
— Por que tenho a impressão que entre Theodore e Nolan é algo mais sério?
Ela hesitou por alguns instantes, como se estivesse pensando no que deveria me contar.
— Olhe, existem conflitos entre Theodore e o filho. Conflitos que existiam muito antes de eu me casar com Theodore.
— Por causa da mãe dele?
— O que você sabe sobre isso? Nolan te contou?
— Não. Nolan não me conta nada. Eu... na verdade, sinto que não o conheço. Austin comentou algumas coisas sobre Nolan e Jace terem problemas em Nova York e que por isso Theodore se mudou para cá após o casamento.
— Sim, isso é verdade. Theodore queria afastar Nolan de lá. Das coisas que aconteceram lá. Eu também tive esperança que ao se mudarem para cá, Jace na faculdade, Nolan longe de... Enfim, acho que fui ingênua acreditando que as coisas poderiam se tornar mais fáceis. Por um tempo, ele parecia sob controle. Ainda existiam as rusgas, as malcriações, respostas atravessadas e algumas discussões, mas aqui em Camden não é Manhattan. Achei que Nolan estava se adaptando, mesmo a contragosto. Mas...
— Mas ele se envolveu comigo.
— Sim, ele aprontou mais uma, como diz Theodore.
Ah sim, Nolan havia apostado que ia transar com a filha do pastor da cidade porque estava entediado. Ou para provocar o pai?
— Claro que engravidar você foi mais motivo de desavenças, não posso negar.
— Imagino...
— Mas até que as coisas se resolveram, de certa forma. Você e Nolan estão juntos.
Ela parou o carro em frente a minha casa e me encarou sorrindo. Porém, não parecia um sorriso genuíno. Tive a impressão que ela queria dar a conversa por encerrada, que desejava que eu ficasse tranquila.
Mas era óbvio que tinha mais coisas ali.
A discussão entre o pai e Nolan hoje não parecia boba.
— Eu não sei se... as coisas estão mesmo resolvidas. Eu e Nolan mal nos conhecemos. Sei que estou grávida, que concordei em me casar com ele, porque no fim pareceu a opção mais... adequada.
Ela pareceu preocupada por um momento.
— Você não quer se casar com Nolan? Não é obrigada a fazer nada contra sua vontade. Sei que seu pai exigiu e o próprio Nolan concordou, mas se não é o seu desejo ainda há tempo de mudar de ideia.
Qual era meu desejo?
Meu desejo era voltar no tempo e mudar tudo. Mas era impossível.
Eu não queria me casar, mas também não queria ficar grávida e sozinha.
Poderia romper com Nolan e o que aconteceria? Não parecia uma opção mais fácil, muito pelo contrário.
Nada era fácil pra mim no momento.
Eu apenas podia escolher um caminho e seguir por ele.
— Eu tomei minha decisão. Não é uma opção voltar atrás. — Tentei manter minha voz firme. — Mas não sei se Nolan quer isso de verdade. Pra ele, eu fui apenas uma aposta e agora sou um motivo de mais problemas entre ele e o pai.
— Não é você. Os problemas já estavam ali.
— Às vezes, é difícil ver um futuro. Por mais que estejamos juntos na mesma direção agora, como podemos chegar a algum lugar? Se eu e ele nem nos conhecemos de verdade.
— Olha, as coisas não têm sido fáceis para o Nolan desde a perda da mãe. Acho que para nenhum deles.
— Mas Theodore encontrou você. — Eu me recordei de Austin dizendo que Theodore não era fiel a mãe de Nolan, será que Helena sabia?
Helena sorriu.
— Sim, nós nos encontramos.
— Nolan... ele te aceitou? — Se Nolan culpava o pai pela morte da mãe e não superou como será que ele viu o novo casamento de Theodore.
— Não foi fácil. Mas eu não desisto fácil também. Talvez isso seja um conselho.
— O que quer dizer?
— Não desista do Nolan. Existe uma boa pessoa em algum lugar dentro dele, embaixo de toda a sujeira em que ele mesmo se soterrou. E acho que estar com alguém como você é bom pra ele.
— Você fala como se eu pudesse ter alguma influência sobre Nolan. O que é ridículo. Até agora, aparentemente, é Nolan que vem me influenciando e veja só no que deu.
— Eu sou uma otimista. — Ela destravou a porta, dando a nossa conversa por encerrada.
Saí do carro e quando entrei em casa, meu pai estava me esperando para ir dormir.
— Oi, pai.
— Olá, e como foi a festa?
Consegui sorrir e dizer que a festa estava ótima.
— E o senhor ficou em casa? — Eu fui até a cozinha e peguei um copo de água enquanto meu pai checava as portas e apagava as luzes.
— Fui à reunião do conselho municipal hoje. Theodore Percy está tentando convencer o conselho que é uma boa ideia um grande empreendimento na área da Marina.
Eu parei, curiosa.
Lembrando que Nolan comentou algo sobre isso.
— E vai acontecer?
— O Percy é bem persuasivo e tem dinheiro. Mas houve uma discussão hoje com o Cooper.
— O pai do Carlton?
— Sim, eu não sei por que, quando vi Harry já estava levando Cooper para fora — Harry era o irmão mais velho de Carlton. — E Theodore não parecia nada feliz.
— Por que eles iriam discutir? Sempre achei que eles fossem bem ambiciosos.
— Sim, não pareceu que foi por causa de negócios. Mas enfim, vamos dormir.
— Boa noite, pai.
Quando me deitei para dormir, minha mente dava várias voltas, relembrando tudo o que aconteceu naquele dia interminável. Primeiro a aparição de Owen e sua proposta de continuar comigo, mesmo depois de tudo o que eu fiz, mesmo estando grávida de outro como prova disso.
Não que fosse uma alternativa viável para mim agora, mas de certa forma saber que ele faria isso por mim me deixava muito mal.
Lembrar do que eu fiz com Owen sempre me deixava triste.
Será que se Nolan não tivesse subido para meu quarto naquela noite eu e Owen ainda estaríamos juntos? Será que eu já teria dormido com ele?
Eu nunca saberia.
Porque Nolan tinha subido. E fui tola o suficiente para me deixar levar.
Do que adiantava ficar pensando nisso agora? Eu ia me casar com Nolan. Tinha dado minha palavra. E mesmo ainda tendo dúvidas de que aquela era a melhor solução, eu não ia voltar atrás.
Fechei os olhos e tentei dormir.
Acordei com a sensação estranha de não estar sozinha.
E a sensação passou a ser certeza quando mãos frias tocaram meu rosto e um hálito quente banhou minha pele.
Abri os olhos e Nolan estava ali comigo.
— Nolan? — indaguei confusa, meu coração disparado no peito num misto de surpresa e alegria tola.
Seus dedos frios enquadraram meu rosto e ele me beijou.
Meu corpo reagiu, mas meu cérebro protestou, lembrando que eu queria perguntar por que seu pai estava brigando com ele e o que foi aquela troca de farpas sobre segredos com Stella. E tantas outras coisas mais que eu desejava saber sobre ele. Sobre nós. Mas Nolan não parecia estar ali para conversar quando seus dedos gelados do frio da noite começaram a tirar meu pijama.
— Nolan, espere... — Eu me desvencilhei.
— O quê? — Ele parou de me beijar, mas continuou com a mão embaixo do meu pijama, subindo para meus seios.
— O que está fazendo aqui?...
— Não é óbvio? — Seus dedos apertaram meu mamilo e ele se abaixou para beijar minha garganta.
— Isso é esquisito...
— O que é esquisito?
— Você aqui...
Ele finalmente parou e me encarou sério. Quase... raivoso.
— Quer que eu vá embora?
— Disse uma vez que não ia forçar mais nenhuma barra comigo...
— E acreditou?
— Você mentiu?
— Eu não sou um cara legal, Amanda. Mas eu quero você. Quero tanto que dói. Quero tanto que chego a ter raiva disso. Eu venho tentando fazer a coisa certa com você, mesmo sabendo que talvez seja tarde pra isso. Então se não quer, diz logo porque eu pulo a porra de sua janela e vou embora.
E por um instante parecia que não estava mais falando só daquela noite e daquele momento.
E sim de tudo.
De nós.
— Estava bravo comigo.
— Eu não lembro mais por que. — Era mentira, claro. Seu olhar estava no colar de Owen.
— Está mentindo porque quer transar comigo.
— Quer esperar até quando nos casarmos? Meio tarde acho, mas...
— Não é isso.
— Então?
— Então vamos fazer isso, não é? Nos casar?
— Diga-me você.
Era agora. Eu podia dizer.
Chega.
Basta.
E pular no desconhecido.
Mas estar com Nolan era pular no desconhecido também. A diferença era que eu estaria com ele.
Eu o empurrei e me sentei na cama.
E ainda sem desviar o olhar, tirei o colar de Owen e coloquei na mesa de cabeceira.
“ Adeus, Owen. ”, sussurrei mentalmente, pedindo desculpas mais uma vez a Amanda que eu era antes.
Porque agora eu estava escolhendo ser a Amanda que surgia com aquele cara.
A Amanda do Nolan.
Nolan me puxou para seu colo e tirou a blusa do meu pijama.
— Tem razão, estou bravo.
— Comigo? — Eu fiz o mesmo com a camiseta dele.
— Com tudo. O tempo inteiro. — Ele segurou meus quadris, me apertando nele e eu gemi, ao sentir o quanto estava excitado. Meu corpo respondendo de imediato.
— Comigo? — insisti.
Em resposta, ele me beijou. E eu já não pensava em mais nada a não ser que ele estava ali, ao alcance das minhas mãos. E tudo o que eu queria era que ele continuasse a me tocar, de todas as maneiras, em todos os lugares.
Comecei a ofegar, quando ele fazia justamente isso. Era como se tivesse mil mãos, em meus seios, minha barriga, meus quadris, o interior da minha coxa e subindo até tocar a junção entre minhas pernas e um desejo líquido percorreu minha pele se concentrando onde ele tocava e gemi seu nome no quarto escuro.
— Tira minha roupa... — sussurrei e ele se afastou para tirar a calça do meu pijama e fez o mesmo com a calça jeans dele.
Deixei meus olhos cobiçosos percorrê-lo com atenção pela primeira vez.
Nolan era lindo. E meu.
Pelo menos neste momento, quando seu olhar intenso inspecionava meu corpo do mesmo jeito que eu o dele. E uma dor doce se instalou com um pulsar úmido e urgente entre minhas pernas, e então ele estava entrando em mim, e nada se comparava com aquela sensação. Da outra vez eu estava bêbada e tudo era bem confuso na minha mente, mas agora eu estava completamente consciente de todas as sensações, de seus dedos retirando os cabelos do meu rosto afogueado, do peso do seu corpo suado e quente grudado no meu, de sua respiração ofegante contra minha pele e seus olhos verdes perscrutando meu rosto.
— Tudo bem? — indagou contra minha boca e sacudi a cabeça afirmativamente, incapaz de falar, meus dedos castigando seus cabelos e minhas pernas passando em volta dos seus quadris, o trazendo para mais perto. Mais fundo. E ainda não parecia suficiente. Ouvi Nolan gemer em meu ouvido enquanto se movia dentro de mim e meus gemidos se misturaram aos dele. Tudo o que eu sentia era a tensão aumentando e meu corpo esquentando cada vez mais até estremecermos juntos, uma, duas, várias vezes.
Nolan se afastou para o lado quando terminou, mas fui junto, não desejando nenhum espaço entre nós. Senti seus dedos deslizando de leve nas minhas costas.
Eu sabia que ele precisava ir embora, mas não ainda.
— Fica um pouco — sussurrei sonolenta e cansada, mas ansiando ainda conversar com ele sobre tantas coisas que nunca tínhamos falado.
Capítulo 22
Tudo o que eu lembro quando acordei de manhã era que eu tinha lutado para ficar acordada, mas foi impossível.
Queria mesmo conversar com Nolan, mas o sono foi mais forte.
E agora, enquanto abria os olhos, percebi que estava sozinha. Claro que Nolan iria embora. Se meu pai o pegasse ali, não ia ser nada bom. Mas bem que ele podia ter falado comigo antes de ir.
Era uma sensação bem parecida com a da primeira vez, mas agora eu nem podia dizer que estava bêbada.
Mas por que eu precisava de desculpas? Íamos nos casar, não íamos?
Então por que ainda sentia como se algo ainda fosse errado?
Eu me levantei e olhei pela janela, estava sol. Pálido, mas ainda sol.
Onde será que Nolan estava?
Pela hora meu pai já tinha saído para o trabalho e desci e paralisei na porta da cozinha ao ver alguém lá.
— Samantha? Da onde você saiu? — indaguei surpresa, embora nem precisasse ficar tão surpresa assim. Meu pai adorava Samantha e ela era bem persuasiva.
— Bom dia, Amanda! Sente-se e tome seu café. Temos bastante trabalho.
— Ah não... — murmurei indo me sentar.
Samantha tinha uma agenda na sua frente e fazia anotações frenéticas.
— Diga que não veio falar dos tais preparativos, eu disse que podia fazer o que quisesse.
Ela revirou os olhos, mas antes que pudesse responder, seu celular tocou e ela atendeu impaciente.
— Samantha Carter? Ah sim... Não, não. Eu fui bem clara. Queremos orquídeas e não rosas. Como assim não está achando? Procura! Dinheiro não é problema. E não me apareça aqui com rosas!
E ela desligou sorrindo para mim de um jeito angelical.
Era quase assustadora.
— Nossa, você não tem ideia de como dá trabalho organizar um casamento em tempo recorde! E quase tudo sozinha, né? — Ela revirou os olhos. — E sinceramente dispenso a ajuda de Stella e Ashley, são muito extravagantes para meu gosto. Pelo menos elas não estão mais aqui para me atrapalhar.
— Não? — Levantei os olhos do meu cereal, interessada naquela informação.
— Não, eles viajaram com meus pais. Era uma viagem que estava agendada há tempos, sabe? Viagem de família. Para nossa casa em Barbados. Achei que nem ia rolar, mas mamãe insistiu que acontecesse e eu sei até bem por que! Enfim, eu bati o pé e disse que seria impossível, porque quem cuidaria do casamento?
— Todos foram? — Um alarme soou na minha cabeça — Nolan também?
— Não sabia? Achei que ele tinha te avisado, que estranho. Afinal ele só chegou hoje de manhã, achei que estava aqui.
— Sim, ele estava... — murmurei tentando me lembrar se Nolan tinha falado alguma coisa sobre viajar. — E você disse que a Ashley também foi?
— Sim, ela foi.
Empurrei o prato de cereal para frente e me senti enjoada.
— O que foi? Vai vomitar? — Samantha indagou preocupada e eu não consegui responder — Oh... tem certeza que o Nolan não falou nada? Será que ele não falou e não ouviu? Você me parece bem distraída às vezes.
— É, pode ser. — Eu me levantei levando as coisas para a pia apenas para me distrair da vontade que tinha de esmurrar algo.
E infelizmente Nolan não estava ali para eu fazer isso.
Samantha ficou falando, algo sobre o menu, mas não estava prestando a menor atenção.
Eu só queria saber por que Nolan transou comigo para depois ir viajar com Ashley.
— Amanda, pode prestar atenção um segundo? — Samantha me chamou impaciente e eu a encarei.
— Não, não posso. Estou ocupada, preciso ainda arrumar toda a cozinha e depois ir trabalhar — falei friamente.
— Achei que não fosse mais trabalhar.
— O quê? O idiota do seu irmão que falou isso?
— Nossa, você está mesmo brava com ele! Acho que vou ligar pra ele e dizer isso! Precisam resolver essas briguinhas de casais para eu poder fazer meu trabalho direito.
Eu tomei o celular da mão dela.
— Não precisa ligar.
— Mas...
— E nem vai falar para ele que fiquei brava, ok?
— Por que não?
— Porque pode ser mesmo que tenha me falado e eu não tenha ouvido — menti.
Ela deu de ombros.
— Tudo bem. Vai escapar de mim hoje. Mas amanhã estarei aqui!
E ela saiu fechando a porta atrás de si numa nuvem de perfume caro e doce.
Voltei minha atenção para a louça e o anel brilhou em meu dedo. Impaciente, eu o tirei e o joguei sobre o mármore.
Só de olhar para ele já me irritava.
Nolan sumiu por uma semana inteira.
Eu só vomitei um dia.
E senti falta dele todos os dias.
Será que estava ficando louca?
Uma parte de mim queria matá-lo. Porque ele viajou sem ao menos me dizer. E na companhia da ex-namorada, que sempre deixava bem claro que ainda era apaixonada por ele.
Não passava um dia em que eu não imaginasse o que estavam fazendo juntos. Eu queria perguntar à Samantha se ela tinha notícias, mas tinha medo do que ia ouvir. E claro que eu podia ligar, mas não queria dar o braço a torcer.
Mesmo porque Nolan também não me ligou nem um dia.
Samantha apareceu na minha casa algumas vezes, tirou medidas do meu pai e cismou que queria falar com a minha mãe.
— Para quê?
— Sobre o casamento, oras!
A contragosto, deixei as duas conversarem e depois Samantha me passou o telefone.
— Não achei que você viesse, mãe.
— Claro que eu irei, Amanda, que comentário! Eu sou sua mãe, como não estaria no seu casamento? Eu só não fui para a formatura porque Ross tinha aqueles shows e você insistiu que eu não precisava ir! E por que está com essa voz? Está com algum problema?
— Não — menti. — Estou tensa com tudo isso indo tão rápido.
— Não se preocupe. Tem sorte da irmã do Nolan estar ajudando. Tenho certeza de que tudo dará certo.
Ela desligou e fiquei me perguntando se tudo ia dar certo mesmo.
Eu tinha sérias dúvidas.
No dia seguinte, Samantha apareceu com várias malas e sacolas. Era sábado e eu estava de folga da loja dos Cooper naquela tarde.
Meu pai estava na igreja.
— O que é isso? — indaguei colocando meu livro de lado.
— Muitas roupas! Já era para ter trazido para experimentar tudo. Vamos subir para seu quarto.
Eu a segui desanimada e Samantha tagarelava enquanto brincava de Barbie comigo, me vestindo e despindo de várias roupas.
— Acho que Nolan tinha razão com suas medidas, está cabendo tudo direitinho, apenas algumas barras, um acerto aqui, outro ali.
Ela me vestia e me fazia dar voltas.
— Isso tudo é tão sem noção!
— Por quê?
— Eu tenho roupas!
Ela riu.
— Eu sei, mas é seu enxoval!
Ela abriu outra mala e arregalei os olhos ao ver várias lingeries.
— Isso não é para mim, é?
— Tudo aqui é seu, que pergunta!
Peguei na mão algo bem pequeno e de renda com uma etiqueta de uma loja bem cara e exclusiva.
— Nolan que escolheu todas elas. — Samantha piscou maliciosa e meu rosto se tingiu de vermelho. — Claro que eu tive que dar uma ajudinha, mas ele sabia exatamente tudo o que ia caber em você e acho que estava certo até nisso. Embora ele tenha dito que provavelmente você não gostaria muito dessas coisas, eu ignorei. — Ela abriu outra sacola e me passou um vestido rosa-pálido. — Vista este aqui. É um vestido para quando terminar a cerimônia. Vou ao carro buscar uma mala que faltou, dos acessórios.
— Oh meu Deus, tem mais?
Ela riu e saiu do quarto e coloquei o vestido, como pediu. Mas não alcancei as costas para fechar o zíper.
Ouvi seus passos se aproximando.
— Samantha fecha para mim.
Mas quando as mãos tocaram minhas costas para subir o zíper eu soube imediatamente que não era Samantha.
Levantei a cabeça e vi Nolan parado atrás de mim pelo espelho.
Senti um redemoinho de emoções me transpassando.
Mas uma, era mais forte. Raiva.
— Oi, Amanda.
— O que faz aqui? — indaguei friamente, me virando e ignorando o jeito que ainda sentia os dedos dele queimando minha pele.
— Samantha está buscando alguma coisa no carro.
— Não perguntei onde a Samantha está. Perguntei o que está fazendo aqui.
— Preciso de um motivo para estar aqui?
— Depois de sumir por uma semana, acho que sim.
— E acho que está me devendo um encontro.
O quê?
— Você desaparece uma semana e quer um encontro?
— Eu estava viajando com a minha família.
— Eu fiquei sabendo. Não por você, claro! — Quase cuspia as palavras de tanta raiva. — Sabe como fiquei com raiva? Sabe como foi saber pela sua irmã que você tinha viajado e nem se deu ao trabalho de me avisar?
— Eu avisei.
— Enquanto eu estava dormindo? Porque eu não me lembro disso!
Samantha apareceu antes que ele pudesse responder.
— Eu falei que estávamos ocupadas, Nolan.
— Agora não, Samantha — resmunguei irritada.
— Mas...
Sem dizer nada, Nolan pegou o braço de Samantha e a colocou para fora do quarto.
— Ei, o que está fazendo? — Mas Nolan já fechava a porta na sua cara.
— Por que fez isso?
— Estamos tendo uma conversa privada aqui.
— Abra a porta — ordenei.
Ele me ignorou, assim como as batidas de Samantha e foi até minha cômoda e tirou de lá um bloco, jogando em cima de mim.
Abri e vi um bilhete rabiscado.
“Amanda.
Estou indo viajar com minha família. Não era algo que eu queria fazer agora, mas talvez seja bom me afastar e pensar em todas essas merdas.
Volto em uma semana.
Espero que ainda esteja aqui.
Nolan.”
Droga. Ele tinha mesmo deixado um bilhete. E eu não vi.
— O que quis dizer com pensar sobre merdas ?
Ele deu de ombros.
— Como diz Helena, me afastar seria bom para repensar minhas atitudes.
— E pensou?
“ Ou ficou nadando com os golfinhos e com a Ashley? ”, queria perguntar.
— Sim, e cheguei a algumas conclusões.
Eu suspirei, ainda um tanto confusa, abaixando o olhar de novo para o bilhete.
Havia algo mais ali.
Minha mão tremeu ao reconhecer o bilhete de Owen que eu havia guardado.
Era óbvio que Nolan tinha visto.
— Hoje à noite? Posso te buscar? — insistiu sem comentar nada sobre eu não ter visto o bilhete. Ou pelo fato óbvio de que ele não tinha gostado nada de ter visto o bilhete de Owen ali.
E eu me perguntei de repente se isso tinha a ver com o fato dele ter saído sem falar comigo. Ou não ter me ligado nem um dia.
Eu respirei fundo.
— Ok — concordei.
Talvez já tenha passado da hora de termos uma conversa bem longa.
Ele abriu a porta e Samantha estava furiosa.
— Não precisa reclamar, eu já vou.
E eu ouvi seus passos se afastando pela escada.
Samantha me encarou.
— Por favor, digam que não estavam se pegando?
Eu tive que rir, mas estava totalmente sem humor.
— Não, nem perto disso.
Ela revirou os olhos.
— Que seja. Vamos tirar este vestido aqui e vestir este agora. Prometo que já estamos acabando e eu te deixo em paz.
Samantha foi embora meia hora depois e eu me joguei na cama, totalmente exausta.
Física e emocionalmente.
Nem sabia o que pensar.
Se me sentia uma idiota por não ter visto o bilhete, ou por ter guardado o bilhete do Owen. Ou ainda por ter concordado em sair com Nolan.
Depois de ele ter ido viajar com a Ashley.
E o que foi que ele disse? Que precisava pensar em suas atitudes.
Que atitudes? Sobre querer casar comigo? Será que este era o questionamento?
De repente eu senti um arrepio de medo.
Mas se ele tivesse desistido do casamento teria pedido para se encontrar comigo?
A não ser que fosse para me dizer exatamente isso?
Será que a Ashley tinha finalmente conseguido o que queria nas praias azuis de Barbados?
Meu estômago começou a revirar.
Peguei o telefone e liguei para seu celular.
“ Não vou mais me encontrar com você! ”
Não, não era isso o que eu queria. Eu queria resolver aquela questão o mais rápido possível e não estava a fim de esperar.
— Oi, preciso conversar com você — disparei assim que ele atendeu.
— Agora? Nós vamos sair hoje à noite, Amanda.
— Eu sei, mas tem que ser agora. Na verdade, estou indo aí.
— O que aconteceu? Algum problema? Está se sentindo bem? — Havia uma nota de preocupação na sua voz.
— Estou bem... quer dizer. Olha, me espera aí.
— Amanda, espera... — Mas eu já tinha desligado.
Eu me levantei e olhei pela janela. Nuvens escuras cobriam o céu. Ia chover forte. Era melhor eu me apressar.
Entrei no carro e tentei acalmar minha ansiedade, mas depois de alguns minutos na estrada, avistei um carro parado no acostamento e reconheci Owen parado ao lado.
Reduzi a velocidade, abrindo a janela.
— O que faz aqui?
— A porcaria do motor fundiu.
— Isso é grave. Vai ter que rebocar para uma oficina.
— Preciso de um guincho. Estou tentando ligar para a oficina, mas Sebastian não atende.
— Posso te dar uma carona até lá — sugeri sem pensar.
Não ia doer, ia?
Era só uma carona até a cidade no caminho para a casa de Nolan.
Owen entrou no carro e eu prossegui. Uma tensão estranha se formou entre nós.
Era triste.
Owen sempre foi meu amigo. E agora, nossa relação estava resumida a isso.
A chuva começou a cair com força e eu liguei o para-brisa.
— Sinto muito por seu carro.
Ele deu de ombros.
— É um carro velho, acontece. Mas Sebastian vai dar um jeito nele.
— Acredito. É um bom mecânico.
— Onde está indo?
— Para a casa de Nolan.
Owen ficou em silêncio por um momento.
— E quando será o casamento?
Eu podia notar como as palavras doíam nele.
E reverberam em mim.
— Daqui a dez dias — murmurei.
E então me pareceu tão perto e tão definitivo.
Dependendo do que Nolan tinha decidido, não é? E se decidisse que não ia mais casar comigo? Eu ainda teria um bebê.
Meu bebê. Eu quase nunca pensava nisso. Era demais para mim.
Mas era uma realidade. Eu estava grávida e ia ter um bebê.
Um bebê meu e de Nolan.
Levei a mão a minha barriga ainda plana instintivamente e ouvi um suspiro profundo do meu lado.
Olhei para Owen.
Havia uma dor resignada em seu olhar.
— Owen, eu...
— Amanda, olhe pra frente — ele gritou e voltei a atenção à minha frente tarde demais.
Estávamos saindo da estrada rapidamente e batendo numa árvore, o vidro se estilhaçou e fui para frente com o impacto.
E não vi mais nada.
Capítulo 23
Minha cabeça doía como se pesasse uma tonelada, foi a primeira coisa que percebi ao despertar.
E quando abri os olhos, as luzes quase me cegaram e soltei um gemido levando a mão aos olhos e notei que este movimento fazia todo meu corpo doer.
— Amanda?
Passos se aproximaram, e abri os olhos novamente ao ouvir a voz de Nolan. Ele estava do lado da cama, me encarando com uma expressão tensa.
— Está se sentindo bem?
— Onde estou? — Percebi que minha garganta estava seca.
— No hospital.
— Hospital? — sussurrei começando a me lembrar.
Estava no carro com Owen e chovia.
E saímos da estrada, batendo numa árvore.
— Meu carro...
— Totalmente destruído, mas o importante é que você está bem.
— Bem? Está tudo doendo — reclamei ao tentar me mexer.
— Podia ter sido pior. Está com algumas escoriações e um corte na mão e na testa — respondeu, mas ele não parecia tranquilo.
Tinha algo errado?
— Owen?... — perguntei preocupada e Nolan ficou mais tenso ainda.
— Ele está bem. Machucou o braço, mas nem está mais no hospital.
Então algo terrível me ocorreu e levei a mão à minha barriga.
— Nolan... o bebê?
— Está tudo bem com o bebê.
— Tem certeza?
— Sim.
Fechei os olhos sentindo vontade de chorar de alívio.
— Sinto muito. Estava chovendo tanto, devia ter prestado atenção à estrada...
— Não pense mais nisso. Tente descansar.
Eu o encarei mais atentamente.
Ele tinha olheiras escuras embaixo dos olhos e parecia bem cansado.
— Há quanto tempo estou aqui?
— Algumas horas.
— Quando poderei ir embora?
— Amanhã. Ficará esta noite em observação.
— Que horas são?
— É madrugada.
— Não precisava ficar aqui, parece cansado.
— Eu preferi que seu pai fosse descansar. Disse que ligaria para ele quando acordasse. Ele não queria sair daqui, mas Helena garantiu que estava bem.
— Coitado do papai.
— Durma agora. Eu ligarei para ele.
Comecei a me sentir sonolenta.
— Vai ficar aqui? — indaguei quase adormecendo.
E não tive certeza se sentia sua mão em meus cabelos.
— Eu não vou a lugar algum.
Quando acordei novamente, era meu pai quem estava ali.
— Amanda, que susto você me deu.
— Oi, pai.
— Não deveria ter saído com aquela tempestade se formando...
— Está tudo bem agora.
— Sim, ainda bem. Owen também só machucou o braço, mas aquele lá é bem forte, já está bem. Ele ficou bastante preocupado com você, mas tivemos uma pequena discussão aqui e ele preferiu ir embora. Acho que fez bem, afinal de contas.
— Discussão?
— Nolan não gostou muito quando Owen veio ver como você estava.
— Droga — murmurei fechando os olhos.
Claro que Nolan devia estar furioso por eu estar no carro com Owen.
— Não fique nervosa com isso. — Meu pai tentou me acalmar. — Owen foi embora e tudo se resolveu.
Eu queria ter o mesmo otimismo.
Nada tinha se resolvido, muito pelo contrário.
— Cadê o Nolan?
— Ele foi até a casa dele, porque eu insisti. Passou a noite aqui com você.
— Quando eu posso ir embora?
— A Doutora Helena já virá te ver. Ela disse que provavelmente terá alta.
Seu celular tocou e fez uma careta.
— É sua mãe. Ela está me ligando de hora em hora querendo falar com você.
Peguei o aparelho e garanti a mamãe que estava bem e que ela não precisaria viajar de São Francisco até Camden.
— Tem certeza? Um acidente de carro é coisa séria! Seu pai disse que o bebê está bem e que você teria alta, mas...
— Sim, estou bem. Só algumas escoriações e hoje já vou pra casa. Não precisa vir me pajear. Nos vemos daqui a dez dias, não é?
Ela acabou concordando por fim e quando desliguei a médica apareceu.
— Como se sente, Amanda?
— Dolorida?
Ela sorriu complacente.
— Sim, se sentirá assim por alguns dias.
— Eu poderei ir embora?
— Poderá se prometer fazer repouso por alguns dias até parar de sentir dor no corpo.
— Ela fará — Gavin respondeu por mim.
— E o bebê? — perguntei apreensiva.
— Está tudo bem. Nada aconteceu com sua gravidez. Teve muita sorte.
Eu assenti.
Era estranho que eu estava preocupada agora. Como se me desse conta, finalmente, que estava irrevogavelmente grávida.
Era assustador.
— Fique tranquila que nada vai afetar os planos de casamento. Samantha já deu um pequeno show quanto a isso ontem. Mas você estará nova em folha para a festa.
Eu sorri sem graça.
Nolan apareceu e com ele estava Samantha.
— Como pode fazer isso, Amanda? — Samantha reclamou. — Dez dias para o casamento! E se quebra uma perna? Um braço? Eu não quero nem pensar nisso!
— Samantha, cale a boca — Nolan praticamente rosnou para ela.
Ótimo. O humor dele não tinha melhorado.
— Bem, Amanda pode ir para casa já — Helena respondeu e saiu do quarto com papai e Nolan.
Samantha me ajudou a trocar de roupa e Nolan voltou me pegando no colo.
— Não precisa... — murmurei.
— Precisa sim.
Ele me levou até o carro e Samantha e Helena se despediram, enquanto Gavin disse que precisava voltar para a igreja, já que Nolan iria me levar embora.
Samantha prometeu ir me ver mais tarde.
— Tenho algumas coisas para acertar para o casamento e não pense que só porque está convalescente se livrou de mim — ameaçou enquanto Helena a arrastava para longe.
Nolan entrou e deu partida.
— Samantha às vezes perde a noção — falou irritado.
— Sim, eu sei. Ela me tira do sério também, com tudo isso de casamento...
Nolan não falou nada.
Eu mordi os lábios com força.
— Talvez seja tudo uma perda de tempo, não é?
— Perda de tempo?
— Todo este trabalho, todos estes preparativos...
— Ela gosta de fazer isso e achei que você tinha concordado que ela faria.
— Sim. Eu só acho que seria um desperdício de tempo para nada — murmurei olhando pela janela.
— O que quer dizer? — Sua voz estava cheia de tensão quando parou o carro em frente a minha casa. — Que não vamos mais nos casar?
Eu o encarei.
— Me diga você.
— Não fui eu que comecei com este assunto.
— Eu dei minha palavra que íamos nos casar.
Droga, eu me sentia uma imbecil por estar praticamente choramingando, mas não conseguia evitar.
Nolan ficou me encarando em silêncio.
— Eu também dei — respondeu e então saiu do carro, dando a volta e abrindo a porta do passageiro e me tirando de lá, me levou para meu quarto.
— Está com fome?
Eu sacudi a cabeça negativamente.
— Estou cansada. — E realmente estava sonolenta.
— Então durma. — Ele tirou meus sapatos e puxou a coberta para cima de mim.
— Vai embora? — indaguei fechando os olhos.
— Não. Eu cuidarei de você.
Acordei com uma leve dor de cabeça. O quarto estava na penumbra.
Eu me levantei e fui até o banheiro. Olhei minha imagem no espelho e tomei um susto. “ Parece que eu sofri um acidente de carro. ”, pensei irônica.
Estava toda roxa e um corte na minha testa, perto do cabelo, havia uns pontos.
Tirei a roupa e dei uma olhada em mim mesma. Estava toda cheia de escoriações também. Mesmo dolorida, entrei embaixo do chuveiro e tomei um banho.
Saí de lá me sentindo um pouco melhor e desci as escadas.
Nolan estava na minha cozinha.
Ele disse que ficaria, não é?
E ficou.
— Não deveria estar aqui embaixo.
— Não vou ficar na cama o dia inteiro, me sinto um pouco melhor.
— Helena disse que tinha que fazer repouso.
— Estou em casa, não estou? Só preciso comer.
— Eu poderia levar até a cama.
— Não estou inválida.
— Não sabia que era teimosa — murmurou se levantando e fazendo um prato pra mim de algo que estava sobre o fogão.
Notei que era pasta ao molho pesto. Meu preferido.
— De onde saiu isso?
— Eu fiz.
Claro que era mentira.
— Duvido.
Ele riu.
— Eu perguntei ao seu pai o que gostaria de comer e pedi em um restaurante, claro.
— Claro. — Rolei os olhos, mas me pus a comer.
— Está se sentindo melhor?
— Um pouco. Meu corpo ainda dói e minha cabeça. E estou parecendo que levei vários socos, estou horrorosa.
— Não está. E você sente alguma coisa na barriga, alguma dor? Helena disse que era pra levar você imediatamente ao médico se sentisse.
— Ela disse que estava tudo bem — falei preocupada.
— É apenas precaução, segundo ela.
Eu assenti, mordendo meus lábios.
De repente algo me ocorreu.
Se eu não estivesse mais grávida não haveria mais nenhum motivo para permanecermos juntos.
Toda aquela confusão que tínhamos nos metido estaria terminada.
Nolan estaria livre de mim.
E eu dele.
Será que Nolan se dava conta disso agora também?
— Eu fiquei... realmente aliviada quando ela disse que estava tudo bem — confessei, quando acabei de comer, e Nolan se levantou pegando meu prato e levando até a pia.
Eu sei que talvez tudo fosse mais fácil se não estivesse mais grávida. Mas pensar nessa possibilidade agora me deixava triste e não aliviada.
— Eu também.
Ele respondeu isso de costas pra mim enquanto lavava a louça na pia.
Estaria sendo sincero? Ou lamentava por tudo não ter terminado, enfim?
—Toc! Toc!
Samantha apareceu sorridente na porta.
— Olá, como está se sentindo?
— Estava bem até você aparecer.
— Samantha, Amanda ainda está se recuperando.
— Eu sei. Não sou insensível! Vim ver como ela está, apenas. Não se preocupe. E aí, como se sente?
— Como se tivesse passado por um acidente de carro.
— Oh, está sendo irônica, então está bem.
Eu ri.
— E eu trouxe meu kit de maquiagem, caso queira disfarçar este monte de marca roxa no seu rosto.
— Não precisa.
— Ah, deixa eu te maquiar, vai se sentir melhor!
O telefone de Nolan tocou, e ele se afastou para atender enquanto eu tentava me livrar de Samantha, mas ela era bem insistente e eu não tinha forças o suficiente para fugir correndo de seus pincéis.
De onde eu estava me perguntava com quem ele falava, porque parecia tenso.
— Ashley está na casa de vocês? — indaguei a Samantha como quem não quer nada.
— Não, ela voltou para Nova York.
— Preciso ir. — Nolan voltou depois de desligar. — Você fica com ela, Samantha?
— Claro que sim. Nos divertiremos.
— Você pode vir comigo até o carro um momento? — ele pediu à Samantha e ela o seguiu.
Curiosa, eu fui até a janela e afastei a cortina. Nolan falava algo com Samantha que colocou a mão na boca, como se estivesse chocada.
Então Nolan entrou no carro e Samantha ainda permaneceu no mesmo lugar por um momento enquanto mexia no próprio celular e então ela levantou a cabeça e me viu. O sorriso voltou ao seu rosto enquanto ela voltava.
— O que aconteceu?
— Nada.
— Por que Nolan saiu desse jeito? E ele parecia estar lhe contando algo.
Ela fez um gesto de descaso com a mão.
— Theodore o chamou, e sabe, às vezes as coisas ficam tensas lá em casa. Nolan preferiu ir para não ter briga.
— Você parecia chocada.
— Eu? — Ela riu me puxando para a cadeira e voltando a me maquiar. — Imagina.
Mordi os lábios, meio irritada por ela estar claramente mentindo.
— Não faz isso — Samantha reclamou. — Acabei de passar o batom.
— Alguém já te disse que você é muito chata, Samantha?
Ela sorriu.
— Nolan diz o tempo inteiro, não se preocupe. Acho que nos sairemos bem como irmãs! E agora feche os olhos para passar essa sombra.
Eu obedeci, na ilusão que me deixaria em paz depois.
Mas depois ela insistiu em fazer minhas unhas, dizendo que estava testando vários esmaltes para o dia do casamento. E meu cabelo também começou a sofrer.
— Eu deveria saber que era tudo uma desculpa, não é? — resmunguei enquanto ela prendia bobes nos meus cabelos.
— Não podemos perder tempo, faltam poucos dias para o casamento.
E não tinha muito o que eu podia fazer contra Samantha.
Já anoitecia quando meu pai chegou e finalmente ela foi embora, isso porque Helena ligou dizendo que tinham entregado alguma coisa errada. Para o casamento, claro.
— Eu voltarei amanhã, para te fazer companhia — disse antes de sair.
Meu pai parecia satisfeito com isso.
— Que bom que tem a Samantha para ajudar você.
Eu rolei os olhos.
— Sim, que bom.
— E o Nolan foi embora?
— Foi sim... Pai, eu vou subir e me deitar.
— Claro, precisa fazer repouso.
Mas antes que subisse o telefone tocou e meu pai atendeu.
— É o Owen.
Eu peguei o aparelho, com as mãos trêmulas.
— Oi, Owen.
— Oi Mandy, como está?
— Dolorida, mas viva.
Ele riu.
E foi bom ouvir a risada dele, me fazia lembrar épocas boas. Quando éramos amigos e nada nos separava.
— E você? Me disseram que quebrou o braço.
— Sim, mas foi só isso. Fiquei preocupado com você.
— Vou ficar bem. Daqui a alguns dias todos os roxos desaparecerão.
— Eu quis te visitar lá no hospital.
— Eu sei que houve uma pequena confusão.
— O Percy não me deixou chegar perto. Acho que ele me culpa pelo que aconteceu.
— Você não tem culpa nenhuma. Eu dirigia e fui imprudente.
— Ele não pensa assim.
— O importante é que não foi nada grave e ficaremos bem.
— Sim, com certeza. E... o casamento?
Ele parecia ansioso.
— Ainda vai acontecer.
— Meu pai recebeu o convite. — Havia dor em sua voz.
Mas claro que Bob, melhor amigo do meu pai, receberia, não é?
— Sinto muito por isso, Owen.
— Ninguém sente mais do que eu.
Nós ficamos em silêncio, cada um perdido em seus pensamentos.
— Owen, preciso desligar. Estou indo descansar.
— Claro, claro. Boa noite, Mandy.
— Boa noite, Owen.
Ao entrar no meu quarto naquela noite, lembrei da noite em que Nolan voltou. E ficou. Parecia anos-luz de distância. Agora ele estava bravo comigo por causa do acidente com Owen. E sinceramente eu ainda não engolia que ele viajou com Ashley.
Eu me deitei sob as cobertas e encarei o teto.
Ele passou uma semana com Ashley.
Ashley com sua beleza loira e perfeita. Ashley e seu interesse maldisfarçado por Nolan. Será que o motivo dele estar frio comigo tinha mais a ver com isso do que com o acidente e Owen?
Suspirei e fechei os olhos.
Só precisava dormir para me esquecer de tudo. Pelo menos por aquela noite.
Capítulo 24
Na manhã seguinte, ainda me sentia um trapo e para piorar, Samantha apareceu à tarde, mas fingi que estava sentindo muita dor e fui para a cama ler.
O que talvez tenha sido um erro, pois meia hora depois Helena bateu à minha porta.
— Samantha disse que estava mal.
Eu revirei os olhos.
— Não estou tão mal assim, apenas com algumas dores.
— Ela ligou para Nolan dizendo que você estava com muita dor e ele pediu que eu viesse vê-la.
Eu fiquei vermelha.
— Eu exagerei para ela me deixar em paz.
— Eu posso entendê-la. Samantha é intensa demais às vezes. Então está mesmo tudo bem com você?
— Sim, estou me recuperando.
— Eu levaria Samantha embora, mas prefiro que tenha companhia, caso precise. No entanto, ela não vai mais te irritar, falarei com ela.
— Obrigada.
Ela saiu do quarto e realmente Samantha ficou bem mais calma.
Apenas entrou no quarto com uma bandeja de sopa e até pediu desculpas.
Tive que rir. Samantha não fazia por mal. Era apenas o jeito dela.
— Tem certeza que não está mais brava comigo? — ela insistiu.
— Não, não estou.
Ela sorriu.
— Sabe, eu sempre quis ser sua amiga.
— Sério? — Tentei me lembrar de Samantha antes de eu ir embora de Camden. Ela era uma menina rica, que andava com algumas garotas mais velhas, que acredito agora já estavam na faculdade. E ela substituiu essas amigas por Stella. A minha amiga.
— Sim, você e Stella pareciam tão legais. Mesmo sendo tão diferentes. Stella era a garota exuberante e você a garota tímida. Era quase engraçado observar a dinâmica, poderia ser um desastre, mas funcionava.
— Porque a gente se conhecia desde criança.
Deixei minhas memórias viajarem há mais de dez anos, quando a mãe de Stella se mudou para a cidade. Sozinha com uma filha e foi até a igreja do meu pai. Papai a ajudou no que pôde para se adaptar e até conseguiu emprego para ela na casa de Owen, para cuidar da mãe dele, que já estava em estado terminal.
Stella já era uma menina altiva, tão diferente de mim que era tímida e de Owen que era um menino brincalhão. Mesmo assim, nos tornamos amigos. Crescemos juntos e quando Stella se tornou uma das garotas mais bonitas, podendo namorar ou ser amiga de quem quisesse, ela continuou comigo. Até que tudo mudou e não sei por quê.
— Alguma vez Stella te contou por que parou de falar comigo?
Samantha sacudiu a cabeça.
— Nunca. E eu perguntei, claro. Mas ela disse que simplesmente percebeu que vocês duas não tinham nada a ver.
— Não faz muito sentido isso. Ou talvez faça. A gente não é nada parecida mesmo, mas isso não era problema antes.
— Enfim, você foi embora. E minha mãe se casou com o Theodore. Eu chamei a Stella pra ir com a gente ao casamento e ela conheceu o Jace e ele não sossegou até conquistar ela.
— Stella não se apaixonou imediatamente?
— Nada! Ela deu uma canseira nele. Mas agora já acho que foram feitos um para o outro. Bem, vou deixar você descansar.
Ela se levantou, mas na porta ela voltou.
— Espero que a gente seja amiga de verdade. E espero que Stella também volte a ser.
Ela saiu do quarto fechando a porta atrás de si.
Continuei lendo por algumas horas até que quando o crepúsculo começou a tingir o céu de vermelho, Nolan entrou no quarto.
— O que está fazendo aqui? — murmurei surpresa.
Ele se sentou na minha frente, eu encolhi os joelhos.
— Vim ver como você estava.
— Meu pai deixou você subir aqui?
Ele sorriu e se inclinou, abraçando minhas pernas, o queixo sobre meus joelhos roxos.
— Claro que sim. Acho que o fato de nos casarmos em pouco mais de uma semana me qualifica para estar aqui.
— Entendi. Mas Helena te contou que estou bem, não é?
— Sim, ela me disse que estava de saco cheio da Samantha.
— Não foi isso que eu disse.
— Mas foi o que quis dizer. Não tem problema. Pelo menos está acabando.
— Sim — murmurei. — Está acabando.
— Você vai ficar aqui?
— Claro. Continue sua leitura.
— Com você aqui?
— Finja que não estou aqui.
— Impossível.
De repente o ar parecia mais quente, quase elétrico.
Uma corrente de déjà-vu passou por mim.
Eu acordando e sentindo seus lábios e mãos em mim, em todas as partes.
E o encarei, me perguntando se ele se lembrava disso.
Se queria isso.
Por um momento senti que sim. Ele estava pensando o mesmo que eu.
Mas de repente, virou o rosto e saiu da cama.
— Tem razão, está tarde, melhor eu ir embora e deixar você descansar. Boa noite, Amanda.
— Boa noite, Nolan — respondi, mas ele já tinha saído do quarto.
Eu suspirei. Acho que tinha me enganado. Definitivamente.
Assim passaram os dias. Samantha aparecia sempre. No entanto, estava mais calma, porém a calmaria durou pouco, conforme ia chegando o dia do casamento, ela ia ficando maluca de novo. Ficava muito no celular, gritando com quem quer que fosse e para meu alívio, às vezes desaparecia.
O vestido de noiva apareceu para eu experimentar duas vezes.
Eu me sentia como num sonho surreal enquanto o experimentava.
Socorro, eu ia mesmo me casar. Com 18 anos.
Com um cara que nem conhecia direito e não fazia ideia do meu futuro.
Eu podia surtar facilmente agora, mas era como se tivesse meio entorpecida naquela convalescência.
— Você gostou? — Samantha indagou enquanto eu olhava minha imagem no espelho.
Era um vestido de saia ampla de tule e corpete com flores delicadas aplicadas e havia uma fenda discreta entre meus seios.
Parecia saído de um conto de fadas.
— Sim, é bonito. — Eu tive que admitir.
— Eu disse que podia confiar em mim que eu tinha bom gosto! — Ela riu, satisfeita.
Em uma manhã, eu me sentia um pouco melhor e quando Samantha entrou e perguntou se eu me sentia bem para ir até a igreja com ela, eu aceitei.
— Vamos nos encontrar com o pessoal das flores! — ela dizia quando chegamos à igreja.
E eu fiquei surpresa quando vi Nolan lá dentro com meu pai.
Samantha foi até duas senhoras que deveriam ser as responsáveis pela decoração, pelo que entendi.
— Oi. — Eu me aproximei de Nolan, que veio em minha direção. — O que faz aqui?
— Samantha disse que eu tinha que vir. Não entendi por que ainda.
— Por acaso você já entrou em alguma igreja antes?
Ele riu e segurou minha mão me guiando até um banco.
— Minha família. Acho que só em casamentos e essas coisas.
Ele me encarou um tanto pensativo.
— Você não é o que eu esperava de uma religiosa.
— O que você esperava?
— Eu não sei. Talvez que andasse com uma Bíblia e rezando o tempo todo, ou tentando me converter.
Foi a minha vez de rir.
— Minha mãe é agnóstica.
Ele arregalou os olhos.
— Como isso é possível?
— Como ela pôde se apaixonar por um pastor?
— Me parece improvável dar certo.
— E não deu. Eles tentaram. Eu acredito que eles realmente se amavam, por isso tentaram tanto... Meu pai fez concessões enormes pra ela ficar. Ela exigiu que ele não me forçasse a ter sua religião, que ele poderia me ensinar, mas que eu seria livre para seguir ou não.
— Então puxou a sua mãe.
— Eu não sei dizer. Acho que faço mais o tipo de garota racional. Sempre gostei de Ciências, Filosofia, Literatura e essas coisas. Não deixo de acreditar e respeitar o que meu pai ensina. Mas por isso que não me vê por aí pregando. — Sorri. — Ele ainda me deixa livre, de certa forma, para manter minhas próprias crenças, seja o que for.
— Isso é legal da parte dele, mas mesmo assim ele insistiu que se casasse.
Desviei o olhar. Era um assunto espinhoso aquele.
— O que eu fiz, foi uma decepção para meu pai com certeza. E eu sinto uma culpa enorme por ter lhe causado este desgosto. Entendo os preceitos pelos quais ele vive. O que esperam dele sendo pastor. E acaba resvalando em mim.
— Acha que vai para o inferno por ter pecado? — Havia divertimento em sua voz e algo mais.
— Está sendo bobo.
— Você acredita em inferno?
Sua pergunta me surpreendeu.
Ele olhou para frente, onde meu pai estava com seu assistente preparando um culto.
— Não quero acreditar que minha mãe esteja no inferno — ele disse.
Eu apertei seus dedos.
— Mas talvez eu tenha um lugar lá, não acha? — Agora ele sorriu com deboche, mas havia aquele fogo em seu olhar. Aquele brilho de ira que às vezes ele não conseguia esconder.
Me assustava ao mesmo tempo que me dava vontade de tirá-lo dali.
— Amanda e Nolan, venham aqui! — Samantha nos chamou até o altar, animada. — Conseguem imaginar, todas as flores aqui? Vai ficar bonito! Eu ia preferir um casamento no jardim da nossa casa, mas o Gavin insistiu que fosse aqui.
— Isso eu não abro mão. — Meu pai ralhou atrás de nós e Samantha revirou os olhos sem ele ver.
— Claro, Gavin!
— Pequena falsa — Nolan resmungou. — Se já terminou aqui, podemos ir? Amanda ainda está se restabelecendo.
— Mas ainda queria...
— Chega! — Ele saiu me puxando e eu entrei no carro com ele.
— Eu queria aproveitar para falar com você sobre o carro.
— Carro?
— Sim, precisa de um carro novo.
Arregalei os olhos, ao entender.
— Não está querendo dizer que quer comprar um carro pra mim, por favor. Diz que não.
— Por que não? Precisa de um carro, o seu está estragado para sempre.
— Meu pai conserta carros antigos, se não sabe. Aposto que meu carro ainda tem jeito.
— Não precisa mais andar com carros velhos.
— Eu não quero que compre um carro pra mim!
— Seu carro foi destruído. Vai precisar de um — insistiu.
— Eu não quero presentes teus, Nolan, achei que tinha deixado isso claro. É ridículo você me dar um carro!
— Claro, presentes do Owen você pode aceitar — falou com ironia.
— Owen não tem nada a ver com isso, mas já que entrou no assunto, não devia ter discutido com ele no hospital, apenas porque ele queria saber como eu estava.
— Ele não tinha nada que estar ali.
— Ele estava comigo no carro, era natural ficar preocupado. Mas disse que provavelmente você acha que a culpa é dele.
Nolan parou o carro em frente a minha casa.
— Ele esteve aqui? — A voz de Nolan era um sibilar frio agora e isso me irritou.
— Não, ele me ligou. Mas não vou colocá-lo para fora só porque você não gosta dele! Owen sempre foi meu amigo.
— Ele era seu namorado.
— Mas não é mais!
— Ele vai ficar atrás de você se contentando com migalhas?
— Isso é problema seu? Acho que não. Mas não sei por que está bravo se a sua amiguinha Ashley se instalou na sua casa pra viver de migalhas também!
Ele respirou fundo, sem responder, como se estivesse se contendo para não responder. Tentei me acalmar também. Já estávamos passando do limite.
E tudo por causa de uma porcaria de um carro.
— Terei que me conformar que o Owen vai estar sempre na sua vida?
— Do mesmo jeito que eu terei que me conformar com a Ashley e você?
— Ashley nem mora aqui.
— Me pareceu que estava morando na sua casa — insisti.
— Ela foi embora.
Respirei fundo, não querendo me sentir tão aliviada.
E ainda tão insegura.
Seria tão mais fácil se eu não me importasse com Nolan.
— Tudo bem.
Eu saí do carro. Mas ele não saiu.
— Ficará bem sozinha?
— Bem melhor — respondi de mau humor.
Eu nem sei se fiquei aliviada por ele estar indo ou não.
Mas do jeito que as coisas estavam, era melhor nos afastarmos mesmo.
Nos dias que se seguiram, Nolan voltou a me visitar. Não tínhamos brigado mais, ou falado de Ashley ou Owen.
Era como se estivéssemos numa trégua. Eu só não sabia até quando duraria. Porém se não discutíamos também não fazíamos outra coisa. Ele nem sequer tentava me beijar, ou algo assim. Ele me tratava com uma distância quase comedida. Talvez porque Samantha, ou mesmo meu pai, estava sempre presente.
A verdade é que quando eu achava que estava começando a conhecer Nolan, voltava a estaca zero.
E realmente, os dias passaram e quando menos esperava minha mãe chegou à cidade para o casamento.
Eu amei revê-la, e se papai ficou um pouco reticente, a tratando com educação, porém com certa frieza, mamãe não pareceu se importar.
Embora isso doesse em mim. Era claro que meu pai, por mais que tentasse, ainda não tinha superado o fato de que o casamento com a minha mãe havia falhado. Para alguém como ele, que acreditava na santidade do para sempre, devia ser terrível.
— É amanhã! Nem acredito que vai mesmo se casar! — ela havia comentado entre animada e chocada quando nos deitamos na minha cama naquela noite.
Havíamos saído para jantar fora, junto com Samantha, que adorou contar a minha mãe sobre todos os preparativos.
— Eu também não acredito — murmurei começando a sentir a realidade bater à minha porta com força.
— Ei, que cara é essa? Por que não parece animada?
Eu suspirei, não adiantava mentir pra minha mãe que estava tudo bem.
— Tudo ainda é muito confuso e... meio chocante.
— Achei que já tinha se acostumado à ideia. Afinal, foi você mesma quem se enfiou nessa situação. A vida é assim. Ação e consequência. — Havia certa crítica em sua voz e eu não podia culpá-la.
— Eu sei.
— Você me disse que queria fazer isso, Amanda. Mudou de ideia?
— Não tem como mudar de ideia agora. Eu aceitei me casar e será amanhã! — Ri meio apavorada. — É só... demais. Há dois meses eu morava com você em São Francisco. Nós conversávamos sobre qual faculdade eu ia fazer e você me cobrava porque eu não tinha planos definidos para o futuro.
Ela riu.
— Você sempre foi meio confusa e indecisa, querida.
— Parecia que eu tinha todo o tempo do mundo pra decidir...
— Você ainda tem.
— Tenho? — Não era assim que eu sentia.
Ainda não havia planos definidos, mas havia um caminho. Um caminho diferente do que tinha imaginado. Um caminho assustador e desconhecido. E ao meu lado um cara praticamente estranho me arrastando com ele.
— Claro que sim. Casamento não era o que eu teria escolhido para você. Não tão cedo, mas não é o fim da linha. Pode ser o começo.
— Eu não consigo enxergar... o depois.
— Você parece apavorada e isso está me preocupando.
— Não quero que fique preocupada. Como disse, eu mesma me enfiei nessa situação. Vou ter que dar um jeito de... — Fazer o quê? Sair dela? Fazer o melhor? — Enfim, amanhã é meu casamento.
Se eu ficasse repetindo talvez parecesse menos assustador.
— Você quer fugir?
— Mãe!
— Vamos fugir! Eu e você! — Ela riu.
E eu sei que estava fazendo piada, mas que no fundo, se eu dissesse vamos, ela iria comigo para o fim do mundo.
Mas eu queria fugir?
Ela ficou séria de repente.
— Me diga o que te preocupa de verdade.
— Nolan — sussurrei. — Eu mal o conheço. Como pode dar certo?
— As pessoas nunca conhecem as outras por inteiro. Isso é ilusão. Você poderia namorar dez anos com Nolan que, ainda assim, não o conheceria. O mais importante é nos conhecer. O outro não pode nos dar nada se não sabemos o que queremos. Para onde queremos ir. Se queremos ir na mesma direção... Você que tem que saber se quer o Nolan ou não.
— E como saber se ele me quer?
— Eu perguntei pra você — insistiu.
Era este o problema não era?
Tudo virou de cabeça pra baixo quando passei a querer Nolan.
No fundo, acho que era o que me movia desde então.
Por mais que eu lutasse, por mais que eu não admitisse.
— Eu acho que eu gosto dele — sussurrei baixinho. Quase como uma confissão a mim mesma. E mesmo assim era assustador admitir em voz alta.
— Isso é bom.
— Há diferenças demais. Como você e papai. Você não teve medo quando se casou com papai?
— Claro que tive. Mas eu gostava dele. E acreditei. Infelizmente, o conto de fadas não durou muito. Eu quis ir embora muito antes do que fui, mas tinha você. E seu pai te amava tanto... Então eu tentei. E tentei...
— Só por minha causa? — De repente eu me perguntei se este seria meu futuro. Tentando e tentando por aquela criança minha e de Nolan que em muitos aspectos parecia ainda tão abstrata.
— Por todos nós. Mas não pense nisso. É diferente. Todas as histórias são diferentes, e a sua ainda vai ser escrita. Você escolhe como vai ser.
Mamãe adormeceu, cansada da viagem, mas eu permaneci acordada, sem conseguir pregar os olhos, entre ansiosa e amedrontada.
Até que escutei pedras na minha janela.
Eu me levantei e abri, para ver Nolan lá embaixo.
Capítulo 25
Minha mãe havia perguntado de Nolan hoje no jantar e Samantha disse que era tradição que o noivo não visse a noiva antes do casamento.
O que era uma grande bobagem, claro. Mas mamãe concordou com um sorriso indulgente.
E agora eu me perguntava se, sendo a véspera do casamento, se Nolan não deveria estar em alguma espécie de despedida de solteiro ou algo assim.
Bem, era a tradição e Samantha até havia me perguntado se eu ia querer uma festa, mas eu tinha recusado.
Não fazia sentido pra mim.
— Desce aqui.
Acenei concordando, embora ainda não entendesse o que Nolan viera fazer ali. Troquei o pijama rapidamente, por um jeans e camiseta, e desci, tentando não fazer barulho.
— O que está fazendo aqui?
— Vim trazer seu carro.
Ele me jogou a chave sem aviso.
Eu o encarei, embasbacada, e depois para o carro atrás dele.
— Este é seu carro.
— Seu carro já está na garagem.
— Se é verdade, quem dirigiu até aqui?
— Seu pai.
— Mentira?
— Ele mesmo quem escolheu. Ele também me mostrou os carros velhos que têm na garagem. Nunca imaginei que o Pastor Gavin gostasse de carros antigos.
— Não está falando sério.
— Estou sim. Entre e pergunte para seu pai, se não está acreditando.
Eu voltei e entrei na garagem e meu pai estava mesmo lá, mexendo em um dos seus carros preciosos.
Na verdade, nenhum daqueles carros, uns três modelos de antes da década de setenta funcionava direito, mas meu pai adorava mexer neles.
— Pai?
— Ei, achei que estivesse dormindo.
— Nolan me chamou... E me contou sobre... — Olhei em volta e vi um carro cinza estacionado ao lado do carro que meu pai usava, um modelo Dodge 1970, o único que funcionava ali. — Puta que Pariu.
— Não pragueje, Amanda!
— Me desculpe, mas... Nolan não tinha nada que comprar um carro, é ridículo.
— Ele tem razão. É mais seguro que tenha um carro bom e novo.
— Ele não pode comprar coisas pra mim!
— Por que não? Vai ser seu marido.
Revirei os olhos.
— Isso é muito retrógrado.
— Não fique tão ofendida. Você vai se mudar para a casa dele, a partir de amanhã. A família do Nolan tem dinheiro, claro que vão cuidar de você.
Eu me encolhi, perturbada.
Sim, eu ia morar na casa do Nolan e estaríamos casados, mas acho que não tinha parado para pensar naqueles termos práticos.
Antes eu só ia pra faculdade, com a poupança que meu pai fez pra mim, e muito provavelmente teria que arranjar empregos para ajudar a me manter. Agora eu ia me casar com um cara cuja família tinha tanto dinheiro que eu não podia nem imaginar.
— Amanda, filha. — Papai tocou meu ombro. — Está tudo bem? Está quieta nesses últimos dias... Sei que foram muitas mudanças, e Deus sabe que eu não esperava que essas mudanças chegassem tão já, mas elas aconteceram. Esses são os planos de Deus para você. Nada acontece sem que esteja escrito.
Tentei sorrir da ideia simplista do meu pai. De que tudo era obra divina.
Não quis lembrar de Nolan me perguntando se existia inferno. Mas se existia bem, existia mal.
Não sei bem se não foi de lá que Nolan saiu.
Sacudi a cabeça, para deixar de pensar bobagens.
— Tudo bem, estou bem. — Tentei tranquilizá-lo. — Por que não vai dormir? Está tarde.
— Só estou acabando de checar algumas coisas aqui.
Saí da garagem e Nolan estava no mesmo lugar me encarando com desafio.
— Eu disse que não queria um carro.
— E eu disse que precisava de um. Encare como um presente de casamento. — Ele riu de forma astuta e desafiante. — Então acho que me deve um.
Eu respirei fundo tentando decidir o que fazer a seguir.
Jogar a chave na cara dele e mandá-lo sumir?
Parecia estranho pensar que, hoje eu ainda podia mandar Nolan desaparecer da minha frente, mas que a partir de amanhã seria impossível.
— Podemos dar uma volta? — eu me vi sugerindo e nem sei de onde surgiu essa ideia.
Se Nolan estranhou, não demonstrou, apenas abriu a porta do carro pra mim.
Ele dirigiu em silêncio por algum momento, então mexeu no som e começou a tocar Kings of Leon.
Como na noite em que nos conhecemos.
A noite em que a tempestade estava se aproximando.
Eu deveria ter intuído que Nolan Percy seria pior do que qualquer tormenta.
— Déjà-vu — sussurrei.
— O quê?
— Você não deveria estar em uma despedida de solteiro ou algo do tipo?
Ele levanta uma sobrancelha.
— Com stripper e tudo o mais?
Dei de ombros.
— É o que costumam fazer, não?
— Convenções. Quem precisa delas?
— O casamento é uma convenção.
— Você parece perturbada — Ele franziu a testa.
— Você também não está? Com essa coisa de casamento e tudo?
— Se você não queria essa coisa de casamento e tudo podia ter dito. Samantha está preparando o que ela acha ser o casamento do século ou algo assim.
Ele estava falando do circo da cerimônia, mas eu não estava me referindo somente a isso.
A cerimônia exagerada talvez fosse o mais fácil.
O que vinha depois que me amedrontava.
— Minha mãe disse que a gente podia fugir.
— É uma ideia.
— Eu e ela. Você não estava incluído nos planos.
— Isso magoa, Amanda. — Ele fez uma falsa expressão triste.
— Não consigo te imaginar magoado com nada.
— Por que não?
— Você tem cara de quem magoa.
— Eu queria ser assim, como acredita.
— Talvez nós devêssemos fugir — ele sugeriu depois de mais alguns minutos de silêncio.
— Eu e você?
— Eu posso continuar estrada afora. Ninguém nunca nos acharia.
— É essa a sua ideia de liberdade? Me levar na sua fuga.
— E qual a sua ideia?
— Eu não sei. Eu só queria... não sei se já me senti livre de verdade algum dia.
Ele desceu o vidro do meu lado. O vento atingiu meu rosto.
— Sinta o vento.
— Isso é bobo.
— Não é não.
Porque ele estava me desafiando, virei meu corpo e me joguei para fora, estendi meus braços, alongando o tronco e fechei os olhos, sentindo o vento nos meus cabelos e na minha pele.
E caramba, ele tinha razão.
Era libertador. Sorri para a noite, adorando aquela sensação, querendo mantê-la pra sempre.
Voltei para o carro ainda rindo e Nolan estacionou em frente a minha casa de novo depois de alguns minutos.
— Tinha razão, é libertador.
— Eu disse.
— Você fugiria mesmo comigo?
— Você não?
— Não sou corajosa o bastante.
— Está sendo corajosa se casando comigo amanhã.
— Não é como se eu tivesse muitas opções.
— Se eu te desse essa opção... Você desistiria?
O carro estava na penumbra e não conseguia vislumbrar a expressão de Nolan.
Mas senti o toque de seus dedos sobre os meus.
E senti aquela eletricidade que vinha dele, que me puxava em sua direção, como se não houvesse mesmo opção a não ser me mover para mais perto.
Meu coração deu um pequeno salto e avancei sem desviar o olhar até que estivéssemos respirando juntos.
— E se eu te desse essa opção?
— Eu fingiria que não teria escutado.
Eu ri.
— Está brincando comigo.
— Acha mesmo que se eu não quisesse estar aqui, eu estaria?
— Como posso saber?
— Nós dois sabemos por que estamos aqui.
— Sabemos?
— Eu sei por que estou.
Queria ser corajosa o bastante para perguntar por quê.
Queria que aquele desejo bobo que tinha nascido no fundo do meu coração sem que eu nem me desse conta, fosse real.
Que Nolan dissesse que desde que ele me resgatou na estrada, não havia outra opção para nós a não ser estarmos indo na mesma direção. Unidos por aquela atração que se negava a ser explicada.
Porque não tinha o menor sentido.
Então, ele me soltou.
— Achei que ia me beijar.
— Eu posso te beijar amanhã. E depois de amanhã... e depois...
Ah minha nossa, eu queria aquilo.
Queria aquela possibilidade.
O amanhã. O depois de amanhã... e pra sempre?
Eu podia ser a garota mais boba do universo por estar prestes a embrulhar meu coração e dar de presente para aquele cara que tinha virado minha vida de cabeça pra baixo.
Mas não conseguia evitar.
Só esperava não me arrepender.
Acordei na manhã seguinte com Samantha animadíssima abrindo as janelas do meu quarto.
— Acorda, é o dia do seu casamento!
Eu me sentei, me sentindo tonta e enjoada, enquanto mamãe colocava uma xícara de chá nas minhas mãos e Samantha olhava em volta, abismada.
— Mas não tem nada arrumado aqui! Você deveria ter feito as malas para se mudar.
Ah, claro.
O enjoo piorou quando me lembrei que estava mesmo acontecendo. Eu ia me mudar para a casa dos Percy.
Eu sabia que deveria ter arrumado minhas coisas há dias, mas simplesmente fingi que não precisava.
Talvez houvesse uma parte de mim que ainda esperasse uma definição diferente?
— Filha, está bem? — minha mãe indagou.
— Estou enjoada.
— É normal, não é? Vai passar logo, logo. — Ela sorriu.
— Espero mesmo que melhore hoje! Nada de vomitar e ficar horrível no dia do casamento e vamos, se levante. Daqui a pouco vai chegar o cabeleireiro, maquiador e temos tanta coisa pra fazer ainda!
Samantha era um furacão e as horas seguintes passaram como um sonho onírico, em meio a arrumar cabelo, fazer maquiagem e tentar não vomitar.
Pelo menos, só estavam ali, Samantha e minha mãe.
Samantha havia me perguntado se queria madrinhas e damas de honra e eu disse que era melhor não.
Claro que podia ter escolhido Naomi e Ellie, por exemplo, mas aquele não era um casamento usual e não era como se eu estivesse rindo e ansiosa para todo aquele circo.
Talvez eu devesse ter aceitado a ideia de Nolan para fugir.
— E aí, pronta? — Samantha voltou já arrumada com um vestido azul-royal. No fim, ela seria minha única madrinha e Austin o padrinho de Nolan.
De repente voltei a sentir medo.
Pavor.
Puro e simples.
Minha mãe surgiu, também arrumada com um vestido rosa.
— Está linda, querida!
Eu dei de ombros, revirando os olhos.
— Samantha faz milagres.
— Não seja boba! E você escreveu os votos?
— Votos? — Minha nossa, tinha que ter votos?
— Nolan sugeriu para que não dissessem os votos na cerimônia, e sim em particular — Samantha esclareceu algo que, na verdade, eu deveria saber, mas que não fazia ideia. — Ele disse que ele e Amanda preferem assim.
Prefiro?
— Está na hora de ir — Samantha anunciou com uma voz prática.
Entramos no carro e minha mãe que seguia comigo apertou meus dedos.
— Vai ficar tudo bem.
Eu sorri, mas tive vontade de dizer que estava desistindo de tudo. Que aquela ideia dela de fugirmos era bem melhor.
Mas me contive. Não adiantava entrar em pânico.
Chegamos em frente à igreja e Samantha ajeitou a cauda do vestido e me surpreendi ao ver Stella surgindo em um lindo vestido justo de seda bege com um buquê nas mãos.
Ela estava séria, quando me entregou.
— Ah, ainda bem que lembrou, Stella. — Samantha suspirou, aliviada. — Com tanta coisa pra lembrar, me esqueci de levar o buquê pra sua casa!
— Obrigada, Stella — sussurrei com vontade de chorar.
Quando éramos crianças, brincávamos como seria o dia do nosso casamento.
Stella tinha sonhos grandiosos de princesas e carruagens.
Eu não me lembro o que eu sonhava, acho que sempre acabava sendo a dama de honra de Stella, enquanto ela brilhava.
Lamentei mais uma vez, não somos mais amigas.
Será que haveria a possibilidade agora que eu me casaria com Nolan e ela sendo namorada de Jace que a gente pudesse se aproximar?
Samantha se afastou, conversando com minha mãe na porta da igreja e eu tive vontade de dizer exatamente isso a Stella.
— Stella, eu...
— Talvez eu deva te desejar felicidades, mas sinceramente. Acho que fica melhor meus pêsames.
— O que quer dizer? — Eu me encolhi com suas palavras ferinas.
— Nolan não é uma boa pessoa, Amanda. Acho que sabe disso, depois do que ele fez. E sinceramente, ainda acho incrível que esteja se casando com ele.
— Por que está dizendo isso? Por que parece ter tanto ódio e me desejar o mal?
— Eu não te desejo o mal. Você está se casando com ele.
Capítulo 26
E com essas palavras horríveis ela se afastou me deixando ali, estarrecida.
Minhas mãos tremiam quando Samantha me guiou até a porta da igreja.
— Não vai vomitar, não é?
— Estou bem — murmurei.
Mas estava tentando convencer a mim mesma.
A marcha nupcial começou.
— Vamos?
Eu respirei fundo.
Samantha avançou na minha frente e eu segui atrás.
Caminhei por entre as flores e a decoração esplêndida de Samantha, mal vendo os rostos à minha volta, todos os olhos grudados em mim. Conhecidos e desconhecidos.
E Nolan me esperando.
Agora não tinha mais volta, me dei conta.
Nolan segurou minha mão, apertou meus dedos. Ele aproximou os lábios do meu ouvido.
— Eu falei que podíamos fugir.
Sua voz era leve com um toque de sarcasmo.
O que me relaxou um pouco, enquanto meu pai começava a cerimônia.
Respirei fundo e fingi estar prestando atenção, mas, na verdade, era como se eu estivesse flutuando acima de tudo.
Palavras foram ditas e chegou a hora de dizer sim.
Ou não.
Nolan não hesitou.
Eu tremi um pouco para sussurrar meu sim.
E então, era oficial.
Eu estava casada.
Meu pai sorriu e acho que estava aliviado quando disse que Nolan podia me beijar agora.
Eu o encarei pela primeira vez desde que a cerimônia começou.
Nolan Percy.
O lindo, perfeito e rico Nolan Percy.
O cara com quem acabei de me casar.
“Eu não te desejo o mal. Você está se casando com ele.”
Palavras que pareciam saídas de alguma tragédia de Shakespeare. Surreais demais.
Stella estava sendo maldosa? Provavelmente. Ela estava com raiva de mim por algum motivo obscuro.
As mãos de Nolan enquadraram meu rosto e ele me beijou muito rápido e de leve. Os olhos verdes cravaram em mim avaliando meu rosto que devia estar pálido.
Sua mão segurou a minha, apertando meus dedos de leve.
— Uma parte acabou — sussurrou com aquele sorriso sarcástico.
Mas havia algo mais ali agora.
Parecia um sorriso de... vitória.
— Sim, parece que sim.
Nós seguimos pela nave, os convidados na porta aguardando, jogando pétalas de rosas, enquanto entrávamos no carro chique.
— Porra, acabou. — Nolan mexeu na gravata a tirando.
Acabou? Acho que estava começando.
— Ainda tem a festa, não é? — rebati sem saber se conseguiria aguentar mais.
Samantha havia organizado uma festa nos jardins da casa de Nolan.
— Não precisa aguentar o resto se não quiser. — Nolan deu de ombros. — Podemos mandar todo mundo à merda.
— Não acho que é assim que funciona. Samantha nos mataria. E seu pai.
Samantha havia comentado uma vez que Theodore deu carta branca a ela para gastar o que quisesse.
Certamente ele não ficaria feliz se eu e Nolan fugíssemos da própria recepção que deveria ter custado uma fortuna.
— Meu pai queria que eu estivesse morto a maior parte do tempo — ele resmungou com ironia. — Não faz diferença.
O carro parou e Nolan abriu a porta, me ajudando a sair.
Samantha já estava lá, e ao lado dela a maquiadora, que começou a retocar minha maquiagem enquanto Nolan estava encostado no carro com cara de impaciente.
— Vocês vão entrar e estará tocando uma linda música e vocês vão dançar, a primeira dança dos noivos.
— Dançar? Eu não danço!
— O Nolan dança muito bem, segue ele! E depois terá os cumprimentos e o banquete e aí você trocará de vestido, pelo da recepção, e depois mais dança, e aí será pra todo mundo se divertir. Você quer jogar o buquê?
— Tanto faz...
— E claro, tem o bolo e...
— E aí, diz que terminou, pelo amor de Deus?
— Sim, aí estará livre para partir para a lua de mel!
— Lua de mel?
Samantha olhou para Nolan.
— Não contou a ela?
— Nós vamos sair em lua de mel?
— É só amanhã, Samantha.
— Mesmo assim, deveria contar a ela que vão para Barbados.
— Nós vamos para Barbados? — Minha cabeça estava dando volta.
— Ai gente, vocês não conversam, não? Será que eu deveria ter arrumado isso também em vez de aceitar quando Nolan disse pra eu não me intrometer que ele podia muito bem cuidar disso?
— Acho que já deu, né? — Nolan pegou minha mão. — Vamos logo que quanto antes começarmos mais cedo termina.
— Certo, então vamos! — Samantha concordou.
Avançamos para o local da recepção e eu ainda me sentia tonta quando chegamos ao jardim decorado e os convidados aplaudiram a mim e Nolan passando.
E então, estávamos no meio da pista e Nolan me rodopiava.
— Nós vamos pra Barbados? — indaguei ainda tonta com tudo.
— Não quer ir? — Nolan me encarou como se eu estivesse sendo boba.
— Eu gostaria de saber seus planos antes!
— Na verdade, eu só pensei nisso quando Samantha perguntou há alguns dias. Temos uma casa lá, você sabe. É prático.
— Eu nem fiz as malas!
— O voo sai só amanhã, terá tempo.
— Isso é tão...
— Tão o quê? Quer ir para outro lugar? É só dizer.
— Não é isso...
— Então qual o problema? Não vai ser ótimo deixarmos tudo para trás? Não ter mais os olhos de todo mundo em cima de nós? Todos esses julgamentos e cobranças?
Ele parecia raivoso agora e me lembrei da briga com o pai.
Era do pai dele que Nolan queria fugir?
— A gente poderia ir, mas nunca seria pra sempre. Os julgamentos e cobranças ainda estariam aqui.
— Somos adultos agora, Amanda. Não precisamos mais deles.
— Deles? Está falando do seu pai?
— De ninguém mais. Só eu e você.
— Nolan... Não falamos sobre isso. Sobre o futuro. Acho que de alguma maneira eu não queria pensar nisso. Era... demais.
Não queria dizer que no fundo acho que duvidei que a gente chegasse mesmo àquele estágio.
— Não vamos falar destes assuntos chatos agora...
— Acho que deveríamos falar.
Ele riu e me afastou enquanto me girava, como fez em seu quarto naquela noite, só que eu não estava de noiva, e sim de calcinha.
Naquela noite, foi a primeira vez que eu tive um vislumbre do que eu achava ser o verdadeiro Nolan.
Os convidados aplaudiram, deliciados, enquanto Nolan me trazia para perto de novo e eu o encarei meio sem fôlego.
— Me deixou tonta.
— E você me deixa com tesão, Amanda Percy.
Ah, minha nossa.
Ele me chamou de Amanda Percy.
E ainda disse que eu o deixava excitado?
Meu rosto esquentou e ele sorriu antes de abaixar a cabeça e me beijar.
Foi um beijo diferente do beijo da cerimônia. Este foi intenso. Profundo. Cheio de uma promessa doce e quente que me deixou ansiosa e louca para a lua de mel que ele estava prometendo.
— Barbados vai ser interessante. — Ele deslizou os lábios por meu rosto vermelho até chegar ao meu ouvido. — Vamos poder falar sobre qualquer coisa que queira, quando estivermos nus, pode ser?
De repente a música acabou e ainda me sentia perdida e meio tonta quando Samantha se aproximou e nos levou até onde uma fila de pessoas se formou. Uma profusão de rostos, beijos e abraços efusivos.
Até que Bob passou por mim e me cumprimentou muito sério.
— Meus parabéns, Amanda. Espero que seja feliz. — Ele beijou meu rosto e de repente senti que passava um bilhete para meus dedos. — Owen pediu que lhe entregasse isso.
E eu só tive tempo de enfiar o bilhete no decote do vestido, antes de Samantha nos apressar.
— Hora das fotos!
E me vi levada até outro canto do jardim. E tentei sorrir enquanto Samantha orquestrava milhões de fotos. A maioria com a família e não pude deixar de notar que Stella não estava com Jace, que sorria e fazia piada de tudo.
E desviei meu olhar para Theodore que estava sério enquanto ralhava com as piadas e Jace que parecia que já estava bêbado.
E ele não olhava para Nolan.
Será que ainda estavam brigados?
— Amanda, fique para tirar fotos com suas amigas! — Samantha pediu quando todos se afastaram e notei Naomi e Ellie se aproximando.
— Está tudo tão lindo! — Naomi elogiou.
— Sim, está fabuloso — Ellie me abraçou e então sussurrou algo em meu ouvido.
— Preciso falar urgente com você.
“ O quê? ”
— Prontinho, vamos para o jantar! — Samantha orquestrou, mas eu segurei o braço de Ellie enquanto Samantha ia em direção às mesas com Naomi.
Notei Austin se aproximando e a beijando, ele parecia estar a acalmando, e piscou pra mim, enquanto a levava para uma das mesas. Respirei um pouco aliviada de ele ter feito o favor de tirar Samantha da minha cola pelo menos por alguns minutos.
— O que quer falar comigo?
— Carlton pediu que eu não te contasse, mas, sinceramente, não posso deixar que não saiba de algo tão sério.
— Saber o quê?
— Nolan colocou Carlton em uma enrascada!
— O quê?
— Então, ele e o Jace encontraram Carlton e o convenceram a sair com eles. Foi há algumas semanas. Você ainda namorava o Owen.
— Nolan e Carlton? Nolan nem gosta do Carlton.
— E aí eles foram até a casa do Peter, acho que ele é noivo da irmã do Owen, ou algo assim...
— Sim...
— E eles convenceram o Carlton a pôr fogo na moto.
Levei a mão à boca, chocada.
— Sim, horrível, né?
— Não faz sentido...
— Então, todo mundo viu você saindo de moto com o Owen da escola, era aquela moto, né? Nolan disse ao Carlton que seria legal ele prejudicar o Owen. E, bem, o idiota do Carlton tinha uma queda por você, né? E foi tonto a este ponto.
Eu não podia acreditar no que Ellie estava me contando.
Era... horrível demais.
Se fosse verdade... Por que Nolan faria isso?
Claro, ele me viu com Owen. Foi logo depois que transamos.
Ah Deus, senti vontade de vomitar.
— Enfim, Peter deu queixa e alguém disse que viu o carro do Carlton lá perto e foram falar com ele. Ele negou, a polícia queria prender ele e tudo! E aí ele foi falar com Nolan, dizer que ia contar a verdade e o Nolan o amedrontou. Na verdade, parece que foi o Jace que bateu no Carlton, mas porque o Nolan mandou! Isso foi um dia antes da festa, depois da formatura. E Carlton ainda disse que Nolan deixou claro que era pra ele não se aproximar mais de você e para ele ficar quieto. Eles ameaçaram o pobre Carlton! Mas o pai dele percebeu que havia alguma coisa errada e apertou o Carlton, que contou tudo. E o pai dele ficou tão furioso que quebrou o pau com o Theodore Percy naquela reunião lá para um novo empreendimento na Marina.
Ah, não. Eu me lembrei do dia da festa. Do pai de Nolan muito bravo.
Então era por isso que ele estava brigando com Nolan?
E como Nolan podia fazer todas aquelas atrocidades?
“ Eu não te desejo o mal. Você está se casando com ele. ”
Estremeci de horror.
— E parece que o Sr. Cooper está disposto a acabar com o Sr. Percy! O negócio é sério, se bem que Theodore Percy é podre de rico, né? Mas pra conseguir fazer este negócio dar certo precisa que o conselho da cidade aprove. E você sabe, o prefeito é primo do Sr. Cooper e não quer mais colaborar não. E eles ameaçaram espalhar essas histórias do Nolan e do Jace, mas o Sr. Percy mandou o advogado abrir um processo contra eles, como difamação, só que não seria difamação porque é verdade, mas é a palavra deles contra a do Carlton. E agora o pai de Carlton está com certo medo porque Theodore Percy é super-rico e disse que se eles não colaborarem, vai acabar com eles. Por isso que ninguém sabe sobre isso. Mas Carlton confessou pra mim ontem e ele estava pensando se deveria te contar, porque, né... Você ia se casar com o Nolan e de boa, agora ele parece um cara muito mal!
— Não posso acreditar, é muita coisa... — sussurrei com a mente dando voltas assim como meu estômago.
— Amanda, vamos logo!
Samantha surgiu me levando de volta à festa e comecei a achar que ia desmaiar a qualquer momento.
As palavras horríveis de Ellie reverberando em meu cérebro.
Eu me vi sentada ao lado de Nolan e ele sorriu pra mim. E não consegui sorrir de volta.
Depois veio o banquete e nada passava pela minha garganta.
Eu sabia que Nolan era um babaca mimado, não sabia? Ele tinha transado comigo por causa de uma maldita aposta!
Em que momento eu comecei a achar que talvez ele fosse digno de perdão pelo que fez? Quando concordou em casar comigo porque eu estava grávida? Quando parecia que me desejava de verdade, apesar de como tudo começou?
Nolan era um mistério pra mim. Eu não sabia quem ele era de verdade e este fato sempre me deixou receosa. Mas acho que nunca imaginei que ele seria capaz de fazer o que fez.
— Você está bem? — Nolan perguntou ao meu lado, sua mão buscando a minha, parecendo notar meu desconforto.
— Não toca em mim. — Puxei minha mão de forma brusca.
E acho que nunca tinha sido tão ríspida assim e Nolan percebeu, pois já não ria.
— Mandou Carlton Cooper tacar fogo na moto do Peter, cunhado do Owen?
— Como sabe disso? — ele indagou tenso.
— Não está negando.
Ele cerrou os punhos e inalou pelas narinas, claramente nervoso.
— Quem te contou isso? O imbecil do Carlton?
— Não foi ele! Pelo amor de Deus, Nolan, por que fez isso? É... Atroz! É horrível!
— Foi uma brincadeira.
— Brincadeira? Botar fogo em uma moto?
— Melhor botar fogo na moto do que no próprio, Owen.
— Não pode estar falando sério! Como pode dizer isso assim? E ainda obrigou o Carlton! Será que não pensou nas consequências?
— Carlton é um babaca e fez porque quis! Ele também queria ferrar o Owen.
— A moto nem era do Owen.
— É, eu descobri depois.
— Tudo isso por quê? Por... ciúme?
— Esquece isso, Amanda!
— Como você está fazendo? Não se sente nem um pouco culpado, Nolan? Carlton quase foi preso.
— E ele foi logo me dedurando, para tirar o rabo covarde dele da reta!
— Mas ele não mentiu! E ainda tem toda essa confusão com seu pai, por isso ele ficou bravo naquela noite da festa!
— Meu pai sempre arranja algum motivo pra ficar bravo comigo! — rebateu com ironia.
— Mas é com razão, pelo que estou vendo!
— Você não sabe de nada! — sibilou baixo, os olhos brilhando de fúria.
— Amanda, vamos trocar de roupa! — Samantha apareceu e olhou de mim para Nolan preocupada ao ver a tensão entre nós.
— Algum problema aqui?
— Pergunte para o Nolan.
Eu me levantei e antes que pudessem me seguir, caminhei por entre as pessoas que me encaravam com os rostos curiosos. Nem sabia bem para onde estava indo, apenas precisava de espaço.
Subi as escadas, passando pelas infinidades de garçons e sem pensar entrei no único lugar que conhecia ali, o quarto de Nolan.
Então paralisei surpresa ao ver que tinha alguém lá dentro.
Ashley.
Ela estava parada em frente à janela, e dali ela conseguiria ver toda a festa.
“ Estava ali o tempo todo? Por que ninguém me disse que Ashley estava na casa dos Percy? Será que ela foi à cerimônia? ”
Ela não parecia estar vestida para uma festa, na verdade acho que nunca a vi tão descomposta. Usando um jeans e uma camisa que parecia masculina, dobradas nas mangas.
Uma camisa do Nolan?
— Ashley?
Ela se virou e notei que seus olhos sem nenhuma maquiagem estavam vermelhos de chorar.
— Olá, Amanda — murmurou me medindo de cima a baixo.
— O que está fazendo aqui?
— Bonito vestido.
Ela caminhou em minha direção e eu reparei que seus passos estavam meio trôpegos.
Bêbada, talvez?
— Não entendo o que está fazendo aqui — insisti. — Eu nem sabia que estava na cidade...
— Eu cheguei hoje cedo. Queria ver o casamento. Claro que não fui convidada, mas no fim nem tive coragem de ir à cerimônia.
— Os Percy sabem que está aqui? Nolan sabe?
Ela estava no quarto dele.
— Eu não sei, está todo mundo tão ocupado. Acho que sou invisível agora...
— Não deveria estar aqui, Ashley. — Minha voz saiu surpreendentemente firme.
— Sabe quem não deveria estar aqui? Você.
Eu respirei fundo. Pronto. Ia começar.
— Olha, Ashley...
— Olha aqui você! Está roubando tudo o que deveria ser meu! Acha que eu tinha que estar feliz com isso? Acha que eu deveria fugir e me esconder? Eu amei o Nolan antes de você. Ele era meu e você roubou ele de mim!
— Eu não fiz isso! Acho que você esquece que foi o Nolan que apostou pra transar comigo. E ele traiu você! Eu nem sabia que você existia.
Os olhos de Ashley brilharam perigosamente.
— É, pode jogar na minha cara. Acho que é verdade mesmo! Mas ele teria voltado para mim. Foi só uma aposta. Uma maldita aposta! Você não era nada! Ele estava entediado aqui e você era só uma distração. Um desafio. Mas você nos surpreendeu com o truque mais baixo, não é? Acha que eu não tentei o mesmo?
— Do que está falando?
Ela riu.
— Ah, Nolan não te contou? Claro que não. Ele adora manipular e mentir quando lhe convém!
— Eu entendo o que está dizendo...
— Nolan não contou que eu perdi um bebê?
Capítulo 27
“ O quê? ”
Por um momento acreditei ter ouvido errado.
Ou que Ashley ia rir e dizer que estava brincando.
Mas ela agora chorava.
— Você... Você esteve grávida?
— Sim, eu estive.
— De um bebê do Nolan?
— Claro que sim!
Ah, minha nossa. Era verdade?
— O que aconteceu?
— Nolan ficou tão bravo... — Ela caminhou pelo quarto mexendo no cabelo, a voz ainda meio ausente. — A gente só brigava e ele me culpava, dizendo que fiz de propósito.
— Você fez de propósito?
— Sim, eu fiz. Mas eu o amava. E ele não entendia isso. Não entendia que não podia se livrar de mim, porque tinha se cansado!
— Acha que Nolan queria terminar com você?
— Não acho que Nolan sabia o que queria de verdade. Ou melhor, acho que a única certeza que tenho é que Nolan vivia para infernizar o pai. Bobo, né? Mas Nolan tinha essa raiva dentro dele, essa ânsia de estragar tudo à sua volta como se assim estragasse a vida do Theodore. Eu achava divertido. Nolan era divertido e a gente se divertia junto. Era como se o mundo nos pertencesse. Podíamos qualquer coisa. Mas ele quis se livrar de mim. Eu não ia deixar. Achei que ele fosse ficar feliz quando eu tivesse um bebê. Que seria... um propósito, sabe? Mas ele só ficou com raiva de mim.
— O que aconteceu?
— A gente estava brigando no carro uma noite. Ele queria que eu fizesse um aborto e eu disse que não ia fazer e então tudo saiu um pouco do controle... Nolan perdeu o controle do carro e caímos no rio.
Levei a mão à boca, chocada com o que Ashley contava.
— Quando acordei estava no hospital e o bebê se foi. Nolan disse que sentia muito, mas eu duvido. Ele deve ter ficado aliviado, assim como o pai dele. As coisas ficaram esquisitas então. Theodore já estava de casamento marcado. Decidiu se mudar para Camden com Nolan. Claro que ele queria afastar Nolan de mim. E Nolan concordou. Acho que estava meio chocado com o rumo que as coisas tomaram e queria talvez passar ao pai a impressão que ia mudar. Mas Nolan tem muita raiva dentro de si para acabar assim de uma hora pra outra. Theodore me disse que eu devia deixar Nolan ir. Que ele era tóxico para mim e que eu estaria melhor sem ele estragando minha vida. Nolan ainda ia me visitar às vezes, mas as coisas não eram iguais. Eu acreditei que iria mudar, que íamos voltar a ser como éramos. Mas aí você apareceu.
Ela me encarou com raiva.
— E estava grávida dele e ele assumiu você! — Ela recomeçou a chorar. — Comigo ele foi horrível e com você ele simplesmente quer se casar? Todo mundo disse que eu não deveria estar aqui. Que eu deveria deixar Nolan para trás. Esquecer. — Ela soltou um riso nervoso. — Como se fosse fácil assim! — Estalou os dedos perto da cabeça com um riso sem humor.
Foi então que eu vi.
As bandagens em seus pulsos.
— O que é isso?
Ela puxou a camisa para baixo.
— Não te interessa! O que foi que o Nolan fez pra te conquistar? Uma menina como você? Tão... inocente! Tão boazinha! Aposto que ele fingiu muito bem, não é? Ele sabe fazer isso quando lhe convém. Ser gentil. Ser romântico. Ser legal e esconder que no fundo ele é horrível!
— Ashley, que diabos está fazendo aqui?
Samantha apareceu na porta, olhando de mim para Ashley de forma preocupada.
— Olá, Samantha, bonita cerimônia! — Ashley sorriu enxugando o rosto, as bandagens no seu pulso aparecendo de novo me fazendo estremecer de horror.
— Não deveria estar aqui!
Ashley não ofereceu resistência enquanto Samantha passou o braço por seus ombros, a levando para fora do quarto. E sussurrando para mim um “desculpa por isso”.
Eu comecei a tremer, como um efeito retardado, enquanto repassava todas as revelações assombrosas de Ashley.
— O que aconteceu?
Ouvi a voz de Stella no corredor e não escutei o que Samantha disse, mas em segundos, Stella estava na porta do quarto.
— O que aconteceu aqui? O que você fez a Ashley?
— Eu?
— Você e Nolan deveriam ter mais consideração por tudo o que ela passou.
— O quê?... Minha nossa, eu nem sabia dessa história da Ashley até há poucos minutos quando ela me contou!
— Claro que não sabia! — Stella acusa. — Nolan é um mentiroso e escondeu de você.
De repente eu me lembrei de Stella perguntando a Nolan se ele estava com medo de que ela revelasse seus segredos.
Era isso.
Stella sabia sobre o aborto de Ashley.
— As marcas nos braços de Ashley...
— Ela cortou os pulsos, é isso que quer saber?
Lutei para respirar. Meu estômago embrulhando.
— Quando?... Por quê?
— Ainda pergunta? Nolan fodeu a mente de Ashley. Ela acredita que precisa chamar a atenção dele. Não se conforma que ele queria que ela fizesse um aborto, mas assumiu você! Lá em Barbados ela ficava se humilhando! Theodore se cansou e mandou ela embora. É outro insensível filho da puta. Ela voltou para Nova York e fez o que fez.
De repente eu me lembrei depois do meu acidente de Nolan recebendo aquela ligação. Do olhar de choque em Samantha.
E ele sumiu por uns dias e depois estava tão distante.
— Eu não sabia, eu...
— Ah, pobre santinha! Sempre tão inocente!
— O que está fazendo aqui, Stella? — Nolan apareceu de repente.
— Ah, ainda não sabe? Parece que sua mentira foi descoberta. Ashley estava aqui e contou tudo a Amanda.
— Ashley está aqui? — Nolan avançou para dentro do quarto, o olhar fixo em mim.
— Parece que ela assustou sua noivinha!
— Saia daqui, Stella! — Nolan sibilou baixo.
Stella saiu batendo a porta.
Encarei Nolan.
Aquele cara que de certa forma sempre foi um estranho, mas que agora parecia que já não era tão estranho assim.
Parecia que eu tinha finalmente conhecido o verdadeiro Nolan.
— Eu não fazia ideia que Ash estava aqui. — Ele começou.
— Ela perdeu um bebê — sussurrei. — Contou que sofreu um acidente...
— Aposto que ela disse que a culpa foi minha.
— Vocês estavam brigando e você perdeu o controle do carro.
— Sim, foi exatamente isso. Parece que está bem informada.
— Por que nunca me contou?
— Era passado, eu não tinha que te contar nada.
— Passado? Ashley estava aqui! Claramente magoada depois de você ter apostado que ia transar com outra garota! Você a traiu, depois de tudo o que aconteceu! Depois de ela ter perdido um bebê!
— Ela contou que eu terminei com ela no dia em que fiquei com você. Que foi por isso que eu te deixei e fui para Nova York?
— O quê?
Ele riu sem humor.
— Eu fui terminar de vez com a Ashley e, na verdade, a gente já não estava junto mesmo há muito tempo.
— Claro, ela me contou que queria se livrar dela, por isso aparentemente ela ficou grávida.
— Sim, ela tentou me segurar desse jeito, mas foi um erro.
— Um erro?
— Você não está me ouvindo? Ashley fez de propósito! Porque eu disse que deveríamos terminar. Inferno, eu não era obrigado a ficar com ela pra sempre. Ninguém é obrigado a ficar junto de ninguém pra sempre.
— Você estava cansado dela...
— Qual o problema? Tínhamos 17 anos. Eu tive namoradas antes dela e ela teve namorados antes de mim. Ela não deveria ter enlouquecido porque não queria levar um fora.
— Mas ela estava grávida, Nolan... Ela disse que queria que fizesse um aborto...
— Sim, eu queria. Era só o que eu pensava naquela época. Vai me culpar? Acha que sou um cretino por isso? Eu não gostava da Ashley e eu achava que seria um erro ficarmos juntos por este motivo.
— Mas era um bebê!
— Eu não via assim! Inferno, acha que eu não me senti culpado depois? Quando ela se machucou? Quando eu a machuquei? Quando por minha culpa, ela perdeu daquele jeito?
— Deve ter ficado aliviado...
— Não, eu não fiquei. Eu me senti um merda. Eu tinha estragado tudo, porque é assim que eu sou. Eu estrago as coisas! — gritou e eu me encolhi.
— Por que... Por que não reagiu da mesma maneira comigo?
— Eu não podia. Quando disse que estava grávida eu repassei tudo na minha cabeça. Repassei as merdas com Ashley. A maneira que agi. Como fodi com tudo e tive certeza de que não podia fazer de novo. Que talvez o universo, ou Deus, sei lá, estivesse me testando. Me colocando à prova de novo. E eu soube que não podia fazer igual. Era uma chance de fazer diferente.
Então foi por isso que ele concordou tão fácil quando meu pai exigiu que ele assumisse o bebê e que nos casássemos, percebia agora.
Mas isso não me fazia sentir melhor.
Eu me sentia presa em uma farsa gigante.
Eu era mais um capítulo no livro de merdas de Nolan Percy.
— Então achou que ia consertar as coisas? E Ashley? Ela cortou os pulsos!
— Não me culpe pelas loucuras de Ashley...
— Ah, Deus... — Segurei minha cabeça entre as mãos, porque parecia que ia explodir.
Eu sentia culpa por Ashley.
Sentia raiva de Nolan por ter me escondido toda aquela história.
Por ele ter se revelado pior do que eu imaginava, afinal.
E raiva de mim mesma por ter me deixado levar por ele, para dentro de sua vida cheia de coisas quebradas.
— Amanda, me escute, talvez tenha razão e eu deveria ter contado, mas não são histórias que eu me orgulhe. Eu sei que fiz muita merda.
— E quantas merdas mais eu vou descobrir de você, Nolan? — indaguei com ironia. — Você apostou que ia transar comigo e eu achei que fosse o pior que podia fazer!
— Eu sempre quis ficar com você, com aposta ou não, eu iria atrás de você! Você foi uma merda de uma obsessão desde o começo.
— E eu devo me sentir lisonjeada com isso? Você tinha uma namorada!
— Eu falei que terminei com ela! Na manhã seguinte que ficamos juntos eu soube que não podia mais levar aquela história com Ashley adiante! E quando eu voltei você estava com Owen no seu quarto! Sabe como me senti um idiota? Eu deveria mesmo ter te tratado só como uma aposta, mas não conseguia parar de pensar em você e me senti miserável porque preferia seu namorado!
— Está me culpando? Você faz um monte de merda... E o que fez com Carlton, com a moto de Peter?
— Eu queria ter botado fogo no Owen. Mas você nunca me perdoaria.
— Meu Deus, quem é você?
— Este sou eu! — ele gritou na minha frente. — Não queria saber! Então veja. Nolan Percy. Este cara fodido. Torto. Indigno de uma garota como você. Este é o cara com quem se casou! Eu destruí a maldita motinho do tal Peter, porque estava com ciúme. Sim, tem razão. Eu estrago tudo.
— Eu deveria saber... Acho que cheguei a desconfiar... Mas às vezes você parecia gostar de mim. Parecia ser um cara legal. Você fingiu?
— No começo sim. Eu queria que gostasse de mim. Depois... Acho que ficou fácil ser legal com você. Eu queria ser um cara legal pra você.
Eu me recordei de nós dois em seu barco.
Dele na casa da minha mãe, sendo legal com ela e o namorado. Dizendo que não ia me forçar a nada.
Dançando comigo em seu quarto.
Prometendo me beijar pra sempre. Sugerindo que fugíssemos juntos ontem.
Talvez fosse por isso. Se fôssemos embora, eu nunca saberia tudo o que ele fez.
Do poder destruidor que ele tinha.
Alguém bateu na porta.
— Amanda, Nolan? Tudo bem? Precisam voltar à festa. Eu prometo que já está acabando, só mais um pouco e podem seguir a vidinha de vocês juntos.
O que eu ia fazer?
“ A sua história ainda vai ser escrita. Você escolhe como vai ser. ”, as palavras da minha mãe voltaram a minha mente.
Eu disse que não tinha opção, mas não era verdade.
Eu só tinha medo das consequências das minhas escolhas.
Sem forças, eu me deixei deslizar para o chão.
— Destruiu a vida de Ashley... — sussurrei. — Acha que vai me destruir também?
— Na verdade, eu achei que você ia me curar.
— O quê?
— Eu me apaixonei por você, Amanda.
E lá estavam, talvez, as palavras que eu queria ouvir todo aquele tempo.
Palavras que eu mesma queria dizer, mas não ousava.
Porque eram palavras que vinham carregadas de um sentimento que eu sempre desconfiei que eu ia me arrepender de sentir.
Porque eu me arrependia agora.
Nolan Percy estava dizendo que não queria me destruir, mas o processo já não estava em andamento?
— Eu sei que talvez nem acredite. E com certeza eu não fiz nada para acreditar que eu possa ser sincero. Mas eu quero você, e não sei como aconteceu e nem por quê. Mas... — Ele se aproximou se abaixando à minha frente.
Mais do que nunca ele parecia aquele Nolan pronto pra briga. Senti lágrimas quentes inundando meus olhos.
— Fica comigo. Eu sou melhor com você. Eu preciso ser. Me dê uma chance de provar que posso deixar de destruir tudo à minha volta. Que não vou destruir você.
— Eu não sou uma espécie de santa que pode curar você, Nolan.
— Então ninguém mais pode.
E ele se levantou quando Samantha bateu à porta de novo.
— Eu vou dar mais só cinco minutos, hein?
Ouvi os passos dela se afastando.
— Vou voltar à festa. Eu vou te esperar.
— Você disse que podia me dar a opção de fugir.
— É isso que quer? Fugir de mim?
— Ninguém é obrigado a ficar junto de ninguém pra sempre. — Usei suas próprias palavras e vi seu olhar toldar de entendimento.
— Acho que mereci ouvir isso. Mas vamos ter um filho, Amanda. Isso não vai mudar. Se fugir, não terei outra opção a não ser ir atrás de você.
— Acha justo usar isso para me prender a você?
— Eu posso esperar que se apaixone por mim. Eu brigaria por isso. Estou disposto a brigar por isso. Por nós. E você?
Ele saiu do quarto fechando a porta atrás dele e ainda permaneci alguns minutos com o olhar fixo onde ele tinha desaparecido.
O que eu ia fazer?
Podia me levantar, tirar aquele vestido, ir embora sem olhar para trás.
Nolan podia vir atrás de mim, mas eu não precisava ficar com ele.
Eu nem sei se queria ficar com ele depois de tudo o que descobri do que era capaz. Mesmo dizendo que queria ser melhor por mim.
Que estava apaixonado por mim.
“ E você não está apaixonada por ele? ”, uma vozinha sussurrou dentro de mim.
— Amanda, posso entrar? Está pronta para continuar? — Samantha bateu à porta novamente.
Eu estava pronta?
Para ir embora, ou continuar com Nolan?
Eu me movi e senti algo em meu seio.
O bilhete de Owen ainda estava ali. Eu o peguei e abri.
“Amanda.
Sei que talvez esteja sendo bobo, e que já deve estar casada agora.
Se mudar de ideia. Se decidir que não quer seguir com isso, eu te receberia aqui.
Acho que sempre vou esperar que mude de ideia e volte pra mim.
Eu te amo hoje e sempre.
Owen.”
Amassei o bilhete.
Culpei Nolan por ter feito coisas horríveis quando eu também tinha minha cota de erros e pessoas quebradas por mim deixadas para trás.
Será que ainda era possível consertar?
Eu poderia aceitar o pedido de Owen e voltar ao meu caminho com ele?
Deixar Nolan e aquela paixão tóxica para trás?
Qual decisão tomar sem me arrepender?
Epílogo
Nolan
Eu carregava todos os meus demônios sobre meus ombros quando saí do quarto querendo quebrar qualquer coisa que visse pela frente.
Pequenas mãos tocaram meus ombros, me obrigando a parar e abaixar o olhar.
Samantha me encarava confusa.
— Que diabos está acontecendo? Porque Stella está com Ashley chorando no quarto e você e Amanda estavam trancados aqui?
— O que você acha?
— Eu nem sabia que a Ashley estava aqui!
— Ela não deveria estar e eu vou dizer exatamente isso pra ela. — Tentei passar, mas Samantha me segurou.
— Para com isso agora! Ashley não deveria estar aqui mesmo, mas ela está doente, Nolan! Brigar com ela agora só vai piorar as coisas!
— Ela contou a Amanda.
— Ai meu Deus! Você mesmo deveria ter contado tudo isso a Amanda! Como é que vocês arrumam essa confusão no meio da festa de casamento?
— O que está acontecendo?
A voz do meu pai soou ameaçadora atrás de mim e eu me virei.
Theodore Percy fixou em mim os olhos tão iguais aos meus, repleto de ira.
— Nada, já estamos resolvendo. — Samantha sorriu amenizando.
— Ashley veio estragar tudo — rosnei.
— Quem estragou tudo foi você e faz isso há muito tempo.
— Eu não preciso dos seus sermões agora! — Tentei passar, mas ele segurou meu braço, me obrigando a parar.
— Arrume isso! Estou farto de suas confusões. Dessa sua incapacidade de fazer qualquer coisa direito! Insistiu nesse casamento, encheu a boca pra me dizer que ia ser responsável e consertar tudo e veja só. No dia que se casou, já está fazendo merda! Eu deveria saber que iria estragar tudo.
Puxei meu braço, sentindo a humilhação se juntar à raiva e à frustração pela briga com Amanda. Por tudo estar ruindo e eu não tinha ideia como iria fazer para pôr tudo no lugar.
Desci as escadas passando pela horda de garçons até que estivesse respirando o ar puro da tarde nublada.
— Irmão? — Jace tocou meu braço.
Bastou um olhar para ele perceber que eu estava me descontrolando.
— Respira.
Fiz o que mandava, tentando levar ar aos pulmões e clarear minha mente.
Mas eu ainda via tudo escuro.
Fechei os olhos com força e tudo o que eu via era o olhar de decepção de Amanda quando escorreu para o chão.
E quando eu os abri, avistei Owen Smith próximo aos portões, olhando para a casa como se esperando... o quê?
Amanda sair e ir embora com ele?
A raiva voltou com força total quando eu me desprendi dos braços de Jace e avancei. Eu o empurrei e quando ele bateu na árvore atrás de si, prendi meu braço no seu pescoço.
— Eu deveria ter posto fogo em você!
— Por que não pôs?
— Porque a Amanda infelizmente ainda gosta de você.
Ele riu.
— E isso não consegue superar, não é? Eu e a Amanda temos uma ligação que um escroto como você nunca vai entender! Pode me bater agora se isso te faz sentir melhor. Ou pode pedir para seu irmão brutamonte me bater, que é o que covardes como você costumam fazer. Mas não vai mudar o fato de que a Amanda mais dia menos dia vai ver o merda que você é. E neste dia, ela vai voltar pra mim.
— Escuta aqui, seu filho da puta. Vai sumir da vida da Amanda. Ela não está mais ao seu alcance. Se eu te vir rondando de novo, não vou ter a clemência que tive até agora, não contando pra ela exatamente quem é o namoradinho canalha dela.
— Você não pode me impedir...
— Posso sim. Ou você some, ou eu conto pra Amanda o que fez com a Stella. Acho que Amanda vai mudar de ideia sobre você rapidinho se souber que obrigou a Stella a abortar um filho teu.
Os olhos de Owen finalmente mostram algum medo.
“Sim, seu cretino.
Eu sei.”
Apertei mais meu braço em seu pescoço.
— Então desapareça e nunca mais ouse chegar perto da minha mulher. Até agora, a pedido da Stella, eu mantive minha boca fechada sobre o merda que você é. Um filho da puta que trepava com a amiga da Amanda até que ela engravidou. O segredinho sujo que você esconde do mundo. Enquanto paga de bom moço. — Eu ri com escárnio o soltando. — Agora suma da minha casa antes que eu mude de ideia e quebre seu nariz pra me divertir.
Owen me encarou com raiva, mas dando uma última olhada para a casa, ele se virou e foi embora.
— Cara , que diabos está acontecendo?
— Volte pra festa, Jace — pedi.
Ele não discutiu e se afastou.
Eu me virei para onde Owen estava olhando antes e vi Amanda na janela. Ainda usando o vestido de noiva.
Se ela descesse agora e fosse atrás daquele idiota, eu quebraria minha promessa a Stella e contaria toda sujeira que o namoradinho mentiroso escondia dela.
Inferno, eu já poderia ter feito isso há muito tempo.
Mas Stella implorou e, sinceramente, não achei que Owen ainda teria coragem de realmente tentar reconquistar Amanda, quando ela tinha se comprometido comigo.
Talvez eu tenha subestimado Owen.
Talvez eu tenha subestimado Amanda.
Eu podia ter nojo de Owen, mas me identificava com ele em várias atitudes horríveis que ele tomou.
Eu fui horrível com Ashley assim como ele foi horrível com Stella.
Só que agora Amanda sabia quem eu era.
E o que ela ia fazer?
Me deixar?
Eu me encostei na árvore e acendi um cigarro. Eu tinha que me acalmar.
Tentar evitar que a raiva que borbulhava em mim me devorasse como um câncer.
Mas não era o que eu fazia desde que a encontrei sem vida?
Como se tudo de bom que havia dentro de mim tivesse ido com ela?
Culpei meu pai, culpei o mundo inteiro. Culpei a mim.
Deixei todos os demônios se aproximarem e serem meus amigos.
Eu perguntei pra Amanda se ela acreditava que existia inferno, mas talvez o inferno estivesse dentro de mim.
Mas estava tão cansado.
E eu não sabia que estava cansado da escuridão até pousar minha atenção nos olhos puros de Amanda Thomas.
Que ironia um cara como eu desejar um anjo.
Talvez Amanda tivesse razão, e ela não tivesse o poder de me curar. Acho que ninguém tinha.
Mas ousei olhar para cima e esperar.
Desejando que ela ficasse.
Se eu fosse cair de novo.
Que Amanda fosse minha queda.
Juliana Dantas
O melhor da literatura para todos os gostos e idades