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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


STAR KING / Susan Grant
STAR KING / Susan Grant

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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A guerra os separou. O destino os reúne.
O príncipe herdeiro Rom está lutando pela sobrevivência de seu povo quando uma mulher encantadora de outro mundo salva sua vida e depois desaparece sem deixar vestígios.
Forçado ao exílio, ele agora é o capitão de uma nave estelar de contrabandistas rebeldes. Pensamentos de seu anjo salvador ainda o perseguem. Ele quer respostas, ele a quer. Sua leal tripulação acha que ele anseia por essa mulher de fantasia por tempo suficiente. Então Jas de repente retorna para ele e coloca suas vidas em rota de colisão com o destino.
A piloto da Força Aérea Jas Hamilton culpa o trauma de combate por suas memórias de um guerreiro de olhos dourados de outro mundo. Nenhum homem que ela conheceu se compara. Quando um império alienígena faz contato com a Terra, ela começa a recuperar seu senso de aventura perdido - e encontra uma segunda chance de amor nos braços do homem que ela passou a vida inteira tentando esquecer.
Quando um terrível inimigo reaparece, Jas e Rom devem escolher entre o dever e um futuro juntos.
Salvar a galáxia acabou de se tornar pessoal...

 


 


CAPÍTULO 1


“Um sonho não compreendido é como uma carta não aberta.”

— O Talmud


O míssil perseguiu o jato de combate da tenente Jasmine Boswell pelo céu com uma precisão impiedosa. A adrenalina alimentada pelo medo bombeou em suas veias.

Sem tempo para ficar com medo.

— Voo Trovão, vá para a esquerda! Bandido às seis! — O aviso de seu ala1 rugiu dentro de seu capacete. — Mais para a esquerda!

Jas agarrou o manche com a mão enluvada e puxou. Nove vezes a força da gravidade a esmagou contra o assento. Sua máscara de oxigênio deslizou mais para baixo em seu rosto suado enquanto ela lutava para inspirar ar suficiente para encher seus pulmões comprimidos.

— Bandido à direita - sete horas. Três quilômetros.

Droga!

Seus pensamentos giraram em um redemoinho de medo, negação e raiva. Era a Arábia Saudita, a zona de exclusão aérea de atrito. Quem atirou nela? E como ela poderia não saber que eles estavam lá?

— Detenha-o! Reverter à direita!

Jas empurrou o manche para o lado oposto e para frente. O cinto de segurança e o arnês de ombro mantinham seu traseiro firme no assento, mas o efeito da gravidade negativa impulsionou seu interior para cima, como se ela tivesse acabado de chegar ao topo da colina mais alta da maior montanha-russa do mundo.

— Míssil às seis, menos de um quilômetro e meio. Voo do trovão, quebra para a direita, para a direita! — Urgência deslizou para o tom de seu ala. — Mais para a direita! — Um segundo depois, uma explosão alvejou o céu faminto por nuvens

Um acerto.

Vibrações de chocalhar os dentes a sacudiram contra seus arreios enquanto luzes de advertência em sua confortável cabine de assento único piscavam como uma árvore de Natal enlouquecida. Então o F-16C começou a deslizar lentamente para o lado, girando torto - puxando para a esquerda como a velha caminhonete de seu avô.

— Estou perdendo o sistema hidráulico... E o combustível — disse ela, lutando com os pedais da alavanca e do leme. — Não consigo manter o nível dela. — Ela olhou para fora. Centenas de quilômetros de deserto estéril bocejavam abaixo dela. Se ela perder o controle, então...

O horizonte mergulhou enquanto o jato tombava. A súbita aceleração violenta prendeu sua cabeça e ombros no topo do dossel. Ao longe, ela ouviu “Ejetar, ejetar, ejetar” em seu fone de ouvido. Mas ela não conseguiu. Ela tentou esticar o braço esquerdo para alcançar a alça de ejeção abaixo dela, mas seu membro parecia pesar centenas. Ela engasgou com os dentes cerrados, lutando para mover a mão enquanto sua voz interior estoica de confiança percorria uma litania de opções. Se ela saltasse presa nessa posição estranha, provavelmente quebraria as costas. Mas o lutador estava fora de controle - se ela ficasse dentro de casa, ela morreria.

Ela deslizou a mão cada vez mais para baixo.

Por favor.

Seu braço tremia e seus ombros queimavam. O suor ardeu em seus olhos.

Oh Deus. Mais... um... centímetro.

Seus dedos enluvados se fecharam sobre o punho, e ela puxou com toda a força.

 


— Por tudo que é sagrado, não!

Romlijhian B'kah saltou de sua cabine de caça para o solo abaixo. Impulsionado pela urgência e pelo medo, ele correu de sua nave para um sulco maciço cheio de pedras e escória. Guerras de muito tempo atrás haviam devastado Balkanor, transformando o planeta em um deserto sem vida de areia grossa e movediça. Rom severamente reconheceu que era uma base adequada para Sharron, o fanático que ele viera matar.

Onde a vala terminava, os destroços começavam - o caça estelar de seu irmão, um pássaro outrora belo, agora quebrado. O vapor sibilava das aberturas rasgadas em seu casco. Embora o aparelho de respiração no capacete de Rom não puxasse o ar externo, ele podia muito bem imaginar o fedor de propelente2 vazando.

— Jhon!

Rom mexeu nos punhos. No topo, ele abriu a cabine, alcançando o homem lá dentro. — Saia! Agora. — Ele puxou os fechos que cruzavam o peito de seu irmão.

Jhon empurrou suas mãos. — Vá sem mim. — Sua voz estava rouca. — Eu... Eu não consigo mover minhas pernas.

Rom desviou sua atenção para baixo. Cacos brilhantes do que antes fora o painel de navegação prendiam as calças de Jhon como dentes. — Crat. — Ele cerrou os punhos. Um cansaço súbito e profundo ameaçou superar a adrenalina do combate. Liberar as pernas de seu irmão seria um trabalho delicado e demorado. Se ele corresse, ele arriscava perfurar o traje de proteção de Jhon, e seu irmão poderia morrer envenenado por radiação antes de sair de Balkanor. Mas se demorasse o tempo que o procedimento arriscado exigia, ele perderia a vantagem surpresa que ganhou ao fugir das forças de defesa de Sharron sem ser detectado.

Os punhos de Rom se fecharam sobre os punhos. Muitos meses gastos e muitas vidas perdidas pesavam em sua consciência para arriscar falhar hoje. Ele tinha que continuar.

— Eu voltarei para você. — Rom disse, sua voz plana. — Vazamento de propulsor; não ligue a energia.

— Não senhor.

— Esteja atento às faíscas ao remover o painel.

— Sim senhor.

Rom apertou sua mandíbula. Como ele poderia, em sã consciência, deixar seu irmão para trás? — Mostre-me suas armas. — Seu tom enérgico camuflou sua agitação interna. — Devo saber que você pode se proteger, se necessário.

Jhon mostrou a ele uma arma de fogo e uma lâmina embainhada. Atipicamente solene, ele apertou o ombro de Rom. — Siga seus sentidos, Rom. Confie no que é revelado a você, como nossos ancestrais fizeram, e a Grande Mãe irá guiá-lo ao seu destino.

Rom cobriu a mão de Jhon, luva sobre luva, e olhou para o visor do capacete preto e dourado de seu irmão que refletia seu próprio rosto igualmente insondável. — Pela vitória. — Ele sussurrou. Então ele saltou para a areia.

Jhon ergueu o punho no ar, o gesto do guerreiro para a vitória. — Esmague a escuridão!

Animado pelo grito de guerra, Rom correu em direção a seu objetivo - um aglomerado de cavernas abrigando um vasto labirinto subterrâneo de túneis, de onde ele penetraria no complexo de Sharron. Mas seu corpo estava esgotado pelas horas de combate espacial anteriores à invasão, fazendo com que cada passo parecesse vinte. Ele mal alcançou várias pedras monolíticas, um marco que seus espiões lhe deram, quando a estática irrompeu na conexão de comunicação de seu capacete. Ele diminuiu a velocidade, esquadrinhando o céu em busca de naves inimigas. Estava vazio. O cabelo arrepiou em seu pescoço.

Jhon.

Ele se virou. O caça estelar de seu irmão estava pegando fogo. — Jhon! — Ele berrou e disparou para a frente. As chamas se espalharam pela fuselagem com terrível eficiência. Antes de dar um segundo passo, o calor detonou um tanque de propelente e o caça estelar explodiu em uma bola de luz cegante.

A areia ao redor dele começou a se infiltrar em pequenas baforadas erráticas. Estilhaços! Ele mergulhou para longe de um projétil girando. Ele atingiu seu peito, cortando tecido e pele, queimando-o como uma lâmina derretida.

A dor apertou seus pulmões em um torno invisível e quase impediu o fluxo de ar. Suas pernas se dobraram. Ofegante, ele caiu na areia, segurando apertado o rasgo em seu traje de proteção. Jhon fora sua sombra virtual desde a infância, seu aliado devotado e amigo mais próximo. Mais do que irmãos, eles compartilhavam uma amizade forjada por sangue e amor, o tipo de vínculo quebrado apenas pela morte - que deveria vir muito depois de ambos terem vivido uma vida plena e envelhecido como velhos fracos.

Com voz rouca, Rom gritou para o céu cor de âmbar: — Grande Mãe - por que isso! Por que você não me levou? — Tonto de agonia que era muito mais do que física, ele se dobrou e quase desmaiou.

O bem das pessoas supera as preocupações de um indivíduo.

As palavras frequentemente recitadas invadiram seu delírio. Tirando força da velha máxima, ele recuperou o controle lentamente, bloqueando sua dor pela morte de Jhon para se concentrar em sua missão. Quando os tremores em suas mãos pararam, ele tirou as luvas e avaliou os danos em seu corpo com a objetividade fria que empregou ao inspecionar seu caça após o combate. O sangue saturava o pano puído e ensanguentado em seu peito. Mas a ferida era a menor de suas preocupações. Ele foi exposto à radiação; se não o matasse, provavelmente o deixaria estéril. Se ele não pudesse produzir um herdeiro - sua responsabilidade para com sua família como o príncipe herdeiro - não haveria casamento. E agora, com seu irmão mais novo morto e incapaz de ocupar seu lugar, Rom pode ter destruído sozinho sua linhagem familiar de onze mil anos.

— Eu não vou permitir! — Ele estremeceu com uma memória particularmente vívida de seu pai avançando em sua direção, os olhos dourados do homem escuros com uma raiva incomum. — Eu proíbo você de lutar! — Mas Rom o desafiou.

Mesmo agora, a memória daquela insubordinação, a primeira em seus vinte e três anos padrão, alternadamente o excitava e o enojava. Seu pai pacifista se recusava a ver o motivo dessa guerra. Ele zombou da afirmação de Rom de que as ideias de Sharron ameaçavam os antigos costumes de fidelidade e família, e que a figura religiosa renegada estava crescendo rapidamente em poder e influência. Rom esperava provar que ele estava errado. Mas na esteira dessa invasão desastrosa, ele duvidava que seu pai veria qualquer coisa além do fracasso de seu primogênito como herdeiro e a vergonha que isso traria para sua família.

O sol se pôs no horizonte, inundando o vale com sombras castanho-avermelhadas e douradas, lembrando Rom do planeta Sienna, seu lar ancestral. De alguma forma, ele tinha que retornar ao palácio para informar sua família da morte de seu irmão - e sua responsabilidade por isso.

Ele tentou se sentar, mas seus músculos o desobedeceram e a escuridão apareceu nos limites de sua visão. Gemendo, ele colocou a cabeça para trás. Ele não foi por vontade própria quando a inconsciência finalmente o reivindicou.

 


— Não se mexa — disse uma voz feminina em um idioma que Rom nunca tinha ouvido, mas de alguma forma entendido. Muito antes de ouvi-la, ele sentiu sua presença na escuridão, persuadindo-o a despertar, a não ceder.

Para não morrer.

As pálpebras de Rom se abriram sobre os olhos ásperos como areia. Ele se apoiou nos cotovelos. As pedras abaixo dele morderam suas costas, mas inexplicavelmente, a dor nauseante em seu peito e costelas havia desaparecido. Assim como seu capacete.

Ele não se lembrava de tê-lo removido.

Rom olhou estupidamente para a aparição caminhando em sua direção. Pelos céus, ele nunca tinha visto ninguém como ela em sua vida. Sua pele parecia tão pálida e macia como areia varrida pelo mar, contrastando vividamente com seu cabelo, fios de seda cortados abaixo de sua mandíbula em um tom impossível - a cor do espaço mais profundo.

Uma visão tão extraordinária só poderia significar que ele estava pairando entre a vida e a morte. A fronteira no limite da eternidade era um mundo todo próprio - ou assim disseram aqueles raros guerreiros que voltaram para descrevê-lo.

— Se você é o anjo enviado para me levar para o Eterno — ele disse baixinho, — talvez não seja tão ruim morrer.

Ela parou. — Mova-se de novo e eu vou atirar em você nas bolas.

Certamente, ela parecia mais um soldado do que um ser celestial. No entanto, seu uniforme não era um que ele reconhecesse, nem era um projeto para protegê-la da radiação. Uma peça de roupa verde discreta cobria seus braços e pernas. Manchas pretas enchiam os lugares onde a insígnia normalmente poderia ser usada e um capacete primitivo pendia de uma das mãos enluvadas. Na outra estava uma arma igualmente tosca - e ela apontava para a cabeça dele.

Ele pegou sua pistola, mas antes que pudesse enrolar os dedos em torno da arma, ela disparou. Um único tiro acertou seus joelhos e espalhou terra em todas as direções. Grande Mãe, ele pensou, engolindo a tosse de surpresa. Ele espalmou as mãos levantadas.

— O próximo tiro será mais alto — alertou. — Muito mais alto. — Ela estava cambaleando, sua respiração rápida e superficial. Por ferimento ou agitação, ele não sabia. Ela indicou com um breve movimento de seu braço que ele deveria largar sua pistola de plasma, mas um aviso interno o deteve. Ela poderia ser um dos asseclas de Sharron, um batedor enviado para investigar o acidente. Não. Seu olhar era muito perspicaz, muito inteligente, nada como os olhos vidrados dos seguidores do cultista de Sharron.

Ele colocou sua arma no chão e ergueu as mãos. — Eu não tenho nenhuma razão para machucar você.

Ela usou a ponta da bota para deslizar a arma dele fora de seu alcance, mas quando o fez, um trovão estourou. Uma série de explosões iluminou o horizonte. O estrondo além das colinas anunciava mais do mesmo.

Seu queixo caiu quando quatro naves com asas em delta voaram pelo céu crepuscular. — O que diabos é isso?

— Lutadores das Estrelas — afirmou. — Nossas.

Lutadores das Estrelas? O coração de Jas disparou. Como todos os pilotos de combate, ela havia memorizado imagens de dezenas de aeronaves; minimizava as chances de atirar em um alvo amigo durante a batalha. Mas esses jatos incrivelmente elegantes não se pareciam com nada que ela já tivesse visto.

Eles pareciam naves espaciais.

Ela desviou sua atenção de volta para seu prisioneiro - o soldado ou o que quer que ele fosse. Um uniforme azul iridescente com detalhes em prata se ajustava perfeitamente ao seu peito, acompanhando o resto de seu corpo longo e atlético até as botas com precisão sob medida. Sua pele lisa era profundamente bronzeada, um tom ou dois mais claros que seu cabelo, mas seus olhos eram de cílios escuros e tão claros como ouro derretido. — Você não é saudita. — Claro que ele não era saudita. Ele não era local. Ela não tinha certeza do que ele era.

Uma explosão massiva sacudiu o chão sob suas botas.

O homem se lançou para ela, puxando-a para baixo em seu peito. — Proteja-se! — Uma detonação maciça e um fogo terrestre em resposta abafaram o som.

Ele arrancou a .45 de sua mão, arrastando-a para trás sobre a areia para um afloramento de pedras avermelhadas. Ela empurrou a palma da mão em direção ao rosto dele. Antes que ela pudesse quebrar seu nariz, ele a bloqueou com a agilidade hábil de um lutador especialista em artes marciais. Puro terror combinado com sua humilhação por ter sido desarmada impulsionou o joelho que ela apontou para seu pau.

Mas deslizou inofensivamente além de sua coxa. Eles rolaram na terra. Pedras afiadas marcavam sua pele exposta. Então ele a jogou de costas - habilmente, facilmente - como um cozinheiro de comida rápida virando uma panqueca. Ela lutou para arrancar os pulsos de suas mãos grandes, calculando a melhor forma de enfiar os nós dos dedos em sua laringe de um ângulo tão estranho.

— Cesse! Cesse suas lutas! — Seus olhos dourados se cravaram nela. Ele parecia tão sem fôlego, parecia abalado. — Há um perigo muito maior para você do que para mim.

Outro par de naves inconcebivelmente futuristas gritou acima. Outro boom. Detritos caíram do céu. Suas mãos formaram um escudo sobre sua cabeça, seu corpo protegendo o dela.

Jas enfiou os punhos entre os uniformes rasgados e tentou se afastar, mas ele era mais forte. Só quando o ataque acalmou ele a deixou ir.

Aturdida, ela ficou de joelhos, penteando os cabelos úmidos e ásperos com os dedos. Para seu horror, a areia onde ela estivera momentos antes estava carbonizada e fumegante. Sua .45 descartada era uma bolha de aço fundido que se solidificou rapidamente.

Puta merda. Seu coração martelava em seus ouvidos, suas mãos tremiam enquanto ele se sentava, os dois ainda tentando absorver o que acabara de acontecer.

— Você salvou minha vida — disse ele.

— Eu o quê? — Ela piscou para ele, seus olhos corajosos. — Você salvou a minha.

— Eu me senti escorregando— ele insistiu. — Mas então eu ouvi sua voz. Eu ouvi sua voz e a segui de volta. — Seu rosto se contorceu de dor crua. — Embora eu não saiba por quê. — Olhos zangados se voltaram para ela.

Ela lançou um olhar fugaz e ansioso para sua arma de fogo derretida.

— Você deveria ter me deixado morrer. — Ele acusou. — Por que você não me deixou morrer?

— Eu não sei. — Ela podia ouvir a defensiva em seu tom. Era como se ela já estivesse em sua corte marcial, explicando por que havia confraternizado com o inimigo durante uma invasão alienígena.

Invasão alienígena?

Ela se virou, sentindo um grande caroço revelador. — Eu bati minha cabeça. Nada disso é real.

— Eu com certeza sou real.

— Se eu tocar em você, você desaparecerá. — E ela poderia acordar dessa alucinação.

O homem ofereceu sua mão. — Por favor.

Incontáveis batimentos cardíacos marcavam enquanto eles se observavam dentro das sombras misteriosas e profundas. Ajoelhando-se ao lado dele na areia arenosa, ela tocou a palma da mão com as pontas dos dedos.

Pele quente e real.

— Ainda estou aqui — disse ele.

— Sim — ela sussurrou. — Eu também.

A mão dela se apertou contra a dele, como se por sua própria vontade. Palma com palma quente. Sua consciência dele se intensificou. Mas antes que ela pudesse recuar, as comportas se abriram. Curiosidade... Cautela... E interesse masculino inconfundível - os pensamentos, os pensamentos dele, jorraram em sua mente, girando com os dela.

Seu grito de pânico se alojou em sua garganta.

Revele seu propósito, imploravam seus olhos. Guie-me.

Perplexa, ela balançou a cabeça.

Por favor.

Jas tirou os dedos dela. Sua mão voltou para o uniforme manchado de sangue. Muito sangue. Por que ela não percebeu isso antes? — Você precisa de um médico. Você tem um kit com você?

— Eu não sinto nada. Sem dor. — Ele estendeu a mão para tocar o caroço inchado em sua testa, os dedos deslizando ao longo da linha do cabelo. — Você?

— Não. Mas... — Seu toque. Esse contato. Isso abriu sua mente para ela novamente. — Eu posso sentir sua dor — Ela sussurrou.

Grande Mãe. Ela sentiu sua dor. Sua perda indescritível. O nó que Rom havia amarrado em torno de suas emoções quase se desfez. — Meu irmão. Eu não deveria tê-lo deixado nos destroços; Eu deveria tê-lo libertado enquanto tinha chance.

— Não. — Os olhos da mulher quase se fecharam. — Esmague a escuridão.

— O que? — Ele tossiu. — O que você disse?

— Você deve esmagar a escuridão. — Ela estava mais pálida agora, sua expressão maravilhada e confusa. — Eu ouço isso na minha cabeça. O que isso significa?

— Meu inimigo, Sharron, é a escuridão. Um monstro de mal incomparável cuja morte significará o fim desta guerra. Minhas tropas clamam 'esmaguem a escuridão' antes de irmos para a batalha. Foi a última coisa que meu irmão disse — seu peito apertou — antes de morrer.

— Então você deve fazer isso — disse ela com convicção, a umidade brilhando em seus olhos atordoados. — Mate Sharron.

Todas as dúvidas sobre por que ela estava aqui foram espalhadas como poeira. Essas poucas palavras deram a ele a determinação, o coração para continuar.

— Esse foi o seu propósito o tempo todo — disse ele. — Para me guiar. Para me colocar de volta no meu caminho. — Ele arriscou acariciar sua bochecha com a mão. A consternação cintilou em seus olhos, mas como nos sonhos, ela aceitou sua carícia impetuosa. A sensação de sua pele macia e perturbadoramente real disparou sinos de alarme em sua cabeça. Ficar tão comovido por essa mulher, mesmo que fosse uma visão, era infeliz e impróprio, especialmente considerando - se ele sobrevivesse fisicamente ileso - seu iminente casamento arranjado e muito necessário.

Jas se apoiou em sua palma quente e áspera, seus olhos vagando semicerrados. Ela não conseguia afastar a sensação de que havia esperado por aquele homem durante toda a sua vida, de que o destino de alguma forma os unia. — Eu sou analítica — ela sussurrou com fervor. — Equilibrada. Coisas assim não acontecem com pessoas como eu.

Ele segurou seu queixo, silenciando-a. Então, devagar e com reverência, ele puxou o cabelo dela para trás, as pontas dos dedos roçando na orelha dela. Ela se manteve completamente imóvel, certa de que um único movimento destruiria aquele sonho inexplicável. A respiração dela gaguejou quando ele pressionou os lábios em seu cabelo, depois em sua bochecha. — Confie em seus sentidos, meu anjo — ele disse. — O que eles revelam nem sempre é o que esperamos. — Passando os dedos pelos cabelos dela, ele a guiou até sua boca.

A paixão queimou por ela com aquele beijo. Sumiram seus avisos internos e qualquer outra coisa semelhante a um julgamento racional. — Ele não é real, e isso não está acontecendo — ela cantou silenciosamente.

Desesperadamente.

Ele se afastou, mas eles permaneceram testa com testa, suas respirações irregulares, seus juízos agitados. O que estava acontecendo? Ele era um estranho, um soldado ferido e sofrido, cujo beijo mais breve a deixara sem fôlego, cuja dor e angústia ela guardara para si como se fossem suas. Isso desafiava a lógica. Desafiava... Tudo. O raciocínio lúcido era uma característica que ela valorizava e cultivava desde a infância, assim como se treinara para reprimir emoções fortes.

Até agora.

— Outro — ele disse calmamente.

— Outro...

Eles caíram como um só na areia grossa.

A mulher encheu os sentidos de Rom como ninguém antes. Ela era salgada e doce, seu cabelo escuro inundado com os cheiros de flores exóticas de terras que ele nunca tinha visto, tudo misturado com a aspereza de fumaça e sangue e sujeira. Balançando à beira da morte, ele ansiava por fazer amor com ela enquanto possuía a força e a paixão da vida.

Seu prazer seria sua salvação.

Mas a escuridão voltou rápido demais, manchas tremeluzentes no início, e então nuvens ondulantes que obscureceram sua visão. Ele orou por mais tempo, orou para que esse ser etéreo o impedisse de escorregar de sua vida mortal para a eternidade.

 


— Acorde!

Rom respirou fundo quando a ponta de um pé calçado com uma bota cravou em seu abdômen e o puxou de volta à realidade com uma crueldade impressionante. A risada de pelo menos meia dúzia de homens com elmos ecoou nas colinas, e ele era novamente um piloto ferido deitado de costas em um campo de batalha. Levando os joelhos até o peito, ele agarrou sua arma. O pé calçado chutou para fora de sua mão.

— Sonhando com sua última servidora de prazer, hein? — zombou um dos soldados. — Pelo que parece, ela deve ter te tratado bem. — Mais risadas. — É B'kah. E ele está duro como uma rocha. Chute-o novamente. — Rom se virou para o lado, desviando o golpe violento de suas bolas para o quadril.

— Chega — uma voz mais profunda ordenou. — Não há muito tempo. Sharron o quer agora.

Os soldados o colocaram de pé. A dor disparou por seu peito. Ele estava queimando vivo, não conseguia encher os pulmões de ar. Foi uma luta para ficar consciente - suas pernas balançavam como fitas. Ele orou por força, por disciplina, por foco, para que pudesse completar sua missão. Ele se agarrou à visão da mulher - o anjo - para mantê-lo acordado, lembrando-se das palavras que o manteriam vivo por tempo suficiente para matar Sharron... Esmague a escuridão.

Eles o arrastaram para as cavernas, cavernas úmidas maduras com o fedor do sofrimento. Havia uma luz escura, o som de um choro distante, então, abençoadamente, um ar frio e fresco na câmara de descontaminação.

— Ele verá você agora. — Disse um dos três guardas musculosos. O homem o impeliu por um corredor que se estendia para sempre, rivalizando em tamanho com os corredores do palácio em que Rom nasceu. Casa. Sienna. Mas aquela grande vitrine arquitetônica emanava bondade, não esse... Mal.

— O príncipe, meu senhor.

Rom quase caiu em uma cadeira. Lutando para manter uma aparência de postura aristocrática, ele se endireitou na cadeira.

Você é o herdeiro B'kah, ele se lembrou.

Suas costelas machucadas queimavam suas entranhas como um atiçador incandescente. Os guardas foram idiotas; por respeito a seu status e pela presunção de que seus ferimentos o haviam deixado indefeso, eles não o amarraram com algemas de choque.

Sharron estava ereto, sereno, enquanto contemplava uma pintura do chão ao teto do buraco negro no centro da galáxia. Ele tinha o cabelo claro e os traços perfeitamente formados de sua bem conceituada família de comerciantes. Gerações de homens leais o precederam. O que tinha acontecido? O que o mudou?

Sharron se virou, encarando Rom. Um medalhão gravado com um sol nascente acima de duas mãos entrelaçadas penduradas em seu pescoço. Rom reconheceu o metal - uma liga empática. O desgosto coagulou seu intestino. Medalhões como esses eram proibidos desde os Anos Sombrios, quando eram usados pelos senhores da guerra para influenciar o comportamento. Ele ficou surpreso que Sharron já não tivesse pedido um pendurado em seu pescoço.

— Romlijhian B'kah, o príncipe rebelde — disse Sharron agradavelmente. — Como eu gostaria que nosso encontro fosse em melhores circunstâncias.

— Francamente, eu imaginei vasculhar os destroços de sua sede, em busca de seus restos inúteis — disse Rom.

— Por favor, sem palavras duras. Esta é a chance de amenizar nossas diferenças. A maior parte do que o perturba vem de não entender o que é a Família do Novo Dia e o que defendemos.

— Você é um açougueiro. Você e seus anciãos escolhidos engravidam suas seguidoras e, em seguida, enviam-nas em uma viagem só de ida ao centro da galáxia após o parto.

O sorriso de Sharron era magnético. — Alegações infundadas.

Essa também foi a resposta de seu pai, que as acusações de tal barbárie não tinham mérito. As poucas dezenas de gravações holográficas de mulheres sendo carregadas em naves não foram suficientes para obter o apoio de seu pai, o rei. Deixou Rom para lutar esta guerra apenas com seus próprios homens de confiança.

— Ah, Romlijhian. Você não pode deixar de ser um produto de sua educação. — Sharron projetou empatia genuína. — Desde a infância, você conheceu apenas a lavagem cerebral de Vash Nadah. É extraordinariamente difícil ver além dessa doutrinação implacável. Mas você deve se esforçar para fazer isso. Você é um jovem poderoso, um dos poucos influentes o suficiente, inteligente o suficiente para fazer a diferença. — O homem deu mais um passo, chegando perto o suficiente para que Rom pudesse estender a mão e agarrá-lo. — Vidas inocentes foram perdidas, do meu lado e do seu. Vamos parar com essa matança.

— Assine o acordo de rendição. É o único caminho. — Com os músculos tensos e prontos, Rom olhou para seu inimigo com as pálpebras semicerradas. — Capturar-me não muda nada.

— Verdade. — Sharron cruzou as mãos atrás das costas e caminhou pela sala para longe dele. Rom praguejou baixinho. — Eu calculei mal. A força não era o caminho a seguir. Ainda não. Não esperava que você reunisse tanto apoio tão rapidamente e sem a bênção de seu pai. No entanto, de certa forma, meu erro rendeu bons resultados.

Um prazer malicioso súbito brilhou nos olhos do líder do culto. — Você foi exposto à radiação por muitas horas. Muitas, você não acha?

Rom mascarou seu medo do que Sharron insinuou, que ele havia se tornado estéril, acabando com a linhagem ininterrupta de reis de sua família.

A animosidade se transformou no tom leve de Sharron. — Uma situação bastante divertida, se qualquer um de nós fosse um homem abençoado com um senso de humor. Olhe para você - descendente da família mais rica e poderosa dos Vash Nadah, os governantes indiscutíveis de todos os mundos conhecidos, danificados além do reparo da única maneira que realmente importa. — Ele balançou a palma da mão larga como se estivesse jogando grãos de areia ao vento. — Sua semente está sem dúvida arruinada. Nenhuma esperança de filhos - ou mesmo filhas, para falar a verdade. — Agarrando-se aos lados da cadeira, Rom deixou cair o queixo. Sharron se aproximou, exatamente como ele esperava. — Você vai morrer por minha conta, não é, Romlijhian?

— O inferno que eu vou. — Arqueando-se para cima, Rom empurrou os saltos das botas na barriga de Sharron, jogando-o no chão. Então ele estava fora da cadeira e em cima de sua presa antes que Sharron tivesse qualquer chance de implorar por sua triste vida. Eles derraparam no chão e se chocaram contra a parede. Uma pintura caiu no chão próximo. Cacos de vidro estalaram sob as costas de Sharron quando sua cabeça atingiu a perna de uma mesa com um baque abafado. Para seu crédito, o homem não gritou.

Rom sentiu sua ferida no peito reabrir. Ele sabia que o sangue carmesim brilhante espalhado pelo rosto de Sharron e sobre o chão de ladrilhos brancos era seu, mas a fúria obliterou sua dor. Ele arrancou a moldura da pintura caída e cravou a ponta de metal dentada na garganta de Sharron com as duas mãos. Cortou tendões e carne. O sangue jorrou pela parede. Sharron gorgolejou, agarrando seu pescoço.

— Morra, bastardo, morra! — Rom usou o que restava de sua força para segurar o corpo trêmulo e moribundo de Sharron no lugar. Ele tinha que ter certeza, ou a maldade incomparável desse monstro se espalharia para os confins da galáxia.

Sharron ficou mole. A visão de Rom ficou cinza e o zumbido em seus ouvidos ficou mais alto, silenciando o som de botas se aproximando e homens gritando. — Nossa segurança foi violada! — ele ouviu alguém gritar por perto. — Evacuar! — Mãos arrancaram seu braço do pescoço de Sharron. Uma explosão de luz o surpreendeu. Não! Rom tateou cegamente sobre ele. Onde? Rastejando, depois se arrastando pelo chão, ele perseguiu os sons dos soldados em retirada.

 


Rom sabia que seus homens o haviam encontrado por meio do tratamento gentil e deferente. Ele forçou sua boca seca a formar palavras. — Sharron... Morto. Eles levaram o corpo. — Quando suas tropas o ergueram, ele pediu com voz rouca: — Não os deixe escapar! — O rugido em seus ouvidos cobriu a resposta de seus soldados. As paredes giraram e giraram, e ele fechou os olhos com força para ocultar a sala inclinada. Alguém abriu seu uniforme até a cintura, expondo seu ferimento. Seus dentes batiam; seu coração vacilou, então continuou sua vibração estranha e superficial.

Você não vai morrer.

O anjo. Ele reconheceu sua voz doce e rouca em sua cabeça.

— Minha amada. — Ele sussurrou. Sem conseguir mais abrir os olhos, ele sentiu os braços quentes dela ao redor dele, confortando-o, enchendo-o de uma felicidade que ele nunca imaginou, prendendo-o a este lado da vida.

Sua presença vacilou.

— Não. Eu não sei como ou onde encontrar você — ele gritou, seu orgulho secundário a tê-la ao seu lado. — Não saia. Eu preciso de você. — Mas ela escorregou de suas mãos. Grande Mãe, ele perdeu seu irmão e agora a mulher. — Eu vou te encontrar. Eu juro. — Alguém - seu cirurgião, talvez - colocou um pano frio sobre sua testa e o acalmou em tons preocupados. Apesar dos cuidados do médico, Rom entoou sua promessa até que ele não pudesse falar mais. — Eu vou te encontrar.

 


Eu vou te encontrar.

Jas apertou seu abraço. — Eu estou bem aqui. — Ela pressionou sua bochecha contra a dele, saboreando a aspereza espinhosa da barba por fazer em sua pele lisa e morena.

Não saia.

— Eu não vou — ela o assegurou em sua língua. Mas em uma rajada de vento quente e seco, sua presença evaporou, drenando seu coração de sua alegria recém-descoberta. Ela agarrou o ar, gritando: — Não, não vá embora!

— Ei ei. Ninguém vai deixá-la, tenente.

Alguém colocou uma máscara sobre sua boca e nariz. — Ela está consciente! Eu preciso do colarinho C - agora!

Com um esforço enorme, ela abriu os olhos, piscando para limpar a sombra flutuando à sua frente, apertando os olhos até que a forma borrada se tornou um jovem médico negro vestido com uniforme de combate da Força Aérea dos Estados Unidos. — Oh — O mundo rugiu de volta. Caos. O trovão rítmico das lâminas do helicóptero. Calor do deserto saudita. Turbulência. A dor espalhou-se pelo lado direito da testa enquanto ela lutava contra a náusea crescente.

O médico se aproximou, dando um tapinha em sua bochecha. Sua voz se suavizou em um doce sotaque sulista. — É isso aí. Mantenha esses lindos olhos bem abertos para mim. — Ele ergueu a máscara de oxigênio de sua boca e colocou uma cinta de pescoço sobre sua garganta. Olhando para o relógio, ele segurou o pulso dela entre os dedos. Em seguida, ele pressionou o microfone conectado ao fone de ouvido contra os lábios. — Diga novamente? Sim, a pressão arterial é de noventa por cento. Cinquenta.

— Eu desisti, não foi? — Suas palavras foram arrastadas. — Não me lembro.

— Abatido... Fogo amigo. — Sua voz foi abafada pelo bater incessante das pás do rotor.

Ela tentou se sentar, mas foi amarrada firmemente a uma maca. — Eu vi alguém lá fora. Um homem. Ele está ferido - temos que voltar. — O médico pressionou a mão em seu ombro e apertou. — Não — ela persistiu. — Nós conversamos... E ele disse... E então nós — Ela engoliu em seco. Como diabos ela iria explicar que ele precisava dela, que ela precisava dele, quando ela mesma mal entendia? — Só não vá.

— Tenente.

— Por favor. — Ela implorou com os olhos enquanto ele colocava a máscara de oxigênio sobre sua boca e nariz, silenciando-a.

Não! Ela gritou silenciosamente.

— Senhora, nós circulamos o local. Se houvesse mais alguém, nós os teríamos visto. — Seu tom era gentil, não condescendente. — Respire fundo e devagar. Ai está. Você vai se sentir melhor em nenhum momento.

— Não preciso me sentir melhor — ela murmurou na máscara. — Não quero esquecer. — Grogue, ela fechou os olhos.

Não vá. Eu preciso de você.

As palavras líricas e exóticas giravam como partículas de poeira no lugar nebuloso entre a vigília e o sono. Então a escuridão se fechou e ela não conseguiu impedir.


CAPÍTULO 2

Dezenove anos depois


— O amor verdadeiro? Okay, certo. Você precisa de novos óculos. — Jas puxou a mão do leitor de mão, apenas para que a mulher a puxasse de volta. — Não existe uma linha de dinheiro? — ela perguntou brilhantemente. — Deve ter, Tina. Muito mais prático, eu acho. Conte-me sobre o grande colecionador que entrará e comprará minhas pinturas para que eu possa viver em Sedona como Betty aqui.

— Abra sua mão, querida.

As paredes de adobe da galeria de arte suavemente iluminada irradiavam frieza e abafavam os barulhos da rua de forma que tudo o que ela ouvia era seu próprio pulso - e o tamborilar de seus dedos enquanto Tina voltava para sua linha amorosa. — Eu poderia usar uma previsão do tempo — Jas arriscou. — Meu filho e eu vamos acampar na próxima semana.

— Sra. Hamilton... — A velha adivinha franziu os lábios, a alegria em seus olhos ampliada por seus óculos grossos. Então ela ergueu seu olhar exasperado para Betty, amiga e agente de Jas, e dona da galeria chique. — Os artistas devem ser intuitivos, de mente aberta e receptivos, não é?

— Era para ser. — Betty piscou para Jas, em seguida, voltou seus olhos castanhos travessos para o leitor de palma. — Eu simplesmente não sei o que dizer sobre este. Mas as pinturas dela vendem, e vendem bem, veja bem. Então — ela suspirou — eu a aturei. — Rindo, Betty organizou uma bandeja com biscoitos de chocolate e bule de café expresso e a levou para a mesa enquanto Tina retomou seu estudo da palma da mão de Jas.

— Sua linha de amor é estável e não se ramifica. Uma raridade. Significa um homem, um amor. Um amor eterno. — A voz de Tina ficou mais baixa. — Ele é sua alma gêmea, você vê. Você o amou no passado e o amará novamente, pois suas almas estão para sempre entrelaçadas.

Cada músculo do corpo de Jas ficou rígido. Os sinos perto da entrada tilintaram enquanto o vento assobiava das colinas circundantes, sussurrando sobre seus braços nus com o toque de um amante.

Eu vou te encontrar.

Inundada por uma sensação inexplicável de déjà vu, de saudade, Jas inspirou e expirou várias vezes pelo nariz para se acalmar, uma técnica que aprendera com outro colega octogenário da Nova Era de Betty. Instintivamente, seus olhos procuraram uma enorme pintura, sua mais recente, na qual ela havia derramado toda a paixão de sua alma ferida. Ele tinha tons de ouro, âmbar e rico Siena. Areia. Céu. O silêncio do crepúsculo se aprofundando enquanto as primeiras estrelas da noite cintilavam no ar frio do deserto.

O sonho misterioso a acordou na noite em que o pintou. Ela havia trabalhado no dia e na noite seguinte, tentando recriar o esplendor severo da paisagem. Com cada pincelada apaixonada, o desejo persistente vibrava profundamente dentro dela, mais poderoso do que nunca - junto com a sensação de que ela havia deixado alguém para trás. Mas quem? Ao acordar, ela às vezes se lembrava de um homem com olhos dourados enigmáticos, mas suas feições estavam sempre borradas, como se ela o estivesse vendo através de um vidro fosco.

Era a única aberração de sua mente totalmente racional. Ele até tinha um nome médico - transtorno de estresse pós-traumático. O diagnóstico de Transtorno de estresse pós-traumático era apenas outro rótulo; nada explicava por que ela nunca mais foi a mesma depois daquele dia na Arábia Saudita.

— Jasmim. — Tina bateu com a ponta do dedo áspero na palma da mão. — Preste atenção.

Jas piscou com a repreensão suave. — Sim, senhora.

Ela falou gentilmente. — Houve sofrimento e decepção em seu passado, mas essa dor continuará a torná-la mais forte, a força de que você precisa para seu amor verdadeiro. Ele exigirá todo o poder do seu espírito, da sua fé... Da sua carne.

Jas bufou. — Diga isso para a meu primeiro e único — ela olhou para seu relógio de pulso Marvin, o Marciano — que por acaso está em Las Vegas neste momento, em lua de mel com sua nova esposa grávida de 20 anos.

— Jock não era seu verdadeiro amor

— Sim. Eu finalmente descobri isso.

Ela não amava mais Jock. Ela certamente não sentia falta dele. Passaram-se seis meses desde que se divorciaram e mais de dois anos desde a última vez que dormiram juntos, fizeram sexo, ou como se chamava aquele casal triste que caracterizou seu casamento.

Jas estendeu a mão livre sobre a mesa. — O verdadeiro amor é um mito, um conto de fadas.

— Você nem sempre pensou assim, — Tina disse suavemente. — Você acreditava.

Jas cerrou os punhos. Ela deixou a magia atrapalhar sua vida uma vez. Uma vez. Ela era mais inteligente agora.

O mais calmamente que pôde, ela se levantou. Perplexa, Tina a deixou apertar sua mão. — Obrigada, de verdade — Jas disse, apertando o braço da mulher idosa. — Estou aberta a quiromancia e tudo mais, mas amor não é minha matéria favorita atualmente. Por que você não se junta a Betty e a mim para almoçar mais tarde na Churrascaria Tomasita? — Ela manteve a conversa enquanto ajudava Tina a se levantar e a escoltava até a entrada da frente. Quando a porta se fechou, ela encostou a testa na madeira lisa e fria.

— Sinto muito. — Ela ouviu Betty dizer.

— Não sinta. — Jas voltou para a mesa e se serviu de outro biscoito de chocolate. — Espero não ter sido muito rude.

— Ela achava que não. — Betty a olhou com ternura. — Ela sabe que tem sido difícil para você ultimamente - os gêmeos foram para a faculdade, o divórcio. Antes que você perceba, a vida vai voltar como era antes. — Ela apertou seu ombro. — Tome outro expresso.

— Que tal uma dose de tequila em vez disso? Segure o limão e o sal. Atire, segure o copo. Basta despejar na minha garganta.

— Sua inauguração rendeu cento e trinta e cinco mil dólares e um convite da esposa do governador para pintar um mural na sala de jantar deles — disse Betty. — Se você quiser beber até ficar estupefata, pode fazê-lo com minha bênção. Vou comemorar com você - em espírito, é claro.

A ideia de beber até o estupor era realmente atraente. Quando foi a última vez que ela ficou realmente bêbada? As inibições que se danem, uma dança bêbada na mesa. Provavelmente não desde seus dias de piloto de caça, e isso parecia ter ocorrido há cem anos. Mas, naquela época, ela estava embriagada com a exuberância inocente e juvenil. Ela flutuava na alegria de acreditar que o resto de sua vida se estendia gloriosamente à sua frente.

Eu faria qualquer coisa para me sentir assim novamente.

Ela empurrou de lado o desejo perigoso e inesperado. Ela tinha uma boa vida - amigos, um trabalho que gostava. Duas crianças saudáveis. Ela estava feliz - ou pelo menos deveria estar. Era idiota desperdiçar mais um minuto desejando alguma sensação elusiva de conclusão que existia apenas em sua imaginação. Metas concretas, não desejos, eram o que mantinham sua vida agradável e ordeira. Sem inspiração.

Jas gemeu. — Acho que preciso de férias.

Sua declaração deixou Betty sem palavras. Inferno, isso a deixou sem palavras também. Ela nunca tirou férias.

Você é indispensável; todo mundo precisa de você.

Esse mantra ecoou dentro dela desde a infância. Ela praticamente criou suas três irmãs, enquanto seus pais se dedicaram a pesquisas na universidade.

— Você certamente merece férias, — Betty disse cuidadosamente. — Demore o quanto quiser.

Jas refletiu sobre suas telas semiacabadas apoiadas em sua casa em Scottsdale. Ultimamente, seu coração não estava no trabalho. Ela tinha a responsabilidade de produzir, mas sua musa se recusou a cooperar.

— Eu vou deixar você saber o que eu decidir.

O som de sapos coaxando invadiu o silêncio. — Esse é o meu telefone — disse Betty. — Eu deixei no escritório. Já volto, querida.

Betty saiu correndo da sala, deixando Jas sozinha com quatro paredes de suas próprias pinturas. As telas coloridas aumentaram e refletiram de volta suas paixões mais íntimas, seus medos, sua dor e frustração, como se ela estivesse se vendo virada do avesso. O acidente fez isso com ela, virou-a do avesso, fez de sua arte um reflexo de seus sonhos, ambos mais vívidos do que sua vida real. Ela não tinha certeza de onde ou quando bateu com a cabeça naquele dia, mas quando acordou no helicóptero, tudo havia mudado.

Os sinos de vento de bronze acima da entrada da frente tilintaram, tirando-a de seus pensamentos.

— Ei mãe!

O filho de Jas caminhou pela galeria. Sorrindo, seu cabelo castanho escuro úmido contra sua testa, Ian a puxou para um abraço animado com um só braço.

Ela inalou seu calor e vida, e os cheiros de óleo de motor, poeira e couro, o resultado de sua Harley 1993 recém adquirida e esporadicamente funcionando.

— Por que você não me mandou uma mensagem?

Ele riu. — Diz a mulher que nunca verifica suas mensagens. Enfim, queria fazer uma surpresa para você. Achei que não iria embarcar no voo anterior. — Seu sorriso se desvaneceu, seu olhar se suavizou com arrependimento genuíno. — Desculpe por ter perdido sua estreia, mãe. Eu realmente queria estar aqui.

— Você vai estar da próxima vez. — Ela fingiu indiferença pelo bem de Ian. Mas realmente a frustrou que Jock tivesse agendado seu casamento no mesmo fim de semana do show mais importante de sua carreira, forçando Ian e Ilana a ficarem com ele, não com ela. — Então, você se divertiu?

— Você quer dizer em Vegas? — Seus olhos castanhos nublados. — Casamento do papai? — Parecia que preferia falar sobre outra coisa, qualquer outra coisa. — Estava tudo bem.

Betty se aproximou deles. Ela parecia distraída. — Era Dan ao telefone. Ele não conseguiu entrar em contato com você, então me ligou.

— Eu deixei meu telefone no carro.

Ian deu a ela um longo olhar que dizia: Vê?

— Está tudo bem?

Nada incomodava Dan Brady. Ele enfrentou muitos conflitos com um sorriso fácil e uma ou duas piadas cafonas. Como ex-professor de economia de Ian, ele fez com que Ian se interessasse por uma carreira em finanças depois que um exame médico malsucedido da Força Aérea acabou com o sonho de seu filho de se tornar piloto. A gratidão de uma mãe foi a entrada de Dan em sua vida. Como um amigo. Ela o deixou acreditar que sua relutância em namorá-lo se devia ao recente rompimento de seu casamento. A verdade não era fácil de falar.

— Eu pensei que ele dirigiu para casa ontem à noite. Se ele ainda está aqui, vamos todos sair para almoçar.

— Não. Ele está de volta em Tempe, Jas. — As palavras de Betty foram cortadas. — Ele disse para ligar a CNN.

Só então Jas percebeu que a pele de Betty parecia estranhamente pálida contra seu cabelo preto com fios cinza. Um estremecimento de preocupação apertou o estômago de Jas.

— Por quê? O que há de errado?

— Basta ligar.

Visivelmente agitada, Betty agarrou-se à borda da mesa para se equilibrar. Perplexa, Jas trocou olhares com Ian e apontou o controle remoto para a TV, imaginando quem havia morrido, que avião havia caído ou onde um grande terremoto havia ocorrido. Seu coração acelerou. Grace, sua irmã mais nova, estava visitando San Francisco.

— Aqui é Kendall Smith, ao vivo na Casa Branca com essa história de última hora. O presidente Talley vai agora falar para nossa nação atordoada.

— Meus concidadãos — interrompeu a voz do presidente. — Hoje é um dia que lembraremos para o resto de nossas vidas como o dia que mudou o curso da história humana para sempre, o dia em que recebemos provas inegáveis de nossos vizinhos na galáxia.

— O que? — Jas pressionou dois dedos contra a boca. A mão de Ian pousou em seu ombro e apertou.

O presidente foi brevemente abafado por um estalo de estática, seu rosto ficando pixelado antes de se reformar. Jas desviou o olhar para o céu salpicado de nuvens lá fora. Enquanto o presidente falava, suas entranhas se apertaram com ceticismo e descrença - e medo puro e primitivo.

Na esteira dessa vulnerabilidade misteriosa, seu sonho há muito descartado de ir para o espaço ganhou vida em uma explosão de não adulterada, quase infantil - e totalmente inadequada para a gravidade do momento - excitação.

Eles se juntaram a Betty em um sofá com estampa navajo.

— Esta manhã, às três e quatorze da manhã, horário padrão do leste, enquanto a maioria de vocês dormia, as Nações Unidas receberam uma transmissão de um indivíduo, declarando em inglês que ele era o comandante de uma frota de espaçonaves. Nave extraterrestre. Todos os postos de escuta ao redor do globo, civis e militares, confirmaram que a transmissão se originou de uma nave em órbita ao redor do planeta Júpiter. Repito, a transmissão foi confirmada.

Ian tinha um olhar de intensa concentração, mas a geralmente imperturbável Betty parecia abalada. Jas pegou a mão gelada de sua amiga e apertou-a.

— Como resultado da conversa do comandante comigo, meus conselheiros militares e os outros líderes mundiais, aprovei seu pedido para buscar uma relação diplomática formal e, enfatizo, uma relação não adversária com a Terra. As negociações começarão com extrema cautela. Coloquei nossas forças militares no mais alto estado de alerta. Diante disso, peço a vocês, como seu presidente, que mantenham a calma e deem o exemplo para o resto do mundo. Vamos ver isso como um novo começo glorioso. — Obviamente emocionado, o presidente pigarreou. — O início de uma era de promessa e prosperidade além de nossas maiores esperanças, para todas as pessoas da Terra... Agora e para as gerações que virão.

Lá fora, um carro saiu rugindo do estacionamento; outro pisou no freio. Houve gritos abafados, uma mulher e um bebê chorando, cachorros latindo.

Jas ficou de pé. — Betty, onde está sua arma?

— Trancada no escritório.

— Dê-me a chave.

Jas carregou a 9 mm, verificou duas vezes a segurança e a enfiou no cós da calça jeans. Ian se certificou de que as janelas e a porta traseira estivessem fechadas e trancadas.

— Eu tenho que ligar para Ilana. — Ela sequestrou o telefone de Betty e digitou o número de sua filha em Los Angeles, xingando enquanto esperava a conexão. — Estou conseguindo uma gravação. Diz que a chamada não pode ser completada.

— Mãe — disse Ian — ela acabou de mandar uma mensagem. Ela ainda está com papai em Vegas. Eles estão bem.

Jas lançou ao filho um olhar agradecido, assentindo.

Fique com seu pai, ela desejou a filha. Fique segura.

— Acho melhor irmos para a sua casa. — Jas disse a Betty.

Ela conduziu a mulher e Ian em seu Range Rover, ignorando a rolagem de mensagens recebidas em seu telefone, em seguida, dirigiu para o rancho da mulher nas florestas acima de Sedona, a horas de distância. Ela deveria estar morrendo de medo. Todos os outros na estrada pareciam estar agindo como loucos. Mas ela estava animada. Por que ela não estava apavorada? Como seus outros segredos, ela guardou para si mesma.

 


Naquela noite, eles se sentaram fixos na TV, nas cenas de histeria alimentada pelo medo e comemoração jubilosa, suicídios em massa, evangelistas proclamando que o fim do mundo estava sobre eles e aqueles que pregavam aceitação e amor, mesmo dos alienígenas - ou Vash, como os extraterrestres se referiam a si próprios.

Pela manhã, o presidente Talley declarou a lei marcial, que incluía toque de recolher do anoitecer ao amanhecer. A sequência de imagens dos tanques da Guarda Nacional descendo a Fifth Avenue em Manhattan e ao longo da Highway 1 em Santa Monica foi quase surreal. As imagens eram assustadoras o suficiente para manter a filha independente e teimosa de Jas, Ilana, em Las Vegas, em vez de arriscar um retorno ao seu dormitório na UCLA3.

No final do segundo dia, quando parecia que as estradas estavam seguras para viajar, Jas se certificou de que Betty estava protegida em sua casa e partiu com Ian para Scottsdale. Demorou quase todo o dia. O trânsito estava horrível. Acidentes, Carros da Guarda Nacional paralisados e bloqueios de estradas retardaram o progresso a cada poucos quilômetros. Uma vez em casa, eles voltaram ao seu novo normal de sentar grudados no sofá para assistir ao noticiário, enquanto, simultaneamente, todos os canais de mídia sociais revelavam os piores medos das pessoas.

— Em um anúncio impressionante esta tarde — disse um correspondente exausto — os dez astronautas estacionados a bordo da estação espacial internacional se ofereceram para se encontrar com os Vash. A única mulher a bordo, a cientista japonesa Keiko Takano, fez a seguinte declaração: 'Como a Terra deve ser protegida de doenças desconhecidas e contaminação não intencional, humildemente pedimos para agir como emissários da Terra, encontrando-nos cara a cara com nossos visitantes.'

Seguiu-se um intenso debate e especulação. — Um sacrifício nobre e visionário, alguns o chamam. Suicídio, disseram outros. Por fim, o pedido de convocação foi aprovado. Seis dos dez astronautas foram apanhados por uma das naves da Vash e levados para mais longe no espaço do que qualquer humano jamais havia sido.

— Cerca de dez horas atrás — anunciou o repórter — os astronautas embarcaram na nave de comando Vash para um cume histórico. A transmissão enviada de volta à Terra foi vista por líderes mundiais, especialistas militares e de inteligência e membros selecionados das Nações Unidas antes de ser liberada. — Um tabuleiro de damas com fotos publicitárias da NASA apareceu - cinco homens e uma mulher de várias nacionalidades. Na tela, o repórter levou a mão ao ouvido e acenou com a cabeça, então a postura jornalística fugiu quando seus olhos se iluminaram. — As fotos estão chegando agora.

Jas olhou, sem piscar, para uma transmissão de vídeo de um grupo de pessoas sorrindo e apertando as mãos. — Apertando as mãos — ela murmurou, agarrando a mão quente de seu filho. Lágrimas de descrença e alegria turvaram sua visão enquanto ela lutava para distinguir entre os astronautas e os Vash. Quando as diferenças surgiram, não eram de forma alguma o que ela esperava.

Na verdade, ela estava um pouco envergonhada pela Terra. Vestidos com macacões mal ajustados, padrão da NASA, os astronautas da Terra pareciam os primos pobres de seus anfitriões. Em contraste, os Vash usavam suntuosos uniformes índigo com detalhes em prata, e sua pele bronzeada e cabelos claros transmitiam um ar de prosperidade e saúde robusta. Então a câmera girou para a direita, trazendo à vista um alienígena que não se parecia muito com o resto. Se elegantes macacões azuis e prateados eram a roupa do dia, ele claramente não percebera o memorando. Em vez de um uniforme elegante e botas pretas brilhantes, ele usava uma camisa larga enfiada em um par de calças justas com um cinto robusto amarrado baixo em volta da cintura, no estilo pirata espacial. Até suas botas de cano alto pareciam quebradas, como se ele realmente trabalhasse com elas. Embora sua roupa fosse definitivamente da classe trabalhadora, seus traços elegantes e expressão vagamente desdenhosa pareciam aristocráticos. Essa impressão persistiu quando um dos oficiais mais baixos, vestidos de índigo, caminhou até ele, parecendo agir manso na presença do homem mais alto. Enquanto o bucaneiro4 espacial inclinava a cabeça para escutar, ele olhou diretamente para a câmera com olhos tão pálidos e brilhantes como ouro.

— Confie em seus sentidos, meu anjo...

Jas congelou, seu coração apertado com as memórias daqueles olhos dourados e sua voz inundando sua mente, memórias que pareciam pertencer a outra pessoa, mas no fundo ela sabia que eram dela. Ela ouviu vozes, sussurros, seus sussurros, sua respiração quente contra seu ouvido. Sua boca na dela.

— Outro...— Ela podia sentir o beijo deles - ela se lembrava - seu corpo reagindo a esse fato mesmo quando ela ficou lá em estado de choque.

— Mamãe? — Ao longe, ela ouviu Ian chamando seu nome.

— Eu o conheço — ela queria dizer ao filho. — Eu conheço aquele homem. — Mas ela não se atreveu a proferir a percepção maluca de que acabara de vislumbrar o amante de seu sonho na forma de uma pessoa que realmente vivia e respirava.

Um alienígena vivo e respirando.

Ok, ela tinha oficialmente perdido a cabeça.

O grupo na tela agora parecia jogadores em um jogo de cadeiras musicais enquanto os Vash vestidos de uniforme e os astronautas se sentavam, deixando seu astronauta sem nenhum. Seu olhar dourado esfriou. Ombros retos, dignidade intacta, ele girou no calcanhar de suas botas gastas e saiu de vista.

Espere! Tremendo, Jas lutou contra o desejo ridículo de segui-lo.

— Mamãe? Ei mãe! — A voz de Ian veio até ela, como se fosse do outro lado do oceano. Ele estava apertando a mão dela e finalmente percebeu que estava apertando de volta.

Ela segurou seus dedos quentes como uma tábua de salvação.

Inspir... Expire... Inspire.

— Você está bem?

— Sim. — Ela passou a manga pela testa úmida. — Não tenho certeza.

— Qual é? Mãe.

Ela apenas balançou a cabeça. Apegando-se a fragmentos de magia, saboreando os últimos fragmentos de desejo, ela tentou em vão se lembrar da última vez que se sentiu viva sem um pincel na mão.

 


— Não! Eu não vou permitir isso, B'kah! — O comandante Lanat bateu com o punho considerável na mesa, derrubando um vaso vazio no console de controle ambiental. As luzes diminuíram e o ar quente começou a soprar das aberturas. — Fui ao Inferno e voltei!

Ainda em uniforme de gala da reunião com a delegação da Terra, Lanat desabotoou o colarinho com uma mão, enquanto a outra dançava com notável destreza sobre as luzes piscantes do painel, devolvendo seus aposentos a bordo do navio mercante Lucre ao normal.

— Eu repito, você quebrou nosso pacto santíssimo. Você está violando o Tratado de Comércio, artigo quatro.

— Parágrafo nove, terceira linha abaixo, eu acredito. — Rom B'kah sentou-se insolentemente contra a parede oposta ao comandante e recitou: — 'Nenhuma organização, exceto os Vash Nadah ou seus representantes devidamente nomeados, podem conduzir transações visando lucro ou outro tipo de ganho.'

A expressão de Lanat dizia: preciso dizer mais?

— Comandante, se posso esclarecer - afirma no apêndice que, se nenhum acordo formal estiver em vigor, os Artigos de Comércio de Fronteira se aplicam, o que significa que comerciantes independentes como eu não podem ser excluídos. — Rom olhou pela janela de exibição para o gigante gasoso em tons de arco-íris com seus olhos vermelhos estranhos. Júpiter, como os habitantes locais chamam. — E eu acredito que este pequeno sistema remoto se qualifica como a fronteira.

O temperamento de Lanat transbordou. Ele apertou o botão de comunicação, gritando: — Dram, chame os Artigos de Comércio de Fronteira.

— Página doze, subparágrafo quatro — Rom ofereceu suavemente. Ele recitava coisas assim desde criança. — Meus ancestrais escreveram a maldita coisa, Lanat. Mas peça ao seu homem que verifique se isso a faz se sentir melhor.

O comandante fechou os olhos, os lábios tremendo como se contasse silenciosamente para se acalmar. — Desconsidere, Dram. — Ele se levantou. Segurando as mãos atrás das costas, ele caminhou por toda a extensão da sala. — Você tem a audácia de manobrar sua embarcação em minha frota. Sem ser convidado. Então, você anuncia sua intenção de nos seguir ao novo planeta. Agora você invade meus aposentos lançando alguma regulamentação obscura que diz que você pode negociar com eles.

Rom ergueu as palmas das mãos. — Eu não invadi. Eu bati.

— Este é o seu estratagema mais descarado até agora, B'kah!

— Outra joia em uma longa sequência, hein?

— O que te traz aqui? Porque agora? Ninguém ouviu falar de você em mais de uma década.

— Estou procurando uma pequena aventura — Rom respondeu com franqueza. — Este é o primeiro novo território descoberto em anos. A fronteira está diminuindo. E o que costumava ser a fronteira agora é inteiramente controlado por Vash Nadah. Como deveria ser. Mas isso faz com que ganhar a vida seja um desafio, se não totalmente impossível para os empresários independentes.

— Empreendedores? Bah! Aproveitadores, todos vocês.

— Eu tenho uma nave para manter, Lanat, uma tripulação para alimentar.

O comandante revirou os olhos, e Rom reprimiu seu desejo de atrair o homem mais velho. O homem ficou intimidado, compreensivelmente, pois poucos homens de sua posição tiveram a chance de cruzar com um B'kah, quanto mais falar com um. Mas Rom não era mais o herdeiro da família mais poderosa de Vash Nadah - ele não era mais capaz de ser o herdeiro de ninguém, aliás. Mas o prestígio ainda o seguia. Romlijhian B'kah - o pária impenitente, o lendário herói de guerra, dependendo de para quem você pergunte. Por decreto de seu pai, ele foi proibido de se envolver nos assuntos dos Vash. Só por isso, sua presença aqui deixava Lanat e os outros inquietos.

Eles iriam superar isso.

— Tudo o que estou afirmando, por pura cortesia, Comandante, é que minha nave seguirá a frota quando você for convidado a pousar.

— Mas a Terra não vai nos deixar pousar! Eles estão desconfiados. Eles se preocupam com doenças, ou que iremos atacar. Nunca vi uma bolinha de sujeira tão atrasada, de mente sombria e pessimista.

— Dê a eles uma nave.

— Uma nave? — Lanat repetiu inexpressivamente.

Rom ofereceu um lembrete gentil. — Os habitantes de Kaaren Prime também suspeitavam. Demos a eles uma nave mercante classe quatro, uma nave muito além da tecnologia que eles tinham. Isso aguçou seu apetite por mais. Todos eles imploraram para que pousássemos.

Lanat voltou para sua mesa. Ele chamou algo em sua tela, estudando o texto pensativamente. — Uma nave...— Ele agora estava alheio à presença de Rom. — Classe dois e três, apenas. Sem quatros. Talvez o cruzador? Não, isso não vai funcionar. Muito velho, precisa de conserto...

Rom lutou para manter seu temperamento sob controle. Este oficial foi o melhor que os Vash Nadah puderam encontrar para esta delicada missão? Ele achava mais fácil acreditar no boato de que a descoberta da Terra havia sido feita por acidente. Isso explicaria como esse burocrata de mente estreita foi empurrado para uma oportunidade única na vida. A menos que Lanat tenha feito uma bagunça profana nos procedimentos iniciais com a Terra, ele seria promovido, garantindo status e uma vida confortável para sua família. Não admira que ele quisesse espantar Rom.

Rom estreitou os olhos e lançou um olhar de soslaio além da partição que separava os aposentos de Lanat da ponte. O engenheiro do Lucre estava explicando o painel de controle da propulsão da nave para o grupo da Terra. A única mulher, Keiko Takano, fazia animadamente ao tradutor uma pergunta após a outra, seu cabelo preto na altura do queixo balançando a cada movimento.

Algo há muito morto dentro dele se mexeu.

Rom pigarreou e desviou os olhos. Ele tinha ficado atordoado quando viu aquela mulher pela primeira vez, finalmente percebendo através de uma névoa de choque que ela não era o anjo de sua visão anterior em Balkanor. Três dos homens de seu grupo compartilhavam dessa cor de cabelo; era comum na Terra, se em nenhum outro lugar, a sombra que ele pensava pertencer apenas ao ser etéreo que salvou sua vida.

Apenas para levar à sua ruína completa.

Mas isso era culpa dela ou dele? Ele escolheu permanecer sob seu feitiço quando deveria ter buscado refúgio da radiação - desperdiçando minutos preciosos para enterrar seus dedos, seus lábios naqueles fios de meia-noite, deleitando-se com a seda desgrenhada, inalando a fragrância que era ela. Ele tinha ficado meio louco por sua resposta pura, a maneira como ela suspirou quando ele beijou o lugar tenro sob sua orelha, gemeu quando ele sussurrou sua necessidade por ela, como ele lhe traria prazer, todas as maneiras como ele a amaria.

Ela abandonou você... Quando você mais precisava dela. Desapareceu sem deixar vestígios.

— Grande Mãe!

Ele se sacudiu para fora de seu transe. Ele estava exausto, pressionando muito a si mesmo e a seus homens. Só uma vez ele se permitiu sucumbir à imaginação e ver onde ela o levou. Por tudo o que era sagrado, se aquela mulher de sua visão alguma vez ousasse tomar a forma de carne viva, seria melhor ela se certificar de que não se encontraria em seu caminho.

Ele descontou sua irritação em Lanat. — Não posso perder tempo relaxando enquanto você atualiza suas aulas de história do comércio. Vou levar minha nave para a Terra quando a frota chegar. É meu direito. — Moderado pela expressão de abjeto desânimo do homem, ele assegurou-lhe: — Não procuro causar-lhe problemas. Enquanto estiver na Terra, conduzirei meus negócios separadamente dos seus. Não vou interferir. Quando minhas transações forem concluídas, minha equipe e eu iremos embora.

O comandante sitiado suspirou e fechou a tela. — Muito bem, B'kah. Vou precisar do nome da sua nave e número de registro. A Terra solicitou as informações. Devo repassar a sua também, já que você estará nos acompanhando - se a Terra permitir que pousemos.

— Ah, claro, comandante. Nome e número de registro. — O humor de Rom aumentou alguns graus. Ele estava entrando com a frota.


CAPÍTULO 3


A bordo do Quillie, seus músculos tensos, seus instintos de combate pulsando em prontidão, Rom girou em um círculo completo, lentamente, segurando uma espada sensorial na frente dele com as duas mãos seguras.

— Acabou para você, Gann.

Sua voz ecoou vagamente na arena a bordo, onde um cerco nanocrílico impedia a entrada de luz e sons externos. Bajha foi tocado no escuro.

— Desista agora, e eu posso mostrar a você um pouco de misericórdia - você choramingando, seja lá o que os habitantes da Terra-chamam-aquelas-criaturas-peludas-subservientes. Ah, sim, seu cachorrinho chorão.

Rom congelou - ele tinha certeza de ter ouvido uma risada abafada. Sufocando os seus, ele olhou com os olhos arregalados para a escuridão completa.

— Acabou. Eu te vejo.

Embora não com os olhos.

Os neurônios em seu corpo zumbiam, apontando para sua presa. Aprimorado a uma sensibilidade quase infalível de anos de treinamento em bajha, o antigo jogo de guerreiros, os sentidos de Rom o guiaram. Seguindo sua direção ancestral e misteriosa, ele confiou em seu corpo da maneira que os guerreiros devem fazer, chegando mais perto. Ouvindo.

Embora não com as orelhas.

Ele confiava no sangue que corria em suas veias, seus poros formigando e os menores pelos de seu corpo, enquanto ele segurava a espada sem ponta dos sentidos em seus punhos. Ah, ele amava esse aspecto do esporte - a antecipação totalmente excitante de uma vitória ainda não realizada.

Mostre-se, Gann.

Seu oponente atacou, a lâmina arredondada de sua espada sensorial passando tão perto que o vento cantou sobre as mãos enluvadas de Rom. Rom arqueou as costas e se abaixou. Gritando de alegria, ele girou, balançando sua arma em um arco brutal acima de sua cabeça e bruscamente para a direita, afundando-a no centro da placa torácica de Gann. Ele ouviu um grunhido de surpresa quando a espada dos sentidos vibrou em suas mãos, sinalizando um golpe.

— Ah, inferno e de volta — Gann murmurou.

— Luzes — disse Rom. A iluminação surgiu, revelando seu segundo em comando em um joelho. Ele apontou sua arma para ele. — Entregue? — ele perguntou, sem fôlego.

— Entregue.

Rom ofereceu sua mão a Gann - uma demonstração de respeito pelo homem em quem ele confiava tanto quanto confiava em seu irmão, e o único membro dos Vash Nadah disposto a segui-lo até o exílio. Segurando um ao outro pelo pulso, eles inclinaram a cabeça, encerrando formalmente a partida.

Lealdade, fidelidade, família.

Como ele, Gann era dedicado ao antigo código do guerreiro, que enfatizava o controle e a autodisciplina. Era um modo de vida honrado, que servia de exemplo para as classes mais baixas - ao contrário dos hábitos da maioria dos governantes atuais.

Tolos, pensou Rom, tirando o capacete e as luvas, depois abrindo os fechos do colarinho.

Certamente, onze mil anos de paz foram uma conquista digna de admiração, mas muitos dos Vash Nadah estavam usando o pacifismo como desculpa para apatia, preocupando-se mais com o poder pessoal, o prazer e as riquezas do que a fundação de sua civilização. Se essa fundação desmoronasse, o caos e a morte de muito tempo atrás voltariam. Os Anos Sombrios. Já havia sinais de deterioração - terrorismo, a destruição de linhas de abastecimento e naves, tumultos nunca antes vistos em planetas essenciais em todo o reino. Se Rom não tivesse matado Sharron com as próprias mãos em Balkanor quase vinte anos antes, ele teria jurado que os atos traziam a marca do monstro e de seus seguidores.

Os músculos do estômago de Rom se contraíram. A política e o futuro dos Vash Nadah não eram mais sua preocupação. Ele foi afastado de sua família, banido em desgraça. Se os Vash queriam chafurdar na ignorância e na inação em nome da paz, que fosse. Ele estava bastante contente em viver sua vida à margem, vagando ao longo das antigas rotas nas estrelas com sua tripulação leal, negociando por bugigangas em planetas de fronteira retrógrados.

Gann interrompeu seus pensamentos decididamente sombrios. — Do que foi que você me chamou? — ele perguntou, desabotoando seu macacão bajha branco. — Um cachorro

— Sim. Um cachorro.

— Posso combinar com seu epíteto para o epíteto de Terra, B'Kah... tudo bem-tenha-um-bom-dia

Rom disse secamente: — Não é algo que eu gostaria de repetir para minha mãe, presumo?

— Não arriscaria.

Rindo, Rom colocou uma toalha sobre os ombros e colocou metade do conteúdo de um saco de água potável na boca.

— Zarra se ofereceu para servir como tradutora — disse Gann. — O rapaz se gaba de ser fluente.

— Não tenho jeito para línguas. — Admitiu Rom.

O fato nunca representou um problema antes. Vash Básico era usado em toda a galáxia; era a linguagem do comércio. No entanto, durante os dois meses que havia perdido esperando os governos da Terra decidirem se receberiam a frota de Lanat, Rom vinha memorizando o pouco de inglês que podia, uma língua gutural e estranhamente familiar. Isso diminuiu a chance de ser enganado no comércio - caso houvesse alguém na Terra que ousasse tentar.

Ele guardou sua espada sensorial, tirou seu traje de bajha, então esticou e flexionou os músculos. Ele se sentia saciado, vivo. O jogo havia intensificado todos os seus sentidos. Uma imagem fugaz de um banho - um banho de verdade, não um banho de higiene cronometrado - passou por sua mente. A seguir apareceu uma mulher, oferecendo-lhe o presente de si mesma por uma longa noite de amor, mais um dos sagrados prazeres da vida que ele foi forçado a dispensar na longa viagem.

— Ponte para o Capitão B'Kah. — Seu engenheiro apareceu na tela posicionada perto do teto à prova de som.

Rom esfregou a cabeça com uma toalha e a colocou sobre os ombros, passando os dedos pelo cabelo úmido e espetado.

— Prossiga, Terz.

— O Comandante da Frota Lanat está em linha, senhor.

Rom trocou olhares surpresos com Gann. — O próprio Sr. Compostura - ele disse baixinho. — Passe o comandante, Terz.

Lanat apareceu na tela, parecendo atormentado, mas triunfante. — A Terra nos liberou para pousar.

— Muito bem, Lanat, em manter os astronautas da Terra felizes e saudáveis. Estou correto ao presumir que os especialistas em quarentena em seu mundo natal concluíram que não infectaremos a população em geral?

O rosto de Lanat caiu. — Não. Até que um estabelecimento que eles chamam de Centro para Controle de Doenças conclua seu estudo final, seremos colocados em quarentena. Uma área restrita designada — Lanat olhou de soslaio para uma tela em sua pulseira — Base Aérea de Andrews.

— Andrews... — Rom guardou o nome estranho na memória.

— Vou encaminhar as coordenadas — continuou Lanat. — Os astronautas da Terra irão pilotar a nave líder; a nave classe três que dei a eles. Quero que você se posicione e siga a frota. — Ele ergueu o queixo. — Agora lembre-se, B'Kah, não espero nada menos do que a total conformidade de sua nave e tripulação.

Rom ergueu as palmas das mãos e sorriu tranquilizador. — Não se preocupe, Comandante. Não se preocupe. Você pode depender de nós para fazer a nossa parte.

A tela ficou em branco e Rom gritou com vontade. — Hora da fronteira! — Com o coração leve pela primeira vez em - por todos os céus, ele havia perdido a conta quanto tempo - ele estalou sua toalha contra as costas sólidas de seu amigo. — Tudo bem, Gann, vamos encontrar uma boa carga enquanto estamos lá. Estou com vontade de lucrar.

 


Jas se sentou em um banco ao lado de Dan Brady com uma visão clara da tela ampla de sua microcervejaria, o negócio paralelo que ele operava por puro prazer empresarial. Fortificando-se com um gole de cerveja, ela assistiu a uma repetição da chegada de onze espaçonaves enormes, mas elegantes em forma de delta. Trazendo fitas giratórias de condensação, eles flutuaram do céu como pétalas exóticas, pousando em uma pista não utilizada da Base Aérea Andrews, a instalação perto de Washington, DC, que abrigava a Força Aérea Um. Mesmo a menor embarcação interestelar era maior do que um avião 747, mas a nave de comando Lucre tinha o tamanho de cinco porta-aviões da Marinha dos Estados Unidos. Ele ficou para trás em uma órbita ao redor da Terra porque ninguém havia sido capaz de descobrir onde colocá-la.

— Isso é incrível – espetacular. — Disse ela, procurando em vão por palavras dignas do evento.

De repente, a cena mudou para uma vista aérea das rodovias dentro e fora de Maryland, com retrocesso por quilômetros em cada direção. Dezenas de milhares de pessoas fugiam do que chamavam de invasão alienígena, mas um número ainda maior estava se reunindo para ter um vislumbre da espaçonave.

— E isso é o caos. — Disse ela para Dan com o canto da boca.

— Imaginei pior, considerando a rapidez com que isso foi aprovado.

Dois meses de protestos mundiais, vários crashes da Internet, rosnados burocráticos, motins, golpes, mal-entendidos e ordens de emergência terminaram abruptamente em um convite unânime estendido aos Vash. A decisão abalou o planeta.

— Nossas costas estavam contra a parede; apenas idiotas arriscariam perder uma nave estelar na velocidade da luz e a cura para o câncer.

Os olhos de Dan brilharam. — Os Vash sabia disso desde o início. Duvido que sejamos o primeiro planeta tecnologicamente inferior que eles 'descobriram'. Eles entendem o poder dos dons.

Pensativa, Jas colocou as pernas vestidas com jeans por baixo dela. — Uma nave e alguma tecnologia médica compartilhada - pequenas batatas em comparação com os minerais que eles afirmam permear os asteroides entre Marte e Júpiter. — Os direitos que os Vash tanto desejavam. — Mas eles terão que nos fornecer mais tecnologia se quiserem que administremos a operação de mineração nós mesmos.

— Eles vão — disse Dan com confiança. — Recebemos equipamentos de inicialização gratuitos e uma clientela integrada. Eles obtêm minerais mais baratos. É uma situação ganha-ganha para ambas as partes. A federação comercial deles é imensa, Jas. O potencial de lucro é impressionante.

— Especialmente ao negociar sal — ela brincou.

— Eu sei. — Ele deu uma risadinha. — Louco.

Parecia loucura que o sal fosse uma mercadoria luxuosa e muito procurada na Federação do Comércio, mas fazia sentido; o sal que ocorre naturalmente em corpos d'água era escasso. Dada a escolha, as pessoas em milhares de mundos preferiram temperar sua comida com sal marinho, não com sal criado em laboratório ou o que era derivado de... hum, fontes biológicas. Era como o comércio de especiarias de séculos atrás, onde pimenta e canela enchiam os porões dos navios.

— É melhor aumentar suas ações na empresa de sal Morton.

Ele espalmou as mãos sobre a mesa. — Feito.

Rindo, ela ergueu o copo de cerveja. — Um brinde à nossa obsessão por nossos visitantes das estrelas.

— Não é obsessão, Jas. — Ele bateu seu copo contra o dela. — Fascínio intelectual e empresarial demonstrativo.

O que quer que Dan pudesse rotular sua absorção com os Vash, isso havia assumido o controle de sua vida. Embora ela não tivesse, novamente, vislumbrado o bonito homem do espaço que tanto a perturbou, ela estava canalizando sua preocupação com ele em uma busca muito mais sensata - aprender Vash Básico, a linguagem do comércio intergaláctico. Noite após noite, ela se conectava ao site da ONU para praticar o Básico e estudar a história e a cultura dos Vash.

— Agora eu me pergunto o que este poderia ser — Dan murmurou.

Um título de reportagem especial rolou pela tela da TV. Jas baixou o copo de cerveja, rezando para que não fosse um restabelecimento do toque de recolher, um retorno a apertar sua vida entre o amanhecer e o anoitecer, lutando a cada três dias para conseguir gasolina e tendo que aguentar a multidão no supermercado. Mas a filmagem mostrava uma reunião de jornalistas. Os flashes piscaram quando um homem com manchas prateadas no cabelo subiu a um pódio, parecendo mais um menino com seu sorriso animado do que um correspondente sênior de cinquenta e poucos anos da CNN.

Uma estranha mistura de desejo e inveja apertou seu peito. — Então, Kendall Smith é o vencedor sortudo — disse ela. As redes concorrentes escolheram Smith em um grupo impressionante de candidatos depois que os Vash se ofereceram para levar um correspondente ao espaço para visitar seu principal depósito de carga. Depois, se Smith quisesse, ele poderia continuar, viajando e relatando indefinidamente.

— Um golpe de gênio em relações públicas dos Vash — comentou Dan, — como os pôsteres de 'vá para o oeste, jovem' dos anos 1800.

Inesperadamente, as palavras de Dan pintaram a imagem de uma nova vida, de um recomeço. Como seria fazer o que Smith estava fazendo, partir rumo ao desconhecido, sentir-se viva novamente?

Do jeito que ela fazia antes do acidente.

A saudade a atingiu com uma força surpreendente, e a dor em seu peito apertou a ponto de ela mal conseguir respirar. Ela pensou em todas as aventuras ainda não realizadas, em todos os sonhos que ela não tinha imaginado desde antes que as obrigações e a dor no coração os roubassem.

Calmamente, ela disse: — Eu daria qualquer coisa para estar no lugar dele.

Dan a contemplou com um sorriso compreensivo. — Em alguns anos, tenho certeza de que todos teremos a chance.

— Certo. — Uns anos.

O que deveria ter sido uma declaração de fato desanimadora inesperadamente tornou-se um desafio. Havia uma maneira de contornar uma espera tão longa?

Você precisa ir - vá para o espaço. Você precisa ir agora.

Ela torceu as pulseiras de prata em seu pulso direito. A adrenalina fazia suas mãos tremerem, mas não de nervosismo; com entusiasmo. Na idade em que muitas mulheres se acomodavam em seus ninhos, ela era repentinamente estimulada pelo desejo irresistível de abrir suas asas.

 


Quando o sol atingiu seu apogeu sobre a Base Aérea de Andrews, Rom, Gann e o jovem Zarra, seu confiável, mas inexperiente tradutor, subiu no banco de trás do automóvel. Era um veículo antiquado, incapaz de voar, observou Rom com algum alívio, pois não apreciava a perspectiva de viajar grandes distâncias preso em seu interior apertado. Como Gann, ele lutou para dobrar seus longos membros em uma posição confortável, pressionando um joelho no assento à sua frente enquanto angulava a outra perna em direção a Zarra, que parecia bastante contente aninhado entre seus dois companheiros maiores.

Gann disse baixinho: — Grande Mãe, isso é pior do que o compartimento de gado de um cargueiro Tromjha.

— A retenção inferior. — Rom relembrou - em detalhes olfativos vívidos - os dois dias infernais que ele e Gann passaram presos em um durante a campanha contra Sharron.

Uma alegre voz feminina chamou do banco do passageiro da frente: — Apertem os cintos, senhores. — Rom estremeceu quando a última porta bateu.

— Ela está se referindo aos cinturões, eu acho. — Disse Zarra, segurando uma alça preta na mão enquanto tateava intimamente atrás da traseira de Rom procurando a outra. — Desculpe senhor.

A escolta deles, a sargento Mendoza, correu para observar seu progresso. Ela estava vestida com um uniforme azul escuro impecável, seu cabelo preto torcido e preso na nuca em uma engenhoca parecida com uma garra. Rom ficou olhando. Embora ele se recusasse a pensar no que acontecera naquele dia longínquo em Balkanor, as tranças de Mendoza evocavam um desejo inegavelmente erótico pela mulher ligada às suas piores memórias. Ele continuou a estudar a sargento, perguntando-se preguiçosamente como seu cabelo ficaria solto, se seria comprido o suficiente para cair abaixo dos ombros.

— Você gostaria de alguma ajuda, senhor? — ela perguntou, uma cadência flertando com seu sotaque básico.

— Não neste momento, não. — Ele arrebatou o arreio de Zarra.

O olhar dela vagou de seu rosto para suas botas, e seus olhos castanhos brilharam com um convite que era inconfundível em qualquer planeta, em qualquer cultura.

— Vou manter a oferta aberta, senhor.

Rom mascarou sua falta de interesse com uma inclinação educada de sua cabeça. Para seu alívio, ela voltou sua atenção para uma pasta em seu colo. Gann observou a troca com um brilho especulativo nos olhos.

— Devo fazer arranjos alternativos para o seu transporte de volta para a nave? — Ele perguntou em Siennan, a língua nativa deles, uma que poucos de fora da classe conheciam.

Rom franziu a testa. — Não seja idiota. É a cor do cabelo novamente. Muito perturbador.

Sempre diplomático, Gann não disse mais nada. Ele sabia mais sobre a visão do campo de batalha de Rom do que qualquer outra pessoa, reconhecia o que suas consequências haviam causado na vida de seu amigo.

Numa torrente de inglês incompreensível, a sargento Mendoza deu instruções ao motorista. O veículo deu uma guinada para a frente.

— O que ela disse, Zarra? — Rom perguntou.

— Sair pelo portão norte do capitólio, senhor. Para o endereço do Comandante Lanat.

Com os pensamentos presos no dia seguinte, Rom apenas observou a paisagem passar zunindo pela metade. Ele antecipou o sucesso.

Depois de todo o tempo perdido esperando para chegar à Terra, então mais dois meses passando sentado na base terrestre, Andrews, enquanto os políticos do planeta se preocupavam com a doença, ele merecia uma rodada de negociações satisfatórias, com o comércio de sal no topo da lista. Os mares deste planeta estavam carregados com a mercadoria cara. Os habitantes realmente nadavam no precioso líquido e não se importavam com isso! Ah, era fácil imaginar o porão do Quillie cheio de blocos de sal marinho, do rosa ao vermelho ao azul-cinza. Talvez, também, ele pudesse comprar uma participação em uma das minas abertas nos asteroides. Essa seria uma oportunidade única, pois a maior parte da mineração estava sob estrito controle dos Vash Nadah, tornando quase impossível para comerciantes desalinhados comprarem uma participação. Se ele pudesse comprar uma ação enquanto estivesse aqui, teria um lucro considerável vendendo-a assim que chegassem ao Depósito - o suficiente para comprar aquela feitoria que ele estava de olho. Era uma lua minúscula e remota, mas tinha um belo porto. Em nenhum momento, ele teria uma pequena, mas eficiente operação instalada e funcionando. Não que ele fosse desistir de sua vida nômade para sempre, mas não faria mal criar algumas raízes.

Rom apertou sua mandíbula. Sonhos eram uma coisa, mas hoje tinha sido um quase desastre. Se não fosse pelo policial de raciocínio rápido monitorando as telas das câmeras montadas no exterior do Quillie, Rom teria sido excluído dos eventos do dia. Os veículos haviam recolhido delegações de outras navias durante toda a manhã e teriam pulado as deles se seu guarda-costas não tivesse bloqueado um dos automóveis com seu tamanho considerável. Supervisão? Rom duvidava disso. Era um subterfúgio, e certamente obra de Lanat. Rom não perderia tempo localizando o comandante impertinente na reunião. Ele ansiava por compartilhar algumas palavras bem escolhidas de sabedoria sobre o assunto da violação do Tratado de Comércio. Quando ele terminasse com Lanat, o bufão nunca mais consideraria tal comportamento traidor.

 


Jas se sentou na beira da cama como se estivesse empoleirada na beira de um penhasco. A TV estava ligada, uma reportagem especial iminente. Por fim, aplausos sinalizaram a chegada dos diplomatas Vash.

O presidente, os membros de ambas as casas do Congresso e chefes de estado de todo o mundo ficaram de pé enquanto a delegação dos Vash entrava. Vestidos com seus lindos uniformes índigo, eles saudaram o público com seu distinto aperto de mão, segurando o antebraço e o pulso de cada diplomata terrestre. Mas eles guardaram a maior parte de seu entusiasmo para a secretária de comércio, a quem se amontoaram até que ela se perdeu atrás deles.

Após uma apresentação animada do Presidente Talley, o Comandante Lanat subiu ao pódio. Sua voz ressonante explodiu, enquanto um tradutor transmitia suas esperanças de parceria, compreensão e, para surpresa de ninguém, lucro. Para testar sua compreensão do Básico, ela se concentrou na voz de Lanat. Aqui e ali, uma frase a evitava, algumas palavras que ela não reconhecia, mas podia entendê-la. O talento para aprender línguas foi algo que ela herdou de sua mãe linguista, mas nunca havia se mostrado útil até agora. Não que o Básico fosse complicado. Pesado e direto ao ponto, foi projetado para facilitar o diálogo entre habitantes de mundos incontáveis. Outras línguas existiam, mas evidentemente nunca foram usadas no comércio.

Para aplausos calorosos, Lanat cedeu o pódio ao secretário de comércio e se juntou à sua delegação, desfrutando de sua adulação, de seus apertos de mão e sorrisos, até que um Vash alto parou na frente dele, bloqueando seu caminho.

Um Vash vestido de bucaneiro futurista.

Jas prendeu a respiração. Era o rebelde do espaço diabolicamente encantador. Seu corpo esguio irradiava força, propósito e uma autoconfiança masculina poderosa que fez sua cabeça girar e seu corpo responder com um desejo profundo e dolorido.

Então ele deu as costas para a câmera. Suas mãos estavam fechadas em punhos atrás dele e escondidas de Lanat, seus dedos fechando e soltando, traindo a intensidade de sua raiva.

A inquieta delegação de Lanat começou a se reunir ao redor de seu líder, enquanto homens do Serviço Secreto de terno escuro se aproximavam, atraídos pela confusão do líder dos Vash. Um microfone colocado perto estava captando a discussão, mal. Jas pegou o controle remoto, aumentando o volume. O tom do alto Vash era baixo, mas intenso.

— Os Artigos de Comércio de Fronteira, conforme registrados no Tratado de Comércio, declaram que posso negociar com quem quiser nos mundos periféricos. Você não pode me excluir, Lanat, como tentou hoje. Vou iniciar o contato com os líderes mercantes de minha escolha.

Lanat ficou inquieto. — O acordo será assinado na próxima semana. A Terra não será mais um mundo marginal e seus artigos não se aplicarão.

As mãos do alto Vash se fecharam em punhos. — Mas até então, comandante, eles fazem.

A pele morena de Lanat brilhava de suor. Ele puxou o colarinho e seu Básico bem aparado assumiu um tom suplicante. — Seria melhor se você e seus companheiros deixassem o planeta. Acredito que uma semana na Terra será tempo suficiente para preparar o Quillie para a partida. Minha equipe deve ajudá-lo a reunir os suprimentos de que você precisa? — Os aplausos explodiram e, no primeiro plano da tela, o secretário de comércio cedeu o pódio ao primeiro-ministro britânico. Mais palavras acaloradas foram trocadas entre Lanat e o outro Vash, mas por causa do barulho, Jas sentiu falta delas.

— Uma semana terrestre. — Disse Lanat, mais alto.

O rebelde alto gesticulou para dois homens vestidos de forma semelhante parados próximos. Um era alto e musculoso com traços fortes e bonitos como ele; o outro era muito mais jovem e tinha cabelos de um loiro mais claro. Com expressões de descontentamento, o rebelde e seus amigos saíram do alcance das câmeras, seguidos por um batalhão de homens do Serviço Secreto.

Jas caiu de costas na cama. Caralho. Seu homem Vash acabara de ser expulso sem cerimônia e de forma não democrática de uma sessão conjunta do Congresso. Não só isso, ele também havia sido expulso do planeta, se ela tivesse ouvido Lanat corretamente. Seus pensamentos mergulharam à frente. O comandante comercial queria excluí-lo. Por quê? Ele aparentemente não fazia parte da delegação. Ela havia presumido que todos os Vash fizessem, mas se ele não fizesse, isso explicaria por que ela não o viu em nenhuma das entrevistas anteriores. Na verdade, ela começou a pensar que o imaginou.

Sem aviso, a lembrança dos olhos dourados do rebelde evocou um eco trêmulo e erótico da maneira como ela se sentiu quando acordou do sonho dele. Mas ela cerrou os dentes contra a imagem espontânea; ela havia suportado muitos anos de imagens espontâneas, fantasias que eram mais vívidas que a vida. O bom senso disse a ela que este homem de carne e osso não tinha nada a ver com seus sonhos. Ela não conseguia entender por que ele a afetava tão profundamente, mas talvez em algum lugar de seu mundo estivesse sua resposta.

O seu mundo.

Ela se sentou, os cotovelos apoiados nos joelhos, o queixo entre as mãos. Ela não era rica e não era digna. Cidadãos comuns como ela teriam que esperar muitos anos pela chance de viajar para o espaço. E mesmo isso era apenas conjectura. Ela massageou as têmporas e se concentrou. Parecia que seu único caminho para o espaço era pela porta dos fundos. Mas, tirando uma carona em uma das naves dos Vash, como ela faria isso?

Tomando uma carona...

Sim, ela poderia pedir carona. Seu coração acelerou enquanto ela analisava a plausibilidade e o risco de tal esquema. Era uma ideia precipitada. Insana.

Eletrizante.

Ela se levantou da cama e começou a andar. Durante toda a sua vida, ela foi elogiada e recompensada por fazer escolhas lógicas e sensatas. Até mesmo seu desejo pouco convencional de se tornar uma piloto de caça foi impulsionado por um senso de dever para com seu país. Confiável, faça o certo, Jas. Bem, exceto quando se tratava de sua vida amorosa, mas ela era mais inteligente agora. Seus pensamentos voltaram para o rebelde Vash. Ele era a chave. Se ela pudesse de alguma forma fazer com que valesse a pena, ele poderia estar disposto a levá-la junto. Ela apostava que ele não obedecia às regras, como Lanat e os outros. Ele era um proscrito, ou melhor ainda, um fora-da-lei - exatamente o tipo de pessoa que ela precisava para seu plano. Sim, ele era sua passagem para fora daqui. E ela tinha uma curta semana para provar isso.


CAPÍTULO 4


Jas cambaleou para uma posição sentada na cama. Seu robe de seda caiu aberto em um deslizamento sensual até os cotovelos, expondo seus seios e coxas à brisa fria do ar condicionado. Ainda tonta de seu sonho, ela alcançou a lâmpada de cabeceira e se atrapalhou com o interruptor. Abraçando um travesseiro contra o peito, ela olhou sem ver a TV que ela havia esquecido de desligar depois de assistir ao discurso de Lanat. Ela tinha sonhado com o deserto novamente. Só que não tinha sido tão intenso, tão real, desde os dias imediatamente após o acidente. Como sempre, ela se viu vagando pelo crepúsculo em uma paisagem árida, mas abundantemente colorida. Mas desta vez o carismático rebelde Vash estava esperando onde antes apenas a imagem borrada de um homem estivera. Quando ela se ajoelhou ao seu lado, ele espalmou uma das mãos na nuca dela e a puxou para sua boca quente. Cada terminação nervosa de seu corpo latejava com o eco de seu abraço cheio de paixão. Se ela não tivesse acordado, ela poderia ter feito amor com ele.

Uma união que teria unido nossos corações e almas para sempre.

Jas colocou um braço sobre os olhos como se tivesse uma chance de sufocar o desejo quase pungente que queimava dentro dela. Nas semanas que se seguiram ao acidente, esses sonhos a visitaram todas as noites, deixando-a com o mesmo desejo inútil. Não era de admirar que ela tenha sido dominada por um senso de destino, de magia, apaixonando-se à primeira vista quando o capitão Jock Hamilton, armado com rosas, vinho e olhos apologéticos, veio visitá-la em seu primeiro dia depois do hospital. Convencida de que o encontro era para ser e certa de que Jock devia ser o homem de seus sonhos, ela jogou de lado o motivo que a guiou por toda sua vida e foi para a cama com ele sem proteção. Depois de saber que ela estava grávida, consequência daquela noite, eles fizeram a coisa certa. Apenas, tinha acabado tão errado. Nunca em um milhão de anos ela se arrependeria de ter Ian e Ilana, mas seu casamento? Ela estremeceu. O que ela esperava, bancando a intérprete de sonhos, acreditando que um homem que ela nunca conheceu era seu único, seu verdadeiro amor, que transcendeu o mundo dos sonhos para estar com ela?

Ela havia aprendido sua lição. Nunca mais ela confundiria fantasia com realidade. O homem Vash era real, mas o homem de seu sonho não. Qualquer semelhança entre os dois era coincidência e nada mais.

Ou não?

Xingando baixinho, Jas se desvencilhou de seus lençóis emaranhados. Eram quase seis e meia, mais tarde do que ela pensava. Enquanto ela penteava o cabelo com os dedos em um rabo de cavalo, ela olhou com os olhos turvos para uma cesta de roupas limpas ao lado da cama. Suas meias estavam enroladas uma dentro da outra em pares combinados; sua calcinha estava cuidadosamente dobrada; seus shorts de corrida estavam empilhados um sobre o outro, limpos e organizados.

Tão diferente de seu futuro imediato se ela seguisse em frente com seu plano de pegar carona no espaço.

Ela vestiu uma calça jeans, uma blusa de seda cor de damasco e um par de meias decoradas com pequenas abóboras de Halloween. Ela levou seu laptop para a cozinha, sentou-se na ilha, retomando sua pesquisa de onde parou. Seu plano finalmente parecia sólido. Sua história de capa era boa, seu motivo para ir para a Base Aérea de Andrews que ninguém questionaria. Agora, para finalizar os detalhes mais sutis, os detalhes críticos, porque embora pudesse chegar à base, ela teria que embarcar na nave - e permanecer a bordo. Ela pegou o celular e ligou para Dan Brady. De todas as pessoas próximas a ela, ninguém estava melhor equipado para ajudar.

 


Às nove da manhã, a cafeteria perto do campus da Universidade do Estado do Arizona estava lotada. Ela contou a Dan sobre o alto e rebelde Vash, a discussão que ouvira no Congresso e o que ela queria fazer. — A base oferece passeios pela linha de voo onde as espaçonaves estão estacionadas para veteranos e organizações de caridade. Veteranos com TEPT é um deles.

— O grupo com o qual você está envolvida há anos — Dan disse cuidadosamente.

Monetariamente, principalmente. Ela quase nunca ia às reuniões. Embora ela achasse gratificante ajudar os outros veteranos de guerra, oferecer um ouvido compassivo, abrir-se era muito estranho. Sua experiência estranha no deserto e como isso a afetou não eram como suas experiências e sofrimento, embora os conselheiros tivessem tentado convencê-la de que a provação de todos durante a guerra era legítima.

— Aqui está a minha ideia. Sei que posso chegar perto da nave, mas preciso de algo de valor para eles para entrar. É aí que você entra. — Como ela esperava, Dan ouviu o plano que ela traçou com interesse e respeito.

Quando ela terminou, ele embalou um café com leite frio nas mãos e a olhou sobriamente. — Mas eu estaria mentindo se dissesse que não prefiro mantê-la aqui.

Você é indispensável; todo mundo precisa de você.

Jas soltou um suspiro. Ela estava deixando seus filhos para trás; ela estava decepcionando Betty, sua família e agora Dan. A dúvida a inundou novamente.

— Seis meses. Isso é tudo. Seis. As pessoas fazem cruzeiros por mais tempo do que isso.

— Ei. — Sua expressão se suavizou. — Isso não foi dito para fazer você se sentir culpada. Vou sentir sua falta, só isso.

Seus punhos cerraram-se convulsivamente. — Eu sei. — Ela assentiu. — Eu sinto muito.

Ele relaxou em sua cadeira e esticou as pernas. — Parece que ele esperava ganhar dinheiro enquanto estava aqui, mas os outros não permitem.

— É aí que você entra. Você serviu ou chefiou todas as grandes associações comerciais da cidade. Você tem muitos contatos.

— Eu conheço o governador — Dan admitiu. — Você também.

— Eu conheço a esposa dele. Precisamos de mais do que isso. Não temos muito tempo. Lanat deu a ele uma semana para fazer as malas e sair, e já perdemos um dia. Isso nos deixa apenas com seis. Há o fim de semana a considerar. Antes disso, temos que fazer uma oferta que o capitão não queira ficar sem.

— Sem problemas. Eu faço um trabalho rápido. Todo mundo parece estar de olho no espaço atualmente. Se forem recursos que nosso amigo Vash deseja, não vai faltar apoio econômico e de liderança no Arizona quando terminarmos. — Ele pegou seu iPad e começou a trabalhar. Inundada de gratidão, Jas acalmou suas mãos ocupadas. Dan deve ter visto a pergunta nos olhos dela. — Sim, estou fazendo isso por você, é claro. Pela nossa amizade. Mas, — seus olhos brilharam — naturalmente estarei muito, muito interessado no resultado.

Ela compartilhou seu sorriso lento. — Seu coração capitalista está batendo forte.

— Oh, sim — disse ele. — Não há dúvida acerca disso.

 


Jas envolveu seu filho em um abraço forte. A camiseta Harley-Davidson de Ian enxugou as lágrimas que ela tentou conter. — Mantenha contato com Ilana — ela disse com voz rouca. — Certifique-se de que ela não está queimando a vela nas duas pontas.

— Eu prometo.

— O pagamento da casa e outras contas serão pagos automaticamente...

— Eu sei, mãe. Você me deu a senha. Vou ficar de olho em tudo.

— Betty fará com que sempre haja dinheiro em sua conta. Seu pai administra as finanças de Ilana, então não há problema nisso. E é claro que Dan estará aqui.

Ian agarrou seus ombros e a moveu de volta. — Apenas vá em sua viagem. Pinte muitas imagens. E me conte tudo quando você voltar.

Ela acariciou sua bochecha com a mão. — Eu te amo.

Seus lábios se comprimiram enquanto seus olhos avermelhavam. — Amo você também.

— Temos que sair em dez minutos. — Ela disse suavemente.

Não havia espaço para erros. Se ela perdesse este voo para Washington, DC, ela perderia sua chance de deixar a Terra. O repórter que ganhou o voo ao espaço partiu dias atrás. De acordo com a CNN, mais duas naves estavam decolando à meia-noite. Ela estava apostando que um deles era o Quillie, a nave dos rebeldes.

— Ajude-me a verificar meu equipamento mais uma vez.

Ian leu a lista de verificação que ela lhe entregou e fez um inventário do conteúdo de sua mochila à prova d'água - algumas roupas que funcionavam tanto para uma viagem de nave espacial quanto para passeios turísticos, o mais básico dos itens de higiene, uma caixa compacta com suas aquarelas, papel aquarela enrolado em um tubo apertado, uma bolsa de seda contendo todas as joias de verdade que possuía, duas pequenas garrafas de Cerveja Red Rocket e todas as bolsas de sal que ela tinha para enfiar no espaço restante. No bolso do laptop, ela escondeu a pasta de couro fina que Dan havia lhe dado. Continha as promessas e declarações de uma dúzia dos CEOs mais poderosos do Arizona, de empresas aeroespaciais a operações de mineração e bancos e, é claro, cerveja, onde Dan havia digitado o nome de sua microcervejaria no final da lista.

— Está tudo aqui. — Disse ela.

Seu celular tocou e seu coração afundou ao ver a ligação. Ela já tinha suportado todas as despedidas agridoces que suas emoções podiam suportar. Todos, exceto Betty, seus filhos e Dan, tinham a impressão de que ela estava tirando férias longas, mas se ela embarcasse na espaçonave com sucesso, Betty contataria o resto de sua família e passaria a notícia.

Ela pegou o telefone da mesa da sala e navegou pela casa, verificando uma última vez se havia algum item deixado para trás.

— Oi, Jock.

— Você está agindo como uma adolescente maldita, Jasmine - saindo em um passeio e deixando nosso filho sozinho no meio do ano escolar. O que diabos deu em você?

Ela praguejou baixinho. Agora não. — Não é da sua conta onde eu vou ou o que eu faço.

— Oh, sim, é se for do meu filho.

— Que é adulto agora e não precisa de babá. — Seu estômago embrulhou. — Estou indo para o aeroporto, Jock. Se você quiser lutar, vá encontrar sua esposa.

— Oh, vou encontrá-la em um minuto, Jasmine — ele disparou de volta — mas eu garanto que não será para lutar.

Inspire... Expire... Inspire.

— Egoísta como sempre, Jas — ele continuou. — Vaidosa e irresponsável. Quando tínhamos bebês em casa, tudo o que você queria fazer era voltar para a cabine. Felizmente para todos nós, os médicos disseram não. Mas você venceu no final, não foi? Fez aquelas crianças se divorciarem porque você era muito egocêntrica para fazer qualquer esforço na cama.

Um punho invisível apertou suas entranhas enquanto a vergonha aquecia suas bochechas. O homem tinha o dom de saber onde ela estava mais vulnerável. E de alguma forma ele descobriu uma maneira de fazê-la se sentir responsável por seus fracassos, usando seu senso de obrigação embutido para justificar seu comportamento.

Mas se você for embora, ele não poderá puni-la por seus pecados, e isso o assusta.

A realização bateu nela com a força de uma explosão, e ela agarrou a ponta da mesa mais próxima para se firmar. Muitas coisas estavam ficando claras sobre sua vida. — Não se trata de Ian, se trata? — Ela disse. — Você está desesperado. Você não pode me deixar ir. Se você fizer isso, não terá ninguém para culpar por seus erros. — Por que ela não tinha visto isso antes? Por que demorou tanto? — Você atirou em mim, Jock. Eles o expulsaram da Força Aérea por esse erro. Lembra? Mas você odiava o fato que eu ainda estava em casa, então me disse que eu faria um péssimo trabalho criando nossos filhos se voltasse a voar. Eu estive ao seu lado durante tudo - o incidente saudita, a corte marcial. Mesmo quando Greg acusou você de dormir com a esposa dele. — A voz dela tremeu. — Eu devia estar cega! Cada vez que você falhou - como soldado, como marido - eu paguei o preço. — Houve silêncio do outro lado. Sua voz ganhou força e propósito. — A culpa foi sua arma de escolha. Usada com bastante eficácia, devo acrescentar, quando descobri que você andava me enganando há anos. Isso também é minha culpa? Vá para o inferno, Jock! O motivo de eu ser péssima na cama era porque você nunca conseguia encontrar o alvo.

Jas apertou o botão de desligar com o dedo enquanto Ian colocava a cabeça pela porta da garagem, alheio ao que acabara de acontecer. — Pronta, mãe?

Seu pulso ainda trovejava. Suas mãos não pararam de tremer. — Tenho certeza que estou.

Ela subiu no banco do passageiro do Range Rover, olhando fixamente para a frente enquanto ele saía da garagem. — Eu não me importo como você faz isso. Apenas me leve lá a tempo para o voo das oito e dez para DC.

— Você entendeu. — Pneus guinchando, eles estavam fora.

Ian deu a ela um olhar de soslaio. Como se sentisse sua inquietação, ele brincou. — Então, Madame, esta viagem é a negócios ou a lazer?

Com isso, uma onda de pura excitação passou por ela, junto com a sensação calmante de que o que estava prestes a fazer era certo. Com um suspiro, ela relaxou contra o assento de couro.

— Bem, agora. Suponho que chamaria de um pouco dos dois.

 


O grupo de veteranos camuflou as verdadeiras intenções de Jas. Com eles a cercando enquanto eles visitavam a Base Aérea de Andrews, ela foi capaz de se misturar como um pato com seu rebanho em um lago. Ela era apenas mais uma veterana agradável com uma bandeira americana presa na lapela. Ninguém deu a ela uma segunda olhada, embora ela sentisse que ia pular de sua pele com os nervos. Os jovens oficiais designados para escoltá-los foram gentis e sinceros; eles não suspeitaram de nada sobre seu objetivo de permanecer na nave depois de entrar nela.

Quem faria algo tão louco assim?

A última parada do dia foi o prédio de Operações de Voo, localizado próximo a um campo asfaltado de pistas de taxiamento, hangares e pistas. Enquanto o grupo ouvia, o oficial encarregado explicava a emoção e as complicações de ter naves alienígenas bem na porta dos fundos.

E eles estavam do lado de fora da porta dos fundos. Uma névoa constante suavizou suas formas pesadas. — Certifique-se de apresentar isso no posto de controle, senhora — uma de suas acompanhantes instruiu, apontando para a etiqueta de visitante que Jas usava em seu pescoço.

— Claro. — Jas prendeu o envelope muito importante entre o cotovelo e a caixa torácica.

— Aqui, deixe-me ficar com isso. — O tenente pegou sua mochila. — Posso assistir para que você não precise andar com ela— disse ele.

Foi tudo o que Jas pôde fazer para não puxar a alça de volta. — Estou bem. A menos que você precise examiná-la novamente no raio-X.

— Não senhora. — O jovem oficial olhou para ela com um lampejo de compaixão por sua relutância em largar a mochila, então ele abriu a porta. — Boa sorte com o pacote do governador. Espero que nossos visitantes apreciem isso.

— Eu sei que eles vão. Obrigada.

Caralho. Aqui vou eu.

Jas saiu na garoa para o posto de controle.

Sua mochila de viagem batia contra sua coxa, seu nariz ardendo no ar frio de outono com cheiro de combustível de jato. O sol flutuava atrás de uma cortina de gaze esfarrapada de nuvens, pintando as sombras de duas embarcações pesadas à frente em uma imprecisão nebulosa. Elas surgiram agourentos e ameaçadores, e ela se perguntou mais uma vez se ela estava fora de sua mente.

Os motores a jato trovejaram à distância. Seus músculos ficaram tensos enquanto ela observava luzes piscantes verdes e vermelhas voando para o céu. Era um avião de carga, não uma nave espacial. Até agora, tudo bem - todo o tráfego aéreo seria interrompido muito antes de uma espaçonave ter permissão para partir. Ainda assim, ela não conseguia deixar de verificar o relógio.

Noventa minutos até o lançamento.

Por trás, Jas ouviu um carro se aproximando. Então veio o som inconfundível de um rádio da polícia. Alguém descobriu o plano dela? O cascalho estourou quando o veículo diminuiu a velocidade, e ela lutou contra um desejo irracional de correr em direção as naves, para a liberdade. A transpiração formigou sua testa, apesar do ar frio. Então, lentamente, com relutância, ela se virou.

 


Os saltos das botas de Rom bateram no piso de liga do Quillie. — Comecem a sequência de pré-lançamento — ele ordenou à tripulação da ponte.

Mas ele não se acomodou em sua cadeira de comando para assistir aos procedimentos, como era seu hábito. Em vez disso, ele estava caminhando, como se o exercício sem sentido fosse queimar sua raiva, sua frustração - e o sentimento profundamente pessoal de vergonha. Ele foi forçado a deixar a Terra sem concluir um único ato comercial. Também era sua própria culpa, por pensar que poderia vencer os Vash Nadah, e agora os homens que confiavam nele sofreriam por isso.

No final da ponte, Rom girou nos calcanhares e retrocedeu. Meses! Ele havia perdido meses nesta excursão à Terra, apenas para ser mandado embora sem mais consideração do que o usado para espantar uma mosca matinal centauriana. Os suprimentos mais básicos enfeitavam as despensas; uma carga lamentavelmente pequena de sal estava no porão - e isso foi o que sobrou do sistema visitado antes deste. Fui ao Inferno e voltei! Passando os dedos de ambas as mãos pelos cabelos, Rom se sentou pesadamente em sua cadeira de comando, os antebraços equilibrados sobre os joelhos. De sua posição atrás dos seis homens que preparavam a nave para o lançamento, ele observou os procedimentos em um silêncio taciturno. Nada menos do que um milhão de quilômetros padrão entre o Quillie e este planeta miserável atrasado iria melhorar seu humor.

Zarra o chamou de sua estação em frente ao amplo console de navegação. — Senhor. A lista de verificação de pré-lançamento está completa.

— Chame a torre — disse Rom, cansado. — Diga a eles que queremos um lançamento antecipado aprovado. Não vejo razão para prolongar nossa estadia, não é?

— Não senhor! — exclamou Zarra. A tripulação da ponte concordou entusiasticamente.

 


Um policial de segurança abaixou a janela, seus olhos reconhecendo a identidade de visitante dela agora praticamente colada na blusa úmida de garoa. — Boa tarde, senhora — disse ele para Jas. — Você foi para o posto de controle?

Ela fez um gesto com o queixo. — As naves Vash. Eu voei com caças na Força Aérea. Pena que não tínhamos nada como esses bebês. O que eu não daria para voar um.

Ele riu e baixou o volume do rádio. — Todos os pilotos da base dizem a mesma coisa. — Ele apoiou o braço na porta como um policial entediado querendo conversar. Mas isso poderia mudar em um piscar de olhos se ele começasse a fazer as perguntas erradas.

— Eu preciso ir — ela disse. Antes que fosse tarde demais. — Eu tenho alguns papéis para entregar e está molhado aqui.

— Oh, senhora. Sinto muito. Eu não estava pensando. — Ele destrancou a porta dos fundos. — Eu posso deixar você na frente do posto de controle. Que tal?

— Perfeito.

— Relacionado com aeronaves? Seu TEPT? — ele perguntou quando ela deslizou para o banco de trás. — Se você não se importa que eu pergunte. Eu vi você com o grupo.

— Fui abatida.

— Você nunca volta cem por cento depois de algo assim.

— Não. — Isso foi um eufemismo. Sua mão apertou a alça da mochila com mais força.

Ele olhou para ela pelo espelho retrovisor, um novo respeito em seu olhar. — Agradeço seu serviço, senhora.

Ela assentiu com a cabeça, conseguindo sorrir. Suas entranhas estavam caindo. Ela olhou para o relógio novamente. Ele parou bem à vista do posto de controle, estabelecendo sua tão necessária credibilidade com os dois parlamentares sentados lá dentro. Então, com um aceno amigável, o policial foi embora.

Dentro do trailer apertado, o odor de suor rançoso e até mesmo de café mais velho pairava em um interior iluminado por lâmpadas fluorescentes excessivamente brilhantes. Jas tirou o portfólio de couro de sua bolsa e o colocou em uma mesa de metal amassada ao lado do rádio.

— Eu preciso disso para chegar ao Quillie. Assim que possível. — Ela abriu o envelope e retirou o portfólio de dentro, alisando a palma da mão sobre a carta de rosto branco cremoso. — O governador do Arizona prometeu ao capitão do Quillie que entregaria por correio ontem, mas...— Ela forçou a voz mais baixa. — Tudo o que posso dizer é que é constrangedor que estes cheguem tão tarde.

O oficial mais atarracado virou a carta de apresentação, revelando a primeira página.

Ela lutou contra o desejo de verificar o relógio novamente. Um silvo agudo ecoou nas proximidades das duas naves Vash. Então um estrondo começou, aumentando de volume até que o piso de vinil vibrou sob suas botas. O coração de Jas bateu com urgência em seu peito. Ela apontou o dedo na direção dos navios.

— Estamos ficando sem tempo. Notifique o Quillie. Diga a eles que as informações que eles queriam estão aqui.

Ela o viu ler a mensagem do governador com uma lentidão excruciante e depois examinar as assinaturas e declarações dos CEOs. — É um acordo comercial. Um contrato legal. Muito trabalho foi dedicado a isso. Você pode imaginar as repercussões se isso perder o voo? Os civis são desagradáveis, especialmente quando os militares erram. Minha bunda já está em jogo. Tenho certeza de que o governador Goldsmith adoraria assar o seu também.

O oficial mais magro interveio. — Jesus, Russ. Não me irrite. É apenas papelada. Estamos divulgando coisas como essa o tempo todo.

— O tempo todo — Jas concordou.

Pegando o transmissor de rádio, ele levou o bocal aos lábios. — Quillie, este é o Alfa Cinco — disse ele em um Básico dolorosamente mutilado. — Alfa cinco para Quillie. Por favor responda.

Houve estática, depois uma resposta curta e ininteligível.

O oficial ergueu as sobrancelhas. — Senhora, o que eu digo a eles?

Jas estreitou os olhos. — Entrega especial.

 


Rom abriu as mãos em descrença. — Eles querem o quê?

— Comércio — respondeu Gann, igualmente intrigado. — Ele - ou ela - afirma representar um consórcio de mercadores poderosos. Com suposta prova assinada de sua ânsia de negociar.

Rom sufocou uma risada. Sem dúvida foi um erro burocrático, um contrato destinado a uma das outras naves. Ele levantou o encosto de cabeça e afivelou o cinto de segurança.

— Mande o habitante da Terra embora. Ele pode resolver a bagunça com Lanat.

Gann voltou ao banco de equipamentos de comunicação que havia recebido a chamada do guarda da Terra.

— Zarra — Rom exigiu. — Onde está minha autorização?

— Estou trabalhando nisso, senhor. A torre diz que o atraso é de algum tipo de autoridade superior da aviação – Centro de Washington, creio que eles o chamaram. E eles não podem me dar uma estimativa do tempo de partida.

— Por que isso não me surpreende? — Rom franziu a testa. Mais malditos minutos perdidos sentado nesta rocha. Na calmaria que se seguiu, ele ponderou sobre a oferta do morador da Terra. Lanat ficaria mortificado ao descobrir que o Quillie havia sido contatado por engano.

Um sorriso lentamente levantou um canto da boca de Rom. O lançamento atrasou, não foi? Ele também pode solicitar um pouco de entretenimento para fazer o tempo passar mais rápido.

Ele desamarrou o cinto. — Gann, desconsidere essa ordem. O que você acha de termos um pouco de esporte?

Gann riu. — À custa de Lanat?

— Naturalmente. Convoque o habitante da Terra. Dói ver seu rosto quando você diz que ele está a bordo da nave errada. — Rom caminhou até a grade que dava para a divisória cavernosa abaixo. — Vou ver a diversão daqui. Naturalmente, me juntarei a você, caso o encontro seja divertido.

 


O corpo de Jas zumbia de espanto e medo enquanto ela seguia o oficial até a nave rebelde. O casco de metal liso e escuro brilhava sombriamente, pontuado por luzes multicoloridas piscantes. O vapor sibilava da barriga da nave, aumentando o coro de motores girando e estalidos mecânicos intermitentes. Distintamente estranho, era pelo menos tão longo quanto um Boeing 747, mas muito mais gordo, com atarracadas asas triangulares perto da fuselagem. Uma fileira de símbolos estranhos decorava um lado, parecendo hieróglifos - não o básico que ela aprendera - provavelmente o nome da nave em uma língua exótica e desconhecida. Uma película de algum tipo revestia as janelas dianteiras, impedindo-a de ver o interior. O cabelo arrepiou na nuca. Ela tinha a sensação de que estava sendo estudada por pessoas que não podia ver. Sua suspeita foi confirmada quando um portal abaixo do nariz se abriu lentamente, derramando luz quente e dourada na pista. Então a rampa pesada atingiu o pavimento com um baque surdo e fez-se silêncio, quebrado apenas pelo chiado do vapor escapando.

— Vá em frente. — A garganta do oficial balançou e ele deu um passo para trás. — Eu esperarei aqui.

— Você tem certeza?

— Sim. Você vai. Eu esperarei aqui.

O que havia além da rampa íngreme era um mistério, mas ela tinha certeza de que as respostas esperavam por ela depois de muitos anos de perguntas. Jas inalou e exalou, firmando-se. Tudo o que ela conquistou em sua vida até agora - as escolhas que ela fez, os erros e os triunfos - foram para que ela pudesse experimentar este momento glorioso. Não importa qual seja o resultado, esta noite sua vida atingia um ponto de viragem.

Ela começou a longa subida.

Luzes verdes embutidas no chão a levaram para dentro. Carregado com a umidade misteriosa de uma caverna, o ar esquentou gradualmente e as luzes começaram a alternar entre douradas e verdes. O túnel era sem características. Sem grafite, sem latas de lixo, ela pensou em uma tentativa frenética de humor. Não havia pontas de cigarro ou latas de refrigerante presas, pisoteadas e esquecidas, no espaço entre o chão e as paredes. Não havia sinais de vida, embora ela pudesse ouvir vozes distantes. E risadas. Esse som irritantemente familiar a persuadiu a seguir em frente.

A rampa terminava em uma câmara cavernosa, vibrando com um vazio metálico, lembrando-a do interior de um hangar de aeronaves. Uma vibração retumbou sob o chão, e ela teve que cerrar os dentes para que não batessem. O barulho cessou. Ela ouviu as vozes abafadas novamente, emanando de uma sala acima, além de uma varanda com uma grade dupla. Ela podia ver as sombras se movendo e as luzes dos instrumentos e computadores refletidas em uma enorme janela curva na frente do navio. Provavelmente, a cabine de comando ou a ponte. Ainda assim, ninguém apareceu para acompanhá-la. Eles sabiam que ela havia subido a bordo?

Ela estava pesando as consequências de gritar — Alguém em casa? — quando ela avistou um homem Vash esperando atrás de uma mesa baixa que se estendia em um ângulo reto da parede. Bonito e de constituição robusta, o homem tinha facilmente um metro e noventa. Uma luz fraca e azulada iluminava o lugar, clareando sua pele morena. Se não fosse por seus surpreendentes olhos dourados, ele teria parecido inteiramente humano.

— Você não é o capitão. — Disse ela em um básico agitado. Os nervos estavam tornando difícil falar a língua que ela aprendeu recentemente.

Ele estendeu as mãos, com as palmas para baixo sobre a mesa. — Eu sou Gann, o segundo em comando. Mostre-me o acordo.

Ela largou a mochila na mesa. Várias luzes piscaram em protesto. Rapidamente, Gann desligou um botão. Sua expressão era absolutamente proibitiva, mas seus olhos brilharam de tanto rir, ferindo o orgulho de Jas.

— Meu nome é Jasmine Hamilton — ela anunciou com profissionalismo frio, usando palavras que ela havia ensaiado mil vezes nos últimos dias. — Represento líderes empresariais que desejam negociar com sua nave. — Abrindo a pasta finamente encadernada, ela a virou para que ele pudesse ver. — Isso é tudo que o capitão quer. O comandante Lanat disse não ao comércio. Mas o estado do Arizona diz que sim.

Gann examinou os documentos. — Inglês — disse ele, pronunciando-o com sotaque. — Com óbvio desânimo, ele admitiu: — Não consigo ler.

Claro! Por que ela não pensou em fazer uma cópia no Básico? Envergonhada, recorrendo ao Básico não ensaiado, ela resumiu o que estava nos papéis e quem os assinou.

— Este é o Quillie — disse ele. — Ninguém está autorizado a negociar conosco. Você não disse isso? Seu contrato é para outra nave.

— Não. Seu.

Ele olhou por cima da cabeça dela e ergueu as palmas das mãos. Ela olhou por cima do ombro, seguindo seu olhar para a varanda, onde a forma sombria de um homem estava. Seu rosto estava escondido, mas ele era o capitão rebelde; ela tinha certeza disso.

Ela voltou sua atenção para Gann. — Eu sei que ele quer ver isso. Negócio exclusivo. Por um preço muito pequeno.

Seus olhos se arregalaram. — Você quer que paguemos você?

— Bem, sim. — Ela pensou muito, lutando para lembrar as palavras de que precisava. — Pequeno preço, grande recompensa. Eu concordo com você. E você me dá passagem para o espaço. Isso é tudo.

O som que ele fez revelou que ele estava igualmente incrédulo e entretido. — Não aceitamos passageiros.

Ela remexeu em sua mochila até encontrar sua pequena bolsa de joias. Ela puxou o cordão de seda e virou a bolsa, derramando suas amadas pulseiras de prata e diversas pedras preciosas. Sua velha aliança de casamento vagou em um círculo instável antes de dar um mergulho suicida na borda.

O Vash o pegou perfeitamente com uma grande palma. Não impressionado, ele sorriu, como se estivesse encantado, o que a irritou um pouco mais. Ela apostou que os ilhéus do Pacífico Sul de séculos atrás sentiram o mesmo quando subiram a bordo do navio superior do capitão Cook apenas para descobrir que suas ofertas mais valiosas eram consideradas bugigangas. Novamente ele olhou por cima da cabeça dela. Seu estômago apertou com força. A qualquer minuto, sua aparente novidade se esgotaria e eles a expulsariam do navio. Era hora de lançar a munição pesada.

— Tenho sal — disse ela. — Muito, muito sal. — Ela jogou as bolsas na mesa reluzente. — Melhor qualidade. Rosa do Himalaia, cinza francês, vermelho vulcânico do Havaí, sal Kosher de Morton - branco. Legal, você vê? Muito agradável. — Ela acenou com a mão sobre a seleção como uma peixaria em San Francisco. — Veja!

Desta vez, quando Gann voltou sua atenção para seu capitão, seus olhos se arregalaram ligeiramente. Então seu olhar incrédulo baixou. — Meu capitão disse que você pode vir.

Sim!

Ela fez. Funcionou. Levou tudo o que ela tinha para não estourar o punho e aplaudir. Um batimento cardíaco depois, uma torrente de emoções conflitantes girou dentro dela quando a realidade a atingiu. Ela estava indo embora. Saindo da Terra.

Jas lutou para impedir que suas emoções aparecessem em seu rosto.

— Rápido — disse Gann. — Estamos prontos para partir.

Ele trancou o sal e as joias em um armário embutido. Então ele ergueu a bolsa dela em um ombro largo e gesticulou para uma escada que levava a um recorte no teto. Ela estava na metade do caminho quando mais estrondos começaram, forçando-a a apertar o aperto suado na escada. Na ponte, a tripulação parou no meio da tarefa para olhar para ela. Loiros e saudáveis, eles usavam roupas de trabalho confortáveis e resistentes. Se não fosse por sua pele bronzeada e olhos cor de uísque, eles poderiam se passar por um grupo de marinheiros suecos.

— Saudações — disse ela, oferecendo um meio sorriso.

— Você. Moradora da Terra.

Suas entranhas estremeceram com o próprio timbre daquela voz muito familiar. O capitão rebelde olhou furioso para ela da ponte. Por incontáveis batidas de coração, eles se olharam em mudo espanto.

Ele falou primeiro. — É você.

Ela se preparou. Ele não é o homem do seu sonho. Ele é de carne e osso, não uma fantasia maluca. — Eu não conheço você.

— Eu acredito que sim. — Sua voz era baixa e aparentemente calma, mas seus olhos eram quentes como brasas brilhantes. — Eu vejo isso em seu rosto.

A mais louca combinação de pânico e alegria girou dentro dela. E se ela tivesse aparecido em seus sonhos também?

— Você está enganado.

— Eu estou?

Claramente, ele era um homem robusto no auge da vida, mas naquele momento seus olhos eram os de um homem velho - um homem que viveu muito e perdeu muito.

Inexplicavelmente, seu coração se compadeceu dele. Ele deve ter visto isso em sua expressão porque suas feições endureceram, e ele passou por sua tripulação e a pegou pelo cotovelo, conduzindo-a para um canto escuro. Sua consciência física vívida de cada centímetro quadrado dele a deixou sem palavras, enquanto seu olhar, uma reminiscência de um gato selvagem, serpenteava sobre ela, das botas ao rosto, propositalmente persistente em sua boca. O calor alagou seu corpo.

Maldita reação dela a ele.

Ela avançou para trás, mas os consoles do computador atrás dela não permitiam recuar.

— Como você me achou? — Ele exigiu baixinho.

— Assisti ao discurso do Comandante Lanat. Eu ouvi o nome da sua nave, então sabia onde procurar.

— Eu vejo. Foi essa a técnica que você empregou da primeira vez?

— Primeira vez? Eu não entendi.

— Em Balkanor! Sede de Sharron.

— Bal-kan-or. Desculpa. Nova no Básico. Por favor, repita.

— Cesse seus jogos, mulher da Terra! Por que você está aqui? É por causa da minha provocação aos Vash Nadah? É inútil, mas satisfatório como o inferno. Devo recuar para os confins da galáxia? É isso? É isso que você quer? Então ninguém precisa ser lembrado da minha existência?

Rom agarrou o console de comunicação atrás dele com as mãos instáveis. A velha fúria ferveu dentro dele, e ele a ouviu em sua voz. Não era de se admirar que ela parecia querer fugir da nave ou dar uma joelhada nas bolas dele. Em qualquer dos casos, suas perspectivas de aprender qualquer coisa com ela estavam desaparecendo mais rápido do que o sal na peneira.

— Bem? O que você tem a dizer?

Ela endireitou a coluna mais um ponto desafiador. — Não tenho ideia do que você fala.

Bem, ela certamente resistiu bem ao interrogatório, Rom pensou e a examinou. Ele se considerava um bom juiz de caráter; normalmente, ele poderia dizer se um comerciante estava mentindo para ele ou escondendo algo. Essa era uma das razões pelas quais ele se saíra tão bem com tão pouco todos esses anos. Mas ele não sentiu absolutamente nenhuma malícia da parte dela. Ou ela era uma mestre do engano, ou ela ignorava seu papel decisivo na vida dele. Mas com a sequência de lançamento bem encaminhada, não houve tempo para saber qual era.

Com um esforço que lhe custou caro, ele encerrou sua turbulenta resposta a ela em uma vontade de ferro. — Que assim seja. Temos muitos dias de viagem pela frente - tempo mais do que suficiente para terminar esta conversa.

— Senhor — Zarra gritou antes que ela pudesse responder. — Recebemos a autorização de lançamento.

— Você pode usar minha cadeira.

Rom a incitou a cruzar a ponte para sua cadeira de comando contornada, de onde ele normalmente supervisionava as partidas planetárias. Ele puxou duas alças sobre a cabeça dela e as afivelou em seus quadris, então puxou mais dois cintos dos lados da cadeira e encaixou as pontas no receptáculo de liga entre os joelhos.

— Sonhei com isso toda a minha vida. — Ela sussurrou.

Surpreso com sua franqueza, ele encontrou seu olhar de joia.

Ela falou pausadamente, como se procurasse cada palavra. — Para você é rotina. Mas para mim é maravilhoso. — Seus olhos brilharam.

Ele apertou a mandíbula. Ele não devia permitir que sua emoção suspeitamente genuína o tocasse. Ele não deveria baixar a guarda. A última vez que o fez, isso lhe custou tudo.

— Quando você me ver levantar, significa que é seguro se locomover. — Disse ele rapidamente.

Ela agarrou os apoios de braço e assentiu. Ele caminhou até um assento perto de Gann e prendeu seus cintos de segurança enquanto os poderosos propulsores de plasma retumbavam para a vida. Mas ele não conseguia desviar o olhar da expressão de admiração no rosto dela e tentou imaginar como tudo deveria ser para ela. Maravilhoso, é claro. Nunca se esquece sua primeira viagem ao espaço. Ele era pouco mais que uma criança quando acompanhou seus pais em seu primeiro voo. Permaneceu sua memória mais antiga.

A vibração aumentou quando o Quillie decolou. Ele observou a mulher agarrar os apoios de braço, a força invisível da gravidade pressionando-a contra o assento enquanto a nave acelerava. Então o nariz subiu para um ângulo mais íngreme. Seus olhos brilhantes e inteligentes procuraram a janela de visão frontal. A turbulência aumentou. Do lado de fora, as nuvens batiam com os dedos molhados no vidro em uma tentativa inútil de manter a grande nave ligada à atmosfera. Então a nave se libertou e havia apenas estrelas, pontinhos brilhantes contra o vasto pano de fundo do espaço profundo. A cor exata de seu cabelo...

Rom praguejou baixinho.

— Vejo que a mulher já capturou seus pensamentos — disse Gann em Siennan. — Eu te invejo. Outros homens devem caçar seu tesouro, mas não o B'kah. — Ele deu uma risadinha. — Para você, o tesouro vem de boa vontade, uma adorável mulher terrestre de pele clara e cabelos negros, que não apenas implora para ser levada como carga - ela lhe paga pela honra.

Rom fez uma careta. — Ela pagou a passagem para o Depósito.

— Ah, sim, joias e sal. Um simples ato de troca.

— Joias? Bah! Apenas um contrabandista mesquinho levaria esses bens pessoais tão queridos. É o sal que eu quero.

— Parece ser de excelente qualidade — reconheceu Gann. — E que variedade.

— Pena que não há mais. Mesmo assim, alocarei um quarto dele para a cozinha para pacificar a tripulação. O resto venderemos no Depósito, junto com os documentos - se forem genuínos e se Zarra puder traduzi-los.

— E, enquanto isso, você vai desfrutar dos encantos dela.

Rom ergueu o rosto em direção ao ar que descia das aberturas do teto, desejando poder esfriar sua perigosa e temerária atração pela mulher com a mesma facilidade com que fazia a transpiração em sua testa. — Nossa cultura dá muita importância aos sonhos, então talvez eu esteja predisposto a esse respeito, mas acredito que ela seja a encarnação do anjo dos Balcãs.

Gann deu uma gargalhada. — Ah sim. De volta para uma visita depois de todos esses anos, ansioso para brincar com seu destino uma segunda vez? Armado com ordens da Grande Mãe para desviá-lo de seu caminho escolhido?

— Não fui eu que escolhi este caminho! Ela escolheu.

— Por todos os céus, Rom, por mais encantadora que seja, ela não é o seu anjo. Você olhou para cada mulher de cabelo preto que conhecemos desde que chegou a este sistema. Existem bilhões a mais que você não viu. Como você pode dizer que ela é a única?

— Juro para você, antes que a viagem termine, terei minha resposta. — A atenção de Rom mudou de Gann para a mulher da Terra. De repente, ele lembrou seus primeiros anos no exílio, a solidão, a culpa, como os pensamentos do anjo Balkanor o impediram de desistir completamente. — Pelos céus! — ele murmurou e desviou os olhos. A mulher trouxe à tona memórias dolorosas como uma repentina tempestade de areia levantando areia. O encontro deles em Balkanor havia precedido o pior período de sua vida - e ainda assim ele foi atraído por ela. Ele ainda não tinha entendido o porquê. Se ela tinha respostas trancadas dentro dela, ele as queria. Só então ele poderia resolver a perda de sua família e seu direito de primogenitura.


CAPÍTULO 5


O clamor de conversas e risos que emanava da sala de jantar da tripulação parecia mais uma festa do que uma refeição matinal, Jas pensou, parando no corredor para reunir coragem para se juntar a eles. Como nas outras áreas de uso comum que ela vira, as paredes eram adornadas apenas com rebites e painéis de controle. A tripulação sentava-se em bancos corridos ao lado de mesas feitas para um jantar familiar. Frascos de cores vivas decoravam as mesas, e os homens ansiosamente pegaram generosas porções de seu conteúdo, derramando-o na comida. Ao lado de bandejas cheias de pães achatados, potes fumegantes de algo que cheirava maravilhosamente bem.

Atraída pelos aromas saborosos, Jas entrou. O silêncio na conversa foi imediato. Em seguida, o som de pernas de cadeiras raspando, saltos de botas raspando e colheres batendo ricocheteou nas paredes de metal enquanto toda a tripulação, trinta deles pelo menos, se levantava. Eles inclinaram a cabeça em uma demonstração óbvia de respeito, depois se sentaram com a mesma rapidez e, com gosto, voltaram a comer e conversar.

Um homem permaneceu de pé - o capitão Vash. Seu coração pulou uma batida. O calor em seu olhar intenso e perscrutador ameaçou desequilibrá-la, mas ela manteve a cabeça erguida e o encarou. Ok, então ele tinha olhos incríveis e era bonito como o pecado. Mas ela mostrava um exterior frio e ilegível, o que mantinha sua atração por ele bem escondida. Ela havia pegado uma carona em sua nave para chegar ao Depósito, de onde pretendia experimentar o suficiente de aventura para colocar sua vida de volta nos trilhos antes de voltar para casa para as pessoas que precisavam dela. Qualquer coisa a mais seria uma distração. E provavelmente um erro.

Colocando o que esperava ser uma expressão agradável e benigna no rosto, ela o cumprimentou com o equivalente básico de - bom dia.

Igualmente estoico, ele disse: — O Quillie é um cruzador mercante, não um navio turístico, mas acredito que seus aposentos sejam do seu agrado?

— Sim. — Bem, exceto pela aplicação cronometrada de spray de sabão em três minutos que passou por um banho. Mas ele provavelmente não se importava que ela tivesse que escolher entre raspar as pernas e lavar o cabelo. — Mais uma vez, agradeço por me permitir embarcar em sua nave.

Ele abriu a boca como se fosse falar. Então ele a fechou, examinando-a. Finalmente, ele disse: — Nunca soube o seu nome.

Essa implicação novamente que eles se conheceram antes. Isso a perturbou ainda mais. — Jasmine Hamilton - Jas para abreviar.

— Jas. — A inclinação educada de sua cabeça contrastava com a cautela em seus olhos. — Eu sou Romlijhian B'kah. Você pode me chamar de Rom. Todo mundo faz. É menos formal. Mais adequado ao meu atual estado de coisas, você não acha?

Ela tinha certeza de que qualquer resposta que desse a ele seria a errada. Inquieta, ela olhou além dele, em busca de um lugar vazio. — Devo encontrar um lugar para sentar. — De preferência em algum lugar do lado oposto da sala de jantar.

— Junte-se a nós.

Com um gesto gracioso de sua mão, ele indicou um lugar vazio à sua frente e ao lado de Gann, que estava obviamente entretido por sua troca estranha. A diversão enrugou os olhos de outro Vash, mas ela teve a sensação de que ele a estava avaliando ao mesmo tempo. Ela apostaria que a lealdade feroz fazia parte de sua natureza tanto quanto o humor.

Ainda em um leve estado de choque pela exibição de homenagem da tripulação, ela se acomodou no banco. — Rom, Gann, você é muito educado — ela usou as mãos para preencher as lacunas de seu discurso hesitante — mas não é necessário que todos fiquem de pé.

Rom respondeu: — Você é uma mulher, portanto, merecedora de tal respeito. Já que insisto para que minha tripulação siga o código do guerreiro, sem dúvida você se acostumará com nossas tradições ao final da viagem.

Portanto, o comerciante rebelde valorizava a etiqueta. Ela não esperava isso, e isso a intrigou.

— Pão de Lar?

Ele pegou uma bandeja e segurou-a na frente dela até que ela escolhesse uma fatia fina como uma pita, então ele continuou seu comportamento deferente enchendo sua tigela vazia com ensopado quente. Havia apenas um utensílio - meia colher, meio garfo - e ela mergulhou na tigela, mexendo com cuidado, liberando um vapor que cheirava vagamente a um sanduíche de presunto e queijo grelhado, junto com outros aromas que eram inidentificadamente exóticos, mas não desagradável. Rom e Gann usaram pedaços de pão achatado em vez de utensílios para desenterrar torrões de ensopado. A comida picante queimou sua língua, mas a única coisa disponível para engoli-la era a bebida quente esverdeada que Rom colocara em sua caneca.

— Tome. Isso afugenta o sono. — Gann forneceu quando ela levou a caneca fumegante aos lábios.

Ela torceu o nariz com o cheiro. Imperceptível aroma de nozes de café fresco. Esta bebida cheirava exatamente como tinha o gosto - um pouco como menta e um pouco como alcaçuz. Ela já sentia falta do café. Mas ela conseguiu dar um sorriso alegre e diplomático.

— Qualquer coisa que afugente o sono é uma coisa boa.

Rom continuou a observá-la atentamente, como se a estivesse avaliando - ou esperando que ela cometesse um erro. Isso era compreensível. Ela era uma estranha, um possível risco à segurança. Como capitão, ele tinha a responsabilidade de proteger sua tripulação.

— Você fala o básico muito bem para uma habitante da Terra. — Disse ele.

— Eu sou sortuda. As línguas vêm facilmente para mim. Mas não tenho nada perto da habilidade de minha mãe. Ela fala quatorze.

Rom ergueu as sobrancelhas e se inclinou para frente. Entrelaçando os dedos, ele murmurou para ela em uma língua estrangeira. A língua era suave, cadenciada e lírica, como o italiano ou o francês soavam quando falados em tons íntimos. Ela inclinou a cabeça, concentrando-se. Algo sobre a cadência parecia familiar, mas ela não conseguia entender uma única palavra.

— Eu não entendi. — Desta vez ele falou mais devagar, mas ela abriu as mãos. — Não conheço esta língua.

— Não — ele disse baixinho — vejo que não. É Siennan — explicou. — A linguagem do meu nascimento. Poucos sabem disso fora do meu mundo natal. Peço desculpas.

Ela sentiu que ele a havia submetido a um teste e ela havia passado.

A mesa inclinou-se e depois se endireitou, e um homem loiro de proporções gigantescas se sentou ao lado dela. Ele era o maior homem que ela já vira, cento e cinquenta quilos, pelo menos - e nem um grama de gordura. Mas seu sorriso era amigável quando ele estendeu uma mão que poderia facilmente agarrar uma bola de basquete.

— É uma honra conhecê-la, habitante da Terra.

— Jas Hamilton. — Ela agarrou o pulso dele no aperto de mão Vash enquanto os dedos poderosos dele se fechavam suavemente ao redor do pulso dela, como se ele achasse que ela iria quebrar tão facilmente quanto uma casca de ovo.

— Eu sou o guarda-costas do B'kah. — Disse ele.

Guarda-costas?

Seu olhar desviou para Rom, que permaneceu inescrutável. Por que ele precisa de proteção?

— Muffin é meu nome — o homem grande continuou, liberando seu braço.

— Muffin? — Jas reprimiu um sorriso. — Por favor. Básico é novo para mim. Qual é o seu nome, mais uma vez?

— Muffin.

Ela apertou os lábios. O homem tinha pelo menos um metro e noventa. Seus ombros eram tão largos quanto os de um jogador de futebol com acolchoamento completo. Em qualquer outro lugar ele se chamaria Thor... Ou Conan.

— Muffin. — Seus olhos estavam lacrimejando.

— É um nome antiquado — insistiu ele, um tanto defensivamente. — Mas ainda é popular no meu mundo natal.

— Na minha língua, muffin é... Um bolo doce.

Ambos Gann e Muffin rugiram de alegria. Os olhos de Rom brilharam. O coração de Jas deu uma pequena torção. Ele parecia um homem diferente quando estava feliz. Inexplicavelmente, despertou nela um desejo lúdico de provocá-lo, só para vê-lo rir.

Gann se inclinou para frente, apoiando os cotovelos na mesa. — O que o meu nome significa?

Jas partiu o pão ao meio. — Você é sortudo. Não existe palavra igual.

— E Rom? — Ele perguntou.

— Bom Dia!

O jovem que a acompanhou até seus aposentos na noite anterior pulou em um assento desocupado por outro membro da tripulação. Zarra a cumprimentou apressadamente antes de despejar o guisado em uma tigela limpa. Em seguida, ele ergueu um dos frascos de cores vivas e colocou várias colheradas pesadas dentro também. Jas se levantou ligeiramente para espiar dentro do frasco.

— É um tempero?

Gann parecia horrorizado. — Por todos os céus! Onde estão nossas maneiras? Jas ainda não comeu, Zarra. Salgue seu ensopado.

— Não, obrigado.

Jas bloqueou o braço de Zarra com o dela, derramando metade do conteúdo na mesa. Os homens engasgaram. Em segundos, Muffin e Zarra estavam limpando seu pão ensopado sobre a mesa, apenas para colocar os repugnantes pedaços em suas bocas com prazer.

Muffin deu um tapinha em sua barriga. — Não aproveitamentos sal deste jeito desde que invadimos as lojas na Paróquia Três, hein?

Gann murmurou em concordância, com a boca cheia. Zarra estava ocupado demais comendo para acrescentar qualquer coisa. Rom supervisioava tudo com diversão paternal e resignada.

Confusa com as travessuras da tripulação, Jas apoiou o queixo na palma da mão e os observou comer. Parecia que sua aventura já havia começado.

 


Os corredores na seção de ré da nave eram estreitos e escuros, e ela não tinha certeza se estava indo na direção certa. Depois de deixar Terz, o engenheiro que a guiara para uma turnê pelos geradores de gravidade, ela fez duas curvas para a direita e depois para a esquerda. Agora ela deveria ir para a esquerda novamente... Ou direta? O estalo dos saltos das botas batendo no chão ecoou pelo longo corredor e se juntou ao som de outros passos vindo em sua direção. Ela dobrou a esquina e colidiu com um corpo quente e muito sólido.

Rom agarrou seus antebraços para impedi-la de tropeçar. Sua boca sensual se espalhou em um sorriso preguiçoso, e cada poro, cada terminação nervosa de seu corpo chamejou para a vida.

— Você está perdida? — Ele perguntou. — Ou apenas dando um passeio?

— Perdida — ela disse e reprimiu sua reação a ele. — Estou tentando encontrar a ponte.

— Eu vou acompanhá-la. Estaremos dando o salto para a velocidade da luz dentro de uma hora. Você achará o procedimento interessante, tenho certeza.

Ele apontou o caminho e os dois caminharam lado a lado, as botas batendo em uníssono, enquanto ele conversava de uma forma racional e profissionalmente confortável sobre o que ela estaria observando na ponte. Uma vez lá, ele a deixou para conversar com vários membros da tripulação que estudavam uma série de monitores. Jas contornou-os, atraída pela enorme janela curva na proa da nave. O ar estava mais frio aqui, perfumado com o leve cheiro de eletricidade. Com um estalo periódico batendo nas solas de suas botas, ela parou na frente do vidro grosso, obrigada a silenciar por puro temor. Estrelas distantes brilhavam, geladas e impossivelmente antigas. Uma, ligeiramente tingida de verde, brilhava mais forte do que o resto.

Rom se juntou a ela. Olhos estreitados, ele colocou as mãos atrás das costas, uma mão enfiada na outra. Seu comportamento era uma reminiscência de um experiente capitão do mar.

Os lugares que ele deve ter visto, ela pensou. As aventuras que ele deve ter tido...

Ele seguiu seu olhar para a estrela em tons de oceano. — É o oitavo planeta deste sol, eu acredito.

— Netuno. — Ela sussurrou. Arrepio endureceu seus braços. Imagens das pessoas que ela havia deixado para trás apertaram seu coração.

Você é indispensável; todo mundo precisa de você.

Ela se preparou contra o ataque de culpa. Seis meses longe de casa não era para sempre.

Rom estava olhando para ela estranhamente, como se sentisse seu humor pensativo. — Você gostaria de se sentar na cadeira do piloto enquanto esperamos o salto?

— Inferno, sim. — A cadeira estava atrás de um banco do que ela supôs serem computadores de voo. Em frente ao equipamento alienígena cintilante, havia um manche de controle de aparência familiar e encorajadora. Já fazia muito tempo. Demasiado longo. O anseio a varreu com o pensamento de assumir o controle de tal nave - qualquer nave. — Eu era piloto — disse ela. — Há muitos anos. — Ela não pôde deixar de sorrir ao amarrar o cinto e pousar as mãos nos controles.

 


Rom subiu os seis degraus até o console do engenheiro, onde Gann supervisionava Terz, enquanto o engenheiro se preparava para a transição para a velocidade da luz. A partir daí, ele aproveitou o cativeiro de Jas com sua nave para estudar a mulher. Seu cabelo caía sobre os ombros em ondas sedosas que alcançavam a parte baixa de suas costas. Ela tinha as curvas de uma mulher madura, com membros elegantemente musculosos devido à atividade física. Mas era a expectativa vívida em seus olhos, como se ela acreditasse que algo maravilhoso estava para acontecer, que o teria atraído para ela em qualquer ambiente.

Esperança.

A surpresa faiscou dentro dele. Sim, seu olhar luminoso irradiava esperança. Ele tinha ficado tão exausto que se esqueceu de como era.

— Vejo que vocês dois estão se dando melhor. — Disse Gann.

Rom acariciou seu queixo pensativamente. — Ela me informou que já foi piloto.

— Hmm. Uma vocação bastante estranha para um ser celestial.

Rom ignorou o tom sarcástico na voz do amigo. — Possivelmente. — Mesmo assim, ele não conseguiu resistir ao impulso de pegar Jas Hamilton mentindo, qualquer mentira. — Eu digo que devemos testar sua teoria. Claro, — ele disse fluentemente — um homem mais diplomático pode avisá-la antes de entregar o controle manual total da nave.

— B'kah.

Rom ignorou o aviso do amigo e desligou o aviador automático. Jas percebeu a mudança imediatamente. Foi um palavrão da Terra que ela murmurou? Ele e Gann haviam agarrado tudo o que podiam para o caso de a nave tombar, mas não havia necessidade. Jas manteve um curso direto para o Quillie sem nenhuma ondulação.

Grande Mãe! Suas habilidades como piloto acrescentaram outra dimensão inesperada a essa mulher já fascinante. Ele ligou o piloto automático novamente e Gann sorriu presunçosamente.

Rom cerrou os dentes para o amigo. — Ponto feito; ela disse a verdade - com relação a voar, de qualquer maneira. — A veracidade de Jas pode ter esfriado sua raiva, mas não sua determinação de decifrar o papel dela em sua visão longínqua - e em sua vida. — Deste ponto em diante, irei presumir que ela simplesmente esqueceu nosso encontro. — Lentamente ele começou a se afastar, então se virou e voltou. — O curso de ação preferido é fazê-la se lembrar.

Gann parecia em dúvida. — Quanto?

— Eu vou seduzi-la.

Seu amigo bateu as mãos nas coxas. — Um empreendimento ambicioso e ousado, B'kah. O sinal de um verdadeiro guerreiro.

Rom se recusou a permitir que Gann o iscasse. — Em Balkanor, ela e eu nunca terminamos o que começamos. Desta vez, vamos.

Ele desceu o passadiço até onde Jas estava se soltando da cadeira do piloto.

Quando Rom se aproximou, Jas sorriu. — Obrigada pela chance de pilotar sua nave.

— Você voa como uma piloto espacial experiente.

Seu elogio lhe trouxe uma onda de prazer inesperada. — Obrigada.

— Você continua a me surpreender. Eu gostaria de saber mais sobre você. Talvez possamos conversar mais durante o jantar esta noite. — Sua voz caiu para o que parecia um tom destinado apenas aos ouvidos dela. — Uma refeição privada. Meus aposentos.

Algumas batidas de silêncio assustado. — Certo.

Certo? Ela estava louca? Ela não tinha saído em um único 'encontro' de verdade desde o divórcio. Ela não queria - não se sentia pronta. Agora ela havia concordado em um jantar para dois com o galã Vash. Fale sobre ir de zero a sessenta.

— Podemos discutir o acordo comercial. — Arriscou.

— Ah, sim, a lista de mercadores que desejam negociar conosco. — Disse ele, como se fosse a última coisa em sua mente.

Talvez devesse ser a última coisa em sua mente também. Ela veio aqui em busca de aventura, não foi? Além disso, não era como se ela tivesse a intenção de pular na cama com ele. Não imediatamente.

De alguma forma, ela conseguiu recuperar a compostura. — Não sei porque não fiz o contrato no Básico. Mas eu o traduzi após a refeição matinal. Deve estar transparente agora — ela bateu a palma da mão contra a testa — não, claro. O contrato não irá expirar - nunca - se você tiver essa preocupação. Mas tudo o que podemos revisar esta noite.

As pontas de sua boca se ergueram na mais leve sugestão de um sorriso. Sua voz era baixa e séria. — Sim, temos muitos negócios a discutir. Concluído e inacabado.

Para seu alívio, ela ouviu Gann gritar: — Propulsores no máximo.

Eles estavam mergulhando no hiperespaço, um lugar além da passagem implacável do tempo, alcançado apenas pela velocidade. Buracos de verme, bolhas de verme... A física absoluta disso a confundia, apesar de suas inclinações técnicas. Mas sem a capacidade de pular distâncias tão alucinantes, a Federação do Comércio nunca teria sido possível.

— Propulsores no máximo — repetiu Terz. — Três, dois, um.

A nave estremeceu e componentes metálicos distantes gemeram. Um brilho laranja-magenta fugaz inundou a proa da nave. — Velocidade da luz — Gann confirmou. Estrelas comuns se alongaram em objetos semelhantes a cometas, deixando fios de luz atrás deles. A excitação dançou com sua pulsação acelerada. — Olhe para as estrelas — disse ela a Rom.

— Uma distorção temporária — explicou. — Elas vão aparecer assim até o final da viagem. Quando nos aproximamos lentamente do Depósito, as estrelas ficarão exatamente como você se lembra.

Impressionada, ela olhou para fora da janela enquanto o Quillie se distanciava mais da Terra e de tudo que ela já conhecera. Rom disse que as estrelas permaneceriam inalteradas no final desta jornada. Mas ela duvidava que fosse capaz de dizer o mesmo sobre si mesma.

 


Rom preparou seus aposentos para o jantar com a mesma atenção meticulosa aos detalhes que usaria para preparar um caça estelar para a batalha. Uma iluminação suave banhava o quarto com um brilho romântico e caloroso. O incenso adoçou suavemente o ar. A música antiga de Sienna - címbalos e sinos em cascata - desceu das aberturas de som. A mesa foi posta à maneira tradicional de Vash Nadah. Tigelas de todos os tamanhos continham as poucas iguarias que restavam na nave. Algumas vasilhas estavam cobertas, com vapor saindo de baixo das tampas ornamentadas; outras continham pedaços que eram gelados, salgados e secos ou preservados com licores colhidos em toda a galáxia - alguns adquiridos por meios legalmente reconhecidos, a maioria não. Passaram-se anos desde que ele desfrutou de uma refeição apresentada inteiramente da maneira antiga, e ele descobriu que estava ansioso pela noite.

Se ao menos você não estivesse tão apreensivo como um jovem na noite de seus rituais de casamento.

Ele apertou a gravata de seu manto e serviu-se de um pequeno copo de licor de amora raro e obtido ilegalmente. De olhos fechados, ele deixou a doçura deslizar sobre sua língua. Rapidamente, ele entorpeceu sua garganta antes de aquecer sua barriga, deixando para trás o mais leve indício de seu notório poder intoxicante. Esta noite ele participaria com moderação, para que pudesse aplicar as habilidades eróticas testadas pelo tempo que aprendera no palácio em sua juventude, junto com as técnicas mais sutis que adquirira como homem, para dar a Jasmine o prazer mais requintado que se pudesse imaginar - se ela permitir que ele fizesse amor com ela. Seu pênis latejava enquanto ele imaginava maneiras de excitá-la antes de levá-la à realização, e ele escolheu várias que tinha certeza que a inspirariam a desistir de seus segredos tão facilmente quanto flores de amora caíam na primeira neve.

— Abra.

As portas de seu depósito de itens pessoais se abriram e ele escolheu seu traje com prudência, habilmente, como um guerreiro pode selecionar suas armas. Tirando sua melhor camisa de um invólucro protetor, ele amarrou a túnica de seda Nandan acobreada da esquerda para a direita sobre o peito e, em seguida, puxou as botas por cima de uma calça Nandan macia - adquirida anos atrás e usada apenas uma vez. Em textura e toque contra a pele nua, o tecido luxuoso não tinha igual. Ele derramou algumas gotas de um frasco dourado em sua mão, esfregou as palmas das mãos e massageou o couro cabeludo com o óleo. Espiando no espelho, ele afastou o cabelo recém aparado do rosto. Isso não era arrogante, ele se assegurou, mas a atenção meticulosa de um caçador para armar sua armadilha.

Sua tela de exibição soou. Ele a ligou. Jas estava no corredor em frente à porta dele, seus braços em volta de um pacote que parecia suspeitamente cheio de papelada. As solas dos sapatos exibiam saliências cilíndricas que erguiam os calcanhares do chão. Com um prazer surpreso, ele notou que a saia dela, decorada com algum tipo de flor, chegava apenas aos joelhos. Não era costume das mulheres de Sienna - a não ser as garçonetes que anunciavam seus produtos nos mercados do sexo - usar vestidos curtos, então Rom deu-se o prazer de examinar vagarosamente suas panturrilhas nuas.

— Um momento — disse ele no comunicador. As portas se abriram. Ela lançou um olhar de admiração, mas nervoso, ao redor de seus aposentos. Curvando-se, ele acenou para ela entrar com um movimento de sua mão. — Estou feliz que você veio.

— Estou ansiosa por isso. Temos muito que conversar. — Seu tom era proposital, mas agradável. — Posso falar mais sobre o acordo agora.

— Quer uma bebida?

— Por que não? — ela disse.

Ele encheu dois copos do tamanho de um dedal com licor de amora e encostou o copo no dela. — Para aventuras ainda não realizadas.

Sua boca se curvou. — Perfeito.

Ele esperou até que ela quase levasse o copo à boca antes de impedi-la. — Espere. Este é o licor de amora, uma bebida muito especial. Deve ser compartilhado da maneira tradicional. — Ele mergulhou o dedo em seu copo e arrastou a ponta do dedo úmido ao longo de seu lábio inferior quente e flexível.

Ela enrijeceu, suas narinas dilatadas. Eles mantiveram contato visual por tempo suficiente para ele ver sua surpresa. Então, um canto de sua boca se ergueu em um sorriso cético.

— Isso é alguma tradição. — Disse ela secamente.

— Milhares de anos. Agora você unge meus lábios com licor de amora. Os métodos variam. Seja tão criativa quanto quiser.

Ela o olhou com interesse e curiosidade, mesmo quando um toque de cor subiu em suas bochechas.

— Talvez outra hora — ele disse baixinho, cedendo. Ele não conseguia se lembrar da última vez que suas palavras sozinhas fizeram uma mulher corar. Sua inesperada inocência o cativou tanto quanto seu espírito e inteligência. — Continue. Experimente o licor.

Conscientemente, ela lambeu o lábio inferior. — É delicioso — seus olhos se estreitaram — e alcoólico.

— Muito mesmo. — Rom bateu seu copo no dela. — Agora esvaziamos nossos copos. — Quando ela terminou, ele perguntou: — O que você acha de jantarmos? Talvez possamos nos conhecer melhor durante uma boa refeição.

Ele acenou para que ela o seguisse. Eles pararam várias vezes para examinar as obras de arte que adornam as paredes. Depois de explicar a história por trás das tecelagens centaurianas de sua coleção, ele a conduziu a um ninho de travesseiros em volta da mesa de jantar.

— Sem sal? — ela perguntou com cautela.

— Eu tenho alguns, se você quiser adicioná-los à comida.

— Não. Obrigada. — Ela fez uma careta. — A tripulação comeu o equivalente a um ano no café da manhã. Você tem um médico a bordo? Ele verificou a sua — ela procurou as palavras de uma forma que achou surpreendentemente cativante — pressão arterial recentemente?

Ele riu. — O sal é uma delícia rara. Achei que a tripulação merecia depois de meses perdidos em seu sistema. Amanhã, o que eu dei a eles terá acabado e eles estarão de volta ao normal. Na ausência de sal, temperamos nossa comida de maneira diferente.

Ele acenou para a mesa festivamente posta. Caindo graciosamente no chão, ela tirou os sapatos. Acima de seu calcanhar esquerdo havia um pequeno corte recente. Um ferimento semelhante marcava seu tornozelo.

— Você encontrou arestas afiadas em seus aposentos? — ele perguntou. — Vou ligar para Terz para fazer reparos.

— Como você não permite mais do que um banho por dia, tive que raspar as pernas com loção. Não foi muito bom, como você pode ver.

— Você raspou o pelo das pernas? A maneira como um homem tira a barba?

— Uh, sim, eu raspo.

Seu pênis endureceu quando ele pensou em suas longas pernas, nuas e lisas.

— Certamente, existem tópicos mais envolventes do que minha pobre técnica de raspar pernas. — Com um dobrar flexível dos músculos das panturrilhas, ela apontou os dedos dos pés, em seguida, curvou as pernas para o lado, provocando nele uma imagem nítida e erótica daquelas pernas fortes envolvendo seus quadris, apertando-o enquanto ele fazia amor completo e delicioso a ela.

— Por exemplo — ela disse, estilhaçando seu devaneio. — Eu quero saber sobre suas roupas. O acabamento é adorável. Todas as roupas que vi aqui são assim. Não fabricadas, como na Terra. Posso? — Ela agarrou a manga da camisa dele e esfregou o tecido entre os dedos. — Tão macio. Eu sou uma artista - eu pinto. Mas muitas vezes me pergunto se não é o meio errado, porque sempre adorei tecidos.

— Isso não é uma surpresa. Como artista, seus sentidos estão sintonizados em um nível superior. Olfato e tato, visão e som e, é claro, gosto. — Seu olhar permaneceu em sua garganta, então sua boca. — Eles afetam você mais do que outras pessoas.

Jas colocou a mão de volta em seu colo. Era novo para ela, esse tipo de contato visual profundo e significativo. Lisonjeada, constrangida e desprezando sua falta de sofisticação, ela estudou suas mãos entrelaçadas.

— Suas calças são do mesmo tecido que sua camisa?

— Sim. Seda Nandan.

— Seda Nandan. — Ela saboreou o nome exótico, retratando mulheres delicadas de pele âmbar usando teares em um planeta tropical distante. — De planta ou inseto? A seda da terra é feita de casulos de bicho-da-seda.

— Plantas. Os fios são feitos de seiva de um salgueiro encontrado no planeta Nanda. As árvores não são cultivadas em nenhum outro lugar. É proibido levar as sementes para fora do planeta, tornando o tecido raro e fora do alcance de todos, exceto dos muito ricos.

— Os negócios devem ser bons para que você possa pagar por tais luxos.

Ele deu uma risada suave. — Não tão bom. — Arrancando as calças, ele disse a ela: — As roupas foram um presente de um contrabandista grato que roubava sementes, condenado à morte pelos nandanos. Como Drandon e eu tínhamos um pequeno negócio bom fornecendo plantações não pertencentes à Vash na fronteira, facilitei sua fuga de uma masmorra bastante sombria.

No final de sua explicação, Jas se pegou inclinando-se para frente, completamente fascinada. Naqueles poucos momentos, ela viveu a aventura junto com ele.

— Você tem mais histórias. — Ela solicitou.

— Um pouco.

— Eu quero ouvir todas elas.

Ele parecia satisfeito. — Eu vou te aborrecer.

— Não — disse ela com um suspiro — você não vai.

— Muito bem. Então você vai me contar suas histórias depois.

Ela acenou com as mãos rapidamente. — O que levará apenas cinco minutos.

— Isso eu duvido — ele disse, um sorriso transformando seu perfil.

Seu nariz era muito longo para ser perfeito, mas ela amava o jeito que ele chegava àquela fração extra e sensual de centímetro mais perto de sua boca, dando-lhe a aparência de uma estátua grega antiga. Seu corpo longo e magro de atleta era musculoso apenas o suficiente para impedi-lo de ser esguio. A luz da vela esquentava seu cabelo com um tom de canela melado, um ou dois tons mais escuros que sua pele, e ela se perguntou se os fios eram tão macios quanto pareciam.

Se ele estava ciente de seu fascínio por ele, ele não demonstrou e se ocupou preparando a refeição. Aromas salgados fumegantes aumentaram e se misturaram no ar enquanto Rom descobria vários potes, escolhendo entre os pratos para enfeitar um prato com uma variedade colorida de comida. O estômago de Jas roncou.

— Vamos começar a refeição. — Rom se acomodou nos travesseiros. Do outro lado da mesa triangular que o separava dela, ele escolheu um pedaço de seu prato. Segurando-o com cuidado entre o polegar e o indicador, ele o ofereceu a ela. — Carne tromjha — explicou ele. Quando ela estendeu a mão para pegá-lo, ele retirou a mão. — Na minha cultura, em ocasiões como essas, alimentamos uns aos outros.

— Oh. — O pensamento a deixou tonta - e não apenas por causa dos efeitos sutis do licor em seu cérebro. O ato gritava intimidade.

Oh, apenas faça.

Esse foi um dos motivos pelos quais ela fez essa viagem, não foi? Para abraçar novas experiências, para lembrar como era se sentir vivo.

Ela separou os lábios.

Os três dedos inferiores dele, aqueles que não tocavam a carne, roçaram sua mandíbula. Se foi por acidente ou propositalmente, ela não sabia, e ela não se importava, porque a sensação de seus dedos quentes e secos era tão deliciosa quanto a carne tenra que ele a alimentava. Limpando o polegar e o indicador em um guardanapo, ele a observou atentamente enquanto ela mastigava, saboreando o delicado sabor cítrico. Então foi a vez dela.

Seu batimento cardíaco acelerou quando ela levou um pedaço de carne à boca dele, segurando a comida do jeito que ele fazia, entre dois dedos, deixando os outros limpos e livres... Para tocar. Seus lábios eram quentes e surpreendentemente macios.

Quando ele terminou de mastigar, ele murmurou o nome da próxima iguaria, então a alimentou, as pontas dos dedos deslizando ao longo de sua mandíbula enquanto ele retirava a mão. Arrepios subiram em seus braços. Enquanto ele a observava, ela esmagou a fruta marinada agridoce com os dentes, então escolheu uma para ele, levando-a aos lábios entreabertos. Desta vez, ela se atreveu a deixar a palma da mão permanecer em sua bochecha, e seus bigodes, muito pálidos para serem vistos, espetaram o interior de sua palma. A temperatura dentro do quarto disparou, mas ela suspeitou que não era devido a um sistema de controle ambiental com defeito.

— Eu poderia me acostumar com isso. — Ela confessou.

A boca dele se curvou quando ela fez uma pausa para limpar e secar os dedos. Ela brilhava por dentro com o sorriso dele e sentiu sua barriga se contrair quando ela entreteve o pensamento insano de beijá-lo. Talvez não seja tão louco; ela sentia uma atração mútua. Mas quando se tratava da arte da sedução, ela se sentia como uma novata, enquanto ele era um homem com experiência galáctica. Se ela fosse um convidado masculino, ele a estaria regalando com contos de conquistas e proezas sexuais.

— Acho que você deve ter tido aventuras para preencher dez vida. — Disse ela.

— Vinte.

Ela riu suavemente. — Diga-me um pouco. — Ela ergueu o copo de licor. — Como isso. Por que é tão especial?

Ele se acomodou de lado e equilibrou um braço sobre o joelho ereto, um movimento impregnado de sensualidade graciosa e preguiçosa. — As amoras crescem apenas nos locais mais inóspitos. As frutas neste frasco vieram de um planeta situado entre duas estrelas gigantes vermelhas. Ele conhece apenas um pôr do sol eterno e temperaturas congelantes, exceto por um verão muito breve. Quando a neve derrete, os arbustos de amoreira florescem. Flores magenta estendem-se até o horizonte. E a fragrância — seus olhos claros vidrados com a lembrança — alguns dizem que é tão inebriante quanto o próprio licor.

Sem pensar duas vezes, Jas mergulhou a ponta do dedo em seu copo de fluido tingido de rosa e acariciou a essência daquela terra fria e distante em seus lábios. Seus olhos escureceram. Ver sua resposta despertou um desejo trêmulo e há muito esquecido. Um pequeno alarme soou dentro dela, um aviso, mas ela escolheu ignorá-lo.

— As flores são extremamente frágeis, — ele começou novamente, observando-a atentamente. — Elas caem com as primeiras rajadas. Os frutos maduros devem ser colhidos logo em seguida, porque em poucos dias estarão enterrados sob centenas de metros de neve.

Os pés básicos medem mais do que os pés terrestres, tornando ainda mais difícil imaginar tanta neve.

— Alguém mora lá? — Jas perguntou.

— Borboletas. E os colhedores que voam para o verão. Todos desaparecem com a primeira neve. Mas fica frio muito antes disso. — Ele desviou o olhar. — Você não pode imaginar como é frio.

Ela pensou ter visto ele estremecer, mas não tinha certeza. Espantada, ela espalmou as palmas das mãos sobre a mesa, inclinando-se para frente para examiná-lo. — Você era um colhedor?

— Por um tempo.

Seus olhos brilharam com algo que ela não conseguia definir. Segredos. Ela apostaria que ele estava cheio deles. E contrastes. Sua autoconfiante graça aristocrática implicava boa educação, mas ele era um comerciante e contrabandista de meio período. Sua tripulação claramente o idolatrava - sua mera presença comandava um cômodo - mas sua atitude arrogante e desrespeito pelas regras dos Vash davam a impressão de que ele não dava a mínima para o que os outros pensavam.

— Você não é o que parece, Rom B'kah.

Sua voz era calma, franca. — Nem você.

Eles se ofereceram mais comida. Jas descobriu que os gostos em constante mudança, as nuances das texturas, a intensificação dos sentidos, tornavam cada toque, cheiro e parte murmurada da conversa incrivelmente erótica. As pontas dos dedos quentes permaneceram. Mãos acariciadas. Pareceu tão natural quando, finalmente, seus lábios se juntaram. Ela não sabia quem alcançou quem primeiro, mas ela estava em seus braços e ele a estava beijando, quase amorosamente, e ela não conseguia recuperar o fôlego.

Sua língua era aveludada, acariciando a dela em uma carícia sem fim. O calor do mel se espalhou por ela, então puro desejo, percorrendo seu corpo com uma intensidade que ela sentiu apenas em seus sonhos. Seus nervos relaxaram, suas inibições escorregando para o fundo de sua mente. Com um suspiro abafado, ela se arqueou contra ele, torcendo os dedos em seu cabelo espesso e macio para mantê-lo perto. Ela nunca imaginou que um beijo sozinho pudesse ser tão celestial... Tão excitante. Mas era, e ela quase se perdeu - nele - até que, finalmente, ele encerrou o beijo.

— Uau. — Ela murmurou contra sua boca em sua língua.

Ela sentiu um sorriso curvar seus lábios. — 'Uau'. Esta é uma boa palavra, sim?

— Uma palavra muito boa.

Seu peito retumbou com um som de satisfação enquanto ele passava os dedos em sua garganta e clavícula. Então sua boca encontrou a dela novamente. Desta vez, seu beijo foi forte de paixão. Habilmente, ele a manobrou de costas, seu corpo magro e poderoso moldando-se ao dela, suas coxas musculosas segurando-a no lugar. Sua mão quente deslizou por sua coxa, seu polegar deslizando pelo elástico de sua calcinha. — Oh, Jas... Meu doce anjo — ele sussurrou, sua respiração quente contra o ouvido dela. — Agora vamos fazer amor.


CAPÍTULO 6


Por razões que Rom não conseguia entender, Jas enrijeceu. Instintivamente, ele transferiu mais de seu peso para seus braços e acariciou o lado de sua garganta, murmurando seu nome e palavras doces e calmantes até que ela relaxou. Fechando os olhos, ela respondeu aos sussurros dele com suspiros ofegantes, reagindo às carícias simples como se fossem seus movimentos mais experientes. A resposta espontânea dela, sua apreciação genuína por cada toque dele, o excitou além de qualquer coisa em sua experiência. Ela não era uma servidora de prazer, é claro, e não foi criada como uma Vash Nadah, então ele não esperava que suas habilidades fossem aprimoradas. Mas sua aparente inocência nas formas de fazer amor o perturbou com uma carnalidade de abalar a alma.

Talvez seja essa a intenção dela, uma voz interior o advertiu, afogar seu juízo de prazer antes de obter as respostas que procura.

Era um risco que ele correria com prazer.

Rom moldou seu traseiro na curva de sua palma, sentiu sua carne quente e flexível. O céu absoluto estava entre suas coxas. Gemendo baixinho, ele levantou seus quadris e abriu suas pernas, ajustando-se, inchado e dolorido, contra o fiapo inconsequente de sua roupa íntima. O calor úmido dela o envolveu e de alguma forma o queimou através do tecido da calça. Ansioso por remover qualquer barreira entre eles, ele puxou a roupa íntima.

Ela parou sua mão. — Não.

Uma palavra da Terra, mas não havia engano em seu significado. Uma coisa que um homem Vash Nadah não fez foi forçar uma mulher. Embora ele tivesse pouco a ver com sua antiga vida, os ensinamentos de seus ancestrais o guiaram até hoje e permaneceriam com ele até seu último suspiro. Atordoado, ele se sentou, desenredando seus membros dos dela.

Em sua pressa de se livrar dele, ela quase tropeçou ao se levantar. Foi algo que ele disse? Algo que ele fez? Freneticamente, ele revisou os últimos momentos em sua mente. Ela achou seu abraço desagradável? Desajeitado? Certamente não. Ele orou por não ser isso. O mais provável é que sua compreensão irregular do Básico lhe causou alguma confusão.

Ele deu um tapinha nos travesseiros amarrotados ao lado dele. — Sente. A noite não acabou.

— Na verdade, acabou — ela disse, evitando cuidadosamente o olhar dele enquanto puxava a bainha de sua saia enrugada.

— Parece que temos um problema de tradução. Fazer amor é o fim tradicional de uma boa refeição.

— Ah. Eu vejo. — Ela apertou as mãos afetadamente na frente dela. — Gosta de sobremesa?

Ele assentiu. Ela revirou os olhos. — Rom, vim aqui para mostrar a você os benefícios do acordo comercial. Eu esperava que você o achasse útil, se não de grande valor. Achei que era isso que você também queria. Ou você me convidou aqui apenas para... Para...

— Para fazer amor com você — ele terminou prestativamente.

Ela fixou nele um olhar contemplativo de olhos estreitos. — Você é honesto. Esse é um ponto a seu favor. Boa noite, capitão B'kah — disse ela com uma formalidade sardônica. — Gostei de sua hospitalidade. E sua comida.

Acima de tudo, meus beijos, ele quase a lembrou, mas pensou melhor. Ele abriu os braços em um convite. — As iguarias mais requintadas ainda estão por vir.

Ela deu um pequeno guincho. — Você é incrível.

— Isso foi dito sobre mim, sim.

Seus olhos castanhos brilharam com fogo interno. Por um momento, ela parecia estar lutando por inspiração. Ela abriu a boca para falar, então fechou. Finalmente, ela abriu as mãos em frustração.

— Básico! Totalmente inútil. Um milhão de palavras para um ato de troca, e nenhuma para colocá-las em seu lugar.

Girando nos calcanhares, ela passou por ele. Ele foi atrás dela. Ela parou na porta dupla, e ele inclinou a cabeça para olhar em seus olhos. Ah, como seu espírito e independência o revigoraram.

— Você não precisa de palavras para 'me colocar no meu lugar', Jas. Eu já estou lá. — Ele ergueu uma mecha de seu cabelo e colocou atrás da orelha. — Por esta noite eu estou com você.

Quase imperceptivelmente, suas pupilas aumentaram. Um observador não treinado teria perdido o sinal sutil. Ele não fez isso. Uma estranha sensação de desejo se filtrou por ele - por sua reação ser de atração, não de desconforto. Ele não tinha percebido até aquele momento o quanto ele queria que ela sentisse como ele.

— Fique. — Ele disse calmamente.

— Eu não posso

— Por que não?

— Muitas razões. — A angústia fugaz em seus olhos assombrados perfurou sua alma. — Você não entenderia.

— Como você pode ter tanta certeza?

Ela se virou ligeiramente, revelando a pulsação rápida em sua garganta. — Eu tenho sonhos... Sonhos que me assombram e me deixam exausta por dias depois. Estou caminhando no deserto, procurando, nunca encontrando... E quando acordo, me sinto vazia, como se tivesse deixado alguém para trás.

Grande Mãe, pensou Rom. Ela poderia estar revivendo seu encontro durante o sono?

— Eu tenho tanto na minha vida — ela disse com sentimento, seu sotaque ainda mais pronunciado. — No entanto, o vazio não vai embora. Não quero passar o resto da minha vida me sentindo assim. Então vim aqui, para o espaço, para talvez encontrar o que estou perdendo. Eu quero me sentir viva de novo. Eu quero aventuras - como você teve.

— Suponho que já estive na galáxia algumas vezes.

— Eu invejo isso. — Ela o estudou, seu olhar contemplativo. — Eu quero isso. — Lentamente, deliberadamente, ela espalmou as duas mãos em seu peito. Sua voz rouca se suavizou em um murmúrio um tanto incerto, mas ainda assim sedutor, enquanto ela erguia o queixo. — Beije-me, Rom — ela sussurrou. — Apenas me beije.

Seu coração saltou com o desejo evidente dela. Tecendo os dedos por sua massa escura e sedosa de cabelo, ele cobriu sua boca com a dele. Ela soltou um grito abafado e prendeu as mãos atrás da cabeça dele, beijando-o de volta com uma sensualidade de cortar a alma. Era um acasalamento ardente e desesperado de bocas quentes e famintas e mãos buscadoras, e seus sentidos girando gloriosamente.

Precisamente o tipo de paixão descontrolada que você foi treinado para se elevar, advertiram as vozes combinadas de seu pai e das gerações de homens antes dele. Ela é indisciplinada. Perigosa.

Tudo o que ele sempre desejou.

Ela se afastou antes que ele pudesse reagir à revelação explosiva. — Aparentemente, não sou tão aventureira quanto pensava. — Ela bateu no painel de controle da entrada com a palma da mão. As portas duplas se abriram, revelando um corredor vazio. Então ele a viu desaparecer nas sombras, seus pés descalços e claros num borrão silencioso sobre o piso de liga leve.

 


Gann perguntou na manhã seguinte: — Diga-me, velho amigo, sua noite com o anjo dos deserto foi tudo que você esperava que fosse?

Rom franziu a testa para a tigela de ensopado de café da manhã na frente dele.

Gann deu uma risada rápida e surpresa. — Não! Diga-me que não é assim.

Rom cerrou os dentes. — O que você acha?

— Ela deixou você exausto!

— Controle-se — Rom implorou baixinho. — Estas são questões privadas, e não para os ouvidos da tripulação.

— Ou da mulher, eu suponho. — Gann acenou com o braço para o refeitório vazio. — Não se preocupe, ela se foi. Eu me juntei a ela para o café da manhã quando ela estava terminando. Mas eu não poderia arrancar dela uma semente de informação sobre a noite passada. Ela parecia estar de bom humor, no entanto. Muito falante. — Ele gesticulou para suas bochechas. — A cor dela também era alta. O olhar de uma mulher satisfeita. Uma mulher satisfeita com Vash-Nadah. — Ele olhou para Rom especulativamente.

Rom olhou de volta.

Gann bateu com as mãos abertas na mesa. — Fui ao Inferno e voltei! Ela recusou você. A primeira, hein, Rom?

Era a primeira vez, mas Rom seria condenado antes que ele admitisse. Os homens sentados perto se levantaram. Com um barulho de utensílios, eles entregaram as tigelas sujas para a equipe da cozinha designada para o dia antes de deixar a sala para cumprir suas obrigações. Refletindo sobre o fiasco da noite anterior, Rom colocou uma colher cheia de flocos de pimenta mandariana em seu ensopado. A noite o havia afetado emocionalmente e fisicamente. O comando de seu corpo e emoções foi criado em seus próprios ossos. Mas com Jas, ele lutou - e quase perdeu - sua habilidade de mantê-la. Exatamente como em Balkanor. O conhecimento o envergonhou.

Um guerreiro nunca deve permitir que seus desejos tenham precedência sobre os de um parceiro.

Gann interrompeu seus pensamentos taciturnos. — Você tem a aparência de um homem obcecado.

— Descobrir por que aquela mulher me ajudou a viver quando eu estava melhor morto é razão suficiente para obsessão. — Ele retrucou.

— Desista, B'kah. Ela não tem nada para te dizer.

— Eu estava começando a sentir o mesmo. Até que ela mencionou ter sonhos perturbadores. Dentro deles, eu acho, está minha resposta. Devo mudar de tática.

Aninhando uma xícara de tock nas mãos, Gann perguntou: — Para quê? Além de tirar as roupas dela.

— Um jogo de bajha.

Gann engasgou. — Você está brincando.

— Não. Na verdade, pretendo caçá-la esta manhã e convidá-la para a arena.

— Esta é uma partida que ficarei contente em assistir.

Pela primeira vez naquela manhã, Rom sorriu. Ele estava ansioso para se juntar a Jas em um nível muito mais intenso do que simplesmente físico.

— Minhas lamentações — disse ele, engolindo em seco. — Mas para isso não posso permitir espectadores. — Após uma pausa propositalmente prolongada, ele se permitiu uma sugestão de sorriso. — Alguns jogos, Gann, são melhores jogados em privado.

 


Depois do café da manhã, a solidão de seus aposentos não trouxe paz para Jas. Ela trabalhou em seu próximo itinerário de viagem, aumentando sua lista de perguntas para fazer aos homens na próxima refeição. Muitas preocupações ainda não tinham resposta - como conseguir transporte uma vez no Depósito; que tipos de acomodações estavam disponíveis; como trocar seu sal por moeda.

Ela jogou a caneta no chão. Na maioria das vezes, fazer listas a acalmava. Mas não hoje. Não depois da noite passada.

Como era seu hábito em casa, ela buscou distração eletrônica. Usando um teclado que era uma superfície plana, ativada pelo toque, rotulada com runas básicas radiantes, ela se conectou ao computador da nave, assim como Terz a ensinou. Uma exibição de anomalias mecânicas atuais surgiu. Um gerador de gravidade resistente, alguns ventiladores de circulação de ar apreendidos, um painel de carga quebrado - ela examinou os itens e não encontrou nada que a interessasse. Seguindo em frente, ela navegou por um vasto reino do conhecimento, até que encontrou um arquivo intitulado História do Comércio. Ela leu mais adiante. Se ela soubesse mais sobre a história dos Vash, talvez pudesse entender melhor Rom e seu efeito sobre ela.

As primeiras passagens descreviam a galáxia, onze mil anos atrás, na véspera de um cataclismo conhecido como a Grande Guerra...

Os anos sombrios nos envolveram. A monarquia não existia mais. Senhores da Guerra surgiram para preencher o vazio. Doenças, fome, escravidão e terror causaram um colapso completo da civilização. Armas de destruição inimaginável foram criadas e aperfeiçoadas por aqueles sem consciência e usadas por aqueles que abraçaram a crueldade e adoraram o poder sem alma. Oito grandes guerreiros se uniram para vencer o mal. Paz para sempre, eles juraram quando a luz da Grande Mãe amanheceu mais uma vez. Louvados sejam os Oito!

Os Oito fundaram o Vash Nadah, que criou a Federação do Comércio. Representantes de cada um dos oito clãs reais - B'Kah, Vedla, Dar, Lesok, Gorok, Vir, B'lenne e Tregornn - formavam o Grande Conselho, que era como uma Organização das Nações Unidas, mas com poder real. Um documento assustadoramente enorme chamado O Tratado de Comércio unia uma galáxia de mundos habitados.

Paz e prosperidade foram os temas principais, mas abrangeram muito mais. — A maternidade é reverenciada — Jas recitou um trecho em voz baixa. — A família é sagrada. A sexualidade deve ser celebrada, pois sagrada é a alegria encontrada em relações sexuais agradáveis e consensuais.

Agradável? Mmm. Fechando os olhos, ela pensou na maneira como Rom a tocou e a abraçou. Um arrepio deliciosamente quente percorreu seu corpo. Ela pressionou dois dedos nos lábios, lembrando-se dos beijos que haviam compartilhado, tão apaixonadamente ternos e apaixonados que a mera memória a fazia ansiar pelas maneiras mais íntimas que ele poderia lhe dar prazer. O mais chocante de tudo foi que ela respondeu a ele com uma carnalidade instintiva, quase como se tal paixão tivesse estado dentro dela o tempo todo.

Mas ela fugiu, assustada com a descoberta e os sentimentos que Rom evocava nela.

Mágico. Como seus sonhos malditos.

Perigoso.

A única vez que ela deixou a magia nublar sua razão, ela agiu precipitadamente e isso significou um desastre.

Abrace a lógica. Não emoção.

Firmando-se, ela se afastou da mesa. A essa altura, a maior parte da tripulação estaria reunida na ponte ou perto dela. Ela precisava de um pouco de distração, talvez de alguma companhia.

Companhia de Rom.

Ela caminhou com confiança pelos corredores escuros e emergiu na área bem iluminada viva com os sons da conversa.

— Ah, Jasmine — Rom a chamou. — Eu tenho algo para você. — Levantando-se de seu assento habitual, ele abriu a gaveta inferior de um console abarrotado de hardware de computador e tirou dois sapatos de salto alto de camurça preta dolorosamente familiares. Segurando-os facilmente em uma de suas grandes mãos, ele anunciou: — Você os deixou em meus aposentos na noite passada.

O calor subiu para seu rosto. Mortificada, ela olhou para Gann e o resto da tripulação da ponte, então soltou um silvo. — Eu não acredito em você.

Rom pareceu genuinamente surpreso. — É a verdade. Lamentavelmente, você saiu com todo o resto intacto.

— Isso não é da conta de ninguém.

— Eu certamente concordo. — Espalhando a palma da mão larga no centro do peito, sobre o coração, ele disse: — O comércio empalideceria com o brilho de seus beijos.

Seis pares de olhos claros a observavam com expectativa, diluindo o efeito do elogio de Rom. Lançando um sorriso rígido para os homens, ela estendeu a mão. — Dê-me os sapatos.

— Você não está satisfeita. Diga-me o porquê. Você é uma mulher. Eu sou um homem — ele recitou, como se citando os ensinamentos que ela havia lido antes. — E todo mundo sabe que o final tradicional de uma boa refeição é...

Jas fez um pequeno ruído de engasgo.

— fazendo amor. Sexo em sua miríade de formas é outra forma de sustento.

Eu só estava beliscando, boneca. Olha, vim para casa para o prato principal.

Jas estremeceu quando as palavras de Rom trouxeram de volta a memória amarga. Enquanto a admissão de Jock daquele primeiro caso ecoava dentro dela, cada fibra de seu ser queria fugir da ponte. Mas ela ficou, fixada no lugar, exposta, enquanto aquela cena se desenrolava dentro dela - a tentativa de provocação de Jock em fazer as pazes; como ela obstinadamente represou suas lágrimas para evitar chatear duas curiosas crianças de cinco anos no meio de um restaurante fast-food. Mas Ian sabia de alguma forma, reconheceu a dor que as palavras de desprezo de seu pai haviam causado a ela. Ela nunca se esqueceria da aparência de Ian, um garotinho com uma coroa de papelão do Burger King apoiada torta no topo da cabeça, uma expressão de cavaleiro de armadura brilhante no rosto. Ele tinha sido seu campeão.

— Jas?

Rom estava usando o mesmo visual. Seu coração se torceu e o desejo cobriu sua solidão eterna. Oh, como ela queria acreditar em magia - sua magia.

Não!

Ela atacou em um sussurro áspero. — Santo prazer, sagrado sexo. Lixo! Você não é diferente do meu... Meu... — O que ela pretendia dizer ficou preso na garganta. Nada traduzido para ex-marido, então ela deixou escapar a segunda melhor coisa. — Do meu marido!

— Seu marido? — Rom exclamou, igualmente abalado.

— Sim. — Sua voz latejava de dor. — Intimidade não significava nada para ele também. — Ela arrancou os sapatos da mão dele e saiu correndo.

— Crianças? — Gann perguntou suavemente enquanto ela passava.

— Duas. — Com a cabeça erguida, Jas desapareceu no corredor.

— E assim a história se desenrola — Gann disse alegremente. — Meninos ou meninas, eu me pergunto?


CAPÍTULO 7


A miséria adora companhia, Jas disse a si mesma, buscando refúgio naquela noite com a equipe na sala comunal dos Quillie, onde Kendall Smith, a repórter da Terra, dominava a tela gigante. A imagem era clara e brilhante, como se o correspondente estivesse em Washington, DC, e Jas assistindo de sua sala de estar em casa. Graças a Terz, engenheiro-chefe e faz-tudo requisitado, ela agora seria capaz de ver todas as transmissões de Smith.

O grupo de tripulantes barulhentos era uma distração perfeita. Eles acharam a ideia de um 'homem da fronteira', expondo sobre atrações turísticas enquanto eram servidos e alimentados no Vash Nadah, divertido. Isso, por sua vez, deu a ela uma visão bem-humorada do mundo deles. Até então, eles haviam dito a ela como reservar passagens em ônibus turísticos, os melhores locais para férias, e que o Romjha Hotel era o lugar para ficar quando ela chegasse ao Depósito.

Deixando de lado a caneta que usava para fazer anotações, ela alcançou através do colo de Muffin uma tigela de cobre martelado, pegando um punhado de pequenos pontos de interrogação crocantes que passavam por batatas fritas. Eles foram condimentados com algo saboroso em vez de salgado... E ela não conseguia o suficiente deles.

— Minhas coxas esperam que os biscoitos brilhantes não tenham um gosto melhor do que estes. Eu poderia viver com esses chapéus de coco - ou melhor, poppers. — Jas tirou as migalhas das mãos com um guardanapo. — Não é isso. Como você os chama?

— Positivamente viciante.

Ela congelou ao som da voz familiar. Seu olhar se ergueu. Com um ombro apoiado no batente da porta, Rom a observava atentamente. Ela lutou contra o desejo de mergulhar para se proteger, desejando estar em qualquer outro lugar, exceto sob o olhar fixo daqueles olhos dourados inabaláveis e obsessivamente familiares.

— Croppers é o nome comum — disse ele agradavelmente. Seu exterior despreocupado não a enganava, e aquela expressão de tédio praticado era uma máscara. Ela apostaria seu último dólar que os músculos tensos em sua mandíbula indicavam que mal continha a fúria. — Você os verá de novo e de novo. Eles são essenciais em estabelecimentos de bebidas, desde o coração da galáxia até a fronteira. — Ele olhou para ela com algo semelhante ao desprezo. — Certamente, você está ansiosa para se socializar durante suas, ah, viagens sem restrições... Sra. Hamilton.

Assentindo, ela engoliu o chumaço de alfinetes de repente seco que tinha grudado em sua língua.

— Ah, Rom, que bom que você pôde se juntar a nós — Gann cantou ao retornar, duas grandes tigelas repletas de biscoitos brilhantes peculiares em seus braços. Ele colocou uma tigela perto de Jas. — Bolachas brilhantes. Recém assadas.

Rom o seguiu para dentro da sala. Rapidamente, ela camuflou o lugar vazio de Gann com travesseiros, mas Rom parou na frente do sofá, elevando-se sobre ela. Tudo nele parecia maior, mais forte. Ameaçando. Ela podia ouvir sua respiração lenta e regular, podia sentir o cheiro do couro quebrado de suas botas de trabalho, o tecido lavado de sua camisa prateada folgada e sua pele - calorosamente perfumada com sabonete higiênico misturado com algo exótico, almiscarado... E distintamente masculino.

A forma como ele provou.

Ela engoliu em seco. Rom gesticulou para as almofadas empilhadas entre ela e Muffin. — Alguma reclamação sobre este local?

Jas implorou ao amigo alto de Rom com os olhos. — Gann, salvei seu lugar.

Gann acenou recatadamente. — Sente-se, B'kah. Posicione antes da beleza.

— Essa é a idade antes de beleza — Jas corrigido com amargura.

— Rom vence em ambas as contagens, então.

Gann inclinou a cabeça na direção de seu capitão e se acomodou em uma pilha de travesseiros no chão. Rom sentou ao lado dela. A imagem silenciosa e multicolorida da tela de exibição atrás dele fazia seu perfil perfeitamente esculpido parecer tão frio e impenetrável quanto mármore.

Ele falou em voz baixa. — Eu teria pensado que seria impossível em uma nave tão pequeno, mas além de vislumbres aqui e ali, não vi você o dia todo.

Ela mal conseguia ouvir a voz dele acima do barulho de fundo de conversa fiada e risos. Inclinando-se mais perto, ela sem querer roçou o braço no dele. Seus bíceps ficaram tensos com o contato.

— Eu tenho pintado, — ela disse inquieta. — E lido.

Um silêncio carregado de emoção pulsou entre eles.

— Diga-me, Jasmine, você pretende me evitar até o final da viagem?

— Eu não tinha um plano de uma forma ou de outra.

— Eu vejo. Uma resposta vaga para embotar seu engano.

Ela se irritou, sussurrando asperamente: — Explique o que você quer dizer.

As pequenas rugas gravadas em ambos os lados de sua boca se aprofundaram. Perturbadoramente calmo, ele pressionou as pontas dos dedos, flexionando-os.

— Não tenho estômago para o adultério.

— O que?

— Cometi um grave erro ao presumir que você era livre para fazer amor comigo. Por ter tanta certeza de que você era a encarnação da minha visão, não pensei que você pudesse ser uma esposa. Se eu soubesse disso, não teria pedido que você fizesse amor. Nunca aceitaria uma mulher que fez os votos sagrados com outro.

— Rom — ela disse suavemente. — Eu não sou casada.

Não havia dúvida do alívio em seus olhos. — Você é uma viúva, então.

— Não. O casamento foi — ela procurou as melhores palavras — legalmente cortado.

— Por que você não me contou na ponte?

— Eu tentei. Mas não existe um Básico que significa 'casamento desfeito'.

Ele parecia tão perplexo que ela apressou a explicação, tropeçando nas palavras básicas mais simples ao contar como seu casamento havia terminado oficialmente há quase um ano, e como eles viveram separados ainda mais. Ainda assim, ela evitou qualquer menção de como eles haviam deixado de ter um casamento de verdade muito antes disso.

— Jock. — Uma sugestão de uma careta curvou os lábios de Rom, como se o próprio nome deixasse um gosto amargo. — Ele te deixou sem um protetor? Quando você teve filhos?

— Eles estão crescidos. Dezenove anos na Terra. Duplicados.

Rom ergueu uma sobrancelha cor de noz-moscada. Ela percebeu pela expressão dele que havia escolhido a palavra errada. — Gêmeos? — ele forneceu, quase sorrindo.

Ela assentiu. — Um menino e uma menina. — Sua voz suavizou. — Eu sinto falta deles...

Ele olhou para ela com admiração aberta e respeitosa. Então sua expressão escureceu e ele enfiou os dedos pelos cabelos.

— Você poderia ter esclarecido isso antes.

— Eu estava furiosa — ela o lembrou.

Ele sacudiu as palmas das mãos no ar. — Isso eu também não entendo.

— Você me envergonhou. Você anunciou os detalhes privados de nosso jantar. Isso... Tornou o que compartilhamos trivial e barato.

— Você não entende! — Sob o escrutínio de uma dúzia de olhares curiosos, ele abaixou a voz e pegou as mãos dela, estudando seus dedos aninhados em sua palma larga. — Há muito entre nós, Jas. Nada trivial ou barato.

Calmamente, ele acrescentou: — Você pode não aceitar isso, mas eu aceito - nós já nos encontramos antes, você e eu. Se não na carne, então no reino dos sonhos. Em um campo de batalha... Em um planeta chamado Balkanor. Eu estava gravemente ferido, sofrendo por Jhon, meu irmão, que foi morto lá. Eu não me importava se vivia ou morria. Mas você se importou.

Sua boca se apertou. — Não era real. Não aconteceu.

— Você está certa?

A dúvida dela deve ter sido óbvia o suficiente para lhe dar uma resposta, pois ele suavizou seu tom. — Minha cultura dá grande importância às visões, aos sonhos. Portanto, estou menos inclinado a descartar o que aconteceu comigo em Balkanor como uma mera alucinação - ou ignorar sua semelhança com a mulher que vi lá.

Ela olhou para as mãos cerradas. — No meu sonho, há um homem com olhos como os seus. Mas eu sempre acordo antes de chegar perto o suficiente para ver seu rosto.

— Meu rosto, Jas. Você sonha com o deserto. Balkanor é um planeta deserto.

Ela ergueu os olhos. — Coincidência.

— Não há coincidências, Jas. Nada acontece por acidente, nada. Incluindo sua aparição em minha nave.

Uma pessoa sensata, como ela, sabia que o que ele sugeria era impossível; mas, bom Deus, ele fez isso parecer tão razoável. Em menos de três dias, ele a intimidou, despertou seu desejo, envergonhou-a e irritou-a. Agora ele afirmava que podia interpretar seus sonhos. No entanto, em vez de fugir da insanidade de tudo isso, tudo o que ela queria fazer era envolver os braços em volta dele e beijar aquele rosto docemente sincero dele. Nunca suas emoções estiveram em uma viagem de montanha-russa. Para se recompor, ela se concentrou na transmissão de Kendall Smith, vagamente ciente de ter perdido metade do programa.

— ... Vou passar dois dias inteiros lá — dizia o repórter. — Depois disso, vou levá-lo a uma terra de beleza mágica.

Uma imagem de uma floresta brilhante, pitoresca, quase iridescente de altas coníferas emplumadas apareceu atrás dele.

A tripulação resmungou apreciativamente.

— Sureen — Rom murmurou em seu ouvido. Seu hálito quente causou arrepios em seu pescoço.

— Sureen — a voz do repórter ecoou distante. — Um destino turístico popular por milhares de anos...

Os lábios aveludados de Rom roçaram a orelha de Jas, espalhando seu formigamento em uma fogueira. — Estive lá uma dúzia de vezes — ele sussurrou, sua coxa dura como ferro pressionando contra a dela. — As árvores lá são fosforescentes e à noite brilham tanto que nunca escurece.

— Produzindo um fenômeno único que eu comparo a pisar dentro de um arco-íris — disse o repórter em uma narração nem de longe tão fascinante quanto a muito pessoal de Rom. — Aumentando o efeito, os habitantes incorporam a substância responsável pela fosforescência em sua arquitetura e arte.

Os dedos de Jas doíam para agarrar um pincel encharcado com os tons exuberantes. Ela ergueu o queixo, quase encontrando os lábios de Rom. Só por causa da decidida falta de privacidade ela se afastou da tentadora possibilidade de um beijo.

— Eles pintam com a substância? Que cor é essa?

Todos responderam ao mesmo tempo.

— Turquesa e lavanda — declarou Zarra.

Muffin acenou com sua grande mão. — De modo nenhum. É tão verde quanto geleia de jampala.

— Não compre bugigangas pintadas com as cores do arco-íris. — Advertiu Terz.

— Ou as pinturas — acrescentou Rom. — Por mais lindas que sejam.

Gann entrou na conversa. — Os mercadores têm um grande lucro vendendo-as. Mas assim que você deixa o planeta, todas elas ficam cinza.

— Porque a substância fosforescente só pode existir lá — disse Jas pensativamente. Sureen seria um dos lugares que ela visitaria, mesmo que apenas para pintar nos tons extravagantes.

Uma voz alta e feminina gerada por computador perfurou seu devaneio. — ALERTA, ALERTA. FUMAÇA DETECTADA NA SEÇÃO SEIS B.

Terz gemeu. — Gerador de gravidade explosivo. Está superaquecendo de novo.

O estômago de Jas embrulhou e ela piscou para afastar uma vaga tontura. Então ela flutuou para fora do sofá. Ela riu em choque e prazer, levitando em meio a nuvens de biscoitos liberados e biscoitos brilhantes.

— Para suas estações — Rom comandou. Os homens reagiram com calma, como se já tivessem passado por situações semelhantes. Em uma imagem totalmente incongruente, eles saíram pela porta, alguns de cabeça. — Gann, fique parado na ponte para nos tirar da velocidade da luz, caso seja necessário.

Esquecida enquanto Rom conversoava com Gann e Terz, Jas apontou um biscoito brilhante para um copo vazio que girava e o acenou com o polegar e o indicador. Ele errou o copo e girou para os outros biscoitos, criando um efeito cascata em toda a sala. Rindo, ela agarrou outro biscoito no ar e mirou, mas Rom a agarrou pelo tornozelo e a puxou em sua direção.

— Tivemos problemas com o gerador desde que mandamos consertar aquele mecânico sem conta do Gamma Nine — disse ele. — Garanto que farei uma visita de retorno.

— Lembro-me de ter visto uma referência aos geradores de gravidade na página de status de manutenção do computador. Mas nunca imaginei que isso significasse que isso pudesse acontecer.

Rom pareceu surpreso e um tanto preocupado. — Você acessou o computador?

— Terz me mostrou como. Para que eu pudesse planejar minhas viagens — acrescentou ela, caso Rom estivesse preocupada que ela fosse um risco à segurança.

— ALERTA, ALERTA. FUMAÇA DETECTADA NA SEÇÃO SEIS B — o computador zumbiu.

Rom entrelaçou seus dedos com os dela. Usando a mobília aparafusada como alavanca, ele a conduziu para o corredor. — Por quanto tempo ficaremos sem peso? — ela perguntou.

— Várias horas, talvez. Eu quero que você vá para a ponte e espere. Encontre uma cadeira e coloque o cinto. A gravidade pode voltar a qualquer momento. Quando isso acontecer, vai...

Eles despencaram no chão. Rom se torceu para que ela caísse sobre seu corpo em vez da implacável superfície metálica. Mesmo assim, seu braço esquerdo bateu na parede. Rangendo os dentes, ela colocou o cotovelo dolorido contra o peito. Rom a colocou no chão, protegendo a parte de trás de sua cabeça com a mão. A preocupação obscureceu seu rosto quando percebeu como ela agarrou seu braço.

— Você está ferida.

— Apenas o bati. — Ela engasgou, sentando-se, ainda assustada com a queda repentina. Ele puxou sua manga quase até o ombro e examinou seu braço, sondando suavemente o hematoma.

— ALERTA, ALERTA. FUMAÇA DETECTADA NA SEÇÃO SEIS B.

Ele passou as costas da mão em sua bochecha. — Existem bolsas de gelo armazenadas no kit médico na ponte. Pergunte a Gann. Eu tenho que descer, ou eu mesmo cuidaria de você. — Eles flutuaram do chão novamente. — Balde de parafusos — ele murmurou e a guiou até uma fileira de anéis de metal na parede. — Apertos de mão. Você acha que pode se puxar para a ponte?

Jas flexionou o braço. A pontada de dor desapareceu quando ela flexionou o cotovelo. — Acho que tudo está funcionando bem. — Para provar seu ponto, ela agarrou dois punhos de mão. O movimento fez com que a parte inferior de seu corpo arqueasse para cima. Ela deu uma risada rápida e surpresa, parando pouco antes de uma risadinha. — Ei, isso é divertido.

Rom apontou para a ponte. — Vá. E sem acrobacias ao longo do caminho.

— Nem mesmo uma? — Ela não sabia a palavra para cambalhota, então rolou as mãos uma sobre a outra.

— Absolutamente não. — Apoiando os saltos das botas na parede, Rom se afastou com a agilidade de um mergulhador olímpico. — Você nunca sabe quando a gravidade virá — Ele caiu no chão e pousou com um baque retumbante.

— Voltou? — Ela forneceu.

Rom se apoiou nos braços. — Precisamente. — Mesmo esparramado no chão, ele conseguiu manter seu comportamento nobre, como se fosse criado em seus ossos.

— ALERTA, ALERTA. FUMAÇA DETECTADA NAS SEÇÕES SEIS A E SEIS B.

— Duas seções agora. — Um fio de desconforto desceu por sua espinha. — Está se espalhando.

O tom de Rom ficou sério. — Vá para a ponte. — A mudança em seu humor disse a ela tudo o que ela precisava saber. Ela assentiu com a cabeça, seu batimento cardíaco acelerado. Rom se levantou e começou a correr mancando. A gravidade fugiu e ele se ergueu do chão antes mesmo de virar a esquina.

Favorecendo seu cotovelo dolorido, Jas derivou com uma mão, olhando para o corredor escuro. Era um longo caminho até a ponte, principalmente se ela tivesse que usar as alças. A sala do gerador estava mais perto. Ela tinha vivido mais do que sua cota de contratempos da aviação. Certamente, ela seria capaz de oferecer alguma ajuda a Rom e aos outros lá embaixo.

— AVISO, AVISO. FOGO DETECTADO NAS SEÇÕES SEIS A E SEIS B.

Desta vez, uma buzina ensurdecedora seguiu a melosa voz gerada por computador. A curiosidade empalideceu com o pensamento de que os homens estavam em perigo. E Rom...

A adrenalina subiu por ela, acompanhada pela necessidade de protegê-lo, uma força tão elementar e instintiva como garantir a segurança de seus filhos. Ela decidiu não analisar, mas agir. Mão após mão, ela abriu caminho até uma escada que descia até as entranhas frias e ecoantes da nave. Embora os recicladores de ar zumbissem alto, um fedor acre de fios queimados picou seu nariz e garganta, e uma névoa branca ondulou perto do teto. A gravidade voltou. Ela caiu no chão, pousando nas solas grossas de suas botas, e correu em direção às luzes brilhantes no final do corredor. O reflexo dançante das chamas e o que ela imaginou ser um agente extintor cintilou sobre o piso metálico. A nave deu um longo e controlado estremecimento. Ela tropeçou. Endireitando-se, ela continuou. Rom deve ter dado a ordem para sair da velocidade da luz. Não era um bom sinal. Terminar a viagem em Zero-G era uma coisa, mas e se o incêndio danificasse o navio? Eles iriam mancar até que os suprimentos acabassem? Ou pior, ficarem isolados no espaço?

Qualquer que fosse a experiência que Rom tinha em se livrar de situações difíceis, ela esperava que ele a usasse para tirá-los dessa.

À sua direita, havia duas portas amplamente espaçadas que conduziam à sala do gerador enfumaçado. Protegendo o nariz e a boca com a manga, ela avistou Rom, Muffin e Terz cerca de dez metros adiante no corredor em frente à primeira escotilha. Animadamente envolvidos em uma discussão, eles estavam reunidos ao redor de um painel com luzes verdes e vermelhas piscando na parede, uma versão maior do painel de controle da porta do quarto dela. O alívio a invadiu ao ver a estrutura musculosa e atlética de Rom e sua postura confiante; ainda assim, seu pavor nauseante persistia. É melhor se distrair ou correr o risco de enlouquecer.

— SEQUÊNCIA DE PURGA ATIVADA. DOIS MINUTOS ATÉ A DESPRESSURIZAÇÃO. — Entoou o computador.

Parecia que Rom ia abrir as portas da escotilha externa para o espaço. O vácuo resultante sufocaria o fogo em um instante. Mas ele não teria que fechar as escotilhas do corredor interno primeiro? Do contrário, tudo e todos não aparafusados seriam ejetados para o espaço. Os punhos pareciam mais atraentes do que nunca. Mas quando ela abriu e fechou as mãos, lutando contra o impulso de agarrar tudo o que valia a pena, o desejo de alcançar Rom era mais forte. Imersa em uma vulnerabilidade inquietante, ela examinou as duas portas mais próximas, rezando para que segurassem firme durante a despressurização iminente.

Zarra saltou para trás, saindo da escotilha mais próxima a ela, bloqueando seu caminho. Sua pele exposta brilhava de suor, apesar da temperatura fria, mas suas mãos estavam firmes quando ele agarrou um extintor de incêndio volumoso. Apertando os olhos, ele apontou para a sala do gerador, disparando um poderoso jato em um alto gabinete de metal. A fumaça saiu da carcaça carbonizada, sibilando ao entrar em contato com o spray. Embora as enormes aberturas de ventilação o sugassem rapidamente, o odor residual a lembrou de plástico queimando.

— Zarra, como posso ajudar? — Ela gritou para ser ouvida acima do alarme de incêndio intermitente e do som de vozes masculinas estrondeando nas paredes de metal. Ele pareceu surpreso ao vê-la. Seu rosto estava vermelho, seus olhos claros da cor de uísque brilhantes. Ela percebeu então como ele era jovem e em que situação de adulto ele havia sido colocado. O spray se dissipou e ele baixou o extintor.

— Vazio. Aqui, segure isso. — Ele entregou a ela a mangueira pingando e o tanque pesado. — Há mais um lá dentro, eu acho.

— SEQUÊNCIA DE PURGA ATIVADA. UM MINUTO, TRINTA SEGUNDOS ATÉ A DESPRESSURIZAÇÃO. — Jas ouviu o computador alertar.

— Lá dentro? — Jas lançou um olhar selvagem para a sala. Uma névoa antifogo chovia sobre as chamas brilhantes e cobria o chão. Do outro lado, meio ocultas pela fumaça, erguia-se um par de portas externas prontas para se abrir para um espaço mortal sem fim. — Eles vão selar a sala. — Ela o avisou.

— Alguns dos equipamentos mais caros que temos estão nessa caixa.

— Zarra, em menos de dois minutos eles vão despressurizar.

— Muitos danos podem acontecer entre agora e então.

Jas resistiu ao desejo maternal de agarrá-lo pelo colarinho. Mascarando o rosto com a manga da camisa, Zarra assegurou-lhe: — Dois segundos, é tudo que preciso. — E disparou para dentro.

Uma comoção atraiu sua atenção pelo corredor. Muffin estava acenando para ela, enquanto Rom colocava as mãos em volta da boca e gritava, — Jasmine, afaste-se! Estamos fechando a sala!

Sua ansiedade disparou. — Zarra está lá dentro!

Rom parecia chocado. — Terz — disse ele bruscamente. — Cancele a sequência.

— Senhor, vai demorar...

— Eu sei. Faça mesmo assim, ou o perderemos. — Rom correu em sua direção. — Fique onde está, Jas! Você não irá atrás dele!

— SEQUÊNCIA DE PURGA ATIVADA. UM MINUTO ATÉ A DESPRESSURIZAÇÃO. FECHANDO ESCOTILHAS INTERNAS.

Terz girou e correu para o painel de controle, as mãos um borrão enquanto se moviam sobre a tela de toque. Extintor na mão, Zarra reapareceu como um contorno vago na névoa do outro lado da sala. Jas gritou de alívio. — Rápido! — Seus olhos se arregalaram com a urgência dela, e ele tentou obedecer, mas seus pés voaram debaixo dele. Girando no chão escorregadio, ele bateu com força em um poste e caiu de lado.

Houve um estrondo ensurdecedor e um chiado prolongado quando a escotilha interna mais adiante no corredor se fechou. Então, as portas duplas grossas na frente de Jas vibraram e começaram a se fechar.

Ela bateu o extintor de incêndio vazio longitudinalmente em seu caminho, mantendo-as separadas. Muffin cravou seu corpo enorme entre elas e Rom mergulhou pela abertura estreita, atrás de Zarra.

— DESPRESSURIZAÇÃO INICIADA. ESCOLTILHAS SEGURAS. ESCOLTILHAS SEGURAS.

Jas nunca sentiu tanto terror e agonia emocional em toda a sua vida - porque ela não podia fazer nada para ajudar. — ROM! — Ela apertou os punhos e os pressionou contra a boca. Os músculos de seu estômago se contraíram em um espasmo doloroso.

Ela iria perdê-lo.

Segundos se estendem pela eternidade. Então ela viu Rom novamente, e seus joelhos quase dobraram.

Escorregando no chão molhado, lutando para se manter em pé, Rom tinha um braço em volta de um Zarra inconsciente. Muffin agarrou a camisa de Rom, puxando-o para o corredor com tanta violência que Rom perdeu o controle sobre Zarra. Caindo, Rom conseguiu recapturar a mão de Zarra. Então todo inferno desabou.

Um rugido explosivo obliterou todos os outros sons. A névoa se formou, uma névoa branca e gelada, e seus tímpanos se retorceram dolorosamente. As portas externas foram abertas. Com a escotilha interna ainda parcialmente aberta, ela criou um vácuo voraz. Jas se debateu para um aperto de mão enquanto Rom, de bruços, seus dedos em volta da mão do garoto, caía de cabeça em direção ao esquecimento. Um grito de horror se alojou em sua garganta.

De seu lugar, tudo que Jas pode fazer foi observar enquanto, agitando-se com uma mão para agarrar as superfícies lisas da parede e do chão, Rom tentava em vão parar seu deslize.

Perto, Muffin apoiou suas pernas musculosas contra a parede, agarrando a camisa de seu capitão. Ela rasgou. Ele agarrou os braços de Rom e errou. Atingido pelas ferramentas soltas e pedaços de papel que passavam voando, Rom cegamente estendeu a mão para Muffin, ainda mantendo seu controle sobre Zarra, mas por fim o esforço foi demais. Os dedos de Zarra escorregaram da mão de Rom.

O menino desapareceu atrás das portas que se fechavam, e Rom deu um grito de angústia que Jas sentiu ressoar em seu coração.


CAPÍTULO 8


— Rom... — Ele ouviu seu nome sendo chamado como se estivesse muito longe. — Você pode me ouvir? Mexa um dedo, pisque os olhos, alguma coisa. Qualquer coisa.

— Por favor.

Desta vez, a voz queixosa penetrou totalmente na escuridão. A voz de uma mulher. Rouca, familiar. Acentuada. Ele percebeu que ela já falava com ele há algum tempo, mas só agora ele conseguia se concentrar nas palavras. Mãos quentes alisaram o cabelo de sua testa repetidamente, acariciando com ternura, mas insistentemente.

— Cabeças não funcionam bem contra portas, você sabe — a voz continuou. — Você tem sorte por não ter quebrado seu crânio. Embora eu ache que este será um hematoma feio. — Houve silêncio por vários momentos. Então a dona da voz deu um tapinha na bochecha dele, implorando mais uma vez. — Rom, você me sente? Me ouve? Vamos, eu sei que você é um lutador.

Seu estômago se revirou ameaçadoramente, mas um ataque violento de dor centrado em sua cabeça e pescoço estilhaçou seu enjoo. Suas mãos se cerraram involuntariamente e ele sentiu os dedos se soltarem de novo.

Você não deveria tê-lo deixado nos destroços; você deveria tê-lo libertado enquanto teve a chance.

Um gemido escapou de sua garganta antes que ele pudesse detê-lo.

As mãos reconfortantes pararam. — Muffin! Ele está acordado! ROM! Você me ouve?

Rom abriu um olho, depois o outro, apertando os olhos em meio a uma névoa de dor para um borrão de cabelo escuro emoldurando um rosto pálido e olhos brilhantes e inteligentes que viam e entendiam cada nuance de sua alma.

O anjo.

Seu coração se encheu de alegria e admiração.

Mas ela não o abandonou? Ele não tinha saído de lá também? Perplexo, ele procurou o céu acima. Era opaco, metálico... Sem estrelas.

Dez dedos firmes pressionaram levemente sua mandíbula. — Tente não mover o pescoço. — Ela retomou suas carícias calmantes, seu rosto mais perto agora.

Ele ouviu uma voz masculina então, e ficou confuso. — A força cinética jogou você na escotilha. Vamos pegar uma maca para levá-lo à enfermaria.

— Você vai ficar bem — a mulher sussurrou em sua voz com sotaque. Rom se ergueu pesadamente, apertando as mãos para embalar seu rosto. Em transe com seus lábios docemente curvos - tentadores, cheios, feitos para beijos, seus beijos e uma centena de outras atividades eróticas que ele visualizou com muita facilidade - ele a puxou para ele. Ela trancou os braços para mantê-lo afastado, as mãos espalmadas sobre o peito dele.

— Oh, agora veja quem está se sentindo melhor.

— Mas é aqui que nos beijamos. — Ele franziu a testa, concentrando-se fortemente. — Sim, tenho certeza de que é o que vem a seguir.

— Não, meu doce e confuso homem. Script errado. — Então ela sorriu em meio às lágrimas. Lágrimas? Ele enxugou a umidade com os polegares. A vergonha envolveu sua inteligência dispersa. Claro. Ele a tinha desapontado, falhado com ela, assim como com sua família. Como ele poderia esperar que ela - ou qualquer pessoa - obedecesse a sua abdicação impulsiva de responsabilidade? — Eu não deveria ter deixado meu irmão vir. Ele deveria ter ficado em casa - seguro - não aqui.

Ela o olhou fixamente por um momento, então soltou um grito suave. Ela agarrou as mãos dele e as esmagou contra os lábios. — Não, Rom; foi Zarra. Zarra. Não seu irmão. Você entende? Ele está bem - machucado como você, mas você o salvou.

A voz masculina disse: — O gerador de gravidade está funcionando de reserva e a tripulação de Terz está trabalhando nos reparos do casco. Gann chamou da ponte - a integridade estrutural está intacta.

Rom sabia que o que acabara de ouvir era significativo, mas pela vida dele, ele não conseguia descobrir o porquê. A mulher colocou as mãos de seu anjo em seu estômago. Ela falou devagar, sua fala um tanto hesitante.

— Você está no Quillie. Uma nave espacial. Você é o capitão dela... Um capitão muito heroico.

Um herói? Como pode ser isso? A declaração dela divergiu tanto de sua visão de si mesmo que ele deixou seus olhos se fecharem para esconder a esperança que ele temia espreitando lá. A agonia trovejava em seu crânio a cada batida de seu coração, mas ele flutuava, impulsionado por uma estranha vertigem de espírito, algo que ele tinha certeza de nunca ter sentido antes.

Houve um estrondo, o murmúrio urgente de vozes profundas. Apoiando seu pescoço e ombros, vários homens o levantaram. A dor disparou de um lado a outro de sua cabeça, terminando em um formigamento estranho e gelado em seu pescoço, desaparecendo quando um adesivo de remédio foi pressionado sob seu queixo. As mãos mágicas e curativas da mulher percorreram seu rosto e cabelo mais uma vez, depois se retiraram. Desolado, ele tentou chamá-la, mas a droga era muito poderosa e tudo o que emergiu foi um murmúrio rouco.

É aqui que ela o abandona sem sequer olhar para trás.

Ele fechou a boca antes de exibir qualquer coisa que pudesse ser interpretada como carência.

— Vejo você quando acordar, Rom.

Ele enrijeceu ao sentir o hálito dela úmido e quente contra seu ouvido, carregado de promessas que sabia que ela não iria cumprir.

— Sim, vou ficar com você...

A inevitabilidade de sua traição o fez companhia enquanto ele começava a longa volta para a escuridão.

 


Ele acordou para um mundo etéreo onde a dor e o tempo não existiam. Um colchão macio substituíra o chão frio e duro sob suas costas. Alguém esfregava seu rosto e pescoço com um pano úmido, perfumado com uma fragrância que ele reconheceu - um usado para curar o corpo e o espírito, lembrando-o dos céus cor de melão sem nuvens e areias frescas de um amanhecer em Sienna. Ele vagou por um tempo em meio a mil lembranças, se viu como um adolescente jogando bajha com seu pai, então, muito mais jovem, sentado aninhado com sua querida irmã no colo de sua mãe enquanto ela lia para eles. Ele teria rido, se tivesse sido capaz, ao se lembrar de ter corrido pela areia com seu irmão mais novo Jhon, ansioso para pegar um dos indescritíveis quillies turquesa com faixas verdes do planeta. As imagens o deixaram com uma saudade tão grande que lhe tirou o fôlego. Ele sentia falta de sua família.

Em um choque de autoconsciência, ele enfrentou o vazio dentro de si. Apesar de todo o seu sucesso como contrabandista e de sua posição sólida, embora um tanto desonrosa, na fronteira, ele não era diferente dos vagabundos do espaço que desprezava - solitário, ressentido e sofrendo de uma falta de propósito inerente.

Talvez seu pai estivesse certo sobre ele.

Um som o distraiu de sua triste epifania. A mulher que o ajudava estava meio cantando, meio cantarolando uma canção em voz baixa enquanto pressionava um pano úmido e frio em sua testa.

O anjo!

A letargia drogada manteve seus olhos fechados, então ele ouviu a música suave. Parecia maternal, mas ao mesmo tempo profundamente sensual, e estava em uma língua estrangeira que parecia familiar. Palavras da terra.

As imagens do anjo e Jas Hamilton se fundiram. Ela disse que iria ficar... E ela ficou. Ela não deu as costas para ele, como seu pai e sua família fizeram. O espanto e o alívio penetrante o invadiram, como se ele fosse um homem que acabara de mergulhar em sua perdição, apenas para ser inesperadamente pego.

E se ela estivesse igualmente desamparada dentro da estrutura da visão? Ele nunca havia considerado a possibilidade de que sua partida pudesse não ter sido de sua própria escolha, que, talvez, ela tivesse tido permissão para ficar apenas para lhe dar vontade de terminar sua tarefa naquele dia. Em vez disso, ele a culpou pelo que poderia estar além de seu controle.

Enquanto ele sucumbia ao sono drogado, ele soltou um suspiro mental longamente contido. Pela primeira vez em anos incontáveis, seus sonhos continham esperança.

 


Rom piscou rapidamente. Sua visão estava turva e seus olhos corajosos. Indo e voltando, ele se sentia como se tivesse passado um mês bebendo em um bar de bordo da fronteira. Ele engoliu em seco contra uma garganta áspera e balançou a cabeça de um lado para o outro, depois flexionou os braços. Rigidez, mas sem dor. Sem tontura, também, o que indicava que ele havia sido retirado das drogas curativas e bloqueadores da dor, o que significa que ele provavelmente havia se recuperado. Ele não estava sozinho, entretanto.

Ele ouviu uma fungada longa e lânguida, seguida de uma fungada completa. — Jasmim? — Ele perguntou com uma voz rouca. A mulher roncava como um dragão Taangori.

Rom se apoiou nos cotovelos para olhar ao redor, então deu uma risada rouca ao ver Muffin, desmaiado, afundado em uma cadeira ao pé de sua cama. A cabeça do homem estava inclinada para trás e suas mãos do tamanho de um prato de jantar estavam abertas, uma em cada coxa, apoiando-o na vertical.

Outro ronco trêmulo, então um suspiro vigoroso. Rom se acomodou no travesseiro e entrelaçou os dedos atrás da cabeça. — Muffin, se os sons que saem de sua boca são qualquer indicação de sua necessidade, sugiro que você contrate uma servidora de prazer assim que atracar no Depósito.

Seu guarda-costas acordou de repente. Instantaneamente alerta, Muffin varreu seu olhar frio ao redor do quarto. Concentrando-se em Rom, ele se iluminou, abrindo um sorriso. — B'kah.

Rom bufou. — Tão protetor.

O sorriso de Muffin se espalhou. Ele se recostou na cadeira e enganchou os polegares na cintura, tamborilando oito dedos grossos contra as coxas enormes. — As chances eram contra você ser assassinado em sua cama em sua nave. Além disso, você sabe que me sinto mal se perder minha soneca do meio-dia. — Rom também sabia o quão rápido Muffin poderia se transformar de um cochilo satisfeito em um combatente letal. O gigante se levantou da cadeira. — Quanto ao Depósito, estarei empregando duas servidoras de prazer lá, não uma. Três, se eu puder pagar.

Rom perguntou suavemente: — Tudo de uma vez?

— Uma após a outra, após a outra. — Impermeável à risada de Rom, Muffin colocou outro travesseiro sob os ombros de seu capitão para ajudá-lo a se sentar. — Com todo o respeito, B'kah, você me manteve longe do porto por muito tempo desta vez. — Ele despejou água em um copo.

Depois que Rom bebeu até se fartar, Muffin foi até o painel de controle ambiental e ajustou as configurações para aquelas mais adequadas para um homem saudável do que para um doente. Uma vez satisfeito com as luzes e temperatura, ele relatou os eventos que levaram aos ferimentos de Rom.

À luz da descrição sangrenta de Muffin de sua concussão severa, Rom fez um inventário cauteloso, mas completo, do resto de suas partes do corpo. Tudo ainda estava conectado e parecia estar funcionando corretamente.

Muffin tornou a encher seu copo. — Desde que Zarra voltou ao trabalho, tudo o que ele fala é como você salvou a vida dele.

A água que Rom acabara de engolir caiu em sua barriga como uma pedra fria.

— Capitão B'kah isso, Capitão B'kah aquilo — Muffin imitou em uma voz cantada. — Como salvar um gato ketta se afogando. Você ganhou um aliado para a vida.

— Redirecione a gratidão do menino. Se Terz não tivesse fechado a escotilha, ele estaria morto agora.

— Mas você...

— Apenas fatos, por favor — Rom retrucou. Eu não sou um herói. — Há quanto tempo estou desmaiado?

Muffin olhou para ele com algo semelhante a pena. Rom apertou a mandíbula e se virou. — Quanto tempo?

— Uma semana padrão. Eu cuidei de suas necessidades pessoais. Jas ficou com você o resto do tempo.

Muffin apontou com o polegar um ninho de travesseiros empilhados perto da cama de Rom. Eles tinham uma marca na forma de um corpo, revelando que Jas realmente tinha ficado com ele dia e noite. Como caçar contas de um colar quebrado, Rom recuperou as imagens dispersas restantes de uma semana de semiconsciência drogada. As poucas memórias que ele pode salvar formaram uma linha frágil de carícias ternas e palavras carinhosas - Jas. Seu peito se apertou com força.

— Onde ela está?

— Na ponte — Muffin disse casualmente. — Gann pretendia levar o Quillie de volta à velocidade da luz esta manhã, mas Terz queria inspecionar os reparos da porta primeiro. Não aquela que você amolgou com a cabeça, B'kah, a outra. Ele tem quatro homens vestidos e do lado de fora. Então Jas perguntou se ela poderia substituir o piloto de plantão.

— O que! Ela está pilotando a nave? — Rom se sentou ereto. — Agora? — Muffin sorriu, e ele afundou contra os travesseiros, murmurando, — Eu tenho homens amarrados do lado de fora da nave, e uma mãe de dois filhos em busca de aventura e estourando a safra nos controles. Uma mulher da fronteira, nada menos. O que eu esperava depois de dormir por uma semana? — Rom olhou ao redor de seus aposentos. Não houve lançamento ou rolamento adverso. E nada foi derrubado, pelo que ele poderia dizer. — Vejo que ela teve o bom senso de manter a nave no aviador automatizado.

— Na verdade, ela está voando manualmente.

Rom soltou uma risada de orgulho e surpresa. A mulher gentil e carinhosa que cuidou dele por uma semana estava lá em cima pilotando sua nave com controle manual como uma veterana espacial experiente. Isso despertou seu desejo de vê-la novamente. Infelizmente, seu corpo ficou para trás de seu espírito enquanto ele lutava para se livrar do cobertor. Seus músculos tremiam pela falta de uso enquanto ele se dirigia para o chuveiro higiênico com um andar nitidamente instável.

Enquanto a água sibilava, Muffin moveu-se para o lado do recinto e comentou: — Acho que você fará uma aparição na ponte.

— No momento em que estiver apresentável. — Rom mirou os pulverizadores em seus ombros, arqueando-se para trás na água até que as torções diminuíssem de seus músculos nodosos. — Parece que fui jogado de lado por uma caixa de metal e parafusos. É hora de avaliar a competição e ver se tenho chance de reconquistar o afeto da senhora.

— Como se você já não os tivesse.

O grandalhão saiu pela porta antes que Rom tivesse a chance de reagir.

 


Após uma busca infrutífera na parte principal da nave, nas áreas de armazenamento de carga da popa, nos corredores de nível médio e na arena bajha, Rom parou perto da escada que conduzia ao convés inferior. Ele não conseguia entender por que ela estaria lá embaixo, mas ele sentiu, de alguma forma, que ela estava. Suas pernas protestaram contra o esforço de descer a escada. Levaria algum tempo para trazer sua força de volta ao que era. Enquanto seus olhos se ajustavam à luz fraca, ele encostou as costas na passarela e ouviu as batidas do gerador de gravidade e o ronronar incessante dos recicladores de ar. Eles eram os sons de uma nave saudável.

Jas estava sentada de pernas cruzadas no chão em frente à escotilha para a sala do gerador, desenhando algo vigorosamente no bloco de papel em seu colo. A visão dela, tão séria, tão absorta em sua obra de arte sentada no meio do chão de um pedaço frio e impessoal de trillidium, acendeu algo dentro dele, algo fundamentalmente quente e necessário, como o desejo que ele experimentou ao relembrar sua infância. Os zíperes de seu macacão preto folgado e as pulseiras prateadas brilhavam na luz fraca do teto. Cada vez que ela se inclinava sobre o desenho, seu cabelo comprido e solto se espalhava para a frente como um véu. Só quando ela o jogou para trás, ela permitiu que ele visse seu perfil - uma boca macia e expressiva aninhada perfeitamente entre um nariz reto e forte e aquele queixo teimoso. Seu rosto era um estudo de contrastes, como tudo o mais que ele descobrira sobre ela até agora.

Com cuidado, ele se agachou na frente dela e ela deixou cair o lápis. Com suas bochechas coradas, olhos escuros e lábios entreabertos de espanto, ela parecia uma mulher que tinha sido interrompida no meio de uma relação sexual. A visão imaginária dela embaixo dele, seus corpos intimamente unidos, conjurou uma pulsação maçante e quente em seu pênis. Ele tentou ao máximo ignorar e pegou o lápis rolando pelo chão.

— O que, posso perguntar, atrai você para a parte mais fria e escura da nave?

— Você. — Seu sorriso era infundido com calor e boas-vindas, e seus olhos não mostravam a cautela dos dias anteriores ao ferimento. — Muffin me disse que as drogas iriam passar hoje, mas eu não esperava que você acordasse tão cedo. Quero te mostrar uma coisa, mas preciso de mais alguns minutos. — Seu básico tinha se tornado notavelmente suave e coloquial. — Você se importa? — ela perguntou. — Estou quase terminando.

Ela procurou em uma bolsa, escolheu outro lápis atarracado de ponta macia e voltou a trabalhar com uma intensidade que o deixou pasmo. Sua mão esquerda moveu-se rapidamente sobre a página, dois dedos segurando o lápis, enquanto os outros estavam empenhados em fazer sombras e manchas.

Isso era paixão em sua forma mais pura, ele pensou. Não claramente ensaiado, como suspeitava das hábeis servidoras de prazer do palácio de seus dias pré-Balkanor, ou modificado para se adequar a um parceiro, como se esperava de uma servidora do prazer. Não, essa paixão surgia de sua alma e o humilhou.

A mão de Jas diminuiu a velocidade, depois parou de se mover. Ela examinou seu trabalho, então ele, massageando a parte inferior de suas costas.

— Você parece melhor — disse ela. — Como você está se sentindo?

— Como na manhã seguinte a uma longa noite de excessos, mas sem o benefício de ter me divertido.

Ela riu. — Se alguém merece um bom tempo, é você. Você mergulhou por aquela escotilha sem pensar na sua própria segurança. É tudo sobre o que a tripulação está falando. — Seu rosto brilhava com admiração inconfundível.

Ele recuou, e uma onda de memórias sombrias o invadiu - a fúria de seu pai no dia em que descobriu que seu único filho restante não poderia gerar um filho, o choro angustiado de sua mãe e a sensação do abraço frenético de sua irmã momentos antes de as portas serem batidas atrás dele após sua expulsão do palácio - o único episódio em onze mil anos.

Ele falhou com sua família, seu povo. Ele não era um homem que merecesse tanta estima.

— Faz-me desejar ter as tintas que deixei em casa — continuou ela. — Não que eu tenha a habilidade de realmente capturar o que aconteceu. — Quase timidamente, ela colocou o bloco no colo dele. — Uma representação bastante inadequada do maior ato de bravura e abnegação que já testemunhei.

A boca de Rom ficou seca. Era uma ilustração de dois homens em uma luta de vida ou morte. Um homem, esparramado de bruços, tinha um rosto que parecia o seu - Grande Mãe, era ele. Ele estava segurando a mão de Zarra como se recusasse a soltar, a tensão evidente nos músculos fortes ondulando a pele de seu antebraço. Seus dentes estavam à mostra, seus olhos escuros de dor e determinação. Detritos girando emolduravam toda a cena, que continha toda a emoção e drama da vida.

Exceto que representava uma mentira.

— Você faz um trabalho excelente. — Ele colocou o retrato no chão. Seu cansaço havia voltado e ele se acomodou no chão, as pernas esticadas à sua frente enquanto sustentava seu peso com as mãos. Seu pulso batia em suas têmporas, ameaçando transformar a pressão em dor. — No entanto, uma representação mais precisa me mostraria libertando-o. — Ela inclinou a cabeça, como se não tivesse certeza de ter ouvido bem. — Eu soltei a mão de Zarra — ele esclareceu.

— Mas você o segurou por aqueles segundos críticos. Isso atrasou seu deslizamento pelo chão da sala do gerador. Isso deu a Terz a chance de fechar a escotilha. A única razão pela qual ele está vivo é porque você o segurou por tanto tempo.

— Não me transforme em um herói. — Você o deixou; você deveria ter ficado. — Eu deixei o menino ir.

— Irrelevante.

— Imperdoável. — Ele respondeu.

Jas olhou em descrença quando uma ponta da boca de Rom se curvou em um sorriso malicioso. O homem que ela começou a conhecer se foi. Em seu lugar estava o contrabandista arrogante, um homem que sorria enquanto seus olhos exibiam uma tristeza desconhecida. — Este não é um simples caso de modéstia, é? — ela perguntou. Tremendo, seu coração disparado, ela se agachou ao lado dele. — Você é um herói, Rom. E não importa o quanto você tente me convencer do contrário, é assim que eu vejo você. E é assim que seus homens veem você. Por que você não vê também?

Uma pequena cicatriz acima de seu lábio superior se esticou quando ele desenhou uma linha estreita com a boca. — Quase vinte anos padrão atrás, lutei em uma guerra - o primeiro conflito verdadeiro em onze mil anos. Meu irmão mais novo se juntou a mim... Sem a permissão do meu pai. Mas ele era um bom lutador, um piloto excelente, então eu o deixei vir. Balkanor foi a batalha crucial, que planejamos por um ano inteiro. Foi uma invasão em grande escala, o culminar de muita coragem e trabalho árduo. — Silenciosamente, ele concluiu: — Vencemos a guerra naquele dia. Mas eu perdi Jhon.

Seu coração se torceu. — Sinto muito — ela sussurrou. — Mas ele te seguiu na batalha porque ele quis. Ele era um soldado. Soldados morrem.

— Você não entende! Sua nave sofreu danos durante a batalha espacial. Ele sobreviveu ao acidente, mas ficou preso lá dentro. Decidi continuar, com a intenção de voltar por ele. Mas - Grande Mãe - sua nave explodiu. Eu deveria tê-lo libertado enquanto tinha chance! Eu não deveria ter deixado ele sozinho.

— Você é um guerreiro, Rom. Você fez o que tinha que fazer.

Seu olhar ficou frio. — Eu tive uma escolha, Jas. Eu fiz a errada. — Ele se levantou. — Agora, se você já acabou com suas perguntas...

— Eu não acabei.

A surpresa cintilou em suas belas feições e ele ergueu uma sobrancelha. Cruzando os braços sobre o peito, ele tamborilou os dedos contra os bíceps em um ritmo agitado, mas ela se recusou a deixá-lo intimidá-la. Ela sabia o que era se sentir desolada por dentro e não saber por quê.

— Eu descobri por que você e Gann são tão diferentes do resto da tripulação. Por que sua pele e cabelo são mais escuros e seus olhos são mais claros.

Seus dedos pararam de tamborilar.

— Vocês são Vash Nadah, membros da classe dominante. Você foi criado com um rígido código de ética que só um deus poderia seguir perfeitamente. Eu sei como eles são rígidos... Eu os li!

Rom girou para longe e caminhou até a escada que levava ao convés superior. Lá ele parou, cabeça baixa, ombros curvados, seus dedos curvados sobre um dos degraus.

Jas o seguiu, rezando para que seus instintos estivessem certos. — Mas talvez você seja um deus. Afinal, você não comete erros.

Ele se virou, seus olhos cor de mel inundados de angústia. Seus olhos queimaram em resposta. A profundidade da empatia que ela sentia por este homem que ela havia conhecido tão recentemente a oprimia.

Com pesar, ele disse: — Já cometi muitos.

— Ahá! Você é um mero mortal, assim como o resto de nós. Mas, em vez de aceitar isso, você se pune continuamente. Já se passaram anos! Você mais do que pagou sua penitência pela morte de Jhon. Deixe para lá. — Ela implorou a ele.

Ele poderia? Rom se perguntou. Ele poderia deixar isso ir? Ele estivera correndo, escolhendo os passatempos mais perigosos e frenéticos, evitando qualquer coisa que cheirasse a contentamento e estabilidade. Ele bateu dois dedos no peito.

— Temo que, se deixar esse vazio se fechar, vou esquecer tudo o que perdi. Não vou desperdiçar o sacrifício do meu irmão.

— Eu não estou pedindo a você. Mas talvez haja outras maneiras, maneiras melhores de honrar a memória dele, do que carregar a dor de sua morte para o túmulo.

Eles se encararam até que o próprio ar ressoasse com emoção. Rom se sentia machucado tanto por dentro quanto por fora. — Talvez — ele respondeu finalmente.

Isso pareceu agradá-la. Esgotado, ele instintivamente procurou a ternura que ela tão generosamente comunicou e puxou-a para perto. Roçando os lábios nos dela, ele acariciou seus cabelos com as palmas das mãos.

— Por que você se preocupa com minhas preocupações? — ele murmurou.

— Porque eu me importo com você — ela sussurrou e ficou na ponta dos pés para beijá-lo - levemente, e com contenção óbvia. Seu corpo era outro assunto. Era um traidor de seus lábios, pressionando contra ele, a sensação exuberante de seus seios macios e cheios e os quadris balançando suavemente tornando-o instantaneamente duro. O beijo se transformou em um abraço sem fôlego antes de se separarem.

Segurando gentilmente seus braços, Rom sentiu o calor de sua pele através do tecido. Seu aroma levemente floral flutuou no ar entre eles. Ela disse que se preocupava com ele. Seu pai não disse o mesmo uma vez? Ele sucumbiu ao desejo irracional de testá-la, pois quando ela descobrisse quem ele era... — Você tem alguma ideia de quem eu sou?

Com aquele jeito intuitivo às vezes perturbador, às vezes estimulante, ela estudou seu rosto. — Sim. Eu tenho.

Ele passou uma mão pelo cabelo.

— Você é Romlijhian B'kah — Grande Mãe. — E você é o único filho do homem mais rico e poderoso da galáxia.


CAPÍTULO 9


Rom deu um passo para trás. A adrenalina corria por suas veias e suas mãos tremiam, mas ele usou anos de disciplina para manter a compostura.

Ela encolheu os ombros. — Não admira que você precise de um guarda-costas.

Ele sacudiu as mãos no ar. — É isso aí? Isso é tudo que você vai dizer? Não é à toa que preciso de um guarda-costas?

— O que eu devo falar?

— Certamente, você pode encontrar algo. Sou a maior mancha em uma história familiar de onze mil anos. Por todos os céus, a única mancha!

— Não acredito. Aposto que meu último grão de sal que o seu estimado fundador da família também foi considerado um criador de caso, quando ele e os outros guerreiros enfrentaram aquele louco senhor da guerra.

— Os oito guerreiros originais - criadores de problemas! — Ele rugiu, incrédulo. Uma sensação vertiginosa de liberdade o inundou e ele riu, realmente riu, balançando a cabeça. — Jas, só você poderia pegar algo tão vão e pesado como a história dos Vash e torná-lo totalmente divertido.

Ela olhou para ele, perplexa. Ela não entendia o humor de tudo isso, ele adivinhou. Mas então ela não teve sorte - ou era uma desgraça? - ter sido criado como ele foi. Ele apertou as palmas das mãos nas têmporas, depois baixou as mãos.

— Quem te contou sobre mim?

— O computador da nave.

— Fui ao Inferno e voltei. O que a levou até lá?

— Eu o estava usando para planejar minha viagem - e para estudar arte e história galáctica. Mas eu não descobri sobre sua família até que descobri como ler seu anel de sinete.

Sua mão esquerda se fechou involuntariamente, fazendo com que o anel mordesse sua carne.

— Eu o tirei depois que você se machucou, porque temia que seu dedo pudesse inchar — ela explicou. — Tentei ler o brasão de sua família, mas não consegui. Então pesquisei no banco de dados de tradução de idiomas e comparei os símbolos - 'lealdade, fidelidade, família', o código do guerreiro. Isso me levou à história de Sienna, e foi aí que encontrei a lista de todos os filhos primogênitos B'kah. No fundo estava o seu. Eu descobri o resto.

— Há quanto tempo você sabe?

— Quase uma semana padrão.

Ele exalou. — Grande Mãe...

— Rom. Isso não muda o que sinto por você. Na verdade, eu o respeito mais. Você sacrificou tudo por uma causa em que realmente acreditava. Acho isso incrivelmente heroico.

Ele olhou para ela. Ela o admirava exatamente pelas coisas que os outros desprezavam nele. Uma estranha sensação de maravilha o encheu e muito mais. Ele procurou as palavras certas para expressar seu apreço pela incomum leveza de espírito que ela evocou, mas não encontrou nenhuma.

— Obrigado — disse ele, sabendo que a declaração era totalmente inadequada. — Estou em débito com você.

Ela acenou para longe sua gratidão.

Ele pegou as mãos dela, sorrindo gentilmente. — Lição número um do comércio - um comerciante honesto sempre paga suas dívidas. — Ele enrolou a mão atrás da cabeça dela e deu um beijo prolongado em seus lábios.

Seu queixo permaneceu inclinado para cima depois que ele se afastou. Ela disse: — Hmm. E a lição número dois?

— Reconheça os talentos dos outros. — Ele tocou a ponta do nariz com o dedo. — Você, por exemplo, é uma mulher de muitos. Voar, para citar apenas um.

— Quem te contou?

— O capitão vê tudo, sabe tudo.

Ela riu. — Certo. Quem me entregou?

— Muffin. Quando eu acordei.

— Não culpe Gann por me deixar voar — disse ela rapidamente. — Eu o assediei até que ele desistiu.

— Culpá-lo? Por tudo que é sagrado, vou agradecê-lo. Isso me leva à lição número três - pegue os ditos talentos e tire proveito deles. Eu seria um tolo se não fizesse isso, Jas. É difícil encontrar bons pilotos. Agora que o fiz, devo aproveitar minha boa sorte.

— Oh? — Ela perguntou, cética. — Quanto?

— Você está contratada.

Jas piscou. — Eu estou o que?

— Contratada. — Os olhos felinos de Rom a observavam atentamente. — Estou oferecendo a você uma posição no Quillie. Piloto aprendiz. Gann vai treinar você. Com suas habilidades, você receberá o status regular dentro de um ano.

— Você está falando sério.

Ele sorriu.

— Obrigada, mas eu não posso...

— Benefícios completos. Um bom salário.

Ela deu uma risadinha. — Plano de aposentadoria?

— Ah não. Infelizmente, ninguém durou tempo suficiente no emprego para exigir um.

— Oh, isso é encorajador. Não é à toa que você está desesperado para contratar uma piloto que não voa há quase vinte anos. — Ela sorriu com o entusiasmo dele.

— Venha trabalhar para mim.

— Eu não posso.

— Por que não?

— Porque...

Porque vou me apaixonar por você. Ela fechou a mandíbula, agradecendo suas estrelas da sorte por não ter soltado aquela bomba em voz alta. Se ela deixasse seu coração afastá-la de seus objetivos, ela estaria repetindo o maior erro de sua vida. — Vim aqui pela aventura. Eu quero seguir em frente. Para ver e fazer as coisas tão distantes da minha vida na Terra quanto possível.

— Ah, claro. Suas férias mal começaram. Vamos viajar primeiro, então.

— Nós?

— Sim. Nós. — Seus olhos brilharam. — Garanto que as viagens que vivenciaremos juntos serão muito mais emocionantes do que aquelas que você faria sozinha.

Sua pele arrepiou-se de excitação, a mesma sensação que sentia ao enfrentar uma tela limpa, pincel molhado na mão. Ela se fortaleceu contra a sensação; ela não deveria permitir que suas emoções indignas de confiança destruíssem sua lógica fria.

No entanto, talvez um pouco de loucura, um pouco de impetuosidade pudesse ajudá-la a aceitar o vazio frustrante dentro dela. De algum lugar lá no fundo, Jas reuniu um pedaço de determinação; ela certamente não tinha alcançado tudo o que tinha em sua vida tomando o caminho mais fácil.

— E quanto ao Quillie? — Ela perguntou, olhando para ele especulativamente.

— Vou dar a minha tripulação a escolha de tirar licença da costa ou continuar no Sistema Quibba, nossa próxima parada após a Destruição da Caveira. Caso optem pelo lucro ao invés do prazer - o que eu suspeito - Gann assumirá o controle na minha ausência. Vejo isso como uma oportunidade perfeita para testar sua teoria de que devo me divertir mais. Que maneira melhor do que mostrar a galáxia?

Ela encontrou o olhar estranhamente perceptivo de Rom. Seu coração deu um salto e ela se sentiu vívida e totalmente viva. Não foram os sentimentos que corriam por ela a razão pela qual ela deixou sua casa e família em primeiro lugar? Sim, alguns meses passados com Rom seriam exatamente o tipo de aventura de que ela precisava.

— Sim — disse ela antes de perder a coragem. — Aceito ambas as ofertas. Viajar e voar, mas não permanentemente — ela lembrou a ele e a si mesma — porque prometi aos meus filhos que estaria em casa em seis meses terrestres.

— Compreendo. — De repente, parecendo cansado, Rom passou os dedos pelos cabelos, fazendo com que algumas mechas brilhantes caíssem sobre sua testa machucada. Grande parte da cor havia sumido de sua pele. — Certamente, existem locais mais hospitaleiros nesta nave para planejar nosso itinerário. — A fadiga tornou sua voz rouca e profunda.

Seus instintos de cuidadora ganharam vida. Ela agarrou seu braço e o empurrou em direção à escada. — Você não deveria estar aqui. Você deveria estar na cama.

— Sim. Nós deveríamos.

Com as mãos no degrau do meio, ela olhou para ele de esguelha. — A falta de persistência não é um dos seus defeitos.

Sorrindo, ele subiu atrás dela.

— Então, o que é Destruição da Caveira? — Ela perguntou enquanto eles caminhavam pelos corredores de nível médio para seus aposentos. — Parece proibitivo.

— É, para os não iniciados. A Destruição é um posto avançado quase sem lei - dois dias de viagem de ida e volta do Depósito à velocidade da luz. A Polícia Comercial quase sempre lavou as mãos disso, o que convenientemente o torna o único lugar decente para o comércio fora da fronteira. Prometi que entregaria algumas mercadorias a um pequeno comerciante peculiar que diz que só negociará comigo. Por causa do risco, prefiro que você espere por mim no Depósito.

Depois de digitar o código para a porta da sala que se tornou mais familiar para Jas na última semana do que a dela, Rom pressionou a palma da mão nas costas dela, guiando-a para dentro. O lindo tapete cobrindo grande parte do chão abafou imediatamente seus passos. O tapete parecia um kilim turco, tingido em tons ricos e macio como pele de coelho. Rom reduziu a iluminação para um brilho confortável, então acendeu uma bola de calor sob uma tigela de óleo perfumado transparente em forma de concha. O calor liberou a fragrância que ela passou a amar. Cheirava a amanhecer na casa de Betty em Sedona, onde ela costumava levar o café para fora para tomá-lo no deque enquanto o sol nascia. Jas tinha sido informada que o cheiro era terapêutico, e ela podia acreditar - passando as noites em um ninho de travesseiros ao lado da cama de Rom, ela nunca tinha dormido melhor.

Enquanto observava Rom definir seu corpo de guerreiro ágil para tarefas domésticas simples, ela começou a se perguntar por que ninguém durava muito em seu serviço. Quanta aventura ela se inscreveu? Ela cruzou as mãos atrás das costas e casualmente se balançou nos calcanhares.

— Então, o que aconteceu com aqueles homens que não conseguiram se aposentar?

— Estou tentado a tecer histórias de serpentes famintas e bandidos assassinos que atacam mulheres que recusam minhas ofertas de emprego — ele começou, sentando-se na borda do colchão para tirar as botas. O cheiro de couro aquecido pela pele misturado com o incenso. — Mas eu não tenho coração. — A alegria afetuosa e a luz das velas tornavam seus olhos da cor do mel quente. Ela nunca imaginou que poderia haver tanta comunicação entre duas pessoas apenas pelo contato visual.

— Os homens simplesmente seguiram em frente — disse ele por fim. — Encontraram o que consideraram melhores oportunidades. Um sujeito, meu primeiro engenheiro, economizou seu pagamento e comprou uma pequena nave para si mesmo. Mas a maioria voltou para as partes mais populosas da galáxia para se casar e criar filhos. A fronteira não é lugar para uma família.

— Você nunca quis filhos? — Ela perguntou.

Os músculos de sua mandíbula se contraíram e se soltaram. Ele torceu o grosso anel de ouro com sinete que usava na mão esquerda e cuidadosamente o colocou em uma bandeja ao lado de sua cama. — Crescendo, não pensei muito se os queria ou não. Era esperado que eu os tivesse. A ironia é que nunca tive.

Ela supôs que ele não queria expor as crianças aos perigos da vida na fronteira. — Talvez você mude de ideia algum dia. Acho que você seria um pai maravilhoso.

Algo insuportavelmente triste brilhou em seus olhos. — Sofri envenenamento por radiação durante a guerra. O dano foi irreparável. Nunca haverá filhos.

— Eu sinto muito.

Pensativo, ele apoiou os antebraços nas coxas. — Eu matei Sharron. Isso é o que torna minhas circunstâncias suportáveis.

— Sharron, uma figura religiosa renegada. Eu li sobre ele em uma seção intitulada 'A Revolta Não Autorizada'.

— É assim que eles estão chamando agora? — Sua boca se torceu em desgosto e ele balançou a cabeça. — Nunca entendi por que as famílias não agiram. Sharron ressuscitou o armamento proibido desde os Anos Sombrios. Ele defendia tudo que os Vash desprezavam. 'Sexo é pecado', ele pregava.

— Mas se ninguém sob seu controle fazia sexo, então como eles planejavam... — Ela acenou com a mão, em busca de palavras.

— Procriar?

— Sim.

— Sharron e seus anciãos escolhidos engravidavam as mulheres. Então, uma vez que as mulheres completavam seus deveres de gravidez, ele as recompensava enviando-as em uma jornada para o futuro.

— Mas não é esse o seu termo para onde você vai quando morre? — Em seu aceno, o sangue foi drenado de seu rosto. — Ele levou seus bebês? E então as matou?

Ele a cumprimentou com um breve aceno de cabeça, em seguida, começou a desfazer os fechos de cima de sua camisa iridescente verde-oliva escura. — Depois de toda a espionagem que fizemos, depois de todas as vidas perdidas, nunca provei essa alegação. Se eu tivesse feito isso, talvez pudesse ter reunido o apoio de que precisava. Em vez disso, fiquei com algumas dezenas de imagens holográficas de mulheres sendo carregadas em naves e levadas embora.

— Por que diabos alguém adoraria um monstro assim?

— Ele era extremamente magnético e inteligente. Ele ofereceu o que os Vash Nadah não oferecem - a promessa impossível de uma sociedade sem classes e aceitação geral para aqueles que optaram por não seguir nosso rígido código moral.

— O Tratado de Comércio. — Ela murmurou.

— Sem necessidade de ter uma família, sem pressão para permanecer fiel ao marido ou à esposa. Sem pressão para ter um marido ou esposa, ponto final.

Ela pensou em suas próximas viagens. — Eles ainda não estão por aí, espero.

— Talvez alguns resquícios de seu culto permaneçam. Meus soldados nunca encontraram os homens que escaparam com seu corpo. Só posso presumir que eles fugiram para um mundo remoto para enterrá-lo. — Distraidamente, seus dedos roçaram seu peito. — Eles usavam medalhões - uma gravura das mãos unidas de um homem e de uma mulher sob um sol nascente. — Ele olhou para algum lugar no passado. — Eu parei de rastrear suas atividades depois da guerra quando voltei para casa para me recuperar dos meus ferimentos. Mas, uma vez que o cirurgião da família interpretou os resultados do exame médico e os anunciou a meu pai, nada mais importou.

— Sua incapacidade de ter filhos. — Ela sussurrou.

Ele assentiu. — Meu pai queria um herdeiro funcional. Como eu não poderia ser aquele herdeiro, ele me mandou embora.

— Onde você foi?

— Para me perder no que você chamou de minhas aventuras — ele disse ironicamente. — Meu irmão - e melhor amigo - estava morto. A mulher com quem eu estava prometido não falava comigo... Não que eu quisesse caridade ou simpatia das outras sete famílias. Então, eu vaguei pela galáxia, quase fiquei viciado em analgésicos por um tempo. Depois disso — ele disse baixinho — parei de viver completamente.

Arrepios subiram na ponta dos pés por seus braços com sua admissão inesperada e de partir o coração. Depois do saudita, ela também parou de viver. — Talvez nós dois precisemos viver um pouco.

— Concordo.

Eles trocaram sorrisos cansados. Em seguida, ele se acomodou de costas e colocou um braço flexionado atrás da cabeça. Estendendo o outro em um ângulo reto com seu corpo, ele acenou para ela. — Me faça companhia.

Ela hesitou enquanto afofava os travesseiros sobre os quais havia dormido. Ela pretendia empilhá-los ordenadamente e depois partir para seus aposentos. — Bem, eu...

— Estou cansado — ele a lembrou com gentil franqueza. — Muito cansado.

— Para ser honesta, um pouco de aconchego parece bom. — Ela havia usado o termo em sua língua original, incapaz de encontrar o equivalente básico. Não importava; ela iria traduzir usando a linguagem corporal. Ela tirou as botas, rastejou sobre o colchão e moldou o comprimento de seu corpo ao dele, aninhando a cabeça na depressão quente entre seu peito e ombro.

Seus braços a envolveram. — Isso é aconchego? — Ele murmurou em uma imitação realmente boa.

— Mmm...

Ela suspirou contra sua camisa. Quando ele pressionou os lábios no topo de sua cabeça, esfregando a palma da mão nas costas, ela estremeceu. Fazia muito tempo desde que ela tinha sido abraçada dessa forma, embalada em ternura, envolvida no calor protetor de um homem, e oh, isso era bom. Seus braços se apertaram. Ele soltou um longo suspiro e acariciou seus cabelos como se fossem amantes durante anos. Enquanto seus olhos se fechavam, ela ouviu o coração de Rom batendo forte sob sua orelha, lembrando-a de sua força interior e paixão a cada batida. Seu corpo respondeu com um calor lento e espiralado enquanto a curiosidade sexual substituía sua sonolência - o corpo esguio e poderoso de Rom entrelaçado com o dela, pele com pele, seus beijos quentes... Suas mãos conhecedoras. Mas um pavor ansioso a dominou quando levou a fantasia ao ponto da consumação. Rom era um homem com experiência galáctica e sexualmente fora de seu alcance. Ela não seria capaz de enganá-lo, fingindo prazer quando só havia dor. A constatação a apavorou e intrigou.

E a excitou.

Fazer amor seria tão comum e natural para Rom quanto comer e beber. E se ela abordasse o sexo da mesma maneira casual? Ela teria uma chance de deixar a vergonha de seu passado para trás?

Ela sentiu Rom estremecer e ergueu a cabeça. Céus, enquanto ela pensava em fazer amor, seu Romeu interestelar havia adormecido! Decepção, alívio e uma dúzia de outras emoções confusas demais para fazer sentido deram uma cambalhota nela. Tanto para seu grande plano de sedução. Além disso, fazia mais sentido esperar até amanhã, o último dia antes de chegarem ao Depósito, para lhe fazer uma proposta. Assim, se a experiência fosse um desastre, ela salvaria os dois do constrangimento da manhã seguinte. Quando a nave atracasse, ela simplesmente diria adeus e desaparecia na multidão.

 


Rom deslizou a mão sobre o espaço vazio e amarrotado ao lado dele. Ela se foi. Ele ficou totalmente acordado. Levantando a cabeça e os ombros do colchão, ele olhou ao redor do quarto e quase chamou o nome dela, parando no último momento. Jas estava agachada no altar perto da parede oposta, as mãos cruzadas, os olhos bem fechados em concentração absoluta. Ela estava orando. Agradou-lhe que ela tivesse fé - em seu Deus da Terra, naturalmente, mas fé do mesmo jeito.

Isso o fez desejá-la ainda mais.

Enquanto ela se levantava, ela fez um gesto simples com uma das mãos, levando-a da testa ao peito, depois de ombro a ombro. Então ela percebeu que ele estava olhando para ela, e sua expressão iluminou-se como o amanhecer de T'aurean. Estranho, mas ela parecia um pouco nervosa. Havia algo mais... Algo novo. Ele poderia jurar que ela o estava avaliando, mas pelo quê ele só podia imaginar.

— Você estava falando com o seu Deus. — Disse ele.

— Sim. Eu estava orando - por meus filhos, meus pais e minhas irmãs mais novas, três delas, todas com suas próprias famílias. Então, — ela revirou os olhos — leva um tempo para convencer todos. Você é um homem religioso — ela ressaltou. — Não sei por quê, mas não esperava por isso.

— Eu tive meus momentos ao longo dos anos — ele admitiu secamente. — Mas a fé é uma das poucas coisas que escondi da minha vida em Sienna.

Ela absorveu a informação com um aceno casual e não julgador. Foi um prazer singular ser aceito por quem ele era e não pelo que representava. Ou tinha representado.

— Deixe-me demonstrar — Rom disse, agachando-se na frente do altar. Ele encaixou os joelhos nas cavidades gastas de uma almofada de tecido e acendeu bolas de calor sob meia dúzia de tigelas rasas contendo óleos perfumados. — Adoramos uma divindade feminina, a Grande Mãe. Os cheiros a agradam. — Ele deu a Jas um olhar de soslaio. — Agradar uma mulher a torna mais receptiva.

Jas riu suavemente.

— Quando você estiver pronta para enviar suas orações para a eternidade — explicou Rom, levantando sua varinha de oração — basta tocar isto contra isto. — Em uma ação que repetia quase diariamente, desde que tinha idade suficiente para agarrar o fino bastão de metal, ele bateu contra um sino antigo. O único toque foi nítido e claro. — Agora suas orações estão a caminho.

— Que adorável. — Ela murmurou.

Ele se levantou, espreguiçando-se com um gemido ruidoso. — Vamos para a cozinha e ver como está o nosso jantar.

— Tarde demais para isso. Ou muito cedo, dependendo de como você olha para isso. Você dormiu a tarde toda e a noite toda. É manhã.

— Manhã! — Só então percebeu que Jas parecia recém saída de um banho de higiene. Ela havia trançado o cabelo em uma única trança reluzente e substituído os brincos de argola de prata que usava ontem por minúsculas joias roxas. Ele murmurou: — O técnico médico deve ter me alimentado com analgésicos suficientes na semana passada para matar um novilho Tromjhan.

— Isso e exaustão também. Eu estava prestes a acordar você. O ensopado está esfriando. — Ela acenou com a mão na mesa de jantar. Duas tigelas cobertas e uma cesta de pão estavam ao lado de uma jarra de xícara fumegante. — O café da manhã está servido.

Depois que ele se lavou e se trocou, eles comeram sem pressa. — Bebi uma xícara com Zarra na cozinha mais cedo— disse ela. — Além de alguma perda temporária de audição, é como se nada tivesse acontecido com ele.

Rom deu um longo suspiro de sofrimento. — A resiliência da juventude.

— Você teve uma concussão grave e uma fratura no crânio — ela o lembrou. — Zarra teve sorte de sair com alguns tímpanos rompidos e alguns hematomas.

Rom encolheu os ombros e estendeu a mão trêmula. — Não contradiga um velho fraco.

— Fraco! — Ela endireitou as costas e ergueu o queixo. — Você vagou por terreno sensível, Capitão B'kah. Quantos anos você tem? É melhor não ser mais jovem do que eu.

Eles riram das conversões e concluíram que tinham quase a mesma idade. Ele era mais velho em não mais do que meio ano padrão. Demorando-se sobre sua bebida, ela respondeu animadamente às perguntas dele sobre o planeta provinciano Terra, seus filhos e seus amigos - e seu tempo gasto como uma guerreira voando em caças terrestres.

— Conte-me sobre sua família agora. — Ela persuadiu enquanto enchia sua xícara.

— Não nos falamos mais.

— Eu percebi isso. — Ela deu a ele um de seus olhares perscrutadores. — Você deve sentir falta deles.

— Eu sinto — ele concedeu. A perda doeu como um membro fantasma. — Eu lutei contra a facção de Sharron contra os desejos de meu pai. As consequências de minhas ações custaram-me seu respeito. Ele me chamou de irresponsável, desrespeitoso e egoísta. Ele disse que eu não me importava nem um pouco com as tradições que uniam nossa família e nossa sociedade. Em vez de tentar provar que ele estava errado, escolhi o caminho mais fácil. Eu me tornei tudo o que ele disse que eu era.

— Mas você não é. — Ela insistiu suavemente.

— Nunca serei o homem que era antes de Balkanor.

— Quem pode dizer que isso é ruim?

A pergunta o chocou. Ela constantemente encontrava pontos de vista que ele não havia contemplado. — Mulher, você tem um talento para me virar do avesso e examinar o conteúdo. Além disso, é impossível manter segredos de você.

Seus olhos brilharam com malícia. — Isso te incomoda?

Ele bufou. — Minha irmã tinha o mesmo jeito. Então, acho que deveria estar acostumado. — A memória inesperada o aqueceu. — Crescendo, éramos muito próximos. Talvez... Nos aproximemos também. — Seus lábios se curvaram em um sorriso suave.

Rom se esticou sobre a mesa para saborear a doçura pungente de seus lábios. Foi um beijo rápido e leve, como ele pretendia. Mas as mãos dela demoraram a deixar seus ombros, e ela manteve os lábios entreabertos e os olhos fechados por longos segundos depois que ele se afastou - o olhar de uma mulher faminta por mais. Por todos os céus, ele queria mais também. Muito mais.

Ele se lembrou de seu plano original para seduzi-la e como ele o descartou. Quer ela o tivesse visitado em sua visão ou não, ela não tinha nenhuma lembrança disso. Deitar-se com ela com um motivo oculto em mente era de mau gosto e inútil agora. Ele ansiava mais do que uma troca casual de prazer, por mais memorável que fosse.

Mas como proceder? Ela não era como qualquer mulher que ele já conheceu. Ela não respondia aos avanços tradicionais ou qualquer coisa que ele tinha aprendido. Não que ele pudesse dar a ela um casamento santificado por Vash Nadah, ou filhos, ou mesmo o conforto e alegria de uma grande família. Apenas gratificação física e o alívio da solidão... E seu coração, se de fato ele ainda tinha um para dar.

Ele foi tirado de suas reflexões ao sentir a ponta do dedo dela deslizando por seu braço. Ele se concentrou em seu rosto para encontrá-la olhando para ele com um sorriso decididamente sedutor, embora um tanto apreensivo.

— Rom, amanhã chegaremos ao Depósito e você ainda não me ensinou a jogar bajha.

Ele olhou para seu relógio de pulso. — Gann e Zarra provavelmente estão na arena. Podemos nos juntar a eles.

— Uma aula particular era mais o que eu tinha em mente. E — ela sustentou seu olhar — um jantar ainda mais privado depois.

O brilho sugestivo em seus olhos o deixou sem palavras. Isso não era um mero flerte. Grande Mãe, a mulher estava tentando seduzi-lo.

Um guerreiro deve sempre estar preparado para o inesperado, ele lembrou a si mesmo enquanto um lento sorriso se espalhava por seu rosto. — Ficaria muito honrado. — Respondeu ele.

Levantando-se, ele fez uma reverência cortês e estendeu a mão. Jas colocou a dela em sua palma quente.

— Minha senhora, estou ansioso para nosso encontro — disse ele, tocando os lábios nos nós dos dedos.

— Eu também — Foi tudo o que ela disse em resposta.

 


Naquela tarde, Rom acompanhou Jas escada acima até as cadeiras para espectadores em uma dúzia de fileiras acima da pista de jogos acolchoada onde Gann estava no meio de sua sessão de treinos semanais com Zarra, conduzindo o menino por uma série implacável de alongamentos e estocadas. Enquanto Gann estava com a cabeça descoberta, Zarra usava um capacete que cobria seus olhos.

Ela se acomodou em sua cadeira, colocando suas botas no apoio para os pés. Rom sentiu uma intensa energia fervendo dentro dela, logo abaixo da superfície, mais do que ele sentiu durante todo o tempo que estiveram juntos. Seus olhos brilhavam e sua boca exuberante parecia tão deliciosa quanto uma fruta gorda e madura.

Doçura que implorava para ser provada.

Ele a teria beijado sem pensar duas vezes se esse pensamento não tivesse surgido na forma de uma memória vívida do dia em que ele devolveu os sapatos dela na frente da tripulação da ponte. Ela não gostava de exibições públicas do que considerava assuntos privados, e a última coisa que ele queria fazer era despertar sua ira quando ela estava agindo tão... Receptiva.

Jas observou os dois homens saltando pelo chão do bajha. Estimulado por seu humor particularmente agradável, Rom se juntou a ela. As estocadas de Zarra erraram Gann por um quilômetro.

— Use seus sentidos, rapaz. Deixe-os guiá-lo.

— Ajudaria se ele pudesse ver — Jas disse com o canto da boca. — Por que os olhos de Gann também não estão cobertos?

— Ele está treinando Zarra. Caso contrário, o jogo é jogado na escuridão total. Um oponente é rastreado usando intuição e instinto. Aprimoramos essas habilidades para alcançar um estado superior de consciência. Isso nos ajuda a nos tornarmos melhores guerreiros ou pilotos mais habilidosos. Ou — seu olhar permaneceu incisivamente em sua boca — amantes mais generosos.

Seu olhar se desviou, revelando a ele o quão incerta ela estava em seu papel de sedutora. Dominado por uma onda de afeto e proteção, ele disse: — Você deve usar outros sentidos além dos óbvios, além daqueles em que você foi criada para confiar. Observe atentamente; Gann está ensinando Zarra a não depender da visão, que tende a dominar os outros sentidos. Quando o menino ganhar confiança, ele será capaz de lutar sem pistas visuais.

Seus olhos estavam de volta, estudando-o. — Então, vamos usar vendas nos olhos?

— Hoje não — ele a assegurou. — Uma partida genuína é jogada na escuridão completa.

Um canto de sua exuberante boca se curvou, e ela proferiu o que parecia suspeitosamente como um de seus palavrões terrestres sob sua respiração.

No momento em que Rom voltou sua atenção para a arena, Gann havia encurralado seu jovem oponente. Rom ficou de pé, as mãos em concha ao redor da boca.

— Desvie, Zarra, desvie!

A boca de Zarra se torceu incerta. Gann lançou um olhar irritado para cima. — É meu dia instruir o rapaz, Rom? Ou estou enganado?

Rom ergueu as duas mãos e voltou a se sentar. Os combatentes retomaram o treino. Desta vez, Zarra perdeu Gann por um pé. Rom bateu com as mãos nas coxas.

— Muito cedo!

Jas sufocou uma risada.

— O que é tão divertido?

— Homens e esportes. Vocês são todos iguais.

— É assim mesmo? — ele perguntou secamente. — Estou muito feliz em saber que não sou diferente de qualquer outro homem para você.

— Não, você é diferente. — Ela parou por um segundo. — Melhor.

Desarmado por sua honestidade, Rom procurou uma resposta adequada e não encontrou nenhuma. Essa franqueza foi certamente um passo enorme para ela, dada a tristeza de seu casamento rompido.

Abaixo, Zarra tirou a venda. Gann falou com ele em particular, depois deu um tapinha nas costas do menino. Depois de recolher o equipamento e embalá-lo, Zarra partiu para os chuveiros de higiene ao lado. Gann jogou uma toalha sobre o ombro e subiu as escadas até onde Jas e Rom estavam sentados.

— O rapaz se saiu bem. Eu estava começando a questionar se ele havia herdado algum sangue de seu pai.

— O pai de Zarra é Vash Nadah — disse Rom a Jas. — Uma relação B'kah distante. Sua mãe era da classe mercantil.

Gann se sentou atrás de Jas. Ele desabotoou seu traje bajha e tirou as luvas. Então ele trouxe sua boca perto de seu ouvido. — Por que você não pede a Rom para ensiná-lo a jogar?

— Ele vai. — Ela esticou os braços e arqueou as costas com a graça sensual e inquieta de um gato ketta. — Uma aula particular. — Ela praticamente ronronou.

Sem perder o ritmo, Rom combinou com a sedução em sua voz. — Tão privado quanto eles vêm.

A cabeça de Gann girou de Jas para Rom. Ele ergueu uma sobrancelha e olhou para Rom com interesse. — Vou deixar vocês dois com seu jogo, então. Mas vá com calma com ele, Jas — Advertiu ele, sorrindo enquanto descia as escadas. — Temo que ele esteja sem prática.

Quando as portas bateram atrás dele, deixando a arena de paredes brancas e sem características em silêncio, exceto pelo assobio constante dos circuladores de ar, Jas tossiu uma risada. — Uau. A última coisa de que precisávamos era uma audiência.

O sorriso de Rom se tornou positivamente libertino. — Concordo.

— Não, eu quis dizer...— Ela parou e riu novamente. — Bem, eu não discordo. Mas meu ponto é que, comparada a mim, Zarra é um especialista. Meu ego pode me permitir fazer papel de boba na sua frente, mas não Gann. Ou qualquer outra pessoa da tripulação.

— Bajha é diferente dos esportes aos quais você pode estar acostumada. Não se preocupe. Eu vou te mostrar o que fazer. — Ele pegou a mão dela e a levou para a pista de jogo. Ele parecia mais alto e mais poderoso na arena, e seu corpo irradiava calor como uma fornalha. — Além disso — disse ele, seu sorriso se transformando em um sorriso inescrutável — se você não tivesse se livrado de Gann, eu o teria feito.

Eles trocaram olhares conhecedores.

Ela acenou com a mão para o conjunto um tanto intimidante de equipamentos ocupando a maior parte do espaço da prateleira na parede atrás de Rom. — O que nós fazemos?

— Primeiro nos trocamos. Os vestiários ficam à sua direita. — Ele pegou um bajha dobrado na prateleira, entregou a ela, e ela o levou para um dos cubículos acortinados.

Lá dentro, ela se encostou na parede e fechou os olhos. Ela cruzou uma linha de partida imaginária onde o jogo de bajha era apenas a primeira fase. Ela estava no domínio de Rom, sua área de especialização - agora e pelo resto da noite.

Vibrando de ansiedade e nervosismo, ela ergueu o traje branco de uma peça de sua embalagem transparente. Era rígido e revestido com uma substância protetora de borracha por fora, mas suave como a seda contra sua pele por dentro. Uma série de fechos semelhantes a velcro ia de cada tornozelo até o pescoço. Quando ela fechou todos eles, ela estava suando.

— Pense em aventura. — Ela disse baixinho e afastou a cortina. Girando os ombros para trás, ela entrou na arena com seus pés de meia.

Rom já estava vestido, e quando ele avistou suas meias de lã pretas decoradas com ovelhas brancas fofas, ele sufocou uma risada.

— O que? — Ela mexeu os dedos dos pés.

— Você escolheu se enfeitar com... O que descobri... são animais de fazenda do seu mundo? — Seus olhos brilharam de alegria.

Ela ficou orgulhosa. — Animais de fazenda, sim. Ovelhas, como as chamamos na Terra.

— Todas as mulheres da Terra usam tais — ele acenou com a mão em seus pés — coberturas para os pés?

Ela o atraiu. — Quando elas não estão usando umas com pequenos corações, patos ou rostos felizes.

— Rostos felizes — ele repetiu categoricamente. Então ele piscou, voltando para a tarefa em questão. — Você vai precisar disso. — Ele se abaixou para pegar um par de botas no chão. Seu traje bajha seguia fielmente o contorno de suas coxas e a curva fechada de suas nádegas. — Experimente enquanto preparo o equipamento.

Suas botas brancas flexíveis eram tão confortáveis quanto chinelos. Ela ficou na ponta dos pés e pisou algumas vezes. — Se estiver escuro, não nos veremos. Mas com isso ligado, também não seremos capazes de nos ouvir.

— Ah, mas nós vamos. Embora não com nossos ouvidos e olhos.

Em dúvida, ela perguntou: — Com nossos neurônios, certo?

— Eu vou explicar.

Com reverência, ele desempacotou duas espadas arredondadas de ponta romba, entregando-lhe uma. Era quase do mesmo tamanho e peso de um taco de beisebol de alumínio. Ela bateu com cuidado contra o chão, fazendo com que o brilho violeta que emanava de dentro pulsasse como um batimento cardíaco.

— É chamada de espada sensorial. — Rom se aproximou dela por trás, curvando seu corpo alto ao redor dela. — Segure-a com as duas mãos.

Ela apontou a arma para longe de seu corpo. Colocando as mãos sobre as dela, ele agarrou a base com ela, movendo-a lentamente de um lado para o outro. Era difícil se concentrar com sua respiração acariciando sua orelha e seu traseiro aninhado contra seu abdômen. Sua proximidade física a despertou imediatamente. Ela se lembrou de seu último beijo e ansiava por sentir sua boca na dela.

— É isso, Jas. Boa. Agora vamos falar sobre os sentidos com os quais você nasceu, mas nunca usou totalmente. — Ele continuou, sem saber que suas palavras haviam temporariamente reprimido seu desejo de se virar em seus braços para um beijo. — Certos neurônios atuam como sensores para diferentes partes do seu corpo. Alguns são ativados pelo movimento. Outros através do toque. Quando um objeto é colocado perto dessa parte do corpo, o neurônio responsável por esse alerta é acionado. — Ele apertou as mãos nas dela. — Uma vez treinado, seu corpo não esquece. — Sua voz ficou mais suave, mais íntima. — É assim que localizamos a boca de nosso amante no escuro. Você sabia disso?

A fala a iludiu. Ela balançou a cabeça. Por acidente ou desígnio, sua bochecha áspera roçou sobre a dela. — Os neurônios se lembram. Em seguida, os sensores associados a seus lábios guiam sua boca para o beijo.

Isso era tudo que seus neurônios precisavam ouvir. Eles ficaram loucos. Eles gritaram e dançaram em círculos.

Beije ele, sua idiota! Beije-o agora!

Mas ela fez uma pausa e, voltando aos negócios, Rom recuou. Enojados com sua covardia, seus neurônios uivaram e caíram de joelhos imaginários.

— Desta forma, sentiremos a presença um do outro no bajha. Você descobrirá, a princípio, que terá de parar com frequência para ouvir o que seu corpo está lhe dizendo. Mas você aprenderá. Algum dia, esses instintos chegarão a você tão facilmente quanto caminhar ou ler. Você está pronta para começar?

— Sim — disse ela com a maior confiança que pôde.

— Mas primeiro, proteção. Vista o capacete e as luvas.

O capacete flexível cobria seu crânio, orelhas e a ponte de seu nariz. As luvas eram tão macias quanto as botas. Enquanto Rom a rodeava, ela permanecia enraizada no lugar, sua espada semelhante a um taco em suas mãos. Então ele desapareceu atrás dela. Seu corpo estremeceu como uma corda esticada.

— Você está com medo, Jas?

— De modo nenhum. — Ha. Certo.

— Bom. Você não deve estar — disse ele. — Nosso código instrui os guerreiros a serem cautelosos, não temerosos. — Ele parou, de frente para ela, sua espada sensorial segura em seus dois grandes punhos. — Diga isso. Isso vai te ajudar. 'Serei cautelosa, não temerosa.'

— Serei cautelosa, não temerosa. — Droga, mas seu batimento cardíaco acelerou quando ele se moveu atrás dela novamente.

— Luzes. — Disse ele, e a escuridão absoluta engoliu os dois.


CAPÍTULO 10


Jas apertou as mãos em torno da espada sensorial, seu salva-vidas na escuridão mais completa que ela já conheceu. Privada da visão, ela estava agudamente ciente de seu corpo. Fogos de artifício ópticos dançavam diante de seus olhos bem abertos. Ela ouviu e sentiu o sangue correndo em suas veias.

— Levante sua espada sensorial — Rom disse em um tom calmo e uniforme.

Ela ergueu a arma para a escuridão, concentrando-se em seus passos. Eles estavam se aproximando ou se afastando? Ela não sabia dizer. E por que a espada não lançou nenhuma iluminação no escuro? Ela não teve tempo para se perguntar.

— Você confia em mim? — ele perguntou.

Eu quero.

— Bom. — Ele sussurrou em resposta ao silêncio dela.

— Como você...

— Não me importo em ler, Jas. Intuição. Instinto.

Mais passos. Ela reprimiu seu gemido de alarme. Estava escuro. E dolorosamente quieto. Ela estava vestida da cabeça aos pés com um traje de proteção. No entanto, ela se sentia nua. Vulnerável.

— Agora vamos jogar.

A voz de Rom veio do outro lado da arena, desorientando-a.

Ela se virou para olhar na direção de onde sua voz tinha vindo. Ou de onde ela pensava que veio. Acenando a espada sensorial à sua frente, testando seu peso, ela tentou ver dentro da parede negra, tentou ouvir acima do trovejar de seu coração. Então ela sentiu - uma brisa, os cabelos arrepiando na nuca. Ela engasgou quando a ponta da espada sensorial de Rom se arrastou por sua parte inferior das costas, deixando para trás uma leve sensação de alfinetes e agulhas.

— Isso dói. — Ela deixou escapar indignada.

— Não deveria. — Rom parecia defensivo e um pouco preocupado. — Minha espada sensorial está ajustada para a configuração mais baixa.

— Não machucou minhas costas. — Ela balançou sua espada sensorial na direção de sua voz, ouviu-o sair do caminho. — Doeu meu orgulho!

Ele deu uma risadinha.

Ela disparou em direção ao som. Ela iria pegá-lo agora.

Sua espada sensorial se cravou em algo sólido e ligeiramente flexível. Uma vibração estremeceu a arma até o braço e o peito um instante antes que ela se chocasse contra a parede que circundava o anel bajha.

— Droga.

— Nunca aja puramente por emoção — acalmou a voz profunda de Rom do outro lado da arena. — Use seus sentidos. Confie neles. Pois eles vão trazer você para mim.

Ele está vindo em sua direção, alertou sua voz interior.

Ela arqueou para longe. Rom tropeçou e ela gritou de alegria.

— Excelente! No entanto, o triunfo geralmente leva à complacência.

Para provar seu ponto, ele bateu em ambas as rótulas com sua espada sensorial. Ela brevemente viu um brilho violeta antes de uma chuva de formigamento quente inundar seus joelhos e panturrilhas.

— Ei, você aumentou o nível.

Ele riu da acusação dela. — Você está entendendo muito rápido. Eu tive que aumentar as apostas.

— Muito obrigada. A propósito, em que minha espada sensorial está sintonizada?

— Setenta e cinco por cento do máximo.

— Isso não vai te machucar? — ela perguntou preocupada.

— Uma picada persistente — ele respondeu, desta vez bem atrás dela. — Nada mais.

— Bom. Prepare-se para sentir aqueles setenta e cinco por cento em lugares que você não deseja.

Ela ouviu sua gargalhada - da direita. Espada estendida, ela girou lentamente, girando e girando, alcançando profundamente dentro dela, batendo em um reservatório do que ela sentiu que sempre esteve lá.

Veio com pressa - a essência do coração generoso e ferido de Rom.

Minha alma gêmea.

Ela o buscou com sua arma, procurando instintivamente, simbolicamente, pelo amor que ela sempre desejou, mas nunca encontrou.

Ele inalou profundamente. Sua espada sensorial cega deslizou ao longo do tecido de seu traje, mas não o atingiu com força suficiente para sinalizar um golpe. Ela sentiu sua surpresa em seus próprios ossos.

— Quase peguei você, Rom! — Ela riu de alegria.

— Está se divertindo?

Ela se lançou. — Muito.

Sua espada sensorial bateu contra a parte de trás de suas coxas.

— Não muito. — Ela estremeceu com as breves picadas. — Você vai pagar por isso.

— Veremos. — Respondeu ele de brincadeira.

Use seus sentidos.

Ela fez uma pausa... Ouvindo.

Mas não com seus ouvidos.

Vendo...

Mas não com os olhos dela.

Caçando-o na escuridão, ela retomou o jogo estimulante e estranhamente excitante de gato e rato. Mais uma vez ela o roçou, apenas para receber um golpe de punição em troca em seu traseiro. Ela respirou fundo e baixou a espada sensorial. Um calor formigante persistiu entre suas pernas. De repente, o jogo perdeu seu apelo; ela ansiava pelo toque de Rom, não por uma arma desapaixonada.

Colocando sua espada sensorial no chão, ela desacelerou sua respiração e ficou parada. Se os neurônios podiam se lembrar, então talvez os dela pudessem se lembrar dos beijos de Rom. Ela certamente não tinha esquecido. Ela nunca tinha sido beijada do jeito que ele a beijou. Era mais do que sua habilidade consumada, era sua ternura, a intensa paixão que ela sentia que ele lutava tanto para controlar e seu óbvio prazer do ato em si.

Ela desejou que seus lábios se lembrassem de tudo e que os dele se lembrassem dos dela. Então, com todo o desejo em sua alma, ela desejou que ele a quisesse tanto quanto ela o desejava.

Ela esperou.

Concentrando mais forte.

E esperou...

Seus lábios formigaram. Então ela sentiu o cheiro dele, como se ela fosse um animal em uma floresta primitiva.

Tão perto agora...

Lá.

Seus lábios, quentes e suaves, roçaram os dela. Ela deixou escapar o mais ínfimo dos suspiros, ampliado no silêncio palpitante.

Ele demorou, provocou, sorveu.

Com os braços flácidos ao lado do corpo, ela abriu a boca em um convite descarado. Sem tocá-la de nenhuma outra forma, ele cobriu sua boca com a dele, beijando-a profundamente, apaixonadamente, a sensação de umidade, buscando um calor poderosamente erótico na escuridão silenciosa. Ela deu um gemido necessitado em sua boca. Ancorada no nada pelo beijo, querendo mais, muito mais, ela jogou os braços sobre os ombros dele.

Ele espalmou uma mão atrás do capacete dela, esmagando-a contra ele. Suas mãos se torceram no tecido de seu traje bajha enquanto ela arrastava beijos sem fôlego e de boca aberta ao longo de sua mandíbula e pescoço, sentindo o gosto de sal em sua pele, querendo devorá-lo.

— Jasmine, espere. — Ela o ouviu dizer como se estivesse a quilômetros de distância.

Ela estava além da linguagem, além da razão. Com a ponta da língua, ela explorou o cabelo sedoso e cortado com precisão em sua orelha. — Rom... — Ela abriu caminho de sua orelha ao queixo áspero de barba, então sugou seu sensível lábio inferior.

Ele murmurou algo e apertou seus ombros, gentilmente movendo suas costas. — Luzes. — Ele disse.

Ela piscou, tanto pelo brilho repentino quanto pela desorientação de sua excitação. Então ela baixou a testa até o peito dele.

— Foi difícil parar.

— Vamos para onde não precisaremos. Nossa privacidade não é garantida aqui. — Ele hesitou, inclinando a cabeça dela para trás, o polegar sob seu queixo. — Privacidade é o que queremos, não é? — Seus olhos escureceram de desejo para a cor de um xerez rico. Em suas profundezas, ela viu uma questão muito além da mera questão de estarem sozinhos.

— Sim — disse ela em uma respiração afiada. — Privacidade. — E mais.

Ela ansiava por se sentir uma mulher de verdade novamente.

Seu olhar era estranhamente perceptivo, como se pudesse ler seus pensamentos. Se ele pudesse, então esta noite poderia ser muito mais fácil. Inserindo os dedos entre o colarinho alto do traje e a base do capacete, ela encontrou um pedaço de pele exposta na nuca. Ele se arqueou levemente em seus dedos que o massageavam, então pareceu se conter. Pressionando a mão na parte inferior das costas dela, ele a conduziu em direção ao provador.

— Vou esperar por você em meus aposentos.

— Eu gostaria de tomar banho primeiro. — Pegando seu traje de bajha úmido, ela perguntou brincando: — Que tal, capitão? Meu segundo do dia.

— Permissão concedida. — Ele murmurou e colocou sua boca sobre a dela.

 


— Sou eu — Jas chamou para a pequena tela acima da entrada dos aposentos de Rom.

As portas se abriram e ela entrou. O quarto já estava iluminado e cheiroso. A música tocando, quase inaudível, mas alta o suficiente para adicionar à atmosfera. Rom B'kah era um mestre em preparar o cenário para a sedução. Mas então, ao contrário dela, ele tinha muita prática.

— Saudações, Jasmine.

Ele cruzou o quarto para encontrá-la. Seu cabelo ainda estava úmido do banho, e ele o havia penteado para longe do rosto. Sua camisa branca, brilhando com uma iridescência perolada, estava enfiada em um par de calças cor de mel, meio escondidas por botas macias até o joelho. Era difícil não permitir que sua confiança aberta e sua aparência bem cuidada a enervassem. Mas ela silenciou a voz que sussurrou que ela estava fora de seu alcance, em sedução.

O olhar apreciativo de Rom passou rapidamente por sua saia floral conservadora e seu suéter lilás, parando nas garrafas de Cerveja Red Rocket que ela segurava nas mãos.

— Desde que você me apresentou ao licor de amora, esta noite pensei em apresentá-lo à minha bebida favorita.

Ele pegou as garrafas e olhou os rótulos. — Uma bebida da Terra?

— Sim. É feita por um processo de fermentação de sementes que tornam a cerveja. Cerveja Red Rocket do meu amigo Dan Brady.

Rom ergueu uma sobrancelha e então olhou para as pálpebras. — Interessante. Como elas são abertas?

Ela balançou um abridor de garrafa em um dedo. — Primeiro, resfrie-as o máximo que puder.

Rom abriu a porta de um pequeno compartimento retangular na parede e digitou um código no painel de controle adjacente. O resfriador zumbia. Segundos depois, ele removeu as garrafas geladas e as levou para a mesa de jantar triangular, onde preparou uma refeição simples de carne fria, pão achatado, sal e dois tipos diferentes de frutas em conserva. Ela enfiou as pernas embaixo do corpo e arrumou alguns travesseiros nas costas. Agachado ao lado dela, ele a observou abrir as tampas das garrafas, olhando para o abridor de uma loja de um dólar como se fosse uma maravilha exótica e maravilhosa da tecnologia. Ela riu de sua curiosidade infantil e colocou uma garrafa em sua mão. O vapor flutuou para cima junto com o cheiro picante.

— Vá em frente, experimente.

Seu tom era claramente sugestivo. — Tenha o seu prazer primeiro — ele disse. — Eu vou cuidar de você.

Oh, que coisa.

Ela tomou um gole, tentando ao máximo não olhar para a boca dele. O único gole não fez nada para esfriar seu desejo. Ele deve ter ouvido seus neurônios superaquecidos sacudindo suas gaiolas porque ele se inclinou mais perto e pressionou os lábios contra o lado de sua garganta.

Fechando os olhos, ela respirou seu perfume exótico e distintamente masculino, então, suspirando, ela ergueu o queixo e ofereceu-lhe o arco do pescoço. Seu hálito quente a acariciou enquanto ele se aninhava mais abaixo.

E então parou em sua clavícula. — Talvez devêssemos provar nossas bebidas — ele disse suavemente. — Daqui a pouco, duvido que qualquer um de nós se interesse.

— Interesse em quê? — Ela sussurrou atordoada.

Sorrindo, ele levou a garrafa aos lábios. Seus olhos dourados brilharam e ele virou a garrafa para um gole mais longo. — Ah! Isso é delicioso. Diga-me novamente como você chamou isso?

— Cerveja. Eu acho que você poderia dizer que cerveja é cerveja com mais sabor e caráter.

— Cerveja, então — ele disse com reverência. — O sabor, bah! Essa é uma razão suficiente para negociar com a Terra. O documento que você me trouxe contém uma provisão para obter esta bebida dos deuses?

— Com certeza sim. A cerveja de Dan Brady.

— Bom homem, este Dan Brady. — Rom fechou os olhos e engoliu em seco. Fascinada pelo prazer sensual que ele sentia em uma simples garrafa de cerveja, ela apoiou o cotovelo na mesa, a cabeça apoiada na mão, e o observou até ele terminar. — Eu quero provar você — ela confessou para seu espanto absoluto.

— Sim, eu quero que você — disse ele calmamente e colocou de lado a garrafa vazia. — Diga-me, Jas - de que maneiras posso agradar você esta noite? Quais são os seus desejos?

Seu rosto aqueceu. Ela não estava acostumada a verbalizar suas necessidades íntimas - ninguém nunca perguntou a ela. Há muito tempo, ela havia se acostumado a enterrá-las. Mas sob os holofotes do olhar paciente de Rom, as palavras saíram mais fáceis do que ela esperava.

— Apenas faça amor comigo. Isso é tudo.

— Saiba disso — ele disse calmamente. — Eu não considero seu presente levianamente. Você me oferece seu corpo de mulher. Sou abençoado nisso. — Ele arrastou o polegar pela boca dela, traçando ternamente a forma de seus lábios, imergindo-a em uma espécie de intimidade além de sua experiência.

Encantada, ela viu todos os seus amanhãs em seus olhos. Mas ela empurrou de lado o pensamento perigoso, mesmo com arrepios cobrindo seus braços. Isso foi exatamente o que a colocou em apuros antes.

Não espere por um futuro com ele, advertiu a si mesma. Apenas aproveite o momento. Mas uma vozinha, silenciada por anos, puxou sua manga mental. Isso é diferente, ela insistiu. Desta vez é real.

Ele enfiou a mão em uma das tigelas de frutas, arrancando o que parecia uma cereja preta brilhante. Segurando-a com dois dedos, ele o ofereceu a ela. Uma gota de suco tremeu em sua parte inferior gorda e ela pegou a umidade com a ponta da língua. As pupilas de Rom dilataram. Incentivada por sua resposta, Jas colocou as mãos em suas coxas e deslizou para cima. Músculos rígidos se agruparam sob suas palmas. Ela roçou os lábios na palma da mão dele e no interior do pulso antes de enrolar a língua sugestivamente sob a pequena fruta, dando mordidas divertidas até que estivesse completamente dentro de sua boca. Doce calor se acumulou baixo em sua barriga e sua pulsação acelerou entre as pernas. Era surpreendente como a brincadeira de comida podia ser estimulante sem mais toques físicos. Claro, os Vash haviam descoberto isso eras atrás.

A pequena fruta ácida e crocante deixou seu paladar limpo e fresco. Engolindo em seco, ela separou a tigela e escolheu outra, levando-a à boca. Claramente o especialista, ele alternadamente brincava com a língua sobre a pele tensa e reluzente e sugava. Seus mamilos enrugaram sob o tecido transparente e apertado de seu sutiã.

— Eu quero fazer isso com você, Jas — ele sussurrou, seus olhos semicerrados. — Isso te agradaria? Se eu beijasse você assim? Se eu beijasse você em todos os lugares?

Sua expressão mudou para uma de satisfação. Observando-a por baixo de seus cílios escuros, ele levou o dedo totalmente em sua boca lisa. Sua língua hábil raspou sua parte inferior. Suas entranhas aqueceram. Não era difícil imaginar o que sua língua poderia fazer com o resto dela.

Quando ela retirou a mão, ele estendeu a mão e girou o dedo no líquido carmesim escuro acumulado no fundo da tigela de frutas. Como fizera certa vez com o licor de amora, umedeceu o lábio inferior dela com o suco doce.

— Outra fruta? — ele perguntou. Ela balançou a cabeça. — Você já comeu o suficiente, então?

— De frutas. — Ela enterrou os dedos em seu cabelo espesso e sedoso. — Mas não de você.

Um gemido vibrou em sua garganta e ele se pôs de joelhos, puxando-a para um beijo. Sua língua era lenta e segura, acariciando em vez de exigindo. Ela adorava a maneira como ele explorava sua boca com calma. Na verdade, ela adorava a maneira como ele fazia tudo com calma. Ele a drogou tanto com seus beijos deliciosos e carícias habilidosas que a sensação de sua palma quente e áspera deslizando sob o suéter foi um choque - embora bem-vindo.

Sua boca abafou seu suspiro. O beijo se aprofundou com uma urgência mútua aumentada, e ele deslizou as mãos para cima para segurar seus seios, levantando-os, roçando seus mamilos tensos e sensíveis com as pontas dos polegares.

— Linda — ele sussurrou. — Linda mulher.

Bebendo em suas palavras, ela se arqueou para frente até que sentiu o cume de carne masculina sob suas calças pressionando contra ela. Instintivamente, ela se esfregou contra ele tanto quanto sua posição ajoelhada permitia. Sua respiração ficou mais rápida, e sua excitação se esticou ainda mais por baixo de suas calças justas.

— Inajh d'anah — ele murmurou. — Minha doce Jasmine.

Ele puxou o suéter sobre a cabeça dela, em seguida, beijou sua garganta e aquele buraco maravilhosamente sensível logo abaixo de sua orelha. No momento em que ele a pôs de pé e a levou para a cama, ela estava dura.

Atordoada e quase dolorosamente excitada, ela se sentou empoleirada na colcha de seda, enquanto ele se agachava entre suas pernas. Ele tirou os sapatos, depois a saia, deixando-a vestida apenas com a calcinha de renda enquanto ele lutava para tirar as botas e as calças. Ela vislumbrou sua ereção projetando-se contra sua roupa íntima - uma ponta de seda marfim cintilante enrolada em seus quadris estreitos - antes que ele gozasse novamente. Mais beijos, beijos incríveis.

Correndo as mãos apreciativamente ao longo de suas pernas nuas, ele espalhou as mãos sob seus joelhos, acariciando-a, massageando seus músculos, parecendo derivar uma quantidade excessiva de prazer das simples carícias. Ela se recostou em seus braços, saboreando a alegria singular do claro prazer desse homem por seu corpo.

— Tão incrivelmente suave — disse ele, massageando os longos músculos sob suas panturrilhas. — Como seda Nandan. — Curvando-se para frente, abaixando a cabeça, ele se aninhou, beliscou e saboreou seu caminho por suas pernas.

A ligeira aspereza de sua bochecha na pele macia de suas coxas, então seus polegares deslizando sob o cós de sua calcinha. Ele tirou a roupa, mas não a acariciou onde ela tão desesperadamente queria senti-lo, o lugar úmido vibrando por seu toque. Ela choramingou de necessidade, e ele agarrou seus pulsos, puxando-a para uma posição sentada. Ele a beijou com força, e suas coxas se abriram para acomodar seus quadris oscilantes, criando uma fricção requintada contra sua carne sensível.

Com os dedos desajeitados com a urgência, ela desatou os fechos restantes da camisa dele, tirando-a dos ombros largos e musculosos para se deleitar com a sensação e o cheiro de sua pele quente e nua. Ele tirou a camisa e a jogou de lado.

Uma cicatriz feia e irregular marcando seu peito a pegou desprevenida. Ela se arqueava de seu mamilo direito até onde terminava abaixo de suas costelas em seu lado esquerdo.

— Deus, Rom, o que aconteceu?

Envergonhada por sua reação de choque, Jas sentiu o calor subir em seu rosto. Ele agarrou seus braços, seus olhos dourados queimando brilhantes. O suor brilhava em sua testa e peito.

— Toque-me.

Quase sem respirar, ela ergueu dedos trêmulos para a velha ferida, traçando a carne fria e acidentada, um contraste terrível com o resto de sua pele lisa e bronzeada. Ele tinha tão pouca gordura corporal em seu torso que cada músculo, cada tendão, cada veia estava claramente definida, perfeitamente esculpida, tornando a cicatriz ainda mais deslocada.

— O que você vê? — Ele sussurrou.

Algo puxou seu subconsciente. Ela piscou, tentando decifrar o que sentia que deveria se lembrar. — Você foi ferido na guerra...

Seus dedos pressionaram a pele nua de seus braços. — Sim. — Ele parecia pronto para alguma revelação, mas parecia que ela era incapaz de fornecê-la.

— Isso deveria ter matado você. — Ela disse enquanto a frustração crescia dentro dela.

— Mas isso não aconteceu, Jasmine. Não funcionou.

Sua boca desceu sobre a dela, dura e faminta, desesperada e desejosa, e seu corpo ágil e poderoso a jogou de costas no colchão.


CAPÍTULO 11


Ele a beijou com a ternura feroz de um guerreiro voltando para casa para uma amante. Os braços de Jas se fecharam sobre seus ombros quando ela encontrou sua urgência com uma consequência - maldita fome própria. Quando a boca dele se moveu para o sutiã, ela havia caído no esquecimento carnal.

Ela ouviu uma maldição murmurada, então veio um leve puxão em seu sutiã. — Eu nunca vi uma roupa de baixo. — Rom lamentou irritadamente.

Seus olhos se abriram. Com uma expressão de intensa concentração no rosto, ele estava se atrapalhando com o fecho frontal. Ela engoliu uma risada de alívio e alegria loucos - mesmo para este homem de experiência galáctica, aparentemente havia uma primeira vez.

— O que as mulheres Vash usam para sustentar os seios?

— Não isso.

— É mais fácil abrir do que uma garrafa de cerveja. — Isso o fez rir. — Eu vou te mostrar — ela disse suavemente.

Eles desabotoaram o sutiã juntos, e então seus seios ficaram pesados e livres, cada falha, cada estria exposta ao seu escrutínio quente. De repente, ela desejou que as luzes estivessem mais baixas - muito mais baixas.

Mas ele estava olhando para seus seios com admiração.

Reverência?

Isso era uma loucura.

Quando ele deslizou a ponta do dedo sobre uma das linhas prateadas que emanavam de seu mamilo direito, ela quis morrer. Ela tentou rolar para uma posição onde não ficaria tão exposta. Ele agarrou seus pulsos e a empurrou de volta para baixo.

— Não olhe para mim aí. — Ela implorou.

Sua voz estava rouca e grossa. — Por favor, não me negue este prazer. Isso atesta sua maternidade. Você é uma mulher, uma linda mulher. — E então ele a beijou...

Lá.

E lá. Cada linha prateada.

Isso não estava acontecendo. Ela não poderia estar com um homem que estava excitado por estrias. Mudando de posição, ele se inclinou sobre ela, os músculos fortes em seus braços flexionando enquanto ele tomava seu mamilo em sua boca.

A sucção suave e insistente reacendeu o calor entre suas pernas, e um momento depois, dois dedos longos e ágeis deslizaram dentro dela. Ela soltou um suspiro estrangulado. Ele girou a palma da mão sobre seu centro sensível, levando-a rapidamente à beira do orgasmo. Sem pensar pela necessidade, ela agarrou seus ombros, revirou os quadris. Então suas entranhas se apertaram.

No primeiro tremor, ele quase parou de acariciá-la. Ela soltou um gemido de protesto, mas ele murmurou em seu ouvido. — Não, ainda não. — Acalmando-a com beijos e palavras líricas em sua língua nativa.

Novamente, ele trabalhou sua magia erótica, e ela subiu mais alto do que antes. Cada vez que ela estava prestes a atingir o pico, ele recuava até que o momento passasse, então começava tudo de novo.

O quente, dolorido prazer-dor cresceu até que era quase demais, e ela se atrapalhou com seu pulso para segurá-lo perto. Ela não suportaria se ele parasse novamente.

— Não, Jas — ele sussurrou com força, sua respiração quente em seu ouvido. — Nós iremos juntos. — Ele se ajoelhou entre as pernas dela, o braço apoiando uma coxa e levantou a perna dela sobre suas costas.

O brilho suave do quarto iluminava seu cabelo castanho dourado e sombreava seu rosto. Enquanto ela se agarrava a seus ombros largos, ele começou a empurrar dentro dela, grosso e duro. Cada músculo de seu corpo ficou rígido. Ele percebeu a mudança e fez uma pausa.

Ela o queria - oh, como ela o queria. Mas tudo isso daria errado; apesar de seu desesperado estado de excitação, seus músculos se fecharam, como acontecera com frequência durante os últimos anos de seu casamento. Se Rom conseguisse penetrar, sua dor arruinaria tudo para os dois.

Com os olhos bem fechados, ela ofegou de medo e vergonha. O passado a alcançou - cada memória ruim. Ela pensou que poderia fugir, mas a acompanhou a cada passo do caminho.

— Jas, abra seus olhos. — Rom estava sussurrando para ela; talvez já estivesse há algum tempo. — Venha aqui, meu anjo, olhe para mim. — Ele beijou cada pálpebra por vez. — Sou eu. Rom. Não vou deixar que os erros de outro homem nos separem. Vai ser bom para nós — ele prometeu, acariciando seus cabelos. — Você vai ver.

— Sinto muito. — Ela começou.

— Silêncio. Coloque suas mãos sobre meus ombros. É isso aí. Me segure. Se a qualquer momento você não gostar do que estou fazendo, diga-me, e eu pararei.

Ele esperou que ela acenasse com a cabeça, depois espalhou as mãos sobre os lençóis amarrotados, sustentando seu peso, os ombros rígidos e brilhando de suor. Então ele abaixou a cabeça para beijá-la, beijos profundos e incrivelmente eróticos, enquanto a esfregava intimamente com a ponta de seu pênis. Mais uma vez, o prazer começou a crescer. Ela empurrou os quadris contra ele, gemendo baixinho.

— Confie em mim, Jas — murmurou ele, seu olhar conhecedor, na expectativa, como se entendesse cada nuance da dúvida e do desejo em guerra dentro dela. — Deixe-me te amar. — Ao seu aceno de cabeça, ele deslizou o braço sob sua coxa esquerda e entrou nela. Seu corpo resistiu a ele no início, mas ele dirigiu lentamente para frente. Houve um alongamento requintado, uma pressão deliciosa. Então, agarrando seus quadris possessivamente, ele empurrou todo o caminho, enviando ondas de choque até os dedos dos pés.

Ela sentiu seu calor, cada cume dele, enchendo-a. Então ele começou a se mover. E oh, ele poderia se mover - retirando-se na metade do caminho e deslizando profundamente. Ela não conseguia respirar, não conseguia falar. Deus a ajudasse, ela nunca soube que poderia ser assim. Nunca soube que poderia ser tão bom.

Ela agarrou seu cabelo em seus punhos, ouviu-se gemer seu nome. O calor e a tensão aumentavam com cada movimento de seus quadris. Mais uma estocada e ela explodiria.

— Aperte-me com força — ele rugiu. — De dentro. Isso vai atrasar você e lhe trazer mais prazer. — Ela o fez, e um gemido áspero escapou de seus lábios.

Ela se agarrou a ele enquanto ele balançava dentro dela, seus dedos agarrando seu corpo duro e escorregadio. Sem palavras agora, apenas seus suspiros e gemidos, seu cheiro se misturando ao dela. Não, ela nunca imaginou que poderia ser assim, que ela poderia se sentir assim. Duas almas compartilhando puro prazer. Isso foi o que ela começou a encontrar. Magia.

Ela se desfez, gritando enquanto colocava os joelhos mais alto nos quadris dele, apertando-o com as coxas, para segurá-lo ali, para segurá-lo perto.

No meio de tudo isso, Rom ficou rígido e gemeu. Pareceu durar muito tempo para ele, sua liberação, poderosa e intensa. O suor alisando sua pele e a dela. Exausta, ela o beijou, saboreando o sal, inalando seu perfume, fazendo o momento durar.

Surpreendentemente, ele não rolou para o lado e para longe dela. Em vez disso, ele embalou sua cabeça em suas mãos e levou um tempo explorando sua boca, então seu rosto, afetuosamente beliscando beijos ao longo de seu nariz, queixo e sobrancelhas. — Ah, Jas. Minha Inajh d'anah. — Sua voz vibrou em seu peito, seu hálito quente contra sua pele. Envolvendo-a em uma ladainha de palavras exóticas - sons líricos infundidos com amor e elogios - ele a abraçou com força e as rolou. Ela caiu em cima dele, sem fôlego e ainda tonta.

Ela passou os dedos pelos cabelos úmidos dele, apreciando sua fragrância. — Inajh d'anah — ela disse languidamente. — O que isso significa?

— É difícil traduzir Siennan para Básico. Siennan é uma linguagem de amor. Básico é a linguagem do comércio. — Concentrando-se, ele pegou e girou o cabelo dela entre os dedos. — O melhor que posso fazer é 'carne da minha carne'. É um carinho. Como 'amada'. Mas mais do que isso.

— É uma palavra linda, de qualquer maneira. — Ela disse suavemente.

Ela se afastou dele para se deitar no colchão, acariciando distraidamente seu abdômen, a maciez sob seu umbigo, a única suavidade em toda a parte superior de seu corpo.

Ela murmurou — Omlajh anah — lembrando mais das palavras que ele disse durante o amor.

Sua risada cresceu em uma risada completa. Ela se inclinou sobre ele. — O que é tão engraçado? Tenho certeza de que ouvi você dizer isso alguns minutos atrás.

Ele enxugou os olhos. — A frase é dita a uma mulher, não a um homem.

Ela fingiu olhar para ele. — Por quê? É condescendente?

— Nem um pouco. Omlajh anah. Descreve... Como me sinto bem quando estou dentro de você.

— Você realmente tem palavras em Siennan que descrevem isso?

— Sim, e mais, muito mais.

Ela se aconchegou mais perto. — O que eu deveria ter dito a você, então? Quando você estava dentro de mim e me deixando tão louca?

Mesmo sem ver seu rosto bonito, ela sabia que ele sorria. — Omlajh dah — Respondeu ele, acariciando levemente as costas dela.

— Parece quase o mesmo.

— Muitas das palavras sim. Siennan é uma linguagem de diferenças sutis.

— Deve ser difícil de aprender.

Ele beijou o cabelo dela. — Foi minha primeira língua, então eu não sabia. Eu vou te ensinar. Você gostaria disso?

Ela ergueu a cabeça. — Se o resto das aulas forem tão boas quanto esta, pode apostar que sim.

Ele se sentou. Hipnotizado por seu torso musculoso brilhando na luz quente e fraca, Jas o observou colocar várias almofadas entre suas costas e a parede ao lado da cama. Então ele acenou para ela, os braços abertos, sua boca curvada em um sorriso que era convidativo, diabólico e muito masculino.

— O resto das aulas será melhor. — Disse ele.

A segurança e a confiança que ela sentia em sua presença trouxeram à tona sua alegria. — Se não, teremos que repeti-las.

Ele riu suavemente. — Uma por uma.

— Combinado — ela disse e sorriu, perguntando-se brevemente quando ela tinha pensado em sexo pela última vez como divertido. Fervendo de ansiedade, ela pegou suas mãos estendidas e montou nele.

 


Um toque familiar arrastou Jas meio acordada. Então ela sentiu o calor reconfortante de Rom escapar de seus braços. Ela tateou sonolenta por ele, mas quando abriu os olhos, ele já estava sentado na extremidade oposta da cama, de frente para a tela na parede. De acordo com o relógio de cabeceira, eles dormiram apenas algumas horas. Quem ligaria tão cedo?

Rom bateu no painel de resposta. — Prossiga.

— Muito bom dia para você, B'kah — disse uma voz melodiosa de homem. — Você demorou muito para responder. — Houve uma pausa, então, — Achei que você gostaria de saber que estamos a três horas do destino.

Jas congelou. Os últimos vestígios de sono evaporaram. O rosto de Gann enchia a tela ao lado da cama no quarto escuro, e apenas o ombro de Rom o bloqueava de uma visão completa de seu corpo nu. Se Rom se movesse...

Ele se moveu. Apoiando os cotovelos nos joelhos, Rom grogue coçou os cabelos com os dedos. — Já entramos na faixa de comunicação?

— Afirmativo.

O rosto de Jas aqueceu. Pense, pense. A colcha. Estava torcida em algum lugar perto de seus joelhos. Ela enviou sua mão esquerda em uma missão secreta, avançando mais, mais baixo... Mais baixo. Contato! Ela puxou com força e agarrou o tecido amontoado contra os seios.

— Estou a caminho. — Respondeu Rom, sem se importar com seu constrangimento.

— Gann desligando.

A tela de exibição ficou em branco.

Jas deu um gemido miserável.

Rom se virou e se espreguiçou, sua boca se curvando em um sorriso sensual e sonolento. Seu cabelo estava despenteado pelo sono, sua bochecha enrugada por causa do travesseiro.

— Bom dia, anjo.

— Seu segundo em comando acabou de me ver nua. — Como se para enfatizar esse fato, seus seios balançaram sob a colcha de seda enquanto ela falava.

— Ele não estava olhando.

— Como ele poderia não ver? É um fato da tela de exibição - se eu o vi, ele me viu. Sendo que eu estava dormindo quando você respondeu — acrescentou ela amargamente — o tato teria ditado me encobrir.

Rom rolou em cima dela, e o calor de seu corpo a queimou através do cobertor fino. Apoiando seu peso com um braço, ele afastou o cabelo dela e acariciou seu pescoço.

— Você não disse bom dia.

— Você está mudando de assunto — ela advertiu ternamente. Envolvendo os braços sobre os ombros dele, ela deu-lhe um beijo lento e sensual.

— Isso será suficiente — ele murmurou. — Agora... De volta à sua alegação. Suponhamos que Gann tenha notado seu estado de nudez. Afinal, ele é um homem. — Rom levou uma mecha de seu cabelo aos lábios, em seguida, escovou em sua mandíbula, inalando profundamente enquanto o fazia. — Mas ele é um homem discreto. Ele manteve contato visual comigo o tempo todo em que conversamos.

— Nenhuma das outras se opôs a ser pega nua? Ou eu sou a única?

Ele inclinou a cabeça. — Outras? Que outras?

— As outras mulheres.

Ela reprimiu a dor que essas palavras lhe trouxeram. — Se isso não as incomodou — ela continuou — então não vou deixar que isso me incomode. Minha amiga Betty me disse que sou muito antiquada. Estou tentando mudar isso, na verdade, mas estou longe de casa há apenas algumas semanas. Espero que demore um pouco para se transformar em uma mulher verdadeiramente selvagem e devassa. Mas fiz progressos, no entanto. Quer dizer, olhe para mim agora.

Rom tapou a boca com a mão. — Posso dizer uma coisa? — Assentindo vigorosamente, ela murmurou algo em sua palma. Ele ergueu a mão hesitantemente. — Aparentemente, estamos tendo um mal-entendido, induzido pela linguagem ou cultura; não tenho certeza. Mas nunca houve nenhuma outra mulher.

Ela gritou em descrença. — Oh, por favor. Devo realmente acreditar que você era virgem? Aposto que você vai me vender uma propriedade à beira-mar no Arizona a seguir.

— Fique tranquila, não sou virgem. — Lembrando-a ainda mais desse fato, ele aninhou seu membro inchado entre suas pernas. Seus olhos vagaram semicerrados e ela levantou os joelhos. Ele respirou fundo e cerrou os dentes. — Grande Mãe — ele murmurou. — Eu deveria ter estado na ponte cinco minutos atrás.

— Gann está acostumado com isso agora — ela argumentou. — Eu sou provavelmente a centésima mulher, ou talvez a milésima...

— Milésima! — Rom rugiu.

— Mas eu não me importo — ela disse com um suspiro — porque a noite passada foi maravilhosa. Na verdade, foi melhor do que maravilhosa e...

Desta vez ele a silenciou cobrindo sua boca com a dele, beijando-a profundamente. No momento em que ele se afastou, os dois estavam sem fôlego.

— Você é a primeira mulher que eu tenho nesta cama — ele disse com voz rouca. — E a única com quem fiz amor nesta nave.

— Mesmo? — Jas perguntou suavemente. Então ela estreitou os olhos. — Há quanto tempo você é dono do Quillie?

— Dez anos padrão. Não, já faz onze agora.

Seu coração disparou. Ela estava acostumada a ser a última na fila para muitas. Esta foi uma mudança adorável. Tudo em Rom era uma mudança adorável.

— Obrigada.

Rom acariciou seu cabelo e lentamente baixou sua boca para a dela, amando-a sem palavras. Seus seios formigavam e ela latejava entre as pernas, tanto por ter feito amor na noite anterior quanto pela necessidade que ele agora estava acendendo dentro dela. Ela moldou as mãos nas nádegas dele e o beijo pegou fogo.

Ele fez um som áspero no fundo da garganta. Afastando-se, ele se manteve acima dela, os braços estendidos. A paixão transformou seus olhos em ouro derretido, mas quando ele falou, foi com sua disciplina sempre presente.

— Eu sou necessário na ponte. Há muito a fazer antes de atracar.

Ela brincou em sugerir algo rápido e quente, mas o instinto disse a ela que Rom não se contentaria com sexo apressado. Para ele, a sedução, as preliminares e até o carinho depois disso eram partes integrantes do ato sexual.

— Depois de me trocar e terminar de fazer as malas, encontro você lá.

Ele deu-lhe um beijo leve e afetuoso antes de sair da cama e caminhar até o box do chuveiro. Ele entrou. O silvo da água encheu o silêncio. Quando ele emergiu momentos depois, ele parecia molhado, sensual e delicioso. Abafando um gemido, ela o observou se secar.

Ela tinha ouvido o termo boa genética antes, mas nunca tinha entendido verdadeiramente o que significava. Até agora. O corpo esguio e musculoso de Rom era o resultado de eras de casamentos cuidadosamente arranjados, onze mil anos de guerreiros poderosos unidos a belas mulheres. Sua aparência era o melhor que a galáxia poderia oferecer. No entanto, foi sua força interior, seu espírito generoso e bondade inata, que a atraiu para ele, além de tudo, além mesmo da familiaridade persistente que a compeliu desde o momento em que o viu pela primeira vez.

Envolvendo-se na colcha, ela pulou da cama. — Estar com você é mágico, sabia disso? Eu não confio em mágica, de jeito nenhum. Mas — ela baixou sedutoramente os cílios — Estou gostando de cada pedaço seu.

Ele juntou seu envoltório em seus punhos, puxando-a para perto para acariciar sob sua orelha. — Magia e sonhos iluminam o caminho de nossa vida. Confie... — Ele moveu sua boca em sua garganta. — Acredite.

Sonhos se tornam realidade.

A frase absurda tocou dentro dela. Acreditar em contos de fadas e magia era frívolo, infantil... Perigoso. Mas dane-se se o homem não apresentasse um argumento convincente. Era como se tudo que ela havia ensinado a si mesma, para proteção, estivesse errado. Ela enganchou os dedos no cós da calça dele e fechou os olhos. Ele manobrou a colcha para baixo, expondo seus ombros, seguindo a crista de sua clavícula com a língua. Seus joelhos quase dobraram.

— Que tal fazermos mágica na cama?

— Eu não posso. — Ele roçou os dentes por cima do ombro. — Eu sou necessário na...

— A ponte — ela disse em coro impaciente e agarrou a colcha ao redor dela com determinação afetada. — Então vá, está bem? Há um limite para o que uma mulher pode aguentar.

— Ou um homem, por falar nisso — ele admitiu. — Abra — ele comandou então. As portas de seu compartimento de roupas se abriram. Sacudindo um pacote de tecido de pelúcia, ele o puxou sobre os ombros. — Vamos precisar de capas quando chegarmos. O Depósito é fresco e úmido o ano todo.

O luxuoso envoltório aveludado verde profundo caiu em um redemoinho gracioso antes de se estabelecer logo acima de seus tornozelos. Ele prendeu a capa pesada em seu pescoço. O fecho de ouro era genuíno, ela suspeitava, pesado e gravado com os mesmos símbolos do anel de sinete de Rom.

Examinando-a, ele ergueu o capuz volumoso sobre seu cabelo despenteado. — É melhor que você não chame atenção para si mesma enquanto espera meu retorno da Destruição da Caveira. A cor do seu cabelo fará com que você seja notada, quer você queira ou não. Mantenha a cobertura.

Em que tipo de mundo selvagem e confuso ela estava se dirigindo? O repórter que a precedeu no Depósito, Kendall Smith, tinha cabelos pretos e não mencionou ninguém sugerindo que ele usasse chapéu. Ela esfregou a bochecha contra o forro de seda de sua nova roupa extravagante.

— É tão macio. Nandan?

Ele assentiu. — A concha é veludo centauriano.

— É linda, obrigada. Vou me certificar de que ainda esteja na mesma condição no sexto mês. — Quando tenho que voltar para casa na Terra, ela não disse nada.

Ele acenou com a mão, casualmente rejeitando o comentário dela, mas por um momento seus olhos mantiveram uma emoção mais profunda. Resumidamente, ele alisou a palma da mão quente sobre a bochecha dela, então se virou para fechar as calças.

Mantendo a capa enrolada em torno dela, Jas tirou a colcha e a deixou cair no chão. Ao dobrá-la e colocá-la na cama, ela se deleitou com a sensação pecaminosa do tecido nandano acariciando sua pele nua.

— Você vai precisar disso também — disse ele, vasculhando a gaveta de sua mesa de cabeceira até encontrar uma caixa estreita parecida com couro preto. — Minha comunicação. — Ele pressionou um objeto metálico brilhante do tamanho e peso de um pente de cabelo de plástico barato em sua mão. — Uma tira de coxa também. — Ele demonstrou, prendendo a fina alça preta em volta da coxa como uma cinta-liga.

— Rom, vou ficar sozinha por dois dias...

— E se eu me atrasar? Uma possibilidade improvável, mas ainda assim. Ou e se você precisar entrar em contato comigo por algum motivo?

Ela abriu as mãos em sinal de rendição.

— Encaixe a chamada de comunicação na tipoia. Está predefinido para sinalizar o Quillie de qualquer lugar da galáxia. Basta encontrar uma caixa de comunicação, colocá-la e ligar.

Jas se lembrou do repórter mencionando caixas de comunicação. Elas estavam por toda parte, até mesmo na fronteira, e eram usadas da mesma forma que os telefones públicos eram na Terra anos atrás. Mas a chamada de comunicação que ele havia demonstrado na televisão não tinha nenhuma semelhança com este equipamento elegante. Nem tinha o tipo de alcance que Rom descreveu.

— Eu não posso, Rom. Parece caro. E se for danificado? Ou eu perco?

Ele calçou as botas. — Sim, o dispositivo é caro e, sim, está disponível apenas para alguns. — Sua boca se torceu. — Um privilégio que sobrou dos meus dias como herdeiro B'kah. Eu guardo para emergências. Mas eu quero que você fique com isso. Se você encontrar alguma dificuldade enquanto eu estiver fora, use-o para me ligar.

Seu tom era brusco, mas o protecionismo por baixo era óbvio. E comovente. — Obrigada. — Ela não conseguia se lembrar da última vez que alguém cuidou dela tão profundamente. Esse sempre foi o seu trabalho - cuidar de si mesma e de todos os outros.

Rom caminhou até a porta. — Não teremos muito tempo. Terei que escoltá-los até suas acomodações assim que atracarmos para conseguir voltar aqui na hora de nossa partida.

— O Romjha.

— Correto. — Sua boca se apertou de desgosto.

Ela ponderou a estranha reação. Havia algo errado com o Romjha? O repórter tinha ficado lá e todos da equipe disseram que era luxuoso.

As portas se fecharam antes que Rom pudesse esclarecer mais. Ah, bem, ela disse a si mesma, juntando suas coisas, ela iria descobrir em breve, não é?


CAPÍTULO 12


— Fique perto das lojas e evite os becos, especialmente à noite — Rom avisou com um olhar de soslaio para Jas.

Desde que desembarcaram da nave auxiliar que os trouxe do Quillie, ele recitou todos os conselhos que reunira em uma vida inteira frequentando postos avançados como o Depósito. Parecendo ligeiramente divertida às vezes, chocada com os outros, ela acatou seus avisos de terroristas e protestos anti-Vash Nadah e ouviu extasiada suas palavras sobre como não ser enganada ao trocar seu sal por dinheiro. Por tudo isso, seus olhos brilharam com antecipação.

A exasperação percorreu seu corpo. Ela tinha alguma ideia de como era difícil deixá-la fora de sua proteção? Ela já foi uma guerreira, sim, então ele não deveria interpretar sua relativa inocência como desamparo. No entanto, por que ele não conseguia se livrar de seu mau pressentimento?

Ele apertou a mão dela, puxando-a para mais perto até que sua capa ondulasse ao redor dela. Foi um movimento projetado tanto para protegê-la da multidão quanto para mantê-la perto dele um pouco mais. Ele pegou a rota mais direta através do principal distrito comercial, apontando uma extensão arenosa de edifícios de prata escovada envelhecidos ao longo do caminho.

— Quartel-general auxiliar de comércio — explicou ele. — Três mil anos atrás, eles foram construídos com um material que supostamente não se deteriora com o tempo.

Jas ergueu as sobrancelhas. — O que aconteceu?

— Falta de atenção, complacência, apatia. A lista continua e continua. Muito parecida com a própria federação Vash Nadah.

Ela tocou seu braço. — Você ainda se preocupa muito com a política dos Vash, com o futuro, não é?

— Sim. — A compreensão o perturbou profundamente. — Eu valorizo minha herança — ele disse calmamente. — Não posso cumprir políticas que colocam em risco seu futuro. — Ele tinha pensado que estava além da dor da culpa, além de se importar. Mas sua reação ao comentário de Jas provou que ele ainda queria. — Sou um empreendedor — disse ele categoricamente. — Não me interessa ver um negócio mal operado quando sei que pode funcionar melhor. As linhas de comércio estão caindo. Onde antes havia abundância, a escassez é abundante. Quem você acha que os habitantes desses planetas culparão por seus estômagos vazios? Preste atenção às minhas palavras. É apenas uma questão de tempo até que alguém use seu descontentamento a seu favor.

— Alguém como Sharron. — Ela sugeriu severamente.

Rom não queria estragar seu tempo juntos com lembranças amargas. — Olhe ali — disse ele com leveza forçada, mudando de assunto. — O museu de arte. E bem ao lado, a biblioteca. Ambos bem abastecidos e sempre vazios de multidões.

— Vazios? Por quê?

— Quem vem aqui tende a buscar lucro, não cultura.

Ela riu. Enquanto ele apontava mais pontos de referência que ela poderia achar interessantes, ele refletiu sobre seu comentário anterior sobre como ele se importava. Talvez não fosse tanto carinho, mas um hábito. Ele havia sido criado para ver sua vida em grande escala - política galáctica, a alocação de recursos, a supervisão de incontáveis mundos. Até mesmo seu casamento seria visto como uma aliança. Antes de seu banimento, raramente algo tão mundano e insignificante como seu futuro pessoal passava por sua mente. Mesmo depois, ele pensou em sua nave, seus homens.

Até que ele viu um futuro que incluía Jas.

Então, o comerciante entediado quer se estabelecer, hein?

A piada em sua mente estava na voz de Gann, um homem que ficaria feliz em vê-lo fazer exatamente isso. Os pensamentos de Rom dispararam. Ele compraria aquela lua; construiria o pequeno porto que ele construía inúmeras vezes em sua mente. Jas poderia se juntar a ele na aventura. Ele lutou contra o desejo louco de tomá-la em seus braços e implorar para que ela fosse sua parceira. Sua amante para toda a vida. Mas e seus filhos? Eles viviam na Terra. Como ele poderia, em sã consciência, atraí-la para ficar longe deles quando ele não podia oferecer sua respeitabilidade ou mesmo seu nome?

— Veja! — Jas espiou por debaixo do capuz. — Um mercado.

— Então, vamos ver quais pechinchas nos aguardam. — Ele não ousou encontrar o olhar dela até ganhar o controle de suas emoções. Mas seu humor melhorou quando ela abriu caminho em direção a um vendedor que vendia joias brilhantes. Só Jas poderia fazer o Depósito parecer novo e excitante.

— Elas são luminescentes — disse ela, com os olhos arregalados. — Todas elas.

Para deleite do vendedor, ela ficou boquiaberta com sua seleção inexpressiva como se fossem joias de valor inestimável. Relutante em diminuir seu entusiasmo, Rom se recusou a dizer a ela como as bugigangas eram comuns.

— Mais alta qualidade — o comerciante bajulou. Olhando para Rom, ele concedeu sabiamente: — Preços mais baixos.

— Ilana adoraria esses brincos — disse Jas. — E não posso ir embora sem conseguir algo para minha amiga Betty. — Ela se atrapalhou com sua bolsa de cintura, onde ela guardou seus cartões de moeda.

Ele colocou a mão na parte inferior das costas dela. — Guarde o seu dinheiro. Vou comprar os presentes. Escolha algo para você também. Qual bugiganga devo comprar para você? — ele perguntou indulgentemente.

Sua expressão ansiosa se suavizou. — Não posso deixar você pagar.

— Por que não?

— Você já fez muito por mim.

Rom se arrependeu de tudo que não pôde dar a ela. Ele tirou a mão dela da bolsa.

— Por favor.

Ela mordeu o lábio inferior e voltou sua atenção para as joias baratas. Juntos, eles escolheram os brincos de Ilana, um anel para sua amiga e, em seguida, uma pulseira semelhante em largura às que Jas usava. Rom a colocou em seu pulso pálido e fino. Inclinando o braço para um lado e para o outro, como se a pulseira brilhante pudesse parecer diferente com a pouca luz do sol que penetrava pela manhã nublada, ela admirou a compra. Então, pela segunda vez, ela lançou um olhar com os olhos estreitos para trás. Rom puxou a bolsa de viagem mais alto em seu ombro e procurou na multidão.

— O que é isso?

Ela hesitou antes de responder. — Nada eu acho. Apenas minha imaginação correndo solta.

— Provavelmente deixei você nervosa com todos os meus avisos.

Ele entrelaçou seus dedos com os dela e a persuadiu. O tempo que ele poderia gastar aqui estava diminuindo rapidamente, e ele amaldiçoou o fato de não poder passar o dia com ela na cama no Romjha. A adesão da noite anterior o havia tocado profundamente; ela o apresentou a um aspecto do ato sexual que ele nunca experimentou, um aspecto profundamente emocional - e igualmente inesquecível. Mas os prazos de partida atribuídos pelas autoridades de voo do Depósito eram rigidamente cumpridos. Com centenas de naves entrando e saindo todas as horas do dia, uma decolagem tardia poderia fazer com que ele perdesse o privilégio de negociar aqui novamente.

Em dois dias normais, você terá seis meses com ela, disse a si mesmo.

Ele conduziu Jas por um labirinto de becos úmidos. Suas botas derramando-se em uníssono através de poças oleosas. Aqui, uma loja de incenso não escondia o odor pungente e metálico de centenas de espaçonaves pairando logo acima das nuvens baixas. A passagem se abria para um largo bulevar. Estava alinhada com delicadas árvores frondosas, que eram importadas e substituídas a cada poucos meses, à medida que sucumbiam aos vapores.

Jas diminuiu a velocidade, e ele seguiu seu olhar atordoado para uma plataforma com fitas flutuando ao alcance de um braço acima da rua - servidoras de prazer anunciando seus produtos.

— Inferno e de volta — ele murmurou. Envolvendo sua capa protetoramente sobre os ombros de Jas, ele tentou sem sucesso apressar o seu passado.

Fascinada, Jas as estudou. — Elas estão vestidas de forma idêntica, cada uma delas. Elas parecem ginastas. Elas são atletas?

— Você poderia dizer isso. — Rom a encorajou.

Uma das mulheres o avistou, e duas dúzias de cabeças de cabelos loiros desviaram em sua direção. Ele gemeu interiormente. Elas começaram a suplicá-lo em uma gíria básica que ele rezou para que Jas não entendesse, exibindo seus seios pequenos e balançando os quadris em uma demonstração de posições sexuais que faziam as servidoras do prazer do palácio de sua juventude parecerem amadoras.

Jas ficou boquiaberta com elas. — Elas são servidoras de prazer, não são?

— Elas são.

Ao passarem na frente do palco, Rom encolheu os ombros em um esforço inútil para desviar os convites implacáveis e íntimos. Jas lançou-lhe um olhar de soslaio.

— Você está causando um grande rebuliço, Capitão B'kah.

— É a minha aparência. — Explicou ele, desconfortável.

Um canto de sua boca se inclinou. — Sim, bem, você é incrivelmente bonito.

— Sou Vash Nadah.

— Isso também.

Cerrando a mandíbula, ele explicou: — Vash Nadah foram criados para respeitar as mulheres - e para ser amantes hábeis. Todo mundo sabe disso.

Jas colocou seu braço possessivamente ao redor dele. Ele sorriu com o gesto inconsciente e como ela se virou para dar uma última olhada quando eles deixaram a plataforma para trás.

De repente, ela disse alarmada: — É ele!

— É ele o quê? Quem é o quê? — Os dedos de Rom se enrolaram em torno da pistola de plasma que ele mantinha escondida em sua capa.

Jas baixou a voz. — Aquele homem ali, atrás dos dois comerciantes - ele está nos seguindo desde o mercado.

— Continue caminhando. — Rom se concentrou em frente. — Diga-me como ele é.

— Ele é enorme — ela sussurrou com urgência. — Eu não posso ver seu rosto, no entanto. Ele está usando um capuz.

— O quê mais?

— Uma capa marrom, na altura da coxa.

A tensão saiu dele. — Botas de joelho?

Ela assentiu.

— Botas de joelho marrom claro? Com sola preta?

— Sim.

— Uma capa com dupla costura na frente?

— Na verdade, sim. — Ela afastou o capuz e olhou para Rom com desconfiança.

Ele não conseguia mais esconder o sorriso. — É Muffin.

Sua cabeça girou rapidamente. Então sua cabeça se jogou para trás. — Por que você não me contou?

— Você sabia que ele era meu guarda-costas.

— Sim, mas bem... Você está certo — ela concedeu. — Eu nunca imaginei ele nos seguindo aqui.

— Que é o trabalho dele, que ele normalmente faz muito bem. Não sei se devo elogiar você por sua louvável consciência situacional ou repreender Muffin por sua falta de discrição.

— Não faça nenhum dos dois e você nos fará felizes. — Ela olhou por cima do ombro e, de todas as coisas, soprou um beijo para Muffin. O homem puxou rapidamente o capuz para baixo e desapareceu na multidão.

Rindo, Rom disse: — Quando você estiver sozinha, ele ficará mais perto.

Seu passo vacilou. — Eu não entendo o que você quer dizer.

— Muffin. Ele será seu guarda-costas durante suas viagens.

— Você está falando sério?

— Bastante.

— Mas você vai precisar dele na Destruição da Caveira.

— Lá terei a proteção de toda a minha tripulação. Você é uma mulher viajando sozinha. Simplesmente esqueça que ele está aqui. Ele tem suas próprias acomodações perto de você. Quaisquer que sejam os locais que você escolher para ver, ele irá acompanhá-la - um pouco mais discretamente, espero.

Eles diminuíram a velocidade ao entrarem nos jardins do Hotel Romjha. Rom respirou fundo e saboreou o ambiente. Nos dez anos desde a última vez que ele esteve no Depósito e passou por aqueles jardins, nada mudou. Fontes altas enchiam o ar com uma névoa fria e nítida, suavizando as bordas ásperas das estruturas ao redor. Os pássaros voavam dentro de gaiolas espaçosas, enchendo o pátio de canções. Era um oásis singular em um porto urbano arenoso. Mesmo assim, seu estômago deu um nó de costume.

Jas emoldurou seu rosto com as mãos. — Não posso mudar sua opinião sobre entrar? — Ele balançou a cabeça e ela concordou em compreensão. Sua voz se suavizou. — Obrigada por me trazer aqui. E pela noite passada. — Maravilha nadou em seu olhar. — Eu nunca vou te esquecer.

Com suas palavras, todos os músculos de seu corpo ficaram rígidos.

Você vai voltar aqui, apenas para descobrir que ela se foi.

Os velhos medos de abandono o assolaram - o anjo de Balkanor, seu pai, as outras famílias Vash Nadah, todos eles lhe deram as costas sem se importar. Ele se aventurou a esperar que Jas fosse diferente. Mas como ele saberia com certeza, a menos que permitisse que o destino seguisse seu curso?

— Isso não é um adeus — afirmou. — Estarei esperando por você no terminal de desembarque em exatamente dois dias padrão.

— Eu sei. — Ela jogou os braços sobre os ombros dele e ficou na ponta dos pés. — Eu estarei lá.

Ele trouxe sua boca para baixo sobre a dela e ergueu-a contra ele, bebendo em sua paixão, sua fé nele. Sua absolvição.

Naquele momento vertiginoso e estimulante, nada existia além dos dois, nenhum passado conspirando para mantê-los separados, nenhuma velha ferida que precisasse ser curada. Então, uma sensação avassaladora de mau presságio o arrepiou como uma nuvem passando sobre o sol. Ele agarrou seus ombros e lentamente a empurrou para trás. Ele colocou o polegar sob seu queixo e ergueu o olhar para ele.

— Dois dias, anjo.

Seu polegar demorou mais um momento, então ele passou a capa ao redor dele e foi embora, deixando seu coração para trás.

Jas enrolou os braços em volta do estômago e observou os passos largos de Rom levá-lo para longe dela, sua postura orgulhosa de um rei, refletindo milhares e milhares de anos de ascendência real.

Ele não olhou para trás.

Ela observou enquanto ele tinha uma breve conversa com Muffin, então desapareceu na multidão. Sacudindo-se por um momento de saudade, ela viu seu novo protetor começar uma caminhada lenta ao longo dos caminhos, permanecendo bem à vista. Rom tinha sido doce em se certificar de que ela fosse cuidada, e certamente Muffin era capaz.

Ela carregou sua bolsa de viagem para o banco mais próximo e arrumou sua capa sobre a pedra fria e úmida. Uma leve névoa estava caindo. Enterrando-se no calor confortável da capa de Rom, ela olhou para a gaiola mais próxima a ela. Lá, incríveis criaturas emplumadas voavam ao redor de sua gaiola. Algumas tinham penas que pareciam pelo, enquanto as pintados de verde presos à tela de arame tinham focinhos enrolados e seis patas.

Pássaros amarelos fofinhos coçavam para se alimentar no chão do aviário. Pareciam fêmeas - piavam como fêmea também - e poderiam ser fofas se não fossem carecas, com bicos nodosos que deixariam os abutres orgulhosos.

Cada vez mais curiosa, ela pensou.

Alice não poderia ter achado o País das Maravilhas muito mais estranho do que isso.

Aos poucos, a novidade dos pássaros foi passando. O vazio a inundou, como aconteceu depois do acidente, como aconteceu depois de seus sonhos, algo que ela não havia sentido uma vez a bordo do Quillie. No entanto, desta vez ela entendeu a razão por trás da desolação - ela sentia falta de Rom. Ele havia preenchido o vazio dentro dela como ninguém jamais havia feito. Talvez houvesse algo no conceito de alma gêmea, o que ela havia descartado há poucas semanas como um exagero da Nova Era. O pensamento a deu um calafrio.

Lembrando-se da leitura da palma da mão que Tina lhe dera na galeria de Betty, Jas desenrolou as mãos que ela não percebeu que estavam cerradas em punhos e olhou para a teia de linhas gravadas ali.

Houve sofrimento e decepção em seu passado, mas essa dor continuará a torná-la mais forte, a força de que você precisa para seu verdadeiro amor.

A previsão reverberou dentro dela. Sem aviso, as lágrimas aumentaram e ela mordeu o interior da bochecha para controlar o impulso de chorar.

Ele exigirá todo o poder do seu espírito, da sua fé... Da sua carne.

Nem todos os homens eram como seu ex-marido. Dan e os homens da família dela provaram isso. E Rom. Mas e se seus sentimentos mágicos e dirigidos pelo destino por Rom se apagassem, sem aviso, como aconteceu com Jock, deixando-a desolada, enquanto Rom continuava a exigir o que ela era incapaz de dar a ele?

Confie... Acredite...

Sim. Isso era exatamente o que ela iria fazer. Ela juntou suas coisas e partiu em direção a Romjha com uma sensação de inevitabilidade, de certeza. Se seus sonhos pós-acidente eram a chave para descobrir o caminho que sua vida havia tomado, então seu relacionamento com Rom era a chave para entender os sonhos. Então ela poderia desfrutar de seu tempo com ele com a consciência limpa e sem a culpa que havia devastado sua vida. Só isso a manteve andando.

 


A partir do momento em que Jas entrou no vasto saguão ao ar livre, ela entendeu a relutância de Rom em vir aqui. O lugar era um verdadeiro santuário para seus ancestrais. Não era de se admirar que ele tenha ficado perto da fronteira todos esses anos, longe das lembranças incessantes da família que o evitava.

Uma estátua real de Romjha, o B'kah original, erguia-se acima da multidão agitada de viajantes intergalácticos. Tinha facilmente dez metros de altura - e parecia feita de ouro verdadeiro. Romjha estava com as pernas abertas, os braços preparados e prontos para a batalha. Suas feições eram duras, resolutas, e seus olhos, voltados para um horizonte distante, eram tão perspicazes e inteligentes quanto os de Rom.

A raiva afastou seu espanto. Romjha pode ser o - herói do reino - como a placa afirmava tão claramente, mas o atual governante B'kah, o pai de Rom, devia ser um homem sem coração. De que outra forma ele poderia transformar seu único filho em um pária? Do jeito que ela via, Rom merecia sua própria estátua. Ele salvou a galáxia de um sociopata com a intenção de destruí-los todos. E tudo o que importava para seu pai era a maldita contagem de esperma de Rom.

— Perdoe-me.

Um homem envolto em uma longa capa preta passou por ela e por um casal próximo para colocar um pacote aos pés da estátua. Enquanto meditava em silêncio, Jas notou pela primeira vez os outros itens espalhados ao redor das botas enormes de Romjha. Um prato de frutas exóticas, luvas, um lenço bordado colorido, um pergaminho amarrado com uma fita de seda. Caridade? Sinais de respeito? Ou o culto ao herói se misturava com a religião?

Impulsivamente, ela torceu uma de suas pulseiras de prata e a colocou na base da estátua - para dar sorte... E na esperança de que Romjha pudesse guiar Rom em direção a alguma aparência de paz interior.

Uma brisa úmida soprou de fora do hotel. Ela bagunçou a bainha de sua capa e tentou atrair seu cabelo do abrigo de seu capuz. Agarrando sua capa ao redor dela, Jas colocou sua bolsa de viagem em seu ombro e atravessou o saguão.

Seus instintos formigaram e ela desacelerou. Alguém a estava seguindo. Ela olhou por cima do ombro, meio que esperando encontrar Muffin - embora ela já tivesse notado ele andando à frente dela. Mas tudo o que ela viu foi um mar preocupado de viajantes.

Seja cautelosa, não tenha medo.

Ela pressionou sua bolsa mais perto de seu quadril e avançou. O hotel transbordava riqueza, em contraste com a sensação latente de decadência lá fora. O magnífico piso e grande parte da mobília eram esculpidos em pedra cor de caramelo, com listras avermelhadas. Ela desviou para o que presumiu ser a recepção, onde um funcionário vestido com um uniforme azul com detalhes prateados estava mexendo em um punhado de cartões de plástico que passavam por moeda básica. Jovem, como Zarra, e ainda mais louro, ele exibia uma fileira de minúsculos quadrados prateados colados na ponte de seu nariz proeminente. Joias para a pele, Rom explicara antes quando viu outras pessoas adornadas dessa maneira.

— Bom dia. — Ela disse para chamar sua atenção.

Ele a cumprimentou com uma reverência respeitosa. Seu olhar passou rapidamente por sua capa e hesitou no fecho em seu pescoço. Imediatamente, seus modos se tornaram mais respeitosos.

— Honrada senhora, em que posso ajudá-la? — Ele se abaixou para olhar sob o capuz dela.

— Um quarto, por favor — ela declarou, jogando o capuz para trás de sua cabeça. Ele recuou, sua expressão era de curiosidade e surpresa. Ela explicou secamente: — Eu sou da fronteira.

Como se isso explicasse tudo, ele relaxou. — Você tem uma reserva, ilustre senhora?

— Sim, um quarto padrão. — Era o que o repórter tinha ficado quando estava no Depósito e o que ela pedira a Terz que pedisse ao hotel quando ele lhes comunicou o rádio mais cedo.

— A duração da sua estadia, por favor?

— Dois dias. — Ela entregou a ele um cartão de papel, um de uma dúzia que ela havia pré-escrito com seu nome em letras básicas. — Meu nome é Jasmine Hamilton.

Ele se curvou novamente, então se ocupou em sua tela visual. Examinando a tela fina como um waffer, ele disse: — Eu tenho uma vista da montanha, se você preferir.

Quais montanhas? Ela não tinha visto nada através da poluição.

— Tudo bem, o que você tiver.

— Seu método de pagamento?

— Sal.

Ela enfiou a mão na bolsa da cintura, retirando e entregando a ele um dos frascos que ela tinha usado para separar seu estoque em quantidades menores e mais administráveis. Ele o trouxe para uma escala computadorizada, onde ela ficou aliviada ao vê-lo medir uma colher do tamanho de meia colher de chá. Isso lhe deu uma ideia melhor de quão rápido ela gastaria seu sal. O dispositivo começou a apitar, testando sua autenticidade e pureza. Depois de um longo tom, ele buzinou novamente e distribuiu seu troco na moeda básica nos cartões usados em todos os lugares - um prata e um azul claro - que ela guardou na bolsa da cintura junto com o frasco.

— Isto é da mais alta qualidade. — Sua voz caiu. — Quase puro.

— É sal Morton Kosher 5— ela confidenciou sob sua respiração. Ele balançou a cabeça lentamente, e ela não resistiu: — 'Quando chove, transborda.'

— Ah... Claro. — Claramente confuso, ele girou a tela para que ela pudesse ver. — O código da sua porta, honrada senhora.

Os quatro números eram os mais próximos que ela chegaria da chave do quarto. — Memorize-os — o repórter Kendall Smith aconselhou seu público da Terra. Isso foi o que foi feito aqui. Repetindo os números do Básico várias vezes em sua cabeça, ela agradeceu ao balconista e saiu. — Quando estiver em Roma — ela raciocinou — faça como os romanos.

 

Dois dias depois, após explorar a maior parte do andar superior do museu de arte do Depósito, Jas descansava em um banco em uma sala onde a atração principal era uma escultura de forma livre feita da mesma liga que as joias brilhantes que Rom comprou para ela. As luzes embutidas diminuíam e aumentavam alternadamente, dando vida a diferentes áreas da escultura. Nem tudo era luminescente, ela percebeu depois de alguns minutos fascinada. O artista havia escolhido engenhosamente quais partes ele queria manter a luz e quais não, criando magia absoluta conforme a iluminação externa surgia e morria. Enquanto ela rabiscava notas e esboçava, ela ponderou novas técnicas que ela poderia trazer para seu trabalho. Duas mulheres entraram, a mesma dupla que ela viu entrando no museu antes. Jas abaixou seu lápis. Depois do que Rom disse a ela, ela não esperava ver mais ninguém aqui.

A dupla se sentou na extremidade oposta de seu banco, e Jas devolveu seus sorrisos calorosos. A mais alta das duas era uma mulher de aparência patrícia, mais ou menos da idade de Jas, com cabelos na altura do queixo da cor de Rom. Ela desabotoou sua capa cinza fofa, abriu um bloco de desenho e, enquanto sua companheira mais baixa olhava, ela começou a desenhar. Correndo o risco de parecer irremediavelmente intrometida, Jas esticou o pescoço para ver.

— Você é uma artista? — ela perguntou.

— Sim — respondeu a mulher com um sorriso sereno. — Meu nome é Beela. Qual é o seu? — Enquanto elas passavam pelas apresentações, Jas sentiu o vínculo instantâneo que costumava fazer com outras pessoas em sua área.

— Minha irmã Janay também é artista — Beela apontou.

Jas olhou de Beela para Janay.

Irmãs, hmm? Fale sobre a estranha inconsistência da genética.

Janay era clara, para um tipo não terrestre, com traços amplos e agradáveis, enquanto a coloração bronze de Beela era mais próxima da de Rom. Beela também compartilhava seu nariz longo e aristocrático e maçãs do rosto esculpidas. Isso não significava que ela também era Vash Nadah?

Jas juntou as mãos no colo e sorriu. — Eu não posso te dizer como é bom conhecer outros artistas tão cedo na minha viagem. Pintar é meu sustento no meu mundo natal.

— Terra. — Disse Beela, balançando a cabeça.

Jas ficou boquiaberta com ela.

— A cor do seu cabelo — explicou Beela, tocando a corrente de um colar meio escondido nas dobras de sua capa. — Isso denuncia você. Minha família e eu vimos imagens do cavalheiro de seu mundo natal. Ficamos muito impressionados com sua aparência. E também pela notícia de que outro morador da Terra o seguiu até aqui, uma mulher. Depois que foi descoberto, tornou-se uma grande notícia em seu planeta. — Seu sorriso suavizou suas feições, mas não seu olhar penetrante. — O Depósito é menor do que parece; poucos realmente vivem aqui. A notícia viaja rápido. Sua chegada - não era segredo.

— Eu vejo.

Uma centelha de desconforto percorreu Jas. A ideia de outras pessoas saberem de seu paradeiro a incomodava. Ela estava feliz por Muffin estar do lado de fora, vagando pelos corredores, fingindo estar interessado em arte em tecido.

Beela deslizou as mãos para fora do caminho para que Jas pudesse ver o que ela estava desenhando. O desenho não foi feito a lápis ou carvão como ela esperava, mas em um meio que parecia pastéis - um espaço preto repleto de estrelas onde uma explosão de cores florescia, anéis concêntricos de branco brilhante desbotando em tons de amarelo, laranja, e finalmente azul e índigo. Mas o que a atraiu foram os raios etéreos de luz emanando do centro.

— Rebite6 — Jas comentou baixinho. — Isso me lembra água quando você joga uma pedra em um lago calmo... Um lago profundo e escuro ao pôr do sol.

— Amanhecer, na verdade. — Janay finalmente falou.

Beela lançou-lhe um olhar penetrante. Os dedos da mulher dispararam para sua boca. Com os lábios pressionados, ela retirou um grande bloco de papel de seu portfólio. Na página superior havia uma réplica virtual do desenho de Beela. Mas era plano e carecia da paixão de sua irmã.

Jas empregou o melhor tato que pôde, murmurando palavras de elogio. — Perdoe minha ignorância em perguntar, mas o que é?

As características aristocráticas de Beela ganharam vida. — É o coração da nossa galáxia. Um lugar que os cientistas do comércio chamam de domínio de violência cataclísmica, um buraco negro, um monstro faminto engolindo massa, luz e até mesmo tempo. Mas não é esse o caso. — Seus olhos claros ficaram vidrados e ela distraidamente acariciou o colar com a ponta dos dedos. — É o útero de onde vem toda a vida. E para onde toda a vida retornará, no final.

A mulher parecia estar em êxtase. Calafrios arrepiaram os cabelos da nuca de Jas. Bom Deus, ela mesma parecia assim para os outros também? Impulsionada e ligeiramente demente? Ela pensou nas paisagens desérticas que tinha sido compelida a criar no rescaldo de seus sonhos, como, trancada dentro de seu estúdio, ela não tinha comido, não tinha dormido até que o período de furiosa criatividade passava, deixando-a esgotada, mas nunca totalmente satisfeita. O buraco negro deve inspirar Beela da mesma forma que o deserto afetou Jasmine. O conhecimento evocou uma identificação emocional repentina com a mulher talentosa.

— Você exibe seu trabalho em uma galeria?

— Em nossa colônia. Nas montanhas acima da cidade. Na verdade, minha irmã e eu voltaremos lá esta noite. — Beela considerou Jas calorosamente, brincando com a corrente em seu pescoço. — Você deve se juntar a nós para o jantar. Os outros adoram receber visitantes. Particularmente viajantes de longe, como você.

Com uma pontada de arrependimento genuíno, Jas balançou a cabeça. Quando Rom voltar esta noite, ela não queria ficar com ninguém além dele. — Eu sinto muito. Vou encontrar alguém esta noite.

— Oh, você deve vir. Você tem tempo. Tenho algo que sei que vai interessar a você. Por favor, o que pode ser tão importante que você não pode perder um pouco de tempo?

Beela estremeceu tanto com a urgência que Jas teve que apertar os lábios para não rir. A mulher parecia a versão galáctica de uma representante de vendas — Por mais que eu queira, não posso. Eu estarei deixando o Depósito em breve. — Curvando-se ao seu julgamento interior, ela se recusou a dizer mais. — Você tem um cartão, porém, de uma maneira de encontrá-la na próxima vez que passar?

Beela pressionou um disco micro fino e brilhante na mão de Jas. Sem saber o que fazer com isso, Jas se sentiu mais como uma mulher da fronteira do que nunca. — Seu cartão de visita?

— Sim. Dados sobre a colônia e como chegar lá. — Beela ergueu a corrente dourada de seu pescoço e a jogou sobre a cabeça de Jas. E agora, um presente.

Jas protestou. — Eu não posso aceitar isso...

— Bah. Eu os faço na colônia e tenho muitos, muitos mais. — O tom maternal de Beela lembrou Jas de Betty. — Fique com ele, Jasmine Hamilton; medite sobre isso. Que isso a leve à verdade.

O que Jas agora esperava que não fosse uma apresentação de slides sobre como ganhar uma fortuna vendendo mercadorias do buraco negro. Agradecendo a Beela novamente, ela desejou sorte às irmãs amigáveis, mas peculiares, em suas aventuras e bateu em retirada apressada.

Lá fora, o céu sombrio e nublado parecia envolvê-la, amortecendo seu humor, e ela prometeu a si mesma um banho quente quando voltasse para seu quarto, um que seria mil vezes melhor se ela pudesse compartilhar com Rom.

Muffin a acompanhou até os jardins da Romjha. Antes de entrar, ela fez uma pausa para cumprimentar os pássaros. — Vocês ficam mais bonitos a cada dia — disse ela em inglês para os verdes de seis patas. — Como periquitos com esteroides.

Eles vibraram loucamente, escalando a gaiola de malha até que todo o rebanho se reuniu na frente dela. Eles nunca haviam prestado atenção nela antes. Jas olhou em volta inquieta para ver se mais alguém tinha notado. — O que chamou sua atenção? Isto?

Ela segurou o colar de Beela em direção a eles. Recuando, eles gritaram. Curiosa, Jas ergueu o medalhão um pouco mais alto. Houve uma explosão de penas verdes. Os pássaros correram para todos os lados da gaiola, o mais longe possível dela, onde piaram carrancudos, olhando para ela com olhos acusadores.

Perplexa, Jas baixou o olhar para o ornamento gravado preso à corrente de ligação plana. A peça brilhava na luz opaca, como se viesse de dentro. Uma liga exótica, ela supôs, mas ainda uma joia benigna - se não para pássaros.

Ao entrar no hotel, ela diminuiu o passo na frente da estátua imponente de Romjha para embalar o medalhão pesado de Beela em sua mão, inclinando-o de um lado para o outro, contemplando a maneira como a mulher posicionou a imagem do sol em seu desenho acima de duas mãos unidas em oração. Um homem e uma mulher. Um reconhecimento perturbador explodiu dentro dela com a visão. Considerando todas as informações que tinha enfiado em sua cabeça recentemente, ela não ficou surpresa por não conseguir descobrir o porquê. Era uma bela peça, no entanto. Mas muito masculina, não para seu gosto pessoal.

— O que você acha — ela perguntou a Romjha — algo que seu bisneto poderia gostar?

Piscando, Jas balançou a cabeça. Se ela não soubesse melhor, ela poderia jurar que o velho guerreiro apenas franziu a testa.


CAPÍTULO 13


— Grande Mãe! — Com os olhos lacrimejando, Gann engasgou com o líquido que acabara de beber. — Tem gosto de galhos cozidos. Se você me desejasse morto, B'kah, eu esperava que você tivesse escolhido um método mais compassivo do que este. — Ele empurrou de lado a primeira tentativa do cozinheiro do Quillie de cerveja e passou as costas da mão na boca.

Rom serviu-se de uma porção da bebida gelada e de cheiro azedo e ergueu a caneca para a luz. — A cor não é ruim. Não exatamente dourada, como deveria ser, mas um agradável marrom claro.

Gann bufou com desprezo.

Rom fechou os olhos e bebeu, rolando o líquido sobre a língua antes de engolir. — Vamos continuar tentando — disse ele, despejando o resto da cerveja na pia.

— Seja honesto comigo, velho amigo. Não é esse... Refresco que o deixa entusiasmado com 'textura lisa, sabor claro e nítido e efeitos salubres prolongados'. É a mulher.

Rom deu uma risada profunda e enigmática. — O potencial de lucro da venda de cerveja é impressionante. Não há nada parecido na galáxia.

— Evidentemente — Gann disse baixinho. Ele pegou suas cartas de jogar. — Eu crio cinco unidades para você. — Ele deslizou a moeda para Rom. — E uma ficha de ouro.

Rom examinou as cinco cartas nas palmas das mãos. Jas deu a Gann seu baralho de cartas e o ensinou a jogar várias formas do que os habitantes da Terra chamam de pôquer. Depois que eles deixaram o Depósito, Gann o apresentou ao jogo positivamente divertido. Aliviou um pouco sua impaciência em chegar à Destruição da Caveira, concluir seu negócio e voltar para Jas.

— Cubro você — disse Rom a Gann, mantendo toda a expressão de seu rosto enquanto considerava suas cartas - uma representando uma gema vermelha singular, outra com uma folha preta singular e três cartas com sete unidades cada, folhas pretas, gemas e corações. Uma mão excelente, que Gann chamou de palácio completo - por qualquer motivo. — E eu levanto para você um cubo de sal.

Um sorriso apareceu na boca de Gann. Com as pontas dos dedos, ele empurrou um minúsculo cubo branco ao lado da aposta de Rom.

Os homens apresentaram as mãos.

— Palácio cheio — Rom anunciou.

— Casa cheia — corrigiu Gann. — Mas para um B'kah, suponho que os dois são intercambiáveis.

Rom lançou-lhe um longo olhar.

— Três de um tipo. Sua vitória. — Gann empurrou o sal e a moeda para Rom. Com habilidade admirável, ele começou a embaralhar o baralho.

A tela de exibição chiou. Terz apareceu. — A chamada chegou para você, senhor. Drandon Keer.

— Keer? — Rom deu uma risada de descrença. — Não tenho notícias do homem desde que deixamos Nanda com aquela sacola cheia de vagens roubadas. Coloque-o na linha. — A tela de exibição piscou. Rom espalmou as palmas das mãos na mesa e se inclinou para frente. — Drandon, seu bandido espacial impenitente!

Drandon deu um sorriso torto familiar, seus dentes cegaram em seu rosto agora profundamente bronzeado. — B'kah. Já faz muito tempo.

— Você está malditamente certo que mudou. Você está bonito. Suponho que o cultivo de seda Nandan combina com você. Como está a plantação?

— Muito lucrativa. Mas aqueles nandanos irritantes não desistem. Na última safra, eles interceptaram uma das minhas remessas de saída. Eu os culpo por todo esse cabelo grisalho.

— Um refrão familiar. Acredito que essas foram suas palavras no dia em que o tirei daquela desculpa nandana de prisão.

Os homens compartilharam uma risada carregada de lembranças. Os anos suavizaram as arestas mais duras de Keer. Rom se lembrava da jovem nobre nandana que ajudou seu amigo a obter as vagens. — E como está a adorável Jhiara?

— Muito bem — Drandon respondeu presunçosamente. — Três filhos agora. Tudo com menos de seis temporadas. E você?

— Ainda casado com meu trabalho.

— Estou surpreso por você não ter encontrado uma esposa. Certamente, há uma mulher que toleraria você.

Jas tinha partido há apenas duas noites, mas parecia que fazia anos desde a última vez que ele a segurou em seus braços. — Eu posso ter encontrado ela — ele disse casualmente. — Sua disposição de me aturar é uma de suas muitas qualidades cativantes.

Drandon deu uma risadinha. Após uma pausa, seu sorriso vacilou. — Escute, eu encontrei algo. Algo que você, entre todos os homens, pode querer saber.

A observação não surpreendeu Rom. O contrabandista que virou dono de plantação - dono ilegal de plantação - não era o tipo de fazer visitas sociais casuais.

Drandon abriu a mão. — Um dos colhedores de vagens que contratei para a temporada deu isso para minha esposa. Alegou que isso a levaria à verdade. — Ele segurou o objeto brilhante em direção à tela. — Eu acho que não.

Rom se afastou da mesa. Cada memória ruim que ele tinha se aglutinado no medalhão que descansava na palma da mão de Drandon.

Mãos orando, um sol nascente. Totalmente mal.

— Onde está o colhedor agora? — Ele exigiu, seu coração martelando dentro de seu peito.

— Foi embora— Drandon respondeu com pesar. — Antes que eu pudesse espremer qualquer informação dele ou do resto de seus amigos fanáticos.

— Faça o que fizer, não permita que ninguém use o colar. — Rom se levantou. — Tranque-o até que eu veja por mim mesmo.

— Quando você vai chegar?

Rom olhou para a tela de progresso ao lado do contador do tempo na antepara. — Se eu desviar agora - em velocidade máxima - estarei lá pela manhã. — Ele poderia voar até lá e ainda voltar ao Depósito ao anoitecer.

Drandon ergueu uma das mãos em despedida. — Rom, Gann — disse ele. — Até. — A tela ficou em branco.

Rom praguejou baixinho e passou as mãos pelos cabelos.

— Pode ser o mesmo culto — disse Gann. — Ou talvez um imitador.

O estômago de Rom se apertou. — De qualquer maneira, temo que a escuridão finalmente nos alcançou.

 


No posto de controle de desembarque, Jas parou diante de uma tela do chão ao teto que mostrava voos chegando. Ela examinou a lista, procurando pelo Quillie. A decepção a inundou. Eles haviam postado um atraso de sete horas, o suficiente até para justificar o retorno ao Romjha. Ela procurou na multidão por Muffin e o encontrou fingindo examinar o conteúdo de uma barraca de comida.

Virando-se, ela abriu caminho entre os viajantes e comerciantes enfiados em cada centímetro disponível na câmara cavernosa, mas abafada. Ela se certificou de segurar a bolsa perto enquanto se espremia pelas portas para as ruas enevoadas do início da noite. O odor pungente de corpos superaquecidos misturado com a fumaça do foguete. Apesar da má qualidade do ar, ela respirou fundo, feliz por estar do lado de fora depois de quase uma hora dentro do terminal.

Exceto por um grupo de barulhentas servidoras do prazer em exibição na esquina oposta, o bulevar estava quase tranquilo. O som musical das risadas de mulheres jovens tilintou atrás dela. Assim como ela suspeitava, Muffin diminuiu o ritmo perto do estágio de servidoras de prazer. Algumas das garotas mais entusiasmadas pularam e puxaram a camisa do homenzarrão. Ele olhou para ela impotente. Ela deu de ombros e ele voltou sua atenção para elas, sem dúvida organizando algum entretenimento noturno. Ele a tinha seguido implacavelmente, sem falhas, por dois dias. Mesmo quando ela tentava sacudi-lo, só para ver se conseguia, ele sempre reaparecia momentos depois. Ela seguiu em frente, sabendo que ele a alcançaria.

No primeiro cruzamento, o pavimento estreitou. As sombras se inclinavam nas frondes entre ela e a rua. Das profundezas da lacuna entre dois edifícios, ela ouviu o som de uma briga.

Fique longe dos becos, Rom avisou. Ela acelerou o passo assim que um homem saiu correndo da escuridão. Com a capa girando, ele tropeçou no caminho dela e caiu no chão. Ela mal evitou tropeçar nele.

— Cuidado! — Ela repreendeu. Ele gemeu e rolou para o lado, se contorcendo.

Maravilhoso. O que agora? Fugir e deixá-lo assim não era uma opção. Ela olhou ao redor procurando por alguém que pudesse ajudar. Nenhum oficial à vista e nenhum Muffin. Isso faz sentido. A única vez que ela andou muito na frente dele, e isso acontece.

O homem gemeu.

— Escute, eu já volto. Vou encontrar alguém que possa ajudar.

Algo levemente doce permeou o ar, como um incenso antigo. Rapidamente se transformou no forte odor de suor masculino. Então alguém puxou a alça de sua bolsa por trás.

— Ei! — Ela se afastou.

O homem esparramado a seus pés voltou milagrosamente à vida, saltando quando uma figura sombria apareceu atrás dela. Jas cambaleou para frente em uma corrida inicial. Outro puxão em sua bolsa arrancou-a de seu ombro e saiu para a rua com um tilintar abafado de vidro quebrando - provavelmente seus frascos de sal e um minúsculo frasco de perfume.

— Socorro! — ela gritou. — Ladrões — Uma mão segurou sua boca. Então um braço musculoso a agarrou pela cintura, prendendo-a a um corpo forte e magro.

Talvez eles não fossem roubá-la. Talvez eles pretendessem pior. Eles poderiam estuprá-la ou matá-la. O terror gelou seu interior e ela lutou para respirar contra a pressão daquela mão.

Fique calma. Pense. Não adianta morrer por alguns grãos de sal.

Uma figura sombria com manto vasculhou sua bolsa. O cheiro de perfume derramado parecia horrivelmente fora do lugar, flutuando como fez para seu nariz. Perto dali, um de seus batons rolou preguiçosamente em uma poça, perseguido por um frasco intacto de sal.

— Você aí! Deixe-a em paz! — Uma voz feminina indignada gritou no crepúsculo enevoado.

Mais vozes se juntaram, todas gritando por ajuda. Jas tentou se libertar. Mas o homem que a segurava a empurrou para frente, e ela bateu com força no pavimento molhado, arranhando as palmas das mãos. O som de sapatos batendo contra a rua molhada chegou mais perto, e seus agressores fugiram na direção oposta. Jas se ajoelhou, ofegando e formigando com o choque.

Mãos gentis se fecharam sobre seu braço. — Oh, que coisa — disse uma mulher, ajudando Jas a se levantar. — Você está machucada?

A bochecha de Jas roçou contra uma capa cinza fofa. Seu olhar desviou para cima. — Beela!

Os traços austeros da mulher suavizaram ligeiramente. — Uma reunião fortuita, você não acha?

 


A escotilha foi levantada e Rom desceu a prancha, deixando Gann para trás para preparar o Quillie para a partida assim que ele retornasse. Esta visita à plantação de seda de Drandon não foi uma visita social. Embora Rom estivesse ansioso para ver seu amigo, ele não tinha tempo a perder. Uma sensação de mau presságio continuou a assombrá-lo. Assim que ele examinasse a descoberta de Drandon, ele voltaria para buscar Jas. Somente quando ele se assegurasse de sua segurança, ele seria capaz de descansar novamente.

Ainda assim, o sol nebuloso era surpreendentemente bom. Uma brisa úmida trouxe o perfume característico das flores de seda de Nandan e deixou uma película úmida em sua pele exposta. Ele deu as boas-vindas. Ao contrário da maioria dos comerciantes que conheceu ao longo dos anos, ele preferia o solo firme ao convés de uma nave espacial. Havia uma certa permanência em viver em um planeta, algo que ele estava apenas começando a perceber que sentia falta. Os perigos e a dura solidão da vida de um contrabandista não tinham mais o fascínio de antes.

Seu amigo gritou através da zona de pouso. — Romlijhian!

Rom acenou e aumentou o passo pelo solo arenoso. Apesar da expressão de preocupação do homem, Drandon parecia melhor do que Rom jamais o vira. Ele tinha uma expressão de felicidade e satisfação que só um bom casamento poderia trazer.

Uma mistura de emoções percorreu Rom. Ele queria o que Drandon tinha - uma mulher que ele amava ao seu lado, uma casa onde ele pudesse criar raízes, um meio de vida estável. Ele passou a acreditar que essas coisas eram para outros homens. Mas sua vida era sua agora, não era? Esse contentamento também poderia ser dele.

Rom agarrou o antebraço de Drandon em uma sacudida vigorosa. A saudação formal se dissolveu em um abraço caloroso. Então, segurando os ombros um do outro, eles se olharam. Por enquanto, o motivo da visita de Rom não foi mencionado.

Eles se separaram. Rom examinou os exuberantes jardins paisagísticos, além dos quais havia um hangar que abrigava pelo menos dez espaçonaves. Drandon nunca foi um homem que dependia de outros para proteção. Consequentemente, não foi surpresa para Rom vê-lo de posse de uma frota pessoal bem armada. Mais perto, uma bola vermelha e um gato ketta de brinquedo gasto estavam ao lado do caminho.

Rom sorriu. — Onde estão Jhiara e as crianças?

— Ela os levou para o mar. Receio que eles não voltem até amanhã. Não esperávamos sua visita. — Drandon examinou o rosto de Rom. — Ela vai querer ver você.

— Por mais que eu queira ficar, não posso. Alguém me espera no Depósito.

Drandon acenou com a cabeça gravemente. — Venha para dentro — ele pediu. — No segundo nascer do sol, a temperatura ficará insuportável.

Eles caminharam em direção a uma ampla residência de um nível construída com paredes de pedra natural e rodeada por pátios sombreados e uma ampla varanda envolvente - um projeto típico em climas tropicais.

Drandon o conduziu para a varanda. Dava para uma vasta plantação de jovens árvores de seda Nandan. Rom admirou a vista, evidência dos anos de trabalho árduo de Drandon, enquanto uma jovem empregada derramava suco em dois copos de gelo e partia, com os pés calçados em chinelos sapatos no piso de laje. Rom seguiu o exemplo de Drandon e se acomodou em uma das almofadas perversamente convidativas feitas de seda Nandan. O segundo sol do planeta, uma pequena orbe incandescente, apareceu acima do horizonte.

— Durante a próxima hora, a temperatura vai subir vinte graus — disse Drandon. Ele ergueu a tampa de uma das duas caixas de madeira esculpida e entregou a Rom uma folha seca enrolada firmemente em torno do que era certamente de primeira qualidade. — Quando isso acontecer, vamos diminuir a barreira do calor molecular. A umidade aqui é formidável.

— Tão ruim quanto em Nanda? — Rom perguntou enquanto Drandon acendia seu charuto.

— Pior. Claro, Jhiara adora ser nandana.

— E você?

— Na verdade, eu detesto — cigarro preso entre os dentes, Drandon entrelaçou as mãos atrás da cabeça — cada vez menos a cada dia.

Rom deu uma risadinha. Ele entendeu como só outro comerciante poderia. O sucesso era algo para se orgulhar. — Como sua esposa, as árvores amam o clima, o que está causando sua mudança de opinião.

— Elas crescem duas vezes mais rápido e produzem quatro vezes mais do que as de Nanda. — Os olhos do homem brilharam. — Meus netos viverão para ver esta plantação eclipsar a produção de todo o planeta. — Repentinamente pensativo, ele desviou o olhar para as fileiras de árvores verdes exuberantes nas encostas abaixo. — Ou eles vão? — ele perguntou baixinho.

Rom se mexeu desconfortavelmente. — Talvez eu possa lhe contar mais depois de examinar aquele medalhão.

Com uma expressão resignada no rosto, seu amigo ergueu a tampa da segunda caixa, retirou uma bolsa de cordão irregular e a entregou a Rom. — Quer as oito famílias decidam apoiá-lo ou não, eu o farei. Fique tranquilo, vou lutar...

— Não estou aqui para recrutar ninguém — disse Rom rigidamente. — Nem para investigar a possibilidade de outra guerra. Vim por motivos pessoais. A galáxia não é mais minha responsabilidade.

— De alguma forma, acho difícil acreditar que você acredita nisso.

Rom deixou a observação de Drandon passar por ele. Durante toda a sua vida, ele suportou as expectativas dos outros. Não mais. Ele não era um B'kah. Ele era um simples comerciante com seus próprios interesses em mente. Ele não pretendia animar as esperanças de Drandon. Ele podia ser um herói aos olhos de Jasmine, mas não se importava em aumentar as expectativas de ninguém simplesmente para acabar vencendo-o.

— Estou aqui por causa de meus próprios interesses egoístas — disse Rom rapidamente. — Não represento as oito famílias nem desejo. Os Vash Nadah estão atolados em complacência, então não peça ajuda a eles, caso os Anos Sombrios voltem a nos atingir. Continue a armar você e sua família. Faça o que for necessário para manter seus próprios interesses protegidos. Melhor ainda, procure um planeta compatível e vá para lá, o mais longe possível das regiões povoadas.

Drandon o olhou com ceticismo. — Correr?

— É o que pretendo fazer. Há uma mulher - eu me preocupo muito com ela. Se a sua descoberta provar ser a sombra de uma ameaça maior, pretendo levar ela e sua família para um lugar onde estarão seguros. — Contendo a emoção indesejada, Rom desamarrou o cordão e esvaziou o conteúdo da bolsa na palma da mão. — A Família do Novo Dia usou uma representação de mãos postas abaixo de um sol nascente. Isso mostra as mãos abaixo de uma nebulosa, ou talvez uma nuvem de plasma ou buraco negro.

O alívio de seu amigo era palpável. — Então meu selecionador não era nada mais do que um fanático por uma bugiganga interessante?

— Possivelmente. — Rom virou o medalhão. — Suspeito que ele pertença a um grupo que quer recuperar a antiga glória da Família do Novo Dia. O design é muito semelhante. — Rom fez uma pausa. — Infelizmente, se o controle dos Vash Nadah sobre a Federação do Comércio continuar a se deteriorar, temo que veremos mais e mais indivíduos como o seu colhedor.

Ele pressionou o disco dourado gravado entre as palmas das mãos e uma sensação de leve formigamento subiu por seus pulsos. Assustado, ele a soltou. A descoberta o deixou consternado. — Isto é fundido a partir de uma liga empática, como os medalhões originais.

— Essas ligas foram proibidas após a Grande Guerra — observou Drandon.

— Elas eram. — Rom manteve toda a expressão de seu rosto quando as memórias horríveis ameaçaram dominá-lo. — Mas Sharron tinha um talento especial para reengenharia de tecnologias proibidas. Isso indica que nem tudo pelo que ele trabalhou morreu com ele.

Drandon apontou para o colar com seu cigarro. — Não é verdade que ligas empáticas já foram usadas para alterar a função cerebral?

Rom assentiu.

— Então, se eu fosse usar esse medalhão, alguém poderia me obrigar a obedecer?

— Eles podem influenciar seu comportamento — respondeu Rom. — Mas eles não podiam controlar isso. Sharron foi o mais próximo de todos. Ele possuía alguma habilidade psíquica - um senso distorcido de empatia, pode-se dizer - e usou o medalhão para aumentar essa habilidade. Durante a guerra, quando fizemos experiências de maneira semelhante com medalhões confiscados, fomos capazes de transmitir sugestões aos neurônios de nossos súditos. Mas o controle da mente real nunca foi alcançado.

Drandon estreitou os olhos. — O que foi alcançado?

— Descobrimos que a maioria poderia desviar as dicas que enviávamos, a menos que estivessem enfraquecidos por doença ou exaustão. Animais eram outro assunto completamente diferente. — Rom deslizou o medalhão perto de onde uma mosca da manhã centauriana estava explorando a base de seu copo. Ela saltou para o medalhão. Então, sem aviso, o inseto se ergueu bruscamente e se chocou contra a parede.

Atordoado, o ex-contrabandista contemplou a mancha brilhante de umidade deixada nas pedras. — Grande Mãe — Drandon murmurou. — Foi uma demonstração bastante gráfica.

— Criaturas menores não possuem a força de vontade que temos.

— Nisso, espero que você esteja certo. Assim como eu oro, Sharron levou para o túmulo o conhecimento do resto da tecnologia proibida.

— Eu suspeito que ele fez. Pelo que meus homens encontraram em sua base, parece que ele confiava em poucos seus segredos. Apenas os mais velhos de sua seita sabiam da clonagem, ou muito pior, de seus planos para ressuscitar o armamento de antimatéria.

— Armamento de antimatéria! — Drandon estava estranhamente abalado. — Durante a Grande Guerra, os senhores da guerra usaram semelhantes para obliterar sistemas planetários inteiros.

— Sharron aspirava eliminar muito mais do que meros sistemas, Drandon. Se não o tivéssemos impedido, se tivéssemos ouvido as oito famílias e o considerado um fanático inofensivo, ele poderia ter seguido seu objetivo. Ele queria detonar uma imensa explosão de antimatéria no núcleo da galáxia, provocando, ele esperava, seu colapso. Se isso é cientificamente possível ou não, é discutível. O certo é que os mundos serão destruídos. Muitos mundos. Seu grupo é um culto ao fim do mundo em grande escala. Sharron acreditava que todos nós renasceríamos em um 'Novo Dia'.

— Com ele como Deus, sem dúvida — Drandon comentou secamente.

— Eu devo ir — disse Rom, levantando-se. Embora Jas estivesse segura sob a proteção vigilante de Muffin, considerando o que ele tinha descoberto hoje, ele não iria descansar até que estivesse de volta ao seu lado.

 


Jas se encostou em Beela. Suas pernas tremiam com a adrenalina ainda bombeando em suas veias. — Eu... Eu pensei que aquele homem estava ferido.

Beela fungou. — Suponho que você não foi a primeira viajante a pensar assim. Você certamente não será a última. — Seus dois companheiros, um homem e uma jovem, recolheram os pertences de Jas espalhados e os devolveram à bolsa enlameada. Humildemente, eles entregaram a ela.

Jas agarrou a alça com gratidão. — Obrigada. Obrigada a todos vocês.

— Estávamos voltando para casa quando ouvimos seus gritos — disse Beela, envolvendo-se em sua capa. Ela pegou Jas pelo braço. — Não é sensato ficar sozinha depois de tanto trauma. Volte para o complexo conosco. Vamos compartilhar uma refeição leve e um chá de flor de lalla.

— Eu não quero me aproveitar. — Jas protestou fracamente.

Beela franziu a testa maternalmente. — Você não está se aproveitando. Passe esta noite entre amigos.

— Tenho que estar no terminal em algumas horas. É longe?

— Nas montanhas. Mas é apenas uma curta viagem de transporte.

— Você quer dizer as montanhas que ninguém nunca vê?

— Sim. Acima dessa poluição imunda. Perto dos céus, das estrelas. — Beela sorriu com indulgência. — Acho que o ar fresco aumenta a criatividade e o bem-estar.

Bem, Jas pensou, era isso que Betty sempre dizia. Se nada mais, Beela compartilhava a atitude de apreciar as coisas simples de sua amiga, algo que Jas precisava agora. — Leve-me — disse ela. — Sou sua.

Beela deu um breve aceno de cabeça para os outros. — Temos nosso próprio transporte — disse a mulher, conduzindo-a em direção ao menor dos três terminais de transporte do Depósito.

O jovem casal ficou atrás deles. Jas achou estranho que Beela não os tenha apresentado. Talvez eles fossem assistentes, aprendizes ou possivelmente criados, abaixo do aviso de uma artista de sucesso. Se Beela tivesse seu próprio transporte, ela obviamente estava bem.

Na verdade, sua nave era elegante e sem identificação. Enquanto Jas se prendia a um dos dezesseis assentos, as travas de ar se fecharam com um silvo e segundos depois a nave decolou. Ela cedeu contra o encosto de cabeça, enquanto Beela falava monotonamente sobre o quanto ela gostaria da visita. Jas esperava que Muffin estivesse na cama com sua servidora do prazer agora e não estivesse procurando por ela. Caso contrário, ela sofreria a ira do grandalhão quando eles se encontrassem mais tarde.

Não muito mais do que quinze minutos depois, o transporte pousou com um baque retumbante. Jas seguiu Beela até um platô varrido pelo vento na encosta de uma montanha escarpada. Bem abaixo, a cidade brilhava, multicolorida e incandescente sob um manto de névoa. O ar estava visivelmente mais rarefeito e frio, sem a umidade enjoativa do próprio Depósito. Jas encheu seus pulmões.

— É lindo aqui em cima — disse ela.

— E por dentro também. — Beela acenou elegantemente em direção a uma enorme abertura na rocha e disse: — Abra. — A pesada grade metálica ergueu-se por polias hidráulicas, revelando o interior cintilante de uma caverna esculpida em paredes tão brilhantes e pretas quanto obsidiana. Jas entrou e então girou lentamente em um círculo. Iluminação embutida, pontinhos de luz nas paredes e no teto, criavam a aparência de um espaço profundo. Era inquietante, fazendo-a sentir como se estivesse flutuando.

Beela continuou a avançar. Jas quase teve que correr para acompanhar. Estalando os dedos e emitindo comandos curtos, a mulher despachou dezenas de homens e mulheres em tarefas desconhecidas. Todos eles usavam túnicas cinza simples semelhantes, e sua ânsia de agradar Beela era desconcertante. Vários lançaram olhares furtivos de boas-vindas na direção de Jas, aguçando sua curiosidade. Se ela não soubesse melhor, ela poderia ter pensado que eles estavam esperando por ela.

Beela a conduziu por outra porta e entrou em uma câmara enorme. Ocupando a maior parte do espaço na parede de trás estava uma enorme pintura da peça que Beela havia mostrado a ela no museu no dia anterior. A representação do buraco negro era tão vívida, tão impressionante, que Jas quase podia ouvir em suas profundezas o espaço e o tempo se fundindo em algo inimaginável. Então seu olhar rastejou para as outras obras, e ela viu que todas eram réplicas da primeira.

— Você pintou isso?

— De jeito nenhum. Algumas foram criadas por meus irmãos e irmãs — disse Beela, acenando com a mão para o grupo de homens e mulheres vestidos de maneira simples e de rosto suave reunidos no perímetro da câmara. O cabelo da nuca de Jas se arrepiou.

Irmãos e irmãs?

Essas pessoas não se pareciam mais com Beela do que Janay. Engolindo em seco, Jas deu uma segunda olhada na multidão. Provavelmente não foi a jogada mais brilhante, ter vindo aqui sem ter como voltar ao Depósito.

— Por favor, aproveite as pinturas. — Disse Beela, com orgulho evidente em sua voz.

Jas olhou com raiva para a mais próxima. Sua inquietação transformou-se em exasperação, estimulada por sua exaustão profunda. Uma companhia normal e cotidiana teria sido legal. Mas não, ela teria que passar a noite com um bando de fanáticos quando estivesse cansada, irritada e impaciente pelo retorno de Rom. Deus ajude a primeira pessoa que tentasse envolvê-la em uma discussão sobre política ou religião. Ela provavelmente iria arrancar sua cabeça.

— Posso trazer um pouco de pomada?

Jas percebeu tardiamente que Beela estava parada ao lado dela, um pouco perto demais para seu conforto. Dando um passo para trás, Jas abriu as palmas das mãos esfoladas. — Elas estão doloridas. — Ela admitiu, culpada por pensar mal de Beela quando a mulher era tão complacente.

A mulher virou as mãos de Jas para um lado e para o outro. Então ela passou a ponta do dedo frio sobre o pulso de Jas. — Tão linda — ela disse em um tom suave, quase reverente. — Tão pálida.

Jas deu uma risada nervosa. — E aqui estou, invejando seu bronzeado o ano todo.

Beela continuou a apertar os pulsos de Jas. Um momento estranho passou. Então ela ergueu um olhar de adoração para o cabelo de Jas. — Perfeito. Negro como o coração do Criador.

Jas tirou as mãos dela. — Perdão?

Beela piscou rapidamente. Ela deu vários passos desajeitados para trás. — Vou pegar o unguento.

Jas observou a mulher alta sair correndo da câmara. Ótimo. Esta seria uma longa noite, e ela não tinha ninguém para culpar além de si mesma. Como nenhum dos outros na sala parecia ansioso para falar, ela poderia muito bem ver a obra de arte. Se ela tivesse sorte, ela iria encontrar algo diferente do buraco negro, fascinante como era. Com as mãos cruzadas atrás das costas, ela vagou pela vasta sala. Os aprendizes de Beela partiram para ela como o Mar Vermelho. Eles provavelmente acharam o cabelo e a cor da pele dela estranhos também.

Num impulso, Jas entrou em um corredor. As paredes de rocha não tinham obras de arte. A passagem estreitava e levava a outra, que terminava em uma ampla varanda com vista para o lado escuro e despovoado das montanhas. As grossas portas de vidro foram lacradas.

— Abra. — Ela comandou, apenas por diversão.

Elas permaneceram firmemente fechadas. Apreensão gotejou ao longo de sua espinha, e ela voltou apressada por onde veio. Ela se lembrava de ter passado por pelo menos duas caixas de comunicação antes. Se ela pudesse se lembrar onde uma estava, ela ligaria para Romjha. Eles possuíam uma frota de transportes; certamente eles enviariam uma para resgatar uma hóspede encalhada. Assim ela não incomodaria Beela. Embora a mulher tivesse boas intenções, ela estava ficando mais assustadora a cada minuto.

Montada na parede à direita da entrada da câmara principal estava uma caixa de comunicação. Jas vasculhou a bolsa da cintura em busca do cartão de comunicação que comprara para ligações de rotina. Em vez disso, seus dedos se fecharam em torno do cartão de metal fino que Rom lhe dera. Ela o embalou na palma da mão arranhada e seu coração apertou.

Ligue para ele.

Sim, apenas para ouvir sua voz, para dizer o quanto ela esperava vê-lo em algumas horas. E ouvi-lo rir loucamente quando ela lhe contasse como tinha ficado presa durante a noite em um complexo cheio de artistas malucos. Sorrindo, ela colocou o cartão na ranhura.

Quando a máquina ligou, uma brisa varreu seus tornozelos, trazendo com ela o cheiro do incenso que ela havia sentido pouco antes de os ladrões a agarrarem. Ela se virou. Um corpo bateu nela, desequilibrando-a.

Jas caiu no chão de pedra polida, derrapando no traseiro. Espalhada de costas, ela ficou boquiaberta com Beela, que gritava: — Pegue o cartão! Atenda a ligação de comunicação!

O caos estourou na câmara. Aprendizes correram em sua direção de todas as direções. Um deles tirou o cartão de Rom da caixa de comunicação. Jas tentou se levantar, mas alguém a agarrou pelos cabelos e a puxou dolorosamente para trás. Sua dormência e descrença se transformaram em pânico. Ela se debateu loucamente, tentando se libertar, mas quem quer que tenha agarrado seu cabelo agora prendeu seus braços atrás das costas.

— Eu gostaria que você não tivesse tentado fazer isso. — Disse Beela.

Com os olhos arregalados de horror, Jas observou a mulher caminhar em sua direção, um pano agarrado em sua mão estendida.


CAPÍTULO 14


Segundos depois que o Quillie se libertou da atmosfera, a chamada de comunicação no bolso da frente de Rom soou. O alívio atingiu seus nervos tensos como a chuva espirrando em propulsores ainda quentes. — Graças aos céus — disse ele, puxando o dispositivo do bolso. Ele levou o cartão ao ouvido. — Jas, seu tempo é excelente.

A estática assobiou na outra extremidade.

— Jasmim? — Ele bateu no dispositivo com irritação. — Olá, Jas? — O silêncio do outro lado ressoou com o medo estrondoso dentro dele. Ele encontrou o olhar perplexo de Gann e, em seguida, examinou a página de status.

CHAMADA ENCERRADA NA FONTE.

Embaixo havia um código alfanumérico de doze dígitos. Rom o digitou no computador de voo. Agarrando o console, braços apoiados, ele olhou para a tela. Então ele ergueu lentamente a cabeça. — Para o depósito - velocidade máxima.

 


— O que está acontecendo? — Jas gritou roucamente, bombeando as pernas.

Os lábios de Beela se estreitaram. — Mantenha-a quieta!

O aprendiz que segurava seus braços apertou seu aperto até que Jas pensou que seus ossos poderiam quebrar. Ofegando em agonia, Jas parou de lutar.

— Por que você está fazendo isso? — Ela implorou em um sussurro urgente.

Beela se agachou na frente dela. A determinação fanática em seus olhos era arrepiante. — Ele aceita tão poucos dos tesouros que ofereço a ele. Mas ele quer você. E desde que falei de você pela primeira vez.

— Quem? Do que você está falando?

— Mas você tornou isso difícil para mim porque você não usou seu medalhão. O que, você deixou em seu alojamento? Mulher tola! É para o fiel vestir, não ser deixado para trás. — Beela colocou o tecido frio e úmido sobre a boca e o nariz de Jas.

O cheiro era doce. Uma droga. Não inale. Jas queria gritar, mas de alguma forma ela teve a presença de espírito para prender a respiração e apertar os lábios. Seu coração batia forte contra suas costelas e seus pulmões queimaram. Lágrimas arderam em seus olhos. Em seguida, o cinza fez cócegas no limite de sua visão.

Com a cabeça leve, ela travou olhares com Beela. Os olhos de ouro pálido da mulher, tão semelhantes aos de Rom, não continham nada de sua compaixão, sua humanidade.

Os pulmões de Jas pareciam prestes a explodir.

Não respire.

Ela cerrou os punhos e arrastou as botas no chão. Mas o instinto elementar de sobreviver era muito forte, e ela não pôde deixar de respirar. O cheiro enjoativo de incenso inundou suas narinas e a deixou tonta. Ela viu o rosto de sua mãe... Seus filhos. E então Rom.

Um grito silencioso de indignação saiu de sua alma. Ela não estava pronta para morrer. Não agora, não no limiar da felicidade, de descobrir sua vida.

Um ruído acelerado encheu seus ouvidos, esmagando seus sentidos e obliterando todo pensamento coerente. E então não sobrou nada além de escuridão...

 


A consciência voltou. Seu corpo machucado doía e sua boca estava seca. Ela foi amarrada em uma cadeira. Vozes filtradas por sua névoa drogada e, ao fundo, motores roncaram. Eles a estavam levando para fora do planeta. Ela tentou se levantar, mas seus pulsos estavam amarrados. Seus tornozelos também. O pânico misturado ao medo amorteceu seu alívio ao descobrir que ainda estava viva, e um soluço escapou dela - mais para protestar por sua total impotência do que para transmitir seu medo. As vozes ficaram mais altas, mais próximas, mais agitadas. Alguém enfiou uma pequena pílula sob a língua dela e apagou a luz.

 


Quando ela acordou novamente, sua cabeça clareou. Embora suas entranhas parecessem estranhamente vazias, considerando o quão brutalmente os assistentes de Beela haviam lidado com ela, nada doía. Independentemente disso, era melhor ela se fingir de morta - ou em qualquer estado que ela deveria estar - até que ela entenda em que tipo de perigo ela tropeçou. Depois de ser sequestrada, drogada e transportada para algum lugar, ela se encolheu, pensando no que poderia acontecer a seguir.

Ela manteve os olhos fechados e tentou usar seus sentidos para investigar os arredores, como Rom havia mostrado a ela no jogo bajha. O ar que circulava ao seu redor estava frio e seco. Ela estava lá dentro em algum lugar, sentada ereta e desamarrada em uma cadeira confortável. O que quer que ela estivesse vestindo mal cobria suas nádegas, porque ela sentiu a almofada de seda entre suas coxas nuas, o que significava - oh, Deus - que alguém havia tirado seu sutiã e calcinha.

Ela lutou contra o pânico crescente. Ela ouviu um farfalhar de tecido, uma respiração. Apreensão vibrou por ela. Seu estômago se contraiu com uma onda de adrenalina e suas pálpebras se contraíram.

— Ah, ela está acordada. — Disse a voz rouca de um homem. As pontas dos dedos frias e secas roçaram sua bochecha. Jas recuou com a sensação enervante, então abriu os olhos.

Um homem mais velho se agachou na frente dela. Uma túnica de bronze brilhante se estendia sobre seus ombros largos, combinando com as manchas em seus olhos amarelo-ouro. Ele tinha pele âmbar, era loiro e bonito ao ponto de ser artificial. Junto com seu sorriso suave e magnético e olhos hipnotizantes, fez dele o homem mais carismático que ela já tinha visto. Eram apenas os dois em uma sala que tinha, no máximo, seis por seis metros. Além da cadeira em que se sentava e do tapete de seda sob seus pés descalços, não havia móveis, nem janelas - e nenhuma porta.

O terror se apoderou dela. — Onde estou?

— Brevdah três. — Um estrondo estranho estragou sua voz rica. — Não se assuste. Você está segura aqui, meu tesouro — ele disse, contemplando-a com um ar insolente de posse. — Meu lindo presente de cabelo preto.

Pela milésima vez desde que deixou a Terra, ela desejou ter pintado o cabelo de loiro. — Escute, não sei que tipo de arranjo você fez com Beela, mas não vai funcionar. — Para sua sorte, a mulher era uma corretora de escravos, e agora esse canalha pensava que era seu dono. — Eu sou da Terra.

— Foi o que me disseram.

— Manter-me aqui é uma violação do Tratado de Comércio.

Seu sorriso esmaeceu. — O Tratado de Comércio - divagações de padres-soldados famintos por poder. Vale pouco mais do que o papel em que está escrito.

Ela baixou a voz. — Apenas me deixe ir, e eu vou manter as coisas quietas. Vamos chamar de mal-entendido, certo? — Puxando sua túnica embaraçosamente curta para baixo em suas coxas, ela se levantou. — Eu gostaria das minhas coisas, por favor, e da minha ligação de comunicação também. Vou providenciar meu próprio transporte de volta para o Depósito, obrigada.

— Sente! — Ele agarrou seus pulsos, forçando-a para baixo.

O terror explodiu em uma luz branca atrás de seus olhos.

— Não é minha intenção assustar você. — Disse ele.

Ela assentiu com a cabeça, seu coração batendo forte contra suas costelas.

— É perigoso para você viajar por conta própria. Para sua própria segurança, você deve me obedecer.

Ela respirou estremecendo. Seu tom, sua expressão, implorava que ela confiasse nele. Ela queria - Senhor, como ela queria. Mas algo estava faltando em seu olhar, uma qualidade que ela estava acostumada a ver nos outros, mas não conseguia definir. Sua ausência a deixou fria. Olhos como o deste homem fariam o diabo choramingar.

— Quem é você?

Ele pareceu genuinamente surpreso. — Você honestamente não sabe, não é?

Ela o olhou carrancuda.

Ele suspirou. — Não me surpreende. Você vem de um mundo remoto e bárbaro de fronteira. Você não teria sido apresentada aos meus ensinamentos. Trilhões procuram minha orientação. — Ele começou a balançar lentamente para a frente e para trás. Ele era uma visão estranha, ajoelhado diante dela, sua bela túnica lançando faíscas de bronze nas paredes de mármore branco. — Eu sou o salvador — ele entoou. — O salvador. Eu sou Sharron.

Assustada, ela piscou. — Sharron está morto.

O homem ergueu o queixo, revelando uma cicatriz torta e enrugada na garganta. Sua risada rouca foi baixa e rica, e durou alguns segundos desconfortáveis a mais do que parecia normal.

— Estou muito vivo, você não concorda? É o meu suposto assassino que está praticamente morto.

Ele quis dizer Rom.

— Eu sei quem você é — disse ela em um sorriso de escárnio, sua voz tremendo de raiva reprimida. — Eu sei sobre a guerra que você começou e as pessoas que você matou. — Como ela sabia, ela guardou para si mesma. Se ela revelasse seu relacionamento com Rom, isso poderia colocá-lo em perigo, e ela estaria condenada se permitisse que aquele monstro o atacasse novamente. — Os Vash colocam mulheres em pedestais. Mas você as vê como máquinas de reprodução. Você escolhe quais mulheres terão filhos e com quem.

— Procriação analítica — respondeu ele. — Para dar força e propósito à sociedade. Não é tão diferente de qualquer outra cultura.

Sua voz era monótona, fria. — Eu nunca vou me submeter a você.

Sharron agarrou o medalhão pesado que ela não percebeu que estava enrolado em seu pescoço. Era idêntico ao presente de Beela. Segurando o colar em uma das mãos, ele se acomodou nas ancas e acariciou o disco com as pontas dos dedos. Inexplicavelmente, o desejo a inundou. Incapaz de bloquear as sensações desconcertantes, ela ficou rígida.

— Você sente isso. — Disse ele em um sussurro rico e rouco.

Jas fez um pequeno som de consternação.

— Você me sente — ele murmurou. — Não o negue. Estamos entrelaçados, você e eu. Nossas almas se conhecem - se desejam, se buscam - desde o nascimento dos tempos.

Ela balançou a cabeça. Ele levantou uma sobrancelha pálida. — Diga-me, então, por que você deixou seu mundo de fronteira, Terra?

Ela cerrou os dentes contra o calor que se acumulava em sua barriga. — Eu não sei.

— Ah, mas acho que sim. — Ele sorriu seu sorriso enigmático. — Você veio aqui em busca de alguma coisa, não veio? Uma busca para encontrar e definir o que estava faltando em sua vida.

Ela congelou.

— Você estava vazia, usada, insatisfeita, mas sem entender por quê. Tudo que você sabia era que estava faltando alguma coisa, sua outra metade... Eu.

Jas tentou protestar contra suas sugestões, mas suas palavras foram drenadas antes que fluíssem de sua mente para sua boca.

— Então você viajou para as estrelas porque eu a chamei — ele continuou suavemente. — Porque eu precisava de você.

Náusea e descrença obstruíram sua garganta. Ele não poderia ser o motivo de ela ter saído de casa.

Ou ele poderia?

Não.

Era um truque que até o leitor de palma mais amador conhecia - fazer suposições sobre seu passado e depois usar suas reações para ajustá-las. Mas de alguma forma o medalhão o estava ajudando, e isso a assustou. Freneticamente, ela tentou conjurar o rosto de Rom, mas tudo o que viu foi seu belo captor.

Sharron.

A dúvida a inundou.

— Comigo, meu tesouro, você está completa. — Ele se inclinou na direção dela. Seus lábios se separaram por conta própria. Ela gemeu baixinho, enrijecendo quando ele roçou sua boca na dela. — Você resiste — ele murmurou, sua respiração quente contra ela. — Sua vontade é forte. — De repente, ele deixou o colar cair entre seus seios. A confusão desapareceu de sua mente, junto com seus sentimentos contraditórios e perturbadores.

— Devo dissolver essa vontade para que não nos mantenha separados — murmurou como se para si mesmo. — Sim, a purificação deve começar. No nascer da segunda lua, você estará pronta. Então você dará as boas-vindas à minha semente e traremos a galáxia para um novo dia. Um novo começo.

A raiva ferveu. — É isso que você chama de assassinar mulheres em sua seita depois que elas dão à luz?

No espaço de uma batida do coração, ele agarrou o medalhão que ela usava e puxou seu rosto perto do dele. Seus olhos felinos se estreitaram em fendas ocre.

— Eu não as mato. Eu dou vida a elas. Vida eterna.

Para seu horror, sua indignação fluiu para ela. Seus músculos se recusaram a dar atenção a sua urgência de afastá-lo, enquanto seus pensamentos se misturavam aos dela, como gavinhas de fumaça tóxica. Ela queria vomitar. Sua mente era frágil, doente, mas extremamente inteligente, zumbindo com o propósito obstinado de um predador. Ela recuou diante de sua frieza, de sua total ausência de compaixão.

— É o que te darei, meu tesouro — ele sussurrou contra seus lábios, acariciando o medalhão, seus nós dos dedos roçando seu seio. — Vida eterna. Você será entregue ao coração pulsante da galáxia, presa a uma extraordinária e injustamente caluniada pouca inovação chamada de bomba de antimatéria, e uma vez lá, você vai trazer todos para o novo dia.

Quase com reverência, ele roçou as costas da mão em sua bochecha. — Que comece a purificação! — ele chamou para a parede oposta. A superfície semelhante a mármore oscilou como uma folha secando ao vento; então se dividiu, revelando um corredor escuro do lado de fora.

A capa de Sharron girou em torno dele enquanto ele caminhava até a abertura ondulante e passava. A parede se fechou atrás dele, tão inexpressiva quanto antes.

Jas saltou da cadeira para alisar as mãos sobre a superfície lisa da parede. Qual foi o truque? Reconhecimento de mão? Um comando de voz? — Que comece a purificação! — ela repetiu. Nada. Sua busca por costuras na parede tornou-se febril. — Ei! Me deixe sair! — Ela bateu os punhos na superfície fria e inflexível. Algo bateu entre seus seios. O colar! O nojo apertou seu interior. Ela agarrou o ornamento pesado e sentiu um verme formigando subir por seu braço. Ao levantar o medalhão sobre a cabeça, uma sensação avassaladora a deteve.

Não, você não deve...

Ela olhou para o disco, confusa. Então ela tentou novamente.

Não deve...

Tremendo, ela tentou puxá-lo pela cabeça. Desta vez, seus braços dispararam para os lados. Perplexa e desorientada, ela lutou para se livrar do medalhão, mas cada vez que o fazia, seu corpo se rebelava. Ela se sentia como uma marionete, exceto que os comandos contraditórios vinham de dentro dela.

— O que está acontecendo comigo? — Ela exigiu. Um alarme penetrante começou a soar. Ele guinchou sem parar, uma faca cortando seus tímpanos sensíveis, trazendo uma dor além de sua imaginação. Ela tapou os ouvidos com as mãos e gritou.

O volume aumentou com sua histeria, como sujeira sugada por um tornado. Ela caiu no chão, contorcendo-se e gritando até que sua voz se desvaneceu em um sussurro áspero.

 


Lado a lado, Rom, Muffin e Gann caminharam rapidamente para a caverna com paredes de vidro. O som de seus passos ecoou nas paredes de obsidiana.

— Fui ao Inferno e voltei.

Vasculhando o quarto de hotel de Jas, eles encontraram um medalhão igual ao que o colhedor de sementes de Drandon exibira, e um cartão localizador que Rom não havia reconhecido. Eles seguiram as instruções no cartão - de uma pessoa chamada Beela - diretamente para este complexo. Rom manteve viva a esperança de que ele finalmente encontraria Jas aqui - ou pelo menos um indivíduo que poderia ser forçado a revelar seu paradeiro. Agora sua confiança vacilou. O cavernoso salão estava cheio de sinais de habitação - pedaços de papel, livros, uma capa. Mas estava assustadoramente vazio de pessoas.

— Eles saíram com pressa — disse Gann, endireitando um copo de tock.

Rom cerrou os punhos. — Para onde? O cartão listava uma dúzia de outros locais possíveis. Por tudo o que é sagrado, se ela não está aqui, como vou encontrá-la?

Seus homens judiciosamente mantiveram o silêncio. Muffin - abatido pela culpa - se afastou, olhando para o chão, em busca de sinais de luta, enquanto Gann derrubava as pinturas repulsivas da parede, uma a uma, procurando por trás de cada uma por painéis ou compartimentos escondidos.

Pareciam dois novatos da Polícia Comercial, pensou Rom. A frustração vibrou dentro dele. Essa não era a maneira de proceder. O complexo estava deserto; qualquer tolo poderia ver isso. A essa altura, a Família do Novo Dia havia levado Jas para fora do planeta, para qualquer um dos incontáveis mundos. Eles eram tão indizivelmente maus como quando Sharron os liderava? Ou eram apenas artistas fanáticos? Apesar de tudo, eles a haviam levado contra sua vontade.

Mas para onde?

Rom girou em um círculo lento. Alcançando fundo, ele silenciosamente evocou Romjha, o antigo guerreiro cujo sangue ele compartilhava.

Guie-me.

Rom estremeceu e fechou os olhos. Usando as lições que lhe foram ensaiadas desde o nascimento, ele abraçou o antigo legado do qual havia fugido, a ancestralidade que o enchia de orgulho e dor. — Guie-me — ele sussurrou.

Só desta vez.

Apenas para manter viva a mulher que amava. — Eu vou te encontrar, Jasmine — ele cantou baixinho. — Eu vou te encontrar.

Seus sentidos se reuniram... Se aglutinaram... Até que todos os poros de seu corpo zumbiram. Ele foi além do tempo físico, transcendendo. Ele se tornou pensamentos, sentimentos e sonhos, enquanto as memórias o invadiram como um mar agitado.

Ele perdeu a noção de quanto tempo ficou ali, imóvel no meio da vasta e árida câmara, mas quando abriu os olhos, foi com a suprema confiança de um caçador.

Ele iria encontrá-la.

— Muffin! Gann! — Os homens o encontraram no perímetro da sala. — Para a nave. Ela não está aqui. — Pistola desembainhada, ele os conduziu para o corredor sombrio.

 


A sirene atingiu um tom agonizante, gemendo sem parar. Temendo perder a consciência e ficar indefesa, Jas lutou para varrer o terror asfixiante de sua mente, conseguindo se acalmar apenas um pouco. O alarme diminuiu na mesma proporção, mas ela não mudou a pressão das mãos sobre os ouvidos. Estava vindo de dentro de sua cabeça? Se contorcendo no chão frio, ofegando de dor e pânico, ela descobriu as orelhas ligeiramente. O horrível guincho permaneceu inalterado. Ele estava vindo de dentro dela! Seu medo disparou. O mesmo fez a sirene brutal.

Está se alimentando de seu pânico. O pensamento - seu próprio - cortou o caos. Se você não se controlar, vai piorar.

Ofegante, tremendo incontrolavelmente, ela colocou os braços em volta do estômago e se inclinou para frente, cerrando os dentes, a testa úmida pressionada contra o tapete.

Está bem; está tudo bem, ela disse a si mesma.

O terror quase dominou sua luta para salvar sua sanidade. Cada vez que sua ansiedade aumentava, o mesmo acontecia com o uivo estridente. Quanto tempo passou, ela não tinha ideia, mas quando ela finalmente se acalmou, o choro cessou.

Ela se ergueu sobre os joelhos trêmulos. Depois de alguns momentos, ela se levantou, usando a parede como suporte. Sharron deve ter sabido que isso aconteceria, que o medalhão se alimentaria de suas emoções e as aumentaria, um ciclo de informação de algum tipo, projetado para despedaçar sua mente. Esta sala devia ter equipamento montado para facilitar isso. O conhecimento a enjoou. Se ela não tivesse descoberto como lutar, ela provavelmente seria um zumbi complacente agora, “purificado” como o resto de seus súditos - exceto Beela.

Ela tinha que se livrar do medalhão. Ela poderia fazer isso agora? E se o fizesse, como esconderia o fato de Sharron? Se ele descobrisse que estava faltando, provavelmente a imobilizaria para impedi-la de tentar novamente. Então ela estaria à sua mercê - algo que ela agora tinha certeza que não existia.

Ela estudou o colar. O amuleto estava conectado à corrente por um elo - um facilmente aberto. A esperança cresceu em seu peito. Mas um curioso zumbido mental se seguiu. Ela imediatamente reprimiu sua resposta e o zumbido parou. Reagia aos sentimentos, o que significava que ela teria que embotar todas as emoções, boas e más, para manter sua mente livre.

Ela olhou nervosamente ao redor em busca de câmeras escondidas, forçando uma expressão vaga em seu rosto no caso de sua atividade alarmar seus guardiões. Em um movimento rápido, ela rasgou a conexão. Ela se abriu, o disco caindo em sua mão trêmula. Ela se sentou na cadeira, fingindo agarrar a barriga, e furtivamente colocou o medalhão sob a almofada. Sentindo uma onda de triunfo percorrê-la, ela enfiou a parte inferior da corrente em seu corpete. Agora tudo o que ela precisava fazer era rezar para que ninguém verificasse.

O mais discretamente possível, no caso de alguém olhar, ela fingiu mancar, procurando no pequeno cômodo por qualquer coisa que pudesse ser usada como arma. Nada. Muito nervosa para se sentar, ela compassou. Sharron a convocaria quando a segunda lua surgisse, por mais longa que fosse. O que ele iria fazer com ela? Estuprá-la repetidamente até engravidá-la? E o que foi que ele disse sobre uma bomba?

Ela deu um passo mais rápido para reprimir o medo que gelava seu interior. Ela nunca sentiu tanto medo - ou tão sozinha. Se ao menos Rom soubesse que ela estava aqui.

Mas ele não sabia.

Um plano. Ela precisava de um plano. Um bom. Ela tinha sido uma soldado uma vez, treinada para tais situações. Sharron devia presumir que o medalhão já havia voltado sua mente para a gelatina. Naturalmente, ela lhe mostraria o que ele esperava ver, fingindo ser obediente, e depois lhe daria a maior surpresa de sua vida. Um barulho de estouro a fez parar. Três das quatro paredes se transformaram em bolhas que incharam e depois se romperam. As lacunas revelaram um exército virtual de lacaios de manto cinza de Sharron. O coração de Jas afundou. Já era tempo. A segunda lua havia surgido.


CAPÍTULO 15


Jas seguiu seus captores em um corredor escuro. O ar fresco lavou seus braços e pernas nuas, esfriando a transpiração que formigava sua pele. Em algum lugar, uma porta ou janela devia estar aberta para o exterior, para a liberdade. A saudade apertou seu peito, mas ela manteve a cabeça baixa como uma convertida dócil. Paciência era a chave, ela se lembrou. Era assim que ela escaparia.

Usando sua visão periférica, ela captou tantos detalhes quanto pode. As paredes pretas vítreas e o piso cintilavam à luz de tochas falsas. Havia muitas portas semelhantes às do Quillie, mas todas estavam seladas.

Mais uma vez, ela voltou sua atenção para o chão, incapaz de afastar a sensação sombria de que essas dezenas de fanáticos sombrios e vestidos de maneira monótona a estavam conduzindo para sua execução. Que reviravolta estranha e terrível sua vida havia dado. Um mês atrás, ela era uma mãe divorciada de dois filhos cujo maior medo era ir a um encontro. Agora olhe.

Mas ela não se arrependeu das últimas semanas nem por um minuto. Ela nunca tinha vivido tão plenamente, tão completamente. Rom... Seu coração se apertou, suas emoções subiram à superfície. Uma pena que eles nunca tiveram mais tempo juntos - mais do que uma bela noite...

Para o inferno com isso. Não era sua hora de morrer - ela sabia disso em sua alma - e ela com certeza não iria tornar mais fácil para Sharron matá-la. Ela lutaria até seu último suspiro. Por Rom, por seus filhos, para seu futuro.

O homem franzino que ela imaginou que estava no comando apontou para uma sala cavernosa e vazia. — Prossiga — ele sussurrou. Uma tela de exibição dominava a parede oposta à porta. A tela estava em branco, mas não no modo de espera prateado que ela estava acostumada a ver. Ela estava sendo observada secretamente. O conhecimento a fez parar.

Seu acompanhante a olhou interrogativamente por baixo do capuz. — Prossiga. — Ele repetiu baixinho.

Muda, ela entrou. Um colchão de pelúcia foi montado exatamente no centro do cômodo, como a peça de exibição premiada em alguma galeria de pesadelo. Estava envolto em cintilantes lençóis brancos, tão enganosamente adoráveis quanto uma noite ártica iluminada pela lua.

Seu acompanhante cutucou a cama com a mão enluvada. — Vista.

Ela seguiu seu dedo até um vestido arrumado na colcha, feito do mesmo material brilhante.

— Vista. — O pequeno troll insistiu.

Jas cerrou os dentes.

— Coloque.

— Eu preciso de privacidade — disse ela, tentando encontrar uma maneira de investigar o quarto sem os guardas olhando por cima do ombro.

— Eu fico.

Intencionalmente virando as costas para pares de olhos desconhecidos, ela trocou sua túnica pelo vestido branco brilhante sem mangas e deu um puxão impaciente na bainha. A maldita coisa era tão curta quanto a túnica. Felizmente, o decote era igualmente alto, escondendo o fato de que ela havia retirado o medalhão de sua corrente.

O fanático baixinho recolheu suas roupas descartadas e recuou em direção à entrada. — Deite-se — disse ele. — De costas.

Ótimo.

Ela lançou um olhar cansado para a tela e se lembrou pela centésima vez que seu plano de fuga dependia de um desempenho convincente de docilidade e obediência. Se ela tentasse correr ou lutar contra os guardas, eles amarrariam seus braços e pernas, deixando-a completamente indefesa.

Só depois que ela se acomodou no colchão macio as portas duplas se fecharam. Então um barulho áspero retumbou atrás deles. Uma barra ou algo semelhante estava sendo usado como uma fechadura. Antiquado, em comparação com os cômodos anteriores, mas igualmente eficaz.

Disposta como um sacrifício humano, ela olhou para o teto. Era decorado com uma pintura totalmente realista do núcleo da galáxia. Flâmulas de branco, amarelo e vermelho espalhavam-se do centro, lembrando-a de um ovo rachado com sangue. Ela engoliu em seco e desviou o olhar.

O silêncio, a espera, tornou-se opressor. Seus braços e pernas tremeram.

É uma maravilha que ainda tenho adrenalina, ela pensou tristemente.

Para manter o medo sob controle, ela repassou seus planos. Primeiro ela alimentaria as fantasias de Sharron. Então, assim que ele atingisse um estado vulnerável de excitação, ela iria bater o joelho em seu pau com tudo o que valia a pena. Então ela acabaria com ele. Ela havia sido treinada em autodefesa na força aérea e, embora ela não tivesse praticado os movimentos em quase duas décadas, ela sabia que a base de sua palma ainda poderia quebrar um nariz, e que os nós dos dedos enfiados em uma garganta poderiam esmagar uma traqueia. Mesmo que ela não matasse Sharron de uma vez, com o estado atordoado de seus seguidores, ela tinha uma chance de escapar antes que ele se recuperasse. Não ser um zumbi estúpido lhe daria uma vantagem mental sobre todos eles, ela esperava com uma risada mórbida rápida.

A barra do lado de fora da porta chacoalhou. Seu peito se apertou com tanta força que ela mal conseguia respirar. Uma brisa sugeriu que as portas se abriram e fecharam. Batidas de pés com botas pisando em sua direção confirmaram isso.

Sharron havia entrado.

Ela ergueu a cabeça para espiar a figura encoberta e encapuzada que se aproximava da cama. Paciência. Sua única esperança estava na precisão, na surpresa - e no tempo.

O líder do culto parou para examinar a tela, como se gostasse de atuar diante de uma plateia e quisesse ter certeza de que a câmera estava funcionando.

Assustador.

Ela se preparou quando ele retomou seus passos confiantes. Sem uma palavra, ele abaixou seu corpo grande para o dela. Um pano frio ondulou ao redor dela, o cheiro de incenso queimado ocultando sua punitiva força física. O terror de ser estuprada destruiu sua frágil calma e ela forçou o joelho esquerdo para atingir carne masculina.

A respiração de Sharron explodiu em um forte oomph. — Grande Mãe — disse ele em um suspiro.

Sim!

Ela causou algum dano. Ela ergueu os polegares, apontando para os olhos dele. Mas ele agarrou seus pulsos e usou seu corpo para esmagá-la no colchão como um inseto impenitente. Ela imediatamente se arrependeu de seu ataque muito precoce, movida pelo medo. Resistindo, ela torceu sob seu peso. Uma perna quase se soltou, mas ele a prendeu com suas coxas musculosas. Finalmente, ela soltou o punho com força, jogando seu peso no balanço.

— Por tudo que é sagrado — ele sussurrou em voz alta. — Jas, sou eu.

Seu braço congelou no ar. — R-Rom?

Olhos dourados familiares a olhavam por baixo do capuz amarrotado. A alegria explodiu em seu coração. Ela jogou os braços em volta dos ombros dele, e sua boca desceu com força sobre a dela. Moldando-se a ele, ela estremeceu com a emoção crua em seu abraço feroz e apaixonado.

Ele segurou a cabeça dela com as mãos grandes e gemeu, o som vibrando em seu peito. Mas assim que ela se perdeu em seu beijo, ele pareceu se lembrar de onde eles estavam e se afastou abruptamente. Amor e preocupação perfuraram seu olhar.

E dor.

— Eu te machuquei. — Ela torceu as mãos no tecido de sua capa. — Eu pensei que você fosse ele - Sharron. Ele está vivo, Rom. Vivo!

— Eu sei — ele sussurrou e pressionou um dedo nos lábios dela. — A tela de exibição. Pode ou não estar transmitindo.

— Mas como você chegou aqui? — ela murmurou ansiosamente. — Como você me achou? Ele viu você?

— Respostas mais tarde. — Ele a olhou solenemente, acariciando seus dedos quentes sobre seu rosto. Seus olhos eram ouro líquido, derretido. — Eu não sabia se veria você de novo — ele disse em um sussurro grosso.

Ela roçou os nós dos dedos na bochecha dele, simplesmente assentindo, enquanto prendia a respiração para evitar as lágrimas.

— Temos pouco tempo. — Rom aliviou seu peso fora dela e novamente tornou-se disciplinado. — Sharron e seus anciãos estão na câmara de oração. Espero que ainda estejam lá por algum tempo. Se vamos sair, temos que fazer isso agora.

— Me diga o que fazer.

Ele apertou as mãos dela e ajudou-a a se levantar. — Eu preciso que você brinque de convertida religiosa. — Ele exibiu um manto cinza amassado. — Acha que pode?

— Oh sim. — Ela alisou os cabelos trêmulos. — Tornarei-me uma Greta Garbo 7normal.

Ele inclinou a cabeça interrogativamente.

— Assista. — Ela demonstrou a mudança mansa que a manteve viva até agora. Seus olhos brilharam em aprovação silenciosa quando ele entregou a ela um par de calçados. Ganhar o respeito deste guerreiro experiente foi um elogio como nenhum outro.

Rapidamente, eles prenderam a roupa que Rom trouxera com ele sobre o vestido branco, arrumando o capuz sobre o cabelo. Ele retirou uma pistola de alta tecnologia das dobras de sua capa e olhou para o corredor.

— Limpo — ele disse, acenando para ela para o corredor deserto. — Agora levante.

— Acima? — ela perguntou inexpressivamente. Ela presumiu que eles iriam disparar por um corredor ou outro.

Ele apontou sua arma para o alto. Uma abertura do tamanho de uma claraboia se abriu logo acima de suas cabeças. — Um painel de acesso no sistema de ventilação — disse ele.

Uma mão projetou para fora do buraco. Jas saltou para trás. Dedos grossos se contorceram convidativamente, e seu olhar rastreou um antebraço musculoso até a versão galáctica de um sueco grande e loiro.

— Muffin! — Ela engasgou.

— Vamos lá para cima. — Rom bateu com as mãos em torno de seus quadris, erguendo-a nas mãos de seu guarda-costas.

Muffin a puxou para uma passagem estreita e sombria. Ela deslizou para trás no duto de ar, permitindo a Rom espaço para subir atrás dela. Ele levantou uma camada de gelo enquanto fechava o painel sobre a abertura. Ela abafou um espirro.

Rom girou no espaço apertado e deixou Muffin assumir a liderança pelo túnel escuro. Rom ficou atrás dela. O piso de metal esfolou seus joelhos, e ela tropeçou na bainha de sua capa várias vezes enquanto navegavam pelo que pareciam quilômetros de dutos.

— Eu estava ligando para você quando eles me drogaram. — Disse ela.

— Agradeça a Grande Mãe. Foi assim que eu soube que algo havia acontecido. Encontrei sua bolsa de viagem e seu tubo de pinturas no Romjha. Onde quer que você estivesse, eu sabia que você estava lá contra a sua vontade; você nunca deixaria voluntariamente sua obra de arte para trás. Quando encontrei o cartão daquela mulher, adivinhei o que tinha acontecido.

O cartão da Beela! — Graças a Deus por isso. Quem mais está com você?

— Zarra está lá fora — disse Rom. — Ele está guardando um par de espaçonaves emprestadas. Eu queria trazer Gann e os outros também, mas não podia arriscar um grupo grande.

— Três ainda é um bom número. Você tem uma arma extra? Eu cobrirei você e Muffin quando você for atrás de Sharron.

— Eu não vou atrás de Sharron.

Incrédula, ela olhou por cima do ombro. — A morte dele foi o que tornou seu exílio suportável. Como você pode sair daqui e viver consigo mesmo sabendo que ele ainda está vivo?

Sua resposta foi quase inaudível acima do súbito zumbido do ar através dos dutos em que eles se arrastaram. — Quando vim aqui e descobri que Sharron ainda vivia, o desejo de vingar meu irmão era inimaginável. Mas eu tive uma escolha, uma escolha entre você e Sharron. Eu escolhi você.

— Ele tem bombas de antimatéria.

Isso resultou em alguns segundos de silêncio.

— O fanfarrão ainda está se vangloriando de suas ameaças vazias — Muffin comentou com Rom. — Ele não as tem. Elas são muito complicadas para qualquer um reconstruir.

Jas persistiu. — Ele disse que me amarraria a uma e me enviaria para o centro da galáxia.

O tom de Rom era duro, nervoso e não deveria ser contradito. — Se Sharron está mexendo ou não com a antimatéria não é nossa preocupação imediata. Sair daqui é. Agora ouça com atenção. Nossas espaçonaves estão estacionadas fora do complexo. Se nos separarmos, saia pela entrada da frente e siga para as árvores. Está abaixo de zero, mas você não ficará fora por muito tempo. Você verá um pico mais alto do que o resto. Vá em frente. Continue indo até ver os navios. Se tudo correr como planejado, Muffin e Zarra ficarão com um e nós com o outro. Mas se alguma coisa acontecer comigo, você vai com eles.

— De jeito nenhum vou embora sem você.

— Oh, eu acho que você vai. — Ele deu um empurrão não tão gentil em seu traseiro. — Agora mova-se.

— Ordene o quanto quiser — ela sussurrou ameaçadoramente — mas não pretendo ir embora, a menos que você esteja comigo.

— Confie em mim, anjo, eu também não planejo isso. — Sua declaração prática irradiava tanta confiança que ela sorriu apesar de sua ansiedade. — Sharron acumulou uma força espacial considerável aqui - caças formidáveis. Ele os enviará atrás de nós. Quanto mais tempo de espera tivermos, melhor.

Eles dobraram uma esquina e a passagem se estreitou, roçando o topo de suas cabeças. Muffin parou abruptamente. Jas colidiu com seu traseiro largo e Rom se chocou contra ela por trás. Eles não eram agentes secretos suaves – ao ar livre, de qualquer maneira.

Muffin tirou uma ferramenta de sua capa e a usou para abrir um painel. Ele a ergueu alto o suficiente para espiar o corredor iluminado por tochas abaixo. O som de um canto monótono distante enviou calafrios por sua espinha.

— Tudo limpo. — Ele sussurrou em um estrondo profundo.

Ele se preparou acima da abertura, fez uma pausa e, em seguida, caiu com uma graça surpreendente como um gato no chão. Ele se achatou contra a parede e tirou a arma da capa.

Jas hesitou. O corredor abaixo estava deserto, mas a qualquer momento alguém poderia passar e vê-los. Como se sentisse seus medos, Rom disse baixinho: — O pior já passou. A entrada principal fica a apenas cem passos daqui. Em breve estaremos livres.

Ela piscou a transpiração de seus olhos e saltou.

Quando seus pés atingiram o chão, o inferno desabou. Portas bateram, homens gritaram. Uma sirene estridente explodiu de aberturas no teto... E esta não estava em sua mente.

Rom gritou: — Corra!

Ela tropeçou, depois recuperou o equilíbrio ao dobrar a primeira esquina. O corredor virou em L à direita. Muffin havia desaparecido. Cinquenta passos à frente, uma porta emoldurava uma paisagem arborizada gelada abaixo de um céu de chumbo. Mas uma figura encapuzada entrou na frente deles, bloqueando habilmente sua fuga.

Envolto em uma túnica vermelho-sangue, os movimentos deste cultista do Novo Dia eram limpos, não lentos como os dos outros. O fanático acenou com um rifle de formato estranho no ar e o alarme cessou. — Ouvi dizer que o dom de meu mestre era brincar com um cavalheiro dos Vash — disse uma voz feminina familiar. — Só que eu não fazia ideia que era você, Rom B'kah.

— Oh, droga — Jas deixou escapar. — Beela. Ela me trouxe aqui.

— Não faça contato visual e não fale. — Disse Rom baixinho. Habilmente alcançando dentro de sua túnica, ele retirou sua arma.

O dedo no gatilho de Beela flexionou. Energia azul-gelo aglutinou-se no cano de sua arma. — Prudência ordena que você pare e deixe cair sua arma.

— Afaste-se — Rom respondeu, igualmente calmo. Ele diminuiu seu movimento para frente, apertando ainda mais a mão de Jas enquanto mirava. Em um movimento suave, Beela tirou o capuz e desviou o cano de sua longa arma em direção à cabeça de Jas. O coração de Jas já batia forte, batendo impotentemente atrás de suas costelas.

As feições esculpidas de Beela relaxaram em um sorriso vencedor que nunca alcançou seus olhos. — Preciso lembrar que os rifles de prótons são extremamente confusos?

Um olhar profundo de dor apertou as feições de Rom, perseguido por um lampejo de indecisão. Seus nós dos dedos ficaram brancos quando ele agarrou a coronha de sua pistola. Então sua expressão ficou vazia como a de um jogador de pôquer habilidoso.

Ele manteve sua arma apontada para Beela.

A arma de Beela permaneceu apontada para a cabeça de Jas.

Um impasse. O ar parecia prestes a se estilhaçar. Jas engoliu em seco contra uma onda de náusea. Ela esperava que Rom soubesse o que estava fazendo.

A atenção de Beela se fixou em Jas. Seus olhos frios e afiados brilharam como diamantes lascados. — Você não deveria ter fugido.

Rom disse: — Ela não correu. Eu a levei.

— O mestre não deve encontrar sua cama vazia — Beela continuou. — Volte para o seu quarto. — Pela primeira vez, a mulher buscou sua obediência por meio do medalhão. Jas percebeu que ela estava tentando influenciar seus pensamentos, como Sharron havia feito.

Jas estreitou os olhos e não disse nada. O rifle de prótons de Beela balançou levemente, seu olhar rastreando até o pescoço de Jas, onde a corrente vazia pendia. — Cadê? — Ela gritou.

Um estalo alto ecoou em algum lugar atrás deles. Ao mesmo tempo, faíscas azul-esverdeadas ricochetearam nas paredes quando o rifle de prótons de Beela disparou. O ar foi sugado à força dos pulmões de Jas. O fedor de algo parecido com um radiador de carro superaquecido queimou suas narinas.

Beela soltou um grunhido e cambaleou. — A Família trará a verdade para suas casas, para seus filhos — ela engasgou, olhando para Rom. — Nós vamos trazer guerra para você, B'kah, como você fez para nós. Nós vamos triunfar, e o novo dia vai alvorecer. — Outra explosão de luz a silenciou, batendo-a contra a parede.

— Eu estava me perguntando quando você a calaria — Rom disse a Muffin enquanto o grande homem caminhava para frente, sua arma ainda apontada para a mulher. Caindo no chão, a mulher olhou para eles com uma expressão de surpresa quase infantil. Filetes de fumaça subiram de seu pescoço e ombros, e Jas não pôde deixar de sentir uma breve tristeza por todos aqueles que foram capturados pelo poder de Sharron.

Uma luz vermelha constante acima da saída começou a piscar. Então, a grossa placa de metal ancorada no teto estremeceu.

— A porta está fechando! — Ela gritou.

Eles correram para a saída. — Vá! — Rom a empurrou pela abertura que se estreitava rapidamente. Muffin mergulhou com ela. Arranhada e machucada, ela caiu ao lado dele sobre a terra congelada. A porta se fechou com um estrondo.

— Cadê Rom? — Ela gritou. — Ele não conseguiu!

Uma pequena e intensa explosão destruiu a porta e Rom saiu correndo. — Vá!

O ar frio feriu seus olhos, fazendo-os lacrimejar. Flocos de neve picaram suas bochechas como agulhas. Acima de sua respiração irregular, ela ouviu o barulho inconfundível dos motores rugindo para a vida. Duas naves voaram no alto, depois outra.

Os lutadores de Sharron.

Um pico coberto de neve apareceu, mas Jas o perdeu de vista quando eles entraram em um bosque de árvores altas como coníferas. Pinhas do tamanho de Volkswagens cobriam o chão da floresta, retardando seu progresso. O alívio agudo a perfurou quando ela avistou um par de naves elegantes à frente.

Zarra saiu correndo de onde estava entre os velocistas. Ele ficou tenso, abruptamente levantando sua pistola.

— Atrás de você! — Ele começou a disparar contra seus perseguidores invisíveis.

Raios de luz explodiram. Rom e Muffin giraram e responderam ao fogo. Projéteis dispararam do casco do velocista mais próximo e fios cegantes de energia cortaram galhos de árvores. Jas agarrou-se a um coldre que gostaria que estivesse ali.

Um grito assustado rasgou o caos. Virando-se, ela viu Zarra voar para trás. — Zarra! — Ela gritou.

Rom segurou seu braço antes que ela pudesse correr para o jovem caído. — Entre! — Ele a empurrou para o interior confortável da nave. A embarcação tinha acomodações para uma pequena tripulação, mas não era espaçosa.

— Muffin tem Zarra?

— Sim!

Ela fez uma oração. O garoto tinha nove vidas.

A escotilha se fechou atrás deles. Ela mal conseguiu chegar a um dos dois assentos de piloto na cabine antes de Rom disparar os propulsores e puxar o manche. O nariz da nave saltou para o céu, jogando-a contra o assento. Eles se libertaram da atmosfera. Não havia gerador de gravidade nesta pequena nave, e seu cabelo flutuava ao redor de seu rosto.

— Bandidos, às seis horas! — Ela gritou quando o visor a sua frente se iluminou em aviso.

Com o computador de bordo fornecendo tempo de fração de segundo e proteção contra imensas forças de aceleração, Rom pressionou os controles para a esquerda. As estrelas lá fora giraram em um caleidoscópio estelar, e a corrida há muito esquecida do combate voador vibrou através dela. Isso era espaço, não o céu, mas as sensações, as manobras, eram as mesmas.

Rom disparou. A primeira nave inimiga explodiu em fogos de artifício verdes e brancos. Pedaços de destroços se chocaram contra o escudo do casco do velocímetro. Mais lutadores apareceram na tela de exibição. Muffin imediatamente tirou dois, mas os outros mudaram de formação, vindo em sua direção.

Rom praguejou baixinho enquanto seus dedos dançavam sobre o console. — O envio do míssil está emperrado.

— O que você quer dizer? — ela deixou escapar.

— A menos que eu conserte a maldita coisa, não podemos atirar de volta. — Rom se desamarrou.

— Onde você vai?

— Embaixo do convés. Para a baía de mísseis. — Ele passou por sua cadeira. — Acho que posso consertar manualmente.

Jas ficou boquiaberta enquanto ele flutuava para uma escotilha no chão e a abria. — Quem vai pilotar?

Rom piscou para ela.

— Eu não voei em combate em vinte anos!

— Se preocupe com isso mais tarde. — Sua cabeça sumiu de vista.

Jas girou de volta para os controles. Preocupada? Não. Animada? Sim.

— Vamos lá. — Firmando-se, ela ergueu o olhar para os caças em perseguição e enrolou as duas mãos sobre o manche.


CAPÍTULO 16


— Na minha cola, seu bastardo!

Jas arrastou o piloto implacável de Sharron por meio de manobras destinadas a drenar sua energia e desacelerá-lo. Mas não estava funcionando. Os propulsores capazes de atingir a velocidade da luz superaram em muito os motores a jato aos quais ela estava acostumada, e o caça estelar permaneceu às seis horas. No máximo, a tática dela evitou que ele atirasse, dando a Rom os minutos preciosos de que ele precisava para consertar o enviador.

— A maldita coisa está instalada e funcionando. — Ele disse, puxando-se para seu assento.

Armas prontas piscavam na tela de status. Quando Rom não agarrou imediatamente os controles, Jas entendeu o que ele queria que ela fizesse. Ela virou a nave de cabeça para baixo e puxou o manche com força. Cara a cara com a nave perseguidora, ela atirou. Um clarão ofuscante apagou as estrelas.

— Sim!

— Bem feito.

— Obrigada. — Foi bom ver que ela não tinha perdido o toque.

Rom assumiu o controle da nave. A nave de Muffin passou rapidamente, seguida por um enxame de caças estelares inimigos. Metade do esquadrão interrompeu a perseguição e se dirigiu para eles. Sua boca ficou seca.

— Deve haver vinte deles!

— Espere. — Rom empurrou a alavanca de impulso para frente, e as estrelas se alongaram em serpentinas.

— Velocidade da luz? — Jas perguntou quando sentiu seu coração desacelerar.

— Sim. Eles não podem nos rastrear através do hiperespaço se não transmitirmos as coordenadas.

— E quanto a Muffin e Zarra?

— Eles darão o salto quando nós dermos. Conforme informado.

— Então acabou. Estamos a salvo. — Ela relaxou um pouco.

As linhas em torno de sua boca se aprofundaram quando ele tirou as alavancas de impulso do máximo. — Ainda não. Posso ter calculado mal.

— Calculou mal? Cuidado! — Jas recuou em seu assento quando uma das milhares de pedras irregulares passou voando. — Asteroides.

— Na verdade não. São os restos das duas luas de um planeta anão.

Rom desviou a nave para a esquerda, depois para a direita. À frente estava um Saturno em miniatura completo com vários anéis. Eles estavam em um deles. Pingando e sibilando, rochas do tamanho de seixos a não maiores que grãos de areia impactaram com o escudo endurecido da nave. Eram os pedaços maiores que a preocupavam. Os do tamanho de uma pedra. Ela colocou as mãos nos apoios de braço e simplesmente se segurou.

Eles estavam quase atravessando o anel de destroços quando uma pedra bateu com força.

O baque oco vibrou através da nave. O painel de status de manutenção começou a rolar uma lista de sistemas afetados e que precisam de reparo. — Ajude-me a encontrar um lugar para pousar. — Disse ele uniformemente.

À frente, o planeta anão parecia uma versão irregular da lua da Terra - com poucos lugares para derrubar uma nave danificada. Ela vasculhou a superfície em busca de um local provável enquanto Rom acelerava a nave. Uma pedra perdida passou raspando a parte de baixo da nave.

Ela deveria estar apavorada, mas não estava. Uma hora atrás, ele salvou a vida dela e ela não tinha dúvidas de que ele faria isso de novo.

Eles avistaram o imenso planalto ao mesmo tempo. Crateras marcavam a superfície, mas pareciam - pareciam - rasas. Rom apontou para isso. — Aguente.

Eles chegaram rápido - rápido demais. Mas no último momento possível, Rom desacelerou habilmente. O velocista derrapou sobre um campo sombrio e espalhado por meteoritos, e então para um aterro raso. Um último solavanco os jogou contra os arreios de ombro.

Jas sentou-se perfeitamente imóvel, meio que esperando o golpe final. — Conseguimos. — Disse ela timidamente, olhando ao redor.

Rom tirou sua alça. Havia gravidade suficiente devido à rotação deste pequeno mundo para mantê-lo plantado no chão. Apoiando-se em seus braços, ele se inclinou sobre ela.

— Temo ter assustado você.

— Quem não ficaria, depois de quase cair? Foi um voo incrível.

— No complexo. Quando você tinha uma arma mortal apontada para sua cabeça. Eu não deixei cair minha arma conforme ordenado.

— Rom...

Ele ergueu uma das mãos. — Foi um risco. Mas não um que fiz porque levei sua vida levianamente. Meus sentidos me disseram que a traidora dos Vash colocaria as peças erradas - com tempo suficiente.

— Você a chamou de blefe — Jas disse. Rom balançou a cabeça confuso com a declaração. — É a marca registrada dos melhores jogadores de pôquer— ela explicou. — Imperturbável. O pôquer é um jogo de cartas da Terra.

Ele quase sorriu. — Sim, eu sei disso.

— Beela queria que você acreditasse que ela tinha cartas melhores. Mas ela não tinha. Você sabia, mas não demonstrou. Você a forçou a jogar sua mão fraca e ela desistiu. Você foi brilhante.

Quando o alívio inundou seu belo rosto, de repente ela percebeu o quão preocupado ele tinha estado por ela pensar que ele tinha arriscado sua vida desnecessariamente. Profundamente tocada, ela estendeu a mão e emoldurou seu rosto com as mãos. — Você é o homem mais incrível e abnegado que já conheci. Não entendo como ou por que acabamos juntos, só que você me traz tanta alegria.

Ele agarrou a cabeça dela com as mãos, então baixou a boca para a dela; Jas agarrou sua capa e aprofundou o beijo, forçando as alças de sua cintura e peito para puxá-lo para mais perto. O desejo mais poderoso do que qualquer coisa que ela jamais pensou ser possível a consumiu. Motivada por uma necessidade quase primitiva de acasalar com ele, ela se tornou a agressora, atrapalhando-se com os fechos de sua capa. Quando eles não se soltaram, ela os abriu com um chiado agudo de tecido rasgado.

— Eu quero você — disse ela em um suspiro. Para refutar a afirmação de Sharron de que ela pertencia a ele, para apagar as palavras zombeteiras de Jock, para obliterar todos os anos solitários entre eles. — Em qualquer lugar, o chão, o assento, eu não me importo. Eu só quero você.

O controle estoico que fazia parte dele desapareceu. Com dedos apressados, ele desabotoou seu arreio e a puxou em sua direção. Suas mãos se fecharam firmemente sobre seu traseiro, puxando-a com força contra ele. Seu beijo foi possessivo, exigente e não havia nada gentil ou reservado em seu toque.

Suas carícias se tornaram mais ásperas, mas as dela também. Ela jogou as capas para o lado, arrancando sua camisa enquanto o puxava para trás em um beliche estreito. Na baixa gravidade, eles caíram no colchão em câmera lenta, como se estivessem debaixo d'água. Atordoada por sua urgência em se juntar a ele, Jasmine deixou suas mãos emaranhadas com as de Rom em uma corrida para libertá-lo de suas calças. Seu vestido curto ondulou até o chão. Palmas quentes e calejadas deslizaram sob seu traseiro. E então, em um impulso rápido e incrivelmente profundo, ele levantou seus quadris e se dirigiu para dentro dela.

Ele a encheu, esticando-a deliciosamente. O prazer estremeceu por ela com o doce e dolorido calor. Seu cheiro, a sensação dele se movendo dentro dela, sua pele quente, seus gemidos, quase a empurrou para o limite.

Mas eles estavam longe de terminar. Ele se balançou contra ela, sua boca e suas mãos famintas e possessivas. Ela se agarrou a ele, os punhos cerrados sobre os músculos das costas, seus gritos de prazer interrompidos quando ele apertou a boca sobre a dela em um beijo cru e selvagem.

Não era como fazer amor no Quillie. Era um acasalamento frenético e desesperado, alimentado pela adrenalina e mil emoções que ela não conseguia definir. Eles caíram juntos em um vínculo selvagem e primitivo, uma celebração extraordinária de sobrevivência. Quando seu corpo poderoso endureceu, então estremeceu, o calor líquido a encheu, desencadeando um clímax agudo e requintado.

Eles desabaram juntos, membros entrelaçados.

A cabeça de Rom caiu para frente até que sua testa molhada roçou seus seios. Saboreando os deliciosos tremores que a percorriam, ela passou os dedos preguiçosos por seu cabelo úmido. Longos momentos se passaram antes que qualquer um deles fosse coerente o suficiente para falar - ou pensar.

Ele ergueu a cabeça. — O que eu fiz?

Ela sorriu e suas pálpebras se fecharam pela metade. — Me tornou a mulher mais amada do universo.

Grande Mãe.

Rom rolou com aversão a si mesmo. Enfiando os dedos pelo cabelo, ele se sentou na beira do beliche. Por tudo o que era sagrado, ela era uma mulher de fronteira ignorante, e ele quase a estuprou.

— Eu sou um animal.

— Mmm. Um animal incrivelmente delicioso. — Jas ficou de joelhos e passou os braços em volta dele. Seu coração afundou quando ela deu um pequeno rosnado.

— Um guerreiro não cede às suas próprias necessidades antes das dos outros.

— Espere - a maneira como acabamos de fazer amor incomodou você?

— Isso não foi fazer amor — disse ele secamente. — Era primitivo e indisciplinado.

— E — ela deslizou os braços delgados ao redor do peito dele para descansar a bochecha em seu ombro — incrivelmente maravilhoso.

Seus seios macios e quentes pressionados contra os músculos tensos de suas costas. Ele não queria nada mais do que se inclinar em seu abraço, fechar os olhos e se perder em sua gentileza, sua generosidade de espírito. — Eu precisava de você — ele ofereceu sem muita convicção. — Meus únicos pensamentos eram o quanto eu queria você. Eu perdi o controle.

— Ah — ela disse calmamente. — Perdendo controle. O verdadeiro problema.

— É imperdoável.

As pontas dos dedos dela patinaram levemente sobre a cicatriz em seu peito. — Isso é o que você foi ensinado.

— Desde o nascimento.

— Não consigo ver isso se aplicando ao sexo.

— As crianças Vash Nadah recebem instrução na arte de fazer amor desde a mais tenra idade.

— Instrução? — Seus olhos se arregalaram de vívida curiosidade. — Que tipo de instrução?

— A discussão, o esclarecimento de dúvidas de professores vivenciados com a curiosidade dos jovens. Nada no nível físico até a adolescência - e apenas para os homens. — Memórias o inundaram, o perfume usado pelas servidoras de prazer do palácio. Estranho que ele se lembrasse do cheiro, mas não dos corpos.

Os dedos de Jas vacilaram sobre sua cicatriz. — Então você teve aulas de sexo quando era adolescente?

— Sim. Até que um homem Vash Nadah se case, ele tem permissão para quantas mulheres quiser. O objetivo é adquirir habilidades destinadas a proporcionar prazer a parceira, em última análise, para fortalecer o vínculo matrimonial. “A base da sociedade é a família. A sexualidade aumenta a espiritualidade.” Está escrito no Tratado de Comércio, que é parte integrante de nossa cultura e de nossa fé.

— Não estou criticando nada disso. E não sou de forma alguma uma mulher experiente no que diz respeito a sexo. Mas saber que posso deixar ir quando estamos juntos... É a beleza da nossa vida amorosa - perder o controle sem medo de me perder. É estimulante, como cair quando você tem certeza de que alguém vai te pegar. Eu quero que você se sinta assim comigo. Não precisa se estender a outras partes de sua vida se você não quiser. Que seja algo lindo e especial só entre nós.

Ele recostou-se nos braços dela e fechou os olhos. — Aqui, eu vi minha perda de controle como uma desonra para você, embora você considere isso um elogio. — Ele sorriu com o absurdo de tudo isso. — Ah, Jasmine. Não será fácil abandonar os ensinamentos de uma vida inteira.

Em suas palavras, ela varreu beijos ternos ao longo de sua mandíbula. — Eu te amo, Rom. Isso me assusta até a morte, mas eu amo. Eu realmente te amo de todo o meu coração.

Ele se virou e a puxou para seu colo. Ele disse rispidamente: — Eu te amo. Eu esperei uma vida inteira por você. — Joy iluminou seu rosto. Provando sal e doçura, beijou-a com uma profunda ternura que era nova para ele, querendo transmitir sem palavras as profundas emoções que ela evocava nele. Ele nunca se sentiu mais próximo de outra.

— A ideia de ficar presa com você é terrivelmente atraente — disse ela quando se separaram. — Teremos que conversar - sobre Sharron, sobre muitas coisas. Mas, por enquanto, espero que não estejamos com pressa para consertar isso.

— A única coisa que quero consertar é a perda de tempo. — Ele passou os braços em volta da cintura dela e a jogou no beliche. Embora a ameaça da sobrevivência de Sharron e as ameaças de Beela permanecessem, por um breve momento seu coração se sentiu tão leve quanto a névoa de Sienna. — Eu digo que é hora de aproveitarmos o fato de que estamos temporariamente abandonados.

— Rápido e furioso — ela perguntou provocativamente — ou lento e doce?

Ele deu uma risada profunda e a puxou para perto. — Nisso, anjo, você simplesmente terá que confiar em mim.

 


Durante toda a noite, ele a amou com habilidade e ternura. À medida que as horas se fundiam, ele a apresentava a formas eróticas de fazer amor muito além de sua experiência, trazendo seu prazer além de sua imaginação. Sua confiança sexual floresceu.

Quando eles finalmente descansaram, Jasmine sussurrou: — Eu não pensei que fosse capaz disso.

Ela era uma mulher real novamente - uma mulher normal que podia dar e receber prazer íntimo. Talvez fosse porque desta vez ela escolheu um homem, em vez de um menino disfarçado de homem. Rom preencheu o vazio dentro dela como ninguém jamais fez, e ela queria ver para onde o relacionamento iria. Mas com anos-luz separando-a de seus filhos, de sua família e amigos, como ela poderia, com uma boa consciência, considerar ficar no espaço mais tempo do que o planejado?

Como se sentisse sua inquietação, Rom silenciosamente a abraçou, as pontas dos dedos percorrendo os contornos de suas costas.

Perdida em pensamentos, ela se aconchegou contra ele.

— Luzes — Rom disse depois de um tempo. — Configurando escurecimento. — Apenas uma luz no alto do dormitório brilhava fracamente enquanto eles estavam entrelaçados, sem barreiras entre eles.

Rom se perguntou o que seu pai diria se soubesse que o palácio informava que seu antigo herdeiro estava se relacionando com uma mulher fronteiriça casada, de cabelo da meia-noite, sem nenhum conhecimento do Tratado de Comércio - um companheiro que teria sido absolutamente a escolha errada em sua vida anterior. Sem dúvida, Sua Majestade o Rei o denunciaria como antes, repetindo a todos que seu filho carecia de disciplina, que ele era impulsivo e que não se importava com os alicerces de sua sociedade. Que melhor maneira de provar que o velho estava certo do que aceitar abertamente Jas Hamilton como amante?

Mas a simples ideia de usá-la induziu um arrepio de autoaversão. Jas não pertencia a um jogo inútil de rancor. Ela pertencia a seus braços, quente e saciada, enquanto sua nave cruzava a noite eterna do espaço sem fim.

Sua vida agora é sua, ele lembrou a si mesmo.

Sim, ele poderia estar com quem quisesse. Envolvendo sua amada na proteção de seu corpo forte, ele deixou que sua respiração tranquila o embalasse para dormir.

 


— Zarra está morto.

Morto.

Chocado demais para falar, Rom mudou seu olhar do rosto de Gann na tela para a refeição que ele estava compartilhando com Jas antes de ser saudado pelo Quillie no que ele presumiu ser uma chamada de rotina para marcar o encontro.

— Oh, Deus. — Jas murmurou em sua língua, agachando-se ao lado da cadeira de Rom, com a mão apoiada em sua coxa.

— Ele se levantou assim que caiu — Gann explicou, suas palavras, Rom suspeitou, tão cautelosamente escolhidas quanto passos em um campo minado nuclear. — O menino até embarcou na nave sozinho. Mas a perda de sangue foi muito severa, muito rápida - não havia nada que Muffin pudesse fazer. Ele... Morreu um guerreiro, Rom.

Rom olhou fixamente para seu ensopado pela metade.

Outra morte fútil nesta guerra não declarada.

A compreensão ecoou dentro dele até que o desejo de vingar Zarra transbordou. Os nós dos dedos dele ficaram brancos e ele soltou um silvo de ar. A colher em seu punho se partiu em duas, com tanta certeza quanto ele desejava quebrar o pescoço de Sharron.

— Rom? — Jas sussurrou. A mão dela deslizou sobre a dele, quente e reconfortante, mas ele não o fez, não conseguiu soltar o utensílio quebrado. O desejo de chorar era tão poderoso quanto seu desejo assassino de retornar a Balkanor imediatamente e matar Sharron. No entanto, quando ele ergueu os olhos para o rosto de Jas e depois para o de Gann, e viu em seus olhares expectantes a vontade de segui-lo de volta para Brevdah. Três contra todas as probabilidades, ele estremeceu. Ele não os arriscaria. Não por uma luta que não era mais dele.

Rom lutou para manter a voz firme. Com rigidez, ele se dirigiu a Gann. — Eu quero que você leve o Quillie para a Destruição da Caveira. — Ele sabia por longa experiência que a melhor maneira de manter a culpa e a tristeza sob controle era uma programação exaustiva. — Conclua nossas transações lá — disse ele. — Depois disso, vá para Karma Prime e venda nosso sal conforme planejado originalmente.

Como se Gann se preocupasse que Rom planejasse buscar vingança contra Sharron por conta própria, a cabeça do homem desviou para Jas. — E você? Onde você irá?

Jas esperou pela resposta de Rom com um olhar firme e inabalável. Seus olhos se suavizaram com compreensão e alívio quando ele respondeu baixinho: — Para reagrupar.

E de alguma forma encontrar uma maneira de redimir outra morte.

A angústia de Rom se transformou em uma ira impotente. Cada vez que ele confrontava Sharron, o monstro levava alguém de quem gostava. Só que desta vez, ele não estava sozinho no rescaldo. Jas compartilhava seu luto, sustentando-o com sua ternura e amor incondicional, e ele quase ficou aliviado quando sua dor finalmente se transformou no arrependimento profundo ao qual ele havia se acostumado.

Nos próximos dias, ele se ocuparia em consertar a nave de Drandon Keer o suficiente para voar. Uma vez fora do planeta anão, eles voariam para o sistema Gorgenon, onde ele conhecia um engenheiro. Quando a aeronave estivesse funcionando, ele e Jas tirariam um ou dois dias para ficarem de luto. Perto dali, estava um planeta famoso por aquele que era um dos com diversões mais estranhas da galáxia conhecida.

 


— Oh, meu Deus, Rom, caracóis gigantes! — Jas deixou escapar, agarrando-se a um galho grosso por tudo o que ela valia.

Ele arrancou a mão esquerda dela da árvore em que estavam empoleirados e pressionou-a contra os lábios. — Eu pensei que você mal podia esperar para montá-los. Na verdade, lembro-me de você me fazer perguntas por uma boa hora sobre a primeira vez que vim aqui.

— Antecipação e realidade são duas coisas diferentes. — Ela brincou de volta. Na verdade, porém, ela estava se divertindo. A trégua foi bem-vinda após a intensidade de sua provação.

Ceres era encantador. O clima era temperado e úmido, como o do Havaí em janeiro, tornando-o ideal para acampar. A clareira cheia de pedregulhos que Rom escolheu para armar sua barraca estava protegida do caminho noturno dos caracóis - ou assim ele insistiu. Bem acima, as árvores se inclinavam umas para as outras, suas folhas se enlaçando para formar uma copa que silenciava o sol diurno e o tingia de verde. Se ao menos o universo real e suas demandas - a ameaça de Sharron, sua família esperando por ela na Terra - não se agarrassem às bordas deste breve idílio. Ela poderia facilmente continuar assim com Rom para sempre, vivendo como nômades, seguindo em frente quando quisessem. Ou simplesmente ficarem parados por um tempo, como fizeram durante aqueles dias na espaçonave, quando o tempo se turvou em uma névoa sensual. Eles encontraram fuga e consolo um no outro.

Outro caracol passou sibilando. Jas agarrou a árvore. — Eles são tão grandes quanto casas.

— E criaturas gentis e inofensivas. Os moluscos Ceresianos não são encontrados em nenhum outro lugar, exceto aqui. Se você perder essa chance, vai se arrepender pelo resto da vida. — Os olhos dourados de Rom brilharam na noite escura e estrelada. — Mas se você preferir, podemos voltar para a tenda. Um jogo de cartas, talvez...

— Quieto. Estou me preparando mentalmente, só isso.

Jas apertou o queixo e olhou para um dos monstros que passava. Sua concha marrom com cicatrizes brilhava à luz da lua crescente, o que fazia o lodo em sua pele irregular brilhar. Raspou o chão da floresta com um estalo de galhos, suas duas antenas balançando de um lado para o outro. Seu coração batia forte no peito, e a adrenalina deixou suas mãos suadas.

Ao longe, ela ouviu a risada de outro casal quando eles caíram de sua árvore para pousar em um dos moluscos. As pessoas faziam isso o tempo todo, ela se lembrou. O objetivo era montar as criaturas até sua área de alimentação perto do mar e apreciar a vista que sua altura proporcionava.

— Eu digo que devemos pegar este aqui — disse Rom. Com o queixo, ele apontou para um vulto marrom que se aproximava.

O caracol bateu na árvore atrás deles, sacudindo-a como se fosse um galho frágil. Ela respirou fundo. — Ok. Vamos fazer isso.

— Ao meu comando, caímos de costas.

— E então é 'monte neles, cowboy'. — As antenas da criatura mudaram de direção. Jas se encolheu. A coisa provavelmente estava planejando uma rodada de rodeio de caracol. Ou os caracóis eram muito densos para saber se era intimidado, ao contrário dos cavalos e cães grandes? Ela esperava que sim.

Rom mudou de posição. — Pronta?

Ela engoliu em seco. — Como sempre estarei.

— Três, dois, um - vai!

Seu estômago subiu até as orelhas quando ela caiu da árvore. Ela acertou o caracol com força e procurou um apoio para a mão. A casca fria e úmida cheirava a folhas molhadas e a textura era semelhante à de uma casca de coco, tornando-a fácil de agarrar. Rom a ajudou a rastejar até a corcova perto do pescoço ondulado do caracol. A superfície era mais larga e plana do que parecia da árvore, dando-lhes espaço para se espalharem. Eles seguraram a borda da concha, esparramados de bruços, lado a lado. Ao chegar ao topo da colina, o caracol balançou ligeiramente, como um elefante gigante. Em silêncio, eles observaram a paisagem passar lentamente. Duas luas se ergueram e outra se pôs. À frente, o mar brilhava como uma arca de tesouro de pérolas.

— O que você acha? — Rom perguntou, os dentes brancos de seu sorriso visíveis no escuro.

Ela riu de alegria e alívio. — É lindo!

Rom passou o braço em volta dos ombros dela e a puxou para perto. — Você é linda. — Ele acariciou sua orelha, então colocou sua boca sobre a dela em um beijo quente e sensual.

Ela arriscou soltar a concha do caracol com uma mão para peneirar os dedos pelos cabelos sedosos de Rom. Ele aprofundou o beijo. A emoção da viagem e seu desejo aparentemente ininterrupto por ele se transformaram em uma mistura explosiva. Quase tonta, ela seguiu a linha de sua mandíbula com beijos cortantes e ofegantes. Ele respondeu com o som familiar que fazia no fundo da garganta sempre que ela o excitava.

— Se você continuar fazendo isso — disse ele, acariciando seu seio, — você vai se ver fazendo amor nas costas de um caracol.

— Hmm. Você já fez?

— Eu fiz o quê?

— Fez amor com um caracol? — Ela enfiou os polegares no cós da calça dele. — Ou serei a primeira?

Ele a forçou de costas. — Você sabe a resposta. — Ele disse, agarrando sua boca.

A alegria passou por ela. Ela era a primeira com ele, sempre a primeira. Ela colocou os braços sobre os ombros dele e o beijou apaixonadamente. Seu rico perfume masculino se misturou com a fragrância da terra úmida.

Os movimentos de Rom tornaram-se mais sérios. Suas botas arranharam a superfície irregular da concha, e ela o sentiu desabotoar as calças, afastando suas coxas com o joelho. Ela estava usando calças elásticas sob uma túnica, e ele facilmente puxou-as até os tornozelos. Suas pernas se abriram para o ar frio da noite. E então ele a encheu com seu calor espesso.

— Omlajh anah — ele murmurou. — Inajh d'anah... — Segurando a borda da concha acima de sua cabeça, ele a ancorou com seu corpo, balançando lentamente.

Seus olhos encontraram o céu estrelado acima, e ela subiu em uma espiral mais alta, voando na magia de seu toque. A brisa do oceano esfriou sua pele suada; o balanço de seus corpos refletia o andar sem pressa do caracol. Sem fim. Eterno. Ela oscilou na linha que separava o pensamento consciente da sensação pura. Seu prazer aumentou, tornou-se primorosamente focado. Ela não conseguia respirar, não conseguia pensar, e ela arqueou em Rom com um apelo silencioso para a liberação.

Ele a pegou gemendo com sua boca, beijando-a até que eles encontraram o paraíso juntos, membros entrelaçados, almas entrelaçadas, alegria ressoando entre eles até que apenas o som de seus suspiros enchera a noite.

 


Na tenda, na manhã seguinte, o amanhecer se infiltrou pela copa das árvores e pela fina membrana de seu abrigo. Incapaz de dormir, Jas observou a luz azul transparente acariciar o rosto adormecido de Rom, suavizando suas feições aristocráticas. Aparentemente, ele era um homem feliz. Mas ela sabia que ele se atormentava em particular com a morte de Zarra e questionando se Sharron acabaria por atacar os mundos natais dos Vash. Os oito planetas ancestrais eram críticos e certamente seus primeiros alvos. Se os mundos fossem dizimados, isso quebraria a espinha dorsal da federação dos Vash Nadah. Sem um governo central, haveria carnificina, turbulência, uma batalha pelo controle.

O que aconteceria com a Terra em tal colapso? O pensamento a gelou. Sem uma frota espacial, seu planeta estaria indefeso em uma guerra interestelar. Sem mencionar todos os outros planetas que poderiam ser destruídos.

Nenhum sistema político era perfeito, certamente não os Vash Nadah, mas a aliança de famílias antigas era tudo o que parecia separar a galáxia do lugar terrível e sem lei em que estivera onze mil anos atrás. A compreensão a enervou, picando o instinto de defesa de seu eu soldado. Era hora de fazer algo a respeito de Sharron.


CAPÍTULO 17


— Você está segura; o resto da minha tripulação está segura — Rom disse enquanto caminhava por toda a extensão de sua pequena tenda. — Não vou arriscar isso partindo para uma cruzada movida a vingança.

— Não estou sugerindo que você faça isso sozinho.

— Não quero participar da política galáctica.

Mas, além de apelar aos governantes Vash Nadah por ajuda, os mesmos homens que lhe deram as costas décadas atrás, ele não tinha como angariar o tipo de apoio de que precisava para acabar com a Família do Novo Dia e seus armamentos. Ele simplesmente não via isso. Compondo seus pensamentos, Jas tentou encontrar uma justificativa suficiente para mudar de ideia. — Você não está enfrentando o mesmo inimigo que enfrentou há vinte anos. Diga isso a eles. O envolvimento de Beela com o grupo é significativo. Significa que Sharron agora está recrutando Vash nobre. Isso significa que ele ganhou credibilidade e isso o trará seguidores mais poderosos e influentes.

— A presença daquela Vash nobre me perturbou — afirmou Rom.

— Isso te chocou. Eu estava lá. Eu vi na sua cara.

Secamente, ele disse: — Tenho vivido na fronteira. Não acompanhei quais membros da realeza fugiram da vida da corte e quais não. Certamente a inteligência dos Vash Nadah manteve o controle. Eles, sem dúvida, estão cientes da Família do Novo Dia.

— Mas não que Sharron esteja vivo.

— Possivelmente. Ou talvez eles tenham optado por ignorar esse fato.

— Idiotas. — Ela enfiou as roupas extras em um saco impermeável, agarrou o saco de dormir e enrolou-o com movimentos furiosos e bruscos. — A Família do Novo Dia não é mais uma seita. É uma revolução completa.

— Eu sei disso, Jas...

— Beela disse que eles trariam a guerra para nós, para nossas casas, nossas famílias!

— O orgulho é o pão com manteiga do fanatismo.

Ela se virou para ele. — Será que vamos correr esse risco? — ela implorou. — Temos o direito de correr esse risco?

A incerteza gravou linhas cansadas em cada lado de sua boca. Com as mãos cruzadas atrás das costas, ele parou na frente da aba da tenda aberta e olhou para fora. Depois de longos momentos de silêncio promissor, ele disse: — Seria necessário um imenso exército para localizar e destruir seu armazém militar.

— Então vamos criar um. Olha, você disse que nunca teve provas de suas maldades. Bem, agora você me tem. Vou contar a eles sobre os medalhões, as bombas de antimatéria, a diversão que ele planejou para mim depois que eu tivesse seu bebê. Coloque-me na frente do Grande Conselho.

— Política galáctica. — Rom cuspiu a frase como se fosse um palavrão. — Dê-me a fronteira distante, onde um homem pode cavar sua própria fortuna. — Onde ele poderia existir longe das lembranças do fracasso que o perseguiu durante toda a sua vida adulta.

Um desejo agudo e melancólico tomou conta dela. Ela poderia dar a ele o que ele queria e, ao mesmo tempo, obter felicidade para si mesma. Terra qualificada como a fronteira. Eles poderiam se estabelecer lá, viver suas vidas fingindo que a galáxia não estava oscilando à beira da guerra. Mas mesmo enquanto ela criava coragem para convidá-lo para casa, o mero pensamento de confinar este herói maior que a vida, este herdeiro da galáxia, a sua vida suburbana comum em Scottsdale, Arizona, a impediu de fazê-lo.

A frustração ferveu dentro dela. Ela pegou uma toalha e um pacote de sabonete. — Vou tomar banho na nascente. — Ela rezou para poder resolver o dilema deles.

O início da manhã era lindo na intocada Ceres. Ela usava um vestido verde-claro, uma das roupas que comprou enquanto esperava a nave ser consertada, uma roupa fina até o tornozelo em um tecido especial projetado para viagens espaciais. O pano macio e confortável refletia a luz do amanhecer no mais leve dos brilhos. Choveu um pouco depois que eles voltaram para a tenda na noite anterior. Ela se lembrou de ouvir as gotas batendo no telhado. Mas havia parado enquanto eles dormiam, e agora apenas gotas ocasionais de água caíam das árvores altas.

Ela abraçou os braços contra o peito, inalando o ar espesso com a rica essência de umidade e plantas. Mas o esplendor da floresta não lhe trouxe paz. Ela pensou em Rom, na tristeza e na solidão que ele sofreu por tantos anos, depois de perder seu irmão e ser expulso do clã B'kah. Ele havia se sacrificado mais do que qualquer outra pessoa em sua busca para ver Sharron morto. Ela não podia culpá-lo por não querer enfrentar o trauma da perda novamente. Ela poderia?

De cabeça baixa, ela marchou para a floresta. A água do escoamento das chuvas diárias abriu um caminho estreito para a nascente. Mas o terreno pantanoso a impedia de andar tão rápido quanto gostaria. Supostamente, os caracóis agora estavam cochilando em suas tocas, mas ela preferia não se encontrar com um sozinha.

Um bando de pássaros escarlates voava acima. Ela se virou para observá-los, e suas sandálias finas derraparam em cima de uma pedra lisa e escorregadia de lama. Ela caiu com força. Pés desviando de debaixo dela, ela gritou e escorregou como uma lontra marinha bêbada em uma poça de água estagnada. A sujeira com cheiro azedo salpicou seu rosto e cabelo. Ela cuspiu, passando as costas da mão no nariz e no queixo respingados. Redemoinhos prateados chamaram sua atenção enquanto ela cambaleava, criaturas microscópicas girando como purpurina na tempestade que ela havia criado. Incrível, até as algas eram lindas neste Jardim do Éden.

Onde a nascente formava uma piscina pequena e morna, a água era clara e limpa, com um fundo coberto de lodo sedoso como talco de bebê. Depois do banho, ela encostou-se a uma pedra aquecida pelo sol e espremeu o excesso de água do vestido e do cabelo. Seus pés descalços afundaram no solo esponjoso coberto de musgo, onde o sol com seus raios, dançavam. Ela estava ansiosa para trazer Rom para a nascente. Ele amava a água, tendo crescido em um planeta deserto onde a água era considerada um luxo, mesmo para uma família privilegiada. Eles iriam passar a tarde juntos, relaxando, rindo... Fazendo amor. No fundo de sua barriga, ela se aqueceu com o pensamento. Sensualidade era parte integrante de sua personalidade, e provavelmente sempre foi, algo que ela estava começando a ver quando aprendeu a expressar essa paixão fisicamente, em vez de confiná-la a um pincel.

O calor mudou para uma contração vagamente inquieta em seu estômago. O que ela precisava era de um ensopado de café da manhã Vash - e o beijo de bom dia que ela perdeu para discutir sobre Sharron. Ela voltou.

Aromas saborosos a encontraram no topo da colina. Perdido em pensamentos, Rom estava mexendo o conteúdo de uma panela que borbulhava em uma prateleira sobre um aquecedor portátil. Seu estômago se revirou de fome, depois uma leve náusea. Distraidamente, ela esfregou a barriga enquanto Rom colocava comida em duas tigelas e se juntava a ela em um tronco caído. Ela arrastou um pedaço de pão achatado pelo ensopado, na esperança de despertar o apetite. Mas seu estômago protestou, fazendo sua pele ficar quente e úmida. Ela pousou a tigela.

— Perdeu o apetite? — Rom perguntou. — Agora você sabe por que não quero discutir antes do café da manhã.

— Não, não é isso.

Pensativo, ele a olhou. — Você mal comeu ontem à noite também.

— Porque eu estava nervosa com os caracóis. Isso é diferente. — Ela tomou vários goles de ar para acalmar seu estômago embrulhado.

— Nauseada?

Ela assentiu.

Olhos suavizando com curiosidade e preocupação, ele pressionou a palma da mão em sua testa. Em seguida, ele entrou na velocidade das estrelas, voltando com uma sacola de suprimentos médicos, dezenas de drogas, bioquimicamente e geneticamente modificadas para curar quase todos os males imagináveis. Ela havia aprendido que, como os medicamentos eram tão eficazes, a maioria dos que viviam na parte central da galáxia consultava médicos apenas para ferimentos graves e cirurgias.

Rom borrifou uma névoa perfumada sob suas narinas. Quando ela inalou, seu abdômen se contraiu, como se alguém a tivesse socado no estômago. Ela se levantou e correu para os arbustos, a mão pressionada sobre a boca. Ela caiu de joelhos, quase desmaiando. Seu estômago revirou em grandes espasmos até que ela ficou vazia e tremendo. Ela estava vagamente ciente da presença de Rom atrás dela, as mãos dele alisando o cabelo úmido de seu rosto e pescoço. Sentando-se de cócoras, ela fechou os olhos e ofegou.

— O pior já passou, anjo — ele a assegurou, levantando-a. Suas pernas tremeram e ela se apoiou nele enquanto ele a conduzia para longe da vegetação rasteira para um cobertor que ele estendeu sobre a terra perto do fogo.

Os músculos de seu estômago relaxaram. Depois de alguns momentos de incerteza, ela arriscou: — Acho que a droga está começando a fazer efeito. — Mas o enjoo a envolveu assim que ela se sentou. — Talvez não.

— A droga age mais rapidamente com alguns indivíduos do que com outros. Vai passar. — Rom a puxou para trás, acomodando-a contra seu peito e dentro do berço de suas coxas. Seu vestido úmido parecia horrível, embora não a incomodasse antes, mas ela estava muito desmotivada para se trocar ou pedir ajuda a ele.

— Melhor? — ele perguntou.

— Não... Isso... Não está ajudando.

Ele borrifou-a novamente com o medicamento. — Inspire... Segure. É isso aí. Agora, deixe sair devagar. — Seu pulso martelava em seus ouvidos. As grandes palmas das mãos de Rom circundaram sua barriga. — Talvez seja algo que você comeu.

— No entanto, tivemos as mesmas refeições. — Outro espasmo estranho se apoderou de sua cintura e ela fechou os olhos. — Eu me pergunto - pode ser muito cedo, eu sei, mas... Eu posso estar grávida.

Suas mãos congelaram.

Abraçando a ideia, ela disse melancolicamente: — Eu estava muito doente com os gêmeos. Por meses.

Sua respiração acariciou o lado de sua garganta. — Mas Jasmine, eu não posso...

— Sim, bem, isso é o que lhe disseram. Em um diagnóstico feito anos atrás. Mas como você sabe que ainda é verdade? Todas as mulheres com quem você dormiu desde então tomaram precauções contra a gravidez, certo?

— Sim, mas...

— Já faz algum tempo desde que fazemos amor - sem proteção - e estou atrasada. — Ela parou para ofegar para não ter que correr para os arbustos antes de terminar. — E se sua contagem de esperma voltar? Só é preciso um.

— Jasmim...

Ela se virou ligeiramente. — Mas e se?

Suas mãos se espalharam protetoramente sobre seu abdômen, seu anel de sinete brilhando ao sol. — Jas... Gerar um filho, nosso filho... — Ele engoliu em seco e a abraçou com mais força. — Há muito tempo, aceitei que tais riquezas nunca seriam minhas. — Sua voz continha dor e esperança o suficiente para trazer lágrimas aos olhos dela.

Naquele momento decisivo, ela viu suas reservas sobre permanecer no espaço pelo que eram - ela acreditava que sua família e amigos não poderiam existir sem ela porque era uma desculpa embutida para fugir da felicidade, para fugir do amor de Rom, por medo de ficar desapontada novamente. Aceitando isso, ela permitiu um futuro que ela não tinha contemplado se desenrolasse em sua mente. Rom, o guerreiro experiente, embalando um bebê em seus braços musculosos; depois ela mesma, amamentando depois de todos esses anos.

— Você pode nos ver como novos pais? — ela perguntou, o riso em sua voz. — Na nossa idade?

— Absurdo! Estamos no nosso auge. — Rom afastou o cabelo úmido e pressionou os lábios contra a garganta dela. — Vash Nadah se deliciam com famílias numerosas. Teremos mais depois deste.

Uma sensação quente-fria se espalhou por seu corpo. Espinhas de náusea rapidamente se transformaram em agulhas percorrendo seu interior, mas ela não conseguia respirar fundo o necessário para diminuir a dor. Um soluço cortou seu interior. Ela estremeceu, tocou os lábios com as pontas dos dedos trêmulos e sua mão se desdobrou em uma flor de sangue carmesim brilhante.

Ela não estava grávida; não haveria um bebê. E ela poderia não viver para tentar fazer um novamente. Junto com o medo vertiginoso, a compreensão silenciosa oscilou entre eles.

Ele a ergueu em seus braços fortes. Ela deve ter desmaiado por alguns segundos, pois, quando acordou, estava de joelhos, vomitando suas tripas nos arbustos.

 


Rom esperou até que Jasmine erguesse a cabeça, então enxugou a boca com uma toalha macia. O pressentimento o consumiu. Ela estava sangrando internamente - a cor já havia escapado de seus lábios.

A bordo da nave estelar, ele a acomodou no beliche. — Tente lembrar-se. Você mordiscou algo na nascente? — Ele se inclinou sobre ela. — Fruta? Uma folha de grama? Nada mesmo?

Suas sobrancelhas se juntaram. Entre o que parecia ser espasmos de dor extrema, ela conseguiu dizer — Poça... Cai. Água engolida.

Sua ansiedade aumentou. Parasitas. Existiam parasitas vorazes que podiam consumir órgãos internos em questão de horas. Ele a colocou na cama, saiu correndo pela porta da nave e jogou o equipamento do acampamento no porão de carga. Em seguida, ele explodiu de Ceres para Gorgenon Prime, o planeta onde a nave foi reparada, e o único no sistema com um médico.

Com as coordenadas inseridas no computador de navegação, ele flutuou em gravidade zero de volta para o beliche, agachando-se ao lado de Jas. Fazendo o inventário de seu kit médico, ele pegou um analgésico e um antiparasitário. Eles ganhariam tempo para ele, cujo instinto lhe dizia que ele tinha muito pouco. Ele colocou o remendo analgésico abaixo de sua mandíbula, em seguida, colocou um disco antiparasitário fino como papel sob sua língua.

— Isso vai ajudar até chegarmos ao médico. — Disse ele, passando os nós dos dedos sobre a bochecha dela.

Seu cabelo da meia-noite flutuava em torno de sua cabeça como uma auréola. Seus lábios tinham adquirido um tom azulado e sua pele estava ficando cinza. Entre respirações, ela gemeu.

Rom se sentia impotente e detestava isso. Mesmo se ele chegasse a um médico a tempo, o dano causado até então poderia ser extraordinário. Por tudo o que era sagrado, ele não tinha nenhum negócio em levá-la para Gorgenon Prime. Ela precisava de um cirurgião treinado Vash Nadah, não o médico comum que ele sem dúvida encontraria lá. Os médicos Vash Nadah eram os melhores médicos da galáxia. Mas ele também poderia desejar uma varinha mágica. Esses indivíduos renomados e altamente qualificados foram criados desde o nascimento para tratar os oito governantes e suas famílias - e servi-los exclusivamente.

Ele era um deles, não era? Um dos oito, o outrora herdeiro dos B'kahs. Não importa o quão completamente seus atos anteriores mancharam o nome de sua família, aquele simples fato permanecia - sangue era sangue.

Mão após mão, ele se impulsionou de volta para a cabine e consultou seu mapa estelar. Sua mente zumbia com possibilidades, enquanto a esperança zumbia em suas veias. Mistraal... Sim. O planeta ancestral da família Dar era apenas um dia de viagem em velocidade máxima. Era também a casa de seu cunhado; um homem que ele uma vez considerou seu amigo íntimo.

Um homem com quem ele não falava há vinte anos.

Não que a vida de Rom passada à margem do espaço civilizado tivesse facilitado o contato familiar, se Joren tivesse se importado em tentar...

Ele girou na cadeira para ficar de frente para o beliche. Além de renunciar ao pouco orgulho pessoal que lhe restava, aparecer no mundo natal dos Vash Nadah em busca de ajuda era uma violação flagrante do mandato que o transformara de herdeiro do trono em pária. Sem mencionar que equivaleria a uma humilhação total. Mas a resolução o fortaleceu ao ver o rosto marcado pela dor de Jas. O planeta Mistraal era sua melhor chance, talvez sua única chance, de encontrar um cirurgião com as habilidades para salvá-la. Se os caças de Joren Dar não me explodirem em poeira cósmica primeiro. Desejando aquela perspectiva sombria de sua mente, Rom alcançou o console de navegação e inseriu as coordenadas do planeta Mistraal, desolado e varrido pelo vento.

 


Empurrado para a velocidade máxima, a nave estelar estremeceu. Estrelas se estendiam a comprimentos impossíveis na tela frontal, enquanto Mistraal, uma minúscula pontada de luz, rastejava pela tela de navegação. Rom manteve o ritmo extenuante o dia todo, enquanto Jas ficava lentamente mais fria, mais fraca. A essa altura, ela estaria sob os cuidados de um médico em Gorgenon. Em vez disso, ela estava morrendo em um beliche de piloto espacial com finos lençóis. Como no pôquer, o jogo que seu povo tanto amava, ele tinha que apostar tudo no que não conseguia ver. Tudo o que ele podia fazer agora era orar para que, quando a mão do destino fosse revelada, as cartas estivessem a seu favor.

— Nave estelar não identificada, este é o Controle Mistraal!

Rom ficou imediatamente alerta.

— Você está entrando em um espaço protegido — latiu o controlador. — Identificação do estado.

— Nave, classe multifuncional tipo M, número de registro 18693, M-2A.

— Declarar intenções.

Rom falou devagar, uniformemente. — Peço permissão para pousar. Emergência Médica. Repito, emergência médica.

— Identificação do piloto. — Exigiu o controlador.

— Romlijhian B'kah.

— Diga novamente?

— Romlijhian B'kah. — Seguiu-se um silêncio revelador e ele imaginou a conversa que certamente deveria estar ocorrendo na cápsula de controle.

Outro controlador assumiu, um pouco mais experiente, como evidenciado por sua voz mais severa e confiante. — Identificação do piloto estadual.

Rom estendeu as mãos sobre o console e respondeu. Ele deve ter chegado ao alcance do interrogatório, pois uma série de luzes dançou no painel frontal do computador enquanto Mistraal extraía as informações de que precisavam para autenticar sua afirmação.

Os brilhos desapareceram. Minutos de silêncio se arrastaram para quase meia hora. Em seguida, fragmentos gelados de pavor começaram a destruir sua confiança. Ele flutuou para fora da cadeira e esticou os músculos contraídos. Ele olhou para trás em direção a Jas.

— Paciência, anjo. Simplesmente um pequeno enredo burocrático. Nada mudou nos anos que estive fora.

A leveza de seu tom não foi transferida para seu coração. Ele apostou que o marido de sua irmã não o rejeitaria. Mas e se os anos tivessem erradicado que lealdade poderia permanecer na amizade e nos laços familiares? Joren Dar poderia recusar sua entrada.

Facilmente. Ou e se Joren estivesse morto?

Então o que?

A transpiração formigou em sua testa. Os outros mundos dos Vash Nadah eram distantes demais para serem úteis. Se Joren o rejeitasse - e ele estaria em seus direitos - Rom seria forçado a arriscar em algum planeta abandonado. E Jas morreria; ele sabia disso com tanta certeza quanto respirava.

— Atenção 18693, M-2A - aqui é Mistraal - você está pronto?

Ele se empurrou na cadeira. — Vá.

— Você tem permissão para pousar. Prossiga para o ponto de verificação alfa.

— Entendido — disse Rom em uma exalação aguda. — Ponto de verificação alfa. — Agarrando a alavanca de impulso, ele facilitou a embarcação no protocolo de pouso.

 


Fatigado até os ossos, Rom embalou Jas em seus braços e caminhou através da escotilha da nave em uma vasta antessala.

Lembre-se de que você é um B'kah. O sangue de Romjha corre em suas veias.

Ele endireitou os ombros e ergueu o queixo. Enquanto suas botas ecoavam no chão de cristal branco impecável, ele instintivamente procurou no grupo reunido na câmara por um rosto familiar, mas não encontrou nenhum.

— Chame seu cirurgião. — Disse ele aos abertamente curiosos moradores do palácio, usando a voz mais autoritária que conseguiu reunir em seu estado de esgotamento.

Dois homens assentiram e saíram correndo. Irritado, Rom os observou partir. Ele não havia transmitido à chegada que precisava de um médico para atendê-lo? Por que não havia ninguém aqui esperando?

— Rom - é você!

A voz familiar e sussurrante cortou a multidão. Ele se preparou enquanto a reunião se separava para sua irmã. A seda em tons de melão soprou atrás dela enquanto ela corria em direção a ele. Seu cabelo estava preso com ornamentos no topo da cabeça e parcialmente escondido sob um véu transparente. Afastado de seu rosto, o estilo revelava os traços elegantes de uma mulher - não a garota que ele conheceu.

Ele sentiu uma onda de volta ao lar, uma sensação de anos perdidos. De alguma forma, ele manteve o controle de suas emoções, uma tarefa muito mais difícil agora que ele se acostumou a revelá-las a Jas. — Di. — Ele disse sem jeito, usando seu apelido de infância como se dias em vez de anos tivessem se passado desde a última vez que se viram.

Lágrimas brotaram de seus olhos. — Eles me disseram que era você. Eu estava com medo de acreditar, mas pelos céus, você está realmente aqui. — Ela deslizou uma mão quente e macia pela bochecha dele e traçou os contornos de seu rosto.

Ele segurou a mão dela. — Você nunca esteve longe dos meus pensamentos.

— Nem você dos meus. — Ela sussurrou.

Sua expressão de alegria absoluta disse a ele o que ele não ousou esperar. O amor entre eles havia sobrevivido aos anos separados.

Engolindo em seco, ele se forçou a se concentrar na razão de estar aqui. — O seu cirurgião está a caminho?

Seu olhar se desviou para Jas, cujo cabelo caía quase no chão. — Sim. — Claramente impressionada com a aparência surpreendentemente exótica de Jas, ela perguntou: — Quem é ela?

— Minha a'nah. — As palavras escaparam sem premeditação.

Sua irmã olhou para Jas com grande interesse. Inconscientemente, Rom abraçou Jas com mais força contra o peito. Embora não fosse formal, o título de - esposa sem votos falados - daria a Jas o status de que ele precisava em uma sociedade que girava em torno de posição social e família.

Ele simplesmente explicaria tudo quando ela acordasse.

— Você chamou meu cirurgião — Joren gritou enquanto alcançava sua esposa. Suas vestes cerimoniais giravam em torno de seu corpo alto e musculoso quando ele parou ao lado dela. — A mulher está doente?

— Sim — Rom respondeu inquieto, incapaz de dizer pela expressão cautelosa de Joren o que o homem pensava de sua chegada aqui. — Parasitas. A espécie mais incrivelmente voraz que já vi. Meu antiparasitário teve pouco ou nenhum efeito. — O desespero apareceu em sua voz. — Temo que, se ela não for tratada imediatamente, morrerá.

Joren sacudiu a mão e mais homens saíram correndo, provavelmente para acelerar o aparecimento do cirurgião. — Não fui informado da gravidade do estado dela. Bello! — ele gritou. — Traga o controlador sênior para mim imediatamente. Com a débil desculpa na ponta da língua do motivo pelo qual recebi informações incompletas. — Quando o homem fugiu da câmara, Joren murmurou: — Ao contrário de meus controladores espaciais, meu cirurgião e sua equipe são o melhor que a galáxia tem a oferecer. Faremos a mulher ficar boa.

— Sua a'nah. — Di forneceu incisivamente.

O casal trocou olhares. — Sua a'nah, então. Ela é bem-vinda aqui. — Ele procurou e sustentou o olhar de Rom. Duas décadas de arrependimento brilharam em seus olhos, junto com respeito e amor inequívocos. — Assim como você, meu irmão. — Ele sussurrou.

O peito de Rom se contraiu com uma onda de alívio. Ele segurou Jas perto, suportando muito de seu peso. Onde estava a ajuda? Por que eles estavam demorando tanto?

Houve uma comoção. A multidão de espectadores do palácio se separou para permitir que um cirurgião de manto verde e sua comitiva passassem. Um grupo de assistentes competentes colocou Jas em uma maca. Rom e Joren os acompanharam para fora da vasta antecâmara e entraram em um labirinto de corredores movimentados. Todos por quem ele passou olharam boquiabertos. — O B'kah. — Alguns sussurraram.

Em voz baixa, Rom disse: — Você correu um grande risco pessoal ao me permitir ficar. Haverá consequências quando os outros descobrirem.

— Eu não me importo com uma mínima consequência sobre isso.

— Basta salvá-la, Joren — Rom interrompeu, sua voz suplicante e baixa. — Isso é tudo que eu peço. Salve-a e não vou incomodá-lo mais.

 


Um carrilhão acordou Jas, mas a fragrância curativa do incenso de Sienna foi o que finalmente a persuadiu a abrir os olhos. Demorou um pouco para absorver onde ela estava. O enorme quarto estava inundado com o brilho suave das velas. Três paredes eram esculpidas em um material opaco, quase luminescente, parecendo cristal branco, enquanto a quarta era totalmente aberta para o exterior, um terraço com vista para uma vista de estepes desoladas inundadas em tons suaves de ocre, abóbora e bege. Almofadas exuberantes e tapeçarias evitavam que a espaçosa câmara parecesse fria.

Flutuando em uma sensação de bem-estar - de ter se curado - ela decidiu que Rom deve ter encontrado um médico, e um bom também, a julgar pela qualidade do ambiente.

Outro estalo de metal batendo em um sino interrompeu o silêncio. Ela rolou para o lado. Suas entranhas pareciam golpeadas e tensas, como se ela tivesse feito muitos abdominais - mil abdominais.

Do outro lado do quarto sombreado, uma forma de ombros largos se ajoelhava diante de um altar. Seu corpo poderoso estava curvado humildemente enquanto ele batia sua varinha de oração contra um sino gravado de aparência antiga.

Enviando suas orações para o céu.

Sua garganta se apertou com força. — Rom. — Ela chamou com voz rouca, levantando uma mão. Ele se virou e encontrou seu olhar. Sua expressão revelou seu alívio absoluto e a intensidade de suas emoções. Se havia alguma dúvida de que ele a amava do jeito que ela o amava, evaporou naquele momento.

Ele atravessou o quarto e se acomodou ao lado dela na cama, com cuidado e ternura, como se ela fosse quebrar se ele se movesse rápido demais. Ele deslizou os braços ao redor dela e murmurou contra seu cabelo: — Então, como você se sente, anjo?

— Cem por cento melhor. — Satisfeita, ela enfiou uma mão dentro de sua camisa de seda solta para saborear o calor de sua pele. — Há quanto tempo estamos aqui? — ela disse suavemente. — E o que eles fizeram comigo?

— Três dias. Durante o qual você foi submetida a cirurgia abdominal e regeneração de tecidos.

— E eu me sinto bem assim? — Ela hesitou em procurar cicatrizes e pontos. Seu estômago estava sensível e um pouco inchado, mas tão macio quanto antes. — Surpreendente.

Ele roçou os lábios em sua testa. — O cirurgião é um mestre. Entre os melhores da galáxia.

— Como este hospital, sem dúvida. — O quarto lembrava sua suíte no Hotel Romjha, só que era três vezes maior e decorado em uma escala mais opulenta. Riqueza e bom gosto infundiam todos os acessórios do quarto, muitos deles obras de arte por direito próprio. — Onde estamos - Gorgenon Prime?

Ela sentiu os músculos de suas costas se contraírem. — Não. Mistraal.

Ela olhou para ele. — Estamos em Mistraal? Um mundo natal Vash?

— Sim. O Palácio Dar.

Ela procurou em seu rosto sombreado a confirmação de que ele estava brincando.

— Gorgenon Prime não mantém as instalações necessárias para salvá-la. Aqui, eles têm. — Ele estendeu a mão e segurou seu rosto com uma mão quente e seca. — Joren Dar é meu cunhado.

As palavras a iludiram. A enormidade do que Rom fez por ela a atingiu com força. Ele não queria ir para casa, se envolver nos assuntos dos Vash, mesmo com a ameaça de Sharron pesando em sua consciência. Agora aqui estavam eles. — Você contou a eles sobre Sharron?

— Apenas Joren. Nós conversamos ontem.

Ela se inclinou na direção dele. — E?

— Ele ficou chocado ao ouvir que Sharron sobreviveu. Mas ainda mais quando eu disse a ele que estava envolvido armamento ilegal. Eu disse a ele que isso é maior do que pensávamos, que tudo o que valorizamos como sociedade está em jogo. Agora Joren está se reunindo com seus conselheiros e oficiais de inteligência para ver se mais pode ser descoberto.

Pensativa, ela disse: — Então, a inteligência dos Vash não sabia sobre a Família do Novo Dia, afinal.

— Eles sabem agora. À primeira luz vamos sair. A nave estelar está embalada com suprimentos e pronta para ir.

Ela se levantou. Seu manto se abriu e ela o fechou com força, pressionando o pano azul suntuoso e acetinado contra os seios. — Eu pensei que esta era a casa da sua irmã?

— É, mas...

— Você contou a ela seus planos?

— Não, mas...

— Bom — ela disse com um suspiro. — Não consigo entender como uma mulher que não via seu único irmão há anos poderia deixá-lo ir embora depois de uma visita de três dias.

— Jasmine, nós partiremos ao amanhecer. Já disse a eles o que sei. Eu não tenho lugar aqui.

— Até parece — ela retrucou. — Isso é família.

— Minha presença aqui coloca meu cunhado em uma posição incômoda, caso o conselho governante descubra.

— Isso é política. Há uma diferença.

Ele deu um suspiro cansado. A porta de entrada se abriu com estrondo e o som melódico das risadas das crianças invadiu o quarto. — Tajhar Rom, Tajhar Rom! — Meia dúzia de querubins bronzeados e de olhos dourados correu para a cama, soltando gritos de alegria enquanto puxavam a camisa de Rom.

— Quem convidou vocês para o meu quarto? — ele exigiu brincando enquanto pulava da cama. — Vocês vão pagar por este ato de imprudência. — Ele agarrou os dois menores, um menino e uma menina, e jogou-os nas almofadas do chão, fazendo cócegas em ataques de riso agudo, enquanto os quatro mais velhos dançavam ao redor dele, competindo por atenção.

— Parjhonian, Entok, Jon... Theeaet Preejha. — Uma mulher alta e elegante, vestida da cabeça aos pés com seda branca, irrompeu pelas portas abertas.

O coração de Jas deu um salto. Ela era uma versão feminina de Rom. Ela tinha os mesmos traços esculpidos lindos, olhos claros de cílios escuros e cabelo cor de noz-moscada, que usava trançado e enrolado no topo da cabeça.

A mulher enxotou as crianças, seus braços adornados com pulseiras gesticulando descontroladamente enquanto ela os repreendia em uma língua lírica e expressiva que tinha que ser Siennan. Depois de conduzi-los para fora, ela empurrou as portas duplas fechadas e caiu contra eles. Seus olhos dourados brilhavam com sagacidade e inteligência - e uma boa dose de curiosidade enquanto ela dava uma olhada completa em Jas. Mudando para o básico com sotaque, ela disse: — Meu coração canta por vê-la bem. — Antes de se lançar em um pedido de desculpas um tanto confuso pela intrusão das crianças.

Jas protestou. — Seis filhos, e não pode haver mais de um ano separando-os. Francamente, não sei como você faz isso. Eu tive minhas mãos ocupadas com dois.

— Ah, mas meus três são muito mais velhos. Esses rufiões são minhas sobrinhas e sobrinhos. — Ela considerou Jas, então Rom, seu olhar cheio de afeto.

Rom apresentou as mulheres com um gesto gracioso de sua mão. — Minha irmã, Dilemma Dar. Nós a chamamos de Di.

Jas sufocou um pequeno som de surpresa divertida. Dilema - quão apropriado. Estendendo a mão, ela disse: — Estou tão feliz em conhecê-la. — Com um olhar desafiador na direção de Rom, ela acrescentou — Estou ansiosa para conhecê-la melhor.

Previsivelmente, sua expressão escureceu. Alheia, Di disse-lhe alegremente: — Todos estão reunidos no refeitório. É melhor você ajudar sua esposa a se preparar para a refeição da noite.

Jas ficou boquiaberta. — Sua esposa?

Rom gemeu.

— Você é... Casado? — Ela perguntou incrédula.

— Não há uma esposa — ele a assegurou.

Consternada, Di gritou: — Mas você disse...

— Eu quis dizer que Jas é minha esposa.

A mente de Jas girou. — Alguém poderia me dizer o que está acontecendo?

Parecendo envergonhado, Rom se agachou ao lado dela. Pegando a mão dela, ele deu uma explicação longa e complicada do termo a'nah, e por que ele pensava que isso a beneficiaria. Os benefícios emocionais eram menos claros. Ele não mencionou o desejo de tornar o acordo legal.

E por que ele iria? Ela pensou, olhando ao redor do quarto espaçoso, os tapetes de seda e os mosaicos incrustados de ouro, as paredes que refletiam a luz como um lago coberto de gelo. O lugar era um castelo. Nos círculos dos Vash, os casamentos eram alianças entre famílias poderosas e não casais de amor com donas de casa divorciadas de planetas atrasados como a Terra.

Ela deu um pequeno suspiro desapontado.

Os olhos de Di brilharam com malícia. — Querido irmão, eu me alegro. Com seu infinito charme, você convenceu esta linda mulher a ser sua a'nah. — Ela derreteu sua carranca de irmã mais velha de olhos estreitos com um sorriso doce. — Acompanhe-a ao jantar - se ela se sentir bem. — Acenando para Jas, ela saiu do quarto em um elegante desfile.

Quando a porta se fechou, Jas deu a ele um longo olhar.

Rom abriu as mãos. — O que?

— Ela ama você. E você a ama.

Ele suspirou.

— Ainda assim, estamos saindo.

Ele se afastou dela, girando o anel de sinete em seu dedo. — Se eu ficar, temo que serei forçado a escolher entre você e meu envolvimento aqui.

— Você não vai. Não se você convencer os Vash Nadah a assumir a luta. — Ela juntou seu robe em torno dela e saiu da cama, estremecendo ao fazê-lo. — Me escute. Mesmo se você não quiser se envolver com o que está acontecendo com Sharron... A vida é muito curta - se tivermos um dia de felicidade, ou uma semana ou mês ou ano, precisamos agarrar isso porque amanhã não está prometido a ninguém. Fique mais um pouco, Rom. Por favor. — Ela agarrou seus braços. — Só para recapturar um pouco do que você e sua irmã perderam.

Rom fechou os olhos para se firmar. No silêncio repentino, uma tigela de incenso estourou e assobiou, e vozes abafadas emanaram de fora do quarto. O calor de sua pele trouxe a ele sua doce fragrância, o cheiro de roupa de cama recém lavada e o leve cheiro de remédios.

Ele abriu os olhos para encontrá-la olhando para ele preocupada. — Vamos ficar aqui mais um pouco — ele disse para seu alívio óbvio. Ele não sabia as consequências de sua aquiescência, mas algo dentro dele sugeria que era o que o destino havia planejado o tempo todo. — Enquanto isso, não vou desperdiçar a oportunidade de convencer meu povo a agarrar o desafio, mesmo que seja necessário jogá-lo aos pés deles.

— Se você acha que os Vash Nadah são teimosos, espere até me ver em ação. Eles não serão capazes de nos negar.

Secamente, Rom disse: — Um exilado e uma habitante da Terra conspirando para acabar com onze mil anos de pacifismo galáctico. Deve ser interessante.

Jas não deixou seu sarcasmo detê-la. Obviamente, a ideia de participar de tal empreendimento a eletrizou. — Esta é uma campanha do bem contra o mal em sua forma mais pura. É uma aventura mais ambiciosa e significativa do que qualquer outra que eu já imaginei. — Ela respirou fundo para se acalmar. — Você não estará sozinho nisso. Estarei ao seu lado a cada passo do caminho.

Rom cobriu os ombros dela com as mãos e a moveu para o comprimento do braço. — Você faria isso por mim?

Sua voz suavizou com amor. — Eu faria qualquer coisa por você.

Sua devoção, sua fé absoluta nele, o encheram de admiração. Outros o haviam abandonado - mas não ela. Deslizando as pontas dos dedos ao longo de sua mandíbula e sob seu queixo, ele inclinou o rosto para cima. — Ah, Jasmine, eu abençoo o dia em que a Grande Mãe trouxe você para mim - e todos os dias desde então, Ela permitiu que você estivesse comigo.

A umidade brilhava em seus olhos. Parecia que sua admissão a pegou desprevenida.

Ele suavizou seu tom. — Eu sou grato a você, Jas. Por sua pureza de coração, sua espontaneidade, o jeito que você me faz rir. E que, nas minhas horas mais sombrias, você sempre me admirou pelo que os outros desprezaram em mim. — Ele roçou os nós dos dedos sobre sua bochecha. — Às vezes não dizemos em voz alta tudo o que sentimos por dentro. Então a chance está perdida e as palavras nunca foram ditas.

— Parece que você está se despedindo — ela sussurrou.

— Bah! Estou apenas expressando o que está em meu coração. Quero uma vida simples, uma vida com você. Em algum lugar, em qualquer lugar onde eu possa mantê-la segura, você e seus filhos. Sua família inteira, se necessário, mãe, pai, irmãs...

Ela lançou os braços ao redor dele em um abraço impetuoso. Suas mãos deslizaram sob seu manto e subiram por suas costas nuas. Segurando-a perto, ele nunca quis soltá-la. Vinte anos antes, sua aparência havia sinalizado o fim da vida como ele a conhecia. Agora que seu “anjo” o havia conduzido de volta aos Vash Nadah - e suas obrigações tradicionais - ele não podia deixar de se perguntar quantos momentos mais como aquele ainda teriam.


CAPÍTULO 18


A notícia de que o lendário B'kah havia estabelecido residência no palácio se espalhou rapidamente, trazendo diplomatas dos Vash e membros do grande conselho para Mistraal em números nunca antes vistos. O complexo de Dar estava lotado de candidatos a cruzados. Mais chegavam todos os dias. Quando Rom fez o check-in com o Quillie pela última vez, Gann afirmou que eles também estavam a caminho.

Mas, apesar do lobby implacável para reunir uma força grande o suficiente para caçar e destruir as bases de Sharron, Jas lamentou ver que seus esforços lhes renderam apenas um punhado de verdadeiros aliados. Sempre cuidadoso em se submeter aos que estavam no poder, Rom não se inclinava a fazer mais do que se encontrar com os visitantes em audiências privadas, sempre insistindo que não veio aqui para se envolver na política dos Vash. Mas quanto mais eles ficavam, mais ele se envolvia, até que finalmente se curvou ao desejo de Joren de dar um endereço.

Como Rom foi proibido de colocar os pés na Roda, a vasta estrutura que abrigava o Grande Conselho quando em sessão, ele concordou em falar no palácio. Jas trabalhou obstinadamente com ele em seu conteúdo, esperando que fosse o catalisador de que precisavam para estimular os Vash a declarar guerra contra Sharron. Infelizmente, o vilão não ajudou sua causa desaparecendo virtualmente nas semanas desde que eles fugiram de seu complexo.

— Enquanto você estava na câmara de exercícios esta tarde — disse Rom, desabafando suas frustrações uma noite enquanto ela se vestia para o jantar — um grupo de anciãos do conselho se encarregou de me informar que minha implicação de que Sharron possui e pretende usar a tecnologia proibida é apenas conjectura - e, portanto, não é digna de sua preocupação.

— O que você disse?

— 'Temos o direito de correr esse risco?' - a mesma pergunta que você me fez em Ceres. Mas eles querem provas, provas de que a tecnologia proibida existe. Essa é a única coisa que não posso dar a eles. — Ele caminhou até a cama e se acomodou cansado na colcha, colocando um travesseiro atrás da cabeça. — Sharron sempre foi muito inteligente para permitir que essa prova se tornasse conhecida.

Seu cansaço e frustração a incomodavam. — Joren apoia você. O dono da plantação também, Drandon Keer. Eles não precisam de provas.

— Não, mas eles são amigos.

— Amigos com influência e dinheiro.

— Os recursos são inúteis sem unidade. — Ele olhou para o teto. — Talvez se os B'kahs viessem, um verdadeiro progresso poderia ser feito.

— Seu pai. — Jas tentou esconder seu desgosto pelo homem. Mesmo agora, ele estava bloqueando os esforços de Rom. Seus dedos enrijeceram enquanto ela torcia o cabelo úmido em um coque. Atrapalhada, ela fez um esforço consciente para relaxá-los a fim de prender o cabelo. — Isso é mais responsabilidade dele do que sua. Ele é aquele que não ajudou em primeiro lugar. Ele e os outros anciãos são os que administraram mal as rotas comerciais e deram à Família do Novo Dia a chance de voltar, não você.

— Quando meu pai deveria ter dedicado seu tempo ao Grande Conselho e deixado a mecânica do dia-a-dia de governar para um filho, ele teve que fazer duas tarefas. É difícil fazer os dois bem.

Sua calma imparcialidade a surpreendeu. — Você está dando desculpas para ele. Não sei se ele merece.

— Todos cometemos erros — Rom admitiu calmamente. — Talvez eu esteja finalmente começando a entender isso.

Uma série de estrondos retumbantes ressoou pelo palácio, chegando cada vez mais perto até que um whoomph surpreendente explodiu atrás dela. O ar rodopiou passando por seus tornozelos. Ela se virou. — Os escudos?

— Sim. Eles ficarão no lugar sobre cada portal até que a velocidade do vento caia para níveis normais.

O Tjhu'nami.

Ela espiou além do terraço para a savana sem fim. Uma barreira clara de três metros de espessura estava agora instalada. Além dele, a grama alta estava completamente achatada. Ela podia sentir, mas não ouvir direito, um estrondo constante - a maré de ar recuando antes de uma onda monstruosa distante.

Tempestades de vento mortais tornaram Mistraal o mais inóspito e ameaçador dos oito mundos natal Vash Nadah. Por volta da meia-noite - as noites aqui eram metade do comprimento das noites na Terra - o Tjhu'nami deveria atingir inimagináveis oitocentos nós8. Pior, a tempestade passaria diretamente sobre o palácio e a cidade de Dar, lar de toda a população do planeta. Estremecendo, Jasmine esfregou as mãos para cima e para baixo nos braços. Desde que a estação meteorológica na enorme cidade espacial orbitando Mistraal emitiu seu alerta, ela estava tão agitada quanto um gato preso a um apartamento que pressentiu que um terremoto era iminente, mas não podia fazer nada além de pular do sofá para a cadeira e para a mesa de centro.

— Meus ouvidos estão estourando — disse ela, tirando o olhar da vista outrora reconfortante.

— Os meus também. A pressão atmosférica está caindo. A Cidade Dar vai literalmente fechar dentro de... — Sentando-se, Rom olhou para o relógio. — Bem agora. Parece que já o fizeram. Blecaute total de comunicações - por pelo menos um dia.

Ela pensou nos emissários lotando o palácio - implacáveis em exigir o tempo de Rom e aqueles na cidade-espaço bem acima do planeta. — Isso significa que ninguém pode voar para fora a menos que seja uma emergência.

— Nem para dentro. — Malícia brilhou em seus olhos dourados.

Ela combinou com seu sorriso diabólico. — Pobres políticos, presos em órbita. Que pena.

— Para eles, talvez. Para nós, uma trégua temporária, digo que devemos celebrar. — Ele tirou as pernas da cama e estendeu a mão. — Permita-me acompanhá-la ao jantar, anjo.

 


O Palácio Dar era uma versão galáctica do esplendor medieval - com todas as suas idiossincrasias. Os jantares eram banquetes comunitários compartilhados com centenas de outras pessoas no maior salão que Jas já tinha visto. Colunas maciças de mármore branco sustentavam uma cúpula resplandecente com cenas pintadas à mão de um mar estranho, repleto de criaturas que ela não encontraria em nenhuma costa da Terra. O teto era tão alto que a umidade se acumulava em faixas diáfanas de névoa, transmitindo a sensação de sonho do castelo subaquático de uma sereia.

Rom conduziu Jas por mesas repletas de iguarias perfumadas. Homens e mulheres sociáveis, descendentes daqueles que serviram os Dars por eras - uma posição procurada entre a classe mercantil - serviam pratos quentes e frios de todos os tipos, licores, vinhos e sucos, tonéis de sal, o melhor que a galáxia tinha oferecer.

Enquanto o vento batia com os punhos do furacão contra as janelas blindadas que mediam a altura do salão, o próprio ar tamborilava com a tempestade. Mesmo assim, os músicos tocavam, os aficionados da bajha regalavam uns aos outros com contos e as crianças se contorciam e riam, enquanto gatos ketta musculosos e de pelos compridos rondavam por baixo das mesas em busca de sobras.

Como de costume, eles se sentaram com Joren e Di, seus filhos e uma variedade de membros poderosos e influentes do clã Dar. Como a maioria falava Siennan, exceto quando se dirigia a ela, Jas estava imersa na língua. A língua era difícil, mas aos poucos ela foi aprendendo a se comunicar. Ela estava grata que esta noite a conversa se centrou em assuntos alegres, talvez devido ao cansaço óbvio dela e de Rom na preparação para seu discurso, e sua consideração sobre isso. Afinal, os Dars eram uma família.

— A bebida da terra, senhor. — Um jovem com uma fileira dupla de triângulos prateados no nariz entregou a Rom um frasco com um líquido cor de trigo coroado com uma camada de espuma branca. Então ele se curvou e recuou.

Rom sorriu. — Cerveja.

Protestos e gemidos encontraram seu anúncio.

— Uma receita diferente desta vez! — Ele gritou por cima do barulho. — Os cozinheiros me garantem que isso vai ganhar seus estômagos e seus corações, assim como o precioso suprimento de Jas ganhou o meu. Dê-me suas taças.

Todos ao seu alcance empurraram com relutância os recipientes limpos que encontraram. Rom derramou cerveja neles um por um. A espuma borbulhou na toalha de mesa, espalhando-se em círculos escuros sobre o padrão holográfico.

Enquanto Rom colocava o resto da cerveja em sua taça, Jas comentou: — Pelo menos é a cor certa desta vez.

Ele cheirou. — O aroma também é promissor. — Ele ergueu seu cálice alto. — Vamos beber!

Jas quase engasgou quando o líquido amargo atingiu sua língua. Com as pontas dos dedos pressionadas contra os lábios, ela olhou ao redor, desesperada por qualquer alternativa para engolir a coisa.

— Romlijhian! — Joren berrou, batendo a taça na mesa.

Rom enxugou a boca com um guardanapo. — Sim irmão?

Alegria dançou nos olhos lacrimejantes de Joren. — Esteja avisado, se algum dia eu ver esta bebida na minha mesa novamente, ficarei feliz e sem a menor cerimônia a despejarei em você!

A risada explodiu. Rom acenou com o guardanapo como uma bandeira de rendição. Então ele mergulhou a cabeça no ouvido de Jas. — Você disse que seu amigo Dan Brady mantém um estabelecimento na Terra dedicado exclusivamente à criação e distribuição de cerveja?

Ela sorriu. — Bem, ele também serve comida sólida.

— Vamos tomar os dois, naturalmente, mas a cerveja é o que me intriga. — Sua boca se curvou em um sorriso maroto, lembrando-a de que ele ainda era um contrabandista rebelde no coração. — Cerveja Red Rocket— disse ele, pronunciando-a com seu sotaque. — Ainda tenho em minha posse o acordo comercial que você trouxe da Terra. Eu acredito que me concede um acordo exclusivo.

Ela deslizou os braços em volta da cintura dele. — Tenho a sensação de que você fará de Dan um homem muito rico. B'kah e Brady - fornecedores de cerveja para as estrelas.

Ele jogou a cabeça para trás e riu.

Estranhamente, seu deleite puxou seu coração. — Eu não vi você fazer isso... Não me lembro quanto tempo.

— O que? Rir?

Ela assentiu. — Está desgastando você. O estresse, as longas horas. Sei que estamos correndo contra o relógio, mas se você não fizer uma pausa, vai se esgotar.

Ele ficou pensativo, tamborilando os dedos nos braços. Então seus olhos dourados brilharam quase como um menino. — Vamos voar.

Ela recuou. — Você está falando sério? Onde? Quando?

— Patrulha - cada um em seu próprio caça estelar. É mais uma tradição do que uma necessidade, mas depois que uma tempestade passa, os Dars lançam naves para inspecionar os danos ao palácio - se houver - e para restabelecer simbolicamente o contato com a cidade-espaço. Sem dúvida, o chefe do espaço já escolheu pilotos para a missão, mas com certeza ele ficará sujeito a um pequeno, ah, rearranjo.

Ela sorriu e apertou sua mão. Ele estava fazendo isso por ela, para animá-la e aliviar sua preocupação. Não importava qual fosse sua condição, ele sempre a colocava em primeiro lugar.

O bem das pessoas supera o desejo do indivíduo.

Foi o que ele aprendeu como o jovem herdeiro do trono.

Ela considerou isso e então todas as pessoas que tinham voado aqui para ouvi-lo falar. Eles estavam procurando por liderança nele, e ela não podia deixar de se perguntar o que isso algum dia significaria para o relacionamento deles. Mas, por enquanto, pelo espaço desse voo que ele queria organizar, ele era dela.

 


— Propulsores auxiliares.

— Verificados. — Jas disse no comunicador que ligava seu navio ao de Rom.

— Sistema de suporte de vida.

— Verificado.

— Sistemas de armas — Rom concluiu.

— Conectados.

Jas olhou para ele através do hangar escuro. Supostamente, ela não o estava vendo.

— Deixe-me ver se entendi bem — ela perguntou. — Minhas janelas não são realmente janelas?

— Correto. São telas de exibição, simulando exatamente o que você veria se fossem transparentes. Só que eles são melhores do que transparentes. O computador de bordo compensa qualquer queda na visibilidade.

Legal, ela pensou. Exceto por sua breve passagem pelos controles do Quillie e do caça estelar, ela não pilotava nada há décadas, e certamente não uma nave tão automatizada. Até mesmo o assento ao qual ela estava amarrada era 'inteligente'. Capaz de reagir mais rápido do que qualquer cérebro humano, fornecia proteção e orientação em situações que iam do combate interestelar à tarefa muito mais mundana de protegê-la das tremendas acelerações exigidas para o voo espacial.

Baixando o visor preto sobre o rosto, ela fez um sinal de positivo com o polegar para Rom.

— A Patrulha Um está pronta — disse Rom por rádio ao controlador espacial, que estava sentado em um casulo do lado de fora da cavernosa baía do ônibus espacial.

— Liberado para o lançamento. — Respondeu o controlador.

Jas deu uma ovação silenciosa quando o escudo na frente dela vibrou, então lentamente se levantou. Folhas e gramas secas giravam dentro da baía, trazidas pelo vento da tempestade que morria. Espalhadas diante dela, havia planícies sem fim sob um céu amarelado. Como em seus dias de piloto de caça, ela se sentou como uma águia prestes a levantar voo.

Em uma explosão de energia, o caça estelar de Rom partiu primeiro. Três segundos depois, ela ligou os propulsores. As forças G pressionaram-na contra o assento, trazendo uma pontada de dor passageira em seu abdômen, onde ela ainda estava se curando dos parasitas que haviam devastado seu corpo.

Limpando o cabide, ela apontou o nariz da nave para o céu. Embora pilotar o caça estelar não fosse difícil, não era como voar em um F-16.

A tempestade estava diminuindo rapidamente, mas a turbulência sacudiu seu caça estelar em solavancos irregulares. Atrapalhada por motores enormes e asas atarracadas, a nave foi projetada para o espaço ao invés da atmosfera, mas era menor, mais avançada e mais fortemente armada do que a velocidade estelar que Drandon emprestara a Rom. Para uma sociedade que abominava o conflito, os Vash certamente colocavam muito esforço e despesa em seu armamento.

Em poucos instantes, ela se juntou a Rom na formação. Lado a lado, a várias centenas de metros de distância, eles voaram sobre a pradaria, procurando danos no amplo palácio abaixo. Não encontrando nenhum, Rom disse: — Avante para a cidade-espaço — e os levou mais alto, através da atmosfera, até que as estrelas tomaram o lugar do sol nascente.

Espaço.

Uma onda de liberdade a invadiu, e ela suspeitou que Rom também sentiu. Transformando os céus em um carrossel de estrelas cintilantes, ele a conduziu por uma série de manobras práticas, tomando cuidado para não sobrecarregar seu estômago sensível.

— Patrulha Um, aqui é o Controle Mistraal. — Disse uma voz em seu comunicador.

— Vá em frente — respondeu Rom.

— Incapazes de estabelecer contacto com o espaço-cidade. Quando você chegar, faça com que o controlador inicie a comunicação a partir de sua extremidade.

No início, a troca intrigou Jas. Como eles poderiam ser cortados? Quarenta mil cidadãos fizeram suas casas ali e nas colônias de mineração. O problema do controlador deu a ela uma visão das diferenças entre o modo como o povo de Rom e o dela na Terra se desenvolveram. Os Vash havia aperfeiçoado a viagem estelar e construído cidades espaciais, mas os Dars não conseguiam compensar algo tão simples como a turbulência atmosférica interrompendo as transmissões espaço-planeta.

Rom reconheceu a chamada, então moveu sua nave para perto de sua asa esquerda. De cabine para cabine, ela o dispensou. — Você está se arriscando, vaqueiro do espaço — ela disse quando ele ficou parado. — Este não é um F-16. Não há garantias de quão estável posso manter esta coisa.

— Então, por que você não dançou comigo ontem à noite no jantar? — Ele perguntou, imune ao aviso dela.

Ela deu uma risada incrédula. A pergunta era a última que ela esperava no meio de uma patrulha voadora. — Era a canção da promessa, é por isso.

— Somos um casal jovem, esse é o único requisito para realizá-lo.

— Casais não casados que pretendem casar legalmente.

— Quando eu pedir a música novamente esta noite, você vai dançar voluntariamente? Ou terei que jogar você por cima do ombro?

Ela bufou. — Atreva-se. — Algo disse a ela que sacudir os ombros não era um acontecimento cotidiano no palácio de Joren. — Nós seremos os mais velhos lá fora por vinte anos. Mas você, eu suponho, como rebelde da família está cansado de tais detalhes?

Ele suspirou. — Mais do que você jamais saberá.

O abismo sem ar e frio do espaço se sentou entre eles como um acompanhante indesejado, ampliando seu silêncio repentino.

De sua cabine, Rom desejou poder ver além do visor de Jas, desejou poder ler o que estava em seus olhos. — Minha decisão de fazer de você minha a'nah foi impulsiva. Não é o que eu queria para nós, mas não tenho escolha. Não tenho título, poucos recursos. — Se ele se unisse a uma mulher não Vash Nadah em um casamento não aprovado e não arranjado, isso significava desistir de sua esperança secreta de recuperar o favor de seu pai.

Os músculos de seu estômago ficaram tensos. Bem, ele pensou. Ele finalmente admitiu. Mas com a admissão veio uma compreensão mais difícil. Se o homem quisesse vê-lo, já o teria feito. Mas, à sua maneira, isso também era libertador.

— Por tudo o que é sagrado, Jasmine, devemos nos casar. Legalmente. Infelizmente, passei a vida sonhando com o impossível, desejando o que não pode ser...

— Por que não pode?

Porque ele nunca imaginou que tal decisão fosse sua. O conceito o abalou. Sua vida era dele agora, não era? Ele não era o herdeiro B'kah, nunca seria novamente. Eles partiriam em breve para visitar a Terra, e depois disso... Bem, eles ainda tinham que discutir o assunto. Claro, havia a questão de se ela realmente consentiria com qualquer acordo...

Suas palavras saíram como as de um jovem nervoso. — Nós precisaríamos de autorização - eu não tenho um título oficial, você vê. Mas então, você não é Vash Nadah. No entanto, existem restrições diferentes para a fronteira, restrições mais flexíveis. O Tratado de Comércio declara...

— Rom.

Ele parou no meio da frase.

Sua voz era rouca, uma carícia suave. — Você está me pedindo em casamento?

Com o computador mantendo a velocidade do lutador, Rom agarrou a alavanca de controle com uma mão e ergueu a outra, pressionando-a contra a janela de frente para Jas. — Sim. — Em silêncio, ela levantou a mão, os dedos bem abertos, como se sobrepondo a palma da mão com a dele. Ele estendeu a mão com seus sentidos até que quase podia sentir o calor da pele dela subindo por seu braço.

Com ternura, ele perguntou: — Bem? O que você diria de uma vida formalmente ligada a um vagabundo espacial sem nada a oferecer além de uma nave de carga e uma má reputação?

Jas não teve chance de responder. Do nada, um pedaço de metal dentado foi arremessado na direção deles. Ela virou para a direita e ele para a esquerda. Os destroços caíram entre eles.

— Asteroides? — Jas perguntou com firmeza.

— Não. — Ele checou sua tela de exibição. — Era uma boia periférica. Teríamos usado para estabelecer uma conexão de comunicação com a cidade-espaço. — Ele procurou as outras boias à frente. — Isso é estranho. Não consigo encontrar nada.

— Deixe-me tentar. — Ela inseriu as coordenadas que ele deu a ela em sua tela de exibição. — Parece mais destroços.

Ele iniciou um diagnóstico em sua nave e na de Jas, certo de que encontraria um defeito explicando tudo. Mas ele não encontrou falhas, apenas uma tela vazia. A nuca formigou. Onde estava a cidade-espaço? Certamente, ele já teria visto isso - as luzes brilhantes no imenso cilindro central, os raios majestosos irradiando para fora. Mas nada parecia estar lá fora.

Impossível. Algo tão grande simplesmente não desaparece.

Eles abriram caminho sobre a curva do planeta e em um mar de destroços. Grande Mãe. Seus caças estelares pareciam partículas em comparação com os pedaços de escória solidificada que passavam rodopiando. Mas foram os itens menores que chamaram sua atenção - uma cadeira quebrada, um sapato. Ele lutou contra uma onda de náusea.

— O que aconteceu? — Jas perguntou.

— A cidade-espaço... As colônias de mineração - elas se foram. — Incapaz de compreender a imensidão da devastação, ele ouviu suas próprias palavras com descrença. Desde os Anos Sombrios não ocorria tamanha atrocidade.

Quarenta mil pessoas. Mortas.

Era obra de Sharron! Ele enviou seus lacaios atrás de Rom como havia prometido, um brilhante golpe e fuga sobre o manto dos Tjhu'nami.

Enquanto o computador de sua nave vasculhava a área, em busca de sinais de vida, Rom imaginou o futuro sombrio que os aguardava se nada fosse feito sobre este ataque. Um por um, os mundos ancestrais cairiam. Com o tempo, bilhões de pessoas desertariam para a Família do Novo Dia por medo de que o equilíbrio de poder mudasse. Tudo porque a federação dos Vash estava muito presa à tradição para agir.

Ele amaldiçoou baixinho. Não, esse futuro não aconteceria. Não enquanto o sangue de Romjha pulsasse dentro dele.

Com a necessidade de retaliar cantando em suas veias, ele socou a luz vermelha piscante que era uma conexão direta para a segurança planetária de Mistraals. — Tragam suas bundas aqui. Todos os lutadores disponíveis.

Jas gritou: — Bandidos - duas horas!

Uma onda de adrenalina o preparou para o combate. Seu olhar seguiu para a tela de exibição, para vários cruzadores e um contingente de embarcações menores acelerando para longe deles. Ele realçou e ampliou a imagem até que ele discerniu o símbolo brasonado em seus lados.

Um sol escaldante acima de duas mãos postas.

A Família do Novo Dia.

— Rom, eles estão quase fora de alcance! — Jas gritou.

Um vislumbre dela, ainda voando valentemente de sua asa, o mergulhou em uma indecisão de cortar a alma. Ela era uma combatente digna, mas ele nunca a colocaria de bom grado, ou qualquer mulher, em perigo. No entanto, o que dizer de seu irmão Jhon e Zarra? Ele não os havia perdido porque os havia deixado para trás?

— Jas — Um som de angústia retumbou em sua garganta. O último membro da frota inimiga estava prestes a pular para o hiperespaço. Se ele os perdesse, ele nunca descobriria sua base. — Volte.

Eu te amo, Inajh d'anah, ele disse silenciosamente.

Suor e remorso queimaram seus olhos enquanto ele se afastava dela. Sharron pagaria pela carnificina que ele havia causado; desta vez, Rom veria isso, mesmo ao custo de sua própria vida.

Mas não de Jas.

Ele iria garantir a segurança dela arrebatando as coordenadas da nave inimiga, saltando com elas para a velocidade da luz, então seguindo os bastardos até que voltassem ao espaço normal. No momento em que eles se engajassem na batalha, Jas estaria anos-luz atrás, envolta na proteção da força espacial Mistraal.

Acelerando para pegar as naves em retirada, ele armou suas armas. — Sharron, eu vou te encontrar! — Ele rugiu na escuridão do espaço.

— Romlijhian, é você?

Uma voz rouca invadiu seu comunicador.

Rom congelou. Um músculo saltou em sua bochecha. O homem o havia sentido. Lutando por compostura, ele estendeu seus sentidos, procurando a frota inimiga. Sharron estava entre eles - mas em que nave? Ele foi mais longe. Lá. No único cruzeiro restante - uma frieza desolada e irreparável aprimorada por uma intensa autoabsorção.

— Junte-se a mim, Romlijhian.

Rom bloqueou a súplica de Sharron, empurrou seu caça estelar o mais rápido que podia.

— As coisas mudaram consideravelmente desde Balkanor. Então você era um jovem ingênuo impulsionado por atos heroicos inadequados. Agora você está à deriva, sem família, sem poder. Mas você pode ter essas coisas de volta. Eu posso dar a você. — A voz de Sharron era gentil, muito razoável. — Ande comigo, Romlijhian. Deixe-me salvar sua alma.

Revulsão sufocou Rom. — Salve isso.

Ele disparou o que pretendia ser um ataque preventivo antes de atingir a velocidade da luz. Mas a nave de Sharron desacelerou - por causa da ofensiva de Rom, ou simplesmente na impaciência para retaliar, ele não sabia, mas não tinha tempo para se preocupar com isso.

Rom passou voando. O cruzador de Sharron disparou. Rom puxou seu caça estelar em uma manobra evasiva, afastando-se dos mísseis perseguidores, seu computador de bordo expelindo iscas e armadilhas na esteira da nave. O primeiro míssil se esgotou em uma isca. O segundo ficou esperto e explodiu em uma folha de energia cegante. Os escudos de Rom o protegeram, mas o impacto o lançou contra seus arreios. O fedor de algo queimando infiltrou-se em seu suprimento de ar. Avisos piscaram no console de controle — INTGRIDADE DO CASCO EM 64%, PROPULSOR NÚMERO DOIS, COMPARTIMENTO DE EQUIPAMENTO QUEIMADO. De alguma forma, o caça danificado permaneceu intacto. Mas estava vazando combustível, perdendo impulso. Ele empurrou o bom propulsor para a potência máxima.

Vai! Vai! Vai!

Mas o caça estremeceu e descarregou a maior parte de sua velocidade. A viatura de Sharron girou lentamente e se dirigiu para ele.

Para acabar comigo.

— Esmague a escuridão!

Assustado, Rom desviou sua atenção da nave.

Um caça estelar passou rapidamente. Grande Mãe - era Jas! Mais, ela havia proferido o grito de guerra que ele não havia compartilhado com ninguém desde... O anjo do deserto.

Rolando invertido, ela lançou um dilúvio de mísseis, golpeando o cruzador e os caças que ainda não haviam feito o salto para o hiperespaço. Uma das naves menores explodiu, a explosão danificando outra próxima. Arremessando-se para longe, seus destroços atingiram o escudo na parte inferior do cruzador.

— O próximo tiro será entre os olhos, camarada — ele a ouviu gritar em seu comunicador. — Entre os olhos!

Rom percebeu a surpresa de Sharron, e então sua indignação.

Ele iria matá-la.

— Jas! — Rom gritou. — Saia, saia agora! — Não morra em meu lugar, ele implorou silenciosamente, desesperadamente. Retorne.

Não! Eu não vou te deixar desta vez.

Ele ouviu a resposta dela em sua mente - como ela sem dúvida ouvira a dele. Mas como? Ele obliterou o pensamento enquanto o formava. Se ele a distraísse de sua tarefa, eles seriam tão bons quanto poeira espacial. Haveria tempo para perguntas mais tarde, se sobrevivessem.

Seus dois caças não eram páreo para um cruzador fortemente armado, mas um ataque tenaz poderia muito bem impedir Sharron de dar o salto para o hiperespaço. E quanto mais tempo eles o ocupavam, maiores as chances dele e de Jas de receber reforços. Ofegante pelo esforço, Rom piscou o suor dos olhos. A vitória dependia dele e de Jas. Desta vez, ele não teve escolha. Juntos, eles deveriam lutar.

Talvez, pensou ele, fosse isso que a Grande Mãe pretendia o tempo todo.

— Esmague a escuridão! — Ele rugiu, seus sentidos anormalmente agudos, intensificados pelo choque e pela proximidade da morte. Os pensamentos de Jas, seu medo e alegria, diminuíram e fluíram com os dele, refletindo a dança assustadoramente bela que ele se lembrava de Balkanor. Eles explodiram as defesas do cruzador e a maioria das armas que a nave inimiga atirou contra eles. Mas eles foram atingidos, duros, danificando seus escudos. As esperanças de Rom de tirar Jas dessa vida se desgastaram. Eles estavam enfraquecendo. Eles não podiam continuar por muito mais tempo.

De repente, os quatro caças restantes de Sharron detonaram na frente deles. A intensa exibição pirotécnica fez as luzes dançarem diante de seus olhos.

Rom gritou. — Que tiro!

Jas engasgou. — Tente me avisar da próxima vez.

— Não foi você?

— Achei que fosse você!

Rom desviou sua atenção para sua tela de exibição. O Quillie estava gritando em direção a eles de um quadrante e a frota Mistraal do Clã Dar do outro. — Parece que temos companhia.

— Uhuu!

Em momentos, a batalha escalou de escaramuça condenada para uma batalha carregada de emoção. As chances eram iguais. Mísseis foram trocados. Bombas relativísticas. Poeira inteligente mortal que detonava com o impacto. Alguém atirou – nele? Em Jas? - rasgou o já enfraquecido casco do cruzador. A superfície do trillidium descascou como pele de peixe, expondo seu núcleo interno. O cruzador explodiu em uma gloriosa floração de energia tão intensa que parecia inflamar o próprio espaço.

Rom olhou para a bola de fogo por muito tempo depois que ela se reduziu a pedaços minúsculos e insuperáveis. Então ele inclinou a cabeça para trás contra o assento, seus músculos tremendo de alívio e exaustão. Ele tinha vivido esse momento uma vez antes, em Balkanor, quando pensou que havia matado Sharron. Só que desta vez ele sabia que era verdade. A frieza, o mal que ele sentiu durante a batalha, se foi.

Sharron havia deixado de existir.

 


Uma vez de volta ao palácio, Rom foi levado para a antecâmara da baía de transporte junto com um mar de soldados exaustos e desgrenhados, homens cujas batalhas normalmente ficavam confinadas à arena bajha. Mas a dor entorpecente já havia subjugado seu triunfo. Quarenta mil pessoas morreram.

Ele abriu caminho no meio da multidão até encontrar Jas. Ela gritou e correu para os braços dele.

Ele a ergueu contra ele, encontrando-a com sua boca, estremecendo com a emoção crua em seu breve abraço. Enquanto a multidão se acotovelava ao redor deles, ele colocou as mãos em cada lado do rosto dela e olhou fixamente em seus olhos.

— Você lembrou. Você se lembrou de Balkanor.

— Sim — ela sussurrou, seus olhos brilhando com lágrimas. — Quando percebi que era Sharron lá fora e você estava prestes a enfrentá-lo sozinho, meus pensamentos... Implodiram. Não sei mais como descrever. Palavras vieram à minha cabeça... Imagens.

Ela fez uma pausa para respirar. — Você é o homem do deserto; era você que eu sempre procurei, mas não consegui encontrar. Porque nunca tive a intenção de deixá-lo lá, onde quer que estivéssemos. Nunca. Você entende? Fui levada de você quando fui resgatada - quando acordei depois de estar inconsciente. Meu Deus, depois de todos esses anos, o sonho finalmente fez sentido. Minha vida faz sentido.

Ele fechou os olhos enquanto ela beijava sua mandíbula. As velhas memórias o alcançaram então, girando como areia em uma repentina tempestade de areia, lembranças de seu primeiro ano de exílio, como sua obsessão com o anjo do deserto o havia permitido cavar seus calcanhares quando a solidão e a culpa o empurraram para o precipício do desespero.

Eu nunca quis te deixar.

— Se você soubesse o que essas palavras significam para mim, Inajh d'anah — ele sussurrou. Não confiando em suas emoções, ele a pegou pela cintura, prendendo-a a ele enquanto eles se misturavam à multidão de pilotos que voltavam.

As portas maciças da sala de jantar se abriram. — Ajha, ajha! — Exclamações de choque e surpresa os precederam na enorme câmara, onde Joren os esperava. A música silenciou. Pratos caíram no chão.

Rom soltou Jas e caminhou até seu cunhado.

— É verdade? — Joren exigiu.

— Sim. A cidade orbital, as colônias de mineração, tudo acabado.

Houve suspiros e orações murmuradas.

Rom ergueu a voz. — Foi deliberado, premeditado.

Joren recuou, como se o conceito fosse grotesco demais para ser contemplado. — Continue.

— Sharron usou o Tjhu'nami para encobrir seu ataque.

— E agora ele está morto.

— Sim — disse Rom. — As naves sobreviventes saltaram para o hiperespaço.

Joren praguejou baixinho. — Agora nós os perdemos.

— Não, não perdemos, Alteza. — Disse uma nova voz.

Intrigada, Jas olhou por cima do ombro. Gann passou, Muffin atrás dele. Eles pareciam amarrotados e desgastados. A testa de Gann estava machucada e ele estava apoiando o tornozelo direito. Inconscientemente, ela pressionou a palma da mão no estômago dolorido.

Gann se endireitou sob o escrutínio de Joren e se apresentou. — Gann do Quillie, Vossa Alteza, vindo de Karma Prime para ver Rom B'kah.

— Você teve ajuda? — Joren solicitou.

— Sim. Um cruzador. Classe seis. Eles receberam um telefonema de socorro de uma das colônias de mineração, como nós, e vieram imediatamente. Ambos detectamos as naves inimigas enquanto transmitiam coordenadas para fazer o salto. Tínhamos apenas alguns segundos para decidir - a classe seis era a melhor nave para rastreá-los fora do sistema, então trouxe o Quillie aqui. Entramos quando a batalha estava em andamento.

— Então, o cruzador está atrás deles? — Joren perguntou.

— Sim, ele está.

Rom fez um som baixo de preocupação. — Um classe seis. Eu me pergunto quem eles são. Comerciantes, você acha?

— Não. Vash Nadah — Gann parecia inquieto. — Rom, era um navio B'kah.


CAPÍTULO 19


Visivelmente abalado, Rom deu um passo em direção à saída. — Vamos discutir isso em particular. — Joren, Gann e Muffin o seguiram, junto com vários guardas. Jas ficou para trás por um segundo. Di e as outras mulheres pareciam abatidas, mas nenhuma parecia remotamente interessada em segui-la. Naquele momento, a lacuna cultural entre eles parecia enorme. Ela correu para o corredor enquanto Rom se virava, claramente procurando por ela.

Ele esperou até que ela o alcançasse. — Lutamos lado a lado desde o início. Não vamos parar agora. — Intencionalmente, ele colocou a mão dela sobre a curva de seu braço e retomou seus passos largos.

Eles entraram em uma sala com duas mesas de conferência dispostas em círculos concêntricos. Então, os diplomatas visitantes - aqueles que tiveram a sorte de estar no palácio e não na cidade-espaço - entraram em fila, com os ombros curvados como se carregassem pesos de chumbo. Logo a sala estava lotada. Jas se aproximou de uma janela para respirar ar fresco. O céu azul claro estava manchado de rastos. As naves que haviam resistido à tempestade em hangares subterrâneos estavam voando além da atmosfera para ver as consequências do ataque, enquanto o pessoal de comunicação procurava os sinais enviados de volta da nave B'kah que seguiam os atacantes sobreviventes.

O dia foi passando. Depois de uma breve visita com o cirurgião dos Dars para tratar seu abdômen lesionado, Jas voltou para a sala de conferências.

Rom pensava, sentado ao lado dela, enquanto os funcionários que administravam a inteligência do palácio iam e vinham, fazendo perguntas e inserindo os dados em seus computadores de mão. Alguns olharam para ela com uma mistura de curiosidade e admiração. As notícias de seu papel decisivo na batalha se espalharam.

— Sua Majestade! — Um jovem robusto entrou na sala de conferências, segurando um capacete de piloto de caça nas mãos. Ele se curvou na frente de Joren. — O comandante de ala Ben e 'Dar pedem permissão para falar.

— Prossiga — disse Joren.

— Nossos testes indicam que as detonações de antimatéria de fato destruíram a cidade.

Vários suspiros emanaram da multidão.

— Uma cidade inteira. — Joren olhou ao redor da sala. — E dezenas de navios transportando membros respeitados de nosso Grande Conselho. Todos mortos em um ataque terrorista covarde realizado com armamento proibido. — Joren olhou para Rom. Jas viu um sinal silencioso passar entre eles. Então Rom assentiu bruscamente e se dirigiu ao grupo.

— Sharron jurou que traria sua guerra para o mundo natal dos Vash. Ele trouxe. Sim, ele agora está morto. Mas seu povo realizará seu desejo de destruir a todos nós.

Os diplomatas e membros sobreviventes do Conselho começaram a murmurar entre si. Joren os silenciou. — Eles são mais impiedosos e implacáveis do que jamais imaginamos. É hora de prestarmos atenção ao aviso de Romlijhian - um que ele nos deu há vinte anos. Este homem não nos deve nada. Este homem tem todo o direito de nos deixar com nossa mente fechada, nossa teimosia em não agir com inteligência para acabar com uma ameaça tão terrível. Mas ele não fez.

A túnica preta de Joren brilhou quando ele enfrentou Rom. — Você é o herdeiro do exaltado Romjha, nossa luz na escuridão. Aguardamos suas ordens. — Ele abaixou a cabeça. Um por um, outros, embora não todos, seguiram o exemplo.

Jas agarrou a mão quente de Rom. Ela esperava que ele se levantasse, mas ele permaneceu sentado por um momento tenso, entrelaçando os dedos nos dela, como se soltar indicasse sua aceitação do papel de liderança que Joren oferecia.

Uma escolha. Ele disse que teria que fazer uma escolha.

Ela olhou para suas mãos entrelaçadas, então mudou seu olhar para os homens agachados humildemente e com expectativa diante de Rom.

Esta era sua verdadeira vocação, ela reconheceu interiormente, seu direito de nascença. Seu relacionamento com ele empalidecia em comparação com este Pearl Harbor9 galáctico, com essas pessoas e sua atração inexorável sobre ele. Rom era apenas seu amante, mas ele era seu governante. Eles tinham todo o direito de tirá-lo dela. Ela forçou o aperto em seus dedos.

Rom levou a boca ao ouvido dela. — É hora de oferecer o desafio mais uma vez. Ore desta vez para que eles o tomem. — Ele se levantou, orgulhoso e alto.

— Tenho notícias do cruzador B'kah — anunciou o jovem piloto antes que pudesse falar. Ele agarrou o capacete com tanta força que os nós dos dedos ficaram brancos. — Eles seguiram o inimigo fora do hiperespaço, até o que pensamos ser o centro de operações. Seu arsenal lá - confunde a mente.

— Onde? — Rom exigiu. — Eles sabem?

— Sim senhor. Balkanor.

— Balkanor — disse Rom em uma exalação áspera. Jas olhou para o rosto dele ansiosamente. O que ele mais temia aconteceu - os anos permitiram que Sharron transformasse Balkanor em um útero de armamento ilegal. — E o cruzador?

O olhar do piloto baixou. — O sinal foi perdido. Não conseguimos contata-los desde então. Eu... Achamos que a nave foi destruída.

Houve uma pequena agitação perto da porta. Então o grupo se separou para Di, o rosto tenso e envolto em uma vestimenta estranhamente sombria. Seu peito estava subindo e descendo rapidamente. — Romlijhian, recebi uma ligação para você no canal privado. — A voz dela tremeu. — É o pai. Ele o convocou para a Roda.

 


Do visor do luxuoso cruzador Dar, Jas podia ver seu destino. Iluminado por dentro, o minúsculo disco girava lentamente, como um brinquedo perdido entre as estrelas. Mas, à medida que se aproximavam da Roda, ela crescia de tamanho até ficar incrivelmente grande. Um milhão de luzes piscando; raios tão largos e altos quanto o Empire State. Era uma construção maravilhosa, mesmo para uma sociedade que havia alcançado a viagem espacial à velocidade da luz há muito tempo.

— Cinco mil anos... Incrível.

— Muita história aconteceu aqui — disse Rom, com os braços em volta da cintura dela. Ela largou sua caneca com bebida fumegante e se recostou em seu abraço. Eles assistiram em um silêncio exausto até que seu cruzador atracasse em uma das milhares das baias. Eles estavam viajando havia três dias, dormindo pouco enquanto preparavam o discurso que Rom esperava fazer ao Grande Conselho - e a seu pai.

O B'kah mais velho ainda não havia contatado Rom durante sua jornada para a sede do conselho, nem enviado quaisquer mensagens além da misteriosa convocação que ele havia enviado a Di. Que pressão Rom deve estar sentindo, Jas pensou, sem saber se seu pai o trouxera aqui para elogiá-lo ou humilhá-lo. Tudo o que ela sabia era que era melhor o tirano não cruzar seu caminho, a menos que ele quisesse ouvir como ela considerava o tratamento que ele dispensava ao filho.

A nave estremeceu e então parou. Ela tentou soar alegre. — Bem, é isso. Aqui estamos.

Rom pousou as mãos nos ombros dela, virando-a para encará-lo. Momentos longos e silenciosos se passaram enquanto ele a observava sombriamente. Ela ficou na ponta dos pés para beijá-lo levemente. — Um grão de sal por seus pensamentos — ela persuadiu.

Ele parecia escolher suas palavras com cuidado. — Tenho pensado muito em nós - em nossa visão compartilhada e por que você voltou para mim. A Grande Mãe nos deu este tempo juntos — a ponta do dedo traçou seu lábio inferior — não por amor, ou pela felicidade que você me trouxe em abundância, mas para iluminar meu caminho para o destino que Ela escolheu para mim.

Os cabelos da nuca de Jas arrepiaram. — Você está me assustando — ela sussurrou.

Suas pupilas escureceram dentro de suas íris de ouro pálido, e ele alisou as palmas das mãos sobre o cabelo dela, lentamente e com cuidado, como se a memorizasse. — Seu mundo terrestre com suas riquezas me trouxe de volta da fronteira. Então você foi capturada pela Família do Novo Dia, dando-me a chance de resgatá-la e descobrir que Sharron ainda estava vivo. Então sua doença me levou de volta ao redil de minha família - algo que jurei que nunca faria. Agora estamos aqui. A Roda, casa do Grande Conselho.

Ela cedeu contra ele. Ele apoiou o queixo na cabeça dela.

— Ao voltar para mim, você me deu a chance de convencer os Vash Nadah a se mobilizar para a guerra e derrotar a revolução. E talvez — sua voz se apertou — a oportunidade de reconciliar com meu pai. Mas Jasmine, temo que, uma vez que sua tarefa foi concluída, você irá embora, como fez antes. Mesmo que não seja de sua escolha.

Ela recuou, o queixo erguido. — A magia pode ter me trazido a você, ou o destino - ou Deus. Mas foi por amor que fiquei. Você entende isso? Eu te amo. Eu nunca deixarei. Nunca.

Seu olhar suavizou com seu amor por ela, embotando a angústia que ela viu em seus olhos dourados. Ele abriu a boca para falar.

— Irmão, o Conselho espera por você no grande salão — Joren interrompeu, caminhando em direção a eles.

Jas deslizou a mão pelo lado do rosto de Rom, pela maçã do rosto e pelos leves espinhos de sua barba. — Trabalhamos muito neste discurso. É incrível. Eu estarei lá, ouvindo, orando. — Ela engoliu em seco. — Você vai ser maravilhoso.

Ele a beijou na testa, depois nos lábios, antes de pegá-la pela mão. Eles seguiram Joren para fora do cruzador e para os confins bastante intimidantes da Roda. Gann e Muffin ficaram na retaguarda, abertamente protetores na forma como examinavam a multidão. Jas não tinha dúvidas de que qualquer um dos homens hesitaria em bater em qualquer um que tentasse machucar Rom.

Vários dignitários os encontraram no caminho, levando Joren e Rom com eles, como ela deveria esperar. Os homens foram designados a sentar perto do imenso palco. Se ela fosse a esposa legal de Rom, ela teria se sentado ao lado dele. Ela pensou em Di, que havia ficado para trás, dividida entre os ditames de sua religião contra a guerra e a necessidade que ela agora via disso. Para ela, o terror eterno de ver seus entes queridos mortos em batalha, mesmo que suas mortes fossem para salvá-los a todos, a deixou quase paralisada.

Jas, ladeada por Gann e Muffin, entrou na antessala do Salão do Grande Conselho. As pessoas se viraram para olhar para eles. Que visão estranha eles deviam dar, ela pensou ironicamente, uma mulher com cabelo preto peculiar e pele clara escoltada por dois homens corpulentos vestidos como fugitivos da prisão de contrabandistas. Como se lesse seus pensamentos, Gann manteve a mão leve e reconfortante sob a dobra do braço dela. Sua voz era gentil. — Você está bem?

Seu estômago apertou com força. — Sim. E quanto a você?

— Mais exausto do que depois de uma partida de bajha com B'kah. — Ela sorriu com o comentário dele. — Aqui — ele disse. Eles encontraram assentos no fundo do auditório escuro. Ele a ajudou a afinar um tradutor embutido em um console à sua frente para que ela pudesse traduzir as palavras de Rom em Siennan para Básico, no qual ela era muito mais fluente.

Oito tronos enormes enfeitavam o lado direito do palco. Da esquerda, oito homens mais velhos com vestes imaculadas marcharam para as cadeiras. O cavalheiro alto e de ombros largos que os liderava tinha a postura confiante de um guerreiro, um andar magro familiar. O coração de Jas parou.

O pai de Rom.

Embora suas características faciais não fossem semelhantes - Rom deve se parecer com sua mãe - seu corpo e o de Rom eram quase idênticos. Fascinada, ela observou uma capa azul-índigo com detalhes em prata ondular ao redor das longas pernas do homem enquanto ele se sentava. Os outros sete seguiram, como um dominó, no que Jas adivinhou ser uma ordem baseada na classificação da família. O silvo de aplausos começou na frente do imenso salão, espalhando-se lentamente para trás.

Então Rom subiu ao palco, caminhando resolutamente até um púlpito de cristal. Buscando contato visual com quem estava na plateia, ele agarrou o pódio, os nós dos dedos brancos - não de ansiedade, Jas pensou, mas com paixão. Esta foi a oportunidade que ele desejou com tanto fervor vinte anos atrás e nunca alcançou - a chance de convencer o teimoso e amante da paz Vash Nadah a ir para a guerra.

— Eu sou Romlijhian B'kah — ele anunciou. Ele inclinou a cabeça na direção dos oito líderes e, em seguida, olhou para a audiência. — Fui convidado a falar com vocês porque tenho experiência com uma revolução iniciada por um grupo chamado Família do Novo Dia. — Sua voz confiante cresceu, enchendo o salão com seu poder. — Cinco dias atrás, o mundo natal de Dar foi repentino e deliberadamente atacado por esses revolucionários. Eles aniquilaram uma cidade-espaço, lar de quarenta mil habitantes, bem como cinco colônias de mineração, vários membros honrados deste Grande Conselho e incontáveis políticos e diplomatas da assembleia. Então, sem provocação, a Família do Novo Dia atirou e destruiu um cruzador classe seis da frota B'kah. — Suas mãos se abriram. — Estamos em grande perigo.

Exalando, ele caminhou pelo palco. — Para compreender totalmente esse perigo, o futuro que enfrentamos, se não agirmos, devemos tentar entender nosso passado turbulento. Não apenas na maneira como aprendemos História do Comércio quando jovens, mas com um olhar mais crítico. — Ele cruzou as mãos atrás das costas e os encarou. Enquanto ele recontava os Anos Sombrios que precederam a Grande Guerra, Jas caiu totalmente sob seu feitiço, mal respirando quando descreveu com detalhes repugnantes o resultado das detonações de armamento de antimatéria maciça.

Sua voz era baixa e séria. — É difícil imaginar uma guerra tão terrível, composta de atos tão hediondos, que suas consequências psicológicas impeliram os guerreiros criados para a batalha a deporem suas armas... Para sempre. Mas eles fizeram. 'Paz para todos os tempos', decretaram, e incorporaram esse pacto em nosso mais sagrado dos documentos, o Tratado de Comércio... Para que nunca nos esquecêssemos. Mas - eu lhe pergunto - eles honestamente pretendiam que mantivéssemos essa paz em face do mal? A qualquer custo?

A multidão reagiu primeiro com silêncio, depois com resmungos inquietos, uma reação que pareceu agradar a Rom. Sua voz aumentou quando ele comparou Sharron aos senhores da guerra que haviam levado a civilização à beira da aniquilação onze mil anos antes. — O líder deles agora está morto. Mas seus soldados continuarão sem ele - muitos deles Vash Nadah. Aqueles que não acreditam em mim - olhe para os dados! Mesmo agora, seus relatórios de inteligência revelam que eles estão se preparando para outro ataque. Onde será isso? Quando? Quantas vidas mais devem ser perdidas antes de travarmos uma guerra contra essa ameaça monstruosa, esse mal fortalecedor insuperável em nosso tempo? Devemos lutar como um só para derrotá-los. Não me refiro a uma família... Ou três. Mas todas as oito. Unidade é vitória. — Ele bateu com o punho na mão. — E sem vitória, não há sobrevivência!

Jas olhou ao redor na escuridão. Alguns membros da assembleia gritavam, outros choravam. Vários saíram furiosos. Mas a maioria estava ouvindo em silêncio extasiado. O pai de Rom, acomodado em seu trono dourado no palco, fez uma careta. As mãos do homem estavam espalhadas sobre os joelhos, os braços musculosos apoiados, os olhos baixos. Ele estava perdido em pensamentos ou com muita raiva.

Ombros rígidos, Rom enfrentou seu pai e os outros sete reis. — Honrados membros do Grande Conselho. Vocês, os Oito, são líderes aos quais foram confiados o poder sagrado e a visão dos antigos guerreiros. Suas responsabilidades onerosas muitas vezes os forçam a fazer escolhas complexas - mas nenhuma, eu acredito, tão dolorosa quanto a decisão que vocês devem tomar hoje. — Intencionalmente, ele procurou e sustentou o olhar de seu pai. Silenciosamente, Jas torceu por Rom. Em toda sua vida, ela nunca conheceu um homem com mais coragem.

A voz de Rom aumentou, assim como eles haviam praticado. — Peço que declarem guerra contra a Família do Novo Dia, para defender a galáxia custe o que custar, para nunca se renderem, mesmo que as batalhas sejam travadas nos próprios planetas que protegem nossos filhos. Peço que continuem a luta, pelo tempo que for preciso, até que a Grande Mãe nos considere dignos de libertar a galáxia deste mal absoluto e impiedoso. — Rom os observou por intermináveis batimentos cardíacos, então se curvou e recuou vários passos. — Esmague a escuridão! — Com os punhos cerrados, ele saiu do palco.

Os aplausos explodiram com a rapidez de uma chuva torrencial. — B'kah, B'kah — alguns começaram a entoar. — Unidade é vitória!

Orgulho e apreensão a atingiram, e arrepios em seus braços. Ela bateu palmas até as palmas doerem. Calmamente, ela comentou com Gann: — Ele reivindicou seu papel de líder.

Ele sussurrou em seu ouvido: — Quer ele quisesse ou não.

Ela pegou a mão dele e apertou.

Os aplausos diminuíram somente depois que os membros da assembleia se levantaram. Jas, Gann e Muffin entraram em fila pela entrada lateral. Ela avistou Rom perto da parede oposta da antessala, do outro lado de uma multidão de admiradores ansiosos. Ele estava olhando ao redor, como se estivesse procurando por ela. Ela tentou abrir caminho no meio da multidão, mas foi lento, especialmente com todos olhando para ela - e seu cabelo. Ela deveria ter usado uma capa com capuz.

Quando ela verificou em seguida o lugar onde Rom estivera momentos antes, ele estava vazio. — Você o vê? — ela perguntou a Muffin, que se elevou sobre a multidão.

O grande homem esticou o pescoço. — Ele pegou o corredor central. Lorde B'kah estava com ele e os outros sete.

Eles correram até o local onde Muffin tinha visto os homens desaparecerem. No momento em que eles chegaram lá, guardas de segurança de aparência formidável haviam bloqueado o corredor. Suas armas brilharam ameaçadoramente. — Eu preciso ver Romlijhian B'kah — ela disse sem fôlego.

A sombra de Muffin caiu sobre eles. Os soldados se prepararam.

— Eu sua a a'nah de Rom B'kah — explicou ela. — Ele está me esperando.

Os homens se entreolharam. O mais baixo do trio falou, seu comportamento educado, mas firme. — Eles estão no conselho. Ninguém é permitido dentro. Sem esposas. — Ele ergueu seu olhar inquieto para Muffin. — Ninguém.

Ela soltou um suspiro preocupada. Gann colocou a mão em seu ombro. — Venha. Vou pagar uma bebida para todos nós. Não temos escolha a não ser esperar.

 


Vozes altas ecoaram de uma vasta praça, onde Jas se aninhou em um pequeno bar ao ar livre com Muffin e Gann, uma tigela de biscoitos brilhantes entre eles. A grama real crescia ao longo das calçadas de tijolos iluminadas por luminárias de halo. Uma cúpula acima deixava entrar o brilho de trilhões de estrelas. Várias taças de vinho mogmelon aqueceram sua barriga, silenciando seu nervosismo, mas ao ver Rom marchando em sua direção, seguido por pilotos de caça estelar Vash e oficiais de inteligência, seu pulso disparou novamente.

Ela se afastou da mesa e se levantou, alisando as longas mangas de seda de seu vestido. O rosto de Rom estava sombreado. Ele usava sua máscara de indiferença, escondendo suas verdadeiras emoções, embora o brilho em seus olhos lhe dissesse que algo significativo havia acontecido na reunião.

Ele não diminuiu a velocidade ao passar. Agarrando-a pelo cotovelo, ele a empurrou para longe da mesa. Ela olhou por cima do ombro para o verdadeiro exército que os perseguia. — Quem são eles?

Rom girou em sua comitiva. — Vão. — Quando os homens hesitaram, ele implorou: — Peço privacidade agora. Estarei no local designado na hora marcada.

Os homens foram parados por Gann e Muffin, e Rom retomou seu ritmo. Jas o seguiu. Eles estavam praticamente correndo pela praça. Um labirinto de ruas estreitas e escuras assomava à frente, alinhadas com lojas e o que pareciam ser residências particulares. Ele escolheu o segundo beco, como se soubesse exatamente para onde estava indo. — Onde estamos indo? — ela finalmente perguntou, ofegando por ar na fina atmosfera da Roda.

— Lá embaixo — disse ele. Paralelepípedos metálicos estalaram sob suas botas. As estruturas foram construídas tão próximas umas das outras que obscureceram as estrelas acima. O ar cheirava a equipamento de computador sobrecarregado, carne cozinhando e algo azedo, como água parada. Os paralelepípedos se transformaram em escadas que desciam para as entranhas da antiga estação espacial.

Rom a conduziu para fora do caminho principal, incitando-a até que estivessem presos entre uma parede e um receptáculo de lixo de maquinário descartado e comida podre. Ela olhou ao redor nervosamente e sua boca se curvou. — Boa parte da cidade. Importa-se de me dizer o que está acontecendo?

Ele pressionou os lábios contra o brilho de suor em sua testa. — Eu devo deixar você.

Ela ficou rígida e se afastou. — Quando?

— Agora. Esta noite. — Ele engoliu em seco. — Eles me aguardam nas docas.

— Quem? O que aconteceu?

— Houve outro ataque — ele disse severamente. — No mundo natal de Lesok. As forças da Família do Novo Dia voltaram a Balkanor para se rearmar. Então eles atacarão novamente. Só que desta vez não permitiremos.

— Nós? Você convenceu os Vash Nadah a revidar?

— Sim. — Rom viu o triunfo brilhar em seus olhos. — Eles me escolheram para liderar o ataque.

O sangue foi drenado de seu rosto. — Eu pensei... Eu pensei que você estava jogando o desafio para eles. Se você fez isso, eles jogaram de volta.

— Eu tenho a melhor chance de entrar furtivamente na sede do Novo Dia sem ser detectado. Eu vi seus caminhos - e já estive no planeta. Seu laboratório de armas e armazenamento estão bem abaixo da superfície do planeta. Só eu conheço os marcos para encontrar a entrada, o sistema de túneis subterrâneos para chegar lá. — Ele pensou nas celas úmidas onde Sharron torturou seus prisioneiros. — Vou conseguir colocar meus homens antes que alguém saiba que estamos lá.

Como um verdadeiro guerreiro, ela corajosamente absorveu o que ele disse. Mas sua voz estava mais rouca agora, traindo seu medo. — Quanto tempo você vai ficar fora?

— Eu não vou voltar, anjo.

Ela engasgou, levando uma mão trêmula à boca.

— Jas, posso colocar minha equipe, mas não serei capaz de nos tirar de lá.

— Você não sabe disso! — Seus olhos brilharam com lágrimas não derramadas.

Ele sentiu tanta dor que não conseguia descrever, não queria compartilhar com ela. — As medidas de segurança em vigor na sede do culto são extraordinárias. Mesmo se tivermos sucesso, não há como escapar. — Uma imagem brilhou em sua mente do grupo de homens que compunham a guarda de elite da Roda, os guerreiros mais bem treinados dos Vash Nadah. Quando ele apresentou o plano, ninguém mencionou suas chances inexistentes de sucesso. Sem hesitar, eles estavam prontos para segui-lo em uma batalha que eles não poderiam sobreviver. — Jasmine, eu tenho que fazer isso. Eu tenho que terminar o que comecei.

Chorando baixinho, ela colocou os braços ao redor dele. Ele a segurou com força contra o peito, cada um de seus batimentos cardíacos marchando mais perto do momento em que ele nunca a veria novamente.

— Vou pedir-lhe que faça algo que espero que recuse — disse ele. — Eu não vou culpar você se você fizer isso.

Ela ergueu o rosto. — Qualquer coisa — ela disse trêmula. — Você sabe disso.

— Quando voamos em patrulha, pedi que você fosse minha esposa. Você foi interrompida antes de me dar sua resposta. — Eles se encostaram um no outro. Ele murmurou suas palavras contra o cabelo dela. — Eu preciso saber o que você pretendia dizer.

— Sim — ela sussurrou. — Era sim.

Alegria e remorso dispararam por ele com a consciência de que este era o melhor e o pior momento de sua vida. — Então case comigo esta noite. Consentir em ser minha esposa. É apenas por razões egoístas que eu pergunto, o desejo de um moribundo...

— Pare! Você estará voltando. Você também sabe, ou não se importaria em se casar comigo.

Ele suspirou. — Essa não é a razão. Na minha religião, um casal deve se casar legalmente para viverem juntos no futuro. Por tudo que é sagrado, Jasmine, nós merecemos a eternidade, já que não podemos ter agora. — Ele agarrou seus braços e a moveu para trás. — Tudo o que posso oferecer é o nome da minha família, mas é algo que valorizo mais do que a mais rara das joias.

Jas mordeu o lábio até doer. Rom era o herdeiro de um império que desafiava a imaginação. Um rei não escolhia o caminho de sua vida. Suas obrigações vinham antes de desejos pessoais. No fundo, ela já havia reconhecido isso; só agora ela finalmente aceitou.

— Rom, meu amor, se eu pudesse te dar uma coisa neste universo, seria felicidade. — Ela passou as costas da mão no rosto, enxugando as lágrimas. — Vamos encontrar alguém que possa nos casar.

Ela viu a umidade em resposta em seus olhos quando ele pegou sua mão e a puxou para longe da parede. Suas botas derraparam sobre os paralelepípedos, que ficaram escorregadios por causa da condensação que pingava do alto. Rom respondeu a sua pergunta silenciosa. — As pessoas que vivem aqui são descendentes daqueles que construíram a Roda há muito tempo. Nem todas são Vash, e os costumes que praticam são frequentemente antigos - e não aprovados. Mas, devido aos sacrifícios que seus ancestrais fizeram na construção desta cidade-espaço, olhamos para o outro lado. — Ele diminuiu o passo, virou à direita e seguiu o caminho até um beco sem saída. Os sinos tilintaram quando ele abriu uma porta que descia por um lance de escadas estreito e escuro. O ar estava abafado, mais quente e com um cheiro forte de incenso.

— Quem te contou sobre este lugar?

— Eu perguntei a um dos guardas. Ele me disse aonde ir.

Eles entraram em uma área de estar apertada. Uma única lâmpada pendurada em um fio amarrado a uma viga de metal no teto. Ela girou em círculos tortos, lançando raios estonteantes de luz âmbar nas paredes e no chão. — Isso conta como uma cerimônia legal? — ela se aventurou em dúvida.

— Entre os Vash Nadah, não. Mas será reconhecido entre os mercadores e em todos os mundos conhecidos, inclusive na fronteira. E na minha religião.

— Ah, ah! — Uma mulher incrivelmente baixa e gorda entrou correndo na sala. O topo de sua cabeça mal alcançou os quadris de Jas. — Ele me disse que você vinha. — Ela apoiou as mãos em seu corpo sem cintura e se recostou, olhando com admiração para Rom e depois para Jas. Ela deu um grunhido rápido de satisfação, seus olhos claros brilhando em seu rosto enrugado. — Eu vou fazer por vocês. Ah, sim, vou fazer.

Apesar da dor que a sufocava, Jas trocou sorrisos com Rom. A mulher a lembrava de um pequeno pardal alegre. Mas a breve diversão de Jas desapareceu assim que ela viu o altar. Os casamentos deveriam ser momentos de alegria - não de tristeza. Ela apertou os dentes. A mulher-pássaro esvoaçou ao redor deles, indicando que eles se ajoelharam diante de uma mesa cheia de velas acesas - velas de verdade - e potes de óleo borbulhante perfumado. Rom se agachou ao lado dela. O seu corpo de guerreiro pressionado contra o dela, emprestando-lhe sua força quente. A mulher executou uma dança lenta e curiosa, com o rosto contraído em oração, enquanto erguia duas velas acima da cabeça, uma em cada mão rechonchuda. Então ela ofereceu uma vela para Jas. Quando ela a pegou, a mulher deu outra para Rom.

— Hoje o sangue de B'kah e de Hamilton está unido — ela recitou em uma voz cantante. — Dois são mais fortes do que um. — Ela acenou com os dedos, indicando que eles deveriam tocar as velas juntos. A mão de Jas tremia. Ela olhou para o rosto sombreado de Rom. A luz trêmula de velas impregnou sua pele bronzeada com um brilho âmbar. Ela prendeu a respiração quando eles juntaram os pavios. Eles acenderam, então surgiram em uma grande chama, e o reflexo dançou nos olhos de Rom.

Enquanto seguravam as velas juntas, a mulher se aproximou, inspecionando a chama. Então ela colocou as mãos nodosas sobre as velas. Seus olhos assumiram aquele ar distante, de sabedoria para os tempos, lembrando Jas de Tina, a velha da Nova Era que uma vez leu sua palma. — Muita sorte — sussurrou o pardal. — Sim, bom futuro... Longa vida... Muitos descendentes. Sua progênie viajará para muitos mundos.

Jas desviou os olhos. Aparentemente, as habilidades psíquicas não eram a força desse ser antigo.

— Tudo feito. — A mulher gritou alegremente.

— Um momento — disse Rom. — Eu quero que ela fique com isso. — Ele torceu seu anel de sinete precioso e empurrou a fita grossa no dedo indicador esquerdo de Jas. — Pegue meu anel.

Tocada profundamente, Jas apertou sua mão até que o anel beliscou sua carne. Então ela apertou o punho protetoramente contra os seios. Solene e silencioso, Rom se inclinou para frente e a beijou, sua boca doce, quente e terna. — Eu te amo. — Eles sussurraram um para o outro.

A mulher tirou um computador de mão das dobras do vestido e apertou várias teclas. Inserindo o evento em um banco de dados galáctico? Em seguida, ela espalhou um pedaço de papel de aparência normal e confortável e duas canetas sobre a mesa. Incapaz de decifrar as runas, Jas deixou Rom guiar sua mão para o lugar apropriado para assinar. Em seguida, eles voltaram para o ar fino e filtrado da noite.

Jas tentou não pensar em por que Rom estava com tanta pressa, caminhando pela vila subterrânea e subindo a colina para as docas. Estava mais lotado na parte principal da estação. As pessoas que passaram por eles manifestaram seu apoio a Rom “Unidade é vitória!” “Sem vitória, não há sobrevivência!” As palavras se tornaram o novo grito de batalha para derrotar a revolta de Sharron.

Adiante estavam as docas. Do lado de fora, um enorme cruzador de batalha esperava, seu casco reluzente brilhando com a luz refletida da Roda. Soldados se enfileiraram em ambos os lados do corredor que levava à escotilha. Eles a observaram com terna compreensão, já tendo se despedido de suas esposas. Joren, Gann e Muffin ficaram de lado - com o pai de Rom, estoico em seu desespero resignado, o rosto contraído. Ele intencionalmente procurou contato visual com ela e acenou com a cabeça, dando-lhe seu respeito silencioso, mas não fez nenhum movimento para roubar o pouco tempo que ela tinha com seu filho. Com repentina clareza - e surpreendente empatia - ela percebeu quanta dor ele devia sentir por perder a mesma criança duas vezes.

A três metros dos espectadores, Rom parou e a puxou para perto. Jas se sentia lenta, entorpecida, como se estivesse presa em um pesadelo. Amanhã Rom não estaria com ela, mas agora ele estava. Ela o abraçou com todas as forças, apoiando a cabeça em seu ombro enquanto fechava os olhos.

— Seja feliz. — Ele sussurrou.

Ela se afastou, tremendo, e arrastou as pontas dos dedos pela bochecha dele. — Volte para mim.

Ele engoliu em seco. Hesitante, ele começou a falar em inglês. — Jasmine Boswell Hamilton B'kah. Eu te amo. — Então ele a beijou, afastando-se lentamente.

Quando ela abriu os olhos, ele estava subindo o passadiço para o navio. Os soldados o seguiram e a escotilha se fechou. De alguma forma, ela conseguiu manter a compostura através do estrondo dos propulsores. Enquanto a nave se afastava, ela se sentiu repentinamente tonta. Ela cambaleou e Gann a firmou, acompanhando-a rapidamente, protegendo-a de perguntas e condolências com seu corpo largo. Ele a trouxe para um quarto. Seus aposentos? Dela? Ela não sabia... Ou se importava. Ela começou a tremer. Gann a segurou antes que ela caísse no chão. Ele apoiou as costas contra a parede e a apoiou transversalmente em seu colo, segurando-a contra o peito. Com os ombros arfando, ela chorou até doer. Algum tempo depois, quanto mais tarde ela não sabia, ela ouviu vozes profundas. Muffin. Gann.

— Tenha notícias... Balkanor está destruída... Sem sobreviventes...

Meu Deus. Rom estava morto.

Ele nunca mais voltaria para ela.

Um grito baixo e agudo saiu das profundezas de sua alma. Gann a abraçou enquanto ela chorava de novo - por Rom, por ela, por tudo que eles haviam perdido e pelo sacrifício que ele havia feito por seu povo. Quando ela finalmente caiu no sono exausto, ela o fez protegida pelo leal cavaleiro de seu rei estelar.


CAPÍTULO 20


— Trezentos e cinquenta mil - sim, esse é o preço de venda. — De pé nos degraus traseiros da Galeria Rivas-Blackwell, com o telefone pressionado contra o ouvido, Betty olhava interrogativamente para Jas.

Agora não, Jas murmurou. Seu Range Rover ocupava o estreito espaço de estacionamento de Betty e metade do próximo. Ela buscou refúgio atrás do casco mecânico, colocou um par de óculos escuros, silenciando o labirinto de becos estreitos salpicados de sol e pátios cheios de fontes, e destrancou o porta-malas. O pesado anel de sinete de Rom - sua aliança de casamento - balançava sob a blusa em sua longa corrente. A maneira familiar como batia entre seus seios se tornou tão reconfortante e essencial quanto seu batimento cardíaco.

— Fabuloso. Mandarei na terça. — Betty dobrou a esquina perto do capô. — Perdão? Você gostaria de falar com ela?

Jas rapidamente enterrou a cabeça e os ombros no porta-malas.

— Ela ainda está em Washington — improvisou Betty. — Mas eu vou deixar ela saber que você ligou.

Jas fez uma mímica de agradecimento. As obras de arte que ela havia criado em suas viagens espaciais tinha encontrado um mercado - um mercado lucrativo - e ela estava grata pelo sucesso, mas quanto a conversar com compradores e fãs, alguns dias eram melhores do que outros, e hoje não era um dos bons. Uma semana traduzindo o básico para o inglês para as audiências comerciais do Senado a deixara exausta. Apesar disso, ela ansiosamente se ofereceu para repetir seus deveres como tradutora freelance em duas semanas para as Nações Unidas. A dor dentro dela não era tão aguda quando se mantinha ocupada, ao contrário daqueles primeiros meses solitários e devastadores em que vivia reclusa na casa de hóspedes na propriedade florestal de Betty.

— Achei que você fosse direto para casa depois do aeroporto? — Betty a repreendeu.

— Eu fui - por cinco minutos. — Jas ergueu uma caixa de suprimentos de arte que comprou em Scottsdale e colocou-a na calçada. — Mas Ian tinha ido embora sabe-se lá onde, e a casa parecia muito vazia. Então aqui estou eu, à sua porta novamente. Vou fazer o jantar.

Betty reprimiu um sorriso e afastou uma lona manchada de tinta que cobria telas na parte de trás do Range Rover. — Vou deixar você cozinhar. Mas só se você tiver acabado algo para mim. — A mulher respirou fundo quando viu uma das pinturas. — Oh, querida...

O rosto de Jas aqueceu e ela se levantou. — É Rom — ela disse lentamente. Era o trabalho estimado que ela secretamente carregava consigo.

Betty a estudou atentamente. — Alguém mais viu isso?

— Só ele. Quando eu o pintei pela primeira vez. — Jas olhou para as manchas de pigmento aplicadas com amor que mostravam Rom dormindo em seu quarto em Mistraal. Ele estava esparramado de barriga para baixo, os braços jogados acima da cabeça, lençóis e roupas descartadas torcendo por cima e por baixo de suas pernas longas e musculosas, mal cobrindo as nádegas. Calêndula amarela, rosa árido... Folha de bronze e canela - a luz do sol refletida na savana de Mistraal fluía sobre suas costas esculpidas, destacando sua pele lisa e brilhando dourada onde a barba por fazer captava os primeiros sinais do amanhecer. Jas fechou os olhos, lembrando-se de como o ar fresco inundou a câmara naquela manhã, acordando Rom, a maneira como ele rolou de costas e deu-lhe seu sorriso sonolento e sensual.

— Gosto da maneira como me sinto — admitiu ela em voz baixa. — Então, eu o mantenho por perto.

A admiração tingiu a voz de Betty. — De longe, é o seu melhor trabalho. — Ela devolveu a pintura ao seu esconderijo, respeitosamente guardando Rom como se ele fosse um tesouro remanescente da história, um guerreiro morto há muito tempo.

Jas cerrou os dentes. A frustração com a injustiça de tudo isso transformou sua constante dor de coração em raiva. — Os Vash triunfaram - por causa dele. — A invasão de Balkanor foi devastadora para ambos os lados, e os poucos detalhes da guerra que se seguiu só agora estavam chegando à Terra. Ela fechou o porta-malas. — Ele salvou seu povo, Betty. Ele deveria estar vivo para saborear sua vitória.

Betty falou com paciência e empatia. — Eu sei que dói, Jas. Será por algum tempo ainda. Mas você está mais forte agora do que antes de partir. E talvez mais capaz.

Jas lançou-lhe um olhar assustado.

— Você se arriscou, Jas. Você desafiou as expectativas e trocou a mediocridade pelo desconhecido. Em troca, você encontrou respeito próprio... E amor verdadeiro.

Jas sustentou o olhar sábio de sua amiga. — Suponho que terei que continuar dizendo isso a mim mesma — ela sussurrou.

O distante trovão de motocicletas cortou o ar perfeitamente imóvel de fim de tarde de Sedona. — É Ian — Jas disse, seu humor melhorando. Duas Harleys entraram ruidosamente no estacionamento. Seu filho ergueu o visor e acenou. Os dois motoqueiros pareciam empoeirados e cansados, como se estivessem andando por horas.

Betty ergueu uma sobrancelha. — Quem é o amigo dele?

— Não tenho a menor ideia — Jas murmurou. O estranho de capacete passou uma longa perna por cima do assento e se levantou. Seu corpo atlético coberto de couro provocou um arrepio de desejo, algo que ela não sentia desde Rom. Ela enfiou as mãos nos bolsos da calça jeans. — Está aqui para ver Sedona? — ela perguntou a ele tão casualmente quanto ela podia.

— Não — Ele tirou o capacete. — Estou aqui para ver minha esposa.

Ao ver seus olhos dourados e cabelo de noz-moscada despenteado, as emoções de Jas se transformaram em um turbilhão. — Rom! — Ela engasgou. Sua visão ficou embaraçada. De repente, não havia ar suficiente para respirar. Ofegante, ela se sentou com força no meio-fio, derramando o conteúdo de sua bolsa. Pontos negros giraram na frente de seus olhos enquanto ela observava seus batons rolarem pela encosta de asfalto. Em seguida, as manchas se transformaram em bolhas que obscureceram sua visão, e alguém estava empurrando sua cabeça entre as pernas.

Quando ela acordou, estava deitada de costas na calçada. Tremendo de calor e vagamente nauseada, ela abriu os olhos. Rom estava agachado sobre ela. Ele parecia chocado enquanto tirava o cabelo de sua testa. — Peço desculpas por chocar tanto você. — Disse ele em Básico.

Ela fechou os olhos com força. Ao abri-los, ele ainda estava lá. Ela deu um pequeno grito e voou para cima, quase o jogando para trás. Seus braços a envolveram. Ela o abraçou o mais forte que pode, seus beijos frenéticos, pousando em todos os lugares, menos em seus lábios. Ele a firmou pressionando as palmas das mãos em cada lado do rosto dela, então cobriu sua boca com a dele. Seu beijo foi profundo e totalmente terno. Tonta, ela suspirou, e ele ergueu a cabeça, olhando-a com os olhos úmidos. — Oh, Rom... Oh, meu amor. — Ela sussurrou com fervor. Suas bocas se juntaram, desta vez famintas e ferozes.

À medida que a realidade de sua aparência se aprofundava, seu alívio se transformou em descrença. Como ele poderia estar vivo e ela não saber disso? Ela afastou os lábios dos dele. — A guerra acabou há meses. — Disse ela sem fôlego.

— Vim assim que pude. Fui ferido no início da invasão e depois capturado. Eu estava praticamente morto quando fui resgatado e levado para casa.

— Por que eu não sabia? Achei que não havia sobreviventes. Por que ninguém me contou?

— Pedi ao meu pai que não o fizesse.

— O que! — Ela deixou escapar, incrédula.

— Eu estava em coma. Acordei cego e incapaz de mover minhas pernas. Não queria que você se sentisse obrigada a um marido que não foi capaz de protegê-la.

Ela olhou para ele mais de perto. Por baixo da jaqueta de couro preta e das calças, ele estava mais magro. As cavidades sob as maçãs do rosto eram mais pronunciadas. Seu coração se torceu e sua alegria transformou-se em uma fúria incandescente. Ela bateu com os punhos no peito dele. — Você não tinha o direito de tomar essa decisão sozinho. Sou sua esposa. Eu deveria ter estado ao seu lado. — Ela estava chorando agora, falando metade em inglês, metade em Básico, esmurrando-o com os punhos. — Eu tenho passado por um inferno...

Ele segurou seus pulsos com suas grandes mãos. — Jasmine, me escute.

— Chorando todas as noites! — Ela tentou recuar, mas ele a segurou pelos pulsos e ficou de joelhos. Ela se afastou dele, caindo de costas, as pernas esparramadas na calçada. A voz dela tremeu. — Eu pensei que você estava morto.

Seus olhos estavam torturados, tristes. — Eu sei, anjo.

Ela rastejou de volta para seus braços, e ele a agarrou como se nunca fosse soltá-la. — Por que você não ligou? — Ela exigiu, seu tom mais suave.

— Você é tão boa no coração, Jas, tão leal. Temia que as próprias qualidades que admirava em você ligassem você a mim... Se eu pudesse ou não ser um verdadeiro marido para você.

Ela descansou sua bochecha contra seu ombro. O cheiro de couro empoeirado aquecido pelo sol se misturou com seu cheiro limpo e masculino.

— Meu pai me trouxe de volta para Sienna para me recuperar. Como eu recuperei, nossas diferenças também. — Ele comprimiu os lábios. — Não tem sido um caminho fácil. Ambos somos homens obstinados.

Ela bufou. As pontas de sua boca se ergueram na mais leve sugestão de um sorriso. Mas desapareceu quando seus olhos se inundaram de dor óbvia. — Por tudo o que é sagrado, sinto sua falta, Jas. Eu preciso de você. “Não tema a felicidade”, você me disse em Mistraal. Essas palavras vieram me assombrar dia e noite, até que finalmente... Finalmente vi que havia voltado aos meus velhos hábitos - os caminhos de meu pai e daqueles que o precederam. O orgulho teimoso de guerreiro em não entrar em contato com você era a mesma adesão pouco iluminada à tradição que tornava os Vash Nadah frágeis. É por isso que quase quebramos com nosso primeiro desafio de verdade - um erro que juro não repetir. — Ele agarrou seus ombros. — Vou começar abordando o costume de casamentos arranjados para governantes. Eu, por meio desta, escolho o amor.

— Venha comigo para Sienna — disse ele — para que possamos nos casar formalmente. Mas esteja avisada: a cerimônia dura seis dias. Nem tudo é festa e folia. Existem passagens do Tratado de Comércio para memorizar, rituais para realizar...

— Rom. — Ela emoldurou seu rosto com as mãos. — Não importa quantas vezes e de quantas maneiras você proponha, minha resposta sempre será sim.

Ele se levantou, puxando-a para seus braços. Um sorriso choroso enfeitou o rosto de Betty enquanto ela aplaudia. Fungando, Jas os apresentou e então olhou para seus dois motociclistas cansados da estrada. — Agora, por que vocês não explicam onde vocês estiveram e por que nenhum de vocês pode ligar.

Os homens trocaram olhares. Ian falou primeiro. — A maior parte do tempo estávamos fora da cobertura, mas Rom tentou, mãe. Várias vezes - seguidas.

Jas engasgou, pegando seu telefone. Com certeza, havia chamadas perdidas. — Mas nenhuma mensagem.

— Eu realmente não sabia disso. Eu acho que ele apenas ouviu a sua voz, repetidamente. — Ele lançou um sorriso afetuoso para Rom, que deu de ombros, seu próprio sorriso um pouco tímido. — Sr. O primeiro encontro da Alta tecnologia com o correio de voz.

Rom enfiou os polegares no cós da calça jeans justa e deu de ombros.

— Você entende inglês? — Jas perguntou.

— A maioria — Rom respondeu na mesma moeda. — Falar é muito difícil... Mais difícil.

— Mas ele me segurou. Eu disse a ele que você estava em Washington e que ele deveria vir. A próxima coisa que você sabe, eu o estava ensinando a pilotar. Eu sabia que você não voltaria até hoje, a essa altura já planejávamos fazer uma surpresa para você. Então, acabamos acampando durante a noite no cânion. — Ian espalmou as mãos com culpa.

Rom roçou os nós dos dedos ao longo de sua mandíbula. — Erro meu. Pedi a Ian um tempo para me conhecer mais, para que ele me permitisse ser o marido de sua mãe.

Ian interrompeu, seus olhos brilhando. — Foi uma ótima viagem. Nós conversamos. A maior parte da noite, na verdade. — Novamente ele lançou a Rom um olhar de admiração. Seu coração cheio de alegria parou de bater. Eles se tornaram confidentes.

— Depois que eu me formar — Ian continuou — ele vai me ensinar os negócios da família.

— Negócios da família? — Ela repetiu entorpecida, sua mente girando.

Rom respondeu no Básico: — Ian é meu enteado. Um rapaz bom e leal a quem eu teria orgulho de chamar de meu herdeiro, caso ele desejasse uma marca tão onerosa. Mas você e eu falaremos mais sobre esse assunto em outra ocasião. — Ele desabotoou o alforje de sua moto e jogou para ela uma jaqueta de couro, capacete e botas. — Esta noite vamos dormir no deserto, sob as estrelas. Nossa noite de núpcias há muito esperada.

Seu olhar se tornou escuro e sensual, e a antecipação vibrou por ela. — Então, amanhã, ou talvez no dia seguinte — ele acrescentou incisivamente, — vamos viajar para ver sua filha. Mas primeiro vamos comemorar. — Ele levantou a tampa de um refrigerador apenas o suficiente para que ela visse o brilho das lascas de gelo e das garrafas. — Cerveja Red Rocket. — Disse ele com uma piscadela.

Ela jogou a cabeça para trás e riu. Ele a agarrou pela cintura e a girou. Quando os pés dela tocaram o chão, ele murmurou em seu cabelo: — Peço desculpas pela dor que causei a você. Admito que tenho muito a aprender sobre como ser um marido.

Ela sorriu em meio às lágrimas e o abraçou de volta. — Não se preocupe, Rom. Você terá uma vida inteira para acertar.

 

 


Notas

 


[1] Um piloto cuja aeronave está posicionada atrás da aeronave líder em uma formação
[2] São substancias que, isoladas ou em combinação com outras, desenvolverem, queimando uma grande massa de produtos gasosos de elevada temperatura, os quais, escapando através do êmbolo de descarga da câmara de combustão, fornecem, por reação, o impulso motor
[3] Universidade da California, Los Angeles
[4] Quem saqueava navios mercantes em mares do Caribe (literalmente Piratas do Caribe KK)
[5] Sal Morton é uma marca de sal nos EUA, e o sal kosher é um sal de cozinha em que os cristais de cloreto de sódio são maiores que o sal refinado
[6] Volta que se dá ou dobra que se faz na ponta de um prego ou pino para que não saia do lugar onde foi cravado.
[7] Referência a uma atriz sueca dos anos 20 e 30 que resolveu abandonar os holofotes.
[8] Unidade usada para medir velocidade, 1 nó equivale a 1,852 quilômetro (ou 1 milha náutica) por hora
[9] Base naval dos EUA e o quartel-general da frota norte-americana do Pacífico, houve um ataque militar do Japão contra os Estados Unidos na base naval de Pearl Harbor em 1941

 

 

                                                   Susan Grant         

 

 

 

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