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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


The Edge of Never
The Edge of Never

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblio VT

 

 

 

 

28

— TÁ COMEÇANDO CEDO, NÃO? - diz o garçom, ao deslizar a bebida pelo balcão até minha mão.

— Se vocês estão abertos e servindo bebidas já, então não é cedo.

Já são três da tarde. Deixei Camryn sozinha hoje logo de manhã, bem antes das oito horas. Meio estranho estarmos nesta viagem juntos há tanto tempo e nenhum dos dois ter pensado ou querido trocar números de telefone. Acho que não importava muito, já que estávamos sempre juntos. Tenho certeza de que a esta altura ela já deve ter se perguntado se vou voltar, talvez lamentando não ter meu telefone para descobrir se estou bem - o vidro do celular está quebrado, mas o aparelho ainda funciona. Mas começo a desejar que não estivesse funcionando, porque Asher e minha mãe já tentaram ligar dezenas de vezes.

Pretendo voltar para o hotel, mas decidi que vai ser só para pegar o violão de Aidan no quarto e deixar uma passagem de avião para Camryn sobre a minha cama. O quarto está pago por mais dois dias, portanto, ela vai ficar bem. Vou deixar dinheiro para o táxi até o aeroporto também. É o mínimo que posso fazer. Fui eu que a convenci a entrar nessa comigo. Sou eu que vou garantir que sua volta para casa esteja totalmente paga, e que não vai ser de ônibus, desta vez.

Isto acaba hoje.

Eu nunca deveria ter deixado chegar tão longe, mas estava iludido e cego por meus sentimentos dolorosamente proibidos por ela. Mas acho que ela vai ficar bem; não dormimos juntos e ninguém disse aquelas três palavras malditas que com certeza tornariam as coisas mais complicadas, então, sim... acho que ela vai ficar bem.

Afinal, ela nunca cedeu para mim. Basicamente, deixei a opção clara para ela: Se você me deixasse transar com você, teria que me deixar possuí-la de corpo e alma.. Se isso não é um convite descarado, então não sei o que é. Não muito romântico, mas é o que é.

Pago minha bebida e saio do bar. Eu só precisava de alguma coisa pra me acalmar um pouco. Se bem que pra me acalmar o quanto preciso no momento, só se eu tomasse a porra da garrafa toda. Enfio as mãos nos bolsos e ando toda a Bourbon Street, depois a Canal Street, e acabo indo parar em ruas das quais nem lembro o nome, ao passar pelas placas. Ando uma eternidade, pra todo lado, de forma bem parecida com a da minha viagem esporádica com Camryn, sem direção nem propósito. Eu simplesmente vou.

Acho que não estou tentando matar o tempo para que a noite caia e eu possa sair de fininho enquanto ela dorme, mas sim matando tempo na esperança de que ela mude de ideia. Não quero deixar Camryn, mas sei que preciso.

Acabo indo parar no Woldenberg Riverfront Park, e fico sentado à margem do Mississippi, olhando os navios e o ferry indo e voltando de Algiers. A noite cai. E por um tempo enorme, minha única companhia é uma estátua de Malcolm Woldenberg, até que duas garotas, obviamente turistas, a julgar pelas camisetas que dizem "Eu Amo Nova Orleans", se aproximam.

A loura sorri timidamente pra mim, enquanto a de cabelos castanhos parte pro ataque.

— Vai pra alguma balada hoje? - Ela inclina a cabeça para um lado, olhando para mim. - Eu sou Leah, esta é Amy.

A loura, "Amy", sorri para mim de um jeito que sei que eu só precisaria pedir pra ela dar pra mim, e ela daria.

Faço um gesto com a cabeça, tentando ser educado, mas não digo o meu nome.

— E então? Vai pra balada hoje à noite ou não vai? - A de cabelo castanho insiste, sentando ao meu lado na calçada.

Já esqueci os nomes das duas.

— Não, não vou - digo, e deixo por isso mesmo.

A loura se senta do meu outro lado, encolhendo as pernas e fazendo seu short subir muito por suas coxas nuas.

Camryn fica melhor num short assim.

Só balanço a cabeça e volto a olhar para o Mississippi.

— Você devia vir com a gente - diz a de cabelo castanho. - Vai rolar muita coisa legal lá no d.b.a., e você parece bem entediado.

Olho de relance para ela. É bem gostosa, como a loura, mas quanto mais ela fala, mais broxante eu acho. Só consigo pensar em Camryn. Aquela garota feriu minha alma. Nunca mais vai cicatrizar.

Olho para as pernas da garota de cabelo castanho e depois para os seus lábios se movendo quando ela diz:

— A gente quer muito que você vá, vai ser divertido.

Eu poderia... se estou indo embora e pretendo nunca mais ver Camryn, talvez devesse sair com estas duas, arranjar um quarto e comê-las. Tenho certeza, pelo jeito que as coisas estão evoluindo, que as duas transariam na minha frente. Já passei por isso algumas vezes, e é algo que não cansa nunca.

— Sei lá - digo. - Eu tava esperando alguém.

Não faço ideia do que estou dizendo, nem por que estou dizendo.

A garota de cabelo castanho se inclina e coloca a mão na minha coxa.

— A gente é companhia melhor - ela diz num sussurro tórrido, com todas as nuanças óbvias de uma garota que teve muitas e muitas transas de uma noite só.

Tiro a mão dela de cima de mim e fico de pé, enfio novamente as mãos nos bolsos e vou embora. Em qualquer outro momento, eu poderia topar, mas hoje não.

É, provavelmente minha alma está ferida de forma incurável. Preciso sair desta cidade.

Enquanto me afasto das duas garotas sem dizer nada, ouço suas vozes flutuando no ar atrás de mim. Estou pouco me fodendo pro que elas dizem ou o quanto se sentiram rejeitadas.

Daqui a uma hora estarão sentadas no pau de outro cara e vão esquecer que falaram comigo.

Já passa da meia-noite, agora. Parei num café com acesso à internet e comprei a passagem de avião de Camryn para a Carolina do Norte, depois passei num caixa eletrônico e saquei dinheiro mais do que suficiente para pagar a corrida de táxi dela até o aeroporto, e do aeroporto para sua casa na Carolina do Norte.

A caminho do saguão do nosso hotel, peço um envelope, uma folha de papel e algo para escrever para a recepcionista, me sento num sofá no saguão e escrevo um bilhete para Camryn:

 

Camryn,

desculpa ter ido embora desse jeito, mas sei que eu não ia conseguir dizer adeus cara a cara. Espero que você se lembre de mim, mas se me esquecer for mais fácil, aceito isso também.

Nunca se limite, Camryn Bennett; tenha certeza do que quer na vida, diga o que sente e nunca tenha medo de ser você mesma. Foda-se o que os outros pensam. Você está vivendo pra você, não pra eles.

O código abaixo é o que você precisa informar no aeroporto pra pegar seu avião pra casa. Você só precisa da identidade. O avião parte amanhã de manhã. O dinheiro é pro táxi.

Obrigado pelas melhores duas semanas da minha vida e por estar ao meu lado quando mais precisei de você.

-Andrew Parrish

KYYBPR

 

Leio o bilhete cinco vezes antes de me dar por satisfeito, e finalmente dobro o papel e coloco junto com o dinheiro, dentro do envelope.

Vou até o elevador. O último obstáculo é sair de fininho sem que Camryn fique sabendo. Espero que ela ainda esteja dormindo. Por favor, faça Camryn estar dormindo. Consigo ir embora se não precisar vê-la, mas se ela me vir... Não. Tenho que ser capaz de fazer isso de qualquer jeito.

E vou fazer.

Saio do elevador no nosso andar e ando por um corredor longo e iluminado, passando por vários quartos. Ver os nossos logo à frente revira o meu estômago de nervoso. Passo em silêncio; temo que o barulho dos meus passos possa ser o suficiente para avisá-la de que estou aqui. Tem um aviso de NÃO PERTURBE na maçaneta do quarto dela, e não sei por que, mas vê-lo faz meu estômago se embrulhar todo. Talvez porque a única vez que pendurei um aviso desses na maçaneta de um quarto de hotel foi quando eu estava lá dentro, transando. A ideia de Camryn sendo comida por outro cara...

Cerro os dentes e passo pela sua porta. Dá pra ser mais neuroticamente patético? Ela nem é minha e eu acabo de ser estuprado por uma reação de ciúme louco.

Quanto antes eu for embora de Nova Orleans, melhor.

Passo minha chave-cartão na porta e entro no quarto. Está exatamente do jeito que eu deixei: as roupas jogadas perto das mochilas e o violão de Aidan apoiado na parede, sob o abajur. Ando pelo quarto recolhendo as coisas e tenho um momento ah, é quando percebo que ia esquecer meus carregadores plugados na parede se não os tivesse visto ao passar. Tiro todos da tomada e os enfio junto com minhas roupas na mochila. Por último, corro para o banheiro para pegar minha escova de dentes na pia.

Camryn está parada na porta quando volto.


CAMRYN


29

— ANDREW, VOCE TA BEM? - Olho para ele de lado, cruzando os braços, enquanto a porta se fecha suavemente atrás de mim com um estalo.

Estava tão preocupada com ele... preocupada porque temia que ele fosse embora sem se despedir, mas mais preocupada por causa do seu estado psicológico quando saiu. Porque seu pai tinha acabado de morrer.

Prendo o fôlego em silêncio e Andrew passa por mim, indo até suas mochilas no pé da cama.

Por que ele não quer falar comigo?

Olho para as mochilas de novo e entendo na hora o que ele está fazendo. Descruzo os braços e me aproximo dele.

— Por favor, fala comigo - digo delicadamente. - Andrew, você me deu um baita susto. - Ele enfia a escova de dentes na mochila, ainda de costas para mim. - Se você precisa ir pro enterro, tudo bem. Posso voltar pra casa. Talvez a gente possa se falar...

Andrew se vira.

— A questão não é o enterro nem meu pai, Camryn - ele diz, e suas palavras me ferem, mesmo sem saber o significado por trás delas.

— O que é, então?

Ele me dá as costas de novo, fingindo mexer numa das mochilas, embora eu saiba que é só para despistar. Vejo um envelope no bolso de trás de sua calça. Está escrito RYN na frente; imagino que seja meu nome parcialmente encoberto pela aba do bolso.

Estendo a mão e pego o envelope.

Andrew se vira e seu semblante murcha.

— Camryn... - Ele dá um suspiro triste e olha rapidamente para o chão.

— O que é isto? - pergunto, olhando para o meu nome.

Já estou abrindo a aba do envelope com o dedo.

Andrew não responde; fica parado ali, esperando que eu leia o bilhete, porque sabe que vou ler mesmo.

Ele quer que eu leia.

Vejo o dinheiro e o deixo no envelope, sem tocá-lo, e ponho o envelope no pé da cama. Só me importa o bilhete que tenho nas mãos e que já está esmagando meu coração, e ainda nem o li. Olho para Andrew e para o bilhete algumas vezes antes de desdobrá-lo.

Minhas mãos estão tremendo.

Por que minhas mãos estão tremendo?

E quando leio, um nó quente se aloja no meio da minha garganta. Meus olhos estão ardendo de raiva, mágoa e lágrimas.

— Gata, você sabia que uma hora esta viagem ia terminar.

— Não me chama de gata - digo bruscamente, apertando o bilhete, agora com a mão junto ao corpo. - Se você vai embora, não tem mais esse direito.

— Tudo bem.

Olho para ele intensamente de novo, com o meu semblante cheio de dor, perguntas e confusão. Por que estou tão furiosa, tão magoada? Andrew está certo: uma hora tinha que terminar, mas por que estou permitindo que isso me afete tanto?

Lágrimas começam a correr dos meus olhos. Não consigo mais contê-las, mas quero morrer seca se vou chorar feito um bebê. Só olho para ele, meu rosto duro e consumido pela dor e ira. Minhas mãos estão fechadas com força ao lado do corpo, e a parte de cima do bilhete de Andrew está esmagada no meu punho.

— Se você estivesse indo embora desse jeito por causa do teu pai, porque precisa ficar sozinho, e fosse o teu telefone no fim do bilhete, em vez de um código de passagem, eu poderia entender. - Levanto o bilhete amassado diante do meu rosto e deixo o braço cair novamente. - Mas ir embora por minha causa e fingir que nada aconteceu entre a gente... Andrew, isso magoa. Magoa, porra.

Vejo o maxilar dele tremer.

— Quem foi que disse que consigo fingir que nada aconteceu? - Ele lança as palavras como setas, claramente irritado pelas minhas. Largando a alça da mochila, se afasta da cama e vem até mim. - Eu nunca vou conseguir esquecer nada, Camryn! Por isso não consegui encarar você! - Andrew corta o ar entre nós com as mãos.

Dou um passo para trás, me afastando dele. Não consigo aceitar isso. Meu coração dói demais. E estou puta da vida por não conseguir parar de chorar. Olho para o bilhete na minha mão, depois de novo para Andrew e finalmente dou a volta nele e deixo o bilhete em cima da cama, ao lado do envelope e do dinheiro.

— Tá. Vai embora, então. Mas eu vou pagar minha viagem.

Enxugo os olhos e ando até a porta.

— Continua com medo - ele diz alto atrás de mim.

Eu me viro.

— Você não sabe porra nenhuma! - E em seguida abro a porta com um empurrão, jogo a cópia da chave dele no chão e volto para o meu quarto.

Eu ando pra lá. E pra cá. E pra lá. Quero esmurrar a parede ou rasgar alguma coisa, mas acabo me contentando em chorar feito um bebê.

Andrew irrompe no meu quarto, jogando a porta com força contra a parede ao entrar. Ele me segura pelos braços, afundando os dedos nos meus músculos.

— Por que ainda tá com medo?! - Lágrimas enchem seus olhos: lágrimas furiosas de dor. Ele me sacode. - DIZ O QUE VOCÊ TÁ SENTINDO!

Sua voz tonitruante enrijece meu corpo por um momento, mas me desvencilho dele. Estou tão confusa. Sei o que quero dizer. Não quero que Andrew vá embora, mas...

— Camryn! - Seu rosto está cheio de ira e desespero. - Diz o que você tá sentindo, seja o que for! Não me importa se é perigoso, idiota, doloroso ou ridículo. ME CONTA O QUE VOCÊ TÁ SENTINDO! - Sua voz me apunhala.

Ele não para:

— Seja honesta comigo. Seja honesta com você mesma! - Suas mãos gesticulam na minha direção. - CAMR...

— Eu quero você, porra! - grito para ele. - A ideia de você ir embora e nunca mais te ver me-rasga-por-dentro! - Minha garganta arde como se estivesse em chamas. - Não consigo respirar sem você, caralho!

— FALA! Putaquepariu - ele diz, exasperado -, fala de uma vez!

— Eu quero que você me possua de corpo e alma! - Mal consigo ficar de pé, a essa altura. Soluços agitam meu corpo todo. Meus olhos ardem e meu coração dói como jamais doeu antes.

Andrew me agarra, juntando meus pulsos nas minhas costas com uma das mãos. Ele puxa minhas costas com força para o seu peito.

— Repete, Camryn - ele ordena, o calor do seu hálito banhando o lado do meu pescoço, fazendo calafrios correrem por meus membros. Sinto seus dentes roçarem a pele logo abaixo da minha orelha. - Repete, porra. - Sua mão aperta dolorosamente meus pulsos.

— Eu te pertenço, Andrew Parrish... quero ser sua propriedade...

Andrew fecha os dedos da outra mão com força ao redor do meu cabelo, puxando meu pescoço para trás e expondo minha garganta. Ele morde meu queixo e segue descendo pelo meu pescoço. Sinto seu pau fazendo pressão em mim por trás, através da barreira das nossas roupas.

— Por favor... - murmuro -, não me solta...

Com minhas costas ainda apertadas contra seu corpo rijo e segurando meus pulsos com uma mão, ele enfia os dedos dentro do meu short e da calcinha e arranca tudo. Ele me força a ir até a cama, onde meus joelhos pressionam o colchão, e ergue meus braços acima da cabeça, tirando meu top.

Não olho para trás quando percebo que ele está tirando os sapatos e a roupa. Só vou me mexer quando ele permitir.

Seus músculos abdominais duros como pedra pressionam com força minhas costas. Sinto suas mãos quentes deslizando por minha cintura nua; uma mão subindo para apertar completamente um seio, a outra entrando no meio das minhas pernas. Meu pescoço cai para trás de novo contra o peito de Andrew quando ele enfia um dedo nos meus lábios latejantes lá embaixo e me dedilha com ele. Gemo, jogando a cabeça mais para trás, para alcançar sua boca. Sua língua serpenteia em direção à minha; o calor carnudo e úmido dela me enlouquece. Ele esmaga seus lábios contra os meus e me beija vorazmente, a ponto de nenhum dos dois conseguir respirar. E então ele me força para a frente, para cima da cama. Minhas mãos afundam nos lençóis, meus dedos se fechando sobre o tecido, até que ele joga todo o seu corpo nas minhas costas e meus braços já não conseguem segurar meu corpo. Ele agarra meus pulsos de novo e os puxa para as minhas costas, se apertando contra mim.

— Porra, por favor, me fode, Andrew... por favor - imploro, minha voz tremendo com meu hálito. Digo o que sinto desta vez, sem que ele precise pedir.

E parece tão certo.

Andrew se apoia totalmente em mim; sinto sua ereção forte e persistente. Quero-o tanto dentro de mim, mas ele, propositalmente, não me concede isso, me fazendo sentir que a qualquer momento vai meter em mim, mas sem nunca meter.

Calafrios atacam meu corpo novamente quando sinto a ponta de sua língua traçando uma linha na minha nuca. Um lado do meu rosto está comprimido contra o colchão, o peso duro do seu corpo em cima de mim, impedindo meus movimentos. Mordo o lábio quando os dentes aguçados se fecham nas minhas costas, o suficiente para causar dor, mas sem rasgar a pele. E depois que me morde, ele beija e lambe cada lugar para aliviar a dor residual.

Como se meu peso não fosse nada para ele, Andrew vira meu corpo com uma mão nas minhas costas e me arrasta para o meio da cama. Ele engatinha para o meio das minhas pernas, abrindo-as com seus joelhos para que eu fique totalmente exposta. Aperta as palmas das mãos na parte de dentro das coxas, forçando minhas pernas a ficarem abertas.

Seus olhos verdes se voltam de relance para o meu rosto e depois para baixo, para o que está aberto diante dele. Andrew me sonda provocativamente, passando o comprimento de um dedo entre meus lábios e em volta do meu clitóris. Gemo e estremeço, me sentindo retorcer por dentro a cada toque. Ele ergue a cabeça de novo, com olhos perigosos e semicerrados, e mete os dedos tão fundo. Minha mão se junta à sua e ele deixa que eu me toque por um momento, antes de se recusar a me dar mais. Ele me masturba furiosamente agora, tocando cada ponto sensível ao toque que existe, e começo a me contorcer suavemente, minha cabeça fazendo pressão sobre o travesseiro. E, como se soubesse que vou gozar logo, Andrew retira a mão para me impedir.

Ele engatinha para cima de mim, beijando e lambendo minha pele, das coxas até o pescoço, e segura meus braços acima da cabeça, para que eu não possa alcançá-lo. Seus olhos ferozes estudam a minha boca e então encontram os meus, e ele diz:

— Vou te foder com tanta força... Meu Deus, você não faz nem ideia. - Suas palavras abrem um caminho de prazer do meu ouvido até a umidade latejante entre as minhas pernas. Ele morde minha língua e me beija com violência, e respiramos, ofegantes, um na boca do outro, nossos lábios gemendo encostados.

Sua mão direita vai para baixo sem interromper o beijo e ele pega o pau com a mão e o guia até mim, mal colocando a ponta, para me enlouquecer. Jogo os quadris contra ele, tentando forçá-lo a meter mais, beijando-o com mais força e finalmente conseguindo pôr uma mão em sua nuca. Agarro seu cabelo tão forte que sinto que vou arrancá-lo. Ele não liga. Eu também não. Ele gosta de dor tanto quanto eu.

E então, bem lentamente, para que eu possa perceber cada sensação dolorosamente ardente atravessar meu corpo, ele mete tudo dentro de mim. Meu pescoço se dobra para trás sobre o travesseiro, meus lábios se abrem. Eu grito, gemo e choramingo. Meus olhos estão formigando tanto que ficam pesados, e mal consigo abrir as pálpebras. Seu pau parece estar inchando dentro de mim, e minhas coxas tremem contra o seu corpo.

Andrew me fode devagar de início, me forçando a abrir os olhos para ver os seus. Ele prende meu lábio inferior entre os dentes e o puxa, e então contorna todo o seu comprimento com a ponta da língua.

Esmago minha boca contra a dele, empurrando-o com meus quadris e forçando-o a meter mais fundo.

Minhas pernas estão tremendo, agora. Não consigo controlá-las. Ele começa a me foder mais forte e não consigo mais continuar o beijo. Meu pescoço se ergue do travesseiro de novo, minhas costas começam a se arquear, empurrando meus seios contra ele, que lambe vorazmente meus mamilos. Fecho meus braços e pernas ao redor do seu corpo, enterrando as unhas nas suas costas, sentindo seu suor se formando embaixo delas. Rasgo sua pele. Isso só faz com que ele me foda com mais força.

— Goza comigo - ele sussurra torridamente no meu ouvido e me beija de novo.

Segundos depois, eu gozo. Meu corpo treme e se agita quando sinto minha carne apertando o seu membro.

— Não tira - murmuro, enquanto gozamos juntos. E ele não tira. Um gemido profundo e estremecedor atravessa o seu peito, e sinto o seu calor jorrando dentro de mim. Aperto minhas pernas na cintura dele até não poder mais, e lentamente deixo que elas se abram. Ele não para de arremeter para dentro de mim, até que seu corpo começa a relaxar.

Ele se deita ao meu lado; seu rosto sobre meu coração, minha perna dobrada sobre sua cintura. E ficamos assim por um tempo, enroscados um no outro, deixando nossa respiração se normalizar e nossos corpos se acalmarem. Mas vinte minutos depois, recomeçamos. E antes que a noite termine e adormeçamos nos braços um do outro, ele transou comigo de mais maneiras que todas as que já experimentei.

Na manhã seguinte, enquanto o sol brilha através das cortinas, ele me mostra que não é sempre brutal e agressivo, me acordando com doces beijos. Ele beija cada uma das minhas costelas, e massageia minhas costas e coxas antes de fazer amor comigo suavemente.

Eu poderia morrer nesta cama com ele agora, envolta em seus braços, e nem perceberia que morri.

Andrew me aperta contra o seu corpo em seus braços e beija meu queixo.

— Agora você não pode ir a lugar nenhum - sussurro.

— Eu não queria ir mesmo.

Me viro de frente para ele, enroscando minhas pernas nuas nas suas. Ele encosta sua testa na minha.

— Mas você ia - digo baixinho.

Ele faz que sim.

— É, eu ia porque... - Seus pensamentos se perdem.

— Por quê? - pergunto. - Porque eu tinha medo demais do óbvio?

Sei que deve ser por isso. Eu acho. Eu espero...

Os olhos de Andrew vagam para baixo. Com a ponta do dedo, aliso toda a sua sobrancelha e depois o nariz. Me curvo para a frente só um pouco e beijo seus lábios suavemente.

— Andrew? É por isso?

Meu coração me diz que não é.

Seus olhos começam a sorrir e ele me puxa mais para perto, me apertando mais nos braços e me beijando com força.

— Tem certeza que você quer isso? - ele pergunta, como se não acreditasse que eu poderia desejá-lo dessa forma, o que é totalmente absurdo para mim.

Me esforço para encontrar o significado por trás dos seus pensamentos, mas em vão.

— Por que eu não iria querer? - pergunto. - Andrew, falei a sério: não consigo respirar sem você. Ontem à noite, depois que você ficou o dia todo longe, me sentei na beirada desta cama e fiquei literalmente sem ar. Achei que você já tivesse ido embora e comecei a pensar em como não tinha nem teu telefone e que nunca iria te encontrar...

Ele toca meus lábios com o dedo, me acalmando.

— Tô aqui agora e não vou a lugar algum.

Sorrio languidamente e deito a cabeça no seu peito. Seu queixo está apoiado na minha cabeça. Ouço seu coração batendo e o barulho da respiração que sai do seu nariz num movimento regular e calmo acima de mim. Ficamos assim por horas, mal dizendo uma palavra. Percebo que esse é exatamente o lugar onde eu queria estar desde que falei com ele no ônibus naquele dia.

Infringi todas as regras... Cada. Uma. Delas.


ANDREW


30

O CORAÇÃO SEMPRE vence a razão. O coração, embora seja imprudente, suicida e masoquista de um jeito só seu, sempre ganha a parada. A razão pode ser a melhor opção, mas agora tô cagando para o que a voz da razão tá me dizendo. Agora só quero viver para o momento.

— Acorda, amor - digo, dando uma palmadinha na bunda de Camryn.

Ela adormeceu nos meus braços de novo depois que acordamos juntos, mais cedo nesta manhã. Acho que talvez eu também tenha adormecido em algum momento, mas desde ontem à noite só penso nela, e se em algum momento cheguei a dormir, nunca vou saber.

Ela geme em protesto e rola na cama para o meu lado, seu corpo enroscado no lençol branco, seu cabelo louro todo embolado, mas mesmo assim sexy pra caramba.

— Ah, vai, amor - ela resmunga, e meu coração bate forte algumas vezes ao ouvi-la me chamando assim -, vamos dormir o dia todo.

Visto minha camiseta, minha bermuda e me sento na cama ao lado dela, me apoiando num braço do outro lado do seu corpo.

Eu me curvo e aperto os lábios na sua testa.

— Quero fazer tudo com você - digo, com um sorriso tão grande que me dou conta de que é constrangedor, mas não me importo. - A gente pode ir pra todo lugar, fazer tudo o que a gente imaginar.

Nunca me senti tão feliz. Não sabia que existia uma felicidade como essa.

Camryn sorri tão docemente para mim, seus olhos azuis brilhando ainda com aquela inocência de quem acaba de acordar. É como se ela estivesse me estudando, tentando me entender, mas gostando de fazer isso.

Camryn estica os dois braços.

— Infelizmente, você vai ter que me carregar pra todo lugar - ela diz.

Eu seguro seus braços e ela ergue o corpo para ficar sentada na cama.

— Bom, pra mim não tem problema - rio. - Eu te carrego numa boa, porra! As pessoas vão olhar, mas e daí... Mas por que preciso te carregar?

Ela me beija no nariz.

— Porque acho que não consigo andar.

A compreensão transforma meu sorriso numa careta diabólica.

Ela começa a se levantar da cama, jogando as pernas para fora, e vejo o desconforto em seu rosto.

— Porra, amor, desculpa mesmo. - Estou sendo sincero, mas não consigo parar de sorrir.

Ela também não, na verdade.

— Não tô dizendo isto pra massagear esse teu ego sexual - Camryn diz -, mas eu nunca tinha sido fodida assim.

Eu rio alto, jogando a cabeça para trás.

— Olha só as coisas que você fala! - digo.

— Ei - ela aponta para mim -, a culpa é toda tua. Foi você que me transformou numa ninfomaníaca boca-suja e pervertida que pelo jeito vai andar torta por uns dias. - Ela mexe a cabeça uma vez para sublinhar esses fatos.

Cuidadosamente, eu a pego em meus braços, as duas pernas por cima de um braço, em vez de levá-la de cavalinho na sua "condição".

— Desculpa, amor, mas você já era meio boca-suja quando te conheci - digo, sorrindo para o bico que ela está fazendo. - Pervertida? Talvez. Mas isso já tava em você, eu só ajudei a trazer à tona. Agora, ninfomaníaca? Isso significa que você quer meter o tempo todo, mesmo andando torta por uns dias.

Ela arregala os olhos cada vez mais.

— Não, eu tô definitivamente fora de combate, pelo menos até amanhã de manhã.

Beijo a testa dela e a carrego para o banheiro.

— Tudo bem - digo, trocando as brincadeiras por uma expressão mais suave. - Eu não deixaria mesmo. Hoje, Camryn Bennett, você vai ser mimada. E o primeiro item do programa é um banho quente e demorado.

— De espuma? - ela pergunta, fazendo bico e um olhar de Bambi.

Sorrio para ela.

— Sim, de espuma.

Abro as torneiras enquanto ela fica sentada no balcão da pia onde a deixei, nua, ainda por cima.

— Acho que vou ficar te devendo a espuma, gata - aviso, espremendo o que sobrou do frasquinho de amostra de xampu fornecido pelo hotel.

— Quer saber? - Camryn diz, balançando as pernas, com as mãos apoiadas na borda do balcão. - Quase todas as minhas coisas acabaram... minha pasta de dente tá no fim e eu queria sabonete líquido para banho, ou alguma coisa do tipo. - Ela apalpa as pernas nuas. - Tô praticamente com escamas. - Ela faz uma careta.

Mastigando a bochecha por dentro, digo:

— Vou comprar. - Deixando a banheira enchendo de água atrás de mim, me viro para ela e verifico o que ela tem sobre o balcão. Depois vou para o quarto e volto com um lápis minúsculo do hotel e um bloquinho de notas quadrado. - Do que você precisa?

Enquanto Camryn está pensando, escrevo o que ela já falou.

— Pasta de dente, sabonete líquido para banho... - Olho para ela. - É aquele que tem nos banheiros de restaurante, certo?

— Bem, não exatamente - ela diz, e fico tentando não olhar para os peitos dela. - Não é sabonete pra lavar a mão, é... bom, você vai descobrir.

Eu anoto: não é pra lavar a mão.

Olho novamente para ela.

— Tá, o que mais você lembra?

Ela estufa os lábios contemplativamente.

— Xampu e condicionador, de preferência da L'Oréal; vêm em tubos cor-de-rosa, não tem tanta importância, mas nada de xampu+condicionador; deixei os frascos que comprei no último motel. Ah! Me traz também uma garrafinha de óleo Johnson's.

Ergo a sobrancelha, muito interessado.

— Óleo Johnson's? Tá pensando em alguma coisa?

— Não! - Ela bate de leve no meu braço com os nós dos dedos, mas só consigo notar como o peito dela balançou quando ela fez isso. - De jeito nenhum! Gosto de usar no banho, só isso.

Eu anoto: uma garrafa grande de óleo Johnson's (nunca se sabe).

— E talvez uns salgadinhos e umas garrafas de água ou chá gelado sem limão, alguma coisa que não seja refrigerante, e, ah! - Ela ergue o dedo. - Stick de carne-seca!

Sorrio e anoto isso também.

— Só?

— Só, não consigo me lembrar de mais nada.

— Bom, se você lembrar - digo, tirando o celular do bolso da perna da minha bermuda -, me liga e pede. Qual o teu telefone?

Ela sorri e me diz o número alegremente, e eu ligo para ela. A caixa postal atende e eu digo: Ei, gata, sou eu. Volto já; no momento tô um pouco ocupado olhando pra uma loura absurdamente gostosa, sentada nua num balcão.

Camryn sorri, fica vermelha, me puxa entre suas pernas e me beija com força.

— Cacete! A água! - ela diz, notando a banheira quase transbordando.

Fecho as torneiras rapidamente.

Deixo o telefone e a lista de compras sobre o balcão e a ergo em meus braços.

— Andrew, não tô aleijada. - Mas ela também não está exatamente brigando comigo.

Eu a ponho na banheira e ela se deita na água quente, deixando o seu cabelo cair em volta dos ombros e na água também.

— Volto já - digo ao sair.

— Promete desta vez?

Isso me faz parar. Me viro para olhar Camryn, e desta vez ela não está brincando. Me sinto mal por ela ter que perguntar uma coisa dessas, não porque isso me ofenda, mas porque fui eu que lhe dei motivos para perguntar.

Olho para ela bem sério.

— Prometo, gata. Você não vai mais se livrar de mim, sabe disso, não sabe?

Ela sorri docemente, mas seu sorriso tem uma pitada de malícia.

— É cada uma em que eu me meto. Pisco para ela e saio.


CAMRYN


O SEXO SEMPRE muda tudo. É como se você estivesse vivendo dentro de uma bolha onde tudo é seguro, só paquera, e muitas vezes previsível. Uma atração pelo tipo certo de pessoa pode durar para sempre quando o mistério da intimidade é mantido intacto, mas assim que você dorme com alguém, a segurança, a paquera e a previsibilidade costumam se transformar nos seus opostos. A atração vai acabar, agora? Ainda vamos nos desejar tanto quanto nos desejávamos antes de fazer sexo? E será que um de nós não está pensando secretamente que cometemos um grande erro e deveríamos ter deixado tudo como estava? Não. Sim. E não. Sei disso porque sinto. Não é excesso de confiança nem o sonho iludido de uma jovem inexperiente e insegura. É um fato óbvio: Andrew Parrish e eu tínhamos que nos encontrar naquele ônibus no Kansas.

Coincidência é só o nome que os conformistas dão ao destino.

Fico de molho na banheira por algum tempo, mas decido sair antes de virar uma ameixa seca. Está doendo lá embaixo, mas sou perfeitamente capaz de andar. Só acho meigo o modo como ele pensa que precisa cuidar de mim.

Visto o short cinza de algodão que comprei na estrada e um top preto. Faço a cama e arrumo um pouco o quarto antes de pegar o celular para ver minhas mensagens: as mesmas doideiras aleatórias de Natalie. Nada ainda da minha mãe. Eu sempre deixo o celular no modo vibrar. Não suporto ouvir telefone tocando. Não adianta a gente poder colocar o toque que quiser; para mim um telefone tocando é como arranhar as unhas num quadro-negro. Vou até a janela, abro bem as cortinas para deixar que a luz do sol inunde o quarto e me apoio na sacada, olhando para Nova Orleans. Nunca vou esquecer este lugar.

Penso em Andrew e no pai dele rapidamente, mas tiro isso da cabeça. Vou lhe dar mais alguns dias antes de tentar tocar no assunto de novo. Ele vai sofrer por um tempo, mas não gostaria que, sem querer, me usasse como uma barreira. Andrew vai precisar enfrentar isso em algum momento.

Ponho meu telefone sobre a sacada e olho minhas músicas. Faz um bom tempo que não ouço nada meu; o que me surpreende é que isso não me fez muita falta. Não me acostumei, apenas, com o rock clássico de Andrew; ele me fez meio que adorá-lo.

Barton Hollow. The Civil Wars. Paro nessa - minha favorita nos últimos dois meses - e ligo o alto-falante, deixando a música invadir o quarto com aquele estilo country-folk que é meu prazer secreto. Não curto muito música country, mas essa banda é uma exceção. Canto junto com John e Joy, me soltando, já que estou na privacidade do meu quarto, e cantando a plenos pulmões. Danço um pouco de pé na frente da janela. E quando começa o solo de Joy, canto junto com ela como sempre faço, tentando tornar minha voz amadora tão aveludada quanto a dela. Nunca vou conseguir cantar como ela, mas me sinto bem cantando junto.

Meus lábios se fecham e meu corpo dançante fica imóvel quando noto Andrew encostado na parede, perto da porta, me observando. Sorrindo de orelha a orelha, naturalmente.

Literalmente derreto com o rubor do meu rosto.

Ele entra completamente no quarto, agora que foi flagrado, e deixa duas sacolas plásticas sobre o balcão da TV.

— Pra alguém que tá tão dolorida - ele caçoa, suas covinhas ficando mais fundas - você tava mexendo essa bundinha pra valer.

Ainda vermelha, tento distraí-lo o máximo possível do pequeno espetáculo que dei, indo até as sacolas.

— Ah, é? E você não devia me bisbilhotar desse jeito.

— Eu não tava te bisbilhotando - Andrew diz -, só curtindo um pouco. Tua voz é linda.

Fico mais vermelha ainda, dando-lhe as costas e fuçando numa das sacolas.

— Obrigada, amor, mas você é meio suspeito pra falar. - Olho para trás só o suficiente para lhe endereçar um sorrisinho brincalhão.

— Não, é sério - ele diz, e parece falar a sério mesmo -, você não canta tão mal como pensa.

— Não canto tão mal? - Eu me viro, segurando uma garrafona de óleo Johnson's. - O que isso significa? Que você acha que eu canto só um pouco mal? - Eu o olho com desdém e mostro o óleo Johnson's. - Eu falei uma garrafinha.

— Bom, eles não tinham outro tamanho.

— Hã-hã. - Dou outro sorrisinho, deixando a garrafa no balcão da TV.

— Não é isso, eu acho que você não canta nem um pouco mal - Andrew responde, e ouço a cama ranger quando ele se senta na ponta.

Olho para ele no espelho à minha frente.

— Bom, você acertou com o xampu e o condicionador - elogio, tirando os frascos e colocando-os perto do óleo Johnson's. - Mas o sabonete líquido, nem tanto.

— Quê? - Ele parece sinceramente decepcionado. - Você disse que não era sabonete líquido para lavar a mão. Esse aí diz claramente "Sabonete líquido para banho" no rótulo.

— Ele aponta, como que para se justificar.

— Tô brincando - digo, sorrindo gentilmente com sua reação. - Este tá ótimo.

Ele parece aliviado, e deixa a mão cair ao seu lado na cama.

— Você devia cantar. Pelo menos uma vez. Só pra saber como é.

Não gosto dessa lampadazinha acesa que ele parece ter sobre a cabeça. Nem um pouco.

— Hãã, tá... só que não. - Balanço a cabeça para ele pelo espelho. - Da mesma forma que comer baratas ou virar astronauta por um dia, isso não vai acontecer.

Enfio a mão na sacola e tiro... ah, não, ele não trouxe...

— Por que não? - ele pergunta. - Vai ser uma experiência, algo que você nunca pensou em fazer, mas que depois vai te deixar nas nuvens.

— Que-cazzo-é-isto-aqui? - pergunto, me virando, segurando uma caixa de Vagisil.

Ele parece incrivelmente pouco à vontade.

— É... bom, você sabe - ele se encolhe todo -, pras tuas... partes de menina. - Ele acena com a cabeça para minhas "partes de menina", constrangido.

Meu queixo cai.

— Você não gosta do meu cheiro? Já me viu coçando ali? - Estou tentando não rir.

Os olhos de Andrew ficam do tamanho de pratos.

— Quê... Não! Eu só achei que ia ajudar com a irritação. - Nunca o vi tão constrangido, e ao mesmo tempo chocado. - Ei, não é fácil pra um cara ficar na frente daquela prateleira lendo os rótulos. - Ele começa a gesticular com as mãos. - Eu vi que era pra essa parte do corpo e joguei na cestinha.

Deixo o Vagisil no balcão e ando até ele.

— Bom, esse negócio não vai ajudar a aliviar a irritação causada por... - estufo os lábios - "fricção excessiva", mas o que vale é a intenção. - Eu me sento no colo dele, a cavalo sobre sua cintura, e me curvo para beijá-lo.

Ele passa os braços pelas minhas costas.

— Então acho que já podemos dizer que não precisamos mais de quartos separados - Andrew diz, sorrindo para mim.

Com os dedos entrelaçados atrás de sua nuca, eu me curvo e o beijo de novo.

— Eu mesma ia pegar suas coisas e trazer pra cá enquanto você tava fora, mas aí lembrei que joguei a cópia da tua chave no chão quando saí de lá ontem.

Ele abaixa suas grandes mãos e segura minha bunda, me puxando mais para perto. Depois beija a curva do meu pescoço e fica de pé, me carregando com ele.

— Vou pegar tudo agora - diz, me deixando deslizar cuidadosamente do seu colo. - Acho que vou levar uns dias pra aprender a tocar aquela canção e decorar a letra. Você já parece estar pronta.

Oh-oh...

Estreito os olhos para ele, olhando-o de lado.

— Aprender por quê?

Suas covinhas ficam mais fundas de novo.

— Se bem me lembro, você renunciou à liberdade depois de ganhar aquele jogo de bilhar.

Sua expressão é quase de pura maldade.

Balanço a cabeça, lentamente primeiro, depois com mais veemência quando me dou conta da minha situação.

— Tuas palavras foram - ele diz, com um gesto -, abre aspas: Só quero ficar livre de comer baratas ou botar a bunda na janela do carro. Sinto muito, gata, mas você precisa aprender a ficar de boca fechada.

— Não... Andrew - fico na frente dele, de braços cruzados -, você não pode me obrigar a cantar na frente de uma plateia. Isso é uma crueldade.

— Com você ou com a plateia?

Ele dá um sorrisão.

Eu piso no pé dele com força.

— Tô brincando! Tô brincando! - ele diz, rindo alto.

— Bom, você não pode me obrigar.

Andrew inclina a cabeça para um lado, aqueles olhos verdes brilhando com um pouco de tudo que o torna irresistível.

— Não, não vou te obrigar a fazer nada, mas... - Que legal, agora ele está fingindo fazer bico. E o pior é que está funcionando! - Eu queria muito, muito, muito que você cantasse. - Ele me segura pelos cotovelos e me puxa para perto.

Rosno para ele e cerro os dentes por trás dos lábios apertados.

Um milhão e um. Um milhão e dois. Um milhão e três.

Respiro fundo.

— Tá.

Seu rosto se ilumina.

— Mas só uma vez! - Levanto um dedo. - E se alguém rir de mim, não me deixa na cadeia!

Ele segura meu rosto, apertando minhas bochechas com as mãos, e beija minha boca de siri.


31

MINUTOS DEPOIS, ANDREW volta para o quarto trazendo suas mochilas e o violão do irmão.

Ele está mesmo empolgado com a ideia.

Eu estou completamente apavorada e já querendo me estapear por ter concordado. Mas preciso admitir que também sinto uma pontinha de empolgação. Não fico totalmente em pânico diante de uma plateia - não tive problemas para fazer um discurso sobre espécies ameaçadas de extinção no colegial, nem para fazer o papel da enfermeira Ratched em Um Estranho no Ninho na peça do último ano. Mas cantar é diferente. Não sou tão má atriz. Minha voz, especialmente em dueto com alguém como Andrew, que canta como um deus do blues-rock que derrete calcinhas, é outra história.

— Pensei que você não quisesse ouvir o tipo de música que eu gosto.

Andrew deixa as mochilas no chão e vai para a cama com o violão.

— Bom, essa canção que você tava cantando e dançando tão bonitinha, seja qual for, passa. Eu tava gostando.

— The Civil Wars; minha banda preferida do momento, acho - digo, saindo do banheiro de cabelo molhado, enxugando as pontas com uma toalha (decidi lavar o cabelo de novo depois que Andrew chegou com os produtos). - O nome da canção é Barton Hollow.

— É tipo um folk moderno - ele diz, dedilhando o violão algumas vezes. - Gostei.

Ele continua, olhando para mim:

— Cadê o seu celular?

Vou pegá-lo da sacada da janela, volto a música para o início e entrego para ele. Ele o coloca sobre a cama ao seu lado e aperta play. Continuo enxugando meu cabelo enquanto ele aprende a melodia de ouvido, parando e começando a música inúmeras vezes, fechando os dedos ao redor do braço do violão e testando o som das cordas até encontrar as certas, que correspondem às notas da canção. Em questão de minutos, depois de alguns acordes desafinados, ele começa a tocar o primeiro compasso facilmente.

E quando anoitece, já tirou praticamente toda a canção, com exceção de um trecho curto que ele sempre confunde com outro. Querendo aprender o mais rápido possível, ele acabou procurando as cifras na internet, e, quando as encontrou, isso certamente acelerou o processo.

A letra foi mais fácil.

— Acho que já quase aprendi - Andrew diz, sentado no parapeito diante de uma paisagem escura e nublada, chuvosa. Começou a chover por volta das oito da noite e não parou mais.

De vez em quando, me junto a ele e canto um pouco, mas estou nervosa demais. Não sei mesmo como vou conseguir fazer uma loucura dessas, se já fico nervosa só com ele no quarto. Lá se vai minha coragem diante de qualquer plateia. Prevejo um caso extremo de pânico do palco, no fim das contas.

— Vem, gata - ele diz com um aceno, com os dedos no braço do violão -, só porque você conhece a letra, não significa que não tenha que ensaiar comigo.

Me sento no pé da cama, emburrada.

— Promete que não vai fazer nenhuma cara engraçada, nem rir, nem sorrir, nem...

— Não vou nem respirar - ele diz, rindo. - Juro! Vamos lá.

Suspiro e me levanto, deixando meu stick de carne-seca semidevorada em cima do criado-mudo. Andrew posiciona o violão sobre a coxa e toma um golinho de chá gelado, preparando a boca para cantar.

— Não se preocupe - diz, enquanto me aproximo lentamente -, o cara tem mais versos sozinho do que a garota; ela só faz um solo, o resto você vai cantar junto comigo.

Dou de ombros, nervosa.

— É verdade - admito. - Pelo menos, na maior parte da canção, tua voz vai ajudar a encobrir a minha.

Ele coloca a palheta nos lábios e estende a mão para mim.

— Amor, vem cá.

Ando até lá, pego sua mão e ele me puxa entre suas pernas, o violão entre nós. Quando fico parada e estou onde ele quer, Andrew tira a palheta da boca.

— Adoro a tua voz, tá? Mas mesmo se você não soubesse cantar, eu ia querer que você fizesse isso. O que os outros pensam não importa.

Meus lábios se erguem num sorriso inseguro e tímido.

— Tá - digo. - Vou fazer isso por você, mas é só por você; trate de se lembrar disso.

— Aponto severamente para ele. - Vai ficar me devendo uma.

Ele balança a cabeça.

— Antes de mais nada, não quero que faça isso só por mim, mas, como ensaiar é mais importante do que discutir com você sobre isso, vou esperar até depois de cantar no Old Point pra perguntar se você aproveitou alguma coisa, além de me contentar.

— Acho que é justo.

Ele balança a cabeça uma vez, se posiciona novamente, e então começa a encostar a palheta nas cordas.

— P-peraí... talvez se você também ficar de pé, não vou me sentir tão isolada.

Andrew ri e se levanta da sacada.

— Caramba, garota, tá, vamos fazer do jeito que você quiser. Se resolver cantar com um saco de papel na cabeça, você pode.

Olho para ele como se estivesse apreciando a ideia idiota.

— Não, Camryn, nada de saco na cabeça. Agora vamos fazer isso de uma vez.

Ensaiamos até bem tarde, até que fomos obrigados a parar porque, aparentemente, estávamos incomodando os hóspedes dos dois lados. E bem na hora que eu estava começando a pegar o jeito de verdade e me soltando mais, sem me preocupar com o que Andrew poderia pensar da minha voz.

Acho que eu estava cantando bastante bem.

Vamos para a cama mais cedo, já que o ensaio foi interrompido, nos deitamos enroscados um ao lado do outro e ficamos conversando.

— Fico feliz por você ter se enchido das minhas besteiras - digo, deitada na dobra do braço dele. - Senão eu poderia estar de volta à Carolina do Norte, agora.

Sinto seus lábios pressionando o meu cabelo.

— Preciso confessar uma coisa - ele diz.

Aguço os ouvidos.

— Hã?

— É - ele diz, olhando para o teto, onde luzes do movimento da cidade lá fora traçam estranhos desenhos de vez em quando. - Em Wellington, no Kansas, no primeiro motel que a gente parou, quando você tava no banheiro de manhã e eu dei dois minutos pra você se aprontar... - Andrew para e sinto sua cabeça se mover um pouco, como se ele estivesse olhando para mim.

Afasto a cabeça do braço dele para poder olhá-lo.

— Lembro, sim; o que você fez?

Ele abre um sorriso nervoso.

— Eu meio que fotografei tua carteira de motorista com meu celular.

Eu pisco, levemente atordoada.

— Por quê? - Levanto um pouco mais o corpo para poder olhar para ele sem correr o risco dos meus olhos virarem nas órbitas.

— Você tá brava?

Eu bufo.

— Acho que depende do que você pretendia fazer com essa informação um tanto pessoal.

Ele desvia o olhar, mas vejo seu rosto corando, mesmo na escuridão do quarto.

— Bom, com certeza não foi pra poder te encontrar depois e te picar em pedacinhos, nada disso.

Meu queixo cai.

— Nossa, que alívio! - Rio. - Mas, falando sério, por que você tirou a foto?

Ele olha para o teto de novo, aparentemente perdido em pensamentos.

— Eu só queria ter certeza de que poderia te achar novamente - ele confessa -, sabe... pro caso de cada um decidir seguir seu caminho.

Meus olhos sorriem para ele, mas minha boca não. Não estou brava por ele ter tirado a foto por esse motivo - isso meio que me faz querer beijá-lo -, mas não sei se gosto dessa parte do "pro caso de cada um" também. Isso me faz achar, mais do que eu já achava, que ele planejava ir embora em algum momento, independente do que acontecesse.

— Andrew?

— Sim, gata?

— Tem mais alguma coisa que você não tá me contando?

Ele fica em silêncio.

— Não. Por que tá perguntando isso?

Olho para o teto também.

— Não sei, mas sempre senti uma estranha... relutância em você.

— Relutância? - Andrew exclama, surpreso. - Eu relutei pra te convencer a fazer esta viagem comigo? Ou pra te chupar?

— Não, acho que não.

— Camryn, a única coisa que já me fez relutar foi me perguntar se era certo a gente ficar junto.

Ergo o corpo da cama e me viro completamente para olhá-lo. A sombra no seu rosto deixa seus olhos mais ferozes. Ele está sem camisa, com um braço dobrado atrás da cabeça.

— Você acha que não estamos certos?

Essa conversa está começando a revirar meu estômago.

Ele estende a mão que não está atrás da sua cabeça e segura meu pulso com delicadeza.

— Não, gata, eu... eu acho que estamos certos de todas as maneiras... e por isso penso... por isso pensei que fosse melhor a gente não se envolver.

— Mas isso não faz o menor sentido.

Ele me puxa para si e me deito nele, com as mãos no seu peito.

— Eu só não tinha certeza se a gente devia ir em frente - ele diz, passando os dedos no cabelo atrás das minhas orelhas. - Mas, gata, você também não tinha muita certeza de nada.

Volto a me deitar ao seu lado. Nisso ele tem razão.

A única coisa que ainda não entendo é: quais eram as razões dele para tomar tanto cuidado para não se envolver, afinal? Ele sabe por que saí de casa, e sabe tudo sobre a morte de Ian. Tenho uma lista quilométrica de motivos válidos presa na porta da geladeira com um ímã em forma de banana, pra todo mundo ver. Os motivos de Andrew ainda estão escondidos em algum lugar, dentro de uma caixa de sapatos com "Cartões de Natal" escrito na tampa.

E eu acho que não é só o pai dele.

Andrew tira o braço de baixo da minha cabeça e sobe em mim, com uma perna de cada lado, seu corpo apoiado nos braços musculosos.

— Fico feliz por você não conseguir dormir com música - ele diz, aparentemente lembrando a primeira coisa que falei para ele, e então se abaixa e me beija.

Levanto os braços e aninho seu rosto lindo nas minhas mãos, puxando-o para baixo para me beijar de novo.

— E eu fico feliz por Idaho ser famoso por suas batatas.

Ele franze o cenho.

Apenas sorrio e o puxo para os meus lábios de novo. Ele me beija profundamente, enroscando sua língua na minha. E então começa a me beijar descendo para a barriga. Faz um círculo ao redor do meu umbigo com a língua e enfia os dedos por baixo do elástico da minha calcinha.

— Acho que não consigo... - digo baixinho, olhando para ele.

Andrew lambe minha barriga e beija meus dedos quando minhas mãos alcançam seu rosto e depois seu cabelo.

— Nada de sexo - diz -, e prometo que vou te chupar com cuidado. - Ele tira minha calcinha e eu levanto um pouco a bunda para facilitar.

Ele beija a parte de dentro da minha coxa. Depois, a outra.

— Vou manter minha língua bem úmida pra não arder - ele diz com delicadeza, e beija minhas coxas de novo, chegando mais perto do meu calor.

Gemo um pouco quando seus dedos me tocam bem cuidadosamente e abrem meus lábios.

— Cacete, amor, você tá inchada mesmo. - Seu comentário é sincero, sem nenhum sinal de provocação.

Arde um pouco, mas, meu Deus, quero tanto isso...

Sinto seu hálito quente no meio das minhas pernas.

— Vou tomar bastante cuidado - ele diz, e fico sem ar quando sua língua muito úmida me lambe uma vez lentamente, seus dedos ainda me mantendo aberta, mas sem exercer pressão sobre a área.

Meu corpo derrete nos lençóis quando ele me lambe várias vezes, usando só pressão suficiente para que eu não sinta dor, apenas um êxtase completo e desinibido.

Estamos ensaiando Barton Hollow há dois dias, sobretudo no nosso quarto no Holiday Inn, mas já fomos andando até o Mississippi no final da Canal Street e ensaiamos um pouco ali também. Acho que Andrew teve essa ideia para tentar discretamente me deixar mais à vontade para cantar em público. Não havia muita gente lá quando fomos, mas mesmo assim eu estava nervosa pra caramba. A maioria passava sem parar para ouvir (não estávamos dando um espetáculo completo, muitas vezes parávamos e começávamos de novo em várias partes da música, então não havia muito para se ouvir mesmo), mas uma ou outra pessoa ficava um pouco, ao passar. Uma mulher sorriu para mim. Mas não sei se foi um sorriso de pena porque sou péssima, ou se ela realmente gostou da minha voz.

Acho que podia ser uma coisa ou outra.

No terceiro dia, Andrew tem certeza de que já estamos prontos e está preparado para ir ao Old Point logo e se apresentar.

Eu, nem tanto. Preciso de mais uma ou duas semanas, meses ou anos.

— Você vai conseguir - ele diz, amarrando as botas. - Na verdade, vai arrasar. Quando terminar, vou precisar bater nos caras querendo te agarrar.

— Ah, para - digo, vestindo um top preto com alças de corrente bem lindinhas. De jeito nenhum vou usar tomara que caia numa noite como esta. - Eu vi como as garotas te olhavam naquela noite; acho que cantar junto com você é a única vantagem pra mim, porque todo mundo vai prestar atenção demais em você pra notar meus erros.

— Amor, você conhece a canção melhor do que eu - ele diz. - Para de ser tão pessimista. - Sua camiseta preta cobre seus músculos abdominais. Ele está usando um cinto preto e prateado, mas só enfia a camiseta um pouco em volta da fivela, deixando o resto por cima dos seus quadris esculturais. Jeans escuro, o topete meio arrepiado.

O que ele estava dizendo?

— A única coisa que você precisa lembrar - ele continua, enquanto passa desodorante — é de não cantar toda a letra; você poderia cantar menos, mas continua cantando nas minhas partes também. - Ele ergue a sobrancelha, olhando para mim. - Não que isso me incomode, só achei que você ia ficar mais tranquila tendo que cantar menos.

— Eu sei, é que tô tão acostumada a cantar junto a música toda... meio difícil pegar o jeito de não cantar algumas partes.

Andrew balança a cabeça.

Enfio os pés nas minhas sandálias novas e vou me olhar no espelho alto ao lado do balcão da TV.

— Você tá tão sexy - Andrew diz, chegando por trás de mim.

Ele enfia as mãos na minha cintura e beija meu pescoço, depois dá um tapa na minha bunda coberta pelo jeans justo, quase aderente, e eu dou um gritinho, porque dói.

— E como sempre, gata, adoro as tranças. - Ele passa os polegares pelas duas tranças sobre meus ombros e me beija alegremente na bochecha.

Eu me encolho e o empurro, provocante.

— Vai borrar minha maquiagem.

Andrew se afasta sorrindo, pega a carteira do criado-mudo e enfia no bolso de trás.

— Bom, acho que é isso - ele diz.

Ele vai para o meio do quarto e estende uma mão para mim, com o outro braço dobrado às costas, e faz uma reverência, sorrindo. As pontas dos meus dedos se aproximam dos seus e ele pega a minha mão e me puxa para a porta.

— E o violão?

Paramos antes de abrir a porta e ele me olha, agradecido.

— É, pode ser útil - diz, pegando o violão pelo braço. - Se Eddie não estiver lá, a gente pode dar azar e ficar sem um violão pra tocar.

— Ah, então eu não devia ter falado nada.

Ele balança a cabeça e me puxa para a porta.


32

DESTA VEZ, VAMOS de Chevelle. Andrew bateu os olhos nas minhas sandálias e entendeu que eu não conseguiria andar até Algiers calçando esses saltos, e ele não estava a fim de me carregar e carregar o violão. Pegamos a rodovia em vez do ferry, cruzamos o Mississippi e chegamos ao anoitecer. Andar o resto do caminho até o Old Point, como fizemos da primeira vez, teria sido melhor, porque agora, à medida que nos aproximamos, sei que vamos chegar muito rápido.

Estou começando a sentir náuseas.

Estacionamos na Olivier Street e saímos do carro. Meus pés ficam colados na estrada.

Andrew vem para o meu lado e me puxa para os seus braços, me apertando delicadamente.

— Não vou te obrigar a fazer isso - ele diz, mudando de ideia. Tenho certeza de que pareço prestes a botar para fora o almoço tardio que comemos há pouco tempo.

Me afastando do seu peito, ele pega meu rosto em suas mãos e me olha nos olhos.

— É sério, amor, sem brincadeira agora. Não quero que faça isso, nem mesmo por mim, se você não quer de jeito nenhum.

Balanço a cabeça, nervosa, e inspiro profundamente; meu rosto ainda está em suas mãos.

— Não, eu consigo - digo, ainda balançando a cabeça, tentando concentrar minha coragem. - Eu quero fazer.

Ele acaricia minhas bochechas com seus polegares.

— Tem certeza?

— Tenho.

Andrew sorri para mim com aqueles olhos verdes que começo a achar que estão me enfeitiçando de alguma maneira e pega a minha mão. Ele pega o violão do banco de trás e entramos juntos no Old Point.

— Parrish! - Carla exclama de trás do balcão. Ela levanta a mão e acena para que nos aproximemos.

Ainda de mãos dadas comigo, Andrew ziguezagueia em meio à multidão na direção dela. A TV atrás da cabeça de Carla está passando comerciais; sua luz cria um brilho branco ao redor da mulher.

— Ei, Carla - Andrew diz, se debruçando por cima do balcão para abraçá-la -, Eddie tá aí hoje?

Ela põe as mãos na cintura e sorri para mim.

— Com certeza - diz -, ele tá por aí em algum lugar. Olá, Camryn, é bom te ver de novo.

Sorrio para ela em resposta.

— Você também.

Andrew se senta num banco do bar e indica o banco ao lado. Eu me sento, nervosa. Só consigo pensar em quanta gente há neste lugar. Meus olhos percorrem o salão desconfortavelmente, vendo muitas cabeças balançando e pessoas de pé, agora que a banda voltou a tocar. À medida que a música adquire força, Andrew e Carla praticamente gritam um com o outro por cima do balcão.

— Tem espaço pra gente hoje? - Andrew pergunta.

Carla se debruça mais para perto dele.

— Pra gente? - diz, me olhando de relance. - Uau, vocês dois vão cantar? - Ela parece empolgada.

Meu coração acaba de abandonar seu posto e cair para os joelhos.

Engulo em seco um nó de nervosismo olhando para os dois, mas outro se forma imediatamente em seu lugar.

Carla inclina a cabeça para o lado, e seu sorriso, já enorme, fica mais carinhoso.

— Ah, querida, você vai fazer bonito, não precisa ficar nervosa; todos vão adorar você.

— Ela mexe atrás do balcão e pega um copo pequeno. Um homem está sentado no balcão ao meu lado, obviamente um cliente assíduo, já que não precisa nem pedir e Carla já está servindo sua bebida.

Mas ela continua dando mais atenção a nós dois.

— Tô tentando falar isso pra ela - Andrew diz -, mas é a primeira vez dela, então preciso dar um desconto.

— A primeira e última vez - corrijo.

Carla sorri secretamente para Andrew e depois me diz:

— Bom, não sou a favor da violência, mas se alguém aqui te der trabalho me chama que eu jogo da porta pra fora, do jeito que fazem nos filmes. - Ela pisca para mim e se vira novamente para Andrew.

— Olha lá o Eddie - ela diz, acenando na direção do palco.

Eddie está andando pela multidão, usando o mesmo tipo de roupa da última vez que o vi: camisa branca, calça preta, sapatos pretos de verniz e um sorriso grande e enrugado.

— Olha só, Parrish! - Eddie diz, agarrando a mão de Andrew e puxando-o para um abraço. Depois olha para mim. - Menina! Você tá igualzinha a uma capa de revista! - E também me abraça. Ele cheira a uísque barato e cigarro, mas me sinto reconfortada mesmo assim, por alguma razão.

Andrew está sorrindo de orelha a orelha.

— Camryn vai cantar comigo hoje - diz, todo orgulhoso.

Eddie arregala os olhos, que se tornam grandes bolas brancas cheias de empolgação, incrustadas no pano de fundo marrom-escuro de sua pele. Isso deveria me deixar mais nervosa, como quando Carla ficou sabendo, mas a presença de Eddie está ajudando a me acalmar, na verdade. Talvez eu devesse algemá-lo ao meu pulso enquanto canto.

— Claro - Eddie diz com um sorrisão -, aposto que tua voz é tão bonita quanto o resto.

Eu fico bem vermelha.

— Então sobe lá! - Ele aponta para o palco. - Assim que eles acabarem essa música!

Andrew pega a minha mão e me puxa para o seu lado. Sinto que Eddie é como outro pai para Andrew, e Andrew está feliz por ele gostar tanto de mim.

Eddie vai até o palco e ergue três dedos para nós.

— Mais três minutos!

— Ai meu Deus, tô tão nervosa!

É, Eddie devia ter ficado por perto.

A mão de Andrew aperta a minha. Ele se aproxima do meu ouvido.

— Lembre-se do seguinte: toda essa gente tá só curtindo aqui; ninguém tá aqui pra te julgar; você não tá no American Idol.

Respiro fundo para relaxar.

Ouvimos a banda terminando sua última canção e então a música para, seguida pelo costumeiro som dos instrumentos sendo transportados, afinados ou batendo nas coisas ao serem carregados. Uma onda de vozes tagarelantes fica mais forte sem a música para abafá-la, tomando conta do espaço como um zumbido amplificado e irregular. Uma grossa nuvem de fumaça de cigarro faz o ar parecer abafado, junto com todos os corpos espremidos no recinto.

Quando Andrew vai me puxar para o palco, minhas mãos começam a tremer e eu olho para baixo, notando que minhas unhas estão cravadas na pele dos nós dos dedos dele.

Ele sorri com ternura e eu o acompanho.

— Tô legal? - sussurro para ele.

Se eu conseguir fazer isso sem ter um ataque de ansiedade, vou ficar surpresa.

— Amor, você tá perfeita.

Ele beija a minha testa e encosta o violão na bateria para posicionar o microfone.

— A gente vai usar o mesmo microfone - Andrew diz. - Mas vê se não me dá uma cabeçada.

Estreito os olhos para ele.

— Não tem graça.

— Não tô fazendo graça - ele diz, rindo baixinho -, tô falando sério.

Várias pessoas da plateia já estão olhando para nós, mas a maioria está ocupada com outras coisas. Não posso fazer nada senão ficar ali de pé, e só isso já está me deixando mais nervosa. Andrew pelo menos pode se preocupar com o violão. Eu fico só ruminando os pensamentos na minha cabeça.

— Você tá pronta? - ele pergunta ao meu lado.

— Não, mas vamos acabar com isso de uma vez.

Olhamos um para o outro e ele mexe a boca sem som:

— Um. Dois. Três...

Cantamos juntos:

— Ooooh... oooh... oooh...oooh! - Pausa de um segundo. - Ooooh... oooh... oooh...oooh!

Violão.

Dezenas de cabeças viram ao mesmo tempo, e o burburinho cessa como uma torneira que se fecha.

Enquanto Andrew toca o primeiro compasso e está se preparando para cantar a primeira estrofe, estou tão apavorada por dentro que sinto que não consigo mover nada além dos olhos. Mas quanto mais ele toca, mais meu corpo não consegue deixar de se mover no ritmo da música.

Praticamente todos os presentes já estão balançando a cabeça, acompanhando o som.

Andrew começa a cantar a primeira estrofe.

E depois, brevemente juntos de novo:

— Ooooh...

Então vem o refrão e nós dois cantamos a letra, e sei que vou ter que soltar um agudo em...

Consegui!

Andrew sorri muito para mim ao entrar direto na estrofe seguinte, já dedilhando o violão sem errar um acorde, como se soubesse tocar a canção desde criança.

A plateia está realmente entrando na onda. Pessoas balançam a cabeça umas para as outras, como quem diz: Eles são muito bons, e sinto meu rosto se iluminar quando começo a cantar minha parte com Andrew de novo, e cada vez com mais confiança. Estou movendo meu corpo com mais naturalidade no ritmo da música agora, e acho que perdi quase completamente o medo, mas meu solo... ai meu Deus, agora vem o meu solo...

Andrew me olha nos olhos, como se estivesse usando o olhar para se concentrar e ficar calmo enquanto toca o violão.

Ele para junto com a música e bate no corpo do violão antes do meu primeiro verso, dedilha a guitarra e para de novo, batendo no violão depois do segundo e assim por diante, até que canto minha última nota e Andrew começa a tocar a todo o volume de novo enquanto me diz num sussurro:

— Impecável - e começa a cantar de novo. Ele está sorrindo tanto. Eu também. Juntamos nossos rostos e soltamos a voz no microfone durante a parte mais rápida.

— Woooh... ooooh... ooooh!

O violão fica mais lento e cantamos o último refrão juntos, baixinho, e ele me beija na boca depois que ambos dizemos:

— ... soul... - E a canção acaba.

A plateia explode em aplausos e gritos. Ouço até um cara dizendo:

— Mais um! - De algum lugar ao fundo.

Andrew me puxa para perto e me beija de novo, apertando os lábios com força nos meus na frente de todos.

— Caramba, amor, você foi demais! - Seus olhos estão brilhando, todo o seu rosto está iluminado por eles.

— Não acredito que consegui! - Estou praticamente gritando com ele, porque as vozes ao nosso redor estão muito altas.

Estou arrepiada da cabeça aos pés.

— Quer cantar de novo? - ele pergunta.

Engulo em seco.

— Não, não tô pronta! Mas fico feliz por ter cantado uma vez!

— Tô tão orgulhoso de você!

Alguns caras mais velhos se aproximam, segurando cervejas. O barbudo diz:

— Você tem que dançar comigo! - Ele ergue os braços e faz uma dancinha embaraçosa.

Fico vermelha e vejo os olhos de Andrew sorrindo.

— Mas não tem música! - digo para o homem.

— Não tem o cacete! - Ele aponta para alguém do outro lado do salão, e alguns segundos depois a jukebox perto da máquina de venda automática e de um jogo de fliperama começa a tocar.

Estou tão empolgada por ter conseguido cantar a música no palco que isso, e também o sentimento de culpa caso eu recusasse, torna obrigatório dançar com esse cara.

Olho mais uma vez para Andrew e ele pisca para mim.

O barbudo pega a minha mão, segura-a acima da minha cabeça e eu rodopio instintivamente. Danço com ele duas músicas antes de Andrew "me salvar" entrando suavemente no meio de nós e apertando ao máximo meu corpo contra o seu, mexendo os quadris encostados nos meus. Suas mãos estão na minha cintura. Dançamos e tagarelamos com várias pessoas e até jogamos dardos com Carla antes de finalmente ir embora, depois da meia-noite.

No caminho de volta, Andrew me olha e diz:

— E então, como se sente? - Seus lábios formam um sorriso experiente.

— Você tinha razão - respondo. - Me sinto... sei lá, diferente, mas de um jeito bom; nunca pensei que eu fosse fazer uma coisa dessas.

— Bom, fico feliz por você ter feito. - Ele sorri com ternura.

Solto meu cinto de segurança e vou para perto de Andrew. Ele passa o braço em volta de mim.

— E então, que tal amanhã à noite?

— Hã?

— Quer cantar amanhã à noite?

— Não, acho que não consigo...

— Tá, tudo bem - ele diz, esfregando meu braço. - Uma vez já é mais do que eu esperava, então não vou ficar te enchendo.

— Não - digo, erguendo o corpo e me virando para olhá-lo. - Sabe de uma coisa? Eu quero, sim. Quero cantar de novo.

Seu queixo recua num movimento de surpresa.

— Sério?

— Sério, sim. - Abro um sorriso cheio de dentes.

Ele faz o mesmo.

— Tudo bem - diz, batendo de leve no volante -, vamos cantar amanhã.

Andrew me leva de volta para o hotel e transamos no chuveiro antes de irmos para a cama.

Ficamos em Nova Orleans mais duas semanas, tocando no Old Point e depois passando por vários outros bares e clubes por toda a cidade. Um mês atrás, cantar e me apresentar ao vivo em clubes estava tão no final da lista de coisas que eu conseguia me imaginar fazendo que pareceria ridículo, mas de repente, lá estava eu cantando a plenos pulmões Barton Hollow e algumas outras canções nas quais eu podia ficar na sombra de Andrew e não ser o centro das atenções. Mas todos nos adoravam. Tantas pessoas nos paravam depois de cada apresentação, apertavam nossas mãos e perguntavam se podíamos cantar esta ou aquela música, mas Andrew sempre recusava. Ainda fico nervosa demais com esse negócio para conseguir atender a pedidos. E para minha estarrecedora surpresa, mais de um desconhecido pediu meu autógrafo e uma foto ao meu lado. Deviam estar simplesmente muito bêbados. Resolvi acreditar nisso, porque qualquer outra coisa seria esquisita demais.

No final daquelas duas semanas, Andrew tinha uma nova banda favorita para acrescentar à sua lista. Ele adora The Civil Wars tanto quanto eu. E noite passada, nossa última noite em Nova Orleans, ficamos deitados juntos, cantando Poison & Wine junto com o celular ao lado da cama... e... por meio dessa letra, acho que dissemos coisas que queríamos dizer um ao outro...

Acho que dissemos...

Chorei baixinho até dormir em seus braços.

Eu morri e fui para o céu. Sim... acho que finalmente morri.


ANDREW


33

— VOCÊ TEM QUE FAZER, SÓ pra ter certeza - Marsters disse, sentado em sua poltrona preta clichê, em sua sala clichê, usando um uniforme clichê.

— Não tenho que fazer nada - eu retruco, sentado do outro lado. - O que mais resta dizer? O que mais resta para se achar?

— Mas você...

— Não, quer saber? Vá se foder. - Levantei, empurrando a cadeira para trás e derrubando uma planta atrás de mim. - Não vou mais me sujeitar a essa merda.

Saí batendo a porta da sala atrás de mim com tanta força que o vidro tremeu no caixilho.

— Andrew! Amor, acorda - ouço a voz de Camryn dizer. Abro os olhos. Ainda estou do lado do passageiro do carro. Me pergunto quanto tempo dormi.

Eu me levanto, estalo o pescoço dos dois lados e passo a mão no rosto.

— Você tá bem?

Está escuro. Vejo o olhar preocupado de Camryn me encarando, até que ela é obrigada a olhar para a estrada.

— Tô - respondo, balançando a cabeça. - Tô bem. Acho que tive um pesadelo, mas nem lembro o que foi - minto de novo.

— Você esmurrou o painel - ela diz, rindo um pouco. - Deu um soco do nada; levei um baita susto.

— Desculpa, amor. - Eu me aproximo sorrindo e beijo o seu rosto. - Há quanto tempo você tá dirigindo?

Ela olha para os números brilhantes do relógio.

— Não sei, umas duas horas, acho.

Olho para uma placa e vejo que ela fez o que pedi e continuou na 90.

— Para ali. - Aponto para uma área plana ao lado da estrada.

Ela sai da estrada e vai para o asfalto trincado, pondo o câmbio em park. Começo a me levantar, mas ela segura meu braço e me detém.

— Peraí... Andrew.

Olho para Camryn. Ela desliga o motor e solta o cinto de segurança.

— Vou dirigir um pouco e te deixar dormir.

— Eu sei - ela diz, me olhando com ar sombrio.

— O que foi?

Ela fecha as duas mãos sobre o volante e se encosta no banco.

— Não sei mais se quero ir pro Texas.

— Por que não?

Chego mais perto dela.

Finalmente, ela olha para mim.

— Porque e depois? - ela pergunta. - Parece que é o fim da linha. Você mora lá. O que mais resta fazer?

Sei por que ela diz isso, e tenho sentido os mesmos temores em segredo já há algum tempo.

— O que resta fazer é qualquer coisa que a gente queira fazer - respondo.

Eu me viro no banco e seguro o queixo dela com a ponta dos dedos.

— Olha pra mim.

Ela olha. Vejo um anseio em seus olhos, algo assustado e torturado. Sei disso porque estou sentindo a mesma coisa.

Engulo em seco, depois me aproximo e a beijo com cuidado.

— A gente pensa nisso quando chegar lá, tá?

Ela balança a cabeça relutantemente. Tento forçar um sorriso, mas é difícil quando sei que não posso dar nenhuma das respostas que ela procura. Não posso dar as respostas que quero dar.

Camryn desliza sobre o assento e vai para o lado do passageiro, enquanto eu saio e dou a volta no carro.

Dois carros passam, cegando-nos com seus faróis altos. Fecho a porta e fico sentado por um momento. Camryn está olhando pela janelinha, sem dúvida com pensamentos parecidos com os meus: perdida, insegura e talvez até com medo. Nunca senti com mais ninguém uma ligação como a que tenho com ela, e isso me mata aos poucos. Ao estender a mão para virar a chave, paro com os dedos segurando o metal. Suspiro profundamente.

— A gente vai pelo caminho mais longo - digo baixinho, sem olhar para ela, e então o motor ganha vida.

Percebo quando ela vira a cabeça para me olhar.

Olho para ela.

— Se você quiser.

Um sorrisinho dá vida ao seu rosto novamente. Ela balança a cabeça.

Aperto o botão para ligar o CD player e o aparelho troca de CD. Bad Company começa a tocar nos alto-falantes. Lembrando nosso acordo, vou mudar a música, mas Camryn diz:

— Não, pode deixar - e seu sorriso fica ainda mais meigo.

Será que ela se lembra daquela primeira noite em que nos conhecemos no ônibus, quando perguntei o título de alguma canção do Bad Company? Ela disse Ready For Love. E eu falei: "Você tá mesmo?" Na hora, eu não sabia por que disse isso, mas agora percebo que não estava tão errado, no fim das contas. Estranho que essa música esteja tocando agora.

Viajamos pela maior parte do sul do estado da Louisiana e ficamos na 82 até chegar ao Texas. Camryn está toda sorrisos de manhã - apesar de estar no Texas -, e vê-la assim só me faz sorrir também. Estamos dirigindo com as janelas abertas, e ela está com os pés descalços para fora há uma hora; só o que consigo ver pelo retrovisor quando tento enxergar o trânsito são suas belas unhas pintadas.

— Não é uma viagem de carro se você não põe os pés pra fora da janela na estrada!

— ela grita por cima da música e do vento atravessando o carro. Seu cabelo está preso numa trança só, desta vez, mas o vento fica empurrando os fios soltos ao redor do seu rosto.

— Tem razão - concordo, apertando o acelerador -, e numa viagem de carro de verdade, você também precisa fazer sacanagem com um caminhoneiro.

O cabelo de Camryn cobre seu rosto de novo quando ela vira a cabeça.

— Hã?

Eu sorrio.

— É. - Tamborilo com os dedos no volante no ritmo da música. - É obrigatório. Você não sabia? Precisa fazer uma destas três coisas: primeira - eu levanto um dedo: - Mostrar a bunda pra um deles.

Ela arregala os olhos azuis.

— Segunda: a gente tem que passar do lado de um enquanto você finge que tá se masturbando.

Ela arregala os olhos ainda mais e seu queixo cai.

— Ou terceira: simplesmente faça assim com o braço - levanto e abaixo o braço com o punho erguido - pra ele tocar a buzina.

O alívio toma conta do rosto dela.

— Tá - ela diz com um sorriso misterioso no canto dos lábios. - Na próxima oportunidade, vou consumar esta viagem de carro fazendo sacanagem com um caminhoneiro - ela diz isso de forma indiscutível.

Dez minutos depois, nossa vítima - bom, está mais pra felizardo; afinal, é Camryn que vai mexer com ele - surge à frente. Estamos num longo trecho de estrada reta que corta uma paisagem plana e sem árvores dos dois lados. Alcançamos a carreta e mantemos uma velocidade constante de 100 quilômetros por hora atrás dele. Camryn, usando aquele shortinho branco minúsculo de algodão que eu adoro tanto, tira as pernas de cima do banco e põe os pés no assoalho. Ela está com um sorriso malicioso, e eu estou ficando meio excitado.

— Tá pronta? - pergunto, abaixando um pouco a música.

Camryn balança a cabeça e eu olho pelos retrovisores primeiro, depois à frente na mão contrária para ver se nenhum carro está vindo dos dois lados.

Quando saio de trás da carreta e vou para a outra pista, Camryn enfia a mão direita dentro do short.

Fico de pau duro na hora.

Eu tinha certeza que ela ia só fazer o gesto de buzinar!

Sorrio com malícia para ela, com todo tipo de pensamento pervertido rodopiando no cérebro, e ela sorri em resposta. Piso mais no acelerador e vou aumentando gradualmente a velocidade até alcançarmos a janela do motorista da carreta.

Meu Deus do céu...

A mão de Camryn se mexe suave mas visivelmente por baixo do tecido fino do short; o indicador e o polegar da mão esquerda estão enfiados por dentro do elástico, baixando-o o suficiente para desnudar sua barriga. Ela encosta a cabeça no banco e puxa o short um pouco mais para baixo. Estou quase distraído demais para manter os olhos na estrada. Ela morde o lábio inferior e mexe os dedos furiosamente dentro do short. Começo a achar que ela não está fingindo coisa nenhuma. Meu pau está tão duro que poderia cortar um diamante.

A carreta também está mantendo o ritmo. Distraído com Camryn, não percebi que meu pé estava relaxando aos poucos no acelerador, e quando a nossa velocidade caiu um pouco, a carreta também reduziu.

Uma voz uivante e rouca sai da janela da carreta:

— Puta que pariu! Vai me matar do coração, neném! U-huu! - Ele toca sua buzina ensurdecedora, excitado.

Sentindo um acesso de possessividade, reduzo de 100 para 70 quilômetros por hora e volto para trás do caminhão. Bem a tempo, porque uma van estava vindo na outra pista.

Olho para Camryn, sabendo que meu olhar deve estar tresloucado. Ela tira a mão de dentro do short e sorri para mim.

— Eu não esperava isso!

— Foi por isso que eu fiz - ela diz, voltando a apoiar os pés na porta do carro e obstruindo o retrovisor com os dedos dos pés.

— Você tava... se masturbando de verdade?

A velocidade baixou de 70 para 60. Meu coração está disparado no peito.

— Tava, sim - ela diz -, mas não pro caminhoneiro.

Seu sorriso se aprofunda quando ela tira alguns fios de cabelo que se alojaram entre seus lábios. Não consigo deixar de olhar para aqueles lábios, estudando-os, querendo beijá-los e mordê-los.

— Bom, não que eu esteja reclamando - digo, tentando prestar atenção na estrada e não matar a nós dois -, mas agora tô com... um probleminha.

O olhar de Camryn para no meu colo e ela olha para o meu rosto de novo, inclinando a cabeça para um lado com uma expressão de malícia e sedução. Então ela desliza no banco para perto de mim e enche a mão no meio das minhas pernas. Agora meu coração está quicando nas costelas. Estou com os nós dos dedos brancos de tanto apertar o volante com as duas mãos. Ela beija meu pescoço, meu maxilar e passa os lábios na minha orelha. Arrepios me estupram.

Ela começa a abrir o zíper da minha bermuda.

— Você me ajudou com meus "problemas" - sussurra no meu ouvido, mordendo meu pescoço de novo. - É justo que eu retribua o favor.

Camryn olha para mim.

Eu só balanço a cabeça feito um idiota porque não consigo pensar com a cabeça de cima tempo suficiente para formar uma frase, no momento.

Aperto mais as costas contra o assento quando ela pega o meu comprimento na mão e põe sua cabeça entre a minha barriga e o volante. Meu corpo estremece um pouco quando sinto sua língua serpentear para lambê-lo. Ai meu Deus... Ai meu Deus... Não sei como vou dirigir...

Quando ela me enfia no fundo de sua garganta, eu tremo, minha cabeça vai um pouco para trás, ainda tentando manter os olhos na estrada, e meu queixo cai. Agora só estou segurando o volante com a mão esquerda; enquanto ela me chupa com força e rápido, minha mão direita largou o volante e está segurando sua nuca, seu cabelo misturado aos meus dedos crispados.

A velocidade aumentou de 65 para 80 km/h.

Quando chego a 95 km/h, minhas pernas estão tremendo e eu não consigo enxergar. Seguro o volante com as duas mãos de novo, tentando manter algum controle sobre alguma coisa, especialmente a porcaria do carro, e solto um grito e gemo quando gozo.

Consegui não matar a gente na estrada depois do boquete avassalador de Camryn. Chegamos a Galveston de manhã e ela continua capotada no banco, com as pernas parcialmente estendidas no assoalho. Não me dou ao trabalho de acordá-la ainda. Primeiro passo devagar pela casa da minha mãe, notando que seu carro não está na garagem, o que significa que ela está trabalhando no banco hoje. Para matar o tempo, faço o caminho mais comprido até meu apartamento, passando pela 53rd. Camryn não dormiu muito a noite passada, mas acho que o carro andando mais devagar do que o normal bastou para acordá-la. Ela começa a se espreguiçar antes que eu entre no estacionamento do meu condomínio, na Park com a Cedar Lawn.

Camryn levanta sua linda cabeça loura do banco, e quando vejo o rosto dela, uma risada escapa dos meus lábios.

Ela inclina a cabeça já bastante bagunçada pelo sono para um lado e resmunga:

— Qual é a graça?

— Gata, eu tentei não te deixar dormir assim.

Camryn estica o pescoço, se aproxima do retrovisor e revira os olhos ao ver as três longas marcas das costuras do banco numa das bochechas, indo até a orelha. Ela cutuca as marcas ao espelho.

— Uau, isso dói - diz.

— Você tá linda, mesmo com listras. - Eu rio e ela não consegue deixar de sorrir.

— Bom, chegamos - digo finalmente, parando numa vaga e desligando o motor, depois deixando as mãos ao lado do corpo.

O carro está constrangedoramente silencioso. Embora nem eu nem ela jamais tenhamos realmente dito que nossa viagem terminaria no Texas, ou que as coisas entre nós iriam mudar, é como se ambos pudéssemos sentir isso.

A única diferença entre nós é que... só eu sei por que vão mudar.

Camryn está perfeitamente imóvel e em silêncio no seu lado, com as mãos dobradas no colo.

— Vamos entrar - digo, para quebrar o silêncio.

Ela força um sorriso para mim e abre a porta.

— Uau, isto aqui parece mais uma república estudantil do que um condomínio de apartamentos. - Ela põe a mochila e a bolsa no ombro, olhando para o prédio antigo e os carvalhos gigantes espalhados pela paisagem.

— Era um hospital dos Fuzileiros Navais na década de 1930 - digo, tirando minhas mochilas do porta-malas.

Camryn pega o violão de Aidan do banco de trás.

Andamos por uma calçada branca como giz e cheia de curvas e chegamos ao meu apartamento de um quarto no térreo. Achando a chave certa, abro a porta da grande sala de estar. O cheiro de casa fechada me atinge assim que entramos; não é um fedor, só um cheiro de lugar vazio.

Deixo minhas mochilas no chão.

Camryn fica parada ali, de início, examinando o lugar.

— Pode deixar suas coisas onde quiser, gata.

Vou até o sofá e pego o jeans que está jogado no encosto, depois uma cueca e uma camiseta da poltrona e da espreguiçadeira do conjunto.

— Este apartamento é muito legal - ela comenta, olhando ao redor.

Finalmente, ela larga suas coisas no chão e apoia o violão de Aidan no encosto do sofá.

— Não é grande coisa como apartamento de solteiro - digo, indo para a sala de jantar -, mas gosto daqui, e queria mesmo morar perto da praia.

— Não mora com ninguém? - ela pergunta, me seguindo.

Balanço a cabeça, vou para a cozinha e abro a geladeira; as várias garrafas e potes na porta tilintam uns contra os outros.

— Não mais. Meu amigo Heath morou comigo por uns três meses quando me mudei pra cá, mas acabou indo pra Dallas morar com a noiva.

Antes de fechar a geladeira, pego uma garrafa de dois litros de Ginger Ale.

— Quer também? - Seguro a garrafa e mostro para ela. - Viu? Eu tenho alguma coisa além de refrigerante e cerveja na geladeira, e você viu que não passei aqui antes pra colocar.

Ela sorri com doçura e diz:

— Obrigada, mas não tô com sede agora. Você comprou isso pra quê? Ressaca, enjoo?

Sorrio para ela e tomo um gole do gargalo. Ela não fica horrorizada como eu esperava que ficaria.

— É, você me pegou - admito, tampando a garrafa. - Se quiser tomar banho - digo, saindo da cozinha e apontando para o corredor -, o banheiro fica logo ali; vou ligar pra minha mãe pra ela não ficar preocupada e dar uma arrumada aqui antes de tomar banho. Minha planta já deve ter morrido.

Camryn parece um pouco surpresa.

— Você tem uma planta?

Eu sorrio.

— Tenho, o nome dela é Georgia.

Suas sobrancelhas se erguem um pouco mais.

Eu rio baixinho e a beijo de leve nos lábios.

Enquanto Camryn está no chuveiro, vasculho cada centímetro visível do meu apartamento à procura de qualquer coisa incriminatória: meias nojentas, encardidas (achei uma no pé da cama), camisinhas (tenho uma caixa cheia no criado-mudo - eu a enfio no fundo do balde de lixo), embalagens abertas de camisinha (duas no cesto de lixo do meu quarto), mais roupa suja e uma revista de sacanagem (Puta merda! Tá atrás da privada - sem dúvida ela já viu).

Depois, lavo os poucos pratos sujos que deixei na pia antes de viajar e me sento na sala para ligar para a minha mãe.


CAMRYN


34

QUANDO VEJO A REVISTA de sacanagem atrás da privada, guardada tão casualmente como se fosse uma revista de motociclismo, não consigo deixar de rir para mim mesma. Fico me perguntando brevemente se existe algum homem no mundo que não usa pornografia, e então percebo como a pergunta é idiota. Eu não posso falar nada; já vi minha cota de vídeos pornôs na internet.

Tomo um banho demorado e quente, me enxugo com a toalha de praia que Andrew me deu e me visto.

Não gosto daqui. Do apartamento dele. Do Texas.

Em qualquer outra época e em outras circunstâncias, seria diferente, mas o que eu disse a ele naquela noite, quando paramos na beira da estrada, continua sendo verdade. Este lugar, tudo nele parece o fim. A magia do nosso tempo juntos na estrada literalmente quase evaporou com a chuva da semana passada. Não nossos sentimentos um pelo outro... não, eles são tão fortes que pensar no fim, de qualquer forma que seja, está me deixando metaforicamente de joelhos. O que sentimos um pelo outro é... bem, é tudo o que nos resta. A estrada à nossa frente se foi. As paradas espontâneas, às vezes sem saber onde estamos, mas se lixando pra isso, se foram. Os motéis e as pequenas coisas como carne-seca, óleo Johnson's e banho de espuma, tudo isso se foi. A trilha sonora do nosso tempo juntos, da nossa curta vida juntos, silenciou com o fim da última faixa do disco. Agora só consigo ouvir a vibração suave do silêncio saindo dos alto- falantes. Sinto que tudo o que quero é estender a mão e tocar tudo de novo, mas minha mão não se move para apertar o botão.

E eu não consigo entender por quê.

Enxugo a lágrima do meu rosto, empurro minhas emoções para os pulmões e as prendo ali, respirando fundo, antes de abrir a porta do banheiro.

Ouço Andrew falando ao telefone quando passo pela sala de jantar:

— Não fode comigo, Aidan. Não tô com saco pra essa merda. É, e daí? Quem é você pra me dizer o que fazer da minha vida? Quê? Dá um tempo, mano; ir a um enterro não é obrigatório. Por mim, prefiro nunca mais ir a nenhum, a não ser que seja o meu. Não sei pra que serve um funeral, aliás; ir ver alguém que você gosta deitado numa porra duma caixa, completamente sem vida. Prefiro que a última vez que eu veja alguém seja ainda com vida. Não me vem com essa, Aidan! Você sabe que é babaquice!

Não quero ficar num canto como se estivesse bisbilhotando, mas também não parece exatamente adequado entrar lá ainda.

Entro assim mesmo. Ele está ficando bravo demais, só quero acalmá-lo. Assim que ele me vê, baixa o tom zangado com Aidan e levanta as costas do sofá.

— Olha, preciso desligar - ele diz. - Já, já liguei pra mamãe. Sim. Tá, tudo bem, entendi. Até.

Ele desliga o celular e o deixa na mesa de carvalho de centro, ao lado de seu pé descalço.

Eu me sento ao lado dele na outra almofada.

— Desculpa por isso - ele diz, dando tapinhas na minha coxa e depois passando a mão nela. - Ele nunca mais vai me deixar em paz.

Eu me aproximo, me sento no colo de Andrew e ele me puxa para seu peito, como se eu fosse o que ele precisa para se acalmar. Abraço o seu pescoço, cruzando os dedos ao redor do seu ombro. Me curvando, beijo o canto de sua boca.

— Camryn. - Ele me olha nos olhos. - Escuta, também não quero que isto seja o fim — ele diz, como se tivesse lido meus pensamentos enquanto eu estava no banheiro, momentos atrás.

De repente, Andrew me levanta e me faz sentar reta no seu colo, de frente para ele, com uma perna de cada lado e os joelhos dobrados no sofá. Ele pega minhas mãos com as suas e me olha com seriedade e intensidade nos olhos.

— E se a gente... - Ele desvia o olhar, ponderando profundamente suas palavras, mas eu gostaria de saber se é porque ele quer dizer do jeito certo, ou talvez para não dizer nada.

— E se a gente o quê? - Tento motivá-lo. Não quero que ele recue, não importa o que seja; quero que ele diga. Sinto um sopro renovado de esperança e não aguento deixar que passe. - Andrew?

Seus olhos verdes e intensos param sobre os meus quando minha voz o traz de volta ao momento.

— E se a gente fosse embora juntos? - ele diz, e meu coração começa a bater mais forte. - Não quero ficar aqui. E não tô dizendo isso por causa do meu pai ou do meu irmão. Nada disso tem a ver com o que eu tô sentindo. Agora. Aqui com você. Com o que senti todo esse tempo, desde o dia em que te vi sentada sozinha naquele ônibus no Kansas. - Ele aperta mais a minha mão. - Sei que você perdeu teu parceiro no crime, mas... quero que você seja a minha parceira. Talvez a gente devesse viajar juntos pelo mundo, Camryn... Sei que não posso substituir teu ex...

Lágrimas correm dos meus olhos.

Andrew interpreta isso mal. Sua mão solta a minha, e de repente ele não consegue mais olhar para mim. Pego o seu rosto em minhas mãos, forçando seu olhar torturado.

— Andrew... - balanço a cabeça, com lágrimas escorrendo pelo rosto - ... sempre foi você - sussurro com voz rouca. - Mesmo com Ian, eu sentia que faltava alguma coisa. Te falei naquela noite no pasto; te falei que... - Minha voz some. Sorrio e digo: - Você é meu parceiro no crime. Já sei disso há muito tempo.

Beijo seus lábios.

— Não consigo pensar em nada neste mundo que eu queira mais do que conhecer o mundo com você. Nosso lugar é na estrada. Juntos. É onde quero estar.

Seus olhos estão rasos d'água, mas ele deixa seu sorriso luminoso afastar as lágrimas antes que caiam. E então esmaga minha boca com a sua, os dois segurando o rosto um do outro com as mãos. Seu beijo tira o meu fôlego, mas eu só o beijo mais, bebendo o máximo possível de seu hálito. E sem deixar de me beijar, suas mãos soltam meu rosto e ele aperta meu corpo, me colocando de pé com ele.

— Você precisa conhecer minha mãe hoje - ele diz, examinando meu rosto, olhando profundamente nos meus olhos.

Enxugo o resto das minhas lágrimas, fungando, e balanço a cabeça.

— Vou adorar conhecer tua mãe.

— Ótimo - ele diz, afastando-me do seu peito e me pondo no chão. - Vou tomar banho, vamos fazer umas coisas na cidade e depois visitá-la quando ela voltar do trabalho.

— Tá - concordo, sem tirar o sorriso do rosto.

Não conseguiria tirá-lo nem tentando.

Ele me olha por um longo momento, como se não quisesse se separar de mim nem o tempo de tomar banho, seus olhos sorridentes tão radiantes como os vi naquela noite depois da nossa apresentação no Old Point. Seu rosto transmite todo tipo de coisa que alguém que está incrivelmente feliz pode querer dizer, mas ele não diz nada.

Não precisa dizer.

Andrew finalmente sai do quarto para tomar banho e eu vou ver minhas mensagens de texto. Mamãe ligou, finalmente. Deixou uma mensagem na caixa postal, contando tudo sobre seu cruzeiro nas Bahamas, que acabou durando oito dias. Parece que ela está gostando de verdade desse Roger. Talvez eu precise passar em casa e ficar tempo suficiente para testar a personalidade dele no meu radar antibabacas, verificar se ele não cegou minha mãe com algo que disfarça os sinais de alerta: mais dinheiro que meu pai, um corpo mais sexy que o de Andrew - bom, isso não é muito provável - ou o tamanho do... Não sei ao certo como vou descobrir isso, a não ser perguntando diretamente pra minha mãe. Não vai rolar.

Meu pai também ligou. Disse que vai pra Grécia daqui a um mês em viagem de negócios e perguntou se quero ir com ele. Eu adoraria, mas sinto muito, papai, se eu for pra Grécia em algum momento do ano que vem, vai ser com Andrew. Sempre fui a menina do papai, mas todos precisam crescer um dia, e agora... agora sou a menina do Andrew.

Afasto essas fantasias do meu cérebro e volto a verificar as mensagens. Natalie finalmente ligou, em vez de ficar mordendo a língua, mandando mensagens. Sei que a esta altura ela está mais do que maluca para saber o que ando fazendo e com quem estou. Talvez eu já a tenha torturado o suficiente.

Hum... posso dar um aperitivo a ela.

Um sorriso maldoso se abre no meu rosto. Um aperitivo pode ser uma tortura ainda maior, mas é melhor do que nada.

Quando Andrew sai do chuveiro, andando pelo apartamento com uma toalha úmida no pescoço, eu o chamo na sala de estar. Ele fica ali, sem camisa: a coisa mais sexy que já vi na vida, com água escorrendo pelo seu tanquinho bronzeado. Quero lambê-lo, mas me contenho pelo bem de Natalie.

— Amor, vem cá - digo, chamando com um dedo -, quero mandar uma foto de nós dois pra Natalie. Ela tá me perguntando de você desde Nova Orleans, mas ainda não falei nada pra ela, nem o teu nome. Ela deixou uma mensagem na caixa postal. - Começo a apertar teclas no meu celular.

Ele ri, enxugando a nuca com a toalha.

— O que ela disse?

— Tá a ponto de explodir, praticamente. Quero mexer com a cabecinha dela.

As covinhas de Andrew ficam mais fundas.

— Demorou, eu tô dentro. - Ele desaba no sofá e me puxa junto.

Tiro algumas fotos de nós dois: uma com os dois só olhando para a câmera, outra dele me dando um beijo estalado na bochecha e outra dele olhando para a câmera, sedutor, com a língua saindo do canto da boca, lambendo o meu rosto.

— Esta ficou perfeita - digo, escolhendo a terceira foto, empolgada. - Ela vai surtar. Prepare-se; o Texas pode ser atingido pelo Furacão Natalie quando ela receber esta foto.

Andrew ri e me deixa no sofá, mexendo no celular.

— Vou ficar pronto daqui a uns minutos - ele diz, saindo da sala.

Anexo a foto à mensagem e digito:

 

Aqui estamos, Nat, em Galveston, Texas : - )

 

E então aperto send. Ouço Andrew zanzando pelo apartamento. Começo a me levantar para espiá-lo quando, menos de um minuto depois que mandei a foto, Natalie me responde:

 

PQP! Vc tah dormindo com Kellan Lutz?!?!!!!?

 

Caio na risada. Andrew aparece no canto, infelizmente vestindo uma camisa desta vez, prendendo a parte da frente no cinto. E ele já trocou a bermuda por um jeans.

— Quê? Ela já respondeu? - Ele parece achar certa graça.

— Já - digo, ainda rindo -, eu sabia que não ia demorar.

Mais mensagens começam a aparecer em sequência rápida, como se uma máquina as estivesse disparando na outra ponta:

Cam, PQP, ele é um FILÉ, cacete! Que porra??? Me liga. Tipo JÁ!!!!!!!!!!

CAMNRYN MARTYBETH BENNETT! É melhor tu me ligar!!

Tô mordendo aqui!!!

Eu quis dizer MORDENDO

GRRR!!!!!

PORRA DE CORRETOR ORTOGRÁFICO! Odeio esta bosta de celular.

MORRENDO, não mordendo!!

 

Não consigo parar de sorrir. Andrew aparece atrás de mim e tira o celular da minha mão.

Ele ri lendo as tontices dela.

— Essa garota é alfabetizada? - ele pergunta. - Quem é Kellan Lutz, cacete? Ele é feio? - Andrew me olha com uma ponta de medo nos olhos.

Não... hãã, pra feio ele não serve.

— É só um ator - tento explicar. - E não, não é. Nem esquenta, Natalie sempre, mas sempre compara todo mundo com algum famoso, geralmente exagerando muito. - Pego o celular de volta enquanto ele está parcialmente absorto pela minha explicação e o deixo no sofá. - Nós duas fomos colegas de Shay Mitchell e Hayden Panettiere, Megan Fox foi a rainha do baile, e Chris Hemsworth, o rei. - Estalo a língua. - E tinha a arqui- inimiga de Natalie, uma líder de torcida que tentou roubar Damon dela no colegial; Natalie dizia que ela era a versão vadia de Nina Dobrev; nenhum deles se parecia muito com nenhum desses famosos, não muito, pelo menos. Natalie é... esquisita.

Andrew balança a cabeça, sorrindo.

— Bom, ela é uma figura, já deu pra ver.

Ainda ouvindo meu celular vibrando sobre o sofá, eu o ignoro e ando até Andrew, passando os braços em sua cintura.

— Tem certeza que quer fazer isso comigo?

Ele me olha nos olhos, pondo suas mãos nas minhas bochechas.

— Nunca tive mais certeza de alguma coisa na minha vida, Camryn.

E então ele começa a andar de um lado para outro.

— Sempre senti um... um... - Seus olhos estão intensos, concentrados - ... um buraco... tipo, não era um buraco vazio, sempre tinha alguma coisa dentro dele, mas nunca era a coisa certa. Nunca se encaixava. Fiz faculdade por um tempo, até que um dia falei pra mim mesmo: Andrew, que porra você tá fazendo aqui? E aí caiu a ficha: eu não estava lá porque era o que eu queria, estava lá porque era o que as pessoas esperavam, até pessoas que não conheço, a sociedade. É o que as pessoas fazem. Elas crescem, vão pra faculdade, arrumam um emprego e fazem a mesma coisa todo dia pelo resto da vida, até que ficam velhas e morrem, como você explicou naquela noite, quando me contou teus planos com teu ex. - Ele move a mão direita como se estivesse dando um tapa no ar. - A maioria das pessoas nunca vê nada além do lugar onde cresceu. - Ele está andando mais rápido, parando de vez em quando para enfatizar uma palavra ou uma ideia importante. Mal olha para mim; parece estar dizendo essas coisas mais para si próprio, como se um rio de respostas que ele procurou a vida toda estivesse finalmente inundando sua mente, e ele estivesse tentando absorver todas de uma vez. - Nunca fiquei feliz fazendo nada...

Finalmente, ele olha para mim.

— E aí conheci você... e foi como se alguma coisa disparasse na minha cabeça, ou acordasse, n-não sei, mas... - Ele para na minha frente de novo. Quero chorar, mas não choro. - Mas eu sabia que, fosse o que fosse, era o certo. Encaixava. Você se encaixa.

Fico na ponta dos pés e beijo seus lábios. Há tantas coisas que quero dizer, mas estou esmagada por todas elas e não consigo escolher.

— Acho que preciso fazer a mesma pergunta pra você - ele diz. - Tem certeza que você quer fazer isso?

Meus olhos sorriem para ele com ternura.

— Andrew, isso não é nem uma pergunta - respondo. - Sim!

Andrew abre um sorriso tão brilhante para mim que seus olhos verdes diabolicamente sexy cintilam.

— Então é oficial - ele diz -, vamos partir amanhã. Tenho um dinheiro no banco que vai dar pra gente se virar por uns tempos.

Balanço a cabeça, sorrio e digo:

— O dinheiro que tenho no banco não foi ganho com o meu trabalho, e por causa disso sempre gastei com moderação, mas pra fazer isso vou usar cada centavo, e quando ele acabar...

— Antes que o nosso dinheiro fique perto de acabar - ele interrompe -, a gente vai trabalhar na estrada, como você falou antes. Podemos tocar em clubes, bares e feiras- livres. - Ele ri alto com a ideia, mas está falando sério. - E a gente pode até trabalhar em bares e restaurantes, cozinhando, lavando louça e servindo mesas e... sei lá, mas vamos pensar em alguma coisa.

Tudo parece um sonho louco que fugiu do controle, mas nenhum dos dois se importa. Estamos vivendo o momento.

— É, trabalhar antes que o dinheiro acabe é um plano melhor, com certeza - concordo, ficando vermelha. - Não quero virar mendiga, dormir atrás de caçambas de lixo ou ficar parada numa esquina com uma plaquinha dizendo: Trabalho em Troca de Comida.

Andrew ri e aperta meus ombros com as mãos.

— Não, a gente nunca vai chegar a esse ponto. Vamos trabalhar sempre, mas não por muito tempo num lugar só, e nunca fazendo a mesma coisa toda vez.

Olho nos seus olhos por um momento e passo os braços no seu pescoço, beijando-o apaixonadamente.

Então ele pega a chave.

— Vem - diz, jogando a cabeça para trás e estendendo a mão para mim. Eu a seguro.

— Vamos começar pelo princípio: preciso dar uma olhada na minha máquina. Ela deve estar sentindo a minha falta!

Revistas de sacanagem e um carro tratado como uma mulher!

Balanço a cabeça, rindo baixinho, enquanto ele me puxa para a porta. Pego minha bolsa do chão e nós saímos.


35

NOSSA PRIMEIRA PARADA é o lugar onde Andrew deixou seu Camaro 1969, e eu vejo meu primeiro texano estereotipado quando paramos na oficina onde Andrew aparentemente costumava trabalhar.

— Cê sabe que eu te demiti, né? - diz um homem alto de chapéu e botas pretas de caubói, saindo para nos receber. Ele estava dentro da oficina, falando com outro homem que tem mais cara de mecânico.

Ele aperta a mão de Andrew e o puxa para um abraço de macho, batendo em suas costas.

— Sei, sim - Andrew diz, batendo nas dele -, mas tive que fazer o que eu tinha que fazer.

Andrew se vira para mim.

— Billy, esta é minha namorada, Camryn. Camryn, este é meu ex-chefe, Billy Frank.

Meu coração pulou quando ele me chamou de sua namorada. Ouvir isso com certeza teve um efeito maior sobre mim do que eu imaginava que poderia ter.

Billy estende uma mão suja de óleo e calejada e eu a aperto sem hesitação.

— Prazer em conhecer você. - Sorrio.

Ele sorri também; seus dentes são tortos e amarelados, provavelmente por muitos anos de vício em café e cigarro.

— Mas que belezinha - Billy diz, sorrindo para Andrew. - Eu também largava meu emprego por uma garota assim. - Ele dá um soco amigável no braço de Andrew. Voltando a me olhar, ele pergunta: - Ele tá te tratando direito? Esse moleque tem uma língua, que se ele morder morre envenenado.

Rio baixinho e digo:

— É, a língua dele é fogo. Mas ele me trata maravilhosamente.

Os olhos de Andrew sorriem para mim ao meu lado.

— Bom, se ele te der trabalho, já sabe onde me encontrar. Ninguém aqui consegue botar esse cara nos eixos como eu. - Ele sorri para Andrew.

— Obrigada, vou me lembrar disso.

Deixamos Billy Frank, atravessamos a oficina e saímos por uma porta lateral que leva a uma área cercada onde ficam os carros. Sei imediatamente qual é o de Andrew, embora jamais o tenha visto, a não ser camuflado no tronco da árvore da tatuagem dele. É o mais bonito de todos. Cinza-escuro com duas faixas pretas no meio do capô. É bem parecido com o Chevelle do pai dele. Andamos por um labirinto de carros e ele abre a porta do motorista, depois de verificar a lataria dos dois lados, da frente até a traseira.

— Se ela não estivesse precisando de alguns consertos quando decidi não ir de avião pra Wyoming - Andrew diz, correndo os dedos pela porta -, eu teria ido dirigindo, em vez de pegar aquele ônibus.

— Bom, não quero falar mal da tua garota aqui - digo, sorrindo e dando tapinhas no capô -, mas fico feliz por ela não ter podido te levar.

Andrew me olha com o rosto iluminado, da mesma forma que o vejo cada vez mais todo dia.

— Também fico feliz - ele diz.

Por um breve momento, penso onde nós dois estaríamos agora se isso tivesse acontecido, se nunca tivéssemos nos conhecido. Mas um momento breve já é tempo demais, porque pensamentos assim me embrulham o estômago. Não consigo imaginar não tê-lo conhecido. Nem quero.

— Então a gente vai nesse, não no Chevelle?

Andrew morde a bochecha por dentro, pensativo. Ele fica na frente da porta aberta, com a palma da mão no teto do carro, dá um tapinha leve e olha para mim.

— O que você acha? O que você prefere, gata?

É minha vez de morder a bochecha por dentro contemplativamente. Eu não achava que seria eu a decidir. Chego mais perto do carro e olho para dentro, verifico os bancos esportivos de couro e... bem, é a única coisa que verifico.

— Sinceramente? - pergunto, cruzando os braços.

Ele balança a cabeça.

Olho para o Camaro novamente, ponderando a questão.

— Eu meio que gosto do Chevelle - digo. - Adoro este carro, é muito irado, mas acho que tô mais acostumada com o outro. - Para reforçar meu argumento, aponto para os bancos. - E como vou deitar a cabeça no teu colo, ou dormir na frente, com bancos assim?

Andrew sorri delicadamente e acaricia o teto do carro, como que para lhe garantir que não é nada pessoal. Ele dá mais um tapinha e fecha a porta.

— Então a gente vai de Chevelle - diz. - Mais tarde venho buscar esta caranga e deixar em casa.

Andrew me leva para comer fora e para alguns lugares variados que ele gosta de frequentar em Galveston Island. E então, depois do horário de pico, recebe um telefonema da sua mãe.

— Tô nervosa - digo do lado do passageiro, quando nos aproximamos da casa dela.

Ele franze as sobrancelhas, me olhando de alto a baixo, e diz:

— Não precisa; minha mãe vai adorar você. - Ele volta a olhar para a estrada. - Ela não é uma daquelas peruas de nariz empinado que acham que mulher nenhuma serve pro filho delas.

— Que alívio.

— E até se fosse - ele diz, sorrindo para mim -, ia adorar você do mesmo jeito.

Dobro as mãos no colo e sorrio. Não importa; ele pode dizer quanto quiser que ela é um doce, não vai ajudar nada a acalmar essa sensação nervosa no meu estômago.

— Você vai contar pra ela? - pergunto.

Ele olha para mim.

— O que, que a gente vai embora?

— É.

Ele balança a cabeça.

— Vou contar, senão ela vai se preocupar tanto comigo que vai precisar fazer terapia.

— O que você acha que ela vai dizer?

Andrew dá uma risadinha.

— Eu tô com 25 anos, gata. Moro sozinho desde os 19. Ela vai ficar bem.

— Bom, só tô falando... sabe... do motivo de você ir embora e do que a gente pretende fazer exatamente. - Desvio o olhar para o para-brisa. - Não é como fazer as malas e se mudar pra outra cidade; até minha mãe aguentaria essa notícia. Mas se eu contasse pra ela que pretendo viajar pra todo lugar e que vou fazer isso com um cara que conheci num ônibus, provavelmente ela ia ficar meio bolada.

— Provavelmente? - Andrew pergunta. - Tipo, se você contar?

Olho para ele.

— Não, eu vou contar, com certeza. Como você, também acho que ela precisa saber... mas, Andrew, você entendeu o que eu quis dizer.

— Entendi, sim, gata - ele diz, dando seta para a esquerda e virando num semáforo.

— E você tá certa; não é exatamente normal. - Então ele abre um sorrisão para mim, e isso instantaneamente me faz sorrir também. - Mas esse não é um dos motivos pra gente querer fazer isso? Porque não é normal?

— É, sim.

— Claro que o maior motivo é quem vai me acompanhar - ele acrescenta.

Eu fico vermelha.

Mais duas quadras de casas aconchegantes e suburbanas e calçadas brancas com crianças pedalando suas bicicletinhas e chegamos à entrada da casa da mãe de Andrew. É uma casa térrea, com um belo jardim florido ao redor de toda a fachada, e dois arbustos verdejantes dos dois lados da calçada que vão até a porta. O Chevelle ronrona ao entrar, parando atrás de um carro de família branco de quatro portas, estacionado dentro da garagem escancarada. Eu me olho rapidamente no retrovisor para me certificar de que não estou com meleca no nariz ou alface nos dentes, do sanduíche de frango que comi, e Andrew dá a volta e abre a porta para mim.

— Ah, saquei - brinco com ele. - Você só abre a porta do carro pra mim quando a mamãe pode estar olhando.

Ele estende a mão e faz uma reverência dramática.

— Vou abrir a porta pra você de agora em diante, se você gosta dessas coisas, milady... mas... - ponho minha mão na dele, sorrindo para o espetáculo - ... não pensei que você fosse desse tipo.

— Ah, é? - digo, com um sotaque britânico horrível, erguendo mais o queixo. - E que tipo pensou que eu fosse, sr. Parrish?

Ele fecha a porta e passa o braço pelo meu, mantendo as costas eretas e o queixo erguido.

— Pensei que você fosse do tipo que tá se lixando, contanto que a porta abra quando você quer sair.

Eu rio.

— Bom, você acertou - digo, e me encosto no ombro dele enquanto vamos para a porta dentro da garagem.

A porta se abre para a cozinha e o cheiro de carne de panela. Eu penso: ela já teve tempo pra fazer carne de panela? Mas então vejo a panela elétrica com timer sobre o balcão. Andrew dá a volta no balcão comigo e entra na sala de estar, quando uma bela mulher de cabelo grisalho surge de um corredor.

— Que bom que você chegou - ela diz, abraçando-o forte, praticamente esmagando-o com seu corpinho. Andrew deve ser uns 8 centímetros mais alto que ela. Mas vejo a quem ele puxou os olhos verdes e as covinhas.

Ela sorri para mim do jeito mais acolhedor do mundo e, para minha surpresa, me abraça também. Retribuo o abraço, apertando meus braços na vertical nas costas dela.

— Você deve ser Camryn - ela diz. - Sinto que já conheço você.

Isso me parece estranho. Eu nem sabia que ela existia até hoje. Olho disfarçadamente para Andrew e seus lábios se curvam num sorriso furtivo. Acho que ele teve muitas oportunidades de falar de mim enquanto estávamos na estrada, especialmente antes de ficarmos no mesmo quarto, mas o que mais me surpreende é saber que ele falou tanto de mim para ela.

— Prazer em conhecê-la, senhora... - Arregalo os olhos quando me viro para Andrew para informá-lo que vou chutar sua canela mais tarde, por ele não ter me dito o nome da mãe dele antes. Aperto os lábios, furiosa, mas ele continua apenas sorrindo.

— Pode me chamar de Marna - ela diz, abaixando os braços e segurando minhas mãos. Ela levanta minhas mãos com as dela, sempre me olhando com aquele sorriso radiante. - Vocês já jantaram? - ela pergunta, olhando para Andrew e depois para mim.

— Sim, mãe, a gente comeu alguma coisa mais cedo.

— Ah, mas vocês precisam comer. Fiz carne de panela e uma caçarola de vagem. - Ela solta só uma das minhas mãos, mantendo a outra delicadamente apertada na sua, e a sigo para outra sala, onde uma TV gigante está montada em cima de uma lareira. - Podem sentar que vou fazer um prato pra vocês.

— Mãe, ela não tá com fome, pode acreditar.

Andrew aparece atrás de nós.

Minha cabeça já está rodando um pouco. Ela sabe de mim, aparentemente o suficiente para sentir que já me conhece. É tão gentil e cheia de sorrisos como se já me amasse. Sem falar que segurou minha mão, não a de Andrew, para me levar pela casa. Será que perdi alguma coisa, ou ela é a pessoa mais doce e de personalidade mais encantadora do planeta? Bem, seja como for, sinto o mesmo por ela.

Ela me olha e inclina a cabeça para um lado, esperando que eu diga algo. Fico um pouco constrangida, porque não quero magoá-la, e digo:

— Obrigada pelo convite, mas acho que não consigo comer nada agora.

Seu sorriso se abranda.

— Bom, então que tal uma bebida?

— Perfeito; tem chá?

— Claro - ela diz. - Com açúcar, sem, sabor limão, pêssego, framboesa?

— Só com açúcar está ótimo, obrigada.

Eu me sento na almofada do meio do sofá cor de vinho.

— Querido, você quer o quê?

— O mesmo de Camryn.

Andrew se senta ao meu lado, e antes de sair e voltar para a cozinha, ela nos olha por um momento, sorrindo, como se estivesse pensando alguma coisa em silêncio. E então desaparece.

Eu me viro rapidamente para Andrew e cochicho:

— O que você falou de mim pra ela?

Andrew sorri.

— Nada de mais - ele diz, tentando parecer casual, mas sem conseguir. - Só que conheci uma garota doce e inimaginavelmente sexy, boca-suja e que tem uma pintinha na parte de dentro da coxa esquerda.

Dou um tapa na perna dele. Seu sorriso só aumenta.

— Não, gata - ele diz, falando sério agora -, só falei pra ela que te conheci no ônibus e que a gente tá junto desde então. - Ele passa a mão na minha coxa para me reconfortar.

— Parece que ela gosta demais de mim pra você ter contado só isso.

Andrew dá discretamente de ombros, e então sua mãe volta para a sala com dois copos de chá. Ela os coloca à nossa frente na mesinha de centro. O vidro dos copos é decorado com pequenos girassóis amarelos.

— Obrigada - digo e tomo um gole, pousando o copo de volta delicadamente. Procuro um descanso de copo sobre a mesinha para apoiá-lo, mas não há nenhum.

Ela se senta na poltrona que faz jogo com o sofá à nossa frente.

— Andrew falou que você é da Carolina do Norte.

Ahan... foi só isso que ele contou, o caramba! Posso sentir que ele está rindo por dentro; consigo até ouvir. Ele sabe que não posso fuzilá-lo com o olhar, nem lhe dar um tapão, nem fazer nada que normalmente eu faria. Apenas sorrio como se ele não estivesse sentado ao meu lado.

— Sim - respondo. - Nasci em New Bern, mas morei quase a vida toda em Raleigh.

— Eu tomo outro gole.

Marna cruza as pernas e dobra as mãos com anéis no colo. Suas joias são simples, só dois aneizinhos em cada mão, brincos pequenos de ouro e um colar combinando por cima dos botões de sua blusa branca.

— Minha irmã mais velha morou em Raleigh por 16 anos antes de voltar pro Texas, o estado de vocês é lindo.

Apenas concordo com a cabeça e sorrio. Acho que era um assunto só para quebrar o gelo, porque fica um silêncio embaraçoso no ar agora, e noto que ela olha muitas vezes de relance para Andrew. E ele não diz nada. O silêncio está me dando uma sensação estranha, como se eu fosse a única pessoa presente que não sabe o que os outros estão pensando.

— Então, Camryn - Marna diz, tirando os olhos de Andrew -, aonde você estava indo quando conheceu Andrew?

Que legal; eu não esperava isso. Não quero mentir, mas a verdade não é exatamente algo que possa ser mencionado casualmente ao tomar chá com alguém que você acaba de conhecer.

Andrew toma um grande gole de chá e põe o copo sobre a mesa.

— Ela tava mais ou menos no mesmo barco que eu - ele responde por mim, e fico muda com o choque. - Eu tava fazendo hora na estrada, Camryn tava a caminho do nada, e por coincidência fomos parar no mesmo lugar.

Os olhos de Marna se iluminam de curiosidade. Ela inclina o queixo para um lado, olha primeiro para mim, depois de novo para Andrew, depois para nós dois. Há algo meigo, mas muito misterioso em seu rosto, e não o ceticismo confuso que eu esperava.

— Bom, Camryn, quero que saiba que fico muito feliz que vocês tenham se conhecido. Parece que sua companhia ajudou Andrew a enfrentar momentos muito difíceis.

Seu sorriso luminoso perde um pouco o brilho depois desse comentário, e de soslaio percebo que Andrew a olha cautelosamente. Pelo jeito ela já falou o suficiente, ou talvez ele tema que ela vá dizer alguma coisa constrangedora na minha frente.

Me sentindo um pouco desconfortável por ser a única que obviamente não tem todas as informações, forço um sorrisinho só para o benefício da mãe de Andrew.

— Bem, a gente se ajudou muito, pra ser sincera - digo, sorrindo mais agora, porque estou dizendo a verdade.

Marna bate de leve nas coxas com as palmas das mãos, abre um sorriso feliz e se levanta.

— Preciso dar um telefonema - ela diz, gesticulando. - Esqueci completamente de avisar Asher sobre a moto que ele quer comprar do sr. Sanders. Melhor ligar pra ele antes que eu me esqueça de novo; me deem licença um minutinho.

Seus olhos pousam discretamente em Andrew antes que ela saia da sala. Eu vi, com certeza nenhum dos dois acha que não sei que mais alguma coisa está acontecendo que eu obviamente não tenho como saber. Não sei se ela não gostou de mim e está disfarçando para não deixar Andrew constrangido, ou se é algo completamente diferente. Isso está me deixando louca, e não estou mais tão calma quanto fiquei ao conhecê-la.

E para confirmar, alguns segundos depois que ela sai da sala, Andrew se levanta.

— O que tá acontecendo? - pergunto baixinho.

Andrew olha para mim e sinto que ele sabe que não vou ignorar isso eternamente. Ele tem plena consciência de que fui mais observadora do que ele gostaria que eu fosse.

Seus olhos examinam meu rosto, mas ele não sorri, apenas me olha como alguém olha para uma pessoa antes de se despedir dela. Então ele se curva e me beija.

— Não tá acontecendo nada, gata - ele diz, decidindo agora ser o Andrew sorridente e brincalhão que conheço tão bem, mas não engulo isso.

Sei que ele está mentindo, e de jeito nenhum vou deixar passar. Vou relevar por enquanto, enquanto estamos aqui, mas depois é outra história.

— Volto já - ele diz, e sai por onde sua mãe saiu.


ANDREW


36

ACHO QUE EU NÃO deveria ter trazido Camryn aqui, porque ela é esperta, e eu sabia que ela iria detectar a menor flutuação na conversa. Mamãe também não dificultou muito as coisas para Camryn. Mas este encontro entre as duas é importante, e fiz o que eu tinha que fazer.

Atravesso a sala e o corredor até o quarto da minha mãe. Ela está de pé, me esperando ali. Chorando.

— Mãe, não faz isso, por favor. - Eu a abraço, segurando sua nuca com a mão.

Ela funga, tosse e tenta parar de chorar.

— Andrew, por favor, vá falar com ele e...

— Mãe, não. Escuta. - Eu a afasto com cuidado do meu peito e olho para ela, segurando-a pelos ombros. - Já passou tempo demais. Adiei demais e você sabe disso. Admito que devia ter ido há oito meses, mas não fui, e agora é tarde demais.

— Você não tem certeza. - Lágrimas correm pelo seu rosto.

Abrando minha expressão, mas sei que ela não vai me ouvir, por mais que eu tente ser convincente.

— Tá pior agora - digo. - Olha, só queria que você conhecesse Camryn. Ela é muito importante pra mim. Vocês duas são muito importantes pra mim, e acho que precisam se conhecer...

Minha mãe põe a mão diante do meu rosto e gesticula para mim.

— Não consigo falar disso - diz com voz sufocada -, não consigo e pronto. Vou fazer o que você quiser e, filho, já adoro a menina. Já percebi que ela é maravilhosa. Consigo ver que ela é diferente de todas as garotas com quem você se envolveu. E ela é importante pra mim, não só porque é importante pra você, mas por causa de tudo que ela te deu.

— Obrigado - digo, tentando não chorar também.

Minhas mãos caem dos seus ombros.

Mexo no meu bolso de trás, tiro um envelope dobrado e ponho nas mãos relutantes da minha mãe. Eu beijo sua testa.

Ela se recusa a olhar para o envelope. Para ela, é algo final. Para mim, diz todas as coisas que não vou conseguir dizer.

Minha mãe balança a cabeça e mais lágrimas vertem dos seus olhos. Ela deixa o envelope sobre a penteadeira e pega um lenço de papel de uma caixa perto da cama. Enxugando as lágrimas da face e fungando, ela tenta se recompor antes de voltar para a sala de estar e ver Camryn.

— Por que você não conta pra ela, Andrew? - minha mãe diz, se virando para me olhar da porta do quarto. - Você devia avisar, pra vocês dois poderem fazer as coisas que sempre quiseram fazer antes que...

— Não posso - digo, e minhas próprias palavras abrem um buraco em meu peito. - Quero que tudo aconteça normalmente, e não forçado a acontecer antes por causa de outra coisa.

Ela não gosta da minha resposta, mas entende.

Saímos juntos do quarto, e ela está sorrindo o quanto pode, por Camryn, quando voltamos para a sala de estar.

Camryn conserva o sorriso também, mas está estampado em seu rosto que ela sabe que minha mãe chorou.

Mamãe anda até Camryn, e ela instintivamente se levanta.

— Desculpe por ter que abreviar esta visita - minha mãe diz, abraçando Camryn -, mas Asher acabou de me dar uma má notícia sobre um parente. Espero que você entenda.

— Claro - Camryn diz, com o semblante endurecido pela preocupação. Ela olha rapidamente para mim. - Lamento ouvir isso. Espero que a senhora fique bem.

Minha mãe balança a cabeça e força um sorriso em seus olhos lacrimejantes.

— Obrigada, querida. Diz pro Andrew trazer você quando quiser, você é sempre bem- vinda aqui.

— Obrigada - Camryn diz baixinho, e resolve abraçar minha mãe de novo.

— Andrew, o que foi tudo aquilo? - ela pergunta antes mesmo que eu feche a porta do carro.

Suspiro e viro a chave na ignição.

— É só briga de irmão - digo, tentando não olhar para ela ao meu lado. Dou a partida e engato a ré. - Mamãe fica nervosa quando Aidan e eu brigamos.

— Você tá mentindo.

Estou, e vou continuar mentindo.

Olho rapidamente para ela e dou ré para a rua.

— Ela só não quis envolver você - digo, e o resto da mentira começa a se formar. - Mas é por causa do enterro do meu pai. Viu como ela não falou disso na tua frente? Me levou pro quarto dela pra conversar pra te poupar.

Ela ainda não está acreditando totalmente, mas posso ver que está começando.

— Então que papo foi aquele de uma má notícia sobre um parente?

— Não tem má notícia nenhuma - digo. - Ela só queria falar comigo, aí contei pra ela que briguei com Aidan por telefone antes de a gente sair do apartamento, e ela ficou chateada.

Camryn suspira e olha pela janela.

— Minha mãe gostou de você de verdade.

Ela olha para mim. De início, tenho a sensação de que quer continuar falando de Aidan, mas ela deixa quieto.

— Bom, ela é um doce de pessoa - Camryn diz. - Você e Aidan (ela diz o nome dele com ênfase, como se não acreditasse totalmente na minha mentira) deviam tentar conviver melhor, pra não deixá-la tão triste.

Mesmo fora de lugar, é um bom conselho.

— Amor, olha, desculpa; talvez eu devesse ter esperado mais pra te trazer pra conhecê-la.

— Tudo bem - ela diz, e desliza para o meu lado. - Fiquei feliz por você ter me trazido. Me senti... especial.

Acho que agora ela acredita em mim, ou talvez esteja apenas tentando empurrar o pressentimento para o fundo de sua mente, porque se deu conta de que não vou revelar a verdade tão cedo.

Passo o braço ao redor dela.

— Mas você é especial.

Ela deita a cabeça no meu peito.

— Você não contou pra ela que a gente vai partir amanhã.

— Eu sei, mas vou contar. Posso ligar pra ela hoje à noite e contar. - Eu a aperto de leve. - Agora que ela já te conheceu e se apaixonou, acho que vai ficar menos preocupada por eu estar fazendo algo tão anormal.

Camryn enfia a mão entre as minhas coxas e sorri para mim.

— E agora só falta eu contar pra minha mãe. - Ela ergue o corpo de repente, como se tivesse acabado de ter uma ideia. - Posso deixar pra contar quando a gente passar pela Carolina do Norte, aí a gente faz uma visita e eu te apresento.

Seus olhos azuis estão radiantes em seu rosto sorridente.

Sorrio também e balanço a cabeça.

— Quer levar alguém como eu pra tua casa e me apresentar pra tua mãe? E se ela bater o olho nas minhas tatuagens e te proibir de ficar comigo? - eu brinco.

— Sem chance - ela diz, rindo um pouco. - É mais fácil ela se apaixonar por você.

— Uau, vou traçar uma loba!

Seus olhos praticamente saltam das órbitas, e eu jogo a cabeça para trás, gargalhando.

— Amor, tô brincando!

Ela rosna para mim e respira fundo, irritada, mas também não consegue disfarçar muito bem seu bom humor.

— Ei, você já... bem...?

Ela não consegue dizer isso em voz alta, e eu acho hilário.

— Se já transei com uma mulher mais velha? - digo com um sorrisinho.

Esse assunto é claramente constrangedor para Camryn, mas foi ela que perguntou, portanto, estou completamente livre para torturá-la com isso o máximo possível.

— Já, sim.

Ela vira a cabeça bruscamente e arregala os olhos mais ainda do que antes.

— Transou nada!

Rio ao mesmo tempo que confirmo:

— Transei, sim.

— Qual a idade dela? Ou... delas? - Ela inclina a cabeça, mas sem mover os olhos.

O plural parece um território perigoso, de repente, mas quero ser completamente sincero com ela. Bom, pelo menos sobre esses assuntos...

Ponho a mão na perna dela.

— Foram poucas vezes. Uma tinha uns 38 anos, que pra mim não é muito diferente de 28. Mas também dormi com uma mulher de uns 43.

O rosto de Camryn está quente de tão vermelho, mas ela não está com ciúmes ou zangada. Mas acho que pode estar um pouco... preocupada.

— E do que você gosta mais? - ela pergunta, muito cautelosamente.

Tento não sorrir.

— Amor, a questão não é a idade - admito. - Tipo, não curto vovozinhas, nada disso, mas acho que dá pra foder qualquer mulher, por mais velha que seja, se ela conseguir se manter gostosa.

— Ai meu Deus! - Camryn ri. - Depois eu é que sou boca-suja!

Ela se recupera do choque do que eu disse e insiste:

— Você não respondeu à minha pergunta.

— Tecnicamente, respondi - retruco, para bagunçar mais um pouco a cabecinha dela.

— Você perguntou do que gosto mais, e não há uma resposta definitiva para a sua pergunta, apenas generalidades.

Sei exatamente o que ela quis perguntar, e tenho certeza de que ela sabe disso. Mas nunca perco uma oportunidade de vê-la se retorcer.

Ela estreita os olhos para mim.

Eu rio e finalmente abro o jogo.

— Amor, você é a melhor transa que já tive - digo, e ela estufa os lábios como quem diz: Ah, tá, você só diz isso porque sou a mais recente. - E tô falando sério, Camryn. Não tô tentando encher tua cabeça só porque você tá comigo agora, pra valorizar meu patrimônio.

Ela sorri e revira os olhos, mas agora acredita no que eu disse. Eu a puxo mais para perto de mim, e ela fica feliz em deitar a cabeça de novo no meu peito.

— Você é a melhor transa que já tive porque com você consegui uma coisa que nunca consegui de nenhuma outra garota.

Ela vira a cabeça para cima para me olhar, esperando para saber o que seria isso.

Sorrio para ela e digo:

— Eu desvirginei tua inocência, te deixei mais à vontade com tua sexualidade. E isso me enche de tesão.

Camryn ergue o corpo e beija meu queixo.

— Você só gosta de mim por causa daquele boquete na estrada.

Olho para cima e sorrio.

— Bom, eu gostei muito, muito, muito daquele boquete, mas não, amor, não gosto de você só por causa disso.

Acho que Camryn finalmente se sente justificada de novo. Ela ajeita a cabeça no meu peito e me aperta, passando o braço direito sobre a minha barriga.

Não dizemos nada o resto do caminho até meu apartamento. Sinto que o silêncio dela é menos sombrio do que o meu. Mas não quero que ela se preocupe nem sofra. Agora não. Nem nunca. É inevitável, mas quero adiar isso o máximo possível.

Passamos quatro horas vendo filmes na sala de estar, os dois espalhados no sofá. Eu a seguro em meus braços e a beijo enquanto ela tenta prestar atenção numa cena importante, e enfio a língua no seu ouvido só para que ela grite o quanto é nojento. Ela fica tão lindinha quando está com nojo, portanto, é culpa dela se faço isso toda hora. Jogamos pipoca um na boca do outro e marcamos o placar. Ela ganha de mim por 6 a 4 antes de desistirmos e começarmos a comer a pipoca, em vez de brincar com ela. E eu a apresento à minha planta, Georgia, que não morreu na minha ausência. Camryn me contou de um vira-lata que ela adotou de um abrigo para animais e batizou de BeeBop, e eu digo o quanto sinto pena do cachorrinho por ter recebido um nome tão besta. Por coincidência, BeeBop morreu de insuficiência cardíaca congestiva, como meu cachorro e melhor amigo, Maximus. Mostrei fotos dele, e ela tinha uma sua junto com BeeBop, também. O bicho era tão feio que chegava a ser bonitinho.

Falamos por horas e horas, até que ela sobe no meu colo no sofá, ficando a cavalo sobre mim. Ela encosta o corpo no meu e diz, tão baixinho que minhas entranhas tremem:

— Vamos pra cama...

Levanto com as pernas dela ainda em volta da minha cintura, segurando sua bunda com as mãos, e a carrego para o quarto. Tiro toda a roupa e me deito no meio da cama. Eu já estava de pau duro antes de trazê-la para cá. E fico vendo Camryn se despir lentamente na minha frente, tirando não só a roupa, mas também seu semblante normalmente tímido. Ela sobe em cima de mim do pé da cama e se posiciona no meu colo, até sentir que estou encaixado no meio de seus lábios quentes. Ela não tira os olhos de mim enquanto se curva para aproximar sua boca da minha, beijando meu peito e lambendo ao redor dos meus mamilos. Mantenho o calor de suas coxas nas minhas mãos até que ela me beija e eu passo a apertar seus seios.

— Você é tão gostosa - murmuro perto de sua boca, pouco antes que ela tire meu fôlego com um beijo.

Eu a forço de leve embaixo, e ela corresponde à pressão um pouco mais, me provocando e me fazendo querer meter fundo dentro dela. Mas agora é ela que está no controle, e eu deixo de bom grado.

Ela interrompe o beijo e beija um lado do meu pescoço e depois o outro, sempre mexendo seus quadris tão lentamente que meu desejo aumenta mais e mais.

— Quero te deixar molhada antes - sussurro para ela, segurando com força sua bundinha. Ela já está molhada, mas a questão não é essa. - Sobe aqui, amor - digo, levantando o queixo para indicar o meu rosto.

Ela lambe meus lábios primeiro, e depois começa a levantar o corpo, e eu me deito um pouco mais para lhe dar espaço.

Não perco tempo quando suas coxas envolvem minha cabeça e começo a lambê-la furiosamente, chupando seu clitóris com tanta força que ela começa a apertar os quadris no meu rosto, se segurando na cabeceira da cama. Ela tá molhada pra caralho. Quando começa a gemer e choramingar, eu paro. E ela sabe por quê. Sabe que quero que ela goze comigo.

Camryn desce de novo pelo meu corpo e se senta no meu colo, se esfregando no meu pau antes de pegá-lo com a mão.

Quando ela se encaixa em mim lentamente, ambos gememos e estremecemos.

Depois de uma noite fazendo amor, ela adormece em meus braços e eu a abraço, sem querer soltá-la jamais. Eu choro baixinho com o rosto mergulhado na maciez do seu cabelo até pegar no sono também.


CAMRYN


37

— ANDREW? - EU CHAMO, rolando para o outro lado da cama. Mais acordada, levanto a cabeça lentamente e vejo que ele não está ali.

Sinto cheiro de bacon.

Penso na noite que tivemos e não consigo tirar o sorriso evidente do rosto. Me desvencilho dos lençóis, me levanto e visto a calcinha e a camiseta.

Andrew está de pé diante do fogão quando entro na cozinha.

— Amor, por que acordou tão cedo?

Ando até a geladeira e abro a porta, procurando qualquer coisa para molhar a boca. Preciso escovar os dentes, mas se ele está preparando o café da manhã, não quero que o gosto fique esquisito por causa do creme dental.

— Queria te levar café na cama.

Ele demorou alguns segundos a mais para responder do que eu acharia normal, e sua voz pareceu estranha. Tiro a cabeça da geladeira e olho para ele. Está parado ali, olhando para a frigideira.

— Amor, você tá bem?

Deixo a porta da geladeira se fechar e não recebo nenhuma resposta.

Ele mal levanta a cabeça para me olhar.

— Andrew?

Meu coração está batendo cada vez mais rápido, embora eu não saiba por quê.

Me aproximo dele e ponho a mão no seu braço. Ele levanta a cabeça e me olha lentamente.

— Andrew...

Numa espécie de câmera lenta cruel, as pernas de Andrew se dobram e seu corpo desaba no chão de cerâmica branca, e a espátula que ele segurava cai junto com ele, espirrando óleo quente. Tento segurá-lo, mas não consigo mantê-lo de pé. Tudo ainda está se movendo em câmera lenta: meu grito, minhas mãos segurando seus ombros, sua cabeça batendo no assoalho. Mas então, quando todo o seu corpo começa a tremer incontrolavelmente em convulsão, a ação acelera e fica apavorante.

— ANDREW! MEU DEUS, ANDREW!

Quero ajudá-lo, mas seu corpo não para de se agitar. Vejo o branco dos seus olhos, e seu maxilar crispado num esgar horripilante. Seus membros estão imóveis e rijos.

Grito de novo, com lágrimas chovendo dos meus olhos.

— Alguém me ajuda! - E então volto a mim e corro até o celular mais próximo. O dele está sobre o balcão. Digito 911, e nos dois segundos que levam para atender, fecho o gás do fogão.

— Por favor! Ele tá em convulsão! Por favor, alguém me ajuda!

— Moça, antes de mais nada, se acalme. Ele ainda está em convulsão?

— Sim!

Olho horrorizada para o corpo de Andrew se agitando no chão. Estou tão apavorada que sinto vontade de vomitar.

— Moça, quero que você tire de perto dele qualquer coisa com que ele possa se machucar. Ele está usando óculos? Sua cabeça pode bater em algum móvel ou objeto?

— Não! M-mas ele bateu a cabeça quando caiu!

— Tudo bem, ache alguma coisa para pôr debaixo da cabeça dele, uma almofada, algo para evitar que ele bata de novo.

Olho ao meu redor na cozinha primeiro, mas não encontro nada, então corro freneticamente para a sala de estar, pego uma almofadinha do sofá e trago de volta. Solto o telefone tempo suficiente para enfiar a almofada por baixo de sua cabeça agitada.

Oh, não... meu Deus, o que tá acontecendo com ele?!

Encosto o telefone no ouvido de novo.

— Tá, já pus uma almofada debaixo da cabeça dele!

— Certo, moça - a atendente do serviço de emergência diz calmamente -, há quanto tempo ele está em convulsão? Você sabe de algum problema que ele tem que possa causar convulsões?

— Eu-eu n-não sei, uns... dois minutos, talvez, três no máximo. E não, nunca vi nada assim acontecendo com ele. Ele nunca me contou de nenhum... - A ficha começa a cair: ele nunca me contou. Todo tipo de coisa começa a atacar minha mente, me fazendo apenas perder a calma de novo. - Por favor, manda uma ambulância! Por favor! Depressa! - Estou engasgando com as lágrimas.

O corpo de Andrew para de se agitar.

Antes que a atendente possa responder, digo:

— Ele parou! O-o que é que eu faço?

— Tá, moça, quero que você vire o corpo dele de lado. Vamos mandar uma ambulância. Qual o endereço?

Enquanto o estou virando de lado, a pergunta me imobiliza.

Eu... eu não sei a porra do endereço! Puta que pariu!

— Eu-eu não sei o... - Pulo de pé e corro até a pilha de correspondência sobre o balcão, descubro o endereço no primeiro envelope e leio para ela.

— Uma ambulância está a caminho. Quer continuar falando comigo até que ela chegue?

Não sei bem o que a atendente disse, ou se não disse nada, na verdade, e só imaginei, mas não respondo. Não consigo tirar os olhos de Andrew, deitado inconsciente no chão da cozinha.

— Ele tá inconsciente! Meu Deus, por que ele não acorda?! - Minha mão desocupada está sobre meus lábios.

— Isso não é incomum - ela diz, e finalmente volto a prestar atenção em sua voz. - Quer continuar na linha até a ambulância chegar aí?

— ... Sim, por favor, não desliga. Por favor.

— Tudo bem, estou aqui - ela diz, e sua voz é meu único consolo. Não consigo respirar. Não consigo pensar. Não consigo falar. Só consigo olhar para ele. Tenho medo até de me sentar no chão ao seu lado, e ele ter outra convulsão e eu estar no caminho.

Minutos depois, ouço uma sirene uivando na rua.

— Acho que chegaram - digo ao telefone com voz distante.

Ainda não consigo olhar para nada, a não ser para Andrew.

Por que isso está acontecendo?

Batem à porta e finalmente me levanto e vou correndo abri-la para os paramédicos. Nem me lembro de ter largado o celular de Andrew no chão enquanto a atendente ainda estava na linha. Quando dou por mim, Andrew está sendo colocado numa maca e amarrado.

— Qual o nome dele? - uma voz pergunta, e tenho certeza que é de um dos paramédicos, mas não consigo ver o rosto dele. Só o que vejo é o de Andrew, enquanto o empurram porta afora na maca.

— Andrew Parrish - respondo baixinho.

Ouço vagamente o paramédico dizer o nome do hospital para onde ele será levado. E quando eles saem, fico parada ali, olhando para a porta, onde o vi pela última vez. Levo vários longos minutos para voltar a mim, e a primeira coisa que faço é pegar o celular dele e procurar o telefone de sua mãe. Ouço-a chorar do outro lado quando conto o que aconteceu, e acho que ela derruba o telefone.

— Sra. Parrish? - Sinto as lágrimas queimando meus olhos. - Sra. Parrish? - Mas ela não responde mais.

Finalmente, visto uma roupa - nem sei o que vesti - pego a chave do carro de Andrew, minha bolsa e saio correndo. Dirijo o Chevelle por alguns minutos até me dar conta de que não sei aonde estou indo, nem onde estou. Encontro um posto de gasolina, pergunto como chegar ao hospital e eles me informam, mas mal consigo encontrar o caminho sem me perder. Minha cabeça não está funcionando bem.

Bato a porta do carro e corro para o pronto-socorro com a bolsa jogada no ombro. Se caísse, eu não ia nem notar. A enfermeira da recepção digita no teclado para conseguir informações, me aponta o caminho e vou parar numa sala de espera. E estou totalmente sozinha.

Acho que passou uma hora, mas posso estar errada. Uma hora. Cinco minutos. Uma semana. Não faz diferença; a sensação seria a mesma, para mim. Meu peito dói de tanto chorar. Já andei tanto de um lado para outro que comecei a contar as sujeirinhas do carpete enquanto vou e volto.

Mais uma hora.

Esta sala de espera é tão incrivelmente sem graça, com paredes marrons e bancos marrons bem dispostos em duas fileiras no meio da sala. Num relógio no alto da parede, por cima da porta, o ponteiro dos segundos gira e gira, e embora seja baixo demais para ouvir, minha mente acredita que consigo ouvi-lo. Há uma cafeteira e uma pia perto de mim. Um homem - acho - acaba de entrar por uma porta lateral, encher um copinho de isopor e sair de novo.

Mais uma hora.

Minha cabeça dói. Meus lábios estão secos e rachados. Eu os lambo constantemente, o que só piora seu estado. Não vejo uma enfermeira passar por aqui há muito tempo, e começo a me arrepender de não ter parado a última que vi antes que ela desaparecesse no corredor longo, estéril e iluminado por lâmpadas fluorescentes que sai da sala de espera.

Por que essa demora? O que está acontecendo?

Bato a testa na palma da mão, e quando vou pegar o celular de Andrew na minha bolsa, ouço uma voz conhecida:

— Camryn?

Eu me viro.

O irmão mais novo de Andrew, Asher, está entrando na sala.

Quero me sentir aliviada por alguém finalmente ter aparecido para falar comigo, para interromper essa sensação de um nada profundo e doloroso, mas não consigo ficar aliviada, pois só posso esperar que ele me conte algo terrível a respeito de Andrew. Asher nem estava no Texas, até onde eu sei, e se ele apareceu aqui de repente, significa que pegou o primeiro voo de onde quer que estivesse, e as pessoas só fazem isso quando algo ruim acontece.

— Asher? - digo, com as lágrimas prendendo minha voz.

Nem hesito e corro para os seus braços. Ele me abraça forte.

— Por favor, me diz o que tá acontecendo? - pergunto, com lágrimas correndo novamente dos meus olhos. - O Andrew tá bem?

Asher segura a minha mão e me leva até uma cadeira, e me sento ao lado dele, apertando minha bolsa no colo, só para poder me segurar em alguma coisa.

Asher é tão parecido com Andrew que meu coração dói.

Ele sorri com ternura para mim.

— Ele tá bem agora - diz, e essa frase tão curta basta para encher todo o meu corpo de energia. - Mas provavelmente não vai continuar assim.

E com a mesma rapidez, aquela energia esperançosa se esvai novamente, levando com ela outras partes de mim: meu coração, minha alma, aquele fiapo de esperança que mantive todo esse tempo, desde que tudo começou. O que Asher está dizendo... o que ele está tentando me dizer?

Meu peito estremece com as lágrimas.

— Como assim? - Mal consigo dizer essas palavras.

Ele respira calmamente.

— Há mais ou menos oito meses - Asher diz com cuidado -, meu irmão ficou sabendo que tinha um tumor no cérebro...

Meu coração se foi. Minha respiração se foi.

Minha bolsa cai no chão, espalhando tudo, mas não consigo me mover para pegá-la. Não consigo mover... nada.

Sinto a mão de Asher pegando a minha.

— Por causa da doença do nosso pai, Andrew se recusou a fazer outros exames. Ele tinha outra consulta com o dr. Marsters naquela mesma semana, mas não quis ir. Mamãe e Aidan tentaram de tudo para que ele fosse se consultar. Até onde eu sei, ele chegou a concordar, mas acabou não indo porque o estado de papai piorou.

— Não... - balanço a cabeça sem parar, sem querer acreditar no que ele está me contando -, não... - Só quero expulsar as palavras dele da minha cabeça.

— Por isso Andrew e Aidan brigavam tanto - Asher continua. - Aidan queria que ele fizesse o que precisava fazer, e Andrew, teimoso como sempre, brigava com Aidan toda vez.

Olho para a parede e digo:

— Por isso ele não queria ver o pai no hospital... - A revelação me deixa ainda mais atordoada.

— Sim - Asher diz em voz baixa -, e por isso, também, ele não quis ir ao enterro.

Olho para Asher agora, com um olhar penetrante, mexendo meus dedos sobre os lábios.

— Ele tem medo. Tem medo que a mesma coisa aconteça com ele, que seu tumor seja inoperável.

— Sim.

Me levanto da cadeira num salto, quebrando um batom com o pé.

— Mas e se não for tão grave? - digo freneticamente. - Ele tá no hospital agora; eles podem fazer o que é preciso. - Começo a marchar para a saída. - Vou obrigar Andrew a fazer esses testes. Vai fazer forçado! Ele vai me ouvir!

Asher segura meu braço. Eu me viro.

— Pelo que estão verificando agora, as chances dele são muito pequenas, Camryn.

Vou vomitar. Minhas bochechas parecem sentir milhares de agulhas quando mais lágrimas abrem caminho para a superfície. Minhas mãos estão tremendo também. Toda a porra do meu corpo está tremendo!

Asher diz baixinho:

— Ele adiou demais.

Cubro o rosto com as mãos e soluço nelas, meu corpo inteiro se agitando, descontrolado. Sinto os braços de Asher me apertando.

— Ele quer te ver.

Suas palavras me fazem olhar para cima.

— Já foi levado pra um quarto; vou te levar pra lá. Espera aqui mais alguns minutos, e quando minha mãe sair do quarto, a gente vai pra lá.

Não digo nada. Fico ali parada, sem palavras... morrendo por dentro, é a pior dor que já senti.

Asher me olha mais uma vez para se assegurar de que o ouvi bem, e então diz cautelosamente:

— Volto já pra te buscar. Espera aqui.

Asher sai, e para não cair, me seguro na cadeira mais próxima e me sento. Não consigo nem enxergar direito, as lágrimas estão queimando meus olhos, escorrendo pelas minhas bochechas. Parece que alguém enfiou a mão no meu peito e arrancou meu coração.

Não sei se vou conseguir vê-lo sem perder completamente o juízo.

Por que ele fez isso?!

Por que isso está acontecendo?!

Antes que eu fique completamente louca e comece a quebrar tudo ou bater nas coisas e me machucar, engatinho procurando minha bolsa no chão. Nem notei que Asher recolheu tudo, devolveu dentro e deixou a bolsa na cadeira. Procuro meu celular e ligo para Natalie.

— Alô?

— Natalie, eu-eu preciso que você faça uma coisa pra mim.

— Cam... você tá chorando?

— Natalie, por favor, me escuta.

— Tá, sim, eu tô aqui. O que aconteceu?

— Você é minha melhor amiga - digo -, e preciso que você venha pra Galveston. Assim que puder. Você vem? Preciso de você. Por favor.

— Meu Deus, Camryn, o que tá acontecendo? O que foi? Você tá bem?

— Não aconteceu nada comigo, mas preciso de você aqui. Preciso de alguém, e só tenho você. Minha mãe não vai en... Natalie, por favor!

— T-tudo bem - ela diz, com a voz cheia de preocupação. - Vou pegar o primeiro voo. Eu vou pra aí. Não desgruda do celular.

Deixo a mão cair para o lado, esmagando o celular no meu punho, e olho para a parede pelo que parece uma eternidade até que a voz de Asher me tira do transe. Olho para ele. Asher vem até mim e pega minha mão, sabendo que vou precisar disso. Minhas pernas parecem frágeis, como se eu estivesse andando com próteses e não soubesse usá-las direito. Asher aperta minha mão tão forte. Saímos para o corredor iluminado e vamos até um elevador.

— Preciso me acalmar - digo em voz alta, mais para mim mesma do que para Asher. Tiro minha mão da dele, passo no rosto e corro os dedos pelo cabelo no alto da minha cabeça. - Não posso ficar histérica na frente dele. A última coisa que ele precisa agora é ficar tentando me acalmar.

Asher não diz nada. Não olho para ele. Vejo nossa imagem refletida na porta do elevador, distorcida e sem cor. Noto que os números no elevador indicam que subimos dois andares, e então ele para. A porta se abre. Fico ali parada, de início, com medo de sair, mas então respiro bem fundo e enxugo os olhos de novo.

Andamos para o meio do corredor, até um quarto com uma grande porta de madeira que está semiaberta. Asher abre completamente a porta, mas eu olho para o chão, para a linha invisível que me separa, no corredor, de Andrew, dentro do quarto, e estou com tanto medo de cruzá-la. Sinto que quando eu o fizer, verei que tudo isso é real e que não tem volta mesmo. Fecho os olhos com força e contenho uma nova onda de lágrimas, respirando profundamente, com a bolsa nos punhos cerrados.

E então abro os olhos quando a mãe de Andrew aparece.

Seu rosto suave está esgotado pela emoção, como sei que o meu também deve estar. Seu cabelo está desgrenhado. Suas pálpebras estão inchadas. Mas ela consegue sorrir amorosamente para mim, tocando meu ombro com delicadeza.

— Que bom que você está aqui, Camryn.

E então ela sai do quarto, de mãos dadas com Asher.

Olho para eles por um breve momento enquanto se afastam pelo corredor, mas suas silhuetas parecem se confundir com o resto.

Da porta, olho para dentro do quarto e vejo o pé da cama onde sei que Andrew está deitado.

Entro no quarto.

— Amor, vem cá - Andrew diz ao me ver.

De início fico imóvel no lugar, mas quando olho nos seus olhos, naqueles olhos verdes inesquecíveis que têm tanto poder sobre mim, largo a bolsa no chão e corro para a cama.


38

PRATICAMENTE DESABO SOBRE seu corpo e em seus braços. Ele me abraça tão forte, embora não tão forte quanto quero. Quero que ele me mate esmagada e nunca mais me solte, que me leve junto com ele. Mas Andrew ainda está fraco. Posso perceber que o que ele está enfrentando o está esgotando rapidamente.

Andrew segura meu rosto com as mãos, afasta o cabelo dos meus olhos e enxuga com beijos as lágrimas que me esforcei tanto para esconder para o bem dele, para que ele não tivesse que gastar nada de suas forças comigo. Mas o coração tem vontade própria e sempre consegue o que quer, especialmente quando está morrendo.

— Eu sinto muito - ele diz numa voz dolorosa e desesperada, com meu rosto ainda em suas mãos. - Eu não podia te contar, Camryn... não queria que nosso tempo juntos fosse diferente de como foi.

Lágrimas caem dos meus olhos, pingando em seus dedos e escorrendo pelos seus pulsos.

— Espero que você não...

— Não, Andrew... - eu engulo algumas lágrimas - ... eu entendo você; não precisa explicar. Ainda bem que você não me contou...

Andrew parece surpreso, mas feliz. Ele puxa o meu rosto e beija meus lábios.

— Você tem razão - digo. - Se você tivesse me contado, nosso tempo juntos teria sido sinistro e... eu-eu não sei, mas teria sido diferente, e não suporto imaginá-lo diferente; mas, Andrew, eu queria que você tivesse me contado só por um motivo: eu ia fazer qualquer coisa, qualquer coisa pra te levar pra um hospital antes. - Minha voz começa a ficar mais alta quando a triste verdade das minhas palavras me machuca ao dizê-las. - Você poderia ter...

Andrew balança a cabeça.

— Amor, já era tarde demais.

— Não fala isso! Agora ainda não é tarde demais! Você ainda tá aqui, ainda há uma chance.

Ele sorri com ternura e suas mãos finalmente soltam meu rosto, voltando para os lados do seu corpo, sobre o cobertor branco do hospital que o cobre. Um cateter sai das costas de sua mão e vai para uma máquina.

— Tô sendo realista, Camryn. Eles já me falaram que minhas chances não são boas.

— Mas ainda existe uma chance - discordo, segurando mais lágrimas e querendo poder desligá-las apertando um botão. - Uma pequena chance é melhor do que chance nenhuma.

— Se eu deixar que me operem.

Sinto que levei um tapa na cara.

— Como assim, se?

Seus olhos desviam dos meus.

Seguro o seu queixo com firmeza, fazendo-o virar e me olhar.

— Não tem nada de "se", Andrew, você não pode estar falando sério.

Andrew estende a mão e abre espaço na cama. Ele me convida a deitar ao seu lado, e quando me encolho para deitar, passa um braço por cima de mim e me puxa para perto.

— Se eu não tivesse conhecido você - ele diz, olhando nos meus olhos, a centímetros dos dele -, nunca ia fazer isso. Se você não estivesse aqui comigo agora, eu não ia querer. Ia achar um desperdício de dinheiro e de tempo que só daria uma falsa esperança pra minha família, atrasando o inevitável.

— Mas você vai deixar que eles te operem - digo, desconfiada, embora seja mais uma pergunta.

Ele roça minha bochecha com o polegar.

— Eu faço qualquer coisa por você, Camryn Bennett. Não importa o que seja, não importa... peça o que quiser que eu faço. Sem exceções.

Soluços sacodem meu peito.

Antes que eu possa dizer mais nada, Andrew passa a mão no meu rosto, afastando o meu cabelo. Ele me olha profundamente nos olhos.

— Eu vou deixar.

Esmago minha boca sobre a dele e nos beijamos febrilmente.

— Não posso te perder - digo. - A gente tem a estrada à nossa frente. Você é meu parceiro no crime. - Forço um sorriso em meio às minhas lágrimas.

Ele beija a minha testa.

Ficamos deitados juntos por um tempinho, falando da cirurgia e dos exames que ainda precisam ser feitos, e eu digo que não vou sair do lado dele. Vou ficar ali com ele pelo tempo que for preciso. E ficamos falando e falando dos lugares que queremos visitar, e ele começa a lembrar canções que quer que eu aprenda para podermos cantá-las juntos na estrada. Nunca estive tão disposta a cantar com ele quanto estou agora. Eu toparia enfrentar Celine Dion ou uma cantora de ópera - não me importa. Eu toparia. O público todo com certeza sairia correndo e gritando, mas eu toparia. Uma enfermeira vem ver como ele está, e Andrew recupera um pouco de sua personalidade brincalhona e mexe com ela, dizendo que ela podia se deitar conosco se quisesse fazer algo a três.

A enfermeira apenas sorriu, revirando os olhos, e continuou com seu trabalho. Ela se sentiu bonita e poderosa, e era só isso que ele queria.

Por um momento, enquanto estou deitada naquela cama com Andrew, é como quando estávamos na estrada. Não pensamos em doença ou morte e não choramos. Só conversamos e rimos e de vez em quando ele tenta me tocar em todos os lugares certos.

Eu dou risadinhas e afasto suas mãos, pois sinto que estou fazendo algo errado. Que ele deveria estar descansando.

Finalmente, eu cedo e deixo. Porque ele é persistente. E, claro, irresistível. Deixo que ele me toque por baixo do cobertor, e depois faço o mesmo por ele com a mão.

Depois de mais uma hora, me levanto da cama.

— Gata, qual o problema?

— Problema nenhum - digo sorrindo, e então tiro a calça e a camiseta.

Ele está sorrindo de orelha a orelha. Eu sabia que as engrenagens pervertidas da cabeça dele começariam a rodar antes de qualquer coisa.

— Por mais que eu fosse adorar transar com você num quarto de hospital - digo, voltando a me deitar -, isso não vai acontecer; você vai precisar de todas as suas forças pra cirurgia. - Eu transaria com ele nessa cama numa boa, mas no momento não estou pensando em sexo.

Andrew me olha, curioso, quando me deito novamente ao lado dele só de calcinha e sutiã e me aninho em seu corpo, como antes. Por baixo do cobertor, ele só está usando uma calça fina do hospital. Aperto bem o meu peito contra o seu e enrosco minhas pernas nas dele. Nossos corpos estão perfeitamente alinhados, nossas costelas se tocando.

— O que você vai fazer? - ele pergunta, ficando mais curioso e impaciente, mas adorando cada segundo.

Eu mexo meu braço livre e traço sua tatuagem de Eurídice com os dedos. Ele observa com atenção. E quando meu dedo indicador encontra o cotovelo de Eurídice, onde a tinta termina, eu o passo na minha pele para continuar o desenho.

— Quero ser tua Eurídice, se você deixar.

Seu rosto se ilumina e suas covinhas ficam mais fundas.

— Quero fazer a outra metade - continuo, tocando seus lábios com meus dedos, agora. - Quero desenhar Orfeu nas minhas costelas e reunir os dois.

Ele está em choque. Posso ver isso nos seus olhos brilhantes.

— Amor, não precisa fazer isso; nas costelas dói pra cacete.

— Mas eu quero fazer, e não me importa quanto vai doer.

Seus olhos ficam cheios d'água quando ele olha para mim, e então sua boca cobre a minha e nossas línguas dançam juntas por um longo momento cheio de amor.

— Eu adoraria isso - ele sussurra nos meus lábios.

Eu o beijo de leve e sussurro em resposta:

— Depois da cirurgia, quando você estiver bem o suficiente, a gente vai.

Ele balança a cabeça.

— É, Gus vai precisar mesmo que eu esteja lá pra alinhar a tua tatuagem com a minha; ele riu da minha cara quando mandei fazer esta.

Eu sorrio.

— Riu, é?

— Sim. - Andrew dá uma risadinha. - Me acusou de ser um romântico incurável e ameaçou contar pros meus amigos. Respondi que ele era igualzinho ao meu pai e mandei calar a boca. Gus é um cara legal, e um tremendo tatuador.

— Tô vendo.

Andrew passa os dedos no meu cabelo, sempre penteando-o para trás. E enquanto me olha, examinando meu rosto, me pergunto o que está passando pela sua cabeça. Seu sorriso lindo desapareceu, e ele parece mais concentrado e cauteloso.

— Camryn, quero que você esteja preparada.

— Não começa...

— Não, amor, você precisa fazer isso por mim - ele diz, com preocupação no olhar. - Você não pode ter 100% de certeza de que vou sobreviver. Não pode fazer isso.

— Andrew, por favor. Para.

Ele põe quatro dedos sobre meus lábios, me calando. Já estou chorando de novo. Ele está tentando ser o mais suave possível com a verdade, contendo suas próprias lágrimas e emoções até melhor do que eu consigo. É ele que pode morrer, e sou eu que estou sem forças. Isso me deixa furiosa, mas não posso fazer nada além de chorar e ficar puta comigo mesma.

— Só me promete que vai continuar dizendo a si mesma que eu posso morrer.

— Não posso pensar uma coisa dessas!

Ele me abraça mais forte.

— Promete.

Cerro os dentes, sentindo meu maxilar rangendo dentro das bochechas. Meu nariz e meus olhos ardem e queimam.

Finalmente digo:

— ... Prometo - e isso esmaga meu coração. - Mas você precisa me prometer que vai sair dessa - digo, apertando a cabeça sob o queixo dele de novo. - Não consigo ficar sem você, Andrew. Você deve saber que não consigo.

— Eu sei, meu amor... eu sei.

Silêncio.

— Você canta pra mim? - ele pergunta.

— O que você quer que eu cante?

— Dust in the Wind - ele responde.

— Não. Não vou cantar essa música. Nunca mais me peça isso. Nunca.

Seus braços se apertam ao meu redor.

— Então canta qualquer uma - ele sussurra -, só quero ouvir tua voz.

E assim, começo a cantar Poison & Wine, a mesma que cantamos juntos em Nova Orleans quando ficamos deitados nos braços um do outro naquela noite. Ele canta comigo algumas estrofes, mas posso ver o quanto está fraco por dentro, porque mal consegue alcançar as notas.

Adormecemos nos braços um do outro.

— Preciso fazer uns exames - ouço uma voz dizendo acima da cama.

Abro os olhos e vejo a enfermeira do sexo a três parada ao lado da cama.

Andrew também acorda.

Já é de tardinha, e posso ver pela janela que vai escurecer logo.

— É melhor você se vestir - diz a enfermeira, com um sorriso compreensivo.

Ela deve achar que Andrew e eu fizemos de tudo aqui em algum momento, considerando que estou seminua.

Saio da cama e me visto enquanto a enfermeira verifica os sinais de Andrew e parece prepará-lo para sair do quarto com ela. Há uma cadeira de rodas perto do pé da cama.

— Que tipo de exames? - Andrew pergunta com voz fraca.

A fraqueza da sua voz me faz olhar. Ele não parece bem. Parece... desorientado.

— Andrew? - Volto para perto da cama.

Cautelosamente, ele levanta uma mão para me afastar.

— Não, amor. Tô bem, só um pouco zonzo. Tentando acordar.

A enfermeira me olha, e embora elas sejam treinadas para parecer calmas e não deixar transparecer suas verdadeiras preocupações no rosto, posso ver nos seus olhos: ela sabe que alguma coisa não está certa.

Ela força um sorriso e dá a volta para ajudá-lo a se sentar, tirando o soro do caminho.

— Vou levá-lo por uma ou duas horas, talvez mais, pra fazer uns exames - ela diz. - É melhor você ir comer alguma coisa, esticar as pernas e voltar depois.

— Mas eu-eu não quero sair de perto dele.

— Faz o que ela tá dizendo - Andrew balbucia, e quanto mais o ouço tentando falar, mais medo sinto. - Quero que você vá comer. - Ele consegue virar a cabeça para me olhar, desta vez, e aponta um dedo, sério. - Mas nada de filé - exige, brincando. - Você ainda me deve um jantar, lembra? Quando eu sair daqui, é a primeira coisa que a gente vai fazer.

Ele consegue um sorriso de mim, como pretendia, mas é tênue.

— Tá - concordo, balançando a cabeça com relutância. - Volto daqui a algumas horas e te espero.

Vou para perto dele e o beijo. Ele me olha profundamente nos olhos quando me afasto. Só consigo ver dor em seus olhos. Dor e exaustão. Mas ele tenta ser forte, e um sorrisinho puxa um canto de sua boca. Ele se senta na cadeira de rodas e me olha uma vez, antes que a enfermeira o empurre para fora do quarto.

Minha respiração fica presa.

Sinto que quero gritar para ele que o amo, mas não digo nada. Eu o amo com todas as forças, mas lá no fundo sinto que, se eu disser isso, se finalmente admitir isso em voz alta, tudo vai desmoronar. Talvez, se eu mantiver isso dentro de mim, se nunca disser essas palavras, nossa história nunca termine. Dizer aquelas três palavras pode ser um início, mas para mim e Andrew, temo que seja o fim.


39

EU NÃO CONSEGUIRIA comer nem se minha vida dependesse disso. Só falei que ia comer para satisfazer Andrew. Em vez disso, saio e me sento na frente do hospital por um tempo. Só não quero sair daqui enquanto ele está lá dentro. Precisei de todas as minhas forças para deixar aquela enfermeira levá-lo para longe de mim.

Recebo uma mensagem de texto de Natalie:

 

Acabei de chegar. Pegando um táxi. Logo eu tô aí. Te amo.

 

Quando vejo o táxi parando na frente do hospital, levo um segundo para me levantar. Faz um bom tempo que não a vejo; desde nosso problema com Damon.

Mas nada disso importa mais para mim. Já não importa há algum tempo. Teu melhor amigo, não importa o que te faça ou o quanto te magoe, só magoa tanto porque ele é teu melhor amigo. E ninguém é perfeito. Erros foram feitos para serem perdoados pelo melhor amigo; é isso que torna alguém oficialmente o melhor amigo. De certa forma, como Andrew, não consigo imaginar não ter Natalie na minha vida. E nunca precisei tanto dela quanto agora.

Ela corre pela calçada quando me vê, com seu cabelo longo cor de chocolate esvoaçando solto atrás dela.

— Meu Deus, senti tanto tua falta, Cam! - Ela praticamente me mata esmagada.

Bastou sua presença aqui e já estou aproveitando seu abraço e soluçando em seu peito. Eu não conseguia mais conter as lágrimas. Nunca chorei tanto na minha vida quanto nas últimas 24 horas.

— Oh, Cam, o que tá acontecendo? - Sinto os dedos dela no meu cabelo enquanto choro baixinho na sua camiseta. - Vem, vamos sentar.

Natalie me leva até um banco de pedra debaixo de um carvalho e nós nos sentamos.

Conto tudo para ela. Desde o motivo que me fez partir da Carolina do Norte e o dia em que conheci Andrew no ônibus no Kansas, até este momento em que estamos sentadas neste banco. Ela chorou, sorriu e riu comigo enquanto eu contava tudo o que passei com Andrew, e raramente a vi levando algo tão a sério. Só quando meu irmão foi para a prisão e depois que meus pais se divorciaram. E depois da morte de Ian. Natalie pode ser louca, desbocada, baladeira e normalmente não saber a hora de calar a boca, mas ela entende que há uma hora e um lugar certo para tudo, e num momento como esse, tudo o que ela me dá é seu coração.

— Não acredito que você tá passando por tudo isso depois do que aconteceu com Ian.

Parece uma porra duma brincadeira cruel do destino.

Parece isso, de certa forma, mas com Andrew parece muito mais do que uma brincadeira cruel.

— Garota - ela diz, pondo a mão na minha perna -, pensa nisto: quais são as chances de tudo que aconteceu, da forma que aconteceu, ter sido só coincidência? - Ela balança a cabeça para mim. - Desculpa, Cam, mas é coincidência demais. O destino de vocês dois é ficar juntos. É como um puta conto de fadas do caralho que não dá pra inventar, sabe?

Não digo nada; fico só refletindo. Normalmente, eu comentaria seu linguajar dramático, mas desta vez não consigo. Simplesmente não tenho forças.

Ela me força a olhar.

— Fala sério, você acha que ia passar por tudo isso só pra ver esse cara morrer?

Dói ouvi-la dizer essa palavra, mas me contenho.

— Não sei. - Olho para as árvores no gramado, mas não as vejo, na verdade. Só o que vejo é o rosto de Andrew.

— Ele vai ficar bem. - Natalie segura meu rosto com as mãos e me olha fixamente nos olhos. - Ele vai sair dessa, você só precisa mandar a morte catar coquinho e dizer pra ela que esse cara é teu, sacou?

Ela me surpreende às vezes. Agora é um desses momentos.

Sorrio um pouco e ela enxuga as lágrimas do meu rosto.

— Vamos procurar um Starbucks.

Natalie se levanta com sua bolsa gigante de couro preto pendurada num braço e estende a mão para mim.

Eu reluto.

— Eu... Natalie, na verdade, eu queria ficar aqui.

— Não, você precisa se afastar dessa energia ruim por um tempo. Hospitais sugam toda a esperança da gente, você só deve voltar quando ele já estiver no quarto e você puder me apresentar esse filhotinho de Kellan pra me matar de inveja, porra. - Ela abre um sorrisão cheio de dentes.

Ela sempre consegue me fazer sorrir também.

Eu seguro sua mão.

— Tá - digo, cedendo.

Pegamos o Chevelle e vamos para o Starbucks mais próximo. Natalie ficou babando pelo carro o caminho todo.

— Meu Deus, Cam, você tirou a sorte grande mesmo com esse cara. - Ela está sentada na minha frente, bebericando seu latte. - Caras tão perfeitos assim são raros.

— Bom, ele não é perfeito - argumento, girando o canudo no meu copo. - É boca- suja, teimoso, me obriga a fazer coisas que não quero fazer e sempre consegue o que quer.

Natalie sorri e chupa o seu canudinho.

Ela aponta para mim rapidamente.

— Viu? Como eu falei: perfeito. - Ela ri e depois revira os olhos castanhos. - E porrr favorrr; obriga a fazer o que você não quer, o cacete. Algo me diz que você adora quando ele manda fazer alguma coisa. - Natalie dá um tapa na mesa e arregala os olhos. - Ooooh, ele é bruto na cama, não é? Não é? - Ela mal consegue se controlar.

Contei que tínhamos transado, mas não dei exatamente nenhum detalhe suculento.

Eu abaixo os olhos.

Ela dá outro tapa na mesa, e um sujeito sentado atrás dela olha para nós.

— Meu Deus, ele é!

— Tá, ele é! - digo entre os dentes, tentando não rir. - Agora quer parar de gritar?!

— Vai, você tem que me dar um detalhezinho só. - Ela junta o polegar e o indicador, para mostrar o tamanho do detalhezinho, e aperta um olho.

Ah, foda-se. Dou de ombros, me debruço sobre a mesa e olho para os lados para ver se ninguém está prestando atenção.

— Na primeira vez - começo a dizer, e a cabeça de Natalie parece parada no tempo, de olhos esbugalhados e boca aberta -, ele praticamente me forçou... você sabe o que quero dizer... claro que eu queria, sabe.

Ela balança a cabeça feito um boneco de mola, mas não diz nada porque quer que eu continue.

— Percebi que ele é dominador por natureza e não tava fazendo isso só porque falei que gosto. Também percebi que ele toma cuidado mesmo assim pra não exagerar, porque quer ter certeza de que eu tô bem.

— Ele já foi além disso?

— Não, mas eu sei que ele irá.

Natalie sorri.

— Você é uma pequena maníaca sexual - ela diz, e eu fico tão vermelha que não consigo erguer os olhos por um momento. - Parece que ele é exatamente o que você precisava em todos os aspectos. Tirou de você coisas que nem Ian nem Christian conseguiram. - Ela olha para cima, como que para o céu, e diz rapidamente: - Você sabe que eu te amo, Ian. - Beija dois dedos e os levanta. Depois, olha para mim de novo.

— Bom, não é por isso que eu amo Andrew.

Natalie se cala na hora. Eu também. Parece que todo o ar foi sugado do ambiente. Eu nem me dei conta do que estava dizendo.

Por que eu tinha que dizer isso em voz alta?

— Você tá apaixonada por ele? - ela pergunta, mas não parece tão surpresa.

Não digo nada, apenas engulo quaisquer outras palavras que estava preparada para dizer.

— Se você não estivesse apaixonada por ele depois de tudo o que vocês viveram juntos, eu ia achar que você é que tá com um tumor no cérebro.

Mesmo detestando ouvi-la usar essa expressão horrível, sei que ela não quis dizer nada com isso.

Mas apesar de seu papo jovial e do seu jeito de me fazer esquecer facilmente que as coisas não estão tão boas no momento, já esgotei minha capacidade de brincar disso com ela. Fico grata por ela ter me ajudado a esquecer a depressão e o temor por Andrew, mesmo que só por uns minutos, falando de sexo e conversando como costumávamos conversar.

Não posso mais.

Só quero voltar para o hospital e ficar com ele.

Natalie e eu pegamos o caminho de volta depois do pôr do sol, entramos juntas no hospital e tomamos o elevador.

— Espero que ele já tenha terminado - digo, nervosa, olhando novamente para aquela imagem borrada no reflexo da porta.

Sinto a mão de Natalie pegando a minha. Olho para o lado e vejo que ela está sorrindo com ternura.

A porta do elevador se abre e nós andamos pelo corredor.

Asher e Marna estão vindo ao nosso encontro.

A expressão dos dois faz meu coração se precipitar para o fundo do meu estômago. Aperto a mão de Natalie com tanta força que provavelmente a estou esmagando.

Quando Asher e Marna ficam frente a frente conosco, lágrimas rolam soltas pelo rosto dela. Marna me abraça e diz, tremendo:

— Andrew entrou em coma... os médicos acham que ele não vai resistir.

Eu me afasto dela.

Qualquer barulhinho, do ar saindo dos dutos no forro até as pessoas passando por nós no corredor, desaparece num instante. Sinto a mão de Natalie tentando pegar a minha, mas a afasto automaticamente e continuo a cambalear para trás, com as mãos apertadas no coração. Não consigo respirar... não consigo respirar. Vejo os olhos de Asher, cheios de lágrimas, me fitando, mas desvio os meus. Desvio porque ele tem os mesmos olhos de Andrew, e não consigo suportar.

Marna mexe na bolsa e tira um envelope. Ela se aproxima de mim cautelosamente, toma minhas duas mãos e coloca o envelope nelas.

— Andrew queria que eu te entregasse isto se alguma coisa acontecesse com ele. - Ela dobra meus dedos sobre o envelope, usando os seus. Não baixo os olhos; continuo olhando para ela, com as lágrimas encharcando meu rosto.

Não consigo respirar...

— Eu sinto muito - Marna diz com voz trêmula -, preciso ir embora. - Ela afaga minhas mãos com ar maternal. - Você sempre será bem-vinda na minha casa e na minha família. Por favor, lembre-se disso.

Ela quase cai, e Asher passa o braço por sua cintura e a acompanha pelo corredor.

Fico ali parada, no meio. Algumas enfermeiras passam, mas desviam de mim. Sinto o vento roçando o meu rosto de leve quando elas passam. Levo uma eternidade para tomar coragem e olhar para o envelope em minhas mãos. Estou tremendo. Meus dedos amassam a aba do envelope.

— Me deixa ajudar - ouço Natalie dizer, e estou fora de mim demais para protestar. Ela tira o envelope das minhas mãos com cuidado e o abre para mim, desdobrando lentamente a carta que ele contém.

— Quer que eu leia pra você?

Olho para ela, meus lábios tremendo sem controle, e balanço a cabeça quando finalmente entendo a pergunta.

— Não... me deixa ler...

Ela me entrega a carta e eu termino de desdobrá-la, minhas lágrimas pingando no papel enquanto leio:

 

Camryn, meu amor,

eu não queria que fosse assim. Queria te dizer estas coisas pessoalmente, mas tinha medo. Tinha medo que se eu dissesse em voz alta que te amava, o que a gente viveu juntos fosse morrer comigo. A verdade é que eu sabia, no Kansas, que era você. Te amei desde aquele dia em que olhei nos teus olhos pela primeira vez, me encarando do alto da poltrona daquele ônibus. Talvez eu não soubesse disso ainda, mas percebi que alguma coisa aconteceu comigo naquele momento, e que eu jamais poderia abrir mão de você.

Nunca vivi da forma como vivi durante minha curta convivência com você. Pela primeira vez na vida, me senti inteiro, vivo, livre. Você foi a peça da minha alma que faltava, o ar nos meus pulmões, o sangue nas minhas veias. Acho que se existem mesmo vidas passadas, então fomos amantes em cada uma delas. Conheço você há pouco tempo, mas parece que conheço desde sempre.

Quero que você saiba que mesmo na morte vou me lembrar de você. Eu sempre vou te amar. Queria que as coisas tivessem sido diferentes. Pensei em você muitas noites na estrada. Ficava olhando para o teto nos motéis e imaginava como seria nossa vida juntos, se eu sobrevivesse. Tive um ataque de pieguice e pensei em você de véu e grinalda, e até mesmo com um minimim na barriga. Sabe, sempre ouvi dizer que comer mulher grávida é uma delícia. ;-)

Mas lamento ter que te deixar, Camryn, lamento tanto... Queria que a história de Orfeu e Eurídice fosse real, porque aí você poderia me trazer de volta à vida cantando. Eu não ia olhar pra trás. Não ia ferrar tudo, como Orfeu.

Eu lamento tanto, amor...

Quero que você me prometa que vai continuar forte, linda, doce e meiga. Quero que você seja feliz e encontre alguém que te ame tanto quanto eu amei. Quero que você se case e tenha filhos e viva a sua vida. Apenas se lembre sempre de ser você mesma, e não tenha medo de dizer o que pensa, nem de sonhar em voz alta.

Espero que você nunca me esqueça.

Mais uma coisa: não se sinta culpada por não ter dito que me amava. Não precisava dizer. Eu sabia disso o tempo todo.

 

Com Amor, Sempre,

Andrew Parrish

 

 

Caio de joelhos no meio do corredor, com a carta de Andrew entre os dedos. E essa é a última coisa que lembro daquele dia.


Dois meses depois...


40

O SOL ESTÁ BRILHANDO e não há uma nuvem no céu. Ouço até pássaros cantando. Acho que é perfeito para um dia como este. O salto do meu sapato afunda numa parte macia da grama. Estou usando um lindo vestidinho branco e amarelo de verão, um pouco acima do joelho. Meu cabelo está preso numa trança de um lado só, como Andrew sempre insistiu que eu usasse. Minhas mãos estão dobradas na minha frente enquanto olho para a lápide onde está escrito PARRISH em grandes letras em baixo-relevo. Achei difícil vir aqui, mas era preciso fazer isso há muito tempo.

Continuo olhando para baixo, com o pensamento longe, para o monte de terra argilosa que ainda parece fresca, mesmo dois meses depois do enterro. Nem as repetidas chuvas parecem tê-lo achatado um pouco. Olho para os outros túmulos, a maioria deles já coberta por grama, e não consigo me sentir triste, só reconfortada, como se estas pessoas, embora já tendo ido embora para todos nós, tivessem a companhia umas das outras.

Duas mãos abraçam minha cintura por trás.

— Obrigado por ter vindo aqui comigo, amor - Andrew diz no meu ouvido, e então beija minha bochecha.

Pego a mão dele e o puxo para o meu lado, e olhamos uma última vez para o túmulo do seu pai, juntos.

Partimos do Wyoming mais tarde naquela noite, mas de avião. Nossos planos de viajar pelo mundo foram apenas adiados. Depois do coma e da cirurgia de Andrew, ele começou a se recuperar em três semanas. Os médicos ficaram tão surpresos quanto todos nós, mas ele ainda precisava de tempo para se recuperar totalmente, por isso fiquei com ele desde então, morando em Galveston. Ele tem fisioterapia uma vez por semana, mas já parece nem precisar mais.

Andrew insistia para que tirássemos a bunda do sofá e pegássemos a estrada, como planejamos - está sofrendo daquela sensação de ter uma segunda chance na vida, que o torna mais ansioso do que nunca para fazer de tudo. Até lavar louça ou roupa é uma curtição pra ele, caramba. Mas sua mãe e eu o proibimos terminantemente de exagerar ou se esforçar demais. Andrew não gosta disso, mas não é nem bobo de enfrentar nós duas juntas.

Nós vamos literalmente enchê-lo de porrada.

Mas Andrew e eu ainda planejamos viajar pelo mundo e cumprir nossa promessa de não nos atolarmos na monotonia da vida. Nada disso mudou, e sei que nunca vai mudar.

Natalie voltou para a Carolina do Norte, e nos falamos todo santo dia. Agora ela está saindo com Blake, o cara que Damon atacou naquela noite no telhado do clube. Sorrio quando penso que os dois estão juntos. Quando falo com eles no Skype, percebo que foram feitos um para o outro. Pelo menos por enquanto; com Natalie, nunca se sabe o que vai acontecer. Damon, por outro lado, acabou preso por posse de drogas. Ele é reincidente e deve passar um ano na cadeia, desta vez. Talvez aprenda com seus erros, mas eu duvido.

Quanto ao meu irmão, porém, acho que Andrew tinha razão. Andrew e eu fomos de avião para a Carolina do Norte visitar a minha mãe, e, durante nossa estada, fomos com ela visitar Cole na prisão. Ele parece diferente, sentindo remorso de verdade. Vejo isso nos seus olhos. Ele e Andrew se deram muito bem. Acho que talvez meu irmão volte a ser o irmão mais velho que eu conheci, quando sair da prisão. E com a ajuda de Andrew, perdoei Cole pelo que ele fez. Sempre vou sofrer pela família que ele destruiu ao matar aquele homem no acidente, mas percebi que o perdão cura muitas coisas.

Minha mãe continua saindo com Roger. Na verdade, eles vão se casar nas Bahamas em fevereiro. Estou muito feliz por ela. Consegui conhecer Roger e usar meu radar antibabacas, e fico feliz em dizer que ele passou com louvor. Mamãe quase não fica mais em casa; ele está sempre arrastando-a para algum lugar.

E ela merece tudo isso.

A mãe e os irmãos de Andrew me receberam na família de braços abertos. Asher e eu ficamos muito amigos. E por mais beligerante que eu sempre tenha achado Aidan, também o adoro. Na verdade, ele nunca foi sacana com Andrew. Sinceramente, Andrew fez por merecer. Aidan e sua esposa, Michelle, falam comigo e de mim como se eu fosse esposa de Andrew. Isso sempre me faz corar. O mais importante é que Andrew e Aidan estão se dando bem. Antes que Aidan e Michelle voltassem para Chicago depois de uma rápida visita, semana passada, eu sorri vendo os dois se provocando e se atracando na sala de estar. Quase quebraram a TV, mas eu e Michelle ficamos rindo e deixamos que os dois descarregassem a testosterona de macho alfa.

E hoje... bem, hoje o dia vai ser um pouco diferente para Andrew.

Entro na sala, onde ele está refestelado no sofá, vendo Prometheus.

Ele estende a mão para mim quando me aproximo.

— Não - digo, balançando a cabeça -, preciso que você se levante.

— Que foi, gata? - Ele se levanta do sofá e coça a cabeça. Seu cabelo já está crescendo, mas ele ainda não se acostumou com a sensação, especialmente perto da cicatriz da cirurgia.

Andrew põe os pés no chão para ficar mais sentado e eu entro no meio de suas pernas, passando as mãos na sua cabeça. Ele beija um dos meus pulsos, depois o outro.

— Vem comigo. - Aponto com a cabeça, segurando seus dedos, e ele me segue até o quarto.

Como sempre, quando o levo para o quarto, ele automaticamente acha que é algo sexual, e seus tentadores olhos verdes brilham como os de um garoto.

— Só quero que você se deite comigo um pouco - digo, tirando toda a roupa.

Ele parece um tanto confuso, mas é tão bonitinho.

— Tá - ele diz, sorrindo. - Quer que eu fique pelado também? Eu fico, não tem problema. Por que é que eu tô perguntando, caramba? - Ele começa a se despir.

Andrew se deita ao meu lado e nos olhamos, aproximando nossos corpos e trançando as pernas. Ele me abraça e então seus dedos traçam a minha tatuagem de Orfeu, que fiz há duas semanas. É perfeita, totalmente alinhada com a de Andrew. Quando nos deitamos juntos assim, os dois desenhos se tornam um só.

— Você tá bem, amor? - Andrew me olha, curioso, as pontas dos seus dedos roçando minhas costelas.

Sorrio e beijo sua boca.

Então me afasto só um pouco e pego sua mão, deslizando-a para a minha tatuagem, para a parte que cobre a minha barriga.

— Adoro minha tatuagem, amor - murmuro no pequeno espaço entre nossos rostos -, mas acho que daqui a uns sete meses e meio, Orfeu vai ficar um pouco esticado.

Andrew pisca, confuso, e leva alguns segundos para entender o que eu disse.

Sua cabeça se afasta num movimento atordoado, e depois de uma pausa, ele ergue o corpo.

— Vai nascer em maio.

Primeiro ele arregala os olhos; está atordoado e sem palavras, mas então consegue dizer:

— Você tá grávida? - A mão dele vai imediatamente para a minha barriga.

Sua reação me faz sorrir ainda mais.

Suas covinhas afundam mais enquanto ele me olha, e quando dou por mim, sua língua está na minha boca. O beijo tira o meu fôlego e ele me ergue em seus braços no meio da cama.

— Casa comigo - ele diz, e agora sou eu que fico atordoada e sem palavras. - Eu ia te pedir amanhã à noite, quando a gente saísse, mas agora não posso esperar. Casa comigo.

Começo a chorar, e ele me abraça de novo e me beija mais.

Quando ele finalmente se afasta e me olha nos olhos de novo, respondo:

— Sim, vou me casar com você, Andrew Parrish.

— Eu te amo tanto, porra - ele diz, me beijando de novo. Então ele segura meu rosto.

— E agora vou comer você grávida.

O que posso dizer? Este é Andrew, e eu não mudaria nada nele.

 

 

                                                                  J. A. Redmerski

 

 

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