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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


TENTE-ME, SUA GRAÇA / Tamara Gill
TENTE-ME, SUA GRAÇA / Tamara Gill

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Ela foi banida da Inglaterra... e ela o baniu de seu coração.
Assim que retorna para a Inglaterra em decorrência da morte de seu pai, a Senhorita Ava Knight torna-se a dona de um dos maiores estabelecimentos de cavalos de corrida do país. Só há um problema: o futuro de seu negócio depende de um programa de reprodução bem-sucedido que gira em torno de um garanhão, Titan.
Uma pena que o cavalo seja agora de propriedade de um homem que ela desejava nunca mais ver.
O duque de Whitstone, Tate Wells, ficou de coração partido quando Ava o abandonou na noite em que fugiriam para se casar, e ele jurou que nunca mais cruzaria o caminho de Ava. Apesar da relutância de perdoá-la, Ava vai ao socorro de Tate quando um incêndio ameaça consumir sua propriedade. Alguém está determinado a destruí-los. Com isso, eles se veem forçados a trabalhar juntos para garantir a segurança de seus cavalos e propriedades.
Será que os sentimentos que nutriam um pelo o outro no passado reacenderá o amor, ou seus sentimentos refugarão ainda na linha de partida?

 

 

 


 

 

 


PRÓLOGO

Estábulo dos Knight, Berkshire, 1816

A senhorita Avelina Knight, Ava para seus amigos, apertou a circunferência da montaria e verificou se a sela não escorregaria quando ela se elevasse no estribo. Com uma única vela acesa na arandela na parede dos estábulos, ela trabalhou com o máximo de rapidez e silêncio possíveis, na esperança de que os cavalariços que dormiam no desvão acima não acordassem.

Segura de que a sela estava firme e de que a montaria estava hidratada, ela conduziu Manny para fora dos estábulos com o mínimo de barulho possível, encolhendo-se quando as ferraduras do cavalo fizeram seu som típico a cada passada.

Ava soprou a vela quando passou por ela e pegou sua pequena bolsa e jogou-a sobre o pescoço do cavalo antes de se erguer para a sela. Ela ficou lá por um minuto, atenta a qualquer barulho ou à possibilidade de alguém estar à espreita. Feliz pela quietude ela cutucou a montaria e partiu para o portão leste.

Ainda havia tempo, e ela não precisava se apressar agora que já estava há caminho. Tate havia dito que a encontraria na árvore favorita deles às três da manhã, e eram apenas duas e meia.

Ela impulsionou Manny para um meio galope, percorrendo os vários pátios que cercavam sua casa e ao se afastar, passou à velocidade de galope que seu pai usava para treinar os cavalos de corrida. Ou a que já foi sua casa. A partir desta noite, sua vida enfim começaria. Com Tate, ela viajaria pelo mundo, faria amor sob as estrelas se assim o desejassem, e não teria que ser escrava de nenhum dos caprichos das famílias de ambos, ou da Sociedade e suas restrições.

Tate e ela encontrariam uma nova vida. Um novo começo.

Apenas os dois até que expandissem a família com filhos em alguns anos.

Prazer aqueceu seu coração ante tal concepção, e ela não conseguiu impedir a risada suave de prazer que escapou de sua boca.

Com o tempo, Ava esperava que seu pai a perdoasse e, talvez, quando retornassem, casados, com filhos e felizes, seu pai ficaria satisfeito.

A silhueta escura de um homem apareceu embaixo da árvore.

No entanto, pela posição e tamanho do cavalheiro, não se parecia com Tate. Frieza varreu sua pele, e ela estreitou os olhos, tentando descobrir quem a esperava. Com o estômago retorcido, ela empurrou o cavalo para a frente, sem saber o que essa nova peça significava.

Ava olhou em volta, mas não viu mais ninguém. Com mais alguns passos, ela se engasgou quando por fim reconheceu a forma fantasmagórica. Seu pai.

O coração dela passou a bater forte. Como era ele estava aqui, e não Tate? Eles foram tão cuidadosos, tão discretos. Ora, eles nem frequentavam a mesma esfera social para serem ouvidos sussurrando ou planejando. Sendo Tate o herdeiro do pai dele, o duque de Whitstone, e Ava apenas a filha de um corredor notável, suas vidas não poderiam ser mais diferentes.

Ava levou seu cavalo até a árvore. Não havia sentido em dar meia volta. Parando diante do pai, ela encontrou o olhar dele, o máximo que pôde distinguir sob a noite de luar.

— Ava, desça, eu gostaria de falar com você.

Seu tom não era de raiva, mas de cautela, e Ava sentiu-se retorcer por dentro ante a possibilidade de que algo ruim havia acontecido a Tate. Ele teria se machucado? Por que ele não estava aqui para encontrá-la?

Ela pulou do cavalo, caminhou até o pai, sua montaria a seguindo de perto.

— Papai, o que o senhor está fazendo aqui? — ela perguntou, precisando saber, e certa de que não era possível ignorar o fato de ele a ter descoberto.

Ela deixou cair as rédeas do cavalo, e sua montaria se abaixou para mordiscar a grama.

O rosto do pai assumiu um tom severo.

— O marquês de Cleremore não a encontrará aqui, Ava. Recebi uma missiva ontem à noite notificando-me que, enquanto nos falamos, Sua Senhoria está à caminho de Londres para pegar o primeiro navio para Nova York. Pelo que seu pai, o duque de Whitstone, afirma, esta foi uma decisão do marquês. Tate confidenciou a seu pai a situação em que se encontrava com você e que não sabia como se desvencilhar de ter que se casar com uma mulher que não de mesma posição.

Ava olhou para o pai, incapaz de entender o que ele estava dizendo. Um abismo se abriu em seu peito, e ela apertou o xale como se para interromper seu progresso .

Tate a havia deixado?

Não, não poderia ser verdade.

— Mas isso não faz sentido, papai. Tate me ama. Ele mesmo me disse, neste exato lugar.

Decerto que ela não poderia estar errada acerca dos sentimentos dele. As pessoas não declaram tais emoções a menos que fossem verdadeiras. Ela com certeza não mentira.

Ela amava Tate.

Ava pensou em todas as vezes que ele tomou liberdades com ela, beijando-a, tocando-a, passando uma quantidade enorme de tempo com ela e que não significou nada para ele. Ela fora uma mera distração, um brinquedo para um homem do porte dele.

Seu estômago revirou com tal percepção, e ela tropeçou na árvore, segurando-se no tronco para ter apoio.

— Não. Eu não acredito. Tate não faria isso comigo. Ele me ama como eu o amo, e nós vamos nos casar. — Ava olhou para o chão por um momento, sua mente vacilando antes de ela girar o corpo na direção do pai. — Eu preciso vê-lo. Ele precisa me dizer tudo na minha cara.

— Lorde Cleremore já partiu para a cidade. E de manhã, ele estará em um navio para a América. — o pai suspirou, aproximando-se dela e pegando-a pela mão. — Eu pensei que seu apego a ele fosse uma bobagem passageira. Sua Senhoria nunca foi para você, minha querida. Nós treinamos e criamos cavalos de corrida e, na Inglaterra, pessoas como nós não se casam com futuros duques.

Ava olhou para o pai, não acreditando no que estava acontecendo. Ela pensou que esta noite seria o começo de uma eternidade, mas agora era o começo do fim. Seus olhos arderam, e ela se viu impotente em manter a postura.

— Mas eu o amo. — ela sussurrou com a voz embargada.

Seu pai, um homem orgulhoso, mas humilde, de princípios ainda mais humildes, endireitou a coluna.

— Eu sei que você pensa que sim, mas não é amor. Você é jovem, jovem demais para jogar sua vida fora por um garoto que usaria você e depois se casaria com outra mulher, intitulada e bem conectada.

— Não estou arruinada, nem usada. Por favor, não fale dessa maneira.

Não queria nem imaginar que Tate pudesse tratá-la com tão pouco respeito, mas o que o pai disse valia a reflexão. As últimas semanas com Tate não foram ocupadas com pouco além de planejamento e roteiros. Teria sido diferente para eles, teria Tate agido de outra forma caso fosse mais velho, mais maduro? Se a partida dele revelava algo, com certeza era que o pai estava coberto de razão. Ele se arrependera de sua escolha e foi embora em vez de encará-la. Sendo o cavalheiro que era, abandoná-la não parecia do seu feitio. Apenas mostrava a pouca consideração que ele possuía quanto a ela e ao amor que ela tão ardentemente declarou a ele.

Ela bateu nas bochechas, querendo gritar para a noite ante a injustiça de tudo.

— Sinto muito. — disse ela, olhando para as botas curtas e incapaz de encontrar o olhar do pai.

Como ele pôde ter feito isso comigo?

Ela nunca o perdoaria.

Ele suspirou.

— Há mais uma coisa, minha querida.

Mais!

O que mais poderia haver?

— O que, papai? — ela perguntou, pavor formando um nó no estômago diante do semblante pálido de seu pai. Ela viu um olhar semelhante quando ele chegou para contar da morte de sua mãe, e era uma expressão que ela nunca mais queria ver.

Ava agarrou a árvore com mais força.

— Vou mandá-la para a França, para terminar seus estudos lá.

Eu a matriculei na Escola da Madame Dufour de Etiqueta para

Moças. Fica no sul da França. É de boa reputação e ajudará a prepará-la para o que está por vir na sua vida; ou seja, administrar o Haras Knight em meu lugar quando chegar a hora.

Escola de Etiqueta!

— Está me mandando para a França! Mas papai, eu não preciso de escola de etiqueta. Você sabe que eu sou mais do que capaz de assumir o controle dos estábulos. E eu sei me portar, sei como agir tanto na Alta Sociedade quanto na esfera mais baixa. Por favor, não me mande embora. Não vou sobreviver sem você e nossos cavalos.

Não me tire isso também.

Não quando eu já perdi a felicidade da qual eu tinha tanta certeza.

Ele a calou, puxando-a para seus braços. Ava o empurrou para longe, indo e vindo diante dele. Seu pai estendeu a mão, tentando acalmá-la.

— Você vai me agradecer um dia. Confie em mim quando digo que é uma coisa boa para você, e não vou voltar atrás com minha decisão. Partimos para Dover amanhã, e eu mesmo a acompanharei para garantir sua chegada segura.

— O que... — ela parou de andar. — Pai, por favor, não faça isso. Prometo não voltar a fazer nada de tão tolo e bobo. Você disse que Tate está indo embora. Não há razão para me mandar embora também.

O simples ato de dizer em voz alta a magoava, e Ava se abraçou. Amar e perder Tate já seria difícil; no entanto, ser enviada para outro país, sozinha e sem amigas ou apoio era demais para suportar.

Seu pai foi até ela, puxando-a contra ele e beijando seus cabelos.

— Esta é uma boa oportunidade para você, Ava. Eu trabalhei duro, economizei e investi para ser capaz de proporcionar a você tudo o que uma criança intitulada poderia receber. Eu quero isso para você. Lorde Cleremore pode não achar que você é adequada para ele, mas provaremos que ele está errado. Me faça orgulhoso, use a educação que receberá para se aperfeiçoar e então volte para casa. Me prometa que vai fazê-lo.

Ava caiu contra ele.

O pai dela nunca foi flexível e, uma vez que a decisão fosse tomada, era final. Não havia escolha; ela teria que fazer o que ele mandasse.

— Eu irei já que sei que não posso fazê-lo mudar de ideia.

— Essa é minha garota. — ele se afastou e assobiou para a montaria dela.

Ela não conseguiu nem dar um meio sorriso quando Manny trotou até eles.

— Vamos. Tenho certeza de que, quando chegarmos em casa, o café-da-manhã estará quase pronto.

Usando um tronco próximo, Ava se ergueu para a sela.

O cavalo, como se soubesse o caminho de casa, começou a descer a colina. A luz brilhava no céu do leste e, olhando para sua esquerda, Ava viu o sol nascer sobre sua terra. Ela observou o amanhecer de um novo dia, marcando um novo futuro para ela, u que não incluía Tate, o Marquês de Cleremore, futuro duque de Whitstone.

Uma lágrima solitária deslizou por sua bochecha, e ela se prometeu jamais chorar por Tate ou qualquer outro homem. Ela dera o coração e confiança a ele, e ele os desprezou. Que a lágrima secando em sua bochecha fosse a última que ela derramaria por ele.

E o precioso ducado que ele tanto amava...

Amava mais que ela.

CAPÍTULO 1

Tantos quilômetros nos separam. Eu não durmo por pensar em você. Quando seu amor por mim pereceu? Não consigo entender por que você não me confidenciou que seus sentimentos haviam mudado, talvez até de direção...

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

Haras Knight, Berkshire, 1821

A va incitou sua égua recém-comprada — uma beleza de dezesseis mãos, puro-sangue que havia sido gerada para competir com sua própria linhagem — a um galope empolgante.

Ela sorriu, inclinando-se sobre o pescoço dessa garota preciosa, e elas começaram a virar a esquina e descer para a casa ainda no galope tão familiar.

O administrador do Haras e treinador, o Sr. Greg Brown, estava observando seu galope, e ouviu seus gritos exuberantes quando ela passava por ele em uma velocidade alucinante. Ela sorriu, impressionada com a rapidez insondável do cavalo.

A névoa da manhã começava a queimar a grama e as árvores, o ar tornando-se fresco após a breve chuva. Puxando a égua, Ava a manteve em um trote lento para retornar a Greg. A égua bufava vapor de suas narinas a cada respiração, e Ava deu um tapinha nela, seguida de uma massagem de congratulações.

Ava respirou fundo, maravilhada com a beleza de sua vida, a beleza deste lugar que agora era dela.

— O que acha, Greg? Ela tem chance em Ascot? — Ava provocou, sabendo que havia muito o que fazer antes que pudessem pensar em inscrever a égua para uma corrida dessas.

Ele riu, curvando-se sob o parapeito e saindo para dar tapinhas no cavalo.

— Talvez no próximo ano, se ela continuar se apresentando como agora. No entanto, ela terá que se provar em Epsom antes.

Ava soltou os pés dos estribos e pulou para o chão. Ela entregou as rédeas a Greg e deu a volta no cavalo, verificando se ela estava bem após a corrida.

— Nossa Garota Valente, como o nome sugere, se provará por si só. Espere e veja. E com os potros que teremos dentro de cerca de um ano, do cruzamento de Titan e Black Lace, teremos mais belezas como esta.

— Falando em Titan. — Greg disse, tirando o chapéu e passando a mão pelo cabelo. — Talvez haja alguns problemas para juntá-lo a Black Lace como você deseja. Soube que o Sr. Tuttle o vendeu.

Ava parou a inspeção que fazia na égua e baixou a pata direita da Garota Valente. Ela encontrou o olhar de Greg e viu que ele não estava fazendo piada.

— Titan foi vendido? Mas o Sr. Tuttle fez um acordo com meu pai de que o primeiro potro, que a Black Lace teve há dois anos, seria dos Tuttle, mas que depois eles cruzariam outra vez. Meu pai cumpriu sua parte no trato, e você está me dizendo que ele não vai cumprir a dele?

Ela partiu para os estábulos, gritando para um dos rapazes selar Manny. Greg a seguiu o mais rápido que pôde enquanto guiava

Garota Valente.

— Srta. Ava, espere. Espere. Acredito que haja outras opções, além de Titan, que deveria considerar.

Não havia outro cavalo melhor que Titan, e se o Sr. Tuttle pensava em passar a perna em seu falecido pai e a ela, então ela pegaria o potro, Beatrice, de volta sem se importar com o escândalo que criaria no mundo das corridas. Como o homem ousava enganá-

los dessa maneira? Ele trocara apertos de mão com o pai dela, caramba. Não significava que o acordo era tão válido quanto qualquer outro?

— Não há outro cavalo tão bom. Quero Titan como provedor da próxima geração de potros dos Knight, e não há nada que possam dizer que me faça mudar de ideia. Você sabe, assim como qualquer um, que ele é o melhor puro-sangue da Inglaterra, talvez até do continente. Sua altura, junto com a forte linhagem de sangue e velocidade, faz dele o único cavalo apto.

Ava agradeceu o rapaz que selou Manny e, segurando-se na sela, se ergueu.

— Aonde vai? — Greg perguntou a ela, segurando as rédeas sob o pescoço do cavalo dela.

Ela franziu o cenho ante a impertinência dele.

Ele largou.

— Vou descobrir o que o Sr. Tuttle pretende ao tratar nosso negócio com tão pouco respeito. Eu posso ser mulher, e meu pai pode estar morto, mas nós tínhamos um acordo. Não vou deixar barato.

Ela virou a montaria e chutou Manny para iniciar um galope, iria numa perna só até a Fazenda Tuttle. Quando o pai dela estava vivo, nenhum tipo de acordo escuso seria feito. Nunca pensariam em

enganar seu querido pai. Mas aqui estava ela, uma mulher, e sendo tratada com tão pouco respeito.

A raiva fervia em seu sangue e, mesmo quando ela trotou já em terras da Fazenda Tuttle, seu humor não havia amenizado. Ela viu o homem que procurava laçando um cavalo no pátio e foi com sua montaria até a cerca, esperando que ele a notasse. O olhar amargo no rosto dele denunciava que ele sabia a razão para ela estar lá.

— Como você pôde, Sr. Tuttle? Você tem um acordo fechado com meu pai, um que ainda está de pé comigo. — ela demandou, ignorando quaisquer gentilezas.

O cavalheiro mais velho gritou para um cavalariço que estava por perto pegar a corda e o chicote e caminhou até a cerca. Ele parecia ter envelhecido nos últimos meses desde que ela o vira.

Enquanto ela olhava para o cabelo cinzento e recuado dele, um pouco de sua explosão se dissipou.

— Eu não tive escolha, senhorita Ava. De fato, se você não comprar seu potro de mim, o comprará em um leilão.

Ela fez uma careta.

— O que houve, senhor Tuttle? Aconteceu alguma coisa para forçá-lo a vender Titan e Beatrice?

Ele suspirou, os ombros caindo com as palavras.

— Sim, minha querida. Não me importo de contar já que nossas famílias se conhecem há muitos anos, mas fiz um mau investimento no ano passado e, bem, ele vai me custar a fazenda. Estamos nos preparando para ir para Bath, onde minha esposa, Rose, tem família. Vender Titan me permitiu ao menos pagar a dívida mais urgente. Com a venda da casa, da terra, e dos cavalos, é claro, podemos ter um pouco de sobra para nos manter por alguns anos em condições razoavelmente confortáveis. — ele encontrou o olhar

dela, seus olhos vidrados de lágrimas não derramadas. — Me perdoe, Ava. Eu sei o quanto você queria potros do Titan.

Esquecendo-se do cavalo, ela disse:

— Posso ajudar em algo? Existe algo que eu possa fazer para aliviar a dívida e permitir que você fique? Esses estábulos estão na sua família há três gerações. Eu odiaria vê-los perder tudo.

— Bem. — disse ele, olhando para a propriedade, o amor que ele nutria pela terra estava evidente em seus globos cinzentos. —

Quando alguém comete um erro, deve se responsabilizar por ele.

Só lamento que minha esposa e meus filhos percam tudo o que trabalhamos tanto para construir. E agradeço, Srta. Ava, mas não posso aceitar sua oferta generosa. Não seria certo.

Ela assentiu, querendo pressionar, mas o Sr. Tuttle sempre foi um homem orgulhoso. Forçá-lo a algo nunca havia funcionado antes, e ela não via como mudá-lo agora. E ela não queria que se afastassem com uma discussão desse porte, mesmo que quisesse muito ajudá-lo.

— Muito bem, mas me avise caso se depare com algo que eu possa ajudar. Ou, se houver algo que você não queira vender a ninguém, talvez eu possa comprar. Pelo menos você saberá quem o possui e que será amado.

— Você é uma boa garota. E saiba que eu nunca teria desonrado nosso acordo se pudesse evitar. É que, de fato, não havia outro remédio.

Ava ajustou-se sobre a cela, observando o cavalo que estava sendo treinado parecia mais interessado na conversa deles que no treinamento.

— Posso perguntar a quem você vendeu Titan? Talvez eu possa negociar com essa pessoa. — ele olhou para os pés, mexendo-os

um pouco. — Senhor Tuttle. — ela se repetiu ante a ausência de resposta dele.

— Quanto a isso, minha querida. Bem, quer dizer...

O que havia de errado com o homem?

— Sr. Tuttle, me conte.

Decerto que não é segredo de estado.

Ele voltou a olhá-la nos olhos e, por um instante, ela se perguntou se ele havia jurado segredo. Com certeza que não.

— O duque de Whitstone comprou Titan, senhorita Ava. Soube pelo seu pai que sua família possui algumas desavenças com eles e, me desculpe, mas para conseguir procriar com Titan, a senhorita precisará ir falar com Sua Graça.

As mãos dela tremeram com a menção daquele nome, e ela apertou as rédeas com força, raiva fervendo em suas veias por ter ouvido o nome do sujeito. Mesmo depois de todos esses anos.

— Por que vendeu para ele? Eu poderia ter ofertado o preço que você queria.

Ele balançou a cabeça, mexendo os pés como uma criança travessa mais uma vez.

— Ele veio aqui ontem e ofereceu para pagar em dinheiro. Como estou com agiotas no meu encalço há semanas, aceitei sem pensar.

Me perdoe, Ava. Mas eu tive que pensar na minha família.

Maldição.

— Eu entendo. — disse ela, incapaz de esconder a decepção em seu tom.

O duque de Whitstone poderia ser um cavalheiro persuasivo, disso ela sabia bem. As histórias que ouvira sobre Tate em Londres não se pareciam com o garoto que ela amara. Na verdade, ele agora parecia um homem que só procurava prazer e se importava com pouco. No ano em que ela voltara à Inglaterra, ele não a

procurara uma única vez para pedir desculpas pela forma que a tratara outrora.

Ava virou o cavalo, preparando-se para sair.

— Nos visite antes de partir de vez, Sr. Tuttle. Traga sua família e teremos uma tarde de chá e bolos. Estou decepcionada pelo cavalo, mas estou mais triste por você ter sido colocado nessa situação. Eu gostaria que não fosse assim.

Ele inclinou o chapéu, curvando-se um pouco.

— Você é muito generosa, Srta. Ava, e iremos até vocês nos despedir.

— Que bom.

Ava acenou e iniciou a volta para casa.

Ela chutou sua montaria a galope e xingou. Maldito fosse o duque e sua mania de se intrometer. Se ao menos ela tivesse ouvido dos problemas enfrentados pelo Sr. Tuttle antes, ela poderia tê-lo ajudado comprando o cavalo antes que o duque aparecesse.

Na sua opinião, o duque não era digno de um cavalo de tão alto padrão.

Ela não podia nem conceber ter que encará-lo para tratar de tal assunto. O fato de ele não a ter procurado era uma bênção, pois ela com certeza não estava disposta a ficar de frente a ele e seu coração feio e mentiroso.

Porém, de nada adiantava manter-se afastada se ela quisesse acesso a Titan para continuar com seu programa de reprodução.

Era um dilema que ela não havia imaginado que iria ter que enfrentar.

Mas o garanhão era fundamental para dar continuidade a suas linhagens, à possibilidade de gerar mais vencedores no futuro e, assim, dar a oportunidade de sua propriedade prosperar e nunca precisar ter de passar pelo mesmo destino que o Sr. Tuttle estava

vivendo agora. Desistir de seu sonho de se tornar o melhor e mais estimado Haras da Inglaterra não daria certo.

Ela já havia desistido de coisas que queria, como um casamento e família com o homem que acreditava amá-la, mas não pensaria em desistir desta parte de sua vida. O duque não tiraria isso dela também. Mandaria seu administrador, Greg, para a propriedade ducal e o faria negociar, se possível.

E com um pouco de sorte, o programa de reprodução poderia ser realizado sem que Sua Graça ou ela tivessem que pisar no mesmo recinto. Como ela pretendia.

TATE WELLS, o duque de Whitstone, recostou-se na cadeira revestida em couro atrás de sua mesa e estalou os dedos enquanto ouvia o administrador do Haras Knight traçar os termos sugeridos para permitir que a senhorita Ava Knight tivesse acesso ao seu premiado corredor, Titan.

Não que ele fosse contar ao velho, que era tão leal a Ava como foi ao pai dela antes de ele falecer, que o inferno teria que congelar antes que ele a deixasse chegar perto de sua propriedade ou de Titan. Fazia cinco anos que ele não a via, nem pensava nela, e não iria começar a fazê-lo agora.

Ele se mexeu na cadeira, sua mente zombando dele pela mentira que era tal pensamento. Inferno, ele pensava nela com frequência. Esperava que ela estivesse bem e feliz. Mesmo quando ele ia à estalagem local para tomar uma caneca de cerveja, seus ouvidos sempre se mostravam atentos à qualquer menção ao Haras Knight e à dona que administrava um Centro de Criação de Cavalos de Corrida bem-sucedido.

Mesmo assim, ele nunca a perdoaria por tê-lo afastado.

O fato de ele estar na América o impediu de dizer adeus ao pai.

Quando as notícias da doença de seu pai, dois anos atrás, enfim chegaram aos Estados Unidos, sua partida para a Inglaterra já não seria em tempo. Ele chegara a Berkshire duas semanas após seu pai ter sido posto no mausoléu da família. Outra mágoa que ele poderia colocar nas costas de Ava. Ou Srta. Knight, cuja alma era negra como uma noite sem lua.

— ...portanto, Sua Graça, seria vantajoso que Titan recebesse nossa égua, Black Lace. A senhorita Knight está disposta a pagar uma quantia generosa pelo serviço, e eu, em conjunto com seu próprio administrador podemos organizar todos os detalhes relativos aos animais para que você e a senhorita Knight não precisem ser incomodados.

Tate encontrou o olhar cinza do senhor mais velho, seus olhos um pouco lacrimejantes com a idade. Então, Ava não queria vê-lo?

Bem, havia pelo menos uma parte do acordo em que eles poderiam concordar.

Uma pequena parte de seu coração doía com a noção de que ela não queria nada com ele. O rompimento do relacionamento deles, a saída repentina da Inglaterra fora tão incomum para a garota que ele conhecera uma vez. Em certa época eles foram inseparáveis, cada hora e cada minuto do dia era gasto na companhia um do outro.

Tate afastou o pensamento inútil.

— Não estou interessado em procriar Titan no momento.

Queremos que ele corra em Ascot no próximo ano, o que não preciso lembrar que falta menos de oito meses. Não preciso que o cavalo se desgaste mais do que o necessário.

— Peço perdão, Sua Graça, mas cavalos correm e se desgastam diariamente. Receber uma égua não será mais vigoroso que treinar.

O que era verdade, não que Tate fosse acatar tais regras.

E ele gostava da ideia de Ava não conseguir o que queria. Ela arrancou as esperanças dele de um futuro. Casar-se com a mulher que ele amava, respeitava e adorava, e não com alguém apenas porque era considerada adequada para ser uma duquesa.

— É demais para o meu cavalo e não vou permitir. Diga à Srta.

Knight que procure outro garanhão, em outro lugar para o seu programa de criação.

O senhor mais velho torceu o chapéu nas mãos.

Se esse acordo era tão importante para Ava, por que ela não veio ela mesma pedir? Ele se esforçava para não a encontrar aqui em Berkshire e, até agora, fora bem-sucedido em seu plano.

Ele sabia que ela estava de volta da França há um ano, em condições normais seria quase improvável que eles não tivessem se encontrado até agora, em eventos de corrida e coisas do gênero.

Tate pensou por um momento e se perguntou se ela também o estava evitando tanto quanto ele a evitava.

Ele se levantou.

— Lamento tê-lo feito perder seu tempo, Sr. Brown, mas minha decisão acerca do assunto é final. Informe a Srta. Knight, por favor.

— ele estendeu a mão. — Bom dia para você, senhor. — disse ele, terminando a conversa.

O Sr. Brown se levantou com os ombros caídos. Tate sentia pena do homem. Ele agora teria que voltar e encarar Ava. Com certeza uma tarefa que Tate não gostaria de ter.

Ao menos na época em que se conheciam, tantos anos atrás, ela sempre fora determinada e dona de si. Dois traços que ele uma

vez adorou. Eles se tornaram amigos antes que ele se caísse de amores por ela. Ela nunca se retirara de uma conversa que considerava o julgamento dele incorreto, sendo bem incisiva ao fazê-lo ver a razão por trás do argumento dela. Sua determinação, seus ferozes olhos castanhos acendiam como fogo quando ela falava em tornar os cavalos dos Knight os mais conhecidos na Inglaterra, com Tate ao seu lado. Ava sempre esperava o melhor das pessoas. Que pena que ela não foi capaz de viver de acordo com seu próprio padrão.

O Sr. Brown apertou sua mão.

— Obrigado pelo seu tempo, Sua graça. Tenha um bom dia.

Tate observou-o sair.

Ele se recostou na cadeira, esticando-se, pensando em quem a Srta. Knight seria nos dias de hoje. Porque ela não havia vindo pedir, ela mesma, que Titan procriasse com a égua dela. Dava indícios de que toda a história entre os dois não significou nada para ela. Que eles eram, de fato, dois estranhos. Não que tal realização surpreendesse Tate. O dia em que ela enviou uma carta dizendo que não se casaria com ele havia sido o suficiente para atestar o que a Srta. Knight pensava dele. De quanto ela mentiu e fazia pouco caso dos ideais infantis dele.

Tate passou a mão na mandíbula.

Mesmo com tudo o que havia passado entre eles, todas as dores, ele não pôde deixar de se perguntar se ela ainda teria a mesma aparência. Ainda teria os cabelos compridos e de uma cor tão rica quanto chocolate? Os olhos castanhos e grandes? As maçãs do rosto ainda eram pronunciadas, ou haviam se tornado mais cheias com a idade?

O relógio bateu as horas e, pegando a pena, ele puxou a papelada de uma das propriedades diante dele e começou a

verificar os livros de contabilidade dos estábulos e das fazendas dos inquilinos. O que importava o quanto ela havia mudado? Ele também mudara, seguiu em frente.

Nos últimos dois anos como duque, ele foi negligente em cuidar de suas propriedades, mas não mais. Estava na hora de garantir que as pessoas que sobreviviam de suas terras fossem bem cuidadas. Que seu Haras aqui em Berkshire crescesse e prosperasse como ele sempre quis.

Tornar o seu estabelecimento melhor do que o dos Knight, há cinco quilômetros daqui, era uma motivação bem boa para estar aqui, em vez da cidade. E com Titan em seus estábulos, ele já possuía vantagem em avançar seus planos. Tate afastou Ava de sua mente, assim como ela o descartara sem olhar para trás.

Ninguém tão desleal e egocêntrica merecia um minuto do seu tempo. Nunca mais.

CAPÍTULO 2

A VA INCITOU o cavalo a galope, a linha do telhado de Cleremore Hall, nomeada quando a família havia acabado de receber o marquesado, emergiu das árvores. Em apenas alguns momentos, ela reveria Tate. Estaria uma vez mais nos reverenciados corredores da casa do Duque de Whitstone. Fazia anos desde que ela chegara tão perto da propriedade dele, e ela sentiu nervosismo se instalando ante a ideia de vê-lo outra vez.

Será que ele mudou tanto quanto ela?

Cinco anos era um longo tempo, e ele esteve nos Estados Unidos por três deles. Ela supunha que tal viagem poderia mudar muito alguém, torná-lo mais mundano, ou até sábio. Ao longo dos anos, ela ouvira, às escondidas, as fofocas ociosas em torno dessa grande família, queria saber se Tate havia se casado ou se estava noivo. Nada disso havia sido mencionado, mas, ao retornar à Inglaterra, as peripécias dele em Londres nunca deixavam de ser assunto para as pessoas. Pelo menos não para as deste condado.

O homem era um verdadeiro patife em todos os sentidos e, de alguma forma, saber que ele estava sempre cercado de tantas amantes, que levava outras mulheres para a cama com tanta regularidade, fazia com que a ferida em seu traição continuasse escancarada como um abismo.

Também não condizia com quem ela acreditara que ele era. Tate em verdade nunca se comportara de tal modo quando eles se encontravam, embora eles fossem bem novos à época, apenas dezenove anos. Sua Graça também se recusou a se casar com ela.

Mas daí, ela supunha que, caso ele estivesse atraído de verdade

por ela e a amasse, ele teria a levado para a cama. Mas ele não o fizera.

Ela guiou Manny para uma pequena inclinação, não muito longe dos estábulos ducais, e dali pôde ver Titan comendo grama em um piquete adjacente. Clicando a língua, ela incitou a montaria na direção dos estábulos, queria falar com o treinador. Ver se ele poderia negociar com o duque, um homem que parecia ter se tornado um imbecil teimoso sem razão.

Ela amarrou a montaria a uma grade próxima, deixou às rédeas com sobra o suficiente para que o cavalo mordiscasse a grama. Os estábulos dele eram tão grandes quanto os dela, contudo, a madeira parecia precisar de tinta fresca. Pelo menos as dela estavam em melhores condições, muito melhores que as de um duque.

Entrando nos estábulos, ela parou no espaço escuro e aguardou que os olhos se ajustassem. Alguns homens cuidavam de seus afazeres, alguns garotos tiravam palha velha das baias, e dois rapazes mais jovens passavam óleo nos estribos das selas de couro.

— Sem aveia hoje, ele está engordando. — disse uma voz familiar, e ela ofegou ao ouvir Tate depois de todos esses anos. A ideia de fugir correndo passou por sua cabeça um segundo antes de ela erguer o queixo e enfrentar o reencontro inevitável, fadada a acontecer desde que ambos voltaram à Inglaterra.

Ele saiu de uma baia, e ela aproveitou a oportunidade para apreciar sua forma e seus traços pelo tempo em que ele estivesse alheio à sua presença.

A juventude que ela amara não existia mais. Seus cabelos castanhos e macios pareciam beijados pelo sol, mais compridos acima que nas laterais, e ele havia empurrado os fios para trás, o que o fazia ter uma aparência bagunçada. O nariz reto e o queixo

esculpido estavam perfeitos como sempre e, mesmo agora, ela se lembrava de como eram sob o toque. Os lábios de Tate se abriram em um meio sorriso depois de conversar com seus funcionários, e ela ficou maravilhada com o fato de que um homem conseguira ter sido tão abençoado com boa aparência.

Ele, com certeza, era uns bons dez centímetros mais alto que ela, e os braços antes finos de marquês, eram musculosos e fortes no atual duque de Whitstone. As coxas dele, envoltas em calções bege, eram formadas por músculos proeminentes, e ela se sentiu corar, e mordeu o interior da bochecha. Mesmo depois de tudo o que ela vivera, seu corpo a traíra ao desejar mais uma carícia, um olhar, um beijo... Que plebeia tola ela era.

Ele se virou e se assustou quando a viu. Um vislumbre de prazer cruzou as feições dele antes que ele piscasse e sua reação se tornasse aborrecimento.

— Srta. Knight, eu não mudarei de ideia. Está desperdiçando meu tempo tanto quanto o seu.

Ela suspirou, erguendo o queixo.

— Eu e o Sr. Tuttle firmamos um acordo antes que o senhor o forçasse a vender Titan para você. Mereço que esse acordo seja mantido.

Ele se virou, dando-lhe as costas.

Se ele pretendia desprezá-la, ele se enganava. Em vez de irritá-

la, o corpo dela mostrou ter suas próprias intenções e seu olhar baixou direto para o bumbum dele. Mordendo o lábio, ela lutou para não sorrir com o quão perfeito ele ainda era na parte de trás.

— Aliás, Srta. Knight, você deveria estar vestida desta maneira?

Você parece um homem.

Ela ergueu uma sobrancelha, ainda encarando suas características traseiras já que ele olhava para o outro lado.

— Como se sua opinião fosse relevante, Sua Graça. Não vim aqui para discutir nossas roupas, mas cavalos. O que é preciso para você permitir que Titan receba minha égua, Black Lace? Estou disposta a pagar se o que precisa é dinheiro. Lembro-me bem do quanto sua família adora dinheiro.

Ele se virou, e ela estreitou os olhos.

Ótimo.

Ela o queria irritado. Irritado como ela estava. Porque era a falta de conexões e de títulos ancestrais na corrente sanguínea dela que a tornara tão inelegível para ele. Ele partiu para a América, a abandonou sem ter o caráter de falar pessoalmente que havia cometido um erro, que ele não a amava mais e não queria que eles se casassem.

Ela teria se magoado, com certeza. Mas essa dor teria sarado, por ele ter agido de forma honesta, como um cavalheiro. O homem à sua frente era um covarde que fugiu em vez de enfrentar suas responsabilidades. Ele a deixou sozinha e vulnerável. As amigas que fez na escola a salvaram, mas ao voltar para a Inglaterra não lhe restava ninguém. Com o pai morto, ela estava sozinha e sem proteção, e havia pagado por esse lapso da pior maneira possível.

Ela nunca o perdoaria.

— Você não teria fundos suficientes, mesmo que eu quisesse seu dinheiro.

As palavras dele a irritaram ainda mais, ela caminhou até ficar há poucos metros dele.

— Eu tenho riqueza o bastante, duque. E tenho certeza de que se seu pai ainda estivesse vivo, eu já poderia ter comprado Titan umas dez vezes. Então me diga, como um fruto nunca cai longe da árvore, qual é o seu preço? O que é preciso para eu ter Titan?

Ele então passou a observá-la, e ela sentiu os nós no estômago se apertarem ainda mais sob o escrutínio dele. O que passava pela cabeça dele? Concluiria que ela havia mudado muito desde que a vira pela última vez? De perto, Ava conseguiu ver a leve sombra da barba crescendo em sua mandíbula. As roupas dele, em vez de calças de camurça e casacos superfinos cortados à perfeição para se adequar à sua forma, eram calças bege, botas até o joelho, camisa e casaco marrom. Nada de gravata ou lenço, ou camisa engomada, ou botas polidas e brilhantes.

Ava olhou para seu peito, para o ponto de onde a gravata havia se soltado da camisa e um lembrete de pelos no peito era visível.

Seus dedos coçaram de vontade de senti-los outra vez. Uma vez, quando estavam sozinhos, eles se beijaram com tanta paixão que ela o tocou, e ele também a tocou.

A lembrança disso a fez ficar desejosa, e ela rangeu os dentes, odiando que seu corpo se ludibriasse com o inimigo diante dela.

— Ele não está à venda. — disse ele, olhando-a com firmeza, as palavras ásperas para não deixar espaço para argumentação.

Ela estreitou os olhos.

— Vejo que ainda é teimoso, Sua Graça. — ela se virou e foi para a porta, o clique das botas dele soando depressa detrás dela.

— Os Estados Unidos não o livraram desse traço. — ela o provocou.

Ele a agarrou pelo braço e a girou para encará-lo.

Ela ofegou e bateu na mão dele, o toque a havia deixado ansiando por mais. Fazia cinco anos que ela não reagia a um toque como reagiu à Tate, e a fome nos olhos dele dizia que ele sabia muito bem o que a presença dele fazia com ela.

— O que você sabe de mim ou de como eu sou? Não me insulte, senhorita Knight, só porque você não conseguiu o que queria. Eu

também posso afirmar que a escola não a livrou de sua própria teimosia. Era de se esperar que uma escola francesa de etiqueta a deixaria mais doce.

Ava manteve as mãos firmes ao lado do corpo.

— Ó, não se preocupe, Sua Graça. Minha educação foi primorosa. O mais importante de tudo, aprendi de que tipo de cavalheiro me afastar, libertinos vis como você.

Na verdade, essa parte ela não havia aprendido muito bem, e ela se forçou a afastar o pensamento ruim, não queria reviver o horror que nada tinha de ver com o homem que com quem ela estava discutindo.

Ava caminhou até o cavalo e subiu.

— O que pretendo fazer agora.

— Libertino? — ele disse, os olhos arregalados, ele agarrou as rédeas do cavalo dela e a interrompeu. — Você sabe tão bem quanto qualquer um que eu nunca fui lascivo.

Ela ergueu a sobrancelha com ironia.

— Mesmo? Então, todas as fofocas londrinas que citam seu nome são equivocadas? Você não é um canalha? Um homem que teve, e tem, tantas amantes que não sabe dizer quantas são? Um homem que prefere vadiar a cuidar de suas muitas propriedades?

Diga-me, Duque, as mulheres de Nova York não o satisfizeram o suficiente de modo que você se viu obrigado a retornar e espalhar sua semente vil por aqui? Quão diferente você é do jovem que conhecia.

Ava fechou a boca com um estalo.

Como uma conversa sobre Titan rumou para uma briga feia entre eles? Era tudo pessoal e revelador demais. Ela não queria que ele soubesse que ele a magoara tanto no passado. Que partira seu coração.

— Perdão, Srta. Knight, mas não vejo por que deveria se importar. Não me insulte, sabemos que a senhorita também não é nenhum anjo.

— O quê? — ela disse horrorizada. — O que quer dizer com isso?

Ele a encarou.

— E agora tenta me fazer de bobo. Bom dia para você, senhora.

— ele deu um passo para trás, deixando-a ir embora.

Com um último olhar para ele, ela incitou a montaria e partiu a galope. A volta para casa foi como um borrão. Ela conseguia ouvir o som alto de seu coração bombeando o sangue enquanto remoía a perplexidade de que uma conversa acerca de um cavalo havia se tornado uma briga em torno do relacionamento deles e do noivado desfeito.

Sem mencionar a falta de educação dela ao mencionar o fato de ele ter dormido com metade de Londres. Os rumores de que suas propriedades careciam de atenção eram verdadeiros agora que ela vira com seus próprios olhos.

Ela se encolheu.

De onde saíra isso?

Ava respirou fundo para se acalmar e cutucou o cavalo para manter o galope. Ela não permitiria que o rancor dele a afetasse. Ele não valia a pena e, no entanto, a mágoa que estava gravada no rosto dele quando ela partiu foi o bastante para abrir uma ferida de que ela considerava estar há muito recuperada.

TATE PASSOU a mão no queixo enquanto observava o belo delineado de Ava fugir da entrada de seu estábulo. Que mulher

andava por Berkshire em calças masculinas? Ao que parece Ava era dessas e não tomava conhecimento de quem a via daquele jeito ou do que pensavam dela.

No momento em que ela entrou no estábulo, o coração dele pulou no peito ao revê-la. Ele precisou se restringir para não a tomar nos braços e dizer o quanto havia sentido saudades. Dentro de uma fração de segundo, a lembrança de por que eles não se casaram o alertou que ele precisaria ter cuidado com a mulher diante dele. Ela deu um basta no amor deles por uma chance de viajar para o exterior e estudar. De fugir de ser duquesa, porque tal posição era detestável, ou assim dizia a carta que ele recebera.

Mas, maldição, ela ainda era tão bonita quanto ele se lembrava que era. As longas madeixas escuras estavam amarradas em um nó frouxo na parte de trás da cabeça, e uma delicada fita vermelha era o único artigo que segurava os fios no lugar. Os olhos dela estavam mais ferozes do que nunca, ardendo de paixão ou de ódio quando se tratava dele, mas revê-la depois de tanto tempo saciou parte da necessidade dele depois de tantos anos.

Ele franziu a testa quando a perdeu de vista, queria que ela voltasse e lhe desse outro pito, mesmo que só para ver aquele pequeno nariz perfeito se erguer no ar.

— Era a Srta. Ava Knight? — disse seu amigo mais próximo, Lorde Arthur Duncannon, olhando para a entrada, na direção em que Ava havia desaparecido.

Ele era seu amigo a vida toda, e não perdia a chance de descobrir algo que poderia virar fofoca. Se parecia interessante e valesse um comentário, ele teria uma opinião.

— Sim. — disse Tate, voltando-se para a casa.

Ele não queria mais falar de Ava, tanto quanto não queria mencionar o fato de que seu coração não parecia capaz de

desacelerar no peito. Ou por que as palavras dela o cortaram como uma espada. Ela parecia zangada com ele, considerando que fora ela quem o rechaçou para costas estrangeiras.

Duncannon o alcançou.

— A mesma Ava que o abandonou? A mesma Ava Knight que administra o Haras ao lado?

Tate se virou para o amigo e esperava que Duncannon entendesse a dica de que uma conversa em que o assunto fosse Ava não seria possível.

— Diga-me, Sua Graça. Ou terei que descobrir de outra maneira.

— Você não vai. — disse ele em um tom que não deixava espaço para argumento. — Tudo o que precisa saber é que somos vizinhos e que, com certeza, não somos amigos. O passado não é mais que uma paixão tola de infância, e que está mais que enterrada da minha parte. E pela minha conversa com Ava agora, para ela também está.

Duncannon lançou um olhar incrédulo ao amigo, como se zombasse das palavras dele.

Tate se exaltou:

— O que foi agora, homem? O que essa sua mente minúscula está tramando agora?

O amigo sorriu.

— Pelo que pude observar de vocês, eu sugeriria que os sentimentos ainda existem por ambas as partes. Na verdade, me sinto confiante o bastante para dizer que, na verdade, vocês ainda se importam bastante um com o outro, e mais do que estão dispostos a admitir.

Tate manteve as mãos firmes na lateral do corpo.

— Eu não me importo com a senhorita Knight, e você precisa guardar suas opiniões para si a não ser que queira voltar correndo

para Londres, para morar com sua avó.

Duncannon levantou as mãos em derrota.

— Muito bem, não direi outra palavra. Mas me diga, o que ela queria discutir? Ela não parecia muito feliz ao ir embora.

Infeliz era um eufemismo para o que Ava estava sentindo. Ela estava com o demônio no corpo se ele a conhecia bem. Por vez, não havia outra pessoa no mundo que a conhecesse tão bem quanto ele.

No passado, depois de um desentendimento como esse que acabaram de ter, Ava teria voltado em alta velocidade para casa, remoendo cada palavra da briga. E, com bastante certeza, estaria amaldiçoando o nome dele e cuspindo fogo. Era natural que ele supusesse que ela estaria reagindo da mesma forma hoje. Ele meio que sorriu ao perceber isso.

— Algo bobo, sério. Ela havia feito um acordo com o Sr. Tuttle, que Titan receberia a égua dela, Black Lace. Quando comprei Titan, o acordo se tornou nulo. Ela pediu para manter o acordo, e eu recusei.

— Por quê? — Duncannon perguntou. — Não era parte dos seus planos? Que Titan procriasse além de correr? Por que não o fazer em conjunto de um dos melhores Haras da Inglaterra? Ela é proprietária do Haras Knight, não é?

Tate se virou para a casa mais uma vez.

— Sim. Ela herdou o local após a morte do pai, doze meses atrás.

— Então, qual é o problema?

O problema era que ele era um desgraçado teimoso que não queria dar a ela o que ela desejava. Nem mesmo quando ela foi tão educada no início. Revê-la excarcerou todos as mágoas pela rejeição dela. Por ela querer algo diferente, querer os livros em vez

o do amor dele. Que tipo de mulher recusava um futuro duque? Que mulher dava às costas para o amor que ele acreditava que eles sentiam um pelo outro? Que tipo de mulher poderia ser tão insensível com palavras de sentimentos e assuntos do coração?

Uma mulher que colocava sua própria ambição antes de qualquer outra coisa. E Tate faria o mesmo. Com Titan em seus estábulos, o garanhão era o primeiro passo na direção de se tornar uma verdadeira concorrência aos Knight, e iniciar seu próprio programa de reprodução e gerar futuros vencedores. Ele não daria a ela a oportunidade de vencê-lo outra vez, nem nos negócios, nem a nível pessoal.

— Eu mudei de ideia. — disse ele, dando de ombros.

— Mudou de ideia? Mesmo? A mim parece que você está tomando essa decisão com base no que aconteceu entre os dois anos atrás. Talvez você devesse aceitar a oferta, mas com a condição de que caso a égua desse a luz à um potro vencedor, você receberia metade dos lucros gerados em sua vida de corredor.

Tate virou-se para encará-lo.

— Ela nunca concordaria com tais termos. A oferta era para pagar para Titan receber a égua, ela não aceitaria a divisão de lucros.

— O haras produziu cinquenta vencedores nos últimos dez anos.

Você pode abocanhar uma fatia dos lucros. Se ela deseja que Titan seja usado no programa dela, ela precisa concordar. — Duncannon disse, as engrenagens da mente de negócios dele girando por um instante.

Duncannon era um homem astuto, e parte do que ele dizia fazia sentido. Sem dúvida ajudaria suas finanças ter uma égua que

gerasse um vencedor. E ter um cavalo junto ao Haras Knight decerto que o ajudaria a elevar o nome dele junto à comunidade do Turfe.

Ele refletiu a ideia por um momento.

Ava não ficaria satisfeita com esse desdobramento, e Tate sorriu ante a chance de irritá-la ainda mais. Mesmo que só para ver os olhos dela o fulminarem.

— Vou pensar no assunto. — ele disse antes de entrar na casa.

Pensaria em todas as maneiras de contar à Ava seus termos e observar aquela pequena diaba tornar-se ainda mais insatisfeita.

Tate afastou a ideia de que faria a contraoferta apenas para passar mais algum tempo perto dela.

Ela não merecia a atenção dele e, no entanto, ao entrar na biblioteca, de algum modo, seus passos mostraram-se mais leves do que antes.

Ele não conseguia adivinhar o motivo...

CAPÍTULO 3

Ao olhar para a paisagem francesa, muito parecida e diferente de onde crescemos, me pergunto se voltaremos a nos ver...

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

U MA SEMANA DEPOIS, Ava estava deitada na cama e olhava para o livro não lido no colo, pensando em um certo duque que havia sigo jogado na vida dela outra vez.

Apenas cinco quilômetros era o que os separava, e ainda assim não era longe o suficiente. Se ao menos um oceano os mantivesse separados, ela ficaria muito satisfeita. Após a conversa desastrosa na semana anterior, ela não vira nem ouvira falar dele. Não que ela ansiasse por notícias, mas houve um tempo em que ela não passava um dia sem estar perto dele. Se apenas para lhe dizer o quanto ela sentia falta dele e, talvez, uma fuga furtiva para trocar um beijo ou dois.

Gritos no quintal chamaram sua atenção e largando o livro na cama, ela correu para a janela. Ava olhou para os estábulos, que ela podia ver do quarto, mas não viu nada de errado. Os homens corriam em direção ao celeiro onde as carroças estavam guardadas e os ouviu gritando ordens para pegar sacos de juta e baldes, pavor a atravessou de que os estábulos localizados no lado oposto de sua casa pudessem estar em chamas.

Ava correu para o armário e, vestiu as roupas separadas para aquele dia, tropeçou entrando no quarto de vestir para procurar suas botas curtas quando viu um brilho laranja beijar o céu noturno. Um brilho vermelho e doentio vindo da direção da propriedade de Tate.

Ela parou por um momento, ainda atordoada com o que estava vendo. Seriam os estábulos ou a casa? Ava terminou de se vestir com pressa, calçando as botas sem meias. Desceu as escadas correndo, chamando os criados para segui-la e, em poucos minutos, aqueles que podiam cavalgar estavam em seu encalço, rumo à propriedade de Tate, os demais se dividiam entre carroças e carruagens de alta velocidade.

Quanto mais perto chegavam à propriedade ducal, mais intenso era o brilho no céu noturno e, ao espreitar a colina que ela havia percorrido apenas uma semana antes, seus piores medos tornaram-se realidade. Os estábulos estavam em chamas, e alguns homens lutavam contra o fogo, enquanto outros tentavam, como desesperados, arrancar a machadadas as paredes laterais da estrutura de madeira para libertar os cavalos.

Deixando os cavalos em um campo próximo, eles correram em direção ao fogo, o encarregado dos estábulos dela entregou um saco de juta para que ela ajudasse. O calor do fogo espreitou sua pele quando se aproximaram e, molhando a saca em uma calha próxima, ela começou a bater contra as chamas altas que lambiam a madeira de vários edifícios.

Os cavalos estavam correndo selvagens e assustados para a noite, e tudo o que ela podia esperar era que todos cavalos fossem poupados. Para ela, prédios poderiam queimar até virar pó, mas as vidas dos cavalos eram insubstituíveis.

Mais gritos soaram atrás dela. e ela girou naquela direção. Ela observou o segundo e maior estábulo pegando fogo, um monte de

palha dentro das portas duplas da frente fumegando, as chamas iluminando tudo. Ela fechou os olhos que já ardiam quando a fumaça soprou em seu rosto e os abriu de novo, ela não conseguiu identificar o homem que os notificou antes de correr em outra direção.

— O segundo estábulo. — ela gritou, correndo para lá.

De onde ela estava, Ava podia ver vários cavalos enfiando a cabeça sobre as portas das baias lá dentro, encarando o fogo, alguns outros corriam pelas baias, chutando as paredes.

Sem pensar, ela correu para dentro e se pôs a abrir as portas de cada baia o mais rápido que pudesse. Ela cobriu a boca com uma saca de juta, tropeçou e tateou ao longo das portas até encontrar a porta da segunda baia. Ela a destrancou também, o cavalo ali disparou e a empurrou para trás.

— Ava. — ela ouviu a voz familiar de Tate gritar, e ficando de joelhos, ela piscou enquanto seus olhos ardiam com a fumaça que enchia o espaço.

— Eu estou bem. Há mais cavalos aqui atrás. — disse ela, levantando-se e indo em direção aos sons aterrorizados dos animais.

Quando isso acabasse, ela diria ao duque que, para um estábulo ser seguro, tanto para animais quanto pessoas, os dois lados precisavam ter saídas. Um pensamento bobo naquele momento, mas que ainda assim cruzou sua mente. Ava soltou os dois últimos cavalos daquele lado e correu para o lado oposto, e no mesmo instante o duque a encontrou na última baia.

Ele forçou o trinco, mas não abria.

— Não abre. — ele gritou, tossindo. — Está trancado.

Ava se virou quando as chamas começaram a lamber as paredes das portas da baia oposta a eles. Olhando em volta, ela viu

um machado em uma parede próxima e, correndo até a ferramenta, a agarrou.

— Aqui! Tate, use isso.

Ele a encarou por um momento, como se uma segunda cabeça tivesse crescido no pescoço dela, até que um painel caiu detrás deles, e ele recobrasse os sentidos.

— Obrigado.

Ele bateu com o machado uma vez, duas vezes no trinco da porta e ela se soltou, permitindo que eles a abrissem e libertassem Titan. O garanhão disparou para fora e, quando estavam prestes a seguir o cavalo, a frente do estábulo caiu, prendendo-os dentro.

— Tate. — disse ela, apertando a camisa dele. — Existe uma janela ou porta neste lado?

Não que ela tivesse visto algo do gênero, mas enfim, os estábulos eram dele, talvez ela não tivesse visto em meio à fumaça e ao fogo.

— Não. — ele respondeu, puxando-a para uma baia próxima e fechando a porta.

Não que fosse capaz de manter o fogo longe, mas impediria que a palha em que estavam pisando pegasse fogo antes do necessário.

— Afaste-se, Ava. — disse ele, balançando o machado alto e o descendo na parede do estábulo.

A fumaça ficava cada vez mais espessa, e Ava foi para a parede, tentando respirar o ar que deslizava entre pequenas rachaduras nas tábuas de madeira. Do lado de fora, ela podia ouvir homens batendo na parede no mesmo local em que Tate a acertava. Ela tentou se concentrar na pequena quantidade de ar fresco que estava conseguindo inalar, mas o calor do fogo às suas costas fez o pânico assentar em seu estômago.

— Rápido, Tate. Não consigo respirar.

Um pedaço de madeira caiu na direção deles, depois mais pedaços, e com a intrusão dos homens que estavam do lado de fora, ar fresco também entrou. Infelizmente, esse ar apenas aumentou a ira do fogo detrás deles. As pernas dela se recusavam a se mover. Ela tentou rastejar para fora, mas seu corpo não cooperou.

— Ava. — disse Tate perto dela, antes de a erguer em seus braços familiares e reconfortantes.

Ela tossiu quando ele atravessou o buraco na parede, meio correndo e meio afastando-os do estábulo antes de cair no chão com ela nos braços.

Ela rolou no chão, tossindo e ofegando, e em algum momento alguém passou um copo de água para ela. Ava se virou e viu Tate deitado ao lado dela, ele também estava tentando recuperar o fôlego. Ela foi até ele e afastou os cabelos do rosto, esperando que ele encontrasse seus olhos.

— Você está bem? Se machucou em algum lugar?

Ele estendeu a mão, passando a mão pela bochecha dela. A ação trouxe lágrimas aos olhos dela por ele quase ter morrido.

Ambos quase morreram.

— Você parece um limpador de chaminés.

Ela riu apesar de si e da situação não ter nada de engraçado. —

Você está fazendo piadas, Sua Graça? Em um momento como esse... — ela disse, com a voz rouca, a respiração ofegante e com um chiado.

Ele lançou um sorriso travesso.

— Acredito que em momentos como este, é preciso um pouco de diversão.

Ele se forçou a sentar, e ela sentou ao lado dele. Eles ficaram em silêncio por um momento enquanto o estábulo ardia diante

deles, o primeiro estábulo que ela lutara para salvar agora não passava de uma pilha carbonizada de madeira fumegante.

O administrador do duque se aproximou deles, ajoelhando-se:

— Todos os cavalos e trabalhadores foram contabilizados, Sua Graça. Estão no cercado perto da casa. Estamos os alimentando para tentar acalmá-los.

O duque assentiu uma vez.

— Algum dos homens sabe como o incêndio começou? Não havia vento, não havia razão para o segundo estábulo ser consumido daquela forma.

Ava lembrou-se de ouvir gritos detrás dela quando tentava combater o fogo no primeiro estábulo, mas o rosto do homem era tão nebuloso quando sua visão neste momento.

— Pelo que vi, o fogo começou na palha que havia sido empilhada no centro do estábulo depois de limpar as baias. Ouvi gritos, como se alguém estivesse nos alertando sobre essa nova ameaça, mas não sei dizer quem era. Não pensa que foi proposital, pensa?

E se fosse esse o caso, onde estava o culpado?

Ela sentiu uma nova onda de pânico a atravessar.

Com todos os seus cavalariços aqui lutando contra as chamas na propriedade do duque, seus próprios cavalos estavam sozinhos, sem proteção. Ela se levantou, e o administrador de Tate a empurrou de volta, para se sentar.

— Seu encarregado e alguns cavalariços voltaram para a sua propriedade, senhorita Knight. Tenho certeza de que já teríamos notícias deles se algo estivesse errado.

Tate sentou-se ao lado dela, e ela o estudou por um momento, feliz por ver que ele parecia estar respirando com um pouco mais de facilidade.

— Teremos que abrigar os cavalos em algum lugar até que os estábulos sejam demolidos e reconstruídos. Eles não podem ficar nos campos.

O administrador dele encontrou o olhar dela e sem que ele precisasse verbalizar, ela sabia o que ele esperava dela.

— É claro que seus animais são bem-vindos em meus estábulos, Sua Graça. Há baias suficientes para eles. — ela ofereceu, nunca fora de se esquivar de ajudar quem precisava.

Mesmo que esse alguém fosse o duque, e que eles fossem quase o oposto de amigos. Mas os cavalos precisavam de um teto, e amando animais tanto quanto ela amava, não os deixaria no frio, mesmo que não estivesse tão gelado no momento.

— Tem certeza, Srta. Knight? São mais de vinte. — disse o administrador, olhando de volta para onde os cavalos estavam, e vendo o fogo queimar o que restava da construção que haviam acabado de sair.

Ava suspirou, observando os cavalos.

— É claro que todos eles são bem-vindos.

O duque estendeu a mão e colocou sobre a dela. Calor, semelhante ao calor que sentiu nas costas quando estava no estábulo em chamas, a preencheu, e com o toque veio uma saudade de que ele a tocasse assim mais vezes.

Ela olhou para onde ele havia deixado a mão e a vontade de colocar a dela por cima era quase demais para negar.

Ava encontrou o olhar dele.

— Obrigado. — disse ele, estudando-a.

Ela lançou um pequeno sorriso para ele e, ficando de pé, limpou as calças e a blusa o melhor que pôde com as mãos.

— Não creio que há muito mais que eu possa fazer por você aqui, então vou voltar para casa e informar o Sr. Brown que você

levará os cavalos para nosso estabelecimento pela manhã.

— Obrigado. — repetiu o duque, olhando para cima de onde estava sentado. — De verdade, Ava. Muito obrigado.

O administrador partiu para resolver outros assuntos.

Ava se virou para absorver a devastação do que havia acontecido esta noite. Homens ainda lutavam para domar o fogo, mesmo que ele tivesse destruído tudo em seu caminho. A fumaça permeava o ar, todos ao redor deles cobertos de cinzas e fuligem, algumas roupas chamuscadas pelas chamas.

— Não importa o que tenha acontecido entre nós, Sua Graça, nunca darei as costas a alguém que precisa de ajuda.

Ava se virou e voltou para onde ela havia deixado a montaria dela, esperando que o cavalo ainda estivesse lá depois de toda a comoção. Muitos cavalos, aqueles que não estavam sendo diretamente cuidados, corriam pela área, os rabos erguidos no ar, era claro que estavam assustados e inquietos.

As pobres almas eram sortudas de estarem vivas, e se o incêndio era criminoso, significaria que todos em Berkshire era possíveis vítimas e precisariam ficar atentos. Ela havia trabalhado muito, já havia perdido muito em sua vida para que tudo virasse cinzas por um maníaco. E ela nunca iria se deixar abater sem lutar.

CAPÍTULO 4

N O DIA SEGUINTE, Ava acordou cedo, mesmo com a noite que tivera. Alguns minutos depois do café-da-manhã, os cavalos da propriedade do duque começaram a chegar junto com seus cavalariços e treinadores que ficariam e ajudariam a cuidar de todos os cavalos, com alimentação e exercícios diários.

Felizmente, no Haras Knight, Ava contava com seu próprio circuito, a uma distância de cinco minutos, onde os cavalos poderiam dar uma volta ou correr um pouco.

Ela estava sentada na cerca de madeira que dava para o pátio em que sua égua reprodutora, Black Lace, estava sendo laçada. Ela era um cavalo bonito, com o pelo cor de ébano e patas felpudas brancas. Esperava-se que ela também gerasse lindos potros.

A égua era de uma bela linhagem, mas o animal em si não teve bons tempos nas poucas corridas em que participou, portanto, Ava esperava que a égua gerasse um potro que pudesse ter a chance de ser um bom corredor.

O pai e a mãe de Black Lace tiveram carreiras mistas antes que os dois se aposentassem, e Ava os colocasse em seu programa reprodutor. Eles conseguiram gerar um primeiro lugar, mas a maioria chegou a segundos e terceiros lugares em suas participações, nada extraordinário, mas nada terrível. Tal histórico não significava que os potros de Black Lace teriam o mesmo destino.

Se ela quisesse que seu Haras sobrevivesse, ela teria que experimentar, tentar expandir e testar as teorias de criação. Uma carta deixada por seu pai com seus últimos desejos pedira que ela mantivesse o negócio vivo, que prosseguisse com os planos para

tornar este um dos Centros mais prestigiados e admirados do país.

Essa promessa nem sempre foi fácil de ser cumprida, e houve momentos em que ela foi excluída das chamadas para corridas, ou seus cavalos foram ignorados como opções para procriação pelo simples fato de que ela era uma mulher, mas isso não a impediu. Só a deixou mais determinada a ter sucesso, e agora nada ficaria no caminho de tornar o Haras Knight uma força a ser reconhecida. Um nome a ser tão reconhecido como Tattersalls, ao menos no que se refere ao mercado de cavalos premiados.

Em um passado distante ela quis construir uma vida com Tate, deixar a vida aqui para trás, mas nunca quis deixar o mundo das corridas por completo. Tate e ela queriam ter seu próprio estabelecimento, tornarem-se confiáveis e procurados por eles mesmos. A morte de seu pai lhe ofereceu a chance de assumir esse papel, mesmo sendo uma mulher e solteira.

Ela não deixaria a Sociedade e suas opiniões e protocolos se colocassem em seu caminho; e não se casaria apenas para tornar sua posição no Haras mais aceitável, mais respeitável no mundo dominado por homens em que ela estava inserida.

Ava olhou para os estábulos e ficou feliz em ver que cavalariços e os tratadores pareciam tratar-se bem, mas mesmo a partir de onde estava ela percebia que estavam cansados e precisavam de uma boa noite de descanso ininterrupta por desastres.

— O duque está chegando, senhorita Knight, e traz Titan com ele. — disse o administrador de seus estábulos ao parar onde ela estava.

Protegendo os olhos com as mãos, Ava olhou para a colina que o duque estava descendo. Mesmo com todos os anos desde a última vez que o vira, sua estrutura muscular sobre um cavalo ainda era um espetáculo à parte, um ótimo de se assistir. Os anos haviam

feito um bem imenso a ele, transformaram o menino que ela conheceu em um homem. Um homem que ela concordava com relutância ainda ser tão bonito que era pecaminoso.

Ava pensou na noite anterior, neles deitados no chão depois de escapar do fogo, o deslizar da mão dele contra sua bochecha enquanto ele verificava se ela estava bem. O olhar que ele deu a ela havia congelado o tempo, suspendido todas as mágoas que ele causara, e tudo o que importava naquele momento para ela, era saber se ele estava bem, sem ferimentos.

Ela estendeu a mão e tocou a própria bochecha, incapaz de negar que o toque dele a fez ansiar por coisas há muito enterradas.

Ele fora tão cuidadoso, tão gentil e delicado que ela não foi capaz de esconder como ele sempre foi capaz de fazê-la sentir.

Viva...

Teria ele notado o desejo dela? Só podia esperar que, no caos da noite que passaram, não fosse esse o caso.

— Coloque Titan no estábulo oeste. As baias lá são maiores, adequadas ao porte dele. Ele ficará mais confortável lá.

— É para já, senhorita. — disse Greg, dirigindo-se ao duque que havia parado e estava conversando com o pessoal dela e dele perto de uma calha.

Ele olhou para ela e assentiu em reconhecimento, e Ava fez o mesmo antes de voltar a olhar para a égua, que continuava a ser treinada no laço.

Ela supôs que teria que ir falar com ele e discutir os arranjos para ele dormir lá enquanto seus cavalos estivessem na propriedade dela. Conhecendo tão bem o duque, ela não acreditava que ele voltaria para casa sozinho. Não que ela pudesse oferecer uma cama sob o teto dela, sendo solteira e não tendo companhia.

Mas havia uma cabana que ela havia reformado no ano anterior,

que ficava perto do riacho natural da propriedade e não ficava longe dos estábulos.

O duque poderia ficar lá e, sendo assim, estar perto o suficiente para ficar de olho em seus cavalos e na continuação do treinamento dos animais enquanto seus próprios estábulos eram reconstruídos.

— Banhe Black Lace após o treino e certifique-se de que ela receba uma boa massagem. Acho que ela merece ganhar aveia esta noite. — o tratador mergulhou o chapéu e pôs-se a trotar com Black Lace.

Ava pulou e foi em direção aos estábulos a oeste.

Estava na hora de discutirem como fariam dali para frente, agora que o duque estava ali. Quando ela enfim chegou aos estábulos, o duque e Titan haviam desaparecido construção adentro. Ela entrou e foi até a baia onde Titan havia sido instalado, deu um tapinha no garanhão quando ele se aproximou dela e cutucou sua mão.

— Ele gosta de você. — disse o duque, parando ao lado dela, com um maço de feno na mão. Ele passou o braço por cima da porta da baia e depositou o feno na calha de alimentação. Com comida à disposição, Titan a deixou e foi mordiscar o feno.

— Ele é um cavalo bonito e amoroso, pelo que parece. Mimado, talvez. — disse ela, sorrindo para o duque que sorriu de volta.

Ó, como ela sentiu falta daquele sorriso...

— Eu o mimo, e ele estava bem em casa, ao menos até o incêndio. Não sei ao certo que tipo de problemas podemos ter, daqui para frente, com os cavalos ainda assustados pela noite passada.

Algumas éguas podem abortar.

Ava assentiu, sabendo muito bem que os cavalos podiam ficar bem assustados após um evento tão traumático. Ela só podia esperar que não fosse o caso de nenhum dos cavalos do duque.

— Eles logo se acomodam e saberão que estão bastante seguros aqui, e eu instruí meus cavalariços e tratadores a se revezarem na observação dos estábulos e celeiros da propriedade.

— Mandei chamar um agente de Bow Street para investigar o incêndio. Não consigo evitar de pensar que foi proposital.

Ava recordou-se do homem que ouviu gritar, notificando-os do outro foco de incêndio. Seria ele, o homem que começou tal destruição e, se sim, por quê? Por que alguém desejaria ferir cavalos que estavam trancados em baias e indefesos contra tais ações?

— Você tem alguma ideia de quem pode querer ferir você e seus cavalos? Se envolveu em alguma discussão recente? — ela perguntou, encontrando seu olhar.

O duque lançou um olhar divertido para ela.

— Além de você, ninguém.

Ela deu uma risada ante a tentativa de piada e estendeu a mão para dar carinho a Titan.

— Bem, você sabe que eu nunca faria uma coisa dessas, então outra pessoa guarda ressentimento contra você, Sua Graça. Você precisa descobrir quem.

— Hm. — ele disse, virando-se contra a porta e cruzando os braços contra o peito.

Ela olhou para o cavalo, pois a ação apenas acentuava os músculos no peito de Tate. Ah, sim, ele havia mudado e, para ainda mais delicioso.

— Eu precisei demitir um rapaz que trabalhava nos estábulos porque havia tentado se engraçar com uma das criadas da casa, vinha assediando a moça e tentou obter liberdades indesejadas.

Suponho que poderia ser ele, mas não o vi, nem ouvi nada acerca

de ele ainda estar em Berkshire, trabalhando em outro lugar, então duvido que isso seja uma pista.

— Se eu fosse você diria ao investigador assim mesmo, deixe que ele julgue as pistas. Nesse ramo, podemos ser civilizados e agir como se a corrida fosse um esporte de cavalheiros, mas, na verdade, todos temos muitos inimigos, sendo o ciúme o principal.

Lorde Oakes passou pela mente de Ava ante a palavra ciúmes e, na mesma hora, descartou a noção de que ele poderia estar envolvido.

Ele não ousaria.

— Neste caso eu teria pensado que seus estábulos estariam em maior perigo que os meus. Seus cavalos ganharam mais prêmios nos últimos eventos. Eu temi, enquanto todos lutavam para apagar o fogo em Cleremore Hall, que o seu sustento pudesse estar em risco.

Era um medo que Ava também sentiu, mas felizmente seus estábulos e cavalos estavam bem quando ela e seus homens voltaram. Pensar em perder os animais que tanto amava, que haviam sido sua companhia e salvação durante o enfrentamento de tantos problemas em sua vida, a enchia de pavor.

Se o que o duque dizia era verdade, precisavam encontrar o culpado e trancafiá-lo em uma cela onde não poderia machucar homem ou animal nenhum.

— Quando vi o brilho do fogo em sua propriedade, nem pensei em deixar alguém aqui para vigiar meus cavalos. Um erro tolo que não voltarei a cometer. Estamos muito agradecidos por ninguém daqui ter sido colocado em perigo. E estamos felizes que seus cavalos também estejam aqui. A estada me dará tempo de convencê-lo a permitir que Titan procrie com Black Lace.

À menção de seu nome, o garanhão levantou a cabeça e olhou na direção deles.

Ava riu, estendendo a mão para dar um tapinha no nariz aveludado e macio do cavalo.

— Que travesso você é. — ela murmurou para o cavalo, olhando de esguelha para o duque que estava parado ali ainda.

— Me esqueci disso. — ele a observou com atenção, e Ava lutou para não cruzar com o olhar dele.

Para não se arriscar a perder-se mais uma vez naquelas orbes cinzentas e escuras que eram como um mar tempestuoso e rodopiante.

— Esqueceu-se de quê, Sua Graça? — ela não deveria perguntar, mas quando se tratava do duque, era raro ela conseguir se conter.

Como uma mariposa atraída para a parte mais quente da chama, ela também era atraída a qualquer opinião que ele pudesse ter que envolvesse os dois. Que envolvesse o passado compartilhado, quando lutar um pelo outro era tudo o que era valoroso.

— Como você era com cavalos. O quanto você os ama.

— Eu os adoro. — ela suspirou, afastando-se da baia. — Mas não são a única coisa que amei.

— Ainda lê romances góticos e se esgueira no meio da noite para contar as estrelas? — ele perguntou sorrindo.

Ela sentiu-se esquentar, um calor reconfortante e familiar, de que o homem à sua frente a conhecia, melhor do que qualquer outra pessoa no mundo.

— É claro, embora eu não precise mais sair às escondidas, só preciso abrir a porta da frente.

— Verdade. — disse ele, olhando para o céu azul acima deles.

— Lembra-se das vezes que nos encontrávamos perto do lago em minha propriedade, na calada da noite. Você estava tão

determinado a desenhar a lua cheia que quase congelei até a morte esperando que você a desenhasse.

— Quero que você saiba que meu pai, mesmo que nunca tenha me questionado sobre como um esboço daquele veio parar nas minhas mãos, gostava muito do desenho. Ele até o enquadrou. Está pendurado na biblioteca.

Ava suspirou, pensando naquela noite. Foi a primeira vez que eles se beijaram, não como conhecidos, nem como amigos. Mas como amantes, como um casal que ansiava por mais do que mera familiaridade.

Encontrando o olhar do duque, o fogo que ela leu nos olhos dele dizia que ele se lembrava daquela noite tão bem quanto ela.

Ava limpou a garganta.

— Talvez devêssemos discutir o que fará agora que todos os seus cavalos estão aqui. Há um chalé que reformei há pouco, é separado da residência dos funcionários, mas ainda é perto o bastante para ver os pátios, os celeiros e os estábulos, se você quiser. Eu o convidaria para ficar na casa principal, mas bem, você sabe que não seria nada adequado.

Os olhos dele escureceram ante a menção da palavra adequado e o significado escondido nela.

— É aquele chalé antigo em que sua cozinheira, a Sra. Gill costumava morar?

— Sim, esse mesmo. Ela deixou de trabalhar conosco faz uns anos, e a nova cozinheira preferiu ficar na casa principal. — ela foi em direção às portas do estábulo. — Venha, vou levá-lo até lá agora e aí você decide se servirá.

Eles caminharam através dos quintais, atravessaram o prado que ficava nos fundos da casa dela, e logo chegaram ao pequeno

chalé que ficava em frente ao riacho. Ava se virou e gesticulou em direção à vista.

— Daqui é possível ver toda a extensão da propriedade com exceção da frente da casa principal.

Ele assimilou a informação e assentiu.

— Me servirá muito bem. — ele voltou-se para ela. — O que aconteceu com a Sra. Gill. Eu sempre gostei tanto dos...

— Biscoitos amanteigados? — Ava respondeu por ele. — Sim, eu me lembro. — ignorando a familiaridade entre eles, ela abriu a porta do chalé e entrou na casa de três cômodos. — A filha dela, que trabalhava para uma família em Kent, casou-se com um padeiro e a chamou para morar com eles. A Sra. Gill viveu com a filha por mais ou menos dois anos, mas adoeceu no outono passado e, por infortúnio, veio a falecer.

— Sinto muito por ouvir isso. Ela era uma mulher adorável, muito apreciada pela equipe, pelo que me lembro.

Ava sorriu, rememorando.

— Ela era adorável e faz muita falta. Creio que os doces feitos por aqui jamais tiveram o gosto tão bom quanto os dela.

O duque entrou e inspecionou a cozinha modesta, o quarto e o banheiro da suíte. Ava o analisou por um breve instante, havia se esquecido como se conheciam bem. Da quantidade de tempo que eles passaram na companhia um do outro ao longo dos anos.

O chalé estava em ótimo estado, o piso era de madeira, havia um grande tapete trançado embaixo da pequena mesa colocada perto do fogo. No quarto havia uma grande cama sem estar arrumada, o cômodo contava com uma pequena janela que estava ornada com cortinas de veludo azul. O banheiro era composto de um jarro e uma tigela, um lavatório, um pequena banheira e um penico que estava no chão.

— Servirá muito bem, obrigado.

— Pedirei que as criadas venham e façam a cama todos os dias, além de trazer sempre roupa de cama e água limpa. É claro que não precisa comer aqui, é mais que bem-vindo para fazer o desjejum e jantar comigo na casa principal.

Ava não conseguia identificar de onde vinha seu fracasso em deixá-lo afastado e sozinho. O duque não se encaixava nos seus planos para o futuro. Durante anos, ela se educou para seguir em frente, para não precisar da opinião ou apoio dele. Inalar fogo e fumaça havia causado claros estragos ao seu cérebro.

Ava fechou a boca com um estalo e se ocupou em inspecionar o forno. Ela estava sendo muito gentil com o duque, e eles estavam longe de estar de bem. Por que ela estava se esforçando para agradá-lo? Uma vozinha terrível sussurrou: “porque ainda se importa com ele, mesmo depois de todo esse tempo e de toda a dor que ele causara.” Fazendo uma última inspeção nas acomodações, ela foi em direção à porta.

— Vou deixá-lo descansar. — disse ela, não dando um passo antes que ele segurasse em seu braço, detendo-a.

— Obrigado, Ava, não apenas por acolher meus cavalos ou me dar permissão para usar esta casa, mas pela noite passada. Por vir em meu auxílio, por não sair do meu lado ou dos meus cavalos, quando ao ficar, você se colocou em grande perigo. Não me esquecerei de sua bondade.

Ela se afastou do toque dele, não gostando do fato de que seu corpo se recusava a permanecer indiferente a ele e a seu toque. Se eles iam permanecer na mesma propriedade por algumas semanas, era melhor ela começar a aprender a conviver com o duque e a não mostrar suas emoções como um livro aberto esperando para ser lido.

— Não foi nada, Sua Graça. Nada que você não faria por mim, tenho certeza.

Ela caminhou para casa, precisava se afastar da expressão de devoção que estava escrita em todo o rosto dele. A última coisa que ela precisava era que ele começasse a olhá-la dessa maneira. Do mesmo jeito que ele costumava quando eram jovens.

TATE SE ENCOSTOU no batente da porta do chalé enquanto Ava voltava para casa. O fato de ela estar usando calças e não um vestido, deu a ele a oportunidade perfeita para admirá-la por trás.

Ele fechou os punhos ao lado do corpo, quando a saudade pelo que foi perdido o dominou como se ele estivesse mergulhado em água.

Se ele tivesse ficado, se ela não o tivesse rejeitado no passado, eles estariam casados. Talvez até já fossem pais e seus filhos estivessem aprendendo tudo para assumir o papel de grande força no mundo das corridas.

O papel que eles criariam juntos contando apenas um com o outro. Teriam um filho que herdaria o título e, se fossem abençoados, uma filha que seria tão selvagem e incontrolável quanto a mãe.

Ele fechou a porta e se encostou nela.

Ele não precisava ficar na propriedade dos Knight, mas voltar para casa não era nada atraente para ele. Seus cavalos estavam aqui, e ele poderia pedir ao administrador dele que enviasse para cá os documentos que precisassem de sua atenção. Caso o que seu Chefe dos Estábulos havia dito mais cedo fosse verdade, e as evidências que encontraram nos escombros se mostrassem corretas, havia um incendiário em fuga.

Era melhor que ele estivesse perto de Ava, caso ela fosse a próxima vítima do demônio. Seu administrador cuidaria de Cleremore Hall até que os estábulos fossem reconstruídos e ele pudesse retornar. A verdade era que ele estava aqui na casa de Ava porque era onde ela estava, e agora que eles ao menos conseguiam trocar algumas palavras em paz, ele se via relutante em se afastar.

Ela sempre teve a capacidade de atraí-lo.

Fazer com que ele desejasse até mesmo a simplicidade de ouvir a voz dela ou vê-la ao longe, em um campo. Tate se afastou da porta e a abriu, precisava orientar o condutor dele acerca de onde levar suas malas. Pelo menos, essa tarefa manteria sua mente ocupada por um tempo em vez de se manter tão obcecado por uma mulher que arrancou seu coração do peito no que parecia tão recente quanto ontem.

Não tenho esperanças de que possamos ser outra coisa senão conhecidos no futuro, mas sei que sempre me importarei você. Você era meu amigo e sempre fará parte de mim. — Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

CAPÍTULO 5

Não tenho esperanças de que possamos ser outra coisa senão conhecidos no futuro, mas sei que sempre me importarei você. Você era meu amigo e sempre fará parte de mim.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

O MÊS SEGUINTE manteve todos ocupados tanto na propriedade de Ava e na reconstrução dos estábulos do duque em sua propriedade. Algumas vezes, Tate pediu a ela uma opinião sobre o layout e o design das novas baias e estábulos, e juntos eles criaram o que seriam soluções modernas e práticas para quaisquer problemas que ocorreram no passado.

E o mais importante, os estábulos eram de tijolo em vez de madeira e todos seriam construídos com uma segunda porta de acesso, para evitar situações de bloqueio como aconteceu no incêndio.

Ava sentou-se atrás de sua mesa na biblioteca e recostou-se na cadeira, olhando para o jardim. O dia havia começado com prenúncio de tempestade e, portanto, muitas das atividades que ela havia planejado para o dia foram adiadas para o dia seguinte.

Ela levantou-se e caminhou até a janela e olhou para o pequeno chalé que o duque adotara como lar nas últimas semanas. Na maioria das noites, ele vinha jantar com ela e, infelizmente, a cada noite, Ava era lembrada de como poderiam ter sido. Do que ela

havia perdido quando Tate escolheu um caminho diferente daquele que eles haviam planejado.

Em nenhum momento os dois conversaram acerca do que houve entre os dois. Na verdade, ambos pareciam ter o cuidado de nunca trazer à tona o passado. Ela não mencionava a França, e ele não mencionava Nova York. Não era surpresa que eles não iriam poder continuar dessa maneira. Era claro que havia um tabu a ser discutido. Ava, em especial, precisava saber o porquê. Por que ele mentiu, por que não a amara como ela acreditava que ele a amava.

Precisava saber como ele chegara à conclusão de que, depois de todo o tempo que passaram juntos, uma carta destruindo seus sonhos era tudo o que ela merecia. Uma carta entregue ao pai dela, e não à ela.

Por que ele não fora capaz de dizer ele mesmo?

Com a chuva batendo contra a vidraça, o pequeno brilho da luz de velas no chalé estava embaçado, uma pequena nuvem de fumaça flutuava para o céu pela chaminé. O jantar não estava muito longe, e ele viria...

Ela se virou e foi para o quarto, banhou-se depressa e depois se vestiria com a ajuda de sua dama de companhia. Na maioria dos dias ela usava calças masculinas e prestava pouca atenção aos cabelos ou mesmo se as botas estavam limpas. Mas esta noite ela resolvera usar um dos vestidos novos que encomendara durante uma visita à Londres no mês anterior, viagem feita para garantir que seu administrador comprasse um potro que ela queria.

Madame Lanchester a recebera sem problemas e suas habilidades como costureira eram melhores do que Ava esperava.

Ao longo dos anos em que estiveram separados, Ava chegou a cogitar, mais de uma vez, que a razão para o duque não ir em frente com os planos deles foi porque ela era muito rude, sem uma

educação apropriada. Que ela não havia estudado o suficiente, ou não conhecia o bastante das artes como a maioria das damas da sociedade que se tornavam duquesas.

Durante meses, ela ficava acordada à noite, imaginando se o uso de calças e chapéus de palha fora de moda o haviam feito desistir dela. Quem com o tempo ele percebeu que ela nunca seria uma boa duquesa.

O que era perfeitamente correto, ela não seria, pelo menos não agora, muita coisa havia acontecido nos cinco anos desde que eles se separaram. Com certeza ela não era do feitio para um ducado agora, mas isso não significava que ela não poderia de vestir bem e mostrar ao duque que as pessoas precisam olhar além da camada exterior, que é necessário valorizar o que se tem por dentro. Talvez ele se esquecera do que havia visto nela.

Ava se olhou no espelho. A camisola de musselina bordada era simplesmente a roupa íntima mais bonita que ela possuía e era quase bonita demais para se cobrir com um vestido.

— Srta. Ava, que vestido você gostaria de usar? — a criada abriu o armário e começou a inspecionar os poucos vestidos que ela possuía.

— O de seda bronze com rendas e bordas de pérolas, e eu gostaria que você, por favor, penteasse meus cabelos em cachos macios no topo da cabeça, Jane, se for possível.

A moça sorriu, ocupando-se da preparação do vestido.

— Ó, você ficará linda esta noite, senhorita Ava. Além disso, eu tenho praticado alguns penteados franceses para usar em seus cabelos. Vai ficar muito bonito junto do vestido.

E Ava precisava admitir, ao olhar de relance para o vestido deitado em sua cama, que o decote era bem baixo. Uma delicada fita de um tom mais claro de bronze passava por baixo da linha dos

seios, e um delicado padrão de flor de lis em renda e pérolas traçava toda a bainha.

— Obrigada, Jane. — Ava sorriu para a criada, ansiosa para a noite começar.

Durante a hora seguinte, Jane mexeu nos cabelos de Ava, puxando-os de forma estilosa, não era o jeito simples e usual de amarrar tudo com uma fita. E então ela estava pronta.

O som de vozes masculinas vinha do andar de baixo, e Ava trocou um olhar com a criada.

— Vou descer, Srta. Ava, e dizer à equipe da cozinha para começar a servir assim que a senhorita chegar ao andar de baixo.

— Obrigada, Jane. — Ava voltou-se para o espelho e estudou a própria aparência.

A criada fizera maravilhas com os cabelos dela e, de alguma forma, a mulher que treinava cavalos de corrida, usava calças e limpava estábulos ao lado dos funcionários desapareceu. Em seu lugar, havia uma mulher que era a dona de sua própria vida no reflexo.

Tate partira o coração dela, mas não seu espírito. E o diabinho nela queria mostrar o que ele havia perdido. O que ele nunca mais teria.

Piscando para voltar para o presente, ela sorriu e virou-se para sair, pegou o xale e o colocou sobre os ombros. O vestido ondulou em torno dela, frio e macio, e ela teve a sensação esmagadora de estar quase nua.

Fazia muito tempo desde que ela havia participado de um baile, festa ou mesmo um jantar mais formal. Quando em casa, ela nunca seguia as regras estritas da sociedade, o que a fez supor que esta poderia ser uma das razões pelas quais Tate fugira para os Estados Unidos em vez de se casar com ela. Ava verificou o vestido

enquanto descia as escadas, e seus passos vacilaram ao ver que Tate a esperava lá embaixo.

O homem que usou calças bege e camisas sujas na última semana havia sumido. O homem; que exercitava os cavalos e ajudava a construir os novos estábulos, além de percorrer as duas propriedades todos os dias para estar a par de tudo o que precisava saber, não estava ali. O homem empoeirado, amarrotado ou cheio de lama, dependendo do clima inglês, desaparecera.

Diante dela estava um duque.

O garoto que ela amara e o homem que ela passou a respeitar de várias maneiras. As calças de pele de gamo e botas pretas e brilhantes até o joelho, o colete prateado, a camisa engomada e o lenço encaixado à perfeição.

Bem, o vocabulário dela desapareceu por um instante.

Ela nunca pensou que ele pudesse se tornar mais atraente do que naquele momento. Ela o imaginara vestido assim quando fantasiava o casamento deles em Gretna Green, antes de ele partir para a América.

Ela afastou a lembrança, não queria estragar seu humor. Desceu o último degrau, e ele baixou a cabeça em um pequeno cumprimento, mas ela não deixou de notar o lampejo de consciência que passou pelos olhos dele. Ele também gostava do que via? Teria se arrependido da escolha que fizera? Ela nutria uma pequena esperança de que sim.

TATE APROVEITOU a oportunidade, enquanto se curvava para Ava, para trazer indiferença aos próprios traços e não mostrar o que ele realmente sentia toda vez que via a mulher diante dele. O desejo

avassalador de cair de joelhos e pedir que ela dissesse por que se afastara do amor dele há tantos anos.

Ela não havia se casado, o que era a primeira razão para afastá-

lo que ele imaginou que ouviria ao chegar dos Estados Unidos, mas nenhuma notícia parecida havia chegado o que apenas o deixou mais inquieto para descobrir a verdade. Por que ela não o amava mais? Por que ela enviou a ele aquela carta fria e insensível na noite anterior à fuga deles?

Os pais dele não disseram muito além de informar que ela havia partido para estudar fora e que parecia gostar muitíssimo do aprendizado, que ela não sentia falta de casa, nem daqueles que deixou para trás. A mudança de caráter havia sido tão extrema e distante da Ava que ele conhecia que ele até considerou a possibilidade de que não fosse verdade. As pessoas poderiam mesmo ser tão falsas?

Ele fez um gesto para que ela tomasse seu braço, para levá-la até a sala de jantar. O cheiro inebriante de rosas permeava o ar e o deixou saudoso pelo passado.

Ele fechou os olhos por um momento para se recompor. Como um perfume poderia trazer de volta tantas memórias ele nunca entenderia, mas era a verdade.

Ela se sentou à mesa, e ele assimilou o vestido de seda adornado com rendas e fios de ouro. Era um modelo do auge da moda, e a silhueta dela mostrava-se mais do que agradável dentro dele. O corpo de uma menina havia dado lugar à uma mulher plena de feminilidade. Sentada em frente a ele estava uma mulher que agradaria até o mais rico dos homens.

Seus longos cachos castanhos avermelhados foram puxados para trás em um delicado penteado que acentuava seus ombros e pescoço perfeitos. Os olhos dela, grandes e claros, brilhavam de

prazer e os lábios brilhavam com o toque bem suave de ruge, um sorriso brincava ali. Esta noite, Aera uma visão de mulher feminina e de curvas suaves, de inferno e danação.

Ela estava linda.

Um lacaio próximo serviu taças de vinho e, sentando-se onde lhe era designado, Tate esperou o primeiro prato ser servido. Ava se ajeitou, colocando o guardanapo no colo antes de encontrar o olhar dele do outro lado da bela mesa de mogno polido.

— Obrigada por vir estar noite, não estava certa de que viria hoje devido ao clima tempestuoso... — ela se interrompeu quando a sopa de legumes, quente e fumegante, foi colocada diante deles.

— Não me importo de caminhar, embora agradeça a carruagem que o Sr. Brown me enviou esta noite por causa da chuva. Mesmo sendo uma curta distância, a viagem foi bem menos úmida para os pés.

Tate quase revirou os olhos ante a banalidade da conversa.

Houve um tempo em que eles compartilhariam todos os tipos de pensamentos, sonhos e desejos. O fato de terem se perdido, perdido um ao outro, o enlouquecia.

Ele franziu a testa, virando-se para um dos criados.

— Vinho para nós dois. Obrigado.

O jovem fez uma reverência, e cumpriu as ordens com rapidez:

— Sim, Sua Graça.

Tate esperou que o vinho fosse servido.

— Chamaremos quando estivermos prontos para o próximo prato. Obrigado. — ele disse ele aos demais criados, e não falou mais até que todos corressem para fora da sala, e ele e Ava estivessem sozinhos.

Enfim...

— Há algo que eu gostaria de discutir com você, Ava, e talvez seja melhor que estejamos sozinhos para tal. E me perdoe, mas estou ansioso para saber algo que me incomoda há algum tempo.

Ela olhou para ele com olhos arregalados e baixou a taça de vinho depois de tomar um gole.

— Claro. O que precisa?

Ele se recostou na cadeira e ficou mexendo a colher na sopa sem atentar-se à refeição. Depois de um tempo, ele se forçou a dizer as palavras que estavam trancafiadas dentro dele há muitos anos.

— Por que você não fugiu comigo?

Ela baixou a colher, o rosto pálido.

— Por que eu não fugi com você? — ela riu, o som zombeteiro.

— Você está mesmo me fazendo essa pergunta?

Ele assentiu uma única vez.

— Por quê?

Ava o estudou por um momento, e ele pôde vê-la tentando entender por que ele fazia essa pergunta depois de todos esses anos. Mas se ele não soubesse a verdade por trás da decisão dela, e continuaria se sentindo como um louco.

— Eu saí de casa no meio da noite e fui para a nossa árvore.

Você não estava lá, mas meu pai sim. Ele me informou que você havia partido para Londres, que embarcaria de lá para os Estados Unidos. Ele contou que você havia me escrito e desistido, que dissera que acreditava que eu havia entendido errado nosso convívio. Que eu esperava uma conexão que nunca poderia acontecer, porque você era herdeiro de um ducado, e que nós não éramos uma família com conexões ou nobreza.

Um soco no estômago teria causado menos dor.

Tate pensou naquela noite e na situação que levou seus pais a entrar no quarto. Ele havia feito as malas cinco minutos antes e ficou agradecido por não terem visto a pequena maleta que estava em seu quarto de vestir. A mãe dele sentou-se na cadeira de couro diante da lareira, a que ele costumava usar para ler, o pai ficou parado atrás dela.

Tate enfiou a mão no bolso do paletó e tirou a carta que ele havia recuperado mais cedo naquele dia, na propriedade ducal, a carta que os pais haviam entregado a ele. Ele estava determinado a descobrir o motivo por trás da separação. Ele a entregou a Ava, e ela estendeu a mão para pegá-la sem questionar a ação e a desdobrou para ler.

Horror cruzou suas feições.

— Eu... é.... — ela mordeu o lábio ao chegar ao fim do bilhete. —

Eu não escrevi isso, Tate. — ela olhou para ele, choque dominava seu rosto bonito. — Nossos pais devem ter trabalhado juntos para nos separar. Meu pai... — ela fez uma pausa, com os olhos cheios de lágrimas. — Não acredito que ele me magoaria dessa maneira.

— por um momento, eles se entreolharam em silêncio antes de ela dizer: — Só posso deduzir disso que a carta que seu pai nos enviou em seu nome também não foi escrita por você. — ela redobrou a carta, deslizando-a sobre a mesa para ele. — Não trouxe a carta do seu pai comigo, mas eu a guardei. Mostrarei para você amanhã.

— Preciso vê-la agora. — ele exigiu, empurrando a cadeira ao ficar de pé.

Ele deu a volta na mesa e ajudou Ava a se levantar e, pegando a mão dela, puxou-a em direção à porta da sala de jantar. Fazia anos desde a última vez que ele a tocara daquela forma. Ter a mão enluvada dela envolta pela mão dele o fez recordar do que sentiu ao ter que suportar a ideia de que ela não o queria.

Uma mentira que ele agora acreditava com todas as suas forças que fora arquitetada pelos pais dos dois. Uma mentira que ele desvendaria. Viajaria para Londres e pediria à mãe que explicasse suas ações desprezíveis.

Ele abriu a porta e os criados, que esperavam por instruções se assustaram, ficando de pé atentos.

Ela não o desprezou.

Será que ela havia ficado tão desolada quanto ele por todos esses anos? A lembrança de como ele tentara esquecê-la. As muitas mulheres com quem ele dormira, as que ele mantinha de prontidão para saciar seus desejos, todas eram uma distração para um coração que clamava por uma mulher que acreditava estar perdida para ele. Como ele se redimiria...?

Entrando no corredor, eles subiram as escadas às pressas. Tate ignorou os olhares chocados e inquisitivos dos funcionários que assistiam a uma mulher solteira levar um duque para seus aposentos particulares.

Ele não dava a mínima para quais regras ele estava quebrando.

A raiva que zumbia em suas veias naquele mesmo minuto, por tudo o que seus pais haviam feito, afastou qualquer pensamento de certo e errado.

Ela parou à porta de um cômodo no final do corredor e, lançando um olhar nervoso para ele, entrou.

Tate encostou-se no batente da porta, não disposto a violar tanto assim o espaço privado dela e, ainda assim, pela primeira vez, vislumbrou seu aposento mais privativo, o quarto de dormir dela.

Um cômodo que ele imaginara exalar masculinidade sendo ela uma mulher que cavalgava e limpava estábulos com a mesma eficácia que os melhores ajudantes de estrebaria de Berkshire. Mas era todo decorado com tons suaves de azul e rosa. A mobília era

branca e, ao analisar o ambiente, lembrava a ele um campo de flores em um dia de verão.

Ava caminhou até uma mesa de cabeceira e abrindo a gaveta, puxou uma missiva dobrada. Ela voltou para ele, e entregou-a. Ele abriu e leu o conteúdo com rapidez. Seu estômago revirou. A letra era de sua mãe. Então ela estava envolvida no esquema para separá-los, um esquema que funcionou por anos a fio. Mas não mais. Não se Ava o quisesse de volta.

— Sinto muito, a caligrafia é de minha mãe. — ele dobrou o papel e devolveu a ela. — Eu não sei o que dizer além de que sinto muito, Ava. Não achei que nossas famílias pudessem ser tão cruéis a ponto de nos enganar, mas, infelizmente, parece que foi o que aconteceu.

Ela caminhou até a cama, devagar, e sentou-se na beirada.

— Eu avisei ao meu pai naquela noite que ele estava errado.

Que você viria, que não era do seu feitio não aparecer. Eu não conseguia acreditar que o garoto que eu amei pudesse fazer uma piada tão cruel comigo. Mentir na minha cara sobre o que ele em tese sentia por mim, apenas para me dar as costas e dizer que eu havia imaginado tudo.

Ele foi até ela e se ajoelhou, pegando a mão dela.

— Eu não poderia, eu não fiz isso com você. Nossas famílias fizeram isso conosco. Sinto muito, Ava e prometo que vou descobrir o porquê.

Tate tinha suas suspeitas de por que seus pais desaprovavam Ava. A posição social deles era tão diferente quanto o temperamento dos cavalos que agora dividiam o mesmo estábulo.

Sua mãe nunca aprovara a amizade deles e, agora que as cartas e o verdadeiro responsável pela separação dos dois haviam vindo à tona, ele a confrontaria e exigiria um pedido de desculpas.

Um para si e outro para Ava. Ele não era mais um marquês, agora era um duque e se casaria com quem bem quisesse.

Ela apertou a mão dele de volta.

— Por mais que isso me choque, Tate, estou feliz que descobrimos a verdade e que podemos seguir em frente, sem qualquer animosidade entre nós.

Os anos se passaram, e ele queria abraçá-la, cercar-se do aroma de rosas que sempre permeava o ar ao redor de Ava. Com certeza ele não queria que nenhuma animosidade entre eles continuasse, mas também não queria que permanecessem distantes. Ava já havia sido sua melhor amiga, seu coração, e ele daria qualquer coisa para reconquistá-la.

Ela puxou a mão, e ele se levantou, dando-lhe espaço.

— Seria melhor se saísse. Nós dois temos muito em que pensar.

Lamento interromper nosso jantar, mas acho que é o melhor.

— É claro. — disse ele, indo para a porta. — Desejo-lhe boa noite.

Tate fechou a porta atrás dele e inclinou-se por um momento para recuperar o fôlego. Era difícil saber o que fazer a partir de agora, como começar de novo. Por mais jovens que os dois fossem quando trocaram juras de amor, era amor mesmo. Verdadeiro e puro como o ar que respiravam.

Muitas coisas aconteceram desde então, muito tempo se passou. Sua própria vida em Londres não era algo de que ele se orgulhava. Ele se encolheu sabendo que suas canalhices haviam chegado a Berkshire, a Ava. Ele se comportara como um Lorde distante depois que seu pai faleceu, desejava enterrar-se nos divertimentos de Londres em vez de crescer e voltar para casa e assumir seu papel como deveria. Tudo porque ele estava bravo, não

apenas consigo mesmo, mas com as cartas que a vida o havia dado quando o assunto era Ava.

Tate foi para as escadas, precisava voltar para sua propriedade e organizar a ida à Londres. Ele precisava voltar para a cidade e confrontar a própria mãe pela cruel interferência em sua vida. A pessoa que sacramentou a perda da única mulher que o conhecia de verdade e o amava por ele mesmo, e não pelo que ele representava ou poderia oferecer.

Ele apertou a mandíbula.

Devido a suas ações descuidadas no passado, a viagem à cidade também significaria que ele teria que visitar a amante, não que alguém soubesse da existência dela, e se afastar. O confronto poderia não correr bem, e talvez fosse necessário oferecer uma recompensa financeira para a mulher. Só então ele poderia retornar a Berkshire e reconquistar sua dama.

Sua duquesa, como Ava sempre deveria ter sido.

CAPÍTULO 6

DEPOIS DE ENVIAR uma carta para Ava contando seus planos de viajar para a cidade, ele chegou a Londres bem tarde no dia seguinte, no momento em que a pequena temporada se iniciava. Tate pulou de sua carruagem enquanto os acendedores de lampiões andavam pelas ruas e acendiam os postes ao longo da calçada.

Tate foi direto para o White's, para conversar com seu bom amigo, Lorde Duncannon, a quem ele havia pedido, no mês passado, para voltar a Londres e contatar um agente de Bow Street.

Contudo, poucas evidências haviam sido descobertas já que não se sucederam mais ataques.

Ele entrou no vestíbulo e, antes que um lacaio pudesse pegar seu casaco, recebeu uma carta de Lorde Duncannon dizendo que estava preso em outro lugar e que iria se juntar a ele mais tarde do que haviam planejado.

Tate se virou e olhou para a rua, debatendo consigo mesmo se poderia adiar ver a mulher que aqueceu sua cama com certa regularidade durante o último ano dele na cidade. Como ele havia enviado uma missiva notificando-a de sua chegada iminente, ele sabia que a encontraria esperançosa de que tudo ia bem e que uma noite de paixão a aguardava.

Girando pelos calcanhares, ele chamou o condutor e começou a se odiar pelo fato de que teria que machucá-la. Fleur, Lady Clapham, viúva do visconde Clapham, não merecia esse tratamento. Não que ela aspirasse ser esposa dele, mas ele prometera não a fazer de boba perante a Sociedade, e os dois eram

vistos juntos em vários bailes e eventos. Ela era uma amiga, um conforto quando os vislumbres de fraqueza e solidão o atormentavam, aqui e ali, desde que ele retornou à Inglaterra.

A carruagem parou diante da casa de paredes de pedra de portland em Mayfair, e ele observou o prédio um momento antes de seu cavalariço abrir a porta. Tate pulou e subiu as escadas. O

mordomo o deixou entrar sem questionar ou se demorar, e Tate foi em direção ao salão da frente sem pestanejar.

Era ali que Fleur sempre gostara de o encontrar antes do interlúdio. A sala de visitas era o cômodo que ele menos gostava na casa, tendo sido decorada no tom mais vil de rosa, um que machucava os olhos.

O mordomo abriu e fechou a porta sem comentar, e dando um passo adiante na sala, Tate não pôde deixar de sorrir com a pose que Fleur escolhera para o esperar.

Sua Senhoria estava esparramada em um sofá cor de rosa, um braço atrás da cabeça de forma preguiçosa, enquanto o outro descansava sobre a barriga, parte do corpo visível através da camisola de seda que ela usava. Seus mamilos, de um rosa que combinavam com o ambiente, estavam eretos sob a roupa, e a mancha mais escura de cachos no ápice das coxas era visível.

Mesmo sabendo que ele nunca mais tomaria a mulher da maneira que ela ansiava, ele não poderia negar que ela era linda e que merecia muito mais do que a vida a havia dado, ele incluso. O

pai dela, um cavalheiro de terras no interior, passara por momentos difíceis e, com sua queda, seus filhos também sofreram. Lady Clapham fora dada em casamento para um visconde rico sem pensarem duas vezes. Agora cabia a ela dar apoio aos irmãos e encontrar bons partidos para todos quando a hora chegasse. Ela

havia se casado com um homem com o dobro de sua idade e um temperamento que diziam rivalizar com o próprio Hades.

— Tate, meu querido, onde você esteve? A pequena temporada está quase no fim, e não vimos você nos últimos meses. Cheguei a perder a esperança de que voltasse à cidade. Me senti tão só... —

ela disse, o olhar o percorrendo com luxúria não satisfeita.

Ele se sentou em uma cadeira que estava de frente para o sofá.

Fleur, sentindo que ele não a tomaria em seus braços, sentou-se ereta e fechou o roupão para proteger o corpo.

— Algo errado? — ela perguntou.

— Há algo que eu preciso falar com você e temo que não gostará do assunto.

Se ele conhecia Fleur, e a conhecia muito bem, ela não era uma mulher com quem se indispor, e ele não desejava se separar dela em maus lençóis. O que eles tiveram foi agradável enquanto durou, mas ele nunca deu nem um tico de falsas esperanças. Ele jamais ofereceu mais do que o acordado antes mesmo de os encontros começarem.

— Vou passar muito tempo em Berkshire, na minha propriedade.

Como você deve saber, houve um incêndio em meus estábulos no mês passado...

Fleur ofegou, inclinando-se para a frente.

— Um incêndio? Os danos foram extensos?

— Perdi dois blocos de estábulos e estou iniciando a reconstrução. Todos os meus cavalos tiveram que ser levados para o Haras Knight. Tive muita sorte de não perder nenhum dos animais.

A viscondessa recostou-se na cadeira, com um olhar de sabedoria.

— Este Haras não é de propriedade da senhorita Ava Knight?

Não foi ela a garota que deixou você há alguns anos?

Tate não queria contar a Fleur toda a verdade, pois assim que ele o fizesse toda a cidade de Londres saberia, e ninguém da cidade precisava saber de sua vida.

— Ela retornou da França e está fazendo um excelente trabalho em manter seus estábulos lucrativos e bem-sucedidos. O que aconteceu no passado entre nós, eu preferiria deixar no passado.

Somos vizinhos e, devido ao nosso amor mútuo por corridas de cavalos, precisamos nos dar bem.

— Bem. — disse ela com o tom indicando incredulidade. — Fico feliz que tenha conseguido deixar o passado para trás, mas não significa que não possamos mais ficar juntos quando você estiver na cidade. Nos damos muito bem, e você sabe que sempre nos divertimos. Não seja enfadonho, nem me diga que não podemos mais continuar.

Tate estava apostando na ideia de que, com tempo e paciência, ele poderia reconquistar o amor de Ava. Fazê-la enxergar que juntos eles poderiam fazer de ambas as propriedades os melhores Centros de Reprodução e Treinamento do país. Que sob nenhuma circunstância ele tentaria cortá-la e forçá-la a mudar para se adequar ao esperado para o título. Ambos ansiavam por filhos e um casamento construído com a solidez de um amor. Ele não descartaria esta possibilidade agora que talvez eles fossem uma opção.

Ele se levantou.

— Sinto muito, Fleur, mas não posso mais ser seu amante. É

claro que sempre serei seu amigo e, se precisar de alguma coisa, sabe que eu sempre lhe darei assistência. Mas o que tivemos deve chegar ao fim. Não seria justo com você mantê-la ligada a mim quando sempre deixei claro que nosso acordo era algo temporário, uma forma divertida de passar o tempo durante a Temporada.

Ela o estudou por alguns segundos antes de se levantar, aproximou-se dele e envolveu seu pescoço com as mãos.

— Sentirei sua falta, Sua Graça, e de todas as coisas deliciosas que costumávamos fazer. Estou ansiosa para reencontrá-lo ano que vem durante a temporada.

Tate retirou os braços dela do pescoço dele, mas deu um breve beijo em sua testa antes de se afastar.

— Boa noite, Lady Clapham. — ele entregou o congé a ela.

Saiu sem dizer mais nada e, chegando à carruagem, pediu que fossem ao White's. Lady Clapham recebeu as notícias muito melhor do que ele imaginara. Talvez ela já tivesse outra pessoa em mente para mantê-la ocupada. Ela era viúva, e muitos cavalheiros se interessavam por ela, algo a que ela sempre se mostrara receptiva.

E agora ambos estavam livres para fazer o que quisessem.

O que era ótimo para Tate conquistar o amor de Ava. Ele conquistou o coração dela uma vez antes, o que decerto era premissa para fazê-lo uma segunda.

CAPÍTULO 7

Dois anos se passaram desde a última vez que vi você. Às vezes me pergunto se voltaremos a nos encontrar...

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

A CARRUAGEM de Tate parou diante de sua casa em Londres, as luzes brilhavam do lado de dentro e o som de música fez seus passos se tornarem cautelosos ao subir as escadas. Um criado de libré vermelho, roupas que eles usavam apenas em bailes, fez seus passos vacilarem. De todos os dias possíveis para ele retornar à Londres, ele escolhera o dia de um baile organizado por sua mãe.

Este seria o terceiro do ano.

Não havia mais nada para a mulher fazer com seu tempo? Ele entregou seu sobretudo a um dos criados que veio ao seu encontro na entrada e cumprimentou as poucas pessoas que se mantinham do lado de fora do salão de baile.

Sem disposição para tais entretenimentos, ele prosseguiu para a escadaria. Não apenas não queria socializar, mas estava longe de estar vestido para um baile. Na manhã seguinte, ele discutiria os excessos sociais de sua mãe e tentaria controlá-la um pouco.

Fora que a carta que ela havia escrito para Ava ainda dominava sua mente de forma a deixá-lo ainda menos disposto a permitir tais frivolidades.

Na metade da subida uma voz masculina gritou seu nome, e Tate se interrompeu. Ao se virar encontrou o Conde de Brandon, um bom amigo que conhecera durante o seu primeiro ano em Nova York.

— Scott. — disse ele, descendo as escadas e puxando-o para um abraço.

O homem era um de seus amigos mais próximos, e sentiu muita falta dele quando precisou voltar para a Inglaterra. Scott também havia voltado, mas optou em ir para o continente, ver os pontos turísticos.

— Como tem passado, meu amigo?

— Muito bem. Muito bem mesmo. — disse Scott, sorrindo. — Eu me lembrei que a duquesa-viúva iria dar um baile esta noite para celebrar o fim da pequena temporada e pensei em dar um alô enquanto você estivesse na cidade.

— Posso dar os parabéns? Admito que fiquei bastante surpreso ao receber sua carta contando que estava noivo, mas estou feliz por você. Sua noiva está com você? Eu adoraria conhecê-la. — disse Tate, olhando para ver se alguma jovem estava à espera de uma apresentação.

— Sim, está certo. Estou noivo. Vamos nos casar em junho próximo. A família dela virá da Itália para preparar e planejar o casamento. Claro, sou a favor de permitir que Rosa tenha o que ela quiser.

Tate sorriu.

— Estou feliz por você, meu amigo. Você irá ser um marido maravilhoso, e estou certo de que Rosa será uma esposa maravilhosa para você se é quem você escolheu. Conto os dias até encontrá-la.

— Eles estão vindo de Roma e chegarão no Natal. Não vou deixar de apresentá-los. Ela é simplesmente perfeita.

Tate apertou-o no ombro, feliz por seu amigo. — Você é um bom homem. Você merece a felicidade.

— Obrigado. — disse Scott, virando-se para o salão de baile. —

Vamos tomar uma taça de champanhe para comemorar?

Tate não pôde recusar e seguiu para as portas do salão de baile.

Ele estava longe de estar vestido para a ocasião, mas ser o duque de Whitstone dava a ele permissão para vestir o que quisesse.

Ele viu a mãe do outro lado do salão, os olhos da mulher se arregalando em choque. Tate não sabia dizer se era por ele estar lá ou se pelo que vestia. Talvez os dois.

Scott pegou duas taças de champanhe de um lacaio que passava e entregou uma a Tate. Eles fizeram um brinde de congratulações e tomaram um gole antes de olhar em volta.

— Quando pretende retornar para Berkshire? Ouvi de Duncannon que teve alguns problemas com a propriedade.

Tate assentiu.

A menção de casa trouxe a memória de Ava e o quanto ele sentia falta de vê-la, mesmo que por um só dia. Ele havia voltado a se acostumar a estar perto dela, e agora que estava na cidade, desejava partir, voltar ao interior. Como ele aguentou morar aqui nos últimos dois anos, sem nunca pisar em Cleremore Hall era algo que estava além de sua compreensão.

— Tenho alguns assuntos a tratar aqui, mas em não mais que uma semana volto a Berkshire. Quanto ao problema, sim, algumas coisas surgiram.

O conde lhe deu toda a atenção, e Tate pensou em contar a Scott tudo o que ele estava pensando. Nunca esconderam nada um

do outro antes, e Tate não podia começar agora. Ele precisava contar de Ava para alguém ou ficaria louco.

— Lembra-se da senhorita de quem falei uma vez, a razão para eu ter ido para a América?

Scott assentiu.

— Claro. Srta. Knight, não era?

— Sim, correto. — disse Tate, suas veias aquecendo-se com a menção do nome dela em voz alta.

— Ela mora na França, pelo que entendi, mas o pai dela possuía um dos melhores Centros de cavalos de corrida da Inglaterra.

— Sim, essa mesma, contudo, ela não está mais na França.

Voltou a Berkshire.

O amigo o estudou um momento antes de erguer a sobrancelha, a boca tremendo de diversão.

— Ela voltou? Que interessante. — ele fez uma pausa. — E este fato teve algum peso em sua decisão de morar em Berkshire em vez de Londres?

— Não exatamente. — disse Tate, não querendo parecer muito com um filhotinho apaixonado, mas ele nunca foi capaz de mentir para Scott. — Vou desapontá-lo ao dizer que nosso reencontro não foi na melhor hora, mas como já deve ter sabido, meus estábulos foram alvo de um incêndio. Detalharei para você em outro momento, mas naquela noite, em grande parte foi Ava quem salvou meu garanhão.

— E então vocês resolveram dar uma trégua.

Tate deu de ombros.

— Foi necessário enviar meus cavalos para a propriedade dela, e ao longo do último mês descobri que ela nunca me abandonou.

Na verdade, nossos pais nos fizeram de tolos e nos jogaram em vidas separadas. O que é a outra razão para eu estar na cidade

hoje. Quero confrontar minha mãe sobre o envolvimento dela em um esquema tão soturno.

Scott assobiou, os olhos arregalados.

— A viúva nunca aprovou a senhorita Knight. Não sabia?

— Ela nunca dissera nada de maneira direta, e a carta, que eu li, tem a caligrafia dela. O desgosto dela acerca da escolha da Senhorita Knight para minha esposa está claro em cada palavra. Eu não a achava capaz de tal traição, mas me enganei. Não foi sem motivo que Ava manteve-se distante todos esses anos. A carta é muito fria e ofensiva.

Tate balançou a cabeça. Odiava o fato de que foram separados porque alguém julgava saber o que era o melhor para os dois:

— Jantamos na outra noite e durante a conversa, eu não me aguentei e precisei descobrir o que houve. Indaguei para descobrir o que a fez enviar a missiva desfazendo nosso compromisso. Foi então que ela perguntou sobre a minha carta. Nenhuma das cartas envolvidas foi escrita por nós. Fomos enganados pelas pessoas em que mais devíamos confiar.

Tate olhou para o outro lado do salão e observou a mãe com as amigas por um momento, rindo e dando ordens aos outros pelo simples fato de ser uma duquesa. Um nó frio e duro se formou dentro dele, e ele se virou para Scott. Não queria vê-la por nenhum segundo a mais.

— Voltei à cidade em parte para confrontar minha mãe acerca das ações desprezíveis dela. Eu pretendia dar cabo a isso hoje à noite, mas ao voltar descobri que ela estava dando este baile, então nossa conversa terá que esperar até de manhã.

— Que outros negócios traz você aqui? — o amigo perguntou.

Tate ajustou a gravata e limpou a garganta.

— Bem, além de alguns negócios envolvendo outras propriedades, e meu problema com minha mãe, é claro, a outra a razão para vir foi um assunto delicado.

Scott ergueu a sobrancelha.

— Mesmo? E gostaria de elaborar? — o amigo terminou o champanhe e pediu mais para um lacaio que estava por perto.

Tate rangeu os dentes, não gostando do fato de ter sucumbido como tantos homens de sua esfera e tomado uma amante. Lady Clapham não era uma concubina de fato, ela era livre para fazer o que quisesse, e com quem quisesse. Mas o fato de ele poder visitá-

la quando assim decidisse, fazia com que parecesse uma amante, embora ele não quisesse usar tal termo.

Ele olhou em volta para garantir que não estavam sendo ouvidos por outros convidados.

— Não é algo de que eu me orgulhe, mas tenho dormido com uma mulher desde o ano passado. Ninguém sabe, e estou certo de que ela teve outros amantes durante esse período, mas se eu quiser algum tipo de futuro com a Srta. Knight, preciso ser honesto. Acabei de chegar da casa dela aqui em Mayfair.

— Ela aceitou bem as notícias?

Melhor do que Tate pensara que aceitaria, mas ambos sempre foram francos, e Lady Clapham havia dito muitas vezes que não queria voltar a se casar.

— Aceitou. Na verdade, ela quase não se incomodou.

E Tate precisava concordar que fora um golpe de sorte. Lady Clapham era uma mulher complexa, imprevisível de saber o que faria.

Ele suspirou.

— Mesmo resolvendo todas as pontas soltas pode não ser o bastante. Não tenho mais certeza de que a senhorita Knight vai me

aceitar. Depois de descobrir a verdade, ela permaneceu distante. —

Tate passou a mão pelos cabelos, sem saber o que Ava sentia. — A impressão que me deixou é que não sabia se me queria em sua vida.

— Como? — Scott perguntou.

— Cheguei a pensar que ela não deseja mais tal capítulo em sua vida. Ela é muito independente, administra a propriedade com precisão de especialista, é minuciosa e justa, e não precisa dar satisfações a ninguém. Tornar-se duquesa traz consigo novas responsabilidades e pressões, e não tenho certeza de que ela tenha espaço para tais obrigações nessa vida que criou.

No passado, houve um período em que ela não pensava em mais nada que não fosse ser a duquesa dele. Mas o tempo tinha o poder de forçar as pessoas a situações em que elas talvez não cogitassem antes, e o afastamento deles... Tate não sabia mais se ela se importava com ele de outra forma que não como amigo.

— Você precisa conversar com ela e descobrir. Talvez ela o surpreenda e haja espaço para você e seu título robusto. Sim, você é um duque, um homem com várias propriedades e muitas pessoas dependem de você, mas a srta. Knight estava disposta a estar à frente de tudo isso antes dos pais de vocês se envolverem. Se ela o ama, e sempre há uma chance de que duas pessoas destinadas uma à outra possam voltar a estar juntas, ela também abrirá espaço para você em sua vida.

Tate sorriu para o amigo.

— Você se tornou um romântico desde que conheceu Rosa.

Scott riu.

— Sim, e sinto orgulho por tal fato. Mas você verá que estou certo. Se tiver paciência, e como já esteve ao lado da Senhorita

Knight, não há razão para não acreditar que ela pode se apaixonar por você mais uma vez.

Ele esperava que sim, e continuaria tendo esperanças. Quando voltasse a Berkshire, iria devagar e com cautela. Tentaria recuperar a afeição dela. Não seria fácil, mesmo que tudo indicasse que eles voltaram a transitar a esfera da amizade. Muita coisa pode acontecer em cinco anos, as pessoas mudam e seus objetivos e sonhos também.

Com certeza era o caso dela. Após gastar dois anos em Londres, os rumores de que Titan — o garanhão mais procurado para procriação — iria a leilão em Tattersalls, o fizeram reviver seu sonho de estar à frente do próprio programa de reprodução, de ser o melhor.

Ele retornou a Berkshire, mesmo sabendo que Ava estaria a apenas cinco quilômetros dele, mas ele quis lutar pelo que uma vez imaginara fazer. Não ser apenas um duque, mas um homem com interesses, uma profissão que ele não apenas desfrutava, mas amava.

Ele bebeu o último gole de champanhe. Conseguiria conquistá-

la, conseguiria unir suas propriedades e fazer com que todos os seus sonhos se realizassem.

— Você faz excelentes argumentos, Lorde Brandon.

— Bem, se a Srta. Knight é o seu futuro, então sim, é necessário resolver o passado e seguir em frente. Estou feliz por você e desejo-lhe felicidades com sua dama. Eu me lembro do quanto você estava destruído. Pode discordar de mim, vejo em seu rosto que discorda.

— disse Scott, rindo. — Mas quando você fala dessa senhorita Knight, você brilha. Ela é sua luz, brilhante e verdadeira. Espero que consiga reconquistar o amor dela.

Tate sorriu, apertando o ombro do amigo.

— Obrigado. Aceitarei seus bons desejos e espero o melhor também. Muita coisa aconteceu nos últimos cinco anos, pode levar algum tempo para encontrarmos o caminho de volta um para o outro, mas estou determinado.

— Espero que sim, e não deixe de trazer a senhorita Knight para o meu casamento, se tiver sucesso. Rosa adoraria conhecê-la, estou certo disso.

— Isto, meu amigo, é algo que prometo a você. — disse Tate, esperando que, por sua vez, em breve ele também pudesse convidar Lorde Brandon para o próprio casamento.

TATE TOMOU o café-da-manhã na manhã seguinte, e felizmente sozinho. O cheiro de café quente impregnava o ar, o Times ainda com cheiro de prensa à sua frente e o prato com bacon, ovos escalfados e presunto fatiado estava diante dele. Ele se recostou na cadeira, aproveitando o momento de paz, um café-da-manhã em silêncio.

A porta do cômodo se abriu e sua mãe se juntou a ele. Ele dobrou o jornal, e suspirou em derrota pelo curto momento de paz agora interrompido.

— Bom dia, mãe. — disse ele, pegando a faca e o garfo.

A mãe dele se sentou à mesa e pediu a um lacaio próximo que lhe servisse chá e fizesse seu prato habitual de torradas e manteiga.

— Não sabia que retornaria à Londres, meu querido. O que o trouxe para a cidade? Eu iria me juntar a você em Cleremore em breve.

— Negócios na cidade.

Ante sua resposta curta, ela apenas ergueu a sobrancelha e voltou para a refeição. Tate comeu por um momento, pensando na totalidade de coisas que teria que dizer a ela. Estava com dificuldade de manter a calma, de não perder a paciência:

— Você aproveitou sua noite ontem à noite? Quantas bailes já foram este ano? Três?

Sua mãe abriu um sorriso doce.

— Sim, de fato. Que maravilhoso que esteja atento aos meus eventos. E fico feliz que tenha chegado a tempo para o entretenimento da noite passada, pois você desapareceu antes da última temporada e faz dez meses que não o vejo!

— Acredito que seja um exagero. Voltei à cidade em alguns momentos para tratar de negócios.

— Não me irrite, garoto, pois estou muito chateada. Como pôde deixar Londres no instante em que diversas mulheres elegíveis e de fortuna agraciam a cidade? Todas prontas para fazer uma reverência e se casarem com um duque. Preciso lembrá-lo de Lady Clapham, que é mais do que elegível, uma viúva que parece gostar da sua companhia, ou ao menos foi o que ouvi. Mas não, fugiu para Berkshire, para seu passatempo bobo com cavalos e não voltou.

Estou desesperada por você.

Tate não queria nada mais além de contar à sua querida mãe que Berkshire também dispunha de algumas mulheres muito doces e mais do que aceitáveis e que poderiam se tornar noivas dele.

Bem, uma noiva em particular.

— Preciso estar em Berkshire, pois adquiri um dos cavalos de corrida mais valiosos da Inglaterra há pouco tempo. E se não entrou por um ouvido e saiu pelo outro, eu escrevi para você contando o que ocorreu nos estábulos semanas atrás. Você sabe... — disse ele, chamando a atenção dela. — os que queimaram.

Ela dispensou a declaração com um gesto de mão.

— Lembro-me que mencionou esses dois itens, mas ainda assim não vejo a necessidade de você se manter longe da cidade por tanto tempo. — ela fez uma pausa, tomando um gole de café. —

Qual o progresso com os estábulos?

— Estão sendo reconstruídos enquanto falamos e não foi um incêndio simples. Como falei na carta, acredito que o fogo foi intencional. Eu contratei um agente de Bow Street para investigar, mas por favor, não espalhe essa informação. Não quero que ninguém saiba que eu tenho suspeitas.

— Muito bem. — ela suspirou, pegando um pedaço de torrada.

— Eu não direi uma palavra.

— Bom, isso me leva ao outro assunto que me trouxe à Londres, um que envolve você.

A mãe dele baixou a torrada, reclamando que estava fria. Um criado pegou o prato e o levou embora antes que sua genitora erguesse o olhar com preocupação nos olhos.

— Mesmo? O que você quer de mim?

Tate largou a xícara de café.

Ele queria analisar o rosto dela quando a confrontasse com a verdade.

— Por que você forjou a suposta carta da Senhorita Knight para mim anos atrás? Por que permitiu que eu seguisse acreditando que a afeição dela por mim era fingida, que ela sonhava com uma vida diferente? Que ela não me queria?

Os olhos de sua mãe se arregalaram antes que o rosto empalidecesse mostrando um tom horrível de cinza. Naquele momento Tate soube que, sem dúvida alguma, a mãe estava por trás do estratagema calculista de separá-los. Ele estava com certa esperança de que não fosse verdade, mas não parecia o caso.

— Eu não sei do que você está falando. — disse ela mexendo com um guardanapo. — Agora deixe-me tomar meu café-da-manhã em paz. O dia será agitado, muitas visitas para fazer a tarde toda.

Ele rangeu os dentes, uma reação melhor do que gritar com a mãe diante de todos os funcionários.

— Há tempo de sobra para suas socializações. Quero falar sobre seu esquema cruel e dissimulado.

A mãe dele pareceu aceitar a derrota a esse respeito e ergueu o queixo, os lábios contraídos em uma linha tensa.

— Sim, eu forjei a carta e o faria de novo. Seu pai e eu fizemos o que era o melhor por causa da pouca idade de vocês dois. Não havia nem passado por uma Temporada e já cogitava se casar com uma garota sem conexões, de fora da nobreza. Filha de um treinador de cavalos, ainda por cima.

A voz estridente da mãe se elevou uma oitava quando mencionou as últimas palavras, o que fez com que seus tímpanos doessem, e ele se encolhesse:

— Falei com o pai da srta. Knight e ele concordou depois de explicarmos que nunca aceitaríamos tal união e que a filha dele estaria arruinada ao ser cortada pela sociedade.

Ele balançou a cabeça.

A crueldade de sua mãe não tinha limites. Então, ela envolveu o Sr. Knight na farsa ao ameaçar sua única filha.

— A Srta. Knight era mais do que a filha de um treinador de cavalos para mim. Nunca me importei com classe, dinheiro, e títulos da forma como você se importa. A Srta. Knight pode ter tido um começo humilde, mas é igual a mim em todos os aspectos.

— Humpft. — sua mãe cuspiu. — Ela não serve para ser esposa de um duque, nunca será uma.

Ele respirou fundo para se acalmar.

— Você não tinha o direito dessa forma. Não tem vergonha de ter agido de forma tão cruel com seu filho ou com pessoas que são nossos vizinhos há anos?

— Tate, preciso lembrar que o Sr. Knight também estava de acordo.

— Você convenceu o homem a concordar ao ameaçar Ava.

— Não me diga que você já pediu a mãe dela de novo. — ela zombou. — Nunca o perdoarei se sim.

— Você não tem direito a voto, mas não. Não propus. Neste momento, a Srta. Knight não é só nossa vizinha, mas a mulher que está abrigando todos os meus cavalos depois do incêndio. Mesmo que eu e Ava não sejamos nada mais do que amigos no momento, não a isenta da culpa do que fez conosco. Como você pôde fazer isso com seu próprio filho? Você sabia o quanto eu gostava dela.

Ela balançou a cabeça, descartando as palavras dele.

— Uma loucura infantil que arruinaria sua vida. Você gostaria que eu me lamentasse por impedir tal enlace. Bem.. — ela fez uma pausa, jogando o guardanapo sobre a mesa. — Não lamento, nem nunca o farei.

— A senhora me enviou para um país que não me era familiar só para me manter distante dela. Você poderia ter sido honesta.

Não que tal honestidade fosse tirar dele a ideia de ter Ava como esposa. Mesmo agora, no âmago da alma de Tate, ele sabia que ela era a mulher certa para ele.

— Minha família tratou você bem em Nova York. Eles proporcionaram a você tudo o que um jovem intitulado e rico poderia querer. Mulheres, festas, eventos sociais do melhor calibre que meu país pode oferecer. Não me venha com lamentações quando sua vida não teve nada de lamentável. Não considerou que os pormenores que atravessaram toda Londres quando retornou

chegaram a mim? As muitas amantes, o jogo e tudo mais. Não seja tão rápido em me julgar quando eu poderia julgá-lo dois anos atrás, quando voltou.

Como ela podia ser tão cega?

Sim, ele gostou da América, mas apenas porque ele foi forçado a ficar e não podia voltar. Ele pensara que a mulher que amava não o amava.

— Eu não vou perdoá-la por essa fraude.

— Suponho que você vai me contar agora que todo esse seu interesse por Berkshire nos últimos meses não tem nada a ver com a senhorita Knight estar de volta da França. Por favor, me diga que não retomou o relacionamento com aquela pé rapada de onde parou.

Tate colocou as mãos na mesa, já nem se importava com a comida.

— Como ousa chamá-la assim? Nunca mais... — ele disse, fazendo sua mãe se assustar. — fale dela assim. O nome dela é Srta. Ava Knight, e me ouça bem, mãe. Não importa o que aconteça entre mim e Ava, saiba que jamais vou tolerar sua intromissão. O

que escolho fazer com a minha vida ou quem escolho para ser minha esposa é minha escolha. Como chefe dessa família, se eu quiser casar com uma prostituta do Soho, é o que farei.

Tate se levantou, já estava farto da conversa.

— Não me ameace. Ainda sou sua mãe e não se esqueça de que posso tornar sua vida na sociedade fácil ou difícil. A senhorita Knight vem de uma linhagem de criados. Pessoas que trabalharam como agricultores arrendatários antes de comprar um cavalo e competir com ele. Um golpe de sorte para eles, embora eu esteja muito feliz que conseguiram se afastar de uma vida de servidão, não é o bastante para se tornar apta ao papel de duquesa.

Ele sempre considerou os olhos azuis claros de sua mãe bonitos, mas, naquele momento, eram gelados e sem um pingo de sentimento.

— Se você se casar com a Srta. Knight, a duquesa de Whitstone será motivo de riso na sociedade. Eu não me casei com a nobreza e sacrifiquei minha vida em meu próprio país e vim morar na Inglaterra, só para ver meu filho se casar com uma mulher que não traria nada além de vergonha e algumas éguas ao casamento.

Tate agarrou a mesa, inclinando-se para sua mãe.

— Não volte a falar comigo, ou de Ava desta forma, mãe. Estou avisando. — ele bufou. — Eu sou o duque de Whitstone e não importa com quem eu me case, ela será aceita pela sociedade porque, caso não a aceitem, sendo eu um duque, farei com que se arrependam do dia que a rechaçaram. Esse aviso também inclui você. Se você deseja ter algo a ver com o meu futuro, não se intrometerá na escolha que eu farei para minha esposa.

A mãe dele empurrou a cadeira para trás.

— Há muitas moças que são mais adequadas para ser a futura duquesa de Whitstone. — disse ela com a voz trêmula. — Se desse uma chance e as conhecesse, veria que há muitas moças que seriam perfeitas para você. Veria que a senhorita Knight não é para você. Ficar com ela pode satisfazer qualquer senso de honra que você acredita ter de cumprir por ter desistido da união, mas esse sentimento não será duradouro. Pessoas com a origem dela sempre possuem esqueletos no armário, e a sociedade não descansará enquanto não descobrir. É apenas uma questão de tempo até que algo que a família ou ela escondem venha à tona e arruíne as perspectivas dos meus futuros netos.

— Só fala bobagens.

— Falo? — sua mãe retrucou. — Pense em seu herdeiro, longe em Eton ou Harrow. O assédio moral que seus filhos sofrerão quando os outros descobrirem que a mãe deles criava cavalos. Que os avós já foram agricultores arrendatários. Isso, por si só, será difícil de suportar, sem falar em algum outro escândalo que ainda não sabemos.

Ele balançou a cabeça, não querendo ouvir mais. Ele caminhou até a porta e parou.

— Você está histérica, sugiro que se acalme. Fique atenta ao meu aviso, mãe. Vou bani-la para um castelo na Irlanda se não me obedecer e seguir minhas ordens. Você não é mais a chefe da família. Nunca cruze essa linha, ou me fará concretizar a ameaça.

A mãe dele o fulminou, a pequena touca de renda no topo da cabeça tremia com a raiva mal disfarçada.

— Se você se preocupasse tanto com o ducado, teria voltado para casa quando soube do incêndio. Mas, em vez disso, apenas continuou a organizar mais eventos sociais e bailes. Pelo menos, a Srta. Knight se importou o suficiente para combater o fogo ao meu lado naquela noite. Agora me pergunto, onde você estava? Bebendo champanhe e desfrutando da companhia daqueles que julga serem valorosos. Não a ocorreria pensar nos outros, mas a Srta. Knight pensa, e é por isso que ela sempre será adequada para se tornar minha esposa. Não há um osso egoísta no corpo dela.

— Você não tem ideia do que está falando ou do que precisa. É

igual ao seu pai. Desvia-se com facilidade.

— Voltarei a Berkshire em alguns dias. Acho melhor que, assim que a pequena temporada se finde, você viaje para uma das outras propriedades e fique bem longe de Cleremore Hall.

— Você tiraria sua mãe de seu convívio por uma pobretona?

Tate olhou para a mãe, estava enojado com as palavras dela.

— Por causa de suas ações, por me mandar para os Estados Unidos, eu perdi a chance de me despedir de meu pai. Você me permitiu culpar uma mulher inocente por isso. A senhorita Knight pode não ser ninguém para você, mas ela é tudo para mim. E

sempre foi. Não importa quantos anos você passe tentando mudar este fato, nada o mudará.

Ele a deixou onde estava, encarando-o, e rumou para a porta.

Após esse confronto, uma visita ao White's seria perfeita. Qualquer lugar seria melhor de se estar do que aqui.

CAPÍTULO 8

DIAS DEPOIS, Ava estava sentada em uma cadeira no terraço e ergueu os olhos ao ouvir o som de rodas no cascalho. Ela protegeu os olhos por causa da luz do sol no horizonte e, fechando o livro que estava lendo, tentou descobrir quem estava chegando para uma visita.

Quando a carruagem ficou visível no pátio de entrada, ela se levantou e seguiu para a frente da casa, a curiosidade cada vez maior. A carruagem preta estava coberta de poeira adquirida ao longo de quilômetros de estrada, e havia uma variedade de baús no topo do veículo. Seu coração pulou de alegria, e ela começou a correr quando reconheceu a cabeça com cachos escuros que espreitou pela janela da carruagem.

Ela acenou.

— Hallie, é você?

Ava riu, mais que feliz em ver sua amiga. Hallie foi uma das primeiras garotas a fazer amizade com ela na escola francesa. A atitude, que não dava espaço para parvoíce, e a franqueza inabalável da moça haviam conquistado Ava que, por sua vez, amava que a amiga fosse tão corajosa e obstinada. Não que somente de olhar alguém pudesse pensar isso dela. Ela era toda delicada, suave à primeira vista. Suas mechas escuras, de um cacheado natural, e os olhos verdes ecoavam inteligência muito além da compreensão de Ava. Hallie era uma rosa inglesa pura, mas era de uma personalidade que amava climas muito mais severos do que tal flor seria capaz de tolerar.

— Ava! — Hallie gritou de volta antes de abrir a porta e sair sem ajuda.

Sua querida amiga correu e a puxou para um abraço feroz, que Ava recebeu de bom grado. Elas não se viam há um ano, e tê-la aqui e agora, em Berkshire, era um sonho.

— Hallie. — disse ela, abraçando-a com força. — Ah, eu estou tão feliz em vê-la.

Lágrimas se acumularam, mas ela as segurou, notou que os olhos da amiga estavam um pouco lacrimejantes também.

— Faz muito tempo, minha querida. Como está a Inglaterra?

Como estão seus cavalos magníficos? — Hallie perguntou, olhando para os estábulos.

— Estão todos muitíssimo bem.

Pelo menos os cavalos estavam indo bem, quanto ao restante de sua vida, bem, esse aspecto era questionável.

— Como foi o Egito e todos aqueles magníficos faraós que você ama tanto?

Hallie riu, tirando o chapéu e olhando para o céu.

— São perfeitos em todos os sentidos. E um dia você deve ir me visitar lá. Sei que você iria adorar.

A ideia de ver uma terra tão quente, de história e cultura anciãs a enchia de inveja por não viajar tão longe quanto Hallie. A mulher era tão inteligente e mundana, e chegara na hora mais perfeita.

— Não acredito que você está aqui. Quanto tempo vai ficar?

Ava a levou para dentro, arrastando-a em direção à sala de estar e ordenou que o chá e o almoço fossem servidos lá naquele dia, em vez da sala de jantar.

Hallie olhou ao redor da sala, notando algumas das antiguidades que o pai de Ava havia colecionado. Segurou e estudou um vaso aqui e uma relíquia ali antes de recolocá-los no lugar.

— Cerca de um mês, se você concordar. Tenho alguns negócios a tratar em um museu de Londres. O novo benemérito de lá se recusa a aceitar a autenticidade de uma tabuleta de pedra que encontramos no platô egípcio. Acredito que seja porque foi uma mulher que a encontrou, no caso eu.

Hallie pousou o chapéu em uma cadeira próxima e se deixou cair na cadeira, suspirando. Ava sentou-se também, sorrindo ante a maneira despreocupada e tranquila da amiga. Como sentira falta dela.

— Parabéns por encontrar um artefato histórico tão magnífico.

Tenho certeza de que convencerá o cavalheiro de que é exatamente o que diz ser. — ela não conseguia tirar o sorriso dos lábios por ter sua amiga aqui. — Eu não consigo dizer com palavras o quanto você estar aqui me faz feliz. Não por você estar com problemas em seu trabalho, mas porque eu terei sua companhia por um mês. Será como nos velhos tempos.

— Falando nisso... — disse Hallie com um olhar inquisidor. —

Ouvi um boato engraçado enquanto estava na cidade, antes de vir para Berkshire. Quer saber o que era?

Ava recostou-se no sofá e tirou os sapatos, cruzou as pernas no assento, embaixo dela. Será que ela ia querer saber das fofocas que sempre correm por Londres? Não, na verdade não, mas o comportamento da amiga, o brilho travesso no olhar dela a deixou curiosa.

— Muito bem, Londres está agitada assim pelo quê? — ela perguntou, já temendo não se interessar pelos mexericos.

— Você é vizinha do duque de Whitstone, não é?

A menção ao nome de Tate a fez endireitar a coluna, e uma pontada de medo a atravessou sem saber para onde a conversa estava indo.

— Conheço o duque há alguns anos, sim.

Ava não havia dito a ninguém que ele a desprezara quando começara a estudar na França. Hallie foi uma amiga nos tempos de escola e parecia contente em não se intrometer em seu passado.

Ava supunha que todas elas, as cinco amizades que havia feito, possuíam seus próprios segredos a serem mantidos bem guardados. Ser abandonada não era algo que uma jovem, seja de qualquer posição social, iria querer anunciar, então Ava tentou se esquecer do que houve e continuar com sua vida o melhor que podia.

Agora que ela sabia que Tate nunca a rejeitara, bem, mudava as coisas de alguma forma, e ela estava desesperada para conversar acerca do assunto com alguém que não fosse o próprio homem. A vida que levava no Haras Knight havia se tornado seu mundo inteiro. Ir para uma escola tão distante a ensinou a confiar e depender de si, e em mais ninguém e, ao longo dos anos, ela se tornou independente. Ela fora capaz de dar continuidade à sua vida de forma alegre e satisfatória sem as amarras da felicidade matrimonial.

Não que Tate fosse a única outra razão pela qual ela se esquivara do casamento, o desastre com Lorde Oakes havia cimentado dentro dela a decisão de que ser uma mulher de meios independentes era preferível a estar à mercê de qualquer marido.

— Há rumores de que ele voltou à cidade e foi visto deixando a casa da amante. A cidade inteira está em tumulto, ou pelo menos é o que Willow está dizendo. Alguns ficaram chocados com o fato de ele ter uma, pois era um caso muito discreto, mas, por infelicidade foi descoberto, é o que está sendo falado.

Willow Perry era outra amiga que Ava fez na escola francesa e residia em Londres com a tia intitulada na maior parte do ano.

— O que Willow disse? — Ava perguntou.

Ela não sabia que o duque havia tomado uma amante permanente. Claro, o erro era dela. Ele era famoso por seus encontros amorosos, pelas modos sociais e hábitos de jogatina desde seu retorno do continente americano. Era natural que ele tivesse um acordo de tal longevidade para satisfazer suas necessidades. Ela se preparou para ouvir, seu estômago revirando ao pensar nele com outra mulher.

— Só que ela é livre para fazer o que bem entender, embora alguns digam que nunca houve um acordo de exclusividade na mesa. Que não passava de uma união de satisfação mútua e nada mais.

Ava engoliu a bile que subia pela garganta.

— Ora, ora. — foi tudo que conseguiu verbalizar.

Hallie continuou.

— Quando ele voltou dos Estados Unidos, há dois anos, as pessoas afirmam que a atração que sentiram no momento em que eles se viram no funeral do marido dela era inegável.

— Ela era casada?

— Ah sim. — continuou Hallie. — Ela é uma dama intitulada.

Lady Clapham, uma viscondessa ainda por cima.

Ava estava sem palavras como nunca esteve. A amante de Tate era uma mulher da classe dele. Sua mente zumbiu ao pensar nisso.

Por que ele não a pedira em casamento? Por que terminar o arranjo agora, depois de tanto tempo...

— A alta classe está em polvorosa de tantas perguntas, sedenta pelo que aconteceu entre eles enquanto a maior parte da sociedade não reparou. Quando soube que ele era seu vizinho, precisei perguntar.

Hallie sorriu.

Graças a Deus, a amiga estava alheia por completo a como a notícia que acabara de dividir ameaçava arrancar o coração de Ava do peito.

— Não estava sabendo. Só porque somos vizinhos não significa que eu tenha algo a ver com a vida pessoal dele. Ele pode fazer o que bem entender, como eu.

Ava desviou o olhar, concentrando-se em nada em particular.

Seu estômago revirava com o mero pensamento de Tate dormir com outra mulher. Até agora, ela foi consciente em seus esforços de se manter longe de pensamentos tão terríveis quanto ele se relacionando ou amando outra pessoa. O duque era um homem que não devia nada a ninguém. Era responsável por suas próprias ações e poderia fazer o que quisesse.

— Claro que sim, minha querida. — Hallie a estudou por um momento. — Você conheceu o duque quando ele era jovem? Dizem que ele é um dos homens mais bonitos da Inglaterra. É verdade?

Faz tanto tempo desde que estive neste país que não conheço mais vivalma além de você e nossas amigas da escola, é claro. Você terá que me esclarecer sobre tudo, Ava.

— Bem, odeio desapontá-la, Hallie, mas seu pequeno boato é a primeira coisa ligada à cidade que ouço em meses. Estive tão ocupada com a propriedade e mantendo os cavalos de corrida em forma e saudáveis que não tenho tempo para socializar.

E era assim que deveria ser. Ava não conseguia pensar em uma maneira mais agradável de passar o tempo do que ao ar livre, cavalgando ou cuidando dos cavalos. Ser uma mulher de sucesso em um mundo de homens:

— Eu me sinto muito contente com a vida que levo.

— Sério? — Hallie perguntou, examinando-a por um momento.

— Você está mesmo feliz? Nenhuma de nós está ficando mais nova,

e a maioria das meninas com quem fomos à escola está casada, com filhos. Eu pensei que você desejasse um futuro assim. — sua amiga recostou-se na cadeira, cruzando as pernas. — Devo admitir que, por mais que eu goste de ser historiadora, de viajar para terras estrangeiras, me pergunto como teria sido minha vida se eu voltasse para a Inglaterra depois de concluir os estudos e tivesse me casado.

Meus pais, que Deus os tenha, amariam tal desfecho, e sinto que os decepcionei um pouco ao seguir meu próprio caminho.

Ava também havia decepcionado o pai.

Ela sabia que ele desejava ter tido netos, vê-los crescer antes de morrer, e que no fim eles herdariam sua dinastia hípica. Por um tempo, ela pensou em realizar tal desejo. Uma decisão que quase a jogou na ruína. Depois disso, Ava se viu decidida a ignorar as normas e expectativas da Sociedade, deixando claro que a Srta.

Ava Knight, do Haras Knight, não estava, de modo algum, à procura de um marido.

Mesmo assim, com toda a independência e proteção que seu status trazia, um homem ainda era capaz de assombrá-la em seus sonhos. Tate.

Ava se levantou e caminhou até o parapeito da lareira e tocou a sineta, queria descobrir o que havia causado o atraso do almoço.

Ela foi até a janela e puxou a cortina de veludo azul e creme para olhar para os gramados.

— Você terá a oportunidade de conhecer o duque de Whitstone.

Ele está hospedado aqui por ora. Os estábulos dele foram destruídos em um incêndio e todos os cavalos de sua propriedade estão abrigados aqui até que a reconstrução termine. Tenho certeza de que quando ele voltar de Londres, você o conhecerá. Talvez até lá haja um novo boato envolvendo Sua Graça, e o anúncio de uma nova amante.

Hallie riu.

— Você não me engana, senhorita Ava Knight. Quando mencionei o duque e que ele estava tirando Lady Clapham de sua vida, não deixei de ver que seu rosto empalideceu ao descobrir que ele mantinha uma amante. Diz que conhece o duque há muitos anos, mas eu me pergunto: o quão bem você o conhece? Porque para mim não consigo evitar de cogitar que o conheça e muito bem.

Ava se recusou a olhar na direção da amiga.

Hallie sempre foi tão boa em ler pessoas. Era uma característica que elas costumavam usar na escola, Hallie decifrava o humor dos professores, de modo que elas soubessem poderiam ser um pouco travessas, ou se precisavam ser boazinhas. Agora, na sala de casa, o discernimento de sua amiga não era bem-vindo.

— Saber da amante a magoou, me perdoe, Ava.

Ela suspirou, não querendo mais mentir para a amiga. Durante anos, ela manteve a dor escondida, mas não havia mais razão para fazê-lo. Hallie era sua amiga, e ela deveria ter confiado a verdade a ela anos atrás.

— Ouvir tais notícias é chocante, eu admito, mas não é nada fora do comum em se tratando da sociedade inglesa. — ela admitiu em voz baixa.

Uma pequena parte dela ainda sonhava com os dois e desejava voltar e lutar pelo que quis para si cinco anos antes. Mas, por mais que doesse tê-lo perdido e não por culpa própria, Ava havia percebido que o desfecho foi para o melhor.

Ela não servia para ser duquesa.

Participar de bailes e festas, ser anfitriã do mais alto calibre da sociedade. Essa vida simplesmente não era para ela. Então, de certa forma, os pais deles a fizeram um favor ao mentir e os separar.

Pois, na mente de Ava, não lhe restava dúvidas de que ela teria

falhado no dever de ser a esposa de um duque e que, no fim, Tate ficaria frustrado e decepcionado por sua falta de gracejos sociais.

Ela nunca seria capaz de lidar com o desapontamento dele. E uma duquesa deveria ser sempre respeitável, incólume, perfeita em todos os sentidos, e ela não era nada disso.

— Eu nunca conheci um duque. — disse Hallie, mudando de assunto. — Será que vou gostar dele, o que acha? — ela perguntou, sorrindo um pouco.

— Acredito que sim. — Ava respondeu, mordendo o lábio enquanto pensava em Tate. — Ele é muito bom e agradável com seus funcionários...

Uma batida na porta soou, e ela ordenou que entrassem. Um criado entrou carregando uma bandeja de prata com chá, frios e pão. Ele deixou a bandeja na mesinha de madeira diante do sofá antes de se curvar e deixá-las.

Ava se pôs a servir o chá, adicionou uma colher de açúcar na xícara de Hallie, lembrava-se que era assim que a amiga gostava, uma pitada de leite, e estendeu a xícara para a amiga. Hallie pegou o chá e encontrou o olhar de Ava por cima da borda da xícara.

— Por que tenho a impressão de que você não está me dizendo algo? O duque distanciar-se de Lady Clapham tem algo a ver com você, Ava?

Ava fechou a boca com um estalo.

Ela se sentou, esperando que o calor que subiu por seu pescoço não fosse perceptível para a amiga.

— Como devo saber o que o duque pensa da amante? — Ava disse, bebendo seu chá.

— Eu acho que você sabe muito mais do que está dizendo. —

Hallie sorriu com malícia.

Ela suspirou, passando um dedo pela lateral do pires de porcelana em que a xícara se apoiava.

— O duque só está aqui por causa do que houve na propriedade dele. Uma circunstância infeliz e muito perigosa. Se quer saber, ele até contratou um agente de Bow Street. Ao investigarem os destroços em Cleremore Hall, descobriram que há grandes chances de ter sido um incêndio proposital. Que alguém queria sim machucar cavalos inocentes.

Hallie franziu o cenho ante as palavras de Ava, toda a alegria desaparecendo.

— Embora eu não goste de montar os animais, pensar que alguém tentaria ferir tantos cavalos deve trazer uma perturbação terrível. Por favor, diga-me que todos sobreviveram.

— Sim, por graças. — disse Ava. — Conseguimos tirá-los a tempo, mas os dois estábulos dos duque sofreram estragos além do recuperável.

Ela pensou na noite em que eles se deixaram cair no chão depois de sair do estábulo que continuava a queimar detrás deles.

Ela ainda podia sentir o cheiro de seus cabelos chamuscados, a dor que a percorria a cada respiração. Ver Tate deitado ao seu lado, ofegante, foi uma visão que ela não desejava rever jamais. O medo paralisante de que ele poderia ter morrido foi revelador, e ela soube naquele momento que ainda carregava sentimentos por ele. Quando Tate levantou a mão e limpou o pó de fuligem de sua bochecha, mesmo a lembrança agora fazia seu coração palpitar no peito.

— E agora, ele está hospedado aqui. — Hallie sorriu mais uma vez, e Ava lutou para não revirar os olhos. — E vocês são amigos.

Não tenho vergonha de dizer, sendo sua amiga também, que adoraria vê-la junto a tão bom partido. Você cogita se casar em algum momento? — Hallie perguntou.

— Não mais. — Ava respondeu num rompante. — Penso que o tempo para tal ocorrência ficou no passado, e que estou bem solidificada em minha posição como solteirona. Tenho vinte e quatro anos, não se esqueça.

Halle estreitou os ferozes olhos verdes.

— E quanto a ter um amante? Você não seria a primeira mulher a fazê-lo, nem a última.

Ava estremeceu com o pensamento. A simples ideia trazia à tona memórias que ela preferia esquecer.

— Não, eu não gostaria disso.

Hallie suspirou, sentando-se na cadeira e apoiando a cabeça no encosto alto.

— Eu tive um, sabe. No Egito. Ele era um major-general ou Liwa como os chamam por lá. Ele era de uma beleza tão fatal quanto sua espada, mas não foi o suficiente para salvá-lo. Houve uma patrulha nos arredores do Cairo, uma pequena escaramuça em uma vila periférica, e ele foi morto por moradores locais.

Hallie ficou quieta por um momento, e Ava não sabia o que fazer, não tendo ideia de que sua amiga havia se apaixonado.

— A pele dele era tão escura e bonita, como cobre sob o céu egípcio. Mesmo agora, seus cabelos e feições escuros fazem meu coração bater rápido. Ele possuía os cílios mais longos que eu já vi, ou vou ver, em um homem, tenho certeza. — Hallie encontrou o olhar da amiga, seus olhos com um brilho intenso. — Foi uma das razões para eu voltar para casa, para a Inglaterra. No Cairo, não importa para onde eu me virasse, as memórias dele me assaltavam.

— Hallie balançou a cabeça, suspirando. — Era muito difícil ficar.

Ava levantou e foi se sentar ao lado da amiga, puxando-a para um abraço apertado. Ela não fazia ideia de que sua amiga havia passado por tanto. Tantos segredos entre todos elas.

— Querida Hallie, sinto muito por sua perda. Se você entregou seu coração a ele, ele era um homem bom e honrado. Fico feliz por ter voltado para casa, e seja bem-vinda a ficar aqui o tempo que precisar para curar seu coração.

— Obrigada, Ava. Eu sabia que você entenderia. Sabe que eu não tenho mais nenhuma família, que sou órfã de fato e, portanto, preciso de minhas amizades neste momento.

— Eu gostaria de tê-lo conhecido. — disse Ava, enxugando uma lágrima da bochecha da amiga.

Hallie fungou, e Ava enfiou a mão no bolso e tirou o lenço, entregando-o à amiga.

— Não sei o que aconteceu de fato, apenas que alguns dos homens dele voltaram ensanguentados e quase mortos. Omar nunca voltou, e alguns dias depois, mais soldados foram atrás dele e o encontraram já morto. Eles o enterraram. E foi tudo o que me falaram.

— Ó, Hallie.

Ava esfregou as costas dela, tentando trazer algum conforto em uma situação que não havia conforto algum. Perder o amor de alguém não era uma separação que se podia superar com facilidade. Ava sabia disso tão bem quanto qualquer um, pois levara anos para superar Tate e o fato de ele a ter abandonado, se é que se podia afirmar que superara.

— Diga-me o que posso fazer, Hallie, para melhorar as coisas para você.

Como ela não fora capaz de ver que sob as risadas e o bom humor, que a amiga sofria com uma perda tão pessoal? Ela se reprimiu por ter se cegado por seus próprios problemas, tão tolos que em nada se comparavam com os de Hallie.

— Estar aqui com você é o bastante para mim, e eu vou superar minha dor, tenho certeza. Mas nunca vou esquecê-lo, ele era o mais amável dos homens, mesmo que nossos passados e religiões fossem muito diferentes.

Ava a abraçou mais uma vez.

— Se você entregou seu coração a ele, não há dúvidas de que ele era uma pessoa maravilhosa. Você também é. E coisas maravilhosas só acontecem com pessoas como vocês.

Hallie sorriu em meio as lágrimas, e Ava prometeu que estaria ao lado da amiga enquanto fosse necessário.

— Agora que você conhece minha pequena e triste história —

disse Hallie servindo mais chá. —, conte-me toda a verdade na sua.

Ava deu uma risada autodepreciativa.

Hallie era muito inteligente para ver através de suas palavras e exigir a verdade que estava por trás delas. Ela balançou a cabeça em reverência por suas artimanhas.

— Muito bem, já que nós duas estamos contando a verdade de nossas vidas, nosso passado triste, eu contarei todas as minhas verdades. — ela se recostou no sofá, cruzando as mãos no colo. —

Há cinco anos; eu e o duque, que era marquês na época, considerávamo-nos apaixonados. Analisando com os olhos de hoje, não tenho dúvidas de que eu o amava, de fato, e com ferocidade.

Estávamos dispostos a fugir e nos casar. Contudo, só há poucos dias veio à tona como nossos pais planejaram para nos afastar.

Nenhum de nós dois sabia dessa participação. Fomos separados por um oceano. Eu fui enviada para a França, para a escola onde nós duas nos conhecemos. O duque foi enviado para a América, para viver com a família da mãe dele nos Estados Unidos. Tanto ele quanto eu acreditávamos que o outro era indiferente. Acreditamos

que o outro havia violado a confiança que partilhávamos. Não é esse o caso, e agora que sabemos a verdade, bem...

Ava se levantou e começou a andar com determinação, o algodão percal de seu vestido subindo a cada passo. Ela parou diante da lareira, segurou-se no mármore polido da moldura e sentiu emergir o ódio por terem sido tão enganados. Que as pessoas que eles amavam e confiavam acima de tudo os enganaram:

— Agora, eu não sei onde estamos. Não sei mais o que sinto. Eu amo minha vida. Eu amo os cavalos e as corridas. Posso andar a cavalo e galopar pelos campos sempre que desejar. Não tenho obrigação de ir à cidade, não preciso participar da Temporada. Não preciso estar à disposição, à espera de um chamado, nem preciso posar como enfeite de um marido. Eu gosto deste modo de vida, de ser dona de mim.

Neste instante, ela assimilou como a volta de Tate tornara a vida dela complicada. De repente, uma confusão. Quando isso aconteceu? Há um mês, ela não carregava nenhuma dessas preocupações, e agora sua mente só pensava nisso. Ela poderia desistir da vida que levava aqui e se tornar uma duquesa? Seria algo que Tate esperaria dela?

Ava mordeu o lábio, não sabia se poderia se tornar a propriedade de outra pessoa agora que havia conhecido a liberdade. Tate não a conhecia tão bem quanto antes, e que quando ele descobrisse a verdade, mesmo que ela quisesse ser a esposa dele, ele poderia considerar que ela não atendia às expectativas.

Hallie pegou o chá e tomou um gole.

— Acredita que o duque ainda gosta de você dessa maneira?

Segundo você, vocês são amigos, será que você seria capaz de almejar mais sem deixar de aproveitar a vida que leva aqui no interior? Mesmo como duquesa?

Ava não acreditava que a vida de agora teria continuidade caso se tornasse a esposa de Tate. Um ducado estava entre os mais altos postos entre a nobreza. A sociedade adorava tê-los em suas festas e eventos. Tate iria querê-la ao seu lado na cidade em todas as temporadas, e ela não era ninguém, talvez uma emergente, mas pouco mais. Uma mulher que se casou para subir na escala social.

Conversariam com ela sim, mas à portas fechadas ela seria o assunto.

— Confesso que ainda penso nele quando estou sozinha. Penso em como seria estar nos braços dele de novo. Estar contra seu tórax rígido, em como seria correr as mãos pelos músculos tesos que sei esconderem-se sob suas roupas. Sentir o toque dos lábios dele nos dela para assombrá-la durante o sono. — Ava abriu os olhos e voltou-se para a amiga. — Não sei o que há de errado comigo. Eu me pensei que havia superado toda essa paixonite.

— Acredito que — disse Hallie, inclinando-se e passando manteiga em um scone antes de colocá-lo em um pequeno prato. —

você ainda gosta do duque e que talvez precise descobrir se ele gosta de você também.

Ava suspirou ao enxergar a lógica por trás do plano da amiga, mas o nervosismo que a fazia sentir-se nauseada ao pensar em ser tão ousada tornariam difícil a concretização da ideia.

— Esse é o problema. Eu sei que gosto dele. Mas não é como eu pensava que seria a minha vida, e não tenho certeza se o quero o suficiente para desistir de tudo o que tenho agora. Eu teria que desistir dessa vida para me tornar uma duquesa. E você consegue me ver em bailes e festas? Coberta de seda e chiffon, carregando o peso da moda e das joias? Não é quem eu sou.

— Acredito que você seria uma duquesa maravilhosa. — disse Hallie com um pouco de bom humor. — Mesmo assim, parece-me

que você tem muito o que pensar. E não precisa tomar nenhuma decisão agora. Presumo que os estábulos do duque estão em reconstrução, que ele voltará para casa muito em breve.

— Sim, os estábulos estão avançando bem. De fato, se você quiser, posso mostrar a você amanhã. Poderíamos ir até Cleremore Hall para dar uma olhada. Vai preencher um pouco do nosso tempo, pelo menos.

Hallie sorriu.

— Parece perfeito.

Ava, contente pela mudança no assunto, afastou as preocupações relativas ao duque. Ela refletiria acerca dele quando estivesse sozinha.

— Precisa me dizer o que gostaria de comer no jantar. Qual é a sua refeição favorita? Vou pedir que preparem para você.

Hallie recostou-se na cadeira, parecia uma mulher sem preocupações no mundo. Quão errado todos estariam ao fazer essa suposição.

— Eu iria adorar qualquer prato que não leve cabra ou ovelha.

Acredito que também não suportaria nem mais uma tigela de arroz.

— Considere feito. — disse Ava. — Vou providenciar agora mesmo, e aproveito para verificar se seu quarto está pronto para você. Estou certa de que está exausta depois de tão longa viagem hoje.

— Obrigada, Ava. — Hallie se inclinou e pegou a mão dela, apertando-a um pouco. — Estou muito feliz por sermos amigas.

Ava colocou a mão sobre a de Hallie.

— Sinto o mesmo, querida. Por mais de coração partido que eu estivesse, minha viagem para estudar na França provou valer a pena. Você, Evie, Willow e Molly consertaram tudo para mim, o que me deixa muito feliz.

NO DIA SEGUINTE, Ava e Hallie partiram para a propriedade do duque. O som de marteladas e de madeira sendo serrada, além do zumbido suave das conversas dos homens trabalhando chegaram a elas. Elas pararam no topo da pequena colina que dava para a propriedade, observando por um momento, permitindo que os cavalos recuperassem o fôlego. Uma carruagem preta e reluzente estava parada na frente da propriedade. Lacaios carregavam depressa um tanto de baús de viagem.

— Será que o duque voltou? — Hallie perguntou, lançando um olhar na direção de Ava.

Ava observou os detalhes do cavalo que agora era conduzido em direção a um pátio próximo.

— Acho que sim, mas ele não veio sozinho.

Ava sentiu o pavor tomar conta de si ao imaginar que a mãe dele havia retornado com ele. A mulher era a única pessoa a ter arquitetado a separação dela e do duque que ainda vivia, e Ava não era do tipo que perdoa. Não quando se tratava de decisões baseadas em despeito e pressão social.

Elas retomaram o avanço, voltando a parar não muito longe de onde os estábulos novos estavam sendo erguidos. Um construtor próximo tirou o chapéu para elas, cumprimentando-as de forma calorosa. Ele veio falar com elas por um tempo e explicou o progresso da construção e que diferenças teriam dos prédios antigos.

Parecia maravilhoso.

A nova construção de tijolos vermelhos e quase todas as paredes já estavam concluídas, e alguns homens estavam no

telhado consertando as telhas em mosaico. O cheiro de pinheiro recém-cortado permeava o ar.

— Está indo bem. — disse o duque, saindo do estábulo e cumprimentando-as com um sorriso. — Não concordam?

Ava olhou do alto de seu cavalo, assimilando as suas botas hessianas e as calças bege que destacavam seu corpo para o deleite do espectador. O cabelo dele, para variar, estava despenteado pela viagem recente, mas fora isso o olhar dele era acolhedor e convidativo. Ava sorriu, animada por vê-lo e conteve um suspiro. Se for para ela permanecer indiferente, em uma simples amizade, ela teria que refrear a apreciação frequente de sua beleza.

A semana em que ele se mantivera longe obscureceu a memória dela de quão atraente ele era. Ao revê-lo ela voltou a ansiar por coisas que não ansiava há cinco anos. Como ela daria continuidade à vida como uma mulher forte e independente que não precisava de um marido para tornar a vida completa enquanto homens como o duque continuassem a desfilar por Berkshire?

Alguém pigarreando trouxe Ava de volta à realidade e às boas maneiras, e ela gesticulou para a amiga Hallie que observava os dois com diversão nos olhos.

— Perdoe-me, Sua Graça, esta é minha melhor amiga, senhorita Hallie Evans. Ela acabou de chegar do Egito onde é historiadora.

O duque fez uma reverência.

— É um prazer conhecê-la, Srta. Evans. Qualquer amiga da srta.

Knight é amiga minha.

— Obrigada pela gentileza, Sua Graça. — Hallie voltou a ostentar um olhar divertido, e cheio de conhecimento, para a amiga antes de descer do cavalo.

Ava também o fez e, entregando os cavalos a um garoto que estava esperando, seguiu em direção à casa principal.

— Eu estava prestes a entrar para o chá.

Tate sustentou o olhar de Ava, e ela não conseguiu desviar nem que sua vida dependesse do movimento. Mesmo a contragosto, ela precisava reconhecer que havia sentido falta dele na semana que passou. Embora soubesse que ele fora até a cidade para se encontrar com amigos, sendo Lady Clapham uma dessas pessoas, o sentimento não abrandava. Seria ela a razão para ele ter rompido o acordo com a amante?

— Não gostaríamos de nos intrometer. Eu queria mostrar a Hallie os estábulos, e não esperava encontrar você em casa. — Ava disse, diminuindo o passo.

— Obrigada pelo convite, Sua Graça. — Hallie respondeu, apertando o braço de Ava e puxando-a na direção da casa. — Eu, por exemplo, adoraria uma xícara de chá.

— Caso precise ir cuidar de outro assento, não há problema. —

Tate informou, sem dúvidas sentindo a relutância de Ava.

— Não há nada a ser feito. — respondeu Hallie antes que Ava pudesse falar. — Vejo que a carruagem trouxe muita bagagem para ser descarregada. Alguém da cidade veio lhe fazer companhia em Berkshire?

O duque limpou a garganta.

— Ah, não. Mas devo dizer que minha mãe veio para ficar por um tempo. Eu pensei que ela iria para uma das propriedades de Surrey, mas a encontrei aqui...

A confirmação de que era mesmo a mãe dele deixou um gosto amargo na boca de Ava e, por um momento, foi quase impossível parecer feliz e cortês por saber que mulher estava de volta à Berkshire. A mãe dele era uma víbora, e agora que sabia que ela participara na separação dos dois... Bem, ela teria sorte se um dia Ava mudasse a opinião que tinha da mulher.

Eles continuaram na direção da casa até que Tate se virou para ela, fitando-a.

— A chegada de minha mãe significa que minha estada na Propriedade dos Knight terá que terminar. Mas fique certa de que deixarei meu melhor cavalariço à sua disposição, e que meus funcionários continuarão a cuidar dos meus cavalos e manterão a vigilância para que o que aconteceu aqui não ocorra com seus estábulos.

Ava estava agradecida pela ajuda dele, mas saber que ele não estaria mais tão perto dela fez com que uma pontada de melancolia a inundasse. Durante o mês em que ele esteve em sua propriedade, ela se acostumou a vê-lo. Trabalhando os cavalos, com as calças de pele de gamo e camisa de camurça e nada mais. Os adoráveis e deliciosos vislumbres dele sempre foram bem agradáveis.

Sem o lenço no pescoço e com a camisa muitas vezes para fora das calça ele poderia, muito bem, ser confundido com qualquer um dos funcionários dos estábulos dela. Exceto pelo fato de ele ter passado por anos de criação ducal, as costas aristocráticas retas perfeitas, os ombros largos e cintura fina. A mente inteligente, que estava sempre maquinado algo por trás daqueles olhos cinzentos, o fazia se destacar de qualquer outra pessoa.

Sempre o fez...

Uma mulher veio de dentro da casa e parou à porta de entrada.

A carranca no rosto da duquesa-viúva dizia à Ava tudo o que ela precisava saber. Se ela tivesse feito preces silenciosas para que a mãe de Tate tivesse abrandado com os anos, tal possibilidade foi eliminada naquele instante junto da esperança de que a mulher sentisse, nem que fosse uma pequena fração, algum tipo de ressentimento por separar o filho da mulher que ele amava.

— Talvez seja melhor voltarmos para casa, Sua Graça. — Ava disse depressa. — O senhor e a duquesa-viúva viajaram bastante hoje, não queremos nos intrometer.

— Não vá.

As palavras dele foram tão baixas e suaves que Hallie nem esboçou ouvi-las.

— Acredito ser o melhor. Sua mãe não parece feliz em me rever.

Tate virou-se para observar a mãe e, em seguida, voltou-se para Ava.

— Nunca pensei que fosse do tipo que se importava com o que os outros pensavam.

Se ele a estava incentivando a entrar... bem, estava funcionando.

Se havia uma coisa que Ava não gostava acima de qualquer outra coisa, era de ser derrotada por inimigo. E a duquesa de Whitstone decerto que se encaixava nesta categoria.

ACOMPANHANDO AS MULHERES casa adentro e em direção à sala de visitas do fundo que era banhada pelo sol da tarde, Tate pediu chá e comida, sentindo-se feliz com o fato de estar em casa.

Ficara fora apenas uma semana e já estava de volta à Berkshire, sua residência preferida no país, e estar a poucos quilômetros de Ava era realmente um prazer.

Ele sentira falta dela enquanto estava na cidade, e vê-la inspecionando seus estábulos hoje junto com a amiga, trouxe uma explosão de alegria diferente de qualquer outro sentimento que ele já vivenciara. Ele considerou que era algo parecido com o que ele sentiu ao pisar em solo inglês depois de tantos anos na nos Estados Unidos.

A decisão de remover Lady Clapham de sua vida havia trazido satisfação também. Ele esperava que, nas próximas semanas, pudesse provar a Ava mais uma vez que ela seria perfeita como esposa e futura duquesa de Whitstone. Por mais independente que ela tenha se tornado, tê-la ao lado dele na cidade como sua duquesa, ter a atenção, o cuidado e a orientação dela na vida dele era o que ele mais queria. Ele havia ficado ocioso por tanto tempo, de um certo modo até perdido, sem ela. Ser duquesa vinha com responsabilidades, mas ele estava certo de que Ava era capaz de cumprir tais obrigações.

Elas sentaram-se diante dos bancos sob as janelas que proporcionavam uma bela vista lá de fora. O padrão floral em seda no sofá e em outros móveis combinava com o toque feminino do cômodo e com sua localização com vista para um jardim de rosas.

Preferindo manter-se de pé, Tate esperou que a mãe iniciasse uma conversa com as convidadas, mas, diante do silêncio contínuo, e o olhar de aço dela enquanto esperavam o chá, ele interpelou e apresentou Ava e a Srta. Evans mais uma vez.

— A Srta. Evans acabou de voltar do Egito, mãe. — disse Tate, tentando dissipar a tensão na sala.

A expressão de sua mãe dizia que ela não estava nada impressionada.

— O Egito, diga por favor, me explique o que uma jovem como você está fazendo em um ambiente tão remoto e severo. Um local bastante estranho para você, alguém poderia pensar.

Hallie sorriu; toda doçura e, no entanto, o olhar dela disse a Ava que sua amiga não iria ser enganada pela viúva e por seus modos calculistas.

— Estive no Egito nos últimos dois anos estudando tumbas, pirâmides e alguns outros sítios ao longo do Nilo. Suponho que se

possa dizer que eu estava cavoucando na areia atrás de sarcófagos ancestrais e artefatos. Embora esta seja uma explicação bem simplificada para o que eu faço.

— E você pretende voltar? Não deseja se casar? — a viúva olhou para Hallie com um ar contemplativo. — Você já está passando da idade, se me permite dizer, Srta. Evans.

Tate precisou dar pontos à Srta. Evans por não externar nenhum sentimento de ofensa perante os comentários de sua mãe. Ele lançou um olhar de advertência para a mãe, que foi recebido com um levantar de nariz e nada mais.

— Ficarei na Inglaterra apenas por um curto período; vim visitar amigas, como Ava, e concluirei alguns negócios. Mas pode ter certeza de que voltarei ao Egito ou a algum outro lugar que ofereça um sítio histórico tão rico.

— Vai ficar muito tempo em Berkshire, Sua Graça? — Ava perguntou, sorrindo um pouco para a mãe de Tate e recebendo nada além de um olhar frio e calculista de volta.

— Ficarei aqui por algumas semanas. Há alguns amigos com quem gostaria de conversar, e claro, meu filho está aqui.

Tate não comprou a conversa da mãe nem por um momento, e nem se deu ao trabalho de lembra-la de que eles haviam se visto na cidade na semana que se findara. Ou que ela não deveria estar aqui, mas na Residência da viúva.

— Eu estava contando à Srta. Knight e à Srta. Evans que os estábulos ficarão prontos em breve. O que significa que meus animais não alterarão sua rotina por muito mais tempo, Srta. Knight.

Não que ele quisesse trazê-los de volta. Ter seus cavalos na casa de Ava era uma garantia de poder vê-la com frequência, de conversar com privacidade.

— Que boas notícias, querido. — disse a mãe dele. — Um duque deve permanecer em suas propriedades quando não estiver na cidade cumprindo seus deveres lá.

Hallie se engasgou, o que resultou em uma tosse. Tate suspirou ante o insulto velado da mãe.

— Srta. Knight, agora que voltei de Londres, estou mais que satisfeito em permitir que Titan receba sua égua. Assim que ela estiver no cio, vamos tentar reuni-los.

A mãe dele murmurou algo baixinho, mas Ava sorriu para ele.

— Verdade? Ó, obrigada, Sua Graça. Estou muito feliz que tenha mudado de ideia.

Ele sorriu para ela e era visível que ela queria abraçá-lo, algo que ela fazia bastante quando eram mais jovens se estivesse animada. Ele sentiu falta do rosto bonito e da alma bonita. Os traços finos dela eram impecáveis, a pele era parecida com alabastro, exceto pelo nariz, onde um pouco de sardas percorria suas bochechas. Seus olhos brilhavam de excitação, os cílios escuros e sobrancelhas de um arqueado perfeito dariam inveja em toda Londres quando ela chegasse lá nos braços dele.

Como a mãe dele podia pensar que ela era de beleza comum estava além da compreensão dele. Ela era muito superior a ele em todos os aspectos que importavam.

— Precisamos mesmo discutir tais assuntos, Tate, meu querido?

A conversa não é muito apropriada, não acha? — disse a mãe dele, o tom cheio de censura direcionado para Ava.

— Sobre o que você prefere conversar, mãe? As últimas fofocas da cidade, ou que escândalos estão em curso entre seus pares?

Nenhum dos quais me interessa.

— A mim interessa, e é tudo que importa, não é? A viúva sorriu.

— Eu bem ouvi alguns rumores acerca de um certo cavalheiro nobre

que andou sendo tolo e quase causou um escândalo para a própria família. Agora... — ela disse, batendo com o dedo no queixo. —

Deixe-me pensar para ver se lembro de quem se trata.

Tate olhou para a mãe, que estava brincando com fogo.

Ele voltou a atenção para Ava.

— Por falar no meu garanhão premiado, como está Titan, senhorita Knight? Espero que ele esteja se comportando em seus estábulos, sem se empolgar demais na frente das éguas? O cavalo, tão rápido e brilhante como ele era, também era vaidoso, se é que cavalos podiam ter tal característica.

— Todos os seus cavalos estão com plena saúde, e alguns dos seus cavalariços os levaram hoje de manhã para um galope, percorrendo algumas das pistas de corrida. Acho que ficará satisfeito com o desempenho de alguns de seus animais mais novos.

Que mulher maravilhosa ela era, inteligente e apaixonada. Ela amava as mesmas atividades que ele. Na verdade, foi o pai de Ava que despertou a paixão de Tate pelas corridas, e ele de fato precisava agradecê-lo pela direção que sua vida tomara longe das propriedades ducais de seu pai.

— Você ainda gosta de correr e se enfiar nos estábulos, senhorita Knight? Vejo que a Escola de Etiqueta na França não a livrou disso.

A mãe dele ostentava um olhar de satisfação, ausente de um pingo de remorso pelas palavras nada apropriadas, na direção de Ava.

Tate virou-se para a mãe.

— Há mais...

— Acredito, Sua Graça — Ava disse o interrompendo. — que a senhora está certa. A escola não me tirou minhas paixões, nenhuma

delas, e agora que estou de volta a Berkshire, estou muito satisfeita com o que está diante de mim.

Ava lançou a Tate um olhar diabólico e, incapaz de se conter, ele riu. A boca de sua mãe franziu em uma linha de descontentamento.

— Suponho que deveríamos contratar seus serviços, Srta.

Knight, para trabalhar em nossos estábulos, já que gosta tanto de tais passatempos. Quanto um cavalariço ganha hoje em dia, Tate, meu querido? — a mãe perguntou, a voz pingando doçura inocente.

— A Srta. Knight é uma empresária bem-sucedida, mãe. Ela não precisa procurar emprego aqui.

Tate lançou um olhar de advertência à mãe, que ela ignorou com mais um levantar de queixo. Caso fosse necessário, ele a escoltaria para fora da sala antes que ela continuasse a insultar Ava.

Sem pestanejar, Ava respondeu:

— Você sabe tão bem quanto eu, Sua Graça, que herdei os negócios, os bens e as terras de minha família. De fato, se eu quisesse, poderia valsar por toda Londres e participar dos mesmos eventos que você. Mas, infelizmente, neste caso, você não pode arcar com o que custaria para me ter trabalhando aqui.

A viúva estreitou os olhos.

— Srta. Knight, você está enganada. As esferas em que circulo não recebem moças se origens plebeias entre os seus. O que me faz me perguntar por que estou aqui oferendo chá para vocês.

— Bem, suponho que seja porque seu filho, o duque, nos convidou, e não você. Então, tecnicamente, você não está nos oferendo nada. — Ava disse, tomando um gole de chá como se a conversa girasse em torno das estações.

Houve uma batida leve na porta e um lacaio entrou carregando chá e doces antes que mais palavras pudessem ser ditas. Tate já

ouvira o suficiente, e caminhando até a mãe, pegou a mão dela e a puxou para ficar de pé.

— Por favor, desculpe-nos um instante. — ele disse.

A mãe dele sorriu, mas não disse outra palavra enquanto ele a arrastava para fora da sala. Assim que estavam em segurança no corredor perto da escada, ele a girou.

— O que deu em você? Como pode ser tão rude? Eu a avisei, ainda em Londres, acerca desse comportamento. Não irei tolerar.

O rosto dela estava cheio de raiva, os olhos em fúria.

— Não volte a trazer aquela mulher aqui. Ela não é bem-vinda e nem é adequado que nós, um duque e uma duquesa, tenhamos que nos sentar e tomar um chá com uma treinadora de cavalos.

Tate lutou para controlar a própria fúria. Ele deu um único passo para se aproximar dela, apontando um dedo a centímetros do nariz erguido da mãe.

— Não quero que você fale com ninguém que eu convide para minha casa daquela maneira. Você tem uma escolha, mãe. Ou retorna àquela sala e pede desculpas à Ava de forma civilizada, ou pode arrumar suas coisas e deixar estar propriedade.

A mãe dele ofegou.

— Você expulsaria sua própria mãe? Trocaria a mulher que deu à luz a você por uma plebeia que se jogou em cima de você antes que você fosse maduro o bastante para compreender as implicações de atitudes tão insensatas e joviais.

Tate rangeu os dentes, tendo ouvido o suficiente.

— Instrua sua criada pessoal para que volte a guardar seus pertences nas malas caso ela já tenha desfeito todas. Você parte para Londres ao amanhecer.

A mãe dele correu pelas escadas.

— Eu não vou a lugar nenhum, Tate, e não tente me forçar a nada ou nunca o perdoarei.

Tate levou um momento para recuperar a compostura antes de voltar para a sala, apenas para encontrá-la vazia. Ele voltou ao corredor, e abriu a porta da frente. Ao longe, perto dos estábulos, ele pôde ver Ava e a amiga subindo nos cavalos.

— Droga. — ele xingou, observando-as por um momento antes de fechar a porta.

Não era assim que ele queria que seu tempo com Ava terminasse hoje, depois de passar uma semana fora. A presença da mãe aqui tornaria difícil que ele confraternizasse com Ava e ele teria que ficar de guarda quando ela estivesse presente. Pois, se uma coisa era certa, a mãe dele não queria nada de bom e estava decidida a trazer o inferno à Terra. E parecia que recorreria até aos modos mais grosseiros para mantê-los separados.

CAPÍTULO 9

Confiei no seu amor, nas suas palavras e ainda não consigo entender como pude estar tão errada. Que todo esse tempo você estava preso a um acordo que não queria. Sinto muito por ter acreditado que não poderia ser honesto comigo.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

A VA INCITOU Gallant Girl o mais rápido que pôde nas pistas em que treinavam os cavalos. Hoje era um teste para ver se ela conseguiria um bom tempo em uma corrida de verdade e, com alguma sorte, um tempo que venceria algumas corridas que antecedem Ascot.

— Ótimo trabalho. — disse o treinador, enquanto ela diminuía a velocidade para um galope lento até que se tornasse um trote. A respiração do cavalo era rápida e, no ar fresco da manhã, vapor subia de seu corpo e de suas narinas.

O coração de Ava deu um pequeno pulo quando viu Tate em pé ao lado de seu administrador. Ele era mais alto do que os outros em torno dele, e hoje ele estava vestido com um belo casaco grande, com a gola de pele de raposa cinza aconchegada ao redor do pescoço, mantendo-o quente. O gorro de lã era o toque final ao visual casual, e cada vez que ela o via, ele a atraía, tentava-a como ninguém jamais havia conseguido. Ele a tentava a viver uma vida

diferente àquela que ela havia trabalhado com tanto afinco para se proteger.

Ela tateou o rosto em busca de lama que poderia ter voado dos poucos cavalos que estavam cavalgando à sua frente e esperava que ela não parecesse uma piada, sorriu.

— Que surpresa agradável, Sua Graça. Não esperava vê-lo aqui tão cedo de manhã.

Ela fez um último carinho no cavalo seguido de um tapinha no pescoço antes de saltar. Um jovem cavalariço se aproximou e pegou as rédeas dela, antes de levar Gallant Girl de volta aos estábulos onde ela receberia uma merecida massagem.

— Eu me levantei cedo. — respondeu o duque. — Um pequeno problema com os estábulos de casa e pensei em supervisionar meus cavalos, já que ainda estão aqui.

Ava esperava que ele quisesse vê-la, mas ela assentiu, feliz em vê-lo não importava o motivo para ele estar ali.

— Muito bem então, Sua Graça.

Greg levantou o relógio de bolso, sorrindo.

— Boa volta hoje, Srta. Ava. Pode ser que já tenhamos uma chance.

— Chance? — o duque perguntou, olhando entre eles.

— Queremos inscrever Gallant Girl em Ascot no próximo ano.

Acreditamos que ela tem chances de ficar entre os primeiros, e ela nunca esteve em melhor forma.

— Quem não arrisca, não petisca. — disse Greg, inclinando o chapéu. — Estou de partida, então. Nos vemos mais tarde, Srta.

Ava.

Ava assentiu e voltou-se para Tate, que a estava encarando. A inspeção intensa dele a deixou sem fôlego, e ela esperava que ele

não percebesse o calor que tomava conta de seu rosto naquele momento.

— Se levar Gallant Girl para competir em Ascot, podemos ter de enfrentar um ao outro. — a voz profunda dele fazia com que fosse difícil ela se concentrar nas palavras que ele dizia.

Ava se recompôs e se concentrou.

— Não tenho esperanças de vencer, decerto que não contra Titan, mas espero alcançar uma boa colocação. Acho que minha Gallant Girl é capaz disso.

— Eu nunca duvidaria. — ele gesticulou para que caminhassem em direção à casa. — Posso acompanhá-la de volta para casa? Há algo que desejo discutir com você.

Ava o estudou por um momento e notou que as sobrancelhas dele estavam franzidas.

— Há algo que o incomoda, Sua Graça? — ela perguntou.

Ele franziu mais o cenho, a boca curvada para baixo.

Ela não gostou de vê-lo dessa forma, e sentiu uma vontade avassaladora de confortá-lo. Uma reação que ela não teve nos últimos cinco anos, com ninguém mais.

— Houve outro incêndio. Dessa vez foi na propriedade de Lorde e Lady Morton, no sul de Berkshire. O incêndio começou no meio da noite e, infelizmente, eles perderam dois cavalos e um dos cavalariços.

Tate passou a mão na mandíbula, e Ava percebeu que ele não havia se barbeado pela manhã.

— Ó, meu Deus, não. — Ava piscou para segurar as lágrimas pela perda da vida de um jovem cavalariço e dos pobres cavalos. —

Como estão Lorde e Lady Morton?

— Devastados, eu presumo. Estou indo para lá agora e queria saber se gostaria de vir comigo. Lady Morton pode precisar de uma

amiga neste momento, e eu sei que ela gosta muito de você.

Ava sentia muito apreço também por Lorde e Lady Morton. Lady Morton em particular a ajudou a resolver alguns problemas que teve no ano anterior. Um apoio que veio numa época de que ela preferiria se esquecer. Um calafrio percorreu sua espinha, e ela afastou as lembranças alarmantes.

Era um casal de idosos, e com frequência faziam Ava se lembrar de seu próprio pai, adoravam os cavalos e a vida no campo, e não cobiçavam nada que estivesse além de seus portões.

A honorável senhora mostrara-se bem contente de desistir da vida em Sociedade e se estabelecer no interior. Ava sempre amou isso neles. Os dois faziam o que lhes apraziam e ignoravam o que os demais poderiam vir a pensar. Um sonho que ela e o duque já dividiram, mas que agora com tantas responsabilidades longe de Berkshire, ela já não estava tão certa de que ele poderia abandonar Londres por tantos meses e se esconder no interior.

— Claro que eu vou com você.

Ava chamou Manny e, em poucos minutos, os dois estavam galopando pelos campos ao sul, em direção à propriedade dos Morton. Com o orvalho ainda no chão, e os pássaros cantando suas melodias matinais, o sol se levantou ao lado deles, aquecendo a terra e dando a partida para um novo dia.

Ava não pôde deixar de pensar na terrível tragédia pela qual as famílias Morton e do jovem cavalariço passavam naquele exato momento.

— Sua Graça, acredita que este incêndio também foi proposital?

Tate, que estava ao lado dela, a fitou e o olhar de desprezo que ele ostentava dizia que sim, que ele acreditava na possibilidade.

— A missiva que recebi de Lorde Morton afirma que um trabalhador testemunhou uma sombra correndo do estábulo onde o

primeiro incêndio ocorreu. O trabalhador disparou o alarme na mesma hora e, no entanto, os estábulos foram consumidos com muita rapidez, e ficaram descontrolados antes que algo pudesse ser feito de fato.

— Você avisará deste novo incidente ao agente.

Tate assentiu.

— Enviei a carta de Lorde Morton junto de minha missiva, para servir de prova do incêndio. Estou certo de que o investigador chegará a Berkshire nos próximos dias. Pedi a ele que viesse disfarçado, claro. Para tentar descobrir algo.

— Creio ser o melhor. — disse ela.

Eles cavalgaram por meia hora, a jornada completa não deveria levar mais do que uma hora. Tate diminuiu a velocidade da montaria quando chegaram a um bosque, e Ava seguiu o exemplo. A mente dela estava dominada sobre teorias acerca dos incêndios nas propriedades que circundavam a dela. Havia mais um vizinho nas redondezas, e ela enviaria um bilhete para que se mantivesse alerta. Melhor prevenir do que remediar.

— Vamos descansar os cavalos por alguns minutos e continuar.

Ava parou ao lado dele, e dando rédea à Manny, permitiu que o cavalo mordiscasse a grama a seus pés. Ela aproveitou a oportunidade para observar o entorno. Um lampejo de movimento no vale chamou sua atenção, e ela estreitou os olhos tentando ver o que havia se movido.

— O que é aquilo lá nas árvores? — ela apontou para onde vira o movimento pela última vez, e Tate se virou naquela direção. — É

um homem andando a cavalo pela base do prado?

A pessoa, que não sabia que Ava e Tate estavam ali, saiu de uma área de mata mais fechada, e ela pôde vê-la melhor. Vestia-se com roupas escuras, um casaco longo e um chapéu de aba larga

havia sido puxado bem para frente, cobrindo seu rosto. Ele estava indo para o norte e parecia vir de uma direção ao sul. Estranho, considerando que um homem vestido da mesma forma acabara de queimar os estábulos ao sul daqui...

— Devemos descer e ver quem é. Considerando que houve um incêndio apenas algumas horas atrás, e agora vemos este cavalheiro cavalgando para o norte, seria justo questioná-lo. Ele pode ter visto alguém ou algo. — disse o duque sem tirar os olhos do sujeito.

Ou poderia ser o culpado.

Ava não disse tais palavras em voz alta, mas não pôde deixar de imaginar. Havia alguém na área iniciando esses incêndios. Poderia ser qualquer um de seus conhecidos, ou um completo estranho.

Nesse momento, eles não podiam isentar uma única alma.

Tate pegou as rédeas e incentivou sua montaria com o pé. Ava fez o mesmo, e eles galoparam em direção ao homem, e o cavaleiro que seguia para o norte ainda não os notara. Quando se aproximaram, o barulho baixo dos cascos no gramado úmido embaixo deles avisou ao cavalheiro de sua presença.

Ele olhou por cima, claramente surpreso, e Ava puxou o cavalo quando ela notou que ele estava com um cachecol amarrado no rosto, cobrindo a boca e o nariz. Apenas os olhos dele eram visíveis, mas a essa distância ela ainda nunca seria capaz de distinguir quem poderia ser, caso sequer o conhecessem.

Sem hesitar, o homem esporeou o animal com força passando a um galope veloz. O fato de que a intenção dele era a de fugir fez com que os cabelos da nuca dela se arrepiassem, e Tate foi atrás dele, incentivando seu cavalo na direção em que o cavaleiro havia partido.

Eles correram atrás dele.

O cavaleiro continuou se esforçando para abrir distância, e Ava seguiu Tate por uma pequena sebe, abrindo caminho entre árvores e campos que não pareciam retardar o homem questionável.

O cavaleiro olhou por cima do ombro mais uma vez, e Ava o ouviu xingar. Conhecendo Berkshire tão bem quanto ela, Ava percebeu que estavam chegando a uma parte da região que era atravessada por um riacho mais adiante, algumas partes eram profundas o suficiente para nadar, e outras bem rasas.

— Ele vai precisar desacelerar para atravessar o riacho. — ela gritou para Tate, apontando para o curso d'água que agora estava aparecendo.

Tate assentiu.

— Vamos pegá-lo lá e descobrir o que quer.

Ao sair de uma pequena área arborizada, um galho de árvore ricocheteou e atingiu Ava na bochecha, trazendo lágrimas aos olhos. Ela tocou na área ferida, e ao recuar a mão enluvada, notou sangue nela. Continuaram a seguir o homem até o riacho, e quando Ava pensou que o homem pararia e seria questionado pela fuga, ele forçou o cavalo a atravessar a água. As patas do cavalo escorregaram por um momento, e o homem teve dificuldade para se manter sobre o animal.

— Pare! — gritou Tate que foi ignorado pelo cavaleiro que alcançou o outro lado da margem. — Por que corre?

O homem não se deu ao trabalho de responder, apenas subiu uma pequena colina. Eles o perderam de vista um momento antes de Ava, ao perscrutar as árvores, o reencontrou.

Ela parou ao ver uma pederneira apontada bem para eles.

Tate fez menção de incitar a montaria a seguir, mas Ava esticou a mão e o segurou pelo braço. — Ele está armado, Tate, olhe. —

disse ela, empurrando o cavalo para trás.

— Maldição. — Tate murmurou, e fez o mesmo.

Era tarde demais para correr, e os dois estavam em campo aberto, alvos fáceis, se analisassem a situação. O homem ergueu a arma, e Ava girou a montaria depressa, sabendo que precisavam afastar-se o mais depressa possível.

Um tiro ecoou no ar, e o cavalo de Ava empinou. Ela tentou se segurar, mas não conseguiu, e então percebeu que não era só ela que iria cair. Voando para trás, seu cavalo também perdeu o equilíbrio e tombava. Ava caiu com força, e uma dor lancinante rasgou seu braço do pulso até o ombro. Felizmente, Manny não caiu em cima dela, mas rolou ao seu lado e logo recuperou o equilíbrio e ficou de pé.

O som de um cavalo em retirada ecoou nas árvores e, em seguida, os braços reconfortantes de Tate a envolveram quando ele ajoelhou-se, os olhos dele repletos de medo enquanto a examinava em busca de um ferimento de bala ou outro causado pela queda.

— Eu estou bem. Apenas caí, nada mais.

Ava movimentou-se para ficar de pé, mas fez uma careta de dor quando seu braço se recusou a completar o movimento.

— Você está ferida. — disse ele, ajudando-a a se apoiar.

Ava tentou mover o ombro e descobriu que ele estava bem na medida do possível, porém ao tentar movimentar o pulso sentiu dor atravessar a articulação.

— Acho que o pulso... — ela fez uma careta.

Tate arrancou a gravata do pescoço e a amarrou no pulso dela, tentando limitar o movimento. Ava não pôde deixar de vislumbrar o pescoço exposto de Tate agora que a gravata dele estava com ela e, por um momento, se esqueceu do homem na colina e do perigo em que ainda poderiam estar correndo.

Ela olhou por cima do ombro para onde o vira pela última vez, mas não havia mais ninguém lá.

— Ele partiu no momento em que a arma disparou. Sinto muito por tê-la colocado em perigo, Ava. Eu não deveria ter iniciado uma perseguição com você ao meu lado.

Ela balançou a cabeça quando ele a ajudou a se levantar. Com o braço bom, ela espanou o traje de montaria e retirou algumas folhas e galhos do cabelo.

— Ninguém, além daquele homem, é culpado pelo que houve aqui hoje. Nenhum de nós sabia o que ele ia fazer.

Tate não pareceu convencido, mas ele a ajudou chegar até o cavalo, sem deixar de verificar Manny e certificando-se de que a égua estava sem ferimentos.

— Consegue cavalgar?

— Creio que sim, mas vou precisar de ajuda para subir na sela.

Uma fração de segundo após as palavras serem ditas em voz alta, Tate a pegou como se não pesasse mais que uma pluma e a posicionou na sela. Ele assobiou para a própria montaria se aproximar antes de ajustar o braço dela para ficar contra o peito durante a volta para casa.

Ele se levantou no cavalo, o que proporcionou a ela uma bela visão de seu traseiro.

— Obrigada. — disse ela, afastando o olhar, mas não antes que ele a pegasse olhando para ele.

— Venha, vamos voltar para sua propriedade e mandarei chamar um médico de imediato. Se o pulso estiver quebrado, ele saberá o que fazer.

Ava esperava que não fosse o caso, e sim uma simples torção. A volta para casa foi desconfortável, mas a restrição improvisada

ajudou de alguma maneira a impedir que a mão se movesse e sacudisse a articulação.

Tate a inspecionava com frequência, os olhos dele plenos de preocupação, e o coração dela se aqueceu por ele se importar. Era bom que os dois fossem amigos outra vez. Ela sentia mais a falta dele do que era capaz de admitir.

— Você sempre se importou com as outras pessoas. Mesmo agora, tantos anos desde que nos conhecemos, ainda é uma alma carinhosa, não importa o quanto tente me dissuadir desse fato.

— Não o bastante já que foi ferida. — ele franziu a testa. — A culpa é minha. — ele repetiu, olhando de esguelha para a mão dela que estava bem segura contra o peito. — Eu deveria ter ido atrás dele sozinho em vez de tê-la colocado em perigo como fiz.

— Que bem isso faria? — Ava respondeu, não querendo ouvi-lo se culpar nem um pouco. — Nós não sabíamos que o homem estava armado, ou que ele iria fugir. Acredito que podemos concordar que o cavalheiro não era de bem e que pode ser o responsável pelos incêndios.

Ele suspirou, inclinando-se e protegendo as costas dela enquanto os cavalos avançavam por uma inclinação mais íngreme no campo. A mão quente dele contra sua coluna causou arrepios, e ela fechou os olhos por um momento, deleitando-se com o toque dele outra vez, com a sensação de tê-lo tão perto quanto agora.

— Acredito que você pode estar certa. Creio que devo escrever para o agente mais uma vez, essa noite ainda.

Ava lançou um sorriso para ele.

— Creio que sim.

A volta para casa foi lenta. O tempo começou a mudar e, quando a luz do sol desapareceu detrás de uma nuvem, Ava se arrependeu

de não ter trazido seu casaco de montaria mais grosso nessa viagem.

— Está com frio? — ele perguntou, puxando o cavalo para uma parada. Ava fez o mesmo, olhando para o céu, que agora parecia estar prestes a desabar.

— Um pouco, mas devemos chegar em casa daqui a pouco.

Não que fosse adiantar, já estava se sentindo bem gelada. Ela estremeceu de novo, e Tate saltou do cavalo, caminhou até ela e ergueu no cavalo, detrás dela.

Ela ficou rígida quando o corpo dele encontrou com o dela, duro.

Eles não ficavam tão perto assim desde o dia anterior à fuga planejada, e ela engoliu em seco sem saber o que fazer assim do nada.

Tate ficou quieto por um momento, e ela se perguntou no que ele estava pensando. O corpo dele estava tenso, era duro e largo, e de certa forma lançava uma sobre ela. Ela sorriu quando ele se inclinou, pegou as rédeas das mãos dela e incitou a montaria a prosseguir.

O cavalo dele os seguiu.

Aroma de sândalo permeou o ar ao redor deles e trouxe consigo uma enxurrada de lembranças de quando ele a cortejara. De quando ele o beijou no pescoço uma vez no grande celeiro que estocava feno, e de quanto ela passou a amar o cheiro amadeirado desde então. O corpo dele se movia a cada passo do cavalo, e ela sentiu calor subir pelas bochechas.

Usando uma das mãos para guiar o cavalo, ele passou o outro braço pela cintura dela, mantendo-a com mais firmeza contra ele.

Ela ofegou e conseguia ouvir a respiração dele entrecortando contra sua orelha.

A respiração dela também estava irregular, como se tivesse acabado de correr. Em anos anteriores ela teria se virado e o beijado enquanto seguiam, mas agora isso não era possível. Por mais que ela odiasse admitir, a mãe de Tate estava certa. O homem detrás dela precisava de uma mulher apta para o papel de duquesa.

E Ava, com suas calças e botas curtas cobertas de lama, seu amor por cavalos e corridas nunca seria adequada para o papel. Ele precisava de uma lady em seu sentido mais literal. Ela nunca seria uma dessas. Não de verdade. E, no entanto, caramba, uma parte dela o queria com um fervor que afugentava qualquer calafrio.

Ela não havia nascido para ser uma duquesa, mas não significava que eles não pudessem chegar a outro tipo de acordo.

Um que fosse agradável para os dois.

Ava colocou a mão sobre a dele e apertou-a um pouco.

— Eu sei que você está preocupado, mas, sinceramente, acredito que seja apenas uma torção. Você bem sabe que eu já sofri acidentes piores à cavalo.

Ele rosnou seu descontentamento e, para a surpresa dela, ela conseguiu sentir o leve toque dos lábios dele em seus cabelos.

— Não posso perdê-la de novo. Quando vi você cair, pensei que o tiro a havia acertado. Ou que o cavalo cairia sobre você.

Ela esfregou a mão enluvada dele, sentia-se gostar da preocupação dele mais do que deveria. Isso era ruim. Ela não deveria permitir tais liberdades, toques íntimos, mas como poderia recusar...

— Não acredito que ele seja um bom atirador.

Ele riu, e o movimento penetrou a alma dela, iluminando-a de uma maneira que ela não sentia há anos. Desta vez, ele beijou seus cabelos, e lágrimas brotaram nos olhos dela. Ava preferiu atribuir as lágrimas à dor no pulso, mas não era o motivo.

Este homem, seus cuidados e natureza doce sempre fizeram suas defesas desmoronarem. Como ela se negaria a ficar perto dele quando o queria tanto assim?

Só não queria o papel da duquesa. Ava mordeu o lábio, despedaçada por tudo. A atração por Tate sempre que estavam perto um do outro tornava-se maior a cada dia. Mais do que nunca, agora que eles sabiam a verdade acerca da separação deles.

Ignorar tal atração era uma batalha que vinha enfrentando dia após dia, mas não queria mais lutar.

Às vezes, ela queria se encaixar nos braços dele, inclinar-se e beijá-lo como no passado e ver para onde ele a carregaria. Para um futuro com que ela sonhara, mas que aprendera a viver sem.

CAPÍTULO 10

O S DOIS DIAS seguintes foram um borrão de dor e momentos inquietos de sono. Não importa para que lado ela se virasse na cama, ou se andasse pela casa, o ato resultava em um movimento do pulso e dor se espalhava pela região.

Ava rolou na cama, a luz do sol inundando o quarto e interrompendo seu sono. A visão de uma forma masculina sentada em uma cadeira ao lado de sua cama afastou todo o sono de seu corpo. Ela sentou-se, encolhendo-se quando o pulso protestou contra o movimento.

— Tate, o que você está fazendo no meu quarto? — ela olhou ao redor depressa, notando que estavam sozinhos. — Você não deveria estar aqui. — ela sussurrou.

Tate estava sentado em uma cadeira, um livro descartado aberto em seu colo. Ele se inclinou na direção da cama, e pegou a mão dela.

— Cheguei cedo para observar o treino de Titan e queria estar aqui para quando você acordasse. Trouxe o café-da-manhã para você. — ele se levantou e foi até um aparador, pegou a bandeja e a colocou ao lado dela na cama. — Como está se sentindo? — ele perguntou.

Ava se ajustou nos travesseiros.

— Fora o pulso doendo, me sinto bem. A tisana que Hallie faz para mim está funcionando muito bem. Não tenho certeza do que mais ela coloca, mas seja o que for, a erva é bem benéfica. Sou grata pela companhia dela.

Ela olhou para a faixa envolvendo o pulso, a camisola um pouco aberta no pescoço. Ava agarrou os cobertores e os puxou para o peito. Tate olhou para ela por um momento, antes de suspirar, vindo sentar-se na cama dela.

— Eu estava com tanto medo de haver mais lesões e não posso dizer o quanto estou agradecido pela bala não a ter acertado. O

médico diz que você ficará bem, após uma semana ou duas de descanso.

Recostando-se nos travesseiros, ela conseguia imaginar sua aparência. Uma mulher que fora incapaz de fazer muito por si nos últimos três dias e, como havia acabado de acordar, seu cabelo estava torto, os olhos inchados de sono. E, no entanto, o olhar de total adoração que ela via no rosto de Tate a lembrou de como ele costumava olhá-la quando eles estavam namorando.

— Você se lembra quando me ensinou a nadar? — ela perguntou, observando-o.

Ele sorriu, assentindo um pouco.

— Sim. Você me fez mostrar todas os tipos de braçadas diferentes das quais eu era tão experiente e conhecedor, mas o tempo todo você já sabia nadar. Percebi naquele instante que você era sinônimo de confusão.

Ava riu, lembrando-se que ele ficou tão vermelho quanto uma beterraba quando ela contou a ele a verdade da situação.

— Você sentiu tanta vergonha e achou que eu havia pregado uma peça. Que, de certa forma, foi o que fiz, não?

Ele olhou para a cama, o dedo seguindo a linha das flores bordadas nos lençóis.

— O que a fez pensar dessa forma naquela época? — ele perguntou, olhando para cima e sustentando o olhar dela.

A vontade de passar a mão pela mandíbula dele, sombreada com uma ínfima camada de barba crescendo era quase impossível de refrear. Ele sempre esteve lá por ela, querendo agradar e ser um amigo, um protetor.

— Eu não sei. — ela deu de ombros. — Venho pensando muito em nosso passado, e essa é apenas uma das muitas lembranças que me fazem sorrir.

— Por melhor nadadora que tenha dito ser, teve sorte de eu estar lá no dia em que teve uma cãibra e afundou, se debatendo, se bem me lembro.

Ele sorriu e ela riu, embora na época o incidente foi de tudo menos divertido.

— Haverá momentos em nossas vidas em que ocorrerão acidentes ou situações em que não estaremos juntos. Eu queria que você soubesse que o que aconteceu conosco três dias atrás estava fora de nosso controle, completamente. Você não precisa ficar e cuidar de mim, Tate. Eu vou ficar bem.

Ava estendeu a mão e colocou em cima da dele, deleitando-se com o calor e que ele virou a palma para cima, dando um breve aperto na mão dela:

— E de qualquer maneira, é apropriado que você esteja aqui, Sua Graça? — ela perguntou, sorrindo com malícia.

O olhar intenso dele, que estava carregado com emoções demais para ela lidar, penetrou nela.

— Você quer que eu saia?

Ela refletiu por uma fração de segundo.

Ava negou com a cabeça, falhando para com seus instintos, indo contra as promessas que fizera de que sempre seria dona de si. De não responder a ninguém, de não pertencer a vivalma.

— Não, eu não quero que você vá. — disse ela por fim, sincera em cada palavra.

— Que bom, então. — disse ele, inclinando-se e dando um beijo suave em sua bochecha. — Porque eu não quero sair. — sussurrou no ouvido dela.

Ava estremeceu e se virou, deixando os lábios perto o suficiente para beijá-lo. Sem se lembrar do pulso ferido, ela voltou a atenção para os lábios dele, ainda tão tentadores como sempre foram. Um desejo feroz a atravessou por ter ficado longe dele por tantos anos.

Ela se afastou quando a porta se abriu e a criada entrou com água quente e roupa de cama limpa.

Por um momento, Tate não se mexeu.

Em seguida, se afastou com um suspiro pesado. O olhar intenso dele a deixou sem fôlego, e ela podia sentir as bochechas queimando. O que ele estaria pensando depois do quase beijo?

estaria esperando a criada sair? Ou ele estaria apenas debatendo se deveria esperar e beijá-la de qualquer maneira, com espectadores ou não.

Ele se inclinou e pegou a bandeja de café-da-manhã, colocando-a diante dela.

— Obrigada. disse ela, pegando a xícara de chá e tomando um gole.

Ava dispensou Jane e ignorou a expressão assustada que a moça fez ao ouvir as ordens.

— Devo admitir que me sinto voraz esta manhã.

— Eu também. — ele murmurou, sem divertimento no tom. —

Virei visitá-la amanhã, Ava. Há algumas coisas que preciso discutir com o agente de Bow Street. Ele chegou hoje de Londres. Parece que há uma chance de ser Lorde Matthew Oakes, o visconde, o responsável pelos incêndios.

Um calafrio percorreu a espinha dela ante a menção de Matthew, um homem que ela nunca mais queria ver. Um homem que ela se prometeu que nunca mais a tornaria uma vítima. Ava estendeu a mão e apertou o braço de Tate, interrompendo sua partida.

— Não, espere, Tate. Quero dizer, Sua Graça. Tem certeza de que Lorde Oakes é o suspeito? Eu pensei que ele estava na Espanha.

— Estava, mas retornou ao país uma semana antes do incidente em Cleremore.

Ava ofegou, e ele franziu a testa, estudando-a por um momento.

— O que você sabe de Lorde Oakes?

Náusea a dominou ao pensar em contar a Tate a idiota que ela fora no ano anterior, logo que retornou à Inglaterra e descobriu que Tate estava em Londres vivendo sua vida ao máximo, rodeado de diversas mulheres, sendo que nenhuma delas era ela. Que ela agiu por ciúme e devido à sua tolice cometera um erro que quase custou sua vida e reputação.

— Ele não é confiável, é tudo o que sei dele.

— Você está mentindo que eu sei, Ava. — disse ele usando seu nome de batismo, o que a assustou um pouco. — E, por favor, permita-me chamá-la pelo primeiro nome, e você faça o mesmo comigo. Acho que nos conhecemos há tempo suficiente para nos tratarmos assim quando estivermos a sós.

Ela encontrou o olhar dele, gostando da ideia.

— Muito bem, vamos usar nossos primeiros nomes.

A resposta dela foi, em parte, para enrolar e não responder a pergunta que ele fez. Como ela poderia explicar que as fofocas da cidade foram como uma faca no coração dela, que a haviam deixado tola e cega? Que cometera um erro que não havia como remediar.

— Conheço Lorde Oakes um pouco. Há rumores de que ele está com problemas financeiros, mas iniciar incêndios no condado em que reside não faz sentido. Acho difícil acreditar que ele tenha alguma coisa a ver com esse assunto. Até onde sei, ele nunca mostrou tamanha crueldade com os animais.

Porém, ela havia visto muito bem como ele reagia com as pessoas, em especial com ela, quando ele não conseguia o que queria.

O duque voltou a sentar-se ao lado dela que se afastou um pouco, seu tamanho e presença a dominando, confundindo sua mente, e ela precisava manter o juízo. Precisava se lembrar de que não queria um marido, que ele não se encaixava no futuro planejado com os mínimos detalhes por ela, como uma velha matrona.

Ava pegou um pedaço de torrada e deu uma mordida, ocupando-se, tanto quanto podia, na esperança de que ele se esquecesse dessa parte da investigação e voltasse para casa.

— Se você sabe algo de Lorde Oakes, precisa me dizer. Eu não o vejo desde que ele era um garoto de calças curtas, e pelo que me lembro, ele nunca foi de dar trabalho. Porém, caso você saiba de algo que possa explicar o porquê de ele talvez ter sido visto em Cleremore e agora na propriedade de Lorde Morton, é imperativo que me conte.

Pensando na noite do incêndio do duque, o cavalheiro que gritara notificando-os do segundo incêndio com certeza se encaixava nas características de Lorde Oakes. Ava deixou a ideia de lado. Agora ela estava imaginando coisas. Havia tanta coisa acontecendo naquela noite, tantas pessoas que poderia ter sido qualquer um, até um dos funcionários do duque.

— Eu não sei de nada. — disse ela, afastando o café-da-manhã.

Tate pegou a bandeja e a colocou na mesinha ao lado da cama.

— Ava. — ele disse, erguendo o queixo dela para que olhasse para ele. — Você pode me dizer qualquer coisa. Por favor, é importante.

A súplica dele atingiu uma parte dela, que ninguém mais além dele conseguia alcançar. Ela suspirou pronta para aceitar o golpe da desgraça de um modo ou de outro.


— Isso é apenas o que sei acerca do caráter de Lorde Oakes.

Não tenho conhecimento ou motivos para suspeitar de que ele possa ter iniciado os incêndios.

— É claro. — disse ele com paciência, esperando que ela começasse a explicar.

Ava mordeu o lábio, tentando encontrar as palavras certas para contar a Tate de sua vergonha.

— Quando retornei para a Inglaterra, voltei logo para Berkshire para assumir a propriedade aqui. Soube que você estava morando em Londres, e ouvi os rumores acerca da vida você levava. — Tate se mexeu na cama, e ela sorriu quando um resquício de rubor tomou as bochechas dele. — Das mulheres com quem se entretinha, e de quantas foram. — Ava queria contar a ele como a notícia arrancou seu coração pela segunda vez, mas ela não conseguiu. Ele nunca poderia saber o quanto ela sentia falta dele quando não estava se iludindo. — Cometi um erro terrível, que nunca poderei reparar.

TATE ESPEROU em silêncio que Ava dissesse o que sabia de Lorde Oakes, e o embaraço que ele reconheceu no olhar dela o deixou reticente. Ele não pôde deixar de imaginar o que ela sabia do homem que a deixava tão desconfortável. Até então, ele não sabia

que ela conhecia Sua Senhoria tão bem, mas o desconforto ao falar dele e a tentativa de evitar contar o que havia acontecido gelaram seu sangue.

Ele fechou os olhos por um momento, odiando o pensamento de que ela pudesse ter sido cortejada pelo cavalheiro. Que talvez ela pudesse gostar de outra pessoa, o suficiente para ter certo apego, mesmo que o sentimento não passasse de amizade. Ele não queria que ela estivesse com mais ninguém. Todo o tempo em que ele esteve no exterior, seu último pensamento antes de dormir era ela.

— Diga-me, Ava.

"Por favor" pairou em seus lábios, mas ele mordeu freou a palavra. Ela diria a ele quando estivesse pronta.

— Nós nos conhecemos por causa do haras. Na época, Lorde Oakes era dono de um puro-sangue, Majesty, que ele queria que fosse treinado por nós. Entre a realização da castração e o cavalo ser retirado das competições mais tarde, formamos uma amizade.

Bem, pelo menos eu pensei que era uma amizade.

Ele sentou um nó duro se formar em seu estômago, mas controlou suas feições, não queria assustá-la.

— E ele acreditava que era mais do que amizade benigna?

Ela encontrou o olhar dele por um breve instante antes de desviar o rosto.

— Sim, ele pensou que poderia haver mais. Ele me propôs ser amante dele. Disse que estava cortejando uma herdeira que logo resolveria seus problemas financeiros, mas que ela era uma mulher que preferia a vida urbana. Uma amante no interior, não muito longe de sua propriedade, seria favorável.

— Ele não a quis como esposa?

Tate fechou a boca com força, para que sua voz não denunciasse o desgosto e repugnância que sentia por Lorde Oakes.

O desgraçado queria usar Ava como prostituta. Ele sentiu a raiva o consumir, mas manteve a compostura sabendo que o descontrole não ajudaria Ava a terminar seu relato.

— Não, não como esposa. — Ava se mexeu debaixo do cobertor por um momento, perdida em pensamentos. — Eu pensei, por um tempo, ser capaz de tal coisa. Decerto, ele é bonito e parecia doce de verdade. E como eu não tinha intenção alguma de me casar, a ideia de ter um amante não soou detestável. Então, eu concordei.

Tate levantou-se, passando a mão pelo cabelo, uma infinidade de imagens correndo por sua mente. Sua cabeça martelava, e ele acreditou que poderia vomitar.

— Você se entregou a ele? — as palavras saíram tensas, e ele não tinha certeza do que deveria fazer.

Ava ficou em silêncio por um momento, o rosto pálido.

— Não, nunca fomos tão longe, mas ele chegou muito perto. Se minha criada não tivesse entrado depois de ouvir um barulho estranho, sim.

Choque e repulsa o atingiram como uma bala, e ele foi até ela.

Sentou-se na cama e a abraçou.

— Ava, não. — ele a abraçou com força, desejando estar lá para protegê-la. Ela ficou rígida nos braços dele por um momento, e ele suspirou de alívio quando ela relaxou e o envolveu com os braços, afundando no abraço dele. — Sinto muito, minha querida.

Ele a sentiu estremecer em seus braços e, para seu choque, percebeu que ela estava chorando.

— Estou tão envergonhada, Tate. Eu o levei a acreditar que queria um relacionamento assim, mas quando ele pressionou por mais, percebi meu erro. Tentei explicar, pedir desculpas a ele pelo engano, mas ele ficou tão bravo, tão violento. As palavras que ele

gritou para mim não eram nada do que eu já ouvira, e quando eu tentei sair do quarto, ele não me deixou.

Tate a embalou levemente em seus braços.

Todo esse tempo ele estava em Londres, dormindo com damas da sociedade dispostas, e a mulher que sempre possuiu seu coração, sua bela e atenciosa Ava estava sendo agredida. E ele não estava lá para salvá-la.

— Eu sinto muito. Eu gostaria que você tivesse mandado me buscar. Eu estaria aqui por você.

E ele teria matado Lorde Oakes por sua atitude. E mesmo que ficasse provado que ele não era o incendiário, Tate ainda se vingaria dele por Ava. Isso, ele poderia prometer ao desgraçado. Ele o desafiaria se fosse necessário.

— Ninguém sabe. — disse ela, afastando-se um pouco, os olhos inchados e vermelhos. — Ninguém pode saber. Precisei guardar este segredo, um pesadelo sujo que poderia arruinar tudo o que meu pai e eu construímos. Se alguém da Sociedade descobrisse que eu cogitei ser amante dele, poderia me arruinar.

Seu coração doía por ela, por não poder remediar sua dor. Ele a abraçou, não querendo soltá-la jamais.

— Fiz minha criada jurar não contar a ninguém, e até hoje ela não o fez.

Ele enxugou as lágrimas que escorriam pela bochecha dela.

— Você não tem nada do que se envergonhar, Ava. As ações dele pertencem somente a ele, e dizem mais sobre o tipo de homem que ele é, e que tipo de código moral ele segue. Você não teve nada a ver com as escolhas dele. As pessoas podem mudar de ideia, não há lei contra isso.

Ela sorriu em meio as lágrimas, estendendo a mão para cobrir a dele que ainda repousava em sua bochecha.

— Obrigada por dizer isso. Tento pensar assim, reprimir o horror daquela tarde, mas às vezes é difícil.

— Nunca ceda a esses pensamentos, pois eles apenas fazem com que Lorde Oakes tenha poder sobre você. E se há algo que sei de você, e que admiro e adoro igualmente, é a sua mente e a ferocidade que fervilha em sua alma. Você é uma boa pessoa, Ava.

O que aconteceu com você não foi.

Mesmo quando crianças, ela sempre fora a pessoa mais gentil que ele conhecera, e talvez este seja o motivo para ele ter gravitado em torno dela todos esses anos após aquele dia em que se conheceram e nadaram juntos no rio.

O casamento dos pais dele era bastante amigável, mas sua mãe era uma duquesa dura, muitas vezes fria e implacável. Seu pai meio que nunca estava lá e, portanto, a vida em família, a conexão entre pai e filho, como a que Ava mostrava ter com o pai dela, era algo novo e surpreendente para ele. Ele queria viver algo parecido. E

assim que se tornaram amigos, o pai de Ava o acolheu na família e eles se tornaram um bando de três.

— Isso aconteceu depois que seu pai faleceu?

Tate não podia acreditar no que estava ouvindo. Ele se levantou e foi até a mesa de Ava, perto da janela do quarto, e se serviu de um copo de água. Ele estava sentindo a náusea embrulhar seu estômago, a ameaça de vômito. Ele precisava desafiar esse homem. Enfiar uma bala no meio da testa e deixá-lo para apodrecer no meio da floresta.

Saber que Ava carregava esse fardo sozinha trouxe tanta culpa ao corpo dele que quase o fez cair. Por amá-la com tanto fervor, ele deveria ter voltado a Berkshire e garantido que ela fosse protegida após a morte do pai. Ele deveria ter garantido a segurança dela, não

importa que escolha ela tivesse feito em relação ao futuro, seja com ele, com outra pessoa ou com ninguém.

— Eu não tinha ninguém que pudesse desafiá-lo, entende. Como bem sabe, não tenho irmãos e, com a morte de meu pai, só me restou conviver com a lembrança devastadora de que quão perto cheguei de me arruinar. Descobrir que ele talvez seja o homem por trás desses incêndios criminosos que aconteceram aqui no interior...

— ela sacudiu a cabeça, os olhos no chão. — Eu queria nunca mais vê-lo, sabe, mas temo que com tais acontecimentos, não seja inevitável.

Era mais do que desprezível, e Tate não pôde deixar de se perguntar por que Lorde Oakes agia de maneira tão violenta. Ele estava mal da cabeça, ou apenas sentia raiva dos vizinhos bem-sucedidos, por ele não ter conquistado nada no mundo das corridas? Ou seria por causa da recusa de Ava em se tornar a amante dele.

— A parte egoísta em mim não quer ter que voltar a enfrentá-lo.

Me considera covarde por dizer isso? — ela perguntou, encontrando o olhar dele.~

Medo espreitava naquelas esferas marrons escuras, e o coração dele se despedaçou por ela. Ele podia entender por que Ava não queria nem ver Lorde Oakes. Mas não significava que ele não poderia ir encontrar Sua Senhoria. Desafiá-lo, colocar uma bala na cabeça dele e pôr um fim em todos os problemas.

— Eu vou matá-lo. — ele murmurou para si.

Ava ofegou, e Tate se encolheu ao perceber que Ava o havia escutado. Ela afastou a roupa de cama, levantou-se e foi até onde ele estava perto das janelas. Ava apertou seu braço e o puxou para encará-la.

— Você não fará isso, Tate. Só para começar, duelos são ilegais.

Se ele é o homem que está causando todos esses incêndios, então vamos lidar com ele através da lei, e precisamos agir sem que ele saiba. Não há provas do que ele fez comigo e, embora tenha tentado, ele não teve sucesso com o ataque. Se ele descobrir que suspeitamos dele pelos crimes na sua propriedade e na de Lorde Morton, ele vai me arruinar perante a Sociedade e sentirá prazer em fazê-lo.

— Eu não posso deixá-lo livre pelo que fez a você.

O aperto dela cedeu, e ela deslizou a mão pelo braço dele, até pegar sua mão.

— E não vamos deixá-lo sair impune. Sei que ele está com poucos recursos financeiros. Ele precisou vender tantas de suas propriedades que chegou ao ponto de só ter posse da casa e um ou dois acres além. Vê-lo ser trancafiado pelos crimes de incêndio e assassinato já é o bastante para mim. Ele não poderá voltar a prejudicar nenhuma outra propriedade, animal, ou mulher se estiver em Newgate.

— Não é o suficiente para mim, Ava. — ele deu um passo na direção dela e cobriu as duas bochechas dela com as mãos. — Ele tentou tomar o que não lhe foi oferecido de boa vontade. Não posso permitir que ele se safe de um crime tão hediondo.

Os olhos dela se encheram de lágrimas, e a repugnância que ele sentia por Lorde Oakes dobrou.

— Eu sei que você quer defender minha honra, e agradeço. Sou muito grata. Nos conhecemos há tanto tempo, Tate. Mas não é seu papel me salvar. Não vou deixar que você se coloque em perigo por algo de que prefiro me esquecer. Por favor, deixe no passado, onde pertence.

As feridas físicas de Ava poderiam ter cicatrizado e desaparecido, mas o que o visconde havia feito a ela ainda era vívido em sua mente. Então, não. Ele iria se vingar do desgraçado, fosse ele culpado ou não dos ataques aos estábulos.

Ele suspirou, deixando a conversa cessar.

Ainda havia feridas abertas, e ela não precisava ficar se lembrando de seu agressor nem se preocupar com as ações de Tate contra ele neste momento.

— Venha. — disse ele pegando a mão dela e puxando-a de volta para a cama. — Você precisa descansar. Prometo que não farei nada até que possamos conversar melhor acerca disso, quando você estiver recuperada.

Tate a ajudou a voltar para debaixo das cobertas, afofou os travesseiros atrás da cabeça dela e serviu outra xícara de chá para ela.

— Vou sair agora, para que descanse. Voltarei hoje à noite, talvez possamos jantar juntos aqui.

Ela olhou para ele com malícia.

— Acredita ser sábio, Sua Graça? Sua reputação como libertino está bem viva e solidificada em Londres. Não deveria jantar comigo em meu quarto.

Ele balançou a cabeça espantado com a capacidade dela de fazer piada e ser doce, ainda mais em um momento como aquele, que ele sabia que ela estava ferida. A grande verdade era que ele não deveria estar no quarto dela nem naquele instante, quanto mais à noite para jantar. Mas antes de tudo eles eram amigos, e caso ela ainda não estivesse bem para descer as escadas, então sim, ele iria jantar nos aposentos dela.

— Voltarei para jantar e dane-se o que a Sociedade diga.

Ele a deixou então, desceu as escadas e saiu pela porta, precisava de seu cavalo e correr o máximo possível.

Em poucos minutos ele estava galopando na direção da propriedade dele, mas não seria logo que pisaria lá. Tate precisava clarear a cabeça, acalmar o sangue e planejar a queda de Lorde Oakes. Ele incitou o cavalo a pular uma sebe antes de reduzir a velocidade para atravessar o pequeno riacho. Ava teria justiça, e ele seria o responsável por fazê-la. E caso ele tivesse prazer ao fazê-lo, melhor ainda.

CAPÍTULO 11

Estou livre do que senti por você em algum momento. Desejo o melhor em tudo que a viga traga para você, e que seja feliz, não importa o que aconteça.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone.

U ma semana depois, Ava, com o pulso ainda enfaixado, encontrou Hallie no corredor, ela estava recebendo as cartas de um criado.

— Alguma coisa para mim? — ela perguntou, pedindo chá e entrando na biblioteca onde decerto havia uma pilha de cartas e o trabalho negligenciado na semana anterior por causa do pulso torcido.

Considerando o quão dolorido estava a apenas dois dias atrás, ela ficou surpresa ao acordar sentindo-se relativamente bem. É

claro que ainda não recuperara todos os movimentos, mas era uma melhora drástica.

As visitas diárias de Tate também a ajudaram a se curar, tanto da lesão como em seu coração, fazendo a escolha consciente de nunca se casar, de nunca procurar um parceiro ainda mais difícil de ser cumprida. Por diversas vezes ela se pegou contemplando as possibilidades.

Observava-o enquanto lia as poesias e romances góticos de que ambos desfrutavam, ponderando acerca de um casamento com ele

e tornar-se duquesa, se tal fato ainda lhe daria a liberdade de que desfrutava agora. Ou será que precisaria comprometer um pouco de sua independência? Por sua vez, será que Tate permitiria que ela fosse a mesma de agora devido ao que se espera da esposa de um duque?

— Há uma carta de Willow. — disse Hallie, quebrando o selo e passando os olhos pelo conteúdo. — Ela nos quer em Londres por uma semana ou duas. Para comparecer a alguns bailes a que ela foi convidada pela tia-avó por casamento, a viscondessa Vance.

Hallie sentou-se em um sofá próximo e continuou a ler a missiva:

— Ela diz algo acerca do fim próximo da pequena temporada e nos quer lá com ela antes de partirem para a propriedade rural da viscondessa.

Ava foi para a cadeira detrás da escrivaninha e sentou-se, remexendo nas cartas que estavam cuidadosamente empilhadas diante dela.

— Havia me esquecido de que Willow tem uma tia de título. Ela diz algo a ver com o que Sua Senhoria pensa de nossa visita?

Hallie examinou a nota ainda mais.

— Sim, afirma aqui que Sua Senhoria anseia por conhecer as amigas de escola de Willow, e que somos bem-vindas a ficar em sua casa na Berkley Square.

Hallie olhou para cima, os olhos brilhando de excitação.

Era um convite adorável e um que até Ava nunca recusaria. Não que ela desejasse por si participar de eventos em Londres por uma semana ou duas, mas Willow era uma de suas melhores amigas no mundo inteiro, e se pedia para que fossem fazer companhia, então Ava faria isso. Sem dúvidas.

— Vou informar minha criada pessoal, para que arrume tudo para a nossa partida na próxima semana.

— E o seu pulso? — Hallie perguntou, dobrando a carta.

Ava deu de ombros.

— Estará ainda melhor na próxima semana, e as luvas esconderão quaisquer hematomas que persistam até lá. Se alguém vir a lesão, serei sincera e contarei que caí do cavalo. Ninguém fará maiores questionamentos.

Hallie recostou-se na cadeira, estudando-a por um momento.

Ava pegou as cartas e se ocupou em separá-las e abri-las.

Quando Hallie ficava quieta como estava agora, era sinal de que sua mente, afiada e onisciente, estava agitando-se com perguntas.

— E quanto ao duque?

Ava deu de ombros, lendo uma carta de seu fornecedor de ração em Ascot.

— O que tem o duque? Tenho certeza de que ele é mais do que capaz de se manter ocupado enquanto estivermos fora.

Ava sorriu para a amiga, determinada a fugir dos questionamentos.

— Você sabe que não foi isso que eu quis dizer. Hallie ergueu a sobrancelha, perplexa.

— Ele acabou de voltar da cidade, e você se engana se pensa que ele voltará a Londres só porque fomos convidadas a passar alguns dias.

Hallie riu, balançando a cabeça.

— Acho que se alguém está a se enganar, é você. O homem está apaixonado por você, e sabe disso. Ora, no dia em que ele a carregou até em casa depois da queda que você sofreu, ele parecia estar prestes a ter um ataque apoplético. O medo gravado no rosto dele por causa do seu ferimento não era apenas uma preocupação de vizinhos, ele ficou em pânico pela possibilidade de ser mais grave, embora felizmente não tenha se concretizado.

A menção de que o duque ficara muito preocupado com ela trouxe uma sensação quente e reconfortante à sua alma. Ela mordeu o lábio, incapaz de esconder o sorriso que se formou em seus lábios. Afastou o pensamento, lembrando a si que não queria que ele a cortejasse, que forjassem um novo compromisso. Ele precisava se casar com uma mulher que fosse adequada para um duque. Uma mulher que quisesse de fato tal posição e todas as amarras que a acompanhavam.

UMA SEMANA DEPOIS, Ava saia da carruagem da viscondessa com a ajuda dos cocheiros de Sua Senhoria e seguiu a viscondessa Vance e as amigas pelas escadas da casa do Conde Tinley.

Dizia-se que o baile desta noite era o evento mais procurado de Londres devido ao fato de o anfitrião ter um parentesco distante com o rei George IV. Todos que eram alguém iria querer estar presente, e a viscondessa e as amigas de Ava não eram exceção.

Não que o rei se prestasse a participar de um evento como esse, ainda mais os anfitriões sendo parentes distantes, mas era o bastante para tornar as conversas interessantes. O salão estava iluminado com centenas de velas de cera, que garantia um brilho dourado e mágico ao espaço. Os músicos estavam em uma pequena varanda com vista para o salão de baile. Tocavam um minueto, e alguns dos convidados já estavam dançando e outros os assistiam, conversando e socializando com seus pares.

Naquela noite, Ava escolhera um vestido de seda dourado e usava as pérolas de sua mãe nos cabelos. Uma criada de Sua Senhoria, mestre nos mais recentes penteados ensinara a criada de

Ava a fazer um conjunto intricado, de forma que a joia estava trançada aos seus cachos escuros como uma peça de arte.

Felizmente, as luvas de seda escondiam as mãos e o pulso machucado, sem mencionar as unhas que não eram tão bem mantidas devido ao trabalho constante com os cavalos. Ela sorriu quando Hallie colocou o braço no dela, a amiga quase pulava de expectativa.

— Como é emocionante, Ava. Faz tanto tempo desde que estivemos nesse meio, se é que já estivemos. Posso garantir que não há bailes como esse no Egito.

Não.

Hallie estava certa.

Mantendo-se perto da viscondessa que ia para o lado oposto do salão, Ava notou alguns olhares curiosos dos presentes e acenou para aqueles que ela conhecia do mundo das corridas.

Era curioso que alguns dos olhares que lançaram a elas eram de apreciação e curiosidade e, pela primeira vez, Ava parecia aproveitar seu tempo em Londres.

Pararam ao lado de uma lareira bem iluminada, um espelho com moldura de ouro que era da largura da estrutura da lareira estava disposto acima do parapeito e refletia a luz e os convidados. Tudo na sala gritava privilégio, e ao olhar em volta não conseguiu evitar de pensar em Tate. Este era o mundo dele, a vida dele.

Os móveis, o excesso e a riqueza expostos, as joias, os vestidos de seda importados e as roupas masculinas, o tom e a maneira de falar, faziam parte de uma vida a que ele estava acostumado a viver.

Ava olhou analisou o salão e avistou a duquesa-viúva de Whitstone conversando com um grupo de matronas, sem dúvida todas com título próprio e casadas com outro. Ela não havia cogitado que a viúva estaria de volta à cidade, considerando que

havia chegado a Berkshire a tão pouco. Sua Graça a viu e, erguendo o nariz para o ar, a cortou sem cerimônia. Ava não deveria ter esperado nada menos, mesmo assim a afronta doía.

— Aqui está uma taça de champanhe para você, Ava. Beba, é uma delícia.

Ela riu, pegando a taça de Willow.

— Obrigada. — disse ela, afastando o olhar da viúva e das poucas mulheres que a olhavam ao mesmo tempo. Ava não era ingênua a ponto de não saber que a mãe de Tate estava espalhando mentiras cruéis sobre ela. Afastou a decepção por não conseguirem ser civilizadas uma com a outra e aproveitar o baile.

Os anos que ela passou na escola na França não permitiram tais passeios. Elas não podiam participar de danças e bailes que a nobreza francesa participava. Muitas vezes só lhes restava a companhia uma da outra. O isolamento do mundo exterior apenas serviu para solidificar ainda mais a amizade delas, como se o sentimento estivesse gravado em pedra. Era uma pena que Evie e Molly não estivessem aqui. Elas iriam adorar uma noite como esta.

Um cavalheiro curvou-se diante de Ava e da viscondessa.

Era um homem atraente, aparentava ser da idade de Ava. O

cabelo, apesar de bem curto, combinava com ele. Ele era um pouco mais baixo do que Tate, porém mais alto que Ava, o que ela gostava. Mas eram os olhos dele, divertidos e bonitos que se destacavam, uma característica que Ava sempre procurava ao conhecer pessoas novas. Pode se descobrir muito ao olhar para a alma de uma pessoa.

— Lady Vance, poderia me dar a honra de ser apresentado à suas amigas?

A viscondessa sorriu, apontando para cada uma conforme nos apresentava.

— Minha sobrinha, Srta. Willow Perry, e suas amigas Srta. Ava Knight e Srta. Hallie Evans. Este, queridas meninas, este é o marquês de Harlan.

Ava mergulhou em uma reverência e Sua Senhoria as observou uma a uma com um olhar contemplativo.

— Prazer em conhecê-las, a todas. E Srta. Knight, caso a senhorita não tiver prometido a outro, gostaria de dançar o cotilhão comigo?

Ava olhou para Hallie e ante o aceno de aprovação dela, esticou a mão.

— Eu gostaria muito. Obrigada, milorde.

Ele pegou a mão dela e a colocou no braço, levando-a para o centro do salão.

— Você é de Berkshire, pelo que sei. Não há um Haras de competição, muito famoso, com este nome? — ele perguntou, deslizando-os com habilidade entre a multidão.

— Eu... sim, existe. Meu pai criou e treinou cavalos até morrer.

Agora sou eu quem administro o Haras Knight.

Os passos dele se tornaram mais lentos, e ele riu, cruzando o olhar com o dela outra vez.

— Arrá, então a senhorita é a famosa treinadora de cavalos de que tanto se fala. Você possui a mais alta estima. Não sabia?

Ele a puxou para a frente, e Ava levou um instante para controlar o orgulho que a preencheu por saber que seus estábulos eram tão bem vistos.

— Obrigada, meu senhor. Fico feliz em saber que é assim. Com certeza, fazemos o possível para criar e treinar os melhores cavalos de corrida que pudermos.

É claro que alguns cavalos nunca ganharão o primeiro prêmio, mas não significa que não possam gerar um que o consiga. Este é

um erro comum a muitos treinadores, vendem cavalos que poderiam muito bem ter uma descendência vencedora. Algo que Ava e seu pai se recusavam a fazer, a menos que tivessem testado o cavalo na pista.

Eles se posicionaram para a dança, e Ava olhou em volta, absorvendo a grandeza. Era bem improvável que ela voltasse à cidade depois desta semana, muito menos para participar da Temporada. Sendo assim, ela aproveitaria essa oportunidade ao máximo. Mesmo que só para fazer contato com pessoas da alta sociedade que poderiam se interessar em possuir um puro-sangue no futuro.

A dança foi agradável e, embora Ava não participasse de um cotilhão há alguns anos, os passos que ela aprendeu com a professora de dança quando jovem eram algo que ela não havia esquecido. Durante a hora seguinte, ela dançou mais dois conjuntos com outros cavalheiros e permaneceu ao lado da viscondessa quando Hallie e Willow também dançaram.

A noite foi uma bela e agradável surpresa, considerando que ela não gostava de tais eventos e nunca se esforçara para participar deles.

Ava tomou um gole de vinho enquanto esperava que as amigas retornassem da dança quando um calafrio percorreu sua espinha.

Olhando para a esquerda, avistou Lorde Oakes olhando-a com diversão gelada. Sua pele formigou, e ela estremeceu, pois esperava nunca mais ver o rosto dele. A lembrança dele, empurrando-a contra as almofadas do sofá, o aperto doloroso e punitivo nos braços dela enquanto ele os prendia atrás das costas, segurando-a ainda bombardeava sua mente, e ela precisou forçar-se a segurar a ânsia.

O que ele estava fazendo ali?

Ele caminhou na direção dela, e ela se esforçou para usar todas as defesas possíveis para se preparar o confronto iminente. Ele curvou-se, sorrindo, o cavalheiro perfeito para toda a sociedade ver.

Mas Ava sabia o que se escondia por trás de seu rosto tranquilo e bonito. Era tão feio quanto o próprio diabo, e tão cruel quanto.

— Srta. Knight, que bom vê-la aqui na cidade. Senti falta de nossos encontros.

Ela olhou para os dançarinos, desejosa de que a música estivesse para terminar, para que não ficasse sozinha com ele.

— Receio, Lorde Oakes, que seu sentimento seja perda de tempo, já que eu não senti falta alguma de sua presença.

Se havia algum desejo nela, era de que ele se ferisse em algum acidente de cavalo ou carruagem. Mas, infelizmente, ele estava tão saudável quanto a última vez que ela o vira.

Ele pressionou o peito com mágoa simulada.

— Não sentiu minha falta? Acreditei que ansiaria por nosso último encontro mais do que qualquer outro. — ele se inclinou para ela, mais perto do que deveria. Ela congelou, o medo a atravessando. — Sei que eu ainda penso nessa época. Como me deixou quente. Porque, mesmo agora, fico duro só de pensar em você toda complacente embaixo de mim, gemendo e se contorcendo de prazer.

Ava se recusou a olhar para ele e soltou um suspiro quando ele se afastou. Ela não respondeu à provocação. Ele não era digno de nada dela.

— Vamos, minha querida. Somos amigos, não somos? Venha dançar comigo.

Ele tomou a liberdade de agarrar o pulso machucado, provocando dor em seu braço. Ela ofegou e tentou soltar o braço sem causar uma cena.

— Nós não somos amigos, e eu não quero dançar, meu senhor.

Quando ele a soltou, ela voltou para a viscondessa, esperando alcançar a proteção dela antes que ele a alcançasse. Ele voltou a agarrá-la pelo pulso, havia percebido a lesão e apertou ainda mais, com força.

Ava deu uma olhada furtiva em torno do salão, sentiu a pele esquentar quando notou alguns convidados observando todos os movimentos dele. Lorde Oakes, percebendo o mesmo, deixou-a ir, com um sorriso doce.

— Faça o que lhe é ordenado, Ava querida. Detestaria que Londres descobrisse que você cogitou ser minha amante.

Ela se virou para ele:

— Como você ousa! — ela sussurrou com ferocidade. — Seria sensato ficar longe de mim, Lorde Oakes, antes que seja para você que Londres inteira vire as costas.

Ele riu, a cabeça toda para trás como se ela tivesse contado uma história incrivelmente divertida.

— Você não passa de uma treinadora de cavalos. Em quem acha que a sociedade iria acreditar? Um par nobre, ou uma prostituta de Berkshire?

— Eles vão acreditar em mim.

O som da voz de Tate trouxe lágrimas aos olhos dela que piscou para afastá-la. Não queria que Lorde Oakes percebesse como ela estava aliviada que Tate viera ao seu resgate. O fato de Tate ter visto como Lorde Oakes a tratara e vir removê-lo de sua presença acabou com a miséria que ela sentia, estava feliz por sua presença.

Ela lançou um sorriso hesitante, sempre seu protetor. O duque pegou a mão dela e a colocou no braço dele.

— Chegue a um centímetro da Srta. Knight outra vez, e eu o desafiarei — disse o duque ao dar um passo na direção de Lorde

Oakes, o fazendo dar um passo para trás. —, e colocarei uma bala nesse seu crânio grosseiro. Compreendeu?

Os olhos de Lorde Oakes se arregalaram, e virando-se para Ava, assentiu.

— Temos um acordo, Sua Graça. — ele zombou.

Tate puxou Ava para a pista de dança quando as primeiras notas de uma valsa começaram a tocar.

— Você está bem, Ava? Quando vi Lorde Oakes partir em sua direção, não consegui chegar a você rápido o bastante. Me desculpe por ter sido necessário ouvir a voz daquele desgraçado.

Os passos da valsa permitiam que a conversa deles fosse mais íntima, e por nada nesse mundo Ava conseguiria tirar os olhos dele.

Ele era um homem tão bom, apesar do título ducal e todas as suas terras e dinheiro, ele ainda era melhor do que qualquer um que ela já conhecera. Um amigo, em primeiro lugar, e esta noite ele agira como um herói.

— Obrigada, Tate. É terrível ter de admitir, mas se você não aparecesse, acredito que eu teria feito papel de tola na frente de todos.

O polegar dele roçou seu ombro através da seda do vestido, e ela desejou toque dele em outro lugar. Queria sentir sua força, a segurança que ele sempre a fizera sentir mais do que qualquer coisa no mundo. Sob circunstâncias normais, ela era uma mulher forte, capaz de administrar um negócio de sucesso em um setor dominado por homens.

Ela era receptiva a ser a própria companhia, que nunca se casaria nem teria filhos. Uma decisão que ela estava contente em conviver. Mas estar nos braços de Tate outra vez, sob sua proteção, também trazia suas vantagens.

Ela havia se esquecido de como era ser amada, cuidada e protegida. Não que ela acreditasse que Tate ainda estivesse apaixonado por ela, mas com certeza se importava o bastante para querer vê-la bem.

Ele ter voltado à cidade só poderia ser por causa da presença dela aqui. Tal reconhecimento a fez ter uma sensação acolhedora e segura a envolvendo. Ava se jogou na dança, querendo aproveitar cada momento que podia nos braços dele.

— Nunca permitirei que ele volte a machucá-la. Você tem minha palavra nisso.

TATE SE APROXIMOU de Ava, esperando que seu rosto não traísse a raiva efervescente que se acumulava dentro dele. Ele mataria Lorde Oakes nem que fosse a última coisa que faria nesta terra.

Ao entrar no salão e cumprimentar os convidados, ele avistara Ava quase imediatamente. Ela era como um raio de sol de verão, que brilha com intensidade em um mar sob o céu cinzento. Ele estava com alguns conhecidos, mas no momento em que viu Lorde Oakes se aproximar dela, e notou desespero no rosto de Ava, ele sabia que Sua Senhoria estava sendo inapropriado.

Ele deixou o grupo sem dizer uma palavra e foi até ela na mesma hora. Típico do caráter de um valentão, Lorde Oakes fugiu quando Tate o ameaçou. Mas ele iria fazê-lo pagar. Um homem como Lorde Oakes era uma ameaça, um homem indigno de confiança, alguém cruel que se fosse um animal, teria sido abatido há tempos.

Sem cuidado, ele puxou Ava para mais perto do que deveria, querendo abraçá-la por inteiro e garantir, para o bem dele mesmo, que ela estava bem.

— Quer falar do que aconteceu? — ele encontrou o olhar dela e ficou agradecido por ela parecer muito mais calma do que quando a dança começou.

— Não de verdade. Tudo o que posso dizer de Lorde Oakes é que não desejo revê-lo, nem na cidade, e nem em Berkshire.

Ele assentiu, querendo o mesmo.

— Tenho uma reunião com o agente de Bow Street amanhã de manhã. Gostaria de me acompanhar? Parece que ele conseguiu informações e deseja partilhá-las. A carta que recebi ontem foi bastante imperativa quanto a nos encontrarmos o mais depressa possível.

— Será alguém viu quem começou os incêndios? Mesmo que não seja Lorde Oakes, é claro que eu gostaria de ver quem iniciou o fogo ir à justiça.

— Todos nós. — eles permaneceram em silêncio por um instante enquanto rodeavam outros casais que ali estavam. — Ava, preciso conversar com você acerca do que houve em Cleremore com minha mãe. Depois da dança, você estaria disposta a dar uma volta no terraço comigo?

Um pequeno franzir maculou a testa perfeita dela que depois de um tempo disse:

— Claro. Creio que precisamos discutir isso também.

Ele assentiu e se preparou para apreciar a dança.

De vez em quando, ele vislumbrava Lorde Oakes espreitando pelo salão, e o temperamento de Tate oscilava ainda mais.

Como o desgraçado ousava mostrar a cara perante a Sociedade?

Agora que Tate sabia o que ele havia feito, e o que poderia estar fazendo em relação aos incêndios, o demônio merecia ser banido da Sociedade Londrina para sempre, da Inglaterra, inclusive.

A dança chegou a um fim lamentável e, pegando a mão de Ava, ele a levou em direção às portas francesas que estavam abertas e a escoltou para o frescor da noite. O ar não estava gelado para a época do ano, contudo, nenhum dos aromas doces e puros que os envolviam em Berkshire estavam presentes. Aqui, o ar tinha uma pitada de pó de carvão, junto com o cheiro da madeira queimada nas lareiras internas.

Com surpresa e algum alívio, não havia outros casais no terraço para interromper a conversa. Além de que Tate não queria compartilhar Ava com ninguém da sociedade de Londres. Ele a queria só para só ele, agora e para sempre. Ele pegou a mão de Ava, a colocou em seu braço e caminhou em direção aos degraus que levam ao gramado e ao jardim além.

A partir de onde estavam, ele podia ver uma pequena estrutura de madeira no jardim que, ao luar, revelava a cobertura de hera.

Eles andaram sem pressa, felizes em estar na companhia um do outro.

— Eu quero falar com você sobre o que minha mãe disse outro dia, sei que você ouviu.

Foi um incômodo na mente de Tate desde o instante em que ele voltara para a sala de visitas e não encontrou Ava lá. O fato de sua mãe tê-la feito se sentir indesejada não era algo que ele deixaria passar. Não sem ela saber que ele não sentia o mesmo.

Ela afastou, com um movimento de cabeça, uma mecha de cabelo que caíra sobre os olhos, que voltou para detrás da orelha.

— Você não tem nada para se desculpar, Sua Graça. Não é segredo que sua mãe nunca gostou de mim e posso entender que

ela quer que se case com alguém que seja adequada. Se eu tivesse um título e várias propriedades que exigissem a produção de um herdeiro, também ficaria preocupada se meu filho, o representante de um ducado, estivesse mostrando uma preferência inabalável a uma mulher do povo que não tenha nada mais a oferecer além dos cavalos que cria.

Ele a segurou para que parasse de andar, e a olhou bem nos olhos.

— Você deve saber que a considero muito mais do que uma mera criadora de cavalos de raça. Eu não me importo com o que minha mãe pensa. Tudo o que me importa é corrigir o mal que nos foi provocado há cinco anos, e que você me dê alguma indicação de que poderia voltar a ser minha.

Ela caminhou na frente dele, e ele a seguiu sem saber no que ela estava pensando. Eles chegaram a estrutura coberta de hera, Ava entrou ali e sentou-se em um pequeno banco de madeira que havia sido colocado bem no meio.

— Minha opinião acerca de casamento mudou, Tate. Decerto você viu que eu não preciso da inviolabilidade do casamento para ser feliz, uma empresária bem-sucedida? — ela olhou para ele com preocupação. — Não é algo que eu preciso na minha vida. Não me faça negar você. Eu não quero magoá-lo.

As palavras dela fizeram-no sentir o pânico se apoderar de seus sangue, e ele veio sentar-se ao lado dela. Desejava que ela percebesse que, caso os pais deles não os tivessem separado, agora eles estariam bem casados. Talvez fossem os pais de uma horda de filhos, à frente de duas grandes estâncias de corrida, felizes.

— Estar perto de você de novo foi como acordar de um pesadelo. Minha vida não passou de um nada sem sentido e repleta

de erros. Não quero mais viver assim. Quero você em minha vida como minha esposa, minha amante e minha melhor amiga.

— Tate. — ela sussurrou, fechando os olhos por um momento.

— Existem expectativas para uma duquesa que eu não posso cumprir. Estou tão acomodada em minhas maneiras agora, os estábulos por si só já tomam grande parte do meu tempo. Como sua esposa, seríamos obrigados a viajar para a cidade, entreter, estar presente durante as sessões do Parlamento. Em que momento eu teria espaço para minhas responsabilidades? Não teria.

— É claro que, sendo minha esposa, ser uma duquesa vem com responsabilidades, mas você nunca se esquivou delas antes, não deixe que o que os outros dizem, ou o que você acredita que ocorrerá, seja a razão para descartar de vez nossa união.

Ela mordeu o lábio, a testa franziu-se.

— Não podemos ser como somos, sem pressão e ver o que acontece? Há muito que preciso considerar, refletir.

Tate passou a mão pela mandíbula, desejando que nunca tivessem se separado. Que o tempo não tivesse forçado Ava a encarar as coisas sozinha. Ele queria estar lá com ela quando ela tomasse decisões, apoiar e incentivá-la em seus esforços. Ele faria o que ela pedisse, daria a ela tempo, provaria sua lealdade, seu amor e ele esperava... reconquistar seu coração?

— Farei qualquer coisa que me pedir. — disse ele, cada palavra sincera desde o âmago de sua alma.

Ela se virou para ele no banco, os lindos e inocentes olhos analisaram o olhar dele por um momento, e ele sentiu o sangue ferver com a determinação que encontrou ali naquelas orbes castanhas.

Ela estendeu os braços e apertou as lapelas da jaqueta dele, em seguida, deslizou as mãos pelo peito dele. Ele fechou os olhos,

deleitando-se com o toque dela que, apesar de tudo, não era o bastante. Ele queria mais, muito mais.

— Mais do que tudo; neste momento, eu quero que você me beije, Tate.

O corpo dele rugiu de desejo, sentiu-se desesperado para beijá-

la. Foi como se os anos não tivessem passado, e a segurando pelo queixo, ele virou o rosto dela e baixou para tomar seus lábios.

Suspirou ao sentir o sabor dela outra vez. Os lábios macios e receptivos de que ele ainda se lembrava de com que ainda sonhava.

As mãos dela agarraram o casaco de noite dele, segurando-o com firmeza, mas ele não iria a lugar algum. Se ela assim desejasse, ele jamais voltaria a deixá-la.

Tate se perdeu com cada toque da língua dela, os suspiros suaves e pequenos beliscões que ela deu nos lábios dele e que o provocavam e o trouxeram de volta à vida dela. O beijo foi como se eles nunca tivessem se separado. Como se o tempo tivesse parado.

Ele a puxou com força contra ele, e o gemido suave dela acendeu o desejo dele.

O beijo se aprofundou, mudou, tornou-se mais selvagem e cru.

Não importava o que Ava havia acabado de dizer, esse beijo dela contava outra história. Ela ainda o queria com tanto fogo e necessidade quanto ele, e isso lhe dava esperança.

Ela pertencia aos braços dele, à vida dele.

— Eu senti tanto a sua falta. — disse ele, beijando-a no pescoço, deliciando-se com lóbulo da orelha, sabendo o quanto ela gostava daquele gesto. Ela estremeceu nos braços dele, e envolveu o pescoço dele com os braços.

— Eu também senti sua falta. — ela sussurrou contra os lábios dele.

Ele a beijou de novo, e ela gemeu.

Tate aproveitou a oportunidade para puxá-la ainda mais perto.

Eles nunca haviam sido tão íntimos antes, mas de alguma forma agora que eram mais velhos, talvez mais sábios, essa proximidade parecia natural, o próximo passo para eles.

Tate precisou lembrar a si que Ava era inocente, uma mulher que já havia passado por muitos problemas, e a última coisa que ele queria fazer era assustá-la ou levá-la a um ponto em que não estava preparada.

E então ela se moveu, colocando-se quase no colo dele, e o sangue dele tornou-se lava. Ele parou um momento, sem saber o que ela estava fazendo, e então ela se moveu, ondulando contra a rigidez dele, e ele lutou para não se perder como um garoto de dezoito anos sem experiência.

— O que é isso que você está me fazendo sentir? — ela perguntou, apertando a nuca dele e cruzando o olhar com o dele.

Os olhos dela estavam nublados, brilhantes e cheios de desejo.

Os lábios de Tate se ergueram em um meio sorriso:

— Desejo, necessidade.

— Ah. — ela disse, assentindo de leve e ondulando um pouco mais forte contra o membro dele que crescia. Ele trincou a mandíbula, lutando contra a tentação de erguer as saias dela e tomá-la ali mesmo no jardim. — Eu gosto. — ela sussurrou contra o ouvido dele, o arfar de suas palavras acelerando ainda mais o sangue dele.

— Eu também gosto. — ele rosnou, as mãos nos quadris dela, ajudando-a com seu empenho.

O som de risadas e tilintar de copos chegou através da hera, e ela congelou. Era todo o aviso que eles precisavam para saber que não estavam mais tão sozinhos. Tate se desenroscou dela com relutância, e afastou Ava dele.

Sob a parca luz da lua que chegava neles na pérgola, ele verificou se o vestido dela estava de volta ao lugar devido e se o cabelo dela não estava despenteado pelo beijo. Ela sorriu para ele quando ele fez uma última inspeção de sua aparência e seu coração apertou. Ele a adorava e não suportaria perdê-la pela segunda vez.

— Parece que fui bem beijada, duque? — ela perguntou.

Ela parecia ter sido beijada como se não houvesse amanhã, o que o fez desejar fazer de novo. Ele iria, é claro, mas da próxima vez seria em um ambiente mais privado.

— Acho que devemos ficar aqui por alguns minutos até que pareça menos suspeito.

E a esperança era que, passados alguns minutos ainda longe do baile, os lábios de Ava retornariam ao normal, sem resquícios do inchaço e vermelhidão causados pelos exercícios deles. Ela estendeu a mão e ajeitou o cabelo dele, ajustou a gravata e o colete dele, garantindo que tudo estivesse no lugar exato que deveria.

— Pronto. — ela disse, assentindo uma vez. — Assim está melhor. Agora você também não parece tão desgrenhado.

O som de casais no terraço diminuiu e Tate aproveitou a oportunidade para olhar através da hera, e ficou satisfeito ao ver que todos haviam retornado para dentro da casa.

— Venha. — disse ele pegando a mão dela e puxando-a de volta para o terraço. — Creio que seja seguro voltarmos ao baile.

Sem nenhum problema, ele devolveu Ava à viscondessa Vance e cumprimentou as amigas dela que a esperavam com paciência ao lado de Sua Senhoria quando Ava o apresentou a todas.

Os olhos arregalados da Srta. Perry ao vê-lo o levaram a acreditar que ela não conhecera muitos duques em sua vida.

— Quando pretende retornar para Berkshire? — ele perguntou, antes de sair.

— Viemos para ficar por uma semana, Sua Graça. — Ava respondeu. — Willow teve a gentileza de nos convidar para visitar a cidade e participar dos poucos eventos restantes da pequena temporada. Devo admitir que é uma boa distração dos problemas que temos tido em Berkshire.

O que lembrou Tate do que ele precisava de uma resposta de Ava antes de deixar o baile.

— A reunião com o agente será às onze da manhã de amanhã em minha casa na Grosvenor Square. Será que poderá ir? Como proprietária de terras na região, acredito que sua presença é importante.

— Ava nos contou dos problemas que enfrentam, Sua Graça. —

disse Willow, baixando a voz para garantir a privacidade. — Se houver algo que você precise que eu ou a Srta. Evans faça, não hesite em nos pedir.

— Obrigado, Srta. Perry. Manterei isso em mente.

Ava sorriu para a amiga antes de se voltar para ele.

— Claro que estarei presente. Estamos ficando com Sua Senhoria, pedirei a ela que indique uma das damas de companhia para me acompanhar.

— Você pode levar Betsie com você, Ava. Ela é minha criada pessoal. — disse a Srta. Perry.

Tate gostava cada vez mais das amigas de Ava. Ambas pareciam equilibradas, inteligentes e leais. Todos os traços que ele sempre procurara em suas amizades ao longo da vida.

— Obrigada. — Ava agradeceu. — É muita gentileza sua.

Tate apertou a mão de Ava e fez uma reverência.

— Até amanhã, Srta. Knight.

Ela lançou um pequeno sorriso carregado de segredos que o fez contar as horas até que ele voltasse a vê-la.

— Até amanhã, Sua Graça.

AVA BATEU com a aldrava de bronze na porta da residência do duque às 11 horas em ponto. Um lacaio atendeu à porta, seu paletó vermelho e calças adornadas com botões de ouro eram um sinal da riqueza e do poder que residiam dentro dessas grandes paredes.

Ava nunca havia entrado na residência de Tate em Londres, e o tamanho imponente e colossal a fez se sentir insignificante e comum. É claro que a propriedade de Tate em Berkshire era grande, mas não tão imponente quanto esta casa. Aqui o piso era de mármore, tão polido que quase se podia ver o próprio reflexo neles.

Uma escadaria larga e sinuosa ficava no centro do piso de entrada e levava aos muitos aposentos acima. Ainda no andar de baixo havia múltiplas portas, cada uma emoldurada por dois pilares que também pareciam ser feitos de mármore.

Era tanta grandiosidade e expectativa nos ombros de quem quer que morasse ali. Uma posição que ela hesitava em aceitar. Ela respirou fundo e, com os braços arrastados, entregou a pelisse ao lacaio que esperava, junto com o chapéu.

— O duque a está esperando, senhorita Knight. Por gentileza, siga-me. — disse um mordomo, saindo das sombras e assustando-a um pouco. A severa carranca e desaprovação no rosto dele por causa da chegada dela fizeram Ava não ousar fazer nada além do que ele solicitasse.

Duas cadeiras estavam dispostas dentro da biblioteca. Ele apontou para as cadeiras como se ela não fosse capaz de vê-las.

— A senhorita e sua criada podem sentar-se ali. — disse o mordomo, o semblante severo não se alterando milímetro algum.

Ava analisou o cômodo ao entrar.

A escrivaninha de Tate estava bem no centro do espaço. Em uma extremidade da biblioteca havia prateleiras de mogno cheias de livros e manuscritos de várias formas e tamanhos. As janelas da frente davam para a rua, e carruagens e pessoas passavam apressadas em seus passeios.

— Sua Graça. — Ava se levantou, mergulhando em uma reverência quando Tate entrou.

Os passos dele vacilaram um momento antes que ele dispensasse o mordomo. Ele se aproximou dela com um sorriso.

Tate assentiu em cumprimento, puxando-a em direção à cadeira que ficava à frente da mesa.

— Obrigado por vir. — disse ele, apertando um pouco a mão enluvada.

Toda a intenção de manter distância, de se lembrar de que essa não era a vida que ela mais desejava desapareceram quando ele sorriu para ela. Agora não havia nada que ela gostaria de fazer mais do que beijá-lo outra vez. A única coisa que a impedia era a criada pessoal dela e o fato de que o agente chegaria a qualquer momento.

Ele se inclinou e beijou a bochecha dela que sentiu calor florescer nas bochechas, sabendo que a dama de Willow havia visto a demonstração de carinho. A criada pigarreou, e Tate apenas riu, dando um sorriso diabólico para Ava quando ela se sentou.

— Eu ficaria mais do que feliz se beijá-la inteira, minha querida.

Eu não me importo mais que os funcionários possam notar o carinho que tenho por você. Não vou mais esconder meu afeto. Já passei muitos anos fazendo o que os outros achavam melhor para nós e não farei mais isso.

Ava olhou para ele quando ele deu um passo para trás e se encostou na mesa, os braços cruzados no peito. Hoje, Tate usava calça bege e botas de cano alto. O colete, a camisa e a gravata haviam sido feitos sob medida e o casaco o envolvia com perfeição.

Nesse cenário, nessa casa enorme e em roupas primorosas, Tate era a descrição perfeita de um duque. Poderoso, carismático e tão acima do alcance dela, ou pelo menos ele deveria estar. Ele era aristocrático demais para o sangue plebeu dela e merecia uma mulher que trouxesse fortuna e conexões familiares. Eles eram tão jovens, tão imunes ao que era esperado deles quando planejavam fugir.

Agora, Ava podia ver que, embora houvesse uma faísca entre eles, um fogo que acendia cada vez que se tocavam, não significava que eles eram adequados para se tornar marido e mulher. Por mais que doesse fazer tal admissão, ela não era do mesmo nível social dele, e caso se casasse com ele, a nobreza e a sociedade em geral fariam questão de deixar claro que a escolha era considerada abaixo do esperado.

— Embora eu não ponha em risco sua reputação ao declarar minhas intenções, mas aqui no meu escritório, longe dos olhares indiscretos de membros da família e matronas da sociedade intrometidos, vou beijá-la, se quiser. Vou beijá-la pelo tempo que desejar. — ele sussurrou, para que a criada não ouvisse.

Ava mordeu o lábio.

Como diabos ela negaria algo se ele falava daquele jeito?

Depois da noite anterior, do beijo deles, ela não conseguiu pensar em muita coisa além do beijo, mas isso não ajudaria a nenhum dos dois. Sua vida estava em Berkshire, e a vida dele em Londres com a Câmara dos Lordes, a Sociedade e a supervisão de suas muitas propriedades.

Um duque esperaria que sua esposa estivesse ao seu lado como um pilar da sociedade, uma anfitriã durante a temporada. Como uma mulher que criava e treinava cavalos de corrida faria tudo o que se era esperado para a posição?

Ela não faria.

— Tate, preciso da sua opinião acerca de um assunto que está me incomodando.

— É claro. — ele disse. — Diga-me o que quiser, Ava.

Ela encontrou o olhar dele e forçou as palavras, que trariam a verdade, saírem da boca dela apesar do pavor.

— Se nós nos casássemos, o que seria esperado de mim?

Ele franziu a testa, ajoelhando-se diante dela e pegando a mão dela.

— Eu gostaria de exibi-la. Trazer você para Londres e gritar da cúpula da Catedral St. Paul que você é minha e de mais ninguém.

Cobriria você com joias, diamantes e presentes que exaltariam a cor deslumbrante de seus olhos e a doçura de sua alma. E dançaríamos e faríamos amor até não termos mais energia para fazê-lo. E este seria só o começo.

As palavras dele a fizeram ser tomada pelo pânico do que tal promessa significaria para ela.

— Você deseja passar todas as temporadas na cidade?

Ele assentiu.

— É claro que teríamos que vir muito para Londres porque sou membro da Câmara dos Lordes e, portanto, o Parlamento me traz à cidade com frequência. Como Duque de Whitstone, espera-se que eu seja visto durante a Temporada, que eu frequente bailes e festas.

Meus amigos, que se tornarão nossos amigos, esperam e querem que participemos de suas reuniões.

Ele sorriu, os olhos cheios de esperança e, incapaz de dizer o quanto suas palavras frustraram todo o otimismo dela, ela sorriu um pouco, passando a mão sobre o queixo dele.

— Tate...

UMA BATIDA rápida na porta fez Tate se erguer antes que o mordomo entrasse e anunciasse o agente de Bow Street, por graças impedindo que Ava respondesse às palavras de Tate acerca do futuro deles, que dissesse o que ela esperaria caso eles contemplassem um matrimônio.

— Ava, este é o Sr. Shelly, o agente de quem falei. — Sr. Shelly, esta é a Srta. Knight, minha vizinha de Berkshire, que veio me ajudar na noite do incêndio em Cleremore.

O homem fez uma reverência a ela.

— Prazer em conhecê-la, Srta. Knight.

Qualquer que fosse a aparência que Ava poderia ter imaginado que um agente de Bow Street teria, não era em nada parecido com o que ela via na frente dela. Este homem era tão alto quanto o duque e com os ombros tão largos quanto.

Na opinião dela, o rosto dele não era tão agradável de se olhar quanto o do duque, embora fosse muito aprazível aos olhos femininos em geral com seus cachos negros e curtos e os olhos de um tom de verde esmeralda como ela nunca havia visto antes.

Todos se sentaram e, uma vez acomodados, o duque disse:

— Você tem alguma informação para nós pelo que soube.

O Sr. Shelly lançou um olhar curioso, e Ava sorriu por saber exatamente o que o pobre homem estava pensando. O que uma

mulher estava fazendo aqui em uma reunião de um assunto que só deveria interessar cavalheiros?

— Pode falar sem ressalvas na frente da Srta. Knight. Ela sabe de tudo o que está acontecendo em Berkshire, e eu não escondo nada dela.

Ava não pôde evitar a sensação reconfortante que a envolveu ante as palavras do duque. Ele era um homem muito bom. Ela seria uma tola caso não chegasse nem a vislumbrar um futuro com ele.

Mas ela não o faria se significasse sacrificar tudo pelo que ela lutou tanto para conseguir.

Mas agora não era hora de pensar em assuntos românticos com o duque, nem nele. Agora era a hora de descobrir se Lorde Oakes estava por trás dos terríveis ataques, e se havia a possibilidade de ele ser levado à justiça.

— Claro, Sua Graça.

O homem enfiou a mão no bolso e tirou um caderno preto, folheou algumas das páginas. Ele parou quando chegou a uma folha em que Ava conseguiu enxergar alguns pontos ao longo do papel.

— O dia em que você perseguiu um cavalheiro na floresta e que ele atirou na sua direção, e que a Srta. Knight se machucou após uma queda. — o agente encontrou o olhar dela. — Espero que esteja se sentindo melhor, senhorita Knight. Fiquei bastante aflito por saber que o criminoso havia agido de tal forma e, ainda mais, por mirar em uma mulher.

Ava agradeceu, sabendo que, se o culpado fosse de fato Lorde Oakes, ele era capaz de ações piores do que atirar em alguém. de olhos fechados, Ava preferia enfrentar uma arma à ser forçada a uma situação em que ela não seria capaz de correr, escapar. Assim como Lorde Oakes tentou fazer com ela.

— Um fazendeiro estava trabalhando nas proximidades e ouviu o tiro. Momentos depois do disparo, o cavaleiro em questão passou correndo pelo fazendeiro. Ele não acredita que o tenham visto. O

lenço do culpado, entretanto, já havia escorregado para o pescoço, expondo o rosto. O fazendeiro reconheceu esse homem como ninguém menos que Lorde Oakes.

Ava encontrou o olhar de Tate e leu a esperança nos olhos dele de que Sua Senhoria seria preso em breve, tornando-se incapaz de provocar mais danos. Pensar que ela nunca mais se preocuparia com ele, nem ficaria com medo de que ele aparecesse na porta dela no meio da noite e se forçasse a ela para terminar o que havia começado fez com que suas esperanças aumentassem, ela sentia seu sangue correr.

Ele seria punido de uma vez por todas.

— Tenho homens seguindo Lorde Oakes aonde quer que suas viagens o levem. Estamos atentos aos lugares que ele visita, a quais negócios ele se engaja quando está em Londres e se ele viajar para fora da cidade, saberemos.

— São notícias encorajadoras. — disse o duque. — Podemos provar que Lorde Oakes não estava em Londres no dia do incêndio de Cleremore ou quando a senhorita Knight e eu fomos alvejados?

— Podemos. — respondeu o Sr. Shelly. — Fizemos uma vistoria na casa londrina de Sua Senhoria e tivemos uma conversa bem esclarecedora com a cozinheira dele. A mulher estava bastante disposta a conversar, já que oferecemos uma coroa. Também foi dito que Sua Senhoria está com os soldos dos funcionários atrasados há um mês. A cozinheira afirmou que, embora não soubesse para onde Sua Senhoria havia ido, que ele esteve sim fora de Londres. É claro que se trata da palavra de um plebeu contra a de um Lorde, o mesmo com relação ao fazendeiro. Não há

evidências suficientes para provar a culpa dele, e caso esse assunto fosse a julgamento, decerto perderíamos. Mas é um começo.

Ava franziu a testa.

Todas as informações eram boas, mas não eram suficientes para derrubar Lorde Oakes.

— Qual é o seu próximo passo?

O investigador sorriu.

— Lorde Oakes vai cometer algum erro. E quando o fizer, estaremos lá. Pela minha experiência, quando tais pessoas pensam que enganaram a todos, fazem algo que não fazia parte do plano original, e toda a farsa começa a se desfazer.

O duque assentiu, parecendo satisfeito.

— Ele está em Londres agora e não fui notificado de nenhum outro incêndio nas redondezas de nossas propriedades rurais.

Quando retornarmos a Berkshire, e se Lorde Oakes também partir para sua propriedade rural, seria interessante estar atento a novos incêndios.

— Estou certa de que sim. — disse Ava. — Ele deve sentir prazer ao infligir tanta dor e sofrimento aos outros, se me permitem tal observação acerca de Sua Senhoria.

Tanto o duque quanto o investigador olharam para ela.

— Por favor. — disse Tate, gesticulando para que ela prosseguisse.

Ava limpou a garganta, calor subindo em suas bochechas.

— Sr. Shelly, preciso que saiba que Lorde Oakes estava decidido a me tornar amante dele meses atrás. Na época, ele estava cortejando uma mulher de meios substanciais aqui na cidade, e queria ter uma amante no interior. Eu o recusei quando percebi que as intenções não eram honradas.

— Ava, você não precisa contar...

— Sim, eu preciso. — disse ela, interrompendo Tate. — Tudo precisar estar bem claro, ao menos para o Sr. Shelly.

Tate recostou-se na cadeira, e Ava virou-se para o investigador.

— Não me escapou a percepção de que os incêndios ocorreram em propriedades que cercam meus próprios estábulos em Berkshire. Não posso deixar de pensar que ele está mirando nas pessoas mais próximas a mim, meus amigos e vizinhos, e me deixando para o final.

Os olhos do investigador se arregalaram com entendimento, e agora, após ter dito em voz alta seus medos, tudo pareceu fazer sentido. Lorde Oakes provara ser um ser humano egoísta e malvado. Não seria surpresa para Ava se ele quisesse se vingar dela, atormentá-la e deixar a propriedade dela por último.

— Ele não ousaria. — disse o duque, assassinato subentendido em seu tom.

O agente olhou para os dois antes de escrever algo no bloco.

— Suas preocupações são justificadas, Srta. Knight, e mandarei mais homens para vigiar sua casa. Lorde Oakes parece ter uma doença que incurável. — disse ele, brandamente. — Com uma doença dessas, não sabemos o que ele planeja ou para quando.

Ava conseguia acreditar nisso.

— Suponho que agora devemos ser pacientes e esperar, embora me preocupe onde ele atacará a seguir. Se ele for bem-sucedido em seus empreendimentos, o que significaria para as vítimas? Eu conheço o caráter cruel dele. Ele é capaz de infligir dor aos outros e não se importar com seus atos.

O agente a estudou por um momento, parecia refletir as palavras dela, dobrou o caderninho preto e o enfiou no bolso do casaco.

— Não há razão para alguém atuar dessa maneira. Algumas pessoas são más em essência, desejam fazer mal aos outros sem

uma razão específica, a não ser prazer próprio. Sabemos que Lorde Oakes está com dificuldades financeiras devido ao fato de a mulher que ele cortejava ter se casado com outro. O pai dela percebeu que ele estava quase falido e rejeitou a proposta dele. Você recusou os avanços dele, e os que o cercam em Berkshire são prósperos, possuem propriedades bem-sucedidas, ao contrário da dele.

Ava analisou os argumentos.

— Então o que está dizendo é que ele está atacando essas propriedades, essas famílias, apenas por inveja?

O investigador deu de ombros.

— Já vi pessoas assassinarem por menos. Não vejo razão para que Lorde Oakes não busque vingança por delitos inventados por sua própria mente débil.

— Isso é perturbador. — disse o duque, pensativo. — Não posso negar que ficarei feliz quando Lorde Oakes estiver atrás das grades ou, quem sabe, for enviado às colônias para nunca mais se aproximar de nossas sombras.

— É isso que pretendemos fazer, Sua Graça. Pode ser que leve algum tempo, mas ele cometerá um erro, todos cometem em algum momento, e quando ele o fizer, estaremos prontos.

Ava pensou nas palavras dele.

Esperar era muito bom, mas o desejo que Lorde Oakes nutria de machucar as pessoas, o desejo de ver animais queimando nos estábulos não era algo com que ela estivesse disposta a apostar.

Não era algo que ela estava disposta a permitir que fizesse de novo.

Dessa vez, não importa quantos agentes estivessem no encalço de Sua Senhoria, eles poderiam chegar tarde demais, assim como chegaram tarde demais para salvar os cavalos e o funcionário de Lorde Morton algumas semanas atrás.

— O que acham da ideia de dizer algo a Lorde Oakes? Não de mencionar que ele está sendo seguido por agentes, apenas deixar escapar que alguém viu um cavalheiro fugindo à cavalo no dia em que fui ferida. Deixar que a mente de Sua Senhoria imploda com a ideia de que alguém possa tê-lo reconhecido. Se disséssemos algo parecido para ele, podemos assustá-lo o suficiente para impedi-lo de iniciar mais incêndios. Eu sei que temos que sentar e esperar.

Entendo por que fariam isso, mas corremos muito risco com esse plano. Meus estábulos, por exemplo, abrigam cavalos que valem centenas de libras. Agora mesmo, o premiado puro-sangue, Titan, reside lá. Se permitirmos que Lorde Oakes volte a atacar, arriscamos nosso sustento, minha equipe e a vida dos cavalos. O

que você acha disso, Sr. Shelly? Acredita que vale a pena tentar esse plano?

O agente esfregou a mandíbula, franzindo os lábios, pensando.

— Entendo seu dilema e sua frustração. Arriscamos muito esperando que ele ataque novamente. Mas acredito que nesse caso precisamos esperar. Meus homens foram instruídos a adiar até o último momento possível antes de prenderem Lorde Oakes, portanto, se ele tentar iniciar um incêndio, estaremos lá e o impediremos, mas precisamos pegá-lo em flagrante. Se ele descobrir que está sendo vigiado ou que a senhorita suspeita dele, ele pode fugir. O homem é um covarde de coração e se fugir, bem, nunca seremos capazes de provar a culpa dele nesse caso.

Ava recostou-se na cadeira. Ela podia entender a opinião dele, mas não tornava mais fácil a perspectiva de deixar Sua Senhoria à solta.

— Muito bem. — ela cedeu. — Eu não direi uma palavra.

Ava leu o entendimento no olhar caloroso do duque. O fato lhe confortou. Eles pegariam Lorde Oakes e depois o trancafiariam. Ela

se livraria dele para sempre, talvez pela primeira vez em uma era, ela poderia respirar.

— Muito bom. — disse o duque. — Estamos de acordo, assunto resolvido. Esperaremos.

Depois de discutir alguns itens diversos em relação à onde os agentes ficariam ao longo do caminho entre a propriedade da Srta.

Knight e do duque, e por quem eles se passariam para não causar suspeitas caso encontrassem Lorde Oakes, o investigador os cumprimentou e saiu.

O duque, depois de se despedir do homem, voltou à biblioteca, fechando a porta atrás de si. Ava se levantou, sabendo que ela também deveria sair. Mesmo com a criada ali, ela ainda arriscava a reputação pelo simples fato de estar ali.

— Eu devo ir também. — disse ela, sem se mexer.

O duque estendeu a mão e pegou a dela, inclinando-se sobre os dedos enluvados e beijando-os. Seu toque enviou um frisson de consciência através do corpo dela, e Ava apertou a mão dele em resposta.

— Você vai ao baile dos York esta noite? Sei que vamos acompanhar a viscondessa.

O duque a conduziu para a porta.

— Agora eu vou.

Ela riu e, ao ver que a dama de companhia continuava sentada à espera de instruções, Ava gesticulou para que se levantasse.

— Até hoje à noite, então, Sua Graça.

Ava parou no limiar da porta da biblioteca, assimilando o máximo possível do duque. Ela adorava ficar sozinha com ele. Ele nunca agia como um nobre pomposo ao lado dela. Para ela, ele era simplesmente Tate. Sempre que estavam juntos, o corpo dela nunca

parecia seu. Estremecia e ansiava pelo toque dele, e ela não parecia capaz de deter a reação.

— Ó, que adorável. — disse uma voz fria e desinteressada da escada. — Se não é a Srta. Knight. Pensei que meus olhos estavam me pregando uma peça quando a vi na noite passada, no baile dos Tinley. Não sabia que havia sido convidada.

Ava respirou fundo e virou-se para sorrir para a viúva que descia, com lentidão exagerada, a escada em direção a eles. Atrás dela, havia uma mulher de impressionante beleza, toda elegância etérea, uma deusa com mechas loiras.

Ava fez uma reverência e não pôde deixar de olhar para seu modesto vestido matutino, um modelito do ano anterior. Ela se esforçou para ignorar as palavras "desagradável" e "simples" que flutuaram em sua mente sempre que estava perto de mulheres que se vestiam com o mais recente da moda, títulos e alta-costura. Ela levantou o queixo, e endireitou a coluna com determinação.

Ela olhou para Tate, o rosto dele assumindo um horrível tom de cinza. Ele a pegou olhando para ele e fechou a boca com um estalo, os lábios formando uma linha de irritação. Em relação a ela ou à mãe dele, Ava estava incerta, mas ela com certeza esperava que fosse a segunda opção.

— Tate, meu querido, você se lembra de Lady Clapham. Ela é minha nova acompanhante e voltará para Berkshire comigo na próxima semana.

A mulher mergulhou em uma reverência perfeita, e algo semelhante a ciúme atravessou Ava ao notar a impressionante beleza da mulher. Ela lançou um meio sorriso ao duque, contente, o que só a fez parecer mais bonita se é que era possível. Por um momento, Ava olhou para todos, tentando se lembrar de onde reconhecia o nome de Sua Senhoria.

Onde ela havia ouvido esse nome?

Tate pareceu se lembrar dos modos e cumprimentou a mulher com uma leve reverência.

— Bem-vinda, Lady Clapham. Tenho certeza de que você servirá muito bem minha mãe.

A viúva riu.

— Ó, com certeza acredito que sim.

Ava estudou Lady Clapham e com um temor nauseante ela se lembrou. Ela foi amante de Tate.

— Mais uma vez obrigada pela reunião, Sua Graça. Um bom dia a todos.

Ava recolheu o casaco e touca que estava nas mãos do lacaio no hall de entrada, e nem se incomodou em vesti-lo, apenas saiu assim que o criado abriu a porta, a criada bem atrás dela.

O modo como a nova acompanhante da duquesa olhava para o duque era predatório. Damas nesta posição não deveriam ser solteironas? Mulheres tímidas por natureza, sem interesse em casamento, ou com muita idade para chamarem a atenção de um homem? Lady Clapham não era nada disso, mas era perfeita se a viúva estivesse fazendo planos para o filho, mantendo uma mulher sem classe e do comércio longe dele.

— Srta. Knight. — chamou o duque, descendo os degraus da frente de sua casa e encontrando-a na porta da carruagem. — Eu a verei esta noite, não a verei? — ele perguntou, pegando a mão dela e ajudando-a a subir os degraus do veículo.

Ela assentiu, mas queria partir antes que ele visse como ela estava com ciúmes da mulher que agora viveria sob seu teto. Ela deu as coordenadas ao condutor.

Pensar que Lady Clapham tomaria café-da-manhã e jantaria com Tate. Que passaria as noites à frente da lareira na sala de jogos,

jogaria cartas e faria companhia à duquesa-viúva, que seriam como uma casal feliz.

— Nos vemos, então. Tenha um bom dia, Sua Graça.

Ela não olhou para ele quando a carruagem se afastou e conteve as lágrimas que ameaçavam. Era por isso que ela não era feita para este tipo de vida. Ela não era uma mulher de estratagemas, não era como a viúva, ou como Lady Clapham que também participaria desses jogos de bom grado.

Essa vida não representava quem ela era ou queria ser, algo que ela precisava se lembrar para manter a cabeça longe de Tate.

TATE FICOU parado na calçada e observou a carruagem rugir rua abaixo, até virar uma esquina e desaparecer. Ele franziu a testa, sabendo muito bem por que Ava ficara chateada com ele, ou para ser mais preciso, com a mãe dele.

Ele girou nos calcanhares e voltou para dentro, subiu até a sala de estar do primeiro andar, que a mãe havia ocupado como seu espaço de entretenimento particular. Ele a encontrou com Lady Clapham, sua antiga amante, tomando chá e sorrindo de orelha a orelha. Sem dúvida, o pequeno ardil provocara a reação desejada em Ava.

— O que — ele disse, apontando para Lady Clapham. — ela está fazendo aqui? E como sua dama de companhia ainda por cima.

Você está louca, mãe? Devo mandar chamar o médico e trancá-la no Asilo Bedlam antes do final do dia?

A viúva estreitou os olhos, sem quaisquer resquícios de diversão, ante as palavras dele.

— Lady Clapham é uma boa companhia e se voluntariou para ser minha dama de companhia, me entreter como a dama de uma Lady deve. Mas se ela também o faz lembrar que você possui um passado, um que a Srta. Knight não conhece, bem, melhor para mim. — a mãe dele pegou a xícara de chá e tomou um gole. — O

que será que a Srta. Knight diria se eu contasse que a mulher que partilhava sua cama agora é minha dama de companhia?

Tate não acreditava que seu sangue pudesse ferver mais do que quando Lorde Oakes cruzava seus pensamentos e, no entanto, de alguma forma sua mãe pareceu conseguir realizar tal feito. Ele fechou os punhos rente ao corpo para evitar que a estrangulasse na tentativa de fazê-la ter algum bom senso.

— Você não pode ter Lady Clapham como sua dama de companhia. A maioria dos cavalheiros que conheço buscaram a atenção dela nos últimos meses.

Sua Senhoria ofegou ante a grosseria dele, e Tate lamentou ofendê-la, mas sua mãe e seus planos não seriam benéficos a ninguém:

— Não importa o que você acredite, mãe, Lady Clapham não era minha amante, ela foi apenas uma mulher que aqueceu minha cama vez ou outra, e que agora não o faz mais. Se der continuidade a este plano, será ridicularizada.

— Eu tenho toda a intenção de fazê-lo. Sou a duquesa-viúva de Whitstone. Ninguém ousaria me contradizer. Lady Clapham vai me acompanhar pela cidade e voltará comigo para Berkshire. Eu, por exemplo, estou muito animada com o que está por vir. — a mãe dele sorriu, e mesmo assim seus olhos só mostravam frieza calculista.

— Por que você faria uma coisa dessas? Eu sempre soube que você não era amorosa, mas não a considerava tão cruel. Deveria se envergonhar.

Tate olhou para a mãe.

Ela permaneceu indiferente e intocada por suas palavras. Se ele esperava ver algum arrependimento nela, enganou-se. Pelo contrário, ela parecia muito bem satisfeita consigo mesma.

— Eu não me envergonho, e nunca o farei. Lady Clapham agora está a meu serviço, e iremos passear quando me convier. Quando eu voltar para Berkshire, ela também virá comigo e faremos uma festa bem alegre.

— Você não voltará para Cleremore. Mandarei um aviso aos criados para que arrumem suas coisas e as enviem para a casa da viúva. Seu tempo como genitora sob meu teto acabou. Quanto à casa em Londres, você pode permanecer aqui até que providencie acomodações alternativas.

A mãe dele deu de ombros, imperturbável.

— Faça o que quiser, meu querido. Nos vemos no almoço.

Tate saiu da sala com pressa.

Ele apertou as mãos para parar de tremer e lutou contra a vontade de socar um vaso que ficava encostado na parede do corredor. Embora ele não pudesse controlar a mãe, ele podia controlar quem morava em suas propriedades.

Ele desceu as escadas.

Escreveria para seu administrador em Cleremore de uma vez e o instruiria a organizar a mudança de sua mãe. Não se arriscaria a perder Ava outra vez, não importava quais esquemas secretos sua mãe inventasse.

Quanto a Lady Clapham, ele falaria com ela sobre sua conduta e o que ela achava que estava fazendo, mas sem a mãe dele estar presente. Ele acreditava ter agido de forma correta com ela, mas parece que ela pensava o contrário.

Ele balançou a cabeça, entrando na biblioteca e trancando a porta atrás de si. Ora, ele ficara sabendo até que ela havia arrumado um novo caso. Tate não sabia que o novo patrono de Sua Senhoria era, na verdade, sua própria mãe. E tal situação era inadmissível.

CAPÍTULO 12

M AIS TARDE NAQUELA NOITE, Tate estava ao lado de seu amigo, Lorde Duncannon, e observava Ava dançar com um cavalheiro sem importância. Era a quarta dança dela nesta noite e assim que ele chegou, a menos de duas horas, foi informado de que o cartão de dança dela estava completo, e portanto, eles não poderiam dançar.

Ele tomou um gole de vinho, imaginando como explicar a ela que o que havia presenciado de manhã na casa dele em nada mudava o que havia entre eles. Ele pode sim ter considerado Lady Clapham atraente, um homem teria que ser cego para não ver sua beleza.

Porém, como ele faria para contar que, além de estar com o coração dele na palma da mão, ela era a única mulher que o fazia girar a cabeça? A única mulher a capturar seu coração e alma.

Ele não teve a chance de conversar com Lady Clapham a respeito de por que ela estava de conluio com a mãe dele, mas ele o faria. No entanto, neste momento, seu maior problema era descobrir como explicar a situação para Ava, sem que ela se magoasse com a verdade.

— Como está a caça ao incendiário, Tate? O Investigador obteve alguma pista acerca da identidade dele? — Lorde Duncannon perguntou, tomando um gole de vinho.

Tate virou-se para o amigo, tendo se esquecido por um momento que ele estava lá. Duncannon era tão alto quanto ele, mas com os ombros um pouco menos largos. Mesmo assim, sua mandíbula marcante, as mechas loiras e o entusiasmo pela vida o tornava, com frequência, o favorito entre as mulheres.

— Temos uma pista, e neste exato momento o cavalheiro em questão está conversando com Lorde York.

Os dois olharam para o outro lado do salão, onde estava seu inimigo. A raiva crepitou no sangue de Tate, e ele precisou se conter e não atravessar o piso de parquet que os separavam para partir a cara do desgraçado.

Ele o analisou por um momento, odiando o fato de ele ter machucado, aterrorizado e tentado estuprar Ava. Tate balançou a cabeça, agradecido pelo fato de a criada de Ava entrar e o deter.

— Lorde Oakes. Você suspeita dele? — o choque na voz de seu amigo o tirou de suas reflexões em torno de como torturar o desgraçado caso o encontrasse sozinho.

— O dia em que a Srta. Knight e eu fomos alvejados, então...

— Espere. Pare. — disse Duncannon, apertando o braço dele.

— Você e a Srta. Knight, a mesma mulher com quem você queria se casar tantos anos atrás, foram alvejados? Como eu não soube disso?

Tate balançou a cabeça.

— Preciso lembrá-lo de que você não estava em Londres, nem mesmo na Inglaterra naquela semana. A propósito, como está Paris? Ainda é tão decadente como sempre e muito disposta a fazer um espetáculo para agradar um visconde rico?

O amigo sorriu.

— Claro, mas esqueça-se disso. — disse ele, franzindo a testa.

— Algum de vocês dois se machucou? O que aconteceu?

— Veja por si. — disse Tate com um movimento de cabeça na direção em que Ava ainda dançava com um barão.

— Aquela é a Srta. Knight?

Tate ouviu a apreciação na voz do amigo e decidiu ignorá-la. Ava era muito bonita, mesmo que na maior parte do tempo ela fosse

alheia a tal fato. E beleza, dentro e fora, que Ava possuía em abundância. Não era de admirar que ela fosse tão requisitada em bailes e festas. A Sociedade sentiria falta dela quando retornasse a Berkshire, mesmo que a mãe de Tate não partilhasse o sentimento.

— Sim, é ela.

Duncannon olhou para ele com desconfiança.

— E ela está dançando com outra pessoa porque...

Era algo pelo que Tate havia se indagado também, mas após a saída precipitada de Ava da casa dele hoje cedo, não era difícil descobrir por que ela o estava evitando. Ela estava com raiva e talvez até magoada, mas tais emoções o levavam a outra constatação. Ava gostava dele mais do que como um amigo, e isso o fazia ter esperanças.

— Minha mãe contratou uma nova dama de companhia. Mas esta pessoa é Lady Clapham, uma antiga amante minha.

— O quê!

A altura da declaração de Duncannon fez as pessoas se virarem na direção deles, até Ava na pista de dança olhou para eles, por tempo o bastante para Tate notar antes de ela desviar.

— Fale baixo, ninguém sabe, e ela só contratou Lady Clapham para poder causar conflito entre Ava, digo Srta. Knight, e eu.

— Então, você ainda gosta dela. Conclui que fosse assim quando percebi que não estava me ouvindo, que sua mente estava longe. Embora eu não soubesse que era a Srta. Knight em particular, eu sabia que era alguém do sexo oposto.

Tate suspirou, gesticulando para um lacaio trazer um pouco mais de vinho para eles.

— Não foi muito depois de eu voltar a Londres. A Srta. Knight soube de alguns dos rumores que circulavam na Sociedade acerca de minhas atividades, mas não sabe de tudo. Lady Clapham é um

desses assuntos, e de alguma forma a minha mãe descobriu e está disposta a causar problemas.

— Você terá que colocar sua mãe no lugar dela. — disse Duncannon, pegando uma taça de vinho do lacaio e sorrindo em agradecimento. — É claro que gosto da viúva, mas ela não pode reger sua vida como costumava fazer. Você é um homem adulto, Tate. Deve deixar claro que não permitirá que ninguém da família o trate com tão pouco respeito.

Tate apertou o queixo.

Sabia que Duncannon estava certo. A mãe dele havia ultrapassado os limites, e ele providenciaria para que ela fosse acomodada na Residência da Viúva, antes que retornasse à Berkshire. Mas não significava que ela não seria capaz de causar desavenças entre Ava e eles, mesmo distante.

Ele olhou para a esquerda e xingou por dentro.

Lady Clapham caminhava em direção a ele com sua melhor amiga, e uma das maiores fofoqueiras da sociedade, a tiracolo.

Sentindo todos os olhos nele, ele se voltou para onde havia visto Ava pela última vez e a encontrou observando-o, junto a um grupo de amigas.

— Falando do diabo. — disse Duncannon, curvando-se para as duas damas que se juntaram a eles em instantes.

Tate jamais desejara estar em outro lugar com tanta vontade com agora. Ele comportou-se como o esperado de um duque e cumprimentou as duas damas com uma pequena reverência de cabeça assim que chegaram. Lady Clapham sorriu para ele com doçura, uma característica que ele sabia ser apenas aparente. A mulher só poderia ter gelo correndo nas veias se havia escolhido unir forças com a mãe dele.

Ele só podia agradecer aos Céus por descobrir tal fato agora, e por não ter seguido em frente com a ideia de propor casamento, como ele cogitou fazer no ano anterior quando estava confuso e sofrendo de amores por uma mulher que não via há meia década.

— Sua Graça. Lorde Duncannon.

As duas mulheres fizeram uma reverência, e Tate lutou para não olhar de volta para Ava e ver se ela estava observando a cena acontecer. Inferno, ele esperava que ela desviasse o olhar, que estivesse dançando com outro cavalheiro.

— Estão gostando do baile? — Lorde Duncannon perguntou, tomando um gole de bebida, com visível júbilo em ver Tate constrangido.

Lady Clapham sorriu, aproximando-se mais de Tate.

— Acabamos de comentar que a próxima dança é uma valsa.

Se essa era uma tentativa de Lady Clapham de sugerir que Tate dançasse com ela, ela ficaria muito desapontada. Havia apenas uma mulher com quem ele queria dançar, e esta era a Srta. Knight.

Incapaz de fazê-lo, Tate a procurou mais uma vez e viu o marquês de Boothby se curvar diante dela, pegar sua mão e a encaixar debaixo do braço dele antes de conduzi-la à área de dança.

Tate terminou o vinho e depositou a taça em um buffet que havia detrás deles. Maldito fosse o homem. Ele sentiu a raiva dentro de si aumentar ao perceber o sorriso que brincava nos lábios de Ava.

Sem mencionar que a mão de Sua Senhoria estava muito baixa nas costas dela, e ele a segurava muito mais perto do que deveria.

Desgraçado.

Uma mão apertou seu braço, e ele nem percebeu que havia dado um passo na direção dos dançarinos.

— Deixe para lá, Tate. — o amigo sussurrou. — É apenas uma dança. Creio que, no momento, você esteja com problemas maiores do que a Srta. Knight.

As palavras de Duncannon o fizeram se acalmar um pouco, e ele assentiu. Precisava dar um voto de confiança ao sentimento que ele e Ava nutriam um pelo outro, mesmo que hoje ela estivesse bem chateada com ele.

— Bem, já que sou viúva e uma bastante escandalosa, terei que resolver o assunto por mim mesma. Dançará comigo, Sua Graça?

Os convidados se viraram, alguns ofegaram ante as palavras de Sua Senhoria. Tate estreitou os olhos, odiando o fato de ele ser uma peça no jogo dela.

Ele retesou o queixo antes que seu humor se fizesse visível.

Para evitar que ela se envergonhasse perante todos e ser um cavalheiro, como ele poderia não dançar com ela agora? Ele estendeu o braço, sorrindo entredentes.

— Claro, Sua Senhoria. Vamos?

Ela o segurou e ergueu o queixo, caminhando ao lado dele enquanto ele buscava um lugar entre os casais que já estavam valsando. Ele não gostou da dança, seus problemas apenas dobravam a cada minuto que Lady Clapham passava em seus braços. A música continuava, as pessoas flutuavam em torno deles, girando e rindo, e ele só conseguia ver Ava. Ela estava com toda a atenção no marquês, e em nenhum momento, virou-se para ele.

Como ela foi capaz de não deixar uma dança para ele?

Ninguém sabia que ele e Lady Clapham haviam sido amantes, a menos que Ava estivesse mais ciente das fofocas que ele soubesse.

Tal possibilidade fez pouco para acalmar sua inquietação. Decerto explicaria por que ela havia deixado a casa dele com tanta pressa.

Maldição.

AVA LUTOU para não olhar na direção em que Tate dançava com Lady Clapham, a mesma mulher que já fora amante dele e agora residia sob seu teto. Eles formavam um par impressionante enquanto dançavam pelo salão, os passos do duque pareciam sem esforço, perfeitos, fazendo com que Sua Senhoria parecesse flutuar como um anjo.

A noite mostrou ser uma de que ela não esqueceria tão cedo.

Com a presença de Lorde Oakes, a noite começara em uma espiral descendente, mas ver Tate dançando com uma mulher que, além de bonita e intitulada, possuía o apreço da mãe dele, fazia sua estada em Londres ser menos aprazível ao ter que testemunhar tudo.

Quando soube que Tate havia retornado dos Estados Unidos, suas aventuras em Londres não a afetaram tanto quanto agora. Ela se distanciou da ideia de se importar com o que ele fazia, ou com quem ele socializava. Ela o ignorou da melhor forma que pôde, quer dizer, ignorou a reação que seu coração teve quando ela soube. No fim, ela se endureceu, aprendeu a confiar em si, cuidou de seus funcionários e de seus cavalos e se esqueceu do duque que certa vez reivindicou seu coração.

Mas agora, vê-lo em meio aos seus iguais, com damas nobres o bajulando como se ele fosse um deus grego, era perturbador. Ela respirou fundo. Bem, não era algo com que deveria se importar, mas, com certeza, não era algo que ela conseguiria aturar. Não se as lágrimas que ameaçavam cair a cada vez que ela olhava para ele fossem prova de algo.

Ava tentou se concentrar no que o marquês dizia a ela, mas seus pensamentos estavam em outro lugar. Ou melhor, no duque que agora olhava para Lady Clapham, engajado em uma profunda

conversa. Felizmente a dança chegou ao fim e, girando-a para parar, ela fez uma reverência e agradeceu Sua Senhoria pela dança.

Ele fez uma reverência, e Ava não ficou tempo suficiente para ouvir a despedida dele, pois girou na direção do quarto de descanso. A última coisa que ela precisava era que ele notasse as provas físicas de que ela estava incomodada pelas ações de um homem com quem ela mesma havia dito não querer se casar.

Ela havia afirmado não querer mais tal vida, então por que tanto transtorno? Ela afastou o pensamento, brava consigo mesma por ser fraca. Por se importar mais do que gostaria.

Tate podia dançar com quem quisesse. Ele era livre para cortejar moças e se casar, e ela deixou claro como o dia, que estava feliz com a vida que levava agora. Então, por que a ideia de ele tomar outra mulher com esposa trazia à tona o pior dela?

A parte nela que fervia, que fazia seu estômago revirar de pavor ao imaginar o que ele estava fazendo e com quem. A parte dela que se afogava em ciúmes. Um sentimento tão grande que a impedia de agir ou pensar com razão, como agora quando ela ficou atormentada por ver o duque dançar com Lady Clapham.

— Ava. — o duque chamou de detrás dela.

Ela olhou por cima do ombro, sem desacelerar o passo. Ela, com certeza, não estava disposta a parar, e muito menos a ter uma discussão em público com ele, em um lugar em que qualquer pessoa poderia aparecer, a qualquer instante.

— Volte ao baile, Sua Graça. — disse ela antes de entrar por uma porta que estava entreaberta e encontrar um tipo de sala de estar vazia. Uma única luz como guia até o banco sob as janelas do outro lado do cômodo.

— Ava. — ele repetiu, seguindo-a para dentro da sala e fechando a porta detrás dele.

O som do trinco sendo encaixado foi alto no espaço vazio, e ela ergueu o queixo, encontrando o olhar dele.

— Por que você trancou a porta? Na verdade, por que me seguiu? Não deveria acompanhar sua parceira de dança até estar ao lado da sua mãe, lugar que ela pertence? — ela se encolheu com a inveja que tingia seu tom, evidente para quem quer que estivesse ouvindo.

Ele suspirou, os ombros caindo um pouco com as palavras dela.

— Eu poderia perguntar o mesmo de você. Por que o marquês não a levou de volta às suas amigas e à viscondessa? Você pareceu gostar muito da dança, pelo que pude ver.

O nervoso que ela sentia aumentou, e ela meio que grunhiu para o duque, ante de se aproximar dele.

— Diga-me, que papel Lady Clapham tem na sua vida? Sua mãe parece gostar muito dela e vi os olhares triunfantes que ela me lançou durante toda a sua dança com Sua Senhoria. Só posso supor que ela pense que vocês conviverão o bastante para que você se apaixone por ela.

Ele franziu o cenho, balançando a cabeça.

— Não trato Lady Clapham como nada mais que uma conhecida de minha mãe. E se quer saber, foi ela quem me convidou para dançar. Eu não queria.

Ava zombou.

— Não me pareceu assim. Na verdade, você parecia muito feliz por tê-la em seus braços. Suponho que eu não deveria esperar menos, pois há rumores de que você adorou tê-la nos braços na última temporada.

Tate se encolheu, mas Ava manteve a postura. Ela não era cega aos atrativos de Lady Clapham e os motivos para que tantos cavalheiros a procurassem.

— Você está com ciúmes.

Foi uma afirmação. Uma que Ava precisava negar, mesmo que fosse tão verdadeira quanto o fato de que o sol nascia toda manhã.

— Não estou com ciúmes. — ela afirmou, a falsidade fazendo suas palavras saírem fortes e tensas. — Você é livre para fazer o que quiser.

— Sério? — ele disse, dando um passo na direção dela e Ava deu um passo para trás. — Qualquer coisa que eu quiser? — ele perguntou de novo e deu outro passo.

Ela parou de se mover sabendo que era inútil tentar fugir de Tate.

— Qualquer coisa. — as palavras sussurradas despedaçaram a restrição que ela ainda possuía, e se Tate pensou que seria ele a decidir o que acontecia a seguir, Ava acabava de mostrar como estava errado.

Ela de o último passo que os separava, esticou o braço e tomou os lábios dele em um beijo ardente. Ela sentiu-se dominar por uma onda de certeza e soube que estava onde queria estar. Não dançando com mais ninguém, ou sozinha treinando cavalos em Berkshire, mas nos braços do garoto que ela sempre amou, que havia perdido e reencontrado como um homem adulto.

Os braços dele a envolveram e ele a puxou contra ele, os lábios tão insistentes quanto os dela. Ela podia sentir o desespero e a necessidade a cada movimento da língua dele e das ou das mãos dele nas costas dela, que não pareciam aproximá-la dele tanto quanto ela queria.

Não que houvesse muita distância entre eles. Pois Ava podia sentir cada linha, cada curva do corpo dele, incluindo o que crescia contra a barriga dela e a fazia tremer por dentro. Ele a guiou para trás até que o sofá atingiu a parte de trás de seus joelhos. Mas não pararam aí, desabaram nas almofadas, o corpo de Tate a prendendo no sofá. O beijo deles não parou, e ela não impediu Tate quando a mão dele deslizou por sua perna para levantar a bainha do vestido.

Ar fresco beijou seu tornozelo, sua panturrilha e, por fim, sua coxa. Tate se ergueu um pouco, ajustando-se para ficar bem entre as pernas dela, e um calor líquido inundou seu núcleo. Estar ali com Tate daquela maneira não provocou o medo que ela imaginou que sentiria.

Estar presa embaixo dele sob um pretexto bem claro, ela pensava que talvez fosse sentir pânico, mas não era esse o caso.

Não com Tate. Desejo delicioso e uma necessidade interminável que só ele poderia satisfazer, era tudo o que ela sentia e ansiava.

Ele sustentou o olhar dela, a respiração irregular, mas mesmo então Ava confiava que caso ela o pedisse para parar, ele o faria.

— É isso que você quer, Ava? Sabe que eu nunca faria nada que você não desejasse.

Ela estendeu a mão e acariciou a bochecha dele.

A barba começava a despontar e pinicava sua mão. Os cabelos escuros dele caíam sobre a testa, concedendo um ar de pecado, e ela suspirou, com o coração cheio do carinho que sentia pelo homem diante dela.

— Eu não quero que você pare.

Ele voltou a beijá-la, com intensidade e assertividade, e ela se deixou perder nos braços dele. Deixou-se desfrutar de tudo o que ele poderia dar a ela esta noite. Ele ergueu o tronco e passou a mão debaixo das saias dela, puxando o tecido de sua roupa íntima para

fora do caminho. Os olhos de Tate escureceram, e Ava estremeceu quando o algodão macio deslizou sobre suas pernas, deixando-a apenas com as meias e sapatilhas de seda.

Não querendo mais negar o desejo que sentia por ele, Ava esticou o braço e agarrou as calças dele. Os dedos dela tremiam, mas se de nervosismo ou expectativa ela não saberia dizer. Ava abriu os botões um a um, queria tanto isso para eles. Deitar-se nos braços dele e ser a mulher que despertava todo o desejo e necessidade que ela conseguia ver nos olhos dele, sentir no toque e a cada beijo.

Abrindo o último botão, Ava enfiou a mão dentro das calças dele e envolveu o membro duro. Ela respirou fundo ante a suavidade da pele que envolvia aço. Os olhos dele se encontraram com os dela, escuros e intensos uma emoção que a deixou inebriada, bêbada de expectativa. Era ela quem fazia Tate reagir desta forma. Que era ela a quem ele desejava e mais ninguém. Não a bela Lady Clapham ou outra mulher com quem ele esteve nos últimos cinco anos, mas ela.

— Beije-me. — ela pediu.

E não precisou pedir das vezes.

Tate envolveu os lábios dela em um beijo ardente, e Ava colocou as pernas em volta dos quadris dele, querendo-o com um desejo que nunca havia sentido. O sexo dele deslizou contra o dela, provocador e torturante. Ela gemeu quando calor deslizou entre suas coxas. Tate pôs a mão entre eles para se guiar nela.

— Você está pronta para mim. — ele rosnou contra seus lábios.

— Diga que está certa disso.

— Uhum. — disse ela, mexendo um pouco para tentar fazê-lo terminar o que haviam começado. — Eu quero.

E não iria conseguir esperar por muito mais tempo. A espera para tê-lo já durava anos, sendo assim, as manobras dele para ir

devagar, a provocação, não eram justificadas.

— Não me faça implorar, Tate. — disse ela, empurrando-se contra ele e provocando um pulsar através de seu abdômen.

— Ah, não a farei esperar mais.

TATE PASSOU os dedos na superfície da vulva dela, estava macia, molhada e pronta para ser reivindicada por ele. Ela ondulou contra a mão dele, e ele sentiu o pênis contrair, duro como pedra e pingando com sua própria necessidade de tê-la.

O local em que estavam não era nada ideal, e Tate tinha a vaga lembrança de ter trancado a porta, mas nada e nem ninguém o tirariam de onde ele estava naquele momento. Ele esperou tanto tempo para ter Ava. Ele sonhava em estar junto dela dessa forma.

Ela olhou para ele com os olhos escuros de necessidade não satisfeita e confiança, e seu coração deu um baque no peito. Como ele a adorava. Ela era tudo o que ele desejava em uma esposa, amante e amiga. Mesmo que ele fosse condenado ao inferno ele a deixaria ir embora agora que a tinha de volta. Depois de hoje, depois que se entregassem dessa maneira, ele se casaria com ela.

Iria amá-la e garantiria que a Senhorita Ava Knight se tornasse a próxima duquesa de Whitstone.

— Você está tão molhada. — ele disse e deslizou um dedo no interior quente dela.

Ele gemeu quando os músculos interiores dela se contraíram no dedo dele, sugando-o.

— Estou. — ela ofegou, agarrando-se aos ombros dele enquanto ele empurrava um pouco mais para dentro. — Eu quero você, Tate.

Eu o quero muito.

Incapaz de esperar por mais um momento, ele se afastou, ergueu as pernas dela ainda mais nos quadris dele e se guiou para dentro dela.

Ela deitou e fechou os olhos. Ver o prazer que ela sentia só contribuiu para que o pênis dele ficasse ainda mais duro. Havia pouca resistência, e ele estava agradecido por isso, não queria que esse momento fosse só de dor, que a memória dela fosse de algo ruim. A união deles era algo para comemorar e apreciar, e ele faria tudo o que ela pudesse ter sonhado.

— Ó, Tate. — ela suspirou, inclinando-se para beijá-lo. — É uma sensação tão boa, tão certa.

Tate se afastou um pouco antes de avançar, as palavras dela nunca foram tão verdadeiras . Inferno, parecia tão certo e tão bom.

Era só nisso que ele conseguia pensar. Eles encontraram um ritmo, e ele lutou para não se perder antes que ela chegasse ao ápice do prazer.

Ele queria vê-la se desfazer em seus braços, que ela se contraísse e tivesse espasmos em torno do membro dele de modo a levá-lo ao próprio clímax. Os movimentos dos dois ficaram mais frenéticos, e os gemidos e suspiros de prazer de Ava eram inebriantes. Ele se derramaria logo se não fizesse algo para levar Ava ao clímax em breve.

Tate se afastou e se ajoelhou entre as pernas, afastando os joelhos dela.

— O que você está fazendo? — ela perguntou sem fôlego, tentando fechar um pouco as pernas.

Ele agarrou as mãos dela e as colocou atrás da cabeça.

— Segure-se no apoio de braço do sofá. Eu quero provar você.

— Provar? Como assim?

Ele não respondeu, apenas se inclinou entre as pernas e lambeu Ava do núcleo ao clitóris. O aroma doce e almiscarado o fez gemer, e lambendo-a de novo, ele decidiu provocar o pequeno botão que implorava por libertação.

— Minha nossa. — ela engasgou.

Ah, sim...

Tate olhou para cima e a viu colocar a mão na boca. Ele deslizou a língua para frente e para trás sobre o sexo dela, amando o gosto dela, como ela ondulava contra os lábios dele por instinto, buscando libertação. Ele não deixou de atacar o sexo dela, querendo lhe dar prazer antes de fazer amor com ela. Ela ofegou o nome dele e soltou o braço do sofá, cravou os dedos nos cabelos dele, segurando-o contra ela.

Tate sentiu contrações contra os dedos e sorriu, beijando-a com vontade, saboreando o momento em que ela chegou ao clímax contra a boca dele.

Quando ele seguiu Ava pelo corredor, ele jamais sonhou que era assim que eles terminariam, mas por Deus, ele estava feliz por tal desfecho. A última coisa que ele queria era que eles continuassem em desacordo pelas reações ou planos de outras pessoas.

Ele a beijou antes de voltar a se colocar entre as pernas dela.

Ela se abriu para ele, os olhos semicerrados e sonolentos de satisfação. Tate se guiou para dentro daquele calor, e ela apenas fechou os olhos, suspirando.

— Está bem, minha querida? — ele perguntou, erguendo o queixo dela com o dedo para que olhasse para ele.

Ele bombeou nela devagar, querendo prolongar o tempo junto dela o máximo que pudesse. Seus olhares se cruzaram, e ela sorriu para ele, sonhando acordada.

— Ó sim, estou mais do que bem. Não pare. — ela disse, passando os braços pelos ombros dele e erguendo mais as pernas para se apoiar nas costas dele.

A aceitação dela, o desejo nela, desfez qualquer controle em que ele ainda se apoiava e ele se permitiu investir, querendo torná-la dele e somente dele.

Ela ofegou, puxando-o para um beijo descarado. Ele a beijou com intensidade, a língua dela mimicava as estocadas dele, e em poucos minutos ele quis se perder dentro dela. Mas ainda não, era muito cedo. Ele precisava adiar um pouco mais.

Ela baixou uma das mãos e agarrou um lado da bunda dele, puxando-o para ir mais fundo. Com uma única rotação de quadris, ela o fez entrar até a base e estilhaçou toda restrição de Tate. Ele se empurrou uma vez, duas vezes, três vezes e gozou com tanta força que o fez se esquecer de onde estavam e gritar o nome dela.

Ava ofegou, gemendo o nome dele em troca, e som do prazer dela foi como um fósforo para o fogo dele. Ela ainda era tão perfeita para ele quanto no dia em que ele pediu que ela se casasse com ele tantos anos atrás. Ele não queria nada mais do que envolvê-la como um presente, levá-la para casa e mantê-la em sua cama e vida para sempre... e mais um dia.

Ele caiu ao lado dela no sofá, puxando-a para se deitar na dobra do braço dele. O relógio do parapeito da lareira soou, marcando uma hora da manhã.

— Gostaria de nunca mais sair daqui. Eu ficaria muito contente do seu lado para sempre, se pudesse.

Ava passou a mão sobre o peito dele, brincando com os botões do colete que ele nem chegou a tirar por causa da pressa deles de se consumirem.

— Eu também, mas infelizmente, não podemos. Temos que voltar ao baile antes que notem nossa ausência.

Tate suspirou, não querendo fazer mais nada.

— Se eu concordar em levá-la de volta ao baile, vai dançar comigo? — ele se virou para encontrar o olhar dela. — Garanti um espaço no seu cartão de dança?

Ela sorriu, erguendo a sobrancelha.

— Creio que sim. — ela disse, virando-se para olhar para o teto e ficando séria de repente. — Se quer saber a verdade acerca de meu descontentamento, eu sei da sua história com Lady Clapham e não fui capaz de suportar. Uma mulher que é intitulada, bonita e elegante, da sua esfera social. Bem, eu não sou tola o suficiente para não saber que senti ciúmes.

Ele virou o rosto dela para encará-lo, implorando para que ela acreditasse nas palavras dele.

— Eu não estou cogitando Lady Clapham como minha esposa.

Quero você como minha esposa, para que esteja sempre ao meu lado. — ele não disse as palavras, ainda não pelo menos, mas ele diria. Tudo o que pairava entre eles precisava ser discutido e em breve. — Ela é apenas a dama de companhia nobre de uma viúva, nada mais.

Comparado a Ava, não havia ninguém que ocupasse tanto espaço no coração dele. Ela sempre foi a pessoa certa. Uma confirmação que ele obteve no momento em que ela o confrontou nos estábulos dele depois de cinco anos sem se verem.

— Quando retornarmos a Berkshire, discutiremos o que isso significa. O que nós dois queremos.

Ele a queria. Como esposa, confidente e parceira. Nada menos serviria. Ela sorriu, inclinando-se para um beijo breve.

— Acredito que seja o melhor a fazer.

CAPÍTULO 13

Percebi hoje que prossegui com minha vida. Que, embora casamento não seja mais algo que eu desejo, saiba que sou feliz.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

N A MANHÃ SEGUINTE, Ava acordou tarde e rolou no colchão para olhar pela janela do quarto. Ela ouvira uma criada entrar mais cedo e abrir as cortinas, colocar um pouco de água fresca na bacia e alguns paninhos para higiene pessoal, mas Ava voltou a dormir.

O baile na noite anterior havia sido muito melhor do que Ava pensara ser possível. Decerto, depois de ser um pouco ciumenta em relação à Lady Clapham e sair correndo da casa do duque mais cedo naquela manhã, ela não acreditava que ele se explicaria quanto a situação dela. Quão errada ela estava. Não que mudasse a situação entre eles, mas a fazia sentir-se um pouco melhor por saber que o elo com a dama terminado.

Ainda assim, ela acreditava que a melhor decisão para ela seria manter a independência. O duque era muito reverenciado na sociedade, as pessoas o admiravam, ele era gentil e se esperava muito dele. O papel de esposa dele seria algo de grandes proporções, e Ava não estava convencida de que queria realizá-lo.

Contudo, havia algo que ela sabia bem: que ela queria Tate. O

fogo que queimava, chamuscava e consumia os dois sempre que

estavam perto um do outro era demasiado intenso para ser ignorado. Mas havia outra opção que não haviam contemplado: a de se tornarem amantes.

Tornar o que ocorrera no baile de Lorde York um arranjo permanente entre eles. Sem casamento, sem contratos, sem expectativas, apenas um tempo juntos, prazer e alegria. Ela sentiu-se estremecer por dentro ao relembrar o que fizeram naquela sala privativa. Ava sorriu, mordendo o lábio inferior.

Queria repetir, e em breve.

Ela afastou a roupa de cama e seguiu com sua rotina matinal e decidiu-se por usar um vestido azul claro. Antes de voltar para Berkshire, ela foi à Hatchards e encomendou alguns livros sobre criação e linhagem de cavalos que deveriam chegar hoje. Ela passaria na livraria antes de ir ao Hyde Park se encontrar com Hallie e Willow.

A viscondessa morava em Mayfair, o que significava uma caminhada curta até a livraria, e como era bem cedo, a maioria dos moradores da região ainda estaria na cama após passarem a noite em festas por toda Londres. Ava não teria percalços e chegaria à loja em pouco tempo.

A campainha acima da porta tocou quando ela entrou e, cumprimentando o atendente que estava detrás no escaninho, passeou pelas estantes para ver se havia outros livros que ela gostaria de levar.

O cheiro reconfortante de couro e cera permeava o ar, os sussurros baixos de outros amantes de livros caminhando na loja a fizeram sorrir.

Por um tempo, Ava se perdeu nas fileiras de livros e na variedade oferecida antes de um livro em particular chamar sua atenção. Abrindo a capa, ela ofegou, e o fechou depressa.

Olhando ao redor, Ava verificou se estava sozinha, e ao confirmar a ausência de outras pessoas, ela abriu o livro mais uma vez para olhar as imagens de homens e mulheres, às vezes mais de duas pessoas em todo o tipo de brincadeiras conjugais.

Ela olhou para uma imagem em particular que mostrava uma mulher deitada na direção oposta ao amante: Ava não conseguia imaginar como era possível. Como isso funcionaria?

Ela fechou o livro, colocando-o de volta no lugar e determinada a folhear mais um pouco em sua próxima visita. Neste instante, se ela não fosse embora, se atrasaria para encontrar as amigas no parque.

Não demorou muito para pegar os livros e após agradecer ao atendente ela caminhou até a Piccadilly, virou na direção do Hyde Park e bateu de frente à uma parede de músculos diante dela.

Por um momento Ava pensou que poderia ser Tate, mas todas as suas esperanças de tal encontro foram frustradas ao olhar para cima.

— Srta. Knight. Como é oportuno encontrá-la aqui. Está com pressa para ir a algum outro lugar?

A resposta foi um retumbante sim. Sim, ela estava com pressa para encontrar as amigas, mas agora estava com mais pressa ainda de se afastar dele.

— Com licença. — disse ela passando por Lorde Oakes.

Ava se assustou quando ele agarrou a mão dela e a colocou no braço dele, juntando-se a ela na caminhada até o Hyde Park. O

pânico a rasgou por estar sozinha com ele outra vez. Ela havia jurado, no dia em que ele a atacou, que jamais ficaria sozinha com

alguém em quem não confiava, e decerto não poderia confiar em Lorde Oakes de jeito nenhum.

— Então... — ele disse com toda jovialidade. — Para onde estamos indo com tanta pressa? Irá se reencontrar com o duque de Whitstone, ou com outra pessoa?

Ele sorriu para ela, mas a tentativa de parecer entretido saiu mais como zombaria. Ava nunca imaginou que poderia odiar alguém tanto quanto odiava o lorde ao lado dela, mas, infelizmente, aqui estava ela com o único homem que a fazia preferir estar morta e não viva.

— Se quer saber, estou indo encontrar minhas amigas, Srta.

Evans e Srta. Perry, no Hyde Park. Não que seja da sua conta.

Ela tentou libertar a mão sem sucesso. Ele lançou um tsc, tsc para ela e sorriu para um transeunte, como se a conversa deles fosse a coisa mais comum do mundo.

— Convenhamos, Srta. Knight. Nós nos conhecemos a nível pessoal. Não seja tão fria comigo. Houve uma época em que você era toda desejosa, e era bem quente ao toque.

Ela conseguiu soltar o braço e o confrontou sem se importar com o lugar em que estavam.

— Eu nunca estive desejosa. E o senhor pode pensar o que quiser, mas caso se aproxime de mim outra vez, farei com que pague.

Ela não sabia dizer como, mas estava certa de que resolveria, mesmo que significasse engolir o próprio orgulho e pedir a Tate que a ajudasse com Sua Senhoria. Não era uma opção que ela apreciava, já que estava muito determinada a manter sua independência, porém, às vezes era necessário um homem para forçar outro a sair de cena.

Lorde Oakes levantou a mão e passou o dedo sobre o pulso que ela havia machucado. Pouquíssimas pessoas sabiam que ela estava ferida e o que assustara o cavalo para que empinasse, causando a queda dela. Então, como Lorde Oakes saberia a menos que...

Ela estreitou os olhos, e ele sorriu antes de apertar o pulso lesionado com mais força do que seria recomendado. Ela ofegou, afastando-se.

— Peço desculpas, Srta. Knight. Está machucada?

Ela olhou para ele por um momento, sem acreditar que ele seria tão descarado.

— Você deveria saber que sim, Lorde Oakes — disse ela, vendo se ele entendia as palavras dela.

Seus olhos se arregalaram e então, jogando a cabeça para trás, ele riu como se ela tivesse dito algo extremamente divertido. As pessoas que desciam Piccadilly olharam na direção deles, mas continuaram sem comentar.

— Ó, você é uma verdadeira beleza. Agora sei por que eu quis tanto você, era só para tentar domar essa fera que ronrona em sua alma.

— Você não tem alma — disse ela sem pensar. —, portanto, faria sentido tentar tirar a de outra pessoa.

A admissão dele acerca de ter estado lá naquele dia, foi algo estranho a se fazer. Ele pode não ter dito as palavras em si, mas admitiu saber do ferimento dela e como havia acontecido. Lorde Oakes era o incendiário, disso não restava dúvidas, mas, ainda assim, era a palavra dela contra a de Sua Senhoria, a palavra de uma mulher contra a de um homem. Um homem poderoso, mesmo que os bolsos estivessem furados.

— Você não pode provar nada, minha querida e bela senhorita Knight. Tentar usar sua palavra contra mim é irrelevante, sem valor.

Portanto, se eu fosse você, não tentaria manchar meu nome.

Contudo, ao olhar para você neste instante, sabendo a delícia de corpo que se esconde aí, eu fico duro de vontade de tê-la.

Ela recuou, seguindo em direção ao parque. Ele a alcançou, mantendo o ritmo apressado dela.

— O duque sabe de nossas escapadas? Ele sabe como você gemeu meu nome naquele dia em que eu acariciei sua boceta na sala de visitas? Lágrimas se acumularam nos olhos dela, e ela piscou para afastá-las.

— Vá embora, já disse o suficiente, e eu não vou ouvi-lo nem mais um momento.

— Ó, mas você vai ouvir, sua vadiazinha. — ele a puxou, forçando-a a parar, o aperto no braço provocando dor, porém, ela se recusava a se encolher, a ceder ao ataque dele.

— Eu a vi ontem à noite com o duque. Eu vi tudo... — ele sorriu.

— Quero você na minha cama. Acho que esperei mais do que o suficiente para ter você.

Um tremor a percorreu, deixando-a com frio. Ela engoliu em seco, olhou em volta e, graças, ninguém na rua prestava atenção aos dois.

— Você nunca vai me ter. — ela sussurrou feroz.

— Se não concordar — continuou ele. —, vou arruinar seu pequeno negócio de criação de cavalos e você ficará sem nada: sem renda, sem clientes e sem duque. — ele sussurrou contra o ouvido dela, repleto de sarcasmo. — Quão tristonha você será. Tão triste quanto era quando o duque ainda estava no exterior e você havia voltado para sua casa em Berkshire. Ou quando ele por fim voltou para a Inglaterra e decidiu ficar em Londres, fodendo sabe-se

lá quantas mulheres. Mas... — ele deu de ombros. — é como minha sociedade funciona. Lordes possuem amantes, e as esposinhas esperam em casa.

Ela se encolheu, odiando a ideia de um casamento assim.

Odiando a possibilidade de Tate fazer amor com alguém que não fosse ela.

— Você pode me ameaçar como quiser. Não farei o que me pede. Sua mente girou, querendo ir embora, afastar-se de Lorde Oakes.

Ele riu, soltando o braço dela.

— Isso nós veremos, Srta. Knight. Bom dia para a senhorita. —

ele disse, curvando-se antes de sair na direção oposta.

Ava se virou para o parque, não diminuindo o ritmo até que visse Hallie e Willow. Suas amigas sempre foram sinônimo de conforto e segurança e, naquele momento, ela precisava delas mais do que nunca. Willow acenou quando ela se aproximou, e Ava escondeu o tumulto que acontecia em sua mente com uma expressão facial treinada.

— Ava, estamos tão felizes por você estar aqui. Estamos falando do baile e da casa do marquês de Boothby. Você conhece o cavalheiro, dançou com ele no baile dos York. É esta noite, estamos tentando decidir o que vestir. Estávamos pensando que todas poderíamos escolher tons pastel para parecer um conjunto. O que acha da nossa ideia?

Ava assentiu, sorrindo e murmurando em acordo embora sua mente estivesse desconcertada. Será que conseguiria contar ao duque da ameaça de Lorde Oakes? Se contasse a Tate o que havia se passado há pouco, ele o desafiaria para um duelo. Lorde Oakes já havia provado ser um homem que não pensaria duas vezes antes

de atirar em pessoas inocentes. Pensar em perder Tate de tal maneira fez bile subir à garganta dela.

Não, ela manteria o episódio em segredo, voltaria para Berkshire e lidaria com Lorde Oakes no campo, longe dos olhos curiosos da alta sociedade, se pudesse. Ele cometeria algum erro em seus acordos e ameaças nefastos, e assim, a lei cuidaria dele.

AO VOLTAR PARA CASA, Ava mal conseguia se lembrar de como a última hora havia passado, o que ela e as amigas haviam conversado, ou com quem haviam se encontrado. Tudo o que sabia era que queria ficar sozinha, longe de todo o barulho de Londres e voltar a Berkshire.

— Com sua licença, creio que vou me deitar um pouco. Estou com uma súbita dor de cabeça.

— Você está bem? — perguntou Hallie, pegando a mão dela, interrompendo-se no meio do vestíbulo da casa da viscondessa.

— Talvez não, infelizmente. Suspeito que esta cefaleia me impedirá de comparecer ao baile desta noite. Espero que não se importe.

Acima de tudo, ela queria rever Tate.

A simples presença dele acalmaria seu nervosismo, mas ela não conseguiria enfrentar a alta sociedade. Lorde Oakes, sem dúvida, estaria lá. Hoje não.

— Claro, minha querida. — Willow disse, aproximando-se dela depois de entregar o chapéu e o xale a um lacaio que aguardava. —

Pedirei que façam um chá de tisana agora mesmo, e que levem para você quando estiver pronto.

— Obrigada. — Ava disse, desatando o chapéu e subindo as escadas. — É muito gentil da sua parte.

TATE ESTAVA de pé ao lado de Lorde Duncannon, sentia-se irrequieto por dentro ante a ausência de Ava no baile. Onde ela estava?

As amigas estavam aqui, dançando e conversavam com alegria, mas Ava não. Ele ponderou um pouco, e ao vê-las reunidas tomando ponche durante o intervalo das danças, caminhou até elas.

— Boa noite, Srta. Evans, Srta. Perry. Acredito que estejam gostando do entretenimento desta noite? — a banalidade em sua fala incomodava até ele mesmo, mas ele faria de tudo para garantir que Ava estivesse bem.

— Estamos contentes sim, Sua Graça, obrigada.

Elas o encaravam com um nítido saber nos olhos, achando graça até, mas não falaram mais nada. Ele não poderia fazer uma pergunta direta acerca de Ava, mas por Deus, como ele gostaria de poder fazer isso. Tais regras e expectativas sociais mostravam-se um incômodo em certas situações.

— Já frequentaram o baile do marquês, ou é a primeira vez?

A Srta. Evans o observou com um ar especulativo e, em seguida, respondeu:

— Esta é a minha primeira vez em Londres depois de um longo tempo. Como sabe, frequentei a mesma escola francesa que a Srta.

Knight e a Srta. Perry. A Srta. Perry compareceu a este baile no ano passado, pois a viscondessa Vance é sua tia.

Por fim, Tate viu uma abertura para perguntar de Ava.

— E a Srta. Knight, ela não veio esta noite? Pensei que ela também fosse convidada da viscondessa?

A senhorita Evans ergueu uma sobrancelha, os lábios tremendo.

— Pois é, Sua Graça, ela estava indisposta e infelizmente ficou em casa esta noite.

Ele deu mais um passo na direção delas, pretendia perguntar mais, mas viu que era melhor não.

— Bem, é uma pena. Espero que ela esteja melhor pela manhã.

— Ó, nós também. — disse a Srta. Perry. — Planejamos uma noite nos Jardins de Vauxhall, e seria muito triste se Ava não puder se juntar a nós.

— Irão ao baile de máscaras?

Tate pensava que era um evento frequentado, na maioria das vezes, por cidadãos de padrões morais baixos e cujos passatempos eram praticados com os corpos deitados em vez de pessoas em busca de socializar com a alta sociedade por distração.

A Srta. Evans silenciou a amiga, fitando-a.

— Eu peço desculpas, Sua Graça. Minha amiga está equivocada. De jeito nenhum vamos à Vauxhall. Ficaremos em casa amanhã à noite.

Tate observou o embate silencioso entre as amigas e compreendeu que a Srta. Perry havia se enganado. Ele reprimiu um sorriso pelo lapso dela e mascarou sua reação.

— Espero que a Srta. Knight não esteja tão doente. Eu detestaria que perdesse os belos passeios pelos jardins.

A Srta. Perry deu uma risadinha.

— É apenas uma dor de cabeça, Sua Graça, mas já cometi minhas gafes. Estamos em casa amanhã à noite.

— E as senhoritas participarão de mais bailes esta noite? Ou o baile de Lorde Boothby é o bastante para entretê-las?

As bochechas das duas ganharam um tom claro de rosa, tornando-as tão bonitos quanto as mulheres que desfilavam repletas de sedas e diamantes.

— Esta noite ainda iremos a mais dois bailes, Sua Graça. Uma boa amiga da viscondessa, Lady Southerton, está nos esperando para logo, e nos prometeu alguns fogos de artifício.

— Parece bem divertido. — Tate fez uma mesura. — Desejo-lhes uma noite agradável. Por favor, enviem meus cumprimentos à senhorita Knight quanto voltarem a vê-la.

Tate girou nos calcanhares e seguiu para as portas do salão de baile. Ele se despediu Lorde Duncannon rapidamente e pediu que trouxessem sua carruagem. O percurso até Berkley foi curto, e ele pediu ao condutor que estacionasse na estrebaria. Ele rumou à porta da frente e bateu duas vezes antes que um lacaio permitisse sua entrada.

Ele entregou o cartão ao mordomo.

— Por favor, peça que a Srta. Knight me encontre na biblioteca agora mesmo.

O mordomo estudou o cartão por um breve momento antes de guiar Tate até um cômodo na parte da frente da casa.

— Por aqui, Sua Graça. Vou verificar se a Srta. Knight está disposta, ela não se sentia bem esta tarde.

— Sua Graça? — uma voz feminina soou no alto da escada.

Ele virou o olhar para cima e sua apreensão ao saber da indisposição dela foi apaziguada ao vê-la.

— Srta. Knight. Peço desculpas pela intromissão. Tenho notícias de Berkshire que pensei que gostaria de saber. Por ser uma vizinha.

— mentiu.

Ele estava disposto a dizer o que fosse necessário para que ela descesse e falasse com ele.

— Obrigada, John. Atenderei o duque na biblioteca. Não devemos ser incomodados.

O criado curvou-se e deixou-os.

Tate esperou Ava na base da escada e a acompanhou até a biblioteca. Ele entrou mais no cômodo quando Ava fechou a porta detrás deles, e sorriu quando ouviu o som alto do trinco sendo acionado. — O que está fazendo aqui, Tate? Se for pego pela viscondessa, nós dois estaremos arruinados.

— Notei sua ausência no baile desta noite e quando suas amigas mencionaram uma dor de cabeça, fiquei preocupado. Eu não seria capaz de descansar se não visse com meus próprios olhos que estava bem.

Ava se juntou a ele diante da lareira.

— Você estava preocupado comigo?

Ele sorriu, puxando-a contra ele e abraçando-a.

— Você sabe que sim.

Ela o abraçou também e olhou para cima.

Tate sentiu seu coração dar um pulo no peito. Ela estava tão bonita em um vestido de dia, sem ornamentos ou ruge nas bochechas como muitas mulheres da alta sociedade gostavam de usar. Ava parecia uma mulher aproveitando uma noite em casa, lendo ou apenas relaxando em seu quarto. Os longos cabelos escuros dela estavam sobre os ombros, e ele precisou se controlar para não correr os dedos neles, sentir a suavidade e o doce aroma.

— Está se sentindo melhor? — ele perguntou, colocando uma mecha do cabelo dela para trás da orelha.

Ela assentiu.

— Não cheguei a ter dor de cabeça, apenas quis ter uma noite para mim mesma, mas fico feliz de vê-lo.

Tate gostou de ouvir essas palavras, e gostou de vê-la. Ele conseguia imaginá-los tendo diversas noites assim: conversas, desfrutando da simples companhia um do outro, como quando eram crianças.

— Mencionou ter novidades de Berkshire e Lorde Oakes?

Ele deu um sorriso largo.

— Não há nada para compartilhar. Só que eu queria revê-la.

— Queria?

— Sim. — disse ele.

A doce voz dela provocava sensações estranhas no peito dele.

Ele se inclinou e a beijou, pegou os lábios dela e tentou transmitir de todo o coração o quanto ela significava para ele. Ava se deixou envolver nos braços dele, os dedos dela deslizaram sobre os ombros dele e cruzaram em seu pescoço. Os seios dela pressionaram o peito dele, as curvas doces e femininas o atraíam como sempre.

Tate se inclinou e a pegou por inteiro em seus braços, carregou-a até uma cadeira próxima. Ele se sentou, colocando-a em seu colo, de modo que ela montasse nele. Ele a beijou com força, lambeu o lábio inferior, traçou a boca, não parecia conseguir o suficiente dela.

Tão suave e disposta, e a palavra minha reverberou na mente dele.

Ela se abriu para ele, e ele aprofundou o beijo. A língua deslizou contra a dela, e ele gemeu, algo como fogo se acendendo no sangue dele.

Ava interrompeu o beijo, a respiração tão irregular quanto a dele e, por um momento, eles se entreolharam. Emoções o dominaram ao encarar os olhos castanhos que o miravam maravilhados ao perceber que eles se afetavam de maneira igual.

Não deveria surpreender nenhum dos dois, sempre fora assim.

Da primeira vez que se beijaram, sob um grande carvalho, os dois

se afastaram daquele abraço completamente transformados, ligados por uma nó invisível que, mesmo tão jovem quanto Tate era na época, ele sabia.

O destino dela era o mesmo do dele, para sempre.

Ele passou os polegares pelas bochechas dela, segurando o rosto dela diante dele. Ava arrastou-se no colo dele, posicionando seu calor bem em cima do dele. Ela suspirou, balançando contra ele, o núcleo quente tentando-o a rasgar a frente das calças e uni-los.

Tate tremeu ante a própria negação em fazer o que estava claro que os dois ansiavam com intensidade. Em algum lugar nos recônditos da mente, ele se lembrou de onde estava.

Quando ele entrou no cômodo, a porta havia sido trancada? Um descuido dele.

— Devo ir. Caso a viscondessa chegue, um inferno será instaurado. — ele disse entre beijos. — Eu não quero causar problemas para você.

Não que ele não aceitasse se casar com Ava no dia seguinte, mas ela não precisava do falatório que a alta sociedade promoveria caso soubesse desses encontros. Seu casamento com Ava seria porque eles desejavam que assim fosse, e não por a nobreza acreditar que ele a havia arruinado de alguma forma e estavam sendo forçados a casar-se.

— Eu não quero que você vá. — ela protestou, com uma voz trêmula.

Ela segurou a mão dele e a empurrou contra o sexo dela. Sua umidade o cumprimentou, e ele ficou duro como aço. Ele não negaria nada a ela, aos dois, não quando ela queria tanto quanto ele. Tate passou os dedos ao longo do núcleo dela, fazendo com que um doce suspiro deixasse aqueles lábios. Ela pressionou a mão

dele, os olhos adquirindo um tom intenso de âmbar, vislumbres do fogo nele.

— Eu quero você, Tate! — ela o beijou com força. — Você me provoca tanto desejo.

Tate gemeu quando a mão dela deslizou pelo abdômen dele, esforçando-se para acariciar os contornos de seu estômago antes de se aprofundar mais e envolver seu pênis inchado.

— Você me faz querê-la também. — ele murmurou, sem fôlego.

Os dedos dela fizeram um rápido trabalho nos botões das calças dele e então ela o tocou, deslizando a mão tão familiar no pênis dele, um massagear constante que o fez ver estrelas.

Ava se aproximou e o beijou.

— Vi em um livro uma figura com a posição que estamos agora.

Você... será que essa posição, é possível?

Que tipos de livros ela estava lendo?

Ele queria saber mais. Ele deixou essa pergunta para outra hora, distraído demais com os movimentos dela no colo dele. Se ele fosse um cavalheiro, daria a ela alguns dias de descanso antes que voltassem a fazer amor, mas tal opção era impossível quando o olhar penetrante dela quase implorava que ele a preenchesse. E ele faria exatamente o que ela pediu.

— Só precisa pedir. — ele sorriu e colocou a mão entre eles, agarrou o tecido das saias e o amontoou em torno da cintura dela.

Ela se ergueu um pouco, ajudando-o com o esforço. Os movimentos dos dois foram rápidos e desesperados. A necessidade de tê-la, de transar e reivindicar a mulher em seus braços era demais. Ele se posicionou na entrada dela, sustentando o olhar sensual dela.

Tate se empurrou com força enquanto ela deslizava sobre o comprimento dele. O núcleo apertado dela o envolveu, e ele

respirou fundo ante a perfeição de tomá-la outra vez. Eles se moveram juntos, os braços dela no pescoço dele, os dedos cravados na pele das costas dele. Ele bombeou forte e profundo, queria que ela se desfizesse em seus braços, que desmoronasse com ele.

Ela era dele, agora e para sempre, assim como ele era dela.

Como poderiam não ficar juntos, se a cada vez que se encontravam a sensação de certeza aumentava? Apesar de todos os anos separados, ainda haviam se reencontrado.

Ava o empurrou contra o encosto da cadeira, as mãos agarrando-se aos braços da cadeira. Tate se divertiu ao vê-la assumir o controle, encontrando o próprio ritmo para obter prazer dele.

Ela era toda maravilhosa, e ele reprimiu a necessidade de se derramar dentro dela. Ele pôs as mãos entre os dois e deslizou os dedos no pequeno botão em seu núcleo. Um meio suspiro, meio gemido escapou da boca dela, e ele ofegou.

— Goze para mim. — ele implorou, ele mesmo estava tão perto que a tentação o consumia a cada estocada.

Os movimentos dela ficaram desesperados, e ele a segurou pelos quadris, guiando-a para mais fundo, mais forte cada vez que ela descia sobre ele. Os dedos dela apertaram a nuca dele, deslizando pelos cabelos, e ele soube que ela estava perto. Os olhos dela tremera e se fecharam, uma mínima transpiração no lábio superior que ele desejava lamber.

— Ó, Tate.

Ela jogou a cabeça para trás quando espasmo após espasmo apertou o pênis dele, jogando-o ao clímax. Tate gozou forte, seguindo-a na sensação de felicidade em que ele não queria nada mais do que repetir. Ele lutou para recuperar o fôlego, voltar à

realidade e se refazer. Ela caiu contra o peito dele, a respiração quente em seu ombro. Ela virou a cabeça, beijando-o no pescoço, e ele estremeceu com desejo renovado. Ele nunca se cansaria da mulher em seus braços.

— No entanto, como vamos parar? — ela riu, e ele passou os braços em torno dela, abraçando-a.

Ele a beijou na testa, cruzaram o olhar.

— Eu não tenho ideia. — disse ele com sinceridade.

E ele não sabia mesmo, mas também não queria.

— Eu deveria fingir uma dor de cabeça mais vezes se essa é a medicação.

Atrevida!

Ele riu, mantendo-a imóvel, sem vontade alguma de tirá-la do colo.

— É justo que eu seja sua cura, pois você sempre foi a minha.

CAPÍTULO 14

A LGUNS DIAS DEPOIS, Tate cavalgava à toda velocidade na estrada que ligava Londres à Berkshire. Ele havia terminado de passar as instruções para seu administrado antes do imaginado e, com sorte, ele alcançaria o coche de Ava. Ele sorriu ao pensar nela. O quanto ele sentia falta dela quando estavam separados.

A Estalagem Cisne Feio tornou-se visível um pouco mais à frente, e ele diminuiu a passada do cavalo ao se aproximar dos arredores da pequena aldeia. As pessoas circulavam pela cidade, cuidavam de suas vidas. A parte da frente da estalagem estava ocupada com uma série de carruagens e pessoas descarregando e carregando bagagens.

Quando ele parou no pátio, um jovem cavalariço saiu correndo e, ao descer, Tate entregou um xelim ao menino.

— Diga-me, rapaz, a Srta. Ava Knight e seus acompanhantes ainda estão aqui ou já seguiram viagem?

Os olhos do menino se arregalaram e assentindo com entusiasmo, ele disse:

— Sim, ainda estão aqui, meu senhor. Estão lá dentro, e meu pai disse que alugaram alguns quartos.

— Obrigado. — Tate disse, dispensando o menino e seu uso de

"meu senhor" em vez de "Sua Graça".

Ele abriu a porta da frente e entrou no que parecia ser a taverna frontal do estabelecimento. A área estava lotada até não poder mais de moradores da região em suas roupas empoeiradas, amarrotadas e desgastadas pelo trabalho. Tate caminhou até o balcão e deslizou um soberano no bar.

— Eu preciso de um quarto para a noite. — E, também, preciso saber em que aposentos você alocou a Srta. Knight para que eu possa notificá-la de minha presença.

O taberneiro, um tipo rotundo e grisalho, ergueu a sobrancelha e cruzou os braços sobre a barriga.

— E você quem seria? — ele perguntou.

Tate precisava dar crédito ao homem por tê-lo questionado em vez de apenas informar o paradeiro de Ava após receber dinheiro.

— Sou o duque de Whitstone.

Os olhos do homem se arregalaram, e ele se endireitou, tentando fazer uma reverência para ele.

— A comitiva que procura está fazendo uma refeição na sala de estar privativa da frente, Sua Graça. Mandarei preparar meu melhor aposento para o senhor, milorde. É a primeira porta à esquerda ao sair das escadas.

— Obrigado. — Tate agradeceu e seguiu para a sala indicada.

Ele bateu duas vezes e abriu a porta. Encontrou Ava sozinha na mesa. Ela estava sentada ao sol com uma edição do Times aberto à sua frente. Ela ergueu os olhos, e ele viu surpresa ali antes que ela deixasse o jornal de lado e fosse até ele.

— Tate, o que está fazendo aqui?

Ele fechou a porta e a pegou nos braços.

— Dois dias era tempo demais.

Ela sorriu e o beijou, e ele tomou seus lábios, tomou como se ela fosse sua última esperança de matar a sede. Ava se derreteu contra o peito dele, e a sensação de seus seios, seus mamilos endurecidos através de seu vestido de algodão macio fez o sangue dele acelerar.

Ele a beijou de forma demorada e profunda, ergueu-a contra si e os deixou sem fôlego.

— Maldição, eu quero você. — ele se engasgou com o beijo.

— Vai passar a noite aqui? — foi a resposta dela.

Ele ficaria para sempre se ela permitisse.

— Aluguei um quarto. — ele a abraçou, não queria soltá-la. —

Gostaria de se juntar a mim?

Ela lançou um olhar repleto de pecado que o fez ferver.

— Vou precisar contar à Hallie o que estou fazendo ou ela se preocupará. Mas estou certa de que ela não se importará.

A porta se abriu e sua amiga entrou como se, por dizer seu nome em voz alta, Ava a tivesse convocado. Ela se assustou ao ver o duque abraçando a amiga dessa forma tão inapropriada. Ela entrou depressa antes de fechar a porta rápido, para que ninguém os visse.

Tate afastou Ava com gentileza e sorriu ante o leve tom de rosa que tomou as bochechas dela. Ava foi se sentar à mesa, e Hallie a seguiu sem dizer uma palavra. Tate também se sentou e, pegando o bule de chá, serviu-se de uma xícara.~

Hallie se virou para um e depois para o outro antes de suspirar.

— O que vocês dois estão fazendo? Não são casados nem noivos, e contudo, cá estamos nós. Entrei e os flagrei abraçados no meio de uma estalagem rural das mais movimentadas! — a Srta.

Evans pegou o pão e o queijo, servindo-se de uma boa porção em enquanto nenhum deles se aventurava a responder. — Ah, e a propósito, a duquesa-viúva acaba de chegar.

— O quê? — tanto ele e Ava disseram em uníssono.

Tate se levantou e foi até a janela para poder ver o pátio da Estalagem. Ele praguejou em silêncio ao ver a mãe e Lady Clapham dando ordens acerca da bagagem, um bando de criados obedecendo a duquesa. Ele se virou para Ava quando a viu de relance e viu a cautela nos olhos dela.

— Me desculpe. Eu não sabia que minha mãe iria para casa hoje.

Ela tocou o braço dele, apertando-o um pouco.

— Você não tem nada pelo que se desculpar, Tate.

A mãe dele entrou na estalagem, e em um momento houve uma batida rápida na porta da sala privativa antes que ela entrasse com sua dama de companhia. A duquesa-viúva fez uma breve inspeção do recinto antes de dar uma fungada desdenhosa.

— Tate, meu querido, por que não me avisou que partiria para Berkshire hoje? Eu teria separado um espaço na carruagem para você.

A mãe dele se sentou à mesa depois que a criada que abriu a porta para elas puxou uma cadeira para Sua Graça.

— Antes de mais nada, eu não sabia que viajaria. E em segundo lugar, estou à cavalo.

Lady Clapham acenou para Tate e sorriu, ignorando Ava e a Srta. Evans, que estavam sentadas à mesa em frente a elas.

— Você irá nos acompanhar até Berkshire pela manhã, Sua Graça? Com um incendiário aterrorizando o condado, ou assim eu soube, acalmaria meus nervos e os de sua mãe se tivéssemos um protetor ao nosso lado.

A Srta. Evans sorriu, e Tate entendeu muito bem o porquê. O

tom de Lady Clapham exalava pecado, mesmo com a presença da mãe dele, e Tate não deixou de notar que as mãos de Ava se fecharam sobre o jornal que ela segurava.

— Claro, eu as acompanharei até a Residência da Viúva, Mãe.

Fui avisado ontem de que está pronta para a sua chegada, a criadagem foi escolhida do jeito que a senhora gosta. E se me permitem ser tão ousado, Srta. Knight e Srta. Evans, posso acompanhá-las também, se quiserem viajar conosco.

Ava olhou entre ele e a viúva. A boca da mãe dele se contraiu formando uma pequena ruga de desgosto e não era difícil saber o que ela pensava da ideia.

— Nós gostaríamos disso, Sua Graça. — a Srta. Evans respondeu, e Ava permaneceu quieta.

— Se nos dá licença, Suas Graças, Lady Clapham, viajamos muito hoje, e creio que seja melhor descansar antes do jantar.

Tate saiu do caminho para permitir que Ava passasse por ele.

Ele esticou o braço e resvalou os dedos contra os dela quando ela passou. Ela não respondeu, apenas o deixou sozinho com a mãe irritante. Ele rangeu os dentes ante a discussão iminente.

Maldição, ele estava cansado das maneiras rudes e intrometidas de sua mãe. Ele a advertiu para manter suas opiniões para si, e ainda assim, ela persistia em ser insolente.

— Vejo que a Srta. Knight ainda corre atrás de você, meu querido Tate. Se ela não se cuidar, ganhará fama.

— A Srta. Knight já estava hospedada, quando cheguei. Então, talvez seja eu quem ganhe tal má fama. — sua mãe o olhou com reprovação, e ele ergueu uma sobrancelha. — Você não concorda, mãe?

— Eu não me importo com o que a Srta. Knight faça ou deixa de fazer, contanto que não interfira e nem traga escândalo às portas do Duque de Whitstone.

— Como quase fez cinco anos atrás? Você sabe bem, não é, mãe, que fui eu que pedi Ava em casamento e implorei que ela fugisse comigo para Gretna? Não foi o contrário, não importa o que você possa pensar.

A boca de Lady Clapham se abriu, e Tate respirou fundo para se acalmar, sabendo que o que ele acabara de declarar estaria em toda Londres antes do fim do mês, graças a Lady Clapham. Não

que ele se importasse. Todas as víboras fofoqueiras poderiam ir para o inferno.

— Se você sonha em me ver casado com uma mulher de título, como Sua Senhoria aqui presente, preciso dizer que é uma grande ilusão. A mulher com quem vou me casar será de minha escolha.

Desculpe, Lady Clapham, pela franqueza da minha língua, mas minha mãe tem uma capacidade fantástica de ignorar os desejos e atos das pessoas.

A viúva pousou a xícara com barulho, derramando um pouco do conteúdo no pires.

— Ava Knight nunca será a Duquesa de Whitstone. Eu o proíbo.

— Por que você é tão contra ela? — ele perguntou, perplexo de verdade. — O Sr. Knight era Sir e, portanto, sua filha é uma Lady.

Segundo sua própria perspectiva, não há razão para seu desagrado, creio eu.

A mãe dele revirou os olhos, algo que ele nunca pensou que veria uma duquesa fazer. Ela se levantou, voltando-se para ele.

— Eles são plebeus. O bisavô dela viveu em uma das fazendas de inquilinato ducal antes de iniciar a criação de cavalos, por diversão. Por favor, pense nisso. Caso tenha filhos com esta mulher, seu filho e futuro herdeiro teriam um tataravô que serviu à casa dele.

Tate já estava farto.

Ele passou a mão pelos cabelos antes de se dirigir até a porta.

— Falando de origens que bom que meu pai não se importou com tais regras quando a conheceu, mãe. Plebeia americana, cheia de dinheiro. Tal fortuna foi sua única carta para reivindicar um pouco de grandeza, não foi? Na minha opinião, você não é diferente da Srta. Knight neste sentido. O que as difere é que Ava tem um coração batendo dentro do peito. Eu chego a duvidar que você possua um.

Sua mãe ofegou, e Lady Clapham empalideceu.

Com o tempo, Tate poderia se arrepender da dureza das palavras que escolheu, mas hoje não seria esse dia.

— Vou visitá-la no dia seguinte a que chegarmos a Berkshire para garantir que esteja bem acomodada na sua residência oficial.

Boa tarde, mãe. Lady Clapham.

CAPÍTULO 15

Meu pai não está bem, mas insistiu que eu ficasse na França. Ele diz que é um simples resfriado, mas havia algo em suas palavras que me causou um arrepio na espinha. Sinto que ele está escondendo algo de mim. Sinto um medo se alastrar por meu corpo hoje, e não consigo me livrar dele.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone.

DOIS DIAS DEPOIS de chegar de Londres, Ava estava nas portas do estábulo com seu administrador, Greg, enquanto o cavalariço de Titan conduzia o garanhão até a égua que eles queriam que ele recebesse. Hoje seria o dia em que saberiam se Titan gostava do cheiro de Black Lace.

Ela esperava que sim.

Ao longo da última quinzena, quando ficaram em baias de frente um para o outro, os dois cavalos pareceram se dar bem, relincharam uma ou duas vezes, ou ao menos era o que o cavalariço a informara, todos bons sinais para um união promissora.

— Muito bom da parte do duque aprovar o cruzamento de Titan com a Black Lace, Srta. Ava. Mesmo que não produzam um campeão, com certeza serão potros bonitos.

Ava riu, supondo que era verdade.

— E, no entanto, não é bem isso que esperamos alcançar.

Prefiro um campeão a um cavalo bonito.

O que não era totalmente verdade. Os cavalos, não importava a idade ou habilidade, sempre teriam um espaço no coração dela.

Para ela, eram o melhor animal da Terra.

— O duque mencionou ontem que houve uma invasão na fazenda do velho Sr. Rogers, embora nada fosse levado houve evidências de que alguém tentou colocar fogo lá, sem sucesso. O

investigador parece acreditar que está conectado ao incendiário, mas o magistrado local não. É difícil saber o que está acontecendo por aqui com todos os problemas que tivemos.

Ava franziu a testa, não havia ficado sabendo que outro vizinho dela havia sido vítima. Na verdade, ela nem chegou a ver Tate no dia anterior. Por que ele não a visitou? Ele não viera visitá-la desde que ficaram juntos na mesma hospedaria ao voltarem de Londres.

Apesar de ser uma grosseria terrível da parte dela, depois de sair da sala de estar ela se manteve no corredor e ouviu as palavras ditas pela duquesa. Palavras mordazes, depreciativas na verdade, e todas direcionadas a ela e à sua inadequação como duquesa.

O ódio que ela ouviu na voz de Sua Graça mostrava que havia pouca esperança de amizade. A mulher odiava seu sangue comum, e como Ava não podia fazer nada para remediar tal fato, havia pouca chance de uma reconciliação.

Ela refletira acerca da perspectiva deles durante a viagem para casa, olhando de vez em quando para Tate que seguiu ao lado do veículo por todo o caminho até a propriedade dela. Cada vez que ela olhava para ele, seu coração se apertava e não havia sentido em negar o que aquela reação significava.

Era a mesma coisa que ela sentira quando menina. Ela o amava.

Para ser sincera, ela nunca deixou de amá-lo, não importava o quão brava ela possa ter ficado. Mas não significava que fosse correto que ficassem juntos.

O papel de duquesa era mais importante que o papel que ela desempenhava aqui nos Estábulos Knight.

— O duque esteve aqui? — ela perguntou, mantendo os olhos nos cavalos e fingindo um ar desinteressado que era apenas superficial.

— Ah sim, Senhorita Knight. Veio antes do almoço, mas não pôde ficar porque iria almoçar com Sua Graça e Lady Clapham na casa da viúva.

— Claro. — Ava manteve-se quieta enquanto Titan montava Black Lace. A união foi breve, com pouco barulho, mas felizmente bem-sucedida. — Muito bem, obrigada por sua ajuda, senhores.

Agora esperemos. — disse ela para os assistentes de pátio que estavam assistindo.

— Pensei ter ouvido o duque dizer que viria para acompanhar o processo, mas talvez algo o tenha retido. — Greg disse, observando os cavalos.

Ava assentiu com a cabeça, pensava o mesmo.

Depois de todas as desavenças com sua negativa de permitir que Titan se reproduzisse com uma de suas éguas, ela imaginou que ele não perderia esse momento.

— Vocês podem devolver Titan para a propriedade ducal esta tarde. Os estábulos já terminaram de ser reconstruídos, e sei que o duque gostaria de ter seu cavalo de volta. Não há necessidade de mantê-lo aqui por mais tempo. — Ava caminhou até o garanhão e passou a mão em seu pescoço. — Mesmo que ele seja uma fera tão bonita.

Ela arrulhou para o cavalo por um momento antes de deixar o cavalariço levá-lo de volta para a baia, para prepará-lo para a caminhada de volta à propriedade de Tate.

— Você está certa, Srta. Knight. Cuidaremos disso agora mesmo.

Ava ficou ao ar livre pelo resto da tarde: observou algumas das potras serem treinadas no pátio, assistiu às suas duas esperanças de prêmio em Ascot fazerem algumas corridas nas pistas e, em seguida, foi analisar os livros de contabilidade dos grãos e feno.

Ela pensou na ausência de Tate.

Haviam voltado para casa há dois dias, e nenhuma palavra dele.

Teria algo errado? A língua perversa da mãe dele enfim o teria convencido a ficar contra ela? Ava se recostou na cadeira, torcendo a pena na mão enquanto mirava o exterior pela janela. Talvez fosse para melhor. As vidas deles eram muito diferentes agora, ambos precisavam pensar nas pessoas que dependiam deles, ele como duque, e ela como criadora de cavalos e treinadora. As esferas sociais a que pertenciam eram de polos opostos, mesmo que uma de suas amigas mais próximas fosse sobrinha de uma viscondessa.

Estar em casa nesses dois dias solidificou sua antipatia pela cidade. Ela sentia falta dos estábulos, de ficar perto dos cavalos, de alimentá-los, ou apenas observá-los correr pelos campos ou pastar nos prados. A vida londrina não era seu forte; e ser duquesa, uma mulher com um senso de moda imaculado e amigos impecáveis não combinaria com ela. Ora, todos as suas amigas da escola eram tão comuns quanto ela, fora Willow, é claro.

Ava suspirou, guardou a pena e se levantou para retornar à casa. O jantar seria servido em breve, e ela prometera a Hallie que compareceria naquela noite, já que na noite anterior fora retida no pátio de baixo depois que uma de suas éguas sofreu um acidente com uma cerca.

Caminhando até a entrada da frente, ela deu um passo para o lado enquanto o carteiro partia a galope, acenando com a boina.

Quando ela adentrou o vestíbulo, um criado saiu do escritório dela com a bandeja de prata na mão.

— Estava procurando por mim, William? — ela perguntou.

Ele fez uma reverência.

— Ah sim, Senhorita Knight. Uma missiva da duquesa-viúva de Whitstone acaba de chegar. Deixei o envelope em sua mesa.

— Obrigada. — disse ela, entrando no escritório e fechando a porta.

Ela sempre amou este cômodo, mesmo quando era o espaço e santuário de seu pai. Agora que era dela, ela nem cogitara fazer mudanças. A mesa de mogno escuro, junto com as estantes que revestiam as paredes e as duas poltronas de couro que estavam dispostas diante da lareira, prontas para qualquer um pegar um livro, sentar e ler o quanto quiser.

Ela quebrou o selo da duquesa e examinou a nota.

Quanto mais ela lia, mais tornava-se incrédula do atrevimento da mulher. Como se atrevia, mas então... como não se atrevia? Ava amassou a nota na mão e, em seguida, abriu-a de novo, examinando o conteúdo pela segunda vez, sem acreditar no que estava lendo.

Srta. Knight,

darei um pequeno baile na minha Residência de viúva em algumas semanas. Sei que tivemos nossas desavenças no passado e espero, pelo bem de nosso pequeno condado, que possamos nos tornar mais agradáveis na presença uma da outra em tempo. Mas, infelizmente, esse momento não é agora. Estou, portanto, enviando esta missiva como uma cortesia, uma pequena explicação para a ausência de um convite. Por favor, não compareça, mesmo que meu

filho peça. A residência da viúva é administrada por mim, e a entrada da senhorita não será permitida.

Com meus cumprimentos, Duquesa de Whitstone PELA SEGUNDA VEZ, ela amassou a missiva, o sangue rugindo nas veias e o som alto em suas orelhas. Como a mulher se atrevia?

Uma batida leve soou na porta, e Hallie colocou a cabeça na soleira.

— Ah, vejo que você também recebeu. Estou tão feliz que seja assim. Talvez a viúva enfim percebeu que o duque está apaixonado por você e, por fim, a aceitará como nora.

Ava afundou na cadeira desejando que fosse verdade.

— Não, temo não ser isso. A missiva é de Sua Graça, mas é um aviso para nem tentar comparecer, porque serei proibida de entrar.

— O quê! — Hallie entrou na sala, deixando a porta entreaberta.

Ela foi até a mesa, pegou a missiva entre os dedos de Ava e a leu depressa.

— Mas que coisa! Eu sabia que a viúva era fria e opinativa, porém isto já é ofensivo demais. — Hallie encontrou o olhar de Ava.

— Sinto muito, Ava. Ela parece determinada a separar você e o duque de vez.

Isso era uma subestimativa.

— Sim, assim parece.

— O que vai fazer? Contará ao duque que ela enviou essa carta? — ela perguntou balançando o bilhete.

Ava negou com a cabeça, cansada de tudo aquilo, cansada das farpas constantes e olhares amargos. Das indiretas bem diretas na cidade e das missivas entregues no meio da tarde.

— Não. Ele não precisa saber, só deixaria a situação mais embaraçosa.

— Mas o duque ama você, tenho certeza. Afinal, ele mandou a mãe para a casa da viúva, embora morasse em Cleremore antes.

Fato, mas não invalidava outro fato, de que a mãe dele a odiava.

Uma vozinha sussurrou que talvez sua chance havia chegado e passado. Que eles deveriam se separar agora, antes que qualquer dano adicional a seus corações e famílias fosse feito.

— Você recebeu um convite? — Ava perguntou.

Hallie ergueu o pergaminho que carregava na outra mão.

— Sim, mas não comparecerei sem você. A viúva me convidar e proibir sua presença é de uma rudeza tamanha que não me permite deixá-la sentir prazer pelo estratagema. Devemos ficar aqui juntas, nos esquecer de Sua Graça e dos esquemas dela.

Os olhos da amiga brilharam como fogo, e Ava a amou ainda mais por sua lealdade.

— Você deve ir, caso contrário ela pensará que eu a fiz ficar em casa. Que regulei as saídas de minha amiga. Vá, divirta-se e socialize. Mostre à duquesa-viúva de Whitstone que não nos importamos com quem ela convida e quem não convida.

— Não posso ir sem você. Não me importa o que a viúva pensará. Ficarei em casa, fazendo companhia a você.

Ava sorriu alcançando a mão da amiga.

— Você irá, se divertirá, e me contará tudo na volta. Fico feliz de ficar em casa e prometo a você que o que a duquesa faz não me afeta nem um pouco. Ela interfere e é rude comigo desde sempre.

Ela não consegue mais manipular o filho, e detesta isso.

Hallie suspirou, não muito convencida.

— Se é o que quer, mas não me sinto bem com essa decisão.

— Vai ficar tudo bem, Hallie. Não se preocupe comigo. Estarei bem em casa.

Uma batida na porta soou, e o mordomo entrou para anunciar o duque de Whitstone. Ava se levantou, o corpo se aquecendo ao vê-

lo. Ela controlou suas feições, e encontrou o olhar assustado de Hallie.

— Boa tarde, Sua Graça. — disse Hallie, fazendo uma reverência. — Se me der licença, preciso escrever algumas cartas.

A porta se fechou sem barulho atrás da amiga dela, e o duque caminhou até ela, puxando-a em seus braços para um beijo profundo. Ela se inclinou para ele, tomando tudo o que ele daria, saboreando cada toque, cada carícia, beijo que ele a presentava.

Ele era impossível de ignorar e sempre foi assim. Tate se afastou, os olhos brilhando com desejo insatisfeito.

— Senti saudades. — ele a puxou para perto da lareira e sentou-se no sofá com ela. — Eu pretendia fazer uma visita, quis vir hoje porque nunca tivemos a chance de terminar a conversa que começamos em Londres.

Um medo tomou conta dela, e ela se endireitou cruzando as mãos no colo.

— Nossa conversa. — ela disse, protelando.

Ele assentiu.

— Sobre nós.

— Ó. — disse ela, com o coração leve. — O que tem nós?

A esperança que brilhou nos olhos cinzentos e tempestuosos dele derrotou a esperança dela de que fossem falar de qualquer coisa fora eles. Ela não estava pronta para este assunto, nem para a reação dele para o que ela precisava dizer. Ele agarrou a mão dela, que sumia por entre seus dedos fortes e capazes.

— Precisa saber que, desde o momento em que descobri que não havia me abandonado, toda a dor e raiva que eu carregava comigo desapareceram. Tentei me esquecer de você, mas mesmo zangado como eu estava, não consegui. Não funcionou, e não desejo mais viver sem você.

Ava não conseguia desviar os olhos dele. As palavras eram um bálsamo para sua alma, e ela gostaria de poder dar tudo o que ele queria, mas não podia. Não porque não o amava, pois queimava por ele a cada momento de cada dia, mas por causa de tantas coisas que se interpunham entre eles.

Ela apertou a mão dele, ajeitando-se no lugar.

— Você não precisa viver sem mim, Tate, mas por favor, não me peça para ser sua esposa. — ele se encolheu com as palavras ditas e apertou a mão dela com mais força. — Ouça-me, por favor, antes de dizer mais nada.

Ele a observou por um momento, os olhos cautelosos e assentiu.

Ava respirou fundo e lambeu os lábios:

— Éramos tão jovens quando nos apaixonamos. E foi amor, disso há poucas razões para duvidar. Mas, tendo vivido no exterior por quatro anos e voltado para casa para administrar uma propriedade com muito pouco apoio além da minha equipe, tornei-me bastante independente. Estou segura em termos financeiros, e não há necessidade de me casar se não for o que desejo. — ela manteve o foco nele, odiando o fato de que ele havia empalidecido, um tom terrível de cinza. — E eu não quero. Casar-me significaria perder minha independência, deixar de fazer o que amo quando eu quisesse. Não posso me tornar um ornamento, uma mulher que apenas fala de frivolidades e não realiza muitas coisas. Não foi para isso que nasci, e agora que sou adulta, percebo isso.

Tate se levantou, liberando suas mãos.

— Eu quero que você seja minha esposa, Ava, minha duquesa.

O que está me pedindo?

A voz dele era dura e impassível, ela se encolheu.

— Eu me tornaria sua esposa amanhã mesmo, Tate, saiba disso.

Mas não serei uma duquesa. É demais, eu estaria desistindo de tudo.

— Você não precisaria desistir de sua vida. — a frustração o fez passar uma das mãos no cabelo, e ele foi para frente do fogo, se apoiou no mármore da lareira, ainda de costas para ela. — É claro que ser duquesa implica responsabilidades. Situações que a afastariam daqui por vários meses do ano. Isso é pedir muito? Não está disposta a ceder nem um centímetro para estar comigo?

Ava se levantou, odiando o olhar desolado nos olhos dele.

— Eu quero você, quero sim. Não quero mais ninguém. Ainda podemos ter um ao outro, mas não como marido e mulher. Serei sua amante enquanto você me quiser.

Ele se desvencilhou dela, o desgosto retorcendo o rosto que sempre pareceu tão bonito.

— Eu preciso me casar. O nome da família por si só me exige um herdeiro. E não quebrarei os votos que eu fizer à minha esposa.

Não farei isso a ela, por mais tentadora que você seja.

Ava mordeu o lábio, pânico percorrendo seu sangue.

Ele se afastou, e ela se acalmou.

— Não a terei como amante. Se eu não puder tê-la como esposa, não a terei de forma alguma.

Tate se virou e foi para a porta.

Ava correu atrás dele, segurou seu braço.

— Por favor, Tate, não posso perder você de novo. Eu apenas quero...

— Você quer tudo. — ele cortou as palavras dela. — Você quer que eu satisfaça seu desejo sempre que ele surgir. Deseja manter sua independência e ser a Senhora de suas terras. Quer que quebre meus votos de casamento para manter sua cama quente.

Ela empalideceu, o coração se desfazendo.

— Sua mãe estava certa, eu não sou adequada para ser sua noiva. Minha linhagem sempre servirá para alimentar as fofocas da cidade. Nossos filhos serão destroçados pelos abutres da sociedade, desprezados. Serei ridicularizada, alvo de fofocas, ignorada. Ao menos como dona do Haras Knight, sou tratada com respeito. Se eu me tornar sua duquesa, tudo mudaria. Seria você que procurariam para tratar dos cavalos e treinamentos que ofereço.

Seria você a quem procurariam por conselhos e orientação. Eu me tornaria obsoleta. Tudo o que a minha família construiu do zero, seria esquecido. — Ava ergueu o queixo, a raiva a fazendo endireitar a coluna. — Não aceitarei tal destino. Nem mesmo por você.

Ele a observou, os olhos vazios.

— Você está errada, Ava, cega para o que posso proporcionar a você. Como minha esposa, meu nome sozinho protegeria a quem eu amo, mesmo que seja uma mulher cujas origens não sejam grandiosas para os outros, mas grandiosas o bastante para mim.

Ava permaneceu um bom tempo encarando a porta após Tate irromper por ela, sem fôlego após a declaração dele. Ele a amava?

Nunca, em todo o tempo em que estiveram juntos, ele pronunciou tais palavras. Ela rezava em silêncio para que seus sentimentos não fossem unilaterais, e agora ela sabia que não eram.

Ava caminhou até a janela, observando-o cavalgar pelo terreno dela como se o próprio diabo estivesse atrás dele. Um arrepio percorreu sua espinha ante a possibilidade que talvez ela estivesse

errada, que estivesse muito errada, e que desta vez seria um erro que não conseguiria consertar.

CAPÍTULO 16

Q UINZE DIAS SE PASSARAM, e Tate não viu Ava, ou para ser sincero, ele a havia evitado depois que se separaram.

Ele olhou para o uísque na mão, lembrando-se de que não importava quanto bebesse, não o faria se sentir melhor, não iria anestesiar a dor que corria por suas veias a cada minuto de cada dia.

Ela o rejeitou.

Tate apertou a mandíbula, olhando na direção da porta enquanto o mordomo anunciava mais convidados recém chegados para o baile de sua mãe, outra noite inútil e não essencial. Ele olhou ao redor do cômodo. As pessoas riam, bebiam, pegavam mais vinho e comida dos servos que ali estavam. Seres inúteis todos eles.

Mimados e prepotentes. Não era de se admirar que Ava não quisesse fazer parte desta vida.

Ele também não queria.

Tate estava parado ao lado de Lorde Duncannon, o amigo tão quieto quanto ele, e felizmente não tentava preencher o silêncio entre eles. Na verdade, ele não queria conversar, pelo menos não com ninguém aqui.

Um estrondo de conversa soou, e Tate virou-se para a porta de novo. Esperança surgiu dentro dele quando reconheceu a Srta.

Evans. Os olhos dele viajaram para detrás dela, procurava por outro conjunto de olhos e cabelos castanho-avermelhados adoráveis, mas não os encontrou.

Ele afastou a decepção, sorveu o líquido âmbar e observou enquanto a Srta. Evans caminhava apressada até ele,

reposicionando, de fato, as pessoas em seu caminho. A moça parou diante dele, mas ele falou antes que ela dissesse uma única palavra.

— Onde está Ava? — ele exigiu.

As duas mulheres quase nunca se separavam em tais reuniões, então Ava deveria estar aqui.

— Por Deus, não pensei que fosse ver você de novo. — Lorde Duncannon ficou boquiaberto ante a amiga de Ava, seu rosto empalidecendo.

— Não ansiava me rever seria uma definição melhor, Lorde Duncannon. — a Srta. Evans respondeu, os olhos brilhando com fogo, mas não antes de um rubor cobrir as bochechas, deixando-as com um belo tom de rosa. — Ou pelo menos é no meu caso.

Ela voltou o olhar penetrante para Tate, e ele olhou entre os dois se perguntando como diabos eles se conheciam. Ele descartou o pensamento por um momento, precisando saber onde Ava estava.

— A Srta. Knight está aqui esta noite, Srta. Evans?

— Ela não recebeu um convite, mas eu a convenci a vir, Sua Graça.

Ele voltou a atenção para a mãe após ouvir tal declaração, e a raiva espiralou dentro dele. Desta vez ela fora demasiado longe.

A Srta. Evans franziu os lábios, inspecionou-o como alguém inspeciona um inseto e não encontra o que era esperado.

— Vou ser franca, me perdoe se eu passar dos limites, mas Ava é minha amiga e o que preciso dizer é mais do que necessário.

Tate assentiu, preparando-se para o que era, sem dúvida, um confronto que estava por vir.

— Sua mãe enviou uma missiva à Ava dizendo por que ela não seria convidada esta noite, e Ava não tem dúvidas alguma acerca do que sua mãe pensa dela. Na verdade, agora mesmo, ela foi

impedida de entrar, na frente de todas essas pessoas que você afirma ser seus amigos. O que você diz, Sua Graça? Que atitude tomará?

— Onde está Ava agora? — Lorde Duncannon exigiu.

— Ela voltou para casa na carruagem.

A Srta. Evans manteve a atenção em Tate, embora tivesse respondido à pergunta do amigo dele. O desprezo público direcionado à Ava era inaceitável. Tate não permitiria que a mãe se aproximasse dele ou da propriedade ducal novamente após esse comportamento atroz.

Ele nem deveria estar aqui, por falar nisso. E deveria ter agido mais cedo acerca das emoções que o atraiam para Ava. Ele deveria ter voltado para a casa dela, de joelhos e implorando perdão, pedindo que ela o amasse tanto quanto ele a amava. Deveria dizer a ela que ele nunca desejou restringi-la, ou exigir dela mais do que ela estava disposta a dar. Dizer a ela que ele a amava mais do que qualquer título.

— Foda-se. — ele xingou, não dando atenção àqueles que os cercavam.

Ele se apressou em direção à porta do salão de baile, com Duncannon e a Srta. Evans o seguindo de perto. Duncannon o alcançou.

— Aonde você está indo?

— Buscar minha duquesa. — ele disse em voz alta, sem se importar com quem o ouvisse. Suspiros soaram em torno dele, e ele precisou controlar o gênio quando a mãe entrou na frente dele, impedindo sua fuga.

— Saia do caminho, mãe.

O cômodo ficou em suspenso, os dançarinos pararam, assim como a conversa. Até a orquestra parou de tocar.

— Está na hora de uma valsa, Tate querido. Você dançaria com Lady Clapham? — a mãe fez um gesto na direção de Sua Senhoria, que fez uma reverência e sorriu para ele, com os olhos brilhando de alegria.

— Sua Graça, eu ficaria honrada. — Lady Clapham disse, ignorando o fato de que ele estava indo embora.

— Não dançarei. — ele disse, causando mais suspiros e sussurros quase inaudíveis.

A mãe deu uma risada nervosa.

Bom, ele queria mesmo que ela ficasse inquieta. Ele decerto havia desistido de ter esperança de que a única genitora viva daria apoio à mulher a quem ele amava e com quem queria se casar. A mãe pagaria por ficar cega de ódio e exclusivismo.

— O baile está apenas começando, e como Lady Clapham é minha convidada de honra, você deve dançar com ela. É o correto.

— Você desconvidou e proibiu a entrada da Srta. Knight. Você está tão cheia de ódio que não consegue se lembrar que também nasceu comum, rica sim, mas igual a Ava. A tiara de duquesa é tudo o que as separam. Não deveria ter tanta afetação sem justificativa.

Sua mãe estreitou os olhos, erguendo o queixo.

— Ela não serve para você, filho. Não cometa o erro que traria escândalo para a porta de nossa família. Ela é uma humilde criadora de cavalos. Por favor, seja sensato.

— Ava é mais do que isso, e você sabe muito bem.

Ele passou por ela, Duncannon e a Srta. Evans seguindo logo atrás. Seguindo para o hall de entrada, ele não esperou pelo lacaio e abriu a porta ele mesmo para chamar a carruagem.

— Está indo para a propriedade da Srta. Knight? — Duncannon perguntou quando despontou na direção da casa.

Tate ficou rígido quando um fedor acre alcançou seus sentidos.

— Consegue sentir esse cheiro? — ele caminhou mais adiante na estrada, olhando para a terra agora beijada pela noite.

— Há um incêndio em algum lugar. — a Srta. Evans surgiu ao lado dele no instante em que a carruagem parou diante das portas da frente. — Está perto, ou não sentiríamos o cheiro.

— Venham. — disse ele a ambos, indo para a carruagem e instruindo o condutor a seguir para a casa da Srta. Knight.

Quanto mais perto chegavam da propriedade de Ava, mais pesado o cheiro de madeira queimada permeava o ar, e quando chegaram à pequena elevação onde a casa de Ava ficava à vista, o desenho horripilante de seus estábulos junto com a casa em chamas ficou visível.

Através da névoa de fumaça, ele conseguia ouvir gritos e os sons de cascos dos cavalos sendo soltos dos estábulos. Alguns cavalos assustados passaram correndo por eles, e Tate gritou para o condutor ir embora.

— Nunca deveria ter deixado ela sair do baile. Eu deveria ter feito ela entrar comigo.

— Não é sua culpa, Srta. Evans. — Duncannon disse, a voz dele com uma calma surpreendente para uma situação que era tudo menos calma.

A garganta de Tate se fechou em pânico, e ele lutou para respirar.

Onde ela está?

Era uma loucura o que estava diante deles. E até que ele a visse com seus próprios olhos, a abraçasse bem apertado, ele não iria descansar. Quanto mais perto chegavam do fogo, mais densa era a fumaça, e quando eles se afastaram um pouco da casa principal, Tate pôde ver que um lado inteiro da casa estava imerso no fogo.

Os criados corriam para dentro e para fora da casa, pegando o máximo dos pertences ancestrais de Ava que conseguiam.

Tate saltou da carruagem.

Ele examinou cada um deles e não vendo Ava, olhou para a casa, rezando para que ela não estivesse lá dentro. Ele tirou o paletó do traje de noite e agarrou o mordomo pelo braço quando o homem estava prestes a voltar para dentro.

— Onde está Ava? — ele gritou acima do barulho do fogo e das ordens que eram proferidas acima dos gritos.

— Não conseguimos encontrá-la, Sua Graça. Ela voltou do baile da duquesa há uma hora, no momento em que o incêndio começava. Ela foi para o quarto dela, mas quando fomos verificar, ela já não estava mais lá.

Tate analisou os rostos presentes, rezava para que um deles fosse de Ava. A Srta. Evans e Duncannon o alcançaram, a respiração dos dois tão irregular quanto a dele.

— O que podemos fazer, Tate? — o amigo perguntou.

Tate lutava para não entrar em pânico.

Ele olhou em volta e rezou mais uma vez para que a encontrasse. Ele olhou para a casa, metade da qual estava bastante consumida. Ela estaria lá dentro? Se estivesse, ele não descansaria até que ela estivesse segura. Ela arriscou a vida para ajudá-lo a escapar do incêndio do estábulo dele, e ele não a abandonaria nesse.

— Procure no terreno, nos estábulos, talvez Ava esteja lá. Volte aqui se não conseguir encontrá-la. Vou verificar a casa.

Duncannon agarrou seu braço com força.

— Você não pode entrar lá, Tate. Você é o último Whitstone. Se você morrer, o título reverte para a coroa. Vamos vasculhar o

estábulo primeiro, veja o perímetro da casa, talvez Ava esteja lutando contra o incêndio com os homens do lado oposto.

— Vou verificar lá primeiro, mas se não conseguir encontrá-la, entrarei. Dane-se o título.

Ava significava mais para ele do que a herança. O título não definia quem ele era, seu caráter era o responsável, e ele não seria o homem que deixou uma mulher, sua mulher para morrer queimada.

Lorde Duncannon aceitou a decisão com um movimento de cabeça e aparente resolução.

— Muito bem. — ele parou por um momento. — Srta. Evans, venha, vamos verificar os estábulos.

Ela partiu sem dizer uma palavra.

Dando outra olhada nas pessoas ao seu redor, ainda sem ver Ava, Tate correu pela lateral da casa. Ainda assim, Ava estava longe de ser vista, e pânico começou a crescer em seu sangue.

Por favor, esteja segura, minha querida. Não esteja na casa.

As portas da cozinha estavam abertas, e Tate correu para lá, saltando para fora do caminho dos servos que corriam com objetos que conseguiram salvar. Tate passou correndo por todos eles, subiu o corredor cheio de fumaça e foi aos tropeços para o piso principal da casa.

As portas que davam acesso à ala em chamas haviam sido fechadas, mas a fumaça dominava o espaço. Ele tossiu, retirou a gravata e a amarrou na boca e no nariz para ajudá-lo a respirar.

Subindo as escadas de dois em dois, ele chamou por Ava, mas apenas o crepitar, o gemido de uma casa que seria cinzas pela manhã soava à noite.

AVA ESTAVA grudada à porta de seu quarto, observava Lorde Oakes caminhar de um lado para o outro do cômodo e parecendo alheio ao fogo violento que estava devastando a casa dela.

Seu lar, o lugar onde nascera, a casa que seus pais construíram ao longo de anos de trabalho árduo estava desmoronando sobre ela e havia pouco que ela ou alguém pudesse fazer. Ela piscou quando a fumaça engrossou, obstruiu seus pulmões e fez seus olhos arderem.

Ela se voltou para a janela que era sua única escapatória, mas ela estava no segundo andar e a queda desta altura seria capaz de quebrar seu pescoço. Ela se aproximou da abertura, disposta a correr o risco.

— Nem pense nisso. — Lorde Oakes a interveio, as feições retorcidas de ódio bruto.

— Por que está fazendo isso? — ela o indagou quando ele se inclinou na direção dela, deixando pouco espaço entre eles. — O

que ganha com isso? — perguntou ela, tossindo com o esforço de falar.

— Eu deixei o melhor para o final. — ele fervia. — Era para você ser minha amante, a mulher que aqueceria minha cama, e mesmo assim abriu as pernas para aquele desgraçado do Whitstone.

Ela perdeu o fôlego.

O homem estava louco!

— Você está com ciúmes! Foi por isso que iniciou os incêndios em nosso condado.

Ava não conseguia acreditar no que ele estava dizendo. Não era possível que ele estivesse tão obcecado por ela a ponto de agir dessa forma. Os vizinhos dela eram pessoas inocentes, não mereciam tamanha tristeza.

— Nenhum deles era inocente. — ele disse e apontou para o lado de fora. — Whitstone teve seu coração, sempre teve, e aqueles malditos dos Mortons, a esposa dele apoiou e confortou você por causa de Whitstone. Eu não poderia permitir que tais atos ficassem impunes.

Ava balançou a cabeça.

— Nunca aquecerei sua cama, Lorde Oakes. Você provou ser o pior dos homens, não apenas esta noite, mas desde o dia em que tentou se impor contra mim nesta mesma casa.

Ela tentou pensar em Tate, em como ele aquecia seu sangue, a confortava e protegia. Não congelar em pânico ante a ideia do que Lorde Oakes estava fazendo com ela neste cômodo. De qual seria objetivo dele esta noite.

Ele apunhalou um dedo no peito dela.

Ava ergueu o queixo, recusando-se a estremecer com a dor que causava.

— Antes do fim desta noite, vou provar o seu corpo e aproveitarei cada segundo. Meu desejo de ter você me cegou e foi por sua causa que minha noiva desfez o compromisso. Ela sentiu que eu não estava comprometido, então veja — ele disse ao passar a mão no corpete dela. —, perdi a noiva que salvaria meus cofres por sua causa. Mas, apesar disso, tenho um plano.

Ava vestiu uma máscara de indiferença mesmo que pânico lambesse sua pele, mesmo que desejasse fugir, até mesmo correr para as chamas do outro lado da porta, apenas para se afastar dele.

Ela engoliu em seco, a garganta dolorida pela fumaça, e as lágrimas a faziam piscar.

A imagem de Tate passou pela mente dela, de que ela jamais o veria de novo se Lorde Oakes conseguisse o que pretendia e um abismo sepulcral se abrisse no peito dela. Ela fora uma idiota

egoísta. Uma idiota boba que não conseguia ver o presente maravilhoso que Tate oferecia quando ele o colocou aos pés dela.

O amor dele.

E ela o amava, todo o resto se encaixaria nesse amor, e eles conseguiriam fazer com que suas vidas ocupadas e difíceis se tornassem uma. Se ela conseguiu sair daqui viva, claro.

— Sua obsessão matou pessoas, você deveria ser enforcado por seus crimes.

Ele deu de ombros.

— O rapaz era um servo humilde. São dispensáveis, e eu não me importo com o que acontece com quem fique no meu caminho, nem com seus preciosos cavalos.

Ava sentiu a raiva rasgar seu ser quando ele mencionou os cavalos, e sem pensar, saltou nele. Eles caíram no chão, e ela arranhou o rosto dele, faria qualquer coisa para machucá-lo.

— É melhor você não ter tocado em meus cavalos. — ela gritou, odiando-o com cada fibra de seu ser.

Ele lutou para agarrar os braços dela, e ela o socou, tentando machucá-lo o máximo que pudesse para escapar. Lorde Oakes estendeu a mão e agarrou o cabelo dela, puxando-o com força. Ava caiu de lado, a dor ricocheteando em sua cabeça enquanto ele a prendia no chão.

— Cadela. — ele fervia em seu ouvido, a respiração pesada revirando o estômago de Ava. — Devo domá-la agora, Srta. Knight?

Nós dois vamos morrer, uma boa foda antes de morrer é exatamente o que eu preciso.

O medo a manteve imóvel por um momento, antes que seu espírito de luta voltasse, e ela erguesse a perna o máximo que conseguiu, tentando acertá-lo entre as pernas, onde os homens são

especialmente sensíveis à dor. Ele percebeu o que ela pretendia e prendeu as pernas dela com as dele.

— Será enforcado por isso, seu desgraçado.

Ele riu.

— Não me resta mais nada, então o que importa se quebrarem meu pescoço, mas minha querida, Ava...

Ele se inclinou, beijando-a à força. Os dentes dele bateram nos lábios dela, e ela sentiu um gosto metálico invadir sua boca. Ava se inclinou para o beijo e mordeu o lábio inferior dele com força. Ele gritou e recuou, mas ela se recusou a soltar antes que as mãos dele apertassem seu pescoço, tirando o fôlego de seus pulmões.

Lorde Oakes se levantou, pressionando a boca. Ava lutou para respirar, observando-o do chão enquanto sua mente se agitava tentando se salvar. Um estrondo soou em algum lugar da casa e a fumaça engrossou, o quarto sufocando a vida de ambos. Ele deu a volta, e ela se sentou, limpando o sangue dele que estava em sua boca.

— Eu lutarei com você até meu último suspiro, seu desgraçado.

Eu não serei sua vítima.

Lorde Oakes avançou nela, chutando-a com força no quadril. Ela se engasgou com a dor do ataque, mas em vez de rolar para longe, ela agarrou as pernas dele, prendendo-as juntas e impedindo-o de repetir o movimento.

Em seguida, ela o mordeu de novo. Ele praguejou e uma sensação de poder se apoderou do sangue dela. O maldito canalha havia incendiado sua casa e seus estábulos, certo? Machucado seus cavalos. Bem, ele também se machucaria esta noite. Ela não seria a única a sair dessa ensanguentada e machucada, se é que sairia viva disso.

Ele caiu, e Ava aproveitou a oportunidade para se levantar e correr para a janela. Ela olhou para a porta, um brilho vermelho se agitava sob a madeira. A fumaça deslizava pela cornija da parede como uma cobra, restava pouco tempo para sair. Ela precisava sair agora ou morreria.

Ava estendeu a mão para destrancar a janela, levantou o painel.

Ela gritou quando seu agressor a agarrou pelo estômago, fazendo suas costas arderem de dor. Em vez de cair no chão, desta vez ela bateu na cama, e Lorde Oakes desceu sobre ela, os olhos selvagens com ódio e determinação. Sangue gotejava de seu rosto, de seu lábio, e ela o empurrou, arranhando-o sem sucesso. Ele era muito pesado, estava muito decidido.

A garganta dela se fechou em pânico ante as semelhanças da tentativa passada de estuprá-la. Ela lutou para não entrar em pânico, para não congelar de medo.

— Saia de cima de mim, seu cretino.

Ele puxou o vestido dela para cima e beijou as coxas dela. Os movimentos dele eram apressados e desesperados ao baixar as calças.

Não. Não. Não!

Isso não poderia acontecer com ela, não poderia estar acontecendo. O corpo dela tremia, e ela ergueu os joelhos, tentando colocá-los entre os dois, negando-o ao que ele queria. O telhado deu um gemido terrível e caiu, expondo as chamas além.

Ela iria morrer.

Ela iria morrer enquanto ele a estuprava.

Não.

— Você acha que eu não tenho tempo. Não consigo pensar em uma maneira melhor de morrer do que dentro da sua boceta.

— Nãooooo! — ela gritou, lutando com ele, o pensamento de tal horror trazendo à tona o resto de sua força.

Ele não iria vencer. Ele não poderia vencer. A vida não poderia ser tão injusta. Ela viu choque se registrar no rosto de Lorde Oakes quando um grito saiu de sua boca segundos antes que ele fosse arrastado de cima dela, ela estava livre.

Ava se arrastou para fora da cama enquanto Tate socava o rosto de Lorde Oakes, o barulho de ossos e dentes quebrando, altos no ar. Uma saraivada de golpes recaiu sobre Sua Senhoria, Tate era uma visão de ira divina.

Ela estremeceu, jamais o vira tão enraivecido.

Ele o mataria se continuasse. Não que ela se importasse com Lorde Oakes, mas ela não queria que a morte dele fosse um peso na consciência de Tate pelo resto de sua vida. Ela foi até Tate, agarrando seu braço antes que ele o acertasse outra vez.

— Pare antes de matá-lo. Deixe que as autoridades apliquem a punição, não você.

Os músculos dele sob sua palma estavam tensos, a respiração irregular. O fogo chegou às cortinas, e ela o puxou para a janela:

— Precisamos ir. Este quarto será tomado pelo fogo a qualquer instante.

Lorde Oakes resmungou alguma coisa e depois se sentou, cambaleando em direção à porta.

— Eu deveria ter atirado em vocês dois naquele dia no campo. É

o único arrependimento com o qual viverei pelo resto da minha vida.

Ava olhou pela janela ignorando as palavras do louco. Uma calha corria ao longo da esquina da casa. Talvez aguentasse o peso dos dois...

— Venha, precisamos descer.

Tate ficou entre Ava e Lorde Oakes e não se moveu.

— Você será enforcado por isso! — ele gritou. — Pode apostar que me certificarei de que aconteça.

Lorde Oakes sorriu, abrindo a porta com força. Ele saiu para o corredor em chamas antes de correr para as chamas além. Ava o observou enquanto as roupas dele pegavam fogo, o cabelo ficou em chamas, antes que ele desaparecesse na fumaça e no fogo que antes era sua casa.

— Ele vai morrer. — disse ela, sem acreditar no que acabara de acontecer.

— Esqueça-se dele.

Tate caminhou até ela e passou o braço em volta de sua cintura, ajudando-a a sair pela janela. Felizmente, o cano suportou o peso de ambos e Ava desceu, alguns de seus criados a esperavam no chão, caso ela caísse. Tate a seguiu, saltando do cano no último minuto assim que um estrondo poderoso soou.

Ava se afastou da casa enquanto o telhado desabava, destruindo tudo o que estava abaixo dele. Enxugou as lágrimas que corriam pelo seu rosto. A essa altura, toda a construção estava tomada pelo fogo, havia pouco a ser feito.

Tate se aproximou dela e a abraçou.

Calafrios incontroláveis atravessavam o corpo dela, e ela se aconchegou contra ele em busca de calor e conforto. Tate pediu um cobertor e uma criada correu até eles com um. Ele envolveu-a, acariciando suas costas.

— Lamento não ter chegado a você mais rápido. Está machucada?

Sua alma estava ferida, e ela estava abalada, mas felizmente Tate havia chegado a tempo.

— Vou ficar bem. Estou triste, nada mais. — ela piscou tentando conter as lágrimas, sem sucesso. — Minha casa...

— Eu sei. — disse ele, segurando-a com mais força. — Iremos reconstruí-la.

Ela ergueu o rosto para ele ao limpar o nariz com as costas da mão. Não era o gesto mais elegante do mundo, mas nesse instante ela não se importava.

— Eu sei, mas não será a mesma.

— Faremos com que seja, querida.

Ele não a soltou e nem ela queria que ele a largasse. Nem agora, nem nunca. Com Tate ela estava segura, era amada e respeitada, ele era um homem honrado, um homem bom, e o coração dela se encheu de amor por ele.

— Sua Graça. — uma voz soou, e Tate e Ava se viraram para ver um dos agentes disfarçados vindo na direção deles.

O rosnado de Tate foi alto ao lado dela.

— Como isso aconteceu? Vocês deveriam estar vigiando cada passo de Lorde Oakes. — Tate disse, apontando um dedo para o homem.

O homem suspirou, passando a mão pelo cabelo já despenteado.

— Só podemos supor que Lorde Oakes aproveitou, quando a Srta. Knight saiu para o baile, para entrar escondido na casa dela.

Esperando até que ela voltasse. — o agente se virou para Ava, colocando a mão sobre o coração. — Sentimos muito, Srta. Knight.

Esta noite nós falhamos com a senhorita.

— Discutiremos isso em alguns dias, em minha propriedade, e sugiro que descubra onde ocorreu o lapso de observação. Eu quero saber.

Tate a puxou com mais força contra ele, seu calor e cuidado agindo como um bálsamo. Os olhos dela se fecharam quando uma onda repentina de cansaço a dominou.

O agente fez uma reverência, recuando.

— Claro, Sua Graça.

Ava olhou para Tate, segurando as lapelas de seu traje de noite.

— Você me salvou. — disse ela, a voz vacilante com a admissão, o olhar dele disparou para ela, surpresa escrita em seu rosto bonito.

— Sempre. — uma expressão de dor cruzou as feições dele. —

Você é tudo para mim. Quando percebi o que Lorde Oakes estava tentando fazer, o que poderia já ter feito. Se o fogo não o tivesse matado, eu o teria feito. Prometo a você que ele jamais voltará a machucá-la, ou qualquer pessoa na verdade.

— Eu sinto muito, Tate. — ela admitiu.

O coração dela doía de tão tola que havia sido. O tempo que ela havia perdido por se agarrar a uma vida que só a preenchia pela metade. Não importava o que ela repetisse para si, sempre haveria uma peça faltando em seu quebra-cabeça. Até que tal peça voltasse para sua vida.

Tate.

— Eu estava tão apegada ao passado que não vi as coisas direito. — ela continuou. — Eu deixei que a opinião dos outros me cegasse quanto ao que eu queria. Deixei o preconceito contra mim me fazer acreditar que eu não era digna de você. Não mais. Agora eu vejo com clareza. Eu quero um futuro com você, quero que nossas vidas se unam em todos os sentidos, quero fazer nosso nós funcionar e deixar cair por terra tudo mais.

Ele sorriu, puxando-a para mais perto.

— Você não foi a única a ficar cega pelos próprios sonhos. Claro que quero você ao meu lado como minha esposa, minha duquesa, mas não espero que fique longe do interior por meses a fio, foi egoísta da minha parte pensar que era algo que você faria. Londres

não fica muito longe, e quando o Parlamento se reúne ou a temporada me chamar à cidade, não espero que você deixe suas responsabilidades por tais frivolidades. Aqui é onde está o que mais importa. — ele passou as mãos pelos cabelos dela, entrelaçando os dedos na nuca dela. — O que eu disse da última vez que conversamos, eu falei sério. Eu amo você, demais. Não posso viver sem você.

Os olhos dela arderam quando a voz dele falhou nas últimas palavras, e ela se aproximou para envolver os braços em volta do pescoço dele, segurando-o perto.

— Eu também amo você. — ela sussurrou contra a orelha dele.

Ele virou a cabeça para ficar de frente para ela, e ela sorriu. Ava se aproximou ainda mais dele e o beijou. Não se importava mais com quem os visse. Tate não se esquivou e tomou a boca dela com fome, fazendo-a se esquecer de todos os problemas da noite, fazendo seu sangue gelado se aquecer.

Uma tosse discreta os separou, e eles se viraram para encontrar Hallie e Lorde Duncannon parados ao lado deles, divertimento no rosto dos dois. Fuligem e sujeira manchavam as roupas de baile, os rostos e as mãos dos dois. Hallie deu um passo em direção a eles, envolvendo-os em um abraço.

— Estou tão aliviada por você estar segura. — disse Hallie, com os olhos muito brilhantes. — Ficamos presos tentando salvar os cavalos. Como você não estava lá, ficamos e oferecemos ajuda e, por graças, nenhum cavalo foi perdido.

— Teremos que reuni-los de manhã. A maioria fugiu do terreno.

— afirmou Lorde Duncannon.

Tudo era compreensível pelo trauma que os animais sofreram, tudo porque Lorde Oakes era um louco. Um homem tão cego de

ciúme por não conseguir o que queria que resolveu punir aqueles que considerava culpados por atrapalhar seus objetivos.

Ava balançou a cabeça.

Como alguém poderia ser tão mau?

— Venha, há pouco que podemos fazer aqui. Vamos voltar para Cleremore, e vocês duas ficarão comigo enquanto a casa e os estábulos são reconstruídos.

Ava assentiu.

Havia pouco que ela pudesse fazer aqui, tudo estava no chão.

Voltariam pela manhã e procurariam os cavalos, que se Deus quisesse, não teriam ido muito longe. Caminharam até a carruagem ducal, e Ava agradeceu quando Tate a ajudou a entrar, as pernas ameaçando ceder sob ela.

Ela olhou pela janela da carruagem e observou o que restou de sua casa, desespero a inundou. Como Lorde Oakes pôde fazer uma coisa dessas?

Talvez uma pergunta que ela se faria por anos e anos.

— Está pronta? — perguntou o duque, sentando-se ao lado dela e tomando-a nos braços, puxando-a para perto.

Ava assentiu, não querendo mais ver a destruição da casa antes de estar preparada para enfrentá-la.

— Estou mais do que pronta.

CAPÍTULO 17

Papai morreu, e eu estou voltando para casa. Perdi tudo o que importava, você, meu pai, mas pelo menos tenho meus cavalos.

Suponho que seja algum conforto em tempos em que não há nenhum.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

U M MÊS DEPOIS, Tate parou do lado de fora da casa em ruínas de Ava e supervisionou a chegada do primeiro lote de madeira para a construção da nova estrutura. Na semana anterior, charretes chegaram cheias de pedra, e agora os construtores estavam recuperando o que fosse reutilizável dos escombros da velha casa.

A propriedade estava em polvorosa de trabalhadores, e Tate olhou para o outro lado do pátio e viu que Ava discutia alguns assuntos com o homem que contrataram para reconstruir a casa e os estábulos. Um sorriso apareceu nos lábios dela.

Ela era tão bonita, capaz, e seu coração doía ao vê-la. Ela o flagrou olhando-a com intensidade e sorriu para ele com um ar conhecedor. De alguma forma ela sempre sabia o que ele estava pensando, sentindo.

Ava Knight era realmente seu par perfeito.

Ele se voltou para a casa, balançando a cabeça ante a destruição. Lorde Oakes queria que nada continuasse de pé, e o

fora bem-sucedido. Restavam apenas algumas poucas peças de mobília e objetos de valor que os funcionários foram capazes de retirar antes que o fogo se alastrasse demais.

O magistrado local havia declarado a morte dele como acidental e, sabendo que o homem havia admitido os crimes para Ava antes de morrer, as autoridades estavam dispostas a dar o caso como resolvido.

Tate ficou feliz com este resultado. Depois do que ele viu Lorde Oakes tentando fazer com Ava na noite do incêndio, ele o teria estripado no gramado caso tivesse escapado, o desgraçado não merecia nada menos.

Ava se esgueirou até ele, segurou seu braço e o trouxe para perto.

— Vai ser como se o incêndio nunca tivesse acontecido quando terminarmos a reconstrução. Não concorda? — ela perguntou, olhando para ele.

Ele beliscou seu nariz fofo.

— Com uma pequena diferença. — disse ele, sorrindo, dando-se ao luxo de dar um beijo em seus lábios encantadores.

Ela olhou para ele com expectativa.

— E qual seria? — ela perguntou.

Tate riu.

— Depois de amanhã, você voltará aqui como duquesa, como minha esposa. — ao proferir tais palavras, contentamento o dominou, acalmando sua alma.

A mão dela soltou-se do braço dele e foi para a cintura dele.

— Sim, e você voltará como meu marido.

Ele passou os braços em volta dela e beijou-a sem se importar com os trabalhadores que os cercavam. E mesmo quando assobios e risadas chegaram aos seus ouvidos, ele não parou. Nunca iria

parar de amar a mulher em seus braços, não importaria onde estivessem ou quem estivesse ao redor.

Eles seriam o duque e a duquesa de Whitstone e fariam suas próprias regras, tomariam suas próprias decisões e isso nunca mudaria.

EPÍLOGO

Dois anos e quatro meses depois...

A va gritou do camarote ducal em Ascot enquanto Titan voava pela reta, os outros cavalos quase em seus calcanhares, e ainda assim o garanhão não dava sinais de desacelerar. Ela se levantou, gritando acima do enxame de cabeças diante dela nas arquibancadas, Tate ao seu lado, rindo e gritando com ela quando o cavalo deles cruzou a linha para a vitória.

Por um momento, eles se encararam com espanto, antes de Ava pular em seus braços, as lágrimas ardendo e seu coração batendo forte em seu peito. Eles ganharam! Eles ganharam Ascot!

— Não acredito. — disse Lorde Duncannon ao lado deles. — Eu ganhei uma fortuna.

Ava riu, não acreditando nela mesma.

— Deve descer, Tate. Pegue a taça e a fita.

Ele olhou para ela, o choque pelo o que havia ocorrido bem claro em seu rosto. Ava olhou de volta para a pista de corrida e sorriu enquanto o jóquei que montava Titan trotou de volta para onde o prêmio seria recebido.

Tate deu um beijo rápido na bochecha dela antes de descer correndo as escadas, em direção ao cavalo. Muitas pessoas em torno deles os parabenizavam, e Ava agradeceu, querendo se lembrar de cada momento deste dia para o resto de sua vida.

Durante os primeiros dois anos de casamento, eles trabalharam muito para deixar o Haras em pleno funcionamento e, felizmente, os

cavalos não sofreram muito com o trauma que Lorde Oakes causara.

— Se ao menos Hallie estivesse aqui para ver isso. Ela iria adorar. — ela disse em voz alta.

O sorriso de Lorde Duncannon diminuiu um pouco com a menção de sua amiga, e Ava não pôde deixar de se perguntar o que havia acontecido entre os dois.

— Ela ficaria feliz por você. Eu não tenho dúvidas.

Ava olhou para onde Tate estava com um largo sorriso que o fazia parecer o homem mais bonito do mundo. Ele apertou a mão do jóquei antes de dar um tapinha no pescoço de Titan.

— Soube dela? — Lorde Duncannon perguntou.

Ava voltou-se para ele, não esperava que ele fosse tão ousado.

— Ela volta a Londres na próxima semana, se o navio do Egito não atrasar.

Sua Senhoria a olhou de frente após ouvi-la, e Ava não deixou de perceber o nítido interesse que havia ali. Ela sorriu para ele, balançando um dedo.

— Um dia desses você vai me dizer por que vocês dois ficam tão cautelosos quando estão perto um do outro. Tate e eu sabemos que os dois escondem algo.

Ele riu e ela balançou a cabeça.

Mesmo Tate não sabia o que havia acontecido entre os dois, mas por Deus, Ava adoraria saber. Quando viajassem para Londres na próxima semana para buscar Hallie, ela exigiria que ela contasse. Não que Hallie fosse dizer algo. A mulher era como um cofre do qual segredos nunca eram revelados.

Ava bateu palmas quando Tate pegou a taça de ouro e sorriu para ele quando ele a ergueu em sua direção. Orgulho se apoderou dela, pelo sucesso de ambos naquele dia.

— Tenho certeza de que está ansiosa para rever a Srta. Evans.

Ava assentiu.

— Claro. — respondeu ela. — Há um artefato que queriam trazer de volta ao Museu Britânico. Presumiram que, como Hallie possui contatos aqui, ela seria a melhor pessoa para viajar com o artefato.

— Ava apertou a mão de um treinador que veio parabenizá-los. —

Eu, pelo menos, mal posso esperar para revê-la. Espero que ela fique um pouco mais dessa vez.

Lorde Duncannon assentiu com a cabeça, um sorriso, e Ava se virou para checar se Tate já fazia o caminho de volta para eles através do bando que dava parabéns e votos de felicidades.

— Você sabe que não deixaremos de ouvir coisas acerca do final dessa corrida pelos próximos anos. — disse ela, rindo quando Tate beijou a taça de ouro em suas mãos.

Duncannon riu.

— Acredito que esteja certa, duquesa.

Tate chegou a ela e entregou a taça.

Casar-se com o duque foi a melhor decisão que ela já tomou, e embora a mãe dele nunca os tivesse perdoado e ainda se recusasse a se desculpar pelo comportamento atroz, os últimos dois anos foram os mais felizes da vida dela, e ela não conseguia mais imaginar como seria sua vida se não fossem casados.

— Parabéns, querida. Você deveria ter descido e recebido a taça comigo. É tanto sua como minha.

Ela olhou para o prêmio, sorrindo.

— Eu vou, no próximo ano, quando um dos meus cavalos correr e vencer.

Tate riu, beijando-a e não se importando nadinha com quem os vissem, o que ele fazia com frequência. Se havia algo que Tate gostava de fazer era escandalizar a alta sociedade. E ela precisava admitir, também gostava.

Ela foi banida da Inglaterra... e ela o baniu de seu coração.
Assim que retorna para a Inglaterra em decorrência da morte de seu pai, a Senhorita Ava Knight torna-se a dona de um dos maiores estabelecimentos de cavalos de corrida do país. Só há um problema: o futuro de seu negócio depende de um programa de reprodução bem-sucedido que gira em torno de um garanhão, Titan.
Uma pena que o cavalo seja agora de propriedade de um homem que ela desejava nunca mais ver.
O duque de Whitstone, Tate Wells, ficou de coração partido quando Ava o abandonou na noite em que fugiriam para se casar, e ele jurou que nunca mais cruzaria o caminho de Ava. Apesar da relutância de perdoá-la, Ava vai ao socorro de Tate quando um incêndio ameaça consumir sua propriedade. Alguém está determinado a destruí-los. Com isso, eles se veem forçados a trabalhar juntos para garantir a segurança de seus cavalos e propriedades.
Será que os sentimentos que nutriam um pelo o outro no passado reacenderá o amor, ou seus sentimentos refugarão ainda na linha de partida?

 


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PRÓLOGO

Estábulo dos Knight, Berkshire, 1816

A senhorita Avelina Knight, Ava para seus amigos, apertou a circunferência da montaria e verificou se a sela não escorregaria quando ela se elevasse no estribo. Com uma única vela acesa na arandela na parede dos estábulos, ela trabalhou com o máximo de rapidez e silêncio possíveis, na esperança de que os cavalariços que dormiam no desvão acima não acordassem.

Segura de que a sela estava firme e de que a montaria estava hidratada, ela conduziu Manny para fora dos estábulos com o mínimo de barulho possível, encolhendo-se quando as ferraduras do cavalo fizeram seu som típico a cada passada.

Ava soprou a vela quando passou por ela e pegou sua pequena bolsa e jogou-a sobre o pescoço do cavalo antes de se erguer para a sela. Ela ficou lá por um minuto, atenta a qualquer barulho ou à possibilidade de alguém estar à espreita. Feliz pela quietude ela cutucou a montaria e partiu para o portão leste.

Ainda havia tempo, e ela não precisava se apressar agora que já estava há caminho. Tate havia dito que a encontraria na árvore favorita deles às três da manhã, e eram apenas duas e meia.

Ela impulsionou Manny para um meio galope, percorrendo os vários pátios que cercavam sua casa e ao se afastar, passou à velocidade de galope que seu pai usava para treinar os cavalos de corrida. Ou a que já foi sua casa. A partir desta noite, sua vida enfim começaria. Com Tate, ela viajaria pelo mundo, faria amor sob as estrelas se assim o desejassem, e não teria que ser escrava de nenhum dos caprichos das famílias de ambos, ou da Sociedade e suas restrições.

Tate e ela encontrariam uma nova vida. Um novo começo.

Apenas os dois até que expandissem a família com filhos em alguns anos.

Prazer aqueceu seu coração ante tal concepção, e ela não conseguiu impedir a risada suave de prazer que escapou de sua boca.

Com o tempo, Ava esperava que seu pai a perdoasse e, talvez, quando retornassem, casados, com filhos e felizes, seu pai ficaria satisfeito.

A silhueta escura de um homem apareceu embaixo da árvore.

No entanto, pela posição e tamanho do cavalheiro, não se parecia com Tate. Frieza varreu sua pele, e ela estreitou os olhos, tentando descobrir quem a esperava. Com o estômago retorcido, ela empurrou o cavalo para a frente, sem saber o que essa nova peça significava.

Ava olhou em volta, mas não viu mais ninguém. Com mais alguns passos, ela se engasgou quando por fim reconheceu a forma fantasmagórica. Seu pai.

O coração dela passou a bater forte. Como era ele estava aqui, e não Tate? Eles foram tão cuidadosos, tão discretos. Ora, eles nem frequentavam a mesma esfera social para serem ouvidos sussurrando ou planejando. Sendo Tate o herdeiro do pai dele, o duque de Whitstone, e Ava apenas a filha de um corredor notável, suas vidas não poderiam ser mais diferentes.

Ava levou seu cavalo até a árvore. Não havia sentido em dar meia volta. Parando diante do pai, ela encontrou o olhar dele, o máximo que pôde distinguir sob a noite de luar.

— Ava, desça, eu gostaria de falar com você.

Seu tom não era de raiva, mas de cautela, e Ava sentiu-se retorcer por dentro ante a possibilidade de que algo ruim havia acontecido a Tate. Ele teria se machucado? Por que ele não estava aqui para encontrá-la?

Ela pulou do cavalo, caminhou até o pai, sua montaria a seguindo de perto.

— Papai, o que o senhor está fazendo aqui? — ela perguntou, precisando saber, e certa de que não era possível ignorar o fato de ele a ter descoberto.

Ela deixou cair as rédeas do cavalo, e sua montaria se abaixou para mordiscar a grama.

O rosto do pai assumiu um tom severo.

— O marquês de Cleremore não a encontrará aqui, Ava. Recebi uma missiva ontem à noite notificando-me que, enquanto nos falamos, Sua Senhoria está à caminho de Londres para pegar o primeiro navio para Nova York. Pelo que seu pai, o duque de Whitstone, afirma, esta foi uma decisão do marquês. Tate confidenciou a seu pai a situação em que se encontrava com você e que não sabia como se desvencilhar de ter que se casar com uma mulher que não de mesma posição.

Ava olhou para o pai, incapaz de entender o que ele estava dizendo. Um abismo se abriu em seu peito, e ela apertou o xale como se para interromper seu progresso .

Tate a havia deixado?

Não, não poderia ser verdade.

— Mas isso não faz sentido, papai. Tate me ama. Ele mesmo me disse, neste exato lugar.

Decerto que ela não poderia estar errada acerca dos sentimentos dele. As pessoas não declaram tais emoções a menos que fossem verdadeiras. Ela com certeza não mentira.

Ela amava Tate.

Ava pensou em todas as vezes que ele tomou liberdades com ela, beijando-a, tocando-a, passando uma quantidade enorme de tempo com ela e que não significou nada para ele. Ela fora uma mera distração, um brinquedo para um homem do porte dele.

Seu estômago revirou com tal percepção, e ela tropeçou na árvore, segurando-se no tronco para ter apoio.

— Não. Eu não acredito. Tate não faria isso comigo. Ele me ama como eu o amo, e nós vamos nos casar. — Ava olhou para o chão por um momento, sua mente vacilando antes de ela girar o corpo na direção do pai. — Eu preciso vê-lo. Ele precisa me dizer tudo na minha cara.

— Lorde Cleremore já partiu para a cidade. E de manhã, ele estará em um navio para a América. — o pai suspirou, aproximando-se dela e pegando-a pela mão. — Eu pensei que seu apego a ele fosse uma bobagem passageira. Sua Senhoria nunca foi para você, minha querida. Nós treinamos e criamos cavalos de corrida e, na Inglaterra, pessoas como nós não se casam com futuros duques.

Ava olhou para o pai, não acreditando no que estava acontecendo. Ela pensou que esta noite seria o começo de uma eternidade, mas agora era o começo do fim. Seus olhos arderam, e ela se viu impotente em manter a postura.

— Mas eu o amo. — ela sussurrou com a voz embargada.

Seu pai, um homem orgulhoso, mas humilde, de princípios ainda mais humildes, endireitou a coluna.

— Eu sei que você pensa que sim, mas não é amor. Você é jovem, jovem demais para jogar sua vida fora por um garoto que usaria você e depois se casaria com outra mulher, intitulada e bem conectada.

— Não estou arruinada, nem usada. Por favor, não fale dessa maneira.

Não queria nem imaginar que Tate pudesse tratá-la com tão pouco respeito, mas o que o pai disse valia a reflexão. As últimas semanas com Tate não foram ocupadas com pouco além de planejamento e roteiros. Teria sido diferente para eles, teria Tate agido de outra forma caso fosse mais velho, mais maduro? Se a partida dele revelava algo, com certeza era que o pai estava coberto de razão. Ele se arrependera de sua escolha e foi embora em vez de encará-la. Sendo o cavalheiro que era, abandoná-la não parecia do seu feitio. Apenas mostrava a pouca consideração que ele possuía quanto a ela e ao amor que ela tão ardentemente declarou a ele.

Ela bateu nas bochechas, querendo gritar para a noite ante a injustiça de tudo.

— Sinto muito. — disse ela, olhando para as botas curtas e incapaz de encontrar o olhar do pai.

Como ele pôde ter feito isso comigo?

Ela nunca o perdoaria.

Ele suspirou.

— Há mais uma coisa, minha querida.

Mais!

O que mais poderia haver?

— O que, papai? — ela perguntou, pavor formando um nó no estômago diante do semblante pálido de seu pai. Ela viu um olhar semelhante quando ele chegou para contar da morte de sua mãe, e era uma expressão que ela nunca mais queria ver.

Ava agarrou a árvore com mais força.

— Vou mandá-la para a França, para terminar seus estudos lá.

Eu a matriculei na Escola da Madame Dufour de Etiqueta para

Moças. Fica no sul da França. É de boa reputação e ajudará a prepará-la para o que está por vir na sua vida; ou seja, administrar o Haras Knight em meu lugar quando chegar a hora.

Escola de Etiqueta!

— Está me mandando para a França! Mas papai, eu não preciso de escola de etiqueta. Você sabe que eu sou mais do que capaz de assumir o controle dos estábulos. E eu sei me portar, sei como agir tanto na Alta Sociedade quanto na esfera mais baixa. Por favor, não me mande embora. Não vou sobreviver sem você e nossos cavalos.

Não me tire isso também.

Não quando eu já perdi a felicidade da qual eu tinha tanta certeza.

Ele a calou, puxando-a para seus braços. Ava o empurrou para longe, indo e vindo diante dele. Seu pai estendeu a mão, tentando acalmá-la.

— Você vai me agradecer um dia. Confie em mim quando digo que é uma coisa boa para você, e não vou voltar atrás com minha decisão. Partimos para Dover amanhã, e eu mesmo a acompanharei para garantir sua chegada segura.

— O que... — ela parou de andar. — Pai, por favor, não faça isso. Prometo não voltar a fazer nada de tão tolo e bobo. Você disse que Tate está indo embora. Não há razão para me mandar embora também.

O simples ato de dizer em voz alta a magoava, e Ava se abraçou. Amar e perder Tate já seria difícil; no entanto, ser enviada para outro país, sozinha e sem amigas ou apoio era demais para suportar.

Seu pai foi até ela, puxando-a contra ele e beijando seus cabelos.

— Esta é uma boa oportunidade para você, Ava. Eu trabalhei duro, economizei e investi para ser capaz de proporcionar a você tudo o que uma criança intitulada poderia receber. Eu quero isso para você. Lorde Cleremore pode não achar que você é adequada para ele, mas provaremos que ele está errado. Me faça orgulhoso, use a educação que receberá para se aperfeiçoar e então volte para casa. Me prometa que vai fazê-lo.

Ava caiu contra ele.

O pai dela nunca foi flexível e, uma vez que a decisão fosse tomada, era final. Não havia escolha; ela teria que fazer o que ele mandasse.

— Eu irei já que sei que não posso fazê-lo mudar de ideia.

— Essa é minha garota. — ele se afastou e assobiou para a montaria dela.

Ela não conseguiu nem dar um meio sorriso quando Manny trotou até eles.

— Vamos. Tenho certeza de que, quando chegarmos em casa, o café-da-manhã estará quase pronto.

Usando um tronco próximo, Ava se ergueu para a sela.

O cavalo, como se soubesse o caminho de casa, começou a descer a colina. A luz brilhava no céu do leste e, olhando para sua esquerda, Ava viu o sol nascer sobre sua terra. Ela observou o amanhecer de um novo dia, marcando um novo futuro para ela, u que não incluía Tate, o Marquês de Cleremore, futuro duque de Whitstone.

Uma lágrima solitária deslizou por sua bochecha, e ela se prometeu jamais chorar por Tate ou qualquer outro homem. Ela dera o coração e confiança a ele, e ele os desprezou. Que a lágrima secando em sua bochecha fosse a última que ela derramaria por ele.

E o precioso ducado que ele tanto amava...

Amava mais que ela.

CAPÍTULO 1

Tantos quilômetros nos separam. Eu não durmo por pensar em você. Quando seu amor por mim pereceu? Não consigo entender por que você não me confidenciou que seus sentimentos haviam mudado, talvez até de direção...

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

Haras Knight, Berkshire, 1821

A va incitou sua égua recém-comprada — uma beleza de dezesseis mãos, puro-sangue que havia sido gerada para competir com sua própria linhagem — a um galope empolgante.

Ela sorriu, inclinando-se sobre o pescoço dessa garota preciosa, e elas começaram a virar a esquina e descer para a casa ainda no galope tão familiar.

O administrador do Haras e treinador, o Sr. Greg Brown, estava observando seu galope, e ouviu seus gritos exuberantes quando ela passava por ele em uma velocidade alucinante. Ela sorriu, impressionada com a rapidez insondável do cavalo.

A névoa da manhã começava a queimar a grama e as árvores, o ar tornando-se fresco após a breve chuva. Puxando a égua, Ava a manteve em um trote lento para retornar a Greg. A égua bufava vapor de suas narinas a cada respiração, e Ava deu um tapinha nela, seguida de uma massagem de congratulações.

Ava respirou fundo, maravilhada com a beleza de sua vida, a beleza deste lugar que agora era dela.

— O que acha, Greg? Ela tem chance em Ascot? — Ava provocou, sabendo que havia muito o que fazer antes que pudessem pensar em inscrever a égua para uma corrida dessas.

Ele riu, curvando-se sob o parapeito e saindo para dar tapinhas no cavalo.

— Talvez no próximo ano, se ela continuar se apresentando como agora. No entanto, ela terá que se provar em Epsom antes.

Ava soltou os pés dos estribos e pulou para o chão. Ela entregou as rédeas a Greg e deu a volta no cavalo, verificando se ela estava bem após a corrida.

— Nossa Garota Valente, como o nome sugere, se provará por si só. Espere e veja. E com os potros que teremos dentro de cerca de um ano, do cruzamento de Titan e Black Lace, teremos mais belezas como esta.

— Falando em Titan. — Greg disse, tirando o chapéu e passando a mão pelo cabelo. — Talvez haja alguns problemas para juntá-lo a Black Lace como você deseja. Soube que o Sr. Tuttle o vendeu.

Ava parou a inspeção que fazia na égua e baixou a pata direita da Garota Valente. Ela encontrou o olhar de Greg e viu que ele não estava fazendo piada.

— Titan foi vendido? Mas o Sr. Tuttle fez um acordo com meu pai de que o primeiro potro, que a Black Lace teve há dois anos, seria dos Tuttle, mas que depois eles cruzariam outra vez. Meu pai cumpriu sua parte no trato, e você está me dizendo que ele não vai cumprir a dele?

Ela partiu para os estábulos, gritando para um dos rapazes selar Manny. Greg a seguiu o mais rápido que pôde enquanto guiava

Garota Valente.

— Srta. Ava, espere. Espere. Acredito que haja outras opções, além de Titan, que deveria considerar.

Não havia outro cavalo melhor que Titan, e se o Sr. Tuttle pensava em passar a perna em seu falecido pai e a ela, então ela pegaria o potro, Beatrice, de volta sem se importar com o escândalo que criaria no mundo das corridas. Como o homem ousava enganá-

los dessa maneira? Ele trocara apertos de mão com o pai dela, caramba. Não significava que o acordo era tão válido quanto qualquer outro?

— Não há outro cavalo tão bom. Quero Titan como provedor da próxima geração de potros dos Knight, e não há nada que possam dizer que me faça mudar de ideia. Você sabe, assim como qualquer um, que ele é o melhor puro-sangue da Inglaterra, talvez até do continente. Sua altura, junto com a forte linhagem de sangue e velocidade, faz dele o único cavalo apto.

Ava agradeceu o rapaz que selou Manny e, segurando-se na sela, se ergueu.

— Aonde vai? — Greg perguntou a ela, segurando as rédeas sob o pescoço do cavalo dela.

Ela franziu o cenho ante a impertinência dele.

Ele largou.

— Vou descobrir o que o Sr. Tuttle pretende ao tratar nosso negócio com tão pouco respeito. Eu posso ser mulher, e meu pai pode estar morto, mas nós tínhamos um acordo. Não vou deixar barato.

Ela virou a montaria e chutou Manny para iniciar um galope, iria numa perna só até a Fazenda Tuttle. Quando o pai dela estava vivo, nenhum tipo de acordo escuso seria feito. Nunca pensariam em

enganar seu querido pai. Mas aqui estava ela, uma mulher, e sendo tratada com tão pouco respeito.

A raiva fervia em seu sangue e, mesmo quando ela trotou já em terras da Fazenda Tuttle, seu humor não havia amenizado. Ela viu o homem que procurava laçando um cavalo no pátio e foi com sua montaria até a cerca, esperando que ele a notasse. O olhar amargo no rosto dele denunciava que ele sabia a razão para ela estar lá.

— Como você pôde, Sr. Tuttle? Você tem um acordo fechado com meu pai, um que ainda está de pé comigo. — ela demandou, ignorando quaisquer gentilezas.

O cavalheiro mais velho gritou para um cavalariço que estava por perto pegar a corda e o chicote e caminhou até a cerca. Ele parecia ter envelhecido nos últimos meses desde que ela o vira.

Enquanto ela olhava para o cabelo cinzento e recuado dele, um pouco de sua explosão se dissipou.

— Eu não tive escolha, senhorita Ava. De fato, se você não comprar seu potro de mim, o comprará em um leilão.

Ela fez uma careta.

— O que houve, senhor Tuttle? Aconteceu alguma coisa para forçá-lo a vender Titan e Beatrice?

Ele suspirou, os ombros caindo com as palavras.

— Sim, minha querida. Não me importo de contar já que nossas famílias se conhecem há muitos anos, mas fiz um mau investimento no ano passado e, bem, ele vai me custar a fazenda. Estamos nos preparando para ir para Bath, onde minha esposa, Rose, tem família. Vender Titan me permitiu ao menos pagar a dívida mais urgente. Com a venda da casa, da terra, e dos cavalos, é claro, podemos ter um pouco de sobra para nos manter por alguns anos em condições razoavelmente confortáveis. — ele encontrou o olhar

dela, seus olhos vidrados de lágrimas não derramadas. — Me perdoe, Ava. Eu sei o quanto você queria potros do Titan.

Esquecendo-se do cavalo, ela disse:

— Posso ajudar em algo? Existe algo que eu possa fazer para aliviar a dívida e permitir que você fique? Esses estábulos estão na sua família há três gerações. Eu odiaria vê-los perder tudo.

— Bem. — disse ele, olhando para a propriedade, o amor que ele nutria pela terra estava evidente em seus globos cinzentos. —

Quando alguém comete um erro, deve se responsabilizar por ele.

Só lamento que minha esposa e meus filhos percam tudo o que trabalhamos tanto para construir. E agradeço, Srta. Ava, mas não posso aceitar sua oferta generosa. Não seria certo.

Ela assentiu, querendo pressionar, mas o Sr. Tuttle sempre foi um homem orgulhoso. Forçá-lo a algo nunca havia funcionado antes, e ela não via como mudá-lo agora. E ela não queria que se afastassem com uma discussão desse porte, mesmo que quisesse muito ajudá-lo.

— Muito bem, mas me avise caso se depare com algo que eu possa ajudar. Ou, se houver algo que você não queira vender a ninguém, talvez eu possa comprar. Pelo menos você saberá quem o possui e que será amado.

— Você é uma boa garota. E saiba que eu nunca teria desonrado nosso acordo se pudesse evitar. É que, de fato, não havia outro remédio.

Ava ajustou-se sobre a cela, observando o cavalo que estava sendo treinado parecia mais interessado na conversa deles que no treinamento.

— Posso perguntar a quem você vendeu Titan? Talvez eu possa negociar com essa pessoa. — ele olhou para os pés, mexendo-os

um pouco. — Senhor Tuttle. — ela se repetiu ante a ausência de resposta dele.

— Quanto a isso, minha querida. Bem, quer dizer...

O que havia de errado com o homem?

— Sr. Tuttle, me conte.

Decerto que não é segredo de estado.

Ele voltou a olhá-la nos olhos e, por um instante, ela se perguntou se ele havia jurado segredo. Com certeza que não.

— O duque de Whitstone comprou Titan, senhorita Ava. Soube pelo seu pai que sua família possui algumas desavenças com eles e, me desculpe, mas para conseguir procriar com Titan, a senhorita precisará ir falar com Sua Graça.

As mãos dela tremeram com a menção daquele nome, e ela apertou as rédeas com força, raiva fervendo em suas veias por ter ouvido o nome do sujeito. Mesmo depois de todos esses anos.

— Por que vendeu para ele? Eu poderia ter ofertado o preço que você queria.

Ele balançou a cabeça, mexendo os pés como uma criança travessa mais uma vez.

— Ele veio aqui ontem e ofereceu para pagar em dinheiro. Como estou com agiotas no meu encalço há semanas, aceitei sem pensar.

Me perdoe, Ava. Mas eu tive que pensar na minha família.

Maldição.

— Eu entendo. — disse ela, incapaz de esconder a decepção em seu tom.

O duque de Whitstone poderia ser um cavalheiro persuasivo, disso ela sabia bem. As histórias que ouvira sobre Tate em Londres não se pareciam com o garoto que ela amara. Na verdade, ele agora parecia um homem que só procurava prazer e se importava com pouco. No ano em que ela voltara à Inglaterra, ele não a

procurara uma única vez para pedir desculpas pela forma que a tratara outrora.

Ava virou o cavalo, preparando-se para sair.

— Nos visite antes de partir de vez, Sr. Tuttle. Traga sua família e teremos uma tarde de chá e bolos. Estou decepcionada pelo cavalo, mas estou mais triste por você ter sido colocado nessa situação. Eu gostaria que não fosse assim.

Ele inclinou o chapéu, curvando-se um pouco.

— Você é muito generosa, Srta. Ava, e iremos até vocês nos despedir.

— Que bom.

Ava acenou e iniciou a volta para casa.

Ela chutou sua montaria a galope e xingou. Maldito fosse o duque e sua mania de se intrometer. Se ao menos ela tivesse ouvido dos problemas enfrentados pelo Sr. Tuttle antes, ela poderia tê-lo ajudado comprando o cavalo antes que o duque aparecesse.

Na sua opinião, o duque não era digno de um cavalo de tão alto padrão.

Ela não podia nem conceber ter que encará-lo para tratar de tal assunto. O fato de ele não a ter procurado era uma bênção, pois ela com certeza não estava disposta a ficar de frente a ele e seu coração feio e mentiroso.

Porém, de nada adiantava manter-se afastada se ela quisesse acesso a Titan para continuar com seu programa de reprodução.

Era um dilema que ela não havia imaginado que iria ter que enfrentar.

Mas o garanhão era fundamental para dar continuidade a suas linhagens, à possibilidade de gerar mais vencedores no futuro e, assim, dar a oportunidade de sua propriedade prosperar e nunca precisar ter de passar pelo mesmo destino que o Sr. Tuttle estava

vivendo agora. Desistir de seu sonho de se tornar o melhor e mais estimado Haras da Inglaterra não daria certo.

Ela já havia desistido de coisas que queria, como um casamento e família com o homem que acreditava amá-la, mas não pensaria em desistir desta parte de sua vida. O duque não tiraria isso dela também. Mandaria seu administrador, Greg, para a propriedade ducal e o faria negociar, se possível.

E com um pouco de sorte, o programa de reprodução poderia ser realizado sem que Sua Graça ou ela tivessem que pisar no mesmo recinto. Como ela pretendia.

TATE WELLS, o duque de Whitstone, recostou-se na cadeira revestida em couro atrás de sua mesa e estalou os dedos enquanto ouvia o administrador do Haras Knight traçar os termos sugeridos para permitir que a senhorita Ava Knight tivesse acesso ao seu premiado corredor, Titan.

Não que ele fosse contar ao velho, que era tão leal a Ava como foi ao pai dela antes de ele falecer, que o inferno teria que congelar antes que ele a deixasse chegar perto de sua propriedade ou de Titan. Fazia cinco anos que ele não a via, nem pensava nela, e não iria começar a fazê-lo agora.

Ele se mexeu na cadeira, sua mente zombando dele pela mentira que era tal pensamento. Inferno, ele pensava nela com frequência. Esperava que ela estivesse bem e feliz. Mesmo quando ele ia à estalagem local para tomar uma caneca de cerveja, seus ouvidos sempre se mostravam atentos à qualquer menção ao Haras Knight e à dona que administrava um Centro de Criação de Cavalos de Corrida bem-sucedido.

Mesmo assim, ele nunca a perdoaria por tê-lo afastado.

O fato de ele estar na América o impediu de dizer adeus ao pai.

Quando as notícias da doença de seu pai, dois anos atrás, enfim chegaram aos Estados Unidos, sua partida para a Inglaterra já não seria em tempo. Ele chegara a Berkshire duas semanas após seu pai ter sido posto no mausoléu da família. Outra mágoa que ele poderia colocar nas costas de Ava. Ou Srta. Knight, cuja alma era negra como uma noite sem lua.

— ...portanto, Sua Graça, seria vantajoso que Titan recebesse nossa égua, Black Lace. A senhorita Knight está disposta a pagar uma quantia generosa pelo serviço, e eu, em conjunto com seu próprio administrador podemos organizar todos os detalhes relativos aos animais para que você e a senhorita Knight não precisem ser incomodados.

Tate encontrou o olhar cinza do senhor mais velho, seus olhos um pouco lacrimejantes com a idade. Então, Ava não queria vê-lo?

Bem, havia pelo menos uma parte do acordo em que eles poderiam concordar.

Uma pequena parte de seu coração doía com a noção de que ela não queria nada com ele. O rompimento do relacionamento deles, a saída repentina da Inglaterra fora tão incomum para a garota que ele conhecera uma vez. Em certa época eles foram inseparáveis, cada hora e cada minuto do dia era gasto na companhia um do outro.

Tate afastou o pensamento inútil.

— Não estou interessado em procriar Titan no momento.

Queremos que ele corra em Ascot no próximo ano, o que não preciso lembrar que falta menos de oito meses. Não preciso que o cavalo se desgaste mais do que o necessário.

— Peço perdão, Sua Graça, mas cavalos correm e se desgastam diariamente. Receber uma égua não será mais vigoroso que treinar.

O que era verdade, não que Tate fosse acatar tais regras.

E ele gostava da ideia de Ava não conseguir o que queria. Ela arrancou as esperanças dele de um futuro. Casar-se com a mulher que ele amava, respeitava e adorava, e não com alguém apenas porque era considerada adequada para ser uma duquesa.

— É demais para o meu cavalo e não vou permitir. Diga à Srta.

Knight que procure outro garanhão, em outro lugar para o seu programa de criação.

O senhor mais velho torceu o chapéu nas mãos.

Se esse acordo era tão importante para Ava, por que ela não veio ela mesma pedir? Ele se esforçava para não a encontrar aqui em Berkshire e, até agora, fora bem-sucedido em seu plano.

Ele sabia que ela estava de volta da França há um ano, em condições normais seria quase improvável que eles não tivessem se encontrado até agora, em eventos de corrida e coisas do gênero.

Tate pensou por um momento e se perguntou se ela também o estava evitando tanto quanto ele a evitava.

Ele se levantou.

— Lamento tê-lo feito perder seu tempo, Sr. Brown, mas minha decisão acerca do assunto é final. Informe a Srta. Knight, por favor.

— ele estendeu a mão. — Bom dia para você, senhor. — disse ele, terminando a conversa.

O Sr. Brown se levantou com os ombros caídos. Tate sentia pena do homem. Ele agora teria que voltar e encarar Ava. Com certeza uma tarefa que Tate não gostaria de ter.

Ao menos na época em que se conheciam, tantos anos atrás, ela sempre fora determinada e dona de si. Dois traços que ele uma

vez adorou. Eles se tornaram amigos antes que ele se caísse de amores por ela. Ela nunca se retirara de uma conversa que considerava o julgamento dele incorreto, sendo bem incisiva ao fazê-lo ver a razão por trás do argumento dela. Sua determinação, seus ferozes olhos castanhos acendiam como fogo quando ela falava em tornar os cavalos dos Knight os mais conhecidos na Inglaterra, com Tate ao seu lado. Ava sempre esperava o melhor das pessoas. Que pena que ela não foi capaz de viver de acordo com seu próprio padrão.

O Sr. Brown apertou sua mão.

— Obrigado pelo seu tempo, Sua graça. Tenha um bom dia.

Tate observou-o sair.

Ele se recostou na cadeira, esticando-se, pensando em quem a Srta. Knight seria nos dias de hoje. Porque ela não havia vindo pedir, ela mesma, que Titan procriasse com a égua dela. Dava indícios de que toda a história entre os dois não significou nada para ela. Que eles eram, de fato, dois estranhos. Não que tal realização surpreendesse Tate. O dia em que ela enviou uma carta dizendo que não se casaria com ele havia sido o suficiente para atestar o que a Srta. Knight pensava dele. De quanto ela mentiu e fazia pouco caso dos ideais infantis dele.

Tate passou a mão na mandíbula.

Mesmo com tudo o que havia passado entre eles, todas as dores, ele não pôde deixar de se perguntar se ela ainda teria a mesma aparência. Ainda teria os cabelos compridos e de uma cor tão rica quanto chocolate? Os olhos castanhos e grandes? As maçãs do rosto ainda eram pronunciadas, ou haviam se tornado mais cheias com a idade?

O relógio bateu as horas e, pegando a pena, ele puxou a papelada de uma das propriedades diante dele e começou a

verificar os livros de contabilidade dos estábulos e das fazendas dos inquilinos. O que importava o quanto ela havia mudado? Ele também mudara, seguiu em frente.

Nos últimos dois anos como duque, ele foi negligente em cuidar de suas propriedades, mas não mais. Estava na hora de garantir que as pessoas que sobreviviam de suas terras fossem bem cuidadas. Que seu Haras aqui em Berkshire crescesse e prosperasse como ele sempre quis.

Tornar o seu estabelecimento melhor do que o dos Knight, há cinco quilômetros daqui, era uma motivação bem boa para estar aqui, em vez da cidade. E com Titan em seus estábulos, ele já possuía vantagem em avançar seus planos. Tate afastou Ava de sua mente, assim como ela o descartara sem olhar para trás.

Ninguém tão desleal e egocêntrica merecia um minuto do seu tempo. Nunca mais.

CAPÍTULO 2

A VA INCITOU o cavalo a galope, a linha do telhado de Cleremore Hall, nomeada quando a família havia acabado de receber o marquesado, emergiu das árvores. Em apenas alguns momentos, ela reveria Tate. Estaria uma vez mais nos reverenciados corredores da casa do Duque de Whitstone. Fazia anos desde que ela chegara tão perto da propriedade dele, e ela sentiu nervosismo se instalando ante a ideia de vê-lo outra vez.

Será que ele mudou tanto quanto ela?

Cinco anos era um longo tempo, e ele esteve nos Estados Unidos por três deles. Ela supunha que tal viagem poderia mudar muito alguém, torná-lo mais mundano, ou até sábio. Ao longo dos anos, ela ouvira, às escondidas, as fofocas ociosas em torno dessa grande família, queria saber se Tate havia se casado ou se estava noivo. Nada disso havia sido mencionado, mas, ao retornar à Inglaterra, as peripécias dele em Londres nunca deixavam de ser assunto para as pessoas. Pelo menos não para as deste condado.

O homem era um verdadeiro patife em todos os sentidos e, de alguma forma, saber que ele estava sempre cercado de tantas amantes, que levava outras mulheres para a cama com tanta regularidade, fazia com que a ferida em seu traição continuasse escancarada como um abismo.

Também não condizia com quem ela acreditara que ele era. Tate em verdade nunca se comportara de tal modo quando eles se encontravam, embora eles fossem bem novos à época, apenas dezenove anos. Sua Graça também se recusou a se casar com ela.

Mas daí, ela supunha que, caso ele estivesse atraído de verdade

por ela e a amasse, ele teria a levado para a cama. Mas ele não o fizera.

Ela guiou Manny para uma pequena inclinação, não muito longe dos estábulos ducais, e dali pôde ver Titan comendo grama em um piquete adjacente. Clicando a língua, ela incitou a montaria na direção dos estábulos, queria falar com o treinador. Ver se ele poderia negociar com o duque, um homem que parecia ter se tornado um imbecil teimoso sem razão.

Ela amarrou a montaria a uma grade próxima, deixou às rédeas com sobra o suficiente para que o cavalo mordiscasse a grama. Os estábulos dele eram tão grandes quanto os dela, contudo, a madeira parecia precisar de tinta fresca. Pelo menos as dela estavam em melhores condições, muito melhores que as de um duque.

Entrando nos estábulos, ela parou no espaço escuro e aguardou que os olhos se ajustassem. Alguns homens cuidavam de seus afazeres, alguns garotos tiravam palha velha das baias, e dois rapazes mais jovens passavam óleo nos estribos das selas de couro.

— Sem aveia hoje, ele está engordando. — disse uma voz familiar, e ela ofegou ao ouvir Tate depois de todos esses anos. A ideia de fugir correndo passou por sua cabeça um segundo antes de ela erguer o queixo e enfrentar o reencontro inevitável, fadada a acontecer desde que ambos voltaram à Inglaterra.

Ele saiu de uma baia, e ela aproveitou a oportunidade para apreciar sua forma e seus traços pelo tempo em que ele estivesse alheio à sua presença.

A juventude que ela amara não existia mais. Seus cabelos castanhos e macios pareciam beijados pelo sol, mais compridos acima que nas laterais, e ele havia empurrado os fios para trás, o que o fazia ter uma aparência bagunçada. O nariz reto e o queixo

esculpido estavam perfeitos como sempre e, mesmo agora, ela se lembrava de como eram sob o toque. Os lábios de Tate se abriram em um meio sorriso depois de conversar com seus funcionários, e ela ficou maravilhada com o fato de que um homem conseguira ter sido tão abençoado com boa aparência.

Ele, com certeza, era uns bons dez centímetros mais alto que ela, e os braços antes finos de marquês, eram musculosos e fortes no atual duque de Whitstone. As coxas dele, envoltas em calções bege, eram formadas por músculos proeminentes, e ela se sentiu corar, e mordeu o interior da bochecha. Mesmo depois de tudo o que ela vivera, seu corpo a traíra ao desejar mais uma carícia, um olhar, um beijo... Que plebeia tola ela era.

Ele se virou e se assustou quando a viu. Um vislumbre de prazer cruzou as feições dele antes que ele piscasse e sua reação se tornasse aborrecimento.

— Srta. Knight, eu não mudarei de ideia. Está desperdiçando meu tempo tanto quanto o seu.

Ela suspirou, erguendo o queixo.

— Eu e o Sr. Tuttle firmamos um acordo antes que o senhor o forçasse a vender Titan para você. Mereço que esse acordo seja mantido.

Ele se virou, dando-lhe as costas.

Se ele pretendia desprezá-la, ele se enganava. Em vez de irritá-

la, o corpo dela mostrou ter suas próprias intenções e seu olhar baixou direto para o bumbum dele. Mordendo o lábio, ela lutou para não sorrir com o quão perfeito ele ainda era na parte de trás.

— Aliás, Srta. Knight, você deveria estar vestida desta maneira?

Você parece um homem.

Ela ergueu uma sobrancelha, ainda encarando suas características traseiras já que ele olhava para o outro lado.

— Como se sua opinião fosse relevante, Sua Graça. Não vim aqui para discutir nossas roupas, mas cavalos. O que é preciso para você permitir que Titan receba minha égua, Black Lace? Estou disposta a pagar se o que precisa é dinheiro. Lembro-me bem do quanto sua família adora dinheiro.

Ele se virou, e ela estreitou os olhos.

Ótimo.

Ela o queria irritado. Irritado como ela estava. Porque era a falta de conexões e de títulos ancestrais na corrente sanguínea dela que a tornara tão inelegível para ele. Ele partiu para a América, a abandonou sem ter o caráter de falar pessoalmente que havia cometido um erro, que ele não a amava mais e não queria que eles se casassem.

Ela teria se magoado, com certeza. Mas essa dor teria sarado, por ele ter agido de forma honesta, como um cavalheiro. O homem à sua frente era um covarde que fugiu em vez de enfrentar suas responsabilidades. Ele a deixou sozinha e vulnerável. As amigas que fez na escola a salvaram, mas ao voltar para a Inglaterra não lhe restava ninguém. Com o pai morto, ela estava sozinha e sem proteção, e havia pagado por esse lapso da pior maneira possível.

Ela nunca o perdoaria.

— Você não teria fundos suficientes, mesmo que eu quisesse seu dinheiro.

As palavras dele a irritaram ainda mais, ela caminhou até ficar há poucos metros dele.

— Eu tenho riqueza o bastante, duque. E tenho certeza de que se seu pai ainda estivesse vivo, eu já poderia ter comprado Titan umas dez vezes. Então me diga, como um fruto nunca cai longe da árvore, qual é o seu preço? O que é preciso para eu ter Titan?

Ele então passou a observá-la, e ela sentiu os nós no estômago se apertarem ainda mais sob o escrutínio dele. O que passava pela cabeça dele? Concluiria que ela havia mudado muito desde que a vira pela última vez? De perto, Ava conseguiu ver a leve sombra da barba crescendo em sua mandíbula. As roupas dele, em vez de calças de camurça e casacos superfinos cortados à perfeição para se adequar à sua forma, eram calças bege, botas até o joelho, camisa e casaco marrom. Nada de gravata ou lenço, ou camisa engomada, ou botas polidas e brilhantes.

Ava olhou para seu peito, para o ponto de onde a gravata havia se soltado da camisa e um lembrete de pelos no peito era visível.

Seus dedos coçaram de vontade de senti-los outra vez. Uma vez, quando estavam sozinhos, eles se beijaram com tanta paixão que ela o tocou, e ele também a tocou.

A lembrança disso a fez ficar desejosa, e ela rangeu os dentes, odiando que seu corpo se ludibriasse com o inimigo diante dela.

— Ele não está à venda. — disse ele, olhando-a com firmeza, as palavras ásperas para não deixar espaço para argumentação.

Ela estreitou os olhos.

— Vejo que ainda é teimoso, Sua Graça. — ela se virou e foi para a porta, o clique das botas dele soando depressa detrás dela.

— Os Estados Unidos não o livraram desse traço. — ela o provocou.

Ele a agarrou pelo braço e a girou para encará-lo.

Ela ofegou e bateu na mão dele, o toque a havia deixado ansiando por mais. Fazia cinco anos que ela não reagia a um toque como reagiu à Tate, e a fome nos olhos dele dizia que ele sabia muito bem o que a presença dele fazia com ela.

— O que você sabe de mim ou de como eu sou? Não me insulte, senhorita Knight, só porque você não conseguiu o que queria. Eu

também posso afirmar que a escola não a livrou de sua própria teimosia. Era de se esperar que uma escola francesa de etiqueta a deixaria mais doce.

Ava manteve as mãos firmes ao lado do corpo.

— Ó, não se preocupe, Sua Graça. Minha educação foi primorosa. O mais importante de tudo, aprendi de que tipo de cavalheiro me afastar, libertinos vis como você.

Na verdade, essa parte ela não havia aprendido muito bem, e ela se forçou a afastar o pensamento ruim, não queria reviver o horror que nada tinha de ver com o homem que com quem ela estava discutindo.

Ava caminhou até o cavalo e subiu.

— O que pretendo fazer agora.

— Libertino? — ele disse, os olhos arregalados, ele agarrou as rédeas do cavalo dela e a interrompeu. — Você sabe tão bem quanto qualquer um que eu nunca fui lascivo.

Ela ergueu a sobrancelha com ironia.

— Mesmo? Então, todas as fofocas londrinas que citam seu nome são equivocadas? Você não é um canalha? Um homem que teve, e tem, tantas amantes que não sabe dizer quantas são? Um homem que prefere vadiar a cuidar de suas muitas propriedades?

Diga-me, Duque, as mulheres de Nova York não o satisfizeram o suficiente de modo que você se viu obrigado a retornar e espalhar sua semente vil por aqui? Quão diferente você é do jovem que conhecia.

Ava fechou a boca com um estalo.

Como uma conversa sobre Titan rumou para uma briga feia entre eles? Era tudo pessoal e revelador demais. Ela não queria que ele soubesse que ele a magoara tanto no passado. Que partira seu coração.

— Perdão, Srta. Knight, mas não vejo por que deveria se importar. Não me insulte, sabemos que a senhorita também não é nenhum anjo.

— O quê? — ela disse horrorizada. — O que quer dizer com isso?

Ele a encarou.

— E agora tenta me fazer de bobo. Bom dia para você, senhora.

— ele deu um passo para trás, deixando-a ir embora.

Com um último olhar para ele, ela incitou a montaria e partiu a galope. A volta para casa foi como um borrão. Ela conseguia ouvir o som alto de seu coração bombeando o sangue enquanto remoía a perplexidade de que uma conversa acerca de um cavalo havia se tornado uma briga em torno do relacionamento deles e do noivado desfeito.

Sem mencionar a falta de educação dela ao mencionar o fato de ele ter dormido com metade de Londres. Os rumores de que suas propriedades careciam de atenção eram verdadeiros agora que ela vira com seus próprios olhos.

Ela se encolheu.

De onde saíra isso?

Ava respirou fundo para se acalmar e cutucou o cavalo para manter o galope. Ela não permitiria que o rancor dele a afetasse. Ele não valia a pena e, no entanto, a mágoa que estava gravada no rosto dele quando ela partiu foi o bastante para abrir uma ferida de que ela considerava estar há muito recuperada.

TATE PASSOU a mão no queixo enquanto observava o belo delineado de Ava fugir da entrada de seu estábulo. Que mulher

andava por Berkshire em calças masculinas? Ao que parece Ava era dessas e não tomava conhecimento de quem a via daquele jeito ou do que pensavam dela.

No momento em que ela entrou no estábulo, o coração dele pulou no peito ao revê-la. Ele precisou se restringir para não a tomar nos braços e dizer o quanto havia sentido saudades. Dentro de uma fração de segundo, a lembrança de por que eles não se casaram o alertou que ele precisaria ter cuidado com a mulher diante dele. Ela deu um basta no amor deles por uma chance de viajar para o exterior e estudar. De fugir de ser duquesa, porque tal posição era detestável, ou assim dizia a carta que ele recebera.

Mas, maldição, ela ainda era tão bonita quanto ele se lembrava que era. As longas madeixas escuras estavam amarradas em um nó frouxo na parte de trás da cabeça, e uma delicada fita vermelha era o único artigo que segurava os fios no lugar. Os olhos dela estavam mais ferozes do que nunca, ardendo de paixão ou de ódio quando se tratava dele, mas revê-la depois de tanto tempo saciou parte da necessidade dele depois de tantos anos.

Ele franziu a testa quando a perdeu de vista, queria que ela voltasse e lhe desse outro pito, mesmo que só para ver aquele pequeno nariz perfeito se erguer no ar.

— Era a Srta. Ava Knight? — disse seu amigo mais próximo, Lorde Arthur Duncannon, olhando para a entrada, na direção em que Ava havia desaparecido.

Ele era seu amigo a vida toda, e não perdia a chance de descobrir algo que poderia virar fofoca. Se parecia interessante e valesse um comentário, ele teria uma opinião.

— Sim. — disse Tate, voltando-se para a casa.

Ele não queria mais falar de Ava, tanto quanto não queria mencionar o fato de que seu coração não parecia capaz de

desacelerar no peito. Ou por que as palavras dela o cortaram como uma espada. Ela parecia zangada com ele, considerando que fora ela quem o rechaçou para costas estrangeiras.

Duncannon o alcançou.

— A mesma Ava que o abandonou? A mesma Ava Knight que administra o Haras ao lado?

Tate se virou para o amigo e esperava que Duncannon entendesse a dica de que uma conversa em que o assunto fosse Ava não seria possível.

— Diga-me, Sua Graça. Ou terei que descobrir de outra maneira.

— Você não vai. — disse ele em um tom que não deixava espaço para argumento. — Tudo o que precisa saber é que somos vizinhos e que, com certeza, não somos amigos. O passado não é mais que uma paixão tola de infância, e que está mais que enterrada da minha parte. E pela minha conversa com Ava agora, para ela também está.

Duncannon lançou um olhar incrédulo ao amigo, como se zombasse das palavras dele.

Tate se exaltou:

— O que foi agora, homem? O que essa sua mente minúscula está tramando agora?

O amigo sorriu.

— Pelo que pude observar de vocês, eu sugeriria que os sentimentos ainda existem por ambas as partes. Na verdade, me sinto confiante o bastante para dizer que, na verdade, vocês ainda se importam bastante um com o outro, e mais do que estão dispostos a admitir.

Tate manteve as mãos firmes na lateral do corpo.

— Eu não me importo com a senhorita Knight, e você precisa guardar suas opiniões para si a não ser que queira voltar correndo

para Londres, para morar com sua avó.

Duncannon levantou as mãos em derrota.

— Muito bem, não direi outra palavra. Mas me diga, o que ela queria discutir? Ela não parecia muito feliz ao ir embora.

Infeliz era um eufemismo para o que Ava estava sentindo. Ela estava com o demônio no corpo se ele a conhecia bem. Por vez, não havia outra pessoa no mundo que a conhecesse tão bem quanto ele.

No passado, depois de um desentendimento como esse que acabaram de ter, Ava teria voltado em alta velocidade para casa, remoendo cada palavra da briga. E, com bastante certeza, estaria amaldiçoando o nome dele e cuspindo fogo. Era natural que ele supusesse que ela estaria reagindo da mesma forma hoje. Ele meio que sorriu ao perceber isso.

— Algo bobo, sério. Ela havia feito um acordo com o Sr. Tuttle, que Titan receberia a égua dela, Black Lace. Quando comprei Titan, o acordo se tornou nulo. Ela pediu para manter o acordo, e eu recusei.

— Por quê? — Duncannon perguntou. — Não era parte dos seus planos? Que Titan procriasse além de correr? Por que não o fazer em conjunto de um dos melhores Haras da Inglaterra? Ela é proprietária do Haras Knight, não é?

Tate se virou para a casa mais uma vez.

— Sim. Ela herdou o local após a morte do pai, doze meses atrás.

— Então, qual é o problema?

O problema era que ele era um desgraçado teimoso que não queria dar a ela o que ela desejava. Nem mesmo quando ela foi tão educada no início. Revê-la excarcerou todos as mágoas pela rejeição dela. Por ela querer algo diferente, querer os livros em vez

o do amor dele. Que tipo de mulher recusava um futuro duque? Que mulher dava às costas para o amor que ele acreditava que eles sentiam um pelo outro? Que tipo de mulher poderia ser tão insensível com palavras de sentimentos e assuntos do coração?

Uma mulher que colocava sua própria ambição antes de qualquer outra coisa. E Tate faria o mesmo. Com Titan em seus estábulos, o garanhão era o primeiro passo na direção de se tornar uma verdadeira concorrência aos Knight, e iniciar seu próprio programa de reprodução e gerar futuros vencedores. Ele não daria a ela a oportunidade de vencê-lo outra vez, nem nos negócios, nem a nível pessoal.

— Eu mudei de ideia. — disse ele, dando de ombros.

— Mudou de ideia? Mesmo? A mim parece que você está tomando essa decisão com base no que aconteceu entre os dois anos atrás. Talvez você devesse aceitar a oferta, mas com a condição de que caso a égua desse a luz à um potro vencedor, você receberia metade dos lucros gerados em sua vida de corredor.

Tate virou-se para encará-lo.

— Ela nunca concordaria com tais termos. A oferta era para pagar para Titan receber a égua, ela não aceitaria a divisão de lucros.

— O haras produziu cinquenta vencedores nos últimos dez anos.

Você pode abocanhar uma fatia dos lucros. Se ela deseja que Titan seja usado no programa dela, ela precisa concordar. — Duncannon disse, as engrenagens da mente de negócios dele girando por um instante.

Duncannon era um homem astuto, e parte do que ele dizia fazia sentido. Sem dúvida ajudaria suas finanças ter uma égua que

gerasse um vencedor. E ter um cavalo junto ao Haras Knight decerto que o ajudaria a elevar o nome dele junto à comunidade do Turfe.

Ele refletiu a ideia por um momento.

Ava não ficaria satisfeita com esse desdobramento, e Tate sorriu ante a chance de irritá-la ainda mais. Mesmo que só para ver os olhos dela o fulminarem.

— Vou pensar no assunto. — ele disse antes de entrar na casa.

Pensaria em todas as maneiras de contar à Ava seus termos e observar aquela pequena diaba tornar-se ainda mais insatisfeita.

Tate afastou a ideia de que faria a contraoferta apenas para passar mais algum tempo perto dela.

Ela não merecia a atenção dele e, no entanto, ao entrar na biblioteca, de algum modo, seus passos mostraram-se mais leves do que antes.

Ele não conseguia adivinhar o motivo...

CAPÍTULO 3

Ao olhar para a paisagem francesa, muito parecida e diferente de onde crescemos, me pergunto se voltaremos a nos ver...

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

U MA SEMANA DEPOIS, Ava estava deitada na cama e olhava para o livro não lido no colo, pensando em um certo duque que havia sigo jogado na vida dela outra vez.

Apenas cinco quilômetros era o que os separava, e ainda assim não era longe o suficiente. Se ao menos um oceano os mantivesse separados, ela ficaria muito satisfeita. Após a conversa desastrosa na semana anterior, ela não vira nem ouvira falar dele. Não que ela ansiasse por notícias, mas houve um tempo em que ela não passava um dia sem estar perto dele. Se apenas para lhe dizer o quanto ela sentia falta dele e, talvez, uma fuga furtiva para trocar um beijo ou dois.

Gritos no quintal chamaram sua atenção e largando o livro na cama, ela correu para a janela. Ava olhou para os estábulos, que ela podia ver do quarto, mas não viu nada de errado. Os homens corriam em direção ao celeiro onde as carroças estavam guardadas e os ouviu gritando ordens para pegar sacos de juta e baldes, pavor a atravessou de que os estábulos localizados no lado oposto de sua casa pudessem estar em chamas.

Ava correu para o armário e, vestiu as roupas separadas para aquele dia, tropeçou entrando no quarto de vestir para procurar suas botas curtas quando viu um brilho laranja beijar o céu noturno. Um brilho vermelho e doentio vindo da direção da propriedade de Tate.

Ela parou por um momento, ainda atordoada com o que estava vendo. Seriam os estábulos ou a casa? Ava terminou de se vestir com pressa, calçando as botas sem meias. Desceu as escadas correndo, chamando os criados para segui-la e, em poucos minutos, aqueles que podiam cavalgar estavam em seu encalço, rumo à propriedade de Tate, os demais se dividiam entre carroças e carruagens de alta velocidade.

Quanto mais perto chegavam à propriedade ducal, mais intenso era o brilho no céu noturno e, ao espreitar a colina que ela havia percorrido apenas uma semana antes, seus piores medos tornaram-se realidade. Os estábulos estavam em chamas, e alguns homens lutavam contra o fogo, enquanto outros tentavam, como desesperados, arrancar a machadadas as paredes laterais da estrutura de madeira para libertar os cavalos.

Deixando os cavalos em um campo próximo, eles correram em direção ao fogo, o encarregado dos estábulos dela entregou um saco de juta para que ela ajudasse. O calor do fogo espreitou sua pele quando se aproximaram e, molhando a saca em uma calha próxima, ela começou a bater contra as chamas altas que lambiam a madeira de vários edifícios.

Os cavalos estavam correndo selvagens e assustados para a noite, e tudo o que ela podia esperar era que todos cavalos fossem poupados. Para ela, prédios poderiam queimar até virar pó, mas as vidas dos cavalos eram insubstituíveis.

Mais gritos soaram atrás dela. e ela girou naquela direção. Ela observou o segundo e maior estábulo pegando fogo, um monte de

palha dentro das portas duplas da frente fumegando, as chamas iluminando tudo. Ela fechou os olhos que já ardiam quando a fumaça soprou em seu rosto e os abriu de novo, ela não conseguiu identificar o homem que os notificou antes de correr em outra direção.

— O segundo estábulo. — ela gritou, correndo para lá.

De onde ela estava, Ava podia ver vários cavalos enfiando a cabeça sobre as portas das baias lá dentro, encarando o fogo, alguns outros corriam pelas baias, chutando as paredes.

Sem pensar, ela correu para dentro e se pôs a abrir as portas de cada baia o mais rápido que pudesse. Ela cobriu a boca com uma saca de juta, tropeçou e tateou ao longo das portas até encontrar a porta da segunda baia. Ela a destrancou também, o cavalo ali disparou e a empurrou para trás.

— Ava. — ela ouviu a voz familiar de Tate gritar, e ficando de joelhos, ela piscou enquanto seus olhos ardiam com a fumaça que enchia o espaço.

— Eu estou bem. Há mais cavalos aqui atrás. — disse ela, levantando-se e indo em direção aos sons aterrorizados dos animais.

Quando isso acabasse, ela diria ao duque que, para um estábulo ser seguro, tanto para animais quanto pessoas, os dois lados precisavam ter saídas. Um pensamento bobo naquele momento, mas que ainda assim cruzou sua mente. Ava soltou os dois últimos cavalos daquele lado e correu para o lado oposto, e no mesmo instante o duque a encontrou na última baia.

Ele forçou o trinco, mas não abria.

— Não abre. — ele gritou, tossindo. — Está trancado.

Ava se virou quando as chamas começaram a lamber as paredes das portas da baia oposta a eles. Olhando em volta, ela viu

um machado em uma parede próxima e, correndo até a ferramenta, a agarrou.

— Aqui! Tate, use isso.

Ele a encarou por um momento, como se uma segunda cabeça tivesse crescido no pescoço dela, até que um painel caiu detrás deles, e ele recobrasse os sentidos.

— Obrigado.

Ele bateu com o machado uma vez, duas vezes no trinco da porta e ela se soltou, permitindo que eles a abrissem e libertassem Titan. O garanhão disparou para fora e, quando estavam prestes a seguir o cavalo, a frente do estábulo caiu, prendendo-os dentro.

— Tate. — disse ela, apertando a camisa dele. — Existe uma janela ou porta neste lado?

Não que ela tivesse visto algo do gênero, mas enfim, os estábulos eram dele, talvez ela não tivesse visto em meio à fumaça e ao fogo.

— Não. — ele respondeu, puxando-a para uma baia próxima e fechando a porta.

Não que fosse capaz de manter o fogo longe, mas impediria que a palha em que estavam pisando pegasse fogo antes do necessário.

— Afaste-se, Ava. — disse ele, balançando o machado alto e o descendo na parede do estábulo.

A fumaça ficava cada vez mais espessa, e Ava foi para a parede, tentando respirar o ar que deslizava entre pequenas rachaduras nas tábuas de madeira. Do lado de fora, ela podia ouvir homens batendo na parede no mesmo local em que Tate a acertava. Ela tentou se concentrar na pequena quantidade de ar fresco que estava conseguindo inalar, mas o calor do fogo às suas costas fez o pânico assentar em seu estômago.

— Rápido, Tate. Não consigo respirar.

Um pedaço de madeira caiu na direção deles, depois mais pedaços, e com a intrusão dos homens que estavam do lado de fora, ar fresco também entrou. Infelizmente, esse ar apenas aumentou a ira do fogo detrás deles. As pernas dela se recusavam a se mover. Ela tentou rastejar para fora, mas seu corpo não cooperou.

— Ava. — disse Tate perto dela, antes de a erguer em seus braços familiares e reconfortantes.

Ela tossiu quando ele atravessou o buraco na parede, meio correndo e meio afastando-os do estábulo antes de cair no chão com ela nos braços.

Ela rolou no chão, tossindo e ofegando, e em algum momento alguém passou um copo de água para ela. Ava se virou e viu Tate deitado ao lado dela, ele também estava tentando recuperar o fôlego. Ela foi até ele e afastou os cabelos do rosto, esperando que ele encontrasse seus olhos.

— Você está bem? Se machucou em algum lugar?

Ele estendeu a mão, passando a mão pela bochecha dela. A ação trouxe lágrimas aos olhos dela por ele quase ter morrido.

Ambos quase morreram.

— Você parece um limpador de chaminés.

Ela riu apesar de si e da situação não ter nada de engraçado. —

Você está fazendo piadas, Sua Graça? Em um momento como esse... — ela disse, com a voz rouca, a respiração ofegante e com um chiado.

Ele lançou um sorriso travesso.

— Acredito que em momentos como este, é preciso um pouco de diversão.

Ele se forçou a sentar, e ela sentou ao lado dele. Eles ficaram em silêncio por um momento enquanto o estábulo ardia diante

deles, o primeiro estábulo que ela lutara para salvar agora não passava de uma pilha carbonizada de madeira fumegante.

O administrador do duque se aproximou deles, ajoelhando-se:

— Todos os cavalos e trabalhadores foram contabilizados, Sua Graça. Estão no cercado perto da casa. Estamos os alimentando para tentar acalmá-los.

O duque assentiu uma vez.

— Algum dos homens sabe como o incêndio começou? Não havia vento, não havia razão para o segundo estábulo ser consumido daquela forma.

Ava lembrou-se de ouvir gritos detrás dela quando tentava combater o fogo no primeiro estábulo, mas o rosto do homem era tão nebuloso quando sua visão neste momento.

— Pelo que vi, o fogo começou na palha que havia sido empilhada no centro do estábulo depois de limpar as baias. Ouvi gritos, como se alguém estivesse nos alertando sobre essa nova ameaça, mas não sei dizer quem era. Não pensa que foi proposital, pensa?

E se fosse esse o caso, onde estava o culpado?

Ela sentiu uma nova onda de pânico a atravessar.

Com todos os seus cavalariços aqui lutando contra as chamas na propriedade do duque, seus próprios cavalos estavam sozinhos, sem proteção. Ela se levantou, e o administrador de Tate a empurrou de volta, para se sentar.

— Seu encarregado e alguns cavalariços voltaram para a sua propriedade, senhorita Knight. Tenho certeza de que já teríamos notícias deles se algo estivesse errado.

Tate sentou-se ao lado dela, e ela o estudou por um momento, feliz por ver que ele parecia estar respirando com um pouco mais de facilidade.

— Teremos que abrigar os cavalos em algum lugar até que os estábulos sejam demolidos e reconstruídos. Eles não podem ficar nos campos.

O administrador dele encontrou o olhar dela e sem que ele precisasse verbalizar, ela sabia o que ele esperava dela.

— É claro que seus animais são bem-vindos em meus estábulos, Sua Graça. Há baias suficientes para eles. — ela ofereceu, nunca fora de se esquivar de ajudar quem precisava.

Mesmo que esse alguém fosse o duque, e que eles fossem quase o oposto de amigos. Mas os cavalos precisavam de um teto, e amando animais tanto quanto ela amava, não os deixaria no frio, mesmo que não estivesse tão gelado no momento.

— Tem certeza, Srta. Knight? São mais de vinte. — disse o administrador, olhando de volta para onde os cavalos estavam, e vendo o fogo queimar o que restava da construção que haviam acabado de sair.

Ava suspirou, observando os cavalos.

— É claro que todos eles são bem-vindos.

O duque estendeu a mão e colocou sobre a dela. Calor, semelhante ao calor que sentiu nas costas quando estava no estábulo em chamas, a preencheu, e com o toque veio uma saudade de que ele a tocasse assim mais vezes.

Ela olhou para onde ele havia deixado a mão e a vontade de colocar a dela por cima era quase demais para negar.

Ava encontrou o olhar dele.

— Obrigado. — disse ele, estudando-a.

Ela lançou um pequeno sorriso para ele e, ficando de pé, limpou as calças e a blusa o melhor que pôde com as mãos.

— Não creio que há muito mais que eu possa fazer por você aqui, então vou voltar para casa e informar o Sr. Brown que você

levará os cavalos para nosso estabelecimento pela manhã.

— Obrigado. — repetiu o duque, olhando para cima de onde estava sentado. — De verdade, Ava. Muito obrigado.

O administrador partiu para resolver outros assuntos.

Ava se virou para absorver a devastação do que havia acontecido esta noite. Homens ainda lutavam para domar o fogo, mesmo que ele tivesse destruído tudo em seu caminho. A fumaça permeava o ar, todos ao redor deles cobertos de cinzas e fuligem, algumas roupas chamuscadas pelas chamas.

— Não importa o que tenha acontecido entre nós, Sua Graça, nunca darei as costas a alguém que precisa de ajuda.

Ava se virou e voltou para onde ela havia deixado a montaria dela, esperando que o cavalo ainda estivesse lá depois de toda a comoção. Muitos cavalos, aqueles que não estavam sendo diretamente cuidados, corriam pela área, os rabos erguidos no ar, era claro que estavam assustados e inquietos.

As pobres almas eram sortudas de estarem vivas, e se o incêndio era criminoso, significaria que todos em Berkshire era possíveis vítimas e precisariam ficar atentos. Ela havia trabalhado muito, já havia perdido muito em sua vida para que tudo virasse cinzas por um maníaco. E ela nunca iria se deixar abater sem lutar.

CAPÍTULO 4

N O DIA SEGUINTE, Ava acordou cedo, mesmo com a noite que tivera. Alguns minutos depois do café-da-manhã, os cavalos da propriedade do duque começaram a chegar junto com seus cavalariços e treinadores que ficariam e ajudariam a cuidar de todos os cavalos, com alimentação e exercícios diários.

Felizmente, no Haras Knight, Ava contava com seu próprio circuito, a uma distância de cinco minutos, onde os cavalos poderiam dar uma volta ou correr um pouco.

Ela estava sentada na cerca de madeira que dava para o pátio em que sua égua reprodutora, Black Lace, estava sendo laçada. Ela era um cavalo bonito, com o pelo cor de ébano e patas felpudas brancas. Esperava-se que ela também gerasse lindos potros.

A égua era de uma bela linhagem, mas o animal em si não teve bons tempos nas poucas corridas em que participou, portanto, Ava esperava que a égua gerasse um potro que pudesse ter a chance de ser um bom corredor.

O pai e a mãe de Black Lace tiveram carreiras mistas antes que os dois se aposentassem, e Ava os colocasse em seu programa reprodutor. Eles conseguiram gerar um primeiro lugar, mas a maioria chegou a segundos e terceiros lugares em suas participações, nada extraordinário, mas nada terrível. Tal histórico não significava que os potros de Black Lace teriam o mesmo destino.

Se ela quisesse que seu Haras sobrevivesse, ela teria que experimentar, tentar expandir e testar as teorias de criação. Uma carta deixada por seu pai com seus últimos desejos pedira que ela mantivesse o negócio vivo, que prosseguisse com os planos para

tornar este um dos Centros mais prestigiados e admirados do país.

Essa promessa nem sempre foi fácil de ser cumprida, e houve momentos em que ela foi excluída das chamadas para corridas, ou seus cavalos foram ignorados como opções para procriação pelo simples fato de que ela era uma mulher, mas isso não a impediu. Só a deixou mais determinada a ter sucesso, e agora nada ficaria no caminho de tornar o Haras Knight uma força a ser reconhecida. Um nome a ser tão reconhecido como Tattersalls, ao menos no que se refere ao mercado de cavalos premiados.

Em um passado distante ela quis construir uma vida com Tate, deixar a vida aqui para trás, mas nunca quis deixar o mundo das corridas por completo. Tate e ela queriam ter seu próprio estabelecimento, tornarem-se confiáveis e procurados por eles mesmos. A morte de seu pai lhe ofereceu a chance de assumir esse papel, mesmo sendo uma mulher e solteira.

Ela não deixaria a Sociedade e suas opiniões e protocolos se colocassem em seu caminho; e não se casaria apenas para tornar sua posição no Haras mais aceitável, mais respeitável no mundo dominado por homens em que ela estava inserida.

Ava olhou para os estábulos e ficou feliz em ver que cavalariços e os tratadores pareciam tratar-se bem, mas mesmo a partir de onde estava ela percebia que estavam cansados e precisavam de uma boa noite de descanso ininterrupta por desastres.

— O duque está chegando, senhorita Knight, e traz Titan com ele. — disse o administrador de seus estábulos ao parar onde ela estava.

Protegendo os olhos com as mãos, Ava olhou para a colina que o duque estava descendo. Mesmo com todos os anos desde a última vez que o vira, sua estrutura muscular sobre um cavalo ainda era um espetáculo à parte, um ótimo de se assistir. Os anos haviam

feito um bem imenso a ele, transformaram o menino que ela conheceu em um homem. Um homem que ela concordava com relutância ainda ser tão bonito que era pecaminoso.

Ava pensou na noite anterior, neles deitados no chão depois de escapar do fogo, o deslizar da mão dele contra sua bochecha enquanto ele verificava se ela estava bem. O olhar que ele deu a ela havia congelado o tempo, suspendido todas as mágoas que ele causara, e tudo o que importava naquele momento para ela, era saber se ele estava bem, sem ferimentos.

Ela estendeu a mão e tocou a própria bochecha, incapaz de negar que o toque dele a fez ansiar por coisas há muito enterradas.

Ele fora tão cuidadoso, tão gentil e delicado que ela não foi capaz de esconder como ele sempre foi capaz de fazê-la sentir.

Viva...

Teria ele notado o desejo dela? Só podia esperar que, no caos da noite que passaram, não fosse esse o caso.

— Coloque Titan no estábulo oeste. As baias lá são maiores, adequadas ao porte dele. Ele ficará mais confortável lá.

— É para já, senhorita. — disse Greg, dirigindo-se ao duque que havia parado e estava conversando com o pessoal dela e dele perto de uma calha.

Ele olhou para ela e assentiu em reconhecimento, e Ava fez o mesmo antes de voltar a olhar para a égua, que continuava a ser treinada no laço.

Ela supôs que teria que ir falar com ele e discutir os arranjos para ele dormir lá enquanto seus cavalos estivessem na propriedade dela. Conhecendo tão bem o duque, ela não acreditava que ele voltaria para casa sozinho. Não que ela pudesse oferecer uma cama sob o teto dela, sendo solteira e não tendo companhia.

Mas havia uma cabana que ela havia reformado no ano anterior,

que ficava perto do riacho natural da propriedade e não ficava longe dos estábulos.

O duque poderia ficar lá e, sendo assim, estar perto o suficiente para ficar de olho em seus cavalos e na continuação do treinamento dos animais enquanto seus próprios estábulos eram reconstruídos.

— Banhe Black Lace após o treino e certifique-se de que ela receba uma boa massagem. Acho que ela merece ganhar aveia esta noite. — o tratador mergulhou o chapéu e pôs-se a trotar com Black Lace.

Ava pulou e foi em direção aos estábulos a oeste.

Estava na hora de discutirem como fariam dali para frente, agora que o duque estava ali. Quando ela enfim chegou aos estábulos, o duque e Titan haviam desaparecido construção adentro. Ela entrou e foi até a baia onde Titan havia sido instalado, deu um tapinha no garanhão quando ele se aproximou dela e cutucou sua mão.

— Ele gosta de você. — disse o duque, parando ao lado dela, com um maço de feno na mão. Ele passou o braço por cima da porta da baia e depositou o feno na calha de alimentação. Com comida à disposição, Titan a deixou e foi mordiscar o feno.

— Ele é um cavalo bonito e amoroso, pelo que parece. Mimado, talvez. — disse ela, sorrindo para o duque que sorriu de volta.

Ó, como ela sentiu falta daquele sorriso...

— Eu o mimo, e ele estava bem em casa, ao menos até o incêndio. Não sei ao certo que tipo de problemas podemos ter, daqui para frente, com os cavalos ainda assustados pela noite passada.

Algumas éguas podem abortar.

Ava assentiu, sabendo muito bem que os cavalos podiam ficar bem assustados após um evento tão traumático. Ela só podia esperar que não fosse o caso de nenhum dos cavalos do duque.

— Eles logo se acomodam e saberão que estão bastante seguros aqui, e eu instruí meus cavalariços e tratadores a se revezarem na observação dos estábulos e celeiros da propriedade.

— Mandei chamar um agente de Bow Street para investigar o incêndio. Não consigo evitar de pensar que foi proposital.

Ava recordou-se do homem que ouviu gritar, notificando-os do outro foco de incêndio. Seria ele, o homem que começou tal destruição e, se sim, por quê? Por que alguém desejaria ferir cavalos que estavam trancados em baias e indefesos contra tais ações?

— Você tem alguma ideia de quem pode querer ferir você e seus cavalos? Se envolveu em alguma discussão recente? — ela perguntou, encontrando seu olhar.

O duque lançou um olhar divertido para ela.

— Além de você, ninguém.

Ela deu uma risada ante a tentativa de piada e estendeu a mão para dar carinho a Titan.

— Bem, você sabe que eu nunca faria uma coisa dessas, então outra pessoa guarda ressentimento contra você, Sua Graça. Você precisa descobrir quem.

— Hm. — ele disse, virando-se contra a porta e cruzando os braços contra o peito.

Ela olhou para o cavalo, pois a ação apenas acentuava os músculos no peito de Tate. Ah, sim, ele havia mudado e, para ainda mais delicioso.

— Eu precisei demitir um rapaz que trabalhava nos estábulos porque havia tentado se engraçar com uma das criadas da casa, vinha assediando a moça e tentou obter liberdades indesejadas.

Suponho que poderia ser ele, mas não o vi, nem ouvi nada acerca

de ele ainda estar em Berkshire, trabalhando em outro lugar, então duvido que isso seja uma pista.

— Se eu fosse você diria ao investigador assim mesmo, deixe que ele julgue as pistas. Nesse ramo, podemos ser civilizados e agir como se a corrida fosse um esporte de cavalheiros, mas, na verdade, todos temos muitos inimigos, sendo o ciúme o principal.

Lorde Oakes passou pela mente de Ava ante a palavra ciúmes e, na mesma hora, descartou a noção de que ele poderia estar envolvido.

Ele não ousaria.

— Neste caso eu teria pensado que seus estábulos estariam em maior perigo que os meus. Seus cavalos ganharam mais prêmios nos últimos eventos. Eu temi, enquanto todos lutavam para apagar o fogo em Cleremore Hall, que o seu sustento pudesse estar em risco.

Era um medo que Ava também sentiu, mas felizmente seus estábulos e cavalos estavam bem quando ela e seus homens voltaram. Pensar em perder os animais que tanto amava, que haviam sido sua companhia e salvação durante o enfrentamento de tantos problemas em sua vida, a enchia de pavor.

Se o que o duque dizia era verdade, precisavam encontrar o culpado e trancafiá-lo em uma cela onde não poderia machucar homem ou animal nenhum.

— Quando vi o brilho do fogo em sua propriedade, nem pensei em deixar alguém aqui para vigiar meus cavalos. Um erro tolo que não voltarei a cometer. Estamos muito agradecidos por ninguém daqui ter sido colocado em perigo. E estamos felizes que seus cavalos também estejam aqui. A estada me dará tempo de convencê-lo a permitir que Titan procrie com Black Lace.

À menção de seu nome, o garanhão levantou a cabeça e olhou na direção deles.

Ava riu, estendendo a mão para dar um tapinha no nariz aveludado e macio do cavalo.

— Que travesso você é. — ela murmurou para o cavalo, olhando de esguelha para o duque que estava parado ali ainda.

— Me esqueci disso. — ele a observou com atenção, e Ava lutou para não cruzar com o olhar dele.

Para não se arriscar a perder-se mais uma vez naquelas orbes cinzentas e escuras que eram como um mar tempestuoso e rodopiante.

— Esqueceu-se de quê, Sua Graça? — ela não deveria perguntar, mas quando se tratava do duque, era raro ela conseguir se conter.

Como uma mariposa atraída para a parte mais quente da chama, ela também era atraída a qualquer opinião que ele pudesse ter que envolvesse os dois. Que envolvesse o passado compartilhado, quando lutar um pelo outro era tudo o que era valoroso.

— Como você era com cavalos. O quanto você os ama.

— Eu os adoro. — ela suspirou, afastando-se da baia. — Mas não são a única coisa que amei.

— Ainda lê romances góticos e se esgueira no meio da noite para contar as estrelas? — ele perguntou sorrindo.

Ela sentiu-se esquentar, um calor reconfortante e familiar, de que o homem à sua frente a conhecia, melhor do que qualquer outra pessoa no mundo.

— É claro, embora eu não precise mais sair às escondidas, só preciso abrir a porta da frente.

— Verdade. — disse ele, olhando para o céu azul acima deles.

— Lembra-se das vezes que nos encontrávamos perto do lago em minha propriedade, na calada da noite. Você estava tão

determinado a desenhar a lua cheia que quase congelei até a morte esperando que você a desenhasse.

— Quero que você saiba que meu pai, mesmo que nunca tenha me questionado sobre como um esboço daquele veio parar nas minhas mãos, gostava muito do desenho. Ele até o enquadrou. Está pendurado na biblioteca.

Ava suspirou, pensando naquela noite. Foi a primeira vez que eles se beijaram, não como conhecidos, nem como amigos. Mas como amantes, como um casal que ansiava por mais do que mera familiaridade.

Encontrando o olhar do duque, o fogo que ela leu nos olhos dele dizia que ele se lembrava daquela noite tão bem quanto ela.

Ava limpou a garganta.

— Talvez devêssemos discutir o que fará agora que todos os seus cavalos estão aqui. Há um chalé que reformei há pouco, é separado da residência dos funcionários, mas ainda é perto o bastante para ver os pátios, os celeiros e os estábulos, se você quiser. Eu o convidaria para ficar na casa principal, mas bem, você sabe que não seria nada adequado.

Os olhos dele escureceram ante a menção da palavra adequado e o significado escondido nela.

— É aquele chalé antigo em que sua cozinheira, a Sra. Gill costumava morar?

— Sim, esse mesmo. Ela deixou de trabalhar conosco faz uns anos, e a nova cozinheira preferiu ficar na casa principal. — ela foi em direção às portas do estábulo. — Venha, vou levá-lo até lá agora e aí você decide se servirá.

Eles caminharam através dos quintais, atravessaram o prado que ficava nos fundos da casa dela, e logo chegaram ao pequeno

chalé que ficava em frente ao riacho. Ava se virou e gesticulou em direção à vista.

— Daqui é possível ver toda a extensão da propriedade com exceção da frente da casa principal.

Ele assimilou a informação e assentiu.

— Me servirá muito bem. — ele voltou-se para ela. — O que aconteceu com a Sra. Gill. Eu sempre gostei tanto dos...

— Biscoitos amanteigados? — Ava respondeu por ele. — Sim, eu me lembro. — ignorando a familiaridade entre eles, ela abriu a porta do chalé e entrou na casa de três cômodos. — A filha dela, que trabalhava para uma família em Kent, casou-se com um padeiro e a chamou para morar com eles. A Sra. Gill viveu com a filha por mais ou menos dois anos, mas adoeceu no outono passado e, por infortúnio, veio a falecer.

— Sinto muito por ouvir isso. Ela era uma mulher adorável, muito apreciada pela equipe, pelo que me lembro.

Ava sorriu, rememorando.

— Ela era adorável e faz muita falta. Creio que os doces feitos por aqui jamais tiveram o gosto tão bom quanto os dela.

O duque entrou e inspecionou a cozinha modesta, o quarto e o banheiro da suíte. Ava o analisou por um breve instante, havia se esquecido como se conheciam bem. Da quantidade de tempo que eles passaram na companhia um do outro ao longo dos anos.

O chalé estava em ótimo estado, o piso era de madeira, havia um grande tapete trançado embaixo da pequena mesa colocada perto do fogo. No quarto havia uma grande cama sem estar arrumada, o cômodo contava com uma pequena janela que estava ornada com cortinas de veludo azul. O banheiro era composto de um jarro e uma tigela, um lavatório, um pequena banheira e um penico que estava no chão.

— Servirá muito bem, obrigado.

— Pedirei que as criadas venham e façam a cama todos os dias, além de trazer sempre roupa de cama e água limpa. É claro que não precisa comer aqui, é mais que bem-vindo para fazer o desjejum e jantar comigo na casa principal.

Ava não conseguia identificar de onde vinha seu fracasso em deixá-lo afastado e sozinho. O duque não se encaixava nos seus planos para o futuro. Durante anos, ela se educou para seguir em frente, para não precisar da opinião ou apoio dele. Inalar fogo e fumaça havia causado claros estragos ao seu cérebro.

Ava fechou a boca com um estalo e se ocupou em inspecionar o forno. Ela estava sendo muito gentil com o duque, e eles estavam longe de estar de bem. Por que ela estava se esforçando para agradá-lo? Uma vozinha terrível sussurrou: “porque ainda se importa com ele, mesmo depois de todo esse tempo e de toda a dor que ele causara.” Fazendo uma última inspeção nas acomodações, ela foi em direção à porta.

— Vou deixá-lo descansar. — disse ela, não dando um passo antes que ele segurasse em seu braço, detendo-a.

— Obrigado, Ava, não apenas por acolher meus cavalos ou me dar permissão para usar esta casa, mas pela noite passada. Por vir em meu auxílio, por não sair do meu lado ou dos meus cavalos, quando ao ficar, você se colocou em grande perigo. Não me esquecerei de sua bondade.

Ela se afastou do toque dele, não gostando do fato de que seu corpo se recusava a permanecer indiferente a ele e a seu toque. Se eles iam permanecer na mesma propriedade por algumas semanas, era melhor ela começar a aprender a conviver com o duque e a não mostrar suas emoções como um livro aberto esperando para ser lido.

— Não foi nada, Sua Graça. Nada que você não faria por mim, tenho certeza.

Ela caminhou para casa, precisava se afastar da expressão de devoção que estava escrita em todo o rosto dele. A última coisa que ela precisava era que ele começasse a olhá-la dessa maneira. Do mesmo jeito que ele costumava quando eram jovens.

TATE SE ENCOSTOU no batente da porta do chalé enquanto Ava voltava para casa. O fato de ela estar usando calças e não um vestido, deu a ele a oportunidade perfeita para admirá-la por trás.

Ele fechou os punhos ao lado do corpo, quando a saudade pelo que foi perdido o dominou como se ele estivesse mergulhado em água.

Se ele tivesse ficado, se ela não o tivesse rejeitado no passado, eles estariam casados. Talvez até já fossem pais e seus filhos estivessem aprendendo tudo para assumir o papel de grande força no mundo das corridas.

O papel que eles criariam juntos contando apenas um com o outro. Teriam um filho que herdaria o título e, se fossem abençoados, uma filha que seria tão selvagem e incontrolável quanto a mãe.

Ele fechou a porta e se encostou nela.

Ele não precisava ficar na propriedade dos Knight, mas voltar para casa não era nada atraente para ele. Seus cavalos estavam aqui, e ele poderia pedir ao administrador dele que enviasse para cá os documentos que precisassem de sua atenção. Caso o que seu Chefe dos Estábulos havia dito mais cedo fosse verdade, e as evidências que encontraram nos escombros se mostrassem corretas, havia um incendiário em fuga.

Era melhor que ele estivesse perto de Ava, caso ela fosse a próxima vítima do demônio. Seu administrador cuidaria de Cleremore Hall até que os estábulos fossem reconstruídos e ele pudesse retornar. A verdade era que ele estava aqui na casa de Ava porque era onde ela estava, e agora que eles ao menos conseguiam trocar algumas palavras em paz, ele se via relutante em se afastar.

Ela sempre teve a capacidade de atraí-lo.

Fazer com que ele desejasse até mesmo a simplicidade de ouvir a voz dela ou vê-la ao longe, em um campo. Tate se afastou da porta e a abriu, precisava orientar o condutor dele acerca de onde levar suas malas. Pelo menos, essa tarefa manteria sua mente ocupada por um tempo em vez de se manter tão obcecado por uma mulher que arrancou seu coração do peito no que parecia tão recente quanto ontem.

Não tenho esperanças de que possamos ser outra coisa senão conhecidos no futuro, mas sei que sempre me importarei você. Você era meu amigo e sempre fará parte de mim. — Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

CAPÍTULO 5

Não tenho esperanças de que possamos ser outra coisa senão conhecidos no futuro, mas sei que sempre me importarei você. Você era meu amigo e sempre fará parte de mim.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

O MÊS SEGUINTE manteve todos ocupados tanto na propriedade de Ava e na reconstrução dos estábulos do duque em sua propriedade. Algumas vezes, Tate pediu a ela uma opinião sobre o layout e o design das novas baias e estábulos, e juntos eles criaram o que seriam soluções modernas e práticas para quaisquer problemas que ocorreram no passado.

E o mais importante, os estábulos eram de tijolo em vez de madeira e todos seriam construídos com uma segunda porta de acesso, para evitar situações de bloqueio como aconteceu no incêndio.

Ava sentou-se atrás de sua mesa na biblioteca e recostou-se na cadeira, olhando para o jardim. O dia havia começado com prenúncio de tempestade e, portanto, muitas das atividades que ela havia planejado para o dia foram adiadas para o dia seguinte.

Ela levantou-se e caminhou até a janela e olhou para o pequeno chalé que o duque adotara como lar nas últimas semanas. Na maioria das noites, ele vinha jantar com ela e, infelizmente, a cada noite, Ava era lembrada de como poderiam ter sido. Do que ela

havia perdido quando Tate escolheu um caminho diferente daquele que eles haviam planejado.

Em nenhum momento os dois conversaram acerca do que houve entre os dois. Na verdade, ambos pareciam ter o cuidado de nunca trazer à tona o passado. Ela não mencionava a França, e ele não mencionava Nova York. Não era surpresa que eles não iriam poder continuar dessa maneira. Era claro que havia um tabu a ser discutido. Ava, em especial, precisava saber o porquê. Por que ele mentiu, por que não a amara como ela acreditava que ele a amava.

Precisava saber como ele chegara à conclusão de que, depois de todo o tempo que passaram juntos, uma carta destruindo seus sonhos era tudo o que ela merecia. Uma carta entregue ao pai dela, e não à ela.

Por que ele não fora capaz de dizer ele mesmo?

Com a chuva batendo contra a vidraça, o pequeno brilho da luz de velas no chalé estava embaçado, uma pequena nuvem de fumaça flutuava para o céu pela chaminé. O jantar não estava muito longe, e ele viria...

Ela se virou e foi para o quarto, banhou-se depressa e depois se vestiria com a ajuda de sua dama de companhia. Na maioria dos dias ela usava calças masculinas e prestava pouca atenção aos cabelos ou mesmo se as botas estavam limpas. Mas esta noite ela resolvera usar um dos vestidos novos que encomendara durante uma visita à Londres no mês anterior, viagem feita para garantir que seu administrador comprasse um potro que ela queria.

Madame Lanchester a recebera sem problemas e suas habilidades como costureira eram melhores do que Ava esperava.

Ao longo dos anos em que estiveram separados, Ava chegou a cogitar, mais de uma vez, que a razão para o duque não ir em frente com os planos deles foi porque ela era muito rude, sem uma

educação apropriada. Que ela não havia estudado o suficiente, ou não conhecia o bastante das artes como a maioria das damas da sociedade que se tornavam duquesas.

Durante meses, ela ficava acordada à noite, imaginando se o uso de calças e chapéus de palha fora de moda o haviam feito desistir dela. Quem com o tempo ele percebeu que ela nunca seria uma boa duquesa.

O que era perfeitamente correto, ela não seria, pelo menos não agora, muita coisa havia acontecido nos cinco anos desde que eles se separaram. Com certeza ela não era do feitio para um ducado agora, mas isso não significava que ela não poderia de vestir bem e mostrar ao duque que as pessoas precisam olhar além da camada exterior, que é necessário valorizar o que se tem por dentro. Talvez ele se esquecera do que havia visto nela.

Ava se olhou no espelho. A camisola de musselina bordada era simplesmente a roupa íntima mais bonita que ela possuía e era quase bonita demais para se cobrir com um vestido.

— Srta. Ava, que vestido você gostaria de usar? — a criada abriu o armário e começou a inspecionar os poucos vestidos que ela possuía.

— O de seda bronze com rendas e bordas de pérolas, e eu gostaria que você, por favor, penteasse meus cabelos em cachos macios no topo da cabeça, Jane, se for possível.

A moça sorriu, ocupando-se da preparação do vestido.

— Ó, você ficará linda esta noite, senhorita Ava. Além disso, eu tenho praticado alguns penteados franceses para usar em seus cabelos. Vai ficar muito bonito junto do vestido.

E Ava precisava admitir, ao olhar de relance para o vestido deitado em sua cama, que o decote era bem baixo. Uma delicada fita de um tom mais claro de bronze passava por baixo da linha dos

seios, e um delicado padrão de flor de lis em renda e pérolas traçava toda a bainha.

— Obrigada, Jane. — Ava sorriu para a criada, ansiosa para a noite começar.

Durante a hora seguinte, Jane mexeu nos cabelos de Ava, puxando-os de forma estilosa, não era o jeito simples e usual de amarrar tudo com uma fita. E então ela estava pronta.

O som de vozes masculinas vinha do andar de baixo, e Ava trocou um olhar com a criada.

— Vou descer, Srta. Ava, e dizer à equipe da cozinha para começar a servir assim que a senhorita chegar ao andar de baixo.

— Obrigada, Jane. — Ava voltou-se para o espelho e estudou a própria aparência.

A criada fizera maravilhas com os cabelos dela e, de alguma forma, a mulher que treinava cavalos de corrida, usava calças e limpava estábulos ao lado dos funcionários desapareceu. Em seu lugar, havia uma mulher que era a dona de sua própria vida no reflexo.

Tate partira o coração dela, mas não seu espírito. E o diabinho nela queria mostrar o que ele havia perdido. O que ele nunca mais teria.

Piscando para voltar para o presente, ela sorriu e virou-se para sair, pegou o xale e o colocou sobre os ombros. O vestido ondulou em torno dela, frio e macio, e ela teve a sensação esmagadora de estar quase nua.

Fazia muito tempo desde que ela havia participado de um baile, festa ou mesmo um jantar mais formal. Quando em casa, ela nunca seguia as regras estritas da sociedade, o que a fez supor que esta poderia ser uma das razões pelas quais Tate fugira para os Estados Unidos em vez de se casar com ela. Ava verificou o vestido

enquanto descia as escadas, e seus passos vacilaram ao ver que Tate a esperava lá embaixo.

O homem que usou calças bege e camisas sujas na última semana havia sumido. O homem; que exercitava os cavalos e ajudava a construir os novos estábulos, além de percorrer as duas propriedades todos os dias para estar a par de tudo o que precisava saber, não estava ali. O homem empoeirado, amarrotado ou cheio de lama, dependendo do clima inglês, desaparecera.

Diante dela estava um duque.

O garoto que ela amara e o homem que ela passou a respeitar de várias maneiras. As calças de pele de gamo e botas pretas e brilhantes até o joelho, o colete prateado, a camisa engomada e o lenço encaixado à perfeição.

Bem, o vocabulário dela desapareceu por um instante.

Ela nunca pensou que ele pudesse se tornar mais atraente do que naquele momento. Ela o imaginara vestido assim quando fantasiava o casamento deles em Gretna Green, antes de ele partir para a América.

Ela afastou a lembrança, não queria estragar seu humor. Desceu o último degrau, e ele baixou a cabeça em um pequeno cumprimento, mas ela não deixou de notar o lampejo de consciência que passou pelos olhos dele. Ele também gostava do que via? Teria se arrependido da escolha que fizera? Ela nutria uma pequena esperança de que sim.

TATE APROVEITOU a oportunidade, enquanto se curvava para Ava, para trazer indiferença aos próprios traços e não mostrar o que ele realmente sentia toda vez que via a mulher diante dele. O desejo

avassalador de cair de joelhos e pedir que ela dissesse por que se afastara do amor dele há tantos anos.

Ela não havia se casado, o que era a primeira razão para afastá-

lo que ele imaginou que ouviria ao chegar dos Estados Unidos, mas nenhuma notícia parecida havia chegado o que apenas o deixou mais inquieto para descobrir a verdade. Por que ela não o amava mais? Por que ela enviou a ele aquela carta fria e insensível na noite anterior à fuga deles?

Os pais dele não disseram muito além de informar que ela havia partido para estudar fora e que parecia gostar muitíssimo do aprendizado, que ela não sentia falta de casa, nem daqueles que deixou para trás. A mudança de caráter havia sido tão extrema e distante da Ava que ele conhecia que ele até considerou a possibilidade de que não fosse verdade. As pessoas poderiam mesmo ser tão falsas?

Ele fez um gesto para que ela tomasse seu braço, para levá-la até a sala de jantar. O cheiro inebriante de rosas permeava o ar e o deixou saudoso pelo passado.

Ele fechou os olhos por um momento para se recompor. Como um perfume poderia trazer de volta tantas memórias ele nunca entenderia, mas era a verdade.

Ela se sentou à mesa, e ele assimilou o vestido de seda adornado com rendas e fios de ouro. Era um modelo do auge da moda, e a silhueta dela mostrava-se mais do que agradável dentro dele. O corpo de uma menina havia dado lugar à uma mulher plena de feminilidade. Sentada em frente a ele estava uma mulher que agradaria até o mais rico dos homens.

Seus longos cachos castanhos avermelhados foram puxados para trás em um delicado penteado que acentuava seus ombros e pescoço perfeitos. Os olhos dela, grandes e claros, brilhavam de

prazer e os lábios brilhavam com o toque bem suave de ruge, um sorriso brincava ali. Esta noite, Aera uma visão de mulher feminina e de curvas suaves, de inferno e danação.

Ela estava linda.

Um lacaio próximo serviu taças de vinho e, sentando-se onde lhe era designado, Tate esperou o primeiro prato ser servido. Ava se ajeitou, colocando o guardanapo no colo antes de encontrar o olhar dele do outro lado da bela mesa de mogno polido.

— Obrigada por vir estar noite, não estava certa de que viria hoje devido ao clima tempestuoso... — ela se interrompeu quando a sopa de legumes, quente e fumegante, foi colocada diante deles.

— Não me importo de caminhar, embora agradeça a carruagem que o Sr. Brown me enviou esta noite por causa da chuva. Mesmo sendo uma curta distância, a viagem foi bem menos úmida para os pés.

Tate quase revirou os olhos ante a banalidade da conversa.

Houve um tempo em que eles compartilhariam todos os tipos de pensamentos, sonhos e desejos. O fato de terem se perdido, perdido um ao outro, o enlouquecia.

Ele franziu a testa, virando-se para um dos criados.

— Vinho para nós dois. Obrigado.

O jovem fez uma reverência, e cumpriu as ordens com rapidez:

— Sim, Sua Graça.

Tate esperou que o vinho fosse servido.

— Chamaremos quando estivermos prontos para o próximo prato. Obrigado. — ele disse ele aos demais criados, e não falou mais até que todos corressem para fora da sala, e ele e Ava estivessem sozinhos.

Enfim...

— Há algo que eu gostaria de discutir com você, Ava, e talvez seja melhor que estejamos sozinhos para tal. E me perdoe, mas estou ansioso para saber algo que me incomoda há algum tempo.

Ela olhou para ele com olhos arregalados e baixou a taça de vinho depois de tomar um gole.

— Claro. O que precisa?

Ele se recostou na cadeira e ficou mexendo a colher na sopa sem atentar-se à refeição. Depois de um tempo, ele se forçou a dizer as palavras que estavam trancafiadas dentro dele há muitos anos.

— Por que você não fugiu comigo?

Ela baixou a colher, o rosto pálido.

— Por que eu não fugi com você? — ela riu, o som zombeteiro.

— Você está mesmo me fazendo essa pergunta?

Ele assentiu uma única vez.

— Por quê?

Ava o estudou por um momento, e ele pôde vê-la tentando entender por que ele fazia essa pergunta depois de todos esses anos. Mas se ele não soubesse a verdade por trás da decisão dela, e continuaria se sentindo como um louco.

— Eu saí de casa no meio da noite e fui para a nossa árvore.

Você não estava lá, mas meu pai sim. Ele me informou que você havia partido para Londres, que embarcaria de lá para os Estados Unidos. Ele contou que você havia me escrito e desistido, que dissera que acreditava que eu havia entendido errado nosso convívio. Que eu esperava uma conexão que nunca poderia acontecer, porque você era herdeiro de um ducado, e que nós não éramos uma família com conexões ou nobreza.

Um soco no estômago teria causado menos dor.

Tate pensou naquela noite e na situação que levou seus pais a entrar no quarto. Ele havia feito as malas cinco minutos antes e ficou agradecido por não terem visto a pequena maleta que estava em seu quarto de vestir. A mãe dele sentou-se na cadeira de couro diante da lareira, a que ele costumava usar para ler, o pai ficou parado atrás dela.

Tate enfiou a mão no bolso do paletó e tirou a carta que ele havia recuperado mais cedo naquele dia, na propriedade ducal, a carta que os pais haviam entregado a ele. Ele estava determinado a descobrir o motivo por trás da separação. Ele a entregou a Ava, e ela estendeu a mão para pegá-la sem questionar a ação e a desdobrou para ler.

Horror cruzou suas feições.

— Eu... é.... — ela mordeu o lábio ao chegar ao fim do bilhete. —

Eu não escrevi isso, Tate. — ela olhou para ele, choque dominava seu rosto bonito. — Nossos pais devem ter trabalhado juntos para nos separar. Meu pai... — ela fez uma pausa, com os olhos cheios de lágrimas. — Não acredito que ele me magoaria dessa maneira.

— por um momento, eles se entreolharam em silêncio antes de ela dizer: — Só posso deduzir disso que a carta que seu pai nos enviou em seu nome também não foi escrita por você. — ela redobrou a carta, deslizando-a sobre a mesa para ele. — Não trouxe a carta do seu pai comigo, mas eu a guardei. Mostrarei para você amanhã.

— Preciso vê-la agora. — ele exigiu, empurrando a cadeira ao ficar de pé.

Ele deu a volta na mesa e ajudou Ava a se levantar e, pegando a mão dela, puxou-a em direção à porta da sala de jantar. Fazia anos desde a última vez que ele a tocara daquela forma. Ter a mão enluvada dela envolta pela mão dele o fez recordar do que sentiu ao ter que suportar a ideia de que ela não o queria.

Uma mentira que ele agora acreditava com todas as suas forças que fora arquitetada pelos pais dos dois. Uma mentira que ele desvendaria. Viajaria para Londres e pediria à mãe que explicasse suas ações desprezíveis.

Ele abriu a porta e os criados, que esperavam por instruções se assustaram, ficando de pé atentos.

Ela não o desprezou.

Será que ela havia ficado tão desolada quanto ele por todos esses anos? A lembrança de como ele tentara esquecê-la. As muitas mulheres com quem ele dormira, as que ele mantinha de prontidão para saciar seus desejos, todas eram uma distração para um coração que clamava por uma mulher que acreditava estar perdida para ele. Como ele se redimiria...?

Entrando no corredor, eles subiram as escadas às pressas. Tate ignorou os olhares chocados e inquisitivos dos funcionários que assistiam a uma mulher solteira levar um duque para seus aposentos particulares.

Ele não dava a mínima para quais regras ele estava quebrando.

A raiva que zumbia em suas veias naquele mesmo minuto, por tudo o que seus pais haviam feito, afastou qualquer pensamento de certo e errado.

Ela parou à porta de um cômodo no final do corredor e, lançando um olhar nervoso para ele, entrou.

Tate encostou-se no batente da porta, não disposto a violar tanto assim o espaço privado dela e, ainda assim, pela primeira vez, vislumbrou seu aposento mais privativo, o quarto de dormir dela.

Um cômodo que ele imaginara exalar masculinidade sendo ela uma mulher que cavalgava e limpava estábulos com a mesma eficácia que os melhores ajudantes de estrebaria de Berkshire. Mas era todo decorado com tons suaves de azul e rosa. A mobília era

branca e, ao analisar o ambiente, lembrava a ele um campo de flores em um dia de verão.

Ava caminhou até uma mesa de cabeceira e abrindo a gaveta, puxou uma missiva dobrada. Ela voltou para ele, e entregou-a. Ele abriu e leu o conteúdo com rapidez. Seu estômago revirou. A letra era de sua mãe. Então ela estava envolvida no esquema para separá-los, um esquema que funcionou por anos a fio. Mas não mais. Não se Ava o quisesse de volta.

— Sinto muito, a caligrafia é de minha mãe. — ele dobrou o papel e devolveu a ela. — Eu não sei o que dizer além de que sinto muito, Ava. Não achei que nossas famílias pudessem ser tão cruéis a ponto de nos enganar, mas, infelizmente, parece que foi o que aconteceu.

Ela caminhou até a cama, devagar, e sentou-se na beirada.

— Eu avisei ao meu pai naquela noite que ele estava errado.

Que você viria, que não era do seu feitio não aparecer. Eu não conseguia acreditar que o garoto que eu amei pudesse fazer uma piada tão cruel comigo. Mentir na minha cara sobre o que ele em tese sentia por mim, apenas para me dar as costas e dizer que eu havia imaginado tudo.

Ele foi até ela e se ajoelhou, pegando a mão dela.

— Eu não poderia, eu não fiz isso com você. Nossas famílias fizeram isso conosco. Sinto muito, Ava e prometo que vou descobrir o porquê.

Tate tinha suas suspeitas de por que seus pais desaprovavam Ava. A posição social deles era tão diferente quanto o temperamento dos cavalos que agora dividiam o mesmo estábulo.

Sua mãe nunca aprovara a amizade deles e, agora que as cartas e o verdadeiro responsável pela separação dos dois haviam vindo à tona, ele a confrontaria e exigiria um pedido de desculpas.

Um para si e outro para Ava. Ele não era mais um marquês, agora era um duque e se casaria com quem bem quisesse.

Ela apertou a mão dele de volta.

— Por mais que isso me choque, Tate, estou feliz que descobrimos a verdade e que podemos seguir em frente, sem qualquer animosidade entre nós.

Os anos se passaram, e ele queria abraçá-la, cercar-se do aroma de rosas que sempre permeava o ar ao redor de Ava. Com certeza ele não queria que nenhuma animosidade entre eles continuasse, mas também não queria que permanecessem distantes. Ava já havia sido sua melhor amiga, seu coração, e ele daria qualquer coisa para reconquistá-la.

Ela puxou a mão, e ele se levantou, dando-lhe espaço.

— Seria melhor se saísse. Nós dois temos muito em que pensar.

Lamento interromper nosso jantar, mas acho que é o melhor.

— É claro. — disse ele, indo para a porta. — Desejo-lhe boa noite.

Tate fechou a porta atrás dele e inclinou-se por um momento para recuperar o fôlego. Era difícil saber o que fazer a partir de agora, como começar de novo. Por mais jovens que os dois fossem quando trocaram juras de amor, era amor mesmo. Verdadeiro e puro como o ar que respiravam.

Muitas coisas aconteceram desde então, muito tempo se passou. Sua própria vida em Londres não era algo de que ele se orgulhava. Ele se encolheu sabendo que suas canalhices haviam chegado a Berkshire, a Ava. Ele se comportara como um Lorde distante depois que seu pai faleceu, desejava enterrar-se nos divertimentos de Londres em vez de crescer e voltar para casa e assumir seu papel como deveria. Tudo porque ele estava bravo, não

apenas consigo mesmo, mas com as cartas que a vida o havia dado quando o assunto era Ava.

Tate foi para as escadas, precisava voltar para sua propriedade e organizar a ida à Londres. Ele precisava voltar para a cidade e confrontar a própria mãe pela cruel interferência em sua vida. A pessoa que sacramentou a perda da única mulher que o conhecia de verdade e o amava por ele mesmo, e não pelo que ele representava ou poderia oferecer.

Ele apertou a mandíbula.

Devido a suas ações descuidadas no passado, a viagem à cidade também significaria que ele teria que visitar a amante, não que alguém soubesse da existência dela, e se afastar. O confronto poderia não correr bem, e talvez fosse necessário oferecer uma recompensa financeira para a mulher. Só então ele poderia retornar a Berkshire e reconquistar sua dama.

Sua duquesa, como Ava sempre deveria ter sido.

CAPÍTULO 6

DEPOIS DE ENVIAR uma carta para Ava contando seus planos de viajar para a cidade, ele chegou a Londres bem tarde no dia seguinte, no momento em que a pequena temporada se iniciava. Tate pulou de sua carruagem enquanto os acendedores de lampiões andavam pelas ruas e acendiam os postes ao longo da calçada.

Tate foi direto para o White's, para conversar com seu bom amigo, Lorde Duncannon, a quem ele havia pedido, no mês passado, para voltar a Londres e contatar um agente de Bow Street.

Contudo, poucas evidências haviam sido descobertas já que não se sucederam mais ataques.

Ele entrou no vestíbulo e, antes que um lacaio pudesse pegar seu casaco, recebeu uma carta de Lorde Duncannon dizendo que estava preso em outro lugar e que iria se juntar a ele mais tarde do que haviam planejado.

Tate se virou e olhou para a rua, debatendo consigo mesmo se poderia adiar ver a mulher que aqueceu sua cama com certa regularidade durante o último ano dele na cidade. Como ele havia enviado uma missiva notificando-a de sua chegada iminente, ele sabia que a encontraria esperançosa de que tudo ia bem e que uma noite de paixão a aguardava.

Girando pelos calcanhares, ele chamou o condutor e começou a se odiar pelo fato de que teria que machucá-la. Fleur, Lady Clapham, viúva do visconde Clapham, não merecia esse tratamento. Não que ela aspirasse ser esposa dele, mas ele prometera não a fazer de boba perante a Sociedade, e os dois eram

vistos juntos em vários bailes e eventos. Ela era uma amiga, um conforto quando os vislumbres de fraqueza e solidão o atormentavam, aqui e ali, desde que ele retornou à Inglaterra.

A carruagem parou diante da casa de paredes de pedra de portland em Mayfair, e ele observou o prédio um momento antes de seu cavalariço abrir a porta. Tate pulou e subiu as escadas. O

mordomo o deixou entrar sem questionar ou se demorar, e Tate foi em direção ao salão da frente sem pestanejar.

Era ali que Fleur sempre gostara de o encontrar antes do interlúdio. A sala de visitas era o cômodo que ele menos gostava na casa, tendo sido decorada no tom mais vil de rosa, um que machucava os olhos.

O mordomo abriu e fechou a porta sem comentar, e dando um passo adiante na sala, Tate não pôde deixar de sorrir com a pose que Fleur escolhera para o esperar.

Sua Senhoria estava esparramada em um sofá cor de rosa, um braço atrás da cabeça de forma preguiçosa, enquanto o outro descansava sobre a barriga, parte do corpo visível através da camisola de seda que ela usava. Seus mamilos, de um rosa que combinavam com o ambiente, estavam eretos sob a roupa, e a mancha mais escura de cachos no ápice das coxas era visível.

Mesmo sabendo que ele nunca mais tomaria a mulher da maneira que ela ansiava, ele não poderia negar que ela era linda e que merecia muito mais do que a vida a havia dado, ele incluso. O

pai dela, um cavalheiro de terras no interior, passara por momentos difíceis e, com sua queda, seus filhos também sofreram. Lady Clapham fora dada em casamento para um visconde rico sem pensarem duas vezes. Agora cabia a ela dar apoio aos irmãos e encontrar bons partidos para todos quando a hora chegasse. Ela

havia se casado com um homem com o dobro de sua idade e um temperamento que diziam rivalizar com o próprio Hades.

— Tate, meu querido, onde você esteve? A pequena temporada está quase no fim, e não vimos você nos últimos meses. Cheguei a perder a esperança de que voltasse à cidade. Me senti tão só... —

ela disse, o olhar o percorrendo com luxúria não satisfeita.

Ele se sentou em uma cadeira que estava de frente para o sofá.

Fleur, sentindo que ele não a tomaria em seus braços, sentou-se ereta e fechou o roupão para proteger o corpo.

— Algo errado? — ela perguntou.

— Há algo que eu preciso falar com você e temo que não gostará do assunto.

Se ele conhecia Fleur, e a conhecia muito bem, ela não era uma mulher com quem se indispor, e ele não desejava se separar dela em maus lençóis. O que eles tiveram foi agradável enquanto durou, mas ele nunca deu nem um tico de falsas esperanças. Ele jamais ofereceu mais do que o acordado antes mesmo de os encontros começarem.

— Vou passar muito tempo em Berkshire, na minha propriedade.

Como você deve saber, houve um incêndio em meus estábulos no mês passado...

Fleur ofegou, inclinando-se para a frente.

— Um incêndio? Os danos foram extensos?

— Perdi dois blocos de estábulos e estou iniciando a reconstrução. Todos os meus cavalos tiveram que ser levados para o Haras Knight. Tive muita sorte de não perder nenhum dos animais.

A viscondessa recostou-se na cadeira, com um olhar de sabedoria.

— Este Haras não é de propriedade da senhorita Ava Knight?

Não foi ela a garota que deixou você há alguns anos?

Tate não queria contar a Fleur toda a verdade, pois assim que ele o fizesse toda a cidade de Londres saberia, e ninguém da cidade precisava saber de sua vida.

— Ela retornou da França e está fazendo um excelente trabalho em manter seus estábulos lucrativos e bem-sucedidos. O que aconteceu no passado entre nós, eu preferiria deixar no passado.

Somos vizinhos e, devido ao nosso amor mútuo por corridas de cavalos, precisamos nos dar bem.

— Bem. — disse ela com o tom indicando incredulidade. — Fico feliz que tenha conseguido deixar o passado para trás, mas não significa que não possamos mais ficar juntos quando você estiver na cidade. Nos damos muito bem, e você sabe que sempre nos divertimos. Não seja enfadonho, nem me diga que não podemos mais continuar.

Tate estava apostando na ideia de que, com tempo e paciência, ele poderia reconquistar o amor de Ava. Fazê-la enxergar que juntos eles poderiam fazer de ambas as propriedades os melhores Centros de Reprodução e Treinamento do país. Que sob nenhuma circunstância ele tentaria cortá-la e forçá-la a mudar para se adequar ao esperado para o título. Ambos ansiavam por filhos e um casamento construído com a solidez de um amor. Ele não descartaria esta possibilidade agora que talvez eles fossem uma opção.

Ele se levantou.

— Sinto muito, Fleur, mas não posso mais ser seu amante. É

claro que sempre serei seu amigo e, se precisar de alguma coisa, sabe que eu sempre lhe darei assistência. Mas o que tivemos deve chegar ao fim. Não seria justo com você mantê-la ligada a mim quando sempre deixei claro que nosso acordo era algo temporário, uma forma divertida de passar o tempo durante a Temporada.

Ela o estudou por alguns segundos antes de se levantar, aproximou-se dele e envolveu seu pescoço com as mãos.

— Sentirei sua falta, Sua Graça, e de todas as coisas deliciosas que costumávamos fazer. Estou ansiosa para reencontrá-lo ano que vem durante a temporada.

Tate retirou os braços dela do pescoço dele, mas deu um breve beijo em sua testa antes de se afastar.

— Boa noite, Lady Clapham. — ele entregou o congé a ela.

Saiu sem dizer mais nada e, chegando à carruagem, pediu que fossem ao White's. Lady Clapham recebeu as notícias muito melhor do que ele imaginara. Talvez ela já tivesse outra pessoa em mente para mantê-la ocupada. Ela era viúva, e muitos cavalheiros se interessavam por ela, algo a que ela sempre se mostrara receptiva.

E agora ambos estavam livres para fazer o que quisessem.

O que era ótimo para Tate conquistar o amor de Ava. Ele conquistou o coração dela uma vez antes, o que decerto era premissa para fazê-lo uma segunda.

CAPÍTULO 7

Dois anos se passaram desde a última vez que vi você. Às vezes me pergunto se voltaremos a nos encontrar...

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

A CARRUAGEM de Tate parou diante de sua casa em Londres, as luzes brilhavam do lado de dentro e o som de música fez seus passos se tornarem cautelosos ao subir as escadas. Um criado de libré vermelho, roupas que eles usavam apenas em bailes, fez seus passos vacilarem. De todos os dias possíveis para ele retornar à Londres, ele escolhera o dia de um baile organizado por sua mãe.

Este seria o terceiro do ano.

Não havia mais nada para a mulher fazer com seu tempo? Ele entregou seu sobretudo a um dos criados que veio ao seu encontro na entrada e cumprimentou as poucas pessoas que se mantinham do lado de fora do salão de baile.

Sem disposição para tais entretenimentos, ele prosseguiu para a escadaria. Não apenas não queria socializar, mas estava longe de estar vestido para um baile. Na manhã seguinte, ele discutiria os excessos sociais de sua mãe e tentaria controlá-la um pouco.

Fora que a carta que ela havia escrito para Ava ainda dominava sua mente de forma a deixá-lo ainda menos disposto a permitir tais frivolidades.

Na metade da subida uma voz masculina gritou seu nome, e Tate se interrompeu. Ao se virar encontrou o Conde de Brandon, um bom amigo que conhecera durante o seu primeiro ano em Nova York.

— Scott. — disse ele, descendo as escadas e puxando-o para um abraço.

O homem era um de seus amigos mais próximos, e sentiu muita falta dele quando precisou voltar para a Inglaterra. Scott também havia voltado, mas optou em ir para o continente, ver os pontos turísticos.

— Como tem passado, meu amigo?

— Muito bem. Muito bem mesmo. — disse Scott, sorrindo. — Eu me lembrei que a duquesa-viúva iria dar um baile esta noite para celebrar o fim da pequena temporada e pensei em dar um alô enquanto você estivesse na cidade.

— Posso dar os parabéns? Admito que fiquei bastante surpreso ao receber sua carta contando que estava noivo, mas estou feliz por você. Sua noiva está com você? Eu adoraria conhecê-la. — disse Tate, olhando para ver se alguma jovem estava à espera de uma apresentação.

— Sim, está certo. Estou noivo. Vamos nos casar em junho próximo. A família dela virá da Itália para preparar e planejar o casamento. Claro, sou a favor de permitir que Rosa tenha o que ela quiser.

Tate sorriu.

— Estou feliz por você, meu amigo. Você irá ser um marido maravilhoso, e estou certo de que Rosa será uma esposa maravilhosa para você se é quem você escolheu. Conto os dias até encontrá-la.

— Eles estão vindo de Roma e chegarão no Natal. Não vou deixar de apresentá-los. Ela é simplesmente perfeita.

Tate apertou-o no ombro, feliz por seu amigo. — Você é um bom homem. Você merece a felicidade.

— Obrigado. — disse Scott, virando-se para o salão de baile. —

Vamos tomar uma taça de champanhe para comemorar?

Tate não pôde recusar e seguiu para as portas do salão de baile.

Ele estava longe de estar vestido para a ocasião, mas ser o duque de Whitstone dava a ele permissão para vestir o que quisesse.

Ele viu a mãe do outro lado do salão, os olhos da mulher se arregalando em choque. Tate não sabia dizer se era por ele estar lá ou se pelo que vestia. Talvez os dois.

Scott pegou duas taças de champanhe de um lacaio que passava e entregou uma a Tate. Eles fizeram um brinde de congratulações e tomaram um gole antes de olhar em volta.

— Quando pretende retornar para Berkshire? Ouvi de Duncannon que teve alguns problemas com a propriedade.

Tate assentiu.

A menção de casa trouxe a memória de Ava e o quanto ele sentia falta de vê-la, mesmo que por um só dia. Ele havia voltado a se acostumar a estar perto dela, e agora que estava na cidade, desejava partir, voltar ao interior. Como ele aguentou morar aqui nos últimos dois anos, sem nunca pisar em Cleremore Hall era algo que estava além de sua compreensão.

— Tenho alguns assuntos a tratar aqui, mas em não mais que uma semana volto a Berkshire. Quanto ao problema, sim, algumas coisas surgiram.

O conde lhe deu toda a atenção, e Tate pensou em contar a Scott tudo o que ele estava pensando. Nunca esconderam nada um

do outro antes, e Tate não podia começar agora. Ele precisava contar de Ava para alguém ou ficaria louco.

— Lembra-se da senhorita de quem falei uma vez, a razão para eu ter ido para a América?

Scott assentiu.

— Claro. Srta. Knight, não era?

— Sim, correto. — disse Tate, suas veias aquecendo-se com a menção do nome dela em voz alta.

— Ela mora na França, pelo que entendi, mas o pai dela possuía um dos melhores Centros de cavalos de corrida da Inglaterra.

— Sim, essa mesma, contudo, ela não está mais na França.

Voltou a Berkshire.

O amigo o estudou um momento antes de erguer a sobrancelha, a boca tremendo de diversão.

— Ela voltou? Que interessante. — ele fez uma pausa. — E este fato teve algum peso em sua decisão de morar em Berkshire em vez de Londres?

— Não exatamente. — disse Tate, não querendo parecer muito com um filhotinho apaixonado, mas ele nunca foi capaz de mentir para Scott. — Vou desapontá-lo ao dizer que nosso reencontro não foi na melhor hora, mas como já deve ter sabido, meus estábulos foram alvo de um incêndio. Detalharei para você em outro momento, mas naquela noite, em grande parte foi Ava quem salvou meu garanhão.

— E então vocês resolveram dar uma trégua.

Tate deu de ombros.

— Foi necessário enviar meus cavalos para a propriedade dela, e ao longo do último mês descobri que ela nunca me abandonou.

Na verdade, nossos pais nos fizeram de tolos e nos jogaram em vidas separadas. O que é a outra razão para eu estar na cidade

hoje. Quero confrontar minha mãe sobre o envolvimento dela em um esquema tão soturno.

Scott assobiou, os olhos arregalados.

— A viúva nunca aprovou a senhorita Knight. Não sabia?

— Ela nunca dissera nada de maneira direta, e a carta, que eu li, tem a caligrafia dela. O desgosto dela acerca da escolha da Senhorita Knight para minha esposa está claro em cada palavra. Eu não a achava capaz de tal traição, mas me enganei. Não foi sem motivo que Ava manteve-se distante todos esses anos. A carta é muito fria e ofensiva.

Tate balançou a cabeça. Odiava o fato de que foram separados porque alguém julgava saber o que era o melhor para os dois:

— Jantamos na outra noite e durante a conversa, eu não me aguentei e precisei descobrir o que houve. Indaguei para descobrir o que a fez enviar a missiva desfazendo nosso compromisso. Foi então que ela perguntou sobre a minha carta. Nenhuma das cartas envolvidas foi escrita por nós. Fomos enganados pelas pessoas em que mais devíamos confiar.

Tate olhou para o outro lado do salão e observou a mãe com as amigas por um momento, rindo e dando ordens aos outros pelo simples fato de ser uma duquesa. Um nó frio e duro se formou dentro dele, e ele se virou para Scott. Não queria vê-la por nenhum segundo a mais.

— Voltei à cidade em parte para confrontar minha mãe acerca das ações desprezíveis dela. Eu pretendia dar cabo a isso hoje à noite, mas ao voltar descobri que ela estava dando este baile, então nossa conversa terá que esperar até de manhã.

— Que outros negócios traz você aqui? — o amigo perguntou.

Tate ajustou a gravata e limpou a garganta.

— Bem, além de alguns negócios envolvendo outras propriedades, e meu problema com minha mãe, é claro, a outra a razão para vir foi um assunto delicado.

Scott ergueu a sobrancelha.

— Mesmo? E gostaria de elaborar? — o amigo terminou o champanhe e pediu mais para um lacaio que estava por perto.

Tate rangeu os dentes, não gostando do fato de ter sucumbido como tantos homens de sua esfera e tomado uma amante. Lady Clapham não era uma concubina de fato, ela era livre para fazer o que quisesse, e com quem quisesse. Mas o fato de ele poder visitá-

la quando assim decidisse, fazia com que parecesse uma amante, embora ele não quisesse usar tal termo.

Ele olhou em volta para garantir que não estavam sendo ouvidos por outros convidados.

— Não é algo de que eu me orgulhe, mas tenho dormido com uma mulher desde o ano passado. Ninguém sabe, e estou certo de que ela teve outros amantes durante esse período, mas se eu quiser algum tipo de futuro com a Srta. Knight, preciso ser honesto. Acabei de chegar da casa dela aqui em Mayfair.

— Ela aceitou bem as notícias?

Melhor do que Tate pensara que aceitaria, mas ambos sempre foram francos, e Lady Clapham havia dito muitas vezes que não queria voltar a se casar.

— Aceitou. Na verdade, ela quase não se incomodou.

E Tate precisava concordar que fora um golpe de sorte. Lady Clapham era uma mulher complexa, imprevisível de saber o que faria.

Ele suspirou.

— Mesmo resolvendo todas as pontas soltas pode não ser o bastante. Não tenho mais certeza de que a senhorita Knight vai me

aceitar. Depois de descobrir a verdade, ela permaneceu distante. —

Tate passou a mão pelos cabelos, sem saber o que Ava sentia. — A impressão que me deixou é que não sabia se me queria em sua vida.

— Como? — Scott perguntou.

— Cheguei a pensar que ela não deseja mais tal capítulo em sua vida. Ela é muito independente, administra a propriedade com precisão de especialista, é minuciosa e justa, e não precisa dar satisfações a ninguém. Tornar-se duquesa traz consigo novas responsabilidades e pressões, e não tenho certeza de que ela tenha espaço para tais obrigações nessa vida que criou.

No passado, houve um período em que ela não pensava em mais nada que não fosse ser a duquesa dele. Mas o tempo tinha o poder de forçar as pessoas a situações em que elas talvez não cogitassem antes, e o afastamento deles... Tate não sabia mais se ela se importava com ele de outra forma que não como amigo.

— Você precisa conversar com ela e descobrir. Talvez ela o surpreenda e haja espaço para você e seu título robusto. Sim, você é um duque, um homem com várias propriedades e muitas pessoas dependem de você, mas a srta. Knight estava disposta a estar à frente de tudo isso antes dos pais de vocês se envolverem. Se ela o ama, e sempre há uma chance de que duas pessoas destinadas uma à outra possam voltar a estar juntas, ela também abrirá espaço para você em sua vida.

Tate sorriu para o amigo.

— Você se tornou um romântico desde que conheceu Rosa.

Scott riu.

— Sim, e sinto orgulho por tal fato. Mas você verá que estou certo. Se tiver paciência, e como já esteve ao lado da Senhorita

Knight, não há razão para não acreditar que ela pode se apaixonar por você mais uma vez.

Ele esperava que sim, e continuaria tendo esperanças. Quando voltasse a Berkshire, iria devagar e com cautela. Tentaria recuperar a afeição dela. Não seria fácil, mesmo que tudo indicasse que eles voltaram a transitar a esfera da amizade. Muita coisa pode acontecer em cinco anos, as pessoas mudam e seus objetivos e sonhos também.

Com certeza era o caso dela. Após gastar dois anos em Londres, os rumores de que Titan — o garanhão mais procurado para procriação — iria a leilão em Tattersalls, o fizeram reviver seu sonho de estar à frente do próprio programa de reprodução, de ser o melhor.

Ele retornou a Berkshire, mesmo sabendo que Ava estaria a apenas cinco quilômetros dele, mas ele quis lutar pelo que uma vez imaginara fazer. Não ser apenas um duque, mas um homem com interesses, uma profissão que ele não apenas desfrutava, mas amava.

Ele bebeu o último gole de champanhe. Conseguiria conquistá-

la, conseguiria unir suas propriedades e fazer com que todos os seus sonhos se realizassem.

— Você faz excelentes argumentos, Lorde Brandon.

— Bem, se a Srta. Knight é o seu futuro, então sim, é necessário resolver o passado e seguir em frente. Estou feliz por você e desejo-lhe felicidades com sua dama. Eu me lembro do quanto você estava destruído. Pode discordar de mim, vejo em seu rosto que discorda.

— disse Scott, rindo. — Mas quando você fala dessa senhorita Knight, você brilha. Ela é sua luz, brilhante e verdadeira. Espero que consiga reconquistar o amor dela.

Tate sorriu, apertando o ombro do amigo.

— Obrigado. Aceitarei seus bons desejos e espero o melhor também. Muita coisa aconteceu nos últimos cinco anos, pode levar algum tempo para encontrarmos o caminho de volta um para o outro, mas estou determinado.

— Espero que sim, e não deixe de trazer a senhorita Knight para o meu casamento, se tiver sucesso. Rosa adoraria conhecê-la, estou certo disso.

— Isto, meu amigo, é algo que prometo a você. — disse Tate, esperando que, por sua vez, em breve ele também pudesse convidar Lorde Brandon para o próprio casamento.

TATE TOMOU o café-da-manhã na manhã seguinte, e felizmente sozinho. O cheiro de café quente impregnava o ar, o Times ainda com cheiro de prensa à sua frente e o prato com bacon, ovos escalfados e presunto fatiado estava diante dele. Ele se recostou na cadeira, aproveitando o momento de paz, um café-da-manhã em silêncio.

A porta do cômodo se abriu e sua mãe se juntou a ele. Ele dobrou o jornal, e suspirou em derrota pelo curto momento de paz agora interrompido.

— Bom dia, mãe. — disse ele, pegando a faca e o garfo.

A mãe dele se sentou à mesa e pediu a um lacaio próximo que lhe servisse chá e fizesse seu prato habitual de torradas e manteiga.

— Não sabia que retornaria à Londres, meu querido. O que o trouxe para a cidade? Eu iria me juntar a você em Cleremore em breve.

— Negócios na cidade.

Ante sua resposta curta, ela apenas ergueu a sobrancelha e voltou para a refeição. Tate comeu por um momento, pensando na totalidade de coisas que teria que dizer a ela. Estava com dificuldade de manter a calma, de não perder a paciência:

— Você aproveitou sua noite ontem à noite? Quantas bailes já foram este ano? Três?

Sua mãe abriu um sorriso doce.

— Sim, de fato. Que maravilhoso que esteja atento aos meus eventos. E fico feliz que tenha chegado a tempo para o entretenimento da noite passada, pois você desapareceu antes da última temporada e faz dez meses que não o vejo!

— Acredito que seja um exagero. Voltei à cidade em alguns momentos para tratar de negócios.

— Não me irrite, garoto, pois estou muito chateada. Como pôde deixar Londres no instante em que diversas mulheres elegíveis e de fortuna agraciam a cidade? Todas prontas para fazer uma reverência e se casarem com um duque. Preciso lembrá-lo de Lady Clapham, que é mais do que elegível, uma viúva que parece gostar da sua companhia, ou ao menos foi o que ouvi. Mas não, fugiu para Berkshire, para seu passatempo bobo com cavalos e não voltou.

Estou desesperada por você.

Tate não queria nada mais além de contar à sua querida mãe que Berkshire também dispunha de algumas mulheres muito doces e mais do que aceitáveis e que poderiam se tornar noivas dele.

Bem, uma noiva em particular.

— Preciso estar em Berkshire, pois adquiri um dos cavalos de corrida mais valiosos da Inglaterra há pouco tempo. E se não entrou por um ouvido e saiu pelo outro, eu escrevi para você contando o que ocorreu nos estábulos semanas atrás. Você sabe... — disse ele, chamando a atenção dela. — os que queimaram.

Ela dispensou a declaração com um gesto de mão.

— Lembro-me que mencionou esses dois itens, mas ainda assim não vejo a necessidade de você se manter longe da cidade por tanto tempo. — ela fez uma pausa, tomando um gole de café. —

Qual o progresso com os estábulos?

— Estão sendo reconstruídos enquanto falamos e não foi um incêndio simples. Como falei na carta, acredito que o fogo foi intencional. Eu contratei um agente de Bow Street para investigar, mas por favor, não espalhe essa informação. Não quero que ninguém saiba que eu tenho suspeitas.

— Muito bem. — ela suspirou, pegando um pedaço de torrada.

— Eu não direi uma palavra.

— Bom, isso me leva ao outro assunto que me trouxe à Londres, um que envolve você.

A mãe dele baixou a torrada, reclamando que estava fria. Um criado pegou o prato e o levou embora antes que sua genitora erguesse o olhar com preocupação nos olhos.

— Mesmo? O que você quer de mim?

Tate largou a xícara de café.

Ele queria analisar o rosto dela quando a confrontasse com a verdade.

— Por que você forjou a suposta carta da Senhorita Knight para mim anos atrás? Por que permitiu que eu seguisse acreditando que a afeição dela por mim era fingida, que ela sonhava com uma vida diferente? Que ela não me queria?

Os olhos de sua mãe se arregalaram antes que o rosto empalidecesse mostrando um tom horrível de cinza. Naquele momento Tate soube que, sem dúvida alguma, a mãe estava por trás do estratagema calculista de separá-los. Ele estava com certa esperança de que não fosse verdade, mas não parecia o caso.

— Eu não sei do que você está falando. — disse ela mexendo com um guardanapo. — Agora deixe-me tomar meu café-da-manhã em paz. O dia será agitado, muitas visitas para fazer a tarde toda.

Ele rangeu os dentes, uma reação melhor do que gritar com a mãe diante de todos os funcionários.

— Há tempo de sobra para suas socializações. Quero falar sobre seu esquema cruel e dissimulado.

A mãe dele pareceu aceitar a derrota a esse respeito e ergueu o queixo, os lábios contraídos em uma linha tensa.

— Sim, eu forjei a carta e o faria de novo. Seu pai e eu fizemos o que era o melhor por causa da pouca idade de vocês dois. Não havia nem passado por uma Temporada e já cogitava se casar com uma garota sem conexões, de fora da nobreza. Filha de um treinador de cavalos, ainda por cima.

A voz estridente da mãe se elevou uma oitava quando mencionou as últimas palavras, o que fez com que seus tímpanos doessem, e ele se encolhesse:

— Falei com o pai da srta. Knight e ele concordou depois de explicarmos que nunca aceitaríamos tal união e que a filha dele estaria arruinada ao ser cortada pela sociedade.

Ele balançou a cabeça.

A crueldade de sua mãe não tinha limites. Então, ela envolveu o Sr. Knight na farsa ao ameaçar sua única filha.

— A Srta. Knight era mais do que a filha de um treinador de cavalos para mim. Nunca me importei com classe, dinheiro, e títulos da forma como você se importa. A Srta. Knight pode ter tido um começo humilde, mas é igual a mim em todos os aspectos.

— Humpft. — sua mãe cuspiu. — Ela não serve para ser esposa de um duque, nunca será uma.

Ele respirou fundo para se acalmar.

— Você não tinha o direito dessa forma. Não tem vergonha de ter agido de forma tão cruel com seu filho ou com pessoas que são nossos vizinhos há anos?

— Tate, preciso lembrar que o Sr. Knight também estava de acordo.

— Você convenceu o homem a concordar ao ameaçar Ava.

— Não me diga que você já pediu a mãe dela de novo. — ela zombou. — Nunca o perdoarei se sim.

— Você não tem direito a voto, mas não. Não propus. Neste momento, a Srta. Knight não é só nossa vizinha, mas a mulher que está abrigando todos os meus cavalos depois do incêndio. Mesmo que eu e Ava não sejamos nada mais do que amigos no momento, não a isenta da culpa do que fez conosco. Como você pôde fazer isso com seu próprio filho? Você sabia o quanto eu gostava dela.

Ela balançou a cabeça, descartando as palavras dele.

— Uma loucura infantil que arruinaria sua vida. Você gostaria que eu me lamentasse por impedir tal enlace. Bem.. — ela fez uma pausa, jogando o guardanapo sobre a mesa. — Não lamento, nem nunca o farei.

— A senhora me enviou para um país que não me era familiar só para me manter distante dela. Você poderia ter sido honesta.

Não que tal honestidade fosse tirar dele a ideia de ter Ava como esposa. Mesmo agora, no âmago da alma de Tate, ele sabia que ela era a mulher certa para ele.

— Minha família tratou você bem em Nova York. Eles proporcionaram a você tudo o que um jovem intitulado e rico poderia querer. Mulheres, festas, eventos sociais do melhor calibre que meu país pode oferecer. Não me venha com lamentações quando sua vida não teve nada de lamentável. Não considerou que os pormenores que atravessaram toda Londres quando retornou

chegaram a mim? As muitas amantes, o jogo e tudo mais. Não seja tão rápido em me julgar quando eu poderia julgá-lo dois anos atrás, quando voltou.

Como ela podia ser tão cega?

Sim, ele gostou da América, mas apenas porque ele foi forçado a ficar e não podia voltar. Ele pensara que a mulher que amava não o amava.

— Eu não vou perdoá-la por essa fraude.

— Suponho que você vai me contar agora que todo esse seu interesse por Berkshire nos últimos meses não tem nada a ver com a senhorita Knight estar de volta da França. Por favor, me diga que não retomou o relacionamento com aquela pé rapada de onde parou.

Tate colocou as mãos na mesa, já nem se importava com a comida.

— Como ousa chamá-la assim? Nunca mais... — ele disse, fazendo sua mãe se assustar. — fale dela assim. O nome dela é Srta. Ava Knight, e me ouça bem, mãe. Não importa o que aconteça entre mim e Ava, saiba que jamais vou tolerar sua intromissão. O

que escolho fazer com a minha vida ou quem escolho para ser minha esposa é minha escolha. Como chefe dessa família, se eu quiser casar com uma prostituta do Soho, é o que farei.

Tate se levantou, já estava farto da conversa.

— Não me ameace. Ainda sou sua mãe e não se esqueça de que posso tornar sua vida na sociedade fácil ou difícil. A senhorita Knight vem de uma linhagem de criados. Pessoas que trabalharam como agricultores arrendatários antes de comprar um cavalo e competir com ele. Um golpe de sorte para eles, embora eu esteja muito feliz que conseguiram se afastar de uma vida de servidão, não é o bastante para se tornar apta ao papel de duquesa.

Ele sempre considerou os olhos azuis claros de sua mãe bonitos, mas, naquele momento, eram gelados e sem um pingo de sentimento.

— Se você se casar com a Srta. Knight, a duquesa de Whitstone será motivo de riso na sociedade. Eu não me casei com a nobreza e sacrifiquei minha vida em meu próprio país e vim morar na Inglaterra, só para ver meu filho se casar com uma mulher que não traria nada além de vergonha e algumas éguas ao casamento.

Tate agarrou a mesa, inclinando-se para sua mãe.

— Não volte a falar comigo, ou de Ava desta forma, mãe. Estou avisando. — ele bufou. — Eu sou o duque de Whitstone e não importa com quem eu me case, ela será aceita pela sociedade porque, caso não a aceitem, sendo eu um duque, farei com que se arrependam do dia que a rechaçaram. Esse aviso também inclui você. Se você deseja ter algo a ver com o meu futuro, não se intrometerá na escolha que eu farei para minha esposa.

A mãe dele empurrou a cadeira para trás.

— Há muitas moças que são mais adequadas para ser a futura duquesa de Whitstone. — disse ela com a voz trêmula. — Se desse uma chance e as conhecesse, veria que há muitas moças que seriam perfeitas para você. Veria que a senhorita Knight não é para você. Ficar com ela pode satisfazer qualquer senso de honra que você acredita ter de cumprir por ter desistido da união, mas esse sentimento não será duradouro. Pessoas com a origem dela sempre possuem esqueletos no armário, e a sociedade não descansará enquanto não descobrir. É apenas uma questão de tempo até que algo que a família ou ela escondem venha à tona e arruíne as perspectivas dos meus futuros netos.

— Só fala bobagens.

— Falo? — sua mãe retrucou. — Pense em seu herdeiro, longe em Eton ou Harrow. O assédio moral que seus filhos sofrerão quando os outros descobrirem que a mãe deles criava cavalos. Que os avós já foram agricultores arrendatários. Isso, por si só, será difícil de suportar, sem falar em algum outro escândalo que ainda não sabemos.

Ele balançou a cabeça, não querendo ouvir mais. Ele caminhou até a porta e parou.

— Você está histérica, sugiro que se acalme. Fique atenta ao meu aviso, mãe. Vou bani-la para um castelo na Irlanda se não me obedecer e seguir minhas ordens. Você não é mais a chefe da família. Nunca cruze essa linha, ou me fará concretizar a ameaça.

A mãe dele o fulminou, a pequena touca de renda no topo da cabeça tremia com a raiva mal disfarçada.

— Se você se preocupasse tanto com o ducado, teria voltado para casa quando soube do incêndio. Mas, em vez disso, apenas continuou a organizar mais eventos sociais e bailes. Pelo menos, a Srta. Knight se importou o suficiente para combater o fogo ao meu lado naquela noite. Agora me pergunto, onde você estava? Bebendo champanhe e desfrutando da companhia daqueles que julga serem valorosos. Não a ocorreria pensar nos outros, mas a Srta. Knight pensa, e é por isso que ela sempre será adequada para se tornar minha esposa. Não há um osso egoísta no corpo dela.

— Você não tem ideia do que está falando ou do que precisa. É

igual ao seu pai. Desvia-se com facilidade.

— Voltarei a Berkshire em alguns dias. Acho melhor que, assim que a pequena temporada se finde, você viaje para uma das outras propriedades e fique bem longe de Cleremore Hall.

— Você tiraria sua mãe de seu convívio por uma pobretona?

Tate olhou para a mãe, estava enojado com as palavras dela.

— Por causa de suas ações, por me mandar para os Estados Unidos, eu perdi a chance de me despedir de meu pai. Você me permitiu culpar uma mulher inocente por isso. A senhorita Knight pode não ser ninguém para você, mas ela é tudo para mim. E

sempre foi. Não importa quantos anos você passe tentando mudar este fato, nada o mudará.

Ele a deixou onde estava, encarando-o, e rumou para a porta.

Após esse confronto, uma visita ao White's seria perfeita. Qualquer lugar seria melhor de se estar do que aqui.

CAPÍTULO 8

DIAS DEPOIS, Ava estava sentada em uma cadeira no terraço e ergueu os olhos ao ouvir o som de rodas no cascalho. Ela protegeu os olhos por causa da luz do sol no horizonte e, fechando o livro que estava lendo, tentou descobrir quem estava chegando para uma visita.

Quando a carruagem ficou visível no pátio de entrada, ela se levantou e seguiu para a frente da casa, a curiosidade cada vez maior. A carruagem preta estava coberta de poeira adquirida ao longo de quilômetros de estrada, e havia uma variedade de baús no topo do veículo. Seu coração pulou de alegria, e ela começou a correr quando reconheceu a cabeça com cachos escuros que espreitou pela janela da carruagem.

Ela acenou.

— Hallie, é você?

Ava riu, mais que feliz em ver sua amiga. Hallie foi uma das primeiras garotas a fazer amizade com ela na escola francesa. A atitude, que não dava espaço para parvoíce, e a franqueza inabalável da moça haviam conquistado Ava que, por sua vez, amava que a amiga fosse tão corajosa e obstinada. Não que somente de olhar alguém pudesse pensar isso dela. Ela era toda delicada, suave à primeira vista. Suas mechas escuras, de um cacheado natural, e os olhos verdes ecoavam inteligência muito além da compreensão de Ava. Hallie era uma rosa inglesa pura, mas era de uma personalidade que amava climas muito mais severos do que tal flor seria capaz de tolerar.

— Ava! — Hallie gritou de volta antes de abrir a porta e sair sem ajuda.

Sua querida amiga correu e a puxou para um abraço feroz, que Ava recebeu de bom grado. Elas não se viam há um ano, e tê-la aqui e agora, em Berkshire, era um sonho.

— Hallie. — disse ela, abraçando-a com força. — Ah, eu estou tão feliz em vê-la.

Lágrimas se acumularam, mas ela as segurou, notou que os olhos da amiga estavam um pouco lacrimejantes também.

— Faz muito tempo, minha querida. Como está a Inglaterra?

Como estão seus cavalos magníficos? — Hallie perguntou, olhando para os estábulos.

— Estão todos muitíssimo bem.

Pelo menos os cavalos estavam indo bem, quanto ao restante de sua vida, bem, esse aspecto era questionável.

— Como foi o Egito e todos aqueles magníficos faraós que você ama tanto?

Hallie riu, tirando o chapéu e olhando para o céu.

— São perfeitos em todos os sentidos. E um dia você deve ir me visitar lá. Sei que você iria adorar.

A ideia de ver uma terra tão quente, de história e cultura anciãs a enchia de inveja por não viajar tão longe quanto Hallie. A mulher era tão inteligente e mundana, e chegara na hora mais perfeita.

— Não acredito que você está aqui. Quanto tempo vai ficar?

Ava a levou para dentro, arrastando-a em direção à sala de estar e ordenou que o chá e o almoço fossem servidos lá naquele dia, em vez da sala de jantar.

Hallie olhou ao redor da sala, notando algumas das antiguidades que o pai de Ava havia colecionado. Segurou e estudou um vaso aqui e uma relíquia ali antes de recolocá-los no lugar.

— Cerca de um mês, se você concordar. Tenho alguns negócios a tratar em um museu de Londres. O novo benemérito de lá se recusa a aceitar a autenticidade de uma tabuleta de pedra que encontramos no platô egípcio. Acredito que seja porque foi uma mulher que a encontrou, no caso eu.

Hallie pousou o chapéu em uma cadeira próxima e se deixou cair na cadeira, suspirando. Ava sentou-se também, sorrindo ante a maneira despreocupada e tranquila da amiga. Como sentira falta dela.

— Parabéns por encontrar um artefato histórico tão magnífico.

Tenho certeza de que convencerá o cavalheiro de que é exatamente o que diz ser. — ela não conseguia tirar o sorriso dos lábios por ter sua amiga aqui. — Eu não consigo dizer com palavras o quanto você estar aqui me faz feliz. Não por você estar com problemas em seu trabalho, mas porque eu terei sua companhia por um mês. Será como nos velhos tempos.

— Falando nisso... — disse Hallie com um olhar inquisidor. —

Ouvi um boato engraçado enquanto estava na cidade, antes de vir para Berkshire. Quer saber o que era?

Ava recostou-se no sofá e tirou os sapatos, cruzou as pernas no assento, embaixo dela. Será que ela ia querer saber das fofocas que sempre correm por Londres? Não, na verdade não, mas o comportamento da amiga, o brilho travesso no olhar dela a deixou curiosa.

— Muito bem, Londres está agitada assim pelo quê? — ela perguntou, já temendo não se interessar pelos mexericos.

— Você é vizinha do duque de Whitstone, não é?

A menção ao nome de Tate a fez endireitar a coluna, e uma pontada de medo a atravessou sem saber para onde a conversa estava indo.

— Conheço o duque há alguns anos, sim.

Ava não havia dito a ninguém que ele a desprezara quando começara a estudar na França. Hallie foi uma amiga nos tempos de escola e parecia contente em não se intrometer em seu passado.

Ava supunha que todas elas, as cinco amizades que havia feito, possuíam seus próprios segredos a serem mantidos bem guardados. Ser abandonada não era algo que uma jovem, seja de qualquer posição social, iria querer anunciar, então Ava tentou se esquecer do que houve e continuar com sua vida o melhor que podia.

Agora que ela sabia que Tate nunca a rejeitara, bem, mudava as coisas de alguma forma, e ela estava desesperada para conversar acerca do assunto com alguém que não fosse o próprio homem. A vida que levava no Haras Knight havia se tornado seu mundo inteiro. Ir para uma escola tão distante a ensinou a confiar e depender de si, e em mais ninguém e, ao longo dos anos, ela se tornou independente. Ela fora capaz de dar continuidade à sua vida de forma alegre e satisfatória sem as amarras da felicidade matrimonial.

Não que Tate fosse a única outra razão pela qual ela se esquivara do casamento, o desastre com Lorde Oakes havia cimentado dentro dela a decisão de que ser uma mulher de meios independentes era preferível a estar à mercê de qualquer marido.

— Há rumores de que ele voltou à cidade e foi visto deixando a casa da amante. A cidade inteira está em tumulto, ou pelo menos é o que Willow está dizendo. Alguns ficaram chocados com o fato de ele ter uma, pois era um caso muito discreto, mas, por infelicidade foi descoberto, é o que está sendo falado.

Willow Perry era outra amiga que Ava fez na escola francesa e residia em Londres com a tia intitulada na maior parte do ano.

— O que Willow disse? — Ava perguntou.

Ela não sabia que o duque havia tomado uma amante permanente. Claro, o erro era dela. Ele era famoso por seus encontros amorosos, pelas modos sociais e hábitos de jogatina desde seu retorno do continente americano. Era natural que ele tivesse um acordo de tal longevidade para satisfazer suas necessidades. Ela se preparou para ouvir, seu estômago revirando ao pensar nele com outra mulher.

— Só que ela é livre para fazer o que bem entender, embora alguns digam que nunca houve um acordo de exclusividade na mesa. Que não passava de uma união de satisfação mútua e nada mais.

Ava engoliu a bile que subia pela garganta.

— Ora, ora. — foi tudo que conseguiu verbalizar.

Hallie continuou.

— Quando ele voltou dos Estados Unidos, há dois anos, as pessoas afirmam que a atração que sentiram no momento em que eles se viram no funeral do marido dela era inegável.

— Ela era casada?

— Ah sim. — continuou Hallie. — Ela é uma dama intitulada.

Lady Clapham, uma viscondessa ainda por cima.

Ava estava sem palavras como nunca esteve. A amante de Tate era uma mulher da classe dele. Sua mente zumbiu ao pensar nisso.

Por que ele não a pedira em casamento? Por que terminar o arranjo agora, depois de tanto tempo...

— A alta classe está em polvorosa de tantas perguntas, sedenta pelo que aconteceu entre eles enquanto a maior parte da sociedade não reparou. Quando soube que ele era seu vizinho, precisei perguntar.

Hallie sorriu.

Graças a Deus, a amiga estava alheia por completo a como a notícia que acabara de dividir ameaçava arrancar o coração de Ava do peito.

— Não estava sabendo. Só porque somos vizinhos não significa que eu tenha algo a ver com a vida pessoal dele. Ele pode fazer o que bem entender, como eu.

Ava desviou o olhar, concentrando-se em nada em particular.

Seu estômago revirava com o mero pensamento de Tate dormir com outra mulher. Até agora, ela foi consciente em seus esforços de se manter longe de pensamentos tão terríveis quanto ele se relacionando ou amando outra pessoa. O duque era um homem que não devia nada a ninguém. Era responsável por suas próprias ações e poderia fazer o que quisesse.

— Claro que sim, minha querida. — Hallie a estudou por um momento. — Você conheceu o duque quando ele era jovem? Dizem que ele é um dos homens mais bonitos da Inglaterra. É verdade?

Faz tanto tempo desde que estive neste país que não conheço mais vivalma além de você e nossas amigas da escola, é claro. Você terá que me esclarecer sobre tudo, Ava.

— Bem, odeio desapontá-la, Hallie, mas seu pequeno boato é a primeira coisa ligada à cidade que ouço em meses. Estive tão ocupada com a propriedade e mantendo os cavalos de corrida em forma e saudáveis que não tenho tempo para socializar.

E era assim que deveria ser. Ava não conseguia pensar em uma maneira mais agradável de passar o tempo do que ao ar livre, cavalgando ou cuidando dos cavalos. Ser uma mulher de sucesso em um mundo de homens:

— Eu me sinto muito contente com a vida que levo.

— Sério? — Hallie perguntou, examinando-a por um momento.

— Você está mesmo feliz? Nenhuma de nós está ficando mais nova,

e a maioria das meninas com quem fomos à escola está casada, com filhos. Eu pensei que você desejasse um futuro assim. — sua amiga recostou-se na cadeira, cruzando as pernas. — Devo admitir que, por mais que eu goste de ser historiadora, de viajar para terras estrangeiras, me pergunto como teria sido minha vida se eu voltasse para a Inglaterra depois de concluir os estudos e tivesse me casado.

Meus pais, que Deus os tenha, amariam tal desfecho, e sinto que os decepcionei um pouco ao seguir meu próprio caminho.

Ava também havia decepcionado o pai.

Ela sabia que ele desejava ter tido netos, vê-los crescer antes de morrer, e que no fim eles herdariam sua dinastia hípica. Por um tempo, ela pensou em realizar tal desejo. Uma decisão que quase a jogou na ruína. Depois disso, Ava se viu decidida a ignorar as normas e expectativas da Sociedade, deixando claro que a Srta.

Ava Knight, do Haras Knight, não estava, de modo algum, à procura de um marido.

Mesmo assim, com toda a independência e proteção que seu status trazia, um homem ainda era capaz de assombrá-la em seus sonhos. Tate.

Ava se levantou e caminhou até o parapeito da lareira e tocou a sineta, queria descobrir o que havia causado o atraso do almoço.

Ela foi até a janela e puxou a cortina de veludo azul e creme para olhar para os gramados.

— Você terá a oportunidade de conhecer o duque de Whitstone.

Ele está hospedado aqui por ora. Os estábulos dele foram destruídos em um incêndio e todos os cavalos de sua propriedade estão abrigados aqui até que a reconstrução termine. Tenho certeza de que quando ele voltar de Londres, você o conhecerá. Talvez até lá haja um novo boato envolvendo Sua Graça, e o anúncio de uma nova amante.

Hallie riu.

— Você não me engana, senhorita Ava Knight. Quando mencionei o duque e que ele estava tirando Lady Clapham de sua vida, não deixei de ver que seu rosto empalideceu ao descobrir que ele mantinha uma amante. Diz que conhece o duque há muitos anos, mas eu me pergunto: o quão bem você o conhece? Porque para mim não consigo evitar de cogitar que o conheça e muito bem.

Ava se recusou a olhar na direção da amiga.

Hallie sempre foi tão boa em ler pessoas. Era uma característica que elas costumavam usar na escola, Hallie decifrava o humor dos professores, de modo que elas soubessem poderiam ser um pouco travessas, ou se precisavam ser boazinhas. Agora, na sala de casa, o discernimento de sua amiga não era bem-vindo.

— Saber da amante a magoou, me perdoe, Ava.

Ela suspirou, não querendo mais mentir para a amiga. Durante anos, ela manteve a dor escondida, mas não havia mais razão para fazê-lo. Hallie era sua amiga, e ela deveria ter confiado a verdade a ela anos atrás.

— Ouvir tais notícias é chocante, eu admito, mas não é nada fora do comum em se tratando da sociedade inglesa. — ela admitiu em voz baixa.

Uma pequena parte dela ainda sonhava com os dois e desejava voltar e lutar pelo que quis para si cinco anos antes. Mas, por mais que doesse tê-lo perdido e não por culpa própria, Ava havia percebido que o desfecho foi para o melhor.

Ela não servia para ser duquesa.

Participar de bailes e festas, ser anfitriã do mais alto calibre da sociedade. Essa vida simplesmente não era para ela. Então, de certa forma, os pais deles a fizeram um favor ao mentir e os separar.

Pois, na mente de Ava, não lhe restava dúvidas de que ela teria

falhado no dever de ser a esposa de um duque e que, no fim, Tate ficaria frustrado e decepcionado por sua falta de gracejos sociais.

Ela nunca seria capaz de lidar com o desapontamento dele. E uma duquesa deveria ser sempre respeitável, incólume, perfeita em todos os sentidos, e ela não era nada disso.

— Eu nunca conheci um duque. — disse Hallie, mudando de assunto. — Será que vou gostar dele, o que acha? — ela perguntou, sorrindo um pouco.

— Acredito que sim. — Ava respondeu, mordendo o lábio enquanto pensava em Tate. — Ele é muito bom e agradável com seus funcionários...

Uma batida na porta soou, e ela ordenou que entrassem. Um criado entrou carregando uma bandeja de prata com chá, frios e pão. Ele deixou a bandeja na mesinha de madeira diante do sofá antes de se curvar e deixá-las.

Ava se pôs a servir o chá, adicionou uma colher de açúcar na xícara de Hallie, lembrava-se que era assim que a amiga gostava, uma pitada de leite, e estendeu a xícara para a amiga. Hallie pegou o chá e encontrou o olhar de Ava por cima da borda da xícara.

— Por que tenho a impressão de que você não está me dizendo algo? O duque distanciar-se de Lady Clapham tem algo a ver com você, Ava?

Ava fechou a boca com um estalo.

Ela se sentou, esperando que o calor que subiu por seu pescoço não fosse perceptível para a amiga.

— Como devo saber o que o duque pensa da amante? — Ava disse, bebendo seu chá.

— Eu acho que você sabe muito mais do que está dizendo. —

Hallie sorriu com malícia.

Ela suspirou, passando um dedo pela lateral do pires de porcelana em que a xícara se apoiava.

— O duque só está aqui por causa do que houve na propriedade dele. Uma circunstância infeliz e muito perigosa. Se quer saber, ele até contratou um agente de Bow Street. Ao investigarem os destroços em Cleremore Hall, descobriram que há grandes chances de ter sido um incêndio proposital. Que alguém queria sim machucar cavalos inocentes.

Hallie franziu o cenho ante as palavras de Ava, toda a alegria desaparecendo.

— Embora eu não goste de montar os animais, pensar que alguém tentaria ferir tantos cavalos deve trazer uma perturbação terrível. Por favor, diga-me que todos sobreviveram.

— Sim, por graças. — disse Ava. — Conseguimos tirá-los a tempo, mas os dois estábulos dos duque sofreram estragos além do recuperável.

Ela pensou na noite em que eles se deixaram cair no chão depois de sair do estábulo que continuava a queimar detrás deles.

Ela ainda podia sentir o cheiro de seus cabelos chamuscados, a dor que a percorria a cada respiração. Ver Tate deitado ao seu lado, ofegante, foi uma visão que ela não desejava rever jamais. O medo paralisante de que ele poderia ter morrido foi revelador, e ela soube naquele momento que ainda carregava sentimentos por ele. Quando Tate levantou a mão e limpou o pó de fuligem de sua bochecha, mesmo a lembrança agora fazia seu coração palpitar no peito.

— E agora, ele está hospedado aqui. — Hallie sorriu mais uma vez, e Ava lutou para não revirar os olhos. — E vocês são amigos.

Não tenho vergonha de dizer, sendo sua amiga também, que adoraria vê-la junto a tão bom partido. Você cogita se casar em algum momento? — Hallie perguntou.

— Não mais. — Ava respondeu num rompante. — Penso que o tempo para tal ocorrência ficou no passado, e que estou bem solidificada em minha posição como solteirona. Tenho vinte e quatro anos, não se esqueça.

Halle estreitou os ferozes olhos verdes.

— E quanto a ter um amante? Você não seria a primeira mulher a fazê-lo, nem a última.

Ava estremeceu com o pensamento. A simples ideia trazia à tona memórias que ela preferia esquecer.

— Não, eu não gostaria disso.

Hallie suspirou, sentando-se na cadeira e apoiando a cabeça no encosto alto.

— Eu tive um, sabe. No Egito. Ele era um major-general ou Liwa como os chamam por lá. Ele era de uma beleza tão fatal quanto sua espada, mas não foi o suficiente para salvá-lo. Houve uma patrulha nos arredores do Cairo, uma pequena escaramuça em uma vila periférica, e ele foi morto por moradores locais.

Hallie ficou quieta por um momento, e Ava não sabia o que fazer, não tendo ideia de que sua amiga havia se apaixonado.

— A pele dele era tão escura e bonita, como cobre sob o céu egípcio. Mesmo agora, seus cabelos e feições escuros fazem meu coração bater rápido. Ele possuía os cílios mais longos que eu já vi, ou vou ver, em um homem, tenho certeza. — Hallie encontrou o olhar da amiga, seus olhos com um brilho intenso. — Foi uma das razões para eu voltar para casa, para a Inglaterra. No Cairo, não importa para onde eu me virasse, as memórias dele me assaltavam.

— Hallie balançou a cabeça, suspirando. — Era muito difícil ficar.

Ava levantou e foi se sentar ao lado da amiga, puxando-a para um abraço apertado. Ela não fazia ideia de que sua amiga havia passado por tanto. Tantos segredos entre todos elas.

— Querida Hallie, sinto muito por sua perda. Se você entregou seu coração a ele, ele era um homem bom e honrado. Fico feliz por ter voltado para casa, e seja bem-vinda a ficar aqui o tempo que precisar para curar seu coração.

— Obrigada, Ava. Eu sabia que você entenderia. Sabe que eu não tenho mais nenhuma família, que sou órfã de fato e, portanto, preciso de minhas amizades neste momento.

— Eu gostaria de tê-lo conhecido. — disse Ava, enxugando uma lágrima da bochecha da amiga.

Hallie fungou, e Ava enfiou a mão no bolso e tirou o lenço, entregando-o à amiga.

— Não sei o que aconteceu de fato, apenas que alguns dos homens dele voltaram ensanguentados e quase mortos. Omar nunca voltou, e alguns dias depois, mais soldados foram atrás dele e o encontraram já morto. Eles o enterraram. E foi tudo o que me falaram.

— Ó, Hallie.

Ava esfregou as costas dela, tentando trazer algum conforto em uma situação que não havia conforto algum. Perder o amor de alguém não era uma separação que se podia superar com facilidade. Ava sabia disso tão bem quanto qualquer um, pois levara anos para superar Tate e o fato de ele a ter abandonado, se é que se podia afirmar que superara.

— Diga-me o que posso fazer, Hallie, para melhorar as coisas para você.

Como ela não fora capaz de ver que sob as risadas e o bom humor, que a amiga sofria com uma perda tão pessoal? Ela se reprimiu por ter se cegado por seus próprios problemas, tão tolos que em nada se comparavam com os de Hallie.

— Estar aqui com você é o bastante para mim, e eu vou superar minha dor, tenho certeza. Mas nunca vou esquecê-lo, ele era o mais amável dos homens, mesmo que nossos passados e religiões fossem muito diferentes.

Ava a abraçou mais uma vez.

— Se você entregou seu coração a ele, não há dúvidas de que ele era uma pessoa maravilhosa. Você também é. E coisas maravilhosas só acontecem com pessoas como vocês.

Hallie sorriu em meio as lágrimas, e Ava prometeu que estaria ao lado da amiga enquanto fosse necessário.

— Agora que você conhece minha pequena e triste história —

disse Hallie servindo mais chá. —, conte-me toda a verdade na sua.

Ava deu uma risada autodepreciativa.

Hallie era muito inteligente para ver através de suas palavras e exigir a verdade que estava por trás delas. Ela balançou a cabeça em reverência por suas artimanhas.

— Muito bem, já que nós duas estamos contando a verdade de nossas vidas, nosso passado triste, eu contarei todas as minhas verdades. — ela se recostou no sofá, cruzando as mãos no colo. —

Há cinco anos; eu e o duque, que era marquês na época, considerávamo-nos apaixonados. Analisando com os olhos de hoje, não tenho dúvidas de que eu o amava, de fato, e com ferocidade.

Estávamos dispostos a fugir e nos casar. Contudo, só há poucos dias veio à tona como nossos pais planejaram para nos afastar.

Nenhum de nós dois sabia dessa participação. Fomos separados por um oceano. Eu fui enviada para a França, para a escola onde nós duas nos conhecemos. O duque foi enviado para a América, para viver com a família da mãe dele nos Estados Unidos. Tanto ele quanto eu acreditávamos que o outro era indiferente. Acreditamos

que o outro havia violado a confiança que partilhávamos. Não é esse o caso, e agora que sabemos a verdade, bem...

Ava se levantou e começou a andar com determinação, o algodão percal de seu vestido subindo a cada passo. Ela parou diante da lareira, segurou-se no mármore polido da moldura e sentiu emergir o ódio por terem sido tão enganados. Que as pessoas que eles amavam e confiavam acima de tudo os enganaram:

— Agora, eu não sei onde estamos. Não sei mais o que sinto. Eu amo minha vida. Eu amo os cavalos e as corridas. Posso andar a cavalo e galopar pelos campos sempre que desejar. Não tenho obrigação de ir à cidade, não preciso participar da Temporada. Não preciso estar à disposição, à espera de um chamado, nem preciso posar como enfeite de um marido. Eu gosto deste modo de vida, de ser dona de mim.

Neste instante, ela assimilou como a volta de Tate tornara a vida dela complicada. De repente, uma confusão. Quando isso aconteceu? Há um mês, ela não carregava nenhuma dessas preocupações, e agora sua mente só pensava nisso. Ela poderia desistir da vida que levava aqui e se tornar uma duquesa? Seria algo que Tate esperaria dela?

Ava mordeu o lábio, não sabia se poderia se tornar a propriedade de outra pessoa agora que havia conhecido a liberdade. Tate não a conhecia tão bem quanto antes, e que quando ele descobrisse a verdade, mesmo que ela quisesse ser a esposa dele, ele poderia considerar que ela não atendia às expectativas.

Hallie pegou o chá e tomou um gole.

— Acredita que o duque ainda gosta de você dessa maneira?

Segundo você, vocês são amigos, será que você seria capaz de almejar mais sem deixar de aproveitar a vida que leva aqui no interior? Mesmo como duquesa?

Ava não acreditava que a vida de agora teria continuidade caso se tornasse a esposa de Tate. Um ducado estava entre os mais altos postos entre a nobreza. A sociedade adorava tê-los em suas festas e eventos. Tate iria querê-la ao seu lado na cidade em todas as temporadas, e ela não era ninguém, talvez uma emergente, mas pouco mais. Uma mulher que se casou para subir na escala social.

Conversariam com ela sim, mas à portas fechadas ela seria o assunto.

— Confesso que ainda penso nele quando estou sozinha. Penso em como seria estar nos braços dele de novo. Estar contra seu tórax rígido, em como seria correr as mãos pelos músculos tesos que sei esconderem-se sob suas roupas. Sentir o toque dos lábios dele nos dela para assombrá-la durante o sono. — Ava abriu os olhos e voltou-se para a amiga. — Não sei o que há de errado comigo. Eu me pensei que havia superado toda essa paixonite.

— Acredito que — disse Hallie, inclinando-se e passando manteiga em um scone antes de colocá-lo em um pequeno prato. —

você ainda gosta do duque e que talvez precise descobrir se ele gosta de você também.

Ava suspirou ao enxergar a lógica por trás do plano da amiga, mas o nervosismo que a fazia sentir-se nauseada ao pensar em ser tão ousada tornariam difícil a concretização da ideia.

— Esse é o problema. Eu sei que gosto dele. Mas não é como eu pensava que seria a minha vida, e não tenho certeza se o quero o suficiente para desistir de tudo o que tenho agora. Eu teria que desistir dessa vida para me tornar uma duquesa. E você consegue me ver em bailes e festas? Coberta de seda e chiffon, carregando o peso da moda e das joias? Não é quem eu sou.

— Acredito que você seria uma duquesa maravilhosa. — disse Hallie com um pouco de bom humor. — Mesmo assim, parece-me

que você tem muito o que pensar. E não precisa tomar nenhuma decisão agora. Presumo que os estábulos do duque estão em reconstrução, que ele voltará para casa muito em breve.

— Sim, os estábulos estão avançando bem. De fato, se você quiser, posso mostrar a você amanhã. Poderíamos ir até Cleremore Hall para dar uma olhada. Vai preencher um pouco do nosso tempo, pelo menos.

Hallie sorriu.

— Parece perfeito.

Ava, contente pela mudança no assunto, afastou as preocupações relativas ao duque. Ela refletiria acerca dele quando estivesse sozinha.

— Precisa me dizer o que gostaria de comer no jantar. Qual é a sua refeição favorita? Vou pedir que preparem para você.

Hallie recostou-se na cadeira, parecia uma mulher sem preocupações no mundo. Quão errado todos estariam ao fazer essa suposição.

— Eu iria adorar qualquer prato que não leve cabra ou ovelha.

Acredito que também não suportaria nem mais uma tigela de arroz.

— Considere feito. — disse Ava. — Vou providenciar agora mesmo, e aproveito para verificar se seu quarto está pronto para você. Estou certa de que está exausta depois de tão longa viagem hoje.

— Obrigada, Ava. — Hallie se inclinou e pegou a mão dela, apertando-a um pouco. — Estou muito feliz por sermos amigas.

Ava colocou a mão sobre a de Hallie.

— Sinto o mesmo, querida. Por mais de coração partido que eu estivesse, minha viagem para estudar na França provou valer a pena. Você, Evie, Willow e Molly consertaram tudo para mim, o que me deixa muito feliz.

NO DIA SEGUINTE, Ava e Hallie partiram para a propriedade do duque. O som de marteladas e de madeira sendo serrada, além do zumbido suave das conversas dos homens trabalhando chegaram a elas. Elas pararam no topo da pequena colina que dava para a propriedade, observando por um momento, permitindo que os cavalos recuperassem o fôlego. Uma carruagem preta e reluzente estava parada na frente da propriedade. Lacaios carregavam depressa um tanto de baús de viagem.

— Será que o duque voltou? — Hallie perguntou, lançando um olhar na direção de Ava.

Ava observou os detalhes do cavalo que agora era conduzido em direção a um pátio próximo.

— Acho que sim, mas ele não veio sozinho.

Ava sentiu o pavor tomar conta de si ao imaginar que a mãe dele havia retornado com ele. A mulher era a única pessoa a ter arquitetado a separação dela e do duque que ainda vivia, e Ava não era do tipo que perdoa. Não quando se tratava de decisões baseadas em despeito e pressão social.

Elas retomaram o avanço, voltando a parar não muito longe de onde os estábulos novos estavam sendo erguidos. Um construtor próximo tirou o chapéu para elas, cumprimentando-as de forma calorosa. Ele veio falar com elas por um tempo e explicou o progresso da construção e que diferenças teriam dos prédios antigos.

Parecia maravilhoso.

A nova construção de tijolos vermelhos e quase todas as paredes já estavam concluídas, e alguns homens estavam no

telhado consertando as telhas em mosaico. O cheiro de pinheiro recém-cortado permeava o ar.

— Está indo bem. — disse o duque, saindo do estábulo e cumprimentando-as com um sorriso. — Não concordam?

Ava olhou do alto de seu cavalo, assimilando as suas botas hessianas e as calças bege que destacavam seu corpo para o deleite do espectador. O cabelo dele, para variar, estava despenteado pela viagem recente, mas fora isso o olhar dele era acolhedor e convidativo. Ava sorriu, animada por vê-lo e conteve um suspiro. Se for para ela permanecer indiferente, em uma simples amizade, ela teria que refrear a apreciação frequente de sua beleza.

A semana em que ele se mantivera longe obscureceu a memória dela de quão atraente ele era. Ao revê-lo ela voltou a ansiar por coisas que não ansiava há cinco anos. Como ela daria continuidade à vida como uma mulher forte e independente que não precisava de um marido para tornar a vida completa enquanto homens como o duque continuassem a desfilar por Berkshire?

Alguém pigarreando trouxe Ava de volta à realidade e às boas maneiras, e ela gesticulou para a amiga Hallie que observava os dois com diversão nos olhos.

— Perdoe-me, Sua Graça, esta é minha melhor amiga, senhorita Hallie Evans. Ela acabou de chegar do Egito onde é historiadora.

O duque fez uma reverência.

— É um prazer conhecê-la, Srta. Evans. Qualquer amiga da srta.

Knight é amiga minha.

— Obrigada pela gentileza, Sua Graça. — Hallie voltou a ostentar um olhar divertido, e cheio de conhecimento, para a amiga antes de descer do cavalo.

Ava também o fez e, entregando os cavalos a um garoto que estava esperando, seguiu em direção à casa principal.

— Eu estava prestes a entrar para o chá.

Tate sustentou o olhar de Ava, e ela não conseguiu desviar nem que sua vida dependesse do movimento. Mesmo a contragosto, ela precisava reconhecer que havia sentido falta dele na semana que passou. Embora soubesse que ele fora até a cidade para se encontrar com amigos, sendo Lady Clapham uma dessas pessoas, o sentimento não abrandava. Seria ela a razão para ele ter rompido o acordo com a amante?

— Não gostaríamos de nos intrometer. Eu queria mostrar a Hallie os estábulos, e não esperava encontrar você em casa. — Ava disse, diminuindo o passo.

— Obrigada pelo convite, Sua Graça. — Hallie respondeu, apertando o braço de Ava e puxando-a na direção da casa. — Eu, por exemplo, adoraria uma xícara de chá.

— Caso precise ir cuidar de outro assento, não há problema. —

Tate informou, sem dúvidas sentindo a relutância de Ava.

— Não há nada a ser feito. — respondeu Hallie antes que Ava pudesse falar. — Vejo que a carruagem trouxe muita bagagem para ser descarregada. Alguém da cidade veio lhe fazer companhia em Berkshire?

O duque limpou a garganta.

— Ah, não. Mas devo dizer que minha mãe veio para ficar por um tempo. Eu pensei que ela iria para uma das propriedades de Surrey, mas a encontrei aqui...

A confirmação de que era mesmo a mãe dele deixou um gosto amargo na boca de Ava e, por um momento, foi quase impossível parecer feliz e cortês por saber que mulher estava de volta à Berkshire. A mãe dele era uma víbora, e agora que sabia que ela participara na separação dos dois... Bem, ela teria sorte se um dia Ava mudasse a opinião que tinha da mulher.

Eles continuaram na direção da casa até que Tate se virou para ela, fitando-a.

— A chegada de minha mãe significa que minha estada na Propriedade dos Knight terá que terminar. Mas fique certa de que deixarei meu melhor cavalariço à sua disposição, e que meus funcionários continuarão a cuidar dos meus cavalos e manterão a vigilância para que o que aconteceu aqui não ocorra com seus estábulos.

Ava estava agradecida pela ajuda dele, mas saber que ele não estaria mais tão perto dela fez com que uma pontada de melancolia a inundasse. Durante o mês em que ele esteve em sua propriedade, ela se acostumou a vê-lo. Trabalhando os cavalos, com as calças de pele de gamo e camisa de camurça e nada mais. Os adoráveis e deliciosos vislumbres dele sempre foram bem agradáveis.

Sem o lenço no pescoço e com a camisa muitas vezes para fora das calça ele poderia, muito bem, ser confundido com qualquer um dos funcionários dos estábulos dela. Exceto pelo fato de ele ter passado por anos de criação ducal, as costas aristocráticas retas perfeitas, os ombros largos e cintura fina. A mente inteligente, que estava sempre maquinado algo por trás daqueles olhos cinzentos, o fazia se destacar de qualquer outra pessoa.

Sempre o fez...

Uma mulher veio de dentro da casa e parou à porta de entrada.

A carranca no rosto da duquesa-viúva dizia à Ava tudo o que ela precisava saber. Se ela tivesse feito preces silenciosas para que a mãe de Tate tivesse abrandado com os anos, tal possibilidade foi eliminada naquele instante junto da esperança de que a mulher sentisse, nem que fosse uma pequena fração, algum tipo de ressentimento por separar o filho da mulher que ele amava.

— Talvez seja melhor voltarmos para casa, Sua Graça. — Ava disse depressa. — O senhor e a duquesa-viúva viajaram bastante hoje, não queremos nos intrometer.

— Não vá.

As palavras dele foram tão baixas e suaves que Hallie nem esboçou ouvi-las.

— Acredito ser o melhor. Sua mãe não parece feliz em me rever.

Tate virou-se para observar a mãe e, em seguida, voltou-se para Ava.

— Nunca pensei que fosse do tipo que se importava com o que os outros pensavam.

Se ele a estava incentivando a entrar... bem, estava funcionando.

Se havia uma coisa que Ava não gostava acima de qualquer outra coisa, era de ser derrotada por inimigo. E a duquesa de Whitstone decerto que se encaixava nesta categoria.

ACOMPANHANDO AS MULHERES casa adentro e em direção à sala de visitas do fundo que era banhada pelo sol da tarde, Tate pediu chá e comida, sentindo-se feliz com o fato de estar em casa.

Ficara fora apenas uma semana e já estava de volta à Berkshire, sua residência preferida no país, e estar a poucos quilômetros de Ava era realmente um prazer.

Ele sentira falta dela enquanto estava na cidade, e vê-la inspecionando seus estábulos hoje junto com a amiga, trouxe uma explosão de alegria diferente de qualquer outro sentimento que ele já vivenciara. Ele considerou que era algo parecido com o que ele sentiu ao pisar em solo inglês depois de tantos anos na nos Estados Unidos.

A decisão de remover Lady Clapham de sua vida havia trazido satisfação também. Ele esperava que, nas próximas semanas, pudesse provar a Ava mais uma vez que ela seria perfeita como esposa e futura duquesa de Whitstone. Por mais independente que ela tenha se tornado, tê-la ao lado dele na cidade como sua duquesa, ter a atenção, o cuidado e a orientação dela na vida dele era o que ele mais queria. Ele havia ficado ocioso por tanto tempo, de um certo modo até perdido, sem ela. Ser duquesa vinha com responsabilidades, mas ele estava certo de que Ava era capaz de cumprir tais obrigações.

Elas sentaram-se diante dos bancos sob as janelas que proporcionavam uma bela vista lá de fora. O padrão floral em seda no sofá e em outros móveis combinava com o toque feminino do cômodo e com sua localização com vista para um jardim de rosas.

Preferindo manter-se de pé, Tate esperou que a mãe iniciasse uma conversa com as convidadas, mas, diante do silêncio contínuo, e o olhar de aço dela enquanto esperavam o chá, ele interpelou e apresentou Ava e a Srta. Evans mais uma vez.

— A Srta. Evans acabou de voltar do Egito, mãe. — disse Tate, tentando dissipar a tensão na sala.

A expressão de sua mãe dizia que ela não estava nada impressionada.

— O Egito, diga por favor, me explique o que uma jovem como você está fazendo em um ambiente tão remoto e severo. Um local bastante estranho para você, alguém poderia pensar.

Hallie sorriu; toda doçura e, no entanto, o olhar dela disse a Ava que sua amiga não iria ser enganada pela viúva e por seus modos calculistas.

— Estive no Egito nos últimos dois anos estudando tumbas, pirâmides e alguns outros sítios ao longo do Nilo. Suponho que se

possa dizer que eu estava cavoucando na areia atrás de sarcófagos ancestrais e artefatos. Embora esta seja uma explicação bem simplificada para o que eu faço.

— E você pretende voltar? Não deseja se casar? — a viúva olhou para Hallie com um ar contemplativo. — Você já está passando da idade, se me permite dizer, Srta. Evans.

Tate precisou dar pontos à Srta. Evans por não externar nenhum sentimento de ofensa perante os comentários de sua mãe. Ele lançou um olhar de advertência para a mãe, que foi recebido com um levantar de nariz e nada mais.

— Ficarei na Inglaterra apenas por um curto período; vim visitar amigas, como Ava, e concluirei alguns negócios. Mas pode ter certeza de que voltarei ao Egito ou a algum outro lugar que ofereça um sítio histórico tão rico.

— Vai ficar muito tempo em Berkshire, Sua Graça? — Ava perguntou, sorrindo um pouco para a mãe de Tate e recebendo nada além de um olhar frio e calculista de volta.

— Ficarei aqui por algumas semanas. Há alguns amigos com quem gostaria de conversar, e claro, meu filho está aqui.

Tate não comprou a conversa da mãe nem por um momento, e nem se deu ao trabalho de lembra-la de que eles haviam se visto na cidade na semana que se findara. Ou que ela não deveria estar aqui, mas na Residência da viúva.

— Eu estava contando à Srta. Knight e à Srta. Evans que os estábulos ficarão prontos em breve. O que significa que meus animais não alterarão sua rotina por muito mais tempo, Srta. Knight.

Não que ele quisesse trazê-los de volta. Ter seus cavalos na casa de Ava era uma garantia de poder vê-la com frequência, de conversar com privacidade.

— Que boas notícias, querido. — disse a mãe dele. — Um duque deve permanecer em suas propriedades quando não estiver na cidade cumprindo seus deveres lá.

Hallie se engasgou, o que resultou em uma tosse. Tate suspirou ante o insulto velado da mãe.

— Srta. Knight, agora que voltei de Londres, estou mais que satisfeito em permitir que Titan receba sua égua. Assim que ela estiver no cio, vamos tentar reuni-los.

A mãe dele murmurou algo baixinho, mas Ava sorriu para ele.

— Verdade? Ó, obrigada, Sua Graça. Estou muito feliz que tenha mudado de ideia.

Ele sorriu para ela e era visível que ela queria abraçá-lo, algo que ela fazia bastante quando eram mais jovens se estivesse animada. Ele sentiu falta do rosto bonito e da alma bonita. Os traços finos dela eram impecáveis, a pele era parecida com alabastro, exceto pelo nariz, onde um pouco de sardas percorria suas bochechas. Seus olhos brilhavam de excitação, os cílios escuros e sobrancelhas de um arqueado perfeito dariam inveja em toda Londres quando ela chegasse lá nos braços dele.

Como a mãe dele podia pensar que ela era de beleza comum estava além da compreensão dele. Ela era muito superior a ele em todos os aspectos que importavam.

— Precisamos mesmo discutir tais assuntos, Tate, meu querido?

A conversa não é muito apropriada, não acha? — disse a mãe dele, o tom cheio de censura direcionado para Ava.

— Sobre o que você prefere conversar, mãe? As últimas fofocas da cidade, ou que escândalos estão em curso entre seus pares?

Nenhum dos quais me interessa.

— A mim interessa, e é tudo que importa, não é? A viúva sorriu.

— Eu bem ouvi alguns rumores acerca de um certo cavalheiro nobre

que andou sendo tolo e quase causou um escândalo para a própria família. Agora... — ela disse, batendo com o dedo no queixo. —

Deixe-me pensar para ver se lembro de quem se trata.

Tate olhou para a mãe, que estava brincando com fogo.

Ele voltou a atenção para Ava.

— Por falar no meu garanhão premiado, como está Titan, senhorita Knight? Espero que ele esteja se comportando em seus estábulos, sem se empolgar demais na frente das éguas? O cavalo, tão rápido e brilhante como ele era, também era vaidoso, se é que cavalos podiam ter tal característica.

— Todos os seus cavalos estão com plena saúde, e alguns dos seus cavalariços os levaram hoje de manhã para um galope, percorrendo algumas das pistas de corrida. Acho que ficará satisfeito com o desempenho de alguns de seus animais mais novos.

Que mulher maravilhosa ela era, inteligente e apaixonada. Ela amava as mesmas atividades que ele. Na verdade, foi o pai de Ava que despertou a paixão de Tate pelas corridas, e ele de fato precisava agradecê-lo pela direção que sua vida tomara longe das propriedades ducais de seu pai.

— Você ainda gosta de correr e se enfiar nos estábulos, senhorita Knight? Vejo que a Escola de Etiqueta na França não a livrou disso.

A mãe dele ostentava um olhar de satisfação, ausente de um pingo de remorso pelas palavras nada apropriadas, na direção de Ava.

Tate virou-se para a mãe.

— Há mais...

— Acredito, Sua Graça — Ava disse o interrompendo. — que a senhora está certa. A escola não me tirou minhas paixões, nenhuma

delas, e agora que estou de volta a Berkshire, estou muito satisfeita com o que está diante de mim.

Ava lançou a Tate um olhar diabólico e, incapaz de se conter, ele riu. A boca de sua mãe franziu em uma linha de descontentamento.

— Suponho que deveríamos contratar seus serviços, Srta.

Knight, para trabalhar em nossos estábulos, já que gosta tanto de tais passatempos. Quanto um cavalariço ganha hoje em dia, Tate, meu querido? — a mãe perguntou, a voz pingando doçura inocente.

— A Srta. Knight é uma empresária bem-sucedida, mãe. Ela não precisa procurar emprego aqui.

Tate lançou um olhar de advertência à mãe, que ela ignorou com mais um levantar de queixo. Caso fosse necessário, ele a escoltaria para fora da sala antes que ela continuasse a insultar Ava.

Sem pestanejar, Ava respondeu:

— Você sabe tão bem quanto eu, Sua Graça, que herdei os negócios, os bens e as terras de minha família. De fato, se eu quisesse, poderia valsar por toda Londres e participar dos mesmos eventos que você. Mas, infelizmente, neste caso, você não pode arcar com o que custaria para me ter trabalhando aqui.

A viúva estreitou os olhos.

— Srta. Knight, você está enganada. As esferas em que circulo não recebem moças se origens plebeias entre os seus. O que me faz me perguntar por que estou aqui oferendo chá para vocês.

— Bem, suponho que seja porque seu filho, o duque, nos convidou, e não você. Então, tecnicamente, você não está nos oferendo nada. — Ava disse, tomando um gole de chá como se a conversa girasse em torno das estações.

Houve uma batida leve na porta e um lacaio entrou carregando chá e doces antes que mais palavras pudessem ser ditas. Tate já

ouvira o suficiente, e caminhando até a mãe, pegou a mão dela e a puxou para ficar de pé.

— Por favor, desculpe-nos um instante. — ele disse.

A mãe dele sorriu, mas não disse outra palavra enquanto ele a arrastava para fora da sala. Assim que estavam em segurança no corredor perto da escada, ele a girou.

— O que deu em você? Como pode ser tão rude? Eu a avisei, ainda em Londres, acerca desse comportamento. Não irei tolerar.

O rosto dela estava cheio de raiva, os olhos em fúria.

— Não volte a trazer aquela mulher aqui. Ela não é bem-vinda e nem é adequado que nós, um duque e uma duquesa, tenhamos que nos sentar e tomar um chá com uma treinadora de cavalos.

Tate lutou para controlar a própria fúria. Ele deu um único passo para se aproximar dela, apontando um dedo a centímetros do nariz erguido da mãe.

— Não quero que você fale com ninguém que eu convide para minha casa daquela maneira. Você tem uma escolha, mãe. Ou retorna àquela sala e pede desculpas à Ava de forma civilizada, ou pode arrumar suas coisas e deixar estar propriedade.

A mãe dele ofegou.

— Você expulsaria sua própria mãe? Trocaria a mulher que deu à luz a você por uma plebeia que se jogou em cima de você antes que você fosse maduro o bastante para compreender as implicações de atitudes tão insensatas e joviais.

Tate rangeu os dentes, tendo ouvido o suficiente.

— Instrua sua criada pessoal para que volte a guardar seus pertences nas malas caso ela já tenha desfeito todas. Você parte para Londres ao amanhecer.

A mãe dele correu pelas escadas.

— Eu não vou a lugar nenhum, Tate, e não tente me forçar a nada ou nunca o perdoarei.

Tate levou um momento para recuperar a compostura antes de voltar para a sala, apenas para encontrá-la vazia. Ele voltou ao corredor, e abriu a porta da frente. Ao longe, perto dos estábulos, ele pôde ver Ava e a amiga subindo nos cavalos.

— Droga. — ele xingou, observando-as por um momento antes de fechar a porta.

Não era assim que ele queria que seu tempo com Ava terminasse hoje, depois de passar uma semana fora. A presença da mãe aqui tornaria difícil que ele confraternizasse com Ava e ele teria que ficar de guarda quando ela estivesse presente. Pois, se uma coisa era certa, a mãe dele não queria nada de bom e estava decidida a trazer o inferno à Terra. E parecia que recorreria até aos modos mais grosseiros para mantê-los separados.

CAPÍTULO 9

Confiei no seu amor, nas suas palavras e ainda não consigo entender como pude estar tão errada. Que todo esse tempo você estava preso a um acordo que não queria. Sinto muito por ter acreditado que não poderia ser honesto comigo.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

A VA INCITOU Gallant Girl o mais rápido que pôde nas pistas em que treinavam os cavalos. Hoje era um teste para ver se ela conseguiria um bom tempo em uma corrida de verdade e, com alguma sorte, um tempo que venceria algumas corridas que antecedem Ascot.

— Ótimo trabalho. — disse o treinador, enquanto ela diminuía a velocidade para um galope lento até que se tornasse um trote. A respiração do cavalo era rápida e, no ar fresco da manhã, vapor subia de seu corpo e de suas narinas.

O coração de Ava deu um pequeno pulo quando viu Tate em pé ao lado de seu administrador. Ele era mais alto do que os outros em torno dele, e hoje ele estava vestido com um belo casaco grande, com a gola de pele de raposa cinza aconchegada ao redor do pescoço, mantendo-o quente. O gorro de lã era o toque final ao visual casual, e cada vez que ela o via, ele a atraía, tentava-a como ninguém jamais havia conseguido. Ele a tentava a viver uma vida

diferente àquela que ela havia trabalhado com tanto afinco para se proteger.

Ela tateou o rosto em busca de lama que poderia ter voado dos poucos cavalos que estavam cavalgando à sua frente e esperava que ela não parecesse uma piada, sorriu.

— Que surpresa agradável, Sua Graça. Não esperava vê-lo aqui tão cedo de manhã.

Ela fez um último carinho no cavalo seguido de um tapinha no pescoço antes de saltar. Um jovem cavalariço se aproximou e pegou as rédeas dela, antes de levar Gallant Girl de volta aos estábulos onde ela receberia uma merecida massagem.

— Eu me levantei cedo. — respondeu o duque. — Um pequeno problema com os estábulos de casa e pensei em supervisionar meus cavalos, já que ainda estão aqui.

Ava esperava que ele quisesse vê-la, mas ela assentiu, feliz em vê-lo não importava o motivo para ele estar ali.

— Muito bem então, Sua Graça.

Greg levantou o relógio de bolso, sorrindo.

— Boa volta hoje, Srta. Ava. Pode ser que já tenhamos uma chance.

— Chance? — o duque perguntou, olhando entre eles.

— Queremos inscrever Gallant Girl em Ascot no próximo ano.

Acreditamos que ela tem chances de ficar entre os primeiros, e ela nunca esteve em melhor forma.

— Quem não arrisca, não petisca. — disse Greg, inclinando o chapéu. — Estou de partida, então. Nos vemos mais tarde, Srta.

Ava.

Ava assentiu e voltou-se para Tate, que a estava encarando. A inspeção intensa dele a deixou sem fôlego, e ela esperava que ele

não percebesse o calor que tomava conta de seu rosto naquele momento.

— Se levar Gallant Girl para competir em Ascot, podemos ter de enfrentar um ao outro. — a voz profunda dele fazia com que fosse difícil ela se concentrar nas palavras que ele dizia.

Ava se recompôs e se concentrou.

— Não tenho esperanças de vencer, decerto que não contra Titan, mas espero alcançar uma boa colocação. Acho que minha Gallant Girl é capaz disso.

— Eu nunca duvidaria. — ele gesticulou para que caminhassem em direção à casa. — Posso acompanhá-la de volta para casa? Há algo que desejo discutir com você.

Ava o estudou por um momento e notou que as sobrancelhas dele estavam franzidas.

— Há algo que o incomoda, Sua Graça? — ela perguntou.

Ele franziu mais o cenho, a boca curvada para baixo.

Ela não gostou de vê-lo dessa forma, e sentiu uma vontade avassaladora de confortá-lo. Uma reação que ela não teve nos últimos cinco anos, com ninguém mais.

— Houve outro incêndio. Dessa vez foi na propriedade de Lorde e Lady Morton, no sul de Berkshire. O incêndio começou no meio da noite e, infelizmente, eles perderam dois cavalos e um dos cavalariços.

Tate passou a mão na mandíbula, e Ava percebeu que ele não havia se barbeado pela manhã.

— Ó, meu Deus, não. — Ava piscou para segurar as lágrimas pela perda da vida de um jovem cavalariço e dos pobres cavalos. —

Como estão Lorde e Lady Morton?

— Devastados, eu presumo. Estou indo para lá agora e queria saber se gostaria de vir comigo. Lady Morton pode precisar de uma

amiga neste momento, e eu sei que ela gosta muito de você.

Ava sentia muito apreço também por Lorde e Lady Morton. Lady Morton em particular a ajudou a resolver alguns problemas que teve no ano anterior. Um apoio que veio numa época de que ela preferiria se esquecer. Um calafrio percorreu sua espinha, e ela afastou as lembranças alarmantes.

Era um casal de idosos, e com frequência faziam Ava se lembrar de seu próprio pai, adoravam os cavalos e a vida no campo, e não cobiçavam nada que estivesse além de seus portões.

A honorável senhora mostrara-se bem contente de desistir da vida em Sociedade e se estabelecer no interior. Ava sempre amou isso neles. Os dois faziam o que lhes apraziam e ignoravam o que os demais poderiam vir a pensar. Um sonho que ela e o duque já dividiram, mas que agora com tantas responsabilidades longe de Berkshire, ela já não estava tão certa de que ele poderia abandonar Londres por tantos meses e se esconder no interior.

— Claro que eu vou com você.

Ava chamou Manny e, em poucos minutos, os dois estavam galopando pelos campos ao sul, em direção à propriedade dos Morton. Com o orvalho ainda no chão, e os pássaros cantando suas melodias matinais, o sol se levantou ao lado deles, aquecendo a terra e dando a partida para um novo dia.

Ava não pôde deixar de pensar na terrível tragédia pela qual as famílias Morton e do jovem cavalariço passavam naquele exato momento.

— Sua Graça, acredita que este incêndio também foi proposital?

Tate, que estava ao lado dela, a fitou e o olhar de desprezo que ele ostentava dizia que sim, que ele acreditava na possibilidade.

— A missiva que recebi de Lorde Morton afirma que um trabalhador testemunhou uma sombra correndo do estábulo onde o

primeiro incêndio ocorreu. O trabalhador disparou o alarme na mesma hora e, no entanto, os estábulos foram consumidos com muita rapidez, e ficaram descontrolados antes que algo pudesse ser feito de fato.

— Você avisará deste novo incidente ao agente.

Tate assentiu.

— Enviei a carta de Lorde Morton junto de minha missiva, para servir de prova do incêndio. Estou certo de que o investigador chegará a Berkshire nos próximos dias. Pedi a ele que viesse disfarçado, claro. Para tentar descobrir algo.

— Creio ser o melhor. — disse ela.

Eles cavalgaram por meia hora, a jornada completa não deveria levar mais do que uma hora. Tate diminuiu a velocidade da montaria quando chegaram a um bosque, e Ava seguiu o exemplo. A mente dela estava dominada sobre teorias acerca dos incêndios nas propriedades que circundavam a dela. Havia mais um vizinho nas redondezas, e ela enviaria um bilhete para que se mantivesse alerta. Melhor prevenir do que remediar.

— Vamos descansar os cavalos por alguns minutos e continuar.

Ava parou ao lado dele, e dando rédea à Manny, permitiu que o cavalo mordiscasse a grama a seus pés. Ela aproveitou a oportunidade para observar o entorno. Um lampejo de movimento no vale chamou sua atenção, e ela estreitou os olhos tentando ver o que havia se movido.

— O que é aquilo lá nas árvores? — ela apontou para onde vira o movimento pela última vez, e Tate se virou naquela direção. — É

um homem andando a cavalo pela base do prado?

A pessoa, que não sabia que Ava e Tate estavam ali, saiu de uma área de mata mais fechada, e ela pôde vê-la melhor. Vestia-se com roupas escuras, um casaco longo e um chapéu de aba larga

havia sido puxado bem para frente, cobrindo seu rosto. Ele estava indo para o norte e parecia vir de uma direção ao sul. Estranho, considerando que um homem vestido da mesma forma acabara de queimar os estábulos ao sul daqui...

— Devemos descer e ver quem é. Considerando que houve um incêndio apenas algumas horas atrás, e agora vemos este cavalheiro cavalgando para o norte, seria justo questioná-lo. Ele pode ter visto alguém ou algo. — disse o duque sem tirar os olhos do sujeito.

Ou poderia ser o culpado.

Ava não disse tais palavras em voz alta, mas não pôde deixar de imaginar. Havia alguém na área iniciando esses incêndios. Poderia ser qualquer um de seus conhecidos, ou um completo estranho.

Nesse momento, eles não podiam isentar uma única alma.

Tate pegou as rédeas e incentivou sua montaria com o pé. Ava fez o mesmo, e eles galoparam em direção ao homem, e o cavaleiro que seguia para o norte ainda não os notara. Quando se aproximaram, o barulho baixo dos cascos no gramado úmido embaixo deles avisou ao cavalheiro de sua presença.

Ele olhou por cima, claramente surpreso, e Ava puxou o cavalo quando ela notou que ele estava com um cachecol amarrado no rosto, cobrindo a boca e o nariz. Apenas os olhos dele eram visíveis, mas a essa distância ela ainda nunca seria capaz de distinguir quem poderia ser, caso sequer o conhecessem.

Sem hesitar, o homem esporeou o animal com força passando a um galope veloz. O fato de que a intenção dele era a de fugir fez com que os cabelos da nuca dela se arrepiassem, e Tate foi atrás dele, incentivando seu cavalo na direção em que o cavaleiro havia partido.

Eles correram atrás dele.

O cavaleiro continuou se esforçando para abrir distância, e Ava seguiu Tate por uma pequena sebe, abrindo caminho entre árvores e campos que não pareciam retardar o homem questionável.

O cavaleiro olhou por cima do ombro mais uma vez, e Ava o ouviu xingar. Conhecendo Berkshire tão bem quanto ela, Ava percebeu que estavam chegando a uma parte da região que era atravessada por um riacho mais adiante, algumas partes eram profundas o suficiente para nadar, e outras bem rasas.

— Ele vai precisar desacelerar para atravessar o riacho. — ela gritou para Tate, apontando para o curso d'água que agora estava aparecendo.

Tate assentiu.

— Vamos pegá-lo lá e descobrir o que quer.

Ao sair de uma pequena área arborizada, um galho de árvore ricocheteou e atingiu Ava na bochecha, trazendo lágrimas aos olhos. Ela tocou na área ferida, e ao recuar a mão enluvada, notou sangue nela. Continuaram a seguir o homem até o riacho, e quando Ava pensou que o homem pararia e seria questionado pela fuga, ele forçou o cavalo a atravessar a água. As patas do cavalo escorregaram por um momento, e o homem teve dificuldade para se manter sobre o animal.

— Pare! — gritou Tate que foi ignorado pelo cavaleiro que alcançou o outro lado da margem. — Por que corre?

O homem não se deu ao trabalho de responder, apenas subiu uma pequena colina. Eles o perderam de vista um momento antes de Ava, ao perscrutar as árvores, o reencontrou.

Ela parou ao ver uma pederneira apontada bem para eles.

Tate fez menção de incitar a montaria a seguir, mas Ava esticou a mão e o segurou pelo braço. — Ele está armado, Tate, olhe. —

disse ela, empurrando o cavalo para trás.

— Maldição. — Tate murmurou, e fez o mesmo.

Era tarde demais para correr, e os dois estavam em campo aberto, alvos fáceis, se analisassem a situação. O homem ergueu a arma, e Ava girou a montaria depressa, sabendo que precisavam afastar-se o mais depressa possível.

Um tiro ecoou no ar, e o cavalo de Ava empinou. Ela tentou se segurar, mas não conseguiu, e então percebeu que não era só ela que iria cair. Voando para trás, seu cavalo também perdeu o equilíbrio e tombava. Ava caiu com força, e uma dor lancinante rasgou seu braço do pulso até o ombro. Felizmente, Manny não caiu em cima dela, mas rolou ao seu lado e logo recuperou o equilíbrio e ficou de pé.

O som de um cavalo em retirada ecoou nas árvores e, em seguida, os braços reconfortantes de Tate a envolveram quando ele ajoelhou-se, os olhos dele repletos de medo enquanto a examinava em busca de um ferimento de bala ou outro causado pela queda.

— Eu estou bem. Apenas caí, nada mais.

Ava movimentou-se para ficar de pé, mas fez uma careta de dor quando seu braço se recusou a completar o movimento.

— Você está ferida. — disse ele, ajudando-a a se apoiar.

Ava tentou mover o ombro e descobriu que ele estava bem na medida do possível, porém ao tentar movimentar o pulso sentiu dor atravessar a articulação.

— Acho que o pulso... — ela fez uma careta.

Tate arrancou a gravata do pescoço e a amarrou no pulso dela, tentando limitar o movimento. Ava não pôde deixar de vislumbrar o pescoço exposto de Tate agora que a gravata dele estava com ela e, por um momento, se esqueceu do homem na colina e do perigo em que ainda poderiam estar correndo.

Ela olhou por cima do ombro para onde o vira pela última vez, mas não havia mais ninguém lá.

— Ele partiu no momento em que a arma disparou. Sinto muito por tê-la colocado em perigo, Ava. Eu não deveria ter iniciado uma perseguição com você ao meu lado.

Ela balançou a cabeça quando ele a ajudou a se levantar. Com o braço bom, ela espanou o traje de montaria e retirou algumas folhas e galhos do cabelo.

— Ninguém, além daquele homem, é culpado pelo que houve aqui hoje. Nenhum de nós sabia o que ele ia fazer.

Tate não pareceu convencido, mas ele a ajudou chegar até o cavalo, sem deixar de verificar Manny e certificando-se de que a égua estava sem ferimentos.

— Consegue cavalgar?

— Creio que sim, mas vou precisar de ajuda para subir na sela.

Uma fração de segundo após as palavras serem ditas em voz alta, Tate a pegou como se não pesasse mais que uma pluma e a posicionou na sela. Ele assobiou para a própria montaria se aproximar antes de ajustar o braço dela para ficar contra o peito durante a volta para casa.

Ele se levantou no cavalo, o que proporcionou a ela uma bela visão de seu traseiro.

— Obrigada. — disse ela, afastando o olhar, mas não antes que ele a pegasse olhando para ele.

— Venha, vamos voltar para sua propriedade e mandarei chamar um médico de imediato. Se o pulso estiver quebrado, ele saberá o que fazer.

Ava esperava que não fosse o caso, e sim uma simples torção. A volta para casa foi desconfortável, mas a restrição improvisada

ajudou de alguma maneira a impedir que a mão se movesse e sacudisse a articulação.

Tate a inspecionava com frequência, os olhos dele plenos de preocupação, e o coração dela se aqueceu por ele se importar. Era bom que os dois fossem amigos outra vez. Ela sentia mais a falta dele do que era capaz de admitir.

— Você sempre se importou com as outras pessoas. Mesmo agora, tantos anos desde que nos conhecemos, ainda é uma alma carinhosa, não importa o quanto tente me dissuadir desse fato.

— Não o bastante já que foi ferida. — ele franziu a testa. — A culpa é minha. — ele repetiu, olhando de esguelha para a mão dela que estava bem segura contra o peito. — Eu deveria ter ido atrás dele sozinho em vez de tê-la colocado em perigo como fiz.

— Que bem isso faria? — Ava respondeu, não querendo ouvi-lo se culpar nem um pouco. — Nós não sabíamos que o homem estava armado, ou que ele iria fugir. Acredito que podemos concordar que o cavalheiro não era de bem e que pode ser o responsável pelos incêndios.

Ele suspirou, inclinando-se e protegendo as costas dela enquanto os cavalos avançavam por uma inclinação mais íngreme no campo. A mão quente dele contra sua coluna causou arrepios, e ela fechou os olhos por um momento, deleitando-se com o toque dele outra vez, com a sensação de tê-lo tão perto quanto agora.

— Acredito que você pode estar certa. Creio que devo escrever para o agente mais uma vez, essa noite ainda.

Ava lançou um sorriso para ele.

— Creio que sim.

A volta para casa foi lenta. O tempo começou a mudar e, quando a luz do sol desapareceu detrás de uma nuvem, Ava se arrependeu

de não ter trazido seu casaco de montaria mais grosso nessa viagem.

— Está com frio? — ele perguntou, puxando o cavalo para uma parada. Ava fez o mesmo, olhando para o céu, que agora parecia estar prestes a desabar.

— Um pouco, mas devemos chegar em casa daqui a pouco.

Não que fosse adiantar, já estava se sentindo bem gelada. Ela estremeceu de novo, e Tate saltou do cavalo, caminhou até ela e ergueu no cavalo, detrás dela.

Ela ficou rígida quando o corpo dele encontrou com o dela, duro.

Eles não ficavam tão perto assim desde o dia anterior à fuga planejada, e ela engoliu em seco sem saber o que fazer assim do nada.

Tate ficou quieto por um momento, e ela se perguntou no que ele estava pensando. O corpo dele estava tenso, era duro e largo, e de certa forma lançava uma sobre ela. Ela sorriu quando ele se inclinou, pegou as rédeas das mãos dela e incitou a montaria a prosseguir.

O cavalo dele os seguiu.

Aroma de sândalo permeou o ar ao redor deles e trouxe consigo uma enxurrada de lembranças de quando ele a cortejara. De quando ele o beijou no pescoço uma vez no grande celeiro que estocava feno, e de quanto ela passou a amar o cheiro amadeirado desde então. O corpo dele se movia a cada passo do cavalo, e ela sentiu calor subir pelas bochechas.

Usando uma das mãos para guiar o cavalo, ele passou o outro braço pela cintura dela, mantendo-a com mais firmeza contra ele.

Ela ofegou e conseguia ouvir a respiração dele entrecortando contra sua orelha.

A respiração dela também estava irregular, como se tivesse acabado de correr. Em anos anteriores ela teria se virado e o beijado enquanto seguiam, mas agora isso não era possível. Por mais que ela odiasse admitir, a mãe de Tate estava certa. O homem detrás dela precisava de uma mulher apta para o papel de duquesa.

E Ava, com suas calças e botas curtas cobertas de lama, seu amor por cavalos e corridas nunca seria adequada para o papel. Ele precisava de uma lady em seu sentido mais literal. Ela nunca seria uma dessas. Não de verdade. E, no entanto, caramba, uma parte dela o queria com um fervor que afugentava qualquer calafrio.

Ela não havia nascido para ser uma duquesa, mas não significava que eles não pudessem chegar a outro tipo de acordo.

Um que fosse agradável para os dois.

Ava colocou a mão sobre a dele e apertou-a um pouco.

— Eu sei que você está preocupado, mas, sinceramente, acredito que seja apenas uma torção. Você bem sabe que eu já sofri acidentes piores à cavalo.

Ele rosnou seu descontentamento e, para a surpresa dela, ela conseguiu sentir o leve toque dos lábios dele em seus cabelos.

— Não posso perdê-la de novo. Quando vi você cair, pensei que o tiro a havia acertado. Ou que o cavalo cairia sobre você.

Ela esfregou a mão enluvada dele, sentia-se gostar da preocupação dele mais do que deveria. Isso era ruim. Ela não deveria permitir tais liberdades, toques íntimos, mas como poderia recusar...

— Não acredito que ele seja um bom atirador.

Ele riu, e o movimento penetrou a alma dela, iluminando-a de uma maneira que ela não sentia há anos. Desta vez, ele beijou seus cabelos, e lágrimas brotaram nos olhos dela. Ava preferiu atribuir as lágrimas à dor no pulso, mas não era o motivo.

Este homem, seus cuidados e natureza doce sempre fizeram suas defesas desmoronarem. Como ela se negaria a ficar perto dele quando o queria tanto assim?

Só não queria o papel da duquesa. Ava mordeu o lábio, despedaçada por tudo. A atração por Tate sempre que estavam perto um do outro tornava-se maior a cada dia. Mais do que nunca, agora que eles sabiam a verdade acerca da separação deles.

Ignorar tal atração era uma batalha que vinha enfrentando dia após dia, mas não queria mais lutar.

Às vezes, ela queria se encaixar nos braços dele, inclinar-se e beijá-lo como no passado e ver para onde ele a carregaria. Para um futuro com que ela sonhara, mas que aprendera a viver sem.

CAPÍTULO 10

O S DOIS DIAS seguintes foram um borrão de dor e momentos inquietos de sono. Não importa para que lado ela se virasse na cama, ou se andasse pela casa, o ato resultava em um movimento do pulso e dor se espalhava pela região.

Ava rolou na cama, a luz do sol inundando o quarto e interrompendo seu sono. A visão de uma forma masculina sentada em uma cadeira ao lado de sua cama afastou todo o sono de seu corpo. Ela sentou-se, encolhendo-se quando o pulso protestou contra o movimento.

— Tate, o que você está fazendo no meu quarto? — ela olhou ao redor depressa, notando que estavam sozinhos. — Você não deveria estar aqui. — ela sussurrou.

Tate estava sentado em uma cadeira, um livro descartado aberto em seu colo. Ele se inclinou na direção da cama, e pegou a mão dela.

— Cheguei cedo para observar o treino de Titan e queria estar aqui para quando você acordasse. Trouxe o café-da-manhã para você. — ele se levantou e foi até um aparador, pegou a bandeja e a colocou ao lado dela na cama. — Como está se sentindo? — ele perguntou.

Ava se ajustou nos travesseiros.

— Fora o pulso doendo, me sinto bem. A tisana que Hallie faz para mim está funcionando muito bem. Não tenho certeza do que mais ela coloca, mas seja o que for, a erva é bem benéfica. Sou grata pela companhia dela.

Ela olhou para a faixa envolvendo o pulso, a camisola um pouco aberta no pescoço. Ava agarrou os cobertores e os puxou para o peito. Tate olhou para ela por um momento, antes de suspirar, vindo sentar-se na cama dela.

— Eu estava com tanto medo de haver mais lesões e não posso dizer o quanto estou agradecido pela bala não a ter acertado. O

médico diz que você ficará bem, após uma semana ou duas de descanso.

Recostando-se nos travesseiros, ela conseguia imaginar sua aparência. Uma mulher que fora incapaz de fazer muito por si nos últimos três dias e, como havia acabado de acordar, seu cabelo estava torto, os olhos inchados de sono. E, no entanto, o olhar de total adoração que ela via no rosto de Tate a lembrou de como ele costumava olhá-la quando eles estavam namorando.

— Você se lembra quando me ensinou a nadar? — ela perguntou, observando-o.

Ele sorriu, assentindo um pouco.

— Sim. Você me fez mostrar todas os tipos de braçadas diferentes das quais eu era tão experiente e conhecedor, mas o tempo todo você já sabia nadar. Percebi naquele instante que você era sinônimo de confusão.

Ava riu, lembrando-se que ele ficou tão vermelho quanto uma beterraba quando ela contou a ele a verdade da situação.

— Você sentiu tanta vergonha e achou que eu havia pregado uma peça. Que, de certa forma, foi o que fiz, não?

Ele olhou para a cama, o dedo seguindo a linha das flores bordadas nos lençóis.

— O que a fez pensar dessa forma naquela época? — ele perguntou, olhando para cima e sustentando o olhar dela.

A vontade de passar a mão pela mandíbula dele, sombreada com uma ínfima camada de barba crescendo era quase impossível de refrear. Ele sempre esteve lá por ela, querendo agradar e ser um amigo, um protetor.

— Eu não sei. — ela deu de ombros. — Venho pensando muito em nosso passado, e essa é apenas uma das muitas lembranças que me fazem sorrir.

— Por melhor nadadora que tenha dito ser, teve sorte de eu estar lá no dia em que teve uma cãibra e afundou, se debatendo, se bem me lembro.

Ele sorriu e ela riu, embora na época o incidente foi de tudo menos divertido.

— Haverá momentos em nossas vidas em que ocorrerão acidentes ou situações em que não estaremos juntos. Eu queria que você soubesse que o que aconteceu conosco três dias atrás estava fora de nosso controle, completamente. Você não precisa ficar e cuidar de mim, Tate. Eu vou ficar bem.

Ava estendeu a mão e colocou em cima da dele, deleitando-se com o calor e que ele virou a palma para cima, dando um breve aperto na mão dela:

— E de qualquer maneira, é apropriado que você esteja aqui, Sua Graça? — ela perguntou, sorrindo com malícia.

O olhar intenso dele, que estava carregado com emoções demais para ela lidar, penetrou nela.

— Você quer que eu saia?

Ela refletiu por uma fração de segundo.

Ava negou com a cabeça, falhando para com seus instintos, indo contra as promessas que fizera de que sempre seria dona de si. De não responder a ninguém, de não pertencer a vivalma.

— Não, eu não quero que você vá. — disse ela por fim, sincera em cada palavra.

— Que bom, então. — disse ele, inclinando-se e dando um beijo suave em sua bochecha. — Porque eu não quero sair. — sussurrou no ouvido dela.

Ava estremeceu e se virou, deixando os lábios perto o suficiente para beijá-lo. Sem se lembrar do pulso ferido, ela voltou a atenção para os lábios dele, ainda tão tentadores como sempre foram. Um desejo feroz a atravessou por ter ficado longe dele por tantos anos.

Ela se afastou quando a porta se abriu e a criada entrou com água quente e roupa de cama limpa.

Por um momento, Tate não se mexeu.

Em seguida, se afastou com um suspiro pesado. O olhar intenso dele a deixou sem fôlego, e ela podia sentir as bochechas queimando. O que ele estaria pensando depois do quase beijo?

estaria esperando a criada sair? Ou ele estaria apenas debatendo se deveria esperar e beijá-la de qualquer maneira, com espectadores ou não.

Ele se inclinou e pegou a bandeja de café-da-manhã, colocando-a diante dela.

— Obrigada. disse ela, pegando a xícara de chá e tomando um gole.

Ava dispensou Jane e ignorou a expressão assustada que a moça fez ao ouvir as ordens.

— Devo admitir que me sinto voraz esta manhã.

— Eu também. — ele murmurou, sem divertimento no tom. —

Virei visitá-la amanhã, Ava. Há algumas coisas que preciso discutir com o agente de Bow Street. Ele chegou hoje de Londres. Parece que há uma chance de ser Lorde Matthew Oakes, o visconde, o responsável pelos incêndios.

Um calafrio percorreu a espinha dela ante a menção de Matthew, um homem que ela nunca mais queria ver. Um homem que ela se prometeu que nunca mais a tornaria uma vítima. Ava estendeu a mão e apertou o braço de Tate, interrompendo sua partida.

— Não, espere, Tate. Quero dizer, Sua Graça. Tem certeza de que Lorde Oakes é o suspeito? Eu pensei que ele estava na Espanha.

— Estava, mas retornou ao país uma semana antes do incidente em Cleremore.

Ava ofegou, e ele franziu a testa, estudando-a por um momento.

— O que você sabe de Lorde Oakes?

Náusea a dominou ao pensar em contar a Tate a idiota que ela fora no ano anterior, logo que retornou à Inglaterra e descobriu que Tate estava em Londres vivendo sua vida ao máximo, rodeado de diversas mulheres, sendo que nenhuma delas era ela. Que ela agiu por ciúme e devido à sua tolice cometera um erro que quase custou sua vida e reputação.

— Ele não é confiável, é tudo o que sei dele.

— Você está mentindo que eu sei, Ava. — disse ele usando seu nome de batismo, o que a assustou um pouco. — E, por favor, permita-me chamá-la pelo primeiro nome, e você faça o mesmo comigo. Acho que nos conhecemos há tempo suficiente para nos tratarmos assim quando estivermos a sós.

Ela encontrou o olhar dele, gostando da ideia.

— Muito bem, vamos usar nossos primeiros nomes.

A resposta dela foi, em parte, para enrolar e não responder a pergunta que ele fez. Como ela poderia explicar que as fofocas da cidade foram como uma faca no coração dela, que a haviam deixado tola e cega? Que cometera um erro que não havia como remediar.

— Conheço Lorde Oakes um pouco. Há rumores de que ele está com problemas financeiros, mas iniciar incêndios no condado em que reside não faz sentido. Acho difícil acreditar que ele tenha alguma coisa a ver com esse assunto. Até onde sei, ele nunca mostrou tamanha crueldade com os animais.

Porém, ela havia visto muito bem como ele reagia com as pessoas, em especial com ela, quando ele não conseguia o que queria.

O duque voltou a sentar-se ao lado dela que se afastou um pouco, seu tamanho e presença a dominando, confundindo sua mente, e ela precisava manter o juízo. Precisava se lembrar de que não queria um marido, que ele não se encaixava no futuro planejado com os mínimos detalhes por ela, como uma velha matrona.

Ava pegou um pedaço de torrada e deu uma mordida, ocupando-se, tanto quanto podia, na esperança de que ele se esquecesse dessa parte da investigação e voltasse para casa.

— Se você sabe algo de Lorde Oakes, precisa me dizer. Eu não o vejo desde que ele era um garoto de calças curtas, e pelo que me lembro, ele nunca foi de dar trabalho. Porém, caso você saiba de algo que possa explicar o porquê de ele talvez ter sido visto em Cleremore e agora na propriedade de Lorde Morton, é imperativo que me conte.

Pensando na noite do incêndio do duque, o cavalheiro que gritara notificando-os do segundo incêndio com certeza se encaixava nas características de Lorde Oakes. Ava deixou a ideia de lado. Agora ela estava imaginando coisas. Havia tanta coisa acontecendo naquela noite, tantas pessoas que poderia ter sido qualquer um, até um dos funcionários do duque.

— Eu não sei de nada. — disse ela, afastando o café-da-manhã.

Tate pegou a bandeja e a colocou na mesinha ao lado da cama.

— Ava. — ele disse, erguendo o queixo dela para que olhasse para ele. — Você pode me dizer qualquer coisa. Por favor, é importante.

A súplica dele atingiu uma parte dela, que ninguém mais além dele conseguia alcançar. Ela suspirou pronta para aceitar o golpe da desgraça de um modo ou de outro.


— Isso é apenas o que sei acerca do caráter de Lorde Oakes.

Não tenho conhecimento ou motivos para suspeitar de que ele possa ter iniciado os incêndios.

— É claro. — disse ele com paciência, esperando que ela começasse a explicar.

Ava mordeu o lábio, tentando encontrar as palavras certas para contar a Tate de sua vergonha.

— Quando retornei para a Inglaterra, voltei logo para Berkshire para assumir a propriedade aqui. Soube que você estava morando em Londres, e ouvi os rumores acerca da vida você levava. — Tate se mexeu na cama, e ela sorriu quando um resquício de rubor tomou as bochechas dele. — Das mulheres com quem se entretinha, e de quantas foram. — Ava queria contar a ele como a notícia arrancou seu coração pela segunda vez, mas ela não conseguiu. Ele nunca poderia saber o quanto ela sentia falta dele quando não estava se iludindo. — Cometi um erro terrível, que nunca poderei reparar.

TATE ESPEROU em silêncio que Ava dissesse o que sabia de Lorde Oakes, e o embaraço que ele reconheceu no olhar dela o deixou reticente. Ele não pôde deixar de imaginar o que ela sabia do homem que a deixava tão desconfortável. Até então, ele não sabia

que ela conhecia Sua Senhoria tão bem, mas o desconforto ao falar dele e a tentativa de evitar contar o que havia acontecido gelaram seu sangue.

Ele fechou os olhos por um momento, odiando o pensamento de que ela pudesse ter sido cortejada pelo cavalheiro. Que talvez ela pudesse gostar de outra pessoa, o suficiente para ter certo apego, mesmo que o sentimento não passasse de amizade. Ele não queria que ela estivesse com mais ninguém. Todo o tempo em que ele esteve no exterior, seu último pensamento antes de dormir era ela.

— Diga-me, Ava.

"Por favor" pairou em seus lábios, mas ele mordeu freou a palavra. Ela diria a ele quando estivesse pronta.

— Nós nos conhecemos por causa do haras. Na época, Lorde Oakes era dono de um puro-sangue, Majesty, que ele queria que fosse treinado por nós. Entre a realização da castração e o cavalo ser retirado das competições mais tarde, formamos uma amizade.

Bem, pelo menos eu pensei que era uma amizade.

Ele sentou um nó duro se formar em seu estômago, mas controlou suas feições, não queria assustá-la.

— E ele acreditava que era mais do que amizade benigna?

Ela encontrou o olhar dele por um breve instante antes de desviar o rosto.

— Sim, ele pensou que poderia haver mais. Ele me propôs ser amante dele. Disse que estava cortejando uma herdeira que logo resolveria seus problemas financeiros, mas que ela era uma mulher que preferia a vida urbana. Uma amante no interior, não muito longe de sua propriedade, seria favorável.

— Ele não a quis como esposa?

Tate fechou a boca com força, para que sua voz não denunciasse o desgosto e repugnância que sentia por Lorde Oakes.

O desgraçado queria usar Ava como prostituta. Ele sentiu a raiva o consumir, mas manteve a compostura sabendo que o descontrole não ajudaria Ava a terminar seu relato.

— Não, não como esposa. — Ava se mexeu debaixo do cobertor por um momento, perdida em pensamentos. — Eu pensei, por um tempo, ser capaz de tal coisa. Decerto, ele é bonito e parecia doce de verdade. E como eu não tinha intenção alguma de me casar, a ideia de ter um amante não soou detestável. Então, eu concordei.

Tate levantou-se, passando a mão pelo cabelo, uma infinidade de imagens correndo por sua mente. Sua cabeça martelava, e ele acreditou que poderia vomitar.

— Você se entregou a ele? — as palavras saíram tensas, e ele não tinha certeza do que deveria fazer.

Ava ficou em silêncio por um momento, o rosto pálido.

— Não, nunca fomos tão longe, mas ele chegou muito perto. Se minha criada não tivesse entrado depois de ouvir um barulho estranho, sim.

Choque e repulsa o atingiram como uma bala, e ele foi até ela.

Sentou-se na cama e a abraçou.

— Ava, não. — ele a abraçou com força, desejando estar lá para protegê-la. Ela ficou rígida nos braços dele por um momento, e ele suspirou de alívio quando ela relaxou e o envolveu com os braços, afundando no abraço dele. — Sinto muito, minha querida.

Ele a sentiu estremecer em seus braços e, para seu choque, percebeu que ela estava chorando.

— Estou tão envergonhada, Tate. Eu o levei a acreditar que queria um relacionamento assim, mas quando ele pressionou por mais, percebi meu erro. Tentei explicar, pedir desculpas a ele pelo engano, mas ele ficou tão bravo, tão violento. As palavras que ele

gritou para mim não eram nada do que eu já ouvira, e quando eu tentei sair do quarto, ele não me deixou.

Tate a embalou levemente em seus braços.

Todo esse tempo ele estava em Londres, dormindo com damas da sociedade dispostas, e a mulher que sempre possuiu seu coração, sua bela e atenciosa Ava estava sendo agredida. E ele não estava lá para salvá-la.

— Eu sinto muito. Eu gostaria que você tivesse mandado me buscar. Eu estaria aqui por você.

E ele teria matado Lorde Oakes por sua atitude. E mesmo que ficasse provado que ele não era o incendiário, Tate ainda se vingaria dele por Ava. Isso, ele poderia prometer ao desgraçado. Ele o desafiaria se fosse necessário.

— Ninguém sabe. — disse ela, afastando-se um pouco, os olhos inchados e vermelhos. — Ninguém pode saber. Precisei guardar este segredo, um pesadelo sujo que poderia arruinar tudo o que meu pai e eu construímos. Se alguém da Sociedade descobrisse que eu cogitei ser amante dele, poderia me arruinar.

Seu coração doía por ela, por não poder remediar sua dor. Ele a abraçou, não querendo soltá-la jamais.

— Fiz minha criada jurar não contar a ninguém, e até hoje ela não o fez.

Ele enxugou as lágrimas que escorriam pela bochecha dela.

— Você não tem nada do que se envergonhar, Ava. As ações dele pertencem somente a ele, e dizem mais sobre o tipo de homem que ele é, e que tipo de código moral ele segue. Você não teve nada a ver com as escolhas dele. As pessoas podem mudar de ideia, não há lei contra isso.

Ela sorriu em meio as lágrimas, estendendo a mão para cobrir a dele que ainda repousava em sua bochecha.

— Obrigada por dizer isso. Tento pensar assim, reprimir o horror daquela tarde, mas às vezes é difícil.

— Nunca ceda a esses pensamentos, pois eles apenas fazem com que Lorde Oakes tenha poder sobre você. E se há algo que sei de você, e que admiro e adoro igualmente, é a sua mente e a ferocidade que fervilha em sua alma. Você é uma boa pessoa, Ava.

O que aconteceu com você não foi.

Mesmo quando crianças, ela sempre fora a pessoa mais gentil que ele conhecera, e talvez este seja o motivo para ele ter gravitado em torno dela todos esses anos após aquele dia em que se conheceram e nadaram juntos no rio.

O casamento dos pais dele era bastante amigável, mas sua mãe era uma duquesa dura, muitas vezes fria e implacável. Seu pai meio que nunca estava lá e, portanto, a vida em família, a conexão entre pai e filho, como a que Ava mostrava ter com o pai dela, era algo novo e surpreendente para ele. Ele queria viver algo parecido. E

assim que se tornaram amigos, o pai de Ava o acolheu na família e eles se tornaram um bando de três.

— Isso aconteceu depois que seu pai faleceu?

Tate não podia acreditar no que estava ouvindo. Ele se levantou e foi até a mesa de Ava, perto da janela do quarto, e se serviu de um copo de água. Ele estava sentindo a náusea embrulhar seu estômago, a ameaça de vômito. Ele precisava desafiar esse homem. Enfiar uma bala no meio da testa e deixá-lo para apodrecer no meio da floresta.

Saber que Ava carregava esse fardo sozinha trouxe tanta culpa ao corpo dele que quase o fez cair. Por amá-la com tanto fervor, ele deveria ter voltado a Berkshire e garantido que ela fosse protegida após a morte do pai. Ele deveria ter garantido a segurança dela, não

importa que escolha ela tivesse feito em relação ao futuro, seja com ele, com outra pessoa ou com ninguém.

— Eu não tinha ninguém que pudesse desafiá-lo, entende. Como bem sabe, não tenho irmãos e, com a morte de meu pai, só me restou conviver com a lembrança devastadora de que quão perto cheguei de me arruinar. Descobrir que ele talvez seja o homem por trás desses incêndios criminosos que aconteceram aqui no interior...

— ela sacudiu a cabeça, os olhos no chão. — Eu queria nunca mais vê-lo, sabe, mas temo que com tais acontecimentos, não seja inevitável.

Era mais do que desprezível, e Tate não pôde deixar de se perguntar por que Lorde Oakes agia de maneira tão violenta. Ele estava mal da cabeça, ou apenas sentia raiva dos vizinhos bem-sucedidos, por ele não ter conquistado nada no mundo das corridas? Ou seria por causa da recusa de Ava em se tornar a amante dele.

— A parte egoísta em mim não quer ter que voltar a enfrentá-lo.

Me considera covarde por dizer isso? — ela perguntou, encontrando o olhar dele.~

Medo espreitava naquelas esferas marrons escuras, e o coração dele se despedaçou por ela. Ele podia entender por que Ava não queria nem ver Lorde Oakes. Mas não significava que ele não poderia ir encontrar Sua Senhoria. Desafiá-lo, colocar uma bala na cabeça dele e pôr um fim em todos os problemas.

— Eu vou matá-lo. — ele murmurou para si.

Ava ofegou, e Tate se encolheu ao perceber que Ava o havia escutado. Ela afastou a roupa de cama, levantou-se e foi até onde ele estava perto das janelas. Ava apertou seu braço e o puxou para encará-la.

— Você não fará isso, Tate. Só para começar, duelos são ilegais.

Se ele é o homem que está causando todos esses incêndios, então vamos lidar com ele através da lei, e precisamos agir sem que ele saiba. Não há provas do que ele fez comigo e, embora tenha tentado, ele não teve sucesso com o ataque. Se ele descobrir que suspeitamos dele pelos crimes na sua propriedade e na de Lorde Morton, ele vai me arruinar perante a Sociedade e sentirá prazer em fazê-lo.

— Eu não posso deixá-lo livre pelo que fez a você.

O aperto dela cedeu, e ela deslizou a mão pelo braço dele, até pegar sua mão.

— E não vamos deixá-lo sair impune. Sei que ele está com poucos recursos financeiros. Ele precisou vender tantas de suas propriedades que chegou ao ponto de só ter posse da casa e um ou dois acres além. Vê-lo ser trancafiado pelos crimes de incêndio e assassinato já é o bastante para mim. Ele não poderá voltar a prejudicar nenhuma outra propriedade, animal, ou mulher se estiver em Newgate.

— Não é o suficiente para mim, Ava. — ele deu um passo na direção dela e cobriu as duas bochechas dela com as mãos. — Ele tentou tomar o que não lhe foi oferecido de boa vontade. Não posso permitir que ele se safe de um crime tão hediondo.

Os olhos dela se encheram de lágrimas, e a repugnância que ele sentia por Lorde Oakes dobrou.

— Eu sei que você quer defender minha honra, e agradeço. Sou muito grata. Nos conhecemos há tanto tempo, Tate. Mas não é seu papel me salvar. Não vou deixar que você se coloque em perigo por algo de que prefiro me esquecer. Por favor, deixe no passado, onde pertence.

As feridas físicas de Ava poderiam ter cicatrizado e desaparecido, mas o que o visconde havia feito a ela ainda era vívido em sua mente. Então, não. Ele iria se vingar do desgraçado, fosse ele culpado ou não dos ataques aos estábulos.

Ele suspirou, deixando a conversa cessar.

Ainda havia feridas abertas, e ela não precisava ficar se lembrando de seu agressor nem se preocupar com as ações de Tate contra ele neste momento.

— Venha. — disse ele pegando a mão dela e puxando-a de volta para a cama. — Você precisa descansar. Prometo que não farei nada até que possamos conversar melhor acerca disso, quando você estiver recuperada.

Tate a ajudou a voltar para debaixo das cobertas, afofou os travesseiros atrás da cabeça dela e serviu outra xícara de chá para ela.

— Vou sair agora, para que descanse. Voltarei hoje à noite, talvez possamos jantar juntos aqui.

Ela olhou para ele com malícia.

— Acredita ser sábio, Sua Graça? Sua reputação como libertino está bem viva e solidificada em Londres. Não deveria jantar comigo em meu quarto.

Ele balançou a cabeça espantado com a capacidade dela de fazer piada e ser doce, ainda mais em um momento como aquele, que ele sabia que ela estava ferida. A grande verdade era que ele não deveria estar no quarto dela nem naquele instante, quanto mais à noite para jantar. Mas antes de tudo eles eram amigos, e caso ela ainda não estivesse bem para descer as escadas, então sim, ele iria jantar nos aposentos dela.

— Voltarei para jantar e dane-se o que a Sociedade diga.

Ele a deixou então, desceu as escadas e saiu pela porta, precisava de seu cavalo e correr o máximo possível.

Em poucos minutos ele estava galopando na direção da propriedade dele, mas não seria logo que pisaria lá. Tate precisava clarear a cabeça, acalmar o sangue e planejar a queda de Lorde Oakes. Ele incitou o cavalo a pular uma sebe antes de reduzir a velocidade para atravessar o pequeno riacho. Ava teria justiça, e ele seria o responsável por fazê-la. E caso ele tivesse prazer ao fazê-lo, melhor ainda.

CAPÍTULO 11

Estou livre do que senti por você em algum momento. Desejo o melhor em tudo que a viga traga para você, e que seja feliz, não importa o que aconteça.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone.

U ma semana depois, Ava, com o pulso ainda enfaixado, encontrou Hallie no corredor, ela estava recebendo as cartas de um criado.

— Alguma coisa para mim? — ela perguntou, pedindo chá e entrando na biblioteca onde decerto havia uma pilha de cartas e o trabalho negligenciado na semana anterior por causa do pulso torcido.

Considerando o quão dolorido estava a apenas dois dias atrás, ela ficou surpresa ao acordar sentindo-se relativamente bem. É

claro que ainda não recuperara todos os movimentos, mas era uma melhora drástica.

As visitas diárias de Tate também a ajudaram a se curar, tanto da lesão como em seu coração, fazendo a escolha consciente de nunca se casar, de nunca procurar um parceiro ainda mais difícil de ser cumprida. Por diversas vezes ela se pegou contemplando as possibilidades.

Observava-o enquanto lia as poesias e romances góticos de que ambos desfrutavam, ponderando acerca de um casamento com ele

e tornar-se duquesa, se tal fato ainda lhe daria a liberdade de que desfrutava agora. Ou será que precisaria comprometer um pouco de sua independência? Por sua vez, será que Tate permitiria que ela fosse a mesma de agora devido ao que se espera da esposa de um duque?

— Há uma carta de Willow. — disse Hallie, quebrando o selo e passando os olhos pelo conteúdo. — Ela nos quer em Londres por uma semana ou duas. Para comparecer a alguns bailes a que ela foi convidada pela tia-avó por casamento, a viscondessa Vance.

Hallie sentou-se em um sofá próximo e continuou a ler a missiva:

— Ela diz algo acerca do fim próximo da pequena temporada e nos quer lá com ela antes de partirem para a propriedade rural da viscondessa.

Ava foi para a cadeira detrás da escrivaninha e sentou-se, remexendo nas cartas que estavam cuidadosamente empilhadas diante dela.

— Havia me esquecido de que Willow tem uma tia de título. Ela diz algo a ver com o que Sua Senhoria pensa de nossa visita?

Hallie examinou a nota ainda mais.

— Sim, afirma aqui que Sua Senhoria anseia por conhecer as amigas de escola de Willow, e que somos bem-vindas a ficar em sua casa na Berkley Square.

Hallie olhou para cima, os olhos brilhando de excitação.

Era um convite adorável e um que até Ava nunca recusaria. Não que ela desejasse por si participar de eventos em Londres por uma semana ou duas, mas Willow era uma de suas melhores amigas no mundo inteiro, e se pedia para que fossem fazer companhia, então Ava faria isso. Sem dúvidas.

— Vou informar minha criada pessoal, para que arrume tudo para a nossa partida na próxima semana.

— E o seu pulso? — Hallie perguntou, dobrando a carta.

Ava deu de ombros.

— Estará ainda melhor na próxima semana, e as luvas esconderão quaisquer hematomas que persistam até lá. Se alguém vir a lesão, serei sincera e contarei que caí do cavalo. Ninguém fará maiores questionamentos.

Hallie recostou-se na cadeira, estudando-a por um momento.

Ava pegou as cartas e se ocupou em separá-las e abri-las.

Quando Hallie ficava quieta como estava agora, era sinal de que sua mente, afiada e onisciente, estava agitando-se com perguntas.

— E quanto ao duque?

Ava deu de ombros, lendo uma carta de seu fornecedor de ração em Ascot.

— O que tem o duque? Tenho certeza de que ele é mais do que capaz de se manter ocupado enquanto estivermos fora.

Ava sorriu para a amiga, determinada a fugir dos questionamentos.

— Você sabe que não foi isso que eu quis dizer. Hallie ergueu a sobrancelha, perplexa.

— Ele acabou de voltar da cidade, e você se engana se pensa que ele voltará a Londres só porque fomos convidadas a passar alguns dias.

Hallie riu, balançando a cabeça.

— Acho que se alguém está a se enganar, é você. O homem está apaixonado por você, e sabe disso. Ora, no dia em que ele a carregou até em casa depois da queda que você sofreu, ele parecia estar prestes a ter um ataque apoplético. O medo gravado no rosto dele por causa do seu ferimento não era apenas uma preocupação de vizinhos, ele ficou em pânico pela possibilidade de ser mais grave, embora felizmente não tenha se concretizado.

A menção de que o duque ficara muito preocupado com ela trouxe uma sensação quente e reconfortante à sua alma. Ela mordeu o lábio, incapaz de esconder o sorriso que se formou em seus lábios. Afastou o pensamento, lembrando a si que não queria que ele a cortejasse, que forjassem um novo compromisso. Ele precisava se casar com uma mulher que fosse adequada para um duque. Uma mulher que quisesse de fato tal posição e todas as amarras que a acompanhavam.

UMA SEMANA DEPOIS, Ava saia da carruagem da viscondessa com a ajuda dos cocheiros de Sua Senhoria e seguiu a viscondessa Vance e as amigas pelas escadas da casa do Conde Tinley.

Dizia-se que o baile desta noite era o evento mais procurado de Londres devido ao fato de o anfitrião ter um parentesco distante com o rei George IV. Todos que eram alguém iria querer estar presente, e a viscondessa e as amigas de Ava não eram exceção.

Não que o rei se prestasse a participar de um evento como esse, ainda mais os anfitriões sendo parentes distantes, mas era o bastante para tornar as conversas interessantes. O salão estava iluminado com centenas de velas de cera, que garantia um brilho dourado e mágico ao espaço. Os músicos estavam em uma pequena varanda com vista para o salão de baile. Tocavam um minueto, e alguns dos convidados já estavam dançando e outros os assistiam, conversando e socializando com seus pares.

Naquela noite, Ava escolhera um vestido de seda dourado e usava as pérolas de sua mãe nos cabelos. Uma criada de Sua Senhoria, mestre nos mais recentes penteados ensinara a criada de

Ava a fazer um conjunto intricado, de forma que a joia estava trançada aos seus cachos escuros como uma peça de arte.

Felizmente, as luvas de seda escondiam as mãos e o pulso machucado, sem mencionar as unhas que não eram tão bem mantidas devido ao trabalho constante com os cavalos. Ela sorriu quando Hallie colocou o braço no dela, a amiga quase pulava de expectativa.

— Como é emocionante, Ava. Faz tanto tempo desde que estivemos nesse meio, se é que já estivemos. Posso garantir que não há bailes como esse no Egito.

Não.

Hallie estava certa.

Mantendo-se perto da viscondessa que ia para o lado oposto do salão, Ava notou alguns olhares curiosos dos presentes e acenou para aqueles que ela conhecia do mundo das corridas.

Era curioso que alguns dos olhares que lançaram a elas eram de apreciação e curiosidade e, pela primeira vez, Ava parecia aproveitar seu tempo em Londres.

Pararam ao lado de uma lareira bem iluminada, um espelho com moldura de ouro que era da largura da estrutura da lareira estava disposto acima do parapeito e refletia a luz e os convidados. Tudo na sala gritava privilégio, e ao olhar em volta não conseguiu evitar de pensar em Tate. Este era o mundo dele, a vida dele.

Os móveis, o excesso e a riqueza expostos, as joias, os vestidos de seda importados e as roupas masculinas, o tom e a maneira de falar, faziam parte de uma vida a que ele estava acostumado a viver.

Ava olhou analisou o salão e avistou a duquesa-viúva de Whitstone conversando com um grupo de matronas, sem dúvida todas com título próprio e casadas com outro. Ela não havia cogitado que a viúva estaria de volta à cidade, considerando que

havia chegado a Berkshire a tão pouco. Sua Graça a viu e, erguendo o nariz para o ar, a cortou sem cerimônia. Ava não deveria ter esperado nada menos, mesmo assim a afronta doía.

— Aqui está uma taça de champanhe para você, Ava. Beba, é uma delícia.

Ela riu, pegando a taça de Willow.

— Obrigada. — disse ela, afastando o olhar da viúva e das poucas mulheres que a olhavam ao mesmo tempo. Ava não era ingênua a ponto de não saber que a mãe de Tate estava espalhando mentiras cruéis sobre ela. Afastou a decepção por não conseguirem ser civilizadas uma com a outra e aproveitar o baile.

Os anos que ela passou na escola na França não permitiram tais passeios. Elas não podiam participar de danças e bailes que a nobreza francesa participava. Muitas vezes só lhes restava a companhia uma da outra. O isolamento do mundo exterior apenas serviu para solidificar ainda mais a amizade delas, como se o sentimento estivesse gravado em pedra. Era uma pena que Evie e Molly não estivessem aqui. Elas iriam adorar uma noite como esta.

Um cavalheiro curvou-se diante de Ava e da viscondessa.

Era um homem atraente, aparentava ser da idade de Ava. O

cabelo, apesar de bem curto, combinava com ele. Ele era um pouco mais baixo do que Tate, porém mais alto que Ava, o que ela gostava. Mas eram os olhos dele, divertidos e bonitos que se destacavam, uma característica que Ava sempre procurava ao conhecer pessoas novas. Pode se descobrir muito ao olhar para a alma de uma pessoa.

— Lady Vance, poderia me dar a honra de ser apresentado à suas amigas?

A viscondessa sorriu, apontando para cada uma conforme nos apresentava.

— Minha sobrinha, Srta. Willow Perry, e suas amigas Srta. Ava Knight e Srta. Hallie Evans. Este, queridas meninas, este é o marquês de Harlan.

Ava mergulhou em uma reverência e Sua Senhoria as observou uma a uma com um olhar contemplativo.

— Prazer em conhecê-las, a todas. E Srta. Knight, caso a senhorita não tiver prometido a outro, gostaria de dançar o cotilhão comigo?

Ava olhou para Hallie e ante o aceno de aprovação dela, esticou a mão.

— Eu gostaria muito. Obrigada, milorde.

Ele pegou a mão dela e a colocou no braço, levando-a para o centro do salão.

— Você é de Berkshire, pelo que sei. Não há um Haras de competição, muito famoso, com este nome? — ele perguntou, deslizando-os com habilidade entre a multidão.

— Eu... sim, existe. Meu pai criou e treinou cavalos até morrer.

Agora sou eu quem administro o Haras Knight.

Os passos dele se tornaram mais lentos, e ele riu, cruzando o olhar com o dela outra vez.

— Arrá, então a senhorita é a famosa treinadora de cavalos de que tanto se fala. Você possui a mais alta estima. Não sabia?

Ele a puxou para a frente, e Ava levou um instante para controlar o orgulho que a preencheu por saber que seus estábulos eram tão bem vistos.

— Obrigada, meu senhor. Fico feliz em saber que é assim. Com certeza, fazemos o possível para criar e treinar os melhores cavalos de corrida que pudermos.

É claro que alguns cavalos nunca ganharão o primeiro prêmio, mas não significa que não possam gerar um que o consiga. Este é

um erro comum a muitos treinadores, vendem cavalos que poderiam muito bem ter uma descendência vencedora. Algo que Ava e seu pai se recusavam a fazer, a menos que tivessem testado o cavalo na pista.

Eles se posicionaram para a dança, e Ava olhou em volta, absorvendo a grandeza. Era bem improvável que ela voltasse à cidade depois desta semana, muito menos para participar da Temporada. Sendo assim, ela aproveitaria essa oportunidade ao máximo. Mesmo que só para fazer contato com pessoas da alta sociedade que poderiam se interessar em possuir um puro-sangue no futuro.

A dança foi agradável e, embora Ava não participasse de um cotilhão há alguns anos, os passos que ela aprendeu com a professora de dança quando jovem eram algo que ela não havia esquecido. Durante a hora seguinte, ela dançou mais dois conjuntos com outros cavalheiros e permaneceu ao lado da viscondessa quando Hallie e Willow também dançaram.

A noite foi uma bela e agradável surpresa, considerando que ela não gostava de tais eventos e nunca se esforçara para participar deles.

Ava tomou um gole de vinho enquanto esperava que as amigas retornassem da dança quando um calafrio percorreu sua espinha.

Olhando para a esquerda, avistou Lorde Oakes olhando-a com diversão gelada. Sua pele formigou, e ela estremeceu, pois esperava nunca mais ver o rosto dele. A lembrança dele, empurrando-a contra as almofadas do sofá, o aperto doloroso e punitivo nos braços dela enquanto ele os prendia atrás das costas, segurando-a ainda bombardeava sua mente, e ela precisou forçar-se a segurar a ânsia.

O que ele estava fazendo ali?

Ele caminhou na direção dela, e ela se esforçou para usar todas as defesas possíveis para se preparar o confronto iminente. Ele curvou-se, sorrindo, o cavalheiro perfeito para toda a sociedade ver.

Mas Ava sabia o que se escondia por trás de seu rosto tranquilo e bonito. Era tão feio quanto o próprio diabo, e tão cruel quanto.

— Srta. Knight, que bom vê-la aqui na cidade. Senti falta de nossos encontros.

Ela olhou para os dançarinos, desejosa de que a música estivesse para terminar, para que não ficasse sozinha com ele.

— Receio, Lorde Oakes, que seu sentimento seja perda de tempo, já que eu não senti falta alguma de sua presença.

Se havia algum desejo nela, era de que ele se ferisse em algum acidente de cavalo ou carruagem. Mas, infelizmente, ele estava tão saudável quanto a última vez que ela o vira.

Ele pressionou o peito com mágoa simulada.

— Não sentiu minha falta? Acreditei que ansiaria por nosso último encontro mais do que qualquer outro. — ele se inclinou para ela, mais perto do que deveria. Ela congelou, o medo a atravessando. — Sei que eu ainda penso nessa época. Como me deixou quente. Porque, mesmo agora, fico duro só de pensar em você toda complacente embaixo de mim, gemendo e se contorcendo de prazer.

Ava se recusou a olhar para ele e soltou um suspiro quando ele se afastou. Ela não respondeu à provocação. Ele não era digno de nada dela.

— Vamos, minha querida. Somos amigos, não somos? Venha dançar comigo.

Ele tomou a liberdade de agarrar o pulso machucado, provocando dor em seu braço. Ela ofegou e tentou soltar o braço sem causar uma cena.

— Nós não somos amigos, e eu não quero dançar, meu senhor.

Quando ele a soltou, ela voltou para a viscondessa, esperando alcançar a proteção dela antes que ele a alcançasse. Ele voltou a agarrá-la pelo pulso, havia percebido a lesão e apertou ainda mais, com força.

Ava deu uma olhada furtiva em torno do salão, sentiu a pele esquentar quando notou alguns convidados observando todos os movimentos dele. Lorde Oakes, percebendo o mesmo, deixou-a ir, com um sorriso doce.

— Faça o que lhe é ordenado, Ava querida. Detestaria que Londres descobrisse que você cogitou ser minha amante.

Ela se virou para ele:

— Como você ousa! — ela sussurrou com ferocidade. — Seria sensato ficar longe de mim, Lorde Oakes, antes que seja para você que Londres inteira vire as costas.

Ele riu, a cabeça toda para trás como se ela tivesse contado uma história incrivelmente divertida.

— Você não passa de uma treinadora de cavalos. Em quem acha que a sociedade iria acreditar? Um par nobre, ou uma prostituta de Berkshire?

— Eles vão acreditar em mim.

O som da voz de Tate trouxe lágrimas aos olhos dela que piscou para afastá-la. Não queria que Lorde Oakes percebesse como ela estava aliviada que Tate viera ao seu resgate. O fato de Tate ter visto como Lorde Oakes a tratara e vir removê-lo de sua presença acabou com a miséria que ela sentia, estava feliz por sua presença.

Ela lançou um sorriso hesitante, sempre seu protetor. O duque pegou a mão dela e a colocou no braço dele.

— Chegue a um centímetro da Srta. Knight outra vez, e eu o desafiarei — disse o duque ao dar um passo na direção de Lorde

Oakes, o fazendo dar um passo para trás. —, e colocarei uma bala nesse seu crânio grosseiro. Compreendeu?

Os olhos de Lorde Oakes se arregalaram, e virando-se para Ava, assentiu.

— Temos um acordo, Sua Graça. — ele zombou.

Tate puxou Ava para a pista de dança quando as primeiras notas de uma valsa começaram a tocar.

— Você está bem, Ava? Quando vi Lorde Oakes partir em sua direção, não consegui chegar a você rápido o bastante. Me desculpe por ter sido necessário ouvir a voz daquele desgraçado.

Os passos da valsa permitiam que a conversa deles fosse mais íntima, e por nada nesse mundo Ava conseguiria tirar os olhos dele.

Ele era um homem tão bom, apesar do título ducal e todas as suas terras e dinheiro, ele ainda era melhor do que qualquer um que ela já conhecera. Um amigo, em primeiro lugar, e esta noite ele agira como um herói.

— Obrigada, Tate. É terrível ter de admitir, mas se você não aparecesse, acredito que eu teria feito papel de tola na frente de todos.

O polegar dele roçou seu ombro através da seda do vestido, e ela desejou toque dele em outro lugar. Queria sentir sua força, a segurança que ele sempre a fizera sentir mais do que qualquer coisa no mundo. Sob circunstâncias normais, ela era uma mulher forte, capaz de administrar um negócio de sucesso em um setor dominado por homens.

Ela era receptiva a ser a própria companhia, que nunca se casaria nem teria filhos. Uma decisão que ela estava contente em conviver. Mas estar nos braços de Tate outra vez, sob sua proteção, também trazia suas vantagens.

Ela havia se esquecido de como era ser amada, cuidada e protegida. Não que ela acreditasse que Tate ainda estivesse apaixonado por ela, mas com certeza se importava o bastante para querer vê-la bem.

Ele ter voltado à cidade só poderia ser por causa da presença dela aqui. Tal reconhecimento a fez ter uma sensação acolhedora e segura a envolvendo. Ava se jogou na dança, querendo aproveitar cada momento que podia nos braços dele.

— Nunca permitirei que ele volte a machucá-la. Você tem minha palavra nisso.

TATE SE APROXIMOU de Ava, esperando que seu rosto não traísse a raiva efervescente que se acumulava dentro dele. Ele mataria Lorde Oakes nem que fosse a última coisa que faria nesta terra.

Ao entrar no salão e cumprimentar os convidados, ele avistara Ava quase imediatamente. Ela era como um raio de sol de verão, que brilha com intensidade em um mar sob o céu cinzento. Ele estava com alguns conhecidos, mas no momento em que viu Lorde Oakes se aproximar dela, e notou desespero no rosto de Ava, ele sabia que Sua Senhoria estava sendo inapropriado.

Ele deixou o grupo sem dizer uma palavra e foi até ela na mesma hora. Típico do caráter de um valentão, Lorde Oakes fugiu quando Tate o ameaçou. Mas ele iria fazê-lo pagar. Um homem como Lorde Oakes era uma ameaça, um homem indigno de confiança, alguém cruel que se fosse um animal, teria sido abatido há tempos.

Sem cuidado, ele puxou Ava para mais perto do que deveria, querendo abraçá-la por inteiro e garantir, para o bem dele mesmo, que ela estava bem.

— Quer falar do que aconteceu? — ele encontrou o olhar dela e ficou agradecido por ela parecer muito mais calma do que quando a dança começou.

— Não de verdade. Tudo o que posso dizer de Lorde Oakes é que não desejo revê-lo, nem na cidade, e nem em Berkshire.

Ele assentiu, querendo o mesmo.

— Tenho uma reunião com o agente de Bow Street amanhã de manhã. Gostaria de me acompanhar? Parece que ele conseguiu informações e deseja partilhá-las. A carta que recebi ontem foi bastante imperativa quanto a nos encontrarmos o mais depressa possível.

— Será alguém viu quem começou os incêndios? Mesmo que não seja Lorde Oakes, é claro que eu gostaria de ver quem iniciou o fogo ir à justiça.

— Todos nós. — eles permaneceram em silêncio por um instante enquanto rodeavam outros casais que ali estavam. — Ava, preciso conversar com você acerca do que houve em Cleremore com minha mãe. Depois da dança, você estaria disposta a dar uma volta no terraço comigo?

Um pequeno franzir maculou a testa perfeita dela que depois de um tempo disse:

— Claro. Creio que precisamos discutir isso também.

Ele assentiu e se preparou para apreciar a dança.

De vez em quando, ele vislumbrava Lorde Oakes espreitando pelo salão, e o temperamento de Tate oscilava ainda mais.

Como o desgraçado ousava mostrar a cara perante a Sociedade?

Agora que Tate sabia o que ele havia feito, e o que poderia estar fazendo em relação aos incêndios, o demônio merecia ser banido da Sociedade Londrina para sempre, da Inglaterra, inclusive.

A dança chegou a um fim lamentável e, pegando a mão de Ava, ele a levou em direção às portas francesas que estavam abertas e a escoltou para o frescor da noite. O ar não estava gelado para a época do ano, contudo, nenhum dos aromas doces e puros que os envolviam em Berkshire estavam presentes. Aqui, o ar tinha uma pitada de pó de carvão, junto com o cheiro da madeira queimada nas lareiras internas.

Com surpresa e algum alívio, não havia outros casais no terraço para interromper a conversa. Além de que Tate não queria compartilhar Ava com ninguém da sociedade de Londres. Ele a queria só para só ele, agora e para sempre. Ele pegou a mão de Ava, a colocou em seu braço e caminhou em direção aos degraus que levam ao gramado e ao jardim além.

A partir de onde estavam, ele podia ver uma pequena estrutura de madeira no jardim que, ao luar, revelava a cobertura de hera.

Eles andaram sem pressa, felizes em estar na companhia um do outro.

— Eu quero falar com você sobre o que minha mãe disse outro dia, sei que você ouviu.

Foi um incômodo na mente de Tate desde o instante em que ele voltara para a sala de visitas e não encontrou Ava lá. O fato de sua mãe tê-la feito se sentir indesejada não era algo que ele deixaria passar. Não sem ela saber que ele não sentia o mesmo.

Ela afastou, com um movimento de cabeça, uma mecha de cabelo que caíra sobre os olhos, que voltou para detrás da orelha.

— Você não tem nada para se desculpar, Sua Graça. Não é segredo que sua mãe nunca gostou de mim e posso entender que

ela quer que se case com alguém que seja adequada. Se eu tivesse um título e várias propriedades que exigissem a produção de um herdeiro, também ficaria preocupada se meu filho, o representante de um ducado, estivesse mostrando uma preferência inabalável a uma mulher do povo que não tenha nada mais a oferecer além dos cavalos que cria.

Ele a segurou para que parasse de andar, e a olhou bem nos olhos.

— Você deve saber que a considero muito mais do que uma mera criadora de cavalos de raça. Eu não me importo com o que minha mãe pensa. Tudo o que me importa é corrigir o mal que nos foi provocado há cinco anos, e que você me dê alguma indicação de que poderia voltar a ser minha.

Ela caminhou na frente dele, e ele a seguiu sem saber no que ela estava pensando. Eles chegaram a estrutura coberta de hera, Ava entrou ali e sentou-se em um pequeno banco de madeira que havia sido colocado bem no meio.

— Minha opinião acerca de casamento mudou, Tate. Decerto você viu que eu não preciso da inviolabilidade do casamento para ser feliz, uma empresária bem-sucedida? — ela olhou para ele com preocupação. — Não é algo que eu preciso na minha vida. Não me faça negar você. Eu não quero magoá-lo.

As palavras dela fizeram-no sentir o pânico se apoderar de seus sangue, e ele veio sentar-se ao lado dela. Desejava que ela percebesse que, caso os pais deles não os tivessem separado, agora eles estariam bem casados. Talvez fossem os pais de uma horda de filhos, à frente de duas grandes estâncias de corrida, felizes.

— Estar perto de você de novo foi como acordar de um pesadelo. Minha vida não passou de um nada sem sentido e repleta

de erros. Não quero mais viver assim. Quero você em minha vida como minha esposa, minha amante e minha melhor amiga.

— Tate. — ela sussurrou, fechando os olhos por um momento.

— Existem expectativas para uma duquesa que eu não posso cumprir. Estou tão acomodada em minhas maneiras agora, os estábulos por si só já tomam grande parte do meu tempo. Como sua esposa, seríamos obrigados a viajar para a cidade, entreter, estar presente durante as sessões do Parlamento. Em que momento eu teria espaço para minhas responsabilidades? Não teria.

— É claro que, sendo minha esposa, ser uma duquesa vem com responsabilidades, mas você nunca se esquivou delas antes, não deixe que o que os outros dizem, ou o que você acredita que ocorrerá, seja a razão para descartar de vez nossa união.

Ela mordeu o lábio, a testa franziu-se.

— Não podemos ser como somos, sem pressão e ver o que acontece? Há muito que preciso considerar, refletir.

Tate passou a mão pela mandíbula, desejando que nunca tivessem se separado. Que o tempo não tivesse forçado Ava a encarar as coisas sozinha. Ele queria estar lá com ela quando ela tomasse decisões, apoiar e incentivá-la em seus esforços. Ele faria o que ela pedisse, daria a ela tempo, provaria sua lealdade, seu amor e ele esperava... reconquistar seu coração?

— Farei qualquer coisa que me pedir. — disse ele, cada palavra sincera desde o âmago de sua alma.

Ela se virou para ele no banco, os lindos e inocentes olhos analisaram o olhar dele por um momento, e ele sentiu o sangue ferver com a determinação que encontrou ali naquelas orbes castanhas.

Ela estendeu os braços e apertou as lapelas da jaqueta dele, em seguida, deslizou as mãos pelo peito dele. Ele fechou os olhos,

deleitando-se com o toque dela que, apesar de tudo, não era o bastante. Ele queria mais, muito mais.

— Mais do que tudo; neste momento, eu quero que você me beije, Tate.

O corpo dele rugiu de desejo, sentiu-se desesperado para beijá-

la. Foi como se os anos não tivessem passado, e a segurando pelo queixo, ele virou o rosto dela e baixou para tomar seus lábios.

Suspirou ao sentir o sabor dela outra vez. Os lábios macios e receptivos de que ele ainda se lembrava de com que ainda sonhava.

As mãos dela agarraram o casaco de noite dele, segurando-o com firmeza, mas ele não iria a lugar algum. Se ela assim desejasse, ele jamais voltaria a deixá-la.

Tate se perdeu com cada toque da língua dela, os suspiros suaves e pequenos beliscões que ela deu nos lábios dele e que o provocavam e o trouxeram de volta à vida dela. O beijo foi como se eles nunca tivessem se separado. Como se o tempo tivesse parado.

Ele a puxou com força contra ele, e o gemido suave dela acendeu o desejo dele.

O beijo se aprofundou, mudou, tornou-se mais selvagem e cru.

Não importava o que Ava havia acabado de dizer, esse beijo dela contava outra história. Ela ainda o queria com tanto fogo e necessidade quanto ele, e isso lhe dava esperança.

Ela pertencia aos braços dele, à vida dele.

— Eu senti tanto a sua falta. — disse ele, beijando-a no pescoço, deliciando-se com lóbulo da orelha, sabendo o quanto ela gostava daquele gesto. Ela estremeceu nos braços dele, e envolveu o pescoço dele com os braços.

— Eu também senti sua falta. — ela sussurrou contra os lábios dele.

Ele a beijou de novo, e ela gemeu.

Tate aproveitou a oportunidade para puxá-la ainda mais perto.

Eles nunca haviam sido tão íntimos antes, mas de alguma forma agora que eram mais velhos, talvez mais sábios, essa proximidade parecia natural, o próximo passo para eles.

Tate precisou lembrar a si que Ava era inocente, uma mulher que já havia passado por muitos problemas, e a última coisa que ele queria fazer era assustá-la ou levá-la a um ponto em que não estava preparada.

E então ela se moveu, colocando-se quase no colo dele, e o sangue dele tornou-se lava. Ele parou um momento, sem saber o que ela estava fazendo, e então ela se moveu, ondulando contra a rigidez dele, e ele lutou para não se perder como um garoto de dezoito anos sem experiência.

— O que é isso que você está me fazendo sentir? — ela perguntou, apertando a nuca dele e cruzando o olhar com o dele.

Os olhos dela estavam nublados, brilhantes e cheios de desejo.

Os lábios de Tate se ergueram em um meio sorriso:

— Desejo, necessidade.

— Ah. — ela disse, assentindo de leve e ondulando um pouco mais forte contra o membro dele que crescia. Ele trincou a mandíbula, lutando contra a tentação de erguer as saias dela e tomá-la ali mesmo no jardim. — Eu gosto. — ela sussurrou contra o ouvido dele, o arfar de suas palavras acelerando ainda mais o sangue dele.

— Eu também gosto. — ele rosnou, as mãos nos quadris dela, ajudando-a com seu empenho.

O som de risadas e tilintar de copos chegou através da hera, e ela congelou. Era todo o aviso que eles precisavam para saber que não estavam mais tão sozinhos. Tate se desenroscou dela com relutância, e afastou Ava dele.

Sob a parca luz da lua que chegava neles na pérgola, ele verificou se o vestido dela estava de volta ao lugar devido e se o cabelo dela não estava despenteado pelo beijo. Ela sorriu para ele quando ele fez uma última inspeção de sua aparência e seu coração apertou. Ele a adorava e não suportaria perdê-la pela segunda vez.

— Parece que fui bem beijada, duque? — ela perguntou.

Ela parecia ter sido beijada como se não houvesse amanhã, o que o fez desejar fazer de novo. Ele iria, é claro, mas da próxima vez seria em um ambiente mais privado.

— Acho que devemos ficar aqui por alguns minutos até que pareça menos suspeito.

E a esperança era que, passados alguns minutos ainda longe do baile, os lábios de Ava retornariam ao normal, sem resquícios do inchaço e vermelhidão causados pelos exercícios deles. Ela estendeu a mão e ajeitou o cabelo dele, ajustou a gravata e o colete dele, garantindo que tudo estivesse no lugar exato que deveria.

— Pronto. — ela disse, assentindo uma vez. — Assim está melhor. Agora você também não parece tão desgrenhado.

O som de casais no terraço diminuiu e Tate aproveitou a oportunidade para olhar através da hera, e ficou satisfeito ao ver que todos haviam retornado para dentro da casa.

— Venha. — disse ele pegando a mão dela e puxando-a de volta para o terraço. — Creio que seja seguro voltarmos ao baile.

Sem nenhum problema, ele devolveu Ava à viscondessa Vance e cumprimentou as amigas dela que a esperavam com paciência ao lado de Sua Senhoria quando Ava o apresentou a todas.

Os olhos arregalados da Srta. Perry ao vê-lo o levaram a acreditar que ela não conhecera muitos duques em sua vida.

— Quando pretende retornar para Berkshire? — ele perguntou, antes de sair.

— Viemos para ficar por uma semana, Sua Graça. — Ava respondeu. — Willow teve a gentileza de nos convidar para visitar a cidade e participar dos poucos eventos restantes da pequena temporada. Devo admitir que é uma boa distração dos problemas que temos tido em Berkshire.

O que lembrou Tate do que ele precisava de uma resposta de Ava antes de deixar o baile.

— A reunião com o agente será às onze da manhã de amanhã em minha casa na Grosvenor Square. Será que poderá ir? Como proprietária de terras na região, acredito que sua presença é importante.

— Ava nos contou dos problemas que enfrentam, Sua Graça. —

disse Willow, baixando a voz para garantir a privacidade. — Se houver algo que você precise que eu ou a Srta. Evans faça, não hesite em nos pedir.

— Obrigado, Srta. Perry. Manterei isso em mente.

Ava sorriu para a amiga antes de se voltar para ele.

— Claro que estarei presente. Estamos ficando com Sua Senhoria, pedirei a ela que indique uma das damas de companhia para me acompanhar.

— Você pode levar Betsie com você, Ava. Ela é minha criada pessoal. — disse a Srta. Perry.

Tate gostava cada vez mais das amigas de Ava. Ambas pareciam equilibradas, inteligentes e leais. Todos os traços que ele sempre procurara em suas amizades ao longo da vida.

— Obrigada. — Ava agradeceu. — É muita gentileza sua.

Tate apertou a mão de Ava e fez uma reverência.

— Até amanhã, Srta. Knight.

Ela lançou um pequeno sorriso carregado de segredos que o fez contar as horas até que ele voltasse a vê-la.

— Até amanhã, Sua Graça.

AVA BATEU com a aldrava de bronze na porta da residência do duque às 11 horas em ponto. Um lacaio atendeu à porta, seu paletó vermelho e calças adornadas com botões de ouro eram um sinal da riqueza e do poder que residiam dentro dessas grandes paredes.

Ava nunca havia entrado na residência de Tate em Londres, e o tamanho imponente e colossal a fez se sentir insignificante e comum. É claro que a propriedade de Tate em Berkshire era grande, mas não tão imponente quanto esta casa. Aqui o piso era de mármore, tão polido que quase se podia ver o próprio reflexo neles.

Uma escadaria larga e sinuosa ficava no centro do piso de entrada e levava aos muitos aposentos acima. Ainda no andar de baixo havia múltiplas portas, cada uma emoldurada por dois pilares que também pareciam ser feitos de mármore.

Era tanta grandiosidade e expectativa nos ombros de quem quer que morasse ali. Uma posição que ela hesitava em aceitar. Ela respirou fundo e, com os braços arrastados, entregou a pelisse ao lacaio que esperava, junto com o chapéu.

— O duque a está esperando, senhorita Knight. Por gentileza, siga-me. — disse um mordomo, saindo das sombras e assustando-a um pouco. A severa carranca e desaprovação no rosto dele por causa da chegada dela fizeram Ava não ousar fazer nada além do que ele solicitasse.

Duas cadeiras estavam dispostas dentro da biblioteca. Ele apontou para as cadeiras como se ela não fosse capaz de vê-las.

— A senhorita e sua criada podem sentar-se ali. — disse o mordomo, o semblante severo não se alterando milímetro algum.

Ava analisou o cômodo ao entrar.

A escrivaninha de Tate estava bem no centro do espaço. Em uma extremidade da biblioteca havia prateleiras de mogno cheias de livros e manuscritos de várias formas e tamanhos. As janelas da frente davam para a rua, e carruagens e pessoas passavam apressadas em seus passeios.

— Sua Graça. — Ava se levantou, mergulhando em uma reverência quando Tate entrou.

Os passos dele vacilaram um momento antes que ele dispensasse o mordomo. Ele se aproximou dela com um sorriso.

Tate assentiu em cumprimento, puxando-a em direção à cadeira que ficava à frente da mesa.

— Obrigado por vir. — disse ele, apertando um pouco a mão enluvada.

Toda a intenção de manter distância, de se lembrar de que essa não era a vida que ela mais desejava desapareceram quando ele sorriu para ela. Agora não havia nada que ela gostaria de fazer mais do que beijá-lo outra vez. A única coisa que a impedia era a criada pessoal dela e o fato de que o agente chegaria a qualquer momento.

Ele se inclinou e beijou a bochecha dela que sentiu calor florescer nas bochechas, sabendo que a dama de Willow havia visto a demonstração de carinho. A criada pigarreou, e Tate apenas riu, dando um sorriso diabólico para Ava quando ela se sentou.

— Eu ficaria mais do que feliz se beijá-la inteira, minha querida.

Eu não me importo mais que os funcionários possam notar o carinho que tenho por você. Não vou mais esconder meu afeto. Já passei muitos anos fazendo o que os outros achavam melhor para nós e não farei mais isso.

Ava olhou para ele quando ele deu um passo para trás e se encostou na mesa, os braços cruzados no peito. Hoje, Tate usava calça bege e botas de cano alto. O colete, a camisa e a gravata haviam sido feitos sob medida e o casaco o envolvia com perfeição.

Nesse cenário, nessa casa enorme e em roupas primorosas, Tate era a descrição perfeita de um duque. Poderoso, carismático e tão acima do alcance dela, ou pelo menos ele deveria estar. Ele era aristocrático demais para o sangue plebeu dela e merecia uma mulher que trouxesse fortuna e conexões familiares. Eles eram tão jovens, tão imunes ao que era esperado deles quando planejavam fugir.

Agora, Ava podia ver que, embora houvesse uma faísca entre eles, um fogo que acendia cada vez que se tocavam, não significava que eles eram adequados para se tornar marido e mulher. Por mais que doesse fazer tal admissão, ela não era do mesmo nível social dele, e caso se casasse com ele, a nobreza e a sociedade em geral fariam questão de deixar claro que a escolha era considerada abaixo do esperado.

— Embora eu não ponha em risco sua reputação ao declarar minhas intenções, mas aqui no meu escritório, longe dos olhares indiscretos de membros da família e matronas da sociedade intrometidos, vou beijá-la, se quiser. Vou beijá-la pelo tempo que desejar. — ele sussurrou, para que a criada não ouvisse.

Ava mordeu o lábio.

Como diabos ela negaria algo se ele falava daquele jeito?

Depois da noite anterior, do beijo deles, ela não conseguiu pensar em muita coisa além do beijo, mas isso não ajudaria a nenhum dos dois. Sua vida estava em Berkshire, e a vida dele em Londres com a Câmara dos Lordes, a Sociedade e a supervisão de suas muitas propriedades.

Um duque esperaria que sua esposa estivesse ao seu lado como um pilar da sociedade, uma anfitriã durante a temporada. Como uma mulher que criava e treinava cavalos de corrida faria tudo o que se era esperado para a posição?

Ela não faria.

— Tate, preciso da sua opinião acerca de um assunto que está me incomodando.

— É claro. — ele disse. — Diga-me o que quiser, Ava.

Ela encontrou o olhar dele e forçou as palavras, que trariam a verdade, saírem da boca dela apesar do pavor.

— Se nós nos casássemos, o que seria esperado de mim?

Ele franziu a testa, ajoelhando-se diante dela e pegando a mão dela.

— Eu gostaria de exibi-la. Trazer você para Londres e gritar da cúpula da Catedral St. Paul que você é minha e de mais ninguém.

Cobriria você com joias, diamantes e presentes que exaltariam a cor deslumbrante de seus olhos e a doçura de sua alma. E dançaríamos e faríamos amor até não termos mais energia para fazê-lo. E este seria só o começo.

As palavras dele a fizeram ser tomada pelo pânico do que tal promessa significaria para ela.

— Você deseja passar todas as temporadas na cidade?

Ele assentiu.

— É claro que teríamos que vir muito para Londres porque sou membro da Câmara dos Lordes e, portanto, o Parlamento me traz à cidade com frequência. Como Duque de Whitstone, espera-se que eu seja visto durante a Temporada, que eu frequente bailes e festas.

Meus amigos, que se tornarão nossos amigos, esperam e querem que participemos de suas reuniões.

Ele sorriu, os olhos cheios de esperança e, incapaz de dizer o quanto suas palavras frustraram todo o otimismo dela, ela sorriu um pouco, passando a mão sobre o queixo dele.

— Tate...

UMA BATIDA rápida na porta fez Tate se erguer antes que o mordomo entrasse e anunciasse o agente de Bow Street, por graças impedindo que Ava respondesse às palavras de Tate acerca do futuro deles, que dissesse o que ela esperaria caso eles contemplassem um matrimônio.

— Ava, este é o Sr. Shelly, o agente de quem falei. — Sr. Shelly, esta é a Srta. Knight, minha vizinha de Berkshire, que veio me ajudar na noite do incêndio em Cleremore.

O homem fez uma reverência a ela.

— Prazer em conhecê-la, Srta. Knight.

Qualquer que fosse a aparência que Ava poderia ter imaginado que um agente de Bow Street teria, não era em nada parecido com o que ela via na frente dela. Este homem era tão alto quanto o duque e com os ombros tão largos quanto.

Na opinião dela, o rosto dele não era tão agradável de se olhar quanto o do duque, embora fosse muito aprazível aos olhos femininos em geral com seus cachos negros e curtos e os olhos de um tom de verde esmeralda como ela nunca havia visto antes.

Todos se sentaram e, uma vez acomodados, o duque disse:

— Você tem alguma informação para nós pelo que soube.

O Sr. Shelly lançou um olhar curioso, e Ava sorriu por saber exatamente o que o pobre homem estava pensando. O que uma

mulher estava fazendo aqui em uma reunião de um assunto que só deveria interessar cavalheiros?

— Pode falar sem ressalvas na frente da Srta. Knight. Ela sabe de tudo o que está acontecendo em Berkshire, e eu não escondo nada dela.

Ava não pôde evitar a sensação reconfortante que a envolveu ante as palavras do duque. Ele era um homem muito bom. Ela seria uma tola caso não chegasse nem a vislumbrar um futuro com ele.

Mas ela não o faria se significasse sacrificar tudo pelo que ela lutou tanto para conseguir.

Mas agora não era hora de pensar em assuntos românticos com o duque, nem nele. Agora era a hora de descobrir se Lorde Oakes estava por trás dos terríveis ataques, e se havia a possibilidade de ele ser levado à justiça.

— Claro, Sua Graça.

O homem enfiou a mão no bolso e tirou um caderno preto, folheou algumas das páginas. Ele parou quando chegou a uma folha em que Ava conseguiu enxergar alguns pontos ao longo do papel.

— O dia em que você perseguiu um cavalheiro na floresta e que ele atirou na sua direção, e que a Srta. Knight se machucou após uma queda. — o agente encontrou o olhar dela. — Espero que esteja se sentindo melhor, senhorita Knight. Fiquei bastante aflito por saber que o criminoso havia agido de tal forma e, ainda mais, por mirar em uma mulher.

Ava agradeceu, sabendo que, se o culpado fosse de fato Lorde Oakes, ele era capaz de ações piores do que atirar em alguém. de olhos fechados, Ava preferia enfrentar uma arma à ser forçada a uma situação em que ela não seria capaz de correr, escapar. Assim como Lorde Oakes tentou fazer com ela.

— Um fazendeiro estava trabalhando nas proximidades e ouviu o tiro. Momentos depois do disparo, o cavaleiro em questão passou correndo pelo fazendeiro. Ele não acredita que o tenham visto. O

lenço do culpado, entretanto, já havia escorregado para o pescoço, expondo o rosto. O fazendeiro reconheceu esse homem como ninguém menos que Lorde Oakes.

Ava encontrou o olhar de Tate e leu a esperança nos olhos dele de que Sua Senhoria seria preso em breve, tornando-se incapaz de provocar mais danos. Pensar que ela nunca mais se preocuparia com ele, nem ficaria com medo de que ele aparecesse na porta dela no meio da noite e se forçasse a ela para terminar o que havia começado fez com que suas esperanças aumentassem, ela sentia seu sangue correr.

Ele seria punido de uma vez por todas.

— Tenho homens seguindo Lorde Oakes aonde quer que suas viagens o levem. Estamos atentos aos lugares que ele visita, a quais negócios ele se engaja quando está em Londres e se ele viajar para fora da cidade, saberemos.

— São notícias encorajadoras. — disse o duque. — Podemos provar que Lorde Oakes não estava em Londres no dia do incêndio de Cleremore ou quando a senhorita Knight e eu fomos alvejados?

— Podemos. — respondeu o Sr. Shelly. — Fizemos uma vistoria na casa londrina de Sua Senhoria e tivemos uma conversa bem esclarecedora com a cozinheira dele. A mulher estava bastante disposta a conversar, já que oferecemos uma coroa. Também foi dito que Sua Senhoria está com os soldos dos funcionários atrasados há um mês. A cozinheira afirmou que, embora não soubesse para onde Sua Senhoria havia ido, que ele esteve sim fora de Londres. É claro que se trata da palavra de um plebeu contra a de um Lorde, o mesmo com relação ao fazendeiro. Não há

evidências suficientes para provar a culpa dele, e caso esse assunto fosse a julgamento, decerto perderíamos. Mas é um começo.

Ava franziu a testa.

Todas as informações eram boas, mas não eram suficientes para derrubar Lorde Oakes.

— Qual é o seu próximo passo?

O investigador sorriu.

— Lorde Oakes vai cometer algum erro. E quando o fizer, estaremos lá. Pela minha experiência, quando tais pessoas pensam que enganaram a todos, fazem algo que não fazia parte do plano original, e toda a farsa começa a se desfazer.

O duque assentiu, parecendo satisfeito.

— Ele está em Londres agora e não fui notificado de nenhum outro incêndio nas redondezas de nossas propriedades rurais.

Quando retornarmos a Berkshire, e se Lorde Oakes também partir para sua propriedade rural, seria interessante estar atento a novos incêndios.

— Estou certa de que sim. — disse Ava. — Ele deve sentir prazer ao infligir tanta dor e sofrimento aos outros, se me permitem tal observação acerca de Sua Senhoria.

Tanto o duque quanto o investigador olharam para ela.

— Por favor. — disse Tate, gesticulando para que ela prosseguisse.

Ava limpou a garganta, calor subindo em suas bochechas.

— Sr. Shelly, preciso que saiba que Lorde Oakes estava decidido a me tornar amante dele meses atrás. Na época, ele estava cortejando uma mulher de meios substanciais aqui na cidade, e queria ter uma amante no interior. Eu o recusei quando percebi que as intenções não eram honradas.

— Ava, você não precisa contar...

— Sim, eu preciso. — disse ela, interrompendo Tate. — Tudo precisar estar bem claro, ao menos para o Sr. Shelly.

Tate recostou-se na cadeira, e Ava virou-se para o investigador.

— Não me escapou a percepção de que os incêndios ocorreram em propriedades que cercam meus próprios estábulos em Berkshire. Não posso deixar de pensar que ele está mirando nas pessoas mais próximas a mim, meus amigos e vizinhos, e me deixando para o final.

Os olhos do investigador se arregalaram com entendimento, e agora, após ter dito em voz alta seus medos, tudo pareceu fazer sentido. Lorde Oakes provara ser um ser humano egoísta e malvado. Não seria surpresa para Ava se ele quisesse se vingar dela, atormentá-la e deixar a propriedade dela por último.

— Ele não ousaria. — disse o duque, assassinato subentendido em seu tom.

O agente olhou para os dois antes de escrever algo no bloco.

— Suas preocupações são justificadas, Srta. Knight, e mandarei mais homens para vigiar sua casa. Lorde Oakes parece ter uma doença que incurável. — disse ele, brandamente. — Com uma doença dessas, não sabemos o que ele planeja ou para quando.

Ava conseguia acreditar nisso.

— Suponho que agora devemos ser pacientes e esperar, embora me preocupe onde ele atacará a seguir. Se ele for bem-sucedido em seus empreendimentos, o que significaria para as vítimas? Eu conheço o caráter cruel dele. Ele é capaz de infligir dor aos outros e não se importar com seus atos.

O agente a estudou por um momento, parecia refletir as palavras dela, dobrou o caderninho preto e o enfiou no bolso do casaco.

— Não há razão para alguém atuar dessa maneira. Algumas pessoas são más em essência, desejam fazer mal aos outros sem

uma razão específica, a não ser prazer próprio. Sabemos que Lorde Oakes está com dificuldades financeiras devido ao fato de a mulher que ele cortejava ter se casado com outro. O pai dela percebeu que ele estava quase falido e rejeitou a proposta dele. Você recusou os avanços dele, e os que o cercam em Berkshire são prósperos, possuem propriedades bem-sucedidas, ao contrário da dele.

Ava analisou os argumentos.

— Então o que está dizendo é que ele está atacando essas propriedades, essas famílias, apenas por inveja?

O investigador deu de ombros.

— Já vi pessoas assassinarem por menos. Não vejo razão para que Lorde Oakes não busque vingança por delitos inventados por sua própria mente débil.

— Isso é perturbador. — disse o duque, pensativo. — Não posso negar que ficarei feliz quando Lorde Oakes estiver atrás das grades ou, quem sabe, for enviado às colônias para nunca mais se aproximar de nossas sombras.

— É isso que pretendemos fazer, Sua Graça. Pode ser que leve algum tempo, mas ele cometerá um erro, todos cometem em algum momento, e quando ele o fizer, estaremos prontos.

Ava pensou nas palavras dele.

Esperar era muito bom, mas o desejo que Lorde Oakes nutria de machucar as pessoas, o desejo de ver animais queimando nos estábulos não era algo com que ela estivesse disposta a apostar.

Não era algo que ela estava disposta a permitir que fizesse de novo.

Dessa vez, não importa quantos agentes estivessem no encalço de Sua Senhoria, eles poderiam chegar tarde demais, assim como chegaram tarde demais para salvar os cavalos e o funcionário de Lorde Morton algumas semanas atrás.

— O que acham da ideia de dizer algo a Lorde Oakes? Não de mencionar que ele está sendo seguido por agentes, apenas deixar escapar que alguém viu um cavalheiro fugindo à cavalo no dia em que fui ferida. Deixar que a mente de Sua Senhoria imploda com a ideia de que alguém possa tê-lo reconhecido. Se disséssemos algo parecido para ele, podemos assustá-lo o suficiente para impedi-lo de iniciar mais incêndios. Eu sei que temos que sentar e esperar.

Entendo por que fariam isso, mas corremos muito risco com esse plano. Meus estábulos, por exemplo, abrigam cavalos que valem centenas de libras. Agora mesmo, o premiado puro-sangue, Titan, reside lá. Se permitirmos que Lorde Oakes volte a atacar, arriscamos nosso sustento, minha equipe e a vida dos cavalos. O

que você acha disso, Sr. Shelly? Acredita que vale a pena tentar esse plano?

O agente esfregou a mandíbula, franzindo os lábios, pensando.

— Entendo seu dilema e sua frustração. Arriscamos muito esperando que ele ataque novamente. Mas acredito que nesse caso precisamos esperar. Meus homens foram instruídos a adiar até o último momento possível antes de prenderem Lorde Oakes, portanto, se ele tentar iniciar um incêndio, estaremos lá e o impediremos, mas precisamos pegá-lo em flagrante. Se ele descobrir que está sendo vigiado ou que a senhorita suspeita dele, ele pode fugir. O homem é um covarde de coração e se fugir, bem, nunca seremos capazes de provar a culpa dele nesse caso.

Ava recostou-se na cadeira. Ela podia entender a opinião dele, mas não tornava mais fácil a perspectiva de deixar Sua Senhoria à solta.

— Muito bem. — ela cedeu. — Eu não direi uma palavra.

Ava leu o entendimento no olhar caloroso do duque. O fato lhe confortou. Eles pegariam Lorde Oakes e depois o trancafiariam. Ela

se livraria dele para sempre, talvez pela primeira vez em uma era, ela poderia respirar.

— Muito bom. — disse o duque. — Estamos de acordo, assunto resolvido. Esperaremos.

Depois de discutir alguns itens diversos em relação à onde os agentes ficariam ao longo do caminho entre a propriedade da Srta.

Knight e do duque, e por quem eles se passariam para não causar suspeitas caso encontrassem Lorde Oakes, o investigador os cumprimentou e saiu.

O duque, depois de se despedir do homem, voltou à biblioteca, fechando a porta atrás de si. Ava se levantou, sabendo que ela também deveria sair. Mesmo com a criada ali, ela ainda arriscava a reputação pelo simples fato de estar ali.

— Eu devo ir também. — disse ela, sem se mexer.

O duque estendeu a mão e pegou a dela, inclinando-se sobre os dedos enluvados e beijando-os. Seu toque enviou um frisson de consciência através do corpo dela, e Ava apertou a mão dele em resposta.

— Você vai ao baile dos York esta noite? Sei que vamos acompanhar a viscondessa.

O duque a conduziu para a porta.

— Agora eu vou.

Ela riu e, ao ver que a dama de companhia continuava sentada à espera de instruções, Ava gesticulou para que se levantasse.

— Até hoje à noite, então, Sua Graça.

Ava parou no limiar da porta da biblioteca, assimilando o máximo possível do duque. Ela adorava ficar sozinha com ele. Ele nunca agia como um nobre pomposo ao lado dela. Para ela, ele era simplesmente Tate. Sempre que estavam juntos, o corpo dela nunca

parecia seu. Estremecia e ansiava pelo toque dele, e ela não parecia capaz de deter a reação.

— Ó, que adorável. — disse uma voz fria e desinteressada da escada. — Se não é a Srta. Knight. Pensei que meus olhos estavam me pregando uma peça quando a vi na noite passada, no baile dos Tinley. Não sabia que havia sido convidada.

Ava respirou fundo e virou-se para sorrir para a viúva que descia, com lentidão exagerada, a escada em direção a eles. Atrás dela, havia uma mulher de impressionante beleza, toda elegância etérea, uma deusa com mechas loiras.

Ava fez uma reverência e não pôde deixar de olhar para seu modesto vestido matutino, um modelito do ano anterior. Ela se esforçou para ignorar as palavras "desagradável" e "simples" que flutuaram em sua mente sempre que estava perto de mulheres que se vestiam com o mais recente da moda, títulos e alta-costura. Ela levantou o queixo, e endireitou a coluna com determinação.

Ela olhou para Tate, o rosto dele assumindo um horrível tom de cinza. Ele a pegou olhando para ele e fechou a boca com um estalo, os lábios formando uma linha de irritação. Em relação a ela ou à mãe dele, Ava estava incerta, mas ela com certeza esperava que fosse a segunda opção.

— Tate, meu querido, você se lembra de Lady Clapham. Ela é minha nova acompanhante e voltará para Berkshire comigo na próxima semana.

A mulher mergulhou em uma reverência perfeita, e algo semelhante a ciúme atravessou Ava ao notar a impressionante beleza da mulher. Ela lançou um meio sorriso ao duque, contente, o que só a fez parecer mais bonita se é que era possível. Por um momento, Ava olhou para todos, tentando se lembrar de onde reconhecia o nome de Sua Senhoria.

Onde ela havia ouvido esse nome?

Tate pareceu se lembrar dos modos e cumprimentou a mulher com uma leve reverência.

— Bem-vinda, Lady Clapham. Tenho certeza de que você servirá muito bem minha mãe.

A viúva riu.

— Ó, com certeza acredito que sim.

Ava estudou Lady Clapham e com um temor nauseante ela se lembrou. Ela foi amante de Tate.

— Mais uma vez obrigada pela reunião, Sua Graça. Um bom dia a todos.

Ava recolheu o casaco e touca que estava nas mãos do lacaio no hall de entrada, e nem se incomodou em vesti-lo, apenas saiu assim que o criado abriu a porta, a criada bem atrás dela.

O modo como a nova acompanhante da duquesa olhava para o duque era predatório. Damas nesta posição não deveriam ser solteironas? Mulheres tímidas por natureza, sem interesse em casamento, ou com muita idade para chamarem a atenção de um homem? Lady Clapham não era nada disso, mas era perfeita se a viúva estivesse fazendo planos para o filho, mantendo uma mulher sem classe e do comércio longe dele.

— Srta. Knight. — chamou o duque, descendo os degraus da frente de sua casa e encontrando-a na porta da carruagem. — Eu a verei esta noite, não a verei? — ele perguntou, pegando a mão dela e ajudando-a a subir os degraus do veículo.

Ela assentiu, mas queria partir antes que ele visse como ela estava com ciúmes da mulher que agora viveria sob seu teto. Ela deu as coordenadas ao condutor.

Pensar que Lady Clapham tomaria café-da-manhã e jantaria com Tate. Que passaria as noites à frente da lareira na sala de jogos,

jogaria cartas e faria companhia à duquesa-viúva, que seriam como uma casal feliz.

— Nos vemos, então. Tenha um bom dia, Sua Graça.

Ela não olhou para ele quando a carruagem se afastou e conteve as lágrimas que ameaçavam. Era por isso que ela não era feita para este tipo de vida. Ela não era uma mulher de estratagemas, não era como a viúva, ou como Lady Clapham que também participaria desses jogos de bom grado.

Essa vida não representava quem ela era ou queria ser, algo que ela precisava se lembrar para manter a cabeça longe de Tate.

TATE FICOU parado na calçada e observou a carruagem rugir rua abaixo, até virar uma esquina e desaparecer. Ele franziu a testa, sabendo muito bem por que Ava ficara chateada com ele, ou para ser mais preciso, com a mãe dele.

Ele girou nos calcanhares e voltou para dentro, subiu até a sala de estar do primeiro andar, que a mãe havia ocupado como seu espaço de entretenimento particular. Ele a encontrou com Lady Clapham, sua antiga amante, tomando chá e sorrindo de orelha a orelha. Sem dúvida, o pequeno ardil provocara a reação desejada em Ava.

— O que — ele disse, apontando para Lady Clapham. — ela está fazendo aqui? E como sua dama de companhia ainda por cima.

Você está louca, mãe? Devo mandar chamar o médico e trancá-la no Asilo Bedlam antes do final do dia?

A viúva estreitou os olhos, sem quaisquer resquícios de diversão, ante as palavras dele.

— Lady Clapham é uma boa companhia e se voluntariou para ser minha dama de companhia, me entreter como a dama de uma Lady deve. Mas se ela também o faz lembrar que você possui um passado, um que a Srta. Knight não conhece, bem, melhor para mim. — a mãe dele pegou a xícara de chá e tomou um gole. — O

que será que a Srta. Knight diria se eu contasse que a mulher que partilhava sua cama agora é minha dama de companhia?

Tate não acreditava que seu sangue pudesse ferver mais do que quando Lorde Oakes cruzava seus pensamentos e, no entanto, de alguma forma sua mãe pareceu conseguir realizar tal feito. Ele fechou os punhos rente ao corpo para evitar que a estrangulasse na tentativa de fazê-la ter algum bom senso.

— Você não pode ter Lady Clapham como sua dama de companhia. A maioria dos cavalheiros que conheço buscaram a atenção dela nos últimos meses.

Sua Senhoria ofegou ante a grosseria dele, e Tate lamentou ofendê-la, mas sua mãe e seus planos não seriam benéficos a ninguém:

— Não importa o que você acredite, mãe, Lady Clapham não era minha amante, ela foi apenas uma mulher que aqueceu minha cama vez ou outra, e que agora não o faz mais. Se der continuidade a este plano, será ridicularizada.

— Eu tenho toda a intenção de fazê-lo. Sou a duquesa-viúva de Whitstone. Ninguém ousaria me contradizer. Lady Clapham vai me acompanhar pela cidade e voltará comigo para Berkshire. Eu, por exemplo, estou muito animada com o que está por vir. — a mãe dele sorriu, e mesmo assim seus olhos só mostravam frieza calculista.

— Por que você faria uma coisa dessas? Eu sempre soube que você não era amorosa, mas não a considerava tão cruel. Deveria se envergonhar.

Tate olhou para a mãe.

Ela permaneceu indiferente e intocada por suas palavras. Se ele esperava ver algum arrependimento nela, enganou-se. Pelo contrário, ela parecia muito bem satisfeita consigo mesma.

— Eu não me envergonho, e nunca o farei. Lady Clapham agora está a meu serviço, e iremos passear quando me convier. Quando eu voltar para Berkshire, ela também virá comigo e faremos uma festa bem alegre.

— Você não voltará para Cleremore. Mandarei um aviso aos criados para que arrumem suas coisas e as enviem para a casa da viúva. Seu tempo como genitora sob meu teto acabou. Quanto à casa em Londres, você pode permanecer aqui até que providencie acomodações alternativas.

A mãe dele deu de ombros, imperturbável.

— Faça o que quiser, meu querido. Nos vemos no almoço.

Tate saiu da sala com pressa.

Ele apertou as mãos para parar de tremer e lutou contra a vontade de socar um vaso que ficava encostado na parede do corredor. Embora ele não pudesse controlar a mãe, ele podia controlar quem morava em suas propriedades.

Ele desceu as escadas.

Escreveria para seu administrador em Cleremore de uma vez e o instruiria a organizar a mudança de sua mãe. Não se arriscaria a perder Ava outra vez, não importava quais esquemas secretos sua mãe inventasse.

Quanto a Lady Clapham, ele falaria com ela sobre sua conduta e o que ela achava que estava fazendo, mas sem a mãe dele estar presente. Ele acreditava ter agido de forma correta com ela, mas parece que ela pensava o contrário.

Ele balançou a cabeça, entrando na biblioteca e trancando a porta atrás de si. Ora, ele ficara sabendo até que ela havia arrumado um novo caso. Tate não sabia que o novo patrono de Sua Senhoria era, na verdade, sua própria mãe. E tal situação era inadmissível.

CAPÍTULO 12

M AIS TARDE NAQUELA NOITE, Tate estava ao lado de seu amigo, Lorde Duncannon, e observava Ava dançar com um cavalheiro sem importância. Era a quarta dança dela nesta noite e assim que ele chegou, a menos de duas horas, foi informado de que o cartão de dança dela estava completo, e portanto, eles não poderiam dançar.

Ele tomou um gole de vinho, imaginando como explicar a ela que o que havia presenciado de manhã na casa dele em nada mudava o que havia entre eles. Ele pode sim ter considerado Lady Clapham atraente, um homem teria que ser cego para não ver sua beleza.

Porém, como ele faria para contar que, além de estar com o coração dele na palma da mão, ela era a única mulher que o fazia girar a cabeça? A única mulher a capturar seu coração e alma.

Ele não teve a chance de conversar com Lady Clapham a respeito de por que ela estava de conluio com a mãe dele, mas ele o faria. No entanto, neste momento, seu maior problema era descobrir como explicar a situação para Ava, sem que ela se magoasse com a verdade.

— Como está a caça ao incendiário, Tate? O Investigador obteve alguma pista acerca da identidade dele? — Lorde Duncannon perguntou, tomando um gole de vinho.

Tate virou-se para o amigo, tendo se esquecido por um momento que ele estava lá. Duncannon era tão alto quanto ele, mas com os ombros um pouco menos largos. Mesmo assim, sua mandíbula marcante, as mechas loiras e o entusiasmo pela vida o tornava, com frequência, o favorito entre as mulheres.

— Temos uma pista, e neste exato momento o cavalheiro em questão está conversando com Lorde York.

Os dois olharam para o outro lado do salão, onde estava seu inimigo. A raiva crepitou no sangue de Tate, e ele precisou se conter e não atravessar o piso de parquet que os separavam para partir a cara do desgraçado.

Ele o analisou por um momento, odiando o fato de ele ter machucado, aterrorizado e tentado estuprar Ava. Tate balançou a cabeça, agradecido pelo fato de a criada de Ava entrar e o deter.

— Lorde Oakes. Você suspeita dele? — o choque na voz de seu amigo o tirou de suas reflexões em torno de como torturar o desgraçado caso o encontrasse sozinho.

— O dia em que a Srta. Knight e eu fomos alvejados, então...

— Espere. Pare. — disse Duncannon, apertando o braço dele.

— Você e a Srta. Knight, a mesma mulher com quem você queria se casar tantos anos atrás, foram alvejados? Como eu não soube disso?

Tate balançou a cabeça.

— Preciso lembrá-lo de que você não estava em Londres, nem mesmo na Inglaterra naquela semana. A propósito, como está Paris? Ainda é tão decadente como sempre e muito disposta a fazer um espetáculo para agradar um visconde rico?

O amigo sorriu.

— Claro, mas esqueça-se disso. — disse ele, franzindo a testa.

— Algum de vocês dois se machucou? O que aconteceu?

— Veja por si. — disse Tate com um movimento de cabeça na direção em que Ava ainda dançava com um barão.

— Aquela é a Srta. Knight?

Tate ouviu a apreciação na voz do amigo e decidiu ignorá-la. Ava era muito bonita, mesmo que na maior parte do tempo ela fosse

alheia a tal fato. E beleza, dentro e fora, que Ava possuía em abundância. Não era de admirar que ela fosse tão requisitada em bailes e festas. A Sociedade sentiria falta dela quando retornasse a Berkshire, mesmo que a mãe de Tate não partilhasse o sentimento.

— Sim, é ela.

Duncannon olhou para ele com desconfiança.

— E ela está dançando com outra pessoa porque...

Era algo pelo que Tate havia se indagado também, mas após a saída precipitada de Ava da casa dele hoje cedo, não era difícil descobrir por que ela o estava evitando. Ela estava com raiva e talvez até magoada, mas tais emoções o levavam a outra constatação. Ava gostava dele mais do que como um amigo, e isso o fazia ter esperanças.

— Minha mãe contratou uma nova dama de companhia. Mas esta pessoa é Lady Clapham, uma antiga amante minha.

— O quê!

A altura da declaração de Duncannon fez as pessoas se virarem na direção deles, até Ava na pista de dança olhou para eles, por tempo o bastante para Tate notar antes de ela desviar.

— Fale baixo, ninguém sabe, e ela só contratou Lady Clapham para poder causar conflito entre Ava, digo Srta. Knight, e eu.

— Então, você ainda gosta dela. Conclui que fosse assim quando percebi que não estava me ouvindo, que sua mente estava longe. Embora eu não soubesse que era a Srta. Knight em particular, eu sabia que era alguém do sexo oposto.

Tate suspirou, gesticulando para um lacaio trazer um pouco mais de vinho para eles.

— Não foi muito depois de eu voltar a Londres. A Srta. Knight soube de alguns dos rumores que circulavam na Sociedade acerca de minhas atividades, mas não sabe de tudo. Lady Clapham é um

desses assuntos, e de alguma forma a minha mãe descobriu e está disposta a causar problemas.

— Você terá que colocar sua mãe no lugar dela. — disse Duncannon, pegando uma taça de vinho do lacaio e sorrindo em agradecimento. — É claro que gosto da viúva, mas ela não pode reger sua vida como costumava fazer. Você é um homem adulto, Tate. Deve deixar claro que não permitirá que ninguém da família o trate com tão pouco respeito.

Tate apertou o queixo.

Sabia que Duncannon estava certo. A mãe dele havia ultrapassado os limites, e ele providenciaria para que ela fosse acomodada na Residência da Viúva, antes que retornasse à Berkshire. Mas não significava que ela não seria capaz de causar desavenças entre Ava e eles, mesmo distante.

Ele olhou para a esquerda e xingou por dentro.

Lady Clapham caminhava em direção a ele com sua melhor amiga, e uma das maiores fofoqueiras da sociedade, a tiracolo.

Sentindo todos os olhos nele, ele se voltou para onde havia visto Ava pela última vez e a encontrou observando-o, junto a um grupo de amigas.

— Falando do diabo. — disse Duncannon, curvando-se para as duas damas que se juntaram a eles em instantes.

Tate jamais desejara estar em outro lugar com tanta vontade com agora. Ele comportou-se como o esperado de um duque e cumprimentou as duas damas com uma pequena reverência de cabeça assim que chegaram. Lady Clapham sorriu para ele com doçura, uma característica que ele sabia ser apenas aparente. A mulher só poderia ter gelo correndo nas veias se havia escolhido unir forças com a mãe dele.

Ele só podia agradecer aos Céus por descobrir tal fato agora, e por não ter seguido em frente com a ideia de propor casamento, como ele cogitou fazer no ano anterior quando estava confuso e sofrendo de amores por uma mulher que não via há meia década.

— Sua Graça. Lorde Duncannon.

As duas mulheres fizeram uma reverência, e Tate lutou para não olhar de volta para Ava e ver se ela estava observando a cena acontecer. Inferno, ele esperava que ela desviasse o olhar, que estivesse dançando com outro cavalheiro.

— Estão gostando do baile? — Lorde Duncannon perguntou, tomando um gole de bebida, com visível júbilo em ver Tate constrangido.

Lady Clapham sorriu, aproximando-se mais de Tate.

— Acabamos de comentar que a próxima dança é uma valsa.

Se essa era uma tentativa de Lady Clapham de sugerir que Tate dançasse com ela, ela ficaria muito desapontada. Havia apenas uma mulher com quem ele queria dançar, e esta era a Srta. Knight.

Incapaz de fazê-lo, Tate a procurou mais uma vez e viu o marquês de Boothby se curvar diante dela, pegar sua mão e a encaixar debaixo do braço dele antes de conduzi-la à área de dança.

Tate terminou o vinho e depositou a taça em um buffet que havia detrás deles. Maldito fosse o homem. Ele sentiu a raiva dentro de si aumentar ao perceber o sorriso que brincava nos lábios de Ava.

Sem mencionar que a mão de Sua Senhoria estava muito baixa nas costas dela, e ele a segurava muito mais perto do que deveria.

Desgraçado.

Uma mão apertou seu braço, e ele nem percebeu que havia dado um passo na direção dos dançarinos.

— Deixe para lá, Tate. — o amigo sussurrou. — É apenas uma dança. Creio que, no momento, você esteja com problemas maiores do que a Srta. Knight.

As palavras de Duncannon o fizeram se acalmar um pouco, e ele assentiu. Precisava dar um voto de confiança ao sentimento que ele e Ava nutriam um pelo outro, mesmo que hoje ela estivesse bem chateada com ele.

— Bem, já que sou viúva e uma bastante escandalosa, terei que resolver o assunto por mim mesma. Dançará comigo, Sua Graça?

Os convidados se viraram, alguns ofegaram ante as palavras de Sua Senhoria. Tate estreitou os olhos, odiando o fato de ele ser uma peça no jogo dela.

Ele retesou o queixo antes que seu humor se fizesse visível.

Para evitar que ela se envergonhasse perante todos e ser um cavalheiro, como ele poderia não dançar com ela agora? Ele estendeu o braço, sorrindo entredentes.

— Claro, Sua Senhoria. Vamos?

Ela o segurou e ergueu o queixo, caminhando ao lado dele enquanto ele buscava um lugar entre os casais que já estavam valsando. Ele não gostou da dança, seus problemas apenas dobravam a cada minuto que Lady Clapham passava em seus braços. A música continuava, as pessoas flutuavam em torno deles, girando e rindo, e ele só conseguia ver Ava. Ela estava com toda a atenção no marquês, e em nenhum momento, virou-se para ele.

Como ela foi capaz de não deixar uma dança para ele?

Ninguém sabia que ele e Lady Clapham haviam sido amantes, a menos que Ava estivesse mais ciente das fofocas que ele soubesse.

Tal possibilidade fez pouco para acalmar sua inquietação. Decerto explicaria por que ela havia deixado a casa dele com tanta pressa.

Maldição.

AVA LUTOU para não olhar na direção em que Tate dançava com Lady Clapham, a mesma mulher que já fora amante dele e agora residia sob seu teto. Eles formavam um par impressionante enquanto dançavam pelo salão, os passos do duque pareciam sem esforço, perfeitos, fazendo com que Sua Senhoria parecesse flutuar como um anjo.

A noite mostrou ser uma de que ela não esqueceria tão cedo.

Com a presença de Lorde Oakes, a noite começara em uma espiral descendente, mas ver Tate dançando com uma mulher que, além de bonita e intitulada, possuía o apreço da mãe dele, fazia sua estada em Londres ser menos aprazível ao ter que testemunhar tudo.

Quando soube que Tate havia retornado dos Estados Unidos, suas aventuras em Londres não a afetaram tanto quanto agora. Ela se distanciou da ideia de se importar com o que ele fazia, ou com quem ele socializava. Ela o ignorou da melhor forma que pôde, quer dizer, ignorou a reação que seu coração teve quando ela soube. No fim, ela se endureceu, aprendeu a confiar em si, cuidou de seus funcionários e de seus cavalos e se esqueceu do duque que certa vez reivindicou seu coração.

Mas agora, vê-lo em meio aos seus iguais, com damas nobres o bajulando como se ele fosse um deus grego, era perturbador. Ela respirou fundo. Bem, não era algo com que deveria se importar, mas, com certeza, não era algo que ela conseguiria aturar. Não se as lágrimas que ameaçavam cair a cada vez que ela olhava para ele fossem prova de algo.

Ava tentou se concentrar no que o marquês dizia a ela, mas seus pensamentos estavam em outro lugar. Ou melhor, no duque que agora olhava para Lady Clapham, engajado em uma profunda

conversa. Felizmente a dança chegou ao fim e, girando-a para parar, ela fez uma reverência e agradeceu Sua Senhoria pela dança.

Ele fez uma reverência, e Ava não ficou tempo suficiente para ouvir a despedida dele, pois girou na direção do quarto de descanso. A última coisa que ela precisava era que ele notasse as provas físicas de que ela estava incomodada pelas ações de um homem com quem ela mesma havia dito não querer se casar.

Ela havia afirmado não querer mais tal vida, então por que tanto transtorno? Ela afastou o pensamento, brava consigo mesma por ser fraca. Por se importar mais do que gostaria.

Tate podia dançar com quem quisesse. Ele era livre para cortejar moças e se casar, e ela deixou claro como o dia, que estava feliz com a vida que levava agora. Então, por que a ideia de ele tomar outra mulher com esposa trazia à tona o pior dela?

A parte nela que fervia, que fazia seu estômago revirar de pavor ao imaginar o que ele estava fazendo e com quem. A parte dela que se afogava em ciúmes. Um sentimento tão grande que a impedia de agir ou pensar com razão, como agora quando ela ficou atormentada por ver o duque dançar com Lady Clapham.

— Ava. — o duque chamou de detrás dela.

Ela olhou por cima do ombro, sem desacelerar o passo. Ela, com certeza, não estava disposta a parar, e muito menos a ter uma discussão em público com ele, em um lugar em que qualquer pessoa poderia aparecer, a qualquer instante.

— Volte ao baile, Sua Graça. — disse ela antes de entrar por uma porta que estava entreaberta e encontrar um tipo de sala de estar vazia. Uma única luz como guia até o banco sob as janelas do outro lado do cômodo.

— Ava. — ele repetiu, seguindo-a para dentro da sala e fechando a porta detrás dele.

O som do trinco sendo encaixado foi alto no espaço vazio, e ela ergueu o queixo, encontrando o olhar dele.

— Por que você trancou a porta? Na verdade, por que me seguiu? Não deveria acompanhar sua parceira de dança até estar ao lado da sua mãe, lugar que ela pertence? — ela se encolheu com a inveja que tingia seu tom, evidente para quem quer que estivesse ouvindo.

Ele suspirou, os ombros caindo um pouco com as palavras dela.

— Eu poderia perguntar o mesmo de você. Por que o marquês não a levou de volta às suas amigas e à viscondessa? Você pareceu gostar muito da dança, pelo que pude ver.

O nervoso que ela sentia aumentou, e ela meio que grunhiu para o duque, ante de se aproximar dele.

— Diga-me, que papel Lady Clapham tem na sua vida? Sua mãe parece gostar muito dela e vi os olhares triunfantes que ela me lançou durante toda a sua dança com Sua Senhoria. Só posso supor que ela pense que vocês conviverão o bastante para que você se apaixone por ela.

Ele franziu o cenho, balançando a cabeça.

— Não trato Lady Clapham como nada mais que uma conhecida de minha mãe. E se quer saber, foi ela quem me convidou para dançar. Eu não queria.

Ava zombou.

— Não me pareceu assim. Na verdade, você parecia muito feliz por tê-la em seus braços. Suponho que eu não deveria esperar menos, pois há rumores de que você adorou tê-la nos braços na última temporada.

Tate se encolheu, mas Ava manteve a postura. Ela não era cega aos atrativos de Lady Clapham e os motivos para que tantos cavalheiros a procurassem.

— Você está com ciúmes.

Foi uma afirmação. Uma que Ava precisava negar, mesmo que fosse tão verdadeira quanto o fato de que o sol nascia toda manhã.

— Não estou com ciúmes. — ela afirmou, a falsidade fazendo suas palavras saírem fortes e tensas. — Você é livre para fazer o que quiser.

— Sério? — ele disse, dando um passo na direção dela e Ava deu um passo para trás. — Qualquer coisa que eu quiser? — ele perguntou de novo e deu outro passo.

Ela parou de se mover sabendo que era inútil tentar fugir de Tate.

— Qualquer coisa. — as palavras sussurradas despedaçaram a restrição que ela ainda possuía, e se Tate pensou que seria ele a decidir o que acontecia a seguir, Ava acabava de mostrar como estava errado.

Ela de o último passo que os separava, esticou o braço e tomou os lábios dele em um beijo ardente. Ela sentiu-se dominar por uma onda de certeza e soube que estava onde queria estar. Não dançando com mais ninguém, ou sozinha treinando cavalos em Berkshire, mas nos braços do garoto que ela sempre amou, que havia perdido e reencontrado como um homem adulto.

Os braços dele a envolveram e ele a puxou contra ele, os lábios tão insistentes quanto os dela. Ela podia sentir o desespero e a necessidade a cada movimento da língua dele e das ou das mãos dele nas costas dela, que não pareciam aproximá-la dele tanto quanto ela queria.

Não que houvesse muita distância entre eles. Pois Ava podia sentir cada linha, cada curva do corpo dele, incluindo o que crescia contra a barriga dela e a fazia tremer por dentro. Ele a guiou para trás até que o sofá atingiu a parte de trás de seus joelhos. Mas não pararam aí, desabaram nas almofadas, o corpo de Tate a prendendo no sofá. O beijo deles não parou, e ela não impediu Tate quando a mão dele deslizou por sua perna para levantar a bainha do vestido.

Ar fresco beijou seu tornozelo, sua panturrilha e, por fim, sua coxa. Tate se ergueu um pouco, ajustando-se para ficar bem entre as pernas dela, e um calor líquido inundou seu núcleo. Estar ali com Tate daquela maneira não provocou o medo que ela imaginou que sentiria.

Estar presa embaixo dele sob um pretexto bem claro, ela pensava que talvez fosse sentir pânico, mas não era esse o caso.

Não com Tate. Desejo delicioso e uma necessidade interminável que só ele poderia satisfazer, era tudo o que ela sentia e ansiava.

Ele sustentou o olhar dela, a respiração irregular, mas mesmo então Ava confiava que caso ela o pedisse para parar, ele o faria.

— É isso que você quer, Ava? Sabe que eu nunca faria nada que você não desejasse.

Ela estendeu a mão e acariciou a bochecha dele.

A barba começava a despontar e pinicava sua mão. Os cabelos escuros dele caíam sobre a testa, concedendo um ar de pecado, e ela suspirou, com o coração cheio do carinho que sentia pelo homem diante dela.

— Eu não quero que você pare.

Ele voltou a beijá-la, com intensidade e assertividade, e ela se deixou perder nos braços dele. Deixou-se desfrutar de tudo o que ele poderia dar a ela esta noite. Ele ergueu o tronco e passou a mão debaixo das saias dela, puxando o tecido de sua roupa íntima para

fora do caminho. Os olhos de Tate escureceram, e Ava estremeceu quando o algodão macio deslizou sobre suas pernas, deixando-a apenas com as meias e sapatilhas de seda.

Não querendo mais negar o desejo que sentia por ele, Ava esticou o braço e agarrou as calças dele. Os dedos dela tremiam, mas se de nervosismo ou expectativa ela não saberia dizer. Ava abriu os botões um a um, queria tanto isso para eles. Deitar-se nos braços dele e ser a mulher que despertava todo o desejo e necessidade que ela conseguia ver nos olhos dele, sentir no toque e a cada beijo.

Abrindo o último botão, Ava enfiou a mão dentro das calças dele e envolveu o membro duro. Ela respirou fundo ante a suavidade da pele que envolvia aço. Os olhos dele se encontraram com os dela, escuros e intensos uma emoção que a deixou inebriada, bêbada de expectativa. Era ela quem fazia Tate reagir desta forma. Que era ela a quem ele desejava e mais ninguém. Não a bela Lady Clapham ou outra mulher com quem ele esteve nos últimos cinco anos, mas ela.

— Beije-me. — ela pediu.

E não precisou pedir das vezes.

Tate envolveu os lábios dela em um beijo ardente, e Ava colocou as pernas em volta dos quadris dele, querendo-o com um desejo que nunca havia sentido. O sexo dele deslizou contra o dela, provocador e torturante. Ela gemeu quando calor deslizou entre suas coxas. Tate pôs a mão entre eles para se guiar nela.

— Você está pronta para mim. — ele rosnou contra seus lábios.

— Diga que está certa disso.

— Uhum. — disse ela, mexendo um pouco para tentar fazê-lo terminar o que haviam começado. — Eu quero.

E não iria conseguir esperar por muito mais tempo. A espera para tê-lo já durava anos, sendo assim, as manobras dele para ir

devagar, a provocação, não eram justificadas.

— Não me faça implorar, Tate. — disse ela, empurrando-se contra ele e provocando um pulsar através de seu abdômen.

— Ah, não a farei esperar mais.

TATE PASSOU os dedos na superfície da vulva dela, estava macia, molhada e pronta para ser reivindicada por ele. Ela ondulou contra a mão dele, e ele sentiu o pênis contrair, duro como pedra e pingando com sua própria necessidade de tê-la.

O local em que estavam não era nada ideal, e Tate tinha a vaga lembrança de ter trancado a porta, mas nada e nem ninguém o tirariam de onde ele estava naquele momento. Ele esperou tanto tempo para ter Ava. Ele sonhava em estar junto dela dessa forma.

Ela olhou para ele com os olhos escuros de necessidade não satisfeita e confiança, e seu coração deu um baque no peito. Como ele a adorava. Ela era tudo o que ele desejava em uma esposa, amante e amiga. Mesmo que ele fosse condenado ao inferno ele a deixaria ir embora agora que a tinha de volta. Depois de hoje, depois que se entregassem dessa maneira, ele se casaria com ela.

Iria amá-la e garantiria que a Senhorita Ava Knight se tornasse a próxima duquesa de Whitstone.

— Você está tão molhada. — ele disse e deslizou um dedo no interior quente dela.

Ele gemeu quando os músculos interiores dela se contraíram no dedo dele, sugando-o.

— Estou. — ela ofegou, agarrando-se aos ombros dele enquanto ele empurrava um pouco mais para dentro. — Eu quero você, Tate.

Eu o quero muito.

Incapaz de esperar por mais um momento, ele se afastou, ergueu as pernas dela ainda mais nos quadris dele e se guiou para dentro dela.

Ela deitou e fechou os olhos. Ver o prazer que ela sentia só contribuiu para que o pênis dele ficasse ainda mais duro. Havia pouca resistência, e ele estava agradecido por isso, não queria que esse momento fosse só de dor, que a memória dela fosse de algo ruim. A união deles era algo para comemorar e apreciar, e ele faria tudo o que ela pudesse ter sonhado.

— Ó, Tate. — ela suspirou, inclinando-se para beijá-lo. — É uma sensação tão boa, tão certa.

Tate se afastou um pouco antes de avançar, as palavras dela nunca foram tão verdadeiras . Inferno, parecia tão certo e tão bom.

Era só nisso que ele conseguia pensar. Eles encontraram um ritmo, e ele lutou para não se perder antes que ela chegasse ao ápice do prazer.

Ele queria vê-la se desfazer em seus braços, que ela se contraísse e tivesse espasmos em torno do membro dele de modo a levá-lo ao próprio clímax. Os movimentos dos dois ficaram mais frenéticos, e os gemidos e suspiros de prazer de Ava eram inebriantes. Ele se derramaria logo se não fizesse algo para levar Ava ao clímax em breve.

Tate se afastou e se ajoelhou entre as pernas, afastando os joelhos dela.

— O que você está fazendo? — ela perguntou sem fôlego, tentando fechar um pouco as pernas.

Ele agarrou as mãos dela e as colocou atrás da cabeça.

— Segure-se no apoio de braço do sofá. Eu quero provar você.

— Provar? Como assim?

Ele não respondeu, apenas se inclinou entre as pernas e lambeu Ava do núcleo ao clitóris. O aroma doce e almiscarado o fez gemer, e lambendo-a de novo, ele decidiu provocar o pequeno botão que implorava por libertação.

— Minha nossa. — ela engasgou.

Ah, sim...

Tate olhou para cima e a viu colocar a mão na boca. Ele deslizou a língua para frente e para trás sobre o sexo dela, amando o gosto dela, como ela ondulava contra os lábios dele por instinto, buscando libertação. Ele não deixou de atacar o sexo dela, querendo lhe dar prazer antes de fazer amor com ela. Ela ofegou o nome dele e soltou o braço do sofá, cravou os dedos nos cabelos dele, segurando-o contra ela.

Tate sentiu contrações contra os dedos e sorriu, beijando-a com vontade, saboreando o momento em que ela chegou ao clímax contra a boca dele.

Quando ele seguiu Ava pelo corredor, ele jamais sonhou que era assim que eles terminariam, mas por Deus, ele estava feliz por tal desfecho. A última coisa que ele queria era que eles continuassem em desacordo pelas reações ou planos de outras pessoas.

Ele a beijou antes de voltar a se colocar entre as pernas dela.

Ela se abriu para ele, os olhos semicerrados e sonolentos de satisfação. Tate se guiou para dentro daquele calor, e ela apenas fechou os olhos, suspirando.

— Está bem, minha querida? — ele perguntou, erguendo o queixo dela com o dedo para que olhasse para ele.

Ele bombeou nela devagar, querendo prolongar o tempo junto dela o máximo que pudesse. Seus olhares se cruzaram, e ela sorriu para ele, sonhando acordada.

— Ó sim, estou mais do que bem. Não pare. — ela disse, passando os braços pelos ombros dele e erguendo mais as pernas para se apoiar nas costas dele.

A aceitação dela, o desejo nela, desfez qualquer controle em que ele ainda se apoiava e ele se permitiu investir, querendo torná-la dele e somente dele.

Ela ofegou, puxando-o para um beijo descarado. Ele a beijou com intensidade, a língua dela mimicava as estocadas dele, e em poucos minutos ele quis se perder dentro dela. Mas ainda não, era muito cedo. Ele precisava adiar um pouco mais.

Ela baixou uma das mãos e agarrou um lado da bunda dele, puxando-o para ir mais fundo. Com uma única rotação de quadris, ela o fez entrar até a base e estilhaçou toda restrição de Tate. Ele se empurrou uma vez, duas vezes, três vezes e gozou com tanta força que o fez se esquecer de onde estavam e gritar o nome dela.

Ava ofegou, gemendo o nome dele em troca, e som do prazer dela foi como um fósforo para o fogo dele. Ela ainda era tão perfeita para ele quanto no dia em que ele pediu que ela se casasse com ele tantos anos atrás. Ele não queria nada mais do que envolvê-la como um presente, levá-la para casa e mantê-la em sua cama e vida para sempre... e mais um dia.

Ele caiu ao lado dela no sofá, puxando-a para se deitar na dobra do braço dele. O relógio do parapeito da lareira soou, marcando uma hora da manhã.

— Gostaria de nunca mais sair daqui. Eu ficaria muito contente do seu lado para sempre, se pudesse.

Ava passou a mão sobre o peito dele, brincando com os botões do colete que ele nem chegou a tirar por causa da pressa deles de se consumirem.

— Eu também, mas infelizmente, não podemos. Temos que voltar ao baile antes que notem nossa ausência.

Tate suspirou, não querendo fazer mais nada.

— Se eu concordar em levá-la de volta ao baile, vai dançar comigo? — ele se virou para encontrar o olhar dela. — Garanti um espaço no seu cartão de dança?

Ela sorriu, erguendo a sobrancelha.

— Creio que sim. — ela disse, virando-se para olhar para o teto e ficando séria de repente. — Se quer saber a verdade acerca de meu descontentamento, eu sei da sua história com Lady Clapham e não fui capaz de suportar. Uma mulher que é intitulada, bonita e elegante, da sua esfera social. Bem, eu não sou tola o suficiente para não saber que senti ciúmes.

Ele virou o rosto dela para encará-lo, implorando para que ela acreditasse nas palavras dele.

— Eu não estou cogitando Lady Clapham como minha esposa.

Quero você como minha esposa, para que esteja sempre ao meu lado. — ele não disse as palavras, ainda não pelo menos, mas ele diria. Tudo o que pairava entre eles precisava ser discutido e em breve. — Ela é apenas a dama de companhia nobre de uma viúva, nada mais.

Comparado a Ava, não havia ninguém que ocupasse tanto espaço no coração dele. Ela sempre foi a pessoa certa. Uma confirmação que ele obteve no momento em que ela o confrontou nos estábulos dele depois de cinco anos sem se verem.

— Quando retornarmos a Berkshire, discutiremos o que isso significa. O que nós dois queremos.

Ele a queria. Como esposa, confidente e parceira. Nada menos serviria. Ela sorriu, inclinando-se para um beijo breve.

— Acredito que seja o melhor a fazer.

CAPÍTULO 13

Percebi hoje que prossegui com minha vida. Que, embora casamento não seja mais algo que eu desejo, saiba que sou feliz.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

N A MANHÃ SEGUINTE, Ava acordou tarde e rolou no colchão para olhar pela janela do quarto. Ela ouvira uma criada entrar mais cedo e abrir as cortinas, colocar um pouco de água fresca na bacia e alguns paninhos para higiene pessoal, mas Ava voltou a dormir.

O baile na noite anterior havia sido muito melhor do que Ava pensara ser possível. Decerto, depois de ser um pouco ciumenta em relação à Lady Clapham e sair correndo da casa do duque mais cedo naquela manhã, ela não acreditava que ele se explicaria quanto a situação dela. Quão errada ela estava. Não que mudasse a situação entre eles, mas a fazia sentir-se um pouco melhor por saber que o elo com a dama terminado.

Ainda assim, ela acreditava que a melhor decisão para ela seria manter a independência. O duque era muito reverenciado na sociedade, as pessoas o admiravam, ele era gentil e se esperava muito dele. O papel de esposa dele seria algo de grandes proporções, e Ava não estava convencida de que queria realizá-lo.

Contudo, havia algo que ela sabia bem: que ela queria Tate. O

fogo que queimava, chamuscava e consumia os dois sempre que

estavam perto um do outro era demasiado intenso para ser ignorado. Mas havia outra opção que não haviam contemplado: a de se tornarem amantes.

Tornar o que ocorrera no baile de Lorde York um arranjo permanente entre eles. Sem casamento, sem contratos, sem expectativas, apenas um tempo juntos, prazer e alegria. Ela sentiu-se estremecer por dentro ao relembrar o que fizeram naquela sala privativa. Ava sorriu, mordendo o lábio inferior.

Queria repetir, e em breve.

Ela afastou a roupa de cama e seguiu com sua rotina matinal e decidiu-se por usar um vestido azul claro. Antes de voltar para Berkshire, ela foi à Hatchards e encomendou alguns livros sobre criação e linhagem de cavalos que deveriam chegar hoje. Ela passaria na livraria antes de ir ao Hyde Park se encontrar com Hallie e Willow.

A viscondessa morava em Mayfair, o que significava uma caminhada curta até a livraria, e como era bem cedo, a maioria dos moradores da região ainda estaria na cama após passarem a noite em festas por toda Londres. Ava não teria percalços e chegaria à loja em pouco tempo.

A campainha acima da porta tocou quando ela entrou e, cumprimentando o atendente que estava detrás no escaninho, passeou pelas estantes para ver se havia outros livros que ela gostaria de levar.

O cheiro reconfortante de couro e cera permeava o ar, os sussurros baixos de outros amantes de livros caminhando na loja a fizeram sorrir.

Por um tempo, Ava se perdeu nas fileiras de livros e na variedade oferecida antes de um livro em particular chamar sua atenção. Abrindo a capa, ela ofegou, e o fechou depressa.

Olhando ao redor, Ava verificou se estava sozinha, e ao confirmar a ausência de outras pessoas, ela abriu o livro mais uma vez para olhar as imagens de homens e mulheres, às vezes mais de duas pessoas em todo o tipo de brincadeiras conjugais.

Ela olhou para uma imagem em particular que mostrava uma mulher deitada na direção oposta ao amante: Ava não conseguia imaginar como era possível. Como isso funcionaria?

Ela fechou o livro, colocando-o de volta no lugar e determinada a folhear mais um pouco em sua próxima visita. Neste instante, se ela não fosse embora, se atrasaria para encontrar as amigas no parque.

Não demorou muito para pegar os livros e após agradecer ao atendente ela caminhou até a Piccadilly, virou na direção do Hyde Park e bateu de frente à uma parede de músculos diante dela.

Por um momento Ava pensou que poderia ser Tate, mas todas as suas esperanças de tal encontro foram frustradas ao olhar para cima.

— Srta. Knight. Como é oportuno encontrá-la aqui. Está com pressa para ir a algum outro lugar?

A resposta foi um retumbante sim. Sim, ela estava com pressa para encontrar as amigas, mas agora estava com mais pressa ainda de se afastar dele.

— Com licença. — disse ela passando por Lorde Oakes.

Ava se assustou quando ele agarrou a mão dela e a colocou no braço dele, juntando-se a ela na caminhada até o Hyde Park. O

pânico a rasgou por estar sozinha com ele outra vez. Ela havia jurado, no dia em que ele a atacou, que jamais ficaria sozinha com

alguém em quem não confiava, e decerto não poderia confiar em Lorde Oakes de jeito nenhum.

— Então... — ele disse com toda jovialidade. — Para onde estamos indo com tanta pressa? Irá se reencontrar com o duque de Whitstone, ou com outra pessoa?

Ele sorriu para ela, mas a tentativa de parecer entretido saiu mais como zombaria. Ava nunca imaginou que poderia odiar alguém tanto quanto odiava o lorde ao lado dela, mas, infelizmente, aqui estava ela com o único homem que a fazia preferir estar morta e não viva.

— Se quer saber, estou indo encontrar minhas amigas, Srta.

Evans e Srta. Perry, no Hyde Park. Não que seja da sua conta.

Ela tentou libertar a mão sem sucesso. Ele lançou um tsc, tsc para ela e sorriu para um transeunte, como se a conversa deles fosse a coisa mais comum do mundo.

— Convenhamos, Srta. Knight. Nós nos conhecemos a nível pessoal. Não seja tão fria comigo. Houve uma época em que você era toda desejosa, e era bem quente ao toque.

Ela conseguiu soltar o braço e o confrontou sem se importar com o lugar em que estavam.

— Eu nunca estive desejosa. E o senhor pode pensar o que quiser, mas caso se aproxime de mim outra vez, farei com que pague.

Ela não sabia dizer como, mas estava certa de que resolveria, mesmo que significasse engolir o próprio orgulho e pedir a Tate que a ajudasse com Sua Senhoria. Não era uma opção que ela apreciava, já que estava muito determinada a manter sua independência, porém, às vezes era necessário um homem para forçar outro a sair de cena.

Lorde Oakes levantou a mão e passou o dedo sobre o pulso que ela havia machucado. Pouquíssimas pessoas sabiam que ela estava ferida e o que assustara o cavalo para que empinasse, causando a queda dela. Então, como Lorde Oakes saberia a menos que...

Ela estreitou os olhos, e ele sorriu antes de apertar o pulso lesionado com mais força do que seria recomendado. Ela ofegou, afastando-se.

— Peço desculpas, Srta. Knight. Está machucada?

Ela olhou para ele por um momento, sem acreditar que ele seria tão descarado.

— Você deveria saber que sim, Lorde Oakes — disse ela, vendo se ele entendia as palavras dela.

Seus olhos se arregalaram e então, jogando a cabeça para trás, ele riu como se ela tivesse dito algo extremamente divertido. As pessoas que desciam Piccadilly olharam na direção deles, mas continuaram sem comentar.

— Ó, você é uma verdadeira beleza. Agora sei por que eu quis tanto você, era só para tentar domar essa fera que ronrona em sua alma.

— Você não tem alma — disse ela sem pensar. —, portanto, faria sentido tentar tirar a de outra pessoa.

A admissão dele acerca de ter estado lá naquele dia, foi algo estranho a se fazer. Ele pode não ter dito as palavras em si, mas admitiu saber do ferimento dela e como havia acontecido. Lorde Oakes era o incendiário, disso não restava dúvidas, mas, ainda assim, era a palavra dela contra a de Sua Senhoria, a palavra de uma mulher contra a de um homem. Um homem poderoso, mesmo que os bolsos estivessem furados.

— Você não pode provar nada, minha querida e bela senhorita Knight. Tentar usar sua palavra contra mim é irrelevante, sem valor.

Portanto, se eu fosse você, não tentaria manchar meu nome.

Contudo, ao olhar para você neste instante, sabendo a delícia de corpo que se esconde aí, eu fico duro de vontade de tê-la.

Ela recuou, seguindo em direção ao parque. Ele a alcançou, mantendo o ritmo apressado dela.

— O duque sabe de nossas escapadas? Ele sabe como você gemeu meu nome naquele dia em que eu acariciei sua boceta na sala de visitas? Lágrimas se acumularam nos olhos dela, e ela piscou para afastá-las.

— Vá embora, já disse o suficiente, e eu não vou ouvi-lo nem mais um momento.

— Ó, mas você vai ouvir, sua vadiazinha. — ele a puxou, forçando-a a parar, o aperto no braço provocando dor, porém, ela se recusava a se encolher, a ceder ao ataque dele.

— Eu a vi ontem à noite com o duque. Eu vi tudo... — ele sorriu.

— Quero você na minha cama. Acho que esperei mais do que o suficiente para ter você.

Um tremor a percorreu, deixando-a com frio. Ela engoliu em seco, olhou em volta e, graças, ninguém na rua prestava atenção aos dois.

— Você nunca vai me ter. — ela sussurrou feroz.

— Se não concordar — continuou ele. —, vou arruinar seu pequeno negócio de criação de cavalos e você ficará sem nada: sem renda, sem clientes e sem duque. — ele sussurrou contra o ouvido dela, repleto de sarcasmo. — Quão tristonha você será. Tão triste quanto era quando o duque ainda estava no exterior e você havia voltado para sua casa em Berkshire. Ou quando ele por fim voltou para a Inglaterra e decidiu ficar em Londres, fodendo sabe-se

lá quantas mulheres. Mas... — ele deu de ombros. — é como minha sociedade funciona. Lordes possuem amantes, e as esposinhas esperam em casa.

Ela se encolheu, odiando a ideia de um casamento assim.

Odiando a possibilidade de Tate fazer amor com alguém que não fosse ela.

— Você pode me ameaçar como quiser. Não farei o que me pede. Sua mente girou, querendo ir embora, afastar-se de Lorde Oakes.

Ele riu, soltando o braço dela.

— Isso nós veremos, Srta. Knight. Bom dia para a senhorita. —

ele disse, curvando-se antes de sair na direção oposta.

Ava se virou para o parque, não diminuindo o ritmo até que visse Hallie e Willow. Suas amigas sempre foram sinônimo de conforto e segurança e, naquele momento, ela precisava delas mais do que nunca. Willow acenou quando ela se aproximou, e Ava escondeu o tumulto que acontecia em sua mente com uma expressão facial treinada.

— Ava, estamos tão felizes por você estar aqui. Estamos falando do baile e da casa do marquês de Boothby. Você conhece o cavalheiro, dançou com ele no baile dos York. É esta noite, estamos tentando decidir o que vestir. Estávamos pensando que todas poderíamos escolher tons pastel para parecer um conjunto. O que acha da nossa ideia?

Ava assentiu, sorrindo e murmurando em acordo embora sua mente estivesse desconcertada. Será que conseguiria contar ao duque da ameaça de Lorde Oakes? Se contasse a Tate o que havia se passado há pouco, ele o desafiaria para um duelo. Lorde Oakes já havia provado ser um homem que não pensaria duas vezes antes

de atirar em pessoas inocentes. Pensar em perder Tate de tal maneira fez bile subir à garganta dela.

Não, ela manteria o episódio em segredo, voltaria para Berkshire e lidaria com Lorde Oakes no campo, longe dos olhos curiosos da alta sociedade, se pudesse. Ele cometeria algum erro em seus acordos e ameaças nefastos, e assim, a lei cuidaria dele.

AO VOLTAR PARA CASA, Ava mal conseguia se lembrar de como a última hora havia passado, o que ela e as amigas haviam conversado, ou com quem haviam se encontrado. Tudo o que sabia era que queria ficar sozinha, longe de todo o barulho de Londres e voltar a Berkshire.

— Com sua licença, creio que vou me deitar um pouco. Estou com uma súbita dor de cabeça.

— Você está bem? — perguntou Hallie, pegando a mão dela, interrompendo-se no meio do vestíbulo da casa da viscondessa.

— Talvez não, infelizmente. Suspeito que esta cefaleia me impedirá de comparecer ao baile desta noite. Espero que não se importe.

Acima de tudo, ela queria rever Tate.

A simples presença dele acalmaria seu nervosismo, mas ela não conseguiria enfrentar a alta sociedade. Lorde Oakes, sem dúvida, estaria lá. Hoje não.

— Claro, minha querida. — Willow disse, aproximando-se dela depois de entregar o chapéu e o xale a um lacaio que aguardava. —

Pedirei que façam um chá de tisana agora mesmo, e que levem para você quando estiver pronto.

— Obrigada. — Ava disse, desatando o chapéu e subindo as escadas. — É muito gentil da sua parte.

TATE ESTAVA de pé ao lado de Lorde Duncannon, sentia-se irrequieto por dentro ante a ausência de Ava no baile. Onde ela estava?

As amigas estavam aqui, dançando e conversavam com alegria, mas Ava não. Ele ponderou um pouco, e ao vê-las reunidas tomando ponche durante o intervalo das danças, caminhou até elas.

— Boa noite, Srta. Evans, Srta. Perry. Acredito que estejam gostando do entretenimento desta noite? — a banalidade em sua fala incomodava até ele mesmo, mas ele faria de tudo para garantir que Ava estivesse bem.

— Estamos contentes sim, Sua Graça, obrigada.

Elas o encaravam com um nítido saber nos olhos, achando graça até, mas não falaram mais nada. Ele não poderia fazer uma pergunta direta acerca de Ava, mas por Deus, como ele gostaria de poder fazer isso. Tais regras e expectativas sociais mostravam-se um incômodo em certas situações.

— Já frequentaram o baile do marquês, ou é a primeira vez?

A Srta. Evans o observou com um ar especulativo e, em seguida, respondeu:

— Esta é a minha primeira vez em Londres depois de um longo tempo. Como sabe, frequentei a mesma escola francesa que a Srta.

Knight e a Srta. Perry. A Srta. Perry compareceu a este baile no ano passado, pois a viscondessa Vance é sua tia.

Por fim, Tate viu uma abertura para perguntar de Ava.

— E a Srta. Knight, ela não veio esta noite? Pensei que ela também fosse convidada da viscondessa?

A senhorita Evans ergueu uma sobrancelha, os lábios tremendo.

— Pois é, Sua Graça, ela estava indisposta e infelizmente ficou em casa esta noite.

Ele deu mais um passo na direção delas, pretendia perguntar mais, mas viu que era melhor não.

— Bem, é uma pena. Espero que ela esteja melhor pela manhã.

— Ó, nós também. — disse a Srta. Perry. — Planejamos uma noite nos Jardins de Vauxhall, e seria muito triste se Ava não puder se juntar a nós.

— Irão ao baile de máscaras?

Tate pensava que era um evento frequentado, na maioria das vezes, por cidadãos de padrões morais baixos e cujos passatempos eram praticados com os corpos deitados em vez de pessoas em busca de socializar com a alta sociedade por distração.

A Srta. Evans silenciou a amiga, fitando-a.

— Eu peço desculpas, Sua Graça. Minha amiga está equivocada. De jeito nenhum vamos à Vauxhall. Ficaremos em casa amanhã à noite.

Tate observou o embate silencioso entre as amigas e compreendeu que a Srta. Perry havia se enganado. Ele reprimiu um sorriso pelo lapso dela e mascarou sua reação.

— Espero que a Srta. Knight não esteja tão doente. Eu detestaria que perdesse os belos passeios pelos jardins.

A Srta. Perry deu uma risadinha.

— É apenas uma dor de cabeça, Sua Graça, mas já cometi minhas gafes. Estamos em casa amanhã à noite.

— E as senhoritas participarão de mais bailes esta noite? Ou o baile de Lorde Boothby é o bastante para entretê-las?

As bochechas das duas ganharam um tom claro de rosa, tornando-as tão bonitos quanto as mulheres que desfilavam repletas de sedas e diamantes.

— Esta noite ainda iremos a mais dois bailes, Sua Graça. Uma boa amiga da viscondessa, Lady Southerton, está nos esperando para logo, e nos prometeu alguns fogos de artifício.

— Parece bem divertido. — Tate fez uma mesura. — Desejo-lhes uma noite agradável. Por favor, enviem meus cumprimentos à senhorita Knight quanto voltarem a vê-la.

Tate girou nos calcanhares e seguiu para as portas do salão de baile. Ele se despediu Lorde Duncannon rapidamente e pediu que trouxessem sua carruagem. O percurso até Berkley foi curto, e ele pediu ao condutor que estacionasse na estrebaria. Ele rumou à porta da frente e bateu duas vezes antes que um lacaio permitisse sua entrada.

Ele entregou o cartão ao mordomo.

— Por favor, peça que a Srta. Knight me encontre na biblioteca agora mesmo.

O mordomo estudou o cartão por um breve momento antes de guiar Tate até um cômodo na parte da frente da casa.

— Por aqui, Sua Graça. Vou verificar se a Srta. Knight está disposta, ela não se sentia bem esta tarde.

— Sua Graça? — uma voz feminina soou no alto da escada.

Ele virou o olhar para cima e sua apreensão ao saber da indisposição dela foi apaziguada ao vê-la.

— Srta. Knight. Peço desculpas pela intromissão. Tenho notícias de Berkshire que pensei que gostaria de saber. Por ser uma vizinha.

— mentiu.

Ele estava disposto a dizer o que fosse necessário para que ela descesse e falasse com ele.

— Obrigada, John. Atenderei o duque na biblioteca. Não devemos ser incomodados.

O criado curvou-se e deixou-os.

Tate esperou Ava na base da escada e a acompanhou até a biblioteca. Ele entrou mais no cômodo quando Ava fechou a porta detrás deles, e sorriu quando ouviu o som alto do trinco sendo acionado. — O que está fazendo aqui, Tate? Se for pego pela viscondessa, nós dois estaremos arruinados.

— Notei sua ausência no baile desta noite e quando suas amigas mencionaram uma dor de cabeça, fiquei preocupado. Eu não seria capaz de descansar se não visse com meus próprios olhos que estava bem.

Ava se juntou a ele diante da lareira.

— Você estava preocupado comigo?

Ele sorriu, puxando-a contra ele e abraçando-a.

— Você sabe que sim.

Ela o abraçou também e olhou para cima.

Tate sentiu seu coração dar um pulo no peito. Ela estava tão bonita em um vestido de dia, sem ornamentos ou ruge nas bochechas como muitas mulheres da alta sociedade gostavam de usar. Ava parecia uma mulher aproveitando uma noite em casa, lendo ou apenas relaxando em seu quarto. Os longos cabelos escuros dela estavam sobre os ombros, e ele precisou se controlar para não correr os dedos neles, sentir a suavidade e o doce aroma.

— Está se sentindo melhor? — ele perguntou, colocando uma mecha do cabelo dela para trás da orelha.

Ela assentiu.

— Não cheguei a ter dor de cabeça, apenas quis ter uma noite para mim mesma, mas fico feliz de vê-lo.

Tate gostou de ouvir essas palavras, e gostou de vê-la. Ele conseguia imaginá-los tendo diversas noites assim: conversas, desfrutando da simples companhia um do outro, como quando eram crianças.

— Mencionou ter novidades de Berkshire e Lorde Oakes?

Ele deu um sorriso largo.

— Não há nada para compartilhar. Só que eu queria revê-la.

— Queria?

— Sim. — disse ele.

A doce voz dela provocava sensações estranhas no peito dele.

Ele se inclinou e a beijou, pegou os lábios dela e tentou transmitir de todo o coração o quanto ela significava para ele. Ava se deixou envolver nos braços dele, os dedos dela deslizaram sobre os ombros dele e cruzaram em seu pescoço. Os seios dela pressionaram o peito dele, as curvas doces e femininas o atraíam como sempre.

Tate se inclinou e a pegou por inteiro em seus braços, carregou-a até uma cadeira próxima. Ele se sentou, colocando-a em seu colo, de modo que ela montasse nele. Ele a beijou com força, lambeu o lábio inferior, traçou a boca, não parecia conseguir o suficiente dela.

Tão suave e disposta, e a palavra minha reverberou na mente dele.

Ela se abriu para ele, e ele aprofundou o beijo. A língua deslizou contra a dela, e ele gemeu, algo como fogo se acendendo no sangue dele.

Ava interrompeu o beijo, a respiração tão irregular quanto a dele e, por um momento, eles se entreolharam. Emoções o dominaram ao encarar os olhos castanhos que o miravam maravilhados ao perceber que eles se afetavam de maneira igual.

Não deveria surpreender nenhum dos dois, sempre fora assim.

Da primeira vez que se beijaram, sob um grande carvalho, os dois

se afastaram daquele abraço completamente transformados, ligados por uma nó invisível que, mesmo tão jovem quanto Tate era na época, ele sabia.

O destino dela era o mesmo do dele, para sempre.

Ele passou os polegares pelas bochechas dela, segurando o rosto dela diante dele. Ava arrastou-se no colo dele, posicionando seu calor bem em cima do dele. Ela suspirou, balançando contra ele, o núcleo quente tentando-o a rasgar a frente das calças e uni-los.

Tate tremeu ante a própria negação em fazer o que estava claro que os dois ansiavam com intensidade. Em algum lugar nos recônditos da mente, ele se lembrou de onde estava.

Quando ele entrou no cômodo, a porta havia sido trancada? Um descuido dele.

— Devo ir. Caso a viscondessa chegue, um inferno será instaurado. — ele disse entre beijos. — Eu não quero causar problemas para você.

Não que ele não aceitasse se casar com Ava no dia seguinte, mas ela não precisava do falatório que a alta sociedade promoveria caso soubesse desses encontros. Seu casamento com Ava seria porque eles desejavam que assim fosse, e não por a nobreza acreditar que ele a havia arruinado de alguma forma e estavam sendo forçados a casar-se.

— Eu não quero que você vá. — ela protestou, com uma voz trêmula.

Ela segurou a mão dele e a empurrou contra o sexo dela. Sua umidade o cumprimentou, e ele ficou duro como aço. Ele não negaria nada a ela, aos dois, não quando ela queria tanto quanto ele. Tate passou os dedos ao longo do núcleo dela, fazendo com que um doce suspiro deixasse aqueles lábios. Ela pressionou a mão

dele, os olhos adquirindo um tom intenso de âmbar, vislumbres do fogo nele.

— Eu quero você, Tate! — ela o beijou com força. — Você me provoca tanto desejo.

Tate gemeu quando a mão dela deslizou pelo abdômen dele, esforçando-se para acariciar os contornos de seu estômago antes de se aprofundar mais e envolver seu pênis inchado.

— Você me faz querê-la também. — ele murmurou, sem fôlego.

Os dedos dela fizeram um rápido trabalho nos botões das calças dele e então ela o tocou, deslizando a mão tão familiar no pênis dele, um massagear constante que o fez ver estrelas.

Ava se aproximou e o beijou.

— Vi em um livro uma figura com a posição que estamos agora.

Você... será que essa posição, é possível?

Que tipos de livros ela estava lendo?

Ele queria saber mais. Ele deixou essa pergunta para outra hora, distraído demais com os movimentos dela no colo dele. Se ele fosse um cavalheiro, daria a ela alguns dias de descanso antes que voltassem a fazer amor, mas tal opção era impossível quando o olhar penetrante dela quase implorava que ele a preenchesse. E ele faria exatamente o que ela pediu.

— Só precisa pedir. — ele sorriu e colocou a mão entre eles, agarrou o tecido das saias e o amontoou em torno da cintura dela.

Ela se ergueu um pouco, ajudando-o com o esforço. Os movimentos dos dois foram rápidos e desesperados. A necessidade de tê-la, de transar e reivindicar a mulher em seus braços era demais. Ele se posicionou na entrada dela, sustentando o olhar sensual dela.

Tate se empurrou com força enquanto ela deslizava sobre o comprimento dele. O núcleo apertado dela o envolveu, e ele

respirou fundo ante a perfeição de tomá-la outra vez. Eles se moveram juntos, os braços dela no pescoço dele, os dedos cravados na pele das costas dele. Ele bombeou forte e profundo, queria que ela se desfizesse em seus braços, que desmoronasse com ele.

Ela era dele, agora e para sempre, assim como ele era dela.

Como poderiam não ficar juntos, se a cada vez que se encontravam a sensação de certeza aumentava? Apesar de todos os anos separados, ainda haviam se reencontrado.

Ava o empurrou contra o encosto da cadeira, as mãos agarrando-se aos braços da cadeira. Tate se divertiu ao vê-la assumir o controle, encontrando o próprio ritmo para obter prazer dele.

Ela era toda maravilhosa, e ele reprimiu a necessidade de se derramar dentro dela. Ele pôs as mãos entre os dois e deslizou os dedos no pequeno botão em seu núcleo. Um meio suspiro, meio gemido escapou da boca dela, e ele ofegou.

— Goze para mim. — ele implorou, ele mesmo estava tão perto que a tentação o consumia a cada estocada.

Os movimentos dela ficaram desesperados, e ele a segurou pelos quadris, guiando-a para mais fundo, mais forte cada vez que ela descia sobre ele. Os dedos dela apertaram a nuca dele, deslizando pelos cabelos, e ele soube que ela estava perto. Os olhos dela tremera e se fecharam, uma mínima transpiração no lábio superior que ele desejava lamber.

— Ó, Tate.

Ela jogou a cabeça para trás quando espasmo após espasmo apertou o pênis dele, jogando-o ao clímax. Tate gozou forte, seguindo-a na sensação de felicidade em que ele não queria nada mais do que repetir. Ele lutou para recuperar o fôlego, voltar à

realidade e se refazer. Ela caiu contra o peito dele, a respiração quente em seu ombro. Ela virou a cabeça, beijando-o no pescoço, e ele estremeceu com desejo renovado. Ele nunca se cansaria da mulher em seus braços.

— No entanto, como vamos parar? — ela riu, e ele passou os braços em torno dela, abraçando-a.

Ele a beijou na testa, cruzaram o olhar.

— Eu não tenho ideia. — disse ele com sinceridade.

E ele não sabia mesmo, mas também não queria.

— Eu deveria fingir uma dor de cabeça mais vezes se essa é a medicação.

Atrevida!

Ele riu, mantendo-a imóvel, sem vontade alguma de tirá-la do colo.

— É justo que eu seja sua cura, pois você sempre foi a minha.

CAPÍTULO 14

A LGUNS DIAS DEPOIS, Tate cavalgava à toda velocidade na estrada que ligava Londres à Berkshire. Ele havia terminado de passar as instruções para seu administrado antes do imaginado e, com sorte, ele alcançaria o coche de Ava. Ele sorriu ao pensar nela. O quanto ele sentia falta dela quando estavam separados.

A Estalagem Cisne Feio tornou-se visível um pouco mais à frente, e ele diminuiu a passada do cavalo ao se aproximar dos arredores da pequena aldeia. As pessoas circulavam pela cidade, cuidavam de suas vidas. A parte da frente da estalagem estava ocupada com uma série de carruagens e pessoas descarregando e carregando bagagens.

Quando ele parou no pátio, um jovem cavalariço saiu correndo e, ao descer, Tate entregou um xelim ao menino.

— Diga-me, rapaz, a Srta. Ava Knight e seus acompanhantes ainda estão aqui ou já seguiram viagem?

Os olhos do menino se arregalaram e assentindo com entusiasmo, ele disse:

— Sim, ainda estão aqui, meu senhor. Estão lá dentro, e meu pai disse que alugaram alguns quartos.

— Obrigado. — Tate disse, dispensando o menino e seu uso de

"meu senhor" em vez de "Sua Graça".

Ele abriu a porta da frente e entrou no que parecia ser a taverna frontal do estabelecimento. A área estava lotada até não poder mais de moradores da região em suas roupas empoeiradas, amarrotadas e desgastadas pelo trabalho. Tate caminhou até o balcão e deslizou um soberano no bar.

— Eu preciso de um quarto para a noite. — E, também, preciso saber em que aposentos você alocou a Srta. Knight para que eu possa notificá-la de minha presença.

O taberneiro, um tipo rotundo e grisalho, ergueu a sobrancelha e cruzou os braços sobre a barriga.

— E você quem seria? — ele perguntou.

Tate precisava dar crédito ao homem por tê-lo questionado em vez de apenas informar o paradeiro de Ava após receber dinheiro.

— Sou o duque de Whitstone.

Os olhos do homem se arregalaram, e ele se endireitou, tentando fazer uma reverência para ele.

— A comitiva que procura está fazendo uma refeição na sala de estar privativa da frente, Sua Graça. Mandarei preparar meu melhor aposento para o senhor, milorde. É a primeira porta à esquerda ao sair das escadas.

— Obrigado. — Tate agradeceu e seguiu para a sala indicada.

Ele bateu duas vezes e abriu a porta. Encontrou Ava sozinha na mesa. Ela estava sentada ao sol com uma edição do Times aberto à sua frente. Ela ergueu os olhos, e ele viu surpresa ali antes que ela deixasse o jornal de lado e fosse até ele.

— Tate, o que está fazendo aqui?

Ele fechou a porta e a pegou nos braços.

— Dois dias era tempo demais.

Ela sorriu e o beijou, e ele tomou seus lábios, tomou como se ela fosse sua última esperança de matar a sede. Ava se derreteu contra o peito dele, e a sensação de seus seios, seus mamilos endurecidos através de seu vestido de algodão macio fez o sangue dele acelerar.

Ele a beijou de forma demorada e profunda, ergueu-a contra si e os deixou sem fôlego.

— Maldição, eu quero você. — ele se engasgou com o beijo.

— Vai passar a noite aqui? — foi a resposta dela.

Ele ficaria para sempre se ela permitisse.

— Aluguei um quarto. — ele a abraçou, não queria soltá-la. —

Gostaria de se juntar a mim?

Ela lançou um olhar repleto de pecado que o fez ferver.

— Vou precisar contar à Hallie o que estou fazendo ou ela se preocupará. Mas estou certa de que ela não se importará.

A porta se abriu e sua amiga entrou como se, por dizer seu nome em voz alta, Ava a tivesse convocado. Ela se assustou ao ver o duque abraçando a amiga dessa forma tão inapropriada. Ela entrou depressa antes de fechar a porta rápido, para que ninguém os visse.

Tate afastou Ava com gentileza e sorriu ante o leve tom de rosa que tomou as bochechas dela. Ava foi se sentar à mesa, e Hallie a seguiu sem dizer uma palavra. Tate também se sentou e, pegando o bule de chá, serviu-se de uma xícara.~

Hallie se virou para um e depois para o outro antes de suspirar.

— O que vocês dois estão fazendo? Não são casados nem noivos, e contudo, cá estamos nós. Entrei e os flagrei abraçados no meio de uma estalagem rural das mais movimentadas! — a Srta.

Evans pegou o pão e o queijo, servindo-se de uma boa porção em enquanto nenhum deles se aventurava a responder. — Ah, e a propósito, a duquesa-viúva acaba de chegar.

— O quê? — tanto ele e Ava disseram em uníssono.

Tate se levantou e foi até a janela para poder ver o pátio da Estalagem. Ele praguejou em silêncio ao ver a mãe e Lady Clapham dando ordens acerca da bagagem, um bando de criados obedecendo a duquesa. Ele se virou para Ava quando a viu de relance e viu a cautela nos olhos dela.

— Me desculpe. Eu não sabia que minha mãe iria para casa hoje.

Ela tocou o braço dele, apertando-o um pouco.

— Você não tem nada pelo que se desculpar, Tate.

A mãe dele entrou na estalagem, e em um momento houve uma batida rápida na porta da sala privativa antes que ela entrasse com sua dama de companhia. A duquesa-viúva fez uma breve inspeção do recinto antes de dar uma fungada desdenhosa.

— Tate, meu querido, por que não me avisou que partiria para Berkshire hoje? Eu teria separado um espaço na carruagem para você.

A mãe dele se sentou à mesa depois que a criada que abriu a porta para elas puxou uma cadeira para Sua Graça.

— Antes de mais nada, eu não sabia que viajaria. E em segundo lugar, estou à cavalo.

Lady Clapham acenou para Tate e sorriu, ignorando Ava e a Srta. Evans, que estavam sentadas à mesa em frente a elas.

— Você irá nos acompanhar até Berkshire pela manhã, Sua Graça? Com um incendiário aterrorizando o condado, ou assim eu soube, acalmaria meus nervos e os de sua mãe se tivéssemos um protetor ao nosso lado.

A Srta. Evans sorriu, e Tate entendeu muito bem o porquê. O

tom de Lady Clapham exalava pecado, mesmo com a presença da mãe dele, e Tate não deixou de notar que as mãos de Ava se fecharam sobre o jornal que ela segurava.

— Claro, eu as acompanharei até a Residência da Viúva, Mãe.

Fui avisado ontem de que está pronta para a sua chegada, a criadagem foi escolhida do jeito que a senhora gosta. E se me permitem ser tão ousado, Srta. Knight e Srta. Evans, posso acompanhá-las também, se quiserem viajar conosco.

Ava olhou entre ele e a viúva. A boca da mãe dele se contraiu formando uma pequena ruga de desgosto e não era difícil saber o que ela pensava da ideia.

— Nós gostaríamos disso, Sua Graça. — a Srta. Evans respondeu, e Ava permaneceu quieta.

— Se nos dá licença, Suas Graças, Lady Clapham, viajamos muito hoje, e creio que seja melhor descansar antes do jantar.

Tate saiu do caminho para permitir que Ava passasse por ele.

Ele esticou o braço e resvalou os dedos contra os dela quando ela passou. Ela não respondeu, apenas o deixou sozinho com a mãe irritante. Ele rangeu os dentes ante a discussão iminente.

Maldição, ele estava cansado das maneiras rudes e intrometidas de sua mãe. Ele a advertiu para manter suas opiniões para si, e ainda assim, ela persistia em ser insolente.

— Vejo que a Srta. Knight ainda corre atrás de você, meu querido Tate. Se ela não se cuidar, ganhará fama.

— A Srta. Knight já estava hospedada, quando cheguei. Então, talvez seja eu quem ganhe tal má fama. — sua mãe o olhou com reprovação, e ele ergueu uma sobrancelha. — Você não concorda, mãe?

— Eu não me importo com o que a Srta. Knight faça ou deixa de fazer, contanto que não interfira e nem traga escândalo às portas do Duque de Whitstone.

— Como quase fez cinco anos atrás? Você sabe bem, não é, mãe, que fui eu que pedi Ava em casamento e implorei que ela fugisse comigo para Gretna? Não foi o contrário, não importa o que você possa pensar.

A boca de Lady Clapham se abriu, e Tate respirou fundo para se acalmar, sabendo que o que ele acabara de declarar estaria em toda Londres antes do fim do mês, graças a Lady Clapham. Não

que ele se importasse. Todas as víboras fofoqueiras poderiam ir para o inferno.

— Se você sonha em me ver casado com uma mulher de título, como Sua Senhoria aqui presente, preciso dizer que é uma grande ilusão. A mulher com quem vou me casar será de minha escolha.

Desculpe, Lady Clapham, pela franqueza da minha língua, mas minha mãe tem uma capacidade fantástica de ignorar os desejos e atos das pessoas.

A viúva pousou a xícara com barulho, derramando um pouco do conteúdo no pires.

— Ava Knight nunca será a Duquesa de Whitstone. Eu o proíbo.

— Por que você é tão contra ela? — ele perguntou, perplexo de verdade. — O Sr. Knight era Sir e, portanto, sua filha é uma Lady.

Segundo sua própria perspectiva, não há razão para seu desagrado, creio eu.

A mãe dele revirou os olhos, algo que ele nunca pensou que veria uma duquesa fazer. Ela se levantou, voltando-se para ele.

— Eles são plebeus. O bisavô dela viveu em uma das fazendas de inquilinato ducal antes de iniciar a criação de cavalos, por diversão. Por favor, pense nisso. Caso tenha filhos com esta mulher, seu filho e futuro herdeiro teriam um tataravô que serviu à casa dele.

Tate já estava farto.

Ele passou a mão pelos cabelos antes de se dirigir até a porta.

— Falando de origens que bom que meu pai não se importou com tais regras quando a conheceu, mãe. Plebeia americana, cheia de dinheiro. Tal fortuna foi sua única carta para reivindicar um pouco de grandeza, não foi? Na minha opinião, você não é diferente da Srta. Knight neste sentido. O que as difere é que Ava tem um coração batendo dentro do peito. Eu chego a duvidar que você possua um.

Sua mãe ofegou, e Lady Clapham empalideceu.

Com o tempo, Tate poderia se arrepender da dureza das palavras que escolheu, mas hoje não seria esse dia.

— Vou visitá-la no dia seguinte a que chegarmos a Berkshire para garantir que esteja bem acomodada na sua residência oficial.

Boa tarde, mãe. Lady Clapham.

CAPÍTULO 15

Meu pai não está bem, mas insistiu que eu ficasse na França. Ele diz que é um simples resfriado, mas havia algo em suas palavras que me causou um arrepio na espinha. Sinto que ele está escondendo algo de mim. Sinto um medo se alastrar por meu corpo hoje, e não consigo me livrar dele.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone.

DOIS DIAS DEPOIS de chegar de Londres, Ava estava nas portas do estábulo com seu administrador, Greg, enquanto o cavalariço de Titan conduzia o garanhão até a égua que eles queriam que ele recebesse. Hoje seria o dia em que saberiam se Titan gostava do cheiro de Black Lace.

Ela esperava que sim.

Ao longo da última quinzena, quando ficaram em baias de frente um para o outro, os dois cavalos pareceram se dar bem, relincharam uma ou duas vezes, ou ao menos era o que o cavalariço a informara, todos bons sinais para um união promissora.

— Muito bom da parte do duque aprovar o cruzamento de Titan com a Black Lace, Srta. Ava. Mesmo que não produzam um campeão, com certeza serão potros bonitos.

Ava riu, supondo que era verdade.

— E, no entanto, não é bem isso que esperamos alcançar.

Prefiro um campeão a um cavalo bonito.

O que não era totalmente verdade. Os cavalos, não importava a idade ou habilidade, sempre teriam um espaço no coração dela.

Para ela, eram o melhor animal da Terra.

— O duque mencionou ontem que houve uma invasão na fazenda do velho Sr. Rogers, embora nada fosse levado houve evidências de que alguém tentou colocar fogo lá, sem sucesso. O

investigador parece acreditar que está conectado ao incendiário, mas o magistrado local não. É difícil saber o que está acontecendo por aqui com todos os problemas que tivemos.

Ava franziu a testa, não havia ficado sabendo que outro vizinho dela havia sido vítima. Na verdade, ela nem chegou a ver Tate no dia anterior. Por que ele não a visitou? Ele não viera visitá-la desde que ficaram juntos na mesma hospedaria ao voltarem de Londres.

Apesar de ser uma grosseria terrível da parte dela, depois de sair da sala de estar ela se manteve no corredor e ouviu as palavras ditas pela duquesa. Palavras mordazes, depreciativas na verdade, e todas direcionadas a ela e à sua inadequação como duquesa.

O ódio que ela ouviu na voz de Sua Graça mostrava que havia pouca esperança de amizade. A mulher odiava seu sangue comum, e como Ava não podia fazer nada para remediar tal fato, havia pouca chance de uma reconciliação.

Ela refletira acerca da perspectiva deles durante a viagem para casa, olhando de vez em quando para Tate que seguiu ao lado do veículo por todo o caminho até a propriedade dela. Cada vez que ela olhava para ele, seu coração se apertava e não havia sentido em negar o que aquela reação significava.

Era a mesma coisa que ela sentira quando menina. Ela o amava.

Para ser sincera, ela nunca deixou de amá-lo, não importava o quão brava ela possa ter ficado. Mas não significava que fosse correto que ficassem juntos.

O papel de duquesa era mais importante que o papel que ela desempenhava aqui nos Estábulos Knight.

— O duque esteve aqui? — ela perguntou, mantendo os olhos nos cavalos e fingindo um ar desinteressado que era apenas superficial.

— Ah sim, Senhorita Knight. Veio antes do almoço, mas não pôde ficar porque iria almoçar com Sua Graça e Lady Clapham na casa da viúva.

— Claro. — Ava manteve-se quieta enquanto Titan montava Black Lace. A união foi breve, com pouco barulho, mas felizmente bem-sucedida. — Muito bem, obrigada por sua ajuda, senhores.

Agora esperemos. — disse ela para os assistentes de pátio que estavam assistindo.

— Pensei ter ouvido o duque dizer que viria para acompanhar o processo, mas talvez algo o tenha retido. — Greg disse, observando os cavalos.

Ava assentiu com a cabeça, pensava o mesmo.

Depois de todas as desavenças com sua negativa de permitir que Titan se reproduzisse com uma de suas éguas, ela imaginou que ele não perderia esse momento.

— Vocês podem devolver Titan para a propriedade ducal esta tarde. Os estábulos já terminaram de ser reconstruídos, e sei que o duque gostaria de ter seu cavalo de volta. Não há necessidade de mantê-lo aqui por mais tempo. — Ava caminhou até o garanhão e passou a mão em seu pescoço. — Mesmo que ele seja uma fera tão bonita.

Ela arrulhou para o cavalo por um momento antes de deixar o cavalariço levá-lo de volta para a baia, para prepará-lo para a caminhada de volta à propriedade de Tate.

— Você está certa, Srta. Knight. Cuidaremos disso agora mesmo.

Ava ficou ao ar livre pelo resto da tarde: observou algumas das potras serem treinadas no pátio, assistiu às suas duas esperanças de prêmio em Ascot fazerem algumas corridas nas pistas e, em seguida, foi analisar os livros de contabilidade dos grãos e feno.

Ela pensou na ausência de Tate.

Haviam voltado para casa há dois dias, e nenhuma palavra dele.

Teria algo errado? A língua perversa da mãe dele enfim o teria convencido a ficar contra ela? Ava se recostou na cadeira, torcendo a pena na mão enquanto mirava o exterior pela janela. Talvez fosse para melhor. As vidas deles eram muito diferentes agora, ambos precisavam pensar nas pessoas que dependiam deles, ele como duque, e ela como criadora de cavalos e treinadora. As esferas sociais a que pertenciam eram de polos opostos, mesmo que uma de suas amigas mais próximas fosse sobrinha de uma viscondessa.

Estar em casa nesses dois dias solidificou sua antipatia pela cidade. Ela sentia falta dos estábulos, de ficar perto dos cavalos, de alimentá-los, ou apenas observá-los correr pelos campos ou pastar nos prados. A vida londrina não era seu forte; e ser duquesa, uma mulher com um senso de moda imaculado e amigos impecáveis não combinaria com ela. Ora, todos as suas amigas da escola eram tão comuns quanto ela, fora Willow, é claro.

Ava suspirou, guardou a pena e se levantou para retornar à casa. O jantar seria servido em breve, e ela prometera a Hallie que compareceria naquela noite, já que na noite anterior fora retida no pátio de baixo depois que uma de suas éguas sofreu um acidente com uma cerca.

Caminhando até a entrada da frente, ela deu um passo para o lado enquanto o carteiro partia a galope, acenando com a boina.

Quando ela adentrou o vestíbulo, um criado saiu do escritório dela com a bandeja de prata na mão.

— Estava procurando por mim, William? — ela perguntou.

Ele fez uma reverência.

— Ah sim, Senhorita Knight. Uma missiva da duquesa-viúva de Whitstone acaba de chegar. Deixei o envelope em sua mesa.

— Obrigada. — disse ela, entrando no escritório e fechando a porta.

Ela sempre amou este cômodo, mesmo quando era o espaço e santuário de seu pai. Agora que era dela, ela nem cogitara fazer mudanças. A mesa de mogno escuro, junto com as estantes que revestiam as paredes e as duas poltronas de couro que estavam dispostas diante da lareira, prontas para qualquer um pegar um livro, sentar e ler o quanto quiser.

Ela quebrou o selo da duquesa e examinou a nota.

Quanto mais ela lia, mais tornava-se incrédula do atrevimento da mulher. Como se atrevia, mas então... como não se atrevia? Ava amassou a nota na mão e, em seguida, abriu-a de novo, examinando o conteúdo pela segunda vez, sem acreditar no que estava lendo.

Srta. Knight,

darei um pequeno baile na minha Residência de viúva em algumas semanas. Sei que tivemos nossas desavenças no passado e espero, pelo bem de nosso pequeno condado, que possamos nos tornar mais agradáveis na presença uma da outra em tempo. Mas, infelizmente, esse momento não é agora. Estou, portanto, enviando esta missiva como uma cortesia, uma pequena explicação para a ausência de um convite. Por favor, não compareça, mesmo que meu

filho peça. A residência da viúva é administrada por mim, e a entrada da senhorita não será permitida.

Com meus cumprimentos, Duquesa de Whitstone PELA SEGUNDA VEZ, ela amassou a missiva, o sangue rugindo nas veias e o som alto em suas orelhas. Como a mulher se atrevia?

Uma batida leve soou na porta, e Hallie colocou a cabeça na soleira.

— Ah, vejo que você também recebeu. Estou tão feliz que seja assim. Talvez a viúva enfim percebeu que o duque está apaixonado por você e, por fim, a aceitará como nora.

Ava afundou na cadeira desejando que fosse verdade.

— Não, temo não ser isso. A missiva é de Sua Graça, mas é um aviso para nem tentar comparecer, porque serei proibida de entrar.

— O quê! — Hallie entrou na sala, deixando a porta entreaberta.

Ela foi até a mesa, pegou a missiva entre os dedos de Ava e a leu depressa.

— Mas que coisa! Eu sabia que a viúva era fria e opinativa, porém isto já é ofensivo demais. — Hallie encontrou o olhar de Ava.

— Sinto muito, Ava. Ela parece determinada a separar você e o duque de vez.

Isso era uma subestimativa.

— Sim, assim parece.

— O que vai fazer? Contará ao duque que ela enviou essa carta? — ela perguntou balançando o bilhete.

Ava negou com a cabeça, cansada de tudo aquilo, cansada das farpas constantes e olhares amargos. Das indiretas bem diretas na cidade e das missivas entregues no meio da tarde.

— Não. Ele não precisa saber, só deixaria a situação mais embaraçosa.

— Mas o duque ama você, tenho certeza. Afinal, ele mandou a mãe para a casa da viúva, embora morasse em Cleremore antes.

Fato, mas não invalidava outro fato, de que a mãe dele a odiava.

Uma vozinha sussurrou que talvez sua chance havia chegado e passado. Que eles deveriam se separar agora, antes que qualquer dano adicional a seus corações e famílias fosse feito.

— Você recebeu um convite? — Ava perguntou.

Hallie ergueu o pergaminho que carregava na outra mão.

— Sim, mas não comparecerei sem você. A viúva me convidar e proibir sua presença é de uma rudeza tamanha que não me permite deixá-la sentir prazer pelo estratagema. Devemos ficar aqui juntas, nos esquecer de Sua Graça e dos esquemas dela.

Os olhos da amiga brilharam como fogo, e Ava a amou ainda mais por sua lealdade.

— Você deve ir, caso contrário ela pensará que eu a fiz ficar em casa. Que regulei as saídas de minha amiga. Vá, divirta-se e socialize. Mostre à duquesa-viúva de Whitstone que não nos importamos com quem ela convida e quem não convida.

— Não posso ir sem você. Não me importa o que a viúva pensará. Ficarei em casa, fazendo companhia a você.

Ava sorriu alcançando a mão da amiga.

— Você irá, se divertirá, e me contará tudo na volta. Fico feliz de ficar em casa e prometo a você que o que a duquesa faz não me afeta nem um pouco. Ela interfere e é rude comigo desde sempre.

Ela não consegue mais manipular o filho, e detesta isso.

Hallie suspirou, não muito convencida.

— Se é o que quer, mas não me sinto bem com essa decisão.

— Vai ficar tudo bem, Hallie. Não se preocupe comigo. Estarei bem em casa.

Uma batida na porta soou, e o mordomo entrou para anunciar o duque de Whitstone. Ava se levantou, o corpo se aquecendo ao vê-

lo. Ela controlou suas feições, e encontrou o olhar assustado de Hallie.

— Boa tarde, Sua Graça. — disse Hallie, fazendo uma reverência. — Se me der licença, preciso escrever algumas cartas.

A porta se fechou sem barulho atrás da amiga dela, e o duque caminhou até ela, puxando-a em seus braços para um beijo profundo. Ela se inclinou para ele, tomando tudo o que ele daria, saboreando cada toque, cada carícia, beijo que ele a presentava.

Ele era impossível de ignorar e sempre foi assim. Tate se afastou, os olhos brilhando com desejo insatisfeito.

— Senti saudades. — ele a puxou para perto da lareira e sentou-se no sofá com ela. — Eu pretendia fazer uma visita, quis vir hoje porque nunca tivemos a chance de terminar a conversa que começamos em Londres.

Um medo tomou conta dela, e ela se endireitou cruzando as mãos no colo.

— Nossa conversa. — ela disse, protelando.

Ele assentiu.

— Sobre nós.

— Ó. — disse ela, com o coração leve. — O que tem nós?

A esperança que brilhou nos olhos cinzentos e tempestuosos dele derrotou a esperança dela de que fossem falar de qualquer coisa fora eles. Ela não estava pronta para este assunto, nem para a reação dele para o que ela precisava dizer. Ele agarrou a mão dela, que sumia por entre seus dedos fortes e capazes.

— Precisa saber que, desde o momento em que descobri que não havia me abandonado, toda a dor e raiva que eu carregava comigo desapareceram. Tentei me esquecer de você, mas mesmo zangado como eu estava, não consegui. Não funcionou, e não desejo mais viver sem você.

Ava não conseguia desviar os olhos dele. As palavras eram um bálsamo para sua alma, e ela gostaria de poder dar tudo o que ele queria, mas não podia. Não porque não o amava, pois queimava por ele a cada momento de cada dia, mas por causa de tantas coisas que se interpunham entre eles.

Ela apertou a mão dele, ajeitando-se no lugar.

— Você não precisa viver sem mim, Tate, mas por favor, não me peça para ser sua esposa. — ele se encolheu com as palavras ditas e apertou a mão dela com mais força. — Ouça-me, por favor, antes de dizer mais nada.

Ele a observou por um momento, os olhos cautelosos e assentiu.

Ava respirou fundo e lambeu os lábios:

— Éramos tão jovens quando nos apaixonamos. E foi amor, disso há poucas razões para duvidar. Mas, tendo vivido no exterior por quatro anos e voltado para casa para administrar uma propriedade com muito pouco apoio além da minha equipe, tornei-me bastante independente. Estou segura em termos financeiros, e não há necessidade de me casar se não for o que desejo. — ela manteve o foco nele, odiando o fato de que ele havia empalidecido, um tom terrível de cinza. — E eu não quero. Casar-me significaria perder minha independência, deixar de fazer o que amo quando eu quisesse. Não posso me tornar um ornamento, uma mulher que apenas fala de frivolidades e não realiza muitas coisas. Não foi para isso que nasci, e agora que sou adulta, percebo isso.

Tate se levantou, liberando suas mãos.

— Eu quero que você seja minha esposa, Ava, minha duquesa.

O que está me pedindo?

A voz dele era dura e impassível, ela se encolheu.

— Eu me tornaria sua esposa amanhã mesmo, Tate, saiba disso.

Mas não serei uma duquesa. É demais, eu estaria desistindo de tudo.

— Você não precisaria desistir de sua vida. — a frustração o fez passar uma das mãos no cabelo, e ele foi para frente do fogo, se apoiou no mármore da lareira, ainda de costas para ela. — É claro que ser duquesa implica responsabilidades. Situações que a afastariam daqui por vários meses do ano. Isso é pedir muito? Não está disposta a ceder nem um centímetro para estar comigo?

Ava se levantou, odiando o olhar desolado nos olhos dele.

— Eu quero você, quero sim. Não quero mais ninguém. Ainda podemos ter um ao outro, mas não como marido e mulher. Serei sua amante enquanto você me quiser.

Ele se desvencilhou dela, o desgosto retorcendo o rosto que sempre pareceu tão bonito.

— Eu preciso me casar. O nome da família por si só me exige um herdeiro. E não quebrarei os votos que eu fizer à minha esposa.

Não farei isso a ela, por mais tentadora que você seja.

Ava mordeu o lábio, pânico percorrendo seu sangue.

Ele se afastou, e ela se acalmou.

— Não a terei como amante. Se eu não puder tê-la como esposa, não a terei de forma alguma.

Tate se virou e foi para a porta.

Ava correu atrás dele, segurou seu braço.

— Por favor, Tate, não posso perder você de novo. Eu apenas quero...

— Você quer tudo. — ele cortou as palavras dela. — Você quer que eu satisfaça seu desejo sempre que ele surgir. Deseja manter sua independência e ser a Senhora de suas terras. Quer que quebre meus votos de casamento para manter sua cama quente.

Ela empalideceu, o coração se desfazendo.

— Sua mãe estava certa, eu não sou adequada para ser sua noiva. Minha linhagem sempre servirá para alimentar as fofocas da cidade. Nossos filhos serão destroçados pelos abutres da sociedade, desprezados. Serei ridicularizada, alvo de fofocas, ignorada. Ao menos como dona do Haras Knight, sou tratada com respeito. Se eu me tornar sua duquesa, tudo mudaria. Seria você que procurariam para tratar dos cavalos e treinamentos que ofereço.

Seria você a quem procurariam por conselhos e orientação. Eu me tornaria obsoleta. Tudo o que a minha família construiu do zero, seria esquecido. — Ava ergueu o queixo, a raiva a fazendo endireitar a coluna. — Não aceitarei tal destino. Nem mesmo por você.

Ele a observou, os olhos vazios.

— Você está errada, Ava, cega para o que posso proporcionar a você. Como minha esposa, meu nome sozinho protegeria a quem eu amo, mesmo que seja uma mulher cujas origens não sejam grandiosas para os outros, mas grandiosas o bastante para mim.

Ava permaneceu um bom tempo encarando a porta após Tate irromper por ela, sem fôlego após a declaração dele. Ele a amava?

Nunca, em todo o tempo em que estiveram juntos, ele pronunciou tais palavras. Ela rezava em silêncio para que seus sentimentos não fossem unilaterais, e agora ela sabia que não eram.

Ava caminhou até a janela, observando-o cavalgar pelo terreno dela como se o próprio diabo estivesse atrás dele. Um arrepio percorreu sua espinha ante a possibilidade que talvez ela estivesse

errada, que estivesse muito errada, e que desta vez seria um erro que não conseguiria consertar.

CAPÍTULO 16

Q UINZE DIAS SE PASSARAM, e Tate não viu Ava, ou para ser sincero, ele a havia evitado depois que se separaram.

Ele olhou para o uísque na mão, lembrando-se de que não importava quanto bebesse, não o faria se sentir melhor, não iria anestesiar a dor que corria por suas veias a cada minuto de cada dia.

Ela o rejeitou.

Tate apertou a mandíbula, olhando na direção da porta enquanto o mordomo anunciava mais convidados recém chegados para o baile de sua mãe, outra noite inútil e não essencial. Ele olhou ao redor do cômodo. As pessoas riam, bebiam, pegavam mais vinho e comida dos servos que ali estavam. Seres inúteis todos eles.

Mimados e prepotentes. Não era de se admirar que Ava não quisesse fazer parte desta vida.

Ele também não queria.

Tate estava parado ao lado de Lorde Duncannon, o amigo tão quieto quanto ele, e felizmente não tentava preencher o silêncio entre eles. Na verdade, ele não queria conversar, pelo menos não com ninguém aqui.

Um estrondo de conversa soou, e Tate virou-se para a porta de novo. Esperança surgiu dentro dele quando reconheceu a Srta.

Evans. Os olhos dele viajaram para detrás dela, procurava por outro conjunto de olhos e cabelos castanho-avermelhados adoráveis, mas não os encontrou.

Ele afastou a decepção, sorveu o líquido âmbar e observou enquanto a Srta. Evans caminhava apressada até ele,

reposicionando, de fato, as pessoas em seu caminho. A moça parou diante dele, mas ele falou antes que ela dissesse uma única palavra.

— Onde está Ava? — ele exigiu.

As duas mulheres quase nunca se separavam em tais reuniões, então Ava deveria estar aqui.

— Por Deus, não pensei que fosse ver você de novo. — Lorde Duncannon ficou boquiaberto ante a amiga de Ava, seu rosto empalidecendo.

— Não ansiava me rever seria uma definição melhor, Lorde Duncannon. — a Srta. Evans respondeu, os olhos brilhando com fogo, mas não antes de um rubor cobrir as bochechas, deixando-as com um belo tom de rosa. — Ou pelo menos é no meu caso.

Ela voltou o olhar penetrante para Tate, e ele olhou entre os dois se perguntando como diabos eles se conheciam. Ele descartou o pensamento por um momento, precisando saber onde Ava estava.

— A Srta. Knight está aqui esta noite, Srta. Evans?

— Ela não recebeu um convite, mas eu a convenci a vir, Sua Graça.

Ele voltou a atenção para a mãe após ouvir tal declaração, e a raiva espiralou dentro dele. Desta vez ela fora demasiado longe.

A Srta. Evans franziu os lábios, inspecionou-o como alguém inspeciona um inseto e não encontra o que era esperado.

— Vou ser franca, me perdoe se eu passar dos limites, mas Ava é minha amiga e o que preciso dizer é mais do que necessário.

Tate assentiu, preparando-se para o que era, sem dúvida, um confronto que estava por vir.

— Sua mãe enviou uma missiva à Ava dizendo por que ela não seria convidada esta noite, e Ava não tem dúvidas alguma acerca do que sua mãe pensa dela. Na verdade, agora mesmo, ela foi

impedida de entrar, na frente de todas essas pessoas que você afirma ser seus amigos. O que você diz, Sua Graça? Que atitude tomará?

— Onde está Ava agora? — Lorde Duncannon exigiu.

— Ela voltou para casa na carruagem.

A Srta. Evans manteve a atenção em Tate, embora tivesse respondido à pergunta do amigo dele. O desprezo público direcionado à Ava era inaceitável. Tate não permitiria que a mãe se aproximasse dele ou da propriedade ducal novamente após esse comportamento atroz.

Ele nem deveria estar aqui, por falar nisso. E deveria ter agido mais cedo acerca das emoções que o atraiam para Ava. Ele deveria ter voltado para a casa dela, de joelhos e implorando perdão, pedindo que ela o amasse tanto quanto ele a amava. Deveria dizer a ela que ele nunca desejou restringi-la, ou exigir dela mais do que ela estava disposta a dar. Dizer a ela que ele a amava mais do que qualquer título.

— Foda-se. — ele xingou, não dando atenção àqueles que os cercavam.

Ele se apressou em direção à porta do salão de baile, com Duncannon e a Srta. Evans o seguindo de perto. Duncannon o alcançou.

— Aonde você está indo?

— Buscar minha duquesa. — ele disse em voz alta, sem se importar com quem o ouvisse. Suspiros soaram em torno dele, e ele precisou controlar o gênio quando a mãe entrou na frente dele, impedindo sua fuga.

— Saia do caminho, mãe.

O cômodo ficou em suspenso, os dançarinos pararam, assim como a conversa. Até a orquestra parou de tocar.

— Está na hora de uma valsa, Tate querido. Você dançaria com Lady Clapham? — a mãe fez um gesto na direção de Sua Senhoria, que fez uma reverência e sorriu para ele, com os olhos brilhando de alegria.

— Sua Graça, eu ficaria honrada. — Lady Clapham disse, ignorando o fato de que ele estava indo embora.

— Não dançarei. — ele disse, causando mais suspiros e sussurros quase inaudíveis.

A mãe deu uma risada nervosa.

Bom, ele queria mesmo que ela ficasse inquieta. Ele decerto havia desistido de ter esperança de que a única genitora viva daria apoio à mulher a quem ele amava e com quem queria se casar. A mãe pagaria por ficar cega de ódio e exclusivismo.

— O baile está apenas começando, e como Lady Clapham é minha convidada de honra, você deve dançar com ela. É o correto.

— Você desconvidou e proibiu a entrada da Srta. Knight. Você está tão cheia de ódio que não consegue se lembrar que também nasceu comum, rica sim, mas igual a Ava. A tiara de duquesa é tudo o que as separam. Não deveria ter tanta afetação sem justificativa.

Sua mãe estreitou os olhos, erguendo o queixo.

— Ela não serve para você, filho. Não cometa o erro que traria escândalo para a porta de nossa família. Ela é uma humilde criadora de cavalos. Por favor, seja sensato.

— Ava é mais do que isso, e você sabe muito bem.

Ele passou por ela, Duncannon e a Srta. Evans seguindo logo atrás. Seguindo para o hall de entrada, ele não esperou pelo lacaio e abriu a porta ele mesmo para chamar a carruagem.

— Está indo para a propriedade da Srta. Knight? — Duncannon perguntou quando despontou na direção da casa.

Tate ficou rígido quando um fedor acre alcançou seus sentidos.

— Consegue sentir esse cheiro? — ele caminhou mais adiante na estrada, olhando para a terra agora beijada pela noite.

— Há um incêndio em algum lugar. — a Srta. Evans surgiu ao lado dele no instante em que a carruagem parou diante das portas da frente. — Está perto, ou não sentiríamos o cheiro.

— Venham. — disse ele a ambos, indo para a carruagem e instruindo o condutor a seguir para a casa da Srta. Knight.

Quanto mais perto chegavam da propriedade de Ava, mais pesado o cheiro de madeira queimada permeava o ar, e quando chegaram à pequena elevação onde a casa de Ava ficava à vista, o desenho horripilante de seus estábulos junto com a casa em chamas ficou visível.

Através da névoa de fumaça, ele conseguia ouvir gritos e os sons de cascos dos cavalos sendo soltos dos estábulos. Alguns cavalos assustados passaram correndo por eles, e Tate gritou para o condutor ir embora.

— Nunca deveria ter deixado ela sair do baile. Eu deveria ter feito ela entrar comigo.

— Não é sua culpa, Srta. Evans. — Duncannon disse, a voz dele com uma calma surpreendente para uma situação que era tudo menos calma.

A garganta de Tate se fechou em pânico, e ele lutou para respirar.

Onde ela está?

Era uma loucura o que estava diante deles. E até que ele a visse com seus próprios olhos, a abraçasse bem apertado, ele não iria descansar. Quanto mais perto chegavam do fogo, mais densa era a fumaça, e quando eles se afastaram um pouco da casa principal, Tate pôde ver que um lado inteiro da casa estava imerso no fogo.

Os criados corriam para dentro e para fora da casa, pegando o máximo dos pertences ancestrais de Ava que conseguiam.

Tate saltou da carruagem.

Ele examinou cada um deles e não vendo Ava, olhou para a casa, rezando para que ela não estivesse lá dentro. Ele tirou o paletó do traje de noite e agarrou o mordomo pelo braço quando o homem estava prestes a voltar para dentro.

— Onde está Ava? — ele gritou acima do barulho do fogo e das ordens que eram proferidas acima dos gritos.

— Não conseguimos encontrá-la, Sua Graça. Ela voltou do baile da duquesa há uma hora, no momento em que o incêndio começava. Ela foi para o quarto dela, mas quando fomos verificar, ela já não estava mais lá.

Tate analisou os rostos presentes, rezava para que um deles fosse de Ava. A Srta. Evans e Duncannon o alcançaram, a respiração dos dois tão irregular quanto a dele.

— O que podemos fazer, Tate? — o amigo perguntou.

Tate lutava para não entrar em pânico.

Ele olhou em volta e rezou mais uma vez para que a encontrasse. Ele olhou para a casa, metade da qual estava bastante consumida. Ela estaria lá dentro? Se estivesse, ele não descansaria até que ela estivesse segura. Ela arriscou a vida para ajudá-lo a escapar do incêndio do estábulo dele, e ele não a abandonaria nesse.

— Procure no terreno, nos estábulos, talvez Ava esteja lá. Volte aqui se não conseguir encontrá-la. Vou verificar a casa.

Duncannon agarrou seu braço com força.

— Você não pode entrar lá, Tate. Você é o último Whitstone. Se você morrer, o título reverte para a coroa. Vamos vasculhar o

estábulo primeiro, veja o perímetro da casa, talvez Ava esteja lutando contra o incêndio com os homens do lado oposto.

— Vou verificar lá primeiro, mas se não conseguir encontrá-la, entrarei. Dane-se o título.

Ava significava mais para ele do que a herança. O título não definia quem ele era, seu caráter era o responsável, e ele não seria o homem que deixou uma mulher, sua mulher para morrer queimada.

Lorde Duncannon aceitou a decisão com um movimento de cabeça e aparente resolução.

— Muito bem. — ele parou por um momento. — Srta. Evans, venha, vamos verificar os estábulos.

Ela partiu sem dizer uma palavra.

Dando outra olhada nas pessoas ao seu redor, ainda sem ver Ava, Tate correu pela lateral da casa. Ainda assim, Ava estava longe de ser vista, e pânico começou a crescer em seu sangue.

Por favor, esteja segura, minha querida. Não esteja na casa.

As portas da cozinha estavam abertas, e Tate correu para lá, saltando para fora do caminho dos servos que corriam com objetos que conseguiram salvar. Tate passou correndo por todos eles, subiu o corredor cheio de fumaça e foi aos tropeços para o piso principal da casa.

As portas que davam acesso à ala em chamas haviam sido fechadas, mas a fumaça dominava o espaço. Ele tossiu, retirou a gravata e a amarrou na boca e no nariz para ajudá-lo a respirar.

Subindo as escadas de dois em dois, ele chamou por Ava, mas apenas o crepitar, o gemido de uma casa que seria cinzas pela manhã soava à noite.

AVA ESTAVA grudada à porta de seu quarto, observava Lorde Oakes caminhar de um lado para o outro do cômodo e parecendo alheio ao fogo violento que estava devastando a casa dela.

Seu lar, o lugar onde nascera, a casa que seus pais construíram ao longo de anos de trabalho árduo estava desmoronando sobre ela e havia pouco que ela ou alguém pudesse fazer. Ela piscou quando a fumaça engrossou, obstruiu seus pulmões e fez seus olhos arderem.

Ela se voltou para a janela que era sua única escapatória, mas ela estava no segundo andar e a queda desta altura seria capaz de quebrar seu pescoço. Ela se aproximou da abertura, disposta a correr o risco.

— Nem pense nisso. — Lorde Oakes a interveio, as feições retorcidas de ódio bruto.

— Por que está fazendo isso? — ela o indagou quando ele se inclinou na direção dela, deixando pouco espaço entre eles. — O

que ganha com isso? — perguntou ela, tossindo com o esforço de falar.

— Eu deixei o melhor para o final. — ele fervia. — Era para você ser minha amante, a mulher que aqueceria minha cama, e mesmo assim abriu as pernas para aquele desgraçado do Whitstone.

Ela perdeu o fôlego.

O homem estava louco!

— Você está com ciúmes! Foi por isso que iniciou os incêndios em nosso condado.

Ava não conseguia acreditar no que ele estava dizendo. Não era possível que ele estivesse tão obcecado por ela a ponto de agir dessa forma. Os vizinhos dela eram pessoas inocentes, não mereciam tamanha tristeza.

— Nenhum deles era inocente. — ele disse e apontou para o lado de fora. — Whitstone teve seu coração, sempre teve, e aqueles malditos dos Mortons, a esposa dele apoiou e confortou você por causa de Whitstone. Eu não poderia permitir que tais atos ficassem impunes.

Ava balançou a cabeça.

— Nunca aquecerei sua cama, Lorde Oakes. Você provou ser o pior dos homens, não apenas esta noite, mas desde o dia em que tentou se impor contra mim nesta mesma casa.

Ela tentou pensar em Tate, em como ele aquecia seu sangue, a confortava e protegia. Não congelar em pânico ante a ideia do que Lorde Oakes estava fazendo com ela neste cômodo. De qual seria objetivo dele esta noite.

Ele apunhalou um dedo no peito dela.

Ava ergueu o queixo, recusando-se a estremecer com a dor que causava.

— Antes do fim desta noite, vou provar o seu corpo e aproveitarei cada segundo. Meu desejo de ter você me cegou e foi por sua causa que minha noiva desfez o compromisso. Ela sentiu que eu não estava comprometido, então veja — ele disse ao passar a mão no corpete dela. —, perdi a noiva que salvaria meus cofres por sua causa. Mas, apesar disso, tenho um plano.

Ava vestiu uma máscara de indiferença mesmo que pânico lambesse sua pele, mesmo que desejasse fugir, até mesmo correr para as chamas do outro lado da porta, apenas para se afastar dele.

Ela engoliu em seco, a garganta dolorida pela fumaça, e as lágrimas a faziam piscar.

A imagem de Tate passou pela mente dela, de que ela jamais o veria de novo se Lorde Oakes conseguisse o que pretendia e um abismo sepulcral se abrisse no peito dela. Ela fora uma idiota

egoísta. Uma idiota boba que não conseguia ver o presente maravilhoso que Tate oferecia quando ele o colocou aos pés dela.

O amor dele.

E ela o amava, todo o resto se encaixaria nesse amor, e eles conseguiriam fazer com que suas vidas ocupadas e difíceis se tornassem uma. Se ela conseguiu sair daqui viva, claro.

— Sua obsessão matou pessoas, você deveria ser enforcado por seus crimes.

Ele deu de ombros.

— O rapaz era um servo humilde. São dispensáveis, e eu não me importo com o que acontece com quem fique no meu caminho, nem com seus preciosos cavalos.

Ava sentiu a raiva rasgar seu ser quando ele mencionou os cavalos, e sem pensar, saltou nele. Eles caíram no chão, e ela arranhou o rosto dele, faria qualquer coisa para machucá-lo.

— É melhor você não ter tocado em meus cavalos. — ela gritou, odiando-o com cada fibra de seu ser.

Ele lutou para agarrar os braços dela, e ela o socou, tentando machucá-lo o máximo que pudesse para escapar. Lorde Oakes estendeu a mão e agarrou o cabelo dela, puxando-o com força. Ava caiu de lado, a dor ricocheteando em sua cabeça enquanto ele a prendia no chão.

— Cadela. — ele fervia em seu ouvido, a respiração pesada revirando o estômago de Ava. — Devo domá-la agora, Srta. Knight?

Nós dois vamos morrer, uma boa foda antes de morrer é exatamente o que eu preciso.

O medo a manteve imóvel por um momento, antes que seu espírito de luta voltasse, e ela erguesse a perna o máximo que conseguiu, tentando acertá-lo entre as pernas, onde os homens são

especialmente sensíveis à dor. Ele percebeu o que ela pretendia e prendeu as pernas dela com as dele.

— Será enforcado por isso, seu desgraçado.

Ele riu.

— Não me resta mais nada, então o que importa se quebrarem meu pescoço, mas minha querida, Ava...

Ele se inclinou, beijando-a à força. Os dentes dele bateram nos lábios dela, e ela sentiu um gosto metálico invadir sua boca. Ava se inclinou para o beijo e mordeu o lábio inferior dele com força. Ele gritou e recuou, mas ela se recusou a soltar antes que as mãos dele apertassem seu pescoço, tirando o fôlego de seus pulmões.

Lorde Oakes se levantou, pressionando a boca. Ava lutou para respirar, observando-o do chão enquanto sua mente se agitava tentando se salvar. Um estrondo soou em algum lugar da casa e a fumaça engrossou, o quarto sufocando a vida de ambos. Ele deu a volta, e ela se sentou, limpando o sangue dele que estava em sua boca.

— Eu lutarei com você até meu último suspiro, seu desgraçado.

Eu não serei sua vítima.

Lorde Oakes avançou nela, chutando-a com força no quadril. Ela se engasgou com a dor do ataque, mas em vez de rolar para longe, ela agarrou as pernas dele, prendendo-as juntas e impedindo-o de repetir o movimento.

Em seguida, ela o mordeu de novo. Ele praguejou e uma sensação de poder se apoderou do sangue dela. O maldito canalha havia incendiado sua casa e seus estábulos, certo? Machucado seus cavalos. Bem, ele também se machucaria esta noite. Ela não seria a única a sair dessa ensanguentada e machucada, se é que sairia viva disso.

Ele caiu, e Ava aproveitou a oportunidade para se levantar e correr para a janela. Ela olhou para a porta, um brilho vermelho se agitava sob a madeira. A fumaça deslizava pela cornija da parede como uma cobra, restava pouco tempo para sair. Ela precisava sair agora ou morreria.

Ava estendeu a mão para destrancar a janela, levantou o painel.

Ela gritou quando seu agressor a agarrou pelo estômago, fazendo suas costas arderem de dor. Em vez de cair no chão, desta vez ela bateu na cama, e Lorde Oakes desceu sobre ela, os olhos selvagens com ódio e determinação. Sangue gotejava de seu rosto, de seu lábio, e ela o empurrou, arranhando-o sem sucesso. Ele era muito pesado, estava muito decidido.

A garganta dela se fechou em pânico ante as semelhanças da tentativa passada de estuprá-la. Ela lutou para não entrar em pânico, para não congelar de medo.

— Saia de cima de mim, seu cretino.

Ele puxou o vestido dela para cima e beijou as coxas dela. Os movimentos dele eram apressados e desesperados ao baixar as calças.

Não. Não. Não!

Isso não poderia acontecer com ela, não poderia estar acontecendo. O corpo dela tremia, e ela ergueu os joelhos, tentando colocá-los entre os dois, negando-o ao que ele queria. O telhado deu um gemido terrível e caiu, expondo as chamas além.

Ela iria morrer.

Ela iria morrer enquanto ele a estuprava.

Não.

— Você acha que eu não tenho tempo. Não consigo pensar em uma maneira melhor de morrer do que dentro da sua boceta.

— Nãooooo! — ela gritou, lutando com ele, o pensamento de tal horror trazendo à tona o resto de sua força.

Ele não iria vencer. Ele não poderia vencer. A vida não poderia ser tão injusta. Ela viu choque se registrar no rosto de Lorde Oakes quando um grito saiu de sua boca segundos antes que ele fosse arrastado de cima dela, ela estava livre.

Ava se arrastou para fora da cama enquanto Tate socava o rosto de Lorde Oakes, o barulho de ossos e dentes quebrando, altos no ar. Uma saraivada de golpes recaiu sobre Sua Senhoria, Tate era uma visão de ira divina.

Ela estremeceu, jamais o vira tão enraivecido.

Ele o mataria se continuasse. Não que ela se importasse com Lorde Oakes, mas ela não queria que a morte dele fosse um peso na consciência de Tate pelo resto de sua vida. Ela foi até Tate, agarrando seu braço antes que ele o acertasse outra vez.

— Pare antes de matá-lo. Deixe que as autoridades apliquem a punição, não você.

Os músculos dele sob sua palma estavam tensos, a respiração irregular. O fogo chegou às cortinas, e ela o puxou para a janela:

— Precisamos ir. Este quarto será tomado pelo fogo a qualquer instante.

Lorde Oakes resmungou alguma coisa e depois se sentou, cambaleando em direção à porta.

— Eu deveria ter atirado em vocês dois naquele dia no campo. É

o único arrependimento com o qual viverei pelo resto da minha vida.

Ava olhou pela janela ignorando as palavras do louco. Uma calha corria ao longo da esquina da casa. Talvez aguentasse o peso dos dois...

— Venha, precisamos descer.

Tate ficou entre Ava e Lorde Oakes e não se moveu.

— Você será enforcado por isso! — ele gritou. — Pode apostar que me certificarei de que aconteça.

Lorde Oakes sorriu, abrindo a porta com força. Ele saiu para o corredor em chamas antes de correr para as chamas além. Ava o observou enquanto as roupas dele pegavam fogo, o cabelo ficou em chamas, antes que ele desaparecesse na fumaça e no fogo que antes era sua casa.

— Ele vai morrer. — disse ela, sem acreditar no que acabara de acontecer.

— Esqueça-se dele.

Tate caminhou até ela e passou o braço em volta de sua cintura, ajudando-a a sair pela janela. Felizmente, o cano suportou o peso de ambos e Ava desceu, alguns de seus criados a esperavam no chão, caso ela caísse. Tate a seguiu, saltando do cano no último minuto assim que um estrondo poderoso soou.

Ava se afastou da casa enquanto o telhado desabava, destruindo tudo o que estava abaixo dele. Enxugou as lágrimas que corriam pelo seu rosto. A essa altura, toda a construção estava tomada pelo fogo, havia pouco a ser feito.

Tate se aproximou dela e a abraçou.

Calafrios incontroláveis atravessavam o corpo dela, e ela se aconchegou contra ele em busca de calor e conforto. Tate pediu um cobertor e uma criada correu até eles com um. Ele envolveu-a, acariciando suas costas.

— Lamento não ter chegado a você mais rápido. Está machucada?

Sua alma estava ferida, e ela estava abalada, mas felizmente Tate havia chegado a tempo.

— Vou ficar bem. Estou triste, nada mais. — ela piscou tentando conter as lágrimas, sem sucesso. — Minha casa...

— Eu sei. — disse ele, segurando-a com mais força. — Iremos reconstruí-la.

Ela ergueu o rosto para ele ao limpar o nariz com as costas da mão. Não era o gesto mais elegante do mundo, mas nesse instante ela não se importava.

— Eu sei, mas não será a mesma.

— Faremos com que seja, querida.

Ele não a soltou e nem ela queria que ele a largasse. Nem agora, nem nunca. Com Tate ela estava segura, era amada e respeitada, ele era um homem honrado, um homem bom, e o coração dela se encheu de amor por ele.

— Sua Graça. — uma voz soou, e Tate e Ava se viraram para ver um dos agentes disfarçados vindo na direção deles.

O rosnado de Tate foi alto ao lado dela.

— Como isso aconteceu? Vocês deveriam estar vigiando cada passo de Lorde Oakes. — Tate disse, apontando um dedo para o homem.

O homem suspirou, passando a mão pelo cabelo já despenteado.

— Só podemos supor que Lorde Oakes aproveitou, quando a Srta. Knight saiu para o baile, para entrar escondido na casa dela.

Esperando até que ela voltasse. — o agente se virou para Ava, colocando a mão sobre o coração. — Sentimos muito, Srta. Knight.

Esta noite nós falhamos com a senhorita.

— Discutiremos isso em alguns dias, em minha propriedade, e sugiro que descubra onde ocorreu o lapso de observação. Eu quero saber.

Tate a puxou com mais força contra ele, seu calor e cuidado agindo como um bálsamo. Os olhos dela se fecharam quando uma onda repentina de cansaço a dominou.

O agente fez uma reverência, recuando.

— Claro, Sua Graça.

Ava olhou para Tate, segurando as lapelas de seu traje de noite.

— Você me salvou. — disse ela, a voz vacilante com a admissão, o olhar dele disparou para ela, surpresa escrita em seu rosto bonito.

— Sempre. — uma expressão de dor cruzou as feições dele. —

Você é tudo para mim. Quando percebi o que Lorde Oakes estava tentando fazer, o que poderia já ter feito. Se o fogo não o tivesse matado, eu o teria feito. Prometo a você que ele jamais voltará a machucá-la, ou qualquer pessoa na verdade.

— Eu sinto muito, Tate. — ela admitiu.

O coração dela doía de tão tola que havia sido. O tempo que ela havia perdido por se agarrar a uma vida que só a preenchia pela metade. Não importava o que ela repetisse para si, sempre haveria uma peça faltando em seu quebra-cabeça. Até que tal peça voltasse para sua vida.

Tate.

— Eu estava tão apegada ao passado que não vi as coisas direito. — ela continuou. — Eu deixei que a opinião dos outros me cegasse quanto ao que eu queria. Deixei o preconceito contra mim me fazer acreditar que eu não era digna de você. Não mais. Agora eu vejo com clareza. Eu quero um futuro com você, quero que nossas vidas se unam em todos os sentidos, quero fazer nosso nós funcionar e deixar cair por terra tudo mais.

Ele sorriu, puxando-a para mais perto.

— Você não foi a única a ficar cega pelos próprios sonhos. Claro que quero você ao meu lado como minha esposa, minha duquesa, mas não espero que fique longe do interior por meses a fio, foi egoísta da minha parte pensar que era algo que você faria. Londres

não fica muito longe, e quando o Parlamento se reúne ou a temporada me chamar à cidade, não espero que você deixe suas responsabilidades por tais frivolidades. Aqui é onde está o que mais importa. — ele passou as mãos pelos cabelos dela, entrelaçando os dedos na nuca dela. — O que eu disse da última vez que conversamos, eu falei sério. Eu amo você, demais. Não posso viver sem você.

Os olhos dela arderam quando a voz dele falhou nas últimas palavras, e ela se aproximou para envolver os braços em volta do pescoço dele, segurando-o perto.

— Eu também amo você. — ela sussurrou contra a orelha dele.

Ele virou a cabeça para ficar de frente para ela, e ela sorriu. Ava se aproximou ainda mais dele e o beijou. Não se importava mais com quem os visse. Tate não se esquivou e tomou a boca dela com fome, fazendo-a se esquecer de todos os problemas da noite, fazendo seu sangue gelado se aquecer.

Uma tosse discreta os separou, e eles se viraram para encontrar Hallie e Lorde Duncannon parados ao lado deles, divertimento no rosto dos dois. Fuligem e sujeira manchavam as roupas de baile, os rostos e as mãos dos dois. Hallie deu um passo em direção a eles, envolvendo-os em um abraço.

— Estou tão aliviada por você estar segura. — disse Hallie, com os olhos muito brilhantes. — Ficamos presos tentando salvar os cavalos. Como você não estava lá, ficamos e oferecemos ajuda e, por graças, nenhum cavalo foi perdido.

— Teremos que reuni-los de manhã. A maioria fugiu do terreno.

— afirmou Lorde Duncannon.

Tudo era compreensível pelo trauma que os animais sofreram, tudo porque Lorde Oakes era um louco. Um homem tão cego de

ciúme por não conseguir o que queria que resolveu punir aqueles que considerava culpados por atrapalhar seus objetivos.

Ava balançou a cabeça.

Como alguém poderia ser tão mau?

— Venha, há pouco que podemos fazer aqui. Vamos voltar para Cleremore, e vocês duas ficarão comigo enquanto a casa e os estábulos são reconstruídos.

Ava assentiu.

Havia pouco que ela pudesse fazer aqui, tudo estava no chão.

Voltariam pela manhã e procurariam os cavalos, que se Deus quisesse, não teriam ido muito longe. Caminharam até a carruagem ducal, e Ava agradeceu quando Tate a ajudou a entrar, as pernas ameaçando ceder sob ela.

Ela olhou pela janela da carruagem e observou o que restou de sua casa, desespero a inundou. Como Lorde Oakes pôde fazer uma coisa dessas?

Talvez uma pergunta que ela se faria por anos e anos.

— Está pronta? — perguntou o duque, sentando-se ao lado dela e tomando-a nos braços, puxando-a para perto.

Ava assentiu, não querendo mais ver a destruição da casa antes de estar preparada para enfrentá-la.

— Estou mais do que pronta.

CAPÍTULO 17

Papai morreu, e eu estou voltando para casa. Perdi tudo o que importava, você, meu pai, mas pelo menos tenho meus cavalos.

Suponho que seja algum conforto em tempos em que não há nenhum.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

U M MÊS DEPOIS, Tate parou do lado de fora da casa em ruínas de Ava e supervisionou a chegada do primeiro lote de madeira para a construção da nova estrutura. Na semana anterior, charretes chegaram cheias de pedra, e agora os construtores estavam recuperando o que fosse reutilizável dos escombros da velha casa.

A propriedade estava em polvorosa de trabalhadores, e Tate olhou para o outro lado do pátio e viu que Ava discutia alguns assuntos com o homem que contrataram para reconstruir a casa e os estábulos. Um sorriso apareceu nos lábios dela.

Ela era tão bonita, capaz, e seu coração doía ao vê-la. Ela o flagrou olhando-a com intensidade e sorriu para ele com um ar conhecedor. De alguma forma ela sempre sabia o que ele estava pensando, sentindo.

Ava Knight era realmente seu par perfeito.

Ele se voltou para a casa, balançando a cabeça ante a destruição. Lorde Oakes queria que nada continuasse de pé, e o

fora bem-sucedido. Restavam apenas algumas poucas peças de mobília e objetos de valor que os funcionários foram capazes de retirar antes que o fogo se alastrasse demais.

O magistrado local havia declarado a morte dele como acidental e, sabendo que o homem havia admitido os crimes para Ava antes de morrer, as autoridades estavam dispostas a dar o caso como resolvido.

Tate ficou feliz com este resultado. Depois do que ele viu Lorde Oakes tentando fazer com Ava na noite do incêndio, ele o teria estripado no gramado caso tivesse escapado, o desgraçado não merecia nada menos.

Ava se esgueirou até ele, segurou seu braço e o trouxe para perto.

— Vai ser como se o incêndio nunca tivesse acontecido quando terminarmos a reconstrução. Não concorda? — ela perguntou, olhando para ele.

Ele beliscou seu nariz fofo.

— Com uma pequena diferença. — disse ele, sorrindo, dando-se ao luxo de dar um beijo em seus lábios encantadores.

Ela olhou para ele com expectativa.

— E qual seria? — ela perguntou.

Tate riu.

— Depois de amanhã, você voltará aqui como duquesa, como minha esposa. — ao proferir tais palavras, contentamento o dominou, acalmando sua alma.

A mão dela soltou-se do braço dele e foi para a cintura dele.

— Sim, e você voltará como meu marido.

Ele passou os braços em volta dela e beijou-a sem se importar com os trabalhadores que os cercavam. E mesmo quando assobios e risadas chegaram aos seus ouvidos, ele não parou. Nunca iria

parar de amar a mulher em seus braços, não importaria onde estivessem ou quem estivesse ao redor.

Eles seriam o duque e a duquesa de Whitstone e fariam suas próprias regras, tomariam suas próprias decisões e isso nunca mudaria.

EPÍLOGO

Dois anos e quatro meses depois...

A va gritou do camarote ducal em Ascot enquanto Titan voava pela reta, os outros cavalos quase em seus calcanhares, e ainda assim o garanhão não dava sinais de desacelerar. Ela se levantou, gritando acima do enxame de cabeças diante dela nas arquibancadas, Tate ao seu lado, rindo e gritando com ela quando o cavalo deles cruzou a linha para a vitória.

Por um momento, eles se encararam com espanto, antes de Ava pular em seus braços, as lágrimas ardendo e seu coração batendo forte em seu peito. Eles ganharam! Eles ganharam Ascot!

— Não acredito. — disse Lorde Duncannon ao lado deles. — Eu ganhei uma fortuna.

Ava riu, não acreditando nela mesma.

— Deve descer, Tate. Pegue a taça e a fita.

Ele olhou para ela, o choque pelo o que havia ocorrido bem claro em seu rosto. Ava olhou de volta para a pista de corrida e sorriu enquanto o jóquei que montava Titan trotou de volta para onde o prêmio seria recebido.

Tate deu um beijo rápido na bochecha dela antes de descer correndo as escadas, em direção ao cavalo. Muitas pessoas em torno deles os parabenizavam, e Ava agradeceu, querendo se lembrar de cada momento deste dia para o resto de sua vida.

Durante os primeiros dois anos de casamento, eles trabalharam muito para deixar o Haras em pleno funcionamento e, felizmente, os

cavalos não sofreram muito com o trauma que Lorde Oakes causara.

— Se ao menos Hallie estivesse aqui para ver isso. Ela iria adorar. — ela disse em voz alta.

O sorriso de Lorde Duncannon diminuiu um pouco com a menção de sua amiga, e Ava não pôde deixar de se perguntar o que havia acontecido entre os dois.

— Ela ficaria feliz por você. Eu não tenho dúvidas.

Ava olhou para onde Tate estava com um largo sorriso que o fazia parecer o homem mais bonito do mundo. Ele apertou a mão do jóquei antes de dar um tapinha no pescoço de Titan.

— Soube dela? — Lorde Duncannon perguntou.

Ava voltou-se para ele, não esperava que ele fosse tão ousado.

— Ela volta a Londres na próxima semana, se o navio do Egito não atrasar.

Sua Senhoria a olhou de frente após ouvi-la, e Ava não deixou de perceber o nítido interesse que havia ali. Ela sorriu para ele, balançando um dedo.

— Um dia desses você vai me dizer por que vocês dois ficam tão cautelosos quando estão perto um do outro. Tate e eu sabemos que os dois escondem algo.

Ele riu e ela balançou a cabeça.

Mesmo Tate não sabia o que havia acontecido entre os dois, mas por Deus, Ava adoraria saber. Quando viajassem para Londres na próxima semana para buscar Hallie, ela exigiria que ela contasse. Não que Hallie fosse dizer algo. A mulher era como um cofre do qual segredos nunca eram revelados.

Ava bateu palmas quando Tate pegou a taça de ouro e sorriu para ele quando ele a ergueu em sua direção. Orgulho se apoderou dela, pelo sucesso de ambos naquele dia.

— Tenho certeza de que está ansiosa para rever a Srta. Evans.

Ava assentiu.

— Claro. — respondeu ela. — Há um artefato que queriam trazer de volta ao Museu Britânico. Presumiram que, como Hallie possui contatos aqui, ela seria a melhor pessoa para viajar com o artefato.

— Ava apertou a mão de um treinador que veio parabenizá-los. —

Eu, pelo menos, mal posso esperar para revê-la. Espero que ela fique um pouco mais dessa vez.

Lorde Duncannon assentiu com a cabeça, um sorriso, e Ava se virou para checar se Tate já fazia o caminho de volta para eles através do bando que dava parabéns e votos de felicidades.

— Você sabe que não deixaremos de ouvir coisas acerca do final dessa corrida pelos próximos anos. — disse ela, rindo quando Tate beijou a taça de ouro em suas mãos.

Duncannon riu.

— Acredito que esteja certa, duquesa.

Tate chegou a ela e entregou a taça.

Casar-se com o duque foi a melhor decisão que ela já tomou, e embora a mãe dele nunca os tivesse perdoado e ainda se recusasse a se desculpar pelo comportamento atroz, os últimos dois anos foram os mais felizes da vida dela, e ela não conseguia mais imaginar como seria sua vida se não fossem casados.

— Parabéns, querida. Você deveria ter descido e recebido a taça comigo. É tanto sua como minha.

Ela olhou para o prêmio, sorrindo.

— Eu vou, no próximo ano, quando um dos meus cavalos correr e vencer.

Tate riu, beijando-a e não se importando nadinha com quem os vissem, o que ele fazia com frequência. Se havia algo que Tate gostava de fazer era escandalizar a alta sociedade. E ela precisava admitir, também gostava. 

Ela foi banida da Inglaterra... e ela o baniu de seu coração.
Assim que retorna para a Inglaterra em decorrência da morte de seu pai, a Senhorita Ava Knight torna-se a dona de um dos maiores estabelecimentos de cavalos de corrida do país. Só há um problema: o futuro de seu negócio depende de um programa de reprodução bem-sucedido que gira em torno de um garanhão, Titan.
Uma pena que o cavalo seja agora de propriedade de um homem que ela desejava nunca mais ver.
O duque de Whitstone, Tate Wells, ficou de coração partido quando Ava o abandonou na noite em que fugiriam para se casar, e ele jurou que nunca mais cruzaria o caminho de Ava. Apesar da relutância de perdoá-la, Ava vai ao socorro de Tate quando um incêndio ameaça consumir sua propriedade. Alguém está determinado a destruí-los. Com isso, eles se veem forçados a trabalhar juntos para garantir a segurança de seus cavalos e propriedades.
Será que os sentimentos que nutriam um pelo o outro no passado reacenderá o amor, ou seus sentimentos refugarão ainda na linha de partida?

 


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PRÓLOGO

Estábulo dos Knight, Berkshire, 1816

A senhorita Avelina Knight, Ava para seus amigos, apertou a circunferência da montaria e verificou se a sela não escorregaria quando ela se elevasse no estribo. Com uma única vela acesa na arandela na parede dos estábulos, ela trabalhou com o máximo de rapidez e silêncio possíveis, na esperança de que os cavalariços que dormiam no desvão acima não acordassem.

Segura de que a sela estava firme e de que a montaria estava hidratada, ela conduziu Manny para fora dos estábulos com o mínimo de barulho possível, encolhendo-se quando as ferraduras do cavalo fizeram seu som típico a cada passada.

Ava soprou a vela quando passou por ela e pegou sua pequena bolsa e jogou-a sobre o pescoço do cavalo antes de se erguer para a sela. Ela ficou lá por um minuto, atenta a qualquer barulho ou à possibilidade de alguém estar à espreita. Feliz pela quietude ela cutucou a montaria e partiu para o portão leste.

Ainda havia tempo, e ela não precisava se apressar agora que já estava há caminho. Tate havia dito que a encontraria na árvore favorita deles às três da manhã, e eram apenas duas e meia.

Ela impulsionou Manny para um meio galope, percorrendo os vários pátios que cercavam sua casa e ao se afastar, passou à velocidade de galope que seu pai usava para treinar os cavalos de corrida. Ou a que já foi sua casa. A partir desta noite, sua vida enfim começaria. Com Tate, ela viajaria pelo mundo, faria amor sob as estrelas se assim o desejassem, e não teria que ser escrava de nenhum dos caprichos das famílias de ambos, ou da Sociedade e suas restrições.

Tate e ela encontrariam uma nova vida. Um novo começo.

Apenas os dois até que expandissem a família com filhos em alguns anos.

Prazer aqueceu seu coração ante tal concepção, e ela não conseguiu impedir a risada suave de prazer que escapou de sua boca.

Com o tempo, Ava esperava que seu pai a perdoasse e, talvez, quando retornassem, casados, com filhos e felizes, seu pai ficaria satisfeito.

A silhueta escura de um homem apareceu embaixo da árvore.

No entanto, pela posição e tamanho do cavalheiro, não se parecia com Tate. Frieza varreu sua pele, e ela estreitou os olhos, tentando descobrir quem a esperava. Com o estômago retorcido, ela empurrou o cavalo para a frente, sem saber o que essa nova peça significava.

Ava olhou em volta, mas não viu mais ninguém. Com mais alguns passos, ela se engasgou quando por fim reconheceu a forma fantasmagórica. Seu pai.

O coração dela passou a bater forte. Como era ele estava aqui, e não Tate? Eles foram tão cuidadosos, tão discretos. Ora, eles nem frequentavam a mesma esfera social para serem ouvidos sussurrando ou planejando. Sendo Tate o herdeiro do pai dele, o duque de Whitstone, e Ava apenas a filha de um corredor notável, suas vidas não poderiam ser mais diferentes.

Ava levou seu cavalo até a árvore. Não havia sentido em dar meia volta. Parando diante do pai, ela encontrou o olhar dele, o máximo que pôde distinguir sob a noite de luar.

— Ava, desça, eu gostaria de falar com você.

Seu tom não era de raiva, mas de cautela, e Ava sentiu-se retorcer por dentro ante a possibilidade de que algo ruim havia acontecido a Tate. Ele teria se machucado? Por que ele não estava aqui para encontrá-la?

Ela pulou do cavalo, caminhou até o pai, sua montaria a seguindo de perto.

— Papai, o que o senhor está fazendo aqui? — ela perguntou, precisando saber, e certa de que não era possível ignorar o fato de ele a ter descoberto.

Ela deixou cair as rédeas do cavalo, e sua montaria se abaixou para mordiscar a grama.

O rosto do pai assumiu um tom severo.

— O marquês de Cleremore não a encontrará aqui, Ava. Recebi uma missiva ontem à noite notificando-me que, enquanto nos falamos, Sua Senhoria está à caminho de Londres para pegar o primeiro navio para Nova York. Pelo que seu pai, o duque de Whitstone, afirma, esta foi uma decisão do marquês. Tate confidenciou a seu pai a situação em que se encontrava com você e que não sabia como se desvencilhar de ter que se casar com uma mulher que não de mesma posição.

Ava olhou para o pai, incapaz de entender o que ele estava dizendo. Um abismo se abriu em seu peito, e ela apertou o xale como se para interromper seu progresso .

Tate a havia deixado?

Não, não poderia ser verdade.

— Mas isso não faz sentido, papai. Tate me ama. Ele mesmo me disse, neste exato lugar.

Decerto que ela não poderia estar errada acerca dos sentimentos dele. As pessoas não declaram tais emoções a menos que fossem verdadeiras. Ela com certeza não mentira.

Ela amava Tate.

Ava pensou em todas as vezes que ele tomou liberdades com ela, beijando-a, tocando-a, passando uma quantidade enorme de tempo com ela e que não significou nada para ele. Ela fora uma mera distração, um brinquedo para um homem do porte dele.

Seu estômago revirou com tal percepção, e ela tropeçou na árvore, segurando-se no tronco para ter apoio.

— Não. Eu não acredito. Tate não faria isso comigo. Ele me ama como eu o amo, e nós vamos nos casar. — Ava olhou para o chão por um momento, sua mente vacilando antes de ela girar o corpo na direção do pai. — Eu preciso vê-lo. Ele precisa me dizer tudo na minha cara.

— Lorde Cleremore já partiu para a cidade. E de manhã, ele estará em um navio para a América. — o pai suspirou, aproximando-se dela e pegando-a pela mão. — Eu pensei que seu apego a ele fosse uma bobagem passageira. Sua Senhoria nunca foi para você, minha querida. Nós treinamos e criamos cavalos de corrida e, na Inglaterra, pessoas como nós não se casam com futuros duques.

Ava olhou para o pai, não acreditando no que estava acontecendo. Ela pensou que esta noite seria o começo de uma eternidade, mas agora era o começo do fim. Seus olhos arderam, e ela se viu impotente em manter a postura.

— Mas eu o amo. — ela sussurrou com a voz embargada.

Seu pai, um homem orgulhoso, mas humilde, de princípios ainda mais humildes, endireitou a coluna.

— Eu sei que você pensa que sim, mas não é amor. Você é jovem, jovem demais para jogar sua vida fora por um garoto que usaria você e depois se casaria com outra mulher, intitulada e bem conectada.

— Não estou arruinada, nem usada. Por favor, não fale dessa maneira.

Não queria nem imaginar que Tate pudesse tratá-la com tão pouco respeito, mas o que o pai disse valia a reflexão. As últimas semanas com Tate não foram ocupadas com pouco além de planejamento e roteiros. Teria sido diferente para eles, teria Tate agido de outra forma caso fosse mais velho, mais maduro? Se a partida dele revelava algo, com certeza era que o pai estava coberto de razão. Ele se arrependera de sua escolha e foi embora em vez de encará-la. Sendo o cavalheiro que era, abandoná-la não parecia do seu feitio. Apenas mostrava a pouca consideração que ele possuía quanto a ela e ao amor que ela tão ardentemente declarou a ele.

Ela bateu nas bochechas, querendo gritar para a noite ante a injustiça de tudo.

— Sinto muito. — disse ela, olhando para as botas curtas e incapaz de encontrar o olhar do pai.

Como ele pôde ter feito isso comigo?

Ela nunca o perdoaria.

Ele suspirou.

— Há mais uma coisa, minha querida.

Mais!

O que mais poderia haver?

— O que, papai? — ela perguntou, pavor formando um nó no estômago diante do semblante pálido de seu pai. Ela viu um olhar semelhante quando ele chegou para contar da morte de sua mãe, e era uma expressão que ela nunca mais queria ver.

Ava agarrou a árvore com mais força.

— Vou mandá-la para a França, para terminar seus estudos lá.

Eu a matriculei na Escola da Madame Dufour de Etiqueta para

Moças. Fica no sul da França. É de boa reputação e ajudará a prepará-la para o que está por vir na sua vida; ou seja, administrar o Haras Knight em meu lugar quando chegar a hora.

Escola de Etiqueta!

— Está me mandando para a França! Mas papai, eu não preciso de escola de etiqueta. Você sabe que eu sou mais do que capaz de assumir o controle dos estábulos. E eu sei me portar, sei como agir tanto na Alta Sociedade quanto na esfera mais baixa. Por favor, não me mande embora. Não vou sobreviver sem você e nossos cavalos.

Não me tire isso também.

Não quando eu já perdi a felicidade da qual eu tinha tanta certeza.

Ele a calou, puxando-a para seus braços. Ava o empurrou para longe, indo e vindo diante dele. Seu pai estendeu a mão, tentando acalmá-la.

— Você vai me agradecer um dia. Confie em mim quando digo que é uma coisa boa para você, e não vou voltar atrás com minha decisão. Partimos para Dover amanhã, e eu mesmo a acompanharei para garantir sua chegada segura.

— O que... — ela parou de andar. — Pai, por favor, não faça isso. Prometo não voltar a fazer nada de tão tolo e bobo. Você disse que Tate está indo embora. Não há razão para me mandar embora também.

O simples ato de dizer em voz alta a magoava, e Ava se abraçou. Amar e perder Tate já seria difícil; no entanto, ser enviada para outro país, sozinha e sem amigas ou apoio era demais para suportar.

Seu pai foi até ela, puxando-a contra ele e beijando seus cabelos.

— Esta é uma boa oportunidade para você, Ava. Eu trabalhei duro, economizei e investi para ser capaz de proporcionar a você tudo o que uma criança intitulada poderia receber. Eu quero isso para você. Lorde Cleremore pode não achar que você é adequada para ele, mas provaremos que ele está errado. Me faça orgulhoso, use a educação que receberá para se aperfeiçoar e então volte para casa. Me prometa que vai fazê-lo.

Ava caiu contra ele.

O pai dela nunca foi flexível e, uma vez que a decisão fosse tomada, era final. Não havia escolha; ela teria que fazer o que ele mandasse.

— Eu irei já que sei que não posso fazê-lo mudar de ideia.

— Essa é minha garota. — ele se afastou e assobiou para a montaria dela.

Ela não conseguiu nem dar um meio sorriso quando Manny trotou até eles.

— Vamos. Tenho certeza de que, quando chegarmos em casa, o café-da-manhã estará quase pronto.

Usando um tronco próximo, Ava se ergueu para a sela.

O cavalo, como se soubesse o caminho de casa, começou a descer a colina. A luz brilhava no céu do leste e, olhando para sua esquerda, Ava viu o sol nascer sobre sua terra. Ela observou o amanhecer de um novo dia, marcando um novo futuro para ela, u que não incluía Tate, o Marquês de Cleremore, futuro duque de Whitstone.

Uma lágrima solitária deslizou por sua bochecha, e ela se prometeu jamais chorar por Tate ou qualquer outro homem. Ela dera o coração e confiança a ele, e ele os desprezou. Que a lágrima secando em sua bochecha fosse a última que ela derramaria por ele.

E o precioso ducado que ele tanto amava...

Amava mais que ela.

CAPÍTULO 1

Tantos quilômetros nos separam. Eu não durmo por pensar em você. Quando seu amor por mim pereceu? Não consigo entender por que você não me confidenciou que seus sentimentos haviam mudado, talvez até de direção...

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

Haras Knight, Berkshire, 1821

A va incitou sua égua recém-comprada — uma beleza de dezesseis mãos, puro-sangue que havia sido gerada para competir com sua própria linhagem — a um galope empolgante.

Ela sorriu, inclinando-se sobre o pescoço dessa garota preciosa, e elas começaram a virar a esquina e descer para a casa ainda no galope tão familiar.

O administrador do Haras e treinador, o Sr. Greg Brown, estava observando seu galope, e ouviu seus gritos exuberantes quando ela passava por ele em uma velocidade alucinante. Ela sorriu, impressionada com a rapidez insondável do cavalo.

A névoa da manhã começava a queimar a grama e as árvores, o ar tornando-se fresco após a breve chuva. Puxando a égua, Ava a manteve em um trote lento para retornar a Greg. A égua bufava vapor de suas narinas a cada respiração, e Ava deu um tapinha nela, seguida de uma massagem de congratulações.

Ava respirou fundo, maravilhada com a beleza de sua vida, a beleza deste lugar que agora era dela.

— O que acha, Greg? Ela tem chance em Ascot? — Ava provocou, sabendo que havia muito o que fazer antes que pudessem pensar em inscrever a égua para uma corrida dessas.

Ele riu, curvando-se sob o parapeito e saindo para dar tapinhas no cavalo.

— Talvez no próximo ano, se ela continuar se apresentando como agora. No entanto, ela terá que se provar em Epsom antes.

Ava soltou os pés dos estribos e pulou para o chão. Ela entregou as rédeas a Greg e deu a volta no cavalo, verificando se ela estava bem após a corrida.

— Nossa Garota Valente, como o nome sugere, se provará por si só. Espere e veja. E com os potros que teremos dentro de cerca de um ano, do cruzamento de Titan e Black Lace, teremos mais belezas como esta.

— Falando em Titan. — Greg disse, tirando o chapéu e passando a mão pelo cabelo. — Talvez haja alguns problemas para juntá-lo a Black Lace como você deseja. Soube que o Sr. Tuttle o vendeu.

Ava parou a inspeção que fazia na égua e baixou a pata direita da Garota Valente. Ela encontrou o olhar de Greg e viu que ele não estava fazendo piada.

— Titan foi vendido? Mas o Sr. Tuttle fez um acordo com meu pai de que o primeiro potro, que a Black Lace teve há dois anos, seria dos Tuttle, mas que depois eles cruzariam outra vez. Meu pai cumpriu sua parte no trato, e você está me dizendo que ele não vai cumprir a dele?

Ela partiu para os estábulos, gritando para um dos rapazes selar Manny. Greg a seguiu o mais rápido que pôde enquanto guiava

Garota Valente.

— Srta. Ava, espere. Espere. Acredito que haja outras opções, além de Titan, que deveria considerar.

Não havia outro cavalo melhor que Titan, e se o Sr. Tuttle pensava em passar a perna em seu falecido pai e a ela, então ela pegaria o potro, Beatrice, de volta sem se importar com o escândalo que criaria no mundo das corridas. Como o homem ousava enganá-

los dessa maneira? Ele trocara apertos de mão com o pai dela, caramba. Não significava que o acordo era tão válido quanto qualquer outro?

— Não há outro cavalo tão bom. Quero Titan como provedor da próxima geração de potros dos Knight, e não há nada que possam dizer que me faça mudar de ideia. Você sabe, assim como qualquer um, que ele é o melhor puro-sangue da Inglaterra, talvez até do continente. Sua altura, junto com a forte linhagem de sangue e velocidade, faz dele o único cavalo apto.

Ava agradeceu o rapaz que selou Manny e, segurando-se na sela, se ergueu.

— Aonde vai? — Greg perguntou a ela, segurando as rédeas sob o pescoço do cavalo dela.

Ela franziu o cenho ante a impertinência dele.

Ele largou.

— Vou descobrir o que o Sr. Tuttle pretende ao tratar nosso negócio com tão pouco respeito. Eu posso ser mulher, e meu pai pode estar morto, mas nós tínhamos um acordo. Não vou deixar barato.

Ela virou a montaria e chutou Manny para iniciar um galope, iria numa perna só até a Fazenda Tuttle. Quando o pai dela estava vivo, nenhum tipo de acordo escuso seria feito. Nunca pensariam em

enganar seu querido pai. Mas aqui estava ela, uma mulher, e sendo tratada com tão pouco respeito.

A raiva fervia em seu sangue e, mesmo quando ela trotou já em terras da Fazenda Tuttle, seu humor não havia amenizado. Ela viu o homem que procurava laçando um cavalo no pátio e foi com sua montaria até a cerca, esperando que ele a notasse. O olhar amargo no rosto dele denunciava que ele sabia a razão para ela estar lá.

— Como você pôde, Sr. Tuttle? Você tem um acordo fechado com meu pai, um que ainda está de pé comigo. — ela demandou, ignorando quaisquer gentilezas.

O cavalheiro mais velho gritou para um cavalariço que estava por perto pegar a corda e o chicote e caminhou até a cerca. Ele parecia ter envelhecido nos últimos meses desde que ela o vira.

Enquanto ela olhava para o cabelo cinzento e recuado dele, um pouco de sua explosão se dissipou.

— Eu não tive escolha, senhorita Ava. De fato, se você não comprar seu potro de mim, o comprará em um leilão.

Ela fez uma careta.

— O que houve, senhor Tuttle? Aconteceu alguma coisa para forçá-lo a vender Titan e Beatrice?

Ele suspirou, os ombros caindo com as palavras.

— Sim, minha querida. Não me importo de contar já que nossas famílias se conhecem há muitos anos, mas fiz um mau investimento no ano passado e, bem, ele vai me custar a fazenda. Estamos nos preparando para ir para Bath, onde minha esposa, Rose, tem família. Vender Titan me permitiu ao menos pagar a dívida mais urgente. Com a venda da casa, da terra, e dos cavalos, é claro, podemos ter um pouco de sobra para nos manter por alguns anos em condições razoavelmente confortáveis. — ele encontrou o olhar

dela, seus olhos vidrados de lágrimas não derramadas. — Me perdoe, Ava. Eu sei o quanto você queria potros do Titan.

Esquecendo-se do cavalo, ela disse:

— Posso ajudar em algo? Existe algo que eu possa fazer para aliviar a dívida e permitir que você fique? Esses estábulos estão na sua família há três gerações. Eu odiaria vê-los perder tudo.

— Bem. — disse ele, olhando para a propriedade, o amor que ele nutria pela terra estava evidente em seus globos cinzentos. —

Quando alguém comete um erro, deve se responsabilizar por ele.

Só lamento que minha esposa e meus filhos percam tudo o que trabalhamos tanto para construir. E agradeço, Srta. Ava, mas não posso aceitar sua oferta generosa. Não seria certo.

Ela assentiu, querendo pressionar, mas o Sr. Tuttle sempre foi um homem orgulhoso. Forçá-lo a algo nunca havia funcionado antes, e ela não via como mudá-lo agora. E ela não queria que se afastassem com uma discussão desse porte, mesmo que quisesse muito ajudá-lo.

— Muito bem, mas me avise caso se depare com algo que eu possa ajudar. Ou, se houver algo que você não queira vender a ninguém, talvez eu possa comprar. Pelo menos você saberá quem o possui e que será amado.

— Você é uma boa garota. E saiba que eu nunca teria desonrado nosso acordo se pudesse evitar. É que, de fato, não havia outro remédio.

Ava ajustou-se sobre a cela, observando o cavalo que estava sendo treinado parecia mais interessado na conversa deles que no treinamento.

— Posso perguntar a quem você vendeu Titan? Talvez eu possa negociar com essa pessoa. — ele olhou para os pés, mexendo-os

um pouco. — Senhor Tuttle. — ela se repetiu ante a ausência de resposta dele.

— Quanto a isso, minha querida. Bem, quer dizer...

O que havia de errado com o homem?

— Sr. Tuttle, me conte.

Decerto que não é segredo de estado.

Ele voltou a olhá-la nos olhos e, por um instante, ela se perguntou se ele havia jurado segredo. Com certeza que não.

— O duque de Whitstone comprou Titan, senhorita Ava. Soube pelo seu pai que sua família possui algumas desavenças com eles e, me desculpe, mas para conseguir procriar com Titan, a senhorita precisará ir falar com Sua Graça.

As mãos dela tremeram com a menção daquele nome, e ela apertou as rédeas com força, raiva fervendo em suas veias por ter ouvido o nome do sujeito. Mesmo depois de todos esses anos.

— Por que vendeu para ele? Eu poderia ter ofertado o preço que você queria.

Ele balançou a cabeça, mexendo os pés como uma criança travessa mais uma vez.

— Ele veio aqui ontem e ofereceu para pagar em dinheiro. Como estou com agiotas no meu encalço há semanas, aceitei sem pensar.

Me perdoe, Ava. Mas eu tive que pensar na minha família.

Maldição.

— Eu entendo. — disse ela, incapaz de esconder a decepção em seu tom.

O duque de Whitstone poderia ser um cavalheiro persuasivo, disso ela sabia bem. As histórias que ouvira sobre Tate em Londres não se pareciam com o garoto que ela amara. Na verdade, ele agora parecia um homem que só procurava prazer e se importava com pouco. No ano em que ela voltara à Inglaterra, ele não a

procurara uma única vez para pedir desculpas pela forma que a tratara outrora.

Ava virou o cavalo, preparando-se para sair.

— Nos visite antes de partir de vez, Sr. Tuttle. Traga sua família e teremos uma tarde de chá e bolos. Estou decepcionada pelo cavalo, mas estou mais triste por você ter sido colocado nessa situação. Eu gostaria que não fosse assim.

Ele inclinou o chapéu, curvando-se um pouco.

— Você é muito generosa, Srta. Ava, e iremos até vocês nos despedir.

— Que bom.

Ava acenou e iniciou a volta para casa.

Ela chutou sua montaria a galope e xingou. Maldito fosse o duque e sua mania de se intrometer. Se ao menos ela tivesse ouvido dos problemas enfrentados pelo Sr. Tuttle antes, ela poderia tê-lo ajudado comprando o cavalo antes que o duque aparecesse.

Na sua opinião, o duque não era digno de um cavalo de tão alto padrão.

Ela não podia nem conceber ter que encará-lo para tratar de tal assunto. O fato de ele não a ter procurado era uma bênção, pois ela com certeza não estava disposta a ficar de frente a ele e seu coração feio e mentiroso.

Porém, de nada adiantava manter-se afastada se ela quisesse acesso a Titan para continuar com seu programa de reprodução.

Era um dilema que ela não havia imaginado que iria ter que enfrentar.

Mas o garanhão era fundamental para dar continuidade a suas linhagens, à possibilidade de gerar mais vencedores no futuro e, assim, dar a oportunidade de sua propriedade prosperar e nunca precisar ter de passar pelo mesmo destino que o Sr. Tuttle estava

vivendo agora. Desistir de seu sonho de se tornar o melhor e mais estimado Haras da Inglaterra não daria certo.

Ela já havia desistido de coisas que queria, como um casamento e família com o homem que acreditava amá-la, mas não pensaria em desistir desta parte de sua vida. O duque não tiraria isso dela também. Mandaria seu administrador, Greg, para a propriedade ducal e o faria negociar, se possível.

E com um pouco de sorte, o programa de reprodução poderia ser realizado sem que Sua Graça ou ela tivessem que pisar no mesmo recinto. Como ela pretendia.

TATE WELLS, o duque de Whitstone, recostou-se na cadeira revestida em couro atrás de sua mesa e estalou os dedos enquanto ouvia o administrador do Haras Knight traçar os termos sugeridos para permitir que a senhorita Ava Knight tivesse acesso ao seu premiado corredor, Titan.

Não que ele fosse contar ao velho, que era tão leal a Ava como foi ao pai dela antes de ele falecer, que o inferno teria que congelar antes que ele a deixasse chegar perto de sua propriedade ou de Titan. Fazia cinco anos que ele não a via, nem pensava nela, e não iria começar a fazê-lo agora.

Ele se mexeu na cadeira, sua mente zombando dele pela mentira que era tal pensamento. Inferno, ele pensava nela com frequência. Esperava que ela estivesse bem e feliz. Mesmo quando ele ia à estalagem local para tomar uma caneca de cerveja, seus ouvidos sempre se mostravam atentos à qualquer menção ao Haras Knight e à dona que administrava um Centro de Criação de Cavalos de Corrida bem-sucedido.

Mesmo assim, ele nunca a perdoaria por tê-lo afastado.

O fato de ele estar na América o impediu de dizer adeus ao pai.

Quando as notícias da doença de seu pai, dois anos atrás, enfim chegaram aos Estados Unidos, sua partida para a Inglaterra já não seria em tempo. Ele chegara a Berkshire duas semanas após seu pai ter sido posto no mausoléu da família. Outra mágoa que ele poderia colocar nas costas de Ava. Ou Srta. Knight, cuja alma era negra como uma noite sem lua.

— ...portanto, Sua Graça, seria vantajoso que Titan recebesse nossa égua, Black Lace. A senhorita Knight está disposta a pagar uma quantia generosa pelo serviço, e eu, em conjunto com seu próprio administrador podemos organizar todos os detalhes relativos aos animais para que você e a senhorita Knight não precisem ser incomodados.

Tate encontrou o olhar cinza do senhor mais velho, seus olhos um pouco lacrimejantes com a idade. Então, Ava não queria vê-lo?

Bem, havia pelo menos uma parte do acordo em que eles poderiam concordar.

Uma pequena parte de seu coração doía com a noção de que ela não queria nada com ele. O rompimento do relacionamento deles, a saída repentina da Inglaterra fora tão incomum para a garota que ele conhecera uma vez. Em certa época eles foram inseparáveis, cada hora e cada minuto do dia era gasto na companhia um do outro.

Tate afastou o pensamento inútil.

— Não estou interessado em procriar Titan no momento.

Queremos que ele corra em Ascot no próximo ano, o que não preciso lembrar que falta menos de oito meses. Não preciso que o cavalo se desgaste mais do que o necessário.

— Peço perdão, Sua Graça, mas cavalos correm e se desgastam diariamente. Receber uma égua não será mais vigoroso que treinar.

O que era verdade, não que Tate fosse acatar tais regras.

E ele gostava da ideia de Ava não conseguir o que queria. Ela arrancou as esperanças dele de um futuro. Casar-se com a mulher que ele amava, respeitava e adorava, e não com alguém apenas porque era considerada adequada para ser uma duquesa.

— É demais para o meu cavalo e não vou permitir. Diga à Srta.

Knight que procure outro garanhão, em outro lugar para o seu programa de criação.

O senhor mais velho torceu o chapéu nas mãos.

Se esse acordo era tão importante para Ava, por que ela não veio ela mesma pedir? Ele se esforçava para não a encontrar aqui em Berkshire e, até agora, fora bem-sucedido em seu plano.

Ele sabia que ela estava de volta da França há um ano, em condições normais seria quase improvável que eles não tivessem se encontrado até agora, em eventos de corrida e coisas do gênero.

Tate pensou por um momento e se perguntou se ela também o estava evitando tanto quanto ele a evitava.

Ele se levantou.

— Lamento tê-lo feito perder seu tempo, Sr. Brown, mas minha decisão acerca do assunto é final. Informe a Srta. Knight, por favor.

— ele estendeu a mão. — Bom dia para você, senhor. — disse ele, terminando a conversa.

O Sr. Brown se levantou com os ombros caídos. Tate sentia pena do homem. Ele agora teria que voltar e encarar Ava. Com certeza uma tarefa que Tate não gostaria de ter.

Ao menos na época em que se conheciam, tantos anos atrás, ela sempre fora determinada e dona de si. Dois traços que ele uma

vez adorou. Eles se tornaram amigos antes que ele se caísse de amores por ela. Ela nunca se retirara de uma conversa que considerava o julgamento dele incorreto, sendo bem incisiva ao fazê-lo ver a razão por trás do argumento dela. Sua determinação, seus ferozes olhos castanhos acendiam como fogo quando ela falava em tornar os cavalos dos Knight os mais conhecidos na Inglaterra, com Tate ao seu lado. Ava sempre esperava o melhor das pessoas. Que pena que ela não foi capaz de viver de acordo com seu próprio padrão.

O Sr. Brown apertou sua mão.

— Obrigado pelo seu tempo, Sua graça. Tenha um bom dia.

Tate observou-o sair.

Ele se recostou na cadeira, esticando-se, pensando em quem a Srta. Knight seria nos dias de hoje. Porque ela não havia vindo pedir, ela mesma, que Titan procriasse com a égua dela. Dava indícios de que toda a história entre os dois não significou nada para ela. Que eles eram, de fato, dois estranhos. Não que tal realização surpreendesse Tate. O dia em que ela enviou uma carta dizendo que não se casaria com ele havia sido o suficiente para atestar o que a Srta. Knight pensava dele. De quanto ela mentiu e fazia pouco caso dos ideais infantis dele.

Tate passou a mão na mandíbula.

Mesmo com tudo o que havia passado entre eles, todas as dores, ele não pôde deixar de se perguntar se ela ainda teria a mesma aparência. Ainda teria os cabelos compridos e de uma cor tão rica quanto chocolate? Os olhos castanhos e grandes? As maçãs do rosto ainda eram pronunciadas, ou haviam se tornado mais cheias com a idade?

O relógio bateu as horas e, pegando a pena, ele puxou a papelada de uma das propriedades diante dele e começou a

verificar os livros de contabilidade dos estábulos e das fazendas dos inquilinos. O que importava o quanto ela havia mudado? Ele também mudara, seguiu em frente.

Nos últimos dois anos como duque, ele foi negligente em cuidar de suas propriedades, mas não mais. Estava na hora de garantir que as pessoas que sobreviviam de suas terras fossem bem cuidadas. Que seu Haras aqui em Berkshire crescesse e prosperasse como ele sempre quis.

Tornar o seu estabelecimento melhor do que o dos Knight, há cinco quilômetros daqui, era uma motivação bem boa para estar aqui, em vez da cidade. E com Titan em seus estábulos, ele já possuía vantagem em avançar seus planos. Tate afastou Ava de sua mente, assim como ela o descartara sem olhar para trás.

Ninguém tão desleal e egocêntrica merecia um minuto do seu tempo. Nunca mais.

CAPÍTULO 2

A VA INCITOU o cavalo a galope, a linha do telhado de Cleremore Hall, nomeada quando a família havia acabado de receber o marquesado, emergiu das árvores. Em apenas alguns momentos, ela reveria Tate. Estaria uma vez mais nos reverenciados corredores da casa do Duque de Whitstone. Fazia anos desde que ela chegara tão perto da propriedade dele, e ela sentiu nervosismo se instalando ante a ideia de vê-lo outra vez.

Será que ele mudou tanto quanto ela?

Cinco anos era um longo tempo, e ele esteve nos Estados Unidos por três deles. Ela supunha que tal viagem poderia mudar muito alguém, torná-lo mais mundano, ou até sábio. Ao longo dos anos, ela ouvira, às escondidas, as fofocas ociosas em torno dessa grande família, queria saber se Tate havia se casado ou se estava noivo. Nada disso havia sido mencionado, mas, ao retornar à Inglaterra, as peripécias dele em Londres nunca deixavam de ser assunto para as pessoas. Pelo menos não para as deste condado.

O homem era um verdadeiro patife em todos os sentidos e, de alguma forma, saber que ele estava sempre cercado de tantas amantes, que levava outras mulheres para a cama com tanta regularidade, fazia com que a ferida em seu traição continuasse escancarada como um abismo.

Também não condizia com quem ela acreditara que ele era. Tate em verdade nunca se comportara de tal modo quando eles se encontravam, embora eles fossem bem novos à época, apenas dezenove anos. Sua Graça também se recusou a se casar com ela.

Mas daí, ela supunha que, caso ele estivesse atraído de verdade

por ela e a amasse, ele teria a levado para a cama. Mas ele não o fizera.

Ela guiou Manny para uma pequena inclinação, não muito longe dos estábulos ducais, e dali pôde ver Titan comendo grama em um piquete adjacente. Clicando a língua, ela incitou a montaria na direção dos estábulos, queria falar com o treinador. Ver se ele poderia negociar com o duque, um homem que parecia ter se tornado um imbecil teimoso sem razão.

Ela amarrou a montaria a uma grade próxima, deixou às rédeas com sobra o suficiente para que o cavalo mordiscasse a grama. Os estábulos dele eram tão grandes quanto os dela, contudo, a madeira parecia precisar de tinta fresca. Pelo menos as dela estavam em melhores condições, muito melhores que as de um duque.

Entrando nos estábulos, ela parou no espaço escuro e aguardou que os olhos se ajustassem. Alguns homens cuidavam de seus afazeres, alguns garotos tiravam palha velha das baias, e dois rapazes mais jovens passavam óleo nos estribos das selas de couro.

— Sem aveia hoje, ele está engordando. — disse uma voz familiar, e ela ofegou ao ouvir Tate depois de todos esses anos. A ideia de fugir correndo passou por sua cabeça um segundo antes de ela erguer o queixo e enfrentar o reencontro inevitável, fadada a acontecer desde que ambos voltaram à Inglaterra.

Ele saiu de uma baia, e ela aproveitou a oportunidade para apreciar sua forma e seus traços pelo tempo em que ele estivesse alheio à sua presença.

A juventude que ela amara não existia mais. Seus cabelos castanhos e macios pareciam beijados pelo sol, mais compridos acima que nas laterais, e ele havia empurrado os fios para trás, o que o fazia ter uma aparência bagunçada. O nariz reto e o queixo

esculpido estavam perfeitos como sempre e, mesmo agora, ela se lembrava de como eram sob o toque. Os lábios de Tate se abriram em um meio sorriso depois de conversar com seus funcionários, e ela ficou maravilhada com o fato de que um homem conseguira ter sido tão abençoado com boa aparência.

Ele, com certeza, era uns bons dez centímetros mais alto que ela, e os braços antes finos de marquês, eram musculosos e fortes no atual duque de Whitstone. As coxas dele, envoltas em calções bege, eram formadas por músculos proeminentes, e ela se sentiu corar, e mordeu o interior da bochecha. Mesmo depois de tudo o que ela vivera, seu corpo a traíra ao desejar mais uma carícia, um olhar, um beijo... Que plebeia tola ela era.

Ele se virou e se assustou quando a viu. Um vislumbre de prazer cruzou as feições dele antes que ele piscasse e sua reação se tornasse aborrecimento.

— Srta. Knight, eu não mudarei de ideia. Está desperdiçando meu tempo tanto quanto o seu.

Ela suspirou, erguendo o queixo.

— Eu e o Sr. Tuttle firmamos um acordo antes que o senhor o forçasse a vender Titan para você. Mereço que esse acordo seja mantido.

Ele se virou, dando-lhe as costas.

Se ele pretendia desprezá-la, ele se enganava. Em vez de irritá-

la, o corpo dela mostrou ter suas próprias intenções e seu olhar baixou direto para o bumbum dele. Mordendo o lábio, ela lutou para não sorrir com o quão perfeito ele ainda era na parte de trás.

— Aliás, Srta. Knight, você deveria estar vestida desta maneira?

Você parece um homem.

Ela ergueu uma sobrancelha, ainda encarando suas características traseiras já que ele olhava para o outro lado.

— Como se sua opinião fosse relevante, Sua Graça. Não vim aqui para discutir nossas roupas, mas cavalos. O que é preciso para você permitir que Titan receba minha égua, Black Lace? Estou disposta a pagar se o que precisa é dinheiro. Lembro-me bem do quanto sua família adora dinheiro.

Ele se virou, e ela estreitou os olhos.

Ótimo.

Ela o queria irritado. Irritado como ela estava. Porque era a falta de conexões e de títulos ancestrais na corrente sanguínea dela que a tornara tão inelegível para ele. Ele partiu para a América, a abandonou sem ter o caráter de falar pessoalmente que havia cometido um erro, que ele não a amava mais e não queria que eles se casassem.

Ela teria se magoado, com certeza. Mas essa dor teria sarado, por ele ter agido de forma honesta, como um cavalheiro. O homem à sua frente era um covarde que fugiu em vez de enfrentar suas responsabilidades. Ele a deixou sozinha e vulnerável. As amigas que fez na escola a salvaram, mas ao voltar para a Inglaterra não lhe restava ninguém. Com o pai morto, ela estava sozinha e sem proteção, e havia pagado por esse lapso da pior maneira possível.

Ela nunca o perdoaria.

— Você não teria fundos suficientes, mesmo que eu quisesse seu dinheiro.

As palavras dele a irritaram ainda mais, ela caminhou até ficar há poucos metros dele.

— Eu tenho riqueza o bastante, duque. E tenho certeza de que se seu pai ainda estivesse vivo, eu já poderia ter comprado Titan umas dez vezes. Então me diga, como um fruto nunca cai longe da árvore, qual é o seu preço? O que é preciso para eu ter Titan?

Ele então passou a observá-la, e ela sentiu os nós no estômago se apertarem ainda mais sob o escrutínio dele. O que passava pela cabeça dele? Concluiria que ela havia mudado muito desde que a vira pela última vez? De perto, Ava conseguiu ver a leve sombra da barba crescendo em sua mandíbula. As roupas dele, em vez de calças de camurça e casacos superfinos cortados à perfeição para se adequar à sua forma, eram calças bege, botas até o joelho, camisa e casaco marrom. Nada de gravata ou lenço, ou camisa engomada, ou botas polidas e brilhantes.

Ava olhou para seu peito, para o ponto de onde a gravata havia se soltado da camisa e um lembrete de pelos no peito era visível.

Seus dedos coçaram de vontade de senti-los outra vez. Uma vez, quando estavam sozinhos, eles se beijaram com tanta paixão que ela o tocou, e ele também a tocou.

A lembrança disso a fez ficar desejosa, e ela rangeu os dentes, odiando que seu corpo se ludibriasse com o inimigo diante dela.

— Ele não está à venda. — disse ele, olhando-a com firmeza, as palavras ásperas para não deixar espaço para argumentação.

Ela estreitou os olhos.

— Vejo que ainda é teimoso, Sua Graça. — ela se virou e foi para a porta, o clique das botas dele soando depressa detrás dela.

— Os Estados Unidos não o livraram desse traço. — ela o provocou.

Ele a agarrou pelo braço e a girou para encará-lo.

Ela ofegou e bateu na mão dele, o toque a havia deixado ansiando por mais. Fazia cinco anos que ela não reagia a um toque como reagiu à Tate, e a fome nos olhos dele dizia que ele sabia muito bem o que a presença dele fazia com ela.

— O que você sabe de mim ou de como eu sou? Não me insulte, senhorita Knight, só porque você não conseguiu o que queria. Eu

também posso afirmar que a escola não a livrou de sua própria teimosia. Era de se esperar que uma escola francesa de etiqueta a deixaria mais doce.

Ava manteve as mãos firmes ao lado do corpo.

— Ó, não se preocupe, Sua Graça. Minha educação foi primorosa. O mais importante de tudo, aprendi de que tipo de cavalheiro me afastar, libertinos vis como você.

Na verdade, essa parte ela não havia aprendido muito bem, e ela se forçou a afastar o pensamento ruim, não queria reviver o horror que nada tinha de ver com o homem que com quem ela estava discutindo.

Ava caminhou até o cavalo e subiu.

— O que pretendo fazer agora.

— Libertino? — ele disse, os olhos arregalados, ele agarrou as rédeas do cavalo dela e a interrompeu. — Você sabe tão bem quanto qualquer um que eu nunca fui lascivo.

Ela ergueu a sobrancelha com ironia.

— Mesmo? Então, todas as fofocas londrinas que citam seu nome são equivocadas? Você não é um canalha? Um homem que teve, e tem, tantas amantes que não sabe dizer quantas são? Um homem que prefere vadiar a cuidar de suas muitas propriedades?

Diga-me, Duque, as mulheres de Nova York não o satisfizeram o suficiente de modo que você se viu obrigado a retornar e espalhar sua semente vil por aqui? Quão diferente você é do jovem que conhecia.

Ava fechou a boca com um estalo.

Como uma conversa sobre Titan rumou para uma briga feia entre eles? Era tudo pessoal e revelador demais. Ela não queria que ele soubesse que ele a magoara tanto no passado. Que partira seu coração.

— Perdão, Srta. Knight, mas não vejo por que deveria se importar. Não me insulte, sabemos que a senhorita também não é nenhum anjo.

— O quê? — ela disse horrorizada. — O que quer dizer com isso?

Ele a encarou.

— E agora tenta me fazer de bobo. Bom dia para você, senhora.

— ele deu um passo para trás, deixando-a ir embora.

Com um último olhar para ele, ela incitou a montaria e partiu a galope. A volta para casa foi como um borrão. Ela conseguia ouvir o som alto de seu coração bombeando o sangue enquanto remoía a perplexidade de que uma conversa acerca de um cavalo havia se tornado uma briga em torno do relacionamento deles e do noivado desfeito.

Sem mencionar a falta de educação dela ao mencionar o fato de ele ter dormido com metade de Londres. Os rumores de que suas propriedades careciam de atenção eram verdadeiros agora que ela vira com seus próprios olhos.

Ela se encolheu.

De onde saíra isso?

Ava respirou fundo para se acalmar e cutucou o cavalo para manter o galope. Ela não permitiria que o rancor dele a afetasse. Ele não valia a pena e, no entanto, a mágoa que estava gravada no rosto dele quando ela partiu foi o bastante para abrir uma ferida de que ela considerava estar há muito recuperada.

TATE PASSOU a mão no queixo enquanto observava o belo delineado de Ava fugir da entrada de seu estábulo. Que mulher

andava por Berkshire em calças masculinas? Ao que parece Ava era dessas e não tomava conhecimento de quem a via daquele jeito ou do que pensavam dela.

No momento em que ela entrou no estábulo, o coração dele pulou no peito ao revê-la. Ele precisou se restringir para não a tomar nos braços e dizer o quanto havia sentido saudades. Dentro de uma fração de segundo, a lembrança de por que eles não se casaram o alertou que ele precisaria ter cuidado com a mulher diante dele. Ela deu um basta no amor deles por uma chance de viajar para o exterior e estudar. De fugir de ser duquesa, porque tal posição era detestável, ou assim dizia a carta que ele recebera.

Mas, maldição, ela ainda era tão bonita quanto ele se lembrava que era. As longas madeixas escuras estavam amarradas em um nó frouxo na parte de trás da cabeça, e uma delicada fita vermelha era o único artigo que segurava os fios no lugar. Os olhos dela estavam mais ferozes do que nunca, ardendo de paixão ou de ódio quando se tratava dele, mas revê-la depois de tanto tempo saciou parte da necessidade dele depois de tantos anos.

Ele franziu a testa quando a perdeu de vista, queria que ela voltasse e lhe desse outro pito, mesmo que só para ver aquele pequeno nariz perfeito se erguer no ar.

— Era a Srta. Ava Knight? — disse seu amigo mais próximo, Lorde Arthur Duncannon, olhando para a entrada, na direção em que Ava havia desaparecido.

Ele era seu amigo a vida toda, e não perdia a chance de descobrir algo que poderia virar fofoca. Se parecia interessante e valesse um comentário, ele teria uma opinião.

— Sim. — disse Tate, voltando-se para a casa.

Ele não queria mais falar de Ava, tanto quanto não queria mencionar o fato de que seu coração não parecia capaz de

desacelerar no peito. Ou por que as palavras dela o cortaram como uma espada. Ela parecia zangada com ele, considerando que fora ela quem o rechaçou para costas estrangeiras.

Duncannon o alcançou.

— A mesma Ava que o abandonou? A mesma Ava Knight que administra o Haras ao lado?

Tate se virou para o amigo e esperava que Duncannon entendesse a dica de que uma conversa em que o assunto fosse Ava não seria possível.

— Diga-me, Sua Graça. Ou terei que descobrir de outra maneira.

— Você não vai. — disse ele em um tom que não deixava espaço para argumento. — Tudo o que precisa saber é que somos vizinhos e que, com certeza, não somos amigos. O passado não é mais que uma paixão tola de infância, e que está mais que enterrada da minha parte. E pela minha conversa com Ava agora, para ela também está.

Duncannon lançou um olhar incrédulo ao amigo, como se zombasse das palavras dele.

Tate se exaltou:

— O que foi agora, homem? O que essa sua mente minúscula está tramando agora?

O amigo sorriu.

— Pelo que pude observar de vocês, eu sugeriria que os sentimentos ainda existem por ambas as partes. Na verdade, me sinto confiante o bastante para dizer que, na verdade, vocês ainda se importam bastante um com o outro, e mais do que estão dispostos a admitir.

Tate manteve as mãos firmes na lateral do corpo.

— Eu não me importo com a senhorita Knight, e você precisa guardar suas opiniões para si a não ser que queira voltar correndo

para Londres, para morar com sua avó.

Duncannon levantou as mãos em derrota.

— Muito bem, não direi outra palavra. Mas me diga, o que ela queria discutir? Ela não parecia muito feliz ao ir embora.

Infeliz era um eufemismo para o que Ava estava sentindo. Ela estava com o demônio no corpo se ele a conhecia bem. Por vez, não havia outra pessoa no mundo que a conhecesse tão bem quanto ele.

No passado, depois de um desentendimento como esse que acabaram de ter, Ava teria voltado em alta velocidade para casa, remoendo cada palavra da briga. E, com bastante certeza, estaria amaldiçoando o nome dele e cuspindo fogo. Era natural que ele supusesse que ela estaria reagindo da mesma forma hoje. Ele meio que sorriu ao perceber isso.

— Algo bobo, sério. Ela havia feito um acordo com o Sr. Tuttle, que Titan receberia a égua dela, Black Lace. Quando comprei Titan, o acordo se tornou nulo. Ela pediu para manter o acordo, e eu recusei.

— Por quê? — Duncannon perguntou. — Não era parte dos seus planos? Que Titan procriasse além de correr? Por que não o fazer em conjunto de um dos melhores Haras da Inglaterra? Ela é proprietária do Haras Knight, não é?

Tate se virou para a casa mais uma vez.

— Sim. Ela herdou o local após a morte do pai, doze meses atrás.

— Então, qual é o problema?

O problema era que ele era um desgraçado teimoso que não queria dar a ela o que ela desejava. Nem mesmo quando ela foi tão educada no início. Revê-la excarcerou todos as mágoas pela rejeição dela. Por ela querer algo diferente, querer os livros em vez

o do amor dele. Que tipo de mulher recusava um futuro duque? Que mulher dava às costas para o amor que ele acreditava que eles sentiam um pelo outro? Que tipo de mulher poderia ser tão insensível com palavras de sentimentos e assuntos do coração?

Uma mulher que colocava sua própria ambição antes de qualquer outra coisa. E Tate faria o mesmo. Com Titan em seus estábulos, o garanhão era o primeiro passo na direção de se tornar uma verdadeira concorrência aos Knight, e iniciar seu próprio programa de reprodução e gerar futuros vencedores. Ele não daria a ela a oportunidade de vencê-lo outra vez, nem nos negócios, nem a nível pessoal.

— Eu mudei de ideia. — disse ele, dando de ombros.

— Mudou de ideia? Mesmo? A mim parece que você está tomando essa decisão com base no que aconteceu entre os dois anos atrás. Talvez você devesse aceitar a oferta, mas com a condição de que caso a égua desse a luz à um potro vencedor, você receberia metade dos lucros gerados em sua vida de corredor.

Tate virou-se para encará-lo.

— Ela nunca concordaria com tais termos. A oferta era para pagar para Titan receber a égua, ela não aceitaria a divisão de lucros.

— O haras produziu cinquenta vencedores nos últimos dez anos.

Você pode abocanhar uma fatia dos lucros. Se ela deseja que Titan seja usado no programa dela, ela precisa concordar. — Duncannon disse, as engrenagens da mente de negócios dele girando por um instante.

Duncannon era um homem astuto, e parte do que ele dizia fazia sentido. Sem dúvida ajudaria suas finanças ter uma égua que

gerasse um vencedor. E ter um cavalo junto ao Haras Knight decerto que o ajudaria a elevar o nome dele junto à comunidade do Turfe.

Ele refletiu a ideia por um momento.

Ava não ficaria satisfeita com esse desdobramento, e Tate sorriu ante a chance de irritá-la ainda mais. Mesmo que só para ver os olhos dela o fulminarem.

— Vou pensar no assunto. — ele disse antes de entrar na casa.

Pensaria em todas as maneiras de contar à Ava seus termos e observar aquela pequena diaba tornar-se ainda mais insatisfeita.

Tate afastou a ideia de que faria a contraoferta apenas para passar mais algum tempo perto dela.

Ela não merecia a atenção dele e, no entanto, ao entrar na biblioteca, de algum modo, seus passos mostraram-se mais leves do que antes.

Ele não conseguia adivinhar o motivo...

CAPÍTULO 3

Ao olhar para a paisagem francesa, muito parecida e diferente de onde crescemos, me pergunto se voltaremos a nos ver...

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

U MA SEMANA DEPOIS, Ava estava deitada na cama e olhava para o livro não lido no colo, pensando em um certo duque que havia sigo jogado na vida dela outra vez.

Apenas cinco quilômetros era o que os separava, e ainda assim não era longe o suficiente. Se ao menos um oceano os mantivesse separados, ela ficaria muito satisfeita. Após a conversa desastrosa na semana anterior, ela não vira nem ouvira falar dele. Não que ela ansiasse por notícias, mas houve um tempo em que ela não passava um dia sem estar perto dele. Se apenas para lhe dizer o quanto ela sentia falta dele e, talvez, uma fuga furtiva para trocar um beijo ou dois.

Gritos no quintal chamaram sua atenção e largando o livro na cama, ela correu para a janela. Ava olhou para os estábulos, que ela podia ver do quarto, mas não viu nada de errado. Os homens corriam em direção ao celeiro onde as carroças estavam guardadas e os ouviu gritando ordens para pegar sacos de juta e baldes, pavor a atravessou de que os estábulos localizados no lado oposto de sua casa pudessem estar em chamas.

Ava correu para o armário e, vestiu as roupas separadas para aquele dia, tropeçou entrando no quarto de vestir para procurar suas botas curtas quando viu um brilho laranja beijar o céu noturno. Um brilho vermelho e doentio vindo da direção da propriedade de Tate.

Ela parou por um momento, ainda atordoada com o que estava vendo. Seriam os estábulos ou a casa? Ava terminou de se vestir com pressa, calçando as botas sem meias. Desceu as escadas correndo, chamando os criados para segui-la e, em poucos minutos, aqueles que podiam cavalgar estavam em seu encalço, rumo à propriedade de Tate, os demais se dividiam entre carroças e carruagens de alta velocidade.

Quanto mais perto chegavam à propriedade ducal, mais intenso era o brilho no céu noturno e, ao espreitar a colina que ela havia percorrido apenas uma semana antes, seus piores medos tornaram-se realidade. Os estábulos estavam em chamas, e alguns homens lutavam contra o fogo, enquanto outros tentavam, como desesperados, arrancar a machadadas as paredes laterais da estrutura de madeira para libertar os cavalos.

Deixando os cavalos em um campo próximo, eles correram em direção ao fogo, o encarregado dos estábulos dela entregou um saco de juta para que ela ajudasse. O calor do fogo espreitou sua pele quando se aproximaram e, molhando a saca em uma calha próxima, ela começou a bater contra as chamas altas que lambiam a madeira de vários edifícios.

Os cavalos estavam correndo selvagens e assustados para a noite, e tudo o que ela podia esperar era que todos cavalos fossem poupados. Para ela, prédios poderiam queimar até virar pó, mas as vidas dos cavalos eram insubstituíveis.

Mais gritos soaram atrás dela. e ela girou naquela direção. Ela observou o segundo e maior estábulo pegando fogo, um monte de

palha dentro das portas duplas da frente fumegando, as chamas iluminando tudo. Ela fechou os olhos que já ardiam quando a fumaça soprou em seu rosto e os abriu de novo, ela não conseguiu identificar o homem que os notificou antes de correr em outra direção.

— O segundo estábulo. — ela gritou, correndo para lá.

De onde ela estava, Ava podia ver vários cavalos enfiando a cabeça sobre as portas das baias lá dentro, encarando o fogo, alguns outros corriam pelas baias, chutando as paredes.

Sem pensar, ela correu para dentro e se pôs a abrir as portas de cada baia o mais rápido que pudesse. Ela cobriu a boca com uma saca de juta, tropeçou e tateou ao longo das portas até encontrar a porta da segunda baia. Ela a destrancou também, o cavalo ali disparou e a empurrou para trás.

— Ava. — ela ouviu a voz familiar de Tate gritar, e ficando de joelhos, ela piscou enquanto seus olhos ardiam com a fumaça que enchia o espaço.

— Eu estou bem. Há mais cavalos aqui atrás. — disse ela, levantando-se e indo em direção aos sons aterrorizados dos animais.

Quando isso acabasse, ela diria ao duque que, para um estábulo ser seguro, tanto para animais quanto pessoas, os dois lados precisavam ter saídas. Um pensamento bobo naquele momento, mas que ainda assim cruzou sua mente. Ava soltou os dois últimos cavalos daquele lado e correu para o lado oposto, e no mesmo instante o duque a encontrou na última baia.

Ele forçou o trinco, mas não abria.

— Não abre. — ele gritou, tossindo. — Está trancado.

Ava se virou quando as chamas começaram a lamber as paredes das portas da baia oposta a eles. Olhando em volta, ela viu

um machado em uma parede próxima e, correndo até a ferramenta, a agarrou.

— Aqui! Tate, use isso.

Ele a encarou por um momento, como se uma segunda cabeça tivesse crescido no pescoço dela, até que um painel caiu detrás deles, e ele recobrasse os sentidos.

— Obrigado.

Ele bateu com o machado uma vez, duas vezes no trinco da porta e ela se soltou, permitindo que eles a abrissem e libertassem Titan. O garanhão disparou para fora e, quando estavam prestes a seguir o cavalo, a frente do estábulo caiu, prendendo-os dentro.

— Tate. — disse ela, apertando a camisa dele. — Existe uma janela ou porta neste lado?

Não que ela tivesse visto algo do gênero, mas enfim, os estábulos eram dele, talvez ela não tivesse visto em meio à fumaça e ao fogo.

— Não. — ele respondeu, puxando-a para uma baia próxima e fechando a porta.

Não que fosse capaz de manter o fogo longe, mas impediria que a palha em que estavam pisando pegasse fogo antes do necessário.

— Afaste-se, Ava. — disse ele, balançando o machado alto e o descendo na parede do estábulo.

A fumaça ficava cada vez mais espessa, e Ava foi para a parede, tentando respirar o ar que deslizava entre pequenas rachaduras nas tábuas de madeira. Do lado de fora, ela podia ouvir homens batendo na parede no mesmo local em que Tate a acertava. Ela tentou se concentrar na pequena quantidade de ar fresco que estava conseguindo inalar, mas o calor do fogo às suas costas fez o pânico assentar em seu estômago.

— Rápido, Tate. Não consigo respirar.

Um pedaço de madeira caiu na direção deles, depois mais pedaços, e com a intrusão dos homens que estavam do lado de fora, ar fresco também entrou. Infelizmente, esse ar apenas aumentou a ira do fogo detrás deles. As pernas dela se recusavam a se mover. Ela tentou rastejar para fora, mas seu corpo não cooperou.

— Ava. — disse Tate perto dela, antes de a erguer em seus braços familiares e reconfortantes.

Ela tossiu quando ele atravessou o buraco na parede, meio correndo e meio afastando-os do estábulo antes de cair no chão com ela nos braços.

Ela rolou no chão, tossindo e ofegando, e em algum momento alguém passou um copo de água para ela. Ava se virou e viu Tate deitado ao lado dela, ele também estava tentando recuperar o fôlego. Ela foi até ele e afastou os cabelos do rosto, esperando que ele encontrasse seus olhos.

— Você está bem? Se machucou em algum lugar?

Ele estendeu a mão, passando a mão pela bochecha dela. A ação trouxe lágrimas aos olhos dela por ele quase ter morrido.

Ambos quase morreram.

— Você parece um limpador de chaminés.

Ela riu apesar de si e da situação não ter nada de engraçado. —

Você está fazendo piadas, Sua Graça? Em um momento como esse... — ela disse, com a voz rouca, a respiração ofegante e com um chiado.

Ele lançou um sorriso travesso.

— Acredito que em momentos como este, é preciso um pouco de diversão.

Ele se forçou a sentar, e ela sentou ao lado dele. Eles ficaram em silêncio por um momento enquanto o estábulo ardia diante

deles, o primeiro estábulo que ela lutara para salvar agora não passava de uma pilha carbonizada de madeira fumegante.

O administrador do duque se aproximou deles, ajoelhando-se:

— Todos os cavalos e trabalhadores foram contabilizados, Sua Graça. Estão no cercado perto da casa. Estamos os alimentando para tentar acalmá-los.

O duque assentiu uma vez.

— Algum dos homens sabe como o incêndio começou? Não havia vento, não havia razão para o segundo estábulo ser consumido daquela forma.

Ava lembrou-se de ouvir gritos detrás dela quando tentava combater o fogo no primeiro estábulo, mas o rosto do homem era tão nebuloso quando sua visão neste momento.

— Pelo que vi, o fogo começou na palha que havia sido empilhada no centro do estábulo depois de limpar as baias. Ouvi gritos, como se alguém estivesse nos alertando sobre essa nova ameaça, mas não sei dizer quem era. Não pensa que foi proposital, pensa?

E se fosse esse o caso, onde estava o culpado?

Ela sentiu uma nova onda de pânico a atravessar.

Com todos os seus cavalariços aqui lutando contra as chamas na propriedade do duque, seus próprios cavalos estavam sozinhos, sem proteção. Ela se levantou, e o administrador de Tate a empurrou de volta, para se sentar.

— Seu encarregado e alguns cavalariços voltaram para a sua propriedade, senhorita Knight. Tenho certeza de que já teríamos notícias deles se algo estivesse errado.

Tate sentou-se ao lado dela, e ela o estudou por um momento, feliz por ver que ele parecia estar respirando com um pouco mais de facilidade.

— Teremos que abrigar os cavalos em algum lugar até que os estábulos sejam demolidos e reconstruídos. Eles não podem ficar nos campos.

O administrador dele encontrou o olhar dela e sem que ele precisasse verbalizar, ela sabia o que ele esperava dela.

— É claro que seus animais são bem-vindos em meus estábulos, Sua Graça. Há baias suficientes para eles. — ela ofereceu, nunca fora de se esquivar de ajudar quem precisava.

Mesmo que esse alguém fosse o duque, e que eles fossem quase o oposto de amigos. Mas os cavalos precisavam de um teto, e amando animais tanto quanto ela amava, não os deixaria no frio, mesmo que não estivesse tão gelado no momento.

— Tem certeza, Srta. Knight? São mais de vinte. — disse o administrador, olhando de volta para onde os cavalos estavam, e vendo o fogo queimar o que restava da construção que haviam acabado de sair.

Ava suspirou, observando os cavalos.

— É claro que todos eles são bem-vindos.

O duque estendeu a mão e colocou sobre a dela. Calor, semelhante ao calor que sentiu nas costas quando estava no estábulo em chamas, a preencheu, e com o toque veio uma saudade de que ele a tocasse assim mais vezes.

Ela olhou para onde ele havia deixado a mão e a vontade de colocar a dela por cima era quase demais para negar.

Ava encontrou o olhar dele.

— Obrigado. — disse ele, estudando-a.

Ela lançou um pequeno sorriso para ele e, ficando de pé, limpou as calças e a blusa o melhor que pôde com as mãos.

— Não creio que há muito mais que eu possa fazer por você aqui, então vou voltar para casa e informar o Sr. Brown que você

levará os cavalos para nosso estabelecimento pela manhã.

— Obrigado. — repetiu o duque, olhando para cima de onde estava sentado. — De verdade, Ava. Muito obrigado.

O administrador partiu para resolver outros assuntos.

Ava se virou para absorver a devastação do que havia acontecido esta noite. Homens ainda lutavam para domar o fogo, mesmo que ele tivesse destruído tudo em seu caminho. A fumaça permeava o ar, todos ao redor deles cobertos de cinzas e fuligem, algumas roupas chamuscadas pelas chamas.

— Não importa o que tenha acontecido entre nós, Sua Graça, nunca darei as costas a alguém que precisa de ajuda.

Ava se virou e voltou para onde ela havia deixado a montaria dela, esperando que o cavalo ainda estivesse lá depois de toda a comoção. Muitos cavalos, aqueles que não estavam sendo diretamente cuidados, corriam pela área, os rabos erguidos no ar, era claro que estavam assustados e inquietos.

As pobres almas eram sortudas de estarem vivas, e se o incêndio era criminoso, significaria que todos em Berkshire era possíveis vítimas e precisariam ficar atentos. Ela havia trabalhado muito, já havia perdido muito em sua vida para que tudo virasse cinzas por um maníaco. E ela nunca iria se deixar abater sem lutar.

CAPÍTULO 4

N O DIA SEGUINTE, Ava acordou cedo, mesmo com a noite que tivera. Alguns minutos depois do café-da-manhã, os cavalos da propriedade do duque começaram a chegar junto com seus cavalariços e treinadores que ficariam e ajudariam a cuidar de todos os cavalos, com alimentação e exercícios diários.

Felizmente, no Haras Knight, Ava contava com seu próprio circuito, a uma distância de cinco minutos, onde os cavalos poderiam dar uma volta ou correr um pouco.

Ela estava sentada na cerca de madeira que dava para o pátio em que sua égua reprodutora, Black Lace, estava sendo laçada. Ela era um cavalo bonito, com o pelo cor de ébano e patas felpudas brancas. Esperava-se que ela também gerasse lindos potros.

A égua era de uma bela linhagem, mas o animal em si não teve bons tempos nas poucas corridas em que participou, portanto, Ava esperava que a égua gerasse um potro que pudesse ter a chance de ser um bom corredor.

O pai e a mãe de Black Lace tiveram carreiras mistas antes que os dois se aposentassem, e Ava os colocasse em seu programa reprodutor. Eles conseguiram gerar um primeiro lugar, mas a maioria chegou a segundos e terceiros lugares em suas participações, nada extraordinário, mas nada terrível. Tal histórico não significava que os potros de Black Lace teriam o mesmo destino.

Se ela quisesse que seu Haras sobrevivesse, ela teria que experimentar, tentar expandir e testar as teorias de criação. Uma carta deixada por seu pai com seus últimos desejos pedira que ela mantivesse o negócio vivo, que prosseguisse com os planos para

tornar este um dos Centros mais prestigiados e admirados do país.

Essa promessa nem sempre foi fácil de ser cumprida, e houve momentos em que ela foi excluída das chamadas para corridas, ou seus cavalos foram ignorados como opções para procriação pelo simples fato de que ela era uma mulher, mas isso não a impediu. Só a deixou mais determinada a ter sucesso, e agora nada ficaria no caminho de tornar o Haras Knight uma força a ser reconhecida. Um nome a ser tão reconhecido como Tattersalls, ao menos no que se refere ao mercado de cavalos premiados.

Em um passado distante ela quis construir uma vida com Tate, deixar a vida aqui para trás, mas nunca quis deixar o mundo das corridas por completo. Tate e ela queriam ter seu próprio estabelecimento, tornarem-se confiáveis e procurados por eles mesmos. A morte de seu pai lhe ofereceu a chance de assumir esse papel, mesmo sendo uma mulher e solteira.

Ela não deixaria a Sociedade e suas opiniões e protocolos se colocassem em seu caminho; e não se casaria apenas para tornar sua posição no Haras mais aceitável, mais respeitável no mundo dominado por homens em que ela estava inserida.

Ava olhou para os estábulos e ficou feliz em ver que cavalariços e os tratadores pareciam tratar-se bem, mas mesmo a partir de onde estava ela percebia que estavam cansados e precisavam de uma boa noite de descanso ininterrupta por desastres.

— O duque está chegando, senhorita Knight, e traz Titan com ele. — disse o administrador de seus estábulos ao parar onde ela estava.

Protegendo os olhos com as mãos, Ava olhou para a colina que o duque estava descendo. Mesmo com todos os anos desde a última vez que o vira, sua estrutura muscular sobre um cavalo ainda era um espetáculo à parte, um ótimo de se assistir. Os anos haviam

feito um bem imenso a ele, transformaram o menino que ela conheceu em um homem. Um homem que ela concordava com relutância ainda ser tão bonito que era pecaminoso.

Ava pensou na noite anterior, neles deitados no chão depois de escapar do fogo, o deslizar da mão dele contra sua bochecha enquanto ele verificava se ela estava bem. O olhar que ele deu a ela havia congelado o tempo, suspendido todas as mágoas que ele causara, e tudo o que importava naquele momento para ela, era saber se ele estava bem, sem ferimentos.

Ela estendeu a mão e tocou a própria bochecha, incapaz de negar que o toque dele a fez ansiar por coisas há muito enterradas.

Ele fora tão cuidadoso, tão gentil e delicado que ela não foi capaz de esconder como ele sempre foi capaz de fazê-la sentir.

Viva...

Teria ele notado o desejo dela? Só podia esperar que, no caos da noite que passaram, não fosse esse o caso.

— Coloque Titan no estábulo oeste. As baias lá são maiores, adequadas ao porte dele. Ele ficará mais confortável lá.

— É para já, senhorita. — disse Greg, dirigindo-se ao duque que havia parado e estava conversando com o pessoal dela e dele perto de uma calha.

Ele olhou para ela e assentiu em reconhecimento, e Ava fez o mesmo antes de voltar a olhar para a égua, que continuava a ser treinada no laço.

Ela supôs que teria que ir falar com ele e discutir os arranjos para ele dormir lá enquanto seus cavalos estivessem na propriedade dela. Conhecendo tão bem o duque, ela não acreditava que ele voltaria para casa sozinho. Não que ela pudesse oferecer uma cama sob o teto dela, sendo solteira e não tendo companhia.

Mas havia uma cabana que ela havia reformado no ano anterior,

que ficava perto do riacho natural da propriedade e não ficava longe dos estábulos.

O duque poderia ficar lá e, sendo assim, estar perto o suficiente para ficar de olho em seus cavalos e na continuação do treinamento dos animais enquanto seus próprios estábulos eram reconstruídos.

— Banhe Black Lace após o treino e certifique-se de que ela receba uma boa massagem. Acho que ela merece ganhar aveia esta noite. — o tratador mergulhou o chapéu e pôs-se a trotar com Black Lace.

Ava pulou e foi em direção aos estábulos a oeste.

Estava na hora de discutirem como fariam dali para frente, agora que o duque estava ali. Quando ela enfim chegou aos estábulos, o duque e Titan haviam desaparecido construção adentro. Ela entrou e foi até a baia onde Titan havia sido instalado, deu um tapinha no garanhão quando ele se aproximou dela e cutucou sua mão.

— Ele gosta de você. — disse o duque, parando ao lado dela, com um maço de feno na mão. Ele passou o braço por cima da porta da baia e depositou o feno na calha de alimentação. Com comida à disposição, Titan a deixou e foi mordiscar o feno.

— Ele é um cavalo bonito e amoroso, pelo que parece. Mimado, talvez. — disse ela, sorrindo para o duque que sorriu de volta.

Ó, como ela sentiu falta daquele sorriso...

— Eu o mimo, e ele estava bem em casa, ao menos até o incêndio. Não sei ao certo que tipo de problemas podemos ter, daqui para frente, com os cavalos ainda assustados pela noite passada.

Algumas éguas podem abortar.

Ava assentiu, sabendo muito bem que os cavalos podiam ficar bem assustados após um evento tão traumático. Ela só podia esperar que não fosse o caso de nenhum dos cavalos do duque.

— Eles logo se acomodam e saberão que estão bastante seguros aqui, e eu instruí meus cavalariços e tratadores a se revezarem na observação dos estábulos e celeiros da propriedade.

— Mandei chamar um agente de Bow Street para investigar o incêndio. Não consigo evitar de pensar que foi proposital.

Ava recordou-se do homem que ouviu gritar, notificando-os do outro foco de incêndio. Seria ele, o homem que começou tal destruição e, se sim, por quê? Por que alguém desejaria ferir cavalos que estavam trancados em baias e indefesos contra tais ações?

— Você tem alguma ideia de quem pode querer ferir você e seus cavalos? Se envolveu em alguma discussão recente? — ela perguntou, encontrando seu olhar.

O duque lançou um olhar divertido para ela.

— Além de você, ninguém.

Ela deu uma risada ante a tentativa de piada e estendeu a mão para dar carinho a Titan.

— Bem, você sabe que eu nunca faria uma coisa dessas, então outra pessoa guarda ressentimento contra você, Sua Graça. Você precisa descobrir quem.

— Hm. — ele disse, virando-se contra a porta e cruzando os braços contra o peito.

Ela olhou para o cavalo, pois a ação apenas acentuava os músculos no peito de Tate. Ah, sim, ele havia mudado e, para ainda mais delicioso.

— Eu precisei demitir um rapaz que trabalhava nos estábulos porque havia tentado se engraçar com uma das criadas da casa, vinha assediando a moça e tentou obter liberdades indesejadas.

Suponho que poderia ser ele, mas não o vi, nem ouvi nada acerca

de ele ainda estar em Berkshire, trabalhando em outro lugar, então duvido que isso seja uma pista.

— Se eu fosse você diria ao investigador assim mesmo, deixe que ele julgue as pistas. Nesse ramo, podemos ser civilizados e agir como se a corrida fosse um esporte de cavalheiros, mas, na verdade, todos temos muitos inimigos, sendo o ciúme o principal.

Lorde Oakes passou pela mente de Ava ante a palavra ciúmes e, na mesma hora, descartou a noção de que ele poderia estar envolvido.

Ele não ousaria.

— Neste caso eu teria pensado que seus estábulos estariam em maior perigo que os meus. Seus cavalos ganharam mais prêmios nos últimos eventos. Eu temi, enquanto todos lutavam para apagar o fogo em Cleremore Hall, que o seu sustento pudesse estar em risco.

Era um medo que Ava também sentiu, mas felizmente seus estábulos e cavalos estavam bem quando ela e seus homens voltaram. Pensar em perder os animais que tanto amava, que haviam sido sua companhia e salvação durante o enfrentamento de tantos problemas em sua vida, a enchia de pavor.

Se o que o duque dizia era verdade, precisavam encontrar o culpado e trancafiá-lo em uma cela onde não poderia machucar homem ou animal nenhum.

— Quando vi o brilho do fogo em sua propriedade, nem pensei em deixar alguém aqui para vigiar meus cavalos. Um erro tolo que não voltarei a cometer. Estamos muito agradecidos por ninguém daqui ter sido colocado em perigo. E estamos felizes que seus cavalos também estejam aqui. A estada me dará tempo de convencê-lo a permitir que Titan procrie com Black Lace.

À menção de seu nome, o garanhão levantou a cabeça e olhou na direção deles.

Ava riu, estendendo a mão para dar um tapinha no nariz aveludado e macio do cavalo.

— Que travesso você é. — ela murmurou para o cavalo, olhando de esguelha para o duque que estava parado ali ainda.

— Me esqueci disso. — ele a observou com atenção, e Ava lutou para não cruzar com o olhar dele.

Para não se arriscar a perder-se mais uma vez naquelas orbes cinzentas e escuras que eram como um mar tempestuoso e rodopiante.

— Esqueceu-se de quê, Sua Graça? — ela não deveria perguntar, mas quando se tratava do duque, era raro ela conseguir se conter.

Como uma mariposa atraída para a parte mais quente da chama, ela também era atraída a qualquer opinião que ele pudesse ter que envolvesse os dois. Que envolvesse o passado compartilhado, quando lutar um pelo outro era tudo o que era valoroso.

— Como você era com cavalos. O quanto você os ama.

— Eu os adoro. — ela suspirou, afastando-se da baia. — Mas não são a única coisa que amei.

— Ainda lê romances góticos e se esgueira no meio da noite para contar as estrelas? — ele perguntou sorrindo.

Ela sentiu-se esquentar, um calor reconfortante e familiar, de que o homem à sua frente a conhecia, melhor do que qualquer outra pessoa no mundo.

— É claro, embora eu não precise mais sair às escondidas, só preciso abrir a porta da frente.

— Verdade. — disse ele, olhando para o céu azul acima deles.

— Lembra-se das vezes que nos encontrávamos perto do lago em minha propriedade, na calada da noite. Você estava tão

determinado a desenhar a lua cheia que quase congelei até a morte esperando que você a desenhasse.

— Quero que você saiba que meu pai, mesmo que nunca tenha me questionado sobre como um esboço daquele veio parar nas minhas mãos, gostava muito do desenho. Ele até o enquadrou. Está pendurado na biblioteca.

Ava suspirou, pensando naquela noite. Foi a primeira vez que eles se beijaram, não como conhecidos, nem como amigos. Mas como amantes, como um casal que ansiava por mais do que mera familiaridade.

Encontrando o olhar do duque, o fogo que ela leu nos olhos dele dizia que ele se lembrava daquela noite tão bem quanto ela.

Ava limpou a garganta.

— Talvez devêssemos discutir o que fará agora que todos os seus cavalos estão aqui. Há um chalé que reformei há pouco, é separado da residência dos funcionários, mas ainda é perto o bastante para ver os pátios, os celeiros e os estábulos, se você quiser. Eu o convidaria para ficar na casa principal, mas bem, você sabe que não seria nada adequado.

Os olhos dele escureceram ante a menção da palavra adequado e o significado escondido nela.

— É aquele chalé antigo em que sua cozinheira, a Sra. Gill costumava morar?

— Sim, esse mesmo. Ela deixou de trabalhar conosco faz uns anos, e a nova cozinheira preferiu ficar na casa principal. — ela foi em direção às portas do estábulo. — Venha, vou levá-lo até lá agora e aí você decide se servirá.

Eles caminharam através dos quintais, atravessaram o prado que ficava nos fundos da casa dela, e logo chegaram ao pequeno

chalé que ficava em frente ao riacho. Ava se virou e gesticulou em direção à vista.

— Daqui é possível ver toda a extensão da propriedade com exceção da frente da casa principal.

Ele assimilou a informação e assentiu.

— Me servirá muito bem. — ele voltou-se para ela. — O que aconteceu com a Sra. Gill. Eu sempre gostei tanto dos...

— Biscoitos amanteigados? — Ava respondeu por ele. — Sim, eu me lembro. — ignorando a familiaridade entre eles, ela abriu a porta do chalé e entrou na casa de três cômodos. — A filha dela, que trabalhava para uma família em Kent, casou-se com um padeiro e a chamou para morar com eles. A Sra. Gill viveu com a filha por mais ou menos dois anos, mas adoeceu no outono passado e, por infortúnio, veio a falecer.

— Sinto muito por ouvir isso. Ela era uma mulher adorável, muito apreciada pela equipe, pelo que me lembro.

Ava sorriu, rememorando.

— Ela era adorável e faz muita falta. Creio que os doces feitos por aqui jamais tiveram o gosto tão bom quanto os dela.

O duque entrou e inspecionou a cozinha modesta, o quarto e o banheiro da suíte. Ava o analisou por um breve instante, havia se esquecido como se conheciam bem. Da quantidade de tempo que eles passaram na companhia um do outro ao longo dos anos.

O chalé estava em ótimo estado, o piso era de madeira, havia um grande tapete trançado embaixo da pequena mesa colocada perto do fogo. No quarto havia uma grande cama sem estar arrumada, o cômodo contava com uma pequena janela que estava ornada com cortinas de veludo azul. O banheiro era composto de um jarro e uma tigela, um lavatório, um pequena banheira e um penico que estava no chão.

— Servirá muito bem, obrigado.

— Pedirei que as criadas venham e façam a cama todos os dias, além de trazer sempre roupa de cama e água limpa. É claro que não precisa comer aqui, é mais que bem-vindo para fazer o desjejum e jantar comigo na casa principal.

Ava não conseguia identificar de onde vinha seu fracasso em deixá-lo afastado e sozinho. O duque não se encaixava nos seus planos para o futuro. Durante anos, ela se educou para seguir em frente, para não precisar da opinião ou apoio dele. Inalar fogo e fumaça havia causado claros estragos ao seu cérebro.

Ava fechou a boca com um estalo e se ocupou em inspecionar o forno. Ela estava sendo muito gentil com o duque, e eles estavam longe de estar de bem. Por que ela estava se esforçando para agradá-lo? Uma vozinha terrível sussurrou: “porque ainda se importa com ele, mesmo depois de todo esse tempo e de toda a dor que ele causara.” Fazendo uma última inspeção nas acomodações, ela foi em direção à porta.

— Vou deixá-lo descansar. — disse ela, não dando um passo antes que ele segurasse em seu braço, detendo-a.

— Obrigado, Ava, não apenas por acolher meus cavalos ou me dar permissão para usar esta casa, mas pela noite passada. Por vir em meu auxílio, por não sair do meu lado ou dos meus cavalos, quando ao ficar, você se colocou em grande perigo. Não me esquecerei de sua bondade.

Ela se afastou do toque dele, não gostando do fato de que seu corpo se recusava a permanecer indiferente a ele e a seu toque. Se eles iam permanecer na mesma propriedade por algumas semanas, era melhor ela começar a aprender a conviver com o duque e a não mostrar suas emoções como um livro aberto esperando para ser lido.

— Não foi nada, Sua Graça. Nada que você não faria por mim, tenho certeza.

Ela caminhou para casa, precisava se afastar da expressão de devoção que estava escrita em todo o rosto dele. A última coisa que ela precisava era que ele começasse a olhá-la dessa maneira. Do mesmo jeito que ele costumava quando eram jovens.

TATE SE ENCOSTOU no batente da porta do chalé enquanto Ava voltava para casa. O fato de ela estar usando calças e não um vestido, deu a ele a oportunidade perfeita para admirá-la por trás.

Ele fechou os punhos ao lado do corpo, quando a saudade pelo que foi perdido o dominou como se ele estivesse mergulhado em água.

Se ele tivesse ficado, se ela não o tivesse rejeitado no passado, eles estariam casados. Talvez até já fossem pais e seus filhos estivessem aprendendo tudo para assumir o papel de grande força no mundo das corridas.

O papel que eles criariam juntos contando apenas um com o outro. Teriam um filho que herdaria o título e, se fossem abençoados, uma filha que seria tão selvagem e incontrolável quanto a mãe.

Ele fechou a porta e se encostou nela.

Ele não precisava ficar na propriedade dos Knight, mas voltar para casa não era nada atraente para ele. Seus cavalos estavam aqui, e ele poderia pedir ao administrador dele que enviasse para cá os documentos que precisassem de sua atenção. Caso o que seu Chefe dos Estábulos havia dito mais cedo fosse verdade, e as evidências que encontraram nos escombros se mostrassem corretas, havia um incendiário em fuga.

Era melhor que ele estivesse perto de Ava, caso ela fosse a próxima vítima do demônio. Seu administrador cuidaria de Cleremore Hall até que os estábulos fossem reconstruídos e ele pudesse retornar. A verdade era que ele estava aqui na casa de Ava porque era onde ela estava, e agora que eles ao menos conseguiam trocar algumas palavras em paz, ele se via relutante em se afastar.

Ela sempre teve a capacidade de atraí-lo.

Fazer com que ele desejasse até mesmo a simplicidade de ouvir a voz dela ou vê-la ao longe, em um campo. Tate se afastou da porta e a abriu, precisava orientar o condutor dele acerca de onde levar suas malas. Pelo menos, essa tarefa manteria sua mente ocupada por um tempo em vez de se manter tão obcecado por uma mulher que arrancou seu coração do peito no que parecia tão recente quanto ontem.

Não tenho esperanças de que possamos ser outra coisa senão conhecidos no futuro, mas sei que sempre me importarei você. Você era meu amigo e sempre fará parte de mim. — Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

CAPÍTULO 5

Não tenho esperanças de que possamos ser outra coisa senão conhecidos no futuro, mas sei que sempre me importarei você. Você era meu amigo e sempre fará parte de mim.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

O MÊS SEGUINTE manteve todos ocupados tanto na propriedade de Ava e na reconstrução dos estábulos do duque em sua propriedade. Algumas vezes, Tate pediu a ela uma opinião sobre o layout e o design das novas baias e estábulos, e juntos eles criaram o que seriam soluções modernas e práticas para quaisquer problemas que ocorreram no passado.

E o mais importante, os estábulos eram de tijolo em vez de madeira e todos seriam construídos com uma segunda porta de acesso, para evitar situações de bloqueio como aconteceu no incêndio.

Ava sentou-se atrás de sua mesa na biblioteca e recostou-se na cadeira, olhando para o jardim. O dia havia começado com prenúncio de tempestade e, portanto, muitas das atividades que ela havia planejado para o dia foram adiadas para o dia seguinte.

Ela levantou-se e caminhou até a janela e olhou para o pequeno chalé que o duque adotara como lar nas últimas semanas. Na maioria das noites, ele vinha jantar com ela e, infelizmente, a cada noite, Ava era lembrada de como poderiam ter sido. Do que ela

havia perdido quando Tate escolheu um caminho diferente daquele que eles haviam planejado.

Em nenhum momento os dois conversaram acerca do que houve entre os dois. Na verdade, ambos pareciam ter o cuidado de nunca trazer à tona o passado. Ela não mencionava a França, e ele não mencionava Nova York. Não era surpresa que eles não iriam poder continuar dessa maneira. Era claro que havia um tabu a ser discutido. Ava, em especial, precisava saber o porquê. Por que ele mentiu, por que não a amara como ela acreditava que ele a amava.

Precisava saber como ele chegara à conclusão de que, depois de todo o tempo que passaram juntos, uma carta destruindo seus sonhos era tudo o que ela merecia. Uma carta entregue ao pai dela, e não à ela.

Por que ele não fora capaz de dizer ele mesmo?

Com a chuva batendo contra a vidraça, o pequeno brilho da luz de velas no chalé estava embaçado, uma pequena nuvem de fumaça flutuava para o céu pela chaminé. O jantar não estava muito longe, e ele viria...

Ela se virou e foi para o quarto, banhou-se depressa e depois se vestiria com a ajuda de sua dama de companhia. Na maioria dos dias ela usava calças masculinas e prestava pouca atenção aos cabelos ou mesmo se as botas estavam limpas. Mas esta noite ela resolvera usar um dos vestidos novos que encomendara durante uma visita à Londres no mês anterior, viagem feita para garantir que seu administrador comprasse um potro que ela queria.

Madame Lanchester a recebera sem problemas e suas habilidades como costureira eram melhores do que Ava esperava.

Ao longo dos anos em que estiveram separados, Ava chegou a cogitar, mais de uma vez, que a razão para o duque não ir em frente com os planos deles foi porque ela era muito rude, sem uma

educação apropriada. Que ela não havia estudado o suficiente, ou não conhecia o bastante das artes como a maioria das damas da sociedade que se tornavam duquesas.

Durante meses, ela ficava acordada à noite, imaginando se o uso de calças e chapéus de palha fora de moda o haviam feito desistir dela. Quem com o tempo ele percebeu que ela nunca seria uma boa duquesa.

O que era perfeitamente correto, ela não seria, pelo menos não agora, muita coisa havia acontecido nos cinco anos desde que eles se separaram. Com certeza ela não era do feitio para um ducado agora, mas isso não significava que ela não poderia de vestir bem e mostrar ao duque que as pessoas precisam olhar além da camada exterior, que é necessário valorizar o que se tem por dentro. Talvez ele se esquecera do que havia visto nela.

Ava se olhou no espelho. A camisola de musselina bordada era simplesmente a roupa íntima mais bonita que ela possuía e era quase bonita demais para se cobrir com um vestido.

— Srta. Ava, que vestido você gostaria de usar? — a criada abriu o armário e começou a inspecionar os poucos vestidos que ela possuía.

— O de seda bronze com rendas e bordas de pérolas, e eu gostaria que você, por favor, penteasse meus cabelos em cachos macios no topo da cabeça, Jane, se for possível.

A moça sorriu, ocupando-se da preparação do vestido.

— Ó, você ficará linda esta noite, senhorita Ava. Além disso, eu tenho praticado alguns penteados franceses para usar em seus cabelos. Vai ficar muito bonito junto do vestido.

E Ava precisava admitir, ao olhar de relance para o vestido deitado em sua cama, que o decote era bem baixo. Uma delicada fita de um tom mais claro de bronze passava por baixo da linha dos

seios, e um delicado padrão de flor de lis em renda e pérolas traçava toda a bainha.

— Obrigada, Jane. — Ava sorriu para a criada, ansiosa para a noite começar.

Durante a hora seguinte, Jane mexeu nos cabelos de Ava, puxando-os de forma estilosa, não era o jeito simples e usual de amarrar tudo com uma fita. E então ela estava pronta.

O som de vozes masculinas vinha do andar de baixo, e Ava trocou um olhar com a criada.

— Vou descer, Srta. Ava, e dizer à equipe da cozinha para começar a servir assim que a senhorita chegar ao andar de baixo.

— Obrigada, Jane. — Ava voltou-se para o espelho e estudou a própria aparência.

A criada fizera maravilhas com os cabelos dela e, de alguma forma, a mulher que treinava cavalos de corrida, usava calças e limpava estábulos ao lado dos funcionários desapareceu. Em seu lugar, havia uma mulher que era a dona de sua própria vida no reflexo.

Tate partira o coração dela, mas não seu espírito. E o diabinho nela queria mostrar o que ele havia perdido. O que ele nunca mais teria.

Piscando para voltar para o presente, ela sorriu e virou-se para sair, pegou o xale e o colocou sobre os ombros. O vestido ondulou em torno dela, frio e macio, e ela teve a sensação esmagadora de estar quase nua.

Fazia muito tempo desde que ela havia participado de um baile, festa ou mesmo um jantar mais formal. Quando em casa, ela nunca seguia as regras estritas da sociedade, o que a fez supor que esta poderia ser uma das razões pelas quais Tate fugira para os Estados Unidos em vez de se casar com ela. Ava verificou o vestido

enquanto descia as escadas, e seus passos vacilaram ao ver que Tate a esperava lá embaixo.

O homem que usou calças bege e camisas sujas na última semana havia sumido. O homem; que exercitava os cavalos e ajudava a construir os novos estábulos, além de percorrer as duas propriedades todos os dias para estar a par de tudo o que precisava saber, não estava ali. O homem empoeirado, amarrotado ou cheio de lama, dependendo do clima inglês, desaparecera.

Diante dela estava um duque.

O garoto que ela amara e o homem que ela passou a respeitar de várias maneiras. As calças de pele de gamo e botas pretas e brilhantes até o joelho, o colete prateado, a camisa engomada e o lenço encaixado à perfeição.

Bem, o vocabulário dela desapareceu por um instante.

Ela nunca pensou que ele pudesse se tornar mais atraente do que naquele momento. Ela o imaginara vestido assim quando fantasiava o casamento deles em Gretna Green, antes de ele partir para a América.

Ela afastou a lembrança, não queria estragar seu humor. Desceu o último degrau, e ele baixou a cabeça em um pequeno cumprimento, mas ela não deixou de notar o lampejo de consciência que passou pelos olhos dele. Ele também gostava do que via? Teria se arrependido da escolha que fizera? Ela nutria uma pequena esperança de que sim.

TATE APROVEITOU a oportunidade, enquanto se curvava para Ava, para trazer indiferença aos próprios traços e não mostrar o que ele realmente sentia toda vez que via a mulher diante dele. O desejo

avassalador de cair de joelhos e pedir que ela dissesse por que se afastara do amor dele há tantos anos.

Ela não havia se casado, o que era a primeira razão para afastá-

lo que ele imaginou que ouviria ao chegar dos Estados Unidos, mas nenhuma notícia parecida havia chegado o que apenas o deixou mais inquieto para descobrir a verdade. Por que ela não o amava mais? Por que ela enviou a ele aquela carta fria e insensível na noite anterior à fuga deles?

Os pais dele não disseram muito além de informar que ela havia partido para estudar fora e que parecia gostar muitíssimo do aprendizado, que ela não sentia falta de casa, nem daqueles que deixou para trás. A mudança de caráter havia sido tão extrema e distante da Ava que ele conhecia que ele até considerou a possibilidade de que não fosse verdade. As pessoas poderiam mesmo ser tão falsas?

Ele fez um gesto para que ela tomasse seu braço, para levá-la até a sala de jantar. O cheiro inebriante de rosas permeava o ar e o deixou saudoso pelo passado.

Ele fechou os olhos por um momento para se recompor. Como um perfume poderia trazer de volta tantas memórias ele nunca entenderia, mas era a verdade.

Ela se sentou à mesa, e ele assimilou o vestido de seda adornado com rendas e fios de ouro. Era um modelo do auge da moda, e a silhueta dela mostrava-se mais do que agradável dentro dele. O corpo de uma menina havia dado lugar à uma mulher plena de feminilidade. Sentada em frente a ele estava uma mulher que agradaria até o mais rico dos homens.

Seus longos cachos castanhos avermelhados foram puxados para trás em um delicado penteado que acentuava seus ombros e pescoço perfeitos. Os olhos dela, grandes e claros, brilhavam de

prazer e os lábios brilhavam com o toque bem suave de ruge, um sorriso brincava ali. Esta noite, Aera uma visão de mulher feminina e de curvas suaves, de inferno e danação.

Ela estava linda.

Um lacaio próximo serviu taças de vinho e, sentando-se onde lhe era designado, Tate esperou o primeiro prato ser servido. Ava se ajeitou, colocando o guardanapo no colo antes de encontrar o olhar dele do outro lado da bela mesa de mogno polido.

— Obrigada por vir estar noite, não estava certa de que viria hoje devido ao clima tempestuoso... — ela se interrompeu quando a sopa de legumes, quente e fumegante, foi colocada diante deles.

— Não me importo de caminhar, embora agradeça a carruagem que o Sr. Brown me enviou esta noite por causa da chuva. Mesmo sendo uma curta distância, a viagem foi bem menos úmida para os pés.

Tate quase revirou os olhos ante a banalidade da conversa.

Houve um tempo em que eles compartilhariam todos os tipos de pensamentos, sonhos e desejos. O fato de terem se perdido, perdido um ao outro, o enlouquecia.

Ele franziu a testa, virando-se para um dos criados.

— Vinho para nós dois. Obrigado.

O jovem fez uma reverência, e cumpriu as ordens com rapidez:

— Sim, Sua Graça.

Tate esperou que o vinho fosse servido.

— Chamaremos quando estivermos prontos para o próximo prato. Obrigado. — ele disse ele aos demais criados, e não falou mais até que todos corressem para fora da sala, e ele e Ava estivessem sozinhos.

Enfim...

— Há algo que eu gostaria de discutir com você, Ava, e talvez seja melhor que estejamos sozinhos para tal. E me perdoe, mas estou ansioso para saber algo que me incomoda há algum tempo.

Ela olhou para ele com olhos arregalados e baixou a taça de vinho depois de tomar um gole.

— Claro. O que precisa?

Ele se recostou na cadeira e ficou mexendo a colher na sopa sem atentar-se à refeição. Depois de um tempo, ele se forçou a dizer as palavras que estavam trancafiadas dentro dele há muitos anos.

— Por que você não fugiu comigo?

Ela baixou a colher, o rosto pálido.

— Por que eu não fugi com você? — ela riu, o som zombeteiro.

— Você está mesmo me fazendo essa pergunta?

Ele assentiu uma única vez.

— Por quê?

Ava o estudou por um momento, e ele pôde vê-la tentando entender por que ele fazia essa pergunta depois de todos esses anos. Mas se ele não soubesse a verdade por trás da decisão dela, e continuaria se sentindo como um louco.

— Eu saí de casa no meio da noite e fui para a nossa árvore.

Você não estava lá, mas meu pai sim. Ele me informou que você havia partido para Londres, que embarcaria de lá para os Estados Unidos. Ele contou que você havia me escrito e desistido, que dissera que acreditava que eu havia entendido errado nosso convívio. Que eu esperava uma conexão que nunca poderia acontecer, porque você era herdeiro de um ducado, e que nós não éramos uma família com conexões ou nobreza.

Um soco no estômago teria causado menos dor.

Tate pensou naquela noite e na situação que levou seus pais a entrar no quarto. Ele havia feito as malas cinco minutos antes e ficou agradecido por não terem visto a pequena maleta que estava em seu quarto de vestir. A mãe dele sentou-se na cadeira de couro diante da lareira, a que ele costumava usar para ler, o pai ficou parado atrás dela.

Tate enfiou a mão no bolso do paletó e tirou a carta que ele havia recuperado mais cedo naquele dia, na propriedade ducal, a carta que os pais haviam entregado a ele. Ele estava determinado a descobrir o motivo por trás da separação. Ele a entregou a Ava, e ela estendeu a mão para pegá-la sem questionar a ação e a desdobrou para ler.

Horror cruzou suas feições.

— Eu... é.... — ela mordeu o lábio ao chegar ao fim do bilhete. —

Eu não escrevi isso, Tate. — ela olhou para ele, choque dominava seu rosto bonito. — Nossos pais devem ter trabalhado juntos para nos separar. Meu pai... — ela fez uma pausa, com os olhos cheios de lágrimas. — Não acredito que ele me magoaria dessa maneira.

— por um momento, eles se entreolharam em silêncio antes de ela dizer: — Só posso deduzir disso que a carta que seu pai nos enviou em seu nome também não foi escrita por você. — ela redobrou a carta, deslizando-a sobre a mesa para ele. — Não trouxe a carta do seu pai comigo, mas eu a guardei. Mostrarei para você amanhã.

— Preciso vê-la agora. — ele exigiu, empurrando a cadeira ao ficar de pé.

Ele deu a volta na mesa e ajudou Ava a se levantar e, pegando a mão dela, puxou-a em direção à porta da sala de jantar. Fazia anos desde a última vez que ele a tocara daquela forma. Ter a mão enluvada dela envolta pela mão dele o fez recordar do que sentiu ao ter que suportar a ideia de que ela não o queria.

Uma mentira que ele agora acreditava com todas as suas forças que fora arquitetada pelos pais dos dois. Uma mentira que ele desvendaria. Viajaria para Londres e pediria à mãe que explicasse suas ações desprezíveis.

Ele abriu a porta e os criados, que esperavam por instruções se assustaram, ficando de pé atentos.

Ela não o desprezou.

Será que ela havia ficado tão desolada quanto ele por todos esses anos? A lembrança de como ele tentara esquecê-la. As muitas mulheres com quem ele dormira, as que ele mantinha de prontidão para saciar seus desejos, todas eram uma distração para um coração que clamava por uma mulher que acreditava estar perdida para ele. Como ele se redimiria...?

Entrando no corredor, eles subiram as escadas às pressas. Tate ignorou os olhares chocados e inquisitivos dos funcionários que assistiam a uma mulher solteira levar um duque para seus aposentos particulares.

Ele não dava a mínima para quais regras ele estava quebrando.

A raiva que zumbia em suas veias naquele mesmo minuto, por tudo o que seus pais haviam feito, afastou qualquer pensamento de certo e errado.

Ela parou à porta de um cômodo no final do corredor e, lançando um olhar nervoso para ele, entrou.

Tate encostou-se no batente da porta, não disposto a violar tanto assim o espaço privado dela e, ainda assim, pela primeira vez, vislumbrou seu aposento mais privativo, o quarto de dormir dela.

Um cômodo que ele imaginara exalar masculinidade sendo ela uma mulher que cavalgava e limpava estábulos com a mesma eficácia que os melhores ajudantes de estrebaria de Berkshire. Mas era todo decorado com tons suaves de azul e rosa. A mobília era

branca e, ao analisar o ambiente, lembrava a ele um campo de flores em um dia de verão.

Ava caminhou até uma mesa de cabeceira e abrindo a gaveta, puxou uma missiva dobrada. Ela voltou para ele, e entregou-a. Ele abriu e leu o conteúdo com rapidez. Seu estômago revirou. A letra era de sua mãe. Então ela estava envolvida no esquema para separá-los, um esquema que funcionou por anos a fio. Mas não mais. Não se Ava o quisesse de volta.

— Sinto muito, a caligrafia é de minha mãe. — ele dobrou o papel e devolveu a ela. — Eu não sei o que dizer além de que sinto muito, Ava. Não achei que nossas famílias pudessem ser tão cruéis a ponto de nos enganar, mas, infelizmente, parece que foi o que aconteceu.

Ela caminhou até a cama, devagar, e sentou-se na beirada.

— Eu avisei ao meu pai naquela noite que ele estava errado.

Que você viria, que não era do seu feitio não aparecer. Eu não conseguia acreditar que o garoto que eu amei pudesse fazer uma piada tão cruel comigo. Mentir na minha cara sobre o que ele em tese sentia por mim, apenas para me dar as costas e dizer que eu havia imaginado tudo.

Ele foi até ela e se ajoelhou, pegando a mão dela.

— Eu não poderia, eu não fiz isso com você. Nossas famílias fizeram isso conosco. Sinto muito, Ava e prometo que vou descobrir o porquê.

Tate tinha suas suspeitas de por que seus pais desaprovavam Ava. A posição social deles era tão diferente quanto o temperamento dos cavalos que agora dividiam o mesmo estábulo.

Sua mãe nunca aprovara a amizade deles e, agora que as cartas e o verdadeiro responsável pela separação dos dois haviam vindo à tona, ele a confrontaria e exigiria um pedido de desculpas.

Um para si e outro para Ava. Ele não era mais um marquês, agora era um duque e se casaria com quem bem quisesse.

Ela apertou a mão dele de volta.

— Por mais que isso me choque, Tate, estou feliz que descobrimos a verdade e que podemos seguir em frente, sem qualquer animosidade entre nós.

Os anos se passaram, e ele queria abraçá-la, cercar-se do aroma de rosas que sempre permeava o ar ao redor de Ava. Com certeza ele não queria que nenhuma animosidade entre eles continuasse, mas também não queria que permanecessem distantes. Ava já havia sido sua melhor amiga, seu coração, e ele daria qualquer coisa para reconquistá-la.

Ela puxou a mão, e ele se levantou, dando-lhe espaço.

— Seria melhor se saísse. Nós dois temos muito em que pensar.

Lamento interromper nosso jantar, mas acho que é o melhor.

— É claro. — disse ele, indo para a porta. — Desejo-lhe boa noite.

Tate fechou a porta atrás dele e inclinou-se por um momento para recuperar o fôlego. Era difícil saber o que fazer a partir de agora, como começar de novo. Por mais jovens que os dois fossem quando trocaram juras de amor, era amor mesmo. Verdadeiro e puro como o ar que respiravam.

Muitas coisas aconteceram desde então, muito tempo se passou. Sua própria vida em Londres não era algo de que ele se orgulhava. Ele se encolheu sabendo que suas canalhices haviam chegado a Berkshire, a Ava. Ele se comportara como um Lorde distante depois que seu pai faleceu, desejava enterrar-se nos divertimentos de Londres em vez de crescer e voltar para casa e assumir seu papel como deveria. Tudo porque ele estava bravo, não

apenas consigo mesmo, mas com as cartas que a vida o havia dado quando o assunto era Ava.

Tate foi para as escadas, precisava voltar para sua propriedade e organizar a ida à Londres. Ele precisava voltar para a cidade e confrontar a própria mãe pela cruel interferência em sua vida. A pessoa que sacramentou a perda da única mulher que o conhecia de verdade e o amava por ele mesmo, e não pelo que ele representava ou poderia oferecer.

Ele apertou a mandíbula.

Devido a suas ações descuidadas no passado, a viagem à cidade também significaria que ele teria que visitar a amante, não que alguém soubesse da existência dela, e se afastar. O confronto poderia não correr bem, e talvez fosse necessário oferecer uma recompensa financeira para a mulher. Só então ele poderia retornar a Berkshire e reconquistar sua dama.

Sua duquesa, como Ava sempre deveria ter sido.

CAPÍTULO 6

DEPOIS DE ENVIAR uma carta para Ava contando seus planos de viajar para a cidade, ele chegou a Londres bem tarde no dia seguinte, no momento em que a pequena temporada se iniciava. Tate pulou de sua carruagem enquanto os acendedores de lampiões andavam pelas ruas e acendiam os postes ao longo da calçada.

Tate foi direto para o White's, para conversar com seu bom amigo, Lorde Duncannon, a quem ele havia pedido, no mês passado, para voltar a Londres e contatar um agente de Bow Street.

Contudo, poucas evidências haviam sido descobertas já que não se sucederam mais ataques.

Ele entrou no vestíbulo e, antes que um lacaio pudesse pegar seu casaco, recebeu uma carta de Lorde Duncannon dizendo que estava preso em outro lugar e que iria se juntar a ele mais tarde do que haviam planejado.

Tate se virou e olhou para a rua, debatendo consigo mesmo se poderia adiar ver a mulher que aqueceu sua cama com certa regularidade durante o último ano dele na cidade. Como ele havia enviado uma missiva notificando-a de sua chegada iminente, ele sabia que a encontraria esperançosa de que tudo ia bem e que uma noite de paixão a aguardava.

Girando pelos calcanhares, ele chamou o condutor e começou a se odiar pelo fato de que teria que machucá-la. Fleur, Lady Clapham, viúva do visconde Clapham, não merecia esse tratamento. Não que ela aspirasse ser esposa dele, mas ele prometera não a fazer de boba perante a Sociedade, e os dois eram

vistos juntos em vários bailes e eventos. Ela era uma amiga, um conforto quando os vislumbres de fraqueza e solidão o atormentavam, aqui e ali, desde que ele retornou à Inglaterra.

A carruagem parou diante da casa de paredes de pedra de portland em Mayfair, e ele observou o prédio um momento antes de seu cavalariço abrir a porta. Tate pulou e subiu as escadas. O

mordomo o deixou entrar sem questionar ou se demorar, e Tate foi em direção ao salão da frente sem pestanejar.

Era ali que Fleur sempre gostara de o encontrar antes do interlúdio. A sala de visitas era o cômodo que ele menos gostava na casa, tendo sido decorada no tom mais vil de rosa, um que machucava os olhos.

O mordomo abriu e fechou a porta sem comentar, e dando um passo adiante na sala, Tate não pôde deixar de sorrir com a pose que Fleur escolhera para o esperar.

Sua Senhoria estava esparramada em um sofá cor de rosa, um braço atrás da cabeça de forma preguiçosa, enquanto o outro descansava sobre a barriga, parte do corpo visível através da camisola de seda que ela usava. Seus mamilos, de um rosa que combinavam com o ambiente, estavam eretos sob a roupa, e a mancha mais escura de cachos no ápice das coxas era visível.

Mesmo sabendo que ele nunca mais tomaria a mulher da maneira que ela ansiava, ele não poderia negar que ela era linda e que merecia muito mais do que a vida a havia dado, ele incluso. O

pai dela, um cavalheiro de terras no interior, passara por momentos difíceis e, com sua queda, seus filhos também sofreram. Lady Clapham fora dada em casamento para um visconde rico sem pensarem duas vezes. Agora cabia a ela dar apoio aos irmãos e encontrar bons partidos para todos quando a hora chegasse. Ela

havia se casado com um homem com o dobro de sua idade e um temperamento que diziam rivalizar com o próprio Hades.

— Tate, meu querido, onde você esteve? A pequena temporada está quase no fim, e não vimos você nos últimos meses. Cheguei a perder a esperança de que voltasse à cidade. Me senti tão só... —

ela disse, o olhar o percorrendo com luxúria não satisfeita.

Ele se sentou em uma cadeira que estava de frente para o sofá.

Fleur, sentindo que ele não a tomaria em seus braços, sentou-se ereta e fechou o roupão para proteger o corpo.

— Algo errado? — ela perguntou.

— Há algo que eu preciso falar com você e temo que não gostará do assunto.

Se ele conhecia Fleur, e a conhecia muito bem, ela não era uma mulher com quem se indispor, e ele não desejava se separar dela em maus lençóis. O que eles tiveram foi agradável enquanto durou, mas ele nunca deu nem um tico de falsas esperanças. Ele jamais ofereceu mais do que o acordado antes mesmo de os encontros começarem.

— Vou passar muito tempo em Berkshire, na minha propriedade.

Como você deve saber, houve um incêndio em meus estábulos no mês passado...

Fleur ofegou, inclinando-se para a frente.

— Um incêndio? Os danos foram extensos?

— Perdi dois blocos de estábulos e estou iniciando a reconstrução. Todos os meus cavalos tiveram que ser levados para o Haras Knight. Tive muita sorte de não perder nenhum dos animais.

A viscondessa recostou-se na cadeira, com um olhar de sabedoria.

— Este Haras não é de propriedade da senhorita Ava Knight?

Não foi ela a garota que deixou você há alguns anos?

Tate não queria contar a Fleur toda a verdade, pois assim que ele o fizesse toda a cidade de Londres saberia, e ninguém da cidade precisava saber de sua vida.

— Ela retornou da França e está fazendo um excelente trabalho em manter seus estábulos lucrativos e bem-sucedidos. O que aconteceu no passado entre nós, eu preferiria deixar no passado.

Somos vizinhos e, devido ao nosso amor mútuo por corridas de cavalos, precisamos nos dar bem.

— Bem. — disse ela com o tom indicando incredulidade. — Fico feliz que tenha conseguido deixar o passado para trás, mas não significa que não possamos mais ficar juntos quando você estiver na cidade. Nos damos muito bem, e você sabe que sempre nos divertimos. Não seja enfadonho, nem me diga que não podemos mais continuar.

Tate estava apostando na ideia de que, com tempo e paciência, ele poderia reconquistar o amor de Ava. Fazê-la enxergar que juntos eles poderiam fazer de ambas as propriedades os melhores Centros de Reprodução e Treinamento do país. Que sob nenhuma circunstância ele tentaria cortá-la e forçá-la a mudar para se adequar ao esperado para o título. Ambos ansiavam por filhos e um casamento construído com a solidez de um amor. Ele não descartaria esta possibilidade agora que talvez eles fossem uma opção.

Ele se levantou.

— Sinto muito, Fleur, mas não posso mais ser seu amante. É

claro que sempre serei seu amigo e, se precisar de alguma coisa, sabe que eu sempre lhe darei assistência. Mas o que tivemos deve chegar ao fim. Não seria justo com você mantê-la ligada a mim quando sempre deixei claro que nosso acordo era algo temporário, uma forma divertida de passar o tempo durante a Temporada.

Ela o estudou por alguns segundos antes de se levantar, aproximou-se dele e envolveu seu pescoço com as mãos.

— Sentirei sua falta, Sua Graça, e de todas as coisas deliciosas que costumávamos fazer. Estou ansiosa para reencontrá-lo ano que vem durante a temporada.

Tate retirou os braços dela do pescoço dele, mas deu um breve beijo em sua testa antes de se afastar.

— Boa noite, Lady Clapham. — ele entregou o congé a ela.

Saiu sem dizer mais nada e, chegando à carruagem, pediu que fossem ao White's. Lady Clapham recebeu as notícias muito melhor do que ele imaginara. Talvez ela já tivesse outra pessoa em mente para mantê-la ocupada. Ela era viúva, e muitos cavalheiros se interessavam por ela, algo a que ela sempre se mostrara receptiva.

E agora ambos estavam livres para fazer o que quisessem.

O que era ótimo para Tate conquistar o amor de Ava. Ele conquistou o coração dela uma vez antes, o que decerto era premissa para fazê-lo uma segunda.

CAPÍTULO 7

Dois anos se passaram desde a última vez que vi você. Às vezes me pergunto se voltaremos a nos encontrar...

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

A CARRUAGEM de Tate parou diante de sua casa em Londres, as luzes brilhavam do lado de dentro e o som de música fez seus passos se tornarem cautelosos ao subir as escadas. Um criado de libré vermelho, roupas que eles usavam apenas em bailes, fez seus passos vacilarem. De todos os dias possíveis para ele retornar à Londres, ele escolhera o dia de um baile organizado por sua mãe.

Este seria o terceiro do ano.

Não havia mais nada para a mulher fazer com seu tempo? Ele entregou seu sobretudo a um dos criados que veio ao seu encontro na entrada e cumprimentou as poucas pessoas que se mantinham do lado de fora do salão de baile.

Sem disposição para tais entretenimentos, ele prosseguiu para a escadaria. Não apenas não queria socializar, mas estava longe de estar vestido para um baile. Na manhã seguinte, ele discutiria os excessos sociais de sua mãe e tentaria controlá-la um pouco.

Fora que a carta que ela havia escrito para Ava ainda dominava sua mente de forma a deixá-lo ainda menos disposto a permitir tais frivolidades.

Na metade da subida uma voz masculina gritou seu nome, e Tate se interrompeu. Ao se virar encontrou o Conde de Brandon, um bom amigo que conhecera durante o seu primeiro ano em Nova York.

— Scott. — disse ele, descendo as escadas e puxando-o para um abraço.

O homem era um de seus amigos mais próximos, e sentiu muita falta dele quando precisou voltar para a Inglaterra. Scott também havia voltado, mas optou em ir para o continente, ver os pontos turísticos.

— Como tem passado, meu amigo?

— Muito bem. Muito bem mesmo. — disse Scott, sorrindo. — Eu me lembrei que a duquesa-viúva iria dar um baile esta noite para celebrar o fim da pequena temporada e pensei em dar um alô enquanto você estivesse na cidade.

— Posso dar os parabéns? Admito que fiquei bastante surpreso ao receber sua carta contando que estava noivo, mas estou feliz por você. Sua noiva está com você? Eu adoraria conhecê-la. — disse Tate, olhando para ver se alguma jovem estava à espera de uma apresentação.

— Sim, está certo. Estou noivo. Vamos nos casar em junho próximo. A família dela virá da Itália para preparar e planejar o casamento. Claro, sou a favor de permitir que Rosa tenha o que ela quiser.

Tate sorriu.

— Estou feliz por você, meu amigo. Você irá ser um marido maravilhoso, e estou certo de que Rosa será uma esposa maravilhosa para você se é quem você escolheu. Conto os dias até encontrá-la.

— Eles estão vindo de Roma e chegarão no Natal. Não vou deixar de apresentá-los. Ela é simplesmente perfeita.

Tate apertou-o no ombro, feliz por seu amigo. — Você é um bom homem. Você merece a felicidade.

— Obrigado. — disse Scott, virando-se para o salão de baile. —

Vamos tomar uma taça de champanhe para comemorar?

Tate não pôde recusar e seguiu para as portas do salão de baile.

Ele estava longe de estar vestido para a ocasião, mas ser o duque de Whitstone dava a ele permissão para vestir o que quisesse.

Ele viu a mãe do outro lado do salão, os olhos da mulher se arregalando em choque. Tate não sabia dizer se era por ele estar lá ou se pelo que vestia. Talvez os dois.

Scott pegou duas taças de champanhe de um lacaio que passava e entregou uma a Tate. Eles fizeram um brinde de congratulações e tomaram um gole antes de olhar em volta.

— Quando pretende retornar para Berkshire? Ouvi de Duncannon que teve alguns problemas com a propriedade.

Tate assentiu.

A menção de casa trouxe a memória de Ava e o quanto ele sentia falta de vê-la, mesmo que por um só dia. Ele havia voltado a se acostumar a estar perto dela, e agora que estava na cidade, desejava partir, voltar ao interior. Como ele aguentou morar aqui nos últimos dois anos, sem nunca pisar em Cleremore Hall era algo que estava além de sua compreensão.

— Tenho alguns assuntos a tratar aqui, mas em não mais que uma semana volto a Berkshire. Quanto ao problema, sim, algumas coisas surgiram.

O conde lhe deu toda a atenção, e Tate pensou em contar a Scott tudo o que ele estava pensando. Nunca esconderam nada um

do outro antes, e Tate não podia começar agora. Ele precisava contar de Ava para alguém ou ficaria louco.

— Lembra-se da senhorita de quem falei uma vez, a razão para eu ter ido para a América?

Scott assentiu.

— Claro. Srta. Knight, não era?

— Sim, correto. — disse Tate, suas veias aquecendo-se com a menção do nome dela em voz alta.

— Ela mora na França, pelo que entendi, mas o pai dela possuía um dos melhores Centros de cavalos de corrida da Inglaterra.

— Sim, essa mesma, contudo, ela não está mais na França.

Voltou a Berkshire.

O amigo o estudou um momento antes de erguer a sobrancelha, a boca tremendo de diversão.

— Ela voltou? Que interessante. — ele fez uma pausa. — E este fato teve algum peso em sua decisão de morar em Berkshire em vez de Londres?

— Não exatamente. — disse Tate, não querendo parecer muito com um filhotinho apaixonado, mas ele nunca foi capaz de mentir para Scott. — Vou desapontá-lo ao dizer que nosso reencontro não foi na melhor hora, mas como já deve ter sabido, meus estábulos foram alvo de um incêndio. Detalharei para você em outro momento, mas naquela noite, em grande parte foi Ava quem salvou meu garanhão.

— E então vocês resolveram dar uma trégua.

Tate deu de ombros.

— Foi necessário enviar meus cavalos para a propriedade dela, e ao longo do último mês descobri que ela nunca me abandonou.

Na verdade, nossos pais nos fizeram de tolos e nos jogaram em vidas separadas. O que é a outra razão para eu estar na cidade

hoje. Quero confrontar minha mãe sobre o envolvimento dela em um esquema tão soturno.

Scott assobiou, os olhos arregalados.

— A viúva nunca aprovou a senhorita Knight. Não sabia?

— Ela nunca dissera nada de maneira direta, e a carta, que eu li, tem a caligrafia dela. O desgosto dela acerca da escolha da Senhorita Knight para minha esposa está claro em cada palavra. Eu não a achava capaz de tal traição, mas me enganei. Não foi sem motivo que Ava manteve-se distante todos esses anos. A carta é muito fria e ofensiva.

Tate balançou a cabeça. Odiava o fato de que foram separados porque alguém julgava saber o que era o melhor para os dois:

— Jantamos na outra noite e durante a conversa, eu não me aguentei e precisei descobrir o que houve. Indaguei para descobrir o que a fez enviar a missiva desfazendo nosso compromisso. Foi então que ela perguntou sobre a minha carta. Nenhuma das cartas envolvidas foi escrita por nós. Fomos enganados pelas pessoas em que mais devíamos confiar.

Tate olhou para o outro lado do salão e observou a mãe com as amigas por um momento, rindo e dando ordens aos outros pelo simples fato de ser uma duquesa. Um nó frio e duro se formou dentro dele, e ele se virou para Scott. Não queria vê-la por nenhum segundo a mais.

— Voltei à cidade em parte para confrontar minha mãe acerca das ações desprezíveis dela. Eu pretendia dar cabo a isso hoje à noite, mas ao voltar descobri que ela estava dando este baile, então nossa conversa terá que esperar até de manhã.

— Que outros negócios traz você aqui? — o amigo perguntou.

Tate ajustou a gravata e limpou a garganta.

— Bem, além de alguns negócios envolvendo outras propriedades, e meu problema com minha mãe, é claro, a outra a razão para vir foi um assunto delicado.

Scott ergueu a sobrancelha.

— Mesmo? E gostaria de elaborar? — o amigo terminou o champanhe e pediu mais para um lacaio que estava por perto.

Tate rangeu os dentes, não gostando do fato de ter sucumbido como tantos homens de sua esfera e tomado uma amante. Lady Clapham não era uma concubina de fato, ela era livre para fazer o que quisesse, e com quem quisesse. Mas o fato de ele poder visitá-

la quando assim decidisse, fazia com que parecesse uma amante, embora ele não quisesse usar tal termo.

Ele olhou em volta para garantir que não estavam sendo ouvidos por outros convidados.

— Não é algo de que eu me orgulhe, mas tenho dormido com uma mulher desde o ano passado. Ninguém sabe, e estou certo de que ela teve outros amantes durante esse período, mas se eu quiser algum tipo de futuro com a Srta. Knight, preciso ser honesto. Acabei de chegar da casa dela aqui em Mayfair.

— Ela aceitou bem as notícias?

Melhor do que Tate pensara que aceitaria, mas ambos sempre foram francos, e Lady Clapham havia dito muitas vezes que não queria voltar a se casar.

— Aceitou. Na verdade, ela quase não se incomodou.

E Tate precisava concordar que fora um golpe de sorte. Lady Clapham era uma mulher complexa, imprevisível de saber o que faria.

Ele suspirou.

— Mesmo resolvendo todas as pontas soltas pode não ser o bastante. Não tenho mais certeza de que a senhorita Knight vai me

aceitar. Depois de descobrir a verdade, ela permaneceu distante. —

Tate passou a mão pelos cabelos, sem saber o que Ava sentia. — A impressão que me deixou é que não sabia se me queria em sua vida.

— Como? — Scott perguntou.

— Cheguei a pensar que ela não deseja mais tal capítulo em sua vida. Ela é muito independente, administra a propriedade com precisão de especialista, é minuciosa e justa, e não precisa dar satisfações a ninguém. Tornar-se duquesa traz consigo novas responsabilidades e pressões, e não tenho certeza de que ela tenha espaço para tais obrigações nessa vida que criou.

No passado, houve um período em que ela não pensava em mais nada que não fosse ser a duquesa dele. Mas o tempo tinha o poder de forçar as pessoas a situações em que elas talvez não cogitassem antes, e o afastamento deles... Tate não sabia mais se ela se importava com ele de outra forma que não como amigo.

— Você precisa conversar com ela e descobrir. Talvez ela o surpreenda e haja espaço para você e seu título robusto. Sim, você é um duque, um homem com várias propriedades e muitas pessoas dependem de você, mas a srta. Knight estava disposta a estar à frente de tudo isso antes dos pais de vocês se envolverem. Se ela o ama, e sempre há uma chance de que duas pessoas destinadas uma à outra possam voltar a estar juntas, ela também abrirá espaço para você em sua vida.

Tate sorriu para o amigo.

— Você se tornou um romântico desde que conheceu Rosa.

Scott riu.

— Sim, e sinto orgulho por tal fato. Mas você verá que estou certo. Se tiver paciência, e como já esteve ao lado da Senhorita

Knight, não há razão para não acreditar que ela pode se apaixonar por você mais uma vez.

Ele esperava que sim, e continuaria tendo esperanças. Quando voltasse a Berkshire, iria devagar e com cautela. Tentaria recuperar a afeição dela. Não seria fácil, mesmo que tudo indicasse que eles voltaram a transitar a esfera da amizade. Muita coisa pode acontecer em cinco anos, as pessoas mudam e seus objetivos e sonhos também.

Com certeza era o caso dela. Após gastar dois anos em Londres, os rumores de que Titan — o garanhão mais procurado para procriação — iria a leilão em Tattersalls, o fizeram reviver seu sonho de estar à frente do próprio programa de reprodução, de ser o melhor.

Ele retornou a Berkshire, mesmo sabendo que Ava estaria a apenas cinco quilômetros dele, mas ele quis lutar pelo que uma vez imaginara fazer. Não ser apenas um duque, mas um homem com interesses, uma profissão que ele não apenas desfrutava, mas amava.

Ele bebeu o último gole de champanhe. Conseguiria conquistá-

la, conseguiria unir suas propriedades e fazer com que todos os seus sonhos se realizassem.

— Você faz excelentes argumentos, Lorde Brandon.

— Bem, se a Srta. Knight é o seu futuro, então sim, é necessário resolver o passado e seguir em frente. Estou feliz por você e desejo-lhe felicidades com sua dama. Eu me lembro do quanto você estava destruído. Pode discordar de mim, vejo em seu rosto que discorda.

— disse Scott, rindo. — Mas quando você fala dessa senhorita Knight, você brilha. Ela é sua luz, brilhante e verdadeira. Espero que consiga reconquistar o amor dela.

Tate sorriu, apertando o ombro do amigo.

— Obrigado. Aceitarei seus bons desejos e espero o melhor também. Muita coisa aconteceu nos últimos cinco anos, pode levar algum tempo para encontrarmos o caminho de volta um para o outro, mas estou determinado.

— Espero que sim, e não deixe de trazer a senhorita Knight para o meu casamento, se tiver sucesso. Rosa adoraria conhecê-la, estou certo disso.

— Isto, meu amigo, é algo que prometo a você. — disse Tate, esperando que, por sua vez, em breve ele também pudesse convidar Lorde Brandon para o próprio casamento.

TATE TOMOU o café-da-manhã na manhã seguinte, e felizmente sozinho. O cheiro de café quente impregnava o ar, o Times ainda com cheiro de prensa à sua frente e o prato com bacon, ovos escalfados e presunto fatiado estava diante dele. Ele se recostou na cadeira, aproveitando o momento de paz, um café-da-manhã em silêncio.

A porta do cômodo se abriu e sua mãe se juntou a ele. Ele dobrou o jornal, e suspirou em derrota pelo curto momento de paz agora interrompido.

— Bom dia, mãe. — disse ele, pegando a faca e o garfo.

A mãe dele se sentou à mesa e pediu a um lacaio próximo que lhe servisse chá e fizesse seu prato habitual de torradas e manteiga.

— Não sabia que retornaria à Londres, meu querido. O que o trouxe para a cidade? Eu iria me juntar a você em Cleremore em breve.

— Negócios na cidade.

Ante sua resposta curta, ela apenas ergueu a sobrancelha e voltou para a refeição. Tate comeu por um momento, pensando na totalidade de coisas que teria que dizer a ela. Estava com dificuldade de manter a calma, de não perder a paciência:

— Você aproveitou sua noite ontem à noite? Quantas bailes já foram este ano? Três?

Sua mãe abriu um sorriso doce.

— Sim, de fato. Que maravilhoso que esteja atento aos meus eventos. E fico feliz que tenha chegado a tempo para o entretenimento da noite passada, pois você desapareceu antes da última temporada e faz dez meses que não o vejo!

— Acredito que seja um exagero. Voltei à cidade em alguns momentos para tratar de negócios.

— Não me irrite, garoto, pois estou muito chateada. Como pôde deixar Londres no instante em que diversas mulheres elegíveis e de fortuna agraciam a cidade? Todas prontas para fazer uma reverência e se casarem com um duque. Preciso lembrá-lo de Lady Clapham, que é mais do que elegível, uma viúva que parece gostar da sua companhia, ou ao menos foi o que ouvi. Mas não, fugiu para Berkshire, para seu passatempo bobo com cavalos e não voltou.

Estou desesperada por você.

Tate não queria nada mais além de contar à sua querida mãe que Berkshire também dispunha de algumas mulheres muito doces e mais do que aceitáveis e que poderiam se tornar noivas dele.

Bem, uma noiva em particular.

— Preciso estar em Berkshire, pois adquiri um dos cavalos de corrida mais valiosos da Inglaterra há pouco tempo. E se não entrou por um ouvido e saiu pelo outro, eu escrevi para você contando o que ocorreu nos estábulos semanas atrás. Você sabe... — disse ele, chamando a atenção dela. — os que queimaram.

Ela dispensou a declaração com um gesto de mão.

— Lembro-me que mencionou esses dois itens, mas ainda assim não vejo a necessidade de você se manter longe da cidade por tanto tempo. — ela fez uma pausa, tomando um gole de café. —

Qual o progresso com os estábulos?

— Estão sendo reconstruídos enquanto falamos e não foi um incêndio simples. Como falei na carta, acredito que o fogo foi intencional. Eu contratei um agente de Bow Street para investigar, mas por favor, não espalhe essa informação. Não quero que ninguém saiba que eu tenho suspeitas.

— Muito bem. — ela suspirou, pegando um pedaço de torrada.

— Eu não direi uma palavra.

— Bom, isso me leva ao outro assunto que me trouxe à Londres, um que envolve você.

A mãe dele baixou a torrada, reclamando que estava fria. Um criado pegou o prato e o levou embora antes que sua genitora erguesse o olhar com preocupação nos olhos.

— Mesmo? O que você quer de mim?

Tate largou a xícara de café.

Ele queria analisar o rosto dela quando a confrontasse com a verdade.

— Por que você forjou a suposta carta da Senhorita Knight para mim anos atrás? Por que permitiu que eu seguisse acreditando que a afeição dela por mim era fingida, que ela sonhava com uma vida diferente? Que ela não me queria?

Os olhos de sua mãe se arregalaram antes que o rosto empalidecesse mostrando um tom horrível de cinza. Naquele momento Tate soube que, sem dúvida alguma, a mãe estava por trás do estratagema calculista de separá-los. Ele estava com certa esperança de que não fosse verdade, mas não parecia o caso.

— Eu não sei do que você está falando. — disse ela mexendo com um guardanapo. — Agora deixe-me tomar meu café-da-manhã em paz. O dia será agitado, muitas visitas para fazer a tarde toda.

Ele rangeu os dentes, uma reação melhor do que gritar com a mãe diante de todos os funcionários.

— Há tempo de sobra para suas socializações. Quero falar sobre seu esquema cruel e dissimulado.

A mãe dele pareceu aceitar a derrota a esse respeito e ergueu o queixo, os lábios contraídos em uma linha tensa.

— Sim, eu forjei a carta e o faria de novo. Seu pai e eu fizemos o que era o melhor por causa da pouca idade de vocês dois. Não havia nem passado por uma Temporada e já cogitava se casar com uma garota sem conexões, de fora da nobreza. Filha de um treinador de cavalos, ainda por cima.

A voz estridente da mãe se elevou uma oitava quando mencionou as últimas palavras, o que fez com que seus tímpanos doessem, e ele se encolhesse:

— Falei com o pai da srta. Knight e ele concordou depois de explicarmos que nunca aceitaríamos tal união e que a filha dele estaria arruinada ao ser cortada pela sociedade.

Ele balançou a cabeça.

A crueldade de sua mãe não tinha limites. Então, ela envolveu o Sr. Knight na farsa ao ameaçar sua única filha.

— A Srta. Knight era mais do que a filha de um treinador de cavalos para mim. Nunca me importei com classe, dinheiro, e títulos da forma como você se importa. A Srta. Knight pode ter tido um começo humilde, mas é igual a mim em todos os aspectos.

— Humpft. — sua mãe cuspiu. — Ela não serve para ser esposa de um duque, nunca será uma.

Ele respirou fundo para se acalmar.

— Você não tinha o direito dessa forma. Não tem vergonha de ter agido de forma tão cruel com seu filho ou com pessoas que são nossos vizinhos há anos?

— Tate, preciso lembrar que o Sr. Knight também estava de acordo.

— Você convenceu o homem a concordar ao ameaçar Ava.

— Não me diga que você já pediu a mãe dela de novo. — ela zombou. — Nunca o perdoarei se sim.

— Você não tem direito a voto, mas não. Não propus. Neste momento, a Srta. Knight não é só nossa vizinha, mas a mulher que está abrigando todos os meus cavalos depois do incêndio. Mesmo que eu e Ava não sejamos nada mais do que amigos no momento, não a isenta da culpa do que fez conosco. Como você pôde fazer isso com seu próprio filho? Você sabia o quanto eu gostava dela.

Ela balançou a cabeça, descartando as palavras dele.

— Uma loucura infantil que arruinaria sua vida. Você gostaria que eu me lamentasse por impedir tal enlace. Bem.. — ela fez uma pausa, jogando o guardanapo sobre a mesa. — Não lamento, nem nunca o farei.

— A senhora me enviou para um país que não me era familiar só para me manter distante dela. Você poderia ter sido honesta.

Não que tal honestidade fosse tirar dele a ideia de ter Ava como esposa. Mesmo agora, no âmago da alma de Tate, ele sabia que ela era a mulher certa para ele.

— Minha família tratou você bem em Nova York. Eles proporcionaram a você tudo o que um jovem intitulado e rico poderia querer. Mulheres, festas, eventos sociais do melhor calibre que meu país pode oferecer. Não me venha com lamentações quando sua vida não teve nada de lamentável. Não considerou que os pormenores que atravessaram toda Londres quando retornou

chegaram a mim? As muitas amantes, o jogo e tudo mais. Não seja tão rápido em me julgar quando eu poderia julgá-lo dois anos atrás, quando voltou.

Como ela podia ser tão cega?

Sim, ele gostou da América, mas apenas porque ele foi forçado a ficar e não podia voltar. Ele pensara que a mulher que amava não o amava.

— Eu não vou perdoá-la por essa fraude.

— Suponho que você vai me contar agora que todo esse seu interesse por Berkshire nos últimos meses não tem nada a ver com a senhorita Knight estar de volta da França. Por favor, me diga que não retomou o relacionamento com aquela pé rapada de onde parou.

Tate colocou as mãos na mesa, já nem se importava com a comida.

— Como ousa chamá-la assim? Nunca mais... — ele disse, fazendo sua mãe se assustar. — fale dela assim. O nome dela é Srta. Ava Knight, e me ouça bem, mãe. Não importa o que aconteça entre mim e Ava, saiba que jamais vou tolerar sua intromissão. O

que escolho fazer com a minha vida ou quem escolho para ser minha esposa é minha escolha. Como chefe dessa família, se eu quiser casar com uma prostituta do Soho, é o que farei.

Tate se levantou, já estava farto da conversa.

— Não me ameace. Ainda sou sua mãe e não se esqueça de que posso tornar sua vida na sociedade fácil ou difícil. A senhorita Knight vem de uma linhagem de criados. Pessoas que trabalharam como agricultores arrendatários antes de comprar um cavalo e competir com ele. Um golpe de sorte para eles, embora eu esteja muito feliz que conseguiram se afastar de uma vida de servidão, não é o bastante para se tornar apta ao papel de duquesa.

Ele sempre considerou os olhos azuis claros de sua mãe bonitos, mas, naquele momento, eram gelados e sem um pingo de sentimento.

— Se você se casar com a Srta. Knight, a duquesa de Whitstone será motivo de riso na sociedade. Eu não me casei com a nobreza e sacrifiquei minha vida em meu próprio país e vim morar na Inglaterra, só para ver meu filho se casar com uma mulher que não traria nada além de vergonha e algumas éguas ao casamento.

Tate agarrou a mesa, inclinando-se para sua mãe.

— Não volte a falar comigo, ou de Ava desta forma, mãe. Estou avisando. — ele bufou. — Eu sou o duque de Whitstone e não importa com quem eu me case, ela será aceita pela sociedade porque, caso não a aceitem, sendo eu um duque, farei com que se arrependam do dia que a rechaçaram. Esse aviso também inclui você. Se você deseja ter algo a ver com o meu futuro, não se intrometerá na escolha que eu farei para minha esposa.

A mãe dele empurrou a cadeira para trás.

— Há muitas moças que são mais adequadas para ser a futura duquesa de Whitstone. — disse ela com a voz trêmula. — Se desse uma chance e as conhecesse, veria que há muitas moças que seriam perfeitas para você. Veria que a senhorita Knight não é para você. Ficar com ela pode satisfazer qualquer senso de honra que você acredita ter de cumprir por ter desistido da união, mas esse sentimento não será duradouro. Pessoas com a origem dela sempre possuem esqueletos no armário, e a sociedade não descansará enquanto não descobrir. É apenas uma questão de tempo até que algo que a família ou ela escondem venha à tona e arruíne as perspectivas dos meus futuros netos.

— Só fala bobagens.

— Falo? — sua mãe retrucou. — Pense em seu herdeiro, longe em Eton ou Harrow. O assédio moral que seus filhos sofrerão quando os outros descobrirem que a mãe deles criava cavalos. Que os avós já foram agricultores arrendatários. Isso, por si só, será difícil de suportar, sem falar em algum outro escândalo que ainda não sabemos.

Ele balançou a cabeça, não querendo ouvir mais. Ele caminhou até a porta e parou.

— Você está histérica, sugiro que se acalme. Fique atenta ao meu aviso, mãe. Vou bani-la para um castelo na Irlanda se não me obedecer e seguir minhas ordens. Você não é mais a chefe da família. Nunca cruze essa linha, ou me fará concretizar a ameaça.

A mãe dele o fulminou, a pequena touca de renda no topo da cabeça tremia com a raiva mal disfarçada.

— Se você se preocupasse tanto com o ducado, teria voltado para casa quando soube do incêndio. Mas, em vez disso, apenas continuou a organizar mais eventos sociais e bailes. Pelo menos, a Srta. Knight se importou o suficiente para combater o fogo ao meu lado naquela noite. Agora me pergunto, onde você estava? Bebendo champanhe e desfrutando da companhia daqueles que julga serem valorosos. Não a ocorreria pensar nos outros, mas a Srta. Knight pensa, e é por isso que ela sempre será adequada para se tornar minha esposa. Não há um osso egoísta no corpo dela.

— Você não tem ideia do que está falando ou do que precisa. É

igual ao seu pai. Desvia-se com facilidade.

— Voltarei a Berkshire em alguns dias. Acho melhor que, assim que a pequena temporada se finde, você viaje para uma das outras propriedades e fique bem longe de Cleremore Hall.

— Você tiraria sua mãe de seu convívio por uma pobretona?

Tate olhou para a mãe, estava enojado com as palavras dela.

— Por causa de suas ações, por me mandar para os Estados Unidos, eu perdi a chance de me despedir de meu pai. Você me permitiu culpar uma mulher inocente por isso. A senhorita Knight pode não ser ninguém para você, mas ela é tudo para mim. E

sempre foi. Não importa quantos anos você passe tentando mudar este fato, nada o mudará.

Ele a deixou onde estava, encarando-o, e rumou para a porta.

Após esse confronto, uma visita ao White's seria perfeita. Qualquer lugar seria melhor de se estar do que aqui.

CAPÍTULO 8

DIAS DEPOIS, Ava estava sentada em uma cadeira no terraço e ergueu os olhos ao ouvir o som de rodas no cascalho. Ela protegeu os olhos por causa da luz do sol no horizonte e, fechando o livro que estava lendo, tentou descobrir quem estava chegando para uma visita.

Quando a carruagem ficou visível no pátio de entrada, ela se levantou e seguiu para a frente da casa, a curiosidade cada vez maior. A carruagem preta estava coberta de poeira adquirida ao longo de quilômetros de estrada, e havia uma variedade de baús no topo do veículo. Seu coração pulou de alegria, e ela começou a correr quando reconheceu a cabeça com cachos escuros que espreitou pela janela da carruagem.

Ela acenou.

— Hallie, é você?

Ava riu, mais que feliz em ver sua amiga. Hallie foi uma das primeiras garotas a fazer amizade com ela na escola francesa. A atitude, que não dava espaço para parvoíce, e a franqueza inabalável da moça haviam conquistado Ava que, por sua vez, amava que a amiga fosse tão corajosa e obstinada. Não que somente de olhar alguém pudesse pensar isso dela. Ela era toda delicada, suave à primeira vista. Suas mechas escuras, de um cacheado natural, e os olhos verdes ecoavam inteligência muito além da compreensão de Ava. Hallie era uma rosa inglesa pura, mas era de uma personalidade que amava climas muito mais severos do que tal flor seria capaz de tolerar.

— Ava! — Hallie gritou de volta antes de abrir a porta e sair sem ajuda.

Sua querida amiga correu e a puxou para um abraço feroz, que Ava recebeu de bom grado. Elas não se viam há um ano, e tê-la aqui e agora, em Berkshire, era um sonho.

— Hallie. — disse ela, abraçando-a com força. — Ah, eu estou tão feliz em vê-la.

Lágrimas se acumularam, mas ela as segurou, notou que os olhos da amiga estavam um pouco lacrimejantes também.

— Faz muito tempo, minha querida. Como está a Inglaterra?

Como estão seus cavalos magníficos? — Hallie perguntou, olhando para os estábulos.

— Estão todos muitíssimo bem.

Pelo menos os cavalos estavam indo bem, quanto ao restante de sua vida, bem, esse aspecto era questionável.

— Como foi o Egito e todos aqueles magníficos faraós que você ama tanto?

Hallie riu, tirando o chapéu e olhando para o céu.

— São perfeitos em todos os sentidos. E um dia você deve ir me visitar lá. Sei que você iria adorar.

A ideia de ver uma terra tão quente, de história e cultura anciãs a enchia de inveja por não viajar tão longe quanto Hallie. A mulher era tão inteligente e mundana, e chegara na hora mais perfeita.

— Não acredito que você está aqui. Quanto tempo vai ficar?

Ava a levou para dentro, arrastando-a em direção à sala de estar e ordenou que o chá e o almoço fossem servidos lá naquele dia, em vez da sala de jantar.

Hallie olhou ao redor da sala, notando algumas das antiguidades que o pai de Ava havia colecionado. Segurou e estudou um vaso aqui e uma relíquia ali antes de recolocá-los no lugar.

— Cerca de um mês, se você concordar. Tenho alguns negócios a tratar em um museu de Londres. O novo benemérito de lá se recusa a aceitar a autenticidade de uma tabuleta de pedra que encontramos no platô egípcio. Acredito que seja porque foi uma mulher que a encontrou, no caso eu.

Hallie pousou o chapéu em uma cadeira próxima e se deixou cair na cadeira, suspirando. Ava sentou-se também, sorrindo ante a maneira despreocupada e tranquila da amiga. Como sentira falta dela.

— Parabéns por encontrar um artefato histórico tão magnífico.

Tenho certeza de que convencerá o cavalheiro de que é exatamente o que diz ser. — ela não conseguia tirar o sorriso dos lábios por ter sua amiga aqui. — Eu não consigo dizer com palavras o quanto você estar aqui me faz feliz. Não por você estar com problemas em seu trabalho, mas porque eu terei sua companhia por um mês. Será como nos velhos tempos.

— Falando nisso... — disse Hallie com um olhar inquisidor. —

Ouvi um boato engraçado enquanto estava na cidade, antes de vir para Berkshire. Quer saber o que era?

Ava recostou-se no sofá e tirou os sapatos, cruzou as pernas no assento, embaixo dela. Será que ela ia querer saber das fofocas que sempre correm por Londres? Não, na verdade não, mas o comportamento da amiga, o brilho travesso no olhar dela a deixou curiosa.

— Muito bem, Londres está agitada assim pelo quê? — ela perguntou, já temendo não se interessar pelos mexericos.

— Você é vizinha do duque de Whitstone, não é?

A menção ao nome de Tate a fez endireitar a coluna, e uma pontada de medo a atravessou sem saber para onde a conversa estava indo.

— Conheço o duque há alguns anos, sim.

Ava não havia dito a ninguém que ele a desprezara quando começara a estudar na França. Hallie foi uma amiga nos tempos de escola e parecia contente em não se intrometer em seu passado.

Ava supunha que todas elas, as cinco amizades que havia feito, possuíam seus próprios segredos a serem mantidos bem guardados. Ser abandonada não era algo que uma jovem, seja de qualquer posição social, iria querer anunciar, então Ava tentou se esquecer do que houve e continuar com sua vida o melhor que podia.

Agora que ela sabia que Tate nunca a rejeitara, bem, mudava as coisas de alguma forma, e ela estava desesperada para conversar acerca do assunto com alguém que não fosse o próprio homem. A vida que levava no Haras Knight havia se tornado seu mundo inteiro. Ir para uma escola tão distante a ensinou a confiar e depender de si, e em mais ninguém e, ao longo dos anos, ela se tornou independente. Ela fora capaz de dar continuidade à sua vida de forma alegre e satisfatória sem as amarras da felicidade matrimonial.

Não que Tate fosse a única outra razão pela qual ela se esquivara do casamento, o desastre com Lorde Oakes havia cimentado dentro dela a decisão de que ser uma mulher de meios independentes era preferível a estar à mercê de qualquer marido.

— Há rumores de que ele voltou à cidade e foi visto deixando a casa da amante. A cidade inteira está em tumulto, ou pelo menos é o que Willow está dizendo. Alguns ficaram chocados com o fato de ele ter uma, pois era um caso muito discreto, mas, por infelicidade foi descoberto, é o que está sendo falado.

Willow Perry era outra amiga que Ava fez na escola francesa e residia em Londres com a tia intitulada na maior parte do ano.

— O que Willow disse? — Ava perguntou.

Ela não sabia que o duque havia tomado uma amante permanente. Claro, o erro era dela. Ele era famoso por seus encontros amorosos, pelas modos sociais e hábitos de jogatina desde seu retorno do continente americano. Era natural que ele tivesse um acordo de tal longevidade para satisfazer suas necessidades. Ela se preparou para ouvir, seu estômago revirando ao pensar nele com outra mulher.

— Só que ela é livre para fazer o que bem entender, embora alguns digam que nunca houve um acordo de exclusividade na mesa. Que não passava de uma união de satisfação mútua e nada mais.

Ava engoliu a bile que subia pela garganta.

— Ora, ora. — foi tudo que conseguiu verbalizar.

Hallie continuou.

— Quando ele voltou dos Estados Unidos, há dois anos, as pessoas afirmam que a atração que sentiram no momento em que eles se viram no funeral do marido dela era inegável.

— Ela era casada?

— Ah sim. — continuou Hallie. — Ela é uma dama intitulada.

Lady Clapham, uma viscondessa ainda por cima.

Ava estava sem palavras como nunca esteve. A amante de Tate era uma mulher da classe dele. Sua mente zumbiu ao pensar nisso.

Por que ele não a pedira em casamento? Por que terminar o arranjo agora, depois de tanto tempo...

— A alta classe está em polvorosa de tantas perguntas, sedenta pelo que aconteceu entre eles enquanto a maior parte da sociedade não reparou. Quando soube que ele era seu vizinho, precisei perguntar.

Hallie sorriu.

Graças a Deus, a amiga estava alheia por completo a como a notícia que acabara de dividir ameaçava arrancar o coração de Ava do peito.

— Não estava sabendo. Só porque somos vizinhos não significa que eu tenha algo a ver com a vida pessoal dele. Ele pode fazer o que bem entender, como eu.

Ava desviou o olhar, concentrando-se em nada em particular.

Seu estômago revirava com o mero pensamento de Tate dormir com outra mulher. Até agora, ela foi consciente em seus esforços de se manter longe de pensamentos tão terríveis quanto ele se relacionando ou amando outra pessoa. O duque era um homem que não devia nada a ninguém. Era responsável por suas próprias ações e poderia fazer o que quisesse.

— Claro que sim, minha querida. — Hallie a estudou por um momento. — Você conheceu o duque quando ele era jovem? Dizem que ele é um dos homens mais bonitos da Inglaterra. É verdade?

Faz tanto tempo desde que estive neste país que não conheço mais vivalma além de você e nossas amigas da escola, é claro. Você terá que me esclarecer sobre tudo, Ava.

— Bem, odeio desapontá-la, Hallie, mas seu pequeno boato é a primeira coisa ligada à cidade que ouço em meses. Estive tão ocupada com a propriedade e mantendo os cavalos de corrida em forma e saudáveis que não tenho tempo para socializar.

E era assim que deveria ser. Ava não conseguia pensar em uma maneira mais agradável de passar o tempo do que ao ar livre, cavalgando ou cuidando dos cavalos. Ser uma mulher de sucesso em um mundo de homens:

— Eu me sinto muito contente com a vida que levo.

— Sério? — Hallie perguntou, examinando-a por um momento.

— Você está mesmo feliz? Nenhuma de nós está ficando mais nova,

e a maioria das meninas com quem fomos à escola está casada, com filhos. Eu pensei que você desejasse um futuro assim. — sua amiga recostou-se na cadeira, cruzando as pernas. — Devo admitir que, por mais que eu goste de ser historiadora, de viajar para terras estrangeiras, me pergunto como teria sido minha vida se eu voltasse para a Inglaterra depois de concluir os estudos e tivesse me casado.

Meus pais, que Deus os tenha, amariam tal desfecho, e sinto que os decepcionei um pouco ao seguir meu próprio caminho.

Ava também havia decepcionado o pai.

Ela sabia que ele desejava ter tido netos, vê-los crescer antes de morrer, e que no fim eles herdariam sua dinastia hípica. Por um tempo, ela pensou em realizar tal desejo. Uma decisão que quase a jogou na ruína. Depois disso, Ava se viu decidida a ignorar as normas e expectativas da Sociedade, deixando claro que a Srta.

Ava Knight, do Haras Knight, não estava, de modo algum, à procura de um marido.

Mesmo assim, com toda a independência e proteção que seu status trazia, um homem ainda era capaz de assombrá-la em seus sonhos. Tate.

Ava se levantou e caminhou até o parapeito da lareira e tocou a sineta, queria descobrir o que havia causado o atraso do almoço.

Ela foi até a janela e puxou a cortina de veludo azul e creme para olhar para os gramados.

— Você terá a oportunidade de conhecer o duque de Whitstone.

Ele está hospedado aqui por ora. Os estábulos dele foram destruídos em um incêndio e todos os cavalos de sua propriedade estão abrigados aqui até que a reconstrução termine. Tenho certeza de que quando ele voltar de Londres, você o conhecerá. Talvez até lá haja um novo boato envolvendo Sua Graça, e o anúncio de uma nova amante.

Hallie riu.

— Você não me engana, senhorita Ava Knight. Quando mencionei o duque e que ele estava tirando Lady Clapham de sua vida, não deixei de ver que seu rosto empalideceu ao descobrir que ele mantinha uma amante. Diz que conhece o duque há muitos anos, mas eu me pergunto: o quão bem você o conhece? Porque para mim não consigo evitar de cogitar que o conheça e muito bem.

Ava se recusou a olhar na direção da amiga.

Hallie sempre foi tão boa em ler pessoas. Era uma característica que elas costumavam usar na escola, Hallie decifrava o humor dos professores, de modo que elas soubessem poderiam ser um pouco travessas, ou se precisavam ser boazinhas. Agora, na sala de casa, o discernimento de sua amiga não era bem-vindo.

— Saber da amante a magoou, me perdoe, Ava.

Ela suspirou, não querendo mais mentir para a amiga. Durante anos, ela manteve a dor escondida, mas não havia mais razão para fazê-lo. Hallie era sua amiga, e ela deveria ter confiado a verdade a ela anos atrás.

— Ouvir tais notícias é chocante, eu admito, mas não é nada fora do comum em se tratando da sociedade inglesa. — ela admitiu em voz baixa.

Uma pequena parte dela ainda sonhava com os dois e desejava voltar e lutar pelo que quis para si cinco anos antes. Mas, por mais que doesse tê-lo perdido e não por culpa própria, Ava havia percebido que o desfecho foi para o melhor.

Ela não servia para ser duquesa.

Participar de bailes e festas, ser anfitriã do mais alto calibre da sociedade. Essa vida simplesmente não era para ela. Então, de certa forma, os pais deles a fizeram um favor ao mentir e os separar.

Pois, na mente de Ava, não lhe restava dúvidas de que ela teria

falhado no dever de ser a esposa de um duque e que, no fim, Tate ficaria frustrado e decepcionado por sua falta de gracejos sociais.

Ela nunca seria capaz de lidar com o desapontamento dele. E uma duquesa deveria ser sempre respeitável, incólume, perfeita em todos os sentidos, e ela não era nada disso.

— Eu nunca conheci um duque. — disse Hallie, mudando de assunto. — Será que vou gostar dele, o que acha? — ela perguntou, sorrindo um pouco.

— Acredito que sim. — Ava respondeu, mordendo o lábio enquanto pensava em Tate. — Ele é muito bom e agradável com seus funcionários...

Uma batida na porta soou, e ela ordenou que entrassem. Um criado entrou carregando uma bandeja de prata com chá, frios e pão. Ele deixou a bandeja na mesinha de madeira diante do sofá antes de se curvar e deixá-las.

Ava se pôs a servir o chá, adicionou uma colher de açúcar na xícara de Hallie, lembrava-se que era assim que a amiga gostava, uma pitada de leite, e estendeu a xícara para a amiga. Hallie pegou o chá e encontrou o olhar de Ava por cima da borda da xícara.

— Por que tenho a impressão de que você não está me dizendo algo? O duque distanciar-se de Lady Clapham tem algo a ver com você, Ava?

Ava fechou a boca com um estalo.

Ela se sentou, esperando que o calor que subiu por seu pescoço não fosse perceptível para a amiga.

— Como devo saber o que o duque pensa da amante? — Ava disse, bebendo seu chá.

— Eu acho que você sabe muito mais do que está dizendo. —

Hallie sorriu com malícia.

Ela suspirou, passando um dedo pela lateral do pires de porcelana em que a xícara se apoiava.

— O duque só está aqui por causa do que houve na propriedade dele. Uma circunstância infeliz e muito perigosa. Se quer saber, ele até contratou um agente de Bow Street. Ao investigarem os destroços em Cleremore Hall, descobriram que há grandes chances de ter sido um incêndio proposital. Que alguém queria sim machucar cavalos inocentes.

Hallie franziu o cenho ante as palavras de Ava, toda a alegria desaparecendo.

— Embora eu não goste de montar os animais, pensar que alguém tentaria ferir tantos cavalos deve trazer uma perturbação terrível. Por favor, diga-me que todos sobreviveram.

— Sim, por graças. — disse Ava. — Conseguimos tirá-los a tempo, mas os dois estábulos dos duque sofreram estragos além do recuperável.

Ela pensou na noite em que eles se deixaram cair no chão depois de sair do estábulo que continuava a queimar detrás deles.

Ela ainda podia sentir o cheiro de seus cabelos chamuscados, a dor que a percorria a cada respiração. Ver Tate deitado ao seu lado, ofegante, foi uma visão que ela não desejava rever jamais. O medo paralisante de que ele poderia ter morrido foi revelador, e ela soube naquele momento que ainda carregava sentimentos por ele. Quando Tate levantou a mão e limpou o pó de fuligem de sua bochecha, mesmo a lembrança agora fazia seu coração palpitar no peito.

— E agora, ele está hospedado aqui. — Hallie sorriu mais uma vez, e Ava lutou para não revirar os olhos. — E vocês são amigos.

Não tenho vergonha de dizer, sendo sua amiga também, que adoraria vê-la junto a tão bom partido. Você cogita se casar em algum momento? — Hallie perguntou.

— Não mais. — Ava respondeu num rompante. — Penso que o tempo para tal ocorrência ficou no passado, e que estou bem solidificada em minha posição como solteirona. Tenho vinte e quatro anos, não se esqueça.

Halle estreitou os ferozes olhos verdes.

— E quanto a ter um amante? Você não seria a primeira mulher a fazê-lo, nem a última.

Ava estremeceu com o pensamento. A simples ideia trazia à tona memórias que ela preferia esquecer.

— Não, eu não gostaria disso.

Hallie suspirou, sentando-se na cadeira e apoiando a cabeça no encosto alto.

— Eu tive um, sabe. No Egito. Ele era um major-general ou Liwa como os chamam por lá. Ele era de uma beleza tão fatal quanto sua espada, mas não foi o suficiente para salvá-lo. Houve uma patrulha nos arredores do Cairo, uma pequena escaramuça em uma vila periférica, e ele foi morto por moradores locais.

Hallie ficou quieta por um momento, e Ava não sabia o que fazer, não tendo ideia de que sua amiga havia se apaixonado.

— A pele dele era tão escura e bonita, como cobre sob o céu egípcio. Mesmo agora, seus cabelos e feições escuros fazem meu coração bater rápido. Ele possuía os cílios mais longos que eu já vi, ou vou ver, em um homem, tenho certeza. — Hallie encontrou o olhar da amiga, seus olhos com um brilho intenso. — Foi uma das razões para eu voltar para casa, para a Inglaterra. No Cairo, não importa para onde eu me virasse, as memórias dele me assaltavam.

— Hallie balançou a cabeça, suspirando. — Era muito difícil ficar.

Ava levantou e foi se sentar ao lado da amiga, puxando-a para um abraço apertado. Ela não fazia ideia de que sua amiga havia passado por tanto. Tantos segredos entre todos elas.

— Querida Hallie, sinto muito por sua perda. Se você entregou seu coração a ele, ele era um homem bom e honrado. Fico feliz por ter voltado para casa, e seja bem-vinda a ficar aqui o tempo que precisar para curar seu coração.

— Obrigada, Ava. Eu sabia que você entenderia. Sabe que eu não tenho mais nenhuma família, que sou órfã de fato e, portanto, preciso de minhas amizades neste momento.

— Eu gostaria de tê-lo conhecido. — disse Ava, enxugando uma lágrima da bochecha da amiga.

Hallie fungou, e Ava enfiou a mão no bolso e tirou o lenço, entregando-o à amiga.

— Não sei o que aconteceu de fato, apenas que alguns dos homens dele voltaram ensanguentados e quase mortos. Omar nunca voltou, e alguns dias depois, mais soldados foram atrás dele e o encontraram já morto. Eles o enterraram. E foi tudo o que me falaram.

— Ó, Hallie.

Ava esfregou as costas dela, tentando trazer algum conforto em uma situação que não havia conforto algum. Perder o amor de alguém não era uma separação que se podia superar com facilidade. Ava sabia disso tão bem quanto qualquer um, pois levara anos para superar Tate e o fato de ele a ter abandonado, se é que se podia afirmar que superara.

— Diga-me o que posso fazer, Hallie, para melhorar as coisas para você.

Como ela não fora capaz de ver que sob as risadas e o bom humor, que a amiga sofria com uma perda tão pessoal? Ela se reprimiu por ter se cegado por seus próprios problemas, tão tolos que em nada se comparavam com os de Hallie.

— Estar aqui com você é o bastante para mim, e eu vou superar minha dor, tenho certeza. Mas nunca vou esquecê-lo, ele era o mais amável dos homens, mesmo que nossos passados e religiões fossem muito diferentes.

Ava a abraçou mais uma vez.

— Se você entregou seu coração a ele, não há dúvidas de que ele era uma pessoa maravilhosa. Você também é. E coisas maravilhosas só acontecem com pessoas como vocês.

Hallie sorriu em meio as lágrimas, e Ava prometeu que estaria ao lado da amiga enquanto fosse necessário.

— Agora que você conhece minha pequena e triste história —

disse Hallie servindo mais chá. —, conte-me toda a verdade na sua.

Ava deu uma risada autodepreciativa.

Hallie era muito inteligente para ver através de suas palavras e exigir a verdade que estava por trás delas. Ela balançou a cabeça em reverência por suas artimanhas.

— Muito bem, já que nós duas estamos contando a verdade de nossas vidas, nosso passado triste, eu contarei todas as minhas verdades. — ela se recostou no sofá, cruzando as mãos no colo. —

Há cinco anos; eu e o duque, que era marquês na época, considerávamo-nos apaixonados. Analisando com os olhos de hoje, não tenho dúvidas de que eu o amava, de fato, e com ferocidade.

Estávamos dispostos a fugir e nos casar. Contudo, só há poucos dias veio à tona como nossos pais planejaram para nos afastar.

Nenhum de nós dois sabia dessa participação. Fomos separados por um oceano. Eu fui enviada para a França, para a escola onde nós duas nos conhecemos. O duque foi enviado para a América, para viver com a família da mãe dele nos Estados Unidos. Tanto ele quanto eu acreditávamos que o outro era indiferente. Acreditamos

que o outro havia violado a confiança que partilhávamos. Não é esse o caso, e agora que sabemos a verdade, bem...

Ava se levantou e começou a andar com determinação, o algodão percal de seu vestido subindo a cada passo. Ela parou diante da lareira, segurou-se no mármore polido da moldura e sentiu emergir o ódio por terem sido tão enganados. Que as pessoas que eles amavam e confiavam acima de tudo os enganaram:

— Agora, eu não sei onde estamos. Não sei mais o que sinto. Eu amo minha vida. Eu amo os cavalos e as corridas. Posso andar a cavalo e galopar pelos campos sempre que desejar. Não tenho obrigação de ir à cidade, não preciso participar da Temporada. Não preciso estar à disposição, à espera de um chamado, nem preciso posar como enfeite de um marido. Eu gosto deste modo de vida, de ser dona de mim.

Neste instante, ela assimilou como a volta de Tate tornara a vida dela complicada. De repente, uma confusão. Quando isso aconteceu? Há um mês, ela não carregava nenhuma dessas preocupações, e agora sua mente só pensava nisso. Ela poderia desistir da vida que levava aqui e se tornar uma duquesa? Seria algo que Tate esperaria dela?

Ava mordeu o lábio, não sabia se poderia se tornar a propriedade de outra pessoa agora que havia conhecido a liberdade. Tate não a conhecia tão bem quanto antes, e que quando ele descobrisse a verdade, mesmo que ela quisesse ser a esposa dele, ele poderia considerar que ela não atendia às expectativas.

Hallie pegou o chá e tomou um gole.

— Acredita que o duque ainda gosta de você dessa maneira?

Segundo você, vocês são amigos, será que você seria capaz de almejar mais sem deixar de aproveitar a vida que leva aqui no interior? Mesmo como duquesa?

Ava não acreditava que a vida de agora teria continuidade caso se tornasse a esposa de Tate. Um ducado estava entre os mais altos postos entre a nobreza. A sociedade adorava tê-los em suas festas e eventos. Tate iria querê-la ao seu lado na cidade em todas as temporadas, e ela não era ninguém, talvez uma emergente, mas pouco mais. Uma mulher que se casou para subir na escala social.

Conversariam com ela sim, mas à portas fechadas ela seria o assunto.

— Confesso que ainda penso nele quando estou sozinha. Penso em como seria estar nos braços dele de novo. Estar contra seu tórax rígido, em como seria correr as mãos pelos músculos tesos que sei esconderem-se sob suas roupas. Sentir o toque dos lábios dele nos dela para assombrá-la durante o sono. — Ava abriu os olhos e voltou-se para a amiga. — Não sei o que há de errado comigo. Eu me pensei que havia superado toda essa paixonite.

— Acredito que — disse Hallie, inclinando-se e passando manteiga em um scone antes de colocá-lo em um pequeno prato. —

você ainda gosta do duque e que talvez precise descobrir se ele gosta de você também.

Ava suspirou ao enxergar a lógica por trás do plano da amiga, mas o nervosismo que a fazia sentir-se nauseada ao pensar em ser tão ousada tornariam difícil a concretização da ideia.

— Esse é o problema. Eu sei que gosto dele. Mas não é como eu pensava que seria a minha vida, e não tenho certeza se o quero o suficiente para desistir de tudo o que tenho agora. Eu teria que desistir dessa vida para me tornar uma duquesa. E você consegue me ver em bailes e festas? Coberta de seda e chiffon, carregando o peso da moda e das joias? Não é quem eu sou.

— Acredito que você seria uma duquesa maravilhosa. — disse Hallie com um pouco de bom humor. — Mesmo assim, parece-me

que você tem muito o que pensar. E não precisa tomar nenhuma decisão agora. Presumo que os estábulos do duque estão em reconstrução, que ele voltará para casa muito em breve.

— Sim, os estábulos estão avançando bem. De fato, se você quiser, posso mostrar a você amanhã. Poderíamos ir até Cleremore Hall para dar uma olhada. Vai preencher um pouco do nosso tempo, pelo menos.

Hallie sorriu.

— Parece perfeito.

Ava, contente pela mudança no assunto, afastou as preocupações relativas ao duque. Ela refletiria acerca dele quando estivesse sozinha.

— Precisa me dizer o que gostaria de comer no jantar. Qual é a sua refeição favorita? Vou pedir que preparem para você.

Hallie recostou-se na cadeira, parecia uma mulher sem preocupações no mundo. Quão errado todos estariam ao fazer essa suposição.

— Eu iria adorar qualquer prato que não leve cabra ou ovelha.

Acredito que também não suportaria nem mais uma tigela de arroz.

— Considere feito. — disse Ava. — Vou providenciar agora mesmo, e aproveito para verificar se seu quarto está pronto para você. Estou certa de que está exausta depois de tão longa viagem hoje.

— Obrigada, Ava. — Hallie se inclinou e pegou a mão dela, apertando-a um pouco. — Estou muito feliz por sermos amigas.

Ava colocou a mão sobre a de Hallie.

— Sinto o mesmo, querida. Por mais de coração partido que eu estivesse, minha viagem para estudar na França provou valer a pena. Você, Evie, Willow e Molly consertaram tudo para mim, o que me deixa muito feliz.

NO DIA SEGUINTE, Ava e Hallie partiram para a propriedade do duque. O som de marteladas e de madeira sendo serrada, além do zumbido suave das conversas dos homens trabalhando chegaram a elas. Elas pararam no topo da pequena colina que dava para a propriedade, observando por um momento, permitindo que os cavalos recuperassem o fôlego. Uma carruagem preta e reluzente estava parada na frente da propriedade. Lacaios carregavam depressa um tanto de baús de viagem.

— Será que o duque voltou? — Hallie perguntou, lançando um olhar na direção de Ava.

Ava observou os detalhes do cavalo que agora era conduzido em direção a um pátio próximo.

— Acho que sim, mas ele não veio sozinho.

Ava sentiu o pavor tomar conta de si ao imaginar que a mãe dele havia retornado com ele. A mulher era a única pessoa a ter arquitetado a separação dela e do duque que ainda vivia, e Ava não era do tipo que perdoa. Não quando se tratava de decisões baseadas em despeito e pressão social.

Elas retomaram o avanço, voltando a parar não muito longe de onde os estábulos novos estavam sendo erguidos. Um construtor próximo tirou o chapéu para elas, cumprimentando-as de forma calorosa. Ele veio falar com elas por um tempo e explicou o progresso da construção e que diferenças teriam dos prédios antigos.

Parecia maravilhoso.

A nova construção de tijolos vermelhos e quase todas as paredes já estavam concluídas, e alguns homens estavam no

telhado consertando as telhas em mosaico. O cheiro de pinheiro recém-cortado permeava o ar.

— Está indo bem. — disse o duque, saindo do estábulo e cumprimentando-as com um sorriso. — Não concordam?

Ava olhou do alto de seu cavalo, assimilando as suas botas hessianas e as calças bege que destacavam seu corpo para o deleite do espectador. O cabelo dele, para variar, estava despenteado pela viagem recente, mas fora isso o olhar dele era acolhedor e convidativo. Ava sorriu, animada por vê-lo e conteve um suspiro. Se for para ela permanecer indiferente, em uma simples amizade, ela teria que refrear a apreciação frequente de sua beleza.

A semana em que ele se mantivera longe obscureceu a memória dela de quão atraente ele era. Ao revê-lo ela voltou a ansiar por coisas que não ansiava há cinco anos. Como ela daria continuidade à vida como uma mulher forte e independente que não precisava de um marido para tornar a vida completa enquanto homens como o duque continuassem a desfilar por Berkshire?

Alguém pigarreando trouxe Ava de volta à realidade e às boas maneiras, e ela gesticulou para a amiga Hallie que observava os dois com diversão nos olhos.

— Perdoe-me, Sua Graça, esta é minha melhor amiga, senhorita Hallie Evans. Ela acabou de chegar do Egito onde é historiadora.

O duque fez uma reverência.

— É um prazer conhecê-la, Srta. Evans. Qualquer amiga da srta.

Knight é amiga minha.

— Obrigada pela gentileza, Sua Graça. — Hallie voltou a ostentar um olhar divertido, e cheio de conhecimento, para a amiga antes de descer do cavalo.

Ava também o fez e, entregando os cavalos a um garoto que estava esperando, seguiu em direção à casa principal.

— Eu estava prestes a entrar para o chá.

Tate sustentou o olhar de Ava, e ela não conseguiu desviar nem que sua vida dependesse do movimento. Mesmo a contragosto, ela precisava reconhecer que havia sentido falta dele na semana que passou. Embora soubesse que ele fora até a cidade para se encontrar com amigos, sendo Lady Clapham uma dessas pessoas, o sentimento não abrandava. Seria ela a razão para ele ter rompido o acordo com a amante?

— Não gostaríamos de nos intrometer. Eu queria mostrar a Hallie os estábulos, e não esperava encontrar você em casa. — Ava disse, diminuindo o passo.

— Obrigada pelo convite, Sua Graça. — Hallie respondeu, apertando o braço de Ava e puxando-a na direção da casa. — Eu, por exemplo, adoraria uma xícara de chá.

— Caso precise ir cuidar de outro assento, não há problema. —

Tate informou, sem dúvidas sentindo a relutância de Ava.

— Não há nada a ser feito. — respondeu Hallie antes que Ava pudesse falar. — Vejo que a carruagem trouxe muita bagagem para ser descarregada. Alguém da cidade veio lhe fazer companhia em Berkshire?

O duque limpou a garganta.

— Ah, não. Mas devo dizer que minha mãe veio para ficar por um tempo. Eu pensei que ela iria para uma das propriedades de Surrey, mas a encontrei aqui...

A confirmação de que era mesmo a mãe dele deixou um gosto amargo na boca de Ava e, por um momento, foi quase impossível parecer feliz e cortês por saber que mulher estava de volta à Berkshire. A mãe dele era uma víbora, e agora que sabia que ela participara na separação dos dois... Bem, ela teria sorte se um dia Ava mudasse a opinião que tinha da mulher.

Eles continuaram na direção da casa até que Tate se virou para ela, fitando-a.

— A chegada de minha mãe significa que minha estada na Propriedade dos Knight terá que terminar. Mas fique certa de que deixarei meu melhor cavalariço à sua disposição, e que meus funcionários continuarão a cuidar dos meus cavalos e manterão a vigilância para que o que aconteceu aqui não ocorra com seus estábulos.

Ava estava agradecida pela ajuda dele, mas saber que ele não estaria mais tão perto dela fez com que uma pontada de melancolia a inundasse. Durante o mês em que ele esteve em sua propriedade, ela se acostumou a vê-lo. Trabalhando os cavalos, com as calças de pele de gamo e camisa de camurça e nada mais. Os adoráveis e deliciosos vislumbres dele sempre foram bem agradáveis.

Sem o lenço no pescoço e com a camisa muitas vezes para fora das calça ele poderia, muito bem, ser confundido com qualquer um dos funcionários dos estábulos dela. Exceto pelo fato de ele ter passado por anos de criação ducal, as costas aristocráticas retas perfeitas, os ombros largos e cintura fina. A mente inteligente, que estava sempre maquinado algo por trás daqueles olhos cinzentos, o fazia se destacar de qualquer outra pessoa.

Sempre o fez...

Uma mulher veio de dentro da casa e parou à porta de entrada.

A carranca no rosto da duquesa-viúva dizia à Ava tudo o que ela precisava saber. Se ela tivesse feito preces silenciosas para que a mãe de Tate tivesse abrandado com os anos, tal possibilidade foi eliminada naquele instante junto da esperança de que a mulher sentisse, nem que fosse uma pequena fração, algum tipo de ressentimento por separar o filho da mulher que ele amava.

— Talvez seja melhor voltarmos para casa, Sua Graça. — Ava disse depressa. — O senhor e a duquesa-viúva viajaram bastante hoje, não queremos nos intrometer.

— Não vá.

As palavras dele foram tão baixas e suaves que Hallie nem esboçou ouvi-las.

— Acredito ser o melhor. Sua mãe não parece feliz em me rever.

Tate virou-se para observar a mãe e, em seguida, voltou-se para Ava.

— Nunca pensei que fosse do tipo que se importava com o que os outros pensavam.

Se ele a estava incentivando a entrar... bem, estava funcionando.

Se havia uma coisa que Ava não gostava acima de qualquer outra coisa, era de ser derrotada por inimigo. E a duquesa de Whitstone decerto que se encaixava nesta categoria.

ACOMPANHANDO AS MULHERES casa adentro e em direção à sala de visitas do fundo que era banhada pelo sol da tarde, Tate pediu chá e comida, sentindo-se feliz com o fato de estar em casa.

Ficara fora apenas uma semana e já estava de volta à Berkshire, sua residência preferida no país, e estar a poucos quilômetros de Ava era realmente um prazer.

Ele sentira falta dela enquanto estava na cidade, e vê-la inspecionando seus estábulos hoje junto com a amiga, trouxe uma explosão de alegria diferente de qualquer outro sentimento que ele já vivenciara. Ele considerou que era algo parecido com o que ele sentiu ao pisar em solo inglês depois de tantos anos na nos Estados Unidos.

A decisão de remover Lady Clapham de sua vida havia trazido satisfação também. Ele esperava que, nas próximas semanas, pudesse provar a Ava mais uma vez que ela seria perfeita como esposa e futura duquesa de Whitstone. Por mais independente que ela tenha se tornado, tê-la ao lado dele na cidade como sua duquesa, ter a atenção, o cuidado e a orientação dela na vida dele era o que ele mais queria. Ele havia ficado ocioso por tanto tempo, de um certo modo até perdido, sem ela. Ser duquesa vinha com responsabilidades, mas ele estava certo de que Ava era capaz de cumprir tais obrigações.

Elas sentaram-se diante dos bancos sob as janelas que proporcionavam uma bela vista lá de fora. O padrão floral em seda no sofá e em outros móveis combinava com o toque feminino do cômodo e com sua localização com vista para um jardim de rosas.

Preferindo manter-se de pé, Tate esperou que a mãe iniciasse uma conversa com as convidadas, mas, diante do silêncio contínuo, e o olhar de aço dela enquanto esperavam o chá, ele interpelou e apresentou Ava e a Srta. Evans mais uma vez.

— A Srta. Evans acabou de voltar do Egito, mãe. — disse Tate, tentando dissipar a tensão na sala.

A expressão de sua mãe dizia que ela não estava nada impressionada.

— O Egito, diga por favor, me explique o que uma jovem como você está fazendo em um ambiente tão remoto e severo. Um local bastante estranho para você, alguém poderia pensar.

Hallie sorriu; toda doçura e, no entanto, o olhar dela disse a Ava que sua amiga não iria ser enganada pela viúva e por seus modos calculistas.

— Estive no Egito nos últimos dois anos estudando tumbas, pirâmides e alguns outros sítios ao longo do Nilo. Suponho que se

possa dizer que eu estava cavoucando na areia atrás de sarcófagos ancestrais e artefatos. Embora esta seja uma explicação bem simplificada para o que eu faço.

— E você pretende voltar? Não deseja se casar? — a viúva olhou para Hallie com um ar contemplativo. — Você já está passando da idade, se me permite dizer, Srta. Evans.

Tate precisou dar pontos à Srta. Evans por não externar nenhum sentimento de ofensa perante os comentários de sua mãe. Ele lançou um olhar de advertência para a mãe, que foi recebido com um levantar de nariz e nada mais.

— Ficarei na Inglaterra apenas por um curto período; vim visitar amigas, como Ava, e concluirei alguns negócios. Mas pode ter certeza de que voltarei ao Egito ou a algum outro lugar que ofereça um sítio histórico tão rico.

— Vai ficar muito tempo em Berkshire, Sua Graça? — Ava perguntou, sorrindo um pouco para a mãe de Tate e recebendo nada além de um olhar frio e calculista de volta.

— Ficarei aqui por algumas semanas. Há alguns amigos com quem gostaria de conversar, e claro, meu filho está aqui.

Tate não comprou a conversa da mãe nem por um momento, e nem se deu ao trabalho de lembra-la de que eles haviam se visto na cidade na semana que se findara. Ou que ela não deveria estar aqui, mas na Residência da viúva.

— Eu estava contando à Srta. Knight e à Srta. Evans que os estábulos ficarão prontos em breve. O que significa que meus animais não alterarão sua rotina por muito mais tempo, Srta. Knight.

Não que ele quisesse trazê-los de volta. Ter seus cavalos na casa de Ava era uma garantia de poder vê-la com frequência, de conversar com privacidade.

— Que boas notícias, querido. — disse a mãe dele. — Um duque deve permanecer em suas propriedades quando não estiver na cidade cumprindo seus deveres lá.

Hallie se engasgou, o que resultou em uma tosse. Tate suspirou ante o insulto velado da mãe.

— Srta. Knight, agora que voltei de Londres, estou mais que satisfeito em permitir que Titan receba sua égua. Assim que ela estiver no cio, vamos tentar reuni-los.

A mãe dele murmurou algo baixinho, mas Ava sorriu para ele.

— Verdade? Ó, obrigada, Sua Graça. Estou muito feliz que tenha mudado de ideia.

Ele sorriu para ela e era visível que ela queria abraçá-lo, algo que ela fazia bastante quando eram mais jovens se estivesse animada. Ele sentiu falta do rosto bonito e da alma bonita. Os traços finos dela eram impecáveis, a pele era parecida com alabastro, exceto pelo nariz, onde um pouco de sardas percorria suas bochechas. Seus olhos brilhavam de excitação, os cílios escuros e sobrancelhas de um arqueado perfeito dariam inveja em toda Londres quando ela chegasse lá nos braços dele.

Como a mãe dele podia pensar que ela era de beleza comum estava além da compreensão dele. Ela era muito superior a ele em todos os aspectos que importavam.

— Precisamos mesmo discutir tais assuntos, Tate, meu querido?

A conversa não é muito apropriada, não acha? — disse a mãe dele, o tom cheio de censura direcionado para Ava.

— Sobre o que você prefere conversar, mãe? As últimas fofocas da cidade, ou que escândalos estão em curso entre seus pares?

Nenhum dos quais me interessa.

— A mim interessa, e é tudo que importa, não é? A viúva sorriu.

— Eu bem ouvi alguns rumores acerca de um certo cavalheiro nobre

que andou sendo tolo e quase causou um escândalo para a própria família. Agora... — ela disse, batendo com o dedo no queixo. —

Deixe-me pensar para ver se lembro de quem se trata.

Tate olhou para a mãe, que estava brincando com fogo.

Ele voltou a atenção para Ava.

— Por falar no meu garanhão premiado, como está Titan, senhorita Knight? Espero que ele esteja se comportando em seus estábulos, sem se empolgar demais na frente das éguas? O cavalo, tão rápido e brilhante como ele era, também era vaidoso, se é que cavalos podiam ter tal característica.

— Todos os seus cavalos estão com plena saúde, e alguns dos seus cavalariços os levaram hoje de manhã para um galope, percorrendo algumas das pistas de corrida. Acho que ficará satisfeito com o desempenho de alguns de seus animais mais novos.

Que mulher maravilhosa ela era, inteligente e apaixonada. Ela amava as mesmas atividades que ele. Na verdade, foi o pai de Ava que despertou a paixão de Tate pelas corridas, e ele de fato precisava agradecê-lo pela direção que sua vida tomara longe das propriedades ducais de seu pai.

— Você ainda gosta de correr e se enfiar nos estábulos, senhorita Knight? Vejo que a Escola de Etiqueta na França não a livrou disso.

A mãe dele ostentava um olhar de satisfação, ausente de um pingo de remorso pelas palavras nada apropriadas, na direção de Ava.

Tate virou-se para a mãe.

— Há mais...

— Acredito, Sua Graça — Ava disse o interrompendo. — que a senhora está certa. A escola não me tirou minhas paixões, nenhuma

delas, e agora que estou de volta a Berkshire, estou muito satisfeita com o que está diante de mim.

Ava lançou a Tate um olhar diabólico e, incapaz de se conter, ele riu. A boca de sua mãe franziu em uma linha de descontentamento.

— Suponho que deveríamos contratar seus serviços, Srta.

Knight, para trabalhar em nossos estábulos, já que gosta tanto de tais passatempos. Quanto um cavalariço ganha hoje em dia, Tate, meu querido? — a mãe perguntou, a voz pingando doçura inocente.

— A Srta. Knight é uma empresária bem-sucedida, mãe. Ela não precisa procurar emprego aqui.

Tate lançou um olhar de advertência à mãe, que ela ignorou com mais um levantar de queixo. Caso fosse necessário, ele a escoltaria para fora da sala antes que ela continuasse a insultar Ava.

Sem pestanejar, Ava respondeu:

— Você sabe tão bem quanto eu, Sua Graça, que herdei os negócios, os bens e as terras de minha família. De fato, se eu quisesse, poderia valsar por toda Londres e participar dos mesmos eventos que você. Mas, infelizmente, neste caso, você não pode arcar com o que custaria para me ter trabalhando aqui.

A viúva estreitou os olhos.

— Srta. Knight, você está enganada. As esferas em que circulo não recebem moças se origens plebeias entre os seus. O que me faz me perguntar por que estou aqui oferendo chá para vocês.

— Bem, suponho que seja porque seu filho, o duque, nos convidou, e não você. Então, tecnicamente, você não está nos oferendo nada. — Ava disse, tomando um gole de chá como se a conversa girasse em torno das estações.

Houve uma batida leve na porta e um lacaio entrou carregando chá e doces antes que mais palavras pudessem ser ditas. Tate já

ouvira o suficiente, e caminhando até a mãe, pegou a mão dela e a puxou para ficar de pé.

— Por favor, desculpe-nos um instante. — ele disse.

A mãe dele sorriu, mas não disse outra palavra enquanto ele a arrastava para fora da sala. Assim que estavam em segurança no corredor perto da escada, ele a girou.

— O que deu em você? Como pode ser tão rude? Eu a avisei, ainda em Londres, acerca desse comportamento. Não irei tolerar.

O rosto dela estava cheio de raiva, os olhos em fúria.

— Não volte a trazer aquela mulher aqui. Ela não é bem-vinda e nem é adequado que nós, um duque e uma duquesa, tenhamos que nos sentar e tomar um chá com uma treinadora de cavalos.

Tate lutou para controlar a própria fúria. Ele deu um único passo para se aproximar dela, apontando um dedo a centímetros do nariz erguido da mãe.

— Não quero que você fale com ninguém que eu convide para minha casa daquela maneira. Você tem uma escolha, mãe. Ou retorna àquela sala e pede desculpas à Ava de forma civilizada, ou pode arrumar suas coisas e deixar estar propriedade.

A mãe dele ofegou.

— Você expulsaria sua própria mãe? Trocaria a mulher que deu à luz a você por uma plebeia que se jogou em cima de você antes que você fosse maduro o bastante para compreender as implicações de atitudes tão insensatas e joviais.

Tate rangeu os dentes, tendo ouvido o suficiente.

— Instrua sua criada pessoal para que volte a guardar seus pertences nas malas caso ela já tenha desfeito todas. Você parte para Londres ao amanhecer.

A mãe dele correu pelas escadas.

— Eu não vou a lugar nenhum, Tate, e não tente me forçar a nada ou nunca o perdoarei.

Tate levou um momento para recuperar a compostura antes de voltar para a sala, apenas para encontrá-la vazia. Ele voltou ao corredor, e abriu a porta da frente. Ao longe, perto dos estábulos, ele pôde ver Ava e a amiga subindo nos cavalos.

— Droga. — ele xingou, observando-as por um momento antes de fechar a porta.

Não era assim que ele queria que seu tempo com Ava terminasse hoje, depois de passar uma semana fora. A presença da mãe aqui tornaria difícil que ele confraternizasse com Ava e ele teria que ficar de guarda quando ela estivesse presente. Pois, se uma coisa era certa, a mãe dele não queria nada de bom e estava decidida a trazer o inferno à Terra. E parecia que recorreria até aos modos mais grosseiros para mantê-los separados.

CAPÍTULO 9

Confiei no seu amor, nas suas palavras e ainda não consigo entender como pude estar tão errada. Que todo esse tempo você estava preso a um acordo que não queria. Sinto muito por ter acreditado que não poderia ser honesto comigo.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

A VA INCITOU Gallant Girl o mais rápido que pôde nas pistas em que treinavam os cavalos. Hoje era um teste para ver se ela conseguiria um bom tempo em uma corrida de verdade e, com alguma sorte, um tempo que venceria algumas corridas que antecedem Ascot.

— Ótimo trabalho. — disse o treinador, enquanto ela diminuía a velocidade para um galope lento até que se tornasse um trote. A respiração do cavalo era rápida e, no ar fresco da manhã, vapor subia de seu corpo e de suas narinas.

O coração de Ava deu um pequeno pulo quando viu Tate em pé ao lado de seu administrador. Ele era mais alto do que os outros em torno dele, e hoje ele estava vestido com um belo casaco grande, com a gola de pele de raposa cinza aconchegada ao redor do pescoço, mantendo-o quente. O gorro de lã era o toque final ao visual casual, e cada vez que ela o via, ele a atraía, tentava-a como ninguém jamais havia conseguido. Ele a tentava a viver uma vida

diferente àquela que ela havia trabalhado com tanto afinco para se proteger.

Ela tateou o rosto em busca de lama que poderia ter voado dos poucos cavalos que estavam cavalgando à sua frente e esperava que ela não parecesse uma piada, sorriu.

— Que surpresa agradável, Sua Graça. Não esperava vê-lo aqui tão cedo de manhã.

Ela fez um último carinho no cavalo seguido de um tapinha no pescoço antes de saltar. Um jovem cavalariço se aproximou e pegou as rédeas dela, antes de levar Gallant Girl de volta aos estábulos onde ela receberia uma merecida massagem.

— Eu me levantei cedo. — respondeu o duque. — Um pequeno problema com os estábulos de casa e pensei em supervisionar meus cavalos, já que ainda estão aqui.

Ava esperava que ele quisesse vê-la, mas ela assentiu, feliz em vê-lo não importava o motivo para ele estar ali.

— Muito bem então, Sua Graça.

Greg levantou o relógio de bolso, sorrindo.

— Boa volta hoje, Srta. Ava. Pode ser que já tenhamos uma chance.

— Chance? — o duque perguntou, olhando entre eles.

— Queremos inscrever Gallant Girl em Ascot no próximo ano.

Acreditamos que ela tem chances de ficar entre os primeiros, e ela nunca esteve em melhor forma.

— Quem não arrisca, não petisca. — disse Greg, inclinando o chapéu. — Estou de partida, então. Nos vemos mais tarde, Srta.

Ava.

Ava assentiu e voltou-se para Tate, que a estava encarando. A inspeção intensa dele a deixou sem fôlego, e ela esperava que ele

não percebesse o calor que tomava conta de seu rosto naquele momento.

— Se levar Gallant Girl para competir em Ascot, podemos ter de enfrentar um ao outro. — a voz profunda dele fazia com que fosse difícil ela se concentrar nas palavras que ele dizia.

Ava se recompôs e se concentrou.

— Não tenho esperanças de vencer, decerto que não contra Titan, mas espero alcançar uma boa colocação. Acho que minha Gallant Girl é capaz disso.

— Eu nunca duvidaria. — ele gesticulou para que caminhassem em direção à casa. — Posso acompanhá-la de volta para casa? Há algo que desejo discutir com você.

Ava o estudou por um momento e notou que as sobrancelhas dele estavam franzidas.

— Há algo que o incomoda, Sua Graça? — ela perguntou.

Ele franziu mais o cenho, a boca curvada para baixo.

Ela não gostou de vê-lo dessa forma, e sentiu uma vontade avassaladora de confortá-lo. Uma reação que ela não teve nos últimos cinco anos, com ninguém mais.

— Houve outro incêndio. Dessa vez foi na propriedade de Lorde e Lady Morton, no sul de Berkshire. O incêndio começou no meio da noite e, infelizmente, eles perderam dois cavalos e um dos cavalariços.

Tate passou a mão na mandíbula, e Ava percebeu que ele não havia se barbeado pela manhã.

— Ó, meu Deus, não. — Ava piscou para segurar as lágrimas pela perda da vida de um jovem cavalariço e dos pobres cavalos. —

Como estão Lorde e Lady Morton?

— Devastados, eu presumo. Estou indo para lá agora e queria saber se gostaria de vir comigo. Lady Morton pode precisar de uma

amiga neste momento, e eu sei que ela gosta muito de você.

Ava sentia muito apreço também por Lorde e Lady Morton. Lady Morton em particular a ajudou a resolver alguns problemas que teve no ano anterior. Um apoio que veio numa época de que ela preferiria se esquecer. Um calafrio percorreu sua espinha, e ela afastou as lembranças alarmantes.

Era um casal de idosos, e com frequência faziam Ava se lembrar de seu próprio pai, adoravam os cavalos e a vida no campo, e não cobiçavam nada que estivesse além de seus portões.

A honorável senhora mostrara-se bem contente de desistir da vida em Sociedade e se estabelecer no interior. Ava sempre amou isso neles. Os dois faziam o que lhes apraziam e ignoravam o que os demais poderiam vir a pensar. Um sonho que ela e o duque já dividiram, mas que agora com tantas responsabilidades longe de Berkshire, ela já não estava tão certa de que ele poderia abandonar Londres por tantos meses e se esconder no interior.

— Claro que eu vou com você.

Ava chamou Manny e, em poucos minutos, os dois estavam galopando pelos campos ao sul, em direção à propriedade dos Morton. Com o orvalho ainda no chão, e os pássaros cantando suas melodias matinais, o sol se levantou ao lado deles, aquecendo a terra e dando a partida para um novo dia.

Ava não pôde deixar de pensar na terrível tragédia pela qual as famílias Morton e do jovem cavalariço passavam naquele exato momento.

— Sua Graça, acredita que este incêndio também foi proposital?

Tate, que estava ao lado dela, a fitou e o olhar de desprezo que ele ostentava dizia que sim, que ele acreditava na possibilidade.

— A missiva que recebi de Lorde Morton afirma que um trabalhador testemunhou uma sombra correndo do estábulo onde o

primeiro incêndio ocorreu. O trabalhador disparou o alarme na mesma hora e, no entanto, os estábulos foram consumidos com muita rapidez, e ficaram descontrolados antes que algo pudesse ser feito de fato.

— Você avisará deste novo incidente ao agente.

Tate assentiu.

— Enviei a carta de Lorde Morton junto de minha missiva, para servir de prova do incêndio. Estou certo de que o investigador chegará a Berkshire nos próximos dias. Pedi a ele que viesse disfarçado, claro. Para tentar descobrir algo.

— Creio ser o melhor. — disse ela.

Eles cavalgaram por meia hora, a jornada completa não deveria levar mais do que uma hora. Tate diminuiu a velocidade da montaria quando chegaram a um bosque, e Ava seguiu o exemplo. A mente dela estava dominada sobre teorias acerca dos incêndios nas propriedades que circundavam a dela. Havia mais um vizinho nas redondezas, e ela enviaria um bilhete para que se mantivesse alerta. Melhor prevenir do que remediar.

— Vamos descansar os cavalos por alguns minutos e continuar.

Ava parou ao lado dele, e dando rédea à Manny, permitiu que o cavalo mordiscasse a grama a seus pés. Ela aproveitou a oportunidade para observar o entorno. Um lampejo de movimento no vale chamou sua atenção, e ela estreitou os olhos tentando ver o que havia se movido.

— O que é aquilo lá nas árvores? — ela apontou para onde vira o movimento pela última vez, e Tate se virou naquela direção. — É

um homem andando a cavalo pela base do prado?

A pessoa, que não sabia que Ava e Tate estavam ali, saiu de uma área de mata mais fechada, e ela pôde vê-la melhor. Vestia-se com roupas escuras, um casaco longo e um chapéu de aba larga

havia sido puxado bem para frente, cobrindo seu rosto. Ele estava indo para o norte e parecia vir de uma direção ao sul. Estranho, considerando que um homem vestido da mesma forma acabara de queimar os estábulos ao sul daqui...

— Devemos descer e ver quem é. Considerando que houve um incêndio apenas algumas horas atrás, e agora vemos este cavalheiro cavalgando para o norte, seria justo questioná-lo. Ele pode ter visto alguém ou algo. — disse o duque sem tirar os olhos do sujeito.

Ou poderia ser o culpado.

Ava não disse tais palavras em voz alta, mas não pôde deixar de imaginar. Havia alguém na área iniciando esses incêndios. Poderia ser qualquer um de seus conhecidos, ou um completo estranho.

Nesse momento, eles não podiam isentar uma única alma.

Tate pegou as rédeas e incentivou sua montaria com o pé. Ava fez o mesmo, e eles galoparam em direção ao homem, e o cavaleiro que seguia para o norte ainda não os notara. Quando se aproximaram, o barulho baixo dos cascos no gramado úmido embaixo deles avisou ao cavalheiro de sua presença.

Ele olhou por cima, claramente surpreso, e Ava puxou o cavalo quando ela notou que ele estava com um cachecol amarrado no rosto, cobrindo a boca e o nariz. Apenas os olhos dele eram visíveis, mas a essa distância ela ainda nunca seria capaz de distinguir quem poderia ser, caso sequer o conhecessem.

Sem hesitar, o homem esporeou o animal com força passando a um galope veloz. O fato de que a intenção dele era a de fugir fez com que os cabelos da nuca dela se arrepiassem, e Tate foi atrás dele, incentivando seu cavalo na direção em que o cavaleiro havia partido.

Eles correram atrás dele.

O cavaleiro continuou se esforçando para abrir distância, e Ava seguiu Tate por uma pequena sebe, abrindo caminho entre árvores e campos que não pareciam retardar o homem questionável.

O cavaleiro olhou por cima do ombro mais uma vez, e Ava o ouviu xingar. Conhecendo Berkshire tão bem quanto ela, Ava percebeu que estavam chegando a uma parte da região que era atravessada por um riacho mais adiante, algumas partes eram profundas o suficiente para nadar, e outras bem rasas.

— Ele vai precisar desacelerar para atravessar o riacho. — ela gritou para Tate, apontando para o curso d'água que agora estava aparecendo.

Tate assentiu.

— Vamos pegá-lo lá e descobrir o que quer.

Ao sair de uma pequena área arborizada, um galho de árvore ricocheteou e atingiu Ava na bochecha, trazendo lágrimas aos olhos. Ela tocou na área ferida, e ao recuar a mão enluvada, notou sangue nela. Continuaram a seguir o homem até o riacho, e quando Ava pensou que o homem pararia e seria questionado pela fuga, ele forçou o cavalo a atravessar a água. As patas do cavalo escorregaram por um momento, e o homem teve dificuldade para se manter sobre o animal.

— Pare! — gritou Tate que foi ignorado pelo cavaleiro que alcançou o outro lado da margem. — Por que corre?

O homem não se deu ao trabalho de responder, apenas subiu uma pequena colina. Eles o perderam de vista um momento antes de Ava, ao perscrutar as árvores, o reencontrou.

Ela parou ao ver uma pederneira apontada bem para eles.

Tate fez menção de incitar a montaria a seguir, mas Ava esticou a mão e o segurou pelo braço. — Ele está armado, Tate, olhe. —

disse ela, empurrando o cavalo para trás.

— Maldição. — Tate murmurou, e fez o mesmo.

Era tarde demais para correr, e os dois estavam em campo aberto, alvos fáceis, se analisassem a situação. O homem ergueu a arma, e Ava girou a montaria depressa, sabendo que precisavam afastar-se o mais depressa possível.

Um tiro ecoou no ar, e o cavalo de Ava empinou. Ela tentou se segurar, mas não conseguiu, e então percebeu que não era só ela que iria cair. Voando para trás, seu cavalo também perdeu o equilíbrio e tombava. Ava caiu com força, e uma dor lancinante rasgou seu braço do pulso até o ombro. Felizmente, Manny não caiu em cima dela, mas rolou ao seu lado e logo recuperou o equilíbrio e ficou de pé.

O som de um cavalo em retirada ecoou nas árvores e, em seguida, os braços reconfortantes de Tate a envolveram quando ele ajoelhou-se, os olhos dele repletos de medo enquanto a examinava em busca de um ferimento de bala ou outro causado pela queda.

— Eu estou bem. Apenas caí, nada mais.

Ava movimentou-se para ficar de pé, mas fez uma careta de dor quando seu braço se recusou a completar o movimento.

— Você está ferida. — disse ele, ajudando-a a se apoiar.

Ava tentou mover o ombro e descobriu que ele estava bem na medida do possível, porém ao tentar movimentar o pulso sentiu dor atravessar a articulação.

— Acho que o pulso... — ela fez uma careta.

Tate arrancou a gravata do pescoço e a amarrou no pulso dela, tentando limitar o movimento. Ava não pôde deixar de vislumbrar o pescoço exposto de Tate agora que a gravata dele estava com ela e, por um momento, se esqueceu do homem na colina e do perigo em que ainda poderiam estar correndo.

Ela olhou por cima do ombro para onde o vira pela última vez, mas não havia mais ninguém lá.

— Ele partiu no momento em que a arma disparou. Sinto muito por tê-la colocado em perigo, Ava. Eu não deveria ter iniciado uma perseguição com você ao meu lado.

Ela balançou a cabeça quando ele a ajudou a se levantar. Com o braço bom, ela espanou o traje de montaria e retirou algumas folhas e galhos do cabelo.

— Ninguém, além daquele homem, é culpado pelo que houve aqui hoje. Nenhum de nós sabia o que ele ia fazer.

Tate não pareceu convencido, mas ele a ajudou chegar até o cavalo, sem deixar de verificar Manny e certificando-se de que a égua estava sem ferimentos.

— Consegue cavalgar?

— Creio que sim, mas vou precisar de ajuda para subir na sela.

Uma fração de segundo após as palavras serem ditas em voz alta, Tate a pegou como se não pesasse mais que uma pluma e a posicionou na sela. Ele assobiou para a própria montaria se aproximar antes de ajustar o braço dela para ficar contra o peito durante a volta para casa.

Ele se levantou no cavalo, o que proporcionou a ela uma bela visão de seu traseiro.

— Obrigada. — disse ela, afastando o olhar, mas não antes que ele a pegasse olhando para ele.

— Venha, vamos voltar para sua propriedade e mandarei chamar um médico de imediato. Se o pulso estiver quebrado, ele saberá o que fazer.

Ava esperava que não fosse o caso, e sim uma simples torção. A volta para casa foi desconfortável, mas a restrição improvisada

ajudou de alguma maneira a impedir que a mão se movesse e sacudisse a articulação.

Tate a inspecionava com frequência, os olhos dele plenos de preocupação, e o coração dela se aqueceu por ele se importar. Era bom que os dois fossem amigos outra vez. Ela sentia mais a falta dele do que era capaz de admitir.

— Você sempre se importou com as outras pessoas. Mesmo agora, tantos anos desde que nos conhecemos, ainda é uma alma carinhosa, não importa o quanto tente me dissuadir desse fato.

— Não o bastante já que foi ferida. — ele franziu a testa. — A culpa é minha. — ele repetiu, olhando de esguelha para a mão dela que estava bem segura contra o peito. — Eu deveria ter ido atrás dele sozinho em vez de tê-la colocado em perigo como fiz.

— Que bem isso faria? — Ava respondeu, não querendo ouvi-lo se culpar nem um pouco. — Nós não sabíamos que o homem estava armado, ou que ele iria fugir. Acredito que podemos concordar que o cavalheiro não era de bem e que pode ser o responsável pelos incêndios.

Ele suspirou, inclinando-se e protegendo as costas dela enquanto os cavalos avançavam por uma inclinação mais íngreme no campo. A mão quente dele contra sua coluna causou arrepios, e ela fechou os olhos por um momento, deleitando-se com o toque dele outra vez, com a sensação de tê-lo tão perto quanto agora.

— Acredito que você pode estar certa. Creio que devo escrever para o agente mais uma vez, essa noite ainda.

Ava lançou um sorriso para ele.

— Creio que sim.

A volta para casa foi lenta. O tempo começou a mudar e, quando a luz do sol desapareceu detrás de uma nuvem, Ava se arrependeu

de não ter trazido seu casaco de montaria mais grosso nessa viagem.

— Está com frio? — ele perguntou, puxando o cavalo para uma parada. Ava fez o mesmo, olhando para o céu, que agora parecia estar prestes a desabar.

— Um pouco, mas devemos chegar em casa daqui a pouco.

Não que fosse adiantar, já estava se sentindo bem gelada. Ela estremeceu de novo, e Tate saltou do cavalo, caminhou até ela e ergueu no cavalo, detrás dela.

Ela ficou rígida quando o corpo dele encontrou com o dela, duro.

Eles não ficavam tão perto assim desde o dia anterior à fuga planejada, e ela engoliu em seco sem saber o que fazer assim do nada.

Tate ficou quieto por um momento, e ela se perguntou no que ele estava pensando. O corpo dele estava tenso, era duro e largo, e de certa forma lançava uma sobre ela. Ela sorriu quando ele se inclinou, pegou as rédeas das mãos dela e incitou a montaria a prosseguir.

O cavalo dele os seguiu.

Aroma de sândalo permeou o ar ao redor deles e trouxe consigo uma enxurrada de lembranças de quando ele a cortejara. De quando ele o beijou no pescoço uma vez no grande celeiro que estocava feno, e de quanto ela passou a amar o cheiro amadeirado desde então. O corpo dele se movia a cada passo do cavalo, e ela sentiu calor subir pelas bochechas.

Usando uma das mãos para guiar o cavalo, ele passou o outro braço pela cintura dela, mantendo-a com mais firmeza contra ele.

Ela ofegou e conseguia ouvir a respiração dele entrecortando contra sua orelha.

A respiração dela também estava irregular, como se tivesse acabado de correr. Em anos anteriores ela teria se virado e o beijado enquanto seguiam, mas agora isso não era possível. Por mais que ela odiasse admitir, a mãe de Tate estava certa. O homem detrás dela precisava de uma mulher apta para o papel de duquesa.

E Ava, com suas calças e botas curtas cobertas de lama, seu amor por cavalos e corridas nunca seria adequada para o papel. Ele precisava de uma lady em seu sentido mais literal. Ela nunca seria uma dessas. Não de verdade. E, no entanto, caramba, uma parte dela o queria com um fervor que afugentava qualquer calafrio.

Ela não havia nascido para ser uma duquesa, mas não significava que eles não pudessem chegar a outro tipo de acordo.

Um que fosse agradável para os dois.

Ava colocou a mão sobre a dele e apertou-a um pouco.

— Eu sei que você está preocupado, mas, sinceramente, acredito que seja apenas uma torção. Você bem sabe que eu já sofri acidentes piores à cavalo.

Ele rosnou seu descontentamento e, para a surpresa dela, ela conseguiu sentir o leve toque dos lábios dele em seus cabelos.

— Não posso perdê-la de novo. Quando vi você cair, pensei que o tiro a havia acertado. Ou que o cavalo cairia sobre você.

Ela esfregou a mão enluvada dele, sentia-se gostar da preocupação dele mais do que deveria. Isso era ruim. Ela não deveria permitir tais liberdades, toques íntimos, mas como poderia recusar...

— Não acredito que ele seja um bom atirador.

Ele riu, e o movimento penetrou a alma dela, iluminando-a de uma maneira que ela não sentia há anos. Desta vez, ele beijou seus cabelos, e lágrimas brotaram nos olhos dela. Ava preferiu atribuir as lágrimas à dor no pulso, mas não era o motivo.

Este homem, seus cuidados e natureza doce sempre fizeram suas defesas desmoronarem. Como ela se negaria a ficar perto dele quando o queria tanto assim?

Só não queria o papel da duquesa. Ava mordeu o lábio, despedaçada por tudo. A atração por Tate sempre que estavam perto um do outro tornava-se maior a cada dia. Mais do que nunca, agora que eles sabiam a verdade acerca da separação deles.

Ignorar tal atração era uma batalha que vinha enfrentando dia após dia, mas não queria mais lutar.

Às vezes, ela queria se encaixar nos braços dele, inclinar-se e beijá-lo como no passado e ver para onde ele a carregaria. Para um futuro com que ela sonhara, mas que aprendera a viver sem.

CAPÍTULO 10

O S DOIS DIAS seguintes foram um borrão de dor e momentos inquietos de sono. Não importa para que lado ela se virasse na cama, ou se andasse pela casa, o ato resultava em um movimento do pulso e dor se espalhava pela região.

Ava rolou na cama, a luz do sol inundando o quarto e interrompendo seu sono. A visão de uma forma masculina sentada em uma cadeira ao lado de sua cama afastou todo o sono de seu corpo. Ela sentou-se, encolhendo-se quando o pulso protestou contra o movimento.

— Tate, o que você está fazendo no meu quarto? — ela olhou ao redor depressa, notando que estavam sozinhos. — Você não deveria estar aqui. — ela sussurrou.

Tate estava sentado em uma cadeira, um livro descartado aberto em seu colo. Ele se inclinou na direção da cama, e pegou a mão dela.

— Cheguei cedo para observar o treino de Titan e queria estar aqui para quando você acordasse. Trouxe o café-da-manhã para você. — ele se levantou e foi até um aparador, pegou a bandeja e a colocou ao lado dela na cama. — Como está se sentindo? — ele perguntou.

Ava se ajustou nos travesseiros.

— Fora o pulso doendo, me sinto bem. A tisana que Hallie faz para mim está funcionando muito bem. Não tenho certeza do que mais ela coloca, mas seja o que for, a erva é bem benéfica. Sou grata pela companhia dela.

Ela olhou para a faixa envolvendo o pulso, a camisola um pouco aberta no pescoço. Ava agarrou os cobertores e os puxou para o peito. Tate olhou para ela por um momento, antes de suspirar, vindo sentar-se na cama dela.

— Eu estava com tanto medo de haver mais lesões e não posso dizer o quanto estou agradecido pela bala não a ter acertado. O

médico diz que você ficará bem, após uma semana ou duas de descanso.

Recostando-se nos travesseiros, ela conseguia imaginar sua aparência. Uma mulher que fora incapaz de fazer muito por si nos últimos três dias e, como havia acabado de acordar, seu cabelo estava torto, os olhos inchados de sono. E, no entanto, o olhar de total adoração que ela via no rosto de Tate a lembrou de como ele costumava olhá-la quando eles estavam namorando.

— Você se lembra quando me ensinou a nadar? — ela perguntou, observando-o.

Ele sorriu, assentindo um pouco.

— Sim. Você me fez mostrar todas os tipos de braçadas diferentes das quais eu era tão experiente e conhecedor, mas o tempo todo você já sabia nadar. Percebi naquele instante que você era sinônimo de confusão.

Ava riu, lembrando-se que ele ficou tão vermelho quanto uma beterraba quando ela contou a ele a verdade da situação.

— Você sentiu tanta vergonha e achou que eu havia pregado uma peça. Que, de certa forma, foi o que fiz, não?

Ele olhou para a cama, o dedo seguindo a linha das flores bordadas nos lençóis.

— O que a fez pensar dessa forma naquela época? — ele perguntou, olhando para cima e sustentando o olhar dela.

A vontade de passar a mão pela mandíbula dele, sombreada com uma ínfima camada de barba crescendo era quase impossível de refrear. Ele sempre esteve lá por ela, querendo agradar e ser um amigo, um protetor.

— Eu não sei. — ela deu de ombros. — Venho pensando muito em nosso passado, e essa é apenas uma das muitas lembranças que me fazem sorrir.

— Por melhor nadadora que tenha dito ser, teve sorte de eu estar lá no dia em que teve uma cãibra e afundou, se debatendo, se bem me lembro.

Ele sorriu e ela riu, embora na época o incidente foi de tudo menos divertido.

— Haverá momentos em nossas vidas em que ocorrerão acidentes ou situações em que não estaremos juntos. Eu queria que você soubesse que o que aconteceu conosco três dias atrás estava fora de nosso controle, completamente. Você não precisa ficar e cuidar de mim, Tate. Eu vou ficar bem.

Ava estendeu a mão e colocou em cima da dele, deleitando-se com o calor e que ele virou a palma para cima, dando um breve aperto na mão dela:

— E de qualquer maneira, é apropriado que você esteja aqui, Sua Graça? — ela perguntou, sorrindo com malícia.

O olhar intenso dele, que estava carregado com emoções demais para ela lidar, penetrou nela.

— Você quer que eu saia?

Ela refletiu por uma fração de segundo.

Ava negou com a cabeça, falhando para com seus instintos, indo contra as promessas que fizera de que sempre seria dona de si. De não responder a ninguém, de não pertencer a vivalma.

— Não, eu não quero que você vá. — disse ela por fim, sincera em cada palavra.

— Que bom, então. — disse ele, inclinando-se e dando um beijo suave em sua bochecha. — Porque eu não quero sair. — sussurrou no ouvido dela.

Ava estremeceu e se virou, deixando os lábios perto o suficiente para beijá-lo. Sem se lembrar do pulso ferido, ela voltou a atenção para os lábios dele, ainda tão tentadores como sempre foram. Um desejo feroz a atravessou por ter ficado longe dele por tantos anos.

Ela se afastou quando a porta se abriu e a criada entrou com água quente e roupa de cama limpa.

Por um momento, Tate não se mexeu.

Em seguida, se afastou com um suspiro pesado. O olhar intenso dele a deixou sem fôlego, e ela podia sentir as bochechas queimando. O que ele estaria pensando depois do quase beijo?

estaria esperando a criada sair? Ou ele estaria apenas debatendo se deveria esperar e beijá-la de qualquer maneira, com espectadores ou não.

Ele se inclinou e pegou a bandeja de café-da-manhã, colocando-a diante dela.

— Obrigada. disse ela, pegando a xícara de chá e tomando um gole.

Ava dispensou Jane e ignorou a expressão assustada que a moça fez ao ouvir as ordens.

— Devo admitir que me sinto voraz esta manhã.

— Eu também. — ele murmurou, sem divertimento no tom. —

Virei visitá-la amanhã, Ava. Há algumas coisas que preciso discutir com o agente de Bow Street. Ele chegou hoje de Londres. Parece que há uma chance de ser Lorde Matthew Oakes, o visconde, o responsável pelos incêndios.

Um calafrio percorreu a espinha dela ante a menção de Matthew, um homem que ela nunca mais queria ver. Um homem que ela se prometeu que nunca mais a tornaria uma vítima. Ava estendeu a mão e apertou o braço de Tate, interrompendo sua partida.

— Não, espere, Tate. Quero dizer, Sua Graça. Tem certeza de que Lorde Oakes é o suspeito? Eu pensei que ele estava na Espanha.

— Estava, mas retornou ao país uma semana antes do incidente em Cleremore.

Ava ofegou, e ele franziu a testa, estudando-a por um momento.

— O que você sabe de Lorde Oakes?

Náusea a dominou ao pensar em contar a Tate a idiota que ela fora no ano anterior, logo que retornou à Inglaterra e descobriu que Tate estava em Londres vivendo sua vida ao máximo, rodeado de diversas mulheres, sendo que nenhuma delas era ela. Que ela agiu por ciúme e devido à sua tolice cometera um erro que quase custou sua vida e reputação.

— Ele não é confiável, é tudo o que sei dele.

— Você está mentindo que eu sei, Ava. — disse ele usando seu nome de batismo, o que a assustou um pouco. — E, por favor, permita-me chamá-la pelo primeiro nome, e você faça o mesmo comigo. Acho que nos conhecemos há tempo suficiente para nos tratarmos assim quando estivermos a sós.

Ela encontrou o olhar dele, gostando da ideia.

— Muito bem, vamos usar nossos primeiros nomes.

A resposta dela foi, em parte, para enrolar e não responder a pergunta que ele fez. Como ela poderia explicar que as fofocas da cidade foram como uma faca no coração dela, que a haviam deixado tola e cega? Que cometera um erro que não havia como remediar.

— Conheço Lorde Oakes um pouco. Há rumores de que ele está com problemas financeiros, mas iniciar incêndios no condado em que reside não faz sentido. Acho difícil acreditar que ele tenha alguma coisa a ver com esse assunto. Até onde sei, ele nunca mostrou tamanha crueldade com os animais.

Porém, ela havia visto muito bem como ele reagia com as pessoas, em especial com ela, quando ele não conseguia o que queria.

O duque voltou a sentar-se ao lado dela que se afastou um pouco, seu tamanho e presença a dominando, confundindo sua mente, e ela precisava manter o juízo. Precisava se lembrar de que não queria um marido, que ele não se encaixava no futuro planejado com os mínimos detalhes por ela, como uma velha matrona.

Ava pegou um pedaço de torrada e deu uma mordida, ocupando-se, tanto quanto podia, na esperança de que ele se esquecesse dessa parte da investigação e voltasse para casa.

— Se você sabe algo de Lorde Oakes, precisa me dizer. Eu não o vejo desde que ele era um garoto de calças curtas, e pelo que me lembro, ele nunca foi de dar trabalho. Porém, caso você saiba de algo que possa explicar o porquê de ele talvez ter sido visto em Cleremore e agora na propriedade de Lorde Morton, é imperativo que me conte.

Pensando na noite do incêndio do duque, o cavalheiro que gritara notificando-os do segundo incêndio com certeza se encaixava nas características de Lorde Oakes. Ava deixou a ideia de lado. Agora ela estava imaginando coisas. Havia tanta coisa acontecendo naquela noite, tantas pessoas que poderia ter sido qualquer um, até um dos funcionários do duque.

— Eu não sei de nada. — disse ela, afastando o café-da-manhã.

Tate pegou a bandeja e a colocou na mesinha ao lado da cama.

— Ava. — ele disse, erguendo o queixo dela para que olhasse para ele. — Você pode me dizer qualquer coisa. Por favor, é importante.

A súplica dele atingiu uma parte dela, que ninguém mais além dele conseguia alcançar. Ela suspirou pronta para aceitar o golpe da desgraça de um modo ou de outro.


— Isso é apenas o que sei acerca do caráter de Lorde Oakes.

Não tenho conhecimento ou motivos para suspeitar de que ele possa ter iniciado os incêndios.

— É claro. — disse ele com paciência, esperando que ela começasse a explicar.

Ava mordeu o lábio, tentando encontrar as palavras certas para contar a Tate de sua vergonha.

— Quando retornei para a Inglaterra, voltei logo para Berkshire para assumir a propriedade aqui. Soube que você estava morando em Londres, e ouvi os rumores acerca da vida você levava. — Tate se mexeu na cama, e ela sorriu quando um resquício de rubor tomou as bochechas dele. — Das mulheres com quem se entretinha, e de quantas foram. — Ava queria contar a ele como a notícia arrancou seu coração pela segunda vez, mas ela não conseguiu. Ele nunca poderia saber o quanto ela sentia falta dele quando não estava se iludindo. — Cometi um erro terrível, que nunca poderei reparar.

TATE ESPEROU em silêncio que Ava dissesse o que sabia de Lorde Oakes, e o embaraço que ele reconheceu no olhar dela o deixou reticente. Ele não pôde deixar de imaginar o que ela sabia do homem que a deixava tão desconfortável. Até então, ele não sabia

que ela conhecia Sua Senhoria tão bem, mas o desconforto ao falar dele e a tentativa de evitar contar o que havia acontecido gelaram seu sangue.

Ele fechou os olhos por um momento, odiando o pensamento de que ela pudesse ter sido cortejada pelo cavalheiro. Que talvez ela pudesse gostar de outra pessoa, o suficiente para ter certo apego, mesmo que o sentimento não passasse de amizade. Ele não queria que ela estivesse com mais ninguém. Todo o tempo em que ele esteve no exterior, seu último pensamento antes de dormir era ela.

— Diga-me, Ava.

"Por favor" pairou em seus lábios, mas ele mordeu freou a palavra. Ela diria a ele quando estivesse pronta.

— Nós nos conhecemos por causa do haras. Na época, Lorde Oakes era dono de um puro-sangue, Majesty, que ele queria que fosse treinado por nós. Entre a realização da castração e o cavalo ser retirado das competições mais tarde, formamos uma amizade.

Bem, pelo menos eu pensei que era uma amizade.

Ele sentou um nó duro se formar em seu estômago, mas controlou suas feições, não queria assustá-la.

— E ele acreditava que era mais do que amizade benigna?

Ela encontrou o olhar dele por um breve instante antes de desviar o rosto.

— Sim, ele pensou que poderia haver mais. Ele me propôs ser amante dele. Disse que estava cortejando uma herdeira que logo resolveria seus problemas financeiros, mas que ela era uma mulher que preferia a vida urbana. Uma amante no interior, não muito longe de sua propriedade, seria favorável.

— Ele não a quis como esposa?

Tate fechou a boca com força, para que sua voz não denunciasse o desgosto e repugnância que sentia por Lorde Oakes.

O desgraçado queria usar Ava como prostituta. Ele sentiu a raiva o consumir, mas manteve a compostura sabendo que o descontrole não ajudaria Ava a terminar seu relato.

— Não, não como esposa. — Ava se mexeu debaixo do cobertor por um momento, perdida em pensamentos. — Eu pensei, por um tempo, ser capaz de tal coisa. Decerto, ele é bonito e parecia doce de verdade. E como eu não tinha intenção alguma de me casar, a ideia de ter um amante não soou detestável. Então, eu concordei.

Tate levantou-se, passando a mão pelo cabelo, uma infinidade de imagens correndo por sua mente. Sua cabeça martelava, e ele acreditou que poderia vomitar.

— Você se entregou a ele? — as palavras saíram tensas, e ele não tinha certeza do que deveria fazer.

Ava ficou em silêncio por um momento, o rosto pálido.

— Não, nunca fomos tão longe, mas ele chegou muito perto. Se minha criada não tivesse entrado depois de ouvir um barulho estranho, sim.

Choque e repulsa o atingiram como uma bala, e ele foi até ela.

Sentou-se na cama e a abraçou.

— Ava, não. — ele a abraçou com força, desejando estar lá para protegê-la. Ela ficou rígida nos braços dele por um momento, e ele suspirou de alívio quando ela relaxou e o envolveu com os braços, afundando no abraço dele. — Sinto muito, minha querida.

Ele a sentiu estremecer em seus braços e, para seu choque, percebeu que ela estava chorando.

— Estou tão envergonhada, Tate. Eu o levei a acreditar que queria um relacionamento assim, mas quando ele pressionou por mais, percebi meu erro. Tentei explicar, pedir desculpas a ele pelo engano, mas ele ficou tão bravo, tão violento. As palavras que ele

gritou para mim não eram nada do que eu já ouvira, e quando eu tentei sair do quarto, ele não me deixou.

Tate a embalou levemente em seus braços.

Todo esse tempo ele estava em Londres, dormindo com damas da sociedade dispostas, e a mulher que sempre possuiu seu coração, sua bela e atenciosa Ava estava sendo agredida. E ele não estava lá para salvá-la.

— Eu sinto muito. Eu gostaria que você tivesse mandado me buscar. Eu estaria aqui por você.

E ele teria matado Lorde Oakes por sua atitude. E mesmo que ficasse provado que ele não era o incendiário, Tate ainda se vingaria dele por Ava. Isso, ele poderia prometer ao desgraçado. Ele o desafiaria se fosse necessário.

— Ninguém sabe. — disse ela, afastando-se um pouco, os olhos inchados e vermelhos. — Ninguém pode saber. Precisei guardar este segredo, um pesadelo sujo que poderia arruinar tudo o que meu pai e eu construímos. Se alguém da Sociedade descobrisse que eu cogitei ser amante dele, poderia me arruinar.

Seu coração doía por ela, por não poder remediar sua dor. Ele a abraçou, não querendo soltá-la jamais.

— Fiz minha criada jurar não contar a ninguém, e até hoje ela não o fez.

Ele enxugou as lágrimas que escorriam pela bochecha dela.

— Você não tem nada do que se envergonhar, Ava. As ações dele pertencem somente a ele, e dizem mais sobre o tipo de homem que ele é, e que tipo de código moral ele segue. Você não teve nada a ver com as escolhas dele. As pessoas podem mudar de ideia, não há lei contra isso.

Ela sorriu em meio as lágrimas, estendendo a mão para cobrir a dele que ainda repousava em sua bochecha.

— Obrigada por dizer isso. Tento pensar assim, reprimir o horror daquela tarde, mas às vezes é difícil.

— Nunca ceda a esses pensamentos, pois eles apenas fazem com que Lorde Oakes tenha poder sobre você. E se há algo que sei de você, e que admiro e adoro igualmente, é a sua mente e a ferocidade que fervilha em sua alma. Você é uma boa pessoa, Ava.

O que aconteceu com você não foi.

Mesmo quando crianças, ela sempre fora a pessoa mais gentil que ele conhecera, e talvez este seja o motivo para ele ter gravitado em torno dela todos esses anos após aquele dia em que se conheceram e nadaram juntos no rio.

O casamento dos pais dele era bastante amigável, mas sua mãe era uma duquesa dura, muitas vezes fria e implacável. Seu pai meio que nunca estava lá e, portanto, a vida em família, a conexão entre pai e filho, como a que Ava mostrava ter com o pai dela, era algo novo e surpreendente para ele. Ele queria viver algo parecido. E

assim que se tornaram amigos, o pai de Ava o acolheu na família e eles se tornaram um bando de três.

— Isso aconteceu depois que seu pai faleceu?

Tate não podia acreditar no que estava ouvindo. Ele se levantou e foi até a mesa de Ava, perto da janela do quarto, e se serviu de um copo de água. Ele estava sentindo a náusea embrulhar seu estômago, a ameaça de vômito. Ele precisava desafiar esse homem. Enfiar uma bala no meio da testa e deixá-lo para apodrecer no meio da floresta.

Saber que Ava carregava esse fardo sozinha trouxe tanta culpa ao corpo dele que quase o fez cair. Por amá-la com tanto fervor, ele deveria ter voltado a Berkshire e garantido que ela fosse protegida após a morte do pai. Ele deveria ter garantido a segurança dela, não

importa que escolha ela tivesse feito em relação ao futuro, seja com ele, com outra pessoa ou com ninguém.

— Eu não tinha ninguém que pudesse desafiá-lo, entende. Como bem sabe, não tenho irmãos e, com a morte de meu pai, só me restou conviver com a lembrança devastadora de que quão perto cheguei de me arruinar. Descobrir que ele talvez seja o homem por trás desses incêndios criminosos que aconteceram aqui no interior...

— ela sacudiu a cabeça, os olhos no chão. — Eu queria nunca mais vê-lo, sabe, mas temo que com tais acontecimentos, não seja inevitável.

Era mais do que desprezível, e Tate não pôde deixar de se perguntar por que Lorde Oakes agia de maneira tão violenta. Ele estava mal da cabeça, ou apenas sentia raiva dos vizinhos bem-sucedidos, por ele não ter conquistado nada no mundo das corridas? Ou seria por causa da recusa de Ava em se tornar a amante dele.

— A parte egoísta em mim não quer ter que voltar a enfrentá-lo.

Me considera covarde por dizer isso? — ela perguntou, encontrando o olhar dele.~

Medo espreitava naquelas esferas marrons escuras, e o coração dele se despedaçou por ela. Ele podia entender por que Ava não queria nem ver Lorde Oakes. Mas não significava que ele não poderia ir encontrar Sua Senhoria. Desafiá-lo, colocar uma bala na cabeça dele e pôr um fim em todos os problemas.

— Eu vou matá-lo. — ele murmurou para si.

Ava ofegou, e Tate se encolheu ao perceber que Ava o havia escutado. Ela afastou a roupa de cama, levantou-se e foi até onde ele estava perto das janelas. Ava apertou seu braço e o puxou para encará-la.

— Você não fará isso, Tate. Só para começar, duelos são ilegais.

Se ele é o homem que está causando todos esses incêndios, então vamos lidar com ele através da lei, e precisamos agir sem que ele saiba. Não há provas do que ele fez comigo e, embora tenha tentado, ele não teve sucesso com o ataque. Se ele descobrir que suspeitamos dele pelos crimes na sua propriedade e na de Lorde Morton, ele vai me arruinar perante a Sociedade e sentirá prazer em fazê-lo.

— Eu não posso deixá-lo livre pelo que fez a você.

O aperto dela cedeu, e ela deslizou a mão pelo braço dele, até pegar sua mão.

— E não vamos deixá-lo sair impune. Sei que ele está com poucos recursos financeiros. Ele precisou vender tantas de suas propriedades que chegou ao ponto de só ter posse da casa e um ou dois acres além. Vê-lo ser trancafiado pelos crimes de incêndio e assassinato já é o bastante para mim. Ele não poderá voltar a prejudicar nenhuma outra propriedade, animal, ou mulher se estiver em Newgate.

— Não é o suficiente para mim, Ava. — ele deu um passo na direção dela e cobriu as duas bochechas dela com as mãos. — Ele tentou tomar o que não lhe foi oferecido de boa vontade. Não posso permitir que ele se safe de um crime tão hediondo.

Os olhos dela se encheram de lágrimas, e a repugnância que ele sentia por Lorde Oakes dobrou.

— Eu sei que você quer defender minha honra, e agradeço. Sou muito grata. Nos conhecemos há tanto tempo, Tate. Mas não é seu papel me salvar. Não vou deixar que você se coloque em perigo por algo de que prefiro me esquecer. Por favor, deixe no passado, onde pertence.

As feridas físicas de Ava poderiam ter cicatrizado e desaparecido, mas o que o visconde havia feito a ela ainda era vívido em sua mente. Então, não. Ele iria se vingar do desgraçado, fosse ele culpado ou não dos ataques aos estábulos.

Ele suspirou, deixando a conversa cessar.

Ainda havia feridas abertas, e ela não precisava ficar se lembrando de seu agressor nem se preocupar com as ações de Tate contra ele neste momento.

— Venha. — disse ele pegando a mão dela e puxando-a de volta para a cama. — Você precisa descansar. Prometo que não farei nada até que possamos conversar melhor acerca disso, quando você estiver recuperada.

Tate a ajudou a voltar para debaixo das cobertas, afofou os travesseiros atrás da cabeça dela e serviu outra xícara de chá para ela.

— Vou sair agora, para que descanse. Voltarei hoje à noite, talvez possamos jantar juntos aqui.

Ela olhou para ele com malícia.

— Acredita ser sábio, Sua Graça? Sua reputação como libertino está bem viva e solidificada em Londres. Não deveria jantar comigo em meu quarto.

Ele balançou a cabeça espantado com a capacidade dela de fazer piada e ser doce, ainda mais em um momento como aquele, que ele sabia que ela estava ferida. A grande verdade era que ele não deveria estar no quarto dela nem naquele instante, quanto mais à noite para jantar. Mas antes de tudo eles eram amigos, e caso ela ainda não estivesse bem para descer as escadas, então sim, ele iria jantar nos aposentos dela.

— Voltarei para jantar e dane-se o que a Sociedade diga.

Ele a deixou então, desceu as escadas e saiu pela porta, precisava de seu cavalo e correr o máximo possível.

Em poucos minutos ele estava galopando na direção da propriedade dele, mas não seria logo que pisaria lá. Tate precisava clarear a cabeça, acalmar o sangue e planejar a queda de Lorde Oakes. Ele incitou o cavalo a pular uma sebe antes de reduzir a velocidade para atravessar o pequeno riacho. Ava teria justiça, e ele seria o responsável por fazê-la. E caso ele tivesse prazer ao fazê-lo, melhor ainda.

CAPÍTULO 11

Estou livre do que senti por você em algum momento. Desejo o melhor em tudo que a viga traga para você, e que seja feliz, não importa o que aconteça.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone.

U ma semana depois, Ava, com o pulso ainda enfaixado, encontrou Hallie no corredor, ela estava recebendo as cartas de um criado.

— Alguma coisa para mim? — ela perguntou, pedindo chá e entrando na biblioteca onde decerto havia uma pilha de cartas e o trabalho negligenciado na semana anterior por causa do pulso torcido.

Considerando o quão dolorido estava a apenas dois dias atrás, ela ficou surpresa ao acordar sentindo-se relativamente bem. É

claro que ainda não recuperara todos os movimentos, mas era uma melhora drástica.

As visitas diárias de Tate também a ajudaram a se curar, tanto da lesão como em seu coração, fazendo a escolha consciente de nunca se casar, de nunca procurar um parceiro ainda mais difícil de ser cumprida. Por diversas vezes ela se pegou contemplando as possibilidades.

Observava-o enquanto lia as poesias e romances góticos de que ambos desfrutavam, ponderando acerca de um casamento com ele

e tornar-se duquesa, se tal fato ainda lhe daria a liberdade de que desfrutava agora. Ou será que precisaria comprometer um pouco de sua independência? Por sua vez, será que Tate permitiria que ela fosse a mesma de agora devido ao que se espera da esposa de um duque?

— Há uma carta de Willow. — disse Hallie, quebrando o selo e passando os olhos pelo conteúdo. — Ela nos quer em Londres por uma semana ou duas. Para comparecer a alguns bailes a que ela foi convidada pela tia-avó por casamento, a viscondessa Vance.

Hallie sentou-se em um sofá próximo e continuou a ler a missiva:

— Ela diz algo acerca do fim próximo da pequena temporada e nos quer lá com ela antes de partirem para a propriedade rural da viscondessa.

Ava foi para a cadeira detrás da escrivaninha e sentou-se, remexendo nas cartas que estavam cuidadosamente empilhadas diante dela.

— Havia me esquecido de que Willow tem uma tia de título. Ela diz algo a ver com o que Sua Senhoria pensa de nossa visita?

Hallie examinou a nota ainda mais.

— Sim, afirma aqui que Sua Senhoria anseia por conhecer as amigas de escola de Willow, e que somos bem-vindas a ficar em sua casa na Berkley Square.

Hallie olhou para cima, os olhos brilhando de excitação.

Era um convite adorável e um que até Ava nunca recusaria. Não que ela desejasse por si participar de eventos em Londres por uma semana ou duas, mas Willow era uma de suas melhores amigas no mundo inteiro, e se pedia para que fossem fazer companhia, então Ava faria isso. Sem dúvidas.

— Vou informar minha criada pessoal, para que arrume tudo para a nossa partida na próxima semana.

— E o seu pulso? — Hallie perguntou, dobrando a carta.

Ava deu de ombros.

— Estará ainda melhor na próxima semana, e as luvas esconderão quaisquer hematomas que persistam até lá. Se alguém vir a lesão, serei sincera e contarei que caí do cavalo. Ninguém fará maiores questionamentos.

Hallie recostou-se na cadeira, estudando-a por um momento.

Ava pegou as cartas e se ocupou em separá-las e abri-las.

Quando Hallie ficava quieta como estava agora, era sinal de que sua mente, afiada e onisciente, estava agitando-se com perguntas.

— E quanto ao duque?

Ava deu de ombros, lendo uma carta de seu fornecedor de ração em Ascot.

— O que tem o duque? Tenho certeza de que ele é mais do que capaz de se manter ocupado enquanto estivermos fora.

Ava sorriu para a amiga, determinada a fugir dos questionamentos.

— Você sabe que não foi isso que eu quis dizer. Hallie ergueu a sobrancelha, perplexa.

— Ele acabou de voltar da cidade, e você se engana se pensa que ele voltará a Londres só porque fomos convidadas a passar alguns dias.

Hallie riu, balançando a cabeça.

— Acho que se alguém está a se enganar, é você. O homem está apaixonado por você, e sabe disso. Ora, no dia em que ele a carregou até em casa depois da queda que você sofreu, ele parecia estar prestes a ter um ataque apoplético. O medo gravado no rosto dele por causa do seu ferimento não era apenas uma preocupação de vizinhos, ele ficou em pânico pela possibilidade de ser mais grave, embora felizmente não tenha se concretizado.

A menção de que o duque ficara muito preocupado com ela trouxe uma sensação quente e reconfortante à sua alma. Ela mordeu o lábio, incapaz de esconder o sorriso que se formou em seus lábios. Afastou o pensamento, lembrando a si que não queria que ele a cortejasse, que forjassem um novo compromisso. Ele precisava se casar com uma mulher que fosse adequada para um duque. Uma mulher que quisesse de fato tal posição e todas as amarras que a acompanhavam.

UMA SEMANA DEPOIS, Ava saia da carruagem da viscondessa com a ajuda dos cocheiros de Sua Senhoria e seguiu a viscondessa Vance e as amigas pelas escadas da casa do Conde Tinley.

Dizia-se que o baile desta noite era o evento mais procurado de Londres devido ao fato de o anfitrião ter um parentesco distante com o rei George IV. Todos que eram alguém iria querer estar presente, e a viscondessa e as amigas de Ava não eram exceção.

Não que o rei se prestasse a participar de um evento como esse, ainda mais os anfitriões sendo parentes distantes, mas era o bastante para tornar as conversas interessantes. O salão estava iluminado com centenas de velas de cera, que garantia um brilho dourado e mágico ao espaço. Os músicos estavam em uma pequena varanda com vista para o salão de baile. Tocavam um minueto, e alguns dos convidados já estavam dançando e outros os assistiam, conversando e socializando com seus pares.

Naquela noite, Ava escolhera um vestido de seda dourado e usava as pérolas de sua mãe nos cabelos. Uma criada de Sua Senhoria, mestre nos mais recentes penteados ensinara a criada de

Ava a fazer um conjunto intricado, de forma que a joia estava trançada aos seus cachos escuros como uma peça de arte.

Felizmente, as luvas de seda escondiam as mãos e o pulso machucado, sem mencionar as unhas que não eram tão bem mantidas devido ao trabalho constante com os cavalos. Ela sorriu quando Hallie colocou o braço no dela, a amiga quase pulava de expectativa.

— Como é emocionante, Ava. Faz tanto tempo desde que estivemos nesse meio, se é que já estivemos. Posso garantir que não há bailes como esse no Egito.

Não.

Hallie estava certa.

Mantendo-se perto da viscondessa que ia para o lado oposto do salão, Ava notou alguns olhares curiosos dos presentes e acenou para aqueles que ela conhecia do mundo das corridas.

Era curioso que alguns dos olhares que lançaram a elas eram de apreciação e curiosidade e, pela primeira vez, Ava parecia aproveitar seu tempo em Londres.

Pararam ao lado de uma lareira bem iluminada, um espelho com moldura de ouro que era da largura da estrutura da lareira estava disposto acima do parapeito e refletia a luz e os convidados. Tudo na sala gritava privilégio, e ao olhar em volta não conseguiu evitar de pensar em Tate. Este era o mundo dele, a vida dele.

Os móveis, o excesso e a riqueza expostos, as joias, os vestidos de seda importados e as roupas masculinas, o tom e a maneira de falar, faziam parte de uma vida a que ele estava acostumado a viver.

Ava olhou analisou o salão e avistou a duquesa-viúva de Whitstone conversando com um grupo de matronas, sem dúvida todas com título próprio e casadas com outro. Ela não havia cogitado que a viúva estaria de volta à cidade, considerando que

havia chegado a Berkshire a tão pouco. Sua Graça a viu e, erguendo o nariz para o ar, a cortou sem cerimônia. Ava não deveria ter esperado nada menos, mesmo assim a afronta doía.

— Aqui está uma taça de champanhe para você, Ava. Beba, é uma delícia.

Ela riu, pegando a taça de Willow.

— Obrigada. — disse ela, afastando o olhar da viúva e das poucas mulheres que a olhavam ao mesmo tempo. Ava não era ingênua a ponto de não saber que a mãe de Tate estava espalhando mentiras cruéis sobre ela. Afastou a decepção por não conseguirem ser civilizadas uma com a outra e aproveitar o baile.

Os anos que ela passou na escola na França não permitiram tais passeios. Elas não podiam participar de danças e bailes que a nobreza francesa participava. Muitas vezes só lhes restava a companhia uma da outra. O isolamento do mundo exterior apenas serviu para solidificar ainda mais a amizade delas, como se o sentimento estivesse gravado em pedra. Era uma pena que Evie e Molly não estivessem aqui. Elas iriam adorar uma noite como esta.

Um cavalheiro curvou-se diante de Ava e da viscondessa.

Era um homem atraente, aparentava ser da idade de Ava. O

cabelo, apesar de bem curto, combinava com ele. Ele era um pouco mais baixo do que Tate, porém mais alto que Ava, o que ela gostava. Mas eram os olhos dele, divertidos e bonitos que se destacavam, uma característica que Ava sempre procurava ao conhecer pessoas novas. Pode se descobrir muito ao olhar para a alma de uma pessoa.

— Lady Vance, poderia me dar a honra de ser apresentado à suas amigas?

A viscondessa sorriu, apontando para cada uma conforme nos apresentava.

— Minha sobrinha, Srta. Willow Perry, e suas amigas Srta. Ava Knight e Srta. Hallie Evans. Este, queridas meninas, este é o marquês de Harlan.

Ava mergulhou em uma reverência e Sua Senhoria as observou uma a uma com um olhar contemplativo.

— Prazer em conhecê-las, a todas. E Srta. Knight, caso a senhorita não tiver prometido a outro, gostaria de dançar o cotilhão comigo?

Ava olhou para Hallie e ante o aceno de aprovação dela, esticou a mão.

— Eu gostaria muito. Obrigada, milorde.

Ele pegou a mão dela e a colocou no braço, levando-a para o centro do salão.

— Você é de Berkshire, pelo que sei. Não há um Haras de competição, muito famoso, com este nome? — ele perguntou, deslizando-os com habilidade entre a multidão.

— Eu... sim, existe. Meu pai criou e treinou cavalos até morrer.

Agora sou eu quem administro o Haras Knight.

Os passos dele se tornaram mais lentos, e ele riu, cruzando o olhar com o dela outra vez.

— Arrá, então a senhorita é a famosa treinadora de cavalos de que tanto se fala. Você possui a mais alta estima. Não sabia?

Ele a puxou para a frente, e Ava levou um instante para controlar o orgulho que a preencheu por saber que seus estábulos eram tão bem vistos.

— Obrigada, meu senhor. Fico feliz em saber que é assim. Com certeza, fazemos o possível para criar e treinar os melhores cavalos de corrida que pudermos.

É claro que alguns cavalos nunca ganharão o primeiro prêmio, mas não significa que não possam gerar um que o consiga. Este é

um erro comum a muitos treinadores, vendem cavalos que poderiam muito bem ter uma descendência vencedora. Algo que Ava e seu pai se recusavam a fazer, a menos que tivessem testado o cavalo na pista.

Eles se posicionaram para a dança, e Ava olhou em volta, absorvendo a grandeza. Era bem improvável que ela voltasse à cidade depois desta semana, muito menos para participar da Temporada. Sendo assim, ela aproveitaria essa oportunidade ao máximo. Mesmo que só para fazer contato com pessoas da alta sociedade que poderiam se interessar em possuir um puro-sangue no futuro.

A dança foi agradável e, embora Ava não participasse de um cotilhão há alguns anos, os passos que ela aprendeu com a professora de dança quando jovem eram algo que ela não havia esquecido. Durante a hora seguinte, ela dançou mais dois conjuntos com outros cavalheiros e permaneceu ao lado da viscondessa quando Hallie e Willow também dançaram.

A noite foi uma bela e agradável surpresa, considerando que ela não gostava de tais eventos e nunca se esforçara para participar deles.

Ava tomou um gole de vinho enquanto esperava que as amigas retornassem da dança quando um calafrio percorreu sua espinha.

Olhando para a esquerda, avistou Lorde Oakes olhando-a com diversão gelada. Sua pele formigou, e ela estremeceu, pois esperava nunca mais ver o rosto dele. A lembrança dele, empurrando-a contra as almofadas do sofá, o aperto doloroso e punitivo nos braços dela enquanto ele os prendia atrás das costas, segurando-a ainda bombardeava sua mente, e ela precisou forçar-se a segurar a ânsia.

O que ele estava fazendo ali?

Ele caminhou na direção dela, e ela se esforçou para usar todas as defesas possíveis para se preparar o confronto iminente. Ele curvou-se, sorrindo, o cavalheiro perfeito para toda a sociedade ver.

Mas Ava sabia o que se escondia por trás de seu rosto tranquilo e bonito. Era tão feio quanto o próprio diabo, e tão cruel quanto.

— Srta. Knight, que bom vê-la aqui na cidade. Senti falta de nossos encontros.

Ela olhou para os dançarinos, desejosa de que a música estivesse para terminar, para que não ficasse sozinha com ele.

— Receio, Lorde Oakes, que seu sentimento seja perda de tempo, já que eu não senti falta alguma de sua presença.

Se havia algum desejo nela, era de que ele se ferisse em algum acidente de cavalo ou carruagem. Mas, infelizmente, ele estava tão saudável quanto a última vez que ela o vira.

Ele pressionou o peito com mágoa simulada.

— Não sentiu minha falta? Acreditei que ansiaria por nosso último encontro mais do que qualquer outro. — ele se inclinou para ela, mais perto do que deveria. Ela congelou, o medo a atravessando. — Sei que eu ainda penso nessa época. Como me deixou quente. Porque, mesmo agora, fico duro só de pensar em você toda complacente embaixo de mim, gemendo e se contorcendo de prazer.

Ava se recusou a olhar para ele e soltou um suspiro quando ele se afastou. Ela não respondeu à provocação. Ele não era digno de nada dela.

— Vamos, minha querida. Somos amigos, não somos? Venha dançar comigo.

Ele tomou a liberdade de agarrar o pulso machucado, provocando dor em seu braço. Ela ofegou e tentou soltar o braço sem causar uma cena.

— Nós não somos amigos, e eu não quero dançar, meu senhor.

Quando ele a soltou, ela voltou para a viscondessa, esperando alcançar a proteção dela antes que ele a alcançasse. Ele voltou a agarrá-la pelo pulso, havia percebido a lesão e apertou ainda mais, com força.

Ava deu uma olhada furtiva em torno do salão, sentiu a pele esquentar quando notou alguns convidados observando todos os movimentos dele. Lorde Oakes, percebendo o mesmo, deixou-a ir, com um sorriso doce.

— Faça o que lhe é ordenado, Ava querida. Detestaria que Londres descobrisse que você cogitou ser minha amante.

Ela se virou para ele:

— Como você ousa! — ela sussurrou com ferocidade. — Seria sensato ficar longe de mim, Lorde Oakes, antes que seja para você que Londres inteira vire as costas.

Ele riu, a cabeça toda para trás como se ela tivesse contado uma história incrivelmente divertida.

— Você não passa de uma treinadora de cavalos. Em quem acha que a sociedade iria acreditar? Um par nobre, ou uma prostituta de Berkshire?

— Eles vão acreditar em mim.

O som da voz de Tate trouxe lágrimas aos olhos dela que piscou para afastá-la. Não queria que Lorde Oakes percebesse como ela estava aliviada que Tate viera ao seu resgate. O fato de Tate ter visto como Lorde Oakes a tratara e vir removê-lo de sua presença acabou com a miséria que ela sentia, estava feliz por sua presença.

Ela lançou um sorriso hesitante, sempre seu protetor. O duque pegou a mão dela e a colocou no braço dele.

— Chegue a um centímetro da Srta. Knight outra vez, e eu o desafiarei — disse o duque ao dar um passo na direção de Lorde

Oakes, o fazendo dar um passo para trás. —, e colocarei uma bala nesse seu crânio grosseiro. Compreendeu?

Os olhos de Lorde Oakes se arregalaram, e virando-se para Ava, assentiu.

— Temos um acordo, Sua Graça. — ele zombou.

Tate puxou Ava para a pista de dança quando as primeiras notas de uma valsa começaram a tocar.

— Você está bem, Ava? Quando vi Lorde Oakes partir em sua direção, não consegui chegar a você rápido o bastante. Me desculpe por ter sido necessário ouvir a voz daquele desgraçado.

Os passos da valsa permitiam que a conversa deles fosse mais íntima, e por nada nesse mundo Ava conseguiria tirar os olhos dele.

Ele era um homem tão bom, apesar do título ducal e todas as suas terras e dinheiro, ele ainda era melhor do que qualquer um que ela já conhecera. Um amigo, em primeiro lugar, e esta noite ele agira como um herói.

— Obrigada, Tate. É terrível ter de admitir, mas se você não aparecesse, acredito que eu teria feito papel de tola na frente de todos.

O polegar dele roçou seu ombro através da seda do vestido, e ela desejou toque dele em outro lugar. Queria sentir sua força, a segurança que ele sempre a fizera sentir mais do que qualquer coisa no mundo. Sob circunstâncias normais, ela era uma mulher forte, capaz de administrar um negócio de sucesso em um setor dominado por homens.

Ela era receptiva a ser a própria companhia, que nunca se casaria nem teria filhos. Uma decisão que ela estava contente em conviver. Mas estar nos braços de Tate outra vez, sob sua proteção, também trazia suas vantagens.

Ela havia se esquecido de como era ser amada, cuidada e protegida. Não que ela acreditasse que Tate ainda estivesse apaixonado por ela, mas com certeza se importava o bastante para querer vê-la bem.

Ele ter voltado à cidade só poderia ser por causa da presença dela aqui. Tal reconhecimento a fez ter uma sensação acolhedora e segura a envolvendo. Ava se jogou na dança, querendo aproveitar cada momento que podia nos braços dele.

— Nunca permitirei que ele volte a machucá-la. Você tem minha palavra nisso.

TATE SE APROXIMOU de Ava, esperando que seu rosto não traísse a raiva efervescente que se acumulava dentro dele. Ele mataria Lorde Oakes nem que fosse a última coisa que faria nesta terra.

Ao entrar no salão e cumprimentar os convidados, ele avistara Ava quase imediatamente. Ela era como um raio de sol de verão, que brilha com intensidade em um mar sob o céu cinzento. Ele estava com alguns conhecidos, mas no momento em que viu Lorde Oakes se aproximar dela, e notou desespero no rosto de Ava, ele sabia que Sua Senhoria estava sendo inapropriado.

Ele deixou o grupo sem dizer uma palavra e foi até ela na mesma hora. Típico do caráter de um valentão, Lorde Oakes fugiu quando Tate o ameaçou. Mas ele iria fazê-lo pagar. Um homem como Lorde Oakes era uma ameaça, um homem indigno de confiança, alguém cruel que se fosse um animal, teria sido abatido há tempos.

Sem cuidado, ele puxou Ava para mais perto do que deveria, querendo abraçá-la por inteiro e garantir, para o bem dele mesmo, que ela estava bem.

— Quer falar do que aconteceu? — ele encontrou o olhar dela e ficou agradecido por ela parecer muito mais calma do que quando a dança começou.

— Não de verdade. Tudo o que posso dizer de Lorde Oakes é que não desejo revê-lo, nem na cidade, e nem em Berkshire.

Ele assentiu, querendo o mesmo.

— Tenho uma reunião com o agente de Bow Street amanhã de manhã. Gostaria de me acompanhar? Parece que ele conseguiu informações e deseja partilhá-las. A carta que recebi ontem foi bastante imperativa quanto a nos encontrarmos o mais depressa possível.

— Será alguém viu quem começou os incêndios? Mesmo que não seja Lorde Oakes, é claro que eu gostaria de ver quem iniciou o fogo ir à justiça.

— Todos nós. — eles permaneceram em silêncio por um instante enquanto rodeavam outros casais que ali estavam. — Ava, preciso conversar com você acerca do que houve em Cleremore com minha mãe. Depois da dança, você estaria disposta a dar uma volta no terraço comigo?

Um pequeno franzir maculou a testa perfeita dela que depois de um tempo disse:

— Claro. Creio que precisamos discutir isso também.

Ele assentiu e se preparou para apreciar a dança.

De vez em quando, ele vislumbrava Lorde Oakes espreitando pelo salão, e o temperamento de Tate oscilava ainda mais.

Como o desgraçado ousava mostrar a cara perante a Sociedade?

Agora que Tate sabia o que ele havia feito, e o que poderia estar fazendo em relação aos incêndios, o demônio merecia ser banido da Sociedade Londrina para sempre, da Inglaterra, inclusive.

A dança chegou a um fim lamentável e, pegando a mão de Ava, ele a levou em direção às portas francesas que estavam abertas e a escoltou para o frescor da noite. O ar não estava gelado para a época do ano, contudo, nenhum dos aromas doces e puros que os envolviam em Berkshire estavam presentes. Aqui, o ar tinha uma pitada de pó de carvão, junto com o cheiro da madeira queimada nas lareiras internas.

Com surpresa e algum alívio, não havia outros casais no terraço para interromper a conversa. Além de que Tate não queria compartilhar Ava com ninguém da sociedade de Londres. Ele a queria só para só ele, agora e para sempre. Ele pegou a mão de Ava, a colocou em seu braço e caminhou em direção aos degraus que levam ao gramado e ao jardim além.

A partir de onde estavam, ele podia ver uma pequena estrutura de madeira no jardim que, ao luar, revelava a cobertura de hera.

Eles andaram sem pressa, felizes em estar na companhia um do outro.

— Eu quero falar com você sobre o que minha mãe disse outro dia, sei que você ouviu.

Foi um incômodo na mente de Tate desde o instante em que ele voltara para a sala de visitas e não encontrou Ava lá. O fato de sua mãe tê-la feito se sentir indesejada não era algo que ele deixaria passar. Não sem ela saber que ele não sentia o mesmo.

Ela afastou, com um movimento de cabeça, uma mecha de cabelo que caíra sobre os olhos, que voltou para detrás da orelha.

— Você não tem nada para se desculpar, Sua Graça. Não é segredo que sua mãe nunca gostou de mim e posso entender que

ela quer que se case com alguém que seja adequada. Se eu tivesse um título e várias propriedades que exigissem a produção de um herdeiro, também ficaria preocupada se meu filho, o representante de um ducado, estivesse mostrando uma preferência inabalável a uma mulher do povo que não tenha nada mais a oferecer além dos cavalos que cria.

Ele a segurou para que parasse de andar, e a olhou bem nos olhos.

— Você deve saber que a considero muito mais do que uma mera criadora de cavalos de raça. Eu não me importo com o que minha mãe pensa. Tudo o que me importa é corrigir o mal que nos foi provocado há cinco anos, e que você me dê alguma indicação de que poderia voltar a ser minha.

Ela caminhou na frente dele, e ele a seguiu sem saber no que ela estava pensando. Eles chegaram a estrutura coberta de hera, Ava entrou ali e sentou-se em um pequeno banco de madeira que havia sido colocado bem no meio.

— Minha opinião acerca de casamento mudou, Tate. Decerto você viu que eu não preciso da inviolabilidade do casamento para ser feliz, uma empresária bem-sucedida? — ela olhou para ele com preocupação. — Não é algo que eu preciso na minha vida. Não me faça negar você. Eu não quero magoá-lo.

As palavras dela fizeram-no sentir o pânico se apoderar de seus sangue, e ele veio sentar-se ao lado dela. Desejava que ela percebesse que, caso os pais deles não os tivessem separado, agora eles estariam bem casados. Talvez fossem os pais de uma horda de filhos, à frente de duas grandes estâncias de corrida, felizes.

— Estar perto de você de novo foi como acordar de um pesadelo. Minha vida não passou de um nada sem sentido e repleta

de erros. Não quero mais viver assim. Quero você em minha vida como minha esposa, minha amante e minha melhor amiga.

— Tate. — ela sussurrou, fechando os olhos por um momento.

— Existem expectativas para uma duquesa que eu não posso cumprir. Estou tão acomodada em minhas maneiras agora, os estábulos por si só já tomam grande parte do meu tempo. Como sua esposa, seríamos obrigados a viajar para a cidade, entreter, estar presente durante as sessões do Parlamento. Em que momento eu teria espaço para minhas responsabilidades? Não teria.

— É claro que, sendo minha esposa, ser uma duquesa vem com responsabilidades, mas você nunca se esquivou delas antes, não deixe que o que os outros dizem, ou o que você acredita que ocorrerá, seja a razão para descartar de vez nossa união.

Ela mordeu o lábio, a testa franziu-se.

— Não podemos ser como somos, sem pressão e ver o que acontece? Há muito que preciso considerar, refletir.

Tate passou a mão pela mandíbula, desejando que nunca tivessem se separado. Que o tempo não tivesse forçado Ava a encarar as coisas sozinha. Ele queria estar lá com ela quando ela tomasse decisões, apoiar e incentivá-la em seus esforços. Ele faria o que ela pedisse, daria a ela tempo, provaria sua lealdade, seu amor e ele esperava... reconquistar seu coração?

— Farei qualquer coisa que me pedir. — disse ele, cada palavra sincera desde o âmago de sua alma.

Ela se virou para ele no banco, os lindos e inocentes olhos analisaram o olhar dele por um momento, e ele sentiu o sangue ferver com a determinação que encontrou ali naquelas orbes castanhas.

Ela estendeu os braços e apertou as lapelas da jaqueta dele, em seguida, deslizou as mãos pelo peito dele. Ele fechou os olhos,

deleitando-se com o toque dela que, apesar de tudo, não era o bastante. Ele queria mais, muito mais.

— Mais do que tudo; neste momento, eu quero que você me beije, Tate.

O corpo dele rugiu de desejo, sentiu-se desesperado para beijá-

la. Foi como se os anos não tivessem passado, e a segurando pelo queixo, ele virou o rosto dela e baixou para tomar seus lábios.

Suspirou ao sentir o sabor dela outra vez. Os lábios macios e receptivos de que ele ainda se lembrava de com que ainda sonhava.

As mãos dela agarraram o casaco de noite dele, segurando-o com firmeza, mas ele não iria a lugar algum. Se ela assim desejasse, ele jamais voltaria a deixá-la.

Tate se perdeu com cada toque da língua dela, os suspiros suaves e pequenos beliscões que ela deu nos lábios dele e que o provocavam e o trouxeram de volta à vida dela. O beijo foi como se eles nunca tivessem se separado. Como se o tempo tivesse parado.

Ele a puxou com força contra ele, e o gemido suave dela acendeu o desejo dele.

O beijo se aprofundou, mudou, tornou-se mais selvagem e cru.

Não importava o que Ava havia acabado de dizer, esse beijo dela contava outra história. Ela ainda o queria com tanto fogo e necessidade quanto ele, e isso lhe dava esperança.

Ela pertencia aos braços dele, à vida dele.

— Eu senti tanto a sua falta. — disse ele, beijando-a no pescoço, deliciando-se com lóbulo da orelha, sabendo o quanto ela gostava daquele gesto. Ela estremeceu nos braços dele, e envolveu o pescoço dele com os braços.

— Eu também senti sua falta. — ela sussurrou contra os lábios dele.

Ele a beijou de novo, e ela gemeu.

Tate aproveitou a oportunidade para puxá-la ainda mais perto.

Eles nunca haviam sido tão íntimos antes, mas de alguma forma agora que eram mais velhos, talvez mais sábios, essa proximidade parecia natural, o próximo passo para eles.

Tate precisou lembrar a si que Ava era inocente, uma mulher que já havia passado por muitos problemas, e a última coisa que ele queria fazer era assustá-la ou levá-la a um ponto em que não estava preparada.

E então ela se moveu, colocando-se quase no colo dele, e o sangue dele tornou-se lava. Ele parou um momento, sem saber o que ela estava fazendo, e então ela se moveu, ondulando contra a rigidez dele, e ele lutou para não se perder como um garoto de dezoito anos sem experiência.

— O que é isso que você está me fazendo sentir? — ela perguntou, apertando a nuca dele e cruzando o olhar com o dele.

Os olhos dela estavam nublados, brilhantes e cheios de desejo.

Os lábios de Tate se ergueram em um meio sorriso:

— Desejo, necessidade.

— Ah. — ela disse, assentindo de leve e ondulando um pouco mais forte contra o membro dele que crescia. Ele trincou a mandíbula, lutando contra a tentação de erguer as saias dela e tomá-la ali mesmo no jardim. — Eu gosto. — ela sussurrou contra o ouvido dele, o arfar de suas palavras acelerando ainda mais o sangue dele.

— Eu também gosto. — ele rosnou, as mãos nos quadris dela, ajudando-a com seu empenho.

O som de risadas e tilintar de copos chegou através da hera, e ela congelou. Era todo o aviso que eles precisavam para saber que não estavam mais tão sozinhos. Tate se desenroscou dela com relutância, e afastou Ava dele.

Sob a parca luz da lua que chegava neles na pérgola, ele verificou se o vestido dela estava de volta ao lugar devido e se o cabelo dela não estava despenteado pelo beijo. Ela sorriu para ele quando ele fez uma última inspeção de sua aparência e seu coração apertou. Ele a adorava e não suportaria perdê-la pela segunda vez.

— Parece que fui bem beijada, duque? — ela perguntou.

Ela parecia ter sido beijada como se não houvesse amanhã, o que o fez desejar fazer de novo. Ele iria, é claro, mas da próxima vez seria em um ambiente mais privado.

— Acho que devemos ficar aqui por alguns minutos até que pareça menos suspeito.

E a esperança era que, passados alguns minutos ainda longe do baile, os lábios de Ava retornariam ao normal, sem resquícios do inchaço e vermelhidão causados pelos exercícios deles. Ela estendeu a mão e ajeitou o cabelo dele, ajustou a gravata e o colete dele, garantindo que tudo estivesse no lugar exato que deveria.

— Pronto. — ela disse, assentindo uma vez. — Assim está melhor. Agora você também não parece tão desgrenhado.

O som de casais no terraço diminuiu e Tate aproveitou a oportunidade para olhar através da hera, e ficou satisfeito ao ver que todos haviam retornado para dentro da casa.

— Venha. — disse ele pegando a mão dela e puxando-a de volta para o terraço. — Creio que seja seguro voltarmos ao baile.

Sem nenhum problema, ele devolveu Ava à viscondessa Vance e cumprimentou as amigas dela que a esperavam com paciência ao lado de Sua Senhoria quando Ava o apresentou a todas.

Os olhos arregalados da Srta. Perry ao vê-lo o levaram a acreditar que ela não conhecera muitos duques em sua vida.

— Quando pretende retornar para Berkshire? — ele perguntou, antes de sair.

— Viemos para ficar por uma semana, Sua Graça. — Ava respondeu. — Willow teve a gentileza de nos convidar para visitar a cidade e participar dos poucos eventos restantes da pequena temporada. Devo admitir que é uma boa distração dos problemas que temos tido em Berkshire.

O que lembrou Tate do que ele precisava de uma resposta de Ava antes de deixar o baile.

— A reunião com o agente será às onze da manhã de amanhã em minha casa na Grosvenor Square. Será que poderá ir? Como proprietária de terras na região, acredito que sua presença é importante.

— Ava nos contou dos problemas que enfrentam, Sua Graça. —

disse Willow, baixando a voz para garantir a privacidade. — Se houver algo que você precise que eu ou a Srta. Evans faça, não hesite em nos pedir.

— Obrigado, Srta. Perry. Manterei isso em mente.

Ava sorriu para a amiga antes de se voltar para ele.

— Claro que estarei presente. Estamos ficando com Sua Senhoria, pedirei a ela que indique uma das damas de companhia para me acompanhar.

— Você pode levar Betsie com você, Ava. Ela é minha criada pessoal. — disse a Srta. Perry.

Tate gostava cada vez mais das amigas de Ava. Ambas pareciam equilibradas, inteligentes e leais. Todos os traços que ele sempre procurara em suas amizades ao longo da vida.

— Obrigada. — Ava agradeceu. — É muita gentileza sua.

Tate apertou a mão de Ava e fez uma reverência.

— Até amanhã, Srta. Knight.

Ela lançou um pequeno sorriso carregado de segredos que o fez contar as horas até que ele voltasse a vê-la.

— Até amanhã, Sua Graça.

AVA BATEU com a aldrava de bronze na porta da residência do duque às 11 horas em ponto. Um lacaio atendeu à porta, seu paletó vermelho e calças adornadas com botões de ouro eram um sinal da riqueza e do poder que residiam dentro dessas grandes paredes.

Ava nunca havia entrado na residência de Tate em Londres, e o tamanho imponente e colossal a fez se sentir insignificante e comum. É claro que a propriedade de Tate em Berkshire era grande, mas não tão imponente quanto esta casa. Aqui o piso era de mármore, tão polido que quase se podia ver o próprio reflexo neles.

Uma escadaria larga e sinuosa ficava no centro do piso de entrada e levava aos muitos aposentos acima. Ainda no andar de baixo havia múltiplas portas, cada uma emoldurada por dois pilares que também pareciam ser feitos de mármore.

Era tanta grandiosidade e expectativa nos ombros de quem quer que morasse ali. Uma posição que ela hesitava em aceitar. Ela respirou fundo e, com os braços arrastados, entregou a pelisse ao lacaio que esperava, junto com o chapéu.

— O duque a está esperando, senhorita Knight. Por gentileza, siga-me. — disse um mordomo, saindo das sombras e assustando-a um pouco. A severa carranca e desaprovação no rosto dele por causa da chegada dela fizeram Ava não ousar fazer nada além do que ele solicitasse.

Duas cadeiras estavam dispostas dentro da biblioteca. Ele apontou para as cadeiras como se ela não fosse capaz de vê-las.

— A senhorita e sua criada podem sentar-se ali. — disse o mordomo, o semblante severo não se alterando milímetro algum.

Ava analisou o cômodo ao entrar.

A escrivaninha de Tate estava bem no centro do espaço. Em uma extremidade da biblioteca havia prateleiras de mogno cheias de livros e manuscritos de várias formas e tamanhos. As janelas da frente davam para a rua, e carruagens e pessoas passavam apressadas em seus passeios.

— Sua Graça. — Ava se levantou, mergulhando em uma reverência quando Tate entrou.

Os passos dele vacilaram um momento antes que ele dispensasse o mordomo. Ele se aproximou dela com um sorriso.

Tate assentiu em cumprimento, puxando-a em direção à cadeira que ficava à frente da mesa.

— Obrigado por vir. — disse ele, apertando um pouco a mão enluvada.

Toda a intenção de manter distância, de se lembrar de que essa não era a vida que ela mais desejava desapareceram quando ele sorriu para ela. Agora não havia nada que ela gostaria de fazer mais do que beijá-lo outra vez. A única coisa que a impedia era a criada pessoal dela e o fato de que o agente chegaria a qualquer momento.

Ele se inclinou e beijou a bochecha dela que sentiu calor florescer nas bochechas, sabendo que a dama de Willow havia visto a demonstração de carinho. A criada pigarreou, e Tate apenas riu, dando um sorriso diabólico para Ava quando ela se sentou.

— Eu ficaria mais do que feliz se beijá-la inteira, minha querida.

Eu não me importo mais que os funcionários possam notar o carinho que tenho por você. Não vou mais esconder meu afeto. Já passei muitos anos fazendo o que os outros achavam melhor para nós e não farei mais isso.

Ava olhou para ele quando ele deu um passo para trás e se encostou na mesa, os braços cruzados no peito. Hoje, Tate usava calça bege e botas de cano alto. O colete, a camisa e a gravata haviam sido feitos sob medida e o casaco o envolvia com perfeição.

Nesse cenário, nessa casa enorme e em roupas primorosas, Tate era a descrição perfeita de um duque. Poderoso, carismático e tão acima do alcance dela, ou pelo menos ele deveria estar. Ele era aristocrático demais para o sangue plebeu dela e merecia uma mulher que trouxesse fortuna e conexões familiares. Eles eram tão jovens, tão imunes ao que era esperado deles quando planejavam fugir.

Agora, Ava podia ver que, embora houvesse uma faísca entre eles, um fogo que acendia cada vez que se tocavam, não significava que eles eram adequados para se tornar marido e mulher. Por mais que doesse fazer tal admissão, ela não era do mesmo nível social dele, e caso se casasse com ele, a nobreza e a sociedade em geral fariam questão de deixar claro que a escolha era considerada abaixo do esperado.

— Embora eu não ponha em risco sua reputação ao declarar minhas intenções, mas aqui no meu escritório, longe dos olhares indiscretos de membros da família e matronas da sociedade intrometidos, vou beijá-la, se quiser. Vou beijá-la pelo tempo que desejar. — ele sussurrou, para que a criada não ouvisse.

Ava mordeu o lábio.

Como diabos ela negaria algo se ele falava daquele jeito?

Depois da noite anterior, do beijo deles, ela não conseguiu pensar em muita coisa além do beijo, mas isso não ajudaria a nenhum dos dois. Sua vida estava em Berkshire, e a vida dele em Londres com a Câmara dos Lordes, a Sociedade e a supervisão de suas muitas propriedades.

Um duque esperaria que sua esposa estivesse ao seu lado como um pilar da sociedade, uma anfitriã durante a temporada. Como uma mulher que criava e treinava cavalos de corrida faria tudo o que se era esperado para a posição?

Ela não faria.

— Tate, preciso da sua opinião acerca de um assunto que está me incomodando.

— É claro. — ele disse. — Diga-me o que quiser, Ava.

Ela encontrou o olhar dele e forçou as palavras, que trariam a verdade, saírem da boca dela apesar do pavor.

— Se nós nos casássemos, o que seria esperado de mim?

Ele franziu a testa, ajoelhando-se diante dela e pegando a mão dela.

— Eu gostaria de exibi-la. Trazer você para Londres e gritar da cúpula da Catedral St. Paul que você é minha e de mais ninguém.

Cobriria você com joias, diamantes e presentes que exaltariam a cor deslumbrante de seus olhos e a doçura de sua alma. E dançaríamos e faríamos amor até não termos mais energia para fazê-lo. E este seria só o começo.

As palavras dele a fizeram ser tomada pelo pânico do que tal promessa significaria para ela.

— Você deseja passar todas as temporadas na cidade?

Ele assentiu.

— É claro que teríamos que vir muito para Londres porque sou membro da Câmara dos Lordes e, portanto, o Parlamento me traz à cidade com frequência. Como Duque de Whitstone, espera-se que eu seja visto durante a Temporada, que eu frequente bailes e festas.

Meus amigos, que se tornarão nossos amigos, esperam e querem que participemos de suas reuniões.

Ele sorriu, os olhos cheios de esperança e, incapaz de dizer o quanto suas palavras frustraram todo o otimismo dela, ela sorriu um pouco, passando a mão sobre o queixo dele.

— Tate...

UMA BATIDA rápida na porta fez Tate se erguer antes que o mordomo entrasse e anunciasse o agente de Bow Street, por graças impedindo que Ava respondesse às palavras de Tate acerca do futuro deles, que dissesse o que ela esperaria caso eles contemplassem um matrimônio.

— Ava, este é o Sr. Shelly, o agente de quem falei. — Sr. Shelly, esta é a Srta. Knight, minha vizinha de Berkshire, que veio me ajudar na noite do incêndio em Cleremore.

O homem fez uma reverência a ela.

— Prazer em conhecê-la, Srta. Knight.

Qualquer que fosse a aparência que Ava poderia ter imaginado que um agente de Bow Street teria, não era em nada parecido com o que ela via na frente dela. Este homem era tão alto quanto o duque e com os ombros tão largos quanto.

Na opinião dela, o rosto dele não era tão agradável de se olhar quanto o do duque, embora fosse muito aprazível aos olhos femininos em geral com seus cachos negros e curtos e os olhos de um tom de verde esmeralda como ela nunca havia visto antes.

Todos se sentaram e, uma vez acomodados, o duque disse:

— Você tem alguma informação para nós pelo que soube.

O Sr. Shelly lançou um olhar curioso, e Ava sorriu por saber exatamente o que o pobre homem estava pensando. O que uma

mulher estava fazendo aqui em uma reunião de um assunto que só deveria interessar cavalheiros?

— Pode falar sem ressalvas na frente da Srta. Knight. Ela sabe de tudo o que está acontecendo em Berkshire, e eu não escondo nada dela.

Ava não pôde evitar a sensação reconfortante que a envolveu ante as palavras do duque. Ele era um homem muito bom. Ela seria uma tola caso não chegasse nem a vislumbrar um futuro com ele.

Mas ela não o faria se significasse sacrificar tudo pelo que ela lutou tanto para conseguir.

Mas agora não era hora de pensar em assuntos românticos com o duque, nem nele. Agora era a hora de descobrir se Lorde Oakes estava por trás dos terríveis ataques, e se havia a possibilidade de ele ser levado à justiça.

— Claro, Sua Graça.

O homem enfiou a mão no bolso e tirou um caderno preto, folheou algumas das páginas. Ele parou quando chegou a uma folha em que Ava conseguiu enxergar alguns pontos ao longo do papel.

— O dia em que você perseguiu um cavalheiro na floresta e que ele atirou na sua direção, e que a Srta. Knight se machucou após uma queda. — o agente encontrou o olhar dela. — Espero que esteja se sentindo melhor, senhorita Knight. Fiquei bastante aflito por saber que o criminoso havia agido de tal forma e, ainda mais, por mirar em uma mulher.

Ava agradeceu, sabendo que, se o culpado fosse de fato Lorde Oakes, ele era capaz de ações piores do que atirar em alguém. de olhos fechados, Ava preferia enfrentar uma arma à ser forçada a uma situação em que ela não seria capaz de correr, escapar. Assim como Lorde Oakes tentou fazer com ela.

— Um fazendeiro estava trabalhando nas proximidades e ouviu o tiro. Momentos depois do disparo, o cavaleiro em questão passou correndo pelo fazendeiro. Ele não acredita que o tenham visto. O

lenço do culpado, entretanto, já havia escorregado para o pescoço, expondo o rosto. O fazendeiro reconheceu esse homem como ninguém menos que Lorde Oakes.

Ava encontrou o olhar de Tate e leu a esperança nos olhos dele de que Sua Senhoria seria preso em breve, tornando-se incapaz de provocar mais danos. Pensar que ela nunca mais se preocuparia com ele, nem ficaria com medo de que ele aparecesse na porta dela no meio da noite e se forçasse a ela para terminar o que havia começado fez com que suas esperanças aumentassem, ela sentia seu sangue correr.

Ele seria punido de uma vez por todas.

— Tenho homens seguindo Lorde Oakes aonde quer que suas viagens o levem. Estamos atentos aos lugares que ele visita, a quais negócios ele se engaja quando está em Londres e se ele viajar para fora da cidade, saberemos.

— São notícias encorajadoras. — disse o duque. — Podemos provar que Lorde Oakes não estava em Londres no dia do incêndio de Cleremore ou quando a senhorita Knight e eu fomos alvejados?

— Podemos. — respondeu o Sr. Shelly. — Fizemos uma vistoria na casa londrina de Sua Senhoria e tivemos uma conversa bem esclarecedora com a cozinheira dele. A mulher estava bastante disposta a conversar, já que oferecemos uma coroa. Também foi dito que Sua Senhoria está com os soldos dos funcionários atrasados há um mês. A cozinheira afirmou que, embora não soubesse para onde Sua Senhoria havia ido, que ele esteve sim fora de Londres. É claro que se trata da palavra de um plebeu contra a de um Lorde, o mesmo com relação ao fazendeiro. Não há

evidências suficientes para provar a culpa dele, e caso esse assunto fosse a julgamento, decerto perderíamos. Mas é um começo.

Ava franziu a testa.

Todas as informações eram boas, mas não eram suficientes para derrubar Lorde Oakes.

— Qual é o seu próximo passo?

O investigador sorriu.

— Lorde Oakes vai cometer algum erro. E quando o fizer, estaremos lá. Pela minha experiência, quando tais pessoas pensam que enganaram a todos, fazem algo que não fazia parte do plano original, e toda a farsa começa a se desfazer.

O duque assentiu, parecendo satisfeito.

— Ele está em Londres agora e não fui notificado de nenhum outro incêndio nas redondezas de nossas propriedades rurais.

Quando retornarmos a Berkshire, e se Lorde Oakes também partir para sua propriedade rural, seria interessante estar atento a novos incêndios.

— Estou certa de que sim. — disse Ava. — Ele deve sentir prazer ao infligir tanta dor e sofrimento aos outros, se me permitem tal observação acerca de Sua Senhoria.

Tanto o duque quanto o investigador olharam para ela.

— Por favor. — disse Tate, gesticulando para que ela prosseguisse.

Ava limpou a garganta, calor subindo em suas bochechas.

— Sr. Shelly, preciso que saiba que Lorde Oakes estava decidido a me tornar amante dele meses atrás. Na época, ele estava cortejando uma mulher de meios substanciais aqui na cidade, e queria ter uma amante no interior. Eu o recusei quando percebi que as intenções não eram honradas.

— Ava, você não precisa contar...

— Sim, eu preciso. — disse ela, interrompendo Tate. — Tudo precisar estar bem claro, ao menos para o Sr. Shelly.

Tate recostou-se na cadeira, e Ava virou-se para o investigador.

— Não me escapou a percepção de que os incêndios ocorreram em propriedades que cercam meus próprios estábulos em Berkshire. Não posso deixar de pensar que ele está mirando nas pessoas mais próximas a mim, meus amigos e vizinhos, e me deixando para o final.

Os olhos do investigador se arregalaram com entendimento, e agora, após ter dito em voz alta seus medos, tudo pareceu fazer sentido. Lorde Oakes provara ser um ser humano egoísta e malvado. Não seria surpresa para Ava se ele quisesse se vingar dela, atormentá-la e deixar a propriedade dela por último.

— Ele não ousaria. — disse o duque, assassinato subentendido em seu tom.

O agente olhou para os dois antes de escrever algo no bloco.

— Suas preocupações são justificadas, Srta. Knight, e mandarei mais homens para vigiar sua casa. Lorde Oakes parece ter uma doença que incurável. — disse ele, brandamente. — Com uma doença dessas, não sabemos o que ele planeja ou para quando.

Ava conseguia acreditar nisso.

— Suponho que agora devemos ser pacientes e esperar, embora me preocupe onde ele atacará a seguir. Se ele for bem-sucedido em seus empreendimentos, o que significaria para as vítimas? Eu conheço o caráter cruel dele. Ele é capaz de infligir dor aos outros e não se importar com seus atos.

O agente a estudou por um momento, parecia refletir as palavras dela, dobrou o caderninho preto e o enfiou no bolso do casaco.

— Não há razão para alguém atuar dessa maneira. Algumas pessoas são más em essência, desejam fazer mal aos outros sem

uma razão específica, a não ser prazer próprio. Sabemos que Lorde Oakes está com dificuldades financeiras devido ao fato de a mulher que ele cortejava ter se casado com outro. O pai dela percebeu que ele estava quase falido e rejeitou a proposta dele. Você recusou os avanços dele, e os que o cercam em Berkshire são prósperos, possuem propriedades bem-sucedidas, ao contrário da dele.

Ava analisou os argumentos.

— Então o que está dizendo é que ele está atacando essas propriedades, essas famílias, apenas por inveja?

O investigador deu de ombros.

— Já vi pessoas assassinarem por menos. Não vejo razão para que Lorde Oakes não busque vingança por delitos inventados por sua própria mente débil.

— Isso é perturbador. — disse o duque, pensativo. — Não posso negar que ficarei feliz quando Lorde Oakes estiver atrás das grades ou, quem sabe, for enviado às colônias para nunca mais se aproximar de nossas sombras.

— É isso que pretendemos fazer, Sua Graça. Pode ser que leve algum tempo, mas ele cometerá um erro, todos cometem em algum momento, e quando ele o fizer, estaremos prontos.

Ava pensou nas palavras dele.

Esperar era muito bom, mas o desejo que Lorde Oakes nutria de machucar as pessoas, o desejo de ver animais queimando nos estábulos não era algo com que ela estivesse disposta a apostar.

Não era algo que ela estava disposta a permitir que fizesse de novo.

Dessa vez, não importa quantos agentes estivessem no encalço de Sua Senhoria, eles poderiam chegar tarde demais, assim como chegaram tarde demais para salvar os cavalos e o funcionário de Lorde Morton algumas semanas atrás.

— O que acham da ideia de dizer algo a Lorde Oakes? Não de mencionar que ele está sendo seguido por agentes, apenas deixar escapar que alguém viu um cavalheiro fugindo à cavalo no dia em que fui ferida. Deixar que a mente de Sua Senhoria imploda com a ideia de que alguém possa tê-lo reconhecido. Se disséssemos algo parecido para ele, podemos assustá-lo o suficiente para impedi-lo de iniciar mais incêndios. Eu sei que temos que sentar e esperar.

Entendo por que fariam isso, mas corremos muito risco com esse plano. Meus estábulos, por exemplo, abrigam cavalos que valem centenas de libras. Agora mesmo, o premiado puro-sangue, Titan, reside lá. Se permitirmos que Lorde Oakes volte a atacar, arriscamos nosso sustento, minha equipe e a vida dos cavalos. O

que você acha disso, Sr. Shelly? Acredita que vale a pena tentar esse plano?

O agente esfregou a mandíbula, franzindo os lábios, pensando.

— Entendo seu dilema e sua frustração. Arriscamos muito esperando que ele ataque novamente. Mas acredito que nesse caso precisamos esperar. Meus homens foram instruídos a adiar até o último momento possível antes de prenderem Lorde Oakes, portanto, se ele tentar iniciar um incêndio, estaremos lá e o impediremos, mas precisamos pegá-lo em flagrante. Se ele descobrir que está sendo vigiado ou que a senhorita suspeita dele, ele pode fugir. O homem é um covarde de coração e se fugir, bem, nunca seremos capazes de provar a culpa dele nesse caso.

Ava recostou-se na cadeira. Ela podia entender a opinião dele, mas não tornava mais fácil a perspectiva de deixar Sua Senhoria à solta.

— Muito bem. — ela cedeu. — Eu não direi uma palavra.

Ava leu o entendimento no olhar caloroso do duque. O fato lhe confortou. Eles pegariam Lorde Oakes e depois o trancafiariam. Ela

se livraria dele para sempre, talvez pela primeira vez em uma era, ela poderia respirar.

— Muito bom. — disse o duque. — Estamos de acordo, assunto resolvido. Esperaremos.

Depois de discutir alguns itens diversos em relação à onde os agentes ficariam ao longo do caminho entre a propriedade da Srta.

Knight e do duque, e por quem eles se passariam para não causar suspeitas caso encontrassem Lorde Oakes, o investigador os cumprimentou e saiu.

O duque, depois de se despedir do homem, voltou à biblioteca, fechando a porta atrás de si. Ava se levantou, sabendo que ela também deveria sair. Mesmo com a criada ali, ela ainda arriscava a reputação pelo simples fato de estar ali.

— Eu devo ir também. — disse ela, sem se mexer.

O duque estendeu a mão e pegou a dela, inclinando-se sobre os dedos enluvados e beijando-os. Seu toque enviou um frisson de consciência através do corpo dela, e Ava apertou a mão dele em resposta.

— Você vai ao baile dos York esta noite? Sei que vamos acompanhar a viscondessa.

O duque a conduziu para a porta.

— Agora eu vou.

Ela riu e, ao ver que a dama de companhia continuava sentada à espera de instruções, Ava gesticulou para que se levantasse.

— Até hoje à noite, então, Sua Graça.

Ava parou no limiar da porta da biblioteca, assimilando o máximo possível do duque. Ela adorava ficar sozinha com ele. Ele nunca agia como um nobre pomposo ao lado dela. Para ela, ele era simplesmente Tate. Sempre que estavam juntos, o corpo dela nunca

parecia seu. Estremecia e ansiava pelo toque dele, e ela não parecia capaz de deter a reação.

— Ó, que adorável. — disse uma voz fria e desinteressada da escada. — Se não é a Srta. Knight. Pensei que meus olhos estavam me pregando uma peça quando a vi na noite passada, no baile dos Tinley. Não sabia que havia sido convidada.

Ava respirou fundo e virou-se para sorrir para a viúva que descia, com lentidão exagerada, a escada em direção a eles. Atrás dela, havia uma mulher de impressionante beleza, toda elegância etérea, uma deusa com mechas loiras.

Ava fez uma reverência e não pôde deixar de olhar para seu modesto vestido matutino, um modelito do ano anterior. Ela se esforçou para ignorar as palavras "desagradável" e "simples" que flutuaram em sua mente sempre que estava perto de mulheres que se vestiam com o mais recente da moda, títulos e alta-costura. Ela levantou o queixo, e endireitou a coluna com determinação.

Ela olhou para Tate, o rosto dele assumindo um horrível tom de cinza. Ele a pegou olhando para ele e fechou a boca com um estalo, os lábios formando uma linha de irritação. Em relação a ela ou à mãe dele, Ava estava incerta, mas ela com certeza esperava que fosse a segunda opção.

— Tate, meu querido, você se lembra de Lady Clapham. Ela é minha nova acompanhante e voltará para Berkshire comigo na próxima semana.

A mulher mergulhou em uma reverência perfeita, e algo semelhante a ciúme atravessou Ava ao notar a impressionante beleza da mulher. Ela lançou um meio sorriso ao duque, contente, o que só a fez parecer mais bonita se é que era possível. Por um momento, Ava olhou para todos, tentando se lembrar de onde reconhecia o nome de Sua Senhoria.

Onde ela havia ouvido esse nome?

Tate pareceu se lembrar dos modos e cumprimentou a mulher com uma leve reverência.

— Bem-vinda, Lady Clapham. Tenho certeza de que você servirá muito bem minha mãe.

A viúva riu.

— Ó, com certeza acredito que sim.

Ava estudou Lady Clapham e com um temor nauseante ela se lembrou. Ela foi amante de Tate.

— Mais uma vez obrigada pela reunião, Sua Graça. Um bom dia a todos.

Ava recolheu o casaco e touca que estava nas mãos do lacaio no hall de entrada, e nem se incomodou em vesti-lo, apenas saiu assim que o criado abriu a porta, a criada bem atrás dela.

O modo como a nova acompanhante da duquesa olhava para o duque era predatório. Damas nesta posição não deveriam ser solteironas? Mulheres tímidas por natureza, sem interesse em casamento, ou com muita idade para chamarem a atenção de um homem? Lady Clapham não era nada disso, mas era perfeita se a viúva estivesse fazendo planos para o filho, mantendo uma mulher sem classe e do comércio longe dele.

— Srta. Knight. — chamou o duque, descendo os degraus da frente de sua casa e encontrando-a na porta da carruagem. — Eu a verei esta noite, não a verei? — ele perguntou, pegando a mão dela e ajudando-a a subir os degraus do veículo.

Ela assentiu, mas queria partir antes que ele visse como ela estava com ciúmes da mulher que agora viveria sob seu teto. Ela deu as coordenadas ao condutor.

Pensar que Lady Clapham tomaria café-da-manhã e jantaria com Tate. Que passaria as noites à frente da lareira na sala de jogos,

jogaria cartas e faria companhia à duquesa-viúva, que seriam como uma casal feliz.

— Nos vemos, então. Tenha um bom dia, Sua Graça.

Ela não olhou para ele quando a carruagem se afastou e conteve as lágrimas que ameaçavam. Era por isso que ela não era feita para este tipo de vida. Ela não era uma mulher de estratagemas, não era como a viúva, ou como Lady Clapham que também participaria desses jogos de bom grado.

Essa vida não representava quem ela era ou queria ser, algo que ela precisava se lembrar para manter a cabeça longe de Tate.

TATE FICOU parado na calçada e observou a carruagem rugir rua abaixo, até virar uma esquina e desaparecer. Ele franziu a testa, sabendo muito bem por que Ava ficara chateada com ele, ou para ser mais preciso, com a mãe dele.

Ele girou nos calcanhares e voltou para dentro, subiu até a sala de estar do primeiro andar, que a mãe havia ocupado como seu espaço de entretenimento particular. Ele a encontrou com Lady Clapham, sua antiga amante, tomando chá e sorrindo de orelha a orelha. Sem dúvida, o pequeno ardil provocara a reação desejada em Ava.

— O que — ele disse, apontando para Lady Clapham. — ela está fazendo aqui? E como sua dama de companhia ainda por cima.

Você está louca, mãe? Devo mandar chamar o médico e trancá-la no Asilo Bedlam antes do final do dia?

A viúva estreitou os olhos, sem quaisquer resquícios de diversão, ante as palavras dele.

— Lady Clapham é uma boa companhia e se voluntariou para ser minha dama de companhia, me entreter como a dama de uma Lady deve. Mas se ela também o faz lembrar que você possui um passado, um que a Srta. Knight não conhece, bem, melhor para mim. — a mãe dele pegou a xícara de chá e tomou um gole. — O

que será que a Srta. Knight diria se eu contasse que a mulher que partilhava sua cama agora é minha dama de companhia?

Tate não acreditava que seu sangue pudesse ferver mais do que quando Lorde Oakes cruzava seus pensamentos e, no entanto, de alguma forma sua mãe pareceu conseguir realizar tal feito. Ele fechou os punhos rente ao corpo para evitar que a estrangulasse na tentativa de fazê-la ter algum bom senso.

— Você não pode ter Lady Clapham como sua dama de companhia. A maioria dos cavalheiros que conheço buscaram a atenção dela nos últimos meses.

Sua Senhoria ofegou ante a grosseria dele, e Tate lamentou ofendê-la, mas sua mãe e seus planos não seriam benéficos a ninguém:

— Não importa o que você acredite, mãe, Lady Clapham não era minha amante, ela foi apenas uma mulher que aqueceu minha cama vez ou outra, e que agora não o faz mais. Se der continuidade a este plano, será ridicularizada.

— Eu tenho toda a intenção de fazê-lo. Sou a duquesa-viúva de Whitstone. Ninguém ousaria me contradizer. Lady Clapham vai me acompanhar pela cidade e voltará comigo para Berkshire. Eu, por exemplo, estou muito animada com o que está por vir. — a mãe dele sorriu, e mesmo assim seus olhos só mostravam frieza calculista.

— Por que você faria uma coisa dessas? Eu sempre soube que você não era amorosa, mas não a considerava tão cruel. Deveria se envergonhar.

Tate olhou para a mãe.

Ela permaneceu indiferente e intocada por suas palavras. Se ele esperava ver algum arrependimento nela, enganou-se. Pelo contrário, ela parecia muito bem satisfeita consigo mesma.

— Eu não me envergonho, e nunca o farei. Lady Clapham agora está a meu serviço, e iremos passear quando me convier. Quando eu voltar para Berkshire, ela também virá comigo e faremos uma festa bem alegre.

— Você não voltará para Cleremore. Mandarei um aviso aos criados para que arrumem suas coisas e as enviem para a casa da viúva. Seu tempo como genitora sob meu teto acabou. Quanto à casa em Londres, você pode permanecer aqui até que providencie acomodações alternativas.

A mãe dele deu de ombros, imperturbável.

— Faça o que quiser, meu querido. Nos vemos no almoço.

Tate saiu da sala com pressa.

Ele apertou as mãos para parar de tremer e lutou contra a vontade de socar um vaso que ficava encostado na parede do corredor. Embora ele não pudesse controlar a mãe, ele podia controlar quem morava em suas propriedades.

Ele desceu as escadas.

Escreveria para seu administrador em Cleremore de uma vez e o instruiria a organizar a mudança de sua mãe. Não se arriscaria a perder Ava outra vez, não importava quais esquemas secretos sua mãe inventasse.

Quanto a Lady Clapham, ele falaria com ela sobre sua conduta e o que ela achava que estava fazendo, mas sem a mãe dele estar presente. Ele acreditava ter agido de forma correta com ela, mas parece que ela pensava o contrário.

Ele balançou a cabeça, entrando na biblioteca e trancando a porta atrás de si. Ora, ele ficara sabendo até que ela havia arrumado um novo caso. Tate não sabia que o novo patrono de Sua Senhoria era, na verdade, sua própria mãe. E tal situação era inadmissível.

CAPÍTULO 12

M AIS TARDE NAQUELA NOITE, Tate estava ao lado de seu amigo, Lorde Duncannon, e observava Ava dançar com um cavalheiro sem importância. Era a quarta dança dela nesta noite e assim que ele chegou, a menos de duas horas, foi informado de que o cartão de dança dela estava completo, e portanto, eles não poderiam dançar.

Ele tomou um gole de vinho, imaginando como explicar a ela que o que havia presenciado de manhã na casa dele em nada mudava o que havia entre eles. Ele pode sim ter considerado Lady Clapham atraente, um homem teria que ser cego para não ver sua beleza.

Porém, como ele faria para contar que, além de estar com o coração dele na palma da mão, ela era a única mulher que o fazia girar a cabeça? A única mulher a capturar seu coração e alma.

Ele não teve a chance de conversar com Lady Clapham a respeito de por que ela estava de conluio com a mãe dele, mas ele o faria. No entanto, neste momento, seu maior problema era descobrir como explicar a situação para Ava, sem que ela se magoasse com a verdade.

— Como está a caça ao incendiário, Tate? O Investigador obteve alguma pista acerca da identidade dele? — Lorde Duncannon perguntou, tomando um gole de vinho.

Tate virou-se para o amigo, tendo se esquecido por um momento que ele estava lá. Duncannon era tão alto quanto ele, mas com os ombros um pouco menos largos. Mesmo assim, sua mandíbula marcante, as mechas loiras e o entusiasmo pela vida o tornava, com frequência, o favorito entre as mulheres.

— Temos uma pista, e neste exato momento o cavalheiro em questão está conversando com Lorde York.

Os dois olharam para o outro lado do salão, onde estava seu inimigo. A raiva crepitou no sangue de Tate, e ele precisou se conter e não atravessar o piso de parquet que os separavam para partir a cara do desgraçado.

Ele o analisou por um momento, odiando o fato de ele ter machucado, aterrorizado e tentado estuprar Ava. Tate balançou a cabeça, agradecido pelo fato de a criada de Ava entrar e o deter.

— Lorde Oakes. Você suspeita dele? — o choque na voz de seu amigo o tirou de suas reflexões em torno de como torturar o desgraçado caso o encontrasse sozinho.

— O dia em que a Srta. Knight e eu fomos alvejados, então...

— Espere. Pare. — disse Duncannon, apertando o braço dele.

— Você e a Srta. Knight, a mesma mulher com quem você queria se casar tantos anos atrás, foram alvejados? Como eu não soube disso?

Tate balançou a cabeça.

— Preciso lembrá-lo de que você não estava em Londres, nem mesmo na Inglaterra naquela semana. A propósito, como está Paris? Ainda é tão decadente como sempre e muito disposta a fazer um espetáculo para agradar um visconde rico?

O amigo sorriu.

— Claro, mas esqueça-se disso. — disse ele, franzindo a testa.

— Algum de vocês dois se machucou? O que aconteceu?

— Veja por si. — disse Tate com um movimento de cabeça na direção em que Ava ainda dançava com um barão.

— Aquela é a Srta. Knight?

Tate ouviu a apreciação na voz do amigo e decidiu ignorá-la. Ava era muito bonita, mesmo que na maior parte do tempo ela fosse

alheia a tal fato. E beleza, dentro e fora, que Ava possuía em abundância. Não era de admirar que ela fosse tão requisitada em bailes e festas. A Sociedade sentiria falta dela quando retornasse a Berkshire, mesmo que a mãe de Tate não partilhasse o sentimento.

— Sim, é ela.

Duncannon olhou para ele com desconfiança.

— E ela está dançando com outra pessoa porque...

Era algo pelo que Tate havia se indagado também, mas após a saída precipitada de Ava da casa dele hoje cedo, não era difícil descobrir por que ela o estava evitando. Ela estava com raiva e talvez até magoada, mas tais emoções o levavam a outra constatação. Ava gostava dele mais do que como um amigo, e isso o fazia ter esperanças.

— Minha mãe contratou uma nova dama de companhia. Mas esta pessoa é Lady Clapham, uma antiga amante minha.

— O quê!

A altura da declaração de Duncannon fez as pessoas se virarem na direção deles, até Ava na pista de dança olhou para eles, por tempo o bastante para Tate notar antes de ela desviar.

— Fale baixo, ninguém sabe, e ela só contratou Lady Clapham para poder causar conflito entre Ava, digo Srta. Knight, e eu.

— Então, você ainda gosta dela. Conclui que fosse assim quando percebi que não estava me ouvindo, que sua mente estava longe. Embora eu não soubesse que era a Srta. Knight em particular, eu sabia que era alguém do sexo oposto.

Tate suspirou, gesticulando para um lacaio trazer um pouco mais de vinho para eles.

— Não foi muito depois de eu voltar a Londres. A Srta. Knight soube de alguns dos rumores que circulavam na Sociedade acerca de minhas atividades, mas não sabe de tudo. Lady Clapham é um

desses assuntos, e de alguma forma a minha mãe descobriu e está disposta a causar problemas.

— Você terá que colocar sua mãe no lugar dela. — disse Duncannon, pegando uma taça de vinho do lacaio e sorrindo em agradecimento. — É claro que gosto da viúva, mas ela não pode reger sua vida como costumava fazer. Você é um homem adulto, Tate. Deve deixar claro que não permitirá que ninguém da família o trate com tão pouco respeito.

Tate apertou o queixo.

Sabia que Duncannon estava certo. A mãe dele havia ultrapassado os limites, e ele providenciaria para que ela fosse acomodada na Residência da Viúva, antes que retornasse à Berkshire. Mas não significava que ela não seria capaz de causar desavenças entre Ava e eles, mesmo distante.

Ele olhou para a esquerda e xingou por dentro.

Lady Clapham caminhava em direção a ele com sua melhor amiga, e uma das maiores fofoqueiras da sociedade, a tiracolo.

Sentindo todos os olhos nele, ele se voltou para onde havia visto Ava pela última vez e a encontrou observando-o, junto a um grupo de amigas.

— Falando do diabo. — disse Duncannon, curvando-se para as duas damas que se juntaram a eles em instantes.

Tate jamais desejara estar em outro lugar com tanta vontade com agora. Ele comportou-se como o esperado de um duque e cumprimentou as duas damas com uma pequena reverência de cabeça assim que chegaram. Lady Clapham sorriu para ele com doçura, uma característica que ele sabia ser apenas aparente. A mulher só poderia ter gelo correndo nas veias se havia escolhido unir forças com a mãe dele.

Ele só podia agradecer aos Céus por descobrir tal fato agora, e por não ter seguido em frente com a ideia de propor casamento, como ele cogitou fazer no ano anterior quando estava confuso e sofrendo de amores por uma mulher que não via há meia década.

— Sua Graça. Lorde Duncannon.

As duas mulheres fizeram uma reverência, e Tate lutou para não olhar de volta para Ava e ver se ela estava observando a cena acontecer. Inferno, ele esperava que ela desviasse o olhar, que estivesse dançando com outro cavalheiro.

— Estão gostando do baile? — Lorde Duncannon perguntou, tomando um gole de bebida, com visível júbilo em ver Tate constrangido.

Lady Clapham sorriu, aproximando-se mais de Tate.

— Acabamos de comentar que a próxima dança é uma valsa.

Se essa era uma tentativa de Lady Clapham de sugerir que Tate dançasse com ela, ela ficaria muito desapontada. Havia apenas uma mulher com quem ele queria dançar, e esta era a Srta. Knight.

Incapaz de fazê-lo, Tate a procurou mais uma vez e viu o marquês de Boothby se curvar diante dela, pegar sua mão e a encaixar debaixo do braço dele antes de conduzi-la à área de dança.

Tate terminou o vinho e depositou a taça em um buffet que havia detrás deles. Maldito fosse o homem. Ele sentiu a raiva dentro de si aumentar ao perceber o sorriso que brincava nos lábios de Ava.

Sem mencionar que a mão de Sua Senhoria estava muito baixa nas costas dela, e ele a segurava muito mais perto do que deveria.

Desgraçado.

Uma mão apertou seu braço, e ele nem percebeu que havia dado um passo na direção dos dançarinos.

— Deixe para lá, Tate. — o amigo sussurrou. — É apenas uma dança. Creio que, no momento, você esteja com problemas maiores do que a Srta. Knight.

As palavras de Duncannon o fizeram se acalmar um pouco, e ele assentiu. Precisava dar um voto de confiança ao sentimento que ele e Ava nutriam um pelo outro, mesmo que hoje ela estivesse bem chateada com ele.

— Bem, já que sou viúva e uma bastante escandalosa, terei que resolver o assunto por mim mesma. Dançará comigo, Sua Graça?

Os convidados se viraram, alguns ofegaram ante as palavras de Sua Senhoria. Tate estreitou os olhos, odiando o fato de ele ser uma peça no jogo dela.

Ele retesou o queixo antes que seu humor se fizesse visível.

Para evitar que ela se envergonhasse perante todos e ser um cavalheiro, como ele poderia não dançar com ela agora? Ele estendeu o braço, sorrindo entredentes.

— Claro, Sua Senhoria. Vamos?

Ela o segurou e ergueu o queixo, caminhando ao lado dele enquanto ele buscava um lugar entre os casais que já estavam valsando. Ele não gostou da dança, seus problemas apenas dobravam a cada minuto que Lady Clapham passava em seus braços. A música continuava, as pessoas flutuavam em torno deles, girando e rindo, e ele só conseguia ver Ava. Ela estava com toda a atenção no marquês, e em nenhum momento, virou-se para ele.

Como ela foi capaz de não deixar uma dança para ele?

Ninguém sabia que ele e Lady Clapham haviam sido amantes, a menos que Ava estivesse mais ciente das fofocas que ele soubesse.

Tal possibilidade fez pouco para acalmar sua inquietação. Decerto explicaria por que ela havia deixado a casa dele com tanta pressa.

Maldição.

AVA LUTOU para não olhar na direção em que Tate dançava com Lady Clapham, a mesma mulher que já fora amante dele e agora residia sob seu teto. Eles formavam um par impressionante enquanto dançavam pelo salão, os passos do duque pareciam sem esforço, perfeitos, fazendo com que Sua Senhoria parecesse flutuar como um anjo.

A noite mostrou ser uma de que ela não esqueceria tão cedo.

Com a presença de Lorde Oakes, a noite começara em uma espiral descendente, mas ver Tate dançando com uma mulher que, além de bonita e intitulada, possuía o apreço da mãe dele, fazia sua estada em Londres ser menos aprazível ao ter que testemunhar tudo.

Quando soube que Tate havia retornado dos Estados Unidos, suas aventuras em Londres não a afetaram tanto quanto agora. Ela se distanciou da ideia de se importar com o que ele fazia, ou com quem ele socializava. Ela o ignorou da melhor forma que pôde, quer dizer, ignorou a reação que seu coração teve quando ela soube. No fim, ela se endureceu, aprendeu a confiar em si, cuidou de seus funcionários e de seus cavalos e se esqueceu do duque que certa vez reivindicou seu coração.

Mas agora, vê-lo em meio aos seus iguais, com damas nobres o bajulando como se ele fosse um deus grego, era perturbador. Ela respirou fundo. Bem, não era algo com que deveria se importar, mas, com certeza, não era algo que ela conseguiria aturar. Não se as lágrimas que ameaçavam cair a cada vez que ela olhava para ele fossem prova de algo.

Ava tentou se concentrar no que o marquês dizia a ela, mas seus pensamentos estavam em outro lugar. Ou melhor, no duque que agora olhava para Lady Clapham, engajado em uma profunda

conversa. Felizmente a dança chegou ao fim e, girando-a para parar, ela fez uma reverência e agradeceu Sua Senhoria pela dança.

Ele fez uma reverência, e Ava não ficou tempo suficiente para ouvir a despedida dele, pois girou na direção do quarto de descanso. A última coisa que ela precisava era que ele notasse as provas físicas de que ela estava incomodada pelas ações de um homem com quem ela mesma havia dito não querer se casar.

Ela havia afirmado não querer mais tal vida, então por que tanto transtorno? Ela afastou o pensamento, brava consigo mesma por ser fraca. Por se importar mais do que gostaria.

Tate podia dançar com quem quisesse. Ele era livre para cortejar moças e se casar, e ela deixou claro como o dia, que estava feliz com a vida que levava agora. Então, por que a ideia de ele tomar outra mulher com esposa trazia à tona o pior dela?

A parte nela que fervia, que fazia seu estômago revirar de pavor ao imaginar o que ele estava fazendo e com quem. A parte dela que se afogava em ciúmes. Um sentimento tão grande que a impedia de agir ou pensar com razão, como agora quando ela ficou atormentada por ver o duque dançar com Lady Clapham.

— Ava. — o duque chamou de detrás dela.

Ela olhou por cima do ombro, sem desacelerar o passo. Ela, com certeza, não estava disposta a parar, e muito menos a ter uma discussão em público com ele, em um lugar em que qualquer pessoa poderia aparecer, a qualquer instante.

— Volte ao baile, Sua Graça. — disse ela antes de entrar por uma porta que estava entreaberta e encontrar um tipo de sala de estar vazia. Uma única luz como guia até o banco sob as janelas do outro lado do cômodo.

— Ava. — ele repetiu, seguindo-a para dentro da sala e fechando a porta detrás dele.

O som do trinco sendo encaixado foi alto no espaço vazio, e ela ergueu o queixo, encontrando o olhar dele.

— Por que você trancou a porta? Na verdade, por que me seguiu? Não deveria acompanhar sua parceira de dança até estar ao lado da sua mãe, lugar que ela pertence? — ela se encolheu com a inveja que tingia seu tom, evidente para quem quer que estivesse ouvindo.

Ele suspirou, os ombros caindo um pouco com as palavras dela.

— Eu poderia perguntar o mesmo de você. Por que o marquês não a levou de volta às suas amigas e à viscondessa? Você pareceu gostar muito da dança, pelo que pude ver.

O nervoso que ela sentia aumentou, e ela meio que grunhiu para o duque, ante de se aproximar dele.

— Diga-me, que papel Lady Clapham tem na sua vida? Sua mãe parece gostar muito dela e vi os olhares triunfantes que ela me lançou durante toda a sua dança com Sua Senhoria. Só posso supor que ela pense que vocês conviverão o bastante para que você se apaixone por ela.

Ele franziu o cenho, balançando a cabeça.

— Não trato Lady Clapham como nada mais que uma conhecida de minha mãe. E se quer saber, foi ela quem me convidou para dançar. Eu não queria.

Ava zombou.

— Não me pareceu assim. Na verdade, você parecia muito feliz por tê-la em seus braços. Suponho que eu não deveria esperar menos, pois há rumores de que você adorou tê-la nos braços na última temporada.

Tate se encolheu, mas Ava manteve a postura. Ela não era cega aos atrativos de Lady Clapham e os motivos para que tantos cavalheiros a procurassem.

— Você está com ciúmes.

Foi uma afirmação. Uma que Ava precisava negar, mesmo que fosse tão verdadeira quanto o fato de que o sol nascia toda manhã.

— Não estou com ciúmes. — ela afirmou, a falsidade fazendo suas palavras saírem fortes e tensas. — Você é livre para fazer o que quiser.

— Sério? — ele disse, dando um passo na direção dela e Ava deu um passo para trás. — Qualquer coisa que eu quiser? — ele perguntou de novo e deu outro passo.

Ela parou de se mover sabendo que era inútil tentar fugir de Tate.

— Qualquer coisa. — as palavras sussurradas despedaçaram a restrição que ela ainda possuía, e se Tate pensou que seria ele a decidir o que acontecia a seguir, Ava acabava de mostrar como estava errado.

Ela de o último passo que os separava, esticou o braço e tomou os lábios dele em um beijo ardente. Ela sentiu-se dominar por uma onda de certeza e soube que estava onde queria estar. Não dançando com mais ninguém, ou sozinha treinando cavalos em Berkshire, mas nos braços do garoto que ela sempre amou, que havia perdido e reencontrado como um homem adulto.

Os braços dele a envolveram e ele a puxou contra ele, os lábios tão insistentes quanto os dela. Ela podia sentir o desespero e a necessidade a cada movimento da língua dele e das ou das mãos dele nas costas dela, que não pareciam aproximá-la dele tanto quanto ela queria.

Não que houvesse muita distância entre eles. Pois Ava podia sentir cada linha, cada curva do corpo dele, incluindo o que crescia contra a barriga dela e a fazia tremer por dentro. Ele a guiou para trás até que o sofá atingiu a parte de trás de seus joelhos. Mas não pararam aí, desabaram nas almofadas, o corpo de Tate a prendendo no sofá. O beijo deles não parou, e ela não impediu Tate quando a mão dele deslizou por sua perna para levantar a bainha do vestido.

Ar fresco beijou seu tornozelo, sua panturrilha e, por fim, sua coxa. Tate se ergueu um pouco, ajustando-se para ficar bem entre as pernas dela, e um calor líquido inundou seu núcleo. Estar ali com Tate daquela maneira não provocou o medo que ela imaginou que sentiria.

Estar presa embaixo dele sob um pretexto bem claro, ela pensava que talvez fosse sentir pânico, mas não era esse o caso.

Não com Tate. Desejo delicioso e uma necessidade interminável que só ele poderia satisfazer, era tudo o que ela sentia e ansiava.

Ele sustentou o olhar dela, a respiração irregular, mas mesmo então Ava confiava que caso ela o pedisse para parar, ele o faria.

— É isso que você quer, Ava? Sabe que eu nunca faria nada que você não desejasse.

Ela estendeu a mão e acariciou a bochecha dele.

A barba começava a despontar e pinicava sua mão. Os cabelos escuros dele caíam sobre a testa, concedendo um ar de pecado, e ela suspirou, com o coração cheio do carinho que sentia pelo homem diante dela.

— Eu não quero que você pare.

Ele voltou a beijá-la, com intensidade e assertividade, e ela se deixou perder nos braços dele. Deixou-se desfrutar de tudo o que ele poderia dar a ela esta noite. Ele ergueu o tronco e passou a mão debaixo das saias dela, puxando o tecido de sua roupa íntima para

fora do caminho. Os olhos de Tate escureceram, e Ava estremeceu quando o algodão macio deslizou sobre suas pernas, deixando-a apenas com as meias e sapatilhas de seda.

Não querendo mais negar o desejo que sentia por ele, Ava esticou o braço e agarrou as calças dele. Os dedos dela tremiam, mas se de nervosismo ou expectativa ela não saberia dizer. Ava abriu os botões um a um, queria tanto isso para eles. Deitar-se nos braços dele e ser a mulher que despertava todo o desejo e necessidade que ela conseguia ver nos olhos dele, sentir no toque e a cada beijo.

Abrindo o último botão, Ava enfiou a mão dentro das calças dele e envolveu o membro duro. Ela respirou fundo ante a suavidade da pele que envolvia aço. Os olhos dele se encontraram com os dela, escuros e intensos uma emoção que a deixou inebriada, bêbada de expectativa. Era ela quem fazia Tate reagir desta forma. Que era ela a quem ele desejava e mais ninguém. Não a bela Lady Clapham ou outra mulher com quem ele esteve nos últimos cinco anos, mas ela.

— Beije-me. — ela pediu.

E não precisou pedir das vezes.

Tate envolveu os lábios dela em um beijo ardente, e Ava colocou as pernas em volta dos quadris dele, querendo-o com um desejo que nunca havia sentido. O sexo dele deslizou contra o dela, provocador e torturante. Ela gemeu quando calor deslizou entre suas coxas. Tate pôs a mão entre eles para se guiar nela.

— Você está pronta para mim. — ele rosnou contra seus lábios.

— Diga que está certa disso.

— Uhum. — disse ela, mexendo um pouco para tentar fazê-lo terminar o que haviam começado. — Eu quero.

E não iria conseguir esperar por muito mais tempo. A espera para tê-lo já durava anos, sendo assim, as manobras dele para ir

devagar, a provocação, não eram justificadas.

— Não me faça implorar, Tate. — disse ela, empurrando-se contra ele e provocando um pulsar através de seu abdômen.

— Ah, não a farei esperar mais.

TATE PASSOU os dedos na superfície da vulva dela, estava macia, molhada e pronta para ser reivindicada por ele. Ela ondulou contra a mão dele, e ele sentiu o pênis contrair, duro como pedra e pingando com sua própria necessidade de tê-la.

O local em que estavam não era nada ideal, e Tate tinha a vaga lembrança de ter trancado a porta, mas nada e nem ninguém o tirariam de onde ele estava naquele momento. Ele esperou tanto tempo para ter Ava. Ele sonhava em estar junto dela dessa forma.

Ela olhou para ele com os olhos escuros de necessidade não satisfeita e confiança, e seu coração deu um baque no peito. Como ele a adorava. Ela era tudo o que ele desejava em uma esposa, amante e amiga. Mesmo que ele fosse condenado ao inferno ele a deixaria ir embora agora que a tinha de volta. Depois de hoje, depois que se entregassem dessa maneira, ele se casaria com ela.

Iria amá-la e garantiria que a Senhorita Ava Knight se tornasse a próxima duquesa de Whitstone.

— Você está tão molhada. — ele disse e deslizou um dedo no interior quente dela.

Ele gemeu quando os músculos interiores dela se contraíram no dedo dele, sugando-o.

— Estou. — ela ofegou, agarrando-se aos ombros dele enquanto ele empurrava um pouco mais para dentro. — Eu quero você, Tate.

Eu o quero muito.

Incapaz de esperar por mais um momento, ele se afastou, ergueu as pernas dela ainda mais nos quadris dele e se guiou para dentro dela.

Ela deitou e fechou os olhos. Ver o prazer que ela sentia só contribuiu para que o pênis dele ficasse ainda mais duro. Havia pouca resistência, e ele estava agradecido por isso, não queria que esse momento fosse só de dor, que a memória dela fosse de algo ruim. A união deles era algo para comemorar e apreciar, e ele faria tudo o que ela pudesse ter sonhado.

— Ó, Tate. — ela suspirou, inclinando-se para beijá-lo. — É uma sensação tão boa, tão certa.

Tate se afastou um pouco antes de avançar, as palavras dela nunca foram tão verdadeiras . Inferno, parecia tão certo e tão bom.

Era só nisso que ele conseguia pensar. Eles encontraram um ritmo, e ele lutou para não se perder antes que ela chegasse ao ápice do prazer.

Ele queria vê-la se desfazer em seus braços, que ela se contraísse e tivesse espasmos em torno do membro dele de modo a levá-lo ao próprio clímax. Os movimentos dos dois ficaram mais frenéticos, e os gemidos e suspiros de prazer de Ava eram inebriantes. Ele se derramaria logo se não fizesse algo para levar Ava ao clímax em breve.

Tate se afastou e se ajoelhou entre as pernas, afastando os joelhos dela.

— O que você está fazendo? — ela perguntou sem fôlego, tentando fechar um pouco as pernas.

Ele agarrou as mãos dela e as colocou atrás da cabeça.

— Segure-se no apoio de braço do sofá. Eu quero provar você.

— Provar? Como assim?

Ele não respondeu, apenas se inclinou entre as pernas e lambeu Ava do núcleo ao clitóris. O aroma doce e almiscarado o fez gemer, e lambendo-a de novo, ele decidiu provocar o pequeno botão que implorava por libertação.

— Minha nossa. — ela engasgou.

Ah, sim...

Tate olhou para cima e a viu colocar a mão na boca. Ele deslizou a língua para frente e para trás sobre o sexo dela, amando o gosto dela, como ela ondulava contra os lábios dele por instinto, buscando libertação. Ele não deixou de atacar o sexo dela, querendo lhe dar prazer antes de fazer amor com ela. Ela ofegou o nome dele e soltou o braço do sofá, cravou os dedos nos cabelos dele, segurando-o contra ela.

Tate sentiu contrações contra os dedos e sorriu, beijando-a com vontade, saboreando o momento em que ela chegou ao clímax contra a boca dele.

Quando ele seguiu Ava pelo corredor, ele jamais sonhou que era assim que eles terminariam, mas por Deus, ele estava feliz por tal desfecho. A última coisa que ele queria era que eles continuassem em desacordo pelas reações ou planos de outras pessoas.

Ele a beijou antes de voltar a se colocar entre as pernas dela.

Ela se abriu para ele, os olhos semicerrados e sonolentos de satisfação. Tate se guiou para dentro daquele calor, e ela apenas fechou os olhos, suspirando.

— Está bem, minha querida? — ele perguntou, erguendo o queixo dela com o dedo para que olhasse para ele.

Ele bombeou nela devagar, querendo prolongar o tempo junto dela o máximo que pudesse. Seus olhares se cruzaram, e ela sorriu para ele, sonhando acordada.

— Ó sim, estou mais do que bem. Não pare. — ela disse, passando os braços pelos ombros dele e erguendo mais as pernas para se apoiar nas costas dele.

A aceitação dela, o desejo nela, desfez qualquer controle em que ele ainda se apoiava e ele se permitiu investir, querendo torná-la dele e somente dele.

Ela ofegou, puxando-o para um beijo descarado. Ele a beijou com intensidade, a língua dela mimicava as estocadas dele, e em poucos minutos ele quis se perder dentro dela. Mas ainda não, era muito cedo. Ele precisava adiar um pouco mais.

Ela baixou uma das mãos e agarrou um lado da bunda dele, puxando-o para ir mais fundo. Com uma única rotação de quadris, ela o fez entrar até a base e estilhaçou toda restrição de Tate. Ele se empurrou uma vez, duas vezes, três vezes e gozou com tanta força que o fez se esquecer de onde estavam e gritar o nome dela.

Ava ofegou, gemendo o nome dele em troca, e som do prazer dela foi como um fósforo para o fogo dele. Ela ainda era tão perfeita para ele quanto no dia em que ele pediu que ela se casasse com ele tantos anos atrás. Ele não queria nada mais do que envolvê-la como um presente, levá-la para casa e mantê-la em sua cama e vida para sempre... e mais um dia.

Ele caiu ao lado dela no sofá, puxando-a para se deitar na dobra do braço dele. O relógio do parapeito da lareira soou, marcando uma hora da manhã.

— Gostaria de nunca mais sair daqui. Eu ficaria muito contente do seu lado para sempre, se pudesse.

Ava passou a mão sobre o peito dele, brincando com os botões do colete que ele nem chegou a tirar por causa da pressa deles de se consumirem.

— Eu também, mas infelizmente, não podemos. Temos que voltar ao baile antes que notem nossa ausência.

Tate suspirou, não querendo fazer mais nada.

— Se eu concordar em levá-la de volta ao baile, vai dançar comigo? — ele se virou para encontrar o olhar dela. — Garanti um espaço no seu cartão de dança?

Ela sorriu, erguendo a sobrancelha.

— Creio que sim. — ela disse, virando-se para olhar para o teto e ficando séria de repente. — Se quer saber a verdade acerca de meu descontentamento, eu sei da sua história com Lady Clapham e não fui capaz de suportar. Uma mulher que é intitulada, bonita e elegante, da sua esfera social. Bem, eu não sou tola o suficiente para não saber que senti ciúmes.

Ele virou o rosto dela para encará-lo, implorando para que ela acreditasse nas palavras dele.

— Eu não estou cogitando Lady Clapham como minha esposa.

Quero você como minha esposa, para que esteja sempre ao meu lado. — ele não disse as palavras, ainda não pelo menos, mas ele diria. Tudo o que pairava entre eles precisava ser discutido e em breve. — Ela é apenas a dama de companhia nobre de uma viúva, nada mais.

Comparado a Ava, não havia ninguém que ocupasse tanto espaço no coração dele. Ela sempre foi a pessoa certa. Uma confirmação que ele obteve no momento em que ela o confrontou nos estábulos dele depois de cinco anos sem se verem.

— Quando retornarmos a Berkshire, discutiremos o que isso significa. O que nós dois queremos.

Ele a queria. Como esposa, confidente e parceira. Nada menos serviria. Ela sorriu, inclinando-se para um beijo breve.

— Acredito que seja o melhor a fazer.

CAPÍTULO 13

Percebi hoje que prossegui com minha vida. Que, embora casamento não seja mais algo que eu desejo, saiba que sou feliz.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

N A MANHÃ SEGUINTE, Ava acordou tarde e rolou no colchão para olhar pela janela do quarto. Ela ouvira uma criada entrar mais cedo e abrir as cortinas, colocar um pouco de água fresca na bacia e alguns paninhos para higiene pessoal, mas Ava voltou a dormir.

O baile na noite anterior havia sido muito melhor do que Ava pensara ser possível. Decerto, depois de ser um pouco ciumenta em relação à Lady Clapham e sair correndo da casa do duque mais cedo naquela manhã, ela não acreditava que ele se explicaria quanto a situação dela. Quão errada ela estava. Não que mudasse a situação entre eles, mas a fazia sentir-se um pouco melhor por saber que o elo com a dama terminado.

Ainda assim, ela acreditava que a melhor decisão para ela seria manter a independência. O duque era muito reverenciado na sociedade, as pessoas o admiravam, ele era gentil e se esperava muito dele. O papel de esposa dele seria algo de grandes proporções, e Ava não estava convencida de que queria realizá-lo.

Contudo, havia algo que ela sabia bem: que ela queria Tate. O

fogo que queimava, chamuscava e consumia os dois sempre que

estavam perto um do outro era demasiado intenso para ser ignorado. Mas havia outra opção que não haviam contemplado: a de se tornarem amantes.

Tornar o que ocorrera no baile de Lorde York um arranjo permanente entre eles. Sem casamento, sem contratos, sem expectativas, apenas um tempo juntos, prazer e alegria. Ela sentiu-se estremecer por dentro ao relembrar o que fizeram naquela sala privativa. Ava sorriu, mordendo o lábio inferior.

Queria repetir, e em breve.

Ela afastou a roupa de cama e seguiu com sua rotina matinal e decidiu-se por usar um vestido azul claro. Antes de voltar para Berkshire, ela foi à Hatchards e encomendou alguns livros sobre criação e linhagem de cavalos que deveriam chegar hoje. Ela passaria na livraria antes de ir ao Hyde Park se encontrar com Hallie e Willow.

A viscondessa morava em Mayfair, o que significava uma caminhada curta até a livraria, e como era bem cedo, a maioria dos moradores da região ainda estaria na cama após passarem a noite em festas por toda Londres. Ava não teria percalços e chegaria à loja em pouco tempo.

A campainha acima da porta tocou quando ela entrou e, cumprimentando o atendente que estava detrás no escaninho, passeou pelas estantes para ver se havia outros livros que ela gostaria de levar.

O cheiro reconfortante de couro e cera permeava o ar, os sussurros baixos de outros amantes de livros caminhando na loja a fizeram sorrir.

Por um tempo, Ava se perdeu nas fileiras de livros e na variedade oferecida antes de um livro em particular chamar sua atenção. Abrindo a capa, ela ofegou, e o fechou depressa.

Olhando ao redor, Ava verificou se estava sozinha, e ao confirmar a ausência de outras pessoas, ela abriu o livro mais uma vez para olhar as imagens de homens e mulheres, às vezes mais de duas pessoas em todo o tipo de brincadeiras conjugais.

Ela olhou para uma imagem em particular que mostrava uma mulher deitada na direção oposta ao amante: Ava não conseguia imaginar como era possível. Como isso funcionaria?

Ela fechou o livro, colocando-o de volta no lugar e determinada a folhear mais um pouco em sua próxima visita. Neste instante, se ela não fosse embora, se atrasaria para encontrar as amigas no parque.

Não demorou muito para pegar os livros e após agradecer ao atendente ela caminhou até a Piccadilly, virou na direção do Hyde Park e bateu de frente à uma parede de músculos diante dela.

Por um momento Ava pensou que poderia ser Tate, mas todas as suas esperanças de tal encontro foram frustradas ao olhar para cima.

— Srta. Knight. Como é oportuno encontrá-la aqui. Está com pressa para ir a algum outro lugar?

A resposta foi um retumbante sim. Sim, ela estava com pressa para encontrar as amigas, mas agora estava com mais pressa ainda de se afastar dele.

— Com licença. — disse ela passando por Lorde Oakes.

Ava se assustou quando ele agarrou a mão dela e a colocou no braço dele, juntando-se a ela na caminhada até o Hyde Park. O

pânico a rasgou por estar sozinha com ele outra vez. Ela havia jurado, no dia em que ele a atacou, que jamais ficaria sozinha com

alguém em quem não confiava, e decerto não poderia confiar em Lorde Oakes de jeito nenhum.

— Então... — ele disse com toda jovialidade. — Para onde estamos indo com tanta pressa? Irá se reencontrar com o duque de Whitstone, ou com outra pessoa?

Ele sorriu para ela, mas a tentativa de parecer entretido saiu mais como zombaria. Ava nunca imaginou que poderia odiar alguém tanto quanto odiava o lorde ao lado dela, mas, infelizmente, aqui estava ela com o único homem que a fazia preferir estar morta e não viva.

— Se quer saber, estou indo encontrar minhas amigas, Srta.

Evans e Srta. Perry, no Hyde Park. Não que seja da sua conta.

Ela tentou libertar a mão sem sucesso. Ele lançou um tsc, tsc para ela e sorriu para um transeunte, como se a conversa deles fosse a coisa mais comum do mundo.

— Convenhamos, Srta. Knight. Nós nos conhecemos a nível pessoal. Não seja tão fria comigo. Houve uma época em que você era toda desejosa, e era bem quente ao toque.

Ela conseguiu soltar o braço e o confrontou sem se importar com o lugar em que estavam.

— Eu nunca estive desejosa. E o senhor pode pensar o que quiser, mas caso se aproxime de mim outra vez, farei com que pague.

Ela não sabia dizer como, mas estava certa de que resolveria, mesmo que significasse engolir o próprio orgulho e pedir a Tate que a ajudasse com Sua Senhoria. Não era uma opção que ela apreciava, já que estava muito determinada a manter sua independência, porém, às vezes era necessário um homem para forçar outro a sair de cena.

Lorde Oakes levantou a mão e passou o dedo sobre o pulso que ela havia machucado. Pouquíssimas pessoas sabiam que ela estava ferida e o que assustara o cavalo para que empinasse, causando a queda dela. Então, como Lorde Oakes saberia a menos que...

Ela estreitou os olhos, e ele sorriu antes de apertar o pulso lesionado com mais força do que seria recomendado. Ela ofegou, afastando-se.

— Peço desculpas, Srta. Knight. Está machucada?

Ela olhou para ele por um momento, sem acreditar que ele seria tão descarado.

— Você deveria saber que sim, Lorde Oakes — disse ela, vendo se ele entendia as palavras dela.

Seus olhos se arregalaram e então, jogando a cabeça para trás, ele riu como se ela tivesse dito algo extremamente divertido. As pessoas que desciam Piccadilly olharam na direção deles, mas continuaram sem comentar.

— Ó, você é uma verdadeira beleza. Agora sei por que eu quis tanto você, era só para tentar domar essa fera que ronrona em sua alma.

— Você não tem alma — disse ela sem pensar. —, portanto, faria sentido tentar tirar a de outra pessoa.

A admissão dele acerca de ter estado lá naquele dia, foi algo estranho a se fazer. Ele pode não ter dito as palavras em si, mas admitiu saber do ferimento dela e como havia acontecido. Lorde Oakes era o incendiário, disso não restava dúvidas, mas, ainda assim, era a palavra dela contra a de Sua Senhoria, a palavra de uma mulher contra a de um homem. Um homem poderoso, mesmo que os bolsos estivessem furados.

— Você não pode provar nada, minha querida e bela senhorita Knight. Tentar usar sua palavra contra mim é irrelevante, sem valor.

Portanto, se eu fosse você, não tentaria manchar meu nome.

Contudo, ao olhar para você neste instante, sabendo a delícia de corpo que se esconde aí, eu fico duro de vontade de tê-la.

Ela recuou, seguindo em direção ao parque. Ele a alcançou, mantendo o ritmo apressado dela.

— O duque sabe de nossas escapadas? Ele sabe como você gemeu meu nome naquele dia em que eu acariciei sua boceta na sala de visitas? Lágrimas se acumularam nos olhos dela, e ela piscou para afastá-las.

— Vá embora, já disse o suficiente, e eu não vou ouvi-lo nem mais um momento.

— Ó, mas você vai ouvir, sua vadiazinha. — ele a puxou, forçando-a a parar, o aperto no braço provocando dor, porém, ela se recusava a se encolher, a ceder ao ataque dele.

— Eu a vi ontem à noite com o duque. Eu vi tudo... — ele sorriu.

— Quero você na minha cama. Acho que esperei mais do que o suficiente para ter você.

Um tremor a percorreu, deixando-a com frio. Ela engoliu em seco, olhou em volta e, graças, ninguém na rua prestava atenção aos dois.

— Você nunca vai me ter. — ela sussurrou feroz.

— Se não concordar — continuou ele. —, vou arruinar seu pequeno negócio de criação de cavalos e você ficará sem nada: sem renda, sem clientes e sem duque. — ele sussurrou contra o ouvido dela, repleto de sarcasmo. — Quão tristonha você será. Tão triste quanto era quando o duque ainda estava no exterior e você havia voltado para sua casa em Berkshire. Ou quando ele por fim voltou para a Inglaterra e decidiu ficar em Londres, fodendo sabe-se

lá quantas mulheres. Mas... — ele deu de ombros. — é como minha sociedade funciona. Lordes possuem amantes, e as esposinhas esperam em casa.

Ela se encolheu, odiando a ideia de um casamento assim.

Odiando a possibilidade de Tate fazer amor com alguém que não fosse ela.

— Você pode me ameaçar como quiser. Não farei o que me pede. Sua mente girou, querendo ir embora, afastar-se de Lorde Oakes.

Ele riu, soltando o braço dela.

— Isso nós veremos, Srta. Knight. Bom dia para a senhorita. —

ele disse, curvando-se antes de sair na direção oposta.

Ava se virou para o parque, não diminuindo o ritmo até que visse Hallie e Willow. Suas amigas sempre foram sinônimo de conforto e segurança e, naquele momento, ela precisava delas mais do que nunca. Willow acenou quando ela se aproximou, e Ava escondeu o tumulto que acontecia em sua mente com uma expressão facial treinada.

— Ava, estamos tão felizes por você estar aqui. Estamos falando do baile e da casa do marquês de Boothby. Você conhece o cavalheiro, dançou com ele no baile dos York. É esta noite, estamos tentando decidir o que vestir. Estávamos pensando que todas poderíamos escolher tons pastel para parecer um conjunto. O que acha da nossa ideia?

Ava assentiu, sorrindo e murmurando em acordo embora sua mente estivesse desconcertada. Será que conseguiria contar ao duque da ameaça de Lorde Oakes? Se contasse a Tate o que havia se passado há pouco, ele o desafiaria para um duelo. Lorde Oakes já havia provado ser um homem que não pensaria duas vezes antes

de atirar em pessoas inocentes. Pensar em perder Tate de tal maneira fez bile subir à garganta dela.

Não, ela manteria o episódio em segredo, voltaria para Berkshire e lidaria com Lorde Oakes no campo, longe dos olhos curiosos da alta sociedade, se pudesse. Ele cometeria algum erro em seus acordos e ameaças nefastos, e assim, a lei cuidaria dele.

AO VOLTAR PARA CASA, Ava mal conseguia se lembrar de como a última hora havia passado, o que ela e as amigas haviam conversado, ou com quem haviam se encontrado. Tudo o que sabia era que queria ficar sozinha, longe de todo o barulho de Londres e voltar a Berkshire.

— Com sua licença, creio que vou me deitar um pouco. Estou com uma súbita dor de cabeça.

— Você está bem? — perguntou Hallie, pegando a mão dela, interrompendo-se no meio do vestíbulo da casa da viscondessa.

— Talvez não, infelizmente. Suspeito que esta cefaleia me impedirá de comparecer ao baile desta noite. Espero que não se importe.

Acima de tudo, ela queria rever Tate.

A simples presença dele acalmaria seu nervosismo, mas ela não conseguiria enfrentar a alta sociedade. Lorde Oakes, sem dúvida, estaria lá. Hoje não.

— Claro, minha querida. — Willow disse, aproximando-se dela depois de entregar o chapéu e o xale a um lacaio que aguardava. —

Pedirei que façam um chá de tisana agora mesmo, e que levem para você quando estiver pronto.

— Obrigada. — Ava disse, desatando o chapéu e subindo as escadas. — É muito gentil da sua parte.

TATE ESTAVA de pé ao lado de Lorde Duncannon, sentia-se irrequieto por dentro ante a ausência de Ava no baile. Onde ela estava?

As amigas estavam aqui, dançando e conversavam com alegria, mas Ava não. Ele ponderou um pouco, e ao vê-las reunidas tomando ponche durante o intervalo das danças, caminhou até elas.

— Boa noite, Srta. Evans, Srta. Perry. Acredito que estejam gostando do entretenimento desta noite? — a banalidade em sua fala incomodava até ele mesmo, mas ele faria de tudo para garantir que Ava estivesse bem.

— Estamos contentes sim, Sua Graça, obrigada.

Elas o encaravam com um nítido saber nos olhos, achando graça até, mas não falaram mais nada. Ele não poderia fazer uma pergunta direta acerca de Ava, mas por Deus, como ele gostaria de poder fazer isso. Tais regras e expectativas sociais mostravam-se um incômodo em certas situações.

— Já frequentaram o baile do marquês, ou é a primeira vez?

A Srta. Evans o observou com um ar especulativo e, em seguida, respondeu:

— Esta é a minha primeira vez em Londres depois de um longo tempo. Como sabe, frequentei a mesma escola francesa que a Srta.

Knight e a Srta. Perry. A Srta. Perry compareceu a este baile no ano passado, pois a viscondessa Vance é sua tia.

Por fim, Tate viu uma abertura para perguntar de Ava.

— E a Srta. Knight, ela não veio esta noite? Pensei que ela também fosse convidada da viscondessa?

A senhorita Evans ergueu uma sobrancelha, os lábios tremendo.

— Pois é, Sua Graça, ela estava indisposta e infelizmente ficou em casa esta noite.

Ele deu mais um passo na direção delas, pretendia perguntar mais, mas viu que era melhor não.

— Bem, é uma pena. Espero que ela esteja melhor pela manhã.

— Ó, nós também. — disse a Srta. Perry. — Planejamos uma noite nos Jardins de Vauxhall, e seria muito triste se Ava não puder se juntar a nós.

— Irão ao baile de máscaras?

Tate pensava que era um evento frequentado, na maioria das vezes, por cidadãos de padrões morais baixos e cujos passatempos eram praticados com os corpos deitados em vez de pessoas em busca de socializar com a alta sociedade por distração.

A Srta. Evans silenciou a amiga, fitando-a.

— Eu peço desculpas, Sua Graça. Minha amiga está equivocada. De jeito nenhum vamos à Vauxhall. Ficaremos em casa amanhã à noite.

Tate observou o embate silencioso entre as amigas e compreendeu que a Srta. Perry havia se enganado. Ele reprimiu um sorriso pelo lapso dela e mascarou sua reação.

— Espero que a Srta. Knight não esteja tão doente. Eu detestaria que perdesse os belos passeios pelos jardins.

A Srta. Perry deu uma risadinha.

— É apenas uma dor de cabeça, Sua Graça, mas já cometi minhas gafes. Estamos em casa amanhã à noite.

— E as senhoritas participarão de mais bailes esta noite? Ou o baile de Lorde Boothby é o bastante para entretê-las?

As bochechas das duas ganharam um tom claro de rosa, tornando-as tão bonitos quanto as mulheres que desfilavam repletas de sedas e diamantes.

— Esta noite ainda iremos a mais dois bailes, Sua Graça. Uma boa amiga da viscondessa, Lady Southerton, está nos esperando para logo, e nos prometeu alguns fogos de artifício.

— Parece bem divertido. — Tate fez uma mesura. — Desejo-lhes uma noite agradável. Por favor, enviem meus cumprimentos à senhorita Knight quanto voltarem a vê-la.

Tate girou nos calcanhares e seguiu para as portas do salão de baile. Ele se despediu Lorde Duncannon rapidamente e pediu que trouxessem sua carruagem. O percurso até Berkley foi curto, e ele pediu ao condutor que estacionasse na estrebaria. Ele rumou à porta da frente e bateu duas vezes antes que um lacaio permitisse sua entrada.

Ele entregou o cartão ao mordomo.

— Por favor, peça que a Srta. Knight me encontre na biblioteca agora mesmo.

O mordomo estudou o cartão por um breve momento antes de guiar Tate até um cômodo na parte da frente da casa.

— Por aqui, Sua Graça. Vou verificar se a Srta. Knight está disposta, ela não se sentia bem esta tarde.

— Sua Graça? — uma voz feminina soou no alto da escada.

Ele virou o olhar para cima e sua apreensão ao saber da indisposição dela foi apaziguada ao vê-la.

— Srta. Knight. Peço desculpas pela intromissão. Tenho notícias de Berkshire que pensei que gostaria de saber. Por ser uma vizinha.

— mentiu.

Ele estava disposto a dizer o que fosse necessário para que ela descesse e falasse com ele.

— Obrigada, John. Atenderei o duque na biblioteca. Não devemos ser incomodados.

O criado curvou-se e deixou-os.

Tate esperou Ava na base da escada e a acompanhou até a biblioteca. Ele entrou mais no cômodo quando Ava fechou a porta detrás deles, e sorriu quando ouviu o som alto do trinco sendo acionado. — O que está fazendo aqui, Tate? Se for pego pela viscondessa, nós dois estaremos arruinados.

— Notei sua ausência no baile desta noite e quando suas amigas mencionaram uma dor de cabeça, fiquei preocupado. Eu não seria capaz de descansar se não visse com meus próprios olhos que estava bem.

Ava se juntou a ele diante da lareira.

— Você estava preocupado comigo?

Ele sorriu, puxando-a contra ele e abraçando-a.

— Você sabe que sim.

Ela o abraçou também e olhou para cima.

Tate sentiu seu coração dar um pulo no peito. Ela estava tão bonita em um vestido de dia, sem ornamentos ou ruge nas bochechas como muitas mulheres da alta sociedade gostavam de usar. Ava parecia uma mulher aproveitando uma noite em casa, lendo ou apenas relaxando em seu quarto. Os longos cabelos escuros dela estavam sobre os ombros, e ele precisou se controlar para não correr os dedos neles, sentir a suavidade e o doce aroma.

— Está se sentindo melhor? — ele perguntou, colocando uma mecha do cabelo dela para trás da orelha.

Ela assentiu.

— Não cheguei a ter dor de cabeça, apenas quis ter uma noite para mim mesma, mas fico feliz de vê-lo.

Tate gostou de ouvir essas palavras, e gostou de vê-la. Ele conseguia imaginá-los tendo diversas noites assim: conversas, desfrutando da simples companhia um do outro, como quando eram crianças.

— Mencionou ter novidades de Berkshire e Lorde Oakes?

Ele deu um sorriso largo.

— Não há nada para compartilhar. Só que eu queria revê-la.

— Queria?

— Sim. — disse ele.

A doce voz dela provocava sensações estranhas no peito dele.

Ele se inclinou e a beijou, pegou os lábios dela e tentou transmitir de todo o coração o quanto ela significava para ele. Ava se deixou envolver nos braços dele, os dedos dela deslizaram sobre os ombros dele e cruzaram em seu pescoço. Os seios dela pressionaram o peito dele, as curvas doces e femininas o atraíam como sempre.

Tate se inclinou e a pegou por inteiro em seus braços, carregou-a até uma cadeira próxima. Ele se sentou, colocando-a em seu colo, de modo que ela montasse nele. Ele a beijou com força, lambeu o lábio inferior, traçou a boca, não parecia conseguir o suficiente dela.

Tão suave e disposta, e a palavra minha reverberou na mente dele.

Ela se abriu para ele, e ele aprofundou o beijo. A língua deslizou contra a dela, e ele gemeu, algo como fogo se acendendo no sangue dele.

Ava interrompeu o beijo, a respiração tão irregular quanto a dele e, por um momento, eles se entreolharam. Emoções o dominaram ao encarar os olhos castanhos que o miravam maravilhados ao perceber que eles se afetavam de maneira igual.

Não deveria surpreender nenhum dos dois, sempre fora assim.

Da primeira vez que se beijaram, sob um grande carvalho, os dois

se afastaram daquele abraço completamente transformados, ligados por uma nó invisível que, mesmo tão jovem quanto Tate era na época, ele sabia.

O destino dela era o mesmo do dele, para sempre.

Ele passou os polegares pelas bochechas dela, segurando o rosto dela diante dele. Ava arrastou-se no colo dele, posicionando seu calor bem em cima do dele. Ela suspirou, balançando contra ele, o núcleo quente tentando-o a rasgar a frente das calças e uni-los.

Tate tremeu ante a própria negação em fazer o que estava claro que os dois ansiavam com intensidade. Em algum lugar nos recônditos da mente, ele se lembrou de onde estava.

Quando ele entrou no cômodo, a porta havia sido trancada? Um descuido dele.

— Devo ir. Caso a viscondessa chegue, um inferno será instaurado. — ele disse entre beijos. — Eu não quero causar problemas para você.

Não que ele não aceitasse se casar com Ava no dia seguinte, mas ela não precisava do falatório que a alta sociedade promoveria caso soubesse desses encontros. Seu casamento com Ava seria porque eles desejavam que assim fosse, e não por a nobreza acreditar que ele a havia arruinado de alguma forma e estavam sendo forçados a casar-se.

— Eu não quero que você vá. — ela protestou, com uma voz trêmula.

Ela segurou a mão dele e a empurrou contra o sexo dela. Sua umidade o cumprimentou, e ele ficou duro como aço. Ele não negaria nada a ela, aos dois, não quando ela queria tanto quanto ele. Tate passou os dedos ao longo do núcleo dela, fazendo com que um doce suspiro deixasse aqueles lábios. Ela pressionou a mão

dele, os olhos adquirindo um tom intenso de âmbar, vislumbres do fogo nele.

— Eu quero você, Tate! — ela o beijou com força. — Você me provoca tanto desejo.

Tate gemeu quando a mão dela deslizou pelo abdômen dele, esforçando-se para acariciar os contornos de seu estômago antes de se aprofundar mais e envolver seu pênis inchado.

— Você me faz querê-la também. — ele murmurou, sem fôlego.

Os dedos dela fizeram um rápido trabalho nos botões das calças dele e então ela o tocou, deslizando a mão tão familiar no pênis dele, um massagear constante que o fez ver estrelas.

Ava se aproximou e o beijou.

— Vi em um livro uma figura com a posição que estamos agora.

Você... será que essa posição, é possível?

Que tipos de livros ela estava lendo?

Ele queria saber mais. Ele deixou essa pergunta para outra hora, distraído demais com os movimentos dela no colo dele. Se ele fosse um cavalheiro, daria a ela alguns dias de descanso antes que voltassem a fazer amor, mas tal opção era impossível quando o olhar penetrante dela quase implorava que ele a preenchesse. E ele faria exatamente o que ela pediu.

— Só precisa pedir. — ele sorriu e colocou a mão entre eles, agarrou o tecido das saias e o amontoou em torno da cintura dela.

Ela se ergueu um pouco, ajudando-o com o esforço. Os movimentos dos dois foram rápidos e desesperados. A necessidade de tê-la, de transar e reivindicar a mulher em seus braços era demais. Ele se posicionou na entrada dela, sustentando o olhar sensual dela.

Tate se empurrou com força enquanto ela deslizava sobre o comprimento dele. O núcleo apertado dela o envolveu, e ele

respirou fundo ante a perfeição de tomá-la outra vez. Eles se moveram juntos, os braços dela no pescoço dele, os dedos cravados na pele das costas dele. Ele bombeou forte e profundo, queria que ela se desfizesse em seus braços, que desmoronasse com ele.

Ela era dele, agora e para sempre, assim como ele era dela.

Como poderiam não ficar juntos, se a cada vez que se encontravam a sensação de certeza aumentava? Apesar de todos os anos separados, ainda haviam se reencontrado.

Ava o empurrou contra o encosto da cadeira, as mãos agarrando-se aos braços da cadeira. Tate se divertiu ao vê-la assumir o controle, encontrando o próprio ritmo para obter prazer dele.

Ela era toda maravilhosa, e ele reprimiu a necessidade de se derramar dentro dela. Ele pôs as mãos entre os dois e deslizou os dedos no pequeno botão em seu núcleo. Um meio suspiro, meio gemido escapou da boca dela, e ele ofegou.

— Goze para mim. — ele implorou, ele mesmo estava tão perto que a tentação o consumia a cada estocada.

Os movimentos dela ficaram desesperados, e ele a segurou pelos quadris, guiando-a para mais fundo, mais forte cada vez que ela descia sobre ele. Os dedos dela apertaram a nuca dele, deslizando pelos cabelos, e ele soube que ela estava perto. Os olhos dela tremera e se fecharam, uma mínima transpiração no lábio superior que ele desejava lamber.

— Ó, Tate.

Ela jogou a cabeça para trás quando espasmo após espasmo apertou o pênis dele, jogando-o ao clímax. Tate gozou forte, seguindo-a na sensação de felicidade em que ele não queria nada mais do que repetir. Ele lutou para recuperar o fôlego, voltar à

realidade e se refazer. Ela caiu contra o peito dele, a respiração quente em seu ombro. Ela virou a cabeça, beijando-o no pescoço, e ele estremeceu com desejo renovado. Ele nunca se cansaria da mulher em seus braços.

— No entanto, como vamos parar? — ela riu, e ele passou os braços em torno dela, abraçando-a.

Ele a beijou na testa, cruzaram o olhar.

— Eu não tenho ideia. — disse ele com sinceridade.

E ele não sabia mesmo, mas também não queria.

— Eu deveria fingir uma dor de cabeça mais vezes se essa é a medicação.

Atrevida!

Ele riu, mantendo-a imóvel, sem vontade alguma de tirá-la do colo.

— É justo que eu seja sua cura, pois você sempre foi a minha.

CAPÍTULO 14

A LGUNS DIAS DEPOIS, Tate cavalgava à toda velocidade na estrada que ligava Londres à Berkshire. Ele havia terminado de passar as instruções para seu administrado antes do imaginado e, com sorte, ele alcançaria o coche de Ava. Ele sorriu ao pensar nela. O quanto ele sentia falta dela quando estavam separados.

A Estalagem Cisne Feio tornou-se visível um pouco mais à frente, e ele diminuiu a passada do cavalo ao se aproximar dos arredores da pequena aldeia. As pessoas circulavam pela cidade, cuidavam de suas vidas. A parte da frente da estalagem estava ocupada com uma série de carruagens e pessoas descarregando e carregando bagagens.

Quando ele parou no pátio, um jovem cavalariço saiu correndo e, ao descer, Tate entregou um xelim ao menino.

— Diga-me, rapaz, a Srta. Ava Knight e seus acompanhantes ainda estão aqui ou já seguiram viagem?

Os olhos do menino se arregalaram e assentindo com entusiasmo, ele disse:

— Sim, ainda estão aqui, meu senhor. Estão lá dentro, e meu pai disse que alugaram alguns quartos.

— Obrigado. — Tate disse, dispensando o menino e seu uso de

"meu senhor" em vez de "Sua Graça".

Ele abriu a porta da frente e entrou no que parecia ser a taverna frontal do estabelecimento. A área estava lotada até não poder mais de moradores da região em suas roupas empoeiradas, amarrotadas e desgastadas pelo trabalho. Tate caminhou até o balcão e deslizou um soberano no bar.

— Eu preciso de um quarto para a noite. — E, também, preciso saber em que aposentos você alocou a Srta. Knight para que eu possa notificá-la de minha presença.

O taberneiro, um tipo rotundo e grisalho, ergueu a sobrancelha e cruzou os braços sobre a barriga.

— E você quem seria? — ele perguntou.

Tate precisava dar crédito ao homem por tê-lo questionado em vez de apenas informar o paradeiro de Ava após receber dinheiro.

— Sou o duque de Whitstone.

Os olhos do homem se arregalaram, e ele se endireitou, tentando fazer uma reverência para ele.

— A comitiva que procura está fazendo uma refeição na sala de estar privativa da frente, Sua Graça. Mandarei preparar meu melhor aposento para o senhor, milorde. É a primeira porta à esquerda ao sair das escadas.

— Obrigado. — Tate agradeceu e seguiu para a sala indicada.

Ele bateu duas vezes e abriu a porta. Encontrou Ava sozinha na mesa. Ela estava sentada ao sol com uma edição do Times aberto à sua frente. Ela ergueu os olhos, e ele viu surpresa ali antes que ela deixasse o jornal de lado e fosse até ele.

— Tate, o que está fazendo aqui?

Ele fechou a porta e a pegou nos braços.

— Dois dias era tempo demais.

Ela sorriu e o beijou, e ele tomou seus lábios, tomou como se ela fosse sua última esperança de matar a sede. Ava se derreteu contra o peito dele, e a sensação de seus seios, seus mamilos endurecidos através de seu vestido de algodão macio fez o sangue dele acelerar.

Ele a beijou de forma demorada e profunda, ergueu-a contra si e os deixou sem fôlego.

— Maldição, eu quero você. — ele se engasgou com o beijo.

— Vai passar a noite aqui? — foi a resposta dela.

Ele ficaria para sempre se ela permitisse.

— Aluguei um quarto. — ele a abraçou, não queria soltá-la. —

Gostaria de se juntar a mim?

Ela lançou um olhar repleto de pecado que o fez ferver.

— Vou precisar contar à Hallie o que estou fazendo ou ela se preocupará. Mas estou certa de que ela não se importará.

A porta se abriu e sua amiga entrou como se, por dizer seu nome em voz alta, Ava a tivesse convocado. Ela se assustou ao ver o duque abraçando a amiga dessa forma tão inapropriada. Ela entrou depressa antes de fechar a porta rápido, para que ninguém os visse.

Tate afastou Ava com gentileza e sorriu ante o leve tom de rosa que tomou as bochechas dela. Ava foi se sentar à mesa, e Hallie a seguiu sem dizer uma palavra. Tate também se sentou e, pegando o bule de chá, serviu-se de uma xícara.~

Hallie se virou para um e depois para o outro antes de suspirar.

— O que vocês dois estão fazendo? Não são casados nem noivos, e contudo, cá estamos nós. Entrei e os flagrei abraçados no meio de uma estalagem rural das mais movimentadas! — a Srta.

Evans pegou o pão e o queijo, servindo-se de uma boa porção em enquanto nenhum deles se aventurava a responder. — Ah, e a propósito, a duquesa-viúva acaba de chegar.

— O quê? — tanto ele e Ava disseram em uníssono.

Tate se levantou e foi até a janela para poder ver o pátio da Estalagem. Ele praguejou em silêncio ao ver a mãe e Lady Clapham dando ordens acerca da bagagem, um bando de criados obedecendo a duquesa. Ele se virou para Ava quando a viu de relance e viu a cautela nos olhos dela.

— Me desculpe. Eu não sabia que minha mãe iria para casa hoje.

Ela tocou o braço dele, apertando-o um pouco.

— Você não tem nada pelo que se desculpar, Tate.

A mãe dele entrou na estalagem, e em um momento houve uma batida rápida na porta da sala privativa antes que ela entrasse com sua dama de companhia. A duquesa-viúva fez uma breve inspeção do recinto antes de dar uma fungada desdenhosa.

— Tate, meu querido, por que não me avisou que partiria para Berkshire hoje? Eu teria separado um espaço na carruagem para você.

A mãe dele se sentou à mesa depois que a criada que abriu a porta para elas puxou uma cadeira para Sua Graça.

— Antes de mais nada, eu não sabia que viajaria. E em segundo lugar, estou à cavalo.

Lady Clapham acenou para Tate e sorriu, ignorando Ava e a Srta. Evans, que estavam sentadas à mesa em frente a elas.

— Você irá nos acompanhar até Berkshire pela manhã, Sua Graça? Com um incendiário aterrorizando o condado, ou assim eu soube, acalmaria meus nervos e os de sua mãe se tivéssemos um protetor ao nosso lado.

A Srta. Evans sorriu, e Tate entendeu muito bem o porquê. O

tom de Lady Clapham exalava pecado, mesmo com a presença da mãe dele, e Tate não deixou de notar que as mãos de Ava se fecharam sobre o jornal que ela segurava.

— Claro, eu as acompanharei até a Residência da Viúva, Mãe.

Fui avisado ontem de que está pronta para a sua chegada, a criadagem foi escolhida do jeito que a senhora gosta. E se me permitem ser tão ousado, Srta. Knight e Srta. Evans, posso acompanhá-las também, se quiserem viajar conosco.

Ava olhou entre ele e a viúva. A boca da mãe dele se contraiu formando uma pequena ruga de desgosto e não era difícil saber o que ela pensava da ideia.

— Nós gostaríamos disso, Sua Graça. — a Srta. Evans respondeu, e Ava permaneceu quieta.

— Se nos dá licença, Suas Graças, Lady Clapham, viajamos muito hoje, e creio que seja melhor descansar antes do jantar.

Tate saiu do caminho para permitir que Ava passasse por ele.

Ele esticou o braço e resvalou os dedos contra os dela quando ela passou. Ela não respondeu, apenas o deixou sozinho com a mãe irritante. Ele rangeu os dentes ante a discussão iminente.

Maldição, ele estava cansado das maneiras rudes e intrometidas de sua mãe. Ele a advertiu para manter suas opiniões para si, e ainda assim, ela persistia em ser insolente.

— Vejo que a Srta. Knight ainda corre atrás de você, meu querido Tate. Se ela não se cuidar, ganhará fama.

— A Srta. Knight já estava hospedada, quando cheguei. Então, talvez seja eu quem ganhe tal má fama. — sua mãe o olhou com reprovação, e ele ergueu uma sobrancelha. — Você não concorda, mãe?

— Eu não me importo com o que a Srta. Knight faça ou deixa de fazer, contanto que não interfira e nem traga escândalo às portas do Duque de Whitstone.

— Como quase fez cinco anos atrás? Você sabe bem, não é, mãe, que fui eu que pedi Ava em casamento e implorei que ela fugisse comigo para Gretna? Não foi o contrário, não importa o que você possa pensar.

A boca de Lady Clapham se abriu, e Tate respirou fundo para se acalmar, sabendo que o que ele acabara de declarar estaria em toda Londres antes do fim do mês, graças a Lady Clapham. Não

que ele se importasse. Todas as víboras fofoqueiras poderiam ir para o inferno.

— Se você sonha em me ver casado com uma mulher de título, como Sua Senhoria aqui presente, preciso dizer que é uma grande ilusão. A mulher com quem vou me casar será de minha escolha.

Desculpe, Lady Clapham, pela franqueza da minha língua, mas minha mãe tem uma capacidade fantástica de ignorar os desejos e atos das pessoas.

A viúva pousou a xícara com barulho, derramando um pouco do conteúdo no pires.

— Ava Knight nunca será a Duquesa de Whitstone. Eu o proíbo.

— Por que você é tão contra ela? — ele perguntou, perplexo de verdade. — O Sr. Knight era Sir e, portanto, sua filha é uma Lady.

Segundo sua própria perspectiva, não há razão para seu desagrado, creio eu.

A mãe dele revirou os olhos, algo que ele nunca pensou que veria uma duquesa fazer. Ela se levantou, voltando-se para ele.

— Eles são plebeus. O bisavô dela viveu em uma das fazendas de inquilinato ducal antes de iniciar a criação de cavalos, por diversão. Por favor, pense nisso. Caso tenha filhos com esta mulher, seu filho e futuro herdeiro teriam um tataravô que serviu à casa dele.

Tate já estava farto.

Ele passou a mão pelos cabelos antes de se dirigir até a porta.

— Falando de origens que bom que meu pai não se importou com tais regras quando a conheceu, mãe. Plebeia americana, cheia de dinheiro. Tal fortuna foi sua única carta para reivindicar um pouco de grandeza, não foi? Na minha opinião, você não é diferente da Srta. Knight neste sentido. O que as difere é que Ava tem um coração batendo dentro do peito. Eu chego a duvidar que você possua um.

Sua mãe ofegou, e Lady Clapham empalideceu.

Com o tempo, Tate poderia se arrepender da dureza das palavras que escolheu, mas hoje não seria esse dia.

— Vou visitá-la no dia seguinte a que chegarmos a Berkshire para garantir que esteja bem acomodada na sua residência oficial.

Boa tarde, mãe. Lady Clapham.

CAPÍTULO 15

Meu pai não está bem, mas insistiu que eu ficasse na França. Ele diz que é um simples resfriado, mas havia algo em suas palavras que me causou um arrepio na espinha. Sinto que ele está escondendo algo de mim. Sinto um medo se alastrar por meu corpo hoje, e não consigo me livrar dele.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone.

DOIS DIAS DEPOIS de chegar de Londres, Ava estava nas portas do estábulo com seu administrador, Greg, enquanto o cavalariço de Titan conduzia o garanhão até a égua que eles queriam que ele recebesse. Hoje seria o dia em que saberiam se Titan gostava do cheiro de Black Lace.

Ela esperava que sim.

Ao longo da última quinzena, quando ficaram em baias de frente um para o outro, os dois cavalos pareceram se dar bem, relincharam uma ou duas vezes, ou ao menos era o que o cavalariço a informara, todos bons sinais para um união promissora.

— Muito bom da parte do duque aprovar o cruzamento de Titan com a Black Lace, Srta. Ava. Mesmo que não produzam um campeão, com certeza serão potros bonitos.

Ava riu, supondo que era verdade.

— E, no entanto, não é bem isso que esperamos alcançar.

Prefiro um campeão a um cavalo bonito.

O que não era totalmente verdade. Os cavalos, não importava a idade ou habilidade, sempre teriam um espaço no coração dela.

Para ela, eram o melhor animal da Terra.

— O duque mencionou ontem que houve uma invasão na fazenda do velho Sr. Rogers, embora nada fosse levado houve evidências de que alguém tentou colocar fogo lá, sem sucesso. O

investigador parece acreditar que está conectado ao incendiário, mas o magistrado local não. É difícil saber o que está acontecendo por aqui com todos os problemas que tivemos.

Ava franziu a testa, não havia ficado sabendo que outro vizinho dela havia sido vítima. Na verdade, ela nem chegou a ver Tate no dia anterior. Por que ele não a visitou? Ele não viera visitá-la desde que ficaram juntos na mesma hospedaria ao voltarem de Londres.

Apesar de ser uma grosseria terrível da parte dela, depois de sair da sala de estar ela se manteve no corredor e ouviu as palavras ditas pela duquesa. Palavras mordazes, depreciativas na verdade, e todas direcionadas a ela e à sua inadequação como duquesa.

O ódio que ela ouviu na voz de Sua Graça mostrava que havia pouca esperança de amizade. A mulher odiava seu sangue comum, e como Ava não podia fazer nada para remediar tal fato, havia pouca chance de uma reconciliação.

Ela refletira acerca da perspectiva deles durante a viagem para casa, olhando de vez em quando para Tate que seguiu ao lado do veículo por todo o caminho até a propriedade dela. Cada vez que ela olhava para ele, seu coração se apertava e não havia sentido em negar o que aquela reação significava.

Era a mesma coisa que ela sentira quando menina. Ela o amava.

Para ser sincera, ela nunca deixou de amá-lo, não importava o quão brava ela possa ter ficado. Mas não significava que fosse correto que ficassem juntos.

O papel de duquesa era mais importante que o papel que ela desempenhava aqui nos Estábulos Knight.

— O duque esteve aqui? — ela perguntou, mantendo os olhos nos cavalos e fingindo um ar desinteressado que era apenas superficial.

— Ah sim, Senhorita Knight. Veio antes do almoço, mas não pôde ficar porque iria almoçar com Sua Graça e Lady Clapham na casa da viúva.

— Claro. — Ava manteve-se quieta enquanto Titan montava Black Lace. A união foi breve, com pouco barulho, mas felizmente bem-sucedida. — Muito bem, obrigada por sua ajuda, senhores.

Agora esperemos. — disse ela para os assistentes de pátio que estavam assistindo.

— Pensei ter ouvido o duque dizer que viria para acompanhar o processo, mas talvez algo o tenha retido. — Greg disse, observando os cavalos.

Ava assentiu com a cabeça, pensava o mesmo.

Depois de todas as desavenças com sua negativa de permitir que Titan se reproduzisse com uma de suas éguas, ela imaginou que ele não perderia esse momento.

— Vocês podem devolver Titan para a propriedade ducal esta tarde. Os estábulos já terminaram de ser reconstruídos, e sei que o duque gostaria de ter seu cavalo de volta. Não há necessidade de mantê-lo aqui por mais tempo. — Ava caminhou até o garanhão e passou a mão em seu pescoço. — Mesmo que ele seja uma fera tão bonita.

Ela arrulhou para o cavalo por um momento antes de deixar o cavalariço levá-lo de volta para a baia, para prepará-lo para a caminhada de volta à propriedade de Tate.

— Você está certa, Srta. Knight. Cuidaremos disso agora mesmo.

Ava ficou ao ar livre pelo resto da tarde: observou algumas das potras serem treinadas no pátio, assistiu às suas duas esperanças de prêmio em Ascot fazerem algumas corridas nas pistas e, em seguida, foi analisar os livros de contabilidade dos grãos e feno.

Ela pensou na ausência de Tate.

Haviam voltado para casa há dois dias, e nenhuma palavra dele.

Teria algo errado? A língua perversa da mãe dele enfim o teria convencido a ficar contra ela? Ava se recostou na cadeira, torcendo a pena na mão enquanto mirava o exterior pela janela. Talvez fosse para melhor. As vidas deles eram muito diferentes agora, ambos precisavam pensar nas pessoas que dependiam deles, ele como duque, e ela como criadora de cavalos e treinadora. As esferas sociais a que pertenciam eram de polos opostos, mesmo que uma de suas amigas mais próximas fosse sobrinha de uma viscondessa.

Estar em casa nesses dois dias solidificou sua antipatia pela cidade. Ela sentia falta dos estábulos, de ficar perto dos cavalos, de alimentá-los, ou apenas observá-los correr pelos campos ou pastar nos prados. A vida londrina não era seu forte; e ser duquesa, uma mulher com um senso de moda imaculado e amigos impecáveis não combinaria com ela. Ora, todos as suas amigas da escola eram tão comuns quanto ela, fora Willow, é claro.

Ava suspirou, guardou a pena e se levantou para retornar à casa. O jantar seria servido em breve, e ela prometera a Hallie que compareceria naquela noite, já que na noite anterior fora retida no pátio de baixo depois que uma de suas éguas sofreu um acidente com uma cerca.

Caminhando até a entrada da frente, ela deu um passo para o lado enquanto o carteiro partia a galope, acenando com a boina.

Quando ela adentrou o vestíbulo, um criado saiu do escritório dela com a bandeja de prata na mão.

— Estava procurando por mim, William? — ela perguntou.

Ele fez uma reverência.

— Ah sim, Senhorita Knight. Uma missiva da duquesa-viúva de Whitstone acaba de chegar. Deixei o envelope em sua mesa.

— Obrigada. — disse ela, entrando no escritório e fechando a porta.

Ela sempre amou este cômodo, mesmo quando era o espaço e santuário de seu pai. Agora que era dela, ela nem cogitara fazer mudanças. A mesa de mogno escuro, junto com as estantes que revestiam as paredes e as duas poltronas de couro que estavam dispostas diante da lareira, prontas para qualquer um pegar um livro, sentar e ler o quanto quiser.

Ela quebrou o selo da duquesa e examinou a nota.

Quanto mais ela lia, mais tornava-se incrédula do atrevimento da mulher. Como se atrevia, mas então... como não se atrevia? Ava amassou a nota na mão e, em seguida, abriu-a de novo, examinando o conteúdo pela segunda vez, sem acreditar no que estava lendo.

Srta. Knight,

darei um pequeno baile na minha Residência de viúva em algumas semanas. Sei que tivemos nossas desavenças no passado e espero, pelo bem de nosso pequeno condado, que possamos nos tornar mais agradáveis na presença uma da outra em tempo. Mas, infelizmente, esse momento não é agora. Estou, portanto, enviando esta missiva como uma cortesia, uma pequena explicação para a ausência de um convite. Por favor, não compareça, mesmo que meu

filho peça. A residência da viúva é administrada por mim, e a entrada da senhorita não será permitida.

Com meus cumprimentos, Duquesa de Whitstone PELA SEGUNDA VEZ, ela amassou a missiva, o sangue rugindo nas veias e o som alto em suas orelhas. Como a mulher se atrevia?

Uma batida leve soou na porta, e Hallie colocou a cabeça na soleira.

— Ah, vejo que você também recebeu. Estou tão feliz que seja assim. Talvez a viúva enfim percebeu que o duque está apaixonado por você e, por fim, a aceitará como nora.

Ava afundou na cadeira desejando que fosse verdade.

— Não, temo não ser isso. A missiva é de Sua Graça, mas é um aviso para nem tentar comparecer, porque serei proibida de entrar.

— O quê! — Hallie entrou na sala, deixando a porta entreaberta.

Ela foi até a mesa, pegou a missiva entre os dedos de Ava e a leu depressa.

— Mas que coisa! Eu sabia que a viúva era fria e opinativa, porém isto já é ofensivo demais. — Hallie encontrou o olhar de Ava.

— Sinto muito, Ava. Ela parece determinada a separar você e o duque de vez.

Isso era uma subestimativa.

— Sim, assim parece.

— O que vai fazer? Contará ao duque que ela enviou essa carta? — ela perguntou balançando o bilhete.

Ava negou com a cabeça, cansada de tudo aquilo, cansada das farpas constantes e olhares amargos. Das indiretas bem diretas na cidade e das missivas entregues no meio da tarde.

— Não. Ele não precisa saber, só deixaria a situação mais embaraçosa.

— Mas o duque ama você, tenho certeza. Afinal, ele mandou a mãe para a casa da viúva, embora morasse em Cleremore antes.

Fato, mas não invalidava outro fato, de que a mãe dele a odiava.

Uma vozinha sussurrou que talvez sua chance havia chegado e passado. Que eles deveriam se separar agora, antes que qualquer dano adicional a seus corações e famílias fosse feito.

— Você recebeu um convite? — Ava perguntou.

Hallie ergueu o pergaminho que carregava na outra mão.

— Sim, mas não comparecerei sem você. A viúva me convidar e proibir sua presença é de uma rudeza tamanha que não me permite deixá-la sentir prazer pelo estratagema. Devemos ficar aqui juntas, nos esquecer de Sua Graça e dos esquemas dela.

Os olhos da amiga brilharam como fogo, e Ava a amou ainda mais por sua lealdade.

— Você deve ir, caso contrário ela pensará que eu a fiz ficar em casa. Que regulei as saídas de minha amiga. Vá, divirta-se e socialize. Mostre à duquesa-viúva de Whitstone que não nos importamos com quem ela convida e quem não convida.

— Não posso ir sem você. Não me importa o que a viúva pensará. Ficarei em casa, fazendo companhia a você.

Ava sorriu alcançando a mão da amiga.

— Você irá, se divertirá, e me contará tudo na volta. Fico feliz de ficar em casa e prometo a você que o que a duquesa faz não me afeta nem um pouco. Ela interfere e é rude comigo desde sempre.

Ela não consegue mais manipular o filho, e detesta isso.

Hallie suspirou, não muito convencida.

— Se é o que quer, mas não me sinto bem com essa decisão.

— Vai ficar tudo bem, Hallie. Não se preocupe comigo. Estarei bem em casa.

Uma batida na porta soou, e o mordomo entrou para anunciar o duque de Whitstone. Ava se levantou, o corpo se aquecendo ao vê-

lo. Ela controlou suas feições, e encontrou o olhar assustado de Hallie.

— Boa tarde, Sua Graça. — disse Hallie, fazendo uma reverência. — Se me der licença, preciso escrever algumas cartas.

A porta se fechou sem barulho atrás da amiga dela, e o duque caminhou até ela, puxando-a em seus braços para um beijo profundo. Ela se inclinou para ele, tomando tudo o que ele daria, saboreando cada toque, cada carícia, beijo que ele a presentava.

Ele era impossível de ignorar e sempre foi assim. Tate se afastou, os olhos brilhando com desejo insatisfeito.

— Senti saudades. — ele a puxou para perto da lareira e sentou-se no sofá com ela. — Eu pretendia fazer uma visita, quis vir hoje porque nunca tivemos a chance de terminar a conversa que começamos em Londres.

Um medo tomou conta dela, e ela se endireitou cruzando as mãos no colo.

— Nossa conversa. — ela disse, protelando.

Ele assentiu.

— Sobre nós.

— Ó. — disse ela, com o coração leve. — O que tem nós?

A esperança que brilhou nos olhos cinzentos e tempestuosos dele derrotou a esperança dela de que fossem falar de qualquer coisa fora eles. Ela não estava pronta para este assunto, nem para a reação dele para o que ela precisava dizer. Ele agarrou a mão dela, que sumia por entre seus dedos fortes e capazes.

— Precisa saber que, desde o momento em que descobri que não havia me abandonado, toda a dor e raiva que eu carregava comigo desapareceram. Tentei me esquecer de você, mas mesmo zangado como eu estava, não consegui. Não funcionou, e não desejo mais viver sem você.

Ava não conseguia desviar os olhos dele. As palavras eram um bálsamo para sua alma, e ela gostaria de poder dar tudo o que ele queria, mas não podia. Não porque não o amava, pois queimava por ele a cada momento de cada dia, mas por causa de tantas coisas que se interpunham entre eles.

Ela apertou a mão dele, ajeitando-se no lugar.

— Você não precisa viver sem mim, Tate, mas por favor, não me peça para ser sua esposa. — ele se encolheu com as palavras ditas e apertou a mão dela com mais força. — Ouça-me, por favor, antes de dizer mais nada.

Ele a observou por um momento, os olhos cautelosos e assentiu.

Ava respirou fundo e lambeu os lábios:

— Éramos tão jovens quando nos apaixonamos. E foi amor, disso há poucas razões para duvidar. Mas, tendo vivido no exterior por quatro anos e voltado para casa para administrar uma propriedade com muito pouco apoio além da minha equipe, tornei-me bastante independente. Estou segura em termos financeiros, e não há necessidade de me casar se não for o que desejo. — ela manteve o foco nele, odiando o fato de que ele havia empalidecido, um tom terrível de cinza. — E eu não quero. Casar-me significaria perder minha independência, deixar de fazer o que amo quando eu quisesse. Não posso me tornar um ornamento, uma mulher que apenas fala de frivolidades e não realiza muitas coisas. Não foi para isso que nasci, e agora que sou adulta, percebo isso.

Tate se levantou, liberando suas mãos.

— Eu quero que você seja minha esposa, Ava, minha duquesa.

O que está me pedindo?

A voz dele era dura e impassível, ela se encolheu.

— Eu me tornaria sua esposa amanhã mesmo, Tate, saiba disso.

Mas não serei uma duquesa. É demais, eu estaria desistindo de tudo.

— Você não precisaria desistir de sua vida. — a frustração o fez passar uma das mãos no cabelo, e ele foi para frente do fogo, se apoiou no mármore da lareira, ainda de costas para ela. — É claro que ser duquesa implica responsabilidades. Situações que a afastariam daqui por vários meses do ano. Isso é pedir muito? Não está disposta a ceder nem um centímetro para estar comigo?

Ava se levantou, odiando o olhar desolado nos olhos dele.

— Eu quero você, quero sim. Não quero mais ninguém. Ainda podemos ter um ao outro, mas não como marido e mulher. Serei sua amante enquanto você me quiser.

Ele se desvencilhou dela, o desgosto retorcendo o rosto que sempre pareceu tão bonito.

— Eu preciso me casar. O nome da família por si só me exige um herdeiro. E não quebrarei os votos que eu fizer à minha esposa.

Não farei isso a ela, por mais tentadora que você seja.

Ava mordeu o lábio, pânico percorrendo seu sangue.

Ele se afastou, e ela se acalmou.

— Não a terei como amante. Se eu não puder tê-la como esposa, não a terei de forma alguma.

Tate se virou e foi para a porta.

Ava correu atrás dele, segurou seu braço.

— Por favor, Tate, não posso perder você de novo. Eu apenas quero...

— Você quer tudo. — ele cortou as palavras dela. — Você quer que eu satisfaça seu desejo sempre que ele surgir. Deseja manter sua independência e ser a Senhora de suas terras. Quer que quebre meus votos de casamento para manter sua cama quente.

Ela empalideceu, o coração se desfazendo.

— Sua mãe estava certa, eu não sou adequada para ser sua noiva. Minha linhagem sempre servirá para alimentar as fofocas da cidade. Nossos filhos serão destroçados pelos abutres da sociedade, desprezados. Serei ridicularizada, alvo de fofocas, ignorada. Ao menos como dona do Haras Knight, sou tratada com respeito. Se eu me tornar sua duquesa, tudo mudaria. Seria você que procurariam para tratar dos cavalos e treinamentos que ofereço.

Seria você a quem procurariam por conselhos e orientação. Eu me tornaria obsoleta. Tudo o que a minha família construiu do zero, seria esquecido. — Ava ergueu o queixo, a raiva a fazendo endireitar a coluna. — Não aceitarei tal destino. Nem mesmo por você.

Ele a observou, os olhos vazios.

— Você está errada, Ava, cega para o que posso proporcionar a você. Como minha esposa, meu nome sozinho protegeria a quem eu amo, mesmo que seja uma mulher cujas origens não sejam grandiosas para os outros, mas grandiosas o bastante para mim.

Ava permaneceu um bom tempo encarando a porta após Tate irromper por ela, sem fôlego após a declaração dele. Ele a amava?

Nunca, em todo o tempo em que estiveram juntos, ele pronunciou tais palavras. Ela rezava em silêncio para que seus sentimentos não fossem unilaterais, e agora ela sabia que não eram.

Ava caminhou até a janela, observando-o cavalgar pelo terreno dela como se o próprio diabo estivesse atrás dele. Um arrepio percorreu sua espinha ante a possibilidade que talvez ela estivesse

errada, que estivesse muito errada, e que desta vez seria um erro que não conseguiria consertar.

CAPÍTULO 16

Q UINZE DIAS SE PASSARAM, e Tate não viu Ava, ou para ser sincero, ele a havia evitado depois que se separaram.

Ele olhou para o uísque na mão, lembrando-se de que não importava quanto bebesse, não o faria se sentir melhor, não iria anestesiar a dor que corria por suas veias a cada minuto de cada dia.

Ela o rejeitou.

Tate apertou a mandíbula, olhando na direção da porta enquanto o mordomo anunciava mais convidados recém chegados para o baile de sua mãe, outra noite inútil e não essencial. Ele olhou ao redor do cômodo. As pessoas riam, bebiam, pegavam mais vinho e comida dos servos que ali estavam. Seres inúteis todos eles.

Mimados e prepotentes. Não era de se admirar que Ava não quisesse fazer parte desta vida.

Ele também não queria.

Tate estava parado ao lado de Lorde Duncannon, o amigo tão quieto quanto ele, e felizmente não tentava preencher o silêncio entre eles. Na verdade, ele não queria conversar, pelo menos não com ninguém aqui.

Um estrondo de conversa soou, e Tate virou-se para a porta de novo. Esperança surgiu dentro dele quando reconheceu a Srta.

Evans. Os olhos dele viajaram para detrás dela, procurava por outro conjunto de olhos e cabelos castanho-avermelhados adoráveis, mas não os encontrou.

Ele afastou a decepção, sorveu o líquido âmbar e observou enquanto a Srta. Evans caminhava apressada até ele,

reposicionando, de fato, as pessoas em seu caminho. A moça parou diante dele, mas ele falou antes que ela dissesse uma única palavra.

— Onde está Ava? — ele exigiu.

As duas mulheres quase nunca se separavam em tais reuniões, então Ava deveria estar aqui.

— Por Deus, não pensei que fosse ver você de novo. — Lorde Duncannon ficou boquiaberto ante a amiga de Ava, seu rosto empalidecendo.

— Não ansiava me rever seria uma definição melhor, Lorde Duncannon. — a Srta. Evans respondeu, os olhos brilhando com fogo, mas não antes de um rubor cobrir as bochechas, deixando-as com um belo tom de rosa. — Ou pelo menos é no meu caso.

Ela voltou o olhar penetrante para Tate, e ele olhou entre os dois se perguntando como diabos eles se conheciam. Ele descartou o pensamento por um momento, precisando saber onde Ava estava.

— A Srta. Knight está aqui esta noite, Srta. Evans?

— Ela não recebeu um convite, mas eu a convenci a vir, Sua Graça.

Ele voltou a atenção para a mãe após ouvir tal declaração, e a raiva espiralou dentro dele. Desta vez ela fora demasiado longe.

A Srta. Evans franziu os lábios, inspecionou-o como alguém inspeciona um inseto e não encontra o que era esperado.

— Vou ser franca, me perdoe se eu passar dos limites, mas Ava é minha amiga e o que preciso dizer é mais do que necessário.

Tate assentiu, preparando-se para o que era, sem dúvida, um confronto que estava por vir.

— Sua mãe enviou uma missiva à Ava dizendo por que ela não seria convidada esta noite, e Ava não tem dúvidas alguma acerca do que sua mãe pensa dela. Na verdade, agora mesmo, ela foi

impedida de entrar, na frente de todas essas pessoas que você afirma ser seus amigos. O que você diz, Sua Graça? Que atitude tomará?

— Onde está Ava agora? — Lorde Duncannon exigiu.

— Ela voltou para casa na carruagem.

A Srta. Evans manteve a atenção em Tate, embora tivesse respondido à pergunta do amigo dele. O desprezo público direcionado à Ava era inaceitável. Tate não permitiria que a mãe se aproximasse dele ou da propriedade ducal novamente após esse comportamento atroz.

Ele nem deveria estar aqui, por falar nisso. E deveria ter agido mais cedo acerca das emoções que o atraiam para Ava. Ele deveria ter voltado para a casa dela, de joelhos e implorando perdão, pedindo que ela o amasse tanto quanto ele a amava. Deveria dizer a ela que ele nunca desejou restringi-la, ou exigir dela mais do que ela estava disposta a dar. Dizer a ela que ele a amava mais do que qualquer título.

— Foda-se. — ele xingou, não dando atenção àqueles que os cercavam.

Ele se apressou em direção à porta do salão de baile, com Duncannon e a Srta. Evans o seguindo de perto. Duncannon o alcançou.

— Aonde você está indo?

— Buscar minha duquesa. — ele disse em voz alta, sem se importar com quem o ouvisse. Suspiros soaram em torno dele, e ele precisou controlar o gênio quando a mãe entrou na frente dele, impedindo sua fuga.

— Saia do caminho, mãe.

O cômodo ficou em suspenso, os dançarinos pararam, assim como a conversa. Até a orquestra parou de tocar.

— Está na hora de uma valsa, Tate querido. Você dançaria com Lady Clapham? — a mãe fez um gesto na direção de Sua Senhoria, que fez uma reverência e sorriu para ele, com os olhos brilhando de alegria.

— Sua Graça, eu ficaria honrada. — Lady Clapham disse, ignorando o fato de que ele estava indo embora.

— Não dançarei. — ele disse, causando mais suspiros e sussurros quase inaudíveis.

A mãe deu uma risada nervosa.

Bom, ele queria mesmo que ela ficasse inquieta. Ele decerto havia desistido de ter esperança de que a única genitora viva daria apoio à mulher a quem ele amava e com quem queria se casar. A mãe pagaria por ficar cega de ódio e exclusivismo.

— O baile está apenas começando, e como Lady Clapham é minha convidada de honra, você deve dançar com ela. É o correto.

— Você desconvidou e proibiu a entrada da Srta. Knight. Você está tão cheia de ódio que não consegue se lembrar que também nasceu comum, rica sim, mas igual a Ava. A tiara de duquesa é tudo o que as separam. Não deveria ter tanta afetação sem justificativa.

Sua mãe estreitou os olhos, erguendo o queixo.

— Ela não serve para você, filho. Não cometa o erro que traria escândalo para a porta de nossa família. Ela é uma humilde criadora de cavalos. Por favor, seja sensato.

— Ava é mais do que isso, e você sabe muito bem.

Ele passou por ela, Duncannon e a Srta. Evans seguindo logo atrás. Seguindo para o hall de entrada, ele não esperou pelo lacaio e abriu a porta ele mesmo para chamar a carruagem.

— Está indo para a propriedade da Srta. Knight? — Duncannon perguntou quando despontou na direção da casa.

Tate ficou rígido quando um fedor acre alcançou seus sentidos.

— Consegue sentir esse cheiro? — ele caminhou mais adiante na estrada, olhando para a terra agora beijada pela noite.

— Há um incêndio em algum lugar. — a Srta. Evans surgiu ao lado dele no instante em que a carruagem parou diante das portas da frente. — Está perto, ou não sentiríamos o cheiro.

— Venham. — disse ele a ambos, indo para a carruagem e instruindo o condutor a seguir para a casa da Srta. Knight.

Quanto mais perto chegavam da propriedade de Ava, mais pesado o cheiro de madeira queimada permeava o ar, e quando chegaram à pequena elevação onde a casa de Ava ficava à vista, o desenho horripilante de seus estábulos junto com a casa em chamas ficou visível.

Através da névoa de fumaça, ele conseguia ouvir gritos e os sons de cascos dos cavalos sendo soltos dos estábulos. Alguns cavalos assustados passaram correndo por eles, e Tate gritou para o condutor ir embora.

— Nunca deveria ter deixado ela sair do baile. Eu deveria ter feito ela entrar comigo.

— Não é sua culpa, Srta. Evans. — Duncannon disse, a voz dele com uma calma surpreendente para uma situação que era tudo menos calma.

A garganta de Tate se fechou em pânico, e ele lutou para respirar.

Onde ela está?

Era uma loucura o que estava diante deles. E até que ele a visse com seus próprios olhos, a abraçasse bem apertado, ele não iria descansar. Quanto mais perto chegavam do fogo, mais densa era a fumaça, e quando eles se afastaram um pouco da casa principal, Tate pôde ver que um lado inteiro da casa estava imerso no fogo.

Os criados corriam para dentro e para fora da casa, pegando o máximo dos pertences ancestrais de Ava que conseguiam.

Tate saltou da carruagem.

Ele examinou cada um deles e não vendo Ava, olhou para a casa, rezando para que ela não estivesse lá dentro. Ele tirou o paletó do traje de noite e agarrou o mordomo pelo braço quando o homem estava prestes a voltar para dentro.

— Onde está Ava? — ele gritou acima do barulho do fogo e das ordens que eram proferidas acima dos gritos.

— Não conseguimos encontrá-la, Sua Graça. Ela voltou do baile da duquesa há uma hora, no momento em que o incêndio começava. Ela foi para o quarto dela, mas quando fomos verificar, ela já não estava mais lá.

Tate analisou os rostos presentes, rezava para que um deles fosse de Ava. A Srta. Evans e Duncannon o alcançaram, a respiração dos dois tão irregular quanto a dele.

— O que podemos fazer, Tate? — o amigo perguntou.

Tate lutava para não entrar em pânico.

Ele olhou em volta e rezou mais uma vez para que a encontrasse. Ele olhou para a casa, metade da qual estava bastante consumida. Ela estaria lá dentro? Se estivesse, ele não descansaria até que ela estivesse segura. Ela arriscou a vida para ajudá-lo a escapar do incêndio do estábulo dele, e ele não a abandonaria nesse.

— Procure no terreno, nos estábulos, talvez Ava esteja lá. Volte aqui se não conseguir encontrá-la. Vou verificar a casa.

Duncannon agarrou seu braço com força.

— Você não pode entrar lá, Tate. Você é o último Whitstone. Se você morrer, o título reverte para a coroa. Vamos vasculhar o

estábulo primeiro, veja o perímetro da casa, talvez Ava esteja lutando contra o incêndio com os homens do lado oposto.

— Vou verificar lá primeiro, mas se não conseguir encontrá-la, entrarei. Dane-se o título.

Ava significava mais para ele do que a herança. O título não definia quem ele era, seu caráter era o responsável, e ele não seria o homem que deixou uma mulher, sua mulher para morrer queimada.

Lorde Duncannon aceitou a decisão com um movimento de cabeça e aparente resolução.

— Muito bem. — ele parou por um momento. — Srta. Evans, venha, vamos verificar os estábulos.

Ela partiu sem dizer uma palavra.

Dando outra olhada nas pessoas ao seu redor, ainda sem ver Ava, Tate correu pela lateral da casa. Ainda assim, Ava estava longe de ser vista, e pânico começou a crescer em seu sangue.

Por favor, esteja segura, minha querida. Não esteja na casa.

As portas da cozinha estavam abertas, e Tate correu para lá, saltando para fora do caminho dos servos que corriam com objetos que conseguiram salvar. Tate passou correndo por todos eles, subiu o corredor cheio de fumaça e foi aos tropeços para o piso principal da casa.

As portas que davam acesso à ala em chamas haviam sido fechadas, mas a fumaça dominava o espaço. Ele tossiu, retirou a gravata e a amarrou na boca e no nariz para ajudá-lo a respirar.

Subindo as escadas de dois em dois, ele chamou por Ava, mas apenas o crepitar, o gemido de uma casa que seria cinzas pela manhã soava à noite.

AVA ESTAVA grudada à porta de seu quarto, observava Lorde Oakes caminhar de um lado para o outro do cômodo e parecendo alheio ao fogo violento que estava devastando a casa dela.

Seu lar, o lugar onde nascera, a casa que seus pais construíram ao longo de anos de trabalho árduo estava desmoronando sobre ela e havia pouco que ela ou alguém pudesse fazer. Ela piscou quando a fumaça engrossou, obstruiu seus pulmões e fez seus olhos arderem.

Ela se voltou para a janela que era sua única escapatória, mas ela estava no segundo andar e a queda desta altura seria capaz de quebrar seu pescoço. Ela se aproximou da abertura, disposta a correr o risco.

— Nem pense nisso. — Lorde Oakes a interveio, as feições retorcidas de ódio bruto.

— Por que está fazendo isso? — ela o indagou quando ele se inclinou na direção dela, deixando pouco espaço entre eles. — O

que ganha com isso? — perguntou ela, tossindo com o esforço de falar.

— Eu deixei o melhor para o final. — ele fervia. — Era para você ser minha amante, a mulher que aqueceria minha cama, e mesmo assim abriu as pernas para aquele desgraçado do Whitstone.

Ela perdeu o fôlego.

O homem estava louco!

— Você está com ciúmes! Foi por isso que iniciou os incêndios em nosso condado.

Ava não conseguia acreditar no que ele estava dizendo. Não era possível que ele estivesse tão obcecado por ela a ponto de agir dessa forma. Os vizinhos dela eram pessoas inocentes, não mereciam tamanha tristeza.

— Nenhum deles era inocente. — ele disse e apontou para o lado de fora. — Whitstone teve seu coração, sempre teve, e aqueles malditos dos Mortons, a esposa dele apoiou e confortou você por causa de Whitstone. Eu não poderia permitir que tais atos ficassem impunes.

Ava balançou a cabeça.

— Nunca aquecerei sua cama, Lorde Oakes. Você provou ser o pior dos homens, não apenas esta noite, mas desde o dia em que tentou se impor contra mim nesta mesma casa.

Ela tentou pensar em Tate, em como ele aquecia seu sangue, a confortava e protegia. Não congelar em pânico ante a ideia do que Lorde Oakes estava fazendo com ela neste cômodo. De qual seria objetivo dele esta noite.

Ele apunhalou um dedo no peito dela.

Ava ergueu o queixo, recusando-se a estremecer com a dor que causava.

— Antes do fim desta noite, vou provar o seu corpo e aproveitarei cada segundo. Meu desejo de ter você me cegou e foi por sua causa que minha noiva desfez o compromisso. Ela sentiu que eu não estava comprometido, então veja — ele disse ao passar a mão no corpete dela. —, perdi a noiva que salvaria meus cofres por sua causa. Mas, apesar disso, tenho um plano.

Ava vestiu uma máscara de indiferença mesmo que pânico lambesse sua pele, mesmo que desejasse fugir, até mesmo correr para as chamas do outro lado da porta, apenas para se afastar dele.

Ela engoliu em seco, a garganta dolorida pela fumaça, e as lágrimas a faziam piscar.

A imagem de Tate passou pela mente dela, de que ela jamais o veria de novo se Lorde Oakes conseguisse o que pretendia e um abismo sepulcral se abrisse no peito dela. Ela fora uma idiota

egoísta. Uma idiota boba que não conseguia ver o presente maravilhoso que Tate oferecia quando ele o colocou aos pés dela.

O amor dele.

E ela o amava, todo o resto se encaixaria nesse amor, e eles conseguiriam fazer com que suas vidas ocupadas e difíceis se tornassem uma. Se ela conseguiu sair daqui viva, claro.

— Sua obsessão matou pessoas, você deveria ser enforcado por seus crimes.

Ele deu de ombros.

— O rapaz era um servo humilde. São dispensáveis, e eu não me importo com o que acontece com quem fique no meu caminho, nem com seus preciosos cavalos.

Ava sentiu a raiva rasgar seu ser quando ele mencionou os cavalos, e sem pensar, saltou nele. Eles caíram no chão, e ela arranhou o rosto dele, faria qualquer coisa para machucá-lo.

— É melhor você não ter tocado em meus cavalos. — ela gritou, odiando-o com cada fibra de seu ser.

Ele lutou para agarrar os braços dela, e ela o socou, tentando machucá-lo o máximo que pudesse para escapar. Lorde Oakes estendeu a mão e agarrou o cabelo dela, puxando-o com força. Ava caiu de lado, a dor ricocheteando em sua cabeça enquanto ele a prendia no chão.

— Cadela. — ele fervia em seu ouvido, a respiração pesada revirando o estômago de Ava. — Devo domá-la agora, Srta. Knight?

Nós dois vamos morrer, uma boa foda antes de morrer é exatamente o que eu preciso.

O medo a manteve imóvel por um momento, antes que seu espírito de luta voltasse, e ela erguesse a perna o máximo que conseguiu, tentando acertá-lo entre as pernas, onde os homens são

especialmente sensíveis à dor. Ele percebeu o que ela pretendia e prendeu as pernas dela com as dele.

— Será enforcado por isso, seu desgraçado.

Ele riu.

— Não me resta mais nada, então o que importa se quebrarem meu pescoço, mas minha querida, Ava...

Ele se inclinou, beijando-a à força. Os dentes dele bateram nos lábios dela, e ela sentiu um gosto metálico invadir sua boca. Ava se inclinou para o beijo e mordeu o lábio inferior dele com força. Ele gritou e recuou, mas ela se recusou a soltar antes que as mãos dele apertassem seu pescoço, tirando o fôlego de seus pulmões.

Lorde Oakes se levantou, pressionando a boca. Ava lutou para respirar, observando-o do chão enquanto sua mente se agitava tentando se salvar. Um estrondo soou em algum lugar da casa e a fumaça engrossou, o quarto sufocando a vida de ambos. Ele deu a volta, e ela se sentou, limpando o sangue dele que estava em sua boca.

— Eu lutarei com você até meu último suspiro, seu desgraçado.

Eu não serei sua vítima.

Lorde Oakes avançou nela, chutando-a com força no quadril. Ela se engasgou com a dor do ataque, mas em vez de rolar para longe, ela agarrou as pernas dele, prendendo-as juntas e impedindo-o de repetir o movimento.

Em seguida, ela o mordeu de novo. Ele praguejou e uma sensação de poder se apoderou do sangue dela. O maldito canalha havia incendiado sua casa e seus estábulos, certo? Machucado seus cavalos. Bem, ele também se machucaria esta noite. Ela não seria a única a sair dessa ensanguentada e machucada, se é que sairia viva disso.

Ele caiu, e Ava aproveitou a oportunidade para se levantar e correr para a janela. Ela olhou para a porta, um brilho vermelho se agitava sob a madeira. A fumaça deslizava pela cornija da parede como uma cobra, restava pouco tempo para sair. Ela precisava sair agora ou morreria.

Ava estendeu a mão para destrancar a janela, levantou o painel.

Ela gritou quando seu agressor a agarrou pelo estômago, fazendo suas costas arderem de dor. Em vez de cair no chão, desta vez ela bateu na cama, e Lorde Oakes desceu sobre ela, os olhos selvagens com ódio e determinação. Sangue gotejava de seu rosto, de seu lábio, e ela o empurrou, arranhando-o sem sucesso. Ele era muito pesado, estava muito decidido.

A garganta dela se fechou em pânico ante as semelhanças da tentativa passada de estuprá-la. Ela lutou para não entrar em pânico, para não congelar de medo.

— Saia de cima de mim, seu cretino.

Ele puxou o vestido dela para cima e beijou as coxas dela. Os movimentos dele eram apressados e desesperados ao baixar as calças.

Não. Não. Não!

Isso não poderia acontecer com ela, não poderia estar acontecendo. O corpo dela tremia, e ela ergueu os joelhos, tentando colocá-los entre os dois, negando-o ao que ele queria. O telhado deu um gemido terrível e caiu, expondo as chamas além.

Ela iria morrer.

Ela iria morrer enquanto ele a estuprava.

Não.

— Você acha que eu não tenho tempo. Não consigo pensar em uma maneira melhor de morrer do que dentro da sua boceta.

— Nãooooo! — ela gritou, lutando com ele, o pensamento de tal horror trazendo à tona o resto de sua força.

Ele não iria vencer. Ele não poderia vencer. A vida não poderia ser tão injusta. Ela viu choque se registrar no rosto de Lorde Oakes quando um grito saiu de sua boca segundos antes que ele fosse arrastado de cima dela, ela estava livre.

Ava se arrastou para fora da cama enquanto Tate socava o rosto de Lorde Oakes, o barulho de ossos e dentes quebrando, altos no ar. Uma saraivada de golpes recaiu sobre Sua Senhoria, Tate era uma visão de ira divina.

Ela estremeceu, jamais o vira tão enraivecido.

Ele o mataria se continuasse. Não que ela se importasse com Lorde Oakes, mas ela não queria que a morte dele fosse um peso na consciência de Tate pelo resto de sua vida. Ela foi até Tate, agarrando seu braço antes que ele o acertasse outra vez.

— Pare antes de matá-lo. Deixe que as autoridades apliquem a punição, não você.

Os músculos dele sob sua palma estavam tensos, a respiração irregular. O fogo chegou às cortinas, e ela o puxou para a janela:

— Precisamos ir. Este quarto será tomado pelo fogo a qualquer instante.

Lorde Oakes resmungou alguma coisa e depois se sentou, cambaleando em direção à porta.

— Eu deveria ter atirado em vocês dois naquele dia no campo. É

o único arrependimento com o qual viverei pelo resto da minha vida.

Ava olhou pela janela ignorando as palavras do louco. Uma calha corria ao longo da esquina da casa. Talvez aguentasse o peso dos dois...

— Venha, precisamos descer.

Tate ficou entre Ava e Lorde Oakes e não se moveu.

— Você será enforcado por isso! — ele gritou. — Pode apostar que me certificarei de que aconteça.

Lorde Oakes sorriu, abrindo a porta com força. Ele saiu para o corredor em chamas antes de correr para as chamas além. Ava o observou enquanto as roupas dele pegavam fogo, o cabelo ficou em chamas, antes que ele desaparecesse na fumaça e no fogo que antes era sua casa.

— Ele vai morrer. — disse ela, sem acreditar no que acabara de acontecer.

— Esqueça-se dele.

Tate caminhou até ela e passou o braço em volta de sua cintura, ajudando-a a sair pela janela. Felizmente, o cano suportou o peso de ambos e Ava desceu, alguns de seus criados a esperavam no chão, caso ela caísse. Tate a seguiu, saltando do cano no último minuto assim que um estrondo poderoso soou.

Ava se afastou da casa enquanto o telhado desabava, destruindo tudo o que estava abaixo dele. Enxugou as lágrimas que corriam pelo seu rosto. A essa altura, toda a construção estava tomada pelo fogo, havia pouco a ser feito.

Tate se aproximou dela e a abraçou.

Calafrios incontroláveis atravessavam o corpo dela, e ela se aconchegou contra ele em busca de calor e conforto. Tate pediu um cobertor e uma criada correu até eles com um. Ele envolveu-a, acariciando suas costas.

— Lamento não ter chegado a você mais rápido. Está machucada?

Sua alma estava ferida, e ela estava abalada, mas felizmente Tate havia chegado a tempo.

— Vou ficar bem. Estou triste, nada mais. — ela piscou tentando conter as lágrimas, sem sucesso. — Minha casa...

— Eu sei. — disse ele, segurando-a com mais força. — Iremos reconstruí-la.

Ela ergueu o rosto para ele ao limpar o nariz com as costas da mão. Não era o gesto mais elegante do mundo, mas nesse instante ela não se importava.

— Eu sei, mas não será a mesma.

— Faremos com que seja, querida.

Ele não a soltou e nem ela queria que ele a largasse. Nem agora, nem nunca. Com Tate ela estava segura, era amada e respeitada, ele era um homem honrado, um homem bom, e o coração dela se encheu de amor por ele.

— Sua Graça. — uma voz soou, e Tate e Ava se viraram para ver um dos agentes disfarçados vindo na direção deles.

O rosnado de Tate foi alto ao lado dela.

— Como isso aconteceu? Vocês deveriam estar vigiando cada passo de Lorde Oakes. — Tate disse, apontando um dedo para o homem.

O homem suspirou, passando a mão pelo cabelo já despenteado.

— Só podemos supor que Lorde Oakes aproveitou, quando a Srta. Knight saiu para o baile, para entrar escondido na casa dela.

Esperando até que ela voltasse. — o agente se virou para Ava, colocando a mão sobre o coração. — Sentimos muito, Srta. Knight.

Esta noite nós falhamos com a senhorita.

— Discutiremos isso em alguns dias, em minha propriedade, e sugiro que descubra onde ocorreu o lapso de observação. Eu quero saber.

Tate a puxou com mais força contra ele, seu calor e cuidado agindo como um bálsamo. Os olhos dela se fecharam quando uma onda repentina de cansaço a dominou.

O agente fez uma reverência, recuando.

— Claro, Sua Graça.

Ava olhou para Tate, segurando as lapelas de seu traje de noite.

— Você me salvou. — disse ela, a voz vacilante com a admissão, o olhar dele disparou para ela, surpresa escrita em seu rosto bonito.

— Sempre. — uma expressão de dor cruzou as feições dele. —

Você é tudo para mim. Quando percebi o que Lorde Oakes estava tentando fazer, o que poderia já ter feito. Se o fogo não o tivesse matado, eu o teria feito. Prometo a você que ele jamais voltará a machucá-la, ou qualquer pessoa na verdade.

— Eu sinto muito, Tate. — ela admitiu.

O coração dela doía de tão tola que havia sido. O tempo que ela havia perdido por se agarrar a uma vida que só a preenchia pela metade. Não importava o que ela repetisse para si, sempre haveria uma peça faltando em seu quebra-cabeça. Até que tal peça voltasse para sua vida.

Tate.

— Eu estava tão apegada ao passado que não vi as coisas direito. — ela continuou. — Eu deixei que a opinião dos outros me cegasse quanto ao que eu queria. Deixei o preconceito contra mim me fazer acreditar que eu não era digna de você. Não mais. Agora eu vejo com clareza. Eu quero um futuro com você, quero que nossas vidas se unam em todos os sentidos, quero fazer nosso nós funcionar e deixar cair por terra tudo mais.

Ele sorriu, puxando-a para mais perto.

— Você não foi a única a ficar cega pelos próprios sonhos. Claro que quero você ao meu lado como minha esposa, minha duquesa, mas não espero que fique longe do interior por meses a fio, foi egoísta da minha parte pensar que era algo que você faria. Londres

não fica muito longe, e quando o Parlamento se reúne ou a temporada me chamar à cidade, não espero que você deixe suas responsabilidades por tais frivolidades. Aqui é onde está o que mais importa. — ele passou as mãos pelos cabelos dela, entrelaçando os dedos na nuca dela. — O que eu disse da última vez que conversamos, eu falei sério. Eu amo você, demais. Não posso viver sem você.

Os olhos dela arderam quando a voz dele falhou nas últimas palavras, e ela se aproximou para envolver os braços em volta do pescoço dele, segurando-o perto.

— Eu também amo você. — ela sussurrou contra a orelha dele.

Ele virou a cabeça para ficar de frente para ela, e ela sorriu. Ava se aproximou ainda mais dele e o beijou. Não se importava mais com quem os visse. Tate não se esquivou e tomou a boca dela com fome, fazendo-a se esquecer de todos os problemas da noite, fazendo seu sangue gelado se aquecer.

Uma tosse discreta os separou, e eles se viraram para encontrar Hallie e Lorde Duncannon parados ao lado deles, divertimento no rosto dos dois. Fuligem e sujeira manchavam as roupas de baile, os rostos e as mãos dos dois. Hallie deu um passo em direção a eles, envolvendo-os em um abraço.

— Estou tão aliviada por você estar segura. — disse Hallie, com os olhos muito brilhantes. — Ficamos presos tentando salvar os cavalos. Como você não estava lá, ficamos e oferecemos ajuda e, por graças, nenhum cavalo foi perdido.

— Teremos que reuni-los de manhã. A maioria fugiu do terreno.

— afirmou Lorde Duncannon.

Tudo era compreensível pelo trauma que os animais sofreram, tudo porque Lorde Oakes era um louco. Um homem tão cego de

ciúme por não conseguir o que queria que resolveu punir aqueles que considerava culpados por atrapalhar seus objetivos.

Ava balançou a cabeça.

Como alguém poderia ser tão mau?

— Venha, há pouco que podemos fazer aqui. Vamos voltar para Cleremore, e vocês duas ficarão comigo enquanto a casa e os estábulos são reconstruídos.

Ava assentiu.

Havia pouco que ela pudesse fazer aqui, tudo estava no chão.

Voltariam pela manhã e procurariam os cavalos, que se Deus quisesse, não teriam ido muito longe. Caminharam até a carruagem ducal, e Ava agradeceu quando Tate a ajudou a entrar, as pernas ameaçando ceder sob ela.

Ela olhou pela janela da carruagem e observou o que restou de sua casa, desespero a inundou. Como Lorde Oakes pôde fazer uma coisa dessas?

Talvez uma pergunta que ela se faria por anos e anos.

— Está pronta? — perguntou o duque, sentando-se ao lado dela e tomando-a nos braços, puxando-a para perto.

Ava assentiu, não querendo mais ver a destruição da casa antes de estar preparada para enfrentá-la.

— Estou mais do que pronta.

CAPÍTULO 17

Papai morreu, e eu estou voltando para casa. Perdi tudo o que importava, você, meu pai, mas pelo menos tenho meus cavalos.

Suponho que seja algum conforto em tempos em que não há nenhum.

— Um trecho de uma carta da Srta. Ava Knight ao Duque de Whitstone

U M MÊS DEPOIS, Tate parou do lado de fora da casa em ruínas de Ava e supervisionou a chegada do primeiro lote de madeira para a construção da nova estrutura. Na semana anterior, charretes chegaram cheias de pedra, e agora os construtores estavam recuperando o que fosse reutilizável dos escombros da velha casa.

A propriedade estava em polvorosa de trabalhadores, e Tate olhou para o outro lado do pátio e viu que Ava discutia alguns assuntos com o homem que contrataram para reconstruir a casa e os estábulos. Um sorriso apareceu nos lábios dela.

Ela era tão bonita, capaz, e seu coração doía ao vê-la. Ela o flagrou olhando-a com intensidade e sorriu para ele com um ar conhecedor. De alguma forma ela sempre sabia o que ele estava pensando, sentindo.

Ava Knight era realmente seu par perfeito.

Ele se voltou para a casa, balançando a cabeça ante a destruição. Lorde Oakes queria que nada continuasse de pé, e o

fora bem-sucedido. Restavam apenas algumas poucas peças de mobília e objetos de valor que os funcionários foram capazes de retirar antes que o fogo se alastrasse demais.

O magistrado local havia declarado a morte dele como acidental e, sabendo que o homem havia admitido os crimes para Ava antes de morrer, as autoridades estavam dispostas a dar o caso como resolvido.

Tate ficou feliz com este resultado. Depois do que ele viu Lorde Oakes tentando fazer com Ava na noite do incêndio, ele o teria estripado no gramado caso tivesse escapado, o desgraçado não merecia nada menos.

Ava se esgueirou até ele, segurou seu braço e o trouxe para perto.

— Vai ser como se o incêndio nunca tivesse acontecido quando terminarmos a reconstrução. Não concorda? — ela perguntou, olhando para ele.

Ele beliscou seu nariz fofo.

— Com uma pequena diferença. — disse ele, sorrindo, dando-se ao luxo de dar um beijo em seus lábios encantadores.

Ela olhou para ele com expectativa.

— E qual seria? — ela perguntou.

Tate riu.

— Depois de amanhã, você voltará aqui como duquesa, como minha esposa. — ao proferir tais palavras, contentamento o dominou, acalmando sua alma.

A mão dela soltou-se do braço dele e foi para a cintura dele.

— Sim, e você voltará como meu marido.

Ele passou os braços em volta dela e beijou-a sem se importar com os trabalhadores que os cercavam. E mesmo quando assobios e risadas chegaram aos seus ouvidos, ele não parou. Nunca iria

parar de amar a mulher em seus braços, não importaria onde estivessem ou quem estivesse ao redor.

Eles seriam o duque e a duquesa de Whitstone e fariam suas próprias regras, tomariam suas próprias decisões e isso nunca mudaria.

EPÍLOGO

Dois anos e quatro meses depois...

A va gritou do camarote ducal em Ascot enquanto Titan voava pela reta, os outros cavalos quase em seus calcanhares, e ainda assim o garanhão não dava sinais de desacelerar. Ela se levantou, gritando acima do enxame de cabeças diante dela nas arquibancadas, Tate ao seu lado, rindo e gritando com ela quando o cavalo deles cruzou a linha para a vitória.

Por um momento, eles se encararam com espanto, antes de Ava pular em seus braços, as lágrimas ardendo e seu coração batendo forte em seu peito. Eles ganharam! Eles ganharam Ascot!

— Não acredito. — disse Lorde Duncannon ao lado deles. — Eu ganhei uma fortuna.

Ava riu, não acreditando nela mesma.

— Deve descer, Tate. Pegue a taça e a fita.

Ele olhou para ela, o choque pelo o que havia ocorrido bem claro em seu rosto. Ava olhou de volta para a pista de corrida e sorriu enquanto o jóquei que montava Titan trotou de volta para onde o prêmio seria recebido.

Tate deu um beijo rápido na bochecha dela antes de descer correndo as escadas, em direção ao cavalo. Muitas pessoas em torno deles os parabenizavam, e Ava agradeceu, querendo se lembrar de cada momento deste dia para o resto de sua vida.

Durante os primeiros dois anos de casamento, eles trabalharam muito para deixar o Haras em pleno funcionamento e, felizmente, os

cavalos não sofreram muito com o trauma que Lorde Oakes causara.

— Se ao menos Hallie estivesse aqui para ver isso. Ela iria adorar. — ela disse em voz alta.

O sorriso de Lorde Duncannon diminuiu um pouco com a menção de sua amiga, e Ava não pôde deixar de se perguntar o que havia acontecido entre os dois.

— Ela ficaria feliz por você. Eu não tenho dúvidas.

Ava olhou para onde Tate estava com um largo sorriso que o fazia parecer o homem mais bonito do mundo. Ele apertou a mão do jóquei antes de dar um tapinha no pescoço de Titan.

— Soube dela? — Lorde Duncannon perguntou.

Ava voltou-se para ele, não esperava que ele fosse tão ousado.

— Ela volta a Londres na próxima semana, se o navio do Egito não atrasar.

Sua Senhoria a olhou de frente após ouvi-la, e Ava não deixou de perceber o nítido interesse que havia ali. Ela sorriu para ele, balançando um dedo.

— Um dia desses você vai me dizer por que vocês dois ficam tão cautelosos quando estão perto um do outro. Tate e eu sabemos que os dois escondem algo.

Ele riu e ela balançou a cabeça.

Mesmo Tate não sabia o que havia acontecido entre os dois, mas por Deus, Ava adoraria saber. Quando viajassem para Londres na próxima semana para buscar Hallie, ela exigiria que ela contasse. Não que Hallie fosse dizer algo. A mulher era como um cofre do qual segredos nunca eram revelados.

Ava bateu palmas quando Tate pegou a taça de ouro e sorriu para ele quando ele a ergueu em sua direção. Orgulho se apoderou dela, pelo sucesso de ambos naquele dia.

— Tenho certeza de que está ansiosa para rever a Srta. Evans.

Ava assentiu.

— Claro. — respondeu ela. — Há um artefato que queriam trazer de volta ao Museu Britânico. Presumiram que, como Hallie possui contatos aqui, ela seria a melhor pessoa para viajar com o artefato.

— Ava apertou a mão de um treinador que veio parabenizá-los. —

Eu, pelo menos, mal posso esperar para revê-la. Espero que ela fique um pouco mais dessa vez.

Lorde Duncannon assentiu com a cabeça, um sorriso, e Ava se virou para checar se Tate já fazia o caminho de volta para eles através do bando que dava parabéns e votos de felicidades.

— Você sabe que não deixaremos de ouvir coisas acerca do final dessa corrida pelos próximos anos. — disse ela, rindo quando Tate beijou a taça de ouro em suas mãos.

Duncannon riu.

— Acredito que esteja certa, duquesa.

Tate chegou a ela e entregou a taça.

Casar-se com o duque foi a melhor decisão que ela já tomou, e embora a mãe dele nunca os tivesse perdoado e ainda se recusasse a se desculpar pelo comportamento atroz, os últimos dois anos foram os mais felizes da vida dela, e ela não conseguia mais imaginar como seria sua vida se não fossem casados.

— Parabéns, querida. Você deveria ter descido e recebido a taça comigo. É tanto sua como minha.

Ela olhou para o prêmio, sorrindo.

— Eu vou, no próximo ano, quando um dos meus cavalos correr e vencer.

Tate riu, beijando-a e não se importando nadinha com quem os vissem, o que ele fazia com frequência. Se havia algo que Tate gostava de fazer era escandalizar a alta sociedade. E ela precisava admitir, também gostava. 

 

 

                                                   Tamara Gill         

 

 

 

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