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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


TRAVESSA DE CORAÇÃO / Tamara Gill
TRAVESSA DE CORAÇÃO / Tamara Gill

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Cavoucar as areias do Oriente Médio enquanto aprende sobre culturas antigas e civilizações enterradas é tudo com que a Srta. Hallie Evans sonha. Mas quando um escândalo iminente a faz voltar à Inglaterra, suas esperanças e sonhos são destruídos. Agora, como arqueóloga à serviços dos ricos, Hallie explora e estuda as antigas ruínas que se escondem nas propriedades deles.
O visconde de Duncannon, Arthur Howard, ficou enfeitiçado após um encontro casual com a Srta. Hallie Evans vários anos atrás. Ela deixou uma impressão que nunca desapareceu. Mas quando seus caminhos se cruzam outra vez, Arthur está determinado a conquistar o coração de Hallie e, desta vez, a todo custo.
Mas, conforme os segredos enterrados de Hallie começam a vir à tona, nenhum dos dois pode impedir a sociedade de descobrir a verdade. Agora, Arthur deve escolher entre o amor e os deveres familiares. Hallie pode impedir os planos daqueles que ameaçam seu sustento por uma chance real de amor verdadeiro?

 

 

 


 

 

 


CAPÍTULO 1

Surrey, 1813

H ALLIE estava sentada à mesa do café com seu pai, lendo artigos de jornal que haviam acabado de sair sobre o Egito e as maravilhosas descobertas, enterradas há milhares de anos naquela terra maravilhosa.

Ela suspirou e olhou pela janela, a manhã úmida e triste, sonhava com o calor, a areia e a cultura egípcia. Um lugar em que especiarias flutuavam no ar e revigoravam a alma. Não era como sua vida aqui em Surrey, onde se fazia pouco além de cuidar do jardim e ler na biblioteca.

Seu pai pigarreou, chamando sua atenção.

— Hallie querida, há algo que preciso discutir com você. É de grande importância, então, por favor, deixe-me terminar antes de dizer qualquer coisa.

Hallie fechou o jornal e virou-se para o pai.

— Claro.

Seu pai, um cavalheiro, apesar das terras e fortuna limitadas, sorriu um pouco, e ela franziu o cenho imaginando por que ele parecia tão nervoso. Um leve brilho de suor se formou na testa dele, e ele usou um guardanapo para limpar.

— Minha querida, não é algo fácil para mim, mas saiba que faço isso apenas porque quero o melhor para você, de coração.

Ela recostou-se na cadeira, um nó enorme se formando por dentro.

— É claro. — ela conseguiu dizer, embora temesse que a conversa seria algo diferente de tudo o que já haviam dito um para o outro. Algo estava errado e, em parte, ela não queria saber o quê.

— Vou mandá-la para a França, para terminar seus estudos. A Escola da Madame Dufour de Etiqueta para Moças é altamente recomendada e, com seu amor pela história, acredito que será muito bom para você. Nunca realizará seus sonhos apenas lendo os livros da minha biblioteca. Que, por infortúnio, são muito poucos, e continuarão assim nos próximos meses.

— Está me mandando embora? Por que papai? Eu não entendo.

Ele suspirou, esticando o braço acima da mesa para pegar na mão dela. Seu toque era quente, mas a ideia de deixar Surrey e seu pai, a deixava gelada.

— Posso ter nascido cavalheiro, o quarto filho de um barão, mas o simples fato de ser parente da aristocracia, por mais distante que seja, não rende dinheiro. Conservei a casa pelo máximo que pude, mas não foi o bastante. Ontem, fico feliz em dizer, consegui vendê-la.

Hallie se engasgou e puxou a mão.

— Você vendeu nossa casa?

O pai ignorou o tom acusatório e assentiu.

— Sim, e com o dinheiro comprei uma pequena cabana em Felday para mim. É uma casa de dois quartos, de frente para a praça da cidade e vai nos servir bem, creio eu. Todos os nossos pertences que lá couberem virão conosco, os livros também, então acredito que podemos fazer dela nosso próprio lar e ficar muito confortáveis lá.

Ela balançou a cabeça, não acreditava no que estava ouvindo.

— Papai, nossa vida está aqui. Eu nasci neste cômodo. Minhas últimas memórias de mamãe estão aqui. Por favor, reconsidere.

O pai empurrou a cadeira para trás, e raspou os pés no chão.

Hallie fez uma careta quando ele foi até a janela, olhando para as malvas-rosa e rosas lá fora.

— Acha que eu não sei disso, minha querida? Não sabe como me partiu o coração vender nossa casa, mas era isso... Vender e ir embora com algum dinheiro, ou ir embora sem nada. Eu escolhi a primeira opção. A venda foi lucrativa e rendeu o suficiente para me manter pelo resto de meus dias e lhe dar um pequeno dote além dos estudos na França.

Ele se virou e caminhou até ela, puxando Hallie para se levantar:

— Você deve me prometer que usará seu tempo na escola para melhorar. Arme-se com tanto conhecimento que nada nem ninguém pode ficar no seu caminho. Que fará a inteligência, que sei que tem, valer e que construirá uma vida a partir daí. Veja o mundo, visite seu amado Egito, de que está sempre lendo — disse ele, olhando para o artigo nas mãos dela. —, viva uma vida plena e feliz. Assim como eu e sua mãe sempre desejamos. Você sempre será bem-vinda na casa de campo quando estiver em casa.

Hallie engoliu o nó na garganta, nunca havia ouvido seu pai falar dessa maneira.

— Eu prometo, papai. Vou deixá-lo orgulhoso e, antes de ir, garantiremos que a casa fique como gostamos. Fazer dela nosso novo lar, longe deste.

Seu papai a puxou para um abraço forte, e Hallie o envolveu com os braços, notando pela primeira vez como ele era frágil e muito mais velho do que ela imaginava. Ela o apertou com mais força, desejando que a vida parasse por um momento, parasse e ficasse como estava.

— Estou feliz que pense assim, minha querida. Pois, o velho McKinnon virá amanhã com a carroça para nos ajudar com a

mudança. Serão dois dias bem movimentados.

Seu pai caminhou até a porta, indo em direção ao foyer. Hallie o seguiu.

— Dois dias. Por que dois dias? — ela perguntou.

Ele se virou, sorrindo.

— Porque temos que sair de casa em dois dias. Sugiro que termine o café-da-manhã e comece a fazer as malas.

Hallie ficou parada olhando para ele e fechou a boca com um estalo. A casa não era pequena, e a ideia de fazer as malas, de escolher o que guardariam e o que deixariam para trás a deixou atordoada por alguns instantes. No entanto como executariam tal tarefa com uma criada de copa, uma cozinheira e um cavalariço que fazias as vezes de mordomo?

Balançando a cabeça, mas sem evitar o trabalho duro, Hallie gritou para Maisie, sua criada, por ajuda. Se só restavam dois dias, ela levaria apenas dois dias para concluir a realocação de seus pertences. Arregaçou as mangas e partiu em direção às escadas.

— Acho que vou começar com o quarto de hóspedes primeiro e ir abrindo caminho. — disse ela em voz alta, para si.

Estava determinada a cumprir o prazo do pai e jogar com as cartas que a vida a havia dado.


CAPÍTULO 2

Dia de Ano Novo de 1817 — Felday

ERA A PIOR MANEIRA de se começar o ano novo.

Hallie parou ao lado da carruagem, no portão do pátio da igreja, odiando o fato de agora ser órfã. Mesmo tendo vinte e três anos, sua idade não mudava o fato de que, além das amigas de escola, ela estava sozinha no mundo.

A neve caia sobre ela, úmida e miserável, e ela olhou para o céu desejando estar em qualquer lugar, menos ali. Queria estar em algum lugar quente de modo que seus ossos não doessem mais, e seu nariz não parecesse prestes a cair.

O cocheiro a ajudou a entrar no veículo, e ela deu o endereço da casa. A pequena cabana que agora iria ser fechada e deixada para trás. Seu pai sempre quis que ela vivesse a vida como quisesse, que usasse a educação francesa para explorar, aprender e desfrutar o mundo que a esperava. E agora ela iria cumprir o desejo dele e viver. Chega de sobreviver nesta Inglaterra fria e úmida.

A jornada até Felday foi curta, e Hallie olhou pela janela, pensando no pai em seus últimos dias. Quando ele faleceu, era apenas uma casca do homem que já fora. O médico acreditava que a convalescência havia sido o resultado de um tumor no rim; a pele amarelada e os olhos do pai eram um sinal de que algo não estava certo em seu corpo.

O único consolo dela durante a provação foi que ele havia sido feliz. O pai dela aceitou ajuda quando foi necessária, leu e conversou nas últimas semanas como sempre fez. Às vezes, Hallie

conseguia até se esquecer que ele não estava crivado por uma doença, mas esses momentos eram passageiros.

A carruagem parou de supetão, e ela escorregou para fora do acolchoado, aterrissando com um puf no chão. Com dificuldade para se levantar, Hallie ouviu certa comoção do lado de fora e abriu a porta, querendo ver qual era o problema. Ela saltou, a neve sob os pés sendo esmagada a cada passo. Hallie deu a volta pela frente da carruagem e se deparou com um homem, ou melhor, um cavalheiro conversando com o condutor dela.

Ele era alto, as roupas eram muito mais bem confeccionadas do que as dela, o sobretudo havia sido ajustado ao corpo musculoso e as pernas eram longas e bem definidas por horas no lombo de um cavalo. Bem barbeado, a mandíbula era bem marcada, os lábios carnudos.

Ela arfou ao vê-lo. Céus, não se via homens como ele em Felday. Hallie puxou o manto para si, para que ele não visse as roupas dela, tão fora de moda e que já viram anos melhores, o vestido de luto havia sido de sua mãe.

— Ó, senhorita. Devo abusar de sua boa vontade e pegar seu veículo emprestado se não for incômodo. Devo acrescentar que compartilharia com a senhorita. Meus amigos, veja bem, pregaram uma peça em mim e roubaram meu cavalo, e eu estou preso no meio do nada sem saber para onde ir.

Hallie encarou o Adônis à sua frente enquanto sua mente lutava para formular uma resposta.

Ele usava um gorro de pelo e um grande cachecol de lã em volta do pescoço, mas ela notou os vestígios de fios louros por baixo. Os olhos dele eram grandes e focados, um adorável tom de azul escuro, o nariz reto sugeria suas origens, para não mencionar os lábios... Eram cheios, talvez mais cheios do que os dela, e por um

momento Hallie pensou que estava olhando para um anjo enviado para fazê-la se sentir melhor naquele dia triste.

— Senhorita? — ele perguntou de novo. — Acredita ser possível me levar até a cidade mais próxima? — ele se abraçou, e ela percebeu o vento gelado.

— Senhorita Evans, a gente não conhece esse homem. Pode ser um assassino, um ladrão de estrada. — o condutor apontou na direção de Felday. — Caminhe nessa direção e em pouco mais de uma hora, chegará a Felday.

— Em meia hora estará escuro. — disse o cavalheiro, voltando-se para Hallie. — Por favor, Srta. Evans, se esse é o seu nome. Por favor, pode me dar uma carona?

Hallie suspirou.

— Qual é o seu nome, sir?

Ele ergueu o queixo, e fez um reverência mínima.

— Arthur Howard a seu dispor.

Ela ergueu a sobrancelha, balançando um pouco a cabeça.

— Bem, não exatamente, já que sou eu que o estou ajudando, certo?

O Sr. Howard sorriu, e Hallie sentiu-se dar uma cambalhota por dentro ante o gesto. Ela ajeitou o xale, voltando-se para abrir a porta da carruagem.

— Sigamos para Felday, John, e deixaremos o Sr. Howard na pousada. Tenho certeza de que ele pode alugar um cavalo lá pela manhã.

Hallie se acomodou nas almofadas e puxou a manta da carruagem para cobrir as pernas. O Sr. Howard pulou para dentro logo atrás dela e fechou a porta para a tarde fria.

— Mais uma vez, obrigado, Srta. Evans, pela ajuda. Eu trouxe meu cavalo, se me entende, mas também estava com amigos que

consideram um boa brincadeira partirem com minha montaria.

Ela o estudou por um momento, sua articulação bastante elitizada e correta.

— Está hospedado aqui perto?

— Eu estava hospedado em Felday Manor e voltava para Londres com um grupo de amigos quando parei para... É, parei por um momento, entrei na floresta e quando voltei para a estrada meu cavalo e meus amigos haviam partido.

Hallie balançou a cabeça diante de tal absurdo.

O homem não estava vestido para ser deixado ao ar livre durante a noite e com a neve caindo com tanta intensidade ele estaria morto pela manhã se não chegasse a Felday a pé.

— Está enganado, Sr. Howard, porque amigo algum faria uma coisa dessas, com certeza não nesta época do ano.

Ele assentiu com a cabeça, pareceu aceitar sua opinião, e ao se acomodar cruzou os braços sobre o peito em um esforço para se manter aquecido.

— O que a traz aqui em um dia tão frio, Srta. Evans? — ele sorriu após a pergunta, e ela teve pena dele pela resposta que daria. Logo ele iria olhar para ela com tristeza e simpatia, como todos faziam na aldeia Felday.

— Enterrei meu pai hoje, estou voltando da igreja.

A boca dele se abriu, e ela desviou o olhar, virando-se para a janela. Logo, muito em breve ela estaria longe de todo esse frio, dessa tristeza e sua vida iria começar.

— Srta. Evans, eu sinto muitíssimo. Se eu soubesse, nunca teria me intrometido. Espero que me perdoe. Lamento muito que meus amigos tenham escolhido uma hora tão inadequada para me fazer de bobo.

A carruagem passou por alguns chalés remotos do condado, e Hallie se virou para o homem que havia ficado branco como um fantasma.

— O falecimento do meu pai era esperado, Sr. Howard, e agora ele não está mais sofrendo. De volta às mãos de Deus, e estou feliz por isso. Não é necessário que se desculpe. Em uma noite como esta, não teria sido cristão da minha parte deixá-lo na estrada.

Ele estendeu o braço e apertou a mão dela.

— Mesmo assim, como um homem que também já perdeu os pais, eu entendo como o dia de hoje deve ter sido difícil para a senhorita. Sinto-me mal por ter me intrometido em tal hora.

Ela negou com a cabeça ao enxugar uma lágrima que aqueceu sua bochecha.

— Obrigada. É muito gentil, mas não se incomode. De qualquer modo, eu moro em Felday e estava voltando para casa.

A carruagem parou, e Hallie olhou pela janela.

Havia dois cavalos parados na porta da pousada, e era estranho que havia três carruagens sendo descarregadas. Não era comum ver tantas pessoas na pousada, o que fez Hallie franzir a testa.

— Sr. Howard, esta é a pousada de Felday, é melhor que entre e verificar se há algum quarto disponível. Desejo-lhe tudo de bom. —

disse ela, estendendo a mão para ele.

Ele a segurou e, em vez de sacudi-la, levou-a aos lábios e deu um beijo gentil. Um arrepio percorreu a pele dela que sorriu um pouco para esconder a reação ao toque dele.

— Precisa ir muito longe esta noite, Srta. Evans?

Ela apontou para o outro lado do parque da cidade pela janela, para uma pequena residência com telhado de palha.

— Eu moro logo ali, Sr. Howard. Creio que chegarei muito bem em casa.


Ele assentiu e esticou a mão para a porta.

— Obrigado de novo, e passe bem.

Hallie examinou os olhos dele e absorveu a beleza daquele homem enquanto ele fechava a porta detrás dele. Quando ele sumiu de vista, Hallie suspirou de alívio. Manter a calma diante de um homem tão bonito era digno de um prêmio. O pai dela teria achado graça que um belo estranho chegasse no dia em que ela disse seu adeus a ele. Mesmo que na verdade ela tivesse se despedido do papai semanas atrás. E logo, muito em breve, ela se despediria da Inglaterra também.

Diria olá para o Oriente Médio e tudo que a esperava por lá. Uma vida, como seu pai costumava dizer. Um novo começo.

O Egito.

LORDE ARTHUR HOWARD, visconde de Duncannon mataria seus amigos quando voltasse a Londres. Não só por terem partido com seu valioso capão que havia custado mais de quinhentas libras, mas também porque a estupidez deles o obrigou a se impor a uma mulher que acabara de enterrar o pai. De todas as ações desprezíveis que se podia fazer, Arthur acreditava que nunca superaria tal atitude insensível e baixa.

Ele se virou e observou a carruagem que partia na pequena estrada de cascalho que rodeava o gramado da vila até parar diante da cabana com telhado de palha do outro lado. A porta da casa abriu e fechou, e a carruagem partiu. Arthur abriu a porta da pousada, satisfeito por a Srta. Evans ter voltado para casa ilesa.

Ele entrou na taverna localizada na frente do estabelecimento e encontrou uma cena de caos total. A sala estava abarrotada de

pessoas, e o atendente e a esposa pareciam correr para todos os lados sem saber o que fazer. Arthur foi até o bar, e chamou o garçom que servia duas cervejas de uma só vez.

— Senhor, posso pedir um quarto? Preciso apenas por uma noite, e caso me atenda, logo o deixarei livre.

O homem, um cavalheiro alto e musculoso olhou para ele e sorriu.

— Ah sim, parece que todos querem o mesmo. Estamos lotados.

Precisará encontrar outro lugar para dormir esta noite.

— Estou mais do que disposto a dormir no salão se não houver outro lugar.

— O salão também está cheio. Há três carruagens na frente e mais duas carroças lá atrás. Toda a alta burguesia e seus criados, perdidos na neve. Não tenho lugar para você aqui. Pode dormir nos estábulos se quiser, mas vai custar um xelim.

— Obrigado por sua generosidade. — disse ele, duvidando que o homem notaria o sarcasmo em seu tom.

Arthur voltou para o lado de fora. Já estava totalmente escuro, se dirigiu aos estábulos que ficavam em uma das laterais do prédio. O

ar frio fazia seus ossos doerem e, ao entrar no celeiro, ele se sentou em uma pilha de feno próxima, sem proteção ao vento.

Ele ficou sentado ali por um tempo esfregando as mãos, mas não adiantou. Nunca conseguiria dormir e se não bastasse, talvez não sobrevivesse à noite. Quem diria que em Surrey poderia ser tão frio? Como ele daria qualquer coisa neste momento para estar de volta a Londres, em sua casa quente e confortável, em Berkley Square, onde poderia acender a lareira até que o fogo estivesse rugindo e nenhum frio fosse capaz de penetrar em seus ossos.

Ele voltou o olhar para fora das portas do estábulo, e dali ele era possível ver a pequena cabana da Srta. Evans, a luz das velas

tremeluzindo no cômodo por detrás das cortinas. Ele se levantou, andou de um lado para o outro na tentativa de aquecer seus membros.

A mente zumbia com a ideia de incomodá-la outra vez. Arthur murmurou palavrões. Ele não poderia perturbá-la uma segunda vez em questão de horas, ainda mais com o dia que ela havia enfrentado. Ele flexionou os dedos que, mesmo com as luvas de pelica, estavam rígidos e doloridos. Os pés formigavam pela falta de fluxo sanguíneo.

— Maldição. — ele xingou.

Arthur se levantou e foi em direção à residência dela. Foi a atitude mais absurda e intrusiva que ele já havia tido na vida, mas era pedir abrigo ou congelar até a morte. Alguns homens, homens fortes, podem suportar uma noite nos estábulos, ao ar livre, sem fogo ou cobertor, mas ele não era um desses homens.

Ele debateu sua escolha por quase um minuto à soleira pintada de verde até reunir coragem de bater com força na madeira. A Srta.

Evans abriu, e agora, sem o gorro preto, sem o vestido de luto e a grande capa de viagem, ela era diferente de tudo que ele já pusera os olhos em toda a vida. Ela parecia um corvo na carruagem antes, mas agora...

Neste momento, ela não era nada disso.

Ele fez uma reverência, sem saber o que fazer quando se perde as palavras, e então voltou a ser um lorde, lembrou-se de suas maneiras ao encontrar uma dama.

— Srta. Evans, estou me jogando aos seus pés. Por favor, tenha pena de mim e permita-me ficar aqui esta noite. Não há mais quartos na pousada e, depois de passar a última hora sentado no estábulo, percebo que não vou sobreviver a est noite se for obrigado a ficar lá.

Os olhos dela se arregalaram, e ela olhou além dele, na direção da pousada antes de voltar a olhar para ele. Agora que ele conseguia enxergar bem seus olhos, ele notou que eram verde-claros e com pequenas rajadas de azul no meio. Eram grandes e amendoados, e suas bochechas eram de um tom muito doce de rosa. Quanto aos cabelos, eram compridos e escuros, e ele sentiu uma vontade estranha de descobrir se eram tão macios quanto aparentavam ser. Visões dos fios cascateando em cima dos ombros nus na agonia da paixão tomaram seus pensamentos, e ele amaldiçoou-se pela rebeldia.

A Srta. Evans não era uma das muitas mulheres em Londres que caíam a seus pés. Ela era uma mulher independente e honrada. Os pensamentos dele eram desonrosos e inúteis. Com o silêncio contínuo dela, ele disse:

— Por favor, Srta. Evans. Pagarei muito bem se me permitir.

As palavras dele a pegaram de surpresa, e ela recuou para deixá-lo entrar.

— Muito bem, você pode dormir diante da lareira, Sr. Howard.

Arthur foi direto para a lareira, parou de costas para o fogo e fez uma promessa de matar os amigos quando os reencontrasse.

— Muito obrigado. Pago o que quiser, basta dizer.

Ela ergueu a sobrancelha.

— O que eu quiser, Sr. Howard? Você é um homem rico?

Ela deu alguns passos e se sentou no sofá diante do fogo, e ele riu. Ele era um cavalheiro rico, nada menos do que visconde, e com várias propriedades e terras no campo e em Londres. Ela poderia dizer o valor que quisesse, e ele pagaria a quantia. Qualquer coisa era melhor do que morrer de frio lá fora.

Por um lado, sua avó ficaria muito desapontada se ele morresse em Surrey antes de se casar com uma das muitas herdeiras que ela

havia escolhido. Um Duncannon deveria se casar por riqueza e conexões. Congelar até a morte sem cumprir os deveres familiares seria uma catástrofe.

— O que você quiser, Srta. Evans. A escolha é sua.

Ela se recostou em um dos sofás, e ele olhou para baixo para ver que ela só vestia um par de meias nos pés. A cena era terrivelmente íntima, como a rotina de marido e mulher tarde da noite, quando todos os funcionários estavam na cama. Ela ergueu as pernas e as escondeu debaixo do bumbum.

Os lábios dele tremeram.

Arthur olhou para ele mesmo, as botas de cano alto feitas pelo melhor sapateiro de Londres. As calças de pele de gamo e as luvas de pelica além do casaco de montaria, valiam mais do que ele presumia que custariam esta pequena cabana. Sem mencionar o belo sobretudo e o gorro de pelo.

Ele olhou em volta, viu muitos livros, mas pouco mais. O sofá em que a Srta. Evans sentava-se estava puído e gasto, e o cheiro distinto de gordura animal dizia a ele que ela não usava velas de sebo.

— Você tem muitos livros aqui. — afirmou ele, com naturalidade.

Ela olhou em volta.

— Sim, eram do meu pai. Morávamos em Felday Manor, a cinco quilômetros da cidade. Meu pai passou por tempos difíceis e fomos forçados a nos mudar.

Ele franziu a testa, não gostou que tanta dor e sofrimento tivessem acontecido à mulher generosa, e se não estava enganado, inteligente diante dele.

— Sinto muito, Srta. Evans. Deve ter sido um golpe terrível para sua família. — ele tirou as luvas e colocou-as no bolso. — Outra

gafe da minha parte, já que estive na referida residência hoje. Se vale de algo, a casa é linda.

Ela deu de ombros.

— Já se passaram quatro anos desde que mudamos para cá, e na maior parte do tempo eu estive longe, estudando. Em breve, partirei mais uma vez, a cabana será fechada e eu começarei uma vida nova no exterior.

— Está de partida? — Arthur deixou de lado a estranha pontada de pesar que sentiu ao ouvir tal notícia.

Por que ele estaria sentindo tal emoção? Não era como se ele a conhecesse o bastante para ser afetado por tais informações, e depois de hoje eles talvez nunca mais se encontrassem. Contudo, a ideia de nunca mais a ver o deixou melancólico. Um estado ao qual ele não estava acostumado.

— Estou. Ofereceram-me uma posição como assistente do Sr.

Shelly, um egiptólogo da Universidade de Cambridge. Ele viajará para estudar a cultura, a história e sítios históricos, é claro. Vou ajudá-lo nessa empreitada.

Arthur não estava certo de como responder a tal afirmação.

Conhecer uma mulher que iria embarcar nessa jornada...

Bem, não era o tipo de trabalho para o sexo frágil. Que esplêndido e intimidante ao mesmo tempo.

— Que extraordinário da sua parte. — ele estava maravilhado com ela. — Não sente medo? Não vejo o Egito como o país mais tranquilo para se viver, nem o mais interessante.

Ela riu e suas feições se iluminaram com a ação.

Nem se sua vida estivesse em risco, Arthur poderia desviar o olhar do belo rosto, do semblante doce. Não era todo dia que se encontrava alguém na estrada que levava um estranho para casa.

Alguém que era bonita e inteligente. Algo lhe dizia que a mulher

diante dele poderia manter uma conversa inteligente sem a necessidade de abrir discussões que envolvessem escândalos ou moda atuais.

— Eu imagino que não. — ela disse. — Mas acredito que gostarei do calor. Estou farta do frio. — ela fechou os olhos e ergueu o rosto na direção do teto, como se já pudesse sentir o calor do sol na pele. — Eu parto amanhã para Londres, e embarco para o Egito no dia seguinte, então é melhor eu gostar, não é?

Arthur riu.

— Suponho que sim.

Agora aquecido, ele se sentou, mas em vez de se sentar na poltrona de couro que estava à esquerda dele, ele foi se sentar ao lado da Srta. Evans.

— Posso saber o seu nome, Srta. Evans? Pode me chamar de Arthur, se quiser.

Ela se virou e a inspeção dela fez o sangue dele acelerar nas veias. Que estranho. Ele nunca havia ficado tão confuso com uma mulher, e talvez fosse simplesmente porque a mulher ao lado dele era inteligente e logo seria mais conhecedora do mundo do que ele também.

— Pode me chamar de Hallie. Já que passará a noite aqui, creio não ter problema. — ela voltou a se recostar no sofá, e Arthur estudou o fogo.

— Já pensou no que quer como pagamento pela minha estada?

Eu fui sincero quando disse que pode ter o que quiser.

Hallie apertou os lábios, e ele engoliu em seco.

Maldição, ele precisava aprender a agir com educação. Mais um pouco e ele estaria jogado aos pés dela declamando poemas de amor caso ela permitisse que ele beijasse aquela boca linda. Ele

estudou o perfil dela por um momento, e sentiu o corpo tenso ao vê-

la mordendo o lábio inferior rechonchudo.

Maldição.

Ele se encolheu. Que canalha ele era. Um típico patife Londrino sem consideração pelos outros.

— Eu preciso de fundos para minha viagem. Como vê, minhas posses são escassas. Papai não deixou muito, e embora a casa vá ser alugada enquanto eu estiver fora, não terei acesso a esses fundos enquanto estiver no Egito. — ela olhou para ele, e ele sentiu calor subir pela espinha. — Então, por ajudá-lo hoje na estrada, e pela hospedagem desta noite, eu gostaria de cinquenta libras, se você tiver.

Cinquenta libras...

Bem, ela era uma boa negociadora, mas era uma barganha a que ele estava disposto a ceder. Ele assentiu, mas de jeito maneira ele planejava deixá-la partir com uma quantia tão ínfima. A mulher ao lado dele merecia muito mais, e ele daria o dobro antes de partir no dia seguinte.

— Considere feito.

Os olhos dela brilharam de prazer.

— Obrigada, você é muito gentil. Fiquei preocupada em como pagaria por minhas coisas enquanto estivesse fora. O cargo com o Sr. Shelly paga muito pouco, e essa quantia que me pagará será o bastante para que eu não precise vender nada da casa e nem outros objetos de valor que possuo. — ela se levantou, dobrou o pequeno cobertor que havia colocado sobre as pernas e o depositou no sofá. — Não me sobrou muito do papai, sabe, por isso fiquei triste por ter de vender algo para fazer o que sei que ele queria que eu fizesse na minha vida. No fim foi bom que seus amigos o tenham deixado para trás. Que oportuno para mim.

Arthur se levantou, sentindo que ela o deixaria.

— Foi uma honra conhecê-la, Srta. Evans... quero dizer, Hallie.

Ela sorriu e mais uma vez a visão dela o desequilibrou. Como um simples gesto era capaz de deixá-lo em apuros?

— Nos veremos pela manhã, Sr. Howard.

— Arthur, por favor. — disse ele, querendo ouvir seu nome mais uma vez dos lábios dela.

— Arthur... — ela repetiu, virando-se.

O pânico se apoderou dele de que o tempo juntos estava terminando. Ele estendeu a mão, impedindo-a.

— Antes de ir, podemos fazer um brinde, em homenagem ao seu pai?

Ela pareceu refletir por um momento, antes de concordar.

Arthur a observou quando ela entrou na pequena cozinha ao lado da sala, o som de um armário abrindo e fechando e o tilintar de copos dizendo a ele que ela havia concordado.

Ele abriu um pequeno sorriso quando ela voltou com duas taças de vinho tinto, e estendeu uma para ele.

— Ao meu pai. Um homem de sabedoria e bondade.

Ela fez uma saudação, e Arthur fez o mesmo.

— Ao Sr. Evans.

Ele a observou enquanto tomava um gole de vinho, uma única gota caindo em seu lábio. Sem pensar, ele estendeu a mão e secou a gota com o polegar. O olhar dela capturou o dele, os olhos arregalados de choque. Ele esperava ver reprovação naquele olhar verde e vibrante, mas não. Na verdade, o olhar dela mergulhou para os lábios dele, e os cabelos da nuca dele se arrepiaram.

Inferno, ela era uma beldade.

Um tesouro escondido no meio do nada.

Por ter tido seu quinhão de mulheres, ele conseguia ler os sinais de desejo melhor do que ninguém, e o corpo dele se agitou com a necessidade que emanava dela. Arthur se inclinou e segurou o rosto dela com as mãos. Ele ficou imóvel fora um sussurro de seus lábios.

A respiração deles se misturou, o cheiro dela, quente e doce, embriagou a alma dele. Ele nunca havia conhecido alguém tão única. Uma mulher tão diferente daquelas com quem ele deveria se casar.

Ela era inebriante.

— Vou beijar você, Hallie. — ele disse, roçando seus lábios nos dela.

Como ele esperava, eles eram macios, dóceis sob os seus. O

que ele não esperava, entretanto, era que Hallie o beijasse de volta.

Não era um beijo de donzela, mas uma exploração profunda e completa de sua boca. O mundo dele virou de ponta a cabeça, girou e acelerou de forma desconhecida. E ele estava perdido com ela no meio do nada, felizmente.


CAPÍTULO 3

Temporada de Londres, 1824

H ALLIE ESTAVA no baile de abertura do duque e da duquesa de Whitstone, ao lado de suas melhores amigas em todo o mundo, era a temporada de 1824 em Londres.

Todos os que eram alguém aceitaram o convite para ir à casa do duque em Londres, aberta apenas em raras ocasiões nos últimos anos devido ao fato de o duque e a duquesa administrarem um Haras bem-sucedido dedicado a cavalos de corrida. Um empreendimento tão grande os mantinha ocupados a maior parte do ano.

Mas, como acontece com pessoas de tão alta posição, às vezes havia um dever para com o nobreza, e Sua Graça tinha responsabilidades na Câmara dos Lordes.

— Tantas pessoas aqui. Estou certa de que nem todos caberemos neste salão se as pessoas continuarem chegando dessa forma.

Hallie assentiu, distraída, para a amiga Willow, sua observação talvez bem correta.

No entanto, o duque e a duquesa haviam planejado bem, e havia outras opções para seus convidados. Uma grande sala de jantar estaria aberta durante toda a noite, além de uma sala de jogos que Hallie podia ver, de onde estava, que já estava cheia de cavalheiros apostadores.

As quatro portas do terraço estavam entreabertas, permitindo que um pouco do exterior adentrasse o salão. A noite estava

amena, e um passeio ou conversa ao ar livre não seria desconfortável. Estar na Inglaterra, e rodeada por um grupo social que ela jamais esteve, era estranho. Hallie observou a alta sociedade agindo, a cabeça dela estava sempre dividida nos últimos tempos. Parte de sua vida a obrigava a tomar parte deste mundo.

Ser vista devido a amizade com Ava, a duquesa de Whitstone. Mas seu coração também se voltava para o filho que, naquele momento, estaria no mais profundo dos sonos se sua prima estivesse seguindo a rotina que Hallie havia imposto.

Hallie verificou o vestido que usava, grata que a amiga tivesse emprestado um modelito adequado para a noite. Hallie não era de muitas posses, a não ser uma boa educação e um chalé em Felday, ao qual ela não poderia voltar no momento, pois estava alugado.

Mas um dia ela voltaria para casa com o filho. A próxima escavação em Somerset ajudaria a atingir esse objetivo, e se ela fosse capaz de conseguir algum outro trabalho semelhante, sua independência financeira estaria garantida.

Um lacaio passou com uma bandeja de champanhe, e ela pegou uma taça. Precisava de coragem para enfrentar a noite, ou pelo menos uma pessoa em particular, que estaria aqui e que ela não via em três anos, não desde a noite do incêndio na propriedade de Ava.

Lorde Duncannon.

O mesmo homem que se hospedou em sua casa e partiu antes mesmo que ela acordasse no dia seguinte. Sem uma única palavra.

Ele era um libertino e um charlatão, ambas acusações ela poderia lançar à porta dele. Que o duque de Whitstone fosse o melhor amigo do cavalheiro fazia pouco sentido, e ela mais de uma vez perguntou a Ava como seu adorável e charmoso marido poderia ser amigo de um idiota.

Hallie balançou a cabeça, envergonhada por suas ações naquela noite em Felday. O que ela fez foi tão estranho que a fez pensar que havia perdido a cabeça. O que era bem possível, considerando seus atos.

— Ó, olhe, Ava e Sua Graça estão abrindo o baile com uma valsa. Que adorável. — disse Evie, observando-os com adoração e nostalgia.

Evie era outra colega de escola que havia sido enviada à França, um cavalheiro se aproximou dela e a convidou para dançar. Hallie sorriu, feliz que amiga estivesse se divertindo. Mesmo que ela dançasse apenas uma vez esta noite, seria o suficiente para Evie considerar o baile como um evento inesquecível em sua opinião.

— Pare de apertar sua taça de champanhe, Hallie. Você vai quebrar a haste de cristal.

Hallie relaxou os dedos em torno do copo, sem perceber que o segurava com tanta força.

— Desculpe, só estou cansada. A viagem do Egito foi longa e não creio que ainda tenha me aclimatado ao frio daqui. Também não dormi muito bem, já que são necessários dezenas de cobertores pesados em cima de mim para que eu não congele.

— Ou... — disse Willow, inspecionando-a como se ela estivesse analisando um novo par de luvas de pelica. — Você está nervosa.

Hallie franziu a testa e voltou-se para os dançarinos, ignorando a amiga. Teria ela descoberto, de algum modo, sobre ela e seu filho?

Nenhuma das amigas sabia de sua desgraça e nem saberia se ela pudesse evitar. O filho estava feliz e morava com a prima dela em Berkshire, e se dependesse dela, seria criado sem a mancha da ilegitimidade obscurecendo seu nome.

— O que há para me deixar nervosa? Estou prestes a iniciar minha própria escavação em Somerset. Estarei longe da terrível

sociedade e não terei que dar satisfação a ninguém além de mim pelos próximos três meses. Eu sou a mulher mais feliz aqui, tenho certeza. — ela mentiu, preferia ficar com o filho, mas não podia. Ela precisava ganhar dinheiro para garantir que ele estivesse seguro.

Nada mais importava.

— Então se eu contasse a você que Lorde Duncannon a está devorando com os olhos, desde o outro lado do salão, você não reagiria de modo algum?

As pernas dela fraquejaram com a ideia dele a observando. Da melhor forma que pôde, ela olhou para a amiga e fingiu indiferença.

— Diga-me que não é este o caso.

Ela não queria vê-lo e decerto não queria falar com ele. Sr.

Arthur Howard, de fato. Ele a enganara no passado, mas ele não iria ludibriá-la outra vez. Já havia sido ruim o suficiente quando ela chegou a Londres e soube que ele era o benemérito recém-nomeado para o Museu de Londres, o local que ela deveria entregar as últimas descobertas do Sr. Shelly no Egito. Era a última de suas obrigações com o egiptólogo, que havia declarado que aquela seria sua escavação final no Egito e, portanto, seu cargo sob o comando do cavalheiro havia chegado ao fim.

Felizmente, no dia em que ela entregou os artefatos, Lorde Duncannon estava ausente, e ela não teve a infelicidade de ter que tratar com ele.

— Ele está, e não tirou os olhos de você nos últimos cinco minutos. — Willow lançou um olhar curioso para ela. — O que aconteceu entre vocês dois? Ele parece gostar de você, mas você é muito fria e distante. Não faz sentido. Um casamento com um homem tão importante permitiria que você fizesse o que quisesse pelo resto de sua vida.

— Exceto que não. — respondeu Hallie com veemência.

Os Duncannon eram conhecidos por se casar bem. Ava havia mencionado quando ela retornou do Egito pela primeira vez, que os Duncannon colocavam riqueza e posição acima de tudo. Ela era a mãe de um menino, um filho ilegítimo. Ela duvidava que Lorde Duncannon fosse tão favorável a ela se soubesse seu segredo.

— Estou muito abaixo na esfera social para ser qualquer coisa além de um brinquedo para Sua Senhoria. — e isto era um fato consumado. — E eu não desejo me tornar nem a empregada, nem a égua parideira de ninguém.

— Não precisa ser assim. Veja Ava, por exemplo, ela ainda é uma empresária de sucesso. Casar-se com o duque não a impediu de administrar o Haras.

— O duque é uma exceção à regra.

Havia poucos homens nesta sociedade que permitiriam tal liberdade a suas esposas. Ava teve sorte na escolha. Hallie teria sorte à sua própria maneira. Havia seu filho, e ele era seu futuro. Ela não precisava de um marido, desde que pudesse continuar a trabalhar e obter uma renda.

Willow estendeu a mão, tocando seu braço.

— Espero que você não se afaste da vida apenas porque amou e o perdeu, Hallie. Eu sei que você amava Omar, mas ele não está mais entre nós, e há uma possibilidade de que você encontre esse tipo de amor mais uma vez. Por favor, não continue se escondendo em escavações arqueológicas para fugir de uma vida. Nós queremos que você seja feliz. Que se case e seja amada.

Hallie suspirou.

Como diria às amigas que não era isso que ela queria. Não de verdade. Ela ficaria muito satisfeita se não se casasse, desde que pudesse continuar seu trabalho e fizesse seu filho feliz, o mantivesse seguro. A Inglaterra estava repleta de sítios históricos,

principalmente Romanos, ali à espera de serem explorados. Ter um marido só a atrapalharia de encontrá-los, e ela duvidava que houvesse muitos homens por aí desejando um filho ilegítimo debaixo de suas asas. Por isso que ela havia aceitado a oferta de escavação em um antigo forte romano que supunha-se estar localizado na propriedade do Barão Bankes, perto de Dinnington em Somerset.

Era a melhor opção fora do Egito, e os sítios romanos revelavam moedas, cerâmica, azulejos com muita frequência, e até mesmo armas. Muitas coisas interessantes para serem catalogadas e entregues ao museu britânico assim que a escavação fosse concluída.

— Se eu pudesse encontrar um marido que se contentasse em viajar, passar o dia todo cavoucando a terra e tivesse a mente aberta, ficaria muito satisfeita. Mas você sabe tão bem quanto eu que essa não é uma possibilidade. Todos os cavalheiros aqui estão muito ocupados com suas muitas propriedades. Eu garanto que pode haver alguns que gostariam de um pouco de aventura, mas logo se cansariam.

— Lorde Duncannon nunca parece se cansar de você. Segundo Ava, ele fala de você o tempo todo. Claro que ela não o pressionou para revelar o motivo de tanto interesse, mas é nítido. Você pode ter um admirador lá.

Ela sentiu-se revolver em nervosismo com a ideia de que Sua Senhoria havia perguntado dela para a amiga. Quando eles se viram juntos três anos antes, em decorrência do incêndio na propriedade de Ava, ela quase engoliu a língua em choque ao revê-

lo. Depois da noite em que ele passou na cabana dela em Felday, ela jurava que jamais o veria de novo.

Ela havia ficado tão brava com ele que não fora capaz de deixar o passado para trás e seguir em frente como amigos. Durante o tempo em que se viram obrigados a dividir os espaços, devido ao casamento de Ava com o duque, ela mal havia trocado palavras com ele. Ele merecia menos do que isso.

Muitas coisas mudaram desde a noite em que se conheceram.

Ela conheceu e se apaixonou por Omar, deu à luz um filho dele.

Quando ela descobriu que ele havia morrido, haviam se passado apenas algumas semanas que havia descoberto estar grávida.

Felizmente, a essa altura, o professor estava encerrando a expedição e logo voltariam para casa.

Hallie viajou com ele até a França e depois voltou para Berkshire, para a casa da prima, onde deu à luz e manteve a notícia do nascimento de seu filho em segredo de todos que conhecia.

Ela encheu-se de vergonha de tão ter se casado com Omar como planejavam, mesmo que a família dele pensasse diferente.

Um erro que ela nunca seria capaz de reparar. Ela tomou um gole da bebida que segurava para conter a agitação que a dominava por dentro.

— Não ligo para o interesse dele, e ele bem sabe.

— Sabe mesmo, Hallie? — Willow perguntou enquanto olhava para os dançarinos diante delas. — Não me parece saber.

Hallie não estava certa se ele sabia mesmo, mas ela, com certeza, não havia mostrado interesse em Sua Senhoria da última vez que se viram. Um desejo irresistível de bater o pé a assaltou. Se ao menos ele não fosse amigo do duque. Se ao menos ela o tivesse deixado congelar na estrada em Surrey naquele fatídico dia, talvez ela não estaria sofrendo essa análise profunda da própria amiga agora, ou a atenção marcante do visconde que estava do outro lado do salão.


— Vou lembrá-lo caso ele pergunte. — disse ela. — Estou surpresa de que ele ainda não esteja casado. Sabe dizer se ele já teve ligação romântica com alguém?

Por que ela perguntava, ela não sabia dizer. Só que um homem tão bonito como o visconde era, permitia a suposição de que ele teria se casado com um diamante da alta sociedade anos atrás.

Afinal, este sempre foi jeito da família dele de fazer as coisas.

Sua amiga a observou de perto.

Hallie lutou para não se sentir afetada pelo fato de um dos homens mais procurados de Londres estar olhando para ela.

— Por que tenho a sensação de que você conhece Sua Senhoria melhor do que me diz que conhece? Ora, Hallie, somos melhores amigas. Você pode confiar em mim.

Ela sorriu, obrigando-se a permanecer indiferente.

— Eu não o conheço bem, eu juro. — ela disse.

Uma noite juntos em uma cabana não dava a ela mais percepção do que qualquer outra pessoa que passasse uma noite com ele como agora. Era bobagem imaginar o contrário.

ARTHUR ESTAVA PARADO do outro lado do salão e absorveu a visão que era a Srta. Hallie Evans. Maldição. Ele não acreditava que sentiria tanta falta da mulher como havia sentido. Uma única noite em Surrey havia deixara uma marca permanente em sua mente, e ele não iria parar até que ela fosse tão despreocupada e doce como fora naquela noite de inverno.

Na manhã seguinte, depois de uma noite em seus braços, a despedida deveria ter sido agridoce, com promessas de voltarem a se ver. Ele acordou cedo e foi até a pousada, queria pedir uma

carruagem para ele e Hallie seguirem para Londres. Havia esperança de poder passar algum tempo junto dela antes que ela deixasse a Inglaterra.

O fato de seus amigos patifes estarem na pousada procurando por ele, o forçou a subir na carruagem e voltar para a cidade sem que ele quisesse de fato, e sem dar à Srta. Evans o dinheiro prometido. Tudo isso o irritava ainda.

Ele não saíra mais com eles desde aquela noite, e ele sabia que era o motivo pelo qual ela o tratava com tanta frieza sempre que seus caminhos se cruzaram desde então. Ela ignorou todas as suas tentativas de explicação e desculpas.

Ele não a havia encontrado até aquela noite no baile da duquesa-viúva de Whitstone. Whitstone estava furioso por Ava ter sido proibida de entrar no baile, e ele lembra-se de olhar para cima e ver a mulher que ele pensava estar perdida para sempre, avançando em direção a eles como um guerreiro.

As pernas dele ameaçaram ceder ao vê-la e demorou algum tempo antes que ele pudesse murmurar algo coerente. Não que ela quisesse ouvir uma palavra dele, a menos que fosse em resposta sobre o fato de a amiga dela ter sido tratada de forma injusta pela mãe do duque e que precisava de sua ajuda.

Arthur avançava na direção dela agora, movia-se através da aglomeração de corpos, o tempo todo mantendo os olhos em sua pessoa. Hallie. Até o nome dela fazia seu coração disparar. Esta noite ele explicaria a ela o que aconteceu, por que ele foi embora e não voltou. Ela não quis ouvir nada dele quando ele a daquela última vez, três anos atrás, mas ele não permitiria mais que ela pensasse o pior dele. Ela saberia a verdade, e só então poderia decidir se queria continuar a ignorar sua presença ou se pelo menos

poderiam ser amigáveis. Ele curvou-se diante dela e sorriu enquanto a amiga dela lhe desejava boa noite antes de sair.

— Srta. Evans, que bom vê-la aqui esta noite, não sabia que estaria presente.

Ela ergueu a sobrancelha, e o olhou com ar de rejeição. Um pouco de sua esperança se dissipou com a recepção fria dela.

— Creio que você sabia que eu estava de volta a Londres, Lorde Duncannon. Claro que eu viria ao baile de minha amiga.

Ele parou ao lado dela, e o cheiro de jasmim flutuou da pele dela. Ele sentiu-se transportado de volta para Surrey, para a pequena cabana dela. Ela ainda teria um gosto tão doce quanto a flor? Ele cerrou os punhos ao lado do corpo, sabendo que pensar nela de tal maneira não ajudaria sua causa de fazer as pazes. De serem ao menos amigos.

— Eu esperava que você estivesse aqui. Faz algum tempo que quero conversar com você.

— Mesmo? Fale então, Sr. Howard, por favor... ah, desculpe, erro meu, Lorde Duncannon. — ela emendou.

Ele olhou para ela, supondo que merecia o desdém.

Arthur notou o adorável tom dourado da pele dela, o brilho claro das sardas em seu nariz, que não estava lá quando se conheceram.

Ela era uma mulher bem viajada e independente agora, mais do que quando se conheceram. Ele estava maravilhado com a habilidade dela de envergonhá-lo. Ele havia feito muito pouco nos poucos anos em que estiveram separados, exceto tentar escapar das muitas propostas de casamento que a avó dele o cobrava a fazer a uma das mulheres que ela considerava apropriadas. Ele só podia imaginar a vida que a mulher diante dele havia experimentado no exterior. Infelizmente, ele nem da fronteira com a Escócia havia

passado nos últimos anos, enquanto ela já havia visto parte do mundo com que as pessoas sempre sonharam.

— Queria explicar por que desapareci naquela manhã em Surrey. É algo que não sai da minha mente há alguns anos.

Ela dispensou as preocupações dele com a mão, mas recusou-se a olhar para ele.

— Isso foi há muito tempo, meu senhor. O melhor, acredito eu, é que a deixemos no passado, onde pertence.

— Por favor, deixe-me explicar, Srta. Evans. Eu quero que sejamos amigos, já que compartilhamos amizades, e haverá muitas ocasiões em que estaremos juntos.

Tudo verdade, é claro, mas não era a única razão pela qual ele queria que ela gostasse dele. Ele gostava dela, mais do que qualquer pessoa que ele conhecia, e odiava que ela pensasse o pior dele, não quando, na verdade, a partida apressada não havia sido culpa dele.

Ela olhou para ele então, e a ligeira queda de seus ombros disse a ele que ela havia sucumbido ao seu apelo.

— Muito bem, diga-me o que aconteceu com você naquela manhã.

Ele sentiu alívio varrer seu corpo por ter a oportunidade de contar a verdade.

— Fui à estalagem para pedir uma carruagem para Londres. Eu estava com toda a intenção de voltar até você, mas meus amigos, os mesmos que me deixaram na estrada na noite anterior, chegaram me procurando. Eles me colocaram na carruagem antes que eu pudesse explicar e se recusaram a parar até chegarmos a Londres. Não vou entrar em detalhes acerca de como estavam ansiosos, mas nem preciso dizer que, ao chegar de volta à cidade,

tentei rastreá-la nas docas, sabendo que iria para lá. Eu vi o Ariande zarpar. Eu me atrasei e perdi a chance de me despedir.

Ela o observou por um momento, e um pouco do fogo que queimava em seus olhos diminuiu com a explicação dele.

— Obrigada por me contar, meu senhor. Fico feliz em saber que você não é tão inconstante e rude como eu imaginava.

— Eu não sou, Srta. Evans. — ele desejava que ela acreditasse nele. — Pensei em você com frequência. Imaginava o que estaria fazendo, e como havia se acostumado ao país mais quente. Sua Graça disse que você voltou para cá agora, que seu trabalho com o Sr. Shelly terminou. Possui planos para o futuro?

Um pequeno sorriso brincou nos lábios dela, lábios que ele há anos sonhava em beijar outra vez. Não importava quantas mulheres ele tivesse levado para a cama, ele não era tolo o bastante para não notar que todas elas eram parecidas com a Srta. Evans. Todas com os mesmos olhos amendoados e lábios carnudos, cheios. Não que tal semelhança o ajudasse, pois nenhuma delas dominava sua cabeça. Nenhuma delas era ela.

Hallie.

Como uma noite pode mudar tanto a vida de alguém? Não fazia sentido. Ele tentou com afinco superar tal paixonite, mas falhou em todas as tentativas. A avó estava desesperada por ele ainda não ter se casado, mas ele não podia deixar de sentir que a Srta. Evans era a outra metade de sua alma. Aquela por quem ele deveria deixar de lado todos os deveres familiares, e se casar. Se ao menos ela jogasse uma migalha a ele, um pouco de esperança de que ela não o odiava e desconfiava dele tanto quanto ele temia.

— Vou fazer uma escavação em Somerset. Parto para lá amanhã, na verdade. O Barão Bankes é o cavalheiro que me contratou, e devo admitir que não tenho certeza de quem ele é,

embora o duque de Whitstone tenha atestado seu caráter, então tenho certeza de que será seguro.

— Estou certo de que sim. — disse ele, conhecendo bem o barão. — Acho fascinante que você tinha um sonho, trabalhou com afinco e o realizou. Poucas mulheres fazem o que você fez, Srta.

Evans. Deveria escrever um livro. Tenho certeza de que seria muito benéfico para as jovens que desejam seguir seus passos.

Ela deu uma risada, e todo o ar dos pulmões dele desapareceu ante tal feito.

— Não, vou continuar a fazer o que amo enquanto eu puder e ficar contente. Mas, creio que sou sortuda de ter tido um pai que me permitiu primeiro estudar e depois viajar para o exterior. O Sr. Shelly também é uma mente liberal, o que me ajudou muito.

Arthur sorriu, suas veias aquecendo com as palavras dela.

— Eu imagino que sim.

Os músicos ergueram seus instrumentos, e o som de um minueto saiu de suas cordas. Arthur estendeu o braço.

— Você me concede a honra, Srta. Evans?

Ela olhou para o braço dele por um momento, e ele não estava certo de que ela aceitaria. Alívio se derramou por ele quando ela colocou a mão em seu braço.

— Claro, obrigada, meu senhor.

Ele a levou para a área de dança quando a música começou.

Eles tomaram seus lugares, outros fazendo fila ao lado deles. Pelo menos este era um começo, um recomeço para uma história que o atormentava há anos.

Ele odiava o fato de ela pensar mal dele, ainda por terem sido os amigos dele que o haviam interceptado naquela manhã, interrompendo seu contato com a Srta. Evans antes que ele cumprisse a promessa e se despedisse. Hallie, como ele sempre


pensava nela, foi a única mulher que escapou dele. Ela não escaparia assim tão fácil pela terceira vez, ele se prometeu que não.

O Sr. Robert Stewart estava parado na lateral do salão de baile e observou enquanto a Srta. Hallie Evans circulava pelo cômodo com as amigas, uma das quais era a Duquesa de Whitstone. A megera que matou seu primo anos atrás.

A duquesa era quase impossível de se chegar perto nos últimos tempos, mas a amiga, a outra mulher que participara daquele trágico acontecimento era muito mais fácil de ser pega. Se ele não pudesse se vingar da duquesa, machucaria a amiga dela, a Srta.

Evans, da mesma forma que a duquesa matou o primo dele. Ele ficaria contente com algo semelhante.

Esta noite a Srta. Evans já havia passado por ele inúmeras vezes. Tão perto que ele foi capaz de estender a mão e tocar seu vestido. Ela não notara, claro. Ele era um especialista em passar despercebido. Mesmo assim, ter Lorde Oakes como primo permitiu que ele circulasse nesta esfera, mesmo depois de tudo o que o primo havia feito a tantas pessoas de posição.

A alta sociedade era tola. Ele duvidava que muitos deles fossem seres inteligentes. Além da Srta. Evans, que ele sabia ser uma mulher muito inteligente e bem-educada. Mas não o suficiente para esconder tudo o que era.

Uma mãe...

E se não bastasse ser mãe, era a mãe de um filho bastardo e mestiço. Ele tomou um gole de vinho, observando-a por cima da borda do copo. O homem a quem ela dera um filho estava morto há muito tempo, mas a família dele era influente e poderosa no Egito,

no Cairo para ser mais preciso, e ele sabia que pagariam muito bem se soubessem que o filho mais velho era pai de um menino. Dentro ou fora do casamento.

A única pergunta dele era: quanto a Srta. Hallie Evans estaria disposta a pagar para garantir que ele ficasse de boca fechada? Ele sorriu ante a ideia de tudo que poderia obrigá-la a fazer. Ah sim, esta temporada seria realmente prazerosa. Para ele, pelo menos.


CAPÍTULO 4

H ALLIE OLHOU ao redor do cômodo em que havia sido alocada. Ela perguntou à criada que a trouxera até o andar de hóspedes se poderia se tratar de um erro. Ela estava certa de que o Barão Bankes desejaria que ela ficasse no andar dos criados.

A moça se mostrou inflexível de que não era o caso e trouxe o baú dela, guardou seus pertences com rapidez e eficiência e avisou que se ela precisasse de ajuda, que bastava tocar a campainha, e ela viria imediatamente.

— Ó, e antes que eu esqueça, Srta. Evans. O jantar é às sete em ponto, caso queira jantar lá embaixo. No entanto, você pode comer em seu quarto, se preferir.

A criada fez uma rápida reverência e foi embora.

Hallie olhou ao redor do quarto, a grande e imponente cama de casal estava bem no centro, e ainda assim era a única peça de mobília masculina que ela podia ver. Todo o resto era branco, as almofadas azuis e rosas, extremamente femininas e bonitas.

Nem um pouco parecido com como Hallie era em vida, mas ainda assim, ela adorou. A decoração a fazia se lembrar do quarto de sua mãe na Residência Felday antes de precisarem vendê-la.

Ao chegar, ela fora informada de que o barão só chegaria dentro de alguns dias, mas que a partir do dia seguinte ela teria a ajuda de dois cavalariços que fariam qualquer trabalho pesado ou escavação de que ela pudesse precisar no sítio do forte romano.

Hallie desamarrou o chapéu e o deixou em uma cadeira próxima antes de caminhar até a janela e olhar para o terreno. Havia várias

colinas que ela conseguia distinguir. Pela correspondência trocada com o barão, ela sabia que uma das colinas outrora abrigou um forte romano e que havia relatos de que uma família romana chegou a morar no posto à época. A possibilidade de descobrir alicerces de velhas construções, cerâmicas, moedas ou equipamento militar fazia o sangue pulsar rápido em suas veias. O soldo que ela ganharia também ajudaria em seu plano para um futuro seguro com o filho.

A pequena cabana que seu pai deixou para ela em Felday seria o lar deles. As pessoas da aldeia acreditariam na história de que seu marido havia morrido, e seu filho seria aceito lá. Seu pai era um cavalheiro respeitado, e ela sempre prestou ajuda à igreja e aos necessitados. Eles iriam apoiá-la e protegê-la, ela estava certa disso. Este trabalho na propriedade do Barão era mais um passo em direção a à vida que ela queria proporcionar ao filho. As próximas semanas aqui em Somerset seriam agitadas e emocionantes, e ela mal podia esperar para começar.

Hallie sentou-se à pequena escrivaninha e, pegando a pena e um pergaminho, começou a escrever uma carta para a prima e para o filho. Os dois estariam curiosos para saber da chegada dela a esta propriedade, e dos planos dela para enquanto estivesse por ali.

NO DIA SEGUINTE, depois do desjejum, Hallie saiu pela saída dos criados para onde dois homens do estábulo: fortes, jovens de idade parecida, ela deduziu. Eles a esperavam perto das portas do estábulo.

— Olá, sou a Srta. Hallie Evans. É um prazer conhecer você. —

ela estendeu a mão e apertou a mão de ambos.

— Eu sou Greg e este é Bruce. É um prazer trabalhar com você, Srta. Evans.

— Por favor, me chame de Hallie. Vamos passar muito tempo juntos, nada mais justo que deixemos as formalidades de lado.

Eles tiraram os chapéus.

— Claro, senhorita... Quero dizer, Srta. Hallie.

Hallie gesticulou para que eles fossem na frente.

— Se tiverem a gentileza de me mostrar o local onde ficava este forte romano, eu ficaria muito grata.

Os homens pegaram seus carrinhos de mão cheios de pás e baldes e o equipamento dela que havia sido enviado na semana anterior e começaram a rumar para o oeste da propriedade. A caminhada foi difícil, e tiveram que passar por uma pequena floresta que circundava a base da colina antes de se abrir para uma área limpa de terreno. Levaram meia hora para chegar ao topo da pequena colina, e Hallie parou por um momento para apreciar a vista que a altura proporcionava a ela sobre Somerset. Dali, ela conseguia ver a propriedade do Barão Bankes aninhada na ravina abaixo, as janelas brilhantes e as paredes de arenito destacavam-se como um farol acima das terras verdes e exuberantes.

Bem devagar, Hallie se virou e observou a paisagem de pequenas colinas, vilas, rios e campos. Um caleidoscópio de cores e uma das vistas mais bonitas com as quais se poderia trabalhar. Por mais que ela amasse o Egito, o calor, a areia e as pessoas; ela sentiu falta de sua terra natal.

A terra verde e exuberante que estava sujeita à chuva teria sido bem-vinda de vez em quando no exterior, decerto que sim durante um longo verão, onde as temperaturas aumentavam. Hallie não pensava que sentiria falta do frio e da umidade, mas às vezes se pegava nesse saudosismo.

Com a ajuda dos cavalariços, ela montou uma pequena tenda ao lado da colina, bem longe de onde os supostos vestígios romanos seriam escavados. Os homens conversaram, contando a ela sobre a área, acerca do que suas famílias sabiam que existiam aqui e para que pensavam que as ruínas haviam sido usadas. Em uma hora, tudo estava no lugar e pronto para quando começassem a escavação no dia seguinte.

— Vou fazer esboços aqui pelo resto do dia, então, podem retornar à propriedade se assim desejarem.

Greg enxugou a testa, apoiando-se em um longo martelo que usava para bater nos postes que marcavam a trincheira a ser cavada.

— Tem certeza, Srta. Hallie? Talvez não devêssemos deixá-la sozinha aqui.

Bruce assentiu, torcendo o boné nas mãos.

— Greg está certo, senhorita. Não devemos deixá-la aqui sozinho.

Hallie descartou as preocupações deles, tendo trabalhado com supervisão mínima no Egito. Ela estava acostumada a ficar sozinha em locais de escavação. O Egito era muito mais perigoso do que a Inglaterra, e não havia nada para ela temer por aqui.

— Vou ficar bem, voltarei para a propriedade para o jantar. Tenho tudo de que preciso aqui agora e, na verdade, não posso impedi-los de trabalhar por nem mais um minuto. — acrescentou ela, vendo que nenhum dos dois parecia confortável em deixá-la sozinha na encosta da colina. — A menos que haja alguma ameaça à minha pessoa da qual eu não saiba. Há? — ela perguntou.

Os dois homens balançaram a cabeça, pareciam negar tal ideia.

— Claro que não, Srta. Hallie. Vamos deixá-la com o seu trabalho.

Hallie tirou um caderno de couro da bolsa, estava bem desgastado. Ela caminhou pela área que o Barão Bankes havia mencionado em suas cartas e deu uma olhada nos pequenos esboços que ele havia fornecido.

Havia um declínio notável do solo em certas áreas que, como um todo, com certeza davam indícios da possibilidade de ser onde as paredes externas do edifício ficavam abaixo da terra.

Ela pegou sua pequena cadeira e sentou-se, desenhando o local: cada pedra que estava na área agora intocada por centenas de anos ou mesmo desde a época em que o forte supostamente estava aqui. Por horas, ela se perdeu nos desenhos, movendo-se e desenhando de diferentes ângulos e graus. Por fim, ela olhou para as muitas páginas que havia preenchido em seu caderno de desenho, feliz com seu progresso.

Uma brisa soprou em sua pele, e ela olhou para o oeste, surpresa ao ver o sol baixo no horizonte. Ela estremeceu com o ar noturno que começava a pairar sobre a terra. Hallie se levantou, entrou na tenda e vestiu o sobretudo, uma peça de roupa em geral usada por homens, mas que ela achava indispensável quando estava na Inglaterra. Depois de anos no exterior em climas mais quentes, o clima úmido da Inglaterra ainda não era algo a que ela estivesse acostumada.

Antes que a luz se fosse, Hallie empacotou tudo o que podia ficar no local, guardando na tenda o melhor que pôde antes de voltar para a propriedade. Havia postes iluminando todo o caminho de cascalho, e a casa também estava bem iluminada, muito diferente de como a propriedade parecia à luz do dia.

Ela parou bem perto de onde a floresta terminava e observou as carruagens chegarem diante das portas duplas da frente,

convidados saindo dos veículos, suas roupas de viagem amassadas e amarrotadas contando suas longas jornadas.

Talvez o barão tivesse chegado antes do planejado. Hallie contornou o bosque, dando a volta pelos fundos da casa, não queria ser vista em seu traje atual, além de estar cansada demais para comparecer a qualquer jantar ou entretenimento que Sua Senhoria tivesse planejado para seus convidados.

Chegando à entrada dos criados dos fundos, ela abriu a porta, limpou as botas de algodão no tapete externo antes de entrar e fechou a porta para a noite fria, que havia caído mais rápido do que ela pensava. Ela teria que se assegurar da próxima vez que terminasse na escavação, de dar a si bastante tempo para retornar à propriedade. Ela odiaria se perder e ficar presa em um local que não conhecia.

Hallie tirou as luvas e abafou um grito quando uma presença sombria encostada na parede se endireitou e saiu para a luz. Ela sentiu a boca abrir e fechar, engolindo a surpresa.

— Lorde Duncannon. — em um cantinho da mente, ela se lembrou de fazer uma reverência e, com irritação, sentiu o calor de um rubor subir em suas bochechas.

Ela não esperava ver Sua Senhoria aqui.

Ele com certeza não mencionou uma viagem para Somerset quando ela contou dos planos dela. Sempre que estavam juntos devido à amizade mútua com o duque e a duquesa de Whitstone, era estranho e quase intolerável, e esse encontro casual não era diferente.

— Senhorita Evans. — ele disse, se curvando. — O Barão Bankes me convidou para ficar na residência dele para a festa de um mês que dará em sua propriedade. Vejo que a senhorita já está trabalhando duro em busca de artefatos históricos.


Os olhos deles a analisaram, os lábios se retorcendo ao notas as calças em vez de um vestido. A inspeção que ele fez feriu seu orgulho, e ela ergueu o queixo, ciente de que não era a mulher normal, decerto não era o tipo de dama que ficava esvoaçante diante de espelhos o dia todo e nem se importava com o que diria a última edição de La Belle Assemblée. Mulheres como essas serviriam bem a Lorde Duncannon e sua estimada família.

— Como você vê. — ela disse, passando por ele e indo em direção à escada dos criados. — Você não deveria estar com seus amigos em vez de apontar minhas deficiências, meu senhor?

Ele ignorou a pergunta.

— Você não vai se juntar a nós esta noite, Srta. Evans? — ele perguntou, virando-se, mas sem segui-la.

Hallie lançou um olhar de rejeição a ele, que ela esperava que ele entendesse. Ela não queria que ele a seguisse, nem desejava, com toda a sinceridade, ser trazida para os pequenos festejos aristocráticos que o barão estava promovendo. Ela pode ter uma duquesa como melhor amiga, mas era aí que sua associação com a alta sociedade começava e terminava. Ela não fazia parte daquele mundo, e nem desejava fazer. O que aconteceu entre eles em um passado longínquo provou que homens como Sua Senhoria eram indignos de seu tempo, nada a convenceria a ir.

— Não, então caso me dê licença, devo voltar para o meu quarto. Boa noite, meu senhor.

ARTHUR SE REPREENDEU por sentir prazer com a visão que ela era naquelas calças de pele de gamo e as botas de algodão. Sem mencionar a camisa e jaqueta que acentuavam a forma doce dela,

de uma maneira deliciosa. A Srta. Evans desapareceu escada acima, e ele esfregou a mão no queixo.

Bem quando ele pensava que estava fazendo progressos com ela, avançando em uma amizade nova, ele estragava tudo com sua apreciação descarada, em vez de perguntar se o primeiro dia no local de escavação foi bem-sucedido.

Idiota.

Ele gemeu por dentro, a visão da bunda dela enquanto desaparecia escada acima cravada em sua mente. Ele precisava de uma grande dose uísque e de um banho frio. Ele fechou os olhos por um momento para ao menos conseguir aparentar autocontrole.

Sempre que ele estava perto dela, a sensação de que ela era perfeita para ele não o deixava.

A família dele nunca concordaria, afinal ela era pobre, uma traça de biblioteca, ele não tinha dúvidas, mas dane-se, ela era inteligente. Um ativo que vale mais do que criação e dinheiro combinados. Ainda mais porque ele não precisava de nenhuma dessas características em uma esposa. Não de verdade. A família dele pode ter sempre considerado esses dois item como indispensáveis, mas não era o caso dele. Não depois de conhecer a Srta. Evans há tantos anos. Agora ele queria algo totalmente diferente.

Ela.

Ele voltou para a sala de estar, e foi falar com o Baron Bankes, o anfitrião para o presente festejo rural. Uma das razões pelas quais ele aceitou o convite foi apenas pelo fato de saber que Hallie estaria aqui. O barão deixou escapar que ele a contratou para escavar suas ruínas romanas, e ele mal se conteve para vir logo. O barão convocou um lacaio para pedir mais vinho, dando um tapinha no ombro de Arthur em boas-vindas.

— O que está achando da minha casa, meu amigo? Acredito que haverá algumas mulheres muito atraentes e disponíveis aqui este mês. Damas que eu sei que sua avó aprovaria. — ele riu. —

Teremos um momento alegre, tenho certeza.

Arthur sorriu, observando a sala e encontrando poucas coisas que o tentassem. A única mulher que ele nunca conseguiu tirar da mente estava bem acomodada no andar de cima e nada tentada a se juntar às atividades no andar de baixo.

Um lacaio entregou a taça de vinho tinto, e Arthur tomou um gole satisfatório, apreciando os sabores de carvalho e terra que bombardeavam sua boca com a bebida bem envelhecida.

— Não vejo sua historiadora aqui esta noite. Ela está aqui? —

ele perguntou, não querendo que o barão soubesse que ele já a havia visto e que ela já havia descartado juntar-se a eles esta noite.

O barão assentiu com a cabeça, as bochechas avermelhadas de tanto vinho e pelo fogo estrondoso atrás dele. O anfitrião era um homem alto, de ossos largos e com uma visão alegre da vida. Ele gostava de artes e história, o que explicaria por que a Srta. Evans fora convidada para explorar suas ruínas.

— Ó sim, ela chegou ontem. Enviei uma mensagem lá para cima para que ela comparecesse se possível, mas não a forçarei. — o Barão Bankes se aproximou. — O pai dela era um pequeno fazendeiro, um cavalheiro, em Surrey, não um grande proprietário de terras, de forma alguma, e eu acredito que antes de ele falecer eles haviam perdido as terras e casa devido a dívidas e má gestão.

A Srta. Evans pode não se sentir confortável em nossa companhia, se você entende o que quero dizer.

Arthur assentiu, entendendo muito bem que ela precisava trabalhar para viver, e em um ramo de negócios incomum para uma mulher.

— Se você não se importa, eu gostaria de ajudá-la quando puder na escavação romana. Como sabe, sou o benemérito do Museu Britânico e achados históricos são sempre os mais interessantes para mim.

— Ah sim, esse pequeno detalhe quase me escapou da cabeça.

E o que está achando da posição?

Na verdade, Arthur achava a posição pouco inspiradora e com muito pouco para cuidar. Ser um benemérito em verdade, só significava que quando o museu precisava de fundos, era a carteira dele que era aberta.

— Muito satisfatória. — ele mentiu, tomando um gole de vinho para diminuir a fisgada por mentir na cara do amigo. — É por isso que estou interessado no trabalho da Srta. Evans.

Bankes concordou com a cabeça.

— Vou contar algo, mas peço que permaneça entre nós. Acho repugnante a ideia de uma mulher se engajar em um trabalho tão braçal e intensivo, mas a garota é muito determinada e parecia bastante desesperada por trabalho. Não consegui recusá-la. — o barão riu. — Não esqueçamos de que ela é bem próxima da duquesa de Whitstone e devo admitir, o rosto bonito fez parte do convencimento. Nunca se sabe, com uma mulher sob meu teto, podemos nos conhecer melhor até o final de sua estada. — Bankes deu uma cotovelada nele e piscou. — Se você entende o que quero dizer, é claro.

Arthur o encarou, sem querer abrir a boca para não a usar para gritar palavrões para o desgraçado por falar daquela maneira de Hallie.

— Ela é uma mulher profissional. Acho que suas lindas palavras podem se perder com ela.

Ele disse as palavras da maneira mais agradável que pôde, sem trair a raiva que fervilhava em suas veias pelo que o barão havia dito. Não ajudaria ninguém, nem mesmo Hallie, se ele se permitisse dizer o que realmente queria: que o homem ficasse bem longe dela, a menos que quisesse que alguém o alimentasse com uma colher pelo resto da vida.

— Não, acredito que ela estaria disposta. Inferno, ela passou anos no Egito sem uma acompanhante. Quão virgem ela poderia ser?

Arthur se engasgou com o vinho.

— Com todo o respeito, conheço a Srta. Evans através do duque e da duquesa de Whitstone que, devo lembrar a você, gostam muito dela. Não creio que falar dela dessa maneira convém a você, nem que desrespeite a Srta. Evans, devo pedir-lhe que pare.

Os olhos de Bankes se arregalaram, e as bochechas dele adquiriram uma cor profunda e avermelhada.

— Peço desculpas se o ofendi, Lorde Duncannon. Não tive a intenção de ser ofensivo. Eu estava apenas brincando, você entende. — Sua Senhoria sorriu para outro convidado do outro lado da sala. — Se me der licença, devo atender meus visitantes.

Arthur o observou partir, feliz com a solidão por um momento.

Ele precisava recuperar o controle de seu gênio, ele esteve terrivelmente perto de explodir ante a insinuação grosseira de Sua Senhoria em relação à Srta. Evans.

O barão precisaria ser vigiado, e a Srta. Evans também. Sob nenhuma circunstância, apesar do que ela pensasse dele em particular, ele permitiria que ela sofresse algum dano ou fosse ridicularizada apenas por causa de sua linha de trabalho, ou porque sua família dela enfrentou tempos difíceis. Ele não toleraria nada desagradável ou cruel.


CAPÍTULO 5

N A MANHÃ SEGUINTE, Hallie chegou ao local da escavação com cinco cavalariços, em vez de dois como no dia anterior. Eles a esperavam em cadeiras que carregaram até o local e ficaram de pé quando a viram chegar.

— Senhorita Hallie, estamos prontos para qualquer tarefa que nos confie. O barão nos deu permissão para trabalhar aqui durante o dia, então estamos apenas esperando sua instrução para começar.

— Maravilhoso, muito obrigada. — disse Hallie, alívio fluindo por ela por ter outros no local, e não dois homens, mas cinco.

Era bom que o barão considerasse que o trabalho dela ali valesse o tempo desses homens longe de tarefas na propriedade.

Tê-los aqui para ajudar com a escavação, uma tarefa trabalhosa, e que ela nunca gostara de fazer, garantiria ótimos resultados e mais rápido do que o esperado.

— Cavaremos uma trincheira no canto leste do sítio. — ela caminhou com os homens até o local a que se referia e apontou para o pequeno declínio no solo. — Aqui, creio eu, estão as paredes externas do forte. Se observarem a área de longe e de uma altura maior, o afundamento da terra é mais comum e óbvio. Vamos cavar através dele. Uns bons três metros de cada lado e três metros para baixo. O solo deve estar compactado, e se eu puder usar dois de seus homens aqui... — disse ela, movendo-se para onde ela queria que o excesso de terra fosse despejado. — pedirei que vasculhem a terra em questão para procurar por qualquer coisa de valor histórico que podemos ter deixado de ver.

Greg tirou o chapéu, os olhos brilhando de animação. Hallie supôs que, para homens que só costumavam trabalhar apenas com cavalos, essa tarefa seria uma pequena aventura na vida. A possibilidade de encontrar um artefato antigo era, em sua opinião, melhor do que cavar cocô de cavalo o dia todo.

— Muito bem, Srta. Hallie. Vamos começar agora mesmo.

Hallie seguiu em frente e guardou o almoço e a bebida, que a cozinheira separara para ela em uma cesta, na pequena tenda. Ela colocou um avental por cima da roupa para diminuir o impacto que seu traje poderia causar. Felizmente, os homens não haviam falado nada acerca das calças e das botas de couro cano alto que ela usava, além da camisa e jaqueta. Participar em tais escavações não era possível se a pessoa tivesse que usar um vestido, e ela se recusasse a ser impedida por qualquer roupa adequada para seu sexo.

Saindo da tenda, ela puxou o chapéu de aba larga, pegou uma pequena espátula de seu conjunto de ferramentas e foi até onde os homens estavam escavando. Trabalharam a manhã toda, parando apenas para comer e beber na hora do almoço.

No momento em que o fim da tarde se estabelecia acima da terra, a trincheira tinha uns bons dez centímetros de profundidade e alguns metros de largura e comprimento. Com a trincheira apenas no primeiro dia, Hallie já podia ver as antigas fundações romanas do forte começando a emergir de seu túmulo de mil anos.

Os homens, tendo terminado o dia, guardaram suas ferramentas e se ofereceram para acompanhar Hallie até a casa.

— Estarei com vocês em breve. Preciso desenhar as descobertas de hoje, depois voltarei para a propriedade. Obrigada, no entanto. — ela disse enquanto desciam a colina, o murmúrio da conversa sumindo junto com a luz.

Hallie puxou seu caderno de desenho, sentou-se em uma cadeira próxima e começou a desenhar. Ela se perdeu no desenho por um tempo, certificando-se de catalogar onde os pequenos objetos estavam colocados e o que ela supunha que fossem.

— Pensei em levá-la de volta à propriedade, Srta. Evans. Uma Lady não deveria estar aqui sozinha.

A mão dele pairou sobre o papel, e ela não precisou olhar para cima para ver que era Lorde Duncannon. O fato de ele chamá-la de lady a fazia ranger os dentes. Ela não era uma, nem nunca fora.

Decerto, ela nunca aceitou as normas a que uma mulher deveria se submeter frente à sociedade ou em qualquer lugar para ser sincera.

Ela ter passado uma noite na cama de Sua Senhoria, e ter um filho nascido fora do casamento eram a prova cabal disso.

— Não precisa fazer isso, meu senhor. Sou mais do que capaz de voltar para a propriedade do Barão Bankes.

Ele deu a volta onde ela estava sentada e, puxando outra cadeira próxima, sentou-se.

— Eu sei que você é mais do que capaz, mas eu queria vir e ver o que todos os convidados do barão têm falado o dia todo. Você é o assunto mais recente.

Hallie se encolheu por dentro.

Ela não queria ser a fonte de assunto de ninguém e nem queria que a sociedade desse pitaco em sua vida. Se descobrissem que ela deu à luz um filho fora da santidade do casamento, ela nunca mais trabalharia. Ninguém contratava uma rameira. Ao menos, é assim que a chamariam.

— Esta é apenas uma escavação arqueológica, meu senhor. A menos que encontremos algo de valor histórico significativo, não consigo ver como a sociedade ficará muito interessada. Como você pode ver — ela disse, gesticulando para a parede de pedra que

recebia os últimos raios de verão após séculos sendo enterrada. —, é apenas pedra. Não é ouro, joias ou algum artefato antigo feito de jade.

Ele olhou para a parede, um pequeno sorriso brincando em sua boca, e ela o observou por um momento. Permitiu-se desfrutar do belo rosto. Um rosto que desde o momento em que o pegou na estrada para Felday ela achou muito bonito para ser nobre. E era exatamente isso que ele era.

Uma vozinha a repreendeu por dentro.

Você também não foi exatamente nobre...

A amiga, Ava, contara várias histórias sobre as aventuras de Sua Senhoria na cidade. O cavalheiro era um brincalhão e não levava nada a sério. Ora, no dia em que se conheceram, o homem foi jogado para fora da carruagem do amigo, e tudo por diversão.

Não que ela achasse divertido. Ser expulso de uma carruagem para enfrentar as temperaturas gélidas do inverno inglês era a personificação da estupidez.

— Bankes mencionou que pode ser Romano. Após enfim pôr olhos em algo das ruínas, acredita nisso?

Ela assentiu.

— Sim. Século IV, e ao observar o terreno antes de começar esta trincheira, acredito que a teoria de que se tratava de um forte está correta. Pode acabar sendo uma villa, mas não parece grande o suficiente para ser uma delas.

Ele a analisou, e ela lutou para não mostrar inquietação sob o escrutínio dele.

— Você é uma fonte de informações, Srta. Evans. Não acredito que conheça uma mulher tão instruída quanto você.

— Minha educação no exterior foi boa, sem mencionar que trabalhar com o Sr. Shelly no Egito me forneceu conhecimento

incontestável e que só pode ser assimilado em um sítio arqueológico. Livros didáticos só podem ensinar um tanto a alguém.

— Posso ajudar amanhã? — ele perguntou, parando de olhar para a trincheira aberta pela metade. — Eu queria subir hoje, mas fui emboscado.

Ela suspirou de alívio por ele não a estar olhando mais. O

homem possuía a habilidade de enervá-la, e ela era muito mais educada e reflexiva quando ele olhava para outro lugar.

— É trabalho sujo. Nunca pensei que fosse o tipo de homem que gostava de sujar as mãos.

E de fato, olhando para as mãos dele sem luvas, ela notou que as unhas estavam bem cuidadas e perfeitamente limpas. Sua pele macia e sem marcas de sol. Hallie olhou para suas próprias unhas lascadas e sujas. O homem era mais bem cuidado do que ela, e ela era uma mulher.

— Eu gostaria de ajudar. Entre mim e você, Srta. Evans, um dia no topo desta colina cavoucando terra é muito mais atraente do que estar na propriedade e ter que fingir que quer estar lá.

Ela olhou para ele.

Por que a repentina antipatia por festas e socialização? Ele era conhecido por gostar de tais eventos. Ou pelo menos, costumava gostar. Teria ele mudado nos três anos desde que ela o viu pela última vez?

— Pode me ajudar se quiser, não vou impedi-lo. Mas precisa se vestir com um pouco menos de pompa. Eu odiaria que arruinasse seu casaco superfino, sem mencionar essas lindas calças creme, meu senhor.

Ele olhou para seu casaco imaculado, cortado pensando em suas medidas, a gravata engomada à perfeição e com um lenço impecável e as calças de pele de gamo. Ele parecia pronto para um

baile e não para um dia na floresta ou no topo das colinas cavoucando na terra. Ele riu, e o som fez a pele dela formigar de consciência. Ela algum dia estaria livre da atração dele?

— Eu me vestirei de forma apropriada. Que horas sairá? Insisto em caminhar com a senhorita.

— Esteja na porta da frente às sete, meu senhor. Sairemos de imediato.

NA MANHÃ SEGUINTE, Arthur estava pronto e esperando por Hallie quando ela saiu da porta da frente, uma pesada capa de lã sobre os ombros e o que parecia ser um gorro de tricô cobrindo cabelos e orelhas. As bochechas estavam rosadas por causa da toalete matinal. Ela parecia adorável e doce o suficiente para ela querer mordiscar.

Ele balançou a cabeça ante sua imprudência.

Aqui estava ele, prestes a caminhar até o topo de uma colina e cavar a terra o dia todo, tudo para que pudesse tentar convencê-la a voltar a gostar dele. Ele era um idiota apaixonado. Ele conseguia entender por que ela estava desconfiada dele e o mantinha à distância. A reputação dele o precedia em todos os lugares em que ia, e durante anos sua família ficou perplexa com sua inação em relação ao casamento.

Tudo bem que algumas das histórias que circulavam na cidade acerca de suas aventuras eram verdadeiras. Os amigos que o acompanhavam no dia em que conheceu Hallie lhe deram uma reputação selvagem, mas ele se separou deles anos atrás. Ele era um homem diferente agora e precisava mostrar isso a ela.

Ele teve pequenos vislumbres dela enquanto caminhavam pela floresta por onde passaram para fazer o local da escavação. Seu

nariz sardento estava um pouco vermelho pela manhã fria. A falta de autoconsciência dela acerca de como era maravilhosa, o fazia sentir-se humilhado.

A pele dela havia sido beijada pelo sol, e ela mostrava uma adorável tonalidade dourada, nada como a pele branca e pastosa dele que nunca havia viajado para fora da Inglaterra.

A indiferença dela por ele o fazia ficar distraído de verdade. Ela era uma das poucas mulheres que não parecia interessada em sua pessoa. Um dilema que o mantinha acordado metade da noite, mas que faria a família dele divertir-se até o fim dos tempos.

Os Duncannon eram famosos por formarem grandes pares, tanto em relação à riqueza quanto à posição. Ele era um visconde, e a Srta. Evans era filha de um cavalheiro com poucos recursos. Não restava dúvidas de que Ava havia dito a Hallie que a família dele esperava que ele continuasse com a tradição de se casar bem.

Mas não significava que, às vezes, como hoje, quando ele caminhava ao lado de uma das mulheres mais inteligentes e bonitas da Inglaterra, ela não o tentasse a jogar de lado todas as expectativas da família e fazer o que diabos ele quisesse.

Ou seja, escolhê-la.

— Qual é o plano para hoje? — perguntou ele, fechando mais o sobretudo para impedir a entrada do ar frio da manhã.

O canto dos pássaros havia começado nas árvores quando o amanhecer se iniciou, e dali ele podia ver alguns veados pastando nos gramados da propriedade.

— Vamos terminar de cavar a trincheira e depois escavaremos o solo à procura de artefatos enterrados. Mandarei os outros homens vasculharem o solo que cavamos para garantir que nada seja esquecido. Tenho certeza de que haverá algum mosaico ou piso de paralelepípedo enterrado. Nunca se sabe o quão elaboradas essas

ruínas romanas serão até que comecemos a cavar mais fundo. De qualquer forma, espero encontrar algumas peças que datem pelo menos da data do forte e, também, deem ao barão algumas informações sobre o sítio.

— Estou ansioso para começar a trabalhar. — disse ele, esfregando as mãos.

Ela zombou, e ele olhou para ela.

— Você acha essa declaração divertida, Srta. Evans?

— Um pouco. Será a primeira vez que vejo o pulso de um visconde mergulhado na lama. — ela deu um pequeno sorriso, uma pequena migalha de gentileza que ele engoliria. — Por favor, me chame de Hallie ou Srta. Hallie como fazem os operários. Estamos prestes a cavar na terra o dia todo juntos, danem-se as formalidades.

Tão ousada e diferente.

Ele ficou pasmo com ela por um momento, inseguro de si e de como deveria fazer para que ela o visse além da imagem que havia formado dele. Ele sabia se divertir, com certeza, e sabia dar prazer às mulheres com quem se deitava, mas isso não significava que não pudesse ser genuíno ou se importar com apenas uma pessoa.

Ele a queria, não era tolo o suficiente para não admitir. Mas ela também era um erro completo para ele. Teimosa e impetuosa não eram características que costumavam ser associadas às esposas Duncannon. Sua família nunca se recuperaria de tal choque. Um Duncannon não se casava com uma plebeia e decerto não com alguém que gostava de cavar na terra o dia todo. A história mostrava que aquelas que se casaram com a família dele são mansas e de natureza doce. Princesas mimadas e paparicadas da Sociedade que, só de lembrar, o fazia estremecer por dentro..

Os lábios de Arthur se contraíram.

Hallie não era nenhuma dessas coisas. Ele gostava dela, apesar de saber disso, e quando ela pulou na trincheira, ajoelhando-se diante de uma rocha de formato estranho, alheia à sujeira que manchava suas calças, esse afeto cresceu. Ele não conseguia imaginar sua última amante fazendo uma coisa dessas ou nenhum de seus conhecidos em Londres.

— Por favor, me chame de Arthur então. — disse ele, ajoelhando-se ao lado dela e pegando a própria ferramenta para remover a terra ao redor da pedra circular no chão. — O que você acha que é isso? — ele perguntou, ignorando o fato de que ela permaneceu metódica e profissional com ele, enquanto ele se agitava por dentro. Estar tão perto dela, o doce aroma de rosa ao vento, o levava à distração.

— Acredito que se mostrará ser algum tipo de vaso. Talvez um que fosse usado para guardar vinho. — ela tirou um pouco da sujeira. — Veja. — ela apontou. — Não é pedra, é terracota.

Ele passou o dedo pela borda lisa, tentando imaginar que o teria usado pela última vez.

— Todos esses anos ficou enterrado e agora estamos aqui, trazendo-o de volta à superfície para que outros vejam e apreciem.

Ela sorriu para ele, e seu estômago se apertou com a pura alegria que leu em seus vibrantes olhos verdes. Este era o amor da vida dela. Cavoucar o chão e encontrar mundos perdidos e escondidos. Ele teria que trabalhar duro para fazê-la ver qualquer outra coisa além dos artefatos que ela estava determinada a encontrar.

— Exatamente o que penso, Arthur. Vou trazer à tona a arqueólogo em você.

Ele riu, duvidoso do fato, mas aproveitando o dia com ela de qualquer maneira. Esta vida não era para ele, mas ele podia ver a

atração em ser tão livre. Com suas muitas propriedades, esse tipo de existência nunca seria um caminho aberto ele.

— Por hoje, pelo menos. — ele fez uma pausa. — Agora, vamos ver o quão grande esta cerâmica realmente é. — disse ele, continuando a retirar a sujeira de seu achado. — Qualquer coisa a ver com vinho terá toda a minha atenção.


CAPÍTULO 6

N A NOITE SEGUINTE, Hallie foi convidada para jantar e participar dos entretenimentos que se dariam após o jantar oferecido pelo Barão Bankes. Ela andava de um lado para outro em seu quarto, voltando várias vezes ao seu guarda-roupa como se, por milagre, ele fosse produzir os mais recentes designs de Londres para ela escolher. Todos os vestidos que trouxera eram lamentáveis e nada adequados para um jantar desses. Alguns ela deveria até jogar fora, estavam tão esfarrapados e gastos.

Ela ficou mordendo o lábio inferior.

Talvez pudesse pedir a uma das criadas que pedisse um vestido de outra convidada. Se ela pedisse com educação, talvez ficassem com pena dela e emprestassem um vestido. Uma leve batida na porta soou, e ela a abriu, ofegando ao ver a amiga.

— Willow! — ela disse, puxando-a para um forte abraço. — Que faz aqui?

— Chegamos esta tarde, você sabe que minha tia, a viscondessa Vance, foi convidada, e quando o barão Bankes mencionou que você estaria trabalhando na escavação do forte romano dele, bem, quase tropecei em mim mesma ao perceber que nos veríamos. Mas, a titia não me deixou subir a colina, disse que eu teria que esperar até à noite, mas assim que soube que você estava em casa e se preparando para o jantar, precisei vir vê-la.

Hallie a puxou para dentro do quarto, maravilhada com o lindo vestido de Willow. Ela foi mandada para uma escola na França, assim como ela e suas outras amigas, e foi na Escola de Madame Dufour que a amizade delas se solidificou. De todos elas, Willow era

a mais afortunada. Sua tia a acolheu após a morte dos pais e, por acaso, a mulher era rica, sem filhos e tinha títulos.

Hallie devorou a imagem que sua amiga apresentava, e o lindo vestido de seda azul claro que ela usava, as luvas compridas até os cotovelos e o lindo colar de pérolas. Willow era tão bonita por dentro quanto por fora, e uma pontada de desespero a inundou.

— Você ainda não se vestiu, minha querida.

Willow caminhou até seu guarda-roupa e vasculhou a minúscula seleção de vestidos. Uma pequena carranca se estabeleceu entre seus olhos e estragou o rosto sempre perfeito. Willow se virou para ela depois de fechar as portas do guarda-roupa com um estalo decidido:

— Gostaria de pegar emprestado um dos meus vestidos? Eu tenho mais do que suficiente.

Hallie assentiu aliviada, disposta a aceitar ajuda. Com os trajes que possuía, não seria digna de ser vista no andar de baixo, muito menos na sala de jantar.

— Muito obrigada, querida. Nem mesmo pensei que seria convidada para jantar, não trouxe nada de acordo.

Sem mencionar que ela detestava gastar seus fundos em qualquer coisa que não fosse manter Ammon vestido e bem cuidado na casa da prima. Um vestido novo e da última moda de Londres poderia manter seu filho vestido e alimentado por meses a fio, e assim seu próprio guarda-roupa havia sofrido, e ela pouco se importava.

Ela supôs que teria que comprar pelo menos um vestido se situações como a desta noite surgissem diante dela e não houvesse nenhuma Willow Perry para salvá-la da próxima vez.

— Venha, vamos para o meu quarto, você poderá escolher.

Posso supor que já se banhou?

— Sim, e este vestido está limpo, embora seja um vestido de dia e não seja adequado para o jantar, nem seja o último da moda.

Willow entrelaçou seus braços e puxou-a em direção à porta.

— Eu tenho o vestido perfeito que combinará com seu tom de pele. E você deve me contar tudo o que tem feito. Sinto que não o vi o suficiente em Londres, e você fugiu de lá assim que pôde. Por favor, diga que vai ficar na Inglaterra de vez. E sei que Ava, Evie e Molly sentem muito a sua falta como eu. E a escavação aqui? Está gostando?

Hallie lutou para se lembrar de cada pergunta que Willow lançava. Ela respondeu o melhor que pôde, mas também removeu qualquer menção ao filho, e ao verdadeiro motivo pelo qual estava tão determinada a fugir de Londres para trabalhar. Nem mesmo Ava sabia que ela havia dado à luz um menino saudável e feliz. É claro que sabiam de Omar, mas não da criança que geraram.

Seu estômago se agitou de nervosismo só de imaginar o que suas amigas mais antigas e queridas pensariam dela caso descobrissem que ela teve um filho fora do casamento, que o filho não era apenas um bastardo aos olhos da sociedade, mas também um mestiço.

— Você sabe que a sociedade londrina nunca foi o meu lugar, e eu queria visitar minha prima antes de vir para cá. Vim para ficar na Inglaterra e me estabelecer em um futuro próximo, e esse trabalho, como o que estou fazendo para o Barão Bankes, é o que eu quero fazer.

Elas chegaram ao quarto de Willow que a apressou para entrar e trancou a porta detrás dela.

— Bem, eu, pelo menos, estou nas nuvens por estar aqui comigo. Pensei que esses festejos de um mês seriam uma chatice.

Apenas minha tia revendo seus velhos amigos, mas não é assim.

Você viu que Lorde Duncannon está aqui? Ele viu você?

Ela assentiu, sentando-se no sofá diante da lareira. O quarto de Willow era mais opulento do que o de Hallie, mas era algo a se esperar, já que Willow fazia parte da aristocracia e Hallie não.

— Ele me ajudou na escavação ontem, até, mas eu não o vi hoje. Acredito que alguns dos cavalheiros iriam cavalgar pela propriedade hoje, sair de casa e tomar um pouco de ar fresco do campo.

— Minha tia disse a mesma coisa. — Willow disse, as palavras abafadas enquanto procurava entre a abundância de vestidos que revestiam seu guarda-roupa. — Ah, aqui está. Eu encontrei.

Hallie até se engasgou com a visão do vestido que Willow ergueu diante dela. Era, sem brincadeira, a peça mais linda que ela já vira. O vestido de corte estilo império era de uma seda verde esmeralda profunda com um tule creme muito fino cobrindo-o.

Faixas de cetim creme e bordados de renda na bainha e no corpete o adornavam e completavam o conjunto à perfeição. Ela foi até onde Willow o segurava, para inspecionar, deixando a seda e o tule correrem sobre sua mão. Era tão fino e macio que Hallie não estava certa se deveria se permitir estar perto de tal obra-prima.

— Isso vai combinar perfeitamente com a sua cor. Seus lindos olhos verdes serão ressaltados, e sua pele morena será complementada. — Willow disse, colocando o vestido na cama e chamando uma criada. — Vou mandar minha criada prender seu cabelo, e com este vestido você não se sentirá nem um pouco deslocada entre os convidados do barão.

Hallie apertou as mãos da amiga, tão grata por ela estar aqui.

Seus olhos ardiam com lágrimas não derramadas, e ela fungou.

— Estou tão feliz por ter vindo, Willow. Eu esperava me desculpar de tais entretenimentos. Decerto não fiz as malas com nada além de roupas adequadas para trabalhar no campo. Você me salvou esta noite, minha amiga.

Willow riu e permitiu a entrada da criada quando uma batida leve soou na porta.

— Para que servem as amigas senão para essas coisas? Agora sente-se, minha querida, e deixe Jane fazer sua mágica.

Hallie fez o que Willow pediu e observou com fascinação como Jane era capaz de arrumar seu cabelo com o estilo mais recente e com tremenda facilidade. Afinal, esta noite poderia não ser tão terrível.


CAPÍTULO 7

R OBERT SE APROXIMOU da Srta. Evans e deu a ela o melhor sorriso cavalheiresco que pôde forjar diante da jovem assassina. Ela o inspecionou com um olhar cauteloso, e ele esperava que ela não o considerasse enfadonho depois da conversa no jantar quando ele falou do tempo e das últimas novidades circulando por Londres. A verdade é que ele não sabia que assuntos deveriam ser abordados nesses eventos e, com certeza, não iria querer falar com ela se pudesse evitar, mas ele precisava que ela soubesse que havia a chance de ele saber mais do que ela gostaria que os outros soubessem.

Afinal, só havia um único propósito para a presença dele em Somerset: derrubar essa vadia e ferir a duquesa de Whitstone por meio de sua amizade. Ver as duas mulheres caírem em desgraça teria um gosto maravilhoso e seu primo ficaria satisfeito por ele ter se vingado delas.

— Que festa adorável, você não concorda? — ele perguntou, pegando um copo de ratafia de um lacaio que passava e tomando um pequeno gole da bebida doce.

Ele pegou o visconde Duncannon observando-os com interesse e estreitou os olhos, fazendo uma nota mental para ser cauteloso com o homem. Ele não precisava do lorde metendo o nariz em seus negócios e interrompendo o plano de derrubar a mulher a seu lado.

— Com certeza, sim. — ela respondeu, não falou mais nada de encorajador.

Um pequeno sorriso brincou naquela boca bonita enquanto ela observava os convidados ao seu redor, e ele se perguntou se

poderia se divertir um pouco com a mulher à frente dele antes de derrubá-la.

A ideia da boca dela em seu corpo não era desagradável e a machucaria mais se ele brincasse com suas emoções um pouco antes de arrancar o tapete de debaixo de seus pés. Ele se inclinou na direção dela, mais perto do que deveria.

— Você nunca se perguntou quais segredos os convidados de tais eventos estão escondendo? — ele tomou um gole da bebida, rindo por dentro enquanto ela tentava se manter calma ao lado dele.

— Devemos adivinhar o que cada hóspede pode estar mantendo escondido? Amantes secretos. Ruína financeira. O que mais deveríamos incluir em nossa lista, Srta. Evans?

— Eu não saberia dizer, Sr. Stewart. Nunca parei para pensar nessas coisas.

Ele encontrou o olhar dela e não perdeu a pequena faísca de medo que tomava conta de seus olhos.

— Não saberia? — ele disse, suspirando por um bom tempo. —

Bem, teremos que pensar sobre isso, ouso dizer. Avise-me se descobrir mais alguma coisa. Faremos disso nosso joguinho enquanto estivermos aqui na propriedade do Barão Bankes. O que me diz? — a Srta. Evans empalideceu, e Robert lutou para manter o rosto sério.

Ó, como era delicioso atormentá-la.

Ela havia apoiado e ajudado a duquesa a descobrir quem estava por trás de todos os incêndios em Berkshire. Assistiu enquanto seu primo morria na casa da amiga e não fez nada para tentar salvá-lo.

Ele derrubaria essa mulher e, por meio dela, a duquesa de Whitstone seria ferida.

Uma jovem sentou-se ao piano e começou a tocar uma melodia local para dança. Robert estendeu a mão para a Srta. Evans.


— Vamos dançar? Parece que alguns dos outros convidados farão um conjunto improvisado.

Ela olhou para a mão dele como se fosse uma cobra, mas balançou a cabeça, pousando a taça de champanhe.

— Me desculpe, mas não. Não estou me sentindo bem e vou me retirar. Boa noite.

— Ó, espero que melhore logo, Srta. Evans. — ele gritou atrás dela enquanto ela fugia. — Talvez amanhã à noite continuemos nosso joguinho. Vou garantir que o barão a convide para jantar conosco de novo.

Ela lançou um sorriso vacilante por cima do ombro, mas ele conseguia ver o medo espreitando em suas orbes verdes escuras.

— Boa noite, Sr. Stewart.

Ele fez uma reverência.

— Boa noite, Srta. Evans.

E tenha sonhos tranquilos, minha querida...

HALLIE ENGOLIU a bile que subia em sua garganta ao sair da sala, tentou não chamar atenção para si. O que o Sr. Stewart disse foi tão chocante e inesperado que a deixou com pouca escolha a não ser ir embora. Um jogo, questioná-la acerca do que ela acreditava que os demais presentes podem ter escondido em seu passado, a fez questionar os motivos dele. Ele havia sido muito ousado, mostrava divertir-se muito com o jogo, para não haver um motivo nefasto que ele quisesse saber.

Ele sabia de Omar? Havia descoberto seu filho?

Ela cerrou os punhos ao lado do corpo para evitar que tremessem e, o mais sem pressa que pôde, voltou para o quarto.

Ela teria que se desculpar com o Barão Bankes amanhã por sua partida sem dizer uma palavra, mas não poderia continuar ali por nem mais um segundo.

Hallie começou a tirar as luvas de seda que Willow havia emprestado enquanto descia o longo corredor para seu quarto. Por que o Sr. Stewart iria querer jogar esse jogo com ela? As palavras dele denotavam alguém tentando descobrir mais informações e, neste caso, sobre ela.

— Srta. Evans. — uma voz detrás dela a chamou.

Hallie fechou os olhos ao som de Lorde Duncannon.

Ótimo, tudo que ela precisava era que ele a visse e reconhecesse seu nervosismo.

Ele estava muito familiarizado com ela e era capaz de lê-la como um livro. Ela se virou, tentando um olhar de interesse agradável que parecia tenso, longe de ser natural.

— Lorde Duncannon. — ela respondeu, sorrindo um pouco. —

Posso ajudá-lo com algo? — ele parou diante dela, a testa franzida de preocupação.

Ela o considerou por um momento, a pura atração que tal homem poderia exercer não parecia muito justa em sua estimativa.

Omar era bonito, a pele escura e os olhos castanho-escuros com cílios longos como ninguém. Lorde Duncannon era o oposto. Sua pele era clara, seus olhos tão azuis quanto o oceano em um dia de tempestade, os cabelos pareciam beijados pelo sol, a cor do trigo no sol do verão.

Ela agarrou as luvas que segurava, ciente de que havia começado a se despir antes de chegar ao quarto.

— Por favor, me desculpe, mas não pude deixar de notar que você parecia angustiada ao falar com o Sr. Stewart. Por favor, me conte caso ele a tenha insultado de alguma forma.

Ela balançou a cabeça, engolindo o medo que a mera menção do homem provocava nela. Era óbvio que ele sabia de algo, o que a fez se perguntar o que ele faria com essa informação e quando.

— Uma dor de cabeça repentina, meu senhor. Nada mais.

Agradeço sua preocupação.

Ele a estudou por um momento, uma inspeção completa e um pouco cética. Hallie colou um sorriso no rosto, ciente de que se ele a olhasse bem de perto a desvendaria como uma janela aberta.

— Se é o que diz, Srta. Evans. — ele franziu a testa, parecia lutar para encontrar as palavras certas para dizer, ou para perguntar se ela estava sendo verdadeira. — Vou mandar trazerem uma tisana para você, e aquecimento para os lençóis. O ar está frio esta noite.

Ela assentiu com a cabeça, grata pela bondade dele.

Depois que ele a deixou sozinha em Felday, ela não pensou que ele fosse capaz de tanta emoção, mas aqui estava ele, tentando confortá-la sem realmente saber por quê. Hallie observou a elegância dele, a mandíbula forte e o nariz aristocrático que podia desprezar as pessoas se ele assim quisesse. Uma coisa que ele nunca fez com ela, felizmente. Talvez ele de fato estivesse mudado, ou pelo menos estava tentando consertar o mal que havia feito a ela no passado.

— Agradeço. — disse ela.

Ele assentiu e recuou.

— Boa noite.

Hallie o observou ir embora, a mente zumbindo com o que deveria fazer. Não apenas sobre o Sr. Stewart, mas com Lorde Duncannon também. O segredo dela era tão devastador, e havia uma boa chance de que, caso alguém descobrisse a existência de seu filho, ela nunca mais conseguiria o tipo de trabalho que estava fazendo agora. Até mesmo trabalhar como dama de companhia ou

como uma criada comum seria difícil. Ninguém gosta de contratar uma mulher que não se comporta da maneira que a sociedade espera. Lorde Duncannon pode não a desprezar agora, mas o faria se soubesse a verdade. Por mais que ela esperasse que não fosse assim, que ele fosse honrado no fundo de seu coração, o medo de que ele também se afastaria não mudava..

Ela esfregou a testa, desesperança inundando-a.

Ela não podia deixar o Sr. Stewart ameaçá-la dessa forma. Nem deveria entrar em pânico ainda. O jogo dele poderia ser apenas isso, um joguinho bobo que atingiu o alvo mais perto do que ele imaginava. Pelo que sabia, o cavalheiro poderia não saber de nada.

Hallie abriu a porta do quarto e se deixou afundar em uma das cadeiras de couro diante da lareira. Amanhã ela iria manter o controle emocional, e continuar como se nada a tivesse abalado na noite anterior. Iria para o sítio da escavação às sete e continuaria seu trabalho e amanhã à noite ela iria jantar se fosse uma convidada, não fugiria como um pássaro assustado diante de um gato. O futuro dela e do filho dependiam de que ela mantivesse a cabeça fria, e não decepcionaria neste quesito.


CAPÍTULO 8

O DIA AMANHECEU com nuvens cinzentas e tempestuosas e um toró assolava a terra. Hallie felizmente havia chegado ao local da escavação antes que a primeira chuva forte os atingisse e, agora, apesar do solo úmido, ela ajudava os cavalariços a cavar o que restava da trincheira.

O baque oco de cascos dos cavalos na relva soou, e ela se virou para ver Lorde Duncannon montado em uma magnífica montaria castanha, o focinho do animal exalava vapor no dia frio, batia um dos cascos dianteiros em protesto pela corrida matinal interrompida.

Sua Senhoria pulou do animal sem dificuldade, e ela admirou o fato de que ele parecia tão bom e capaz em tudo o que fazia. As mãos hábeis dele amarraram a montaria a uma árvore próxima, e ele caminhou em direção a ela, o sobretudo esvoaçando atrás dele como uma capa.

Ela desviou o olhar, calor formigava sua pele.

O fato de ela reagir dessa forma ao cavalheiro cada vez que o via estava se tornando exasperante. E daí que ele fosse o homem mais bonito que ela viu na Inglaterra? Não significava que precisava agir ou ser boba perante tal ideia. Nem o fato de ele estar aqui significava que ele pensava nela de alguma forma romântica. Afinal, ele era o benemérito do Museu de Londres. Se ele não se interessasse por escavações arqueológicas na Inglaterra e no exterior, algo estaria errado.

— Lorde Duncannon. — disse ela, saindo da trincheira e caminhando até ele. — O que o traz aqui hoje?

Ele sorriu para ela, tirando as luvas.

— Eu vim ajudar de novo, é claro. — ele foi até a tenda e pegou a pequena espátula que usou no outro dia. — Como já mencionei, prefiro mil vezes estar aqui que lá dentro. Eles estão jogando charadas, e eu não estou com vontade de tentar descobrir o que ou quem as pessoas são. Eu prefiro muito mais estar aqui. Com você.

— ele acrescentou, seu rosto sério de repente.

Hallie estendeu a mão e puxou-o para o lado da tenda e fora da visão de seus trabalhadores.

— Meu senhor, não sei por que você, de repente, ficou tão fascinado com a história da propriedade do Barão Bankes, mas devo garantir que não é por minha causa que você está aqui. Nós nos conhecemos há alguns anos, e bem o suficiente para eu falar com franqueza, eu acho.

Ele ergueu a sobrancelha, cruzando os braços sobre o peito.

A ação chamou a atenção dela para aquela parte de seu corpo.

A memória da noite que passaram juntos, tantos anos atrás, e como ele se sentia sob seu toque.

Querido Senhor do céu, iria para o inferno.

— Vá em frente. Acho que vou gostar de ouvir essa sua opinião.

Ela verificou se os outros homens estavam fora de alcance, todos os quatro ainda ocupados cavando a trincheira.

— O que aconteceu em Surrey não vai se repetir aqui se é o que espera. Nossa noite foi um erro. Um do qual me arrependo, e espero que não tenha me seguido aqui para Somerset na esperança de ter um rabo de saia para desfrutar durante estes festejos rurais.

Um músculo se contraiu na têmpora dele enquanto ele ainda a encarava.

— É isso que você pensa de mim? Que estou aqui apenas para levar você de volta para a minha cama?

A mera menção ao ato fez uma sensação dolorida se instalar bem em seu núcleo. Ela agarrou o estômago, balançando a cabeça, desejando que seu corpo não gritasse “sim” por dentro só por ouvir a ideia.

— Espero que não. Eu não estava bem da cabeça naquela noite e não deveria ter feito as propostas que fiz. Como bem sabe, não pensei que voltaríamos a nos ver. Decerto, não pensei que teríamos amigos em comum.

Ele estendeu a mão, acariciando o ombro dela, e ela estreitou os olhos. Não gostou da ação condescendente.

— Não tema, Hallie. Não estou aqui para seduzi-la, por mais que tenha gostado de nosso encontro. Não. Estou aqui para ajudar como seu amigo, e isso é tudo. Sua virtude está segura comigo.

Ela o estudou por um momento, esperando que fosse verdade, antes de caminhar de volta para a trincheira. Ele era uma complicação de que ela não precisava, nem precisava que ele descobrisse que deu à luz um filho de outro homem depois de estar com ele. Ele pensaria que ela era uma prostituta comum que distribuía favores para qualquer um que passasse por ela. E isso não era verdade.

Um sentimento de vergonha se apoderou dela por ter sucumbido ao charme dele, à sua boa aparência e à grande quantidade de vinho naquela noite em Surrey. Por ter se permitido se esquecer de todos os problemas e apenas se entregar ao prazer e à paixão com um homem que ela pensou que nunca mais voltaria a ver. Um erro imprudente do qual ela se arrependia desde então. Hallie esfregou a nuca, sentindo o olhar dele nela enquanto ela voltava para os trabalhadores.

Lorde Duncannon a seguiu, e logo estava trabalhando perto de onde haviam encontrado os restos de um barril de vinho anteontem.


De vez em quando, ela se pegava olhando para ele, as pequenas nuances como a maneira como ele mordia o lábio quando estava tentando ser cuidadoso, ou como uma mecha de cabelo caía sobre um de seus olhos, dando-lhe uma aparência libertina.

Ela bufou.

Como se ele precisasse parecer mais libertino. O homem era um verdadeiro deus do sexo no corpo de um mortal. O fato de ela saber o quão divino ele poderia ser no calor da paixão também não ajudava. Lembrar-se de como aquele cabelo era macio quando ele a beijou no estômago, as mãos segurando aqueles cachos dourados enquanto ele mergulhava mais em seu corpo.

Hallie empurrou a pá na terra com mais força do que o necessário. Não estava atraída e nem interessada nele dessa forma. Não mais. Agora, ela só precisava convencer o corpo deste fato.

ARTHUR PODIA SENTIR Hallie observando-o. E seria um mentiroso se não admitisse gostar de ter os olhos dela nele, observando-o quando ela acreditava que ninguém iria notar. Hoje era a primeira vez em anos que abordavam o assunto da indiscrição em Surrey. Ele não estava certo de como aconteceu, e supôs que parte disso era porque ela estava se afundando em tristeza quando se sentou ao lado dele na casa dela naquela noite. Ela havia acabado de enterrar o pai, e ele queria confortá-la.

Esse conforto se transformou em uma união quente e desesperada que o abalou até o centro de seu ser. Ele deixou a cama dela cedo na manhã seguinte, caminhou até a pousada para providenciar uma carruagem e foi meio que sequestrado pelos

amigos idiotas. Era de se admirar que ela o detestasse tanto e não oferecesse nem a mão da amizade. Ele não podia culpá-la, mas poderia tentar mudar a opinião que ela nutria por ele.

Poderia contar a ela a verdade.

Ele cavou o solo, procurando por qualquer coisa que pudesse vir à tona e exigir um manuseio delicado. E agiria de forma semelhante com Hallie, ele teria que ser cuidadoso em torno dela. Ganhar sua confiança e verificar se poderiam seguir em frente como amigos, talvez mais.

A família dele não iria gostar, mas ele não era controlado por eles. A partir do momento em que se sentou na pequena sala dela em Felday, ele sentiu uma conexão com ela que nunca sentira com ninguém. Uma emoção que ele não conseguia explicar, e ele sabia, no fundo, que se ele não a cortejasse e descobrisse que o que sentia poderia ser o começo de algo grande, ele se arrependeria pelo resto de sua vida. As ações dos amigos dele e a partida de Hallie puseram fim a essa ideia. Ele balançou a cabeça. Odiava o fato de terem perdido uma oportunidade que pode ter sido eterna.

Hallie se engasgou, e Arthur foi até onde ela estava cavando. Ela começou a remover mais solo da área, devagar e com cuidado.

— Encontrou algo?

— Acho que sim. — ela respondeu e sorriu para ele e seu interior se apertou com o prazer genuíno escrito naquelas feições.

Inferno, ele adorava vê-la feliz, animada. — Acredito que pode ser ouro. Tive um vislumbre de cor conforme cavava.

Ele a ajudou a remover o solo da área e, com certeza, um minuto depois de mais escavação, o topo liso de um pequeno artefato de formato redondo apareceu. Demoraram para remover o solo e, em uma hora, Hallie libertou o pedaço de tesouro enterrado e o segurou diante deles.

— Creio que esta é uma peça de um capacete de um legionário.

Que extraordinário.

Extraordinário como ela.

Ele a ajudou a se levantar, e por um momento eles olharam para o achado.

— A primeira de muitas grandes descobertas, espero.

Ela assentiu, foi até a tenda e colocou o item em uma pequena caixa que ela havia deixado montada em cima da mesa.

— Vamos ver o que mais este forte tem a revelar, certo? — ela perguntou, passando por ele para voltar para a trincheira.

— Estou bem atrás de você, Srta. Evans.

Arthur se acomodou ao lado dela. O resto do dia realmente exibiu novos achados, outras partes do capacete e algumas pontas de flecha, embora Hallie não estivesse certa se eram do século IV

ou anterior.

Arthur contemplou sua situação presente.

Se a avó dele o visse agora, o visconde Duncannon, afundando as botas na lama e cavoucando em busca de artefatos que não possuíam mais valor algum para a sociedade, apenas um lembrete do passado. Ela ficaria horrorizada. E, no entanto, ele nunca se sentiu mais vivo e útil do que agora ao lado da Srta. Evans. Estar contribuindo com a sociedade, por menor que fosse a contribuição.


CAPÍTULO 9

H ALLIE SENTOU-SE em seu quarto mais tarde naquela noite depois do jantar em que, para felicidade dela, o Sr.

Stewart não se dignou a trazer à tona mais jogos que envolvessem o passado das pessoas. Sua amiga Willow estava sentada em frente a ela, quieta e reflexiva enquanto olhava para as chamas no fogo.

— Willow — ela disse, chamando sua atenção. — Há algo que preciso dizer a você, a todas as nossas amigas, na verdade, mas já que você está aqui, desejo confiar em você, se puder.

A sobrancelha de Willow franziu, e ela se virou para ela, dando-lhe toda a atenção.

— Claro. Sabe que pode confiar em mim. Eu nunca trairia sua confiança.

Hallie apertou a barriga para tentar conter o nervosismo por admitir o segredo que nunca contara a ninguém além da prima. Ela não estava certa de como as amigas iriam reagir à verdade, ou se a desprezariam, menosprezariam pelas escolhas que fez.

— Na verdade, há duas coisas, e nem imagino o que pensará de mim quando eu contar.

Willow esticou a mão entre o espaço que as separavam e apertou a mão dela.

— Eu nunca vou pensar menos de você, não importa o que você está prestes a me dizer. Prometo isso a você.

Ela esperava que fosse verdade, pois perder as amigas por causa de seus segredos seria insuportável.

— Você sabe o quanto eu amei Omar, sempre vou amá-lo, mesmo que ele não esteja mais aqui, mas há algo que não sabe, e eu preciso confiar em alguém antes de gritar a plenos pulmões para que todos ouçam e que se danem as consequências.

— Diga-me o que é antes que eu morra de ansiedade. — Willow disse, sorrindo um pouco.

Hallie respirou fundo para se acalmar e engoliu o medo.

— Pouco depois de Omar ser morto, descobri que estava grávida de um filho dele.

Willow se engasgou, puxando-se de volta para encostar na cadeira.

— Você ficou grávida. O que aconteceu, Hallie?

Ela se levantou, andando de um lado para o outro entre a lareira e a cama.

— Naquela época o Sr. Shelly, o egiptólogo, já havia programado seu retorno à Inglaterra, e eu aproveitei a chance para voltar para casa. Eu precisava voltar para casa, para Berkshire, onde minha prima mora, e lá dei à luz. Tudo isso foi na época em que Ava perdeu a casa para o incêndio. Fui visitá-la, se você se lembra.

Bem, não que alguém saiba, mas foi apenas algumas semanas depois de dar à luz Amon.

— Você teve um menino? — Willow perguntou, levantando-se e vindo até ela para unir suas mãos. — Você é mãe?

Hallie concordou.

— Sou. Ele é um menino muito doce, e meu trabalho aqui para o barão é para que eu possa sustentá-lo. Preciso de posições como essa para que um dia possamos voltar a Surrey, ao meu chalé em Felday, e nunca mais ter que deixá-lo. Mas há um problema nisso.

— Que problema? — Willow perguntou, franzindo a testa.

— Um com Lorde Duncannon. — Hallie admitiu. — Eu também não fui de todo honesta acerca de Sua Senhoria, e depois que eu contar o que aconteceu há muitos anos, temo que você pense que sou uma...

— Uma o quê? — Willow apertou seus ombros para interromper o ritmo de Hallie. — Uma o quê, Hallie?

Hallie manteve a atenção no fogo, incapaz de olhar para a amiga.

— Uma prostituta. — ela admitiu, a vergonha passando por ela por ter estado com dois homens ao longo de sua vida e, em ambas as vezes, sem estar casada com nenhum deles.

Nada digno de uma dama, mesmo para uma mulher como ela, que pensava que as mulheres deviam ter tanta liberdade quanto os homens. Ainda assim, assim como todas as mulheres que conhecia, ela era um produto de seu tempo e havia regras. Regras que ela havia deixado de lado, e agora teria que pagar o preço.

— Você não é uma prostituta. Diga-me o que aconteceu e, por favor, pare de andar de andar de um lado para o outro. — Willow a puxou para sentar-se diante da lareira. — Eu quero saber tudo.

Hallie mordiscou o lábio inferior um momento antes de dizer:

— Eu conheci Lorde Duncannon por acaso na estrada para Felday, no dia em que enterrei papai. Ele havia sido largado na estrada pelos amigos em uma tempestade de neve, e eu dei uma carona até a cidade para que ele pudesse encontrar um lugar para ficar. Mas, devido ao mau tempo, muitas pessoas que viajavam por Surrey naquele dia pararam em Felday para pernoitar. Não havia mais acomodações na cidade. Lorde Duncannon perguntou se poderia ficar em minha cabana, e eu não vi mal nisso, de modo que permiti que ele ficasse.

Hallie recordou-se da noite, os muitos vinhos, o fogo quente da lareira e a sala aconchegante, iluminada apenas por uma única vela, era uma situação perfeita para sedução e erros. E, minha nossa, ela cometeu um naquela noite.

A simples recordação das mãos dele, fortes e experientes e, com certeza, inteligentes, a faziam tremer até hoje, bombardeava sua mente. Ela deixou a memória tomar vida em seus pensamentos enquanto contava tudo a Willow, lembrava-se de cada detalhe do que aconteceu como se tivesse sido ontem.

— Tudo começou com um brinde para papai e saiu de controle a partir daí...

Felday, 1817

— Vou beijar você, Hallie. — ele disse, roçando seus lábios nos dela.

Sem pensar, Hallie estendeu a mão e agarrou seus cabelos, longos e perversos, e puxou-o para um beijo. Ele gemeu ante a atitude dela, e ela sentiu o corpo doer em lugares que ela não sabia que poderiam doer. E pior, Arthur a beijou de volta. Ele tomou os lábios dela de forma feroz, e ela teve dificuldade de manter-se à altura do desejo dele.

Ela nunca havia feito nada do tipo, mas uma sensação inebriante tomou conta dela. Uma sensação de que era certo, e de que era o que ela queria mais do que tudo antes de sair de casa e começar uma nova vida.

Era uma atitude escandalosa, é claro e, quando concordou com a carona mais cedo, não foi assim que ela pensou que a noite iria acabar. Mas ali nos braços dele, enquanto a mão dele deslizava

pela dela, delineava seu estômago e iria parar ao redor de seu bumbum, nada jamais sentiu tão certo.

— Você tem certeza? — ele perguntou, beijando-a na garganta e puxando as pequenas fitas de seu vestido, abrindo-o na altura do pescoço.

Hallie assentiu, beijando-o mais uma vez.

— Tenho certeza. — ela se engasgou quando a mão dele segurou seu seio, os dedos dele encontrando seu mamilo e rolando-o entre o polegar e o indicador.

Um relâmpago atravessou suas veias e com vontade própria, seu corpo ronronou contra o dele como um felino em busca de conforto. Arthur se levantou, pegando-a nos braços e levando-a para o quarto dela. Ele a deitou na cama, seguindo-a e beijando-a, sua intenção tão clara quanto sua aquiescência.

— Você é tão bonita. — ele rolou um pouco para longe dela, levantando a bainha de seu vestido e puxando-o para cima.

Hallie se sentou para permitir que ele tirasse todo o resto, e ali no quarto dela, iluminado pela lua, ela conseguia ver a necessidade que ardia no olhar dele. Ele tirou as calças e a camisa tornou-se seu único traje, a gola aberta dava a ela uma visão perfeita de sua cintura cinzelada.

Ela estendeu a mão, pegando a camisa e puxando-a sobre a cabeça dele. Hallie mordeu o lábio ante a visão que a saudou. O

corpo dele era tão lindo quanto o rosto, linhas fortes, tensas e dela para a noite.

Hallie passou a mão pelos músculos ondulantes do estômago dele, incapaz de impedir que os olhos mergulhassem no que estava ereto entre suas pernas. Ela se abaixou, passando o dedo ao longo da ponta e ficou maravilhada com a perfeição.

— É tão macio, e ainda assim duro. Eu não fazia ideia.


Ela sentiu os olhos dele sobre ela e ergueu os olhos.

— Você é virgem? — as palavras dele eram ofegantes, mas controladas, e ela assentiu.

— Sim. — ele franziu a testa, a mão se interrompendo a caminho de seus seios. — Eu não quero parar. — ela disse, movendo-se até ele e envolvendo os braços em volta de seu pescoço. — Mostre-me como é antes de eu deixar tudo isso para trás. Só uma vez, eu quero estar com um homem.

Ele afastou o cabelo do rosto dela, segurando seu queixo.

— Tem certeza mesmo? Não quero que pense que tirei vantagem de você esta noite. Esta não era minha intenção quando vim aqui. Eu preciso que você saiba disso.

Ela o beijou, de forma lenta e profunda, assim como fizera antes, e o puxou com força contra sua pessoa.

— Eu sei que não, mas eu quero. Eu quero mesmo.

Arthur beijou-a com força, caindo na cama.

Hallie sorriu através do abraço. Sim, era isso que ela queria.

Isso, tudo isso.

A última lembrança dela antes de cair no sono mais tarde naquela noite, envolvida em seus braços e ouvindo a batida do coração dele contra o ouvido, era de Arthur, e o presente de despedida perfeito que ele lhe dera. Vários presentes de despedida, na verdade. O que mais o mundo havia reservado para ela? Ela mal podia esperar para descobrir.

HALLIE TERMINOU de contar a Willow a noite que passou com Lorde Duncannon, mas sem os detalhes mais particulares que eram apenas para suas memórias. Os olhos da amiga estavam

arregalados, as bochechas tão vermelhas quanto uma moça escocesa que fica no sol por muito tempo.

— Bem. — Willow disse, sem fôlego. — Você de fato conhece Lorde Duncannon muito bem.

Hallie concordou.

— Eu não sabia que ele era um lorde naquela época. Ele se apresentou como Sr. Howard. Quando voltei a vê-lo, no baile da dos Whitstone, na noite do incêndio na propriedade de Ava, foi que descobri quem ele realmente era. Não que tal informação mudasse o que aconteceu naquela noite em Surrey, mas eu decerto estaria mais preparada para revê-lo do que quando aconteceu.

— O que você não achou que aconteceria. Estou certa?

— Exato. Mas nos encontramos de novo e é estranho. Acho que ele gosta de mim. — ela admitiu, encontrando o olhar assustado da amiga. — No que está pensando? Você parece surpresa.

Willow lançou um olhar preocupado.

— Só estou preocupada. Morar com minha tia tem sido informativo, e nem sempre positivo. Esses lordes não são confiáveis e, embora haja alguns que possam ser, o duque de Whitstone, é um deles claro, a maioria dos homens que conheço são malandros e trocam de mulher como trocam de roupa.

— Eca. — Hallie disse, não gostando da ideia de que ela estava sendo vista como uma peça de roupa, ou apenas uma entre tantas à disposição de Lorde Duncannon.

Mas então, ela deveria sim pensar desta forma, pois era a mais provável verdade. Ele era um libertino renomado. A família também se esforçava para que ele se casasse apenas com uma das melhores. Ela ficou surpresa por ele ter falado com ela, ela estava muito abaixo dele, pelo menos na avaliação da família.

Mas ele se dirigia a ela, ajudava-a na escavação e estava tentando fazer as pazes. Hallie não poderia culpá-lo por isso. Ele era doce e carinhoso com ela. Já haviam dormido juntos, então não havia razão para continuar insistindo em uma amizade, a menos que estivesse sendo sincero e tentando acertar as coisas entre eles.

— Você precisa conversar com ele, contar o que aconteceu no Egito. Explique que o que aconteceu entre vocês dois não vai mais acontecer, e que ele deve se concentrar em mulheres elegíveis que estejam, de fato, interessadas em cortejos. — Willow a estudou por um momento, e Hallie lutou para não se inquietar sob a inspeção da amiga. — A menos que esteja querendo sim a atenção dele.

Ela se sentiu vibrar por dentro de nervoso ante o pensamento de ele a tocar. Ela se levantou e foi até a escrivaninha, serviu duas taças de vinho. A criada que a estava servindo havia trazido uma garrafa a seu pedido antes de se retirar para a noite. Hallie entregou uma para Willow e engoliu o conteúdo da dela de uma vez.

— Claro que não, e já disse a ele que nada mais acontecerá entre nós. Tenho outras coisas que ocupam minha atenção. Não preciso de um homem para atrapalhar minha vida. Estou farta de tudo isso. Não acredito que ninguém me fará sentir metade do que Omar me fez sentir.

Ela se afundou na cadeira, apoiando a cabeça no encosto, sabendo que o que acabara de dizer estava longe da verdade.

Lorde Duncannon a fazia sentir coisas também, não apenas Omar o fez, mas ela não podia expressar tais coisas. Ter expectativas onde não havia esperança era um erro que ela não podia cometer. Esse caminho a levaria a um coração partido, e ela não podia pensar apenas nela agora. Havia um filho para ela cuidar.

— Creio que se você for honesta com ele, ele a deixará em paz.

Ele é o melhor amigo do duque de Whitstone. Whitstone não seria

amigo dele se não fosse honrado.

Hallie assentiu, tendo pensado o mesmo.

— Falamos sobre o que aconteceu em Surrey hoje, no local da escavação. A maneira como ele falou me fez acreditar que ele queria mais.

Willow riu, bebendo o vinho.

— Estou certa de que sim, mas não significa que ele terá mais.

— Claro que não. — Hallie respondeu, ignorando o fato de que seu corpo se agarrava à ideia de sentir as mãos dele de novo.

A primeira vez foi rápida, mas muito satisfatória. Depois de estar com Omar, ela tornou-se bem ciente do que seu corpo era capaz e do que ela gostava. Ter um amante não era uma ideia horrível, mas os riscos eram muito altos. Ter mais filhos fora do casamento não era algo que ela estava disposta a fazer. Nem se significasse mais uma noite nos braços dele.

— Fico feliz. — Willow disse, levantando-se e dando uma palmadinha em seu ombro ao passar para recolocar a taça de volta na mesa de Hallie. — Vou deixá-la agora para descansar, mas não se preocupe, Hallie. Seja honesta com Lorde Duncannon e tudo ficará bem. Verá, ele entenderá que você não está mais aberta a este tipo de relacionamento. Seu filho deve ter prioridade e ele respeitará sua decisão.

— Boa noite, Willow. — Hallie disse quando a amiga saiu de seu quarto, fechando a porta com cuidado atrás dela.

Ela se levantou e voltou para a mesa, servindo-se de outra taça de vinho. Quando terminou a garrafa, estava apenas um pouco tonta, mas também precisava de outra bebida. Talvez a biblioteca tivesse um pouco de uísque que ela pudesse levar para o quarto.

Hallie vestiu o robe e, verificando o corredor do lado de fora da porta, não viu ninguém por perto, nem ruído algum vindo do andar

de baixo. Algumas arandelas queimavam ao longo das paredes, iluminando o caminho, mas quando ela subiu a escada, avistou um lacaio abaixo, caído em sua cadeira e dormindo, apenas uma única vela acesa no hall de entrada.

Ela passou por ele e foi para a biblioteca que, ainda bem, estava vazia. A garrafa estava cheia, e ela a pegou, perguntando-se se levá-la para seu quarto pareceria um pouco exagerado. Em vez disso, ela a colocou no lugar, curvando-se para olhar o armário abaixo. Uma garrafa de vinho tinto estava lá junto com uma série de copos. Ela pegou o vinho e se virou para a porta, seus passos um pouco desiguais enquanto ela se movia pelo cômodo tentando não bater em nenhum móvel e fazer barulho.

Uma rápida olhada na entrada revelou apenas o criado adormecido que não havia se movido. Hallie passou correndo por ele e subiu as escadas o mais rápido que pôde. Quando ela chegou ao corredor em que seu quarto ficava, o nervosismo diminuiu. O

vinho a deixara aquecida e relaxada e depois de admitir seus dois maiores segredos esta noite, e ela precisava de fortalecimento.

Graças a Deus, Willow pareceu receber bem a notícia.

Talvez as outras amigas também reagissem bem quando ela contasse, e ela precisava contar. E logo. Queria viver com o filho, e não viveria mais escondida com medo do que todos iriam pensar.

Se as pessoas decidissem virar as costas, essa era sua cruz a carregar.

— Beber sozinha nunca é uma coisa boa, Srta. Evans.

Hallie sufocou um grito e se atrapalhou com a garrafa, quase deixando-a cair. Ela olhou para cima e, mais à frente do corredor escuro, avistou Lorde Duncannon, vestido da mesma forma que estava na noite em que estiveram juntos em Surrey. As calças de

pele de gamo se agarravam nele como uma luva e a camisa estava aberta, mais uma vez tentando-a a pecar.

Ela fechou os olhos, afastando-se do apelo visual.

— Está me espionando agora, meu senhor? Se continuarmos nos encontrando assim, vou pensar que está obcecado por mim.

Ele riu e se afastou da parede, caminhava com um ar relaxado que a lembrou de um gato saindo de cena depois de encurralar a refeição.

— Ora, eu admito que estou obcecado por você, Srta. Evans e apaixonado, estupefato, e muitas outras coisas. Se ao menos você me tirasse da miséria e ficasse comigo. Sempre.

Ela se engasgou e bateu a mão na boca, perguntando-se se ela havia bebido em demasiado esta noite e agora estava imaginando tudo isso. Decerto que não.

— Você me provoca. — ela disse, chamando o blefe dele e encontrando-o no meio do corredor.

O aroma de sândalo flutuou da pele dele. Eles estavam tão perto que ela podia ver que ele havia tomado banho há pouco. A ideia de ele mergulhar até o pescoço na água, esfregar a pele com sabão e lavar o corpo causou um arrepio na espinha dela. Ela abraçou a garrafa de vinho a frente dos seios na esperança de impedir que suas mãos se estendessem e o tocassem.

Saber como seria estar com Lorde Duncannon, ser a única receptora das atenções do cavalheiro, não era algo que ela era capaz de remover da mente sem muita dificuldade. Uma dificuldade de teor intransponível devido ao estado de embriaguez que ela estava.

— Nunca falei tão sério. — ele se aproximou ainda mais e seu peito roçou o dela.

A respiração dela falhou. e ela deixou cair as mãos para os lados, a garrafa ainda pendurada em uma delas. Seu coração batia tão forte que ela estava certa de que ele ouviria.

— Eu avisei a você hoje que o que aconteceu entre nós foi um erro, e um que não estou disposta a repetir. — ela estudou a mandíbula dele, uma pequena sombra de barba por fazer manchando o rosto normalmente perfeito.

Maldição, ele era tão bonito e tão adorável.

Os dedos dela coçavam para deslizar até o peito dele, agarrá-lo, e puxá-lo para um beijo. Permitir que ele a seduzisse a ponto de pensar na união deles, um futuro que nunca aconteceria. Se ela permitisse que essa loucura começasse, só causaria dor de cabeça.

Ela não poderia deixar que acontecesse.

— Eu quero você, você por inteiro, Hallie. Eu a quero desde o dia em que você me ofereceu uma carona em Surrey. Você também não sentiu?

Ela fechou os olhos, desejando que as emoções que ele provocava nela diminuíssem. Que sumissem e nunca mais voltassem. Ele não era para ela. Se a linhagem dela não era o suficiente para excluí-la de ser algo para ele, tudo o que ela fizera no Egito, e o filho que ela gerou fora do casamento decerto acabariam com essa ideia.

— Não faz diferença o que eu sinto. Só podemos ser amigos.

Ela se virou para voltar para o quarto. Precisava ficar longe dele e de tudo o que ele oferecia. Ser amada pelo visconde Duncannon significava segurança e proteção, tanto para ela quanto para seu filho. Mas este era um sonho frágil. Assim que ele soubesse a verdade sobre sua situação, correria para as montanhas. Nenhum homem quer criar o filho de outro homem. Ainda mais se tal criança

fosse fruto de uma união fora do casamento. Ele a fez parar, girando-a para olhar para ele.

— Por que luta contra isso? Sei que sente algo por mim, então, se não for pedir muito, gostaria que parasse de me afastar. Pode fazer isso?

Ela puxou o braço do aperto dele, olhando para ele. Odiando-o por ser tão honesto. Seria muito mais fácil negá-lo se ele não fosse tão gentil.

— Eu não sinto nada por você, meu senhor. Lamento desapontá-

lo, mas essa é a verdade.

— Sério? — ele disse, uma inclinação sarcástica na boca. — Por que eu não acredito? — ele sussurrou, inclinando-se e tentando-a com os lábios.

Ela mordeu o lábio inferior, forçando seu olhar para longe do rosto dele.

— Você deve. É a verdade. Boa noite.

Hallie voltou para seu quarto, a necessidade de correr quase impossível de negar. Ele não a seguiu desta vez, e ela sentiu-se grata. Não estava segura de que conseguiria negá-lo uma segunda vez. Não com a mente confusa pelo excesso de vinho e, também, por causa do poder de persuasão dele. As palavras tentadoras acerca de uma vida a dois.


CAPÍTULO 10

H ALLIE CHEGOU TARDE à escavação no dia seguinte, com uma forte dor de cabeça nas têmporas. Ela observava da segurança da tenda enquanto os homens continuavam a cavar, cavoucar com a espátula e peneirar o solo dentro e fora da trincheira. Ela esboçou alguns dos artefatos que haviam sido encontrados além do próprio sítio, satisfeita em fazer este tipo trabalho em vez da parte mais braçal que faria como de costume.

Ninguém queria ver uma mulher esvaziar o estômago.

Lorde Duncannon não foi visitá-la ali, e ela ignorou o fato de sentir-se revirando por dentro, de uma forma desagradável, só por ele não estar lá. Ou talvez o mal estar fosse por causa de todo o vinho que bebeu na noite anterior. Ela decidiu tomar várias outras taças depois de deixar Arthur. Felizmente adormeceu e não foi para o quarto dele para permitir que eles continuassem a se conhecer melhor.

Hallie esfregou a testa, a mente não tão afiada ou clara como em seu normal. Ela não beberia de novo, se prometei isso. Chega de afogar as mágoas em bebida. Ela enfrentaria seus medos e sua vida assim como seu pai a criou para enfrentá-los.

De cabeça erguida e com o queixo alto.

— Aqui está você. — uma voz profunda e grave disse antes que uma cabeça aparecesse entre as abas da tenda.

O coração dela deu um salto ao vê-lo, aquela imagem loira e divina e um sorriso que seduziria até uma freira.

— O que está fazendo aqui? — ela perguntou, levantando-se, segurando o caderno de desenho contra o peito como se para afastá-lo, uma armadura de papel.

— Vim ver se você mudou de ideia.

— Não mudei. — ela respondeu, se afastando para colocar a pequena mesa de trabalho entre eles.

Ele entrou na tenda, uma das mãos correndo, de forma distraída, pelo tampo da mesa enquanto caminhava em sua direção.

— Talvez precise de um lembrete de como somos bons juntos.

Hallie fechou os olhos, nenhum lembrete era necessário. Ela conseguia se lembrar de cada segundo do tempo que passaram em Surrey. Cada toque e olhar, a forma como os lábios dele tomaram os dela, exigentes e ainda, suaves e flexíveis.

— Eu sei que você está mentindo, minha querida. Venha, me beije. — ela se interrompeu, e ele continuou a passear pela mesa, alcançando-a. — Beije-me, Hallie. Se depois desse beijo, você ainda não sentir nada por mim além de amizade, nunca mais vou incomodá-la. Eu prometo. — ele disse, fazendo o sinal da cruz sobre o peito.

Hallie apertou os lábios, debatendo a oferta.

Com certeza, ao menos serviria para ela afirmar o beijo dele não a afetava, mesmo que a afetasse sim.

— Muito bem, você pode me beijar. Uma vez e nada mais.

— É o suficiente, garanto a você. — disse ele, depressa, erguendo-a nos braços e tomando os lábios dela sem hesitação.

NO MOMENTO em que os lábios de Arthur tocaram os de Hallie, ele confirmou a sensação de certeza. A mulher em seus braços era sua outra metade neste mundo. Não havia dúvidas. Ela se derreteu

contra ele, e ele aprofundou o abraço, queria mostrar a ela tudo o que ela o fazia sentir, e ela o fazia sentir muito. Mais do que ele já havia sentido com qualquer outra pessoa.

Ele soube, no momento em que a tocou em Surrey, que ela era diferente. Sua alma sabia que ela era a única para ele. Agora, ele precisava convencê-los do fato, tanto ela quanto a família dele que não ficaria impressionada por ele ter decidido se casar com uma mulher fora da esfera em que circulavam.

— Você é tão doce. — disse ele, levantando-a para colocá-la em sua bancada.

Ela se engasgou com a ação, e ele aproveitou a oportunidade para dar um beijo longo e profundo. O corpo dele rugiu para a vida quando ela o beijou de volta com tanta paixão quanto ele se lembrava, estimulando seu desejo por ela. Já fazia muito tempo desde a última vez que ele estivera com uma mulher, e mais ainda desde que estivera com uma que o fazia querer tão mais que apenas uma perseguição repleta de sedução.

Ele queria mais com Hallie. Queria fazê-la feliz tanto nessas situações quanto no dia a dia. Ele queria dar a ela um lar, segurança e, se Deus quisesse, filhos.

As mãos dela agarraram seus ombros antes de deslizar ao redor do pescoço, puxando-o para perto. Ele conseguia sentir os seios dela subindo a cada respiração contra seu peito, e ele ansiava por segurá-los. Arthur manteve as mãos na cintura dela, exigindo que ficassem parados e não se movessem. Não queria pressioná-la em demasiado. Ele precisava que ela permanecesse em sua vida, e não que fugisse de medo.

A língua dela deslizou contra a dele, e ele rosnou.

Maldição, ela o tentava como o canto de uma sereia. Ele se aproximou ainda mais, colocando sua dureza contra o corpo dela.

Uma pena que ambos estivessem completamente vestidos. Ele ondulou contra seu sexo, arrancando um suspiro dela. A perna dela envolveu a dele, puxando-o ainda mais perto.

O pênis de Arthur estava duro como pedra, e ele empurrou contra o sexo dela. A ação o provocou, e ele lutou para não se derramar nas próprias calças como um rapazote. A respiração áspera dela fazia coisas estranhas com ele, e ele aumentou o ritmo.

Se alguém tivesse entrado, teria parecido como se estivessem no cio como dois animais selvagens. Ele queria tomá-la de novo, sonhou com esse encontro muitas vezes durante anos, se fosse honesto consigo mesmo.

O som da risada dos homens fora da tenda o fez retomar o juízo, e se arrancou do abraço dela, afastando-se. Ela pulou da mesa, segurando-a para se apoiar no momento em que Bruce empurrou as abas da tenda e entrou, tirando a boina ao vê-los.

— Senhorita Hallie, encontramos outro artefato de ouro. Gostaria de dar uma olhada antes de irmos mais fundo no solo?

Arthur observou enquanto ela lutava para recuperar a compostura. Ela verificou o cabelo e, olhando em volta, agarrou o gorro de lã que gostava de usar, colocou-o na cabeça e saiu da tenda sem dizer uma palavra.

Arthur se apoiou na mesa, respirando fundo para se acalmar.

Maldição, o beijo que ele pediu havia progredido tão rápido que mesmo agora sua cabeça girava. Ele ficou a encarando, esperando que ela não o dispensasse depois de seu lapso de etiqueta. Havia algo entre eles, e ele precisava descobrir o que era. Ele suspeitava de que era algo semelhante ao que seu bom amigo, o duque de Whitstone, sentia por sua esposa.

Ele passou a mão pelo cabelo, verificando as roupas antes de sair para se juntar a Hallie e seus trabalhadores na trincheira.


Decerto depois de um beijo como o que acabaram de compartilhar, ela concordaria que havia algo especial entre eles. Algo que só acontecia uma vez na vida. Algo a que se agarrar e não jogar fora, não importa os obstáculos.

MAIS TARDE, naquela noite, Hallie sentou-se na sala de estar, e ouviu Willow contar de seu dia e de como a tia havia dado aprovação para visitar o local de escavação no dia seguinte.

Todas as palavras que a amiga dizia se perdiam, pois sua atenção foi cativada pelo mortal e sedutor Lorde Duncannon, que conversava com um grupo de cavalheiros do outro lado da sala, que incluía o Barão Bankes.

Depois de perder Omar, ela jurou não ser afetada ou atraída pelos jogos dos homens. Mas daí, Lorde Duncannon era diferente da maioria dos homens. O fato de ela o ter conhecido antes de partir para o Egito também era um fator a ser considerado. Mesmo então, quando ela mal conhecia o cavalheiro, ela sentiu uma conexão com ele. Luxúria, mais do que qualquer coisa. Disso não restava dúvidas, agora que sabia o que era aquela emoção.

E ela estava a sentindo mais uma vez, mais forte. Havia um sentimento que ela não queria analisar por demais naquele instante.

Trilhar tal caminho significava arriscar seu coração, e ela não estava certa de que poderia sobreviver a uma segunda quebra.

Ela se amaldiçoou em silêncio por sua fraqueza. Ela precisava ser forte, por sua própria bússola moral e por seu filho. Estar com um homem de novo era um risco, e ela estava certa de que, mesmo sendo tão sedutor quanto Sua Senhoria era, não valia aquele preço.

Ele riu de algo que o barão disse, e seu coração deu um pulo.

Ela suspirou, talvez ele valesse tal preço...

— Hallie? Você ouviu alguma palavra do que eu disse a você?

Hallie se virou para Willow e lutou para se lembrar do que a amiga havia dito até então. Algo sobre rendados...

— Sinto muito, Willow. Eu estava divagando.

— Você não estava. — sua amiga respondeu. — Estava observando um certo deus loiro do outro lado da sala.

Calor floresceu em suas bochechas, e ela balançou a cabeça, descartando fisicamente a ideia, embora sua mente gritasse, sim, sim, ela estava olhando para ele e aproveitando cada momento.

— Claro que não. Estava apenas observando os convidados, só isso. Lady Hayes está muito bonita esta noite.

Willow lançou um olhar superficial para Lady Hayes e voltou seu olhar incrédulo para Hallie.

— Por favor, até eu sei mentir melhor do que isso. Você está se deixando afetar, Hallie. Costumava mentir melhor.

Ela encolheu os ombros, o olhar voltando sozinho, de forma irritante, para Lorde Duncannon.

Como se sentisse a inspeção dela, ele olhou em sua direção, os lábios se contraindo em um sorriso libertino. Ela sentiu-se apertar por dentro. O que ela iria fazer com ele?

— Nós temos idade suficiente para saber que, se for discreta, poderia ter um amante. — Willow sussurrou, inclinando-se para garantir privacidade. — Ninguém precisa saber.

— Não. — ela disse, odiando a ideia. — Já pari um filho fora do casamento, não farei isso de novo. Estou contente como estou. Sou independente, ou serei muito em breve, e nos próximos meses poderei voltar a Surrey com Ammon e viver em paz. Eu não preciso de nada que possa atrapalhar esses planos.

— Claro que a decisão é sua, mas pode ser que Lorde Duncannon valha o risco.

— Talvez você devesse levá-lo para a sua cama, já que gosta tanto da ideia.

Willow se engasgou, os olhos se arregalando em choque.

— Não é em mim que ele está interessado, caso contrário, eu bem que investiria. Sei que minha tia quer que eu me case bem, mas depois de todos esses anos em meio à sociedade e sem perspectivas, temo que o sonho dela seja em vão. Estou destinada a ser uma solteirona. Pelo menos terei você como companhia.

Hallie riu.

— Você é incorrigível.

Ela se virou para observar Lorde Duncannon. Ele estava em conversa acalorada com Lorde Bankes, e ambos pareciam absortos no assunto. Bem provável que falassem de cães ou cavalos.

— Você o beijou desde que ele chegou? Sinto que não está me contando tudo. — Willow ergueu a sobrancelha questionando-a.

Como poderia contar, depois de tudo o que havia acabado de dizer de Sua Senhoria, que ela o beijou entre algumas outras coisas. Permitiu que ele a tocasse enquanto ambos eram convidados do barão, que deslizasse contra seu corpo da maneira mais evocativa para provocar a ambos.

Ela sufocou um suspiro pela lembrança.

Era tudo delícia e um passatempo ao qual ela poderia se acostumar. Mesmo assim, havia algumas coisas que Willow, nem suas outras amigas não precisava saber, e esta era uma delas. Um único beijo na tenda não resultaria em nada mais, e por isso seria bobo envolver a amiga ou aumentar as próprias esperanças em relação a Sua Senhoria.

— Não. — ela mentiu e tomou um gole do vinho. — E nem vai.


ROBERT TOMOU um gole de uísque e observou Hallie e Lorde Duncannon trocarem olhares acalorados através da sala. A idiota estava apaixonada pelo homem, e ele também era um participante voluntário, se coubesse a ele julgar. Pena que o que ele sabia da Srta. Evans arruinaria as chances dela de ter algo com Sua Senhoria. Se Lorde Duncannon não se afastasse de um enlace com esta garota ao descobrir seus segredos, então a família dele decerto asseguraria de mantê-los afastados.

— Srta. Evans. — ele disse, parando ao lado dela. — Nesta noite em particular, você está muito bela. É outro vestido emprestado da Srta. Perry?

A cabeça dela virou para encará-lo, e ele sorriu com o desdém que ela manteve nos olhos, direcionado a ele. Ótimo. Pois ele também nutria desdém por ela.

— É sim, Sr. Stewart. Como você é esperto em notar. Está tão familiarizado assim com os trajes femininos deste festejo?

— Só quando se trata de você. — ele disse, pegando-a pelo braço e levando-a para longe de Willow.

Hallie franziu a testa diante da coragem dele. Ele sorriu e continuou.

— Estou feliz por termos este momento para nos conhecermos melhor. Adoro estar bem informado, saber como estão as outras pessoas. É um pequeno hobby meu, pode-se dizer.

— Sério? — ela disse, a resposta plena de tédio e desinteresse.

— Sim, sério, Srta. Evans. Devo contar uma pequena história que ouvi quando estava viajando por Roma no ano passado?

Ela encolheu os ombros, mantendo suas mãos a frente do corpo.

Ele olhou para as mãos dela, perguntando-se se era um pequeno

tremor que ele podia ver.

— Claro, se você quiser.

Ele riu, gostando do joguinho deles mais do que pensava que seria possível.

— Que uma certa mulher solteira, de Felday, deu à luz um filho fora do casamento, um filho de um general egípcio. Consegue imaginar o escândalo? Não vai me perguntar a quem me refiro?

A pele dela empalideceu, e ela se recusou a olhar para ele.

— Eu não vou perguntar. Parece ser um assunto privado. —

respondeu ela.

Garota esperta, mas não o suficiente.

— Bem, quanto a isso, é algo que posso ajudar. — ele disse com naturalidade. — Foi você, minha querida. Consegue visualizar tal boato? No entanto, você conseguiu sobreviver bastante tempo com esse laço no pescoço, não é mesmo?

Ela não respondeu, e ele se perguntou quanto tempo levaria para arrancar qualquer reação dela. Ela era uma moça fria, essa Srta. Evans, mas não era indiferente o suficiente para escapar dessa bagunça.

Ele queria que ela fizesse papel de boba. Que parecesse paranoica e com os pensamentos confusos. Ela assistiu o primo dele morrer sem nem piscar. Fazer com que a educada e respeitada Srta. Evans pagasse por suas indiscrições era responsabilidade dele. Sua família e sua honra exigiam isso.

— Não vou mais provocá-la, Srta. Evans. Saber que sei o seu segredo deve ser um choque, eu sei, mas serei honesto com você quanto ao que farei com essa informação, que é mais do que você jamais fez por meu primo. Você e sua amiga não deram uma segunda chance à Sua Senhoria.

Ela puxou o braço do dele e deu um passo para trás.

— Seu primo, senhor? Eu não entendo.

— Não, não entende, eu suponho, mas vou explicar. Deixe-me apenas dizer que sei tudo o que há para saber sobre você, Srta.

Evans. Eu sei de Ammon, e sei onde ele mora. Também sei que Omar, seu amante, era de uma família muito influente e rica do Cairo. Tenho certeza de que eles ficariam muito interessados em saber que Omar, seu único filho, teve um menino.

— Você não ousaria. — disse ela.

Ele precisava dar crédito a ela, quando ele pensou que ela sucumbiria às lágrimas, ela o encarou com uma linha dura e determinada nos lábios.

— Ó, ousaria sim. Na verdade, tenho toda a intenção de contar a todos em Londres, e aqui nesta festa quem você realmente é. Que você não é nada mais do que uma prostituta que, embora eu acredite que seja inteligente, não passa de uma rameira em busca de uma foda.

— Por que está fazendo isto comigo? — ela perguntou, e ele quase sentiu pena dela.

Ela parecia tão patética pelo medo que pairava nas profundezas verdes de seus olhos. Quão triste é que, sendo uma mulher independente, que a Srta. Evans se tornasse tão patética ao primeiro sinal de desentendimento.

— Meu primo, Lorde Oakes deve ter se perguntado a mesma coisa, antes de vocês o deixarem para morrer queimado. Ele não merecia tal destino, e foram você e a Srta. Ava Knight que tiraram o futuro dele. Então, agora, vou tirar seu futuro de você, a menos que faça o que eu peço.

Ela olhou ao redor da sala. Robert fez o mesmo, notando que estavam sozinhos.

— O que você quer? — ela sussurrou com a voz trêmula.

— Dinheiro. Quero tudo o que você vai ganhar aqui nesta escavação, e em qualquer outra em um futuro previsível. Eu também possuo planos para um futuro que preciso organizar e trabalhar para alcançá-los, e você irá me ajudar a realizá-los.

— Mas, se eu der tudo que ganhar a você, como farei para viver? Tenho despesas como quaisquer pessoas, Sr. Stewart.

Ele deu de ombros.

— Não é da minha conta. Você fará o que eu pedir, ou direi a Lorde Duncannon, e à família de seu filho, tudo o que está escondendo, deixarei que os dados do destino decidam por você.

Você pode permitir que o destino escolha seu futuro ou pode tomar as rédeas. A decisão é sua.

Ela olhou para ele por um momento, e ele pôde ver que ela debatia, pesando no que ele exigia dela. Ele a observou com interesse, já sabendo que ela concordaria com sua exigência. Que escolha ela teria? Não havia outra opção. A Srta. Evans assentiu com a cabeça e se afastou, colocando o copo na mesa, saindo da sala.

Ele sorriu.

— Bem como eu pensei.


CAPÍTULO 11

H ALLIE FUGIU da sala de visitas e, ao ver algumas pessoas na escada, sem humor para bate-papos, se dirigiu para os fundos da casa, para a escada de serviço que costumava usar ao longo do dia. Lágrimas escorriam por seu rosto, e ela as enxugou, não queria que ninguém a visse chateada.

O que ela faria? As cento e cinquenta libras que essa escavação renderiam haviam sido alocadas para dívidas não pagas e para garantir certa estabilidade para o futuro dela e do filho. Ela queria comprar algumas coisas novas para o menino, e o restante ajudaria a pagar a prima por cuidar dele nos últimos anos. O dinheiro era sua proteção e segurança quando não estivesse trabalhando. Ter que entregar o soldo ao Sr. Stewart só porque ela estava envolvida no Reinado de Loucura do primo dele seria outra loucura.

Hallie entrou em um cômodo vazio e se deixou cair no sofá, ficou encarando a lareira apagada diante dela. Ele iria arruiná-la, disso não havia dúvidas. O ódio que ela leu nos olhos frios dele era a prova disso. Qualquer pessoa que os visse não teria percebido o ódio oculto por ela, mas estava lá, mascarado sob uma boca sorridente e uma voz encantadora.

Desgraçado.

Ela fungou e enxugou o rosto.

Como é que homens como o Sr. Stewart sequer existiam? Ela duvidava que ele tentasse tal esquema com um cavalheiro. Não, ele só mirava mulheres. Mulheres como ela, que tinham muito a perder e nenhuma família, nenhum irmão para defendê-las.

— Hallie?

Ela saltou e se virou e viu Lorde Duncannon parado na porta, a luz do corredor atrás dele iluminando-o, mas deixando as feições escuras demais para serem lidas.

— Posso ajudá-lo, meu senhor? — ela perguntou, virando-se para olhar para a lareira, não queria que ele a visse chateada.

— Eu vi você com o Sr. Stewart, e você pareceu aborrecida com a conversa. Queria ter certeza de que ele não a magoou de alguma forma.

Ela fechou os olhos, em parte exasperada por Lorde Duncannon estar ciente dela o bastante para saber quando ela estava magoada, e em parte de prazer por ele se importar para ver se ela estava bem.

— O Sr. Stewart estava apenas sendo um homem. Não precisa se preocupar comigo, meu senhor. Sou perfeitamente capaz de cuidar de mim mesma.

Ela suspirou.

É claro que, ao pagar ao Sr. Stewart todo o soldo, ela manteria a boca dele fechada por alguns meses, ou pelo menos até ela encontrar outro emprego, e então as ameaças recomeçariam. Por quanto tempo ele planejava manter essa ameaça pairando?

Para sempre, talvez. Quem no mundo não continuaria a sugar-lhe todo o dinheiro e, portanto, não ter que trabalhar nunca mais?

Muitas pessoas ela poderia imaginar.

Lorde Duncannon entrou na sala e fechou a porta atrás de si antes de se sentar ao lado dela. Ela esperava que ele não pudesse ver que ela esteve chorando ou saberia que ela mentiu, e ele acabaria, então, por fazer uma cena com o Sr. Stewart sem saber de todos os fatos. Não havia como saber do que o homem era capaz se ameaçado. É provável que gritasse para todos os presentes que ela havia dormido com um general egípcio e gerara um filho fora do casamento.

— Você está chateada. — disse ele, pegando a mão dela e puxando-a para si.

Como ele poderia saber?

O homem deve ter visão noturna para ver que ela estava chorando. A presença dele a dominou, tentando-a a se ancorar ao apoio e carinho dele. Ficar ali para sempre.

— Nada de preocupante, meu senhor. Por favor, não se intrometa. — ela disse, esperando que ele deixasse o assunto morrer.

— Hallie. — ele implorou, esticando a mão e segurando-a no queixo, virando-a para encará-lo. — Você me diria se algo estivesse errado. Sabe que eu a ajudaria em qualquer coisa. Não gosto de vê-

la angustiada.

Ela puxou o queixo da mão dele.

O toque dele a fazia querer coisas que não deveria. Coisas que no passado a colocaram na situação difícil que ela agora enfrentava.

O homem era um problema, mas de uma maneira diferente, em todos os sentidos, dos problemas que o Sr. Stewart trazia. Uma noite em seus braços estava começando a ser muito difícil de se negar, ainda mais quando escapar para esse sonho poderia removê-la do pesadelo em que o Sr. Stewart a fazia viver.

— Estou cansada, só isso, meu senhor. Acho que vou me retirar por esta noite. — ela se levantou, e ele a interrompeu com um toque no braço.

— Você precisa ir? Eu não a vi hoje. Lorde Bankes me pediu para cavalgar com ele até as fazendas arrendadas e ver algumas de suas terras. Eu não pude recusar.

— Há mulheres mais elegíveis e adequadas na sala de visitas, Lorde Duncannon. Ainda me confunde por que você perderia seu tempo comigo. Nós não somos compatíveis.

A lembrança de Arthur na cama dela naquela noite em Surrey bombardeou sua mente. Ela supôs que incompatíveis não era uma verdade completa. Eles se adaptaram muito bem quando colocados juntos em tais circunstâncias. Mas a ideia de “para sempre”, bem, essa era um absurdo em que ela não podia se permitir acreditar.

O toque dele no outro dia, no local da escavação, o calor escaldante e a necessidade que fez seu corpo sentir-se tentado até mesmo agora. Ele a tentava quando não deveria. Muito depois de ele ter voltado a trabalhar na trincheira, ela ardia pelo toque dele, por sentir seus lábios implacáveis contra os dela.

Ela estaria condenada se tais desejos continuassem. Era uma defeito dela, algo intrínseco, querer coisas que eram comuns aos homens. Queria a mesma liberdade, mas era incapaz de tê-la.

— Eu não me importo com o que as pessoas pensam. Preciso que você saiba, e que acredite, que você é a mulher que eu desejo.

A única mulher que eu quero na minha cama. — ele se aproximou ainda mais, segurando o rosto dela com as duas mãos. — Eu ardo de desejo por você, Hallie. Há anos. Sei que nossa história é tão turbulenta quanto a carona na carruagem que você me ofereceu em Surrey, mas você é a única mulher que nunca fui capaz de me esquecer. Não quero me arrepender de não tentar saber se você e eu podemos ser mais do que uma história.

Ela olhou para ele, a mente confusa tentando entender o que ele estava dizendo.

— Eu não sou uma boa opção para você, Arthur. Sua família nunca me aceitaria, e se você me conhecesse, sei que você também não iria me querer. — Hallie estendeu a mão e juntou as mãos dele, puxando-as para apoiarem-se no colo dela. — Eu estaria mentindo se não admitisse que quero você. Que à noite, o desejo de estar com você me dá vontade de jogar todas as regras de etiqueta

de lado e me esgueirar para o seu quarto, mas isso não mudaria nada. Há coisas em meu passado que não posso mudar, e são coisas que não acredito que você ou sua família entenderiam. Por favor, saiba que não posso dar o que quer. Eu arrisco muito com essas ações.

Ele franziu a testa, as mãos segurando as dela em um aperto implacável.

— O que aconteceu que a faz acreditar nisso? Eu conheço minha família, e assim que eles a conhecerem, vão adorar você.

Você é filha de um cavalheiro, e eu sou um cavalheiro. Não vejo razão para não poder ao menos cortejá-la.

A respiração dela falhou ante a doçura dele. Ser cortejada e receber flertes soava celestial, se ela não fosse uma mulher que teve um amante fora do casamento e deu à luz um filho sem remorsos.

— Eu estou além de ser cortejada. Esse tempo ficou no passado.

— Por favor. — ele implorou, apertando as mãos dela. — Deixe-me ao menos tentar conquistá-la, e se não quiser correr atrás de um futuro comigo, vou deixá-la em paz. Prometo isso a você.

Hallie se levantou e foi até a janela, olhando para o terreno escuro que era banhado pela menor quantidade de luar, apenas para mostrar a alguém onde ir. Ela pensou na proposta. Não que ela achasse que poderia levar a alguma coisa, mas se o Sr. Stewart pensasse que estava sendo cortejada por Lorde Duncannon, talvez a deixasse em paz. Poderia até, de fato, parar com as ameaças.

Ela se voltou para Sua Senhoria, odiando em parte o fato de estar usando-o para manter o Sr. Stewart à distância.

— Muito bem. Vou deixar que me corteje, mas saiba que não acredito que nada possa resultar desta união. Mesmo assim, será

bom receber a atenção de um cavalheiro bonito.

Ele sorriu e se levantou, aproximando-se dela.

— Você me acha bonito.

Ela riu.

— Você sabe que é. — ela disse, prendendo a respiração quando ele se aproximou de sua pessoa, o peito roçando o dela e fazendo seu corpo doer.

— Você é tão bonita.

A respiração dele fez cócegas nos lábios dela.

Hallie poderia se acostumar a Arthur falando com ela dessa maneira. Já fazia muito tempo que ela não ouvia palavras tão doces sussurradas para ela.

Mesmo com tudo contra eles, a família dele e o passado dela, mesmo assim ela não se via capaz de evitar render-se à essa dança de cortejo. Ela se inclinou para ele e o beijou, sorriu por dentro quando ele parou por um momento de surpresa antes de erguê-la com força contra ele e beijá-la de volta.

Os lábios dele tomaram os dela, e ela se abriu para ele de imediato, queria sentir seu toque, o deslizar da língua dele contra a dela, calor e desejo. Tudo só para ela.

Estar com ele era delicioso.

O beijo deles, assim como tudo o que compartilhavam, passou de doce e tentador para quente e exigente em um segundo.

Somente Arthur a fazia reagir dessa forma. Esta necessidade cresceu dentro dela e a deixou dolorida e querendo mais. Sempre mais.

— Devíamos parar. Qualquer um pode entrar. — ela se engasgou, se afastando.

Ele a beijou no pescoço, a língua deslizando contra a clavícula.

Ela agarrou-o pelos ombros, os joelhos fraquejaram de repente.


— Deus, você cheira uma delícia. — ele trilhou beijos até a orelha dela e lambeu o lóbulo.

Hallie fechou os olhos, um arrepio percorreu seu corpo.

Maldição, ele era bom em seduzir. Bom em fazer qualquer mulher que estivesse em seus braços se sentir especial.

— É difícil parar. — ele admitiu.

Com grande dificuldade, ela empurrou o peito dele, separando-os. Ele deu um passo para trás, a decepção estampada em seu rosto. Uma decepção que ela podia entender muito bem, pois ela também a estava sentindo naquele momento.

— Você irá à escavação amanhã?

— Sim. — disse ela, verificando o vestido e certificando-se de que o cabelo estava exatamente como antes de começarem a se agarrar. — Subirá para me ajudar? Espero começar uma segunda trincheira amanhã.

Ele veio por trás dela, envolvendo os braços em volta da cintura dela e plantando um beijo breve em seu pescoço.

— Estarei lá. Tenho algumas missivas para escrever ao meu administrador primeiro e, em seguida, irei para lá. Vou levar um almoço caso queira fazer um piquenique comigo.

A ideia de partilhar uma refeição com ele no local da escavação, era adorável, em um lugar do qual ela sentia prazer apenas de estar lá, embora trabalhando, e a ideia fez seu coração bater mais rápido.

O fato de Arthur não apenas gostar do que ela fazia, mas também apoiá-la, dizia a ela que talvez ele não fosse mais o cafajeste que a fama dizia ser. Nem todos os homens seriam tão complacentes.

Com certeza, não os intitulados.

— Eu gostaria disso. Obrigada.

ARTHUR PASSOU A MANHÃ escrevendo cartas para o administrador, falando de suas duas propriedades, e depois começou a escrever uma carta para a avó. Ele vinha adiando esta missiva pelo simples fato de que da última vez que ela havia escrito para ele, ela discursou, do início ao fim, acerca da ainda solteirice dele, e de sua falta de perspectivas ou inclinação para o casamento.

Tudo isso havia mudado.

O beijo no local da escavação, para começar, e agora apenas a noite anterior parecia ter sido um ponto decisivo para ele e Hallie. O

fato de ela permitir que ele a cortejasse foi um grande passo para ela, e um enorme alívio para ele.

Agora ele precisava escrever para a avó e explicar o que pretendia, e contar quem ele cortejava. Ele estava certo de que assim que ela conhecesse Hallie, se apaixonaria por ela tanto quanto ele temia estar se apaixonando. Ele nunca havia sentido tal conexão com ninguém em sua vida, e ela por fim estar de volta na Inglaterra e disposta a ver o que poderia resultar deles era um desejo que ele nunca pensou que seria realizado.

— Ah, Lorde Duncannon, posso entrar? Há um livro de botânica que o Barão Bankes falou e estou ansioso para lê-lo.

Arthur ergueu os olhos ao assinar a carta para a avó e assentiu para o Sr. Stewart, que estava na soleira da sala.

— Claro. Por favor, entre. Estou quase terminando.

O cavalheiro examinou as estantes de livros enquanto Arthur fechava suas missivas e as carimbava com o emblema da família.

Com o canto do olho, ele observou o progresso do homem, algo sobre o cavalheiro não lhe caía bem. Arthur não sabia dizer exatamente o que havia nele que não inspirava confiança, talvez um instinto, mas havia algo muito errado com o homem. Hallie decerto

não gostava dele, e a presença dele a desconcertava mais do que ela admitiria.

Ele teria que ficar de olho.

— Que festejos maravilhosos. — disse Stewart, de costas para Arthur enquanto continuava sua busca. — Creio que nunca estive em meio a convidados tão agradáveis. Não concorda, Lorde Duncannon?

Arthur havia ido a muitas festas rurais ao longo dos anos, algumas com pessoas muito mais amigáveis e agradáveis, mas o Sr. Stewart pode não ter ido a tantas como ele, portanto ele apejas assentiu, mostrando concordância.

— Vem sendo uma estada muito agradável.

— Já foi até o sítio de escavação arqueológica? Devo admitir que ainda não fui ver, mas acredito que a mulher que está encarregada disso, a Srta. Evans, é bem habilidosa.

— Ela é. — ele concordou, pelo menos neste ponto o Sr. Stewart estava realmente correto.

— Na verdade, começarão a abrir uma nova trincheira amanhã.

Tenho certeza de que nos próximos dias encontrarão muitos novos artefatos para datar e explicar.

— Ó, sim, sem dúvida. — o Sr. Stewart concordou de pronto. —

Sei que ela passou algum tempo no Egito. Muito exótico da parte dela. As histórias que ela poderia contar, se contasse. — ele riu. —

Não concorda, meu senhor?

Arthur colocou as cartas na bandeja de prata que estava na mesa, para que os funcionários as postassem, e recostou-se na poltrona de couro com espaldar alto. Juntou os dedos diante de si, observando o Sr. Stewart passear pelas prateleiras. Ele estreitou os olhos, começando a acreditar que seu único propósito aqui era discutir Hallie e não o tal livro de botânica.

O fundo de suas entranhas se apertou com a ideia de que o Sr.

Stewart pudesse gostar de Hallie mais do que estava demonstrando e o analisou para descobrir se ele representaria certa competição.

— Imagino que ela saiba muito sobre a região e as pessoas. Sei por amigos em comum que ela amava muito o país.

— Talvez haja mais nisso do que sabemos. — disse ele. —

Afinal, as mulheres são seres misteriosos com muitos pensamentos e sonhos dentro de suas mentes.

Arthur olhou para as costas do Sr. Stewart, a ideia de que Hallie teria vivenciado mais do que trabalho no Egito, algo nunca havia passado pela sua cabeça. Ele não acreditava que a cultura permitia bailes como aqueles que ele frequentava no Almacks com seus diversos amigos. Mas não significa que eles não ocorressem, ou que ela pudesse ter conhecido pessoas.

Homens...

— Arrá, aqui está. — disse ele, segurando um livro grosso e mostrando a Arthur. — Estou tão feliz que o Barão Bankes não me levou a uma perseguição sem fim. Um livro como este é exatamente o que eu preciso em uma propriedade tão grande e solitária.

Arthur olhou para a mesa, pensando em Hallie e seu tempo no exterior.

— Espero que goste do seu livro. — disse ele, levantando-se. —

Visite o local da escavação, Sr. Stewart. Creio que achará muito interessante.

O homem não respondeu, apenas assentiu.

Arthur foi até o hall e subiu para seu quarto. O que o Sr. Stewart falou fez Arthur refletir. Ele nunca havia pensado em Hallie no Egito, ou que seus muitos anos lá possam ter sido ocupados com mais do que apenas escavações arqueológicas. É claro que os dias de


escavação eram longos, árduos e muito trabalhosos, mas não significava que fosse a única atividade de Hallie no exterior.

Alguém no exterior a cortejara?

Muitos ingleses viajaram para fora, foram para o Egito e mais ao leste para pesquisar e aprender sobre novas terras. Algum deles havia mostrado interesse em Hallie? Por que outro motivo o Sr.

Stewart diria uma coisa dessas? O homem não era confiável, e Arthur não pôde deixar de pensar que ele estava insinuando algo.

Mas o quê?

Ele coçou o queixo, pensando nesta perspectiva. Também não significava que Hallie havia sido cortejada por um inglês. E se houve um homem egípcio que a interessou? Ele teria a cortejado? Teria a amado tanto quanto ele temia começar a amar?

HALLIE SE JOGOU no trabalho nos dias seguintes. A nova trincheira estava bem encaminhada, um processo lento feito à mão, e ela não podia deixar de torcer para que um dia tais tarefas pudessem ser facilitadas com alguma invenção ou engenhoca.

Infelizmente o Sr. Stewart fez uma visita a ela ontem, ficou falando do que eles haviam encontrado e como era muito interessante descobrir coisas que estavam perdidas. Um de seus comentários particulares acerca do passado e de como as coisas nunca ficavam enterradas por muito tempo era de particular interesse e parecia fazê-lo rir de suas próprias ameaças.

Ela olhou para ele, querendo que ele visse o quanto ela odiava a ele e a sua chantagem. Ela não podia confiar nele, nem que ficaria de boca fechada se ela o pagasse. Ele tramava algo diferente do que apenas tomar seu dinheiro suado, e o estômago dela se revirou

por saber que ele não ficaria satisfeito apenas com tal compensação.

Depois de uma hora ou mais, ela ficou feliz em vê-lo partir e viu-se ainda mais satisfeita com a chuva que se iniciava e que havia garantido a partida dele. Apesar de todas as declarações dizendo gostar da linha de trabalho dela, e de estar ao ar livre, ele não era de uma opinião muito agradável quanto ao lugar ou o clima.

A chuva, infelizmente, continuou a passar por Somerset e ela precisou abandonar o local da escavação e voltar para a propriedade várias horas antes do planejado. Os homens colocaram lonas sobre as trincheiras para tentar impedir que o solo empapasse muito, mas com o passar da tarde, a chuva parecia ficar mais forte.

Hallie pediu um banho e, com a ajuda de uma criada, conseguiu tirar a roupa encharcada sem problemas.

— Vou levá-las lá para baixo para secar, Srta. Evans. Precisa de mais alguma coisa antes de eu ir?

— Não, obrigada. — disse ela, caminhando até a porta para trancá-la antes de tomar banho. — Não vou precisar de mais nada esta noite.

Hallie trancou a porta e, felizmente, sozinha, afundou em seu banho quente. Os criados colocaram a banheira diante do fogo bem aceso, e ela se recostou, relaxando no pequeno luxo que a casa oferecia.

Ela sorriu ao pensar em voltar para sua cabana em Felday. A pequena casa não permitia uma banheira tão grande assim. Eles teriam que se contentar com uma de sentar e outra na cozinha quando surgisse a necessidade.

Hallie pegou o sabonete que cheirava a ervas frescas e o usou para tirar a sujeira do dia da pele. Assim que o trabalho fosse concluído, ela havia planejado fazer mais uma ou duas escavações

arqueológicas antes de pegar o filho com a prima e voltarem para Surrey.

A ameaça do Sr. Stewart agora a impedia de seguir seu plano.

O que poderia fazer?

Talvez ela pudesse procurar o cavalheiro e pedir-lhe que repensasse sua ameaça. Havia muito poucos a quem ela poderia recorrer. Claro que Willow a ajudaria, mas então se a sociedade descobrisse que ela tinha um filho sendo solteira, as pessoas associadas a ela seriam contaminadas.

Ela não podia contar a Willow acerca da exigência do Sr.

Stewart, pois sabia que sua amiga a defenderia mesmo que fosse por sua própria conta e risco.

Infelizmente, a ideia de enterrar o Sr. Stewart em uma de suas trincheiras veio à mente. Decerto resolveria todos os seus problemas, e um homem capaz de ameaçar uma mulher vulnerável, ela duvidava que ele faria muita falta neste mundo. Uma batida leve soou em sua porta, e ela se sentou na banheira, a água espirrando pela lateral.

— Quem é? — ela perguntou, grata por ter trancado a porta.

— Sou eu. Duncannon. Preciso falar com você.

Ela ficou sentada na banheira por mais um momento, sem saber se queria falar com ele. Cada vez que ela estava perto dele, ele a fazia sentir e fazer coisas que ela se prometeu nunca sentir, ou fazer, desde a perda de Omar. Mesmo assim, ela se levantou, agarrou a toalha de uma cadeira próxima e se enrolou antes de ir até a porta.

— O que você quer? — ela sussurrou, esperando que ninguém visse Sua Senhoria sussurrando em sua porta como um amante após um encontro à meia-noite.

— Você pode me encontrar na sala dos fundos, no andar de baixo? Todos os outros estão na sala de desenho à espera do jantar ser anunciado, mas preciso falar com você.

Hallie franziu a testa.

Que assunto Lorde Duncannon teria para falar com ela?

— Descerei logo. Eu o encontro lá.

Ela permaneceu com o ouvido na porta enquanto os passos dele recuando soavam no corredor acarpetado. Hallie se vestiu depressa, um vestido de tarde limpo. O corpete era pouco confortável e o modelo já era datado, mas ainda não estava desgastado, e a cor a complementava.


Enquanto descia as escadas, ela não pôde deixar de se perguntar o que ele queria discutir. Também não pôde deixar de debater se deveria confiar nele e contar do Sr. Stewart. Ela não precisava mencionar o filho, mas poderia mencionar o passado no Egito, e que o Sr. Stewart estava a ameaçando com exposição.

Contar daria uma boa indicação do que Lorde Duncannon pensava de suas ações. De seu passado como uma mulher que se apaixonou e dormiu com outro homem fora do casamento. Se ele a apoiasse e não a ofendesse, poderia ser alguém a quem ela poderia recorrer para obter ajuda e, em algum momento, falar do filho.

Lorde Duncannon possuía amigos poderosos, muitos dos quais podiam fazer o Sr. Stewart manter a boca fechada e deixá-la em paz para sempre.

A sala de estar dos fundos estava às escuras e, no entanto, uma pequena vela queimava sobre a lareira e o fogo fora aceso. Lorde Duncannon veio até ela quando ela entrou e trancou a porta detrás dela, levando-a a para sentar-se em uma cadeira diante da lareira.

— Há algo que preciso perguntar, depois você pode me mandar para o inferno, mas eu espero de verdade que possa me dizer a

verdade.

— Se eu puder, direi. — ela o olhou quando ele se sentou em uma cadeira próxima, mexendo as mãos no colo. Sentiu o nervosismo crescer dentro dela porque talvez o Sr. Stewart já tivesse falado com Sua Senhoria e envenenado a mente dele contra ela.

— Estou nervoso para perguntar o que quero perguntar. — ele admitiu.

Hallie sorriu para deixá-lo à vontade, mas ela sentiu o estômago embrulhar.

O que ele queria saber? Ou pior, do que ele suspeitava?

— Pergunte-me, Arthur, ou vai me deixar tão nervosa quanto você está.

Ele respirou fundo, encontrando-a com um olhar firme.

— Queria perguntar a você de seu tempo no Egito. Como foi sua vida lá.

Tudo dentro dela se acalmou.

Ele fazer tal pergunta deixou bem claro que o Sr. Stewart estava sussurrando ideias na cabeça das pessoas. Com quem mais ele havia falado? Que outras sugestões ele fez para que pessoas desconfiassem? Claro, poderia ser paranoia dela, mas ela duvidava muito que fosse o caso. O homem estava decidido a arruinar sua reputação.

— Era uma vida muito agitada. Havia vários locais de escavação sob supervisão do Sr. Shelly, e a cada dia um novo artefato era encontrado e catalogado. Você é o benemérito do Museu Britânico e, com certeza, saberia tão bem quanto qualquer pessoa como éramos ocupados. O museu recebeu vários artefatos nossos.

— Claro. — disse ele, uma pequena carranca entre os olhos.

Ela o observou por um momento e percebeu que ele digladiava com alguma verdade ou uma pergunta que não estava certo se deveria fazer. Ou como abordar:

— Sua vida social no Egito, era agitada?

E aí estava, a única pergunta que ela temia.

Mesmo assim, um pouco de alívio se derramou por ela ante a pergunta dele. Ela não precisava contar de Amon, mas não esconderia o namoro com Omar. Ela o amou de todo o coração, e ninguém mudaria aquele momento maravilhoso de sua vida.

— Eu frequentei jantares e bailes na casa do Cônsul Geral no Cairo, semelhantes aos realizados em Londres. O Sr. Henry Salt havia forjado laços estreitos com o governante do Egito, Pasha Mohamed Ali, e as noites eram sempre interessantes e agradáveis.

O Sr. Salt é um egiptólogo e muito inteligente. Você o conhece, é claro.

— Eu o encontrei uma ou duas vezes, ele também doou antiguidades para o Museu Britânico.

— Exato. — disse ela, acreditando bem nisso. — Assim como acontece na Inglaterra, o governante do Egito contava com uma milícia, homens que estavam sob seu governo e o protegiam. Esses homens sempre estavam presentes nesses eventos, mas sempre observando, sem se interessar muito. Exceto por um, é claro.

Omar, que vira Hallie desde o outro lado do salão, e o mundo dela havia parado ao vê-lo. o dele também, ela sabia. Os olhos de Lorde Duncannon se estreitaram nela, e ela podia ver que ele pesava as palavras.

— Você... — ele limpou a garganta. — Você foi cortejada enquanto estava no exterior?

Hallie ergueu as sobrancelhas enquanto pensava naquela época. Como a mera visão de Omar fez seu coração parar de bater.

Ele não se moveu, apenas observou, e ainda assim seus olhos se aqueceram de interesse ao vê-la, e ela sabia, de alguma forma, que de algum jeito suas vidas se entrelaçariam.

— Minha passagem pelo Egito foi muito memorável e agradável.

Sentirei saudades para sempre.

Ele a observou, e ela pôde ver nos olhos dele que ele não queria segredos entre eles. Se falava sério sobre cortejá-la, ela supôs que não deveriam ter segredos, mas algo nos olhos de Arthur a fez parar. O medo de ouvir sobre o passado dela poderia fazer com que ele não gostasse do que ouviria, e a fez parar. A impediu de formar as palavras: que ela se apaixonou naquela terra antiga e maravilhosa e não se arrependia nem um pouco disso.

— Quero que sejamos honestos um com o outro, Hallie. Sem segredos.

— Não há nada que você precise saber, meu senhor. — ela mentiu, esperando que ele não pudesse lê-la tão bem, nem perceber que ela estava tentando esconder um segredo.

Ele não estava pronto para ouvir as verdades dela e, com toda a franqueza, ela não estava pronta para contar a ele. Não de verdade.

— E você? — ela perguntou, mudando de assunto. — Você é bem conhecido em Londres, e muitas mães desejam fazer sua cabeça girar na direção de suas filhas. Não há ninguém que sua avó tenha escolhido para você?

Ele riu, recostando-se na cadeira, juntando os dedos.

— Tenho certeza de que há muitas, mas nenhuma seria uma boa escolha. Eu nunca fui dócil e gentil. — ele disse, dando a ela um olhar aguçado que fez a pele dela se aquecer.

Ela não era tola o suficiente para não saber que ele se referia a ela. Afinal, ele queria cortejá-la, mas ainda assim, havia tantos segredos entre eles. Tantas coisas de que ele não iria gostar caso

soubesse da verdade. Por um momento, ela pensou em contar tudo a ele, colocar toda a vida no Egito na mesa e deixar o machado cair em seu pescoço, ou não.

Lorde Duncannon era acima de tudo um homem de honra, disso ela sabia com certeza, mas então, alguns eram tolos quando se tratava de mulheres e se considerariam enganados pelo sexo frágil.

— Suponho que tal informação explique por que está me cortejando então. Eu não sou nenhuma dessas coisas.

— Não, você não é. — ele levantou-se e sentou-se ao lado dela.

Sua proximidade a oprimia.

Por mais terrível que fosse, escandaloso até, ela desejava ser abraçada, ser o foco de outra pessoa. A maneira como Lorde Duncannon a fazia se sentir lembrava como ela se sentia com Omar, e o sentimento era inebriante, de fato.

Ele estendeu a mão, traçando os lábios dela com o dedo.

— Você é tão linda que me deixa sem fôlego toda vez que a vejo.

Ela sentiu uma vibração a percorrer.

— Mesmo quando estou vestindo calças e coberta de lama? —

ela provocou, tentando aliviar o clima. O olhar de aço dele pôs fim a essa tentativa de negação, e ela engoliu em seco.

— Mesmo assim.

Ela se engasgou quando ele tomou seus lábios em um beijo feroz, a língua dele tomando posse da dela. Ela sentiu a cabeça girar por um momento antes de colocar os braços em volta do pescoço dele e beijá-lo de volta. Ela quis beijá-lo de novo também.

Cada vez que ela era agraciada com um vislumbre dele no terreno; forte e alto, musculoso e esguio, ela sentia as mãos coçarem para percorrer o corpo dele. Para sentir a pele quente dele contra a dela, o toque em sua pessoa.

— Você me distrai. — ele admitiu, beijando-a ainda mais fundo.

Ela se afastou, os olhares se encontrando.

— É o mesmo para mim. — ela disse, beijando-o de novo, e se perdendo nele e em tudo o que ele oferecia, pelo menos por ora.


CAPÍTULO 12

A RTHUR TENTOU controlar o desejo por Hallie, mas os doces suspiros e beijos decadentes fizeram seu juízo sair pela janela. Ele a segurou pelo rosto e tomou tudo o que ela estava disposta a dar a ele. Ele ansiou ter essa mulher em seus braços desde o momento em que se separaram. Havia sonhado diversas vezes com ela, e as poucas mulheres com quem se deitou ao longo dos anos, todas elas empalideciam em comparação com Hallie.

Ele não se importava com o que a família pensaria de sua escolha, havia sido feita bem e com verdade. Uma esposa sem juízo, uma boneca da sociedade que agradava a alta sociedade, fofocava e tomava chá o dia todo, todas essas características faziam seu maxilar doer de desgosto.

Ele se viu baixando-a no sofá, aproximando-se dela. Hallie nunca o entediaria, a mente dela era afiada o suficiente para mantê-

lo alerta sem mais nada. Ela adorava viajar e estaria disposta a visitar lugares estrangeiros sem hesitação. A vida deles apareceu diante dele, rica e plena, e ele mal podia esperar para agarrá-la.

Ela era toda curvas suaves e corpo feminino que o fazia doer.

Ele se acomodou em cima dela, desfrutando do calor e aquiescência. Ele queria essa vida com um desespero que o assustava, mas não podia evitar de sentir que ela escondia algo dele. A hesitação dela em responder a pergunta dele acerca de sua vida no Egito, foi reveladora.

Talvez o Sr. Stewart estivesse insinuando algo, afinal. Era tão ruim assim que ela não conseguia confiar nele? Ele nunca faria

nada que a magoasse, ele passou sete anos pagando por este erro, não o cometeria outra vez.

Uma das pernas dela escorregou em cima da dele, e ela se apertou contra ele. Ele esfregou o pênis duro como pedra contra seu monte, e ela gemeu durante o beijo. Assim como ela era em vida, no ambiente privado em que estavam agora ela era reativa, emocionante e tão doce quanto ele se lembrava.

Seria tão fácil seduzi-la, mas ele não o faria. Aqui não. Ele precisava que ela confiasse nele acima de qualquer outra coisa, que fosse capaz de enxergar que poderiam ficar juntos. Ele não a apressaria nesse quesito.

Ele se afastou, a respiração irregular e, olhando para ela, percebeu que a respiração dela também estava descompassada, os seios forçavam o corpete. O aroma de flores subiu da pele dela, e ele soube que ela havia se banhado antes de descer. Pensar nela tomando banho, passando sabão e relaxando na água o fez gemer.

— Eu deveria escoltá-la de volta para seu quarto antes que qualquer coisa progrida essa noite. Não temos pressa.

Ela mordeu o lábio, os olhos arregalados, e um pouco turvos de excitação. O olhar dela mergulhou nos lábios dele que se xingou por dentro. Os pensamentos dela o contradiziam de forma tão clara quanto uma palavra escrita o fariam. A escolha era impossível. Ele não queria ir embora.

Ele queria erguer o vestido dela, descer ao sofá e deliciar-se com ela, com cada parte de sua pessoa. Então, e somente quando ele a tivesse se contorcendo de prazer, e implorando para que ele a tomasse, ele se embainharia em seu calor acolhedor. Ele fechou os olhos, tentando apagar a imagem dele tornando tais desejos realidade.

— Você deveria. — ela deslizou a outra perna sobre a dele, puxando-o com força contra seu núcleo.

Incapaz de se conter, ele deslizou contra a carne dela, o prazer o abalando até o centro de seu ser. O corpo dele rugiu para tê-la. Ela ergueu os quadris, esfregando-se contra ele, obtendo o próprio prazer quando ele não se moveu.

— Maldição, Hallie. Pare.

Um sorriso perverso deslizou nos lábios dela, e o controle dele se partiu. Ele empurrou contra ela, e ela arfou em meio ao beijo. A deliciosa fricção era demais. Ele não gozaria aqui. Não em uma sala de estar durante uma festa na casa do Barão Bankes.

Desta vez, ele encontrou forças para se desvencilhar e se levantou, caminhando até a janela e abrindo-a. O ar frio da noite esfriou um pouco a pele dele, e diminuiu o desejo dele por ela. Ele se inclinou sobre o peitoril, o cérebro exigindo que ele se virasse e terminasse o que ambos queriam.

E maldição, que ele fosse para o inferno, ele a queria.

Ele a sentiu vir por trás dele e se endireitou. Ela colocou as mãos na cintura dele por trás, segurando-o com força.

— Você torna difícil parar. Vou contar um segredo a você, e então você pode me acompanhar até meu quarto.

As mãos dela deslizaram no peito dele, e ele prendeu a respiração quando ela mergulhou os dedos entre os botões do colete de encontro à camisa.

— O que é? — perguntou ele, curioso e querendo saber tudo o que havia para saber sobre ela.

A avó dele diria que ele estava um pouco obcecado por ela, e talvez estivesse, mas a certeza de que ela era a pessoa certa para ele nunca diminuía. Nem mesmo depois de todos os anos em que estiveram separados.


— Mesmo com todos os meus planos de viajar para o exterior, antes de encontrá-lo em Felday, havia uma pequena parte de mim que esperava que você voltasse naquela manhã. Que o destino o havia colocado diante de mim, e que eu deveria ouvir o chamado.

Creio que ambos perdemos uma oportunidade naquele dia, uma que não tenho certeza se poderemos recuperar.

Ele se virou, franzindo a testa para ela.

— Podemos recuperá-la, Hallie. Os sentimentos que eu passei a ter por você naquele dia só aumentaram desde então. Vou conquistar sua afeição e confiança. Prometo nunca mais magoá-la.

Ela assentiu, e ele pôde ver que os olhos dela estavam um pouco vidrados de emoção.

— Vou cobrar essa promessa, Lorde Duncannon.

— Espero que sim, Srta. Evans.

Sempre.

HALLIE ACORDOU com o som de chuva forte batendo na vidraça.

Ela afastou as cobertas da cama e foi até a janela, puxando as cortinas de veludo escuro para ver se o mau tempo havia vindo para ficar, e de fato parecia ser o caso.

Ela suspirou, debatendo o que deveria fazer. Havia muito trabalho a ser feito na escavação, e ela ainda poderia realizá-lo na pequena tenda que havia sido erguida como escritório.

Terminando a toalete matinal, ela vestiu as calças, a camisa e a jaqueta, e pôs o sobretudo e o chapéu de aba larga que usara no Egito. Serviria para evitar que a chuva pingasse em seu pescoço, assim como impedia o sol de queimar sua pele.

A caminhada até o sítio de escavação demorou mais do que o normal. O solo já estava molhado e pantanoso, as botas afundavam alguns centímetros a cada passo. Não havia nenhum trabalhador no local, o que a tranquilizou. Ela entrou na tenda, feliz por ver que tudo estava onde ela havia deixado pela última vez.

Hallie acendeu uma lamparina e pegou o caderno, precisava fazer um esboço de suas descobertas do dia anterior e anotar o que ela acreditava que fossem. Ela trabalhou durante algumas horas, desenhando e estudando o lado de fora, a chuva batia no teto de lona de forma incessante, embalando-a em um ritmo calmante.

A lona da tenda se abriu, e ela saltou ao ver Lorde Duncannon, e um redemoinho quente de prazer floresceu dentro dela ao vê-lo.

Ele suspirou, o som tingido de alívio.

— Você está aqui. — disse ele ao entrar na tenda e retirar o sobretudo, mais para si que para ela.

Ele passou a mão pelo cabelo molhado e pingando, de forma que os fios dourados ficaram em pé. Ele era de uma beleza fatal nesse momento, e depois da noite anterior, ela não estava certa se era uma boa ideia que eles ficassem sozinhos. Ele a deixou com um desejo insatisfeito, e durante toda a noite ela se revirou, querendo mais. Ser provocada daquela maneira, sem obter liberação, não era o que ela acreditava ser uma atitude cavalheiresca.

— Estou. Estou catalogando nossas descobertas. O que está fazendo aqui? Você está encharcado. — ela observou as roupas dele, as calças úmidas e a camisa que se agarraram a sua figura e acentuaram cada curva deliciosa dos músculos maravilhosos de seu abdômen.

Hallie não conseguia tirar os olhos do peito dele.

— Talvez devesse parar de olhar para mim como se quisesse dar uma mordida, antes que eu permita que o faça. — ele brincou e

abriu um sorriso malicioso. — Eu não a vi na casa e fiquei preocupado. Quando sua dama de companhia disse que você havia saído antes que ela pudesse servir o café-da-manhã, vim ver como está.

Ela deu uma risadinha.

— Acreditou que eu havia fugido, meu senhor? Que sua sedução na noite passada me assustou?

Ele não disse nada por um momento, apenas olhou para ela sem dar um pio antes de limpar a garganta, mais uma vez puxando o cabelo para trás. A ação fez pouco para refrear o ardor dela. Para ser honesta consigo mesma, ela começou a pensar que ela é que estava um pouco preocupada com ele.

Mais do que seria saudável. Para ambos.

— Preocupei-me que sim.

Ela olhou para ele de esguelha.

— Por quê?

Ele ergueu a sobrancelha, dando a volta na mesa de trabalho dela, pegou alguns dos achados e inspecionou-os antes de colocá-

los de volta no lugar.

— A ideia de estar com você de novo é o que me faz levantar todas as manhãs e seguir em frente ao longo do dia. A ideia de não ter você por perto, de não ter você ao meu lado enquanto prosseguimos em nossas vidas, me assusta. Me assusta que o que sinto por você é mais forte do que o que já senti por qualquer pessoa e que você não pode retribuir essa sentimento.

Hallie ficou rígida com as palavras dele, não esperava tanta honestidade de Sua Senhoria. Nem imaginava que o que ele dissera ressoaria com tanto fervor dentro dela. Na noite anterior, ela queria caminhar pelo corredor até o quarto dele, fechar as portas do mundo e, assim, se perderem um nos braços do outro.

A pontada de decepção quando ele fez exatamente o que disse que faria foi profunda. Mesmo agora, aqui no sítio de escavação, tudo em que ela conseguia pensar era em estar com ele daquela maneira de novo, e talvez ir mais longe.

O olhar dela foi parar na cama de campanha improvisada que havia sido trazida para ela, apenas no caso de ela ficar presa aqui ou precisar de descanso. Agora brilhava como um farol de prazer.

Eles estavam presos ali, ninguém se aventuraria aqui hoje com o mau tempo implacável.

Nervosismo apertou o estômago dela que manteve a mão ocupada ocupou a mão no desenho da pequena moeda redonda que encontrara.

— Você tem mãos lindas. Sabia disso? — a mão dele, que deslizava pelo tampo da mesa de madeira, escorregou pelo topo da dela e subiu pelo braço dela com lentidão.

Um arrepio percorreu sua espinha, e ela olhou para cima, encontrando o olhar dele. Estava pesado de desejo, e ela respirou fundo para se acalmar, pousando o lápis.

— Você está tocando meu braço, meu senhor.

Um brilho provocador tomou conta dos olhos dele.

— Estou.

Ela se levantou, os olhos no nível do pescoço dele, um pescoço muito bonito que levava a um abdômen ainda melhor e, que mesmo agora, anos depois de ela ter visto pela última vez, ainda fazia suas mãos coçarem para tocar. Hallie estava cansada de se negar. Era óbvio que ele a queria tanto quanto ela o queria. A respiração dele era profunda e, embora lenta, ela sabia que ele estava tentando controlar o desejo.

Ela não queria que ele o fizesse.

Inclinando-se para frente, ela beijou a pequena depressão no meio de sua garganta, abrindo caminho ao longo da escápula. Ele respirou fundo, e ela arfou quando ele se inclinou, segurou o rosto dela e a trouxe para encontrar seu beijo. Foi profundo e um pouco selvagem e despertou o desejo nela.

Ela colocou os braços em volta do pescoço dele, e ele a ergueu, colocando-a sobre a mesa de madeira, tomando cuidado para não estragar o trabalho ali. Ele recuou, retirou a gravata, sem nunca perder o contato visual com ela. Hallie mordeu o lábio enquanto ele tirava o casaco e o colete antes de puxar a camisa de dentro das calças e puxá-la pela cabeça.

Ele era assim lindo, tão perfeito quanto ela se lembrava dele.

Todos os músculos e linhas definidas, o estômago teso flexionava-se a cada respiração. Ela passou a mão nele, maravilhada com sua beleza. Calor se acumulava em seu núcleo, e ela desejou tê-lo.

— Agora é sua vez. — ele estendeu a mão e um por um, abriu os pequenos botões que desciam pela frente da camisa dela. Assim como ele, ela usava calças, preferindo-as em vez de vestidos quando trabalhava em locais de escavação. Ele tirou a camisa de dentro das calças dela, e a deslizou sobre os ombros, deixando-a sobre a mesa.

A mão dele segurou um seio através do espartilho, e ela fechou os olhos, deleitando-se com o contato pelo qual esteve faminta por tanto tempo.

— Tão perfeita. — ele sussurrou, deslizando o espartilho para baixo, expondo-a para o deleite dele.

Ela não se expunha a um homem há anos, e o desejo de se cobrir foi forte, mas ela forçou as mãos na mesa, deixando-o se deliciar com ela.

Arthur se inclinou e beijou o seio, pousou mais beijos suaves e doces em seu mamilo. A língua dele deslizou sobre a carne dura, e ela segurou-se na cabeça dele, mantendo-o contra ela.

— Senti falta disso. De você toda. — ele foi veloz com os laços e, jogando-os no chão com pouco cuidado, deixou-a à mostra.

Arthur agarrou as calças dela pela frente e puxou-a da mesa para ficar de pé. — Agora, isso precisa sumir.

Hallie se abaixou, soltando os botões e deslizando o tecido pelas pernas. Ela chutou as calças para o lado antes de encontrar o olhar aquecido de Arthur, que ameaçava derretê-la, transformá-la em um poça confusa.

Ela estava tão nua quanto um bebê e, no entanto, o prazer no rosto dele, a reverência que ela leu ali, afastou qualquer dúvida ou medo. Sem ajuda, ela se sentou na mesa, apoiando-se nas mãos, esperando por ele.

— Você vai se juntar a mim aqui, meu senhor?

Ele engoliu em seco, o som quase audível.

— Arthur. Por favor, me chame de Arthur.

Ela sorriu.

— Você vai se juntar a mim aqui... Arthur?

Ó inferno, sim ele o faria.

Ele iria para o inferno e voltaria se ao menos pudesse viver o resto de sua vida com a mulher diante dele. Como ele a deixou escapar tantos anos antes?

Ele deveria ter dito aos amigos para parar a carruagem e deixá-

lo sair. Deveria tê-la convencido a levá-lo com ela ao Egito, e jamais ter deixado o lado dela. “Deveria” não era uma palavra, era uma

besta a que ele odiava. Tantos erros que ele não poderia voltar no tempo para evitar.

Com o desejo se apoderando dele com força, ele abriu as calças com rispidez e se livrou delas. Ele se colocou entre as pernas dela e uma sensação de certeza o inundou. Seu pênis tenso entre eles, ele lutou para não se apressar. Queria ir devagar e saborear este momento. Ela colocou os braços nos ombros dele, e ele a beijou, sentindo o gosto de chá e mel em seus doces lábios.

Abaixando-se, ele agarrou uma das coxas dela, tomando um tempo apreciando a carne quente e macia, e deslizou o pênis em sua entrada molhada e pronta.

Ela gemeu contra a boca dele, e ele mordeu o lábio dela.

— Você gosta disso. — disse ele, deslizando-se contra o calor dela uma segunda vez e ganhando um gemido de aprovação.

Ó, sim...

A mão dela desceu pelo ombro dele, até a cintura, antes de circundar seu membro. Ela deslizou por seu falo, provocando-o com carícias longas e constantes, e por um momento Arthur pensou ter visto estrelas. Ele fechou os olhos, apreciando a fricção que o toque dela provocava. As bolas dele se apertaram, e ele se abaixou, parando a mão dela.

— Assim você me fará perder o controle.

Observando-o, ela o guiou em seu calor úmido. Ela o engolfou, quente e apertada. O corpo dele rugiu para tomá-la forte e rápido, tomá-la até que ambos estivessem exaustos e ofegantes.

Puta que pariu, ela é divina.

A boca dela se abriu em um suspiro, e ele a beijou, puxando-a com força contra ele, a pele dele tocando a dela do peito às pernas.

Ele se empurrou nela, e percebeu que nunca seria o suficiente. Ele

precisava dela mais do que nunca. Ela enrolou a perna em volta do quadril dele, segurando-o contra ela com o pé.

Ele a tomou, forte e rápido. Sem se importar com onde estavam, ou com o fato de que alguém poderia entrar na tenda a qualquer momento. Ela era dele, essa era uma certeza, e ela seria sua esposa se ele pudesse convencê-la a tomá-lo por marido.

Arthur aumentou o ritmo, a sensação do corpo dela disposto, os pequenos suspiros e ofegos o deixaram sem sentido. Ele se afastou do beijo, observando-a enquanto a tomava. Os lábios inchados e um pouco vermelhos pelos beijos, os olhos nublados de desejo.

— Sim. — ela se engasgou, olhando para ele, as mãos apertadas nos ombros dele enquanto ele se impulsionava, implacável, em seu calor.

Ela jogou a cabeça para trás, os cabelos caindo pelas costas.

Ele se inclinou para frente para beijar seu pescoço, pequenos toques rápidos.

— Assim mesmo. Não pare. — ela arfou, os dentes brancos e retos mordendo seu lábio inferior.

Arthur fez o que ela pediu, não ousaria fazer nada que não lhe desse prazer. Um som de choramingo e o nome dele saíram dos lábios dela. Ele cerrou os dentes, precisava que ela se desfizesse sobre ele antes que ele atingisse seu próprio prazer. O suor escorria da pele, não importava que o dia estivesse frio.

Logo em seguida, ele sentiu um forte estremecimento ao redor do pênis, arrastando-o para a estrada do prazer. Ele se desvencilhou no último momento, derramando-se no chão de terra sob a mesa, a mão trabalhando o pênis enquanto observava Hallie recuperar o fôlego e a compostura.

Ela se sentou, apoiando-se mais uma vez nos braços, uma perna balançando de forma preguiçosa para fora da mesa. Um

sorriso satisfeito apareceu em seus lábios.

— Deveria chover com mais frequência se for assim que vou passar o tempo aqui quando você vier me visitar.

Ele riu, colocando-se entre as pernas dela e puxando-a para perto.

— Você sabe que não haverá como se livrar de mim agora.

Ela encolheu um dos ombros perfeitos.

— Você não é tão ruim.

Ele envolveu o rosto dela com as mãos.

— Nem você. — ele disse, beijando-a de novo e se perdendo mais uma vez em seus braços.


CAPÍTULO 13

P ARA SUA INFELICIDADE, a chuva parou durante a noite.

O terreno no local da escavação ainda estava alagado, e Hallie continuou a catalogar as descobertas e as desenhar. Ela criou um diário e um mapa de tudo o que haviam encontrado e onde antes de cavar as trincheiras.

Mais uma vez, ela estava sozinha ali e, no entanto, quando estava arrumando os lápis e o caderno de desenho, não foi Arthur quem a encontrou do lado de fora para levá-la de volta à propriedade, mas o Sr. Stewart.

Ela o cumprimentou com fria civilidade, havia tido esperanças de não se ver mais sozinha com ele. Ele era sinônimo de problema, para ela um problema em especial, e ela ainda não estava certa de como sobreviveria se ele quisesse todo o dinheiro que ela ganhava.

— Como está o progresso, Srta. Evans?

— Muito bem, obrigada. — disse ela, abotoando o sobretudo, colocando o chapéu de aba larga e iniciando a descida da colina em direção à propriedade. Ela partiu mais tarde do que o previsto e, ao longe, podia ver que as luzes da propriedade do Barão Bankes já estavam acesas e visíveis através das muitas janelas, prontas para as festividades noturnas.

— Pensei que, por termos um minuto para nós, deveríamos conversar para ver se há mais escavações que estaria interessada em se envolver. É claro que se lembra do nosso acordo, ou precisa ser lembrada dele?

Ela se virou para ele, olhando para o salafrário.

Era uma praga que a sociedade sempre iria combater, seja de que nível da sociedade fosse, qualquer um a menos de um quilômetro deste homem saberia que ele não era boa coisa. Podre dos pés à cabeça, como uma fruta com um verme.

— Você arruinaria minha vida, tiraria tudo de mim só porque não pode aceitar o fato de que seu primo era um louco que matou pessoas e quase matou minha amiga. Como se atreve, senhor.

Ele a agarrou pelo braço, apertando com força.

Ela lutou para não se encolher sob o ataque.

— Eu ousaria, sim. Meu primo era inocente e foi só porque sua amiga fodeu um duque que ela não foi pega por ser a vadia maquinadora e mentirosa que ela é. Meu primo escreveu para mim, eu conhecia seu caráter melhor do que ninguém. As coisas de que o acusaram eram ridículas. Ele nunca faria nenhuma daquelas coisas.

— Nem minha amiga. — ela cuspiu de volta para ele, se soltando do aperto. — E se você me tocar de novo, eu vou acertar esse seu nariz. Você entende isso, Sr. Stewart?

Ele riu, o som condescendente e repelente.

— Você possui uma dívida comigo, uma que será paga e continuará a ser paga até que eu considere apropriado que cesse.

Até então, lembre-se de que sei tudo que fez no Egito e do segredinho sujo que você guarda. O que Lorde Duncannon pensará quando descobrir que a mulher que ele deseja foder, esteve com outro homem no exterior? Diga-me, Srta. Evans. — ele a provocou, esfregando o queixo com a mão. — Você sempre foi livre assim, repleta de artimanhas?

Sem mais pensar, ela o acertou no rosto. O estalo da bofetada ricocheteou no braço dela, e ela fechou a mão em punho, enquanto a dor se alastrava por sua palma.

— Vou deixá-la sair livre dessa vez, minha querida, mas na próxima terá troco. Se voltar a me bater, eu vou revidar.

Hallie ficou imóvel e observou enquanto ele continuava descendo a colina em direção à casa como se nada no mundo o preocupasse. Desgraçado. Lágrimas queimavam seus olhos, e a visão da floresta se liquefez diante dela.

O que ela faria agora? Poderia contar a Lorde Duncannon?

O medo de que o que o Sr. Stewart a ameaçou se tornasse verdade a impediu de fazer isso. Sua Senhoria a desprezaria se ela contasse a verdade. Quanto ao filho, essa seria a gota d'água, e ele nunca mais pensaria nela sabendo que ela havia dado à luz.

A família dele estava certa em mantê-lo longe dela.

Ela não era pura, não vinha de uma grande família próspera, nem nunca quis ser. Ele logo perceberia que os sonhos tolos para os dois eram irrealistas.

Não que ela se importasse com o que a família dele pensava dela, mas ela não colocaria o filho em uma situação em que seria alvo de desprezo, fosse desconsiderado e tratado de forma injusta.

Não por Arthur e, mais ainda pela avó dele, que era uma força formidável na alta sociedade. O amor tinha seus limites, pelo menos o amor pelos outros.

O filho dela e seu amor por ele não era um preço que ela estava disposta a pagar para ter o homem em que ela começara a pensar mais do que deveria. Visualizar a vida que poderiam ter tido e sonhar. Se ao menos não houvesse tantos outros fatores que os separassem, ela teria tentado ter uma vida com ele.

Mas ela não era tola o suficiente para seguir essa ideia. O afeto entre eles estava condenado, e o tempo dela também estava se esgotando.


ARTHUR ENCONTROU Hallie na biblioteca no dia seguinte. Ela estava sentada no chão atrás de algumas estantes. O Barão Bankes possuía uma biblioteca bem abastecida que mais parecia uma livraria, com muitas prateleiras alinhadas em uma das extremidades da sala. Sua Senhoria havia levado a maioria dos hóspedes para um passeio até o rio que corria por sua propriedade, mas Arthur permaneceu fora de cena até que partiram.

Ele a observou mastigar o lábio inferior enquanto se inclinava sobre um livro antigo, o cabelo amarrado às pressas para trás em uma única fita, fios de cabelo escuro escorregando sobre o rosto.

Uma dor se formou em seu peito, e ele limpou a garganta, tornando sua presença conhecida.

Ela olhou para ele, e ele esperava ver prazer em suas feições.

Em vez disso, tudo o que viu foi apreensão e arrependimento.

Inquietação desceu por sua espinha, e ele se sentou, esticando as pernas e cruzando os pés.

— Lorde Duncannon, por favor, junte-se a mim. — disse ela, seu tom escorrendo com sarcasmo.

Ele olhou para ela, encontrando seus olhos.

— Eu esperava que já tivéssemos além de títulos formais, Srta.

Evans. Você foi Hallie para mim ontem, e eu fui Arthur. Não podemos continuar assim?

— O que você me pede é impossível. — ela disse, fechando o livro com força, levantando uma nuvem de poeira.

Ele balançou a mão para afastar a poeira, tossindo.

— Nada é impossível. Suas viagens ao exterior e o trabalho que você fez lá são a prova disso.

Ela olhou para a estante diante dela, sem olhar para ele. O que havia de errado? Ele reconstituiu na cabeça tudo o que havia acontecido entre eles desde ontem, e haviam se separado em bons termos. Muito bons, na verdade.

Ela suspirou, virando-se para encará-lo.

— Você deveria cortejar outra pessoa, Arthur. Sabe que sua família nunca me aceitaria e nunca me modificarei para fazer as pessoas felizes. A longo prazo, vou apenas trazer dor a você.

Ele franziu a testa, a ideia de que ela não era boa para ele uma noção ilógica. Ela era perfeita para ele. Ele nunca travou conversas inteligentes com mais ninguém, ela era doce e honesta, não se importava com a alta sociedade, nem era envenenada por suas muitas farpas.

— Creio que não. —ele se inclinou em direção a ela e a beijo na bochecha, ela cheirava a lavanda, fresca como uma manhã de primavera. — Sinto que estou me apaixonando por você, se é que já não estou apaixonado. — o desespero que cruzou o rosto dela ante a declaração dele o fez sentir náuseas. — Por que você não me deixa amá-la?

Ela balançou a cabeça com veemência.

— Por favor, confie em mim quando digo que não podemos seguir em frente com isso. Não é justo para nenhum de nós se continuarmos este relacionamento.

— Eu não sou volátil, Hallie. Não vou deixar você de novo. Eu prometo. O dia em que ele a deixou em Felday era um erro que ele não voltaria a cometer. Jamais. — ele lutaria para mantê-la, lutaria para torná-la sua esposa. — Confie em mim, por favor. — ele implorou, sem a menor vergonha. Ele faria mais do que isso se o ajudasse a fazê-la dar uma chance a eles.

— Você é tão enlouquecedor. — disse ela com um pequeno sorriso, o primeiro hoje.

A visão aqueceu o coração dele, e ele sorriu de volta.

— Qual o tema de sua leitura? — ele perguntou, olhando para o livro que ela segurava nos braços, querendo mudar de assunto e fazê-la esquecer o que a preocupava em relação a eles.

— É um livro sobre o Império Romano. Eu estava desenhando outra moeda que encontrei ontem e me perguntei se ela poderia ter sido cunhada in loco, e não trazida do exterior. Se este livro está dizendo o que acho que diz, os romanos passaram a fazer isso após a conquista.

— Quanto mais você tem a fazer no local da escavação? Faltam apenas algumas semanas até terminar a Confraternização.

— Ah, mas você esquece que não estou aqui para aproveitar os festejos, você que está. Estou livre para ficar o tempo que for preciso. A estimativa original era de três meses.

Uma sombra passou nos olhos dela, antes que ela piscasse e desaparecesse.

O que a preocupava?

Havia algo, ele sabia disso, assim como sabia, com certeza, que ela escondia algo dele. Com o tempo, ele esperava que confiasse nele o suficiente para se abrir.

— O que direi ao Barão Bankes para evitar que ele me mande embora quando todos forem embora?

Ela riu, levantando as pernas para se apoiar nos joelhos.

— Que você está tendo um caso ilícito com a arqueóloga dele e ainda não pode ir embora.

— Então ainda estamos tendo um caso ilícito? Que ousadia da nossa parte. — ele estendeu a mão, precisando tocá-la.


Passou a mão pela cintura dela, desejando que houvesse menos roupas entre eles. Ele desejava sentir a pele macia, ouvir os doces suspiros de prazer enquanto a levava ao clímax.

— Se você não vai ouvir a razão quando se trata de nós, então suponho que minha única escolha é deixar você tirar tudo que puder de mim e seguir em frente. Não é isso que a maioria dos homens faz? — ela estendeu a mão e envolveu o pênis dele.

Arthur gemeu pelo contato ousado dela.

Caramba, ela era tão perfeita.

— Eu não sou a maioria dos homens. — ele colocou a mão sobre a dela e a moveu para baixo, para acariciar seu pau já duro.

— Apesar de toda a diversão que podemos ter juntos, não vou a lugar nenhum.

Ela veria que isso era verdade, e em breve.

O INTERIOR DE HALLIE se contraiu ao senti-lo.

Toda a perfeição masculina era dela para brincar se quisesse.

Mesmo que não fosse para sempre, ela decerto poderia tê-lo enquanto ele ficasse nessa confraternização rural. O futuro juntos era impossível, mas aqui e agora não era.

Ela se mexeu e montou nele, o que era fácil de fazer já que ela estava usando calças. As mãos dele a envolveram e agarraram a bunda dela, puxando-a com força contra o pênis inchado. O calor a envolveu, e ela sentiu que ficava úmida. Hallie se moveu contra ele, buscando a própria liberação e prazer sem penetração.

A boca dele se contorceu em um sorriso perverso, e ela o beijou deleitando-se com o desejo pulsante dele por ela, as promessas de eternidade. Promessas que ela sabia que nunca poderiam ser

realidade, não importa se uma parte dela, que ansiava por estabilidade, se sentisse tentada, para ter proteção para seu filho e para ela.

— Você fica tão bem em meus braços.

Ela gemeu durante o beijo enquanto um tremor de prazer a percorria.

— Você também. — ela conseguiu dizer.

Hallie ondulou contra ele, as calças que usavam eram a única coisa que os separava. Que eles estivessem fazendo isso na biblioteca do Barão Bankes não era muito inteligente, e mesmo assim ela não conseguia parar. Agora não. Ela queria sentir prazer e se esquecer de todos os problemas por um momento, pelo menos.

— Eu quero você.

Arthur interrompeu o beijo.

Ele a beijou no queixo, contornou o pescoço até chegar na orelha dela, e mordeu o lóbulo:

— Malditas calças.

Hallie empurrou com mais força contra a masculinidade dele, e enquanto ela ondulava em seu colo a respiração dela engatou. O

pênis inchado causava sensações deliciosas nela, e ela poderia se satisfazer sem muito estardalhaço. Mas também não se importava com o barulho que fizessem. Todos estavam fora, e aqueles que haviam ficado para trás poderiam ir a melhores cômodos do que a biblioteca.

Os espasmos começaram baixo em seu núcleo e floresceram por toda parte, e ela jogou a cabeça para trás, desfrutando do clímax que rasgou seu corpo. Ele a beijou durante o suspiro de alívio, reprimindo o barulho. Hallie se curvou nos braços dele, apoiando a cabeça em seu ombro enquanto os dois tentavam recuperar o fôlego.

— Isso foi muito prazeroso. — ela murmurou contra o ombro dele, um pequeno beijo na base de seu pescoço.

O falo sólido como uma rocha dele se contraiu contra ela, e ela se recostou, encontrando seu olhar.

— Você não encontrou liberação?

Ele balançou a cabeça, engolindo em seco.

— Não, mas quero que venha ao meu quarto esta noite. Iria?

Hallie assentiu sem pensar.

Ela tomaria tudo o que pudesse dele pelo tempo que ainda restava para os dois ali. Logo estaria acabado, e ela teria que encontrar um novo emprego. Um soldo que precisaria ser entregue ao Sr. Stewart. Um pouco de distração diante das realidades da vida era exatamente o que ela precisava.

— Vou me juntar a você quando todos estiverem na cama. A ideia de dormir nos braços dele aqueceu sua alma, e a noite parecia não estar perto o bastante.


CAPÍTULO 14

H ALLIE RECEBEU uma carta da prima mais tarde naquele dia, e ficou aliviada e feliz em saber que Ammon estava bem e começava a aprender as letras. Uma pontada de decepção por não ser ela a ensinar filho a ler e escrever atingiu sua consciência, mas em seguida ela se lembrou de que o trabalho dela era o que proporcionava a ele o conforto em que vivia agora, além de prover todas as coisas de que ele precisava para aprender e crescer.

Era assim até que a realidade, que o Sr. Stewart e sua chantagem, colocasse em risco todo o trabalho árduo dela. Ela não podia permitir que ele a usasse daquela forma. Precisava haver uma maneira de se livrar dele.

Ela respondeu contando de todas as descobertas que fizeram, e até desenhou alguns esboços dos artefatos que ela sabia que Ammon poderia gostar, sendo um menino e gostando de coisas militares. Que meninos não gostavam?

Depois de deixar a carta para ser postada no dia seguinte, Hallie pediu que preparassem um banho e ajeitou tudo para dormir, dispensou a criada mais cedo porque não queria ninguém aqui quando ela escapulisse para se juntar a Lorde Duncannon no quarto dele.

Ela sentiu a barriga contrair ao pensar em estar junto dele outra vez. Ela não havia pensado em desejar outro homem, mas aqui estava ela, com o primeiro homem que tocou sua alma, e a perversidade dele, a determinação em conquistá-la era um prazer difícil de negar.

Uma batida soou em sua porta, e ela abriu para ver Willow, seu rosto magoado.

— Willow, entre. O que houve?

Willow olhou para os dois lados do corredor e então, entrando no quarto, fechou a porta e trancou-a.

— Você nunca vai acreditar nas fofocas que ouvi pouco antes de me retirar para dormir.

Medo se alojou dentro de Hallie que se abraçou.

— Fofoca? O que é?

Os lábios de Willow se estreitaram em uma linha de desaprovação.

— Fala-se lá no andar de baixo que um casal foi visto em flagrante delito na biblioteca hoje cedo. O Sr. Stewart diz que os viu com os próprios olhos. Ele não sabia que eu conseguia ouvi-lo quando ele estava contando ao Barão Bankes todos os detalhes, caso contrário, estou certa de que ele não teria dito uma palavra. —

Willow fez uma pausa para respirar. — Eu conheço a maioria dos que estavam no passeio com o barão hoje, mas várias pessoas ficaram para trás. Lorde Duncannon foi um deles e você.

A inspeção direta da amiga fez seu estômago revirar. Hallie ergueu o queixo, recusando-se a desmoronar sob o olhar dela.

— O Sr. Stewart deveria ter vergonha de contar tais histórias.

Tenho certeza de que ele não gostaria que as pessoas falassem dele caso fosse encontrado nessa posição.

Hallie fervilhava por dentro.

Como ele ousava começar histórias assim sobre alguém, não apenas ela. Apenas provava as desconfianças que ela tinha quanto a ele. Ele estava determinado a derrubá-la, e não apenas financeiramente.


— Ó, tenho certeza de que não. Mesmo assim, isso não o impedirá de falar. Ele parece ser um fofoqueiro.

Hallie bocejou, esperando que Willow notasse sua necessidade de dormir, embora não tivesse intenção alguma de dormir, pelo menos nas próximas horas. Ela queria ver Arthur e contar a ele o que Willow havia dito. Talvez ele pudesse falar com o Sr. Stewart para garantir que o homem não espalhasse boatos sobre eles. Se ele sabia que eles estavam na biblioteca, estava claro que sabia também o que havia acontecido entre eles.

Calor floresceu em seu rosto ao lembrar do que fizeram, e ela se encolheu. Se já não havia problemas suficientes para preocupá-la, agora isto se adicionava à questão. Willow estendeu a mão e tocou seu braço, fazendo-a voltar a ouvir a amiga.

— Me despeço com um boa-noite. É visível que está cansada.

Durma bem, Hallie.

— Conversamos pela manhã. Boa noite. — Hallie fechou a porta atrás de Willow e se deixou cair encostada nela.

Ela olhou para o relógio da lareira, marcava pouco depois da meia-noite. Esperaria mais meia hora, e então se esgueiraria para o quarto de Arthur. Hallie sentou-se na cadeira diante do fogo para esperar o tempo passar. Ela observou enquanto as chamas lambiam a madeira, o tremeluzir a embalando-a em um sono.

COM UM SUSPIRO, ela acordou, sentando-se ao som da criada abrindo as cortinas e do canto dos pássaros nas árvores que ficavam ao lado de sua janela. Ela viu um bule de chá e algumas torradas em uma bandeja de prata na mesinha diante dela, a

pequena vasilha de geleia de morango ao lado fez seu estômago roncar ao ver a comida.

— Droga. — ela murmurou, esfregando o rosto para tentar acordar.

Como ela não passou a noite nos braços de Arthur? Ela praguejou baixinho, mexendo os ombros rígidos por ter dormido em uma cadeira em vez de na cama. Uma cama muito confortável ao lado de um homem bonito e sensual que só queria agradá-la.

Hallie comeu e se vestiu depressa: as calças, camisa e jaqueta fazendo seu progresso muito mais rápido do que se ela usasse um vestido. Como de costume, ela se dirigiu para a escada dos criados, queria ir logo para o local da escavação, sem ver o Sr. Stewart ou o Barão Bankes, a quem ela se perguntava se algum dia seria capaz de ver cara a cara outra vez, ainda mais agora que ele sabia como alguns dos convidados estavam se divertindo.

Se ele soubesse que era ela e Lorde Duncannon, ela não teria nenhum trabalho em nenhum outro lugar. Ele se certificaria disso.

Ela saiu pela porta dos fundos e olhou para o céu sem nuvens, respirou fundo o ar fresco da manhã.

— Bom dia, minha querida.

Hallie sufocou um grito e levou a mão à garganta, o coração batendo forte no peito.

— Lorde Duncannon. Você acordou cedo.

— Noite de insônia. — ele brincou, e ela não pôde deixar de rir.

— Sinto muito por isso. Adormeci.

Ela continuou em direção ao portão do quintal e viu que uma carruagem estava atrelada na porta dos estábulos. Pânico se apoderou dela ao pensar que Arthur já estava acordado e que a carruagem pronta significava que ele estava indo embora:

— Vai se juntar a mim no local da escavação hoje? — ela perguntou, esperando que a carruagem não fosse para ele.

Ele negou com a cabeça e pôs as luvas.

— Não, infelizmente. Mas você também não vai. Quero que venha dar uma volta comigo.

— Em um cavalo? — ela nunca gostou muito de cavalos, e com certeza não de estar em cima deles, e a ideia de cavalgar o dia todo não era algo que a tentava.

— Não, de carruagem. Quero que você visite minha propriedade.

Sou vizinho do Baron Bankes, se não sabe. Tenho uma proposta para você.

A menção de uma proposta era intrigante, e ela o estudou por um momento se perguntando o que ele queria dizer. Ela olhou para os estábulos, e viu Greg e Bruce esperando por ela. Decisão tomada, ela foi até eles.

— Vou visitar a propriedade de Lorde Duncannon hoje. Portanto, vocês não precisam ir ao sítio arqueológico. Nos encontraremos amanhã às sete, se estiverem livres.

Eles a cumprimentaram com o chapéu.

— Claro, Srta. Evans. Estaremos lá amanhã então.

Ela sorriu em agradecimento.

Caminhando de volta, ela estendeu a mão para Lorde Duncannon, e ele a ajudou a subir na carruagem. Ela se acomodou nas almofadas de couro e observou quando Arthur veio se sentar ao lado dela. A carruagem era semelhante à que sua amiga, e agora a duquesa de Whitstone, usava em suas viagens. Hallie não possuía uma, precisava viajar sempre em diligências, só gozava de tal luxo quando estava com as amigas ricas.

Sua Senhoria fechou a porta e bateu no telhado com o punho. A carruagem balançou para frente, e ele tirou as luvas, colocando-as

ao lado dele. Hallie observou as mãos fortes e grandes. Sem aviso, seus dedos se entrelaçaram com os dela, e ele segurou sua mão.

Ela olhou para ele que estudava o campo pela janela, uma expressão serena no rosto. Calor se espalhou por ela com o gesto doce e inocente, apenas dar as mãos e estar perto, sem nada mais.

Hallie desejou que pudesse ser tão fácil assim. Apenas a união de duas pessoas que gostavam uma da outra, talvez até que apenas gostar se ela fosse dar crédito ao que sentia. E se o que Lorde Duncannon dissera na biblioteca outro dia fosse verdade.

— O que quer me mostrar em sua propriedade? Qual é a proposta?

Ele sorriu.

— Bem, quanto a isso, tenho uma surpresa que acho que a deixará bem satisfeita. — ele deu de ombros. — E, também, eu queria mostrar minha propriedade, minha casa à você.

Ela seria uma mentirosa se a ideia de ver onde ele morava não a intrigasse. A casa dele seria tão acolhedora quanto Arthur se mostrava ser? Um farol em que ela não se via capaz de se apoiar para afastar todas as suas preocupações? Continuaram a viagem em silêncio por algum tempo e em uma hora a carruagem parou, nenhum sinal de casa. Hallie se inclinou para frente e olhou pela janela, não via nada além de uma densa área de árvores em um vale raso abaixo.

— Por que paramos?

O sorriso malicioso dele a fez sorrir.

— Você verá. — disse ele, abrindo a porta e ajudando-a a sair.

Eles desceram a colina em direção às árvores, e Hallie olhou em volta, tentava adivinhar o que ele iria mostrar a ela. Quando entraram nas árvores, as sombras gelaram sua pele, e ela esfregou os braços, desejando ter trazido um xale. Arthur olhou para ela e

como o cavalheiro que era, tirou o casaco e colocou-o sobre os ombros dela.

— Obrigada. — disse ela, puxando-o para perto e inclinando-se para beijá-lo.

Eles estavam sozinhos ali, os criados da carruagem não podiam mais vê-los, e o cuidado dele merecia um pequeno agradecimento.

Mesmo que fosse apenas um beijo.

Ele passou o braço em volta da cintura dela, e eles continuaram até chegar a um muro baixo de pedra.

— Isto. — ele disse, gesticulando para o muro e para outros que ela podia ver, algumas partes mais altas, como se fossem a parede externa de um castelo.

Hallie conseguiu ver uma lareira, ainda que enegrecida pelo carvão e pelo uso. Faias e olmos cresciam em toda a estrutura.

— É o local original da nossa casa ancestral. O Castelo Cadding foi construído durante o reinado de Henrique VII e caiu em ruínas.

Foi quando meu tataravô decidiu construir uma casa maior e muito mais grandiosa, Cadding Hall.

Hallie passou a mão pelos grandes blocos de pedra, só podia imaginar o quão imponente e grande o castelo teria sido. Ela contornou a parede de pedra e entrou no centro de um dos cômodos inferiores já sem teto. Ela virou-se para encará-lo.

— É muito grande, mas por que você queria que eu viesse aqui?

— Bem, quanto a isso. — ele contornou a parede de pedra e se juntou a ela, olhando as ruínas com interesse. — Eu gostaria que você escavasse as ruínas. Quero reconstruir a estrutura, mas gostaria que todo a história do local fosse catalogada e preservada.

Achei que, se trouxesse alguém que soubesse o que procurar, a pessoa poderia me ajudar a reconstruí-lo. Preservá-lo.

Por um momento, Hallie não conseguiu responder.

Ela não havia pensado que ele faria tal proposta, mas também não poderia fazer o trabalho de graça. Ela precisaria de trabalhadores e equipamentos. Era um trabalho grande e demoraria meses para ser concluído. Lorde Duncannon pretendia pagar um salário a ela, ou esperava que ela fizesse de graça?

— Sinto-me honrada, de verdade, mas...

— Pagarei um montante generoso. Não sei dizer quanto se paga a um arqueólogo, mas pagarei o que você julgar justo. Quinhentas libras, mil. Diga seu preço, e eu pagarei.

Hallie fechou a boca com um estalo.

— Eu não preciso de tanto assim, meu senhor.

A possibilidade de tais somas a ajudaria a manter o filho em segurança, e ela não precisaria de mais trabalhos, a menos que o projeto fosse algo que a interessasse. Isto é, se ela pudesse enganar o Sr. Stewart quanto ao que ele alegava ser dele por direito.

Embora fosse uma proposta de trabalho interessante, ela não pôde deixar de se perguntar se ele a fez para mantê-la por perto.

Mantê-la em sua cama um pouco mais. Não era uma ideia horrível, mas ainda assim, estar perto dele, dia após dia e noite após noite, só a afundaria ainda mais naquele poço de emoções que ela havia escondido por tanto tempo.

— Se eu vier a aceitar, preciso de uma promessa, de uma declaração e de contratos assinados para que tudo seja honesto.

— Claro. — ele disse, aproximando-se dela e pegando sua mão.

— Admito que quero você comigo, mas essa reconstrução está em meus planos para a propriedade há algum tempo. Já tenho os desenhos elaborados, só preciso de alguém que garanta que os bens ou qualquer coisa encontrada aqui estará protegida de danos.

Eu gostaria de manter, na nova construção, quaisquer estruturas originais que sejam viáveis. É aí que você entra.

Tudo faz sentido, mas...

— Eu insisto em ter uma cabana ou outra casa pequena na região para ficar. Nossas escapadas precisam cessar enquanto eu trabalho nisso. Não quero ser vista como uma amante sua. Uma que mora com você e que é paga para escavar de dia e para aquecer sua cama à noite.

Ele passou a mão pelo cabelo, olhando as ruínas por um momento antes de se virar para ela.

— Muito bem. Vou instalá-la em uma cabana próxima em que meu antigo jardineiro morava e manteremos nosso relacionamento apenas profissional até que você conclua a escavação aqui. Mas depois disso... — ele disse, avançando contra ela e envolvendo as mãos em sua cintura. Hallie relaxou contra ele, adorando o fato de que ele a fazia se sentir em casa, segura e adorada. — Vou continuar a cortejá-la, Srta. Evans, e nada ficará no meu caminho.

Hallie entrelaçou os dedos nas costas dele, desejando que fosse assim.

— Acho que temos um acordo, meu senhor.

— E seu preço?

Ela respirou fundo para se acalmar, pensando no filho e lembrando-se de que Lorde Duncannon afirmou que pagaria o que ela quisesse.

— Peço mil libras pelo trabalho que estou prestes a realizar, mais a mão de obra e as ferramentas. Ela prendeu a respiração enquanto ele contemplava sua proposta.

— Feito. — ele disse sem questionar. — O dinheiro estará pronto amanhã.

Ela se engasgou, e ele aproveitou a oportunidade para beijá-la.

Hallie se esqueceu da escavação, do dinheiro, de tudo, e se entregou ao afeto dele. Ela precisaria contar a ele, depois de terminar seu trabalho aqui, tudo de seu passado e se permitir viver ou morrer pela espada que ele poderia manejar sobre sua alma.


CAPÍTULO 15

F IEL À SUA PALAVRA, Lorde Duncannon a convocou para uma reunião na biblioteca do Barão Bankes no dia seguinte. Haviam passado um dia maravilhoso na propriedade dele, caminharam pelos jardins, ele mostrou a casa com os muitos retratos de família e passagens secretas.

Ele a encontrou na porta e ajudou-a a se sentar na cadeira diante da mesa do barão.

— Tenho tudo que você pediu. Até pedi ao meu administrador que redigisse um contrato durante a noite e o enviasse por via expressa esta manhã.

Hallie pegou o pergaminho dele e leu o contrato, observando o valor a ser pago, e o apoio que ela pediu durante a escavação antes do início dos trabalhos de construção. Tudo o que ela pediu, ele tornou concreto. Ela olhou para cima e viu outro pacote amarrado com barbante.

O pagamento, talvez?

Se o Sr. Stewart descobrisse quanto ele a pagaria, todas as negociações e aceitação desse trabalho seriam em vão. Durante a noite, ela havia debatido esse dilema e decidido que pagar ao Sr.

Stewart parte do dinheiro, para mantê-lo feliz e tranquilo, seria melhor do que não pagar nada. Ainda assim, ela teria o bastante para enfim cuidar do filho e voltar para Felday, poder ser seletiva no que aceitaria trabalhar no futuro.

— Tudo parece muito bom, meu senhor. Pena, por favor. — ela disse, colocando o contrato na mesa, pronta para assinar.

Arthur sorriu, mergulhando a ponta da pena na tinta e entregando a ela. Hallie assinou e, com seu rabisco, um pouco do peso de não ter segurança, de precisar confiar em outras pessoas para manter os lobos afastados diminuiu. Era o começo de um novo começo. Ela se recostou, encontrando o olhar dele.

— Eu gostaria que os detalhes do contrato permanecessem entre nós, meu senhor. Ninguém precisa saber os detalhes específicos do que acordamos. Não concorda?

Arthur assentiu sem hesitar.

— Claro. — ele empurrou o pacote amarrado com barbante pela mesa. — Um último detalhe. Aqui estão as mil libras que decidimos, entregues hoje como prometido.

Ela o pegou, girando-o na mão, jamais havia segurado tanto dinheiro de uma vez.

— Obrigada. É muito generoso.

Ele se levantou e deu a volta na mesa, mergulhando a pena mais uma vez e assinando sua parte do contrato, então, enrolou o pergaminho, se virou e entregou a ela.

— Assim que tiver concluído seu trabalho aqui, espero recebê-la em minha propriedade, Srta. Evans.

Ela ficou de pé.

— Eu também.

O que era verdade. Ela mal podia esperar para sair dos olhos vigilantes do Sr. Stewart e, com alguma sorte, com o dinheiro que ela lhe daria hoje, ele a deixaria em paz por um tempo.

— Preciso ir, já estou atrasada para a escavação.

— Claro. — Arthur disse, curvando-se. — Vou vê-la esta noite?

— ele perguntou quando ela se virou para sair.

Calor floresceu na parte de baixo de sua barriga, e ela reprimiu um pequeno sorriso.


— Quando todos estiverem na cama, irei ao seu quarto. Não vou adormecer desta vez. Eu prometo.

Ele deu um sorriso largo.

— Vou contar as horas.

Hallie saiu do cômodo com um sorriso absurdo nos lábios e esperança no coração. Havia mais entre eles do que apenas atração física. Ele se importava, ela estava certa disso. Mas significava que ele gostava dela o suficiente para querê-la quando soubesse de tudo? Mais importante, ela seria forte o bastante para dizer a

verdade e arriscar o coração uma segunda vez?

MAIS TARDE, ainda no mesmo dia, Hallie estava sentada em sua tenta junto à escavação e comia um sanduíche, à espera de que a chuva passasse. Greg e Bruce pediram para voltar aos estábulos por causa de uma égua que estava em trabalho de parto. Hallie assentiu com a mão, sem hesitar e continuou estudando os pequenos artefatos que haviam saído da segunda trincheira.

Meia estátua que poderia ser um dos muitos deuses aos quais os romanos oravam e mais peças de cerâmica. O local era decerto interessante, mas o Barão Bankes só queria uma pequena escavação para provar que já existiu um forte romano aqui.

Se o trabalho dela aqui nas últimas semanas provou alguma coisa, foi que com certeza havia. Pelo menos ela garantiu que o Barão e a família estavam corretos quanto ao local, mesmo que ela não tivesse tido a oportunidade de revelar tosos os segredos históricos ali escondidos.

— Srta. Evans, exatamente a mulher que eu desejava encontrar.

— Hallie pulou ao som da voz do Sr. Stewart, uma voz que era ao mesmo tempo nasal e irritava os nervos. — Soube que você foi contratada para trabalhar na propriedade de Lorde Duncannon depois de terminar aqui.

Ela franziu o cenho.

Como ele havia descoberto?

Ela pediu a Arthur para não dizer nada, e ainda assim, aqui estava o Sr. Stewart duas horas depois, perguntando do contrato.

— Quem contou a você?

Ele sorriu, a ação mais como uma careta.

— Eu tenho meus contatos, mas isso não é importante. Mas afirmo que não foi Lorde Duncannon quem me passou a informação.

Por mais agradável que fosse a notícia, o fato de o Sr. Stewart estar ali significava que ele conhecia parte do acordo.

— Suponho que você queira sua parte.

— Claro. — disse ele, sentando-se em frente a ela na mesa.

Hallie observou o cabelo dele, um pouco oleoso e penteado para trás. Ele a lembrava de uma enguia, pegajosa e indigna de confiança. Ela se levantou e foi até uma caixa que estava escondida em um dos baús de ferramentas em sua tenda. Não era onde ela gostaria de deixar tais objetos de valor, mas também aprendera a carregá-los com ela o tempo todo. Se ela estivesse em uma escavação, seu dinheiro também estaria. Não importava quão grande ou pequena fosse a tal soma.

Ela foi rápida em retirar as duzentas e cinquenta libras que separara antes, fechando a caixa de dinheiro e a tampa do baú.

— Aqui está. Isso é o que recebi, menos cem libras que guardei para mim. Não posso trabalhar e não ter nenhum dinheiro, então se deseja me roubar, deve aceitar que manterei uma parte.

Ele esfregou o queixo, sem tirar o dinheiro da mão dela. Hallie controlou suas feições, ansiedade a dominando por sua imobilidade contínua.

— E o resto?

Ela engoliu em seco, franzindo a testa para estudá-lo.

— Não sei o que quer dizer. — ela mentiu, esperando que o tivesse enganado.

Ele riu, o som cansado.

— Ah, Srta. Evans. Eu sei que você recebeu mil libras. Então, eu sugiro que você volte para a sua caixinha de dinheiro ali naquele baú, pegue as seiscentas e cinquenta libras que me são devidas, e seja breve, antes que eu mude de ideia e fique com as cem libras que estou disposto a deixar que mantenha.

— Como você sabia? Conte.

Ela olhou para ele, a esperança de seus planos queimando em cinzas diante dela. A vida com o filho, uma vida sem precisar economizar e contar cada centavo, desapareciam em um piscar de olhos. Não precisar mais de vários empregos, como fazia antes do Barão Bankes oferecer este trabalho. Por mais que ela amasse história, aprender e explorar vidas passadas por meio de escavações, era um trabalho árduo, duro para o corpo e cansativo.

Em um cenário ideal, ela escolheria os locais para explorar e seria paga de forma justa, para que pudesse estar em casa a maior parte do tempo, criando o filho da melhor maneira possível.

— Eu estava na biblioteca quando você se reuniu com Lorde Duncannon. Foi um acaso total, mas bem oportuno. Se eu não estivesse lá, não saberia que estava tentando me roubar bem debaixo do meu nariz. No futuro, terei de vigiá-la mais de perto.

A raiva a atingiu, e ela se levantou da cadeira, o banquinho em que se sentava caiu atrás dela.

— Com certeza, novecentas libras são suficientes para você não precisar continuar me chantageando. Não é o bastante? Não posso continuar desse jeito para sempre.

— Como expliquei antes — ele disse, seu tom entediado e indiferente. O homem não tinha coração? Bússola moral? —, você vai continuar me pagando até que eu diga o contrário. Estou ansioso para aproveitar o que esse dinheiro pode me comprar.

— Seu desgraçado. É minha vida que você tem nas mãos. O

futuro do meu filho comigo. A mãe dele. Está me tirando isso.

Ele fez beicinho com as palavras dela, e a vontade de arrancar os olhos cresceu. Hallie agarrou o lado da mesa para não dar vazão à tal vontade.

— Sinto muito por você, mas ajudou a duquesa de Whitstone a ceifar a vida de meu primo. Se analisar a situação, minha vingança está à altura. Você machucou minha família, e agora vou machucar a sua.

— Eu não fiz nada para seu primo. Qualquer mal que se abateu sobre ele, foi resultado de suas próprias ações.

A visão do Sr. Stewart turvou, e ela piscou. Odiou o fato de ele perceber que ela estava incomodada. Ela voltou ao baú e contou mais seiscentos e cinquenta libras, jogando-as sobre a mesa.

— Saia.

—Ó, não chore, minha querida. Você é uma mulher durona e trabalhadora. Deveria estar satisfeita por poder ajudar ao próximo.

— disse ele, pegando o dinheiro, o olhos como pequenas contas gananciosas para a grande soma em suas mãos.

— O que está acontecendo aqui?

Hallie se engasgou e enxugou os olhos quando Lorde Duncannon entrou na tenda, confusão escrita em suas feições até que ele viu o maço de dinheiro que o Sr. Stewart segurava. Se

assassinato tivesse uma aparência, Sua Senhoria era a essência dela.

— Nada. — ela deixou escapar. — O Sr. Stewart estava de saída.

— Com o seu dinheiro. — Lorde Duncannon caminhou em torno da mesa e arrancou o dinheiro da mão do cavalheiro, a boca do homem puxada em uma linha de descontentamento. — O que pensa estar fazendo ao pegar o pagamento da Srta. Evans?

Hallie sentiu a bile subir pela garganta e pensou que vomitaria.

Ela precisava contar a Arthur sobre seu passado, ninguém mais. Ele a odiaria por mentir para ele. Por saber que que outros descobriram seu passado antes dele. Por dar a ele falsas esperanças.

O Sr. Stewart ajeitou o casaco sem pressa.

— Na verdade, eu a estou chantageando. Caso queira saber, não há motivo para não contar.

Arthur olhou para ela, confusão e raiva fervilhavam em suas órbitas azuis.

— Por que você a chantagearia.

— Porque, como acabei de lembrá-la, ela está envolvida na morte do meu primo, Lorde Oakes, talvez o senhor se recorde.

Ele franziu a testa, antes de seus olhos se arregalarem ante a lembrança.

— O desgraçado que quase estuprou e matou a duquesa de Whitstone?

— Ele mesmo. — disse o Sr. Stewart, como se a morte do primo merecesse tais reprimendas.

— Você está louco? — Sua Senhoria perguntou ao Sr. Stewart, olhando para ele como se o homem de repente tivesse ganhado uma segunda cabeça. — Este não é o comportamento de um cavalheiro. Você deveria ser preso por um ato tão desleal e ilegal.

O Sr. Stewart apenas ergueu as sobrancelhas, olhando para Hallie.

— Talvez a Srta. Evans gostasse de explicar os motivos para eu ser capaz de chantageá-la. Senhorita Evans — disse ele. —, conte tudo a Sua Senhoria.

Hallie olhou entre os dois homens, em conflito com a necessidade de correr e a coragem de ficar e lutar. O desejo de fugir era forte em seu corpo, mas ela sabia que não havia sentido. Lorde Duncannon precisava saber da verdade, ela só queria ter contado de outra maneira. Com certeza, não por meio da insistência do Sr.

Stewart, que parecia sentir prazer ao ver a dor de ambos.

Ela respirou fundo para se acalmar e cruzou as mãos diante de si para não se mexer.

— O Sr. Stewart está me chantageando porque conhece meu passado. Minha vida no Egito.

— Eu sei da vida dela lá, mas você não me vê tratando a Srta.

Evans dessa forma.

— Sabe. Sabe mesmo? — o sr. Stewart olhou surpreso para Sua Senhoria. — Sabe de todos os detalhes? Tudo?

Lorde Duncannon olhou entre eles, dúvida crepitava no olhar dele.

— Eu acho que sim.

— Achou errado. — disse o sr. Stewart, rindo e dando tapinhas nas costas de Sua Senhoria, e se dirigiu para a saída da tenda. —

Vou-me embora, este pequeno tête-à-tête me deixou bastante faminto. Acredito que o jantar será servido em uma hora. Nada como um pequeno desacordo para aquecer o sangue e me fazer salivar.

— Hallie? — Lorde Duncannon disse, trazendo a atenção dela de volta a ele. — O que aconteceu no Egito?

O Sr. Stewart colocou a cabeça de volta na tenda com a pergunta.

— Ela teve um filho de outro homem, meu senhor. Pensei que você soubesse. — ele deu de ombros. — Devo ter me enganado.

Erro meu.

Hallie encontrou o olhar de Arthur e percebeu a confusão e a dor em seus orbes azuis tempestuosos. Ela deu um passo em direção a ele, e ele ergueu a mão para impedir que ela continuasse.

— Você é mãe!

Um olhar de repulsa cruzou o rosto dele, e ela ergueu o queixo, não querendo ser desprezada, nem mesmo pela aristocracia.

— Eu sou mãe. Posso ver pelo seu rosto que isso o desaponta, meu senhor, mas se espera que eu peça desculpas por minha vida, não o farei.

— Você disse... Pensei que você dissera que não houve ninguém no Egito.

— Nunca falei que não. Eu apenas não disse que houve. Você fez suas próprias suposições acerca da minha situação. Foram erradas.

Ela estava sendo injusta e cruel, mas precisava se proteger agora. Ninguém mais o faria. Ele esfregou a mão no queixo, olhando em direção à área escavada.

— A criança não é minha, é? Aquela noite em Felday, você não engravidou.

— Não, meu filho não é seu. O pai é um homem chamado Omar, que conheci no Egito.

Os olhos de Sua Senhoria se arregalaram, e ele se afastou.

Como se estar perto dela fosse o mesmo que estar perto de um leproso.

— Seu filho é metade egípcio?

Ela assentiu, não sentia vergonha nisso.

— Sim ele é. Mora com minha prima no momento. Assim que eu terminar com a propriedade do Barão Bankes, planejo viajar para lá, para passar algumas semanas com ele. Ele tem apenas quatro anos, entende.

— Eu não acredito. — ele afirmou, o rosto uma máscara de descrença. — Como pôde me esconder tal verdade? Teve vergonha?

— Não tenho vergonha do meu filho, mas também não sou idiota. Sei que minhas opções de trabalho, como esta ou mesmo como uma dama de companhia ou criada comum em uma casa grande estariam comprometidas se soubessem que eu tive um filho fora do casamento. Eu preciso de dinheiro, meu senhor. Não tenho um dote ou grandes propriedades que me gerem renda e me mantenham segura e abastecida pela vida toda. Essa é a razão pela qual optei por não contar a ninguém sobre meu passado. Apenas por razões de capital, não morais.

— Você me permitiu acreditar que havia uma chance para nós.

Como pôde fazer uma coisa dessas?

Ela engoliu o nó na garganta ante as palavras dele.

Então seria sim.

Ele a estava descartando sem nem ouvir toda a história, a verdade dela. Nem mesmo quis entender o lado dela, ou confiar nos sentimentos que ela pensava que ele nutria por ela.

— Eu tentei dissuadi-lo, falei que um futuro comigo não era possível. Você não quis me ouvir.

— Eu não quis... Uma coisa era ignorar seu status na sociedade, o fato de que você entraria em nosso casamento com pouco em comparação com minha riqueza e propriedades. Eu acreditava que era com isso que se preocupava. Não ligo para isso e teria ignorado

os surtos de melancolia de minha avó por causa de nosso casamento, mas isto eu não posso ignorar. Você é mãe. A mãe de uma criança que nasceu fora de um casamento.

— Você não é melhor do que Omar. Fomos íntimos, um filho poderia ter sido gerado. Qual a diferença? Como você é um Lorde e Omar não era, está tudo bem?

Ele passou a mão pelo cabelo, deixando-o em pé.

— É apenas diferente.

Hallie voltou a sentar na mesa e pegou a pequena escova que usava para limpar os artefatos.

— Creio que terminamos aqui então.

Ela não lutaria por um homem, uma vida com um homem que era regido por dois pesos e duas medidas. Se ele iria mudar de opinião acerca dela apenas porque ela era mãe, não era o homem certo para ela.

Lágrimas pinicaram os olhos dela, e ela piscou ante tudo que havia perdido. Se Omar estivesse vivo, ela não estaria nesta situação, mesmo que a família dele fosse contra uma união. Na verdade, recusava-se a considerar tal possibilidade. Talvez fosse melhor. Ela finalizaria as coisas por aqui, voltaria para a casa, arrumaria suas coisas e amanhã voltaria para sua casa. Surgiriam outros trabalhos caso Lorde Duncannon não revelasse o passado dela para ninguém.

— Vai contar a alguém?

— Claro que não. — ele disse, olhando para o chão como se assim pudesse encontrar soluções mágicas. — Presumo que o Sr.

Stewart descobriu sobre o seu passado. O quanto ele quis extorquir de você?

— Ele descobriu. — ela respondeu, vendo pouco sentido em esconder qualquer coisa dele agora. — Descobriu acerca de meu

filho, e de Omar. Ameaçou contar tudo a todos para que ninguém me contratasse, nem como arqueóloga, historiadora ou criada. —

disse ela, com naturalidade, tentando controlar as emoções.

A garganta dela doía pela tentativa de controlar seus sentimentos, e ela ficaria agradecida quando ele saísse. Ela olhou para ele e o encontrou olhando para ela, o rosto dele uma máscara que ela não conseguia ler.

— À luz do que me disse, vejo agora que não poderá trabalhar em minha propriedade. No entanto, o dinheiro é seu. Faça o que quiser com ele. O Sr. Stewart não colocará suas mãos de ladrão naquele montante.

— Eu não quero seu dinheiro ou caridade, meu senhor. Por favor, saia. — ela pegou o dinheiro e o entregou a ele. — Você sabe tudo que há para saber sobre mim e minha vida, e já disse que não está interessado em nada disso. Acredito que nós dois saibamos que não há mais nada a dizer um ao outro.

— Eu sinto muito, Hallie. Se as circunstâncias fossem diferentes...

Ela assentiu, mas sem coragem de olhá-lo nos olhos.

— Adeus, Lorde Duncannon.

— Adeus, Hallie.

Ao som da saída dele, ela olhou para cima e observou-o descer a colina, de volta à propriedade. Ela afundou de volta na cadeira, limpando com raiva a lágrima que escorregou pela bochecha. Ela terminaria seu trabalho aqui e depois iria embora. Não queria mais estar aqui, ou em qualquer lugar perto de onde Lorde Duncannon estivesse ou da laia hipócrita dele.


CAPÍTULO 16

A RTHUR VOLTOU à propriedade do Barão Bankes e, ao encontrar um lacaio, ordenou que suas coisas fossem arrumadas e que uma carruagem estivesse pronta em uma hora.

Ele fez uma pausa no meio de uma palavra ao som de uma mulher gritando, a voz autoritária.

Ele gemeu por dentro ao reconhecer a voz de sua avó.

O que diabos ela estava fazendo aqui?

— Exijo ver o meu neto. Onde está Lorde Duncannon?

Maldição.

Essa era a última coisa de que ele precisava nesse momento.

Sua mente era uma selva de pensamentos e negações acerca do que acabara de acontecer.

Hallie é mãe!

Ele não conseguia compreender. A raiva pulsava em suas veias por ela ter mentido para ele, mantido em segredo tantos detalhes pessoais e importantes de sua pessoa. Ela não sentia nada por ele?

Se algo, era prova definitiva que ela não confiava nele. Ele começou a subir as escadas para a sala de estar do primeiro andar. Os convidados do Barão Bankes se aglomeravam no corredor, e alguns também estavam na sala de estar, toda a atenção voltada para a avó dele e suas exigências.

— Onde está Duncannon? Ele precisa me responder acerca dessa notícia que recebi. Onde está aquela megera da Srta. Evans, que pensa que vai tornar-se uma condessa?

— Minha senhora, você está enganada. — Arthur ouviu o barão dizer, tentando aplacar a avó com um tom suave.

Não ajudaria. A mulher conhecia apenas um tom e foi abrupto.

— A Srta. Evans está empregada aqui para fazer uma escavação nas minhas ruínas romanas. Ela não está de forma alguma buscando casamento com Lorde Duncannon.

Arthur abriu a porta, vendo a avó balançar uma missiva no ar.

— Não é isso que esta carta afirma. Exijo vê-lo agora mesmo.

Onde ele está?

— Bem aqui, vó. — ele disse ao entrar na sala. — Peço que todos se retirem, obrigado.

— Você já propôs a Srta. Evans? A historiadora que deu à luz um filho fora do casamento? Um filho de um estrangeiro? Egípcio ainda por cima.

Sua avó apertou o peito, procurando uma cadeira antes de se sentar com a ajuda de duas convidadas que pareciam não ter pressa em sair.

— Vamos falar deste assunto a sós.

— Ó não, não vamos. Não há nada mais para falar. — ela disse, sua papada vibrando com cada palavra. — Você não vai se casar com nenhuma vadia. A próxima condessa de Duncannon será uma senhora de bom nascimento e educação. Ora, qualquer uma dessas jovens presentes servirá. Não permitirei que meu neto arraste o nome da família na lama por causa de uma prostituta comum que deveria trabalhar em St. Giles em vez de cavoucar terra em Somerset.

— Não fale da Srta. Evans dessa maneira, vovó. Eu não vou aceitar. Não me importa o que pensa do passado dela.

Ou dele.

Arthur olhou para os muitos rostos que haviam ouvido tudo sobre Hallie. Ela voltaria aqui para uma alcateia de lobos, todos esperando para estraçalhá-la. Ele se voltou para o Barão Bankes.

— Mande que os criados arrumem as coisas da Srta. Evans.

Pode ver tão bem quanto eu que ela não pode ficar aqui.

— Eu cuidarei disso. — disse Willow, dando um passo por trás de alguns dos outros convidados, o desdém dela por ele claramente escrito em suas feições. A tia de Willow olhou para ela, seu rosto pálido com a notícia que a avó dele contara a todos.

— Você não vai chegar perto da Srta. Evans de novo, Willow. Eu a proíbo.

— Ela é minha amiga, tia. Vou garantir que ela esteja protegida antes de partir. Ao contrário de alguns aqui, não me esqueço dos meus amigos ou daqueles de quem gosto. — disse ela, olhando-o bem nos olhos, sem desviar.

As palavras dela o envergonharam, e ele se viu prestes a passar mal.

— Obrigado, Srta. Perry.

Ela se virou para ele na porta, o fulminando com o olhar.

— Não faço isso por você, não se engane, meu senhor.

Tampouco desejo ver seu eu covarde se aproximar outra vez de minha amiga. Nenhum de vocês, ouviram? — Willow disse, sua voz aumentando a uma oitava ou duas. — Ou precisam que eu repita?

Arthur a observou percorrer o corredor, as saias voando sobre os tornozelos. A firmeza dela para com Hallie o envergonhou ainda mais, e ele se xingou por dentro.

— Todos. Fora. Agora! — ele gritou, assustando os poucos que o cercavam, e eles saíram da sala às pressas.

— Vou garantir que a Srta. Evans vá embora hoje. Não podemos ter esse tipo de coisa em nossas casas. O que todos vão pensar? —

disse o barão, estalando a língua e fechando a porta, deixando Arthur com a avó.

— Como você pode ser tão irresponsável, Arthur? Sabe que nossa família nunca se une a pessoas que não sejam o melhor, a melhor criação, as melhores conquistas, um bom dote e uma boa família. Você manterá a tradição e interromperá qualquer contato com essa Srta. Evans. Quem já ouviu falar de uma historiadora, ou de alguém que sai por aí desenterrando pilhas de pedras antigas com as quais ninguém se importa? — a avó dele revirou os olhos, segurando o colar de diamantes em volta do pescoço para se apoiar. — Seus pais devem estar se revirando no túmulo.

Arthur caiu em uma poltrona próxima, destruído pelo que acabara de acontecer. Ele não se importava que a avó expressasse o suas preocupações, ela poderia ter continuado por meses e não o teria afastado de sua escolha de Hallie.

Ele balançou a cabeça.

A ideia de que ela era mãe era inimaginável. Ela nunca escorregou e mencionou seu filho ou o homem a que ela amou o bastante para gerar uma criança.

As mãos dele se fecharam em punhos.

O desejo de socar alguma coisa, qualquer coisa, o assolava com força. Ele odiava o desgraçado, quem quer que a tenha amado. Se o sujeito a amava tanto, por que não se casou com ela, levou-a para casa e cuidou dela e do filho? Ele os abandonou no Egito? Ele gemeu, sem nem ter pensado em perguntar a ela por que não estava com ele.

— Você está me ouvindo, Duncannon?

Ele ergueu a cabeça para encarar a avó, o rosto dela era uma máscara de desaprovação.

— O que você estava dizendo?

— Deve sair daqui e voltar para Cadding Hall esta noite. O Barão Bankes vai, como falamos, remover a Srta. Evans de sua casa.

Depois que expliquei a ele que um barão estar perto de uma mulher assim não faria nenhum bem à reputação dele em Londres, ele viu o sentido neste conselho e agirá de acordo.

A raiva estava remoendo o orgulho de Arthur e, ainda assim, a ideia de que Hallie seria chutada daqui como se o tempo que gastou não valesse nada o deixava furioso. Ser expulsa em desgraça apenas porque havia escolhido um estilo de vida diferente daqueles sob aquele teto.

Ele se levantou.

— Vou para o meu quarto fazer as malas.

Sem mais nada a dizer para a avó ou para qualquer outra pessoa, Arthur voltou para seus aposentos, ignorando os poucos que se reuniam na porta da sala de estar, sem dúvida ouvindo a conversa.

Uma mulher parou na frente dele, e ele estendeu a mão, agarrando os ombros dela para não derrubar os dois no chão. Ele olhou para os olhos verdes de aço da Srta. Willow Perry.

— Como pôde ser tão covarde com Hallie? Pelo que pude ver aqui hoje, já conhece o passado dela e desaprova sua escolha.

Ele curvou um dos lábios, não estava com humor para sermões.

— São poucos os que não desaprovariam. Estou errado? — ele perguntou, olhando bem nos olhos dela que ainda o encaravam.

Ela fungou em descontentamento.

— Deixe-me perguntar algo, meu senhor. Com quantas mulheres você já dormiu na vida? Imagino que sejam muitas, mas as mulheres não têm a mesma liberdade. Bem. — ela disse, cutucando-o no peito com o dedo. — Hallie, Ava, eu, inferno, todos as nossas amigas não vão se conformar com as regras de um homem, mesmo que este seja o mundo de um homem. E se você

não é homem o suficiente para aceitar e amar Hallie por tudo o que ela é, então não a merece.

— Acho que não.

As palavras subiram por sua garganta e ameaçaram sufocá-lo.

Mesmo assim, ele não conseguia aceitar o que Hallie havia feito. O

que Willow disse era verdade, ele dormiu com muitas mulheres desde a primeira vez que se deitou com uma adorável criada de sua mãe antes de ela falecer. A ideia, porém, de sua esposa ter sido livre com seu corpo, seu coração, deixava um gosto amargo em sua boca, e ele não suportava a ideia de Hallie estar com outra pessoa.

Ter tido um filho de outro... Sim, ele dormiu com ela, mas ele iria se casar com ela. Se ao menos ele tivesse sido o único homem a subir em sua cama.

— Jamais tente entrar em contato com ela de novo, meu senhor.

Não vou permitir que você a magoe outra vez.

— Ela voltou do local de escavação?

Hallie já estava de volta à casa? Nesse caso, o barão foi rápido em encerrar seus serviços. A ideia o deixou vazio por dentro.

Maldição!

— Ela está fazendo as malas. O barão disse a ela, há menos de meia hora, que ela deveria partir devido a tudo que sua avó gritou para a metade da sociedade.

— Em minha defesa, não sabia que minha avó chegaria hoje.

A única parente dele não era nem esperada na casa do barão, então para ela estar aqui, a notícia de seu envolvimento com Hallie deve ter chegado a Londres. Ele apertou o queixo, pensando em apenas uma pessoa que desejaria causar dano a ela.

— Suas desculpas não são relevantes. Deixe-a em paz, case-se com uma jovem, rica e pura, uma debutante que tem sua virgindade intacta. Uma daquelas a que sua família é tão famosa por se aliar e

deixe minha amiga em paz. Ela merece felicidade, e você e sua avó tóxica só podem trazer dor.

Arthur ficou em silêncio, poucas palavras surgiam em sua mente para retaliar a Srta. Perry. Como ele poderia quando tudo o que ela disse era verdade?

Ele fez uma reverência.

— É o que eu pretendia, Srta. Perry. Não há necessidade de me dar um sermão.

Ela debochou dele, caminhando de volta pelo corredor, em direção ao quarto de Hallie.

— Lembre-se do que eu disse, ou não apenas me enfrentará, mas a Ava e nossas amigas. E osso prometer uma coisa a você, meu senhor. — ela disse com ênfase sarcástica no honorífico. — Se considera a sua avó uma tirana, não viu nada ainda.


CAPÍTULO 17

U MA BATIDA soou na porta, e Willow que a ajudava com seus pertences a destrancou e a escancarou. Hallie não pôde deixar de olhar para ver quem estava lá, uma pequena parte dela estava esperançosa de que fosse Lorde Duncannon vindo para se desculpar e implorar perdão.

Não que ela o perdoasse pela forma como a tratou ou, pior ainda, pelo julgamento que fez dela. Quem era ele para a condenar apenas por ter seguido seu coração? Ela duvidava muito que ele pudesse dizer o mesmo. Havia poucas dúvidas de que ele dormiu com muitas mulheres, nenhuma das quais ele estava apaixonado, então quem era pior? Decerto, não era ela.

A criada que a servira nas últimas semanas estava parada na porta, uma missiva nas mãos.

— Srta. Evans, uma missiva expressa chegou esta tarde.

Lamento ter demorado tanto para trazê-la para você. Não sabia que estava de volta do local de escavação. — os olhos da jovem criada varreram o quarto, observando as roupas e baús espalhados. —

Está indo embora, senhorita? Precisa de ajuda?

O estômago dela embrulhou ao ver a missiva, e ela quase se esqueceu seus problemas com o barão, Arthur, e até mesmo da pergunta da criada. Hallie pegou a missiva e quebrou o lacre, examinando a carta. Doença, voltar para casa, pressa saltaram do texto, e ela ficou imóvel por um momento, a mente um zumbido de planos. Ela se assustou quando Willow fechou a porta, falando baixinho com a criada sobre uma carruagem e dois lacaios para ajudar antes de vir até ela.

— O que é, Hallie?

— Devo partir agora mesmo. Minha prima está doente.

— A que cuida de Amon? — Willow voltou para os baús e começou a abarrotá-los com menos cuidado do que antes. — Pedi uma carruagem, e um par de lacaios estarão aqui em breve para ajudar a carregar a bagagem. Você estará na estrada para Berkshire antes que a hora acabe.

— Não creio que o barão me permita manter a carruagem até Berkshire. Vou ter que pegar a diligência da cidade mais próxima.

— Deixe isso comigo. Vou garantir que você seja entregue em segurança em Berkshire amanhã. Posso ser apenas sobrinha de uma viscondessa, mas isso não me torna totalmente sem mérito.

Depois do que aconteceu com você hoje, você não será largada em uma pousada local para descobrir sozinha como chegar em casa.

Não aceitarei isso.

Hallie puxou a amiga em um abraço, muito grata por ainda ter amigas verdadeiras e por elas a apoiarem, não importa o quê. Ela deveria ter confiado nessa amizade quando se viu grávida. Ela não iria mais se esconder nas sombras com medo do que as pessoas pensariam dela ou de suas escolhas. Ela fingiria ser a viúva de Omar El Sayed, a mãe do filho dele, e todos poderiam ir para o inferno se não gostassem disso.

— Obrigada, Willow. Você é a melhor amiga do mundo.

— Eu sou, e sempre irei apoiá-la. — elas sorriram uma para a outra por um momento antes de Willow dar um tapinha em seu ombro. — Venha, ainda há malas para fazer. — ela se virou para um baú próximo, jogando algumas das botas de Hallie nele. — A missiva fala mais de sua prima? Quão grave é?

— Uma febre forte, e ela está bem abatida. Não sabem se é contagioso. Espero que Ammon não se contamine. Eu odiaria que

qualquer coisa acontecesse com ele. Ele é apenas uma criança.

— Tudo ficará bem, minha querida. Tenho certeza de que as amigas dela já providenciaram a visita do médico.

Hallie tentou se consolar com as palavras de Willow, mas a menção de uma febre que parecia estar afetando a mente da prima a fez temer o pior. E se ela falecesse? O que ela faria agora? Ela não havia economizado o suficiente para manter ela e Ammon seguros em Felday. Havia suas amigas, é claro, a quem poderia recorrer, mas não poderiam sustentá-la para sempre.

Depois da maneira atroz como sua verdade veio à tona aqui na propriedade do barão, era bem improvável que ela conseguisse um novo trabalho, mesmo que fosse uma posição em uma casa grande como criada doméstica. Seu nome estava, ou logo estaria, na lama.

Hallie esfregou a mão na testa, a mão ficou um pouco úmida de suor. Pelo menos o barão havia pagado o valor integral pelo trabalho que ela havia feito, e sem nenhum sinal do Sr. Stewart ela não precisou entregar nada a ele. Não que ela precisasse mais se preocupar com ele. Não agora que todos sabiam a verdade.

A hora seguinte foi um borrão entre seus baús, missivas para Greg e Bruce agradecendo a eles, e para onde encaminhar suas ferramentas e papelada, esboços e equipamentos que ela havia deixado no local da escavação.

Ela havia pedido aos lacaios que descessem suas coisas pela escada dos criados, assim ela partiria pelos estábulos. Ela não queria ver nenhum dos convidados, nem o barão que cedeu como uma rocha sob pressão quando a avó de Lorde Duncannon exigiu que ele a rechaçasse e a despedisse.

Hallie deu uma última volta pelo cômodo, certificando-se de não ter deixado nada para trás. Ela se virou e pegou o casaco e a boina de lã que ela sempre preferia usar. Willow a observava, seus olhos

eram uma janela de decepção, e Hallie pegou suas mãos, apertando-as.

— Nada disso. Vou fazer o que disse e ter pensamentos positivos em relação à minha prima. Tenho certeza de que vai ficar bem, e melhorará ainda mais rápido quando eu chegar.

— Vou sentir saudades. Partiremos na próxima semana para Londres, então, por favor, escreva-me e diga-me como está sua prima e, claro, você.

— Escreverei. Eu prometo.

Hallie seguiu para as escadas dos criados, seus passos diminuindo quando ela avistou Lorde Duncannon esperando por ela no corredor.

— Você está partindo.

Não era uma pergunta, e ela assentiu com a cabeça, a raiva fervilhando em seu sangue ao vê-lo. O que ele acreditava conseguir ao vê-la de novo? Ele havia deixado a própria opinião bem clara no local da escavação. Com certeza, ela não precisava que ele repetisse.

— Estou, se me der licença. — ela disse, passando por ele e começando a descer as escadas.

— Hallie. — ele a chamou. — Se as coisas fossem diferentes...

Hallie ajustou a pequena valise que levava na mão, ignorando-o.

Ela engoliu o nó na garganta que as palavras dele provocaram. Sem mais lágrimas, sem mais dor de cabeça. Ela voltaria para casa, cuidaria para que a prima se recuperasse e voltaria para Felday. Se esqueceria do visconde Duncannon e enterraria tudo que ele a fez sentir e desejar. Havia apenas um homem em sua vida daquele ponto em diante. O filho dela.

O resto poderia ir para o diabo. O quanto antes melhor.


CAPÍTULO 18

H ALLIE CHEGOU à Berkshire, à casa de sua prima, na tarde seguinte. Para sua felicidade, Willow foi fiel à sua palavra e o condutor do Barão Bankes a levou direto à porta da prima e a ajudou a levar todos os baús para dentro da casa.

A única criada que sua prima podia pagar ajudou a colocar suas coisas dentro.

— Como está Charlotte, Betty? Onde está Ammon? — ela perguntou, desamarrando o chapéu e colocando-o em um aparador próximo. A casa da prima era maior do que sua casa em Felday.

Sua única parente havia se casado com um cavalheiro que era fazendeiro e, após a morte dele na fazenda, ficou com os rendimentos da terra e da casa. Sem filhos, ela ficou feliz em ajudar Hallie quando ela voltou para casa, grávida e sem nenhum apoio.

Devia muito a ela. Na verdade, nunca seria capaz de retribuir a bondade da prima.

— Ela está lá em cima, Srta. Evans. Ammon está sentado com ela. Quis contar a ela tudo o que aconteceu na escola hoje.

Claro, era quarta-feira, dia em que Ammon frequentava a escola paroquial local. Ele estava com só quatro anos, mas era brilhante para a idade.

— É bom que ela esteja acordada e falando. Pensei que a situação seria bem mais grave.

— Ó, não, Srta. Evans. É apenas um pequeno resfriado. — a criada analisou seus muitos baús. — Vai ficar por algum tempo, Srta. Evans? Arrumarei o quarto de hóspedes, caso sim. Peço desculpas, mas não a estávamos esperando.

Hallie franziu a testa.

Não estavam?

— Por favor, se puder. Ficarei por vários dias.

Hallie começou a subir as escadas. Como poderiam não saber de sua chegada se haviam escrito uma missiva? Ela bateu na porta de madeira do quarto e ouviu Ammon, a vozinha animada contando da árvore que ele e um amigo tentaram subir:

— Posso entrar?

— Mamãe! — Ammon saltou da cadeira e correu na direção de Hallie.

Ela se ajoelhou, tomando-o nos braços e abraçando-o com força.

As pequenas mãos agarraram seu pescoço, e Hallie sentiu as lágrimas se formarem por tê-lo ao seu lado outra vez. Ela não iria mais deixá-lo para trás. Não era justo com nenhum dos dois. De alguma forma, ela encontraria trabalho, e seria capaz de mantê-lo por perto.

— Ó, eu senti sua falta, meu querido. — ela disse, se afastando e observando seu rostinho. Olhos, iguais aos de Omar, olhavam para ela e a faziam sentir a falta dele ainda mais. Sentir falta do que poderia ter sido. — Você cresceu. Será um rapazinho muito em breve.

Ammon se desvencilhou dela, ficando mais ereto ao ouvir as palavras da mãe.

— A titia também acha. A Srta. Smith teve que soltar a bainha das minhas calças. Meus tornozelos estavam aparecendo.

Hallie riu, o ergueu no colo e foi se sentar na cama. Não o queria muito longe dela. Ela voltou a atenção para a prima.

— Como está, Charlotte? Recebi uma carta dizendo que você estava muito doente. É verdade?

Charlotte balançou a cabeça, um semblante confuso no rosto.

— Não escrevemos para você essa semana, a última carta foi quinze dias atrás, contando o que eu e Ammon temos feito. Estou resfriada, mas nada sério o bastante para fazê-la voltar para casa.

— Que estranho. — o estômago de Hallie se revirou enquanto ela tentava descobrir quem pode ter enviado a carta. — Se você não enviou, me pergunto quem o fez.

— Ammon, por que você não vai até a Srta. Smith. Tenho quase certeza de que ela me disse que fez alguma guloseima para você no almoço hoje.

Ammon olhou por cima do ombro para Hallie.

— Posso, mamãe?

Ela se inclinou, e o beijou na bochecha.

— Claro, meu querido. Logo estarei lá embaixo com você.

Ele saiu correndo, o som dos pequenos passos na escada fizeram Hallie sorrir.

— Mandando Ammon para baixo, suponho que há algo que você deseja me dizer, Charlotte? — a boca da prima se estreitou em uma linha de descontentamento.

— Há um vai e vem de algumas pessoas na cidade, hospedadas na pousada. São egípcios, e eu os vi observando Ammon quando o peguei na escola paroquial. É coincidência demais. Acho que sabem quem ele é.

Um arrepio percorreu a espinha de Hallie, e o desejo de correr escada abaixo, pegar seu filho e mantê-lo seguro e à vista o tempo todo latejou em suas veias.

— A Srta. Smith sabe que deve ficar de olho nele?

— Claro. Foi ela quem primeiro me contou deles. — Charlotte franziu a testa. — Acredita que estão aqui para levá-lo embora?

— Não vou deixá-los ir a lugar nenhum com meu filho, mas também me recuso a viver com medo. Vou até a pousada hoje,


descobrir o que significa a presença deles. Não permitirei que nossa família se sinta ameaçada, por ninguém.

— Bom, muito bom. — disse a prima que estendeu a mão e apertou a dela. — Passei a amar muito esse menino, e odiaria que o tirassem de nós. Mesmo que seja pela família do pai dele.

Hallie assentiu, tentando esconder o medo que gelava seu sangue. Se a família de Omar estava aqui, somente poderiam querer uma coisa. Sabiam que ele tivera um filho, e queriam o menino no Egito.

ARTHUR ESTAVA sentado na carruagem, quase de volta a Londres, as casas dos arredores da cidade passando por ele. Ele deu pouca atenção, a mente zumbia, em especial o arrependimento acerca de como lidou com a situação com Hallie.

Ele a decepcionou, deu as costas para ela quando deveria ter ficado e sido um pilar de força e apoio. Ele deveria ser chicoteado por julgá-la. Por que era muito bom para homens como ele irem para a cama com quem quisessem e quando desejassem? Hallie não agira dessa forma, ela deu seu coração a um homem no Egito e teve um filho.

Ele se encolheu, apoiando a cabeça nas almofadas.

Não importa o quanto ela o odiasse neste momento, ela não poderia odiá-lo tanto quanto ele se odiava. Ele não apenas a decepcionou, ele se decepcionou também. Lorde Duncannon não era um cavalheiro que julgava, ninguém. A vida era para se viver, para amar e desfrutar. Desde o momento em que conheceu Hallie, seu desejo de viver, de vivenciar e ver o mundo falava de uma alma que não seria domada, e ele não queria que ela fosse contida. Ele

sabia disso, era uma das razões para ele amá-la, e ainda, jogou tal fato na cara dela, disse, de uma forma indireta, que a vida dela era escandalosa e abaixo da dele. Que ela não seria uma esposa adequada.

— Foda-se. — disse ele em voz alta.

Os olhos da avó se arregalaram de maneira incomum, o rosto ficou vermelho.

— Arthur, eu o ouvi bem? Não blasfeme na minha frente. Nem agora, nem nunca.

— Por que não? — ele perguntou, encarando-a. Ele não devia culpar a avó, ela era produto de seu tempo, uma mulher que formara opinião sobre todos, não importava se estivesse certa ou errada. — Eu ferrei tudo e nunca poderei reparar o dano que fiz.

Ela fungou, revirando os olhos e olhou pela janela como se o próprio rei estivesse lá fora para manter sua atenção.

— Suponho que esteja falando da Srta. Evans, a rameira.

— Ela não é uma rameira. Não permitirei que fale assim dela.

— Falarei da maneira que quiser. Ao contrário de você, eu investiguei a vida dela antes de vir buscá-lo em Somerset. Sabia que o filho dela é o único herdeiro da família do falecido Omar El Sayed no Egito? Recebi uma carta muito interessante de um cavalheiro que se interessou pela vida da Srta. Evans. Outro amante enganado, sem dúvida, mas ele me deu algumas informações muito interessantes. Parece que ele escreveu para a família do amante egípcio dela e contou a eles da existência da criança. Estão a caminho da Inglaterra para coletar o menino, ou assim me foi informado na semana passada.

O sangue de Arthur gelou com as palavras da avó.

— Esta carta informando tudo isso, por acaso, era de um Sr.

Stewart?

— Ora, sim, foi. Você o conhece? — ela perguntou, parecendo animada com a chance de os dois conhecerem o homem.

Por Deus, sim, Arthur o conhecia e quando ele colocasse as mãos no Sr. Stewart, ele iria estrangulá-lo para que não pudesse causar mais problemas.

— Você pode não se importar, mas o Sr. Stewart vem chantageando a Srta. Evans há algumas semanas. Ameaçou revelar a identidade do filho, arruinando suas chances de obter renda, tudo porque ele é primo do falecido Lorde Oakes, o mesmo cavalheiro que tentou matar a duquesa de Whitstone. Duvido muito que o duque venha a olhar com bons olhos a qualquer um que ajude o homem. — Arthur viu a insinuação ser entendida pela avó, com o rosto pálido. — Não nos esqueçamos de que a Srta. Evans também é amiga íntima da duquesa.

Os olhos de sua avó se estreitaram.

— Me ameaçar, não importa o quão vago seja, com as palavras, não vai funcionar, meu garoto. Deve admitir seus erros e agir de acordo. A Srta. Evans pode ter sido uma pequena diversão para você enquanto estava no interior, mas nem por cima do meu cadáver, permitirei que ela se torne a próxima Condessa de Duncannon.

— E se eu quiser que ela seja minha esposa? Vai aceitar isso e silenciar sua língua viperina? Eu odiaria ter que enviar você para o interior. E, por favor, minha querida vovó, entenda que minhas palavras não são uma vaga ameaça, mas uma promessa do que está por vir se me causar mais problemas.

— Você, se casar com ela! Como pode fazer isso com sua família? Os Duncannon não se casam com mulheres decaídas.

Você jogará toda a família no poço do escândalo e da libertinagem.

Ele encolheu os ombros, tendo ouvido o suficiente.

— Eu a amo. Sempre a amei, mesmo antes de ela partir para o Egito, e eu pensar que jamais voltaria a vê-la. Creio que não me importa o passado dela, apenas que quero estar em seu futuro. Se ela e o filho me aceitarem.

Jamais na vida ele precisou fazer uma pergunta tão importante.

Ele lutaria para mantê-la em sua vida, e se isso significava que ele se tornaria um pai para o filho dela, então que fosse. Ele não daria às costas a ninguém a quem ela amava. Nem mesmo o filho de outro homem.

Alguns o chamariam de idiota e virariam as costas para ele, e algumas portas em Londres estariam para sempre fechadas para eles por causa dessa escolha, mas ele não se importava. Que essas pessoas fechem suas portas. Arthur sabia que havia alguns que sempre o receberiam, e seria o suficiente. Seus verdadeiros amigos.

— Eu o proíbo, Arthur.

Ele ergueu a sobrancelha ao ouvir o tom da avó, que não admitia discussão.

— Quando eu deixar você em Londres, continuarei viagem até Berkshire e reconquistarei a mulher que adoro, e nada do que você ou que a sociedade digam vai me fazer mudar de ideia. Fico mais feliz quando estou com ela. Não preciso de mais nada.

Ela apontou um dedo nodoso para ele, o rosto pálido.

Ele sentia pesar por fazê-la passar por isso, mas ele sabia da verdade em seu coração. Isto era o correto a se fazer. Seu corpo zumbia com a expectativa de que a vida começasse, e ele sabia quem queria ao seu lado quando isso acontecesse.

— Jamais vou admiti-la em minha casa. Nem qualquer filho que vocês tenham. Deste ponto em diante você está morto para mim.

Ele suspirou, encolhendo os ombros.

— Bem, que pena, avó, porque sou o visconde e chefe da família e, portanto, controlo o dinheiro que sustenta a família. Se punir Hallie por uma vida vivida ao máximo, devo punir você da mesma maneira. É isso o que você realmente quer?

— Como se atreve, seu menino insolente!

A carruagem parou, e Arthur olhou para o lado de fora, estavam parados em frente à casa de Mayfair de sua avó.

— Escreverei para você com os detalhes do meu casamento.

Espero vê-la lá.

A avó saiu da carruagem e, bufando de descontentamento, subiu correndo os degraus da frente da casa. Arthur observou enquanto ela abria a porta, sem dar tempo ao mordomo para sair do caminho, fazendo o homem tropeçar.

Arthur balançou a cabeça, gritou instruções para Berkshire e se acomodou nas almofadas. Se viajassem durante a noite toda e trocassem os cavalos com certa regularidade, ele deveria chegar à casa da prima de Hallie antes do jantar amanhã, talvez um pouco mais tarde.

A tarefa de implorar por perdão a ela não seria fácil. Hallie não seria convencida rápido de que ele estava arrependido, mas ele estava. Lamentava tanto que seu peito doía a cada vez que ele se imaginava sem ela. Ele não perderia esta guerra. Ele iria ganhar a ela e seu amor.

Para ele, não havia outra escolha.


CAPÍTULO 19

H ALLIE ENTROU na taverna da pousada local no final da tarde, o lugar tomado por um estranho silêncio e sem os clientes habituais. Ela ficou grata pelo pequeno sino de latão acima da porta da pousada, que soou assim que ela entrou no salão cheio de mesas e uma lareira, bem acesa, que fazia o ambiente parecer aconchegante e acolhedor.

Um homem robusto e baixo apareceu detrás do bar. Hallie sorriu, esperando que polidez a ajudasse a fazer o taberneiro falar dos hóspedes e trazê-los ali para falar com ela.

— Boa tarde, senhor. Acredito que há hóspedes seus com quem eu preciso conversar. Não são ingleses, e talvez tenham um sotaque forte. Está hospedando alguém assim?

— Ah, sim, sim, senhorita. Mas eles alugaram a propriedade do falecido Sir Garrick ao norte da cidade. Se seguir a estrada em direção à Londres, vire à esquerda cerca de 400 metros e chegará à propriedade num piscar de olhos.

— Havia alguma mulher nesse grupo?

O taberneiro esfregou o queixo barbudo, puxando o tufo de pelo para baixo, como se acariciasse um animal preso ao rosto.

— Não, eram dois cavalheiros muito bem vestidos, mas nenhuma dama que eu tenha visto. Só passaram uma noite aqui antes de conseguirem fechar o contrato para a casa.

— Obrigada pela ajuda. Partirei para lá agora mesmo.

Hallie voltou para o pátio do estábulo da pousada e, usando um bloco de montar, saltou nas costas da única montaria da prima. Ela deu um tapinha no cavalo, esperando que a besta não a fizesse cair.

Era em momentos como esse que ela desejava ser uma amazona tão boa quanto Ava. Infelizmente, não era uma especialidade dela. Ela subiu a estrada ao norte e virou à esquerda quando chegou a uma estrada muito usada, o telhado da propriedade apenas visível acima das copas das árvores.

Ela sentiu o nervosismo aumentar ao pensar que as pessoas poderiam muito bem ser a família de Omar, a mãe ou pai dele. Eram uma família muito rica e influente no Egito. A presença deles aqui significava apenas uma coisa. Haviam ficado sabendo de Ammon e o queriam.

Ela nunca negaria aos outros o que queriam, é claro que permitiria que visitassem Ammon. Se Omar não a tivesse alertado para não entrar em contato com eles, ela mesma teria feito isso, mas ele a fez prometer que a união deles seria um segredo. A família dele, como ele a explicou, nunca entenderia o amor que nutriam um pelo outro.

Hallie havia cumprido a promessa, mas talvez com a morte de Omar seus pais tivessem abrandado. Perder um filho mudava as pessoas, talvez tenha mudado a família de Omar no que diz respeito ao que pensar dela.

Levou apenas alguns minutos antes que ela puxasse o cavalo já na frente da casa. Ela amarrou o animal no corrimão da escada da frente. O lugar parecia deserto, nenhum sinal de jardineiros ou funcionários na propriedade. Ela olhou para a construção, uma veneziana mal pendurada em sua dobradiça quebrada ameaçava cair, e os degraus pareciam não ver uma vassoura há alguns meses.

Hallie bateu a aldrava de latão na porta, um eco oco percorreu a casa antes que os passos cortados de alguém fossem ouvidos de lá de dentro. Ela respirou fundo para se acalmar, pronta para discutir e

negociar com a família de Omar se necessário, mas não desmoronaria sob a pressão daquela família importante.

A porta se abriu, e ela cambaleou para trás, medo crescente dentro dela.

— Sr. Stewart. O que está fazendo aqui?

Ele saiu, um passo cauteloso como se ela fosse fugir a qualquer momento. A ideia passou pela cabeça dela, mas o fato de que ela não era rápida e seu cavalo estar amarrado bem atrás do Sr.

Stewart estava, tornava tal opção inútil.

— Senhorita Evans. Imaginei que viria. É uma mulher inteligente, admito.

Ela franziu a testa, confusa com a virada dos eventos.

Esperava ver a família de Omar aqui, mas então talvez...

— Você fez parecer que a família do meu filho veio do Egito.

Talvez seja eu quem deva dizer que você é um homem inteligente.

Cruel também, creio eu.

Ele riu, o som misturado com ameaça.

— Ó, eu sou todas essas coisas. Fiz exatamente o que disse. Fiz parecer que a família do seu filho estava aqui para pegá-lo. Mas nem mesmo eu conseguiria avisar a eles, rápido o suficiente, de que descobri onde seu filho estava, ou trazê-los aqui para tirá-lo de você. Porém, mandei um recado a eles sim. Portanto, estou certo de que o seu filho será bem cuidado no futuro. Quanto a você, a história é outra.

— Como assim? — ela recuou, e ele a seguiu como um leão perseguindo uma presa.

— Espero que tenham se despedido, pois nunca mais irá vê-lo.

Ele agarrou-a pelo braço, puxando-a em direção à porta. — Entre, minha querida. Preparei um quarto só para você.

Hallie tentou se soltar, mas o aperto dele, mais forte e firme do que ela pensava dado o corpo magro dele, apenas se intensificou.

— Eu não vou a lugar nenhum com você.

— Eu não vou a lugar nenhum com você também. Vou sair daqui hoje, mas você, minha querida, será bem recebida lá embaixo nas entranhas da casa. Este lugar era propriedade do falecido Sir Garrick. A família deles está discutindo quem vai herdar a casa e as terras. A divergência deve durar alguns meses, o que tenho certeza será tempo suficiente para você murchar e morrer de fome, sozinha e no frio. Assim como merece, já que ajudou a ceifar a vida do meu primo.

Ele a puxou em direção a uma porta que, se não estivesse aberta, Hallie não teria visto. Fundia-se com os painéis do cômodo quando fechada, e se ele a colocasse lá, ninguém iria ouvir ou procurar por ela em tal lugar. Ninguém além do taberneiro sabia que ela estava aqui, e ela não deu um nome ao homem.

Pânico se apoderou dela, e ela se desvencilhou da mão dele, escorregando no chão de parquet empoeirado enquanto tentava correr para a porta. As saias, malditas fossem, prenderam-se nas pernas, e ela caiu de joelhos.

O Sr. Stewart a agarrou por trás, erguendo-a contra o peito.

— Xiu. Xiu, minha querida. Só vai sentir fome por alguns dias.

Depois disso, apenas se sentirá fraca e cansada. Em algum momento, nem acordada vai estar. Eu poderia botar fogo na casa, para que tivesse um fim como o do meu primo, mas tenho pena de você, não farei isso. Eu não um monstro desses.

Ele riu das próprias palavras, e Hallie lutou para manter a calma.

Não entraria em pânico. Ela bateu o pé com força contra o dele, e ele a soltou, praguejando. Hallie aproveitou a oportunidade para

correr, desta vez concentrando-se nos pés e nas pernas, certificando-se de que permanecessem firmes.

Dor cortou sua cabeça quando ele a agarrou pelo cabelo e a puxou para trás. Ela caiu com um baque no chão, a cabeça girou para trás e sua visão se tornou um borrão. Ele se aproximou dela, a agarrou pelo queixo e apertou sua boca até que o gosto acobreado de sangue escorresse pela língua dela.

Ela choramingou.

— Não tente escapar de novo, sua megera. Não vou ser tão gentil da próxima vez.

Lágrimas turvavam sua visão, e ele a puxou para cima, empurrando-a em direção à porta que levava ao porão e quem sabe o que mais. A escada que descia era feita de pedra e parecia muito mais velha do que a própria estrutura da casa.

— Sua mente inteligente está se perguntando se esta é a adega original da casa?

Ele olhou para ela, o sorriso fácil e polidez de volta, em vez da ira mortal e ódio que ela havia detectado segundos antes. Como um homem podia ser tão mutável era impossível de imaginar e algo que ela não queria presenciar nunca mais. Não que houvesse chances se ela fosse enterrada viva ali.

— Havia uma castelo aqui, no século XI, eu acredito. A adega é tudo o que resta, e quando a casa foi construída, utilizaram a fundação existente. Perfeito para você, minha querida. Conforme definha, se quiser pode estudar o lugar. Não sou tão bárbaro a ponto de deixá-la no escuro. Arrumei velas para que você possa enxergar o ambiente durante sua estada. Não fica feliz? — ele perguntou sorrindo.

Hallie fechou a boca e manteve as mãos imóveis ao lado do corpo para não arrancar os olhos dele. O desgraçado estava louco.

Tão louco quanto o primo. Deve haver algum tipo de transtorno na família para que esses primos agissem de forma tão cruel e mortal.

Lorde Duncannon surgiu em sua mente, a compreensão de que ela nunca mais voltaria a vê-lo. Que seu lindo filho nunca saberia para onde a mãe foi ou por quê.

As escadas desciam em espiral, e mesmo se gritasse por socorro até que a voz ficasse rouca, ninguém jamais a ouviria. Na verdade, era uma tumba. Uma tumba para ela. E seu algoz estava certo, era mesmo adequada, já que ela havia passado a vida estudando os mortos em lugares como aquele, agora se juntaria a eles.

O Sr. Stewart acendeu algumas arandelas na parede que ladeavam o caminho até que a visão de uma porta de madeira para uma sala no final do corredor, se revelou. Hallie esfregou os braços, a escuridão se fechando em torno dela, ameaçando deixar o pânico subir como uma espiral em sua mente. Ela não iria sucumbir ao pânico. Entrar em pânico significava morte.

Talvez mais cedo do que tarde.

A prima dela enviaria um grupo de busca. Ela a encontraria ali.

Este não era o fim. O Sr. Stewart a empurrou para dentro do cômodo e bateu a porta com força. Havia uma vela acesa no canto, e ela correu para a luz quando o som de fechaduras de aço deslizando na pedra do lado de fora.

— Adeus, Srta. Evans. Desejo a você uma morte agradável. —

ela o ouviu dizer, a voz abafada pela espessura da porta.

Hallie percorreu a sala com a vela, procurando no vazio por alguma saída, por algo para acender a luz. O medo gelou seu sangue, e ela estremeceu. Depois de toda aquela conversa de não a deixar no escuro, ele havia deixado uma vela para ela, porém nada para acendê-la.


Iria morrer, sozinha e no escuro. Ela se encostou na parede, sentindo os joelhos de repente menos do que firmes e deslizou para se sentar no chão. A pedra arranhou suas costas, mas ela não se importou. Não havia como sair dessa confusão. Reprimiu um soluço e lutou para não chorar. Era uma mulher forte, inteligente e corajosa.

Não iria ceder, não agora.

Se ela estivesse aqui dentro de uma semana e, ainda assim, ninguém viesse, então poderia se deitar e esperar pela morte, mas até então, lutaria como pudesse para permanecer neste mundo. Por mais cruel e injusto que fosse, ainda era melhor do que ser presa e enterrada viva como ela estava agora.

ARTHUR CHEGOU ao pequeno vilarejo de Slough na tarde seguinte, assim que o sol começava a se pôr no céu oriental. Pediu informações na cidade, e uma jovem com uma cesta de pão e outros alimentos apontou para ele continuar ao longo da estrada em que estava até chegar à pequena cabana com telhado de palha nos arredores da cidade, a casa da prima da Srta. Evans.

Na estalagem próxima, em que ele se hospedou mais cedo, ele pediu sopa, pão e queijo para serem embalados e levados para a residência, caso fosse necessário. Não sabia com exatidão a gravidade dos acontecimentos, mas uma criada da pousada mencionou uma Sra. Nibley, prima de Hallie, que havia adoecido há uma semana ou mais e ainda convalescia.

Arthur chegou ao chalé que contava com uma grande porta da frente e duas janelas de cada lado. Era estranho, mas não tão pequeno quanto ele pensava que seria. O jardim, quase todo

coberto de legumes, parecia bem cuidado, as janelas brilhavam limpas ao sol da tarde.

Ele bateu na porta, o sangue gelado pela possibilidade de que Hallie ficasse descontente por ele a ter seguido. Que ela não iria querer vê-lo e mandá-lo embora. Ele até a compreendia. Ele não agiria diferente se a situação fosse inversa. A ira dela era mais do que tudo merecida.

Ele só esperava que a partir daquela dor e desilusão, eles pudessem reconstruir uma vida. Juntos como uma família. Ele não permitiria que a família do filho dela levasse o menino para longe.

Não depois de tudo que ela fez para mantê-lo seguro e protegido.

As palavras de sua avó o perseguiram no dia anterior, e ele não conseguia deixar de temer que já fosse tarde demais. Que a vingança do Sr. Stewart já havia feito suas vítimas, e o filho estivesse perdido para ela. Em um barco indo para o leste.

Arthur parou diante da porta vermelha.

Respirou forte e bateu. Ajeitou a gravata quando a porta se abriu, mas em vez de haver um criado ou Hallie abrindo a porta, um garotinho olhou para ele com grandes olhos castanhos que analisavam todas as suas feições e o avaliavam.

O menino era, sem dúvida, de Hallie, ele via os trejeitos dela no rosto do menino, sempre curioso para saber mais. Algo na região de seu coração apertou, e ele se ajoelhou, sorrindo, para tentar deixar o menino à vontade.

— Olá, sou Arthur Howard, Visconde Duncannon. Gostaria de saber se a Srta. Hallie Evans está aqui.

O menino negou com a cabeça, mas abriu mais a porta.

Arthur entrou e observou a casa.

Estava tão limpa e bem conservado por dentro quanto estava por fora. A pequena sala de estar que havia atrás da porta possuía uma

grande lareira e um sofá de aparência confortável com um padrão floral. Ele foi até a lareira e parou diante das chamas, aquecendo as costas e as mãos.

O garotinho correu para os fundos da casa e, em um momento, a batida constante de passos soou no piso de madeira polida.

— Posso ajudá-lo... — as palavras da jovem vacilaram ao vê-lo, e ela franziu a testa.

Ele a analisou, o vestido matinal modesto um pouco gasto e coberto por um avental pouco lisonjeiro. Seu cabelo estava torto e parecia que faltavam metade dos grampos. Mesmo assim, ele percebeu que era parente de Hallie. Ao que parecia, ele estava condenado a encontrar pessoas que o lembrassem do grave erro que havia cometido. De perder a mulher que amava.

— Sou Lorde Duncannon.

— Eu sei quem você é, meu senhor. A Srta. Evans não está.

A resposta abrupta dela foi mais do que ele merecia, mas ele precisava falar com Hallie. E implorar perdão. Prometer a ela tudo o que ela sempre quis, se ao menos ela o aceitasse. Aceitasse ser a esposa dele.

— Estou procurando por ela. Um assunto de grande importância, que caso esteja sentindo-se bem, posso compartilhar com você.

Ele olhou para o garotinho e sorriu quando a boca dele se abriu, observando a interação com entusiasmo. Arthur piscou para ele, sorrindo quando um pequeno sorriso torceu os lábios do garoto.

— A sós se você preferir, Srta. Nibley, assim presumo.

— Sra. Nibley. — ela olhou para o menino, virando-o para que seus olhos se encontrassem. — Vá até a cozinha e ajude a Srta.

Smith com os biscoitos. Tenho certeza de que estão quase prontos para ir ao forno. — antes de se sentar, ela gesticulou para que

Arthur se sentasse em um dos sofás, e antes de falar, ajeitou as saias e o encarou. — O que quer, meu senhor?

— Primeiro, vim pedir desculpas à Srta. Evans, mas também contar a ela o que descobri sobre a família do filho dela. Acredito que podem estar vindo do exterior para levar o menino. Eu preciso avisá-la.

A Sra. Nibley se inclinou para frente, as mãos agarradas com força no colo.

— Eles já estão aqui, e não sei o que fazer. Hallie confia no senhor? Você sabe de tudo?

A pergunta o envergonhou. Hallie confiou nele até certo ponto, mas depois ele a rechaçou como todos os outros, por seu passado.

Ele se encolheu, era o pior dos homens.

— Ela confiava, e desejo ser digno dessa confiança de novo, se ela me perdoar. Mas, por favor, me diga o que sabe. Talvez eu possa ajudar antes que tentem fazer algo.

— Nós vimos homens pela cidade. Homens que, sem dúvidas, são estrangeiros. Estão observando Ammon há vários dias.

Estavam hospedados na pousada local, e Hallie foi lá ontem. O

taberneiro falou da casa que estes senhores alugaram fora da cidade, na estrada norte para Londres, e ela foi para lá. Sei que sim, pois encontrei meu cavalo vagando pelo terreno no dia seguinte, mas não consigo encontrá-la, nem aos homens. Não há nenhum vestígio de ninguém na casa. A propriedade era do falecido Sir Garrick. A família está envolvida em um processo pela herança, a casa não é habitada há meses. Decerto não teria sido alugada para ninguém, então o taberneiro me dizer que é para onde os cavalheiros foram não faz sentido.

Um calafrio desceu pela espinha de Arthur ao receber essa informação. Sua avó disse que o Sr. Stewart havia escrito para a

família de Omar, mas tal aviso poderia levar meses para chegar até eles antes que agissem com base nas notícias. Mas havia pessoas aqui agora. Descobriram a criança por outros meios, ou o Sr.

Stewart mentira e estava por trás do desaparecimento de Hallie.

— Onde fica esta casa?

A Sra. Nibley se levantou, foi para a cozinha e tirou o avental enquanto caminhava.

— Senhorita Smith, vou levar Lorde Duncannon para a propriedade de Sir Garrick. Acreditamos que podemos encontrar o que procuramos por lá

— O que procuram, tia? — o menino perguntou, olhando para ela com interesse. — Arthur observou enquanto ela se abaixava, envolvendo as bochechas dele com as mãos. — É a mamãe? Ela disse que me levaria para pescar antes de voltar a partir.

Raiva latejava nas veias de Arthur, pois se Hallie tivesse sido ferida, se tivesse sido tirada de seu filho e dele, ele mataria quem quer fosse o responsável. É melhor o Sr. Stewart estar a quilômetros de distância deles, pois quando ele alcançasse o demônio, teria sorte de sobreviver ao ataque.

— Sua mãe estará em casa logo. Eu prometo. Agora, vá ajudar a Srta. Smith. Voltarei em breve.

Usando a carruagem de Arthur, a Sra. Nibley deu instruções para a casa e, meia hora depois, eles pararam diante de uma casa grande e imponente que precisava de alguns reparos.

— Foi aqui que encontrei meu cavalo vagando ontem. — disse a Sra. Nibley, apontando para a grama crescida diante da propriedade. — Escrevi para as amigas dela, da escola, pedindo ajuda quando me vi ser incapaz de encontrá-la. Espero que cheguem aqui dentro de alguns dias para ajudar a procurá-la aqui, ou em Londres. Não é do feitio de Hallie agir assim. Não posso

deixar de pensar que esses dois homens que vimos na cidade a levaram para algum lugar. Por que a levariam, e não a Ammon, eu não consigo entender.

Nem Arthur.

Não fazia sentido. Ele mexeu na maçaneta e encontrou a porta destrancada. Empurrando-a, ele gritou. Não ouvindo resposta, ele entrou, olhando ao redor do grande saguão.

— Hallie! — ele gritou, parando para ver se conseguia ouvi-la responder, ele se virou para a prima dela. — Vamos vasculhar a casa e partir daí. Vou começar descendo, suba e vasculhe os quartos e os aposentos dos criados.

— Muito bom.

Arthur observou a Sra. Nibley subir as escadas correndo. Ele se virou para o primeiro cômodo à sua esquerda, uma biblioteca. Os livros pareciam estar como ficaram desde o momento da morte de Sir Garrick. A casa não valeria nada se a família continuasse a brigar por muito mais tempo.

Ele chamou Hallie enquanto ia de cômodo em cômodo, verificando armários e portas trancadas que por vezes precisaram ser abertas com força. A cozinha possuía um pequeno porão, mas estava vazio, exceto por alguns blocos de queijo que haviam sido deixados para apodrecer.

Ele foi para o porão, caminhando pela parede e sentindo-a. Era feito de pedra, grandes blocos cinzentos. A casa era feita de arenito, mas as paredes que o cercavam diziam que a casa foi construída em cima de uma estrutura mais antiga.

Bem mais antiga inclusive.

Arthur correu de volta para o saguão, gritando para a Sra. Nibley, que começou a descer as escadas com seus gritos.

— O que é, meu senhor? Encontrou Hallie?

— Esta casa sempre esteve aqui, ou já houve uma estrutura mais antiga nesta área?

Os olhos dela brilharam.

— Sim, você está certo. Esta propriedade foi construída com a fundação de um antigo castelo.

Eles se encararam um momento antes que Arthur reconhecesse o momento em que a Sra. Nibley teve o mesmo pensamento que ele. Os olhos dela se arregalaram, lembrando-o de Hallie e fazendo-o sentir ainda mais falta dela.

— Um castelo costuma ter uma masmorra.

— Masmorra. — disse a Sra. Nibley ao mesmo tempo que Arthur, olhando em volta.

— Não está na cozinha. — ele comunicou, antes de subir as escadas e abrir a porta embaixo da escada central.

O espaço estava vazio, exceto por alguns trapos de limpeza e uma velha vassoura empoeirada. Ele voltou para o foyer, analisando chão.

Talvez um alçapão?

Arthur franziu a testa, notando que a poeira no chão parecia mais dispersa do que pela movimentação apenas deles dois. Ele deu um passo para o lado, inspecionando o piso de outro ângulo e seguiu a perturbação em direção à parede, ali parou.

— Mas que diabos... — ele murmurou, indo até a parede e sentindo os painéis de madeira, tateou ao longo dos cordões, não sentia nenhuma pequena alavanca ou fechadura escondida na madeira.

— Empurre a parede. — disse a Sra. Nibley, juntando-se a ele e empurrando ao longo da parede como se esperasse que se abrisse.

Ele fez o mesmo e, para sua surpresa, a parede se soltou, e uma porta se abriu ao longo do painel, revelando outra porta. Arthur

agarrou uma vela próxima, acendendo-a depressa com a pederneira ao lado dela e segurou-a no vazio negro.

Escadas...

— Hallie! — ele gritou, mas sem resposta. — Espere aqui, Sra.

Nibley. Se eu não voltar em uma hora, vá até a cidade e peça ajuda.

Não tenho certeza de quão estável e segura essa estrutura antiga pode ser. Melhor que não me siga.

— Claro. — ela disse sem questionar.

Arthur adentrou a parte antiga da construção e desceu as escadas em espiral, gastas no centro por centenas de anos de uso.

O ar estava frio, úmido e havia água pingando pela pedra quanto mais fundo ele descia.

No final da escada, que ele pensou que nunca terminaria, chegou a um espaço aberto que levava a um corredor mais longo.

Ele balançou a cabeça, odiando a ideia de que Hallie pudesse estar aqui. Não era lugar para ninguém. Até Arthur sentiu o arrepio do passado rastejar em sua pele e sussurrar para ele se retirar. Mais à frente, no escuro, uma porta apareceu. Ele ergueu a vela, não havia nenhuma luz vindo do espaço.

— Hallie, você está aqui?

Um farfalhar e depois duas batidas fortes soaram do outro lado da porta. Ele se acalmou, seu coração batendo forte nos ouvidos, antes de ouvir o grito feminino de seu nome. Ele correu para a porta, tomando cuidado para não apagar a vela antes de destrancá-la e abri-la.

Assim que ele a abriu, foi engolfado por um abraço forte, os braços tão apertados em volta do pescoço que ele pensou que poderia desmaiar por falta de ar. Arthur tirou Hallie da cela, abraçando-a, esfregando suas costas e tentando conter o medo que

ele conseguia sentir pulsando do corpo dela. Sua pele estava gelada, e ela tremia em seu abraço.

— Estou aqui. Encontrei você. — ele disse, beijando o topo da cabeça dela, murmurando pensamentos calmantes de estar ao sol em alguns minutos. De ver o filho outra vez.

— Minha vela apagou, e eu não conseguia enxergar. Não conseguia enxergar nada.

O soluço dela rasgou seu coração, e ele jurou vingar-se do desgraçado que havia feito isso. Lágrimas brotaram nos olhos dele, que respirou fundo para se acalmar, precisava ser forte.

— Venha. — ele passou o braço pela cintura dela e, pegando a vela, voltou para a escada. — Vamos levá-la para casa.

— Eu ia perguntar como você me encontrou, mas você está certo, tudo que quero é sair daqui, por favor. Só preciso sentir o sol na pele e ver meu filho.

— Sei que sim. — eles subiram as escadas e, à medida que se aproximavam do saguão, a escada começou a aparecer sob o sol do lado de fora. — Quase lá, Hallie. Não vou deixar nada acontecer com você. Você está segura comigo.

Ele manteria essa promessa e descobriria quem havia feito isso a ela, e mataria o desgraçado.


CAPÍTULO 20

H ALLIE ACORDOU CEDO na manhã seguinte, o sol entrava pela janela do quarto e a tirou do sono. Ela rolou de costas, com o quadril dolorido de ficar deitada no frio chão de pedra da masmorra por quase dois dias. Pensar que ainda poderia estar lá, de que ninguém jamais iria encontrá-la fez um tremor frio percorrer sua espinha.

Ela olhou ao redor do quarto, pensando em Lorde Duncannon, e o encontrou dormindo em uma cadeira ao lado da cama, a cabeça recostada no encosto, a boca um pouco aberta ao dormir. Mesmo desgrenhado como estava agora, ainda era o inglês mais bonito que ela já conheceu e, ontem, quando ouviu seu próprio nome ser chamado pela voz dele, sentiu que poderia começar a chorar de alívio.

Bem, talvez ela possa ter chorado um pouco.

Como se sentisse que ela o observava, ele abriu os olhos, as órbitas azuis com as pálpebras pesadas, o cabelo torto e espetado em alguns lugares. Um desejo de correr os dedos por seus cabelos loiros e domar aquela juba a oprimiu, e ela contemplou tais sentimentos e o que significavam, mesmo agora, depois daquela discussão terrível.

— Você ficou.

Ele esfregou o queixo com a mão, sentando-se e apoiando-se nos joelhos.

— Como se sente esta manhã?

Hallie se sentou e se encostou na cabeceira da cama, puxando os cobertores até o peito.

— Estou dolorida, meu quadril está machucado de dormir no chão, e é possível que alguns músculos estejam distendidos. Houve uma pequena altercação antes de eu ser jogada na masmorra.

Arthur rosnou com as palavras dela.

— Quem fez isso a você, Hallie? Eu preciso saber.

— O sr. Stewart.

Lembrar-se do que aquele homem a fez passar não a fez ter nenhum impedimento em contar tudo a Arthur, ele merecia saber quem e como acontece, não era um segredo que ela pudesse esconder dele. Nunca mais esconderia nada dele:

— Ele contratou dois homens que pareciam ser estrangeiros para vigiarem meu filho. Eles o fizeram o bastante para que se tornasse óbvio para minha prima e sua funcionária. Escreveram para eu voltar para cá, mas eu já havia saído para a casa do barão quando a missiva chegou. E, no mesmo dia em que o barão me convidou a me retirar da propriedade dele, eu recebi uma carta informando que minha prima estava doente. Todas as mentiras que o Sr. Stewart inventou para me fazer voltar para Berkshire.

Ele se encolheu com a lembrança de seu fracasso.

— E depois?

— Os homens em Slough nos fizeram pensar que a família de Omar estava aqui. Fui confrontá-los na estalagem, mas disseram-me que haviam alugado a propriedade de Sir Garrick. Quando cheguei, percebi meu erro. Não passava de mais uma ameaça do Sr. Stewart, uma manobra para me deixar sozinha. Nunca vi os outros dois homens de quem minha prima falou, de modo que acredito que eram bandidos contratados. O Sr. Stewart me trancou na masmorra sem intenção de voltar. Se não tivesse me encontrado...

Um estremecimento sacudiu o corpo dela. A ideia de ser enterrada viva, bem abaixo do solo, onde ninguém pudesse ouvir seus gritos de socorro, fez seu estômago revirar.

— Eu vou matá-lo.

Ela sentiu calor penetrar seu corpo antes a intenção dele de defendê-la. Ela o observou por um momento, ele também a olhava.

A preocupação e o calor nos olhos dele a fizeram se perguntar se ele havia mudado de ideia. O fato de ele a ter encontrado a fazia pensar que sim.

— Por que você está aqui, meu senhor?

Ele se levantou e veio se sentar na beira da cama dela. Pegou-a pela mão.

— Porque eu estava errado. Não deveria ter julgado você como fiz. Não deveria ter colocado o que minha família pensava, o que a sociedade pensaria, acima do que eu sentia. Eu me apaixonei por você. Você não seria a primeira mulher a ter uma vida antes do casamento. Nunca usarei isso contra você. Juro pela minha vida que não vou.

Hallie estudou as mãos entrelaçadas dos dois.

— Sua família nunca vai me aceitar. Já é ruim o suficiente eu ser pobre e não ser de uma linhagem sanguínea importante, mas tenho um filho. Um que nasceu fora do casamento, um filho mestiço. Não estou certa de que você estaria preparado para o que isso representa para você e para a sua família. Por mais progressista que você possa ser, ou esteja tentando ser, a sociedade é cruel e há aqueles que andam por ela que nunca irão recebê-lo novamente em suas casas, ou oferecer amizade a meu filho quando chegar a hora de ele tomar o lugar dele nesse mundo.

— Vou lutar todos os dias, pelo resto da minha vida, para garantir que Ammon seja tratado com o respeito que ele merece.

— Vai mesmo, Arthur? Ou está apenas dizendo tudo o que eu desejo ouvir? Lá na propriedade do Barão Bankes, você me enumerou todas as razões para não funcionar entre nós. Não sou idiota. Sei que uma das razões é meu filho ter nascido fora do casamento e ter um egípcio como pai. Não vou permitir que se ressinta com ele se os outros nos virarem as costas. Caso faça isso, não importa o escândalo, nosso casamento chegaria ao fim. Então, se está sendo honesto no que diz, deve ser sincero e de coração.

— Sim, Hallie. Com minha alma, nunca vou decepcionar você.

Ela queria acreditar nele, mas ele era um lorde, um visconde.

Casar-se com ela significaria muitos sacrifícios. Entregar-se a ele, permitir que ele se tornasse a figura paterna do filho dela, em tão tenra idade era uma aposta da qual ela não estava certa. Ela brincou com a roupa de cama, incapaz de encontrar o olhar dele.

Muitas lembranças vieram à cabeça, as palavras ditas por ele antes, a declaração de Arthur agora. Negar-se de tudo o que ele a fez sentir. A recusa em aceitar que seu coração havia sido tocado mais uma vez. Tudo era confuso e complicado em sua mente.

A porta do quarto se abriu, e Ammon entrou correndo, pulou na cama dela e a envolveu pelo pescoço com os pequenos braços. Ela o puxou para um abraço, inspirando fundo nos cabelos dele. Tê-lo de volta em seus braços, revê-lo era o melhor remédio para seus músculos doloridos e quadril machucado.

— Mamãe, você está de volta. Pensei que havia partido de novo.

— Estou aqui agora, meu querido, e nunca mais nos separaremos.

Ele se afastou, e ela tirou uma mecha de cabelo do olho do filho.

Ele tinha os olhos do pai, um rico castanho com manchas douradas que a lembrariam para sempre da quente terra egípcia. Como se

lembrando que havia outra pessoa no quarto, Ammon se virou para Arthur, sorrindo.

— Bom dia, Lorde Duncannon. Obrigado por trazer minha mãe para casa.

Hallie observou as reações de Arthur ao filho e não viu nada além de doce diversão e interesse em suas orbes azuis. Nenhum cálculo sobre o que fazer para tirá-lo de vista, para manter o filho dela escondido da esfera social que circulariam. Lorde Duncannon apenas observava o filho dela como uma criança gentil que estava feliz por ter a mãe de volta e sorriu.

— Não há de quê, Ammon. Eu falei que a traria para casa, não falei?

— Falou. Quando a Srta. Smith me explicou o que era um lorde, imaginei que você não falharia.

Arthur riu, e Hallie sorriu ante a conversa.

O filho dela, sempre um menino curioso, sentou-se com as pernas cruzadas na cama e olhou entre eles, os olhos se estreitando em pensamento.

— Você ama minha mãe.

Hallie piscou para clarear a visão turva provocada pela declaração do menino. Por que chorava pela fala dele, não sabia dizer. Medo de que ele negue tais sentimentos, talvez, ou pior, afirme que sim.

— Eu amo muito sua mãe, mas agi como um tolo nos últimos dias, e você me encontra, Mestre Ammon, rastejando aos pés de sua mãe, implorando por perdão

Ela sentiu um sorriso de formar nos lábios e suspirou.

— Mamãe, você deveria perdoá-lo. Ele parece triste, e você sempre me diz que quando as pessoas estão tristes, devemos tentar fazê-las felizes. Acredito que se você se casar com ele, ele

ficará feliz. — o filho balançava a cabeça como se fosse a melhor das ideias.

— Creio que Ammon está correto. Você deveria se casar comigo e me fazer feliz. E fazer você mesma feliz também.

Hallie olhou para o filho, o rostinho iluminado de esperança.

Quanto a Arthur, seus olhos se turvaram de incerteza com o silêncio contínuo dela. Ela mordeu o lábio, confusa se deveria arriscar o coração uma segunda vez. A memória de Arthur puxando-a para os braços assim que a encontrou na masmorra atravessou seus pensamentos. Ele havia ido atrás dela. A salvou de uma morte terrível e agonizante.

— Prometa-me que nunca vai me decepcionar, Lorde Duncannon, e eu me casarei com você.

Ele sorriu enquanto Ammon saltitava de alegria, batendo palmas.

Arthur puxou o filho dela para um abraço de celebração, e lágrimas que tentava segurar caíram despercebidas. Ela nunca havia visto seu filho ser abraçado por um homem, e não qualquer homem, mas seu homem. Seu futuro marido.

Arthur fuxicou dentro do bolso do casaco, e tirou uma pequena caixa antes de mostrar a ela.

— Case-se comigo, minha linda, inteligente e amorosa Hallie.

— Sim, sim, sim. — o filho aplaudiu, rindo.

Hallie olhou para o anel de diamante, um amarelo solitário. Ela nunca havia visto nada tão bonito. Ela fungou, assentindo.

— Sim, eu me casarei com você, meu compreensivo, amoroso e protetor Arthur.

Ela sorriu quando ele a puxou para um abraço feroz, beijando-a como se não houvesse amanhã, sem se importar com ninguém à volta deles. O filho dela fez um som de nojo, e ela o ouviu sair correndo do quarto, gritando pela prima.

— Ammon parece bem satisfeito. — disse Arthur, enquanto ela o deixava se afastar, com relutância.

— E eu também. Sinto não ter sido mais honesta com você.

Prometo nunca mais esconder nada.

Ele enxugou as lágrimas do rosto dela com os polegares, beijando-a com gentileza.

— Eu entendo por que você fez. Jamais vou voltar a magoá-la, Hallie. Nem a Ammon. Dou a minha palavra de cavalheiro e homem que a adora desde o momento em que você parou a sua carruagem e olhou para mim como se eu fosse um louco. Eu me apaixonei por você naquele dia, e nada jamais mudou esse sentimento em mim.

Eu a amo tanto.

Ele a puxou contra ele, abraçando-a com força. Um desejo familiar cresceu dentro dela, e ela não conseguiu evitar de beijá-lo ao longo do pescoço, até a orelha.

— Achei você tão bonito, tão intocável na primeira vez que o vi.

Creio que também me apaixonei um pouco.

Ele gemeu quando ela mordeu o lóbulo da orelha.

— Só um pouco?

— Eu disse que nunca mais esconderia nada de você, nem que mentiria. Eu estou dizendo a verdade.

Ele a empurrou de volta para os travesseiros, com um beijo profundo. Calor a avassalou, e ela não podia deixar de desejar que estivessem sozinhos, trancados em um quarto, já marido e mulher.

— Hm. Talvez me poupe dessas verdades. Um homem tem limites.

Ela riu, deslizando a mão por baixo da camisa dele e sentindo os músculos tensos se flexionarem sob seus dedos.

— Você tem?

— Sim, e deixe-me ser honesto agora, Srta. Evans. Você está me empurrando cada vez mais perto do meu neste momento.

— Bom, porque você está fazendo o mesmo comigo.

Não que ela não amasse cada momento disso.


EPILOGUE

Dois Anos Depois, Somerset

H ALLIE OUVIU o barulho horrível e alto de um animal que não acreditava poder ouvir em seu jardim em Somerset. Ela se levantou da mesa em que usava para analisar as últimas descobertas que fizera no castelo que estava ajudando Arthur a renovar e foi olhar pela janela.

— Mas que diabos. — ela suspirou, incapaz de acreditar no que estava vendo.

Um camelo.

— O que está aprontando, meu querido? — murmurou para si.

Observou com diversão seu filho caminhar, com muita cautela, até onde Arthur estava e parar ao lado dele enquanto o camelo se inclinava para se sentar no chão, as duas patas dianteiras primeiro, seguido das patas traseiras.

Ela acariciou a barriga cada vez maior enquanto o bebê chutava, rindo quando o camelo fez um som tristonho. Hallie foi até as portas que levam ao terraço, e empurrou-as para abrir, e foi para a balaustrada.

— Devo perguntar o que é isso, Arthur?

Ele riu, mostrando a Ammon que não havia nada a temer ao tocar no pescoço do camelo. Ele chamou um homem que ela ainda não havia percebido no canto. Ela presumiu que fosse o dono do camelo, Arthur a beijou ao parar ao lado dela e passou um dos braços em sua cintura.

— Com nossas viagens ao exterior planejadas nos próximos dois anos, achei necessário mostrar a Ammon um camelo. Não tenho dúvidas de que montaremos neles ao chegarmos ao Egito.

Ela revirou os olhos, e riu da premeditação dele.

— Há cavalos no Egito, sabia. Carruagens também. Não precisamos montar camelos.

Ele encolheu os ombros, os olhos cheios de diversão.

— E qual é a diversão nisso? — ele disse, dando um sorriso perverso que, mesmo após dois anos de casamento ainda fazia o coração dela vibrar e perder uma batida.

Arthur cumprira todas as promessas que havia feito no dia em que esteve na casa da prima dela. Ele havia se vingado do Sr.

Stewart. Contratou um agente de Bow Street e conseguiu prender o homem por suborno e sequestro, o pegaram em um antro de jogatina que era administrado por um dos amigos de Arthur. Um homem a quem Hallie nunca conheceu, mas que parecia ser amigo do Duque e de Lorde Duncannon desde Eton.

Hallie não pôde evitar de sentir pena do Sr. Stewart, que viveria o restante de seus dias na prisão de Newgate. Não era um lugar que ela jamais desejaria estar, mas quando esses pensamentos passavam por sua cabeça, ela logo lembrava-se de que tudo o que ela possuía agora teria sido impossível se o plano do Sr. Stewart tivesse sucesso.

Quanto a Ammon, bem, Arthur era perfeito como padrasto. Eram um par que sempre era visto por toda a propriedade. As cabeças juntas, falando de livros e cavalos, um dos animais favoritos de Ammon. Seu marido havia dado um de presente ao filho dela assim que se casaram. Um cavalheiro sempre tem um cavalo, foi o que Arthur afirmou.

Arthur levantou Ammon no camelo, e ela agarrou o corrimão da escada.

— Não sei se é boa ideia. É muito alto aí em cima.

— Não, mamãe, vai ser divertido.

Com o coração na boca, ela observou o camelo ficar de pé, os olhos do filho se arregalando ante a altura e ao movimento brusco.

— Segure-se bem, Ammon.

Arthur voltou até ela enquanto o dono do camelo o guiava pelo pátio.

— Tenho algo para contar a você.

Hallie ficou de olho em Ammon, certificando-se que ele não cairia.

— O que foi?

— Ammon me chamou de pai hoje, durante o café-da-manhã.

Hallie ofegou e virou-se para ele.

— Ele chamou?

A visão dela ficou turva, e ela mordeu o lábio, nunca havia pensado que o menino chamaria alguém desta forma. Eles haviam sido honestos e contaram ao garoto de seu pai, de quão corajoso e bom ele foi. A carta que o Sr. Stewart havia escrito à família de Omar não provocou a resposta que ele desejava. Na verdade, a família respondeu com poucas palavras, contestando a reivindicação dele e pedindo para não serem incomodados outra vez.

Hallie ficara desapontada por Ammon que merecia saber de onde veio tanto quanto qualquer um, mas já esperava esse tipo de resposta. Eles não a haviam recebido em sua casa quando Omar estava vivo, era improvável que o fizessem se ele estava morto.

— Chamou sim, e isso nos leva a algo mais que decidi fazer.

Arthur pegou na mão dela, beijando-a.

— Por favor, diga-me que não vai ficar com o camelo.

Ele riu.

— Não, não é isso. Mas decidi que o Castelo de Cadding será entregue a Ammon após a minha morte. Essa parte da terra não é vinculada, e irei incluir vários milhares de hectares para gerar sustento à propriedade. O castelo será reconstruído dentro de alguns anos, e eu gostaria de vê-lo com meu filho mais velho.

Mesmo que ele não seja meu por sangue, é meu filho em todos os outros sentidos. Quero que ele saiba que o amo tanto quanto amarei a criança que geramos. Não deixarei que nenhum dos meus filhos fique desamparado.

Hallie atirou-se nos braços de Arthur.

Como é que ela teve tanta sorte?

— Você é bom demais para mim. Obrigada, Arthur. Obrigada por fazer algo tão maravilhoso pelo nosso menino. Se Omar estivesse aqui, iria agradecer por amar e cuidar de Ammon quando ele não foi capaz de fazê-lo.

Ele recuou, envolvendo o rosto dela com as duas mãos.

— O que é a vida se não para ser vivida, para amar e fazer felizes aqueles que amamos? Eu a amo, Hallie, e muito. Ammon não é apenas seu filho, ele também é meu.

Hallie beijou-o com vontade.

Um tremor percorreu suas veias, e ela passou os braços em torno do pescoço dele. Se ao menos eles pudessem ir lá para cima, desaparecer por algumas horas...

—Eu também te amo. Obrigada por ser meu.

Ele abriu outro sorriso perverso.

— Obrigado você por dizer sim. Eu sempre soube que seríamos perfeitos um para o outro.

E eles estavam... perfeitamente felizes.

 

 

                                                   Tamara Gill         

 

 

 

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