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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


SEGREDO DE MULHER / Sharon Kendrick
SEGREDO DE MULHER / Sharon Kendrick

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblio "SEBO"

 

 

 

  

Como poderia esquecê-lo se esperava um filho daquele homem?

Há nove anos, o atraente Marcus Foreman fora o chefe de Donna King e também o seu primeiro amante. Aquela aventura de uma noite foi um desastre e, no dia seguinte, ele despediu-a. Agora, Donna voltara à cidade, tinha o seu próprio negócio e estava mais bonita do que nunca... e Marcus parecia decidido a demonstrar-lhe como devia ter sido aquela primeira noite. Naquele momento, a experiência na cama foi fabulosa, ardente e apaixonada, todavia, ao contrário do que Donna esperara, não conseguiu resolver aquele assunto pendente... porque o homem que lhe causara tanta dor no passado era o pai do filho que trazia no seu ventre...

 

 

 

                               CAPÍTULO 1

O advogado era inteligente, sofisticado e atraente e tinha as mãos mais arranjadas que Donna alguma vez vira.

- Bom, Donna, assina aqui, por favor - o advogado assinalou uma zona do papel. - Vês? Exactamente aqui

Donna conteve a vontade de se rir.

- Referes-te à linha que a tua secretária assinalou com uma cruz?

- Ah, sim, desculpa - disse ele rapidamente. - Não era a minha intenção insultar-te.

- Não te preocupes, não insultaste - Donna escreveu a sua assinatura. - Não sabes como estou contente por tudo ter finalmente acabado.

A expressão de Tony Paxman não se reflectiu nas palavras de Donna.

- Vou sentir a tua falta - Tony suspirou. - Enfim, a propriedade já é tua e conseguiste a licença para servir álcool. Parabéns, Donna! Desejo-te todo o sucesso do mundo.

- Obrigada - respondeu ela.

Donna pegou no seu casaco de seda creme e dedicou a Tony Paxman um sorriso de agradecimento. O advogado, com uma diligência suprema, encarregara-se dos trâmites burocráticos referentes à compra da propriedade

E, mais importante ainda, fizera-o com uma discrição absoluta. Donna devia-lhe um favor.

- Queres almoçar comigo para celebrar?

Tony pestanejou. A sua expressão de surpresa sugeriu que um convite para almoçar, vindo de Donna King, era a última coisa que esperava ouvir.

- Almoçar? - repetiu Tony fracamente.

Donna arqueou o sobrolho. Não estava a fazer-lhe nenhuma proposta indecente!

- Estou a infringir alguma lei ao convidar-te para almoçar comigo?

Tony abanou a cabeça rapidamente.

- Não, não, absolutamente. Na verdade, almoço com os meus clientes várias vezes.

- Imagino que sim - Donna olhou para o relógio. -Pode ser à uma hora? No New Hampshire?

- No New Hampshire? - Tony Paxman sorriu com pesar. - O restaurante de Marcus Foreman? Eu adoraria, mas não me parece que consigamos uma mesa para hoje. Para comer nesse restaurante é preciso fazer a reserva com muita antecedência. Será impossível encontrar mesa para hoje.

- Eu sei - Donna sorriu. - Por isso é que reservei uma mesa a semana passada.

Tony franziu o sobrolho.

- Estavas assim tão certa de que conseguiríamos resolver tudo hoje?

- Sim. Sabia que hoje era o dia em que chegava a licença e não pensei que surgisse nenhum imprevisto.

- És uma mulher com muita confiança em ti mesma, Donna - disse Tony com voz suave. - Além de seres extremamente bonita.

Chegara o momento de destruir as suas ilusões. Era uma pena que alguns homens interpretassem simples gestos de amizade como um convite para alguma coisa mais profunda e íntima.

- Por favor, Tony, não te iludas - disse-lhe ela. - É um almoço amigável. É uma forma de te demonstrar como estou agradecida pelo teu empenho. É só isso, mais nada.

- Está bem - Tony começou a ordenar papéis na sua secretária com uma urgência repentina. - Bom, então encontramo-nos à uma hora no New Hampshire, está bem?

- Combinado - Donna agarrou na sua mala e levantou-se. - Até à uma hora, Tony.

- Adeus - respondeu ele.

Fora do escritório do advogado, Donna respirou o ar fresco de Abril, quase sem conseguir acreditar que estava de volta àquela cidade de que tanto gostava. Desde a sua chegada, algumas semanas antes, mantivera o seu regresso em segredo, contudo, já não havia necessidade de se esconder. Voltara e ia ficar.

Estava um dia perfeito: céu azul e sol. As pétalas brancas lustrosas de uma magnólia brilhavam como estrelas. Perfeito. E o que coroava tudo era a sua aquisição.

Toda a gente lhe dissera que era uma loucura abrir uma «casa de chá» numa cidade como Winchester, já a transbordar de cafés e restaurantes. E tinham razão, contudo, a maioria dos estabelecimentos pertencia a cadeias grandes e impessoais. Só um se destacava e pertencia a Marcus Foreman.

Donna controlou a excitação, os nervos e uma sensação que há muito tempo não experimentava e que pensara que seria impossível voltar a sentir. Era uma sensação esquecida há muito tempo, porém, ali estava, urgente e insistente, causada pela possibilidade de voltar a ver Marcus.

Excitação. Uma excitação que lhe produzia ardor nos mamilos e tremor no resto do corpo.

- Bolas! - exclamou Donna em voz alta. - Bolas, bolas!

E, depois de subir a gola do casaco para se proteger do ar frio da Primavera, Donna começou a descer a rua para ver algumas montras até que chegasse a hora do seu almoço.

Passeou devagar à frente das lojas, olhando sem interesse excessivo para as roupas caras. Roupa linda feita com tecidos naturais de seda, algodão e caxemira. Roupa que, em qualquer dia normal, faria com que se sentisse tentada a examinar cuidadosamente e talvez a comprar.

No entanto, aquele não era um dia normal. E não apenas porque não era todos os dias que alguém investia as suas economias num negócio que algumas pessoas consideravam destinado a fracassar.

Não, aquele dia era diferente porque, apesar de caminhar para a frente, Donna ia recuar. Ia voltar para o lugar onde conhecera Marcus e onde aprendera tudo sobre o amor e o sentimento de perda.

Há uma hora, Donna entrara no New Hampshire, com a esperança de dar a impressão de ter uma confiança em si mesma que naquele momento não sentia.

O restaurante mudara completamente. Quando ela trabalhara naquele local, a decoração era muito mais excessiva, com folhos, rendas e flores.

No entanto, Marcus mudara-o com os tempos. Os tapetes tinham desaparecido, dando lugar a um chão encerado e cortinas simples cobriam as janelas. O mobiliário que havia era o mínimo possível e dava a sensação de simplicidade e conforto, não de opulência.

Donna recordou como se sentira intimidada da primeira vez que atravessara aquelas portas. Fora como entrar noutro mundo, contudo, acontecera quando acabara de fazer dezoito anos; já tinham passado nove anos e toda uma vida.

Donna aproximou-se do balcão de recepção onde havia uma jarra gigante com flores aromáticas. As pétalas carnudas dos lírios estavam rodeadas por uma folhagem verde espinhosa. Era um arranjo floral extraordinário... mas Marcus sempre tivera um gosto excelente.

A recepcionista levantou o rosto.

- Em que posso ajudá-la, senhora?

- Sim, olá... Tenho uma mesa reservada - Donna sorriu.

- O seu nome, por favor?

- King. Donna King - pareceu-lhe que a sua voz soava um pouco alta e esperou que Marcus surgisse de entre as sombras. - Venho encontrar-me com o senhor Tony Paxman.

A recepcionista leu a lista e marcou o nome de Donna antes de voltar a levantar a cabeça.

- Sim. O senhor Paxman já chegou e está à sua espera - a recepcionista, com educação, lançou a Donna um olhar interrogante. - Já alguma vez tinha almoçado no New Hampshire?

Donna abanou a cabeça.

- Não.

Fizera camas e limpara as casas de banho dos quartos do andar de cima e também comera os deliciosos restos de comida que costumava haver na cozinha. E uma vez, com o resto do pessoal do restaurante, comera na sala privada do andar de cima quando Marcus convidara todos os funcionários para celebrar um artigo deveras lisonjeador sobre o restaurante num jornal.

Donna engoliu em seco ao recordar aquele incidente em concreto. Fizera todas aquelas coisas, porém, na verdade não podia dizer que tivesse comido no restaurante.

- Não, nunca almocei aqui.

- Nesse caso, chamarei alguém que a leve para a sua mesa.

Donna, decidida a não se deixar intimidar e repetindo a si mesma que trabalhara e comera em lugares daqueles por todo o mundo, seguiu um dos empregados.

No entanto, o seu coração batia com força ao pensar na possibilidade de voltar a vê-lo e perguntou-se porquê.

Já que superara o que acontecera com Marcus.

Há muitos anos.

O restaurante estava quase lotado e Tony Paxman levantou-se ao vê-la a aproximar-se.

- Começava a pensar que não vinhas.

- Oh, homem de pouca fé! - brincou Donna, sorrindo ao empregado que, educadamente, esperava. -Por favor, traga-nos champanhe da casa.

- É claro, senhora.

Tony Paxman esperou pela segunda taça de champanhe para comentar de forma sombria:

- Esperemos que dentro de seis meses continues a ter motivos de celebração.

- O que queres dizer? Tony encolheu os ombros.

- Marcus Foreman não vai gostar de ter a concorrência de um novo estabelecimento na cidade.

- A sério? Toda a gente o conhece, a sua reputação na hotelaria é extraordinária. E suponho que é homem para agüentar um pouco de concorrência, não achas?

- Suponho que é homem para a maioria das coisas - observou Tony com cinismo, - mas talvez não lhe apeteça ter concorrência na mesma rua.

Donna deixou o caroço de uma azeitona no pires que tinha à sua frente.

- Vá lá, não sou uma rival a sério, pois não? Além disso, o hotel dele só serve chá à tarde e aos seus hóspedes.

- É verdade, mas e se os hóspedes do hotel começarem a ir ao teu estabelecimento?

Donna encolheu os ombros e sorriu, ao mesmo tempo que levantava a sua taça para brindar.

- É um país livre. Que vença o melhor!

- Que vença o melhor - repetiu Tony.

Donna examinou o menu, que considerou excelente.

- Vamos escolher? Estou cheia de fome.

- Parece-me perfeito. Depois, fala-me sobre a tua vida - Tony franziu o sobrolho. - Sabes uma coisa? Tens uma cor de cabelo incrível, vermelho dourado.

Aposto que te vestias de princesa quando eras pequena.

- Não, vestia-me com farrapos - brincou Donna, apesar de realmente não ser uma brincadeira.

Passara uma infância itinerante com a sua carinhosa, mas louca mãe. Com ela, aprendera a arte do exagero e da evasão e, depois, que ambas as coisas eram formas diferentes de mentir. Também aprendera que as mentiras se tornavam mais e maiores, até que acabavam por engolir as pessoas.

Donna sorriu para Tony Paxman.

- Falemos sobre ti. E depois conta-me tudo o que sabes acerca de Winchester.

Tony começou a falar e Donna esforçou-se realmente por desfrutar da comida e da companhia de Tony.

No entanto, Donna estava demasiado distraída para se concentrar na conversa. Ou na comida. Estranho. Não achara possível que Marcus ainda tivesse o poder de fazer com que perdesse o apetite.

Contratava sempre os melhores cozinheiros, mesmo ao princípio, quando não podia pagar-lhes bons salários. E a cozinha daquele restaurante não baixara de qualidade. Donna contemplou a perfeita pirâmide de mousse de chocolate no meio de algumas bananas.

Talvez tivesse enlouquecido ao pensar que, de alguma forma, podia competir com aquele homem.

- Donna - disse Tony de repente.

Donna afastou o seu prato para o lado e levantou o olhar. -Hum?

- Porque me convidaste para almoçar? - Tony respondeu à sua própria pergunta sem perceber que o fazia. - Certamente, não foi porque querias aprofundar a nossa relação.

Ela, confusa, olhou para ele.

- Já te tinha dito isso no escritório.

- Sim, suponho que sim - Tony encolheu os ombros. - Talvez tivesse a esperança de que mudasses de idéia.

- Lamento - disse ela com voz suave e recostou-se nas costas da cadeira para olhar para ele fixamente. -O almoço foi uma forma de te agradecer.

-Por?

- Por resolveres tudo sem complicações e por teres mantido segredo.

- Ah, sim - Tony bebeu um gole da sua bebida, olhando para ela. - Queria perguntar-te... Porque querias mantê-lo em segredo?

- Já não é nenhum segredo - Donna sorriu. - Podes dizer a quem quiseres.

Tony inclinou-se sobre a mesa.

- Disseste-me que nunca tinhas almoçado ou jantado aqui.

- E é verdade.

- Mas não é a primeira vez que aqui vens, pois não? Donna entreabriu os olhos. Não pensara que Tony

pudesse ser tão perspicaz.

- Por que razão dizes isso?

- Por causa da tua atitude. Passo a vida a observar as pessoas, é o meu trabalho. Sou um perito.

«Não és assim tão perito», pensou Donna, já que não reparara que lhe enviara sinais para que não se aproximasse dela. No entanto, não fazia sentido criar mal-entendidos.

- Trabalhei aqui - disse Donna. - Trabalhei aqui há muitos anos, quando era jovem.

- Não és propriamente velha.

- Tenho vinte e sete anos.

- E muita experiência? - brincou Tony.

- Não, não acredito - disse uma voz nas costas de Donna. - Não, se pensarmos no passado. Não concordas, Donna?

Ela não se virou. Não precisava de o fazer. Teria reconhecido aquela voz em qualquer lugar do mundo. Deitou a cabeça para trás um milímetro e quase sentiu a presença dele, apesar de não o ver.

- Olá, Marcus... - disse ela com cuidado, perguntando-se como soaria a sua voz.

Uma voz mais madura e reflexiva? Ou ainda repleta de adoração juvenil?

Marcus entrou no seu campo de visão contudo, ao princípio, Marcus não olhou para Donna, mas para Tony Paxman. Assim, Donna pôde observar Marcus sem que ele reparasse.

E o coração pareceu querer sair do peito.

Donna sabia que o encontraria e, mentalmente, ensaiara aquele momento. Um sentimento de maldade fizera com que se perguntasse se Marcus estaria careca, se o dinheiro e o sucesso teriam feito com que relaxasse, se teria uma barriga saliente ou se teria começado a usar roupa horrorosa.

No entanto, Marcus Foreman continuava a ser o tipo de homem pelo qual a maioria das mulheres abandonaria o seu lar.

- Olá, Tony! - cumprimentou Marcus. O advogado inclinou a cabeça. -Olá, Marcus!

- Conhecem-se? - perguntou Donna a Tony com surpresa.

- Toda a gente conhece Marcus - respondeu Tony, encolhendo os ombros.

Contudo, Donna reparou numa mudança subtil no seu companheiro de mesa. De repente, Tony Paxman já não parecia o ardiloso e atraente advogado de antes. Naquele momento, parecia um homem normal. Um homem que acabava de reconhecer o chefe da manada.

Finalmente, Marcus olhou para ela e Donna percebeu que era a sua oportunidade de reagir como prometera fazer se voltasse a vê-lo: com frieza, calma e indiferença.

O seu educado sorriso não hesitou, porém, Donna perguntou-se se se reparava na forma como o seu coração estava acelerado e o modo como as suas mãos suavam.

- Tudo bem, Donna? - perguntou Marcus devagar. E Donna viu, com um fascínio vergonhoso, aqueles

olhos azuis frios com as suas pestanas escuras.

- Tudo bem, Marcus?

Era verdade que Marcus não estava careca nem gordo nem feio, porém, mudara. Mudara muito. Não acontecia o mesmo a toda a gente?

- Vais dizê-lo tu ou preferes que eu diga? - a voz de Marcus estava impregnada de divertimento... E mais alguma coisa que Donna não conseguiu interpretar, mas que fez com sentisse a necessidade de ficar em alerta.

- Dizer o quê?

- Há quanto tempo! - respondeu ele preguiçosamente. - Não é o que costuma dizer-se quando duas pessoas se encontram depois de tanto tempo?

- Sim, suponho que sim - respondeu ela lentamente, pensando que tinham passado nove anos desde a última vez que o vira. - Podias ter dito: «Olá, Donna, que alegria voltar a ver-te!». Mas isso teria sido uma grande mentira, não é verdade, Marcus?

- Se tu o dizes... - Marcus sorriu. - E tu és a perita em mentiras, não é, Donna?

Enfrentaram-se com o olhar e Donna surpreendeu-se, observando os detalhes do rosto de Marcus; um rosto adorado no passado... Porém, naquele momento era apenas um rosto entre tantos, disse para si Donna.

Donna conhecera o princípio da vertiginosa carreira profissional de Marcus. Antes de Marcus ter fabricado a sua própria imagem, em vez de projectar a que herdara.

Desfizera-se do aspecto educado e académico que herdara, tal como do fato de casaco e a gravata, os sapatos de couro italianos e as camisas confeccionadas na Jermyn Street. No presente, Marcus usava calças claras e uma camisa mas, naturalmente, uma camisa de seda e, é claro, os dois botões de cima desabotoados. Estava muito atraente.

Também tinha o cabelo um pouco mais longo. Antes, o curto cabelo definia bem a forma orgulhosa da sua cabeça. Agora, finas madeixas acariciavam-lhe as sobrancelhas e as proeminentes maçãs do rosto e cobriam-lhe a nuca, tocando na gola da sua camisa.

Parecia ter saído da cama de uma bonita rapariga depois de fazer amor a meio do dia.

E talvez tivesse acontecido.

Desesperadamente, Donna procurou alguma coisa para dizer enquanto encontrava um estúpido alívio, olhando para os seus sapatos.

- É evidente que não estás a trabalhar.

Os olhos dele não tinham mudado e disfarçavam uma leve surpresa, como se a reacção dela não tivesse sido a esperada. Marcus olhou para os seus sapatos náuticos.

- Qual é o problema dos meus sapatos? - quis saber Marcus.

- Nada, mas não é um calçado convencional, não te parece? - observou ela. - Mais apropriados para velejar do que para tomar conta de um negócio.

- Mas eu não tenho um negócio convencional -disse ele com impaciência. - E já não sinto a necessidade de me esconder atrás de um fato e de uma gravata.

- Meu Deus! Tornaste-te um rebelde, Marcus! - comentou Donna.

Ouviu-se uma pequena tosse e Donna e Marcus viraram as cabeças e surpreenderam Tony Paxman a observá-los. Donna, com arrependimento, mordeu os lábios.

Esquecera-se do seu convidado para o almoço. Que mal-educada! O facto de Marcus ter aparecido não significava que o mundo tivesse deixado de girar sobre o seu eixo.

Apesar de parecer que sim...

- Pedimos café, Tony? - perguntou ela rapidamente.

Porém, Tony Paxman já sofrera demasiadas rejeições para um dia. Abanou a cabeça e levantou-se.

- Não me tinha apercebido de que era tão tarde. Bom, tenho de me ir embora. Tenho uma reunião com um cliente às três horas - ofereceu a mão a Donna. -Muito obrigado pelo almoço, Donna.

De repente, Donna sentiu-se mal. Não quisera que aquilo acontecesse. O que fez com que se perguntasse o que realmente esperara. Sabia que havia a possibilidade de o ver. Esperara que ele passasse pela sua mesa sem a reconhecer? Ou que trocassem apenas uma rápida saudação?

- Obrigada por tudo o que fizeste por mim, Tony! Talvez almocemos outro dia.

- Claro. Adeus, Marcus - Marcus apertou a mão de Tony. - Uma refeição excelente... como sempre.

- Muito obrigado - murmurou Marcus.

Os dois ficaram em silêncio enquanto Tony Paxman abria caminho entre as mesas. Então, de repente, Donna sentiu-se perturbada quando Marcus concentrou a sua atenção nela.

- Parabéns, Donna. É um dos jovens advogados com mais dinheiro e mais inteligentes da cidade.

- Não estou interessada na conta bancária nem na cara bonita dele. Escolhi-o porque é o melhor.

Marcus arqueou o sobrolho.

- Em quê?

- Não no que estás a pensar! Foi-me recomendado - respondeu Donna com um suspiro.

Contudo, enquanto pronunciava aquelas palavras apercebeu-se de que não tinha de se justificar a Marcus. Já não. Ele já não era o seu chefe. Era apenas um homem que lhe oferecera uma desastrosa introdução ao mundo do amor e do sexo. E que depois a abandonara.

- E a pessoa que o recomendou também te disse que acabou de passar por um processo de divórcio muito desagradável? Que agora está livre... mas só se não te importares que metade do seu salário seja para a sua esposa e para os seus dois filhos. Sei que os problemas económicos afugentam muitas mulheres.

E então, Marcus esboçou um breve e inesperado sorriso que a deslumbrou.

- Céus, até parece que estou com ciúmes - murmurou ele.

- Sim, é verdade - disse ela com doçura. - Mas não há necessidade, Marcus. A minha relação com Tony é exclusivamente de trabalho.

- Não estou interessado nas tuas relações - Marcus olhou insolentemente para os dedos de Donna. - Suponho que ainda estás à espera, não é verdade?

Donna olhou fixamente para ele.

- Ainda sou solteira, se é a isso que te referes. E tu?

- Sim - disse ele em voz baixa. - Ainda solteiro. Marcus entreabriu os olhos.

- Bom, Donna, o que estás aqui a fazer outra vez? Tencionas passar algum tempo na cidade?

Estava disposta a ser interrogada por ele? A expor-se às suas críticas?

- Eu adoraria contar-te tudo, Marcus - Donna sorriu. - Mas não tenho tempo neste momento.

Marcus reparou que não era verdade. O que não o surpreendeu. Já não lhe mentira antes? Porém, naquela altura ele era demasiado jovem e estava demasiado cego pela luxúria para reparar.

- Aposto que não é nada urgente - comentou ele suavemente. - Nada que não possa esperar.

-Tenho uma reunião urgente...

- Não, não tens nenhuma reunião - a voz de Marcus agravou-se ao recordar a oportunidade perdida da única noite que passara com ela. - Tens o ar de uma mulher que tirou o dia livre.

Marcus puxou a cadeira que estava à frente de Donna.

- O que achas de beber comigo o café que o teu advogado não pôde beber? - sugeriu Marcus. - Assim poderás dizer-me o que vieste fazer à cidade.

 

                              CAPÍTULO 2

Donna tinha um dilema. Por um lado, queria ficar... Porque, com Marcus à sua frente, era como se o sol existisse apenas para ela. Contudo, por outro lado, queria sair do restaurante o mais rapidamente possível.

No entanto, a última hipótese não convenceria Marcus de que continuava a ser emocionalmente uma adolescente?

Alisou a saia do vestido de seda creme e acomodou-se na cadeira.

- Está bem, beberei um café - respondeu ela. Marcus lançou um suave suspiro triunfal. Portanto

Donna decidira ficar. O seu coração começou a bater acelerado e esboçou um sorriso quase cruel enquanto se sentava na cadeira.

Com um movimento quase imperceptível com a cabeça, chamou uma empregada. Depois de pedir o café, ficou na linha de fogo de uns olhos tão verdes como a relva. Olhos escurecidos pelo rimel, muito longe de mostrarem as pálidas pestanas sobre as quais costumava brincar.

- Mudaste muito, Donna - afirmou ele. Ela olhou para ele com incredulidade.

- É claro que mudei. Para começar, tenho mais nove anos. As pessoas mudam com o tempo, sobretudo as mulheres - no entanto, durante uns segundos, sentira-se como a pouco sofisticada adolescente que ele obviamente recordava. - Mas não acho que tenha mudado assim tanto, já que me reconheceste imediatamente.

-Sim.

E apenas com um breve olhar pelo restaurante. Mar-cus surpreendera a si mesmo. Talvez tivesse sido aquele inesquecível cabelo de fogo. Ou as curvas do corpo de Donna. Ou o colar à volta do seu pescoço. Engoliu em seco ao recordar a última vez que a vira com aquele colar.

- Talvez seja porque tenho a tua imagem gravada na minha mente - murmurou ele.

- Sim, costumo ter esse efeito nas pessoas - comentou ela num tom brincalhão.

Donna percebeu que a sua sofisticação surpreendera Marcus.

Talvez Marcus não soubesse, porém, em grande parte, ele era o responsável pela sua transformação numa mulher de negócios. Quantas vezes pensara em deixá-lo atónito se voltassem a encontrar-se? Bom, agora estava à sua frente. Era-lhe tão indiferente como parecia?

- Diz-me, Marcus, em que é que mudei? - perguntou Donna com voz doce.

Marcus recostou-se nas costas da cadeira e aproveitou a oportunidade para a examinar, o que lhe provocou mais prazer do que gostaria. Donna King tornara-se uma mulher muito atraente... apesar do seu aspecto pouco convencional e da sua menos convencional procedência.

Lidava há demasiado tempo com pessoas importantes para não se aperceber de que a aparente simplicidade do vestido de seda de Donna devia custar mais do que muita gente ganhava num mês, tal como os sapatos de salto alto que calçava. E tinha a certeza de que a mala de Donna combinava com os sapatos. Olhou para o chão, para observar a mala ao lado dos seus pés. Sim, combinava!

Donna, expectante, olhava para ele e Marcus recordou a pergunta.

Em que é que mudara?

- Antes tinhas um aspecto barato - declarou ele com sinceridade. Aparentemente sem reparar na expressão gélida dela. - Agora o teu aspecto é sofisticado. És uma mulher de gostos caros. Quem paga as contas, Donna? Quem é o sortudo?

Donna deitou faíscas pelos olhos.

- Meu Deus, que antiquado! - exclamou ela. - Hoje em dia, as mulheres não precisam que um homem pague os seus luxos. Tudo o que tenho foi pago com o meu dinheiro.

Marcus engoliu em seco. Nesse caso, era dinheiro bem gasto.

Uma fita de cetim creme no cabelo avermelhado de Donna dava-lhe um aspecto sedutor de sofisticação. E os seus seios estavam parcialmente escondidos pelo bom corte do casaco, de tal forma que apenas conseguia ver a sua erótica curva quando ela se mexia para a frente. Era de enlouquecer! Marcus sentiu um desagradável e repentino desejo e fez um esforço para o conter.

- E estás maquilhada - afirmou ele num tom quase acusador. - Antes nunca usavas maquilhagem.

Donna desatou a rir-se.

- Claro que não! Levantando-me às seis da manhã para fazer camas, nunca me passaria pela cabeça pintar-me. Acredita, a vida de uma empregada não é nada sofisticada.

- A menos que se tenha sorte com o chefe.

- Mas esse não foi o meu caso, pois não, Marcus? De facto, o melhor que consegui foi partir daqui sem olhar para trás uma única vez.

- No entanto, estás aqui hoje. Porquê?

- Vim celebrar.

- Que interessante - murmurou Marcus. - Queres que adivinhe a celebração ou vais dizer-me?

Donna abrira a boca para responder, porém, naquele momento, uma mulher muito bonita, com um vestido preto justo e uma bandeja nas mãos, aproximou-se da mesa.

Donna olhou o brilhante cabelo preto com um risco perfeito no meio enquanto a mulher deixava as chávenas, a cafeteira, o açúcar e a leiteira na mesa. Depois, ouviu-a perguntar com sotaque francês:

- Mais alguma coisa, Marcus?

E Donna também reparou no olhar de luxúria que os seus olhos pretos lançaram ao seu chefe.

- Não, obrigado - Marcus abanou a cabeça, enquanto observava a rapariga a afastar-se.

- Parece muito eficiente - comentou Donna. -Sim, é.

- E muito bonita.

Marcus levantou o sobrolho.

- Muito.

- Mas não é empregada, a julgar pelo vestido - insistiu ela.

Marcus sorriu.

- Estás assim tão interessada em falar acerca dos meus empregados, Donna?

- Claro que não.

Marcus serviu o café e, automaticamente, ofereceu a Donna o açúcar. E ela sentiu uma repentina nostalgia ao perceber que Marcus se lembrara de que gostava do café muito doce.

- Não, obrigada. Já não ponho açúcar no chá nem no café.

- Nem sequer quando estás a celebrar um acontecimento de forma tão misteriosa?

- Não é nenhum mistério - Donna bebeu um gole de café e sorriu. - Era esse o motivo do almoço com Paxman. Acabei de fechar um negócio.

- Que tipo de negócio?

Donna reparou na condescendência da voz de Marcus e a sua determinação aumentou.

- Um acordo que ultimei - Donna apoiou as costas na cadeira.

Ele franziu o sobrolho, parecia tão surpreendido como se ela acabasse de lhe anunciar que ia candidatar-se às eleições para Presidente da Câmara.

- Quer dizer que vais trabalhar para alguém?

- Que conclusão tão pouco imaginativa! Não, vou trabalhar para mim mesma - Donna permitiu-se sorrir.

- Desta vez, a chefe sou eu.

- A fazer o quê?

- Vou abrir um estabelecimento - respondeu ela serenamente.

- Onde?

- Aqui, em Winchester.

O interesse de Marcus despertou, tal como a sua imaginação. Não era possível que fosse uma coincidência. O mesmo tipo de negócio, a hotelaria, e na mesma cidade?

Porquê?

Seria possível que Donna quisesse vingar-se pelo que acontecera há tantos anos? Ou a sua decisão de voltar devia-se a um impulso mais básico? Aquela noite deixara-lhe uma lembrança indelével na memória, tal como acontecera com ele?

Donna quereria...? Marcus sentiu uma doce e lenta pulsação sexual... Quereria repetir a cena, embora com uma conclusão mais satisfatória?

- Aplicaste muito bem o salário de empregada para conseguires montar um negócio, Donna.

- Tenho aspecto de empregada?

Marcus sentia uma pressão dolorosa no sexo. Não. Naquele momento, Donna tinha um aspecto incrível. Bonita, orgulhosa, com estilo...

- Tenho? - insistiu ela.

- Não. Mas da última vez que te vi eras uma empregada. Pergunto-me o que fizeste durante estes anos para conseguires comprar um estabelecimento.

- O que achas que estive a fazer? Não, não te incomodes em responder! Trabalhei muito desde que me mandaste para a rua!

- Por favor, Donna, não sejas melodramática - Marcus suspirou. - Ofereci-te uma compensação muito generosa e um emprego em Londres. Foste tu que decidiste não aceitar.

- Não queria nada de ti! - exclamou ela amargamente.

Marcus encolheu os ombros.

- Foi uma decisão tua. Recuso-me a representar o papel de canalha só porque tu foste orgulhosa.

Donna olhou para ele, furiosa.

- Desenvencilhei-me sozinha, obrigada. Fui para a Nova Zelândia e trabalhei como cozinheira numa quinta. Trabalhei num bar em Manhattan e num cruzeiro! Conheço o negócio da hotelaria na perfeição. Trabalhei muito e poupei muito...

- E apostaste forte, não foi? - interrompeu-a ele.

- Isso é uma coisa que nunca saberás.

- Bom, garanto-te que é uma coisa que não me vai tirar o sono - comentou ele cinicamente enquanto mexia o açúcar que acabava de pôr no café. - É uma profissão muito precária, vejo constantemente estabelecimentos a terem de fechar.

- Obrigada pelas palavras de apoio.

- É um facto, mais nada - inesperadamente, Marcus esboçou um sorriso. - Não me queres contar os teus planos, Donna? Tens medo da... espionagem industrial?

- Não, o único medo que tenho é de perder a paciência!

Marcus riu-se e o sorriso dele fez com que Donna sentisse o sangue a ferver.

- Não te preocupes com isso - murmurou Marcus.

Ignorando a indirecta, Donna fez uma pausa antes de anunciar:

- Comprei o Buttress Guest House.

Marcus abriu os olhos desmesuradamente. Não apenas na mesma cidade, mas na mesma rua. Vizinhos e rivais? Conteve um sorriso. Não. Ninguém, no seu perfeito juízo, sonharia em comparar uma velha casa com o seu hotel de cinco estrelas.

- Vais abrir uma pensão?

- Não foi isso que eu disse. Comprei a propriedade e restaurei-a.

Claro que o fizera, pensou Marcus. De repente, tudo começou a encaixar.

A Buttress Guest House, uma antiga pensão, abrira falência há alguns anos e ninguém quisera comprar a propriedade. Era um edifício pequeno, velho, com quartos desmantelados e, mais importante, não tinha lugares para estacionar.

Porém, Marcus vira, durante o dia, a carrinha de uma empresa de canalização estacionada à frente da casa. Também vira pintores e pedreiros a entrarem e saírem. Ouvira ruídos de obras e também vira carregarem algumas peças de mobiliário muito interessantes.

Marcus, tal como a maioria das pessoas, supusera que a casa estava a ser remodelada e transformada numa residência familiar. Contudo, agora via o seu erro.

- Estás a transformá-la em quê exactamente?

- Numa casa de chá.

- Uma casa de chá?

- Foi o que eu disse!

Marcus quase desatou a rir-se, porém, o orgulho que reparara na voz de Donna impediu-o.

- Que encanto - murmurou ele.

- Encará-lo-ei como um elogio.

- Não o disse como um elogio.

Marcus franziu o sobrolho. Em vez de ficar zangado, sentiu uma súbita necessidade de a proteger, tal como anos atrás.

- Pensaste bem, Donna? Foste aconselhada por algum profissional? Estou a falar a sério.

- Se soubesses como o que acabas de dizer é insultante! Ou talvez saibas. É óbvio que fui aconselhada! E também fiz um curso de Contabilidade à noite. Porquê?

- Porque não há sítio onde estacionar! - exclamou ele. - Não pensaste por que razão a propriedade nunca tinha sido vendida? Ou pensaste que era uma oportunidade que só tu tinhas visto?

- Para tua informação, não preciso de espaço para estacionar.

- Não? A sério?

- A sério! A propriedade fica na rota de, pelo menos, dois roteiros turísticos de Winchester. O pessoal do departamento de turismo conhece-me e vai ajudar-me. E também conto com o habitual «passa a palavra». As pessoas que forem ao meu estabelecimento serão pessoas que visitam a cidade a pé e é esse o tipo de clientes que quero! Quero pessoas interessadas na história do lugar, que não se importem de passear para entrar num sítio para beber um chá e comer uma fatia de bolo, em vez de poluir tudo com a maldita gasolina.

Fez-se silêncio.

- Estás louca! - exclamou ele finalmente. - E também és muito impetuosa!

- O que se passa? - Donna lançou-lhe um olhar frio. - Achas que ser proprietária de um negócio é demasiado bom para alguém da minha condição social?

- A forma como a tua mãe ganhava a vida não me dizia respeito - respondeu Marcus friamente, - mas sim o facto de me teres mentido. No entanto, a nossa relação assentava numa série de mentiras, não é verdade?

- A nossa relação? - exclamou Donna. - Vá lá, Marcus... Descrever como «relação» o que houve entre nós não só é incorrecto, mas um insulto às «relações».

Marcus recostou-se nas costas da cadeira e cravou-lhe um gélido olhar azul.

- Bom, este teu negócio é uma forma de vingança? - perguntou Marcus, cravando-lhe um olhar gélido.

Donna pestanejou.

- Vingança?

- É uma conclusão lógica - observou Marcus.

- Marcus, por favor, tenho mais inteligência do que isso. Não sou assim tão estúpida para contribuir para a minha própria desgraça apenas para preparar um plano para me vingar de ti.

- Talvez valha a pena o preço - Marcus encolheu os ombros. - Tudo depende da vontade que tens de te vingares de mim.

Donna olhou para ele enquanto se dizia que ele talvez nunca a tivesse conhecido verdadeiramente.

- Que egocêntrico, Marcus! Achas realmente que arriscaria tudo o que tenho se não pensasse que tenho possibilidades de sucesso no meu negócio?

- Não faço idéia. Talvez não te tenha julgado bem -disse Marcus, embora nada convencido. - Mas, nesse caso, como conseguiste mantê-lo em segredo? E porquê?

- Como? - Donna sorriu. - Contratando um bom advogado. Tu mesmo o disseste, Tony Paxman é caro. Bem, Tony é bom e o bom paga-se; aprendi-o com os anos. E porquê? A verdade é que tinha medo de que, se soubesses quem estava atrás da compra, quisesses impedi-lo.

E Donna tinha razão! Não porque tivesse temido a concorrência. Não, o problema era o efeito que Donna tinha sobre ele.

Marcus respirou fundo numa tentativa de conter o seu instinto. Sentiu calor. Donna sempre fizera com que desejasse o que não precisava...

Não conseguia falar, não se atrevia. Antes, tinha de controlar os seus sentimentos e emoções. Só então, falou, acompanhando as suas palavras de sarcasmo.

- Portanto é guerra aberta, eh, Donna?

- Claro que não! Tenho a certeza de que há espaço para os dois - disse ela com uma generosidade fingida.

- Deixemos que as pessoas escolham onde querem ir.

- Como tu hoje - observou ele. - Embora... É possível que tivesses as tuas razões para querer comer aqui.

Donna susteve a respiração.

- Como assim? -Eu.

- Tu?

- Sim. Eu. Há muitos outros sítios onde poderias ter convidado o teu advogado para almoçar. É possível que não conseguisses agüentar o desejo de me ver.

Em parte, era verdade. Mas não pelas razões que ele insinuava. Ao voltar a ver Marcus, a sua intenção fora demonstrar a si mesma que, não só conseguira dar a volta à sua vida, mas também conseguira esquecer o homem que a fizera sofrer.

Donna abriu a boca sem pensar.

- E porque haveria de querer ver-te, Marcus? Porque haveria de querer ver o homem que só me causou dor e sofrimento? O homem que tirou o que queria e que depois não sabia o que fazer! Não foi essa a verdadeira razão pela qual me despediste, Marcus? Não foi porque te menti, mas porque ver-me recordava-te do que tinhas feito. Sentias-te culpado por teres seduzido uma pobre virgem?

- Falas como se fosses uma vítima, Donna, e garanto-te que não o foste. Para uma menina inocente, sabias muito bem como ser provocadora. Quanto a seduzir-te... Não é essa a forma correcta de descrever o que foi um incidente lamentável.

- Um incidente lamentável? - repetiu ela com incredulidade. - Meu Deus, vou gostar muito de ter o estabelecimento de hotelaria mais famoso da cidade. Espero que os teus clientes te abandonem para vir para a minha loja!

Marcus abanou a cabeça ao mesmo tempo que se levantava.

- É uma pena, Donna! - Marcus suspirou. – Talvez tenhas mais nove anos, mas ainda tens muito para aprender. O teu plano não vai ter sucesso, acredita. -O tempo o dirá!

- Farei os possíveis para não ficar contente quando as coisas acontecerem como eu previ.

- E eu ficarei muito contente quando acontecerem como eu espero.

- Veremos.

Marcus saiu, deixando Donna, e a maioria das mulheres presentes, a olhar para ele enquanto saía.

 

                           CAPÍTULO 3

Donna pagou a conta do restaurante e foi-se embora.

Não fora o encontro que imaginara. Fora muito inocente e tola ao pensar que aquela atracção sexual se extinguira com os anos.

Caminhou rua acima, em direcção ao seu recém-com-prado futuro, até que parou à frente da fachada do But-tress. Contemplou a porta de madeira e os antigos tijolos de terracota. Eram dela.

Há muito tempo que pensava no seu novo negócio, repleto de sonhos e esperança. No entanto, naquele dia, ver Marcus obrigara-a a enfrentar o facto de aquele homem ainda a afectar de uma forma como nunca nenhum outro conseguira.

O coração voltou a bater acelerado ao pensar no seu aspecto físico. Diferente. Mais velho e mais maduro. E irradiando uma sexualidade incompatível com a sua.

A primeira vez que o vira, Marcus fora muito amável com ela. Amável e terno...

Ainda adolescente, Donna chegara a Winchester num dia chuvoso de Dezembro, vestida com calças de ganga, camisola e um velho casaco comprado numa loja de segunda mão. Estava encharcada.

Era uma semana antes do Natal e a cidade estava iluminada. Ao dar a volta a uma esquina e entrar na rua Westgate, Donna viu as luzes do hotel New Hampshire e tremeu. Era o tipo de sítio que vira em livros de história e guias, um edifício antigo e elegante cuja entrada estava enfeitada por dois loureiros em grandes suportes de vasos. Os vidros das janelas eram brilhantes e a pintura da fachada estava imaculada. Sim, lugares assim precisavam de mais empregados naquela época.

Agarrou-se à sua mala com os dedos gélidos e empurrou a porta de vidro. No hall, viu um homem no alto de um escadote a tentar pôr um enfeite na árvore de Natal, que chegava até ao tecto.

Silenciosamente, Donna deixou a sua mala no tapete e observou o homem. Ele tinha calças escuras, de aspecto novo e perfeitamente engomadas, e a camisa era de um corte delicioso. Roupa de qualidade num corpo de qualidade.

Esperou até que a estrela estivesse no seu sítio.

-Bravo!

O homem virou a cabeça, franziu o sobrolho e, devagar, desceu do escadote.

Tinha cabelo preto e espesso e uns olhos de um azul extraordinário, extremamente pálidos. Era um azul cristalino, transparente. E Donna sentiu uma emoção que nunca antes sentira.

Ele voltou a franzir o sobrolho enquanto olhava para ela de cima a baixo.

- Em que posso ajudar? - perguntou num tom que contradizia as suas palavras.

Ela enganara-se no sítio. A história da sua vida.

- Tem um quarto?

A surpresa dos olhos dele desvaneceu-se com a mesma rapidez com que aparecera. Encolheu os ombros com uma expressão de desculpa.

- Lamento muito, mas todos os quartos estão ocupados. Nesta época do ano...

- A verdade é que não quero um quarto - interrompeu-o ela rapidamente, pensando que aquele homem fora muito amável ao fingir acreditar que ela podia pagar um quarto naquele hotel quando era óbvio que não podia. - Procuro trabalho.

- Que tipo de trabalho?

-Qualquer trabalho. Posso servir às mesas... Ele abanou a cabeça.

- Lamento muito. O restaurante é de cinco estrelas...

- Ou cortar batatas. Ele sorriu.

- Não há nenhuma vaga na cozinha.

- Oh - Donna apertou os lábios, para evitar que tremessem. - Está bem, compreendo. Feliz Natal!

O homem suspirou.

- Assim fazes com que me sinta um malvado.

- Não tem aspecto de malvado - ela sorriu.

- Alguma vez fizeste camas?

- Não, mas aprendo rapidamente.

- Quantos anos tens?

- Quase vinte - e ela disse para si mesma que não mentira, apenas exagerara.

Porque aquele homem parecia o tipo de homem que a teria enviado de volta para casa se soubesse que acabava de fazer dezoito anos.

- Estiveste a viajar? - perguntou ele, olhando para o seu casaco.

-Sim.

Viajara a maior parte da sua vida e gostava pois ninguém lhe pedia nada. Todavia, apercebera-se de que ele esperava que elaborasse a sua resposta.

- Tenho uma vida um pouco nómada - explicou ela com um sorriso. - A minha mãe era actriz, portanto habituei-me a viajar desde pequena.

- Entendo - ele assentiu, perguntando-se em que confusão estava a envolver-se.

No entanto, através do vidro da porta, viu que a chuva se tornara mais intensa. Era o tipo de noite em que nem um cão devia andar na rua.

- Está bem, contrato-te até ao Ano Novo. Mas é só isso, está bem?

-Oh, obrigada!

E Donna pareceu prestes a atirar-se para os seus braços.

Marcus recuou.

Com aquele cabelo encaracolado alaranjado e o rosto pálido, não era o tipo de mulher que considerasse atraente, porém, tinha um aspecto indómito... algo que a fazia parecer pequena e valente... Havia uma alegria nela que era estranhamente apelativa e que despertava a sua ternura.

- De nada. Como te chamas?

- Donna. Donna King. E o senhor?

- Marcus Foreman. E chama-me Marcus. Sou apenas um ano Mais velho do que tu.

- Está bem, Marcus - disse ela timidamente. - És o chefe?

- Sim - disse Marcus bruscamente.

Ainda não se habituara ao facto de ser o dono do hotel. O que era natural, já que passara apenas um ano desde que o seu pai falecera. Olhou para a rapariga e as suas feições suavizaram-se.

- Tens fome?

O olhar de Donna escureceu. Seria assim tão evidente que não comia uma refeição real há semanas? O que ia ele pensar?

Marcus observou a reacção de Donna e percebeu que estava envergonhada. Assim, para que não desconfiasse da sua amabilidade, tentou aparentar indiferença.

Marcus encolheu os ombros e disse sem lhe dar importância:

- Se quiseres comer, há comida na cozinha.

- Está bem, talvez coma alguma coisa - respondeu ela, também sem lhe dar importância.

Marcus levou-a para a cozinha e apresentou-a aos empregados. Depois, observou-a dissimuladamente.

Nunca vira ninguém comer com tanto gosto, nem com tanta fome. Sobretudo uma mulher. No entanto, ela não comia como um animal, mas com delicadeza, saboreando cada bocado com um prazer imenso. E quando acabou, limpou a boca delicadamente com um guardanapo, como uma princesa, e dedicou-lhe um sorriso radiante.

E aquele sorriso atravessou a armadura de Marcus como um raio de sol projectado sobre um bloco de gelo.

A Primavera deu lugar ao Verão e Marcus não dava sinais de querer despedi-la. Donna sentia um grande alívio, porque adorava aquela cidade e o hotel e queria ficar. E, talvez, também gostasse um pouco de Marcus.

Era o primeiro lugar que considerava a sua casa. Trabalhando tanto como lhe era possível, tornara-se indispensável. E Donna sabia trabalhar. Se aprendera alguma coisa durante a sua infância era que não se conseguia nada sem esforço.

A sua mãe trabalhara como dançarina de striptease em locais de pouca categoria ao longo da costa. Trabalhava de noite e dormia de dia. Donna crescera como pudera, tentando incomodar o menos possível.

Sabia que o pai de Marcus morrera há pouco tempo. Um dia, sentira-se com coragem suficiente para lhe perguntar pela sua mãe.

Grande erro!

Os olhos de gelo entreabriram-se.

- Porquê?

- Por... nada em especial.

- Morreu há muito tempo - respondeu ele, irritado.

- E quantos anos tinhas quando morreu? Não gostou da pergunta.

- Nove e sim, antes que perguntes, foi horrível. E não quero voltar a falar do assunto, percebeste?

No entanto, Donna, de certo modo, sentiu-se aliviada, já que uma pessoa que não gostava de dar explicações era uma pessoa que não fazia demasiadas perguntas. Apesar de obviamente um homem como Marcus não estar interessado nas vidas das suas empregadas.

Contudo, por vezes, surpreendia-o a observá-la quando pensava que ela não se apercebia. E outras vezes, ria-se quando ela dizia alguma coisa. Também gostava muito de brincar sobre a palidez das suas pestanas.

Um dia, Marcus encontrara-a a jogar às cartas com um dos empregados e desafiara-a para uma partida com ele. E Marcus descobriu imediatamente que ela conseguia ganhar em todos os jogos de cartas que conheciam.

Marcus era um homem que admirava as habilidades especiais, portanto, passou a tratá-la com mais deferência. Dissera-lhe que a forma como baralhava era pura poesia e Donna sentiu-se orgulhosa.

- Onde aprendeste a jogar assim? - perguntou ele.

- Aqui e ali - respondeu ela. - Acho que não queres sabê-lo.

- Não, não quero - Marcus desatou a rir-se.

E era em momentos como aquele que Donna tinha de recordar a si mesma que havia homens pelos quais não devia sentir-se atraída.

E Marcus Foreman era um desses homens.

Marcus tinha um irmão mais novo chamado Lucas, que era quase tão bonito como ele mas muito ardiloso. E loiro, não moreno. Era uma espécie de fotógrafo e estava a viajar, na Tailândia.

No primeiro encontro que tivera com Lucas, estava de joelhos a arranjar um enorme suporte de vasos no patamar do primeiro andar e ouviu um assobio nas suas costas.

Donna virou-se e viu um homem com uns olhos azuis que pareciam os de um anjo caído. Reparou nas semelhanças imediatamente.

-Tu deves ser Lucas!

- E tu deves ser uma alucinação - murmurou ele passando a língua pelos lábios. - Uau! Vá, levanta-te!

Era o irmão do chefe. Portanto, Donna fez o que lhe pedia e levantou-se, apesar de não ter gostado do seu sorriso.

- Meu Deus! Não é de estranhar que o meu irmão não quisesse que eu voltasse para casa, é evidente que queria a Barbie só para ele.

- Lucas, nem penses, estás a ouvir? - Marcus apareceu nas costas do seu irmão.

Donna, além de bonita, era inteligente, pensou Marcus. E trabalhadora. E simpática. E atenciosa... a julgar pelo pouco que sabia dela. E não queria saber mais.

E embora fosse suficientemente sincero para admitir que desejava Donna King, também era suficientemente sincero para saber que procediam de mundos completamente diferentes.

Lucas olhou para Donna com uma expressão inocente.

- Marcus gosta de agir como um macho comigo -sorriu.

- Donna, por favor, deixa isso e vai-te embora -disse Marcus, já que ela se baixara para apanhar a terra que ficava no chão.

-Mas...

-Vai-te embora!

Donna endireitou-se, alisou o uniforme cinzento-claro e depois sorriu para Marcus.

- Continua de pé a partida desta noite? As pupilas de Lucas dilataram-se.

- Que partida?

- Não, esta noite não - respondeu Marcus tensa-mente. - Vá lá, Donna, vai-te embora. Quero falar com Lucas em privado.

Mais tarde, Marcus apercebera-se de que o pior que podia ter feito fora ordenar a Lucas que não se aproximasse da espantosa empregada. Não havia nada que o seu irmão gostasse mais do que do fruto proibido.

Porém... que alternativa tivera? Nem por um momento lhe passara pela cabeça que ela fosse virgem, apesar de ter um certo ar de inocência.

Era uma combinação irresistível que o mantinha acordado à noite, suado e excitado.

Donna reparou em como os irmãos eram diferentes. Marcus era o sério, o responsável. Lucas era um aventureiro. Enquanto Marcus não parecia interessado na sua vida, Lucas queria saber tudo sobre ela.

Lucas era muito aberto com ela, ao contrário do seu irmão. Falou-lhe acerca da sua infância e da de Marcus, da sua bonita e louca mãe, tão diferente do seu pouco imaginativo pai.

Lucas chegava a ser indiscreto, reparou Donna. Não se importava de falar sobre as infidelidades da sua mãe nem das discussões dos seus pais. Explicou-lhe que o seu pai estava tão apaixonado que nunca a abandonara.

De facto, contara-lhe coisas que Donna sabia que devia ter mantido em segredo. E, talvez por isso, Donna lhe contara a verdade sobre a sua própria mãe.

Lucas não parecera escandalizado, limitando-se a olhar para ela e dizer:

- Sim, entendo que se despisse em público... Se o seu corpo era parecido com o teu.

Donna percebeu que devia ter sido mais discreta.

- Não vais contar a Marcus, pois não? - suplicou-lhe ela.

- Porquê?

- Por favor!

- Está bem. É melhor não escandalizarmos o meu irmão. Ele gosta de ti, não é verdade?

Donna abanou a cabeça.

- Só para jogar às cartas.

- Não me parece - respondeu Lucas. - Marcus antes jogava bridge com o pároco e nunca olhava para ele como olha para ti.

Lucas não estava a dizer nada que Donna não tivesse reparado. Parecia que Marcus gostava dela. A forma como por vezes olhava para ela... com uma espécie de paixão intensa que fazia com que se perguntasse por que motivo Marcus não parava de se conter e a apertava entre os seus braços...

Sabia exactamente porquê. Não eram iguais. Ele era o chefe e ela, a empregada e era melhor não o esquecer, já que Marcus não o esquecia.

Donna viu que o hotel se tornava mais e mais famoso. Toda a gente queria comer no restaurante e transformou-se no local da moda. Actores famosos iam de Londres para jantar e passar a noite num dos luxuosos quartos.

Uma noite, um famoso crítico culinário foi ao restaurante para jantar para depois escrever uma crítica no jornal sobre o restaurante. Todos os empregados se esforçaram ao máximo e contiveram a respiração até à primeira edição do jornal onde se qualificava o estabelecimento como «o melhor e mais desconhecido restaurante do sul de Inglaterra».

Não por muito mais tempo!

Choveram telefonemas para reservar mesa e Mar-cus anunciou que ia oferecer um jantar de agradecimento a todo o pessoal do estabelecimento na sala de jantar privada do hotel.

Donna vestira a única coisa que tinha apropriada para a ocasião: um vestido de veludo preto que comprara numa loja de segunda mão. Estava fora de moda e era demasiado sério para ela, porém, assentava-lhe muito bem. Também usou um colar de pedras de âmbar que combinava com a cor do seu cabelo.

Bebeu champanhe e soltou o cabelo, literal e figurativamente. Dançou com cozinheiros e empregados ao som da música de fundo, consciente de que Marcus a observava.

E Donna era filha da sua mãe; dançava de forma fenomenal.

Marcus não conseguia tirar os olhos de cima dela. Nunca desejara nada nem ninguém com tanto desespero. E depois do café, rendeu-se e sentou-se ao lado dela.

- Olá, Donna! - Marcus sorriu. -Olá!

- Estás a divertir-te? -Hum!

Agora sim!

Marcus tocou numa das pedras de âmbar com a ponta de um dedo.

- Estas pedras são lindas - disse ele com voz suave. - Quem te deu o colar?

- A minha mãe.

- Tem um gosto excelente.

Donna sorriu.

- A verdade é que me deu o colar porque pensava que as contas eram de plástico. Tem graça, não é verdade? Era a única coisa de valor que possuía, mas não sabia. Usava sempre bijutaria.

- E onde está a tua mãe agora? A representar uma obra de Shakespeare em algum sítio?

Donna franziu o nariz. Não queria falar sobre nada, e muito menos de coisas que inventara. A única coisa que queria era que Marcus a beijasse.

- Não, deixou a profissão de actriz! Agora tem uma pensão na costa.

- Em que parte da costa?

Donna proferiu uma gargalhada cínica.

- Num sítio em que tu jamais porias os pés, Marcus. Aquela gargalhada tinha um eco sombrio e Marcus

vislumbrou momentaneamente outro mundo. Viu tudo. Uma praia rochosa e ovos fritos gordurosos num prato. Rodas de carros, gritos de crianças e um cheiro rançoso a batatas fritas. Não, não queria fazer parte daquele mundo.

Se não desejasse tanto Donna...

- Estás... - passeou o olhar pelo veludo preto e foi incapaz de pronunciar uma palavra.

O sorriso e a forma como olhava para ela fizeram com que Donna esquecesse toda a precaução. Olhou para ele provocantemente por cima da taça de champanhe.

- Como estou, Marcus?

- Absolutamente irresistível - respondeu ele com toda a sinceridade.

-Meu Deus!

Donna desejava-o, morria por ele, amava-o. Sabia que nunca teria outra oportunidade como aquela. Inclinou-se para ele e deu-lhe um beijo na boca.

Marcus quase a apertou nos seus braços, ali e naquele momento, contudo, lembrou-se a tempo de que todos os seus empregados estavam a vê-los.

- Deixemo-lo para depois - sussurrou ele.

- O que deixaremos para depois? - brincou ela.

- Isso depende. O que te parece se começarmos com um beijo e vemos para onde nos leva?

- Hum! - Donna riu-se. - Avisa-me quando estiveres pronto!

E Marcus reparou que não estava nervosa. Além disso, Donna tinha vinte anos, portanto não estava a aproveitar-se de uma rapariga mais nova. Gostavam um do outro e era tudo. Ele começara a confiar nela e a vida era demasiado curta.

- Não te preocupes, avisarei. Podes apostar que o farei, querida.

Quando Donna foi à casa de banho, para se ver ao espelho, reparou que tinha o rosto corado e que os seus olhos brilhavam como diamantes. Pôs água fria nos pulsos e retocou os caracóis. Quando estava a caminho da sala de jantar, uma figura apareceu entre as sombras.

- Donna.

-Lucas! Lucas, assustaste-me!

- Estás um pouco nervosa, não? - observou ele. - O meu irmão esteve atrás de ti como um cão a noite toda.

Donna franziu o sobrolho.

- Lucas, estás bêbado?

- Um pouco, mas não completamente - olhou para o tecto e suspirou. - Sinto claustrofobia, preciso de sair daqui. Donna, empresta-me dinheiro.

- Nem pensar! Ainda não me devolveste o último empréstimo que te fiz.

Donna começou a andar, contudo, Lucas parou-a.

- Não achas que ele ficaria zangado se descobrisse a verdade? - perguntou Lucas.

Donna ficou imóvel. -A que... te referes? Lucas encolheu os ombros.

- Refiro-me ao facto de nunca teres conhecido o teu pai. E que a tua mãe ganhava a vida a despir-se. E que passaste a vida a andar de um lado para o outro - fez uma pausa para dar mais ênfase às suas palavras. -Marcus é uma pessoa muito convencional, Donna, ficaria escandalizado. Queres que continue?

- Estás a tentar chantagear-me, Lucas?

- Não sejas melodramática. Estou a pedir um favor, é só isso... Se queres que eu seja discreto.

Donna olhou fixamente para ele, angustiada ao perceber que Lucas podia estragar tudo.

- Quanto dinheiro queres?

- Não muito, vinte libras.

- Espera aqui, vou buscar a minha mala. Quando voltou para a sala de jantar, viu Marcus à

mesa sozinho, a olhar para ela com intensidade enquanto ela se aproximava. E Donna esqueceu-se de Lucas.

Marcus perdeu a batalha com a sua consciência e parou de lutar. Foi até ao quarto de Donna e, ver aquele quarto minúsculo, intensificou o seu sentimento de culpa. No entanto, vê-la nua em cima da colcha dourada fez com que enlouquecesse de desejo.

Contudo, o acto de amor foi um desastre: doloroso e incômodo para ela e demasiado rápido para ele.

Marcus ficou acordado a olhar para ao tecto, suspeitando que Donna estava a fingir que estava a dormir, no entanto, era-lhe impossível falar com ela. Era a primeira vez na sua vida que fracassava, porém, descobriu que não desejava dar-lhe o prazer que sabia que o seu bonito corpo merecia.

Supostamente, devia ter sido uma aventura de uma noite, mais nada. Nesse caso, por que demônios Donna escondera a sua virgindade? Se soubesse, nunca lhe teria tocado.

Saiu silenciosamente da cama, vestiu as calças de ganga e a t-shirt e foi até à cozinha, onde encontrou Lucas, a beber uma cerveja, embriagado.

Lucas sorriu.

- Bom, foste para a cama com ela?

- Com quem?

- Com Donna. Cuidado, Marcus, por pouco não foste para a cama com uma menor.

Marcus ficou gelado.

- Tem vinte anos.

- Não, só tem dezoito - Lucas bebeu um gole de cerveja. - Sabias que a mãe dela ganhava a vida a despir-se em locais de reputação duvidosa?

Aquilo foi o final e a desculpa que Marcus precisava.

No dia seguinte, despediu-a.

Donna abriu a porta e olhou rua abaixo. Conseguia ver as luzes do hotel New Hampshire. Se Marcus estivesse à janela, poderiam ter-se cumprimentado com a mão.

No entanto, não era muito provável que acontecesse.

Voltar àquela cidade era um passo lógico. Era um lugar perfeito e seria um negócio perfeito. No entanto, Donna perguntou-se como podia ter ignorado um factor tão importante na equação como Marcus Foreman.

Pensara que a atracção teria desaparecido. Pois não, enganara-se. E muito.

A questão era... o que podia fazer? Conseguiria ignorá-lo? Conseguiria ignorar a sua existência?

Uma nuvem cobriu o sol e Donna tremeu com a sensação de que tinha um assunto pendente.

 

                               CAPÍTULO 4

Donna estivera ocupada durante a semana seguinte com os preparativos do salão de chá, por isso conseguira esquecer Marcus. Havia tanto para fazer; o pedido dos arranjos florais, a organização dos empregados, a publicidade... E o telefone não parava de tocar.

Estava sentada no seu minúsculo escritório, a desenhar chaleiras minúsculas para o menu, quando ouviu alguns golpes na porta antes de uma rapariga morena de cabelos frisados espreitar.

- Donna.

- Sim, Sarah, entra - Donna sorriu à sua nova empregada. - Não posso acreditar que vamos abrir amanhã. Diz-me que não estou a sonhar!

- Não estás a sonhar - respondeu Sarah obedientemente. -Ah, e a senhora Armstrong...

Donna pestanejou. -Quem?

- A mulher do Presidente da Câmara. Acabou de telefonar a dizer que ela e o marido estarão presentes amanhã na inauguração. Portanto acrescentei-os à lista.

- Óptimo. Esperemos que caibam todos!

Sarah aproximou-se da secretária e, baixando o tom de voz, acrescentou:

- Ah, e está um homem na recepção que quer falar contigo.

- Deve ser o fotógrafo do Hampshire Times - respondeu Donna, pensando em como a sua jovem empregada estava bonita com aquele uniforme creme.

Encontrara Sarah Flowers sem dinheiro, com fome e com vontade de aprender, tal como ela nove anos atrás. Na verdade, colocara um anúncio a oferecer um emprego na montra de uma loja local com o objectivo de empregar pessoas que realmente precisassem de trabalhar, já que essas eram as pessoas mais eficientes. Ninguém sabia melhor do que ela.

Olhou para o relógio e franziu o sobrolho.

- Vem um pouco cedo, não? Pensei que só viria depois do meio-dia.

- Não é o fotógrafo - disse Sarah com voz afogada.

- Então quem é?

- Marcus... Marcus Foreman!

- Diz-lhe que estou ocupada. Ele que venha amanhã se quiser.

- Já lhe disse, mas respondeu que não vai sair daqui sem falar contigo.

- Ah, sim? - Donna levantou-se com uma mistura de exasperação e excitação.

Rapidamente, olhou-se ao espelho, saiu do escritório e foi até ao hall, onde encontrou Marcus, sentado num dos sofás de couro.

Ele não se mexeu, ficou sentado, a olhar para ela com uma certa insolência.

Marcus estivera a perguntar-se por que razão não conseguira resistir à tentação de ir visitá-la. Agora, a razão estava à sua frente. Estava tão bonita! Sensual e com um ar de professora de escola, com um vestido cor de chocolate abotoado até ao pescoço e o colar de pedras de âmbar.

Sempre tivera as pernas tão compridas? Ou eram resultado dos saltos de dez centímetros? E que outra mulher conseguia usar o cabelo daquela forma e estar tão sensual?

- Olá, Marcus! - cumprimentou Donna calmamente, apesar de se sentir trémula e estranha. - É um prazer inesperado.

- Di-lo outra vez, mas com mais convicção - comentou ele num tom brincalhão.

Ela esboçou um sorriso.

- Lamento muito, mas não tenho tempo para receber visitas.

Marcus levantou-se em silêncio e Donna reparou que, mesmo com saltos altos, Marcus parecia um gigante ao seu lado.

- Então arranja tempo - disse ele em voz baixa. Donna enfrentou o seu olhar de desafio.

- E se não o fizer?

- Se não o fizeres, ficarei aqui sentado a distrair-te o dia todo.

- E eu ignoro-te.

- Não, impossível. Mas podes tentar. E fracassaria. Porque um homem como Marcus era

impossível de ignorar.

Tinha uma camisa de seda preta e umas calças de ganga também pretas e tinha um aspecto fenomenal. Apesar de já não ter vinte anos, Donna supôs que a maioria dos jovens daria qualquer coisa para ter um corpo como o de Marcus.

- Vá lá, Donna, considera-o um interesse profissional. A única coisa que quero é ver o que tens para oferecer.

Por que demônios aquilo parecia uma indirecta sexual? Fora essa a intenção de Marcus? Donna recusou-se a enfrentar o seu olhar mais um segundo e cravou os olhos no seu peito.

- Abrimos amanhã - disse ela com agitação. - Vamos organizar uma festa de inauguração. Acho que o sabes porque te enviei um convite. Ou não o recebeste?

- Sim, recebi-o há alguns dias.

- Ficaste surpreendido... por te ter convidado?

- Um pouco. Não pensei que fosse o teu número um na lista de convidados...

- Não foste. Foste o cento e um.

- Nesse caso, porque te incomodaste?

- Porque suspeitava que chegarias ao extremo de te disfarçares para dares uma vista de olhos, portanto decidi poupar-te o incómodo.

- Que amabilidade da tua parte.

- A sério?

- Apesar de achar que me convidaste porque querias vangloriar-te, não é verdade? - sugeriu ele.

- Talvez também tenha sido um pouco por isso. Não podes reprovar-me por o fazer, Marcus.

- Não — respondeu ele devagar, olhando à sua volta.

- Não, não posso.

- Bom, vens amanhã ou não?

O sorriso de Donna fazia com que o seu corpo doesse em partes que não devia.

- Vou pensar.

- Terás a oportunidade perfeita para examinar o salão.

- Não, não é verdade - respondeu Marcus. Tivera problemas de insónia nos últimos dias e

não gostava. Olhou furioso para a causa da sua insónia.

- Amanhã, vais ter a cidade inteira a elogiar-te -disse Marcus. - Vais trocar menos de dez palavras com cada um e, certamente, não vais conseguir dedicar a ninguém atenção exclusiva. E eu quero atenção exclusiva, Donna.

- Sim? E consegues sempre o que queres?

- Normalmente sim - os olhos azuis endureceram-se. - Embora nem sempre. A sinceridade é uma coisa muito difícil de encontrar, não é, Donna? Sobretudo no que diz respeito a empregar pessoal.

- Oh! - exclamou ela sarcasticamente. - Referes-te a mim com esse comentário, Marcus?

Marcus encolheu os ombros.

- Digamos que me seria difícil dar boas referências sobre ti.

- Nesse caso, é uma sorte não precisar de referências tuas!

Donna percebeu que Marcus falara a sério ao dizer que não tinha intenção de sair sem ver o estabelecimento, portanto, porque não ceder e acabar com a situação o quanto antes?

- Está bem, Marcus, ganhaste - Donna suspirou. -Vem comigo e mostrar-te-ei o estabelecimento. O que queres ver primeiro?

- O que tu quiseres mostrar-me, não sou exigente.

- Pode ser a cozinha? - perguntou ela.

Donna sentia os batimentos do seu coração enquanto Marcus a seguia até à cozinha.

- Muito bem equipada - comentou ele, passando a mão por um gigantesco forno de aço inoxidável. - E de primeira qualidade. Um grande investimento.

- E necessário. Vamos preparar todo o tipo de produtos de confeitaria.

Marcus olhou para ela fixamente.

- Não estás a pensar em fazê-lo sozinha, pois não?

- Sim, claro - respondeu ela. - Além de limpar, fazer os pedidos, servir às mesas e organizar a contabilidade. Não sejas idiota, Marcus! É óbvio que vou ter empregados.

- Quantos?

- Bom, para começar, dois. Uma empregada... Sarah, a rapariga que te recebeu, lembras-te?

- Vagamente.

- E Ally Lawson, a mulher que vai ajudar-me na

cozinha.

Marcus franziu o sobrolho.

- Vais ter capacidade para quantos clientes?

- Trinta pessoas cá dentro e outras trinta no jardim, apesar de evidentemente o jardim só ser usado quando estiver bom tempo.

- Nesse caso, não tens pessoal suficiente - informou Marcus.

Donna não gostou de ouvir o seu conselho, apesar de saber que Marcus tinha razão.

- Eu sei, não sou completamente idiota. Durante o Verão, na temporada alta, farei contratos temporários. Há uma série de estudantes que precisa de trabalho durante as férias - Donna engoliu o desejo de ouvir Marcus a elogiá-la. - Vamos. Vou mostrar-te o salão.

- O salão - repetiu Marcus quando Donna abriu uma porta e entraram numa divisão de tecto baixo com vigas de madeira.

Marcus pensou que viajara no tempo; a sala tinha madeira escura e cheirava a cera. Todas as mesas estavam cobertas por uma toalha branca, com renda, e por cima havia chaleiras brilhantes de cobre e antigos vasos com campainhas azuis.

Donna estava orgulhosa do que conseguira e Marcus Foreman era um homem respeitado na hotelaria. A sua opinião tinha peso.

- Bom, o que te parece?

- Antigo e conservador - respondeu ele com franqueza.

- Naturalmente que é conservador, o chá da tarde é um ritual conservador! As pessoas que vêm para Winchester ver as ruas antigas, a catedral e a casa de Jane Austen não esperam entrar num estabelecimento ultra-moderno onde lhes sirvam sushi ou saladas de três tipos de feijões! O que querem é um chá com bolos caseiros, iguais aos que as suas mães costumavam fazer antigamente!

Marcus, com uma percepção cruel, abriu muito os olhos.

- Isso era o que a tua mãe costumava fazer? Donna corou e depois odiou-se por o ter feito. E

pensou na crueldade de Marcus.

- Sabes perfeitamente que não! Marcus abanou a cabeça.

- Aí é que te enganas, querida, não sei. Não sei nada. Pensei que a tua mãe era uma actriz nobre e dedicada porque foi isso que tu me disseste que ela era.

- E tinha motivos para o dizer, tendo em conta a forma como reagiste quando descobriste. Julgas as pessoas com demasiada facilidade, Marcus!

- Admito que fiquei surpreendido ao descobrir que se despia e remexia a pélvis à frente dos homens - respondeu Marcus, ignorando as palavras de Donna.

- E estranhas que não to tenha contado? - perguntou ela com voz trêmula. - Marcus, não tinhas nem tens imaginação para ver que era a única alternativa que a minha mãe tinha! Era uma mãe solteira!

- Não era a única alternativa, Donna. Há milhares de mães solteiras que não são bailarinas de striptease. Há muitos empregos disponíveis.

- Eu não tenho vergonha da minha mãe nem do que ela fazia para ganhar a vida! - declarou Donna com orgulho. - E nada do que digas poderá fazer com que tenha vergonha dela! Apesar de poder parecer que não foi o caminho mais recto, a minha mãe não era promíscua.

Donna fez uma pausa e, tremendo, respirou fundo.

- A minha mãe não estava interessada nos homens, porque sofreu muito quando o meu pai a abandonou. E eu não cresci rodeada de «padrastos». A minha mãe era uma mulher de princípios e não gastou o dinheiro como muitas das suas companheiras. E, quando juntou dinheiro suficiente, abriu uma...

- Uma pensão que, uma vez, mencionaste num tom

de desprezo?

- Sim, é verdade! - exclamou ela. - Mas foi porque naquela altura eu não tinha idade para reconhecer o quanto a minha mãe trabalhou nem os sacrifícios que fez.

Marcus viu-a a pestanejar rapidamente e sentiu-se mal. De repente, descobriu que queria apertá-la nos seus braços e acariciar aqueles cabelos de fogo. No entanto, em vez de o fazer, agarrou num dos menus.

- E o que faz a tua mãe agora?

- Morreu há dois anos e meio. E foi o dinheiro da venda da pensão que me permitiu comprar esta propriedade.

-Donna, eu...

- Não, não! - exclamou ela apaixonadamente. -Não me digas que lamentas, Marcus, porque sei que não é verdade!

- Ouve-me - disse-lhe ele com uma voz igualmente apaixonada. - É óbvio que lamento que tenha morrido! Eu também perdi a minha mãe quando era pequeno e sei o quanto magoa.

- Está bem, obrigada - respondeu Donna tensa-mente.

- Não fiques tão surpreendida, não sou assim tão insensível.

- Não, só disfarças muito bem, não é verdade? Marcus desatou a rir-se e sentiu o quanto desejava

beijá-la. Há muito tempo que desejava beijar aquela mulher.

Donna olhou para ele e a sua coragem abandonou-a ao perceber como desejava aquele homem.

E porque estava a olhar para ela daquela forma? Como se quisesse comê-la ao pequeno-almoço...

Marcus olhou para ela nos olhos. Parecia tão fria e com um ar de superioridade...

- Ainda não perguntaste pelo meu irmão - comentou Marcus. - Surpreende-me muito, já que tu e Lucas eram muito amigos.

- Lucas tinha sempre tempo para conversar comigo, se é a isso que te referes. Como está ele?

Marcus sorriu.

- Que estranho não terem continuado em contacto, não é? Lucas sabia tudo sobre ti e a vossa relação era tão íntima...

- Nunca tive relações íntimas com o teu irmão!

- Claro que sim. Falavam das vossas vidas, dos vossos segredos... Mas, caso não saibas, as pessoas não tem de ir para a cama com alguém para gozar de intimidade.

Donna surpreendeu-se ao perceber que estava disposta a soltar o seu próprio veneno.

- Surpreende-me que queiras tocar no assunto da intimidade, Marcus.

- Ah! Tem cuidado, Donna. Se vais acusar um homem de ser um desastre na cama, vais feri-lo onde mais dói.

- No orgulho? Ou no ego?

- Estava a pensar em algo mais básico do que isso, querida. Desafia um homem dessa forma e ele responderá da única forma que pode responder: exigindo uma repetição da actuação. O que achas, Donna, queres repetir? Com um pouco de sorte, o resultado será mutuamente satisfatório desta vez.

Donna ficou imóvel. Ignorou a pergunta e as implicações... apesar de se perguntar como reagiria se Marcus a apertasse nos seus braços naquele momento.

- Pensei que estávamos a falar sobre Lucas.

-Ah, sim, Lucas.

Marcus sorriu, surpreendendo-a. Foi um sorriso carinhoso de irmão mais velho.

- Bom, Lucas está muito bem, apesar de nos ter surpreendido a todos. Andou por aí com a sua máquina fotográfica, chegou à América do Sul e, por estranho que pareça, apaixonou-se.

- E o que tem isso de estranho?

- Nada, só que Lucas nunca tinha sido fiel a uma mulher. Casou-se com Rosa e agora é o pai orgulhoso de dois meninos gémeos. Montou um estúdio fotográfico em Caracas e tira fotografias de casamento, baptismos e essas coisas, além de fotografias de estúdio. E parece muito satisfeito.

- Meu Deus! - exclamou Donna, surpreendida.

- Desiludida?

- Não digas tolices. Mas é difícil imaginar Lucas casado e pai. Era demasiado inquieto para estar satisfeito.

- O que o amor de uma boa mulher consegue! É uma pena que tu não o tenhas conseguido.

- Eu nunca desejei o teu irmão.

- Mas ele desejava-te.

- É possível, mas isso não tinha nada a ver comigo. Lucas sabia que não estava interessada nele nesse sentido.

Marcus abanou a cabeça.

- Usaste-me a mim e ao meu irmão, Donna. Sabes perfeitamente que o fizeste. Era a mim a quem dedicavas olhares insinuantes, mas era com Lucas que falavas sobre a tua vida, não era?

Donna, confusa, franziu o sobrolho.

- Tu é que querias manter as distâncias, Marcus! -protestou ela. - Pelo menos, comigo. Sabes que é verdade. Nunca permitiste que falássemos sobre assuntos pessoais e sempre deixaste muito claro que tu eras o chefe.

- Não funcionou - comentou Marcus com alguma amargura. - Pelo menos, não contigo.

Marcus abanou a cabeça antes de acrescentar:

- Pensei que tinhas experiência sexual, Donna. Quando descobri que eras virgem... não podia acreditar! Fiquei atónito.

- Não gostaste, pois não?

- Não - respondeu ele com sinceridade. A resposta de Marcus magoou-a.

- Pensei que ser o primeiro amante de uma mulher era o sonho de todos os homens.

- Não deste homem.

Donna não lhe perguntou porquê, já que fazia uma idéia. As virgens eram raparigas reprimidas. O tipo de raparigas com quem os homens acabavam por se casar, não o tipo de raparigas com quem se tinha uma aventura de uma noite.

Donna observou-o, hipnotizada pela beleza daqueles olhos azuis.

- Bom, Marcus, o que é que queres? Porque vieste? Marcus franziu o sobrolho. Donna não sabia? Não

adivinhava? O que queria era apagar da sua memória o fantasma daquela noite e substituí-lo por algo que a deixasse a arder de desejo.

- O que aconteceu às tuas sardas?

- Sardas? - perguntou ela, suspeitando da repentina mudança de conversa.

- Sim, as minúsculas manchas castanhas que tinhas na cara.

- Deixei de apanhar sol - respondeu Donna. Marcus ficou em silêncio durante um momento,

com os olhos fixos naquele rosto pálido e suave e sentiu-se invadido por um desejo nostálgico.

Sem pensar, humedeceu os lábios com a ponta da língua e surpreendeu Donna a seguir o seu movimento com o olhar.

- Estás com fome? - perguntou ela. - Não estás a alimentar-te bem?

- Porquê? Estás a convidar-me? Donna ignorou as suas palavras.

- Marcus, acho que está na hora de te ires embora. Já viste tudo o que há para ver.

- Ainda não vi o jardim.

- Vais ver amanhã - Donna olhou para os olhos dele. - Vens?

- Não faltaria por nada deste mundo - murmurou Marcus.

 

                             CAPÍTULO 5

- Donna, fizeste milagres com este lugar!

Donna sorriu educadamente à esposa do Presidente da Câmara, pensando que também era um milagre que aquela mulher se agüentasse em pé depois de tudo o que comera.

- Obrigada, senhora Armstrong. Apetece-lhe outra chávena de chá?

- Oh, obrigada, querida. A verdade é que a última fatia de bolo me deixou com muita sede.

- Vou buscar-lhe o chá - disse Donna. Atravessou a sala de jantar, sorrindo para os seus

convidados e reparando, com satisfação, que todas as mesas estavam ocupadas. À frente da porta da cozinha tropeçou com Ally, que saía com uma bandeja de bolos nas mãos.

- O que achas? - perguntou-lhe Donna em voz baixa. - Achas que estamos a ter sucesso?

- É claro! - Ally riu-se. - Quando se forem embora, poderás descansar deitada sobre os teus louros.

- Não estão com muita vontade de sair, pois não? -perguntou Donna.

- Não, mas não acho que devamos queixar-nos disso. A maioria das pessoas no negócio da hotelaria tem problemas para fazer com que os clientes entrem, não que saiam. Bom, vou dar de comer aos famintos. Até mais tarde - disse Ally.

Na cozinha, Sarah estava ocupada a colocar bolos em bonitas travessas de porcelana. Ao ver Donna, levantou os olhos para o tecto.

- Quantas pessoas convidaste? Ninguém pensou em não vir?

- Só algumas pessoas - respondeu Donna despreocupadamente. - Ninguém importante.

Tentou convencer-se de que não estava desiludida com a ausência de Marcus. No entanto, por que razão olhava para a porta sempre que o sino soava?

De qualquer modo, a inauguração do estabelecimento fora um grande sucesso.

Quando finalmente todos os convidados saíram. Donna, Ally e Sarah levantaram as mesas, esfregaram e varreram o chão da cozinha. Depois, as três mulheres sentaram-se à volta de uma mesa e felicitaram-se.

- Não era suposto vir aquele homem? - perguntou Sarah.

- Um homem? - perguntou Ally, fingindo surpresa. - Ouvi a palavra «homem»?

Donna gostava muito de Ally e ficara contente por lhe ter dado o trabalho. Era uma loira atraente com trinta e três anos. O seu marido deixara-a e à sua filha Charlotte de cinco anos, por uma mulher que conhecera no bar de um hotel.

- De que homem estão a falar? - insistiu Ally, olhando à sua volta como se esperasse que, a qualquer momento, aparecesse um membro do sexo oposto.

- Do amigo de Donna - respondeu Sarah. - Um alto, bonito e moreno. Mas não veio.

- Não é meu amigo! - protestou Donna. - Nem sequer gosto dele.

- Não? - perguntou Sarah, sem disfarçar a sua incredulidade. - Nesse caso, porque é que ontem quando ele apareceu ficaste corada?

Donna suspirou.

- Porque trabalhei para ele há alguns anos. E não estava corada.

- Tem nome? - perguntou Ally.

- Sim, Foreman - respondeu Donna com desinteresse.

Ally aumentou os olhos.

- Referes-te a Marcus Foreman?

- O próprio. -Hum! Comoé? Donna hesitou. -É...

- Vê por ti mesma, está ali - disse Sarah dissimula-damente.

Donna levantou o olhar e viu Marcus na soleira da porta. Um raio de sol iluminava a sua cabeça, dando-lhe o aspecto de um anjo moreno.

Os seus olhares encontraram-se e ele sorriu, e algo extraordinário aconteceu a Donna enquanto Marcus caminhava na sua direcção. Era como entrar num lugar quente depois de ter estado a caminhar pela neve. Era como se o mundo, de repente, fizesse sentido.

- Olá, Marcus! - cumprimentou ela fracamente.

- Olá, Donna! Como foi a inauguração?

- Se tivesses vindo, terias visto por ti mesmo. Marcus considerou aquela resposta estimulante, o

que não era de estranhar, já que tudo em Donna era estimulante; sobretudo com aquele uniforme preto e o avental branco.

- Disseste que ias mostrar-me o jardim, ou esqueceste-te? - Marcus sorriu às outras duas mulheres. -Mas acho que antes devias apresentar-me.

- Sarah Flowers. Ally Lawson. Este é Marcus Foreman.

Sarah e Ally levantaram-se das suas cadeiras ao mesmo tempo.

- Passei mil vezes à frente do seu hotel! - comentou Sarah. - Mas claro, nunca comi lá.

- Porquê? - perguntou Marcus. Ally decidiu ajudar Sarah.

- É um pouco caro. Marcus sorriu.

- Muitas vezes, as pessoas descobrem que é menos caro do que imaginavam. Na verdade, os preços são comparáveis aos de outros restaurantes com menos categoria. Vamos fazer o seguinte; uma segunda ou terça-feira à noite, quando há menos gente, vão lá jantar e podem levar acompanhante.

-Ah, obrigada! - exclamou Sarah.

- Sim, muitíssimo obrigada! - exclamou Ally. Depois foram-se embora e Donna acompanhou-as

até à porta para se despedir.

Fechou a porta e voltou para a sala de jantar, encontrando Marcus no mesmo sítio onde o deixara. Sentiu um aperto no coração.

- Foste muito amável ao convidar Ally e Sarah para jantar.

Marcus arqueou o sobrolho.

- Não sei porque te surpreende tanto.

- A verdade é que não me surpreende. Gostas de representar o papel de benfeitor... Fizeste-o comigo.

- Tens a habilidade de fazer com que um gesto amável pareça uma ofensa, Donna.

- A sério? Lamento muito.

Donna não sabia se ficar de pé ou sentar-se. Estava incomodada.

- Ainda não me disseste como correu.

- Eu sei - Donna olhou para ele nos olhos. - Mas tu não vieste por isso, pois não, Marcus? Se estivesses tão interessado no futuro do meu negócio, terias vindo antes, como o resto dos convidados.

Marcus sorriu ironicamente.

- Sim, suponho que é verdade.

- Nesse caso, porque vieste?

- Queres saber a verdade? Ela assentiu.

- Não precisas que eu o diga, Donna. Sabes perfeitamente - os olhos de Marcus nunca tinham estado tão azuis. - Quero fazer amor contigo.

Donna ficou boquiaberta.

- Marcus!

Ele abanou a cabeça.

- Se não quisesses que isto acontecesse, não devias ter voltado - disse ele em voz baixa e as suas palavras pareciam doces carícias. - Há nove anos estragámos tudo... E agora quero a oportunidade de me redimir.

- Entendo - respondeu ela com uma enorme desilusão. O que esperara, uma declaração de amor? - Sou a única amante que tiveste com quem não tiveste uma nota alta na tua actuação? É isso?

- Não. Quero desfazer-me de um desejo que se recusa a desaparecer. Olha-me nos olhos, Donna, e com sinceridade diz-me que não me desejas tanto como eu a ti. Di-lo e sairei daqui.

No entanto, Donna não conseguiu.

Oxalá Marcus pudesse fazer-lhe a vontade, dizendo-lhe que nunca conseguira parar de pensar nela, que não podia viver sem ela. Porém, Marcus era um homem sincero e, no seu mundo, tudo era preto ou branco.

- Não faças isto, Marcus - sussurrou Donna. - Por favor. Não consigo lutar contra ti.

- Não quero que lutes contra mim - respondeu ele, também num sussurro. - Quero que te rendas aos teus desejos.

Os olhos de Marcus obscureceram-se e, inesperadamente, levantou a mão para lhe acariciar o cabelo.

- Incrível. Nunca conheci uma mulher com um cabelo como o teu, Donna. É como o fogo. Porque não me beijas? Vá lá, querida, beija-me.

Durante anos, Donna levantara uma muralha à volta do seu coração, contudo, Marcus estava a derrubá-la em alguns segundos.

- Não podemos fazê-lo.

- Não concordo e tu também não. Vejo-o nos teus olhos... e no teu corpo.

Marcus passeou o olhar pelo uniforme de cetim preto que escondia as curvas irresistíveis de Donna. Por debaixo da fina malha, viu os seus mamilos excitados.

- Olha para ti, se não acreditas em mim.

Donna baixou o olhar e viu os seus seios inchados. Com um gesto protector, pôs as mãos no pescoço e viu que os seus dedos tremiam.

E ele também viu. E sorriu.

- Sim, precisamente o que eu pensava.

Marcus pegou na mão dela, entrelaçou os seus dedos com os dela e pôs a mão de Donna sobre o seu coração.

- Consegues senti-lo?

No entanto, Donna não conseguiu responder. Nem olhar para ele. A única coisa que conseguia fazer era sentir os batimentos daquele coração.

Finalmente, Donna levantou o rosto e olhou para ele nos olhos com uma expressão hesitante e apaixonada.

- Beija-me, Donna - insistiu ele. - Sabes que queres fazê-lo.

- Às vezes também quero comer mais gelado do que devia, o que não significa que vá fazê-lo.

Sem aviso prévio, Marcus baixou a cabeça e esmagou-lhe os lábios com os seus. A última vez que ele a beijara ela sentira-se como uma noviça nos seus braços, porém, daquela vez não.

Donna abriu os lábios, tremeu e perdeu-se no poder erótico daquele beijo.

- Isso... não foi justo! - ela ofegou.

- Talvez não, mas soube muito bem, não foi? -murmurou Marcus. - Sei o que queres. Talvez sempre tenha sabido. Há nove anos, fui demasiado egoísta. Agora, quero compensar-te.

Marcus pôs as mãos nas nádegas de Donna, atrain-do-a para si, e ela gemeu ao sentir a sua força.

- Desta vez, vou devagar.

- Marcus...

Marcus beijou-lhe o pescoço e o queixo.

- Vou fazer com que grites o meu nome. Vou dar-te tanto prazer que, no final, vais acabar por rogar que eu pare.

Donna não podia acreditar que Marcus estivesse a dizer aquilo e também não podia acreditar em como estava a excitá-la, fazendo com que gemesse por uma coisa que não sabia o que era.

Marcus levantou a cabeça com os olhos brilhantes.

- O que se passa?

- Não sei - respondeu Donna, quase a chorar. Marcus começou a levantar-lhe a saia do uniforme e ela sentiu uma pontada do mais puro desejo.

- Queres ir para outro sítio? Donna queria...

- Quero...

- Diz-me, querida. Diz-me o que queres.

- Não sei! - gemeu ela.

Esperara nove anos para que Marcus lhe fizesse aquilo outra vez. No entanto, daquela vez, Donna não ia estragar tudo com sonhos de adolescente.

- Sabes perfeitamente!

Marcus levantou o rosto, abandonando o pescoço de Donna, e sorriu triunfalmente. Sim, sabia o que ela queria.

- Onde é o teu quarto?

De repente, num recôndito lugar da sua mente, Donna ouviu um alarme. Não, no seu quarto não. Lá, Marcus estaria rodeado das suas coisas pessoais e isso fora o que estragara tudo anteriormente. Daquela vez, não queria que Marcus se sentisse preso. O seu quarto era demasiado feminino para um homem como ele.

Donna abanou a cabeça.

- Não, no meu quarto não.

Durante um momento horrível, Marcus pensou que ela ia mandá-lo embora.

- Então... onde?

- Vamos.

- Estou com vontade de subir contigo às costas -disse ele quando a viu hesitar.

- Não, nem pensar.

- Queres apostar?

Marcus quase não podia acreditar no que estava a fazer quando, agarrando-lhe na mão, a pôs sobre o seu ombro. O que se passava com ele?

Teve cuidado para não cravar os olhos nas nádegas de Donna, caso contrário, suspeitava que podiam ter caído escada abaixo.

- Aqui - sussurrou Donna quando subiram a escada. Marcus abriu a porta com um joelho e deixou Donna

no chão, prestando pouca atenção ao cenário. O que reparou foi que a cama era enorme, por sorte. Virou-se para a mulher que estava ao seu lado a olhar para ele com uns olhos verdes enormes e um rosto de tensa excitação.

Marcus baixou a cabeça e acariciou-lhe os lábios com os seus.

- E agora... onde estávamos?

- Não me lembro - murmurou ela.

Beijou-a até que as pernas de Donna fraquejaram e depois desabotoou-lhe os minúsculos botões de cetim que percorriam o vestido, contudo, os seus dedos tremiam e o desejo era quase insuportável.

Não podia acreditar que aquilo estivesse a acontecer outra vez.

Sentiu-se fora de controlo e afastou a boca da dela.

- Podes acabar de o desabotoar?

Os dedos de Donna tremiam apenas um pouco menos do que os dele, porém, ela pensou que era mais fácil despir-se do que despir outra pessoa e o seu vestido rapidamente acabou num canto do quarto.

Marcus estava apenas com uma t-shirt e umas cuecas de seda pretas.

Donna engoliu em seco enquanto olhava para ele, incapaz de afastar os olhos dele.

Marcus tirou a t-shirt e viu-a a desabotoar o sutiã. Deixou que os seus olhos festejassem a visão daqueles seios apenas cobertos por renda preta.

- Não, não o tires. Deixa-o - disse Marcus com voz trêmula. - E aproxima-te.

Marcus afastou os lençóis e subiu para a cama. Estendeu os braços para ela e Donna atirou-se para ele, como uma menina que voltava para o seu lar, para se deixar abraçar por ele.

- Oh, Donna - disse Marcus com voz suave. - És tão bonita.

Ela sentiu os músculos de Marcus e o calor do seu desejo contra o seu corpo.

- Não posso acreditar nisto... Que esteja a fazer isto - murmurou ela. -Aqui, contigo. Prometi a mim mesma que não voltaria a repetir-se.

Marcus agarrou no seu queixo para que não pudesse escapar do seu olhar penetrante.

- Pelo amor de Deus, Donna... se não queres que aconteça, di-lo agora mesmo.

Ela abanou a cabeça.

- Sabes que não conseguiria deixar-te partir... mesmo que quisesse. E não quero.

Marcus proferiu um gemido e deitou-a em cima dele. Depois, desabotoou-lhe o sutiã e os seios de Donna libertaram-se. Marcus deu-lhes as boas-vindas.

- Hum! - murmurou ele. E Donna riu-se.

- Assim está melhor - disse ele num tom de aprovação.

Acariciou-a com a língua enquanto ela gemia e roçava contra ele. Marcus pensou que ia rebentar.

- Tira-me as cuecas - sussurrou ele.

Os dedos de Marcus deslizaram debaixo das cuecas de Donna enquanto ela lhe tirava as cuecas e, quando afastou os dedos, sentiu a sua fragrância feminina.

- Oh, meu Deus - sussurrou Donna. -Gostas?

-Sim!

- Queres fazer amor. -Sim!

Marcus sentiu-a à sua procura, rodeando-o como, com inocência, fizera uma vez. E algo na sua memória se reavivou.

- Estás a tomar a pílula? -Não.

Marcus praguejou suavemente enquanto tirava o braço da cama para agarrar nas suas calças. Procurou no bolso e tirou uma caixa de preservativos.

Colocou um, sentindo simultaneamente alívio e desgosto; uma parte dele não queria barreiras entre os dois. Porém, era apenas a sua parte louca. E foi então que Marcus parou de pensar e começou a sentir enquanto se envolvia naquele corpo quente.

Quando Donna abriu os olhos, já era de noite. Pestanejou algumas vezes, perguntando-se porque estava no quarto de hóspedes e o que a acordara.

Porém, um ligeiro movimento fez com que recordasse. De repente, começou a sentir uma comichão nos seios. Sorriu enquanto estendia uma mão para acender o candeeiro da mesa-de-cabeceira. Esticando-se preguiçosamente, virou a cabeça e viu Marcus a vestir as calças de ganga. Quando a viu a olhar para ele, a sua expressão mudou.

- Olá! - cumprimentou ele.

Donna esperara mais do que um «olá» depois do que tinham feito durante várias horas.

Mas, claro, o facto de terem partilhado uma experiência sexual gloriosa não significava que Marcus tivesse de declarar o seu amor. Embora não fosse uma má idéia, pensou Donna caprichosamente.

- Olá! - respondeu ela e sorriu enquanto se sentava na cama.

Marcus afastou os olhos do espectacular movimento dos seios dela, porém, foi demasiado tarde para evitar que o seu corpo respondesse. Começou a procurar o seu relógio com a esperança de que Donna não tivesse reparado na sua reacção.

Marcus sentia-se confuso com o que acontecera. Fizera amor com ela várias vezes e nunca imaginara que pudesse ser tão extraordinário. De facto, a experiência assustara-o.

- Não queria acordar-te - disse Marcus enquanto procurava os sapatos.

- E portanto estavas a tentar sair como se fosses um ladrão?

- Não. Mas estavas a dormir tão bem que não quis acordar-te.

Donna suspirou. Não ia suplicar-lhe que ficasse, porém, também não ia comportar-se como se tivessem passado as últimas horas a falar da situação econômica do país.

- E, é claro, saindo sem me acordares não terias de responder a perguntas incómodas.

Marcus ficou imóvel.

- Falas como se estivesses a julgar-me.

- Não. Mas confesso que estranhei tanta pressa, é só isso. Tens outra pessoa à tua espera?

- Não devias ter feito essa pergunta antes de termos ido para a cama?

Como a imagem viva da namorada possessiva, Donna ouviu-se dizer:

- Isso é um sim ou um não? Marcus apertou os lábios.

- O meu limite é uma mulher por dia.

Aquelas palavras magoaram Donna. Assim como a indiferença da voz de Marcus, já que ela não podia continuar a fingir. De repente, apercebeu-se de que não queria fingir. Já não era uma jovenzinha incapaz de enfrentar a verdade, por muito que essa verdade doesse.

- Sabes uma coisa, Marcus? Acho que acabámos de cometer o nosso segundo erro.

- Erro? - repetiu ele com uma ligeira surpresa, como se o seu comportamento fosse perfeitamente normal. - Donna, por favor, não vamos por esse caminho. Ninguém te arrastou para a cama, nem desta vez nem da anterior. E foste tu que voltaste para Winchester, foste ao meu restaurante e me deste luz verde. O que esperavas? Devias suspeitar que isto aconteceria. Luz verde? Donna tentou manter a voz calma quando falou.

- Está bem, talvez esteja a exagerar um pouco. Nesse caso, podias explicar-me porque ficaste com essa cara? E porquê agora, depois do que acabou de acontecer? Foi bom, não foi?

- Sabes muito bem que foi fantástico.

- Então, o que se passa?

Marcus levantou os olhos para o tecto enquanto parecia pensar no que ia dizer.

- Eu não gosto daquilo em que me transformas.

- E em que te transformo?

- Viste-o com os teus próprios olhos. Não preciso de to dizer.

Donna assentiu. A profundidade da paixão dele surpreendera-a realmente, tal como a forma como se entregara a ela, deixando vislumbrar o homem que era no fundo: um espírito livre contido pelo peso da responsabilidade. Será que Marcus não tinha coragem de enfrentar a verdade?

- Quer dizer que estás preocupado em acabar como a tua mãe?

Fez-se um silêncio horrível.

- O que sabes sobre a minha mãe? - perguntou ele gelidamente.

- Muitas coisas.

- Como por exemplo?

- Lucas falou-me acerca da tua mãe.

- Ah, sim? E o que te disse Lucas exactamente?

- Que era muito bonita e que... queria viver ao máximo. Que era infiel ao teu pai. Disse que discutiam muito portanto mandaram-vos para um colégio interno, mas o teu pai não suportava a idéia de se divorciar dela.

- É só isso? - perguntou ele, com uma fingida voz sedosa.

Donna encolheu os ombros.

- Disse que a tua mãe não conseguia controlar-se -Donna respondeu ao olhar furioso de Marcus com afecto. - E foi isso que aconteceu contigo hoje, não foi, Marcus? Perdeste o controlo.

- Os teus comentários não só são impertinentes, mas também inexactos. A paixão não tem nada a ver com a fidelidade. E a fidelidade é uma questão de escolha pessoal.

-Marcus...

- Como aprendizes de psicólogo, receio que Lucas e tu deixem muito a desejar - continuou ele. - Não me digas que te iludiste, Donna. Esperavas que eu dissesse que és a única mulher na minha vida, só porque tivemos um grande encontro sexual?

- É claro que não - Donna puxou os lençóis para tapar os seios.

- A dívida que tinha contigo ficou saldada - acrescentou ele. - Já estamos em paz.

- Quer dizer... que te redimiste sexualmente, dan-do-me os orgasmos que não conseguiste dar-me no passado?

- Eu não o diria com essas palavras.

- Ah, não? E como dirias, Marcus?

- Não vamos estragar isto, Donna! - exclamou ele. - Enfrenta a realidade como eu fiz. Aconteceram demasiadas coisas entre nós, Donna.

Ela respondeu ao seu olhar brincalhão com um rosto carente de expressão. E porque estava a cobrir-se com o lençol como se fosse uma humilde empregada à frente do seu senhor?

Afastou os lençóis e levantou-se como uma Vénus surgindo das águas.

Marcus engoliu em seco.

- O que estás a fazer?

- Vou ao meu quarto vestir-me para te acompanhar à porta. Não é nenhum crime, pois não?

Marcus ficou imóvel, boquiaberto. Aquela mulher tinha um corpo fantástico.

- O que se passa, Marcus? Não queres que te acompanhe à porta para que ninguém saiba o que estivemos a fazer? Não te preocupes, as pessoas não adivinham que estiveste na cama com uma mulher só por olharem para a tua cara. Além disso, quero fechar a porta à chave quando saíres.

E Donna saiu do quarto.

Marcus esperou, mais confuso do que nunca. Donna era uma manipuladora! Porque esperara para se levantar daquela forma, nua, quando ele estava vestido e pronto para se ir embora?

Quando Donna regressou, prendera o cabelo e vestira umas calças de ganga e uma camisa velha.

Marcus deveria ter-se sentido menos agitado, porém, não foi isso que aconteceu. De repente, o aspecto simples de Donna pareceu-lhe mais erótico do que a renda e o cetim.

- Bom, vamos - disse ela.

Quando chegaram à porta, a campainha assustou-os.

Quem seria?, perguntou-se Donna e abriu. Tony Paxman estava do outro lado da porta.

Marcus sentiu um ataque de ciúmes quando o atraente advogado deu a Donna uma garrafa de champanhe com um sorriso.

- Olá, Donna! Lamento chegar tão tarde, mas tinha um julgamento. Isto é para ti - Tony assentiu cautelosamente. - Olá, Marcus!

Marcus também assentiu.

- Oh, Tony, que atencioso! - exclamou Donna, exagerando a sua gratidão. - Por favor, entra.

Tony olhou para Marcus.

- Bom, pareces estar...

- Não, não! Marcus estava a sair, não é verdade, Marcus? Vamos beber uma taça para celebrar o sucesso da inauguração. Por favor, entra enquanto eu me despeço de Marcus.

O advogado entrou no edifício e Donna sentiu o olhar de Marcus como uma bofetada. -Adeus - disse ela em voz baixa. -Adeus, Donna. Posso dar-te um conselho?

- Que conselho?

- Não te esqueças de mudar os lençóis, eh? Donna quis gritar, contudo, não ia fazer uma cena. Em vez disso, fechou-lhe a porta na cara.

 

                                  CAPÍTULO 6

O mês de Abril deu lugar a um glorioso e dourado Maio.

Donna trabalhava muito e o negócio ia de vento em popa. Parecia que Winchester estivera à espera de uma pastelaria ao estilo antigo e convencional, já que o público recebeu o seu aparecimento como se fosse um velho amigo. O estabelecimento estava repleto diariamente.

Donna levantava-se ao amanhecer para começar a preparar os artigos de confeitaria. Gostava do cheiro dos bolos no forno enquanto os pássaros cantavam na rua. O Buttress transformara-se no seu lar. Depois de tanto tempo à procura, finalmente encontrara o seu lugar.

Na verdade, havia apenas uma nuvem no horizonte e essa nuvem era Marcus, ou mais exactamente, o que acontecera com Marcus no quarto de hóspedes. No entanto, Donna estava decidida a ser uma mulher moderna e madura, recordando as coisas boas e esquecendo as más.

Perguntou-se o que faria se se encontrasse com ele, porém, não o encontrou. Nem uma vez.

Algumas vezes, via-o de longe, como acontecera quando ambos estavam às compras no mercado de Winchester. Donna sentira um aperto no coração ao reconhecer a figura alta e morena e parecera-lhe que ele também a vira. Porém, Marcus não se aproximara para a cumprimentar.

Donna apercebeu-se de que as suas vidas eram muito diferentes. Marcus tinha o seu próprio mundo e ela o seu. Viviam em calçadas opostas da mesma rua, mas parecia que viviam nos antípodas.

Foi no fim de Maio que Donna começou a inquietar-se.

Encontrou desculpas.

Era devido ao trabalho, à tensão e às preocupações. Contudo, o tempo passou e a sua angústia aumentou. No entanto, conseguiu convencer-se de que não havia motivos de preocupação.

O facto de o período se atrasar era comum em muitas mulheres, era impossível que estivesse grávida. As suas faces arderam ao recordar que Marcus insistira em utilizar preservativos. Todas as vezes, pois não quisera que ela engravidasse.

Continuou a repetir-se que não estava grávida, porém, Maio passou e chegou Junho. E quando Donna viu a palavra «Julho» escrita no calendário, percebeu que tinha de sair do seu estado de negação e enfrentar a realidade.

Foi à farmácia e comprou o necessário para fazer um teste de gravidez. Na manhã seguinte, comprovou que o pior acontecera.

Estava grávida. Grávida, sozinha e assustada.

Sabia que tinha de dizer a alguém e sabia a quem, contudo era-lhe impossível fazê-lo.

Foi à sua médica e esta destruiu a sua última esperança.

- Está grávida - disse-lhe a médica, sorrindo. - É uma mulher saudável, por isso não antecipo nenhum problema. Felicidades!

Contudo, a falta de resposta de Donna fez com que a médica acrescentasse:

- Enganei-me ao felicitá-la?

Um instinto protector eliminou as dúvidas de Donna.

- Não, claro que não. Muito obrigada.

- E o pai... está consigo? - perguntou a doutora Baxter delicadamente.

- Bom... não exactamente.

- Não vai ajudá-la?

- Não sei - respondeu Donna. - Ainda não lhe disse.

Queria confiar o seu segredo a alguém. Talvez Ally, que estava sozinha com a sua filha. Ou Sarah. Porém, a consciência disse-lhe que antes disso, devia contá-lo à pessoa com quem não queria falar.

Atrasou-o, enterrou a cabeça na areia como se isso lhe desse a sensação de que não era real.

Contudo, era real. O peso dos seus seios era real, tal como os enjôos.

Continuou sem dizer nada a ninguém, no entanto, numa das consultas regulares à sua médica, esta disse-lhe:

- Ah, Donna, finalmente começa a notar-se.

- Notar-se?

A doutora Baxter dedicou-lhe um olhar estranho.

- Sim. É natural que por esta altura se repare no seu estado.

De repente, Donna convenceu-se da realidade: ia ter um filho. Estava grávida e não podia mantê-lo em segredo durante mais tempo. Tinha de o contar a Marcus.

Assim que voltou para o seu estabelecimento, telefonou para o hotel.

- Bom dia, hotel New Hampshire. Está a falar com Francine.

- Bom dia. Posso falar com Marcus Foreman, por favor?

- O seu nome, por favor?

- King. Donna King.

- Lamento muito, senhora King, mas o senhor Foreman está ocupado neste momento. Quer deixar algum recado?

Donna resistiu à tentação de desligar, de gritar e de praguejar, já que a culpa não era de Francine.

- Pode dizer-lhe que preciso de falar com ele, por favor? É um assunto urgente.

- Ele sabe o seu número de telefone?

- Sabe onde vivo. O meu número de telefone está na lista.

Donna desligou.

Marcus foi visitá-la naquele dia. Chegou quando Donna estava a pendurar o letreiro de «Fechado» na porta. Tinha uma camisola cinzenta e calças de ganga pretas, e o seu aspecto era sério. Donna deixou-o entrar, pensando que ficaria ainda mais sério ao fim de alguns minutos.

- Olá, Marcus! - Donna conseguiu sorrir.

- Olá, Donna!

Não trocaram mais nenhuma palavra até que chegaram à pequena sala de estar de Donna no andar de cima. Marcus olhou à sua volta.

- Fiquei muito surpreendido quando telefonaste.

- Recusaste-te a atender o telefone ou esqueceste-te? .

- Estava numa reunião. E com os planos para abrir um novo hotel estou com imenso trabalho.

- Eu também!

Marcus proferiu uma gargalhada seca.

- O teu trabalho não se compara com o meu, e não o digo para te insultar.

- Mas estás a fazê-lo!

Marcus suspirou, apercebendo-se de que fizera bem em manter-se afastado dela nos últimos meses.

-Vês? Percebes que, quando estamos juntos, só podemos fazer duas coisas? Discutir ou ir para a cama?

- Antes não discutíamos - disse Donna com tristeza. - O que é que mudou?

Marcus abanou a cabeça.

- Não é nenhum mistério, Donna, o que aconteceu foi que fomos para a cama. Foi isso que mudou a nossa relação, porque o sexo muda tudo. Não sabias?

Donna começou a ficar nervosa.

- Sim, talvez tenhas razão.

- Bom, o que querias dizer-me?

- Não queres sentar-te? Queres que te prepare uma chávena de chá?

De repente, tudo lhe parecia melhor do que lhe dar a notícia.

- Não, obrigado.

De que forma podia dizê-lo sem o assustar?

- Estou grávida - anunciou Donna sem mais contemplações.

Marcus ficou em silêncio durante um segundo.

- Parabéns. E quem é o sortudo? Donna olhou para ele fixamente.

- O quê?

- Quem é o pai do teu filho?

Donna abanou a cabeça com incredulidade. Nem sequer nos seus pesadelos teria sonhado que Marcus chegasse a ser tão insensível.

- Tu, é claro.

A expressão dos olhos de Marcus tornou-se gélida.

- Não é assim tão claro. Na verdade, acho que sou o candidato menos provável. Usámos preservativos, lem-bras-te?

- Candidato? - Donna fez um esforço para controlar a sua crescente agitação. - Estás...? Estás a insinuar o que eu acho que estás a insinuar? Que há vários homens que podem ser o pai?

Marcus encolheu os ombros.

- Tu é que sabes.

Donna conteve o desejo de lhe cravar as unhas na cara, acção pela qual podia culpar as suas hormonas descontroladas.

De repente, Donna sentiu náuseas e pôs a mão na boca.

- Não é possível que acredites que, depois de estar contigo, tenha ido para a cama com Tony Paxman, pois não?

- Por que razão não pode ser possível?

Donna continuou a olhar para ele, sentindo-se como um animal ferido.

As suas pernas começaram a fraquejar. Viu estrelas brilhantes. Sentiu que o seu corpo ardia e que a sua testa estava coberta por suores frios. E, quando falou, as palavras saíram abafadas.

- Vai-te embora! Sai daqui... agora mesmo!

Donna deixou-se cair no sofá e, esgotada, fechou os olhos.

Quando voltou a abri-los, Marcus estava inclinado sobre ela, abanando uma revista à sua frente.

Com satisfação, Donna reparou que o rosto de Marcus mostrava tensão.

Donna tentou endireitar-se no sofá, contudo, Marcus abanou a cabeça e pôs-lhe uma mão no ombro para a forçar a ficar quieta.

-Tira as mãos de cima de mim!

- É um pouco tarde para isso, não achas? Queres beber alguma coisa?

- Sim,um conhaque!

- Não podes beber conhaque - respondeu ele. -Não no teu estado.

- No meu estado? - Donna esteve prestes a desatar a chorar.

Marcus endireitou-se e dirigiu-se para a porta.

- Onde vais? - perguntou ela com voz abafada.

- Fazer-te um chá. Eu beberei o conhaque. Donna esticou-se no sofá e devia ter adormecido

porque, quando abriu os olhos, encontrou Marcus a deitar açúcar no chá.

- Eu disse-te que já não ponho açúcar no chá -disse ela com voz cansada.

- Cala-te - respondeu ele, mas com uma voz quase terna.

Donna estava esgotada fisicamente. No entanto, sentia-se como se lhe tivessem tirado um peso de cima. Marcus não lhe dissera que não se preocupasse, e Donna não achava que o fizesse, contudo, pelo menos, já não se sentia sozinha.

Marcus esperou que Donna bebesse um pouco de chá e recuperasse a cor. Depois, sentou-se numa cadeira à sua frente.

- Bom, dizes que eu sou o pai? Donna abanou a cabeça.

- Não digo, Marcus. És.

- Tens a certeza?

Donna acabou o chá e deixou a chávena em cima do tapete. Não ia servir-lhe de nada zangar-se com ele. Além disso, ficar histérica não ia ajudar em nada.

- Sim - respondeu ela com calma.

- Posso perguntar-te como?

- Não estudaste Biologia na escola?

- Não sejas impertinente num momento como este! Fiz-te uma pergunta educadamente e agradecia-te que me respondesses da mesma forma.

- Porque... Porque foste o único homem com quem fui para a cama.

No entanto, Donna reparou que Marcus ainda não estava convencido.

- Desde quando?

- Desde há muito tempo - respondeu ela, enfatizando as palavras. - Pelo menos... há alguns anos.

Marcus assentiu.

- Entendo. Um dos preservativos deve ter-se rasgado - disse Marcus como se falasse consigo mesmo.

- Quantas vezes o fizemos?

Donna corou.

- Não me lembro.

- Deve ter sido isso que aconteceu - Marcus suspirou. - Quantas semanas passaram?

- Quase vinte e duas.

Fez-se um silêncio tenso e prolongado. Marcus olhou para ela com uma expressão de incredulidade.

- Estás grávida de quanto tempo? - perguntou ele com voz abafada.

- Pensa, Marcus. Não é preciso que eu to diga. Faz as contas! - exclamou ela.

- Quer dizer que já passaram quase vinte e duas semanas desde que...?

- Desde que fizemos amor? - inquiriu Donna. Embora, provavelmente, Marcus não o diria com

aquelas palavras.

- Sim, já passou esse tempo todo.

Marcus abanava a cabeça como se acabasse de sair de um transe.

- Escuta, normalmente sou bom a fazer contas, mas não neste momento. Tenho a cabeça às voltas - os olhos azuis de Marcus adquiriram uma intensidade estranha. - Diz-me quando nasce a criança.

- No princípio do ano. Na primeira semana de Janeiro - respondeu Donna, pensando que nunca vira Marcus tão assustado.

- Estás a brincar, não é verdade?

- Oxalá.

- O que queres dizer com isso?

Donna olhou para ele. O que esperava que lhe dissesse, que estava muito contente por trazer uma criança ao mundo sem o ter planeado? Uma criança cujo pai não queria ter nada a ver com ela?

- Não sei o que quis dizer. Acho que estou um pouco confusa.

Marcus cravou os olhos na barriga dela enquanto pensava na situação.

- Meu Deus, acho que neste momento uma bebida seria muito útil.

- Então serve-te de um copo.

- Não, é melhor não — Marcus olhou para o relógio e suspirou. - Tenho de sair esta noite. Na verdade, tenho de sair já.

- Essa é a diferença entre nós, não é, Marcus? -perguntou ela com amargura. - A tua vida continua igual, não é verdade?

- Achas? Não me parece que vá ultrapassar o medo esta noite depois da bomba que acaba de cair em cima de mim.

- Estás preocupado com a tua vida social? - perguntou ela com incredulidade. - Pois não te preocupes comigo. Eu estou apenas preocupada com o meu futuro, mais nada!

- Pelo amor de Deus, Donna, pára de distorcer o que eu digo. Estava a pensar a curto prazo. Tu, naturalmente, estavas a pensar na situação em geral.

Donna sabia que não tinha o direito de lhe perguntar para onde ia nem com quem, no entanto, também lhe parecia que tinha esse direito, já que Marcus ia ser o pai do seu filho!

Donna tomou uma resolução naquele momento. Aquela criança não era fruto do amor, porém, quando nascesse, a única coisa que iria encontrar era amor, e muito.

Donna sentou-se no sofá, sentindo-se mais forte.

- Talvez seja melhor deixarmos algumas coisas claras desde o começo, Marcus.

A expressão dele mostrou-se cautelosa.

- Continua - disse Marcus fracamente.

- Quero que saibas que não quero ajuda económica. -Não?

- E também não quero apoio moral. -A sério? Então, o que queres, Donna?

- Nada - Donna mordeu os lábios. - Absolutamente nada.

- Não queres dinheiro? Também não vais querer que eu fique com a criança quando quiseres sair?

-Não.

- Nesse caso, porque te incomodaste em contar-me?

- Porque, como pai, tens o direito de saber.

- Mas não tenho o direito de fazer parte da vida do meu filho?

- Não queres fazê-lo, pois não? - perguntou ela com verdadeira surpresa.

- Como demônios podes saber o que eu quero ou não quero, quando nem eu sei? - perguntou ele. - E como esperas que tome uma decisão imediatamente depois de descobrir uma coisa tão importante?

-Marcus...

- Preciso de tempo para pensar - continuou ele. -Temos de ver qual é a melhor opção. Devemo-lo ao nosso filho e a nós mesmos. Ouve, isto é demasiado importante para ser resolvido num breve encontro. Além disso, tenho de me ir embora.

- Sim, é claro.

Marcus permaneceu a olhar para ela. Donna tinha um aspecto tão vulnerável.

- Estás bem? Ficarás bem sozinha?

Donna, fazendo um esforço, levantou-se do sofá.

- Claro que estou bem. Não é necessário que me trates como se fosse uma frágil idosa. Estou grávida, Marcus, não estou doente!

- Sim, está bem.

Agora que ela estava de pé, Marcus reparou numa pequena diferença no tamanho da barriga de Donna. Sentiu um nó na garganta e, instintivamente, envolveu-a com ternura entre os seus braços.

Durante um momento, Donna deixou-se abraçar, refugiando-se na quente segurança que lhe dava. Donna quis descansar a cabeça no seu ombro e, naquele breve instante, sentiu-se muito perto dele.

Era estranho, contudo, um simples abraço podia ser imensamente mais íntimo do que o sexo. Donna afastou-se dele, consciente de como era perigoso interpretar um gesto terno como mais do que isso.

- Bom... é melhor ires-te embora.

- Sim - mas Marcus não parecia com muita vontade de sair. - Bom... boa noite, Donna.

- Quando vou voltar a ver-te?

- Não sei - respondeu Marcus. - Realmente, não sei.

 

                             CAPÍTULO 7

Na manhã seguinte, Donna começou a preparar bolos às seis da manhã. Nos últimos dias, sentia-se enjoada ao fim da manhã, por esse motivo, apressava-se o mais que podia para preparar a comida.

No entanto, naquela manhã, sentiu náuseas mais cedo, sem aviso prévio. Donna perguntou-se se não seria devido ao facto de, depois de falar com Marcus, não ter conseguido adormecer.

Quando Ally chegou, às nove horas, depois de deixar a sua filha Charlotte na escola, Donna estava sentada à mesa da cozinha com o rosto muito pálido e trémula.

- Queres que te prepare um chá? - perguntou-lhe Ally ao vê-la.

- Oh, não! - Donna gemeu.

- O que se passa? A gravidez está a causar-te muitos enjôos?

Donna, perplexa, olhou para Ally.

- Como demónios sabes? - perguntou Donna num sussurro.

- Como? -Ally desatou a rir-se. - Sou mãe! Há semanas que suspeito, se queres saber a verdade. Disfarçar uma gravidez é muito mais difícil do que imaginas, Donna.

- Oh, meu Deus - resmungou Donna e apoiou a cabeça em cima da mesa. - O que vou fazer?

- Não tens muitas alternativas, pois não? De quantas semanas estás? Vinte?

- Um pouco mais - murmurou Donna sem levantar a cabeça da mesa.

- E não tens uma relação estável com o pai, não é verdade? - comentou Ally.

- É assim tão óbvio? -Sim.

- Oh, Ally, sinto-me uma idiota! Como demônios me envolvi nesta confusão?

- Donna — Ally suspirou, - não és mais idiota do que muitas mulheres. São coisas que acontecem. Já lhe disseste? Refiro-me ao pai.

- Sim - Donna ficou a olhar para a mesa. - Sim, disse-lhe.

- E qual foi a reacção dele?

- Disse que temos de falar.

- Que atencioso - disse Ally ironicamente. - Não há a possibilidade de acabarem por...?

- Não - respondeu Donna com firmeza. - Não, nenhuma possibilidade. Ele deixou isso muito claro. Na verdade, ainda não me perguntaste se é casado.

- Porque haveria de perguntar?

- Bom, é uma hipótese lógica quando uma mulher tem um amante que ninguém conhece, não é?

- Sei que não é casado - disse Ally. - O pai é Marcus Foreman, não é verdade?

Ao ver a expressão de Donna, Ally riu-se.

- E antes de me perguntares, a resposta é não, não leio os pensamentos. Tanto eu como Sarah achamos que é evidente.

- O quê? Apesar de eu não o ver há semanas?

- Reparámos no dia em que ele veio ver-te, no dia da inauguração.

As duas calaram-se quando ouviram o ruído da chave na fechadura. Donna olhou para Ally.

- Então, Sarah também sabe?

- Sim. Há muito tempo que vestes blusas e t-shirts muito largas. E, como já disse, uma mulher repara quando outra está grávida.

Devia ter-lhes contado há algumas semanas, mas não queria pensar nisso. Além disso, não queria que ninguém soubesse antes de ter contado a Marcus. Donna ouviu o telefone, seguido da voz de Sarah a dizer que ela atendia.

- Ally, por favor, não digas a ninguém. Primeiro quero falar com Marcus.

- Não te preocupes, não o farei.

As duas olharam para Sarah quando ela entrou na cozinha com um sorriso.

- Donna, adivinha quem está ao telefone!

- O Presidente da República.

- Marcus Foreman.

Donna fez um esforço para que a sua voz soasse calma, porém estava um pouco ofegante quando atendeu.

-Sim?

- Porque parece que estás com falta de ar? - perguntou Marcus.

- Porque as grávidas têm dificuldade em respirar! Marcus fez uma pausa antes de perguntar:

- Queres jantar comigo esta noite?

- Jantar?

- É assim tão estranho, Donna, dadas as circunstâncias?

- Não, claro que não. Onde? Outra pausa.

- Na minha casa. Podes vir às seis horas?

- Penso que sim.

- Queres que vá buscar te?

- Não, acho que conseguirei suportar os cinco minutos que demorarei para ir até tua casa.

- Bem, se é assim que queres...

- Marcus, já te disse que não sou uma inválida!

- Não, apenas carregas o meu filho na tua barriga, mais nada.

E Donna perguntou-se se era orgulho ou pânico que reparara na voz de Marcus.

Donna vestiu-se com um fato de calças de seda que comprara na Nova Zelândia há séculos. As calças eram largas e tinham um elástico, perfeito para a sua volumosa barriga, e o casaco era fresco e folgado.

Maquilhou-se e prendeu a trança com um laço preto às riscas.

Marcus vivia numa rua atrás do hotel. As casas daquela rua eram afastadas umas das outras e tinham jardins bonitos cobertos de relva. Estava uma temperatura agradável e o ar estava impregnado com a fragrância das rosas.

Marcus abriu a porta antes de ela ter tempo para tocar à campainha, o que agradou a Donna. Não porque pensasse que ele tinha vontade de a ver, mas porque indicava que ele também estava nervoso. O que nivelava as coisas, já que Marcus quase nunca ficava nervoso.

Marcus, da porta, observou-a. A forma como alguém via outra pessoa dependia do que pensava dessa pessoa e, agora que sabia que Donna estava grávida, parecia-lhe a mulher mais grávida do mundo. Fresca e limpa como um copo de água. Reluzente e radiante.

- Olá! - cumprimentou ele, com uma voz mais suave do que era costume. - Entra.

- Obrigada.

Donna entrou no amplo hall, com a sua escada de madeira e, de repente, sentiu-se extremamente insegura.

- O que é que se passa? Donna encolheu os ombros.

- É estranho estar aqui, é só isso. Quer dizer, é a primeira vez que ponho os pés na tua casa. Nunca vim aqui durante o tempo que trabalhei no teu hotel. Nunca me convidaste e imagino que nunca o terias feito se não fosse devido à estranha situação em que me envolvi.

O rosto de Marcus escureceu.

- Acho que somos ambos responsáveis por esta «estranha situação», como tu dizes. Quanto a vires cá... Nunca houve motivo para vires, pois não? As coisas não funcionavam dessa forma.

- Não, tens razão. Tu eras o chefe e eu, uma empregada de hotel.

- E era um bom chefe? - perguntou Marcus subitamente.

Fora um óptimo chefe.

- Nunca vinhas para casa, estavas sempre a trabalhar no hotel - disse Donna, recordando uma vez em que, ao chegar ao trabalho de manhã, o encontrara a dormir com a cabeça apoiada na secretária do escritório. Sem fazer ruído, saíra e preparara-lhe um café. Levara-o ao escritório e tocara-lhe no ombro para o acordar. Quando Marcus a vira, olhara para ela com uma estranha expressão.

Fora naquele preciso momento que Donna se apercebera de que estava apaixonada por ele...

- Eras viciado no trabalho - concluiu Donna, sorrindo.

Marcus reflectiu sobre a forma cuidadosa como Donna decidira responder à sua pergunta. Finalmente, decidiu não reprimir o que sentia, não era justo.

- Não queria voltar para casa - disse ele simplesmente. -Tu fazias com que trabalhar até tarde fosse algo muito agradável. Bom, e agora vamos para a cozinha.

Era uma cozinha enorme, com uma mesa de pinho muito grande. Estava demasiado ordenada para ser um sítio utilizado com freqüência e Donna perguntou-se com que freqüência Marcus comeria ali. Porém, havia cerâmica às cores e uma travessa com laranjas e limões.

- É uma cozinha linda - murmurou ela.

A porta dupla de vidro que dava para o jardim estava aberta e o jardim estava coberto de flores azuis e violetas que contrastavam com a folhagem verde e a relva. Donna pestanejou. Ouvira vozes de crianças ou fora a sua imaginação?

Virou-se para Marcus e surpreendeu-o a olhar para ela intensamente.

- O que queres beber? - perguntou ele. - Tenho sumos de frutas. Ou, se preferires, água mineral.

Donna sentiu que a sensação de estar a perder o controlo sobre o seu corpo se intensificava.

- E o que dirias se te pedisse uma cerveja ou um copo de vinho?

- Provavelmente, dir-te-ia que, apesar de depois do primeiro trimestre de gravidez ser permitido beberes um copo ou dois por semana, os médicos recomendam...

- Marcus! - Donna deixou cair a sua mala numa cadeira e virou-se para lhe lançar um olhar cheio de indignação. - Queres parar?

- Parar?

- Sim, parar de tentar controlar-me!

- Não estava a tentar controlar-te. Estava apenas...

- O corpo é meu! - interrompeu-o ela.

- E estás à espera do meu filho - disse ele com voz calma.

Olharam um para o outro, em silêncio.

Iam ter um filho...

No entanto, até àquele momento, fora um filho em sentido abstracto. Naquele momento, ao pronunciar aquelas palavras, era algo real. E muito mais real para ela do que para ele, já que a criança estava a desenvolver-se dentro do seu corpo. Que direito tinha ele de a controlar?

- Está bem, bebe um copo de vinho se quiseres -disse Marcus finalmente.

- Não, não quero - respondeu ela docemente. -Mas gosto de tomar as minhas próprias decisões.

- Está bem, Donna, entendi a mensagem - Marcus esboçou um sorriso trêmulo enquanto servia dois copos de água mineral, aos quais acrescentou gelo e algumas rodelas de limão. - Bom, queres brindar a quê? Ao nosso filho?

- Ao nosso filho - Donna assentiu, perguntando-se se aquela sensação de irrealidade algum dia desapareceria. - Parece que aceitaste a situação com muita facilidade.

- Não tenho outra alternativa, pois não? - Marcus deixou o seu copo na mesa e pôs pão no forno. Depois, tirou as hortaliças do frigorífico para preparar uma salada e começou a partir tomates. - E quando não há alternativas, o melhor é tirar o máximo proveito da situação.

Donna pensou que tinha razão. De facto, partilhava daquela filosofia de vida. Levantou os olhos para lho dizer e encontrou o olhar de Marcus cravado nela. Sem qualquer palavra, comunicaram na perfeição.

Marcus pousou a faca e sorriu com ternura e tristeza.

- Oh, Donna...

Durante um momento, Donna esteve prestes a aproximar-se dele para lhe acariciar o rosto, contudo, não tinha o direito de lhe tocar, nenhum, e o seu rosto empalideceu.

- O que se passa? - perguntou Marcus. - Estás branca. Estás com enjôos?

Donna abanou a cabeça.

- Não. A realidade acabou de me dar um golpe e obrigou-me a aceitar factos difíceis de encarar.

- Sim? - perguntou Marcus ao mesmo tempo que começava a partir pepino.

- Lembrei-me de que estou aqui devido a um acidente, é só isso. Não estamos juntos, Marcus. Nem sequer somos amantes. Esta criança foi um acidente...

-Não sigas esse caminho! - interrompeu-a Marcus. - Pensar negativamente não vai ajudar ninguém. Temos de ser positivos.

Donna assentiu.

- Eu sei.

- Não quero que te preocupes, Donna. Não quero que te preocupes com nada. Entendeste-me?

- Mas estou preocupada! - protestou ela. - É a verdade!

Marcus abanou a cabeça.

- Bom, eu também estou - respondeu Marcus, decidindo ser honesto.

- Tu estás preocupado?

- Sim.

- O que é que te preocupa?

- Para começar, preocupa-me que vivas na parte de cima do teu negócio.

Donna lançou-lhe um olhar furioso. A casa não o incomodara o suficiente para o impedir de fazer amor com ela!

- Qual é o problema da minha casa?

- Imagina que, por algum motivo, há um incêndio na tua cozinha - disse ele.

Donna franziu o sobrolho.

- Porque haveria de haver um incêndio na minha cozinha?

- Porque cozinhas em grandes quantidades, não é? É a cozinha de um negócio e tem empregadas. Portanto, a possibilidade de haver um fogo lá é muito maior do que numa cozinha de uma casa privada. E tu vives e dormes em cima da cozinha. Meu Deus, até pode haver uma explosão!

- O teu forno também pode explodir! Passei na inspecção, caso não saibas! Além disso, antes de me deitar, inspecciono tudo.

- Exacto! - exclamou Marcus triunfalmente. É demasiado para ti sozinha! Pareces esgotada! Imagina como será quando estiveres de quarenta semanas.

- E como sabes o que sente uma grávida de quarenta semanas?

Marcus esboçou um sorriso tímido de repente.

- Comprei alguns livros sobre o assunto.

- Quantos livros?

- Quatro sobre gravidez, um sobre o primeiro ano de vida de um bebé e...

- Já ouvi tudo o que tinha de ouvir.

- Não, não tudo - Marcus bebeu mais água, como se estivesse a ganhar tempo. - Por muito que protestes, sabes que tenho razão.

- Se tu o dizes...

- E o Buttress, embora reconheça que é um excelente estabelecimento e que estou impressionado com os lucros que conseguiste...

-Ah, obrigada!

- Não é o lugar apropriado para uma mulher grávida, nem para um recém-nascido. E por isso é que decidi que... - Marcus respirou fundo, como um homem a ganhar coragem antes de fazer um sacrifício enorme.

- Decidi deixar que venhas viver aqui.

Boquiaberta, Donna ficou a olhar para Marcus. Não devia ter ouvido bem.

- Marcus, acho que não te entendi.

Ele esboçou um sorriso paternalista; era o sorriso de um homem que nunca tinha sido contrariado.

- Disse que podes vir viver aqui - respondeu Marcus, fazendo uso de grande amabilidade. - A minha casa será a tua casa.

- Viver aqui... O que queres dizer exactamente? Marcus pareceu cansado.

- Eu acho que é muito claro.

- Não, para mim não. Eu gostava de saber que papel esperas que eu tenha em tudo isto.

- Que papel? - repetiu ele com cautela.

- Sim. Vais ser meu... companheiro em todo o sentido da palavra? Vamos partilhar a cama e ter relações sexuais? Ou esperas que vivamos na mesma casa, mas com vidas separadas? E, se assim é, as tuas namoradas não acharão estranho encontrar uma mulher grávida do teu filho em tua casa? E se, por exemplo, um dia decidires fazer amor com uma das tuas namoradas no sofá da sala de estar?

-Donna!

- Isso não responde à minha pergunta!

- Lá fora.

- Nesse caso, vamos lá para fora.

Donna pegou na toalha aos quadrados que Marcus lhe dera e estendeu-a na relva. Enquanto isso, ele levou a comida e um jarro de água numa bandeja.

Marcus serviu-lhe uma porção generosa de salada e observou-a, enquanto Donna devorava a comida com um apetite que fez com que recordasse a primeira vez que a vira, quando chegara ao seu hotel com frio, molhada e faminta. Porém, o sentimento protector que despertara nele naquela altura não era nada comparado com o que sentia naquele momento.

- Comes assim tanto ultimamente? - perguntou Marcus.

Donna limpou os últimos restos do molho da salada com um pedaço de pão e mastigou devagar antes de responder.

- É por causa da gravidez.

Marcus deitou-se na relva de costas e Donna pensou mais uma vez nas suas longas e musculadas pernas.

- Bom, fala-me sobre a gravidez - disse ele em voz baixa.

Donna afastou o seu prato vazio e bebeu um gole de água.

- As vezes, o meu estômago dá tantas voltas que penso que nunca vou voltar a conseguir comer.

- E outras vezes?

- Outras vezes... comeria tudo o que pudesse. Marcus não conseguiu evitá-lo...

- Comer-me-ias a mim?

Donna lançou-lhe um olhar furioso.

- Marcus, fazeres comentários insinuantes não vai ajudar.

- Não consigo evitá-lo, Donna. É esse o efeito que tens em mim.

- Não estou a fazer nada! - protestou Donna. Marcus suspeitava que, mesmo que lhe lesse a lista

telefônica, acharia excitante. Porém, o olhar que Donna lhe lançou foi de advertência, por isso Marcus deu meia volta, ficando deitado de barriga para baixo para que ela não reparasse na forma como estava a afectá-lo. Nem onde.

Donna viu-o a fazer uma careta e pensou que sabia porquê. Vira-o a corar. E quis tocar-lhe, acariciá-lo...

Pensou em como seria fácil deitar-se ao lado de Marcus com a desculpa da digestão. De qualquer modo, seria apenas uma questão de tempo, contudo, Marcus acabaria por a beijar.

E queria que ele a beijasse. Desejava-o. Era o único homem que realmente desejara.

- Bom, vens viver comigo, Donna?

A Donna de dezoito anos teria agarrado aquela oportunidade com ambas as mãos, contudo, já não tinha dezoito anos e a situação em que se encontrava já era suficientemente complicada...

Donna abanou a cabeça.

- Não, não posso fazê-lo. Ainda não me habituei à idéia de que, dentro de quatro meses, vou ter um filho. Este não é o melhor momento para experiências.

Marcus voltou a virar-se até se deitar de barriga para cima.

- Talvez não volte a pedir-to. Donna desatou a rir-se.

- Que desgraça! Nesse caso, perdi a oportunidade da minha vida. Enfim, o que posso fazer?

Marcus olhou para o céu, que começava a escurecer. Não compreendia Donna. Pensara que... Donna olhou para ele.

- O que se passa, Marcus, não consegues acreditar que uma mulher te tenha dito que não?

Marcus foi delicado com ela porque estava grávida, contudo, não hesitou quando a puxou até a deitar em cima de si.

- Talvez consiga fazer com que mudes de idéias -murmurou Marcus antes de lhe baixar a cabeça até que os seus lábios se uniram.

Beijou-a. Mais nada. Não tentou despi-la nem explorar os contornos do seu corpo. Os lábios de Marcus foram doces, suaves, duros e apaixonados ao mesmo tempo.

Foi um acto entre activo e passivo, inocente e imensamente habilidoso. Foi uma sedução totalmente nova para Donna.

Marcus sabia que tinha de parar, pois aquilo estava fora da sua experiência. Nunca sentira nada tão bonito. E, se não tivesse cuidado, iria...

Donna pestanejou quando Marcus afastou a boca dela e, fazendo um esforço enorme, levantou-se e ajudou-a a levantar-se. Então, soltou-a.

-Donna...

- Não consegues respirar - ofegou ela.

- Nem tu. E tens o cabelo todo despenteado.

Donna afastou alguns fios de cabelo da cara. Sacudiu a relva da sua roupa e começou a caminhar para a casa.

Marcus seguiu-a.

- Posso ir contigo à clínica para ver a ecografia? Quero ver a criança.

De repente, Donna sentiu-se culpada.

- Já fiz uma ecografia.

Marcus ficou tenso, apesar de saber que não tinha o direito de se sentir excluído. -E?

- Está tudo bem - Donna pensou que o melhor seria começar a falar de assuntos práticos. - Em breve, as pessoas vão reparar que estou grávida.

- Ainda não repararam?

- Ally sim e Sarah também, mas não comentaram com ninguém. O que queres que eu diga se alguém me perguntar?

Marcus olhou fixamente para ela. Estava a pedir-lhe a sua opinião contudo, na verdade, Donna não estava interessada na sua opinião, já que recusara ir viver com ele.

- Marcus, o que queres que eu diga às pessoas?

- Diz o que quiseres! A decisão é tua - disse Marcus, irritado.

Donna teria gostado que ele a ajudasse um pouco.

- Portanto... se disser às pessoas que tu és o pai... Não te importas?

- Porque haveria de me importar? Mesmo que não o fizesses, ficariam a sabê-lo mais tarde ou mais cedo porque, quando a criança nascer, vou pedir a sua custódia.

 

                           CAPÍTULO 8

- Ele disse-te isso?

Donna fez um esforço para parar de tremer para repetir o que acabava de dizer à incrédula Ally.

- Marcus disse que... que... vai pedir a custódia do bebé assim que nascer.

- Ele não pode fazer isso - respondeu Ally.

- Quem disse que não pode? Pode fazer o que quiser. É rico e tem poder e influências. Que juiz, quando o comparar comigo, não vai dar-lhe a custódia? Afinal de contas, eu estou a começar um negócio e vou ter de o fazer e criar um bebé ao mesmo tempo!

Ally olhou para ela, furiosa.

- Para começar, pára de te comportares como se já tivesses perdido o caso! Depois, procura um bom advogado, especialista nestes assuntos, que te explique as possibilidades que tens. Tu és a mãe.

-Eeleé o pai.

- Ele engravidou-te, Donna, é só isso. Mas és tu que carregas a criança dentro de ti.

No entanto, Donna hesitou.

- Não se trata apenas de um assunto biológico, Ally. Não com Marcus. Marcus é o pai do menino no sentido pleno da palavra.

Donna não sabia por que razão pensava daquela forma, porém, não podia evitá-lo. De certo modo, fugia ao campo da lógica ou da razão.

- É possível, Donna, mas isso não quer dizer que tenha o direito de te tirar o teu filho. É opressão masculina!

- Ou igualdade - comentou Donna, encolhendo os ombros. - Talvez os homens se sintam excluídos da criação dos seus filhos e é possível que tenham decidido que podem oferecer o mesmo apoio emocional e físico que as mulheres.

- Não pode tirar-te o teu filho - repetiu Ally. - Ou pode?

- Não sei, esse é o problema. E vou ter de descobrir.

- Como?

- Consultando um advogado.

- Bem, isso é fácil - Ally sorriu. - Tony Paxman é um bom advogado.

Contudo, Donna não queria recorrer a Tony. Na verdade, não queria ir a nenhum advogado de Winchester. A luta pela custódia do bebé podia ser muito desagradável. E Donna precisava de conhecer bem a sua situação e as possibilidades que tinha antes de assumir o papel de vítima local.

- Vou fazer alguns telefonemas - disse Donna a Ally. - Podes fazer o bolo de frutas?

- Claro! - respondeu Ally. - Sarah está quase a chegar. Porque não tiras o resto do dia livre?

- Obrigada, chefe! - exclamou Donna, rindo-se apesar das circunstâncias.

Donna telefonou a Carly Morrison, uma mulher que conhecera alguns anos antes em Londres num curso nocturno de confeitaria. Carly acabara por ter o seu próprio programa de culinária num canal de televisão, porém, ainda se mantinham em contacto. Carly não se assustava com nada, era encantadora e tinha muitos contactos.

Donna localizou-a no estúdio de televisão e depois de responder a todas as perguntas de Carly sobre o Buttress, Donna ganhou coragem suficiente para falar acerca do que queria.

- Carly, preciso que me faças um favor. A sua amiga desatou a rir-se.

- Se precisas de dinheiro, dirigiste-te à pessoa errada, querida.

- Não, não é dinheiro. Preciso que me recomendes um advogado.

- Estás com problemas, Donna?

Donna percebeu que, se começasse a explicar-lhe a sua situação, nunca mais acabaria.

- Não, não tenho problemas, Carly. Só preciso que alguém me aconselhe sobre um assunto.

- Está bem, tenho aqui o telefone de um bom advogado. Tens papel e lápis para apontar?

Depois de se despedir da sua amiga e desligar, Donna marcou o número do advogado, que era amigo de Carly, e ele disse-lhe tudo o que precisava de saber.

Depois da conversa telefônica, Donna voltou para a cozinha e encontrou Ally e Sarah a prepararem bolos a uma velocidade enorme.

- Tudo bem? - perguntou Sarah.

- Sim. Se não se importam, vou dar um passeio. Preciso de um pouco de ar fresco.

Donna, o que disse o advogado? - perguntou Ally.

Donna sentia-se enjoada.

- Depois conto-te. Agora preciso de sair daqui, sinto claustrofobia.

Lá fora, o dia estava abafado e o sol de Setembro encadeou-a. Sentia-se como uma estranha na cidade que melhor conhecia. Talvez fosse ao mercado comprar flores.

Seguiu pelo caminho mais bonito, apesar de ser também o mais longo. Gotas de suor caíam-lhe pelas costas e arrependeu-se de não ter posto um dos muitos chapéus que tinha.

No mercado, comprou dois ramos de margaridas e, enquanto tirava o dinheiro do porta-moedas, sentiu uma estranha dor na barriga. A sua testa estava coberta de suor e o vendedor olhou para ela com o sobrolho franzido.

- A senhora está bem?

Donna assentiu, com as flores nos braços. Depois, escolheu o caminho mais curto, mesmo que tivesse de passar pelo hotel de Marcus. Era muito fácil dizer a si mesma que a gravidez não mudava nada, todavia, sabia que teria de reduzir um pouco o ritmo.

Marcus estava à janela do seu escritório, perguntando-se por que motivo tudo lhe parecia tão diferente. A rua era a mesma e os carros continuavam a andar...

Seria porque havia uma mulher que esperava o seu filho? Uma mulher vulnerável a quem ameaçara levar aos tribunais. O que sentia era culpa e raiva. Apoiou a cabeça no vidro e suspirou.

Como pudera ter feito aquilo? Que tipo de homem era?

Teria de lhe dizer que não falara a sério, que as suas palavras tinham sido causadas por um enorme sentimento de frustração.

De repente, viu uma cabeça de cabelo avermelhado...

Não, não podia ser Donna. Aquela mulher estava demasiado grande para ser Donna. Donna não tinha o corpo redondo da mulher que estava a ver.

Marcus ficou gelado.

Estava enganado. A Donna da sua memória era uma rapariga despreocupada e a mulher que estava a atravessar a rua, com margaridas nos braços, tinha quase mais dez anos e caminhava torpemente devido ao peso do bebé que tinha na barriga.

Impulsivamente, Marcus começou a bater no vidro da janela. Ela levantou o olhar e viu-o.

Marcus viu-a atravessar a rua, para o hotel, com uma expressão de firme decisão.

Quando Marcus chegou à recepção, ela já lá estava, com o rosto extremamente pálido.

- Tenho de falar contigo - disse ela com voz abafada.

Marcus agarrou-a pelo braço, ignorando a tentativa de Donna de escapar dele.

- O que precisas é de te sentar - corrigiu ele e levantou uma mão para um dos ajudantes de cozinha que passava por ali naquele momento. - Graham! Por favor, leva chá para o meu escritório.

- Claro, Marcus - respondeu Graham.

Marcus conduziu Donna para o seu escritório. Lá, sentou-a numa cadeira. Estava assustado com a sua palidez e com o facto de se ter sentado sem protestar.

Donna sentiu alívio quando se sentou. Deixou as flores no seu colo, sentindo as palmas das suas mãos pegajosas e frias.

Marcus inclinou-se sobre ela.

- Ouve, Donna...

- Não! - Donna pensou no bebé, ganhando força. -Ouve tu, Marcus! Falei com um advogado...

-Donna...

- Cala-te! - exclamou ela com voz cansada. -Cala-te e ouve, Marcus. O advogado disse-me que, sem sermos casados, tu não tens nenhum direito sobre a criança. E já que não somos casados nem nunca seremos, acabou-se tudo. Está bem?

Marcus sentou-se na beira da secretária e deu-se conta de que Donna estava à beira das lágrimas.

- Está bem - respondeu Marcus.

Contudo, Donna queria uma discussão. Fora ali com a idéia de gritar com ele e...

- Estou disposta a fazer qualquer coisa para evitar que me tires o meu filho, Marcus. E é melhor que acredites em mim!

- Donna, não quero tirar-te o teu filho.

- Sim, queres!

Naquele momento, Donna olhou para ele com horror ao sentir uma dor intensa na barriga, uma dor quase insuportável.

- Marcus...

Marcus viu-a pestanejar e reparou que a expressão de Donna se devia, além do medo, a uma intensa dor física.

Donna... - disse ele num tom preocupado.

Enquanto se aproximava dela, viu-a ficar tensa antes de começar a cair para a frente, atirando as margaridas para o chão.

Marcus ouviu um grito e percebeu que fora ele que gritara enquanto agarrava Donna nos braços, evitando que caísse.

 

                             CAPÍTULO 9

Quando Donna abriu os olhos, viu uma luz suave dourada.

- Olá, Donna!

Reconheceu a voz. Sentia os lábios secos e hume-deceu-os com a língua. Pestanejou ao ver aqueles olhos azuis... E sentiu medo ao ver a sua expressão.

Viu dor naqueles olhos. Viu uma dor profunda.

Recordou. Recordou a sua própria dor física. E sangue. E Marcus, pálido, a falar ao telefone. Uma ambulância e calma. O frio da maça de um hospital. Um homem com uma máscara. Luz nos olhos. Dor e humidade.

- Oh, meu Deus! Não! - tentou endireitar-se na cama, porém, deixou-se cair mais uma vez na almofada.

Marcus pôs os braços à volta dos seus ombros e apertou-a com cuidado, como se receasse magoá-la.

- Espera um momento, vou chamar alguém. Ouviu uma campainha. Algum tempo depois,

Donna viu uma mulher de cabelo escuro com covinhas nas faces que se aproximou da cama. A mulher pediu a Marcus para sair, no entanto, ele recusou-se a mexer-se.

A mulher tinha um cartão de identificação na bata, que a identificava como enfermeira Hindmarsh.

- É uma mulher com muita sorte, Donna - disse a enfermeira Hindmarsh.

Donna olhou para ela e sentiu uma lágrima a rolar pela sua face. Sorte? Aquela mulher estava louca! Como podia ter sorte depois de ter perdido a única coisa importante na sua vida?

Donna abanou a cabeça.

- Claro que é - insistiu a enfermeira. - Andar por aí sem parar, descansar tão pouco... Não é de estranhar que se tenha sentido mal.

De repente, Donna apercebeu-se de que a enfermeira não estaria a falar daquela forma se...

- O meu filho? - perguntou Donna com voz abafada.

- O seu filho está bem. Está óptimo. Como disse, tem muita sorte.

Sem acreditar no que acabava de ouvir, Donna virou a cabeça para Marcus em busca de confirmação.

- Ele está bem, Donna. Está tudo bem - então, Marcus sorriu fracamente.

Donna tentou sentar-se na cama, contudo, Marcus impediu-a.

- Há quanto tempo estou aqui?

- Há algumas horas. O médico fez-te um exame e uma ecografia. Depois, adormeceste. Não te lembras de nada?

Donna abanou a cabeça.

- Não, não me lembro de nada.

- Eu estava contigo quando fizeram a ecografia - a voz de Marcus denotava um inconfundível orgulho.

A criança está muito bem! Claro que eu não sou muito imparcial.

Donna pôs uma mão na barriga. Continuava volumosa. Outra lágrima deslizou pela sua face.

- Não chores, querida - disse Marcus com ternura. - A criança está bem e tu também. Está tudo bem.

O médico mostrou-se mais firme e directo do que a enfermeira.

- Entende o que eu lhe disse, Donna?

Donna assentiu e olhou para Marcus à procura de ajuda, porém, ele mostrou-se tão implacável como o médico.

- Tem um pequeno problema: a placenta está muito descaída no útero. Isso significa que corre o risco de a placenta se rasgar e, se isso acontecer pode correr perigo de vida, assim como o bebé - o médico sorriu levemente. - Mas, no seu caso, não está excessivamente baixa, por isso o risco é pequeno, como já expliquei ao seu companheiro.

Donna abriu a boca para protestar, contudo, ao ver a cara de Marcus, percebeu que era melhor manter a boca fechada.

- Não há necessidade de tratamento especial, o que é importante é que descanse. É imperativo descansar, Donna. Entendeu? - o médico virou-se para Marcus: -Deve vigiá-la e evitar que se repita o que aconteceu hoje. Não significa que a sua mulher não possa dar um passeio, mas sem excessos de nenhum tipo. Nada de levantar pesos nem andar de bicicleta... nem sexo.

Donna nunca corara tanto na sua vida. Desejou que Marcus a ajudasse, porém, ele apenas piorou a situação ao perguntar:

- Refere-se ao sexo com penetração, não é, doutor? Daquela vez, foi o médico que corou.

- Bom, sim... é óbvio.

- E o meu trabalho? - perguntou Donna rapidamente, já que sabia que ia morrer de vergonha se continuassem a falar sobre o mesmo assunto.

O médico olhou para ela fixamente.

- Donna, o seu filho é importante?

- É a coisa mais importante do mundo - respondeu Donna sinceramente.

- Está bem. É tudo o que preciso de saber - disse o médico, sorrindo.

Marcus esperou que Donna apertasse o cinto de segurança do carro para insistir nas palavras do médico.

- Ouviste o que o médico disse, Donna. Espero que faças o que ele disse.

«Mantém a calma, mantém a calma», disse Donna para si.

- Diga o que disser o médico, tenho de gerir o meu negócio. Não posso ignorá-lo.

- Não tens de te preocupar com o negócio.

- Não tenho de me preocupar? - perguntou Donna quase a gritar. - É impossível manter as portas abertas apenas com duas pessoas e não tenho dinheiro para contratar mais ninguém.

Marcus lançou-lhe um olhar fugaz.

- Deixa-me concentrar na condução. Não quero ter uma discussão no carro.

- Quem disse que vamos ter uma discussão?

- Vejo-o na tua cara. Falaremos quando chegarmos a casa.

Donna recostou-se no banco e suspirou, consciente de que não valia a pena discutir naquele momento.

No entanto, protestou quando Marcus parou o carro à frente da sua casa.

- Importas-te de me dizer porque me trouxeste para a tua casa? Quero ir para a minha!

- Eu sei, mas aqui poderemos falar em privado. Nem no hotel nem no teu estabelecimento vamos conseguir falar sem sermos interrompidos.

Donna achou mais fácil concordar do que protestar. Além disso, sabia que Marcus tinha razão.

Donna permitiu-lhe ajudá-la a sentar-se num cômodo sofá à frente da janela da sala de estar que dava para o jardim. Depois, esperou que ele voltasse com um chá e algumas sandes.

Marcus sentou-se numa poltrona à frente dela e esperou que ela acabasse de comer, satisfazendo aquele apetite voraz. Ele, no entanto, perdera a vontade de comer depois do susto.

Durante a longa espera enquanto o médico examinava Donna, sentira-se completamente indefeso. Imaginara-se a perder a criança, a perder Donna... e parecera-lhe que o seu mundo se virava ao contrário. Fora uma experiência extremamente angustiante.

- Bom, Donna, agora quero fazer-te uma proposta.

- Continua.

- Prometes ouvir-me sem interromper? Donna fez uma careta.

- Não gosto nada desse pedido!

- Mas é necessário no teu caso. Prometes?

Como vou responder antes de saber o que vais propor-me?

- Donna, por favor... Ela sorriu.

- Suponho que, se pedes por favor, deve ser muito importante.

- Está bem, encararei isso como um sim - Marcus devolveu-lhe o sorriso, incapaz de resistir aos encantos de Donna e pensando que aquela mulher era um mundo de contradições. - Sei que disseste que não queres vir viver para cá...

Marcus levantou uma mão ao ver que Donna estava prestes a protestar.

- Lembra-te de que prometeste! - avisou ele.

- Sim, mas a situação não mudou. Continuo sem querer viver aqui.

- Claro que a situação mudou! Não estás em condições de fazer o que quiseres. Precisas de descansar, Donna. Ouviste o que o médico disse. Não podes voltar a trabalhar. E agora, em relação a viveres sozinha... O que aconteceria se começasses a sentir dores a meio da noite? Ou se, e espero que não, tivesses outra hemorragia?

- Nem o menciones! - Donna tremeu.

- O médico disse que não é provável, desde que te cuides. Precisas que alguém esteja contigo dia e noite e, se vivesses aqui, eu poderia cuidar de ti. Raios, quero cuidar de ti!

Donna olhou para ele fixamente.

- Já acabaste? -Sim.

- Posso falar?

Marcus suspirou. Como podia Donna estar grávida e, ao mesmo tempo, ser tão sensual?

- Sim, Donna, já podes falar.

- Quem vai gerir o teu negócio enquanto tu estás aqui a tomar conta de mim?

- O meu supervisor, naturalmente.

- Exacto! - respondeu ela triunfalmente. - E quem vai gerir o meu?

Felizmente, Marcus estava preparado para responder àquela pergunta.

- Como já te disse, isso está resolvido. Vou enviar uma das minhas cozinheiras para o teu salão de chá para ajudar Ally a preparar a confeitaria e também está disposta a servir às mesas e a fazer o que for necessário - Marcus tentou acalmá-la um pouco mais. -A verdade, Donna, é que tenho muitos empregados e estão à tua disposição sempre que precisares.

No entanto, Donna manteve-se implacável.

- Marcus, ainda não respondeste à minha pergunta. Quem vai administrar o meu negócio?

Marcus franziu o sobrolho enquanto tentava recordar o nome da rapariga loira que olhara para ele como se fosse o demônio em pessoa. Era Alison...?

- Ally! - exclamou Marcus, lembrando-se. - Ou Sarah.

- Não - corrigiu-o ela. - Ally trabalha e tem uma filha, que está a criar sozinha, e não pode trabalhar mais horas do que já trabalha. E Sarah tem apenas vinte e dois anos e uma vida social activa que lhe interessa mais do que o meu negócio, o que não é de estranhar.

Marcus olhou para ela fixamente.

- Então?

- Então, eu gostava de saber quem vai tratar dos pedidos ou do serviço da lavandaria ou receber os turistas... Todas as coisas que um negócio implica. Quem vai tratar de tudo?

Marcus compreendeu o ponto de vista de Donna e também percebeu quem era a única pessoa que podia fazer tudo o que ela enumerara.

- Eu - respondeu Marcus, suspirando.

- Exacto! Portanto, faz muito mais sentido que tu vás viver comigo.

Marcus olhou para ela com interesse.

- Como?

- Como? - resmungou ela. - Agarras numa mala com as tuas coisas e vais viver comigo!

O interesse tornou-se ainda mais intenso.

- Posso perguntar onde?

- Talvez não tenha cinco quartos, como tu, mas tenho dois. Um para mim e outro para ti. O andar de cima é um apartamento, portanto encontrarão nele todas as comodidades de uma casa normal. Simples.

- Simples - repetiu Marcus, apercebendo-se de que ficaria no quarto onde fizera amor com ela.

Marcus suspirou, sem conseguir evitar pensar que o seu novo lar ia ser como uma espécie de prisão sofisticada.

Ally e Sarah riram-se como duas meninas quando Donna lhes deu a notícia.

- Marcus Foreman vai trabalhar e viver aqui? - perguntou Sarah com incredulidade.

- Vai usar avental? - perguntou Ally.

- Bom, desde que não tenha nada debaixo do avental - disse Sarah. - Tem um corpo de morrer!

- Sarah! - gritaram Donna e Ally em uníssono.

- É verdade - insistiu Sarah.

- Faz-nos um favor e prepara um chá! - exclamou Donna, rindo-se. - E depois vai tomar um duche de água fria.

- Bom, vamos ver se entendi - disse Ally, quando Sarah foi até à cozinha. - Marcus vai fazer o teu trabalho e, além disso, vai enviar-nos pessoal do hotel quando precisarmos?

- Sim. Quer tomar conta de mim.

- Até que ponto? Donna corou.

- Não é o que estás a pensar. Ele acha que não devo estar sozinha e o médico também o disse.

- É só isso?

- Sim! Eu vou dormir no meu quarto e Marcus vai ficar no quarto de hóspedes.

- E não estarás a provocar o seu apetite sexual... Com a proximidade?

Donna olhou para Ally, incrédula.

- Estás a brincar! Não me parece que Marcus se sinta excitado com uma mulher que parece uma montanha de gordura.

- O quê? - perguntou o homem que acabava de entrar.

Donna corou imediatamente.

- Nada.

- A falar dos meus apetites sexuais, eh? - perguntou Marcus com voz sedutora.

- Se sabias, porque perguntaste?

- Gosto de te ver a corar, Donna.

- Pois aproveita enquanto podes. Com um pouco de sorte, ficarei imune ao teu sentido de humor - disse ela com voz doce.

- Duvido - Marcus sorriu. -Veremos!

Ally levantou-se.

- De repente, sinto que estou a estorvar. Acho que vou ver como está o chá.

- Não tens de sair - protestou Donna. Ally sorriu.

- Sabes bem que três pessoas são uma multidão! Ally fechou a porta quando saiu e Donna e Marcus

olharam um para o outro.

- Vamos ter de parar de fazer isto - disse Donna.

- O quê? Falar do que me excita? Concordo. A vida no meu hotel vai parecer-me muito aborrecida comparada com a vida aqui se este é o tipo de conversa que têm normalmente!

Donna olhou para ele nos olhos e reparou na sua expressão travessa e cheia de humor; uma mistura irresistível.

- Sabes perfeitamente que não estava a referir-me a isso, mas a excluir Ally e Sarah. Não podemos fazê-lo.

Contudo, o desejo já se apoderara de Marcus.

- Tu é que começaste ao falar de mim quando eu não estava presente!

- Estávamos apenas a falar do sítio onde vais dormir - Donna sorriu e olhou para a discreta mala que Marcus tinha consigo. - Queres que te mostre o teu quarto?

- Está bem.

Sentindo-se como um homem a caminho da sua própria execução, Marcus seguiu-a até ao andar de cima e reparou como a gravidez dera mais volume às nádegas de Donna. Decidiu que gostava mais assim. Talvez gostasse demasiado.

Nunca estivera no andar de cima, além da tarde em que tinham feito amor, contudo todas as divisões estavam gravadas na sua memória.

Donna reparou que ele ficou tenso e imaginou o que estava a pensar, pois estava a pensar em algo parecido.

- Foi aqui que tudo começou - murmurou ela quando se aproximaram da porta do quarto. No entanto, Marcus abanou a cabeça.

- Não, Donna, começou muito antes. Começou na primeira vez em que puseste os pés no meu hotel, encharcada e vulnerável.

Donna fez um esforço para evitar que aquela lembrança a seduzisse. Ou as palavras de Marcus. Passou pela porta do quarto que ia ser o dele e levou-o até ao dela.

Marcus ficou surpreendido ao perceber que Donna

iria permitir-lhe acesso ao seu santuário.

As paredes do quarto eram cremes, as cortinas das janelas eram brancas e a cama com pés e cabeceira de bronze. Nas paredes, Donna tinha inúmeros chapéus de palha pendurados; alguns com flores, outros com laços e outros com diferentes decorações.

- Compro um chapéu todos os anos quando chega o Verão - explicou ela quando viu que Marcus observava os chapéus.

- Qual foi o que compraste este ano?

Donna apontou para a sua nova aquisição: um chapéu com cerejas e um laço vermelho.

- Este.

- Coloca-o - disse Marcus com voz suave. -Não.

- Como supervisor deste estabelecimento, ordeno-te que o ponhas.

Era estranho como Marcus conseguia fazer com que um gesto tão inocente como pôr um chapéu parecesse um convite tão erótico.

- Não, não vou pô-lo. Acaba de ver o meu quarto! Reprimindo o seu desejo, Marcus obedeceu. Além

da cama, a única peça de mobiliário que havia era uma cômoda com um pequeno banco. Em conjunto, o efeito era simples, espaçoso e com estilo. Donna olhou para ele.

- Bom, o que achas?

- Gosto. É um quarto muito bonito e feminino, mas sem excessos.

- Era isso que esperavas, excessos?

- Não sei o que esperava, Donna. Não esperava que voltasses para Winchester e abrisses um negócio -Marcus sorriu. - Mas aprendi a esperar qualquer coisa de ti, Donna. Não encaixas em nenhum estereótipo.

- Nesse caso, destruamos outro estereótipo, está bem?

Donna aproximou-se da cômoda e agarrou numa fotografia com uma moldura prateada.

- Toma - disse Donna, dando a fotografia a Marcus.

Marcus observou-a. Era o retrato de uma mulher de uns vinte e cinco anos, com um biquíni minúsculo, que sorria para a objectiva com uma mistura de atrevimento e inocência. Apesar de ter o cabelo escuro, era fácil ver as semelhanças. Os grandes olhos verdes e o sorriso misterioso eram os mesmos de Donna.

- É a tua mãe?

- Sim - Donna apontou para o biquíni. - Vês o que tem vestido?

Marcus assentiu.

- Quando se despia durante a sua actuação, costumava deixar as cuecas do biquíni. E parte dos seus seios estava coberta com brilhantes. Nunca se despia por completo.

- Não tens de me dar explicações, Donna - disse Marcus, incomodado.

- Sim, Marcus, tenho - respondeu ela com firmeza. - Os tempos mudaram. Antes era outra coisa, mas a minha mãe não ficava mais nua do que muitas mulheres na praia agora.

Donna tirou-lhe a fotografia e voltou a colocá-la no seu sítio.

- Não estou a dizer que o trabalho da minha mãe era bom, porque não era - continuou Donna. - Era um mau trabalho. No entanto, a minha mãe fazia tudo para o tornar aceitável. E agora, vê esta outra fotografia.

A fotografia seguinte que Donna lhe mostrou era da mesma mulher mas quando tinha à volta de cinqüenta anos. O seu cabelo tinha alguns fios brancos e tinha um vestido leve de lã e um colar de pérolas. Tinha o aspecto de uma mulher que, se entrasse no seu restaurante, receberia automaticamente a sua melhor mesa.

- Esta fotografia foi tirada alguns anos depois de ter comprado a pensão - disse Donna.

Marcus não conseguiu disfarçar a sua surpresa.

- Como é possível que mudasse tanto?

- A minha mãe foi sempre uma autodidacta. Não foi a aulas nocturnas para adultos nem nada disso. Simplesmente, começou a ler muito e livros de todos os tipos. Aprendeu a pensar e a vestir-se bem. Deixou de achar que a bijutaria era maravilhosa e que as pérolas e o âmbar eram aborrecidos. Aprendeu a valorizar as coisas.

- Mas não voltou a casar-se?

- Nunca foi casada, nem com o meu pai. Eu sou filha ilegítima - disse Donna e sorriu quando pousou a fotografia no seu lugar. - Vês? Isso também já não escandaliza ninguém.

- Mas quando tu eras pequena escandalizava, não é verdade?

- A algumas pessoas, mas não as suficientes para me destruir a vida - Donna encolheu os ombros e aproximou-se dele. - Não estou a mostrar-te isto para ganhar a tua simpatia, Marcus. A minha infância fez-me como sou e eu gosto da pessoa que sou. Portanto, não me envergonho de nada. Marcus pôs-lhe as mãos no rosto.

- Eu também gosto da pessoa que és.

- É um bom começo.

Marcus acariciou-lhe o queixo com o polegar.

- Eu também quero que saibas algumas coisas, Donna, e a primeira diz respeito à tua mãe.

Donna recuou, afastando-se daquele dedo que estava a distraí-la.

-Continua.

- Eu nunca te julguei, nem ti nem à tua mãe, pela forma como ela ganhava a vida... Não me deste oportunidade de o fazer. Foste tu que decidiste que eu tinha esse tipo de preconceitos. O que me incomodou foi o facto de tu me teres mentido e, por outro lado, teres confiado no meu irmão.

- Tu estavas sempre ocupado com o trabalho, Marcus. Além disso, sempre puseste uma barreira entre nós.

- É possível.

- É a verdade - Donna olhou para ele e percebeu que talvez não tivesse sido tão sincera com ele como poderia ter sido. - Queria que gostasses de mim, Marcus, não que olhasses para mim como um ser inferior. Foi por isso que te disse que a minha mãe era actriz.

- Sim, eu percebi, mas agora. Além disso, eu gostava de ti. O problema era que o que sentia por ti era uma coisa que não conseguia controlar. Acho que, mesmo que me tivesses dito que vinhas de Marte, agiria da mesma forma.

Donna olhou para os seus olhos.

- Isso era a primeira coisa que querias dizer-me. Qualé a segunda?

- É uma coisa que tentei dizer-te ontem quando foste ao meu escritório: nunca tive intenção de te tirar a custódia da criança.

- Mas foi o que disseste.

- Eu sei. Mas estava zangado e frustrado... Porque me sentia rejeitado.

- Lamento - disse Donna.

O desejo de a beijar foi mais forte do que nunca, contudo, Marcus sabia que não era o momento certo sabia que Donna estava demasiado frágil.

E o médico dissera que nada de sexo.

- Porque não vais descansar um pouco? - perguntou Marcus. - Enquanto isso, eu vou ver o que é preciso fazer na cozinha.

 

                               CAPÍTULO 10

Durante a primeira semana que Marcus passou em casa de Donna, trataram-se como duas pessoas que tinham acabado de se conhecer, em vez de como um casal que estava prestes a ter um filho.

Marcus chegava mesmo a ir barbear-se ao hotel de manhã, depois de Ally e Sarah chegarem, pois como dissera a Donna, as casas de banho eram sítios privados e não queria Invadir o seu espaço.

Finalmente, Donna decidiu que precisavam de falar. Esperou que Ally e Sarah saíssem depois de um dia especialmente atarefado e foi ter com Marcus, que estava a trabalhar no pequeno escritório. Encontrou-o com um aspecto cansado, no entanto, continuava a ser o homem mais atraente que vira na sua vida.

Marcus levantou a cabeça e franziu o sobrolho ao ver Donna a entrar.

- Está tudo bem? -Não.

Marcus levantou-se imediatamente.

- É o bebé?

- Não, não é o bebé! - respondeu Donna, zangada. - Nem sempre que estou cansada se deve à gravidez, Marcus!

- Não te exaltes!

- Exaltar-me-ei se quiser! Sou eu quem está grávida, está bem? Sou eu que tenho de agüentar esta situação estranha de te ter aqui como... como...

- Como o quê? - perguntou Marcus com cautela.

- Como um desconhecido! - exclamou ela. Marcus sorriu.

- Vá lá, senta-te - sugeriu ele com voz suave. Donna sentou-se na cadeira à frente da de Marcus. Perguntou-se o que ia dizer-lhe. Então, apercebeu-se de que não ia perder nada por ser sincera.

- Se, para ti, viver comigo só significa preparar-me a comida, levar-me chávenas de chá o dia todo e depois fechares-te no quarto, acho que isto não vai funcionar.

- Está bem, diz-me o que queres. Donna engoliu em seco.

- Se estiveres aqui fisicamente, mas não em espírito, para mim implica ter as desvantagens de partilhar a casa com uma pessoa, mas não as vantagens.

- Como por exemplo? Donna encolheu os ombros.

- Oh... não sei! Por exemplo... conversas nocturnas enquanto bebemos um chocolate quente...

Marcus voltou a sorrir.

- Queres chegar ao fundo da minha alma, não é isso, Donna? - murmurou ele num tom brincalhão.

- Sim, é isso - respondeu ela. - Se é que tens alma! Vais ser o pai do meu filho, Marcus. Por isso, não quero que sejas um desconhecido para mim... nem para o menino quando nascer. Quero poder responder às perguntas que ele me fizer sobre ti quando crescer.

O sorriso de Marcus desapareceu.

- Referes-te a quando eu estiver ausente? Achas que não vou poder responder às perguntas dele?

- É essa a questão, não sei! Não falámos sobre isso, pois não? Não falámos sobre nada. Até que ponto pretendes exercer o teu papel de pai? - perguntou Donna, olhando para ele com intensidade.

Marcus ficou em silêncio um momento.

- Não achas que devíamos levar as coisas com mais calma?

- Há uma grande diferença entre levar as coisas com calma e não as enfrentar absolutamente!

Marcus voltou a sentar-se na sua cadeira; os seus olhos, em contraste com a camisa clara que tinha, estavam muito azuis.

- Não podemos prever como vamos reagir quando a criança nascer. O que podemos fazer é tirar o maior partido possível do presente e ver onde nos leva. A relação que estabelecermos nestes meses que faltam até ao nascimento do nosso filho será a base do futuro.

- Que bela base! - murmurou ela. - A única coisa que fizeste até agora foi evitar-me.

Marcus abanou a cabeça.

- Não estive a evitar-te, querida. Apenas tentei não invadir o teu espaço. Não queria mudar a tua vida...

- Marcus! - Donna inclinou-se sobre a secretária. -A única coisa que poderia mudar a minha vida mais do que já mudou seria descobrir que o meu parto seria televisionado!

- Ah, sim, agora que falas nisso... Queria falar contigo precisamente sobre esse assunto - disse Marcus com uma expressão séria.

Os seus olhares encontraram-se e soltaram faíscas de humor incrivelmente eróticas. Donna acariciou a barriga, como se quisesse recordar a si mesma as conseqüências dos pensamentos eróticos.

- Está bem, pergunta-me o que queres saber - disse ele, finalmente.

- O que quero saber são coisas sobre ti - respondeu ela simplesmente.

Marcus assentiu, quase para si mesmo, pois já se perguntara quando iam chegar àquele ponto.

- Suponho que não queres que fale acerca da minha vida profissional no mundo da hotelaria, pois não? -perguntou ele com um sorriso brincalhão.

- Não.

- Queres que fale sobre as minhas relações com outras mulheres?

Donna respirou fundo. Sim, era isso que queria saber, contudo, não esperara que Marcus fosse tão directo.

Marcus não esperou por uma resposta.

- Vá lá, Donna, não é preciso corares. Queres que eu fale sobre as minhas relações no passado, não é verdade?

- Mentiria se te dissesse que não me interessa - respondeu Donna. - No entanto, não tenho a certeza de querer saber alguma coisa sobre as tuas relações.

- Talvez prefiras falar-me tu acerca das tuas - disse ele, desafiando-a.

- Bom, a minha vida sentimental não foi nada extraordinária... O normal.

- Um resumo muito geral, não? - Marcus entreabriu os olhos. - Pensaste em casar-te?

- Não. E tu?

Marcus abanou a cabeça.

- Não, nunca. E alguma vez estiveste apaixonada? Donna não estava disposta a admitir que o amava,

pois a sinceridade não devia ser sinónimo de humilhação.

- O que é o amor? - respondeu ela num tom petulante.

- Cínica! - Marcus desatou a rir-se, contudo estranhou que a resposta de Donna o tivesse desiludido.

Não podia ser assim tão presunçoso para acreditar que, no passado, ela o amara, ou podia?

- E tu? - perguntou ela num tom hesitante.

- Bom... houve alturas em que acho que senti alguma coisa que alguns qualificariam de amor - respondeu ele devagar. - Mas sempre recuei.

- Mesmo a tempo, não é verdade? - sugeriu Donna.

- Sim, é possível.

O olhar de Marcus tornou-se pensativo. Houvera mulheres na sua vida. Depois de ter despedido Donna, tivera relações com muitas mulheres, talvez para demonstrar a si mesmo que era o melhor amante do mundo. Durante uma temporada.

Nos anos que se tinham seguido, conhecera algumas mulheres perfeitas para o casamento. No entanto, alguma coisa o impedira de se comprometer e nunca pensara demasiado para tentar descobrir o que era.

- É possível - repetiu Marcus. - E agora, tu, Donna. Diz-me, quando te levantas de manhã e te lembras de que vais ter um filho meu, sentes-te encurralada? Desejas que não tivesse acontecido?

Donna mudou de posição na sua cadeira e meditou alguns segundos antes de responder.

- Às vezes sim. Sobretudo, quando penso na responsabilidade que implica ter um filho. E, é claro, também tenho algum receio do parto. Mas perguntei a outras mães no grupo de preparação para o parto e todas me disseram que lhes aconteceu o mesmo. Quanto ao resto, enfim... aconteceu e, como tu mesmo me disseste uma vez, não podemos mudar o passado. Mas...

Donna interrompeu-se e a sua expressão tornou-se reflexiva.

- Mas o quê?

Donna encolheu os ombros.

- É engraçado... Quer dizer, às vezes, a razão grita: «Socorro!». Mas, por outro lado, a lógica deixa de ter importância. Apesar de não ter engravidado intencionalmente, quero ter um filho. De facto, estou desejosa de o ter.

- A sério?

- Sim, a sério. Imagino que um psicólogo diria que estou a tentar formar uma família para compensar a falta de vida familiar na minha infância. O problema é que não vai ser uma unidade familiar completa. Vou fazer exactamente o que a minha mãe fez; vou criar o meu filho sozinha.

Marcus abanou a cabeça.

- Enganas-te, Donna. O teu pai abandonou a tua mãe, mas eu não irei a lado nenhum.

- Mas talvez um dia o faças. Chegará o dia em que não olharás para trás. O dia em que te apaixonarás por uma mulher e essa mulher não quererá que tenhas nada a ver comigo. E quem poderá culpá-la? Afinal de contas, o bebé é o resultado de uma noite de sexo.

- Donna, o preservativo talvez se tenha rompido porque... - Marcus interrompeu-se para ganhar coragem e reconhecer a verdade. - Porque... não me recordo de alguma vez ter feito amor com tanta paixão. Fez-se um breve silêncio.

- A sério? - perguntou Donna, com o coração apertado e sem se atrever a olhar para ele.

- A sério.

Donna tentou não se iludir, já que o facto de terem feito amor apaixonadamente não significava que Marcus a amasse.

- Estás bem? - perguntou Marcus. Donna sentia-se estranhamente tímida.

- É a criança, está a mexer-se.

Marcus morria de vontade de tocar na sua barriga, contudo, já tinham tido demasiadas emoções por um dia.

- Donna... -Hum?

- Pareces cansada.

- Estou... um pouco.

- Nesse caso, vai deitar-te enquanto eu preparo o jantar - viu a expressão de Donna e interpretou-a imediatamente. - E não te preocupes, não vou voltar a agir como um hóspede. Vai ser tudo como tu queres que seja, está bem? À noite, falaremos pelos cotovelos.

Marcus sorriu e acrescentou:

- Continuas a gostar de jogar às cartas?

- Bom... estou um pouco em baixo de forma.

- Melhor para mim.

- Tenho a certeza de que não conseguirei ganhar -disse Donna num tom inocente.

 

                             CAPÍTULO 11

- Bom, o que queres fazer esta noite, querida? Donna levantou a cabeça do bordado que estava a

fazer para o seu filho e sorriu.

-Jogar às cartas?

Marcus fez uma careta e, inquieto, começou a passear pela sala de estar.

- Estou farto de jogar às cartas.

- O que estás é farto de perder!

- Só te deixo ganhar por causa da tua condição frágil-

- Sim, claro! - Donna conteve uma gargalhada. -De qualquer modo, não me sinto nada frágil esta noite.

- De facto, não pareces estar. Pareces tão saudável como...

- Como uma bola?

Marcus ficou a olhar para ela com uma mistura de orgulho e luxúria.

Sobretudo, luxúria.

Não fora fácil, porém, durante os últimos meses conseguira conter o seu desejo por ela, grávida ou não.

- Não, não pareces nada uma bola.

- Então, o que pareço?

Eram aqueles olhares que o desarmavam.

- Pára de brincar comigo, Donna! Arriscas-te a ter uma surpresa.

Donna olhou para ele pensativa, fixando-se em como estava bonito com aquela camisola cinzenta e calças escuras de bombazina. No entanto, parecia mal-humorado e não sabia porquê, já que agora as coisas entre eles estavam a correr às mil maravilhas.

Num canto do quarto estava a árvore de Natal que Marcus decorara no dia anterior, com as suas instruções, é claro.

Era difícil de acreditar que estavam a viver juntos apenas há três meses e, no entanto, Marcus parecia ter encaixado perfeitamente na sua vida.

- Pareces um pouco alterado esta noite - observou ela com a calma que parecia ser uma característica permanente da sua gravidez.

-Sim, bom...

- Bom, o quê? Marcus abanou a cabeça.

- Nada.

- Marcus - disse ela impaciente, - não podes começar e depois não explicar nada. Diz-me o que se passa.

- Bom, é... a tua atitude.

- Sim? Ficaste incomodado por eu ter imposto a minha opinião em relação à árvore?

- Vês! É precisamente isso a que me referia!

- O quê? - perguntou Donna sem compreender. -Encaras as coisas com muita displicência. Donna olhou para ele e a sua expressão tornou-se violenta.

- Estás a insinuar que não estou a encarar a gravidez com seriedade?

- Sim! Não! Não sei!

- Continua.

Marcus passou uma mão pelo cabelo e depois deixou-se cair numa poltrona.

- Fisicamente, estás a fazer tudo o que o médico recomendou.

- Parece-me que vem aí um «mas» - observou Donna.

- Mas não faço idéia do teu estado mental! Donna pestanejou.

- Achas que estou a enlouquecer? -Donna!

- Bom, foi o que me pareceu que disseste.

- O que estou a dizer é que nunca falas do que te preocupa! - exclamou Marcus. - Não me falas dos teus medos, das tuas preocupações, das tuas inseguranças...

- É óbvio que tenho tudo isso.

- Eu sei.

Donna olhou para ele fixamente nos olhos.

- E como sabes?

- Lembras-te do que aconteceu em Setembro? -perguntou ele.

-Isso foi há meses!

- Eu sei, conheço o calendário! Mas, lembras-te do passeio que demos até à catedral, quando viste um grupo de meninos da escola?

- Sim, lembro-me. E então?

- Lembras-te de como ficaste calada? Vi-te a olhar para um menino em particular.

Um menino que tinha os olhos muito parecidos com os de Marcus.

- Sim, é verdade.

- Sei que estavas a pensar no dia em que o nosso filho for à escola como aquelas crianças.

- Admito que fico contente por teres reparado na minha reacção, Marcus, no entanto, isso foi há três meses. Porque demoraste tanto tempo para o mencionar?

Marcus suspirou.

- Porque quando o médico disse que não devias aborrecer-te, supus que o melhor era adiar os assuntos mais preocupantes para evitar problemas. Mas eu gostava de saber... Como te sentes? O que sentes?

- E tu, como te sentes? - perguntou Donna. -Isso não é justo!

- Não fales no que é justo ou não é, Marcus. Marcus hesitou. Analisar os seus próprios sentimentos era uma coisa muito estranha para ele.

- Às vezes, tento imaginar a vida depois do nascimento do menino, mas não consigo. Não tenho imaginação suficiente - Marcus esticou as pernas e sorriu. -Mas também nunca teria imaginado viver contigo e, olha, aqui estou eu.

- E é suportável? - perguntou ela, forçando um tom despreocupado.

- É mais do que suportável! Eu gosto e muito - ex-cepto o facto de não poder ter relações sexuais com ela. - O que mais quero no mundo é que tu e o nosso filho estejam bem.

Donna assentiu.

- Eu sei, Marcus - respondeu Donna, acariciando a barriga.

Marcus considerou a imagem de Donna com a barriga volumosa imensamente terna naquele momento. Pensou em como estava a ser valente; nunca se queixava de cansaço nem parecia estar preocupada com as novas formas do seu corpo, como acontecia com muitas mulheres.

- Aconteça o que acontecer entre nós, Donna, temos de fazer um esforço, temos de fazer com que tudo corra o melhor possível... Pelo nosso filho.

- Sim, eu sei - respondeu Donna, preparando-se para o inevitável.

E o inevitável era que Marcus partiria daquela casa, assim que a criança nascesse, e que ela apenas o veria quando fosse visitá-la ou buscá-la para passear.

- Nós não tivemos infâncias muito felizes, querida. Façamos o possível para que não aconteça o mesmo ao nosso filho.

O sorriso de Donna estava repleto de desejo e incerteza.

Marcus percebeu-o e desejou apertá-la nos seus braços, contudo, aterrorizava-o que Donna pudesse interpretar mal o seu gesto. Além disso, não confiava em si mesmo. Se a abraçasse... não sabia se conseguiria parar.

Os dias continuaram a passar. Passavam as tardes juntos e também os fins-de-semana. Marcus cozinhava e Donna continuava a comer por duas ou três pessoas. Jogavam às cartas e viam televisão, apesar de mudarem de canal sempre que havia alguma coisa remotamente relacionada com sexo.

Liam livros, às vezes, o mesmo livro. Depois, cada um expunha a sua crítica à leitura. Por vezes, estavam de acordo, contudo, e com mais freqüência, as discussões acabavam acaloradamente.

E acalorado era o adjectivo que melhor descrevia a forma como Marcus se sentia depois de Donna ir para a cama. Marcus procurava distracções que evitassem com que pensasse em como ela devia estar suave e bonita debaixo do edredão branco.

- Queres comer alguma coisa? - perguntou ele com um sorriso terno.

- Não tenho muita fome - Donna entrelaçou as mãos em cima da sua barriga. - Parece-me que já não tenho espaço para a comida. Ai!

Marcus sentiu-se ansioso.

- O menino está a mexer-se? -Sim.

- Posso pôr a mão na tua barriga para o sentir?

- Claro.

Donna endireitou-se no sofá para que ele se sentasse perto dela, porém, receava a sua própria reacção ao sentir a mão dele na barriga.

Marcus sentou-se ao seu lado e, quando pôs a mão na barriga de Donna, o bebé voltou a dar um pontapé.

- Ah, grande pontapé! Deve doer-te muito, não é verdade, Donna?

Ela abanou a cabeça.

- Não, não é exactamente uma dor. Na verdade, é uma sensação fantástica, mas acho que não consigo descrevê-la.

Marcus não afastou a mão. -Achas que é um menino?

- Sim - Donna assentiu. - Ou uma menina. -Donna!

- Marcus! - brincou ela.

- Gostavas que nos tivessem dito?

Nas ecografias de rotina, tinham perguntado se queriam conhecer o sexo do bebé, contudo, depois de olharem um para o outro, ambos negaram com a cabeça simultaneamente.

- Não, acho que não - respondeu Donna. - Quero que seja uma surpresa.

Marcus sentiu um aperto no coração.

- Oxalá pudesse dar à luz por ti, querida.

- Lamento, mas não podes. De qualquer modo, agradeço-te a intenção.

Marcus perguntou-se se Donna era tão consciente como ele de que tinha os dedos a escassos centímetros dos seios dela, que cresciam a cada dia. Morria de vontade de tocar neles.

Donna estava com o vestido que ele lhe comprara em Londres um dia que tivera de ir, contrariado, a uma reunião. O vestido era de veludo verde-claro, caro e não muito prático. Quando o comprara, Marcus pensara que Donna se sentiria como uma deusa grega.

- Este vestido fica-te muito bem - disse Marcus com voz sedutora.

-Sim?

- Sim. Pareces um broto prestes a abrir-se.

- É demasiado elegante para andar por casa, mas como só faltam três semanas para o parto, acho que é melhor aproveitar.

- Hum - murmurou Marcus, mal prestando atenção às palavras de Donna, apenas consciente do bebé que estava a crescer na barriga dela.

Donna apercebeu-se de que Marcus ainda tinha a mão em cima da sua barriga e foi invadida por uma sensação incrível de satisfação. Sentiu-se a salvo, protegida.

Por que razão não podia desfrutar daquela sensação de bem-estar? Afinal de contas, era uma atitude convencional entre duas pessoas que iam ser pais. Na verdade, eles não eram o casal mais convencional do mundo, mas... qual era o problema?

Gostava de sentir a mão de Marcus na barriga. De facto, sentia-se tão bem que ia apoiar a cabeça no ombro dele. E porque não? Já tinham combinado que ele estaria presente no parto e não havia nada mais íntimo do que isso.

Marcus sentiu o pulso a acelerar quando ela apoiou a cabeça no seu ombro. Era extremamente cómico pensar que um gesto simples de afecto como aquele podia proporcionar-lhe semelhante prazer! E era ainda mais ridículo o facto de se sentir tão inexperiente. Bom, na verdade, era um novato naquela situação. Nunca fizera amor com uma mulher grávida...

E também não ia fazê-lo naquele momento, disse para si com firmeza. A única coisa que Donna estava a fazer era apoiar a cabeça no seu ombro!

Donna fechou os olhos e ficou meio adormecida. Incapaz de resistir mais, Marcus subiu ligeiramente o dedo e acariciou-lhe o peito inchado, contendo a respiração com medo da possível reacção de Donna.

Ela suspirou.

Marcus continuou a acariciá-la e, daquela vez, o suspiro de Donna foi muito agradável. Então, ele sentiu-se mais audaz, recomeçando as carícias até fazer com que ela se mexesse e gemesse.

- Donna? - inquiriu Marcus com voz suave. Donna abriu os olhos e encontrou-o a olhar para ela.

-Hum?

- Acordei-te?

- Não estava a dormir.

- Estavas a fingir que estavas a dormir? - perguntou ele de repente.

Donna sentiu-se preguiçosa e confortável.

- Sim. Foi um atrevimento da minha parte, não foi?

- E porque fingiste?

- Suponho que pensava que, se fingisse estar a dormir, podia continuar a desfrutar do que estavas a fazer sem me perguntar se devia deixar-te fazê-lo.

- Não te sintas culpada.

- Isso é fácil de dizer.

- Não penses, desfruta - a idéia de que Donna queria que ele lhe tocasse excitou-o quase ao ponto de enlouquecer. - A verdade é que tinha medo que desses um salto e me esbofeteasses por te tocar.

- No meu estado, duvido muito que possa saltar -comentou ela.

Marcus reparou no tom rouco da voz de Donna. Ela queria que continuasse, tinha a certeza.

- Bom, parece-me que vou continuar com o que estava a fazer. Quem sabe, talvez te ajude a adormecer.

- É possível - respondeu ela, pouco convencida, e voltou a fechar os olhos.

Marcus tinha medo de não ser capaz de parar. E teria de o fazer no momento em que sentisse a mínima resistência em Donna.

No entanto, continuou a acariciar os seus seios e ouviu-a a suspirar de prazer. Só um parvo não perceberia que Donna desejava há meses aquelas carícias.

Marcus sorriu junto aos lábios de Donna.

- Podia passar a noite toda a beijar-te. Ela abriu os olhos.

- E talvez eu deixasse.

- A sério? - murmurou ele.

- Sim, a sério.

Donna pensou que Marcus ia começar a despi-la naquele momento, todavia não o fez. Em vez disso, tirou-lhe a fita que lhe segurava o cabelo, libertando-o.

-Abana a cabeça - sussurrou ele.

Donna obedeceu e o cabelo caiu-lhe sobre os ombros.

- És o meu sonho tornado realidade, Donna. Sabias?

«Não, tu és o meu sonho», pensou ela. «Tu és o meu sonho tornado realidade e eu amo-te».

Marcus começou a acariciar o corpo de Donna até que ela ardeu de desejo. Então, com cuidado, subiu-lhe o vestido até à cintura, deixando a descoberto a sua volumosa barriga.

- Não - disse ela imediatamente.

- Não o quê?

- Não olhes.

- Mas és tão linda.

- Não, não sou. Estou...

- Sim, és - contradisse Marcus. - Grande e forte e maravilhosamente madura.

Donna deu-se por vencida e deixou que ele a rodeasse até lhe pôr as mãos nas nádegas firmes. Deixou que ele lhe beijasse as pálpebras, a ponta do nariz e os contornos da boca e sentiu-o a tocar no centro do seu desejo... até se perder no erótico mundo que Marcus criara.

Donna murmurou o nome dele e depois começou a mexer-se ao ritmo que Marcus marcava.

Ele, olhando para ela, continuou a acariciá-la, maravilhado com os movimentos das pernas dela. Sabia que era mais prático levá-la para o seu quarto, porém, também sabia que Donna estava à beira do clímax.

A pena era que ia ser tudo muito rápido, pensou Marcus enquanto observava o movimento frenético das ancas de Donna.

Ela sentiu o primeiro espasmo de prazer a percorrer o seu corpo todo... até que receou morrer de prazer. E gritou o nome dele.

Marcus levou-a nos braços até ao seu quarto e despiu-a como se fosse uma menina. Depois, tirou a camisa de dormir de debaixo de uma almofada e ajudou-a a vesti-la.

Quando a cobriu com o edredão, ela estava a dormitar e Marcus estava dorido de excitação, sabendo que se não saísse daquele quarto imediatamente...

Começara a caminhar em bicos de pés para a porta quando a voz dela fez com que parasse.

- Marcus?

Marcus virou-se.

Os olhos de Donna estavam muito abertos.

- Vem para a cama. Ele abanou a cabeça.

- Não, estás cansada e precisas de dormir. Não te preocupes comigo - mentiu ele.

- Claro que me preocupo. Quero abraçar-te e quero que me abraces.

- E se eu disser que não?

- Queres obrigar-me a levantar-me e a correr atrás de ti pela casa toda? Na minha condição delicada? -perguntou ela num tom brincalhão.

Marcus sorriu.

- Bom, depois não digas que não tentei comportar-me como um cavalheiro.

- Eu não vou deixar que te comportes como um cavalheiro.

- Nesse caso... - Marcus lançou-lhe um olhar felino enquanto fechava a porta antes de começar a desabotoar a camisa.

Marcus não queria assustá-la, por isso decidiu despir-se devagar. E viu-a a observá-lo, claramente desfrutando do que via. E quando se deitou na cama, descobriu que Donna tremia quase tanto como ele.

Donna pôs os braços à volta do seu pescoço, quase timidamente.

- Vou fazer amor contigo - disse ela. Marcus abanou a cabeça.

- Não, querida, lembra-te do que o médico disse: nada de sexo.

- Há muitas formas de o fazer, não há?

- Sim, há.

Quero dar-te o mesmo prazer que tu me deste -sussurrou Donna. - Queres ensinar-me como o fazer?

A inocência da pergunta de Donna surpreendeu-o, tal como a confiança que demonstrava ter nele ao fazer-lhe aquela pergunta.

- Podes apostar o que quiseres que o farei - murmurou Marcus.

 

                               CAPÍTULO 12

Donna acordou a meio da noite.

- Marcus! - exclamou ela com alguma ansiedade. -Sinto alguma coisa estranha!

Perdido na lembrança do orgasmo mais maravilhoso da sua vida, Marcus mexeu-se na cama.

- Hum. Eu também senti.

- Estou a falar a sério!

Alarmado, Marcus endireitou-se e abriu os olhos.

- Referes-te ao bebé?

- Não tenho a certeza. Marcus franziu o sobrolho.

- Não pode ser! Ainda faltam três semanas.

- Os bebés, às vezes, vêm mais cedo.

- Não te mexas - Marcus pôs-lhe um braço à volta dos ombros e apertou-a contra si quando voltou a deitar-se. - Vamos esperar um pouco para ver se passa, está bem?

- Está bem.

Ambos ficaram imóveis, contendo a respiração. Depois, soltaram o ar em uníssono. Marcus acariciou-lhe o cabelo.

- Não consigo imaginar uma forma mais agradável de esperar, e tu?

- Eu também não - respondeu ela, apoiando a cabeça no peito dele.

Marcus ficou em silêncio durante alguns segundos. Havia coisas que queria perguntar-lhe, contudo, não sabia se aquele era o momento adequado. Talvez nunca fosse o momento adequado.

- O que tens? - murmurou ela.

- Como sabes que tenho alguma coisa? - Marcus sorriu na escuridão.

- Porque senti que os teus ombros ficaram tensos, como acontece sempre que queres fazer uma pergunta difícil.

- Já me conheces muito bem, não é verdade, Donna? Donna sentiu-se protegida pela escuridão e suficientemente segura de si mesma para ser sincera.

- Acho que sempre te conheci. Mas, antes, não me sentia igual a ti.

- E agora sim?

- Sim, claro que sim.

Marcus respirou fundo, no entanto, antes de conseguir falar, Donna fê-lo por ele.

- Queres saber se foste o único amante que tive, não é isso, Marcus?

Marcus ficou perplexo com a percepção de Donna.

- Não tenho o direito de te fazer essa pergunta.

- Sim, tens. Mas tens de estar disposto a ouvir coisas que preferirias não saber.

Marcus suspirou.

- Suponho que esperava o impossível. Donna sorriu.

- E então? Todos temos o direito de esperar coisas impossíveis, ou pensavas que eras imune a isso? Eu, por exemplo, desejaria que nunca tivesses estado com outra mulher, mas não é possível.

- É verdade, estive com outras mulheres - Marcus fez uma pausa antes de continuar. - No entanto, o que pensarias se eu te dissesse que nunca houve nenhuma mulher que tenha feito com que eu sentisse o que tu fazes com que eu sinta?

- E o que pensarias se eu te dissesse que, na minha vida, só houve outro homem...?

- Amava-te?

- Sim, muito.

- Mas tu não o amavas da mesma forma?

- Não — respondeu ela com voz pausada.

Como poderia tê-lo amado se o único homem que alguma vez amara fora Marcus?

- Sabes uma coisa? Ainda não falámos sobre o que vai acontecer depois de o menino nascer - disse Donna.

Marcus sabia o motivo pelo qual não tinham falado acerca daquele assunto: era demasiado doloroso.

- Bom, suponho que, para mim, o mais importante é saber com que freqüência vou poder ver o bebé.

- Referes-te às tuas visitas periódicas?

Marcus assentiu e a frieza da frase fez com que pestanejasse.

- Se quiseres, podemos recorrer a um advogado para resolver o assunto.

Donna levantou a cabeça do peito de Marcus e inclinou-se sobre ele.

- É isso que queres?

Marcus proferiu uma gargalhada amarga.

- O que eu quero não tem importância.

- Claro que tem! - exclamou ela com paixão. – Tu és o pai!

- Sou apenas o pai biológico! — exclamou ele.

- E que outro tipo de pais há?

- Os reais! Os que limpam o nariz aos seus filhos, que vão ao parque com eles para jogar à bola e que os ensinam a andar de bicicleta.

- E se for uma menina? - perguntou Donna.

- É igual! - resmungou Marcus. - E não tentes mudar de assunto, Donna! Não te importas de falar do que aconteceria se eu conhecesse outra mulher, mas não pareces dar importância ao que seria para mim se tu ti-vesses relações com outro homem, não é verdade? O que faria? Teria de agüentar quando visse o meu filho ou filha a chamar «papá» a outro homem? Acho que não o suportaria.

- Porque estamos a discutir sobre um homem imaginário num momento como este? - perguntou-lhe Donna. - Pensei que tínhamos tido uma experiência mutuamente satisfatória...

Marcus suspirou.

- É esse o problema.

- E porque é um problema?

- Porque faz com que me dê conta do quanto... te desejo - não parecia a palavra apropriada, porém, era suficiente naquele momento. - Desejo-te mais do que nunca, Donna. E o pior é que o sexo só piorou as coisas, porque fez-me perceber o que me falta.

Era verdade, a experiência sexual que tinham partilhado mudara tudo. Donna tinha a suspeita de que, por vezes, as mentes dos homens e das mulheres apontavam na mesma direcção, contudo, seguiam rotas diferentes para chegar ao mesmo sítio. Ela amava-o, tinha a certeza. E acreditava que, no fundo, Marcus também a amava. No entanto, não queria forçá-lo a nada.

- Queres dizer que queres que comecemos a ter relações sexuais com regularidade? - perguntou ela num tom casual.

Marcus acendeu a luz e Donna, depois de pestanejar, viu-o a olhar para ela, furioso. -Não! Donna fingiu surpresa.

- Não queres fazer amor comigo? -Sim!

- Marcus, se vais continuar a gritar como um louco, sugiro que vás para o teu quarto.

- Se não estivesses grávida, dar-te-ia uns açoites!

- Se eu não estivesse grávida, tu não estarias aqui, amiguinho.

- Quem diz?

- Digo eu!

- Claro que estaria aqui! Fez-se um breve silêncio.

- Sim? - perguntou Donna depois de engolir em seco.

- Claro que estaria aqui! Porque mais cedo ou mais tarde teria recuperado a razão e ter-me-ia apercebido de como te amo. Sim, Donna, amo-te.

Donna ficou a olhar para ele. Estaria a falar a sério? Era verdade que o seu sonho se tornara realidade?

- Amo-te, Donna - repetiu Marcus suavemente antes de a abraçar. - Se não tivesse sido tão estúpido, tê-lo-ia reconhecido muito antes.

A felicidade que Donna sentiu foi tão pura, que quase enjoou.

- Eu também te amo - respondeu ela, suspirando. -

Oh, Marcus!

- Hum?

- Podíamos estar assim há muito tempo... Marcus abanou a cabeça.

- Não, querida - disse ele com ternura. - Éramos demasiado jovens... e tínhamos demasiados preconceitos sociais. Eu era demasiado arrogante e tu eras demasiado...

- Demasiado o quê?

- Demasiado boa para mim - respondeu ele com paixão.

Donna sorriu e não o contradisse. Afinal de contas, não ficava nada mal a um homem respeitar a mulher da sua vida.

- Tínhamos de estar separados para poder...

- Marcus! - interrompeu-o ela com uma angústia repentina.

- O que foi?

Donna ofegou e a sua expressão mostrou medo. -Acriança, Marcus. Vai nascer!

- Como sabes? -Porque sei!

- É um menino! - exclamou a enfermeira enquanto o menino dava o seu primeiro grito. - Um menino lindo.

A mulher deu o menino a Donna, pousou-o na sua barriga e acrescentou:

- E acho que é o maior menino que vi na minha vida. Vai ser tão alto como...

- Como o seu pai - disse Donna com a respiração entrecortada e sorriu para Marcus.

- Quer cortar o cordão umbilical, senhor King? -perguntou a enfermeira.

Marcus, até àquele momento, considerara-se um homem com grande confiança em si mesmo, porém, sabia que seria incapaz de fazer alguma coisa que pudesse magoar o seu filho.

- Prefiro deixá-lo para os peritos - respondeu Marcus com um sorriso cansado. - E o meu apelido é Foreman.

- Ah, sim? - comentou a enfermeira com despreocupação.

Marcus olhou para ela com o sobrolho franzido.

- Agora, vou preparar uma chávena de chá para os pais - explicou a mulher. - Assim terão alguns minutos a sós com o vosso filho.

Depois de a enfermeira sair, Donna e Marcus olharam um para o outro com incredulidade.

- Está aqui - disse Donna. - Não sei porquê, mas tenho a impressão de que é real como tinha de ser.

Marcus engoliu em seco ao mesmo tempo que se baixava para afastar uma madeixa de cabelo da testa de Donna. Estava perturbado com a emoção e sentia um amor tão puro que jurou a si mesmo nunca esquecer aquele momento.

- Obrigado, Donna - disse Marcus simplesmente.

- De nada! - respondeu ela com os olhos brilhantes. - Não é lindo?

- Claro que é. Tal como a mãe.

- Não, muito mais do que a sua mãe! - insistiu ela. - É verdade, vamos ter de decidir o nome dele, porque não podemos continuar a chamá-lo «menino» durante muito mais tempo. Alguma sugestão?

Marcus encolheu os ombros.

- Pensei em alguns nomes, mas diz tu primeiro.

- Bom, eu gosto bastante de Nick - disse Donna acariciando a pequena cabeça. - O teu pai chamava-se Nick e a minha mãe Nicola, portanto pensei que...

Donna interrompeu-se porque, naquele momento, a enfermeira entrou e olhou para Marcus com uma expressão interrogante.

- Bem, já tomou uma decisão? Marcus sorriu.

- Não completamente, mas... gostamos do nome Nick.

A enfermeira olhou para ele com desespero.

- Senhor Foreman! Quando é que vai pedir a esta rapariga que se case consigo?

Os olhos azuis de Marcus encheram-se de humor ao olhar para Donna.

- Talvez ela não aceite.

A enfermeira lançou um suspiro destinado a mostrar que não suportava a falsa modéstia.

- Queres casar-te comigo, querida? - perguntou Marcus com voz suave.

Donna esteve prestes a desatar a rir-se de pura felicidade ao mesmo tempo que a boca de Nick, que acabava de adormecer, se abria e soltava o seu mamilo.

- Marcus, não tens de te casar comigo por causa do nosso filho...

- Não é por causa disso! - exclamou ele rapidamente. - Quero casar-me contigo porque te amo. Mais do que possas imaginar. Ia pedir-te antes, mas... adormecemos.

Marcus sorriu de forma travessa.

-Marcus!

Marcus baixou-se ao lado da cama, de tal forma que os seus rostos ficaram muito próximos.

- Por favor, Donna, diz que sim. Diz que vais casar-te comigo.

- Sim - e Donna esboçou um sorriso radiante. -Claro que vou casar-me contigo.

- Parabéns! Já estava na hora! - exclamou a enfermeira e inclinou-se sobre Donna para lhe tirar o menino dos braços. - Tu e eu vamos sair um bocadinho porque vou limpar-te, jovenzinho. E também porque o teu pai acaba de pedir a tua mãe em casamento e agora querem estar alguns minutos a sós.

Donna sorriu enquanto a enfermeira, com o pequeno Nick nos braços, saía do quarto e fechava a porta. Por estranho que parecesse, já sentia falta da presença do seu filho.

Mas então, abriu os braços para Marcus, que estava prestes a quebrar várias cláusulas do regulamento dos hospitais, já que estava a tirar os sapatos e a entrar na cama com Donna.

Já na cama, Marcus abraçou-a e olhou para ela nos olhos.

- Quando vamos casar-nos? - perguntou ele.

- Queres que seja agora? - respondeu ela suavemente.

Beijaram-se até que Marcus a avisou de que, se não parassem, ela engravidaria outra vez. Portanto, contentaram-se em permanecer abraçados.

E foi assim que a enfermeira os encontrou quando foi devolver-lhes o seu filho: profundamente adormecidos e agarrados um ao outro na cama do hospital.

O bebé começou a chorar e os pais abriram os olhos imediatamente.

- É a tua vez - murmurou Donna.

- Será um prazer - respondeu Marcus.

Marcus levantou-se da cama com cuidado para não incomodar Donna e, depois, com extrema ternura, envolveu o seu filho nos braços e começou a embalá-lo.  

 

                                                                                Sharon Kendrick

 

 

                      

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