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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


SEDUÇÃO MAIS SOMBRIA
SEDUÇÃO MAIS SOMBRIA

 

 

                                                                                                                                                

  

 

 

 

 

 

Possuído pelo demônio da Promiscuidade, o guerreiro imortal Paris é irresistivelmente sedutor, mas seu potente fascínio vem com um preço terrível. Toda noite deve dormir com alguém novo, ou se enfraquecer e morrer. E a mulher que anseia acima de todas as outras é a única mulher que havia pensado estar para sempre além de seu alcance… até agora.

Recém-possuída pelo demônio da Ira, Sienna Blackstone é atormentada por uma necessidade cruel de punir aqueles ao seu redor. No entanto, nos braços de Paris, a vulnerável beleza encontra assombrosa paixão e paz incrível. Até que uma vingança de sangue entre antigos inimigos se torna grave.

A batalha contra deuses, anjos e criaturas da noite os vinculará eternamente ou os afastará?

 

 

 

 

     —SUA RAIVA...

     —Eu sei.

     Alto nos céus, Zacharel observava o mundo abaixo dele. Assistia como o uma vez genial Paris assassinava mais um dos inimigos, os Caçadores. Quantas vítimas ele havia feito apenas na última hora, o anjo não poderia dizer. Há muito havia perdido a conta. E mesmo que fizesse uma pausa para registrar, a resposta poderia ter mudado um segundo mais tarde quando mais um corpo caísse, o sangue revestindo as lâminas que o guerreiro empunhava.

     Naturalmente, o ofegante e coberto de suor Paris girava para lutar com outros dois, seus movimentos fluidos letalmente graciosos... tão irrefreáveis quanto uma avalanche. Primeiro, ele brincava. Um soco, ossos quebrando. Um chute, pulmões esmagados. Rindo, soltando as piores maldições. Logo, nada disso era suficiente para o endemoniado soldado, e dançava suas lâminas sobre os tendões de seus tornozelos, deixando sua presa manca para facilitar a eliminação.

     Paris havia se feito de isca propositadamente para atrair esses Caçadores até ele. Eles haviam vindo com entusiasmo, alegria, com intenção de roubar o demônio vil preso dentro dele e, finalmente, acabar com ele. Então Zacharel não poderia culpar o guerreiro pelo que fazia para se defender, mesmo quando vários novos corpos caiam na pilha já montanhosa envolta por um mar de vermelho e preto. E, no entanto, não podia elogiar o guerreiro também.

     Estes não eram assassinatos misericordiosos ou mesmo executados em nome de uma vingança fria e calculada nascida nas entranhas de uma raiva igualmente fria. Não, eram vômitos de fogo do ódio e desespero do que qualquer coisa mais quente que o inferno jamais criou.

     —Ele é como uma maçã envenenada, — Zacharel disse ao anjo ao seu lado. E porque Paris estava ligado ao demônio da promiscuidade, sua poda não pertencia aos humanos que viviam entre os anjos, mas à divindade que policiava diferentes reinos do mal. — Veneno desta natureza se espalha lentamente, mas corrompe totalmente.

     Gotas de gelo caíram em torno de Zacharel, como sempre caiam em torno dele nesses dias, sua respiração condensando na frente de seu rosto. Cada cristal uma lembrança de seus próprios crimes, tão recentemente trazidos à sua atenção. Mas ao contrário de Paris, não usava a miséria como um casaco de inverno, abraçando-a perto de seu corpo, se apoiando nela, alimentando-a, ajudando-a a crescer. Zacharel não se importava com nada, não mais.

     Em sua missão para destruir os demônios que arruinaram sua vida, ele matou "inocentes" seres humanos, e esta seria sua punição — transportar o desagrado de sua Divindade com ele para sempre.

     —Tão suculenta quanto outros consideram essa maçã em particular — Lysander proclamou, — estarão dispostos a provar tudo o que ele oferece.

     Zacharel moveu seu olhar para o homem que o havia ensinado como sobreviver no campo de batalha. O guerreiro de elite era uma torre de músculos de inabalável força. Vestia uma longa túnica branca, suas asas majestosas como rios de ouro derretido. O gelo de Zacharel se envolvia ao redor dele também, embora nem um único floco ousasse pousar sobre o homem. Talvez, como uma miríade de outras criaturas, os cristais tivessem medo dele e com razão. No mundo deles, ele era juiz e júri, a sua palavra lei.

     —Devemos remover a tentação? — Zacharel perguntou. Durante séculos, agiu como carrasco de Lysander.

     —Não vou ordenar seu assassinato, não, — disse Lysander, resoluto. —No momento, Paris é resgatável.

     Inesperado. Mesmo com a grande distância entre os céus e a terra, Zacharel podia ouvir os grunhidos e gemidos que Paris provocava, os gritos de seus inimigos. Os pedidos de misericórdia que ecoariam na eternidade, para sempre ignorados. E, tão determinado como este Senhor do Submundo estava, este era apenas o começo.

     —O que quer que eu faça, então?

     —Paris procura por sua mulher, com a intenção de libertá-la da escravidão do rei dos Titãs. Vai ajudá-lo, protegê-lo e proteger a jovem. No momento que seus laços com Cronus forem cortados, no entanto, vai trazê-la aqui, onde vai viver o resto da eternidade.

     Ainda mais inesperado. O comando cheirava a clemência, algo que Lysander havia mostrado apenas a outro endemoniado imortal em todos os milênios de sua vida: Amun, o amigo de Paris. E só porque Bianka, a companheira Harpia de Lysander havia pedido.

     Ela deveria ter solicitado esse segundo favor também, pois era amplamente divulgado que Lysander era impotente contra seus ardis. Mas mesmo um companheiro apaixonado, encarregado como era de governar os céus, responsável por tudo o que acontecia lá, não deveria pedir a outro anjo para fazer esta ação. Auxiliar um demônio? Trazer outro para viver aqui? Horripilante.

     Zacharel não ofereceu nenhuma objeção. E apesar do fato de nunca haver experimentado desejos próprios, faria seu melhor para curar Paris, de forma que, quando a ruptura inevitável com a mulher viesse, o guerreiro não voltasse à sua raiva.

     —Paris protestará a perda dela. — Depois de tudo que o guerreiro havia feito para encontrá-la e salvá-la, tudo que poderia fazer em breve... — oh, sim, protestaria usando aquelas lâminas gotejantes para marcar seu ponto.

     —Tem que convencê-lo que ficará melhor sem ela, — disse Lysander.

      —Ficará?

     —Claro. — Não houve hesitação no pronunciamento, emprestando-lhe uma borda de verdade ardente. Uma borda desnecessária, pois Zacharel sabia que Lysander não podia mentir.

     —E se eu falhar em convencê-lo? — Ele teve que perguntar, precisando da pesada punição sobre os ombros, levando-o a ter sucesso.

     Os impiedosos olhos marinhos foscos de Lysander revelaram as profundezas do núcleo de ferro do guerreiro. —Estaremos perdidos para a maior guerra que o mundo já viu. A jovem nos levará à nossa vitória ou nossos inimigos à deles. É simples assim.

     Muito bem, então. Quando chegasse à hora, Zacharel a levaria. Sem importar como Paris fosse afetado.

     Paris iria odiá-lo, e talvez isso o afetasse mais que a raiva. Não havia como parar quando tanta escuridão rodava dentro dele, uma podridão em sua alma, muito pior que qualquer veneno espiritual. Mas isso não impediria Zacharel de cumprir seu dever.

      Nada o faria.

    

     PARIS ENGOLIU OS TRÊS DEDOS[1] de Glenlivet[2] e sinalizou ao garçom. Queria uma mão inteira e por direito ou poder, teria. Exceto que logo após o malte ser derramado, percebeu que uma mão inteira não iria golpeá-lo também. Fúria e frustração eram entidades vivas dentro dele, espumando e borbulhando, apesar de sua luta recente.

     —Deixe a garrafa, — disse ele quando o barman fez um movimento para atender outra pessoa. Inferno, de repente Paris duvidava que cada gota de álcool num raio de dez quilômetros faria o truque, mas opa. Tempos de desespero.

     —Claro, claro. Qualquer coisa que quiser. — O Garoto Maravilha descamisado soltou a garrafa e saiu batendo os pés.

     O quê? Parecia tão perigoso? Por favor. Lavou o sangue, não? Espere. Não o fez? Olhou para baixo. Merda. Não o fez. Vermelho o marcava da cabeça aos pés.

     Que fosse. Não estava num bar humano, e de modo nenhum as "autoridades" teriam uma luta com ele. Estava no Olimpo, embora o reino celestial fosse recentemente rebatizado de Titania. Uma vez apenas deuses e deusas eram permitidos aqui, mas quando Cronus recuperou o reino, mudou as coisas, permitindo que vampiros, anjos caídos e outras criaturas da escuridão entrassem e brincassem. Um fodido mais agradável que o rei anterior, Zeus.

     Chame o garçom de volta — Promiscuidade disse. Eu o quero.

     Promiscuidade — o demônio preso dentro dele — o dirigia. O irritava. Lembra quando eu queria fidelidade? Monogamia? — Paris respondeu em sua mente. —Bem, nem sempre conseguimos o que queremos, não é?

     Um rosnado familiar soou em sua cabeça.

     Há, há, beicinho, beicinho. — Ele tomou a segunda dose alcoólica e rapidamente a seguiu com uma terceira. Ambas queimaram tão bem que queria uma quarta. O álcool potente arrasava o peito, a queimação perfurando seu abdômen, e inundando suas veias. Bom.

     E, no entanto, mantinha suas emoções tão sombrias como sempre, as margens daquela fúria profundamente em seus ossos e a frustração silenciosa. Sua incapacidade em salvar uma mulher não-tão-inocente que devia odiar — odiar pelo menos um pouco — mas também ansiava de corpo e alma, era um chicote constante contra seu flanco.

     —Se eu pedisse para sair, você o faria? — Uma voz monótona disse, ao lado dele. Uma voz acompanhada por uma rajada de ar ártico.

     Não teve que olhar para saber que Zacharel, anjo guerreiro extraordinário e infame demônio assassino, acabava de se juntar a ele. Não se encontraram há muito tempo, quando o emplumado Homem do Machado chegou a Buda para eliminar Amun, amigo de Paris. O velho Zach realmente conseguiu, as duas lâminas de cristal teriam perfurado sua espinha naquele momento.

     Eu o quero, o demônio disse.

     Vá se foder.

     Finalmente. Estamos na mesma página.

     Realmente odeio você agora.

     Era uma vez, o demônio falava com Paris com frequência irritante. Então, o estúpido viciado em sexo parou, apenas pedindo para Paris ir para a cama com esta ou aquela pessoa, não importando seu sexo ou os próprios sentimentos de Paris em relação a eles. Agora, a conversa começava de novo e era pior que antes, porque queria todos, especialmente os que Paris não sentia desejo.

     —Bem? — O anjo pediu.

     —Sair, quando tive que implorar a Lucien para me trazer até aqui e sei que não vai ser tão complacente da próxima vez? Não, mas porra se eu quero saber por que dá a mínima para minha localização.

     —Não me importo com sua localização.

     Era verdade. Zacharel não se importava com nada, um fato que descobriu muito rápido nas suas relações com ele. —Esse é o ponto, caso não tenha notado.

     Quando Paris bebeu o quinto uísque, estudou o espelho manchado de fumaça na frente dele, secretamente vistoriando a área atrás dele. Lustres de pedras preciosas pendiam do teto. As paredes eram de mármore rosa, com veios de ébano reluzente, o piso uma extensão cintilante de diamantes triturados.

     Ao longo da sala, homens e mulheres conversavam e riam. De deuses e deusas menores a anjos caídos que tentavam trabalhar seu caminho de volta para seu aprisco santo. Boa sorte com isso num bar. Idiotas. Enfim. Provavelmente, havia um demônio ou dois salpicados entre as massas, mas Paris não podia dizer com certeza.

     Demônios eram tão sorrateiros quanto malvados. Podiam se esconder em torno de suas próprias escamas, orgulhosamente mostrando seus chifres, garras, asas e caudas — e serem decapitados por anjos guerreiros como Zach. Ou podiam possuir o corpo de outra pessoa e se esconder em torno de sua pele.

     Paris tinha milhares de anos de experiência no último.

     —Vou sair como muito sucintamente sugeriu, — Zacharel disse, — depois que me responder outra pergunta.

     —Tudo bem. — Outra coisa que Paris sabia por experiência própria: anjos eram assustadoramente teimosos. Melhor ouvir o cara logo, caso contrário, se encontraria com uma nova sombra. Ele se virou de frente para o atraente moreno com olhos cor de jade, e respirou fundo. Nunca deixava de surpreendê-lo como eram magnéticos esses seres celestes. Não importava seu sexo — ou como eram tediosamente maçantes suas personalidades — atraiam e puxavam sua atenção cada maldita vez. Por alguma razão, Zacharel o fazia com mais intensidade que a maioria.

     Mas o magnetismo não foi o que chamou a atenção de Paris desta vez. As asas majestosas estavam arqueadas sobre os ombros largos do anjo, uma queda turbulenta de nuvens de inverno em sinuosas correntes de ouro se enroscando, os flocos de neve chovendo desde as pontas como purpurina num globo.

     —Você está nevando. — Capitão Óbvio, esse sou eu.

     —Sim.

     —Por quê?

     —Posso responder a você, ou posso fazer minha pergunta e sair. — Vestido com o manto longo e branco que era habitual em sua espécie, Zacharel deveria parecer inocente e certinho. Em vez disso, parecia o gêmeo maligno do Grim Reaper: sem emoção enquanto a neve fria como ele caía e pronto para matar. —Sua escolha.

     Não achava necessário. —Pergunte.

     —Quer morrer? — Zacharel falou simplesmente como falou todo o resto, a névoa cristalizando na frente de sua boca, criando uma névoa onírica e lembrando a Paris do sopro da vida. Ou da morte.

     Definitivamente, pronto para matar, Paris meditou. —O que acha? — Perguntou ele, porque, honestamente? Não sabia mais a resposta.

     Durante séculos lutou para viver, mas agora, agora, constantemente se jogava no fogo e esperava ser queimado. Gostava de ser queimado. Que tipo de babaca doente havia se tornado?

     Inabalável, o anjo manteve seu olhar. —Acho que quer uma mulher em particular mais do que quer qualquer uma — ou qualquer coisa — aliás. Mesmo a morte... até mesmo a vida.

     Paris pressionou sua língua no céu da sua boca. Uma mulher em particular: a não-tão-inocente.

     Seu nome era Sienna Blackstone. Uma vez uma Caçadora e sempre sua inimiga, os Caçadores eram um irritante exército de humanos que esperavam livrar o mundo dos demônios de Pandora. Em seguida, temporariamente, tinha sido sua amante. Em seguida, morta, desaparecida. Em seguida, tinha sido trazida de volta da sepultura, sua alma fundida com o demônio da Ira. Agora, estava lá fora. Em algum lugar. E estava sofrendo. Cronus a havia escravizado, pensando em usar seu demônio para punir seus adversários, e agora que havia perdido o controle dela, pensava em torturá-la até sua submissão.

     Paris podia não gostar das coisas que Sienna havia feito a ele, e sim, como já havia admitido, parte dele podia odiar a própria mulher, mas mesmo ela não merecia a cruel, depravada—eterna — punição a ser dispensada.

     Vou encontrá-la e vou salvá-la. De Cronus... de si mesmo. Agora, Paris simplesmente não podia ignorar o fato que ela estava sofrendo. Uma vez que parte da equação fosse tratada, pararia de pensar nela. Tinha que parar de pensar nela.

     —Então eu a quero, — ele acabou dizendo ao anjo. Sienna não era para discussão. —BFD[3].

     —Vou fingir saber o que isso significa. — Zacharel balançou as asas, mais da pura neve brilhante caindo. —Quanto a você, acho que, apesar de seus próprios desejos, seu demônio quer qualquer coisa viva.

     —Às vezes até estar vivo não é um requisito, — ele murmurou, e porra, se isso não era verdade. Sexo, como havia começado a chamar seu companheiro obscuro, queria qualquer um e todos — mas sempre apenas uma vez. Com exceção de Sienna, Sexo não permitia a Paris endurecer para a mesma pessoa duas vezes.

     Por que podia ter Sienna novamente? Nenhuma maldita ideia. —Mas de novo, e então?

     —Acho que, mesmo que suspire por esta mulher em particular, dormiu com a futura esposa de seu amigo Strider. Ele é o demônio da Derrota, e suas ações tornaram seu namoro com a Harpia muito difícil.

     —Ei. Está entrando em território perigoso aqui. — Não que Paris tivesse nada a se desculpar.

     A única-noite aconteceu semanas antes de Strider e Kaia se unirem. Ou sequer houvessem pensado se unir. Por isso, Paris não fez nada errado. Tecnicamente. E, no entanto, agora sabia como era Kaia nua, e Strider sabia que ele sabia, e isso significava que todos os três sabiam que Sexo expulsaria imagens nuas da moça toda vez que estivessem juntos. Uma consequência que Paris detestava, mas não conseguia evitar.

     A cabeça escura de Zacharel se inclinou de lado numa pose reflexiva, ainda mais misteriosa por causa da névoa que continuava a se formar a cada exalação sua. —Quis apenas salientar que claramente se moveu para outras conquistas e dificilmente é exigente com suas escolhas, o que me faz perguntar por que ainda persegue sua Sienna.

     Porque Sienna havia sido a primeira e única chance de Paris por monogamia. Porque ele inadvertidamente havia provocado sua morte. Porque sentia que havia perdido tudo quando ela morreu.

     —Você é chato, — retrucou. —E estou farto de falar com você.

     Ainda assim o anjo persistiu. —Acho que você se sente culpado por cada coração que você rompe, por cada sonho de felizes-para-sempre que esmaga, e cada pequeno desgosto próprio que você encoraja quando suas parceiras percebem o quão sem esforço você sobrepuja suas reservas. Também acho que é extremamente mimado e patético, e que não tem nada que ficar chorando sobre seus problemas.

     —Ei! Eu nunca chorei. — Paris bateu o copo no balcão com tanta força que rachou no meio e quebrou. O sangue jorrou dos cortes em sua palma, mas a dor foi mínima. —E sabe o quê? Acho que está a segundos de distância de encontrar pedaços de seu corpo espalhados em todos os cantos deste bar.

     Então, enquanto estiver caído, podemos tê-lo!

     Calado, Sexo.

     —Uh, aqui está, — disse o barman solícito imediatamente empurrando um pano limpo na direção de Paris. Seu braço tremeu. Ainda estava com medo de Paris.

     Eu o quero...

     Disse calado! — Obrigado, cara. — Paris amassou o pano, aplicando pressão com o pedaço de tecido rasgado antes que alguém pudesse cheirar os feromônios oh-tão-especiais que seu demônio excretava.

     Uma brisa do aroma intoxicante, e todos à sua volta estariam imperdoavelmente excitados, indiferentes de onde estavam ou com quem estavam. Principalmente famintos por Paris e, apesar de ser um resultado de merda, especialmente hoje à noite considerando que estava operando com uma crise de tempo, teria gostado de rechaçar os machos com os punhos.

     Exceto... que os feromônios não o envolveram. Franziu a testa. Sexo queria a todos que via esta noite. Por que não tirar proveito de sua habilidade e forçar os clientes a querê-lo de volta?

     Paris voltou seu foco para Zacharel, querendo saber se o anjo era de alguma forma responsável.

     Aqueles raros olhos de jade estavam reduzidos a minúsculas fendas. —Acho que você espera salvar sua Sienna e isso é uma boa coisa. Acho que pretende mantê-la, e isso não é. Não importa o quão intensamente anseie por ela, não importa que ela possa ser sua única chance de eternidade, seu demônio acabará por arruiná-la, já que os humanos nunca foram destinados a combater demônios, e no coração, ela ainda é humana.

     —Que tal o seu próprio demônio? — Retrucou.

     —Se um é ruim, dois é seguramente pior.

     —Basta! — Se continuassem neste caminho, sua fúria e frustração aumentariam e o consumiriam. Perderia de vista o objetivo desta noite. —Não vou ficar com ela. — Ele ia. Ele então se daria uma chance, e se ela o quisesse, é claro, mas inferno, ela não o queria.

     —Ótimo. Porque essa mulher especial não gostaria do homem que se tornou.

     Bufando, Paris enfiou a mão livre pelo cabelo. —Ela não gostava de quem eu era. — E agora, depois que havia irrevogavelmente andado sobre a linha entre o certo e o errado? Por favor.

     Sabia que suas ações eram condenáveis, e havia feito de qualquer maneira. Havia matado cruelmente. Seduzido metodicamente. Mentido, enganado e traído. Faria tudo de novo e de novo.

     —No entanto, ainda quer correr para salvá-la, — disse Zacharel.

     Sim. Ele era um idiota tão grande quanto os caídos que frequentavam este lugar. Tanto fazia. Ele sabia. Não importava. —Olha, não responderei a você. Não tenho que me explicar. E o que quer com todas essas perguntas? Disse que só tinha mais uma.

     —Fiz apenas uma. O resto foram observações, e tenho mais uma dessas para oferecer. — Zacharel se inclinou para ele e sussurrou: — Acho que se continuar neste caminho destrutivo, vai perder tudo que aprendeu a amar.

     —É uma ameaça? — Paris apertou o colarinho do manto do anjo. —Vá em frente e tente algo, alado. Veja o que...

     Ar. Estava com os punhos cerrados e gritando com o ar.

     Pequenos grunhidos saltaram de sua garganta quando baixou os braços em seus lados. A única razão pela qual sabia que Zacharel havia estado aqui era a temperatura de suas mãos. Estavam praticamente congeladas.

     —Uh, com quem estava falando? — o barman perguntou, com falsa casualidade enquanto limpava um balcão já limpo.

     Se um anjo não queria ser visto, um anjo não seria visto. Nem mesmo por seus irmãos, caídos ou não. Assim, só Paris havia visto Zacharel nesta discussão. Grande. —Comigo mesmo aparentemente, e preferimos conversar sem audiência.

     Zacharel ainda estava aqui? Paris se perguntou. Ou tinha se materializado em algum outro lugar? E qual era o propósito de toda essa conversa de Paris precisar ficar longe de Sienna? O anjo não deveria se preocupar.

     Paris soltou o pano e virou o resto do caminho para enfrentar a multidão. Vários guerreiros olhavam carrancudos em sua direção — por quê? — perigosamente perto de estragar a elegância do salão com o sangue de Paris que estavam tentados a respingar. Massageou a nuca, forçando ocultar os pensamentos de Zacharel e sua ameaça. Tinha coisas maiores e piores para lidar. Estava aqui por Viola, à deusa menor da Pós-Morte e detentora do demônio do Narcisismo. Ela já deveria ter aparecido.

     Talvez ela tivesse ouvido que ele vinha e houvesse fugido, e se fosse esse o caso, não poderia culpá-la. Ele e seus amigos haviam roubado e aberto uma vez à caixa de Pandora, liberando o mal de dentro. Como castigo eles foram amaldiçoados a hospedar dentro de si os demônios que haviam soltado. Infelizmente, havia tido mais demônios que garotos e garotas impertinentes para contê-los, e quando a caixa havia desaparecido em meio ao caos, os espíritos malignos que restaram haviam precisado de casas. Que destinatários melhores para os gregos escolherem que os infelizes e presidiários incapazes de correr do Olimpo — Titania — o Tártaro prisão imortal?

     Então, sim, Paris era parcialmente responsável pelo lado obscuro de Viola. Ela havia sido um daqueles prisioneiros infelizes. Ele não era inteiramente responsável, porém, considerando-se que a garota era uma criminosa, uma vez considerada perigosa o suficiente para ser forçosamente mantida longe dos próprios deuses e deusas que muitas vezes eram elogiadas em livros da mitologia por seus atos mais cruéis.

     Que crime cometeu Viola, não sabia e não se importava. Podia cortá-lo em fatias, desde que desse a informação que ansiava. A peça final necessária do quebra-cabeça para finalmente salvar Sienna.

     De acordo com os Caçadores mortos esta manhã, Viola vinha aqui toda sexta à noite para empurrar imortais na piscina e delirar sobre sua grandiosidade com mais algumas cervejas. Aparentemente o Caçador a vigiava, na intenção de prendê-la e "persuadi-la" a se juntar a eles. Então, de certa forma, ela meio que lhe devia.

     Onde diabos estava? Perguntou-se de novo, procurando o revelador comprido cabelo loiro, olhos cor de canela e um corpo assassino que poderia...

     Apareceu numa nuvem de fumaça branca.

     Lá, em frente à entrada do bar, estava uma mulher sedutora com longos cabelos loiros e olhos cor de canela. Paris se endireitou, as terminações nervosas rangendo com antecipação. Assim mesmo. Presa localizada. Alvo adquirido.

 

EU A QUERO, — SEXO DISSE enquanto Paris estudava Viola.

Claro que quer, — ele respondeu secamente.

 Os tentáculos de fumaça que haviam marcado a aparição de Viola agora se enrolavam para longe dela, se diluindo para revelar um vestido preto colante. As tiras grossas sobre os ombros desciam em V enquadrando a grande abertura antes de mergulhar rumo ao umbigo com piercing. A minissaia parava logo abaixo da barra da calcinha.

Estava pelo menos usando calcinha?

Paris bocejou. Esteve com mulheres lindas, mulheres feias, e tudo mais. Uma lição que aprendeu rapidamente: a beleza pode esconder uma besta e uma besta poderia esconder uma beleza.

Sienna pertencia à categoria de beleza-escondendo-a-besta, pelo menos para ele. Embora ele houvesse estado louco de desejo por ela, ela esteve tramando sua ruína. E talvez ele fosse tão ruim quanto seu demônio, porque parte dele achava até mesmo esse lado dela sexy. Uma fêmea magra como um caniço que havia superado um guerreiro endurecido pela batalha, e ele achava isso quente como o inferno.

E tudo bem, sim, ela se considerava simples e, talvez, uma vez ele tivesse concordado, mas desde o início, houve algo fascinante sobre ela. Algo que o atraiu, o manteve cativo. Agora, a qualquer momento que a imaginava, a via como uma joia impecável, sem igual.

Concentre-se. Um comando ao demônio, que ainda queria a deusa menor, e uma reprimenda a si mesmo.

Viola jogou o longo cabelo sedoso sobre um ombro beijado pelo sol e espiou seus arredores. Homens abertamente boquiabertos. Mulheres tentando esconder seu ciúme com (pouco convincentes) rostos impassíveis. Ela fez uma pausa em Paris, olhando-o de cima abaixo, suas pálpebras se estreitando, e então, incrivelmente, o rejeitou e continuou sua varredura visual.

Da última vez que seu demônio havia falhado em atrair uma potencial companheira de cama, ele havia conhecido Sienna pouco tempo depois. Poderia significar que... e se... sua antecipação se intensificou até que seus ossos vibraram. Receberia suas respostas — esta noite — não importa o que fosse exigido dele.

Ele se aproximou de Viola preparando suas feições para revelar apenas admiração como era seu plano. Charme em primeiro lugar, se pudesse realmente lembrar como era ser encantador. Vigor em segundo, e sim, definitivamente se lembrava de como ir por esse caminho.

Ignorando sua abordagem, Viola abaixou e deslizou um telefone rosa brilhante de dentro de sua bota de couro preto. Gemidos de aprovação irromperam atrás dela, e os homens se congratularam uns aos outros, como se acabassem de receber um vislumbre do céu. Mesmo imortais podiam ser infantis. Nunca ele. Inconsciente ou indiferente, ela dançou seus dedos ágeis sobre o teclado minúsculo do telefone.

Paris fez uma careta. —O que está fazendo?

Como um abridor, a pergunta explodiu totalmente, como seu tom acusador. Mas se ela achava que ia pedir ajuda, alguém para lutar com ele, ou até mesmo um Caçador para matá-lo, ela em breve se encontraria sua refém, bem como seu informante.

—Estou Screeching[4]. Essa é a versão imortal do twitter ou twittar ou como vocês seres inferiores queiram chamar, — disse ela sem erguer os olhos. —Tenho mais de sete zilhões de seguidores.

Cer-to. Não era o que esperava. Passou muito tempo com os humanos, e sabia que desfrutavam em compartilhar cada pensamento fútil com o mundo. Mas um Titã que fazia isso era novo.

—O que está dizendo? —Cronus estava entre os sete zilhões? E Galen, o chefão dos caçadores? E quanto eram zilhões?

—Talvez pudesse meio que de certa forma dizer tudo sobre você. — Um sorriso ergueu os cantos de seus grossos lábios vermelho enquanto ela continuava teclando, teclando, digitando. —“Senhor do Sexo é sujo e tenta pontuar. Não estou interessada, mas deveria ajudá-lo a acumular pontos com outra pessoa?” Enviar. — Ela focou os assombrosos olhos canela sobre ele. —Vou deixar você saber quando os resultados voltarem. Até então, há alguma coisa que queira saber sobre mim antes de eu me afastar e ignorá-lo?

Senhor do Sexo, ela havia dito. Entãoooo. Ela sabia quem ele era, o que era, mas não estava fugindo dele, não estava soltando insultos para ele e não estava gritando por sua execução. Um grande começo. —Sim, existe, e é um assunto privado muito importante para mim. — Subtexto: não ouse Screechar sobre isso!

—Ohhh. Amo segredos, questões importantes que eu supostamente não deveria falar, mas falo, porque sou abnegada. Estou ouvindo.

Apesar de sua confissão complicada que significava bisbilhoteira, não estava mais digitando. Bom. Ele prosseguiu. —Quero ver os mortos. Como posso fazer isso acontecer? —Sienna era uma alma sem um corpo — uma alma que não podia sentir de forma alguma. Somente aqueles que comungavam com os mortos podiam ver, ouvir e tocar nela. Mas o boato era que Viola sabia um truque que tornava a capacidade desnecessária.

Ela piscou, e ele notou que seus cílios estavam pintados de um brilhante rosa para combinar com seu telefone. —Deixe-me dizer o que acabei de ouvir. Falou, falou, falou, eu. Falou, falou, falou, eu. Bem, e quanto a mim?

Sua mandíbula se apertou. Havia o ser charmoso, e havia o ser otário. Ele não era um otário. Bem, não o tempo todo. —Vou falar sobre você. Pode ver os mortos. Agora vai me ensinar como vê-los. — Uma ordem que ela faria bem em prestar atenção.

Seu nariz enrugou. —Por que se importa em ver almas? Se ainda estão aqui, estão causando problemas e, oh, oh, espere. — Clap, clap, salto, salto, giro. — Já descobri um pouco do mistério, porque sou altamente inteligente. Deseja ver sua amante humana assassinada.

Instantaneamente sua fúria faiscou a superfície, suficientemente quente para empolar. Não gostava de ninguém falando de Sienna de qualquer forma. Nem Zacharel, e certamente não essa deusa menor estranha com um pendor para a fofoca. Sienna era sua para proteger, mesmo nessa qualidade. —Eu...

—Tsk, tsk. Não há necessidade de confirmar minha suposição de gênio. — Viola deu um tapinha no seu rosto, toda doçura melosa de sua deficiência mental. —Especialmente porque não posso te ajudar.

Ela tentou se afastar.

Ele pegou o pulso dela. —Não pode ou não vai? — Havia uma grande diferença. O primeiro ele não poderia fazer nada a respeito. O segundo poderia mudar, e se ela o forçasse, iria descobrir quão longe estava disposto a ir, para fazer exatamente isso.

—Não vou. Até mais. — Alheia à raiva que ameaçava soltar, ela se soltou e praticamente o ignorou indo para o fundo do bar, sua bunda perfeita balançando, os saltos de suas botas estalando.

Furioso a seguiu, empurrando de lado qualquer um que estivesse em seu caminho. Grunhidos, gemidos e rosnados abundaram, os predadores no meio da multidão protestando contra suas táticas de força bruta. Ninguém tentou impedi-lo, no entanto. Sentiram um predador muito maior no meio deles.

—Como sabe quem sou? — Perguntou ele no momento que alcançou Viola. Começaria por aí e a faria mudar de ideia, apenas para o caso de um depender do outro.

Ela fez outro giro, numa produção como se fosse uma modelo no final de uma passarela. Ele era um homem alto acostumado a elevar-se sobre as mulheres, mas Viola era um cotoquinho de 1,50m e ele a diminuía a anã.

Sienna, por outro lado, era da altura certa. Em pé, de joelhos ou deitada, alcançava todas as melhores partes dela, sem problema.

—Sei tudo que há para saber sobre os Senhores do Submundo, — disse Viola. —Fiz da sua horda inteira meu negócio quando escapei do Tártaro e descobri que eram responsáveis pela minha condição.

Ela o culpava pelo demônio que carregava, então. E cheirava a rosas, percebeu com choque, o perfume suave de repente se agarrando aos seus seios nasais, quase o afogando num ingênuo senso de paz.

Lucien, o guardião do demônio da morte, podia fazer a mesma coisa aos seus inimigos, acalmando-os pouco antes de desferir um golpe final.

A fúria e frustração de Paris rapidamente afastaram essa tranquilidade. —Pare com isso.

—Uau, isso é uma sombria cara feia. E não fica muito bem em você, devo dizer, — acrescentou ela em seguida, um vislumbre de suas unhas pintadas de coral ao estudá-las à luz. —Tão bonito.

Toque-a.

Ele sintonizou com seu demônio e decidiu que daria a coisa de charme/otário mais uma chance. Porque, honestamente? Tinha que intimidar essa mulher de qualquer forma. Se esta próxima tentativa falhasse, soltaria sua besta em plena força e não estava falando sobre sexo. Havia escuridão dentro dele agora — tanta escuridão — e essa escuridão o levaria a fazer o que fosse necessário, não importa o quão vil.

Não tinha ninguém a culpar exceto a si mesmo, por que havia se aberto para ela. Apenas uma fração num primeiro momento, como uma rachadura numa janela. Mas o engraçado era que, uma vez que recebia uma brisa, não havia como parar o que vinha a seguir. Um vento, uma tempestade com trovões e relâmpagos, até que não conseguia mais alcançar a janela para fechá-la e realmente não queria de qualquer maneira. Assim era esta nova escuridão. Mal em sua forma mais pura, uma entidade muito parecida com sexo, o incitando.

Mentir, enganar, trair, Paris pensou. Aqui, agora, como todas as outras vezes antes.

Ele se inclinou, suavizando sua expressão, obrigando os desejos de seu demônio a se infiltrar através de seus poros. Forçando em seu sangue o calor e o cheiro almiscarado de excitação deslizando dele, tão sensual como champanhe, tão inebriante como chocolate. Se Sexo não usasse os feromônios, Paris o faria. Odiava fazer isso, porque, como todo mundo, tanto ele como Sexo se tornavam irracionais, seres famintos de carne ao primeiro sopro. Pior ainda, as lembranças do que forçava as pessoas a fazer... a desejar...

—Viola, doçura. Converse comigo. Diga-me o que quero saber. — Seu tom era uma carícia sensual, feliz e seguro, e, no entanto mesmo com os feromônios que afetavam Paris, queria apenas uma mulher e não era Viola.

—Queria agradecer a você pelo meu demônio, — ela continuou, como se nunca tivesse falado. Como se no momento não cheirasse a prazer andante. —Ele é o melhor! Mas, então, a meio caminho de Budapeste para rastrear sua fortaleza, esqueci tudo sobre você. Tenho certeza que entende. — Ela afofou seu cabelo, olhando longe dele, enquanto acenava para alguém à sua direita. —Então, de qualquer maneira, agora que está aqui, obrigado. Sinta-se livre para transmitir isso aos outros. Agora vai ter que — Argh! Quem colocou um espelho lá? — Ela terminou num grito.

Raiva não diluída brilhou em sua expressão num simples piscar de olhos, seguido pelo êxtase arrebatador quando estudou seu reflexo.

—Olhe para mim. — Ela posou, se posicionou em seguida em outro ângulo e posou novamente. —Sou linda.

—Viola. — Segundos se passaram, mas ela nunca deixou de se admirar. Ainda soprou um beijo. Bem. Fariam isso de outra maneira. —Posso fazê-la implorar pelo meu toque, Viola. Na frente de todos. E acredite, vai implorar. Vai chorar, mas o alívio nunca será seu. Vou me certificar disso. Mas sabe o que mais? Isso não é nem mesmo o pior do que vou fazer com você.

Alguns segundos se passaram, mas ela nunca ofereceu uma resposta.

Fúria...

Frustração...

Escuridão... subindo... Ele queria atacar, ferir, matar.

Ele inalou, segurou, segurou... cheirou uma infusão de rosas... soltou o fôlego. Certo. Bom. Desta vez foi capaz de permitir que ambas as bombas de emoção fracassassem antes da detonação, o acalmando.

Talvez Viola não pudesse evitar, percebeu de repente. Como sabia muito bem, todos os demônios de Pandora vinham com uma grande falha. Essa poderia ser a dela. Era Narcisismo, afinal, uma amante de si mesma.

Testando sua teoria entrou na frente dela, bloqueando sua visão do espelho. Seu corpo todo enrijeceu. Seu olhar correu para a esquerda e direita, como se procurasse intrusos que pudessem tentar prejudicá-la, enquanto ficava incapacitada. Ninguém se aproximou, e a tensão saiu dela. Respirou mais fácil.

—Vou estripar o culpado! — Ela sussurrou ferozmente.

Bingo. Sua falha, e uma que claramente a insultava.

—Concentre-se em mim, Viola. — Ele a agarrou pelos ombros, apertando mais duro do que pretendia e sacudindo-a até que aqueles olhos canela subiram para encontrar os dele. —Diga-me o que quero saber e sairá disto ilesa.

Ainda nem um pouco intimidada, ela deu de ombros se soltando. —Tão impaciente. Deveria estar acostumada com isso agora, mas, infelizmente não. Homens caindo em cima de mim... ainda é um fardo.

—Viola!

—Ótimo. Vamos ver o que meus seguidores têm a dizer mais cedo ou mais tarde, certo? — Ela levantou o telefone e leu a tela. —485 votos para Ajudá-lo dando-lhe meu número. 207 votos para Você é estúpida escale-o como uma montanha, e 123 votos para Ele é meu, cadela, se mande. — Ela olhou para ele, outro sorriso criando raízes. —As pessoinhas falaram. Sim, vou falar sobre as almas.

A urgência cancelou seu alívio. —Diga-me, então. Agora.

—Ei, você. Demônio escória. — A voz rouca soou atrás dele.

E um dos caras que Paris colidiu antes finalmente estava agindo. Paris rangeu os molares. Suas mãos voltaram aos ombros da fêmea. —Viola. Diga-me. — Ela diria a ele, e ele iria embora, finalmente começando sua busca de verdade.

—Tire as mãos da minha mulher!

Ou não. Agressão desencadeada pingava do tom do macho, e a necessidade de violência ressurgiu rapidamente dentro de Paris.

Contenha-se, o bom senso aconselhava. A vitória está ao nosso alcance. —Amigo seu?

—Não tenho amigos. — Dedos graciosos se estenderam e prenderam vários fios de cabelo atrás da orelha. —Somente admiradores.

—Estou falando com você, demônio. — O macho novamente.

Crescente necessidade... mais e mais... uma nuvem espessa e negra que não se dissiparia até que o sangue corresse em rios aos seus pés. —Se quer que este admirador sobreviva, tire-nos daqui. — Estalar de um local a outro com apenas um pensamento sempre o deixava doente, mas doente era melhor que distraído.

—Eu não, — disse ela. —Quero que ele sobreviva, é isso.

—Está me ouvindo, demônio? — O tom era mais duro, e muito mais determinado. —Se afaste dela e me encare. Ou é um covarde?

Uma nuvem envolveu sua mente, um único pensamento de repente o consumindo. O macho era um obstáculo em seu caminho, o impedindo de alcançar Sienna, e os obstáculos deviam ser eliminados. Sempre.

Outra vozinha da razão sussurrou através dele, um farol de ouro em meio a uma infindável meia-noite. Zacharel... caminho atual... Destruição...

—Olhe para si mesmo no espelho, deusa, — o homem ordenou. —Não quero que veja o que farei ao demônio.

Mesmo quando uma maldição saiu de sua boca, Viola obedeceu, contornando Paris como se não pudesse evitar e se odiando por isso. Mas então foi novamente arrebatada por sua própria imagem, o dedo mindinho acenando e mandando beijos.

O sussurro de ouro foi destruído. A morte tornou-se inevitável. Paris girou sobre os calcanhares para encarar seu adversário.

Logo, o sangue fluiria.

 

PARIS ERROU NUM FATO. Não tinha um adversário. Tinha adversários. Saber disso provocou uma onda emocionante de ânsia o inundando. O dia só estava ficando melhor. Antes havia matado um punhado de Caçadores, e a seleção da hora conhecida como sobremesa era um trio de anjos caídos, cada um maior que o anterior. Estavam sem camisa — era a nova moda? —as costas cicatrizadas visíveis no espelho no topo da parede.

O espumante trio formava uma parede sólida de músculos do outro lado do bar, os braços cruzados sobre o peito, as pernas separadas para distribuírem de forma igual seu peso. Uma clássica postura de vou-machucar-alguém.

Eu os quero, Sexo disse, como se isso fosse alguma grande surpresa.

—Não vão sair, — ele advertiu os homens. Ultimamente, não podia se dar ao luxo de deixar sobreviventes. Tinham o péssimo hábito de voltar por vingança.

—Vi você por aí, — o da esquerda disse. —Sorri e as mulheres caem aos seus pés, mas vou mudar isso quando arrancar sua espinha pela sua boca. Então vou dizer aos seus inimigos onde está. Sim, sei quem é Senhor do Sexo. Conheço também Caçadores que querem o privilégio de te matar.

O da direita abriu um sorriso de perdi-minhas-asas-mas-estou-feliz. —Sim. Gosto dessa ideia. Talvez me junte a eles, só para ver o que fazem a você quando terminar, seu sujo...

O do meio, o maior deles, colocou a mão no ombro do Direitinha para silenciá-lo. Tinha um halo branco brilhante tatuado em seu pescoço. Isso podia significar que caiu recentemente, que ainda tinha laços com os anjos ou que gostava de relembrar. O que quer que fosse. Enfrentaria o mesmo destino de seus amigos. —Menos palavras, mais dor.

—Sim, mais dor, — Paris concordou. Desembainhou suas duas adagas favoritas, as claras lâminas de cristal brilhando como arco-íris na luz.

—Ei, armas não são permitidas aqui dentro, — o garçom gritou. —Somente os punhos.

O bar inteiro parou e silenciou claramente na intenção de assistir.

—Sinta-se livre para tentar tirar a minha do meu punho. — Isso significaria mais adversários, mais derramamento de sangue. Mais satisfação.

—Vantagem injusta, — alguém gritou.

Exatamente. Se não estava enganando, não estava tentando. Mas, tudo bem. Mesmo perdido para o gosto decadente da violência como estava, Paris sabia como fingir jogar bonito. Comandou para que suas lâminas desaparecerem da vista, enquanto ainda permaneciam em suas mãos. Mágicas como eram, obedeceram.

—Não importam as armas que usa, — Halo disse.

—Não deveria ter vindo aqui. Esquerda desdobrou seus braços. —Este é nosso território, e o estamos tomando de volta.

—Agora, vamos ter certeza que nunca mais voltar. — Direitinha fechou suas mãos, estalando os dedos. —Isso será divertido.

—Diversão. Sim. Para mim. — Paris se aproximava.

O trio se aproximou.

Todos os quatro se reuniram no meio. No momento que Paris estava ao alcance, chutou Esquerdinha enquanto perfurava Direitinha. Esquerdinha se curvou, ofegante. Direitinha morreu. Paris o perfurou com sua lâmina invisível, afundando até o cabo profundamente na carótida do bastardo.

Um abaixo. Faltam dois.

Halo balançou um punho carnudo, mas a linha baixa e reta que Paris fez com seu corpo fez com que o ex-atacante encontrasse apenas ar, o impulso girando ao redor dele. No momento que Paris ficou de pé, Esquerdinha se recuperou e pulou em cima dele, tentando arrancar sua traqueia com garras que não estavam lá há pouco. Através de sorte ou talento, Esquerdinha conseguiu dobrar seu pulso quando percebeu que Paris estava mudando de posição, atingindo o tendão que descia pelo pescoço em seu lugar. Houve um brutal rasgo antes que Paris o empurrasse, o sacana levando pedaços de pele e músculo com ele.

Paris não o liberou, no entanto. Segurou firme, mesmo quando Halo voltou ao jogo e bateu em seu rosto. Ele esfaqueou Esquerdinha com um soco rápido, espetando. Os rins primeiro, para chocar e desativar. Segundo o coração, para matar. Esquerdinha morreu como o seu amigo.

Dois abaixo. Falta um.

Paris jogou o corpo agora sem vida, ouviu o baque quando caiu. Sorriu. Todo o tempo, Halo continuava socando sobre ele. Crack, crack. Dor nos olhos, dor no lábio. Sangue descendo pelo queixo, estrelas piscando através de sua visão, e Sexo recuado para um canto escondido em sua mente. Cada novo ponto de contato o jogava atrás em mesas, derrubando copos, cadeiras e pessoas.

Finalmente conseguiu se esquivar de um desses punhos. Recuperou o equilíbrio e girou baixo, com intenção de atingir Halo por trás do joelho e derrubá-lo. Mas o ser uma vez celestial usava truques sujos de demônio e girou bem, correndo para fora do caminho antes do contato.

No comprimento de um braço de distância um do outro agora, se ajeitaram e se encararam. Paris ainda tinha que atingir um único golpe no homem. Queria acertar um golpe. Teria que conseguir um golpe. Então, quando Halo estivesse imobilizado, Paris o cortaria do umbigo ao pescoço.

Pelo canto do olho, pegou um brilho de alabastro, uma onda de ouro derretido entre as penas de um guerreiro angelical, e a neve que se tornava a mais próxima companheira de Zacharel.

O homem deseja a mulher dele como você deseja a sua. Vai puni-lo por isso?

As palavras deslizaram pela mente de Paris, os raios de luz perfumados com esperança. Para sua surpresa, a escuridão diluiu e pensou: Não, não quero punir um homem por ir atrás da mulher que deseja. Mesmo se sou o obstáculo que enfrenta.

—Provavelmente vou me arrepender disso, — Paris disse, segurando a lâmina invisível no punho apertado, apenas para o caso, — mas estou disposto a deixá-lo ir. Esta é uma única oferta. Saia e viva. É isso aí. Nenhuma negociação.

Halo fez uma careta, seu queixo se ergueu, o olhar escuro se estreitando. Seja qual fosse o nome dele, não havia como negar seu apelo punk. Seu cabelo estava tingido de rosa como o telefone e cílios de Viola. Lágrimas de sangue tatuadas nos cantos dos olhos. Um anel de aço saía do centro do seu lábio inferior. —Não vou embora. Ela é minha, e não vou permitir que a tenha para usar e descartar quando terminar com ela.

Sempre voltamos a tudo isso, Paris pensou enojado consigo mesmo e com a necessidade de seu demônio por sexo. Mas o cara disse a única coisa que garantia desistir de sua ostentação de não-negociação, então tentaria um caminho diferente. —Viola quer você em troca?

Um silvo de fúria. —Ela vai querer.

O mesmo que Paris havia pensado uma vez sobre Sienna. Ainda pensava, se fosse honesto. Esperava que houvesse algo que pudesse fazer ou dizer que a fizesse mudar de ideia sobre ele e se aproximar, do jeito que ele queria.

Será que o anjo caído tinha uma chance de sucesso? Ele próprio tinha? As mulheres eram as criaturas mais resistentes já criadas.

—Só para saber, não quero Viola. — Ele deu um passo para a esquerda, novamente e novamente até que estavam circulando entre si, cada segundo trazendo Paris de volta ao homem que costumava ser: honesto, preocupado, valente. Isso não duraria, sabia, mas fugiria enquanto pudesse.

—Está mentindo! —As narinas de Halo se dilataram pela força de sua inalação. —Eu, que nunca antes ansiei por uma mulher, não pude resistir a ela. Todo mundo a quer.

—Mais uma vez, não eu. Estou aqui por informação que vai me ajudar a salvar minha mulher. Só isso.

Uma pausa pesada quando Halo abriu e fechou seus dedos, debatendo a verdade da afirmação de Paris.

Círculo, círculo. —Apenas informação, — reiterou Paris. —Juro.

—Não. — Ele deu um aceno brusco com sua cabeça rosa, sua teimosia rivalizando com a de uma fêmea. —Não acredito em você. Carrega a natureza do mal de um demônio. Não será capaz de evitar. Vai cobiçar e tirar proveito dela. Da cama dela.

Não, ele não o faria. Estava muito perto de Sienna, e esperaria por ela, enquanto pudesse e sobrevivesse. Bem. Então, talvez a verdade fosse que podia. Sobreviver o obrigava a fazer coisas terríveis. Talvez devesse salientar que Viola carregava um demônio também. Mas Halo já tinha passado do ponto de pensar logicamente.

Paris suspirou, a escuridão subindo novamente. —Vamos terminar isso, então.

Paris...

—Não! — Ele gritou, bloqueando a voz de Zacharel em sua cabeça. —Tentei do seu jeito. Não funcionou.

Ele e Halo pularam um no outro, se encontrando no meio. Tal como antes, aqueles punhos carnudos martelaram Paris. Enquanto sentia as pancadas como cascos de demônio em seu rosto, a parte do meio de Halo ficou escancarada. Mas ao invés de acertar as facadas mortais como Paris fez com os outros — parte da luz de Zacharel deve ter ficado em torno dele afinal de contas —varreu seu braço por baixo e cortou a coxa de Halo, mal cortando sua femoral.

Ainda assim, o espancamento continuou a chover, o Caído sequer registrando o fato que sangraria se não parasse e se costurasse. Braços balançando, pernas chutando, caíram numa mesa, caíram no chão, rolaram. Cacos de vidro cortaram os braços de Paris, as costas. Conseguiu vários golpes lancinantes, acidentalmente cortando com suas lâminas, até que finalmente enviou Halo tropeçando para trás, fora da faixa.

Halo ficou de pé, ofegante quando se adiantou uma vez, duas vezes. Então parou e franziu a testa com confusão. Finalmente seus joelhos cederam. Caiu como uma pedra no oceano. Sua pele uma vez bronzeada empalideceu para um giz branco não-natural, suas tatuagens escurecendo. Seus olhos ficaram subitamente febris e brilhantes.

Anjos caídos não se curavam como imortais. Curavam-se como humanos: lentamente. Ou não.

—Você... você...

—Ganhei. — Feito, feito e feito. Todos os três derrubados. —Consiga alguma ajuda, e deve se recuperar muito bem.

—Mas você... — Incredulidade banhava as feições do punk Halo. —Ganhou trapaceando. Foi uma lâmina que senti. Várias vezes!

—Odeio decepcioná-lo, garotão, mas trapaça acontece muito. Pode querer experimentar por si mesmo. Além disso, disse que não se importava com as armas que eu usasse.

Lá estavam murmurando atrás dele.

Paris levantou os braços e girou em câmera lenta. A multidão ainda não tinha se dispersado, mais preocupada em recolher as apostas que escapar do aviso. —Quem é o próximo? — Sangue escorria de seus punhais ainda invisíveis, se juntando no chão.

De repente, todos tinham outro lugar para ir. O mar de rostos se separou, dando-lhe uma visão direta de Zacharel. O anjo tinha os braços cruzados sobre a vasta extensão do seu peito. Sua expressão era incomodada.

—Ainda aqui? — Paris arqueou uma sobrancelha em desafio. —Quer um pedaço meu também?

Com o cenho franzido, em silêncio, Zacharel desapareceu.

Sério. Por que o interesse?

Será que isso importava? Urgência golpeou através dele, e Paris pisou forte até Viola, que ainda se estudava no espelho. Ele embainhou suas armas e a puxou em direção à porta. —Vamos.

Era definitivamente hora de ir. Um, não queria arriscar qualquer outra pessoa a tomar a decisão de lutar com ele. Dois, vê-lo conversando com ela podia ser mais do que Halo podia lidar. E três, ela podia ter mudado de ideia sobre dizer o que queria saber. Precisava de contato físico.

Halo olhou para ela com saudade em seus olhos — um pouco antes da porta se fechar atrás para Paris, com ódio. Sim. O cara voltaria para a vingança. Devia tê-lo matado. Ainda podia. Mas Paris optou por não retornar para terminar o trabalho. Se Zacharel reaparecesse e começasse uma discussão, seu plano estaria ferrado.

—Ei, — disse Viola, finalmente saindo de seu transe. Ela puxou para se soltar. Um vento frio soprou passando por eles, acariciando o seu longo cabelo sedoso ao longo de seu braço. —O que acha que está fazendo?

Eu a quero, Sexo disse, olhando das sombras de sua mente.

Estamos numa missão aqui. —Vou levar você para a segurança, — ele mentiu. —Não quer que seus admiradores em bando sobre você, não é?

Ela puxou mais duro. —Claro que sim. Aqui está uma lição sobre as mulheres. Nós gostamos de ser admiradas de longe, e, em seguida, cumprimentadas de perto.

Ele seriamente não precisava de lições. —Quis dizer que seus admiradores não estavam rendendo a homenagem adequada. Não merecem sua exaltada presença.

E você não sabia disso. Sua resistência acabou ali. —Marcou um excelente ponto.

Claro, ela perdeu seu sarcasmo.

Ele chegou a um beco abandonado e parou. Perfeito. A lua estava tão perto que só precisava estender a mão para traçar os macios contornos amarelo-alaranjados. Nuvens mais perto ainda, o envolvendo numa névoa fina de orvalho perfumado. Embora a área fosse bem iluminada, ninguém passando veria o que acontecia dentro do espaço estreito.

Ele se virou para Viola, pressionando-a contra os tijolos de ouro maciço do prédio, invadindo seu espaço pessoal para ganhar sua atenção. Exceto que sua atenção já estava em seu telefone, os dedos voando sobre o teclado.

Eu a quero, eu a quero, eu a quero!

Espero que você apodreça e morra.

—“Senhor do Sexo está mais sangrento que antes e... eca... inchado. Meus olhos não se divertem”. Enviar.

Ele pegou seu telefone e, ao invés de quebrá-lo como seu instinto exigia, o retornou ao interior de sua bota. —Pode Screechar sobre isso mais tarde. Por agora, vai falar comigo. O que posso fazer para ver os mortos? Lembre-se, seus seguidores insistiram que me dissesse.

Os lábios exuberantes fizeram beicinho, mas ela disse, — Queime o corpo da alma que deseja ver e guarde as cinzas. Falando nisso, tenho que contar a você como uma vez guardei as cinzas de uma...

Mais e mais ela zumbia sobre o que fez, então, sobre si mesma, sua vida, e Paris já não a ouvia, uma cortina de esperança se formando em torno de sua mente. Ele já tinha queimado o corpo de Sienna e guardado as cinzas. Na época, não sabia por que havia feito isso, só sabia que não podia perder o que restava dela. E desde então, havia secretamente carregado um pequeno frasco dessas cinzas no bolso.

De alguma forma, devia ter suspeitado que iria precisar delas.

Quando Viola finalmente se acalmou, ele disse: — Há mais para ver uma alma do que guardar as cinzas. — Tinha que haver. Há poucas semanas, Sienna havia escapado de Cronus, caçado Paris, mas Paris não a havia visto.

Nunca saberia sobre sua chegada se William – O Sempre Lascivo outro ser que podia conviver com a morte, não estivesse com ele e casualmente mencionasse a garota morta aos seus pés. Claro, Cronus rapidamente a havia rastreado e arrastado de volta para sua prisão.

Um ato que o rei Titã pagaria.

—Duh, é claro que há. Misture as cinzas com ambrosia e tatue na borda de seus olhos, — disse Viola. —Vai vê-la, prometo. Se quiser tocá-la, tatue nas pontas de seus dedos. Se quiser ouvi-la, tatue a carne atrás de suas orelhas, blá, blá, blá. Lembro-me de uma época que eu...

Mais uma vez não a ouvia. Isso funcionaria, o faria. Tatuar a si mesmo com as cinzas dos mortos podia ser repugnante para a maioria das pessoas, mas Paris faria muito pior. —Vou sentir o cheiro dela? Prová-la? — Ele perguntou, interrompendo o monólogo de Viola.

—Só se tatuar o interior do seu nariz, lábios e a parte superior de sua língua. Uma vez, no Tártaro, e...

—Espere.

Basta! Eu não a quero, de repente Sexo saltou. Encontre alguém.

Bem, bem. Pela primeira vez estavam de acordo. —Existe alguma coisa que eu deveria saber? Consequências que deveria estar ciente...

—Paris.

A voz familiar veio atrás dele. Paris se virou rápido, a náusea já se produzindo dentro de seu estômago. Sempre que Lucien o visitava, uma má notícia vinha rápida em seus calcanhares. —O que há de errado?

 

LUCIEN, GUARDIÃO DA MORTE, era alto e forte, uma presença poderosa, mesmo através da névoa que o envolvia. Como Viola, o guerreiro podia piscar de um local a outro com apenas um pensamento. Seu cabelo escuro era um espanador de emaranhados saindo em tufos. Seus olhos — um azul e outro marrom — estavam brilhantes de preocupação. Sujeira manchava as bochechas cheias de cicatrizes, e havia rasgos em sua camisa e calças amassadas.

—Desde que te disse para não voltar por mim até que eu mandasse uma mensagem de texto, não entendo porque está aqui. — Por hábito, Paris espalmou suas lâminas. —É melhor começar a falar.

O olhar de Lucien desviou para Viola. —Livre-se dela primeiro.

"Ela" no caso ajeitou a coluna com uma sacudida. —Oh, não, ele não vai fazer isso. Não sou alguém que um homem bonito pode simplesmente deixar de lado — oh, ei. Você é o homem de Anya. — A indignação a deixou, e acenou alegremente. —Olá! Sou Viola. Como se você não pudesse adivinhar. Minha reputação de grandiosidade me precede, e tenho certeza que Anya me mencionou inúmeras vezes.

Ela conhecia Anya, a deusa menor da Anarquia? Uma mulher que tinha mais bolas que muitos homens, porque as cortava fora de caras estúpidos o suficiente para entrar em seu caminho, e as mantinha como souvenires. Bem, é claro que Viola conhecia Anya. Poderiam ser "menores" em seus respectivos títulos, mas ambas eram grandes dores no traseiro.

As sobrancelhas escuras de Lucien baixaram. —Não, ela nunca...

—Para de falar sobre você, — Paris saiu correndo, parando seu amigo antes que insultasse a egomaníaca. Passou a mão ao longo da frente do pescoço, os dedos esticados como uma lâmina, o sinal universal para pare ou morra.

—Sim, — Lucien mentiu, franzindo a testa. —Ela a menciona o tempo todo.

Viola riu um tilintar de diversão. —Não há necessidade de afirmar o óbvio, querido menino. Como se não estivesse ciente de quantas vezes entro na conversa.

—Provavelmente devia Screechar que viu o homem de Anya, — disse Paris. —Talvez descrevê-lo. Publicar uma foto. Seja o que for.

Com expressão séria, ela disse — Não fale em foto. São reservadas para minha imagem, caso contrário, meus fãs ficam inquietos. Mas a outra coisa... certamente. Descrição é uma das muitas áreas que brilho, já que brilho em tudo. — Ela pegou o telefone e digitou a distância. —Cabelos índigo e olhos de cristal e chocolate, está diante de mim...

Paris encontrou o olhar confuso de Lucien. —Ela é a guardiã do Narcisismo, e só registra conversas sobre si mesma. — Claramente. —Pode falar livremente comigo.

Os olhos de Lucien se arregalaram, e estudou Viola de novo. —Outro hospedeiro? Como a encontrou... Por que não é...? Não importa. Não importa agora. — Seu foco voltou para Paris. —Estou aqui porque Kane sumiu.

A náusea voltou para queimar um caminho pelo peito de Paris, parando para jogar hockey com as amígdalas, na garganta. —Há quanto tempo?

—Apenas alguns dias. Ele e William estavam juntos. Alguém os capturou, levou ao inferno para executá-los. Talvez Caçadores, talvez não. Outro grupo atacou o primeiro. William diz que a caverna que estavam desabou e saiu antes que os homens pudessem fazer algo com ele. Quando acordou, estava num quarto de motel, em Budapeste. Sem Kane.

Paris passou a mão pelo rosto. —Kane ainda está... vivo? — Tinha dificuldade para falar a última palavra, muito menos pensar nisso. Se seu amigo estivesse morto, enquanto estava perseguindo sombras, nunca iria se perdoar.

—Sim. Está. Tem que estar.

Porque não podiam suportar a ideia de viver sem ele. —Montou uma equipe para procurá-lo?

—É por isso que estou aqui.

—Quem tem até agora?

—Amun, Aeron, Sabin e Gideon.

Lutadores desagradáveis, todos eles. Se Paris sumisse, gostaria que esses mesmos caras procurassem por ele. Sério, a única equipe capaz de conseguir melhores resultados seria Jason Voorhees, Freddy Krueger, Michael Myers e Hannibal Lecter[5].

Amun era o guardião de Segredos, e não havia maior guerreiro para se ter do seu lado. O homem era como um verme em seu cérebro, capaz de desmascarar em segundos, informações enterradas por anos. Na verdade, não havia nada que alguém pudesse esconder dele. Até a localização de Kane? Nenhuma chance.

Aeron era o ex-guardião da Ira. Recentemente foi decapitado e dado a um novo corpo, e foi aí que seu demônio se fundiu com Sienna. Mas mesmo sem sua metade mais escura, Aeron gostava de fazer sua presa gritar antes de se mover para matá-la. Qualquer pessoa que machucasse Kane pagaria. Repetidamente.

Sabin era o guardião da Dúvida, um guerreiro de força incomparável e determinação, e tinha um traço vicioso que fazia criminosos sujar as calças de medo. Entrava em sua cabeça, lembrava-se de suas fraquezas, e basicamente o transformava num saco babão de auto-recriminação, antes que barbaramente o assassinasse com um sorriso no rosto.

E Gideon, bem, era o guardião da Mentira. Tingia o cabelo de azul, era tatuado e perfurado, e tinha um senso de humor distorcido que poucos tinham. Seu novo jogo favorito envolvia soltar seu demônio de seu corpo e em seu inimigo, em seguida, sentar e assistir o humano destruir a si mesmo enquanto o mal o consumia.

Paris quase sentia pena de quem levou Kane.

Quase.

—Então, vem? — Lucien perguntou.

—Eu... — Odiava isso. Queria dizer sim. O fazia. Amava seus amigos. Mais que amava a si mesmo, ainda mais que Viola, provavelmente amava a si mesma. (Falando nisso, a maldita mulher ainda estava escrevendo, e por seus murmúrios, ia dizer ao mundo como o Senhor da Morte era muito mais atraente que a deusa da anarquia.) Seus amigos haviam lutado ao lado dele, sangrado por ele e sempre haviam coberto suas costas.

Fariam mais que levar uma bala por ele. Levariam uma vida — mesmo que a sua própria. Mas... —Não posso, — disse ele, fosse capaz de perdoar a si mesmo ou não. —Não neste momento. Há algo que tenho que fazer primeiro. — Sua determinação e a nuvem de escuridão, ainda rodavam dentro dele, o tomando. Chegou tão longe, não podia voltar atrás agora.

Lucien concordou sem hesitar. —Entendido. — Não houve tentativa de fazer Paris mudar de ideia, o fazendo se sentir culpado, o que significava que não havia nenhum amigo melhor. —Quer ajuda com sua missão? — Acrescentou, e caramba, se Paris não começava a se sentir culpado de qualquer maneira. —Se está a caminho de algo perigoso fico feliz em oferecer William como voluntário.

William, o melhor amigo de Anya e alguém que Lucien gostaria de ver esfaqueado pelas costas. E no coração. E na virilha. Willy não estava possuído por um demônio, mas de acordo com boatos era irmão de sangue do diabo, bem como relacionado com os Quatro Cavaleiros do Apocalipse.

Boato provavelmente certo. Nada intimidava William. Nada o incomodava. E a cereja em cima disso? Se Willy alguma vez abrisse a porta do armário e pulasse um bicho-papão, era o bicho-papão que teria medo.

—Traga-o para mim, — disse Paris. —Ele me deve. — William deixou Cronus levar Sienna sem luta. No que dizia respeito a Paris, o cara agora era seu escravo por toda vida.

—Feito. — O olhar de Lucien se deslocou para Viola, que ainda estava digitando. —E ela? Não podemos deixá-la por aí por conta própria. Cronus e os Caçadores sem dúvida gostariam de roubá-la.

Cronus odiava os Caçadores, e os Caçadores odiavam Cronus. Ambos os lados procuravam os que restavam possuídos pelo demônio, cada um na esperança de recrutar mais que o outro, e sequer coibiam em usar a força bruta para conseguir o que queriam. Paris gostava da ideia de piorar as coisas para as duas partes.

—Leve-a, — disse ele, colocando a mão no ombro de Viola, o que significava sacudi-la para ganhar sua atenção.

A ação, inocente como foi, a assustou e entre um batimento cardíaco e o próximo, ela passou de maravilhosamente angelical ao demônio dentro dela. Dois chifres se estenderam de seu couro cabeludo. Escamas vermelhas substituíram sua pele, e seus olhos brilharam como rubis radioativos. Afiadas presas mortais se projetavam sobre os lábios. Suas unhas cresceram em garras. O cheiro de enxofre dominou o perfume de rosas, uma névoa escarlate flutuando dela, ardendo de suas narinas, fazendo seu demônio gemer como um bebê recém-nascido.

Com um rugido de raiva ardente, afundou aquelas garras no pulso de Paris e o jogou com tanta força que ele se chocou contra o prédio ao lado, seus tijolos de ouro maciço rachando e explodindo filigranas no ar.

O oxigênio abandonou seus pulmões. Estrelas voltaram para sua linha de visão. Que. Inferno? Quando foi capaz de se concentrar claramente, viu que Viola era Viola novamente, requintada, loira e inocente.

—Oops. Foi mal. — Com uma risada tilintada, enfiou seu telefone em sua bota. —Tocar a mercadoria não é permitido. Nunca. Agora, precisa de mim para algo?

Lucien beliscou a ponte do nariz. —Isso vai ser divertido. Posso dizer.

—Se importa em ir com Lucien? — Paris perguntou enquanto se movia devagar para levantar. Cada novo fôlego raspava seus pulmões contra suas costelas. Pior, o ferimento em seu pescoço reabriu. Com um golpe, ela fez muito mais dano ao seu corpo que os três amigos dentro do bar. —Ele vai levá-la para Anya e vocês duas podem, uh, por o assunto em dia. — Ele havia pensado em forçá-la a ir. Agora? Imploraria se necessário.

—Sério? — Viola aplaudiu, girou e se jogou nos braços de Lucien. —Sim, sim, mil vezes sim! Vou com você, mas só se prometer parar e pegar meu animal de estimação, a princesa Fluffikans, no caminho. Um pequeno aviso, no entanto. Está prestes a cair loucamente apaixonado por mim, e Anya ficará completamente desolada.

Era muito mais provável que outro dos guerreiros — solteiro — caísse loucamente, apaixonadamente na cama com ela, mas agora não era o momento de apontar isso.

Lucien lutou contra seus braços como polvo, franziu a testa para Paris, e desapareceu com Viola tagarelando sobre sua grandiosidade incrível. Paris não se preocupou em ficar onde estava. Morte poderia seguir fácil a trilha espiritual que deixou para trás, e encontrá-lo em outro lugar.

Hora de fazer uma pequena tatuagem.

Os mundos mortais e imortais eram assustadoramente parecidos. Titania era uma próspera metrópole de centros comerciais e restaurantes, repleto de entretenimento de toda e qualquer espécie. Não demorou a Paris juntar o equipamento necessário para a tatuagem e um conjunto extra de roupas, e se estabelecer num dos motéis que foi divertido para ele descobrir que existia aqui. Aparentemente, até mesmo imortais gostavam de ter encontros amorosos secretos.

Enquanto esperava por Lucien, comeu porque era de praxe. Um sanduíche, e não tinha ideia do que estava preso entre o pão. Masturbou-se porque era necessário para seu demônio. Não fez sexo hoje, e o orgasmo era como uma injeção de força. Força que não duraria, não como a adrenalina que acompanhava a relação sexual, mas fazer o que. Pegaria o que pudesse.

Tomou banho, limpou o sangue e as muitas outras coisas agarradas à sua pele. Um monte de pessoas havia morrido sob sua lâmina hoje. Caçadores, seus inimigos. A maioria macho. Mais e mais, estavam recrutando mulheres. Paris se perguntou o que aconteceria se conhecesse Sienna no campo de batalha, ou se tentasse interrogá-la então.

Se ela houvesse vivido o suficiente, isso era o que ele havia planejado fazer com ela. Depois de haver se deitado com ela novamente. Tê-la-ia machucado? Gostava de pensar que não, mas... maldição. Não podia ter certeza. Ela sabia coisas que não deveria. Onde ele estava, porque estava lá. Como distraí-lo, que droga usar nele, que toxinas humanas afetavam um imortal. Agora sabia que ela conseguiu a informação de Rhea, mulher de Cronus e a verdadeira líder dos Caçadores. Não diretamente, não achava, mas filtrada através das fileiras. Mas mesmo se não houvesse sabido, não teria se preocupado em questioná-la desta vez. Só queria a ela.

Segura, certo? Só a quer segura? Um esgar de Sexo.

O que quer que fosse. Paris se secou e olhou atento no espelho enevoado pelo vapor. Havia perdido um pouco de peso, tinha hematomas em seus olhos, alguns arranhões nas bochechas e no pescoço. Seu cabelo não era exatamente o mesmo. Ele mesmo cortou os fios, apenas cortando cada vez que uma parte caía em seus olhos. O que Sienna pensaria dele agora? Apesar de tudo, esteve atraída por ele antes. Será que ainda se sentiria atraída? Agora, podia ser um pouco selvagem para qualquer mulher. Muito homem-da-montanha sobrevivente encontrando com estresse pós-traumático.

Mas e se o impossível acontecesse e ela, de fato, o quisesse de novo? Realmente, sem planos ocultos. E se ela simplesmente ansiasse seu corpo dentro dela? Afinal, havia lutado para sair da prisão de Cronus e vir procurar por ele.

Baixar a guarda poderia ser estúpido. Não podia confiar nela. Não de verdade. Poderia tomá-la, sim, isto ainda estava no menu. Se ainda pudesse ficar duro por ela, enquanto estivesse ao seu redor. Só o tempo diria. E se pudesse, e achava que podia, considerando que ficava duro apenas ao pensar nela, talvez pudesse até ficar com ela uns poucos dias. Se assim fosse, sua fome por ela, finalmente, diminuiria? Ou será que continuaria a se intensificar? Seria capaz de deixá-la ir quando chegasse a hora?

E se ela quisesse ficar com ele?

Ele ansiava por isso. Ansiava muito por isso. Mas, como Zacharel havia dito, Paris a arruinaria se a mantivesse. Não pelas razões que o anjo havia dado, mas porque se ele e Sienna fossem de alguma forma separados e não conseguisse chegar até ela, iria traí-la. Ele o faria. Sua outra opção seria a morte, e na escala da vida versus morte, trair — sobreviver — ganhava a cada vez.

Sabia, em primeira mão, que certa vez havia tentado manter um relacionamento com uma mulher. Susan. Ele a havia tido, sabia que não podia tê-la novamente, mas ansiava por algo mais e tirava o prazer dela de outras formas. Ele realmente gostava dela, desfrutava de sua companhia — mas por fim a havia traído, magoando-a como nunca ninguém havia feito.

E aqui estava outro tapa da verdade: se traísse Sienna, destruiria tudo que havia conseguido construir, bem como seu coração, seu senso de confiança e qualquer indício de inocência. Seria digno de toda ação obscura que ela cometesse depois contra ele — e ainda assim a queria.

A situação estava tão confusa.

Carrancudo, bateu com o punho no espelho. Pedaços partidos de vidro caíram, quebrando ainda mais quando atingiram o chão, em torno de suas armas descartadas e brilhando como diamantes num mar de destruição. O sangue escorria de seus dedos quando espalmou e embainhou as lâminas em seus pulsos e tornozelos e as armas no coldre sob seus braços. Nesse ritmo, logo estaria esculpindo em si mesmo como Reyes, o guardião da Dor. Qualquer coisa pela liberação, por um momento que não tivesse que saber ou se preocupar com nada, exceto seus ferimentos.

Qualquer coisa. Havia se acostumado a pensar e se preocupar. Eram seus companheiros constantes agora, e sem eles, estaria totalmente sozinho. Paris se vestiu com as roupas novas que havia comprado, uma camisa preta e calças pretas. Onde estava indo, a noite reinava não importava a hora do dia. Precisava se integrar.

Não muito tempo atrás, havia conseguido entrar em segredo no harém de Cronus e seduzido uma das concubinas, trocando sexo por informações. Paris já sabia que Sienna estava sendo mantida no Reino de Sangue e Sombras, parte de Titania, mas... não. O reino era um reino dentro deste reino celestial, invisível para a maioria e protegido pelo mal. Entrar era morrer, blá, blá, blá.

Paris podia encontrar o reino por conta própria, sem problema. Era muito bom em subornar seu caminho através dos céus, mesmo nas áreas escondidas. Penteando o cabelo molhado com os dedos, se dirigiu à mesa na sala de estar/quarto. Sentou e espalhou seu novo equipamento de tatuagem. Parte dele desejava estar lá fora, matando Caçadores ou já abrindo caminho para o Reino de Sangue e Sombras. Estes atrasos eram uma droga.

Para seu imenso alívio, Lucien o encontrou um pouco mais tarde, aparecendo no centro da sala. —Me senti mal por ser inflexível sobre Willy, por isso trouxe um prêmio.

Morte empurrou o encharcado e protestante William na direção de Paris, depois acenou para Zacharel, que estava do seu outro lado. O "prêmio", como se fosse algo saído de uma caixa de Jack Cracker[6].

—Na verdade, — Zacharel disse com aquela sua voz fria. —Eu trouxe a mim mesmo. Lucien estava caçando você, e eu poupei tempo e trabalho.

Paris bateu o queixo. —Toneladas de obrigados, — disse ele a Lucien, ignorando o anjo. —De verdade...

William, William meu doce! Eu o quero, Sexo disse, praticamente pulverizando baba pela mente de Paris. Sexo sempre quis um pedaço do cara. Não que Paris admitisse em voz alta. Nem que alguma vez fosse.

—Fico tão triste por não poder ficar, — disse Lucien com pena simulada. —A propósito, o bichinho de Viola, a Princesa Fluffycakes ou qualquer outra coisa, é um demônio da Tasmânia e um vampiro. Tem sorte por eu ir embora sem cortar sua garganta. — Mais uma vez, o guerreiro desapareceu.

Enquanto pequenos flocos de neve giravam em torno dele, Zacharel olhou para a sala com desgosto. —O que está fazendo aqui?

—Sério cara, é uma lixeira, — acrescentou William. —Quando estou no céu, só fico no Godlywood Ocidente. Podemos, pelo menos, pedir uma suíte?

Não, não ia jogar nenhuma versão de Perguntas-e-Respostas com eles. Eles jogariam o jogo de Paris. —Por que sempre está nevando em torno de você ultimamente? — Ele exigiu de Zach.

—Há uma razão.

Nada útil em qualquer nível. —A compartilhará?

—Não.

—Está me seguindo?

—Sim.

Pelo menos não tentou negar. Não que pudesse. Anjos falavam a verdade, e sempre apenas a verdade, o que tornava a ameaça anterior de Zacharel de matá-lo ainda mais real. —Por quê?

—Você ainda não está pronto para ouvir a resposta.

Paris amava esse tipo de porcaria enigmática, realmente o fazia. —Se vai ficar por aqui, seja útil e tatue o resto de mim. — Para as linhas ao redor dos olhos, precisava de uma mão firme. —Então pode me ajudar a dar porrada e não se preocupar com os nomes.

Zacharel o encarou com uma carranca tão feroz quanto à enxurrada de flocos de neve caindo pelas extremidades das asas. —Nunca tatuei ninguém antes. Corro o risco de estragar você.

E, no entanto, ainda faria um trabalho melhor que William, sem dúvida. —O pior que podemos fazer é arrancar meus olhos, mas isto não é uma preocupação, uma vez que voltarão a crescer. Eventualmente.

A carranca se aprofundou, por um minuto tiquetaqueando. —Muito bem. Vou fazer isso por você.

—Sim, seja um menino anjo útil. Enquanto isso estarei no banheiro. — O cabelo de William colorido de negro estava molhado e colado ao seu rosto. Havia uma toalha branca e macia enrolada na cintura, exibindo os músculos que rivalizavam com os do próprio Paris, e um mapa do tesouro tatuado que levava a sua porcaria masculina. Olhando para ele, podia ver o resultado de um temperamento selvagem que qualquer pessoa que sobrevivesse milagrosamente a um encontro com ele acabaria precisando de terapia. E fraldas. —Tenho que terminar de condicionar meu cabelo.

Ou talvez não tão selvagem.

Não importava. Paris nunca esteve mais perto de encontrar e salvar Sienna. Com estes dois guerreiros ao seu lado, teria sucesso. Garantido.

 

SIENNA BLACKSTONE, recém-coroada Rainha das Bestas, Princesa de Sangue e Sombras, e duquesa do Horror, estava com as costas pressionadas contra a parede de pedra em ruínas do castelo que involuntariamente chamava de lar. Suas asas eram pesadas, sempre puxando os tendões e ossos recém-formados provocando dor, encolhimento, e humilhantemente o suficiente, às vezes choro.

As asas arqueavam sobre seus ombros e caíam abaixo por seus lados numa cascata meia-noite, suas pontas pontiagudas agora atingindo o chão. Lembrou ter visto estas próprias asas em Aeron, o anfitrião anterior do demônio da Ira. Em seu corpo musculoso e sombriamente tatuado, pareciam macias, finas, leves e bonitas como nuvens de tempestade. Em sua estrutura leve, a dominavam e sobrecarregavam e dificultavam encontrar o equilíbrio.

Infelizmente, esse não era o pior de seus problemas. Cronus, deus dos deuses (segundo ele) e um Bundão (segundo ela) andava em frente a ela, reclamando e delirando. Dizer que estava "chateado" seria o equivalente a dizer que o Atlântico era uma poça de chuva.

Quando o conheceu, parecia um velho excêntrico, com o cabelo grisalho, pele enrugada e ombros curvados. Agora era um impecável GQ[7] e um bárbaro duro. O cabelo castanho escuro caía nos ombros fortes e largos. A pele de textura mais suave estava bronzeada no tom perfeito de bronze. Também abandonou sua luxuosa toga em favor de uma camisa de malha preta e calça de couro preta.

A mudança era gigantesca — e assustadora. Queria perguntar por que escolheu esse caminho, e em seguida, se oferecer para punir seu estilista gratuitamente. Será que se atreveria? Diabos, não. O reclamar e delirar se transformaria direto numa batida selvagem. Pelo menos, essa era a impressão que dava.

—Salvei você, — retrucou, com morte em seu timbre enquanto colocava um pé na frente do outro, indo e voltando, indo e voltando. —Te fortaleci. Presenteei com seu demônio. E como me paga? Constantemente se recusando a me obedecer. É inconcebível!

Presenteou? Sério? Se a nova definição de presenteada era amaldiçoada para sempre e sempre pela miséria e dor, então sim, ele o fez. —Obedeci, — o lembrou. No começo.

—No começo, — disse ele, repetindo seus pensamentos. Sua acusação amarrava como nítidos chicotes. —E só porque foi obrigada. Já aprendeu a me bloquear.

Verdade. E ela era testemunha da rigidez de ferro de seu núcleo teimoso. Com apenas um pensamento, este ofegante ser bufando podia tornar a dor sem fim. Com um aceno de sua mão, podia vaporizar cidades inteiras. Algo que ela faria bem em lembrar.

Sienna escolheu suas próximas palavras com cuidado. —Para ser justa, você me enganou. — Certo, talvez ela não houvesse escolhido com cuidado. Pelo menos seu tom era tão plano e sem acusação quanto possível.

Um movimento de estreitar seu olhar quase a fez dobrar os joelhos. —Como assim?

Ela apertou mais seu peso na parede. —Prometeu que eu veria minha irmã mais nova.

Parece tão bonita, Enna.

Sério?

Sério. É a garota mais bonita do mundo inteiro!

Skye, sua única irmã, uma menina que adorava com todo o seu coração, havia sido raptada anos atrás, para nunca mais ser vista ou ouvida de novo. Sienna sentia sua falta terrivelmente, rezava que estivesse saudável, inteira e que não sofresse crueldades incomparáveis.

—Mas apenas me provocava com um vislumbre dela, — acrescentou, esfregando a barriga como sempre fazia quando pensava em sua irmã, lembrando-se de outra menina, alguém que havia amado e perdido, o... Ela cortou o pensamento antes que pudesse se formar. Não vou quebrar na frente dessa criatura.

Cronus rangeu os dentes. —Essa visão... Deveria saber que voltaria para me assombrar. — Ele fez uma pausa, um grunhido baixo em sua garganta. —Acho que deveria finalmente admitir a verdade, então. Mostrei uma ilusão de sua irmã, nada mais.

Espere, espere, espere. Uma ilusão? Sienna mordeu a língua. Por que ele... Como podia...? Não importava a pergunta, a resposta era simples. Para brincar com ela como um piano, como Paris havia uma vez dito a respeito dela. Bastardo não era uma palavra vil o suficiente para esse monstro.

Calma, firme. —Será que ela ainda está viva? — Sienna soltou.

—Claro.

Não havia claro com Cronus. Vivia por seu próprio conjunto de regras, e nem sempre as respeitava.

Toda vez que aparecia diante dela, seu demônio mostrava as coisas desprezíveis que ele havia feito ao longo de sua vida. As vidas que havia tomado, derrubando não só seus inimigos, mas seu próprio povo, humanos, qualquer um que ousasse desafiá-lo. E havia roubado, oh, ele havia roubado. Artefatos antigos, poderes que pertenciam a outras pessoas, mulheres. Ele não tinha vergonha. Nem limites.

—Como sei que está dizendo a verdade agora?

—Não sabe. O demônio sabe.

Um momento suspenso enquanto procurava dentro de si. Ira estava calmo, não se agitava numa frenética necessidade de puni-lo por mentir. Esse vislumbre de Skye de fato havia sido uma ilusão, mas Cronus acreditava que ainda estava viva. Sienna rangeu os dentes, dizendo: — Traga-a para mim, a Skye real, e deixe-me ficar com ela, então vou fazer qualquer coisa que pedir.

—Não.

—Por quê? — Ela bateu o pé. Era infantil, com certeza, mas não tinha outra maneira de expressar seu descontentamento com este homem. —Você, supostamente onisciente, não sabe onde ela está?

Num piscar de olhos passou de um mero sussurro distante a franzir a testa para ela, sua respiração sobre ela. —Basta de sua irmã! Não está curiosa porque a presenteei com Ira? Você, uma mulher frágil, saudosa que virou uma das minhas mais fortes guerreiras? Não está curiosa sobre meu desejo de sua participação voluntária na minha guerra?

Não sugira que o rei do Titãs precisa de hortelã em seu hálito. Ela engoliu em seco. E não se atreva a pensar no guerreiro que chateou. Não se atreva a pensar em Paris. Oh, não, não, não. —S-sim. — E agora estava gaga? Cresça algumas bolas, senhora Blackstone!

Vermelho brilhou nos olhos de Cronus. Vermelho demônio. Um vermelho diabólico que a fez pensar em sangue misturado com toxinas nucleares. Não somente era o rei dos Titãs, mas também estava possuído pela Ganância e agora, seu demônio estava no controle, dirigindo suas ações, suas palavras. Em torno dela o castelo tremeu, sua raiva chocalhando seus alicerces.

—Conhece os Caçadores. Sabe como operam. Uma vez foi parte de sua causa.

—Eu sei. — Como se pudesse esquecer ou se absolver. Uma vez até teve o símbolo do infinito em seu pulso, sua marca. Um lembrete permanente de suas "metas". Nesta forma de espírito não tinha tatuagens, apenas a borboleta em torno de suas asas, e por isso, era imensamente grata. —O mesmo é verdade para milhares de outros.

Exceto que aqueles milhares de outros realmente não tinham ideia que eram loucos, ou que eram dispensáveis, nada mais que marionetes nas cordas. Como ela foi, até que recebeu uma bofetada de verdade e cortaram suas cordas com proficiência brutal.

Logo após a posse dela por Ira, Cronus a levou a um complexo dos Caçadores. Porque Cronus podia se proteger dos olhares indiscretos e os humanos não podiam vê-la, ninguém os notou. Assim como havia visto os pecados do rei brincando através de sua mente, viu as transgressões dos Caçadores. Roubos, estupros, assassinatos, tudo em nome do "bem". O que era uma parte (supostamente vital) da sua causa, uma vez que ela os ajudou...

Puni-los... Roubar, estupro, assassinato...

Lá estava ele. Ira. Seu companheiro sombrio. Lembrando-a do que havia visto, e estando a mundos de distância dos responsáveis, pedia a ela para buscar vingança contra os Caçadores. Sem mostrar nenhuma piedade, nenhum perdão, mesmo para os inocentes no meio deles, por todo o mal que causaram, por prejudicá-la muito mais do que feriram outros.

Punir...

Se encolhendo, tapou os ouvidos com as mãos. —Cale a boca, cale a boca, cale a boca, — cantava. Às vezes, podia resistir, às vezes não. Era quando ele a alcançava, e seu mundo se tornava negro. Por algum tempo, pelo menos.

Embora fosse amaldiçoada a ficar dentro desta monstruosidade deteriorada de castelo, de alguma forma Ira não estava. Quando estava no controle de sua mente, podiam sair. Ele poderia usar seu corpo para castigar outros sempre que desejasse.

Dias depois, acordava com sangue nas mãos e cobrindo sua pele. Claro, as memórias do que o demônio havia feito eram então um dilúvio dentro dela. Sádicas, coisas de embrulhar o estômago. E, no entanto, nada — nada!  — que a havia forçado a fazer era mais nojento do que os Caçadores estavam fazendo a humanos inocentes.

Humanos. Que estranho esse vernáculo novo era para ela. Uma vez foi um ser humano. Uma humana tola. Como poderia pensar que o objetivo dos Caçadores era a eliminação do mal?

Bem, certo, isso era fácil. Quando adolescente tinha visto um demônio vil em ação ou o que achava ter sido um demônio e a experiência a havia assustado, a convencido que esse mal era a razão de sua irmã ter sido levada. Combinado com o choque de descobrir que os humanos não estavam sozinhos, que havia todo um mundo de criaturas trabalhando em torno deles...

A coisa de outro mundo provou ser verdadeira, pelo menos. Mas o resto, o demônio que viu? Enquanto de fato eles existiam, ela não encontrou um naquela noite. O namorado Caçador dela a havia drogado, seu método preferido de recrutamento, criado a atmosfera perfeita para provocar medo, e seu cérebro alucinante preencheu o resto. Depois disso, ele havia alimentado seu medo com histórias sobre mal que podia combater e o bem que poderiam fazer, dizendo que ela até poderia ser capaz de encontrar e salvar sua irmã.

O que falhou em dizer a ela: os humanos tomavam suas próprias decisões, influenciados por demônios ou não. Decidiam abraçar o escuro ou correr para a luz.

Nem todos os Caçadores camuflavam sua maldade com justa determinação, ela sabia. Alguns eram realmente sinceros em seu desejo de livrar o mundo do mal, e não criariam seu próprio mal ao fazê-lo. Mas o fato que uma vez ter contribuído de boa vontade para uma causa tão deformada, bem, nunca superaria esse fato. Pior ainda, ela havia machucado Paris, um guerreiro que daria sua vida para proteger aos que amava.

Não havia como parar o próximo dilúvio de pensamentos, cada um girando em torno do homem que havia prejudicado além da reparação. Ela havia atingido Paris quando estava no seu estado mais fraco. Pior, teria ajudado em seu assassinato a sangue-frio, se ele não tivesse fugido com ela.

Durante essa fuga, ela foi atingida por um tiro e ainda o tinha culpado por isso, pensando que ele havia usado seu corpo para proteger o dele. Oh, como o havia desprezado. Agora, desprezava apenas a si mesma.

Não, não era exatamente verdade. Também odiava os Caçadores e tudo que representavam.

Cronus queria puni-los. Seu demônio queria puni-los. Ela queria puni-los. Mas Cronus se recusava simplesmente a libertá-la. Ao contrário, exigia que ela retornasse ao seu meio e espionasse Galen, o líder, bem como guardião da Esperança. Sim, um demônio era o segundo no comando dos matadores de demônios, e nenhum deles sabia disso. Pensavam que era um anjo.

—Dedicada como foi à causa dos Caçadores em vida, Galen vai acreditar que deseja reunir-se a ele depois de sua morte, — Cronus disse como se estivesse lendo seus pensamentos. Talvez estivesse. —Vai recebê-la de braços abertos.

—Não será capaz de me ver.

—Ele o fará. Deixe isso comigo.

—Não vai perguntar por que estou possuída pelo demônio? Como fui possuída pelo demônio?

—Ele sabe. Minha esposa, sua líder, disse a ele. Mas está muito confiante de seu apelo e força, e vai pensar que ele está te observando.

—Nesse caso, nunca me dirá nada.

—Não, vai alimentá-la com informações falsas, e a verdade poderá ser obtida a partir disso.

—E se me pedir para provar minha lealdade a ele?

—Ele o fará.

E seria obrigada a obedecer para continuar seu ardil. Será que ia pedir para ferir os guerreiros que agora desejava ajudar? A machucar humanos inocentes? Bem, a resposta para ambas era a mesma. Nunca!

Olhe para mim. Uma vez uma humana que não sabia sobre o sobrenatural, então uma Caçadora no meio de tudo isso, odiando os demônios que perseguia e agora sou um desses demônios e com esperança de ajudar os outros. —Desculpe, mas vou ter que ficar com minha primeira resposta.

Outro flash de vermelho riscou através dos olhos de Cronus, mais brilhante que antes. Se fosse inteligente, veria o vermelho como um semáforo para sua resistência.

Por que começar a agir como se fosse inteligente agora? —Isso é um grande não, caso tenha se esquecido, — ela disse com mais firmeza.

—Seu superior humano ordenou que dormisse com Paris, — ele rosnou, — e você o fez. Não tente ser moralista comigo.

Sim, mas sua atração por Paris foi imediata e avassaladora. Ela sonhava com ele.

Ansiava por ele, mesmo que acreditasse que seu demônio era o responsável por infidelidade, dissolução de casamentos, gravidez de adolescentes, estupros e a disseminação desenfreada de doenças sexualmente transmissíveis. Mesmo que Paris estivesse, e sempre estaria, à frente de um desfile interminável de amantes. Um fato levado para casa por um colega de trabalho que o seguiu por dias, tirando fotos de todas as mulheres que dormiu, e em seguida, mostrou as fotos a Sienna depois que ela o havia trazido. E ainda assim tinha tido que lutar contra uma onda de ciúme , uma emoção que nunca devia sentir na linha do dever.

Ela mencionou sua incompetência mental?

—Se ele pedir que mate por ele, o seduza na cama em vez disso, — Cronus disse. —Isso vai te poupar de fazer algo desagradável.

Certamente tinham definições diferentes para desagradável! —Você estaria melhor servido exigindo que trouxesse a cabeça de Galen numa caixa mágica com luz das estrelas enquanto cavalgo no dorso de um Pégasus através de um arco-íris, porque ele não vai me querer sexualmente. Nunca fui do tipo de atrair a atenção de um homem.

Ela sabia de sua aparência. Olhos castanhos grandes demais para seu rosto — comum. Lábios também grandes demais para seu rosto — pouco atraentes. Pele sardenta — fora de moda. E o cabelo castanho ondulado que não era nem liso nem encaracolado — comum pouco atraente e fora de moda.

Cronus permanecia determinado. —Está certa. Não é.

A verdade não poderia feri-la, disse a si mesma, enquanto feria.

—Mas, — continuou ele, —sua aparência não importa. Galen será atraído pelo seu poder demoníaco. Vai querer controlá-la, alimentá-la com todas as informações falsas, usá-la. Sim, quanto mais penso nisso, mais gosto. Vai dormir com ele.

Ela passou a língua sobre os dentes. —Matar Galen destruirá o coração e a alma dos Caçadores de forma mais eficaz que dar prazer a ele.

—Sim, mas morrer não é seu destino.

—Qual seu destino, então? O que, exatamente, acha que ele pode fazer por você?

Silêncio.

Inspiração profunda para dentro... para fora... —Certo, existem dois problemas com seu plano. Galen é um pretensioso, e sou péssima na cama. — Espere. Isso não havia saído direito. —Quero dizer, mesmo se apenas me quisesse pelo meu demoníaco poder... — Simplesmente dizer as palavras doía. —Ou porque acha que pode me alimentar com falsas informações, ou me controlar ou por qualquer outro motivo que você imagina, nunca voltará para uma segunda vez, porque ambos estaremos envergonhados por nossos desempenhos, e todo o plano será discutível.

A única razão pela qual havia chamado a atenção de Paris foi porque ele estava desesperado para transar — com qualquer uma! — a fim de sobreviver. —É mais provável Galen rir de mim que me contar seus segredos.

As sobrancelhas perfeitamente aparadas arquearam, transformando os traços do rei numa expressão condescendente. —Pode ser treinada.

—Assim como os cães, mas eles podem te morder. — Ela faria muito pior.

Um momento de silêncio enquanto absorvia seu insulto. —Mulher, você me frustra! Não estou pedindo que voluntariamente se submeta à tortura. Estou apenas pedindo para permitir que um homem a tenha em nome do dever, como permitiu antes.

—Isso é um grande compromisso para mim. Eu o mato, ou não faço nada com ele.

—Galen é um guerreiro imortal que passou milhares de anos num campo de batalha. Como supõe que vai matá-lo, hein?

—Deixe isso para mim, — disse ela, imitando suas palavras anteriores. —E, ei, aqui está outra ideia. Porque você não pode matá-lo? Pensei que fosse todo-poderoso.

—Basta! — Com uma carranca tão sombria como uma noite sem lua, Cronus bateu os punhos na parede de ambos os lados de suas têmporas, criando buracos, fazendo os tijolos caírem e poeira flutuar pelo ar.

Estrondo... estrondo...

Grande. O castelo inteiro tremia de novo.

—Como ousa uma escrava, me questionar? Sou seu mestre, seu proprietário. O árbitro de seu destino. Não respondo a ninguém.

Exceto à sua esposa. Entre os soberanos reais, ferir um sempre feria o outro, através do vínculo entre eles. Mas Sienna não ia lembrá-lo dessa pequena joia. —Não me importa quem você é. Não vou me alinhar com Galen.

Antes que pudesse sequer piscar, Cronus pôs as mãos em volta de seu pescoço e apertou até que ela não conseguia mais respirar, até que seus pulmões queimavam e sua garganta parecia comida por ácido. Estrondo, estrondo, eram as paredes, como se toda a estrutura fosse ruir por dentro. —Posso ser o carrasco da sua alma, e deixará de existir em todos os sentidos, ou posso ser seu salvador, concedendo-lhe certa paz, finalmente. — Mais apertado... apertado... então abruptamente, a pressão diminuiu. —Lembre-se que, será a pessoa que decidirá seu destino final.

Ela mal refreou a ânsia de devorar seus dedos. —Apesar de tudo que eu decidir, — ela retrucou indiferente das consequências — você ainda será um imbecil.

Surpreendendo-a, ele deu um sorriso cheio de dentes. —Sou mesmo, não é?

Antigamente, Sienna era educada, tinha medo de ferir os sentimentos de alguém, desesperada para suavizar qualquer e toda pena eriçada. Talvez o mau humor do demônio sangrasse dentro dela. Ou talvez a impertinência fosse cortesia por saber o quão inútil toda a sua vida foi. De qualquer forma, nunca teve mais a perder ou se importar tão pouco.

—Deveria ter escolhido outra pessoa para hospedar Ira. Porque... espere por isso... a minha resposta ainda é não.

Em vez de adicionar combustível ao caldeirão fervente de seu temperamento, suas palavras pareceram acalmá-lo. Suas feições suavizaram, a fúria assassina abandonou seu olhar, seus lábios tensos deslizaram atrás sobre seus dentes. Ele baixou os braços.

Chocante.

—Não, — disse ele, gentil, tão gentil agora. —Não havia melhor escolha que você.

Seu coração batia irregularmente em seu peito. Embora estivesse morta, seu próprio espírito desenvolveu num piscar de olhos uma necessidade de respirar no momento que o demônio entrou em sua alma e corpo. Infelizmente, isso significava que podia sentir dor e caso se cortasse, sangraria.

—Por que eu? — Ela finalmente perguntou. —Tem que me dizer alguma coisa.

—Tenho? — Ele se virou, oferecendo seu perfil e ignorando a pergunta dela. —Neste reino escondido do resto dos céus, onde ninguém nunca vai encontrá-la, não tenho fazer nada.

Um músculo pulsou rapidamente em sua mandíbula, e antes que ela pudesse responder, ele acrescentou, — Gosta de viver aqui, Sienna?

—Não. — Não porque estava magicamente obrigada a permanecer dentro deste castelo, mas porque ele fez o que pôde para tornar seu tempo aqui numa miséria. Incluindo cavar profundamente dentro de sua mente e tirar o pior de suas memórias. Essas lembranças saíam como filmes em cada quarto, um fluxo interminável de culpa, perseguição e vergonha.

Todos os dias ela revivia o rapto de Skye. Como não conseguiu salvar a irmã do homem a arrastando. Todos os dias ela testemunhava a perda do bebê que foi incapaz de levar a termo, algo que detestava lembrar, jamais voluntariamente. Todo dia via sua traição tola ao belo Paris. Como machucou o primeiro homem a fazê-la ansiar cada vez mais. Como o condenou simplesmente por causa de sua espécie.

—Isso é muito ruim. Porque vai ficar aqui até que concorde em retornar ao seu bando e se torne minha espiã.

Seu nariz subiu novamente. —Se essas são minhas escolhas, vou ficar aqui para sempre.

Cronus deu outro sorriso, um toque cruel em seus lábios que não tinha qualquer indício de diversão. —É isso mesmo? E se dissesse que escolhi você por causa de sua irmã?

—Exijo saber por quê. — Seus olhos se estreitaram em fendas minúsculas, o rei dos Titãs em sua mira. Ele era complicado, sem moral e totalmente desonesto. Tinha que ter cuidado. —Gostaria também de salientar que poderia ter usado essa carta especial mais cedo.

—Não se temesse que estivesse tão obcecada por ela que esqueceria meu propósito. Agora, no entanto, não me deixou escolha.

Ela fingiu indiferença e lustrou suas unhas.

Ele sussurrou para ela. —E se sua preciosa Skye vivesse com Galen? E se ela lhe desse um filho?

Leve-me para a natação, Enna. Por favor, por favor, por favor. Nunca vou pedir nada nunca mais.

—Não acredito em você. — A negação saiu ofegante dela, um coaxar de desânimo. Está mentindo. Tem que estar mentindo. —Mostre para mim. — Ela se forçou a acrescentar: —Por favor, — embora a palavra fosse espremida.

Ele não fez. —E se Galen for o único que sabe onde estão? E se os estiver torturando? E se você se tornar sua prostituta for a única maneira que descubra a verdade? A única maneira de salvá-los?

E-eu... — não tinha resposta. Ele está mentindo! O grito de desespero ecoou em sua mente, dela própria, e não de seu demônio. Tinha que ser forte. Tinha que insistir que mostrasse pelo menos um mínimo de prova antes que ela reagisse.

—Pense em tudo que disse a você, minha querida Sienna. Voltarei em breve e vamos discutir todas as novas funções que pode querer assumir. — Com isso, desapareceu, lá num momento, partindo no seguinte.

Sienna caiu de joelhos, sua força partindo com o rei. Seus olhos ardiam, o queixo tremia. Suas asas puxavam e dobravam de forma que não deveriam, e um grito agudo escapou. Cada maldito dia era uma nova lição de terror para ela.

Lágrimas escorriam pelo seu rosto, queimando sua pele. Quanto mais podia fazer? Quanto tempo até se quebrar?

Por Skye, faria qualquer coisa, e Cronus sabia disso. Skye era tudo que restava, tendo de alguma forma se tornado tanto irmã como filha em sua mente. Fazia sentido, no entanto. Só havia conhecido sua irmã apenas quando menina, e o bebê que ela havia perdido uma menina também, nunca havia tido a oportunidade de crescer. E a possibilidade de uma sobrinha ou sobrinho? Sim, faria qualquer coisa.

Cronus sabia disso. Não era de admirar que se abstivesse de seu temperamento. Não tinha que machucá-la fisicamente para conseguir o que queria. Não admirava ter escolhido Sienna para seus jogos. Ela ainda era uma marionete, as cordas que achou terem sido cortadas ancoradas na mão de outro mestre.

Pior, não havia como lutar contra este.

 

PARIS ESTAVA ESPARRAMADO NUMA cama estranha, uma mão ao seu lado segurando uma lâmina de cristal, a outra caída sobre a testa, protegendo os olhos. Depois de alguns dias de viagem — mais perto que nunca de seu objetivo — estava em outro motel em Titania, com Zacharel... em algum lugar, e William cochilando pacificamente na cama ao lado da dele.

Em momentos tranquilos como este, a mente de Paris sempre pulava para treinar a memória, levando-o ao passado, quando conheceu Sienna, e esta noite não foi diferente. Lembrou-se de andar pelas ruas de Roma, da necessidade desesperada de uma amante, toda mulher que encontrava o enxotando longe como se fosse repugnante. Então, alguém colidiu com ele por trás, e fraco como estava pela falta de sexo, quase caiu de cara no chão antes de conseguir se endireitar.

—Sinto muito—, a tinha ouvido dizer, a rouquidão sensual de sua voz o emocionou em todos os níveis.

Ele se virou lentamente, com medo que caso se movimentasse muito rapidamente, a assustasse e ela fugiria como as outras. Documentos estavam espalhados ao redor de seus pés, e ela se agachou, tentando recolhê-los. A primeira coisa que registrou foi a cortina de cabelos escuros num rosto escondido pelas sombras.

—Isso vai me ensinar a não ler e andar ao mesmo tempo. — ela murmurou.

—Estou feliz que estava lendo. — disse ele, curvando-se para ajudá-la. —Fico feliz que batemos um no outro. — Mais do que ela jamais saberia.

Suas pálpebras com espessos cílios se levantaram, e seu olhar encontrou o dele. Ela ofegou. Ele cambaleou. Ela estava do lado claro, com olhos e lábios grandes demais para seu rosto e pele salpicada de sardas incontáveis, mas possuía uma graça e presença que tão poucos mortais jamais poderiam esperar alcançar.

  —Seu nome não começa com um A, não é? — Perguntou ele, de repente suspeitando dos planos do mestre destino. Maddox recentemente se tornou um brinquedo para uma mulher chamada Ashlyn. Lucien abandonou sua masculinidade por Anya. Paris se recusava a fazer o mesmo por qualquer uma.

Sua testa enrugou em confusão, e ela balançou a cabeça, e seus cabelos escuros caíram em cachos sobre os ombros delicados. —Não. Meu nome é Sienna. Não que se importe realmente em saber. Desculpe. Não pretendia deixar escapar isso.

—Eu me importo. — respondeu ele com voz rouca, pensando que teria bons momentos em despi-la. O primeiro, tirando suas roupas, que escondia os segredos da sua feminilidade. Segundo, ela era arisca, seu balbucio charmoso, e esperava uma reação semelhante na cama. —Você é... americana?

—Sim. Estou de férias aqui para trabalhar no meu manuscrito. Novamente, não é o que perguntou. Entretanto, não posso identificar seu sotaque.

—Húngaro. — disse ele, dando a resposta mais simples. Os senhores viviam em Budapeste há muito tempo, e não havia forma de se explicar sem parecer louco, que falava línguas que nunca sequer ouviu falar. —Então você é uma escritora?

  —Sim. Bem, espero ser. Espere, isso não é certo, também. Sou uma escritora, mas não publiquei nada ainda.

Agora, é claro, ele sabia a verdade. Ela não era escritora. As páginas de seu romance serviram apenas como uma rampa de lançamento para a conversa sensual, nada mais.

Quando ela o convidou para tomar um café com ela, disse que sim, já pulsando com a necessidade por ela. Conversaram e riram o tempo todo, e ele gostou de cada momento com ela. Relaxou com ela, algo que não era capaz de fazer com muitas outras. Mas ela tinha um sorriso contagiante, um humor afiado, e essa graça de movimento que combinava com seu comportamento.

Enquanto isso, seu demônio disparava rajadas de seus feromônios, portanto, não houve nenhuma grande dificuldade em convencê-la a alugar um quarto de hotel com ele. Ou pelo menos assim pensava na época. Ao longo do caminho, ela fingiu mudar de ideia. Ou inferno, talvez mudasse de ideia. Talvez tivesse gostado dele também, e decidiu não entregá-lo aos seus irmãos Caçadores. Mas viciado em sexo como Paris era, a pressionou por mais, arrastando-a para um beco abandonado e roubando sua respiração com um beijo.

Foi quando ela o drogou, usando uma agulha escondida num de seus anéis. Ele acordou amarrado numa maca, nu e embriagado. Ela se agachou na frente dele, e assumiu que os Caçadores o pegaram como prisioneiro, também. Até que ela disse três pequenas palavras que mudaram a natureza de seu relacionamento.

—Eu te prendi.

Sua resposta brilhante? —Por que faria algo assim? — Ele ainda não queria acreditar que esta mulher que tanto ansiava tinha algo a ver com suas circunstâncias atuais.

—Não consegue adivinhar? — Perguntou ela. Inclinou a cabeça para o lado, e, estudando o seu pescoço, traçou um dedo sobre um ponto sensível. Ferimento, ele percebeu, a resposta à pergunta dela escorregando no lugar, enraizando.

—Você é minha inimiga.

—Sim. — Então acrescentou com um olhar severo — A ferida não está curando. Não quis espetar a agulha tão vigorosamente. Por isso, me desculpe.

Seus olhos se estreitaram sobre ela, sentimentos de traição e descrença o atravessando.

—Me enganou. Brincou comigo como um piano.

Novamente, — sim.

—Por quê? E não me diga que você é Isca. Não é bonita o suficiente. —disse isso para ser cruel, mas agora, se lembrando, se encolheu. Não admira o que ela fez mais tarde, o que disse.

Um rubor corou suas faces. — Não, não sou uma isca. Ou melhor, não seria para qualquer guerreiro, exceto você. Mas então, não se importa com quem transa, não é, Promiscuidade? —Cada palavra pingava com desgosto, seu charme romancista balbuciado, perdido. Mas a graça... oh, essa ela não podia banir.

—Obviamente que não. — Quando o rubor aprofundou, acrescentou sedosamente, só para provocá-la ainda mais: — Não tem medo de eu te machucar?

—Não. Você não tem a força. Tenho certeza disso.

Sua resistência recém-descoberta a ele, não importa o quão mal agisse, o irritou. As mulheres o adoravam, sempre. Bem, quase sempre. —Gostou de mim enquanto estava em meus braços. Admita. Conheço as mulheres, sei o que é paixão. Estava ardendo por mim.

—Cale a boca. — ela retrucou.

Boa. Estava chegando nela. —Quer me dar sexo antes que seus amigos apareçam?

Depois desse golpe em particular, ela se afastou dele, mas não deixou o quarto. Permanecendo a uma distância segura, admitiu seu status de Caçadora, detalhando exatamente o que seus amigos planejavam fazer com ele.

—Vamos fazer experimentos com você. Observá-lo. Usá-lo como isca para capturar mais demônios. E então, quando encontrarmos a caixa de Pandora, vamos tirar o demônio, matá-lo e prendê-lo lá dentro.

Guerreiro como era, e com muitas batalhas, sabia como mostrar sua indiferença. —Só isto?

—Por enquanto.

—Pode muito bem me matar, então, querida. Meus amigos não vão se entregar para salvar este velhinho.

—Isso nós vamos ver, não vamos?       

Quando ele percebeu que antagonizar não estava ajudando sua causa, passou à sedução, sua base padrão. Projetou imagens sexuais em sua cabeça, algo que detestava fazer. Que não havia feito mais. Não podia viver com ele mesmo depois. E quando projetou o que ele queria que ela imaginasse — os dois juntos, nus e se esforçando em direção ao clímax —sua respiração tornou-se instável, seus mamilos duros sob sua camisa. Uma camisa branca, que não fazia nada para esconder a renda de seu sutiã, provando que ela tinha um lado sensual secreto.

Ele quase a teve, mas no final, ela foi sensata. Ele cometeu o erro de continuar a chamá-la de amor, um carinho que usou com inúmeras outras, e ela sabia disso. Depois disso, não levou muito tempo para descobrir que usou o termo porque ele não conseguia lembrar o nome dela ou de qualquer outra pessoa.

Finalmente ela o deixou de verdade, só retornando alguns dias depois, quando ele estava há alguns suspiros longe da morte. Foi quando ela por fim se desnudou para ele, finalmente para seu prazer.

Foi quando ele a matou.

 

NA MANHÃ SEGUINTE Paris estava no alto de um penhasco com vista para o Reino de Sangue e Sombras, seu corpo pronto para a guerra. Finalmente, encontrou seu destino, escondido num canto distante de Titania, o portal invisível para todos, menos para William. Quem diria? O cara tinha seus usos.

Agora Paris encontraria Sienna.

Seu sangue ferveu com a fúria que supriu por muito tempo. Seus músculos ardendo com ferocidade assustadora, e seus ossos vibrando com a necessidade de agir, machucar alguém. Múltiplos alguém.

Em breve.

Afiadas rajadas de vento vociferavam, nada fazendo para dissipar o espesso manto negro de névoa ao seu redor, penetrando dentro dele. O cheiro de cobre envelhecido enchia o ar, deixando uma película úmida no nariz. Gritos abafados ecoavam por todos os lados, tantos gritos de dor. Acima, a lua formava um gancho pálido, suas extremidades desgastadas, sangrando numa infindável extensão de noite implacável. Abaixo, um oceano de lágrimas vermelhas espumantes assobiava, criando uma segunda sinfonia de angústia.

E ali, no centro de tudo, empoleirado num pesadelo estava um castelo. Pedra escura desmoronada. A hera murcha quando o punhal de ponta afiada escalava as paredes, cada folha o lembrando de uma aranha. O telhado esburacado em vários pontos, um corpo com uma estaca atravessada no coração e pendurado em cada lado, gotejando sangue nos vidros de todas as janelas. Havia várias varandas guardadas por múltiplas gárgulas de todos os tamanhos.

Gárgulas que, aparentemente, ganharam vida.

Sombras se contorcendo, lisas e oleosas na aparência, giravam em torno de toda a estrutura, mas não tocavam uma única pedra. Mantinham uma distância generosa, como se uma vara de ferro as prendesse no lugar. No momento que ouvissem o sino de partida, o que quer que fosse, Paris suspeitava que explodiriam livres e atacariam quem chegasse perto.

—Ela está lá dentro. — ele disse aos seus companheiros. —Sei disso. — Queria ir, armas em punho. Estava desesperado para entrar, armas em punho e facas cortantes, mas não conseguia. Ainda não, ainda não. Informações tinham que vir em primeiro lugar.

A morte estava nos detalhes.

—Isso é ótimo, maravilhoso, mas por que estou aqui de novo? — William perguntou, coçando a cabeça. Ocupava o espaço à esquerda de Paris, vestido para a passarela, em vez de linhas de frente. Terno de seda, sem armas. Um frasco de condicionador no bolso. Sim. Condicionador. Mais uma vez. Para reparar pontas duplas. Um pequeno passeio no inferno "tinha danificado alguns dos preciosos fios", então carregava seu "tratamento diário" a todos os lugares.

Eee... ouvir sua voz fez Sexo ronronar como um gatinho. Era nojento.

—Ainda estou me recuperando de um trauma físico e mental agonizante — acrescentou William. O guerreiro mal havia escapado de seu encontro no inferno, é verdade, mas ser esmagado por pedras e arranhado por demônios famintos por carne não era angustiante.

—Assim, não sei, considere como punição por abandonar Kane. — disse Paris. Quantos gárgulas teria na batalha? Fez uma contagem rápida. Cinquenta e nove na frente. Provavelmente, um número semelhante esperava atrás. Metade delas tão grande quanto dragões, mas algumas tão pequenas como ratos.

—Não o abandonei sozinho. —William tirou um fiapo de seu ombro. —Fui atacado por pedras caindo e acordei num motel em Budapeste. No meu estado mental comprometido, achei que alguma donzela demônio no cio havia dado uma olhada no meu corpo incrível e nos salvado, mas Kane pensou em afastá-la do meu impressionante apelo animal, e por isso a arrastou para tomar um café, ainda não percebendo que estava simplesmente a energizando para a maratona de cama por vir. A maratona comigo, caso não tenha sido claro nesse ponto.

Paris não se incomodou em revirar os olhos. Era evidente que William era a contraparte masculina de Viola. Não era um pequeno buquê de rosas?

—Na verdade, está aqui porque deve a Paris um favor. — Zacharel ladeava o outro lado de Paris, a tempestade de neve agora fermentando em cima deles. A mudança aconteceu no momento que entrou neste reino. Ainda usava seu manto, mas as lâminas estavam amarradas por todo o corpo musculoso. Era definitivamente um guerreiro apropriado. —Mais que isso, está evitando sua namorada.

William ofegou com indignação. —Primeiro, não devo favor a ninguém. Segundo, não tenho namorada, seu pedaço de merda alado e maricas.

—Não tem? — Num piscar de olhos, todo inocência. Zacharel não parecia se preocupar com o xingamento. —O que a jovem Gilly é para você, então?

Gilly. Um ser humano com uma queda por William. O guerreiro afirmou que eram apenas amigos e nada mais, mas se alguém podia ver desejo secreto no olhar de alguém, era Paris. E William definitivamente tinha um monte de desejo secreto guardado por essa garota. Surpreendentemente, porém, não fazia nada a respeito. Só a acarinhava e mimava, que era por esse motivo que Paris não o tinha destruído. Gilly passou por coisas suficientes em sua curta vida, sem William jogando seu charme letal sobre ela.              

Perigoso como um relâmpago, tão letal quanto um par de espadas curtas se cruzando, William sussurrou, — Está prestes a descobrir qual o gosto de fígado, meu amigo.

—Já provei isso. — Zacharel disse, sua usual voz monótona. Os flocos de neve começaram a cair para valer, pequenos no início, mas crescendo em diâmetro. Um vento ártico fazia barulho em torno dele. —Era um pouco salgado.

Como inferno um cara devia responder a isso?

Aparentemente, William não sabia também, porque ficou boquiaberto com o anjo. Então, — Talvez se adicionasse um pouco de pimenta?

C-certo. Era oficial. William tinha uma resposta para tudo.

—Basta. — disse Paris. Até então, tinha sua escuridão interior presa. Isso podia mudar a qualquer momento. Isto era o mais próximo que já havia estado de salvar Sienna. Vê-la novamente, tocá-la, e a urgência disso o apertava como um torno. O que era estúpido. Sabia que era estúpido.

Não a conhecia, não realmente, só havia interagido com ela essas duas vezes, e ainda assim, olhando pra trás, estava certo que nunca havia se sentido tão conectado a qualquer pessoa em sua vida. Podia ainda se lembrar da rouca delicadeza de sua voz. Suave e lírica, correndo sobre ele, extasiando-o. Ainda podia cheirar seu doce perfume de flores silvestres. Ainda podia sentir seu corpo macio pressionado muito forte contra o dele.

Agora se perguntava se gostaria mesmo dela, em qualquer nível, além do sexual. Será que a acharia irritante? E sobre ela, ainda o veria como mau, mesmo que ela própria já tivesse um demônio?

—Vamos nos concentrar, senhoras. — Isso inclui você, ele acrescentou em seu próprio benefício. Se pudesse contornar a linha externa de defesa da fortaleza completamente, estaria em perfeitas condições quando estivesse dentro. — Zacharel, irá me teletransportar dentro do castelo.

—Não, não irei.

Ele fez uma careta, mas não perdeu tempo perguntando por quê. Como sempre, seus ouvidos pegaram a teia de verdade tecida no tom do anjo. Zacharel não podia ou não queria riscá-lo, o motivo não importava.

—William?

—Só recentemente comecei a me teletransportar, e sim, sou muito bom para um iniciante, não que precise dizer isso, já que qualquer um com olhos notaria, mas ainda estou aprimorando minhas habilidades incríveis. Não há nenhuma maneira que possa transportar sua carcaça a qualquer lugar.

Paris abafou um suspiro. Sem teletransportar com William, também. —A água está envenenada?

—Não. Não apenas a água está envenenada, como os demônios dentro dela tem um desejo ardente por carne. —William apontou para a ponte em ruínas que conduzia à entrada da frente, as grossas e arqueadas portas duplas cobertas de espinhos com um líquido transparente escorrendo de suas pontas. —Tem que usar a ponte levadiça, e tem que deixar os guardas levarem você. Não há outra maneira.

—Nunca enfrentei uma gárgula antes. — Zacharel balançou a cabeça, uma mecha de cabelo escuro caindo num dos olhos esmeralda. A umidade da neve derretida deixava o cabelo preso em sua pele. Não parecia notar. —Mas estou certo que estas irão assassinar Paris antes de carregá-lo de bom grado para dentro.

Como se fosse a única forma de vida inteligente deixada na existência, William abriu seus braços. —E o problema com isso? Ainda vai estar lá dentro, exatamente onde quer estar. E por falar nisso — acrescentou, piscando para Paris, com longos cílios que deveriam pertencer a uma menina. —Seu novo delineador permanente é muito bonito. Vai ser um cadáver bonito.

Não reaja. Se o fizesse, as provocações sobre suas tatuagens de cinzas/ambrosia nunca acabariam. —Obrigado.

—Prefiro delineador de lábios, no entanto. Um pequeno e agradável toque feminino que realmente faz seus olhos pop.

—Novamente, obrigado. — ele rangeu.

Ele nos quer!

Demônio estúpido.

William sorriu.

—Talvez possamos namorar mais tarde. Sei que me quer.

Diga-lhe que sim!

Nem mais uma palavra sua, ou...

—Paris? Guerreiro? —Zacharel disse. —Está me ouvindo?

—Não.

Zach assentiu, aparentemente, não menos ofendido.

—Aprecio sua honestidade, embora acredite que sofre do que os humanos chamam DAD.

—Oh, sim. Definitivamente tenho Deficit de Atenção Demoníaca.

—Agora, mudando de assunto, pois não estou ouvindo o anjo, também. — disse William. —Como vamos com meu plano diabolicamente genial, vai ter que escalar o penhasco e passar pela ponte levadiça. — Ele uniu suas mãos e tamborilou com os dedos, contemplando a ponte de todos os ângulos. —No momento que o fizer, as gárgulas virão à vida. Vão te atacar. Ah, e quanto mais lutar contra elas, mais duro mordem e arranham você. Então, se permanecer relaxado, só te machucarão um pouquinho antes de levá-lo para dentro até uma corrente numa parede. Em teoria.

Maravilhoso. Mas isso era o que sua mulher tinha que lidar todos os dias. Não podia fazer menos. E se as gárgulas a machucaram...

Machucada... dentro, fora, dentro, fora, ele respirou, oxigênio escaldando sua garganta, empolando em seus pulmões. Ele virou a cabeça à esquerda e depois à direita para estalar os ossos em seu pescoço. Sua fúria borbulhava a superfície, como ondas em suas veias. Ele salvaria Sienna e pulverizaria o castelo até o chão, juntamente com todos os seres vivos no seu interior.

Zacharel cruzou os braços sobre o peito maciço, a neve tão espessa que agora nenhum dos flocos tinha chance de derreter. Seu cabelo agora ostentava fios de brilhante branco. —Como sabe tanto sobre este lugar e seus protetores, William das Trevas?

William das Trevas? Isso era novo, porém apropriado. —Sim. Como sabe? —Paris estudou as gárgulas em questão. Eram hediondas. As maiores eram aladas, com chifres curvados para trás, presas como espadas curtas e provavelmente unhas tão fortes como adagas, em ambas as mãos e pés. As pequenas só pareciam famintas. Ah, e infectadas com raiva.

Outro pedaço de fiapo invisível foi espanado dos ombros de William. —Talvez eu tenha sido uma vez co-regente do submundo e procurado todos os esconderijos de Cronus e seus seguidores, com intenção de chantageá-los, e descobri esta pequena cabana de amor. Ou talvez vi o futuro e sabia que viria aqui um dia. Ou talvez as gárgulas tenham uma vez me servido, chamando-me de Mestre Ardente.

Paris leu nas entrelinhas. —Talvez tenha uma vez transado com uma gárgula, e ela tivesse uma boca grande. — Se havia um galinha maior que Paris, era William.

William deu de ombros novamente. —Ou isso.

Asas brancas entremeadas em ouro levantaram, sacudiram e voltaram ao seu lugar de descanso atrás de Zacharel. —E o que te faz tão certo que sua Sienna está lá, demônio?

Não reaja. —Somente sei. — Arca, a deusa que seduziu no harém de Cronus, a que ele prometeu resgatar depois de garantir a segurança de Sienna, disse que havia apenas duas localizações possíveis para ela. Se Sienna fosse levada para a outra, sua alma secaria em poucos dias. Portanto, estava aqui. Fim da história.

—Vou provocar os guardas — disse ele, pensando em voz alta —, mas não enfurecê-los. Vão me transportar para dentro, planejando me trancar. Vou me libertar antes que possam, procuro Sienna, a encontro e fujo com ela. Simples, fácil.

Sim. Direto.

—Vou ficar aqui e agir como vigia. — William balançou a cabeça, claramente satisfeito com a ideia. —Se não voltar, digamos na quantidade de tempo que leva meu condicionador para penetrar no meu couro cabeludo, vou procurar ajuda. — Ele riu. —Eu disse penetrar.

Realmente!!! —Eu te conheço, vai esquecer tudo sobre mim e seguir para um salão para fazer manicure e pedicure. — Mais que isso, Paris não tinha certeza se Zach o apunhalaria pelas costas. —Então, adivinhem? Vai comigo. Zach vai agir como vigia.

—Talvez viva na Hungria por tanto tempo que se esqueceu do inglês e não entendeu o que estava dizendo. — Primeiro em francês, em seguida em espanhol, em seguida em russo, ele disse: — Vou ficar aqui, e ponto final. —William passou uma mão através de sua juba índigo, franziu a testa quando encontrou um obstáculo. Carrancudo, sacou seu frasco, apertou algumas gotas sobre os dedos e penteou a mistura cremosa pelo meio até que alcançou a suavidade desejada. —Sou um amante, não um lutador.

—Garanto que esfaqueou sua mãe segundos depois que dela ter parido você. Então me faça um favor e aceite porque o negócio é o seguinte: Se sair agora, vou segui-lo pelo resto de seus dias, seduzindo cada mulher que desejar para longe de você.

Uma pausa pesada, cheia de fúria tão fria quanto a neve do anjo. —Tudo bem. — William finalmente murmurou. —Vou com você, mas só porque estou precisando de um exercício cardiovascular decente.

Boa. Paris quis dizer cada palavra. Não veio até aqui para encontrar a derrota. Mentiria, enganaria, destruiria o que fosse preciso. Agora, e até que Sienna estivesse a salvo.

Deu uma palmadinha rápida para baixo. Todas as suas lâminas estavam em suas bainhas. A verificação visual em suas armas assegurou que os dispositivos de segurança estavam desativados.

—Balas não vão matá-las, sabe. — disse William. —Só vai causar ataques histéricos.

—Não me importo.— As balas comprariam alguns segundos seguramente, e às vezes isto era tudo que um sujeito precisava para levar a vitória para casa.

William deu um tapa no seu ombro, enviando a Sexo convulsões arrebatadoras. —Antes de fazermos isso, tenho uma pergunta para você. E não pode mentir. Isso é muito importante.

Um pouco mal do estômago pelo que tal libertino poderia querer saber, Paris voltou sua atenção para os cabelos pretos, olhos azuis-do diabo. —Pergunte.

—Vai sugerir que te dê um beijo para dar sorte ou força, ou seja qual for as necessidades sexuais do seu demônio?

Ele ganhou do guerreiro uma saudação com dois dedos.

—Então isso é um não? — William perguntou.

Paris trabalhou sua mandíbula. —Aqui, deixe-me ajudá-lo a sair do penhasco para a ponte levadiça. — sem nenhum aviso, empurrou William sobre a borda. Pensou ter ouvido um desvanecido "Não tão legal", do canalha quando caiu... caiu...

Splat.

Sexo ofegou em indignação.

—Não é exatamente uma coisa agradável de fazer. — disse Zacharel, mas havia um brilho em seus olhos, um que Paris nunca havia visto antes. Algo semelhante à diversão.

—Qual seu plano? — Paris perguntou.

—Só o tempo dirá.

—Vai esperar aqui, certo?

—Talvez.

Está bem, então. Com a resposta enigmática do anjo não tocando sua cabeça, Paris agarrou uma lâmina entre os dentes e escalou as rochas pontiagudas, descendo, descendo, com as mãos rapidamente rasgadas em tiras. Cipós deslizavam das rachaduras, acariciando por cima dele, tentando algemar seus pulsos e tornozelos. Pendendo para um lado, parou tempo suficiente para cortar o caule verde mais próximo.

Outro logo veio a ele, e o cortou, também. Mas caramba, estavam por toda parte. Um enrolava em torno do braço que estava usando para se equilibrar. Seu coração disparou de expectativa e medo. Olhou para a ponte. Não havia outro jeito.

Paris agarrou o cipó que o segurava, chutou as rochas com as pernas e caiu. Quando bateu no fundo, realmente atingiu o fundo, tirando o ar de seus pulmões.

De repente, William pairava sobre ele, franzindo a testa, rosnando e sangrando, seu terno manchado de sujeira e rasgado. —Sabe quantos. Fios de cabelo perdi. No caminho até aqui embaixo?

Tanto faz. —Matemática nunca foi coisa minha, mas vou dizer que perdeu... um monte.

Eletricidade azul brilhou com ameaça.

—Você é um bastardo, sádico cruel. Meu cabelo precisa de TLC [8]e você... você... Droga! Estripei homens por menos.

—Sei. Vi você. —Paris se moveu pesadamente sobre seus pés e esquadrinhou o banco rochoso onde estavam. Estendia-se sobre o oceano vermelho e borbulhante em todas as direções. A ponte levadiça era apenas um traço a 45 metros de distância. —Não mate o mensageiro, mas estou pensando que deve mudar seu perfil de namoro a meio calvo.

A face masculina ficou escarlate quando o grande e mau guerreiro se esforçou para replicar.

Sem mais joguinhos. Era o dia D. Logo, vou resgatar Sienna, Paris pensou. Talvez ela ficasse com ele por alguns dias. Se assim fosse poderiam fazer amor, uma e outra vez, e por apenas um pouco, poderia fingir que tinham o para sempre.

Ou talvez ela o deixasse imediatamente. Não fariam amor uma única vez, e seria forçado a ter alguém tão logo a porta fechasse atrás dela.

A quem estava enganando? Ela o deixaria. Havia muitos obstáculos entre eles. Seu demônio. O demônio dela. O fato que dormiu com ela e, em seguida, inúmeras outras. O fato que inadvertidamente usou seu corpo como escudo para se salvar. Sua ocupação anterior. O fato que ela o enganou para baixar sua guarda para que pudesse drogá-lo e permitir que os Caçadores o capturassem. O fato que olhou enquanto era torturado. O fato que o odiava.

E talvez, uma vez que a salvasse, ele percebesse que ela não era a única para ele. Talvez ele fosse o único a se afastar dela. Talvez descobrisse que realmente não conseguia dormir com ela novamente. Que cometeu um erro.

Talvez. Mas ainda estava fazendo isso.

—Um dia desses você vai acordar — William finalmente disse —, e vou ter raspado você. Em todos os lugares.

—Não vai fazer diferença. As mulheres ainda vão me querer. Mas sabe o que mais? O que fiz para você não foi tão cruel, Willy. —Ele ofereceu ao guerreiro um sorriso de bandeira branca. Um truque. Uma mentira. —Isso, no entanto, é.

Ele agarrou William pelo pulso, girou em torno do homem e ao redor antes de finalmente liberá-lo e atirar seu corpo diretamente sobre a ponte. A corda desgastada gemeu e as placas quebraram sob o peso musculoso.

William estava lá, tentando recuperar o fôlego e fulminando Paris com o olhar. No parapeito do castelo, as gárgulas desencadearam um coro de gritos de guerra.

 

ELA DEVERIA OU NÃO? Horas se passaram desde o ultimato de Cronus e sua partida, mas a mesma pergunta ainda rolava pela mente de Sienna. Deveria se entregar a Galen, talvez salvar sua irmã, talvez sucumbir ao engano do seu captor, ou deveria continuar resistindo, possivelmente causando a tortura contínua de sua irmã?

Outra pergunta, uma muito mais importante: Se houvesse uma chance que pudesse salvar Skye, mesmo a chance mais remota, não deveria tentar? Prometeu fazer tudo, qualquer coisa, e Galen se enquadrava na categoria de qualquer coisa, não?

Bem, inferno. Lá estava, exposto, sem disfarces. A resposta era um retumbante sim. Passou a vida à procura de Skye. Se necessário, passaria a procurá-la na morte, também. Pelo menos agora as vendas haviam sido tiradas, e sabia o monstro que iria seduzir.

Na cama. Com Galen. Tentaria não vomitar.

Desejava ser mais forte, mais capaz, o resultado assegurado. Ela lamentava que a batalha de Skye não pudesse ser travada em seus termos, sem Cronus lá para puxar as cordas de seus fantoches.

E talvez... talvez pudesse arranjar isso. Se escapasse deste inferno antes do retorno do rei, poderia ir atrás do guardião da Esperança, torturá-lo para obter as informações que queria e depois matá-lo, sem ter relações sexuais com ele.

Na teoria, isso era fácil. Na realidade, era provavelmente impossível. Um riso amargo, o único tipo que tinha armazenado dentro dela recentemente, escapou, imitando o frio súbito no ar. Ela estremeceu. Tentou escapar deste castelo uma e outra vez. Enquanto podia abrir portas e janelas que levavam para fora, não podia pisar ou rastejar além delas. Seu corpo inteiro tremeria, a dor se lançaria através dela, milhares de agulhas a picando, e desmaiaria ao sair.

Não gostava da dor. Mas podia suportar. Mas a coisa de desmaiar ao sair? Não havia como combater isso.

Estava curiosa para saber se alguém podia passar. E a boa notícia era, haviam três candidatos no andar de cima que poderiam testar essa questão. Tudo que tinha a fazer era libertá-los.

Hora de fazer outra visita, pensou com um arrepio que nada tinha a ver com o frio. E o que causava essa grande queda na temperatura?

Suas asas cheias de cicatrizes rasparam o chão de mármore enquanto se movia devagar por um corredor, em torno de um canto até o salão, amplo e espaçoso. Seu coração afundou quando as paredes caíram e as memórias que Cronus arrancou de sua mente começaram a sair. Na sua esquerda, uma jovem Skye começava a gritar por ajuda. À sua direita, uma horda de Gargl, como ouviu Cronus chamar as gárgulas, que serviam como sentinelas aqui, arrastavam um Paris caído no chão, mas muito acordado.

Sienna parou, um nó súbito crescendo na garganta. Paris. Seu corpo estava quente e frio ao mesmo tempo, arrepios se espalhando sobre a pele, brasas ardendo em suas veias. Cronus certamente sabia como atormentá-la, não? Sabia exatamente que imagens serviriam para deixá-la louca.

E este... quem criou se superou. Como Paris era assombrosamente belo. Nenhum mortal poderia jamais esperar se comparar a ele. Nenhum outro deus imortal ou mítico jamais poderia chegar perto. Possuía um rosto desenhado para os luxos do quarto, bem como a selvageria do campo de batalha. Olhos de um azul vívido sedutoramente contornados com Kohl que nunca o viu usar antes, o cabelo um concerto de cores. Preto, marrom, até mesmo alguns fios claros. Um corpo alto, musculoso, da maneira mais deliciosa.

Ele era a perfeição em pessoa, e era nada mais do que uma miragem. Ainda assim, queria correr para ele tão intensamente, sufocá-lo com beijos enquanto implorava seu perdão.

O perdão que não merecia.

Pelo menos ele não estava ferido nesta memória. Um pequeno conforto, mas tinha que consegui-las e levá-las onde pudesse.

Outra visão se desenrolava atrás de Paris, uma horda de Gargl o seguia, enquanto carregavam um segundo guerreiro de cabelos escuros. Este homem era tão alto quanto Paris, tão musculoso e, milagre dos milagres, quase tão lindo, mas ele definitivamente estava ferido. Marcas de mordida cobriam os braços e punções de chifre criavam uma tela de dor no tórax dele. Surpreendente. Nunca teve uma visão dele antes. Nem mesmo lembrava-se de conhecê-lo.

Seu olhar retornou a Paris. Duas das Gargl o estavam... encoxando? Sim. As línguas estavam saindo, seus corpos inferiores girando contra ele. Por que Cronus mostraria algo assim? Para deixa-la com ciúmes? Das Gargl?

Alguma coisa estava errada... sobre isso, ela pensou.

Antes que pudesse decifrar, Ira bateu contra seu crânio, uma e outra vez, a distraindo. Suas têmporas latejavam em sintonia com seus movimentos, mesmo enquanto o calor se dobrava dentro dela, derrotando o frio, deixando-a transpirando e ruborizada. Toda vez que uma memória de Paris era materializada, tanto o demônio quanto seu corpo reagiam desta forma.

Céu... inferno... Sempre quando viam flashes de Paris, Ira pronunciava estas duas palavras. Ele pode nos ajudar.

—Eu sei que pode. — ela sussurrou, não se surpreendendo quando se viu conversando com a besta. —E é certamente nosso céu, não é? — Seu único raio de esperança.

Bem, bem. Olhe o quão longe foi. Do ódio ao... amor? Será que o amava? Certamente que não. Mal o conhecia. Mas se fosse mais um truque cruel, sem coração destinado a trazê-la na rédea, podia aprender com ele, pensou melancolicamente.

— Sienna? — a voz de Paris, profunda, forte, áspera, os uniu mais uma vez.

Outro arrepio a percorreu quando seu olhar prendeu o dele. Seu corpo inteiro sacudiu com consciência. Basta, ela quase gritou. Torturou-me bastante. Reconheço.

—Sienna! — Foi um grito rouco mergulhado em desespero e expectativa. —Sienna!

—Basta! — Não pode segurar o comando nesse instante. Lágrimas queimaram seus olhos. Seu queixo tremia, batendo os dentes juntos. Ela apertou as bordas de sua camisa para que não chegasse a tocá-lo quando as Gargl o transportaram além dela.

No início acreditava que as ilusões fossem reais. Jogava-se nelas, seu fracasso em se conectar destruindo pedaços dela — pedaços que ainda gostava.

Céu e Inferno. Ajude-me. Socorro!

—Sienna! — Paris lutava tão fervorosamente contra seus captores, se torcendo, girando, chutando, golpeando que um de seus ombros estalou com um dos seus golpes. —Estou aqui por você. Não vou sair sem você. Sienna!

CÉU E INFERNO. AJUDE-ME!

Ela sentia como se bolas de ferro batessem em seu estômago, seus movimentos rápidos jogando a bílis até sua garganta. Soltou sua camisa para cavar as unhas nas suas coxas, cortando a pele, tentando chegar ao osso. Inalterável. Embora quisesse fazer algo, qualquer coisa para acalmar Paris, sabia realmente que ele lutaria mais. Isso não era real. Ele não era real.

—Sienna!

Finalmente, o grupo desapareceu ao virar a esquina, e se fossem reais, teriam sidos levados ao calabouço. Paris continuou a brigar, e quase correu atrás dele, miragem ou não.

—Sinto muito. — ela respondeu asperamente. —Sinto muito.

Ira choramingou.

Embora quisesse desmaiar, se enrolar na posição fetal e soluçar, forçou sua mente a clarear e os pés a se moverem na direção oposta. Só assim outra memória piscaria à vida, brincando ao lado dela enquanto caminhava. Sua mãe — há muito falecida — estava sentada no escuro, mamando um copo de vodka.

Deveria ter sido você a sequestrada! Grandes, angustiantes soluços. Sinto muito. Não quis dizer isso, querida. Sinto muito. Bofetada. Eu te odeio! Fique longe de mim. Mais soluços. Sinto muito. Não deveria ter te machucado.

Outras famílias sofreram dor semelhante, lutas semelhantes, e Sienna tentou não deixar isso afetar sua lembrança. E de qualquer maneira era mais seguro que a visão de Paris. Ainda assim, fez seu melhor para deixá-la de fora e se concentrar em sua tarefa. Libertar os possuídos por demônios imortais do andar de cima, aprendendo com eles.

Cronus poderia ter ordenado aos Senhores que encontrassem e capturassem os outros hospedeiros do mal de Pandora, mas o rei Titã nunca parou de procurar por si mesmo. Agora, três estavam acorrentados nos quartos acima. Indiferença, Obsessão e Egoísmo. E nem um deles sabia que ela estava aqui.

Porque ainda não aprendeu a voar e não tinha certeza se alguma vez desenvolveria a força para fazê-lo, Sienna subiu a escada em caracol. As pontas de suas asas travaram no tapete desgastado pelo menos mil vezes, arrasando seus músculos já doloridos. Suas coxas queimavam pelo esforço necessário para se impulsionar acima. Duas vezes teve que fazer uma pausa para curvar-se e recuperar o fôlego.

Quando chegou ao patamar, endireitou os ombros, levantou o queixo. Os guerreiros aqui sentiam qualquer tipo de fraqueza, mesmo que não pudessem ver sua fonte. E quando sentiam fraqueza, batiam nas claras portas invisíveis que os continham, soltando as mais vis obscenidades e prometendo todos os tipos de retribuição, como se ela fosse responsável por sua prisão.

Vamos lá, vamos lá, pode fazer isso, pode fazê-lo. Olhe ao que já sobreviveu. A conversa de incentivo funcionou. Lá vai você. Boa menina. O primeiro quarto que passou era o de Cameron. Não levou muito tempo para Sienna descobrir que era anfitrião de Obcessão. Era uma criatura de hábitos e porque era crepúsculo, estava estirado no chão de seu quarto, fazendo flexões. Levanta. Desce. Levanta. Desce.

Como sempre ao vê-lo, provocou em Ira uma erupção e um frenesi de movimento. A dor explodiu na cabeça dela, um precursor das próximas imagens que o lançaria em sua mente. Imagens violentas do passado de Cameron. Batalhas sangrentas, uma mulher em seus braços, mole, morta, em seguida, uma dele mesmo, xingando os céus, gritando... gritando... jurando vingança...

Sienna se apressou a passar, mas não antes que a imagem real de sua pele bronzeada brilhante, o suor pingando ao longo dos cumes sensuais de seus músculos, ficasse gravado em seu cérebro. Seu cabelo era uma rica sombra do mais profundo bronze e emplastrado em sua cabeça. Seus olhos eram tão tristes, mas sabia que eram de uma cor lavanda surpreendente contornados com prata.

Na sala ao lado dele estava Púkinn. Indiferença. Ao vê-lo, Ira ficou letalmente calmo. Uma reação que Sienna não entendia, e o demônio não explicava.

A herança egípcia brilhava em Púkinn através da nitidez de sua estrutura óssea e a sensualidade de seus olhos escuros. Seu cabelo era longo, preto e reto como uma pena. O resto dele, no entanto, era mais besta que homem. Chifres se estendiam do couro cabeludo. Suas mãos permanentemente eram garras, as pernas musculosas e peludas.

Cameron o chamava de irlandês, porque, apesar de sua aparência e ascendência, sua voz gotejava com o sotaque sedutor das ilhas. Sienna pensava nele dessa forma, também.             

Finalmente chegou à sala de Winter. Egoísmo. Ira era ambivalente sobre ela, nem soltava as imagens nem soltava lanças de ameaça, algo mais que Sienna não entendia.

Winter ergueu seu quadril contra o batente e os braços cruzados sobre o peito. Suas unhas pintadas de coral tamborilavam uma canção constante de impaciência. Ela parecia tanto com Cameron que devia ser parente. Pele bronzeada, cabelos bronze e olhos de lavanda contornados com prata. Quilométricas pernas longas, curvas que não eram apenas perigosas, mas fatais.

A exuberância de sua feminilidade seria um perfeito contraste com a masculinidade requintada de Paris.

Sienna ficou tensa, somente o pensamento causando ondas de ciúme envolvendo e comprimindo seu peito. Ele é meu.

Não, não era, se forçou a pensar, e nunca mais seria. Ela tentou alcançá-lo, mas ele foi incapaz de vê-la. E isso era provavelmente o melhor. Depois de tudo que fez a ele, todas as formas que o machucou, nunca seria capaz de confiar nela.

—Quem está ai fora? — Cameron rosnou. Ele se tornou obcecado —naturalmente — pelas investigações. E talvez não devesse tê-los visitado tantas vezes, mas mesmo antes de hoje, planejava libertá-los. De alguma forma, alguma maneira. —Sei que alguém está ai fora. Revele-se. Agora.

—Estamos lidando com um dos espiões de Cronus, tenho certeza. — disse Winter, sua voz tão suave e sensual como uma carícia. Seu olhar quase fixo, mas não completamente, encontrou Sienna. —O ouvi falando mais cedo.

—Vou... estripar... você... — Cameron fervilhava. Ele não estava falando de Winter, mas de Sienna. Poderia resmungar para Winter, rosnar para ela e às vezes até gritar com ela, mas nunca a ameaçou. E se alguém podia encontrar uma maneira de matar um fantasma... — ou qualquer coisa que ela fosse, — Sienna estava disposta a apostar que era Cameron. Porque, e isso era chocante, não pararia até que tivesse o que queria.

—Esses seus discursos inflamados nunca acabam? —Irlandês perguntou, esse sotaque dando-lhe um caso de “Oh, meu!”

— De fato, seu irritante mitológico — Winter disparou de volta — eles não acabam, e ele vai fulminar toda a sua bunda, se não calar sua boca.

—Alguém deveria ter espancado você há muito tempo, menina. — Irlandês disse.

—Toque-a e em breve vai estar comendo suas próprias bolas. E vão ser apenas o lanche. O prato principal seguirá. —Cameron replicou.

Sienna não se importava com seu falatório. Este era leve em comparação com o que diziam a ela. Além disso, só tinham um ao outro. E, enquanto gostavam de rosnar e irritar um ao outro, se uniriam contra Cronus quando o momento aparecesse, ligados pelo ódio mútuo entre eles.

Ela estendeu a mão tocando o escudo claro que bloqueava a cela de Winter. Entrou em contato. Suspirou quando a barreira se recusou a ceder. Ontem apalpou a metade de cima, em busca de todas as aberturas vulneráveis. Não encontrou nenhuma. Hoje atacaria a metade inferior.

—Sienna — a voz de Paris ecoou pelas paredes. —Sienna! Onde diabos foi?

Algo deu balançou em seu peito, e ela lutou mais uma vez contra as lágrimas. Maldito seja, Cronus. De todos os seus tormentos, este era o pior. Suas mãos continuaram a se mover ao longo do escudo, tremendo agora.

—Sienna!

Lágrimas escaldantes correram de seus olhos e salpicaram por suas bochechas, deixando marcas em seu caminho. As memórias nunca a seguiram antes. Quando se movia para um novo quarto, uma nova aparecia, um horror trocado por outro. Esta era a primeira vez que a perseguia.

E... ela se acalmou, franziu a testa. Isso não podia ser uma memória, percebeu a resposta à sua preocupação antes de finalmente deslizar no lugar. Até onde sabia, Paris nunca veio a este castelo, e ela nunca viu a Gargl em qualquer outro lugar. Assim, os dois nunca lutaram em sua presença.

Será que ele... Era ele...

Seu coração falhou uma batida.

—Sienna!

Outra batida.

—Quem é esse? — Winter perguntou.

—Outro prisioneiro? — Cameron.

—E quem é esta Sienna? — Irlandês.

Ouviram a voz de Paris. Nunca viram ou ouviram as memórias antes. Isto não era... Isso não podia ser... Seu coração parou completamente.

—Sienna! Droga. —Grunhido, bang! — Fiquem longe de mim, seus pervertidos sacos de pedra. — Bang. —Sienna!

Isto não era uma memória, não era uma visão. Isto era real e acontecia agora. Paris estava aqui. Veio por ela. Estava procurando por ela, tentando chegar até ela. Um segundo depois, o coração dela dava um pontapé e voltava a funcionar, batendo num ritmo muito rápido, fazendo-a arquejar. A Gargl poderia tê-lo machucado, poderia o estar machucando agora.

—Paris! — Em pânico, se endireitou e correu pelo corredor, descendo as escadas. Tal como antes, suas asas se prenderam no tapete. Seu impulso a levou para frente, batendo o rosto. Ela se encolheu, gemeu, mas dois segundos depois conseguiu, estava de volta em pé e correndo — Paris, estou aqui!

Se ele continuasse a lutar contra a Gargl, tirariam seus órgãos como petiscos. Ela viu isso acontecer muitas vezes para contar. E uma vez que provassem as entranhas de um homem, nada e ninguém poderia parar a festa que se seguiria.

Ela apressou o passo e orou para que não fosse tarde demais.

 

CRONUS SE MATERIALIZOU PARA SEU QUARTO PARTICULAR em seu palácio secreto favorito, segurando um insignificante e infeliz Caçador pelo cangote. No momento que os murais apareceram ao seu lado, uma grande cama trabalhada do mais escuro ébano surgiu, se materializando na frente dele, e empurrou o Caçador de joelhos, sustentando o forte aperto. Um espesso tapete vermelho evitou que as rótulas do humano fraturassem, a única misericórdia que o homem receberia neste dia.

Em cima da cama, correntes se agitaram. A fêmea nua presa aos postes o viu e lutou para se libertar. Claro, falhou. As correntes não eram apenas reforçadas com aço, mas misticamente reforçadas. E realmente, ela só podia culpar a si mesma por seu confinamento. Cronus nunca a teria capturado se não viesse aqui com a intenção de seduzi-lo e acorrentá-lo.

Se ele não estivesse de posse da Chave Absoluta, ela teria êxito. Agora, nada poderia contê-lo.

Sorrindo, a estudou. O cabelo escuro enrolava em volta dos ombros machucados, provas de que ela havia lutado muito antes de sua chegada. A pele geralmente da perfeita cor creme estava agora divertidamente pálida. Quando os olhos — de uma mistura de cristal e vermelho — piscaram ódio absoluto para ele, seu sorriso se alargou.

—Vou massacrá-lo por isso. — rosnou. Antes que tivesse tempo para responder, ela se acalmou, devolveu seu sorriso com outro devasso e maligno, e ronronou: — Mas só depois que eu brincar com você um pouco.

—Agora, agora, querida. — Cronus estalou sua língua. Se alguma mulher era capaz de prejudicá-lo era esta, mas nunca admitiria isso. — Isso é forma de cumprimentar seu marido de incontáveis séculos?

Rhea, a rainha dos Titãs, o olhou como se fosse um animal, e quisesse usar sua pele como um casaco da vitória.

—Uma forma melhor para cumprimentá-lo seria com uma espada balançando em seu pescoço.

Ele acenou com a mão no ar como se não tivesse importância, a ação de certo modo paternalista reacendendo a chave de seu temperamento.

—Cuidado, minha querida. Corre perigo ao protestar muito.

—Argh! — Com seu demônio, Discórdia, piscando as escamas rubi e os ossos se retorcendo sob a superfície de sua pele, ela intensificou sua luta. —Vai pagar por isso.

—Já disse inúmeras vezes. Ai de mim! — Ele soltou um suspiro de zombaria, quase inaudível sobre a respiração rouca dela. —Como se humilha, coração do meu coração, mas continue. Minha parte favorita é quando percebe que nada pode fizer, nada que disser, vai ajuda-la, e cai em derrota.

Apesar de seu sarcasmo, ela, de fato, continuou a lutar. E quando seus próprios pulsos e tornozelos latejaram em protesto, ele perdeu sua diversão. Estava ligado a esta criatura horrível. Conectados de uma maneira que não podia escapar.

Quando alguém a feria, ele era ferido também. Não importa onde estava ou o que estava fazendo. Da mesma forma, quando ela sentia prazer, assim o fazia. Sim, sempre sabia quando ela estava na cama com outro homem. Mas em compensação ela sempre sabia quando ele estava na cama de outra mulher.

Talvez fosse por isso que se desprezavam com tanta paixão, e por que haviam escolhido lados opostos da guerra travada entre imortais e seus inimigos humanos. Cronus havia se alinhado com os Senhores do Submundo, e Rhea com os Caçadores.

—A morte é muito gentil para você! — Cuspiu antes de cair flácida contra o colchão como ele havia previsto, a transpiração pontilhando cada centímetro de seu corpo e fazendo-a brilhar.

Gostava de vê-la desta forma. Desamparada, nua e totalmente incapaz de se proteger ou se cobrir. Ela tinha seios exuberantes com belas pontas morenas. Uma barriga suave, coxas até mesmo mais suaves. E uma vez, realmente a havia amado. Teria dado a ela qualquer coisa, poderia ter dado tudo para fazê-la feliz. Na verdade, havia dado tudo.

Embora a conhecesse melhor, havia partilhado seu trono com ela. Até mesmo compartilhado suas habilidades divinas. Ele havia ansiado por ela tão absolutamente, não tinha desejado existir se ela não pudesse estar ao seu lado, governando com igual poder.

Com o passar dos séculos, porém, ela começou a mudar. De ardente para gananciosa, de afável para cruel, sua sede de poder superando a dele própria. Finalmente o traindo numa tentativa de usurpá-lo. Ela era a razão dele ter sido encarcerado dentro do Tártaro. Ela era a razão pela qual os Titãs terem sido derrotados pelos gregos. Pelo menos os que ela havia ajudado na insurreição contra ele a haviam traído do mesmo modo.

Agora, nada a salvaria de sua ira eterna.

—É outra vez, meu bichinho de estimação. — disse ele, toda suavidade de suas emoções indo embora.

Durante uma de suas muitas altercações na prisão, depois dele ter matado seu amante e ela matado a dele, juraram nunca mais machucar as pessoas mais próximas do outro, e foi uma promessa inquebrável. Portanto, Cronus não podia tocar o precioso Galen ou qualquer um dos principais conselheiros de Galen — embora Cronus tivesse finalmente encontrado o covil do bastardo, bem como seu primeiro no comando, o novo detentor da Desconfiança, Fox. Por sua vez, Rhea não podia tocar em qualquer um dos seus senhores.

Poderiam, no entanto, prejudicar os soldados menores. Como ele provaria logo.

—Sua escolha, Rhea. Eu bato em você, ou mato um de seus caçadores.

O homem ajoelhado ao lado de Cronus se sacudiu com a ameaça, miados filtrando-se de seus sangrentos lábios, mas nunca falou uma palavra. Apenas uma tentativa, mas poderia ser porque Cronus já havia cortado sua língua.

Cronus queria que Rhea escolhesse seu castigo, e não se importava que ele, essencialmente, estivesse punindo a si mesmo. Fazê-la sofrer cancelava todas as outras preocupações.

—O que vai ser? — Todo dia oferecia a mesma escolha, e cada dia ela dava a mesma resposta.

—Acha que me preocupo com um ser humano frágil e inútil? — Ela ergueu o queixo, seu olhar fixo permanecendo em Cronus, completamente desprovido de medo ou piedade. —Mate-o.

Um gemido escapou do Caçador.

Não, a resposta dela não havia mudado. Cronus poderia ter batido nela de qualquer jeito, e talvez um dia o fizesse. Por enquanto, gostava de dar o que ela pedia. Gostava de pensar que ela seria assombrada por seu egoísmo pelas próximas décadas.

— Muito bem. —Cronus esticou o braço livre, convocou uma espada de nada além do que ar, e golpeou. A cabeça do Caçador caiu no chão com um baque. Seu corpo logo em seguida.

O cheiro de cobre revestiu o ar.

A expressão trovejante de Rhea permaneceu a mesma, intocada pelo remorso. —Se sente melhor agora, meu garanhão? Se sente como um homem grande e forte?

Cadela. Ele não permitiria que ela tivesse vantagem.

—Não se importa nada com seu exército cada vez menor? Os próprios homens lutando por sua causa.

Um ombro nu levantou num encolher de ombro casual. —Sinto o mesmo pelo meu exército do que sente pelo seu, tenho certeza. Nada.

Não, não gostava de seus Senhores, mas respeitava sua força e determinação. Ou melhor, tinha. Ultimamente os guerreiros estavam muito ocupados se apaixonando, muito preocupados com suas próprias brigas insignificantes, e agora muito ocupados salvando Kane, o guardião do Desastre para dar atenção às ordens de Cronus. Ainda assim, eram um anteparo entre Cronus e a morte eterna, então precisava deles.

Franziu a testa ao pensar em tudo que tinha acontecido para trazê-lo para este momento. Há muito tempo atrás, o Primeiro Olho Que Tudo Vê sob seu comando, um ser capaz de ver o céu, inferno, passado e futuro havia profetizado que um homem cheio de esperança voaria até ele com suas asas brancas e o decapitaria. No momento, Galen ainda não tinha sido criado. Portanto, Cronus presumiu que um anjo assassino viria por ele, e foi por isso que se opôs contra os soldados de elite da divindade. A guerra eclodiu entre anjos e deuses, gregos e Titãs, e até mesmo aqueles sobre a terra sofreram.

Enfraquecido pela luta incessante, Cronus se viu derrotado por Zeus e jogado no Tártaro. Logo depois Zeus criou os Senhores, Galen entre eles, para servir como seu exército pessoal, prontos para defendê-lo, caso os Titãs se levantassem de sua decadente prisão. Mas em um louco ataque de ressentimento, aqueles mesmos guerreiros abriram a caixa de Pandora, liberando os demônios e causando mais estragos num mundo que ainda se recuperava da guerra celestial. Quando Zeus infligiu sua punição, decretando que cada um abrigaria um demônio dentro de si, Galen foi emparelhado com o demônio da esperança, asas brancas brotando de suas costas. Então, Cronus fugiu da prisão imortal, e o mais novo Olho que Tudo Vê pintou o mesmo futuro já anunciado, desta vez mostrando a vitória de Galen sobre ele.

O que o primeiro Olho havia dito a ele — e o mais novo ainda não sabia, — era que havia um caminho para ele se salvar. Uma mulher com asas de meia-noite, que tinha vivido entre seu inimigo, mas ansiava por uma vida com seus aliados, e seria sua salvação.

Aquela mulher era Sienna. Tudo nela se encaixava na descrição do Olho, desde sua aparição até suas circunstâncias.

Portanto, ela tinha que fazer como o Olho havia dito que ela deveria fazer. Reinar ao lado de Galen, apesar de seu desejo de ajudar os Senhores. Só ela podia manter a atenção de Galen, embora ela ainda não soubesse como nem por que e Cronus não diria a ela. Só ela podia protegê-lo contra a própria Rhea, se alguma vez sua esposa ficasse livre. Só ela podia parar os ataques de Galen contra os Senhores, mas matar o guardião da Esperança não pararia a profecia que viria a acontecer. Seu demônio seria dado à outra pessoa, e alguém se tornaria então o assassino de asas brancas do rei Titã.

—Vou escapar, sabe. — disse Rhea, e parecia confiante.

Se essa confiança resultava de suas habilidades ou sua capitulação, não tinha certeza. Não importava. Esfregou um dedo sobre uma sobrancelha, outro gesto de desprezo. —Não, eu não sei. Nunca vi uma deusa tão fraca.

Só ele podia desbloquear suas correntes, e planejava nunca fazê-lo. Entre seus crimes mais recentes, ela havia convencido a irmã a se tornar amante dele e espiã para ela. Outra razão para a insistência de Cronus que Sienna fizesse o mesmo com Galen.

—Um dia... — ela soltou.

Moveu-se para o lado da cama, longe do corpo morto e mais perto de sua odiada esposa. —Vai me arruinar. Vai me prender. Vai... Que outras ameaças emitiu, hein?

—Vou descascar sua pele, cuspir em seus ossos e dançar na poça do seu sangue.

—Soa como uma noite verdadeiramente espetacular. Até então, acho que vou ter um pouco de diversão. — Com um único aceno de sua mão, chamou uma das incontáveis mulheres que residiam atualmente em seu harém. Uma ruiva com a pele muito bronzeada e bochechas rosadas apareceu ao lado dele. Ao contrário de algumas das outras que possuía, ela realmente gostava de atender às suas necessidades.

Hoje, usava um tecido transparente de seda e rendas, joias que tinham pertencido à Rhea e um sorriso mais brilhante que qualquer sol. Vendo a rainha Titã tão impotente na cama, e sabendo que era a favorita dele, inchou de orgulho, jogou seu cabelo sobre o ombro e acenou presunçosamente.

Rhea sibilou.

E é por isso que a escolhi, pensou com um sorriso interior.

Reconhecendo os diamantes enrolados em torno do pescoço da garota, Rhea lançou um vomitar de maldições.

—Majestade. — disse a garota com uma reverência, acima da a rainha para provar o quão pouco se importava. A fragrância cítrica flutuava dela. —O que posso fazer por você?

—Pode mostrar a mulher na cama o quanto seu homem a agrada. — Ele acenou para ela ficar na frente dele, onde ele se inclinou sobre ela, seu rosto na frente de Rhea.

—Ela não sabe agradá-lo? — A garota perguntou.

A rainha deu outro silvo e tentou mordê-la.

—Chega disso. — Seu olhar sobre sua esposa, ele abaixou o zíper de suas calças de couro. Desprezava vestir tal roupa apertada, mas Rhea achava este tipo de roupa atraente, e sua necessidade de vingança ultrapassava em muito qualquer desejo de conforto. —Sabe o que deve dizer para impedir que isso aconteça. — disse à sua esposa. Rhea só devia admitir a derrota, prometendo sempre obedecê-lo.

—Vou morrer primeiro.

—Muito bem.

Tomou à serva e o prazer era intenso — e nunca iria admitir que isso foi tão satisfatório somente porque manteve os olhos em sua esposa. Ela, porém, fechou os olhos para bloquear sua imagem. Não importa. Ela sentia cada sensação junto com ele, e isso era suficiente. Por agora.

Quando terminou, endireitou suas roupas com as mãos trêmulas pela força da sua liberação, o que era humilhante — um rei deve se recuperar rapidamente — e enviou a serva sorridente longe.

—Bastardo. — Rhea disse numa respiração ofegante. —Te odeio. Com todo meu ser, te odeio.

—Como eu te odeio.

Um sorriso de divertimento genuíno de repente curvou os cantos de sua boca. —Sabe, Cronus, querido. Não gosta de sua puta tanto quanto eu gosto do meu.

As palavras foram cuidadosamente calculadas, um golpe contundente ao seu orgulho masculino. Mas ele teve o cuidado de manter sua própria expressão igualmente divertida. —Sabe, querida. — disse ele. —Pode ter apreciado seus homens, mas só os teve uma vez antes que eu os encontrasse e matasse. Eu, por outro lado, já estou ansioso para ter a ruiva de novo amanhã.

 

PRESAS EM SEUS BRAÇOS. Garras em suas pernas. Chifres espetando seu estômago. Pelo menos Paris seriamente esperava que fossem chifres em seu estômago. Por um tempo algumas das gárgulas caíram em cima dele como cães no cio enquanto suas amigas tentavam acorrentá-lo abaixo. Não iriam amordaça-lo. Ele teria permitido as restrições, se não visse Sienna. Ela estava aqui. Livre. Sem restrições.

Ela tinha olhado para ele, tinha encontrado seu olhar fixo e a tristeza flutuou dela. Tristeza e arrependimento, e até mesmo horror. Os óculos com aros de tartaruga que havia usado uma vez havia ido embora, provavelmente sua visão perfeita na vida após a morte, mas seus traços eram os mesmos. Grandes olhos castanhos, carnudos lábios vermelhos. Um fluxo de ondas de mogno, agora até a cintura.

Sua mulher. Minha. Um por um, seus amigos se apaixonaram, e ele tinha ficado tão ciumento. Agora, aqui estava a mulher que o fascinava como nenhuma outra. Ele pensou, devia chegar até ela... devia apagar o horror...

Sexo havia pensado, deve tê-la.

Agora seu demônio tinha se retirado para o fundo da sua mente, o covarde, enquanto Paris abria caminho através das gárgulas para correr atrás dela. Num instante, suas captoras o cercaram, seu fervor intensificado. Ele jogou uma, depois outra, depois outra ainda, batendo os corpos rígidos nas paredes de pedra. Recuperavam-se imediatamente e voltavam por ele. Mais arranhões, mais espetadas.          

Elas o retardavam, mas não detinham. Estava fraco e crescentemente mais fraco porque não havia tido relações sexuais todos os dias. Não havia feito sexo ontem, também. Já havia se esquecido. Qualquer que fosse. Sienna estava aqui, e com um olhar, ficou duro por ela.

Pode tê-la novamente. Nenhuma dúvida sobre isso agora.

Só tinha que chegar até ela.

Enquanto a escuridão se levantava dentro dele, escurecendo sua mente com pensamentos de destruição e morte, não ofereceu mais nenhuma resistência, permitindo ser levado mais e mais para o lugar onde só demolir os obstáculos em seu caminho importava. Essas gárgulas queriam impedi-lo de chegar em sua mulher. Não mereciam viver.

Um passo, dois, três, as coisas arranhando suas coxas, suas panturrilhas, pendurando em seus tornozelos, abria caminho para o salão. Todo o tempo socava a cabeça, chutava e apunhalava em vão. A pedra rachava. Pedaços se espalhavam pelo chão.

—Sienna! Onde...

Ela voou em torno do canto, o cabelo escuro emaranhado atrás dela, seus olhos castanhos selvagens e brilhantes. Num piscar de olhos, o mundo abrandou e notou detalhes que havia perdido antes. Seus lábios estavam mais inchados que o habitual, com gotas de sangue seco nos cantos. Um hematoma coloria seu rosto, uma prova azulada da dor que tinha sido forçada a suportar. Uma das suas asas de obsidiana estava dobrada num ângulo estranho, claramente quebrada.

Ela havia sido ferida. Alguém a havia magoado.

Vermelho se misturava com preto, ambos mergulhando tão densamente em seu cérebro que comprometiam sua linha de visão. Cintilações de raiva provocaram milhares de fogos deve-matar-deve-proteger, cada um em guerra com os outros. Em suas veias, o sangue dele derretia, transformando os movimentos bruscos em fluidos arcos letais.

Com um rugido, arremessou outras duas gárgulas. Agarrou outra pelo pescoço e socou, socando, socando, criando um buraco na bochecha da criatura, o resto da pedra estilhaçando pouco a pouco. Ainda assim, a criatura lutou contra a repressão de Paris, os dentes mastigando seu punho.  

—Deixe-as acorrentá-lo, — Sienna gritou. —Por favor, deixe-as acorrentá-lo.

Ela o queria acorrentado? O odiava tanto quanto ele havia temido? Não importa. Sua ordem e apelo foram descartados, sua determinação inabalável. Devia matar... Soco, soco. O inimigo deve morrer. Soco, soco, soco. Punhalada. Os obstáculos devem ser eliminados. Soco, facada. Detritos voavam em todas as direções. As gárgulas esqueceram seu desejo de prazer, ou o que sentiam ao se contorcer sobre ele, e passaram ao ataque total, não mais vindo com calma.

Sienna chegou até ele, com cheiro de flores silvestres e... ambrosia? Ele inalou profundamente. Oh, sim. Doce perfume de ambrosia permeava sua pele, ofuscando todo o resto, incluindo a necessidade de matar, mas, oh, agora ele queria beber. Tinha que absorver. Sua boca salivou, mesmo que se perguntasse por que ela tinha o cheiro da droga imortal que havia se obrigado a parar de usar não muito tempo atrás, quando foi ferido durante uma briga, que ganharia se estivesse lúcido. Seus ferimentos quase o haviam feito perder seu encontro com uma deusa para comprar lâminas de cristais, e havia decidido então parar de usar. Felizmente, tinha passado pelo pior da abstinência, não podia se dar ao luxo de passar por isso novamente. Pararia de se preocupar com tudo, exceto sua próxima dose.

Quero-a. Tão perto como agora estava, Sexo se animou, derramando força direto no sistema de Paris e mudando a direção de seus próprios pensamentos. Deve tocá-la... deve fazê-la sua...

Pela primeira vez, estavam de acordo.

—Tem que deixá-los acorrentá-lo. — Quando ela tentou empurrar duas das gárgulas longe dele, elas se voltaram para ela, algumas mordendo, arranhando um pouco, algumas golpeando a cabeça dela. Seus joelhos entraram em colapso sob seu peso.

Outro rugido rasgou sua garganta. Ela havia tentado salvá-lo? A ideia era muito estranha para ele. Ignorando as bestas ainda tentando dominá-lo, se concentrou naqueles que subiam em cima dela. Pegou uma e jogou. Pegou outra, jogou.

—Corra! — Ordenou a ela.

A bestas se voltaram para ele num piscar de olhos. Tentou derrubá-los longe, abrindo caminho para ela, mas ela não correu. Estava ofegante, seus membros imóveis, nem mesmo tentando se proteger.

Seu olhar fixo aquoso implorava.

—Por favor, Paris. Pare. Não lute contra elas.

Hálito quente retida em sua garganta, e embora todos os instintos que possuía gritasse para continuar lutando, continuar machucando tudo e todos em seu caminho, plantou os calcanhares no chão, embainhou suas lâminas e baixou os braços. Ela tinha tentado salvá-lo, confiaria nela.

Iria se render.

Por um momento, os animais se aproveitaram, convergindo para ele como moscas no mel. Inabaláveis. Como Sienna, permaneceu imóvel. Surpreendentemente, o frenesi de combate logo diminuiu. As gárgulas agarraram seus braços e mais uma vez começaram a arrastá-lo para a prisão onde já haviam trancado William.

Sienna se moveu devagar sobre seus pés e o seguiu, nunca permitindo que o contato visual fosse quebrado. Uma coisa boa. Se ela o fizesse, teria explodido tudo de novo. Não podia perder, mesmo que pouco.

—Vão te deixar em paz depois que te acorrentar. — Sua voz tremeu, baixa pela dor. —Simplesmente têm que completar sua tarefa, e então estará livre para fazer o que quiser.

Quero-a...

Apesar de seus ferimentos, ele endureceu uma segunda vez, seu perfume demoníaco flutuando dele, um chocolate rico misturado com o champanhe mais caro. Se precisava de mais provas que poderia ter essa mulher de novo, aqui estava. Poderia tê-la tantas vezes quanto quisesse, porém quantas vezes ela permitisse a ele. Ficou impressionado. Foi absolvido.

Estava desfeito.

Finalmente estava com a mulher que desejava acima de todas as outras.

As bestas que não seguravam seus membros saltaram de volta em cima dele, se esfregando contra ele de forma repugnante. Mais duramente desta vez, e muito mais determinado. Mesmo sua necessidade de concluir o seu dever e acorrentá-lo não podia substituir o fascínio pelo seu demônio, supôs. Não deu atenção a eles, manteve seu foco em Sienna.

Ela estava aqui, nunca se cansaria desse pensamento, e era linda de tirar o fôlego, a essência de tudo que era feminino. Mesmo suja com sangue endurecido como estava, nunca viu uma mulher mais requintada. Sua mente não a havia imaginado durante sua separação. Pelo contrário, sua mente não a havia feito justiça. Aqueles olhos castanhos brilhavam com redemoinhos esmeralda e cobre, indícios de verão e inverno combinados, emoldurados por espessos cílios. Seus lábios fazendo biquinho sensual e totalmente perverso. Boas mulheres pagavam para tê-los e homens pagavam para usá-los.

Seu cabelo não era muito escuro ou muito claro, mas no tom perfeito de castanho-avermelhado com mechas brilhantes do mais puro ouro. Suas mechas estavam mais longas que antes, com ondas fascinantes como as de um oceano.

Suas sardas tinham clareado, mas estavam tão luxuriosas como sempre, um mapa do tesouro para sua língua. O resto de sua pele, creme e pétalas de rosa, brilhava como se tivesse engolido o sol. Seu corpo, tão delgado, tão elegante, era tão gracioso quanto o de uma bailarina. Seus seios pequenos, mas iriam se encaixar surpreendentemente bem em suas mãos grandes, quando lambesse seus mamilos. Suas pernas eram longas e se envolveriam em torno de sua cintura, segurando-o firmemente.

Minha, ele pensou. Minha.

Tome-a. Sexo tinha abandonado o eu quero e eu preciso, e agora era todo sobre ordens. Como se Paris discutisse. Uma pergunta o atormentava, no entanto. Será que estar com ela pela segunda vez realmente o fortaleceria?

Ao virar a esquina, William esperava — e estava sorrindo, seu elétrico azul chamando Paris de todos os tipos de estúpido. Ele tinha se soltado de suas correntes, como Paris deve ter feito para evitar a surra, e acenou quando Paris passou por ele. As bestas não lhe deram nenhuma atenção, ainda agarrados a Paris e provando a alegação de Sienna. Ele relaxou. Tão perto de segurá-la, tocá-la como havia sonhado.

Oh, as coisas que queria fazer com ela...

Ela poderia afastá-lo, ou não. De qualquer maneira, finalmente ia descobrir.

 

PARIS ASSISTIU ENQUANTO WILLIAM fluía em movimento ao lado de Sienna. Ainda assim ela não desviou o olhar dele e se perguntou quais pensamentos a entretinham. Estaria o corpo dela reagindo ao dele, como o dele reagia ao dela?

Paredes respingadas de sangue a emolduravam, e Paris amaldiçoou. Daria qualquer coisa para vê-la cercada de sedas e veludos. Faria isto antes de deixá-la partir. Um voto, até o pensamento de deixá-la ir o querer fazer uivar.

—Bom vê-la novamente, Sienna — William disse tão agradavelmente quanto podia. O gelo em seus olhos desmentia sua fachada amável.

Paris ficou tenso. Se o guerreiro a machucasse…

—Nós nos conhecemos?— Ela perguntou.

Por um momento, William irradiou confusão absoluta. Então sua expressão clareou e ofereceu um sorriso doce como açúcar. —Me aflige que não se lembre, mas não me importo em lembrar a você. Permita-me pintar a cena. Estávamos no Texas e você estava abaixada no concreto como um cachorro, segurando Paris como uma sanguessuga. — Seu tom cruel, sarcástico era para intimidá-la, pô-la em seu lugar por tudo que ela fez a Paris.

—O tom— Paris estalou. Ela podia ter errado com ele, mas não permitiria que fosse desrespeitada.

Sienna encolheu os ombros, aparentemente desinteressada do que o guerreiro disse. —Terá que me perdoar por não notá-lo então. Perto dele, você é um tanto quanto feio.

William sufocou com sua própria língua.

Pela primeira vez desde sempre, Paris sorriu com diversão verdadeira. A única outra vez que testemunhou tal coragem dela foi quando o drogou. Não gostou disto então, mas gostava agora, especialmente quando era dirigido a outra pessoa.

William tomou fôlego e adicionou: —Só para saber, a matarei se prejudicá-lo de qualquer forma. E não me importo o quanto isso o chateará. —Tão calmamente declarado não havia discussão quanto à intenção do guerreiro. —Paris tem provado ser estúpido no que concerne a você e isso significa que seus amigos devem preencher sua lacuna mental.

Lá se foi sua diversão. Um grunhido animalesco saiu dele, seus lábios se afastando para mostrar seus dentes. A escuridão subindo novamente… a ira retornando… Paris lutou para libertar seus braços, com a intenção de envolver os dedos ao redor do pescoço de William e esmagar. Ninguém ameaçava Sienna. Ninguém. Nunca.

Você realmente não quer feri-lo. Pare. Um apelo bem no fundo de si, onde sobras do antigo Paris deviam ainda residir. A lealdade de William era uma surpresa boa, e algo que apreciava num nível visceral.

No que concernia a Sienna, porém, Paris não era exatamente racional, e sua luta se intensificava. Deve defendê-la…

As gárgulas pararam de arrastá-lo, pararam de encoxá-lo e voltaram a lutar com ele, o empurrando para o chão e numa pilha de ossos. Elas se agarraram a ele com suas garras e dentes.

—Vê?— William abriu seus braços, seu ponto provado. —Estúpido

Mordendo dentro de sua bochecha, Paris se forçou a se calar pela segunda —terceira? — vez. Soprou e bufou como o grande lobo mau que era, sabendo que teria uma chance de marcar seu ponto com Sienna mais tarde, quando pudesse alcançar suas facas. Seus amigos podiam fazer e dizer qualquer coisa que quisessem a ele, mas não a ela.

Uma vez mais as criaturas perderam o interesse na batalha e retomaram a caminhada para a prisão.

Sienna e William continuaram a seguir, e logo os pulsos e tornozelos de Paris foram acorrentados a uma parede de pedra numa câmara de quatro por quatro desprovida de quaisquer luxos. Garras raspavam o chão, conforme as criaturas saíam cada uma grasnando alegremente sobre o que claramente consideravam um trabalho bem feito.

Sienna cortou o contato visual e caiu ao lado dele, seus dedos trêmulos trabalhando numa das bandas de metal. Ele poderia ter se libertado. Ou inferno, William poderia o ter libertado, mas Paris gostava de ter essas mãos suaves e elegantes nele. Elas eram sua parte favorita do corpo dela, cada movimento uma dança exótica.

Num fôlego, ela disse, — Estão encarregadas de acorrentar qualquer um que sobreviva à caminhada da ponte levadiça até o castelo, e uma vez que isso é feito, perdem o interesse. Estará livre para se mover sobre o local tanto ou tão pouco como queira.

Ele fechou seus olhos por um momento, deixando que as palavras dela soassem como brisa por sua mente. Rouca, baixa, uma carícia que sentiu falta mais do que percebeu. Podia escutá-la para sempre.

Será que parte dele ainda a odiava? Sim. Definitivamente. Odiava o que ela fez a ele, odiava o que ele fez por ela. Odiava quão forte ela o afetava. E por baixo de todo esse ódio, se ressentia que ela não visse além de seu próprio ódio para escolhê-lo tantos meses atrás, do jeito que ele escolheu.

Ele a teria levado para sua casa. A teria mimado. Pelo menos, é o que dizia a si mesmo agora. Não contemplaria o que faria a ela antes do início dos mimos. Não pensaria sobre o interrogatório que planejou ou as algemas que imaginou comprar para ela.

—Estou tendo problemas… Não posso... A queda deve ter me machucado mais do que eu imaginei. — Sua voz se diluía a um mero fiapo de som, quase inaudível. —Então… desculpe… — Suas mãos caíram longe dele, e ela caiu para frente, seu peso leve descansando no peito dele.

—Sienna?— Ele perguntou, mas não houve resposta. Qualquer um que pudesse vê-la e tocá-la podia ferir sua forma de espírito; sabia disto. E as gárgulas certamente eram capazes de vê-la ou tocá-la. Mas sem uma batida do coração ou a necessidade de respirar, ela devia se recuperar rapidamente. Certo? Exceto que a manchas de sangue ao redor de sua boca… como ela havia sangrado? Ele se perguntava agora.

—Deve ter desmaiado pela visão da minha beleza, — William observou com um suspiro. —Lá se vai a luta de cócegas que planejei.

Ignorando-o, Paris puxou um de seus braços, arrancando a corrente da parede. Passou o braço em torno da cintura de Sienna, a segurando contra ele, mantendo-a firme.

Ela encaixava perfeitamente.

Depois que puxou o outro braço livre, ele a acomodou de costas e olhou para ela, seu coração causando um tumulto de sensações em seu peito.

A cabeça dela pendeu para o lado e estava pálida, mais pálida que antes. Outro puxão, seguido por outro, e seus tornozelos estavam livres. Então puxou as algemas para si até que caíram. Então fez o que queria fazer desde o primeiro momento que a viu. Ele a tocou, alisando o cabelo de sua testa. Sua pele era tão suave quanto parecia, e morna, tão maravilhosamente morna. Ansiava por um momento como este tão desesperadamente, sonhou com ele inúmeras vezes, e quase se matou cem vezes mais para tê-lo. Para seu encanto, a realidade era muito melhor que o sonho. Mais que sentir seu calor, sentiu seu cheiro ao redor dele, o envolvendo. As flores silvestres, a doçura da ambrosia de coco, ambos criando um inebriante almiscarado de excitação.

Por que ambrosia? Não podia passar por isso. Ela era uma usuária? Nesse caso, apostava que alguém, como, digamos, Cronus, a forçou a se tornar uma. Ela não era do tipo de cair nas drogas de boa vontade. Do pouco que conhecia dela, gostava de ordenar e almejava controle.

Vou protegê-la de novos abusos, ele pensou em seguida. Ela era sua. Por apenas um pouco, ela era sua.

Sexo dava pulos de cima abaixo. Tome-a, tome-a, tome-a.

O instinto exigia que obedecesse. Ele ainda resistia. Não desta forma. Não enquanto está desmaiada.

Um suspiro de frustração, talvez até um murmúrio você não é divertido conforme Paris a olhava, protegendo-a do olhar de William enquanto movia sua roupa fora do caminho para verificar se havia lesões. Cada centímetro de pele revelada agia como uma lambida de chama para Sexo, fazendo o demônio silvar e se agitar. Ou talvez você seja divertido.

Apesar de Paris admirar o corpo debaixo dele da mesma maneira fervorosa que seu companheiro sombrio, silvou e se agitou por uma razão diferente. Outra origem da escuridão, outro aumento de ira fervendo. Sob contusões desvanecendo, sua mulher estava tão marcada por presas e garras quanto ele, sangue escoando dela em minúsculos rios de dor.

Sua próxima missão cristalizada. Descobrir como machucar as gárgulas e então fazê-las pagar por cada marca.

Realmente fazê-las pagar, decidiu quando avistou um profundo e inflamado corte na lateral dela. Tomou fôlego profundamente para tentar se acalmar, mas inalou tão drasticamente que seus pulmões pareciam mini-aspiradores, atraindo o ar com força de comando. Seus músculos tensionaram, sua cabeça embaçou tudo de novo e sua boca umedeceu. Realmente podia saborear a ambrosia no ar. Com o cenho franzido, se abaixou e cheirou ao longo da linha do pescoço dela. Quanto mais perto dela chegava, mais intenso se tornava o cheiro.

—Pervertido, — William disse.

—Você pode ser sério?

—Eu estava sendo sério. Sempre imaginei você como do tipo entra e sai. Furtivo, dissimulado, deixando a garota se perguntando se esteve lá ou não. Mas não sabia que era tão camuflado.

—Bom saber que vem considerando minha vida sexual, — ele murmurou.

—Todo mundo não o faz?

—Dane-se você.

—Novamente, todo mundo não o faz?

—Isto é inútil. — Outra fungada. A névoa espessou e o cérebro de Paris praticamente nadou através dela. Será que a fragrância se originava do sangue de Sienna? Ainda outra fungada, outra infusão da sempre-espessa névoa. Sim, estava definitivamente em seu sangue—e em grande quantidade. Mais do que mesmo um viciado podia lidar. Seu odor era tão forte como se ela estivesse realmente crescendo num campo de ambrosia.

O que devia ser impossível. Certo? A ambrosia era colhida em prados especiais em outro lugar nos céus, tão longe deste reino escuro quanto a Lua estava da Terra. As pétalas de lavanda eram arrancadas da folhagem, o líquido claro e inebriante espremido antes daquelas pétalas serem secadas e transformadas em pó. Ninguém podia lidar com o líquido, nem mesmo os imortais, e humanos certamente não podiam lidar até mesmo com o pó.

Mas Sienna não era mais humana, de fato.

Estava envergonhado em admitir que estava tentado a mordê-la, beber dela e saborear cada gota. Ele foi para o caminho do vício, o percorreu realmente, mas de alguma maneira conseguiu contornar a borda da necessidade durante sua jornada aqui, sabendo que sua genialidade era exigida para ter sucesso. Se só isso diminuísse a doce atração, atormentando sua isca agora mesmo… mas não.

—Tão interessante quanto isto é, e honestamente, não quero interromper seu processo de sedução, — William disse, citando[9] as últimas duas palavras, — mas chegará ao que interessa ou o que?

—Pensei ter dito que calasse a boca.

—Não, disse para me danar, e isso foi há cinco minutos. Muito mudou desde então. Tipo, eu atualmente estou entediado.

Mordendo sua língua até que saboreou o cobre, Paris terminou sua procura por lesões. E merda, havia outro tiro de desejo—seu próprio e não de seu demônio. Ele não devia notar aqueles mamilos rosados adoráveis, não devia notar a depressão suave de sua barriga ou o comprimento elegante de suas pernas. Não devia estar contando suas sardas, já planejando o ataque de sua língua. (Começaria com as mais escuras em seu estômago, e trabalharia seu caminho para as mais claras em suas coxas.) Ele era um bastardo. Estava doente, era repugnante. Devia ser chicoteado.

Quando ela acordar, ela cuidaria disso por ele, apostava.

Odeio-me.  —Ela já está morta, — ele rangeu os dentes. Ele notou que seu pulso direito já não tinha mais a imagem do infinito, um símbolo usado pelos Caçadores. —Por que está sangrando? Não devia se curar tão depressa quanto nós?

—Oh, agora quer conversar comigo?— O guerreiro brincou.

—Só responda a pergunta antes que eu corte sua língua e a pregue na parede.

—Realmente perdeu seu senso de humor, sabia? Mas tudo bem. Certo. Vou participar. Ela está morta, sim, mas também está possuída por um demônio que está muito vivo. O coração dele bate por ela. Seu sangue enche suas veias. Eu não devia ter que explicar a fisiologia de um demônio para você. E que diabo é este cheiro? É de dar água na boca. Uma verdadeira festa para meu...

—Pare de respirar!— Paris não queria que mais ninguém sentisse o aroma dela.

—C-certo. Muito possessivo?

—Vamos voltar para o assunto que não vai deixá-lo aleijado. Ela está possuída por um demônio, sim, mas também é um espírito de uma humana morta. Então…

—Então, ainda é capaz de tocá-la.

Emprestando a frase do bastardo: Muito óbvio? —O que estou perguntando é será que vai se curar?

—Sim, porque seu demônio se curará. E aqui está uma pequena dica para a próxima pessoa mantida em cativeiro por sua conversa atordoante. Devia ter começado com isso e nos economizado tempo e problema.

Certo. Certo, então. Bom. Ela ia se curar. Paris a pegou em seus braços—puto de novo com as gárgulas. O que soltaram sobre ele… estava agora sobre sua mulher.

Sexo adorou o contato e ronronou sua aprovação.

—Estou levando-a para cima, à procura de um quarto. — Paris a limparia e a enfaixaria. Se não acordasse e exigisse que a deixasse malditamente sozinha primeiro. —Não está convidado.

Por mais que a quisesse acordada, olhando para ele, conversando com ele, esperava que dormisse durante a limpeza. Estava desesperado para colocar suas mãos nela, realmente nela. Sim, era um doente, bastardo doente. Mas essa não era a razão principal, disse a si mesmo. Não queria que ela sentisse qualquer dor enquanto a manipulava.

Ele estudou as correntes por um segundo, pensando que poderia ser uma boa ideia amarrar Sienna a uma cama enquanto tinha a chance. Deste modo, não podia fugir até que tivessem discutido algumas coisas. Mas não percorreu todo este caminho, fez todas aquelas coisas, só para escravizá-la. Sua meta era, e sempre foi, sua liberdade.

E merda. Talvez ela não fugisse dele. Mais cedo o ignorou, assistiu enquanto passava por ela, mas alguns minutos mais tarde, ela correu em seu salvamento. Qualquer que fosse a razão para a mudança, ela não procurou se livrar dele.

Ele esfregou seu rosto contra o topo da cabeça dela, deleitando-se ao sentir seu cabelo sedoso antes de carregá-la para fora da cela. As gárgulas não se incomodaram em fechar as barras de ferro que manteriam William e ele do lado de dentro. Pelo menos até que escolhessem a fechadura, era assim.

—Você é tão maricas,— William disse, andando ao lado dele. —Espero que saiba disso.

—Realmente? Não sou eu quem carrega condicionador para todo lugar.

—Talvez seja por isso que seu cabelo tenha tantas pontas duplas.

—Fale sobre seu cabelo mais uma vez. Acordará careca.

—Isto é uma coisa ridícula para se dizer. Nós dois sabemos que eu teria seus intestinos derramados antes de você conseguir aproximar a navalha de mim. — William levantou seu queixo. —A propósito, apenas um homem de verdade aceita seu lado feminino.

—Não sei quem te abasteceu com essa frase de lixo, mas posso apostar que ela está rindo de você agora mesmo.

—Surpresa! Foi sua mãe—depois que dormi com ela.

Uma piada de mãe. Que original.

As gárgulas não estavam mais no salão de baile. Paris não notou o interior antes; estava um pouquinho ocupado tendo seu traseiro chutado. Agora deu uma olhada ao redor. Era escuro, ruindo como o restante do lugar, com sangue seco nas paredes e ossos lançados a esmo.

Sobre as escadas que subiram, o tapete estava puído em vários lugares. Na seguinte elevação havia estátuas, muitas malditas estátuas. Macho, fêmea, velho, jovem. A única coisa que tinham em comum eram suas expressões de horror.

—Acho que ficará ocupado por algumas horas, uma vez que suspeito ser por quanto tempo ela ficará desacordada e pode fazer o que tem que fazer. — William escovou seus dedos acima de um par de grandes seios de alabastro. —Eu quero dizer, que esta é a razão por eu não ser convidado para me juntar a você, certo?

—É melhor calar a boca enquanto ainda tem uma cabeça. — Mesmo tão irritado quanto estava com a sugestão de William, pulsações de desejo dispararam em Paris pensamentos de ficar a sós com Sienna e tocá-la tão facilmente quanto William tocava a estátua — pequenas chamas que não sabia ao certo se as apagava ou dava boas vindas.

—Grite se precisar de mim. Tipo, se ela for demais para você.

—Esse dia nunca chegará. — Paris virou à esquerda enquanto o guerreiro virava à direita. —A propósito, se bater na minha porta, melhor estar morrendo. Porque se não estiver, logo estará. — Ele abriu caminho para o primeiro quarto que achou. Sua sorte permanecia, porque era um quarto mobiliado. Tudo que teria a fazer era remover as camadas espessas de pó e o lençol que cobria tudo.

Ou talvez devesse deixar o lençol. Porque quando Sienna acordasse, isto poderia se tornar uma zona de guerra.

 

KANE, GUARDIÃO DO DEMÔNIO do Desastre, não podia acreditar em sua sorte. Normalmente sua vida tomava o trem expresso para o inferno, independente se comprasse o bilhete ou não, com pedras caindo sobre sua cabeça, lâmpadas em curto-circuito e buracos abrindo a seus pés. Coisas deste tipo realmente podiam bagunçar com a mente de um sujeito, então ao longo dos anos desenvolveu uma filosofia que salvava sua vida: merdas ruins acontecem, mas seja o que for, lidaria com isso e seguiria em frente.

Agora estava realmente no inferno, mas não estava sendo torturado. Não estava sendo questionado e catástrofes não estavam acontecendo. Estava sendo adorado. Por demônios lacaios, claro, mas adoração era adoração, certo? Cheios de escamas, mãos com garras o acariciavam, suas cabeças com chifres esfregavam contra ele suavemente, e o resto de seus corpos… não ia pensar.

Meus. Desastre sussurrou dentro de sua cabeça, orgulho borbulhando para a superfície e lavando o corpo inteiro de Kane.

Sim, Kane sabia que estes lacaios pertenciam somente a Desastre. Há muito tempo, o Alto Senhor viveu nesta parte do inferno, governou aqui, e então escolheu deixar isso tudo para trás e fugir. E mesmo tendo passado milhares de anos desde aquele tempo, a conexão não enfraqueceu. Os lacaios, ou demônios menores sentiam seu líder dentro de Kane e o salvaram de seus atacantes.

Atualmente Kane estava empoleirado num trono de ossos recentemente… escavados. Certo, certo. Isso era um modo agradável de dizer que os ossos costumavam pertencer aos Caçadores que pensaram em machucar Kane, e só alguns dias atrás foram arrancados. E, quando considera o fato que a camisa e a calça de Kane eram feitas das peles bronzeadas deles— por causa do calor, o processo foi rápido—bem, uma cadeira de fêmures? Não era grande coisa.

Esses eram presentes, os lacaios disseram. E como podia realmente dizer, — Obrigado, mas prefiro ganhar uma torradeira. — Em vez disso, tudo que eles queriam era seu esperma.

Sim. Isto mesmo. Seu suco de bebê.

Parecia que seu demônio possuía uma veia ciumenta e, fiel ao seu nome, causou um desastre que dizimou seus subordinados machos. Somente as mulheres permaneceram e estavam desesperadas para procriar com seu Soberano Maligno favorito.

Kane não fazia sexo há séculos; o ato era simplesmente muito arriscado para suas parceiras. Então sim, seu corpo estava preparado e pronto. As demônios poderiam ter mãos calosas, mas ainda acariciavam e seguravam muito bem. Sua mente, porém, não estava muito a bordo disto.

—Para trás, senhoras, — ele ordenou. Podia ter sido simpático sobre isto, claro, mas algo que aprendeu era que demônios só respondiam bem com a força. Simpático não conseguiria porcaria nenhuma.

Mesmo assim, esperou uma briga. Ao invés disso, gemidos de decepção ecoaram e os contatos cessaram. Elas o obedeceram, se afastaram. Mas permaneceram perto, prostradas, ainda ao seu alcance, claramente esperando que mudasse de ideia.

 Dentro de sua cabeça, Desastre rondava com um propósito, infeliz com a distância. As fêmeas lhe pertenciam, eram seu direito, e queria acasalar com elas. Tome-as, ele disse.

Não. Kane não era o tipo de sujeito que poderia se afastar de seus filhos, mesmo aqueles meio-demônios, e era o que ele teria de fazer nesta situação.

Tome-as!

Eu disse não. Preferia encontrar uma saída dali. Mas toda vez que ficava em pé, e não importando o que dissesse enquanto estivesse em pé, dentro de segundos as fêmeas se apinhavam nele, empurrando suas calças ao redor de seus tornozelos. Não estava certo se Desastre as treinou para reagir tão rapidamente, ou apenas se Kane era especial.

De duas coisas ele tinha certeza. Seus amigos estavam preocupados com ele, e o estavam procurando. Não queria que descessem ali, arriscando suas vidas quando não estava mais em perigo.

Tome uma, então. Só uma.

Ah, então deveriam negociar agora, não? Bem, a resposta ainda era um ressonante não, inferno. Mas… talvez pudesse fingir, Kane pensou. Talvez se escolhesse uma das fêmeas, ficasse a sós com ela, teria uma melhor chance de escapar sorrateiramente da caverna.

Seu olhar patinou sobre os corpos contorcidos ajoelhados. Algumas tinham chifres saindo de suas espinhas, algumas asas pontudas. Algumas tinham escamas vermelhas, outras verdes. Atrás deles estava a caverna, sangue endurecido sobre as pedras irregulares, chamas ardentes em todos os cantos, e gritos dos condenados flutuando no ar quente, com aroma de enxofre. Quando achou um corpo menor sem chifres ou asas, suas escamas num tom de jade claro, apontou.

—Você. — Se por uma vez em sua vida eterna sua boa sorte ajudasse, ela seria um vínculo fraco.

Suspiros de surpresa. Silvos de ciúme.

—Quero você, — ele reiterou.

Sua escolhida parou. Suas pernas estavam retorcidas, de frente para o caminho errado. Seus pés terminavam em cascos, e quando sorriu, ele viu um bocado de dentes manchados de sangue. Desastre bateu contra seu crânio, bang, bang, desesperado para sair, tocá-la, bombear dentro dela.

Minha. Ela é minha!

E como o bastardo reagiria quando—hipoteticamente—Kane a pegasse? Assassinaria Kane, do mesmo modo que uma vez assassinou seu próprio povo? Provavelmente. Porque se conseguisse dar fim a vida de Kane, poderia permanecer aqui, um lugar de onde uma vez lutou para escapar, mas agora percebia sentir falta. Claro, se isso acontecesse, Desastre ficaria louco pela perda de seu hospedeiro humano, mas o demônio estaria livre para transar com quem desejasse, sozinho.

Falando sobre uma situação confusa.

A garota demônio mancou para o trono, e o brilho devasso em seus olhos sugeria que pretendia escalar Kane como um pônei de feira no segundo que o alcançasse, enquanto todo mundo assistia.

Bang, bang. Desastre estava no limite com isto.

Kane agitou sua cabeça e estendeu a mão, a palma para cima, parando seu progresso. —Não, desculpe. Não chegue mais perto.

Uma carranca puxou os cantos da boca dela à medida que obedecia.

—Privacidade, — ele disse. Bang, bang. Mais duro mais rápido. —Quero... tomá-la numa tenda.— Ele não estava certo sobre qual palavras estas demônios entenderiam.

—Messstre?— Sua língua bifurcada batia acima de lábios muito finos.

—Não vou tomá-la aqui. — Ou em qualquer lugar. Bang, bang. Droga. Seu demônio precisava se acalmar, inferno. —Então, construa uma tenda. — Bang. —Todas vocês. — Bang. E inferno, talvez, com sua maré de boa sorte, não teria de esperar por sua conclusão. Talvez as fêmeas estivessem tão distraídas durante a construção da tenda, que poderia sair da caverna enquanto gritasse, assobiasse, tanto faz, e elas não notariam.

—Tenda?— Ela perguntou ainda muito claramente confusa.

—Sim. Quero uma. Construa a tenda agora, e pode ter bebês mais tarde. — Com outra pessoa.

Bang! Bang!

A maior parte das lacaias se apressou a juntar o material necessário, empurrando umas às outras para fora do caminho, mas algumas retardatárias permaneceram atrás, olhando fixamente para ele. E por algumas, queria dizer um pouco mais de cem. Suspirou. Então, não haveria gritaria ou assobio na sua saída.

Desejava ser mais como Paris. Desejava que pudesse garimpar através delas — na cama e fora dela — e ser mais forte por isso enquanto houvesse distância emocional e desinteresse pelas consequências.

Claro, também seria um viciado em drogas obsecado por achar a mulher que tentou matá-lo, mas no momento, drogas e obsessão pareciam uma boa mudança de passo. E maldição. Quando Kane chegasse em casa, seria avacalhado impiedosamente sobre sua preciosa semente, seu harém de  meninas necessitadas, e sua recusa em fertilizar seus retalhos de petúnia.

Que venham, meninos. Pelo menos estaria em casa.

Casa… A palavra ecoava por sua mente, uma onda de pressentimento batendo através dele.

Algo estava para acontecer, percebeu com uma tontura de náusea. Algo terrível estava para acontecer. Um desastre… uma tragédia do pior tipo… dentro da fortaleza em Buda, onde todos os Senhores e os outros com quem se importava viviam. A fortaleza dele. Seu demônio sabia disto, sentia isto, e por sua vez, Kane também.

Estava em pé e correndo para a saída, não diminuindo a velocidade nem quando várias fêmeas se jogaram sobre ele e o seguraram no chão.

 

 VIOLA FOI RASTEJANDO ATRÁS do magnífico guerreiro chamado Maddox enquanto ele carregava sua muito grávida esposa, Ashlyn, para cima pelas escadas, passando por retratos nus de seus amigos segurando fitas com as cores do arco-íris e gordos ursinhos de pelúcia. Esta era a quarta vez que um dos residentes de Budapeste a empurrava para outra pessoa, e não conseguia entender por que ninguém queria passar mais tempo com ela.

De Lucien a Anya, que ela conheceu há séculos atrás no Tartarus. Elas foram companheiras de cela no bloco B. Anya sempre teve ciúmes dela, claro. E quem não tinha — e não estava? Hoje mais cedo a deusa menor fingiu não reconhecê-la, mas Viola entendeu a mentira pelo que era. Um apelo para ouvir tudo sobre a vida magnífica de Viola.

Uma hora mais tarde, Anya a entregou para Reyes e sua Danika. Viola estava ainda intrigada pelas palavras de despedida de Anya ao casal. —Aqui está. Leve-a. E de nada. Não precisará se apunhalar para agradar seu demônio por pelo menos um ano, Reyes.

Assim, como Viola supostamente deveria agradar um demônio angustiado-feliz como Reyes? Estava possuído pelo demônio da Dor, mas ela era perfeita… perfeita, uma alegria de se olhar e ouvir, uma verdadeira fonte de brilhantes, uma inestimável pérola de sabedoria, com grande senso de moda e um dom para a decoração de interiores.

Falando daquelas pequenas habilidades de vida, já decidira colocá-las em bom uso. De agora em diante estaria vestindo todo mundo aqui, como também redesenhando o interior e exterior da mansão. E nem mesmo cobraria deles — não mais que cem mil.

Seus olhos encheram de lágrimas enquanto sua mão tremulava para seu coração. Era tão generosa.

Uma vez, séculos atrás, fez algo não tão generoso e se enviou de catapulta numa espiral de vergonha, mas não podia recordar o que esse algo era. Nunca pôde. Seu demônio armazenava memórias negativas longe, as escondendo dela. Qualquer coisa para continuar seu caso amoroso com ela mesma. Como se pudesse alguma vez terminar com isso.

De forma nenhuma. Uma hora na conversa deles, Reyes a entregou para o anjo de Aeron, Olivia. E quinze minutos depois disto, Olivia docemente sugeriu que Viola não devia negar a Maddox o prazer de sua companhia. Cinco gloriosos (para ele) minutos mais tarde, Maddox saiu pisando duro, resmungando algo sobre encontrar sua esposa e Viola poderia se juntar a ele se insistisse. Então, aqui estavam eles, dirigindo-se ao quarto do casal.

—Tenho certeza que poderia arrumar rapidamente algum tipo de cadeira mecânica que carregasse sua esposa ao redor, — Viola disse ao guerreiro. Estava sem camisa, e a tatuagem de borboleta carmesim que se estendia por seu ombro — a marca de seu demônio — parecia fazer uma careta para ela. —Sou habilidosa com ferramentas, como provavelmente adivinhou, e suas costas estão provavelmente tensas pelo peso extra.

Ashlyn sufocou uma risada com a mão, mas falhou em sufocar o grunhido de Maddox com a outra.

—Ela é leve como uma pluma, — ele rosnou. —Gosto de carregá-la. E também aprecio tê-la só para mim.

—Certo, mas é o enterro de suas costas. Em alguns anos, provavelmente precisará de uma cinta. — Oh, sim. Sua tatuagem estava, de fato, carrancuda com ela. Um rosto carrancudo esquelético se formou entre as asas, os dentes se estendendo de uma boca minúscula. As extremidades das asas, afiados pontos cortantes, enrolavam em sua direção.

Fria, mas de nenhuma maneira comparável com a dela. A frente de sua borboleta se estendia por seu peito, estômago e pernas. A parte detrás de sua borboleta se estendia por seus ombros, coxas e panturrilhas. Um corpo totalmente tatuado que brilhava com o esplendor de diamantes rosados esmagados.

Os olhos cor de mel de Ashlyn a encontraram ao longo do ombro musculoso de Maddox. —Ele não está tentando se livrar de você.

—Sim, estou, — Maddox disse.

—Ele é apenas rabugento, — a humana terminou.

A testa de Viola enrugou enquanto tentava compreender como a pobre e confusa mulher grávida podia ter uma ideia tão absurda. Livrar-se dela? Por favor. Homens, mulheres e crianças, mortais e imortais, lutavam para mantê-la ao seu lado. —Não preocupe sua bonita cabecinha por mim, — ela disse. Não era isso que os humanos diziam uns aos outros para provar que não se sentiam ofendidos com ideias estúpidas? —Estou certa que está simplesmente inundado pela minha magnificência.

Maddox foi o único carrancudo desta vez, lançando uma expressão sombria para ela antes de parar na frente de uma porta fechada. Entretanto Ashlyn deu uma risadinha e deu o olhar ao rosto dele. Seu corpo inteiro amoleceu, derretendo como um cubo de gelo no calor do verão.

Uma pontada latejou no peito de Viola. Pensou no passado, mas não pôde se lembrar de ninguém que já tivesse olhado para ela assim, como se fosse o sol matutino, a lua da meia-noite, e toda estrela pendurada no céu infinito. Embora tivesse milhares—não, zilhões!—de admiradores.

—Onde esta seu cachorro?— Ashlyn perguntou.

—Princesa Fluffikans está explorando este novo ambiente sem qualquer impedimento da mamãe.

—Isso explica a gritaria no andar de baixo, — Maddox murmurou.

Ashlyn beijou seu marido nos lábios, então alcançou para virar a maçaneta. A porta abriu, e Maddox a levou para dentro. Ar fresco e limpo flutuou para Viola. Por hábito, espiou cada centímetro numa única varredura, procurando todos os espelhos e superfícies reflexivas. À esquerda estava uma cômoda, e fez uma nota mental para evitar isto, mesmo que seu demônio pedisse que se aproximasse para… dar uma olhada minúscula, pequenina… só uma, só por um segundo, porque estaria tão, tão bonita...

Ela rangeu os dentes. Flores orvalhadas derramavam em vasos coloridos equilibrados por todo pedaço de mobília no quarto, exceto na cama. Flores foram tecidas no dossel de ferro forjado da cama, enroscadas e presas como hera.

Um retrato pendurado no centro da parede oposta. E doce paraíso. Viola se aproximou da coisa lentamente. A atenção aos detalhes era impressionante. Podia assimilar só um pouco de cada vez, estudando uma seção pequena, olhando, então voltando a estudar outra, repetindo o processo novamente até que examinou cuidadosamente cada polegada.

Nele, Ashlyn descansava num exuberante jardim, pétalas de flores em seu cabelo, drapeando seu corpo e gotejando ao seu redor. Mas as pétalas não eram realmente pétalas, eram faces. Tantas faces. Os guerreiros daqui, suas mulheres, faces que Viola não reconhecia e outras que reconhecia — incluindo a sua mesma. Desviou rapidamente o olhar de sua própria imagem, decidindo ponderar sua presença num tempo mais seguro.

Um dos braços de Ashlyn estava nu, sua pele tatuada no cotovelo. Chamas e flocos de neve caíam juntos, e enquanto as chamas deveriam ter derretido os flocos e estes deveriam ter apagado as chamas, os dois de alguma forma alimentavam um ao outro, crescendo em cor e intensidade quanto mais alto se moviam em seu braço.

Havia uma piscina reflexiva na frente dela, e Maddox olhava para ela de suas profundidades escuras. Ashlyn o alcançava com o braço tatuado, um anel de prata sinuoso ao longo de seu dedo indicador, brilhando majestosamente.

As terminações nervosas de Viola formigavam. Viu pinturas como esta antes, mas não podia recordar onde ou quando. O que sabia: cada cor, cada rosto, cada polegada significava algo. De verdade. Isto era simbolismo no seu melhor. Só que não sabia como decifrá-lo.

—Quem pintou isto?— Ela perguntou, sua reverência inconfundível. Ela se endireitou, se afastou do retrato antes de perder horas de sua vida intrigada sobre a coisa. Da mesma forma que perdia horas toda vez que via por um momento sua própria imagem.

—Danika, a mulher de Reyes, — Maddox murmurou.

Danika. Humm. Agora que a pintura estava atrás dela, Viola se permitiu questionar sua aparição nela. Ela encontrou Danika pela primeira vez nesta manhã. A fêmea parecia humana, mas depois de ver isto, soube que havia mais nela. —É uma peça extraordinária.

—Seu trabalho sempre é, — Ashlyn orgulhosamente disse.

—Ela vê o futuro?

—Nós não discutiremos isto, — Maddox disse.

Então sim, ela via. — Vai querer pintar uma apenas minha, é claro. Terei que verificar minha agenda e ter certeza de ter tempo para posar para ela. — Se não, arranjarei tempo. Devo questioná-la. Deve aprender mais sobre mim.

Outra risadinha de Ashlyn. Outra carranca de Maddox.

Ele colocou sua fêmea na cama e dobrou os cobertores ao redor ela. Agora alisava o cabelo de sua testa, tão suavemente como se estivesse cuidando de uma criança frágil. —O que precisa, querida? Peça, e será seu.

Dedos delicados esfregaram aquela barriga inchada até que um sorriso suave tocou seus lábios rechonchudos. —Gostaria muito, muito de uma laranja. Apenas uma, entretanto. Da última vez que este desejo em particular me atingiu você me trouxe o pomar inteiro.

—Vou trazer para você a melhor, e mais suculenta laranja que já saboreou. — Ele acariciou sua bochecha por um momento, como se não pudesse suportar não olhar para ela. Então forçou-se a fazê-lo e enviou um olhar ameaçador para Viola.

—Você a protegerá com sua vida. E se a machucar, mesmo acidentalmente…— Suas mãos se fecharam em punhos ao seu lado.

—Não pode pensar em algo vil o suficiente?— Viola pensou por um momento. —Posso sugerir estripação? Poderia me pendurar no teto com meu próprio intestino. Isso seria realmente horrível.

Ele olhou boquiaberto para ela.

—Palavra de advertência, no entanto. Intestinos são rosa e rosa é minha melhor cor. Espere. Quem estou enganando? Todas as cores são minha melhor cor. Então, se seguir por este caminho, esteja pronto para se apaixonar por mim novamente.

Sua boca estalou fechada, uma careta contorcendo seus lábios. —É isso aí. Vou ficar. Viola, você vai encontrar a laranja.

—De jeito nenhum. A menos que vá junto e me carregue.— Toda aquela caminhada fez seus pés pulsarem.

Ele olhou para a porta, então para Viola, então para porta, então para Viola novamente.

Oh, vamos. —Seu anjo residente já disse que sou pura de coração, pode confiar, blá, blá, blá. — Isso surpreendeu Viola, porque não tinha certeza que alguma vez já havia sido pura de coração. O fato que os guerreiros acreditavam na menina de cabeleira escura que nunca vacilava realmente a surpreendeu. Supostamente, eram os seres mais suspeitos na Terra. —Oh, e me traga uma laranja também, mas coloque ao lado de um hambúrguer e fritas. Pulei o almoço.

Depois de emitir algumas ameaças mais por sua vida, ele finalmente saiu de forma arrogante do quarto.

—Mamãe superprotetora macabra, — ela murmurou. —Poxa.

—Você nunca se apaixonou?— Ashlyn perguntou.

—Olá. Não sou tola.

—Isto é um sim, então?

—Hum, sim, isto é um não.

Um sorriso sereno encontrou sua veemência. —Por que tanto horror perante a perspectiva?

A dor em seu peito voltou. Esfregou e esfregou, quase arrancando sua camisa e a pele embaixo, mas a maldita dor persistiu. —Não sei. — Hora de mudar de assunto. —Estou pensando em planejar uma noite de solteiros aqui na minha nova casa — dedos cruzados, que seja para sempre— e deixar os guerreiros solteiros me cortejarem.— Ela passeou para a cama e sentou sobre a extremidade. —Talvez algo como encontro-relâmpago, já que normalmente não suporto um homem por mais que alguns minutos de cada vez. Posteriormente, darei uma rosa àqueles que eu gostar e os outros terão que fazer as malas e deixar a fortaleza permanentemente.

—Humm. Bem. — Ashlyn bateu um dedo contra seu queixo, os cantos dos lábios se contraíndo como se estivesse lutando contra a risada. —Acredite nisto ou não, existem só alguns solteiros.

—Como quem?

—Bem, vamos ver. Existe Torin.

Sua imagem passou pela mente de Viola. Cabelo branco, sobrancelhas pretas, olhos verdes brilhantes. Rosto e corpo musculoso, magníficos. —Ele participará. Continue.

—Bom, não que não seja maravilhoso, mas devo avisá-la que existe uma desvantagem em potencial para sair com ele. É o guardião da Doença, e não pode tocar em outra criatura viva pele-a-pele sem causar uma pestilência. Você não seria contaminada por ele, porque é imortal, mas por sua vez também não poderia tocar em outra criatura viva sem passar a enfermidade. Isso é, além dele.

Viola esfregou sua língua contra o céu da boca. —Está certa. Não ficaria doente se eu o tocasse. Estou certa que notou quão mortal meu sistema imunológico é. Mas mesmo assim, não estou certa de querer alguém tão problemático me adorando em meu templo. Quem mais existe?

—Existe Kane, mas ele é…— Tristeza entorpeceu os olhos âmbar de Ashlyn. —Ele não tem encontros. Diz que não vale a pena o sofrimento.

—Ele mudaria de ideia por mim, claro, mas não é por isso que está triste, certo? Acredito ter ouvido algo sobre ele estar desaparecido.

—Sim.

—Não se preocupe. Tão logo ele descubra que estou aqui, achará seu caminho de volta. Ainda que esteja morto. Não gosto de me gabar, mas isto já aconteceu algumas vezes antes. Só soltarei um rápido e pequeno Screech, e boom. A corrida para me alcançar começaria.

Em lugar de alegrar a garota, suas certezas lançaram preocupação naquela tempestade de tristeza. —Uh, não deveria Screenchar, — Ashlyn disse. —Lembra?

Os ombros de Viola caíram. É verdade. Cinco minutos depois de chegar aqui, Lucien a arrastou para o delicioso quarto de Torin e disse ao sujeito para verificar seu blog e site — obviamente ele era o residente guru dos computadores. Posteriormente, ambos os homens emitiram a mesma advertência. Screenchar ou postar qualquer coisa on-line sobre sua localização ou seus novos melhores amigos e nunca teria permissão para voltar.

—Quem mais?— Ela perguntou.

Ashlyn mordiscou o lábio inferior. —Existe Cameo, mas tenho certeza que ela gosta de homens.

Viola agitou sua cabeça. —Poderia fazê-la mudar de ideia, sem nenhum problema, mas não estou mais nesta fase da minha vida. Quem mais?

—Existe o Sempre Barulhento William. Não é um guardião de demônio, mas é algum tipo de imortal.

William, o Menino Brinquedo Malcriado. Oh, sim, o conhecia. Como Anya, Viola o encontrou no Tártaro. —Ele é mais que imortal, mas tanto faz. — Ele também era arrogante, vaidoso e altamente irritante. —Vou colocá-lo na categoria talvez.

—Mais que imortal? O que isso quer dizer? Ele alegou ser algum tipo de deus, algumas vezes, mas sempre assumi que estava se vangloriando, preenchendo a verdade. Que é...

—Suficiente sobre ele. Estamos conversando sobre mim. Com quem mais posso me encontrar?

Eee voltou a mordiscar. —Existe Paris, mas está meio obcecado com outra mulher neste momento.

—A morta. Sim. Eu sei. Ainda poderia fazê-lo mudar de ideia, mas não acho que quero, porque… — Existia uma razão, não existia? Enquanto Viola ponderava a resposta, batia os dentes.

 Paris perguntou a ela como ver os mortos, e ela disse a ele. Então ele perguntou a ela qualquer outra coisa, mas Lucien chegou e acabou a conversa. O que ele perguntou? Ela sintonizou como um rádio na conversa passada em sua mente, e seus olhos se alargaram conforme a resposta finalmente aparecia.

Consequências. Ele quis saber se existiriam consequências se tatuasse a si mesmo com as cinzas de Sienna. Oops. Ela o deixou cair fora sem dizer que sim, existiriam.

Oh, bem. Não era seu problema. Era dele.

 

Atordoada, Sienna caminhou por um corredor longo. Da mesma maneira que seu passado passava ao longo das paredes do castelo, o passado de Paris também passava aqui, um concerto de cores, rostos, vozes... membros. Em ambos os lados, acima e abaixo dela mulheres se contorciam, tantas mulheres. No princípio, as via sorrindo, rindo, cada uma ansiosa pelo que ele oferecia, rapidamente apaixonando-se por sua fachada encantadora.

Por que elas não iriam? O que elas queriam, ele dava. Um toque, um beijo, uma lambida. Um passeio gentil. Uma socada rápida. Fez amor com todas elas, sabia exatamente onde acariciar e saborear o máximo de prazer. Ele sabia exatamente a quantidade certa de pressão a aplicar quando amassava seus seios, suas coxas. Suaves para algumas, firme para outras.

Ele sabia em qual posição colocá-las. Em suas costas, suas mãos e joelhos, lado certo em cima, de cabeça para baixo. Sabia que algumas queriam lento, e algumas queriam rápido. Elas o amaram por isto, seu prazer inigualável.

Então as deixava e choravam com seus intestinos se torcendo em soluços, seus corpos levantando, seus corações quebrando com o pesar. Intercalados com as fêmeas estavam machos. Paris esteve com homens também, e os deixou na mesma condição das mulheres. Eles o quiseram, e mesmo não sendo a preferência dele, os tomava de forma que pudesse sobreviver. Posteriormente, pediam para ficar e ele escapava.

Uma mulher, Susan, era uma beleza com a qual ele realmente se importou. Tentou fazer uma relação com ela funcionar, mas Paris, sendo Paris, a magoou do pior modo, escolhendo a sobrevivência, como sempre, acima de seu coração.

Quando Sienna pegou uma imagem de si mesma, parou ofegante. Lá, praticamente obscurecida pelas outras imagens, Paris estava amarrado com correias à mesa de seu chefe, nu, as luzes ofuscadas, e ela estava em cima dele. Ela não precisava da visão para servir como lembrança. Nunca esqueceria.

Ela foi incapaz de vê-lo, necessitando da escuridão para relaxar, e ele alternava entre agarrá-la, odiá-la, odiá-lo e ajudá-la, movendo seus quadris para aumentar seu prazer. Agora, porém, ela via sua mente. A parte dele que esperava castigá-la posteriormente. Parte dele—a mais profunda e secreta—queria esperar por ela e nunca deixá-la. Para ele, ela foi um bálsamo diferente de qualquer outro.

Náusea subiu, ameaçando entrar em erupção. Ele pensou tais coisas bonitas sobre ela, e ainda ela o condenou.

Ira atingiu seu lóbulo frontal, persuadindo-a a ir adiante. Para ver mais, ver tudo. Ela tropeçou, seus pés tão pesados quanto pedregulhos.

Outras cenas sangraram na imagem dela com Paris, e alguém deve ter aumentando o volume porque de repente ouviu grunhidos, gemidos, lamentos e gritos. Gritos de prazer, de dor e até de fúria. Acusações eram lançadas, seguidas por apelos.

Os apelos eram seguidos por maldições.

Às vezes, quando Paris não podia achar ninguém disposto a ficar com ele, sua força enfraquecia, sua vontade de viver diminuía e seu demônio fugia de suas rédeas. Um escuro e rico odor evaporava pelos poros de Paris, intoxicando todos por perto, atraindo-os mais perto. Essas pessoas correriam para ele, não importando suas reservas anteriores sobre ele ou sua repugnância pelo sexo casual. Eles o tomariam, ou permitiriam a ele tomá-los.

Quando isto acontecia, Paris sempre lutava com a intensa culpa, porque sabia a coisa vil que estava fazendo—mas tomava tudo que era oferecido de qualquer maneira.

Estes companheiros de cama não choraram quando ele partiu. Assistiram com olhos apertados, detestando-o, envergonhados pelo que fizeram com e para ele, horrorizados com o que logo perderiam. Respeito de uma pessoa querida.

Ele desmanchou casamentos, cometeu adultério e realizou atos sexuais que o deixaram frio e agitado. Então permitiu que aqueles mesmos atos sexuais fossem realizados nele. Um castigo auto-imposto de alguma forma, ela pensou. Tudo aquilo ela poderia ter adivinhado. Mas o que a surpreendeu? Ele se odiava mais poderosamente que qualquer humano já o odiou ou pudesse vir a odiá-lo.

Oh, Paris, ela pensou. Ele era céu e inferno, assim como Ira disse, embrulhados no mesmo pacote delicioso.

Sienna quis cobrir seus olhos para bloquear as visões. Quis gritar e gritar e gritar para bloquear os sons. Todo mundo na multidão estava chorando agora. Até Paris. Suas lágrimas despejadas do teto, chovendo, batendo nela. Mas suas mãos permaneceram aos seus lados e sua boca permaneceu fechada, seus pés automaticamente se movendo. Seu corpo não estava mais conectado ao seu cérebro.

Ira queria que ela soubesse, e então ela saberia.

O volume aumentou em outro grau, um grito agudo que ressoava à sua esquerda, arrepiante, nauseante. Todas as lágrimas cessaram. Outro grito agudo soou então, cena de batalha após cena de batalha veio à vida. Sangue, uma tela de escarlate. Lâminas que refletiam com ameaça. Disparos de armas de fogo um depois do outro. Bombas explodindo. Membros se separando dos corpos, intestinos derramando. Morte, tanta morte. Cada uma delas entregue por Paris.

Paris, entregador de Prazer e Fatalidade da FedEx.

Não existia nenhuma culpa aqui, no entanto. Nenhuma vergonha. Apenas lógica fria e dura. Matar ou ser morto. Não havia espaço para emoções ou remorsos. Nenhuma esperança de algo melhor. Isto era o que era; estas eram as cartas que constantemente devia jogar. Lutar por aquilo que queria ou curvar-se e morrer.

Ele não se curvaria e morreria.

Apesar do demônio de Sienna parecer gostar de Paris, em algum nível, Ira, sendo Ira, ainda esperava castigá-lo por todas as injustiças que cometeu. O demônio a incitou a dormir com Paris e deixá-lo. Quebrar o coração dele. Fazê-lo soluçar e implorar por outra chance com ela. Então, claro, viria a facada, ferindo-o como ele feriu tantos outros.

Não! Não, não, não. Ela se libertou de qualquer coleira que o demônio usava para ligá-la à sua vontade e apertou as mãos contra seu estômago, como se a ação insignificante pudesse solucionar a náusea ainda batendo lá.

—Não vou puni-lo, — ela gritou orgulhosa de sua força e convicção. Paris fez todas essas coisas, sim. E não, não exisita desculpa para isso. Embora ele fosse influenciado pela criatura maléfica dentro dele, era responsável por suas próprias decisões. Ele podia ter achado outro modo.

Mas quem era ela para condenar qualquer um? Ela achou outro modo? Não.

Ira não ofereceu nenhum argumento, e ela franziu a testa. Isso não soava como ele. Normalmente lançava ataques até que ela cedesse. Entretanto, talvez Aeron, antigo guardião de Ira, já lutara e ganhara esta cruzada em particular. Afinal, Aeron e Paris viveram juntos por séculos, tempo de sobra para o demônio ter conseguido um gostinho do que desejava ou ser repreendido em submissão.

Se alguma vez encontrasse Aeron — e se realmente pudesse vê-la e não tentar matá-la — ela perguntaria. Ela faria qualquer coisa para devolver Ira para ele, também, apesar do fato que tal ação a mataria.

—Sienna. — Calor se movia acima de sua bochecha, deslizando ao longo da linha de sua mandíbula.

Suas terminações nervosas se animaram, disparando de volta à vida, fazendo sua pele formigar.

—Acorde para mim. Vamos, é isso, esse é o caminho.

Sim. Aquela voz… sexual e primitiva, descarada em sua masculinidade... um dedo chamando, que ela devia seguir. Onde a voz se originava, o prazer a aguardava. Tanto prazer.

Ela piscou abrindo seus olhos. As coisas estavam nebulosas a princípio, mas quanto mais piscava, melhor podia ver. Estava dentro de um dos quartos no segundo andar do castelo. O ar era bolorento e ainda achocolatado e — Paris pairava acima dela, olhando-a.

A respiração prendeu em sua garganta. Era tão bonito, seu rosto perfeitamente cinzelado. Ele poderia seduzir qualquer pessoa, em qualquer lugar. Seu cabelo era o mais rico tom de negro, o mais puro tom marrom, com mechas mais claras tecidas como longas tiras de ouro. Seus olhos eram um cristal temerário, seus cílios tão grossos e pretos que pesavam abaixo de suas pálpebras, mantendo-as semicerradas, um sempre tentador venha-para-a cama. Seus lábios eram luxuriantes e vermelhos, e talvez a parte mais decadente de um homem já decadente. Sua pele era como diamantes moídos misturados com mel e creme. Pálida, mas beijada com vislumbres de sol.

Ele tinha alguns arranhões e sombras debaixo de seus olhos, mas nenhum parecia como uma imperfeição. Simplesmente realçavam sua atração, adicionando profundidade. Amante, guerreiro, protetor daqueles que escolhia. E estava aqui. Com ela.

—Como está se sentindo?— As palavras ásperas agora, como se existissem fragmentos de vidro presos em sua garganta.

Era uma nota de preocupação que detectou? Nesse caso, isto deveria ser uma alucinação. Paris não cuidaria de seu bem-estar. Não depois de tudo que aconteceu entre eles. Tremendo, ela estendeu a mão e apertou as pontas dos dedos nas bochechas rosadas dele. Sólidas, mornas. Reais.

Ela engasgou com o susto, — Você realmente está aqui.

—Sim. Eu… Sim. — Suas pupilas dilataram, escondendo todo o azul como uma negra teia de aranha, antes de estalar de volta ao lugar. —Como está se sentindo?

—Ótima. — Havia uma leve pontada em seu estômago, uma dor definitiva em suas asas, mas nada incontrolável. Uma vantagem em ser morta-viva além de anfitriã da Ira, ela supunha. Não importava a gravidade de seus ferimentos, a morte não tinha poder sobre ela e se curava depressa.

—Limpei você, enfaixei os piores ferimentos. — Culpa aumentava as cores de seu tom, um rubor mais fundo florescendo em suas bochechas. Suas pupilas dilataram novamente, permanecendo daquele modo — não, se contraíram de volta.

Ela nunca viu olhos fazendo isto. —Obrigada. — Ela moveu a mão pelo cabelo, fazendo careta quando os encontrou emaranhados. Deveria parecer com lixo total. —E você? Como está?— Sua pergunta tremia com a mesma intensidade que sua mão.

—Tudo bem, — ele repetiu, não oferecendo nada mais do que ela.

Ele se endireitou, aumentando a distância entre eles, entretanto seu quadril permaneceu pressionando contra o dela. Um de seus braços deslizou para frente e parou ao lado das costelas dela, tomando o fardo de seu peso.

Ficaram assim por um longo tempo, em silêncio, olhando um para o outro e então olhando para longe.

Isto era… estranho. Muito, muito estranho. Não se viam há tanto tempo, e a última vez que se viram, bem, as coisas não terminaram bem. Ninguém além de você mesma para culpar, ela pensou tristemente.

—Muitas coisas aconteceram desde a última vez que estivemos juntos, — ele começou, então ficou em silêncio como se contemplando tudo que aconteceu.

—Sim, — ela concordou, mas já passara muito tempo contemplando-o.

—Sei que recebeu um demônio. O que não sei é como está lidando com ele,— ele disse, olhando fixamente em algum lugar distante, muito além de seu ombro.

—Nós temos nossos momentos.

—Ele mostra a você os pecados dos outros?

—Sim.

—E a obriga a castigar os malfeitores?

—Sim.

Ele balançou a cabeça. —Aeron, o sujeito que teve Ira antes de você, costumava odiar isto. Resistia por todo tempo que conseguisse.

—E então Ira passava à sua frente, — ela murmurou.

—Sim.

—Tenho o mesmo problema. — Normalmente ela via as imagens dos pecados da pessoa enquanto estava acordada, e as coisas progrediam de lá. Poderia lutar contra os impulsos e ganhar, ou poderia lutar contra os impulsos e falhar. Não estava certa sobre o que fazer com o fato que viu as transgressões de Paris enquanto estava adormecida.

Outro turno de incômodo silêncio se seguiu. Existia tanto para dizer, mas ela não sabia por onde começar.

—Paris, — ela respirou ao mesmo tempo que ele suspirou e disse, — Sienna.

Olhavam fixamente um ao outro agora, procurando, inseguros. Eeeeee mais uma vez o silêncio reinou, tão pesado que podia sentir seu peso afundando-a no colchão. Seu coração apertou contra seu peito numa tentativa inútil de fuga. Se o maldito estivesse ligado numa bateria, o teria puxado da tomada. Qualquer coisa para aliviá-la desta sensação suspensa, ansiosa, do medo de enviar Paris para a fuga impedindo-a de dizer todas as coisas que ela imaginou dizer a ele.

—Você primeiro,— ele disse, assinalando um músculo em sua mandíbula.

Muito bem. Ela podia fazer isto. Ela podia. —Só queria saber como chegou aqui e por que… por que veio por mim. — E ele definitivamente veio por ela e apenas por ela. Por que mais teria gritado seu nome assim? Será que tinha esperanças de castigá-la pelo que uma vez fez para ele?

Seus olhos se estreitaram. —Eu mudei de ideia. Falarei primeiro. Diga-me por que veio por mim, naquela noite no Texas quando William viu você aos meus pés. William sendo meu amigo e acolhedor. — Através das fendas em suas pálpebras, ela viu que suas íris estavam congeladas, a escuridão ainda em evidência. Sua expressão se tornou duro granito, determinação implacável a disfarçando.

O homem que estava sentado diante dela agora não era a pessoa que lutou com as Gárgulas para alcançá-la; não era a pessoa que tomou tanto cuidado com seus ferimentos. E se importou com seus ferimentos. Ela estava limpa, enfaixada, assim como ele disse.

Não, o homem sentado à sua frente era aquele que ela encontrou pela primeira vez em Roma. A pessoa que a beijou num minuto e no outro acordou amarrado com correias a uma mesa de tortura. A pessoa que a amaldiçoou num suspiro, e a louvou no seguinte.

Quem quer que fosse, ela não mentiria para ele. Nunca mentiria para ele novamente. —Precisava de ajuda, — ela admitiu, —e Ira sabia onde você estava e como alcançar você. Assumiu o comando, e fui para lá aos seus pés.

—Ainda precisa de ajuda?

—Com Ira? Sim.

Ele movimentou a cabeça, perdendo aquele fio de navalha de crueldade. —Eu sinto muito por não poder vê-la aquela noite.

—Não tem nada que se desculpar. —

—De qualquer maneira, — ele disse depois de limpar sua garganta. —Imaginei que teria dificuldades de adaptação, entretanto está muito melhor do que eu estive nesta fase, então perguntei a Aeron se teria algumas dicas pra você. Ele disse que terá um tempo fácil com as coisas se alimentar o bastardo um pouco todo dia. Se alguém mentir para você, minta de volta. Se alguém enganar você, engane de volta. Se alguém bater em você, bata de volta.

Como facilmente ofereceu as informações. Não a fez implorar. Não a insultou porque ele sabia e ela não. E Aeron não reteve as informações, quando teria que odiá-la por tomar seu companheiro — e foram companheiros. Ira era uma extensão dele, ainda sentia falta dele. Mas tão grata quanto estava pelo conselho… que maneira terrível para viver, ela pensou. —Obrigado por isto.

—Por nada,— ele disse secamente. Após, — Você ainda pensa que sou mau e na necessidade de me extinguir?

—Não! Você não é mau. — Que já tivesse colocado o homem na mesma categoria que o demônio… ela estava muito, muito envergonhada. Quão tola foi. Que crédula. —Sinto muito por já ter pensado que você fosse.

A olhada que ele deu depois poderia ter arrancado a roupa dela, deixando-a nua, tremendo. —E eu deveria acreditar em você?

Ele nunca confiaria nela, entretanto, por que deveria? —Estar emparelhada com Ira, bem, abriu meus olhos. Vi a verdade pela primeira vez. As coisas que fiz… as coisas que fui persuadida a fazer… tem lidado com isso por milhares de anos, e ainda luta. Duvide de mim o quanto quiser, mas juro a você agora. — Para se impedir de alcançá-lo, ela apertou suas mãos ao seu lado. —Nunca machucarei você novamente.

Em seus olhos cobertos viu manchas de raiva, uma chama de excitação. Então, nada.

Ele desviou os olhos dela, seu olhar pousando na janela do quarto. Havia uma fenda na espessa cortina preta, um único raio de luar deslizava para dentro. Em seguida ele ofereceu um encolher de um ombro forte. —Perguntou por que vim por você.

Decepção a abalou. Uma resposta para sua promessa seria boa. Entretanto, não merecia isto. —Sim.

—Eu... droga. Não podia deixar você sofrer.

Ele não podia… deixá-la… sofrer… oh… Aqui estava a misericórdia que não seria capaz de oferecer aos outros, então sabia como era preciosa. Lágrimas brotaram de seus olhos e percorreram suas bochechas, uma gota a princípio, então uma inundação. Até que seu corpo pesava com a mesma força das mulheres naquele corredor de sonho. Até que não podia ver o quarto ou Paris.

O que aconteceu com o cresceu um par de bolas na senhora? Vir abaixo agora, na frente dele, estava a humilhando, mas não podia parar.

Sua vergonha explodiu pequenos pedaços lançados por toda parte do corpo dela, saturando-a. Por toda sua vida foi capaz de confiar em si mesma. O alcoolismo da sua mãe, que começara logo após o rapto de Skye, havia corroído qualquer amor que a mulher sentia por Sienna. Seu pai eventualmente desistiu e começou outra família, esquecendo a pequena menina que deixou atrás.

Mais tarde na faculdade, começou a sair com Hugh. Ele ouviu suas histórias sobre seu passado, ofereceu simpatia e ajuda. Ele contou a ela sobre ele mesmo, e sua crença no sobrenatural. Quando expressou dúvida, ele prometeu mostrar a ela — e mostrou. Ela estava assustada e ainda emocionada ao mesmo tempo porque agora tinha alguém para culpar por cada um de seus problemas.

Quão libertador era. Como era maravilhoso perceber que sua mãe não tinha culpa. Seu pai não tinha culpa. Ela não tinha culpa. Como era calmante pensar que seus pais ainda a teriam amado se não fosse o mal que os Senhores trouxeram ao mundo. Então, claro, saltara de cabeça no jogo do bem contra o mal.

E ainda assim, os Caçadores a assassinaram para chegar até Paris.

Paris, aquele que não queria que ela sofresse.

Seu choro surgiu muito poderosamente, logo estava soluçando, olhos e nariz escorrendo livremente, o que fez seu constrangimento alcançar um novo nível. Braços robustos se envolveram ao redor ela, cuidando para não tocar suas asas frágeis, erguendo-a, puxando-a para um quente e musculoso peito. Suas batidas de coração martelando tão rapidamente quanto às dela.

E caso não saiba, isso a fez chorar ainda mais forte.

—Acalme-se, — ele ordenou, claramente desconfortável. E, uau. Pensaria que um homem que esteve com tantas mulheres como Paris saberia como acalmar alguém que beirasse a histeria, mas não. Ele bateu em suas costas um pouco demais, então a olhou quando falhou em obedecê-lo.

Como podia não querer que ela sofresse? Como podia já tê-lo julgado tão severamente?

—Sienna. Pare com isso.

—Não pode… ajudar… com isto. Fiz… coisas terríveis para… você. E você… você está aqui. E está sendo tão bom.

Uma pausa, como se não conseguisse digerir suas palavras. Então, muito suavemente, disse, — Mas fiz coisas terríveis para você, também. Não fiz?

 

SIENNA DISSE A SI MESMA QUE SE CALASSE, que se fechasse, mas as palavras eram despejadas contra sua própria vontade. —Faria sexo comigo e iria embora. Não é o comportamento mais nobre, mas dificilmente justificaria ser drogado, torturado e quase morto. Eu te enganei, deixei que machucassem você. E então estuprei você. Acho que estuprei você. — Ela engasgou, mas ainda assim as palavras continuavam vindo. —Sinto muito, Paris. Sinto tanto. Sei que isto não é bom o suficiente. Nada que eu diga jamais será bom o suficiente, mas...

—Sienna.

—Eu sinto muito. Eu sinto. E depois, quando estava morrendo, culpei você, mas não foi sua culpa. Disse que te odiava, e estou muito triste por isto, também. Você não merece nada disto.

Outra pausa. Suas mãos começaram a descer pelas costas dela, acariciando, antes de deslizar para cima novamente, acalmando-a. — Você não me estuprou, — ele disse, e existia um tom surpreendente de diversão em sua voz. —Eu queria você. Queria tanto você, mesmo não querendo te querer. — Ou talvez ela houvesse imaginado a diversão. Seu timbre era agora uma lixa abrasiva.

—Dormi com você porque me foi dito, porque queria destruir você, — ela disse.

—Eu dormi com você para me fortalecer.

—Mas eu ainda queria você, — ela adicionou num sussurro suave.

As pontas de seus dedos apertaram os músculos logo abaixo da elevação de suas asas, mas a pressão se aliviou muito cedo. —E eu ainda queria você. Isto é uma das razões pelas quais te levei comigo quando fiquei livre, porque queria ficar com você novamente.

Outro soluço a deixou. —Pensei que havia me usado como escudo, e eu… eu…— Bom, merda. Os soluços se tornaram tão grandes que ela finalmente fechou a matraca.

Ele pressionou um beijo em sua têmpora. —Não usei você como escudo. Não intencionalmente, pelo menos. Sinto muito pela forma como as coisas terminaram, então realmente, me desculpe. Se ajudar, me castiguei mil vezes, e provavelmente me castigarei mais mil. Se soubesse o que aconteceria, teria deixado você lá… e voltado por você mais tarde.

O último foi oferecido hesitantemente, como se temesse sua reação para tal verdade. —Eu fico contente.

Uma eternidade passou assim, os dois agarrando um ao outro, o silêncio não era mais espinhoso e sim calmante. E, certo. Talvez ela fosse a única a agarrar, mas ele não parecia se importar. Continuou a acariciá-la.

Ela não percebeu o quanto almejou contato com outro corpo, até aquele momento. Que o corpo pertencesse a Paris, bem, isso fazia tudo muito melhor. Era tão forte, e cheirava tão doce, e se não fosse cuidadosa, logo roçaria a bochecha contra o peito dele, enterrando o nariz no buraco de seu pescoço e se enroscando ao redor dele como uma videira.

Quando ela finalmente se acalmou, exaustão apareceu e ela meio que afundou contra ele, sua cabeça descansando em seu ombro. Seus olhos estavam inchados, pesados, seu nariz obstruído e sua garganta crua por suas lágrimas.

—Melhor?— Ele perguntou.

—Sim, obrigado. Eu… eu… Paris. — Seus lábios se separaram e ela inalou pela boca. —Apesar de tudo, veio aqui para me ajudar. Colocou-se em perigo.

—Perigo não é nada para mim. — Sua voz ficou áspera, como se não gostasse da direção que a conversa tomava.

Perigo podia não ser nada para ele, mas ela o viu com seus amigos. Eles eram tudo para ele, e ainda assim os deixou para salvá-la. Uma surreal—e até mais vergonhosa—realização.

O que sua relutância em não deixá-la sofrer queria dizer? Será que ele — ela ousava ter esperanças — teria sentimentos por ela? Almejava algo mais com ela? Embora ela não estivesse pronta para libertá-lo, fez exatamente isto, retraindo-se, puxando outra respiração funda e absorvendo o odor de chocolate escuro dele. Se o movimento não rompesse o ângulo de suas asas, a lançando numa dor aguda, teria ficado lá, saboreando-o, se afogando numa explosão súbita de excitação, por horas.

Franzindo o cenho, Paris manobrou as extensões leves de suas asas numa posição mais confortável. Ele foi infinitamente cuidadoso, cada movimento verificado. Quando terminou, olhou-a com cautela. —Melhor?— Ele perguntou novamente.

Ele tinha que ter sentimentos por ela. Impossível, e ainda, possível da mesma forma. —Sim, obrigada. — Ela olhou abaixo em suas mãos. Estavam espremendo sua camisa, torcendo e enrugando o tecido, e ainda não tinha percebido que as moveu. Devia perguntar a ele sobre seus sentimentos. Ela devia...

—Por que se afastou de mim quando me viu?— Ele perguntou, seu tom curioso e não acusatório. —Quando as gárgulas me pegaram.

—Pensei que fosse uma alucinação. Uma memória. Elas são como rolos de filme, tocando ao meu redor num fluxo sem fim.

Sua carranca se aprofundou, apertando aqueles lábios luxuriantes sobre dentes brancos perfeitos. —Mesmo agora?

O olhar dela percorreu ao redor do quarto, e só podia se embasbacar. Ela viu o desintegrar das pedras, retratos envoltos por lençóis, mas nenhuma memória. —Não. Somos apenas você e eu. — Provavelmente porque não podiam roubar sua atenção para longe de Paris. —Paris, quero dizer coisas. Sobre os Caçadores. Coisas que podem ajudar você e seus amigos. Eu...

—Não,— ele disse, cortando-a.

—Mas...

Ele deu uma sacudida abrupta de sua cabeça. —Não, — ele reiterou.

—Eu não entendo.

—Não quero que me diga qualquer coisa sobre eles.

—Mas… por quê?— Mesmo quando estava debruçada sobre o corpo indefeso dele, movendo-se sobre ele, até quando ele tinha razão em culpá-la por sua condição, ele não a olhou com tal dura determinação. Vermelho piscava através de seus olhos, aquelas sombras uma vez mais dançando por sua íris.

Ela não teve de considerar o problema muito antes da resposta escorregar no lugar, uma jiboia pronta para sufocar sua presa. Ele achava que ela o enganaria, o enviaria diretamente para uma armadilha, e não existiria nada que pudesse dizer para convencê-lo do contrário. Isso machucava, entretanto merecia isto e mais.

Não sabendo mais o que fazer, ela evitou o assunto. —Como pode me ver, me ouvir? Tocar? Não podia antes.

O vermelho enfraqueceu, as sombras acalmaram. Suas pupilas que haviam se expandido, contraíram, elásticos apertados prontos para explodir.

—Aprendi alguns truques sobre os mortos, — ele disse. —Isto é tudo.

E não compartilharia aqueles truques ou qualquer outra coisa com ela; seu tom deixava isso bem claro. Uma dor despertou em seu coração, caiu em seu estômago e guilhotinou cada pedaço de felicidade que a presença dele aqui trouxe.

—Também aprendeu como quebrar uma maldição e raptar alguém de um castelo do qual não poderia partir?— Ela perguntou. Bom. De volta aos negócios. Sem outra avaria.

Um silêncio terrível se apoderou dele. —Sabia que estava presa aqui, mas ainda não estava certo de como.

—Sabe onde é aqui?—Ela poderia adivinhar, mas as respostas que vieram a ela a deixaram enjoada.

—Um reino escondido na seção dos céus dos Titãs.

Seus olhos se arregalaram. —Céus? Sério? Apostaria em algum lugar no inferno.

—O que acontece quando tenta partir?

—Existe algum tipo de bloqueio invisível. Me aproximo de uma porta ou janela e me machuco, e se permanecer na frente do portal por muito tempo, desmaio. Mas às vezes… às vezes Ira assume o comando e os bloqueios caem. Acabo do lado de fora dos muros do castelo, não muito longe daqui, acho. E faço coisas. Coisas terríveis, — ela sussurrou. —Então volto aqui, não consigo evitar. Entro e os blocos imediatamente voltam a subir.

Ele estendeu a mão como se quisesse alcançar sua bochecha, para oferecer conforto. Então rosnou baixo e gutural, e seu braço caiu para seu lado. Isso a fez querer estourar numa nova rodada de soluços, mas não se permitiu o luxo. Nem mesmo quando ele levantou, caminhou para a janela e jogou as cortinas de lado, a distância — uma grande brecha entre eles—simbólica.

Pó flutuou ao redor dele. Alguns puxões e teve o vidro erguido. Ar quente, picante moveu-se dentro, pinicando suas narinas. Ele espalmou uma lâmina, estendendo seu braço na escuridão — e não encontrou nenhuma resistência.

Outros podiam partir, ela percebeu. Só ela estava presa.

Ele deslizou o vidro no lugar e girou para ficar de frente para ela. Não voltou ao seu lado, mas se inclinou atrás, apoiando-se contra a parede. A protuberância de seus músculos estirou o tecido preto de sua camiseta. Suas calças abraçaram suas coxas — e uma ereção impressionante.

Ele possivelmente… poderia querê-la? Da mesma forma que ela o queria?

Quem está tentando enganar? Ele é o Senhor do Sexo. Provavelmente tem esta reação com todo mundo.

—Pode deixar Ira assumir o comando de seu corpo sem assumir o comando de sua mente?— Ele perguntou, uma rispidez em sua voz.

Ela se forçou a encontrar seus olhos com o calor brilhando em suas bochechas. —Eu, uh… Ele assume o comando de ambos, mas nunca simplesmente permito. Nem sempre ganho, mas sempre luto.

—Pare de lutar contra ele. Deixe-o assumir o comando de seu corpo, mas tente manter algum tipo de controle em sua mente.

Sua boca abriu, estalada. Simples assim, queria que ela permitisse que o ser que se realizava em castigar todo mundo a consumisse, a dirigisse em toda ação? —Não entende o que aconteceria se eu fizesse isto.

Ele deu uma risada amarga que não fez nada para arruinar sua perfeição masculina, e tudo para realçar isto. Talvez porque com o descerramento de sua amargura veio uma necessidade para beijá-lo. —Oh, mas entendo.

Sim, ela supunha que ele entendesse. —Ira machuca pessoas. Eu machuco pessoas. E se eu te machucar?

Aço derretido em seus olhos, borbulhando em sua voz. —Posso cuidar de mim, e quero você fora daqui.

—Quero isto, também. — Só não o suficiente para arriscar machucá-lo. E realmente, seu demônio não era sua única — ou mesmo sua pior — preocupação. Seus olhos se arregalaram. Como podia ter esquecido, até mesmo por um momento? —Cronus, — ela ofegou. —Se me ajudar, Cronus irá atrás de você. Estou surpresa que ainda não tenha vindo.

—Pelo que ouvi, tem estado muito ocupado para se preocupar comigo. — Paris sorriu lento e perverso. Ansioso. —Mas ele e eu temos uma conta a acertar e logo resolveremos isto.

Sua mão escorregou para a garganta. —Não por minha causa. Não quero você...

—Tem alguma família?— Ele perguntou, a interrompendo. —Qualquer um a quem eu possa levá-la, uma vez que consiga tirá-la dos céus?

Ela piscou. Ele a salvou, ainda a desejava se sua ereção fosse alguma indicação, mas não tinha intenção de mantê-la, ou mesmo ficar com ela. Ele queria se desfazer dela tão depressa quanto possível. Claro. Estúpida, Sienna estúpida por sequer ter esperança que acontecesse o contrário.

Não poderiam fazer nada funcionar entre eles, de qualquer maneira. Agora sabia mais sobre seu demônio e sabia que Paris não podia dormir com ela novamente, apesar… disto. Certo? Ele era apenas uma aventura de uma única vez. Certo?

—Sienna, — ele estalou. —Olhos no meu rosto. Por favor.

O calor em suas bochechas subiu para fervente quando afastou seu olhar para longe de suas joias de homem uma segunda vez. —Sinto muito. Não queria fazer você se sentir como um pedaço de carne. Estava só perdida em pensamentos.

—Sobre meu pe... uh, partes?

—Bem, sim.

Seu queixo caiu com a força de seu espanto, e ela teve de se perguntar por que o deus do sexo acharia tal revelação tão incrível.

Enfim. O que ele perguntou a ela antes? Oh, sim. Sua família. —Não. Não existe ninguém a quem pudesse me levar, ninguém que nem ao menos pudesse me ver. — Enquanto falava, olhou o resto dele. Ainda estava cortado das Gargl, os ferimentos agora formando crostas. Ele se curou, mas só ligeiramente. E sua pele perdeu um pouco de seu brilho reluzente. Estava enfraquecendo por falta de sexo? Isso foi o que aconteceu na prisão dos Caçadores.

—Quando foi a última vez que teve uma mulher?— Ela perguntou, tentando agir desinteressada sobre um assunto muito dolorido entre eles.

O frio que viu anteriormente caiu sobre todo o corpo dele. Suas pálpebras se estreitaram, o cintilar naquelas íris oceano-lindas tornaram-se pedra.

—Não lembro, — ele rangeu.

A confissão a aliviou e emocionou, tinha vergonha de admitir. Ele claramente estava machucado. —Bem, estou… uh, estou, sabe… disponível. Para você. Se quiser, quero dizer. E se me quiser e puder usar… aquilo em mim. — Como soava patética, mas queria tocá-lo novamente, estar com ele uma última vez. Ainda que tivesse que reduzir o ato a um simples procedimento clínico. —Devo a você. — Ou um favor entre pseudo-amigos.

O gelo engrossou, rachou, espessou novamente, como se uma batalha se desenrolasse dentro dele. O gelo ganhou. —Realmente? Está disponível para mim? Me deve?— Ele estalou sua mandíbula. —Obrigado por esta oferta generosa. Como poderia um sujeito como eu pensar em recusar?

Um sujeito como ele? —Não quis dizer...

—Só para que saiba, não vim aqui para desfrutar da sua disponibilidade ou receber uma dívida. Então, se pudesse, de fato, te foder novamente, espero que entenda quando eu fizer o inconcebível e passar. Mas não se preocupe, ainda ajudarei você. Me foder não é uma exigência.

Ela mordeu seu lábio inferior para se impedir de responder. Merecido, merecido, merecido, disse a si mesma novamente. E talvez sua recusa fosse uma boa coisa. Ele ainda se ressentia dela. E como já tinha provado, não confiava nela. Estar com ele, e vê-lo ir embora depois, a cortaria em pedaços tão irregulares que nunca poderia se juntar novamente.

Mais que isto, tinha que seguir Galen. O pensamento a golpeou com tanta força que seu corpo inteiro tremeu. Ela brincou com a ideia, mas oficialmente não havia decidido. Agora, via a verdade. Disse a Paris que não tinha nenhuma família, mas e se tivesse? E se apenas pudesse salvá-los? Se houvesse a menor possibilidade que Galen estivesse torturando sua irmã e seu filho, Sienna tinha que agir, o que significava que poderia ter de fazer coisas com ele. Coisas necessárias. Coisas que não poderia fazer se forjasse qualquer tipo de laço com Paris. Uma toxina quente branca inundou suas veias, ardendo.

—Parece enojada e assustada, — Paris disse, sua voz tão afiada quanto qualquer punhal. —Por que?

—Nenhuma emoção por você, — ela disse baixinho. Nunca para ele. Não mais.

Um golpe duro soou na porta, seguido pelo timbre áspero e rude. —Paris. Isto não é exatamente vida ou morte, cara, mas as coisas estão quietas aí, assim imagino que meio que não entendeu como abrir o fecho do sutiã dela. Dê um tempo e venha aqui. Tem que ver isto.

Paris parecia como se ganhasse uma concessão de um pelotão de fuzilamento. Se endireitou. —A caminho, — ele respondeu. Ficou lá por um momento, rangendo os dentes, pensando sobre algo desagradável a julgar pela expressão em seu rosto. Então seguiu para a cama e estendeu sua mão, ajudando-a a se levantar.

Os calos dele rasparam nas palmas das suas mãos do modo mais delicioso, e estremeceu. —Obrigada.

—De nada. — Não a levou para fora, mas a olhou com uma carranca feroz. —Não tente deixar meu lado. Entendeu?

Tinha medo que ela fugisse dele? Medo que dissesse a alguém onde ele estava, assim poderiam matá-lo?

Merecido, ela se lembrou. O que realmente chateava sobre toda essa situação era que não podia pedir uma segunda chance a ele, ou até mesmo uma oportunidade para se redimir. Como acabava de perceber, já estavam condenados, seus caminhos já decididos.

Outra realização a atingiu. Aquele mesmo caminho poderia dar-lhe o que ele mais queria. A vitória contra os Caçadores. Não que jamais pudesse saber a parte em que ela jogou. Se fizesse como Cronus queria, Paris assumiria que era amante de Galen. O brinquedo sexual dele. E… e ela seria pelo menos até que descobrisse a verdade sobre Skye. Então o mataria como queria, não importando as consequências para ela mesma.

—Sienna,— Paris estalou, puxando-a de volta ao presente.

Ela olhou para ele. Não importava como as coisas se agitassem, iria perdê-lo, e isso era um duro fato, uma vez que acabava de achá-lo novamente. Mas por hoje, estava com ele. Isso teria que ser suficiente. —Não deixarei seu lado.

 

GALEN, GUARDIÃO DA ESPERANÇA, líder dos Caçadores, vagarosamente explorou os quartos dentro da fortaleza de seu inimigo. Só recentemente havia se curado dos ferimentos de batalha que havia recebido por cortesia dos Senhores do Submundo. Agora era hora de dar o troco.

A lâmina que segurava era nova e nunca tinha visto um único momento de ação. Hoje, isso mudaria.

—... Cale essa maldita coisa, — Cameo, detentora da Miséria, estava dizendo enquanto serpenteava pelo canto e passava por ele. Coberto como estava pelo Manto da Invisibilidade, ela não conseguia localizá-lo.

Ele a estudou enquanto passava. Em todos os séculos desde sua criação, ela não havia mudado. Tinha cabelo longo e escuro feito para ser agarrado por um punho, e o corpo magro de uma dançarina feito para foder. Seus olhos eram prata líquida— feito para pendurar em seu colar. —Se não o fizer, vou apunhalar os dois. E deixe-me dizer, 1,8 pessoas morrem a cada segundo. Não me importo de aumentar à estatística.

Talvez ela tivesse mudado. O tom baixo de sua voz rouca carregava o fardo pesado de um mundo de tristezas. O suficiente para fazer surgir uma dor no peito que prontamente escoava para fora, invadindo mais e mais dele. Nos céus, a voz dela havia trazido apenas prazer.

Carrancudo, Galen alinhou suas asas ao seu lado e se pressionou contra a parede. A ação fez uma pena branca se soltar e deslizar para o chão, já não escondida pela capa. Ele se curvou para pegá-la e parou.

Uma loira baixa, curvilínea segurando um cachorro preto... coisa preta disparou atrás de Cameo. —Tudo que estou dizendo é que, com um pouco de maquiagem poderia se parecer com meu parente do interior, em vez de meu tio desnutrido. Talvez ninguém tenha te dito isso, mas bolsas são para ser carregadas em suas mãos, e não sob seus olhos.

Um — cão mutante? — a cabeça torceu, virou, seus olhos redondos fixos em Galen. Um rosnado letal encheu o ar, as presas afiadas saindo por seu lábio inferior. Evidentemente a magia do Manto não funcionava com todas as criaturas. (O que era aquela coisa?). Ele se virou, e latiu.

—Quieta, princesa. Mama está ensinando Beleza 101 para a desinformada. Além disso, não queremos que os bobos dos Senhores fiquem chateados com você de novo, não é?

Galen não reconhecia à loira ou sua feia "princesa". O que sabia? Os Senhores recebiam somente seletos convidados em seu meio. Isso significava que era ou uma nova adição ao exército dos Senhores ou namorada de um guerreiro. Lamentável como muitos dos homens outrora dourados caíram apaixonados recentemente.

O que quer ou quem quer que fosse, ia morrer como os outros.

A dupla e sua companheira não-muito-canina invadiram um dos quartos. A porta bateu. Nenhum alarme soou.

Sua carranca derreteu num sorriso. Não podiam vê-lo, mas podiam tê-lo percebido. O que não significava que isso seria mais fácil do que imaginava.

Strider, o idiota, tinha dado o manto de invisibilidade aos Tácitos, seres tão cruéis, tão maus que até mesmo Hércules tremia de medo à menor menção deles. Cronus os havia escravizado antes de sua própria prisão, uma vez pensando em controlá-los. Por sua vez, eles o queriam morto. Agora estavam presos em sua ilha particular em Roma e reduzidos a negociantes.

Um ponto a favor de Galen. Sabiam que ele estava destinado a remover a cabeça do rei Titã, e assim, quando visitou a ilha, procuraram seu apoio. Seu primeiro gesto foi dar-lhe a capa. Seu segundo, ensinar exatamente como usá-la. Assumiu que era um escudo contra olhares indiscretos, mas assumiu errado. A capa também era uma arma. Uma muito eficaz.

Precisava de todas as vantagens que pudesse conseguir, mesmo que isso significasse se aliar às piores criaturas que já andaram nesta terra. Seus homens estavam desaparecendo das ruas, para nunca mais se ouvir falar deles. Sua rainha havia desaparecido também. Não havia tido contato com ela em semanas.

Ela o conhecia bem o suficiente para saber que queria ser o número um. Trairia qualquer um para conseguir o que queria, e se ela houvesse decidido ir embora, para traí-lo como fez com tantos outros, era seu problema. Iria atrás dela da mesma forma que continuaria a ir atrás de seu marido. Com tudo que tinha.

Galen planejava governar os céus. E vou ser bem sucedido desta vez. Sabia disso, mas então, sempre "soube" que seus planos iam funcionar. Seu demônio podia convencer qualquer um a fazer quaisquer coisas — e Galen estava incluído nesse número. Esperança que construía sonhos para todos, então ria quando esses sonhos desabavam.

Mas não era Esperança que o dirigia neste dia. Era Ciúme. Seu outro demônio.

Oh, sim. Seus antigos amigos podiam não ser brilhantes o suficiente para descobrir isso ainda, mas Galen estava possuído por dois demônios de Pandora.

Porque havia convencido seus companheiros guerreiros a roubar sua Caixa, porque os havia traído então, pensando em se tornar líder da Guarda de Elite — tomando o lugar de Lucien — cometeu dois crimes. Portanto merecia duas punições. Ou foi isso que Zeus havia dito quando começou a emparelhar cada Senhor com seu demônio e restaurar a ordem nos céus.

Desprezava ter dois demônios. Esperança se acumulava nele só para derrubá-lo, e então o ciúme o exasperava de volta, sussurrando coisas como O macho tem uma fêmea, mas somos muito melhores. Por que não tirá-la dele? Esperança, então, o enchia com a vontade de fazer exatamente isso, tomar, a necessidade se tornando uma coisa viva dentro dele, tomando cada milímetro de seu ser, certo que teria sucesso — mas de alguma forma sempre aquém da vitória.

Bem, hoje não falharia.

Hoje iria desferir um duro golpe no inimigo.

Roubaria Legion, a mulher-demônio que uma vez haviam enviado para matá-lo. A gata que o havia seduzido. A virgem inocente que vivia dentro da pele de uma estrela pornô. Ela havia ferrado com cada polegada de sua vida imortal antes de mordê-lo com suas presas envenenadas. Enquanto se contorcia de dor, ela o havia deixado para morrer, só para ser carregada ao inferno graças a um acordo com seu criador que deu errado.

Galen a havia caçado, mas os Senhores a haviam encontrado primeiro. Haviam-na trazido aqui, e Galen a queria de volta. Queria tê-la novamente. Queria puni-la. Para matá-la e cortar o cordão que parecia atá-lo.

Estava cansado de querer saber sobre ela, cansado de pensar nela.

A quantos guerreiros ela havia se entregado desde seu regresso?

Sim, era isso. Estava cansado de imaginá-la com milhares de outros, doente de raiva pelo constante ciúme em relação a ela.

Ia descobrir a resposta, porém, e se algum dos Senhores houvesse desfrutado de seu corpo delicioso, pagaria mais caro que seus amigos. Oh, todos e cada um deles iriam morrer, mas alguns gritariam por meses antes dele cortar suas cabeças.

Exceto que... procurou na fortaleza de cima abaixo, olhou em cada câmara, sabia o paradeiro de todos os guerreiros ainda na residência — até mesmo Torin, que monitorava o local, o notou — mas não havia sinal da garota.

Muito bem. Iria com o Plano B. Levaria uma página do livro dos Tácitos e "negociaria" antes de atacar.

Desprezando o atraso, espreitou o quarto de Maddox e Ashlyn como um fantasma através da madeira. Não estava apenas invisível, estava sem substancia. Maddox, guardião da Violência, não estava mais lá dentro. Sua mulher muito grávida estava reclinada em sua cama, lendo um livro para seu bebê durante a gestação. Um menino que Maddox estaria desesperado para salvar.

Ashlyn era uma coisa bonita, com pele, cabelos e olhos da cor de um favo de mel. Na verdade era tão dourada como a lua sobre a mais brilhante das noites, e era delicada e frágil como só uma humana poderia ser. Sua voz era suave, melodiosa e cheia de amor.

Sem dúvida, Maddox moveria céus e terra para recuperá-la.

Galen sentou ao lado do leito e empurrou a capa de um ombro. Quando se materializou, outro sorriso torceu os cantos de sua boca. Ashlyn o viu e se imobilizou, sacudindo seu corpo inteiro com medo.

—Galen, — ela ofegou.

—Grite por mim, pequena Ashlyn, — disse ele, estendendo a mão para ela. E ela o fez.

 

William meio que esperava ser pulverizado no momento que Paris saiu do quarto. Punhos martelando sua face, dentes rasgando sua jugular, algo assim ameaçador desde que havia se atrevido a interromper o feliz reencontro. Afinal, loucura e caos era parte do Senhor Paris. O que William não esperava era o olhar meio grato, meio estrondoso, mas isso era exatamente o que havia recebido.

—O que queria me mostrar? — O Senhor do Sexo disse.

Paris havia movido montanhas para chegar até aqui. Havia feito coisas que faziam um degenerado como William parecer um menino de coro, tudo para salvar a garota enfiada atualmente ao seu lado. E estava segurando na mão dela como se ela fosse um bote salva-vidas e o dilúvio tivesse chegado, ao invés de se lançar sobre o homem que acabava de bloquear seu pau... bem, isso era muito estranho.

Podia significar uma de duas coisas. Paris já havia tido sexo com ela, então não havia tido nada para impedir. No entanto, apenas uma hora havia se passado desde sua separação. Então, isso significaria que Paris foi rápido para atingir o clímax e, como muitas senhoras que ele havia pegado, William apostava que o cara podia levar a noite toda e mais algumas.

A opção dois era um pouco mais provável, mas ainda improvável. Paris não havia sabido o que fazer com a garota e queria escapar da situação difícil.

Mas por que quereria escapar? Por falar nisso, porque a cada segundo que passava, parecia mais chateado do que nunca? Sienna havia se recusado a ele?

Impossível, William pensou em seguida. Estava segurando a mão de Paris tão desesperadamente como ele agarrava a dela.

William passou seu olhar sobre ela. Ela estava pálida, suas sardas um gritante contraste, e estava um pouco instável em seus pés. Humm. Estudando-a assim, se perguntava o que Paris havia visto nela.

À primeira vista, e inferno, talvez até mesmo na segunda, parecia normal. Olhou mais fundo, porém, e foi aí que a delicadeza de sua estrutura óssea se tornou evidente. Além disso, os olhos castanhos eram grandes e incrivelmente lindos, a mistura perfeita de esmeralda e cobre. Seu cabelo era uma cachoeira de mogno, em cascata ao seu redor. E os lábios dela... sim, teria cometido alguns crimes para tê-los ao redor de seu eixo.

Ela era esbelta, seios pequenos e até mesmo abaixo do peso, mas maldição se não atraia cada instinto protetor que um homem possuía.

—Só vai ficar olhando para ela? — Mais uma vez Paris disse as palavras. Desta vez, ameaça derramava dele, uma ameaça de ataque muito real.

Agora William duvidava que sua face seria a única coisa reorganizada. Seu apêndice favorito ficaria em fatias pouco agradáveis e cubos. Entãooooo. A maior puta já criada era possessiva como o inferno com uma mulher que uma vez quis matá-lo. Falando sobre punição merecida. Mas então, não era essa a especialidade de Ira?

Paris deu um passo em direção a ele, a ameaça se intensificando. —Eu fiz uma pergunta.

William cortou o sorriso e estendeu as mãos para cima, as palmas para fora, perguntas rolando em sua cabeça. Quanto Paris realmente queria essa garota? Arrependia-se de ter vindo aqui? Qual a influência que ela podia exercer sobre suas emoções? Era o plano ainda entrar, sair e se livrar dela? Havia apenas uma maneira de descobrir.

—Responda-me, — Paris disparou.

—Não, — disse William. —Não planejo apenas olhar.

Um rosnado surgiu do guerreiro. Ambos sabiam que apenas sugeria que queria fazer mais.

Bom. Talvez William sobrevivesse ao que seguiria, talvez não. —Gosto de sua blusa, — disse ele, dirigindo o elogio a Sienna. —Realmente gosto das suas calças. — Usava uma camiseta branca, imunda e rasgada, e calças cargo largas. Seus tênis faltavam os cadarços.

—Eu... obrigada? — Suas sobrancelhas se uniram com sua confusão.

—Posso fazer uma sugestão de guarda-roupa, contudo?

Outro grunhido soou de Paris antes que ela pudesse responder, uma mão se estendendo e se envolvendo em torno da traquéia de William. Pontinhos vermelhos brilhavam dentro dos oceanos azuis. Não, as íris de Paris não eram mais azuis. Estavam negras, não havia diferença entre as pupilas e o resto. —Agora vai sugerir que a roupa ficará melhor no chão do seu quarto?

Muito. Mais. Divertido. —Quem, eu? — Não conseguia respirar, por isso as palavras assobiaram para fora. Não, Paris não havia se arrependido de vir aqui.

—Paris, — disse Sienna, totalmente calma. —Sei que não tenho o direito de pedir isso, mas pode, por favor, não matá-lo? Não sou fã do cheiro de corpo em decomposição.

Mais apertado... apertado... então a pressão aliviou, saiu. —Mostre-nos o que encontrou.

Interessante. Ela exercia muita influência. Ele se perguntou se Paris percebia o quanto — e exatamente o que — o guerreiro esperava do relacionamento. Mas sem importar o quê, William assumia que o plano ainda era do tipo vamos-nos-livrar. Nenhum relacionamento durava sem confiança, e estes dois não tinham uma centelha dela entre eles. Mesmo enquanto Paris olhava William como uma peça de carne a ser cortada para o jantar, mantinha Sienna na mira, como se tivesse medo que ela fugisse, ou até mesmo que fizesse seu próprio pequeno corte.

—Vamos, ou vai assinalar que não te mostrei mais cedo. — William girou nos calcanhares e marchou pelo corredor até outro lance de escadas para o terceiro andar. Não tinha que olhar atrás para saber que o casal o seguia. As passadas das botas de Paris lembravam um estouro de búfalos.

Diminuiu o ritmo e Paris surgiu ao lado dele. Em algum momento, o guerreiro pegou Sienna. Estava embalada em seus braços, suas asas dobradas em torno dela, a cabeça apoiada no oco de seu pescoço. Ainda mais interessante era o fato de que não fazia nenhuma queixa.

Seu olhar encontrou o de William, firme como uma rocha. Ela franziu a testa. —Ira fica em silêncio em torno de você. Não me mostra qualquer um dos seus pecados percebidos. Por que isso?

Oh, não. Não ia por esse rumo na conversa. Não com uma ex-Caçadora e uma morta, embora de volta à vida, recém-possuída o que diabos ela era. —Terá que perguntar a ele.

—Eu o fiz.

Ele pressionou a língua contra o céu da boca. —E?

—E não me deu nenhuma resposta, então decidi que é porque você tem que viver com você mesmo, um castigo pior que qualquer coisa que Ira pudesse dar.

Milagre dos milagres. O demônio não estava fofocando sobre ele. —A resposta apenas vai continuar sendo um mistério, então. Ah, e uma palavra de advertência. Espertinhos realmente me irritam. Continue falando sujo comigo, querida.

Ela revirou os olhos.

Paris entrou na conversa com um hesitante, —Ele mostrou os meus? — Que não ameaçasse mostrava a William as profundezas de sua incerteza sobre o que Ira podia ter transmitido.

William viu Paris excitado (não de propósito), brincalhão, irritado, encharcado de sangue, teimoso, drogado, relaxado, estressado e tudo mais. Mas nunca viu o guerreiro assustado. Mas agora, Paris estava com medo, sua expressão assombrada, seus músculos tensos sobre os ossos.

—Sim, — ela respondeu tão baixinho que teve que se esforçar para ouvir.

Um momento de silêncio tenso. —Quer que eu te desça?

—Não! — Cor inundou seu rosto quando percebeu o quão alto tinha gritado a palavra. —Não. Gosto de onde estou.

De rato a leoa. Adorável realmente, e William pensou que poderia dar em cima dela quando Paris terminasse. Porque, mesmo tão feroz quanto Paris estava com relação ela, a deixaria ir. Determinação perdia para o medo. Mesmo que Paris suspeitasse que ela preferiria não ser tocada por um homem que havia feito as coisas que ele havia feito, mesmo que ela houvesse provado que estava errado, o que devia ser um alívio, estava determinado a viver sem ela.

—Só quis dizer que, uh, minhas costas doem, — acrescentou. —Preciso do seu apoio.

—Como um bom suporte atlético[10], — disse William, batendo no ombro de seu menino. —Mas então, Paris é isso para você.

Mesmo com Sienna nos braços, Paris conseguiu fazer uma saudação com dois dedos. Mentalmente, é claro, mas William viu tudo da mesma forma.

—Deveria ter pedido para terminar com você, ao invés de deixá-lo ir, — ela murmurou. Então, —estamos indo para o quinto andar?

Ah. Então ela sabia o que estava lá em cima. —Sim.

—Por quê? — Paris perguntou.

—Você vai ver, — respondeu William.

Sienna optou por estragar a surpresa. —Outros imortais possuídos por demônios estão lá em cima.

—Outros demônios... — Paris aumentou sua velocidade, deixando William comendo poeira. —Estão armados?

—Não, — ela disse, — mas estão presos.

—Mostre-me.

—Isso era o que eu estava tentando fazer, — William murmurou quando seguiu atrás deles. Um dia seria bom alguém colocá-lo em primeiro lugar. Não uma amante, porém, e nem a garota que assombrava seus sonhos. A garota que protegeria com sua vida agora e sempre. Não estava destinada a ele.

Seu único e verdadeiro amor morreria — ou o mataria. Já havia sido profetizado, e não havia outra opção.

 

CUIDANDO PARA MANTER SUA MENTE na situação em questão, ao invés de em seu corpo dolorido e carente, Paris parou no centro do corredor do quinto andar. Ficou chocado com o que encontrou. Apenas o leve peso de Sienna nos braços, seu cheiro tropical e feminino no nariz, o cabelo sedoso roçando sua pele, o mantiveram firme.

Engraçado isso. A ampliação do seu cheiro viciante deveria o enviar voando direto para uma fuga — ou para uma mordida em seu pescoço. Em vez disso, a necessidade de protegê-la, até dele próprio, ultrapassava tudo.

Haviam três imortais aqui, uma fêmea e dois machos. Estavam na parte detrás de seus quartos, olhando para ele, sem nenhum movimento em direção a ele. Nunca havia encontrado com eles, o que significava que não os havia trancado no Tártaro antes de sua posse. Ainda assim olhavam para ele. Será que eles sabiam quem era? O que era?

Eu os quero, Sexo disse.

Uau. Que choque.

Um choroso: Estou ficando mais fraco a cada minuto que passa.

Acredite em mim, eu sei. Como ansiava por aqueles dias quando Sexo se retirava para a terra do silêncio e o levava simplesmente através dos impulsos. Agora, faça-me um favor e cale a boca.

É isso que estou tentando fazer!

Bastardo bruto.

Como se Paris fosse realmente melhor. Ao longo dos anos Paris havia dormido com milhares de pessoas diferentes por milhares de razões diferentes, e nem todas por paixão. Realmente precisava tomar uma mulher, tipo ontem, e essa era uma das razões dele estar aqui, para ficar com Sienna novamente. Mas sequer a havia beijado, mesmo desesperado para fazê-lo, porque não queria ficar com ela por qualquer motivo que não fosse paixão.

Desejo mútuo importava.

Ela o desejava, sim. Pelo menos, tinha certeza de ter sentido o cheiro de sua excitação quando havia se oferecido para "servi-lo", mas a havia tratado de forma mesquinha. Ela havia olhado para ele com aqueles olhos tristes e lacrimejantes, esperançosos pelo perdão, e ele havia se virado contra ela.

Maldição, não queria suas desculpas ou sua gratidão. Não queria sua piedade, e certamente não queria que o quisesse por causa dos feromônios de seu demônio. Se aceitasse sua oferta, gratidão e piedade estariam naquela cama com eles, bem como a desconfiança, raiva e arrependimento. Não fazia essa coisa de ménage há muito tempo.

Talvez devesse ter tomado o que podia pegar, no entanto. Esperar era uma coisa estúpida. No caso em questão —sua fraqueza atual. Mais que isso, Sienna podia não lhe dar uma segunda chance. Podia partir, como ele temia. Mas ela não era como qualquer das outras mulheres que havia estado, e não queria tratá-la como se fosse.

O que a fazia diferente das outras?

A pergunta surgiu de dentro dele, o confundindo. Era corajosa, mas outras também eram. Era inteligente, assim como outras eram. Era, por vezes doce e às vezes picante, mas, novamente, outras também.

Hummm, picante.

Sexo estúpido. Enfim. Sienna também era cautelosa, mas vulnerável. Determinada, mas gentil. Disposta a tudo para cumprir uma missão até o fim. Assim como ele. Ela havia tido visões de seu passado, ainda assim não o havia julgado.

Uma vez Paris havia perguntado a Aeron exatamente o que o demônio revelava em relação a ele. A resposta foi brutal: todos os corações que quebrou, todas as lágrimas que provocou. Isso era o que Sienna havia visto e perdoado. Então, sim, ela era diferente, e gostava dessas diferenças.

Ela endureceu quando Paris retornou à primeira porta. Isso sugeria que havia tido conflito entre ela e o homem no interior. Então, é claro, Paris estudou o cara atentamente. Era alto, musculoso e o encarava mais ferozmente que os outros, como se Paris estivesse marcado e sob um microscópio. Bonito, se gostasse de pele muito bronzeada e estranhos olhos bicolores. Não que Paris estivesse com ciúmes, nem nada.

Mas quanto tempo o cara gastou com Sienna?

—Esse é Cameron. É o guardião da Obsessão, — disse ela com um tremor.

Um tremor nascido do medo... ou desejo? Não vou perguntar. Eu não. Do jeito que haviam deixado as coisas no quarto, e inferno, com as coisas que Paris havia feito desde sua primeira separação, a resposta não era da sua conta.

—Ele já tocou em você? — Maldição. Ele perguntou, e com muita força.

Ela pareceu surpresa. —Não. As mesmas portas invisíveis que me mantêm no interior do castelo os mantém presos em seus quartos.

Sua voz. Será que alguma vez teria o suficiente? Seus ouvidos zumbiam pela sensação cada vez que ela falava. —Quer que ele te toque? —Tinha que parar com isso.

—Nunca!

Um grande alívio. —Então ele pode viver, — Paris murmurou. Reposicionando-a nos braços, estendeu a mão e, sim, com certeza, havia um bloco invisível o impedindo de entrar na sala.

—Então não vai matá-lo? Isso é muito generoso de sua parte, — disse ela secamente.

Seu humor irreverente com ele o chocava o tempo todo. Em todas as vezes que haviam ficado juntos — certamente não haviam sido muitas — as coisas haviam sido muito sérias entre eles, muito graves. Gostava que agora se sentisse confortável o suficiente para provocá-lo.

—Eu tento. — Ele parou na segunda porta.

—Este é Púkinn também conhecido como irlandês. Está ligado à Indiferença, — informou a ele.

Indiferença era metade homem, metade animal. Chifres, garras e peludo. Algo saído de um pesadelo. Para a realidade. O homem-besta apenas olhou para Paris de cima abaixo e se virou, como se Paris não tivesse nenhuma importância.

Na terceira porta, Sienna enrolou as extremidades de seu cabelo em torno de seu dedo. —Aqui temos Egoísmo, — disse ela com uma pitada de... raiva? Ou a mesma picada de ciúme que ele (não) havia sentido?

—Ela é muito bonita, não é? — Sienna perguntou.

—Sim. — A mulher tinha os mesmos olhos bicolores do primeiro homem, a mesma pele profundamente bronzeada. Era atraente, não havia como negar isso, mas ansiava apenas pela mulher em seus braços.

—O nome dela é Winter.

—Isso é ótimo. Há quanto tempo está aqui? — Paris perguntou, olhando para Sienna, em vez da imortal. Suas pálpebras estavam baixas, seus cílios fazendo sombras sobre seu rosto. —Há quanto tempo eles estão aqui?

—Perdi a noção. — A ponta rosa de sua língua deslizou sobre a boca, deixando um brilho reluzente de umidade. —Estavam aqui primeiro, apesar de tudo.

Quero prová-la. Eu vou prová-la.

Seu sangue esquentou outro grau. Entre na fila.

Com toda a experiência de Paris, ficava perdido quando se tratava desta mulher. Como seria fazê-la se entregar total e completamente? Não apenas incendiar sua compaixão, mas realmente seduzi-la? Ela havia mudado desde que se encontraram pela última vez em Roma, mas ainda era um grande mistério para ele.

Que houvesse chorado, pedido desculpas, soado sincera, tudo era muito mais do que havia esperado dela. Tente chocante como congelar o inferno. Mas ela havia feito as três coisas, e olhado para ele como se nunca o tivesse visto antes. Como se fosse um homem digno de carinho e atenção. Como se não fosse uma coisa suja e repugnante na sola do seu sapato. Como se ela quisesse proteger a ele.

Como diabo lidaria com isso? Como deveria reagir?

Era um tolo por querer acreditar nela? Inferno, não queria, mas realmente o fazia.

Talvez não devesse ficar tão ofendido por sua oferta de atendê-lo. Talvez devesse tê-la tomado. Levado-a para a cama. Poderia Tê-la despido, aberto suas pernas e golpeado dentro dela. As mãos dela teriam estado em cima dele, seus gritos de paixão tocando em seus ouvidos.

Cortou um riso amargo. Estava todo distorcido, confuso, indeciso e se contradizendo. Não confiava nela, confiava nela. Não ia tocá-la sem paixão, ia tocá-la de qualquer maneira que pudesse. E merda. Por que ela não fugia dele, apesar de sua promessa? Ou estava muito ocupada se arrependendo de sua oferta de servi-lo para entrar em ação?

E realmente, o que isso significava para ela? Que podia tomá-la aqui, agora, a qualquer momento, ou que cairia sobre ele? Não pense sobre isso. Só ficaria duro novamente.

A risada amarga escapou. Só se ficasse mais duro. Sua ereção ainda não tinha se dissipado, agindo como um míssil em busca do calor enquanto a fêmea imortal caminhava para sua porta, balançando os quadris de uma forma totalmente felina. Não importava que Paris não estivesse atraído por ela. Seu demônio viu, seu demônio quis.

Parte dele tinha esperança de que estar na presença de Sienna impedisse este tipo de coisa de acontecer. Mas, não. Mesmo que pudesse tê-la novamente, seu demônio ainda procurava outras mulheres e sempre seria assim.

Sou um premio. Não era de admirar que uma vez ela houvesse querido matá-lo.

Tão cuidadosamente como era capaz, colocou Sienna de pé. Quando ela se moveu para o lado dele arrastou-a de volta à sua frente, pressionando sua ereção entre as curvas de sua bunda. Ele assobiou pela beleza do prazer. Puro, não diluído. No entanto...

Ela havia endurecido, ele percebeu. Pelo menos não saltou longe, e não o castigou. Eventualmente relaxou contra ele, como se estivesse exatamente onde queria estar. Bem, inferno. Ela devia ter temido que a houvesse afastado, a rejeitando, e por isso havia ficado rígida — e por que havia relaxado quando ele não. Falando sobre impulso do ego. Queria bater no peito no estilo King Kong.

—Diga-me o que sabe sobre eles, — disse ele, mal contendo suas mãos de alisar seu estômago, se enterrar sob a cintura de suas calças e buscar seu centro quente e úmido.

—Sobre quem? — A imortal na frente dele perguntou. —E quem diabos é você?

Uma pergunta respondida, pelo menos. Não o conheciam, também. —Não estava falando com você, — disse ele.

A fêmea abriu os braços. —Então, com quem? Está sozinho.

—Com o diabo que estou...

—Eles não podem me ver, — Sienna interveio. —Tenho ouvido algumas de suas conversas, e é assim que sei quem são e o que são. — Enquanto falava, seu estômago roncou.

O som deu a desculpa que precisava. Moveu as mãos para sua barriga e esfregou. —Com fome?

—Sim.

Então iria alimentá-la. Gostaria disso, pensou ele. Gostaria de saber que atendia pelo menos uma de suas necessidades. —O que come? — O que ela poderia comer?

—Não como. E só recentemente, nas últimas semanas, desenvolvi apetite. — Ela cobriu suas mãos com as dela, sua pele umedecendo. —Cronus me traz um copo de algo doce uma vez por semana. Esqueceu-se desta vez.

Um copo de algo doce. Doce. Doce. A palavra ecoava em sua mente, uma resposta a outra de suas perguntas anteriores caindo em seu lugar. Seu estômago afundou quando disse, —É transparente, com minúsculos grânulos de cor púrpura flutuando dentro?

—Sim. — Seu pescoço esticou, permitindo-lhe olhar para ele, e ele viu a sua testa enrugada. —Como sabe?

Aquele desgraçado! Paris manteve a maldição dentro de sua cabeça e sua expressão neutra. —Será que tem gosto de coco esse líquido? — Ele perguntou, ignorando a pergunta dela.

—Sim. Mas, novamente, como sabia? Sabe o que é? Ele nunca me disse.

Sim, ele sabia o que era, e agora entendia porque ela cheirava tão deliciosa como ambrosia. Cronus fez mais que escravizá-la. Ele a havia condenado. E pagaria. Oh, ia pagar.

Para o melhor ou pior, no entanto, a vingança teria que esperar. Cronus gostava de visitar Torin, o guardião da Doença, e o gênio da computação que encontrava coisas para ele. Atualmente queria as localizações das células dos Hunters, e havia dado ordens aos Senhores para não atacar. Torin estava passando a informação, tudo bem, mas apenas um pedaço de cada vez, a pedido de Paris, mantendo o rei ocupado indo e voltando entre os céus e a terra enquanto perseguia sua presa e fazendo aquilo que fazia por eles. Dessa forma, tinha pouco tempo para Sienna. Mas "pouco" havia sido demais.

Deveria ter chegado aqui mais cedo. Não havia como corrigir os danos feitos à Sienna. Não havia cura para o que a afligia. Paris teria que dizer a ela, teria que prepará-la para o que aconteceria quando saísse daqui por conta própria. Não agora, no entanto. Ela ficaria chateada e com razão. Mais que isso, queria provar seu sangue primeiro para ter certeza.

 —Ei. Cara. Com quem diabo está falando? — O imortal exigiu. —Não me faça perguntar de novo.

—Ou vai o quê? — Retrucou. —Me pegar? Xingar-me?

Winter abriu a boca para responder e, a julgar pelo fogo em seus olhos, as palavras queimariam, mas então seu olhar se deslocou para a direita de Paris e os lábios franziram em desaprovação.

Oh, oba! William acabava de decidir entrar no assunto.

—Você de novo, — disse ela, e não parecia feliz.

—Eu sei, — o guerreiro respondeu com um suspiro sincero. —É tão sortuda ao ver-me duas vezes no mesmo dia. Está honrada com minha presença, blá, blá, ouvi tudo isso antes. Vamos apenas seguir em frente, podemos. Não lido muito bem com bajulação.

Ela mostrou uma careta cheia de dentes, e Paris demorou para entender. Presas? Ela era uma vampira? Sabia que tais criaturas existiam, sabia que William gostava de dormir com elas, mas nunca havia conhecido uma ele mesmo.

—Eles não vão a lugar algum e Sienna está com fome, — disse ele. —Vamos encontrar a cozinha. Eu...

De repente a mulher imortal cambaleou atrás, caindo de bunda. Sua pele perdeu a cor, e quando se arrastou mais longe e mais longe da porta, seu olhar começando a se mover ao longo de sua câmara. Estava balbuciando sobre sombras e dor. Os mesmos murmúrios irromperam das outras portas.

Sienna cravou as unhas no braço de Paris, uma grande onda de estremecimento se movendo através dela. —Não. Não, não, não.

—O quê? — O pânico se espalhando por ele. Ele a obrigou a se virar para enfrentá-lo. —O que está acontecendo?

—Eles estão vindo. — Seus olhos se encheram de horror quando olhou para ele.

—Quem?

—As sombras. A dor.

—Não entendo.

—Acho que entendo, — disse William, toda ponta de provocação e auto-elogio partindo. —E se eu estiver certo, estamos em apuros, Paris. — Nunca havia soado mais solene. —Agarre sua garota, porque não tenho certeza de quantos de nós vão sair daqui.

 

—ONDE ESTÁ MINHA MULHER! Minha... mulher... preciso... dela...

Viola observava o desmedido gigante de cabelos negros derrubando a outra metade da sala de entretenimento. A TV, mesa de bilhar e uma variedade ímpar de outras coisas já haviam sido destruídas. Então, tudo na sala ao lado, e no quarto ao lado deste. Ela sabia, porque Maddox havia arrebentado as paredes entre eles, dando-lhe uma visão clara do outro lado da fortaleza. Apenas permaneciam os escombros.

Os outros guerreiros saltaram sobre o gigante, mais uma vez, derrubando-o e prendendo-o. Ainda assim, ele lutava, gritando as maldições mais vis que ela já havia ouvido, até mesmo dos prisioneiros trancados no Tártaro. Da última vez, seus amigos haviam perdido o agarre sobre ele. Desta vez, conseguiram mantê-lo lá. Ainda assim, ainda sentia uma espécie de medo, uma emoção estranha para ela.

—Onde ela está? Tenho que encontrá-la!

A última palavra saiu dele, apenas uma espécie de colapso confuso, soluçando tanto que suas costelas deveriam estar rachando. Lágrimas encheram seus próprios olhos, mas ela as piscou de volta. Ele queria sua esposa de volta, sua perda o destruindo.

—Vamos encontrá-la, — disse alguém.

—Ela e os bebês estarão ilesos.

—Relaxe, amigo.

Os guerreiros falavam calmamente, mas até ela ouvia a tensão e dúvida em suas vozes. Maddox chorou mais forte.

Viola se sentia como uma voyeur. Sentia-se inútil. Havia muita emoção aqui, muita perda, e nunca havia lidado com esse tipo de coisa também.

—Fique tranquilo, todos temos que manter a calma.

—Vamos ter respostas em breve, e podemos sair.

—Apenas alguns minutos mais.

—Ele a tem, — Maddox conseguiu dizer entre estremecimentos. —Aquele desgraçado a tem. Não sei onde procurar. Não há nenhum sinal... nada... só uma pena, apenas uma pena.

Um por um os guerreiros o soltaram, e recuaram. Maddox permaneceu caído por opção, sua mão se movendo sobre seu rosto para proteger os olhos da luz muito brilhante no teto. O quanto devia amar sua mulher e seus bebês. Viola havia suspeitado quando os havia visto juntos antes, mas ver isso provava que não havia percebido as profundezas ilimitadas.

—Vamos caçar, — Cameo disse, falando pela primeira vez desde que havia ouvido Ashlyn gritar e o barulho de Maddox.

Viola desejava que a guerreira não houvesse falado, tampouco, e teve que esfregar o peito para afastar a dor que a voz de Cameo sempre deixava atrás.

—Esta noite, — o chamado Reyes rosnou. Havia um profundo corte em seu pescoço, sangue gotejando dele. —O mais tardar.

—Conseguimos encontrar Amun, e está a caminho de volta para Buda. — Strider, o mais feroz na sala, realmente tremia. Seu olhar se voltava para sua esposa, que estava a alguns metros de distância com sua irmã, como se ele precisasse se assegurar que ela estava aqui e bem. —Vai descobrir alguma coisa. Apontando-nos a direção certa.

—E se não ele, Lucien lidará com isso, — disse Anya, a namorada sempre orgulhosa. Lucien saiu para acompanhar a trilha espiritual de Galen.

—Galen não ousaria machucar Ashlyn ou os bebês. — Haidee, a namorada de Amun andava para trás e para frente, para trás e para frente, agitada demais para permanecer num só lugar.

—Gideon e Scarlet estão voltando para casa com Amun. Scarlet pode nos dizer se os bebês ainda estão... ainda... — Aeron passou a mão sobre seu couro cabeludo raspado. Deveria estar com os outros, em busca de Kane, mas ficou para trás por algum motivo que ninguém diria a ela.

Viola não havia estado aqui há muito tempo, mas tinha memorizado os nomes dos guerreiros, rostos, demônios e habilidades. Scarlet era a guardiã dos Pesadelos e entrando no mundo dos sonhos, podia procurar pela porta mental de uma pessoa específica. Uma porta fechada significava que estavam dormindo. Uma porta aberta significava que estavam sonhando. Nenhuma porta significava que estavam mortos. Mas Maddox e Ashlyn estavam ligados, destinados a morrer quando o outro morresse, então ninguém precisava saber sobre ela. Os bebês, no entanto... não vá por aí. Scarlet também podia matar pessoas enquanto sonhavam, matando-os na vida real. Talvez Galen exalasse seu último suspiro nesta noite. Então, novamente, talvez não. Se Scarlet pudesse entrar nos seus sonhos, teria feito isso, mas Viola imaginava que algo a impedia.

Eu poderia derrubá-lo.

Chega disso, pensou com uma carranca. Uma vez que entrava no trem do amor-próprio, não havia como voltar atrás.

Ela se concentrou. Os guerreiros. Sim. Não confiavam nela, e havia ficado um pouco surpresa quando a apontaram, culpando-a por esta catástrofe. Ela era a estranha, afinal de contas, e o sequestro havia acontecido logo após sua chegada. Mas, em seguida, Olivia, o anjo que a tinha feito relaxar em sua presença na primeira vez, disse que Viola não era responsável por nada, e todos acreditaram nela, sem questionar.

Além de Olivia, Scarlet, Anya, a excitada Haidee e Danika, que tinha seu braço em torno de uma garota chamada Gilly, havia duas Harpias, as meias-irmãs Gwen e Kaia. Gwen pertencia a Sabin e Kaia a Strider. A dupla tinha suas cabeças juntas enquanto sussurravam. Galen era o pai de Gwen, e, se a audição superior de Viola acertasse o alvo — e sempre o fazia — Gwen planejava caçá-lo ela mesma, abrir suas costelas e arrancar seu coração negro e apodrecido. Apenas para compensar a vez que havia sido indulgente com ele.

—Esse cara, Torin, não tem quaisquer gravações de Galen? — Viola perguntou, recordando sua parede de computadores e monitores.

Ninguém olhou para ela ou prestou qualquer atenção.

Seu demônio raspou os afiados chifres pontudos contra o interior de suas têmporas, e ela reprimiu um gemido. A ignorar era o caminho mais rápido para ganhar a atenção de Narci. E quando a atenção de Narci era bloqueada... oh, estrelas do céu. Problemas surgiam. Sempre. Viola não queria que sua outra metade se intrometesse neste evento devastador, determinado a fazer tudo sobre ela.

—Não, não há gravações, — uma voz suave e gentil disse, ao lado dela.

Com um suspiro, ela girou. Ela não havia ouvido qualquer abordagem, mas agora uma fêmea alta e magra com cabelos longos e loiros estava ao seu lado. A menina parecia frágil... assombrada. Dor consumia aqueles olhos escuros. Mais dor que qualquer pessoa devia alguma vez ter que suportar. Ela olhou Maddox, uma lágrima descendo pelo rosto pálido.

Viola pensou ter interagido com todos na casa, mas essa menina era nova. Tinha um cobertor envolto em torno dela, o material apertado contra o peito, os nós dos dedos sem um pingo de cor. —Falou com ele? Com Torin?

O queixo da menina tremia violentamente para falar, então balançou a cabeça.

—Então como sabe sobre as gravações? Melhor pergunta, quem é você?

Mais lágrimas caíram. Deviam queimar, pois pelo caminho que viajavam, deixavam vergões vermelhos para trás. —Sou... sou Legion. — Um sussurro suave, macio.

Legion. Ah, sim. Um demônio que uma vez fez um pacto com o diabo. E o diabo lhe concedeu um corpo humano. Um acordo que ela havia perdido, forçando-a a voltar para o inferno, onde foi torturada das mais vis formas, estuprada, abusada, repassada e torturada um pouco mais.

Viola olhou para a menina. Realmente olhou para ela, da maneira que apenas ela podia. Através da pele, dos ossos, até a alma. Legion estava morrendo. Na verdade uma parte dela já estava morta. Sua vontade de viver havia sido destruída. Era uma folha frágil pendurada pelo fio mais fino, e o próximo vento frio era todo o necessário para soltá-la e, finalmente, derrubá-la.

Pela natureza de seu nascimento, Viola podia ser esse vento. Tudo que precisava fazer era estender a mão, enrolar os dedos em torno do pulso de Legion e atraí-la perto. Geralmente não era tão simples, e geralmente não tão fácil, mas a vontade fazia toda a diferença. Uma respiração profunda, e não restaria nada da alma de Legion. Ela deixaria de existir em todos os níveis.

Talvez Viola a tenha olhado por tempo demais, ou atenta demais, porque Legion começou a tremer, mudando de um pé ao outro, e então, quando isso não foi suficiente, se afastando.

—Não vou te machucar, — disse Viola.

Legion parou, como se fosse gritar. Pobre menina, quebrada. Uma boneca de porcelana quebrada. Puxou o cobertor perto, tentando se dobrar dentro dele e se esconder.

—Lucien. — O alívio de Anya era palpável, enchendo a sala após o guardião da Morte aparecer.

Viola se virou, vendo como a deusa menor se jogava nos braços do homem. Ele a abraçou com força incansável, seu amor uma coisa tangível. Mais uma vez o peito de Viola doeu. Queria isso. Queria tanto que mataria para ter. Mas, é claro, nunca poderia ter isso. Estava destinada a amar a si mesma, e apenas a si mesma.

Todo mundo na sala ficou quieto, esperando para ouvir o que o guerreiro tinha a dizer, tão tensos que seus corpos estavam prontos para estourar. O guerreiro com cicatriz os olhou, abriu a boca, então a fechou.

—Somente fale, — Maddox ordenou. Fez um esforço para ficar de pé, verificando o clipe numa de suas armas. —Diga-me o que descobriu.

Com os lábios comprimidos, Lucien deu outra varredura na sala. Desta vez, parou em Legion, que bravamente abriu caminho de volta para o lado de Viola. —Legion, querida, — ele disse, seu tom tão suave que podia estar falando com uma criança trancada num armário, com medo de um monstro esperando debaixo da cama, — Vá lá para cima, para seu quarto. Isto não é para você. Tudo bem? Certo?

Depois que todos se viraram para encará-la, murchou sob a atenção, girou e fugiu. Vários batimentos cardíacos agonizantes se passaram antes que Maddox soltasse.

—Diga-me. Agora.

Lucien puxou Anya mais perto de seu corpo. —Galen não tentou se esconder. Sabia que eu seguiria seu rastro, e assim esperou que eu o alcançasse. Ashlyn não estava com ele, — acrescentou quando Maddox abriu a boca para dizer alguma coisa. —Disse que eu não seria mais capaz de segui-lo, que o encontrei só porque me deixou ir tão longe. E estava certo. Depois, tentei. E falhei. Sinto muito.

—Diga-me! — Maddox escondeu a arma dele e agora apertava duas lâminas. Uma delas segura pela lâmina e não pelo punho, sua mão abrindo um corte. Não pareceu notar como o sangue escorria, escorria. —Termine com isso.

Um aceno de cabeça duro. Lucien parecia como se as palavras fossem arrancadas dele, balançando pela mágoa. —Disse que está segura por agora, e que vai enviar um vídeo dela para provar. Ele disse... disse... que se a queremos de volta, viva, temos que trocar Legion por ela.

Viola não tinha certeza se alguém ouviu o grito e as pisadas frenéticas além da parede quebrada, mas ela ouviu. E sabia. Legion não havia subido até seu quarto. Havia ficado e ouvido. Agora, porém, estava correndo para seu quarto, sem dúvida em busca de refúgio entre suas paredes.

Os guerreiros discutiam, atirando palavras entre eles com disparos precisos.

—Onde quer nos encontrar? Quando? — Maddox.

—Roma. No Templo dos Tácitos. Amanhã. A meia-noite. — Lucien.

—Leve-me lá. Agora. — Maddox.

—Seja sensato sobre isso. — Strider. —Esses bastardos são durões, e se estão do seu lado...

—Não me importo! Entendam isso. Não me importo com nada, exceto minha mulher e meus filhos. E vai me levar lá, e vou caçá-lo, e quando o encontrar vou matá-lo. Pode me ouvir? Leve-me para aquela ilha. Tem cinco segundos para me teletransportar ou estarei pegando o vôo noturno, e ninguém neste mundo ou no outro poderá ajudar os mortais que ficarem no meu caminho.

Decidindo não esperar pela resposta de Lucien, Viola escapou da sala. Ninguém reparou e isso mais uma vez incomodou Narci.

Seja uma boa menina, ela disse a sua outra metade, e vou mostrar o quanto é bonita.

O demônio saltou para cima e para baixo dentro de sua cabeça. Quando?

Em breve.

Agora. Um lamento.

Em breve.

Agora. Uma ordem.

Nunca.

Em breve? Outro lamento.

Em breve. Você negocia duro. Viola seguiu a trilha espiritual de Legion — Lucien não era o único com tal talento — se teletransportando para o quarto. A menina estava andando, com os cabelos voando loucamente atrás dela. Não havia abandonado o cobertor, mas agarrava o material cada vez mais apertado.

—Não posso, não posso, não posso. Não posso sair. Não posso ir com ele.

—Legion, — Viola disse suavemente. Sim, estava desconfortável com os sentimentos das outras pessoas, mas havia espiado a alma desta boneca quebrada e queria ajudar.

Que estranho. Uma vez, Viola havia se alimentado de almas, de sua energia. As drenava, acabava com elas. Um dia, porém, havia pego a alma errada na hora errada — a única memória terrível que havia conseguido manter — e se viu presa no Tártaro. Então, é claro, foi emparelhada com Narci e a única alma que havia sido capaz de se alimentar era de sua própria.

Como o membro de um Imortal, sua alma continuava a crescer e ela continuava se alimentando dela, mas nunca voltou a crescer em sua totalidade, porque nunca realmente parou de comer. Por falta de uma palavra melhor. Então, basicamente, era uma pessoa pela metade, bem como uma canibal espiritual, e nunca se preocupava com os outros.

Por que veio aqui de novo? Devia sair.

Aqueles olhos escuros a encontraram, as lágrimas presas em cílios igualmente escuros, e os pés de Viola enraizaram no lugar. —Não posso. Não posso fazê-lo. Não posso fazê-lo. Ele vai querer me tocar. Machucar-me. Eu... não posso.

Legion correu para o banheiro, debruçou sobre o vaso e vomitou. Os pés de Viola ficaram livres, mas ainda assim não saiu. Entrou no banheiro e segurou os cabelos da menina, apenas para perceber que realmente não tinha vomitado. Ela tinha arcadas secas. Coitadinha. Provavelmente não havia comido uma refeição decente nas últimas semanas.

Horas pareceram assinalar a miséria sem fim. Entre cada uma de suas arcadas, a menina chorava. E quando não estava chorando, tremia tão violentamente que seus dentes batiam. Ninguém nunca veio à porta, e Viola decidiu que os Senhores haviam optado por não trocar a menina pelo retorno seguro de Ashlyn.

Finalmente, graças a Deus, a explosão de Legion a drenou. Ela caiu sobre o vaso sanitário, seus dutos lacrimais secos.

Viola se afastou, e olhos vermelhos e inchados a seguiram.

Eu realmente devia sair agora, ela pensou. Havia ficado muito tempo, o sentimento de inquietação retornando. —Vou dizer aos guerreiros que é inútil, certo? — Maddox podia tentar matá-la por seus esforços, mas Narci chamaria sua atenção como fosse.

—Não posso ir, não posso ir, — Legion sussurrou. —Ele estava aqui, eu o senti, sabia que estava aqui, mas não podia fazer minha voz funcionar, não havia falado desde que cheguei aqui, não podia nem mesmo gritar, mesmo que quisesse gritar e gritar e gritar. Escondi-me debaixo da cama. Deveria ter gritado, deveria ter gritado.

Suas palavras eram pesadas pela culpa, uma emoção que Viola se recusava a se misturar. —É, então, uh, boa sorte com isso. Foi bom conhecê-la e tudo mais. — Um passo, dois e estaria de saída. Não fazia essa coisa de amizade. Nunca. Com ninguém. Especialmente não com quebradas bonecas de porcelana que exigiriam tempo e esforço demais.

Os dutos lacrimais de Legion claramente não haviam secado, porque uma nova cachoeira começou. —Não posso deixar Ashlyn com ele, também. — Ela fungou, engoliu em seco. —Ashlyn é tão boa, e os bebês, ela me deixou senti-los chutar uma vez. Vai tê-los a qualquer dia. Precisa estar em casa. Maddox precisa que ela esteja em casa. O que devo fazer?

Tanto quanto Viola queria alcançar seu telefone para Screechar a pergunta e seguir a inundação que se seguiria de conselhos, tanto quanto ansiava por sair desta sala, queria ficar na fortaleza.

Apesar de todas as suas falhas, os Senhores não haviam tentado se aproveitar dela. Não a haviam enganado para olhar num espelho, e absolutamente a adoravam. Tudo bem, talvez esse último não fosse a verdade, mas uma cortesia para seu demônio, mas nada era mentira se acreditasse. Portanto, os Senhores na verdade a adoravam.

—Acho que deveria, uh, seguir seu coração? — Oh, eca. Que merda. Assim, bem grande. A menina não sabia o que seu coração queria, e era por isso que pedia orientação.

—O que você faria? — Legion perguntou.

Poderia tecer um discurso bonito sobre estar sempre disposta a ajudar aos outros, Viola supôs. Os caras lá embaixo provavelmente prefeririam isso. O único problema era que ao mentir para alguém, se criava bagunça. Viola odiava bagunça.

—Me salvaria, não importando o custo para os que me rodeiam. Mas sempre só me importei comigo mesma, então... — Ela deu de ombros. —Cabe a você. Quem ama mais? Você mesma, ou os que te rodeiam?

 

DESPIDO E PRESO a uma pedra, Kane rangeu os dentes de humilhação. Não demorou para as servas o pegarem depois que havia saído correndo. Sua pequena inocente escolhida era a pior do lote, arrancando seus tendões de Aquiles, o deixando manco.

Agora todos no meio da multidão se revezavam tentando roubar o que havia se recusado a dar.

Não daria a eles o que queriam. Não faria isso. Mas por quanto tempo podia sobreviver ao tormento? A pressão estava crescendo, tão intensa quanto dolorosa.

Sobreviveu a esse tipo de coisa antes. Poderia sobreviver a isso. Respire, apenas respire. Suas pálpebras estavam comprimidas, seu sangue fundido em suas veias. Todo o tempo, seu demônio ria dentro de sua cabeça. Ria. Apreciando o desastre enquanto acontecia.

Talvez sobreviver não fosse o caminho certo, pensou ele, a humilhação se transformando em raiva. Kane nunca havia gostado de seu demônio, mas agora, agora, odiava a criatura com cada fibra do seu ser. Queria ficar livre dele, e isso significava morrer. Queria punir Desastre por ter prazer com sua miséria, independentemente do destino que se abateria sobre ele.

E o faria. Sim. Ele o puniria de algum modo. Não importava o que tivesse que fazer para alcançar o fim desejado, ele faria.

 

PARIS EMPURROU SIENNA na parede, inclinou-se e colou em seu rosto. Sua respiração saia agitada, seus olhos estavam selvagens e suas pupilas dilatadas pelo pânico. Sexo gostou do contato, já implorando por mais. Paris o ignorou e manteve as coisas tão assexuadas como possível. Sienna estava muito chateada para isso.

—Tem que se esconder, — disse ela, as palavras surgindo aos pedaços. —Vou tentar atraí-las para mim, longe de todo mundo. Certo? Sim? Mas realmente, realmente tem que se esconder.

Ele segurou seu queixo, forçando-a a olhar para ele em vez de sondar seus arredores por um esconderijo. Como se alguma vez fosse se esconder de um inimigo e deixar uma mulher lutar por ele. —O que está vindo? Fale comigo, bebê. — Sabia que ela não estava muito interessada nos carinhos dele, pelo menos — não estava antes — mas então, nunca havia chamado outra mulher de bebê. Apenas querida e mel, palavras sem sentido como essa, e nunca com tal nota de afeição.

Aqueles lábios exuberantes se abriram num suspiro, e piscou de perplexidade. —Bebê, — ela sussurrou, e decidiu que gostava. Havia uma nota de reverência no tom dela. Calma de repente suavizou o pânico. —As sombras. Dardejam através das paredes e se alimentam de nós. Todos nós. Mesmo as gárgulas se escondem. Há tantos deles. Vão cobri-lo, vão se transformar em tudo que vê, tudo que sabe, e vão comer você.

Sombras corpóreas com fome de carne. Pensava ter viajado por todos os cantos dos céus, mas nunca havia ouvido falar de tal criatura.

William ouviu, porém, porque murmurou, —Oh, que droga. Isso é ruim. Exatamente o que temia.

Paris encontrou seu olhar perturbado. —O que preciso fazer?

—Apenas fique onde está. — O guerreiro de face sombria estendeu a mão e desembainhou uma faca atrás de seus ombros, em seguida, cortou o braço do cotovelo até a palma da mão. Instantaneamente carmesim fluiu. Aproximou-se, curvou-se até o chão e manchou um círculo sangrento em torno de Paris e Sienna. —Não pisem fora disso, está me ouvindo? Vocês dois, fiquem aí. Desobedeçam-me, e vão se arrepender.

Ele não esperou por uma resposta, mas correu para a entrada do quarto da imortal feminina e escorreu sua ferida através do escudo claro que os separava. A fêmea estava muito ocupada se agarrando nas paredes para perceber. Antes que William chegasse ao segundo quarto, a ferida fechou e teve que fazer outra incisão. Pintou uma linha de sangue sobre o escudo, também.

Não alcançou o terceiro quarto.

Assim como Sienna havia previsto, as sombras explodiram através das paredes. Num piscar de olhos era noite, o negro tão espesso que óleo poderia estar saturando o ar.

O castelo inteiro sacudiu e balançou. Gritos ecoaram, canções ardentes de dor e angústia. A escuridão dentro de Paris respondeu, praticamente ronronando com aprovação do mesmo jeito que Sexo sempre ronronava pelo contato físico, desfrutando de cada nota terrível. Querendo sair, querendo se soltar. Querendo causar a todos em sua volta dor também.

Paris estava quase cedendo, saindo do círculo que William havia desenhado e lutando com as sombras, inferno, lutando com William, quando Sienna tremeu contra ele. Ele se apertou contra ela com mais firmeza. Devia proteger, pensou. É por isso que estava aqui. Por ela. Para ficar com ela. Para garantir sua segurança.

Ela tremeu de novo, este inquietante em sua intensidade. Não tinha certeza do que estava acontecendo atrás dele ou ao seu redor ou mesmo quanto tempo isso ia durar, mas ela sabia, e a aterrorizava. E ainda assim havia pensado em protegê-lo, percebeu. Ainda assim, havia querido escondê-lo. Ele, não ela mesma. Seu núcleo guerreiro ficou ofendido com isso, verdade, mas agora só podia se emocionar sobre sua preocupação. Ela se preocupava com seu bem-estar.

Eu a quero, Sexo disse. Naturalmente, o ronrono começou a crescer de novo.

Assim como eu. E teria um gosto dela. Finalmente, aqui e agora, as circunstâncias que se danassem. Ela estava muito preocupada para um contato sexual? Dificilmente. Precisava de uma distração, e não havia nada melhor que desejo.

Paris tateou até o queixo dela, envolvendo-o para segurá-la firme, enquanto se deleitava com o calor de sua pele sedosa, a delicadeza de seus ossos. —Concentre-se na minha voz, bebê. Pode fazer isso?

Um aceno brusco.

Gostaria de poder vê-la e descobrir se a cor estava voltando ou não para aquelas bochechas delicadas. Em seu ouvido, sussurrou, —você é tão macia. Nunca senti nada mais suave. E seu perfume me embriaga. Não posso evitar, mas acho que vai ser ainda mais doce entre as pernas.

Sua respiração prendeu, suas mãos encontraram seu peito e palmearam sobre seus peitorais.

—Quando eu enfiar meus dedos profundamente dentro de você, vai ficar muito molhada para mim, não vai, bebê? Vou te comer, beber cada gota de seu mel, e vai gritar por mais.

Simmmm, Sexo disse num gemido. Por favorrrrrr.

—Paris, — Sienna respirava.

Um apelo carente por mais? Isso foi o que seu demônio ouviu em sua voz trêmula. Paris se viu inclinando, o resto do mundo esquecido, o nariz em seu cabelo quando cheirou as ondas pesadas. Perfumado com flores silvestres e coco, agora misturado com algo raro, uma flor encontrada somente à noite.

Oh, inferno, sim. Essa era sua excitação.

Sexo gostou também, soltando sua própria fragrância especial. A combinação das duas, o buquê mais maravilhoso, envolveu Paris. Maravilhoso — e torturante. Imediatamente ficou acelerado, mais que preparado, mais que pronto, desesperado para afundar nessa mulher e atravessar seu caminho para o orgasmo. Tudo que precisava fazer era abrir as calças de ambos e abrir as pernas dela. Ele entraria profundo e certo. Ela estaria quente, pingando e tão apertada em torno dele.

Pequenas unhas afiadas arranharam sua camisa e sua pele, como se para segurá-lo no lugar. Podia sentir o calor dela, pulsando, infiltrando, se misturando com o seu próprio e espetando diretamente seu pau. Ele doía insuportavelmente. Antes mesmo de perceber que se movia, afastou as pernas dela com o pé e se arqueando, encaixou sua ereção contra seu núcleo feminino.

Olá, doce condenação. Ou havia cometido o maior erro de sua vida, ou o melhor. Encaixavam-se como peças de quebra-cabeça correspondentes. Ele se esfregou contra ela, lentamente no início, apenas o suficiente para provocar e atormentar a ambos. O prazer cresceu, assim como a pressão. Sim, definitivamente devia tê-la tomado mais cedo. Seu demônio estava pronto para explodir livre de sua pele.

Paris não podia avaliar a reação de Sienna através do som por causa dos gritos que o cercavam, então levou uma das mãos à garganta dela, mantendo seu toque suave. Nada poderia impedi-lo de sentir seus gemidos, e as vibrações eram tão malditamente lindas.

—Paris. — Seus lábios pressionaram contra sua orelha. Definitivamente não era um apelo neste momento, nem um alerta, também. —Não pode me querer.

Ele circulou seus quadris, pressionando, retirando-se, pressionando. —O que é isso, então?

—Um deleite pela única mulher disponível na sala.

As palavras foram como uma bofetada em sua cara e sua volátil escuridão interior respondeu mal se agitando através dele e exigindo que machucasse quem o havia machucado. Reprimiu o desejo e retrucou: —Então, um cara como eu só quer o que está disponível?

—Você não me queria antes, no quarto. Então esta talvez seja a punição. — Raiva afiava seu tom.

Punição? Suas mãos crisparam em reflexo, sua própria raiva se tornando um eco da dela.

Infelizmente, ela não parou. —Acredite em mim, entendo o conceito muito melhor do que antes. Talvez não tenha vindo aqui para me salvar, afinal de contas, mas para me ferir da mesma maneira que uma vez feri você.

Ele não confiava nela, não podia, não importa o quanto quisesse, e até mesmo dissesse a si mesmo que o fazia, e agora via que ela não podia, não confiava nele, tampouco. Não era verdade. Havia suspeitado que isso fosse acontecer. Isso não o incomodava (muito) antes, mas o incomodava agora. Odiava tantas barreiras entre eles. Roupas, reservas, dúvidas e preocupações.

—Não sou nada parecida com as mulheres que você está acostumado, — ela continuou. —Sei disso. Sei que não sou bonita.

—Está certa. Está além de linda.

Um suspiro. —E-e meus lábios são ridículos.

—Se ridículo for uma palavra nova para um sonho molhado.

Seus punhos pequenos martelaram seu peito. —Pare! Apenas pare. Precisa de sexo e está tentando fazer uma barganha. Fiz o mesmo com você antes, querendo ficar com você uma última vez. Não deveria ter me jogado em você assim.

Suas costas se endireitaram. Ela havia se oferecido para ele, não porque se sentia culpada, mas porque o havia querido. Não devia ter admitido isso. Não haveria como pará-lo agora. Ele a teria, de uma forma ou de outra.

Lambeu os lábios, dizendo: —Bebê eu nunca tive que tentar. Respiro e as mulheres se oferecem.

O abuso parou, um gemido soou vindo dela. —Está — Está tentando me colocar no meu lugar, então. Tentando me provocar com o que nunca poderei ter.

Oh, pode tê-lo, tudo bem. —Sabe que não é verdade. Não porque confia em mim, mas por causa de seu demônio. — Ira mostraria qualquer fraude por parte de Paris.

Uma longa pausa agonizante de três batimentos cardíacos. —Você está... certo. Que estranho... — disse ela, tanto temerosa quanto esperançosa. As unhas mais uma vez encontraram seu peito. — Odeio o fato de um demônio ter sido colocado dentro de mim, queria me livrar dele, vociferar e xingar, e até mesmo planejei o devolver, mas comecei a contar com sua capacidade de ler as intenções das outras pessoas.

Uma vez possuído, sempre possuído. Na maior parte, de qualquer maneira. Então dar Ira de volta à Aeron? Inferno Isso seria um grande e forte, não. Isso a mataria. Mais uma vez. —Pode acreditar em mim quando digo que quero você, Sienna. É tudo que eu penso há meses. Resistir a você naquela sala foi uma das coisas mais difíceis que já fiz.

A vibração na garganta sinalizou um gemido. —Está realmente atraído por mim, apesar de tudo? — Maravilha saturava sua voz, escorrendo sobre ele como mel morno.

Ele tinha uma coisa com mel morno.

—Sim. — Para trás, para frente ele se arqueou, renovando o contato luxurioso. Queria empurrar mais ainda, mas não o fez. Ainda não. Queria que ela focasse apenas no prazer, todos os seus medos por suas segundas intenções apaziguados. —Que não haja dúvidas a esse respeito.

Outra vibração, esta atingindo uma parte mais profunda dele. —Por que eu? — Suas unhas tocando livres em seu peito, as mãos alisando sobre ele. —Quero dizer, poderia ter qualquer uma.

—Exatamente. Podia, e escolhi você. Por tantas razões. Você é inteligente.

—Discutível.

—É inteligente.

—Não mais que mil outras.

—É argumentativa e não pode aceitar um elogio.

—Ei! — Ela estendeu a mão e puxou seu cabelo.

Apesar da severidade dos arredores e circunstância, se viu sorrindo. —Você é linda.

Seus dedos deslizaram pelo couro cabeludo, massageando. —Não apenas mais que linda? — Ela perguntou secamente.

—É perfeita, e não quero te ouvir se rebaixando novamente. Entende? —Ele havia matado outros por fazê-lo. Ela, iria simplesmente espancar. —Pode ou não ficar feliz com os resultados.

—Por quê? Está pensando em palmadas? Porque estou pegando algumas imagens na minha cabeça.

—Bem, bem. Algo mais a gostar em você. Você me entende.

Uma inalação. Aquela que ele apreciava, porque ele tinha causado o humor por trás dela. —Deve estar cego pelo tesão de seu demônio, — disse ela.

E ela pensava que havia milhares de outras pessoas tão teimosas quanto ela. Acabava de emitir uma ordem ao lado de uma ameaça, mas ela havia ignorado as duas e continuado alegre por seu caminho.

—Seu demônio já te deixou ficar com a mesma mulher duas vezes? — Perguntou ela, suas palavras encobertas por uma borda rouca de excitação, bem como uma nota de nervosismo. —Eu ouvi que você... não importa.

Ela havia conseguido muitas informações dos Caçadores. Ele endureceu, odiando a lembrança de seu passado, mas isso não o impediu de admitir: — Ninguém além de você.

O calor de sua respiração caminhou sobre seu pescoço enquanto ela inclinava a cabeça, colando seus rostos. —Por que eu?

—Não sei. Sexo não sabe, tampouco. Eu perguntei.

—Bem, ele deveria ter escolhido outra pessoa. Tenho seios pequenos, — ela sussurrou, como se envergonhada.

Ele pegou os minúsculos bocados em questão. Eles. Eram. Perfeitos. Suas mãos eram grandes, os mamilos endurecidos contra os centros de suas palmas, e caramba, se isso não era a sensação mais requintada do mundo. Encaixando seus lábios contra sua orelha, mordiscou o lóbulo.

—Eu os quero na minha boca, — respondeu asperamente.

Um gemido de aprovação. As unhas estavam em seu couro cabeludo agora, cavando cada vez mais fundo.

Paris beijou e lambeu seu caminho até os lábios. Eles se abriram, quentes, a doçura da respiração dela entrando e saindo, perfumada pelo tempero de coco. Ele pairou lá, ainda não pegando o que queria. O que eles tanto queriam. Se começasse isso, seria difícil parar. Um momento muito difícil. Tinha estado sem uma mulher por muito tempo, e seu demônio muito carente, mas...

Não queria tomar Sienna num corredor, na frente dos outros, percebeu. Sim, havia feito essa merda antes, e ela havia gozado muito rápido. Queria um presente só para ele, cada um de seus gritos para seus ouvidos apenas, toda a reação dela ao seu toque uma descoberta pessoal. Seu cheiro, dele. Sua pele, dele. Dele, dele, dele.

 Pegue o que é seu! Tome, tome, tome!

Bem, tão só quanto podia com um demônio preso dentro dele.

—Paris, — ela disse, seu tom ilegível.

—Sim.

—Uma palavra de advertência. Sou muito ruim nisso.

A confusão o abalando, e levantando as sobrancelhas. —Em que?

—Beijar.

Antes que ele pudesse contradizê-la, ela encaixou suas bocas juntas e sugou seu fôlego direto de seus pulmões. Ela não era ruim em beijar, era receosa, insegura e hesitante, mas a ansiava muito violentamente para ensiná-la melhor. Ele assumiu, incapaz de parar a si mesmo. Sua língua empurrou com força, exigindo que ela cedesse ao seu domínio.

Por certo que ela não o fez. Após os dentes dele baterem nos dela na terceira vez, ela mordeu seu lábio inferior, duro, tirando sangue.

Ele se afastou antes que ela cortasse a coisa pela metade. —Maldição, mulher.

Sexo fazia algum tipo de movimento saltitante contra a lateral de seu crânio. Não se queixando ou se escondendo da violência, mas se empolgando, para se aproximar da violência. Mais, mais! Beije-a mais!

—Posso ser ruim nisso, mas sei quando alguém mais também é. Faça direito, — Sienna exigiu.

Ela estava brincando? —Ninguém nunca havia criticado minha técnica antes.

—Isso é porque não queriam ferir seus sentimentos, — ela disparou de volta. —Você e eu passamos desse estágio, então me sinto bem em admitir que ganhei um beijo melhor de Carl “calça curta” na terceira série.

Espírito novamente, e caramba, se isso não o colocou em movimento novamente, demolindo qualquer indício de raiva persistente. Ele gostaria de poder ver seu rosto. Aqueles olhos castanhos estariam brilhantes, sua pele corada, os lábios inchados. Seria a paixão encarnada. —Por acaso está me dando dicas? É muito pior nisso do que eu.

—Alguém tem que te ensinar. — Ela deu um tapinha no rosto dele. —Acho que vamos ter que aprender como fazer isso juntos.

Mais, mais, mais!

Seus lábios tremeram com sua diversão. Engraçado, isso. Diversão, quando seu corpo e seu demônio estavam em chamas, desesperados por esta mulher. Estou nisso.

 

—CERTO. VAMOS VER O QUE POSSO fazer para ser melhor que o pequeno Carl. Lentamente, Paris baixou, pressionou sua boca suavemente contra Sienna, levantou, apertou novamente, provocando-a com o contato, mal provando. Ela suavizou contra ele, as unhas arranhando seu couro cabeludo, as mãos rastreando abaixo, abaixo, até que contornaram o pescoço para puxá-lo contra ela.

Ele lambeu a divisão dos lábios, bebendo dela, dando-lhe o que ela queria, lento e fácil, e quando ela se abriu para ele, lambeu seu caminho para dentro, profundo, provando mais dela, tomando mais. Sua língua encontrou a dele, conectando, duelando com golpes longos, lânguidos. Descobrindo um ao outro, desvendando todas as nuances de língua e dentes, hálito e sabor, e era a coisa mais sexy que ele já havia experimentado.

Durante sua primeira união, ela o havia beijado e usado sua distração contra ele, empurrando a agulha em seu pescoço. Ela poderia ter feito algo parecido agora, mas ele não teria se importado. Seu corpo ardendo lentamente de paixão, seu sangue já derretido de uma forma que nunca havia estado. Seu coração era um tambor de guerra em seu peito, batendo seu grito por mais dessa mulher, dessa obsessão. Seus membros tremiam.

Com a escuridão tão densa ao seu redor, sua visão ainda estava arrasada e seus outros sentidos relaxaram. O cheiro floral de Sienna estava marcado dentro de seu nariz, fazendo com que sua cabeça desorientasse novamente. Seus dedos tatuados formigavam, memorizando a sensação acetinada dela. Seus ouvidos contraiam, cada som que fazia uma carícia. E seu gosto... oh, inferno, sim...ambrosia na sua versão mais potente.

Mas então, ela era isso agora, o que Cronus fez a ela. Uma fornecedora. Uma distribuidora de ambrosia ambulante. Enfie um canudo em sua veia e poderia ficar alto pela eternidade.

Quando humanos consumiam ambrosia, morriam. Uma vez quase havia matado a mulher de Maddox. Sienna, porém, já estava morta e não era humana. Ao alimentá-la com o néctar misturado com os bulbos necessários para o crescimento da planta, algo que mataria até mesmo um imortal, ela era em essência, um terreno sempre fértil para a droga.

O que corria em suas veias era mais viciante do que Paris usava para derramar em seu álcool. E se alguém imortal provasse o sangue dela, ficaria instantaneamente viciado nela. Precisariam dela, manteriam e lutariam até a morte com qualquer um que tentasse levá-la.

Por que em nome de tudo que era profano Cronus havia feito isso com ela? Por que ele daria a ela tal destino?

Algo mais para os dois negociarem — com lâminas.

Não pense sobre isso agora. Você a tem. Está segura, e quer você tanto quanto você a quer. Ele segurou sua cintura, a levantou, e em seguida, apertou-a mais firmemente contra a parede. —Enrole suas pernas em volta de mim, bebê.

Ela obedeceu, e ele esfregou sua ereção contra o clitóris dela com tanta força que ela gritou. Isso foi... isso foi... sem palavras.

Mais.

Todo. Cada coisa. Havia algumas palavras, afinal. —Está molhada para mim? — Geralmente tinha um fluxo de elogios amáveis e sem sentido para falar. Sienna teria sorte se conseguisse tirar dele mais que minha, mais e sim.

Houve uma hesitação, em seguida, sussurrou timidamente: —Estou.

Devassidão abandonada salpicada com uma pitada de reserva... uma combinação sensual.

Suas línguas rolaram juntas, mais rápidas, mais rápido ainda. Seu beijo era como sexo. Esmagador, consumidor, necessário. Não conseguia o suficiente, não achava que poderia ter o suficiente. Tudo que havia feito para chegar a este ponto, absolutamente valia à pena.

Esteve com tantas pessoas, fez tantas coisas. Algumas que gostou, outras que não. Noventa por cento do tempo operava no piloto automático, atravessando os movimentos para conseguir o que precisava, deixando suas parceiras com um sorriso de satisfação, mesmo quando havia odiado quem estava com ele, detestando os cheiros, as mãos o agarrando, o conhecimento de que estava dentro de alguém que não conhecia.

Não estava no piloto automático no momento. O instinto o levava, a necessidade de possuir e ser possuído. A necessidade de se tornar um, tão brega quanto soasse. Então a beijou de novo, porque não podia deixar de beijá-la. Porque tinha que conhecer mais de seu gosto, mais dela. Ele inclinou a cabeça, se dobrando para um contato ainda mais profundo, movendo a língua com mais rapidez, e mais rápido ainda, tomando a boca do jeito que queria tomar o corpo dela.

Desta vez, ela não ofereceu resistência. Todo o tempo ele se esfregava contra ela. Suas terminações nervosas estavam tão sensíveis que pensou que estaria em carne viva quando terminasse.

—Sim, — ela gemeu, e claramente, desta vez gostou de seu fervor. —Paris... vou... tem que... parar... não pare... por favor pare. Paris!

Não haveria parada. Apertando-a sempre mais forte, ouviu-a gritar em êxtase, e inferno, ele estava em chamas. Queimava por ela, desesperado para afundar tão malditamente profundo dentro dela até que soubesse que pertencia a ele.

Mais!

—Paris... pare... por favor.

A palavra de novo. —Pare. — Suas mãos puxaram seus cabelos, forçando sua cabeça a levantar.

—Quero você, — ela raspou, — mas não aqui. Em outro lugar. Em algum lugar privado.

MAIS.

Ele a levaria de volta ao quarto, pensou tonto pela necessidade. Sim. Isso era o que faria, porque tinha que despi-la, tinha que vê-la, entrar nela agora, agora, agora.

Ele se endireitou, arrastando-a com ele. Um passo, porém, apenas um passo, e milhares de picadas de agulha atravessaram sua perna. A razão voltou, e pulou de volta ao círculo de sangue. Estava ofegante, podia sentir o fluxo de sangue quente abaixo de sua panturrilha, e ficaria surpreso se ainda tivesse qualquer músculo sobrando. Num estalar de um dedo, as coisas-sombras o tinham mastigado como se fosse um bife e estivessem famintas como cães.

Isso era o que Sienna havia sofrido?

Sexo recuou para o fundo da sua mente, a dor demais para ele.

Escuridão... subindo... a mão de Paris estava no punho de sua lâmina, apertando, enquanto contemplava saltar no meio e cortar.

Os dedos de Sienna envolveram seus bíceps, o acalmando. Ela também estava ofegante. —Está bem?

—Ferida? — Ele a tocou, em busca de lesões.

—Não eu. E você?

—Estou bem. — Seus mamilos ainda estavam duros, a barriga tremendo. Necessidade ainda galopava através dela, mas ela havia tido a força para parar quando ele não havia. Impressionante. Irritante.

—Você...

Assim de repente, como as criaturas sombras chegaram, foram embora. O castelo ficou tremendo, os gritos morrendo. A luz voltou pelo corredor. Paris teve que piscar contra o ardor nos olhos.

As bochechas de Sienna estavam cobertas por um rosa profundo, seus lábios macios, inchados e abertos, brilhando com seu gosto. Devia ter enfiado as mãos pelo cabelo dela inúmeras vezes. Os fios estavam embaraçados em torno dela. Parecia devassa e má, e tão sexy que seu eixo pulsou contra sua braguilha.

Ele se virou antes que caísse sobre ela, devorando-a. No centro do corredor, William estava agachado em seu próprio círculo de sangue, a cabeça baixa. A imortal fêmea estava em sua porta, os olhos arregalados, sem saber. O macho William estava protegido em sua porta, também.

O outro homem, o que William não havia chegado a tempo, estava deitado no chão do quarto, um mar de vermelho e... outras coisas derramadas em torno dele. Contorcia-se em agonia, assim como lutava para se aprumar novamente.

—Sabe que coisas eram essas? — Paris exigiu. Quando seu mundo girou, fez uma careta e estendeu o braço para segurar a si mesmo na parede. Mas não por causa da perda de sangue ou da dor.

Sexo choramingava, jorrando fraqueza diretamente nas veias de Paris. O bastardo esteve preparado e decepcionado muitas vezes nos últimos dias, e com a negação de Sienna havia começado a contagem regressiva para o "desastre". Isso significava que, se não conseguisse ter relações sexuais e, em breve, rapidamente desvaneceria até que estivesse completamente inútil. Até que entrasse em colapso, os feromônios flutuando dele, atraindo as pessoas para ele. Até que alguém simplesmente o escalasse.

De jeito nenhum deixaria isso acontecer. Suas razões para resistir a Sienna não haviam desaparecido milagrosamente, mas não o deteriam mais. Ele a tomaria, no entanto, poderia tomá-la, porque a alternativa era tomar outra pessoa e não estava disposto a fazer isso.

—Sim, sei o que são, — William finalmente conseguiu falar depois de recuperar o fôlego. Os olhos azuis do outro levantaram e colocaram Paris no lugar. A tensão estalava no ar entre eles. —Há muito tempo atrás Cronus os criou da mesma forma que Zeus criou você, mas ouvi que após a prisão de Cronus alguém os havia tomado aos seus cuidados. Cronus os deve tê-los recuperado. E agora vou ter que ter uma conversa com ele sobre hóspedes e costumes. — Ameaça absoluta derramava dele.

Claramente antecipava uma conversa a dois, da qual apenas um poderia ir embora. Sim. Paris queria o mesmo.

—Isso já aconteceu com você? — Perguntou ele, se voltando para Sienna e sacudindo o dedo na direção do sujeito aberto do pescoço ao umbigo. Por causa do que havia sido feito ao sangue de Sienna, as criaturas teriam enlouquecido por ela. Teriam convergido em massa, concentrados apenas sobre ela, não a deixando até que drenassem cada gota possível.

Não houve resposta.

—Sienna. O que... — Seus olhos estavam vidrados, ele percebeu, estavam vítreos e brilhantes, de um vermelho forte e vibrante.

—Punir, — ela sussurrou.

Ira assumiu sua mente e corpo.

—Devo puni-los, — ela repetiu numa voz que ela nunca antes havia usado com ele, rude, sem paixão. Um segundo depois, suas asas explodiram de suas costas, nuvens de meia-noite misturadas com violeta. Batiam acima, abaixo, alongando em sua total largura e riscando a parede, o chão.

—Sienna, — disse ele. Calma, tinha que manter a calma. Caso contrário Ira ia transferir essa necessidade de punir para ele. Estalou os dedos na frente do seu rosto. —Preciso que me escute, certo, Bebê?

—Punir. — Suas asas deslizaram mais rápidas, até que pairava no ar.

—Sienna.

Sem outra palavra, ela disparou direto para a única janela, estilhaçando o vidro e desaparecendo na noite.

Paris deu um mergulho rápido para ela, mas errou e acabou com metade do seu corpo pendurado pronto para desabar muitos andares no lago de espuma do castigo. Bem, inferno. Havia pedido para deixar o bastardo assumir, não foi? Estúpido. Sem dizer até onde Ira poderia levá-la, ou o que o demônio a faria fazer.

De uma forma ou de outra, ia atrás dela.

Nunca teve que perseguir tanto uma mulher. Puxou a si mesmo de volta e estudou a inclinação, tentando decidir a melhor maneira e mais rápida de descer sem chamar a atenção das gárgulas. E não sabia? Havia apenas um caminho. Teria que fazer o mergulho de 50 metros, afinal, e rezar para as pernas não quebrarem com o impacto.

O problema era, agora que estava na opção tenha-sexo-ou-morra, ele poderia se machucar e não se curaria muito rapidamente. Como fosse. Ela estava em perigo, faria o que fosse necessário. Jogou a perna por cima da janela.

—Fique aqui. — Ele jogou as palavras por cima do ombro. —Veja se pode ajudar os imortais.

—Vá em frente, —William murmurou a resposta.

Quando a outra perna estava no lugar, Paris fez a contagem regressiva. Três. Dois. Tão estúpido. Um...

E de repente Zacharel estava lá com suas asas brancas abertas e se agitando graciosamente pelo ar. Flocos de neve flutuavam ao redor dele, a moldura perfeita para traços sem emoção. Ele arqueou uma sobrancelha escura. —Gostaria de uma carona?

—Onde estava quando as sombras estavam aqui? — Perguntou ele bruscamente.

—Posso responder, ou posso te ajudar.

Estou cansado de suas manipulações, mas não há como negar que posso usar sua ajuda. E não sou sempre a mais bonita donzela em perigo? Aeron havia levado Paris através dos céus uma ou duas vezes, então sabia que não havia nada de sexual nisso. Só orava para que Zacharel percebesse que a ereção que atualmente ostentava não tinha nada a ver com sua proximidade.

O anjo passou os braços em volta da cintura de Paris. —Vai descobrir que boas obras são bálsamo para a alma.

—Isso é excelente. — Para um maior sentido de fixação, Paris envolveu seus próprios braços em volta do pescoço do anjo. Músculos sólidos, pele gelada. Mesmo pronto e carente como Sexo estava, o demônio ficou quieto. —Mas podemos fazer isso sem conversar?

—Podemos? Sim. Iremos? Não. Enquanto for meu público cativo, gostaria de discutir sua obsessão doentia com a garota morta e o fato de que ficará melhor sem você.

Cer-to. Paris puxou as pernas entre eles, empurrou seus corpos separados, e pulou.

 

SANGUE ESCORRIA DAS MÃOS DE SIENNA, endurecendo sua roupa e fazendo seus tênis chapinhar repugnantemente a cada passo que dava. Como em outros momentos, Ira havia tomado conta de seu corpo e o levado para fora do castelo, forçando-a a seguir as sombras de seu esconderijo, de modo que pudesse travar um ataque e ferir as criaturas muito piores que haviam ferido outros. Seu olhar vermelho-brilhante havia brilhado através dela, cortando através de suas peles... ou infiltrando-se... ou o que quer que englobasse suas camadas externas, queimando-os. Ele havia rido e rido.

As sombras estavam muito satisfeitas se empanturrando para revidar o ataque, seu desamparo um afrodisíaco para Ira, fazendo-o desejar mais, mais, mais, e no momento que ele havia acabado com as sombras, voltou sua atenção para os outros seres que viviam neste reino oculto, entusiasmando-se quando, também, gritaram de dor.

Quando a fome finalmente estava satisfeita, tentou forçá-la a caminhar de volta para o castelo. Pela primeira vez, soube o que ele estava fazendo enquanto ele estava fazendo, sua mente se recusando a romper sua ligação com Paris, e ela havia lutado com ele — e lutado muito. Finalmente, como estava cheio de saciedade, ele havia desistido e recuado para o fundo da sua mente. Agora estava no controle e decidindo aonde ir.

Infelizmente, sua luta ainda não havia terminado. Havia um cordão invisível que ligava o castelo ao seu pescoço, tentando puxá-la cada vez mais perto. Não tinha certeza de quanto tempo mais poderia resistir. Suas asas estavam retalhadas — não que soubesse voar sem a orientação de Ira, — e apesar de se curarem em algumas horas, eram atualmente incapaz de manter seu peso. Ainda assim, cavou os calcanhares no chão e conseguiu diminuir seu ímpeto. Dor vibrou em seus ossos. Ela se encolheu quando girou... girou... e começou a escorregar na direção oposta. Sim. Sim!

Para retornar, mesmo para ver Paris, para dizer adeus, para beijá-lo uma última vez, para fazer amor com ele, e para se aprisionar. E embora estivesse tentada, oh, estava tentada, tinha que fazer isso. Por ele. Por Skye. Antes de Cronus saber de sua fuga, pensar em punir Paris e começar a puxar suas cordas mais uma vez.

Se pudesse chegar a Galen, interrogá-lo e matá-lo antes que Cronus percebesse que havia ido embora, não teria que seduzi-lo, e a guerra entre os Senhores e os Caçadores finalmente terminaria. Mesmo que o guardião da Esperança nunca dissesse onde sua irmã estava, não poderia machucar a garota se estivesse morto. O que deveria ser suficiente.

Passos ecoavam, empurrando-a para fora de sua mente. Eram seres atrás dela, percebeu, seguindo-a. Não teve que olhar para trás para saber que estavam com os olhos vazios, machos curvados, a pele de cor acinzentada que se dividia em quatro linhas, cada uma carregada com afiadas presas. Eram assassinos sem consciência, o sangue de seus inimigos sua fonte de vida.

Algumas semanas atrás, Ira havia atingido seu acampamento, deixando sangue e morte em seu rastro. Claro, isso significava que Sienna — o rosto que os sobreviventes haviam visto — tinha se tornado uma inimiga. Eles a estavam perseguindo desde então, e atacariam o castelo se não fossem as Gargl.

A vontade de correr era quase irresistível. Desde os vislumbres que seu demônio havia lhe dado dessas criaturas, sabia como caçavam no passado, soube que matavam sem dó. Sabia que gostavam da perseguição mais que apreciavam o abate. Então, talvez se mantivesse a cabeça calma, talvez se ficasse em seu caminho atual, perdessem o interesse por ela.

Sim, talvez. Não.

—Você levou nossasss essscravasss, as fêmeas. Agora você se torna nossa essscrava.

Os sibilos vieram como cortesia de suas presas, que cortavam as palavras quando as proferiam. 

—As coisasss que vamos fazer com você... — Um riso calculado. —Os gritosss que vai proferir...

Oferecendo nenhuma resposta, mas permanecendo altamente sintonizada com todos os seus movimentos, ela se forçou mais e mais longe do castelo. Seus arredores se tornaram mais escuros, o ar mais espesso, perfumado por sangue e outras coisas. Ela contornou pilhas de ossos, a lagoa de cor rubra, cavernas que saltavam das bocas de grandes crânios esculpidos. Não tinha armas, e não sabia exatamente onde era a saída do reino — porque Cronus a havia trazido enquanto estava semi consciente e, além disso, como Paris e seu amigo haviam entrado? — Ou onde nos céus, se encontraria depois.

Deveria ter questionado Paris. Droga de percepção tardia.

—Sssim, continue andando, fêmea. Está indo direto para nosso acampamento.

Verdade ou mentira? Ira não era nenhuma ajuda neste momento. Deveria parar? Combatê-los? Suas habilidades de autodefesa eram risíveis, considerando que tinha problemas para equilibrar seu peso. Não importa o que fizesse ou onde fosse os homens a atacariam, e era isso. Esperá-los atacar apenas adiava o inevitável.

Um grito cheio de dor grunhiu no ar atrás dela, seguido por outro. Em seguida, outro. Os homens deviam estar lutando entre si, pensou com uma onda de alívio, poupando-lhe o problema.

Uma cabeça — sem um corpo — passou rolando por ela. O olhar vazio a fitou piscando, desapareceu, piscou, desapareceu. Ela tropeçou em seus próprios pés quando outra cabeça passou rolando. Seu estômago se agitava, assim como seu alívio triplicava.

—Tem que matar tão desnecessariamente? — Uma voz masculina perguntou. Sem emoção, e ainda havia algo na cadência, algo que acariciava seus ouvidos.

—Sim. Devo.

Paris! Sienna virou, seu coração uma tempestade dentro do peito. Seu olhar cortou a escuridão. Onde estava — Ali! Seus joelhos quase se dobraram com a inundação de felicidade que se seguiu.

—Por quê? — O orador era um homem de cabelos escuros vestido com uma túnica, mantendo o ritmo ao lado de Paris. Tinha um rosto sublime, mau em sua beleza cruel. Asas majestosas de branco e ouro se estendiam de suas costas. Parecia um anjo caído, assim como Galen. Ainda assim, se Paris confiava nele, assim ela o faria. Neve flutuava em torno dele, mas só nele. Os flocos pareciam ser absorvidos em sua pele e cristalizar.

—Estavam olhando para ela, a ameaçando. — Paris disse, mas se sabia onde Sienna esperava, não deu nenhuma indicação. —E meu demônio sabia o que estavam pensando. Mereciam um inferno muito pior do que tiveram.

—Agarrei você, te salvei de pintar o chão com seus órgãos. Devia-me um favor, e pedi um único dia sem derramamento de sangue.

—Sim, mas não especificou qual dia. — Com isso, Paris rejeitou o anjo e, finalmente, se focou nela.

Alto e forte, carrancudo, caminhou em sua direção. Tinha hematomas debaixo dos olhos e cortes que desciam ao longo de seus braços, mas sua marcha, embora lenta, era constante. Corpos estavam empilhados atrás dele. Ela pensou que apenas duas das criaturas a estavam seguindo, mas, oh, havia calculado mal. Pelo menos onze a haviam seguido.

—Onde diabo pensa que está indo? — Paris exigiu no momento que a alcançou.

Seu olhar caiu sobre seus lábios. Esses exuberantes lábios vermelhos, que a haviam beijado e bebido e se esmagado contra os seus próprios. Lábios que ansiava por toda ela.

—A algum outro lugar. Estou tentando escapar, e fazendo um excelente trabalho nisso, obrigada. — respondeu ela.

—Sem dizer adeus? — Ele agarrou seu pulso manchado de sangue, virou o braço esquerdo e direito, em busca de qualquer dano. —Legal, Sienna. Muito legal.

Estaria ele realmente louco sobre isso? A culpa a deixou corada, seguida pela vergonha e até mesmo prazer. Ela ergueu o queixo, recusando-se a se curvar sob seu olhar.

—Se eu retornasse ao castelo — e acredite em mim, meu corpo quer voltar e até mesmo ficar aqui em pé é uma tarefa difícil — ficaria presa lá dentro novamente. Você disse que queria minha maldição quebrada. Bem, estou fazendo meu melhor para quebrá-la.

Ele a soltou, suspirando.

—Ótimo. Fez a coisa certa, mas odeio o fato que, se eu não tivesse vindo atrás de você nunca a teria visto novamente. —Ele podia tê-la acusado de abandoná-lo, de deixá-lo lá para sofrer, ou qualquer número de outras coisas. O fato de não ter...

—Odeio isso, também. — ela admitiu.

Limpando a garganta, como se desconfortável pelo rumo da conversa, ele massageou seu pescoço. Os olhos azul oceano a fitaram como se o sol brilhasse por trás deles, brilhando fora da água. —De qualquer forma, não quero você aqui sozinha. É muito perigoso.

—Bem, por mim, não me quero aqui, também. — Uma onda de tontura, de repente a abateu, e ela balançou.

Ele a examinou da cabeça aos pés, um pouco do gelo do anjo se estabelecendo em sua pele.

—Isso não é apenas sangue de outras pessoas a cobrindo, não é? Está ferida.

Preocupação. Por ela. Se tivesse qualquer resistência, perderia cada pedacinho dela naquele momento.

—Me curarei.

—Quem te machucou? — Ameaça letal em seu tom.             

—Ira, quando irrompeu pela janela. As outras vezes que tomou o controle, me fez andar para o parapeito no telhado do castelo. Desta vez, estava com medo que você me atrasasse. Então... —ela encolheu os ombros —escolheu uma rota mais rápida.

As pontas dos longos cílios de Paris se uniram, mal mascarando a ameaça descansando por trás deles.

—Não o deixe assumir mais.

Nem um pouco intimidada pela raiva crescente do guerreiro, ela revirou os olhos.

—No início queria que eu fizesse exatamente isso.

—Mudei de ideia. —disse ele, inclinando-se até que estivessem frente a frente. —Não me pressione sobre isto, mulher. Estou muito tenso.

Ficaram assim por alguns segundos, misturando as respirações emergindo mais rápido. Ela queria que a beijasse novamente, para terminar o que haviam começado.

—Esta área não é segura. — disse o outro homem, arruinando a sensualidade do momento.

Paris assumiu a posição vertical, suas costas ficando duras e retas.

—Sienna, conheça Zacharel. É um anjo guerreiro para a Ùnica, Verdadeira Divindade. Zacharel, conheça Sienna. Ela é minha.

Um arrepio a percorreu. Uh, simplesmente a havia reinvidicado? Estaria advertindo o outro homem para ficar longe dela, como se a possuísse? Prazer a aqueceu, afastando o frio paralisante que o anjo havia trazido com ele.

Zacharel ofereceu a mão, os dedos longos e grossos.

—Vou te proteger. — disse ele, as palavras de alguma maneira um convite e uma promessa.

—Não a toque. — retrucou Paris, empurrando o anjo para longe dela. —Nunca.

A expressão neutra de Zacharel nunca vacilou, nem a intensidade do seu olhar.

Ela se mexeu desconfortavelmente, incerta por que queria protegê-la. Havia um tom de verdade em sua voz, no entanto, que não podia refutar. De alguma forma sabia que faria tudo ao seu alcance para mantê-la segura.

Ou... talvez fosse um truque. Talvez, como Galen, Zacharel construísse esperanças e as quebrasse. Engolindo, olhou para Paris para obter respostas.

—Ele é...

—Como Galen? — Perguntou ele, sentindo a direção de seus pensamentos. —Não. Ele é a coisa real, bem como um pedante hipócrita que vai testar todos os limites de sua paciência. Também é impotente. Agora, onde está indo? —Ele segurou seu queixo e a forçou a focar sobre ele e somente nele.

O calor do seu toque... a textura áspera de suas palmas... outro arrepio passou através dela.

—Não tenho certeza. — Será que ela soava com falta de ar para ele como parecia para si mesma? —Estava andando sem rumo, procurando a saída. Não saberia dizer onde é, saberia?

—Sim. Caminhada de dois dias na outra direção.

—Oh. —Teria que passar pelo castelo, então, e se passasse, seria atraída para dentro. Sem dúvidas. Se entrasse, não sairia novamente.

—Vou levá-la. — disse ele ao mesmo tempo que Zacharel disse:

—Posso voar até lá em apenas algumas horas. E não sou impotente. Simplesmente nunca experimentei o desejo.

Uau. Falando sobre roubar atenção. Perguntas imediatamente se derramaram em sua mente. Por que não? Os anjos eram assexuados? Quantos anos tinha? Que tipo de mulher poderia romper essa casca de gelo e fazer saltar seus hormônios?

Talvez quando as coisas se acalmassem, juntasse o anjo com alguém — não que conhecesse alguém — porque ninguém devia ficar sem contato físico de algum tipo. Doía.

Quando abriu os olhos e descobriu sua nova forma fantasmagórica, tentou tocar alguém, qualquer um. Ninguém a percebia, de qualquer maneira, e sua mente ameaçou romper pela falta da sensação.

—Não voará com ela a qualquer lugar. — Paris rosnou. Estava olhando para ela, percebeu, avaliando sua reação à oferta de Zacharel. —Disse a você. Sem tocar. Além disso, ela fica comigo, ao meu lado. Isso é inegociável.

Poderia ter argumentado com ele. Deveria discutir com ele. Não tinham um futuro juntos, e prolongar o inevitável a destruiria no final. Mas o pensamento de mais dois dias com ele era irresistível.

—Fico com você. — disse ela com um aceno de cabeça.

Um surto de satisfação acendeu os olhos de Paris quando ele, também, acenou com aprovação.

—Depois de ter uma mulher, você rapidamente se cansa dela. — disse Zacharel.  —É por isso que está tão ansioso para ficar sozinho com esta? — Ele parecia genuinamente curioso e não irritado, mas as palavras picaram mesmo assim. —Se for esse o caso, então, terei prazer em permitir que passem algum tempo juntos.

Ela devia ter se encolhido, porque Paris a soltou e girou para o ataque, dois punhais nas mãos.

—Quer morrer?

Zacharel se manteve focado nela.

—Só tem que dizer meu nome, fêmea, e virei por você. — Ele desapareceu.

 

PARIS AVANÇOU PARA ZACHAREL e encontrou apenas o ar, daí soltou um fluxo sombrio de maldições. Sendo a principal delas “estúpido empata foda”. Ele se virou para Sienna com os olhos apertados. —Diga seu nome, e assine a sentença de morte dele. —Não deu a ela chance de responder — não que soubesse o que dizer — mas voltou para seu lado e a mergulhou em seus braços. Ele começou a avançar, o ritmo suave, seu peso aparentemente insubstancial. —Há uma caverna lá na frente. Colocaremos curativos antes de irmos para a saída.

—Como sabe que há uma caverna? — Ela havia vivido aqui por meses, muito mais que Paris, mas não sabia sobre as cavernas.

—Explorei a área quando cheguei.

Uma coisa tão guerreira a fazer, e sexy como o inferno. Ela suspirou e deixou a cabeça cair em seu ombro. Os músculos sobressaíram sob sua bochecha. E agora que estavam indo em direção ao castelo, o aperto havia se tornado menos pronunciado, permitindo que relaxasse.

—Sabe. — disse ela — Só ficamos juntos por pouco tempo, mas esta é, mais ou menos, a centésima vez que teve que me carregar.

Um bufar.

—Sua matemática pode estar um pouco ultrapassada, Bebê. Além disso, gosto de carregar você.

Bebê. Adorava quando a chamava com carinho, adorava a maneira como sua voz rouca baixava tão profundamente. Seu peito apertou e sua barriga tremeu. Foi o primeiro a falar com ela de tal forma e, ao contrário do tempo que a havia chamado de "querida" — muito tempo atrás —claramente queria que fosse algo especial só para ela.

Quando ela esfregou seu rosto contra ele, seu cheiro de champanhe e chocolate a atingiu, mais intenso que nunca, e descarrilou seus pensamentos. Ela apertou seu nariz contra seu pulso martelando, bebendo tanto do aroma quanto podia. Suas terminações se animaram, cantando por seu toque, seu carinho.

Sua marcha era lenta. Poucos passos depois, ele disparou.

Estava perturbado por ela, ou ferido? Preocupação ofuscou sua excitação quando lembrou dos cortes no seu braço.

—Está bem?

—Estou bem. — ele respondeu rispidamente. A garantia foi arruinada um segundo mais tarde, quando tropeçou numa pedra.

Definitivamente ferido.

—Ponha-me abaixo. — Ela lutou contra seu aperto. —Quero andar.

—Fique quieta. — ele sussurrou, como estivesse com dor. —Me distraiu. Diga-me por que se juntou aos Caçadores. Disse-me antes, naquele dia que acordei na sua cela, mas alguns detalhes estão faltando.

Ela lutou até drenar o resto das suas forças, e não chegou a lugar nenhum. Mesmo num estado debilitado, era mais forte do que ela.

Cada coisa nova que descobria sobre ele a fazia o querer mais, e o deixava muito mais sexy.

Em última análise, relaxou de volta contra ele, admitindo a derrota, apenas tempo suficiente para planejar. Ou não. Seus pensamentos descarrilaram uma segunda vez quanto mais e mais seu cheiro impregnava sua pele. Desejo por ele começou a dominá-la.

—Sienna.

Sem pergunta. Direto. E, certo, tudo bem. Se queria levá-la apesar de sua fraqueza ou o que estivesse errado, o deixaria levá-la. Estar perto dele era uma necessidade.

—Comprei sua ideologia. Estava convencida que o mundo se tornaria livre da dor, doença, maldade e do mal se apenas você e seus amigos fossem destruídos.

—Nos matar não vai transformar o mundo numa utopia. Os humanos fazem suas próprias escolhas, trazendo o mal e a maldade em si. Mas digamos que influenciem o mundo. Será que isso importa? As pessoas ainda têm escolhas. Podem resistir, lutar, e optar por agir como foram feitos.

—Sei disso. — Ela molhou os lábios e se imaginou lambendo o caminho para os dele... então descendo. —Agora.

—Realmente?

—Se repetir minha resposta, vai finalmente acreditar em mim?

Um momento se passou em silêncio. Um silêncio tão espesso e pesado quanto o ar em torno deles.

—Sim.

Ela piscou, surpresa, momentaneamente distraída do assunto em mãos.

—Por quê?

—Porque quero acreditar em você.

Não porque confiava nela, pensou, e tentou não se decepcionar. Mas, então, pedir sua confiança seria como pedir a um macho humano para presenteá-la com a lua e as estrelas. Impossível. E ainda sua confiança, até dada por essa razão, era um começo promissor.

—Então, sim, realmente acredito que matar você não teria nenhuma utilidade.

O contorno de sua mandíbula parecia esculpido em pedra quando ele assentiu.

—Próxima pergunta. Cronus já te disse por que a escravizou? 

Um assunto perigoso, mas ela disse:

—Sim.

Ele passou a mão, os dedos acariciando a parte inferior de seu peito. Com isso, o desejo voltou.

—Bem. Diga-me.

Tentando seduzi-la para conseguir informação dela? Não havia necessidade. Ela havia mentido para ele uma vez, e já tinha decidido nunca mentir novamente. A confiança era uma coisa preciosa, e não viraria as costas, não importa o problema que cortejasse.

—Quer que eu volte para os Caçadores, observe seu líder e roube seus segredos.

Contra sua bochecha, ela sentiu seu coração parar de bater. Simplesmente parou. Um segundo, dois. Finalmente, o órgão impulsionou de volta em movimento, mas suas batidas eram muito rápidas, muito brutais.

—Vai fazer isso? —questionou. Haviam chegado à entrada da caverna, que acontecia de ser apenas a boca de um dos crânios gigantes. Paris teve que curvar os ombros para entrar sem bater a cabeça.

—Sim — ela suspirou, rezando para que sua aflição interior permanecesse escondida. —Vou — sussurrou.

—Por Cronus ou por si mesma?

—Por... todos nós. Para obter respostas sobre minha irmã mais nova. Está desaparecida, está assim há anos. Por vingança. Odeio os caçadores. Odeio o que fizeram. —Por você, ela acrescentou silenciosamente. —Embora espero não ter que fazer as coisas à maneira de Cronus. — Não havia razão para falar na coisa de amante. Agora seu plano de se esgueirar, interrogar e matar poderia funcionar.

Se Paris havia acreditado nela ou não, não disse. Carregou-a para o centro da caverna, onde uma fonte natural descansava, e a colocou sobre a borda. Organizou suas asas de modo que as pontas não raspassem no chão de terra.

Uma brisa fria soprou, preenchendo todo o espaço e fazendo-a tremer. Silencioso, Paris iniciou um fogo à moda antiga, esfregando duas pedras juntas e deixando que as chamas se ateassem nos galhos que havia recolhido. Chamas douradas iluminavam seu rosto, banhando suas feições numa mistura inebriante de luz e sombra.            

Sempre havia sido bonito, mas naquele momento estava excepcionalmente de dar água na boca. Um deus mítico dos céus, não digno de uma mera mortal. Especialmente dela.

—Não vim aqui para puni-la. — disse ele.

Lembrou-se da acusação que ela havia lançado para ele enquanto estava preso à parede, com os lábios ardendo pelo beijo brutal que havia forçado sobre ela. Um beijo que podia ter apreciado sob quaisquer outras circunstâncias. Mas naquele momento, estava assustada, tanto pelas sombras quanto por seus sentimentos por ele, e precisava de algo suave.

Mas suave não era suficiente para seu corpo desenfreado.

—Fico feliz. — disse ela suavemente.

—Acredita em mim? Assim simplesmente? —Ele estalou os dedos.

—Sim.

Seu olhar atraiu o dela, estalando com o calor intermitente como o fogo.

—Por quê?

—Porque eu quero.

Um tremor raivoso de sua cabeça, o cabelo escuro batendo contra seu rosto.

—Ou talvez porque seja grata a mim.

Ela molhou os lábios, saboreando-o no ar, sabendo que estavam falando de algo completamente diferente.

—Não.

—Ou porque simplesmente deseja me manter forte.

—Não.

—Certamente não é porque me deseja. — ele disse, seu tom afiado como um chicote. —Não porque você tem fome de mim.

Ele queria que ela dissesse isso, queria que admitisse seu desejo por ele, enquanto estavam separados. Dessa forma, ela não poderia alegar que a paixão havia falado por ela. Mais que isso, queria que ela dissesse isso sem oferecer a mesma admissão. Não no início, e talvez não depois. De qualquer forma, estaria assumindo um risco. Enquanto a negação podia salvar seu orgulho, poderia o afastar dela, agora e sempre. E embora admitir pudesse causar constrangimento, ele também poderia levá-la a um prazer diferente de qualquer outro que havia conhecido antes. Assim, nenhuma dúvida.

—Sim. — Ela admitiu. —Porque eu te desejo, tenho fome de você.

Silêncio mais uma vez reinou, e ela não tinha certeza se a havia ouvido falar ou se importava. Em seguida, seu olhar passou longe dela, só para voltar a ela um segundo depois, como se não tivesse força para lutar contra suas próprias necessidades, o azul de seus olhos misturado com lampejos vermelho e preto do demônio. Era assombroso, mas não assustador. Não mais.

—Não tinha certeza do que faria com você quando te encontrasse. — ele disse, sua voz mais rouca que qualquer coisa. —Salvá-la, sim. Definitivamente. Dormir com você, sim, isso também. Queria tanto achá-la. Todo o tempo sentia dor, mas mesmo que quisesse mantê-la, parte de mim sempre soube que teria que deixá-la mais tarde. Não posso fazer isso ser permanente, nem mesmo por você.

Até mesmo nessas palavras, ele falava como se ela fosse especial. E o fato de que havia estado preso aos seus próprios sentimentos de desejo, fazia sua fome por ele voltar com força total. Seu corpo inteiro tremeu, e se estivesse em pé, teria desmaiado.

—Sei que tem que me deixar. — disse ela. Não era algo que pudesse culpá-lo, porque não podia ficar com ele, também.

Ele arrastou uma respiração, com os dedos apertados sobre as pedras que continuava segurando.

—Não vou mentir para você, e não vou enganá-la, e se tentássemos algo mais, teria que fazer as duas coisas.

Como fez com aquela mulher, Susan.

—Estar com você pode não afetar meu demônio, pode não me fortalecer. Não sei, porque não tive a mesma mulher duas vezes desde minha posse. Se não funcionar, vou ter que deixá-la mais cedo que o esperado e encontrar outra pessoa...

Não havia razão para que ele soubesse que o pensamento dele com outra mulher a corroia, deixando-a em carne viva, as feridas escorrendo.

—Eu sei.

—Porque você viu...

—Susan. Sim.

Tristeza cintilou em seus olhos, então raiva. Passou a língua sobre os dentes, como se a resposta dela, de alguma forma, picasse seu temperamento.

—Se isso acontecer, vou te contar. Vou te contar primeiro, antes de partir, e não importa o quê, vou voltar por você. Vou me certificar que alcance a saída. Mas depois disso, temos que... Nós dizemos adeus, de uma vez por todas.

O fogo devia ter começado a fazer seu trabalho, a caverna parecendo aquecer num instante, o frio vencido. Talvez seu corpo estivesse simplesmente sugando aquele frio no interior. Ela se sentia gelada até os ossos. Paris não estava protestando contra seu retorno aos Caçadores. Ela se perguntou se iria se opor ao seu envolvimento com Galen, se fosse necessário, mas não ia perguntar. Tanto quanto queria saber da resposta, não queria saber da resposta.

—Sabendo de tudo isso, ainda quer ficar comigo? — Perguntou ele.

O tom deixava implícito que não daria a mínima para sua resposta. Que daria de ombros e facilmente encontraria alguém, se dissesse que não. Mas estava prendendo a respiração, percebeu, as bochechas ruborizadas sob pressão. Ele a queria, e se importava se não o quisesse de volta.

—Ainda quero ficar com você. — disse ela. —Ainda quero você.

Ele procurou seu rosto, claramente satisfeito com o que viu, porque concordou.

—Ótimo. Agora tire a roupa e entre na água.

 

PARIS ASSISTIU ENQUANTO SIENNA deixava cair a camisa no chão, onde já havia chutado suas calças. Agora estava de sutiã e calcinha. Simples, brancos. E ainda assim, agarrados ao seu pequeno corpo perfeito eram as a roupas mais sexy que já havia visto.

Sua ereção se estendeu acima da linha do umbigo, a base mais larga que seu pulso. Sim, a queria muito.

Mais, Sexo implorou.

—O resto. — ele resmungou. Era tão linda... tão forte. Ele havia vindo até aqui, feito todas aquelas coisas terríveis, e ainda assim ela havia se libertado da custódia de Cronus. Quando Paris olhava para trás com seu próprio orgulho masculino, ficava contente com isso. Ela havia lutado e ganhado de seu demônio, algo que nunca havia sido capaz de fazer. O que quer que acontecesse fora deste reino, ela ficaria bem.

O que acontecia dentro dele, no entanto...

Não deve fazer isto, pensou, mesmo que se repetisse. —O resto. Agora.

Ela desabotoou o sutiã, largando-o em cima das outras roupas. Os mamilos rosados eram como pérolas por causa da persistente frieza do ar que cobria os seios que tanto queria em sua boca. Seus polegares deslizaram sob a cintura da calcinha e puxaram. Desceu pelo maravilhoso comprimento de suas pernas, até que estivesse totalmente nua. Seu olhar estava voltado para o triângulo escuro de cachos que protegiam seu lugar favorito neste reino ou em qualquer outro.

Ela se mexeu desconfortavelmente, com os braços levantando e abaixando como se quisesse se cobrir, mas dissesse a si mesma para continuar.

—Você é perfeita. Tão doce e perfeita. —Magra, finamente estruturada, com aquela pele deliciosamente sardenta, cada marca o lembrando de uma pequena gota doce. Ia lambê-la de cima abaixo.

Quando se separassem, não haveria nenhuma parte dela que não tivesse experimentado.

Franzindo a testa, ela se olhou mais.

—Como pode dizer isso de mim?

—Se está prestes a se insultar, sugiro que feche a boca e entre na água.

Seu tom irritadiço a fez piscar.

—Está louco.

Inferno, sim, estava louco.

—Quando te disser como é linda, e você expressar dúvida, estará basicamente me chamando de mentiroso.

—Não, não quero dizer... É que... — Ela fez uma pausa, lembrando-o da indecisa mulher tagarela que havia se chocado contra ele em Roma. A que o havia fascinado tão completamente, aquela que havia tagarelado tão encantadoramente. —Os homens apenas não...

Homens. Amaldiçoou com calor suficiente para empolar.

—Isso é bom, porque senão teria que matá-los. —Ela era dele e qualquer outra pessoa que a olhasse, alguém que pensasse em tocá-la... Pare aí mesmo. Mantenha a possessividade ao mínimo. Isso é temporário. Tem que ser temporário.

—Paris. — disse ela, um nó em sua voz.

—Sim. — Ele queria desviar o olhar, não conseguia desviar o olhar.

—Eu te acho lindo, também. — Com isso, como se não acabasse de desfazê-lo, ela se virou para a fonte. Ele viu a elegante e machucada linha das costas. Viu onde as asas violeta-e-azeviche cresciam em duas linhas perfeitas, viu a tatuagem de borboleta obsidiana gravada entre elas.

A curva de sua coluna fez sua boca salivar. Havia duas covinhas na base, logo acima da bunda dela. E por falar em bunda... ele havia visto algo mais lindo? O suficiente para agarrar enquanto dava arremetidas no fundo dela, tonificadas, quatro sardas formando um padrão de estrela na bochecha direita.

Poderia adorá-la por horas, dias.

Mais. Por favor, mais. Precisa tocar.

Um gemido de êxtase a deixou quando afundou na água fumegante. Desapareceu sob a superfície, molhando o cabelo, em seguida voltou, respingando.

—Aqui. — Seu braço tremia quando ele retirou uma fina barra de sabão embrulhada de seu bolso. Constrangimento o inundou quando notou que estava tremendo.

Ela aceitou com gratidão, os dedos roçando a palma da sua mão. Gotas de suor irromperam em sua testa.

—Obrigada. Foi inteligente ao viajar com um desses. Vou ter que me lembrar de fazer isso.

Sim. Não ia explicar sua razão para fazê-lo. Não iria até aí com ela. Nunca.

Dizer que sempre carregava uma barra de sabão porque nunca sabia em cujo leito acabaria, ou que tipo de pessoa estaria com ele, ou o quão sujo se sentiria mais tarde, ou que carregava o sabão como outros homens carregavam preservativos... nada inteligente. Arruinaria o clima, com certeza.

E por falar em preservativos, podia dizer a verdade? Não podia pegar uma DST, por isso não poderia passar uma, a gravidez era rara entre um imortal e um humano, muito menos uma humana morta, e enquanto odiava dormir com estranhos, tanto quanto odiava ser íntimo deles, era necessário ao seu demônio o contato pele contra pele. Então, sem camisinha, apesar de seu sexo ter entrado em contato com milhares de pessoas. Ela ficaria indignada.

Não deveria empurrá-la para uma relação sexual, quando não tinha mais nada a oferecer. Deveria ter lhe dado tempo para tomar uma decisão mais informada, mas não teve tempo. Não tinham tempo. Em dois dias a perderia. E mais, Sexo precisava de satisfação agora. Então, sim, se ela deixasse, ele a tomaria.

Ele se acomodou na borda da fonte, a necessidade por ela o arranhando. Se fizessem isso —iam fazer isso — e Sexo não ficasse satisfeito imediatamente depois, Paris faria... o quê? Faria o que disse a ela e encontraria outra pessoa?

Não pense sobre isso agora. Perderia o controle de seu temperamento.

A escuridão dentro dele já rodava, liberando um desejo próprio, fazendo-o sentir como se estivesse possuído por dois demônios, cada um com necessidades distintas. Sexo precisando de sexo, e Violência precisando de derramamento de sangue. Mas Maddox carregava o demônio da violência, assim, lá se ia sua teoria.

Qualquer que fosse. Não importava. Apenas Sienna e este momento importavam.

Sienna.

Logo ela deixaria este reino, dos céus, e se esconderia de Cronus. De jeito nenhum Paris permitiria que caçasse Galen. A convenceria a permanecer escondida, e isso era tudo. Ela estaria segura, e Paris voltaria para seus amigos. Para sua guerra. Para sua antiga vida.

Para sua existência doente, lamentável, infernal, mas depois de todas as pessoas que havia machucado ao longo dos séculos, merecia. Especialmente pelo que havia feito com Susan.

Realmente admirava e respeitava Susan. Havia prometido sua fidelidade, embora não pudesse dá-la, e lentamente havia partido seu coração. Não faria isso com outra mulher.

Mas... Ansiava por mais que transas aleatórias. Ansiava pela monogamia.

Ansiava por Sienna.

Você pode tê-la, Sexo disse.

Apenas para perdê-la.

Sem argumentos nisso.

Por que me permitiu endurecer por ela em várias ocasiões, apesar de a termos tido, mas nunca fez o mesmo com outra? Repetidas vezes havia perguntado, e sempre a resposta era a mesma.

Eu não sei. Simplesmente acontece.

Um monte de "simplesmente acontece." Enquanto Paris odiava a perspectiva da separação em breve de Sienna, ela havia concordado facilmente com seu limite de dois dias. Tinha que ser desse jeito, sim, mais nada. Seria uma pequena vingança por tê-la matado?

Merda. Não estava sendo razoável, a escuridão ainda dirigia suas emoções. Se quisesse essa mulher, deveria tê-la. Se quisesse mantê-la, deveria tê-la sempre. Fim da história.

Deveria, deveria, deveria. Não podia viver com deveria, podia? Somente desejava.

Ele balançou a cabeça, limpando seus pensamentos. Tinha uma visão direta de Sienna enquanto se banhava. Ela se ensaboava, e maldição se não estava paralisado com as bolhas descendo em cascata por seus seios, capturadas em seus mamilos, em seguida, retomando a viagem até o umbigo.

—Sienna, eu tenho que falar algo. — Ele abaixou a cabeça, muito humilhado para encará-la. Depois disso, ela poderia ir embora, sem chance de sexo, mas tinha que fazer isso ou sua consciência nunca o perdoaria.

—Pode me falar qualquer coisa.

Iriam descobrir logo. —Depois de sua morte tive que... sabe... e mesmo no meu caminho para cá, eu...

O que está fazendo? Sabe que é melhor se nunca souberem o que acontece quando acabamos com eles.

Nós. Quer dizer você. Quando você acabou.

—Eu sei. — disse ela, acalmando tanto o demônio quanto ele.

Sem acusações, sem fazê-lo descarregar os detalhes. Gostava disso a respeito dela. Bastante. Ela provavelmente não tinha ideia de quão raro sua aceitação era, mas ele sim.

—A última vez foi há poucos dias, juro. Continuava pensando em te encontrar, queria ficar com você e somente você quando aconteceu.

—Paris, não estamos namorando. Não estamos comprometidos. A última coisa que disse era que o odiava. E sinto muito por isso, realmente sinto. Portanto, não se culpe por suas ações. Não fez nada errado. —A água espirrou quando ela se aproximou. Levantou-se e as ardentes mãos molhadas envolveram seu pescoço, girando as pontas de seu cabelo.

Ele descansou a testa na curva de seu ombro. Pele macia, suave, perfumada tão docemente, que fez sua cabeça entrar em ebulição. Sexo ficou muito louco, talvez até mais desesperado para tocar e provar que estava Paris.

—Não seria tão compreensivo com você. Se dormisse com outro homem, mesmo que não estivéssemos namorando, mesmo que não estivéssemos comprometidos, eu ficaria... furioso.  —Ainda não mentiria para ela.

O que faria depois, quando se separassem...

—Comigo?

—Não. Talvez. Não sei. —Seus braços se estenderam e a puxaram mais perto, a precisando mais perto. Água ensopou o peito de sua camisa. Seus mamilos roçaram nele, criando o mais escaldante dos atritos. —Quero você só para mim.

Ela carregava o sol sob a pele, iluminando-o cada vez que se aproximava dela. O jade e cobre em seus olhos eram um vale exuberante, florescente, onde podia se perder dentro. Sua boca inspirava cada uma de suas fantasias mais eróticas.

Sim! Isto é o que preciso, o que desejo.

O que Paris almejava.

—Desde você — ela disse baixinho: — não houve ninguém, e antes de você, anos haviam se passado.

Anos. O conceito o confundiu tanto quanto o agradou.

—Ele era... o único homem que eu já... Pensei que casaria com ele. — disse ela. —Era um Caçador, aquele que me recrutou. — Uma pausa repleta de milhares de arestas cortantes, então — ...estou mudando de assunto, mas só um pouco. Gostaria de expressar mais uma dúvida sobre, hum, mim mesma, antes de continuar.

Ele endureceu, suspeitando aonde ia e receando com cada fibra do seu ser.

Ela agiu rapidamente.

—Sei que já estivemos juntos antes, e você sabe que sou somente eu. Mas desta vez é diferente, porque o conheço melhor, me conheço melhor, e tenho medo que você... Que não vou ser... Que não possa ser comparada. Com as outras.

Sim. Exatamente onde achava que ela ia. Deixou cair um beijo em sua clavícula, lambeu onde seus lábios haviam estado, em seguida, chupou forte o suficiente para deixar sua marca. Ela ofegou.

—Tenho medo de não corresponder às suas expectativas também. — ele admitiu. —Aqui estou eu, o guardião do Sexo. E se não conseguir te agradar? E se não puder viver de acordo com suas expectativas? E Sienna — acrescentou antes que ela tivesse tempo para responder — as outras não podem se comparar a você.

Ele esteve com milhares sim, e fez seu melhor para deixar cada uma satisfeita. As havia usado, afinal de contas, por isso era o mínimo que podia fazer. Mas as fazer gozar não havia sido para benefício delas, havia sido pelo dele, algo para aliviar a dor de sua culpa. Estava preocupado realmente com seu prazer? Não.

—Oh, Paris. — Aquelas delicadas e bonitas mãos alisaram suas costas. Os movimentos eram rítmicos, graciosos, acordando partes que não sabia existir. —Que tal isso? Hoje você é apenas um homem e sou apenas uma mulher. Não há passado, nem futuro, só presente. Faremos o que gostarmos. Nada mais. Nada menos.

Ah, inferno. Ela continuou e ele achou que explodiria antes de chegar dentro dela. Ela havia oferecido as palavras mais sexy que já havia ouvido falar, jamais havia esperado ouvir, e era mais um motivo para gostar dela. Fazia mais que excitá-lo. O confortava.

—Sim. Eu gostaria disso. —ele disse.

Eu também!

Isso é o suficiente de você. Ele apoiou suas grandes mãos nos quadris pequenos de Sienna a levantou para fora da água e colocou sobre a borda rochosa ao lado dele. O calor da água havia ruborizado sua pele, e agora, gotículas percorriam todos os lugares onde queria ir. Foi para a frente dela, agachando, balançando nos calcanhares antes de se decidir sobre os joelhos. Lentamente deslizou as mãos ao longo do topo de suas coxas. Parou em seus joelhos, os polegares incursionando debaixo por vários minutos antes de aplicar pressão e abri-las tão amplamente quanto conseguiu. Estava rosada, molhada e brilhante.

Deveria passar a língua por seus mamilos primeiro, e queria. Esse era o plano. Abri-la, deslizar mais perto e prestar homenagem adequada a esses pequenos doces botões. Exceto, que agora que havia tido uma visão direta do núcleo feminino mais bonito que já havia visto, não havia nenhum começo lá em cima e trabalhando seu caminho para baixo. Queria isso. Agora. A queria pingando.

—Preciso de você na minha boca. Na minha garganta. Toda sobre mim. Diga-me que precisa disso também.

—Eu...

—Diga-me.

—Sim. Por favor, Paris. Agora.

 

NÃO O PROVOCAVA, NÃO O ATORMENTAVA. Sua mulher merecia uma recompensa. Paris pressionou um beijo suave onde os polegares haviam brincado, logo atrás dos joelhos, depois lambeu e mordiscou seu caminho até... até... Um tremor passou por ela, uma perfeita imitação das vibrações que Sexo lançava através dele.

Inclinou-se mais perto... mais perto ainda... Respirou fundo, inalando o aroma erótico de seu desejo. Seu sangue disparou, queimando, queimando tudo em seu caminho e deixando apenas o desejo. Era tudo que sabia, tudo que queria saber. Então estava lá, bem sobre ela, lambendo seu caminho até seu centro.

Ela gritou, a mistura de som rouco com seu gemido de êxtase. Sua excitação revestiu sua língua e a engoliu de imediato, viciado. Seus olhos fecharam quando a saboreou. Não era apenas ambrosia que provava, mas também. Sob o melaço tropical da droga, havia um sabor único só dela, algo como vinho rico e decadente. E pela primeira vez em sua vida, pensou que poderia realmente gostar, de fato, do afrodisíaco que seu demônio liberava. Doce como mel, rico em especiarias, enchendo sua boca, revestindo sua garganta, penetrando por sua pele, se misturando com a suculência de Sienna.

Quantas vezes havia sonhado em fazer isso com ela? Incontáveis. Havia esperado tanto tempo e, às vezes, temia que nunca fosse conhecer a realidade. Nada era capaz de fazer jus ao lânguido festejar que havia visionado, mas isto não só correspondia, como superava. Ela era tudo que já havia desejado, e muito mais.

Seus dedos enroscaram nos cabelos dele, aplicando o tipo mais excitante de pressão. Sua mulher o queria de volta, atendendo sua necessidade. Não houve conhecimento perturbador. Lambeu de volta até seu núcleo, mas desta vez não se afastou. Rodou a ponta da sua língua ao redor do clitóris, provocando, provocando, aumentando mais a paixão dela. Inferno, aumentando sua própria paixão.

Estava faminto por ela, seu pau latejando contra a braguilha.

—Não, lá. — ela instruía. —Está quase lá. Por favor, apenas um pouco mais e estará lá. —As palavras dela eram ofegantes. Seus quadris ondulavam enquanto procurava colocar sua língua diretamente em seu clitóris inchado.

E achava que era ruim no beijo e sexo? Fêmea boba.

Ele penetrou seu núcleo, afundando sua língua dentro dela, rápido, mais rápido, se glorificando enquanto ela arfava seu nome, enquanto sua essência cobria seu rosto, enquanto a engolia, enquanto as unhas afundavam em seu couro cabeludo, enquanto os quadris giravam e encontravam sua pressão, enquanto ela se arqueava para ele, se afastava, se arqueava novamente.

—Paris! Sim, sim. Ai!

Quando sentiu as contrações, cada vez mais perto do orgasmo, ajustou os lábios sobre seu clitóris e sugou forte, ao mesmo tempo dirigindo dois, depois três dedos profundamente, tão profundo. Fez movimentos de tesoura, mudando a profundidade e largura num fluxo constante de movimento, e só quando ela atingiu o auge do clímax, recuou uma fração, retardando seus movimentos. Seus gemidos diminuíram gradativamente em murmúrios incoerentes, seus quadris o seguiram, movimentando-se em círculos, tentando atraí-lo de volta dentro daquelas paredes acetinadas.

—Paris! Acabe com isso!

—Quero fazer você se sentir bem.

—Estou, juro.

—Mas quer mais.

—Sim. Por favor!

—Muito bem. — A queda brutal de seus dedos, tesourando mais e mais, sua língua passando rapidamente sobre esse broto inchado, e ela chegou ao clímax com uma força violenta, suas paredes internas se fechando sobre ele. Um grito rasgou dela, tão alto, barulhento e estimulante que estalou suas cordas vocais. Ele adorou, se deleitou ao saber que a havia trazido a este ponto.

Seu desespero aumentou criticamente, e ele teve de retirar os dedos dela e apertar em suas coxas para se manter firme, para se impedir de abrir seu zíper e entrar em casa.

Ele permaneceu assim até que ela se acalmou. Finalmente os ombros cederam, e sua cabeça pendeu para frente. As asas meia-noite tremeram, brilhando como ébano polido. Ela estava ofegando superficialmente, seu lábio inferior cortado onde havia mordido profundamente.

Quando seu olhar sonolento encontrou o dele, levou os dedos à boca e lambeu sua excitação. Não conseguia o suficiente dela, não achava que jamais pudesse obter o suficiente.

Suas pupilas se expandiram, consumindo essas íris cor de avelã e deixando apenas preto. Veludo preto, liso e sem fim. Poderia se perder e nunca se importar em ser encontrado.

—Tire a roupa. — ela sussurrou. —Por favor. Deixe-me tê-lo agora.

Ele agarrou a gola da camisa e puxou, abaixando-se para libertar a cabeça do confinamento da vestimenta. Suas mãos encontraram seu peitoral um segundo mais tarde, as palmas das mãos pressionando seus mamilos.

—Seu coração está acelerado. — disse ela, claramente impressionada com esse fato.

Nesse momento, seu coração batia por ela. Apenas por ela. Nunca havia desejado tanto uma mulher. E ela sabia o que ele era, o que havia feito, e o queria de qualquer maneira... moveu-se e encaixou a boca em torno de um de seus pequenos mamilos rosados, sugando forte, aliviando a mordida com um movimento de sua língua. Ele virou a cabeça e fez o mesmo com o outro, deixando sua marca em ambos. Sua marca, para que quando ela se visse no espelho, soubesse que pertencia à outra pessoa. A ele, só dele.

—Deixe-me ver o resto de você. — disse ela.

Ele balançou a cabeça.

—Paris...

Outra sacudidela. Para remover suas calças, teria que parar de tocá-la, e não queria parar de tocá-la. Não era possível conceber uma razão boa o suficiente para parar.

—Por favor. Preciso ver você.

Tremendo, pressionou sua testa entre seus seios. Engoliu em seco, encontrando sua voz.

—Você nunca tem que mendigar. Não comigo. O que quiser, eu darei. —Sempre antes, havia tomado de seus parceiros. Com ela, queria dar qualquer coisa, tudo. —Mas se eu tirar, vou perder o controle. Deixe-me saborear você, Sienna.

—Controle é superestimado. Quero você, do modo que puder tê-lo.

Tais palavras bonitas.

—Gostaria que fosse na minha casa, e na minha cama, e a teria apoiada em meus travesseiros. Merece mais que uma caverna suja.

Ela segurou seu rosto e forçou seus olhos a encontrarem os dela.

—Depois de tudo que fiz para você, como pode dizer isso?

Ele não a recordou que neste momento não havia passado. Não podia. O passado o inundava, também.

—Sienna, correu para mim quando estava em apuros, quando Cronus a havia escravizado. Antes disso, dormiu comigo para me fortalecer, apesar do fato de estar horrorizada com nosso potencial público, apesar do fato de que eu era seu maior inimigo. Antes disso, esteve envolvida numa guerra e jogava por sua equipe, assim como eu. Não fez nada que eu não houvesse feito, se a situação fosse inversa.

Lágrimas encheram seus olhos, salpicando por suas bochechas.

—Nada disso. Não aqui, não agora. —Ele as capturou com a língua, beijando-a. Agora veio a lembrança. —Apenas um homem e uma mulher, lembra?

—Só... sempre me emociono após minha mente ter sido destroçada por orgasmos. — disse ela com um tom seco, e ele riu. —Ou devo, considerando que foi meu primeiro.

—O outro homem não...

O sorriso dela era de seda, devasso.

—Que outro homem?

Boa menina. Ele riu, surpreendendo a si mesmo. Humor genuíno entre amantes não era algo que já havia experimentado antes dela.

—Quero você em qualquer lugar que possa te pegar. — Mordiscando o lábio inferior, ela estendeu a mão e abriu o zíper. As pontas dos dedos roçaram a ponta chorosa de seu pênis, que se estendia muito além da cintura de suas calças. —Humm, sem cueca.

—Estava esperançoso...

Agora, ela foi a única a rir.

Ele a agarrou sob a bunda e a encorajou em frente, enquanto se inclinava atrás em seus quadris. Ela deslizou pelas rochas, segura apenas por suas mãos. Ele posicionou seu núcleo sobre sua ereção. Tão quente, tão molhada, mas não empurrou para dentro. Ainda não.    

—Beije-me — ele ordenou, assim que Sexo conseguiu ronronar. Achava que o demônio estava tão excitado que não podia ficar quieto por mais um momento. Pelo menos não estava falando. —Como antes. Possua-me com sua boca.

—O prazer é meu. — Um arrepio a sacudiu quando ela encaixou seus lábios sem qualquer hesitação, enfiando a língua em sua boca e o alimentando com tudo que ela era. Possuindo-o, assim como ele queria.

—Não consigo segurar. — disse ele. Todos os pensamentos de saboreá-la, este momento, o abandonaram. Tinham o aqui e agora, e não muito mais. Tinha de conhecer o resto dela, tinha que uni-los. —Tenho que estar em você. Preciso estar em você.

—Sim. Você me terá.

Ele empurrou profundo e com segurança, preenchendo-a. Gemeram em uníssono. Paris, Sienna, Sexo. Foi como voltar para casa depois de um ano no deserto, quando estava com tanta sede, tanta fome que sentia como se estivesse bebendo e comendo pela primeira vez. Como se estivesse vivo pela primeira vez. Seus sentidos acordaram, conscientes de cada necessidade sua, em sintonia com cada nuance dela.

Isso era o que tinha ansiado tão desesperadamente. Não apenas uma comunhão com seu corpo, mas com sua mente. Sua alma, sua respiração — tudo interligado.

Sim. Sim, sim, sim.

Ela estava apertada, mais apertada que um punho, e sabia que a esticava. Sabia que era grande demais para um corpo tão esbelto, mas isso não o impediu de movê-la para cima e para baixo, para cima e para baixo a partir da raiz do seu eixo até a ponta. Estava tão molhada, o deslizamento tranquilo. Seus mamilos raspavam o peito dele, criando a fricção mais deliciosa. Fricção que lançou picadas de prazer por todo seu corpo.

Foi completamente consumido por ela. Ela estava em sua boca, pressionando contra ele, seu peso deslizando sobre ele... para baixo... todo o caminho... as pernas apertando as dele, suas mãos sobre as costas, as unhas arranhando e agarrando. Até as pontas dos cabelos agiam como um estimulante, dançando sobre sua pele, fazendo cócegas.

Paris subiu as mãos acima de sua espinha e parou entre suas asas. Ocasionalmente, ao longo dos anos, havia tido que massagear seu amigo Aeron para afastar a rigidez da batalha. Então sabia quão sensíveis as fendas destas asas podiam ser. Tendo em mente que deveria estar dolorida, massageou suavemente, rolando os músculos e tendões sob seus dedos.

Um grito rouco a deixou.

—Paris! Oh, Paris!

Seu nome nos lábios dela fez isso por ele, totalmente, completamente. Raramente dizia aos seus parceiros seu nome, não querendo ouvi-los dizê-lo e aumentar sua vergonha. Mas agora, com Sienna, estava mais uma vez desfeito.

Ele arremeteu nela, mais forte, tão forte que seus dentes bateram juntos quando ela mergulhou para outro beijo. As línguas duelaram com a mesma força, a mesma intensidade. Seus testículos contraíram, a pele ao redor deles apertando. Brancas e quentes ondas de prazer e força nadavam na base de sua espinha, prontas para estourar através dele, devorá-lo e marcá-lo.

Tão perversamente queria gozar, mas não queria, não até que ela explodisse nele. Seu prazer vinha primeiro, agora e sempre.

Ele alcançou entre seus corpos e circulou seu polegar contra o clitóris dela. E, oh doce céu, isso era tudo que ela precisava. Outro grito que rasgou suas cordas vocais ecoou em torno dele, suas paredes internas o ordenhando. Jorrou dentro dela, derramando todo seu desejo, toda sua necessidade e paixão, direto em seu núcleo. Rugindo, rugindo, tão preso nas sensações incríveis, indiferente sobre qualquer outra coisa.

E quando, uma eternidade depois, ela caiu contra seu peito, com as pernas frouxas contra as dele, continuou a segurá-la, sem vontade de deixá-la ir. Mas então, não tinha certeza se jamais seria capaz de deixá-la ir.

 

ELE HAVIA SIDO ABUSADO, sua pele como bonitas fitas onduladas cor de rosa de uma caixa de Natal.

Violado das piores maneiras.

Mas Kane nunca deu às servas fêmeas o que queriam.

Tinha vergonha de não poder lutar para abrir caminho, que seu demônio de alguma forma o prendesse e segurasse, tão certo como as correntes em seus pulsos e tornozelos. Era um guerreiro, há milhares de anos, com aperfeiçoada experiência nas mais sangrentas batalhas. Isso devia ser brincadeira de criança para ele. Deveria ter fugido há muito tempo.

Mais que qualquer coisa, porém, foi humilhado por todos os tipos de outras coisas que não estava pronto a reconhecer ou enfrentar. As coisas que haviam feito com ele...

Mais tarde. Lidaria com isso mais tarde. Talvez. Agora, tudo que podia fazer era se distanciar do que estava acontecendo com seu corpo, como se não fosse realmente seu corpo suportando o abuso. Como se outra pessoa tivesse dentes na coxa dele, mãos onde nenhuma outra havia estado.

Pinga-pinga, era seu sangue.

Kane havia sido torturado antes. Muitas vezes, na verdade. Isto era apenas mais do mesmo, disse a si mesmo. Sim. Correto.

Desastre riu, um cruel som feliz ecoando em sua mente. Se apenas fosse pela primeira vez, mas não. Desastre ria e ria e ria, um fluxo interminável de diversão.

Ódio consumiu totalmente Kane, o manteve consciente. Toda vez que se sentia escorregando para a escuridão, pensava no Alto Senhor dentro dele. Apesar de seu instinto em permanecer distanciado, queria saber cada ato feito a ele. Um dia, retribuiria o favor em espécie — multiplicado por mil. Seu demônio sofreria desta maneira. Seu demônio morreria desta forma.         

Sim, um dia.

Seu olhar desviou da parede da caverna manchada de sangue em cima dele e deslizou por seu corpo. Era uma placa crua de escarlate. Pingando... pingando... eram aquelas suas costelas? Sim, pensou nebulosamente. Eram, uma delas até apontando na direção incorreta.

Um. Dia. 

À distância ouvia o bater de cascos de cavalo...? Talvez. Seja quem fosse fez as servas que estavam com ele, e até mesmo aquelas em torno dele aguardando sua vez, se dispersarem no vento, deixando-o no topo da pedra, nu, ainda sangrando... ainda pingando. Carmesim, uma cor tão bonita, mas horrível. Vida e morte, unidos.

Deveria estar com uma dor tremenda, mas não havia nada. Somente uma dormência estranha, bem-vinda.

O relincho de um cavalo. Pegadas de botas. Devia se preocupar. Alguém estava aqui, olhando para ele, vendo-o no seu pior estado. Importava-se, mas não havia nada que pudesse fazer sobre isso. Não havia maneira de se cobrir ou esconder o que haviam feito nele. Queria matar esse recém-chegado da mesma forma que queria matar as servas e Desastre. Qualquer coisa para limpar todas as recordações desse dia. Para sempre.

Uma sombra caiu sobre ele, então alguém estava inclinado e olhando em seus olhos. Cabelo escuro, olhos do mais cruel azul.

—Sei quem é você. É Kane, detentor de Desastre. Teve um dia ruim, não é?

Kane ganhou força suficiente para virar a cabeça. A ação, pequena como foi, apagou todas as partículas de força, deixando-o frio, vazio. Não tinha nada a perder. Claro, o cara estendeu a mão e virou sua cabeça para ele, forçando sua atenção a retornar.

—Vou tomar isso como um sim.

Silêncio.

O cara deu um sorriso, e não era agradável.

—Antes não poderia imaginar um Senhor do Submundo me visitando aqui. Agora continuam surgindo de forma gratuita. A propósito, seu amigo Amun me chamava de Red, enquanto estava aqui em baixo. Bem — pensou ele. — O homem não fala muito, não é? —Deu uma risada genuinamente divertida, e ainda assim, havia uma picada no som. —Desejava ler pensamentos quando ele esteve na minha frente, mas não podia, e este foi um presente de Amun antes de ir embora.

Red levantou as duas mãos e não estavam ligadas ao seu corpo ou qualquer outro. Eram de pele escura e mantidas juntas por uma cinta de couro. Uma correia de couro que enrolava no pescoço, como se estivesse carregando luvas de boxe. Os interiores das mãos haviam sido raspados, a carne removida.

Eram luvas agora. Luvas Humanas.

Ácido borbulhou no estômago de Kane. Amun veio até aqui para resgatar Legion e no processo foi infectado por centenas de servos demônios, o mal se tornando uma mancha de óleo sobre sua pele. A única solução foi mandá-lo de volta aqui para libertá-los.

As luvas eram da mesma cor morena da pele de Amun, e possuía as mesmas linhas.

—O que quer dizer... presente? — Kane conseguiu trabalhar ao longo de sua garganta rasgada. A garganta foi arranhada brutalmente quando as servas encheram sua boca de coisas. Não se importaram que havia tentado  mordê-las, e não tentaram impedi-lo de fazê-lo. Realmente gostaram disso. Elas haviam só... não está pensando nisso ainda. Vai se tornar tão louco quanto Amun estava.

 —Ganhei as luvas num jogo de pôquer. — Red disse, seu tom casual. —Você joga? Espere. Não responda a isso. Deixe-me conhecer seus segredos com meu novo brinquedo favorito. —Sorrindo seu sorriso não-legal, enfiou as mãos nas luvas de pele e estendeu a mão.

Entrou em contato.

Aquelas mãos pressionaram contra as têmporas de Kane, frias e duras. Red fechou os olhos, seu corpo inteiro sacudindo como se ligado a um carro com um monte de cavalos sob o capô. Um momento se passou, o único som era sua respiração pesada.

Em seguida, outra rodada de cascos reverberou. Pegadas de botas vieram em seguida. Um homem loiro com um sorriso semelhante e cheio de dentes estava inclinado sobre Kane.

—O que temos aqui? Outro guerreiro demônio?

—Parece. —Red se endireitou, seu olhar azul perfurando Kane. —Está bastante bagunçado.

—Vai sarar?

—Não sei. — Um encolher de ombros como se a resposta não fosse importante de qualquer modo. —O homem ao meu lado é meu irmão. Amun o chamava de Black. Eu o chamo de Babaca. Pode usar o que preferir.

—Deixe-me usar as mãos. — disse Black, esfregando as suas próprias com antecipação.

—Claro que não. — Um rosnado surgiu de Red, um aviso animalesco. —Só as tenho hoje, e esta é minha semana de possuí-las.

—Só quero pedir emprestado por um minuto.

—Por favor. Vai ficar com elas, afirmando que já é sua vez.

—Não.

—É minha, também.         

Estou sonhando. Tenho que estar sonhando. No mínimo, alucinando. Assassinos — e eram assassinos selvagens, possuindo a mesma borda dura como seus amigos — não estavam discutindo como crianças.

—Ótimo. Apenas me diga o que descobriu. — disse Black, claramente aborrecido.

—Esteve com Dark, e recentemente. — Amor e ódio banhavam o tom de Red. —Dark acha que isso vai levar White de nós. Um par deles foram capturados e trazidos para cá e marcados para morrer. Um desmoronamento os separou. Não sabe onde Dark está. Os lacaios o trouxeram aqui, tentaram acasalar com ele.

Dark? A única pessoa que Kane achava que poderia ser chamado de White era William. E como Red sabia... — pelas mãos, Kane percebeu. Aquelas mãos haviam pertencido a Amun, então. Amun, o guardião de Segredos. Red colocou as luvas... então, tocou Kane e cavou fundo em sua mente, investigando informações. Uma arma muito útil para ter. Devia estar furioso, mas ainda estava muito insensível.

Black bateu o queixo. —White vai sentir sua alegria por encontrar um demônio novo, como eu fiz. Estará aqui em breve. Não podemos permitir que atenda esse guardião. —Olhos esmeralda perfuraram Kane. —Não vai levá-la de nós.

Não quero nada com ela, cara.

—Vamos matá-lo e acabar logo com isso? — Red perguntou como se estivesse contemplando o que servir para o jantar.

Black esfregou a barba dourada em sua mandíbula. —Isso o tiraria de sua miséria. Uma boa ação de nossa parte.

Kane queria ajudá-lo com a resposta. Claro que sim, deve me matar. Porque quando esta dormência passar, quando seu corpo gritasse pela dor e sua mente se fundisse com suas emoções, ele iria sofrer. Ia gritar. Ficaria com raiva.

Vingança, disse a si mesmo. Não podia ter vingança se estivesse morto.

—Não, não matar. — Black finalmente decidiu. —Não até que tenha minha vez dentro de sua cabeça.

—Concordo.

Então iriam matá-lo daqui a uma semana, depois de Black ter sua vez. Sete dias. Kane não sabia se ria, os agradecia ou apenas seguia em frente e começava a gritar de fúria agora.

Os dois o libertaram das correntes, mas não teve força para se mover. Só podia ficar lá, esperando, indefeso aos seus caprichos.

—Green vai nos rasgar ao meio por salvá-lo. — Red disse. —Sabe como é protetor com White.

—É verdade. — Black ergueu Kane por cima do ombro, esquecido de suas costelas expostas. —É a única mulher que pode tolerar.

A ação interrompeu um pouco da dormência física, atirando lanças afiadas de dor por meio dele. Sua mente começou a enevoar por oxigênio, um sonho distante.

—Mas... — Black continuou, quando Kane ia desaparecendo... desvanecendo... —Tive minha vez, de modo que é um ponto discutível.

Kane não ouviu a resposta de Red. Para ele era, finalmente, o abençoado apagar das luzes.

 

NO ALTO CÉU, Cronus estava ao pé de sua cama, olhando para sua esposa. Ela ainda estava nua, ainda acorrentada, mas com duas palavras, ela simplesmente havia mudado o próprio fundamento da guerra deles.

—O que disse? — Certamente ele havia ouvido mal.

Seu queixo se levantou com altivez, seus olhos escuros brilhando com ódio.

—Bata-me e deixe-o ir.

Não, ele não havia ouvido mal. Seu olhar se estreitou e se fixou no Caçador macho ajoelhado aos seus pés. Cronus havia vindo aqui, como todos os dias durante as últimas semanas, e oferecido a Rhea a escolha. Assistir um Caçador morrer ou sentir o martelo de seus punhos. Ou neste caso, assistir dois Caçadores morrerem — um macho e a fêmea quem tinha se recusado a soltá-lo enquanto Cronus o arrastava da gaiola. Sempre ela preferia assistir um Caçador morrer. Sempre.  

Exceto hoje.

O que havia mudado? O Caçador em questão? Era a única variável diferente. Isso significava que ela se importava com o macho? Não, se assegurou depois de um piscar de olhos de espanto. Rhea se importava apenas consigo mesma. Será que ele queria fazer algo por sua companheira celeste? Mas o que poderia fazer um humano solitário insignificante para ajudar uma deusa? A resposta era simples. Nada.

Isso deixava apenas uma opção. Ela o queria.

Raiva se espalhou dentro de Cronus, punhos de ferro que golpearam seu peito. Sua pele puxou firmemente contra seus ossos, sua medula se afiou em pontos de adaga cortante. Ele agarrou o homem pelos cabelos, puxando-o de pé e o estudou de novo. Vinte e tantos anos, loiro, bonito de uma forma tranquila e distinta, apenas um mortal com uma quantidade limitada de tempo para gerenciar. Magro, com apenas o indício mais básico de músculos.

Claramente, não era um lutador. Um estudioso, talvez. No entanto, não poderia dizer mais nada. Como todos os outros, Cronus já havia cortado sua língua. Um imperativo para estas reuniões. Permitir que alguém falasse com Rhea, que entregasse uma mensagem secreta que Cronus não conseguisse decifrar, seria um enorme erro tático.

Cronus nunca cometia erros táticos.

Ele olhou para sua esposa. Sua expressão teimosa não entregava nada.

—Deixe-o ir. — disse ela, o queixo indo cada vez mais alto. —Fiz minha escolha. Vou ser espancada em troca de sua vida.

Deixar o macho ir? Vivo e bem, perdoado pelos seus crimes contra o maior rei que Titania já havia conhecido? O conceito era inconcebível. Risível. —E a mulher? — Ele rosnou, puxando seu cabelo para levantar sua cabeça.

Ela gemeu, sua angústia óbvia fazendo com que o macho grunhisse. Como é doce, Cronus pensou secamente. Os humanos cuidando um do outro.

Olhos da cor de um campo de batalha sangrento varreram a garota. —Eu não me importo com ela. Faça o que quiser com ela, apenas deixe o homem.

O demônio de Rhea devia estar dando seus ataques. Ou isso, ou simplesmente Discórdia gostava do show. Bem, Cronus teria prazer em oferecer outra explosão para Discórdia. —Não aprovo sua escolha, esposa. Portanto, acho que vou decapitar o homem antes de soltá-lo.

A rainha estalou por um momento, suas correntes chocalhando contra os pilares da cama. —Está completamente desprovido de honra, marido?

—Claro. Para ganhar, é preciso fazer o que for necessário. Além disso, nunca prometi deixar seus Caçadores irem enquanto seus corações ainda batessem, não é?

—Seu filho da puta!

—Se quiser salvar este, vai me dizer o que há de tão especial sobre ele. Esse é nosso novo trato.

O homem tremia de medo, seu suor pegajoso criando um cheiro acre no ar. A fêmea, ainda ajoelhada do outro lado de Cronus o alcançou, apertou sua mão numa demonstração de conforto e apoio. Seu cabelo era cortado até os ombros, e tão negro que a nuance devia ter vindo de um frasco de tintura. Seus olhos eram castanhos, um chocolate profundo, e se encheram de lágrimas angustiantes. Era bonita numa espécie delicada de forma, e de alguma forma familiar para ele.

Não era a primeira mulher que havia trazido a Rhea, nem seria a última. Havia várias outras esperando abaixo no calabouço. Agora se perguntava se havia matado um irmão dela, uma irmã, talvez, e por isso pensava reconhecê-la.

—Explicar minhas razões nunca foi parte do nosso trato. — disse Rhea com a voz altiva, a que ele detestava. Aquela que garantia fazê-lo ver vermelho. — Deixe. Ele. Ir.

Com certeza e a raiva de Cronus se intensificava. Voltou sua atenção para o macho. Sombras formavam semicírculos sob seus olhos, as bochechas estavam côncavas e havia sangue escorrendo pelo queixo, toda a prova de sua mortalidade.

Rhea o havia recebido alguma vez em sua cama? Foi este homem um dos muitos que Cronus havia sentido sua esposa desfrutar nos últimos meses? Este bastardo havia atingido o clímax dentro dela?

Quando suas paixões se apoderavam dela, tornava-se selvagem, desenfreada e inconsciente — ou insensível — ao dano que infligia.

Cada nova deliberação jogava mais lenha, queimando os fogos da sua raiva, até que a única coisa dentro de seu corpo era uma espessa fumaça negra com chamas vermelhas prendendo-o por toda parte. Ele não podia ver além delas, só podia sufocar. E só então percebeu que não era o homem que tremia com tal intensidade — era ele — e o conhecimento o humilhava.

O humano tinha que pagar.

—Olhe para mim. Agora.

Os longos cílios marrom-dourado se levantaram. Olhos cheios de desafio e ódio o olharam. De ressentimento, também. Esse humano ansiava por aquilo que ele mesmo possuía? Uma conexão com Rhea?

Bem, terminava agora. Antes de Cronus perceber que se movia, liberou a garota, segurou uma lâmina na palma da mão e cortou. Viu como a garganta do homem se dividia ao centro, o sangue jorrando e fluindo. Assistiu quando a dor tomou o lugar do ressentimento... observou até mesmo enquanto se entorpecia... desvanecia... e seu corpo cedia.

A garota gritou o ruído estridente raspando seus ouvidos, irritando-o. Franziu a testa para ela, com a intenção de repreendê-la, desenrolou os dedos do cabelo do homem e estendeu a mão para ela. Baque. O corpo sem vida bateu no chão, e ela lançou outro grito, correndo para fora de seu caminho.

Não antes de apanhar o arquejo de horror de Rhea.

Sua atenção chicoteou para ela, a garota de repente esquecida. Sua esposa mal respirava. A miséria devia ser sua única companhia na eternidade sem fim ​​que a esperava, sim, mas o fato que havia se atrevido a achar a miséria na morte de algum mortal frágil não havia conseguido enchê-lo com qualquer tipo de satisfação.

Tal reação significava que havia calculado mal, e ela, de fato, se importava com o homem. Mesmo que seu temperamento chamejasse ao mais quente, lutava com a compreensão. Por que se importar com uma criatura tão limitada pelo tempo e capacidade? Uma criatura tão frágil, que morria tão facilmente. Como acabara de demonstrar.

A garota de cabelos negros correu para o corpo do homem caído e o apertou contra si. Ela chorou as lágrimas uma enxurrada de emoção. Obviamente, gostava do homem, também. Mas... por quê? O que ele havia feito para atrair a lealdade de duas mulheres?

Os lábios de Cronus se curvaram num rosnado. A resposta não importava, realmente não. O bastardo já era agora, para nunca mais voltar.

—Deixe-o ir. — ordenou à garota.

Ela o olhou, o ódio brilhando em seus olhos. Cuidadosamente colocou o corpo no chão, pressionou um beijo na testa e levantou. Seus passos cortados, medidos, se aproximou de Cronus, sons horríveis de sofrimento crescendo dela.

Se não tirasse sua língua, maldições seriam arremessadas para ele, tinha certeza. Mas ela não podia culpá-lo por sua falta. Havia dado a ela uma escolha. Voltar para a gaiola e morrer um dia, ou ficar com o homem, perder sua língua e morrer no presente. Ela havia escolhido ficar.

—Não sou um monstro. — disse ele. —Seu par escolheu o lado errado da guerra, e você pagou por ele. — Uma coisa que havia aprendido enquanto passava séculos afastado no interior do Tártaro: um rei sem uma mão firme era um rei sem trono.

O que veio a seguir era o esperado. Atirou-se contra ele, seus punhos o esmurrando, sua fúria e sofrimento infundindo cada golpe. Ele não tentou se defender. Não havia necessidade. Será que ela realmente achava que o estava machucando? Que poderia machucá-lo?

Um retumbante não a ambos, mas seu esforço incansável logo o irritou. Tinha coisas melhores para fazer.

—Pare, fêmea.

Ou ela não o ouviu ou não se importou em obedecê-lo. Empurrou-a longe dele, uma concessão da sua parte, a qual não costumava oferecer, mas ela apenas voltou uma catapulta de ira feminina. Ele poderia a ter congelado no lugar com um aceno de mão, mas se recusou a se aventurar por esse caminho. O orgulho ditou que ela obedeceria por vontade própria ou sofreria as consequências.

—Gostaria de morrer também? — Perguntou ele.

De alguma forma, a questão atingiu além da desordem psíquica, e ela silenciou, um sussurro de ar carregado de emoção separava seus corpos. Respirações ofegantes serravam dentro e fora de sua boca as lágrimas comoventes continuando a fluir.   

O que veio depois não era o esperado.

Com um grito brotando das profundezas de sua alma, ela se jogou em sua lâmina. Seus olhos se arregalaram com sua dor, sangue borbulhando de sua boca. A lâmina dele. Oh, sim. Ainda segurava o punho, a ponta prata afiada, de frente para ela, agora dentro dela.

Realmente queria morrer.

—Muito bem, fêmea. Mais uma vez, vou apoiar sua escolha. —Um puxão de braço, e ela foi libertada da invasão. Um movimento de seu pulso, e a matou da mesma forma que matou o homem. Rápido, fácil. Um assassinato misericordioso, disse a si mesmo.

Seus olhos rolaram atrás em sua cabeça enquanto seu corpo caía ao lado do seu homem.

Um longo momento se passou em silêncio. Algo ardia em seu peito. Lamento, talvez. Embora por que sentiria uma emoção tão forte por alguém que não conhecia e não se preocupava era um mistério. Violência caminhava de mãos dadas com a vitória. No céu, não pode ter um sem o outro.

—Bem, bem — disse Rhea, e não havia nem um pouco de remorso em seu tom. Nenhuma raiva ou traição, também. —Meus elogios por um trabalho bem feito, querido.

Ele girou para encará-la. Não foi recebido com lágrimas de recriminação, ou mesmo tristeza. Foi recebido com alegria. Lábios que uma vez havia beijado com reverência se levantaram num sorriso maroto.

—Como se sentiu, assassinando dois inocentes?

Ele instruiu sua expressão vazia, não querendo revelar sua confusão.

—Por que tão altiva mulher? É seu homem sangrando por todo o meu tapete, não é?

—Não. Não é. —Ela arqueou uma sobrancelha em sua resposta vacilante. —Acha que não sei sobre nossas profecias? Como será meu Galen a tomar sua cabeça — a menos que o prenda à fêmea com as asas da meia-noite.

Ele limpou a lâmina na colcha aos pés de Rhea, uma forte lembrança de suas proezas. Aquela que seria forçada a ver no resto de sua estada aqui.

—Se seu Galen tomar minha cabeça, você morre também.

Risos em camadas de gelo a deixaram, causando um calafrio que rastreou sua espinha.

—Eu sei. — E não soava como se a importasse. —Também sei como sua mente funciona. Espera que Galen queira usar a garota alada e seu demônio novo, mas duvido que vá desejar a garota por ela mesma. Como, então, pode forçar uma ligação? Deixe-me pensar, deixe-me pensar. Oh, sim, eu sei. Ao transformá-la numa fonte ambulante de ambrosia viciando o sangue de Galen. Como estou me saindo até agora?

Não, desde que Zeus o havia emboscado e deixado de joelhos, Cronus havia sentido tal medo.

—Cale a boca. Não sabe nada!

  Rhea continuou a voz dela uma carícia de seda.

—Não poderia infectar uma garota viva com ambrosia, só poderia infectar um morto. E quem melhor escolher que alguém que o Senhor do Sexo deseja? Ele vai convencer seus amigos a deixá-la em paz, e ela vai convencê-lo a deixar Galen em paz. Finalmente, a paz reinará e sua cabeça estará a salvo. Sim? Isso é o que acredita, não é?

Seu coração bateu contra as costelas.

—Errado. — ele resmungou. —Está tão errada.

—Como desonra a ambos com sua mentira. Acha que eu não teria ideia do que estava previsto todos esses séculos atrás?

Permaneceu em silêncio, mais uma vez instruindo suas feições, não estando disposto a dar-lhe mais de uma reação.

—E realmente acha que não faria nada quando soubesse que deu o demônio da Ira a uma garota humana morta, e nela crescia asas da cor da meia-noite? —Outro sorriso, diabólico na sua alegria. —Bem, o que fiz marido, foi descobrir tudo que podia sobre ela. Sobre sua irmã desaparecida, Skye, e o companheiro de Skye. As duas pessoas que acabou de matar.

Um momento se passou enquanto ele digeria sua alegação. Quando o fez, cambaleou atrás, sacudindo a cabeça com veemência.

—Não. Não.

—Porque acha que permiti que me capturasse, humm? Porque acha que permiti que capturasse meu povo? De que outra forma acha que seus espiões sabiam onde estavam escondidos? Estive à espera apenas deste dia. O dia que traria sua própria ruína, o dia que perceberia que carregando dentro de si a Chave Absoluta, eu também a teria. Acha que sua Sienna irá ajuda-lo agora?

Com isso, Rhea desapareceu da cama, as correntes que a prendiam batendo no colchão vazio.

 

LEGION PASSEOU PELO CHÃO DO QUARTO como se seus pés estivessem em chamas. Os Senhores já haviam deixado à fortaleza, com destino a Roma, determinados a encontrar e matar Galen, salvando assim Ashlyn e os bebês. Que não viessem até ela... sabia que nunca considerariam negociá-la.

Eram honrados.

Como Legion os havia retribuído? Escondendo-se. E por causa de suas ações, Ashlyn sofreria.

Doce, doce Ashlyn. O que Galen estava fazendo com ela? Se a houvesse machucado da forma como os demônios haviam ferido Legion... o estômago se rebelou, e ela correu para o banheiro e se debruçou sobre o vaso sanitário. Quantas vezes havia vomitado na última semana? —Ficou surpresa quando seus pulmões permaneceram em seu peito. Surpresa e decepcionada.

Queria morrer. Preferia morrer a passar pelo apalpar grosseiro, mãos rasgando sua roupa, ter feito às coisas... a... Argh! — Ela cortou os pensamentos venenosos antes que pudessem se formar por completo. Uma imagem espontânea e entraria em colapso, histérica, inútil nos dias vindouros.

Com um suspiro trêmulo, descansou sua têmpora na tampa do vaso sanitário. Essa deusa menor loira bonita havia feito uma pergunta. Quem mais ama? Os homens que a salvaram, ou ela mesma? Finalmente, tinha a resposta. Os homens, definitivamente. Poderiam tê-la deixado no inferno, mas vieram por ela, a resgataram. Ela lhes devia. Mas... caso se entregasse a Galen, ele iria torturá-la. O havia envenenado, depois de tudo. Tentado matá-lo.

Ele esperava que ela aquecesse sua cama. Sabia disso.

Antes de ela o envenenar, havia dormido com ele. Sua primeira vez com um homem, e havia gostado ansiado por mais, até que...

Ela engoliu em seco, mais uma vez forçando sua mente em branco.

Se fosse para Galen, estaria disposta a se colocar em outra versão do inferno. Mas então, isso era o que significava sacrificar-se, não é? Dor persistente para que outra pessoa não sofresse.

Isso era o que os guerreiros haviam feito uma e outra vez. Será que realmente faria menos por eles?

 Um arrepio de repulsa a atravessou, e fechou os olhos. Decidiu, então. Iria para Galen. Trocaria a si mesma por Ashlyn.

Não havia outro jeito, outra escolha.

E agora que a decisão estava tomada, só tinha que fechar os olhos e pensar nele, e apareceria diante dele. Os Senhores esqueceram que, como Lucien, podia se mover de um local para outro com apenas um pensamento. A única diferença era que não tinha que seguir uma trilha espiritual. Uma vez que conhecia alguém, podia aparecer diante dele a qualquer hora, em qualquer lugar.

Alguém bateu na porta com delicadeza, como se tivesse medo de assustá-la. Ela cheirou o ar, reconheceu o cheiro de céu que banhava Danika, a mulher de Reyes. Devia ter vindo falar com ela. Provavelmente queria tranquilizá-la que estava protegida e segura, que ninguém pensava em usá-la como isca.

—Vá embora. — ela gritou.          

—Não, preciso... Espere. Está falando. Está falando comigo. Faz tanto tempo...

—Eu disse vá embora!

—Legion, deixe-me entrar, por favor. Eu preciso falar com você. Preciso dizer...

—Adeus. — ela sussurrou, sabendo que precisava sair agora ou perderia a coragem. Sabendo que nunca voltaria. Depois da troca, depois que Ashlyn fosse devolvida em segurança, se mataria. Preferia morrer que ser tocada.

Imaginou Galen — loiro, bonito e perverso. Um momento depois, o chão debaixo dela sumiu.

 

SIENNA ARRUMOU A ROUPA QUE Cronus havia lhe dado quando a havia levado para o castelo. A camisa caía em volta de seus braços, mas era pregueada sob as asas, sem envolver a parte superior e passando sobre os ombros. Sem preocupação, sem tensão, mas a cobria completamente. Estava tremendo.

O que havia acabado de fazer com Paris... nunca havia experimentado nada parecido. Nem mesmo com ele. Nada poderia prepará-la para o total despertar do corpo. O prazer que havia lhe dado havia abalado sua alma, sabia exatamente onde tocá-la, como beijá-la, o que dizer para elevar seu desejo, elevar, oh, doce céus, elevar. Estava completamente nele, sua mente focada nele, o resto do mundo esquecido.

E ainda assim, tão bonito como o amor havia sido estavam agora, meia hora depois, mergulhados em algum tipo de embaraço. Para ela havia sido mais emocional e significativo do que estava preparada para lidar, tinha que admitir. Era sempre assim para ele, com todo mundo?

—Então, uh, estar comigo funcionou? — perguntou, então quis engolir a língua, tanto temendo quanto animada pela resposta. —Para seu demônio?

Ele balançou a cabeça quando sentou na borda da fonte. —Sim. Estou forte agora.

Apesar da afirmação, seu medo cresceu. Ele havia fechado sua expressão, escondendo seus sentimentos atrás de uma máscara em branco.

—Sabe como usar uma arma? — Ele perguntou abruptamente. E, claramente esse era o fim da conversa sobre o demônio.

Cer-to. Então não iam falar sobre o que havia acontecido. O que significava que não falariam sobre o que viria em seguida em seu relacionamento.

Dois dias não faz uma relação, idiota.

—Que tipo de arma? — Pergunta idiota. Tudo que ele dissesse, a resposta seria a mesma.

—Qualquer uma.

—Não realmente. Quando Ira me surpreende, mata usando meu corpo ou o que está disponível. Nunca estou ciente quando faz isso — só depois do fato é que as memórias me inundam, assim como as habilidades não são algo que conservo. 

—E antes de sua posse?

—Sempre fui a garota por trás dos bastidores. — Oh, droga. Por que tinha que falar a única coisa que com certeza o transformaria no Sr. Distante? Ou melhor, Sr. Mais Distante Ainda.

Mas ele a surpreendeu. Mostrou uma coisinha, uma arma pequena, então como inverter a trava de segurança. Ele liberou a trava, revelou as balas e a ensinou a colocar tudo de volta.

—Tudo que tem a fazer é apontar e apertar o gatilho. — disse ele. —Buracos farão dano suficiente para o que está visando, não importa onde acertar.

E quando falhasse o que era uma possibilidade muito real? Porque só de pensar em segurar a arma fazia suas mãos tremerem. —Então, quer que eu compre uma e a carregue, assim, o tempo todo? — Ela nunca, em toda a sua vida ou morte, havia disparado uma.

—Não. —Ele se inclinou e enfiou o metal na cintura de suas calças. Frio, mais pesado do que poderia ter imaginado. —Quero que carregue essa. Como segurança, para que não se machuque.

—Não tem medo de eu atirar em você pelas costas? — A piada atingia sua relação — ou outra coisa muito nova — e ela corou.

Claro, ele a surpreendeu mais uma vez. —Não. Não tenho. —Absoluta confiança revestia as palavras.

Alívio a percorreu. —Fico contente.

Ele limpou a garganta.  —Tenho toda a sua atenção?

—Sim. Claro. —E em seguida, sabia, a realidade a atingiria com força suficiente para machucar. Esta era sua maneira de dizer adeus. Sua maneira de prepará-la para viver sem ele. Seus joelhos ameaçaram dobrar, mas conseguiu permanecer em pé. —Sim. — reiterou.

—Ótimo. Agora escute, e escute bem. —Seu olhar a perfurou. —Fiz muita pesquisa sobre os mortos vivos. Se alguém te ameaçar, isso significa que a pessoa pode te ver. E se pode ver você, ele e suas armas serão sólidos para você. Não vou lembrá-la sobre os homens lá fora, como te viram e foram capazes de tocar em você. Se podem tocá-la, isso significa que você pode tocá-los. Então, precisa agir primeiro e pensar depois. Isso significa que dispara nos criminosos, sem hesitação. Entendeu?

—S-sim.

—Tudo bem, então. Seguindo em frente. —Em seguida, ele retirou uma lâmina de cristal. Estendeu a mão livre e fez sinal para mais perto.

Um passo, dois, até que ela estava em seu joelho. Aparentemente, porém, não era bom o suficiente. Ele agarrou sua cintura e a arrastou entre o profundo “V” de suas pernas. Embora não estivesse em modo sexual, seu toque a excitou mais uma vez.

Ele a forçou a envolver os dedos em torno do punho, aquele profundo azul oceano sério. —Se alguém entrar em seu perímetro, merecem o que vão receber. Ataque órgão vitais, onde são macios e não precisa se preocupar em cortar através do osso. Como aqui. — Ele moveu a mão para seu lado, colocando a lâmina plana a poucos centímetros acima do quadril. — E aqui. —Ele moveu a mão para os laços de seu estômago.

Tocar ali a lembrou de como estava com fome — e não apenas pelo seu corpo — fazendo seu próprio estômago roncar. Suas bochechas aqueceram novamente. Estava amaldiçoada para sempre a se envergonhar na frente deste homem?

Seus belos lábios se ergueram com a aparência de um sorriso. —Ainda não comeu, hein?

Apesar de uma mera sombra do que poderia ser, aquele meio sorriso iluminou seu rosto inteiro, sintonizando de "bonito" para "lindo". Ela também se iluminou, as terminações nervosas pulsaram. Engolindo de volta seu desejo sempre crescente, ela balançou a cabeça. —Estou morrendo de fome.

Um momento se passou. Ele amaldiçoou. —Isso vai contra a pouca moral que me resta. —Com o cenho franzido, começou a procurar em seus bolsos. Retirou um saquinho plástico cheio de pó roxo escuro.

—O que vai contra? — Segurá-la? Entregá-la suas armas? Agora que estava ciente de sua fome, as dores começaram, seu sangue aquecendo ao ponto de ebulição, sua pele encolhendo sobre seus ossos.

Não pense sobre isso, e vai ficar bem.

Ele colocou o saquinho de lado, olhou para ele durante alguns minutos, e soltou uma respiração irregular.       

Querendo dar-lhe tempo para que ele entendesse o que o estava incomodando, ela estudou a faca que ele havia dado a ela. A lâmina de cristal era irregular, fragmentos de arco-íris presos sob o exterior claro. O punho era de um cobre opaco, sólido e quente como seu calor corporal.

—Nunca vi nada como isso. — disse ela.

—E nunca verá novamente. Há apenas duas no mundo, e eu tenho a outra. Esse bebê matará qualquer coisa, até mesmo um deus deste mundo e fará tudo que você comandar, enquanto estiver em sua mão. Como, se precisar escondê-la, segure-a e a pense invisível.

Seus olhos se arregalaram, e seu queixo caiu. —Não posso aceitar isso. As duas são, obviamente, um conjunto e...

—Não discuta comigo. — Seu tom era duro, inflexível. Retirou um pequeno frasco do outro bolso, pegou o saquinho plástico e jogou metade do seu conteúdo dentro.

Ela disse para onde estava indo quando se separassem, e com quem estaria. Ele claramente havia esquecido, ou estaria insistindo para que desse as costas ao cristal e fingisse que nunca o havia visto.

—Paris, escute. Vou atrás do líder dos Caçadores. Entende o que estou dizendo a você? Não pode arriscar que algo assim caia nas mãos dos inimigos...

—Não faça isso. Não diga outra palavra agora. Decidi que não chegará perto desse psicopata, e eis que, então, basta pegar a faca e agradecer. —Ele girou o líquido no frasco antes de levantar a pequena borda redonda para seus lábios. —Agora beba.

—Você já decidiu? Você não pode...

—Beba.

Ela não teve escolha senão obedecer, já que ele começava a despejar o conteúdo em sua garganta. E doce céu, ela adorou o gosto. A versão diluída que Cronus lhe dava, mas delicioso da mesma forma. Voltou a engolir novamente, um gole, depois outro e outro, o calor deslizando dentro dela, dançando através dela, aliviando sua dor mais rápido que um piscar de olhos.

—Chega. — Ele tirou o frasco antes que ela pudesse começar a lamber qualquer gotinha perdida.

Ela gemeu seu desapontamento, depois fechou os olhos por um momento e saboreou. Sua pele se encheu de novo e — uau —podia ter flutuado para longe numa nuvem de felicidade, para sempre perdida.

—O que é essa coisa, afinal? — Cronus nunca disse.

—Ambrosia.              

Huh. Uma substância consumida pelos imortais, recordava da leitura, usada para o prazer e a reafirmação do poder. Como já sabia mitos muitas vezes induziam a erros, acima da mentira ou mal tocando a verdade. —Por que eu...

—Não. Sem perguntas sobre este assunto em particular agora. —Ele enfiou o frasco num dos laços de seu cinto e o saquinho com cuidado no bolso. —Quando sentir que está afundando... quero dizer, quando sentir que está ficando fraca, tome alguns goles. Vai se animar rapidamente.

—Claramente.

Ele encontrou seu olhar, o azul de seus olhos gelando em segundos, transformando o oceano num rio de vidro. —Disse que pode passar uma semana com o que Cronus te traz, certo?

Sim. Não podia questioná-lo, mas ele podia interrogá-la? Ela poderia se recusar a responder, ou exigir a troca de respostas. Não o fez. —Sim. — A mudança nele a aborreceu, e não gostaria de aumentar seu estresse óbvio.

—O que acabou de beber deve durar alguns dias. — Ele agarrou seus braços e a sacudiu. —Preciso que escute minhas próximas palavras. Se não conservar nada mais do que digo, conserve isto.

—Tudo bem. — Repetiu ela, enrijecendo quando sua ansiedade sangrou dentro dela.

—Jamais, sob quaisquer circunstâncias, permita que alguém prove seu sangue. Entendeu? Eles o farão, e deve matá-los antes que possam escapar de você.

—Quem iria querer provar meu sangue? — Os humanos? Impossível. Não podiam vê-la ou mesmo senti-la. Vampiros? Talvez. As criaturas noturnas existiam, mas queriam o sangue de todos. Por que atingir o fantasma de uma mulher?

Um músculo pulsava no maxilar de Paris, um sinal de sua raiva crescente. —Ficaria surpresa. Agora me prometa. Prometa que vai matar qualquer um que o fizer.

—Prometo. — Suas mãos escorregaram para seus ombros, uma oferta de conforto. Ele estava tentando dizer algo sem enlouquecê-la. Sabia disso, sentia. Tentando protegê-la, mesmo que estivessem destinados a se separar.

A soltou para afastar o cabelo de sua testa. Havia manchas escuras nos dedos, ela viu. Querendo ajudá-lo, mesmo de forma tão pequena, levou uma das mãos e esfregou as manchas de tinta. Elas permaneceram. Ela franziu a testa.

—Não vão sair. São tatuagens. — explicou, sem inflexão na voz. Estava imóvel, e até parou de respirar com seu primeiro toque.

Por que tinha manchas de tatuagem nas pontas dos dedos? Seus olhos encontraram os dele, um emaranhado de confusão e o desejo sempre presente. Ela ignorou o primeiro e se concentrou no último, levantando a ponta do seu dedo à boca e sugou.

Suas pupilas fizeram aquela coisa pulsante, alongando, estalando de volta ao lugar, estendendo-se novamente. O aroma de chocolate e champanhe caro deslizou dele, a envolvendo, embaçando seus pensamentos, eletrizando seus nervos já sensibilizados. Ela mordeu a ponta do dedo de forma leve, e um gemido rouco o deixou.

—Tem filhos? — Ela perguntou, e em seguida, teve que lutar contra uma onda de tristeza. Não posso. Nunca mais. Para se distrair, chupou o dedo mais forte que antes, agitando a língua na raiz e deslizando o apêndice com um pop.

A súbita mudança de assunto não o perturbou. —Não. Sempre sei quando uma mulher está... quero dizer, Sexo sabe, e a quer muito mais, mas fecundar uma estranha é uma das duas coisas que nunca o deixarei me forçar a fazer.

A cabeça se inclinou de lado. —Qual a outra?

—Deitar com alguém abaixo da idade consentida.

Como atentamente deve ter lutado por tais concessões. Sabia em primeira mão o quanto eram poderosas as compulsões de um demônio. —Você as quer? Crianças, quero dizer. Um dia, com uma mulher que ame? — Pare com isso. É muito doloroso.

Ele ofereceu um dar de ombros casual, ou tentou. O levantar do seu ombro estava duro, irregular. —Quero você, aqui e agora. — Disse ele. —Deixe-me tê-la. Mais uma vez, antes de partirmos.

Uma vez mais, o pensamento a excitava tanto quanto a deprimia. Recusar, no entanto, não era uma opção. Não havia mentido antes. De qualquer forma o aceitaria, podia fazer isso. —Sim.

Um ligeiro assobiar atrás dela, um respingo frio passando por ela, e então o corpo inteiro de Paris se sacudiu. Seus olhos se arregalaram, e suas mãos caíram. Ele franziu a testa, olhou abaixo. Um cabo de lâmina se projetava de seu peito.

Sienna gritou e se moveu depressa ao redor, usando seu próprio corpo como escudo para o dele. Exceto que uma lâmina já havia passado através ela, como se não fosse nada mais substancial que neblina. Para quem quer que houvesse atirado a arma, ela não era. Ele não podia ver os mortos, nem tocar os mortos, portanto, não podia ser tocada por sua lâmina.

O culpado era um cara grande — realmente grande — com o cabelo rosa e tatuagem de gotas de sangue num de seus olhos. Estava na entrada da caverna.

Suas feições idiotas brilhavam com ódio. —Que tal isso como não lutar justo? — Ele rosnou.

Paris a empurrou atrás, e ela tropeçou pela força que ele usou, caindo na água e respingando. Seu coração disparou fora de controle enquanto os dois homens cortavam um ao outro com os olhos. O uso da força física se seguiria, sem dúvida. Ambos estavam familiarizados com a dança da morte, uma verdade inegável quando entraram em posição.

—Como me encontrou? Sabe do que, não importa. Não me importa. Jogou esse punhal na minha mulher. Por isso vou arrancar sua mão. —Com um puxão e uma careta, Paris retirou a lâmina de seu peito. Seus olhos brilhavam vermelho forte, soltando uma luz vermelha sobre o homem que obviamente queria espalhado no chão.

—Sua mulher? — Um bufo, um sorriso de escárnio. O recém-chegado estendeu a mão e deslizou duas lâminas serrilhadas que se entrecruzavam em suas costas. —Que mulher? É só você e eu, demônio.

—Não importa um mínimo que não possa vê-la. — As palavras surgiram num rosnado, mais animal que humano. —Ela é minha, e trouxe violência à sua porta. Por isso, irá perder suas bolas.

—É mesmo? Bem, disse que você me feriu através da minha mulher, então agora vou feri-lo através da sua. —Ele sorriu sem humor, o metal brilhava e assobiava enquanto ele girava os punhos.

—Duvido. — Paris apertou a outra lâmina de cristal.

Outro bufo. —Se quiser sair daqui vivo, vai me dizer onde está minha deusa.

—É o único que gosta de mais dor e menos conversa, certo? — Paris disse. —Vamos lá, então. Venha pegar sua dor.

Apenas com isso estavam um sobre o outro. Lutavam mais rápido que podia acompanhar. O que via era como cliques de uma câmera: uma pausa quando Paris derrotou o punk, sua bota caindo sobre a garganta. A interrupção horrível quando uma lâmina se arqueou em direção à barriga de Paris. A esperança quando Paris caiu de joelhos, atingido. A batida terrível do tempo quando Paris atingiu o chão, seu oponente rosnando em cima dele.

E o que se seguiu foi um balé de socos e pontapés martelando com vigor suficiente para arrancar ossos. Joelhos indo por lugares sensíveis. Dentes rasgando. Garras rasgando. Ressoar de metal. Bateram nas paredes, rolaram pelo chão, cortaram um ao outro. Sangue se espalhava em todas as direções. Nunca havia visto nada mais brutal.

Manejavam suas lâminas maravilhosamente, horrivelmente. Eeee sim, como prometido, lá se foi a mão jogada fora do recém-chegado. Sangue borrifou de novo. Isso não o impediu de se lançar contra Paris, e começar a segunda rodada de Batam Um no Outro sem Motivo.

Tão gravemente que Sienna queria tirar sua nova arma e disparar, mas os dois estavam entrelaçados, e tinha medo de atirar em Paris. Tendo ironizado sobre acertá-lo pelas costas, agora se confrontava com a possibilidade muito verdadeira de não poder se arriscar. Mais que isso, a bala provavelmente não feriria o punk, provavelmente o atravessaria, da mesma forma que sua lâmina havia disparado através dela.

Então... o que podia fazer? Não tinha certeza, mas sabendo que sua posição atual não ajudava ninguém, abriu caminho para fora da água e se ergueu. Um jato de ar frio a atingiu, fazendo-a tremer tão veementemente que seus dentes bateram e cristais de gelo se formaram em sua pele. Um segundo depois, o anjo Zacharel se erguia na frente dela.

—Pare-os. — ela implorou.

Seus olhos verdes estavam duros, firmes e totalmente voltados para ela. —Venha. Vamos deixá-los com a batalha.

Seu mergulho inesperado devia ter inundado seus ouvidos. Não podia ouvi-lo corretamente. —Ir com você, deixando Paris atrás? — Os dois homens não eram amigos?

—Sim. — Ele acenou com os dedos com definitiva impaciência. —Entendeu perfeitamente o que quis dizer. Paris prefere que não fique ao redor de tanta violência, tenho certeza.

—Não importa. Vou ficar. —Guerreiros como ele e Paris não estavam familiarizados com a negação, e encaravam todas as medidas de resistência como um desafio, estava descobrindo. Antes que pudesse saltar sobre ela, segurou as mãos para cima, com as palmas para fora, e se afastou dele.

Covarde, talvez, mas eficaz. Ele franziu a testa.

—Vou ficar, e ponto final. — acrescentou.

Paris sentiu a nova ameaça e desencadeou um rugido profano. Mergulhou contra Zacharel, derrubando o guerreiro de túnica. O anjo não o empurrou longe. Não o tocou de qualquer forma de fato, e ainda assim Paris o impulsionou por toda a caverna e o chocou contra a parede oposta.

O punk de cabelo rosa estava sobre ele um segundo depois, a luta acelerando num novo nível de ferocidade. Mas apesar de tudo, Paris nunca deixou cair à lâmina que havia encontrado e cumprimentado seu coração. Ele empurrava a ponta, e depois o punho naqueles pontos super especiais e macios ao lado do sujeito e no estômago, como havia mostrado a ela.

Um grunhido cheio de dor, uma maldição negra. Então o cara estava desabando sobre o chão, e Paris se virou rapidamente, seus olhos vermelhos mais uma vez em Zacharel — que agora estava em pé ao lado de Sienna.

Com um suspiro, ela contornou a fonte, pondo tanta distância entre eles quanto possível. —Cai fora, garoto anjo.

As sobrancelhas negras se arquearam em sua testa. —Dificilmente garota demônio. Faço isso para te salvar, para salvar milhares de outros.

Uh, o que era isso agora?

—Venha para mim, Sienna. — Paris estava ofegante, sangrando, tremendo e a loucura animalesca de seu olhar não o havia abandonado. —Agora.

Com cada fibra do seu ser queria correr em vez de andar até ele. E o faria, se o anjo não dissesse: —Não posso deixá-la fazer isso, demônio. — e apareceu ao seu lado num piscar seguinte, tomando conta de seu pulso e a prendendo no lugar.

 

OH, INFERNO, PARIS PENSOU. DOIS MARICAS EXTREMISTAS — um de pé e outro deitado — não iam derrotá-lo. Não havia matado o Caído, ainda não, apenas machucado o cara um pouco. Ou muito. Não importava. Agora queria que o bastardo sofresse por um longo maldito tempo.

Sua necessidade de proteger Sienna o queimava ardentemente. O fato de que o Caído havia interrompido o jogo sexual, o fato que outra pessoa que não ele mesmo havia visto suas feições delicadas dominadas pelo desejo era motivo para matar. Selvagemente.

Gostava realmente de Zacharel, mas isso não significava que toleraria interferência neste assunto. A única coisa que o favorecia agora era o fato que Sexo estava adormecido ou escondido, e felizmente não tinha opinião.

—Deixe-a ir. — Ele rosnou. Estava perdendo sangue rapidamente, seu peito parecendo uma bica com vazamento. Doía como uma merda, e sabia que cairia mais cedo ou mais tarde. Estava determinado a fazê-lo mais tarde, quando Sienna estivesse segura.

O anjo deu uma sacudida única de sua cabeça.

—Seu temperamento está muito feroz.

Então, inferno, e daí?

—Tenho a mim mesmo sob controle.

—Realmente?

Não.

—Disse que sim, não foi? Então a deixe ir antes que a tome de você.

—Arrancando minha mão? Minhas bolas, como disse ao Caído? — Uma pausa cheia de significados, a raiva lutando para se liberar de um homem que claramente negava suas emoções — mas não podia suprimi-las totalmente. Um dia explodiria, sem dúvida.  —O que vai fazer a si mesmo quando acidentalmente ferir sua mulher?

Um forte passo, dois.

—Caia fora. Agora. —A escuridão dentro dele estava tão profundamente enraizada que sabia que as coisas continuariam — e assentariam — e nunca superaria isso, mesmo quando ele e Sienna se separassem. Especialmente quando se separassem. Afundaria em desespero quando a perdesse, e se permitisse a si mesmo relaxar com ela, gostar dela muito mais, só a arrastaria abaixo com ele. Por isso havia lutado tão fortemente contra suas emoções, depois que havia feito sexo com ela.

Agora ele estava feliz por isso. Se tivesse que matar o anjo, o mataria, e a escuridão se estenderia feliz sobre o ato, e não o remorso.

—Sua escuridão. — disse Zacharel.

—Está lendo minha mente? — A invasão custaria sua vida.

—Não. — Respondeu o anjo, salvando sua vida. —Seus olhos. A escuridão está lá. Sabe o que é, guerreiro? Sabe com o que brinca? Não? Bem, permita-me explicar. Como um corpo humano pode desenvolver uma criança, um demônio pode desenvolver o mal. Isso foi o que fez. Permitiu ao demônio o nascimento de outro demônio, por falta de uma palavra melhor. Este é todo seu, seu bebê, e quando o outro te possuir, nunca vai deixá-lo.

Deveria o surpreender, não o fez. Devia o irritar ainda mais, mas não o fez. Sienna ouvia essas palavras condenatórias.

—A menos que queira uma demonstração pessoal, é melhor se afastar da minha mulher.

—Paris. — disse ela, a tristeza escorrendo de seu tom.

Tristeza, em vez de raiva, deixando-o confuso. O que quer fosse. Se tentasse dizer que não era sua mulher, que esse segundo demônio — o que quer que fosse — era uma complicação, ele perderia. Quando tivesse que deixá-la ir tudo bem, não importaria, reavaliaria e marcaria outra vez sua posse. Mas aqui? Agora? Não podia marcá-la. Acabava de estocar dentro dela, acabava de gozar dentro dela, a havia marcado, e ainda tinha seu gosto luxurioso em sua boca. Ela havia gritado seu nome, queria mais, e ele teria dado mais.

—Ainda tenho seu presente. — lembrou a ele. —Se eu... Quer que eu... o use? Pensei que era seu amigo, mas...

Ele piscou. Esfaquearia o anjo? Por ele? O pensamento provavelmente não deveria ter dobrado seu desejo por ela, mas o fez. E que faria isso depois de ouvir a condenação de Zacharel sobre ele era comovente.

—Ainda não. — Atrás dele, ouviu o punk se mover desajeitadamente para levantar. Sua mão apertou sua arma.

—Não. — disse Zacharel, parando-o. Finalmente, libertou Sienna. —O vermelho está se afastando de seus olhos. Isso é bom. Não vai machucar a garota agora. Portanto, levarei o Caído para outro lugar e voltarei depois. Quanto a você, vai se dirigir à porta que conduz para fora deste reino. —Desapareceu um momento depois, levando com ele o Caído, embora Zacharel nunca o houvesse tocado.

Como se sua presença fosse a única coisa mantendo Paris na posição vertical, ele caiu, seus joelhos dobrando. Sienna correu para seu lado e o deslizou pelo resto do caminho. Grossas teias de aranha preta teceram através de sua linha de visão. A qualquer momento afundaria na inconsciência.

—Tenho você. — disse ela. —Vou cuidar de você. Não vou deixar nada te acontecer.

Ele não queria dizer agora o que precisava dizer, não queria estragar o que havia acontecido antes com o que precisava acontecer agora. Esteve aqui, nesta mesma situação, mil vezes antes. Ferido e desvanecido — com apenas uma maneira de se curar.

—Tenho que... Você tem que... Sexo, preciso de sexo.

Seu demônio estava por todo ele, saindo como um torpedo do esconderijo para enviar sangue ao seu pênis. Aconteceu tão rápido que Paris suspeitava que o demônio havia lutado contra esse açoite durante dias. Esse era um território desconhecido, no entanto. Até Sienna, nunca havia estado com a mesma mulher duas vezes. Agora que esteve, sabia que o manteria no nível, forte, mas estar com ela mais de uma vez realmente consertaria seu corpo?

—Sexo? Mas não está em condições para isso. Deve descansar.

—Sem descanso. Odeio que precise ser assim, mas não posso mudá-lo. —Quando estava ferido assim, precisava de sexo desenfreado, extremo, com tantos parceiros diferentes quanto possível. Mas mesmo se uma centena de belezas o cercasse, ainda só ia querer a que pairava sobre ele, em silêncio, suas mãos suaves explorando suas feridas. Uma mulher que não devia confiar, especialmente quando estava assim, mas uma que não podia — não iria — se afastar.

Não importava o que acontecesse em seguida.

—Por favor, Sienna. Monte-me.

Apenas uma pequena pausa.

—Não tem que implorar por nada, Paris. — disse ela, usando suas próprias palavras para confortá-lo. —Disse que ia cuidar de você, e vou.

 

SE ALGUM DIA EU VER PARIS completamente nu, Sienna pensou melancolicamente quando desabotoava e abria o zíper do preto material fluido de suas calças, provavelmente vou ter uma combustão espontânea.

Não querendo sacudi-lo, esticou o tecido para os lados ao invés de puxar abaixo pelas pernas, permitindo que o tamanho enorme de seu eixo saltasse livre, exatamente como ele havia feito anteriormente. Nenhum homem devia ser tão bonito em todas as partes, um esboço de força dura e sexualidade sombria, não importava onde olhasse.

Ele jogou um braço sobre o rosto, escondendo suas feições da vista.

—Odeio isso.

Ela estava se aproximando, mas agora recuava.

—Sinto muito. Posso achar alguém se você preferir.

—Não. — Ele se apressou. Devia ter ouvido o horror e a angústia em sua voz. —Não odeio estar com você, e não quero mais ninguém.

Bom, porque ela não tinha certeza se podia ter continuado. Tornar-se sua cafetina seria um tipo especial de inferno.

—O que odeio é que estamos misturando algo significativo e orgânico com algo clínico e mecânico. Algo forçado.

Seu primeiro pensamento: ele havia gostado do sexo também, e considerado significativo. Alegria se espalhou através dela, explosões de luzes brilhantes esquentando cada uma de suas células. Seu segundo pensamento: estava com vergonha agora. A alegria secou, esfriando. Tinham muito trabalho contra eles já, não podia permitir que adicionasse essa emoção terrível à mistura.

—Não está me forçando a fazer isso, Paris. Antes de sermos interrompidos, estava molhada. Ainda estou molhada.  —E não estava falando da água. —Por que agora tem que ser menos significativo que antes quando estávamos indo nesta direção, de qualquer forma?

Ele gemeu com a menção de molhada. Agora o braço caiu, e olhou para ela com aqueles incríveis e ardentes olhos azuis. —É tão adorável.

Quando a olhava assim, com as pálpebras pesadas e sonhadoras, ela se sentia bonita.

—Deixe-me mostrar o resto de mim. — Ela ficou em pé e se despiu seu olhar monitorando cada movimento dela.

Ao longo dos séculos, havia visto inúmeros outros corpos nus. Ela sabia disto, havia visto. Ele havia estado com mulheres altas, mulheres baixas, magras, fortes, negras, brancas e tudo mais.

Sienna não tinha nada de especial, e ainda, quando disse: "mais que linda", com um brilho fino de suor pontilhando sua testa, acreditou nele desta vez. Estava certo. Seu demônio sentiria uma mentira. A alegria voltou.

—Acho o mesmo sobre você. — ela admitiu. Nua, encorajada por seu elogio, montou seu quadril e se posicionou. Mas não empalou a si mesma em seu comprimento espesso. Ainda não. Ele precisava de sexo, e o tempo era imperativo, mas precisava muito mais ser acariciado. Precisava para garantir que ela estava aqui, neste momento com ele, ao longo do caminho.

Sua excitação se projetava entre suas pernas, seu calor por toda parte. Ela traçou os dedos sobre a ponta, e ele respirou fundo.

—Suba aqui e monte em meu rosto. — ele resmungou. As mãos dele encontraram seus seios e os apertaram, revirando os mamilos eriçados através de seus dedos. —Quero provar você novamente.

O desejo de fazer exatamente isso quase a matou. O sangue correu em suas veias a uma velocidade alarmante e perigosamente aquecido, afastando qualquer frio persistente.

—Vou te machucar. Meu peso... Seu peito está ferido.

—Que tal isso? Preciso te provar mais uma vez, e não me importo se meu peito dói.

Ela lambeu os lábios.

—Que tal isso? Eu provo você.

Ele se acalmou, até pareceu parar de respirar.

—A menos que não me queira. — ela correu para assegurá-lo.

—Não é isso. — As palavras dele serraram roucas e guturais, mais coragem que substância.

—Não permito que ninguém faça isso comigo há mais de mil anos. — Ele respirou fundo. —Não, isso não é verdade. Deixei um escravo realizar o ato em mim na viagem para cá, e odiei cada momento dele.

—Oh. —Perplexidade arregalou seus olhos. Todos os homens amavam receber sexo oral. Certo? Então, por que havia impedido mulheres de o sugarem? E as havia detido, sabia que ele havia feito. Toda mulher que havia recebido em sua cama provavelmente queria ter encaixado seus lábios sobre aquele pênis e bebê-lo.

—Mas você — ele continuou, ainda no limite. —Vou permitir. Se quiser.

Ela achatou as mãos em seu estômago, sentindo os feixes de músculos se contraírem.

—Não quero fazer você se sentir desconfortável ou fazer algo que não gosta.

—Não. Entendeu mal. — Sua cabeça balançou todo o surpreendente cabelo realizando um balé em torno de suas têmporas. Os fios pretos, marrons e dourados que desejava agarrar nos punhos.  — Não deixei os outros fazê-lo porque já os usava e não queria que me fizessem mais favores. E a única razão para eu ter deixado o escravo fazê-lo foi porque precisava de respostas, e essa era a maneira mais rápida de obtê-las.

Respostas sobre mim.

—E Sienna? O escravo era... ele era um homem.

E não era sua preferência. Simpatia lavou através dela. Não ter nenhum controle sobre seu corpo e suas reações, ser forçado a se submeter a um desejo que você mesmo não sentia, devia ser tortura.

—Só para você saber, não há nada de errado com isso. E não vou estar fazendo um favor a você, Paris. É um homem bonito, charmoso, inteligente, sexy como o inferno, e estou morrendo de vontade de ter você. Tal como é. Com todos os outros que esteve simplesmente estava praticando para este momento. — disse ela, esperando provocá-lo para ver a verdade de sua afirmação. —Ao fazer isso, vou estar dando prazer a nós dois. Espero. Quero dizer, tenho experiência sobre boquetes tanto quanto tenho com sexo.

—Se for esse o caso, estou perto de gozar fora meus miolos. Vai ser perfeita.

—Quieto. — Sienna não havia acabou de colocá-lo em seu lugar.

Um sorriso floresceu.

—Sim, senhora. Mas, uh, qual é meu lugar?

—O pedestal para o homem mais admirável que conheço. Não me importo com o que fez, ou o que fez com ele. Poderia ter tumultuado todo o mundo, poderia ter estuprado violentamente, constantemente, mas não. Quanto ao sexo do escravo, bem, espero que me respeite pela manhã, porque acho que está ainda mais sexy agora e vou ficar muito chateada se não conseguir minha vez.

Ele lambeu os lábios.

—Você quer sua vez?

—Mais que qualquer coisa.

Os quadris já se contorciam sob ela, como se estivesse imaginando a boca dela, trabalhando-o.

—Por favor, Sienna. Por favor, faça isso.

—Sim. Mas só se você for gostar.  —Ela deslizou abaixo até que seus lábios estavam posicionados ao longo da bonita ereção. Isto é meu, ela pensou, atordoada.

—Vou gostar. Juro que vou gostar.

—Vamos descobrir com certeza. — Sua língua surgiu, lambendo para cima e para baixo no seu eixo, tratando seu comprimento como um pirulito. Gemido após gemido o deixava, e ela o tomou com aprovação. Em seu terceiro deslize para cima, encaixou seus dedos ao redor de sua base e os lábios ao redor da cabeça. Enquanto ela se gloriava em seu sabor, sua mão continuava a jornada erótica em seu eixo.

Suas asas se espalharam abaixo e ao redor, as pontas acariciando seus lados. Pela primeira vez, compreendeu a alegria de tê-las. Ao seu redor assim, se esquecia do resto do mundo. Só eles existiam. Apenas o prazer.

A maldição rugiu dele quando seus quadris se sacudiram, empurrando-o mais profundo. Imediatamente se desculpou e recuou.

—Mais. Por favor, mais. —Ele bateu com os punhos contra o chão. —Tenho que ter mais.

Ela chupou mais, provando-o mais profundamente, saboreando, depois o engoliu, tanto quanto podia. Era muito grande e esticou o queixo, mas não se importava. Seu corpo inteiro balançou com a força de seu gozo. Ela nunca parou de acariciá-lo com as mãos, uma ou outra, uma afagando, a outra puxando seus testículos.

Mas então começou a se perguntar que gosto tinha, e soltou seu pênis com um pop para passar a língua sobre a rigidez de suas bolas. Ele gostava também, especialmente quando ela atraiu uma, e depois a outra, em sua boca.

Será que nunca se fartaria deste homem?

Quando ele estava gritando o nome dela, ela voltou ao evento principal, tomando-o, tomando-o abaixo, sua reação selvagem a estimulando e assim por diante, seu corpo se acendendo, desesperado por ele, por ele todo.

—Estou perto, bebê, estou tão perto. Se não quer me provar, precisa...

Em resposta, ela o chupou com tanta força que escavou as bochechas.

—Oh, sim! — Ergueu seus quadris, seus músculos se apertando em sua foda, e um rugido muito mais alto que qualquer outro que veio antes saindo dele. Jorrou por sua garganta e ela engoliu cada gota, segurando-o até o fim, quando ele caiu no chão, suas respirações ofegantes enchendo o recinto inteiro.

—Me monte. — ele ordenou naquela voz rouca. —Preciso estar em você. Agora.

—Sim. Agora.  —Ela sabia que apenas repetia o que ele dizia, de novo, mas o cheiro rico estava escorrendo dele, em torno dela, cegando-a para tudo, menos para ele. E isto. Oh doce céu, isto.

Ela levantou, surpresa ao descobrir que estava tremendo. Uma olhada rápida, e viu que suas feridas não estavam mais sangrando e a pele havia se unido novamente. E apesar de seu clímax recente, ainda estava duro e pronto para ela.

Mais uma vez o montou, e dessa vez o levou dentro, todo o caminho, até que estava sentada sobre ele, a bunda dela descansando nas suas coxas. Agora era a única a gemer. Como antes, a esticava, mas era como um estiramento, uma queimação boa e estava tão malditamente molhada, tão malditamente ansiosa.

Ele apertou os dedos sobre a curva dos seus quadris e a movimentou, de cima para baixo, sua força um choque. Porque quando ele se moveu, bateu nela, obrigando-se tão profundamente quanto podia ir, erguendo-se até encontrá-la na metade do caminho.

—Me beije. — ele rosnou. —Incline-se para baixo e me beije.

Mesmo enquanto se balançava sobre ele ela obedeceu, o peito esmagando no dele quanto inclinou a cabeça e encaixou seus lábios juntos. Sua língua imediatamente disparou dentro de sua boca, afirmando-a como sua, possuindo-a. Suas mãos foram para suas costas, deslizando sob as fendas que abrigavam suas asas. Era como se colocasse os dedos e a boca no seu clitóris ao mesmo tempo, usando seu nariz e queixo e sua barba incipiente, tudo para estimulá-la ao máximo.

A liberação a atingiu com a mesma força de Paris. Alegria selvagem bombeou através dela, o prazer tão intenso que suas terminações nervosas estavam eletrificadas. Alfinetadas de branco atrás de suas pálpebras, o fogo em suas veias. Uma tempestade de satisfação em cada centímetro dela.

Ela não queria, mas mordeu o lábio até sentir o gosto de sangue, e mesmo isso era um estimulante. Suas unhas cavaram seu couro cabeludo, segurando-o ainda para seu abuso quando ela montou o trovão e o relâmpago. Mas ele não pareceu se importar, pareceu gostar. Uma de suas mãos caiu na bunda dela e a apertou quando ele se levantou, e então ele rugiu, jorrando dentro dela, enviando-a ao longo da borda uma segunda vez.

Quando finalmente se acalmaram, entraram em colapso no chão num monte de braços e pernas, tremendo juntos, ofegantes, desesperados por ar, mas não se importando que não pudessem encontrá-lo.

—Obrigado. — ele ofegou.

—Você gostou? — Respondeu ela quando encontrou sua voz.        

—Mulher, quase me matou. Deveria estar fortalecido novamente, colocando-nos novamente no caminho certo, mas estou completamente em êxtase.

Então, era ela. Cada vez juntos era melhor que a anterior.

—Esperei por isso milhares de vezes hoje.

—Espero que seja um palpite preciso e não um chute.

—Se alguma coisa, eu o subestimei. Você é muito bom com minhas asas.

Ela sentiu o golpe quente de uma risada contra sua pele.

—Não fui muito bruto?

—Foi perfeito. — Um beijo na pele que ligava o ombro ao pescoço, uma raspagem de seus dentes. —Já esteve com uma mulher alada antes?

—Uh... eu... — Ele hesitou, mesmo que sua pele arrepiasse com o calor debaixo de sua boca.

Sua vergonha retornou, e mais uma vez ela sentiu simpatia por tudo que ele havia suportado.

—Vou tomar isso como um sim. Era um anjo, como seu amigo? —Ele precisava limpar as memórias e os sentimentos que as acompanhavam.

—Uh...

—Outro sim. Um demônio, também?

Apenas uma pausa menor.

—Sim. —Ele abaixou a cabeça na direção oposta, tão tímido quanto um colegial.

Adorável. Simplesmente adorável. Tão forte como era, tão feroz como era, se preocupava com sua opinião.

—Paris, está tudo bem. Sei que tem um passado, e não estava pressionando para obter mais detalhes para envergonhá-lo ou fazer você se sentir desconfortável. Só queria que soubesse que não há nada que possa ter feito para me dar nojo.

Lentamente ele relaxou e virou em sua direção. Sombras giravam em suas íris, mas enquanto ela o olhava, elas diluíram e enevoaram. Zacharel disse que aquelas sombras eram outro demônio, um mal dentro de Paris que nunca poderia se livrar. Não tinha certeza por que deu boas-vindas ao mal, ou "nasceu", e não se importava. Para ela, era Paris, apenas Paris, e nunca mais cometeria o erro de odiar alguém por uma maldade percebida.

—Obrigado. — disse ele novamente, apertando seu poder sobre ela.

—Ouça, você. Se não posso me depreciar, não pode me agradecer pelo meu senso comum impressionante.

Uma de suas mãos deslizou pelo seu rosto, segurou seu queixo. Ela tinha a intenção de fazê-lo sorrir, mas sua expressão nunca foi mais feroz.

—É um trato.

Emoção entupiu a garganta dela, e ela forçou uma tosse.

—E se eu te contar uma coisa embaraçosa sobre mim, de modo que ficamos quites?

O áspero, irregular, "por favor".

—Quando era pequena, brincava de salão de beleza com minha irmã mais nova. Eu era a estilista e prendi seu lindo cabelo loiro mel num rabo de cavalo, então cortei a coisa toda. Ela era a maquiadora, e pintou o rosto com marcadores permanentes. Nossos pais ficaram horrorizados. —Um bombardeio de nostalgia a fez sufocar num soluço repentino.

Enna, Tommy da minha classe diz que tenho sardas demais, e que elas me deixam feia. As lágrimas rolaram pelas faces ainda arredondadas de bebê.

Bem, o Tommy da sua classe é estúpido. Não tem a metade ou mais do que eu, e sou a garota mais bonita do mundo. Você disse que sim.

Um riso de menina. E eu nunca menti!

Eu sinto tanto sua falta, Skye, pensou agora. Vou encontrar você. Vou te salvar.

O polegar de Paris acariciou a curva de sua bochecha.

—Eu perdi você por um momento.

—Sinto muito.

—Não sinta. Estava apenas dizendo que sua história não é constrangedora. É bonita. A propósito, acho que suas asas são quentes, e estou curioso para saber por que nunca quis lambê-las quando Aeron as tinha.

Ela colocou a mão sobre a dele e se obrigou a sorrir. Logo iria perdê-lo, então precisava desfrutar dele enquanto tivesse chance.

—Não leve isso a mal, mas espero que seja apunhalado novamente. Na verdade, em breve. Adorarei te beijar para deixá-lo melhor.

Finalmente, um riso surpreendente vociferou dele. Puxou-a abaixo até que seu corpo cobriu o dele.

—Bebê, estaria disposto a me apunhalar por esse tipo de beijo. Mas, felizmente, não há nenhuma necessidade. Tenho outras dores que precisam das suas habilidades medicinais especiais.

 

NO MOMENTO QUE ESTAVAM VESTIDOS e saindo de sua caverna privada para a grande esfera má, onde Zacharel o Cinto de Castidade esperava, Paris havia recuperou cada gota de sua força e mais alguma. Seus músculos erguidos com adrenalina, seus ossos fortificados com aço. Seus passos estavam mais pesados pelo seu aumento de peso, mais seguros pelo equilíbrio superior.

Tudo por causa de Sienna.

—Usei minha energia acompanhando um Caído... a outro lugar. Vamos ter que caminhar até a porta, — Zacharel disse a Sienna. Suas bochechas estavam um pouco magras, sua pele bronzeada agora sem qualquer brilho. —Isso é o que ainda prefere, sim? Antes, me disse que preferiria andar com Paris que voar comigo, de qualquer maneira, e embora vá descobrir logo porque isso é insensato, é o melhor que posso oferecer no momento.

—Sim, obrigado, — respondeu ela, sempre educada.

—Se vai ficar com a gente, faça alguma coisa útil. — Paris assumiu a liderança, pediu para Sienna segui-lo e forçou o anjo a ficar na retaguarda. —Proteja-a com sua vida.

Uma rajada de vento dançou ao redor do anjo, e só do anjo, mais fria a cada segundo que passava. —Pretendo fazê-lo. Não importa a ameaça contra ela.

Um tom fácil, mas sua expressão deixava claro que se Paris fosse uma ameaça, Zach o derrubaria se necessário.

Bom saber.

Durante a caminhada para encontrar Sienna, quase nenhuma criatura estava fora de casa, e havia uma pequena medida de luz, um brilho vermelho da lua. Agora, havia um monte dessas famintas sombras escorregadias deslizando em todas as direções, e a única luz vinha de demônios ocasionais — como os que seguiram Sienna, com toda a intenção de machucá-la. Estavam presos em postes e queimando vivos.

Paris voltou e passou os dedos dela ao redor da cintura da sua calça. —Não me solte a menos que tenha que lutar. — Não quero que ela lute.

—Não vou. — Confiante, sem medo.

Essa é minha garota. Seu trenzinho rastejou através do deserto, e, agora, alcançaram uma espécie de acampamento. Tendas esticadas de ambos os lados. Sexo manteve sua grande boca fechada, e desta vez Paris sabia, além de qualquer dúvida que o demônio estava dormindo abatido pelo prazer ao invés de se esconder.

Um silvo. Pressão de dentes.

Inimigo.

Paris procurou através da escuridão, encontrou a fonte lá na frente, no início da próxima tenda, e entrou em ação. Abaixou-se, deslizando de joelhos, passando a lâmina ao longo dos troncos das mesmas criaturas parecendo vinhas que havia encontrado na sua descida daquele penhasco. Estava em pé um segundo depois, vendo como os restos deslizavam ao longo dos lados do tecido.

Não havia tempo para relaxar. Três mais chegaram. Manteve sua mão devassa em movimento de arco, cortando, e pelo gemido que ouvia atrás de si, sabia que Sienna e Zacharel faziam o mesmo.

Uma rápida olhada para verificar sua mulher — ela olhava em volta, procurando algo que pudesse atacá-lo — provou que ela não tinha ferimentos, não foi ferida. Uma das videiras partiu na direção dela, dentes salientes pingando de um par de folhas afiadas. Ela estava muito ocupada o protegendo para se proteger.

Paris estendeu o braço, e conseguiu um pedaço de pele e músculo arrancados. Puxou de volta um uivo de dor. Certo, então agora sabia o que pingava desses dentes. Ácido.

—Voe com ela para fora daqui, — ordenou a Zacharel, mesmo enquanto cruzando as mãos e cortando, pedaços de videira eram arremessados para fora. Preferia perdê-la dessa maneira que de outra forma, mais permanente.

—Eu te disse. Gastei o resto da minha energia removendo os Caídos.

Desde o início, Paris sabia que devia ter mandado o bastardo embora, mas nãoooo. Simpatizou com a situação do cara. Lição aprendida, no entanto. Mostre um lado mais suave, e pronto, pode ser punido mais tarde.

—Não vou te deixar, — disse Sienna ao agarrar um caule e cortar a cabeça com a lâmina de cristal que ele havia dado a ela. Ela era rápida, mas não rápida o suficiente, e logo estariam sobre ela. —Devo ter deixado cair a arma na água. Sinto muito.

Escuridão... subindo... Paris deixou cair suas adagas e pegou sua própria lâmina de cristal. Um único comando mental e o metal alongou... tornando-se uma tocha crepitando em chamas. Ele apertou aquelas chamas contra as paredes de couro, o material logo engolido... e as faíscas saltando para a tenda ao lado.

Misturados com o crepitar das chamas estavam os gritos, enquanto ele, Sienna e Zacharel corriam para longe.

Depois de uma milha ou assim, diminuíram e Zacharel disse: — Pensei que queria permanecer discreto.

—Precisamos enviar uma mensagem. — Felizmente, as criaturas da sombra receberam a mensagem, também. Mexa com o grupo desorganizado de Paris e frite. Mantiveram distância. Só a presença de Sienna impedia Paris de pisá-los e fazer algum dano.

Queria machucá-los, mas a queria mais segura.

Sempre pode voltar por eles. Verdade. Quando Sienna partisse, precisaria de uma boa luta para nivelá-lo.

Grande. Agora, com o pensamento de sua partida, estava todo nervoso novamente. Só começou a se acalmar algumas horas mais tarde. Nada nem ninguém havia se atrevido a abordá-los, e mais uma vez seus pensamentos pularam de volta ao que Zacharel havia dito.

A escuridão de Paris... seu temperamento. Zacharel havia insinuado que Paris um dia machucaria Sienna. No entanto, quando estavam dentro da caverna e tinha sido consumido por uma escura fúria, havia permanecido totalmente consciente dela. Não havia deixado a ação perto dela.

Com as videiras, o mesmo negócio. Permaneceu consciente dela. Procurou protegê-la, colocando essa necessidade acima da de mutilar.

Boa notícia, certo? Exceto, e se ela o irritasse? E se todo o foco da escuridão estivesse sobre ela?

Oh, inferno, não. Isso não ia acontecer. Zacharel o havia deixado paranoico, era tudo. Mas as dúvidas, uma vez plantadas, podiam assumir vida própria, e Paris se viu suando sobre a possibilidade.

Sienna o afetava de uma maneira que ninguém jamais havia feito. Ela o havia aceitado como era, bom, mau e feio. Mas se alguma vez o traísse se mentisse para ele, se lutasse com ele ou se voltasse contra ele, não poderia prever como reagiria. Especialmente agora que conhecia a emoção de sua rendição completa.

O que está fazendo, pensando o pior? Ele havia dado a ela uma pequena medida de sua confiança. Ao sucumbir a esses medos, desonraria os dois. Nunca havia se importado em desonrar a si mesmo, mas o pensamento de desonrá-la pesava sobre seus ombros.

Ela o tomou na boca, provou tudo que ele era, e amou seu corpo com tal doçura que nunca mais seria o mesmo. Ela viu seu pior. Conhecia seu passado, seu futuro, e ainda assim o observava com admiração em seus olhos, como se significasse algo para ela. Não rejeitaria esse presente. E era um presente.

Um tropeço sobre uma rocha a levou para o lado de seu corpo e o tirou de seus pensamentos. Ele a pegou com a mão livre, antes que caísse.

—Desculpe, não vi a distância, — ela murmurou quando se endireitou. Enquanto o sexo o havia fortalecido, claramente a havia cansado.

Não deveria sentir tanto orgulho nisso, mas o fazia. —Não me ouve queixar de ter você em meus braços.

Seu sorriso, exuberante e lindo piscou para ele. —Verdade.

Zacharel poderia ter revirado os olhos.

Paris deu-lhe um silvo mental, antes de examinar a faixa de terra pela frente. Havia quilômetros de escuro ainda para viajar, repletos de pequenas minas. Como a poça ao lado, que teve que pular em seguida, então ajudar Sienna a fazer o mesmo. Seu nariz enrugou. A água tinha cheiro de cadáveres em decomposição. Provavelmente por que... sim, viu um par de olhos sem brilho, mortos boiando abaixo.

Uma mosca tão grande quanto seu punho passou disparada, depois outra. Uma pousou em seu braço e imediatamente mordeu seu bíceps. Ele deu uma bofetada no inseto para arremessá-lo longe dele, mas acabou esmagando-o, a maldita coisa espirrando em cima dele.

O reino inteiro era um coquetel assustador de alguns de seus filmes favoritos de terror, piores que nunca. Sim. Ele cavou o queijo. Também gostava de romances, erguer pesos e assar biscoitos de chocolate.

Não havia tido tempo para essas coisas há um tempo, e agora... agora percebia o quanto havia perdido. Como seria legal colocar um DVD, relaxar com Sienna ao lado dele e ver o sangue rolar. Depois disso, poderiam se enroscar juntos e talvez ler algumas cenas de um romance.

Nada disso aconteceria, no entanto. Ele e Sienna se afastariam logo que chegassem à saída. E o que você sabe. Agora queria matar alguma coisa — simplesmente ferir já não era bom o suficiente — com suas mãos nuas. Estava realmente rezando que algum macho feroz, espumando pela boca saltasse e o atacasse.

Isso não era bom. Significava que sua obsessão por Sienna havia alcançado o nível seguinte.

Paris talvez pudesse se obrigar a deixá-la ir sem muito alarde antes de seu tempo na caverna. Agora? Não era provável. Ela era tudo que sempre quis para si mesmo e tudo que não sabia precisar, tudo num pacotinho sexy. Uma guerreira, quando precisava ser, uma sereia, quando ele precisava que ela fosse, mas sempre suave, doce e generosa. E corajosa muito corajosa.

Quando o punk de cabelo rosa havia invadido seu espaço privado, ela não havia fugido. Havia ficado onde estava. Para o caso de Paris precisar dela, e para manter Zacharel fora da sua vista quando as coisas ficaram feias. Admirava isso nela. Inferno estava começando a admirar tudo sobre ela.

De repente, Paris entendia Amun de uma maneira que nunca havia feito antes. A mulher de Amun era uma ex-Caçadora também, e uma vez havia ajudar a assassinar seu grande amigo Baden. Por isso, cada um dos Senhores do Submundo a desprezava e queria ver suas entranhas derramadas por toda a fortaleza, Paris inclusive, mas Amun se manteve firme e defendeu o que era dele, e todos eventualmente, relutantemente, embarcaram no comboio de boas-vindas.

Talvez, depois que a haver levado de Cronus, fizesse o mesmo por Sienna — a levando para seu lar e brincando de casa. As coisas seriam difíceis no começo, com certeza. Ela não havia matado ninguém, mas os Senhores ainda não a conheciam e não gostariam dela. Viram seu corpo cortado e machucado depois que seus companheiros haviam terminado de torturá-lo. O viram sofrer por sua perda, e os ouviu amaldiçoar a si mesmo por se preocupar com ela quando ela nunca havia sentido o mesmo por ele.

Até agora. Ela havia mudado de ideia sobre ele, e ele sobre ela. Não tinha certeza do que havia provocado a mudança afinal, embora suspeitasse que tivesse mais a ver com simplesmente querer acreditar nela, como ele havia alegado. Não tinha certeza de quando a mudança havia acontecido. Tudo que sabia era que ela não estava atrás dele.

Aceitando que uma vez mais demonstrou o ponto de que seus receios anteriores, plantados por Zacharel, eram tolos.

Paris conhecia as mulheres, e conhecia sexo, e achava que era muito bom em ler a emoção envolvida no primeiro segundo. Mais que isso, havia estado com Sienna antes. Ela poderia tê-lo querido antes, mas não tinha nada a ver com o que sentia por ele agora. Total, abrangente e real.

Não sabia o que a havia feito mudar de ideia também, mas estava feliz que alguma havia feito. Adorava estar com ela. Ela o aliviava. De muitas maneiras, o aliviava. Então que diabo ia fazer sem ela, enquanto caçava Cronus?

Quem levaria para a cama quando a primeira onda de fraqueza o atingisse?

Ah... ninguém. O pensamento de estar com alguém o deixava doente. Tipo vomitar sangue doente. Queria Sienna, e apenas Sienna, e quando se separassem, e iam, porque não podia levá-la com ele para caçar Cronus — muito perigoso para ela, considerando a ambrosia em seu sistema — teria que ter alguém.

Se continuasse nesta linha de pensamento, se partiria.

Talvez ela tenha percebido sua agitação. Torceu os dedos com os dele, levou sua mão à boca, e o beijou onde seu pulso saltava. O mundo voltou ao foco com uma lufada.

—...que você fez com aquele outro cara, o Caído como o chamou? — Ela dizia para Zacharel. —Ele, uh, sobreviveu?

—Ele vive, sim, — disse o anjo, mas não ofereceu mais.

—Ele vai voltar por mim. — Esse tipo de culpa e ódio não desapareceria. Mas pelo tempo que o Caído se curasse, Paris e Sienna já teriam se separado. Ela estaria segura.

—Sim, — disse Zacharel. —Ele o fará.

Um pico de medo acrescentou uma camada de tempero à doçura do perfume de Sienna. Paris traçou seu polegar sobre os nós dos dedos, deleitando-se com a suavidade da sua pele tanto quanto por sua preocupação por ele. —Ele não vai me derrubar.

De repente, uma sombra à sua esquerda cresceu em movimento, correndo para Sienna com a velocidade de uma flecha. A única cor na barra de seis metros de escuridão era o flash de dentes manchados de sangue dentro de sua boca.

Sem perder o ritmo, Paris entrou na frente dela, soltando o agarre de Sienna para agarrar a criatura pelo pescoço. Ficou surpreso pela sensação de solidez da carne e do calor. Ordenou que sua adaga de cristal se tornasse o que fosse necessário para destruir uma sombra viva e esfaqueou, afundando na boca e sentindo os dentes cortando sua pele.

O punhal começou a pulsar com a luz do sol, brilhante o suficiente para fazer os olhos arderem. Houve um grito de dor, um gorgolejo, antes que a massa se contorcendo explodisse em partículas de neblina e se espalhasse na brisa.

—Obrigada, — disse Sienna num sopro de ar. O rosa desceu sobre seu rosto, fazendo com que as sardas gritassem.

—Não agradecemos ao outro por esse tipo de coisa, lembra? — A proteger nunca seria por agradecimento.

Aqueles lábios requintadamente rechonchudos subiram num sorriso radiante, e se viu em suas fantasias pelo resto da eternidade. O desejo por ela ganhou nova vida.

Ela estendeu a mão, talvez planejando passar a ponta do dedo ao longo da linha da sua boca, agora dolorida. Então Zacharel disse: —Que a Divindade possa me salvar de tal absurdo, — e ela deixou cair o braço ao lado dela.

—Não acho que sua divindade terá que se preocupar em salvar você, — retrucou Paris. —Tenho certeza que as fêmeas vão reconhecer o fato que não vale o esforço de um relance.

O anjo pareceu satisfeito com isso.

Polos opostos, Paris pensou, o que ele e o anjo eram. Zacharel nunca havia experimentado uma faísca de excitação, então não tinha ideia do que estava perdendo. Paris tinha pena da pobre garota que finalmente ganhasse sua consideração. Teria que ter bolas de aço. Zach lutaria com ela a cada passo do caminho para o quarto, e provavelmente até mesmo a culparia por sua introdução à paixão.

Agora isso poderia ser divertido de assistir.

Se as circunstâncias fossem diferentes, Paris poderia ter desencadeado o perfume especial de Sexo em cima do anjo. Mais que provavelmente, mesmo Zach cairia na luxuriante luz de velas e lençóis de seda — imagens que sempre consumiam todos os outros, então seu horror divertiria Paris durante os séculos vindouros.

Sienna enrijeceu. Em sintonia a qualquer nuance dela como estava, a atenção de Paris voltou a ela. O rosa voltou para suas bochechas, mas estava muito brilhante, como se estivesse sofrendo com uma febre. Seus olhos cor de esmeralda, agora mais que ouro, estavam presos à frente no castelo que acabava de apontar à vista.

Seu vínculo com a estrutura devia ter crescido, pensou.

Paris passou o braço em torno dela e a puxou mais perto para que pudesse carregá-la, tomando cuidado com suas asas. Ela não protestou. Na verdade, aninhou o rosto contra seu pescoço, quente e macia e dele.

Ele beijou sua têmpora. —Não se preocupe. Não vou deixar você ir.

Um suspiro de alívio e gratidão inconfundível. —Então... quero dizer, que seja.

—Boa menina, — disse ele com um sorriso.

Zacharel franziu a testa. —Ainda com intenção de se separar?

Paris perdeu seu bom humor, e deu ao anjo um olhar de espero-que-morra-dolorosamente. Agora não havia tempo para isso.

—Sim, — Sienna disse num tom tão frio e cortante como o vento esbofeteando Zacharel. Então, contrariando a afirmação dura, esfregou o punho contra o peito como se um ferro quente queimasse lá. —Nós ainda vamos nos separar.

A indignação se ergueu, mas Paris a engoliu de volta. Essa era a maneira que tinha que ser. Sabia disso, havia concordado. Merda, até mesmo foi o único a sugerir isso.

—Isso é bom. — O anjo acenou com aprovação, a ação permitindo que vários flocos de neve grudassem no cetim de seu cabelo.

—Por que se importa? — Paris exigiu. Ainda não havia descoberto a razão para a presença contínua de Zacharel.

Um encolher de ombros de um ombro forte. —Não diria que me importo. Simplesmente sei que vocês dois não conseguirão manter um relacionamento.

Com essa nota de verdade em sua voz, ficou claro que o anjo acreditava piamente no que dizia. —Nosso relacionamento não é da sua conta, então sua opinião não é bem vinda.

—Na verdade, vocês dois são da minha conta.

Paris viu tudo vermelho. Vermelho demônio. Uma reação volátil quando não era necessária, mas estava impotente contra ela. Apenas a pura vontade manteve suas mãos de lado, em vez de martelar na cara de Zacharel. —Por quem?

Asas brancas e douradas se abriram o anjo ao lado num momento, então na frente dele no seguinte. Os pés de Zacharel flutuavam acima do solo, aquelas asas batendo lentamente, mantendo-o firme. Paris precisou de uma parada abrupta para evitar bater nele. Em torno deles, flocos de neve caiam e rodavam apenas para aterrissar e derreter.

No caso das coisas ficarem feias, empurrou Sienna atrás dele. —O que aconteceu com estou demasiado fraco para voar?

—Recuperei minha força.

—Como?

—A resposta não vai mudar o que está prestes a acontecer.

Ele arqueou uma sobrancelha, preparado. —Tem certeza que quer ir por esse caminho?

—Uma parte de você espera mantê-la. Caso contrário, não reagiria tão violentamente à minha observação. — Antes que Paris pudesse responder, acrescentou: — Se lembra quando eu disse que se continuasse em seu caminho atual, perderia tudo que viria a amar?

Ele apertou a mandíbula. Apenas a carícia suave das mãos de Sienna em suas costas o impediu de soltar obscenidades.

—Não menti demônio. Nunca faço. E agora acho que é tempo de provar o quão terrível inimigo posso ser.

Paris piscou. De repente, ele pairou no ar, bem acima da ponte levadiça do castelo, Zacharel o embalando contra um peito duro ganho no campo de batalha. Seu coração batia irregular.

—Como diabo fez isso? — E onde diabo estava Sienna?

—Com poderes que você nem pode começar a imaginar. Mas isto não é o que eu queria te mostrar. — Um dedo de cada vez, o anjo afrouxou o aperto. —Espero que descubra rápido que posso ajudá-lo... ou destruí-lo.

—É melhor não fazer o que acho que vai fazer pedaço sujo de...

Sua âncora desapareceu, e Paris caiu livre nas ripas de madeira em ruínas. Aterrissou nas placas rangentes com uma batida forte e grande perda de oxigênio. Atrás ele pode ouvir as gárgulas urrando gritos de guerra, suas asas balançando, suas garras raspando.

Zacharel fez. Realmente fez. —Filho da puta!

 

—VENHA. VOU ACOMPANHÁ-LA até a saída.

Sienna fitou Zacharel boquiaberta, que acabava de aparecer na frente dela. Paris e o anjo estavam de pé na frente dela, enfrentando um ao outro, prontos para se derrubarem enquanto a testosterona enchia o ar, apenas para desaparecer sem aviso prévio. O anjo havia voltado no segundo seguinte. Sem Paris.

—Onde ele está? — Ela exigiu, embora não estivesse muito preocupada com a resposta. Paris e Zacharel eram amigos, apesar de suas diferenças, e Ira ainda não tinha dado um pio.

—Levei-o para o castelo e ele caiu na ponte.

Tempo de reavaliar. Paris e Zacharel não eram amigos, a qualquer nível. Ira, por outro lado, devia pensar que anjos não podiam fazer nada errado. —Por que faria isso? — Claro Paris seria arrastado para dentro e trancado. Claro, ia escapar, e ficaria bem. Mas nada disso importava para ela naquele momento. Fúria rosa, escura, quente e perigosa.

Acalme-se. Antes que sacasse a lâmina de cristal que Paris havia dado a ela e agisse com extravagância na pele do anjo. Já teve o suficiente de machos abusando de habilidades sobrenaturais.

Zacharel piscou como se a resposta fosse óbvia para todos. —Isso, como chamou, é o que um homem faz ao outro quando estão discutindo.

—Não. Não, não é.

Seus lábios desceram ligeiramente na mínima das carrancas. —Isso foi o que Paris fez com William, O Escuro ainda esta manhã.

Bem, não tinha resposta para isso, tinha?

Zacharel sacudiu as asas, as penas brancas e ouro se erguendo lentamente, elegantemente. Neve brilhava entre elas. Sua raiva não fazia nada para diminuir o impacto de sua beleza, a paisagem escura de alguma forma proporcionando um cenário adequado para ele, escuridão onde havia luz.

Não, não luz, ela pensou. Uma aura de amanhecer irradiando dele, fazendo-o brilhar.

—Bem, — ela solicitou. —Vai me levar até ele?

—Seus olhos..., — ele disse sua carranca aprofundando.

—O que têm eles?

—Posso ver a escuridão de Paris já criando raízes dentro de você.

Ele falou as palavras e de alguma forma sabia que eram verdadeiras, o conhecimento simplesmente se tornando uma parte dela. A escuridão de Paris, aquela que seu demônio deu à luz, estava de fato dentro dela. Uma pequena pontada de preocupação foi rapidamente seguida por um encolher de ombros de despreocupação. Ira vivia dentro dela. O que era mais uma entidade?

—Ignorou minha primeira pergunta tempo suficiente. Agora estou assumindo. Ouça-me, e ouça bem. Quero que me leve de volta ao castelo.

A demanda era imprudente, desnecessária e contraproducente para seu plano “foda-se Cronus”, seguido pelo acondicionamento e etiquetagem de Galen, bem como a busca por sua irmã, mas isso não iria impedi-la. Paris lutaria para alcançá-la, esse lado protetor seu exigindo que ele testemunhasse sua fuga do reino, ela sabia disso agora. Se isso acontecesse, ele seria prejudicado.

—Pretendia partir em minha companhia em dois dias, — disse ele, inabalável. —Apenas acelerei as coisas.

Ela estava ansiosa por esses dois dias com Paris, queria fazer amor com ele novamente e novamente e marcá-lo dentro de sua mente, seu corpo, até que cada célula sua cheirasse a ele.

—Fica nos lembrando que não podemos ficar juntos. — A suspeita dançou em seus pensamentos quando cruzou os braços sobre o peito. —Por que isso?

—Porque precisa muito lembrar. — Simplesmente, como se ela devesse ter vergonha de perguntar.

—Por quê? — Ela insistiu.

—Por que iria querer ficar com ele? —A cabeça escura de Zacharel inclinou para o lado, seu estudo se intensificando. —Você o ama?

Será que se admitisse isso faria sua ruptura doer muito mais? —Gosto dele. — Muito. Muito, realmente, realmente muito. E o respeitava. Admirava. Ansiava por ele como uma droga. Ele era inteligente e gentil e protetor e leal, e mesmo que tivesse todas as razões para desprezá-la, não o havia feito nenhuma vez a havia tratado como se fosse o inimigo.

—Precisamos de você nos céus, Sienna.

Eram eles, agora? —Bem, entre na fila. Ultimamente, todo mundo precisa de mim. — E ninguém podia explicar a razão. Ela fechou as mãos e as apoiou em seus quadris. —O que acha que posso fazer por você? Porque agora, estou tendo dificuldade para cuidar de mim mesma.

—Tudo que sei é que vai anunciar nossa vitória na guerra mais horrível que este mundo já viu.

Esqueça pulverizar. Ela ficou boquiaberta. Ela, responsável por vencer uma guerra. Sem pressão, porém, certo? Então não podia lidar com isso agora.

Zacharel endureceu, olhou sobre o ombro forte. —Cronus está vindo, — disse ele. —Ele tem as respostas que procura, embora não confiaria nele se fosse você.

Câimbras no estômago. Cronus não, não agora, e não fora do castelo. Ele ia enlouquecer. Embora, mantê-lo fora do castelo seria mantê-lo longe de Paris, então... —Cai fora, menino anjo.

Com isso, ele torceu uma sobrancelha. —Vou permitir que saia com ele. Não acho que vá me agradecer depois, no entanto. Até que nos encontremos de novo garota demônio.

Ele se foi no momento seguinte, e como sabe, Cronus apareceu um momento depois. Não mais vestido como um gótico rejeitado do inferno, agora usava um terno de seda cinza feito sob medida para seu corpo, todas as linhas elegantes e conta bancária transbordando.

Ira parou e começou a rondar batendo em seu crânio, querendo muito ir por ele, mas não conseguindo descobrir o por que. O que ele não fez foi preencher sua mente com imagens dos pecados do rei. Estranho.

Cronus olhou para a esquerda, direita, e franziu a testa. —Por que está fora do castelo? Ainda nesse assunto, como conseguiu saiu do castelo?

—Ira assumiu, — disse ela, para que não decifrasse que havia sido ajudada por outros imortais.

—Ah. — Sorrindo, revelando seus deslumbrantes dentes brancos e brilhantes, estendeu uma rosa vermelha em sua direção. —Para você.

—Eu, uh... — Não apenas atordoada, mas completamente desconcertada, aceitou a flor orvalhada. —Obrigada.

Ele inclinou a cabeça ligeiramente quando aceitou seu agradecimento. —E esse não é o único presente que trago. Tenho o que precisa. — Um frasco claro cheio de brilho líquido violeta seguiram o mesmo caminho da rosa. —Minhas desculpas pelo atraso em sua entrega.

Suas desculpas? Sério? —Não se preocupe com isso? — Uma pergunta, quando deveria ser um comunicado.

Cronus limpou a garganta, claramente desconfortável. —Beba.

Porque não tinha vontade de confessar que já havia sido alimentada, tomou um pequeno gole do que agora sabia que era ambrosia. O que não sabia era por que precisava da ambrosia, ou por que Paris parecia doente quando havia entregado a ela aquele frasco.

Coco fresco fluiu por sua garganta, criando asas e voando através de seu corpo inteiro. E uau, era um soco poderoso. Tanto força como fraqueza brilharam através dela, se canibalizando mutuamente e deixando-a num nevoeiro.

—Que boa escrava, — ele murmurou.

Amo ser apadrinhada, realmente amo. —Por que está sendo tão bom para mim? — Perguntou ela, balançando enquanto devolvia o frasco para ele.

Acenou com a mão e o vidro desapareceu. —Preciso te mostrar uma coisa, — disse ele, e com outro aceno de mão, seus arredores mudaram. Do quente ao frio, da escuridão para a luz.

Da salvação para a condenação.

 

DE REPENTE SIENNA ESTAVA DENTRO de uma câmara familiar com paredes brancas que se estendiam tão altas que mal conseguia discernir o teto abobadado acima. Retratos penduravam em toda parte. Não havia móveis, apenas colunas de mármore que impulsionavam a corrente ocasional de hera e destacavam esculturas e outros artefatos artesanais.

Para se impedir de gritar pela calamidade mental da mudança de posição, ela mordeu sua língua até sentir o gosto de sangue.

—Isto, — disse Cronus, abrindo seus braços e, lentamente, girando, — é a Câmara do Futuro. — Havia uma qualidade reverente em sua voz, que nunca havia ouvido antes nele. —Aqui, o destino toma forma e infinitas possibilidades aguardam, pois é onde meu Olho-Que-Tudo-Vê registra suas visões.

—Olho-Que-Tudo-Vê? — Ela ainda estava tão desorientada que era quase impossível juntar as palavras.

—Uma mulher que vê o céu e o inferno, tempo e espaço, presente, passado e futuro. — Cada sílaba carregava uma nova camada de urgência. —Quando alguém morre, outro toma seu lugar. Ao longo dos séculos, muitos têm me servido. Não há limites para quão atrás ou quão na frente estas mulheres podem ver. Não há limites para o alto ou abaixo no seu âmbito.

Ter tal poder seria uma bênção e uma maldição, ela pensou.

—Tudo que vê aqui foi criado por meus Olhos.

Sienna enfiou a rosa atrás da orelha, esquecendo seu humor estranho quando tropeçou seu caminho para o próximo retrato. Nele, uma versão mais antiga, mais frágil de Cronus olhava para ela. Tinha cabelos grisalhos, pele enrugada, e usava uma longa túnica branca. Este era o deus que havia conhecido. Só que estava sujo machucado e preso numa gaiola.

—Descobri que todo mundo tem vários futuros diferentes, e as escolhas que fazem, em última análise, decidem qual o caminho que vão viajar. Venha, — acrescentou sem fôlego, levando-a pelo antebraço e conduzindo-a através da longa, e aparentemente interminável expansão da sala. —Há algo que deve ver.

A cada passo que dava, os retratos se reorganizavam, deslizando sobre a parede, mudando de lugar com graça fluida. Não tentou se afastar dele. A tontura a escravizava, e precisava da âncora de sua mão para mantê-la ereta.

—Estes Olhos, nem sempre entendem o que veem, porque não podem determinar o contexto das ações que registram. Não sabem se veem o passado ou futuro, como impedir alguma coisa ou como fazer isso acontecer.

—E então tem que adivinhar, — ela terminou com ele.

—Correto. — Ele parou, assim como o movimento dos retratos.

No quadro agora na sua frente, guerreiros lutavam até a morte em todas as direções. Não apenas guerreiros, mas rostos familiares. Estavam Galen, suas asas brancas estendidas, sua espada longa e sangrenta erguida. Diante dele estava Cronus, com uma linha fina de sangue conectada de uma orelha a outra, a cabeça prestes a deslizar de seu pescoço.

O batimento cardíaco de Sienna acelerou quando viu o resto. Paris estava ao lado, observando o que acontecia com Cronus com olhos arregalados e chocados. Sangue endurecia nele. Sua boca estava aberta, como se estivesse gritando alguma coisa.

—Este é um dos futuros que me esperam, — disse o rei. —Há muito tempo atrás, meu primeiro Olho me avisou que um guerreiro branco com asas um dia me mataria. Achava que seria um anjo, só depois percebi que havia outros guerreiros, como os Senhores do Submundo, que eram igualmente capazes de fazê-lo. E então meu novo Olho pintou isso.

—Por que não mata todos os Senhores, então? — Sienna perguntou. Sabia que já tinha considerado esse caminho. Um ser como ele não seria capaz de evitar. —Apenas para estar seguro.

Ele moveu-se dois passos adiante. Mais uma vez as imagens dançaram em novos locais. —A razão está aqui. — Ele parou, assim como as pinturas. —Olhe.

Com o cenho franzido, Sienna obedeceu. Neste, um Cronus jovem estava sentado num trono de ouro maciço, os Senhores do Submundo perfilados atrás dele, expressões e posturas reverentes e determinadas. Estavam claramente o protegendo, o guardando com suas próprias vidas. Queria muito se aproximar e traçar com as pontas dos dedos os lábios de Paris. Como era lindo. Tão forte.

—Este é meu real futuro, — Cronus disse. —Ou melhor, a possibilidade que devo assegurar que venha a acontecer.

—Como?

—A resposta está nos dois guerreiros faltando no exército.

Ela engoliu em seco, estudou cada face. —Galen está faltando. E... mais ninguém.

—Vê o guardião de Ira?

—Claro. Aeron está cert...

—Não falo de Aeron. Ele não é mais guardião do demônio.

—Eu? — Ela guinchou.

—Sim. Você é a chave deste futuro, Sienna.

Descrença a atravessou. —Não entendo. — O anjo disse que receberia suas respostas e que não devia confiar no que ouvisse. Parecia que uma eternidade havia se passado desde que havia emitido o aviso. Não tinha certeza em que acreditar o que descartar. —Como sou a chave?

—Olhe atentamente na parte inferior.

Ela se inclinou, olhando a borda inferior do retrato. Cercado por uma multidão de curiosos estava uma mulher. Seu perfil era Sienna, sua pele sardenta, nariz, bochechas e queixo. Seus olhos arregalaram. Dela. Essas características eram dela. O cabelo da mulher era castanho e ondulado, como o dela, e asas negras se estendiam do seu manto. Estava ao lado de um homem ajoelhado com os braços envolvidos em torno de suas pernas, segurando-se como se ela fosse preciosa para ele.

Galen, Sienna percebeu. Não estava faltando na pintura afinal.

—Todos esses séculos atrás, quando meu Olho falou da minha morte, também me disse que havia uma maneira de me salvar... ou, para ser preciso, uma mulher que poderia me ajudar a fazê-lo. Procurei pela mulher em cada esquina. Ela nunca apareceu, e me desesperei.

O que vinha a seguir ia doer, Sienna pensou, se endireitando. Não precisava ser um gênio para descobrir isso.

—Eras passaram, e fiquei preso quando os inúteis gregos conspiraram com minha esposa, a quem mais tarde eles traíram. Sabia que escaparia, pois isso, também foi anunciado, embora os gregos fossem muito tolos para acreditar. Quando finalmente recuperei meu lugar de direito no trono celestial, procurei os Senhores, pensando em destruí-los antes que pudessem me destruir.

Fez uma pausa e suspirou. —Mas voltando recentemente ao poder como voltei, não gostava da ideia de matar os Senhores e liberar seus demônios, pois assim, teria mais inimigos batendo à minha porta. Mais que isso, gostei da ideia de controlar os guerreiros de Zeus, usar os seres que criou como meus próprios meninos de recados pessoais enquanto procurava qual deles tinha o poder de me matar.

—E oh, essa decisão valeu a pena. Tenho mantido um olho próximo em suas idas e vindas e, na verdade, os Senhores têm se mostrado surpreendentemente úteis para mim. É por isso que sei que o futuro que está vendo nesta pintura, comigo reinando em harmonia com esses guerreiros como meu exército fiel já está acontecendo.

—Mas ainda há a questão da minha previsível execução — e minha salvadora prevista. Só quando perdi a esperança, você finalmente apareceu, uma mulher que não pertencia a nenhum dos lados da guerra e que também pertencia a ambos os lados. Uma mulher que havia prometido sua fidelidade a Galen, mas cujo interesse inequivocamente foi capturado por Paris. Uma mulher que tinha o poder de, mesmo na morte, influenciar cada pensamento e ação do guerreiro.

Ela só conseguia balançar a cabeça.

—Oh, sim. Ele pensou em você, só você, e foi isso que chamou minha atenção. Nunca notei uma alma humana, mas tinha que saber por que ele ansiava tanto pela sua. Foi quando descobri que você era o que o Olho previu. Se parece com a mulher na pintura, e tem o mesmo passado que a mulher que me disseram que me salvaria. Ambas as revelações só podem significar uma coisa. Será a minha salvação.

—Não me importo com sua salvação, — ela sussurrou.

—Eu sei. Mas se preocupa com Paris, e se Galen morre, ele também. —Ele acenou com a mão e outro retrato apareceu. Neste, Galen, Paris e alguns poucos outros Senhores estavam em pedaços no chão encharcado de sangue. Seu coração afundou à vista.

—E assim estamos de volta ao seu papel — como minha salvadora, de Paris — e no final não fará diferença, todos os caminhos levarão a Galen. Deveria me agradecer, — ele continuou. —Te dei Ira. Fiz-te forte o suficiente para sobreviver a qualquer coisa que o guardião da Esperança escolha para você. — Seu olhar a perfurou, um negro rodopiando que aumentou a intensidade da sua tontura. —Galen adora o poder, e deve ser sua companheira.

—Não. — Um suspiro, um apelo.

Impiedoso, ele continuou. —Por causa de seu demônio, vai saber quem mente para ele, quem é amigo dele e quem realmente o odeia, e vai detê-los antes que sejam capazes de prejudicá-lo.

Primeiro dormir com ele, e agora protegê-lo? —Não! Eu o odeio.

—Não disse que tinha que amá-lo para cumprir sua tarefa. Simplesmente pense na alternativa se não o fizer. Paris morre.

Não. Não, não, não. —O que aconteceu com descubra os segredos de Galen e o traia? — Fúria despertava para a vida. —O que aconteceu com encontrar minha irmã? E por que quer que eu pare de prejudicá-lo se é o homem destinado a matá-lo?

Vermelho brilhou dentro do preto dos seus olhos, piscinas escarlates de sua própria fúria. —Digamos que tenho meus motivos, e meus planos. Então, ouça e ouça bem. Não são apenas uns poucos futuros possíveis para mim e, sim, para o mundo. O primeiro, eu reinar por toda a eternidade. O segundo, eu morto, o que significa que minha mulher está morta. Se nós dois formos perdidos, o caos se tornará rei e os Senhores vão morrer. —Ele girou o dedo e os retratos começaram sua dança de novo.

Um novo quadro parou ao lado dela e o olhou, a boca secando. Anjos, tantos anjos, lágrimas de sangue caindo das asas brancas e douradas. Homens e mulheres vestindo togas lutando com cada guerreiro angelical de forma selvagem.

E lá no chão aos seus pés estavam os Senhores, sangrentos, quebrados... sem vida. Ela queria chorar, desmaiar.

—Para responder sua outra pergunta, — Cronus continuou, —gostaria de saber os segredos de Galen. Desejo que o traia. Para que isso ocorra, preciso que o proteja, também. Como disse, tenho meus motivos e meus planos, e por direito deveria puni-la por se atrever a questionar sua lógica.

Tudo que ela conseguia pensar era na morte de Paris. Paris, morrendo. Paris, morto. Paris, desaparecido para sempre.

Cronus acrescentou: — Antes que pense que minha esposa infiel teve a ideia certa quando conspirou para me trancar, antes que pense em pôr em prática qualquer plano que resultaria em encontrar um caminho para minha mulher reinar sozinha — sua voz era baixa, dura, — saiba que se Rhea ditar as regras, o assassino de sua irmã irá controlar o destino de seu mundo.

Sua cabeça girou ainda mais pela descrença, fúria e medo. Cronus acabava de dizer... acabava de alegar... —Mas me disse que ela estava viva, — Sienna resmungou.

—Ela estava.

Estava.  — Não “está”.  Estava. —E agora? — Outro coaxar.

Ira escolheu aquele momento para golpear, e desta vez, rosnou. Algo está errado. Não gosto disso.

Sua voz a sacudiu. Havia falado com ela antes, é claro, mas geralmente se limitava a palavras como punir, matar, céu e inferno.

Ele está mentindo? Como Zacharel sugeriu. Por favor, me diga que está mentindo.

Não sei. Não sei de nada agora.

Um gemido escorregou dela.

—Fiz minha pesquisa. Skye se tornou uma Caçadora, — Cronus disse. —Talvez pela mesma razão que você — para corrigir o erro de seu sequestro. Poderia tê-la conhecido, falado com ela, e nunca tê-la reconhecido, porque era uma criança quando a viu pela última vez. Nem ela reconheceria você. Ela finalmente saiu, mas estava casada com um Caçador. Estava tentando tirá-lo, também. Ela... morreu com ele.

—Não. — Isso era demais para digerir. Não podia processar tudo.

—E quando Rhea descobriu que você, minha salvadora alada, procurava a menina, ela a pegou... — Seu olhar deslizou para longe. —Rhea tinha que matá-la.

Ira lançou outro rosnado. Algo está errado.

—Está mentindo. Tem que estar mentindo. — Os joelhos de Sienna tremiam e mal conseguia manter-se ereta. Que pudesse ter estado tão perto de Skye e nem perceber que... que agora nunca teria outra chance... —Prove. Prove que está... que está... que se foi. —Um pedaço de luto congelado em sua garganta. Seus olhos ardiam, lágrimas borbulhando atrás.

—Muito bem.

O ar na frente dela brilhou, cristalizou, e então, como se olhasse através de um olho mágico, viu um quarto, uma garota de cabelos negros esparramados no chão, a garganta cortada, seu corpo descansando ao lado de um homem que claramente havia conhecido um destino semelhante. Um lago de carmesim se juntava em torno deles, espesso e preto nas bordas.

Sienna lutou contra sua instintiva repulsa — A forçariam suportar quantas imagens horríveis de pessoas que se importava neste dia? — e obrigou-se a pensar novamente. Por suas lembranças, não havia interagido com esta garota durante seu tempo com os Caçadores, mas, havia centenas, se não milhares de compostos Caçadores e células, e nunca havia tido acesso ao banco de dados dos membros.

—Essa não é ela, — disse com um tremor violento de sua cabeça. —Minha Skye tinha cabelos loiros.

—Assim como esta garota. Sabe que o preto não é sua cor natural. Os cílios provam isso.

Sienna olhou mais de perto. Longos cílios marrons enquadravam embotados olhos castanhos.

 Enna, quando crescer e se casar, ainda vai me amar? Cílios marrons que vibravam inocentemente enquanto Skye aguardava sua resposta.

Sempre vou te amar mais que tudo e todos.

—Não. — Os lábios macios e rosa, e tão grandes como os de Sienna. A estrutura óssea delicada, um queixo teimoso. —Não. — Ácido criava uma toxina de raiva e tristeza em seu estômago.

—Sim. Quando eu... a encontrei assim, percorri sua mente, suas memórias. Esta é sua Skye.

—Não!

Sua irmã... deitada no chão. Arruinada. Morta. Morta para sempre, como Paris estaria. Não mais uma menininha, mas uma mulher. Se foi... para sempre... As palavras ecoaram em sua mente, horríveis, chocantes e revoltantes. Longe...

É realmente ela? Ela perguntou a Ira.

Sim. Posso ver sua vida, e você nela, mas não posso ver sua morte. Por que não consigo ver sua morte?

Sienna bloqueou na afirmação, nada mais se registrando. Skye estava... estava... morta. Morta. Sua preciosa Skye estava morta. —Traga-a de volta. — Ela se empurrou através do ar cintilante e agarrou as lapelas de Cronus, o sacudindo. —Traga-a de volta da mesma maneira que me trouxe de volta.

—Nem sempre é tão simples, mesmo para mim. — Culpa, tanta culpa em seu tom, toda sobre seus traços, irradiando dele.

Errado, tão errado.

Chega com a tagarelice! —É o rei auto proclamado dos deuses. — Ela balançou Cronus mais forte. —Governante dos Titãs. Carcereiro dos gregos. Líder dos Senhores do Submundo. O que é uma pequena alma em relação a tudo isso? Traga. Ela. De. Volta.

—Há leis de vida e morte que mesmo eu devo obedecer.

—Sua alma.

—Não é mais resgatável.

—Não acredito em você.

—Isso não muda as circunstâncias.

—Bastardo! — Sua palma disparou contra sua própria vontade, atingindo seu rosto tão forte que não ficaria surpresa ao descobrir que desfez sua pele. —Mentiu para mim. Disse que era prisioneira de Galen.

Quando ele não retaliou, ou a bloqueou para novos golpes, ela atacou novamente.

—Você mentiu!

—Para garantir que me obedecesse e mantivesse Galen sob controle, fiz o que senti que precisava fazer, — ele finalmente admitiu. —Sabia que não iria matá-lo se achasse que só ele sabia onde estava sua irmã. E como disse, tenho minhas razões para querer que seja protegido por agora. Mas não, Galen nunca a aprisionou. Ela nunca teve um filho com ele.

Outra bofetada, um presente tão duro que ela pensou ter fraturado os próprios ossos. Ainda assim, ele aceitou o abuso sem comentário. —A morte dela poderia ser outra de suas mentiras. Qualquer coisa para me manter presa, certo?

Errado, tão errado, mas ela está morta. Ela está morta.

Um piscar então Sienna estava de pé no quarto que Cronus havia mostrado. O corpo da mulher imóvel aos seus pés. Podia sentir o cheiro acobreado de sangue e morte. E aqui, nesta câmara de fatalidade, não faltava à semelhança com sua mãe.

Mãe delas.

Ira lançou outro rosnado, outro e outro, algo "errado" continuando a incitá-lo. Mas não sabia qual era o problema, e Sienna não tinha força para raciocinar as coisas com ele. Luto a atingiu duro, roubando o fôlego de seus pulmões. Respiração que não podia recuperar, não importava o quanto tentasse. A névoa adensava em sua mente. Navalhas mergulhadas em chamas arrasaram seu peito, queimando-a.

Os arredores desbotaram quando ela entrou e apertou a menina no peito, segurando-a perto, deixando seu coração bater por ambas. As lágrimas finalmente deslizaram em cascata, caindo, caindo, um rio interminável de dor.

—Você voltará para o castelo, — Cronus disse, a voz suave como se estivesse falando com um bebê, — e vou te dar tempo para chegar a um acordo com o que aconteceu. Suas memórias não vão mais persegui-la, e será capaz de deixar o reino, caso queira isso. Nisto, tem minha palavra. Mas vou voltar por você, Sienna, onde quer que esteja, e vou esperar que ajude minha causa. E agora... agora que já viu o que minha esposa, governante de Galen, é capaz, acho que vai querer, sim?

 

OS SENHORES DO SUBMUNDO estavam aqui, na ilha, em Roma, e chegando ao Templo dos Tácitos naquele exato momento.

Teriam que ter um plano de ataque, Galen pensou. O mais provável: todos, exceto um guerreiro, o cercaria, permanecendo escondido nas sombras, e este se aproximaria dele para falar. A menos, claro, que todos pensassem ​​em se esconder, atirando flechas e balas agora, e deixando as perguntas para mais tarde.

Não importava de qualquer maneira. Os guerreiros deviam saber que estavam entrando numa armadilha. Que Galen não marcaria o encontro aqui se não pudesse usar os Tácitos em seu benefício.

Uma vez que os Senhores atingissem o limiar do templo, os Tácitos poderiam pegá-los, tomá-los aqui em seu santuário, como um só, bem na frente de Galen, e trancá-los no local com correntes invisíveis, permitindo-lhe fazer o que tinha que fazer.

No entanto, Galen não queria ir por esse caminho. Era muito demorado, com um risco muito grande. Não à sua vida, mas as deles. Se matasse um dos Senhores, ninguém jamais completaria a operação que ele havia exigido. Tudo que queria agora era Legion.

Suas mãos apertaram. Se os guerreiros houvessem falhado em trazê-la, honraria sua palavra pela primeira vez na sua vida. Como havia dito a Lucien, tomaria mais um ente querido dos Senhores, e outro e outro — até que quebrassem. Não mataria, mas machucaria.

Cada dia a necessidade de Galen por Legion piorava. Esperança havia construído sonhos de tê-la, castigá-la, domá-la... de possuí-la. Ciúme jogava combustível num fogo já latente de ressentimento quando perguntava onde ela estava e o que estava fazendo.

Um ruído atrás dele o deixou tenso.

Girou ao redor. Entre os grossos pilares brancos estavam todos os cinco Tácitos. O peludo com uma cabeça cheia de cobras sibilantes no lugar de cabelo. O com cicatrizes, com mais músculos que três lutadores de boxe juntos. A fêmea, com o rosto de um pássaro feio e chifres revestindo o comprimento de sua coluna vertebral. Por último os dois mais altos — um com sombras escorrendo de seu cabelo curto na frente e longo atrás, e o outro com lâminas que gotejavam veneno, cravadas na coroa de sua cabeça.

Cada criatura estava presa por correntes que não podiam quebrar. Mas os laços tênues importavam apenas enquanto Cronus vivesse. No momento que o chutasse, estes seres estariam soltos sobre um mundo desprevenido. Ninguém, nem mesmo Galen, seria capaz de conter a destruição, sem dúvida, desmedida.

Num altar na frente deles estava Ashlyn, pálida e ofegante, suando, como um antigo sacrifício virginal. Mas esta virgem estava grávida e prestes a dar à luz. O susto que ele deu a ela a fez entrar em trabalho de parto.

Curiosamente, Galen não gostava que ela estivesse com dor. Ela não era má, e ferir o sexo frágil nunca havia sido particularmente o favorito dele. Faria isso, havia feito isso — faria qualquer coisa — mas nunca gostava.

—Corte os bebês da sua barriga, a fêmea-demônio ordenara. —Gostaria de tê-los para mim mesma.

Bebês? Havia mais de um?

—Eles devem morrer, — o homem de cicatrizes acrescentou.

—Não. Vamos usá-los como troca, — uma das montanhas de músculos, disse.

Ashlyn gemia de dor, em súplica, seu olhar vítreo implorando enquanto olhava para Galen. —Por favor. Não faça isso.

Implorando ao inimigo. Para isso, devia amar os bebês com todo seu coração, mesmo que ainda não os conhecesse. Imaginava compreender isso. Aproximadamente vinte e nove anos atrás, inadvertidamente havia tido uma filha, e não havia sabido de sua existência até que estivesse totalmente crescida. Saber que era do seu sangue foi todo o necessário para ele... não amá-la, não achava que já haver experimentado esta emoção, mas sentir uma espécie de parentesco com ela, apesar do fato de que era tão diferente dele como ele era dos Senhores.

Sua Gwendolyn. A Harpia. Uma mulher que ele não tinha coragem de ferir. Uma mulher que o cortaria, sem um momento de hesitação. Gostava disso sobre ela, sentia orgulho de sua crueldade.

Galen havia feito coisas terríveis ao longo de sua vida. Traído seus amigos, matado pelo poder, arrasado cidades, propositadamente viciando seu próprio povo às drogas para que precisassem dele, o seguissem. Ele havia destruído suas famílias quando se atreveram a desobedecer ou mesmo quando pensaram em traí-lo. Havia dormido com fêmeas que não deveria ter tido, de forma que não deveria ter feito.

Não havia linha que não houvesse cruzado. Nenhuma linha que não passaria. Fez tudo isso e faria mil vezes pior, mas nunca havia se preocupado com as consequências. Ainda não. Ao contrário dos guerreiros com quem havia sido criado não veio com senso de honra, um vínculo de fraternidade ou necessidade de ajudar ninguém, exceto a si mesmo.

Baden, o primeiro a ser criado, havia conseguido a maior parte da bondade e o resto um mero gotejamento. Galen, o último a ser criado, havia conseguido o que restou — nada, apenas frio e escuridão.

Talvez fosse por isso que houvesse ido atrás de Baden primeiro.

Nenhum dos Senhores sabia que ele havia falado com Baden antes de enviar sua isca para atrair o homem à morte. Um encontro privado que o próprio Baden havia arranjado. Nenhum deles sabia que Galen havia prometido abandonar o exército imortal em paz, deter a guerra, se Baden se sacrificasse.

Possuído pelo demônio da Desconfiança, Baden não havia acreditado no voto de Galen, mas havia feito o negócio de qualquer maneira, apenas no caso de acontecer. Galen sabia que era porque culpava o demônio por seu instinto de desconfiança, e esperava pelo melhor — por causa do demônio de Galen.

A isca — Haidee, uma das guardiãs do Ódio — foi pelo guerreiro, sem saber que a vítima sabia onde ela o levaria. Baden não queria que seus amigos soubessem que de bom grado havia se apressado à sua sepultura. Não queria que testemunhassem o evento também, mas é claro que o haviam seguido. Não havia tido como parar a guerra depois disso, mesmo que Galen houvesse querido. O que, naturalmente, não havia.

—Gaaaaaleeeen. — O baixo, triste gemido ecoou enquanto Ashlyn se contorcia em cima da pedra. Seu rosto estava vermelho, inchado, sua respiração vindo em baforadas curtas.

—Não me peça ajuda, fêmea. — A próxima meia hora seguinte era crítica, e não podia permitir que ela o distraísse. —Disse ao seu homem o que ele devia fazer para salvá-la.

—Por favor. Por favoooor.

Uma pontada no peito. Se dissesse que a única maneira de garantir que entregaria os bebês ao seu pai era se rastejasse até ele, encontraria força para fazê-lo. Até beijaria e lamberia suas botas. Ela faria qualquer coisa e tudo que pedisse, não importa o quão vil.

Oh, sim, ela amava seus filhos. Eram carne da sua carne, sangue do seu sangue, e a amariam em troca.

Nada nem ninguém jamais haviam pertencido a ele e só a ele — com exceção de Legion. Não que ela fosse fazer qualquer coisa necessária para salvá-lo, nem que ele faria qualquer coisa necessária para salvá-la. Mas... Sim, sempre havia um, porém com ele. Ele havia sido primeiro amante — e queria ser o último.

Não tinha certeza do que havia acontecido com ela durante sua estadia forçada no inferno. Não sabia o que havia recebido, e o que não tinha. Mas já não havia sido apenas dele, pelo que sabia. Outra coisa para puni-la — punir todos eles.

—Os pequeninos, — a mulher Tácita disse outra vez. Era anseio... que detectava em sua voz? Será que realmente ansiava por uma chance de maternidade? —Dê. Para. Mim.

Os machos se viraram contra ela, franzindo a testa, soltando palavrões, discutindo sobre o que devia ser feito contra desejos tolos. O que quer que aconteça com a mãe, Galen decidiu naquele momento, não permitiria que os Tácitos tivessem ou machucassem as crianças.

Finalmente, um ato digno de sua parte. Uma bondade, sem dolo ou egoísmo. Que nunca digam que era de todo ruim, o tempo todo.

—G-Galen. Estou a-aqui, conforme solicitado.

Cada músculo em seu corpo ficou tenso, disparando imediatamente seu sangue, borbulhando através dele. Uma alucinação? Cheirou, sentindo terra, uma ponta de fogo do inferno e o mais sutil traço de sal marinho. Não era alucinação.

Legion estava aqui.

A riqueza e a variedade de emoções que sentiu quase o oprimindo quando girou para olhar para ela. E lá estava a poucos metros de distância. Ela estava na beira da área do templo, as árvores se estendendo atrás dela. Estava linda, embora não exatamente como se lembrava. Alta, seios grandes, com longo cabelo claro e olhos castanho suaves. Seus lábios estavam rachados, como se os tivesse mordido, e havia perdido muito peso porque sua camiseta e calça de moletom pareciam um saco sobre ela.

Os Senhores não haviam tomado o devido cuidado com ela. Por isso, sofreriam mais do que havia planejado originalmente. Ela seria punida, sim, mas pela sua mão e apenas sua mão. A raiva se tornando o principal dentro dele.

—Está armada? — Ele perguntou, sem esperar a verdade.

—Eu... — Sua mão escorregou para a garganta, e seu olhar deslizou por ele, se arregalando. —Ashlyn. — Ela correu em frente, apenas para ser sacudida para trás quando ele entrou em seu caminho, seu desespero para evitá-lo palpável.

—Vai ficar onde está.

—D-d-deixe-a i-ir. — O gaguejar dizia mais que suas palavras. Tinha medo dele. —Disse q-que o faria.

—Legion, váaaaa! — Ashlyn gritou, falando através de uma contração. —Diga a Maddox...

—Silêncio! — Galen rosnou. Não aceitaria interferência neste assunto.

Legion agarrou seu estômago, sua pele assumindo um tom esverdeado. Seu queixo tremia.

Este medo dela raspava seus nervos. Antes, havia sido corajosa e cheia do fogo no qual havia sido criada.

—Os guerreiros estão quase em cima de nós, — um dos Tácitos disse. —Vamos levá-los daqui no momento que pudermos. Agora, deixe as fêmeas aos nossos cuidados, de modo que possa lutar sem nenhuma distração.

Que havia sido plano deles, e um que ele havia fingido concordar. Então e agora, o pensamento de permitir que qualquer pessoa tocasse sua mulher irritava. E quando percebeu a reação de Legion com a ideia — um frio de horror nos olhos vítreos com lágrimas não derramadas — estava decidido.

—Volte, — disse a ela. —Fique nos escombros à beira das árvores. E se ao menos pensar se desmaterializar para longe ou correr, vou machucar a humana.

As lágrimas finalmente caíram, mas ela fez como ordenado. Ele odiava o aumento da distância entre eles, e culpava os Tácitos.

—O que está fazendo? — Um rosnou.

—Dê-a para nós, — gritou outro.

Tinham apenas uma fraqueza que conhecia. Não podiam pegar o que queriam, tinha que ser dado a eles. Normalmente usavam truques para driblar o livre-arbítrio, como haviam feito para conseguir a capa de invisibilidade de Strider. Quando os truques falhavam, recorriam a assustar suas vítimas em sua apresentação.

Iam aprender. Galen não temia nada.

—Não se mova a partir desse ponto, não importa o que aconteça, — disse à Legion, olhando para ela até que acenou para reconhecer que o havia ouvido falar.

Então ela engoliu em seco, levantou o queixo. —Mas só se... só se der Ashlyn e os bebês de volta para Maddox. Vivos.

Claro, os Tácitos reagiram primeiro.

—Não!

—Nunca!

—Ela vai te deixar no momento que obedecer!

—Não seja idiota!

Legion olhou atrás. O tom esverdeado voltou para sua pele, e caramba, se não parecia pronta para gritar.

—Olhos em mim, — ele arrebentou e ela imediatamente se submeteu. Esses lindos olhos. Ricos, escuros e sem limites, mesmo com sua cascata de lágrimas. —Não olhe para longe de mim.

Um tremor em resposta.

Ele voltou até que ficou ao lado de Ashlyn, em seguida, torceu e dobrou, deslizando os braços abaixo dela, a pegando. Estava pesada, seus músculos um nó de tensão. Legion manteve a ligação entre eles.

Os Tácitos exigiram saber o que pensava que estava fazendo. Ele os ignorou, levando a menina para o lado de Legion.

—Nós te demos a capa, Esperança. Nos deve as fêmeas.

Tinham a intenção de trocar os humanos pela dívida, então? Ele riu com um pouco de humor. Provavelmente. Algo que ele faria, também, assim não podia culpá-los.

Espere. Sim, decidiu. Ele podia.

—Se nos trair agora, vamos caçá-lo. Vamos destruí-lo da maneira antiga. — A fêmea soltou uma risada cacarejante. —Tem alguma ideia do horror que isso implica?

Ele a ignorou, dizendo para Legion, — Prometa aqui e agora que não vai tentar fugir de mim, que vai comigo de boa vontade e fará tudo que eu disser, quando eu disser para fazer isso. Um voto de sangue. — Aquele que não seria capaz de quebrar, mesmo se quisesse.

Para os imortais, o sangue mantendo votos tornava-se uma compulsão.

Outro tremor a sacudiu. Aqueles olhos líquidos com seus espetados cílios vaguearam sobre ele, fazendo com que seu pau crescesse e endurecesse. A teria. Hoje à noite. —Eu v-vou, mas só se prometer devolver Ashlyn e os bebês para Maddox, sem machucá-la. Ou a eles. Hoje. E, sem lutar contra os Senhores.

A menina aprendeu a negociar, cobrindo todas as bases. Uma complicação, mas não qualquer coisa que pudesse ficar em seu caminho.

Galen colocou a fêmea grávida, ainda ofegante, no chão tão suavemente como foi capaz. Estava com muita dor para perceber ou falar. Quando se endireitou, tirou uma de suas adagas.

Legion se encolheu.

Esse medo teria que ser tratado. Queria seu foguetinho de volta. O que o havia seduzido no bar, fodido com ele no banheiro. Mordido e envenenado antes que pudesse terminar.

Falando nisso, ela lhe devia um orgasmo. E pelas muitas semanas que haviam se passado, agora lhe devia mais de um. Juros eram uma merda. Mas, primeiro, garantir sua cooperação. —Em troca do que pedi para prometer, me comprometo com você aqui e agora, neste dia, que devolverei a fêmea Ashlyn e sua prole para seu macho Maddox, e não vou machucar nenhum deles. Não vou lutar com seus amigos, apenas entregá-la e os bebês, incólumes pela minha mão ou qualquer outra, e seguir meu caminho. — Ele apertou a ponta da lâmina na palma da mão e cortou tão profundamente que atingiu o osso.

O sangue jorrou. Manchou de carmesim ambos os lados da lâmina, certificando-se que saturasse a ponta. Em seguida, ofereceu a arma para Legion, o cabo primeiro. Parte dele esperava que a pegasse e o cortasse, mas não. Sabia que estava derrotada, então apenas o observou, indecisa sobre seu próximo passo. Cooperação era sua única opção. Ao contrário de Lucien, ela não tinha o poder de piscar os outros ao lado dela, então não podia levar o espírito de Ashlyn para a segurança.

—Depressa. — A qualquer momento, os Senhores chegariam e seria tarde demais para ficar com o que queria. Não podia lutar contra os Senhores e observar Legion. E não podia sair com ela, evitando a batalha, porque ela podia piscar longe dele a qualquer momento que desejasse. Precisava de seu voto. —Antes que eu mude de ideia. — Como se alguma vez fosse mudar de ideia.

Com a mão trêmula, aceitou a lâmina. Nervosa, lambeu os lábios.

Ele esperou, no limite.

Finalmente ouviu as palavras que ansiava. —Em troca do que já prometeu, me comprometo com você aqui e agora, neste dia, a acompanhá-lo de bom grado para onde quiser. — Essas lágrimas grossas continuaram a descer pelas bochechas. —Farei t-tudo que pedir. E ficarei e-enquanto exigir minha presença.

Ela pressionou a ponta da lâmina na palma da mão e cortou. Não tão profundamente quanto ele, mas o suficiente para garantir uma troca bem sucedida. O sangue jorrou, se misturando com as gotículas que ele havia deixado antes. Gostava disso, gostava de saber que uma parte dele agora estava dentro dela.

Ele estendeu a mão, apertou a dela contra a dele, sua ferida contra a dele. No momento do contato, sentiu um estalo dentro dele, uma lágrima em sua alma, e embora nunca houvesse feito nada assim antes, sabia que o voto havia assentado em algum lugar dentro dele. A julgar por sua careta, com ela acabava de acontecer o mesmo.

Finalmente ela pertencia a ele.

Legion se encolheu.

Será que havia dito as palavras em voz alta? Ou talvez também ela tenha voltado à realidade quando os Tácitos assobiaram e amaldiçoaram ameaçando atrás dele. Galen tocou sua bochecha com a mão não ferida, o polegar acariciando a ascensão de ossos cobertos por pele acetinada. Ela tremeu, mas não se afastou.

Recitou as coordenadas para sua casa. —Parta agora, sem nenhuma parada, sem falar com ninguém, e entregarei a garota e seus bebês para seu homem, como prometido. — E os Tácitos não poderiam impedi-lo, nem os Senhores. Bem, todos os Senhores salvo o sempre chato Lucien. —Depressa, é quase tarde demais.

Ela engoliu em seco, e se afastou. Ele lamentou a perda. Queria rugir quando ela desapareceu diante de seus olhos. Ela vai para sua casa. Estará com ela novamente.

Só tinha que cuidar de duas tarefas. Ashlyn, e os Tácitos. Eles poderiam enganar a qualquer um, ele inclusive, com seus olhares, lançando ilusões e hipnotizando. E gostavam de fazê-lo, mas também gostavam de brincar com sua presa. Algo que não precisavam era de um espírito disposto.

Ele sabia, porque os havia alimentado com alguns de seus próprios homens. Os que ele não gostava, os que feriam os inocentes. Irônico, sim, considerando todas as coisas que ele mesmo havia feito, mas também outra de suas obras muito boas. Ele fez aproveitando a ocasião, por nenhuma outra razão além de se divertir.

Logo os Senhores estariam muito perto para ele desviar. Como prometido, não podia, não ia lutar contra eles, mas os Tácitos podiam. Se permitisse que isso acontecesse, os Tácitos o perdoariam por sua falta de vontade em compartilhar as fêmeas. Exceto, que Ashlyn poderia ser ferida durante a batalha, o que significava que Galen não podia permitir isso. Entãoooo, não podia cuidar dos Senhores ou dos Tácitos neste dia. Ambos teriam que ser tratados mais tarde.

Mantendo seu olhar treinado no chão, se aproximou dos pilares. Ouviu correntes chocalhando. Sorrateiramente tirou a capa de seu bolso e desdobrou o material. As criaturas queriam controlá-lo, e mesmo sibilando para ele, sentiu o calor de seus olhares.

Agindo rapidamente, alargou as asas e o manto ao mesmo tempo. Seus pés levantaram do chão, e girou... girou... deixando a invisibilidade ultrapassá-lo enquanto as bordas afiadas de suas asas cortavam o Tácito mais próximo a ele, enquanto a capa se estendia como um tentáculo e prendia no pescoço do mais distante, esmagando sua traqueia.

O primeiro perdeu suas entranhas, e se curvou, com um uivo de dor. O segundo não conseguiu respirar e desmaiou inconsciente.

Galen estava sobre os próximos dois uma fração de segundo depois, um tsunami de movimento, girando, mergulhando, cortando e fazendo pouco mais que esmagar. Não podiam vê-lo, não podiam lutar com ele, e oh, ele se divertia.

Menos de um minuto após o ataque inicial, todos os cinco estavam no chão. O Manto afundou no aperto de Galen quando plantou os pés no chão, seu corpo voltando à vista.

—Não deveriam ter me ensinado a usar corretamente o Manto, — ele disse.

Abaixou-se e pegou Ashlyn em seus braços. O suor a embebia, suas bochechas inchadas pela tensão, e apertava a barriga enquanto ofegava. Sem a capa, não podia piscá-la e, com isso, seu homem não a sentiria. Isso deixava a Galen apenas uma opção. Se afastar do templo, sem qualquer explicação. Galhos de árvores se estendiam, batendo nele. Galhos estalavam sob suas botas.

—Você. Vai. Morrer, — ouviu um dos feridos engasgar.

—Essa é nossa promessa para você, — outro ofegou.

—Seus gritos vão ecoar na eternidade.

Ignorando-os mais uma vez, continuou no ritmo. Depois disso, podiam optar por ajudar os Senhores. Não importava, no entanto. Estavam presos aqui, então o que podiam realmente fazer com ele, mesmo com a ajuda imortal?

—Grite por seu homem, Ashlyn.

A cascata de cabelo mel permaneceu colada ao seu couro cabeludo quando balançou a cabeça violentamente. Um momento se passou. Ela se encolheu e tapou os ouvidos com as mãos, uma ação que entendia. Onde quer que estivesse poderia ouvir todas as conversas que haviam acontecido lá.

Usando o braço envolto em seus ombros, dobrou seu pulso para puxar uma de suas mãos para longe. —Ouviu meu voto à Legion. Não posso machucá-la ou seu homem hoje. Grite por ele. Traga-o para você.

Talvez pensasse em negar uma segunda vez, mas abriu a boca e um grito de dor foi desencadeado. Os pássaros voaram das copas das árvores. Insetos calaram. Animais da variedade de quatro patas correram para se esconder.

Poderia tê-la descido e deixado lá, mas não o fez. Seja o que fosse que os Senhores planejavam fazer com ele, mudariam de ideia quando ouvissem o grito e viriam correndo. Ouviu o estrondo dos seus passos e uma parada, esperando. Alguns segundos depois irromperam através da espessa folhagem verde, formando um semicírculo ameaçador à sua volta.

Estavam mais perto do que percebi, pensou. Interessante. Poderiam ganhar este round, depois de tudo.

Maddox não se preocupou com sua própria segurança. —Me dê ela. — Ele correu o resto da distância, e com uma ternura que desmentia sua expressão selvagem, pegou sua mulher em seus braços. —Oh, meu amor. Sinto muito. Sinto muito.

Outra angústia rasgou o peito de Galen.

Ela gemeu. —Dói.

—Eu sei querida, eu sei. Lucien, — o guerreiro rosnou quando seu olhar estreitou pousado em Galen. —teletransporte-a daqui. Agora. Está em trabalho de parto.

—Maddox, — ela ofegou. —Não quero... ir embora... sem você.

—Shh, amor. Shh. Vamos te ajudar. Lucien vai levá-la. Então voltará por mim. Não pode tirar os dois de uma só vez, mas só estarei segundos atrás de você.

—Promete?

—Prometo.

—Se algo acontecer e não puder voltar por você... — Lucien começou.

—O quê? — Ashlyn guinchou. —Por que não seria capaz de voltar?

Maddox deu ao guerreiro cheio de cicatrizes um olhar duro.

—Lembre-se do que Danika disse a nós. — Lucien gentilmente pegou Ashlyn ainda protestando dos braços de Maddox. —Não estaremos na fortaleza.

Maddox manteve contato por tanto tempo quanto possível. Quando o guardião da Morte e a fêmea grávida desapareceram, se ajeitou em sua altura máxima e mais uma vez encontrou o olhar de Galen.

Galen não estava certo porque havia ficado, mesmo assim. Cada guerreiro tinha armas, e todas essas armas apontadas para ele. Armas, lâminas, uma besta. Sua própria filha, Gwen, segurava um arco, uma flecha entalhada e pronta.

Ah, agora sabia por que havia ficado. No fundo sabia que ela viria, e queria que ela visse o que havia feito. Visse uma de suas raras boas ações. E talvez... talvez até mesmo decidisse gostar dele.

—Por que a devolveu? — Maddox exigiu. Apesar do fato de sua mulher ter sido devolvida saudável e inteira, cheirava a raiva.

—Por que mais? Agora tenho o que queria de você.

As sobrancelhas do guerreiro abaixaram, surpreendendo uma fenda vermelha em seus olhos. —Tem Legion?

Ora. Eles não a haviam trazido. Ela havia vindo a ele por conta própria. Outro petisco — e interessante o suficiente para amadurecer cada fio de possessividade dentro dele. —Ela é minha, sim.

—Como?

Ele sorriu lentamente com alegria. —Como acha?

Um flash de ossos e escamas no rosto de Maddox, seu demônio subindo à superfície. —Há algo que deve saber sobre Legion.

—E o que seria? — Ele sabia o que ia acontecer, sabia exatamente o que os guerreiros planejavam fazer. Sabia que ia doer como um filho da puta. Poderia se cobrir com o manto poderia estar longe. Em vez disso, estava ali, seu sorriso aumentando.

—Não vai voltar para ela. — Maddox levantou uma Glock, como Galen sabia que faria, e disparou, acertando Galen no peito.

No rastro da bala, lâminas cortaram seu estômago, uma seta direta em seu coração. Encontrou o olhar de sua filha quando caiu de joelhos, atrás e finalmente pegou o Manto. —Agora estamos quites, — disse a ela, a voz fraca quando sumiu de vista.

 

WILLIAM OBSERVAVA ENQUANTO PARIS era carregado cada vez mais perto dele por esses chifrudos demônios gárgulas o encoxando, divertido pelas amorosas infernais. Na verdade, quase se dobrou de rir. Sim, sabia que insultar o novo e melhorado Paris 2.0 era o limite da idiotice, e que o guerreiro se atiraria sobre ele nos próximos minutos, mas William realmente não podia fingir estar triste sobre isso, então, que venha.

—Cara, — disse ele. —Já conseguiu diversas gozadas molhando seu peito. Clássico!

Sexo não disse uma palavra. Apenas mostrou a William o dedo e manteve a emoção constante, fervendo em seus olhos. Emoção em forma de fodidas sombras, sim, mas que não conseguiam diminuir a diversão de William.

Paris estava claramente planejando matar alguém que não fosse William antes do dia terminar, pois, claramente, algo mais estava acontecendo aqui além de simples humilhação. E William suspeitava que esse alguém seria... uma Sienna misteriosamente sumida? Não. Já estava morta. Zacharel? O desagradável voltou por mais? William realmente esperava que sim. Esperava que Paris fizesse seu máximo, seu melhor.

William não tinha uma boa história com o ligado-ao-céu, e embora não parecessem reconhecer seu rosto que era uma máscara muito bonita, pulariam sobre ele como uma matilha de cães raivosos se revelasse sua verdadeira forma.

Não que jamais fosse fazer. De qualquer maneira. Era melhor não ir por aí, mesmo mentalmente. Leitores de mente abundavam neste reino.

Assim que Paris havia desaparecido na esquina, um Lucien grave e desesperado materializou-se bem na frente de William, com uma Ashlyn gritando e ofegando apertada em seus braços.

As palavras saindo dos lábios sangrando dela eram coisas que apenas prostitutas de rua e viciados em fissura diriam. E talvez Lúcifer, o auto proclamado rei do Submundo.

—Dia ruim? — William nunca havia ouvido a suave beleza proferir tais coisas imundas e vis. E realmente, nunca havia parecido mais bonita para ele. Incrível.

—Danika nos disse que ela precisava ter os bebês onde quer que você vivesse, — o guardião da Morte disse sem preâmbulos. Linhas de tensão ramificavam de seus olhos como pequenos rios de veneno. —Seguir seu rastro espiritual não foi fácil ou divertido, especialmente porque meus guerreiros precisam de mim. Mostre-me uma cama agora.

—Tem certeza que ela disse que era eu? — William bateu no peito só para ter certeza.

—Cama. Agora.

—Agora! — Ashlyn gritou. —Eles estão chegando agora. Por favor, por favor. Ou vou dizer para Maddox que tentou me apalpar!

—Tão cruel. Prometeu remover a melhor parte da minha anatomia se eu apenas respirasse em sua direção. — Apesar de seu tom arrogante, William avançou rapidamente quando levou a dupla a subir as escadas, pelo corredor e no quarto que havia limpado para si mesmo, com a intenção de libertar a aprisionada imortal feminina e passar alguns dias conhecendo seu corpo em todas as posições que pudesse. Até agora, nenhuma sorte.

Lucien desceu Ashlyn, temeroso, de modo cuidadoso. —Vou pegar Maddox agora.

—Obrigado. Ohhhhhhh, Deeeeeus. — Ela apertou a mão de Lucien, e William ouviu o crack de ossos. Quando saiu da dor uma eternidade depois, lançou ao guerreiro agora pálido. —Maddox. Agora. Ou vou rasgar seu rosto e... e... Ohhhhhh! — O último foi um grito mais adequado a uma banshee nos mais obscuros corredores do inferno.

—E dirá a Maddox que ele o tocou com isso? — Disse William, sempre disposto a ajudar.

—Estarei de volta em apenas alguns segundos. Cuide dela. — Lucien desapareceu, seu "ou então" não-dito, mas não menos evidente.

—Bem, inferno, — William respirou, esfregando uma mão pelo rosto. Sozinho com a noiva grávida de Chucky, bem como a Semente de Chucky. E devia fazer algo de bom? Sim. Isso devia acontecer. O melhor que podia fazer era ficar exatamente onde estava e não vomitar sangue.

Um por um, Lucien piscou os outros guerreiros para dentro. Maddox primeiro, depois os outros, então as mulheres, então os dois artefatos divinos que estavam em sua posse. A fortaleza de Budapeste estava sob ataque ou algo assim? Porque, porra.

Uma vez que ninguém tocou na ponte levadiça, as gárgulas nunca vieram por eles, então eram livres para vagar — também conhecido como correr como o inferno no alerta de segurança 5.

E ainda, horas mais tarde, Ashlyn continuava em trabalho de parto. Do pior tipo. Os bebês queriam sair, precisavam sair, mas estavam presos, e ninguém aqui era um estúpido médico, de modo que ninguém sabia o que diabos fazer para ajudá-la.

Maddox mal se continha, enquanto andava, gritava, esmurrava paredes. Os outros pararam de explorar e agora se reuniam na sala fora do quarto de Ashlyn, andando ao lado dele. Exceto por Danika, a alma corajosa que havia se encarregado de ajudar no parto. Estava dentro do ventre da besta. Espere. Estava espiando fora da porta.

—Vem aqui, — gritou a loira para William.

Ficou surpreso por ouvi-la. Após a última rodada de maldições de Ashlyn, seus ouvidos ainda estavam vazando sangue e massa encefálica. Havia se encostado contra a parede mais distante, os braços cruzados sobre o peito, e sua postura afastava os intrusos de seu espaço pessoal. —Quem, eu? — Mais uma vez se viu batendo no peito.

—Sim. Você. Ficar em pé ao redor não faz parte da descrição de seu trabalho quando disse a Ashlyn que era o cara que ela precisava para isso.

Espertinha. —Novas notícias, pequena Dani. Não sei nada sobre nascimentos humanos. — Ainda assim, entrou no quarto e se aproximou da cama. O suor embebia as mulheres da cabeça aos pés, e ambas estavam pálidas, tremendo. Assustadas também, a julgar pelo tamanho de suas pupilas.

—Mas sabe sobre nascimentos de demônios, não é?

Às vezes se esquecia que Danika era o Olho-Que-Tudo-Vê atual, e que podia perscrutar o céu e o inferno, o passado e o presente. E também havia esquecido que Maddox era metade demônio, metade humano, e um quarto idiota, e capaz de gerar descendência demoníaca com necessidades especiais.

 —Certo, sim. Vou assumir. — E sabia o que fazer agora, o que era um alívio. Para ele. Ashlyn estava prestes a experimentar a pior dor da sua vida. Dor que imploraria para escapar, mesmo no cabo de uma espada.

—Ele não vai tocá-la, — Maddox rosnou, pisando para ficar cara a cara com William. O bastardo devia ter entrado na sala atrás dele.

William só levantou uma sobrancelha. —Quer que sua mulher sobreviva?

—Claro. — Um silvo.

—Então dê o fora do quarto! Você também Dani, e informe seu homem para ficar de guarda e manter todo mundo fora, também. E quero dizer todos. Não importa o que ouçam. — Se tivessem um sopro do que ele planejava, removeriam suas mãos com uma faca de manteiga enferrujada.

Na cama, Ashlyn não estava mais se contorcendo, não gritava mais. Era apenas um pedaço de carne e cobertas. Ficando mais fraca a cada segundo... quase tarde demais...

—Agora! — William gritou. —Sou a única chance que os três têm de sobreviver.

A pequena Danika colocou o braço em torno do Maddox descontrolado e de alguma forma conseguiu arrastá-lo para o corredor. William caminhou e fechou a porta, fechando-se dentro com Ashlyn. Em seguida, passou a cômoda na frente dela, sabendo que precisaria de poucos minutos de vantagem, se alguém passasse por Reyes.

Inspirou profundo, outra respiração profunda. Estava tremendo quando desembainhou uma adaga. —Desculpe por isso, — disse ele, e começou a trabalhar.

 

            DEPOIS DE UMA PEQUENA RESTRIÇÃO no calabouço abaixo do castelo, Paris saiu da última contenção do túnel escondido das gárgulas e encontrou seus amigos. Tão contente quanto ele estava por vê-los, também estava chateado por que tudo havia afundado enquanto esteve fora. Ashlyn sequestrada por Galen. Legion trocando a si mesma para salvar a fêmea grávida. Kane, ainda perdido. Nenhum contato. Uma trilha sem saída que até Amun tinha dificuldade levantando.

             Ele se estatelou em um banco que alguém havia arrastado no corredor do lado de fora do quarto de Ashlyn. Ele estava tentando manter-se distraído e tranquilo. Zacharel tinha Sienna. Provavelmente a havia mostrado para a saída do reino. Ela estava provavelmente a caminho… de algum lugar, seu laço com este local estava quebrado afinal.

             Isto era para o melhor.

         O melhor era um saco.

            Eu a quero, Sexo disse fazendo beicinho.

            Eu, também.

             —Este castelo está carente de algo, — Viola disse quando estava próxima a ele.

             Ela era a primeira a falar com ele em um tom sociável. Seus amigos tinham estado muito preocupados com Ashlyn para fazer mais que ordenar pedindo por água, toalhas e uma focinheira para alguém. William provavelmente.

             A deusa havia desistido do vestido “estou a procura” e trocado por uma camiseta com brilho e algum tipo de calças de seda cinza, o material tão transparente que ele podia ver sua roupa íntima. Certo, então talvez ela não houvesse desistiu do “preciso conseguir para mim um pouco de atividade” completamente. Ela puxou seu pálido, cabelo prateado em um rabo-de-cavalo alto o comprimento balançando com seu movimento.

             —Oi? Você está me escutando? Claro que você está me escutando! Eu preciso redecorar ou receio ter que partir. —

            Eu a quero! Em só alguns segundos, Sexo estava espumando a boca, saltando ao redor da cabeça de Paris, desesperado para dar a deusa em lugar de Sienna. Muito mais desesperado que o demônio já havia estado, de fato. Eu preciso. Eu tenho que tê-la. Agora, agora, agora.

             Sobre o que era isso? Eles haviam tido Sienna mais cedo neste mesmo dia. Sexo devia estar resplandecente até amanhã.

            Quero, eu quero! Quero, quero, quero!

             Paris estava carrancudo. Quando Kaia andou a passos largos passando por ele em uma batida do coração, seus quadris balançando com seu passo, seu pau urgentemente buscou calor, ele realmente fechou a cara.

             Normalmente quando ele pensava sobre tomar uma mulher que ele já tinha tido, sua ereção esvaziava como um balão. Ou, se ele não se lembrasse de ter tido sexo com uma mulher em particular, ele simplesmente não podia ficar duro enquanto estivesse ao redor ela. Seguramente isto não significava... seguramente ele não poderia…

            Quero-a, preciso dela! Quero todas elas!

             Sim. Ele poderia. Ele poderia tomar Viola (que ele não havia tido ainda) e Kaia (que ele já havia tido), Paris percebeu, seu pau tendo espasmos com necessidade das duas. Em lugar de excitante, o conhecimento o encheu com medo.

             Como isto era possível?

            Seu compromisso com Sienna… eu não sei… mas eu posso ter todas elas e eu quero todas elas.

             Mas… mas… Paris havia sonhado com isso, de achar uma mulher e estar com ela múltiplas vezes. Qualquer mulher. Todas as mulheres. Sienna, como também todas as outras. Depois de seu primeiro encontro com Sienna, ele havia pensado que ela era sua única esperança de conseguir isto. Ele não havia entendido, entretanto, ele não havia se importado em entender. Ele havia aceitado e deixado rolar. Ainda agora que ele poderia ter isso com outra pessoa, qualquer outra, aparentemente, ele ainda… queria só Sienna, ele percebia.

             Ele nunca estaria com uma mulher gostando dela. Alguém que sabia sobre ele, mas o aceitava de qualquer maneira. Alguém que deu mais que ela tomou, até quando ele quis que ela tomasse mais que ela dava. Alguém que não tinha medo de repreender severamente a ele ou se desculpar quando cometia um engano. Alguém que lutava pelo que acreditava, feito o que era preciso para ganhar. Uma qualidade odiada antigamente. Admirada agora.

             De repente Strider estava em seu rosto, olhos azuis reluzindo enquanto apertava a parte de trás da cabeça de Paris na parede.

—Esse bastão em suas calças é melhor que seja para a deusa próxima a você e não para a ruiva que acabou de passar. —

    Gostava mais dele quando estava preocupado. Em lugar de arriscar uma briga com Strider que teria que vencer para ficar de pé, Paris movimentou a cabeça.

—Certo. A deusa. — Finalmente ele entendia a raiva possessiva aborrecedora de Strider. Como o guerreiro mataria outro homem por até olhar para o que era seu. Paris mataria macho ou fêmea, deus ou deusa, bom ou mal, por dar em cima de Sienna.

             Existia suficiente verdade em seu tom para aliviar o guerreiro.

—Certo. — Strider se endireitou, ele estralou os ossos em seu pescoço. —Certo, então. Nós estamos bem. —

             Paris assistiu ele ir embora, e pegou o olhar divertido de Gideon. O guardião da Mentira deve ter sentido a camada de decepção. Ninguém cheirava a pilha de fumaça mais rápido que Gideon. Não importa quão pequena aquela pilha fosse.

             Culpado, Paris olhou para longe. Isto não devia estar acontecendo.

             Seu demônio ainda tagarelando com exultação, ainda querendo, ainda precisando.

             Ele se sentiu sujo e asqueroso e envergonhado, de repente estava contente que Sienna havia escolhido não segui-lo. Se ela o visse assim, ele a perderia. Ele precisava de um chuveiro. Precisava esfregar sua pele, camadas por camada, até a última gota de sangue ser drenada dele.

             Quando o odor de chocolate e champanhe começou a flutuar dele, ele amaldiçoou debaixo de sua respiração. Eu não estou dormindo com Kaia ou Viola ou qualquer outra mulher aqui. Ele não dava uma merda para o que seu corpo ou seu demônio estavam exigindo dele. Ele não iria permitir isto. Não iria tolerar isto. E você não pode me obrigar, não pode atraí-las. Você entende? Você para com isto agora mesmo, ou eu corto meu pau e rirei enquanto ele se degenera.

            Mas… mas…

             Não! Nenhuma desculpa, nenhum argumento. Ele não estaria dormindo com ninguém hoje, amanhã ou no dia seguinte. Ou até no próximo. De nenhum modo. Ninguém exceto Sienna, ele pensou com uma determinação que chocou a ele mesmo. E ele não se importava o quão fraco o fazia. Suas mãos ainda formigavam de ter tocado toda aquela pele morna e macia. Ele ainda tinha seu odor doce, tropical em seu nariz. Ele não estaria desistindo disto, não estaria dando boas-vindas à outra pessoa.

             —Oi. Eu ainda estou aqui,— Viola disse, fazendo beicinho como uma criança. —Você não se importa que eu possa partir se você não me der o que eu quero?—

             Ele não tinha a paciência para lidar com ela agora mesmo. —Você não pode deixar o castelo, certo? Este é o lugar mais seguro para todos vocês, mais seguro que a fortaleza de Budapeste. Galen e seus Caçadores não podem entrar sem dano sério, e se eles tentarem, todos nós seremos alertados. —

             Mais, ele havia visto as raias carmesim acima de cada uma das janelas e portas, e sabido que William havia derramado seu sangue lá. Isso significava que as sombras monstros não poderiam entrar novamente.

             —Quem disse qualquer coisa sobre se preocupar com nossa segurança? Nós precisamos de retratos meus lá, lá e lá. — Enquanto falava, ela apontava.

             —Eu estarei verificando e alertarei o decorador, — ele disse amargamente.

             —E lá. —

             Sexo ainda não havia desistido da busca para estar dentro dela, o pau de Paris fez aquela coisa de espasmo. Ele rangeu seus molares. A deusa era magnífica, nenhuma dúvida sobre isto. Naturalmente feminina e sensual de um modo que a maioria podia nunca ser, até com séculos de treinamento. E era uma vez, Paris teria estado por toda parte dela. Ignorado sua personalidade, e ela havia sido o tipo que ele teria dado em cima. Abundantemente curvilínea.

             Agora, tendo se deleitado em uma satisfação tão completa que ele nunca seria o mesmo, conformando-se com qualquer outra coisa menos não tinha nenhuma atração. O corpo magro da Sienna fazia isto com ele. Fez sua fome crescer. Cegava-o para outras. Seu cheiro, seu gosto, ambos tinham estado especificamente projetados para tirá-lo do controle tão fortemente que ninguém mais poderia alcançá-lo.

             —Você está além de enlouquecedor, — Viola disse.

            Ele estava enlouquecendo? Certo. —Você pode decorar tudo que você quiser. Feliz?— Se ele não mudasse o assunto, ela manteria a carga em cima o dia todo e ele acabaria introduzindo a língua dela por sua lâmina. — Então onde esta seu cachorro? —

             —Minha pequena princesa está descansando em meu novo quarto. A viagem foi tão dura para sua constituição delicada. —

             —Claro. — Porque toda a constituição do diabo tasmaniano era delicada. E o que era isso de chamar aquilo de princesa? Paris esfregou a mão por seu rosto, cansado, faminto e despedaçado do lado de dentro.  Assim que ele soubesse que Ashlyn e os bebês estavam bem, ele estaria decolando, procurando Sienna e tendo certeza que ela estava bem. Então ele a deixaria ir de uma vez por todas de forma que, quando ele dormisse com outra pessoa, ele não estivesse a enganando, não destruiria sua sensação de confiança.

             Mas talvez… talvez ele estivesse com ela mais uma vez primeiro. O sexo com ela era uma revelação, não só porque ela o havia fortalecido, o havia curado e o feito ficar mais duro do que ele jamais havia estado em sua vida, mas também porque o sexo com ela não era sobre ele. Era sobre eles. As necessidades deles. Os desejos deles.

             Não existia nada sujo sobre isto. Nada manchado, unilateral ou imparcial. Eles tocavam um ao outro, beijavam um ao outro e davam prazer um ao outro porque era bom, porque a paixão os queimava inexoravelmente.

             —... me escutando? — Viola disse em exasperação.

             Ele agitou sua cabeça, quase disse a ela a verdade, e então parou.  Se ele fizesse, e o demônio dela daria ataques. Ela provavelmente o seguiria como um pequeno filhote de cachorro perdido. —Sim, uh. Estou fascinado. Material interessante. —

             Maddox compassava de um lado para outro, de um lado para outro na frente dele. Reyes tentou pará-lo com um bater leve no ombro, mas o guerreiro encolheu os ombros fora e manteve continuou. Lucien tentou em seguida, mas Maddox encolheu os ombros de lado, também. Um engano. Em castigo, Anya o fez tropeçar quando ele a passou.

             —Por que eu sempre tento ajudar as causas perdidas?— Viola disse. —Você podia ser mais egoísta? Então novamente, eu acho que não devia ficar surpreendida. Eu quero dizer, você está casado por minha causa, e você nem me agradeceu. —

             —Mmm-hmm. Como eu disse fascinante, — Paris disse. E então suas palavras penetraram. —O que é isto agora?— Ele torceu no banco, alfinetando-a com seu olhar fixo estreitado. —Você acabou de dizer a palavra casado em referência a mim?—

             —Está certo. E eu nunca repito o que digo. Com exceção daquelas vezes que eu, de fato, repito o que digo. Mas isto é normalmente apenas quando eu estou mencionando como meu cabelo é sedoso, como meus olhos são brilhantes, e quão sensual meu corpo é. Ei você acha que alguém tem um saco de amendoim? Do tipo temperado? —

            Eu não te sufocarei. —Exatamente com quem eu estou casado, e quando a formalidade suposta aconteceu?—

             —Oh, eu me esqueci de dizer novamente? Você está casado com sua namorada fantasmagórica, a que você tatuou em você mesmo. Isto é como os casamentos são forjados. Cinzas para cinzas, pó ao pó, e tudo aquilo. Bem, isto é como casamentos unilaterais são forjados, de qualquer maneira. Ela não é casada com você, então ela pode dar uma com quem ela quiser sem violar quaisquer leis antigas e ter que suportar um castigo horrível. —

             Sua mandíbula rangeu abriu e fechou quando Viola continuou a falar. E falar. —Cale-se por um minuto. Como eu estou casado com Sienna?—

             Silêncio.

             Entretanto, o olhar de Viola disse o suficiente.

             —Desculpe, — ele murmurou. —Eu estou em choque. Eu não posso estar… O que você está dizendo não é… não existe nenhum modo… —

             —Você está, e existe. Isto é parte da razão pela qual você pode interagir com ela agora. Você ligou a si mesmo a ela. —

             Ligado. Sua mente teve um pequeno curto. Ele estava ligado. Ele estava casado com Sienna. Ela era sua. Sua mulher. Sua esposa. Para sempre.

             Sua.

             Esposa.

             E aparentemente, apesar do fato de seu corpo poder se alegrar com qualquer corpo feminino que ele quisesse, ele podia violar uma lei que ele nunca havia ouvido falar, assim condenando ele mesmo a algum tipo de castigo. Um castigo que ele não estava certo de poder suportar.

             A reação do seu demônio para as outras mulheres agora fazia sentido. Sexo tinha estado à direita em seu caminho. Com o compromisso de Paris para Sienna, sua infidelidade agora alimentaria o demônio. Fazendo amor com Sienna iria, também, entretanto. Ele havia se casado com ela antes de encontrá-la, e haviam feito amor três vezes desde então.

             —Você está certa?— Ele coaxou quando houve um atraso no monólogo de Viola. Ele queria isto, ele percebeu. Ele queria que isto fosse verdade tanto que podia provar sua própria antecipação. Podia sentir o zumbir em seu sangue, a canção em suas orelhas. Ele queria ter Sienna do mais irrevogável modo.

             Viola bateu levemente em cima de sua cabeça. —Como se eu estivesse sempre errada. Mas Paris escute-me. Nós precisamos ficar sérios por um minuto. —

             Eles não estavam falando sério já? —Então você não estava séria sobre a coisa do casamento?— Ele a mataria. Só avançaria em sua carótida e a destruiria.

             —Claro que eu estava falando sério. —disse com sua expressão triste. Então ela cheirou, e lambeu os lábios. —Hmm, você cheira bem. — Mais perto… mais perto… ela se debruçou sobre ele. Cheirado seu pescoço. —Realmente, realmente bom. —

             Demônio estúpido.

             —Agora me diga a verdade, — ela disse. —Você acha que eu sou a mulher mais bonita que você já encontrou?—

             —Eu vou dar você para o anjo caído,— ele murmurou, pondo um pouco de distância entre eles. Ela o estava apertando, seus olhos já vítreos com querer. —Isso será seu castigo por me perseguir. —

             Uma piscadela lenta, confusa. —Caído quem?—

             Ela não se lembrava de seu próprio pretendente ardente. Bom.

             —O que está errado comigo? Por que eu me sinto deste modo?— Ela perguntou, logo antes de um gemido baixo a deixar. —Eu não acho você atraente, não quero balançar seu mundo, e ainda, eu estou pronta para subir em você. —

             Um grito rasgado saiu do quarto, salvando Paris de ter que formar uma resposta. Todo mundo no corredor se calou, nem mesmo ousando respirar.

             —Ashlyn. — Maddox se apressou em direção à porta do quarto, mas Reyes o agarrou.

             O guardião de Violência lutou por tudo que valia a pena, e vários outros guerreiros tiveram que mergulhar na pilha para segurá-lo. Paris estava para juntar-se a rixa quando ele viu por um momento asas pretas familiares na entrada do corredor.

             Seu olhar cresceu rapidamente, e ele encontrou um magnífico hall que era mais largo que o habitual. O rosto de Sienna estava vazio, seus olhos vermelhos como se ela tivesse chorado, e sua boca inchada. Ele estava correndo um segundo mais tarde, saltando acima da pilha de seus amigos, tropeçando, levantando, e correndo um pouco mais.

 

SIENNA NÃO ESTAVA LOUCA. O que ela havia sentido estava muito além do que a palavra loucura podia descrever. Uma mistura de ira e culpa duelo e mais ira, talvez. E então um pouco mais de ira com um salpico de coração partido. E muito mais ira. Sua irmã estava morta, e a rainha dos Titãs a havia matado. Rasgando sua garganta e deixando seu corpo no chão como se ela fosse lixo.

             Quando Cronus havia soltado Sienna aqui, tudo que ela havia querido era achar Paris e se lançar em seus braços. Não para chorar, ela duvidava poder vir a chorar novamente, mas para esquecer só um pouco. Ao invés, ela descobriu que alguma beleza estranha havia a ultrapassado na linha de chegada.

             Uma beleza que os amigos dele provavelmente gostavam. O grupo havia assumido aparentemente o comando do castelo de Sienna, e eles iriam provavelmente agarrar Sienna se ela desse um único olhar em direção a Paris.

             Os grandes gigantes, maciços estavam fortemente armados, um exército de ameaça. O coro principal sendo “eu sorrirei quando matar você”, mas eles nunca se movimentaram para matar. Eles estavam simplesmente tentando subjugar quem estava na parte inferior de uma pilha.

             O que parecia uma eternidade atrás, ela havia estudado estes homens para propósitos abomináveis. Vendo-os viver e pessoalmente, eles deveriam ter feito ela louca. E talvez houvesse se Ira não acabasse de preparar rapidamente uma festa em seu cérebro, lançando imagem depois de imagem, todos eles envolvendo a loira que não conseguia manter as mãos longes.

             Com seu sorriso, sua risada, seu tudo, ela incitava homens a apaixonarem-se por ela. Sua adulação era sua nutrição. E então, quando ela os tinha em seus pés, ela os deixava, só partindo para o próximo, e esquecendo tudo sobre eles.

             É isso que ela deveria ter feito para Paris. E por que ele não havia se apaixonado por ela? Sienna perguntou-se. Ela era a mulher mais bonita que Sienna já havia visto. Inferno, até ela estava tentada.

             Paris apareceu na frente dela, juntando ela em seus braços, roçando sua bochecha contra a sua. Ele estava com cheiro de desejo que ela reconhecia tal desejo arrojado. —Eu estou tão feliz por ver você. —

             —Você… você… —

             —O que está errado, bebê? O que aconteceu?—

             Olhando para ele, ela se arrastou longe de seu abraço. —Eu fui há algumas horas— e nesse tempo decidido estar com Galen para salvar a vida de Paris, ela pensou, mas não adicionou. —E você já seguiu em frente. — Ela deu uma risada amarga. Mesmo sabendo que isto aconteceria, não poderia ter se preparado para a inundação de dor que realmente ver havia causado. —Você tentou me advertir, não é, e eu disse a você que eu compreendia. — Bem, eu não faço!

             —Segui em frente? Com Viola?— Ele fez careta. —Inferno, não. Nós estávamos só conversando. —

             —Sim, eu sei. Sua linguagem corporal diz bastante. — Ela só havia visto sua ereção — e tinha estado apontado para a loira. Agora ela sentia isto, duro e longo e espesso, e doce céu, ela ainda queria isto. Ainda o queria.

             —Você está com ciúmes?—

             —Claro que não!—

             —Você está. Você é ciumenta. — Ele riu. —Posso dizer a você o quanto isso me excita?—

             —Tudo excita você,— ela ladrou, lutando para amortecer sua raiva. Ele era apenas tão malditamente contente com ele mesmo. E com ela! —E eu não sou ciumenta. —

             —Você é, e eu amo isto. De qualquer maneira, isto é algo que está relacionado com meu demônio, isto é tudo. Eu juro para você, eu não estive com a deusa e não estarei. Nunca. —

             —Ela é uma deusa?—

             —Que não tem nenhuma atração para mim. —

             Ele podia estar dizendo a verdade. Realmente, ele estava dizendo a verdade, ela decidiu em um momento, não precisando da ajuda de Ira. Paris não era o tipo de mentir. As consequências não eram algo que ele temia.

             —Não importa. — Seus ombros caíram com derrota. —Eu não devia ter voltado. —

             —Não importa? Você está desistindo de mim? De nós?— Ele agarrou seus antebraços e a agitou. —Eu sei que nós dissemos que nos separaríamos quando você pudesse deixar o reino, mas eu quero mudar aquela decisão. Não é mais uma opção para mim. E eu sei que vai ser difícil pra você acreditar nisto, mas não importa como meu corpo reage a outras, não importa o que meu demônio quer você é o que eu preciso. Você entende?— Outra sacudida, mais dura que antes.

             —Uh, Paris, — Strider chamou. — Com quem você está conversando, amigo?—

             Ele virou, e ela espiou ao redor dele. Os guerreiros pararam de lutar um com o outro, e todo mundo exceto o cicatrizado e a deusa loira estavam olhando Paris como se ele apenas houvesse perdido sua sempre amorosa paciência.

             —Eles não podem me ver, — ela disse.

             Ele economizou de ter que responder para ela ou seus amigos quando a porta no centro do corredor abriu-se e William andou pelo corredor. Ele estava pálido, claramente agitado até sua alma e banhado em sangue.

             Ela ofegou. —O que aconteceu com ele?—

             William bateu palmas ganhando atenção de todo mundo. —Certo, escutem. Eu tenho boas notícias e más notícias. Porque eu sou uma pessoa tão positiva, nós começaremos com as boas. Ashlyn sobreviveu ao nascimento, assim como sua horda pessoal. —

             O corredor ecoou com suspiros de alívio… nenhum mais alto que o do próprio Maddox.

             —Então qual é a ruim?— Alguém exigiu.

             Depois de uma pausa dramática, o guerreiro disse, — Eu estou sem condicionador. Eu preciso que alguém me consiga algum. Sugestão, eu estou olhando para você, Lucien. E, sim, disponha pela minha surpreendente contribuição para sua família feliz. Os pequenos terrores me escalaram a unhas, mas bem. —

             —William!— Outra pessoa estalou. —Mantenha os detalhes desnecessários ao mínimo. Nós estamos morrendo aqui. —

             —Isto é gratidão para você. Então de qualquer maneira, vamos, entrem, e conheçam seu sobrinho e sobrinha, Assassinato e Mutilação. Ou, se você quiser os chamar por seus apelidos. ­ — Pistola e Facada. —

 

TÃO FELIZ QUANTO PARIS ESTAVA pelos nascimentos, tanto quanto queria conhecer os bebês, tinha que cuidar primeiro de sua mulher. Jogou Sienna acima de seu ombro com a delicadeza de um trator e gritou: — Ninguém entra no meu quarto, não importa o que ouçam, — e saltou para o quarto que usou antes, passando pelo corredor de estátuas. Cada um de seus amigos lançou olhares misteriosos antes dele dobrar a esquina. Principalmente porque todos estavam segurando um Maddox chutando e empurrando, então estavam atordoados, mas também porque assumiram que Paris acabava de gastar uns bons cinco minutos numa conversa com ele mesmo.

Eu a quero, Sexo disse.

Não se preocupe. Nós a teremos.

Sienna estava atordoadamente muda e permaneceu imóvel a princípio, mas com seus passos foi se soltando. Logo estava pendurada nas costas dele, puxando seu cabelo, tentando dar uma joelhada em seu rosto e acertar suas bolas. Ele subiu os degraus para o hall mal capaz de evitar sua castração. Usou o ombro para entrar na câmara e empurrou a porta com um pontapé atrás.

Estava torpedeando em sua ira, mas ver Sienna o acalmou. Apenas assim. Zacharel podia explodi-lo, porque claramente nunca machucaria sua mulher.

Ela voltou para ele. Isso merecia uma recompensa.

Ele a colocou em pé, e ela imediatamente se lançou sobre ele. Para ser honesto, estava contente como o inferno. Qualquer coisa era melhor que aquele momento de derrota. Seus pequenos punhos o esmurraram, e aceitou o abuso. Até que percebeu que ela fez um punho impróprio e realmente ia se machucar. Colocou um braço ao redor de sua cintura, a girando e deslizando na linha dura de seu corpo para aquietá-la.

—Deixe-me ir!

—Num minuto. — Enquanto ela lutava, puxou seu dedo polegar abaixo de seus dedos e reorganizou seu punho. —Bata assim. — Feito, a soltou.

Ela girou ao redor para bater nele um pouco mais. —Não vai sair deste quarto até que eu mate você!

Isso era uma boa pequena ameaça, e talvez algo para tentar mais tarde. —Deixarei você fazer o que quiser comigo, mas gostaria primeiro de uma explicação. O que é isto?

—Argh!— Ela saltou longe dele, compassada como um leão enjaulado. Energia radiava dela, praticamente erguendo seu cabelo de sua cabeça. —É sobre o fato que todos os homens não prestam! E no caso de não perceber, está incluso nesse número.

—Esperaria que sim. Caso contrário em nosso romance faltaria algo.

Seus olhos reluziam com fogo de jade, ouro perdido. —Isso é uma brincadeira sobre seu pênis? Porque nesse caso, pode fazer melhor. — Ela saltou para a cômoda e empurrou com toda a força que podia, batendo a coisa no chão. A madeira lascou. A superfície de granito quebrou. As gavetas derramaram seus pertences.

—Por que seus amigos estão aqui? Não tem medo que os espie e descubra seus segredos?

—Não. — E não tinha. Não mais. Ele a julgou severamente antes, mas não ia cometer esse engano novamente. —Assim como não tem medo que eu vá dormir com qualquer outra enquanto estivermos juntos.

Outra gaveta. —Foi isso que disse à Susan!

—Eu sei, e tenho vivido com a culpa desde então. Nunca farei aquilo com você. Diga que sabe disto.

—Sim, sei, mas não estávamos juntos desde alguns minutos atrás. O que significa que seguiu o primeiro rabo que balançou em sua direção no segundo que nos separamos. Mas não sou sua namorada, e nunca serei sua namorada, então não posso reclamar, não é?

—Não, — ele disse baixinho. —Nunca será minha namorada. — Porque já é minha esposa. — Aquelas palavras. Nunca pensou em usar a respeito dele mesmo. Mas agora que fez, sim, seus instintos possessivos chamejaram, insistindo em seus direitos. Não ajudava que Sienna fosse a mais sensual fêmea que já viu. Um fio vivo, chiando, crepitando, a essência da paixão. Sim, estava duro como um cano de aço.

Outra gaveta foi lançada. Só mais quatro restando. Ele a deixaria usá-las, e então agiria.

—Estou tão cheia deste mundo, da mentira e do engano e da matança. — Uma. —Aquela mulher vai pagar. Oh, vai pagar caro. — Duas. —Vou me juntar na matança. Não com Ira, mas com minhas próprias mãos. — Três. —Aquele Cronus bastardo pensa que pode me manipular, mas não pode. Acabarei com todos vocês! — Quatro. —E não vou poupar você, então! Pode ir...

Paris deslizou adiante, a agarrando pela cintura e a jogando na cama. Quando ela saltou no colchão, suas asas dispararam para diminuir a velocidade de seu impulso. Ele tombou sobre ela antes que pudesse pairar no ar, e por uma vez não tentou ser cuidadoso. Ele a segurou, interceptando suas pernas em baixo do peso musculoso de suas próprias pernas e seus braços acima de sua cabeça. Ela tentou resistir, mas tudo que conseguiu fazer foi roçar seu duro membro contra seu clitóris.

Um grito de necessidade separou aqueles bonitos lábios.

Mais!

—Está molhada para mim, Bebê?— Não pediu permissão, mas transferiu seus pulsos para uma mão e empurrou sua camisa acima e também o sutiã, desnudando seus seios. Seus mamilos estavam vermelhos e inchados.

—Não, — ela disse, e soube que ela mentia. —Não estou molhada, não estou molhada, tãooooooo nada molhada. — Sim, ela sabia também.

Ele abaixou e chupou. Ela soltou outros daqueles bonitos gritos, seus quadris ondulando contra ele. Ele continuou chupando e ela continuou resistindo contra ele, até que ele não podia segurar a pressão mais e empurrou a mão dentro das calças dela, passando aquela calcinha e indo diretamente ao seu calor. Ela praticamente se curvou para fora do colchão.

Sim, por favor, sim.

 Um dedo, dois, três. Os empurrou dentro, tão fundo quanto podia conseguir.

—Paris… eu… Oh, sim, sim!

—Esta é minha garota. — Ela encharcou sua mão, do modo que ele gostava, tão quente e molhada, se ajustando a ele tão condenadamente perfeita, até deste modo. —Quando usou sua boca em mim, quis ter meu rosto enterrado entre suas pernas. Ainda quero. E da próxima vez, o farei. Vou ter todo esse mel na minha garganta.

—Paris… vou… estou muito perto já. — Seus olhos estavam fechados apertados, aquelas pestanas longas fundidas juntas. —Libere minhas mãos. Quero tocar em você, também. Preciso tocar em você.

—Pensa que aqueles pequenos socos que me deu não foram preliminares? E inferno, Bebê, estava duro por você muito antes disto.

—Sim?

—Oh, sim. Ainda está louca comigo?

—Sim, mas não pare.

—Chega. Preciso dar a você algo mais. — Ele removeu seus dedos do ponto culminante, e ela gritou de frustração. —Preciso dar a você algo melhor.

Suas inalações raspavam na entrada e na exalação saíam violentas, ambas rápidas e pesadas. A necessidade verdadeiramente estava a montando duramente – não tão duro quanto ele a iria montar. Ele estava bêbado com a paixão dela, sua cabeça nadando com isso, suas veias queimando com isto.

Ele empurrou o zíper dela abaixo, mas não se incomodou em tirar suas calças. Não podia. Estava muito ocupado abrindo as próprias. Não as abaixou também, e uma vez que seu pau estava livre, se equilibrou na entrada dela. Ela não podia abrir muito suas pernas, o tecido não deixava, então quando ele empurrou, teve que fazer pressão com seu peso. Mas quando estava dentro, estava realmente dentro, as paredes internas dela apertaram ao redor dele, mais apertadas que qualquer punho já o apertou.

Ela gritou no contato, e ele amou o som.

Toda punhalada era lenta contra ela, e sim, seu corpo esfregava seu clitóris a cada deslizamento descendente. Suas palavras não faziam mais qualquer sentido. Ela estava arquejando e incoerente, perdida pelo fervor. Sexo, também. Inferno, Paris, também. Suas bolas estavam apertando mais e mais, ainda escorregando contra o topo das coxas dela.

Os braços dela lutaram contra seu aperto — oh querida, não a soltou, soltou? — mas manteve um aperto fixo, os seios dela empurrando acima, os mamilos roçando seu tórax, a fricção faiscando todos os tipos diferentes de chamas. Satisfação, luxúria, necessidade que arranhava, satisfação. Com sua mão livre, segurou seu queixo.

—Olhe para mim. — Diminuiu a velocidade de suas punhaladas.

Levou um momento, mas no última instante ela obedeceu. Aqueles olhos castanhos estavam brilhantes, vítreos.

—Não acabou comigo. Me ouviu? Não acabou. Você é minha.

—Eu… — Outro grito, suas paredes internas o ordenhando, seus quadris se erguendo... erguendo… até erguer seu peso, afundando mais do que devia ser possível.

Sexo gritou pelo prazer surpreendente.

E assim, Paris estourou no orgasmo que agitava em sua espinha, atravessando seu saco, para a ponta de sua ereção e nela, diretamente em seu corpo. Um jato quente branco, de novo e de novo. Gozou tão duro que viu estrelas.

Quando estava vazio, abriu seus olhos, para descobrir que Sienna havia desmoronado no colchão e ele desmoronado por cima dela, provavelmente a esmagando. Rolou para seu lado, mas estavam ainda conectados, assim a levou com ele.

Houve um período longo de silêncio enquanto acalmavam suas respirações e suas batidas de coração diminuíam de velocidade, mas o tempo todo soube de um fato verdadeiro: nunca experimentou sexo assim com qualquer outra e nunca o faria novamente. Inferno, não queria.

—Nunca fui temperamental antes, — ela murmurou.

Ele correu uma mão de cima abaixo em sua espinha. —Bem, agora é, com certeza.

Ela mordeu sua clavícula, um beliscão brincalhão. Ele esperou Sexo responder, mas o demônio foi dormir. —Não devíamos fazer isto.

—Quis te acalmar e consegui. Missão cumprida. — Outro beliscão.

—Quis dizer, nós não devíamos ter sexo zangados.

Ele disse: —Não pude me conter. Gostei de seu temperamento.

—Vi. Existe uma posição que não se supera, entretanto? Está me dando complexo.

—Se existir, me ajudará na prática até que eu me supere?

—Tantas vezes que perderá o respeito por si mesmo.

Ele riu. Ela estava brincando, como se fossem amigos. Eles eram amigos. —Não ia dormir com a deusa, — ele disse. —Juro para você. Nunca dormirei com outra fêmea.

Ela colocou um beijo acima de seu coração. —Não faça isto. Não prometa coisas assim. Porque mesmo ciumenta como estava, e sim, livremente estou admitindo que prefiro que durma com mil como ela a se debilitar e morrer.

Seu tórax ficou apertado. Suavemente se retirou de seu corpo doce, macio, e os dois gemeram pela perda. Ele tirou a roupa dela e a dele, então colocou sua arma no criado ao lado da cama, e sua lâmina sob seu travesseiro. E então abraçou Sienna. Entretanto, primeiro deu em seus mamilos um beijo.

—Vamos conversar sobre isto, e sobre porque estava tão chateada, porque sei que existe mais além da deusa, — ele disse. —Em alguns minutos. Agora mesmo, quero dizer algumas coisas, e então quero que diga algo sobre você. Quero conhecer você melhor. — Em todos os sentidos.

Não iam deixar esta cama até que ele visse seu cérebro desnudo também, e isso era isto.

—C-certo.

—Susan Dille,— ele disse. —Gostei dela. Quis algo com ela, mas era fraco. Finalmente dormi com outra pessoa. Estava miserável, ela descobriu, e as coisas só ficaram piores então. Não quero isso com você.

—O que me faz tão diferente?— Ela sussurrou. —Quero dizer, como pode ficar comigo mais de uma vez?

—Me perguntei sobre isso, e acho que é porque meu desejo por você é mais poderoso que meu demônio.

—Isto é… Oh, Paris. Isto é a coisa mais doce que já ouvi.

—Bom. Agora é sua vez de uma confissão. Comece a falar.

 

—EU, HUMMM BEM, — Sienna disse.

—Vamos, Bebê. — Paris enfiou os dedos pelo cabelo dela. —Olhe além da minha personalidade terrível, aparência horrorosa e me dê uma chance. Me ensine como galantear você corretamente.

Ela bufou. —Discutiria a parte da aparência horrorosa.

—Mas não a personalidade terrível? Ai. Isso machuca, Bebê.

Seu próximo bufo foi meio tomado pelo riso. —Bem, isto não ensinará a você qualquer coisa, além da minha estupidez. Uma vez tentei pulverizar bronzeador nas minhas sardas e acabei parecendo uma cenoura doente.

—Adoro suas sardas, e minha fantasia favorita envolve lamber todas. Mais segredos, entretanto. Quero mais. — Estava tão faminto deles.

Uma pausa pesada, e quando falou, ela soltou o ar de seus pulmões. —O sujeito que me casaria, bem, teria seu bebê, mas no meio do caminho — um tremor balançou seu corpo —bem, eu a perdi. Minha menina. Posteriormente ele terminou comigo e partiu. Fui transferida para uma divisão diferente do empreendimento dos Caçadores.

—Oh, Sienna, oh, Bebê, sinto tanto.

—Eu me recuperei.

Ninguém nunca se recupera completamente desse tipo de perda.

—Nunca me permito pensar nela. Isto é provavelmente insalubre, mas…

—Mas é como sobrevive. Como a chamou?— Sabia que ela deu a pequena um nome.

Outra pausa, então uma hesitação, — Rebecca Skye.

Ele se lembrava de quando ela perguntou a ele se queria ter filhos. Ela queria ter outra? Provavelmente. A perda deixaria um ferimento dentro dela, um que nunca se curaria completamente. Conhecia bem esse tipo de perda. Mas a gravidez não era uma possibilidade para um não morto. Ainda, se perguntava se adoção era. Talvez ela pudesse cuidar de uma das crianças com habilidades inexplicáveis que Anya escondeu ao redor do mundo para salvá-las dos Caçadores. Sienna seria uma mãe surpreendente, protetora, amorosa, feroz.

—Ela está no céu, acho. Não no céu de Cronus, ou neste céu, ou onde quer que estejamos, e não no céu de Zacharel, também. Nunca disse isso a ninguém, mas quando morri, soube que existia um lugar maravilhoso para passar a eternidade, como também um lugar terrível. Talvez Cronus seja meu inferno pessoal, meu algo terrível, mas Rebecca está naquele outro lugar, que é muito melhor, onde alguém muito melhor que a Deidade de Cronus ou Zacharel governam. E agora quero conversar sobre qualquer outra coisa. Algo leve.

Leve. Ele podia dar algo leve, embora tivesse mil perguntas sobre este —lugar melhor— e este regente melhor, e seu sofrimento e seus sonhos. —Aprecio assistir comédias românticas, aventuras de ação, horror, qualquer coisa. Qualquer coisa exceto legendas. Essa porcaria artística é defeituosa. — Ele colocou a mão na bunda mais deliciosa do planeta e se encontrou duro novamente.

—Diga mais. — Com uma voz totalmente rouca ela disse, — Quero saber sobre você, também.

—Direi qualquer coisa que quiser saber. — E quis dizer isto.

—Você e seus amigos… são realmente próximos.

Aqueles mesmos amigos diriam a ele que ela desejava informações de forma que pudesse usar contra ele. Paris sabia melhor. —Fomos criados juntos. Somos uma família.

—Criados?

—Sim. Zeus nos fez do sangue de seus melhores guerreiros, aço, instintos mais básicos, coisas assim.

—Então não tem nenhuma mãe ou pai?

—Não!

—Sinto muito. A família de sangue não é sempre corações e flores, mas existe conforto lá. Sinto muito que não teve isto.

—Apenas me faz mais próximo dos meus meninos, mas às vezes me pergunto como seria. Então pensaria sobre o que tive, homens que morreriam por mim, e perceberia que tenho tudo que preciso.

—Ter alguém que está disposto a morrer por você é raro. E vários? Incrível.

—Sim. É.

—Estou contente que tenha isto. É melhor que família.

Quão saudosa soava. —Você não tem?

—Não. Nunca.

E isto fez quebrar seu coração. Poderia morrer por ela, ele pensou. Poderia me jogar contra uma espada por ela. —Agora sou a pessoa que sente muito. Quero dizer, morreu por mim, mas eu não o fiz — Oh, maldição. Palavras erradas. Ele esperou que ela ficasse tensa, esperou que seu humor se partisse.

Ela não fez, não partiu. —Sim, fiz, não é? Você é sortudo.

Nenhuma hostilidade, só uma diversão amável, um sonho contemplativo. Lá se foi seu coração novamente, quebrado em mais alguns pedaços.

—Quando nós nos encontramos, — ele disse, —alegou estar escrevendo um romance. Até tinha algumas páginas. Lembro como dispersaram aos seus pés quando esbarrei em você. Isso era verdade? Eram suas? Desde que acordei naquela cela, imaginei que era uma mentira, mas agora que a conheço melhor, penso de forma diferente.

—Eram minhas, sim. Amo romance, e quis escrever um. Talvez um dia. Não que exista uma editora para mortos.

—Bem, já tem audiência cativa. Quero ler o que escreveu, e o que um dia vai escrever. Promete?

Ela lambeu os lábios, sua língua acariciando sua pele, também, e oh, gostou disso. —Já, uh, se apaixonou?— Ela perguntou, ignorando sua demanda.

Certo, certo. Ele deixou sua falta de resposta sobre o romance sair. No momento. —Uma vez pensei que estivesse, mas não deu certo. E existiram algumas vezes depois de estar com uma mulher e desejar mais. Algumas vezes até tive encontros com uma mulher sem dormir com ela, pulando para outro tipo de relação, mas desde o princípio tinha que dormir com outras, então me sentia culpado e apenas parava de vê-la de forma que a culpa enfraquecia.

—Sinto muito.

—Não sinta. Não é sua culpa.

—Não ajuda aqueles Caçadores ameaçarem todo mundo que ama.

—Sim.

—Como lida com isso, tendo um grupo das pessoas caçando você, odiando você?

—Não é fácil, não mentirei. Às vezes nos empurramos acima da extremidade. Drogas, álcool, sexo, qualquer vício particular, mas continuamos e cuidamos uns dos outros. — O calor de sua respiração bateu sobre ele, o atormentando. —E ultimamente somos normais como a Família Addams, fazendo o negócio de corações e flores enquanto recebemos tudo que nossos inimigos lançam em nós.

Suas unhas cavaram em seu tórax. —Os Caçadores… mais da metade da organização tem a mente lavada. Somos informados repetidas vezes do quão mal vocês eram, como eram responsáveis por tudo ruim que já aconteceu, para todo mundo. Quão perfeita nossa vida poderia ser se partissem. Nos mostram retratos, retratos horríveis de tortura, doença e morte, e vivem de nossas debilidades. Como minha irmã, dizendo a mim que aquelas pequenas meninas não seriam sequestradas se não existisse nenhum demônio no mundo.

Primeiro ela perdeu sua irmã, então seu bebê. Ele a apertou forte. —Sinto muito pela perda dela. — Por toda a porcaria que ela sofreu durante sua vida muito curta. Porcaria que ele apenas aumentou. —Deveria dizer a você quando a mencionou, mas… 

— Mas acabávamos de nos reconectar e não confiávamos um no outro.

Ele beijou sua têmpora. —Sempre soubemos que os Caçadores estavam nos estudando. Isto é como soube que estava em Roma naquele dia? Como soube que o romance me distrairia, e que droga usar em mim?

—Soube por Stefano, meu chefe, e soube por Galen. Galen, estou certa, soube por Rhea, Esposa de Cronus. Engraçado, mas nunca entendi a cadeia de comando até depois da minha morte.

Paris não podia se controlar e deu outro beijo em sua têmpora. O assunto estava ficando pesado novamente, e não se importava com aquilo, queria passar por aquilo com ela, passar por tudo com ela, mas ela não queria e honraria seu desejo.

—Vou mudar de assunto por um minuto, certo?

Seu alívio era palpável à medida que ela falava. —Por favor, faça. — Uma de cada vez, arrancou suas unhas de sua pele.

—Sei que nunca foi casada, mas já… quis ser?— Ele tentou perguntar isto casualmente, como se a resposta não fosse importante, mas não podia evitar a nostalgia em seu tom.

Sua reação, quando veio, foi de choque, e não estava certo se isso era bom como uma festa-surpresa ou como se apertasse o freio de seu carro. Ela se empurrou em pé, aquela inundação escura de cabelo drapejando um ombro nu. Seus olhos ainda estavam mais verdes que marrons. Os lábios que beijou até que ficassem vermelhos estavam abertos.

—Eu… eu…

Cartas na mesa. Ele terminaria com isto. —Quero que se case comigo — ele disse. Queria que se amarrasse nele do mesmo modo que estava amarrado nela. Mentalmente, emocionalmente e fisicamente.

—Paris…

Ele passou os dedos por seu cabelo. —Não diga nada agora. Só pense sobre isto. — Porque não haveria mais conversa de separação. Ficariam juntos, e era isso. Não ia deixá-la ir, e certo como o inferno que não a enganaria. Não importava o custo para si mesmo.

De agora em diante, existia só uma capa para sua espada. Haveriam problemas? Complicações? Oh, sim. Provavelmente mais que estava ciente, e estava ciente do bastante. Mas preferia lidar com aqueles problemas com ela que ficar sem ela.

—Tenho que dizer algo a você, — ela sussurrou com a derrota retornando. —Eu menti. Eu não a matarei, e ele pode me manipular. Caso contrário, o resto de vocês estará morto também, e não posso permitir isso.

—Não matará quem? Quem pode manipular você? Diga-me, e resolverei.  Matarei seus dragões.

—Você não pode. Rhea, ela… ela… Quando minha irmã Skye foi levada, estávamos nadando. A nossa mãe nos disse para nunca irmos lá sozinhas, mas eu tinha quatorze e pensava que podia lidar com as coisas, e Skye queria tanto nadar. Nós deveríamos apenas caminhar no parque, mas fomos ao riacho invés disso. Estava tão cheio naquele dia, e tive que ir ao banheiro, e quando voltei, ela estava sendo arrastada para longe por um estranho. Todo mundo deve ter pensado que estava brincando, porque ninguém os parou, e não podia chegar até eles.

Ele abriu sua boca para oferecer conforto, dizer a ela que não era sua culpa, embora ela fosse contra as ordens de sua mãe, ela não era a pessoa que sequestrou a pequena menina, mas ela não acabou.

—Hoje soube que em todos estes anos Skye estava viva. Até recentemente. Foi assassinada. Rhea a assassinou. Se apenas a encontrasse mais cedo, mas não fiz, e agora tenho que viver sabendo que ela… que eu… — Estava divagando, as palavras vomitando como se estivessem presas por muito tempo e agora lutassem pela liberdade.

Ele se doeu por ela. Como nunca doeu por qualquer coisa, doeu por ela, e não tomou a decisão de matar seus dragões levianamente. Faria o que precisasse ser feito. —Continue Bebê.

Um tremor se moveu por ela. Ela vigorosamente inalou. —Cronus me disse que Skye era prisioneira de Galen, então me disse que realmente não sabia onde ela estava, então me mostrou seu corpo inanimado, sangrento.

Paris sabia que o bastardo era baixo, mas isto… não tinha nenhuma palavra. Seu contato com Cronus precisava acontecer logo e com facas. Nenhuma maravilha, Sienna estava tão chateada quando retornou ao castelo. —Sinto tanto, bebê. Se pudesse tirar sua dor, o faria. — Finalmente disse a ela o que queria dizer. —Isto não é sua culpa. Nunca foi sua culpa. Não é responsável pelas coisas que outras pessoas fazem. Nunca foi e nunca será. Mas sei que machuca, sei, e se quiser lidar com isto, ajudarei você.

—Ele me mostrou porque espera que eu vá espiar Galen e… ficar com ele.

—Quando diz ficar com Galen, quer dizer sexualmente?

Um aceno vergonhoso com a cabeça, e talvez até um pouco resolvida, como se não merecesse nada melhor.

—Até considerar isso me diz que quer castigar a si mesma, — ele disse com a compreensão dando um bofetão no seu rosto. —Pelo que fez a mim, e o que pensa que permitiu acontecer com sua irmã.

Seu queixo obstinadamente sobressaiu. —Talvez.

—Então, o que mais fez exatamente que a faz pensar que precisa ser castigada? Lutou por uma causa que acreditou? Checado. Dormiu com um homem pelo qual estava atraída, apesar de tudo? Checado. O salvou quando poderia tê-lo deixado para uma morte atormentadora? Checado.

Sua mão se fechou num (adequado) punho. —Disse a você que o odiava quando estava morrendo.

—Todo casal diz coisas que não querem dizer quando estão brigando.

—Bem, quis dizer isto no momento! E antes disto, droguei você.

—Sim, e planejei foder e deixar você como fiz com outras mil outras. — Ela vacilou em sua rudeza, mas ele continuou. —E acha o que? No momento estava alegre com isto. Amei mulheres, e as protegi, mas ainda as usei. Em minha mente, era meu direito. Precisei de um toque para acordar, e você me deu isto.

—Não, você...

—Não se desculpe para mim. Viu meu passado, e sabe que falei a verdade.

Ela mostrou seus dentes pra ele. —Então está dizendo que me aguenta com nenhuma má vontade? Nenhuma mesmo?— Um bufar carente de qualquer sugestão de diversão.

Ele pegou seu cabelo muito mais duro do que pretendia, mas não soltou seu aperto. —Bebê, estou dizendo que adoro você.

Uma vez mais, ela tentou uma resposta. A raiva drenava dela, e o desejo tomava conta. —Adora?— Ela gritou.

—Suas orelhas devem estar tapadas.

A aspereza de sua resposta a fez suspirar perplexa. —Estava errada mais cedo. Esta é a coisa mais doce que alguém já disse para mim.

—Nada pra dizer de volta?

—Bem, sim. Cronus disse que eu ficar com Galen é o único caminho para manter você e seus amigos seguros.

Inferno, não. Quando viviam nos céus, Galen foi um dos sujeitos que Paris recorria. Eles lutaram juntos. Paris admirou a distância sentimental do sujeito, sua habilidade em fazer qualquer coisa necessária para terminar um trabalho com sucesso. E certo, muitas vezes compartilharam mulheres, às vezes até ao mesmo tempo.

Não se importou então. Se importava agora. Não só porque Galen era um Inimigo, mas porque Sienna era sua e só sua. Ia ficar com ele.

—Não voltará para Galen. — Paris morreria primeiro. —E só um rápido PARA SUA INFORMAÇÃO. Aparentemente meus amigos encheram de balas o guardião da Esperança mais cedo hoje. Está inútil agora mesmo.

—Mas se recuperará, sei que vai, e então… então… — O resto da história a inundou. A Câmara do Futuro, os quadros, as três possíveis consequências para o mundo. Para Cronus. Para ele.

Muito para digerir de uma vez, mas ainda, nada mudava sua mente sobre Sienna ficar.

—Temos tempo, — ele disse. —Temos tempo para consertar isso, e iremos. Mas não vai voltar para ele. Você é minha. Só minha. E eu sou seu. Nunca dormirei com qualquer outra. Entende o que estou dizendo? Nunca. Quando disse que você era isto para mim, quis dizer isto. Ninguém mais, se estiver comigo ou não. E Sienna, ficará comigo.

Quando ele falou, sua boca caiu aberta, estalada. —Não diga coisas assim.

—Bebê, farei mais do que falar. Farei um juramento de sangue. — Ele agarrou os punhais sob o travesseiro, mas ela se lançou acima de seu corpo e rebateu a arma para o chão. Então, claramente suspeitando que pudesse pegar outra arma, bateu seu braço sobre o criado ao lado da cama e enviou a arma voando.

Ele não estava ofendido por sua resistência, entretanto. Ela o queria seguro, vivo, prosperando. Estava até disposta a sacrificar sua felicidade pela dele.

—Acabou de me desafiar?— Ele perguntou. Estavam carne contra carne, macho contra fêmea. Suas asas se estenderam, bloqueando o resto do quarto. Ela era tudo que ele via e tudo que sentia. Seus seios apertados em seu tórax, seus mamilos já enfeitados com contas para ele. Seu centro se esfregando contra seu comprimento inchado, e suas pernas abertas acima das dele. —Acho que acabou de me desafiar.

—Não. Não fiz.

—Fez. Fato rápido —mexe com as armas de um homem, e poderia também ter enfiado o joelho nas bolas dele. Conseguiria os mesmos resultados. Então aceito. — Movendo muito depressa de que forma que ela possivelmente não pudesse resistir, a virou, abrindo suas pernas e empurrando para o lado de dentro.

Nenhuma preliminar. Só sexo direto, duro, da forma mais básica. Ela estava molhada, tão, tão molhada, então não tiveram nenhum problema.

             —Paris!

—Sim, bebê, isto. Me tome.

—Isto é como recompensa todos os desafiantes?— Ela perguntou entre arquejos.

—Só você.

Seu gemido de prazer encheu o quarto, misturado com seu silvo de felicidade inexorável. Quando ele terminasse com ela, saberia a que homem pertencia — porque não existiria nenhuma parte sua deixada intocada.

 

GALEN APARECEU NO CENTRO DO QUARTO e Legion se encolheu em seu canto sombreado. Ela ficou aqui por mais de uma hora e não tinha nenhuma ideia de onde estava. Covarde como era não deixou a segurança relativa do quarto. Para seu alívio imenso, ninguém entrou também.

Entretanto esteve tentada, mas não explorou nem o resto do quarto. Pilhas magníficas e mais pilhas magníficas de moedas de ouro brilhante, joias reluzentes e armas estranhas e antigas abundavam. As armas que não podia usar contra seu capturador, então qual o ponto em estudá-las?

Enquanto Galen se vestia de branco no templo, agora usava uma bata vermelha. Algo estava pingando da bata vermelha. Ela fez uma carranca. Um cheiro de cobre cobriu o ar. Isto foi quando percebeu. Não era uma bata vermelha, mas uma bata encharcada de sangue.

Seus joelhos dobraram e ele caiu apenas se segurando para não bater o rosto. Suas asas estavam esfarrapadas, e cabos de lâmina e flechas estavam em seu tórax.

Todo aquele sangue…

—Mãos pegando em seus peitos, suas coxas...

—Dentes raspando em sua pele...

—Garras em seus olhos, os arrancando.

—Algo duro entre suas pernas...

—Riso, tanto riso...

—Correntes em seus pulsos, seus tornozelos.

A Bílis queimou buracos em seu estômago e escapou, rapidamente se espalhando pelo resto dela. Cobriu sua boca com uma mão trêmula, lutando contra as lágrimas. As memórias de seu tempo no inferno nunca a deixavam, mas às vezes a tomavam completamente, arrastando-a num tipo diferente de inferno. Um de humilhação, degradação e horror.

—Fox!— O grito de Galen ecoou. —Preciso de você.

Legion deve ter choramingado ao som daquele grito, porque a cabeça de Galen virou em sua direção. Seus olhos azuis celeste estavam com bordas vermelhas, suas bochechas listradas com sujeira. Ele iria assistir enquanto “Fox” fazia coisas com ela?

Sua expressão se suavizou. Só um pouco, mas suficiente para protelar a histeria. —Acha que estou numa condição ruim, devia ver o outro sujeito.

A esperança a alcançou, tentada a se embrulhar ao redor ela. Esperando algo melhor. Esperando um futuro com o homem na frente dela. Pânico se fundiu nela afinal, e lutou contra aqueles pensamentos com toda a sua força mental. Finalmente a esperança desapareceu.

—Por favor, não me machuque, — ela coaxou.

Ele fez uma carranca para ela.

Passos apressados além, e a porta abriu. Uma mulher alta, esbelta, com cabelo preto e traços angulosos fluiu dentro. Era atraente, de um modo real, com olhos parecendo chamas, uma mistura estranha de azul e ouro.

Mas existia um toque de cinza em sua pele, contusões sob seus olhos, apesar de segurar uma arma de fogo em cada mão, estava tremendo. Um rápido esquadrinhar, e achou Legion. Ergueu uma das armas de fogo.

Sim, Pensou Legion, estranhamente confortada, de repente. Sim. Um fim. Finalmente.

—Não!— Apesar de seus danos, Galen se jogou na frente dela.

A garota — Fox? — tirou seu dedo do gatilho numa batida de coração, e a arma foi abaixada.

A decepção caiu sobre os ombros de Legion. Talvez devesse ter se matado antes. Por que não o fez? De repente não sabia, não podia lembrar.

—Não a machucará, — Galen disse, com uma ameaça forte. — Nunca.

Confusão se juntou à decepção. A estava defendendo.

Fox correu sua língua acima de seus dentes. —Ela fez isso com você?

—Não. Agora me ajude até a cama.

Quando Fox embainhou suas armas, continuou olhando para Legion, estreitando os olhos com ódio. Mesmo quando abordou Galen, colocando o braço em torno do guerreiro e o ergueu em pé, manteve Legion à vista. Ele se debruçou jogando seu peso nela, e começaram seu caminho para a cama. Lentamente, cuidadosamente, ele sentou na extremidade do colchão.

Eram amantes? Legion se perguntou.

Visivelmente debilitando, agora ofegante, Galen disse, — Pegue suas ferramentas e tire essa merda de mim.

Com uma última advertência clara em direção a Legion, Fox voou para fora da porta.

—Ela obedecerá você?— Legion perguntou suavemente. —Sobre mim?

Os olhos azul-celeste a encontraram, as pálpebras pesadas, deixando seu olhar no modo sensual venha-para-a-cama, e ela se odiou por notar. —Sim. A única pessoa que precisa se preocupar é comigo.

Então. Ele planejou guardar a tortura toda para ele mesmo. E a torturaria. Ela não tinha nenhuma dúvida sobre isto.

—Algo cortando entre suas costelas...

—Hálito podre soprando sua orelha, traçando abaixo de seu tórax.

Ela embrulhou os braços ao redor de seu corpo. Se distraia. —Os Senhores fizeram isso com você?

—Sim, — ele disse. —Como prometido, os deixei ir sem machucá-los de volta.

—Obrigada. — A preocupação com eles era outra constante em sua vida.

Um momento longo passou em silêncio, permitindo que seus pensamentos uma vez mais se inclinassem fora de controle. Logo estava imaginando o que aconteceria uma vez que Galen se curasse. —Por que os odeia tanto?— Ela perguntou, só para encher o vazio.

—Não os odeio. — Ele equilibrou seus cotovelos em seus joelhos e seu peso em seus cotovelos. —Estou simplesmente me cuidando com relação a eles.

—Por quê?

—Quem mais faria? — Então, — Isso foi suficiente sobre mim. O que aconteceu com você no inferno?

O sangue foi drenado de seu rosto, então do resto de seu corpo, deixando somente frio e vazio. —Não posso… falar sobre isto, por favor, não me faça falar sobre isto.

Ele olhou fixamente para ela, emoções diferentes lavando seu rosto. Fúria, remorso, esperança, ciúme, fúria novamente.

Fox se apressou na entrada com a bolsa preta que segurava batendo em sua coxa com um baque alto. Legion enrolou seus joelhos em seu tórax, fazendo seu melhor para se tornar um objetivo menor, mas Fox não estava lá para intimidar, seu foco estava em Galen.

Ela abaixou na frente dele, abriu a bolsa, e pegou algo dentro. Depois de cortar sua bata, assobiou quando o examinou. —Isto vai doer como o inferno.

—Não importa. Faça o que for preciso.

Enquanto trabalhava, Legion manteve sua atenção atrás de sua cabeça. Talvez porque Galen manteve a sua nela, ainda olhando fixamente para ela, tentando ver além de sua pele, em sua alma.

Fox estava possuída por um demônio, ela percebeu. Tendo crescido entre os Senhores Escuros do Inferno, Legion sentiu o mal dentro dela, podia sentir o escoar de sua… desconfiança. Sim. Era isso que sentia roçando seus nervos.

Desconfiança. Um Alto Senhor. O mais forte dos fortes, um líder de muitos subordinados. Legion era subordinada de Discussão, e os dois demônios constantemente guerreavam, jogando seus exércitos um contra o outro. A desconfiança não estava mais… certa, entretanto. A malícia que vazava dos poros da garota era quase frenética. Nenhuma maravilha que sua pele estivesse cinzenta e seu rosto contundido. Devia ter que lutar com o demônio toda hora e todo dia para permanecer sã.

—Então, vai me dizer o que aconteceu?— Fox perguntou. —O que está acontecendo?

—Nada. — Galen respondeu. —Não quero falar.

—Faça isto de qualquer maneira. Vai para Roma para falar com os Tácitos e pegar a Capa, e fico sem ouvir a seu respeito por semanas. Pensei que estava morto. Então de repente volta, e praticamente está morto.

Ela removeu tudo que não pertencia a ele, e estava limpando o sangue de seu tórax. Quando o vermelho estava longe, começou a reconstituir as tatuagens em seu tórax, colocando sua pele no lugar. Uma mariposa acima de seu peitoral esquerdo, e outra acima de seu direito.

Duas mariposas?

Legion sacudiu a cabeça e seus olhares se encontraram. Ele ainda olhava para ela por aquelas pálpebras estreitas, desafiando-a a dizer algo. Ela engoliu, se mantendo quieta.

—Consegui algo, roubei a mulher de Maddox e a negociei por esta aqui. — Ele apontou para Legion com seu queixo. —Ei! Pode pelo menos fingir ser uma mulher e tentar ser gentil?

—Wuss. Por que ela?— Fox exigiu, espalhando algum tipo de pasta acima de cada um dos ferimentos.

—Não se preocupe com ela. É minha, e não me vai machucar. Não é, Legion?

Ela somente agitou sua cabeça.

—Diga isto. Diga as palavras.

Um tremor se moveu através dela. —Não vou machucar você. — Não podia. Ainda que a encadeasse e fizesse… e fizesse… Bílis se espalhando mais rápido e mais rápido…

—Porque estou escalando você para cuidar de mim, e tem que me obedecer, não é? — Não era uma pergunta.

—Sim, — ela sussurrou.

—Acalme-se, Homem Alegre, — Fox disse a ele. —Seu coração acelerou, e isso está fazendo você sangrar mais forte.

—Sabe que odeio quando me chama assim.

Ele murmurou a repreensão, mas não a atingiu, e isso chocou Legion até os ossos. Ele devia realmente gostar da mulher, pensou. E isso era… podia ser… ciúme nadando através dela?

De modo nenhum. Legion não queria nada com Galen. Nada! O odiava. Pelo que fez a Aeron, a Ashlyn.

Um pequeno momento mais tarde, Fox colocou a bandagem sobre ele e o deitou no colchão. Ela dobrou as cobertas ao redor dele e ficou lá, escovando o cabelo de seu rosto até que ele adormeceu com um último comando. —Não a machuque.

Isto foi quando Fox girou e nivelou Legion com o olhar fixo mais malvado que ela já viu e já ficou encadeada com o diabo por algum tempo.

—Galen pode pensar em você como sua, pequena garota, mas ele é meu. E eu protejo e vingo o que é meu. Você o machuca de qualquer forma, e nem mesmo ele poderá me impedir de machucar você.

 

CRONUS FERVEU QUANDO descobriu que seus Senhores acharam seu lugar escondido, o Reino de Sangue e Sombras, onde mantinha Sienna e três guerreiros demônios possessos que trancou lá. Invadiram seu castelo privado. Todos com exceção de Torin, o guardião da Enfermidade, que voltara à fortaleza em Budapeste, tendo recusado Lucien. Risco demais, ele disse, ainda que estivesse vestido da cabeça até o dedão do pé com equipamento protetor.

Um toque da pele de Torin contra a dele, e Lucien seria infectado com alguma doença e poderia infectar os outros guerreiros. Torin sempre punha seus amigos antes dele mesmo, sempre, uma atitude que Cronus não entendia ou respeitava. Mas Cronus pensou lembrar que existia um caminho para trabalhar esta situação a seu favor.

Torin faria qualquer coisa para tocar uma humana sem a machucar. Até aceitaria um presente que não era um presente. Um presente que era uma maldição. Um presente que era uma oração da morte. Um presente que arruinaria os próprios planos de Rhea. Não que fosse saber disto. Cronus riu.

Diferente de Lucien, Cronus não tinha que tocar alguém para movê-lo. Cronus simplesmente chamou, e Torin apareceu na frente dele.

O guerreiro apalpou duas lâminas em suas mãos enluvadas, procurando pelo culpado, até que se orientou em seu novo ambiente. Parou quando notou Cronus, entretanto seu olhar continuava a perambular, memorizando os detalhes, as saídas.

Um campo de ambrosia estirado por milhas, perfumando o ar, tão docemente, as pétalas violeta brilhando sob o cintilar de um sol que oferecia a quantia perfeita de luz e calor.

—Cronus, — Torin disse com um movimento de sua cabeça. Se estava chateado ou até emocionado sobre ser puxado de sua fortaleza em Budapeste pela primeira vez em séculos, não mostrava isto. Não se curvava, mas não desprezava.

Todos os seus problemas atuais se originavam de sua indulgência com os Senhores, Cronus meditou. Emitiram comandos e esperavam que ele obedecesse. Então, quando ele emitia comandos, recusavam, às vezes abertamente. Seu engano estava em tentar se conectar com eles, se tornar um deles. Devia ter provado sua força e demonstrado as consequências de desafiá-lo desde o início. Não era seu amigo, nunca seria seu amigo. Era seu rei, seu mestre.

E agora provaria isto.

—Você chamou?

Oh, sim. Provaria isto. Cronus o estudou, este guerreiro que ia usar. Torin tinha um cabelo branco que congelava os humanos pelo o resto de suas vidas se fossem azarados o suficiente para pegar um vislumbre único disto. Olhos de esmeralda, mais pecadores que qualquer coisa. Lábios que nunca conheceram uma fêmea.

—Caminhe comigo,— ele comandou, esperando complacência absoluta.

E conseguindo isto. Quando o guerreiro alcançou seu lado, andou a passos largos pelo campo, as folhas luxuriantes acariciando seu terno. Ele correu argumentos por sua mente, medindo os prós e contras de sua decisão.

—Então… o que está acontecendo?

O tom descarado o irritava, mas não fez nenhum comentário. No momento. —Eu tenho uma nova tarefa para você.

Um gemido. —Você e suas tarefas. Torture fulano. Mate siclano. Reúna meus meninos e mande-os à zona de perigo. Vamos ouvir esta nova. Estou certo que me encantará tanto quanto as outras.

—O tom, — ele estalou.

—Sim. Tenho um.

Calma. —E perderá sua língua se o usar novamente.

Silêncio.

Excelente. —Hoje, Enfermidade, dou a você um presente. O maior tesouro em minha possessão. Apesar de sua atitude desapontadora, ofensiva.

Aqueles olhos verdes rolaram. —Certo. Morderei. O que é este presente?

—Minha… chave. — Ele tinha que se desfazer dela, mesmo considerando pelo que passou para consegui-la.

—Grande, mas não tenho nenhuma ideia do que é isto.

Claro que não. Além de quatro outros, Cronus assassinou todo mundo que sabia disto. Quatro? Anya, a deusa menor da Anarquia e seu antigo possuidor: seu pai, Tartarus, que deu isto a ela; Lucien, que sabia todos os segredos de Anya; e Reyes, que uma vez ousou algemar Cronus e permutar pela liberdade da sua mulher. E o quarteto vivia só porque Cronus tinha uma utilidade para eles. Se falassem da chave, teria parado de se preocupar com sua utilidade, e sabiam disto.

—Esta chave destranca qualquer porta, qualquer prisão, qualquer maldição. Qualquer coisa. Nada pode prender você. E se alguém tentar tomar isto de você, morre. — Isso não significava que Torin estaria livre de seu demônio. Os dois estavam hipotecados, duas metades de um todo. Um não podia viver sem o outro.

—Soa bem, mas por que eu?

Porque Torin era solitário, gastando mais tempo só do que com seus amigos. Porque nunca se apaixonaria, nem trairia seus segredos por uma fêmea enquanto passassem tempo demais na cama. Algo que acontecia demais para o bem de Cronus. Algo que ele próprio uma vez foi culpado de fazer.

—Não pode dizer a ninguém sobre este presente, — ele continuou, não concedendo a resposta em voz alta, — Matarei você como também a quem você disser. Se tentar dar isto, matarei você e todos aqueles que ama. E, quando pedir a você para me devolver, fará sem vacilação. Um momento de resistência, só um, e farei mais que matar suas pessoas queridas. Eu os machucarei de modos que não pode imaginar.

Os passos largos propositados de Torin nunca hesitaram. —Sim, bem, obrigado por pensar em mim, mas prefiro comer merda.

Cronus enviou uma onda de poder ao homem, o derrubando. Ele bateu no chão, se contorcendo de dor, sangue saindo de suas orelhas.

Assomando acima dele, Cronus disse, — Estava dizendo?— Uma onda de sua mão, e a dor foi aliviada.

Torin ficou deitado lá, arquejando, gotejando com suor. —Estava dizendo que a merda é deliciosa, obrigado pelo pedaço.

Seus lábios se curvaram. Quebrar os Senhores claramente tomaria mais que seus habituais esforços. Sorriam quando os machucava, riam quando os ameaçava. Tanto quanto o deixava frustrado e bravo, também o fascinava. Apesar de tudo, eram honrados. Quando davam sua palavra, a mantinham. Uma prática tola, realmente.

Só quando ameaçava aqueles que amavam os fazia andar na linha com ele. Mas Torin não podia simplesmente cooperar por causa do medo. Não desta vez. Não com algo tão importante quanto a Chave Absoluta.

—Faça isto, mantenha a chave segura para mim, e concederei a você um benefício, — Cronus disse. —Qualquer coisa que deseje. Qualquer coisa que esteja em meu poder dar, claro.

Suspeita dançava nos olhos do guerreiro, e Cronus soube que estava pesando suas opções. Recuse o rei, e ele o castigará. Aceite, e terá um artifício em potencial. Traição. Mas para o prospecto de tal recompensa, não diria não.

—Acho que nós dois sabemos o que você quer, — Cronus apertou. —Uma chance de tocar uma mulher sem começar uma pestilência.

A respiração parou na garganta de Torin, e Cronus soube que acertou. —Pode me dar esta chance?

—De uma forma. O que aconteceu com o frasco de água que o anjo Lysander deu a você? — Se existisse uma gota, Torin poderia tocar numa mulher, então dar o frasco para ela e a salvar, a água sagrada curava qualquer ferimento em qualquer criatura. Ele a poderia tocar depois? Não, mas sua condição seria mudada.

—Acabou. E os anjos não nos darão mais.

Lamentável, mas compreensível. Os anjos tiveram que suportar coisas terríveis, terríveis até mesmo para ele, ao abordar o Rio da Vida de onde a água vinha. Cronus nunca ousou se aproximar disto. —Existe uma mulher… eu a forçarei a se encontrar com você. Pode tocá-la como desejar, e ela nunca adoecerá.

—Sim, uh, não obrigado. Quero escolher minha própria mulher.

—Isso não posso dar a você, e isso não é uma pechincha. Quer uma mulher para tocar. Posso dar a você uma.

Um longo silêncio passou enquanto Torin considerava a oferta. —Está morta?

—Não. Ela vive.

—Velha? Uma criança?

—Não. Não é muito velha, nem muito jovem.

—Como serei capaz...

—Respostas não fazem parte da pechincha, qualquer uma. Decida!

Finalmente Torin acenou a cabeça, como Cronus sabia que faria. —Muito bem. Temos um trato.

Não se permitiu sorrir. Quando a Chave Absoluta o deixasse, seus poderes deixariam Rhea. Ele poderia a encarcerar. Tê-la em sua clemência – ou falta dela.

O que não mencionou a Torin: A Chave Absoluta apagava a memória da pessoa que a doava. Exceto de Cronus, e provavelmente, por causa de sua conexão, de Rhea. Cronus criou a chave, e então se assegurou que isto nunca o afetaria. Porém a ninguém mais, incluindo Torin, se estendia a mesma cortesia.

Quando Torin curvou seus joelhos, como se empurrasse a si mesmo para levantar, Cronus agitou sua cabeça. —Fique aí. Isto pode machucar um pouco.

 

Do outro lado dos céus, Lysander andava na nuvem que compartilhava com sua Harpia acasalada, Bianka, suas asas estendidas e deslizando só o suficiente para deixá-lo pairando no lugar.

—Estou falhando com você, — Zacharel disse as palavras friccionadas. A nevasca que o seguia constantemente aumentando em ferocidade, os flocos grudando em seus cílios, entre as penas de suas asas, pesando nelas.

—Não falhou, e não falhará. Tenho fé completa em você. Agora, quero um relatório. Tem a garota?

—Enquanto pensava que podia se afastar de Paris em alguns dias, o par ficou mais íntimo. Pior, ela agora carrega sua escuridão. — Ele viu as sombras que rodavam em seus olhos depois que levou Paris para longe dela.

—A guerra sempre faz isso, — Lysander respondeu. —Ela ainda será de grande uso.

—Está certo? Cronus a enganou, a mantendo para ajudá-lo. Esperei que mentisse para ela, mas também esperei que seu demônio compreendesse. Não fez. E agora que Paris sabe de seu casamento com ela, lutará por ela até a morte. — Ele pensou que Paris nunca saberia da conexão, que foi a única razão que Zacharel ajudou a tatuá-lo. Caso se recusasse, Paris faria isto de qualquer maneira e começaria a resistir mais a frente.

—Cronus é um bobo avaro, mas Paris me surpreendeu. Pode ter compartilhado sua escuridão com ela, mas ela compartilhou um pouco de sua luz com ele. — Lysander pensou por um momento. —Se ele a quer como eu quero minha Bianka, não se separará dela facilmente.

Também verdade. Paixão, desejo, luxúria, como quisesse chamar aquela moda selvagem de acasalar, ainda permanecia completamente fora do reino da compreensão de Zacharel.

Como ímãs, Paris e Sienna eram atraídos um para o outro. Lutariam um pelo outro, e a divisão os destruiria. Que uma vez pensasse convencer Paris de boa vontade a se afastar dela foi tolo. Seria preciso a força.

—Qualquer coisa que deseje que eu faça,— ele disse, curvando sua cabeça, — farei. —

Lysander expeliu um suspiro cansado. —Precisamos dela. Não importa como, precisamos. Faça qualquer coisa que precise para convencê-la a nos apoiar. Se isto não for suficiente, simplesmente a leve.

 

Nas profundezas do inferno, Kane afundava dentro e fora da consciência. Tão vulnerável quanto estava quando dormiu, preferia isto ao invés de ficar incapacitado pela dor e ter seus intestinos enfiados dentro de seu corpo e sua carne grampeada em volta. Então, quando os grampos falharam, teve aquela carne danificada cauterizada com fogo líquido. Sentia como se alguém houvesse estacionado um ônibus em seu tórax, feito alguns donuts e então deixado os passageiros se dispersarem.

E o riso… oh, o riso de seu demônio. Desastre amava isto. Amava a dor, a degradação e o desamparo. Kane imaginava que isto era exatamente como Legion se sentiu quando esteve presa aqui.

Deveria a ter amparado melhor. Deveria tentar ajudar. Não que Kane quisesse ajudar a si mesmo. Parte dele ainda queria morrer.

Os cavaleiros — Black e Red — eram redentores tanto quanto tiranos. Quando gritou enquanto o “tratavam”, colocaram uma mordaça de bola em sua boca. Quando se debateu, o acorrentaram. Não eram cruéis sobre isto, entretanto; pareciam na verdade fazer um favor a ele. Uma razão pela qual não os levaria com ele quando saísse.

Red permanecia acima dele agora, soprando fumaça do charuto em sua direção. —Está bem para um pouco de pôquer já?

Sempre que o par percebia que estava acordado, sempre faziam a mesma pergunta.  Agitou sua cabeça, inseguro de por que um jogo de cartas era tão importante para eles.

—Vagabundo. — Uma decepção genuína brilhou em seus traços. —Logo, entretanto.

Kane movimentou a cabeça de acordo porque não sabia mais o que fazer, e fechou seus olhos. Sem qualquer resistência de sua parte, foi levado de volta ao seu lugar favorito, um vazio preto de nada.

 

Na manhã seguinte, após passar a noite toda fazendo amor com Sienna, Paris se banhou, vestiu as roupas que alguém trouxe de casa, armou-se e se assegurou que o punhal de cristal de Sienna estivesse sobre o criado mudo, pronto para ela usá-lo se fosse necessário. Embora odiasse deixá-la, saiu do quarto e entrou num mundo inteiramente novo.

Aparentemente Danika, o O Olho que Tudo Vê atual, previu que coisas terríveis aconteceriam na fortaleza em Budapeste, e sentiu que ficar perto de William era o único modo de sobreviver. Então, estavam todos aqui, uma família feliz — entretanto como seus amigos rapidamente instalaram uma academia, um bar e uma sala de entretenimento no castelo, Paris poderia nunca saber.

Se concentrou nas mudanças enquanto andava pelos corredores, assim não pensaria em sua mulher dormindo pacificamente em sua cama. Desnuda, saciada, avermelhada por sua boca, mãos e corpo. Não pensaria sobre os sons ofegantes que ela fez, o modo como gritou seu nome e implorou por mais. Não pensaria sobre o modo que o fez implorar por mais. O modo que se encaixavam tão malditamente perfeitos.

Talvez no início estivesse obcecado por ela sem realmente conhecê-la. Mas estava a conhecendo. Sob seu exterior cerimonioso e apropriado, e até mesmo sob aquela coluna de ferro de teimosia, era suave e gentil. Delicada. Ela amava com todo seu coração e lutava para proteger o que considerava seu. Inferno, ela sacrificou seu corpo, seu tempo e sua vida pelo que considerou dela.

Era dedicada. Aquele temperamento dela era um enorme tesão. A cada vez que jogava uma gaveta nele, ficava mais duro. Quantas fêmeas eram valentes o suficiente para desafiá-lo numa competição de força? Não muitas. Mas ela o fez, porque quando olhou para ele, viu além da face, do cabelo e do passado manchado, corrupto. Viu um homem. Só um homem.

Ele quase girou e retornou a passos largos de volta para seu quarto. Queria a excitação em seu rosto, suas unhas afundando em suas costas. Queria ser marcado a ferro por ela em todos os sentidos. Então, qualquer um que olhasse para ele saberia. Ele pertencia a ela. E...

Que diabos seria isso pendurado na parede? Deslizou numa parada. Como na fortaleza em Buda, havia retratos se enfileirando pelas paredes do corredor. Só que todos eram de Viola.

Viola num vestido. Viola em couro. Viola em pé. Viola se levantando. Viola olhando por cima do ombro. Uma série infinita de poses.

—De tirar o fôlego, não sou!— Uma declaração, não uma pergunta, vindo diretamente atrás dele. Viola se moveu para o lado dele, uma visão de beleza num top rosa e calças de cintura baixa. —Fui buscá-los numa das minhas casas.

—Uh, sim. Claro. De tirar o fôlego.

—Qual seu favorito?— Ela bateu uma ponta do dedo contra seu queixo, estudando-os. —Estou passando por um momento difícil escolhendo entre aquele e — todos os outros.

—Uh… deixe-me pensar sobre isto.

Enquanto fingia examiná-los, Sexo ronronou, querendo ser mais íntimo dela. Um segundo depois, Paris tinha uma enorme ereção. Merda. Passou uma mão por seu cabelo, envergonhado. Mesmo isto era como se fosse uma traição à Sienna.

Por que está fazendo isto comigo? Ele exigiu de seu demônio. Pensei que havíamos conversado sobre isto.

Trair me faz sentir bem. Quero me sentir bem.

Bem, a traição não vai acontecer. E quero que pense sobre isto um pouco. Toda vez que estamos com Sienna, é um acordo dois-por-um. Ou inferno, talvez até mais que isto. Ela é uma humana, um fantasma, uma fonte de ambrosia, uma ex-Caçadora e uma demônio, tudo embrulhado num gostoso pacote. E se formos infiéis a ela, a perderemos. E nunca conseguirá esse quinteto novamente.

Por que ela é uma orgia esperando para acontecer.

Exatamente.

Uma pausa demorada. Oh… bem… hmm.

—Então?— Viola insistiu.

Certo. O que a acalmaria? —Realmente não posso escolher. Todos são igualmente incríveis.

—Eu sei, certo. Mandarei entregar um em seu quarto. Você e sua mão podem passar incontáveis horas estudando os detalhes. Tenho algumas surpresas pintadas por toda parte. De nada. — Ela assobiou enquanto saltava longe.

Ele ficou ali um momento, pensando sobre o anjo caído que a desejava. Realmente devia ajudar a juntar os dois. Porque realmente, existiria um castigo pior para o sujeito que ficar com ela pela eternidade? Objeto de reflexão.

Ele bateu os pés no próximo corredor, e não ficou surpreso ao encontrar Anya tirando os retratos de Viola e substituindo-os por retratos dela mesma. A guerra da decoração estava ligada, supôs.

—Gwen, Kaia, sério— a deusa (menor) rebateu, tendo dificuldade em segurar a moldura e um martelo ao mesmo tempo em que se equilibrava numa escada. —Esta é a missão mais importante de suas vidas e estão no banco de reserva? Entrem aqui, cadelas preguiçosas!

Não querendo ser recrutado, Paris baixou a cabeça e continuou a caminhada, as mãos enfiadas nos bolsos. Pelo canto do olho pegou um vislumbre das irmãs Harpias num dos quartos, estudando um desenho de tamanho natural — e deformado — de Galen. O sujeito tinha chifres, dentes tortos e três dedos em cada mão. Seus pés de palhaço eram muito grandes para seu corpo, e no lugar de seus órgãos genitais tinha um X. Um X realmente pequeno.

Gwen estava fingindo puxar uma flecha, apontando para o coração dele e Kaia estava balançando a cabeça negativamente e apontando para a virilha do homem.

Sexo começou seu ronronar. Por hábito talvez, porque alguns segundos mais tarde, os ronronados enfraqueceram. Melhor parte? Paris não ficou duro.

Um suspiro cauteloso ecoou dentro de sua cabeça. Se vamos fazer esta coisa de relacionamento, precisarei dela com maior frequência.

O demônio estava disposto a tentar. Paris não pode evitar. Deu um soco no ar em direção ao teto. Acredite em mim, eu sei. E nós a teremos muito mais que apenas “frequentemente”.

Que maldito dia surpreendente estava para se tornar. Um sorriso megawatt floresceu. Sim, tinha um monte de merda para fazer. Conversar com Cronus, espancar a esposa do sujeito, matar Galen enquanto estava em seu momento mais fraco e encontrar Kane, mas primeiro, queria alcançar seus amigos e visitar as mais recentes adições à família.

Abaixo no próximo andar, estava uma mesa abarrotada de lanches. Sem diminuir a velocidade, agarrou uma maçã e uma caixa de Red Hots de Strider. Uma mordida na maçã seguida por alguns doces de canela e tinha a boca cheia de delícias.

Muitos de seus meninos estavam reunidos no corredor fora do quarto de Ashlyn, comendo, conversando, rindo e mais relaxados do que os viu há muito tempo. Assim era como suas vidas sempre deveriam ser, meditou.

William estava no canto, uma menina de cabeleira escura fincada ao seu lado, o par preso numa conversa séria. Gilly era uma adolescente no auge da feminilidade que sofreu abusos inimagináveis quando criança. Danika a abrigou e a menina era desconfiada ao redor de todo mundo, exceto William. Por alguma razão adorou o bastardo desde o início.

Talvez porque ainda não soubesse que William recentemente abateu toda a sua família. Paris se perguntou como ela reagiria quando a verdade viesse à tona. E viria; sempre vinha.

Gilly odiava sua mãe, padrasto e irmãos, mas no fundo provavelmente também os adorava, e era duro esquecer este tipo de sentimento. Cenário mais provável: ela partiria, e William a seguiria e protegeria. Não seria capaz de evitar. A necessidade de proteger estava enraizada na alma do homem, e uma vez que sentiu isto, era difícil esquecer, também.

Agora que William derramou sangue por ela, essa necessidade seria ainda mais forte, como Paris bem sabia. Toda vez que tomava uma vida, seu desespero para alcançar Sienna aumentava. Mas a tinha agora. Estavam juntos, e não a deixaria partir.

Quando Paris alcançou o casal, bateu no ombro da menina para chamar sua atenção. Ela gritou de surpresa, o estapeou por reflexo e afundou mais ao lado de William. Não querendo que ela assumisse que estava zangado ou que retaliaria, manteve seu olhar no guerreiro. —E a respeito dos três imortais?

Podia ter passado por seus quartos — estavam apenas mais abaixo no corredor — mas preferia descobrir pelo trem de fofoca que era a boca de William e ganhar tempo.

Willy franziu a testa para ele. — Que merda. Se desculpe.

Merda? —Ela não precisa se desculpar comigo. — Ele deu seu um sorriso tranquilizador. —Recentemente fui informado que tenho um rosto muito “estapeável”.

—Não estava falando com ela, estava falando com você. Desculpe-se por assustá-la.

Oh. —Desculpe, Gilly.

Ela ofereceu um sorriso suave de volta. Era uma coisinha bonita, com cabelo e olhos escuros, pele beijada pelo sol e o tipo de curvas que nenhum pai gostaria que sua filha tivesse. —Sem problema. Foi minha culpa. Perdi a noção do que me rodeia.

—Bem, posso ver por que quer sintonizar nas coisas ao invés de prestar atenção à careta feia de Willy.

Ela riu e Paris enfrentou William, dizendo: —Então, os imortais?

William encolheu os ombros. —Nenhuma mudança. Tentei tudo que pude pensar a respeito, e acredite em mim, foi uma mer... —uh, porcaria muito impressionante, mas nada feito do mesmo jeito. Estão bloqueados e bem apertados naqueles quartos.

—Alguma notícia sobre Kane?

—Uh, sim, sobre isto.— Com a mão livre, William massageou a parte detrás de seu pescoço. —Está vivo e no inferno, mas está fora das mãos de inimigos. Vocês o querem de volta, entretanto, terão que afundar lá e resgatá-lo.

Algo estava estranho no tom do sujeito. —Como sabe isto?— Nem mesmo Amun foi capaz de chegar à verdade.

—Só faça. O grupo sairá amanhã, e a propósito, não foi convidado. Meu palpite é que pensam que é um psicopata louco que “dá uns amassos” consigo mesmo, mas isto é só um palpite.

Tanto faz. —Quem vai?

—Amun, Haidee, Cameo, Strider e Kaia.

A maioria meninas. Suas forças de trabalho estavam mudando ou o quê? —Não vai com eles?

—É capaz. Quero dizer, com certeza, o tipo dos captores farão disto uma condição para soltar Kane, mas… não. Não acho que vá. Tenho coisas a fazer, sabe. Eu e minha Aussie temos uma noite íntima planejada.

Intimidade com seu condicionador. Imaginava. —Quem são os captores? E por que estão insistindo que você vá?— Não se preocupou em se aborrecer pela recusa de William porque, honestamente? Isso não significava uma merda. Se sua presença fosse uma condição para conseguir a liberdade de Kane, ele iria. Fim da história.

William olhou para Gilly, sua expressão toda gentil e reverenciada, e deu-lhe um pequeno empurrão. —Seja um amor e me encontre alguns Ursinhos Gummi.

Suas pálpebras, normalmente a meio-mastro e sempre a meio caminho para o quarto quando ela olhava para o guerreiro, se estreitaram. —Tão protetor.— Ainda assim, se afastou, exatamente como ele queria, oferecendo um pouco de privacidade.

—Certifique-se de prestar atenção à sua boca enquanto está procurando por meus doces,— William a chamou após. Foi quando Paris viu por um momento sua camiseta. Leia-se, Salve um Virgem, faça comigo como alternativa. —Responder não é atraente.

—Você está certo. Deveria respeitar os mais velhos. — Ela não voltou, mas estendeu a mão o afastando.

Paris riu. —O que está ensinando a esta menina?

De repente sério, William grunhiu, —Como sobreviver. Agora, retornando à nossa conversa.  Acontece que os captores de Kane são durões sérios que costumava conhecer lá embaixo.

“Durões” disparou uma memória. —Está falando sobre os Cavaleiros do Apocalipse, certo? Porque sim, Amun poderia ter mencionado que você é o papai do bebê.

—Aquele maldito Amun.— Olhos elétricos brilharam com a promessa de retribuição. —Que marica fofoqueira!

Voltando aos xingamentos, todos as maldições e merdas estavam fora da equação?

—Oh, e falando de fofoca,— William continuou, sua expressão agora antecipatória. —Já viu Sangue e Coágulo?

—Quem?

—Pistola e Canela. Eu os renomeio a cada hora, mais ou menos. Mantém as coisas frescas.

Sim, mas quais eram seus nomes verdadeiros? —É por isso que estou aqui. Quero conhecê-los.

—Bem, por que não disse isso?— William jogou um braço ao redor dos ombros dele e o conduziu pelo mar de corpos familiares. —Fora do caminho, mutantes. Meu menino P está passando.

—Mas é minha vez,— Cameo disse, e droga se não era lamento em sua voz, misturado com toda a miséria do mundo. Ela entrou na frente deles para bloquear o caminho para a porta, seus braços cruzados acima do tórax. —Sabia que sete mil bebês morrem todo ano de...

—É por isso que está sendo ignorada.—William ofereceu um sorriso doce. —Além disso, eu trouxe aqueles malvados ao mundo e quase tive um eterno cochilo sujo por causa disto. Escolho a ordem, e digo que Paris é o próximo.

Cameo franziu a testa. Era uma das mulheres mais bonitas que Paris já viu. Mais bonita até que Viola, com longo cabelo preto e olhos de prata líquida. Lábios tão rechonchudos e orvalhosos quanto uma rosa.

—Sabe que aproximadamente um por cento dos nascidos são natimortos?— Ela perguntou. O lamento se foi, deixando apenas a miséria.

Também era um infortúnio maior.

Me apunhale no coração já, Paris pensou. Porque ela bancava a anfitriã para o demônio da Miséria, o som de sua voz sempre suficiente para despedaçar um sujeito. Associe isso às suas estatísticas da morte, as quais oferecia cada vez mais sem ser solicitada, e assista a festa esvaziar como um balão.

—Alguém consiga um pirulito para esta menina e o empurre pela sua garganta, — William gritou, persuadindo Paris a passar por ela pela porta. Ele não bateu, mas tamborilou do lado de dentro. —Certo, senhoras. Nossa vez.

Reyes estava sentado ao lado da cama, escuro e ameaçador, com Strider, o loiro gigante, à esquerda. Ambos os guerreiros estavam arrulhando para o denso cobertor empacotado de alegria que Reyes segurava.

Ashlyn estava encostada na cama, pálida, trêmula e claramente cansada. Maddox sentado ao lado dela, segurando o outro pacote.

—Fora — William adicionou. —Paris quer ver Smith e Wesson.

—Não os chame disto — Maddox disse. Paris nunca ouviu o guardião de Violência usar um tom tão gentil. Era mais surpreendente que um soco no rosto.

—Do que quer que os chame? Merda e Sorriso? Punho e Joelho? Não, não gosto desses. Martelo e Prego? Cara, estas crianças são gângsters durões. Precisam de nomes de arrebentar, não aquele blá, blá de mer... — porcaria que deu a eles.

Lentamente Reyes parou, esperando que William se aproximasse e suavemente colocou o pacote em seus braços. O guerreiro escuro bateu levemente no ombro de Paris enquanto partia, e Strider fez o mesmo. Apenas, parou e disse: —Encontre-me no ginásio quando estiver pronto — antes de partir.

Lutando contra uma onda de mau agouro, Paris concordou. Então os dois foram embora, a porta fechou atrás deles, e tirou a conversa próxima de sua mente. Percorreu seu caminho até William, que parecia perfeitamente à vontade segurando um ser tão frágil. Só em segredo Paris alguma vez se permitiu contemplar ter uma família, porque de jeito nenhum queria ser pai de um garoto de apenas uma noite. Agora, com Sienna, a quem foi negada a chance de ser mãe...        

Queria lhe dar isso.

Ao lado de William, olhou para o primeiro bebê híbrido demônio-humano a se juntar à sua tripulação —e o que viu quase o chocou a ponto de fazê-lo molhar as calças.

—Pequena demôniazinha maravilhosa, não é? —William disse, sorrindo abaixo. Fazia cócegas na barriga dela. —Oh, sim, ela é. Sim, realmente é.

Gargalhando feliz, o bebê agitou os punhos pequenos. Seus olhos estavam abertos e claros, um vibrante ouro-laranja, e estupidamente inteligentes, apesar do fato que olhava para William com total e absoluta adoração. E sim, era linda. Já tinha uma camada de cabelo mel, encaracolado e pontudo acima de sua cabeça. Mas o choque real? Tinha a boca cheia de dentes. Realmente, dentes muito afiados. E aqueles pequenos punhos bonitos? Acabavam em garras onduladas.

—Será que nunca será capaz de passar por humana?  —Ele perguntou baixinho, não querendo que a mãe, provavelmente sensível, ouvisse.

—Talvez sim, talvez não —respondeu Ashlyn de qualquer maneira. —O tempo dirá. De qualquer maneira, ambos são bonitos além da imaginação.

Percebeu que ela o ouviu. Ela mesma podia ser humana, mas podia ouvir qualquer conversa em qualquer lugar, não importa quantos anos passassem. Esta era sua maldição. E mesmo que os gêmeos fossem realmente mimados, nunca seriam capazes de esconder qualquer coisa de sua mãe.

—Qual o nome dela?— Ele perguntou.

—Ever,— William disse com uma pequena quantidade de desgosto.

Ever fez uma bomba com o punho no ar. Com orgulho? Ou raiva?

—O nome é perfeito, assim como ela — Ashlyn disse. Suas pálpebras estavam tremulando, como se estivesse tendo dificuldade para ficar acordada.

—Volte a dormir, coração — Maddox disse a ela. —Cuidarei de tudo.

—Obrigada. — Ela disse enquanto suspirava, a cabeça já pendendo para o lado.

—Quer segurá-la?— William perguntou à Paris.

—Ashlyn? Não, obrigado. — Maddox arrancaria sua cabeça, o mesmo que Paris faria a qualquer guerreiro que tentasse segurar Sienna. Não que qualquer um, além de William e talvez Lucien pudessem vê-la no momento.

William revirou os olhos. —Sabe o que quis dizer. O bebê. Ever.

—Oh, uh, sim. Eu sabia o que quis dizer.

—Tem que falar tão alto?— Maddox estalou naquela baixa voz gentil muito em conflito com a aspereza de seus traços.

Paris levantou as mãos, palmas para fora, sussurrando, —De modo nenhum vou segurar a bebê. — Ele era muito grande, e muito duro para fazer qualquer coisa além de machucar a pequena. Além disso, Ever rosnava em sua direção, seus lábios descascando atrás de suas presas, e estava muito claro que estava feliz onde estava.

Ele se moveu ao redor do outro lado da cama, onde Maddox segurava o menino. Claro, o guerreiro irradiava orgulho enquanto alisava o cobertor do rosto da criança. Como Ever, o bebê parecia meses mais velho. Tinha uma camada de cabelo preto e seus olhos eram a mesma sombra violeta dos de seu papai e duros como diamantes. Dois pequenos chifres apontavam de seu crânio, e havia manchas de escamas em suas mãos. Aquelas escamas eram tão pretas e lisas como vidro.

Com intensidade focada, o menino estudou Paris. E Paris não teve nenhuma dúvida que a criança o avaliava numa batida de coração, descobrindo suas debilidades, suas falhas e seus hábitos ruins, e estava se preparando para o ataque.

—Qual o nome dele?

—Urban. —William respondeu antes que Maddox pudesse, e novamente era todo desgosto.

Ever e Urban. Atraente, de uma estranha maneira Hollywoodiana. —O que o fez escolher esses nomes em particular?

—Nós não escolhemos,— Maddox disse. —Eles escolheram.

Seus olhos se arregalaram. —Podem falar?

—Não, mas são muito bons em se comunicar.

E isso seria… como? —Então, ouvi que o nascimento foi problemático. Como William salvou o dia?

Maddox endureceu, assim como William agitou sua cabeça e colocou Ever no berço ao lado da cama. Quando se endireitou, William agitou a mão sobre o pescoço em movimento de corte. Um gesto de acabe-com-este-assunto-agora.

—Aquele filho da puta, maldito, bun... — cortou minha mulher, arrancou os bebês e a costurou. — As narinas de Maddox queimavam, de tão forte que respirava. —Sem anestesia.

William estalou sua mandíbula. —Não havia tempo. Estavam arranhando para sair, e esperar mais mataria sua Ashlyn, com certeza. E melhor um corte de punhal, que é liso, que o selvagem rasgo que vem com as garras. E a propósito, de nada. Estão todos vivos.

Bem, certo, então. Como um covarde, Paris abandonou o navio, deixando William suportar a ira de Maddox sozinho. Foi para o ginásio no piso inferior. Strider estava lá, como prometido, correndo na esteira como um homem possuído. Que era.

O cabelo loiro estava colado em sua cabeça, e rios de suor escorriam por sua pele profundamente bronzeada.

Torin, cabelos brancos, estava do outro lado da sala, o banco pressionado com peso suficiente para trincar o chão de mármore. Choque o enraizou no lugar por um momento. Torin nunca se aproximava das massas, com muito medo que alguém acidentalmente o tocasse.

Como chegou aqui, de qualquer maneira? Da última vez que Paris soube, Doença rejeitou a oferta de Lucien para viajar pelo ar. E quando, infernos, Torin conseguiu ficar tão musculoso? Normalmente se escondia em seu quarto, coberto de preto do pescoço aos pés. Agora, sem camisa, Paris viu que o sujeito tinha o corpo esculpido de alguém que podia chutar sua bunda.

Os dois homens pararam o que estavam fazendo quando perceberam que ele entrou. Paris arrancou sua camisa, sua arma com o coldre e suas lâminas, guardando-os num banco e se moveu para a esteira ao lado de Strider.

—O que queria conversar comigo?— Ele apertou alguns botões, e então a coisa estava se erguendo e se movendo, dando a ele um declive e um ritmo de corrida cansativo que pareceu incrivelmente bom. Não se exercitava assim há um bom tempo.

—O que é isto que estou ouvindo sobre você ter uma Caçadora invisível nas imediações?— Strider perguntou, pegando a toalha que Torin lançou nele. Enxugou seu rosto, seu olhar permanecendo em Paris. —A Caçadora possuída por Ira, poderia adicionar.

Deveria saber. —Ela não é uma Caçadora, não mais, e não está em discussão.

—Com o inferno que não está. Minha mulher está aqui.

—Sim, e sua mulher pode cuidar de si mesma.

Orgulho cintilou nos olhos marinhos de Strider. —Verdade o suficiente. O fato, porém, é que um inimigo invisível é o mais perigoso. Sua menina pode fazer todos os tipos de dano para todo mundo aqui.

Ele dobrou a velocidade acima de mil pontos, até que suas botas estavam martelando na base e sacudindo a máquina inteira. —Não está aqui para nos machucar.

—Sim, bem, tenho algo de instalação elétrica para fazer,— Torin disse atrás deles. —Vocês meninos têm um ao outro. — Passos, e então estavam apenas os dois.

—Está me dizendo que a garota que drogou você, que assistiu sua tortura, não é mais uma ameaça para você ou qualquer um?— Strider perguntou ceticamente. —Por favor.

—Resolvemos isto.— Suor enfeitava com gotas sua pele também, gotejando, gotejando. Seus músculos queimando apenas o necessário, absorvendo a tensão, amando isto.

—No papel, nenhuma dúvida, mas tudo isso significa que está pensando com algo diferente de seu cérebro. Tem que saber disto.

Não o desafie, não o desafie, não ouse desafiá-lo. Tinha que ser cuidadoso ao redor de Strider. Seu demônio tomava como exceção qualquer indício de confronto, e então Strider tinha que lutar, fazendo tudo em seu poder para vencer ou sofreria por dias, como castigo.

—Todo mundo aceitou Haidee, — Paris o lembrou, — e era uma Caçadora.

—Agora é a encarnação viva do Amor. É meio difícil não gostar ou não confiar nela. Sua garota, não podemos ver ou ouvir. Não podemos julgar suas ações e suas palavras por nós mesmos. Não podemos ver como ela é com você. E realmente precisa de outro se está pensando com suas partes baixas.

Escuridão… subindo… —Estou pedindo para se afastar, — Paris disse, — antes que as coisas fiquem desagradáveis e resolveremos isto da maneira mais dura. — Se tivesse que pegar a rota do desafio para fazer seu amigo parar de agredir verbalmente sua mulher, o faria.

Silêncio. Então, um horrível, —Eu sinto...

—Uma sensação em chamas quando urina?— Agora está apenas sendo mau.

—Muito maduro, — Strider disse, mas se acalmou um pouco. —Você e eu, temos história. Mais que os outros sabem, mais que nós dois nunca vamos querer reconhecer. Mas nós dois sabemos que é uma das razões pela qual separamos nossos caminhos quando os dois grupos se dividiram, eu com Sabin e você com Lucien.

O calor queimava as bochechas de Paris, e não tinha nada a ver com esforço físico. —Dissemos que nunca conversaríamos ou pensaríamos sobre isto. — E sempre manteve sua parte neste acordo.

—Aparentemente, os tempos mudaram. Você estava fraco, morrendo. Não existia nenhum humano ao redor, e se recusou a deixar algum de nós ajudá-lo.

—Cale-se. — Seu dia feliz estava rapidamente indo pelo ralo. —Apenas se cale.

—Então meu demônio começou a estudar o desafio, e cuidei de você. Agora estou pedindo para cuidar de seus amigos por sua vez. Livre-se da garota, — Strider continuou, ignorando o pedido. —Nos falta um artefato, apenas um, e uma vez que o encontremos, poderemos começar a procurar pela caixa de Pandora. Podemos finalmente nos salvar. Não só ela pode nos espiar, roubar e machucar nossos membros mais vulneráveis, como poderia arruinar nosso futuro. Só pense sobre isto. Por mim.

Strider jogou sua toalha no cesto e saiu da sala.

 

Para Sienna, os dias seguintes passaram numa névoa feliz pontuada por momentos de luto. Com exceção de duas coisas, tudo estava certo em seu mundo. Mas não ia pensar sobre essas duas coisas. Estouraria numa de suas iras raras e chocantes, e deixaria o castelo inteiro em pedaços.

Em vez disso, pensaria sobre o fato que Paris a adorava. Pensaria sobre todas as vezes que ela e Paris faziam amor, e como a cada vez ele estava mais frenético para conseguir gozar dentro dela do que antes. A tomou de formas que a escandalizou, encantou e emocionou, e no crepúsculo tranquilo, conversavam.

Nenhum assunto estava fora do limite. Discutiram os Caçadores — onde certas instalações estavam, os nomes de alguns dos oficiais mais graduados, a caverna onde Galen supostamente encontrava com Rhea e o casal realizava rituais para “o bem maior”. Então conversaram sobre eles mesmos, sobre onde viajariam e o que fariam se não existisse uma guerra para lutar.

Paris escolheu as montanhas, com o frio e a neve e um tapete suave na frente de uma lareira. Ela escolheu a praia, querendo vê-lo sair da água, gotas brilhantes correndo ao longo das cordas de seu estômago e chegando ao seu novo lugar favorito no corpo dele — porque as ondas teriam roubado seu traje de banho.

Claro, mais cedo nesta manhã ele saiu do chuveiro, encharcado, nenhuma toalha a vista, com um sorriso mau em seu rosto, e ela riu de sua travessura (depois que prendeu a respiração). Ela estava tentando desesperadamente proteger seu coração contra ele, apesar da exigência dele que ficassem juntos, porque sabia que ainda teria de deixá-lo por Galen, que teria de impedir Rhea de tomar o trono dos Titãs, que não podia matar sua maior inimiga porque fazendo isso mataria Cronus, e como ele disse, se morresse, o caos reinaria e Paris morreria.

O único caminho para salvá-lo era controlar Galen, e assim Rhea. Não era a melhor vingança, mas era tudo que podia se permitir.

Ela desejou que Skye pudesse ter conhecido Paris, desejou que a garota pudesse ter visto o bem nele, que o homem e o demônio não eram verdadeiramente um e o mesmo, que o demônio era escuro e perigoso, destrutivo, mas o homem era divertido e atencioso, merecedor de respeito. Assim como Sienna não era a soma total das ações de Ira, mas uma mulher que lutava por aquilo que estava certo.

Uma vez, Sienna considerou devolver o demônio para Aeron. Mas se o fizesse, ela morreria — real e eterno — e seria incapaz de vingar sua irmã, até da menor maneira. Além do mais, precisava dele. Ele ainda não compreendia o que estava “errado” com a morte de Skye.

Não chore, Enna. Os meninos são estúpidos, mamãe disse isso, e se aquele Todd gorducho não quer ir ao baile com você, é o mais estúpido de todos!

Eu sinto tanto sua falta, Skye. Sienna virou a esquina —e se deparou com um carrinho de golfe em alta velocidade. Depois do impacto-aterrissagem em sua bunda, viu que o carrinho era azul com chamas laranja pintadas nas laterais, e a deusa menor da além-vida / possuidora do Narcisismo estava ao volante.

—Desculpe, eu sinto muito. — A maior parte do tempo Sienna não se aborrecia observando aonde ia, porque só Paris, Viola e Lucien podiam vê-la e tocá-la.  Para todos os outros era um fantasma que ninguém sequer sabia da existência. Mas como o carro pertencia a Viola, Sienna pode sentir o metal que acabou achatando seus pulmões.

—Estou atrasada,— Viola disse, acenando um pedaço de jornal no ar. —Você também? Precisa de uma carona?

Como sempre, Ira bombardeou a mente de Sienna com imagens. Viola quebrando corações. Viola enganando outros para se salvar. Viola desinteressada pela dor que deixou ao partir.

Castigue…

Um sussurro em vez de um desejo. Por alguma razão, Ira estava em seu melhor comportamento ultimamente, nunca tentando a pegar, sua fome sob controle e, entretanto ela não fez nada para alimentá-lo.

—Sienna. Fêmea... pessoa fantasma. Precisa de uma carona? Tempo é um problema sério agora mesmo.

—Adoraria uma carona. — Precisava de alguns minutos a sós com a mulher, então isto era realmente perfeito. —Estive procurando por você. — Não aguentaria mais nenhuma má vontade vinda da mulher. Afinal, Sienna assistiu Paris interagir com ela, e o sujeito fingia muito mal sua impaciência para escapar.

Mas após toda sua observação, Sienna agora sabia como lidar com a deusa. Também sabia que Viola era uma das poucas pessoas que não a amaldiçoariam, e que a ouviriam.

—Bem, subindo e parando lá, todos perdidos em seus pensamentos. Não quero perder a parte boa.

Sienna não perguntou qual era a “boa parte”, porque a mulher explicaria com detalhes minuciosos sobre como tudo se referia a ela. Simplesmente se desdobrou para o chão e deslizou na cadeira de couro de pelúcia, cuidadosa com suas asas.

—Bem?— A deusa solicitou, pisando no pedal. Sacudiram com o movimento, cortando cantos, buzinando para o nada, relampejando suas luzes. —Sobre o que queria conversar comigo?

Para começar: bajulação. —Sendo tão inteligente e poderosa quanto é, é a única capaz de me ajudar.

—Bem, claro que sou. Este é um fato bem conhecido. Sou mais do que incrível. Sou a incrível original. — Por trás do volante, Viola sacudiu seu cabelo pálido acima de seu ombro. Usava um vestido de ouro cintilante, o material só apertado sob seus seios e deslumbrante em seus quadris. Digno de tapete vermelho, com certeza. —Eeeee?

—Estou tentando descobrir a melhor forma de pedir o que preciso.

—Tente abrir sua boca formando palavras. É isso que faço, e posso assegurar que meus métodos são sempre estelares.

Sienna passou a língua sobre os dentes, não se permitindo emitir uma réplica mal humorada. Não achou que Viola quisesse parecer tão arrogante, mas olá, uma garota apenas podia aguentar um tanto. —Bem, estou ficando sem tempo.

E lá estava a razão principal para sua recente série de acessos temperamentais de raiva. Seu tempo aqui estava passando, passando longe. Logo teria que partir. Não só porque ouviu alguns dos amigos de Paris conspirando sua queda, e não só porque aqueles mesmos amigos odiavam sua coragem e nunca confiariam ou a perdoariam, mas porque realmente ia para Galen, mantendo-o longe de Cronus, de forma que Cronus pudesse manter Rhea longe de seu trono, não importando quão doentio fossem as tarefas que teria que encarar.

—Quer que eu compre mais tempo para você? —Viola perguntou, como se tal coisa fosse possível. Chegaram na escada. Sem pausa, ela subiu. Salto, salto, salto. —Teria que me pagar de volta. Quero dizer, com duzentos por cento de juros, mas...

—Não, eu… bem, quando eu partir, Paris enfraquecerá.— Sua cabeça se chocou contra o teto do veículo. Oh, por favor, por favor, não deixe que minha próxima morte seja um trágico acidente de carrinho de golfe. —Não sei se sabe disto, mas tem de fazer sexo todos os dias ou seu corpo fica enfraquecido. Seu demônio é… necessitado, sabe.

—Blá, blá, blá.— Aterrissando suavemente, o carro saiu em velocidade total. (Quarenta quilômetros por hora).

Ela mordeu sua língua para segurar sua réplica. —Quando eu for, quero que se certifique que Paris durma com as mulheres que Lucien trouxer, e que ele continue dormindo com elas.

E lá se foi a segunda razão para seus acessos temperamentais de raiva. Devido à pressão dos mais ferrenhos inimigos de Sienna, Lucien continuava desaparecendo e reaparecendo com uma nova mulher na esperança que aquela seduzisse Paris para longe dela.

Enquanto Paris podia facilmente ignorar seus amigos, a persistente e determinada Viola encontraria uma forma de atingir seus objetivos. Caso contrário, ela seria um fracasso, e a deusa nunca se permitiria ser um fracasso.

—O que estou ouvindo é que sou a única coisa entre seu homem e sua morte certa,— Viola disse. —Então o que ganho se o salvar?

Por um momento, Sienna não pôde responder; existia um caroço gigante em sua garganta. Isto a estava matando. Queria Paris todo só para ela, agora e sempre, e oh, realmente amava o homem, não é? Corpo, coração e alma, o amava. Foi se apaixonando lenta e fixamente, mas agora estava de cara no chão, nada além de uma poça de amor.

Ele era tudo para ela. Sua luz quando coisas se tornavam muito escuras. Quando chorava, ele a confortava. Quando ela ria, ele ria com ela. A tratou como se fosse um tesouro especial. A protegeu, se importando com cada dor e sofrimento que pudesse enfrentar.

Ela despedaçaria o mundo para mantê-lo a salvo. Ela de boa vontade sofreria sem ele, desde que soubesse que estava lá fora, vivo.

—O que gostaria de mim?— Sienna não ia discutir. O que a deusa quisesse, daria. Simples assim.

—Você é Ira, certo? Bem, quando eu chamá-la para matar um de meus inimigos, tem que matá-lo. Nenhuma pergunta, nenhuma hesitação.

—Desde que o inimigo em questão não seja alguém que Paris ou seus amigos conheçam e gostem. Ou queiram vivo.

A deusa pensou por um momento, movimentou a cabeça. —Temos um acordo.

—Bom. Agora, tenho outro pedido para você.— Ela esboçou o que queria.

Viola deu um sorriso malicioso. —Cruel e bastante chocante vindo de você. Não tinha nenhuma ideia que era para isso. Parece tão tímida. Mas são sempre os mais tímidos, não é?

—Fará isto?

—Me deverá dois assassinatos, mesmas condições.

—Feito.— Estava feito.

—Agora, segure firme por que estou acionando este bebê. Estou certa que não começarão sem mim, mas estes Senhores às vezes desafiam a lógica, então nunca se sabe.

—Oh, bom.— Uma mulher com cabelo escuro ondulado, um rosto tão inocente como de um querubim e asas do mais puro branco apenas apareceu na frente delas. —Achei você.

Viola pisou no freio, e o carro derrapou a alguns centímetros da parada esmagando a recém-chegada sob os pneus. —O que há com todas essas senhoras saltando na minha frente, me impedindo de chegar onde quero? Muito ciúme?

—Procuro Sienna.

—Eu?— O coração de Sienna de repente parecia como se fosse injetado com adrenalina. Isso pareceu íntimo, com certeza, mas não era por isso que estava palpitando. —Céu,— ela sussurrou, o anseio reverente em sua voz fluía diretamente de seu demônio.

—Sim, você. Sou Olivia,— o anjo disse com um sorriso doce. Uma túnica branca a vestia dos ombros aos tornozelos, fazendo-a parecer como se tivesse saído de um sonho.

Viola saltou do carro e se apressou para passar Olivia. —Divirtam-se meninas, sou necessária em outro lugar.— O cabelo pálido fluindo atrás dela, e desapareceu no salão de baile cerca de um metro à frente.

—Reconheço você,— Sienna disse, embora as duas nunca se encontrassem. Estava com as pernas trêmulas e diminuiu a distância —Céu, meu céu —e estendeu a mão, apertando um dos cachos entre os dedos. Macio, sedoso. —Ira ama você, imagino.

O sorriso de Olivia iluminou-se como um raio de sol enquanto arranhava Sienna atrás de sua orelha. —Como meu menino querido está indo?

Ira ronronou como um gatinho.

—Ele está, uh, bem.

—Fico feliz. Ele realmente é um amor, não é?

Ira?

O demônio rolou de costas, chutou e suas pernas se agitaram enquanto grandes ondas de êxtase tomavam conta dele.

—Vamos — você e eu — conversar mais tarde, certo?— Olivia disse, o braço caindo para seu lado. Enquanto Ira fazia beicinho como uma criança, a anjo acrescentou, —Aeron mandou que achasse você. Ele queria conversar com você ele mesmo, mas não pode vê-la e conversar com a mulher que tem seu Ira e através de um terceiro seria muito doloroso. Talvez um dia. Mas divago. Ele está pronto para deixar este castelo e caçar Legion, mas não porque Paris está prestes a ter um aneurisma. Pelo menos, foi o que Aeron disse, e pensa que é a única que pode tranquilizar seu menino.

Paris. A preocupação imediatamente a inundou, a preocupação de seu demônio com a anjo obscurecida. —Onde está ele?

—Basta seguir o caminho traçado por Viola. — Andando para o lado, Olivia apontou em direção ao salão de baile.

Sienna disparou em movimento, voando pela entrada aberta e uma vez mais parando abruptamente. Um grupo de guerreiros e suas companheiras estavam sob uma bandeira que dizia apenas INTERVENÇÃO em letras garrafais. Cada um segurava um pedaço de papel. Viola tomou seu lugar no centro, movendo-se ansiosamente, pronta para dizer sua parte.

Sienna fixou o olhar no guerreiro chamado Aeron, o homem que uma vez hospedou Ira. Tinha cabelo escuro raspado, lindos olhos violeta, e seu corpo, que uma vez foi coberto pelas imagens tatuadas das vítimas de sua ira de sangue, agora lentamente estava sendo coberto com tatuagens de seu anjo.

Vendo-o, Ira enlouqueceu dentro da cabeça de Sienna, querendo o alcançar, tocar no guerreiro. Amigo. Meu amigo.

Eu sei, mas agora não é o momento para alcança-lo. Honestamente? Ela não tinha certeza se qualquer hora seria a certa. O sujeito a assustava. Parecia comer gatinhos no café da manhã e dedos polegares no almoço. Seu jantar não era algo que ousasse contemplar. Os órgãos poderiam estar envolvidos.

Ira fez beicinho. O demônio queria estar de volta dentro de Aeron tanto como Sienna queria se livrar dele. Mas ela mudou de ideia, e esperava que Ira também. Não estava implorando para se livrar dela. Por tudo que ela sabia, estava tão viciado em Paris quanto ela.

Amigo. Converse com o amigo.

Logo, ela prometeu. Ira choramingou, e teve que se forçar a desviar o olhar. Paris estava na frente do grupo, de costas para Sienna. Sua pele bronzeada pelo sol estava nua da cintura para cima, e seus músculos estavam tensos. Ao seu lado, suas mãos eram punhos.

Anya estava lendo sua carta em voz alta. —Você está bem, acho. Quero dizer, se Lucien diz que você é uma boa pessoa, você é uma boa pessoa. Acho que tem um corpo realmente quente com muitos músculos e tendões deliciosos, e mesmo que tocasse você, exceto por uma emergência médica, muitas mulheres com baixa autoestima estariam totalmente dispostas a isto.

—Anya,— Lucien disse com um caminhão de exasperação.

Ela olhou para ele, toda inocência. —O que? Disse para começar a carta com elogios antes de entrar na raiz do problema. Agora se cale assim posso terminar. Já vai ler a sua. — Ela limpou a garganta, voltando a olhar o papel. —Ficar com uma mulher invisível é uma doença. E realmente assustador. Se vir você com suas mãos apertando o ar mais uma vez, vou lixar minhas córneas.

—Suficiente — Paris disse com ameaça baixa.

—Minha vez — Viola disse.

Ignorando os dois, a deusa da Anarquia rapidamente continuou. —Adicione o fato que o Bebê invisível é uma Caçadora, e tem uma receita para oh, merda. O que não é bom para sua saúde. Ou a nossa. Principalmente a nossa. É por isso que humilmente pedimos que entre em algum tipo de programa de tratamento antes daquela mulher te colocar num programa de morte com armas de fogo, facas e uma prateleira. E por prateleira não quero dizer seios.

Uau, isso machucava. Não deveria. Sienna causou este problema para si mesma, mereceu isto cem por cento, e não fez nada para ganhar a confiança deles. Ainda. Ouch. Os amigos do seu amante organizaram uma intervenção para tirar Sienna de suas vidas.

Uma das mãos de Paris deslizou ao redor de sua cintura, seus dedos enrolando em torno do cabo de uma faca.

Ia explodir, ela pensou, e não o queria em guerra com seus amigos por sua causa. Não agora, nem nunca. Então, sim, ia partir. Mais cedo em vez de mais tarde.

O peito apertava, anunciando as lanças afiadas da dor de um coração partido. Não importava, entretanto. Ficaria mais um dia com ele. Apenas um. Então, adeus para sempre. —Paris, — ela disse, fazendo seu melhor para esconder sua mágoa.

Ele girou, aqueles azuis elétricos que tanto amava crepitando com fúria, as sombras maliciosas dançando por suas profundidades.

Suavemente ela disse, —Venha até o telhado comigo, — e acenou. —Preciso praticar meu voo.— Verdade, e era a razão pela qual não deixava a fortaleza neste segundo, ao invés de se permitir este dia extra com ele. Tinha que estar preparada para qualquer coisa. E, sim, queria dizer adeus corretamente, na cama. —Não precisa se preocupar com as vinhas de lá. As gárgulas comeram e as paredes estão limpas, o sangue de William está nas calhas, verifiquei, então as sombras não nos aborrecerão. Nenhum de nós.

—Meus amigos estão… Precisam de…— Estava arrastando oxigênio por seu nariz muito intensamente, suas narinas queimando.

—Não, eles não estão. Não vai brigar com eles por isso. — Um comando que não tinha nenhum poder para obrigar, mas um que podia ver.

—Sim, eu vou.

Atrás dele, Viola relatou a conversa que só ela e Lucien podiam ouvir, claramente emocionada por ser o centro da atenção. Sienna a afastou. Só Paris importava neste momento.

Mais vigorosamente, disse, —Paris, não estou ofendida por isto.— Ela estava destruída. —Agora venha aqui. Preciso de um líder de torcida, e estou pensando que ficará ótimo numa saia, segurando pom-pons.

Ele não abriu um sorriso. Aquela profana, malévola raiva ainda o mantinha num abraço apertado. Então, realmente, existia apenas outra coisa a fazer.

—Me pegue,— ela disse, correndo para ele. Ele nunca perdoaria a si mesmo se lutasse com suas pessoas queridas.

—Não, não chegue perto de mim quando estou como… isto. Humph.

Ela se jogou nele. Aqueles braços fortes realmente a pegaram, se enrolando ao redor e fixando como correntes. Tremores vibravam dele para ela.

Agindo rápido, beliscou sua orelha. —Se os machucar, conseguirá sangue nas paredes do meu castelo — bem, mais sangue, e ficarei muito chateada. — Apenas uma vez antes tentou usar artimanhas femininas, e aquela foi a primeira vez que se encontraram. Agora ela ergueu sua cabeça só o suficiente para ele ver seu rosto, e bateu os cílios. —Por favor, venha para o telhado comigo. Por favor.

Ele olhou para ela por um longo tempo, em silêncio, antes de finalmente relaxar. Apertou um beijo diretamente em sua boca, ousando o mais rápido dos gostos, a provocação, antes sair com ela ainda presa em seus braços.

—Meus olhos, — Anya lamentou. —Oh, meus olhos.

—Acho que acabamos de cometer um engano enorme, — Lucien disse gravemente.

Paris sequer olhou para trás, e nem Sienna.

 

No momento que Paris andou sobre o telhado, sentiu o mal esperando para atacar. Graças ao sangue de William, as sombras não podiam entrar no castelo ou passar pela grade, assim como Sienna disse, mas o que esperava por ele não era exatamente uma sombra.

Não querendo nenhuma parte da próxima ação, Sexo retrocedeu mais rápido que nunca.

Tateando suas lâminas de cristal — não, a lâmina, tinha apenas uma agora — Paris manobrou Sienna em pé e atrás dele. O céu era uma tira de veludo preto sem brilho de estrelas, a lua um gancho carmesim no canto, da mesma maneira que antes. Umidade se agarrava ao ar, quente em alguns lugares, fria em outros.

Ou Sienna sentiu a ameaça também, ou soube que não era para distraí-lo. Permaneceu quieta. Seu olhar se fixou nas setas, fixo num pedaço mais escuro de ônix e, merda, outro pedaço escuro, então outro, deslizando juntos, se fundindo, prolongando… até que um homem estava diante deles, envolto pela negra névoa como um véu na frente dele.

Sienna ofegou. Em fascínio ou horror, não estava certo.

O cara era bonito, se gostasse de assassinos em série, com olhos pretos frios, mais músculos que até mesmo Paris ostentava, e ombros largos o suficiente para derrubar toda a primeira linha de defesa num jogo do futebol.

Paris se agachou, uma serpente enrolada pronta para dar o bote e morder. O cara cometeu um engano, se aproximando agora. Desde que Paris entrou naquela intervenção e percebeu que seus amigos ainda o instigavam a abandonar Sienna, a fúria era uma maré em ebulição dentro dele.

Entendia as razões deles. Entendia. E não podia culpá-los. Mas fazer o que fizeram abertamente, só para magoá-la, era levar as coisas longe demais.

Ele ordenou ao seu cristal que se tornasse uma arma capaz de matar a criatura, e a coisa imediatamente se transformou em... um laser? Alguém faça Há Há Há para Debbie Downer, porque seriamente. Tipo, se sentiu como se estivesse indo para um tiroteio com, bem, um laser bizarro.

O Homem Sombra riu, um som bizarro e sem nenhuma alegria. —Sei o que quer saber. Posso ignorar o sangue, sim. E o farei, se precisar. Meus fantasmas se alimentam de imortais, e este é o pagamento devido por sua permanência. Ainda agora abriga o Senhor da Escuridão, seu inimigo, e afasta meus meninos de suas obrigações. Isto é inaceitável.

—Seus fantasmas não vão se alimentar dos meus amigos. — Ele recordou do guerreiro deitado numa poça de seu próprio sangue, o que restava de suas entranhas caídas pelo chão. A dor do prisioneiro foi insuportável para testemunhar, então Paris só podia imaginar o que o sujeito sentiu.

—Outros acordos devem ser feitos, ou forçarei você a sair do meu reino. Não gostará de meus métodos, asseguro.

Existia um tempo para confrontação física, e um tempo para barganhar. —O que mais eles gostariam de comer?

—Imortais.— Cortou, bravo. —Apenas imortais.

—Então temos um problema.— Ele recuou, encostando Sienna na porta.

O Homem Sombra avançou, aquela névoa escura se alongando e deslizando como asas. Paris balançou a lanterna, seu polegar sacudindo o interruptor. A luz branca cortou a escuridão, mas antes que atingisse seu oponente, o homem rolou através do ar para fora de alcance.

Quando se acalmou, eles se enfrentaram. Paris girou a lanterna fina na palma de sua mão. —Isso é tudo que tem? Huh?— Uma provocação destinada a ganhar tempo suficiente para Sienna escapar para o lado de dentro. Ele esperava que ela entendesse isto, mas ele não pode ouvir passos, não pode ouvir o estrondo de porta.

—Se mostrasse a você o que tenho, seria a última coisa que veria.

—Prove isto.

Assim, estavam um no outro, uma dança coreografada saída diretamente da Guerra nas Estrelas. Engraçado que ambos soubessem os movimentos. Paris usou o laser como um sabre de luz, girando a corrente de ouro enquanto contorcia seu corpo de lado a fim de evitar o toque daquelas asas nubladas.

Finalmente, contato. Quando a luz fatiou uma das pernas do Homem Sombra, houve um cheiro, um aumento de vapor, e o grandalhão soltou um grito de morte, sua raiva parecendo pequenas balas que bombardeavam contra a cabeça de Paris, fazendo-o tropeçar.

Aquele tropeção custou caro.

Uma daquelas asas escuras agarrou e atingiu seu braço com tanta força que a lanterna voou de seu aperto. Não era névoa, afinal. Então aquele grande corpo o engolfou, se fechando ao redor dele. Gritos, milhares e milhares de gritos, ecoavam ao redor dele. Tão alto que estourou seus tímpanos despejando sangue morno por seus lóbulos.

Soltando seu próprio grito, cobriu suas orelhas e caiu de joelhos. As formigas rastejavam por todo seu corpo, seguramente comendo sua carne, o rasgando, consumindo mordida após mordida gostosa.

Outro grito de morte soou, e a escuridão imediatamente se levantou dele. Levou um momento para se orientar, e o que viu o fez querer vomitar. O Homem Sombra estava a poucos metros de distância, e Sienna o mantinha afastado com a lanterna. Suas bocas estavam se movendo, mas Paris não podia ouvir o que diziam.

Até… boom, seus tímpanos se curaram e o volume voltou numa explosão de barulho.

—Quantos estaria disposto a aceitar… consumir?— Sienna estava dizendo, tentando não revelar seu desgosto.

—Cinco. Por dia.

—Nunca conseguiram cinco antes! Um,— ela estalou. —Por semana.

—Três. Por dia.

—Três. Por semana.

Um momento de silêncio antes do Homem Sombra movimentar a cabeça. —Concordo. O primeiro pagamento deve ser feito hoje.

—Sim, mas só se todos nós — os Senhores, seus entes queridos, os bebês, os imortais, eu — estivermos seguros, não importando onde formos neste reino ou o que fizermos.

Outro momento de silêncio, outro aceno de cabeça. —Então negócio fechado. Mas melhor se apressar, fêmea. Poderia mudar de ideia antes do primeiro pagamento ser entregue.— Com isto, a névoa preta se diluiu, separou e desapareceu completamente.

Sienna correu para o lado de Paris e caiu de joelhos, batendo levemente nele, verificando os danos.

—Está bem?

Ele abaixou a cabeça. Ele não a salvou, não a ajudou. Ela teve de salvá-lo. Ela teve que ajudá-lo. Ele a decepcionou de tantas formas. Que tipo de guerreiro era?

—Sinto muito, Bebê.

—O que? Por que?— Ela entregou a lanterna.

Um comando mental rápido, e a lâmina de cristal retornou. A escondeu em sua cintura. —Desapontei você. Podia ser machucada. — E Zacharel o advertiu sobre isto, não foi? Aquele temperamento de Paris levaria vantagem sobre ele e machucaria sua mulher. Ele pensou que significava que a atacaria, o que sabia que nunca aconteceria. Mas, não. O anjo sabia melhor. Seu temperamento o faria perder o foco, permitindo que outros a machucassem.

Sim. Bem. Isso não aconteceria novamente. Se manteria controlado, não importando que diabos tivesse que fazer.

—Paris, nunca me desapontou,— ela disse magoada.

Sim, ele fez, mas isso acabava agora. Seus músculos da coxa queimavam como um filho da puta enquanto ficava em pé. A ajudou a fazer o mesmo. Dentro do castelo, a colocou num canto, verificou a única janela na pequena alcova para ter certeza que o sangue de William ainda estava espalhado por cima — e estava — então colocou as palmas nas bochechas dela.

—Fique aqui por mim, certo? Preciso dizer a Lucien para nos achar três aceitáveis, uh, refeições.

—Não têm que ser imortais,— ela disse. —Ele finalmente admitiu que imortais têm sabor melhor, mas qualquer um servirá.

Então Paris soube exatamente o que usar. Da última vez que deu uma olhada, Caçadores estavam escondidos em seu calabouço de Budapeste.

—Quem são...

—Não se preocupe com isto.— Se ela conhecesse os homens, bem, não estava certo de como reagiria. —De fato, por que não vai para nosso quarto em vez de ficar aqui? Vou acompanhá-la logo. Certo?— A beijou antes dela poder responder, e a deixou lá.

Não demorou muito para localizar Lucien. O guerreiro ainda estava no salão de baile, e quando avistou Paris se desculpou por toda sua parte, seu mal entendido, com olhos cheios de remorso.

—Conversaremos sobre a intervenção mais tarde. Agora mesmo preciso de você para fazer algo.

Explicou o que precisava, e o guerreiro foi o Sr. Prestativo, desaparecendo e retornando alguns minutos mais tarde segurando um Caçador em cada mão. Humanos eram mais fáceis de transportar que imortais.

Os homens, ambos aparentando trinta e poucos anos, estavam encardidos, fracos e sem ânimo para mais luta. Paris os reivindicou, e Lucien voltou por um terceiro.

Talvez isto devesse pesar fortemente em seus ombros, mas estes homens foram capturados enquanto tentavam sacrificar seus amigos e suas amadas. Teriam cortado as gargantas das fêmeas num instante, sem vacilação.

Mereciam o que ganhariam.

Quando Lucien retornou, levou sua carga acima pela escada e voltou para a pequena alcova. Sienna não se moveu um centímetro, e Paris amaldiçoou sob sua respiração. Mas ela não disse nada quando viu seus fardos, embora sua boca se abrisse como se tivesse bastante para soltar. Ela apenas observava com os olhos arregalados enquanto ele e Lucien andavam sobre o telhado.

—Fique— ele ordenou, fechando a porta na cara dela. Não queria que ela visse o que aconteceria a seguir.

Ele e Lucien se aproximaram da extremidade e olharam abaixo. Muito tempo antes de alcançar o rochoso chão encharcado de sangue. Qualquer que fosse. Ainda não ia se sentir mal. Mas se perguntou, novamente, se Sienna conhecia estes sujeitos. Se entendia por que os escolheu. Se entendia que usaria as informações que deu a ele para achar mais Caçadores, trazê-los aqui e usá-los da mesma maneira, por quanto tempo fosse necessário.

Solte-os, uma voz desencarnada que agora reconhecia disse num vento súbito.

Só então os Caçadores começaram a lutar. Paris e Lucien compartilharam um momento de merda antes de empurrá-los mais. Sombras imediatamente dispararam do céu, cercando os homens, os pegando, e então os devorando. Gritos, mais-que-cheios-de-dor que aqueles que ouviu enquanto estava dentro do Homem Sombra, inundaram a noite. Então, silêncio.

E assim o acordo está selado, outro vento proclamou. Estão seguros. Por agora.

Ele não tinha certeza se podia confiar no Homem Sombra, mas Sienna conheceria uma mentira, então lá vai. —Obrigado,— ele disse para Lucien.

—Claro.— Uma pausa, um suspiro. —Ouça. Lamento o que aconteceu, conversarei com os outros. Nunca gostei do que estávamos fazendo a você, como estávamos o forçando, e me certificarei que sua mulher seja respeitada. Ela é quem você quer, ela é quem terá.

Sua garganta se apertou. —Obrigado — ele repetiu.

Lucien bateu a mão em seu ombro, um tapinha de amor com mais força que provavelmente percebeu, antes de decolar. No momento que saiu, Sienna entrou.

—Ei — ela disse, a expressão impassível.

—Ei — ele respondeu. Ansiedade, pressentimento, sim, os sentiu.

—Então o pedágio foi pago?

Ele movimentou a cabeça em silêncio.

—Bom. Vi seus pecados. Aqueles homens eram terríveis, fizeram coisas terríveis. Ira os queria.

Era isso? Essa era sua resposta? Não ia questioná-lo, castigá-lo? Só aceitar? —Amo você — ele disse. Não podia segurar mais as palavras. Não havia como esconder a verdade por mais tempo, nem mesmo de si mesmo.

O queixo dela caiu. O bonito avelã estava, uma vez mais, sobre o esmeralda, o chocolate completamente obscurecido. Ele era mais desta mulher do que jamais seria de outra. Tão dela que morreria por ela. De boa vontade, felizmente.

Ela apenas se encaixava nele. O fazia feliz. Relaxava, excitava, desafiava.

—Eu—eu…— gêmeos círculos rosados apareceram em suas bochechas. Excitação, talvez. Pelo menos, esperava.

—Não, não diga nada.— Ele apontou e disse, com a voz rouca, —Só venha aqui.

Ela tropeçou sobre ele, e ele a puxou perto para um abraço. Respirando profundamente, bebeu seu perfume tropical, deixando-a marcá-lo, refazê-lo. Não existia ninguém ou qualquer coisa que pudesse afastá-lo desta mulher. Ela era sua. Agora e sempre.

Colocou o mais doce dos beijos contra a pulsação selvagem martelando em seu pescoço. —Vamos praticar seu voo, certo?

—C-certo.

Ela o amava de volta; tinha que amá-lo de volta. Se não o fizesse, a seduziria, encheria de romance e conquistaria até que o fizesse. A batalha mais importante da minha vida.

Ele a afastou, e passaram as próximas horas trabalhando na abertura correta de suas asas e com rapidez suficiente, como também tentando tirar seus pés do chão. Sem nunca ter ele mesmo voado, repetiu as coisas que Aeron disse a ele, as coisas que aprendeu simplesmente assistindo o guerreiro, e estava feliz ao notar que Sienna fazia progressos. Mas, merda, soube que havia muito que ele não sabia.

Eventualmente Sexo saiu da clandestinidade, apreciando o contato, empurrando Paris a levar as coisas ao próximo nível.

Não ainda. Isto é muito importante.

Você me disse “frequentemente”.

E frequentemente está conseguindo, seu estúpido de merda.

—Ela nunca aprenderá a sustentar voo assim.— Uma familiar voz masculina. Atrás dele.

Paris não se preocupou em virar. —O que sugere?— Estava disposto a aceitar sugestões nisto, e apenas nisto.

Zacharel se moveu para o lado até ele, seus dedos acariciando seu queixo livre de pelos. —Posso apenas ensiná-la do modo como fui ensinado. Ela deve permanecer na extremidade do telhado e abrir suas asas até onde conseguir.

—E se eu cair?— Ela ofegou. —Não serei capaz de me manter no ar.

—Não cairá — o anjo disse, e a camada de verdade em sua voz foi tão convincente como nunca antes.

Sienna encontrou os olhos de Paris, e ele concordou. Voar era importante. Voando podia um dia salvar sua alma. Porque sim, como as sombras provaram, até mesmo as almas podiam ser saqueadas.

Engolindo, ela passou por ele. No momento que os dedos dela se arrastaram sobre os dele, ele os agarrou, e decidiu caminhar com ela. O tremor dela aumentando a cada passo.

—Com medo de altura, Bebê?— Ele perguntou, quando alcançaram a extremidade plana.

—Não devia estar, mas este é um longo caminho.

—Está tudo bem. Não deixaremos nada acontecer com você. Prometo.

—Se afaste. — Zacharel ordenou, e apesar de relutante em cortar o contato, Paris obedeceu. —Agora, abra suas asas — o anjo disse para Sienna.

As asas leves e negras se estenderam em todo seu comprimento, adoráveis de um modo que nunca notou antes. Um profundo e rico purpúreo criava veias no negro, rodado no centro e estirado nas pontas.

—Excelente. Agora, tente não deixar esta próxima parte assustar você. — Sem qualquer advertência adicional, Zacharel a empurrou pela borda.

Ela deu um suspiro horrorizado enquanto caía do telhado, descendo... abaixo...

—Nããããão!— O estômago de Paris saía pela boca enquanto se lançava adiante, querendo mergulhar atrás dela.

O anjo o parou com um direto certeiro no queixo, mandando-o de volta atrás. Sexo gemeu pela dor explodindo em sua cabeça, mas se recusou a recuar, se recusou a se esconder.

—Disse que ela não cairia!— Paris gritou enquanto se levantava, com intenção de tentar novamente. A seguiria, e era isto.

—Ela não caiu. Eu a empurrei.

—Se ela se machucar...

Zacharel desapareceu, reaparecendo um segundo mais tarde com Sienna ao seu lado. Havia uma tonalidade verde em sua pele, e quando ela percebeu o chão sólido a segurando, se curvou, engasgando, tremendo incontrolavelmente.

—Seu… bastardo…— ela gritou.

—Este é o único modo de aprender.— Nenhuma emoção maquiava as camadas de voz de Zacharel. Apenas um monte de o-que-eu-fiz-de-errado. —Assim é como somos ensinados. Além disso, você é uma alma. Se fizesse contato com o chão, duvido que se abrisse como um melão.

—Você duvida!

—Ache seu núcleo valente, menina demônio. Volte e tentaremos novamente.

Paris entregou um direto certeiro, ele mesmo. A cabeça do anjo chicoteou para o lado, sangue vazando do corte em seu lábio inferior, mas apenas se endireitou e piscou em confusão.

—Se fizer qualquer coisa assim novamente, acabo com você. — Paris não esperou por uma resposta, mas pegou Sienna em seus braços e a levou para seu quarto.

 

—POR QUE não toma banho e relaxa, Bebê?— Paris disse enquanto sentava Sienna em sua cama. —Voltarei num instante.

Ela não tinha nenhuma ideia do que ele planejava ou aonde ia, mas acenou com a cabeça. Podia desfrutar de um tempo a sós. Seu batimento cardíaco estava atualmente envolvido numa corrida de recorde mundial.

Ele beijou sua testa e saiu, fechando-a do lado de dentro. Chuveiro, sim, era disso que precisava. Afinal, acabava de mergulhar em direção à morte certa, incapaz de forçar suas asas a funcionar, e a única razão pela qual sobreviveu foi que o Anjo que tentou acabar com ela a pegou segundos antes de cair no chão.

Punição, Ira disse.

A primeira vez que realmente quis machucar um anjo. Ou tomou o empurrão como pessoal ou sua fome retornou.

Tropeçando para o banheiro, notou que Viola tinha vindo por ela. Um anel repousava sobre o criado-mudo, com apenas uma pedra, uma ametista enorme no centro. Bom. Sim. Bom. Não era de cortar o coração.

A água morna a relaxou um pouco, mas não tinha nenhum desejo de demorar. Apenas lavar os cabelos, ensaboar, enxaguar e uma toalha seca. Cerca de cinco minutos passaram. Que dia. E, no entanto, apesar da experiência de quase morte, teve a sensação que, quando olhasse para trás, este seria seu dia favorito de todos os tempos. Paris disse que a amava.

Sem falar que isto quase a destruiu, especialmente porque ele a massageou, suas mãos deslizando ao longo de suas asas, acariciando mais firmes, enquanto a ensinava o que sabia sobre voar. Mas o deixaria amanhã, para nunca retornar, nunca vê-lo novamente, e bem, sim. Não iria por aí.

Quando saiu do banheiro, o viu sentado na extremidade da cama, a enfrentando, seus cotovelos descansando em seus joelhos. Tinha uma expressão que ela nunca viu nele antes, uma ternura brilhante que quase fez seus joelhos dobrarem.

—Venha aqui, — ele disse.

Soltando a toalha, nua e brilhando, obedeceu sem hesitação, parando entre as pernas abertas dele. Suas grandes mãos agarraram seus quadris, seus polegares ligeiramente ásperos raspando no alargamento de sua cintura. Ela estremeceu.

—Onde foi?— Ela enredou os dedos pelo cabelo dele, adorando como os fios macios levantavam e caíam.

—Apenas no corredor. Estava perdendo o controle, e não queria que visse. Esmurrei alguns buracos na parede. Agora só quero segurar você por um minuto. Certo?

Sempre. —Sim.

Ele a puxou mais perto, seus braços se apertando ao redor dela, e então deitou sua cabeça acima de seu peito, sua respiração morna viajando sobre sua pele, sua orelha apertada na batida de seu coração. Ficaram assim por um longo momento, até que ela estava tremendo pela necessidade de tocá-lo, estar com ele completamente.

Ele deve ter sentido seu desejo porque se inclinou mais atrás, aguentando mais do peso dela, mais até que deitou e ela ficou em cima dele. Então girou seus corpos lateralmente, rolou e a posicionou à sua frente, em forma de conchinha. Seu peito na coluna dela, sua ereção apertando entre suas bochechas.

—Deixe-me te amar, — ele sussurrou. —Quero enchê-la, penetrar e gozar em você. Quero estar tão dentro de você, Bebê. Tão malditamente fundo. — Sua mão se moveu entre seus seios, inclinada e amassou acima, roçando contra seu mamilo, criando a fricção mais deliciosa.

—Sim, — ela repetiu. Seu cérebro estava nublado, todo e cada um de seus pensamentos nele, no que estava fazendo.

A outra mão dele se moveu entre suas pernas e achou o centro de seu desejo. —Todo esse mel. Todo meu. — Enterrou um dedo na abertura criada entre as pernas dela e a penetrou, então outro.

Ela balançava com seus golpes entrando, se arqueando para ele. —Amo o modo como me seduz.

Ele mordiscou sua orelha. Deslizou um terceiro dedo dentro. Gemido após gemido cortava sua garganta, florescendo pelo quarto.

—Me deixe todo molhado, Bebê. A quero sobre mim, me cobrindo, me encharcando.

Ela continuou a balançar… balançar contra ele, se perdendo, feliz em se perder, nunca querendo ser encontrada, desesperada para permanecer aqui, com ele, sempre, perdida, tão perdida.

—Tão perfeito. Mais.

Ela apertou as pálpebras fechadas, suas orelhas registrando sons que mais tarde sentiria falta. A lixa dura de sua respiração, vindo mais e mais rápido. A forma de seus quadris contra os lençóis, a lenta batida de carne contra carne. —Paris.

—Vou fazer você se sentir tão bem. — A voz dele era gutural, quase totalmente animal. —Estarei em você, e vou tê-la na minha garganta, seu gosto na minha boca. Vai me dar boas-vindas dentro, não vai?

—Oh, sim. Por favor, sim.

Ele removeu seus dedos, e ela gritou seu desespero por ele a deixar fora de controle. Como ia conseguir tudo que procurava, ela não sabia, mas pelo menos não ficaria vazia por muito tempo. Ele agarrou seu joelho e separou suas pernas, e sem uma pausa no escorregar de seus quadris, deslizou tão fundo quanto prometeu. Ela gritou novamente, agora de alívio, estirada, cheia e quase louca por sua necessidade de mais.

Ele se moveu nela enquanto localizava os lábios dela com seus dedos molhados —molhados dela — e deslizava dois dedos dentro de sua boca. —Chupe.

Ela fez, oh, ela fez, se saboreando, o ato erótico novo para ela, mas tão terrivelmente excitante. Rolou aqueles dedos ao redor, chupando-os como ordenado, mordendo-os. Então os dedos se foram e ele estava inclinando seu rosto, e sua boca apertando contra a dela, sua língua passeando por dentro, tomando o gosto dela nele mesmo. O tempo todo se movendo, profundo, tão profundo, então quase toda distância se foi, fundo, tãããão fundo.

Isto era mais que sexo, algum instinto distante disse a ela; isto era um vínculo, um acasalamento. Ele estava por toda parte dela, nela, e ela estava por toda parte dele, nele. Este homem… oh, este homem. Ela não podia conseguir o suficiente, nunca conseguiria o suficiente.

—Onde estou?— Ele de repente exigiu. Suas punhaladas ficando mais severas, atingindo mais duro dentro dela, mais áspero.

—Aqui. — Um gemido de paixão. —Comigo.

—Onde estou?

—Por toda parte de mim. Em mim.

—Sim. Está certo. Por toda você. Em você. Sou seu, você é minha. — Ele mergulhou atrás de outro beijo de “roubar-a-alma”, a partindo, reivindicando. —Você gosta disto.

Não era uma pergunta, mas ela respondeu de qualquer maneira. —Amo. Isto. — Em todas as muitas vezes que estiveram juntos, nunca foi tão intenso, tão focado em propriedade. E inferno, queria ser sua dona também. Ela estendeu sua mão até as costas dele e agarrou seu cabelo, mantendo-se firme, não se importando com os fios puxados.

Ele silvou numa respiração.

Seus quadris se curvaram atrás, com força desta vez, o atingindo. Ambos gemeram de felicidade. Ela atingia cada vez mais a liberação, e ele estava ali com ela.

—Tome-me, Bebê. Tome tudo de mim. Sim. É isto. Sabe a maneira.

Pressão, crescendo e crescendo, consumindo. Só um pouco mais… —Paris!— Um golpe mais forte e ela estava se atirando nas estrelas, o prazer a inundando numa corrida, numa tempestade. Suas paredes internas o agarraram, segurando, deixando-o saber que estava onde pertencia, que isto era certo, que eles eram certos.

Ele a colocou de bruços, apertando seu rosto nos travesseiros, e martelou mais duro, mais rápido. Um rugido o rasgou, tão áspero quanto suas punhaladas, e ele a encheu, gozando e gozando e gozando um pouco mais. Ela estava lá com ele, se lançando num segundo orgasmo, um que a alcançou sorrateiramente, mas a levou cada vez mais alto.

Quando voltou para a Terra, piscou os olhos. Ela desmaiou? Devia, porque Paris estava do seu lado, e ela no dela, e estavam se olhando, mas ela não se lembrava do movimento. Ele estava um pouco sem fôlego, então imaginou que não passou muito tempo. Ele estendeu o lençol sobre seus corpos e ficou olhando-a, como se memorizasse seus traços.

—Quero partir com você, — ele disse. —Ir a algum lugar onde Cronus não poderá te achar. Onde ninguém poderá te machucar.

Seu coração balançou. Ninguém — significava seus amigos. —Disse a você. Não quero que fique zangado com ninguém por minha causa.

—Eles desrespeitaram você.

—E eu merecia.

—Não!— Ele lançou um soco, seu punho passando a cabeceira da cama, fragmentos de madeira caindo. —Eu disse para não falar assim. E da próxima vez, colocarei você sobre meus joelhos. Eles não são perfeitos, nenhum deles. Todos já fizemos coisas. Coisas que envergonhariam os criminosos mais cruéis.

—Bem, estão reformados.

—Assim como você. Não estou dizendo que quero deixá-los para sempre. Eu os amo. Preciso deles. Só quero dar a eles tempo para te aceitar. E só para que você saiba, se eu tratasse alguma vez suas mulheres do modo como trataram você, eles retaliariam.

Ela precisava mudar de assunto. Precisava. Ele estava derretendo sua determinação. Sendo o que precisava, dizendo tais coisas maravilhosas. E queria dizê-las. Seu tom era muito sério.

—Me esconder de Cronus, — ela disse. —Não acho que isto é possível.

Gradualmente ele relaxou. —Há medalhões. Quem os usa fica escondido dele e de todos os seus seguidores. Ele os deu a nós uma vez, mas logo os levou embora. Posso roubar um.

E enfurecer a besta, se colocando ele mesmo em perigo eterno? —Não. Tenho que fazer isto, Paris. Tenho que ir para Galen, e Cronus vai me levar. Apenas tenho, — ela terminou pouco convincente. Por você, por mim.

—Então é isso?— A raiva retornava àqueles olhos elétricos. —Nem mesmo vai pensar sobre isto? Quando a simples ideia de meu inimigo respirando o mesmo ar que você me leva a cometer um assassinato?

Sua própria raiva provocada. —Quando se trata de colocá-lo em perigo? Quando se trata de ter certeza que sobreviva? Não há nada sobre o que pensar.

Ele suavizou, mas só ligeiramente. —O mesmo comigo. Não quero você em perigo. Nunca. E pense sobre isto. Enfraquecerei sem você. Sim, sei que sou o rei da manipulação, tocando suas emoções, mas farei qualquer coisa para manter você. Matarei. Mentirei. Trairei e enganarei e roubarei. Removerei montanhas.

—Paris, eu...

Ele não terminou. —Toda minha vida lutei e fodi, e pensava que era feliz até que você me irritou — e me acordou — e percebi que simplesmente existia e aceitei. E pode ter conseguido minha atenção por meu demônio, mas manteve isto por sua causa. Poderia ter alguém agora mesmo, e não, isto não é ego ou fachada, apenas eu dizendo a você que agora Sexo sabe que estou comprometido e está me tornando difícil para qualquer maldita fêmea no lugar, ou estava, e pode fazer novamente, mas não as quero e não as tomarei.

Cuidado, menina. Este homem, este homem que amava, podia convencê-la de qualquer coisa. Não podia passar o resto da noite com ele. Tinha que partir. E teria que partir agora.

O conhecimento a quebrou.

—Sienna, Bebê. Sei que estou me fortalecendo. Sei que estou pressionando muito. Só… me dê algum tempo, certo? Resolveremos isto. Existe uma solução, tem que haver. Confie em mim.

Tantos pedaços dela, dispersos e quebrados, para nunca mais serem colados juntos. —Eu confio, — ela resmungou. —Confio em você. — Era verdade, mas não a impediria.

—Bom. — Ele deve ter assumido que ela concordou em dar a ele tempo.

Ela não corrigiu o engano.

—Agora, quero que me escute. Lembra quando eu disse para não deixar ninguém cheirar seu sangue, sempre se limpar se fosse ferida?— Ele esperou que ela acenasse antes de continuar. —Isto é porque Cronus fez de você uma fonte de ambrosia. Seu sangue é uma droga para os imortais e altamente viciante.

—Isto não é... —Bem, nenhuma razão para terminar aquela oração. Qualquer coisa era possível. Estava viva — er, não morta — como prova disto. Amargura cresceu, se juntando a raiva e ao desespero. —Como ele fez isto? Por que faria?— Mesmo enquanto falava, sabia a resposta desta última.

Por que —para que pudesse seduzir e controlar Galen mais facilmente. Seria assim que manteria seu interesse. Como ousou fazer isto! Ela ferveu. Como ousou transformá-la num… num… narcótico ambulante!

Punição… PUNIÇÃO.

Sim. Ela puniria. Isso a impediria de fazer o que era preciso fazer? Não. Não quando a vida de Paris estava em jogo. Mas, oh, ela e Cronus teriam um acerto de contas um dia.

Ira grunhiu sua aprovação.

Áspero, Paris disse, —Sinto muito sobre o que aconteceu, bebê. Gostaria de poder voltar e evitar.

Derretendo… —Existe uma maneira de me consertar?

—Não que eu saiba.

Ela se debruçou em Paris, apertando seus lábios nos dele. Ele queria continuar a conversa, ela podia dizer, mas foi pelo beijo e aceitou sua língua, tomando isto como seu direito — e era. Enquanto estava distraído, ela agarrou o anel que Viola deixou. Deslizou o metal sobre seu dedo médio.

Lágrimas queimaram por trás de seus olhos. Faça isto.

—Sienna, — Paris disse. Ele segurou seu queixo como gostava de fazer, tão gentil como se ela fosse um tesouro precioso que não podia suportar machucar. —Converse comigo. Diga-me o que está pensando. Por favor.

Faça isto. Faça isto! Primeiro, mais um beijo, só mais um. Ela mergulhou de volta, enchendo sua boca com seu gosto especial. Todo aquele calor e chocolate. O que estava à sua frente era uma eternidade de miséria, entretanto, isso era seu castigo, não dele. Pelo que fez com ele antes. Parte dela ainda pensava que Ira aprovava, seu demônio agora ronronando atrás de sua mente, como fazia para Olivia, se alimentando da tristeza de Sienna.

Faça. Isto. Ela ainda hesitou. Estaria convencendo a si mesma a desistir? Não, oh, não. Estava se convencendo a fazer isto, percebeu quando seu próximo pensamento a golpeou. Paris teria que se desapaixonar por ela. Ele teria. Teria que esquecer o voto que fez, e viver. Viver feliz.

E assim ela fez. Fez a única coisa que garantia que a odiaria.

Ela posicionou seu dedo com o anel em sua garganta, da mesma maneira que fez uma vez antes, naquele dia no qual se encontraram pela primeira vez. Sua pulsação era irregular, uma batida trêmula.

FAÇA ISTO. Um trágico — sinto muito— a deixou quando o atingiu. Ela não deveria dizer isto. Devia ficar fria, insensível.

Seus olhos queimaram abertos. —O que... — Compreensão sangrou em suas íris, mesmo enquanto vidravam. O líquido quebrou a barreira sangue/cérebro imediatamente. Ao invés de gritar com ela, amaldiçoá-la, sussurrou, —Não me deixe. Não parta… Fique… comigo… por favor…

Embora ele lutasse com os efeitos, não podia pará-los, e suas pálpebras se fecharam. Seus braços caíram para os lados. Estava muito quieto, seu tórax subindo e descendo uniformemente. Custou tudo que ela tinha para sair da cama. Vestir a roupa que Cronus forneceu a ela, escolhendo uma camiseta de manga longa que se ajustava ao redor de suas asas, calças de couro e botas de combate preto. Ela tremia o tempo inteiro, lágrimas escorrendo pelo seu rosto.

Ela reivindicou dois punhais, e nenhum deles era de cristal. Aqueles deixou no criado-mudo próximo um do outro. Eram dele. Precisaria deles. Amarrou com uma correia as armas em seus pulsos com os cabos para baixo. Uma sacudida de seus braços, e aquelas lâminas deslizariam direto em suas palmas.

Por um momento, fechou seus olhos. Tinha que ser feito, tinha que ser feito, cantou. Não fez sua dor diminuir, ou se sentir de qualquer forma melhor. Ou menos culpada. Por que Paris não podia olhar para ela com raiva no final? Por que tinha que ser tão compreensivo?

Ela se recusava a se iludir. Ele viria atrás dela.

Tinha que detê-lo.

Entretanto quase quebrou e soluçou quando saiu do quarto, e de alguma forma conseguiu levantar e vasculhar o castelo. Encontrou Lucien abaixo no corredor, no quarto que reivindicou para si. Estava sentado numa cadeira forrada de veludo, um copo de algo âmbar numa mão, a outra agarrada ao redor de Anya, que estava empoleirada em seu colo.

Ele sentiu a intrusão imediatamente, seu olhar focado diretamente em Sienna. Deixou seu copo no chão.

—O que está errado?— Anya exigiu. —Ficou tenso.

Quando ele identificou Sienna relaxou, seu rosto cicatrizado diminuindo a expressão alguém-vai-morrer. —Anya, querida, faria algo por mim?— Ele perguntou, ternamente correndo seus dedos por sua cascata de cabelo pálido.

—Qualquer coisa, Flores. — Ela lambeu o pescoço dele, cantarolando em êxtase. —Sabe disto.

Ele apertou os punhos e ergueu a cabeça dela, forçando o prazer a terminar. —Iria até a cozinha e faria um chocolate quente? Com chantilly e marshmallows?

—Espere. O que?— Seus lábios vermelhos se abriram numa careta. —Pensei que queria que fizesse algo totalmente, absolutamente bizarro com seu corpo, e estava cem por cento pronta para isto. Chocolate quente.

—Anya. Por favor. Estou com desejo.

Seus olhos estreitaram. —Está grávido?

—Anya.

—O que? É uma pergunta legítima agora mesmo, considerando que está disposto a desistir, mas tudo bem. Meu homem tem um desejo. — Anya se foi, murmurando, deixando Lucien só com Sienna e não percebendo isto.

—Droguei Paris, — ela admitiu. E uau, que maneira ruim de dar o pontapé inicial.

Carrancudo, Lucien saltou em seus pés. —O machucou?

—Não, não. Claro que não. — Ela se debruçou contra a porta, incapaz de se manter em pé. —Cronus quer que eu vá… por Galen… para espioná-lo, controlá-lo. — Por que isto era tão difícil? Drogou o homem que amava; isto devia ser tão fácil quanto respirar. —É o único modo de salvar Paris, e todos vocês, da morte certa. Quanto mais eu ficar aqui, mais aumenta a chance de Galen chegar até Cronus, e Rhea tomar o trono. — E o mais duro seria deixar Paris.

Seu olho azul girou, a hipnotizando, enquanto o marrom parecia prendê-la no lugar. —Poderia acusá-la de mentir, de dizer isto como forma de não suspeitarmos que se reuniu com seu bando para compartilhar nossos segredos.

Sua língua engrossou pela necessidade de amaldiçoar, mas seguiu forte adiante de qualquer maneira. —Sim. Poderia. E tudo bem, tanto faz, mas Paris, ele confia em mim e quer que eu fique. Não me deixaria partir.

No silêncio que se seguiu, ela notou algo. Ira estava quieto agora; realmente se alimentava de sua dor e suas ações, e não estava preocupado com Lucien de qualquer forma. E também, talvez tivessem se acertado antes e Aeron ganhou esta batalha. Talvez os Senhores estivessem isentos do senso de justiça do demônio. O que fosse. Não importava. Não estaria ao redor deles muito mais, não é? Ira podia se alimentar de sua tristeza pela eternidade.

—Paris virá atrás de mim, — ela disse. —Sabe que virá.

Uma sobrancelha escura subiu no rosto de Lucien. —Então ele pode retaliar por ser drogado?

—Não. Para me salvar de Galen.

Seus lábios se contraíram enquanto considerava suas palavras. —O que quer que eu faça?

—O impeça. — As palavras eram cacos de vidro em sua garganta. —Tenho que ficar com Galen, de alguma forma, para encontrar um caminho de controlá-lo.

—Aqui vai uma dica. O mate!— Lucien sugeriu.

Se fosse tão simples. —Cronus diz que não posso, que se Galen morrer todos vocês morrem, também. Este é o caminho. O único caminho. — Enquanto falava, endireitou os ombros. Sua determinação cresceu, a tornando uma rocha.

Sienna não era fraca, e não era uma covarde. Não mais. Ia fazer isto, mesmo à custa de sua própria felicidade. —Não o deixe vir atrás de mim. Mantenha-o aqui, e o mantenha forte. Então. Bem. Isto é tudo que vim dizer.

Uma longa, torturante pausa enquanto ele considerava sua resposta. —Sabe o que está pedindo, certo?

—Sim. — Para mascarar a mais nova inundação de lágrimas, olhou para suas botas. —É um bom amigo para ele, e fico feliz. — Ficando emocionada novamente. —Estou contente que ele tem você. Cuide dele, Lucien. Se alguma vez conseguir informações que possam ajudá-los, de alguma maneira as enviarei. Acredite nisto ou não, mas estarão lá se você quiser.

—Sienna...

—Só… cuide dele, como eu disse. — Não havia necessidade de abrir a porta. Ela simplesmente a atravessou e correu seu caminho para o telhado.

Havia apenas uma coisa a fazer.

 

AS ASAS DE SIENNA SE ERGUIAM corretamente e já não arrastavam pelo chão. Seus ombros doíam, mas as dores não eram nada que não pudesse suportar. Estava determinada. Sólida. Inflexível.

Faria isso. Sem vacilar.

Abriu caminho para o telhado, a escuridão sufocante do reino mais uma vez a envolvendo. Nenhum sinal do coisa... cara sombra, mas é claro, seu pedágio de sangue havia sido pago e ele havia prometido deixar todo mundo em paz. Se iria ou não manter sua palavra, ela não podia ter certeza. Ira havia percebido a ameaça nele, mas as imagens que o demônio havia atirado na cabeça dela estavam granuladas e, até sombreadas, confundindo os dois.

Nada havia sido claro, de modo que não tinha ideia do que o cara sombra era capaz de fazer. Confiava nele porque não tinha outra escolha.

No centro do parapeito parou e abriu os braços. Não houve hesitação para tomar fôlego. Sem refletir sobre o que poderia ser, deveria ter, sido. —Cronus! Cronus! Eu te chamo!

Um flash branco à sua esquerda. Com o coração disparado, ela girou. O anjo Zacharel havia tomado forma, adorável em sua glória celestial, brilhando com uma aura que pulsava com a energia, mas vê-lo provocou um tremor de medo rastejar por sua espinha. Sua expressão estava desprovida de emoção, as asas de cor branco-e-ouro, abertas regiamente, seu manto imaculadamente limpo.

Ira reagiu como se apenas tivesse visto Olivia. Céu!

—Meu povo precisa de você, Sienna, — Zacharel disse. —Eu te disse isso.

Ela ergueu o queixo. —E eu te disse para entrar na fila.

—Por que, quando posso simplesmente pegar o que quero?

—Se pudesse se contentar com minha falta de vontade, já teria me levado.

Ele inclinou a cabeça ante sua lógica. —Então venha comigo por sua própria vontade. É a chave para nossa vitória.

Estava tão cansada dessas palavras. —Por que sou a chave? Como sou a chave?

—Não sei.

Tão cansada da falta de respostas. —Bem, então não vai pegar a chave. Além disso, não acho que anjos e demônios já trabalharam juntos.

O menor abrandamento em torno de seus olhos de esmeralda. —Altos Senhores Demônios, como o que está dentro de você, foram anjos uma vez. Eu sei, Ira sabe. Uma vez, sua justiça não foi pervertida ou deformada, mas justa e correta.

—Isso não me faz mudar de ideia. — Onde diabo estava Cronus? —Paris vem em primeiro lugar, e esta é minha maneira de salvá-lo. — E se o próprio Paris não tinha mudado a ideia dela sobre seu curso atual, Zacharel não tinha chance.

Sua testa franziu quando ele jogou suas palavras através de sua mente. —Por que o ama? — Ele parecia genuinamente perplexo. —Por que sacrifica a si mesma e sua felicidade por ele?

—Ele é forte.

Uma fungada. —Outros são fortes.

Lembrou-se de ter feito a mesma coisa com Paris, contrariando tudo que ele dizia. Ela havia sido assim irritante? — Ele é inteligente e generoso, atencioso e gentil, e...

—Ele é um assassino.

Embora seus olhos se estreitassem, ela continuou como se ele não tivesse falado. —Ele é protetor comigo, e me faz sentir especial. Cuida de mim. E se sacrifica por mim também.

—Deseja que um sacrifício aconteça? Feito. Diga seu preço e farei de imediato.

A esperança se inflamou. —Pode salvar Paris do destino que Cronus me mostrou? Nos dois futuros em potencial, ele morre. Pode salvá-lo e aos seus amigos?

—Não, — respondeu Zacharel honestamente, o que não deveria tê-la surpreendido, mas fez. —As estradas já foram pavimentadas, os veículos colocados em cima delas e em movimento. Não há pausas.

Tão vívida quanto à metáfora era, a realidade era inevitável. A esperança queimou até as cinzas e flutuou para longe. —Muito bem, então. Cronus! — Ela gritou. —Cronus!

Zacharel passou a ponta do dedo ao longo de sua sobrancelha. —O rei Titã mentiu para você, sabe. Mentiu sobre muitas coisas.

Prendeu a respiração e congelou seus pulmões. —A respeito de Paris?

—Não.

Então, nada mais importava. —Cronus!

Ele soltou um suspiro de frustração irregular. —Nos ajude Sienna. Uma guerra fermenta nos céus. Bem contra Mal. Você quer ficar do lado do bem.

Estive lá, arruinei vidas por causa disso, pensou. —Cronus!

—Nunca vou mentir para você, — disse ele, flutuando perto — e terá uma chance de vingar as injustiças cometidas contra você e aqueles os quais ama.

Ira realmente gostou da ideia, e bateu contra suas têmporas para chamar sua atenção.

Não precisa usar de técnica mais agressiva. O pensamento de trabalhar ao lado dos anjos — para valer desta vez — era incrível, e sim, parte dela queria tudo disso. Mas... Sim, sempre havia um “porém”. —Me desculpe, eu realmente sinto, mas droguei um bom homem para fazer isso, e você não pode garantir a segurança dele, por isso não posso ajudá-lo.

Zacharel a estudou por um longo tempo, em silêncio. Então, — Muito bem. Permitirei que saia com o Titã. Quando precisar de mim, e vai, basta falar meu nome e virei por você.

E a levaria direto aos céus. —Encontre uma maneira de salvar Paris e seus amigos, e sou sua. Veja, aprendi alguma coisa neste novo mundo imortal. Tudo tem um preço, um pedágio. Os Senhores são meus. Suas vidas pela minha, ou nenhum negócio.

—Muito bem, — repetiu antes de desaparecer.

Uma fração de segundo depois, Cronus se materializou na frente dela, e oh, estava chateado. Sua carranca marcava linhas em seu rosto, transformando os traços régios em sinistros. Pelo menos havia desistido da malha gótica e ternos a favor de sua túnica branca.

—Me chamou, e então me bloqueou? — Seus olhos eram uma mistura brilhante de ébano e escarlate, quando rosnou: — Como me bloqueou?

Tal como antes, Ira ficou em silêncio, incapaz de ver o passado de Cronus. Frustrando a ambos. Por mais que se enfurecesse com as coisas doentes que o demônio a obrigava a fazer, veio a contar com sua aguçada percepção das pessoas ao redor.

—Não o bloqueei, — respondeu ela honestamente, as palavras misturadas com veneno. Odeio esse homem, ela percebeu. Por tudo que havia feito a ela, e tudo que estava fazendo para Paris. —Chamei para dizer que estou pronta. Quero ir para Galen. Mas primeiro...

Passos sem pressa, ela se aproximou dele. Seus braços estavam baixados em seus lados, e ela deu uma sacudidela. As lâminas deslizaram em suas mãos, como planejado, e no momento que alcançou Cronus, chicoteou num movimento de frenesi, o empurrando para trás, na parede do castelo, a ponta de sua arma pronta na jugular dele.

Ele poderia tê-la empurrado para longe, mas a ameaça aconteceu tão rápido que ele só pode arregalar os olhos de espanto.

—Me alimentou de ambrosia, me tornou ambrosia.

Finalmente, ele a empurrou, impulsionando-a para trás. Apenas por bater freneticamente suas asas ela se impediu de voar sobre a amurada.

—E qual o problema? — Ele tirou um pedaço de gaze de seu ombro. —Fiz o que era necessário para este trabalho. Estava certa, você não é bonita o suficiente para captar a atenção de Galen, e precisamos da atenção dele.

Sem desculpas, o bastardo.

Um dia...

Ele continuou sedoso: —Agora, me permita capturar a sua.

Ela piscou e seus arredores mudaram da escuridão para a luz, de sombrio para ostentação. Confusa, ela embainhou suas armas.

Acima, um lustre de gotas pendurava no centro de madeira esculpida. Aos lados, espessas cortinas de veludo vermelho se derramavam sobre as janelas, com cadeiras e espreguiçadeiras feitas do mesmo material espalhadas por toda parte. Uma mesa de jacarandá, candelabros, mesas com barras de ouro ao redor de suas bases. Abaixo, um tapete de lã com as mais belas flores tecidas em tons de joias. O aroma de jasmim e madressilva saturava o ar.

—Que lugar é esse? — Perguntou ela.

—Esta, — ele respondeu: — é sua nova casa.

Não ia chorar. Não faria isso. —Galen vive aqui?

—No reino de Rhea dos céus? Sim. Normalmente seus homens ocupam cada quarto, mas muitos deles estão fora. — Com passos leves, Cronus diminuiu a distância entre eles. Agarrou seus braços, a puxando para ele. —Em exatamente 60 segundos, você vai entrar naquela sala. — Seu olhar se deslocou para uma porta fechada atrás dela.

Por que esperar? Então, novamente, quem se importava? —Tudo bem.

—Galen não vai aceitar você como está não mais. Fede a Paris, seu inimigo.

E deveria convencer o horrível homem de outra forma? Fabuloso.

—Há apenas uma maneira de evitar isso, — Cronus acrescentou.

Seu estômago embrulhou, suas veias gelaram. —E seria?

—Isso.

Ela nunca viu acontecer. Num momento Cronus a estava segurando, no seguinte estava apunhalando-a no estômago. Dores agudas rasgaram através dela, e olhou abaixo através de olhos arregalados. A mão dele estava enrolada no punho da lâmina que ele havia golpeado em sua barriga.

Ira rugiu pela injustiça, e naquele momento, o demônio não precisava ver o passado de Cronus para experimentar um desejo de atacar. Punir!

—Por que você... Por que...? — O sangue escorria de sua boca. Um dia, realmente vou matá-lo.

PUNIR. PUNIR. PUNIR.

—Eu disse a você. Galen não iria querê-la de outra forma. — Cronus recuou, levando a arma com ele. Novamente não ofereceu desculpas por suas ações.

Odeio-o. Sangue molhava sua camisa, escorria de sua pele. Seus joelhos tremeram, entraram em colapso.

PUNIRPUNIRPUNIR.

Com os olhos se estreitando, ela avançou em direção a ele, mais uma vez espalmando suas lâminas.

Ele sorriu. —Imprudente desperdiçar sua energia remanescente em mim. Sugiro que rasteje até a porta que mostrei e encontre Galen. Caso contrário, vou voltar por Paris e o matarei eu mesmo.

Com isso a abandonou, deixando-a sozinha e, sangrando lentamente até a morte.

Teias se teceram em torno de sua visão. Zacharel tinha razão, pensou confusa. Cronus havia mentido e traído-a uma e outra vez, e como uma idiota ela havia permitido. Lamentava suas decisões. Mas não podia gritar pelo anjo.

Seu desejo se fundiu com o de Ira. De alguma forma, acabaria com Cronus, Rhea e Galen, e salvaria Paris, e diria ao resto do mundo que se danasse.

 

PARIS PULOU ERGUIDO. Nevoeiro envolvia sua mente, e um grande senso de desgraça se instalara em seu peito. Ele procurou no lugar ao lado dele. Frio, vazio.

—Sienna, — ele chamou, pensando que ela poderia estar no banheiro. Precisava segurá-la, saber que estava bem. A sensação de mau agouro o superava.

Silêncio.

—Sienna. — Gritava o nome dela agora, e com a reverberação de sua voz, a névoa afinou e memórias o inundaram.

Sienna o havia deixado. O deixou para ir para Galen. Jogou as pernas ao lado da cama, ignorando uma onda de tontura.

Preciso dela, Sexo disse.

Eu sei. Vou encontrá-la.

—Não se levante, — entoou uma voz familiar. Lucien brilhou no interior da sala.

Paris ficou tenso, fez seu melhor para se concentrar. Seu amigo puxou uma cadeira ao lado da cama, esticou as pernas e cruzou os dedos sobre o estômago. Embora fosse uma posição relaxada, seu cabelo escuro enrolava em torno dos traços sérios e olhos cansados.

 —Tenho que... — Paris fez uma análise rápida da sala, marcando coisas que precisava. Roupas. Botas. Armas. Seu olhar pousou na cabeceira onde ambas as suas lâminas de cristal descansavam. Rangeu os dentes. Ela estava lá fora, desprotegida.

O medo momentaneamente o sobrecarregou, e baixou a cabeça em suas mãos.

Preciso dela!

Eu sei, porra! Acha que não sei?

—Ela veio até mim, sabe, — disse Lucien. —Me pediu para mantê-lo aqui.

Ele levantou a cabeça e encontrou o olhar multicolorido de seu amigo, sua fúria crescendo numa maré rápida. —Você a machucou?

Lucien empalideceu, as cicatrizes no lado do rosto parecendo subir. —Não.

Certo, então. Certo. —O que disse a ela?

—Vamos chegar a isso. Aparentemente, ela também esteve com Viola e pediu que a deusa se certificasse que seu demônio fosse devidamente alimentado.

Seu queixo caiu. Sienna queria que tivesse relações sexuais com outra mulher. O conhecimento poderia ter desfeito um homem menor, e sim, o havia irritado e perturbado, mas compreendia seu motivo. Seu bem-estar acima do dela. Era a mesma coisa para ele, e era exatamente por isso que iria atrás dela. Em seguida, encontraria uma maneira de vinculá-la a si permanentemente, através de meios lícitos ou ilícitos.

Ela é nossa. Sexo podia estar relutante no início, mas estava totalmente a bordo agora.

Nenhuma discussão comigo.

Uma vez Paris havia pensado que seria capaz de deixá-la ir. Achava que nunca poderia pedir a alguém para passar 24 horas por dia com ele. Havia pensado que as complicações seriam muito grandes para superar. Bem, havia pensado errado. Quando se tratava de Sienna, não havia nada que não fizesse, nada que não suportasse — ou exigisse que ela suportasse.

Paris levantou, balançando.

Lucien o seguiu.

Ele revirou os ombros, se preparando para a batalha. —Vai tentar me manter longe dela? — Nada e ninguém o impediria de alcançá-la.

—Claro que não. — O guerreiro sacou sua Glock e verificou o clipe. —Vou com você resgatar sua garota.

 

SIENNA ENGATINHOU PARA A ENTRADA. Deixou um rastro de sangue atrás de si, mas finalmente chegou ao seu destino. Esperava mover-se como um fantasma. Em vez disso, encontrou resistência. Uma parede sólida. Porra! Levantar e envolver os dedos ao redor do trinco foi uma produção. Já estava tonta e fraca, mas a cada segundo que passava, ela ficava mais ainda.

Duas coisas a mantinham. Ódio por Cronus, Rhea e Galen, e amor por Paris. Podia fazer isso. Faria isso. Havia chegado tão longe, não ia parar agora. Gordas estrelas brancas piscavam através das teias. A respiração era difícil, o ar parecendo engrossar cada vez que inalava.

Trinco, torceu. Porta, empurrando com o ombro. Dobradiças rangendo. Sim! Sucesso.

Uma mão na frente da outra, os joelhos arrastando atrás dela. Passado a soleira. Uma mão na frente da outra, os joelhos ainda arrastando. Estrelas, estrelas, tantas estrelas suplantando as teias completamente.

Farfalhar a poucos metros de distância. Um gemido feminino.

Uma maldição de macho.

Galen?  —Ajude...-me... — Sienna balbuciou.

Pés tocaram o chão. Passos ecoaram. O arrastar de penas sobre tábuas de madeira. Em seguida, um bonito homem loiro estava agachado na frente dela. Olá, Galen, o homem do retrato. Estava de peito nu e coberto por ataduras ensanguentadas. Tinha uma lâmina erguida, como se quisesse a atacar, mas então hesitou, as narinas queimando, os olhos instantaneamente vidrando.

—Quem é você? — Ele resmungou.

Seu batimento cardíaco acelerou, o que por sua vez a levou a sangrar mais rápido. Seus pensamentos eram como névoa, impossíveis de entender. —Sou... Ira. Caçadora. —E por que não estava seu demônio piscando imagens dos crimes de Galen pela sua cabeça? Estava tão fraco quanto ela? Sua força dependia da dela e a dela às vezes dependia da dele?

Do outro lado viu uma pálida fêmea de cabelos claros num canto, espiando das sombras. Suas feições estavam tensas, a pele incolor. Esta era Legion, a menina que os Senhores procuravam? A menina que havia se trocado para salvar Ashlyn?

A menina que Galen havia arriscado sua vida para conseguir?

Inferno, Ira disse com um gemido.

—Por que está aqui? — Galen exigiu. —Como chegou aqui?

Sienna queria vir com uma história de antemão, queria que Cronus lhe houvesse dado uma. Agora não tinha nada. Sem palavras para acalmá-lo e convencer Galen de sua confiança. Pelo menos até que pudesse se defender.

—Ajuda, — foi tudo que disse.

Legion se arrastou para frente. —I-ira? Não posso ver você, mas eu o sinto.

Meu inferno.

—Para trás, Legion, — Galen latiu, e a menina correu imediatamente de volta para seu posto. Ele nunca tirando a atenção de Sienna.

O que havia feito à Legion para criar tanto medo nela? O que pretendia fazer com ela? Não importava o que, Sienna não podia deixá-lo machucar a menina. Tinha que encontrar uma maneira de levá-la para a segurança.

Como se ele lesse sua mente, disse violentamente, —Ela é minha. Se a tocar morre após eu brincar com você um pouco.

Sienna olhou para ele. Tantas ameaças haviam sido lançadas recentemente em seu caminho, que era apenas um ruído branco.

Lambeu os lábios, se inclinou e cheirou. —Você cheira tão bem. — Suas palavras beiravam a repreensão. —Tão bem.

Ela permaneceu imóvel, parte sua querendo que provasse seu sangue, o resto se repugnando pela ideia. Mas era isso, a forma como iria controlá-lo, e tanto quanto desprezava Cronus por isso, estava de repente um pouco grata. Enquanto Galen estivesse sob o feitiço da ambrosia, Paris estaria seguro.

E então reescreveria o futuro previsto, criando uma quarta estrada. Como havia prometido a si mesma, mataria o rei e a rainha dos Titãs. Não haveria prendê-los, nem misericórdia.

Outra fungada, um estremecimento de prazer e, em seguida, Galen se sacudiu, tropeçando em sua bunda. —Fox, — ele gritou, andando de costas o resto do caminho dela. —Fox!

Maldito. Sienna chamou suas últimas forças e foi na direção dele. Tinha que levá-lo a prová-la. Tinha que... Estendeu a mão sangrenta.

—Fox! — Seus olhos se arregalaram com horror quando ele bateu no muro, incapaz de se mover quando ela avançou... avançou...

Passos atrás dela, uma mão dura agarrando seus cabelos, puxando-a para trás. Então, ela estava visível para mais pessoas além do mestre da casa, pensou vagamente enquanto sua força diminuía. Evidentemente Cronus havia trabalhado sua magia sobre os capangas de Galen, também.

—Mate-a, — resmungou Galen. —Mate-a.

 

KANE SABIA QUE ESTAVA SONHANDO. Por que mais ele veria Amun e Haidee enfrentando os dois cavaleiros, punhais ressoando juntos, grunhidos e gemidos enchendo o ar? Por que mais a pele de Haidee estaria mudando para azul gelo, com os cabelos gelados? Por que outra razão William estaria polindo as unhas enquanto se inclinava contra a parede?

Por que mais uma bela mulher com longos cabelos loiros caindo em cascata de prata sobre um dos ombros e olhos da mais pura lavanda estaria olhando para ele, franzindo a testa, puxando as algemas de seus pulsos e tornozelos?

Inferno. Talvez não estivesse sonhando. Talvez ela fosse um anjo. —Morto? — Respondeu asperamente. Afinal, havia se forçado a morrer, e talvez, finalmente, graças a Deus, sua alma houvesse deixado seu corpo. Talvez estivesse livre de seu demônio. Talvez estivesse sendo enviado para o reino secreto nos céus, onde o falecido Baden e Pandora viviam. Um reino onde os endemoniados passavam a totalidade da sua vida após a morte.

Baden, uma vez seu melhor amigo. Uma vez o guardião da Desconfiança. Aeron havia passado um pouco de tempo nesse reino secreto, havia falado com Baden, e até mesmo com Pandora, que odiava todos com uma paixão que não havia diminuído ao longo dos séculos.

Aeron havia fugido com sua Olivia. Kane, porém, não queria escapar.

—Morto? — Ele perguntou de novo. Mesmo enquanto falava, seu cérebro deu um sinal de néon em sua consciência. Minha.

A fêmea — com certeza a criatura mais bela que já havia visto — disse apenas uma palavra. —Não. — Mas sentiu a força de sua voz em cada uma de suas células. Pura, encantadora, inebriante.

Minha. Um rugido agora.

Anjos não podiam mentir, então sabia que havia dito a verdade. Mesmo não havendo uma camada real de verdade em sua voz. Então, se não estava morto, estava vivo. O pensamento não o agradava. Odiava que tal beleza o visse assim. No seu pior, violado, ferido, fraco.

—Mate-me, então, — ele ordenou.

Minha. Mais alto que antes. Não entendia o instinto possessivo, e não queria entender isso. Podia desviar-se do seu caminho atual.

Silêncio, silêncio tão pesado. A calma antes da tempestade. Porque, no próximo batimento cardíaco, Desastre protestou. Em voz alta. Gritando e gritando e gritando dentro da cabeça de Kane.

Não, não estava morto.

Kane tentou cobrir suas orelhas, e conseguiu. Seus braços estavam livres das correntes, percebeu ao longe. Isso foi o que a mulher havia feito. O soltado.

—Não, — ela repetiu. —Não vou matar você.

Minha.

Cale a boca. Ele retornou à sua teoria dos sonhos. Este era um sonho, apenas um sonho, o que significava que tinha que fazer tudo que queria que ela fizesse. Certo? —Mate. Me.

Suas mãos deslizaram abaixo dos ombros e o empurraram acima, para cima. Ele sentiu o calor, a suavidade de suas palmas. Sentiu o cheiro do perfume de patchouli, profundo, rico e almiscarado, erótico e terroso. No fundo do seu nariz, agarrado aos seus seios nasais, espalhando por seu estômago, sua corrente sanguínea.

MINHA.

Um grunhido se erguia de sua garganta, ameaçando saltar de sua boca. Seus braços ficaram moles e caíram inutilmente dos lados, e ainda teve que lutar contra o desejo de alcançá-la e se agarrar a ela. Queria sua boca sobre ela, queria seu corpo no dela.

Ele queria... e por isso a teria.

MINHA, ela é minha.

A loira — que de repente deixou de ser loira, mas sim uma linda mulher negra — não, uma sensual Latina — se aproximou de seu rosto, os olhos escuros penetrantes. —Não estou aqui para acabar com sua vida, mas para salvá-lo, — disse ela. —Vou levá-lo para o mundo humano e, em troca, você vai me matar. Quero primeiro seu juramento.

Desastre parou de gritar e começou a rir novamente.

 

CRONUS ANDAVA PELA CÂMARA DOS FUTUROS SOZINHO, suas emoções se equilibrando no fio da navalha da destruição. Havia procurado por toda parte, mas ainda não havia encontrado Rhea. Os Caçadores que havia capturado e trancado estavam agora sumidos. Rhea, de alguma forma os havia libertado, sabia. E Sienna ainda não tinha feito seu trabalho com Galen.

Se tivesse que destruir o mundo inteiro para se salvar, o faria.

De uma forma ou de outra, conseguiria o que queria. Domínio sobre o mundo humano. Controle de sua esposa. E da vida. A vida eterna. Era um imortal, um rei, o mais poderoso de seu povo, mesmo que alguns lá fora o deixassem tremendo.

Parou na frente de um vaso que um de seus Olhos haviam esculpido e pintado há muito tempo. Nele, a detestada filha de Rhea — Scarlet, a guardião dos Pesadelos — estava em processo de remoção de sua cabeça. Então, sim, havia duas previsões sobre sua morte. Dois supostos assassinos. Dois lugares diferentes, em dois momentos diferentes.

Por quê?

Nunca havia sido capaz de descobrir este mistério em particular. Apenas uma pessoa poderia matá-lo, não era verdade? A menos que Galen e Scarlet trabalhassem juntos? Mas o par se desprezava um ao outro, lutava em lados opostos. Prova: Scarlet recentemente havia invadido os sonhos de Galen e convencido o homem de sua própria ruína iminente. Esses sonhos haviam feito o guardião da Esperança atacar seu homem — Gideon — o que a havia enfurecido ainda mais.

Cronus piscou quando uma ideia se enraizava. Poderia a resposta ser tão simples? Scarlet de alguma forma havia invadido os sonhos de seu Olho? Mostrado uma falsa realidade? Ele e Scarlet eram inimigos desde seu nascimento, e ferir um ao outro havia se tornado uma espécie de jogo.

Talvez, pensou ele. Sim, talvez. O que significava que era mais provável estar no caminho certo. Galen era a maior ameaça, e assim Galen devia ser encurralado.

Sienna agora sabia exatamente como Cronus podia ser impiedoso para se assegurar que seus objetivos fossem cumpridos, e viria por ele. Se falhasse, cumpriria sua ameaça. Paris ia morrer. E a faria assistir.

 

A SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO, Sienna pensou, mas apenas porque a guarda-costas de Galen, Fox, havia feito o que não deveria e provado o sangue dela. Quando a mulher arrastou Sienna para fora do quarto e para uma adega ostentando apenas uma mesa comprida com um dreno abaixo dela, o sangue havia alcançado suas mãos. Sienna havia se assegurado disso. Havia prometido a Paris que mataria quem provasse seu sangue, e faria seu melhor para isso.

E quando a mulher a havia levantado sobre a mesa, sentido o cheiro doce de coco da ambrosia. Ela havia lambido, fechado os olhos e gemido em êxtase. Então, é claro, veio à festa. Fox havia caído sobre ela, lambendo, mordendo. E quando havia terminado não havia dado o golpe mortal, mas havia carregado Sienna para seu quarto e a amarrado num canto.

Que foi... há quantos dias? Sienna havia perdido a noção. O tempo passava muito devagar para ela e ainda muito rapidamente se medido apenas pelo número de visitas que Fox fazia a ela. Sua lesão inicial havia se curado, mas Fox havia feito incisões novas, tomando mais sangue, mantendo-a fraca.

O que Paris estava fazendo agora? Se ressentindo dela? Odiando-a? Lucien havia conseguido mantê-lo dentro do castelo? Sim. Provavelmente. Os Senhores haviam deixado seus sentimentos por ela claros, e saltariam sobre a oportunidade de aprofundar suas emoções negativas.

Não vá por ai. É ruim para sua saúde mental. Além disso, precisava planejar. Primeiro? Tirar Legion daqui. Em segundo lugar, retornar e forçar Galen a se alimentar de seu sangue. Porque de nenhuma maneira ele confiaria nela depois que fugisse com sua mulher, e realmente precisava de sua confiança. Não podia matá-lo se não pudesse chegar perto dele.

O rosto assustado de Legion passou por sua mente. Não a mulher de Galen. A mulher percebida de Galena.

Ira se esticou dentro de sua cabeça. Como ela, ele enfraquecia. Ele precisava se alimentar, estava desesperado para punir alguém, e Galen era o candidato perfeito.

Ela se mexeu no chão, esfregando os pulsos presos contra a parede atrás dela. Infelizmente suas asas continuavam a ficar no caminho. E havia uma mordaça em sua boca para que não pudesse pedir ajuda. Não que o faria. Zacharel viria direto do céu e esperaria que ela marchasse direto para seu Bando Faça O Que Eu Disser. Então não ia acontecer.

A porta do quarto abriu e Fox entrou. Usava botas de combate, calças de couro pretas e um top. Seu cabelo estava preso num rabo de cavalo, e estava lambendo os lábios. Vinha continuar de onde havia parado.

Ela caiu de joelhos na frente de Sienna, retirou sua mordaça e disse "Sentiu minha falta?" e puxou uma lâmina.

Vamos lá, lute contra ela. Faça alguma coisa. —É patética, sabia? Galen teve forças para resistir a mim, mas você não. Não tem vergonha?

Fox estava muito extasiada com o pulso em seu pescoço para responder, e nem sequer se preocupou em verificar suas restrições, algo que havia feito todas às vezes antes. O vício estava piorando e, muito. Bom.

—Aposto que não. É muito estúpida.

Com um rosnado, Fox se lançou, baixando a cabeça. Sienna sacudiu os joelhos, atingindo a fêmea na têmpora e a fazendo voar para o lado. Sienna pesadamente se levantou, o que era difícil de fazer com os braços algemados atrás e os tornozelos presos juntos. Sem mencionar o turbilhão dentro de sua cabeça.

Carrancuda, Fox saltou para seus pés. —Vai pagar por isso.

O que faria em seguida não sabia, mas depois, não importava. De repente Legion estava lá, atrás de Fox, despercebida e balançando uma frigideira. O ferro fundido bateu no crânio de Fox, um ruído alto ecoando. Os olhos de Fox se arregalaram, giraram, e ela caiu de joelhos.

Legion deixou cair à panela como se o cabo estivesse em chamas e ficou ali, ofegante, olhando com horror.

—Pegue sua faca e corte para me soltar, — Sienna ordenou, assumindo. —Depressa, não temos muito tempo.

Tremendo, chorando agora, Legion ficou exatamente como estava. —E-eu sei que está aqui, mas não posso, não posso ver você — não posso te ouvir.

Não. Não, não, não. Se Legion não podia vê-la, Legion não podia tocá-la. Sienna tentou tudo que podia imaginar para se fazer notar. Ao mesmo tempo Ira batia contra suas têmporas, desesperado para fugir. Finalmente, não sabendo mais o que fazer, permitiu que ele assumisse.

Pela primeira vez, após ceder o controle ao demônio, Sienna estava ciente de seus arredores, de seu corpo e sua mente. Não tinha certeza se isso havia acontecido porque estava mais forte ou mais fraca que Ira, mas sentiu sua mudança de pele, de suave para escamas. Sentiu seus dentes unhas alongando e afiando.

Um segundo depois, Legion engasgou. —Ira.

—Inferno. A voz de Sienna era baixa, mais rouca do que nunca.

A menina teve coragem de se abaixar e pegar a faca, em seguida, se aproximar. Mãos delicadas cortaram a corda, liberando os braços de Sienna.

Através do demônio comandou a faca. Abaixar provou ser um grande erro, no entanto. A tontura duplicou fora de controle, e acabou estatelada no seu estômago. Levantou os joelhos e serrou a corda, encolhendo-se a cada centímetro seu que latejava.

—Sabia que ela não havia matado você, — a voz suave de Legion proclamou. —Podia sentir minha Ira. Teria vindo mais cedo, mas Galen me mandou ficar em seu quarto por quanto tempo ele tivesse que ficar dentro dele. Acabou sendo três dias. Saiu esta manhã, anulando a ordem, e segui Fox até a cozinha e depois ao quarto dela.

A mente de Sienna pegou apenas um fato. Três dias. Paris teria que dormir com pelo menos uma mulher para manter sua força. Mais provável serem duas. Não pense sobre isso também. Uma divisão a impediria de fazer o que precisava ser feito.

Completamente livre agora, prendeu a lâmina na cintura de suas calças, se empurrou em pé e estendeu a mão para Legion. A menina não se moveu, estava congelada no lugar, uma expressão de grande miséria.

—Onde está Galen agora? — Sienna perguntou, ainda com aquela voz rouca.

—Não sei. Ele não voltou.

Bom. Isso era bom. —Vamos sair. — Ela acenou as garras na ponta dos dedos. —Eu e você, agora.

Cabelos loiros esvoaçaram em torno dos ombros delgados quando ela balançou a cabeça. —Não posso.

—Pode. Vamos.

—Não, não posso. Fiz um juramento. — A miséria aumentou. —Tenho que ficar com ele.

Vamos ver sobre isso. Juramento ou não, Sienna ia levar essa menina para a segurança. Agora. Argumentar seria perder tempo. Lutar seria ineficaz. Tão fraco como o corpo de Sienna estava, Legion escaparia em segundos. Rota sorrateira, aqui vamos nós.

—Tudo bem. Vamos sem você, — ela mentiu. —Preciso de outra arma primeiro. — Apesar de quase cair mil vezes, conseguiu pegar a panela, se endireitar e atingir o cérebro da garota da mesma maneira que havia feito com o cérebro de Fox. Clang.

Legion caiu, aterrando em cima de Fox. Sim. Isso ia deixar uma marca.

Pegar a menina, que não era leve, e posicionar corretamente em seu ombro era uma tarefa quase impossível. No último momento, Sienna encontrou forças para sobreviver e se equilibrar. Mas o estouro teve um custo. Ira perdeu o controle sobre ela, sua imagem retornando ao normal e seu corpo agora se movendo sob seu próprio vapor. Tropeçou seu caminho para o corredor.

Um longo corredor. Paredes empapeladas, móveis recém-polidos. Só o melhor. Uma escada em espiral aparecia à frente. Quilômetros de distância, no que dizia respeito a ela.

Então, no final do corredor, Galen dobrou uma esquina como se estivesse usando patins, todo velocidade e graça furiosa. Estava armado como um petroleiro, e ameaça ondulava dele. Se o visse na rua, teria corrido como o inferno e orado por uma morte rápida. Agora, só conseguia assistir como vinha na direção dela, com intenção de pegar Legion de volta.

Não, nunca confiaria nela agora. Sua única esperança era envolvê-lo e forçar seu sangue em sua garganta. Então ia querê-la viva. Certo? Por favor, que esteja correto.

Estava prestes a soltar Legion quando avistou Zacharel de um lado dela e o Cara Sombra do reino de Cronus do outro. Caraca, quantas pessoas estavam atrás dela? Estes dois estavam se aproximando e Galen havia notado também, e gritou uma maldição negra. Iriam alcançá-la antes que ele o fizesse.

E então aconteceu. O contato. A névoa negra a envolveu primeiro. Ela e Legion foram arrastadas para um mundo de gritos estonteantes. Abaixo desses, pensou ter ouvido o barulho de frustração e raiva de Zacharel. Um erro de sua parte, certamente. O anjo era sem emoção.

Ira recuou para o fundo de sua mente, e assim que Sienna abriu a boca para soltar seu próprio grito, o barulho acalmou. Ira pegou essas imagens granuladas de novo, e não teve ideia de como reagir. Tentou lutar para se livrar, mas a névoa negra se mantinha firme ao seu redor, bloqueando a visão de seus arredores.

—Fêmea. — A voz do Cara Sombra era rouca e persuasiva. —Tenho um negócio a propor.

Legion escorregou de seu aperto. Sienna se esticou por ela, mas não conseguiu alcançar, a menina permanecendo dentro da névoa, flutuando, girando. Com os olhos fechados, ela dormia.

—Tem um nome? — Perguntou ela.

—Sim.

Quando não ofereceu mais, ela retrucou: —Bem, qual é?

—Alguns me chamam Hades.

O rei dos mortos? Alto Senhor do Submundo? Deus grego? O que os Caçadores temiam mais que todos os outros? Esse Hades? Não estou intimidada. —Estou ouvindo, — disse ela, porque não tinha ideia do que dizer.

—Seu homem precisa de você.

Seu estômago afundou. —O que quer dizer?

—Recusa todas as mulheres e fica mais fraco a cada momento. Vou levá-la para ele. Depois chegaremos a um final agradável para nossas negociações.

Paris, fraco e ficando mais fraco. A notícia que permaneceu fiel a ela não deveria aliviá-la e deixar contente, mas o fez. Fez mesmo. —Como sei que está dizendo a verdade? O que quer em troca? — Mais corpos para alimentar suas sombras?

—Ao contrário do tolo do Cronus, não tenho necessidade de mentir. E parte de mim espera que se una a mim para que eu possa forçá-lo. Seus gritos se juntarão aos meus outros, e a sinfonia me emocionará durante os séculos vindouros. Estou me sentindo magnânimo, no entanto, e vamos tentar primeiro do seu jeito.

Isso só podia acabar mal.

Ele continuou: —Ouvi o que o anjo disse. Ouvi o que Cronus te disse. É uma chave para a vitória, e quero que jogue na minha equipe.

Argh! Uma vez ninguém a queria. Agora todo mundo o fazia. —Não. Desculpe. Já escolhi meu lado.

—Pensei que diria tal coisa. Mas ouvi dizer que negociou com a deusa. Ela pediu uma benção, e você concordou. Vou aceitar a mesma disposição.

—Quer que mate seu inimigo? — Chocante. Não devia ter nenhum problema ao fazer isso por conta própria.

—Não. Gostaria apenas de um benefício, a ser pedido mais tarde. Qualquer coisa que eu deseje, desde que não fira o homem ou seus amigos. Concorda?

—Não posso voltar para Paris. Vai ter que fazer alguma coisa para salvá-lo.

—Não posso, mas você pode. Tudo que deve fazer é me permitir levá-la a ele. Tão simples, tão fácil.

Dificilmente. —Deixá-lo quase me matou.

—Ficar longe dele vai matá-lo. — Sua voz se tornou uma carícia. —Deixe-me levá-la para ele. Pode ficar com ele, fortalecê-lo e salvá-lo, e então pode convencê-lo a desistir de você, o que ninguém mais foi capaz. Ninguém mais será capaz.

Estou tão fraca. Não é possível deixá-lo em perigo. —A garota vai comigo, e isso é inegociável.

—Claro. Para uma segunda bênção.

Doce céu, quantos favores deveria quando isto acabasse? — Muito bem, mas apenas se as mesmas condições se aplicarem.

—Sim. E assim o novo trato é feito. — Embora não pudesse distinguir nenhum rosto no escuro, as sombras se diluíram numa área, a luz escoando para revelar uma ponta de sorriso. —Eu a levo para seu homem, que está procurando por você, e a menina para Aeron, que procura por ela.

Sienna piscou, e se encontrou dentro de uma barraca localizada em algum lugar fora do Reino de Sangue e Sombra. Muita luz penetrava nas rachaduras da barraca. Mas então viu o tapete de pele e sua localização deixou de importar. Paris estava esparramado em cima dele. Estava imóvel. Muito imóvel. O medo quase à fez dobrar os joelhos. Até que inalou. O ar quente, perfumado com champanhe e chocolate, a envolvendo da mais suculenta das maneiras. O perfume especial do seu demônio. Sua boca molhou, e seu sangue vivificou. Seus próprios ferimentos foram esquecidos quando o calor se agrupou entre suas pernas.

—Paris, — ela sussurrou. Sua pele estava febril e brilhante, vermelha e frisada pelo suor. Estava gloriosamente nu, e densamente excitado. Seus olhos estavam calmos por trás de suas pálpebras, o peito mal levantando com sua respiração. —Oh, Paris. — Não posso deixá-lo ficar assim de novo. Tenho que fazer alguma coisa.

—Sienna?

Ela correu até ele e o beijou, sabendo que mesmo tão pequeno gesto ajudaria a reanimá-lo. Quanto mais suas línguas duelavam, mais agressivo ele se tornava. Quando as pálpebras abriram, os olhos vermelhos brilhantes se prenderam nela. Com um grunhido, a agarrou pela cintura e puxou de volta. Seu coração acelerou numa superbatida quando suas asas abriram para evitar serem esmagadas.

Ele arrancou suas roupas, as rasgando. No exato momento que ficou nua, abriu suas pernas e estava dentro dela, empurrando duro e profundo.

Enquanto a trabalhava, ele jogou a cabeça para trás e rugiu. Ela se arqueou e o tomou ainda mais profundo. Brutalmente, maravilhosamente.

Ela havia sentido falta disso, falta dele. Precisava disso, precisava dele. Suas unhas foram para sua bunda e o guiaram num ritmo mais rápido. A paixão a varreu, apertou, consumiu, partiu seu coração e encaixou os pedaços de volta. Seu amor por ele não conhecia limites, não tinha limites.

Assim que o clímax se aproximou, ele parou. Apenas parou e olhou para ela, a respiração ofegante estourando em cima dela. O rubor cobria suas bochechas, e a percepção agora inundava seus olhos, seguida pela preocupação e horror.

—Oh, Bebê. Eu te machuquei? — Seus polegares passaram sobre os lábios com cuidado primoroso.

—Fale mais tarde. Faça amor agora. — Tão perto. A qualquer segundo agora iria chocar-se em satisfação.

Seu pênis estremeceu no seu centro, como se o comando despertasse todos os tipos de desejos impertinentes. —Como chegou aqui?

—Mais tarde! — Ela apertou seu comprimento enorme.

—Simmmm. — Seus quadris subiram uma vez, subiram novamente, e então estava atingindo dentro e fora, e ambos estavam gemendo. Em seguida, seus lábios estavam nos dela, as línguas entrelaçadas, e ela estava engolindo seu gosto, e era melhor que nunca, e não conseguia o suficiente, nunca queria que isso terminasse, e... e... e... Oh!

Pequenas bombas de prazer explodiram por cada centímetro dela. Seu nome saiu da boca uma e outra vez, o coro acompanhado pelo grito de seu nome quando ele gozou. Jorrou quente, dando-lhe cada gota de sua paixão. Ela aproveitou o momento, saboreando-o, emocionada por tudo que ele era.

Quando ele caiu em cima dela, ela embalou seu peso, exatamente onde queria estar. Onde queria ficar, para sempre. Ela o havia deixado uma vez. Não achava que poderia deixá-lo novamente.

—Eu te amo, — ela sussurrou. —Eu te amo tanto.

—É melhor, — ele murmurou contra seu ouvido.

Esse é meu homem. Uma coisa tão Paris de dizer, e ela sorriu.

Ele se desprendeu e rolou para o lado, mas a levou consigo, com o braço envolto em torno dela. —E agora que não estou morrendo, — ele anunciou, com crescente expressão sombria, —falaremos.

 

PARIS MANTEVE SEU CORPO RELAXADO, não querendo deixar Sienna desconfortável, ou ciente do fato que basicamente a estrangulava. Um gentil aperto, que não fazia nada para prejudicar sua capacidade de respirar, mas um estrangulamento da mesma forma.

Ela não ia a lugar nenhum, e era isso.

Felizmente, Sexo estava fora de combate e incapaz de comentar.

—Tudo bem, — disse ela. —Vamos conversar. Vou começar. Me odeia agora?

—Odeio você? Bebê, essa pode ser a coisa mais estúpida que já disse. Sem ofensa.

—Não me ofendo. Estou muito aliviada. Depois do que fiz para você...

—Tudo que você fez foi me lembrar que preciso jogar quando o assunto é você. — E honestamente? Suas ações lhe davam esperança que ela sentia tão profundamente por ele como ele sentia por ela.

—Não está com raiva de mim por ir até Galen?

Quando ele faria a mesma coisa? —Só de mim. Deveria ter saciado você tanto, que nunca seria capaz de andar novamente.

—Uma pouco mais de prática, — brincou ela, —e pode ser uma possibilidade.

—Bruxa.

Quando ela se aproximou até roçar os cabelos no seu rosto, viu que estava cortada e machucada. Ele engoliu um latido de fúria. Tendo sido contido algumas vezes durante toda a sua vida, reconheceu as marcações pelo que eram. Queimaduras de corda.

Pavor apertou seus traços. —Não, e não quero falar sobre isso.

Muito bem. Ele queria tranquilizá-la sobre algumas coisas em primeiro lugar, de qualquer maneira. Mas descobriria quem a machucou depois, e assim que o fizesse, partiria para a vingança.

—Isso significa que está pronta para a segunda parte da conversa, — disse ele, todo o toque de diversão desaparecido.

—E-eu não sei nada sobre isso.

—É uma pena. Precisa saber que não dormi com ninguém enquanto estávamos separados. — Sem importar o quão fraco havia começado a ficar, sem importar quantas mulheres seus amigos haviam empurrado para ele. Finalmente todos, exceto Lucien, haviam continuado sua busca para encontrar Sienna.

Nota mental: diga a Morte para acabar com o grupo de busca.

Falando nisso, tinha certeza que Lucien havia entrado enquanto estavam fazendo sexo, pensando em protegê-lo do que quer que havia vindo matá-lo e, em seguida saiu quando percebeu o que estava acontecendo.

—Eu sei. — As pontas de seus dedos traçaram círculos lânguidos em torno de seus mamilos. —Confio em você. Mas Paris, a morte estava tão perto. — Ela beijou seu peito, logo acima do coração. —Não gosto que se permita entrar em tal condição.

—Não importa. Só assim sabe que Sexo sente saudades de você também. Você usa um monte de chapéus, e ele quer tirá-los todos.

Ela riu, um som quente e rico, que agiu como maná para seus ouvidos. —Agora tenho meu chapéu de capataz severo, para que ouça melhor. Tenho que sair. Só tenho que ir, mas preciso saber que está cuidando de si mesmo e...

—Não.

—Não seja assim.

—Tente me deixar. Basta experimentar. Veja o que acontece.

—Paris...

—Você fica ou me deixo desaparecer. Fim da história. Prometa.

Tal silêncio pesado. —Tenho um plano que preciso...

—Mude de planos. É um trato.

Ela bateu com o punho contra o peito. —Você é tão frustrante.

—Diga-me o que quero ouvir, Sienna.

Um suspiro deslizou dela, parecendo drenar sua luta. —Ótimo. Vou ficar com você, mas vamos ter que debater uma solução para nossos problemas Cronus e Rhea, nosso problema Galen, e é nosso problema Você Vai Morrer Pela Profecia. Porque, o que eu te disse? Cronus me disse que se Galen morrer, você e seus amigos morrem. Se Cronus morrer, você e seus amigos morrem.

—Não estou dizendo que duvido do que ouviu falar, mas duvido da fonte. Mas, mesmo se o que disse for verdade, deve haver uma maneira de contornar esta profecia. Sempre há. Não estou nem um pouco preocupado. — Na verdade, estava muito feliz. E eram lágrimas nos seus olhos? Sim. Sim, eram. Se isso fazia dele um covarde, então era um covarde. Não se importava. Ela estava aqui, ia ficar. Era sua.

Ele deslizou seu braço ao redor de seu pescoço até a parte inferior das costas, abrindo os dedos sobre suas curvas. —Obrigado, — disse ele, mas as palavras não eram suficientes. Não transmitiam o suficiente. —E agora que estamos oficialmente juntos, quero te dizer algumas coisas sobre mim. Quero tudo claro, nada oculto. Quero compartilhar tudo que sou.

Ela devia sentir a direção que ele ia. —Não precisa. O que aconteceu no passado é passado.

—Contar tudo. Quero que saiba se vai ficar comigo. Dessa forma, se Ira mostrar alguma coisa, ou meus amigos falarem alguma coisa, já haveremos lidamos com isso.

—O que disser não vai mudar a maneira como me sinto por você.

—Fico feliz, mas farei isso de qualquer maneira.

Seu suspiro acariciou sua pele oh, tão deliciosamente. —Tudo bem.

Ela o amava. Captou o sentimento. Isso seria bom. —Sou um viciado em ambrosia. Mas não toquei nela desde antes de alcançar você, — ele correu a adicionar. —E se algo acontecer e for exposto ao seu sangue, não precisa se preocupar. Não vou te machucar.

Seu cabelo sedoso fez cócegas em seu peito quando ela balançou a cabeça. —Sei que não vai me machucar, mas Paris eu droguei você. Não sabia sobre seu vício, ou teria encontrado outra maneira de ter te derrubado. Estou tão, tão triste, e nunca vou me perdoar.

Ele odiava a implicação que ela o teria deixado, mas bebeu sua preocupação por ele. —Perdoe-se agora. Isso é uma ordem. Mas vou, naturalmente, lhe dar uma surra antes de te perdoar.

O ruído mais adorável escapou dela, um suspiro e um sorriso, combinados. —Aceito a surra. Mereço.

Seus lábios se contraíram com o mais doce tipo de humor. —Não pode aceitar sua própria punição, Bebê. Precisa lutar contra mim.

Ela ronronou, na verdade ronronou, e as vibrações o deixaram duro de novo.

Diga o resto, então pode passar para as coisas boas. Ele perdeu seu meio sorriso. —Certo, aqui está à terceira parte. Sei que me disse que viu meu passado, mas não tenho certeza se Ira mostrou tudo. Falei de um escravo, mas ele não foi o único. Eu já... estive com homens.

Nem mesmo uma pausa. —Oh, sim? Bem, na faculdade beijei uma menina. Ela era minha colega de quarto, estava chovendo lá fora, escuro, com os flashes ocasionais de relâmpagos, romântico ainda que assustador. Sabe como é.

Não ia fazer drama sobre isso, novamente apenas aceitava cada faceta dele... não admirava que amasse essa mulher. —Gostou?

—Eu meio que gostei, — Sienna disse num sussurro escandalizado.

Hummm, mas gostava dela escandalizada. Perguntou-se o que poderia fazer para aumentar isso, o que a faria nervosa, mas muito animada para dizer não. Podia descobrir, bem, não esperava encontrar mais companheiros de cama.

—Mais tarde, após seu espancamento, vamos fazer uma troca de papéis. Serei seu companheiro de quarto, doce e inocente, Parette, e vai demonstrar esse beijo em mim. — E então vou convencê-la a fazer coisas que nunca sonhou.

—Besta incorrigível.

—Mas me ama assim mesmo.

—Eu te amo sempre.

Antes que pudesse responder, houve uma explosão de luz branca na parte da frente da tenda. Numa onda de movimento e espumando de raiva, Paris pegou ambas as lâminas de cristal, pressionando uma na mão de Sienna. Estava de pé um momento depois, despreocupado por sua nudez.

Cronus havia chegado, e se sua temível carranca fosse qualquer indicação, estava com raiva. Primeiro instinto: atacar. Paris retrocedeu. Embora por pouco. Segundo: reconsiderar. Respostas, ele precisava de respostas.

O olhar estreitado do rei deslizou de Paris para Sienna, que acabava de arrumar sua roupa. —Estragou tudo, — ele rosnou.

Paris se moveu para sua frente, bloqueando a visão do rei. Cronus simplesmente apontou para o lado da tenda, e Paris foi impulsionado para lá numa rajada forte de vento, seus braços abertos, as pernas estendidas, cordas invisíveis o prendendo no lugar. Embora lutasse, não conseguia se libertar.

Desamparado. Assim mesmo. O pânico era como uma pílula amarga em sua boca, e engoliu tantas que só poderia ter uma overdose.

Escuridão... tanta escuridão... Vou machucá-lo. Vou matá-lo. Lutou tão ferozmente que seus músculos começaram a soltar de seus ossos. Isso não o retardou.

Uma Sienna carrancuda ficou de pé. Use o cristal, projetou com os últimos vestígios de seu controle. Ela não fez — ficou firme, o queixo erguido.

—Não vou voltar para Galen, — anunciou ela.

—Mesmo se ficasse viciado em você, Galen não confiaria ou a seguiria agora. Ele te odeia. Levou sua prisioneira, machucou seu soldado, e não é do tipo de perdoar ou esquecer. Para ele, toda ofensa deve ser devolvida mil vezes.

Essas asas leves e negras se abriram. —Não há outra maneira. Vamos encontrá-lo. Basta nos dar tempo.

—Tempo? Tempo. — Ameaça pulsava de Cronus. —Uma vez me perguntou por que queria você disposta. A resposta era simples. Eventualmente, teria se virado contra mim. Agora o fez e não é mais uma preocupação. Então, não. Receio que seu tempo acabou. Agora vou destruir tudo que lhe é querido.

Paris rosnou quando Cronus desapareceu e reapareceu na frente de Sienna num único piscar de olhos. Ele a agarrou pelos cabelos. Paris por fim conseguiu se libertar, ambos os ombros saindo da articulação. Estava correndo para eles. Quase em cima deles.

Pouco antes de chegar lá, Sienna gritou: —Zacharel! Eu te chamo.

Cronus estendeu a mão e esfaqueou Paris pouco antes de Paris os alcançar. Sienna engasgou. O casal desapareceu, seu olhar preso em Paris quando ele caiu de joelhos, uma dor lancinante o consumindo.

 

—NÃO ESTAMOS FAZENDO ISSO de novo — Sienna gritou, preocupada com Paris, desesperada para voltar a ele. —Estou cansada de todos me tirando de onde quer que eu esteja. — Tudo ficou escuro ao seu redor. Em seu nariz, em seus pulmões, derramando através de sua corrente sanguínea. Sem cor, sem vida, apenas um vazio sem fim.  — Isso termina agora.

—Não tomará o caminho mais fácil, e agora vai ter que viver com o plano B — Cronus disse sua voz deslizando a partir do nada.

Não vou perguntar. Seus planos não significam nada para mim.     

—Zacharel! — Ela chamou de novo. Trabalhar com os anjos? Por que não? Aprenderia a voar corretamente, e, finalmente, de uma vez por todas, controlaria seu próprio destino.

Um lampejo de luz. Um retorno do escuro. Outra cintilação, com duração um pouco maior. Teve um vislumbre de grandes nuvens inchadas, coladas numa imensidão de céu noturno. Uma estrela aqui, uma estrela lá, brilhando de seus poleiros como olhos treinados sobre ela, observando cada movimento seu. Devia estar em outra dimensão. Uma sem um único ser vivente morando.

Ela se virou num círculo completo, e encontrou Cronus de pé a poucos metros de distância. Seus braços estavam cruzados sobre o peito, as pernas apoiadas separadas. Ela estava de repente muito agradecida por manter seu domínio sobre a lâmina de cristal que Paris havia lhe dado.

—Outra razão para eu querer sua boa vontade. —Cronus disse. —Se não estivesse ligada a mim teria se tornado soldado de Rhea e, portanto, estaria sob sua proteção.

Agora ele queria conversar? Bem, podia ouvir suas confissões e empurrá-las.

—Estou te avisando. Regresse-me para Paris. Agora.

Zombeteiro, ele arqueou uma sobrancelha para ela.

—Ou o quê?

—Ou vou lutar com você. — Planejava, de qualquer maneira. Só acelerou as coisas.

Uma risada estrondosa, afiada e amarga, até mesmo antecipatória.

—Poderia tentar.

—Retorne-me para Paris. — repetiu. —Esta é sua última chance.

Ele continuou como se ela não tivesse falado.

—Rhea não matou sua irmã. Eu matei.

Seu coração falhou uma batida quando a negação correu através dela.

—Não. — Uma mentira, certamente. Uma intenção de puni-la. Porque, se estivesse dizendo a verdade, ela havia ajudado o homem que havia destruído sua preciosa Skye, deixando-a sangrenta e quebrada, sua última lembrança sendo uma faca deslizando através de sua pele. Ela teria sangrado pelo homem que destruiu uma inocente. Ela quase havia sacrificado sua própria vida e felicidade pelo assassino de sua irmã...    

Não!

E, no entanto, a insistência anterior de Ira que algo estava errado, de repente fazia sentido. A umidade evaporou de sua boca. Um nó cresceu em sua garganta, e tinha dificuldade para absorver o oxigênio necessário. Tontura tomou o lugar central em sua cabeça.

—A segurei em minhas mãos e cortei sua garganta. Assisti a vida escorrendo para fora dela. Matei primeiro seu marido. A fiz olhar. Posso provar isso. —Ele estendeu a mão e puxou uma corrente em torno de seu pescoço. Uma borboleta esculpida a partir de um diamante negro pendia do centro.

No momento seguinte, o escudo que impedia Ira de ver seus pecados se reduziu a nada. Ela apertou as têmporas, apertou os olhos fechados quando a cena se desenrolou dentro de sua cabeça. Cronus, detendo Skye e um macho humano ao seu lado. Fazendo-os se ajoelhar. Esfaqueando o macho. Skye, lutando, se empurrando em sua lâmina. Skye sangrando. Cronus, terminando com ela. Skye, morrendo.

Náuseas rolaram através do estômago de Sienna, uma ácida agitação ameaçando ferver para cima e para fora. A fúria a encharcou em chamas ardentes e afiadas como pedaços irregulares de vidro.

—Vivo há milênios. — Cronus disse. —Acha que não aprendi alguns truques ao longo do caminho?

Vamos puni-lo. Um sussurro. VAMOS puni-lo. Um grito.      

Eu vou, ela respondeu. Um voto. Oh, vou. Por Skye. Por Paris. Por si mesma.

—Estragou meu plano, e agora vou estragar o seu. — Ele fervia. —Vou negociar com Galen. Por sua fidelidade eterna, vou te entregar, será dele para castigar como lhe aprouver. Se fugir dele, a levarei de volta para ele. E se pensar em fugir para seu amante demônio, farei Paris sofrer antes de matá-lo. E não tenha dúvidas, vou matá-lo. Ele pensa em se vingar de mim por tudo que fiz para você.

O rei fez esse tipo de ameaça uma e muitas vezes.

Ódio se juntou à doença, assim como um monte de trevas. Violência valsava entre essas sombras, o desejo de mutilar e destruir tão forte que parecia estar se afogando neles. Ela não os combateu, ela os abraçou.

Ele seria punido. Aqui. Hoje.

Segure, Ira disse. Ainda não... Ainda não...

Ela não sabia o que Ira planejava, só sabia que confiava nele para levá-la à vingança.

Cronus acrescentou alegremente:

—Sabia que quatro artefatos são necessários para encontrar a caixa de Pandora? Galen tem um, e os Senhores têm três. Isso vai mudar. Vou levar o Olho Que Tudo Vê a Gaiola da Compulsão e a Haste de Partir, e as cederei a Galen. Todos os quatro artefatos serão dele. Ficará muito grato por meus presentes, vai prometer nunca mais fazer o mal contra mim. Vai encontrar a caixa, e seus preciosos Senhores vão morrer.

Segure...

—Confia muito em Galen, não é? Realmente acha que vai manter sua palavra? Que não vai tentar tirar seu demônio, também? —Ela deu um sorriso condescendente. —Aposto que é tão confiável quanto você. Então, depois de fazer tudo isso para ele e ele se ocupar do tiro que irá matá-lo, o que vai fazer, hein? Vai lutar com ele? Ou, finalmente, aceitar sua sentença de morte como é devida?

Cronus foi até ela, mas parou no meio do caminho, seus ouvidos se contorcendo. Um estranho sorriso, borbulhando dele.

—Falando do diabo. Ou neste caso, do homem que se disfarça como anjo. Galen se aproxima mulher. E jamais foi um guerreiro furioso. Ele quer o que roubou dele, e irá extrair cada pedaço de carne do seu corpo.

Segure...         

—Traga-o. — Disse ela. Porque, sim, puniria Galen também. Puni-lo por todos os crimes que havia cometido contra Paris. Por tudo que havia feito a Legion. Tudo que já havia pensado em fazer. Enfim.

As narinas do rei se alargaram. Ele claramente não gostava de sua falta de medo.

Bem, muito ruim.

Segure...

—Não se preocupe Bebê. Nós já o trouxemos. —Paris disse, por trás de Cronus.

A escuridão passou, como se uma cortina fosse empurrada para o chão. A luz brilhante explodiu, o sol brilhando tão vividamente. Seus olhos ardiam, mas os manteve abertos. Paris estava pálido e ensanguentado, mas firme em seus pés. Estava com o resto dos Senhores atrás de Cronus, que girou para enfrentá-los. Estavam armados para a guerra. Ao contrário da pintura, não estavam aqui para protegê-lo.

Ou melhor, um exército de guerreiros cujas asas brancas proclamavam serem anjos, estava de pé atrás deles, e estavam armados para a guerra. Zacharel reivindicava o controle. Toda vez que o havia encontrado, sua falta de emoção a havia espantado e até mesmo a perturbado. Agora, era grata por isso. Ele era a determinação em si, frio e cruel como a neve caindo dele, claramente disposto a fazer qualquer coisa para alcançar seus objetivos.

—Quebrou as regras, Cronus. — o anjo guerreiro disse, sem rodeios —, e agora vai pagar.

Quais regras?

—Posso me juntar à festa? Outra voz — uma voz feminina — disse atrás de Sienna. —Estive esperando por esse momento por muito tempo.

Sienna girou rapidamente para ver uma morena bonita que só poderia ser Rhea. A régia rainha dos Titãs estava ao lado de Galen, que olhava para Sienna como se a visse pela primeira vez. Um exército de Caçadores os ladeava, e reconheceu alguns rostos.

Eu escolhi meu lado. Cuidado, ela projetou através de seus olhos apertados.

—O que é isso? — Cronus exigiu.

—A primeira batalha da nova guerra. — Zacharel respondeu gravemente.

—Bem, então. Ela começa. Preciso do meu próprio exército, não é?  —Ele acenou com a mão e uma grande multidão de seu povo apareceu, deuses e deusas Titãs o envolvendo, escondendo-o num mar de rostos deslumbrantes, perfeitos e imaculados, joias cravejadas em vestidos e togas. Estavam, obviamente, confusos pela mudança repentina de cenário e nenhum estava armado.

Quando avistaram a agitação em torno deles, pensaram rápido. Armas de todos os tipos apareceram a partir do nada.

—Para a morte! — Cronus gritou.

Como se sua voz fosse o sinal de partida, os exércitos correram uns para os outros.

Agora! Ira gritou para ela.

Sienna abriu sua mente para seu demônio, o permitiu assumir, e se jogou no meio da ação.

 

PRIORIDADE UM: SIENNA.

Pela primeira vez, Sexo não havia se escondido num canto da mente de Paris. O demônio, alto pelo corpo da mulher deles, se elevou de seu corpo, bombeando força direto em suas veias quando correu na direção dela, as feridas de suas facadas já curadas. A escuridão dentro dele batia e se contorcia, guiando-o, mas não o consumindo. Os três eram um só.

Quando viu um homem, um Caçador, vindo por trás de Sienna com uma Glock levantada e apontando, rugiu, apressando o passo. Recebeu o cara com um arco de sua lâmina em sua garganta antes de um único tiro ser disparado, enquanto escondia sua mulher atrás dele.

Zacharel o avisou que aqui, neste domínio entre os reinos um pouco acima do coração dos céus, todos poderiam vê-la. E se podiam vê-la, poderiam tocá-la. Se poderiam tocá-la, poderiam machucá-la. E como ele, poderia ser morta com seu corpo muito ferido para Ira poder repará-la, especialmente considerando os danos causados ​​a ela durante sua separação, que ainda não tinha contado a ele. A primeira vítima de Paris na batalha foi esmagada. Um a menos. Apenas cerca de mil a mais para ir.

—Pode voar para a segurança? — Perguntou ele, acertando outro Caçador. Lá se foi o número dois.

Ela não ofereceu resposta. Temendo o pior, meteu sua espada para derrubar qualquer ameaça à sua frente. Somente então, ela abriu caminho de volta à frente dele. Ele viu suas costas, as asas dobradas com segurança para fora, e percebeu que estava envolvida em sua própria batalha. Ou permitiu que Ira tomasse conta dela, ou descobriu algumas novas habilidades durante as horas que haviam ficado separados.

Estava apostando no anterior. Bom.

Apenas segurando o punhal de cristal, dançou no meio da multidão com ameaça letal, seu foco em Cronus e nos homens e mulheres que o rodeavam. Caçadores caíam ao seu redor. Ela se virou, abaixou, disparou à esquerda e a direita. Suas asas explodiram de repente, e se levantou alto, mais alto, cortando alguém abaixo dela.

Um verdadeiro anjo da morte. Paris nunca havia visto nada tão bonito. Parou atrás dela, e qualquer um que voltasse seus olhos para ela, matava barbaramente. Sem hesitação. Sem arrependimentos.

Uma estrela lançada cortou seu antebraço. Houve uma dor aguda, uma gota de sangue quente. Nem abrandou, e não se preocupou em verificar o culpado. Havia tantas pessoas, tantos corpos, assim como muitas asas e armas.

Os deuses e deusas vestiam túnicas ornadas com joias e cantarolavam com energia elétrica que levantava o cabelo. Alguns podiam disparar fogo de suas mãos, outros lançar gelo. Além de Cronus e Rhea, nunca havia tido realmente uma briga com os Titãs, mas os anjos, que estavam — milagre dos milagres — do seu lado, brigavam no modo… o inimigo do meu amigo é meu inimigo. Sempre que Paris via um Titã, matava primeiro e decidia perguntar depois.

Embora, porque Titãs contra anjos? Uma coisa de território, talvez? Tipo, os céus pertenciam aos alados e não iam tolerar mais invasores? Fazia sentido, mas mesmo se o motivo fosse algo tão coxo como "Nós não gostamos dos Titãs, blá, blá, blá... eles são malvados”, estaria nisto em plena aceleração.

Um grupo de Caçadores disparou na direção de Sienna, reivindicando seu foco total e raiva. Pareciam reconhecê-la como um deles. Ou melhor, uma traidora de sua espécie. Sua aversão era evidente, como se uma luz projetasse nela, como se Rhea e Galen a houvessem colocado no topo da lista deve-ser-morta.

Movendo-se mais rápido que os olhos humanos podiam controlar, Paris girou e virou, sempre cruzando os braços, balançando, cortando. Grunhidos e gemidos soavam. Gritos, também. Adiante, um Caçador apontou uma pistola .40.  Mesmo enquanto continuava em frente, Paris lançou sua lâmina de cristal, como se fosse um bumerangue mortal. E, na verdade, era. Ela mudou de forma em pleno voo e cortou o pulso do Caçador antes do tiro poder sair, tanto sua mão como a arma saltando, antes de se precipitar de volta para o punho de Paris à espera.

Exceto que perdeu outro Caçador com a outra arma, atualmente apontada para Lucien. Paris ia lançar a lâmina, mas o tiro ressoou, acertando Lucien na lateral. O sangue jorrou. O guerreiro gritou, mas não caiu. Continuou a lutar.

Os outros Senhores cerraram fileiras em torno dele, o protegendo. Bons homens. Os melhores. Lutavam juntos há muito tempo, nos céus e na terra. Sabiam que tinham que ficar perto, lutar com as costas uns nos outros e se mover mais rigorosamente quando um dano ocorresse.

Mas Lucien reuniu sua força e brandiu diretamente atrás do Caçador que o havia ferido. O homem estava morto antes de seu corpo atingir o chão.

—Cuidado! — gritou Paris quando outro Caçador veio pelo amigo. Suas botas martelaram no chão, quando correu para intervir.

Lucien abaixou. O punhal humano golpeou nada mais que o ar. E então Paris estava em cima do cara, o atingindo, impulsionando-o abaixo, caindo. Socou uma vez, ouviu trincar o osso, duas vezes, sentiu o osso rachar, em seguida, acabou com ele com um golpe de sua espada.

—Obrigado — disse Lucien, ajudando-o.

—Sem problema. —Ele examinou a área, enquanto se lançava em outra luta. Merda. Havia perdido Sienna de vista. Os humanos e imortais ainda estavam de pé, armas travadas na batalha. Os feridos se moviam sorrateiramente para a margem, para se protegerem de novos danos. Claro, os guerreiros, sendo guerreiros, caçavam e cuidavam do negócio.

Enquanto isso, pedaços de corpos voavam e sangue se acumulava em poças. E era uma asa aos seus pés, branca entremeada com ouro? Sim. Porra. Pobre anjo.

Encontre Sienna. Um comando de seu demônio, de sua escuridão e dele próprio.

Caminhou velozmente na direção que a havia visto pela última vez, deixando um rastro de morte em sua esteira. Foi para isso que havia sido criado, afinal. Para lutar. Para matar. Girava com a violência, flexionava, se endireitava, corria se necessário. Dando socos, cortando pele e órgãos. Experimentou várias dores mais pungentes e filetes de sangue, mas ainda assim continuou.

Pelo canto do olho, pensou ter visto Maddox caindo. Então Reyes. Aquele era Sabin? Estariam muito bem, disse a si mesmo. Como Lucien, eram fortes. Não acreditaria no contrário.

A poucos metros à frente, Gideon foi cortado através do estômago e sangrava como uma peneira, lutando contra dois gigantes. Strider estava... em nenhum lugar. Perdido. Mas Kaia e Gwen, Haidee e Scarlet, cortavam através das linhas inimigas com sorrisos em seus rostos.

Meus garotos estão bem, ou as meninas não estariam tão felizes, Paris assegurou a si mesmo. Apressou seus passos e pegou um dos gigantes por trás, a decapitação permitindo que Gideon centrasse seus esforços. Apenas havia tantos Caçadores, tantos imortais. Se pudessem ferir seus amigos, então Sienna seria...

Não! Teve um vislumbre das asas negras. O sangue escorria de suas pontas, e não tinha certeza se era dela ou de outra pessoa. Urgência o montou, guiando-o cada vez mais rápido. Um grito de guerra ecoou de um homem que atacava com ferocidade em sua direção a partir da direita. Paris percebeu e se lançou no homem, pegando-o pela cintura. Patinaram pelo chão. Uma torção rápida no pescoço do cara, e essa pequena batalha havia acabado.

Paris pulou de pé e se dirigiu para sua mulher. Ela pegou um grande brutamontes com um balanço de sua adaga. Carmesim manchava seus braços até os cotovelos. Sua camisa estava rasgada, sangrando na lateral.  A escuridão dentro dele engrossou.

Zacharel apareceu na frente de Sienna, abrindo um caminho mais claro para ela e desafiando os Titãs, que entravam em confronto com outros anjos na frente de Cronus. Grande choque, Cronus estava lutando também. Os homens de Rhea vinham pelo outro lado, e estavam nesse momento cortando como se fossem uma piñata[11] e quisessem o doce dentro dela. E, no entanto, não conseguiam infligir um único ferimento nele. Era muito forte, muito rápido. Malditamente poderoso.

Em seguida, os Caçadores foram derrotados, e era Cronus contra Rhea, ninguém entre eles, o resto da batalha feroz por trás deles. Ambos seguravam duas espadas curtas, e ambos correram em direção um do outro. Contato. Metal contra metal retiniu, soltando faíscas.

—Megera!

—Bastardo!

—Se seu homem me matar, vai morrer também. — Cronus cuspiu.

—Vale a pena — a rainha rangeu.           

Todos ao redor, humanos e anjos — e inferno, até mesmo os Senhores, porque sim, Paris havia sentido isso também — experimentaram um aumento de fúria. Como se suas emoções estivessem ligadas às do rei e rainha. Dentes foram descobertos. Garras desencadeadas.

Paris tinha um pensamento estranho que o mundo inteiro provavelmente tremia por esta agitação. Terremotos, furacões, tsunamis, erupções vulcânicas, tempestades de qualquer e todo o tipo. O que encontraria quando voltasse para lá?

Concentre-se no jogo.

Matar pensou. Jogou-se de volta na briga. Punhal, movendo-se de lá para cá. Corpos, em queda. Sienna, por perto. Finalmente, chegou até ela. Claro que foi quando Galen apareceu. Estava encharcado de vermelho, tremendo de raiva. E mirou uma espada longa no pescoço de Sienna.

Ela não notou muito ocupada acabando com outro Caçador.

—Não! — Paris saltou entre os dois combatentes. Porque era mais alto que Sienna, a ponta da espada de Galen cortou seu peito em vez de seu pescoço. Pele, músculo, osso, tudo separando em três. Sangue quente derramou enquanto seus joelhos fraquejavam.

Um grito estridente de raiva e negação profana quase arrebentou seus tímpanos. Sienna percebeu. Pensou que talvez seu coração recebesse um pouco do impacto, também, porque o órgão ignorou uma batida, depois outra.

Sua visão embaçou. Os corpos se tornaram borrões de movimento. Negro — Sienna e sua ira. Branco — Galen e sua força bruta. Os dois envolvidos, um turbilhão de movimento e ameaça.

Vamos lá, vamos lá. Paris não seria derrotado assim.

Empurrou-se em pé, mas imediatamente foi lançado de volta abaixo. Alguém avançou rapidamente para ele, socando seu rosto. Atingiu seus lábios, e o tecido foi cortado por seus dentes. Apesar de Paris não poder ver quem era, suspeitava que o culpado fosse humano, e chutou. O peso o deixou, e se ergueu em pé.

O macho o alcançou novamente. —Sempre quis a honra de matar um de sua espécie.

Paris ainda mantinha sua adaga e investiu. Contato, borbulhas. Outro corpo se juntando a pilha sempre crescente.

Sienna... Sienna... Não! Ainda lutando com Galen. Seus movimentos estavam desacelerando, e aparentemente havia milhares de novas faixas vermelhas, intercalados pelo preto de suas asas quebradas. Estava sofrendo, enfraquecendo. Os olhos se estreitando, focando em seu alvo, Paris se empurrou para frente. Mais Caçadores se apressaram​​, mas manteve seu olho no prêmio e cortava quem entrava em seu caminho. Então aconteceu.

Galen a prendeu no chão, pronto para dar o golpe final.

—Onde está Legion? — O guardião da Esperança gritou, ajoelhando, colocando seu peso sobre seus ombros.

—...Nunca direi... — Sua voz não tinha nenhum vestígio de Ira. O que significava que o demônio não a guiava agora. Ela estava no controle. Sentiria todas as lesões.

Depressa! Chegue até ela! Paris tropeçou, se endireitou, continuou se movendo. Mais perto... mas não perto o suficiente... tão malditamente longe.

Outro humano, posto de lado.

—Onde ela está? — Galen.

—Onde nunca vai encontrá-la. — Sienna.

Apenas além deles, Cronus atingiu a espada de Rhea com tanta força que a rainha perdeu seu aperto. O rei aproveitou, puxando seu cabelo e a forçando a ajoelhar. E não havia nada que pudesse fazer sobre isso, desarmada como agora estava.

Com a mão livre, Cronus retirou uma corrente fina do bolso de sua túnica e amarrou seus pulsos atrás dela. Lutando o tempo todo, ela cuspiu maldições para ele. Ele enganchou a corrente em torno de seus tornozelos. Um porco amarrado. Bom. A rainha não iria a lugar algum até que ele deixasse.

Um lance agudo de dor queimou entre suas omoplatas. Alguém acabava de esfaqueá-lo nas costas, Paris percebeu distante. Mais uma vez os joelhos cederam. Desta vez, não podia levantar. Comandando sua lâmina de cristal para alongar, empurrou-a atrás, espetando quem o havia derrubado, então começou a engatinhar. Alcançaria Sienna. A cada centímetro ganho deixava um grosso rastro de sangue atrás. Na verdade, havia perdido tanto sangue que não tinha certeza de como ainda estava consciente.

Galen girou, tirando o peso de Sienna, mas ela continuou onde estava. De bruços, imóvel.

O que o desgraçado havia feito com ela? —Não. Não. — Em suas mãos e joelhos, Paris a alcançou. —Espere, Bebê. Estou indo.

Cronus e Galen circulavam um ao outro. Ambos estavam cortados e sangrando muito. Ambos estavam mancando.

—Bem, bem. Nosso confronto do passado, — disse o rei. Tossiu e cuspiu um dente. Estava sem arma, depois de tê-la jogado para amarrar sua esposa.

Não podia piscar longe, muito ferida para fazê-lo.

Galen levantou sua espada. —Bem, bem, na verdade. Não trouxe o que me prometeu, e agora está indefeso.

—Estou? Acho que não. Se quer sua mulher, — o rei continuou, — vai sair agora. Vou trazê-la para você, e pode ficar com ela. Mas nunca irá me desafiar novamente. Apenas vá embora. Agora.

Sienna se contorceu. Estremeceu novamente. Alívio consumiu Paris. Quase lá, quase... Lentamente, ela levantou, sacudiu a cabeça e fez um balanço da cena na frente dela, claramente ainda consumida pela influência de Ira, afinal. Cronus estava de costas para ela. Galen na frente de Cronus, mas sem prestar nenhuma atenção.

A adaga de cristal que segurava reluziu na luz. E alongou como a sua acabava de fazer, grossa, a fim de se tornar um gancho. Tornando-se uma foice. Tornando-se a única arma capaz de matar o homem que governava o trono Titã. Paris percebeu o que estava prestes a acontecer e congelou.

Ah, maldita. Quem estivesse olhando por trás de Galen, veria o ponto de vista da pintura de Danika neste momento, veria apenas Cronus. Não veriam a pequena fêmea atrás dele. A mulher que mudaria o mundo com sua próxima ação.

—Nunca vou me submeter a você, — rosnou Galen. —E vou procurar minha mulher sozinho.

—Vai buscá-la depois que eu a matar, então.

Galen rugiu sua arma tremendo em seu aperto.

—Na verdade, — disse Sienna, quando Galen oscilou, —vai ser o único a morrer. — Ela também balançou.

Sua arma era maior, mais forte, e muito mais poderosa, e derrotou Galen ao perfurar.

Cronus nunca soube o que o havia atingido.

Sua cabeça separou e voou, e seu corpo entrou em colapso. Rhea gritou, mas por uma fração de segundo, parecia quase triunfante. —Bom... — ela sussurrou, e, em seguida, também ficou em silêncio, de repente imóvel.

Minha mulher. Orgulho se juntou ao alívio de Paris. Minha mulher fez isso. Ganhou esta.

Quando a multidão começou a gritar em Apocalipse, uma forma escura gritando ressuscitou o corpo do rei, seus olhos vermelhos brilhantes, seus dentes longos e afiados, e uma cauda balançando atrás dele. Uma forma semelhante subiu de Rhea, só que a dela com curvados chifres e garras tão afiadas que poderiam ser sabres.

Os demônios estavam escapando.

Enlouquecidos Ganância e Discórdia subiram, desaparecendo na noite. Dois dos demônios de Pandora mais uma vez estavam soltos sobre o mundo.

—Alguém deveria ir atrás deles, — Paris tentou dizer, mas depois Sienna gritou, caindo de joelhos, e não se importou com mais nada. Seus braços se abriram, as costas arquearam, se contorcendo. Sua cabeça caiu atrás, e ela soltou outro grito, depois outro e outro.

Finalmente Paris a alcançou. Finalmente, ela se acalmou, sua voz arrasada. Ela permaneceu nessa posição, se sacudindo, balançando muito. Ele queria pegá-la em seus braços, oferecer conforto, mas se colocou na frente dela. Era seu escudo. Agora, sempre.

Galen estava ali, ofegante, e talvez a atacasse, mas a batalha terminou tão repentinamente como havia começado. Os poucos Caçadores remanescentes perceberam que estavam em desvantagem numérica e partiram numa corrida mortal apesar de que para onde achavam que poderiam escapar, ele não tinha ideia. Deusas e deuses sangrentos e sujos, caíram de joelhos. Alguns inclinaram suas cabeças, outros simplesmente olhavam atordoados.

Os anjos vieram até o lado de Sienna, desafiando o guardião da Esperança a fazer um movimento.

—Salve a nova rainha, — uma deusa de repente disse.

O resto dos Titãs repetiu a frase, suas vozes subindo em fervor, então um por um, se ajoelharam na frente de Paris. Ele não tinha certeza do que estava acontecendo, certamente não se referiam a ele como a nova rainha. Teve seus momentos, com certeza, mas talvez fosse uma coisa Titã, tal como o animal de estimação macho de Viola chamava "Princesa".

—Falam com a grota atrás de você, — disse Zacharel, se movendo para ficar ao lado dele.

Sienna? Sienna era rainha? Dos Titãs? Ainda agachado, se virou para ver como ela estava. A tontura havia aumentado, e percebeu que sua linha de visão estava completamente queimada.

O anjo acrescentou a grosso modo, — Escolhas decidem nosso destino. E embora não tenha sido informado até agora, ela era o maior trunfo do rei — ou sua ruína, dependendo da escolha que fizesse.

—Mas ele... saberia. Seus Olhos... teriam... dito. — Cada palavra raspava sua garganta, queimando. Cada palavra o enfraquecia ainda mais.

—Tenho certeza que o fizeram, — disse Zacharel. —Da sua própria maneira. Talvez ele não tivesse olhado perto o suficiente, ou talvez eles não houvessem mostrado tudo a ele. E agora Sienna tomava o trono divino. É por isso que a queria do nosso lado, porque todo mundo a queria do seu lado. Os poderes que Cronus havia roubado de tantos outros ao longo dos séculos eram agora dela.

Não saber como escolher ou o quê? Este era mais um chapéu para ela vestir, pensou com uma risada fraca que fez borbulhar sangue em sua garganta, derramando em sua boca.

Um nevoeiro deslizava por sua mente, mas não conseguia esconder a revelação que estava morrendo. Já tinha perdido muito sangue, e a cada segundo que passava, sua respiração se tornava mais difícil. Mas Sienna estaria segura, sempre segura, e isso era tudo que importava. Não podia pedir mais que isso. Exceto um futuro com ela. Gostaria disso.

O resto de sua força sumiu, e se permitiu cair para trás, sua cabeça caindo no colo dela.

—Paris?

Uma escuridão que não tinha nada a ver com a raiva presa dentro dele. —Eu... amo... você, — ele resmungou para fora.

—Paris!

—Salvar... amigos... não os deixe... morrer. — A escuridão o consumiu, e não soube de nada mais.

Exceto...

—Paris!

Sua voz o trouxe de volta. Um flash branco. Escuridão. Um flash branco, com duração de vários segundos mais longos. Outro flash, duradouro... duradouro... seu corpo e demônio parecendo se estender além, desligando... até que ouviu a voz de Sienna e tudo voltou a se juntar.

—Não me deixe! Não vou deixar você. Lembra quando falamos sobre ter alguém para morrer? Bem, você é meu. Você é meu alguém. Se partir, vou te seguir. De alguma forma, vou te seguir. — Oh, ela estava chateada. O temperamento dela estava saindo para jogar. —Pode me ouvir?

A terra retumbou abaixo dele.

Ele sorriu, porque naquele momento percebeu algo maravilhoso. Tudo ficaria bem. Sienna era teimosa até seu núcleo. Havia derrotou Cronus, enganado Galen. Isso não era nada.

Estariam juntos, de uma maneira ou de outra. Ela teria certeza disso.

 

SIENNA ODIAVA DEIXAR PARIS NA CAMA, e não queria que acordasse sem ela ao seu lado. Seu corpo estava em processo de cura pelas feridas enormes sofridas durante a batalha, e quando abrisse os olhos, ia querer respostas. Respostas que ela ficaria feliz em dar, tão logo as descobrisse.

Então, depois de acariciar seu rosto com os nós dos dedos — embora ele se virasse para ela, não teve nenhuma reação, — saiu às pressas para a outra câmara que partilhavam no Reino de Sangue e Sombras. Então parou. Espere, espere, espere. Poderia piscar agora, não poderia?

Na verdade, foi assim que havia trazido Paris e todos os seus amigos de volta aqui. Acalentou um pensamento simples: queria que estivéssemos em casa, e pronto, ela piscou e cada um deles se materializou no castelo. Choque quase havia feito ceder seus joelhos, e sua mente havia entrado numa pirueta. Horas depois, sua mente balançava com as possibilidades — Havaí, Rússia, Irlanda, Key West, além de todos os outros lugares que sempre havia querido visitar —e acabou piscando por todo o mundo por acidente.

Isso era o que? Dois dias atrás. Dois dias que pareciam uma eternidade, mas finalmente havia conseguido o controle dessa capacidade em particular. Achava que nunca se acostumaria com algumas das outras.

O poder girava dentro dela, tanta força que fazia sua pele se parecer muito apertada para seu corpo e sentia seus poros esticados, como se a qualquer momento pudesse se partir em mil pedaços. Ao que parece capturar a cabeça de Cronus significava que tinha direito a quase todos os seus poderes, e definitivamente tudo que ele havia possuído. Como, digamos sua casa nos céus e até seu harém — do qual libertou prontamente todo mundo.

Uma das fêmeas lá dentro — Arca — perguntou se Paris a havia enviado. Em troca da ajuda de Arca, ele havia prometido libertá-la depois de salvar Sienna. Ela disse que sim, e agora a dívida estava paga.              

No topo de tudo, os aliados de Cronus eram aliados dela, assim como eram seus inimigos. Mas ela não estava preocupada.

Também podia sentir a escuridão dentro dela agora, a escuridão que Zacharel disse que Paris havia dado a ela — as trevas. Ira adorava devorar a escuridão. Nunca havia se alimentado dela, mas começou a se alimentar da escuridão de Paris, tomando parte dela e diminuindo sua influência sobre ele. Zacharel teria aprovado.

Com um suspiro, cintilou na sala de Lucien, pronta para começar seu check-up diário de todos os amigos de Paris. Ele e Anya estavam na cama, dormindo pacificamente. Seus ferimentos eram menos graves que os de Paris, e ele finalmente havia se arrastado para fora da cama esta manhã, apenas para ir à sala de entretenimento, jogar Anya por cima do ombro, e os dois desaparecerem.

Maddox e Ashlyn estavam também na cama, mas arrulhavam para seus bebês, que batiam os pés e balbuciavam nos braços de seus pais adoráveis. Maddox estava muito habilidosamente enfaixado, pálido e machucado, mas sorrindo. O menino, Urban encontrou o olhar de Sienna e piscou.

Piscou? Certamente que não.

Strider e Kaia estavam... fazendo sexo. Oh, oh, eca! Meus olhos. Sienna moveu-se para a próxima sala.

Sabin e Gwen — alguém me salve. Também estavam fazendo. O que acontecia com as pessoas neste castelo? O demônio de Paris de algum modo havia passado para todos eles?

Gideon e Scarlet estavam aconchegados juntos, conversando. E uma estranha conversa que Sienna nunca havia ouvido falar.

—Eu te odeio.

—Eu te odeio mais.

—Eu odeio mais você.

Seguindo em frente.

Amun e Haidee estavam na cozinha, assando bolachas. Haidee tinha farinha espalhada em suas bochechas, impressões em seus seios e bumbum, tudo cortesia de Amun e suas mãos errantes.

Reyes e Danika estavam em seu quarto. Como Paris, Reyes estava se recuperando durante o sono de suas lesões. Danika estava pintando.

Sienna sabia que Danika era o Olho Que Tudo Vê atual, e propositadamente não olhou para a cena colorida sendo criada. Não queria acabar como Cronus, obcecada pelo que estava para acontecer e fazendo tudo em seu poder para impedir, e ao mesmo tempo esquecendo-se de realmente viver o presente.

Tudo que esteve disposta a ouvir foi a reivindicação de Danika que a fortaleza dos Senhores em Budapeste em breve seria muito perigosa para ocupar, embora ela não soubesse por que, e que toda a equipe precisava ficar aqui por enquanto. Sienna, é claro, deu sua bênção.

Cameo estava na sala de entretenimento, polindo seus punhais, enquanto na TV passava um episódio de 1000 Maneiras de Morrer. Sim, os guerreiros haviam encontrado uma maneira de fraudar o reino imortal para receber um sinal de satélite.

Aeron e Olivia... De novo não! Sério. O castelo mais parecia um zoológico com macacos. Ira deu seus costumeiros arrulhos céu / inferno, e ainda havia uma pitada de nostalgia em sua voz, mas não mais lamúrias.

Feliz por estar comigo? Sienna perguntou ao demônio. Pelo menos um pouco?

Você não é tão terrível.

Ela riu. Ira conversava com ela mais e mais agora, conversas reais ao invés de um único vomitar de palavras mentais. Ele a havia ajudado campo de batalha, orientando suas ações, mas não a superando completamente, assim como havia feito com Fox, permitindo-lhe trabalhar com ele e fazer o que fosse necessário. Suspeitava que ele sentia que desta maneira, ajudava a proteger seu Aeron e Olivia. Legion estava no quarto que haviam escolhido para ela também, mas um dos seus pulsos estava acorrentado à parede. Uma conexão longa que permitia que se movesse livremente no quarto, mas a braçadeira a impedia de piscar até Galen para manter seu voto a ele.

Vou ter que consertar isso, Sienna pensava.

Esperança vai lutar até a morte para reconquistá-la, disse Ira.

Sim. Provavelmente. Mas isso era uma preocupação para mais tarde nesse dia.

Viola e seu cão Princesa eram as únicas que estavam com Legion, e Viola estava brindando a garota acorrentada com histórias sobre si mesma. Um público cativo. Parecia certo. Pobre Legião, no entanto. Princesa estava lambendo seus pés.

Torin estava em seu quarto, sentado na frente de uma tela de computador. Havia uma expressão distante no rosto, e ela se perguntou o que estava pensando.

Num piscar de olhos, soube. Podia realmente ouvir o que estava pensando.

—O que devo fazer com a Chave Absoluta agora? Cronus não a pedirá de volta, pois está morto, e porcaria, o que acontecerá com a mulher de Paris sendo a rainha dos Titãs? Está brincando comigo com isso? Ela é uma ex-humana e, além disso, ex-morta. Sem mencionar uma ex-Caçadora. E já sabemos quão doido é ser governado por aqueles com demônios dentro deles. Curvamos-nos para ela agora? Porra, isso é estranho e não tenho ideia...

Basta! Ela pensou, e o volume em sua mente foi completamente desligado. Por mais que não quisesse saber o futuro, não queria saber mais que seu quinhão sobre o presente, também. Invadir os pensamentos das pessoas era tão chato. A Sra. Boas Maneiras não aprovaria.

Sienna não havia falado muito com os Senhores nos últimos dois dias, muito ocupada cuidando de Paris e se adaptando à sua nova posição, mas agora sabia que a maioria deles ainda estava inquieto sobre ela. Bom, que seja. Isso levaria tempo. Tempo que estava disposta a dar-lhes. Tudo para ficar com Paris.

Em seguida, ela apareceu na frente dos três quartos ocupados pelos prisioneiros imortais de Cronus. Cameron, Winter e Irlandês. Ao contrário de todos os momentos anteriores, não havia visto flashes de seus crimes dentro de sua mente. Durante a batalha nos céus, Ira havia se alimentado a ponto de adoecer e, atualmente, não tinha apetite.

Cameron a viu primeiro, e alertou os outros. Não estava surpresa que pudessem vê-la agora. Todo mundo podia, também. Caminharam até as portas blindadas.

Cameron farejou, pegou o cheiro dela e rosnou.

— Ambrosia. Novamente. A conheço. É a espiã invisível daquele bastardo.

—Bem, uma boa notícia. — respondeu ela. —Aquele desgraçado está morto, e claramente não estou mais invisível.

Todos os três piscaram para ela. Irlandês sem nenhuma reação, mas os outros dois riram sem humor.

—Sim, certo.

—Não tem importância.

—Vou libertá-los. — disse ela, o que os calou rapidamente. Olharam para ela, subitamente sérios. Ela não fez isso antes porque não havia tido certeza de qual ação era mais segura. Como reagiriam a ela como rainha? Tentariam matá-la? Mas então decidiu, e se o fizessem? Meus poderes são maiores que os deles.

—Se prejudicarem os Senhores do Submundo, seus irmãos por circunstância — ressaltou — vão se arrepender. São meus, e protejo o que é meu. Entenderam?

Rígidos, acenaram incrédulos.

—Perguntem ao redor. — disse ela. —Vão descobrir que posso feri-los de formas que irão assombrá-los pela eternidade.

Ela se aproximou, tocou a porta de Winter. O escudo caiu e Winter ofegou. Um segundo depois, a garota foi embora. Ela repetiu o processo com os homens, e eles também, deixaram-na num piscar de olhos.

Tão fácil, quando apenas alguns dias atrás, tal coisa era impossível. Vai entender.

Infelizmente, ainda não havia terminado suas tarefas.

William não estava em seu quarto, mas uma garota humana — Gilly, ela se lembrava — estava dormindo profundamente em sua cama, o cabelo escuro derramado ao longo de seu travesseiro. O cheiro de sexo não estava no ar, mas o de medo sim, com uma sobreposição de conforto. Gilly havia vindo aqui, assustada por William, que também havia sido ferido durante a batalha. Ele a havia acalmado até que havia adormecido ao lado dele, então a havia deixado.

Agora estava empoleirado no telhado do castelo, estalando ursinhos de goma em sua boca e conversando com outro homem em voz baixa. Hades. Imediatamente os machos perceberam que ela estava lá, como ficou provado quando olharam em sua direção.

—Olá garota que ajudei uma e outra vez. — disse William, seu humor astuto evidentemente intacto apesar dos ferimentos de batalha.

—Olá garota que me deve muitos favores. — Hades acrescentou. Estava envolto em névoa negra, veias de fogo atravessando o que pareciam ser asas.

Talvez seus novos poderes tivessem melhorado sua visão, porque de repente podia ver coisas que não havia notado antes. Ele tinha longos cabelos negros, olhos de puro preto, sem pupilas evidentes, e um rosto ainda mais bonito que o de Paris. Bem, um cara que outras mulheres podiam considerar mais bonito que Paris. Ela não.

Seus músculos eram enormes, e parecia haver pequenas estrelas tatuadas por todo o peito.

Eu gosto dele, Ira disse.

Isso me assusta um bocado, só para você saber.         

—Se duas vezes é igual a muitas em seu mundo, sim. — respondeu ela secamente. —No entanto, já decidiu o que quer que eu faça? — O que a deixava desconfortável era o fato que ele poderia pedir o mundo e teria que dar para ele, contanto que não prejudicasse Paris ou seus amigos.

Hades balançou a cabeça na sombra, seu malvado sorriso assassino.

—Em breve.  — prometeu.             

—Grande. — disse ela, e deixou-os na sua conversa secreta. Um piscar de olhos, e estava lá em cima nos céus, de pé dentro da nuvem de Zacharel.

Impressionava-a que os anjos vivessem nas nuvens, e que as nuvens fossem, na verdade como residências. Móveis, corredores, jardins. O que quer que fosse que o proprietário desejasse. Zacharel tinha a cama necessária, mas havia um homem com cabelo rosa e gotas de sangue tatuadas no rosto, acorrentado nela. Uma venda estava acondicionada em torno de seus olhos, uma mordaça enchia sua boca, e um lençol caía sobre sua cintura. De resto estava nu.

Não olhe. Não é da minha conta. Na mesa de cabeceira estava um frasco em forma de ampulheta com algum tipo de substância pegajosa nele. Não queria pensar sobre o que ele fazia com o material.

—Zacharel — ela chamou, voltando a olhar o homem de cabelo rosa. Seus olhos se estreitaram. Este era o agressor de Paris da caverna... e viu com sua visão nova e melhorada, que não era completamente homem, mas um anjo Caído. Desde quando sua espécie era mantida refém no mesmo lugar que havia escolhido escapar? Observou enquanto ele se debatia pela liberdade.

Zacharel entrou pela porta agora, estava nu e molhado, e oh, doce Senhor, era lindo. Apenas... uau. Uma massa de músculo que rivalizava com a de Paris, e deveria lavar roupa para fazer jus ao seu abdômen, porque nossa! Tinha gomos de músculos atrás de gomos de músculos. Pequenos mamilos marrons e uma grande virilidade.

O único defeito que possuía era uma mancha preta tão grande quanto seu punho em seu peito, logo acima do coração. O local sangrava em alguns lugares, como se estivesse manchado de tinta. Espere. Não. Não era a única falha. Marcas de chicote pareciam envolver em torno de suas costelas, vermelhas e cruas. E poderia realmente considerar a neve que continuava a cair de suas asas um sinal de perfeição?

Ele parou quando a viu. Um segundo depois, um manto branco o envolvia. Também sua cama — e seu prisioneiro — haviam desaparecido.

—Tenho um não perturbe barrando a entrada lá fora. — Seu tom sem emoção havia retornado. —Como conseguiu entrar?

—Hum, sinto muito por isso. — disse ela. —Eu, uh, tipo, desejei estar aqui.

Sem castigo. Apenas um tenso:

—O que quer?

—Queria agradecer. — Ele era a razão pela qual Paris ainda vivia. —Me deu água do Rio da Vida. Não sabia o que tinha tido que fazer para obter essa água naquele momento, mas agora sei, e estou ciente que teve que fazer algum tipo de sacrifício.

Pedaços de informação chegavam a ela nos mais estranhos momentos agora, e só esta manhã, havia percebido que anjos precisavam desistir de algo que gostavam para se aproximarem da água. E para sair com um frasco? Tinham que sangrar. Muito. Talvez fosse por isso que havia sido chicoteado.

Após a batalha, enquanto a energia de Paris era drenada junto com seu sangue, Zacharel havia trocado com ela um frasco do material por uma simples promessa de ajudar os anjos na próxima guerra. Aparentemente, a batalha contra Cronus não era a que precisava de ajuda para vencer.

—Vou fazer tudo que posso por você. —Ela terminou. Havia limites para o que podia fazer, é claro. Não podia trazer sua irmã de volta, embora tentasse. Não conseguia encontrar Kane. Não conseguia curar os outros. Cronus nunca foi a entidade tão poderosa a qual fazia a si mesmo parecer.

—Tem muito a aprender sobre si mesma. — disse o anjo. —Vai passar as próximas semanas com a gente, e vamos ensiná-la o que precisa saber.

—Assim que Paris estiver melhor e ao meu lado. Virá comigo. — disse ela. E orou para que estivesse certa, que ele quisesse.

—Ele compartilhou sua escuridão com você, e ainda o quer?

—Claro. Sou uma luz para ele, uma saída, e de alguma forma sua escuridão é minha luz.

—Isto é…

—Chega disso, eu sei. Eu quero-o comigo, e é isso. —Ela desapareceu, tendo mais uma parada para fazer antes que pudesse voltar para Paris.

A casa de Galen.

Ele e Fox estavam sentados na sua mesa da cozinha, pilhas de armas e munição espalhadas em torno deles. Estavam polindo metais, verificando clipes, ajustando balas.

Ira rosnou, mas não disse nada.

Galen parecia chateado. Fox parecia fisicamente esgotada. Suas narinas queimavam, e ela farejou tensa, e sua cabeça ficou girando em torno. Seu olhar pousou em Sienna e ela saltou em pé, avançando na direção de Sienna, obviamente ansiando por outro gole dela.

Com um movimento de pulso, Sienna enviou a fêmea à mesa, onde a própria Sienna havia sido a refeição refeições, prendendo-a lá.

Galen se ergueu, sua cadeira derrapando atrás dele.

—Você!

—Eu.  

—Quero minhas mulheres de volta. Legion e Fox.

—E quero que libere Legion do voto que fez a você.

—Nunca.

—Imaginei que ia dizer isso. — Ela deslizou suavemente para o banco de Fox. Ele não fez nenhum movimento agressivo em direção a ela, mas então, sabia o que ela poderia fazer agora.

Talvez devesse tê-lo matado por todos os erros que havia cometido. Mas a maioria de seus Caçadores estava morta, dizimada na batalha, então talvez tenha sofrido o suficiente. Além disso, não queria seu demônio solto, como Ganância, que havia pertencido à Cronus, e Discórdia, que havia pertencido à Rhea, os dois agora lá fora em algum lugar, sem dúvida assolando o mundo.

—Como sabem, os Tácitos estavam presos a Cronus. Agora que está morto, estão livres. Tentei mantê-los acorrentados, mas com o tempo percebi quem e o que eram, que também poderia prendê-los, mas estavam muito longe. —Seu olhar era penetrante. —Querem seu sangue, Galen. Querem isso demais. Vão vir obstinadamente. —E realmente ficou surpresa por ainda não terem chegado. —Realmente quer colocar Legion nesse tipo de situação? Esse tipo de perigo?          

Um longo momento se passou. Sua resposta revelaria seus verdadeiros sentimentos pela garota.

Seus ombros cederam. Ele afundou em seu assento.

—Não. Não quero.

Ele se importava com ela, Sienna pensou. Realmente se importava com a garota.         

—Eu... a liberto. — ele cerrou os dentes. —Legion está liberada de seu voto de ficar comigo, me obedecer.

Duplo uau, mas ela não quis comentar. Não sabia o que dizer. Então, os levou por fim ao seu próximo negócio.

—Tem algo que quero.

Ele não fingiu não entender.

—A Capa da Invisibilidade.

—Sim.

—É minha. Minha.

Como desejava que pudesse fazê-lo dar-lhe o artefato, mas o livre-arbítrio era um poder maior do que o que borbulhava dentro dela. O que quer que Cronus houvesse dito a ela, foi por isso que havia trabalhado tão duro para convencê-la a fazer o que queria. Imortal ou não, rei ou não, mexa com o livre-arbítrio, e será punido. Severamente. Ela tinha certeza que havia sido por isso que finalmente o havia derrotado. Porque ele havia o tomado o dela, e havia perdido o seu próprio, por sua vez.

—O que será preciso para convencê-lo a me dar a Capa? — Perguntou ela. Havia descoberto uma coisa ou duas sobre negociação.

Seus olhos se estreitaram sobre ela.

—Proteção. Deve me proteger dos Tácitos.

Os Senhores não amariam isso?

—Durante um ano. — disse ela.

—Eternamente.

—Dois anos.

—Eternamente.

—Um ano — disse ela, seus próprios olhos se estreitando.

Ele bateu o queixo.

—Muito bem. Dois anos de proteção. Talvez nesse tempo, possa te matar e tomar esses poderes reais para mim. Protegendo a mim mesmo.

Nesse tempo, teria encontrado a caixa de Pandora, mas não disse isso.

—Faça um lance em minha direção, Galen, e se encontrará numa prisão especial para imortais pelos próximos dois anos.

Ele empalideceu.

Sim. Entendeu o significado. Estaria apodrecendo ao lado dos gregos, uma vez que a traísse.

—Dê-me a Capa.

Com movimentos bruscos puxou um pequeno quadrado de material cinza do bolso da calça e o jogou para ela.

—Aqui está. É sua.

Não houve tempo para gozar sua vitória.

—Sienna!

Ouviu o berro de Paris, através da grande distância entre eles. Suas bochechas coraram com prazer quando enfiou a minúscula Capa dobrada em seu corpete. Estava acordado!

—Tenho que ir. — disse ela, e desejou estar de volta dentro de seu quarto.

 

PARIS ESTAVA PRESTES A COMEÇAR um tumulto quando sua mulher apareceu ao lado da cama. Ele recuperou o fôlego e caiu atrás contra os travesseiros. Seu cabelo escuro caia sobre um ombro. Ela usava um vestido de linho com ouro e esmeraldas, joias cintilando no tecido. Seu cabelo estava escovado num brilho mogno luxuoso. Aquelas asas negras espalhadas sobre os ombros.

Nunca havia parecido tão linda.

Ele suspirou com felicidade quando ela se jogou em cima dele.

—Estou tão feliz que esteja acordado!

Seu peso leve colocado sobre ele, o cabelo dela criando uma cortina que os fazia as duas únicas pessoas no mundo. Ele se alegrou. Pertenciam um ao outro.

—É verdade que agora é nossa chefe?

Ela bufou.

—Tem tal jeito com as palavras. Mas sim, sou um tipo de chefe para você. Titãs continuam aparecendo do nada para prestar seus respeitos, e finalmente tive que fazer um decreto real por espaço.

Rainha Sienna. Ele gostava.

—Acho que isso me faz Rei Paris.

Um riso tilintando escapou.

—Sempre soube que estava destinado à grandeza. 

—Vou comandar meus rapazes, é claro.

—Claro.

Ele sorriu tão feliz que poderia estourar.

—Sabia que ia me trazer de volta, Bebê. Desse modo, sou uma alma não morta?

Ela levantou a cabeça, um sorriso suave iluminando suas feições delicadas.

—Não, está muito vivo, e ainda tem seu demônio.  Sim, podia sentir o desgraçado acordando, se estendendo, exigindo Sienna, apenas Sienna. Sexo não era aleatório após enfraquecer nesses dias. O demônio abraçou Sienna e todas as diferentes facetas de sua personalidade, e não queria perdê-la. Ela era seu bilhete de loteria.

Mantendo seu domínio sobre ela com uma mão, se acariciou abaixo com a outra. Nenhum ferimento. Estava completamente curado.

—O que aconteceu lá em cima?

Ela beijou seu rosto, pescoço.

—Depois que perdeu a consciência e me desesperei, o sempre amoroso Zacharel me acalmou e falou sobre meu novo status e habilidades. Também me deu um frasco de água do Rio da Vida. Por um preço. Dei a você e a todos os Senhores um gole e estão se curando desde então.

—Qual o preço? — Perguntou ele.

—Bem, todos os anjos me queriam nos céus, ajudando-os na sua guerra. Disse a ele que estava disposta a ajudar, mas não viveria lá. Vou ficar com você. Se quiser ficar comigo. Exceto, que temos que ficar lá em cima por algumas semanas para que eu possa aprender a usar meus novos poderes. Onde eu estava agora. E estou divagando, não estou?

—Adoro quando divaga. Mas realmente disse as palavras, se você quiser ficar comigo? —Não conseguia evitar. Beijou-a forte e rapidamente, apostando na sua afirmação. —Quero ficar com você hoje e em todos os outros dias. E vou te ajudar a ajudar os anjos. E sim, irei com você, onde quer que precise ir.

Um suspiro aliviado a deixou.

—Estou contente. Ah, e só no caso de mencionarem, a escuridão dentro de você está agora dentro de mim, também.

—O quê? — Ele gaguejou, empalideceu. —Sinto muito, sinto muito. Eu não…

—Não se preocupe com isso... marido.

Tudo acalmou dentro dele. Seu coração, seus pulmões, as sinapses em seu cérebro.

—Sabe que casei com você?

—Claro. — Um sorriso maroto levantou seus lábios. —Sei de um monte de coisas agora. Como, coisas para mudar o mundo.

—O mundo em mudança, mudança do mundo. Está tudo bem em estar vinculada a mim para sempre? Porque tenho a impressão de que não é um casamento dos dois lados até que o diga.

—Estou dizendo, estou me sentindo muito bem com isso.

Ele amava esta mulher.

—Bom, porque sinto o mesmo. Esposa.

O sorriso dela tremia como se lutasse contra as lágrimas. Ela contou sobre Arca, e em vez de exibir sua culpa e vergonha habitual por causa de suas ações passadas, beijou-a com ternura. Ela o amava também, e o havia perdoado. Via o melhor nele.

—Obrigado. — disse ele. —Com todo meu coração, obrigado.

—Por nada.  Agora, de volta à escuridão. — disse ela, provavelmente, tentando um tom de negócio, mas não. Sua mulher era uma melosa, um bolinho com recheio de creme, e adorava isso, também. —Ira irá alimentá-lo, o que ajuda a mantê-lo calmo. E sabe o que isso significa, certo? Somos perfeitos um para o outro em todos os sentidos.

—Assim, concordo com isso. Somos uma família você e eu, e te amo mais que do que possa dizer.

—Isso é bom, porque isso é o quanto eu te amo.

Plantou um beijo rápido em sua boca. Mais nada, e seria todo dela antes que tivesse todas as informações que precisava.

—Então, onde estamos agora mesmo?

Um brilho mal piscou nos olhos dela quando disse:

— De voltar ao Reino de Sangue e Sombras. Todos os Senhores, menos Kane estão aqui. Amun e Haidee o encontraram, lutaram por ele, mas depois o perderam novamente de alguma forma. Mas não se preocupe, estou no caso agora. Vou encontrá-lo de uma vez por todas. É, uh, uma espécie de grande negócio.

Ele sorriu.

—Agora, vamos para o próximo tópico. Quero mostrar uma coisa. — disse ela. Rolando para o lado, mas permanecendo dentro do seu abraço, rodou a mão no ar acima deles. Brilhos de luz, um espessamento das partículas e, em seguida cores floresceram em torno de um nevoeiro.

Ele viu Baden. Os cabelos vermelhos, o corpo musculoso.

Alegria e tristeza floresceram dentro dele.

Viu Pandora. Cabelos negros, corpo magro aprimorado.

Culpa e vergonha.

Viu Cronus. Cabelos castanhos, corpo musculoso.

Presunção.

Viu Rhea. Cabelos negros, corpo esbelto.

Vingança.       

Suas bocas estavam se movendo, mas não podia ouvi-los. Estavam entre grossas colunas brancas num templo.

—Estou morta. — Sienna disse — porém viva. Portanto, posso fazer o que nem mesmo Cronus podia quando teve o trono. Posso viajar até lá. Posso falar com eles. E penso que posso até recobrar seu Baden.

Lágrimas de repente queimaram seus olhos. Uma bicha mais uma vez, mas tanto fazia. Este era um sonho, tudo isso.

—Adoraria isso. Obrigado.

Seus olhos se embaçaram, e ela limpou sua garganta.

—Certo, então quer a notícia boa ou a má em seguida?

Havia mais? Seu peito se apertou.

—A má, não importa o que seja.

—Com Cronus morto, seus inimigos agora são meus. Não sei exatamente quem são eles, então não sei exatamente em quem confiar. Além disso, os Tácitos estão livres, e tenho que proteger Galen deles.

Ele soprou uma rajada de alívio. Não tinha certeza do que havia esperado, mas não era isso.

—Vamos lidar com os inimigos quando vierem. Quanto a Galen, vamos discutir isso.

Ela plantou um beijo em seu pescoço.

—Ótimo, porque essa é a transição perfeita para a boa notícia.

Nunca iria se cansar de seu carinho e sua cabeça se inclinou de modo que ela pudesse beijá-lo novamente.

—O quê?

—Bem, são duas partes. Primeiro, os Caçadores foram quase todos dizimados. Em segundo lugar, Galen me deu a Capa da Invisibilidade.

—Espere, espere, espere. Volte. O que?          

—Você está atualmente livre de inimigo.

— Eu não... — não tinha palavras, percebeu. Experimentou choque, então excitação, então descrença, então choque novamente. Esteve lutando contra os Caçadores por tanto tempo. Milhares de anos. De repente descobrir que nunca teria que lutar contra outro? Quase demais para receber.

Quando encontrou sua voz, conseguiu coaxar:

—Por que Galen lhe deu seu único artefato?

—Bem, quando Cronus e Rhea morreram, os Tácitos foram libertados, como eu disse. Agora estão atrás dele. Deu-me a Capa e, em troca, ofereci minha proteção. Ele odiou fazê-lo, e diminuí gradativamente à apenas dois anos.

—Deveria ter economizado o aborrecimento. Um, todo mundo aqui o quer morto, não importa o que, e dois, com os Caçadores fora de cena, estamos bem sem a Capa. Não vamos precisar usá-la para nos esgueirar em território inimigo.

—Não há de que. — disse ela, o queixo indo para o ar.

—Desculpe, desculpe. Sou grato, juro. Isso saiu errado. Odeio o fato que esteve à sua volta, e agora tem que protegê-lo. —O que significava que Paris tinha que protegê-lo, também.

Ela suavizou.

—Ainda precisa da Capa. Não pode ter certeza que ninguém mais se levantará contra você, e é melhor ter todas as armas à sua disposição, em vez de outra pessoa.

—Uma menina tão inteligente.

Nossa menina.

Definitivamente.       

—Além disso, podemos agora procurar a caixa. — disse ela, radiante.

Todos os quatro artefatos, ele pensou, impressionado por esta mulher dele. Estava certa. Precisavam dos artefatos, não só para mantê-los fora das mãos do inimigo, mas para encontrar a Caixa de Pandora e destruí-la antes que alguém pudesse usá-la contra eles. O objetivo — que vinham trabalhando única e exclusivamente e por tanto tempo — estava mais perto que nunca de ser cumprido.

—Não vamos procurar a caixa ainda. — disse ele, puxando sua roupa.

—Um menino tão inteligente. — Ela encontrou sua boca, que esperava a dela, lambendo, beijando e a sugando. —Vamos procurar mais tarde. Muito mais tarde.

—Sim! Estou a bordo!

 

NUM CANTO DA MENTE DE SIENNA, os pensamentos de um homem borbulhavam. O que acontece com essa porcaria? Aí vem outro pedido de desculpas que tenho que fazer.

A voz de Strider, percebeu. Estava caminhando em direção ao seu quarto, até então.

Tentei falar com Paris sobre a inicialização de sua garota, assim como tentei falar com Amun da inicialização da sua, e ambos sofreram por isso. Sem mencionar como as mulheres devem ter se sentido. Então é isto. Chega. Não vou mais me envolver com meus garotos e suas mulheres. Mas então, os únicos que restam são Kane e Torin, mas Torin é um recluso, então não conta. E se alguma vez Cameo trouxer para casa um cara, bem, todas as apostas estão fora. Guy vai ter que se provar digno, não importa o quê. E, caramba, estou quase lá. É melhor Kaia me agradecer adequadamente por isso, pois foi a única que insistiu para eu fazer isso. Odeio pedir desculpas, e Paris é do tipo vingativo. Vai me fazer ficar de joelhos e implorar, eu sei. Isso vai ser embaraçoso. E doloroso!

Toc. Toc.

—Vá embora. — Paris gritou, apertando as mãos na bunda de Sienna.   

—Preciso falar com você, cara. — Strider respondeu a voz abafada pela porta. —Também com Sua Alteza, que presumo estar com você. Realmente não preciso chamá-la de Sua Alteza, preciso?

—Sim, precisa. Mas conversaremos mais tarde.

—Agora. Então, uh, certo. Sinto muito. Até mais.  —Sim, machucou tanto quanto imaginei, pensou Strider. 

Seus passos desapareceram.

—O que foi aquilo? — Paris perguntou.

Os próprios pensamentos de Sienna encheram a cabeça dela. Não vou rir.

—Eu. Ele estava dizendo: desculpe-me pela forma como havia mexido com você sobre mim. Desculpando-se conosco, na verdade.

—Eu te amo, Bebê. — disse Paris.

Seus lábios se esticaram em outro sorriso.

—Eu também te amo.

Quando ambos estavam nus, ele mergulhou dentro dela. Estava em casa, finalmente em casa. E estava em paz. Sua mulher estava com ele, e não iria deixá-lo. Ficariam juntos.

Qualquer outra coisa que viesse, acontecesse o que acontecesse, estariam juntos, exatamente como havia querido desde o início.

 

MAIS UMA VEZ ZACHAREL se encontrava no alto dos céus, Lysander ao lado dele, os dois olhando abaixo, para a grande satisfação de Paris e Sienna.

—Ganhou sua cooperação — disse ele —, mas não do jeito que queria. Paris irá se juntar a ela aqui.

—Esta não é a paródia que temia que fosse. — Lysander respondeu. —Ao lidar com pessoas e suas emoções, as concessões devem ser sempre feitas. Às vezes, esquecemos.

Emoções. Um desperdício de energia na estimativa de Zacharel. Você vive você guerreia e um dia morre. Todo o resto era desnecessário.

Lysander continuou:

—Estou surpreso que se complementem tão bem, ainda mais surpreso que realmente ajudem um ao outro emocionalmente e fisicamente. Nunca teria imaginado.

Nem ele. Paris devia ter arrastado Sienna para baixo. Ela não deveria ter a determinação e força para puxá-lo para cima.

—O que acontece agora?

—Agora, vou começar a treinar Sienna, e assumir a responsabilidade por Paris. E você, por sua vez, vai atender a mais nova ordem da Divindade.

—Muito bem. A mais nova ordem da Divindade — ou melhor, sentença — havia chegado apenas esta manhã. Zacharel havia sido convocado para o templo da divindade, onde uma segunda punição por seus pecados anteriores havia sido amontoada em cima de sua cabeça, como se a queda de neve eterna não fosse suficiente.

—Tem que admitir que possua a tarefa mais fácil.

—Verdade. Não invejo você, meu amigo.

Zacharel conduziria seu próprio exército de guerreiros. Guerreiros simplesmente iguais a ele, só que muito piores. Os homens que haviam desafiado as regras muitas vezes. Homens que —supostamente — o ensinariam a seguir as leis celestiais.

Eram como nenhum outro anjo que já houvesse lidado. Alguns tomavam amantes. Alguns amaldiçoavam e bebiam. Alguns eram tatuados e perfurados, e tão sombrios em espírito como muitos seres humanos.

Se os treinasse bem, a divindade havia proclamado, a neve deixaria de cair de suas asas, e estaria autorizado a permanecer no seu próprio lugar no céu. Se falhasse — se eles falhassem — todos cairiam juntos, para sempre banidos do único lar que haviam conhecido.

O que quer que assuma, Zacharel devia permanecer nos céus. Seu maior tesouro estava aqui, e preferia morrer a se separar dele. Não havia considerado seu apego emocional, mas sim, essencial para sua sobrevivência. Não pode sobreviver mesmo se permanecer por aqui, ele pensou, esfregando a mancha escura que crescia em seu peito.

—Se algum dia precisar de mim — disse Lysander, puxando-o de seus devaneios, — só tem que chamar.

—Obrigado. Sinto o mesmo. Se algum dia precisar de mim...  —Não podia estar por perto para ajudar. Naquele momento, as palavras de despedida da Divindade ecoaram em sua mente. Sua vida vai mudar em breve de maneiras que sequer podemos imaginar. Espero que esteja preparado.

Estava? Ele e seus homens descobririam juntos, supôs.



 

[1] Era um jeito de medir um copo na década de 20, em vez de uma dose. 2 dedos uma dose, 3 dedos dose-dupla.

[2] Marca de uísque.

[3] Big Freakin’ Deal – Grande coisa.

[4] Então... esse tal de screeching que a autora usou foi uma sátira do twitter (twitting - que significa provocar,ridicularizar, os erros mais embaraçosos de outras pessoas)... mas o significado da tradução é um grito muito alto (de animal, pessoa ou até um pneu quando freia muito rápido) que provavelmente ela quis fazer uma graça por serem demônios e outros seres postando num site de relacionamento.

[5] Jason Voorhees, nascido em 13 de julho de 1946, é um personagem fictício, principal personagem dos filmes de terror da franquia Sexta-Feira 13.

Freddy Krueger é um personagem fictício da série de filmes de terror "A Nightmare on Elm Street" (no Brasil, A Hora do Pesadelo).

Máximo Audrey Myers (Haddonfield, 19 de Outubro de 1957) é um Serial Killer. Myers é protagonista da série de filmes de terror slasher Halloween.

Hannibal Lecter é uma célebre personagem de ficção, que surgiu pela primeira vez no livro Dragão Vermelho (1981). As aventuras de Hannibal continuaram, no entanto, em O Silêncio dos Inocentes (1991) e Dragão Vermelho (2002) filme e em Hannibal (2001).

[6] Cracker Jack é uma  marca de lanche dos EUA  feito de pipoca e amendoim revestidos com forte melado, bem conhecida por ser empacotada com um prêmio  dentro.

[7] GQ (originalmente Gentlemen's Quarterly/trimestral) é uma revista mensal sobre moda, estilo e cultura para os homens, através de artigos sobre alimentação, cinema, fitness, sexo, música, viagens, desporto, tecnologia e livros.

[8] Tender, Love and Care - Ternura, amor e cuidado.

[9] Gesto entre aspas...

[10] A pinhata (em espanhol: piñata) ou pichorra é uma tradição ibérica bastante difundida em certos países americanos, porém incomum nos países onde surgiu (Portugal e Espanha).

Trata-se de uma brincadeira, que, normalmente, se dedica às crianças, contudo pode ser jogado por adolescentes e até adultos. Consiste em uma panela, recheada de doces, totalmente coberta por papel crepom, suspensa no ar a uma altura média de dois metros, onde o participante, vendado, tenta quebra-la com um bastão e, consequentemente, liberar os doces.

É especialmente popular no México, onde é comum em aniversários, sob a forma de uma estrela de cinco pontas.

No Brasil, se restringe à Região Nordeste, mais precisamente nos estados da Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte e interior da Bahia, sob o nome de quebra-panela ou quebra-pote.

  

                                                                                                   

 

 

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