Criar uma Loja Virtual Grátis
Translate to English Translate to Spanish Translate to French Translate to German Translate to Italian Translate to Russian Translate to Chinese Translate to Japanese

  

 

Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


SOMEONE LIKE YOU / Lauren Layne
SOMEONE LIKE YOU / Lauren Layne

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

Biblio VT

 

 

 

 

— Lincoln, você sabe que te amo como um irmão, mas se tentar alguma coisa com a minha irmã, eu acabo com você.
Lincoln Mathis deu um gole lento em seu coquetel, estudando a feroz futura noiva. — Espero que Cassidy saiba o quanto é sortudo. Você é tão delicada e gentil.
Emma Sinclair, que no dia seguinte no mesmo horário seria Emma Cassidy, ergueu um dedo que exibia uma unha elegantemente bem cuidada e o empurrou contra o peito dele. — Prometa, Lincoln. Nada de dar em cima da Daisy.
— Eu não dou em cima das mulheres.
Emma o encarou.
Ele levantou a mão livre em sinal de rendição. — Sério. São elas que me procuram. Eu sou como um estame.
Emma arregalou os olhos castanhos, dando a ele um olhar levemente acusador. — Um o quê?
— Estame. A parte da flor que produz o pólen, Sinclair. Você não assiste ao Discovery Channel? Animal Planet? Recentemente, vi um documentário fascinante sobre abelhas. Veja bem, quando as abelhas pousam em uma flor, as patinhas delas recolhem o pólen do estame...
— Mathis. Você está falando sobre sêmen com a minha noiva? — Alex Cassidy perguntou, se colocando ao lado de Emma e apoiando a mão de forma possessiva na cintura dela.
— Estame — Lincoln esclareceu —, não sêmen. Francamente, vocês só pensam em sexo?
— Sim. — A resposta veio de Riley Compton, um mulherão de cabelos escuros, cujo status de principal “especialista em sexo” de Nova York significava que ela não via problema nenhum em falar sobre sexo no jantar de ensaio da melhor amiga. — E sabe, na verdade, o estame está sim relacionado a sexo. Eu também vi esse documentário sobre abelhas, porque, a propósito, esse é o tipo de coisa que você faz quando está amamentando um bebê insaciável, e o estame é o órgão reprodutor masculino de uma flor. Sexy, não?

 


 


Emma colocou o braço que não segurava taça de champanhe entre os dois. — Pessoal, é o fim de semana do meu casamento. Podemos não falar sobre ereções de flores?

— Parece justo, noiva — disse Lincoln. — Sobre o que você quer falar? Da ereção de Cassidy?

Alex Cassidy engasgou com o champanhe.

— Ninguém vai falar sobre ereções — disse Emma. — Lincoln e eu estávamos conversando sobre como ele vai manter distância da minha irmã.

— Falando em flores, onde está Daisy? — Riley perguntou, analisando a sala.

— Atrasada. Conhecendo minha irmã, o vestido dela provavelmente amarrotou um pouco dentro da mala e ela não vai aparecer até o tecido estiver sem amassado nenhum, com todos os fios de cabelo no lugar e nenhum fiapo de algodão à vista.

— Caramba, será que vou conseguir me segurar? — Lincoln murmurou.

— Lincoln, eu juro por Deus...

— Ele está brincando com você, Em — disse Cassidy, puxando cuidadosamente a noiva para longe de Lincoln. — Não deixe ele te irritar. E Lincoln, cara, que bebida é essa?

Lincoln olhou para baixo. — É chamada “Jasmine”. Uma mistura de gim, limão, um pouco de Campari...

— É rosa. — Cassidy constatou.

— Sim? Você quer uma?

Cassidy revirou os olhos. — Vou continuar tomando meu champanhe, obrigado. Ah, merda, minha avó está acenando para nós. Emma, ??está a fim de conversar sobre a situação do seu útero?

Emma gemeu. — Ah, não. Pensei que ela tinha concordado em esperar até depois do casamento para falar sobre meus óvulos.

— Eu vou com vocês — disse Riley. — Como a única em nosso pequeno grupo de amigos que já expulsou um crânio humano para fora da minha...

— Ok, vou expandir minha lista de temas-tabus — Emma falou. — Nada de conversas sobre ereções, flores ou vaginas.

— Tá bem — disse Riley, entrelaçando o braço ao de Emma e levando-a na direção da avó de Cassidy. — Mas se a vovó começar a falar sobre fertilidade, faça o que eu disser...

Lincoln sorriu, observando os amigos se afastarem. Ele poderia ir junto, certamente, ajudá-los a lidar com a situação, mas Riley, a mais nova mãe no pedaço, era a melhor escolha para essa tarefa de festa pré-casamento em especial.

Além disso, como padrinho principal, Lincoln já tinha o suficiente para se preocupar. As alianças, confirmar mais uma vez o transporte até a igreja amanhã, o discurso perfeito que daria, o...

A lista de afazeres de padrinho principal de Lincoln sumiu de sua mente quando seus olhos pousaram em uma mulher parada na porta do espaço privado da festa. Ele deu uma segunda olhada nela. Como Emma encontrou tempo para trocar de roupa? De um modo geral, ele não se considerava particularmente interessado em reparar nas roupas dos amigos. Especialmente as mulheres, porque, bem... ele não dava a mínima. Mas ele tinha certeza absoluta que Emma estava usando um vestido branco dez segundos atrás.

Agora ela vestia um amarelo curto, um pouco recatado, de mangas espalhafatosas e esvoaçantes, gola alta e...

Não, recatado não, Lincoln se corrigiu mentalmente quando ela se virou. Sexy. O vestido tinha um grande decote nas costas, exibindo uma extensão suave de pele levemente bronzeada, subindo da parte inferior das costas até o longo cabelo loiro escuro.

... Cabelo loiro.

Emma tinha cabelos castanhos na altura dos ombros. Uma mudança de roupa ele podia aceitar, mas o cabelo?

Seu idiota.

Ele estava olhando para ninguém mais ninguém menos que Daisy Sinclair, o fruto proibido, em carne e osso.

Ele havia esquecido que Daisy não era somente irmã de Emma – mas também gêmea idêntica dela.

Além do fato de não poder dar em cima dela, Lincoln não sabia muito sobre a mulher.

Bem, agora sabia que ela havia pintado o cabelo de loiro, ele supôs.

Ou talvez Emma tenha tingido o dela de castanho?

Tanto faz. De qualquer forma, eram coisas de mulher com as quais ele não se importava.

E, no entanto, ele não desviou o olhar, sentindo-se cativado de alguma forma. Ele vasculhou o cérebro em busca de tudo que já ouviu sobre Daisy Sinclair.

Ele sabia que ela e Emma cresceram na Carolina do Norte. Mas Emma se mudou para Nova York logo depois da faculdade e Daisy permaneceu na cidade natal. Ele pensou ter ouvido algo sobre um recente divórcio, embora não recordasse dos detalhes.

E nem precisava. Lincoln sabia melhor do que ninguém que nem todos os relacionamentos tinham finais felizes.

Ele observou Daisy hesitar do lado de fora da porta, ainda sem ser notada pelo resto da festa pré-casamento e pelos convidados que vieram de fora da cidade.

Deixar as pessoas mais à vontade ??era uma habilidade especial dele. Normalmente, teria ido para perto dela em um piscar de olhos, ofereceria uma taça de vinho e diria algumas de suas melhores piadinhas até que os ombros dela relaxassem e conseguisse arrancar um sorriso daquele rosto lindo.

Mas ele não estava totalmente convencido de que Emma não cumpriria as ameaças de castração que fez para ele, então Lincoln limitou-se a estudar Daisy de longe. A mulher era linda. O que não era uma surpresa, já que Emma era deslumbrante. No entanto, embora os traços das duas fossem idênticos, elas eram atraentes de maneiras totalmente diferentes.

Emma tinha uma confiança inabalável e era estonteante de uma forma inalcançável.

Daisy era, de alguma maneira, mais delicada. Mais gentil. Ela parecia... alcançável.

Lincoln paralisou o coquetel no meio do caminho até a boca, subitamente assustado quando o proibido o atingiu. Ele não podia se meter com Daisy Sinclair, por razões que não tinham nada a ver com as ameaças de Emma.

Como se sentisse os pensamentos inquietos de um homem direcionados a ela, Daisy se virou levemente, os olhos fixos nos dele. Olhos que ele sabia que seriam castanhos escuros como os de Emma e, ainda assim, fazer contato visual com Emma nunca o fez se sentir daquela forma.

Lincoln sentiu como se estivesse entrando em pânico, porque por um momento de parar o coração, parecia que Daisy Sinclair estava o vendo. Não o Lincoln que ele queria que todos vissem.

Mas seu verdadeiro eu.

Ele se deu uma pequena sacudida mental. Controle-se, Mathis. A mulher nem conhece você.

Ninguém conhecia.

Não de verdade.

Em resposta, ele reparou o choque no olhar dela e teve a sensação de que, por uma fração de segundo, ela considerou dar meia-volta e correr. Dele, da festa, de tudo.

Então, viu outra coisa. Algo familiar, porque ele mesmo havia feito aquilo milhares de vezes. Ela endireitou os ombros, e ele percebeu o momento que ela deslizou a máscara sobre o rosto.

Ele soube, mesmo antes de ela se aproximar, que Daisy era exatamente como ele – boa em estar perto das pessoas somente porque ela escolheu estar. Ele sabia que, outrora, talvez tinha sido um hábito, mas agora não passava de uma tentativa premeditada de se certificar que todos pensassem que ela estava bem.

Daisy começou a se aproximar e ele enrijeceu por razões que não conseguia identificar, mas ordenou a si mesmo que relaxasse.

Era só a irmã da amiga dele. A madrinha principal que o acompanharia como padrinho.

Ela parou diante dele e ele sentiu o tênue aroma do perfume dela, uma fragrância surpreendentemente refinada para alguém chamada Daisy. Ela estendeu a mão.

— Você deve ser Lincoln Mathis, "O Cafajeste com Quem Devo Tomar Cuidado"?

A voz dela o surpreendeu. Tinha a mesma rouquidão suave que a da irmã, mas os anos em Nova York praticamente apagaram o sotaque sulista da voz rouca e grave de Emma. Já o de Daisy estava muito intacto – era como beber um mojito em um dia quente.

Ele sorriu e pegou a pequena mão estendida. — O que faria de você Daisy Sinclair, "A Flor Delicada Com Quem Não Devo Falar".

Ela sorriu. — Acertou em cheio.

— E me diga, Daisy Sinclair — ele prosseguiu —, por que você é considerada zona proibida?

Ela bateu os cílios, parecendo exatamente a beldade sulista que a voz aparentava ser. — Não é óbvio? Divorciada, destruída e muito frágil. E você? Por que você deve ser evitado?

Mandou bem. Evitar suposições ao anunciá-las antes que qualquer um pudesse especular.

Ele se inclinou um pouco para a frente e abaixou a voz. — Mulherengo consumado, intrigantemente inalcançável, com uma pitada de segredos perigosos.

Ela se inclinou, abaixando o tom de voz como ele. — Parece um sonho. Acha que devemos contar à Emma que vamos fugir juntos agora ou mais tarde?

Lincoln apostaria todo seu plano de aposentadoria que ela fingia a ousadia e a audácia, mas porque ele entendia, entrou no jogo.

Lincoln fingiu pensar na proposta dela. — Vamos esperar até depois de darmos nossos respectivos discursos na festa amanhã. A propósito, o meu está incrível, me desculpe antecipadamente por fazer o seu parecer ruim.

Ela estendeu a mão lentamente e arrancou a bebida dele, encarando-o enquanto tomava um gole, sem sequer hesitar com a amarga adstringência do drinque. — Não estou preocupada. Dizem que você conseguiu o papel de padrinho principal em uma partida de futebol de papel.

— Ei, pelo menos tive que me esforçar. Só o que você precisou fazer foi compartilhar um útero.

Daisy devolveu a bebida. Os dedos dela roçaram nos dele no processo e Lincoln ficou um pouco surpreso ao perceber que notou o toque. De um modo geral, ele não se permitia se sentir consciente das mulheres ao seu redor, e foi irritante pra caramba perceber o quanto estava consciente daquela diante dele.

— Aposto que consigo fazer mais pessoas chorarem do que você amanhã — ela disse.

— As lágrimas são todas suas para manipular. Vou ficar com as risadas.

Ela fez um biquinho e assentiu em apreciação. — Escondendo suas dores íntimas por trás de piadas. Legal.

— Direcionando a conversa para as dores íntimas de outra pessoa para evitar falar das suas — ele rebateu. — Legal.

Ela deu um sorriso lento e genuíno, erguendo os olhos castanhos para os dele. — Acho que vamos nos dar muito bem, Sr. Mathis.

Lincoln sorriu de volta, mas não o sorriso premeditado de costume, que vinha praticando há tantos anos que se tornou um hábito.

O sorriso que ele deu foi verdadeiro, porque ela estava certa. Ele e Daisy eram parecidos.

E eles iriam se dar bem, porque em poucos minutos, sob o disfarce de piadinhas casuais, haviam compartilhado mais verdades um com outro – mesmo sendo perfeitos estranhos – do que haviam feito com qualquer outra pessoa em anos.

Lincoln não conseguia explicar como tinha certeza daquilo, mas ele e Daisy Sinclair compreendiam um ao outro. As respectivas muralhas dos dois foram reconhecidas em um acordo silencioso de que nenhum deles tentaria escalar o muro do outro.

Ali, no improvável local do casamento do melhor amigo, Lincoln encontrou outra pessoa que entendia que a melhor maneira de lidar com segredos ocultos e dores silenciosas era simplesmente fingir.

E, no entanto, sob o alívio de saber que Daisy talvez fosse a mulher que nunca pediria mais do que Lincoln poderia oferecer, havia algo mais...

Uma constatação perturbadora e desconhecida de que, pela primeira vez em muito tempo, Lincoln queria algo além de proteger os próprios segredos.

Ele queria conhecer os dela.


Capítulo 2

Verdade seja dita, Daisy Sinclair ficou aliviada pela irmã tê-la avisado sobre o quão lindo Lincoln Mathis era. Isso fez Daisy pesquisá-lo no Google e ver uma foto antes quase a deixou preparada para o choque que foi vê-lo pessoalmente na noite passada.

Quase, mas não totalmente.

Simplificando, Lincoln Mathis era o cara mais lindo que ela já viu... em toda sua vida.

O tipo de cara que pertencia a cartazes de filmes e anúncios de roupas íntimas.

Agora ela o observava de um canto tranquilo do salão, tomando um gole de champanhe. Ele não estava brincando quando disse que iria fazer as pessoas gargalharem com o discurso dele. Os convidados do casamento estavam comendo na palma de sua mão, de uma forma positiva.

É claro que, com a aparência do homem naquele smoking, ele poderia ter só ficado lá parado sem dizer uma palavra ou gritar obscenidades e, mesmo assim, todo mundo continuaria meio apaixonado por ele.

Os cabelos castanhos escuros caindo em ondas sobre a testa de Lincoln davam um aspecto de menino, mas os ombros largos e a mandíbula forte eram completamente másculos. Os olhos azuis exalavam tanto alegria quanto mistério. Ele era hábil em rir e ainda mais hábil em sorrir e, até onde ela percebeu, tinha sempre uma piadinha na ponta da língua.

Todos os padrinhos usavam gravatas borboleta na cor rosa-pálido para combinar com os vestidos das madrinhas e, de alguma forma, Lincoln Mathis conseguia fazer a cor feminina parecer sexy como o diabo em um homem.

Daisy pensou que Emma estava brincando quando disse que a cor rosa havia sido ideia do padrinho principal. Agora não tinha mais tanta certeza. Lincoln parecia ser bom em surpreender as pessoas.

Ela respirou fundo, relaxando aos poucos depois do nervosismo que sentiu durante o discurso. Daisy nunca sentiu medo de falar em público, sabia que podia lidar com uma multidão tão habilmente quanto Lincoln, mas a “apresentação” desta noite tinha sido diferente.

Tinha sido para sua irmã gêmea e, embora talvez somente ela e Emma soubessem, o discurso de Daisy foi meio que uma despedida. Durante toda a infância, elas pertenceram uma à outra. Agora, Emma pertenceria a outra pessoa.

Ainda assim, Daisy fora honesta ao descrever o prazer que foi assistir os universitários Emma e Cassidy se apaixonarem anos atrás. Estava falando sério quando disse que sofreu pela separação deles junto com Emma (Daisy foi bem breve nessa parte, obviamente). E foi sincera quando disse que o fato de eles terem se reencontrado parecer ter saído de um conto de fadas.

Mas a parte do discurso de Daisy que talvez tenha sido um pouco enfeitada demais? A parte em que falou de forma radiante sobre a magia do matrimônio.

Daisy sabia que um “Grande Casamento” nem sempre levava ao “Felizes para Sempre”. Nem mesmo ao “Satisfeitos para sempre”.

Às vezes, um casamento nada mais era do que o primeiro passo em direção ao seu inferno pessoal.

Daisy ficava feliz por Emma e Cassidy. De verdade. Ao vê-los trocando os votos, ela pensou que seu coração explodiria de felicidade.

Mas também de dor. Porque se lembrava muito bem da sensação de se casar. Lembrava-se da alegria, da esperança e da confiança de que o homem que disse “Eu aceito” a amaria para sempre.

Haha.

Daisy não duvidava de que Cassidy iria amar Emma para sempre. Alex Cassidy era um homem bom – um homem fantástico – que daria a vida por Emma.

Mas Daisy não teve tanta sorte assim.

Ela tomou um gole de champanhe e, quando ouviu alguém em uma mesa próxima fungar, se recompôs rapidamente e retornou a atenção ao padrinho principal.

— ...Não é todo dia que você tem a chance de testemunhar uma das maiores histórias de amor — dizia Lincoln, erguendo uma taça. — Mas eu me considero abençoado todos os dias, não porque conheço Cassidy, não porque conheço Emma, ??mas porque conheço os dois como um casal. Eles despertam o melhor um do outro. O melhor de todos nós. À Emma e Cassidy.

Daisy ergueu a taça assim como o resto dos convidados, mas seus olhos se estreitaram na direção de Lincoln. Eles tinham um acordo. Ela ficaria com a parte de fazer as pessoas chorarem, ele com a de fazê-las rir. Mas ele fez as duas coisas.

Filho da puta.

Inferno, até Cassidy parecia estar engolindo um nó na garganta ao abraçar o amigo.

Lincoln olhou para Daisy por cima do ombro de Cassidy e deu uma piscadela.

Ela soltou uma risadinha e bebeu o champanhe. Desgraçado.

— Ele é gostoso, não é?

Daisy se virou e deu de cara com a namorada de um dos colegas de trabalho de Cassidy e Lincoln parada ao lado dela. Ela vasculhou rapidamente sua lista de pessoas mental, tentando lembrar de todos os nomes que aprendera na noite anterior. Mandy? Macy? Não, Mollie.

Mollie era a namorada do Jackson Burke. Daisy não tinha vergonha de admitir que estava um pouco fascinada por estar no mesmo lugar que o quarterback vencedor de vários Super Bowls. Uma lesão havia encerrado a carreira dele, e ele se reergueu decidindo se juntar à equipe da Oxford como editor de fitness.

Oxford era a revista parceira da Stiletto, na qual Emma e as outras madrinhas trabalhavam. Daisy conversava com a irmã o suficiente para saber que eram uma equipe muito unida, mas antes de pegar um vôo para Nova York, precisou fazer a “lição de casa” de modo a conseguir se colocar a par da vida de todos.

Emma (Stiletto) estava se casando com Cassidy (Oxford), que era amigo de Jake (também da Oxford), que era casado com Grace (também funcionária da Stiletto e melhor amiga de Emma)...

E havia Mollie, que não estava ligada a nenhuma das revistas, a não ser pelo relacionamento com Jackson Burke, mas parecia que estava, já que todos eram como carne e unha.

Daisy esfregou a testa. Tentar lembrar de tudo dava dor de cabeça.

E, embora nunca fosse admitir, talvez estivesse sentindo um pouquinho de inveja. Inveja por Emma estar se casando com o amor da vida dela e cercada por um grupo de amigos que estavam lá um para o outro, independente da situação.

Daisy não perdeu todas as amigas quando Gary a deixou, mas perdeu o suficiente. Muitas a abandonaram depois que Daisy não se encaixava mais nos encontros duplos à noite, em Charlotte, e nem nos chás de bebê nos clubes fora da cidade – quando os recém-casados começaram a lentamente migrar para o posto de "novos pais".

Ela estava feliz pela irmã, mas parecia que a vida da gêmea estava decolando justamente no momento em que a de Daisy desmoronou.

— Quem é gostoso? — Daisy perguntou, voltando sua atenção para Mollie.

A loira bonita riu. — Acho que não foi uma pergunta muito justa. Estamos meio que rodeadas por testosterona. Pensei que estava acostumada com a beleza dessa equipe, mas ver esses caras usando smoking...

O olhar de Daisy correu de volta para onde Lincoln ria com a irmã dela.

— É difícil não encarar, não é?

Daisy olhou de novo para Mollie, que lhe dava um sorriso gentil, como se soubesse exatamente para quem Daisy estava olhando – e pensando sobre.

Ela decidiu não bancar a desentendida. — Lincoln é... bem, ele é tudo que Emma prometeu que seria. É verdade que metade da população feminina da cidade está apaixonada por ele?

Mollie bufou e tomou um gole do vinho tinto que segurava. — Metade? Devem ser pelo menos três-quartos. Nem aquelas de nós que estão solidamente apaixonadas por outra pessoa conseguem deixar de estar um pouco apaixonadas por Lincoln Mathis.

— Certamente a fila enorme de mulheres que tiveram o coração partido por ele devem querer a cabeça dele, não?

— Na verdade, não — Mollie respondeu. — Ninguém sabe como ele administra isso, mas apesar de ter uma agenda de contatos maior que a Bíblia, não parece existir qualquer traço de rancor entre os “ex-casinhos” dele.

— Isso é... impressionante.

— Pois é.

— Ele é gay? — Daisy perguntou casualmente, soando mais intrigada do que queria deixar transparecer.

— Não sei. Talvez? Mas não sinto essa vibe vindo dele — Mollie admitiu enquanto as duas assistiam Lincoln ser levado para a pista de dança por uma morena deslumbrante em um vestido justo.

Daisy também não sentia essa vibe dele. Quando se dirigiu a ele no jantar de ensaio na noite anterior, sentiu a forma como ele a observou. Do mesmo jeito que um homem olhava para uma mulher. Com apreciação e intenção.

Mas quando ela se apresentou, a máscara dele voltou ao devido lugar e toda a intensidade naqueles olhos azuis foi substituída por uma diversão charmosa.

Mesmo assim, ele era... atraente. E muito, muito simpático. Ela entendeu porque Emma a alertara sobre ele. Alguns anos atrás, Lincoln Mathis teria sido exatamente o tipo de cara por quem Daisy seria atraída.

Ele tinha uma beleza que completava a dela, o cara gentil da cidade que combinaria perfeitamente com a encantadora beldade do sul. Juntos, poderiam ofuscar o casamento – e a recepção pós-casamento, se quisessem.

Mas Emma não precisava se preocupar. Daisy não era mais aquela garota. Decerto, ainda interpretava esse papel. Na superfície, continuava sendo a mesma Daisy Sinclair bem-humorada que sempre fora. Somente Emma sabia a verdade.

Bem, Emma, ??e talvez Lincoln Mathis, ela pensou, quando mais uma vez seus olhos se encontraram, ele olhando-a por cima da cabeça da morena que fazia uma dança proibida para menores contra o quadril dele.

Ela esperou outra piscadela charmosa, mas ele apenas inclinou um pouco o queixo, como se entendesse os pensamentos dela.

— Hum — disse Mollie, fazendo Daisy lembrar que não estava sozinha.

— “Hum” o quê? — Daisy perguntou, olhando para a loira bonita.

— Já é a segunda vez que ele procura por você no meio da multidão — Mollie respondeu, pensativa.

— Ele é um mulherengo — Daisy disse, divertindo-se. — Não é o papel dele fazer isso?

— Lincoln é um mulherengo de verdade — disse Mollie. — Isso significa que está sempre de olho em todas as mulheres, nunca em apenas uma.

— Eu nem falei com ele essa noite.

— Às vezes, o contato visual já diz tudo — Mollie provocou, cutucando Daisy com o cotovelo.

Daisy riu e olhou ao redor. — Você é romântica.

Os olhos de Mollie examinaram o salão cheio até pousarem em Jackson Burke, que estava rindo com alguns colegas de trabalho. — Tenho motivos para ser.

Pois bem, já eu tenho motivos para não ser, pensou Daisy.

A batida incansável de um hit irrelevante do Top 40 se transformou em uma música lenta, e Daisy assistiu com diversão o sorriso de Mollie aumentar ainda mais quando Jackson Burke começou a se aproximar dela, parecendo ter um objetivo em mente.

— Você se importa se eu te abandonar um pouquinho? — Mollie perguntou em voz baixa, depositando a taça vazia em uma bandeja próxima.

— Claro que não — disse Daisy, dispensando-a com um gesto de mão.

Daisy tomou outro gole de champanhe, observando os convidados do casamento tomarem seus lugares na pista de dança e dando um jeito de afastar o próprio tédio ao tentar adivinhar há quanto tempo cada casal estava junto com base na linguagem corporal.

Ela se divertiu um pouco ao notar que Emma e todas suas amigas da Stiletto ainda pareciam estar no estágio da lua de mel com suas cara-metades, mesmo sabendo que elas estavam com seus respectivos companheiros há anos.

Daisy sentiu uma pequena pontada no coração. Outrora, pensou, ela e Gary estariam ali também. Tão apaixonados um pelo outro quanto no dia do próprio casamento. Quer dizer, pelo menos ela estava apaixonada naquele dia. Daisy não tinha certeza de que alguém como Gary sabia o que era o amor.

Mesmo assim, ela estava feliz por estar aqui. Grata por estar cercada por toda aquela felicidade, mesmo que provocasse nela uma sensação amarga. Daisy desejou que seu pai pudesse estar aqui para ver isso. Ele falecera de um ataque cardíaco há um ano e, embora o pai delas tivesse causado muitos estragos no relacionamento de Emma e Cassidy anos atrás, Daisy desejou que ele pudesse ter levado Emma ao altar, que tivesse tido a oportunidade de dançar com a filha, assim como dizia a tradição.

No entanto, a maneira como tudo ocorreu também foi maravilhosa. Cole Sharpe, outro colunista da Oxford, levou Emma ao altar, e uma enorme quantidade de homens que também trabalhavam na revista rodopiaram uma Emma risonha pela pista de dança, substituindo a dança de pai e filha.

Daisy percebeu que aquela era a família de Emma. Claro, as gêmeas eram próximas, mas agora eram órfãs e nunca foram particularmente próximas do resto da família. Emma havia construído uma família em Nova York, com uma rede de amizades muito unida.

E, embora Daisy estivesse feliz por Emma, também estava com... ciúmes.

— Odeio ter que te dizer isso, querida, mas você está interpretando o papel de “tímida” de maneira meio convincente demais.

Daisy se virou, de alguma forma surpresa ao ver Lincoln Mathis parado ao lado dela, os olhos azuis brilhando acima da gravata-borboleta rosa que assentava bem nele e exalava uma masculinidade impressionante.

— Você trapaceou. — Foi o que ela disse para cumprimentá-lo.

Ele sorriu, um sorriso lento e sedutor, descansando um ombro contra a parede em que ela estava encostada, e a olhou. — Como é?

— Você os fez rir e chorar com seu discurso. Pensei que concordamos que só bancaria o engraçadinho.

O sorriso dele se alargou ainda mais. — O que posso dizer? Tenho várias maneiras de seduzir as pessoas.

— Falando nisso — ela retrucou, acenando levemente com a cabeça em direção à morena sensual que se aproximava deles. — Acredito que sua parceira de dança está querendo um bis.

Ele soltou o mais sutil dos gemidos, tão baixo que ela pensou que poderia ter sido coisa da imaginação dela.

— Dance comigo — ele falou subitamente para Daisy, endireitando-se e olhando para ela.

Ela foi atingida por uma pontada de surpresa e, então, pelo pânico. — Não posso.

Ele sorriu e estendeu a mão. — Vamos lá, Wallflower1. Sou um ótimo dançarino.

Wallflower. Daisy nunca foi uma pessoa tímida ou anti-social em toda sua vida. Mas ele tinha certa razão. Ela realmente estava distante das pessoas, encostada na parede. Ela se repreendeu silenciosamente. Era tudo o que ela havia se treinado para não fazer: deixar Gary vencer...

— Não duvido das suas habilidades como dançarino — ela respondeu ousadamente — Mas...

Ela interrompeu a própria fala. O que poderia dizer? Não gosto de ser tocada?

Não é como se não pudesse ser tocada. Não estava tão quebrada assim. Não havia surtado mais cedo. Conseguiu receber um abraço de Cassidy quando o cumprimentou na noite passada; havia dançado horas atrás com o tio. Mas aqueles homens eram da família.

Lincoln Mathis não era... da família.

Dance com ele, ela se ordenou. Não seja aquela mulher quebrada em que Gary tentou te transformar.

Ela não se mexeu e, lentamente, Lincoln abaixou a mão ao lado do corpo, justamente quando a morena os alcançou.

— Eu amo essa música — disse a mulher, passeando a mão possessivamente pelo braço de Lincoln. — Vamos dançar?

Lincoln sustentou o olhar de Daisy e ela deu de ombros, mandando um beijo de despedida no ar para provocá-lo. — Tchauzinho.

Ele estreitou o olhar. — Na verdade — disse Lincoln, virando-se e dando à mulher um sorriso de desculpas — vou precisar dar uma saída rápida.

As sobrancelhas perfeitamente modeladas da mulher se arquearam. — Uma saída? Para quê?

— Preciso mostrar uma coisa para Daisy — disse ele, se inclinando e beijando a bochecha da outra mulher. — Talvez numa próxima vez, amor.

Antes que Daisy pudesse registrar que havia sido colocada como parte da fuga de Lincoln Mathis, ele arrancou a taça de champanhe da mão dela e a colocou de lado, entrelaçando os dedos nos dela e puxando-a em direção à porta.

— Espere, vamos mesmo embora? — Ela perguntou, dando risada enquanto ele a guiava pelo meio da multidão de convidados.

— Sim.

— Não posso — ela protestou. — É o casamento da minha irmã, meus familiares estão aqui, e...

— Mas você quer ir embora — disse ele, virando-se e encarando-a.

Ela estreitou o olhar. — Por que eu iria querer isso?

Ele ergueu os olhos para os dela. — Porque você, assim como eu, não gosta de casamentos.


Capítulo 3

— Quanta experiência você tem em andar nessas coisas? — Lincoln perguntou, apontando o queixo em direção às sandálias prateadas de salto alto de Daisy.

— Bem, deixe-me ver — ela respondeu, estendendo os dedos para contar à medida em que listava: — Já usei saltos em concursos que ganhei, em bailes de debutantes, como princesa do Festival Daffodil, nas fraternidades, nas reuniões do conselho do clube de campo...

— Isso quer dizer que vai dar conta de me acompanhar?

Ela deu um pequeno sorriso. — Vou dar conta. O que tinha em mente?

Lincoln inalou o ar quente de junho e expirou lentamente. O que ele tinha em mente?

Tudo o que sabia era que não suportava mais ficar lá. Ele havia passado o dia inteiro, inferno, o mês inteiro, feliz por Cassidy e Emma. Não precisava fingir. Estava realmente feliz por eles. Não havia no mundo inteiro pessoas ou amigos melhores que aqueles dois.

Ainda assim, aquilo não foi capaz de tornar as crises de “deveria ter dado certo/poderia ter dado certo” mais fáceis de lidar, e aquela que havia o atingido durante a festa foi ainda mais complicada. A onda esmagadora de nostalgia, o aumento súbito de raiva.

Lincoln precisou sair dali. Precisou fugir, ficar sozinho com os próprios pensamentos.

E, no entanto, em vez de fazer isso sozinho, convidou uma quase desconhecida para se juntar a ele em um momento particularmente vulnerável. Por quê?

Ele olhou para Daisy, que esperava pacientemente que ele terminasse de refletir. Era estranho. Os traços dela eram quase idênticos aos de Emma, ??uma mulher que ele via quase todo dia, e, ainda assim, quando olhava para ela, não via Emma. Ele via Daisy.

E não só porque o cabelo dela era mais claro, ou porque ela tinha um sotaque sulista, ou o fato de parecer preferir batom rosa enquanto Emma preferia os de cores neutras. Era o que estava por baixo de tudo isso que a fazia diferente.

— Você está me encarando — ela comentou.

— Esse vestido rosa. Combina com você.

— Combina mesmo. — Ela acenou com a cabeça para a gravata-borboleta dele. — Rosa combina com você também.

Lincoln estremeceu. A sugestão da cor rosa para as gravatas havia sido um erro. Ele fez isso porque sabia que os caras esperavam tais palhaçadas dele, mas só serviu para trazer mais memórias dolorosas à tona. Ele havia feito isso na intenção de ser uma homenagem particular, mas em vez disso, parecia mais como se estivesse zombando de um casamento que nunca chegou a acontecer.

Ele ficou em silêncio por tempo demais, e Daisy deu-lhe um olhar pensativo.

— Não precisamos fazer isso — ela falou. — Posso voltar para dentro. Te dar um pouco de espaço.

Não me abandone.

O pensamento surgiu do nada e ele franziu a testa. O que havia de errado com ele? Ela havia dado a ele a solução perfeita, mas...

Ele não aceitaria. Não queria remoer a própria melancolia. Haveria tempo de sobra para isso amanhã.

— E deixar você voltar a segurar aquela parede com os ombros? — Ele disse, fixando um sorriso no rosto. — Acho que não. Diga-me, Daisy Sinclair, qual é a sua opinião sobre a cidade de Nova York?

Ela torceu o nariz. — É... agitada.

Ele chiou. — Acho que a palavra que você estava procurando era “enérgica”. Prossiga.

— Barulhenta? — Ela sugeriu.

— Animada. Próxima.

— De alto custo.

— Sim, tudo bem. — Ele admitiu. — Você me pegou. Mas as coisas só custam mais caro porque todo mundo quer estar aqui.

— Eu não.

— Missão aceita.

— Espera, o quê? Eu não quero...

— Se apaixonar por esta cidade? Claro que quer.

Lincoln estendeu um braço e gostou do jeito que ela revirou os olhos antes de tomá-lo. Era estranhamente reconfortante passar um tempo com uma mulher que não parecia exatamente com vontade de passar um tempo com ele.

— Então, para onde vamos? — Ela perguntou quando começaram a caminhar pela calçada. — Edifício Empire State? Estátua da Liberdade? Ponte do Brooklyn?

— Não essa noite, amor, não estou com minha pochete ou pau de selfie.

— Então para onde?

— Para um pub de má reputação.

— Hum, você está de smoking e esse vestido aqui é de seda.

— Então vamos deixar o ping-pong de cerveja de lado e viver um pouco.

Ela olhou por cima do ombro. — Tem certeza de que não devemos voltar para o casamento? Somos a madrinha e o padrinho principais.

Ele olhou para a expressão de preocupação dela. — Podemos, se você quiser. Mas até onde sei, todo mundo lá está bêbado de champanhe e otimismo. Eu sei que Cassidy não vai se importar. Emma vai?

— Não. — Ela admitiu. — Pela maneira como eles estavam se comendo com os olhos na pista de dança, nem tenho certeza se notarão que saímos.

— Foi o que pensei também. E já confirmei com a limusine que vai buscá-los à meia-noite e levá-los para uma luxuosa suíte de hotel, onde poderão transar de verdade.

— Bom trabalho, Padrinho Principal — ela elogiou, dando um soco no ombro dele. — Embora eu acredite que o clichê completo seria nós dois irmos à suíte antes deles e espalhar pétalas de rosa sobre a cama.

— Sim, mas o clichê completo nos deixaria tão emocionados com o romance da situação que cairíamos na cama de lua de mel deles em um acesso de luxúria.

Ele quis engolir de volta as palavras de flerte quase no segundo em que as colocou para fora. Não que Lincoln não flertasse com mulheres – era o que ele fazia, quem ele era.

Mas ele tinha limites – tópicos em que não tocava, insinuações que não fazia – e havia acabado de cruzar a própria barreira. Flertava com mulheres, mas sempre dentro das restrições que ele mesmo adotara para si. Sugerir ele e Daisy juntos em uma cama... Era, no mínimo, inapropriado.

Inferno, a visão dele com uma Daisy nua passando por sua cabeça estava muito mais perto de ser uma restrição ainda mais proibida.

E o deixava muito mais assustado do que ele gostaria de admitir.

Para a sorte dele, Daisy não pareceu notar. Em vez disso, inclinou a cabeça para trás e olhou para o céu. — Não dá para ver as estrelas daqui.

— Dá para vê-las de onde você mora? — Ele perguntou, agradecido pela mudança de assunto. Estrelas eram definitivamente um assunto mais seguro que sexo.

— Algumas. Meu ex queria uma casa grande em um terreno vasto, então não tem muitas luzes artificiais por perto.

— Você ainda mora lá?

Ela levantou um ombro. — Fiquei com a casa no divórcio. Ele não queria e, na época, não tive sanidade mental o suficiente para pensar em um plano alternativo.

— E agora?

— Agora? — Ela observou o céu. — Agora é meu lar.

— Um lar com lembranças ruins?

Os lábios dela se apertaram e Lincoln xingou silenciosamente. O que ele estava fazendo? Ele era a última pessoa no mundo que deveria desenterrar o passado de outras.

Lincoln foi salvo de ter que se desculpar quando chegaram ao destino desejado.

Daisy olhou para cima e riu. — Quando você disse “pub de má reputação”, pensei que quis dizer um pub de má reputação, não que fosse o nome do estabelecimento.

— O que posso fazer? Gosto de coisas literais.

Ela bufou. — Isso é mentira.

— Diz a mulher que me conhece há vinte e quatro horas.

— Eu te conheço o bastante para saber que a morena com quem você estava dançando era a mulher mais linda que já vi e, ainda assim, você não parecia minimamente interessado nela.

Lincoln estava prestes a abrir a porta do bar, mas parou ao ouvir as palavras dela, virando-se para encará-la. Os olhos dele se estreitaram um pouco. — E isso significa?

Ela deu um pequeno passo para perto dele, o olhar mais desafiador do que provocante. — Significa que acho que essa sua reputação de mulherengo é pura ilusão, e acho que você prefere que seja assim.

— Você não sabe do que está falando — ele murmurou, virando-se.

Ela tocou o braço dele. — Sei que todo mundo admira a sua capacidade de manter as coisas amigáveis ??com as mulheres com quem dorme, mesmo depois de supostamente descartá-las.

— Supostamente? Acha mesmo que dou falsas esperanças às mulheres só porque quero dormir com elas, sempre que sinto vontade?

— Não seja bobo — ela retrucou, estalando a língua, enquanto ia até a porta. — Não acho que você sequer durma com elas.

Lincoln a encarou enquanto ela entrava no bar, um vulto de cabelos loiros e vestido rosa, sem sequer olhar para trás.

Bem, inferno. No fim das contas, mesmo em vinte e quatro horas, aquela mulher realmente já sabia muito sobre ele.


Capítulo 4

— Vamos fazer o seguinte — Lincoln falou, juntando-se a ela no bar e elevando a voz para que ficasse audível no meio da multidão da noite de sábado do local. — Não falaremos sobre as mulheres com quem dormi e, em troca, não vou perguntar sobre seu ex.

Daisy estendeu a mão. — Temos um acordo, Sr. Mathis.

Os dedos dele se fecharam sobre os dela em um aperto firme e caloroso. Era uma lástima estar certa sobre o fato do número de parceiras sexuais dele ser muito menor do que ele queria que as pessoas pensassem. Era uma pena desperdiçar mãos boas como aquelas.

Ela balançou a cabeça.

Não era para esse caminho que seus pensamentos deveriam estar indo.

— O que vamos pedir? — Lincoln perguntou, deslizando para seu lado e apoiando os cotovelos no balcão enquanto examinava as garrafas de bebida atrás, esperando o barman sobrecarregado de trabalho notá-los.

— Uísque com coca-cola.

Ele virou a cabeça e ergueu as sobrancelhas em surpresa. — Pensei que você fosse o tipo de garota que pediria um mojito.

Ela riu em deleite. — Como sabe disso? Emma? Cassidy?

— Por favor, querida, certamente você não pensou que todas as partes da minha reputação não fossem verdadeiras. Sei ler as mulheres como se fossem um maldito mapa do tesouro — ele disse.

— E qual exatamente seria o tesouro?

Lincoln apenas sorriu enquanto levantava a mão para chamar a atenção do barman. — Dois uísques, um com coca-cola, um sem.

— Não precisa se esforçar para me impressionar. — Daisy provocou quando o barman virou a garrafa de cabeça para baixo e despejou uma quantidade generosa de uísque em dois copos antes de jogar um pouco de refrigerante no dela. — Você sabe que essa bebida não é rosa ou cremosa e que não há açúcar na borda, não sabe?

Em resposta, ele pegou os copos que o barman estendia e entregou-lhe o dela. Lincoln fez um brinde antes de levar o uísque aos lábios, bebendo tudo em um só gole.

A boca de Daisy ficou um pouco seca por razões que não tinham nada a ver com a antecipação do álcool. Pela primeira vez, ela entendeu – entendeu de verdade – o que Emma havia tentado alertá-la.

O outro Lincoln... aquele com as piadinhas prontas, o flerte e a risada fácil, era encantador, mas possível de resistir.

Esse, no entanto – esse de olhar um tanto firme e nós dos dedos meio tensionados... um homem que podia beber um copo de uísque em um só gole sem sequer hesitar. Esse homem era perigoso. Esse homem poderia fazê-la desejá-lo.

Ele ergueu um dedo para o barman. — Outro.

— Ceeeeerto, eu vou saborear o meu — disse Daisy, dando risada.

— Eu imaginei que sim, Wallflower. — Lincoln assentiu em agradecimento ao garçom, mas dessa vez sem pressa de beber a segunda dose. Ao invés disso, pegou as duas bebidas, acenando com a cabeça para que ela o acompanhasse, e abriu caminho pela multidão barulhenta.

Daisy o seguiu, notando em perplexidade a maneira como quase todas as mulheres por quem ele passava simplesmente paravam de conversar e davam a ele um olhar demorado e apreciativo. Também percebeu que ele não retribuiu nenhum.

Emma e os amigos estavam completamente errados sobre Lincoln Mathis. Não se tratava de um libertino contemporâneo disposto a seduzir todas as mulheres que cruzavam seu caminho. Aquele era um homem desesperado por parecer um mulherengo.

Mas por quê?

Uma loira atraente, dona de um corpo espetacular e usando um cropped branco justo, foi mais ousada do que as outras, movendo-se habilmente para a frente de Lincoln antes que ele pudesse chegar a uma mesa que haviam acabado de desocupar no canto de trás.

— Você está vestido demais, desconhecido — disse a mulher, estendendo a mão e passando um dedo sedutoramente sobre a gravata borboleta dele. — Posso te pagar uma bebida, ver se conseguimos pensar em uma maneira de deixá-lo sem roupa?

Daisy revirou os olhos com a cantada descarada da mulher. E mesmo Lincoln estando de costas para ela, de alguma forma, ela soube que ele exibia aquele sorriso lento e de molhar calcinhas que ele distribuía de graça para qualquer pessoa com seios.

— Quem sabe outra hora, amor. Estou acompanhado essa noite.

A loira voltou o olhar para Daisy e praticamente torceu o nariz. Daisy deu um sorriso educado, o desdém da mulher não a incomodando nem um pouco. Mesmo se não estivesse usando o sofisticado vestido de madrinha principal, Daisy sabia que não pertencia a esse lugar. Para começar, ela tinha mais de trinta anos, e a maioria dos clientes ali tinha menos de vinte e cinco. Alguns eram até menores de vinte e um e equipados com identidades falsas, ela supôs.

Mas era mais do que isso. Essas mulheres – não, essas meninas – eram completamente diferentes dela. Ela duvidava que elas tivessem passado os primeiros vinte anos de vida desempenhando o papel de filha perfeita, e os cinco seguintes, o de esposa perfeita. Só para perceber que, apesar de ter sido uma filha razoavelmente atenciosa, havia falhado totalmente no papel de esposa.

Embora, para ser justa, ela não conhecia essas mulheres. Talvez também escondessem segredos sombrios e inseguranças nocivas e estivessem seguindo em frente de uma maneira que Daisy não conseguiu. De uma maneira que ela nem queria.

A atenção da loira se voltou para Lincoln. — Bem, se mudar de ideia... — A garota passou a língua pela ponta da garrafa de cerveja que segurava, o olhar fixo no de Lincoln enquanto se afastava lentamente.

Porém Lincoln não notou o evidente convite sexual, apenas olhou por cima do ombro para Daisy, deu uma piscadela rápida e prosseguiu em direção à mesa ainda vazia.

Como o bar tinha apenas alguns móveis que não combinavam espalhados de forma aleatória, só havia um banco alto e cambaleante à mesa.

Lincoln apontou para o objeto. — Porque sou um cavalheiro e porque esses seus sapatos parecem letais, sente-se.

— Você nunca ouviu dizer que saltos-agulha podem servir como fabulosas armas de defesa pessoal? — Ela respondeu, aceitando a palma estendida de Lincoln e ajeitando-se no banquinho.

— Falando por experiência própria?

A voz de Lincoln carregava um tom de provocação, mas, ainda assim, deixou Daisy tensa, o olhar dela fixando no dele enquanto tentava puxar a mão de volta.

Um segundo antes, ela notara distraidamente a força e o calor da mão dele da mesma forma que uma mulher se dava conta do toque de um homem bonito.

Mas, embora ele não soubesse disso, eles haviam acabado de entrar em tópicos de conversa muito complicados, e de repente ela sentiu falta de ar, sentiu-se desesperada para fugir. Desesperada para não ser tocada.

O olhar de Lincoln se estreitou um pouco, o polegar pressionando suavemente contra as costas da mão dela, como se relutante para soltá-la antes de receber uma resposta. Ela assistiu cautelosamente os próprios fantasmas de Lincoln parecerem dominá-lo e, relutantemente, ele soltou a mão dela e pegou a bebida.

Por um segundo, parecia que ele queria engolir tudo de uma só vez e afugentar os próprios demônios, mas em vez disso, balançou a cabeça levemente e tomou um gole moderado. Ela fez o mesmo, apreciando o modo como a mistura do sabor doce da coca com a queimação do uísque lhe dava espaço para pensar em algo além das memórias ruins – dos momentos em que ela desejava profundamente ter um salto de quinze centímetros para se defender.

Pelo canto do olho, Daisy captou a imagem de uma garota pequena com cabelos pretos e brilhosos dando a Lincoln um olhar daqueles.

Ela se inclinou um pouco para mais perto dele e sorriu. — Prepare-se.

Para crédito dele, ele não bancou o desentendido. Em vez disso, virou-se ao mesmo tempo que a garota se aproximava, e Daisy tomou outro gole da bebida ao vê-lo abrir o sorriso – cada vez mais familiar para ela – que usava para cumprimentar as mulheres. A garota piscou, entorpecida com o efeito daquele gesto, e Daisy sentiu vontade de perguntar se ninguém mais se dava conta de que aqueles sorrisos não valiam de nada. E que eram falsos para caramba. Não havia dúvidas de que o homem era simpático e provavelmente o tipo de cara legal o suficiente para retribuir quando as pessoas sorriam para ele, mas esses sorrisos também eram um escudo, do tipo muito mais eficaz do que qualquer expressão carrancuda.

— Qual é o seu nome, amor? — Ele perguntou, tomando um gole lento da bebida e observando a outra mulher recuperar a compostura.

— Hailey.

Ele estendeu a mão. — Lincoln.

Hailey deu um sorriso levemente predatório, exibindo os dentes brancos e alinhados, apesar de Daisy ter certeza de que Lincoln era quase uma década mais velho que a garota.

— Veio de uma festa? — Hailey perguntou, chegando mais perto e erguendo a mão na direção da gravata-borboleta, peça que as mulheres pareciam não conseguir manter as mãos longes.

— Sim — Lincoln respondeu. — Eu e a Daisy aqui.

O olhar de Hailey se voltou para Daisy, e Daisy balançou o dedo mindinho de forma animada enquanto tomava outro gole da bebida. Sinceramente, qual era o problema dessas garotas? Que tipo de mulher dava em cima de um homem obviamente acompanhado por outra?

Será que ela e Lincoln disparavam sinais imaginários que diziam que o que os dois tinham era platônico ou algo do tipo? Tinha um “estou totalmente na friendzone” tatuado na testa dela? Será que parecia que ela era irmã dele?

Ou, Daisy pensou, ao observar o perfil de Lincoln, talvez fosse porque o cara era lindo o suficiente para fazer com que as mulheres sentissem que precisavam ao menos tentar algo, independente disso violar o código feminino ou não.

Hailey se afastou com um sorriso satisfatoriamente envergonhado e Lincoln voltou-se para Daisy. — Onde estávamos?

— Acho que não estávamos em lugar algum — disse Daisy. — É sempre assim?

Ele levantou um ombro largo. — Foi o que tentei dizer à sua irmã. Eu sou como um estame.

— O pênis da flor?

Ele deu risada, um tom suave e sexy. — Parece que alguém sabe sobre as partes das flores.

— Estou mais para “alguém que ficou com tempo livre de sobra depois que se divorciou e assiste TV demais” — ela admitiu. — De alguma forma, me sinto menos culpada por assistir ao Discovery Channel enquanto como cenouras do que se estivesse assistindo a algum reality show e tomando sorvete.

— Parece lógico para mim — disse ele, girando preguiçosamente o copo de uísque e observando o líquido marrom dourado balançar de um lado para outro.

— Com o tempo acaba perdendo a graça? — Ela deixou escapar.

Os olhos dele se ergueram. — O quê?

— Ser lindo. E irresistível.

O canto da boca dele se inclinou para cima. — Acho que ninguém nunca conseguiu fazer esses dois adjetivos soarem tão desagradáveis.

— Minha imunidade aos seus encantos te incomoda?

— Não — disse ele. — É bastante reconfortante, na verdade.

— Ahá, então com o tempo a incessante atenção feminina de fato perde a graça. — Ela insistiu.

— Dizer isso seria um pouco como admitir que esse é o maior problema do mundo, não acha? Há coisas piores do que ser abordado por uma mulher bonita de vez em quando.

— De vez em quando? — Ela ergueu uma sobrancelha. — Parece que elas nunca param.

Ele riu. — Provavelmente a culpa é minha.

— Você realmente não se empenha muito em evitá-las. — Ela concordou. — Além do mais, faz parte, não é?

Ele afiou um pouco o olhar. — Parte do quê?

— Do seu mecanismo de defesa. Flertar te distrai.

— De?

— Não faço ideia. — Ela mordeu o lábio. — Sabe, se quiser conversar sobre...

Lincoln se endireitou, terminou de tomar o resto da bebida e acenou com o queixo para ela. — Outra?

Daisy olhou para o copo quase vazio e, imitando-o, bebeu de uma só vez o resto da bebida, apreciando a queimação. Então, ele não queria conversar sobre.

Tudo bem. Ela também não queria falar sobre as dores dela. Especialmente na noite do casamento da irmã, onde memórias rançosas ameaçavam ultrapassar os limites de sua própria consciência.

Talvez uma noite de esquecimento fosse exatamente a coisa certa a ser feita.

Daisy estendeu o copo vazio para Lincoln. — Outra. Sem coca-cola dessa vez.


Capítulo 5

A dor de cabeça que ela estava sentindo não era a pior que já teve, mas definitivamente estava presente.

Daisy abriu os olhos devagar, agradecida pela pouca luz do quarto dela...?

Ela estendeu as mãos para os lados, encontrando uma colcha com a qual não estava familiarizada, lençóis um pouco menos macios que os dela.

Uma cama de hotel, seu cérebro sonolento registrou. Ela estava em Nova York por causa do casamento de Emma e Cassidy, não na cama dela em Charlotte.

Seus olhos se abriram por completo e ela rolou para o lado em direção ao despertador da mesa de cabeceira... que não estava lá.

Havia, no entanto, um pequeno monte de pelos brancos perto de seu rosto.

O monte de pelos se moveu.

Daisy rapidamente se sentou, percebendo várias coisas ao mesmo tempo:

(1) Sua cabeça doía mais do que havia pensado anteriormente.

(2) Sua boca estava terrivelmente seca.

(3) Havia um cachorro na cama com ela. Um maltês pequenininho, se a memória sobre raças não lhe falhava.

(4) A colcha do hotel era cinza ao invés de branca, o despertador estava na mesa de cabeceira esquerda e não na direita...

Porque... (5) Ela não estava no quarto de hotel dela.

Uma rápida olhada para baixo revelou que ela vestia a camiseta de um homem; e uma espiada por baixo das cobertas mostrou que usava uma cueca boxer xadrez azul e branca grande demais para ela.

O único alívio, se é que havia um, era que ao menos estava sozinha na cama. Agora, de qualquer maneira. Porque há algumas horas, vai saber, ela não conseguia se lembrar de nada...

Ela fechou os olhos com força, desejando que a ressaca induzida por uísque se dissipasse. Teve o casamento, a recepção pós-festa. O bar com Lincoln...

Ela abriu os olhos novamente, as batidas do coração desacelerando. Lincoln. Ela estava na cama de Lincoln. Eles foram para outro bar depois do primeiro, e para outro após o segundo, e depois disso...

Oh, céus.

Para a casa dele, aparentemente.

O cachorro se mexeu, erguendo a cabeça de modo acusatório em direção à Daisy, como se irritado por ter sido acordado. Ele bocejou, exibindo uma língua minúscula e rosada, e desenrolou-se da bola que havia formado com o corpo enquanto dormia. A pequena criatura rastejou para o colo dela, descansando a cabeça pequenina na coxa de Daisy.

Ela nunca foi uma pessoa apaixonada por cachorros, mas esse era fofo. Daisy passou a mão sobre o pelo branco e macio, deslizando os dedos pela coleira de cor magenta – é claro que o cachorro de Lincoln teria uma coleira cor de rosa – até encontrar o pequeno identificador circular.

— Kiwi. — Ela leu, dando risada.

O animal levantou a cabeça, como se dissesse “Sim?”

O homem tinha uma cadela que cabia na palma da mão dele. Adorável.

No fim das contas, talvez Emma estivesse mesmo certa em alertar Daisy sobre Lincoln.

Um movimento na porta do quarto a fez olhar para cima e dar de cara com Lincoln parado ali, levantando o punho de forma lenta e desnecessária para bater na madeira. Ele usava calça jeans e uma camisa de mangas compridas azul-marinho que caíam tão bem nele quanto o smoking da noite passada. A barba por fazer em seu queixo estava um pouco mais aparente do que ontem, o que indicava que não havia se barbeado, embora a maneira que os cabelos escuros caíssem sobre a testa fosse um sinal de que ele havia tomado banho há pouco tempo.

— Bom dia, Wallflower. Posso entrar? Trouxe presentes.

— Não. — Ela balançou a cabeça. — Decidi que não vou responder quando você me chamar assim. Nunca fui anti-social ou tímida em toda a minha vida.

— Diz a garota que encontrei encolhida no canto ontem à noite.

— Eu não estava... tudo bem, eu estava. Mas meu apelido não é esse. Isso é café? — Ela perguntou, esfregando a têmpora latejante enquanto concentrava o olhar na xícara nas mãos dele.

— Sim. Com leite e açúcar.

Ela estendeu as mãos como se dissesse “passa isso pra cá”. — Como você adivinhou?

Ele sorriu ao se aproximar. — Você me disse. Umas quatro vezes. Foi a sua condição para aceitar vir para minha casa depois que tentamos, sem sucesso, conseguir um táxi para levá-la de volta a Midtown em um sábado à noite, no horário de fechamento dos bares.

A cadela saiu do colo de Daisy, atravessou a cama e apoiou as patinhas na coxa de Lincoln, implorando por atenção.

— Oi, Ki — ele disse, pronunciando o “Ki” como “qui”, a mão grande acariciando o pelo do animal. — Fazendo companhia para nossa hóspede?

A cadela latiu em resposta, um latidinho estridente que poderia ter sido fofo se não fosse a cabeça dolorida de Daisy.

Ela tomou um gole do café. Estava um pouco menos doce do que o que ela normalmente gostava, mas forte e delicioso. Daisy bebeu mais um pouco, incapaz de conseguir olhá-lo..

Então, nós... fizemos sexo?

Como pronunciar algo assim?

Ela não conseguiu fazer a pergunta em voz alta. Se a resposta fosse “sim” e ela não se lembrasse, os dois ficariam mortos de vergonha.

Se fosse “não”, a pergunta seria presunçosa.

Santo Deus, que situação constrangedora.

Lincoln estendeu a mão e ficou assim até ela olhar para cima. Ele segurava algo, mas ela não conseguia ver o quê. Franzindo a testa em confusão, Daisy abriu a palma da mão e soltou uma risadinha quando ele deixou cair dois comprimidos brancos.

— Achei que poderia precisar disso — disse ele com diversão, pegando um copo d'água, que Daisy não notou antes, da mesa de cabeceira e entregando a ela.

Ela engoliu os comprimidos em gratidão. — Será que quero mesmo saber o quanto bebi?

— Quase tanto quanto eu.

— E, no entanto, aqui está você de banho tomado e vestido, enquanto eu pareço não estar sequer funcionando direito e usando sua cueca.

Ele riu, mas não foi um riso indelicado. — Espere um pouquinho. Os comprimidos e a cafeína farão maravilhas. Você está de ressaca e enjoada demais para comer ou acha que um café da manhã ajudaria?

Kiwi abanou furiosamente o rabinho, como se respondesse um entusiasmado “Sim, por favor” para o café da manhã.

Daisy considerou a pergunta. — Não seria má ideia comer algo para absorver o álcool. Mas posso passar no Starbucks quando voltar para o hotel. Suponho que terei que colocar meu vestido de volta — ela disse, estremecendo.

— Infelizmente, sim — ele respondeu, indo até o armário. — Quero dizer, fique à vontade para pegar algo emprestado, mas presumo que você não veste tamanho G masculino.

Lincoln abriu a porta do guarda-roupa e puxou o vestido rosa.

— Eu pendurei! — Ela disse, surpresa.

Ele ergueu uma sobrancelha em provocação.

— Ou você pendurou. — Ela se corrigiu, sentindo um puro constrangimento correr por ela outra vez.

— Se te faz sentir melhor, eu fiquei de costas enquanto você fazia o striptease.

Daisy soltou uma risada horrorizada. — Eu não fiz isso.

— Não posso confirmar, já que eu estava de costas e tudo mais, mas você cantarolou algo que parecia ser uma música da Britney Spears.

Daisy gemeu dentro da xícara de café que estava segurando. — Se essa xícara fosse maior, eu tentaria me afogar nela.

— Se te faz sentir melhor, Wallflower — disse ele, depositando o vestido na beirada da cama. — Eu dormi no sofá.

— Antes ou depois que nós fizemos...

— Depois que não fizemos — ele disse, dando uma piscadela.

Ela suspirou em alívio, embora já estivesse quase certa de que não haviam dormido juntos. Os detalhes da noite passada poderiam estar meio vagos, mas ela tinha certeza de que nenhuma quantidade de álcool no mundo apagaria a experiência de uma noite entre lençóis com Lincoln Mathis.

Não que ela planejasse descobrir.

— Não posso lhe oferecer roupas, mas encontrei uma escova de dentes novinha em folha no armário embaixo da pia. Deixei sobre o balcão.

— Certo — disse ela, percebendo a indireta, e empurrou as cobertas de cima do corpo e levou as pernas para o lado da cama enquanto bebia o resto do café. — Sinto muito. Vou te deixar em paz.

Ele deu a ela um sorriso de desculpas enquanto pegava a cachorrinha minúscula com as mãos. — Normalmente eu seria uma companhia melhor para uma hóspede de ressaca, mas confesso que há um outro lugar em que preciso estar hoje.

— Oh, céus, não precisa explicar. Você me deu um lugar para dormir depois de eu ter feito escolhas muito ruins e me ofereceu café e uma escova de dentes. Fez além do necessário. Apesar de ser altamente revelador o fato de você ter escovas de dentes extras sobrando — ela disse, brincando.

— Uma escova de dentes. No singular. Você fala como se eu as comprasse aos montes.

Ela olhou para o rosto dele, procurando sinais que indicassem que ela estava errada na suposição que fez noite passada sobre ele não dormir com sequer metade das mulheres que as pessoas falavam. Mas o rosto dele era uma máscara ilegível.

Ele estava diferente esta manhã, ela percebeu. As piadinhas não tão rápidas, o sorriso menos deslumbrante.

— Nesse caso — disse ela, pegando o vestido e indo na direção do banheiro. — Prometo dizer a Emma que você não é nada além de um cavalheiro.

Falando em Emma...

Daisy puxou o celular da mesa de cabeceira no caminho até o banheiro. Antes de os detalhes em sua cabeça ficarem confusos, ela havia mandado uma mensagem para a irmã para se certificar de que Emma estava ok com o fato de ela ter ido embora da festa.

Ela não esperava uma resposta, porque, bem, noite de núpcias, mas Daisy encontrou uma mensagem de Emma enviada uma hora atrás. Daisy balançou a cabeça. Ela torcia muito para que sua irmã gêmea tivesse se levantado para fazer xixi ou pegar um copo de água, e não que tivesse realmente acordado às seis horas da manhã após o próprio casamento..

A mensagem de Emma fez Daisy estremecer.

Não me importo nada com o fato de você ter saído mais cedo, mas me diga que os rumores de que você saiu de lá com Lincoln estão errados?

Daisy abriu a embalagem da escova, colocou um pouco da pasta que Lincoln havia deixado lá e escovou os dentes enquanto pensava na melhor maneira de responder Emma.

Ela estava errada quando supôs ontem à noite que Lincoln não era o mulherengo que fingia ser?

Afinal, Emma e seus amigos o conheciam muito mais do que ela. Talvez tenha simplesmente tentado pintar uma imagem de Lincoln da maneira que ela queria que ele fosse.

Ela examinou o banheiro com os olhos, procurando mais pistas sobre o mistério que era Lincoln. Simples, mas confortável. Embora não houvesse acessórios cheios de babados, havia uma toalha de mão azul quase combinando com a toalha de banho pendurada na prateleira, e um tapete que também não combinava com o resto das coisas, mas pelo menos tinha um. O lugar aparentava ser mais do que uma mera casa de solteiro, ela pensou.

Apesar de que algo sobre o quarto e o banheiro não dessem tantas vibes de apartamento de um homem solteiro quanto davam de... alguém solitário. Com base na reputação dele, ela esperava encontrar móveis elegantes e lençóis pretos, talvez uma caixa de preservativos sobre o balcão do banheiro. Ao invés disso, era tudo confortável e arrumado, mas, de alguma forma, desleixado. Como se ele tivesse auto-estima o suficiente para deixar tudo limpo, mas não se importasse tanto com o que as pessoas poderiam pensar de sua casa. Não havia nada que acolhesse a presença de mulheres no local, mas também nada que as fizessem querer ir embora. Parecia... ambivalente.

Daisy enxaguou a boca e cuspiu antes de pegar o celular para responder a irmã.

Os rumores são verdadeiros, mas não se preocupe, a honra dele está intacta. Parabéns novamente pelo lindo casamento, Em. Eu nunca te vi tão feliz, e isso ME deixou muito feliz.

Ela esperou por um instante para ver se a irmã responderia de imediato, mas não aconteceu. Ótimo. Sem dúvida Emma estava abraçada a Cassidy na cama, exatamente como deveria estar.

Com relutância, Daisy tirou a camisa e a cueca boxer macias e confortáveis. Uma rápida olhada pelo local a fez notar uma cesta no canto do banheiro. Ela largou as roupas de Lincoln lá e colocou o vestido. O modelo do corpete da roupa dispensava o uso de sutiã, então felizmente não precisava se preocupar em descobrir onde poderia ter jogado um sutiã durante o striptease.

Seu cabelo estava uma bagunça, e uma espiada rápida e cheia de culpa nas gavetas do banheiro dele a fez encontrar apenas lâminas de barbear e desodorantes. Nenhum sinal de um elástico de cabelo esquecido por algum de seus casinhos de uma noite só. Caramba. Ela sabia que ele não dormia com a quantidade de mulheres que haviam contado a ela, mas estava definitivamente tendo a impressão de que ele não dormia com nenhuma. Não havia absolutamente nenhum sinal de que alguma mulher já estivera nesse lugar.

Daisy penteou os fios da melhor maneira possível e fez uma trança rápida. Não havia nada para segurar a ponta, mas o cabelo dela tinha laquê o suficiente da noite anterior para permanecer no lugar.

Ela abriu a porta do banheiro.

Lincoln não estava mais lá. Ela pensou em tirar os lençóis da cama para que ele pudesse lavar, mas parecia errado deixá-lo com uma pilha pesada de roupa suja, então arrumou a cama e esticou as dobras do edredom cinza. Ela inclinou a cabeça e estudou a cama por um tempo. Era uma queen size.

Mais uma prova de que ele não gostava muito de receber parceiras de sexo. O quarto era pequeno, como ela suspeitava que a maioria dos quartos de Manhattan fossem, mas ele certamente poderia bancar uma cama king size se quisesse. E a colcha, embora perfeitamente útil e masculina, não gritava tanto “sedução” quanto gritava “não dou a mínima”.

Pensando melhor, talvez ela estivesse baseando demais suas suposições na versão dos apartamentos de solteiros que via nos filmes. Só porque Lincoln ficava melhor de terno do que qualquer homem que ela já conhecera e parecia ter um corte de cabelo de cem dólares, não necessariamente significava que o apartamento dele tinha que ter couro escuro e luzes negras por toda parte.

Percebendo que o tempo estava passando e que ela estava abusando cada vez mais da hospitalidade de Lincoln, Daisy olhou ao redor em busca de seus sapatos e, por não achá-los, entrou na sala de estar.

Agora, esse cômodo parecia mais com ele. Havia a indispensável TV de tela grande, um sofá de couro de aparência confortável e uma garrafa de cerveja abandonada na mesa de centro.

Seus olhos examinaram o local até encontrarem Lincoln na cozinha, lavando a xícara em que ela havia tomado café. Ele olhou por cima do ombro quando ela entrou no cômodo e sorriu, embora ela tivesse a sensação de que o sorriso parecia um pouco menos largo do que o de costume, os olhos um pouco menos sedutores.

Sim, ela definitivamente havia abusado da hospitalidade dele.

— Eu arrumei a cama — disse ela, gesticulando sem jeito por cima do ombro. — Mas se tiver lençóis limpos que você queira que eu coloque...

— Nah, cuidarei disso mais tarde. Talvez. Há coisas piores do que o cheiro do perfume de uma mulher em um travesseiro.

Aquelas poderiam ter sido as palavras de um homem bastante acostumado a ter uma variedade de perfumes femininos em seu travesseiro, mas Daisy poderia jurar que ouviu um rastro de tristeza na voz dele naquele momento.

Ela assistiu enquanto ele enchia uma pequena tigela prateada com ração. Kiwi se aproximou para farejar, então deu a ele um olhar desdenhoso que dizia claramente: Faça alguns ovos para mim.

Lincoln balançou a cabeça para a cadela, uma comunicação que o animal pareceu entender, porque Kiwi bufou antes de comer um pouco da ração seca, sem entusiasmo.

Fofo. Muito, muito fofo.

— Eu quero mesmo saber onde posso ter largado meus sapatos? — Perguntou Daisy, cruzando um pé descalço sobre o outro conscientemente.

Lincoln acenou com o queixo em direção a uma mesa perto da porta da frente. Sem dúvida, aquela era a bolsa dela e, no chão, as sandálias de tiras prateadas.

Ela foi colocá-las, tentando manter o clima leve. — Em uma escala de um a dez, o quão “caminhada da vergonha” essa roupa parece? É muito ruim, não é?

Ele não respondeu e Daisy olhou para cima, encontrando-o com as mãos apoiadas no balcão e olhando fixamente para baixo. — Lincoln?

Ele levantou a cabeça. — Perdão. O quê?

Ela enfiou a tira fina através da pequena fivela com a facilidade de anos de prática usando sapatos desconfortáveis, ??e pegou a outra sandália. — Nada. Não preciso ligar para um táxi como faria se estivesse em Charlotte, certo? Estou em Nova York, então só preciso fazer como fazem na TV: sair e estender a mão?

— Eu te dou uma carona.

Daisy afivelou o outro sapato e se levantou. — Você vai dirigir? Nova-iorquinos fazem isso?

Ele deu um leve sorriso. — Não muitos. Mas eu tenho um carro.

Para quê?

Ela não sabia muito sobre os bairros de Nova York, mas ele lhe dissera na noite anterior, antes do uísque começar a fazer efeito, que o apartamento dele no Chelsea ficava a uma curta viagem de metrô do escritório no Upper West Side. Para que ele precisava de um carro?

Não era da conta dela. Essa era a resposta.

Daisy pegou a bolsa rosa e guardou o celular dentro. — Não seja bobo. Você já fez muito; vou pegar um táxi, deixá-lo livre para ir ao seu compromisso.

Ele estremeceu como se o lembrete dos planos de seu dia fosse doloroso. Sim, definitivamente tinha algo de errado com ele hoje.

Então, ele pareceu deixar o que quer que estivesse acontecendo de lado e caminhou na direção dela, pegou as chaves de cima do pequeno aparador de apoio e abriu a porta da frente.

A cadela correu na direção dele, arfando freneticamente, mas Lincoln a afastou gentilmente da porta aberta com o pé.

— Desculpa, Ki. Dessa vez não. — Ele olhou para Daisy. — Eu te levo. Assim compenso a minha culpa por praticamente expulsá-la da minha casa sem que você tenha se alimentado antes. A garagem fica lá embaixo, posso te deixar no Starbucks da Times Square em menos de dez minutos. Fica a uma curta caminhada de distância do seu hotel.

Ela olhou para o perfil dele. — Tudo bem. Obrigada.

Ele olhou para ela, parecendo surpreso. — Eu estava preparado para uma discussão.

— Isso é porque não conhece as garotas do sul — ela retrucou, exagerando no sotaque. — Não nos importamos de ser paparicadas de vez em quando.

— Tenho certeza de que você merece ser, Wallflower — ele respondeu distraidamente.

Wallflower.

Ela era “Wallflower” enquanto todas as outras mulheres com quem ele falava eram “amor”. A palavra saía da boca dele tão casualmente. Quando ele se dirigia à Emma e suas amigas, àquelas garotas no bar ontem à noite. O termo “amor” não significava nada para ele, obviamente. Era só um apelido carinhoso descartável que ele usava do mesmo jeito que outras pessoas usariam docinho, querida ou linda.

Não deveria incomodá-la. Não a incomodava. E, no entanto, por alguma razão, ela se sentiu um pouco indignada por estar de alguma forma à parte das outras mulheres, como se não valesse o esforço do flerte.

Pensando bem, talvez não fosse assim tão ruim. Talvez fosse bom o fato de ela ser diferente. Não diferente no sentido de querer que ele a visse de forma romântica, mas no de querer que ele baixasse a guarda quando estivesse perto dela.

Ela queria que ele soubesse que, com ela, não precisava ser aquele cara.

Oh, céus. Ela estava definitivamente pensando demais sobre isso.

Eles não disseram nada enquanto desciam de elevador para o andar da garagem do prédio dele, mas era um silêncio confortável. Ela teve a sensação de que a quietude dele tinha mais a ver com o que se passava na própria cabeça do que com o constrangimento pelo fato de se conhecerem há menos de quarenta e oito horas e ela já ter passado a noite na casa dele.

Lincoln abriu a porta do passageiro do Audi prateado para ela, e Daisy conseguiu entrar habilmente no carro sem olhar para ele. Não que ele estivesse tentando olhá-la.

Ela observou o interior do carro enquanto ele se sentava atrás do volante. — Esse carro é impecável. Ou você o limpa regularmente ou não o dirige com frequência.

— No último domingo de cada mês — ele disse, colocando a chave na ignição.

Ela olhou para o rosto tenso dele. — Isso é... específico.

Ele se virou e sorriu para ela. — Wallflower. Há alguma chance de restabelecermos a regra da noite passada? Aquela coisa de “sem perguntas/sem intromissão”?

Daisy estremeceu. — Claro. Claro. Sinto muitíssimo.

— Não precisa — disse ele, colocando o carro em marcha à ré e saindo da garagem gradeada. — Não estou acostumado a ter companhia numa manhã de domingo e confesso que não estou no meu melhor.

— Eu entendo — disse ela com sinceridade. — Sou assim também. É como se em 95% do tempo eu ficasse completamente comprometida em ser tudo o que todo mundo quer que eu seja... o que precisam que eu seja. Mas aí tem esses 5% que são só para mim. Meu momento de me alinhar comigo outra vez, de me centrar e ser eu mesma. E quando alguém se intromete nesses preciosos cinco por cento...

Ela fez um gesto de garras com as mãos e fez um pequeno movimento de ataque.

Lincoln olhou para ela quando parou em um semáforo, uma expressão especulativa no rosto.

Ela se contorceu no assento. — Exagerei? Foi mal.

Daisy olhou para as próprias mãos, se perguntando o que diabos estava fazendo. Ela nunca era propensa a falar demais. Pelo menos não hoje em dia. Outrora, ela era a tagarela extrovertida que nunca pensava duas vezes no que ia dizer, porque tudo era tão simples.

Agora, ela raramente revelava seus pensamentos mais íntimos, nem mesmo para Emma e, ainda assim, aqui estava ela desabafando com um cara que mal conhecia.

— Hotel Marriott, certo? Tem um Starbucks aqui perto, se ainda quiser um sanduíche de café da manhã.

— Na verdade, acho que vou dispensar a comida. A dor de cabeça se foi, mas o enjoo está começando. Ir direto para o hotel seria ótimo.

Era mentira. Na verdade, apesar de tudo, ela estava se sentindo muito bem, mas não queria lidar com todas as pessoas no Starbucks agora. Queria ficar sozinha.

Lincoln parou em frente ao hotel e Daisy alcançou a maçaneta da porta. — Obrigada pela carona. E por... bem, pela noite passada, mas de maneira não-pervertida.

Ele riu. — Sempre que quiser. Quando é seu vôo de volta para casa?

— Amanhã de manhã.

Lincoln assentiu e Daisy ficou consternada ao perceber que hesitava – esperando para ver se ele sugeriria vê-la antes que ela fosse embora, depois que o compromisso dele terminasse.

Ele não sugeriu.

Tudo bem, então.

Era bom assim. Melhor, na verdade. Mais tempo com esse cara e Daisy poderia acabar querendo coisas que ela não tinha absolutamente nenhum direito de sequer pensar sobre.

Ela abriu a porta e colocou um pé no asfalto antes de ele pará-la com uma única palavra.

— Wallflower.

Daisy olhou para trás. — Sim?

O rosto dele estava ilegível. Ele se virou e encarou o para-brisas por alguns segundos antes de olhar para ela novamente. — Tem planos para hoje?

— Na verdade, não. Não conheço ninguém nessa cidade e Emma optou por não fazer o brunch pós-casamento, então...

— Venha comigo.

Era tanto uma súplica quanto um comando e, de alguma forma, Daisy sabia que o que quer que ele estivesse pedindo era extremamente importante, mesmo que ela não soubesse o que era.

— Certo — respondeu lentamente. — Dá tempo de eu trocar de roupa bem rápido ou você prefere o vestido rosa?

Ele sorriu. — Pode ir se trocar. Talvez algo azul para combinarmos como ontem à noite e ficarmos adoráveis.

Ela riu, aliviada por ver um vislumbre do Lincoln da noite passada. — Verei o que posso fazer.

Daisy colocou os dois pés para fora do carro, mas ele a parou novamente ao tocar levemente no braço dela.

Dessa vez, quando ela olhou para trás, ele não desviou o olhar, apenas manteve os olhos nos dela, uma expressão calma no rosto. — Obrigado antecipadamente.

— Por nada antecipadamente — ela falou em voz baixa.

Daisy se sentiu um pouco trêmula quando saiu do carro e caminhou em direção à porta da frente do hotel. Ela tentou dizer a si mesma que era por causa da ressaca e da falta de sono, mas estava preocupada que fosse algo mais.

Daisy estava preocupada porque, menos de cinco minutos atrás, queria desesperadamente ficar sozinha.

E, no entanto, aparentemente, havia algo que ela queria mais do que ficar sozinha - ela queria estar com ele.


Capítulo 6

Daisy vestiu uma roupa azul.

Ele não sabia o porquê de ter reparado. Ou a razão de ter se importado. Inferno, ele não se importava. Mas pensar no suéter de gola alta azul de Daisy era muito mais fácil do que pensar em outras coisas.

Como porque diabos ele a convidou para ir junto. Ele não mentiu quando disse que só fazia essa viagem no último domingo de cada mês.

Cada. Mês.

E ele sempre fazia isso sozinho.

Até agora. Até ela aparecer.

Ele murmurou uma série de xingamentos mentalmente enquanto passava a mão pelo rosto e tentava digerir a confusão que o atingira. Ao mesmo tempo em que estava aterrorizado com a ideia de ter companhia nessa viagem em particular, de alguma forma, também estava muito mais tranquilo do que jamais esteve.

Algo sobre a presença de Daisy Sinclair era reconfortante. E pensar isso era desleal – uma traição, especialmente hoje, entre todos os dias.

— Por quanto tempo ficaremos na estrada? — Ela perguntou, desviando a cabeça da janela para poder encará-lo.

— Pouco mais de uma hora — ele respondeu, aliviado por ela não ter feito a pergunta muito mais difícil de ser respondida: para onde iriam. — Pode botar música, se quiser.

— Você quer ouvir música?

Ele olhou para ela e deu um sorriso rápido. — Depende. Quando sóbria, você canta Britney Spears tão bem quanto quando está bêbada?

Daisy riu e ele percebeu que a risada dela era muito parecida com a voz. Atraente e feminina, pelo menos quando ela permitia. Em alguns momentos, Daisy parecia reservada demais e, apesar da determinação dele em dar espaço a ela, queria entendê-la.

O que não fazia sentido. Amanhã ela iria embora de Nova York e de sua vida, e isso o fazia se sentir... aliviado?

Não, essa não era a palavra certa.

Mas algum zumbido distante no fundo de seu cérebro lhe dizia que Daisy Sinclair era um risco para a vida que ele havia construído cuidadosamente. Quase como se ela o fizesse querer mais... mais do que aquilo que ele tinha direito.

— Você não gravou nenhum vídeo meu com seu celular para usar como chantagem depois, certo? — Ela perguntou.

— Se eu tiver feito isso, você nunca saberá até que eu os tenha entregado a Emma no dia do seu casamento.

Daisy parou de rir abruptamente e Lincoln estremeceu. — Merda. Sinto muito. Sei que cerimônias de casamento não são o seu tópico de conversa favorito.

— Não faz mal — ela respondeu, virando a cabeça para a janela novamente. — E, na verdade, não me expressei bem ontem à noite. Não são das cerimônias de casamento que eu não gosto. É do matrimônio.

Lincoln disse a si mesmo para esquecer aquele assunto e dar privacidade a ela. Mas considerando para onde estavam indo, ele estava se sentindo um pouco vulnerável. Precisava de alguma coisa sobre ela em troca. Precisava deixar a vulnerabilidade dos dois equilibrada.

— Por quê? — Ele perguntou.

Ele realmente esperava que ela se calasse ou lhe desse um fora atrevido, mas ela virou o rosto de volta para ele e, nesse momento, a sentiu examiná-lo.

E, então, Lincoln teve a estranha sensação de que ela entendia do que ele precisava – o equilíbrio da vulnerabilidade dos dois – porque ela deu um pequeno suspiro e começou a falar. — Gary e eu namoramos por alguns anos antes de ele me pedir em casamento. Nosso noivado durou um ano inteiro. Durante esse tempo, conversamos sobre todas as coisas que os casais modernos devem discutir antes de casar. Acordo pré-nupcial, carreiras, finanças... filhos. Estávamos de acordo com tudo. Tudo. — Ela repetiu baixinho.

Daisy brincou com o relógio dela antes de prosseguir.

— Alguns meses depois de nos casarmos, comentei com ele que estava pensando em parar com o anticoncepcional. Sei que para alguns casais leva um tempo, mas pensei... por que não, sabe? Eu queria um bebê, ele também...

Lincoln não disse nada, embora tenha apertado o volante com força a fim de evitar o desejo estranho e insuportável de estender o braço e segurar a mão dela durante a parte seguinte da história.

— Ele não queria — Daisy sussurrou. — Ele riu da minha sugestão e disse que era melhor eu nem me atrever a fazer isso. E que se eu tentasse enganá-lo e parasse de tomar o anticoncepcional sem que ele soubesse, ele faria uma vasectomia, e eu fiquei... fiquei confusa, sabe? Tipo, nós tínhamos conversado sobre isso. Talvez eu estivesse mais ansiosa para ter um bebê do que ele, mas ele nunca me disse que não queria filhos.

Ele olhou para o rosto tenso dela. — Deve ter te dado uma sensação de traição.

Ela bufou. — Sim. Deu. Mas eu poderia ter lidado com isso. Digo, ele tinha o direito de mudar de ideia, certo? Talvez ele mudasse de opinião de novo ou talvez eu desistisse. Mas não, a verdadeira traição foi ele me trocar pela secretária dele... que estava grávida.

Os dedos de Lincoln apertaram o volante de novo, mas dessa vez por um motivo diferente. Dessa vez, foi para sufocar o desejo de enfiar o punho na cara de um homem que sequer estava ali. Que não estava nem no mesmo estado que ele.

— Desgraçado — Lincoln murmurou.

Daisy apenas deu de ombros. — Ele era.

Lincoln assentiu e, embora estivesse feliz por ela ter confiado nele, ficou estranhamente decepcionado. Tinha bastante certeza de que aquela não era a história completa. Era apenas uma peça do quebra-cabeça de Daisy, não a única.

O resto do trajeto foi silencioso, mas não de uma forma desagradável.

Lincoln pensou no que ela dissera sobre ter que ser ser outra pessoa cerca de 95% do tempo e precisar dos 5% restantes para si própria – para ser ela mesma. Ele se perguntou se esse exato momento, neste carro, estava sendo contabilizado como parte dos 5% dela. Se, ao estar com ele, ela se sentia livre para ser ela mesma.

Porque ele estava assustadoramente consciente de que estar perto dessa mulher que mal conhecia contabilizava como parte dos momentos de tranquilidade dele. A primeira vez em muito tempo em que não sentia a necessidade de ser “aquele” Lincoln.

Então, a sensação passou, porque eles haviam chegado naquele lugar. Na verdade, Lincoln não tinha muita certeza de quem ele era no último domingo de cada mês. Não o Lincoln charmoso e imprudente que era no trabalho, mas também não seu verdadeiro eu.

Era um Lincoln preso no estranho lugar intermediário em que sua vida antiga e a atual convergiam da maneira mais dolorosa. Era o que poderia ter sido e o que nunca será, tudo ao mesmo tempo e, ainda assim, ele não conseguia se afastar desse lugar.

Jamais se afastaria.

Lincoln ficou grato por Daisy não ter dito uma única palavra, por não ter feito uma pergunta sequer, apesar de provavelmente ter visto os cartazes do local.

Ela ficou pacientemente quieta enquanto ele registrava os nomes de ambos na recepção. Lincoln Mathis e acompanhante. Até isso parecia desleal, mas ele afastou a culpa. Não era como se estivesse trazendo uma namorada. Ele não sabia o que Daisy era para ele.

Um amiga, ele supôs, apesar de ser uma muito recente.

Lincoln se perguntou se foi o fato de eles terem virado amigos tão rapidamente que o motivou a pedir que ela fosse com ele, quando nunca havia pedido isso nem mesmo aos amigos mais próximos. Quase como se a conexão instantânea dele e de Daisy garantisse que ele não tinha tempo de ir com calma e pensar melhor.

Pela primeira vez em muito tempo, estava sendo impulsivo. Era uma sensação tão libertadora quanto desconcertante.

Eles subiram de elevador para o segundo andar, Daisy permanecendo a apenas um passo atrás dele enquanto caminhavam pelo corredor completamente limpo.

Ele parou do lado de fora da última porta à direita – um quarto privado com vista para o jardim. Um enfermeiro olhou para cima e sorriu quando viu Lincoln. — Sr. Mathis, que bom te ver.

Lincoln sorriu de volta. — Chuck, pela milésima vez, eu venho aqui todo mês há dois anos. Me chame de Lincoln, cara.

Ele seguiu em frente enquanto Chuck murmurava uma saudação para Daisy e saía pela porta, deixando Lincoln à vontade, como sempre fazia.

Lentamente, Lincoln se agachou em frente à cadeira no centro do quarto.

Era um modelo novo. Um especialmente projetado para mover membros que não podiam mais se mover, projetado para evitar atrofia em músculos que nunca mais se mexeriam.

— Olá, querida — disse ele em voz baixa, estendendo o braço e pegando a mão de Katie. Ele apertou os dedos dela. Ela não apertou os dele de volta. Ele beijou as costas da mão dela. Pensou que talvez os olhos dela tivessem mirado os seus por notarem a presença dele, mas talvez não. Ele engoliu em seco. Aquilo o matava todas as vezes. Toda maldita vez em que se dava conta de que ela não conseguia distingui-lo de Chuck. De que não poderia diferenciar Chuck da mãe dela. Não poderia distinguir a cadeira nova da velha, ou da cama, ou do chão...

Lincoln xingou baixinho quando a dor o inundou, mesmo enquanto tentava lutar contra ela. Ele inclinou a cabeça para frente antes de se forçar a olhar novamente para Katie. — Eu trouxe um amiga para te conhecer — disse ele. — Acho que você vai gostar dela. Ela também gosta da Britney Spears.

Então, ele reuniu coragem e voltou a atenção para Daisy, que estava de pé próxima a ele. E ficou aliviado ao ver que não havia pânico nos olhos dela, nem pena. Apenas paciência.

— Daisy Sinclair, essa é Katie Lyons. Minha noiva.


Capítulo 7

Daisy disse a si mesma que não estava tentando fugir quando se ofereceu para pegar um café para ela e Lincoln, mas a verdade era que precisava de um tempo para processar tudo.

Lincoln Mathis era o noivo de alguém.

Ela não sabia o que tinha acontecido com Katie – há quanto tempo a outra mulher não tinha mais consciência do mundo ao redor dela –, mas a realidade era de partir o coração. Tanto a de Katie quanto a de Lincoln.

Daisy imaginara que talvez boa parte da tristeza escondida por baixo de todo o charme dele fosse resultado da morte de um ente querido ou por ter sido abandonado por algum ente, mas isso...

Daisy respirou fundo enquanto apertava os botões da máquina automática de café – dois mochas, um para ela e outro para Lincoln – e descansou a testa no aparelho, tentando organizar os próprios pensamentos.

Ela não se arrependia de ter vindo com ele, mas precisava descobrir o que ele queria dela. Companheirismo? Compreensão?

Ou era a simples necessidade de compartilhar a dor com alguém e ele imaginou que uma mulher que pegaria um vôo para outro estado amanhã era uma opção segura?

Daisy se perguntou se Emma e Cassidy sabiam – se alguém sabia. Provavelmente não. Os amigos dele faziam comentários tão bem humorados quando provocavam Lincoln que pareciam acreditar genuinamente que ele era um mulherengo sedutor. Um sempre apto a fugir de relacionamentos. A verdade era infinitamente mais complicada.

Noite passada, ela suspeitou que ele não dormia com todas as mulheres com quem flertava, ou mesmo com boa parte delas.

Mas agora, ela tinha a certeza – a certeza – de que ele nunca dormira com nenhuma delas.

Lincoln não era um mulherengo. Inferno, ele nem sequer queria ter um encontro com alguém.

O compromisso secreto e a lealdade à Katie estavam estampados na cara dele quando ele pegou a mão da noiva. Na mente de Lincoln, ele era um homem comprometido. Mesmo que sua noiva não soubesse.

Esse tipo de lealdade... esse tipo de amor...

Daisy sentiu os olhos lacrimejarem quando pegou os cafés. Ela tomou um gole do dela, mesmo que ainda estivesse muito quente. Queimou a língua, mas mal percebeu.

Lentamente, ela caminhou de volta para o quarto de Katie, observando o local com outros olhos agora que sabia o que era – o que era para Lincoln.

Não parecia um hospital. Era limpo, sim, mas havia algo que dava certo aconchego ao lugar: pinturas agradáveis, um suave tom de verde sálvia nas paredes. Havia pessoas entrando e saindo dos quartos, médicos e enfermeiros de uniforme, mas não dispunha da urgência de um hospital.

Daisy pensou que se a maioria dos pacientes que estivessem ali fossem como Katie, então o foco era no cuidado a longo prazo, não em atendimentos de urgência. Ela não sabia muito sobre esse tipo de coisa, mas imaginou que custasse caro. O quarto de Katie tinha vista para jardins radiantes e, logo atrás deles, havia uma linda floresta. Embora houvesse uma cama hospitalar instrumentalizada com várias máquinas por perto, alguém obviamente se esforçou para deixar o quarto o mais aconchegante possível, colocando conjuntos de cobertores e almofadas sobre a cama. Lincoln? Ela pensou no apartamento dele, no desleixo do local, e se perguntou se esse era o motivo. Se ele dedicava toda a energia dele a esse lugar em vez da própria casa.

Daisy desacelerou ainda mais o passo quando viu uma mulher parada de braços cruzados do lado de fora do quarto de Katie, olhando pelo vidro na direção onde Daisy deixou Lincoln lendo em voz alta o mais recente livro do Dan Brown para Katie.

Era uma mulher de meia-idade, o cabelo na altura do queixo uma mistura de loiro e branco, a maquiagem aplicada com habilidade para disfarçar os sinais da idade dos cantos dos olhos e lábios.

A expressão com que ela observava Lincoln e Katie era ilegível, mas Daisy conseguiu sentir a tristeza irradiando da outra mulher.

Quando Daisy se aproximou, a mulher se virou, parecendo um pouco assustada, e deu-lhe uma rápida olhada, analisando o café que ela segurava. Não vestia uniforme. Os olhos cor de avelã dela se estreitaram um pouco, como se tentasse reconhecer Daisy.

— Oi — disse Daisy, abrindo um pequeno sorriso. — Sou Daisy Sinclair. Amiga de Lincoln.

Os olhos da outra mulher se arregalaram e ela levou uma mão fina à garganta para remexer no colar delicado ao redor do pescoço. A mulher estava bem vestida em um conjunto de suéter e blusa na cor coral e calça preta. Parecia alguém que ocasionalmente almoçava em clubes privados fora da cidade com as amigas, mas que também não se importava em sujar as mãos na horta que cultivava nas tardes de sábado ensolaradas.

Mas nada disso foi o que mais impressionou Daisy – e sim os olhos cor de avelã, grandes e levemente puxados. Os olhos de Katie, embora o olhar de Katie fosse vago, ao passo que o dessa mulher era sagaz, mas não de uma forma desagradável.

Daisy soube quem a mulher era antes mesmo de ela se apresentar.

— Sou Brenda Lyons — disse ela, soltando o colar e estendendo a mão para Daisy. — Mãe de Katie.

Foi quase um malabarismo, mas depois de colocar um café em cima do outro, Daisy apertou a mão de Brenda e se perguntou qual seria o protocolo de como agir em situações assim. Ela não estava ali como uma namorada, obviamente, mas o que Brenda deveria estar pensando?

— Eu...

— Ele é bom para ela — interrompeu Brenda, voltando-se para o vidro, antes que Daisy pudesse dizer algo para explicar a presença dela em um momento que era obviamente familiar.

Daisy se aproximou da outra mulher e olhou para Lincoln, tendo a mesma visão que Brenda. Lincoln e Katie estavam como ela os deixou.

Depois de conversar com Katie sentada na cadeira dela por um tempo, Lincoln pegou seu pequeno corpo e a levou para a cama com uma facilidade e familiaridade que revelava que ele já havia feito aquilo centenas de vezes.

Então, ele se sentou em uma poltrona e puxou um livro de uma gaveta da mesa de cabeceira, o tempo todo dizendo à Katie que era melhor ela não ter lido sem ele, e enfim abrindo o livro na página marcada.

Lincoln gesticulou para Daisy puxar uma poltrona para mais perto, mas ela balbuciou uma besteira qualquer sobre precisar de uma segunda dose de cafeína e deixou o quarto. Lincoln provavelmente tinha percebido a verdade e ela ficou um pouco envergonhada, mas sabia que se ele tivesse visto os olhos dela cheios de lágrimas, teria sido muito pior para os dois.

— Ele obviamente a ama muito — disse Daisy em voz baixa.

— Sim. — Brenda levou a mão novamente ao colar. — Katie também o amava. Loucamente.

Amava. Daisy ficou um pouco surpresa com o uso do pretérito.

— Perdi minha filha há dois anos — disse a mulher no tom calmo e monótono de quem contava uma história com frequência, mesmo que apenas para si mesma. — Houve um acidente de carro. Katie estava... — A voz dela falhou um pouco. — Ela estava voltando da última prova do vestido.

Daisy sentiu um aperto no coração. — Da prova do vestido de noiva?

A mãe dela assentiu uma vez. — Faltavam dois dias para o casamento. Katie estava... estava mandando uma mensagem para Lincoln.

O coração de Daisy apertou mais ainda.

— Nós vemos todas aquelas estatísticas — Brenda prosseguiu, a voz um sussurro agora. — Sobre os perigos de enviar mensagens enquanto dirige, e simplesmente não parece real. Você consegue imaginar alguém que bebeu e dirigiu ou que adormeceu no volante, mas não pensa por um segundo em alguém olhando para o celular quando deveria estar olhando para a estrada... Ela desviou um pouco para a esquerda, mas o pequeno Honda dela não foi páreo para a SUV enorme. Minha única filha. Se foi.

— Eu sinto muitíssimo — disse Daisy. Palavras ineficazes e insuficientes, mas verdadeiras. Daisy sentia muito. Sentia muito que isso tenha acontecido com Katie. Com Brenda. Com Lincoln.

— Eu perdi minha filha naquele dia. — Brenda voltou a falar. — Sei que isso soa insensível e não quero dizer que não amo com todo o meu ser a Katie que está nesse quarto agora. Mas a garotinha que eu criei, a mulher que mal podia esperar para se casar com Lincoln. Ela se foi. Eu não amo menos essa Katie, mas não finjo que ela sabe me distinguir da enfermeira ou diferenciar a enfermeira de Lincoln. Ou a noite do dia, ou até mesmo estar acordada de estar dormindo.

Daisy olhou para o copo de café esquecido. — Certamente ela sabe...

— Não — Brenda falou, dando uma olhada gentil, mas firme para Daisy. — Não sabe. Temos sorte de ela não ter perdido a capacidade de respirar e engolir sozinha. Dá a ela uma certa liberdade das máquinas ao longo do dia, mas além de responder por reflexo a barulhos altos, ela não está ciente do que está ao redor dela. Os médicos são sempre bem claros quanto a isso, mas mais importante, eu sinto em meu próprio coração.

Daisy empilhou os cafés novamente para deixar uma mão livre e descansou os dedos no braço da mãe de Katie em um aperto reconfortante, sabendo que nenhuma palavra seria capaz de oferecer consolo.

Brenda Lyons olhou surpresa para o toque antes de estudar o rosto de Daisy com mais calma. — Ele queria se casar com ela, sabe. Depois do acidente. Mesmo depois do diagnóstico, quando ficou claro que ela não voltaria para nós. Ele disse que o amor era eterno e que não iria desistir só porque ela sofreu um trauma.

— Sra. Lyons — disse Daisy. — Você não precisa pedir para eu me afastar. Prometo que não tenho nenhum interesse amoroso por Lincoln. Somos amigos, e nem do tipo que conhecem um ao outro muito bem.

— Eu não iria pedir para você se afastar — disse Brenda, olhando novamente para Lincoln e Katie. — Eu só... você é a primeira mulher que ele trouxe aqui. A primeira pessoa que ele trouxe aqui, embora os pais dele costumassem vir ocasionalmente no começo.

Como se finalmente sentisse que ele era o assunto da conversa, ou talvez se perguntando para onde Daisy foi em sua saída demorada para pegar café, Lincoln olhou por cima do ombro, pulando pouco de surpresa ao ver Brenda e Daisy conversando.

Daisy observou Lincoln se levantar, dizendo algo para Katie e tocando a mão dela antes de ir em direção à porta aberta.

— Brenda! Estou tão feliz que você veio, não te vejo já faz alguns meses. — Ele a envolveu em um abraço caloroso e Daisy sentiu um nó familiar na garganta enquanto observava Lincoln abraçar a mulher que teria sido a sogra dele.

Lincoln olhou para Daisy e sorriu, depois para os cafés. — Um desses é para mim?

Ela entregou um copo a ele. — É um mocha. Apostei mentalmente que talvez você preferisse seu café tão doce quanto seus coquetéis.

Ele riu. — Diz a mulher que me acompanhou em cada shot de uísque Jack Daniel’s na noite passada. Mas sim, está certa sobre o café.

Daisy lançou um olhar nervoso para Brenda pelo canto do olho, mas conforme a outra mulher os estudava, parecia não haver nenhum julgamento nos olhos dela. Nenhuma acusação.

— Onde Glen está se escondendo? — Lincoln perguntou, olhando ao redor.

— Ele veio ontem. Hoje teve um grande torneio de golfe no clube. Ele disse para te dizer “olá”.

Lincoln assentiu. — Mande lembranças para ele. Vocês estão bem?

— Estamos — disse Brenda, dando um sorriso caloroso para Lincoln. — Estamos felizes.

Daisy não achou que a leve ênfase de Brenda na palavra felizes fosse coisa da imaginação dela. Quase como se a mulher desse permissão a Lincoln. Não, mais que isso. Como se ela suplicasse para ele ser feliz.

Houve um momento de silêncio constrangedor e Daisy, sempre a pacificadora, limpou a garganta. — Vamos ver o que acontece a seguir nessa história?

Lincoln olhou para ela. — Acho que Katie já está cansada. Vou só me despedir e depois podemos voltar para a cidade?

— Não estou com pressa — ela respondeu rapidamente para tranquilizá-lo. Já era ruim o suficiente ter escapado para tomar um café para não chorar na frente dele. A última coisa que queria era que ele pensasse que ela estava ansiosa para ir embora.

A expressão dele estava vaga quando ele olhou para a cama em que Katie estava, imóvel, depois balançou a cabeça como se quisesse afastar os pensamentos devastadores. — Está tudo bem. Só vou demorar um minuto.

Ele voltou para o quarto, em direção à cama de Katie. Daisy pretendia dar a eles privacidade, realmente pretendia, mas a cena roubou seu coração, o jeito que ele agia com a noiva. Ela observou enquanto ele trazia o corpo da outra mulher para um abraço, segurando a cabeça dela cuidadosamente com a palma da mão.

Os lábios dele se moveram, sussurrando algo no ouvido dela antes de gentilmente deitá-la de volta e depositar-lhe um beijo na testa.

Daisy afastou uma lágrima com o dedo. — Ele realmente vem todo mês? — Ela perguntou em voz baixa para a mãe de Katie.

— Sem falta — disse Brenda em um tom um tanto deprimente.

— Você não parece feliz com isso — Daisy comentou.

A outra mulher deu um olhar sincero para ela com os olhos cor de avelã. — Eu acho lindo, mas não é sobre o que eu acho. É sobre Katie. E minha filha jamais iria querer isso para o homem que ela ama.


Capítulo 8

Daisy pensou em tagarelar sobre algo simples e feliz enquanto os dois voltavam para o carro, mas sentiu que ele não iria querer isso. Ao invés disso, ela deixou Lincoln em paz, entendendo que às vezes a mente e o coração precisavam de um pouco de tempo para se estabilizarem e repararem seus muros.

Ele abriu a porta do banco do carona para Daisy e fechou-a antes de dar a volta em direção ao lado do motorista. E também não disse nada quando ligou o carro e dirigiu para longe da mulher que amava.

Passaram-se uns bons vinte minutos até ele romper o silêncio. — Obrigado.

Ela olhou para cima. — Por nada.

Lincoln prendeu o olhar no dela e sorriu, e Daisy ficou aliviada ao ver que era um sorriso verdadeiro. Não de flerte, mas mesmo assim, verdadeiro. Como se ele guardasse Katie em algum lugar seguro de sua mente. Até que quatro domingos a partir de agora passassem e ele fizesse tudo aquilo outra vez. O pensamento era tão lindo quanto triste.

Ele olhou de volta para a estrada, tamborilando os polegares no volante. — Daisy, ouça. O que você viu... Ninguém mais sabe...

Ela sentiu uma pontada no estômago ao ouvir as palavras dele. Ninguém? Pela proximidade que tinha com Cassidy, Emma e o restante, ela pensou que algum dia ele havia precisado compartilhar a dor com alguma dessas pessoas.

Mas se não compartilhou, por que com ela sim?

— Não vou contar a ninguém — ela prometeu com serenidade.

Ele não sorriu nem a olhou. — Eu imaginei que não.

Daisy virou a cabeça na direção da janela e observou a paisagem em movimento. — Por quê?

— Porque você compreende a natureza dos segredos.

Ela continuou encarando a janela, pensando na resposta dele. — Foi por isso que me trouxe?

Lincoln tamborilou os polegares no volante outra vez. — Sinceramente, Wallflower? Não faço a menor ideia do que me fez trazê-la.

Ela riu um pouco com a honestidade dele, mas ficou séria mais uma vez. — Sabe, se algum dia quiser alguém com quem conversar...

— Sim — ele respondeu em um tom um tanto áspero. — Igualmente.

Ela sentiu um formigamento estranho ao pensar em si mesma como a confidente de Lincoln. Parecia... íntimo.

E interessante.

— Bem — disse ele, olhando para ela e abrindo um sorriso que ecoava o flerte casual da noite anterior. — Vai ser difícil para nós dois termos essas conversas íntimas sem os números de telefone um do outro.

Daisy bufou. — Boa jogada. Muito bem, me dê seu celular, eu vou salvar o meu número nele, e o seu no meu.

Ele apontou para trás com a mão. — No compartimento atrás do meu assento.

Ela torceu o nariz enquanto tentava alcançar o celular dele com o braço. — Eu nem vi você guardando. Qual o motivo?

O sorriso de Lincoln se desfez outra vez. — Assim nunca ficarei tentado. A mexer nele enquanto estiver dirigindo.

Daisy entendeu de imediato. O uso do celular ao volante destruiu mais do que apenas a vida de Katie.

— Quer me dar sua senha ou devo apenas te enviar uma mensagem com o meu número? — Ela perguntou.

— Um-cinco-zero-um.

— Seu aniversário? — Ela tentou adivinhar.

— O dela.

Ah.

— Eu não sabia — ele falou em voz baixa enquanto Daisy adicionava o nome e o número dela à lista de contatos dele.

— O que você não sabia?

Houve um momento de silêncio. — Que ela estava no volante enquanto conversávamos por mensagem. Estávamos brincando sobre eu me esconder no armário dela quando ela chegasse em casa, para ver se eu conseguiria dar uma olhada no vestido de noiva antes da hora. Estávamos tão... eu estava tão feliz. Pensei que ela estivesse na loja, conversando comigo de lá. Mas aí ela parou de responder, e presumi que era porque estava dirigindo. Então ela ligou, e eu atendi...

Ele apoiou o cotovelo esquerdo na porta e esfregou a testa. — Não era ela. Era o socorrista. No dia anterior, eu tinha mudado o nome do meu contato no celular dela para “Marido”, brincando que isso a impediria de desistir de se casar comigo, e foi assim que o policial me chamou. De marido dela. Exceto que eu não era. Ainda não.

— Lincoln. — Daisy descansou a mão em cima do joelho dele, o gesto instintivo e platônico, talvez um pouco íntimo demais. Ele cobriu os dedos dela com a mão e os apertou, como se agradecendo pelo contato. Ela se perguntou se alguém já havia o tocado de uma maneira que não fosse provocadora ou indesejada. Se alguma vez ele aceitou ser consolado pelo que aconteceu. — Não foi culpa sua.

Ele deu uma risada desprovida de humor.

— De certo modo, acho que sei disso. A parte racional do meu cérebro se esforça para convencer meu coração. Mas o coração... fala mais alto. Continua fazendo suposições. Se eu não tivesse mandado uma mensagem para ela, ou se eu tivesse...

Ela apertou a mão dele. — Continuar fazendo essas suposições só vai te destruir.

Ele olhou pela janela e depois para frente. — Acho que já destruiu.

Daisy não disse nada, sentindo que talvez o melhor consolo que poderia oferecer era o silêncio.

Eles ficaram calados por um bom tempo até ele falar novamente. — Eu quis casar com ela. Depois.

Daisy assentiu, não querendo revelar que Brenda já havia contado aquilo.

— Os pais dela gentilmente me lembraram que não seria certo. Que você não pode se casar com alguém incapacitado de conceder consentimento. Katie não conseguiria dizer os votos dela. Não saberia que eu estava colocando um anel em seu dedo, muito menos seria capaz de colocar um anel no meu. Foi quando ouvi isso que eu soube... foi nesse momento que caí na real e me dei conta de que a minha Katie se foi para sempre.

Ah, Lincoln.

— Mas não posso abandonar a Katie de agora. Não irei. — Os dedos dele apertaram os dela com mais força, como se ele estivesse se entregando a um último momento de contato antes de colocar a mão de volta no volante. — Me faça um favor, Wallflower — disse ele, após alguns segundos calado.

Qualquer coisa. Era estranho o quão próxima ela se sentia desse homem que mal conhecia.

— Sim?

Ele sorriu e olhou de relance para ela.

— Pode mudar o assunto? Converse comigo. Sobre qualquer outra coisa.

— Pode deixar — disse ela, batendo continência de modo brincalhão e sentindo que ele precisava que o clima ficasse mais leve o mais rápido possível. — Então, que tal isso: acabei de receber uma mensagem de Emma dizendo que ela e Cassidy vão dar um jantar de última hora hoje à noite. Uma confraternização de improviso antes de partirem para a Toscana amanhã. O cardápio será pizza.

— Eu estou convidado?

Ela sorriu. — Hipoteticamente, talvez eu tenha visto uma mensagem de Cassidy, quando estava adicionando o meu número ao seu celular. Então, sim.

Ele mordeu as bochechas enquanto pensava. — Você vai?

— Para a confraternização pós-casamento da minha irmã gêmea? Eu diria que é meio que minha obrigação comparecer.

— Deveríamos levar vinho. Assim compensamos o fato de termos abandonado a festa mais cedo noite passada? — Ele sugeriu.

— Acho que vinho eu consigo tomar. Contanto que ninguém diga as palavras “uísque Jack Daniel’s” para mim ou meu fígado por pelo menos um mês ou dez.

— Qual é o vinho favorito da Em? Nunca consigo me manter a par das preferências das mulheres da Stiletto.

— Qualquer coisa tinto está ótimo, embora ultimamente ela prefira vinho Syrah. Por quê?

— Acho que levar vinho é minha melhor tentativa de fazer sua irmã não me castrar quando ela descobrir que você dormiu na minha cama ontem à noite.

— Não se preocupe — Daisy falou enquanto mandava uma mensagem para a irmã, confirmando que ela e Lincoln iriam. — Eu já disse a ela que realmente saímos juntos, mas que não te violei.

— Você diz isso porque não viu o striptease ao som de Britney.

Daisy olhou para cima, os olhos estreitados. — Você não tinha dito que ficou de costas?

— Ah...

Ela estendeu a mão e deu um soco no braço dele. — Mathis.

— Talvez eu tenha dado uma rápida olhada antes do meu cavalheirismo entrar em cena. Em minha defesa, você puxou aquele vestido pela cabeça muito rápido.

Ela riu e voltou a atenção para mensagem que digitava. — Desde que futuramente eu não encontre um vídeo dessa cena no YouTube.

— Emma vai perguntar o que você fez durante o dia — disse Lincoln, o sorriso se desfazendo só um pouco.

— Provavelmente — respondeu Daisy, enviando a mensagem e colocando o celular de volta na bolsa. — Mal posso esperar para contar a ela sobre todas as compras que fiz.

— Cassidy consegue ler as pessoas como uma águia. Ele saberá que passamos um tempo juntos. E não quero que minta abertamente para sua irmã por minha causa.

— Não vou precisar mentir — disse Daisy.

— Não estou acompanhando seu raciocínio.

— Bem, não vou mentir para Emma, ??porque realmente vou fazer compras quando chegarmos na cidade. E quando todos perguntarem se passamos um tempo juntos, poderemos dizer que sim, porque você vai fazer compras comigo. Oláaaaaaa, álibi platônico. Dessa forma, seu segredo estará a salvo.

— Você acabou de me passar a perna para me levar às compras com você?

— Impressionante, não?

Ele soltou uma risada incrédula. — Não sei te abraço em admiração ou te enforco de irritação.

Daisy enrijeceu em reflexo ao ouvir a observação casual. Ela havia progredido bastante – agora era capaz de tocar outras pessoas em afeição ou consolo sem pensar duas vezes. Mas se permitir ser abraçada, não importava o quão platônico ou bem-intencionado fosse o abraço, parecia... ameaçador.

— Você está bem? — Ele perguntou.

— Totalmente.

O olhar que ele direcionou a ela no carro parecia dizer que ele sabia que ela estava mentindo.

Mas o leve aceno de cabeça dizia que ele entendia e que não a pressionaria por respostas.

E, mesmo quando Daisy disse a si mesma que estava aliviada, não podia negar que sentiu uma pontada de algo que parecia terrivelmente com um sentimento de decepção.


Capítulo 9

Lincoln estava bastante seguro de que Emma não cumpriria a ameaça sobre matá-lo caso ele não ficasse longe de Daisy, mas não apostaria dinheiro nisso.

No segundo em que entrou no apartamento de Cassidy e Emma no Upper West Side, ele procurou a pessoa que o protegeria da Emma Enfurecida: Erin Elizabeth Compton, filha de Riley e Sam Compton, e a coisa mais próxima que ele tinha de uma sobrinha.

— Venha para o tio Lincoln, querida — disse ele, tirando a bebê aos berros dos braços de sua amiga Grace.

Grace Malone se inclinou, disse algumas frases para acalmar a criança e fez um ruído de beijo contra o rosto da bebê. — Só estou permitindo que roube a minha sobrinha de mim porque quero uma bebida para abafar esses gritos. É como se ela não soubesse o quão sortuda é de ter todas essas tias e tios postiços.

— Não somos postiços. Apenas não somos parentes de sangue. E tenho certeza de que sou o favorito — disse Lincoln.

Grace bufou, um som que contrariava a elegância natural da linda morena. — É mesmo? Porque acho que ela está chorando mais alto.

Lincoln deu um olhar brincalhão para a amiga. Assim como Emma, ??Grace se ligava de duas formas ao pequeno círculo de amigos deles. A primeira porque trabalhava na Stiletto. A segunda, porque era casada com Jake Malone, um dos amigos de Lincoln da Oxford.

Honestamente, se o grupo deles ficasse um pouquinho maior, eles precisariam começar a usar crachás.

Grace mandou um beijo no ar para ele ou para a bebê – provavelmente para a bebê – antes de caminhar até o marido, que segurava uma garrafa de vinho tinto em uma mão e uma de vinho branco na outra, balançando as sobrancelhas para ela em uma pergunta.

— Oi, bebêzinha — Lincoln disse, voltando a atenção para Erin. O bumbum revestido por uma fralda estava repousado em seu antebraço e ele envolveu a cabeça pequenininha e escura dela com a palma grande, mas os berros não pararam.

— Quem diria — disse Julie Greene, outra amiga dele que também trabalhava na revista Stiletto, tomando um gole de vinho branco e acariciando a bochecha da bebê irritada. — A única mulher solteira do planeta que não se apaixonou por Lincoln Mathis de imediato.

Não a única mulher solteira, pensou Lincoln, balançando de leve a bebê. Daisy Sinclair não parecia sequer enxergá-lo como um homem. Ela o forçou a fazer compras, pelo amor de Deus. E depois, de alguma forma, convenceu-o a carregar as sacolas dela.

E...

Lincoln odiava fazer compras.

Odiava. Fazer. Compras.

Não era algo anormal, ele supôs. A maioria dos homens odiava. Certamente, como alguém nascido e criado em Manhattan, ele gostava de se vestir bem, mas seu senso de moda era 100% forjado. Sem seu alfaiate e sua estilista loira e bonita do Trunk Club, que quase todos os meses mandava novas camisas e gravatas para ele, juntamente com um bilhete instruindo-o sobre o que vestir com o que, Lincoln provavelmente seria o tipo de cara que usava camisa branca e terno azul comprados normalmente, não feitos sob medida.

E mesmo que Lincoln ficasse com vontade de fazer compras, com certeza não faria isso em uma tarde movimentada de domingo. Perambular de vitrine em vitrine, de loja em loja, bem no meio dos turistas?

Que pesadelo.

Exceto que não tinha sido. Não tanto.

Lincoln disse a si mesmo que só concordou porque devia a ela e porque seria uma justificativa decente para explicar o fato de ele e Daisy terem passado um tempo juntos hoje. Mas a verdade era que ficar o dia todo na companhia Daisy, comprar um almoço tardio para ela, discutir se berinjela era de fato deliciosa (a opinião dele) ou se era a coisa mais nojenta do mundo (a opinião dela)... fora divertido.

Mais importante ainda: conseguiu fazê-lo se distrair. A primeira vez em que ele voltou para casa após visitar Katie e não passou a tarde inteira sozinho, sentindo-se completamente destruído.

Não houve sequer um simples flerte vindo de Daisy. Desde o instante em que ele a conhecera na sexta-feira até o momento em que a deixou no hotel algumas horas antes para que pudessem trocar de roupa e ir para o jantar. Em todo esse tempo, ela foi somente amigável. Agradável de se estar perto. As outras mulheres que ele conhecia – exceto, é claro, suas amigas felizmente comprometidas da Stiletto – teriam sugerido não-tão-casualmente que ele passasse no hotel para buscá-las antes do jantar, para que chegassem juntos.

Daisy somente se colocou na ponta dos pés, deu um beijo na bochecha dele, disse que o veria à noite, e sequer olhou para trás quando se afastou.

Foi reconfortante.

E, de alguma forma, frustrante.

Ele afastou o pensamento traiçoeiro antes que pudesse criar raízes, ao mesmo tempo em que, em vão, procurava por Daisy com o olhar.

— Ela ainda não chegou — Julie avisou, tomando outro gole de vinho.

Ele sabia, é claro. De alguma forma, soube no segundo em que entrou na sala.

Ele se fez de desentendido.

— Quem? — Lincoln perguntou, abrindo um sorriso largo para a amiga.

Julie revirou os olhos. — Daisy. E não finja que não estava procurando por ela agora mesmo.

Lincoln ninou a bebê, agradecido por ter algo além dos olhos curiosos de Julie para olhar. De todas as suas amigas, ele achava pouco provável que a alegre e descontraída Julie fosse ser a pessoa que encheria seu saco por ele e Daisy terem saídos juntos da festa noite passada, mas aparentemente não.

A loira inclinou-se para ele, os olhos castanhos brilhando de malícia. — Cara, Emma vai mataaaaaar você. Posso assistir?

— Onde está a nossa amada noiva? — Ele perguntou, examinando a sala com o olhar mais uma vez.

— Da última vez que a vi, se pegando com Cassidy na cozinha.

Lincoln olhou na direção da cozinha, onde, sem dúvidas, seu chefe beijava a nova esposa contra o balcão.

— Você acha que algum dos dois se lembra de que estamos aqui? — Ele perguntou para Julie.

— Quem se importa? Eles pediram pizza.

— Não sei porque fizeram isso — disse o marido de Julie, parando ao lado da esposa. — Eles poderiam pedir para você preparar uma de suas especialidades: pizza congelada.

— Certo — disse Julie, levantando a mão e olhando para Mitchell com uma mistura de irritação e veneração. — Tem que haver um prazo de validade para comentar sobre aquele pequeno incidente.

Mitchell olhou para Lincoln, ajustando o óculos. — Mathis? O que acha?

— Acho que uma pessoa com mais de doze anos que coloca uma pizza congelada ainda dentro do plástico no forno definitivamente merece uma vida inteira de lembretes sobre o incidente. E, meu Deus, essa bebê nunca para de chorar?

— Não, nunca. — A fala veio de Sam Compton, o pai da bebê aos prantos. — Quer que eu a segure? Para te deixar livre para tomar uma bebida?

— Talvez — disse Lincoln, balançando de leve a bebê de um lado ao outro na tentativa de fazê-la se acalmar. — Você trouxe alguma coisa boa?

Sam tinha uma destilaria própria no Brooklyn – e o que havia começado como um passatempo e uma paixão acabou se transformando em uma das produtoras de uísque mais aclamadas do país.

— Depende — respondeu Sam, inclinando o próprio copo para frente e para trás, observando o líquido âmbar deslizar de um lado para o outro. — O que acha de uísque envelhecido em barril, com um leve toque de bordo?

Em resposta, Lincoln estendeu Erin com rapidez para o pai dela. — Cada vez que a vejo, ela fica ainda mais parecida com Riley. Também age como ela, com todo esse barulho.

Sam estremeceu. — Por favor, não diga isso. Você esquece que conheci Riley durante o ensino médio. Acho que não vou dar conta se minha filha tiver um pedacinho do espírito da mãe.

— Espírito — Julie repetiu. — É o nome que estamos dando agora?

Riley Compton se aproximou e passou um braço em volta do pescoço da amiga. — Como você chamaria?

— Hum... vigor? — Julie respondeu com um sorriso cheio de dentes.

— Soa vagamente sexual — disse Riley. — Gostei.

Riley estendeu a mão para acariciar os tufos de cabelos pretos da filha, os olhos azuis se fixando em Lincoln como um raio laser. — Mathis. Gostaria de explicar seu comportamento ontem à noite?

— Não sem antes pegar uma bebida — Lincoln falou, se afastando bem no momento em que Grace e seu marido Jake apareceram, sem dúvida para ouvir o que havia acontecido ou não entre ele e Daisy noite passada.

Lincoln gostava dos amigos. De verdade. Eram um grupo unido, apesar do fato de que parecia estar sempre aumentando. Tinha Cole, Penelope, Jackson, Cassidy e Jake, seus colegas da Oxford.

Havia também as mulheres da Stiletto – Julie, Grace, Riley e Emma, as quais ??metade estava comprometida com homens da Oxford.

Completando o grupo, havia a namorada de Jackson, Mollie, o marido de Julie, Mitchell, e Sam, marido de Riley – as únicas três pessoas que teoricamente não faziam parte da família Stiletto/Oxford e, no entanto, eram igualmente importantes para a estranha dinâmica do grupo.

Às vezes, ele sentia como se fosse parte de um longo episódio de “Friends” e era feliz para caramba por isso. Lincoln era sortudo por ter amigos assim – amigos que, apesar das brincadeiras e provocações, eram ferozmente leais.

Não fazia sentido que ele ocasionalmente sentisse como se estivesse segurando vela – ou treze velas, tanto faz. Nenhum deles jamais pensava nele como o diferente do grupo, ele sabia disso.

Mas, ainda assim, não o impedia de se sentir dessa forma.

Não impedia o fato de saber que ele seria para sempre o número ímpar. Não só no meio desses amigos, mas para sempre.

Não havia futuro como casal para ele e Katie, nem um futuro em que ele formasse um casal com alguém que não fosse ela.

Ele era tão leal à Katie hoje em dia quanto no dia em que se ajoelhou e colocou um anel em seu dedo, mas isso não o fazia se sentir menos sozinho atualmente.

Emma conseguiu desviar o rosto de Cassidy por tempo suficiente para ver Lincoln se servindo de um pouco do uísque RUNE de Sam, no aparador.

Ele começou a colocar a garrafa de lado e, ao ver o fogo nos olhos de Emma, ??decidiu acrescentar um pouco mais da bebida ao copo.

— Lincoln Mathis — disse ela, deslizando para seu lado, envolvendo os dedos longos logo acima do cotovelo dele e apertando. — Será que pode me dizer em qual parte do “fique longe da minha irmã” eu não fui clara? Você sabe que estou a cinco passos de distância de um conjunto vasto de facas afiadas, não sabe?

— Ahhh...

Lincoln olhou por cima da cabeça de Emma, na direção de Cassidy, que deu de ombros e pegou uma taça de vinho tinto. — Ela te avisou, cara. Aliás, é isso mesmo que estou vendo? Você está bebendo algo que não tem um aro de açúcar ou enfeite de frutas?

— Sam jura que tem gosto de bordo — disse Lincoln, interpretando o papel que havia criado para si mesmo, como sempre fazia. O cara despreocupado e descontraído com um fraco por doces. A parte de ter um fraco por doces, pelo menos, era verdade. — E Ems, nada aconteceu. Palavra de escoteiro.

Os olhos dela, tão parecidos com os de Daisy, se estreitaram. — Você já foi escoteiro?

— Sim. Embora só porque pensei que seria igual à organização de escotismo para garotas e que haveria biscoitos.

— Tem certeza de que o que você realmente queria não era ter acesso às garotas que vendiam os biscoitos? — Cassidy perguntou.

— As duas coisas — Lincoln murmurou para Cassidy.

Emma deu um soco nele. — Sério, Linc, eu te adoro, de verdade, mas havia cerca de cem mulheres naquele casamento para você dar em cima. Por que ela? E não venha com aquele negócio de ser o pênis das flores de novo, porque sei que não foi ela quem foi atrás de você.

— Como você sabe? — Ele perguntou.

— É, como você sabe, irmã querida?

Tanto ele quanto Emma se viraram e viram Daisy atrás deles com um sorriso que dizia “peguei vocês”.

Ela mudara de roupa. Ocorreu a Lincoln que, no espaço de um dia, ele a viu em quatro trajes. Com a camisa e a cueca dele, novamente com o vestido de madrinha, depois com a calça jeans e o suéter azul, e agora em um vestido rosa claro casual e botas marrons na altura dos joelhos.

Ela ficava bonita para caramba em todos os trajes, mas, se ele tivesse que escolher um, seria sua cueca e camisa. Sem sutiã. Lincoln paralisou o copo de uísque a meio caminho da boca. O pensamento que ele acabou de ter era inoportuno e 100% proibido.

— Daisy. Que bom que você chegou. — Cassidy se aproximou e beijou a bochecha dela. — Aceita algo para beber?

— Claro — disse ela, sorrindo para o novo cunhado. — Vinho branco?

Lincoln ergueu uma sobrancelha junto com o copo. — Nada de uísque? Jack Daniel's, talvez?

Ele cantarolou a música “Oops!... I did it again” da Britney Spears e Daisy deu a ele um olhar de quem fingia achar graça. Emma estreitou os olhos, claramente notando que aquilo era uma piada interna e não gostando nada disso.

— Calma, mamãe urso — disse Daisy, passando a mão no braço da irmã.

Emma suspirou. — Nunca vou descobrir o que aconteceu ontem à noite, não é?

— Claro que vai — Daisy falou para amenizar. — Seu amigo e sua irmã gêmea saíram para tomar um drinque em comemoração aos discursos perfeitos de padrinho e madrinha principais.

O olhar endurecido de Emma se transformou em um sorriso cheio de emoção e Lincoln quase revirou os olhos, sabendo que Daisy havia hábil e intencionalmente transformado a raiva da irmã em sentimentalismo.

— Nem comece. — Emma, geralmente imperturbável, estava fungando. — Vou começar a chorar de novo, e eu odeio chorar.

— Ok, mas qual discurso foi melhor? — Lincoln perguntou, virando-se para poder se encostar no balcão da ilha da cozinha de Cassidy e Emma.

— O dele — Daisy respondeu por Emma, ??mas apontou um dedo em acusação para Lincoln enquanto falava. — Porque ele trapaceou.

— Isso é possível? — Cassidy perguntou, juntando-se a eles e entregando à Daisy uma taça de vinho branco. — Trapacear em um discurso de padrinho principal?

— Sim — disse Daisy com um aceno de cabeça. — Ele deveria fazer vocês rirem. Eu quem deveria ter sido maravilhosamente emocionante e fofa.

— E você foi — Emma foi rápida em acrescentar.

— Sim, mas ele também — disse Daisy, dando um olhar zombador para Lincoln.

— Ora, ora, Wallflower. Você também foi um pouco engraçada.

— Não fui. — Ela resmungou. — Estava ocupada demais tentando fazê-los chorar.

— Verdade, você não foi tão engraçada assim. — Ele admitiu. — Mas não se estresse, nem todo mundo tem o meu talento natural.

Emma voltou a olhá-los com desconfiança. — Ok, se não vou conseguir nenhum detalhe sobre a noite passada, onde vocês passaram o dia de hoje?

— Emma — Cassidy disse em tom suave. — Eles são adultos.

— Sim, mas Daisy é...

— Daisy é o quê? — Daisy perguntou ligeiramente, virando-se para encarar a irmã com uma mistura de irritação e curiosidade no rosto. Era a teimosia idêntica nos rostos delas que sinalizava que as duas eram gêmeas, bem mais do que as feições, pensou Lincoln.

Emma foi a primeira a ceder. — Desculpa. Eu vou parar.

A expressão de Daisy imediatamente se transformou em um sorriso feliz quando ela cruzou o braço com o da irmã, descansando a cabeça no ombro de Emma, os cabelos loiros se misturando aos fios marrons da outra. — Se te faz sentir melhor, fomos às compras hoje.

Cassidy expirou contra a taça de vinho. — Mathis? É sério?

— Daisy me ajudou a escolher um lenço de bolso estampado para combinar com minha gravata nova — disse Lincoln, deixando a mentira rolar de sua boca.

Pelo canto do olho, viu Daisy observando-o. Ela sabia que era mentira. Eles fizeram compras, sim, mas não para ele. Era um pouco estranho ter alguém que realmente poderia desmenti-lo se ela sentisse vontade.

Não que ele mentisse para os amigos com muita frequência, mas havia desenvolvido um hábito bastante saudável de dizer o que quer que precisasse ser dito para evitar que as pessoas olhassem mais de perto ou investigassem mais a fundo. Lincoln gostava de dizer a si mesmo que não estava mentindo, somente não respondendo as coisas com seriedade.

E claro, às vezes se sentia um tanto vazio, mas antes vazio que machucado.

Ainda assim, era estranho que fosse a pessoa que o conhecia há menos tempo que poderia expô-lo.

Ela não fez isso, no entanto. Nem sobre as compras. E nem sobre para onde foram antes das compras.

Lincoln encontrou os olhos dela e assentiu uma vez, discretamente. Ela sorriu de volta.

Cassidy tirou o celular, que estava vibrando, do bolso. — Ah. É o pessoal da recepção. A pizza deve ter chegado.

— A pizza chegou! — A fala veio de Riley, que sempre teve uma audição excelente quando se tratava de comida. O tom alto e estridente de sua voz era a prova de onde a filha pequena havia conseguido o dela.

Poucos minutos depois, o grupo se aglomerou na cozinha, passando pratos descartáveis de uma mão a outra para que Cassidy e Emma não tivessem louça para lavar antes do voo pela manhã que pegariam no dia seguinte. Mais vinho foi consumido, o grupo começou a falar cada vez mais alto enquanto conversavam, mesmo depois da bebê ter se acalmado, sendo embalada para dormir com uma mamadeira nos braços do pai.

A ilha da cozinha não era grande o suficiente para caber todos, então a maioria ficou de pé ou se sentou onde achavam espaço livre, servindo-se de fatias, discutindo sobre as vantagens de colocar pimentão verde na pizza.

Quando as caixas foram esvaziadas e os potes de sorvete foram retirados do freezer para servir a sobremesa, Lincoln se viu ao lado de Daisy. Foi quando percebeu...

Que ficou ao lado de Daisy durante toda a noite. Ele não achou que houvesse sido intencional de nenhuma das partes, apenas... natural.

Deixando o copo de lado, ele se levantou e se sentou sobre o balcão da cozinha de granito, batendo no espaço ao lado dele. — Venha, Wallflower. Vamos olhar para o nosso povo daqui de cima.

— De jeito nenhum vou conseguir subir aí sem pagar calcinha — ela respondeu, tomando um pequeno gole de vinho.

Em resposta, ele pulou de volta para baixo e envolveu as duas mãos na cintura dela, erguendo-a com facilidade. Ela deu um gritinho quando ele colocou as mãos em ambos os lados dos joelhos dela e os juntou. As mãos de Lincoln coçaram com o desejo de permanecer ali, mas ele as fechou em punho e se esforçou fortemente para pensar em uma distração.

— Sente-se como uma dama agora, Wallflower. — Merda. Isso soou tão rouco quanto ele sentiu que tivesse soado?

Ela riu, deixando Lincoln livre para subir no balcão mais uma vez e se sentar ao lado dela. — Você sempre consegue o que quer? — Ela perguntou.

Ele estava prestes a tomar outro gole da bebida, mas paralisou e colocou o copo de volta no mármore, pensando em Katie. — Não. Nem sempre.

O sorriso brincalhão dela se desfez e ele se arrependeu de ter levado os dois para aquele assunto.

— Sinto muito — disse ela baixinho. — Não pensei direito.

— Não — ele respondeu, a voz um tanto afiada. — Não peça desculpas. Nunca pense que precisa ter cuidado com o que vai dizer quando estiver comigo.

— Mas...

— Por que acha que não contei a nenhum deles? — Ele perguntou, apontando o queixo na direção dos amigos espalhados pelo apartamento, sem prestar atenção neles. — Não suportaria ver as pessoas com quem me importo pisando em ovos quando falassem comigo.

Daisy ficou em silêncio por um longo momento. — Eu entendo — ela falou por fim. — Ter pessoas te tratando de maneira diferente por causa de situações do seu passado pode ser... difícil.

Ele mordeu a língua para não perguntar sobre as coisas dolorosas do passado dela.

Ela olhou para ele com um sorriso provocador. — Prometo não ter o mínimo de cuidado com as coisas que direi quando estiver com você daqui em diante. Juro.

— Promessa fácil de ser feita — ele brincou, cutucando o cotovelo no dela. — Considerando que volta para casa amanhã.

— É verdade — disse Daisy em um tom alegre. Mas o sorriso dela desmanchou um pouquinho, como se o pensamento a deixasse triste.

Por mais estranho que parecesse, Lincoln entendeu. Porque o pensamento de Daisy voltando para a cidade dela o deixava um pouco triste também.

Esta noite, pela primeira vez em muito tempo, ele não havia sido o diferente do grupo. Esta noite ele fez parte de um par. Parte de algo.

E a sensação foi tão boa que chegava a ser quase preocupante.


Capítulo 10

— Verdadeiro ou falso: esses enroladinhos de salsicha têm baixo teor calórico já que são tão pequenos — Whitney Silva disse ao espetar mais um dos salgados gordurosos com um palito de dente.

— Ah, absolutamente verdadeiro — Daisy afirmou, batendo o liquidificador contra a palma da mão para ver se a margarita precisava de mais líquido. Considerando-a perfeita, despejou a bebida nas duas taças com as bordas crustadas de sal. — Salsichas em miniatura, enroladas em massa folhada e pinceladas com manteiga definitivamente têm baixo teor calórico. Não engordam também.

Sua melhor amiga de anos recostou-se no banquinho da cozinha de Daisy, dando um suspiro feliz e mastigando o aperitivo enquanto balançava os dedos na direção da margarita. — Me dá.

Daisy entregou uma das bebidas para ela. As duas levantaram as taças, brindando sem encostar os vidros de verdade. Um acordo fora feito há muito tempo em uma noite de margaritas: tilintar as taças poderia fazer o sal sair do lugar, ficando então proibido.

— Hmmm — Whitney disse contra a taça. — Isso também tem baixo teor calórico, certo?

— Sempre — disse Daisy, pegando um enroladinho de salsicha com um palito de dente.

Toda terça-feira, Whitney aparecia para o que inicialmente era chamado de “Terça-feira do Taco”, mas acabou se transformando em uma desculpa para tomar margaritas comendo tudo ou qualquer coisa. Para ser sincera, Daisy preferiria preparar algo um pouco mais leve, mas, apesar das constantes ambições de fazer dieta de Whitney, sua amiga tinha uma fraqueza por qualquer comida frita e processada.

Daisy não se importava. Pelo menos ela tinha alguém para quem cozinhar. Por mais estranho que parecesse, essa era uma das coisas que mais sentia falta de quando era casada. Ela havia se curado há muito tempo da crença no romantismo do casamento – a ideia de amor verdadeiro e de duas pessoas fazendo uma a outra feliz para todo o sempre.

Mas ela sentia falta do companheirismo. Sentia falta do jeito que, no começo, ela e Gary dividiam uma garrafa de vinho para beber com qualquer nova receita que ela tentasse fazer. Não que ele tivesse elogiado o esforço dela uma vez sequer, mas naquela época, gostar do processo de preparar as receitas era o suficiente para ela.

Daisy ainda cozinhava, mas fazer isso para uma pessoa só não era a mesma coisa. Ainda bem que ela tinha Whitney. Claro que enroladinhos de salsicha mal contavam como cozinhar de fato, e o prato favorito de sua melhor amiga era um patê de espinafre que levava somente quatro ingredientes. Mas fazer comida para a amiga permitia que Daisy fingisse por um tempo que estava cuidando de alguém.

Que alguém queria ser cuidado por ela.

— Ok, então — Whitney disse depois de outro longo gole de margarita. — Quero ouvir tudo sobre o casamento. Literalmente tudo. O quão chateada Em ficou por eu não ter conseguido comparecer?

— Nem um pouco — Daisy respondeu, sendo sincera. Emma e Whitney nunca haviam sido muito próximas, mas sempre gostaram uma da outra. Daisy sempre apreciou o fato de elas nunca terem se odiado. Whitney entendia a irmandade de gêmeas das duas, e Emma nunca pareceu se sentir ameaçada pela presença cada vez mais constante de Whitney na vida de Daisy.

Na verdade, Daisy tinha certeza de que Emma ficou aliviada quando Daisy arrumou alguém com quem compartilhar a tendência que tinha de tagarelar bastante. Emma ficava feliz em passar uma tarde de sexta-feira sozinha com um livro enquanto Daisy e Whitney preferiam ir ao shopping.

Emma e Whitney eram próximas o suficiente para que Whitney fosse convidada para o casamento, mas ela não conseguiu folga do trabalho no dia. Como corretora de imóveis, os fins de semana eram o ganha-pão de Whitney para garantir as amostras principais.

Assim como Daisy, Whitney era divorciada. Ao contrário de Daisy, o divórcio de Whitney não tinha vindo com uma casa grande e antiga e cheques enormes de pensão alimentícia.

Entretanto, não havia ressentimento da parte dela. Na verdade, foi Whitney quem insistiu que Daisy pegasse cada centavo que seu advogado havia conseguido. Dinheiro de vingança, como Whitney havia chamado – fazer Gary se sentir culpado.

Daisy sabia que não era bem assim. Sabia que era um dinheiro que pedia silêncio. Gary não havia brigado com Daisy por um único centavo e só os dois sabiam o porquê.

Era o único segredo que ela escondia de Whitney. De Emma. De todos.

Whitney estendeu a taça, pedindo mais margarita, e Daisy obedeceu com satisfação, enchendo os dois copos com o que havia restado na jarra.

— O casamento — Whitney repetiu. — Conte. Diga-me que transou com um dos padrinhos.

— A maioria deles é casado ou comprometido — disse Daisy.

Whitney ergueu as sobrancelhas escuras perfeitamente arqueadas. — A maioria, mas não todos?

Ela apertou os lábios e Whitney deu um pulinho na cadeira. — Você transou!

Daisy riu. — Não transei.

Whitney fez beicinho. ? Não? Mas você não ficou com ninguém desde Gary. Não sente falta de fazer sexo?

A amiga dela deu uma pequena rebolada que fez coisas impressionantes aos seus grandes seios. Whitney tinha o corpo arredondado e voluptuoso de uma mulher que adorava frituras e tinha a sorte da metade superior de seu corpo ficar com a maior parte do peso extra. Somando isso ao cabelo castanho com um corte perfeito e o delineador preto sempre presente que fazia seus olhos azuis incomumente claros parecerem sedutores e misteriosos, o dedo mindinho de Whitney parecia carregar mais sensualidade do que Daisy em todo seu ser.

— Conheço esse brilho nos seus olhos — Daisy retrucou, voltando o assunto para Whitney. — Você transou enquanto eu estive fora.

Sua amiga desviou o olhar apenas por um instante, tomando um gole da bebida.

Daisy gemeu, conhecendo aquele olhar. — Ah, Whitney. Não me diga que fez isso.

— O quê? Jay pode ser um idiota de primeira linha, mas ainda é o melhor homem que eu já tive.

Whitney conheceu Jay Cunningham em um bar em um sábado à noite quando tinha 24 anos, e se casou com ele três dias depois no tribunal do condado da cidade após muitos copos de mimosas.

O casamento durou quatro anos e seis meses, exatamente quatro anos e cinco meses a mais do que Daisy imaginou que duraria. O divórcio e o relacionamento dos dois desde então eram exatamente iguais a quando estavam casados: tumultuoso.

— Ele é seu ex-marido. Você o odeia — Daisy argumentou.

— Inferno, sim, odeio. E é isso que torna o sexo tão bom.

Daisy espetou outro enroladinho, percebendo que havia algo perigosamente viciante neles.

Whitney deu um suspiro de felicidade. — Simplesmente não há nada melhor que uma foda com raiva.

Daisy engasgou com o mini enroladinho. — Uma o quê?

— Foda com raiva. Sabe, aquele sexo violento, furioso e indecente com alguém que você não suporta. Me diga que já teve um assim?

Daisy balançou a cabeça. — Não. Não fico com raiva tão facilmente assim e, quando fico, com certeza não sinto vontade de ter relações sexuais.

Whitney deu um sorriso complacente. — Relações sexuais. Você é tão fofa. Então, me conte sobre o cara com quem você teve uma relação sexual em Nova York?

Daisy revirou os olhos, agradecida pelo zunido de seu celular ao lado da cafeteira a ter feito escapar do interrogatório da amiga.

Ela não conseguiu evitar o sorriso quando viu a mensagem. Quando viu de quem era.

Wallflower. Segui seu conselho sobre como manter as mulheres afastadas. Você tem razão, ninguém gosta de um cara com urticária, não importa o quanto eu tenha jurado que não estava coçando.

Ela estava de volta à Carolina do Norte há pouco mais de uma semana e ficou agradavelmente surpresa quando recebeu uma mensagem de Lincoln assim que desembarcou em Charlotte. Uma mensagem inofensiva e brincalhona sobre Britney Spears estar saindo em turnê.

Ela respondeu que ela e Britney só se davam bem em eventos privados, nos quais o uso de roupa era opcional.

Ele respondeu que o apartamento dele estaria sempre disponível – ele não estava falando sério, obviamente – e isso tornou tudo ainda mais seguro. Não havia se passado um dia sem que ela tivesse notícias dele e, de alguma forma, as mensagens desse cara que ela mal conhecia se tornaram o ponto alto de todos os seus dias.

Ela mandou uma mensagem de volta. Diga a elas que não há nada com o que se preocupar, que a pomada que você usa provavelmente não vai causar irritação nelas, a menos que elas façam parte dos 2% da população que é alérgica ao medicamento.

As resposta dele foi imediata.

Tentei isso na primeira vez. Infelizmente para mim, ela era dermatologista. Achou a situação excitante.

Então é difícil? Ser tão bonito ao ponto de literalmente não conseguir manter as mulheres afastadas?

É tão difícil, Wallflower. Ontem à noite eu chorei por causa disso.

— Meu. Deus. — A voz de Whitney estava em um tom impressionado.

Daisy virou-se de volta para a amiga, dando um sorriso tímido. — Desculpa.

Whitney parecia fascinada ao estender a mão para o celular. — Me dá isso.

— O quê?

— O celular. Passa para cá.

Daisy riu. — Não!

— Então é um cara.

— É. — Daisy admitiu. — Mas não é o que você está pensando. Somos só amigos.

— Mentira — Whitney disse no meio de uma tosse falsa. — É a sua transa do casamento?

— Minha não-transa do casamento. O padrinho principal, mas não rolou nada. Ele está... indisponível.

— Que merda. — Whitney fez beicinho. — Ele tem namorada?

Algo assim.

— Espera — disse Whitney, estreitando os olhos na direção de Daisy. — Se ele tem namorada, por que você e ele estão fazendo sexting?

— Nós não estamos fazendo sexting.

— Certo, trocando mensagens regularmente então.

— É inofensivo.

— Ahammm — Whitney falou, cruzando os braços. — Me diga uma coisa. Se a namorada dele desbloqueasse o celular dele, ela olharia para essas mensagens e as acharia inofensivas? Conheço esse sorriso no seu rosto, docinho. É o sorriso de alguém que tem uma quedinha por outra pessoa.

Daisy refletiu enquanto sentava no banquinho ao lado da amiga, passando o polegar distraidamente pela borda da capa de celular da Tory Burch. — Não é uma quedinha — respondeu ela com sinceridade. — Mas me sinto confortável com ele, e ele comigo. E, no momento, preciso disso muito mais do que sexo.

A expressão de Whitney se suavizou e Daisy se perguntou se a amiga suspeitava mais sobre o relacionamento de Daisy e Gary do que aparentava.

— Sabe o que isso me faz pensar? — Whitney disse, pegando um palito de dente e mastigando pensativamente o salgado gorduroso. — Que ele é feio. Talvez um pouco idiota, mas terrivelmente espirituoso, correto? Melhor por mensagem do que pessoalmente, correto?

— Bemmmm...

Whitney suspirou e apontou para o celular de Daisy, estalando os dedos rapidamente. — Fotos. Eu preciso ver esse cara.

— Não sei se tenho fotos dele.

— Procure-o no Facebook. Ouuu, melhor ainda, você deve ter recebido fotos adiantadas do casamento, não? Mesmo que as oficiais ainda não estejam prontas.

— De fato, sim. — Daisy admitiu. — O site do casamento de Emma e Cassidy tem um local para os convidados enviarem as fotos que tiraram. Aposto que tem alguma dele lá...

Um minuto depois, Daisy encontrou uma foto que alguém tirou de Lincoln dando o discurso perfeito de padrinho principal e entregou o celular para Whitney.

A amiga olhou para a tela e depois para Daisy. — Sinto muito, acho que você não entendeu minha pergunta. Pedi que me mostrasse o cara para quem estava mandando mensagens, não uma foto do cara mais gostoso do mundo.

Daisy riu. — Infelizmente, ele é lindo assim mesmo. Mais do que na foto, na verdade.

Whitney começou a percorrer as fotos, procurando por mais. Ela paralisou quando encontrou outra. — Querida, você acertou em cheio. Esses ombros. Esse cabelo. Esses olhos. O maxilar. O sorriso. E ele é alto, e os altos sempre têm os maiores tamanhos dentro da cueca, se é que me entende.

Daisy revirou os olhos e pegou o celular de volta. — Sim, Whitney. Eu sei sobre o que você está falando.

— Então, estou certa? — Disse a amiga dela, inclinando-se para a frente. — De quão grande estamos falando? Mais de vinte e dois centímetros, certo?

— Você é impossível — Daisy murmurou, ficando de pé e indo até a geladeira. — Ainda vai querer sanduíches de frango para o jantar ou está cheia?

— Você tem aquele molho pesto caseiro aí?

Daisy ergueu uma Tupperware cheia do pesto verde brilhante que ela havia feito naquela tarde.

— Mãos à obra — disse Whitney. — Vou fazer outra rodada de margaritas enquanto você cozinha e me conta tudo sobre as fantasias indecentes que vem tendo sobre o Sr. Olhe-Mas-Não-Toque.

— Eu não tive fantasias indecentes sobre Lincoln.

Não tantas assim, de qualquer forma.

— Lincoln. Ah, céus, um ótimo nome para combinar com toda aquela gostosura. Sonhos eróticos, então. Não minta para mim, Sinclair, uma mulher não passa tempo com ele sem que sua parte mais primordial fique imaginando sobre como seria.

Daisy não disse nada enquanto tirava o frango da gaveta de carnes.

— Eu sabia. — A amiga se vangloriou, colocando um pouco de tequila no liquidificador. — A Daisy acordada pode até bloquear o tesão, mas a Daisy adormecida não, ela deseja um pouco.

— Às vezes, não sei porque somos amigas — respondeu Daisy, colocando os ingredientes do sanduíche no balcão.

— Porque estou certa. Você teve um sonho erótico com ele.

Daisy não disse nada enquanto tirava a sanduicheira do armário.

Mas sim. A amiga dela tinha um pouquinho de razão.


Capítulo 11

— Uma novata super gostosa começou hoje.

Lincoln ergueu os olhos do computador e, de certa forma, não se surpreendeu ao ver que não era um dos seus colegas de trabalho que trazia a notícia, mas uma das colunistas da Oxford.

Penelope Pope era co-editora da seção de esportes da revista, uma função que dividia com Cole Sharpe – seu namorado e um dos melhores amigos de Lincoln.

A minúscula simpática morena era uma das pessoas favoritas de Lincoln, mais ainda nesse momento, em que ela colocou um prato contendo uma rosquinha de chocolate coberta por granulado colorido diante dele.

— Eu te amo — Lincoln disse, dando uma grande mordida. — Largue o Cole e se case comigo.

— Nem pense nisso, Pequena — Cole disse da porta, entrando no escritório de Lincoln enquanto comia a própria rosquinha coberta por um glacê tradicional, Lincoln notou com o olhar de quem tinha experiência com qualquer tipo de doce.

— Desista logo, Sharpe — Lincoln brincou, lambendo a cobertura de chocolate do polegar. — Eu sou irresistível. Não sou, Pen?

A resposta dela foi puxar a cabeça de Cole para um beijo e morder um pedaço da rosquinha dele. Ela se sentou na cadeira de Lincoln e piscou para ele com aqueles enormes olhos castanhos enquanto mastigava. — O quê?

— Esquece. — Cole e Penelope eram tão apaixonados um pelo outro quanto era possível. Desde o dia em que Cole a viu pela primeira vez em um jogo dos Yankees, mais de um ano atrás.

— Então, o que estamos fazendo aqui? — Cole perguntou, sentando em uma cadeira ao lado de Penelope.

— Contando ao Lincoln sobre a novata.

— Que novata?

— A gostosa — respondeu Penelope.

Cole estreitou os olhos e apertou os lábios, balançando a cabeça como se não estivesse conseguindo identificar a pessoa a quem sua namorada se referia.

Cara esperto.

Ela riu. — Nem tente, Sharpe. Você estava bem do meu lado quando Cassidy a apresentou para nós. Taylor Carr é deslumbrante.

Lincoln olhou para Cole, erguendo uma sobrancelha em questionamento, porque sabia que era isso que esperavam dele. Cole levantou um ombro em confirmação.

— Não sabia que estávamos contratando gente nova — disse Lincoln, sem compromisso, terminando de comer a rosquinha e pegando seu café.

— Ela é uma nova consultora de publicidade.

— Ah — disse Lincoln. — E isso me interessa porque...

Penelope começou a levantar um dedo para cada característica a medida em que listava: — Cabelos castanhos compridos e ondulados. Um cabelo realmente muito bonito. Olhos cinzas. Cinzas, Lincoln. Alta. Mais ou menos um metro e setenta e sete de altura, embora isso possa ser por conta do salto de doze centímetros que ela estava usando. Imagine só... uau. Estamos falando de um busto tamanho 86, 60 de cintura e 88 de quadril. Praticamente perfeita. Não estou certa, Cole?

— É, não vou responder isso — Cole murmurou.

Lincoln sequer ouviu o que eles diziam, pois sua atenção estava no celular, em uma mensagem que Daisy enviou com um link de uma cama de cachorro rosa, ornamentada com strass brilhantes, em resposta a uma foto que ele havia mandado de Kiwi. Junto com o link, havia um recado: “A diva precisa do brilho dela.”

Ele digitou uma resposta.

Kiwi vai precisar de mais do que essa cama fuleira, Sinclair. Ela ainda está chateada desde que descobriu que a coleira dela era ornamentada com diamantes falsos e está exigindo uma melhoria. Não consigo decidir se compro na Harry Winston ou na Tiffany. Qual a sua opinião?

Pessoalmente, sou apaixonada pela Tiffany & Co. Tudo por causa daquele azul icônico. E da Audrey Hepburn, é claro.

Ninguém vai me pôr em uma jaula.

Puta merda, Mathis. Você acabou de citar uma frase de ‘Bonequinha de Luxo’?

Ele sorriu e enviou outra citação do filme. “Pobre velho gato! Pobre palerma! Pobre palerma sem nome.”

Você tem certeza de que não é gay? Nunca conheci um homem hétero tão em sintonia com Holly Golightly.

— Mathis. — Lincoln olhou para cima e deu de cara com Alex Cassidy parado na porta. Apesar de ter acabado de voltar de uma lua de mel de duas semanas com o amor de sua vida, parecia tão sério e profissional como de costume.

Ao lado dele, estava uma mulher que Lincoln nunca tinha visto antes.

Não, ele respondeu mentalmente à mensagem de Daisy. Ele não era gay. Porque o heterossexual nele conseguia entender claramente que a mulher a sua frente era a prova mais perfeita disso. A descrição de Penelope havia sido certeira, até mesmo sobre as medidas.

— Esta é Taylor Carr — Cassidy disse. — Começando hoje como nossa nova gerente de publicidade.

Lincoln levantou-se e deu a volta na mesa para cumprimentar Taylor, quase certo de ter ouvido Penelope murmurar um “Eu pegaria ela” em voz baixa.

— Lincoln Mathis — disse ele, apertando a mão da mulher.

Ela tinha um bom aperto de mão e olhou com franqueza para ele.— Prazer em conhecê-lo. Você é um editor?

Ele sorriu. — O cara do sexo.

Cassidy pigarreou. — O nome da seção é “Mulheres e sexo”. E não é só sobre sexo.

— De forma alguma — Cole concordou. — Grande parte das nossas matérias principais são simplesmente fotos de mulheres nuas. Elegantes. Claro.

Penelope assentiu com entusiasmo.

Taylor riu, um som baixo e gutural. Era sedutor, e Lincoln tinha certeza de que era intencional que a risada soasse assim. Essa mulher estava acostumada a ter os homens na palma da mão, embora houvesse algo de reconfortante em sua honestidade. A maioria das mulheres que eram sexys tentavam fingir que não sabiam disso. Taylor Carr definitivamente sabia.

— Fiz minha lição de casa antes de aceitar o emprego — ela contou com um sorriso. — Aquela matéria que você fez sobre garotas praianas foi bastante sofisticada.

Lincoln sorriu de volta. — Viu só? Cassidy, você ouviu? É disso que estou falando.

Cassidy revirou os olhos pelas costas de Taylor e houve um silêncio significativo na sala – um momento de expectativa, e ele sabia que essas expectativas eram direcionadas a ele. Todos, de Taylor à Penelope, esperavam ansiosamente para ouvir sua próxima cantada.

Ao invés disso, Lincoln segurou a língua. Flertar com mulheres que ele sabia que não tinham interesse nele era uma coisa. Responder animadamente a uma cantada em um bar para não ferir o ego feminino também era ok. Mas ele se recusava a flertar com uma mulher que parecia ter um convite nos olhos, convite esse que ele teria que ver todos os dias. Ele não tinha intenção de flertar com uma mulher perfeitamente simpática sem de fato querer alguma coisa séria com ela.

O sorriso de Taylor mudou, passando de atraente para somente-amigável, e ele pôde praticamente ver a maneira como o cérebro dela o transferiu da categoria “parceiro em potencial” para “colega”.

— Prazer em conhecê-lo — disse ela com um aceno de cabeça, sorrindo para o grupo antes de se virar e sair do escritório. Cassidy a seguiu e Lincoln voltou para sua mesa, bem a tempo de ver uma Penelope aborrecida jogar uma nota de vinte dólares na palma da mão de Cole, que se gabava.

Lincoln deu um passo à frente, puxando a nota novinha da mão do amigo. — Explique isso.

— Penelope tinha certeza de que você daria em cima dela — disse Cole, inclinando a cabeça em direção à porta pela qual Taylor havia saído.

— E do que você tinha certeza? — Lincoln perguntou.

Cole sorriu com os olhos para ele. — Que atualmente seu interesse está em outro lugar.

Lincoln parou, seu primeiro pensamento que Cole havia descoberto sobre Katie. Mas não. Se seu amigo soubesse, ele seria sensível o suficiente para não esbanjar aquele sorriso estúpido. O que significava que Cole deveria estar se referindo à...

Penelope se inclinou sobre a mesa, pegando o celular de Lincoln. — Cole está certo? Foi Daisy quem te manteve grudado no celular nas últimas duas semanas? Qual é a sua senha?

— Não é da sua conta — Lincoln respondeu, pegando o telefone da mão dela e empurrando o aparelho e a nota de vinte dólares para dentro do bolso. Ele estranhamente se lembrou de Daisy pedindo a senha dele e ele dizendo o aniversário de Katie, sem um segundo de hesitação.

Estranho, já que Penelope e Cole estavam incluídos em seu grupo de amigos mais próximos, enquanto Daisy era...

...O quê?

O que Daisy era para ele?

Eles trocavam mensagens todos os dias desde que ela voltou para a Carolina do Norte e, até esse momento, ele não havia pensado sobre isso. Não era como se tivesse tomado a decisão consciente de iniciar uma amizade a distância; simplesmente havia acontecido.

Mas de alguma forma, em apenas duas semanas, o fato de eles conversarem sobre tudo, desde o clima até sua cachorrinha e as maratonas de Game of Thrones, havia se tornado a melhor parte do dia dele.

Lincoln sentiu uma pontada brutal de vergonha. O que estava fazendo? Ele era um homem comprometido. E embora nada tivesse acontecido entre ele e Daisy, nada estava acontecendo, não podia negar que ficava meio que ansioso demais pelas mensagens dela, que pensava nela com frequência.

Ele engoliu em seco. Precisava ver Katie. Esta noite. Dirigiria até lá hoje à noite. Raramente fazia uma visita fora da programada rotina “último-domingo-do-mês”. Uma vez por mês era tudo que seu coração machucado conseguia aguentar.

Mas ele precisava vê-la. Precisava se lembrar dela.

— Linc. Você está bem? — Penelope perguntou em voz baixa.

— Sim. — Ele limpou a garganta e tentou responder novamente: — Sim. Estou bem.

O celular em seu bolso vibrou, e o fato de Lincoln querer desesperadamente agarrá-lo e ver a mensagem de Daisy foi o motivo pelo qual pegou a xícara de café em vez do aparelho.

Era hora de colocar uma pequena distância entre ele e Daisy, antes que começasse a desejar coisas que não deveria ousar desejar.

Mas o celular vibrou de novo e ele fechou os olhos, consternado ao perceber que talvez fosse tarde demais para colocar uma distância entre os dois.

Ele já estava desejando o que não devia.


Capítulo 12

— Mathis, seu esquilo agressivo está se esfregando na minha panturrilha.

Lincoln tirou os olhos da geladeira e olhou para onde Kiwi tentava alcançar a pilha de caixas de comida nas mãos de Jake Malone.

— Jogue um rolinho primavera para ela.

— Um rolinho inteiro? — Jake indagou, cético. Caminhou até o balcão, tomando cuidado para não pisar na cadelinha branca. — É do tamanho dela.

— Então morda metade e dê a ela o restante.

Quando Jake abriu a embalagem de isopor, Lincoln viu que os rolinhos primavera eram mesmo do tamanho do seu animal de estimação. — Tudo bem, morda dois terços. Dê a ela o pedaço que restar.

Kiwi latiu em protesto, uma vez que sua porção estava ficando cada vez menor.

Jake revirou os olhos e abriu várias gavetas até encontrar os talheres. — Que tal eu cortar como um homem de trinta e poucos anos, em vez de arrancar um pedaço com os dentes feito um jovem universitário de ressaca?

Em resposta, Cole caminhou até o balcão, pegou um rolinho, deu uma mordida enorme e se ajoelhou para oferecer o resto à Kiwi, que abanou o rabo alegremente. — Aqui, amor. Quem é seu tio favorito agora?

— Deve ser eu — Mitchell resmungou enquanto se servia de uma cerveja da geladeira de Lincoln. — Fui eu que a levei para fazer as necessidades dela. Lincoln, sabia que existem saquinhos de fezes em outras cores além de rosa e roxo?

— Claro. Mas não combinariam com a minha roupa — Lincoln brincou. Não mencionou que quando Kiwi era de Katie, sua noiva realmente combinava a cor dos saquinhos para fezes com a das roupas que usava. Ele achava, de uma forma estranha, que honrava a memória de Katie dando continuidade àquilo.

— Estou tentado a tirar uma foto sua agora, vestido com essa calça jeans e essa camiseta feia para provar à Riley que nem sempre você se veste como se estivesse em um anúncio de revista — Sam admitiu, aceitando a cerveja que Mitchell lhe estendia. — Talvez assim ela me deixe vestir minhas camisetas feias.

— Falando em anúncios — disse Cassidy, saindo do banheiro de Lincoln. — Tenho que admitir, Mathis, meio que pensei que você ia dar em cima da Srta. Carr.

— Quem é Srta. Carr? — Perguntou Mitchell.

— Minha nova gerente de publicidade — respondeu Cassidy. — Ela é...

— Gostosa — disse Cole. — E sim, eu posso dizer isso, porque Penelope disse primeiro.

— Ela é gostosa — Lincoln disse casualmente, colocando uma pilha de pratos no balcão. — Mas não estou interessado.

— Desde quando? — Jake perguntou, dando uma mordida em um rolinho primavera, aparentemente tendo mudado de ideia sobre não arrancar um pedaço do alimento feito um jovem universitário.

— Desde agora — Lincoln retrucou, um pouco irritado. — Sinceramente, estamos aqui para comer comida chinesa e jogar pôquer ou devo colocar uma música da Adele para tocar e servir um pouco de vinho rosé?

— Você fala como se isso não fosse um hábito seu — Jake falou.

Cole começou a cantar as notas iniciais de “Rolling in the Deep”, o normalmente reservado Mitchell se unindo a ele em harmonia.

Lincoln riu. — Jesus. Preciso de outra cerveja.

Mitchell obedeceu ao pedido e Lincoln foi salvo de mais um interrogatório pela chegada de Jackson Burke. O cara fazia parte do grupo de amigos há algum tempo, mas de vez em quando Lincoln tinha que sacudir a cabeça, perplexo por ter um ex-quarterback vencedor de vários Super Bowls em sua sala de estar.

Na verdade, foi ideia de Jackson agendar um jogo de pôquer, somente para os homens. Lincoln ofereceu a casa dele. Não que particularmente gostasse de pôquer, mas precisava de uma distração. De Katie. De Daisy.

De si mesmo.

Em tempo recorde, a comida chinesa que Jake trouxe foi destruída, as bebidas reabastecidas, e eles se acomodaram ao redor da mesa que Lincoln havia arrumado com cartas, fichas de pôquer e uma tigela de batatas fritas industriais para manter tudo bem másculo.

Sam embaralhou as cartas ao mesmo tempo que Mitchell distribuía as fichas. Lincoln sentiu o celular vibrar no bolso e, antes que conseguisse se conter, seu coração pulou de empolgação ao pensar que poderia ser Daisy.

De qualquer maneira, não era provável que fosse ela. Fazia uma semana desde que ele se forçou a se afastar e ela pareceu captar a mensagem, porque mal teve notícias dela. Lincoln disse a si mesmo que era melhor assim, mas era como se os dias dele tivessem ficado um pouco menos radiantes.

O celular vibrou outra vez, e de novo, e ele percebeu que não era uma mensagem, mas sim uma chamada de voz. Então não era Daisy. Eles nunca conversaram por ligação.

Ele pegou o celular e paralisou quando viu o identificador, seu sangue gelado.

— Me dêem um segundo — disse para os caras. Ou talvez não. Não fazia ideia do que dissera, apenas que de alguma forma conseguiu chegar ao quarto, deslizando o polegar sobre a tela para aceitar a ligação. Kiwi entrou no cômodo com ele no momento em que fechou a porta.

— Lincoln Mathis — ele respondeu.

Ele sabia antes mesmo da pessoa do outro lado da linha dizer uma única palavra sobre o que estava acontecendo. Ele não fazia ideia de como sabia – não era como se esperasse por isso, nunca havia se deixado sequer considerar a possibilidade desse momento – mas, de alguma forma, ele sabia.

Lincoln não se mexeu quando o médico deu a notícia. Ele não se lembrava de ter desligado a chamada. Não se lembrava de ter deixado o celular cair no chão coberto por um tapete do quarto, apesar de ter ouvido o barulho.

De alguma forma, conseguiu chegar na cama e, quando o fez, abaixou-se lentamente para sentar no colchão, apoiou os antebraços nas coxas e abaixou a cabeça lentamente, soltando um suspiro trêmulo.

Pela primeira vez, Kiwi não estava agitada e nem pulando em cima dele para conseguir atenção. Em vez disso, a cachorrinha pareceu entender que o dono precisava de consolo, então se aconchegou ao lado do quadril dele e descansou o focinho em sua perna.

Lincoln não tinha certeza de quanto tempo ficou ali, imóvel, sem conseguir sentir nada, mas deve ter passado um bom tempo, porque houve uma batida hesitante na porta.

— Mathis?

Ele não respondeu.

— Lincoln, cara, você está bem? Precisa de alguma coisa?

Ainda assim, ele não respondeu.

Ouviu os amigos debaterem algo em voz baixa, então a voz de Cole veio à tona. — Cara, eu vou abrir a porta no três. Se estiver nu, essa é sua chance de se vestir ou de nos mandar cair fora.

Lincoln nem sequer levantou a cabeça.

Como prometido, Cole contou até três, e a porta se abriu.

Ele levantou a cabeça e encontrou todos os amigos dele observando-o com expressões de preocupação idênticas.

— Ela está morta. — Conseguiu dizer em uma voz rouca.

— Quem está morta? — Jake perguntou, entrando no quarto.

— Katie. Minha noiva. Ela está, ah, Deus — ele disse com dificuldade, deixando a cabeça cair para frente novamente. Não conseguia respirar. — Ela está morta. Embolia pulmonar. Nem sei o que é isso, embora devesse. Eu deveria ter impedido; eu deveria ter... Ah, Deus. Katie.

Ele cobriu o rosto com as mãos.

Houve um momento de silêncio enquanto seus amigos absorviam a notícia de que Lincoln estava comprometido, não, de que ele era comprometido. Não mais. Porque ela estava morta.

Ele se preparou.

Preparou-se para as perguntas inevitáveis.

Preparou-se para os “que diabos”.

E para os “por que você não nos contou?”.

Ele se preparou para os “Que merda, cara” cheios de raiva e frustração.

Mas nunca na vida Lincoln se sentiu tão grato pelos amigos que tinha quanto naquele momento, porque eles não disseram nada disso.

Ele não soube quem colocou um braço em volta de seu ombro, oferecendo o consolo que ele não tinha percebido que precisava. Cole, talvez.

Ele não soube quem apertou o outro ombro dele, uma garantia silenciosa de que o que ele precisasse, ele teria. Jake?

Ele não fazia ideia de quem encontrou um rolo de papel higiênico – Lincoln nunca se lembrava de comprar lenços de papel – e colocou sobre os joelhos dele. Pensou que talvez tenha sido Cassidy.

Quando Lincoln olhou para cima, sabe lá Deus quanto tempo depois, todos estavam lá, amontoados ao redor dele, Cassidy e Cole junto dele na cama, o resto dos caras sentados no chão enquanto ofereciam um apoio silencioso.

Lincoln assentiu uma vez em agradecimento.

Mitchell assentiu de volta.

Ele não pegou o papel higiênico uma vez sequer. Não derramou uma única lágrima.

Estava quebrado demais para isso.


Parte II


Capítulo 13

TRÊS MESES DEPOIS

— Você queria me ver?

Cassidy ergueu os olhos do computador e fez sinal para Lincoln entrar. — Sim. Entre. Feche a porta.

Lincoln ergueu as sobrancelhas ao ouvir aquilo. — Devo ficar nervoso? Você só fecha a porta quando transa com a Emma aqui dentro ou demite alguém.

— Será que pode só... fechar a porta. E cale a boca, ninguém vai transar ou ser demitido. Por que está segurando essa bola?

Lincoln jogou a mini bola de basquete de um lado ao outro. — Estávamos jogando Horse no escritório do Cole.

Cassidy recostou-se na cadeira e Lincoln se sentou. — Pensei que tivesse me livrado de bolas depois que um de vocês idiotas jogou uma que atravessou o andar inteiro e derrubou o café de Jo, que molhou nosso sistema telefônico muito caro e deu curto no teclado dela.

Lincoln ergueu a bola. — Essa aqui é uma substituta. E por falar em Jo, a barriga dela está do tamanho de uma bola de basquete. E não de uma em miniatura como essa. Uma de tamanho normal. Você tem a visto ultimamente?

— Não — Cassidy respondeu sarcasticamente. — Sou editor-chefe dessa revista, passo mais de oito horas por dia tentando ficar de olho nos arruaceiros que são vocês, mas não, Mathis, não fazia ideia de que minha recepcionista está grávida de seis meses.

— Seis. Só isso? Pensei que fossem... dez.

— Faça um favor a todos nós e não diga isso a ela — Cassidy pediu antes de erguer as duas mãos na altura do peito, como se quisesse agarrar algo. — Me dê a bola.

Lincoln não parou de jogá-la de mão em mão. — Por quê?

— Porque você está me deixando louco para caralho.

Lincoln jogou a bola para Cassidy com mais força do que o necessário. O outro homem pegou o objeto com facilidade, apesar de seu esporte favorito ser o futebol. Lincoln tinha certeza de que seu chefe queria esvaziar a bola, mas, em vez disso, apenas a colocou de lado.

— Precisamos conversar.

— Tem certeza que não está terminando comigo? — Lincoln perguntou. Manteve o tom de voz brincalhão, mas não conseguiu evitar o leve enrijecimento dos ombros ao ver a seriedade da expressão de Cassidy.

Ele não seria demitido. Não achava que seria. Seus trabalhos continuavam perfeitos. Não havia perdido um único prazo. Inferno, além de ter tirado três dias de luto para preparar o funeral de Katie, nada havia mudado. Ele não tinha deixado que mudasse. Ainda era o Lincoln descontraído e divertido. Ainda era o cara com uma piadinha sempre pronta e que ria com facilidade.

E, caso as piadas parecessem meio vazias, se todos os sorrisos tivessem uma aparência remendada... bem, ele estava cuidando disso. Não deixava que afetasse seu emprego.

Ou assim ele pensava. A expressão mortalmente séria de Cassidy dizia o contrário.

— Acho que você precisa de um tempo — Cassidy sugeriu calmamente.

Lincoln levou um leve choque. Ele esperava por aquilo, mas causou uma sensação ruim do mesmo jeito. — Tempo para quê?

— Para ficar de luto — Cassidy respondeu em voz baixa.

— Eu fiquei, eu tirei...

— Três dias, eu sei. Mas Lincoln, você ia se casar com Katie. E mesmo depois que isso se tornou impossível, cuidou dela como se fosse sua esposa por dois anos.

— Alguém fez a lição de casa — Lincoln constatou sarcasticamente.

— Pode apostar que sim. Precisei fazer, já que você se recusou a nos contar qualquer coisa.

Lincoln tamborilou os dedos no braço da cadeira. — Cara, eu sabia que isso ia acontecer. Sabia que você só seria capaz de segurar a língua por um tempo antes de vir me dar sermões por eu não ter contado a verdade. Simplesmente não consegue suportar não estar no controle, não saber todos os detalhes...

— Cale essa maldita boca — Cassidy interrompeu, inclinando-se para a frente e encarando Lincoln com um olhar firme. — Acha que é disso que se trata? Que é sobre eu ser um controlador? Não é. É sobre o fato de eu me importar com um amigo que vem sendo uma mera concha do homem que ele era alguns meses atrás.

Lincoln jogou a cabeça para trás. — Como assim? Eu não mudei. Nada mudou.

Cassidy balançou a cabeça. — É isso que você acha? Que continua o mesmo? Você está no piloto automático, Lincoln. Quem não te conhece provavelmente não notaria, mas eu te conheço. Todos nós te conhecemos e todos nós estamos preocupados.

Lincoln queria negar. Queria revidar. Inferno, se tivesse visto apenas teimosia no rosto de Cassidy, teria feito isso.

Mas seu amigo parecia preocupado. Aflito. Por causa dele.

— Você precisa de tempo para viver seu luto — Cassidy afirmou em voz baixa. — Estávamos todos no funeral. Emma chorou mais que você e ela nem conhecia Katie, e Emma não é de chorar.

Lincoln abriu a boca, mas Cassidy levantou a mão. — Ainda não terminei. Não vou te insultar dizendo que você precisa chorar bastante. Cada um de nós lida com a dor de maneira diferente. Mas Lincoln, você sequer está lidando com ela.

Lincoln soltou um suspiro. — Então, o quê? Vai me forçar a tirar um ano sabático?

— Acho que é uma boa ideia. Você não?

Ele engoliu em seco e, pela primeira vez desde que soube da morte de Katie, decidiu se permitir ser totalmente honesto. Não dizer tudo. Mas ser honesto. — Eu preciso trabalhar, cara — admitiu, um pouco desesperado. — Não posso ficar sozinho em casa, pensando nas coisas. Pensando nela. O emprego é tudo o que tenho no momento e a qualidade do meu trabalho não foi afetada. Você sabe que não foi.

— Não — disse Cassidy. — Não foi. É por isso que não vou tratar como férias o seu tempo longe daqui.

Lincoln paralisou. — Não?

Cassidy juntou os dedos. — Você precisa de uma mudança de cenário. Uma mudança de rotina.

— Como diabos você sabe do que preciso? As coisas estão sob controle, eu estou só...

— Porque sou seu chefe e seu amigo — Cassidy retrucou. — Sei que você acha que tem as coisas sob controle, mas está agindo feito um robô vazio e piadista, então não, você não tem nada sob controle.

— E quanto a todo o trabalho que precisa ser feito aqui?

— Encontrei um cara. Nick Ballantine. Ele é bom, mas só está procurando por um trabalho de meio período, temporário. Seu emprego estará aqui quando você voltar.

— E se o outro cara começar a ficar de olho em um emprego em tempo integral?

— Ele não vai. Caras como ele vivem de desafios temporários, não querem um plano de aposentadoria e o escritório que fica na esquina.

— Diga isso para Jake e Cole — Lincoln falou.

Jake Malone e Cole Sharpe eram terceirizados da revista antes de aceitarem cargos em período integral, e Lincoln não gostava exatamente da ideia de que esse tal de Nick Ballantine poderia ficar de olho no emprego dele.

— Bom argumento — Cassidy respondeu. — Mas se esse problema surgir, vamos resolver, encontraremos algo para ele, se ele se encaixar. Seja como for, ele não vai pegar o seu cargo. Confie em mim.

— Bem. — Lincoln levantou as mãos em sinal de rendição. — Para onde serei exilado?

Cassidy desviou o olhar e Lincoln estreitou os olhos; ele sabia que não gostaria do que viria a seguir.

— Eis o que estou pensando — disse Cassidy, voltando o olhar para Lincoln. — Você faz coisas boas para caramba na sua seção, mas se não tomarmos cuidado, a Oxford vai ser injustamente classificada como uma revista feita para homens da cidade. Queremos ser urbanos, sim, mas também queremos ser universais.

— E isso significa?

— Significa que, embora sejamos muito bons em dar dicas aos homens sobre como seduzir uma mulher que mora em SoHo, a verdade é que ensinamos como namorar e cortejar em Manhattan, e isso não significa que seja o mesmo para todos os lugares.

— Cortejar? — Lincoln repetiu baixinho.

— Eu estava pensando em fazer uma possível comparação, ver os contrapontos. Descobrir o que diferentes mulheres em diferentes cidades procuram nos homens. É a mesma coisa? Ou é o completo oposto? Você, sendo alguém de fora, poderia fazer um artigo sobre, entrevistá-las, descobrir todas as maneiras pelas quais nós, caras da cidade, nos daríamos mal tentando cortejar uma garota do sul.

— Primeiro de tudo, se eu estivesse com cabeça para namorar agora, não iria me dar mal. Segundo, você já sabe que nunca fui um mulherengo, só interpretava o papel de um. E terceiro... cara, Cassidy... você vai me mandar para uma fazenda?

— Sim, Lincoln. Vou te mandar para uma fazenda. Pensei que você e Kiki...

— Kiwi.

— ...Kiwi. Pensei que vocês dois poderiam dormir em um celeiro com porcos. Jesus. Eu estava pensando em algo mais intermediário.

Lincoln estreitou os olhos e esperou.

— Algo mais cidade mediana, com um toque sulista para manter as coisas interessantes.

Lincoln levou trinta segundos para perceber onde Cassidy queria chegar com aquilo. — Carolina do Norte. Você quer me mandar para Charlotte.

— Isso é exclusivamente opcional. Se tiver outra cidade para qual prefira ir, vou aceitar a sugestão, desde que se afaste do Nordeste do país e das más lembranças. Mas vou logo dizendo que a mansão de Daisy tem uma casa de hóspedes totalmente mobiliada, uma cozinha sofisticada, quarto...

Lincoln inclinou a cabeça para trás e riu, embora houvesse pouquíssima alegria no gesto. — Ou você está tentando me arranjar com alguém ou tentando me arrumar uma babá. Não tenho certeza de qual dos dois é pior.

— Não estou tentando fazer nem uma coisa nem outra — Cassidy disse calmamente.

As risadas de Lincoln cessaram quando percebeu que seu chefe estava falando sério.

— Veja bem, nunca pensaria em bancar o casamenteiro logo após a sua perda. Nem Emma. E, mesmo se eu fizesse isso, não escolheria Daisy.

Ele não pôde evitar. Seu estômago se apertou com a menção ao nome. Ele mal teve notícias dela desde que se afastou vários meses atrás, antes mesmo da morte de Katie. Ela enviou uma mensagem na manhã do funeral, um simples “Eu lamento tanto” e, embora tenha ficado grato pela mensagem, não respondeu. Nem a ela, nem a ninguém.

— Por que Daisy não? — Lincoln perguntou antes que pudesse se conter.

— Porque ela está tão destruída quanto você — disse Cassidy em voz baixa.

Lincoln queria perguntar mais, mas não o fez. — Então é a opção da babá.

— Por que você precisaria de uma babá? — Cassidy perguntou, parecendo genuinamente intrigado.

— Bem, tem que haver um motivo para você me mandar para lá e não para uma cidade aleatória e desconhecida.

— Sim, dois motivos. O primeiro vem de mim como seu chefe. A hospedagem e a cozinha serão gratuitas, o que significa que as únicas coisas que vão sair do meu orçamento da Oxford são um carro alugado, a conta do supermercado e o dinheiro que você precisar gastar enquanto estiver pesquisando sobre o cenário do namoro em Charlotte.

— E o segundo motivo?

O chefe dele soltou um suspiro. — Esse é mais pessoal. É porque eu me importo com você.

Lincoln desviou o olhar, envergonhado. Cassidy não era exatamente um homem de muitas palavras. Nenhum deles era, exceto talvez Cole, e mesmo Cole agia com naturalidade na maioria das vezes.

Cassidy pegou a bola, jogou-a de mão em mão da mesma maneira que Lincoln havia feito antes, então voltou a si e colocou o objeto de lado.

— Não estou te exilando, é só um... trabalho a distância. Nem você nem Daisy estão com cabeça para romance, e nenhum de vocês precisa de um vigia, mas há algo que vocês dois precisam desesperadamente.

— Mal posso esperar para ouvir o restante.

Cassidy pegou a bola novamente e atirou-a em Lincoln, que a pegou logo antes de acertar seu rosto. — Você precisa de um amiga, imbecil. Mais especificamente, precisa de um raio de uma maldita amiga com quem realmente conversará.

— E você acha que essa amiga pode ser Daisy?

Cassidy levantou as sobrancelhas em desafio. — Você não?


Capítulo 14

— Então, deixe-me ver se entendi — Whitney falou, seguindo Daisy com uma taça de vinho Chardonnay na mão. — O homem mais bonito do planeta virá passar um tempo com você e vai colocá-lo na casa de hóspedes?

— Sim — Daisy explicou pacientemente, reorganizando umas tulipas brancas dentro de um vaso simples. — Porque ele é um hóspede.

— Mas você não nega que ele seja o homem mais bonito do planeta — respondeu Whitney, apontando o vinho na direção da amiga.

Daisy riu. — Não. Não nego. Mas ele não está vindo para cá atrás de transas, ou seja, você já pode guardar os seios.

Whitney estremeceu. — Eu vesti um sutiã push up especial só para ele. Quando é que o avião vai pousar mesmo?

Daisy olhou para o relógio. — Cinco minutos atrás. Mas imagino que ele tenha muita bagagem para recolher, além de ter que pegar o carro alugado, dirigir até aqui, blá, blá, blá.

Whitney não estava ouvindo. Estava ocupada demais verificando o decote no espelho.

— Whitney.

Sua amiga se virou e Daisy a olhou. — Você sabe que te amo até a morte, mas o homem acabou de perder a noiva. E sim, tecnicamente ele está aqui para escrever sobre o cenário do namoro em Charlotte, mas não está de fato atrás de... você sabe.

A expressão no rosto de Whitney se suavizou. — Eu sei, Daiz. Digo, sim, eu queria que ele se deparasse com uma bela visão quando chegasse, mas não vou fazer nada, prometo. Você gosta dele, o que significa que eu também. Além disso, gosto de que você não vai mais ficar sozinha neste lugar tão distante.

— “Neste lugar tão distante” significa a uma curta distância de carro da sua casa?

— Você me entendeu. Não tem nem vizinhos, sério. Odeio te imaginar aqui, solitária.

Daisy queria garantir à amiga que não era solitária, mas a verdade é que de fato era um pouco. Quando Emma telefonou e sugeriu timidamente a possibilidade de Lincoln passar um tempo na casa da irmã, Daisy disse sim antes mesmo de Emma terminar a frase.

Em parte porque queria companhia e ajudar um homem em luto, mas também...

Porque sentia falta dele.

Ela entendia o motivo de ele ter se afastado, mesmo antes da morte de Katie. Realmente entendia. E foi melhor assim.

Mas a saudade que sentia do relacionamento leve que tinham foi quase instantânea. Foram precisos dois encontros às cegas sem graça para Daisy perceber o quão raro era se identificar com outra pessoa, mesmo no nível de amizade.

E ela se identificou com Lincoln.

Whitney estendeu a mão e acariciou um broto de tulipa. — Eu nem conheço esse cara, e mesmo assim meu coração dói ao pensar no que ele passou. Pode me dizer qual foi a causa da morte dela outra vez?

— Embolia pulmonar — Daisy respondeu, estendendo a mão e pegando a taça de vinho da amiga, servindo-se de um gole. — Acho que não é incomum ocorrer com pessoas que passam muito tempo em estado sedentário. Um coágulo sanguíneo se formou na perna dela e se rompeu, foi liberado na circulação sanguínea e ficou preso no pulmão. Bloqueou o fluxo de sangue para o coração dela.

— Então foi rápido? — Whitney perguntou baixinho.

Daisy levantou os ombros. — Espero que sim.

Whitney estudou-a por alguns segundos antes de olhar para o relógio. — Sabe de uma coisa? Acho que vou embora.

— Sério? Pensei que estivesse morrendo de vontade de conhecê-lo?

— Ah, eu estou. Muito. Mas continuo me deixando esquecer que ele não é um brinquedinho bonito. É um homem machucado e não acho que minha comissão de frente fabulosa seja o que ele precisa no momento. E sim um rosto familiar, talvez um pouco de sossego também.

Daisy sentiu uma onda de carinho pela amiga. Sob todo o barulho e sexualidade evidente, Whitney era mais sensível do que deixava transparecer.

— Venha na terça-feira, como sempre; a essa altura ele já vai ter se estabelecido — Daisy pediu, seguindo a amiga até a porta enquanto voltavam para a casa principal.

A casa de hóspedes ficava a uma distância de um ou dois minutos a pé; longe o suficiente para que eles não sentissem como se fossem colegas de quarto, mas perto o suficiente para estarem, bem... próximos.

— Por quanto tempo ele vai ficar na cidade?

— Isso ainda está sendo definido. Cassidy disse que acha que levará cerca de duas semanas para ele conseguir o que precisa para a matéria, e talvez espairecer um pouco.

— Duas semanas — refletiu a amiga. — Não muito tempo, mas é o suficiente. Talvez.

— O suficiente para quê?

— Nada — Whitney cantarolou, empurrando a taça de vinho pela metade para Daisy e puxando as chaves da bolsa. — Beba isso. E me envie uma mensagem mais tarde. Você ganhará pontos extras se conseguir tirar uma foto dele saindo do banho e mandar para mim.

— Com certeza — disse Daisy, bebendo um pouco do vinho que sobrou. — Esse tem sido o meu plano desde o início. Tirar fotos do pau do cara.

— Não acho que uma garota possa tirar fotos do pau de um cara, acho que ele tem que fazer isso sozinho para tornar a foto um nude legítimo — Whitney continuou da janela aberta do carro, ligando o automóvel. — Peça a ele, pode ser?

— Tchau, Whitney — disse Daisy por cima do barulho do motor.

Depois que a amiga se afastou dando um aceno atrevido, Daisy voltou para a cozinha, decidindo que não seria nada mal encher a taça de vinho.

Porque Lincoln Mathis estava vindo.

Para ficar.

E namorar outras mulheres.

Não de verdade, Daisy lembrou a si mesma. Era apenas parte da matéria dele. A mesma coisa que sempre fez em Nova York, entrevistar mulheres sobre o tópico namoro, mais do que realmente namorá-las.

Ela não tinha certeza do motivo pelo qual essa distinção importava tanto. Daisy lavou um monte de roupas e fez uma jarra de chá gelado. Depois, enquanto tomava o vinho, reorganizou as flores cor de rosa que comprara para si mesma na mesma floricultura que adquiriu as brancas para ele. Estava bastante determinada a não olhar para o relógio em seu pulso, a não dar uma olhada no que estava na parede, a não ouvir o som de um carro...

Ela realmente não ouviu o barulho do carro dele se aproximando da entrada da casa, mas ouviu um cachorro latindo. Um cachorro muito pequeno.

Kiwi.

Daisy não conseguiu conter o sorriso quando foi até a porta da frente e a abriu. Pretendia ir até o carro, ajudá-lo com as malas, mas ele já estava parado ali. Bem ali, de pé na varanda com uma mala modesta em uma mão e uma pequena caixa de transporte para cachorros cinza na outra.

Por alguns instantes, os dois congelaram, e havia algo estranhamente elétrico naquilo, como se estivessem posicionados à beira de um precipício que guardava algo épico e maravilhoso lá embaixo.

Então a sensação passou, e eles voltaram a ser somente Daisy e Lincoln. Era estranho que “Daisy e Lincoln” pudesse ser considerado algo, tendo em vista o pouco tempo que passaram juntos. Mas era. E ela apostaria qualquer coisa que ele também sabia disso.

Os olhos de Lincoln estavam cobertos por um óculos aviador contra a luz do sol de fim de tarde, mas o sorriso dele continuava o mesmo de sua memória.

— Olá, Wallflower.

Ela sorriu de volta. E, pela primeira vez desde os primeiros dias de seu casamento com Gary, teve o desejo de abraçar um homem e senti-lo abraçá-la de volta. Ao invés disso, afastou-se e fez um gesto para ele entrar. — Ora, se não é o garoto da cidade que veio para cá com o objetivo de cortejar nós, garotas do interior.

Lincoln passou os olhos pelo luxuoso hall de entrada e soltou um assobio baixo. — Não tem nada de “cidade interiorana” nesta casa.

— Eu sei, é um pouco ostensiva, não?

A entrada era de mármore branco, assim como a ampla dupla de escadas que serpenteavam em torno do lustre e se encontravam na entrada do segundo andar.

Em vez de responder, ele colocou os óculos de sol em cima da cabeça e a olhou. — É bom ver você.

Ela sentiu uma inesperada sensação de prazer ao ouvir a sinceridade na voz dele. Estava aterrorizada pela possibilidade de ele ter sido forçado a embarcar nessa pequena aventura.

— É bom te ver também.

Com os óculos escuros não mais escondendo os olhos, Daisy viu que estava errada quando pensou que ele parecia o mesmo. O Lincoln em sua frente não era o que ela conhecera em Nova York. Claro que ainda tinha o mesmo maxilar bonito e o mesmo corpo perfeitamente esculpido, mas os olhos não mais pareciam atormentados e desconfiados, e sim reservados e talvez um pouco cínicos. O sorriso parecia um tanto sem emoção.

Seus olhares se mantiveram presos um no outro por um tempo, mas antes que ela descobrisse o que estava sentindo, um latido irritado vindo da caixa de transportar cachorros arruinou o momento.

Ele levantou a caixa até o nível dos olhos e a cadelinha branca o encarou de volta. — Ela precisa... qual é a palavra para isso... hum, fazer cocô.

— Ela não faz desde Nova York? — Perguntou Daisy.

— Ela mijou em um vaso feio na saída do aeroporto, mas precisa fazer o número dois. Em que parte do lado de fora devo deixá-la fazer isso?

— Qualquer lugar está bom — Daisy respondeu, acenando em direção à porta da frente.

Lincoln ergueu as sobrancelhas. — Tem certeza? Tem um jardim bem sofisticado lá fora.

— Exigência do Gary. Os jardineiros vêm uma vez por semana para fazer a manutenção, mas os gramados impecáveis e as cercas vivas são tudo coisa dele. E... sabe de uma coisa, Kiwi? — Ela disse, dando um passo à frente e deslizando um dedo pela grade da caixa para acariciar o pelo macio da cadela. — Faça o seu pior, pode ser?

Lincoln sorriu e foi para a porta da frente. — Se quer realmente destruir o lugar, precisará de um pastor alemão, mas Ki fará o possível com os cocôs do tamanho de pedrinhas dela.

Daisy sorriu enquanto entrava na cozinha e pegava a bandeja de queijos e frios que havia preparado, e tomou outro gole de vinho.

Poucos minutos depois, ouviu a porta da frente abrir e fechar, e o ruído de uma voz grave e masculina conversando com a pequena cadela não-masculina.

— Daisy?

— Aqui.

— Você precisa de um maldito mapa para esse lugar — ele murmurou enquanto entrava na cozinha, parando quando viu a bandeja. — Sabe que está me fazendo um favor só de me deixar ficar na casa de hóspedes, não sabe? Não precisa me alimentar.

Ela gesticulou na direção de um banquinho. — Sente. Eu quero a companhia.

Daisy apreciou o fato de ele não ter feito protestos desnecessários e, em vez disso, sentou no banquinho e pegou uma fatia de salame, ao passo que a cachorra passeava pela cozinha, farejando o rodapé do piso.

— O que quer beber? Tenho vinho, cerveja, um bar completo, caso queira um coquetel, limonada, obviamente caseira, chá gelado que acabei de fazer, algumas folhas de hortelã fresca se preferir um mojito, ou...

Ele balançou a cabeça, maravilhado. — Caramba, Cassidy tinha razão quando disse que as mulheres do sul eram coisa de outro mundo. — Lincoln apontou o queixo em direção à taça na mão dela. — Vou querer o que você estiver bebendo.

Ela serviu-lhe uma taça e colocou na frente dele enquanto ele sorrateiramente entregava um pedaço de provolone para Kiwi. Vestia um terno cinza-claro, sem gravata, e ela sentiu uma pontada de pura apreciação feminina pela maneira como a cor da barba recém-feita em seu queixo contrastava com o branco da camisa e complementava o escuro da lapela do terno.

— Lincoln.

Ele olhou para cima.

— Sinto muito — disse ela em voz baixa. — Pela sua perda.

Os olhos dele escureceram, dirigindo o olhar para a cadela mais uma vez. — Obrigado.

Daisy queria lhe dizer que, se precisasse conversar, ela estaria ali. Mas não disse nada, porque sentiu que ele já sabia disso. Sabia que se e quando ele quisesse falar sobre, ela estaria sempre disponível para ouvi-lo.

No momento, o que ele precisava era não falar sobre. Eventualmente, iria. Se não com ela, então com alguém. Mas o machucado ainda estava fresco. Era por isso que ele estava aqui – uma mudança de rotina que lhe permitiria começar a curar.

Afinal, esse era o plano de Emma e Cassidy. Eles o amavam como um irmão e estavam um tanto desesperados para que o sofrimento do amigo acabasse. Mas isso não dependia deles. Ela, de todas as pessoas, sabia que não havia prazo de validade para a dor, nem data prevista para a cura.

O fato de Lincoln estar aqui lhe fazia pensar que uma parte dele desejava ficar longe de Nova York. Apesar de toda a vibe cuidadosamente elaborada para parecer descontraído, Lincoln era um homem que estava sempre no controle – um que não deixaria ninguém forçá-lo a fazer algo que não quisesse.

Ele movimentou os ombros antes de colocar um pedaço de peru sobre uma fatia de pão e mastigá-lo, pensativo. Então, limpou os dedos e pegou a taça de vinho, batendo no banquinho ao lado dele.

— Wallflower. Sente, venha me contar como tem passado. Deixe-me desfrutar da mansão antes de ser enviado para os aposentos dos empregados.

Ela riu e sentou ao lado dele, um pé embaixo da bunda, o outro balançando livremente enquanto tomava um gole do vinho. — Você sabe que é bem-vindo para ficar aqui. Tem oito quartos. Você e Kiwi podem ter um para cada.

— Sem chance. Ki gosta de dormir de conchinha.

— Ah. Ela é quem fica por trás abraçando? — Perguntou Daisy.

— Obviamente. Mas você se esquivou da pergunta. Como tem passado? Já faz algum tempo que não nos falamos.

— Sim, bem, é isso que acontece quando duas pessoas moram em estados diferentes. — Ela tomou um gole da bebida. — Estou bem. Ótima.

— Bem e ótima. Existe algum homem novo em sua vida responsável por tanto entusiasmo?

Ela bufou. — Dificilmente. Dois encontros regulares que quase mereceram um “bom”, mas definitivamente não um “ótimo”.

Ele fingiu enxugar lágrimas de felicidade. — Minha pequena Wallflower... namorando por aí?

Daisy mordeu o lábio e ignorou a pergunta. — Ok, antes que eu esqueça, há uma coisa que preciso dizer. Eu queria ir ao funeral, mas parecia... não sei. Não fui convidada e mal te conheço, e...

Ele pegou a mão que ela agitava nervosamente. — Obrigado por enviar flores para Brenda. Foi gentil da sua parte.

Daisy paralisou. — Ela te contou?

Ele assentiu. — Ela achou o gesto simpático. Quanto ao funeral, para ser sincero, não sei se prestei atenção em quem estava lá e quem não. Aquela semana inteira é meio que... um bloqueio na minha memória. Mas, para constar, gostaria que não tivesse achado que precisava de um convite.

— Bem, eu só te conheci por quarenta e oito horas — disse ela com um sorriso.

— Sim, mas naquelas quarenta e oito horas, tivemos um duelo de discursos de casamento, bebemos um rio de uísque Jack Daniel’s e teve aquele striptease...

— O que pode ter sido horrível, pelo pouco que você viu, já que ficou de costas. Certo?

Ele sorriu. — Voltando a aqueles dois encontros bons. Alguma chance de eles quererem ser entrevistados para a minha matéria?

— Hum, um não bem grande. Mas qual é o seu plano de verdade?

Ele deu de ombros. — Perguntar a todas as Scarlett O'Haras por aqui o que qualifica alguém como um “príncipe encantado”. Tenho certeza de que elas apontarão para mim.

Ela bufou. — Queria discordar, mas provavelmente é verdade. As mulheres realmente parecem te adorar. Você sempre foi tão... bom nisso? E quando você e Katie se conheceram, cometeu alguns erros?

Era uma jogada arriscada, falar sobre a Katie de antes, mas ele levou numa boa, sorrindo enquanto pegava a taça de vinho, como se o afeto da memória ofuscasse a dor da perda recente.

— Ahá! Então existiu um momento na vida em que você não foi perfeitamente bom nisso — disse ela.

— Pode ter sido por cinco minutos, só uma vez, quando eu estava tão encantado pela garota bonita de olhos verdes sentada no bar que pronunciei a frase “Você vem sempre aqui?”.

Daisy gargalhou. — Você não fez isso.

— Fiz. E disse isso enquanto apoiava um braço no balcão do bar, tentando parecer legal, exceto que coloquei o cotovelo em um daqueles malditos mini guardanapos de coquetel e acabei com metade do corpo estendido sobre balcão quando o guardanapo deslizou.

Daisy bateu palmas em deleite. — Mas aposto que ela ficou encantada.

Os olhos dele ficaram um pouco sombrios. — Depois Katie me disse que foi a coisa do guardanapo que a fez decidir me dar o número dela. Disse que foi adorável ou uma merda dessas.

— Sim, bem — Daisy deu um tapinha no braço dele. — Acho que essa possa ter sido uma iniciativa bem sucedida. Mas aqui em Charlotte, terá que fazer mais do que jogar uma cantada ruim e desabar sobre o balcão, não importa o quão lindo seja.

— Que tal algumas dicas?

— Sem chance — ela respondeu, mordiscando uma fatia de queijo. — Tenho um lugar na primeira fileira para assistir Lincoln Mathis vivendo fora da zona de conforto, e pretendo saborear cada minuto.

— Vocês, garotas de Carolina do Norte, não podem ser tão diferentes das de Nova York.

— Será? — Ela disse, batendo os cílios.

— Você é uma garota do sul e eu consegui te levar para a minha cama em uma noite.

— Não conta. Você pode ter me feito vestir a sua roupa íntima, mas nunca tirou a minha.

Por meio segundo, ela poderia jurar que viu os olhos dele brilharem com calor, mas o momento passou e Lincoln olhou para o relógio. — Trinta minutos. Foi o tempo que levamos para levar a conversa para o tópico “roupa íntima”. Somos estranhos juntos, Wallflower.

— Sim, somos. — Ela concordou, certificando-se cuidadosamente de que a voz não saísse tão sem fôlego quanto ela se sentiu ao pensar nele tirando sua calcinha. — Mais vinho ou quer ver a casa de hóspedes primeiro?

— A casa. Suponho que, uma vez que você praticamente tem as palavras “anfitriã perfeita” costuradas nessa blusa, a casa de hóspedes seja abastecida com cerveja, vinho e licor?

— E flores frescas e uma jarra da minha limonada caseira. Limonada cor de rosa, porque você é você.

— Você é boa demais para mim — disse ele, levantando-se, pegando um pedaço de pão e jogando metade para Kiwi antes de colocar o resto na boca. — Mostre o caminho.

Alguns minutos depois, Lincoln retirou uma mala do porta-malas e seguiu Daisy em direção à casa de hóspedes. Kiwi correu na frente deles, apenas para voltar a cada poucos metros, como se os conduzisse.

— Deixei a porta destrancada — Daisy disse enquanto colocava uma mão na maçaneta. — Mas quando sair para passar constrangimento investigando o cenário do namoro em Charlotte, tem uma fechadura digital para não precisar se preocupar com uma chave. Programei para "um-cinco-zero-um", igual a senha do seu celular.

Lincoln não disse nada quando ela empurrou a porta, conduzindo-o à entrada da casa de hóspedes. Bem, não exatamente conduzindo. Essa função foi ocupada por Kiwi.

— Bem, isso é uma casa — Lincoln falou, observando o piso de madeira pouco usado e o balcão de granito escuro da cozinha de plano aberto. A casa de hóspedes era minúscula em comparação à casa principal, assim como a maioria delas, mas era tudo de primeira linha. Gary queria que atendesse aos padrões exigentes da mãe dele quando ela saía da Flórida para visitá-los.

Os eletrodomésticos eram novinhos, de aço inoxidável, e a sala de estar estava equipada com um enorme sofá branco e uma TV de tela plana ainda maior.

— A suíte principal é por ali — Daisy informou, apontando para o corredor. — Os lençóis e as toalhas estão limpos; tem mais no armário de roupas de cama, no banheiro. O segundo quarto é do outro lado, caso você e Kiwi briguem e precisem dar um tempo na dormida de conchinha.

— Aposto que você pode adivinhar qual de nós dorme no famoso sofá quando isso acontece — ele disse alto, carregando a mala em direção ao quarto principal.

Kiwi não estava prestando atenção. Ela havia encontrado as tigelas para cachorros que Daisy comprou naquela tarde e comia alegremente a ração que o dono do pet shop havia garantido à Daisy que era a melhor existente.

— Você comprou comida para a minha cadela — Lincoln observou, surgindo atrás de Daisy.

Ela se virou. — É como você disse. Anfitriã perfeita.

— Isso. Ou é simplesmente muito gentil — ele murmurou, estudando o rosto dela.

Ela deu de ombros e se virou. — Pessoalmente, eu adoro vinho, mas posso te trazer...

— Daisy.

Ela parou quando os dedos dele tocaram seu cotovelo e ele abaixou a mão.

— Você não precisa me servir. De verdade.

— Eu sei — disse ela em uma voz calma. — É que... eu estava falando sério quando disse que me sinto um pouco solitária vivendo aqui sozinha. É bom ter companhia.

Ele segurou o olhar dela. — Eu te devo desculpas.

Daisy franziu o cenho. — Por?

— Por ter me afastado. Depois que você deixou a cidade, mas antes de Katie falecer, eu sei que meio que... parei de responder suas mensagens.

— Ah. Eu entendi — ela disse.

— Sim. Sim, eu percebi que você entendeu. Essa é a questão, Daisy, você sempre parece entender tudo.

Ela torceu o nariz em confusão. — Você diz como se fosse uma coisa ruim.

— Não é uma coisa ruim, não é. — Ele desviou o olhar rapidamente e voltou a encará-la. — Mas é por isso que tive que me afastar.

— Porque eu entendo as coisas?

— Não, porque você me entende. E já faz muito tempo que ninguém entende.


Capítulo 15

Lincoln se considerava um homem da cidade da cabeça aos pés, mas isso não significava que era imune ao encanto de uma fresca noite de outono que envolvesse cerveja, uma churrasqueira enorme e gargalhadas de duas mulheres adoráveis.

Ele sempre amou a agitação bastante enérgica da vida em Nova York, mas tinha que dar crédito a Charlotte, Carolina do Norte... não era ruim passar as férias ali. Nem um pouco.

A companhia também não era nada ruim.

Era impossível não gostar da melhor amiga de Daisy. Um pouco barulhenta e muito paqueradora, Whitney Silva o atingiu como um fogo de artifício dourado em formato de coração. Ele confessou que não teria apontado a morena curvilínea que saiu de um Mustang vermelho usando um vestido de estampa de leopardo e sandálias plataforma na cor laranja brilhante como a melhor amiga de Daisy Sinclair, mas era claro que eram próximas como irmãs.

Talvez ainda mais próximas do que Daisy e Emma hoje em dia, visto que Emma era recém-casada e estava a uma viagem de avião de distância, enquanto Whitney morava perto e também era uma mulher divorciada, cortesia de seu ex ser “um desgraçado imoral, mas maravilhosamente ainda ligado a ela”.

— Essa talvez seja a nossa melhor “Terça-feira do Taco” de todas — Whitney declarou, recostando-se na cadeira da varanda dos fundos da casa de Daisy enquanto acariciava Kiwi em seu colo. A cachorrinha ficou obcecada pela mulher assim que a viu. — Fizemos ótimos tacos, Daiz.

Daisy tomou um gole da margarita e revirou os olhos. — Ah, nós fizemos?

— Ei, eu cortei um limão. Lincoln, baby, você não me viu cortar aquele limão?

— Com certeza. Nada disso seria possível sem você.

Whitney balançou um dedo na direção dele. — Eu gosto de você. Gostei logo de cara, quando Daisy me mostrou sua foto.

Daisy engasgou um pouco com o guacamole caseiro que fizera e Lincoln se virou, sorrindo enquanto se recostava no parapeito da varanda. — Uma foto, é? Conte-me mais.

— Não — interrompeu Daisy. — Não conte.

Whitney atendeu ao pedido de Lincoln, como ele sabia que faria. — Bem, era uma “Terça-feira do Taco” como essa...

— Uma terça-feira do taco sem os tacos. — Ele interrompeu.

— Isso! Você entendeu! Enfim, Daisy estava grudada no celular, rindo feito uma adolescente com uma paixonite...

— Hum, não. Não aumente. Talvez eu tenha sorrido...

— Para ele — disse Whitney.

— Para a mensagem dele — Daisy esclareceu entredentes.

— Mensagens. Foram várias. Não foram? — Whitney disse, virando-se para Lincoln em busca de confirmação.

Os olhos dele estavam fixos no rosto de Daisy, no leve rosado de vergonha nas bochechas dela. — Suspeito que tenham sido várias.

Naquela época, naquelas poucas semanas felizes, a quantidade de mensagens que trocaram atingiu um número de dois dígitos. Perigoso, não por causa do conteúdo, mas por conta da frequência. E pelo prazer que ele obteve com elas.

Ainda assim, vendo a forma pela qual Daisy parecia se recusar a encará-lo de volta, ele percebeu que ela também havia se divertido com as mensagens. E que talvez o fato de ter se afastado tenha sido mais difícil para ela do que Daisy jamais deixaria transparecer.

— Enfim — Whitney prosseguiu. — É claro que eu tinha que ver o cara que estava fazendo minha garota sorrir daquele jeito, aí ela encontrou uma foto sua no casamento da Emmy.

— Eu passei no teste? — Lincoln perguntou, forçando os olhos de volta para a intrometida Whitney.

Ela apertou os lábios e agitou as mãos. — Você não estava nada mal. Em suma, pouco impressionante.

Ele riu, divertindo-se com ela. Divertindo-se consigo mesmo, percebeu.

— Quando devo colocar isso para assar? — Ele perguntou, inclinando a cabeça na direção dos pedaços de carne que havia temperado e que estavam prontos para serem colocados na churrasqueira de última geração.

— Ah, vamos esperar um pouco, sem pressa — Whitney falou e bateu a unha vermelha contra a taça de margarita. — Daiz, se eu beber outra dessa, posso passar a noite em um dos seus doze quartos de hóspedes?

Daisy mandou um beijo no ar para a amiga e levantou. — Claro que pode. Vou fazer outra rodada para nós e me certificar de que os lençóis do seu quarto estejam limpos.

— Isso mesmo, meu quarto — Whitney disse alto.

O sorriso de Whitney se desfez um pouquinho quando Daisy saiu. Ela passou um dedo sobre a orelha de Kiwi. — Sempre fico dividida entre odiar aquele desgraçado por deixá-la sozinha nesse lugar ou pensar que pelo menos ele foi bom para alguma coisa ao deixar essa mansão inteirinha para ela.

— Você não é muito fã do...? — Lincoln parou, percebendo que não se lembrava do nome do ex de Daisy.

— Gary — Whitney praticamente cuspiu.

— Você não gosta dele.

— Alguma melhor amiga gosta do homem que quebrou o coração de sua melhor amiga?

— Ele não a quebrou, no entanto — Lincoln respondeu suavemente.

— Não, não quebrou, e é legal da sua parte ter notado. — Whitney refletiu. — Mas às vezes acho que chegou muito perto de fazer isso, mais do que ela deixa as pessoas perceberem.

Lincoln apertou os dedos ao redor da garrafa. — Porque ele disse que não queria uma família e começou uma com outra pessoa?

O olhar de Whitney ficou afiado. — Ela te contou?

Ele levantou um ombro. — Eu compartilhei algo com ela, algo pessoal. Creio que ela tenha me contado na intenção de me deixar à vontade.

— Sim, ela é assim. Gosta de fazer as outras pessoas se sentirem à vontade. E sim, Gary engravidou a secretária, no mais cafona dos clichês, mas sempre tive a sensação de que isso foi só a gota d’água que fez o copo transbordar. Ela já estava bem diferente mesmo antes de descobrir isso.

— Diferente como? — Ele perguntou, dividido entre a culpa por se intrometer abertamente no casamento infeliz de Daisy e o desejo inabalável de saber mais sobre ela.

— Submissa. Calada. Inferno, ela ainda não voltou a ser a Daisy que era antes de ele colocar aquele diamante estúpido e enorme no dedo dela. Ela costumava ser o centro das atenções. Não tão barulhenta quanto eu, mas quase. Daisy está lentamente voltando a ser quem era, mas se reservando de uma maneira que nunca fez antes.

A porta dos fundos bateu. Whitney e Lincoln trocaram um rápido olhar – um acordo de que aquela conversa ficaria entre eles. Felizmente, Daisy estava ocupada demais carregando uma bandeja cheia para ter prestado atenção. — Ok, eu trouxe outra jarra de margarita, uma cerveja para Lincoln, um pouco de água, porque nenhum de nós tem 23 anos mais e hidratação é importante, e Lincoln, se não se importar em colocar essas batatas na grelha...

Mas ele já estava pegando a bandeja das mãos dela. — Calma, anfitriã. Sabe que não precisa fazer tudo sozinha, não sabe?

Ela olhou para cima, encontrou o olhar dele com aqueles delicados olhos castanhos cor de uísque, que o fazia pensar em drinques de mojito tomados na varanda em uma noite de verão.

Ele queria isso, percebeu.

Não a varanda, nem a bebida. Ela.

Então, ele balançou a cabeça.

Aquilo não era para ele. Nem a imagem que surgiu em sua mente, nem a mulher.

O celular de Whitney tocou – uma música country com a qual Lincoln não estava familiarizado. — Minha nossa — ela gritou. — Cliente com muito dinheiro ligando. Vocês se importam se eu atender?

Ela aceitou a ligação antes que Daisy ou Lincoln pudessem responder, estendeu a taça de margarita para ser reabastecida e saiu da varanda para circular pelo quintal de Daisy, conversando enquanto dava altas risadas ao celular e acompanhada por Kiwi, que seguia seus passos com adoração.

— Eu gosto dela — Lincoln falou, enchendo a taça de Daisy até a borda com mais margarita e depois tomando um gole da cerveja gelada que ela trouxe.

— É, ela é gente boa — Daisy concordou carinhosamente e gesticulou para a bandeja que trouxe. — Muito bem, dentro das batatas têm pasta de alho, só precisam assar, e já temperei os aspargos, não vão demorar muito para ficarem prontos, eles são bem finos e...

Lincoln agarrou a mão que ela gesticulava enquanto falava da comida. — Wallflower. Eu dou conta.

Ela levantou as sobrancelhas em desafio. — Você, garoto da cidade? Porque eu vi o seu apartamento. O fogão tinha uma aparência de nunca usado, o microondas, de usado com muita frequência e o seu celular tem três aplicativos diferentes de comida a delivery.

— Só porque não cozinho não significa que eu não saiba.

Daisy o encarou.

— Tudo bem — ele admitiu. — Eu não sei cozinhar. Nem um pouco. Mas assar coisas em uma churrasqueira é diferente.

— Como?

Ele flexionou o braço. — Sou homem.

Ela riu e mexeu um pouco o pulso. — Acha que pode me soltar agora?

Merda. Ainda segurava a mão dela. Ele a soltou imediatamente, sentindo o mais estranho desejo de pedir desculpas. E uma vontade ainda mais estranha de pegar a mão dela mais uma vez, puxá-la para frente e ver se ela tinha um sabor tão doce e picante quanto parecia...

O que havia de errado com ele? Lincoln Mathis não fazia o tipo “adolescente esquisito”. Inferno, ele havia passado os últimos dois anos sendo o cara que sempre se sentia perfeitamente confortável perto de mulheres – que aperfeiçoou a arte de deixá-las confortáveis ??perto dele.

Ele nunca pensou em Katie como uma rede de proteção, mas percebeu que era exatamente isso que ela tinha sido. Não somente isso, obviamente, mas porque seu coração estava cuidadosamente guardado e a lealdade fixada em apenas uma mulher, estar perto de outras era fácil.

Agora, Lincoln não tinha mais essa proteção e essa ausência era perturbadora. Pela primeira vez em cinco anos, desde que conheceu Katie, tinha permissão para reparar em outra mulher. Sua mente sabia que ainda era muito cedo, o coração gritando “nem fodendo, nunca mais...”.

Mas o corpo dele?

Seu corpo estava ciente de que fazia muito tempo desde a última vez que havia tocado uma mulher. Tocado de verdade.

Daisy apoiou o quadril magro no parapeito. Estava usando calça jeans escura, botas marrons na altura dos tornozelos e um suéter cor creme que parecia macio e caro.

— Você está bem? — Ela perguntou, estudando-o por cima da borda da taça.

Ele abriu a boca para soltar uma piadinha descontraída, mas, como sempre acontecia quando estava perto dela, a verdade escapou. — Às vezes eu queria gostar menos de você, Wallflower.

— Por quê?

Porque então eu colocaria minhas mãos em todo seu corpo, arrancaria o Band-Aid de dois anos de celibato e nós dois poderíamos nos afastar sem nenhum arranhão.

Mas ele gostava dela de verdade. E sua intuição dizia que se ultrapassassem esse limite, as coisas ficariam muito mais complicadas, de uma maneira que, no momento, eles não seriam capazes de lidar.

— Deixa pra lá — ela disse rapidamente, dando uma risada sem fôlego. — De alguma forma, estou tendo a impressão de que não vou querer saber.

Lincoln balançou a cabeça e tomou um gole de cerveja. Não. Ela não iria querer saber.

Ele abriu a churrasqueira, certificou-se de que estava pré-aquecida e colocou as batatas na grelha.

— Então, o que acontece agora para você? — Daisy perguntou, sabiamente deixando a primeira pergunta que fez passar sem respostas. — Como vai fazer para conseguir o material da matéria?

— Estou hospedado na sua casa de hóspedes há dois dias e você já está tentando se livrar de mim?

— Dificilmente — ela respondeu com um sorriso. — Só estou genuinamente curiosa sobre como vai funcionar.

— Bem — ele disse, fechando a churrasqueira para deixar as batatas assarem antes da carne e dos aspargos. — Preciso fazer várias entrevistas. Se não se importar, eu gostaria de alugar um pouco o cérebro de Whitney quando ela terminar a ligação. Acha que ela se importaria?

Daisy revirou os olhos. — Sinceramente? Ela iria adorar.

Lincoln imaginou que sim. — Achei que ela seria uma boa para começar, me ajudaria a ter uma ideia de como é o cenário de namoro aqui na cidade. O que as mulheres procuram, quantos encontros são necessários para selar compromisso, se marcaríamos mais pontos convidando-as para uma refeição caseira ou para um jantar fora espalhafatoso, e assim por diante.

— Você não me perguntou nada disso — ela acusou, tomando um gole da bebida.

Ele a olhou de relance. — Não achei que você estivesse ligada no mundo do namoro.

— Eu te disse que tinha ido a dois encontros — ela falou, a voz um pouquinho irritadiça.

— Sim. Dois — ele disse, dando um pequeno sorriso.

Ela não sorriu de volta. — Só porque não tenho encontros com tanta frequência quanto Whitney não significa que não quero arranjar alguém de novo.

Ele ficou um pouco surpreso ao ouvir aquilo. — Desculpa, Wallflower. Quando estávamos em Nova York, tive a impressão de que você meio que não mais acreditava em “felizes para sempre”.

Assim como eu.

Daisy depositou a margarita sobre o balcão ao lado da churrasqueira e virou-se para ficar de frente para o quintal, os dois braços apoiados no parapeito enquanto observava Kiwi perseguir Whitney, que ainda falava ao telefone. — Eu não sei. Funciono como ondas: às vezes sim, outras não. Tipo, na maioria das vezes, acho que não quero mais me submeter a esse tipo de sofrimento. Então, de repente, começo a me sentir como uma eremita entediada e digo a mim mesma para voltar a ativa. Mas estar na ativa é uma merda, e por isso volto a ser a mesma eremita. Todo esse processo me faz sentir meio... quebrada.

Ele mudou de posição, imitando a dela, a garrafa de cerveja pendurada entre os dedos enquanto os dois observavam o pôr-do-sol iminente, o barulho da conversa de Whitney se misturando agradavelmente ao som dos pássaros.

— Essa é a parte em que você deveria me dizer que não estou quebrada — ela acrescentou, cutucando o braço dele com o dela.

Ele tomou um gole de cerveja. — Bem, merda. Não sei se sou a pessoa certa para apontar o que está quebrado e o que não está. Mas vou lhe dizer uma coisa... não há nada de errado em estar confusa.

— Você está confuso? — Ela perguntou.

Claro que sim.

Em vez de responder, ele inclinou a cabeça para trás, imaginando quanto tempo levaria para as estrelas, que ela prometeu naquela noite em Nova York, ficarem visíveis no céu.

Ele gostou do lugar.

Apesar da perfeição exageradamente esculpida do jardim da frente, o quintal de Daisy era mais confortável. Havia uma piscina luxuosa, sim, mas a cascata proporcionava um fluxo constante de pequenas ondas, fazendo com que a água não parecesse imóvel e intocada.

Da mesma forma, as linhas do gramado perfeitamente aparado contrastavam lindamente com os ramos enormes de flores brilhantes que margeavam o quintal. Uma casa de passarinho amarela pendia de um galho de árvore e um banco pitoresco ao lado de uma fonte parecia o lugar perfeito para sentar e ler um livro em um dia quente de verão.

O quintal, mais do que qualquer outra coisa do imóvel, parecia Daisy. Como se fosse o único lugar que ela teve permissão para decorar ao seu modo. Ou talvez tenha sido a primeira coisa em que ela colocou as mãos quando se livrou do ex imbecil.

— Vamos fazer assim — ele continuou. — Que tal me acompanhar enquanto eu estiver trabalhando nessa maldita matéria?

— Está com medo de não conseguir lidar com nós, garotas do sul?

— Pode me proteger? — Ele falou, entrando na brincadeira.

Daisy riu. — Ah, por favor. Eu já te vi em ação. Você é a pessoa mais qualificada que conheço para desviar de atenção indesejada sem que ninguém se sinta rejeitado no processo.

— Venha para seu próprio bem então — disse ele. — Eu escrevo sobre mulheres, mas para homens. Sei como eles funcionam. Posso ajudá-la a evitar os ruins.

— Com que finalidade?

— A que você quiser. Não criaremos nenhuma expectativa além de ajudá-la a se sentir menos confusa.

— Por quê? — Ela perguntou, os olhos estreitados demonstrando ceticismo.

— Se quer dizer não, apenas diga, Daisy.

— Não — ela disse.

— Tudo bem, então. — Lincoln se endireitou, notando que Whitney havia terminado o telefonema e estava voltando para a varanda. — Em qual ponto preferem a carne?

— Digamos que eu te acompanhe — Daisy deixou escapar. — Você poderia me dizer como identificar os idiotas?

— Claro — ele respondeu com tranquilidade, abrindo a churrasqueira. — Alguma característica em particular que deseja evitar?

— Crueldade — ela falou baixinho. — Eu gostaria muito de evitar os homens cruéis.


Capítulo 16

— Tem certeza sobre o terno? — Lincoln perguntou quando Daisy deu uma olhada na variedade limitada de gravatas que ele trouxe para Charlotte.

— Positivo — ela respondeu, segurando uma listrada nas cores lilás e prata ao lado de uma toda preta, tentando escolher sua favorita.

Aparentemente, a preparação dele para o primeiro “encontro” em Charlotte havia se tornado um assunto a ser discutido em grupo, com Daisy escolhendo a gravata e Kiwi designando um par de meias como seu novo osso favorito. A cena não parecia nem um pouco esquisita e Lincoln se recusou a pensar sobre o porquê de parecer tão normal.

Era quarta-feira, um dia depois da ‘Terça-feira do Taco” com Whitney, que na verdade tinha sido uma “Terça-feira do churrasco”. Com carnes que, em sua opinião, ele preparou como um chef. Estavam no quarto principal da casa de hóspedes de Daisy, que tinha o dobro do tamanho do apartamento inteiro dele em Nova York.

Além de ter uma decoração melhor também. Como a maioria dos caras, Lincoln não se importava com coisas como enfeites de mesa e colchas de cama, mas tinha que admitir que o quarto era confortável. O chão era de madeira escura, decorado com um tapete verde claro. Os lençóis eram brancos, mas espessos e macios, o banheiro, bem equipado com um box de vidro, banheira de hidromassagem e penteadeira de mármore. Isso em um banheiro de hóspedes.

Daisy Sinclair era rica. Ou, pelo menos, o ex-marido era.

— Para ser preciso, não preciso ir de terno — disse Lincoln, virando-se para encarar o espelho de corpo inteiro. — Quero dizer, vou sair pela cidade a trabalho, mas não é realmente trabalho. Preciso me misturar.

— Você vai se misturar — Daisy garantiu. — O centro de Charlotte não é como o de um interior nos EUA, com uma única estrada e dois botecos. É uma cidade. Não tão grande como Nova York, mas grande o suficiente para que um homem de terno não se sinta deslocado às cinco da tarde de uma quarta-feira. Pelo menos não no bar que iremos.

— Então você decidiu me acompanhar? — Lincoln perguntou, terminando de abotoar a camisa branca.

Ela mordeu o lábio e sentou na cama. — Não sei. Não vai ser estranho?

— Bem, considerando que meus três encontros pré-arranjados são todos com amigas suas, acho que não. Será apenas eu conversando com elas. Perguntando o que buscam em um encontro.

— Elas não são minhas amigas, exatamente — Daisy esclareceu. — Estão mais para... amigas de amigas. Minhas amigas de verdade são todas casadas. Exceto Whitney, é claro.

Lincoln pensou ter ouvido um leve tom de tristeza na voz dela quando declarou aquilo – ou talvez fosse resignação. Ele quis lhe dizer que não era vergonhoso ter trinta e poucos anos e estar solteira, ou ser solteira em qualquer idade, mas ele supunha que, para Daisy, tinha muito menos a ver com o status civil e mais com o fato de ela se sentir só.

Ele conhecia muito bem a sensação de ser o “número ímpar” em um grupo de amigos.

Lincoln não sabia o que era pior – nunca ter a oportunidade de apresentar a mulher que amava aos melhores amigos ou ter amigos que o enxergassem desde sempre como parte de um casal, somente para ser deixado de lado no momento em que o relacionamento desmoronou.

— Essas suas amigas de amigas sabem que não é um encontro de verdade, certo? — Lincoln questionou, pegando o paletó pendurado na parte de trás da porta do armário.

— Hum.

Ele parou. — Daisy.

— Eu falei pra elas que seria mais como um encontro grupal, estilo “The Bachelor”.

— Um o quê?

— Você sabe. Um cara, várias garotas...

— Uma orgia?

Ela riu. — Não fique tão esperançoso. Não, só... confie em mim. Vai ser bom. Divertido, até.

— Eu confiaria mais em você se aceitasse ir comigo — ele retrucou.

Daisy sorriu e colocou a gravata preta de volta na mala de viagem dele, aparentemente tendo optado pela de listras lilás e prata. — Lincoln Mathis, você está nervoso?

— Sobre?

— Sobre a possibilidade de se dar mal conosco, garotas da Carolina do Norte. Você tem medo que seu charme nova-iorquino não funcione aqui.

— Eu sei que não vai funcionar — ele admitiu, encontrando os olhos dela no espelho.

— Como assim?

Ele observou quando ela se levantou e caminhou em sua direção. Então, virou-se para encará-la. — Porque exceto por Whitney, que ainda não conheço direito, conheço duas mulheres muitíssimo parecidas da Carolina do Norte, e nenhuma das duas está interessadas no lendário charme Mathis. A primeira nem sequer me notou, estava envolvida demais com meu chefe. A outra...

Ela levantou as sobrancelhas. — A outra?

— A outra me jogou na friendzone no momento em que me viu.

— Sorte a nossa — replicou Daisy, sem se preocupar em negar o que ele havia dito. — Considerando que você está indisponível.

Indisponível.

No presente.

Ela não disse que ele estava indisponível, no pretérito.

Lincoln supôs que deveria se sentir aliviado por ela pensar nele assim. Porque ele estava indisponível. Ainda se sentia muito afetado pela perda de Katie para sequer pensar em começar algo com Daisy ou alguém, mas não podia negar a onda de descontentamento que passou por ele ao ouvir aquela rejeição rápida.

Mas então ela se aproximou dele e, antes que ele pudesse registrar suas intenções, amarrou a gravata no pescoço dele, aproximando-se ainda mais quando os dedos rápidos e hábeis puxaram a peça em um perfeito nó de Windsor.

Então Daisy congelou, e ele percebeu que ela estava tão surpresa com o que havia feito quanto ele.

— Sinto muito — disse ela, o olhar fixo na gravata. — Eu só... é o hábito. Eu costumava...

As mãos de Lincoln subiram, descansando gentilmente nos cotovelos dela, querendo acalmá-la. — Não estou reclamando, Wallflower. Você deu um nó melhor do que eu mesmo daria.

Ela soltou uma risadinha. — Você nem viu ainda.

— Não, mas já observei o jeito com que faz tudo. Você é perfeccionista.

— Eu não costumava ser.

Foi uma resposta estranha. A maioria das pessoas ou eram altamente organizadas ou não eram. Rigorosas ou não. Ninguém aprendia a ser perfeccionista, era algo que vinha desde sempre.

Ou não?

Ele ordenou a si mesmo que a soltasse e desse um passo para trás, mas suas mãos não se moveram. Bem lentamente, o olhar dela viajou para um ponto acima do nó da gravata e, no segundo em que seus acolhedores olhos castanhos se fixaram nos dele, ele sentiu uma onda de desejo tão forte que quase o deixou sem fôlego.

Solte-a. Solte-a.

Em vez disso, suas mãos a puxaram para mais perto e ele abaixou a cabeça.

Daisy ofegou e se afastou.

Ele a soltou, embora a sensação fosse a de que levou uma fração de segundo a mais do que deveria para os dedos obedecerem ao cérebro.

Merda. Caramba.

Lincoln se virou para o espelho, fingindo checar o nó que ela deu, tentando disfarçar o fato de que a parte inferior de seu corpo estava absurdamente consciente da presença de Daisy.

Concentre-se na gravata, concentre-se na gravata...

Como esperado, o nó estava perfeito, embora ele tenha levantado a mão para afrouxá-lo um pouquinho. Afinal, não estava no trabalho. Não de verdade.

— Venha comigo esta noite — disse ele de novo, mantendo a voz casual e o olhar fixo no próprio reflexo. — Vamos jantar juntos depois que eu conversar com suas amigas.

Daisy não disse nada e ele olhou por sobre o ombro, encontrando-a mordendo o lábio. Ela queria. Ele podia ver na maneira como os olhos dela se iluminaram e depois escureceram.

— Não posso.

Não pode ou não quer?

— Wallflower...

— Esse apelido realmente não se encaixa comigo — ela interrompeu. — Você me viu uma vez quando aconteceu de eu estar perto de uma parede, mas não significa que sou do tipo que se esconde pelos cantos.

— Espera, o quê? Eu nunca disse...

— Eu não tenho medo — disse ela, um pouco desesperada. — De me expor.

Mas o jeito que ela girou os calcanhares e quase fugiu do quarto deixou claro que estava mentindo. Daisy tinha medo de alguma coisa. De alguém?

A constatação deixou Lincoln furioso de um jeito que há muito, muito tempo não ficava.


Capítulo 17

— Então, em que momento vou saber para onde estou indo? — Lincoln perguntou.

— Em breve — disse Daisy, levantando um dedo para apontar. — Vire à direita logo ali.

— Aquilo é um estacionamento.

— É mesmo? Tem certeza de que você não trabalha para a CIA? Suas habilidades de observação são aguçadas.

— Tem certeza de que você não canalizou esse sarcasmo através do cordão umbilical? Porque sua irmã gêmea tem a mesma língua afiada.

Ela deu um sorriso atrevido, aliviada pela interação esquisita que tiveram noite passada não ter afetado, bem... eles.

Daisy não tinha certeza do que havia acontecido com ela. Em um momento, estava vendo se ele precisava de alguma coisa antes de sair para passar a noite fora, no outro, estava dando um nó na gravata dele, como uma esposa com o marido.

Foi humilhante. E o fato de ter parecido tão certo também fora altamente preocupante. A ideia de jantar com ele, de sentar-se do outro lado da mesa como se fossem... o quê, um casal?

Porque amigos não davam nó na gravata do outro.

Mas então ele tornou as coisas ainda mais confusas. Por um segundo, ela pensou que ele queria puxá-la para mais perto. E beijá-la.

Esse pensamento a manteve acordada metade da noite, dividida entre o pânico por ter quase acontecido e o desapontamento por não ter.

Ela se agarrou à esperança. Esperança de que ainda conseguissem se sentir confortáveis um com o outro.

E, felizmente, naquela manhã, quando ele veio à casa principal para convencê-la a fazer o café (que, é claro, ela já planejava fazer), as coisas pareciam ter voltado ao normal. Não houve nenhuma sensação estranha implícita, nem tensão.

Ela perguntou como havia sido o “encontro”, ele disse que foi ótimo, e fim. E mesmo que talvez ela quisesse saber mais alguns detalhes, que estivesse curiosa para saber se alguma das mulheres o intrigou, Daisy não perguntou. E ele não prolongou o assunto.

Ela estava determinada a fazê-los voltar ao normal, como se a noite passada nunca tivesse acontecido. Continuar sendo a amiga que ele precisava era importante para ela.

— Hum, me diga que não estamos em um estacionamento do Walmart — disse ele.

— Caramba, retire o que eu disse sobre você trabalhar para a CIA. Sim, Lincoln, é um estacionamento do Walmart. Pare na primeira vaga que achar.

— Isso é loucura — ele murmurou.

— Você deveria ver como fica em dias de sábado. Olha ali. Um cara acabou de colocar uma espreguiçadeira na picape dele, está prestes a sair.

Lincoln acionou a seta e esperou pela vaga. — Puta merda, quanto papel higiênico — ele falou, observando com admiração uma família de quatro pessoas empurrar um carrinho cheio em direção ao carro.

Ela olhou também. — Mais ou menos. É uma quantidade normal.

— Não. É uma tonelada de merda de papel higiênico, e o trocadilho foi intencional.

— É por isso que as pessoas vêm aqui — ela falou. — As coisas são baratas, especialmente quando se compra por atacado.

— Que ótimo. Mas, sendo uma família formada por um membro e um hóspede temporário, o que estamos fazendo aqui? — Ele perguntou, estacionando no local desocupado pela picape azul.

— Digamos que há uma razão pela qual eu lhe disse para trazer seu bloco de anotações e iPad.

— Você acha que vou usar isso como parte da minha pesquisa?

— Ah, eu sei que vai — ela garantiu, se virando e puxando uma bolsa enorme do banco traseiro. — Olha, ontem à noite você conheceu o que eu chamaria de grupinho do clube de campo privado. Composto por mulheres com penteados elegantes que tomam o vinho Chardonnay mais caro no almoço. Elas não são diferentes da elite da Park Avenue. Sabe a Melody? Ela tem um funcionário encarregado de fazer as compras dela. E a Rachel? Tem um cabeleireiro pessoal que vai na casa dela três vezes por semana.

— Sim, eu notei que elas cheiravam a dinheiro — disse ele.

— Assim como eu?

Ele sorriu. — Assim como você.

— Mas — disse Daisy, erguendo um dedo. — Nós, garotas do sul, somos multifacetadas. Em Nova York, você sabe que precisa lidar com uma bartender sexy de modo diferente com que lidaria com uma princesinha chique da Park Avenue, assim como não falaria com uma estudante da Columbia do mesmo jeito que falaria com uma advogada competente...

— Espera aí. Uma estudante da Columbia? Eu não sou um tarado.

Daisy acenou com a mão. — Estudante de graduação, tanto faz. Você entendeu.

— Que mulheres diferentes requerem métodos de sedução diferentes, sim, entendi. Agora me explique porque estou do lado de fora de um Walmart pela primeira vez na vida.

Ela o encarou.— Você nunca entrou em um Walmart?

Ele levantou os ombros. — Nasci e cresci no Tribeca. Sou um cara da cidade, dos pés a cabeça. Não existe Walmart em Manhattan.

— Caramba, essa lição será ainda mais importante do que eu pensava. Ok, saia do carro — disse ela, apontando para a maçaneta da porta do motorista enquanto abria a dela, saindo em direção à luz do sol de outono.

Ele obedeceu, começando a dar a volta na parte de trás do carro, mas voltou quando ela apontou para o capô. — Ok, o que vamos comprar?

— Nós não vamos comprar nada — ela respondeu, remexendo na bolsa até encontrar a toalha de mão de cor branca que guardava na pilha de trapos da lavanderia.

Ela deu um passo à frente, enfiou a toalha no cós da calça jeans dele e recuou, inclinando a cabeça e assentindo em aprovação.

Lincoln olhou para baixo. — Hum...

— Ok, agora abra o capô.

Ele olhou para ela. — Como é?

— O capô. Do carro. Se não souber como, talvez eu possa encontrar um tutorial no YouTube...

Ela começou a enfiar a mão na bolsa para pegar o celular, mas ele praticamente rosnou para ela antes de virar em direção ao carro e puxar uma alavanca que fez o capô abrir com tudo.

— O que há de errado com o carro? — Ele perguntou. — O que devo consertar?

Ela deu de ombros. — Não sei. Invente alguma coisa.

Lincoln virou-se e lançou-lhe um olhar incrédulo. — Então esse é o seu grande plano?

Ela suspirou. — Olha, a maioria das mulheres não admite, mas elas adoram um mecânico. Um cara que sabe como mexer no capô de um carro, bem... também sabe como mexer em outras coisas.

O olhar dele se estreitou. — É mesmo?

— Sim.

— Por isso você me fez usar jeans e camiseta. Para servir como um maldito uniforme.

— Sim. E a toalha é o acessório perfeito. Veja se não consegue um pouco de graxa em algum lugar aí. Suje um pouco as mãos e limpe-as na toalha. Vai ter que fazer as pessoas acreditarem.

— Acreditarem no quê? Em problemas falsos no carro?

— Só... — Ela soltou um suspiro. — Pode confiar em mim nessa parte? Um cara vestindo uma camisa branca muito apertada...

— É uma camiseta. Do tipo que nunca pretendi exibir em um estacionamento do Walmart.

— Um cara em uma camisa branca muito apertada — ela continuou como se ele não tivesse a interrompido. — Esticada sobre um peito largo, dono de bíceps bem grandes e com a cabeça sob o capô de um carro, um pouco suado, meio despenteado, bastante habilidoso.

— Falando assim, você parece um cafetão.

— Vai me agradecer quando as gatinhas chegarem rastejando e você tiver conseguido um lote inteiro de anotações fresquinhas para a sua matéria.

Ele olhou para ela. — E o que você vai fazer durante esse tempo? Sua presença aqui não vai atrapalhar minha jogada?

— Sim. É por isso que estarei lá dentro.

Ela apontou o polegar para a loja gigante.

— Comprando o quê?

— Papel toalha. Produtos de limpeza. Absorventes — ela acrescentou para garantir que ele não tentasse segui-la.

Ele se encolheu, como ela sabia que faria. Lincoln poderia ser evoluído, mas ainda era um homem.

— Não se preocupe — disse ela docemente. — Vou demorar. Queria ter pensado em trazer um borrifador. Poderíamos fazer meio que um suor falso, deixar a coisa toda mais real.

— Juro por Deus, Daisy...

Ela recuou alguns passos, porque ele parecia prestes a carregá-la em direção à porta do carro e empurrá-la para dentro. — Boa sorte!

— Wallflower... Daisy!

Ela girou os calcanhares, entrando rapidamente na segurança da loja.

Ela sempre amou o quê de anonimato do Walmart. Era tão grande e ninguém te olhava duas vezes lá dentro. Você poderia ficar andando pelos corredores por horas e ninguém sequer saberia. Será que não havia um livro, filme ou qualquer coisa sobre uma mulher que vivia no Walmart?

Não era difícil de imaginar. A loja parecia ter literalmente de tudo.

Como prometido, Daisy demorou. No corredor de cosméticos, principalmente. De um modo geral, ela preferia maquiagem de alta qualidade encontrada em galerias comerciais, mas sempre teve uma fraqueza por esmaltes. Adorava uma unha bem feita, mas odiava o processo de sentar e pagar para fazê-las profissionalmente quando havia tantas opções de produtos para fazê-las por conta própria.

Aparentemente, a cor azul estava na moda. Ela ficou em dúvida entre uma dúzia de tons variando do azul-marinho ao pastel antes de optar pelo clássico e pegar um esmalte de cor vermelho escuro profundo que parecia perfeito para o outono.

Em seguida, pegou o pacote de absorventes – ela realmente estava precisando – e foi para a seção de livros. Daisy costumava ler em e-book, mas, para os banhos de espuma ocasionais, achava melhor as versões físicas, para evitar derrubar aparelhos tecnológicos e eletrônicos dentro da banheira.

Ela colocou três livros no carrinho. Um sobre o casamento falso de um bilionário, outro sobre um prefeito gostoso que se envolvia com uma bombeira e o último sobre uma cantora de Nashville que se mudava para O Meio Do Nada, Louisiana, para transar com um bad boy.

Por fim, ela foi para a seção de produtos para a casa, manobrando um pacote enorme de papel toalha para dentro do carrinho, seguido por seu produto de limpeza multiuso favorito com fragrância de maçã.

A fila do caixa estava grande, o que deu a Lincoln ainda mais tempo de usar a magia dele com as mulheres, então, quando Daisy finalmente tirou o carrinho da loja, se preparou para encontrá-lo cercado por companhia feminina.

Ela estava certa.

Daisy balançou a cabeça, perplexa, ao encontrar não somente uma mulher, mas três. Havia uma garota que não parecia ter mais que 23 anos, vestindo minúsculos shorts jeans inapropriados para o clima, uma mulher mais velha em uma regata que deixava os seios bem à mostra e uma da idade de Daisy que parecia, bem... simpática.

Então, a loirinha de short curto se moveu para o lado e Daisy teve uma visão de Lincoln. Os passos dela vacilaram, a respiração falhou.

Até aquele momento, não havia percebido que, quando disse que algumas mulheres tinham uma queda por caras bancando o mecânico, aparentemente estava falando de si mesma.

Daisy sempre se considerou o tipo que preferia ternos italianos e camisas polo a jeans e camisetas justas, mas vendo Lincoln agora, exalando aquela vibe de “faz-tudo”, ela percebeu.

Os braços musculosos estavam um pouco mais brilhantes, como se ele tivesse aceitado o conselho dela e dado um jeito de parecer suado. Ela observou enquanto ele limpava uma mão manchada de óleo na toalha pendendo ao longo da coxa e ria de algo que a mulher mais velha dizia.

Estava perfeito. Ele era perfeito. Havia dominado brilhantemente a combinação de confiança e timidez – másculo o suficiente para estar ciente de que atraía mulheres com facilidade, mas modesto o suficiente para fingir que não estava preparado para receber toda essa atenção enquanto consertava o carro.

Santo Deus, ela havia criado sua própria kriptonita.

Daisy ordenou que os pés continuassem andando. Seu coração estúpido disparou quando ele a viu pelo canto do olho e abriu aquele sorriso enorme para ela.

— Oi, amor.

Daisy piscou. Amor?

Mas ele já estava se movendo na direção dela, pegando as chaves do bolso da calça jeans e apertando um botão para abrir o porta-malas. Antes que pudesse registrar a intenção dele, ele passou a mão pelas suas costas e pressionou os lábios nos dela.

Os dois congelaram.

Era para o beijo ser casual e falso – parte do papel que ele interpretava, ela sabia disso. Sabia que ele também estava ciente.

Mas não havia nada de casual ou falso na eletricidade que percorreu os dois. Os olhos dele procuraram os dela, parecendo tão desnorteado e frustrado quanto ela.

Então, ele deu um passo atrás e pegou o pacote de papel toalha.

Ele voltou a ser o Lincoln de sempre quando a olhou de um jeito que parecia dizer algo que ela imediatamente entendeu. Você me meteu nessa confusão com essas mulheres – agora dê um jeito de me tirar.

Daisy se forçou a pensar em algo. — Oi, querido, você consertou o carro?

Ela pegou uma das sacolas e parou, olhando para as outras mulheres como se só agora as tivesse visto. — Oh! Olá.

A mais velha havia desaparecido há muito tempo, tinha experiência suficiente à espreita para saber quando uma causa estava perdida, mas a Srta. Short-Curto e a morena permaneceram lá, como se esperassem que a conversa com Lincoln tivesse sido tão estimulante que o faria abandonar a namorada compradora de papel toalha por uma delas.

Lincoln entrou no jogo, olhando para as mulheres como se só então tivesse se lembrado de que ainda estavam lá. — Ah, certo. Daiz, essas são Holly e Melora.

— Olá! — Daisy disse com a voz perfeitamente simpática de uma mulher que estava segura de seu relacionamento e confiante de que seu homem não a trairia, não importava quão curtos os shorts fossem ou quão bronzeadas e tonificadas fossem as pernas das mulheres. — Sou a Daisy.

A garota mais jovem deu o mais falso dos sorrisos antes de encarar Lincoln com um último olhar sensual e seguir na direção da loja.

A outra mulher esbanjou uma expressão doce e sorriu para Daisy, mesmo que o olhar cheio de desejo e esperança tenha se voltado imediatamente para Lincoln. — Prazer em conhecê-lo, Lincoln. Muito obrigada pelas dicas sobre carro.

— Não foi nada, foi um prazer ajudá-la.

A mulher conseguiu dar um sorriso antes de puxar as chaves do carro de dentro da bolsa e caminhar pela fila de automóveis, em direção ao dela.

— Você deu mesmo dicas? — Daisy perguntou, largando uma sacola no porta-malas.

— Eu disse as palavras motor, cinto e torque, então definitivamente sim. Acha que eu deveria ter cobrado?

Ela riu. — Não vou mentir, isso meio que funciona pra você.

— O quê? — Ele perguntou, agarrando a última sacola e a jogando no porta-malas. — Falar de carros, né? Você gosta, Wallflower? Seus motores aceleram?

Ela riu. — Poupe-me. Mas admita que eu estava certa — disse com um sorriso exultante. — Essas mulheres caíram direitinho no papel de "homem comum bancando o mecânico" que você interpretou. Não se preocupe. Não vou esfregar na sua cara.

— Não se preocupe, eu também não vou esfregar na sua — ele retrucou com um sorriso quando ela fechou o porta-malas.

— Esfregar o quê?

Ele se inclinou para frente, aproximando-se, mas não de um modo que a deixasse desconfortável. — Que esse seu plano saiu pela culatra. Essa coisa toda da toalha suja presa no cinto também satisfaz você, não é?

Lincoln deu uma piscadela e caminhou para o lado do motorista, e Daisy ficou dividida entre ficar impressionada por ele tê-la lido tão bem ou envergonhada por ter sido pega.


Capítulo 18

No sábado à noite, Daisy estava um pouco surpresa com a rapidez com que a semana passou. E um pouco triste que a estadia de Lincoln em Charlotte estivesse quase na metade.

Eles haviam estabelecido uma rotina agradável juntos. Confortável, mas nunca entediante. Apesar de ter uma cafeteira na casa de hóspedes, ele ia para a casa principal todas as manhãs depois que Kiwi fazia as necessidades matinais dela.

Juntos, tomavam café – com bastante leite e açúcar para os dois – e ela apreciava a oportunidade de ter alguém para elogiar suas evidentes e impressionantes habilidades no preparo de omeletes.

Depois, iam para a academia. Daisy conseguira um passe de entrada para convidados; e eles se exercitavam por uma hora antes de voltar para casa e tomar banho.

Depois disso, Lincoln ia para o local de trabalho improvisado que havia montado no balcão da cozinha da casa de hóspedes e Daisy fazia suas atividades de costume: ficar de bobeira pela casa, fazer compras, tomar café ocasionalmente com Whitney. Ela levou almoço para ele duas vezes, mas quase não o incomodava durante o dia, não querendo que ele pensasse que ela era do tipo “recatada e do lar” com nada melhor para fazer do que preparar frango assado todos os dias para um homem.

Exceto que... ela não tinha nada melhor para fazer, e se dar conta disso foi terrível.

Daisy nunca estivera tão ciente de quão entediada havia ficado com a própria vida quanto agora: nesses momentos em que encontrava Lincoln absorto no que escrevia ou falando ao telefone, ou mesmo jogando uma bola para Kiwi, que ia atrás do brinquedo cerca de 2% das vezes.

Daisy não tinha um cachorro. Não tinha filhos. Nem emprego. Ela sequer tinha alguém para telefonar, exceto por Emma e Whitney.

No ano em que o processo do divórcio foi oficializado, ela gastou tanta energia desfrutando da própria companhia, aproveitando a nova vida sem Gary, que não notou a monotonia e a solidão chegando. Não havia percebido que, quando finalmente começasse a se sentir segura outra vez, a sensação de falta de objetivo estaria à espreita.

O dia em que Daisy percebeu que havia se casado com um monstro foi o pior momento de sua vida.

Mas isso – a constatação de que não tinha nenhum propósito – foi o segundo pior.

E era por isso que ela estava usando um vestido de festa vermelho, sentada ao balcão do bar luxuoso de uma churrascaria em Charlotte, ao lado de Lincoln Mathis.

Ele estava de terno hoje e, embora ela pensasse que a própria libido havia se recuperado daquela coisa da “camiseta e calça jeans” no Walmart, precisava admitir que o traje que ele vestia agora provocava um retrocesso na doença que ela nomeou como “sede de Lincoln”.

Era hora de reconhecer que o homem podia usar uma fantasia de palhaço e ainda assim ficar gostoso. Ele não estava de gravata esta noite, usava somente um terno preto sobre uma camisa cinza clara, aberta na garganta e deixando um perfeito pomo de Adão em exibição.

Oh, Deus.

Começar a cobiçar o pomo de adão de um homem era a prova de que você estava ferrada.

Ainda assim, estava feliz por ter deixado que ele a convencesse a vir junto. Ele saiu sozinho todas as noites semana passada e, embora não tivessem conversado sobre os detalhes, obviamente havia conseguido muito material para fazer o trabalho dele, visto que passava o dia inteiro escrevendo.

Ela não parava de se perguntar se alguma “pesquisa” dele envolvia o tópico nudez. Tecnicamente, ele estava disponível agora. E, por mais que estivesse bastante certa de que o coração de Lincoln ainda não havia se curado, ele não seria o primeiro homem a buscar sexo sem compromisso.

Esta noite, porém, ele a convidou para jantar. Disse que queria agradecê-la por todas as refeições da semana que se passou e tirar uma folga do trabalho.

Daisy quis dizer não.

E, no entanto, aqui estava ela.

— Tem certeza de que quer sentar no bar? — Lincoln perguntou. — Parece que eles têm algumas mesas disponíveis.

— Não, aqui está ótimo — ela respondeu, pegando a taça de espumante.

Se eles sentassem um de frente ao outro em uma mesa, seria como um encontro. No balcão do bar, ela podia se lembrar do que os dois realmente eram: amigos tomando bebidas caras.

— Você não está bebendo Jack Daniel’s — ele observou, acenando com a cabeça para a taça sofisticada que ela segurava. — Isso significa que não haverá striptease mais tarde?

— A noite é uma criança, Mathis. A noite é uma criança. Além disso, você tem uma admiradora entusiasmada à sua esquerda.

Ele nem olhou na direção mencionada quando ergueu a taça de Manhattan e tomou um gole. — Eu sei.

Daisy riu da confiança natural.

Para a surpresa dela, ele não riu de volta.

Ela ficou um pouco séria enquanto pensava naquilo.— Acho que deve ter sido estranho para você, em Nova York. Estar noivo, mas sem a feliz promessa do “grande dia”. Nunca te ocorreu simplesmente dizer às pessoas que não estava disponível?

— Sim, o tempo todo. Mas isso teria trazido perguntas que eu não estava preparado para responder. Acho que fui um covarde.

Ela colocou uma mão no braço dele. — Você estava protegendo-a.

Ele balançou a cabeça e olhou para a bebida. — Acho que não. Eu estava me protegendo. Criando escudos contra o olhar de pena que eu sabia que receberia até dos amigos mais bem-intencionados. Mas olhando para trás, acho que foi mais porque não queria pensar sobre. Atitude terrível, não? Tentei empenhadamente evitar pensar na mulher que amava.

— Porque era doloroso.

Lincoln passou as mãos pelo rosto. — Desculpe. Acho que estou sendo uma companhia de merda essa noite.

— Por favor, não peça desculpas. — Ela apertou o braço dele com os dedos e ele a surpreendeu ao colocar uma mão sobre a dela e apertar de volta, como havia feito no carro naquele dia, depois que a levou para ver Katie.

— Hoje é o aniversário do dia em que a pedi em casamento.

O peito dela se apertou. — Ah, Lincoln.

Ele deu um sorriso triste. — Acho que eu esperava que um jantar fora, um coquetel forte e um lombo mal-passado fosse servir como distração, mas minha cabeça está... me desculpe.

— Talvez... — Ela mordeu o lábio e interrompeu a própria fala, não querendo passar dos limites.

Ele virou a cabeça e a olhou. — Estou aberto a receber conselhos.

— Talvez seja hora de se permitir pensar nela — Daisy disse de uma vez só. — Talvez tenha deixado todas as coisas ruins de lado por muito tempo e agora seja preciso colocá-las para fora.

Ele tomou um gole do coquetel antes de se virar e olhar para frente, perdido nos próprios pensamentos. — Tipo uma sessão de terapia?

— A vida te deu um golpe enorme, Lincoln. Talvez possa começar falando com um amigo.

Ele movimentou os ombros largos de forma inquieta sob o terno. — Uma amiga como você, você quis dizer.

— Me considero sua amiga, sim — ela admitiu com um pequeno sorriso, afastando a mão do braço dele para tomar um gole do champanhe. — Mas, independentemente, isso tudo que você está reprimindo vai acabar explodindo algum dia.

— Não parece certo — ele murmurou. — Falar sobre uma mulher enquanto janto com outra.

— Se isso fosse um encontro, eu poderia até concordar, mas não é.

— É difícil lembrar disso com você vestida assim — ele resmungou.

A mão de Daisy vacilou quando ela colocou a bebida de volta no balcão, se perguntando se ouviu corretamente. — Isso foi um elogio?

O canto da boca dele se inclinou para cima. — Não precisa jogar um verde. Você sabe que está gostosa pra caralho nesse vestido. Platonicamente falando. Claro.

Claro.

— É lindo, não é? — Ela decidiu bancar a tímida, sedutora e inocente. — Comprei por impulso meses atrás, depois de um almoço cheio de taças de vinho com Whitney. Gosto de como é todo trabalhado na frente, com essa gola alta, mangas compridas e esvoaçantes, mas a parte de trás...

— Que parte de trás?

Daisy riu. — Exatamente.

— É uma pena deixar tudo isso ser desperdiçado — ele comentou. — O cara do outro lado do bar está olhando para você.

Daisy começou a procurar quem, mas Lincoln emitiu um barulho baixinho, em aviso. — Caramba, mulher. Não desse jeito. Cadê a sua habilidade com flertes?

— Meu ex-marido matou.

Ele virou a cabeça, mas ela não olhou para ele, as bochechas queimando. — Sinto muito. Eu não... você disse que precisava falar sobre si mesmo, e aqui estou eu falando sobre mim e...

Foi a vez dele de pegar a mão dela e apertar suavemente. — Que tal fazermos isso juntos? Ajudar um ao outro? Vou começar. Meu nome é Lincoln Mathis e hoje é o aniversário do dia em que pedi minha namorada Katie em casamento enquanto estávamos em uma pousada em Cape Cod. Sinto falta da garota que ela era e, mais que isso, lamento o quão distante essas memórias pareçam. Sua vez.

Daisy respirou fundo. Que mal tinha? — Meu nome é Daisy Sinclair e morro de medo que o idiota do meu ex-marido tenha arruinado tudo de bom que havia em mim.

— Impossível — ele respondeu, apertando a mão dela mais uma vez, mas logo afastando os dedos, como se soubesse instintivamente que ela só gostava de ser tocada nas próprias condições. — Você é a melhor pessoa que conheço.

Ela revirou os olhos ao ouvir a hipérbole dele.

— Estou sendo sincero — ele garantiu em voz baixa. — Às vezes, acho que... não sei. Acho que você é a razão de eu ainda estar de pé.

— Nós mal nos conhecemos.

— Mentirosa — ele retrucou suavemente.

— Você já se perguntou o que é preciso ser feito para chegar à conclusão de que é hora de enfrentar a vida outra vez? — Ela perguntou, brincando com o guardanapo. — Tipo, como você sabe que está dando a si mesmo tempo para se recuperar, e não só vivendo no passado?

— Boa pergunta, mas não sei a resposta. Não sou a pessoa certa para responder isso. Talvez seja uma questão de intuição.

Ela olhou para ele. — O que sua intuição está lhe dizendo?

Ele encontrou os olhos dela com firmeza. — Que não lidei com a perda de Katie como deveria pela primeira vez, depois do acidente, muito menos quando ela me deixou pela segunda vez. Não estou nem perto de estar pronto para isso. Não sei se algum dia estarei.

Daisy sentiu uma pontada aguda e melancólica na boca do estômago. Ela queria dizer-lhe que ele era um homem bom demais para ficar sozinho, mas uma parte dela entendia. Amar alguém dessa forma e depois perder a pessoa...

— E você? — Ele perguntou. — O que sua intuição está dizendo?

Daisy se moveu lentamente até os olhos estarem na direção do homem loiro no outro lado do balcão, que de fato parecia observá-la entre algumas olhadas para Lincoln, como se tentasse descobrir o que eles eram um para o outro.

Apenas amigos, ela queria dizer. Definitivamente apenas amigos.

Mas ela queria mais, e isso estava começando a assustá-la.

O loiro era bonito. Vestia uma camisa social preta dobrada até os cotovelos. No maxilar rígido, havia alguns fios dourados, talvez um tanto avermelhados, embora talvez fosse por causa da pouca iluminação do bar.

A ideia de voltar a namorar era assustadora como o inferno, mas Daisy estava se dando conta de que ela e Lincoln não eram tão parecidos quanto ela se permitia acreditar. Ele agia cautelosamente por causa do amor. O amor dele por Katie ainda tinha poder sobre ele.

Ela se segurava em razão de ressentimento e medo. Por conta da raiva que sentia de um casamento que deu terrivelmente errado. Katie era digna do sacrifício de Lincoln.

Gary não era nem um pouco digno do dela.

— Certo — ela falou, levantando a taça e inclinando o restante da bebida para dentro da boca em um gole de coragem. — Vamos lá.

— O quê?

— Diga-me como conseguir o número daquele cara.

Lincoln observou, do outro lado do bar, a cabeça de Daisy inclinada para trás, a garganta lisa em exibição enquanto ela ria de algo que o outro homem disse.

Que pequena mentirosa.

De jeito nenhum ela precisava do conselho dele sobre como conseguir o número de um cara. Daisy conseguiu prender o outro homem na palma da mão desde o segundo em que caminhou em sua direção, o olhar do cara quase a devorando.

Mesmo que Lincoln tivesse odiado o outro homem, não podia culpá-lo. Daisy naquele vestido era a personificação do pecado. Como ele não havia notado antes que as pernas dela eram tão longas? Que a pele era tão bronzeada? Que os braços tinham a definição perfeita?

Lincoln soube no segundo em que a viu que Daisy era bonita. Linda, na verdade. Ele sabia porque Emma também era.

Hoje à noite, Daisy estava gostosa.

Gostosa de um jeito que Emma nunca havia estado, não aos olhos dele. Ele sempre viu a irmã gêmea de Daisy sob um olhar estritamente platônico, mas os pensamentos que estava tendo sobre Daisy agora não eram nada platônicos.

Certamente não estava com ciúmes. Lincoln não era um cara ciumento.

Mas a sensação quente e ácida no estômago não era familiar para ele.

Assim como a necessidade de socar algo. Especificamente, o rosto ordinário do cara que sorria para Daisy agora.

Lincoln tomou outro gole da bebida, observando com olhos semicerrados o homem pegar o celular de Daisy, sem dúvida para salvar o número de telefone.

Seus olhos se estreitaram ainda mais quando viu que, apesar do sorriso cativante de Daisy, ela moveu os dedos antes que o outro homem pudesse fazer um contato “mão a mão” mais casual possível.

Interessante.

Preocupante.

Uma mulher tão experiente em flertar quanto Daisy aparentemente saberia o poder de deixar os dedos roçarem contra um homem, para ver se haveria alguma faísca no toque.

Minutos depois, a suspeita de Lincoln aumentou um pouco quando o outro homem passou a mão pela parte de trás da cadeira de Daisy e, em resposta, ela arrastou o corpo para a frente no banco acolchoado.

Foi um movimento discreto. Ela pegou a bebida ao mesmo tempo, fazendo o ajuste parecer acidental, mas Lincoln tinha certeza de que havia sido de propósito.

Daisy não gostava de ser tocada.

Como não percebeu antes? Ele sabia que havia algo de errado, algo obscuro escondido no passado dela, mas isso...

A mente de Lincoln foi fisgada por uma onda de especulação e raiva, mas talvez a reação mais alarmante de todas?

Necessidade.

A necessidade de consertá-la, ajudá-la, cuidar dela, de fazê-la ver que ela não precisava ter medo de nada, nunca mais.

Ele bebeu o resto da bebida, tentando apagar esse pensamento.

Daisy Sinclair não era dele, e ele não tinha o direito de consertá-la.


Capítulo 19

Ela tinha gosto de mel e especiarias, e ele não conseguia parar.

As unhas dela cravaram em seus ombros quando ele deslizou a boca sobre o peito dela, lambendo a curva lateral do seio antes de sugar um mamilo rosa e doce.

Daisy choramingou, arqueando-se contra o corpo dele, e ele deslizou as mãos sob as costas dela para trazê-la para mais perto, sentindo de imediato que a pele dela estava quente e úmida de desejo.

Ela gemeu o nome dele em um tom suave e carente, e ele estava convencido de que nunca ouvira nada tão doce quanto a palavra “Lincoln” sussurrada naquele sotaque rouco.

Ela enroscou os dedos nos cabelos dele, puxando-o para longe dos seios deliciosos para aproximá-lo mais uma vez de sua boca.

Lincoln aprofundou o beijo como se quisesse afundar nela, reivindicando cada canto da boca de Daisy com a língua. Ela puxou o lábio inferior dele entre os dentes, mordiscando apenas o suficiente para provocar um rosnado, e depois amenizou a mordida de modo provocante com a língua.

Foi o suficiente. Fazia tanto, tanto tempo que ele...

Lincoln deslizou a mão pelo abdômen dela, saboreando a sensação de tocar aquela pele macia e curvas suaves, e afastou suas coxas nuas. Os dois gemeram quando ele a encontrou quente e molhada. Os dedos dele acariciaram as dobras macias dela antes de tomar-lhe a boca de novo e deslizar o dedo médio dentro dela, que gemeu mais alto e se apertou ao redor do dedo dele.

Daisy se contorceu embaixo de Lincoln enquanto ele a aproximava do clímax repetidas vezes, fazendo movimentos circulares com o polegar ao mesmo tempo em que enfiava os dedos, parando antes de ela gozar.

Ela mordeu o ombro dele, frustrada. — Agora.

Os olhos dele se fecharam. Agora. Agora.

Aquilo era certo. Sempre foi certo. Sempre foi ela.

Ele se colocou entre Daisy quando ela abriu as pernas, os corpos quentes e cobertos de suor alinhados perfeitamente.

Lincoln colocou as mãos em cada lado do rosto dela, fixando o olhar naqueles olhos suplicantes, vendo neles o mesmo desejo confuso que disparava dos dele.

Nenhum dos dois desviou o olhar quando ele moveu os quadris, encostando levemente na abertura dela.

Ele se impulsionou para frente, colocando-se firmemente dentro de Daisy em um movimento suave, a perfeição do encaixe dos dois fazendo-o ofegar. Ela o envolveu com os braços, os lábios reivindicando os dele.

Ele estava em casa. Porra, ele finalmente estava em casa.

Lincoln abriu os olhos bruscamente. Sua respiração estava rápida, saindo em arquejos superficiais, a pele, úmida de suor. Seu pau: duro.

Ele dormia nu a maioria das noites, mas até a fina camada de lençóis que o cobria no momento parecia quente demais, então ele os arrancou de cima do corpo.

Lincoln fechou os olhos novamente enquanto tentava recuperar o fôlego e entender o que acabou de acontecer.

Um sonho.

Foi só um sonho.

Um sonho erótico. Não o primeiro que teve, certamente, mas com certeza o mais detalhado. E o mais gostoso.

Droga.

Com Daisy.

Mesmo que o cérebro dele tentasse racionalizar que aquilo não significava nada, sua mão desceu pelo corpo e pressionou o pau ainda duro.

Ele resistiu por uma fração de segundo antes de se masturbar, deixando a imaginação fluir da parte exata em que o sonho havia parado.

Porque não havia mais como negar.

Ele queria Daisy Sinclair.

E se essa era a única maneira que poderia tê-la, aqui, tarde da noite, com os sonhos e o desejo dele...

Que assim fosse.


Capítulo 20

— Lincoln, você é muito bonito e tudo mais, mesmo com essa camiseta feia, mas será que pode, por favor, colocar minha afilhada na tela? — Penelope Pope disse, o rosto preenchendo a tela do iPad de Lincoln por completo enquanto ela se inclinava para frente como se tentasse encontrar Kiwi através da câmera frontal.

Lincoln deu o assobio rápido que Kiwi há muito tempo associou ao barulho que ele fazia para chamá-la, e ela saiu do banheiro, local em que ficava o luxuoso tapete de Daisy, o qual a cadela decidira transformar em sua nova cama.

No segundo em que ela chegou, Lincoln a pegou nas mãos. — Ki adora conversar por Skype, não é, amor?

— Cole! — Penelope gritou. — Venha ver a nossa afilhada!

— Isso não é uma criança — Cole respondeu, aparecendo na tela, empurrando Penelope de leve e dando uma enorme mordida na fatia de pizza que segurava. — É um rato com um laço. Lincoln, por que esse rato está usando um laço?

— Ela costuma fazer companhia à Daisy pela manhã. Quando as duas saem do quarto dela, Daisy está de maquiagem e Kiwi com um laço.

— Ah. Um momento só de garotas — Penelope falou, soando contente.

Cole ainda estava mastigando a pizza e encarando a cadela. — Diga-me novamente como um cara de um metro e oitenta e oito terminou dono de um cachorro de dois quilos?

Lincoln hesitou. Cole disse “diga-me novamente”, mas na verdade Lincoln nunca contou o motivo a ninguém. Seus amigos haviam juntado as peças: foi por causa de uma mulher, mas não sabiam que era a mulher.

Talvez estivesse na hora. Talvez o processo de cura começasse com pequenas decisões, por meio de gestos simples, em momentos ínfimos como esse.

— Kiwi era de Katie — ele contou, mantendo a voz casual. — Sou só um responsável legal.

— Mentira — Cole disse, dando outra mordida na fatia. — Você, meu amigo, é o papai amado dessa cadela.

— E eu sou a madrinha, não sou? Oi, amor — Penelope disse em uma voz fina.

Lincoln revirou os olhos e relaxou os ombros. Pronto. Não foi tão difícil.

Talvez todas as menções à Katie não precisassem ser um problema.

— Como está indo a matéria? — Penelope perguntou.

Lincoln deu a ambos um olhar acusador. — Checar como anda a minha matéria é o motivo pelo qual vocês insistiram em fazer essa festinha por Skype em vez de trocar e-mails feito colegas normais?

— Nós não somos colegas, somos amigos — Penelope disse.

— E só para constar, eu votei para que mandássemos mensagem — Cole acrescentou, acabando com o resto da pizza em uma mordida e limpando a boca com um guardanapo. — Penelope insistiu na ligação por Skype para que pudéssemos nos certificar de que você não estivesse todo abatido e desarrumado.

— Acho que isso não seria nem possível — disse Penelope, dando tapinhas na mão de Cole. — E sim, ligamos para ver como você está, mas quero mesmo saber sobre a matéria.

Lincoln deu de ombros. — Quase pronta. Está boa.

— Cassidy vai querer algo melhor do que bom.

Lincoln colocou a cadela de volta no chão e girou levemente a cadeira giratória. — Bem, não é como se ele tivesse me dado um material premiado para trabalhar. Basicamente, conversei com duas dúzias de mulheres, descobri o que elas buscavam em um cara. Então, vou escrever isso de um jeito melhor, explicar como é diferente do que as mulheres de Nova York pensam...

— Então elas são diferentes? De nós, nova-iorquinas? — Penelope interrompeu.

— Você é de Chicago — Cole falou.

Ela colocou a pequena mão no rosto dele e o empurrou. — Adoro o jeito como as garotas do sul falam. É um sotaque tão suave e delicado. Bastante sexy. Você também adora, Lincoln?

— Pen. Temos mesmo que ter essa conversa toda máscula? — Ele perguntou, fazendo uma careta.

— Sim — ela respondeu enfaticamente.

Lincoln sorriu. — Certo. Sim, tem muitas mulheres bonitas aqui, e sim, o sotaque é um tanto sexy.

— Mulheres, no plural?

Ele parou de girar a cadeira. — Você sabe que não estou aqui para namorar, certo? Cassidy me exilou para que eu pudesse espairecer, não encontrar a porra de um cônjuge. Volto semana que vem. E por falar nisso, como meu substituto está se saindo?

— Nick? Ele é ótimo. Gosto dele. Muito.

Cole voltou para a tela com outro pedaço de pizza na mão. — Ah, você gosta, é?

— Nick tem um emprego de meio período como barman — Penelope disse a Lincoln. — Às vezes, conseguimos convencê-lo a fazer coquetéis para nós à tarde, na copa.

Ele assentiu, mas não conseguiu sorrir. Nick Ballantine havia sido contratado para cobrir a parte online do trabalho de Lincoln, o que basicamente significava garantir que os jornalistas que trabalhavam pela internet não publicassem artigos de merda, se certificar de que tudo fosse postado na hora certa e fazer alguns posts por conta própria quando sobrasse tempo.

Lincoln checava o site da Oxford diariamente, dividido entre o pavor de que o cara estragasse o que ele havia construído e o medo de que isso não acontecesse.

Até agora, a última opção havia prevalecido. Nick parecia muito competente, e isso irritava Lincoln. Ele sabia que Cassidy não o substituiria depois de somente uma semana longe, nem mesmo duas, mas ainda era uma droga sentir-se tão... substituível.

Foi também uma surpresa desagradável perceber o quanto ele mesmo havia deixado o trabalho se tornar o centro de sua vida nos últimos dois anos. Lincoln aceitou o emprego na Oxford porque gostava de escrever, gostava da equipe e porque o salário era bom, mas estava começando a se perguntar se não havia deixado isso defini-lo – deixado o emprego se tornar a coisa mais importante de sua vida depois do acidente de Katie. Uma maneira de se distrair da dor.

E agora, chega esse cara novo, substituindo-o como se não fosse nada demais...

— Tudo bem aí, Mathis? — Perguntou Cole. — O laço de Kiwi se desprendeu ou algo assim?

— Sim, tudo bem — ele respondeu, virando a cabeça ao ouvir o barulho do motor de um carro.

Lincoln recostou-se um pouco, olhando pela janela que dava para a casa principal. Ele esperava ver o carro de Daisy dando partida, mas era outro veículo estacionando. Não o Mustang vermelho de Whitney, mas um sedan prateado.

— Então, como Daisy é? — Penelope perguntou.

Ele voltou a olhar para a tela. — Ela é legal. Ótima, na verdade. Não poderia pedir uma anfitriã melhor.

— Bem, óbvio, ela é irmã gêmea de Emma. Claro que ela seria incrível. Vocês estão se dando bem?

Os olhos de Lincoln se estreitaram ao ouvir aquele tom casual demais. — Emma pediu para você descobrir se Daisy e eu estávamos dormindo juntos?

— Não — Cole respondeu por Pen. — Mas Cassidy sim.

Lincoln xingou baixinho e tentou não pensar no melhor sonho erótico que já teve. — Não estamos. Somos amigos. E não estou nem perto de ter cabeça para um relacionamento agora, e ela tem...

— Ela tem...?

— Um encontro no final da semana — Lincoln concluiu, olhando novamente para a janela a tempo de ver um homem alto e encorpado sair do carro.

— Como devemos nos sentir sobre isso? — Perguntou Cole.

— Nós devemos nos sentir bem para caramba com isso. Talvez até um pouco orgulhosos, já que fui eu quem a ajudou a conseguir o número do cara.

— Caramba — Penelope murmurou. — De alguma forma, não acho que você bancando o casamenteiro com Daisy e um cara em um bar seja o que Emma e Cassidy previram ao fazer isso.

— Bem, mas é assim que as coisas estão ocorrendo, então é melhor eles se acostumarem.

Inferno, o próprio Lincoln estava tentando se acostumar com a ideia. Ele disse a si mesmo que tinha sido um desafio divertido na noite de sábado, ensinar uma mulher a conseguir um homem, em vez de dizer aos homens como conseguir uma mulher. Até considerou que poderia ser algo divertido de se colocar em uma matéria e fez uma anotação mental para sugerir a Cassidy e Camille, editora-chefe da Stiletto, escrever uma espécie de artigo de inversão de papéis.

O escritor dentro de Lincoln sentiu uma onda de satisfação quando assistiu uma Daisy risonha pegar o iPhone do homem e digitar o número dela.

O homem nele sentiu algo quente e primitivo com a maneira que o olhar do outro cara se demorou nas costas nuas de Daisy enquanto ela se afastava.

Ele olhou em direção à janela outra vez. Daisy tinha saído de casa e estava parada de frente ao homem a meio caminho do carro. Estavam conversando, mas não parecia uma conversa agradável. Lincoln conseguia ver apenas o perfil deles, mas as duas expressões esbanjavam raiva, os braços do outro homem se movendo loucamente.

Só podia ser o ex-marido dela. Lincoln apostaria dinheiro nessa suposição.

Ele semicerrou o olhar quando viu Daisy ficar tensa e dar um passo para trás.

— Pessoal, eu ligo de volta depois — disse Lincoln. — Foi mal.

Ele desconectou a chamada do Skype antes mesmo de ouvir os amigos terminarem de se despedir e empurrou a cadeira para trás, indo até a janela para ficar de olho em Daisy.

Ela ainda estava com raiva. Ele podia ver isso no jeito que os lábios dela se tensionaram, pela forma que os braços estavam cruzados, mas havia algo mais também. Alguma coisa...

O outro homem ergueu o braço, ainda gesticulando freneticamente, e os gritos dele eram altos o suficiente para que Lincoln conseguisse captar a raiva, mesmo não compreendendo as palavras.

O homem gritou alguma coisa e deu um passo na direção de Daisy, e foi então que Lincoln viu.

O medo.

Daisy se encolheu, colocando os dois braços na frente do rosto, como se fosse se proteger.

Como se fosse se proteger.

Filho da puta. Aquela era a peça que faltava na história de Daisy. Ela não passou só por um divórcio difícil. O cara não só a traiu.

Ele batia nela.

Agora Lincoln sabia com todas as fibras de seu ser. Isso explicava o olhar às vezes assombrado de Daisy e a maneira como parecia sempre pronta para fugir se alguém – especialmente um homem – a tocasse por tempo demais.

Provavelmente também explicava porque o desgraçado havia deixado uma mansão, duas Mercedes e uma quantia enorme de pensão alimentícia para Daisy.

Suborno. Ele estava tentando mantê-la de boca fechada sobre o real motivo pelo qual não estavam mais juntos.

Porque ele a batia. Esse Gary desgraçado havia batido na linda, engraçada e gentil Daisy do Lincoln.

O pensamento preencheu Lincoln com uma fúria que ele nunca havia sentido antes, algo forte e brutal.

Antes que pudesse pensar melhor, ele abriu a porta da casa de hóspedes e caminhou na direção de Daisy e do ex dela


Capítulo 21

Em um segundo, Daisy estava preparada para a dor bastante familiar do punho de Gary contra sua bochecha. No seguinte, seu ex estava voando na direção das cercas vivas perfeitamente cuidadas e repugnantes que ele sempre desejou.

— Seu filho da puta do caralho.

Daisy arregalou os olhos quando seu cérebro registrou o que estava acontecendo. O que tinha acabado de acontecer.

Lincoln agarrou a frente da camisa social de Gary, colocando-o bruscamente de pé apenas para derrubá-lo de novo com outro soco no rosto.

— Mas que porra? — Gary levou a mão ao rosto, mas logo a retirou e olhou horrorizado para o sangue que lhe manchava os dedos. — Você quebrou o caralho do meu nariz.

— Você merece muito mais do que um nariz quebrado.

Lincoln fechou as mãos em punho mais uma vez, mas Daisy pulou para frente, agarrou o braço dele e segurou o punho com as mãos.

Ele rosnou, levantando a mão como se fosse afastá-la, mas então a olhou. Ele xingou baixinho, fechou os olhos e respirou pelo nariz, como se estivesse se forçando a se acalmar.

Por ela.

Estava tentando não assustá-la.

— Por favor — ela sussurrou.

Ele deu um breve aceno de cabeça, embora o rosto ainda estivesse rígido feito granito. Não havia nenhum sinal do Lincoln gentil, nem da versão triste dele.

Aquele era um Lincoln primitivo – furioso, teimoso e lutando fortemente por autocontrole.

— Ele não vale a pena — disse ela em um tom calmo.

— Não, mas você vale — ele respondeu, encontrando os olhos dela.

Ela apertou a mão dele em gratidão e soltou rapidamente, mas não antes de Gary testemunhar o gesto e decidir piorar ainda mais as coisas abrindo aquela boca imbecil.

— É ele, não é? — Gary disse, levantando-se desajeitadamente. — O idiota com quem Brian te viu no bar na outra noite, usando um vestido vulgar, agindo como uma maldita prostituta na frente de todo mundo...

— Desculpe, Wallflower — Lincoln murmurou. — É necessário.

O punho dele colidiu contra o rosto de Gary mais uma vez, mas dessa vez ele agarrou a camisa do ex-marido dela e o puxou para frente enquanto ele cambaleava.

Lincoln arrastou Gary até o carro. Gary era corpulento, mas Lincoln era mais forte e, pela primeira vez, Daisy viu o ex-marido como ele realmente era:

Fraco.

Fraco de espírito, caráter e, no momento, fisicamente mais fraco.

Ela cruzou os braços sobre a cintura enquanto observava Lincoln empurrar Gary contra a porta do carro, um antebraço pressionado contra a garganta do outro homem.

Daisy não conseguiu ouvir as palavras, mas a intenção delas era clara, tanto pela expressão furiosa, mas resignada, no rosto de Gary, quanto pela raiva fria e controlada no de Lincoln.

Ela sentiu algo macio encostar nos tornozelos dela e se ajoelhou para pegar Kiwi. A porta da frente da casa de hóspedes estava aberta, sinalizando que Lincoln havia saído de lá às pressas.

Daisy beijou o topo da cabeça da cadela, roçando a bochecha no adorável laço roxo enquanto observava Gary entrar no carro.

Gary não olhou para ela. Nem uma vez sequer. Deu marcha à ré e dirigiu para fora da longa entrada arborizada da casa que ele mesmo havia projetado.

Foi então que ela soube – aquele era o fim. A história dos dois estava terminada. Ele não voltaria. Levou muito tempo para ela entender Gary. Entender que ele era um valentão, mas do tipo covarde de merda.

Ele gostava demais de ser o "rei da razão" para cogitar voltar a um lugar onde fora derrotado.

Daisy odiava Gary, mas também o conhecia. E sabia que, na mente bagunçada dele, ela agora estava manchada pela força de Lincoln. Gary não olharia para ela e enxergaria uma mulher a quem podia dominar; ele a olharia e lembraria de como Lincoln o prendeu contra aquele carro como uma boneca de pano.

Lincoln permaneceu perfeitamente imóvel, observando a BMW de Gary até o veículo desaparecer de vista, e se virou para ela. Nenhum dos dois se moveu quando seus olhos se encontraram e se fixaram um no outro, mas ela sentiu a intensidade do olhar dele.

Ela pretendia ir até ele. Para agradecer-lhe. Mas quando tentou dar um passo adiante, sentiu os joelhos vacilarem, então, ao invés disso, deu um passo para trás, abaixando o corpo trêmulo até sentar no degrau da varanda.

Em um instante, ele estava ao lado dela, sentado próximo, mas não muito perto, como se soubesse instintivamente que ela não conseguiria lidar com contato físico no momento.

— Você está bem? — Ele perguntou, rouco.

— Sim. Sim, estou bem... não — ela respondeu, a voz embargada. — Não estou bem. Eu o odeio. Odeio quem sou quando estou perto dele, odeio o fato de ter me acovardado.

Ela abaixou a cabeça, apoiando a testa nas costas de Kiwi, e a cachorrinha se enrolou no colo dela de modo protetor.

Daisy sentiu Lincoln se aproximar, perto o bastante para confortá-la, mas não o suficiente para fazê-la se sentir sufocada. — Você sabe que sou a última pessoa para pedir que alguém converse sobre algo antes que esteja pronta — ele disse em voz baixa. — Mas Daisy. Você está pronta.

Ela assentiu contra o pelo da cadela, dando-se conta de que estava chorando. Kiwi se contorceu, manobrando o corpo para poder lamber a bochecha úmida de Daisy, que sorriu, apesar de tudo.

— Aconteceu só algumas vezes — ela contou, levantando a cabeça e enxugando as lágrimas. — Não estou dizendo que isso sequer amenize um pouco as coisas, mas às vezes acho que não foram as agressões físicas que me causaram mais danos, mas sim o abuso verbal constante. Sabe, aquela ideia de que hematomas externos cicatrizam, mas os que nos atingem por dentro... permanecem conosco.

Kiwi colocou as patas frontais no peito de Daisy e deu-lhe uma lambida no queixo, oferecendo o próprio tipo de consolo.

— E eu conversei com alguém — disse Daisy. — Fui a uma psicóloga três vezes por semana depois que nos separamos, e devo tudo a ela. Acho que ela é a única razão pela qual não estou totalmente quebrada agora. Só um pouquinho.

— Você não está quebrada — Lincoln respondeu baixinho. — Alguém tão fraco quanto ele nunca poderia quebrar alguém tão forte.

— Mas quase — ela falou, virando o rosto na direção do perfil rígido dele. — Ele quase me quebrou. Eu queria tão desesperadamente ser uma boa esposa, uma boa companheira. Não da maneira “recatada e do lar”. Ou talvez sim, não sei. Só sei que eu era muito feliz e queria que ele também fosse. Então, eu quis ser perfeita.

Ela ajustou o laço de Kiwi e prosseguiu: — Nós morávamos em um condomínio luxuoso no centro da cidade e ele não queria que eu trabalhasse. Acho que talvez, olhando agora, isso tenha sido um sinal de alerta, mas em vez de notar, me dediquei a construir o lar perfeito. Tudo estava sempre limpo; as refeições que eu preparava eram extravagantes, levavam horas. Na maior parte do tempo, ele estava satisfeito. Era mais fácil quando morávamos lá. A casa era pequena, tinha só uns quartos para eu manter impecáveis. Mas então nos mudamos para cá, e surgiram muito mais coisas para fazer. Contratei um serviço de limpeza que vinha uma vez por semana, mas ele estava sempre irritado com alguma coisa. Com a desordem na garagem ou com as compras do mercado que eu ainda não havia guardado quando ele chegava em casa. A primeira vez que ele me bateu foi quando não li a mente dele, então não comprei mais garrafas da água com gás aromatizada que ele queria. Pensei que estivesse brincando quando ficou irritado. Eu ri, disse a ele que iria comprar mais no outro dia, mas ele... perdeu o controle.

Lincoln passou as duas mãos pelo rosto e xingou baixinho.

— Gostaria de poder dizer que fui uma daquelas mulheres que vão embora logo no início — ela acrescentou. — Mas, ao invés disso, fui uma daquelas que se convence de que foi um incidente de uma vez só. Que não foi de propósito. Ele ficou horrorizado e muito arrependido e, depois disso, passou semanas tentando ser gentil e engraçado. Exatamente como o Gary que eu namorei, sabe? Mas aí, lentamente, começou tudo de novo. As críticas. As reclamações, os acessos de raiva. Ele me bateu mais duas vezes. Depois da segunda, pesquisei como pedir o divórcio. Depois da terceira, eu agi. Nessa altura, ele já tinha engravidado a amante, e todo mundo achou que esse foi o motivo do divórcio. E foi isso, sério. O fim

— Não, não foi “o fim”, Daisy — Lincoln falou. — Ele veio até aqui hoje. Você tem o visto desde o divórcio?

— Essa foi a primeira vez. Ele manteve distância. Tenho certeza que ele esperava isso fosse me fazer ficar de boca fechada.

— O que ele queria?

— Um dos amigos dele, um idiota misógino chamado Brian, estava no restaurante na outra noite. Nos viu juntos e contou para Gary. Aparentemente, ele pode engravidar a secretária e se casar com ela, mas eu não tenho permissão para jantar com outro homem.

Lincoln contraiu os dedos. — Gostaria de poder bater nele de novo.

— Eu meio que quero isso também — ela admitiu, colocando uma Kiwi esperneando no chão. — Eu tentei alertar a Larissa, sabe.

— Quem é Larissa?

— A nova esposa dele. Mãe do bebê, tanto faz. Eu a avisei sobre o temperamento dele, disse-lhe que se ela precisasse de alguém com quem conversar... Ela riu da minha cara, me chamou de “megera ciumenta”.

— Legal — Lincoln rosnou.

Daisy levantou um ombro e passou os dedos pelas lágrimas secas no rosto. Ela sabia que sua aparência estava péssima – nariz vermelho, olhos inchados –, mas se deu conta de que não se importava. Na verdade, meio que estava satisfeita. Gary nunca quis que ela parecesse nada além de perfeita, e era estranhamente libertador falar sobre ele com a pior aparência possível.

— Eu não estou quebrada — ela repetiu e olhou para baixo, juntando as mãos e colocando-as entre os joelhos. — Consegui ajuda de imediato e isso foi muito importante. Às vezes, sinto como se ainda restassem algumas rachaduras em mim, só isso. Tentar descobrir como preenchê-las tem sido mais difícil do que eu pensava.

— Somos todos um pouco rachados, meu bem — Lincoln comentou.

— Você já se perguntou? — Ela questionou, inclinando a cabeça e olhando para o sol do fim de tarde.

— Já me perguntei o quê?

— O que fazer para preencher essas rachaduras? Como melhorar.

— A merda do tempo inteiro.

— Alguma ideia que gostaria de compartilhar? Preciso de algumas.

— No momento, só tenho uma, e estou preocupado que você não irá gostar, mas estou me perguntando se confiará em mim.

Ela olhou para ele, demorando-se na linha teimosa do maxilar, na força do corpo rígido e, principalmente, na bondade pura naqueles olhos.

— Eu confio em você — ela sussurrou.

A gratificação brilhou nos olhos dele, e então ele acenou com a cabeça uma vez antes de mover o corpo, aproximando-se cada vez mais dela no degrau de cimento, até estarem quadril a quadril. Dando-lhe tempo, ela percebeu – dando-lhe tempo de se adaptar à sensação de ser tocada por um homem, um toque além de um aperto de mão casual.

Daisy esperou a onda de pânico, mas não veio. E quando ele lentamente a envolveu com o braço esquerdo, ela se viu aconchegando-se nele, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Seu peito repousou contra o batimento cardíaco dele, e ele a envolveu com o outro braço, trazendo-a para mais perto.

Apenas abraçando-a.

Apenas isso.

O gesto não teve a intenção de ser um precursor para nada. Foi um momento singelo em sua mais pura totalidade, momento que dividiu tudo que acontecera antes do que viria pela frente.

Natural como um pequeno e perfeito batimento cardíaco.

Daisy sentiu os olhos lacrimejarem, mas por uma razão diferente. Ela se perguntou se ele sentiu também – se perguntou se ele sabia que era a primeira vez que ela deixava alguém abraçá-la em anos.

Será que ele sabia?

Será que Lincoln sabia que quanto mais ele juntava os pedaços de Daisy, mais poder ele tinha de partir o coração dela?


Capítulo 22

Dois dias depois de Lincoln ter dado uma surra no ex de Daisy, dois dias depois que ela o deixou abraçá-la, Daisy estava de pé dentro do closet enorme dela, tentando desviar o foco de sua atenção para outro homem.

Especificamente, Dan Lowe, o homem para quem ela havia dado seu número no restaurante, na outra noite. Eles iriam sair juntos.

Ela sequer lembrava de como agir em um encontro?

Aparentemente, não lembrava-se de como se vestir para um.

Irritada consigo mesma e cansada de pensar demais, Daisy tirou um vestido azul-marinho do cabide e colocou a peça no corpo antes que tivesse a chance de reconsiderar pela centésima vez.

O vestido simples se ajustava perfeitamente ao corpo. Terminava logo acima dos joelhos, justo, mas não apertado. Era de gola alta e sem mangas, o corpete forrado por renda preta para evitar que parecesse tão sem graça.

Ela estendeu a mão para fechá-lo, mas os braços eram curtos demais para alcançar o zíper. Droga. Ela descobriria como fazer essa contorção de ioga depois de terminar a maquiagem.

Daisy entrou no banheiro para fazer a maquiagem dos olhos, decidindo colocar um pouco mais de sombra do que o habitual. Aplicou uma de cor marrom chocolate, um pouco da dourada cintilante sobre as pálpebras e adicionou algumas camadas de rímel da Dior. Ela deu um passo para trás e avaliou.

Nada mal.

Estava ótima, na verdade.

Se ao menos conseguisse se sentir mais animada.

Ela deveria estar mais animada. Dan tinha sido perfeitamente encantador por mensagem e a levaria a um dos restaurantes italianos favoritos dela. Todos os sinais indicavam que esse encontro tinha mais potencial do que qualquer um a qual ela foi depois do divórcio e, no entanto, tudo em que conseguia pensar era em como preferia se juntar a Lincoln e Kiwi na noite de filmes deles.

A única coisa que a fazia se sentir um pouco melhor era que pelo menos Lincoln não sairia com outra mulher. Ele havia concluído as anotações da matéria e declarou os últimos três dias na Carolina do Norte como um momento de folga, livre de trabalho.

Três dias.

Era tudo que restava a eles.

Não era como se fosse uma surpresa. Ela sabia, desde o momento em que Emma ligou para apresentar a ela a proposta, que ele ficaria somente duas semanas e depois voltaria para Nova York. Voltaria à vida real dele e ela ficaria aqui com a dela.

Uma vida que parecia cada vez mais vazia.

Daisy se perguntou se isso era parte normal do processo de cura. Se, conforme as feridas emocionais saravam e as mágoas cicatrizavam, você se deparava com um vazio esmagador no espaço que outrora a dor havia ocupado.

Ela estava em dúvida entre qual cor de batom usar – nude moderno, vermelho clássico ou rosa sedutor – quando sentiu a cutucada úmida do nariz de Kiwi uma fração de segundo antes de ouvir uma batida na porta do quarto.

Ela pegou a cadela e saiu do banheiro, dando de cara com Lincoln parado na porta do cômodo.

Daisy não pôde evitar. Seu estômago se revirou. Para começo de conversa, o homem estava lindo. Ele sempre estava lindo, mas a camiseta preta e o jeans gasto de hoje à noite gritavam “que homem” da maneira mais apelativa possível.

E ele estava na entrada do quarto dela.

Ter a companhia da cadela no andar de cima não era incomum, mas Lincoln nunca estivera lá e sua presença parecia estranhamente íntima.

E pareceu ainda mais íntima pela maneira como os olhos dele se voltaram para a cama dela.

Daisy sentiu o próprio estômago se apertar com um desejo que ela não sentia desde muito antes do divórcio. Na época em que achava as tendências controladoras de Gary cavalheirescas, e não misóginas, antes que o sexo entre os dois se tornasse uma tática para mantê-lo feliz e deixar a raiva dele sob controle.

Mas mesmo depois de tudo isso, Daisy sentia falta de fazer sexo.

Ela não sabia se era normal ou não, depois de tudo pelo que passou. Se alguém lhe perguntasse anos atrás se, como uma mulher que já foi agredida, ela gostaria de ser tocada novamente, teria respondido que não.

E, embora certamente tivesse receio de homens, também tinha certeza de que, com o cara certo, adoraria o toque. Desejaria ser tocada.

Lincoln voltou a encará-la, mas deu uma olhada rápida de relance na cama mais uma vez. Ela se perguntou se ele estava experienciando os mesmos pensamentos perigosos que ela.

Se perguntou se ele sabia o quanto ela desejava que ele fosse o homem a ensiná-la a desejar novamente.

Quem ela estava querendo enganar?

Ele já havia feito isso.

Depois do divórcio, Daisy ficou com a cama enorme e cara, mas decidiu se livrar do dossel de cerejeira que Gary escolheu e jogou fora a pesada colcha vermelha que seu ex insistia em ter. No lugar de tudo isso, agora havia uma simples cama plataforma com uma cabeceira estofada cinza e roupa de cama nas cores azul-água e cinza, que ela achava feminina, mas não espalhafatosa.

— Oi! — Ela disse, finalmente quebrando o silêncio. Mas sua voz saiu forçada e alegre demais.

— Você sabe que só tem filmes melosos, não sabe? Existe sequer um que não seja comédia romântica?

— Você não curte clássicos?

— Claro que sim. O Poderoso Chefão. Rocky. Nós somos os campeões.

Ela riu. — “Nós somos os campeões” não é um clássico.

— É sim. Quais são os clássicos para você?

Ela deu um suspiro feliz, colocando os brincos. — A Garota de Rosa Shocking. A proposta. Ah, e claro, Digam o Que Quiserem.

— Digam o quê?

Ela deu-lhe uma olhar que dizia claramente que aquela piada não teve graça, mas ele não notou, porque estava ocupado demais encarando as pernas nuas dela.

— Desculpa por chegar assim — ele falou em voz baixa. — Eu te chamei, você não me ouviu. Então, Kiwi me mostrou o caminho.

— Não faz mal — ela respondeu enquanto passava a mão sobre a cabeça da cadela. — O que houve?

Em vez de responder, os olhos azuis dele percorreram o corpo inteiro dela e ela sentiu um formigamento que a atingiu da cabeça aos pés.

— Você está bonita.

Era imaginação dela ou a voz dele soou um pouco mais rouca que o normal?

Ainda descalça, ela se moveu, colocando um pé em cima do outro, sentindo-se estranhamente vulnerável. — Obrigada. Estou um pouco... nervosa.

Ele encostou um dos ombros na porta e cruzou os braços. — Sério?

Daisy deu de ombros. — Tenho ido a encontros desde o divórcio, mas esse parece diferente.

— Como assim?

Ela lambeu os lábios. — Nos outros, acho que sabia que nada ia acontecer, sabia que não tinha intenção de dar uma chance aos homens.

O olhar dele pareceu escurecer. — Mas com esse cara você vai com tudo?

— Bem, não sei — ela respondeu, dando uma risadinha. — Conversei com ele por quinze minutos, mas de alguma forma me sinto diferente. Me sinto pronta. Pronta para seguir em frente com a minha vida.

Ele engoliu em seco, dando a ela a maldita visão daquele sexy pomo-de-adão.

Controle-se, Daisy!

— Fico contente em saber. Feliz por você — ele disse.

Não era a resposta que ela queria. Droga. Ela não podia mais negar que o que sentia por Lincoln Mathis era algo muito mais complicado que só amizade.

Ela queria que ele dissesse que estava pronto também. Que ele queria ser o cara com quem ela seguiria em frente.

Mas ele não estava pronto. Isso estava óbvio pela maneira como os braços dele estavam cruzados de modo protetor sobre o peito, o maxilar rigidamente tenso. Ele gostava dela. Importava-se com ela. Mas o coração pertencia a outra pessoa. A alguém que ele perdeu.

— Precisava de alguma coisa? — Daisy perguntou, curvando-se para colocar uma Kiwi agitada no chão, somente para ter que pegar a cadela mais uma vez quando ficou claro que o animal queria deitar na cama, mas não conseguia subir por conta própria.

— Não precisa deixar minha cadela subir nos seus móveis, Wallflower.

Ela deu de ombros quando a bola de penugem branca parou em seu lugar de costume e enrolou-se no travesseiro de Daisy. — Não me importo. Estou pensando em adotar um cachorro, na verdade. Talvez um gato. Para que quando você não estiver mais aqui, eu não fique tão solitária.

Ela ergueu a cabeça quando percebeu o que tinha dito. — Não quis dizer nesse sentido... digo, é claro que você vai ter que ir embora, não quis te fazer se sentir culpado...

— Eu não entendi dessa forma — ele respondeu, afastando o ombro do batente da porta e entrando no quarto sem ser convidado. Ou talvez o convite estivesse estampado no rosto dela. Ela nem sabia mais. Mas estava formigando.

Por que ela estava formigando?

— De qualquer forma, adote um gato ou um cachorro, mas você merece mais do que isso — ele disse baixinho, caminhando na direção dela. — Dê uma chance a esse cara. Prometa que vai.

Ela riu nervosamente quando ele se aproximou. — Eu já não disse que era isso que eu ia fazer?

— Eu ouvi o que você disse. Mas preciso que esteja falando sério. Para minha própria paz de espírito.

Ela olhou nos olhos dele e leu o subtexto que ele não pronunciou. Se dê uma chance com esse cara, porque não terá uma comigo. Não espere por mim.

Para afastar a pontada de dor, ela olhou para o relógio na mesa de cabeceira. — Ai, meu Deus, está na hora! — Ela virou-se para o closet. — Preciso calçar os sapatos e passar um batom. Qual você acha melhor: vermelho ou rosa? Não consigo decidir...

Lincoln a alcançou e envolveu os cotovelos dela com aqueles dedos fortes. Ela parou, o coração na garganta, e começou a se virar para ele.

Os dedos dele se apertaram, impedindo-a de virar-se, mesmo quando ele se aproximou. — Seu zíper.

— Ah — disse ela, um pouco sem fôlego. — Verdade. Um dos perigos da vida de solteira. É fácil fechar, só precisa meio que esticar primeiro e...

— Eu sei como.

Os olhos de Daisy se fecharam quando ela sentiu o roçar dos dedos dele na base de sua coluna. Ele se aproximou ainda mais enquanto arrastava lentamente o zíper para cima.

Ele parou o movimento na metade das costas dela e Daisy abriu os olhos bruscamente quando sentiu o polegar dele roçar sobre o fecho do sutiã. Em uma tentativa desesperada de se sentir bonita e desejável, ela pegou um dos seus sutiãs mais caros na parte de trás da gaveta. Era de cetim rosa claro, revestido por renda preta.

— Todos os seus sutiãs são tão sexys assim?

A voz dele estava muito baixa, em um tom que ela jamais ouviu dele.

Como responder?

Ela balançou a cabeça. — É uma espécie de... sutiã para ser usado em um encontro.

— Ah.

Por um segundo, ela pensou que ele prosseguiria, que continuaria subindo o zíper. Mas em vez disso, ela sentiu o roçar do polegar dele de novo, dessa vez um pouco mais embaixo, dedilhando a pele das costas, logo abaixo do fecho.

— Então vai ser esse tipo de encontro. O que tem uma festinha depois.

— Bem, não sei se sou esse tipo de garota — ela comentou, exagerando o sotaque na tentativa de infundir um pouco de humor naquele momento cheio de tensão.

Ele não disse nada, passeando novamente o dedo sobre a pele dela, um toque imponente e leve ao mesmo tempo.

— O que você concluiu com a pesquisa? — Ela perguntou, tentando novamente deixar as coisas mais leves. Qualquer coisa para parar a pontada de desejo que ameaçava fazer seus joelhos cederem. — Nós, garotas do sul, transamos depois do primeiro encontro?

— Depende.

— Do que?

— Do cara. Da garota.

— Bem, essa garota aqui está indecisa — disse ela de forma audaciosa. Só que não saiu em um tom atrevido. Soou ofegante. Sensual.

Ela tentou deixar as coisas mais leves outra vez, um tanto desesperada. — Mas, se tudo correr bem, eu não gostaria de estar usando as minhas lingeries feias, não acha?

— Você diz isso como se eu tivesse passado um bom tempo pensando na sua roupa íntima.

— Eu não quis dizer nesse...

— Eu tenho — ele interrompeu, a voz um rosnado baixo quando o polegar se moveu para baixo, traçando a espinha dela. — Tenho pensado em coisas que não deveria.

Ela fechou os olhos novamente e começou a se virar, mas os dedos dele se espalharam em suas costas, mantendo-a firmemente no lugar.

A mão dele deslizou para cima, empurrando gentilmente os cabelos dela por cima de um ombro, deixando o pescoço exposto. — Eu não sou bom para você, Daisy. Não sou bom para nenhuma mulher, não no momento. Mas se eu fosse...

— Lincoln...

— Mas se eu fosse... — ele prosseguiu em uma voz baixa e áspera, interrompendo-a. — Se eu fosse, pressionaria meus lábios aqui.

Ele passou os dedos na parte de trás do pescoço dela e ela estremeceu.

— Eu te beijaria aqui e depois me moveria para o lado do seu pescoço. Descobriria se você gosta de ser beijada lá.

Eu gosto.

— Estou dividido com o que faria em seguida — ele continuou. — Dividido entre deslizar minha mão aqui. — Ele roçou o dedo contra o fecho do sutiã dela mais uma vez. — Abrir isso, porque, por mais bonito que seja o sutiã, sem ele é sempre melhor.

— Ou talvez... — A respiração dele estava irregular. — Talvez eu empurraria o vestido para frente, deixaria seus ombros expostos e viraria seu corpo para mim. Para ver se o sutiã é tão bonito na frente quanto é atrás. Ver se seu corpo é tão bonito quanto seu rosto, mas tenho certeza de que é.

Faça isso, ela quis implorar. Vire-me. Me pegue em seus braços.

— Mas se eu fizesse isso... — ele disse, arrastando os dedos ao longo das laterais do corpo dela até que as mãos cruzaram sua cintura. — Se eu fizesse isso, teria que te beijar. E eu não posso te beijar, Daisy.

— Por que não? — Ela conseguiu sussurrar.

— Porque me recusaria a parar aí. Eu te empurraria para a cama e transaria com você até que ficasse exausta.

— E se eu dissesse que queria isso?

Ele sussurrou: — Não.

— Por quê?

Ela tentou se virar, mas as mãos dele a seguraram firme, os dedos cravando contra os ossos do quadril. — Porque não tenho nada para oferecer em troca, Daisy. Ah, eu te daria prazer. Daríamos isso um ao outro. Mas eu tomaria absolutamente tudo, caralho, eu te consumiria por completo. Você iria querer algo em troca, mas eu não teria nada. Sou vazio por dentro, e você merece muito mais.

— Lincoln, por favor. Podemos ir devagar, um passo de cada vez, ver para onde isso vai. Não estou atrás de...

— Sim, você está, Daisy. Você quer tudo. Quer os encontros, o romance e o namoro. O pedido de casamento, a festa de noivado, a cerimônia, do jeito que sonhou uma vez, mas não teve. Você quer tudo isso e merece tudo isso. Mas eu não sou o cara certo para você.

— Por quê? — Ela retrucou um pouco teimosamente. — Você quis tudo isso uma vez.

— Sim. — A voz dele estava fraca. — Eu quis. Quis muito e isso me foi arrancado. E não foi tudo de uma vez, não foi como um tiro certeiro. Foi como ser mutilado, foi como ter um pedaço do meu coração sendo dilacerado pouco a pouco, sendo esticado ao longo dos malditos anos.

O coração dela doía por ele. Sim, mas...

— Se eu me permitisse fazer todas essas coisas de novo, Wallflower, se me sentisse assim outra vez, seria por alguém como você.

Ela sentiu os olhos lacrimejaram e tentou se virar, mas mais uma vez ele a manteve no lugar. — Mas não posso. Não vou arriscar tudo. Nem mesmo por você.

As mãos dele deslizaram para longe da cintura dela quando ele encontrou a aba do zíper mais uma vez, fechando-o com um ruído rápido e eficiente antes de dar um passo para trás.

Ela sentiu a ausência dele de modo profundo e, em seguida, reunindo coragem, virou-se, preparada para brigar com ele. Preparada para lutar por ele.

Mas viu apenas as costas dele e, em um instante, ele tinha ido embora.

Kiwi se mexeu, sentando no travesseiro e olhando para seu dono. Ela deu à Daisy um olhar triste, como se estivesse dividida. A lealdade de longo prazo venceu e a cachorrinha pulou da cama e caminhou depressa atrás de Lincoln.

Kiwi, pelo menos, voltou e deu à Daisy um olhar arrependido antes de também desaparecer, deixando Daisy da forma como ela sempre estava ultimamente.

Sozinha.


Capítulo 23

Maldito seja, Lincoln.

O encontro poderia ter sido bom. Teria sido bom se Lincoln não tivesse, minutos antes de ela sair para encontrar Dan, verbalizado coisas que a fizeram se sentir desejada, e depois ter brutalmente listado todas as razões pelas quais ela nunca teria o coração dele.

Daisy sobreviveu ao encontro. Foi uma estranha mistura de "suportável" e "péssimo".

Dan era um cara legal. Um cavalheiro. Ele fez perguntas, foi educado e parecia interessante. Qualquer outro dia, em qualquer outra circunstância, ela teria dito sim para um segundo encontro.

Mas enquanto esperavam o manobrista trazer seus respectivos carros, Dan perguntou se poderia ligar para ela novamente e Daisy teve que dizer não.

Teve que dizer-lhe que ainda estava se recuperando do divórcio e que lamentava muito ter desperdiçado o tempo dele.

Foi uma mentira inofensiva. Ela estava se recuperando, mas não do desgraçado do Gary.

No segundo em que Daisy passou pela entrada, antes mesmo de ver que as luzes da casa de hóspedes estavam apagadas e que o carro dele não estava lá, ela sentiu.

Lincoln tinha ido embora.

Entorpecida, ela estacionou o carro para a garagem e entrou na cozinha. Durante as últimas duas semanas, o cômodo tinha sido o seu favorito de toda a casa. O lugar onde ela e Lincoln tomavam o café matinal juntos, o desjejum e o ocasional happy hour da tarde.

Mas quando acendeu a luz, Lincoln não estava sentado ao balcão, esperando para provocá-la sobre o encontro ao qual ela tinha ido.

Não havia Kiwi pulando nas pernas dela, exigindo carinho.

Havia, no entanto, um bilhete.

Daisy caminhou devagar até o balcão, o barulho dos saltos ecoando no cômodo solitário. Ela colocou a bolsa de lado e pegou o simples bloco de anotações amarelo onde ele havia escrito a despedida.

Daisy...

Estou indo visitar meus pais na Flórida por alguns dias antes de voltar para Nova York. Sinto muito por não ter te esperado para me despedir pessoalmente, mas é melhor assim. Confie em mim.

Você vai me achar um covarde, e talvez seja verdade, mas também sou homem. Um homem que se importa muito com uma mulher, mas não sabe o que fazer sobre isso.

Não estou pedindo para você esperar – não sei se sequer um dia serei o que você precisa –, mas estou pedindo que seja feliz. Eu preciso que você seja feliz, Daisy.

Até a próxima, Wallflower, e espero, de coração, que nos encontremos de novo,

Lincoln


Daisy leu duas vezes, e uma terceira, então amassou lentamente o bilhete com o punho.

Ele queria que ela fosse feliz? Ela seria.

E talvez ele estivesse certo sobre ela ser uma “wallflower”, mas já estava farta de ser assim. Não iria mais ficar nos bastidores, esperando a vida passar diante dos olhos, esperando que algum homem a considerasse digna de ser amada.

Daisy Sinclair estava pronta para ter sua vida de volta. Com ou sem Lincoln Mathis.


Parte III


Capítulo 24

UM MÊS DEPOIS

Lincoln se considerava um cara bastante tranquilo. Não era muito possessivo. Mas quando entrou em seu escritório depois de quase dois meses longe da Oxford – sendo que mais da metade desse tempo não fora planejado –, a última coisa que queria ver era outro homem ali, sentado atrás de sua mesa.

No escritório dele. Na mesa dele.

O outro homem olhou para cima. Não sorria, mas também não parecia antipático. — Oi. Você deve ser o Lincoln. Sou Nick Ballantine.

— Eu sei quem você é.

O outro homem era um cara bonito. Cabelos escuros, um pouquinho compridos. Olhos castanhos escuros, pele bronzeada e um pouco de barba por fazer.

O canto da boca do outro homem se ergueu em um meio sorriso. — Estou no seu território. Entendi. Estou só pegando minhas tralhas. Teria feito isso na sexta-feira, mas não esperava que você fosse chegar tão cedo. Não se preocupe, não mijei em nada para marcar território. Tudo aqui dentro ainda é seu.

Droga. Pego no flagra.

— Foi mal — disse Lincoln, abrindo o que esperava ser um sorriso mais ou menos genuíno.

— Sem problemas — Nick respondeu, deslizando algumas canetas e uma pasta de arquivos para dentro de uma bolsa para notebook. — É um emprego ótimo. Você está certo em querê-lo de volta.

— Você fez um ótimo trabalho — Lincoln elogiou, se aproximando da mesa e largando a pasta na cadeira oposta à dele enquanto esperava Nick terminar de recolher as próprias coisas.

Nick olhou para ele rapidamente e, dessa vez, abriu um sorriso enorme. — Eu sei.

Lincoln riu da confiança do outro homem. — Está planejando pedir a Cassidy um emprego em tempo integral?

— Não. É um bom lugar, com pessoas legais, mas fico entediado com facilidade. O trabalho como freelancer me cai bem e, quando as coisas começam a ficar paradas, complemento com o emprego de barman. Apareça no Founders Hotel algum dia. Eu trabalho no bar de lá, a bebida será por minha conta.

— Claro, obrigado — disse Lincoln, apertando a mão de Nick quando o outro homem contornou a mesa. — E obrigado por segurar as pontas.

Nick assentiu uma vez antes de erguer a mão, acenar e sair pela porta. Um homem de poucas palavras. Tal fato serviu perfeitamente bem para Lincoln, que adorou a ideia de voltar ao trabalho.

Na verdade, ele não era uma pessoa muito matinal, mas chegara ali uma hora mais cedo que todos de propósito. Precisava de alguns minutos para se reorientar.

Ele sentou na cadeira giratória, surpreso e um pouco aliviado ao ver que tudo estava exatamente como ele deixou. Ballantine não mentiu sobre não ter marcado o território de Lincoln.

Ele tirou o notebook da pasta e colocou o aparelho no suporte antes de ligá-lo.

Café, se deu conta. Deveria ter pegado café antes de ir para o escritório. Havia uma enorme e antiga cafeteira na copa, mas a essa hora da manhã, ninguém teria preparado nada. Parecia que teria que ser ele.

Ele se levantou e saiu, pretendendo ir até a copa, mas virou à direita no último segundo. Talvez para checar se Cassidy já havia chegado. Como um notório viciado em trabalho, o homem parecia sentir prazer em chegar antes de todo mundo, em sair depois de todos também. Lincoln se perguntou se a vida de casado o mudou.

A essa hora, o escritório normalmente estava completamente silencioso, então Lincoln pôde ouvir a conversa discreta que saía pela porta aberta de Cassidy antes mesmo de se aproximar.

Ele diminuiu a velocidade dos passos e parou completamente quando uma voz feminina o atingiu. Ele reconheceria aquele suave tom rouco e grave em qualquer lugar.

Daisy.

Era a voz de Daisy.

Antes que pudesse pensar melhor, acelerou os passos até que estava praticamente correndo na direção da porta do escritório do chefe. Ele não sabia o que ela estava fazendo aqui, não sabia o que faria quando a visse, mas tinha que vê-la. Tinha que dizer a ela que...

Lincoln parou na porta aberta e seu coração acelerado começou a bater mais devagar, decepcionado.

Cassidy e Emma se viraram para ele, surpresos.

Emma.

Cacete. Claro que a voz que ele ouviou era de Emma, não de Daisy. Claro que seria a gêmea casada com seu chefe que estaria no escritório, e não a gêmea da Carolina do Norte que provavelmente guardava muita mágoa dele.

Ele nunca se sentiu tão desapontado por ver a amiga.

Mas Emma estava sorrindo, movendo-se em sua direção e envolvendo o pescoço dele com os braços em uma saudação tão calorosa – e inesperada, visto que Emma era normalmente reservada – que ele não pôde deixar de sorrir, mesmo que ela não fosse bem a gêmea que ele esperava ver.

— Você está de volta — ela constatou, afastando-se e sorrindo para ele, as mãos em seu ombro.

— Parece que sim — disse ele.

— Mathis, se importa em tirar as mãos da minha esposa? — Cassidy falou. Mas ele também estava sorrindo. Lincoln estendeu a mão para o amigo e Cassidy o surpreendeu ainda mais do que Emma, pois usou a mão para puxar Lincoln e o abraçou usando apenas um braço. — É bom pra caramba te ver de novo, cara.

— Desculpe pelo afastamento mais longo do que o previsto.

Cassidy deu um aceno despreocupado e foi para seu trono habitual atrás da mesa. — Sem essa. Venha. Sente-se. Converse comigo.

Lincoln e Emma trocaram um olhar diante do autoritarismo dele. — Ele é um maníaco por controle, Em. Não sei como você aguenta.

— É simples: ignoro os comandos dele em todos os lugares, exceto no quarto, e lá sou tão controladora quanto ele.

Lincoln estremeceu. — É sério?

Ela riu e deu um tapinha na bochecha dele. — Desculpa. É bom ter você de volta. Vou deixar vocês, garotos, conversarem a sós.

Emma estava quase do lado de fora quando Lincoln a chamou novamente.

Ela se virou. — Sim?

Merda. Caralho. Ele ia fazer mesmo isso? Claro que iria.

— Como está sua irmã? — Ele perguntou.

As sobrancelhas dela se ergueram. — Ela está bem. Muito bem, na verdade.

Lincoln sentiu o peito apertar e torceu para que o fato de Daisy estar “muito bem” não estivesse relacionado a alguma mudança em seu status de relacionamento.

— Você não tem falado com ela? — Emma perguntou.

Ele engoliu em seco. — Não. Não entrei em contato desde que fui embora.

— Desde que fugiu, você quis dizer. — Emma corrigiu.

— Emma — Cassidy falou em tom de aviso.

— Não, não faz mal — Lincoln disse a Cassidy, sem desviar os olhos do olhar sincero de Emma. — Eu realmente fugi.

— Você se arrepende?

— Sim e não — ele respondeu lentamente.

— Explique.

— Eu sei que devo uma explicação, mas, com todo respeito, não a você.

Ela apertou os lábios. — Caramba. Boa resposta.

— Eu sei — ele disse com um sorriso. Então, reuniu coragem e fez a pergunta. — Se eu lhe dissesse que estava planejando uma viagem à Carolina do Norte, o que você diria?

Ela piscou, surpresa, olhando rapidamente para Cassidy antes de voltar o olhar para Lincoln. — Eu diria que estaria desperdiçando seu tempo.

O coração de Lincoln parou e Emma girou os calcanhares e saiu do escritório de Cassidy. Era o que ele esperava ouvir, mas havia estupidamente se agarrado à esperança de que Daisy ainda pensasse naquela noite tanto quanto ele.

— Sente-se — Cassidy disse em voz baixa.

Lincoln tentou pensar em alguma piadinha sarcástica, mas nada lhe veio à mente, então finalmente fez o que lhe foi pedido. — Conheci Ballantine.

Cassidy assentiu.

— Ele não vai ficar?

Cassidy deu de ombros. — Ele disse para ligar se precisássemos de um freelancer. Eu provavelmente irei. Gosto dele. É pontual, organizado e tem uma escrita boa. Assim como você.

— E ele estava aqui — Lincoln acrescentou baixinho. — Quando eu não estava.

— Não esqueça de quem foi o dono dessa ideia.

— Por duas semanas, sim. Mas transformei em um mês e meio, usei até as minhas férias.

— Nós sobrevivemos — disse Cassidy, recostando-se na cadeira. — Valeu a pena?

Lincoln soltou um suspiro. — Sim. Valeu muito a pena.

— Você viu seus pais?

— Na primeira semana, sim. Eu não os via desde o funeral e minha mãe sentiu a necessidade de cuidar de mim, de me alimentar com aquelas travessas de frango sem gosto. Meu pai me arrastou para jogar golfe, palestrou sobre o ciclo da vida, esse tipo de coisa.

— E você pegou um voo da Flórida para a Costa Rica.

Cassidy disse isso casualmente, como se estivesse simplesmente recitando as informações que Lincoln transmitira por e-mail, mas Lincoln captou a pergunta não dita.

— Sim. Passei algumas semanas lá. — Lincoln exalou. — Fui para a minha lua de mel.

A única reação de Cassidy foi um piscar lento de olhos. — Sua lua de mel.

— O que teria sido minha lua de mel, anos atrás. Hospedei-me no mesmo resort que reservei para mim e Katie. Fiquei na beira da piscina, fiz coisas turísticas, bebi os drinques açucarados do resort...

— O que você com certeza adorou.

Lincoln riu. — Sim.

— O que te inspirou a tirar essas férias de última hora?

— Foi um pensamento que simplesmente me atingiu — Lincoln contou. — Todo mundo tem ideias diferentes sobre a melhor maneira de fechar um ciclo e eu percebi que é porque cada pessoa supera as situações de formas diferentes. Para mim, foi isso. Me forçar a encarar o que eu poderia ter tido e o que não tive meio que me tirou do limbo. Me fez aceitar que ela se foi, que ela tinha ido embora há muito tempo. Fiz isso por ela também. Ir para a Costa Rica era ideia dela. O sonho dela. E odeio pra caramba que ela não pode ver tudo aquilo com os próprios olhos, então eu vi por ela.

— Você disse adeus.

Somente algumas semanas atrás, Lincoln teria se encolhido interiormente a qualquer menção dessa palavra. “Adeus” parecia algo tão definitivo. Ele não estava pronto.

Agora, no entanto...

Ir para uma lua de mel individual forçou Lincoln a ficar sozinho com os próprios pensamentos. Com a dor dele. Fez ele lidar com isso de uma maneira que não havia conseguido quando estava cercado por pessoas, situações em que seria fácil encontrar distrações para a dor.

Durante as duas semanas passadas na Costa Rica, ele se permitiu viver o sofrimento. Deixou-se lamentar o fato de Katie não estar na espreguiçadeira ao lado dele na piscina, que ela não estava ao lado dele na cama de casal. Que ela não poderia desfrutar a paisagem verde, o momento de tranquilidade e a comida típica.

Ele se permitiu reconhecer o que havia acontecido.

Ele amou uma mulher.

E perdeu essa mulher.

E, no entanto, por anos não a deixou ir. Agora, havia permitido.

Pelo menos, era o que ele pensava. Que estava quase lá. Tudo o que sabia era que a dor não parecia tão esmagadora quanto alguns meses atrás.

— Sim — Lincoln respondeu, pigarreando. — Eu disse adeus.

— Fico feliz em saber — disse Cassidy, inclinando-se para frente de novo. — Precisa da minha ajuda para voltar ao trabalho?

Lincoln riu. — Simples assim, hein?

Cassidy sorriu. — Simples assim.

— Eu preciso de café. E já que você me arrastou até aqui, aposto que a essa altura alguém já preparou, então...

Cassidy acenou com a cabeça em direção à porta. — Pode ir. Colocaremos a conversa em dia mais tarde. E, Lincoln...

Lincoln se virou.

Cassidy parecia estranhamente indeciso, mas apenas balançou a cabeça. — Deixa pra lá. Te vejo por aí.

Lincoln estava a meio caminho da cozinha quando teve um déjà vu. A voz dela. A voz de Daisy.

Ele parou e balançou a cabeça, irritado consigo mesmo. Era isso que ele ganhava por ter se apaixonado pela irmã gêmea de uma mulher que trabalhava no mesmo maldito prédio que ele, e era casada com o chefe dele, droga.

As vozes das duas não eram exatamente iguais. A de Emma era mais rápida, a de Daisy, mais lenta e arrastada. Ele só precisaria concentrar-se nas diferenças até conseguir ouvir a voz de Emma sem pensar nela.

Ele continuou caminhando em direção à cozinha. O andar ainda estava silencioso, então a voz de Emma vindo da recepção alcançava os ouvidos dele com muita facilidade.

É só Emma, caramba.

Ele parou. Porque aquela voz não soava como a de Emma. Desde quando Emma ria assim, toda suave e sedutora? Desde quando ela pronunciava as vogais de modo tão arrastado?

Ele lentamente mudou a direção dos passos e caminhou até a recepção. Ou estava enlouquecendo, de alguma forma transformando a voz de Emma na de Daisy, ou Emma estava imitando Daisy, mas por quê? Apenas para torturá-lo?

Lincoln parou bruscamente quando seus olhos registraram a cena diante dele.

Ou talvez houvesse uma terceira opção.

Talvez não fosse mesmo Emma.

Talvez Daisy Sinclair – sua Daisy – estivesse sentada na recepção da Oxford, rindo de um Nick Ballantine parecendo muito interessado nela.


Capítulo 25

Daisy havia formulado um milhão de maneiras diferentes sobre como agir quando esse momento chegasse. Ela até convenceu um Cassidy relutante a fingir ser Lincoln, para poder praticar a orientação que Emma havia dado de “agir com naturalidade”.

Mas quando girou o corpo e encontrou os olhos azuis de Lincoln, não houve tranquilidade, apenas instinto.

Ela lentamente afastou a cadeira, levantou-se, caminhou até ele e envolveu o pescoço dele com os braços.

— Daisy?

A palavra soou tanto como uma pergunta quanto uma súplica. Ela fechou os olhos e assentiu enquanto os braços dele lentamente a envolviam.

— Daisy. — Dessa vez, a pronúncia veio em um sussurro contra o pescoço dela, e ela sentiu os olhos lacrimejarem. Lá se foram todos os treinos para seguir as instruções de Emma e manter a calma.

Ela queria que o momento durasse para sempre, mas houve um pigarro atrás deles. Ela se virou e viu Nick observando-os com uma expressão confusa, os antebraços apoiados no balcão alto da recepção.

— Ah! Lincoln, esse é o Nick. Ele é o cara que...

— Nós já nos apresentamos — disse Lincoln, o tom um pouquinho hostil. Daisy franziu o cenho para ele.

Nick sorriu para Lincoln. — Eu não fiz xixi na sua mesa para marcar território, Mathis, mas fique sabendo que estou prestes a fazer nessa aqui.

Daisy torceu o nariz, intrigada com a declaração nojenta. — Espera, o quê?

Nick não respondeu, porque estava ocupado demais olhando para a morena deslumbrante que se aproximava da mesa.

— Lincoln — Taylor Carr falou, caminhando até eles. — Bem-vindo de volta. Vejo que já conhece nossa recepcionista.

O olhar de Lincoln se voltou para Daisy. — Perdão?

— Recepcionista temporária — Daisy corrigiu.

— Onde diabos está Jo? — Lincoln perguntou, referindo-se à recepcionista habitual da Oxford.

— De repouso — explicou Daisy. — Por conta de uma leve complicação na gravidez. Está tudo bem, mas o médico preferiu não arriscar. Só que foi inesperado, então precisaram contratar alguém para substituí-la às pressas.

— Aham — disse ele, olhando para ela. — E só conseguiram encontrar uma substituta em Charlotte, na Carolina do Norte?

Taylor passou um braço em volta da cintura de Daisy. — Bem, a essa altura nossa garota aqui já havia se mudado.

O olhar de Lincoln voltou-se para a encrenqueira Taylor e depois para Daisy. — Espera aí. Você está morando aqui?

— Sim — disse Taylor. — E eu rapidamente a transformei em minha nova melhor amiga, principalmente com o objetivo de ensiná-la a evitar os avanços do desgraçado do Ballantine.

— Não sei como você teria alguma experiência com isso — Nick falou em um tom preguiçoso por trás delas. — Já que nunca foi alvo deles.

Daisy retirou o braço de Taylor de sua cintura e a empurrou gentilmente. — Bem que você e Nick poderiam levar essa habitual briguinha de cão e gato para outro lugar, não é?

— Taylor é quem? — Nick perguntou. — A gatinha ou a cadela?

— Quer mesmo saber? — Taylor provocou, a voz saindo em um ronronar que deixava claro que ela associava si mesma a uma espécie de felino.

Daisy levou os dedos às têmporas. — Queria que alguém tivesse me avisado que esse emprego incluiria precisar bancar a babá.

Taylor mandou um beijo no ar para ela e Lincoln antes de mostrar o dedo do meio para Nick. — Daisy, ainda vamos almoçar juntas mais tarde?

— Com certeza — Daisy respondeu com um sorriso, mesmo com plena consciência que Lincoln ainda tentava processar a situação. Talvez ter feito tudo parecer uma surpresa não tenha sido a melhor estratégia. Ele parecia... irritado.

— E o jantar mais tarde? — Nick perguntou. — Ainda está de pé?

Merda. Merda, merda, merda.

Ela gostava de Nick Ballantine. Muito. O que começou com eles tomando café juntos duas vezes por semana se transformou em um almoço ocasional, depois em uma bebida após o trabalho. E agora um jantar estava em jogo.

Daisy sabia que Nick estava interessado nela e, caramba, tinha certeza de que estava prestes a ficar interessada nele também, mas era muito difícil pensar em outro homem quando Lincoln estava bem aqui diante dela.

Por outro lado, há mais de um mês não tinha notícias de Lincoln. Ele não entrou em contato com ela uma vez sequer desde que a deixou aquele bilhete meia-boca e fugiu no meio da noite.

Ela estava certa em seguir em frente com outra pessoa. E Nick era simpático. Gostava dela.

Daisy compreendia o porquê de Lincoln ter agido da forma como agiu. Mas, como Emma havia frisado uma dúzia de vezes no mês passado: era hora de Daisy se preocupar consigo mesma. E ela queria seguir em frente – havia se dado conta de que, acima de tudo, usou a experiência com Gary como um escudo.

Se o tempo que passou com Lincoln havia lhe ensinado alguma coisa, com certeza foi perceber que, no fundo, não queria ficar sozinha. Que estava pronta para amar novamente – arriscar-se novamente.

E sim, ela tinha esperanças de que essa pessoa fosse ser Lincoln.

Mas ele foi embora. E não somente isso, como também deixou claro como cristal que ele nunca seria o homem que ela procurava.

Talvez Nick fosse.

Nick Ballantine era uma pessoa estável. Não desaparecia se as coisas ficassem complicadas. E ela gostava da falta de convencionalismo dele. Gostava de como ele se sentia à vontade tanto usando terno em um arranha-céu quanto preparando martinis atrás do balcão de um bar.

— Sim, Nicholas — Taylor respondeu em tom especulativo. — É claro que Daisy irá jantar com você.

— Calma lá — Lincoln disse antes que Daisy tivesse a chance de intervir. — Pensei que você tivesse dito que estava alertando-a sobre os avanços de Ballantine.

— Realmente — Taylor concordou, dando um sorriso lento. — Mas isso foi antes de eu ver essa situação toda. — Ela balançou um dedo entre Daisy e Lincoln. — E isso será muito mais divertido.

— Você é mesmo uma vaca — Nick murmurou.

Ela o ignorou, dando a Daisy e Lincoln um pequeno aceno de mão enquanto se afastava.

— Te mando uma mensagem mais tarde, Daisy? — Nick perguntou.

— Sim, com certeza — disse ela com um sorriso, mesmo sabendo que Lincoln a observava.

Nick bateu levemente a palma da mão duas vezes contra a mesa antes de assentir e se levantar. Daisy teve certeza de que ele e Lincoln trocaram olhares afiados sobre sua cabeça, mas Nick se virou e caminhou calmamente até a porta da frente antes que ela tivesse a chance de avaliar a situação.

Ela voltou-se para Lincoln, que já parecia bem menos em choque, mas muito mais irritado.

— Quer me atualizar sobre o que está acontecendo?

Ela abriu a boca, mas foi interrompida pelo toque do telefone da recepção. — Droga — ela murmurou. — Pelo visto, hoje vão começar cedo.

Daisy voltou para a mesa. — Revista Oxford, aqui é Daisy... Claro, vou transferir a ligação.

Se ela aprendeu alguma coisa em duas semanas de trabalho, era que havia uma ligação nova a cada segundo, e levou mais três chamadas atendidas para ela finalmente poder direcionar a atenção para Lincoln de novo.

— Você é boa nisso — ele disse, acenando com a cabeça para o sistema telefônico complexo.

Ela encolheu os ombros. — Demorei alguns dias, mas...

— O que está fazendo aqui, Daisy?

— Na Oxford ou em Nova York? — Ela perguntou, enrolando.

— Os dois. Tanto faz.

Ela apoiou levemente as dez pontas dos dedos contra a mesa e os abriu, tamborilando-os calmamente enquanto pensava em como responder. Ela queria ser honesta, obviamente, mas muita honestidade a deixaria vulnerável.

— Eu me dei conta de que precisava de uma mudança — disse ela. — Amo Charlotte, mas lá eu estava presa em um impasse. Sem amigos além de Whitney, sem emprego, sem perspectivas. Lembrei do jeito como você e Emma sempre falam sobre Nova York, e me pareceu o lugar ideal para recomeçar.

— Como recepcionista da Oxford?

— Bem, não, esse emprego é temporário — ela respondeu. — Fico grata por Cassidy ter me dado algo a curto prazo para fazer, mas vou renovar meu currículo. Estou pensando em trabalhar com algo envolvendo organização de eventos. Planejamento de casamentos, de preferência.

— Você seria boa nisso — disse ele.

Ela sorriu. — Eu sei.

— Então, está pensando em ficar. Vai morar aqui?

— Vendi minha casa. Bem, a casa de Gary. Agora, percebo que nunca foi realmente minha.

— E está saindo com Nick Ballantine.

— Não tenho... certeza.

— Mas irá jantar com ele essa noite — disse Lincoln, a voz um tanto fria.

Daisy jogou as mãos no ar, irritada. — Tudo bem, estou saindo com Nick Ballantine. Não era isso que você queria, Lincoln? Que eu seguisse em frente com a minha vida? Encontrar alguém digno. "Seja feliz, Daisy”, não foi isso que me disse?

— Sim, mas deveria fazer tudo isso na Carolina do Norte!

— Que diferença faz!? — Ela gritou, mas abaixou a voz. — Aqui, lá, é tudo a mesma coisa.

— Não, não é a mesma coisa — ele retrucou. — Quando você estava lá, eu precisava apenas pensar nisso, não ver. Mas isso... isso...

— O que você quer? — Ela perguntou firmemente, desafiando-o a ser corajoso. Desafiando-o a convidá-la para sair.

Ele deu-lhe um olhar afiado e ela quase sorriu, porque ele era obviamente um homem não acostumado com a frustração, e a versão irritada de Lincoln era meio sexy.

— Eu quero café — ele resmungou. — No momento, quero café e ar fresco, e vou ao maldito Starbucks.

— Certo...

Daisy não teve chance de terminar a frase. Porque Lincoln já estava saindo do escritório e quase derrubou Grace Malone, que entrava no mesmo momento em que ele estava saindo.

— Ei! — A linda morena disse, sorrindo para ele. — Você voltou! É tão bom te ver, temos que almoçar juntos e colocar o papo em dia.

Lincoln deu um passo para trás para segurar a porta para Grace, rosnou uma resposta que Daisy não conseguiu ouvir e entrou no elevador, pressionando o botão com um golpe furioso.

Grace caminhou para a mesa de Daisy, partindo um pedaço do bolinho que segurava e mordiscando-o enquanto analisava Lincoln através da porta de vidro. — O que foi aquilo? Eu nunca o vi assim.

— Não faço ideia — Daisy respondeu.

Grace se virou e estreitou os olhos. — É mesmo? Porque você parece quase alegre com o mau humor dele.

— Eu acho que... — Daisy mordeu o lábio. — Acho que talvez ele tenha ficado com ciúmes. Ele ouviu Nick Ballantine me convidar para sair e ficou todo... estranho.

— Ciúmes — disse Grace, pensativa. — Isso explicaria porque não o reconheci. Não sei se sequer já o vi com ciúmes alguma vez. Digo, o cara nem notou meu bolinho de chocolate. O Lincoln que eu conheço...

Ela interrompeu a fala bruscamente quando Daisy pigarreou alto, no momento em que Lincoln voltou para o escritório.

Nenhuma das mulheres disse nada quando ele parou ao lado de Grace. Então, inclinou-se para beijar a bochecha dela. — É bom ver você também, Sra. Malone. O almoço me parece uma ótima ideia.

Ele olhou para Daisy e o sorriso no rosto desapareceu. — Nossa conversa ainda não terminou, Wallflower.

— E isso significa?

Ele não respondeu.

Apenas arrancou o bolinho de Grace da mão dela e saiu do escritório mais uma vez, mordendo o doce pelo caminho.

— Ora, ora — Grace murmurou. — Sinto que as coisas estão prestes a ficarem interessantes.


Capítulo 26

Lincoln pegou o celular e checou duas vezes o endereço situado no Upper East Side que Emma lhe enviara por mensagem, para confirmar se o arranha-céu novinho em folha e reluzente era, de fato, a residência atual de Daisy.

Ele deveria ter imaginado. O custo de vida em Manhattan era alto, mas a casa de Daisy em Charlotte era gigante. Se ela a vendeu, poderia comprar um apartamento luxuoso em praticamente qualquer bairro que quisesse.

Outro homem poderia se sentir intimidado, mas sabendo que esse estilo de vida era a recompensa de Daisy por ter aturado o ex idiota, ele ficava muito feliz por ela.

Mas ficaria muito mais feliz se ela não estivesse em um encontro com outro homem agora.

Foi surpreendentemente fácil convencer Emma a dar-lhe o endereço de Daisy. Ele esperava que Emma agisse como uma “mamãe ursa”, que fosse dizer a ele poucas e boas sobre deixar a irmã dela em paz e tudo mais, mas, ao invés disso, ela mandou uma mensagem com o endereço de Daisy juntamente com um “Tome muito cuidado”.

Ele não tinha certeza se deveria ser cauteloso por causa dele ou de Daisy. Provavelmente por ambos.

Inferno, ele nem tinha certeza do que estava fazendo ali. Dissera a si mesmo que era porque precisava se desculpar pela maneira como as coisas entre eles terminaram em Charlotte. Mas depois disse a si mesmo que era porque queria contar à amiga sobre como havia conseguido fechar o próprio ciclo de sofrimento, na Costa Rica.

As duas opções eram verdade.

Mas o que parecia ser ainda mais verdadeiro era que ele queria ser o último homem que ela veria antes de dormir essa noite. Ele. Não o fodido do Nick Ballantine.

Lincoln olhou para o relógio. Nove e meia. Será que ela já estava em casa? Nova-iorquinos eram conhecidos por fazer todas as refeições mais tarde que o normal, mas era segunda-feira, e ele sabia que Daisy acordava cedo, mesmo que agisse de modo atrapalhado e meio grogue até tomar uma xícara de café.

Merda. E se Ballantine estivesse lá? Ou se ela não estivesse porque estava na casa do outro homem? E se Ballantine estivesse vendo a lingerie sexy dela agora, tocando aquela pele macia e bronzeada...

Lincoln cogitou ir embora, mas se forçou a prosseguir. Estava cansado demais de ficar nos bastidores da própria vida.

O saguão do prédio dela era luxuoso, uma mistura do glamour dos pisos de mármore e lustres clássicos com tecnologias contemporâneas – à sua esquerda, as caixas de correio dos moradores tinham fechaduras eletrônicas sofisticadas; uma tela plana embutida na parede notificava de forma discreta os residentes do local quando havia alguma entrega para eles na recepção.

Lincoln se aproximou do balcão, onde dois homens bem vestidos de terno lhe deram sorrisos educados, embora sem emoção.

— Estou aqui para ver Daisy Sinclair.

— Ela está esperando por você?

Porra, não.

— Não.

— Seu nome?

— Lincoln Mathis.

O homem à direita assentiu antes de pegar o telefone e discar um número.

Um segundo depois, o homem sorriu. — Boa noite, Srta. Sinclair. É Roy, da recepção... Sim, senhora, estou bem, obrigado. Tem visita para você aqui em baixo. Um tal de Lincoln Mathis...

Lincoln resistiu à vontade de arrancar o telefone da mão do homem e exigir que Daisy o deixasse subir agora.

— ... Sim, senhora, muito bem. Vou mandá-lo subir.

Lincoln deu um suspiro de alívio. Ela estava em casa. Agora só esperava que estivesse sozinha também. E que quando chegasse lá, já tivesse pensado em algo para dizer a ela.

Roy desligou e apontou para a direita, na direção ao elevador. — Vou chamar o primeiro elevador à direita, irá levá-lo ao quadragésimo segundo andar. O apartamento da Srta. Sinclair é o 42F.

Lincoln assentiu em agradecimento e seguiu as instruções dadas até, finalmente, estar diante da porta de Daisy.

Ela atendeu a batida quase imediatamente e a respiração dele saiu em um sopro rápido. Ela usava shorts brancos minúsculos, uma blusa branca justa e um enorme cardigã azul e felpudo que terminava no meio da panturrilha. — Você já está pronta para dormir.

Daisy riu levemente e fez um gesto para ele entrar. — Eu estava planejando ler na cama por um tempo. Ia me trocar, mas lembrei que fomos praticamente colegas de quarto por algumas semanas. Você viu essa mesma roupa em Charlotte quando tomávamos café juntos.

Sim, mas era diferente. Para começo de conversa, o pijama parecia puramente adorável pela manhã, mas à noite, era definitivamente apertado demais. E talvez a parte mais importante: as coisas eram seguras entre eles em Charlotte.

Havia o fantasma de Katie como escudo, assim como o terrível legado do ex-marido de Daisy.

Aqui, porém, era um novo começo.

Ou talvez não.

— Como foi o seu encontro? — Ele perguntou bruscamente quando ela fechou a porta da frente.

Ela deu um sorriso tranquilo e cruzou os braços sobre o peito. — Foi bom. Quer uma bebida?

Quão bom? — Sim. Obrigado.

Ele seguiu Daisy até a sala de estar. Era bastante simples – um sofá único, uma mesinha de centro e um carrinho de bebidas –, mas quem precisava de muita coisa quando se tinha uma vista de Manhattan concedida por um arranha-céu?

— Estou aqui há apenas algumas semanas — ela comentou, andando até o carrinho de bebidas no canto mais distante da sala, e servindo aos dois algo de uma garrafa. — Já tenho os móveis principais, mas ainda estou tentando me decidir sobre alguns detalhes.

— Você vendeu a casa em Charlotte?

Ela assentiu. — Recebi uma oferta quase no mesmo segundo em que foi lançada no mercado. Provavelmente poderia ter esperado mais, conseguido uma oferta maior, mas queria vender o mais rápido possível. Além disso, o comprador ficou com todos os móveis, ou seja, não precisei lidar com a limpeza do local.

— Você se mudou rápido.

— É fácil fazer isso quando saí correndo — disse ela, entregando-lhe um copo.

Ele analisou o rosto dela enquanto eles brindavam, e se perguntou se ela havia escolhido aquelas palavras de propósito – para lembrá-los que, não muito tempo atrás, ele saiu correndo.

Mas, em vez de provocá-lo, ela deu um sorriso agradável, gesticulou para o sofá, sentou-se de pernas cruzadas e o encarou enquanto ele se sentava ao lado dela.

— Então, o que está rolando? — Ela tomou um pequeno gole do uísque.

Ele se inclinou para frente, apalpando o copo entre as mãos, observando o líquido âmbar balançar suavemente de um lado ao outro. — Eu te devo desculpas.

— Certo — ela respondeu lentamente. — E você achou que nove e meia da noite de uma segunda-feira fosse a hora certa para fazer isso?

— Já ficamos acordados até mais tarde do que isso antes — disse ele. — Juntos.

— Sim. Mas como você mesmo enfatizou hoje, as coisas eram diferentes.

— Eu não quero que sejam diferentes.

— Bem, elas precisam ser, Lincoln — ela retrucou, a voz um pouquinho impaciente. — Naquele tempo, estávamos protegidos atrás de nossos próprios muros. Então, eu saí de trás do meu e você permaneceu firmemente cercado pelo seu. E eu entendo, realmente, realmente entendo, mas você me disse para não esperar, me pediu para ser feliz... eu não esperei, e estou feliz, mas tenho a impressão de que você não está.

— Eu estou — ele afirmou entredentes. — Só quis dizer que estava errado em ir embora daquele jeito. Sem me despedir.

— Foi mesmo patético — ela concordou, levantando um ombro e tomando um gole da bebida. — Mas eu superei.

— Fácil assim, hein? — Ele virou a cabeça e deu um sorriso triste.

— O que eu deveria ter feito, implorado para que voltasse? Você tinha assuntos para resolver, eu entendi. E você resolveu. Costa Rica, certo?

Ele assentiu, virando-se e olhando diretamente para a janela.

— Quer falar sobre isso? — Ela perguntou, a voz suave.

Ele abriu a boca, disposto a contar-lhe a mesma coisa que havia dito a Cassidy. Que foi terapêutico. Que tinha sido o que ele precisava para se recuperar totalmente.

Mas percebeu que não queria falar sobre isso, porque não precisava. Talvez esse fosse o problema de fechar um ciclo de sofrimento – depois que você o fazia, seu cérebro começava a direcionar seus pensamentos para outras coisas.

Começou a mudar de Katie para Daisy.

Da mulher que não estava mais aqui para a que estava.

Para a mulher que estava saindo com outro homem.

— Não — ele disse, engolindo de vez o resto da bebida. — Não quero falar sobre isso.

— Bem, o que você quer? — Ela perguntou, repetindo a pergunta de mais cedo.

Pela manhã, ele desviou da conversa da maneira mais covarde possível: decidiu ir tomar café em vez de responder. E fez o mesmo agora também. Lincoln levantou o copo, indicando que queria mais.

Ela sorriu, mas foi forçado. — Vá em frente. Fique à vontade.

A decepção dela estava estampada no rosto, e Lincoln odiou a si mesmo quando levantou a fim de servir a si mesmo de mais uma dose de uma bebida que ele nem queria. Ele pegou a garrafa, mas parou, e, ao invés disso, pousou o copo silenciosamente no carrinho de bebidas. — Tenho que ir.

Ele a ouviu se colocar de pé e apoiar o copo na mesa. — Se é o que você quer. Mas eu odeio esse desconforto entre nós dois.

Lincoln se virou. — Sim, bem, como você disse, as coisas estão diferentes agora. Não somos mais amigos a distância destinados a ver um ao outro a cada poucos meses ou anos. E você está saindo com Nick.

Ele queria que ela negasse, mas ela não negou.

Droga, cara, seja decente. Deixe-a em paz.

Lincoln caminhou até a saída e abriu a porta. Ela o seguiu. — Então, acho que te vejo amanhã no trabalho — ele falou, dando uma risadinha. — Essa é nova.

— Você vai se acostumar — ela respondeu. — E se não, é como eu disse, vai ser temporário, e em breve estarei fora do seu caminho.

Ele franziu a testa e apoiou uma mão na porta aberta. — É isso que você acha que eu quero? Não te ver de novo?

— Eu acho que você é um homem que teve a vida virada de cabeça para baixo e finalmente está pronto para recuperá-la. Acho que aquela noite estranha que tivemos em Charlotte pode complicar tudo.

— Não me transforme em um projeto, Daisy — ele retrucou. — E “estranha” não seria a palavra que eu usaria para descrever aquela noite.

— Qual palavra você usaria, então?

— Excitante — ele rosnou antes que pudesse pensar melhor. — Foi muito excitante e você sabe disso.

— Sim, eu sei. Também sei que você fugiu.

— E já me desculpei!

— E eu aceitei! — Ela gritou de volta.

Ele soltou uma risada incrédula e passou a mão sobre os olhos antes de balançar a cabeça. — Isso é ridículo. Vou embora. Vejo você amanhã depois que estivermos de cabeça fria.

Ela assentiu, o rosto tenso e confuso, como se a raiva fosse um sentimento tão estranho para ela quanto era para ele. — Boa noite.

Ele se virou e parou no corredor quando ela fechava a porta atrás dele, mas no último segundo, ele se virou, batendo a palma da mão contra a porta e empurrando-a com força suficiente para fazer Daisy recuar e arquejar em surpresa.

Quando Lincoln a encarou, a sensação era que seu cérebro parecia um aglomerado de ruídos, fervendo de raiva, esperança e muito desejo.

— Por que Nova York?

Ela levou os dedos para a garganta nervosamente antes de deixar as mãos caírem para o lado do corpo outra vez, dando um passo para trás. — O quê?

— Por que Nova York? — Ele perguntou de novo, continuando a andar na direção dela. — Com tantos lugares no país, no mundo, e você escolhe começar do zero justamente aqui.

— Dificilmente sou a primeira pessoa a fazer isso — ela respondeu de modo impaciente. — É Nova York. É o que as pessoas fazem.

— Isso não é uma resposta — ele disse suavemente ao mesmo tempo que as costas de Daisy se chocaram na parede atrás dela. Lentamente, ele levantou um braço, descansando o antebraço acima da cabeça dela, cercando-a. — Por. Que. Nova. York?

— Não sei — ela sussurrou. — Emma, ??eu acho.

— E eu acho que você está mentindo — ele falou, descansando a outra mão suavemente contra o pescoço dela, os olhos fixos no movimento que o próprio polegar fazia ao longo do maxilar dela.

— Tudo bem, vou jogar o seu joguinho — disse ela. — Por que você acha que eu vim para Nova York?

Os olhos de Lincoln se voltaram para os dela. — Eu acho que veio para isso.

E então, pela primeira vez em quase três anos, Lincoln abaixou a cabeça e beijou uma mulher porque realmente desejava


Capítulo 27

A mente de Daisy ficou em branco ao sentir a boca dele na dela, mas logo foi preenchida com mais emoções do que ela era capaz de assimilar.

As principais?

Choque.

Felicidade.

E um desejo tão forte que ela pensou que morreria.

E foi esse último que ela escolheu.

O beijo foi exigente e gentil, como se ele quisesse desesperadamente que ela o desejasse, mas preparado para recuar se isso não acontecesse. Pela maneira como manteve o corpo longe do dela, ela percebeu que ele estava agindo cautelosamente, mesmo que sentisse o comando silencioso dos lábios dele.

Daisy ergueu as mãos para a frente da camisa dele, enroscou os dedos ali e o puxou para perto. Precisava dele.

Vá em frente, ela silenciosamente ordenou.

Ele foi. No segundo em que obteve a resposta que queria, Lincoln gemeu contra a boca dela, inclinando-se contra ela enquanto movia o braço, outrora acima da cabeça dela, para a cintura, pressionando uma palma quente e insistente em sua pele. Então, usou os próprios lábios para afastar os dela, reivindicando o interior de sua boca com a língua como se cada parte dela o pertencesse.

Daisy já era dele, talvez fosse desde aquela primeira noite em que se viram.

Mesmo com os corpos juntos, não parecia o suficiente. Ela envolveu os braços ao redor do pescoço dele, segurando-o o mais perto que podia, aterrorizada pela possibilidade de ele mudar de ideia.

Lincoln deslizou as mãos para os cabelos dela, afastando-a gentilmente para manter o toque delicado, e moveu a boca ao longo de sua mandíbula.

Ela deixou um pequeno suspiro escapar quando os dentes dele mordiscaram-lhe o lóbulo da orelha, e o que eram apenas suspiros se transformaram em um gemido completo quando ela sentiu a boca quente e úmida dele tocar a pele sensível de seu pescoço.

Ele deslizou as mãos sob a camisa dela, palmas quentes pressionando sua cintura nua enquanto ele respirava com dificuldade contra o pescoço dela.

— É melhor eu ir embora — ele disse em uma voz rouca.

Os braços de Daisy se apertaram reflexivamente ao redor dele. — Por quê?

— Porque se eu ficar, vou te levar para a cama, e eu deveria pelo menos levá-la para sair antes.

— Já tivemos muitos encontros — ela respondeu, correndo as mãos pelas costas dele. — Apenas não os nomeamos assim.

Ele soltou uma risadinha. — Acho que você não entendeu direito, Wallflower. Não estive com nenhuma mulher desde antes do acidente de Katie. Eu não vou ser gentil. Não acho que consigo.

— Eu não quero delicadeza — disse Daisy, mentalmente fazendo as contas de quanto tempo fazia. Três anos. Ele não tocou nenhuma mulher durante esse tempo. O coração dela se alegrou.

— Mas você merece — ele respondeu, colocando a mão na bochecha dela e olhando-a com tanta intensidade que a fez queimar de dentro para fora. — Depois do que passou com seu ex... eu vejo a forma como você se esquiva dos homens, o jeito que se mantém afastada...

Ela levantou as mãos e passou as pontas dos dedos sobre as maçãs perfeitas do rosto dele. — Eu tenho sido cautelosa, sim. E demoro um pouco para conseguir me sentir segura perto de homens, isso também é verdade. Talvez seja sempre assim. Mas não tenho medo de você, Lincoln. Nunca tive.

— Daisy...

— Eu quero você — ela falou, simples e direta. — Quero suas mãos em mim, quero seu toque gentil ou bruto, desesperadamente, porque estou sentindo todas essas coisas. Eu tenho sentido tudo isso há um tempo.

Ele xingou baixinho, a testa apoiada na dela, e ela pôde sentir que ele estava em guerra consigo mesmo.

Droga de homem teimoso.

Daisy pararia de suplicar, mas lutaria.

Ela o empurrou para trás com firmeza e propósito. — Você disse que veio se desculpar pelo modo como me deixou naquela última noite em Charlotte.

Lincoln se afastou um pouco e assentiu, mesmo com o olhar semicerrado.

Ela ficou na ponta dos pés e pressionou os lábios nos dele suavemente. — Não cometa o mesmo erro duas vezes. Não vá embora.

— Wallflower, você não faz ideia do que está pedindo.

Em resposta, ela pegou a mão dele e, de costas, levou-o até o quarto. Se a sala de estar parecia um pouco vazia, o quarto era ainda mais, mas ele não pareceu notar.

Tinha uma cama, e era só isso que importava.

Ela viu a indecisão no rosto dele – o cavalheirismo em guerra com o desejo primitivo – e decidiu facilitar as coisas. Daisy tirou o cardigã, jogou-o para o lado, e fixou o olhar no dele enquanto puxava a camiseta por cima da cabeça.

Ele gemeu, os olhos escurecendo para um tom de azul escuro, e Daisy recuou lentamente em direção à cama, parando quando a parte de trás dos joelhos tocaram o móvel, e despreocupadamente deslizou o short para baixo.

Por um mínimo segundo, ela segurou a peça no lugar, ainda mantendo o olhar no dele, e então deixou o short cair de uma vez. Daisy pensou que ficaria envergonhada – era a primeira vez que sequer tentava seduzir um homem –, mas pela maneira que o olhar dele percorria avidamente o corpo dela, ela soube que estava indo bem.

Ela deitou de costas na cama e, apesar de ter parado e feito o famoso “vem cá” com o dedo, o convite não poderia ter sido mais claro.

Os olhos de Lincoln se fecharam. — Caralho, Daisy.

Então, ele estava tirando o terno e arremessando-o em cima de uma caixa de papelão que ainda não fora desempacotada. Ele abriu nos botões da camisa enquanto se aproximava da cama, e ela quase lhe pediu que parasse para poder desabotoa-los por conta própria, mas estava ansiosa demais para vê-lo, para sentir o peso dele sobre seu corpo.

Lincoln tirou os sapatos e Daisy foi para a beirada da cama, ajoelhando-se para puxar a camisa dos ombros dele, e ele inclinou a cabeça para frente e reivindicou a boca dela em outro beijo de tirar o fôlego. Lincoln se afastou por tempo suficiente para puxar a camiseta por cima da cabeça.

As mãos de Daisy estavam nele antes da peça cair no chão. — Gostaria apenas de salientar que tive um excelente autocontrole mantendo minhas mãos longe disso aqui por tanto tempo.

— É mútuo — ele disse, rouco, deslizando as mãos pelas costas dela e segurando seus seios com as mãos. — Você é mais perfeita do que eu imaginava.

— Você imaginou isso? — Ela perguntou sem fôlego quando os polegares dele roçaram seus mamilos.

— Você não faz ideia. — Ele a beijou novamente de modo lento e um pouco meigo, e as mãos dela encontraram a fivela do cinto, desabotoando a calça dele e deslizando-a lentamente pelo quadril.

Ele deu um passo para trás, mantendo o olhar no dela enquanto tirava a calça e as meias, e então estava diante dela vestindo apenas uma cueca preta básica, exibindo a perfeição que era aquele corpo.

Lincoln sorriu para ela, claramente se divertindo com a admiração descarada que estava recebendo, e justamente quando ela pensou que ele poderia ter exagerado sobre o quão grande era o próprio desejo, ela se viu deitada de costas na cama, as mãos dele nos dois lados de sua cabeça, equilibrando-se sobre o corpo dela. Então, ele uniu suas bocas mais uma vez.

Daisy sentiu-se tonta de desejo quando o envolveu com os braços, com a necessidade de se aproximar mais. Quando ela inclinou os quadris para cima e roçou o tecido fino da calcinha contra a ereção dele, ele interrompeu o beijo com um palavrão.

Ela deslizou os dedos para o elástico da cueca, mas as mãos dele seguraram os seus pulsos, empurrando-os de volta para a cama, mantendo-a imóvel enquanto inclinava a cabeça para seus seios e deslizava uma língua quente e provocadora sobre o mamilo dela.

Daisy choramingou e arqueou corpo, e ele a lambeu novamente. Seus lábios e língua a provocaram até ela se contorcer, murmurando o nome dele como uma súplica. Finalmente, ele atendeu o pedido dela: envolveu um mamilo com a boca ao mesmo tempo em que a arranhava levemente com os dentes.

Ela agarrou a cabeça dele. Estava bom, muito bom, mas ela precisava de mais. Precisava de tudo.

Daisy não percebeu que tinha dito isso em voz alta até que o sentiu sorrir contra seu corpo úmido.

A mão dele deslizou para baixo, passeando sobre o estômago dela até envolver a região quente e úmida através do tecido da calcinha.

Lincoln gemeu, levantou a cabeça e a olhou. — Você faz alguma ideia do que tocar você faz comigo? Do quanto eu fantasiei te tocar bem aqui?

Ela negou com a cabeça, encontrando os olhos dele quando ele deslizou os dedos sob o tecido, sobre a pele lisa dela.

Lincoln provocou seu clitóris com movimentos circulares e torturantes antes de deslizar a mão para baixo e enfiar um dedo dentro dela.

Ele deixou a cabeça cair em seu ombro, agarrando a pele dela entre os dentes enquanto deslizava o dedo para dentro e para fora, os dois respirando cada vez mais irregularmente.

— Me diga que você tem camisinha — ele rosnou.

— Eu tomo anticoncepcional — disse ela. — E fiz exames depois do divórcio e não houve mais ninguém...

Lincoln se moveu e, em segundos, havia tirado a roupa íntima dos dois e estava apoiado acima dela.

Ele colocou as mãos nos dois lados da cabeça dela, encostando o pau em sua entrada. Em resposta, ela abriu mais as pernas e cravou os dedos nas costas dele.

— Daisy. — Lincoln engoliu em seco quando encostou contra ela novamente. — Daisy, fui o mais devagar possível, mas não acho que vou conseguir ser gentil agora.

Ela cravou as unhas nas costas dele com um pouco mais de força e ergueu os quadris. — Eu não quero gentileza. Só quero você.

Era tudo o que ele precisava. Lincoln se moveu levemente e se empurrou para dentro dela, preenchendo-a com tanta firmeza e tão profundamente que ela ofegou.

— Porra — ele falou de olhos fechados, respirando pesadamente, o suor escorrendo pela testa. — Me fode.

Mas então ele começou a se mover, e não restou dúvidas de quem estava fodendo quem. Lincoln estava no controle. Ela percebeu que ele estava certo. Não estava sendo gentil. Mas sim fodendo-a com força e precisão, e Daisy saboreou cada impulso, cada suspiro liberado a medida em que ele se empurrava para dentro dela.

Seus impulsos ficaram mais rápidos e ele parou de apoiar o corpo com as mãos e equilibrou-se com os antebraços, segurando a cabeça dela, os dedos emaranhados em seus cabelos. Ele se impulsionou para dentro dela várias e várias vezes, o corpo dele ficou tenso e ele rosnou o nome de Daisy, gozando dentro dela.

Ela permaneceu com o corpo grudado ao dele, envolvendo-o com os braços, querendo abraçá-lo para sempre, desejando poder ser tudo que ele precisasse, sempre.

Quando sua respiração se estabilizou, ele se moveu, afastando-se o suficiente para poder retirar os cabelos úmidos grudados no rosto dela. Ele roçou o polegar em seu lábio inferior. — Bem, não foi um trabalho muito bem feito da minha parte.

— Eu discordo — ela falou, a voz rouca.

— Você acreditaria se eu lhe dissesse que, em circunstâncias diferentes, sou muito melhor dando prazer à minha mulher?

— Lincoln Mathis, tenho certeza que você foi colocado neste mundo para dar prazer às mulheres.

Ele abaixou a cabeça, dando-lhe um beijo excitante, enroscando a língua na dela.— Gostaria de provar.

Ele passou uma mão pela lateral do corpo dela, deslizando-a entre as coxas e afastando-as.

— Lincoln, você não precisa...

Ele interrompeu o protesto dela com um beijo, pressionando um polegar contra ela e deslizando um dedo, e depois outro, para dentro dela.

— O que você disse mesmo? — Ele murmurou contra a boca dela.

— Não pare. — Ela ofegou.

Ele aumentou a velocidade, acelerando cada vez mais os movimentos circulares do polegar, até que o corpo de Daisy enrijeceu e ela gozou em suas mãos hábeis. Ele permaneceu ali durante cada estremecimento do corpo dela e capturou cada grito e arfada com os lábios.

Finalmente, o batimento cardíaco dela desacelerou, e ele apoiou a cabeça na mão, olhando-a enquanto acariciava preguiçosamente a lateral do corpo dela.

— Oi — disse ela, subitamente sentindo-se tímida.

— Oi — ele respondeu com um sorriso.

— No que você está pensando?

Ele bufou. — Sério, Wallflower?

Daisy riu. — Eu sei. Esse é o clichê principal do que não perguntar a um homem, mas nossas circunstâncias dificilmente são normais. Nossa história não é nem um pouco comum.

— Acontece que eu gosto da nossa história — ele admitiu, a mão ampliando as carícias para o torso dela, roçando acidentalmente-de-propósito na parte de baixo de seus seios. — Especialmente agora que ela tomou um rumo na direção da parte envolvendo nudez.

— Não se arrepende de nada? — Ela indagou, odiando-se por perguntar aquilo, mas incapaz de se conter. Tinha acabado de transar com um cara que não fazia sexo há quase três anos, sendo que na maior parte desse tempo ele estava noivo de uma mulher que sequer conseguia reconhecê-lo.

Eles não eram só dois adultos atraídos um pelo outro e agindo por puro desejo. O passado dela era complicado. O dele mais ainda.

O corpo de Lincoln esteve presente durante cada segundo, ela teve certeza disso em todos os impulsos que ele dera para dentro dela. Mas e a mente?

E o coração dele?

Ele estava pensando nela, Daisy? Ou se lembrando de Katie, por sentir culpa ou falta dela?

— Wallflower. — A voz de Lincoln estava firme, forçando os olhos dela a encontrarem os dele. — Não me arrependo de um único segundo.

— Não? — Ela sussurrou.

Ele deslizou uma mão nos cabelos dela, acariciou sua bochecha e olhou para ela com... carinho?

Então, ele inclinou a cabeça para a dela, reivindicando sua boca em um beijo doce, cheio de promessas.

Ele colocou o corpo por cima do dela e Daisy arregalou os olhos quando percebeu que ele estava duro de novo.

— Já? — Ela perguntou.

— Acho que estou compensando o tempo perdido — ele murmurou, correndo os lábios sobre os seios dela, a respiração quente contra seu mamilo.

— E não haverá reclamações da minha parte — ela disse em um arquejo quando ele a lambeu.

— Ótimo — ele sussurrou. — Porque agora pretendo ir com calma.

E ele foi. Ele a venerou com as mãos e a boca, e ela fez o mesmo com ele. E por mais que tivesse sido ótimo antes, na segunda vez foi ainda melhor. Quando eles caíram em um pesado sono pós-sexo, ela não pôde deixar de imaginar o que viria depois da “parte envolvendo nudez”, como ele havia nomeado, da história deles.

Mais preocupante ainda, Daisy começou a se dar conta de que sua história com Lincoln Mathis era uma que ela não queria que tivesse fim.


Capítulo 28

Uma semana depois de Lincoln ter voltado de seu tempo fora, entrado no escritório e encontrado Nick Ballantine atrás de sua mesa, ele teve o pior déjà vu possível.

Lincoln parou de assobiar bruscamente ao ver o homem alto de cabelos escuros recostado em sua cadeira, encarando o celular, os pés apoiados na mesa de Lincoln como se fosse o dono do lugar.

— O que diabos está fazendo aqui?

Nick olhou para cima e sorriu quando viu Lincoln, mas não havia nada de amigável em seu sorriso.

Ele colocou os pés no chão e se levantou. — Desculpe, Mathis. Por acaso você gravou seu nome aqui?

O tom do outro homem era propositalmente descontraído e Lincoln entendeu de imediato. Daisy.

Ela e Nick haviam combinado de ir a um brunch juntos ontem. Lincoln não havia ficado nada contente com a insistência dela em não desmarcar o encontro, mas ficou um pouquinho mais apaziguado quando ela explicou para ele que queria terminar as coisas com Nick de forma amigável.

Não que houvesse algo para ser terminado, mas Daisy salientou que algumas notícias mereciam ser dadas cara a cara.

Ela disse que ele tinha aceitado tudo numa boa.

Olhando para o homem agora, Lincoln não tinha mais tanta certeza.

— Olha, cara — Lincoln disse calmamente. — Eu a conheço há mais tempo do que você.

E ela já era minha desde o início.

— Certo. Então, devo ficar impressionado que você levou meses para se dar conta do quanto ela é incrível, sendo que eu soube disso assim que a vi?

— As circunstâncias eram diferentes quando conheci Daisy — Lincoln respondeu, a voz pouco amigável enquanto contornava a mesa.

Nick recuou, só um pouquinho, enfiando as mãos no bolso. Não usava terno hoje. Apenas jeans escuro e uma camisa preta. — Lamento pelo que houve com sua noiva. Que situação difícil.

— Isso é um eufemismo — retrucou Lincoln.

Nick assentiu e Lincoln teve a desconfortável sensação de que estava sendo estudado.

— Tem algo a me dizer? — Lincoln perguntou.

— Está usando ela como um tapa buraco?

A pergunta fez Lincoln levantar a cabeça bruscamente, os ombros tensionados de raiva. — Sério, cara? Eu falei com você uma vez. Nem te conheço.

— E eu também não conheço você, então garanta para mim que não está enganando Daisy, usando-a para superar seus problemas.

— Eu já superei meus problemas — Lincoln resmungou. Ou pelo menos estou trabalhando nisso.

Nick deu de ombros como se quisesse dizer “certo”, apesar da expressão em seu rosto gritar: mentira.

Lincoln decidiu se afastar, colocou a pasta no chão, acomodou-se na cadeira recentemente desocupada e girou o móvel preguiçosamente enquanto dava a Nick um olhar de provocação. — Sabe, apesar de todas as suas investidas para cima de Daisy, eu apostaria muito dinheiro que Taylor Carr é a mulher que realmente te deixa louco.

Nick rapidamente virou a cabeça para ele, só um pouquinho, mas foi o suficiente para Lincoln saber que atingiu uma ferida, e ganhado um ponto por tal constatação.

— Taylor é uma vaca. E está saindo com Bradley Cross.

Bradley Cross era o executivo de publicidade da Oxford. Lincoln não podia dizer que o conhecia bem – seus caminhos não se cruzavam com frequência –, mas sempre teve a impressão de que, na melhor das hipóteses, o sujeito era sem graça, na pior, um babaca. Dificilmente o tipo de cara com quem um mulherão como Taylor ficaria satisfeita.

— Eu sei — Nick resmungou, aparentemente lendo os pensamentos de Lincoln. — Um idiota de primeira. É por isso que ele é perfeito para Taylor.

Lincoln riu. — Tudo bem. Entendi. Eu me enganei em achar que o ódio entre você e Taylor era motivado por desejo sexual, mas isso não muda o fato que...

— Daisy é sua — Ballantine concluiu. — Entendi isso perfeitamente pela maneira toda sentimental com a qual ela falou sobre você ontem.

Lincoln sentiu uma pontada de satisfação. Ele e Daisy estavam fazendo... o que quer que estivessem fazendo... há uma semana. Mas parecia certo. Era bom. Envolvia gargalhadas e um companheirismo confortável por conta do tempo que passaram juntos na Carolina do Norte, mas também envolvia sexo.

As duas coisas combinadas faziam Lincoln sentir-se, bem... feliz.

O que era ótimo, exceto que por trás dessa felicidade sempre havia a culpa. A sensação de que ainda era cedo demais para superar Katie, de que ele não tinha o direito de se sentir assim sobre uma mulher duas vezes na vida.

E, ao lado da culpa, estava a preocupação.

Preocupação de que Ballantine estivesse certo e que talvez, só talvez, Lincoln estivesse usando Daisy. Usando-a como apoio para fugir da dor. Talvez até usando-a para substituir o vazio deixado pelo acidente e pela morte de Katie.

— Preciso começar a trabalhar — Lincoln falou, a voz audível e indiferente.

Ballantine deu um sorrisinho, como se soubesse exatamente que tipo de pensamentos traiçoeiros havia plantado na cabeça de Lincoln.

— Sem problemas — respondeu, andando na direção da porta. Então, virou-se outra vez. — Apenas saiba que estarei esperando.

— Esperando o quê? — Lincoln paralisou.

O sorrisinho de Ballantine se transformou em um sorriso largo. — Você foder a sua relação com Daisy.

Então ele se foi, deixando Lincoln com o desejo feroz de socar alguma coisa. De preferência, Ballantine. O outro homem falou como se fosse algo inevitável. Não houve nenhum “se” em sua afirmação.

Como se a possibilidade de Lincoln estragar tudo com Daisy fosse uma certeza.

Lincoln abriu a terceira gaveta da mesa. Ele guardava um estoque de doces para dias difíceis, da mesma maneira que os caras de “Mad Men” guardavam bebidas alcoólicas. Ele não havia precisado disso em nenhum dia da semana que se passou, mas caramba, ele queria açúcar e...

Ele retirou a mão da gaveta subitamente como se tivesse se queimado. Ali, ao lado dos pacotes de balinhas Jolly Ranchers, Kit Kats e chocolates recheados de caramelo, havia um porta-retrato de Katie. Ele nunca ousou colocá-lo sobre a mesa por medo das perguntas que isso traria, mas a foto, juntamente com os doces, havia sido uma fonte de conforto para ele. Um lembrete de quem ele era e como teria sido sua vida.

Ele esqueceu que o quadro estava ali.

Como ele havia esquecido que estava ali?

Lincoln queria fechar a gaveta, mas se forçou a pegar a simples moldura prateada. Ele mesmo havia tirado a foto com o celular dele em uma viagem que os dois fizeram aos Hamptons. O vento arenoso tinha bagunçado completamente os cabelos loiros escuros dela, mas não havia escondido os lindos olhos verdes.

Todas as vezes que olhava para a foto, ele imaginava a risada dela, mas agora podia jurar que ela estava olhando para ele com outra coisa no olhar.

Acusação.

Eu sinto muito. Eu sinto muito.

Em um esforço para se redimir por tê-la esquecido, ele colocou a moldura sobre a mesa. Não deixaria ali. Pareceria mórbido demais. Mas precisava que o porta-retrato ficasse ali, apenas por alguns minutos.

Esquecendo os doces, ele fechou a gaveta e apoiou os cotovelos na mesa, pressionando os polegares contra as pálpebras fechadas. Ele tinha sido um idiota em pensar que não precisaria de nada além de uma viagem à Costa Rica para consertar as coisas. Um idiota por imaginar que merecia felicidade...

— Lincoln?

Ele olhou para cima e, caralho, era Daisy.

E duas vezes “caralho”, porque ela estava usando o vestido. O vestido. O azul com renda preta que ela usou naquela noite em Charlotte quando ele a fodeu verbalmente. Quando fodeu ambos verbalmente.

— Você está bem? — Ela questionou, entrando no escritório e fechando a porta.

Não. Estou muito longe de estar bem.

— Sim — ele respondeu, afastando-se da mesa.

Os olhos dela se ergueram com o tom ríspido dele, mas não disse nada. — Hum, eu só queria passar aqui e...

— Eu sei porque você veio até aqui — ele a interrompeu.

Daisy piscou. — Sabe?

Lincoln passou por ela e, silenciosa e intencionalmente, trancou a porta, depois caminhou para perto dela outra vez.

— Sei — ele disse baixinho, estendendo a mão e deslizando-a pelos cabelos dela, um toque não muito delicado, enquanto traçava a linha do maxilar dela com o polegar, os olhos fixos nos lábios cheios que sempre foram uma terrível tentação desde o primeiro dia.

Maldita seja ela. Maldita seja ela pelas coisas que fazia com ele.

Sem avisos, a virou de costas para ele. Sabia que estava agindo de modo desesperado, mas precisava disso. Precisava dela.

— Você vestiu este vestido de propósito — ele acusou em uma voz rouca.

Ela deu uma risada nervosa que confirmou que ele estava certo. A safadinha viera aqui para seduzi-lo. E ele estava muito feliz em entrar no jogo.

— Diga-me uma coisa, querida — ele continuou, empurrando os cabelos dela para a frente, por cima do ombro, os dedos brincando com a pontinha de metal do zíper do vestido. — Se eu abrisse isso, encontraria o mesmo sutiã sexy que você usou para aquele outro cara... como era mesmo o nome dele?

A respiração de Daisy estava um pouquinho acelerada. — Eu não lembro.

— Boa menina — ele murmurou, puxando o zíper lentamente, recompensando-a.

Parou apenas quando estava no meio das costas dela, expondo a renda preta e o sutiã de cetim rosa que ele sabia que estaria esperando por ele. — Exatamente como eu esperava — disse ele. — Parece que alguém andou tendo pensamentos indecentes sobre transar no escritório essa manhã.

Ela tentou se virar, mas ele a segurou, mantendo-a no lugar. — O que eu disse que faria com você naquela noite? — Ele perguntou, pensativo, deslizando os polegares pela alça da parte de trás do belo sutiã.

— As memórias são meio vagas...

Ele se inclinou para frente e pressionou os lábios contra a nuca exposta dela antes de mordiscá-la levemente. — Mentirosa. O que eu disse, Daisy?

Por um momento, houve apenas o som de suas respirações – o ar tenso com antecipação.

— Você não conseguia se decidir — ela sussurrou. — Não conseguia decidir entre abrir o sutiã primeiro ou tirar o vestido antes.

— Ah, verdade — ele falou, como se não lembrasse de cada palavra e fantasia daquela noite. — Eu não conseguia decidir se queria vê-la nesse sutiã bonito ou se queria pôr as mãos em você o mais rápido possível.

Ele deslizou os polegares pelas costas dela, exatamente como naquela noite, e então abriu o zíper completamente.

— E...? — Ela indagou, ofegante. — O que decidiu?

Em resposta, ele apoiou as mãos no centro das costas dela e abriu o fecho do sutiã.

Lincoln se aproximou, deslizando as mãos na abertura agora escancarada do vestido, as palmas das mãos passeando rápido ao longo das laterais do corpo dela antes de segurar seus seios.

Daisy ofegou e Lincoln se aproximou mais, aninhando o pau contra a curva da bunda dela ao mesmo tempo em que segurava seus mamilos com as mãos.

Fazia uma semana que estavam dormindo juntos e ele ainda não conseguia acreditar no quão bom era senti-la. Não se cansava de tocá-la. De sentir o gosto dela.

Ele beliscou os mamilos dela com os dedos enquanto a boca brincava com a pele macia do pescoço.

— Lincoln — ela sussurrou de prazer e jogou a cabeça para trás, descansando-a no ombro dele.

Ele retirou as mãos do vestido apenas por tempo suficiente para empurrar a peça e o sutiã já aberto para frente, pelos ombros. — É isso que você quer? — Ele murmurou contra a pele dela. — Ficar exposta assim, nua da cintura para cima, para que eu possa tocá-la em todos os lugares.

Ele roçou as pontas dos dedos levemente nos mamilos dela, provocando-a, e Daisy choramingou de desejo.

Seu pau ficou inacreditavelmente mais duro. — O que mais eu disse que faria com você? — Ele perguntou, a voz um comando enquanto mantinha o toque leve.

— Você disse que me viraria — ela sussurrou. — Mas não fez isso, porque tinha medo que se fizesse, precisaria me beijar.

— Você queria que eu te beijasse naquela noite, Daisy? — Ele parou de tocá-la, porque, de alguma forma, a resposta dela era extremamente importante..

— Sim — ela sussurrou. — Naquela noite. E muitas noites antes. E depois.

Os olhos dele se fecharam. Era a resposta que ele precisava e temia. — E agora?

Em resposta, Daisy se virou. Ela manteve o olhar no dele enquanto deslizava as mãos pelo corpo, dando ao vestido o último impulso necessário para a peça cair no chão. Ela se moveu e empurrou a roupa e o sutiã para o lado com um pé calçado por um salto alto, parando na frente dele com somente uma calcinha preta.

— Beije-me, Lincoln.

Como se houvesse outra opção. Ele se aproximou, deslizando um braço ao redor da cintura dela enquanto segurava seu rosto com o outro. Ele inclinou a cabeça para a dela.

Os lábios dela se abriram para ele e Lincoln gemeu. Essa mulher. Não era preciso nada além do gosto da boca dela para transformá-lo em um homem faminto e incansável.

Ela provavelmente se sentia assim também, porque seus dedos agiram frenéticos, empurrando o terno dele para baixo e rapidamente desabotoando sua camisa.

Lincoln soltou uma risada atormentada quando ela avidamente alcançou o cinto dele. — Calma, querida.

Daisy balançou a cabeça e fixou os olhos nos dele. — Eu não quero ir com calma.

Lincoln gemeu novamente, fundindo a boca dela na dele, dobrou um pouco os joelhos e deslizou as mãos para a parte de trás da bunda dela pra poder carregá-la e deitá-la de costas na mesa.

— Você quer que eu te foda com força? — Ele perguntou, colocando-a sobre a mesa e abrindo a fivela do cinto.

Em resposta, ela lambeu o lábio inferior.

Ele se inclinou para ela, mas parou, os lábios a centímetros de um beijo. — Muito exigente você.

Ele deslizou as mãos sob os joelhos dela, erguendo-os para que os saltos em seus pés ficassem apoiados na mesa e afastou as coxas dela completamente.

Sem avisos, ele usou um dedo para empurrar a calcinha dela para o lado e inclinou a boca para sua boceta quente, lambendo-a em movimentos famintos antes de ajeitar o próprio corpo para que pudesse prová-la por um bom tempo.

Daisy gemeu, abrindo ainda mais pernas, e Lincoln apoiou as duas mãos na mesa, usando os braços para se sustentar quando debruçou-se sobre ela, tocando-a com nada além de sua boca.

Ele era um aprendiz rápido quando se tratava de tudo que envolvia o corpo de Daisy Sinclair, e sabia quando ela estava perto. Levou-a até o limite pressionando a língua contra o clitóris dela e se afastou justamente quando ela estava perto de gozar.

Ela gemeu em protesto.

Lincoln abaixou a calça e a cueca o suficiente para libertar seu pau, e empurrou Daisy para o lado da mesa.

— Aqui está a resposta para o seu pedido, Wallflower.

Lincoln puxou bruscamente sua calcinha para baixo e se empurrou para dentro dela de modo rápido e brutal. Daisy colocou a mão sobre a boca para reprimir o grito.

Ele a fodeu. Ele a fodeu como se a vida dele dependesse disso, os dedos cravados em seu quadril macio, os olhos fixos no balanço dos seios dela enquanto a penetrava várias e várias vezes, movido por um desejo frenético.

Em tempo recorde, ele estava à beira de um orgasmo intenso, e moveu o polegar pelo corpo dela, pressionando seu clitóris para levá-la ao limite junto com ele.

Ele acelerou ainda mais, o desejo mútuo dos dois ficando quase insustentável.

Daisy arremessou os braços sobre a cabeça quando gozou, e algo caiu no chão. Lincoln olhou para ela em êxtase e empurrou-se para dentro dela mais uma vez, gozando com um gemido áspero.

Era tão bom. Era sempre tão bom. Como se ele nunca pudesse se cansar disso.

Se cansar dela.

Ele a colocou sentada, roubando um beijo. — Essa é a melhor manhã de segunda-feira que já tive.

Ela deu uma risada baixa e rouca. — Acredite ou não, não foi realmente para isso que eu vim aqui.

— Não? — Ele perguntou, puxando a calça para cima.

— Cassidy quer todos na sala de conferências. Às nove horas.

Ele olhou para o relógio. Restavam-lhe cinco minutos. — Você poderia ter ligado para me dizer isso.

— Ah, definitivamente. Farei isso da próxima vez.

Ele a puxou para outro beijo. — Não se atreva. Daqui em diante, quero que me entregue todos os recados pessoalmente. O uso de vestidos sexys é obrigatório.

Ela riu e foi recolher as próprias roupas.

Lincoln estava curvado para pegar o paletó do chão quando viu.

O item que Daisy havia derrubado da mesa durante a foda violenta deles?

A foto de Katie.

Lincoln congelou, olhando para o porta-retrato. Havia uma rachadura no vidro.

O que fazia jus à situação. Porque Lincoln tinha certeza que havia uma rachadura em seu coração também.

E, caramba, foi como se naquele momento ela tivesse ficado um pouquinho maior.


Capítulo 29

Daisy hesitou antes de aceitar o convite de Mollie Carrington para a “noite das garotas”.

Quando criança, ela e Emma sempre foram muito decididas a ter grupos de amigos diferentes. Claro, elas tinham um punhado de amigos em comum, mas quando chegaram ao ensino fundamental II, reconheceram a real importância de fazer parte de um grupo que não as identificassem como apenas “uma das gêmeas”.

Aceitar ir para a casa de Mollie parecia um pouco como se ela estivesse roubando as amigas de Emma.

Mas caramba, ela realmente queria ir. Para começar, gostava daquelas mulheres. Ela se aproximou mais de Penelope, especialmente porque ela trabalhava na Oxford. E de Grace também, já que Grace não só trabalhava no mesmo prédio, como também era casada com um dos homens da Oxford.

Ela não conhecia Julie, Riley e Mollie tão bem assim, mas considerando os momentos que já havia passado com elas, era impossível não gostar delas também. Julie era toda vivaz e ousada, Riley, ultrajante e intensa, e Mollie, de alguma forma, dominava a habilidade de ser nerd e sexy ao mesmo tempo.

Daisy pensou com mais lógica e decidiu que não estava roubando as amigas de Emma, apenas pegando-as emprestadas. E quando tentou explicar isso à Emma, a irmã dela revirou os olhos, tomou-lhe o celular da mão e confirmou a presença de Daisy por conta própria.

Quando ela bateu na porta de Mollie, repetiu mentalmente as palavras de Emma: Elas te amam. Eu te amo. Pare de ser esquisita e apareça lá.

A porta se abriu e não foi Mollie que atendeu, mas sim Riley, que enfiou na boca o que parecia ser uma batata frita coberta de molho e abriu os braços, puxando Daisy para um abraço. — Daiz! Eu quase nem te vejo, já que você passa o dia todo lá em cima com os meninos. Aah, isso na sua mão são brownies? Meninas! A Daisy chegou!

Menos de cinco minutos depois, uma taça de champanhe havia sido empurrada na mão de Daisy, e ela deu por si que estava bastante confortável, entrando na discussão sobre pedir comida italiana ou sushi.

Ela ficou do lado derrotado: comida italiana, mas não se importou, porque era tão bom estar cercada por pessoas novamente. Ela não tinha percebido o quanto havia se isolado desde o divórcio. Caramba, desde antes do divórcio.

Agora, era provável que seus fins de semana fossem ser ocupados por encontros com garotas tagarelas, e os dias de semana normais por um trabalho que, embora fosse temporário e quase tedioso, não era horrível. E as noites dela... todas as suas noites seriam de Lincoln.

— Oh-oh — Grace disse quando todas se acomodaram ao redor da sala de estar de Mollie. — Alguém mais reconhece esse olhar no rosto de Daisy?

— Que olhar? — Daisy perguntou inocentemente, mergulhando uma cenourinha no molho ranch e sentando de pernas cruzadas no chão, ao lado de Julie.

— Você está apaixonada, meu bem — Grace respondeu com compaixão. — É por quem eu acho que é?

— Aaaah, eu amo o Nick — Julie disse, brindando a taça com a de Daisy. — Eu te entendo totalmente.

— Hm... — Daisy mordeu o lábio.

— Ai, Jules, isso são águas passadas — disse Mollie, acenando com a mão.

— Como você sabe? — Grace indagou.

— Jackson me contou — respondeu Mollie.

— Espera aí, o que eu perdi? — Perguntou Julie.

— Lincoln e Daisy estão se pegando — Grace e Mollie disseram ao mesmo tempo, com uma pitada de presunção.

Julie arquejou. — O quê? Não, é sério? Fico doente por dois dias e Lincoln Mathis se torna um homem comprometido?

— Uau, calma lá — disse Daisy, levantando a mão e tentando assumir o controle da conversa. — Não estamos...

— Se comendo? — Riley sugeriu. — Com certeza estão. Há rumores de que vocês transaram no escritório.

O rosto de Daisy ficou vermelho. — Nós não fizemos isso.

— Fizeram sim — Penelope disse, entrando na sala e sentando no sofá, no espaço entre Daisy e Mollie. — Palavra de alguém que já fez sexo em um escritório da Oxford, você estava com aquele olhar.

— Não existe um olhar para isso — Daisy argumentou, em vão.

— Na verdade, meio que existe sim... — Emma admitiu lentamente.

— E como é que você saberia disso?! Eu nem te vi naquele dia! — Daisy retrucou, o tom beirando o divertimento e o exagero. Ela não era puritana, mas era um pouco chocante que amigos e familiares aparentemente soubessem tanto sobre sua vida sexual.

— Então... não acho que Emma estava falando de você — Julie disse em um sussurro alto.

Daisy arregalou os olhos quando olhou para a irmã. — Você? E Cassidy...

— Não somos o assunto da conversa, gêmea querida — Emma interrompeu, limpando um pouquinho de molho ranch dos lábios.

Daisy olhou para o grupo. — Qual é o tópico da conversa?

Riley balançou as sobrancelhas. — Lincoln é tão bom quanto parece?

Daisy não conseguiu segurar a risada. — É por isso que vocês me chamaram? Para saber tudo sobre mim e Lincoln?

— Claro que não, chamamos você porque te adoramos — protestou Mollie.

— E? — Daisy perguntou, já sabendo do que se tratava.

— E porque queremos saber tudo sobre você e Lincoln — Penelope admitiu, dando um sorriso de desculpas.

Daisy deu uma olhada rápida na irmã, se perguntando se Emma estava chateada por Daisy não ter confidenciado as informações a ela, mas Emma parecia mais preocupada do que ofendida.

Aliás, não era apenas Emma que parecia preocupada. A sala exalava vibes de uma preocupação leve no meio de toda aquela conversa feminina.

— Eu sei que vocês são protetoras em relação a ele — Daisy falou suavemente. — Mas não vou magoá-lo. Eu sei pelo que ele passou. Ele é importante para mim.

— Ele é importante para nós também, assim como você — Grace respondeu. — Gostando ou não, você faz parte dessa família e nós cuidamos umas das outras. Não queremos que você machuque Lincoln, obviamente, mas também não queremos que ele magoe você.

— Eu adoro Lincoln — disse Emma, ??encontrando o olhar de Daisy com firmeza. — Mas eu te amo. Preciso ter certeza de que sabe no que está se metendo. Que compreende no que isso vai dar.

O resto das mulheres assentiu e Daisy estremeceu um pouco, surpresa, ao perceber o que estava acontecendo. Aquela não era uma conversa com o tópico “Não se atreva a magoar Lincoln”. E sim uma do tipo “Tome cuidado com Lincoln.”

E, embora Daisy soubesse que falaram aquilo com a melhor das intenções, sentiu uma pequena pontada de protecionismo. Uma necessidade de defender a honra dele. — Vocês sabem, não é? Que o Lincoln que vocês achavam que conheciam era só uma miragem. Ele nunca foi o playboy mulherengo que dizia ser. Ele é um homem bom.

— Ele é o melhor — disse Riley, concordando. — Mas querida, ele também é um cara danificado. A bagagem emocional que ele carrega... nem consigo imaginar o quanto as companhias aéreas cobrariam por ela.

— Riley — Grace murmurou baixinho.

— Ah, qual é. Como se vocês todas não estivessem pensando o mesmo — Riley disse com uma sinceridade reconfortante. — O cara estava noivo e, dias antes do casamento, a garota sofreu um acidente de carro, e o resultado foi de partir o coração. Ele passou dois anos cuidando da mulher que amava, que não conseguia alimentar-se sozinha, muito menos reconhecer ele ou a si mesma, e aí ela morre.

— Mas ele está lidando com isso — Penelope argumentou antes de olhar para Daisy. — Não está?

— Sim — disse Daisy lentamente, desejando que fosse verdade. — Não vou dizer que ele não vai passar um bom tempo lidando com o fantasma de Katie, mas ele fez progresso. Ir para Costa Rica fez bem a ele, e agora...

— E agora ele está com você.

— Não estamos juntos. Nós não estamos namorando — disse Daisy. — Somos só... nem eu sei.

— E tudo bem. — Mollie garantiu suavemente, colocando uma mecha de cabelo loiro atrás da orelha e se inclinando para frente. — Tudo bem não definir ou rotular. Todas nós já passamos por isso. E nenhum dos nossos relacionamentos se desenrolaram sem segredos obscuros ou vergonhosos. Quero dizer, pelo amor de Deus, Jackson era casado com a minha irmã.

Riley levantou a mão. — Sam é o melhor amigo do meu irmão e fez uma promessa idiota de nunca me tocar, então perdemos uma década inteira brincando de gato e rato.

Julie bufou. — Isso não é nada. Eu insisti em Mitchell por causa de uma matéria para a Stiletto, e ele só ficou comigo por causa de uma aposta.

— Jake é “compromisso-fóbico” — Grace contou.

— Meu marido só me chamou para sair pela primeira vez porque meu pai mandou, e mesmo assim ele fez isso porque pensou que sairia com minha irmã gêmea mais divertida que eu — Emma acrescentou sobre a taça de vinho.

Daisy jogou uma mini cenoura nela. Tecnicamente, Cassidy disse sim ao pedido do pai de Emma e Daisy de chamar a filha para sair porque ele pensava que seria Daisy, mas ninguém além de Emma se lembrava disso. E, de qualquer maneira, não importava. Os dois tinham uma grande história de amor.

Houve um segundo de silêncio e todo mundo olhou para Penelope, que mordiscava um pretzel.

— Querida — disse Riley, observando a pequena morena. — Alguma coisa que queira nos contar sobre Cole?

Penelope piscou os grandes olhos castanhos, depois deu um sorriso tímido. — Às vezes, ele concorda com tudo que eu digo. Chega a ser irritante.

Todas jogaram cenouras nela.

— Mas falando sério — Grace disse, voltando a atenção para Daisy. — Não estamos dizendo que tudo tem que ser um mar de rosas; só estamos falando que você precisa tomar cuidado, Daisy.

— Com o quê? — Ela perguntou.

Emma decidiu responder. — O coração de Lincoln foi arrancado da maneira mais brutal possível, e não foi como se o Band-Aid tivesse sido puxado de uma vez. Foi uma tortura prolongada. Ninguém quer que você encontre seu final feliz mais do que eu, Daiz. Você sabe disso. Mas querida... não sei se Lincoln será o seu final feliz. Não sei se ele conseguirá ser.

Daisy engoliu em seco quando a verdade da afirmação de Emma a atingiu. Em algum nível, ela supôs que sabia com o que estava lidando – com um homem que nunca colocaria o próprio coração em risco, não depois do que aconteceu. Mas ouvir aquilo sendo dito em voz alta causava uma dor totalmente diferente.

O tipo que a fazia lembrar do porque ela deixou de acreditar em “felizes para sempre”.

Porque acreditar nisso e depois assistir ser tomado de você... machucava. Machucava de uma forma que você jamais conseguisse se recuperar outra vez.

Especialmente quando o que seria perdido – quem ela perderia – era Lincoln Mathis.

Daisy fechou os olhos quando percebeu que o que ela queria mais do que qualquer coisa que quis na vida era que Lincoln Mathis sentisse por ela o mesmo que ela sentia por ele:

Um amor que durasse para sempre.

Ela também sabia que isso nunca iria acontecer. Lincoln já havia sentido isso por alguém uma vez. E não foi por ela.

O que estava acontecendo entre ela e Lincoln era passageiro. Era isso que suas amigas estavam tentando lhe dizer.

Pior ainda, ela sabia da cabeça às unhas dos pés pintadas de rosa que elas estavam certas.

Mas havia algo que ela não sabia:

Como ela sobreviveria quando ele fosse embora de sua vida?


Capítulo 30

Daisy abriu os olhos devagar, agradecida pela pouca luz em seu...

Ela estendeu as mãos para os lados, encontrando uma colcha com a qual não estava familiarizada, lençóis um pouco menos macios que os dela em Charlotte.

Era sua nova cama, seu cérebro sonolento registrou. A que ela recentemente havia comprado, depois de se mudar para Nova York...

Seus olhos se abriram por completo e ela rolou para o lado em direção ao despertador da mesa de cabeceira... que não estava lá.

Havia, no entanto, um pequeno monte de pelos brancos perto de seu rosto.

O monte de pelos se moveu, deu uma rápida lambida no queixo de Daisy e desceu do móvel, indo para a própria cama cor de rosa no canto do quarto.

Daisy percebeu algumas coisas ao mesmo tempo:

(1) Havia um cachorro na cama com ela. Um maltês pequenininho.

(2) A colcha era cinza em vez de branca, o despertador estava na mesa de cabeceira esquerda e não na direita...

Porque... (3) Ela não estava no quarto dela.

Uma rápida olhada para baixo revelou que ela vestia a camiseta de um homem; e uma espiada por baixo das cobertas mostrou que usava somente uma calcinha azul claro.

Houve uma agitação ao lado dela. Um homem.

Daisy sorriu quando a sonolência passou completamente. Estava na mesma cama que uma vez havia acordado, mas em circunstâncias completamente diferentes.

Para começar, dessa vez não havia ressaca. Ela e Lincoln saíram para jantar na noite anterior e tomaram algumas taças de vinho, mas não beberam nenhuma quantidade abundante de uísque Jack Daniel’s como se fosse água, como haviam feito naquela vez.

E, apesar de ela estar vestindo uma camiseta masculina, dessa vez não havia cueca boxer.

E definitivamente não houve um striptease ao som de Britney Spears, embora Lincoln tivesse implorado.

A diferença mais importante, no entanto...

Daisy rolou para o lado, sorrindo para o homem adormecido ali. Como era de se esperar, Lincoln era tão bonito dormindo quanto acordado. Na verdade, às vezes eram desses momentos de tranquilidade que ela gostava mais. Momentos em que sentia que o tinha só para si.

Ele se mexeu, empurrando mais para baixo as cobertas que o cobriam. Ela já havia percebido que ele sentia muito calor enquanto dormia, tirava os lençóis de cima do corpo com mais frequência do que os deixava.

Daisy assistiu com apreciação quando o peito esculpido dele entrou em exibição, embora, infelizmente, ele tenha parado de empurrar o tecido quando o cobertor chegou na cintura. Outra coisa que Daisy havia percebido... Lincoln gostava de dormir nu.

Ela deslizou para mais perto dele até colocar uma mão de modo possessivo sobre seu peito. Ele se mexeu um pouco, apoiando uma mão quente sobre a dela, mas não acordou.

Daisy mordeu o lábio, sentindo-se... inspirada.

Afastando a mão da dele, ela deslizou-a sobre o estômago dele até seus dedos agarrarem o lençol, puxando-o para baixo por completo.

Ela sorriu, triunfante. Deus abençoe a ereção matinal.

Ela voltou o olhar para o rosto dele enquanto lentamente envolvia os dedos ao redor do pau quente. Lincoln paralisou, depois arqueou as costas levemente ao sentir o toque dela, como se quisesse mais.

Ela deu o que ele queria, esfregando o polegar sobre a cabeça macia de seu pênis. Os olhos dele permaneceram fechados, mas a respiração acelerou como se ele estivesse desfrutando de um sonho erótico.

Daisy decidiu transformar o sonho erótico em realidade.

Ela se sentou um pouco, puxou a camisa emprestada sobre a cabeça e jogou-a para o lado antes de voltar para perto dele, abaixando-se em direção ao seu corpo. Ela se ajoelhou para poder fazer um trabalho melhor, então curvou-se até estar com a boca nele.

Daisy fez isso com ele apenas uma vez antes e havia se sentido tímida na ocasião. Mas com ele ainda sonolento, ou pelo menos em alguma etapa parecida do sono, se sentiu encorajada.

Então, o experimentou, lambendo-o de cima a baixo em movimentos vagarosos antes de engoli-lo por completo, o mais fundo que conseguia.

Até onde Daisy sabia, ele estava acordado desde o início, mas quando o sentiu envolver os dedos nos cabelos dela, quando o ouviu pronunciar seu nome, ela soube que ele estava completamente desperto.

Ela virou a cabeça levemente, o bastante para poder olhar para o corpo dele com o pau dele ainda na boca. Os olhos dele estavam repletos de sono e desejo quando ele ergueu os quadris, empurrando-se mais fundo.

Daisy o chupou com mais força, rolando a língua sobre ele, e Lincoln soltou um gemido ansioso.

A mão que não segurava o cabelo dela deslizou por suas costas, pela bunda, até que os dedos dele roçaram a frente úmida de sua calcinha. Os dedos compridos e ágeis dele se esgueiraram sob o elástico e Daisy gemeu com a boca ainda nele quando ele deslizou um dedo nela por trás.

Era um desafio delicioso tentar não deixar aqueles dedos que a acariciavam distraí-la do que ela havia começado. O jogo mudou para uma competição sexual, uma corrida para ver quem poderia levar o outro ao orgasmo primeiro.

E, embora os dedos dele agissem com habilidade enquanto a torturavam, ela passou na frente. E teve uma forte sensação de vitória quando o corpo dele tensionou embaixo dela.

Daisy moveu a boca mais rápido quando os dedos dele apertaram seus cabelos, a outra mão puxou a calcinha dela para agarrar sua bunda, e ele cravou os dedos desesperadamente na pele dela quando gozou em sua boca em um rugido suave.

Ela esperou até que ele tivesse se acalmado e afastou-se, sentando-se sobre os calcanhares.

Ele observou-a com um olhar de irritação e carinho. — Está orgulhosa de si mesma, não é?

Daisy não conseguiu conter o sorriso largo. — Eu venci.

— Não era um jogo.

— Diz o cara que perdeu.

Em um segundo, ele a colocou de costas no meio da cama; no outro, puxou a calcinha dela bruscamente e colocou o corpo enorme entre suas pernas, e usou a boca para cobrir sua boceta em um beijo íntimo.

Ele olhou para o corpo dela enquanto a lambia, movendo a língua de modo perverso e incansável ao redor de seu clitóris. Daisy segurou a cabeça dele com as mãos, a combinação dos dedos rápidos com a adrenalina da recente sedução e o toque úmido da língua dele a fazendo gozar em menos de um minuto.

Lincoln a segurou contra a boca dele enquanto ela se sacudia em desesperadas ondas de prazer, soltando-a somente quando o último espasmo se dissipou.

Quando ela abriu os olhos, ele estava sorrindo para ela. Daisy o encarou. — Quem está se vangloriando agora?

— É um jogo que fico feliz de ocupar o segundo lugar — ele afirmou, dando uma piscadela, antes de dar-lhe um beijo no nariz, sair de cima dela e plantar os pés no chão.

— Onde você vai? — Daisy perguntou, observando-o ir até a cômoda e vestir um short esportivo e uma camiseta.

— Sempre que durmo na sua casa, você prepara um café da manhã para mim. Pensei em passar a comprar algo quando você dormir aqui.

— Sim, porque essa é uma troca justa — ela provocou com um sorriso.

— Segure essa língua afiada até que tenha provado o croissant com ovos mexidos e o sanduíche de queijo suíço que vende do outro lado da rua — disse ele, apontando um dedo para ela. — Vai te deixar de boca aberta.

— Achei que você mesmo já tivesse feito isso.

— Como você está atrevida esta manhã — ele falou, se dirigindo para a sala de estar. — Gostei.

— Kiwi precisa sair para passear? — Ela perguntou alto.

— Ela te amaria para sempre se você saísse com ela — Lincoln respondeu. — Tem chaves extras perto da porta para quando vocês voltarem.

A porta da frente bateu e Daisy se inclinou para o lado da cama e acariciou Kiwi. — Você vai me amar para sempre se eu te levar para passear, é? Tem alguma ideia do que seria necessário para fazer seu papai me amar para sempre também?

A cachorrinha olhou para ela com olhos castanhos solidários.

— É, acho que não — disse Daisy, suspirando. — Vamos lá, então. Precisamos deixar nossos cabelos bem bonitos antes de enfrentar o mundo, certo?

Cinco minutos depois, os dentes de Daisy estavam escovados, o cabelo, preso em um coque baixo razoavelmente arrumado. Kiwi estava com um laço verde para combinar com a fruta de mesmo nome que o dela, e Daisy estava colocando a coleira na cadela.

— Sabe, normalmente tenho total respeito pelo preto básico, mas não acho que você goste dessa coleira de nylon preto — disse Daisy à cadela.

Ela suspeitava que, por mais que Lincoln gostasse de bebidas açucaradas e de flertar, havia um limite entre isso e passear por Manhattan com uma coleira cor de rosa. Mas Daisy apostava que poderia convencê-lo a comprar alguma bonita em um tom verde limão sem-gênero-específico.

Elas caminharam pelo quarteirão, Kiwi fez suas necessidades imediatamente, depois diminuiu o ritmo e passou a cheirar cada folha e hidrante. Daisy não se importou. Era uma manhã linda de domingo, cedo o suficiente para que ela sentisse que tinha a cidade só para ela.

Ela estava começando a gostar de Nova York. Não que já tivesse não gostado, mas havia uma enorme diferença entre ser turista e morar ali quando se tratava da cidade de Nova York. Era quase como se um véu fosse retirado de seus olhos assim que você mudava seu endereço de correspondência e via a cidade como realmente era – de alguma forma, humilde e espetacular.

Durante a maior parte da caminhada, Daisy liderou o caminho enquanto Kiwi andava para trás, fazendo xixi em embalagens descartadas de cachorro-quente, mas quando se aproximaram do prédio de Lincoln, a cachorrinha deu um latido feliz e avançou.

Como a cadela não gostava muito de estranhos, Daisy olhou para cima com um sorriso no rosto, esperando ver Lincoln de volta, com o café da manhã nas mãos.

O sorriso dela congelou.

Não eram nas pernas de Lincoln que Kiwi estava pulando. Não foi Lincoln quem soltou um suspiro contente antes de se abaixar para pegar a cachorrinha agitada e enchê-la de beijos.

Era Brenda Lyons.

Por isso Kiwi conhecia a mulher. Era a mãe de Katie. Se cães tinham avós, aquela era a dela, e meu Deus.

Ali estava Daisy, passeando com a neta dela, vestindo o moletom de Lincoln.

Assim como na primeira vez que Daisy a encontrou, a mulher estava perfeitamente bem vestida, o cabelo branco-e-loiro arrumado, o batom lindamente no lugar.

O sorriso de Daisy permaneceu estampado no rosto quando Brenda a estudou, olhando-a de modo confuso enquanto tentava identificar de onde conhecia Daisy, e então ficou surpresa quando as peças se encaixaram.

Daisy engoliu em seco e agradeceu à sua mãe, que há muito tempo havia falecido, por tornar seus bons modos tão naturais quanto respirar, porque de alguma forma ela conseguiu dar um passo à frente e estender a mão. — Sra. Lyons. Prazer em vê-la novamente.

Brenda passou Kiwi para o braço esquerdo e apertou a mão de Daisy, mas não disse uma única palavra, e foi horrível.

A mente de Daisy pensou rapidamente em formas de preencher o silêncio. Acabou que na verdade havia apenas uma coisa a dizer: a mais importante.

— Sinto tanto por sua perda — disse ela.

Brenda inalou longa e lentamente pelo nariz antes de se abaixar e colocar Kiwi de volta no chão. — Lincoln, ele está...?

— Comprando o café da manhã — Daisy respondeu. Não havia sentido em fingir que o que estava acontecendo entre os dois era outra coisa senão o que realmente era. Daisy estava vestida com as roupas de Lincoln, passeando com a cadela dele em frente ao seu apartamento, às sete da manhã de um domingo.

— Eu deveria ter ligado — Brenda disse, um pouco rígida. — Imaginei que... precisava pensar mais nele. Não queria que ficasse sozinho, caso ele estivesse sofrendo como eu estou...

A mulher parou de falar, os olhos se encheram de lágrimas, e Daisy instintivamente deu um passo à frente para confortá-la.

Brenda Lyons recuou. — Não. Por favor.

— Eu lamento tanto — Daisy falou, impotente. — Lincoln voltará a qualquer minuto. Vou embora e deixar vocês conversando a sós e...

— Não — Brenda respondeu, se recompondo e secando os cantos dos olhos. — É melhor eu ir. Por favor, diga a ele que passei aqui, e não vou esquecer de me certificar que ele está sozinho na próxima vez que eu aparecer na cidade.

Subtexto: vou me certificar de que ele não tenha acabado de sair da cama com uma sem-vergonha qualquer.

— Por favor, Sra. Lyons. Eu sei o quão difícil isso deve ser. Você fica, eu vou embora e...

— Kiwi já foi o animal de estimação de Katie. Ele sequer te disse isso? — Brenda perguntou.

Daisy engoliu em seco e forçou um pequeno sorriso. — Sim, ele contou.

Brenda não sorriu de volta. Ela apenas encarou Daisy com firmeza, os olhos verdes aflitos antes de assentir uma vez e se afastar.

Daisy resistiu ao desejo de chamá-la de volta. Porque ela sabia o que Brenda Lyons realmente queria dizer. Não somente que Kiwi era de Katie.

Mas que Lincoln também pertenceu à Katie uma vez.

— Não precisa se preocupar — Daisy sussurrou para as costas da mulher se distanciando. — Eu acho que ele ainda pertence.


Capítulo 31

No segundo em que Lincoln voltou ao apartamento, ele soube que havia algo de errado. Kiwi estava eufórica, como sempre, mas a mulher em estado de choque sentada no sofá parecia tudo menos eufórica.

A expressão de Daisy estava atormentada, a pele pálida e os olhos ilegíveis. Mais preocupante ainda: estava vestida com as roupas da noite passada, e considerando que para isso seria necessário entrar em um apertado vestido de festa verde antes das oito da manhã de um domingo, provavelmente não era um bom sinal.

— Você poderia ter pegado uma roupa minha emprestada — ele disse, forçando um sorriso enquanto colocava a sacola e os cafés no balcão.

— Eu fiz isso — ela respondeu, sem se mexer. — Peguei um dos seus moletons da Universidade Brown.

Lincoln fez um esforço consciente para não estremecer. Ele conheceu Katie na faculdade. Era quase impossível pensar naquela época e não lembrar dela.

— A mulher que seria sua sogra me viu usando.

Dessa vez, ele não conseguiu esconder o estremecimento. Ou o choque.

— Brenda está aqui? — Ele perguntou, tomando cuidado para manter a voz estável. — Onde?

— Ela foi embora. Não quis ficar depois que me viu passeando com a cadela. Vestida com suas roupas.

Ele fechou os olhos. Tinha esperanças de que talvez Daisy tivesse explicado as coisas, convencido Brenda de que aquilo não era nada do que ela estava pensando.

Mas evidentemente, era exatamente o que ela estava pensando. Ele deixou uma mulher passar a noite no apartamento dele. Transou com ela duas vezes durante a noite e outra vez esta manhã.

— Isso é um maldito pesadelo — disse ele, passando as mãos pelos cabelos e andando em círculos.

— Talvez não precise ser — Daisy disse, levantando-se e aproximando-se dele. — Talvez você possa ligar para ela, convidá-la para tomar café. Explicar as coisas.

— Não, é tarde demais para isso — disse Lincoln, afastando-se da mão estendida de Daisy. Ele ignorou a dor nos olhos dela quando a rejeitou. Não conseguia lidar com isso agora. — Se ela só tivesse te visto passeando com Kiwi, eu provavelmente poderia ligar para ela mais tarde, fingir que você estava tomando conta da Kiwi enquanto eu não estava na cidade, mas Katie e eu estudamos na Brown, então o moletom entregou tudo.

— Espera aí. Você está mesmo insinuando que diria a ela que eu era sua “cuidadora de cães” se achasse que conseguiria se safar?

Daisy ficou completamente imóvel, o humor mudando de magoado para furioso.

Ele não se importou. Ela não entendia. Ninguém entendia. Ele basicamente destruiu a memória do amor da vida dele e a mãe dela presenciou o resultado.

Deus, não fazia nem um ano. Katie não merecia um ano?

Inferno, talvez Katie merecesse uma eternidade.

— O que mais você quer que eu diga a ela, Daisy? — Lincoln explodiu, uma mistura de raiva com desespero. — Que você me acordou com um boquete e fui comprar café da manhã em agradecimento?

— Isso tudo é porque ela veio hoje? — Daisy perguntou, o sotaque ficando mais evidente do que antes, como acontecia quando ela estava com raiva, mas tentando não ficar.

— O que o dia de hoje tem a ver com isso? — Ele retrucou, cansado. — Domingo, quinta, terça, existe sequer um dia bom para dizer à mulher que seria sua sogra que você traiu a filha dela, que está no túmulo há menos de seis meses, transando casualmente com outra pessoa?

— Transando — ela repetiu, dando uma pequena risada. — É isso que estamos fazendo? E só mencionei porque o último domingo de cada mês costumava ser o dia que você saía para visitar Katie e...

Lincoln ficou em choque e paralisou por uma fração de segundo antes da raiva atingi-lo. Ele cerrou a mão antes que pudesse se conter, querendo socar o punho contra o granito do balcão da cozinha como forma de autopunição. Ele impediu-se de fazer isso bem a tempo, mas não barrou a onda de espanto e raiva.

Ele havia esquecido.

O último domingo de cada mês.

Lincoln sequer se lembrou. Por causa dela. Porque Daisy tinha mexido com a cabeça dele, com sua vida... talvez com seu coração.

Ele não podia continuar com aquilo.

Ele precisava se afastar. Pelo bem de Katie. Pelo bem dele.

Lincoln fechou os olhos e lutou para controlar as próprias emoções. — Preciso que você vá embora, Daisy.

E então, ele se forçou a abrir os olhos e encará-la, porque devia isso a ela, pelo menos isso.

Ela não parecia nem um pouco surpresa. Parecia vazia, talvez um pouco conformada, e isso piorou tudo.

— Tudo bem — ela falou calmamente. — Está me pedindo para ficar longe de você por alguns dias, para ter espaço, ou o que está me dizendo é “Vá embora e não volte mais”?

Ele queria desviar o olhar, mas continuou encarando-a, implorando silenciosamente para que ela entendesse o que ele não conseguiria dizer em voz alta.

Ela entendeu.

O rosto de Daisy vacilou por meio segundo, como se ela estivesse prestes a chorar, e o coração dele se partiu.

Mas ela se recuperou rapidamente, erguendo o queixo ainda mais, e ele viu seus lindos olhos castanhos lacrimejarem. — Tudo bem, então. Tudo bem.

Ela caminhou rigidamente em direção à porta da frente.

Cada fibra de seu ser queria gritar para que ela ficasse, mas ele se controlou. Era melhor deixá-la ir agora, desse jeito, antes que qualquer um deles aprofundasse ainda mais os sentimentos.

No último minuto, ela se virou e andou na direção dele. Seu coração bateu forte com medo e esperança. Era como se ele pudesse enxergar o coração dela pelos olhos, e ele se recusou a reconhecer o que viu ali.

Daisy ficou na ponta dos pés e pressionou os lábios suavemente nos dele. — Seja feliz. Por favor.

Foi um beijo de despedida.

Mas muito tempo depois que ela saiu e fechou a porta silenciosamente, ele se perguntou se o beijo havia sido mais do que isso.

Ele conhecia Daisy Sinclair quase tão bem quanto conhecia a si mesmo.

Tinha certeza absoluta de que o que ela realmente acabou de dizer a ele era que o amava.

E não havia uma maldita coisa que ele pudesse fazer em relação a isso.


Capítulo 32

DUAS SEMANAS DEPOIS

Daisy colocou um sorriso no rosto quando viu Emma se aproximar da mesa do luxuoso restaurante em Midtown, onde Daisy havia feito reservas para o almoço.

Ela levantou e abraçou a irmã, notando o modo como Emma envolveu-a por um pouco mais de tempo do que a Emma que normalmente não demonstrava emoções faria. Sua irmã estava preocupada com ela – desde aquela tarde de domingo em que Daisy apareceu na porta da casa dela, após Lincoln ter simplesmente terminado com ela, e passou o resto do dia se debulhando em lágrimas.

Mas isso foi semanas atrás e Emma não precisava mais se preocupar.

Daisy estava começando a se recuperar. Não o seu coração. Isso ainda estava em pedaços. Mas o resto de sua vida estava indo muito bem.

— Então...? — Emma perguntou quando elas se sentaram. — Vamos pedir um champanhe para comemorar ou um para dizer “Que se fodam, eles não fazem ideia do que estão perdendo”?

Daisy sorriu. — Para comemorar.

— Você conseguiu! Parabéns, Daiz.

Poucas horas antes, Daisy recebeu a ligação da empresa de assessoria de festas de casamentos, a qual ela havia feito uma entrevista semanas antes, informando-a que ela estava contratada. Era para uma vaga de assistente, já que Daisy tinha pouca experiência.

Mas parecia certo. Ela fez entrevistas em seis empresas, algumas de organização de casamentos e outras de planejamento de vários tipos de eventos, e essa parecia a melhor. As mulheres que trabalhavam lá eram muito unidas, a empresa elegante e cara.

Daisy sabia que conseguiria se dar bem.

Além disso, tinha esperanças de que planejar o casamento de outras pessoas aliviasse a dor de nunca mais planejar o próprio. Talvez fosse justo. Ela já havia tido o seu grande casamento. Sim, o matrimônio não durou, mas ela não conseguia nem reunir raiva ou tristeza por Gary atualmente.

Porque o amor que ela sentia por Gary não era nada em comparação ao amor que sentia por Lincoln. E a dor que sentiu depois de Gary também doeu muito menos.

Alguns dias, ela pensava que talvez Lincoln tivesse o direito de ser covarde demais para amar de novo. Talvez o risco realmente não valesse a pena.

— Certo, vamos pegar algo caro — Emma falou, ??olhando para o cardápio de vinhos. — E colocar na conta do Cassidy.

Daisy riu. — Ele sabe que vai ser “na conta do Cassidy”? Ainda estou me sentindo culpada pra caramba por ter abandonado o cargo de recepcionista daquele jeito e tê-lo deixado na mão.

— Por favor, ele mesmo pediu para você fazer isso — Emma respondeu, gesticulando para deixar para lá. — Ele conseguiu contratar um jovem ansioso e pretensioso antes do meio-dia de segunda-feira.

Daisy sorriu, agradecida, embora isso não aliviasse a culpa. Ela supôs que era por isso que o senso comum recomendava não se envolver com um colega de trabalho. Não conseguia sequer suportar a ideia de vê-lo no dia seguinte, mas estava preparada para engolir o choro quando acontecesse.

Cassidy, com sua mania de controlar tudo, havia feito a mágica dele e encontrado um substituto para que ela não precisasse encarar aquilo tudo.

Esse era o benefício de trabalhar para o cunhado.

E, além disso, a longo prazo, era melhor assim. O emprego como recepcionista da Oxford nunca teve a intenção de ser duradouro. Planejar casamentos, no entanto... ela podia se imaginar fazendo isso por um bom tempo.

Alguns minutos depois, Daisy e Emma estavam com uma taça de champanhe na mão e Emma ergueu a dela para um brinde. — À minha linda gêmea. Por ser corajosa e brilhante.

— Você sabe que acabou de se elogiar também, certo? — Daisy perguntou quando elas brindaram. — Nós temos o mesmo rosto.

— O rosto sim, mas não a mesma coragem.

— Você é corajosa — protestou Daisy.

Emma bufou. — Não sou. Um cara partiu meu coração e eu fugi para outro estado. Você se mudou para o quintal do que partiu o seu. Como eu disse, brilhante.

— Ou estúpida — Daisy murmurou, examinando o cardápio e discutindo mentalmente se iria pedir sanduíche de abacate ou macarrão com crustáceos.

— Não, brilhante — Emma insistiu. — O homem está péssimo por saber que você está tão perto, mas ao mesmo tempo fora do alcance dele, e isso está torturando-o.

— Duvido muito. Foi ele quem disse adeus, não eu. E ele não apareceu do lado de fora da minha janela segurando uma caixa de som acima da cabeça.

Emma revirou os olhos. — Sim, porque isso é muito romântico. Você sempre foi apaixonada por esse filme brega. Qual era mesmo o nome? Clube dos Cinco?

Daisy colocou a mão sobre o coração. — Assim você me machuca. É “Digam o Que Quiserem”. Estou pensando em assistir outra vez. Você poderia ver comigo.

Emma fez um gesto de quem estava prestes a vomitar. — Passo.

— Ah, para. Não entendo como John Cusack, aos 22 anos de idade, não roubou seu coração naquela cena.

— Hum, não roubou. Nada contra o ator, mas qualquer cara que aparecesse segurando uma caixa de som do lado de fora do meu quarto ao amanhecer iria ganhar um belo chute nas bolas. E não sei como consegue achar isso romântico. Você é a pessoa menos matinal que conheço.

— Verdade — Daisy concordou, tomando um gole de champanhe. — Mas ainda assim é romântico.

— Me chame para assistir “Sintonia de Amor” qualquer dia, que eu vou.

Daisy torceu o nariz. — Eu nunca entendi esse. O cara corre até o topo do Empire State Building para encontrar o filho e a mulher simplesmente está lá. Cadê o esforço?

Sua gêmea levantou as mãos em sinal de rendição. — Ok, tudo bem. O que você vai pedir?

— Eu gostaria de ir direto para o chocolate — Daisy murmurou.

A irmã dela a olhou com simpatia. — Está melhorando?

— A dor constante no meu peito? Não.

Emma estendeu a mão sobre a mesa e apertou a dela. — E você tem certeza de que conversar com ele não ajudaria?

— Ele me mandou embora da casa dele, Emma. Momentos depois de cogitar fingir que eu era uma cuidadora de cães.

— Ele está péssimo, você sabe.

— Bem, não quero que ele se sinta assim — Daisy sussurrou. — É a última coisa que quero. Mas se aprendi alguma coisa com toda essa situação, é que não posso consertar Lincoln. Ele tem que se consertar sozinho. Consertar-se por inteiro.

— Você estará esperando por ele se e quando ele fizer isso? — Emma perguntou.

Daisy tomou um pequeno gole de champanhe e pensou. — Uma grande parte de mim quer dizer sim, mas acho que Lincoln e eu somos parecidos demais. Amamos intensamente, mas existe uma desvantagem nessa intensidade toda.

— Qual?

Daisy encontrou o olhar da irmã. — Lincoln estava com muito medo de se arriscar no amor depois de ter o próprio coração destroçado pela morte de Katie. E acho que eu estou com muito medo de me arriscar no amor depois de ter meu coração destroçado por Lincoln.

— Você não confia que ele não fará isso de novo — Emma constatou.

— Vamos somente dizer que meu coração sempre será dele, mas será um tipo de relacionamento à distância. Tenho medo que dar a Lincoln Mathis uma nova chance me destruiria.


Capítulo 33

O dia estava úmido e frio. Perfeito.

Ele não queria estar aqui, mas ainda assim precisava estar.

Lincoln olhou para o enorme buquê de rosas coloridas na mão antes de se agachar bem devagar e depositá-lo no túmulo.

Katie sempre amou a elegância das rosas, mas sua cor preferida mudava a quase cada todos os dias dos namorados e aniversários de namoro. Vermelho em um ano, rosa no outro, amarelo no seguinte. Hoje ele trouxera para ela uma rosa de cada cor.

— Oi, Katie — ele disse, abaixando a cabeça e encarando as mãos entre as pernas enquanto se agachava diante da lápide de sua noiva morta.

O corpo dela foi cremado, mas depois a família acabou decidindo que queriam um lugar para visitá-la. Para ser sincero, ele não ficou muito contente com a ideia. Katie gostaria de ser livre.

Mas ela estava livre.

Este lugar, esta lápide era para aqueles que ela deixou para trás. Um local para conversar com ela quando necessário.

E hoje, ele precisava.

Levou um tempo para perceber, mas a ideia o atingiu ontem. Todo mundo continuava a insistir que, para se curar, ele precisaria conversar com alguém, mas isso nunca parecia a coisa certa a ser feita.

E então, ele se deu conta.

A verdadeira pessoa com quem ele precisava conversar não era uma amiga, nem um terapeuta, nem mesmo Daisy.

Ele precisava conversar com Katie. Não somente pensar nela, como havia feito na Costa Rica.

Falar com ela.

— Gostaria de saber onde você está agora — ele continuou, olhando o nome esculpido na lápide, a data que marcava um tempo de vida muito curto. — Mas onde quer que esteja, espero que seja um lugar feliz, bonito e que tenha bastante daquele queijo em formato de palitinhos que você costumava comer aos montes.

Ele arrancou um pedaço da grama. — Eu conversei com sua mãe. Ela disse que ela e seu pai estiveram aqui alguns dias atrás. Pensei em vir hoje com eles, mas decidimos que talvez fosse melhor se eu não os visse por enquanto. Para esperar a ferida que a sua falta causou curar um pouco.

Lincoln ficou em silêncio por alguns minutos. Brenda Lyons evitou os telefonemas dele por dias depois que viu Daisy na casa dele. Ele pensou em dirigir até a casa dela, mas não sabia se seria bem-vindo. Não sabia nem o que iria dizer.

Ontem ela o surpreendeu ao telefoná-lo. Surpreendeu-o ainda mais ao se desculpar.

Você não está fazendo nada de errado, Lincoln, por ter encontrado uma garota legal. Espero que saiba disso. Katie teria desejado que você amasse novamente. Espero que saiba disso também.

Ele apreciou as palavras – ajudaram bastante a aliviar a culpa no que dizia respeito aos Lyons.

Mas não ajudaram em nada no alívio da dor que sentia todas as vezes que pensava na maneira como havia tratado Daisy.

Ele se sentiu impotente por dias, recusando-se a conversar com Cassidy, Emma, ??Cole, seus pais, com qualquer pessoa.

E depois de falar com Brenda ontem, ele entendeu o porquê. Deu-se conta da pessoa com quem ele realmente precisava conversar.

— Quero falar com você sobre uma coisa — ele falou novamente para a lápide antes de levantar os olhos e encarar o céu, caso ela estivesse olhando para baixo. — É um pouco estranho, talvez um tanto inapropriado, mas você costumava ser minha melhor amiga, e preciso da minha melhor amiga agora, Katie.

Nenhum raio caiu do céu para atingi-lo e ele tomou isso como um bom sinal.

— Acho que me apaixonei, Katie. Não enquanto você ainda estava aqui, claro. Fui fiel a você durante todos os segundos, te amando o tempo inteiro. Eu teria permanecido fiel a cada minuto que você ainda respirasse. Só porque estávamos a poucos dias de dizer as palavras “Até que a morte nos separe”, não significa que não as honrei. Mas, veja, a questão é que, a morte de fato nos separou. E doeu como o inferno, eu morri por dentro junto com você, mas depois voltei à vida. Alguém me trouxe de volta.

— Eu sei que você só a conheceu de passagem, mas... bem, você gostaria dela. Ela é engraçada e gentil, mas a melhor parte é que é genuinamente boa. Ela também foi machucada, mas não deixou que isso a mudasse. Não por tempo demais, de qualquer maneira, e isso faz dela uma pessoa corajosa. Mais corajosa, creio eu, do que tenho sido. E acho que essa é a verdadeira razão de eu estar aqui, Katie. Porque quero ser corajoso. Quero ser corajoso o suficiente para merecê-la e reconquistá-la.

Lincoln levantou-se e enfiou as mãos nos bolsos, indo direto ao ponto. — Estou aqui para me despedir de você, Katie. Pensei que tivesse feito isso na Costa Rica, só que na verdade, lá eu só aceitei que você se foi. Mas agora é hora de aceitar que eu não fui embora. Ainda estou aqui e percebi que prefiro me arriscar a ser machucado mais uma vez do que viver sozinho. Tenho que viver sem você, Katie, mas não preciso viver sem Daisy. E eu só... pensei que queria que você ouvisse isso de mim. Não vou aparecer por aqui durante um tempo. Talvez eu não te visite mais.

Lincoln piscou, expulsando a umidade que se acumulava em seus olhos. Colocou a mão sobre o coração. — Mas você sempre estará aqui, está bem? Sempre.

Ele ficou lá por longos minutos, mesmo depois de ter terminado de falar, desejando que ela respondesse alguma coisa. Que lhe desse sua bênção, mesmo sabendo que ela não poderia fazer isso.

Mas então, ele jurou que a ouviu dar um familiar suspiro de irritação. Um som que ele não ouvia há anos, mas que agora ouviu. O som que ela fazia quando achava que ele estava agindo feito um idiota.

Então, ele a ouviu. Ouviu a voz de Katie vindo de algum lugar do fundo da alma dele, alta e em bom som.

Lincoln, eu também amo você. Mas que diabos ainda está fazendo aqui? Vá atrás dela.

Ele sorriu. Beijou dois dedos e os pressionou na lápide antes de se virar e voltar para o carro, sentindo-se mais leve do havia se sentido em anos.

Lincoln empurrou a chave na ignição para dirigir de volta a Nova York, mas no último minuto, desligou o carro e pegou o celular.

Ele recebeu a bênção de Katie.

Agora era hora de pedir reforços.


Capítulo 34

— Alguém pode me explicar o porquê de ter umas dez pessoas na minha sala de conferências em uma tarde de sexta-feira, sendo que só algumas delas trabalham para mim? — Cassidy perguntou, irritado.

— Cale a boca — Lincoln retrucou, examinando a sala e fazendo uma contagem mental. — Julie, onde está Mitchell?

A loira bonita congelou no processo de morder um dos sanduíches que ele trouxe para manter os amigos de pé e em pleno funcionamento mental. — Hum, trabalhando?

— Mande ele vir para cá.

Julie piscou. — Está falando sério?

— Não discuta — disse Mollie, pegando um sanduíche de presunto e um punhado de chips de batata. — Eu não atendi meu celular porque estava trabalhando e ele ligou para a recepcionista do laboratório. Quatro vezes.

— Pode apostar que liguei. O único que vai receber um passe livre é Sam. — Lincoln disse. — Porque ele trabalha no meio do Brooklyn e não posso esperar tanto tempo assim.

— Na verdade, hoje ele está em Manhattan fazendo uma degustação — Riley contou, a boca cheia de sanduíche de rosbife. Ela congelou quando Lincoln a encarou.

— E — acrescentou Riley, engolindo o que estava comendo e pegando o celular. — Eu estava prestes a ligar para ele!

— Ótimo. Diga a ele para ser rápido.

— Eu nunca o vi assim — Grace sussurrou para Jake.

Lincoln mal prestou atenção. Estava ocupado demais andando de um lado da sala, esperando o restante da equipe chegar para juntos descobrirem como desfazer a merda enorme que ele fizera em seu relacionamento com Daisy.

Ele havia conseguido a melhor coisa de sua vida e fugiu dela. Tinha uma mulher boa pra caralho, perfeita para ele, mas agiu como um completo idiota, deixando o próprio coração tão preso ao passado que a perdeu.

Ele pensou em ligar para ela. Enviar uma mensagem. Aparecer no apartamento dela. Daisy era uma das pessoas mais decentes e racionais que ele conhecia. Ocorreu-lhe que, talvez, um “Me perdoe” seria o suficiente, e eles poderiam voltar a ser o que eram antes.

Mas ele não queria que voltassem a ser o que eram.

Ele queria mais. Queria tudo.

E para isso dar certo, precisaria fazer o que fosse possível.

Lincoln bateu não-tão-gentilmente na nuca de Cole, continuando a dar voltas pelo lugar. — Foco, cara. Você deveria estar me ajudando a reconquistar minha mulher, não se pegando com a sua.

— Foi só um beijinho — Penelope protestou.

Lincoln apontou um dedo para ela. — Pope, você sabe que é a minha favorita, mas preciso que coloque sua cabeça no jogo.

Penelope estalou os nós dos dedos, exatamente como ele sabia que ela faria ao ouvir qualquer referência esportiva. — É para já. Qual será a minha jogada?

Jackson e Cole, os outros dois nerds do esporte, se inclinaram para a frente, prontos para entrar em ação, e todo o restante revirou os olhos.

— Eu já volto — murmurou Cassidy, afastando-se da parede onde estava encostado e conversando entre sussurros com Emma.

— De jeito nenhum — disse Lincoln. — Para onde você vai?

Cassidy empurrou-o para fora do caminho dele e saiu da sala de conferências. — Confie em mim — ele disse alto por cima do ombro.

Lincoln rangeu os dentes e mudou o alvo de sua frustração para Julie e Riley. — Como estamos em relação a Mitchell e Sam?

— Mitchell está a caminho – Julie respondeu suavemente, colocando um pedaço de sanduíche em um prato descartável e estendendo-o para ele. — Coma isso, você está sendo movido pela fome, meu bem.

Lincoln resistiu ao desejo de empurrar o prato da mão dela feito uma criança e, em vez disso, encarou-a.

Riley encolheu os ombros e pegou o sanduíche rejeitado. — Agora é uma boa hora para lhe dizer que Sam não vai conseguir vir? — Ela perguntou, dando uma mordida enorme.

— Jesus, Ri, você está grávida de novo? — Emma perguntou. — Está comendo demais, até mesmo para você.

Riley lambeu um pouco de maionese do polegar. — Infelizmente, não. Minha menstruação está forte como nunca.

— Não — disse Jackson, colocando o próprio sanduíche de volta ao prato, enojado. — Não. Existem regras para esse tipo de coisa, Riley. Não se deve falar sobre menstruação enquanto as pessoas estão comendo.

— Ou — Jake acrescentou, erguendo o refrigerante que estava segurando. — Que tal nunca falarem sobre isso?

Cole brindou sua lata de Coca-Cola contra a de Jake. — Isso!

— Como assim Sam não vem? — Lincoln perguntou, ignorando as brincadeiras que normalmente ele estaria fazendo.

Riley suspirou. — Está em uma degustação de uísques. Ele não sabia.

— Tudo bem — Lincoln resmungou. — Mas eu preciso...

— De uísque? — Cassidy disse, voltando para a sala de conferências carregando uma garrafa de Blanton e uma pilha de copos descartáveis.

— Céus, sim — todos disseram quase em uníssono.

— Quem adivinharia que Lincoln tinha esse lado ditador medonho? — Alguém murmurou.

Lincoln revirou os olhos com aquele melodrama e esperou com uma paciência admirável, assim ele pensou, todos tomarem o uísque.

Ele balançou a cabeça quando Cole lhe ofereceu um copo, mas seu amigo não se desencorajou. — Estamos aqui pelo motivo que acho que estamos? — Perguntou Cole.

Lincoln semicerrou o olhar. — O que você acha?

— Você fodeu tudo no seu relacionamento com Daisy. Quer que a gente “des-foda”?

Lincoln assentiu bruscamente e Cole empurrou o copo para ele outra vez. — Beba isso. Confie em mim.

— Sim, confie nele. Cole me reconquistou de uma maneira muito impressionante — Penelope disse, olhando com adoração para Cole.

— Só porque eu ajudei — Cassidy murmurou, se servindo de um pouco da bebida.

— Nenhum de vocês se comparam a mim — Jake falou. — Consegui minha mulher de volta em um jogo de beisebol, na frente de um estádio inteiro.

— Sim, mas eu vou querer meus créditos — disse Cole. — Eu estava prestes a colocar minha língua na boca de Grace para que ela não fosse humilhada por causa da sua covardice idiota.

— Seja como for — disse Mitchell Forbes da porta da sala de conferências, vestido de forma impecável, como sempre, em um terno listrado e óculos de armação fina. — Eu reconquistei Julie por conta própria.

— Hum, só depois de ter me deixado de joelhos no chão, chorando — Julie respondeu, dando a ele um olhar amoroso e indulgente.

Mitchell levantou um ombro. — Isso fez o final ser ainda mais dramático.

— Sim — disse Lincoln, indo até Mitchell e apertando o ombro do outro homem. — É disso que estou falando. Eu preciso de drama, pessoal. De fogos de artifício.

— Que tal fogos de artifício de verdade? — Perguntou Jackson. — Pode ser cativante.

Todo mundo olhou para ele, depois para Mollie. — Meu Deus, Molls, como foi que ele te reconquistou? — Riley perguntou, maravilhada.

Mollie pegou a mão calejada de vários anos sendo quarterback de Jackson e beijou nos nós dos dedos. — Foi de um jeito muito fofo. E muito particular. E envolveu um closet.

— Meu Deus, não — disse Lincoln. — Dispenso o closet e os fogos de artifício. O que mais vocês têm em mente?

— Espera, é isso mesmo? — Perguntou Mitchell. — Foi para isso que arrastei minha bunda até aqui num horário de pico de uma sexta-feira? Para te ajudar a reconquistar Daisy?

Em resposta, Cassidy serviu-lhe um copo generoso de uísque, que Mitchell aceitou com um aceno de cabeça. — Ok, tudo bem. Qual é a história?

Lincoln estalou os nós dos dedos, um hábito que pensava ter abandonado no ensino fundamental II. — Certo, então, é ruim, mas não desesperador. Não a fiz chorar ajoelhada no chão — ele disse, olhando para Mitchell.

— Também não peguei um vôo para o Texas. — Dessa vez, Lincoln disse olhando para Jackson.

— Nem a abandonei no dia do casamento dela — acrescentou ele a Cassidy, que lhe mostrou o dedo do meio calmamente.

— Mas estraguei tudo — Lincoln concluiu, baixinho. — Eu a afastei, a machuquei. E preciso desfazer isso.

— Fogos de artifício — Jackson murmurou novamente.

— Ok, que tal um pedido de desculpas tranquilo e delicado? — Grace sugeriu.

Riley fez que “não” com os polegares dramaticamente na frente do rosto da amiga. — Concordo com Jackson. Fogos de artifício. Ah, ou talvez você possa fazer uma serenata naquelas arquibancadas da Times Square. Ou pode pedir para projetarem um coração na fachada do Empire State Building, que nem naquele filme. Ou talvez um pênis, para deixar as coisas mais modernas. Mas sério, qual é mesmo o nome do filme que estou falando?

— Sintonia de Amor.

Todo mundo olhou para Emma, ??que até agora era a pessoa mais calada do grupo. Na verdade, Lincoln meio que estava evitando-a desde que as coisas explodiram com Daisy. Ele adorava a mulher. Mas até mesmo quando tudo estava bem, ela conseguia ser um pouco assustadora.

Pior ainda agora, com a irmã de coração partido.

Até Cassidy estava olhando de forma desconfiada para a esposa.

— Viram só? Emma gostou da minha sugestão de “projetar a imagem de um pênis no Empire State Building” — Riley afirmou, triunfante, pegando o terceiro sanduíche.

— Na verdade, não — Emma murmurou. — Quero dizer, eu meio que gostei, mas Daisy não vai.

Ela estava falando com Riley, mas o olhar estava fixo em Lincoln, e ele se forçou a continuar olhando para ela.

— Do que Daisy iria gostar? — Ele perguntou.

Ela não respondeu.

— Por favor — ele pediu, a voz falhando um pouco. — Me ajude.

Ela sorriu. — Depende, Mathis. O quão disposto você está a agir feito um idiota por essa mulher?

Lincoln sentiu um aumento súbito de esperança pela primeira vez desde que Daisy fora embora de seu apartamento, semanas antes. — Por ela? Até o fim.

O sorriso de Emma ficou mais largo. — Eu sei exatamente o que você precisa fazer.


Capítulo 35

Daisy foi até a varanda da casa que havia alugado em Montauk e inalou o ar salgado e praiano antes de tomar um gole de café.

Emma tinha razão quando sugeriu que Daisy tirasse um fim de semana só para ela antes de começar no novo emprego. Uma fuga para os Hamptons parecia a coisa perfeita para aliviar o nervosismo constante de começar um novo emprego em uma área diferente da que estava acostumada, em uma nova cidade.

Ela ainda tinha esperança de que pudesse aliviar a dor em seu peito também.

Daisy chegou ontem pela tarde e, embora o nervosismo causado pela ansiedade tivesse diminuído um pouco, a dor da solidão não.

Talvez ela devesse adotar um cachorro.

Não, um cachorro não. Um cachorro a faria lembrar de Kiwi. Um gato, então. Um gato para dar o nome de “Wallflower”...

Ela suspirou bruscamente, a mente mergulhando mais uma vez no sentimento de derrota. Ela fechou os olhos e respirou fundo mais uma vez.

Isso precisa parar. Você precisa parar de associar todas as pequenas coisas a ele.

Quando ela ergueu a cabeça novamente, sentiu-se mais calma, mas feliz? Não muito. Haveria felicidade sem Lincoln?

Ela supunha que, de forma objetiva, sim. Mulheres sobreviviam a términos o tempo inteiro. Caramba, a própria Daisy havia passado pelo fim de um casamento.

No entanto, de alguma forma, apesar de toda a mágoa que Gary havia causado a ela, o divórcio não deixou uma cicatriz tão forte assim. Ela morria de medo de que o tempo com Lincoln houvesse deixado-a irreversivelmente danificada.

Não que ela desejasse mudar algo. Ela não mudaria uma única coisa do tempo que passaram juntos. Era precioso demais para ela.

Bem, exceto o final. Se pudesse voltar no tempo e fazer tudo outra vez, não haveria um fim. E talvez ele estivesse aqui com ela, bebendo um café muito doce, do jeito que os dois preferiam, e ela poderia colocar um lacinho de marinheiro no pelo de Kiwi e...

Daisy parou no meio do processo de levar a xícara à boca quando jurou ouvir os primeiros acordes de “Oops!...I Did It Again” da Britney Spears.

Ela balançou a cabeça e tomou um gole de café. Sim, ela precisava mesmo tirar aquele homem da cabeça.

O som não parou. Pelo contrário, ficou ainda mais alto, a música de quando Britney estava no auge, um pop suave chegando aos seus ouvidos

Antes que ela pudesse descobrir a fonte do som, algo macio e molhado tocou levemente seu tornozelo exposto entre o chinelo e a calça de moletom. Daisy gritou e deu um pulo para trás, então olhou para baixo e deu de cara com uma bola de pelos branca.

Agora sim ela estava enlouquecendo.

— Kiwi? — Ela perguntou, colocando a xícara no parapeito com a mão trêmula e curvando-se para pegar a cachorrinha. Não podia ser Kiwi. Era só uma cadela parecida...

Mas o animal olhou para ela e não havia como confundir aquele rosto familiar com nenhum outro.

Daisy soltou uma risada desacreditada, pegou a cadela no colo e se colocou de pé. Não era possível que Lincoln havia mandado a cadela dele fazer o trabalho sujo em seu lugar...

Então, ela o viu.

Ele estava parado a vários passos de distância do parapeito, segurando um iPhone de forma desafiadora acima da cabeça, a música da Britney Spears tocando através do alto-falante do aparelho.

Ela soltou uma risadinha e cobriu a boca com a mão, os olhos lacrimejando.

Lincoln.

Ele estava aqui.

Ela deixou a mão cair. — Você está mesmo refazendo a cena de “Digam o Que Quiserem” para mim? — Ela perguntou alto.

Ele sorriu, mas o braço não se mexeu. — Parece que sim — ele respondeu por cima da voz da Britney. — Emma me contou que é uma cena clássica. Interpretada pelo Joan Cusack.

— John Cusack — Daisy corrigiu com uma risada. — E sim. Sim, essa cena é um clássico.

O sorriso de Lincoln ficou mais amplo, mas ele não se mexeu. Não caminhou na direção dela, não interrompeu o remake moderno da “caixa de som acima da cabeça”.

Foi então que ela entendeu. Entendeu que ele estava lhe dando uma escolha. Ele veio aqui para dizer algo, mas não o faria, a menos que ela estivesse disposta a ouvir.

Lincoln ergueu as sobrancelhas em questionamento, e ela assentiu bruscamente com a cabeça, o coração batendo forte no peito.

Lentamente, ele abaixou os braços, deslizou o polegar pela tela para silenciar a música e enfiou o celular no bolso de trás.

Ele começou a caminhar em sua direção.

Daisy agarrou a cadela com mais força e se deu conta de que estava praticamente esmagando a pequena criatura. Ela colocou Kiwi no chão, que imediatamente foi investigar um dos vasos de flores feios da varanda da casa alugada.

Lincoln lentamente subiu os três degraus que separavam a praia da varanda, e o coração dela bateu mais rápido.

Ele estava maravilhoso. Vestido em uma calça jeans e uma camiseta preta, o cabelo úmido e ondulado, os olhos azuis e intensos.

Ela queria ir até ele, mas seus pés se recusaram a se mexer, então ficou esperando até ele parar a poucos centímetros dela.

— Você gostou mesmo dessa breguice? — Ele perguntou, a voz rouca.

— Depende — ela respondeu, dando um sorriso trêmulo. — Do motivo por trás dela.

Ele se aproximou e levou a mão ao rosto dela, um toque gentil, traçando sua bochecha com as pontas dos dedos, trilhando um caminho até o cabelo. — Que tal começarmos com algo simples? Eu fui um idiota e sinto muito.

— Você não foi um idiota — ela sussurrou. — Você era, ainda é, um homem que perdeu alguém e está tentando se recuperar.

Ele assentiu, os olhos fixos na boca dela antes de olhá-la nos olhos. — Ainda assim, fui um idiota. E ainda sinto muito.

— Eu sei — ela sussurrou. — Mas Lincoln, não estou com raiva de você. Nunca estive. Entendo que precisará de tempo e, quando estiver pronto, encontrará alguém incrível...

— Não quero alguém incrível, eu quero você — ele a interrompeu.

Ela ergueu as sobrancelhas e ele fechou os olhos e riu timidamente ao perceber o que havia dito. — Droga. Não foi isso que eu quis dizer.

— Suas habilidades não estão tão boas hoje. — Ela provocou. — Não como quando você está com outras garotas.

— Não — ele falou rispidamente. — Não, porque as outras garotas não importam como você, Daisy.

— Lincoln...

Ele inclinou a cabeça dela. — Você deve ter notado que tenho um hábito estranho de chamar todo mundo de “amor”. Mas nunca você. Eu nunca te chamei assim. Você sempre foi Daisy ou Wallflower.

Lincoln respirou fundo. — Acho que... acho que nunca te chamei de “amor” da maneira indiferente com que chamava todo mundo, porque sabia que se eu fizesse isso, se tornaria realidade. Que você seria o meu amor e eu te amaria, Daisy. Eu não queria isso. Não podia arriscar. Então, nunca te chamei assim. Mas caramba, Daisy, acabou não adiantando de nada. Me apaixonei por você do mesmo jeito. Em algum momento entre Nova York, Charlotte e Nova York de novo, me apaixonei perdidamente pela minha Wallflower.

Ela riu e enxugou as lágrimas. — Eu pensei que tivéssemos concordado que não me chamaria mais assim.

Ele roçou os lábios na bochecha dela, capturando a lágrima. — Que tal eu te chamar de outra coisa? De amor.

Ela fechou os olhos e sentiu o coração disparar. — Aposto que você diz isso para todas as outras.

— Não mais — ele sussurrou, pressionando de leve a boca na dela. — Só você, Daisy. Você é o meu amor.

Ela se endireitou e se forçou a fazer a pergunta mais difícil de todas. — E Katie?

Ele não se encolheu. Não estremeceu. — Katie se foi. E ela e eu chegamos a um acordo.

Daisy não perguntou como ele fez um acordo com uma mulher morta. A convicção na voz dele a deixou sem fôlego, fez ela ter coragem de ter esperança de que talvez, só talvez...

Então, a realidade voltou à tona, e ela lembrou de como ele ficou nervoso no segundo em que a sombra de Katie surgiu.

Daisy deu um passo para trás e as mãos dele caíram ao lado do corpo, os olhos dele se fechando enquanto inclinava a cabeça para trás em derrota.

— Não posso — ela sussurrou. — Sinto muito, mas não posso me colocar nessa posição mais uma vez e arriscar que você surte comigo a cada aniversário da Katie, do acidente ou da morte dela. Sei que isso soa cruel, mas...

— Não é cruel. Digo, não vai acontecer, mas é justo que você tenha medo de que aconteça depois do modo como te tratei — ele disse, abrindo os olhos e encarando-a. — É o que eu esperava.

A agonia em seus olhos azuis a partiu ao meio.

— Eu vou embora — ele sussurrou. — Mas Daisy, será que posso te pedir um favor, como amigo...

Ela assentiu, sentindo o coração se apertar com a ideia de ser realmente capaz de deixá-lo ir. — Qualquer coisa.

— Diga que me ama.

Daisy ofegou de dor e ele deu a ela um olhar atormentado, mas firme.

— Lincoln...

— Eu sei que você me ama — disse ele, a voz desesperada. — Ou pelo menos amava antes de eu estragar tudo. Deixe-me ouvir as palavras pelo menos uma vez, Daisy. Minta para mim, se for necessário, mas me dê algo que eu possa martelar quando estiver velho, sozinho e amando tanto você que chegará a doer...

Daisy soltou um soluço sufocado e se lançou contra ele, envolvendo os braços ao redor dele e enterrando o rosto em seu pescoço. — Eu te amo — ela sussurrou. — Eu te amo tanto.

Lincoln paralisou por um segundo, em choque, e quando seus braços a envolveram, ele tremeu. — É melhor do que eu pensei que seria.

Eles se abraçaram por longos minutos, e até Kiwi teve o bom senso de se enrolar no tapete da porta dos fundos e deixá-los a sós enquanto as mãos dele acariciavam as costas de Daisy.

— Não sei se consigo te deixar — ele admitiu, dando uma risada dolorida. — Pensei que conseguiria, e pretendia, mas...

Daisy se afastou um pouco e puxou a boca dele para a dela, derramando seu coração e alma no beijo. As mãos dele subiram para a cabeça dela, aprofundando o beijo antes de se afastar e inclinar o rosto dela em direção ao dele.

— Me dê mais uma chance. Só mais uma chance, amor. Meu amor.

Ela olhou para ele e percebeu que uma vida inteira de riscos com Lincoln seria infinitamente mais gratificante do que uma eternidade em segurança sem ele.

— Vamos fazer isso — ela sussurrou.

Os olhos dele brilharam com esperança. — Fazer o quê?

— Tudo. Colocar nossos corações em risco, confiar que valerá a pena.

— Já tem valido a pena — ele afirmou, baixinho, pressionando os lábios nos dela. — Mas eu sou ganancioso. Eu quero ainda mais.

— O que você quer? — Ela perguntou, envolvendo-lhe a cintura com os braços e sorrindo para ele.

Ele sorriu de volta, descansando a testa na dela. — Você, Daisy. Eu quero alguém como você.


Epílogo

TRÊS ANOS DEPOIS

Daisy estava refogando a carne para a “Terça-feira do Taco” em estilo nova iorquino quando ouviu a música familiar. Ela riu daquele momento inesperado e se virou, dando de cara com o marido encostado na porta com um iPhone na mão.

— É sério? Você sabe que essa música fica presa na cabeça por dias depois que escutamos.

— Dance para mim, Mathis — ele disse, falando alto para que ela conseguisse escutá-lo apesar da voz de Britney.

— Como assim dançar para você? Já basta ter me convencido a deixar essa monstruosidade ser a nossa música de casamento. Que tal fazermos assim: eu danço, mas com você.

— Não mesmo — ele respondeu. — Quero que seja como na primeira vez que ouvimos a nossa música.

— Não é a “nossa música” — ela resmungou.

— É sim. Desde a noite do casamento de Cassidy e Emma, ??quando você fez um belo de um striptease.

— Como você poderia saber? — Ela perguntou. — Já que ficou de costas e tudo mais.

— Você está certa, fiquei mesmo — ele falou com um sorriso. — É por isso que mereço uma reprise.

— Que tal você ganhar sua reprise quando eu não estiver me sentindo tão enorme?

— Não, quero agora.

Ela olhou para a expressão insistente no rosto dele. Lincoln ainda era um cara tão tranquilo quanto antes, mas de vez em quando tinha essa mania de agir de forma teimosa e autoritária e...

— Tudo bem — ela concordou, desligando a boca do fogão. — Se tem certeza que quer eu faça isso quando deveria estar preparando o jantar.

Os olhos dele percorreram o corpo dela. — Ah, eu tenho certeza. Definitivamente tenho certeza.

Ela mordeu o lábio, porque mesmo naquelas circunstâncias estranhas, a maneira como ele olhava para ela a deixava excitada, agora e sempre. Assim era sua vida de casada com Lincoln Mathis.

— Aumente o volume — ela pediu, baixinho.

Ele aumentou e ela começou a balançar um pouco de um lado para o outro, sentindo-se tola, mas também livre. Ergueu os dedos para a parte de cima da blusa, mantendo o olhar no dele enquanto abria um botão. E depois outro.

— Tem certeza? — Ela indagou, a mão hesitando. — Estou meio que...

— Tenho certeza.

Daisy abriu outro botão. Depois outro. Até que a blusa estava aberta e os olhos dele se fixaram nela com adoração à medida em que ela ficava cada vez mais segura com a própria dança, rebolando e se movendo um pouco mais, balançando o quadril para um lado e para o outro, dando um passo para mais perto dele...

Daisy congelou, arregalando os olhos.

Lincoln estava de pé, ereto, e rapidamente aguçou o olhar. — O que foi? — Ele foi até ela. — Caramba, Daisy, o que houve?

Ela olhou para ele, maravilhada, colocando a mão sobre a barriga. — Acho que a minha bolsa acabou de estourar.

SETE HORAS DEPOIS

— Ele é tão lindo — Penelope constatou, deslizando um dedo sobre a bochecha do recém-nascido Christian Daniel Mathis.

— Ela também — disse Cole, segurando a minúscula Adelaide Katherine Mathis nos braços.

— Gêmeos — Penelope sussurrou. — Quero dizer, eu sei que já sabíamos que seriam, mas vê-los juntos assim...

Lincoln pigarreou. — Você sabe que nós somos os pais, certo?

— Sim — Penelope respondeu, ainda olhando para o bebê. — Mas há um exército do lado de fora esperando a vez deles, então vou desfrutar de cada segundo que eu puder com os bebês, e você trate de manter essa sua matraca fechada, Lincoln.

Lincoln olhou para a janela que separava o quarto de Daisy da sala de espera. Sem dúvida, todos os seus amigos estavam lá – incluindo os novos amigos que Daisy fez trabalhando no ramo de planejamento de casamento – de pé, esperando, não tão pacientes assim, a chance de prestar homenagem aos recém-nascidos de Lincoln e Daisy.

— Estou impressionada que todos não estejam amontoados aqui — Daisy falou em uma voz cansada, mas feliz. Ele olhou para a esposa, com quem estava casado há pouco mais de um ano, e pegou a mão dela, sentindo o coração disparar de amor do mesmo jeito que acontecia sempre que a olhava, falava com ela ou apenas pensava nela.

— Paguei a Cassidy para mantê-los sob controle. Amo essa nossa estranha família Stiletto/Oxford até a morte, mas não estou totalmente convencido de que não irão tentar roubar nossos filhos.

Mas no momento em que ele disse isso, Penelope estava se aproximando da porta com Christian nas mãos.

— Pequena — Cole chamou pacientemente a esposa.

— Certo — ela falou, deu um suspiro, voltou para a cama e entregou o filho de Lincoln a ele. — Grace e Jake são os próximos, mas seus pais podem passar aqui antes para vê-los por alguns minutos.

Penelope ficou na ponta dos pés e deu um beijo na bochecha de Lincoln. — Você é o meu favorito. E estou tão feliz por você.

Ele sorriu para ela, observando-a abraçar cuidadosamente uma Daisy exausta.

Cole colocou Adelaide nos braços da mãe, deu um tapinha no ombro de Lincoln e caminhou até a saída. — Sam conseguiu alguns cigarros para celebrarmos de uma forma bem máscula. Se você estiver com disposição.

Lincoln assentiu distraidamente. Ele comemoraria com os caras, assim como fez quando o filho de Grace e Jake nasceu, e também no nascimento da segunda filha de Sam. O bebê de Jackson e Mollie estava para nascer dentro de alguns meses e ele comemoraria isso também.

Mas agora era sobre ele. E Daisy. E os filhos deles.

Agora era sobre sua linda família.

O bebêzinho minúsculo soltou um suspiro, aconchegando-se em seus braços, e ele olhou maravilhado para Daisy, que observava Adelaide com a mesma admiração.

Alguém bateu de forma impaciente na janela. Riley, ele supôs. Mas a ignorou, aproximando-se mais da lateral da cama e curvando-se para beijar a esposa.

Ela o beijou de volta, com talvez um pouco mais de desejo do que um quarto de hospital permitia, e ele pensou ter ouvido uma vaia e um “Arranjem um quarto” vindo de algum lugar.

— Eu te amo — ela sussurrou.

— Eu também amo você.

— Não acredito que temos bebês — ela disse, estendendo um dedo e acariciando a cabeça de Christian. — Durante muito tempo, desejei tanto ter uma família, e agora você está aqui, tudo é tão perfeito e não sei nem o que fazer.

Ele apoiou o filho em um braço e estendeu a mão livre para enxugar a lágrima feliz que rolou pela bochecha dela. — Você tem que fazer a única coisa que pode fazer, amor. Que é se acostumar com isso. Porque não vamos parar por aqui. Iremos ter mais algumas dessas criaturinhas, vamos criá-las do melhor jeito possível, e eles vão criar os filhos deles do melhor jeito possível, e um dia estaremos velhos e grisalhos, sentados na varanda, ouvindo Britney...

— Hum, não — ela o interrompeu, dando uma risada.

— Tudo bem, um dia estaremos velhos e grisalhos, sentados na varanda em um silêncio entediante, como idosos fazem, e vou ficar bem com a situação do mesmo jeito, porque terei tudo o que sempre quis. Terei você, Daisy Mathis.

Os olhos de Daisy lacrimejaram de emoção, e então ela soltou uma risada quando olhou por cima do ombro para os amigos sempre-impacientes deles. — Você terá alguns deles também.

— Pode ser — ele concordou, dando uma rápida olhada para os amigos e recebendo um dedo do meio de Julie e uma revirada de olhos de Cassidy. — Err. Só de vez em quando.

Ele olhou para Daisy e viu que o sorriso dela havia diminuído um pouquinho. Ele estendeu a mão e segurou o queixo dela. — Diga-me.

— Você já se perguntou, alguma vez sente falta...

Ele balançou a cabeça, sabendo do que ela estava falando. De quem estava falando. — Eu tenho tudo o que preciso bem aqui — ele disse, baixinho.

E mesmo quando sua filha abriu a boca minúscula e soltou uma enxurrada de gritos não-tão-minúsculos, Lincoln soube que era verdade.

Finalmente, seu coração havia encontrado felicidade.


1. Wallflower: termo usado para flores que crescem em muros, mas também para descrever alguém extremamente tímido ou "anti-social". Como o nome de “Daisy” remete a uma flor (margaridas), Lincoln usa o “wallflower” também como um trocadilho, portanto, optou-se por deixar o apelido em sua forma original.

 

 

                                                                  Lauren Layne

 

 

              Voltar à “Página do Autor"

 

 

 

 

      

 

 

O melhor da literatura para todos os gostos e idades