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Poesia & Contos Infantis

 

 

 


SEGUINDO A CONSCIÊNCIA / Paulo Coelho
SEGUINDO A CONSCIÊNCIA / Paulo Coelho

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblioteca Virtual do Poeta Sem Limites

 

 

Contos do Alquimista

Volume VI

SEGUINDO A CONSCIÊNCIA

 

                   CONFÚCIO E OS PROFESSORES

            Pouco se conhece a respeito da vida do filósofo chinês Confúcio. Acredita-se que viveu entre 551-479 a.C. Algumas de suas obras são atribuídas a ele, outras foram compiladas por seus discípulos. Em um desses textos, Conversas Familiares, existe um interessante diálogo a respeito do aprendizado:

 

            Confúcio sentou-se para descansar, e logo os alunos começaram a fazer perguntas. Naquele dia, o mestre estava bem disposto, e resolver responder.

            - O senhor consegue explicar tudo o que sente. Por que não vai até o imperador e fala com ele?

            - O imperador também faz belos discursos – disse Confúcio. – E belos discursos são apenas uma questão de técnica. Eles não trazem em si a Virtude.

            - Então envie o seu livro Poemas.

            - Os 300 poemas ali escritos podem ser resumidos numa só frase: pense corretamente. Este é o segredo.

            - O que é pensar corretamente?

            - É saber usar a mente e o coração, a disciplina e a emoção. Quando se desejar uma coisa, a vida nos guiará até lá, mas por caminhos que não esperamos. Muitas vezes, nos deixamos confundir, porque esses caminhos nos surpreendem – e então achamos que estamos indo na direção errada. Por isso eu disse: deixe-se levar pela emoção, mas tenha a disciplina de seguir adiante.

            - O senhor faz isso?

            - Aos 15 anos, comecei a aprender. Aos 30, passei a ter certeza do que desejava. Aos 40, as duvidas voltaram. Aos 50 anos, descobri que o Céu tem um projeto para mim e para cada homem sobre a face da Terra. Aos 60, compreendi este projeto e encontrei a tranqüilidade para segui-lo. Agora, aos 70, posso escutar meu coração, sem que ele me faça sair do caminho.

            - Então, o que o faz diferente dos outros homens que também aceitam a vontade do Céu?

            - Eu procuro dividi-la com vocês. E, quem consegue discutir uma verdade antiga com uma geração nova, deve usar sua capacidade para ensinar. Esta é a minha única qualidade: ser um bom professor.

            - O que é um bom professor?

            - O que examina tudo o que ensina. As idéias antigas não podem escravizar o homem, porque elas se adaptam, e ganham novas formas. Então, tomemos a riqueza filosófica do passado, sem esquecer os desafios que o mundo presente nos propõe.

            - O que é um bom aluno?

            - Aquele que escuta o que eu digo, mas adapta meus ensinamentos à sua vida, e nunca os segue ao pé da letra. Aquele que não procura um emprego, mas um trabalho que o dignifica. Aquele que não busca ser notado, mas sim fazer algo notável.

 

                   DOIS GRANDES PINTORES

            Desde jovem, o pintor Henri Matisse costumava visitar semanalmente o grande Renoir em seu ateliê. Quando Renoir foi atacado por artrite, Matisse passou a fazer visitas diárias, levando alimentos, pincéis, tintas, mas sempre procurando convencer o mestre de que estava trabalhando demais, e precisava descansar um pouco.

            Certo dia, notando que cada pincelada fazia com que Renoir gemesse de dor, Matisse não se conteve:

            - Grande mestre, sua obra já é vasta e importante. Por que continuar torturando-se dessa maneira?

            - Muito simples – respondeu Renoir. – A beleza permanece; a dor termina passando.

 

                   MESTRE E DISCÍPULO

            Um discípulo tinha tanta fé nos poderes do guru Sanjai, que o chamou certa vez à beira do rio.

            - Mestre, tudo que aprendi com o senhor fez com que minha vida mudasse. Fui capaz de reatar meu casamento, acertar-me nos negócios de minha família, e fazer caridade com todos na vizinhança. Tudo que eu pedi em seu nome, com fé, eu consegui.

            - Sanjai olhou para o discípulo, e seu coração encheu-se de orgulho.

            - O discípulo aproximou-se da margem do rio:

            - Minha fé em seus ensinamentos e em sua divindade é tanta que basta pronunciar seu nome e conseguirei caminhar sobre as águas.

            Antes que o mestre pudesse dizer alguma coisa, o discípulo entrou no rio, gritando:

            - Louvado seja Sanjai! Louvado seja Sanjai!

            Deu o primeiro passo.

            E outro.

            E um terceiro. Seu corpo começou a levitar, e o rapaz conseguiu chegar ao outro lado do rio sem sequer molhar os pés.

            Sanjai olhou surpreso para o discípulo, que acenava da margem, com um sorriso nos lábios.

            “Quer dizer que sou muito mais iluminado do que penso? Eu poderei ter o mosteiro mais famoso da região! Eu poderei igualar-me aos grandes santos e gurus!”

            Decidido a repetir o feito do discípulo, Sanjai aproximou-se da margem, e começou a gritar, enquanto caminhava rio adentro:

            - Louvado seja Sanjai! Louvado seja Sanjai!

            Deu o primeiro passo, o segundo, e no terceiro já estava sendo carregado pela correnteza. Como não sabia nadar, foi preciso que o discípulo se atirasse na água e o salvasse da morte certa.

            Quando os dois chegaram à margem, exaustos, Sanjai ficou em silêncio por longo tempo. Finalmente, comentou:

            - Espero que entenda com sabedoria o que aconteceu hoje. Tudo que eu lhe ensinei foram as sagradas escrituras, e a maneira correta de comportar-se. Entretanto, isso não bastaria se você não acrescentasse o que estava faltando: a fé de que tais ensinamentos poderiam melhorar sua vida.

 

            “Eu lhe ensinei, porque meus mestres me ensinaram. Mas, enquanto eu pensava e estudava, você praticava o que tinha aprendido. Obrigado por me fazer entender que, muitas vezes, o homem não acredita no que deseja que os outros acreditem”, disse Sanjai.

          

 

                   O CAMINHO DO MEIO

            O monge Lucas, acompanhado de um discípulo, atravessava uma aldeia. Um velho perguntou ao asceta:

            - Santo homem, como me aproximo de Deus?

            - Divirta-se. Louve o Criador com sua alegria – foi a resposta.

            Os dois continuaram a caminhar. Neste momento, um jovem aproximou-se.

            - O que faço para me aproximar de Deus?

            - Não se divirta tanto – disse Lucas.

            Quando o jovem partiu, o discípulo comentou:

            - Parece que o senhor não sabe direito se devemos ou não devemos nos divertir.

            - A busca espiritual é uma ponte sem corrimão atravessando um abismo – respondeu Lucas. – Se alguém está muito perto do lado direito, eu digo: “para a esquerda”, e se aproximam-se do lado esquerdo, eu digo: “para a direita”. Os extremos nos afastam do Caminho.

 

                   EU FUI AJUDÁ-LO A CHORAR

            O autor Leo Buscaglia foi, certa vez, convidado a ser jurado de um concurso numa escola, cujo tema era: “a criança que mais se preocupa com os outros”.

            O vencedor foi um menino, cujo vizinho – um senhor com mais de 80 anos – acabara de ficar viúvo. Ao notar o velhinho no seu quintal, em lágrimas, o garoto pulou a cerca, sentou-se no seu colo, e ali ficou por muito tempo.

            Quando voltou para casa, a mãe lhe perguntou o que dissera ao pobre homem.

            - Nada – disse o menino. – Ele tinha perdido a sua mulher, e isso deve ter doído muito. Eu fui apenas ajudá-lo a chorar.

 

                   O SILÊNCIO DA NOITE

            Num deserto da África, caminhavam o mestre sufi e seu discípulo. Quando a noite caiu, os dois montaram a tenda, deitaram-se para descansar.

            - Que silêncio! – comentou o discípulo.

            - Nunca diga: “que silêncio!” – respondeu o mestre. Diga sempre: “eu não estou conseguindo escutar a natureza”.

 

                   O GRANDE MAPA

           “Certo rei encomendou aos geógrafos um mapa do país”, conta Jorge Luis Borges. “Mas exigiu que tal mapa fosse perfeito, com todos os detalhes.”

            Os geógrafos mediram todos os locais, e fizeram um rascunho. Um deles comentou que ainda faltavam detalhes de rios.

            Resolveram refazer o desenho numa escala bem maior. Quando ficou pronto, o mapa estava do tamanho do primeiro andar de um edifício. Mesmo assim, alguns conselheiros do rei argumentaram:

.         - Não dá para ver os caminhos nos bosques.

            E os sábios geógrafos foram desenhando mapas cada vez maiores, com detalhes e mais detalhes do país.

            Quando, finalmente, conseguiram o mapa perfeito, chamaram o rei, e o levaram a um imenso deserto. Ali chegando, mostraram uma estranha tenda, que estendia-se até o horizonte.

            - O que é isso?

            O mapa do país – responderam os geógrafos. – Como quisemos fazê-lo o mais próximo da realidade, ele ficou tão grande que ocupa o deserto inteiro.

            O medo de errar, na maior parte das vezes, termina nos conduzindo ao próprio erro - comentou o rei. – O mapa é tão detalhado, que não serve para nada.

            E mandou enforcar os geógrafos.

 

                   AFASTANDO OS FANTASMAS

            Durante anos, Hitoshi tentou, inutilmente, despertar o amor daquela que acreditava ser a mulher de sua vida. Mas o destino é irônico: no mesmo dia em que ela finalmente o aceitou como futuro marido, também descobriu que estava com uma doença incurável, e não deveria viver por muito tempo.

            Seis meses depois, já à beira da morte, ela pediu:

            - Você vai me prometer uma coisa: jamais se apaixonará de novo. Se fizer isso, voltarei todas as noites para assombrá-lo.

            E fechou os olhos para sempre. Durante muitos meses, Hitoshi evitou aproximar-se de outras mulheres, mas o destino continuou irônico e ele descobriu um novo amor. Quando preparava para casar-se, o fantasma da ex-amada cumpriu sua promessa e apareceu.

            - Você está me traindo – disse.

            - Durante anos, eu lhe entreguei o meu coração, e você não me correspondia – respondeu Hitoshi. – Não acha que mereço uma segunda chance de ser feliz?

            Mas o fantasma da ex-amada não quis saber de desculpas e, todas as noites, vinha assustá-lo. Contava em detalhes o que tinha acontecido durante o dia, que palavras de amor ele dissera à sua noiva, quantos beijos e abraços haviam trocado.

            Hitoshi já não podia mais dormir e foi procurar o mestre Bashô.

            - É um fantasma muito esperto – disse Bashô.

            Ela sabe tudo, nos melhores detalhes! E já está levando o meu noivado ao fim, porque não consigo dormir e, nos momentos de intimidade com minha amada, fico constrangido.

            - Vamos afastar esse fantasma – garantiu Bashô.

            Naquela noite, quando o fantasma retornou, Hitoshi interrompeu-o antes que dissesse a primeira frase.

            - Você é um fantasma tão sábio que vamos fazer um trato. Como você me vigia todo tempo, vou perguntar algo que fiz hoje. Se acertar, eu largo minha noiva e nunca mais terei mulher alguma. Se errar, você promete não tornar a aparecer, sob pena de ser condenada pelos deuses a vagar para sempre na escuridão.

            - De acordo – respondeu o fantasma, confiante.

            - Esta tarde, eu estava na mercearia e, em determinado momento, peguei um punhado de grãos de trigo de dentro de um saco.

            - Eu vi – disse o fantasma.

            - A pergunta é a seguinte: quantos grãos de trigo eu segurei?

            - O fantasma, na mesma hora, entendeu que não conseguiria jamais responder à pergunta. Para evitar ser perseguido pelos deuses na escuridão eterna, resolveu desaparecer para sempre.

            Dois dias depois, Hotoshi foi até a casa do mestre zen.

            - Vim agradecê-lo.

            - Aproveite para aprender as lições que fazem parte desta sua experiência – respondeu Bashô.

            “Em primeiro lugar, aquele espírito voltava sempre porque você tinha medo. Se quiser afastar uma maldição, não lhe dê nenhuma importância.”

            “Segundo: o fantasma tirava proveito de sua sensação de culpa. Quando nos sentimos culpados, sempre desejamos, inconscientemente, o castigo.”

            “E finalmente: ninguém que realmente o amasse iria obrigá-lo a fazer este tipo de promessa. Se você quer entender o amor, aprenda a liberdade.”

 

                   O JOVEM E O CAÇADOR

            O velho caçador de raposas – considerado o melhor da região – resolveu finalmente se aposentar. Juntou seus pertences e decidiu partir em direção ao sul do país, onde o clima era mais ameno.

            Entretanto, antes que terminasse de empacotar suas coisas, recebeu a visita de um jovem.

            - Quero aprender suas técnicas – disse o recém-chegado. – Em troca, compro a sua loja, a sua licença de caçador, e ainda pagarei por todos os segredos que o senhor conhece.

            O velho concordou. Assinaram o contrato, e ensinou ao rapaz todos os segredos da caça à raposa. Com o dinheiro recebido, comprou uma bela casa no sul, onde passou o inverno inteiro sem precisar preocupar-se em juntar lenha para calefação, já que o clima era muito agradável.

            Na primavera, sentiu saudades de sua aldeia, e resolveu voltar para ver os seus amigos.

            Lá chegando, cruzou no meio da rua com o jovem que, alguns meses antes, resolvera pagar uma fortuna por seus segredos.

            - E então? – perguntou – Como foi a temporada de caça?

            - Não consegui pegar uma só raposa.

            O velho ficou surpreso e confuso:

            - Mas você seguiu meus conselhos?

            Com os olhos fixos no chão, o rapaz respondeu:

            - Bem, na verdade, não segui. Achei que seus métodos estavam ultrapassados e terminei descobrindo, por mim mesmo, uma melhor maneira de caçar raposas.

 

                   COMPREENDA ANTES A VIDA

            Zilu perguntou a Confúcio (filósofo chinês, que viveu no século VI a.C.):

            - Posso perguntar-lhe o que pensa sobre a morte?

            - Poder, você pode – respondeu Confúcio. – Mas, se ainda não compreende a vida, por que deseja saber tanto sobre a morte? Deixe para refletir sobre ela quando a vida já tiver acabado.

 

                   A QUEM CABEM OS INSULTOS

            Perto de Tóquio, vivia um grande samurai, já idoso, que agora se dedicava a ensinar o zen-budismo aos jovens. Apesar da idade, corria a lenda de que ainda era capaz de derrotar qualquer um.

            Certa tarde, um guerreiro – conhecido por sua total falta de escrúpulos – apareceu por ali. Era famoso por usar a técnica da provocação. Esperava que seu adversário fizesse o primeiro movimento e, dotado de uma inteligência privilegiada para reparar os erros cometidos, contra atacava com velocidade fulminante.

 

            O jovem e impaciente guerreiro jamais havia perdido uma luta. Conhecendo a reputação do samurai, estava ali para derrotá-lo e aumentar sua fama.

            Todos os estudantes se manifestaram contra a idéia, mas o velho aceitou o desafio.

            Foram todos para a praça da cidade, e o jovem começou a insultar o velho mestre. Chutou algumas pedras em sua direção, cuspiu em seu rosto, gritou todos os insultos conhecidos – ofendendo, inclusive, seus ancestrais. Durante horas, fez tudo para provocá-lo, mas o velho permaneceu impassível. No final da tarde, sentindo-se já exausto e humilhado, o impetuoso guerreiro retirou-se.

            Desapontados pelo fato de que o mestre aceitara tantos insultos e provocações, os alunos perguntaram:

            - Como o senhor pode suportar tanta indignidade? Por que não usou sua espada, mesmo sabendo que podia perder a luta, em vez de mostrar-se covarde diante de todos nós?

            - Se alguém chega até você com um presente e você não o aceita, a quem pertence o presente? – perguntou o samurai.

            - A quem tentou entrega-lo – respondeu um dos discípulos.

            - O mesmo vale para a inveja, a raiva, e os insultos – disse o mestre – Quando não são aceitos, continuam pertencendo a quem os carregava consigo.

 

                   OS OBJETOS E A FÉ

            Um aprendiz de ocultismo que conheço, na esperança de impressionar bem o seu mestre, leu alguns manuais de magia e resolveu comprar os materiais indicados nos textos.

            Com muita dificuldade, conseguiu determinado tipo de incenso, alguns talismãs, uma escultura de madeira com caracteres sagrados escritos numa ordem determinada. Vendo isto, o mestre comentou:

            - Você acredita que, enrolando fios de computador no pescoço, conseguirá ter a sabedoria da máquina? Acredita que, ao comprar chapéus e roupas sofisticadas, vai adquirir também o bom gosto e a sofisticação de quem as criou? Aprenda a usar os objetos como aliados, não como guias.

 

         Os dez tesouros

           

            O mestre sufi Abu Muhammad al-Jurayry costumava dizer:

            - A religião possui dez tesouros, que nos enriquecem. São cinco interiores, e cinco exteriores. Todos aqueles que seguem o caminho espiritual devem estar conscientes disso.

             “Eis os tesouros interiores: capacidade de ser verdadeiro, despreocupação com os nossos bens, humildade na aparência, equilíbrio para evitar dificuldades com os outros, e força para reagir.”

            “Eis os tesouros exteriores: descobrir um Amor supremo, despertar o desejo de estar junto a este Amor, ter inteligência para ver as próprias faltas, estar consciente de tudo o que acontece na vida, e ser grato pelas bênçãos recebidas.”

 

                   PENSANDO UM POUCO NA MORTE

            Creio que este texto será lido em aproximadamente três minutos. Pois bem: segundo as estatísticas, neste espaço de tempo irão morrer 300 pessoas, e outras 620 nascerão.

            Talvez eu demore meia hora para escrevê-lo. Estou concentrado no meu computador, com livros ao meu lado, idéias na cabeça, carros passando lá fora. Tudo parece absolutamente normal à minha volta. Entretanto, durante estes trinta minutos, 3.000 pessoas morreram, e 6.200 acabam de ver, pela primeira vez, a luz do mundo.

            Onde estarão essas milhares de famílias que apenas começaram a chorar a perda de alguém, ou rir com a chegada de um filho, neto, irmão?

            Paro e reflito um pouco: talvez muitas destas mortes estejam chegando ao final de uma longa e dolorosa enfermidade, e certas pessoas estão aliviadas com o Anjo que veio buscá-las. Além do mais, com toda certeza, centenas destas crianças que acabam de nascer serão abandonadas no próximo minuto, e passarão para a estatística de morte antes que eu termine este texto.

            Que coisa! Uma simples estatística, que olhei por acaso – e de repente estou sentindo essas perdas e esses encontros, esses sorrisos e essas lágrimas. Quantos estão deixando esta vida sozinhos, em seus quartos, sem que ninguém se dê conta do que está acontecendo? Quantos nascerão escondidos, e serão abandonados na porta de asilos ou conventos?

            Reflito: já fui parte da estatística de nascimentos, e um dia serei incluído no número de mortos. Que bom: eu tenho plena consciência de que vou morrer. Desde que fiz o caminho de Santiago, entendi que, embora a vida continue e sejamos todos eternos, esta existência vai acabar um dia.

            As pessoas pensam muito pouco na morte. Passam suas vidas preocupadas com verdadeiros absurdos, adiam coisas, deixam de lado momentos importantes. Não arriscam, porque acham que é perigoso. Reclamam muito, mas se acovardam na hora de tomar providências. Querem que tudo mude, mas elas mesmas se recusam a mudar.

            Se pensassem um pouco mais na morte, não deixariam jamais de dar o telefonema que está faltando. Seriam um pouco mais loucas. Não iam ter medo do fim desta encarnação – porque não se pode temer algo que vai acontecer de qualquer jeito.

            Os índios dizem: “Hoje é um dia tão bom quanto qualquer outro para deixar este mundo.” E um bruxo comentou certa vez: “Que a morte esteja sempre sentada ao seu lado. Assim, quando você precisar fazer coisas importantes, ela lhe dará a força e a coragem necessárias.”

            Espero que você, leitor, tenha chegado até aqui. Seria uma bobagem assustar-se com o título, porque todos nós, cedo ou tarde, vamos morrer. E só quem aceita isso está preparado para a vida.

 

                   SEGUINDO A CONSCIÊNCIA

            Depois de muitos anos de governo, o rei Arthur voltou à presença do mago Merlin, seu instrutor.

            - Procurei seguir minha consciência em todos os atos do meu governo – disse – Espero que esteja satisfeito.

            - Como trataste quem não acreditava em Deus? – perguntou Merlin.

            - Com a severidade que merecem os incrédulos.

            - E os que não honravam seus compromissos?

            - Com a prisão, para não desmoralizar o trabalho de gente honesta.

            - E como trataste as prostitutas?

            - Com repressão, para evitar que o país perdesse a dignidade e a moral.

            - Você não entendeu nada do que ensinei – foi o triste comentário de Merlin. – Precisamos ajudar os mais fracos, mas tudo que fez foi seguir o manual do bom comportamento.

 

                   O PREÇO DA PERGUNTA

            O rabino vivia ensinando que as respostas estão dentro de nós mesmos. Mas seus fiéis insistiam em consultá-lo sobre tudo que faziam. Um dia, teve uma idéia. Colocou um cartaz na porta de sua casa, e escreveu: RESPONDO CADA PERGUNTA POR 100 MOEDAS.

            Um comerciante resolveu pagar. Deu o dinheiro ao rabino, comentando:

            - O senhor não acha caro cobrar tanto por uma pergunta?

            - Acho – disse o rabino. – E acabo de respondê-la. Se quiser saber mais, pague outras 100 moedas. Ou procure a resposta em você mesmo, que é mais barato e mais eficaz.

            A partir deste dia, nunca mais o perturbaram.

 

                   OUVINDO O CORÃO

            Sadi de Shiraz conta que, quando era criança, costumava rezar com seu pai, seus tios e primos. A família reunia-se todas as noites para escutar um trecho do Corão, o texto sagrado do Islã.

            Numa dessas noites, enquanto seu tio lia uma passagem do livro, Shiraz reparou que a maior parte das pessoas dormia. Então, comentou com seu pai:

            - Nenhum destes dorminhocos é capaz de ficar atento às palavras do profeta. Jamais chegarão até Deus!

            - E o pai respondeu:

            - Meu filho querido, procura seu caminho com fé, e deixe cada um cuidar de si. Quem sabe, em seus sonhos, eles estão conversando com Deus. Eu preferia mil vezes que você estivesse dormindo como eles, a ter que escutar este seu julgamento duro, e esta sua condenação.

 

                   ENTRE A FÉ E A ORAÇÃO

            - Há algo mais importante que a oração? – perguntou o discípulo ao mestre.

            O mestre pediu que o discípulo fosse até um arbusto próximo e cortasse um ramo. O discípulo obedeceu.

            - A árvore continua viva? – perguntou o mestre.

            - Tão viva como antes.

            - Então vá até lá e corte a raiz.

            - Se eu fizer isto, a árvore morrerá.

            - As orações são os ramos de uma árvore, cuja raiz se chama Fé – disse o mestre. – Pode existir fé sem oração, mas não pode existir oração sem fé.

 

                   UM PROBLEMA DE MÃE

            Uma mãe judia tentou educar seu filho da maneira mais tradicional possível. O rapaz, porém, tinha uma personalidade forte e fazia apenas aquilo que o coração lhe indicava.

            Quando morreu, ela foi direto para o céu – já que havia sido um exemplo de dedicação na Terra. Ali chegando, contou às outras mães sua agonia com o filho – e descobriu que nenhuma delas estava satisfeita com os caminhos que seus descendentes haviam seguido.

            Após dias de conversa – em que lamentavam não terem sido fortes o suficiente para controlar a família -, o grupo viu Nossa Senhora.

            - Aquela ali conseguiu educar seu filho! –disse uma das mães.

            Imediatamente, todas se dirigiram até Nossa Senhora, e elogiaram a carreira de Jesus.

            - Ele foi um sábio – disseram. Cumpriu tudo o que tinha lhe sido destinado, andou no caminho da verdade, não se desviou um só minuto, e, até hoje, é motivo de orgulho para sua família!

            - Você tem toda razão – respondeu Nossa Senhora. Mas, para falar a verdade, meu sonho era que ele fosse médico.

 

                   OS DESEJOS NEGATIVOS

            O discípulo disse ao mestre:

            - Tenho passado grande parte do meu dia pensando coisas que não devia pensar, desejando coisas que não devia desejar, fazendo planos que não devia fazer.

            O mestre convidou o discípulo para um passeio na floresta, perto de sua casa. No caminho, apontou uma planta e perguntou se o discípulo sabia o que era.

            - Beladona – disse o discípulo. – Pode matar quem comer suas folhas.

            - Mas não pode matar quem simplesmente a contempla. Da mesma maneira, os desejos negativos não podem causar nenhum mal – se você não se deixar seduzir por eles.

 

                   O PATO E A GATA

            - Como o senhor entrou na vida espiritual? – perguntou um dos discípulos ao mestre sufi Shams Tabrizi.

            - Minha mãe dizia que eu não era louco o bastante para ser internado num hospício, nem bastante santo para entrar num mosteiro - respondeu Tabrizi. – Então, resolvi dedicar-me ao sufismo, onde aprendemos através da meditação livre.

            - E como explicou isso à sua mãe?

            - Com a seguinte fábula: alguém colocou um patinho para que uma gata tomasse conta. Ele seguia sua mãe adotiva por toda parte – até que, um dia, os dois foram parar diante de um lago. Imediatamente, o patinho entrou na água, enquanto a gata gritava da margem: “Saia daí! Você vai morrer afogado!”

            E o patinho respondeu: “Não, mamãe. Descobri o que me faz bem, e sei que estou no meu ambiente. Vou continuar aqui, mesmo que a senhora não saiba o que significa um lago.”

 

                   SEJAM SEMPRE ESQUECIDOS

            No mosteiro de Sceta, o abade Lucas reuniu os frades para o sermão.

            - Que vocês jamais sejam lembrados – disse ele.

            - Mas como? – respondeu um dos irmãos. – Será que nosso exemplo não pode ajudar quem está precisando?

            - No tempo em que todo mundo era justo, ninguém prestava atenção nas pessoas exemplares – respondeu o abade. – Todos davam o melhor de si sem pretender, com isso, cumprir seu dever com o irmão. Amavam ao seu próximo, porque entendiam que isso era pare da vida, e não estavam fazendo nada de especial em respeitar com uma lei da natureza. Dividiam seus bens para não terem de ficar acumulando mais do que podiam carregar, já que as viagens duravam a vida inteira. Viviam juntos em liberdade, dando e recebendo, sem nada a cobrar ou culpar nos outros. Por isso, seus feitos não foram contados, e eles não deixaram nenhuma história.

            “Quem dera pudéssemos conseguir a mesma coisa no presente: fazer do bem uma coisa tão comum, que não haja qualquer necessidade de exaltar aqueles que o praticaram.”

 

                   A MULHER PERFEITA

            Nasrudin conversava com um amigo:

            - Então, Mullah, nunca pensaste em casamento?

            - Já pensei – respondeu a Nasrudin. – Em minha juventude, resolvi conhecer a mulher perfeita. Atravessei o deserto, cheguei em Damasco e conheci uma mulher espiritualizada e linda. Mas ela não sabia nada das coisas do mundo.

            “Continuei a viagem, e fui a Isfahan. Lá, encontrei uma mulher que conhecia o reino da matéria e do espírito, mas não era bonita. Então resolvi ir até o Cairo, onde jantei na casa de uma moça bonita, religiosa, e conhecedora da realidade material.

            - E por que não casaste com ela?

            - Ah, meu companheiro! Infelizmente ela também procurava um homem perfeito.

 

                     MOJUD E A VIDA INEXPLICÁVEL

            Mojud era um funcionário de uma repartição pública em uma pequena cidade do interior. Não tinha qualquer perspectiva de um emprego melhor, seu país atravessava uma grande crise econômica e Mojud já estava resignado em passar o resto de sua vida trabalhando oito horas por dia, tentando divertir-se durante as noites e os fins de semana, vendo televisão.

            Certa tarde, Mojud viu dois galos brigando. Com pena dos animais, foi até o meio da praça para separá-los, sem dar-se conta que estava interrompendo uma luta de galos de briga. Irritados, os espectadores espancaram Mojud. Um deles ameaçou-o de morte, porque o seu galo estava quase ganhando, e iria receber uma fortuna em apostas.

            Com medo, Mojud resolveu deixar a cidade. As pessoas estranharam quando ele não apareceu no emprego. Mas, como havia vários candidatos para o posto, esqueceram rápido o antigo funcionário.

            Depois de três dias viajando, Mojud encontrou um pescador.

            - Onde você está indo? – perguntou o pescador.

            - Não sei.

            Compadecido da situação do homem, o pescador levou-o para sua casa. Depois de uma noite de conversas, descobriu que Mojud sabia ler, e propôs um trato: ensinaria o recém-chegado a pescar, em troca de aulas de alfabetização.

            Mojud aprendeu a pescar. Com o dinheiro dos peixes, comprou livros para poder ensinar ao pescador. Lendo, aprendeu coisas que não conhecia.

            Um dos livros, por exemplo, ensinava marcenaria, e Mojud resolveu montar uma pequena oficina.

            Ele e o pescador compraram ferramentas, e passaram a fazer mesas, cadeiras, estantes, equipamentos de pesca.

 

            Muitos anos se passaram. Os dois continuavam a pescar, e contemplavam a natureza durante o tempo que passavam no rio. Os dois também continuavam a estudar, e os muitos livros para ler traziam lições importantes da cultura humana. Os dois continuavam a trabalhar na marcenaria, e o trabalho físico os deixava saudáveis e fortes.

            Mojud adorava conversar com os fregueses. Como agora era um homem culto, sábio, e saudável, as pessoa lhe pediam conselhos. A cidade inteira começou a progredir, porque todos viam em Mojud uma pessoa capaz de dar boas soluções aos problemas da região.

            Os jovens da cidade formaram um grupo de estudos com Mojud e o pescador, e logo espalharam aos quatro ventos que eram discípulos de sábios. Um dos jovens perguntou, certa tarde:

            - Mojud resolveu abandonar tudo para dedicar-se à busca da sabedoria?

            - Não – respondeu Mojud. – Eu tinha medo de ser assassinado na cidade onde vivia.

            Mas os discípulos aprendiam coisas importantes, e logo transmitiam às outras pessoas. Um famoso biógrafo foi chamado para relatar a vida dos Dois Sábios, como eram agora conhecidos. Mojud e o pescador contaram o que tinha acontecido.

            - Mas nada disso reflete a sabedoria de vocês – disse o biógrafo.

            - Tem razão – respondeu Mojud. – Mas é a verdade. Nada de especial aconteceu em nossas vidas.

            O biógrafo escreveu durante cinco meses. Quando o livro foi publicado, transformou-se num grande êxito de vendas. Era uma maravilhosa e excitante história de dois homens que buscam o conhecimento, largam tudo o que fazem, lutam contra as adversidades, encontram mestres secretos.

            - Não é nada disso – disse Mojud, ao ler sua biografia.

            - Santos precisam ter vidas excitantes – respondeu o biógrafo. – Uma história tem que ensinar algo, e a realidade nunca ensina nada.

            Mojud desistiu de argumentar. Sabia que a realidade era o que ensinava tudo o que um homem precisa saber, mas não adiantava tentar explicar isso.

            “Que os tolos continuem vivendo com suas fantasias”, disse para o pescador.

            E ambos continuaram a ler, escrever, pescar, trabalhar na marcenaria, ensinar os discípulos, fazer o bem. Só prometeram nunca mais tornar a ler livros sobre a vida de santos, já que as pessoas que os escrevem nunca entenderam a verdade: tudo o que fazemos em nossas vidas pode nos aproximar de Deus.

 

                   GANDHI VAI ÀS COMPRAS

            Mahatma Gandhi, depois de ter conseguido a independência da Índia, fez uma visita à Inglaterra. Passeava com algumas pessoas pelas ruas de Londres, quando sua atenção foi atraída para a vitrine de uma famosa joalheria.

            E ali ficou Gandhi, olhando as pedras preciosas e as jóias ricamente trabalhadas. O dono da joalheria imediatamente o reconheceu, e foi até a rua saúda-lo:

            - Muito me honra que o Mahatma esteja aqui, contemplando o nosso trabalho. Temos muitas coisas de imenso valor, beleza, arte, e gostaríamos de oferecer-lhe algo.

            - Sim, estou admirado com tanta maravilha – respondeu Gandhi. E mais ainda surpreso comigo, pois, sabendo que podia ganhar um rico presente, ainda consigo viver e ser respeitado sem precisar usar jóia.

 

                     NÃO BASTA RENUNCIAR

            Conheci a pintora Myie Tamaki durante um seminário sobre energia feminina, em Kawaguchiko, Japão. Perguntei qual a sua religião.

            - Não tenho mais religião – ela respondeu.

            Notando a minha surpresa, explicou:

            - Fui educada para ser budista. Os monges me ensinaram que o caminho espiritual é uma constante renúncia. Temos de superar nossa inveja, nosso ódio, nossas angústias de fé, nossos desejos.

            “Consegui me livrar de tudo isso, até que um dia meu coração ficou vazio. Os pecados tinham ido embora, e minha natureza humana também.

            No início, fiquei contente, mas percebi que já não compartilhava das alegrias e paixões das pessoas à minha volta. Foi então que larguei a religião. Hoje, tenho meus conflitos, meus momentos de raiva e de desespero, mas sei que estou de novo perto dos homens – e consequentemente perto de Deus.”

 

                   SABENDO ONDE MUDAR

            Durante uma viagem, recebi um fax da minha secretária.

            “Ficou faltando um tijolo de vidro para a reforma da cozinha”, dizia ela. “Envio o projeto original, e o jeito que o pedreiro dará para compensar a falta.”

            De um lado, havia o desenho que a minha mulher fizera: fileiras harmoniosas, com abertura para a ventilação. Do outro lado, o projeto que resolvia a falta do tijolo: um verdadeiro quebra-cabeça, em que os quadrados de vidro se misturavam sem qualquer estética.

            “Comprem o tijolo que falta”, escreveu minha mulher. Assim foi feito, e o desenho original foi mantido.

            Naquela tarde, fiquei pensando muito tempo no ocorrido. Quantas vezes, pela falta de um simples tijolo, deturpamos completamente o projeto original de nossas vidas.

 

                   SE EU PUDESSE SER DEUS

            A história é atribuída ao grande rabino Bal Shen Tov. Conta-se que ele estava no topo de uma colina, com um grupo de estudantes, quando viu um grupo de cossacos atacarem a cidade e começarem a massacrar as pessoas.

            Vendo muitos de seus amigos, lá embaixo, morrendo e pedindo misericórdia, o rabino disse:

            - Ah, se eu pudesse ser Deus!

            Um discípulo, chocado, virou-se para ele:

            - Mestre, como ousa proferir uma blasfêmia dessas? Quer dizer que, se o senhor fosse Deus, iria agir de maneira diferente? Quer dizer que o senhor que Deus muitas vezes faz o que é errado?

            O rabino olhou nos olhos do discípulo e disse:

            - Deus sempre está certo. Mas, se eu pudesse ser Deus, eu saberia entender o que está acontecendo.

 

                   PRÁTICA DO AMOR E DA MISERICÓRDIA

            Em pleno inverno, o samurai chegou à presença do mestre zen.

            - Não há mais lugar para homens como eu. Estou morrendo de frio e de fome, e não tenho como ganhar meu sustento.

            Compadecido, o mestre foi até a estátua de Yakushi-Buda, retirou a corrente de ouro que adornava seu pescoço, e entregou-a ao samurai. Os outros discípulos reclamaram:

            - Isso é um sacrilégio!

            - Por que sacrilégio? – respondeu o mestre. – Vocês ouviram falar de David, que comeu o pão do tabernáculo quando passava fome.

            “Apenas coloquei o espírito de Buda em ação: amor e misericórdia agora fazem seu trabalho.”

 

                   SAIBA O QUE DESEJA ATINGIR

            O iogue Raman era um verdadeiro mestre na arte do arco e flecha. Certa manhã, ele convidou seu discípulo mais querido para assistir a uma demonstração do seu talento. O discípulo já vira aquilo mais de cem vezes, mas, mesmo assim, resolveu obedecer ao mestre.

            Foram para o bosque ao lado do mosteiro. Ao chegarem diante de um belo carvalho, Raman pegou uma das flores que trazia em seu colar e a colocou em um dos ramos da árvore.

            Em seguida, abriu seu alforje, e retirou três objetos: seu magnífico arco de madeira preciosa, uma flecha, e um lenço branco, bordado com desenhos em lilás.

            O iogue, então, posicionou-se a uma distância de 100 passos do local onde havia colocado a flor. De frente para o seu alvo, pediu que seu discípulo o vendasse com o lenço bordado.

            O discípulo fez o que o mestre ordenara.

            “Quantas vezes você já me viu praticar o nobre e antigo esporte do arco e flecha?” – perguntou.

            “Todos os dias”, respondeu o discípulo. “E sempre o vi acertar na rosa, a uma distância de 300 passos.”

            Com seus olhos cobertos pelo lenço, o iogue Raman firmou os seus pés na terra, distendeu o arco com toda a sua energia – apontando na direção da rosa colocada num dos ramos do carvalho – e disparou.

            A flecha cortou o ar, provocando um ruído agudo, mas nem sequer atingiu a árvore, errando o alvo por uma distância constrangedora.

            “Acertei?”, disse Raman, retirando o lenço que cobria seus olhos.

            “O senhor errou, e por uma grande margem” respondeu o discípulo. “Achei que ia mostrar-me o poder do pensamento, e sua capacidade de fazer mágicas.”

            “Eu lhe dei a lição mais importante sobre o poder do pensamento”, respondeu Raman.

            “Quando desejar uma coisa, concentre-se apenas nela. Ninguém jamais será capaz de atingir um alvo que não consegue ver.”

 

                                                                                Paulo Coelho  

 

                      

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