Criar um Site Grátis Fantástico
Translate to English Translate to Spanish Translate to French Translate to German Translate to Italian Translate to Russian Translate to Chinese Translate to Japanese

  

 

Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


UM BEBÊ INESPERADO / Juliana Dantas
UM BEBÊ INESPERADO / Juliana Dantas

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblio VT 

 

 

Series & Trilogias Literarias

 

 

 

 

 

 

— Já dá pra ver?
Simon desvia o olhar do celular para mim.
Estamos no táxi, voltando para casa depois de nossa fabulosa e perfeita lua de mel em Paris.
Quer dizer, talvez perfeita seja um exagero, se contar a parte que eu fiz striptease no Jardim das Tulherias depois de quase morrer com uma alergia causada por um casaco vagabundo (preciso me lembrar de ir lá na Primark fazer valer meus direitos como consumidora e pedir meu dinheiro de volta), vomitei na Torre Eiffel depois de me entupir de macarons, quase mijei nas calças no ônibus de turismo (sem contar quase congelar de frio) e ainda descobrir que estava grávida assim, do nada.
— Ver o quê? — Simon me encara confuso.
— Minha barriga! — Pouso as mãos sobre a barriga, revestida por meu vestido preto de inverno. — Já dá pra ver que estou grávida?
— Claro que não, Julie — Simon resmunga impaciente, voltando a atenção ao celular.
— Droga! Será que vai demorar pra aparecer?
Só faz vinte e quatro horas que estou lidando com a novidade da gravidez, porém, embora ainda pareça surreal demais para ser verdade, me vejo delirando em expectativas que essa nova condição me traz.
Eu. Estou. Grávida!
Grávida!

 


 


Tem um bebezinho dentro de mim. Será que ele se parece com Simon? De repente minha mente é invadida por uma imagem de mim mesma em uma sala de hospital toda descabelada, suada e gemendo, com as pernas arreganhadas, enquanto um médico bonitão estilo Doutor McDreamy (eu posso sonhar, né) retira de dentro de mim um bebê de cabelos cor de cobre, vestindo terno preto e berrando em um celular.

— Você não acha que eu tive uma premonição? — Cutuco Simon.

— Que diabo está falando?

— Lá na festa dos seus pais, quando eu disse que estava grávida. Eu imaginei que poderíamos ter uma filha e...

— Filha? — Ele levanta a sobrancelha.

— Pode ser, não é? Ou você acha que é um menino?

— Como eu posso saber?

— Ah, a gente podia criar ele sem gênero! Está super na moda! Podíamos chamá-lo por um código, sabe, tipo o Prince quando mudou de nome! E depois que definisse seu sexo, ele mesmo poderia se dar um nome! Ia ser tão moderno! Seríamos exemplos de pais! Acho que a BBC até faria um documentário sobre nós... ou um filme! Ou eu poderia escrever um livro sobre minha fantástica experiência e ficar rica!

Simon não parece impressionado, enquanto volta sua atenção para o celular, mas tem um sorriso em seu rosto.

— Já somos ricos.

— Você é!

Ele acaricia meu cabelo carinhosamente, com a mão que não está digitando.

— O que é meu é seu.

— Sério? Até seus vinis?

— Não, os vinis são meus. — Agora ele me lança um olhar bem sério.

— Então teria que ter feito um daqueles testamentos de separação de bens, porque acho que são meus sim — provoco, encostando minha cabeça em seu ombro e aproveitando para espiar o que ele está digitando. E parece ser uma mensagem para James Potter, um dos diretores da DBS, a empresa na qual Simon é CEO. Por um momento me perco nessa constatação, que sempre me enche de júbilo. Sim, eu estou casada com o CEO da DBS!

Puta que pariu!

E pensar que tudo começou com uma paixonite no elevador e agora estamos casados. Nem dá pra acreditar que nos conhecemos em menos de três meses!

— Está espiando? — Simon indaga divertido, mas fecha a mensagem.

— Estou me perguntando por que não consegue parar de trabalhar por um minuto! — Minha voz está suave, mas a crítica é clara.

Óbvio que não quero ser aquele tipo de esposa chata que só reclama que o marido trabalha, mas vamos combinar que Simon não é um marido qualquer.

Ele é um tremendo workaholic viciado e se eu não tomar cuidado, serei obrigada a me transformar numa dessas esposas megeras reclamonas se quiser ver meu marido.

Hum, faço uma anotação mental para colocar isso na minha lista “como ter um casamento perfeito”, por Julie Harris-Bennett.

É uma espécie de diário que estou fazendo colocando todas as minhas experiências bem-sucedidas no meu casamento perfeito. Estou pensando se crio um blog ou quem sabe um canal no Youtube, ou se espero ter material suficiente para enviar a uma editora! Tenho certeza que posso ajudar muitas mulheres na mesma situação que eu. Já consigo me imaginar como uma espécie de guru das jovens esposas! Talvez até ganhe um programa na TV! E agora que estou grávida então, vou ter muito material! Nossa, minha cabeça já está fervilhando de ideias!

— Quer dizer que teremos uma menina de acordo com suas premonições? — Simon muda de assunto deliberadamente.

Ah ele se acha muito esperto. Sorte dele que estou bem empolgada para falar sobre o assunto gravidez, bebês e afins.

Tudo bem que às vezes eu ainda sentia certo pânico ao pensar em tudo o que ter um bebê implica, mas sempre que isso acontecia eu pensava em como seria incrível quando meus sonhos se concretizassem.

— Sim, e ela estudará no mesmo colégio que a Princesa Charlotte e serão grandes amigas. — Coloco Simon a par deles.

— Ah é?

— Sim! E ela pode conhecer o Príncipe George e se apaixonarão e...

— Espera? Minha filha não vai namorar aquele paspalho.

— Paspalho? Ele é uma criança!

— Mas pode virar um paspalho. Veja o avô dele!

— Ele pode puxar ao pai, Príncipe William é gente boa. Embora careca... Não sei se quero minha filha casada com um cara careca. Talvez ele possa fazer implante, tipo o Elton John. Ou usar uma daquelas perucas de lace das Kardashian... Se bem que pode puxar ao avô Charles. Charles ainda tem cabelo.

— E foi um marido filho da puta.

— Ah meu Deus, tem razão! Não podemos deixar nossa filha entrar naquela família e casar com um cara daqueles! Ela vai ser tipo a Lady Diana do século XXI! Coitadinha, toda tristinha e com um corte de cabelo terrível! Não, ela vai ter que conseguir um título por si só! Ah, já sei, podemos fazer uma petição à rainha?

— Que merda está falando?

— Você sabe, ela pode conceder títulos para quem ela quiser! Ah, podemos pedir pra gente! Já pensou? Você poderia ser um visconde! Não, um conde! E aí eu seria condessa e...

— Desde quando tem fixação por títulos reais?

— Eu não tenho! Mas temos que pensar no futuro agora, vamos ser pais, não podemos mais ser irresponsáveis e vida louca!

— Quem aqui é vida louca?

— Bem, você não é, certamente. Já que só pensa em trabalho!

— Mas você é.

— Não sou! Quer dizer, eu podia ser, mas agora sou uma mulher casada e mãe! Tudo isso ficou no passado.

Simon sacode a cabeça rindo com indulgência, como se minhas palavras fossem uma pequena piada.

Quero rebater que estou falando muito sério, mas o motorista já está parando em frente ao nosso prédio. Então deixo aquela discussão para depois.

Porque sinceramente, agora que chegamos em casa, tudo o que eu quero é tirar o salto alto, um bom banho de banheira, comida e uma transa bem safada com meu marido. Não necessariamente nessa ordem.

— Cansada? — Simon pergunta quando entramos no elevador.

— Não tão cansada. — Sorrio com malícia, e ele retribui meu sorriso, o que faz um frisson percorrer meu corpo em expectativa. E sem pensar duas vezes, pulo em seu pescoço, beijando sua boca e o fazendo rir, já que ele está com as duas mãos ocupadas segurando nossas malas.

— Não se aproveita de um homem com as mãos inutilizadas, Julie.

Desço a mão e aperto sua bunda enquanto mordo seu queixo.

— Vai poder usar bastante suas mãos, quando estivermos sozinhos em nosso quarto!

O elevador chega ao andar e saio na frente, quase correndo para abrir a porta, adorando quando Simon para, atrás de mim, largando as malas no chão e me agarrando ali mesmo, as mãos apertando meus seios e a boca em meu pescoço.

Fecho os olhos, derretendo, enquanto a porta se abre e...

— Surpresa!

Um flash me faz piscar e abro os olhos ao ouvir o coro vindo de dentro do apartamento, para ver meus pais e a família de Simon toda ali, nos encarando.

Papai com uma câmera fotográfica que não para de disparar flashes em nossa direção como um maldito paparazzo . Mamãe está rodando em volta de si mesma enquanto entoa algum cântico bizarro.

Já os pais de Simon parecem estar com o sorriso congelado no rosto.

Mila está segurando o riso, o marido dela, mais vermelho que pimentão. Sean, o outro irmão de Simon, segura uma champanhe e sua esposa Florence sacode a cabeça com a mão na cintura com uma expressão de censura mesclada com divertimento.

— Mas que merda... — Simon exclama ainda com as mãos nos meus seios e eu dou-lhe um tapa para me soltar, enrubescendo.

— Surpresa... — Mila grita de novo, rindo abertamente agora e jogando os braços no ar.

— Que porra estão fazendo aqui? — Simon continua.

— Eu falei que ele não ia gostar — Scott, o mais sensato do bando intrometido, sussurra para Mila.

— A gente queria fazer uma festa de boas-vindas! — mamãe exclama parando de rodar feito um pião da casa própria e vindo em nossa direção, enquanto joga algum pó fosforescente em nossa direção.

— Mamãe, para com isso! — reclamo, tossindo. — Não podiam ter avisado? E como conseguiram entrar aqui?

Papai se aproxima e se coloca atrás de nós fazendo várias selfies , alheio à confusão.

— Para, pai! Acha que quero me lembrar deste momento constrangedor?

— Ah querida, não fique constrangida! Sabemos que estão em lua de mel! — Mamãe ri.

— Ainda não entendo que porra estão fazendo aqui na minha casa? — Simon continua se dirigindo a sua família. — Achei que agora que estou finalmente casado, iam me deixar em paz.

— Mas nós queríamos fazer uma surpresa de boas-vindas — Maggie explica.

— Desde quando eu gosto de surpresas deste tipo?

— Simon, não fale assim com sua mãe! — Alfred reclama.

— Sim, Simon, não seja grosso com a mamãe — Sean endossa, servindo champanhe em taças que Mila segura e distribui.

— Sim, chega de briga! — Mila diz. — Hoje é dia de celebrar! Bem-vindos!

— Mila, para de ser ridícula! — Simon continua irritado.

— Nossa, achei que depois de ter voltado da lua de mel estaria mais legal Simon, que horror! Como aguenta ele, Julie?

— Gente, eu falei que não era uma boa ideia — Scott sensato se intromete. — Eles chegaram de viagem e devem querer descansar e...

— Descansar? Eles querem é trepar isso sim! — Sean ri e recebe um tapa de Florence.

— Cala a boca!

— Mas é verdade, não viu onde estava a mão dele quando entraram?

— Não interessa o que vamos fazer, essa é nossa casa e não deveriam estar aqui sem serem convidados! — Simon explode, mas já não o escuto, porque minha atenção está agora em mamãe fazendo pose em frente ao que parece ser um... altar?

— Que diabos é isso aqui?

Aproximo-me horrorizada, deixando Simon brigando com sua família intrometida.

— Um altar à deusa, querida. Não é lindo?

Espio a monstruosidade, um misto de imagens de druidas e árvores de massinha que mais parecem feitas por uma criança no jardim de infância, cercada por velas e até um minicaldeirão que solta uma fumaça esquisita.

— Como isso entrou aqui?

— Oras, a família de Simon tinha a chave! Quando Mila nos convidou para a festa de boas-vindas achei que seria a oportunidade perfeita para mais essa surpresa! Agora estarão protegidos pela deusa e...

— Você pirou? Isso vai ter que sair daqui!

— Querida, não fale assim com a sua mãe. — Papai me puxa para o outro lado da sala. — Venha ver a minha surpresa que é muito mais interessante.

— Ah não... — sussurro com medo quando ele se coloca ao lado de algo na parede coberto com um pano branco que ele puxa com um floreio e meu queixo cai ao ver uma foto de Simon quase pelado lá no celeiro de casa, enquadrado na parede da sala pra todo mundo ver.

— Esse é o Simon? — Florence se coloca ao meu lado e toda a família de Simon, que estava discutindo, agora está em silêncio olhando para a obra-prima do meu pai.

— Eu falei que esse rapaz tinha bons ossos! — papai diz bem orgulhoso. — E aí, gostaram?

— É... bem artístico. — Maggie engole em seco.

— A luz está ótima... — Alfred completa.

— Caramba, você parece um daqueles atores pornô! — Sean gargalha, e Mila e Florence também estão rindo.

Simon está pálido e pela primeira vez sem fala.

— E aí, filhinha? — papai insiste.

— Eu não sei nem o que dizer... — sussurro olhando para Simon. — Eu sabia que isso ia dar merda!

— Gente, agora que eles chegaram podemos sair para jantar, estou faminta! E meu bebê também! — Florence pede passando a mão na barriga ainda plana, como a minha, lembrando-me que ela também está grávida.

— Não vamos a lugar nenhum! — Simon diz. — Vocês precisam ir embora agora.

— Mas nem brindamos! — Mila coloca uma taça na minha mão e na de Simon.

Simon revira os olhos, mas pega a taça.

— Ok, mas depois desse brinde, todo mundo fora!

— Que maravilha! A Simon e Julie e sua nova vida juntos! — Mila puxa o brinde.

— Que a deusa abençoe esta união! — mamãe completa e diz algo em uma língua estranha que ela jura ser céltico, mas acredito que algum guru sem noção inventou e ela acreditou.

Todos brindam e sorrio tomando um gole e então me lembro que não posso beber nada alcoólico e cuspo dentro do copo.

— Que foi isso? — Mila me encara com nojo.

— Filha, que educação é essa? — papai ralha.

Encaro a plateia, vermelha. E Florence, que está brindando com o que parece ser leite, arregala os olhos.

— Você está grávida?

— Claro que não, eles se casaram faz dias! — Mila refuta.

— Como se ela fosse virgem antes! — Sean ri.

Eu e Simon trocamos olhares e ele dá de ombros, vencido.

— Acho que teremos que contar em algum momento...

— Ai meu Deus, é verdade? — Florence diz.

Respiro fundo e encaro a plateia.

— Sim, é verdade. Estou esperando um bebê!

E de repente todos estão enlouquecidos de novo, falando ao mesmo tempo e nos congratulando.

E nem sei como acabamos sendo arrastados para o The Ivy, para um ruidoso jantar de comemoração, com mais brindes, e intermináveis perguntas de Florence e Mila sobre meus planos.

— Como posso ter planos, acabei de descobrir!

— A gente te conhece e deve estar planejando até a formatura do seu filho! — Mila ri.

— Filha — corrijo.

— Como sabe?

— Eu tenho um palpite! — Bocejo, cansada de tanta conversa e comemoração.

Simon percebe e segura minha mão.

— Melhor irmos embora. Julie está cansada.

Ah graças a Deus! Levanto-me e nos despedimos dos meus pais, que voltarão a nossa cidade ainda hoje, e entramos no carro de Sean e Florence, já que viemos com eles.

Encosto em Simon e fecho os olhos, me sentindo mesmo muito cansada.

— Julie está dormindo? — Florence pergunta do banco da frente.

Nem respondo, porque ela vai continuar a querer conversar e minha cota já deu por hoje.

— Sim, eu falei que ela estava cansada — Simon responde.

Suspiro satisfeita e deixo mesmo o sono me dominar, as vozes deles ficando cada vez mais distante.

E de repente escuto uma conversa que não sei se é sonho ou realidade.

— Você contou a ela? — Sean pergunta como se vindo de muito longe.

— Não tem por que contar — Simon responde.

— Eu acho que deveria contar, Simon — Florence diz.

Contar o quê? Minha mente enevoada quer perguntar.

— Isso sou eu quem decide — Simon diz com aquele tom de CEO fodão que lhe é característico e, mesmo semiadormecida, sinto um mau pressentimento.

Só que estou com sono demais para abrir os olhos e perguntar do que eles estão falando, então deixo o sono me dominar.

 


Capítulo 2

 

Julie


— Não acredito que eu praticamente desmaiei ontem e estraguei tudo! — resmungo tentando passar o batom sem borrar enquanto Simon costura o trânsito em alta velocidade pelas ruas de Londres, já que estamos terrivelmente atrasados.

— Estragou o que, Julie?

— Nossa primeira noite de casados!

— Nos casamos há algumas semanas se não se lembra.

— Mas era a primeira noite na nossa casa! Tinha que ser especial! Aliás, esquecemos que você tinha que ter me carregado no colo! — Consigo terminar o batom sem ficar parecendo o Coringa e pego o blush.

— Provavelmente eu teria te derrubado de susto depois de ver nossa família lá dentro.

— Você precisa mudar a fechadura! Já imaginou se eles entram quando a gente estiver transando? Ah nossa, não acredito que a gente ainda não transou!

Simon ri fazendo uma curva fechada e o blush vai para meu nariz.

— Eu sou uma piada para você, Simon? Não é engraçado! Ou você quer que a gente seja um daqueles casais que não transa nunca? Já pensou nisso, Simon? Se não tomarmos cuidado, estaremos fazendo terapia de casal com menos de um mês de casados! E isso definitivamente não entra na minha lista de casamento perfeito por Julie Harris-Bennett.

Ele levanta a sobrancelha enquanto tento reparar o estrago do blush.

— Harris-Bennett?

— Sim, sou uma garota moderna, não preciso usar só o sobrenome do meu marido! É o primeiro capítulo do meu livro.

Simon estaciona o carro e guardo minha maquiagem enquanto saímos do carro e seguimos para o elevador.

— Espera, você disse livro? — Ele parece entender o que estou dizendo.

— Não sei bem se é um livro ainda, por enquanto é um diário, mas tenho certeza que é um bom material... — Aperto o botão para subir.

— Pelo amor de Deus, só não faça isso no trabalho e deixe jogado por aí! Já chega de escândalos!

— Mas agora a gente não precisa mais ser discretos! Estamos casados!

— Por isso mesmo, Julie — ele diz sério —, não quero dar motivo para desacreditarem do meu trabalho.

— O seu trabalho? — É minha vez de levantar a sobrancelha.

— O seu também, claro!

— Sim, tem mesmo que se preocupar com a minha reputação, porque você além de ser o CEO, agora também é um dos acionistas!

— Isso é mais sério ainda! — Arruma a gravata com tom arrogante.

Ah Deus, como ele é sexy quando fala assim...

Sim, eu sou casada com o CEO mais lindo do mundo e mal posso acreditar.

— Por isso, espero que mantenha a compostura e suas loucuras fora do local de trabalho, Julie.

— Nossa, Simon, é muito esquisito eu ficar com tesão quando fala assim? — Eu me encosto nele e os olhos de Simon brilham perigosamente, mesmo que suas mãos já estejam nos meus ombros, prontas para afastar meu ataque.

— Nem pense nisso, não se esqueça do que aconteceu da última vez que perdemos a compostura no elevador.

— Compostura! — Eu rio. — Parece um velho falando!

— Não é brincadeira, Julie.

Eu tenho vontade de continuar provocando, mas me seguro.

— Ok, está bem! Vou manter minha compostura aqui, Senhor Bennett, mas terá que me recompensar depois!

O elevador para no meu andar e me preparo para sair, mas Simon me puxa de volta e cola a boca no meu ouvido.

— Prometo que vou foder você de todas as maneiras que quiser quando chegarmos em casa hoje, Senhora Bennett.

Meus joelhos ficam bambos com aquela promessa sacana e já estou pronta para me voltar e persuadir Simon a me dar uma amostra grátis ali mesmo quando sou surpreendida por uma horda de funcionários surgindo a nossa frente, com bexigas e faixas de boas-vindas nas mãos.

— Surpresa!

— Bem-vindos de volta, Simon e Julie! — Rachel grita estourando uma champanhe enquanto Benjamin está com algo que parece ser uma língua de sogra na boca, assoprando e todo mundo pula e bate palma como em um aniversário de criança.

— Que porra é essa? — Simon exclama atrás de mim e posso sentir sua tensão.

— Disfarça e não fique bravo! — murmuro forçando um sorriso ao sair do elevador puxando Simon pela mão. — Que linda surpresa.

Alan está se aproximando segurando um enorme buquê de flores.

— Bem-vinda, Julie.

— Obrigada, Alan! — Apanho o buquê, agradecida.

— Só pode estar de brincadeira! — Simon resmunga e belisco seu braço.

— Cala a boca e seja educado!

— Estamos muito felizes de tê-los de volta. — Rachel se aproxima, toda feliz, mas seu sorriso congela no rosto ao ver a expressão de desagrado de Simon. — Opa, espero que não esteja bravo com nossa festinha...

— Vocês deveriam estar trabalhando e não bebendo champanhe em pleno horário de trabalho!

— Simon! — Eu lhe lanço um olhar de advertência.

— Eu disse que isso era bobagem. — Natasha surge com sua expressão de frieza habitual.

— Imagina, nós adoramos! — Olho em volta. — É tudo adorável!

— E desnecessário — Simon resmunga. — Mark, você que começou isso?

Mark, o diretor de RH, está se aproximando com cara de medo.

— Não, quer dizer...

— A gente pode comer agora? — Angie pergunta enquanto Benjamin está com o celular ligado filmando tudo.

— Deveriam voltar ao trabalho... — Simon começa.

— Para de ser ridículo! — reclamo e percebo que falei a coisa errada quando todo mundo para de falar e nos encara esperando o próximo movimento.

Ai merda.

Simon está me fuzilando com o olhar.

— Hum, Simon — Mark se aproxima —, realmente eu tentei contê-los, mas quando percebi já estavam se organizando e ficariam muito tristes de...

— Ficariam tristes? Aqui não é o jardim de infância, Mark! — Ele se volta aos funcionários, agora apreensivos. — Muito obrigado por todas as boas-vindas, mas estamos em horário de trabalho e devem acabar com a balbúrdia e voltarem a seus postos. Agora! Bom dia a todos.

E ele sai caminhando em direção ao elevador.

Eu o sigo.

— Por que foi tão chato com todo mundo?

Ele se volta, furioso.

— E por que estava me contrariando na frente de todo mundo?

— O quê?

— Você me chamou de ridículo. Na frente dos meus funcionários.

— Ah... Não era minha intenção, mas estava mesmo sendo ridículo...

— Julie, estamos em local de trabalho e aqui, eu sou seu chefe. Eu sou o chefe de todos. E preciso ter autoridade, e não vou permitir que ninguém me chame de ridículo, muito menos você.

Eu me encolho com sua ira.

Sério que ele está bravo por isso?

Não é para tanto é?

— Mas todo mundo sabe que somos casados e...

— Eu estou tentando fazê-la entender que justamente por isso não podemos deixar que esse fato mude a ordem das coisas. Só de estarmos noivos já foi um escândalo e por muito pouco você não foi demitida. E eu também.

— Mas eu pensei que agora...

— Agora temos que ser mais discretos ainda. Estamos entendidos?

Entendidos? Quem ele pensa que é pra falar assim comigo?

Tenho vontade de mandá-lo enfiar a discrição onde o sol não bate.

Mas vejo Natasha se aproximando como uma alma penada e respiro fundo, mantendo a compostura.

Não é isso que ele quer?

— Certo. Entendido! Chefe! — rosno e me afasto irritada.

A galera ainda está desfazendo a festinha malsucedida, mas me cercam cheios de indagações.

— E aí, vocês estavam brigando? — Rachel é a primeira a se aproximar. — Achei que a cabeça dele fosse explodir quando o chamou de ridículo!

— Ninguém fala assim com o Simon! — Phill diz.

— Mas ela é a esposa dele, pode falar do jeito que quiser! — Nancy diz. — Aposto que ela lhe deu uma boa bronca por ter estragado nossa festa que fizemos com tanto empenho e...

— Você não fez nada, fui eu quem organizou tudo! — Rachel rebate.

— Cala a boca vocês duas e deixem a Julie contar pra gente! — Benjamin pede.

Encaro a plateia ávida por fofoca em primeira mão.

E minha vontade é de gritar em alto e bom som que Simon é um tremendo pau no cu! Filho da puta, mas apenas dou de ombros, afastando uma bexiga para sentar na minha mesa.

— Simon tem razão. Devemos voltar ao trabalho.

Eles se entreolham.

— Só isso? — Nancy questiona decepcionada.

— Sim, Nancy! E deviam parar de fofocar e voltar ao trabalho, o Simon ficará puto se fizerem mais confusão aqui!

— Eita que ela está falando igual ao Simon. — Benjamin ri.

— Só estou sendo profissional. E deviam fazer o mesmo! — rebato, fazendo minha melhor cara de funcionária do mês.

E pensando bem isso poderia bem ser verdade. Vou sugerir a Simon (quando estiver falando com ele de novo, vamos deixar bem claro), que poderíamos ter um concurso de funcionário do mês e poderia ter até um quadro na parede com a foto do vencedor.

E obviamente eu poderia ser a primeira a estampar a parede de honra! Será perfeito para as pessoas me respeitarem como ótima profissional e não como a esposa do CEO.

— Julie tem razão, todos ao trabalho! — Alan me apoia.

— Obrigada. — Lanço-lhe um olhar agradecido que o faz ficar vermelho.

Caramba, ele ainda tem uma queda por mim?

Bem, devo dizer que sou difícil de esquecer mesmo.

Todos se dispersam a contragosto, menos Nancy, minha antiga colega de apartamento.

— E aí, quando vai me contar todas as novidades da lua de mel! Quero detalhes. E sórdidos!

— Ah Nancy, agora não é o momento! Acho melhor voltarmos mesmo ao trabalho.

— Ah que pena que agora é chata como Simon! Ia te chamar pra gente ir tomar café e aí poderia me contar tudo.

Hum, até que não seria uma má ideia... eu estava mesmo precisando de um café. Mas espera, mulheres grávidas podem tomar café?

Eu não faço ideia!

— E vai ficar aí nessa mesa de assistente? Achei que fosse pra sala da Erin...

— Bem, na verdade eu nem sei. Eu a substituí quando caiu, mas não era nada oficial...

Sim, Erin, minha ex-chefe bruxa que me odiava e fazia da minha vida um inferno tinha sofrido um tenebroso acidente na casa dos pais de Simon, rolando as escadas e se quebrando toda. Ainda cismou em dizer que eu a tinha empurrado! Eu, uma pessoa doce e tranquila que não fazia mal a uma mosca!

Mas Erin me detestava e foi naquela festa que ela descobriu meu romance secreto com Simon e como não poderia deixar de ser, ela deu um jeito de aparecer ali na DBS, toda enfaixada como uma múmia e louca dos analgésicos gritando para todo mundo que eu e Simon estávamos envolvidos e ainda me agredindo com as muletas.

E para completar Simon e os acionistas apareceram na hora e tudo virou uma grande confusão. Que acabou com uma reunião supertensa onde os acionistas exigiram que Simon me demitisse ou terminasse comigo.

Bem, não quero lembrar que depois de uma fofoca malsucedida de Natasha, eu achei que Simon fosse terminar comigo e terminei com ele primeiro, e ainda destruí os pneus do seu carro.

Felizmente tudo se resolveu, graças à astúcia de Simon.

E o que posso dizer? Ele tem razão em dizer que não chegou aonde chegou à toa. Ele é tipo um mafioso mau quando se trata de manter sua carreira.

Ou nosso relacionamento. Afinal, foi ele quem armou um casamento de verdade quando tudo o que eu tinha pedido era um casamento de mentira para agradar minha avó.

Mas antes que eu possa responder a Nancy, meu telefone toca e vejo que é do ramal de Natasha.

Putz, espero que não esteja ligando para me convidar pra almoçar com ela entre as lápides do cemitério.

— Oi, Natasha.

— O Simon quer que suba aqui agora.

Ai droga.

Será que ele ia continuar brigando comigo?

Realmente esse primeiro dia de trabalho não está saindo como eu tinha imaginado.

Tenho vontade de pedir a Natasha que mande Simon para o inferno com sua autoridade e grosseria, mas me contenho. Afinal, agora não sou mais aquela Julie que fura pneus quando está brava com o namorado. Agora sou uma senhora casada e sensata.

Por isso sorrio placidamente.

— Claro, já estou subindo.

Desligo e encaro Nancy

— Tenho que subir até a diretoria. A gente pode almoçar juntas e eu te conto tudo, ok?

Ela sorri satisfeita e me encaminho para a sala de Simon, um tanto apreensiva. Porque no fundo, por mais que esteja meio puta por ele ter sido autoritário comigo, sei que tem alguma razão. Ali é nosso local de trabalho e as coisas podem mesmo ficar bem nebulosas por causa do nosso relacionamento.

Natasha está na sala de Simon quando entro e ainda cheia de ranço faço uma exagerada reverência.

— Chamou sua alteza, CEO?

Simon reage a meu sarcasmo apenas com um revirar de olhos impaciente e sacode as mãos na frente de Natasha, a dispensando e empurrando a cadeira para trás e se levantando.

— Pode ir, Natasha. E faça o que eu te pedi agora. Quero tudo pronto antes do almoço.

— Sim — a secretária responde saindo da sala e quando passa por mim, tenho a impressão que está com os olhos mais arregalados do que o habitual, enquanto fixa a atenção em algo do meu lado direito e sussurra palavras que não consigo ouvir até sair da sala, fechando a porta silenciosamente atrás de si.

— Que foi isso? — questiono Simon que agora está na minha frente.

— Ela estava me contando que tem certeza que tem uma sombra atrás de você, o que pode ser o culpado de seu comportamento bizarro.

— Hã? — Faço uma careta olhando para o lado, onde claramente não tem ninguém. — Ela pirou de vez? Então eu tenho uma espécie de fantasma birrento me seguindo?

— Esqueça a Natasha. Que diabos foi essa reverência ridícula que fez?

— Oh, desculpe, deveria me ajoelhar? — Continuo com meu sarcasmo, mas em vez de ficar bravo, Simon sorri.

— Eu adoraria, mas seria inapropriado já que prometemos não fazer mais sacanagem aqui — diz levando minha sugestão para o lado malicioso. — Eu te chamei aqui para pedir desculpas.

— Desculpas?

— Sim. Fui ríspido, não precisava. Eu só... me preocupo com toda essa situação saindo do controle de novo.

— Realmente não precisava. Fiquei muito brava com você! Não precisa ser grosso só pra confirmar quem manda aqui!

— Eu sei, pode me desculpar? — Ele toca meu rosto e o que posso dizer? Acho que já tinha desculpado antes de chegar a sua sala, mas estava sendo apenas teimosa.

— Bem... — Cruzo os braços o encarando em desafio. — Talvez você possa se ajoelhar?

— Sério?

— Quer que eu te desculpe, ou não? Pode pedir desculpas de joelhos e eu posso pensar em talvez te perdoar... — Antes que termine de falar, Simon já está não só ajoelhado como também erguendo meu vestido.

Minha nossa!

Não era bem disso que eu estava falando, mas Simon já está abaixando minha calcinha e é bem difícil conter a excitação que percorre minha pele em expectativa quando me encara com um sorriso sacana.

— Achei que não fôssemos mais fazer sacanagem aqui? — Ainda consigo dizer.

— Pelos velhos tempos. — Ele pisca antes de mergulhar a língua entre minhas pernas.

Ah caramba!

Estremeço inteira, segurando seus cabelos com os dedos aflitos e tentando não desmontar no chão feito gelatina enquanto Simon se desculpa da forma mais deliciosa possível.

Ah, ele poderia dar uma de chefe ríspido o quanto quisesse se depois fosse se desculpar assim , penso, fechando meus olhos e gozando rápido e intensamente em sua boca furiosa que sabia fazer bem mais do que gritar impropérios para os funcionários.

Abro os olhos, ainda zonza e Simon está me puxando para o chão e se ocupa em abrir suas próprias calças, me deixando excitada de novo em tempo recorde, com suas intenções.

— Desculpado? — Abre minhas pernas e vem para cima de mim.

— Não sei por que tenho a impressão que está me manipulando?

Ele não nega, enquanto me beija e me penetra devagar, gemendo no meu ouvido.

É uma delícia de ouvir, mas...

— A Natasha pode nos ouvir e não creio que vamos poder enganá-la de novo dizendo que é algum espírito.

Ele ri e se move dentro de mim.

— Natasha está no financeiro. A despachei.

— Ah, que ardiloso, Senhor Bennett! — Eu o abraço com minhas pernas, erguendo os quadris em sua direção.

— É por isso que eu mando aqui! — diz com presunção.

Eu o empurro, nos girando para ir para cima dele, segurando suas mãos acima da cabeça.

— Quem manda aqui agora? — sussurro mordendo seus lábios.

Mas Simon é rápido também e me gira de volta.

— Eu mando aqui, Julie, não se esqueça. — E intensifica o ritmo de suas investidas fazendo meus olhos rolarem das órbitas. — Diz, quem manda aqui? — insiste, os quadris batendo nos meus com força.

— Dane-se, você! — gemo, perdida, gozando em seguida e dessa vez Simon me acompanha.

— E você está tranquila com isso? — indaga quando se move para o lado, continuando nosso papo sobre quem manda.

— Lembre-se que eu sempre posso furar seus pneus. — É minha resposta ofegante e ele ri se levantando e me levando junto enquanto arrumamos nossas roupas.

— Vou sentir falta de ficar assim com você — murmura, sua mão acariciando minhas costas e me puxando para perto, os lábios na minha testa, quando já estamos apresentáveis de novo.

— Você manda aqui e poderia instituir a hora da foda como regra na empresa, o que acha?

— É tentador, mas nem um pouco produtivo.

Levanto a cabeça o encarando.

— Eu acho bem produtivo!

Ele ri e acaricia meu rosto.

— Eu sei que pareço meio rude, mas é sério demais pra mim, Julie. — Ele fica sério de repente. — Não quero que saia do controle de novo.

— Vai dar tudo certo, Simon! — Sorrio confiante. — Eu vou me manter na linha, ok?

— E vamos manter a gravidez em sigilo.

Hum... Não sei se concordo. A vontade que tenho é de mandar um memorando para a empresa inteira. E quem sabe colocar nos murais? Porém, Simon pode ter razão e manter tudo discretamente por enquanto seja o melhor.

— Ok — concordo. — Vamos ser discretos quanto a isso por enquanto.

— Então é melhor voltar ao trabalho, antes que Natasha volte.

— Está bem!

Ele me beija rapidamente e me solta.


Estou praticamente flutuando quando volto a minha sala.

Talvez eu consiga convencer Simon de que não há problema algum de fazer a nossa “hora da foda secreta” em seu escritório de vez em quando, penso, divertida.

Sento à minha mesa e me recordo do questionamento de Nancy de que deveria estar na sala de Erin.

Hum, acho que é uma boa ideia! Nada foi dito oficialmente sobre eu substituí-la, mas quem mais faria isso?

E eu tinha provado meu valor. Trabalhei mil vezes melhor que Erin no pouco tempo que estava na DBS e claro que seria a nova gerente de Relações Públicas!

Animada, me levanto e vou tomar posse da minha nova sala já imaginando que poderia solicitar uma nova decoração, quando abro a porta e estaco surpresa ao ver um homem sentado à mesa de Erin.

— Quem é você?

O homem levanta a cabeça me encarando.

E uau, ele é lindo! Cabelos pretos incríveis, uma pele morena com ar mediterrâneo e vestindo um terno sob medida, meus olhos curiosos notam rapidamente.

Mas quem diabos é este cara e de onde ele saiu?

— Olá, você deve ser Julie? — Ele não parece surpreso em me ver.

— Sim, e quem é você?

— Eu sou Justin Taylor. Sou o novo gerente de Relações Públicas. Seu novo chefe.

Como é que é?

 


Capítulo 3

 

Simon


Finalmente, tudo parece estar sob controle, penso enquanto ligo meu laptop e checo meus e-mails do dia.

Como eu sempre digo: não cheguei ao topo à toa. Posso até ter me desviado do meu caminho desde que Julie Harris entrou na minha vida, mas... Opa, Julie Bennett me corrijo com um sorriso presunçoso. Mas tudo estava voltando à normalidade, onde eu facilmente manipulava todas as situações. Onde eu sempre sei o resultado final e sempre tenho a última palavra. Na mais absoluta ordem.

Eu devia saber que meu casamento com Julie seria um sucesso. Quer dizer, teve um tempo que duvidei da minha própria sanidade, por insistir em me casar com uma pessoa meio descontrolada como Julie. Ok, meio descontrolada é um eufemismo. Julie é um trem desgovernado, que passa por cima de tudo com sua impulsividade e histórias mirabolantes, deixando apenas um rastro de confusão no caminho.

E foi assim que ela deixou minha vida. Mas se estar com Julie era uma aventura em que eu não conseguia prever onde íamos chegar, também logo percebi que havia algo de kamikaze em mim, que em vez de afastá-la apenas fazia tudo para trazê-la ainda para mais perto, como o casamento que era para ser de mentira e se tornou uma cerimônia de verdade como manda o figurino com direito a lua de mel em Paris e um bebê a caminho.

Eu poderia ter surtado com a ideia de um filho tão cedo, mas o que era usual em se tratando de meu relacionamento com Julie? Então assumi que ia administrar aquela situação como administrava a DBS. E tudo ia dar certo, afinal eu era um fodido CEO. E agora sócio.

Porra! Eu sou mesmo muito bom.

E até tinha conseguido que Julie me perdoasse depois de ela ter ficado brava comigo quando acabei com a festinha descabida dos funcionários. Claro que eu devia saber também que sexo sempre funciona com Julie. Se tem uma coisa em que somos malditamente bons juntos é nisso. Não foi assim que tudo começou? Com Julie respondendo minha proposta de fingir ser minha noiva com uma contraposta que incluía nós dois fodendo? E foi o melhor negócio que fiz na vida.

Estamos casados. E esperando um bebê.

E tínhamos conseguido driblar toda a confusão que nosso indiscreto relacionamento causou na empresa. Agora era só manter a discrição quanto à gravidez e não ceder à vontade que eu tinha de fodê-la cada vez que a chamava na minha sala. Hoje tinha sido apenas uma medida extrema de contenção de danos. Eu me senti culpado de deixá-la magoada com minha bronca aos colegas e precisava que Julie me perdoasse e entendesse que quem mandava ali era eu.

Posso estar apaixonado por ela e muito ansioso para tudo o que viveremos juntos na nossa nova vida de casados, mas ainda sou o CEO (e sócio) desta empresa. E agora mais do que nunca tenho que demonstrar minha autoridade e habilidade para manter tudo e todos na linha.

— Simon!

A voz cavernosa de Natasha na porta da sala me faz sair do meu devaneio.

— Porra, Natasha, que susto.

Minha secretária está parada na porta com seus trajes pretos e olhos arregalados sem expressão.

Será que ela fazia isso de propósito, será que tinha noção que me assustava pra cacete às vezes? Eu ainda não descartei a ideia de que ela arquitetava meu assassinato com requintes de crueldade usando o grampeador contra meu crânio. Ou socando minha cabeça na quina da mesa. Ou envenenando meu café, ou...

— Os acionistas chegaram, estão te aguardando na sala de reunião junto com o Justin Taylor — anuncia.

Caralho, me esqueci completamente do novo gerente de Relações Públicas.

— Ele já está aí? Achei que fosse começar na próxima semana!

Isso me daria tempo suficiente de contar a novidade a Julie e não sei se ela vai gostar de ter um novo chefe, quando eu mesmo tinha dito que ela poderia substituir Erin. Mas Barbara havia sugerido que não seria aconselhável deixar Julie, que além de ser minha esposa agora, ainda era muito nova na empresa, assumir um cargo de chefia tão cedo. Quis refutar, mas os outros acionistas pensavam igual, e se eu fosse sincero comigo mesmo, teria que concordar que eles tinham razão. Se Julie assumisse agora o lugar de Erin, mesmo sendo muito capaz, todos iriam se perguntar se ela estava sendo favorecida por seu envolvimento comigo. E eu não queria começar minha história como acionista como o cara que indica a própria esposa.

Porém, eu sei que Julie não vai gostar nada disso, pois está bem empolgada com suas novas atribuições. Só achei que teria um tempo ainda para conversar calmamente. Parece que não teria mais.

— Barbara pediu que ele viesse hoje, pois ela estaria na cidade, para que tivesse a reunião com os acionistas, pelo que eu entendi — Natasha responde.

— Isso é uma grande merda — digo devagar imaginando se Justin Taylor já assumiu seu escritório e se Julie já está sabendo de tudo.

Natasha ergue a sobrancelha, mas é a única reação que causo nela com minhas palavras nada profissionais.

— Devo dizer que está indo para a sala de reunião? — insiste.

— Sim, claro. Já estou descendo.


Quando chego à sala de reunião, meu maior medo se tornou realidade quando vejo não só Justin Taylor ali, na companhia dos outros acionistas, mas também Julie ao seu lado.

Está branca feito papel e seu rosto é uma máscara de fúria que ela mal consegue conter.

Misericórdia.

Eu tinha esperança que conseguiria falar com ela e explicar, mas parece que é tarde. Agora é contenção de danos de novo e algo me diz que um oral bem feito não vai resolver a questão tão facilmente desta vez.

— Aí está o Simon.

Brad Hart, um dos acionistas, nota minha presença e eu avanço para dentro da sala, tentando não demonstrar minha preocupação.

— Boa tarde a todos. — Sento-me no meu lugar entre Barbara Bailey e Collin Bremmer, os outros dois acionistas, e encaro Justin Taylor.

Caramba, o homem é bonito.

É a primeira vez que o vejo cara a cara, pois sua contratação fora por intermédio de Barbara. Eu apenas tinha checado seu currículo e tido uma conversa breve por conferência no Skype quando estava na Coreia, onde fiquei duas semanas a negócios.

Todavia, Justin Taylor é bem impressionante pessoalmente. Ele me lembra um modelo de comercial de perfume italiano, ou algo mediterrâneo assim. Pergunto-me se seus atributos físicos foram o motivo de Barbara tê-lo contratado sem pestanejar.

— Que bom que chegou, Simon, acho que não conhecia o Justin pessoalmente — Barbara interrompe meus pensamentos.

— Não, não conhecia. Seja bem-vindo ao time. E estou vendo que já conheceu sua assistente, Julie. — Volto minha atenção a Julie que continua impassível sentada ao lado do novo chefe.

Mas enquanto seu rosto é uma máscara de frieza, percebo em seu olhar que uma tempestade está se formando.

Caralho.

Ela está realmente puta.

Mas agora não é o momento de resolver aquela contenda.

— Sim, já me apresentei a Julie. E tomei a liberdade de chamá-la para minha apresentação, pois acho importante que ela fique a par de todos os meus planos para o departamento.

— Claro, fez bem — digo de maneira lacônica. — Então nos preparou uma apresentação? Achei que primeiro iria se familiarizar com o setor e com a empresa, para então montar sua estratégia.

— Eu já fiz isso, desde que Barbara me contratou, estou estudando a DBS e suas necessidades.

Justin se levanta e começa sua apresentação.

E minha teoria de que ele é só um rostinho bonito que impressionou Barbara cai por terra.

Justin Taylor é brilhante e demonstra isso muito bem na hora seguinte.

Quando a reunião finda, estamos todos impressionados.

Bem, Julie não parece impressionada. Já que passou a reunião inteira revirando os olhos com deboche para tudo o que Justin dizia.

Caralho, eu só espero que ela não abra a boca para reclamar bem aqui.

— Achei suas ideias muito bem colocadas, Justin — comento depois de algumas perguntas e dúvidas dos outros acionistas. — Tenho certeza que todos nós estamos impressionados e sabemos que foi a melhor escolha para essa posição. Não concorda, Julie?

Eu a incluo na conversa, tentando fazer com que entenda que Justin é mesmo a escolha perfeita para a situação.

Ela sorri. Não um sorriso feliz ou de concordância, parece mais com um dos sorrisos de Natasha quando eu achava que queria me assassinar com o grampeador.

— Claro que sim. Justin é perfeito e tudo o mais! Que melhor opção para a gerência de RP teríamos?

Merda.

Ela não está compreendendo muito bem.

Felizmente Barbara e os outros acionistas estão se levantando e dando a reunião por encerrada.

Justin agradece e chama Julie, que ainda parece petrificada na cadeira pela força da sua ira. Ela o acompanha para fora, sem olhar para mim, não deixando espaço para que possamos conversar.

Volto para minha sala, preparado para chamar Julie e explicar os motivos da contratação de um gerente de RP de fora da empresa, rezando para que ela seja razoável e finalmente entenda, mas Natasha me lembra de que tenho uma conferência em poucos minutos.

Infelizmente minha contenda com Julie terá que esperar.

O dia já está findando quando finalmente me livro de todos os compromissos do dia e, agora, penso que foi melhor assim. Levarei Julie para jantar fora e lhe explicarei, da maneira mais clara possível, as decisões dos acionistas.

Afinal, ela já sabia quem mandava ali não?

Pode estar um pouco chateada com a contratação de Justin, quando lhe dei esperança de ter o cargo para si, mas ela será razoável quando eu lhe explicar. E depois ainda podíamos ir para casa e fazer sexo por boa parte da noite para desanuviar a tensão do dia.

Sim, é um plano perfeito.

Eu já me sinto em posse de minha autoridade de novo.

Pego meu casaco e saio da sala, disposto a buscar Julie em seu andar, mas me deparo apenas com Justin Taylor no andar comercial.

— Ei, Justin, Julie já foi? — indago ao novo gerente.

— Sim, ela saiu mais cedo. Achei que ela não estava se sentindo bem.

— Não estava se sentindo bem?

Começo a ficar preocupado.

— Ela apenas parecia tensa, estranha, não sei. Eu a chamei na minha sala depois da reunião para lhe solicitar alguns relatórios, já que com certeza está mais familiarizada do que eu com o que a outra gerente fazia. E enquanto ela anotava, quebrou o lápis, de tanta força que usava.

Merda.

— E eu perguntei se estava nervosa, achei que podia estar, não sei, tensa por eu ser seu novo chefe, ou algo assim, mas ela me disse que não estava com raiva de mim.

— Ela usou a palavra raiva?

— Achei esquisito também. Perguntei de quem ela estava com raiva e ela... sorriu. — Justin para, como se relembrando o momento.

Sim, o sorriso.

— O sorriso dos psicopatas antes de cometer um crime — murmuro.

— O quê? — Justin me encara confuso.

— Nada, estava pensando alto! E foi só isso?

— Eu disse que ela devia relaxar. Que sou um cara bem fácil de se trabalhar. Bem, eu ouvi algumas histórias.

— Histórias?

— Sim, sobre Erin York e a maneira que tratava Julie. Eu falei pra ela que agora as coisas serão diferentes. Eu tenho uma maneira muito mais justa.

— E ela ficou mais calma com isso?

— Não exatamente. Ela se levantou e pediu desculpas, perguntou se podia ir embora.

Que porra Julie estava pensando ao pedir para ir embora mais cedo depois de ficar duas semanas fora?

O lado chefe exigente em mim não está nem um pouco contente com aquela atitude.

— Enfim, eu disse que não haveria problema. E... — ele se mexe na cadeira um pouco incomodado — e Barbara me pôs a par do casamento de vocês. E eu ainda não tinha comentado com Julie, porque, bem, na verdade não tem nada a ver com o trabalho. Acho que isso é particular. Mas achei melhor comentar que eu sabia da sua ligação com o CEO, para que não houvesse mal-entendidos ou algo assim. Se for isso que a preocupava.

Justin não faz ideia do que se passava na cabeça de Julie.

Mas eu estou começando a fazer ideia.

— E então ela foi embora?

— Eu lhe dei os parabéns pelo casamento recente. Disse que entendia que ela estava voltando ao trabalho hoje e que poderia ter muitas coisas para fazer sendo recém-casada. E ela sorriu concordando.

— Sorriu, de boa ou um sorriso de quem tinha ideias... macabras na cabeça?

— Quê?

— Não, nada, enfim, obrigado, eu já vou indo.

— Na verdade, antes de sair, Julie disse que foi preparar algo para você. Que vai ter uma surpresa.

Ai merda.

Julie está furiosa comigo.

Na minha mente me vem uma imagem daquelas notícias em que mulheres arrancam o pinto dos maridos e o fazem comer.

Começo a suar frio.

— Certo, obrigado, Justin. Até amanhã e mais uma vez, bem-vindo.

— Obrigado. Espero que possamos almoçar juntos para nos conhecer melhor nos próximos dias.

— Claro.

Desço para a garagem e enquanto caminho em direção ao meu carro, um pensamento alarmante passa pela minha cabeça.

Lembranças de quando Julie achou que eu tinha dito aos acionistas que íamos terminar porque eu preferia manter meu cargo na DBS voltam a minha mente. Recordo-me de chegar neste mesmo local e ser surpreendido por Julie com um estilete na mão, sorrindo de forma diabólica depois de estraçalhar meus pneus.

Apresso o passo, agora bem apavorado, já imaginando o verdadeiro massacre que encontrarei, mas ao avistar meu carro, volto a respirar, aliviado.

Os pneus estão intactos.

Graças a Deus.

Solto um risada quando sento no banco do motorista e dou partida. Claro que Julie não ia cometer um desatino deste de novo. Devo estar exagerando possivelmente, ela apenas está chateada e atordoada com a nova ordem das coisas, mas assim que eu chegar em casa, ela estará bem.

Não?

Tento me convencer disso em todo o percurso até em casa, mas a verdade é que no pouco tempo do nosso relacionamento eu aprendi a conhecer Julie muito bem. E Julie não é nem um pouco razoável.

Ela é explosiva.

Impulsiva.

E vingativa.

Caralho, estou fodido.

Começo a suar frio de novo quando abro a porta. E a primeira coisa que escuto é uma música tocando a todo volume. Reconheço os acordes de “Starman” do David Bowie, enquanto caminho pelo corredor em direção à cozinha.

Julie está de costas, mexendo algo no fogão, enquanto cantarola a música. O cheiro de tempero rescende no ar, algo que reconheço pelo aroma ser camarão. A comida que ela quase matou Barbara por intoxicação alimentar.

Hum, ela não está tentando me matar pela comida então, já que não sou alérgico a camarão, muito pelo contrário. Eu aprecio bastante.

Permito-me relaxar um pouco.

— Julie? — eu a chamo com cuidado.

Ela se vira. Uma faca na mão, enquanto sorri.

Aquele sorriso de gótica iluminatti.

Caralho.

— Oi, querido.

“Querido”?

— Oi... Tudo bem? Passei na sua sala para virmos juntos e Justin disse que não estava bem ou algo assim.

Avanço devagar, ainda sem baixar a guarda.

Sei lá se ela não andou treinando jogar a faca no ar, como aqueles jogos circenses.

— Ah sim, Justin — ela diz o nome dele com asco enquanto caminha até a ilha no meio da cozinha e começa a picotar algo com um formato bem fálico em rodelas.

Acho que é uma linguiça, ou algo assim.

Mas caramba, ela corta com gosto, a faca batendo na tábua de madeira vezes sem fim.

Sinto minhas bolas se encolherem.

— Acho que... Justin exagerou. Estou perfeitamente bem. Homens sempre acham que mulheres são frágeis, não? — Ela para com a faca no ar. — Ou que somos idiotas, ou... incapazes de exercer certas funções tão bem quanto os homens!

Limpo a garganta me aproximando, mas mantendo a ilha entre nós.

Lá vamos nós. Ela tinha entrado no assunto temido.

— Julie, querida, eu não acho que... — começo com cuidado. Ela está portando uma faca. Melhor ser cuidadoso com as palavras.

— Ah, a música acabou! — ela me interrompe. — Simon, podia escolher outro para escutarmos? Eu estava precisando relaxar e adorei fuçar entre seus vinis preciosos... tentando escolher algo bom pra ouvir, sabe... espero que não fique bravo, acho que fiz uma pequena bagunça, espero não ter arranhado nenhum, principalmente aquele do Sex Pistols, tão querido pra você...

— Você o quê? — digo devagar enxergando tudo preto.

Não, ela não faria.

Ela não ousaria estragar algum dos meus vinis, ousaria?

— Ah, não fica bravo, não é querido?

Porra!

Saio quase correndo até o escritório, aterrorizado com o que Julie pode ter feito.

Mas quando chego lá, está tudo em perfeita ordem.

Avanço até a estante com os vinis, toco meus preciosos, acho o vinil do Sex Pistols que vale mais de dez mil libras e que eu fiquei a vida inteira procurando para achar na casa do pai de Julie, que havia me dado de presente.

Graças a Deus ele ainda está ali, inteiro. Retiro o disco da capa, olho com cuidado sob a luz. Não há um só risco.

— Graças a Deus — resmungo sentando-me sobre o sofá, porque meus joelhos estavam bambos de pavor.

Julie tinha me provocado.

A pequena psicopata sabia como me apavorar.

Respiro fundo, me acalmando e passando os dedos nervosos pelo cabelo.

Certo. Foi apenas uma provocação. Uma brincadeira.

De mau gosto, mas uma brincadeira.

Está tudo sob controle.

Mais calmo, porém ainda alerta, volto à cozinha.

Julie está servindo vinho tinto em uma taça colocada ao lado de um prato já cheio de linguini com camarão.

Ela quer realmente me provocar fazendo o mesmo prato que causou a confusão com Barbara, tenho certeza.

Ainda estremeço ao me lembrar daquela noite de terror.

Vou até a vitrola que está ali em um canto e coloco o mesmo disco pra tocar.

— Achei que fosse escolher outra música — ela diz inocentemente.

— Vamos continuar com David Bowie e, querida, sabe que não gosto que mexa nos meus vinis, eles são muito caros.

— Ah, amor. Você viu que não estraguei nada, não viu? Vamos, sente-se para comer.

— Você poderia ser... descuidada e arranhar algum... sem querer. — Tomo um gole de vinho, o líquido gelado descendo bem por minha garganta seca.

— Ah, claro que não. Que ideia! Eu nunca faria algo assim sem querer...

Ela retira o avental e senta na minha frente e eu entendo o que quis dizer. Se fosse para fazer, seria de propósito.

Bem, isso queria dizer que era só uma ameaça. Ela não estava nervosa o suficiente para acabar com meus preciosos vinis.

— Vamos, coma! — ela pede com um sorriso.

Ainda é um sorriso sinistro.

Pego o garfo e experimento a comida.

Está deliciosa.

— Hum, muito bom.

— Obrigada, querido. Fiz especialmente pra você.

— Não vai comer?

— A gravidez me deixou um pouco sensível a certas comidas.

Noto que ela não está tomando o vinho também. O que é compreensível.

Mas...

Começo a mastigar mais devagar, um pouco incomodado, porque ela continua me encarando fixamente, enquanto tomo mais um gole de vinho.

— Sabe que tem ratos no prédio?

Tusso quando me engasgo.

— O quê?

— Ratos! Hum, o Ray, da portaria, sabe? Disse pra gente tomar cuidado. No inverno os ratinhos entram pela tubulação para fugir do frio! Parece que alguns vizinhos tiveram que chamar a dedetização. Mas eu já comprei veneno! — Aponta para algo acima da pia e eu sigo seu olhar para ver alguns potes de veneno de rato disposto como se fossem temperos suculentos.

Misericórdia!

— Julie acha que ali é lugar de deixar veneno? Junto com a comida? — De repente a situação começa a me apavorar de verdade.

A comida parece ter gosto de... veneno na minha boca.

— Por quê? Acha que eu posso confundir com manjericão? E colocar na comida? — Ela solta uma risada. — Ai Simon, que imaginação! E então, o camarão está bom? Estava me lembrando de quando a Barbara esteve aqui, de como eu quase a matei por intoxicação. Bem, eu devia ter matado mesmo — sua voz sobe de tom conforme ela continua, agora não mais de forma blasé , e sim com toda a raiva que devia ter guardando por todo o dia —, assim ela não colaboraria para colocar aquele tal de Justin Taylor no lugar que devia ser meu!

A frase termina com um grito e é acompanhado por um bater de punho na ilha fazendo o conteúdo da minha taça voar pelo mármore.

Certo. Lá vamos nós.

— Julie, se acalme, precisamos conversar sobre isso... — digo devagar.

— Me acalmar? Quer que eu fique calma quando tenho que aguentar aquele boneco Ken bronzeado filho de uma puta com seu diploma de MBA de Cambridge e seus dentes brancos tomar meu lugar?

— Julie, não é assim...

— É exatamente assim! Já posso até ver! Ele está fingindo que é muito gente boa agora, mas assim que conseguir arrancar todos as informações de mim, vai me tratar pior que a Erin! Já imagino ele mandando trazer Whey protein pra ele na sala em vez de café, enquanto ele faz flexões e monta estratégias de RP ao mesmo tempo, porque claro, ele é o Super-Homem das relações públicas! E a trouxa aqui vai continuar de assistente para o resto da vida! Ah Meu Deus, o que meu filho vai dizer? Que a mãe é um fracasso! Vai ser motivo de riso na escola com a mãe que trabalha há dez anos de assistente, sem nunca ter uma promoção...

— Julie para de delirar! Eu sei que está decepcionada, que queria aquela posição, mas a Barbara e os acionistas acharam, que devido a nossa relação...

— Aquela cretina da Barbara foi quem deu a ideia, ela nunca gostou de mim, claro! Acho que ela queria ficar com você, sempre desconfiei...

— Chega, Julie, não fala merda... — Começo a ficar irritado também.

— Agora sou acusada de falar merda? Você deveria ter me defendido! Sabia que eu queria ficar no lugar da Erin e mais, sabia que eu era muito capaz! Você mesmo me disse! Por que me traiu desse jeito, Simon? Me deixou pensar... — De repente ela enfia o rosto entre as mãos e começa a soluçar.

Seu choro me desmonta e com poucas passadas, dou a volta na bancada e a abraço.

— Julie, não chora, merda!

Ela começa a chorar ainda mais alto.

— Shi, vai ficar tudo bem, se acalme. Olhe pra mim. — Levanto seu rosto a fazendo me encarar e enxugo sua bochecha. — Me desculpe, ok? Eu fui um babaca por não ter te preparado. Achei que ia dar tempo, Justin só ia chegar em uma semana. Queria te contar direito e explicar. Eu sei que você é capaz. Todos os acionistas sabem. Mas você está há três meses na empresa, Julie. Seja razoável.

Ela funga.

— Eu sei, mas achei que... Ah Simon, eu queria tanto! Sabe que eu nem sabia que gostava tanto deste trabalho e achei que com a saída da Erin...

— Eu sei. Mas nosso casamento também complica tudo, Julie.

— Oh... — Finalmente ela parece começar a entender. — Isso é uma merda.

— Sim é uma merda, mas é como é. E eu sinto muito por não ter te contado. Não era minha intenção que fosse pega de surpresa.

— Sim, foi um choque ver aquele cara lá! Fiquei com tanta raiva!

— Eu sei. — Sorrio me lembrando da tensão de achar que ela ia me matar ou algo do tipo. — Por isso quis me assustar?

Ela sorri também, não negando.

— Foi divertido ver você com medo.

— Ah, Julie, sua psicopata...

— Me desculpe... Eu só estava um pouco descontrolada. — Ela começa a chorar de novo.

— Agora pare de chorar, por favor. Acho que prefiro ver você com raiva. Não gosto de ver você assim.

— São os hormônios, acho...

— Não sei lidar com você assim. Por favor, me desculpa.

— Eu vou pensar se consigo te desculpar... — Ela se afasta pegando um lenço de papel e enxugando o rosto.

Ainda me sinto preocupado.

Não mais com uma ameaça a minha integridade, mas por Julie estar chateada.

— Vamos, o que eu posso fazer para deixar você feliz? — Aproximo-me e a abraço. — Para te recompensar?

— Posso pedir qualquer coisa?

Ah Deus, eu sei que posso estar cavando minha sepultura, mas concordo.

— Eu faço qualquer coisa para você, baby.

Ela sorri.

— Quero que a gente vá a um clube BDSM.

O quê?

— Está louca? É isso que você quer?

— Qual o problema? Eu sempre tive curiosidade! — Ela brinca com minha gravata, um sorriso safado no rosto.

Hum, pode não ser uma má ideia.

Merda. Eu estou começando a ficar excitado com a ideia também.

— Por favor, Simon... Só pra gente ver como é... E aí eu posso ficar bem inspirada... — Seus dedos percorrerem meu peito.

— Ok, você venceu, Senhora Bennett. Vamos satisfazer sua curiosidade.


Horas depois estamos deixando nossos casacos em uma chapelaria de um clube muito esquisito.

As paredes são escuras e o ambiente à meia-luz é quase fantasmagórico.

O segurança que me revista parece bem mal-encarado, mas acho que tudo é uma espécie de encenação, não é?

Julie parece uma criança levada pela primeira vez ao parquinho ao meu lado.

Eu tinha ficado bem surpreso depois que concordei com sua ideia, quando logo disse que já sabia onde queria ir.

— Como assim você já sabe? Achei que fosse a primeira vez que estivesse indo num lugar assim.

— E é! Mas eu pesquisei e este lugar foi indicado.

— Indicado por quem? — Levanto a sobrancelha intrigado.

— Por uma amiga!

E agora estamos aqui percorrendo o corredor até um salão, que se assemelha a qualquer boate, com música tocando, mesas dispostas e um balcão servindo bebidas.

Só que além disso tudo também bem no meio tem algo que se parece com um palco, cheio de aparelhos e acessórios para realizar os mais diferentes fetiches.

Um garçom se aproxima trazendo um whisky para mim e água com gás para Julie. Pedir bebida não alcoólica para ela me faz lembrar de seu estado e me sinto um tanto culpado por trazê-la aqui.

Talvez não seja o momento certo.

— Uau! Aqui é demais! — Julie exclama empolgada. — Queria saber para o que são aquelas coisas! — Ela aponta para o minipalco.

— Painel para Spanking , vigas para Bondage e Shibari — respondo tomando um gole da minha bebida.

Os olhos de Julie se estreitam.

— Como você sabe? Vai me dizer que é uma espécie de CEO dominador tipo o cara do quarto vermelho da dor daquele livro!

Eu solto uma risada.

— Não viaja, Julie. Mas assim como você, eu já fui bem curioso, e claro que tive minha época de ir atrás de realizar essas fantasias, mas não passou disso. Fantasias. Eu gosto de uma perversão como bem sabe, mas tudo dentro do normal.

— Ah, quase chego a sentir que é uma pena...

— Por quê? Por favor, não me diga que é uma submissa e vai me obrigar a te bater.

É a vez dela rir.

— Por que eu seria uma submissa? Poderia ser uma dominatrix! Me diz, Simon, ia me deixar eu te bater?

— Acho que consigo te imaginar querendo algo assim, Julie! — Eu rio, a beijando de leve.

De repente a música fica mais baixa as luzes diminuem.

O garçom veio trazer outro whisky e Julie pergunta o que está acontecendo.

— A dominatrix da noite está entrando.

Olhamos para onde ele aponta e vemos uma mulher com uma capa, se aproximando.

Quando chega ao palco, ela retira a capa revelando uma roupa de couro colada. Há algo em seu cabelo também a cobrindo assim como uma máscara.

— Ela pode chamar qualquer um para ser seu escravo hoje. Se quiser participar, coloque a máscara — o homem diz apontando para uma máscara em cima da mesa que não tinha visto.

— Ah que legal! — Julie pega a máscara e sem pedir licença, enfia na minha cabeça.

A peça de couro pega até meus cabelos, deixando apenas meus olhos e minha boca de fora.

— Que merda pensa que está fazendo?

Ela ri.

— Vai ser divertido, relaxa! Disse que ia fazer qualquer coisa pra me deixar feliz?

— Isso?!

Ela ri e levanta a mão.

— Ei, temos um escravo para você! — grita para a dominatrix no palco, que estala o chicote no chão e vem em nossa direção.

Porra, caralho, onde eu tinha me metido?

— Julie, eu não gosto dessas coisas, não pode estar falando sério...

— Para de ser bobo, vai ser legal!

A mulher de couro chega até onde estamos e estala o chicote na mesa me assustando.

Caramba!

— Vem comigo, escravo! — Ela segura algo na máscara, uma corrente perto do meu pescoço que não tinha visto antes e eu não tenho alternativa, a não ser me deixar puxar pela estranha figura até o palco.

Mas quando chego lá, decido que já foi longe demais.

Julie deve estar rindo da minha cara. É isso.

Ela quer me provocar e me punir ainda pelo lance do novo chefe. Mas já chega.

Mas antes que eu possa fazer qualquer coisa, a dominatrix estala de novo o chicote, dessa vez na minha camisa.

Porra, aquilo dói.

— De joelhos, escravo!

E é então que eu reconheço aquela voz.

É a voz que me assombra desde que me tornei o CEO da DBS.

A voz da minha secretária Natasha.

Caralho!

 


Capítulo 4

 

Simon


O susto é tanto que não consigo esboçar qualquer reação enquanto Natasha puxa meus braços para cima, prendendo meus pulsos com correntes.

Caralho, isso não pode estar acontecendo!

— Mas que merda... — resmungo tentando soltar meus braços, mas ela me dá um tapa na cara.

— Cala a boca, escravo! Você só fala quando eu mandar, entendido?

Meus olhos se arregalam por baixo da máscara, questionando-me agora se ela sabe que é o chefe dela que está ali.

Não, ela não pode saber.

Ela não ousaria fazer nada disso se soubesse.

Ousaria?

Eu espero mesmo que não.

E a verdade é que não quero que Natasha saiba que sou eu ali, o escravo apavorado atrás da máscara.

Porra. Cacete!

Eu sabia que ela era louca, mas nem tanto!

Louca não. Sádica.

Estou ferrado.

— Sacuda a cabeça se entendeu, escravo!

Sem alternativa, sacudo a cabeça em concordância e para meu pavor, Natasha abre minha camisa com maestria, passando as unhas pintadas de preto por meu peito.

Isso está mesmo acontecendo? Minha secretaria gótica está passando a mão no meu peito?

Quão inapropriado é isso?

— Muito bem, escravo. Vamos ver o quanto de dor aguenta!

Dor?

Ela disse dor?

Viro a cabeça rápido, olho para onde Julie está sentada.

Pergunto-me se ela sabe que é Natasha ali e quando capturo seu olhar deliciado, percebo que foi ela quem aprontou toda essa situação.

Não sei se Natasha tem ideia da minha identidade, mas Julie com certeza arquitetou tudo direitinho.

Psicopata maldita!

Ela vai me pagar por isso.

— Aiiiii! — Um grito estridente escapa da minha garganta quando sinto algo quente escorrendo por minha pele, olho para baixo para ver Natasha jogando um troço jocoso que parece... cera?

Meu Deus do céu, ela quer me matar?

Eu sabia que ela tinha uma verve assassina!

— Gostou escravo? — indaga sorrindo.

Sacudo a cabeça negativamente.

— Responde!

— Não, não gostei dessa mer...

Outro tapa na cara.

Porra!

— Diga “senhora”!

Respiro fundo.

— Não, senhora.

— Então ainda não está bom? Que tal mais? — E ela esparrama mais da meleca quente no meu peito. Dessa vez eu não grito.

Não vou lhe dar esse gostinho.

— Muito bem, escravo!

Ok. Talvez se eu ficar quieto e entrar na brincadeira ou sei lá como chama essa tortura, ela me liberte. Para que eu possa acertar as contas com minha querida esposa vingativa que agora ri com gosto de seu privilegiado campo de visão.

— Agora vamos ver o que mais eu posso fazer com você... — Natasha me rodeia e de repente sinto uma chicotada na minha bunda.

A risada de Julie vibra alto no meu ouvido.

Sem aviso, meus pulsos são soltos, mas antes que eu possa fugir, sou empurrado para um banco de espancamento, caindo de joelhos sobre o couro, enquanto a versão sadomasoquista da minha secretária empurra minha cabeça pra baixo e sussurra em meu ouvido.

— Vamos ver o quanto aguenta, escravo!

— Eu acho que chega... — Tento acabar com aquela brincadeira, mas Natasha está tirando minha camisa e prendendo meus pulsos no banco.

— Cala a boca, escravo! Quem define quando termina sou eu!

E antes que eu possa responder, sinto uma mordaça com uma bola sendo enfiada na minha boca e mais uma chicotada na minha bunda, acompanhado de sua risada maligna.

— Acho que hoje eu vou pedir ajuda para punir este escravo insolente!

— Eu, por favor! — A voz de Julie se faz ouvir.

Ah claro.

Ela não vai deixar Natasha se divertir sozinha.

— Aproxime-se, irmã.

Irmã?

— O que gostaria de fazer com este escravo?

— Você tem um grampeador?

Quê? Que diabos!

— Seria ótimo grampearmos nas suas costas alguns bilhetes do tipo “Não devo nunca tentar enganar minha esposa”.

— Não temos um grampeador... Mas temos chicote, cera, grampos para mamilos, plugs anais...

Plug anal? Elas estão loucas se acham que...

— Um plug anal? De qual tamanho? — Julie indaga.

Tento me soltar, rosnando, sem poder falar nada com aquela bola na minha boca.

— Quer que eu tire a calça dele? — Natasha pergunta, para meu desespero.

— Hum, não, acho que vou pedir apenas para dar umas chicotadas!

E sem aviso, sinto de novo o chicote na minha bunda e a risada de Julie, agora perto do meu ouvido.

— Está se divertindo, amor? — Ela tira a bola da minha boca.

— Sua, filha da puta, quando eu sair daqui...

— Ei, não seja impertinente, escravo! — Ela ri voltando a colocar a bola na minha boca.

— Muito obrigada, senhora, acho que pode me devolver meu escravo. Ele já se divertiu demais — diz à Natasha.

— Tem certeza que não quer que eu busque um plug anal que dá choque?...

— Vai ficar para a próxima! Se ele for impertinente, com certeza vamos querer esse treco aí de dar choque na bunda!

— Muito bem!

Finalmente Natasha me solta e antes que eu posso tirar minha máscara e confrontá-la — e quem sabe adiantar sua demissão — ela já sumiu de vista.


— Nunca me diverti tanto na minha vida! — Julie não consegue parar de rir, no caminho inteiro para casa.

Eu ainda estou tão puto e chocado que nem consigo esboçar uma reação maior do que soltar palavrões indignados de tempo em tempo enquanto relembro que fui subjugado pela minha secretária.

E num plano arquitetado pela minha esposa!

Que espécie de mundo paralelo bizarro eu tinha entrado?

Quando entramos no elevador ela continua rindo sem parar.

— Não teve graça nenhuma, Julie!

— Ah teve sim! Precisava ver a sua cara quando reconheceu a Natasha!

— Ainda não acredito que armou isso pra mim! Com a minha secretária! Como acha que vou encará-la amanhã, lembrando que ela queria enfiar um plug no meu rabo?

Julie explode em gargalhada de novo enquanto saímos do elevador.

— Ai caramba, eu devia ter deixado!

— Se tivesse permitido uma merda dessa eu teria que demitir a Natasha e pedir o divórcio!

Abro a porta do apartamento, ainda enfurecido.

— Ah, não precisa ficar bravo! Tenha senso de humor! Não curtiu nem um pouquinho?

— Você acha que gosto de apanhar de uma louca gótica mascarada que ainda por cima é minha secretária? Secretária essa que, confesso, tenho certo medo de que alimente ideias violentas a meu respeito?

— Eu sabia que tinha medo da Natasha! Eu falei para ela isso!

— Você falou?

— Bem, ela comentou uma vez antes da gente sair em lua de mel que frequentava esses lugares de BDSM, eu nem dei muita atenção na hora. Ontem depois de me deparar com o filho da puta engomadinho que arranjou para usurpar meu lugar, eu fiquei muito brava e subi lá no seu andar, mas Natasha me parou e disse que estava em conferência. Aí acabei confessando que estava enfurecida contigo. E ela disse que quando estava brava com algum namorado deixava o lado sádico vir à tona e aí, bum! Eu tive essa ideia maravilhosa!

— E ela concordou?

— Claro que não concordou de pronto. Mas eu sou bem persuasiva quando quero, né? E lhe garanti que você não iria saber da identidade dela. Ou seja, não precisa demiti-la, Natasha acha que você não sabe que era ela lá, vestida de dominatrix.

— Eu reconheceria aquela voz cavernosa em qualquer lugar. Ela está nos meus piores pesadelos!

— Então fique calmo! Foi apenas uma brincadeira.

— Brincadeira de mau gosto!

— Eu me diverti muito vendo você amarrado. Acho que vou comprar umas algemas e um chicote...

Antes que consiga terminar, eu a puxo para perto a jogando sobre meus ombros.

Hora da revanche!

— Ei, o que está fazendo?

Eu a levo direto para nosso quarto e a jogo na cama.

— Você acha que sou algum tipo de submisso, querida esposa? Está muito enganada. Se quer brincar, eu prefiro dominar a cena.

Tiro seu vestido e uso para amarrar seus pulsos na cama.

— Espero que se lembre que sou uma mulher grávida e frágil!

— Devia ter pensado nisso antes!

Eu a deixo nua e retiro minhas roupas, a virando de costas e aplicando-lhe um sonoro tapa na bunda.

Ela começa a rir de novo.

— Julie, se ficar rindo não tem graça nenhuma! — Ergo seus quadris e a penetro devagar, a fazendo gemer.

— Está bem, mestre! Ou prefere senhor? — Ela gira o rosto para me encarar. — O que vai fazer comigo? Não temos chicote aqui e nem grampos para os seios! Ah, adoro grampos no seio!

Franzo o olhar, a encarando desconfiado e parando meus movimentos.

— Você parece bem familiarizada com essas coisas.

Ela rola os olhos.

— Simon, acreditou mesmo que eu nunca tinha ido num lugar daquele?

— Você foi?

— Milhões de vezes!

— Quê?

— Quer dizer, é maneira de falar. Eu tive um namorado que curtia esses fetiches, foi divertido embarcar nessa algumas vezes.

— Porra, Julie!

— Está bem, é mentira, querido marido! Eu era praticamente virgem quando te conheci, uma santa, nunca nem tinha tido um orgasmo, você é o único homem que fez meu corpo delirar... vamos, continua fazendo amor comigo... — Faz a melhor voz de mocinha de romances.

Não combina com ela.

— Cala a boca, Julie. — Eu lhe dou outro tapa e ela ri.

— Achei que era isso que queria ouvir!

— Melhor parar com este papo. Quer que eu te amordace?

— Achei que ia me foder com força e está aí batendo papo sobre meus ex-namorados...

Rosno irritado e volto a estocar com força, disposto a tirar da cabeça dela — e da minha — seus ex-namorados pervertidos. E não demora para seu riso debochado se transformar em gemidos cada vez mais altos, até que ambos estamos gozando ruidosamente, esquecidos de qualquer coisa que não seja o prazer que sempre tiramos um do outro.


— Tem mais alguma coisa que queira me contar? — pergunto algum tempo depois, quando estamos ambos prontos para dormir.

Julie se vira mim.

— Jura que quer um relatório sobre isso?

— Não, não quero — resmungo.

Ela ri.

— Decida, Simon!

— Só acho que fiquei um pouco chocado. E nem sei por que, como se você não me surpreendesse sempre.

— Então não preciso tirar meus esqueletos do armário?

— Que porra de esqueletos no armário?

— Minhas histórias escabrosas.

— Tem mais?

— Até parece que você era um santo! Podia exigir que me contasse suas histórias também!

— Duvido que tenha algo digno de Julie Harris.

— Julie Bennett! — ela me corrige. — Ah, eu amo meu novo sobrenome! Tão imponente. Me sinto quase da realeza. Tem certeza que não tem nenhum parente nobre?

— Se queria um nobre devia ter casado com o Henry.

Seus olhos se arregalam.

— O quê? Henry é da realeza?

— Henry é um maldito duque.

— Uau! Acho mesmo que casei com o cara errado!

— Julie, não me provoque, acho que já me testou demais por um dia só!

— Ah, não pode me contar uma bomba dessa e querer que não fique impressionada! Gente, Henry anda parecendo um mendigo e é um duque! Ele é muito rico? Oh, ele tem um castelo?

— Sim, ele é rico e tem um castelo, mas eu sou rico também, esqueceu?

— Como vou esquecer? É por isso que me casei com você.

Caramba, hoje ela está mesmo querendo me enfurecer.

— Então se eu não fosse rico não me amaria?

Eu a observo fazer uma careta, pensando sobre o assunto, e dá de ombros.

— Hã, sei lá.

— Porra, Julie!

Ela solta uma gargalhada e me beija.

— Ai Simon, é tão engraçado zoar com você! Fica tão bonitinho irritado!

— Então agora eu sou bonitinho? Não sou mais o marido que quer assassinar por ter te privado de ser uma gerente de RP?

— Aff, vai me lembrar? Eu já estava me esquecendo daquele idiota do Justin Taylor! E também que estava brava com você por isso!

— Eu deveria estar bravo com você. Está cogitando se deveria ter casado com um cara mais rico!

— Simon, você é tão bobo! Não sabe que eu sou louca por você?

— Eu sei que você é louca.

Ela bufa.

— Sabia que eu não era uma mocinha de romance bobo! Ou preferia ter casado com alguém assim?

É minha vez de puxá-la pela nuca e beijá-la.

Porque sim, eu sei que ela não é uma mocinha de romance bobo.

Ela é toda errada. Mas tão perfeita pra mim.

— Não quero uma mocinha de romance.

— Certeza que não ia preferir que eu fosse virgem, modesta e de coração puro?

— Eu prefiro uma maluca que jura que quebrou o osso cúbito.

Ela sorri.

— Então sou perfeita pra você?

— Sim.

— Mesmo se eu envenenar o novo gerente de RP?

— Julie, sério! Pare de implicância. Bem no fundo sabe que essa foi a coisa certa a fazer. No tempo certo, tenho certeza que vai chegar muito longe ainda.

— E se ele for igual a Erin e me odiar?

— Não vai. Prometa pra mim que vai fazer um esforço para gostar dele. Por favor? Pode aprender muito, eu te garanto.

Ela suspira.

— Tudo bem, eu posso fazer esse esforço. Mas se ele folgar comigo não vou deixar barato!

Apago a luz do abajur.

— Agora chega, vamos dormir.

— Ah, esqueci de te avisar. Amanhã temos nosso primeiro ultrassom. Não é emocionante?

— Avisou à Natasha para pôr na minha agenda?

— Não achei que tivesse que avisar algo assim!

— Julie, se eu tiver algum compromisso, não poderei ir.

— Que compromisso é mais importante do que nosso bebê, Simon? Sério que vai ser esse tipo de pai omisso? Como nosso filho vai crescer saudável desse jeito? Amanhã mesmo já terei que procurar um psicólogo infantil pra ele, porque o coitadinho...

— Ei, shiu! — Tapo sua boca. — Já passa da meia-noite, dá pra deixar suas neuras pra amanhã? Prometo que vou ajustar qualquer coisa que tenha agendado para ir com você, ok? — Tiro a mão da sua boca.

Ela sorri satisfeita.

— Ah, vai ser tão emocionante! Mal posso esperar para ver nosso bebê amanhã!

 


Capítulo 5

 

Julie


Estou muito animada quando entro no hospital e ansiosíssima para finalmente ver como meu bebê está na minha barriga.

Toda manhã, eu ficava em frente ao espelho, analisando meu ventre para ver se já tinha crescido, o que fazia Simon rir da minha cara.

— Julie, não tem nada aí ainda! Acho que vai demorar uns dois meses para aparecer.

— Eu sei, mas estou tão ansiosa! Quero muito saber como vai ficar! Tenho certeza que serei como Kate Middleton, uma grávida elegante!

Sim, eu tinha certeza que minha gravidez seria incrível!

— A senhora chegou um pouco adiantada — a recepcionista diz com um sorriso polido. — Seu exame está marcado para daqui uma hora.

— Eu sei! Mas fiquei com medo de pegar algum engarrafamento, sabe como é Londres essa hora da manhã.

Ok, é uma mentira. O hospital fica a dez minutos do apartamento de Simon, em Chelsea.

Quer dizer, nosso apartamento.

É difícil para mim ainda pensar no apartamento de Simon como minha casa. Talvez porque lá era a casa dele antes de me conhecer. Talvez a gente precise de um lugar que fosse nosso.

Sim, podemos comprar um apartamento novo!

Ai meu Deus, eu ia adorar reformá-lo. Será que os “Irmãos à Obra” viriam dos Estados Unidos para fazer o quarto do bebê com conceito aberto?

Ai caramba, o quarto do bebê!

Preciso pensar nisso urgente! Nove meses é muito pouco tempo e...

— Senhora? — a recepcionista chama minha atenção, e eu volto à realidade.

— Desculpe, me distraí.

— Eu disse que a senhora pode esperar na sala à direita.

— Tudo bem. Obrigada.

Caminho até a sala de espera enquanto olho o celular, para ver se Simon mandou alguma mensagem de que estava a caminho.

Ele havia me comunicado naquela manhã que tinha mesmo um compromisso de trabalho.

— Eu não acredito que não vai comigo! — reclamei enquanto ele se preparava para ir trabalhar.

Simon não pareceu afetado pela minha irritação enquanto continuava arrumando a gravata no espelho.

— Eu não disse que não vou com você! Tenho uma reunião com alguns fornecedores agora de manhã e assim que sair de lá, te encontro no hospital, ok? Vai dar tempo.

— Eu devia ter chamado minha mãe para ir comigo, se soubesse que ia ficar me colocando em segundo lugar!

— Duvido que chamasse sua mãe! Já imagino Alicia fazendo alguma dança maluca enquanto entoa cânticos para a deusa e joga fumaça de incenso na cara de todo mundo na sala de espera. — Ele riu.

Sim, ele tinha razão.

Mamãe era mesmo bem capaz de fazer isso.

— Então estamos combinados? Nos encontramos no hospital daqui a duas horas, certo?

— Está bem — concordei com desânimo, porque sabia que não adiantava discutir com Simon quando se tratava de seu precioso trabalho.

Agora, só espero que ele saia dessa tal reunião a tempo.

Entro na elegante sala de espera e tem várias mulheres sentadas, aguardando.

Sorrio, muito animada, me sentando em um dos sofás.

Ah, tudo isso é tão incrível!

Gerar um bebê é uma experiência mágica e única na vida da mulher. Penso, tocando meu ventre ainda plano.

— E como você está se sentindo? — Uma delas, uma loira com uma barriga enorme pergunta à outra, uma ruiva que tem uma barriga um pouco menor.

Sorrio, prestando atenção na conversa.

Quero muito ouvir a experiência delas, ouvir suas palavras emocionadas sobre o pequeno milagre de carregar outro ser humano dentro de si.

Nossa, que frase bonita, acho que vou anotar para colocar no meu livro de poesia sobre gravidez. Tenho certeza que ninguém pensou em algo assim.

Sou mesmo muito inovadora.

— Ah, estou com um humor terrível! — a mulher responde fazendo a outra sorrir compreensiva.

— Mas aposto que os enjoos já passaram! Quanto tempo está?

— Entrando na vigésima semana. E nem me lembre dos enjoos! Eu vomitava todo dia durante os primeiros três meses! Era praticamente uma bola de vômito ambulante.

Eu me recordo da minha onda de náusea lá em Paris, que me fez vomitar todo macaron que tinha ingerido.

Bem, aquela foi a única vez que fiquei mal. Espero que tenha sido a única, até agora não senti enjoo de novo.

— Sim, eu te entendo — uma mulher que não tem barriga aparente se intromete. — Eu me sinto nauseada o tempo inteiro! Não consigo comer nada, todos os cheiros me irritam! Sabe que enjoei até do cheiro do meu marido? O coitado está dormindo no sofá!

Ah, gente, como ela pode enjoar do cheiro do próprio marido?

Eu amo o cheiro de Simon! Queria poder colocar num potinho e usar de perfume! Como aquele cara psicopata do filme “Perfume” fez com suas vítimas.

— Eu sinto dores de estômagos terríveis — outra diz, com uma barriga enorme também. — E me disseram que os enjoos eram nos primeiros três meses. Mentira! Sinto azia o tempo inteiro!

— Ai gente, desculpa preciso ir ao banheiro, minha bexiga não dá trégua. — A moça com a barriga inexistente se levanta e as outras riem.

— Isso que ela ainda tem controle sobre a bexiga! Quando a gravidez avançar, vai ver como vai ficar bem pior.

Pior?

— E os bebês de vocês mexem tanto que parece que querem te matar? — a barriguda loira questiona as outras.

— O meu tem horas que pressiona minha vagina de um jeito que acho que vai sair a qualquer momento! — a ruiva responde.

Elas riem.

Gente, isso não é engraçado!

— Ah me sinto inchada como um balão — a mulher com a barriga enorme diz com voz cansada. — Meus pés parecem de palhaço.

Olho disfarçadamente para baixo e caramba, ela tem razão.

A coitada está tão inchada que se passar um vento leva ela voando como um dirigível!

— Eu engordei vinte quilos! Está difícil! — outra comenta.

Vinte quilos? Ela daria à luz a um lutador de sumô?!

— Pelo menos não teve diabete gestacional como eu! — outra diz e elas começam a falar ao mesmo tempo, fica difícil acompanhar.

— Mas tive hipertensão!

Quê? Diabetes? Hipertensão? Como assim?

— E as dores nas costas? — outra diz. — Eu não encontro posição para dormir! Sem contar a dor na bunda! Pelo menos está chegando meu parto!

— Vai ser normal ou cesárea?

— Optei pelo normal.

— Não fique tão feliz! Este é meu segundo bebê e o primeiro parto foi normal e traumático! Fiquei trinta horas com dores e não dilatava e estava já implorando para alguém me trazer uma faca porque eu mesma ia tirar aquele bebê dali! Por isso agora será cesárea.

— Meu primeiro foi cesárea e acredite, o pós-parto é horrível também! Mal aguentava de dor nos pontos e ainda tinha que levantar para amamentar a noite inteira!

Gente, do que estas mulheres estão falando?

Como assim a gravidez não é um momento único e mágico?

E que porra é aquela de parto de trinta horas?

De repente sinto uma irresistível vontade de fazer xixi e me levanto, indo ao banheiro.

Ai caramba, já está começando!

Elas têm razão?

Em que merda eu tinha me metido?

Estou ligeiramente trêmula e enjoada quando saio do banheiro e caminho pelo corredor sem rumo. Preciso de algo alcoólico pra me acalmar.

Não, droga, não posso beber! Porque estou grávida!

E daqui a pouco, começarei a vomitar por aí como a garotinha do Exorcista! E terei que usar fraldas quando não conseguir mais conter minha bexiga! E eu achei que só o bebê usasse fralda!

Vou ficar com um humor terrível porque meu estômago, minhas costas e minha bunda estarão em agonia!

Isso se não desenvolver uma diabetes ou hipertensão, ou sei lá mais o quê!

E o parto?

Caramba, eu não tinha parado para pensar no parto! Claro que já tinha visto em filmes e sempre achei muito engraçado a mulher lá resfolegando, suada e gritando enquanto o bebê era retirado pelo médico.

E aí ela ficava rindo de orelha a orelha, toda emocionada e esquecia a dor. Não era assim?

E se não fosse? E se só tivesse a parte ruim e tudo não passasse de enganação? Sim, é tudo parte de uma conspiração para nos manter cegas à verdadeira face da gravidez!

Nossa, como ninguém nunca percebeu? Deve ter até uma área 51 ou algo assim, só que em vez de alienígenas, o governo esconde as grávidas!

Paro de repente, extenuada e percebo que estou em outra área do hospital. Uma enfermeira passa empurrando uma moça grávida em uma cadeira de rodas. A mulher está respirando rápido e com um soro nas mãos.

Olho em volto, curiosa. Será que me deixariam assistir o parto?

Sim! É isso que eu preciso. Saber como é de verdade, nada de filmes de Hollywood para me enganar!

Penso rápido e avisto uma sala escrito “vestiário”.

Corro pra lá e como desconfiei, tem um uniforme de enfermeira pendurado. Eu o visto rapidamente, prendendo meus cabelos sob a touca, com medo de alguém me pegar ali e saio fazendo minha melhor cara de enfermeira de sala de cirurgia. O que é muito fácil pra mim, pois assisti todas as temporadas de Greys Anatomy.

Uma médica passa por mim ao sair do quarto onde a enfermeira havia levado a mulher em trabalho de parto.

— É você que está no quarto cinco? A paciente ainda não está dilatada o suficiente. Fique de olho e me avise se mudar algo. Volto daqui a pouco para ver se dilatou mais. Estamos com muitos partos hoje, está uma correria, todo mundo muito ocupado!

— Sim, senhora, quer dizer, doutora.

Entro no quarto e sorrio para a mulher na cama.

Ela não parece tão mal.

— Olá, como se sente? — Eu me aproximo e pego a ficha que está ao lado da cama, fingindo ler.

Obviamente não entendo nada.

— Como acha que estou? — Ela sorri, porém mais parece uma careta. É uma mulher bonita, com cabelos loiros e expressivos olhos cinzentos. Embora esteja um pouco descomposta agora.

Hum, acho que se ela soltasse os cabelos e passasse uma chapinha ia melhorar. Ela deve ter suado bastante, pois os fios loiros estão opacos e grudados na sua testa, que, não posso deixar de notar, está sem maquiagem.

Sério, ela não devia ter se preparado para um momento importante desses? Será que quer sair nas fotos com seu bebê recém-nascido com aquelas olheiras de panda e sem sequer um batom?

Eu me pergunto se ela achará ruim se eu comentar isso. É só uma dica, de mulher pra mulher, claro.

— Vejo que está bem... descomposta. — Sorrio com solidariedade, dando a volta na cama para dar uma boa olhada no seu pé. Hum, não está assim tão inchado. — Por que não se maquia um pouquinho? Talvez usar um babyliss nos cabelos, para definir, acho que iria ficar ótimo com a sua estrutura óssea.

Ela me encara, confusa.

— O quê?

— Ah, era só um conselho! Aposto que vai ter alguém gravando seu parto, não?

— Meu marido Eddie está chegando, ele estava em uma reunião de trabalho em Birmingham, por isso não está aqui ainda!

— Ah, maridos e suas reuniões de trabalho! — Nossa, sinto-me conectada com aquela estranha de repente. Será que o marido dela também é workaholic ? — Enfim, aposto que o Eddie vai gravar seu parto e você quer mesmo que seu rosto sem maquiagem fique eternizado em vídeo caseiro que vai chegar até seus netos?

A mulher continua me encarando como se não compreendesse o que estou falando.

Certo, talvez ela esteja confusa por causa das contrações e tudo o mais.

Se bem que até agora ela parece bem serena. Acho que tinha exagerado mesmo, as contrações não podiam ser tão ruins assim.

E, por favor, as mulheres aguentavam depilação à cera e terríveis cólicas menstruais! Claro que iam tirar de letra algumas contrações bobas.

Volto a pegar a ficha da paciente. Seu nome é Claudia Phillips.

— Infelizmente minha bolsa não está aqui — eu havia deixado minha bolsa no vestiário, afinal não queria que estragasse meu disfarce —, mas se tiver alguma coisa na sua, eu posso melhorar seu rosto. Sua pele é muito boa! Talvez só um blush e um rímel... Talvez um cílio postiço? Sim, ficaria lindo em você!

— Sério, que diabos está falando? Onde está a enfermeira Fisher? Achei que ela que iria me checar.

— A enfermeira Fisher está em outro parto. Está lotado hoje, uma correria! — repito o que a médica disse.

— Então, Claudia — puxo uma cadeira e sento ao seu lado —, conte-me tudo sobre sua gravidez! — encorajo com um sorriso.

Eu devia ter trazido um bloco de anotação. Ou meu notebook!

Mas antes que pudesse falar, um grito escapa de sua garganta e ela leva a mão à barriga, respirando rápido como se estivesse em agonia.

— Ai meu Deus, essa está forte! — ela grita de novo, me assustando.

Misericórdia, o que é aquilo?

— O que foi? Você está bem?

Ela ainda respira rápido algumas vezes até cair exausta para trás.

— Como assim o que é isso? É uma contração!

— Ah... Então isso é uma contração!

Ela franze o olhar para mim.

— O que disse?

— Ah nada!

Eu me aproximo da cama e ajeito seu travesseiro.

— Pareceu doer, como foi?

— Está falando sério? Não é uma enfermeira da obstetrícia?

— Claro que sou! Não só da obstetrícia como da cirurgia de cérebro também — minto com presunção. — Eu sou muito experiente.

— Acho que devia chamar a Doutora Lane...

— Fica tranquila, ela vai voltar já, já! E aí, podemos aproveitar e você me conta todos os detalhes de sua gravidez.

— Como assim?

— Ah, você sabe, como foram os enjoos, se seu pé ficara igual ao de um palhaço, se perdeu o controle da bexiga ou se teve diabetes, coisas assim.

De repente tenho uma ideia e pego meu celular do bolso.

— Se incomoda de eu gravar essa conversa?

— Eu não estou entendendo... — Sua frase é interrompida por outro grito e dessa vez eu me assusto mais ainda.

— Caramba, é outra contração?

Ela não responde, porque obviamente está ocupada morrendo.

Meu Deus, aquele bebê quer matar a própria mãe?

A mulher segura minha mão, apertando meus ossos até quase quebrarem.

— Isso dói muito! Por favor, me dá alguma droga, qualquer coisa, não quero mais sentir essa dor...

— Eu não posso! — Solto minha mão da sua, enquanto finalmente ela para de gemer como uma pessoa sendo assassinada à marretada.

— Acho que não vai demorar, as contrações estão mais próximas agora! Preciso da médica aqui...

— Claro, claro! Eu vou chamar...

Saio do quarto, assustadíssima.

Vejo uma enfermeira passando rápido por mim.

— Cadê a doutora... é... Lane? Isso! Doutora Lane.

— Ela está no parto de gêmeos agora.

— Mas a mulher naquele quarto também está parindo!

— Da última vez que verificamos ainda não tinha dilatação suficiente. Ela vai aguardar...

— Então chame outro médico!

A mulher franziu a testa.

— Nunca te vi aqui, é nova?

— Sim, comecei hoje! Eu trabalho no... Seattle Grace, com a Doutora Meredith, conhece? Ela é superfamosa.

A mulher me encara como se eu fosse louca.

— Ei, Fisher, a Doutora Lane está aguardando! — outra mulher grita mais à frente e a enfermeira Fisher segue em frente.

E agora?

Volto para o quarto e a grávida está gemendo de novo, virando a cabeça de um lado para outro como se o demônio tivesse tomado posse do seu corpo.

— Isso não pode ser normal — murmuro horrorizada.

— Não é normal? O que quer dizer? — Ela ofega assustada.

— Não, não quis dizer...

Ela segura meu pulso com força de novo.

— Tem alguma coisa errada? Tem que me dizer! Ai Meu Deus, isso dói muito, cadê a doutora?

— Ai, ela esta ocupada... mas já vai aparecer, fique calma e sei lá, segura esse bebê aí!

— Mas dói muito... — ela geme chorando. — Por favor, você não deveria olhar minha dilatação?

Credo, ela ficou louca?

Eu não ia enfiar a mão na vagina dela!

Mas se eu não fizer nada, pode desconfiar que estou ali de penetra, então vou até a frente e finjo olhar.

— Ah, está tudo bem — garanto.

— Mas você disse que não é normal e essa dor... — começa a gemer alto de novo em mais uma contração.

— Vai ficar tudo bem... — sussurro mais para acalmar a mim mesma.

— Tem que me dizer se tem algo errado, eu vejo pelo seu rosto, está apavorada! — a mulher exige puxando minha mão com força.

Caramba, ela é forte!

— Olha, provavelmente não é nada, essas coisas acontecem...

— Que coisas?

— Provavelmente é um problema com o... Osso cúbito.

— O quê? Que diabos é isso?

— Sim, você pode ter quebrado o osso cúbito — invento. — É um osso da vagina.

— Meu Deus!

— Mas tudo bem...

— Tudo bem? Você acabou de dizer que eu fraturei um osso da minha vagina! E eu nem sabia que isso era possível! — grita apavorada.

— Não, não é grave. Você só vai precisar fazer um transplante.

— Transplante?

— Sim, um transplante de vagina.

Os olhos da mulher parecem que vão saltar da órbita e eu só me pergunto se vai ficar muito brava se eu sair correndo.

E já estou olhando para a porta calculando minha rota de fuga, quando ela começa a gritar de novo.

Minha nossa! Aquilo é horrível!

Se é assim que é um parto, eu não quero passar por isso!

— Estou vendo que as contrações estão mais fortes.

Finalmente eu vejo a tal Doutora Lane entrando no quarto e respiro aliviada.

— Graças a Deus está aqui! Essa mulher está morrendo! — grito.

As duas, grávida e médica, me encaram chocadas.

— Eu vou morrer? — Claudia mal consegue respirar. E, meu Deus, a sua aparência agora está mais para uma sobrevivente de um apocalipse zumbi.

— Enfermeira, se controle! — a Doutora Lane me repreende. — Como estão seus sinais vitais e a pressão? — indaga enquanto examina Claudia.

— O quê?

Ela me encara impaciente.

— Vamos logo, acho que já teremos que levá-la para a sala de parto...

Não! Eu não quero ver o parto!

— Na verdade, acho que deu a hora do meu almoço e preciso ir...

— Ficou louca, aonde vai?

— Tenho certeza que vai aparecer outra enfermeira para me cobrir...

— Mais isso é um absurdo, qual o seu nome, aliás, eu nunca te vi aqui?

— Meu nome é enfermeira Regina Falange. — Uso o nome que a personagem de “Friends” usava para se camuflar. Eu era bem apaixonada por essa série na adolescência. Sabia que iria me servir de alguma coisa um dia.

— Não temos nenhuma enfermeira com esse nome... — a mulher me encara desconfiada. — Cadê seu crachá?

Ai merda.

— Eu esqueci! Vou lá pegar e já volto!

Sem pensar duas vezes, saio quase correndo do quarto.

Só paro quando chego ao vestiário e me apresso em tirar as roupas roubadas e pego minha bolsa, saindo rápido, rezando para que a médica ainda esteja distraída com o parto e não tenha chamado a segurança.

Estou voltando para a sala de espera, quando vejo Simon vindo na minha direção.

— Julie, onde se meteu? Estava te procurando.

— Você veio! — Abro um sorriso aliviado.

— Eu disse que vinha... Mas onde estava?

Com o canto do olho vejo a enfermeira Fisher empurrando a maca de Claudia pelo corredor, seguida da médica.

Droga.

Puxo Simon em outra direção.

— No banheiro.

— O que foi, porque está correndo.

— Nada, vamos voltar à sala de espera, já deve estar na minha hora...

— Julie, tem alguma coisa acontecendo...

— Nada! Não está acontecendo nada.

Chegamos à sala de espera, que agora está quase vazia.

E uma enfermeira nos intercepta.

— A senhora é Julie Harris?

— Bennett — Simon corrige.

— Simon, ainda não mudei meus documentos! Sim, sou eu.

— Já estamos prontos para seu exame.

— Ah, ainda bem. — Respiro aliviada.

Seguimos para a sala de ultrassom, onde a mulher me instrui a ir até um banheiro, retirar a calcinha e vestir uma camisola aberta nas costas para o exame e me acomodar na maca.

— O médico já vem, fique à vontade — a mulher diz antes de sair.

Simon pega o celular.

— Simon, não vai ficar mexendo no celular, né?

— O médico nem está aqui ainda. Relaxa.

Mas ainda demora uns dez minutos para o médico, um senhor grisalho simpático, aparecer.

— Olá, sou o Doutor Davis. Como se sente?

— Ela está impaciente — Simon responde para mim e eu rolo os olhos.

— É meu primeiro ultrassom. Estou ansiosa mesmo.

— Desculpe a demora, mas houve uma confusão na ala onde acontecem os partos.

Ai merda.

— Confusão? — Simon indaga me encarando.

Como ele pode saber que eu tenho algo a ver?

Desvio o olhar.

— Uma falsa enfermeira invadiu um dos partos e apavorou uma mulher em trabalho de parto, dizendo que a coitada iria morrer, porque tinha quebrado o osso cúbito ou algo assim.

Simon me encara enfurecido.

— Osso cúbito?

O médico ri.

— Pois é, e este é um osso do antebraço não da região da vagina.

— Que absurdo, o mundo está perdido, tem gente louca em todo lugar — afirmo desviando o olhar para a tela. — E aí, doutor, como está meu bebê? — mudo de assunto.

Ignorando o olhar de fúria mal contida de Simon.

O médico começa o exame.

— Vamos ver... Você está na sétima semana. Aqui é o colo do útero. Aqui dentro o saco gestacional. E aqui o embrião. — Aponta na tela. — Vamos verificar... Sim, feto único.

Oh, graças a Deus tem um só!

Não consigo nem imaginar ter que parir dois bebês. Ou três!

Minha nossa!

— Vamos medi-lo... Seu bebê está com uns nove milímetros.

— Ai meu Deus, que pequeno. Isso é normal? Ele não é subdesenvolvido?

— Isso é o tamanho normal. — O médico ri.

— O senhor está vendo tudo isso? Eu só vejo manchas pretas!

— É difícil ver mesmo nessa fase.

— Então está tudo correndo bem? — Simon pergunta.

— Está ouvindo isso? — o médico diz.

De repente começamos a ouvir um barulho.

— São os batimentos cardíacos.

Eu e Simon nos entreolhamos e ele segura minha mão.

— Isso é incrível. Ele sorri e eu seguro a vontade de chorar.

Nossa, agora parece tão real.

Tem realmente alguém dentro de mim.

Alguém minúsculo ainda. Tipo um mosquito. Mas que em breve começaria a crescer.

E eu me tornaria a mulher com os pés de palhaço.

Não, não vou pensar nisso agora e nem como ele vai sair daí.

— Nessa fase, o cordão umbilical se desenvolve e a placenta está pronta. Os primeiros movimentos começam. Vamos ver se está tudo certo... Sim, líquido amniótico normal para a idade gestacional.

— Eu já vou sentir ele mexer?

— Não, a mãe ainda não nota. Mas essa é uma fase de grande sensibilidade para o bebê, pois ele está muito vulnerável. Tome muito cuidado e não corra nenhum risco que poderia comprometer o embrião.

— Ela vai tomar cuidado — Simon diz muito sério, me encarando com um olhar ameaçador.

O que ele achava que eu iria fazer? Pular de bungee jump ?

Claro que eu tomaria cuidado!

O médico dá o exame por encerrado e pede que passe na sua sala para pegar a receita das vitaminas que precisarei tomar.

E graças a Deus, Simon espera ele sair para me interrogar.

— Posso saber que ideia maluca você teve agora de invadir um parto?

— Eu só queria tirar umas dúvidas, não foi nada demais.

— Você disse que a mulher quebrou o osso cúbito, porra! Você não esquece esse maldito osso?

— Foi a primeira coisa que me veio à cabeça! Eu só queria ver como era o parto e vou dizer, não vou passar por aquilo!

— E como é que a criança vai sair?

— Um parto cesária. Já decidi. Não vou ficar sofrendo daquele jeito não! Simon, ela parecia que estava parindo o anticristo!

— Não exagera. E além do mais, isso nós ainda temos tempo para decidir e faremos o que for melhor. Mas tem que parar de fazer essas merdas, ok?

— Já falei que não queria confusão!

Saímos da sala e pegamos os exames com o médico e minhas receitas.

— Olha, Simon, a primeiro foto do nosso bebê! — digo com emoção.

— Não dá pra ver quase nada, Julie.

— Não importa.

— Agora vamos embora. Ainda temos que voltar ao trabalho.

Enquanto estamos a caminho da DBS, a conversa daquelas mulheres volta a minha mente e eu estremeço de medo.

E eu que tinha achado que a gravidez era um momento mágico!

— O que foi? — Simon indaga diante do meu silêncio quando já estamos no elevador.

Conto a ele algumas coisas que ouvi na sala de espera.

— Simon, você vai ter que ser forte! Talvez eu me transforme em um monstro com pé de palhaço mal-humorada e vomitando por todo lado! E terei dores terríveis!

Ele ri.

— Julie, não exagera. Pode ter alguns contratempos, mas tudo vai ficar bem. Por que não conversa com a Florence? Ela já está de cinco meses, deve ter alguns conselhos para te dar. E ela me parece muito bem.

— Sim, pode ser uma boa ideia.

— Não esquente sua cabeça com isso. Você é muito exagerada.

— Você ainda vai me amar se eu me transformar em um balão inflado com pé de palhaço?

Ele ri e me beija.

— Claro que sim. Agora vá trabalhar e seja boazinha com seu novo chefe.

— Ah, droga!

Com toda a confusão da manhã eu tinha me esquecido que tinha um novo chefe.

— Você prometeu se esforçar, lembra?

— Sim, eu lembro.

Ele me beija de novo quando a porta do elevador se abre no meu andar e eu sigo em frente.

Rezando para poder manter minha promessa.

 


Capítulo 6

 

Simon


— Mais alguma coisa? — Natasha indaga para mim, ainda anotando minhas últimas solicitações em seu bloco de anotação.

Reparo em suas unhas pintadas de preto, recordando-me de quando ela passara em meu peito depois e jogar cera quente.

Pare com isso Simon! Repreendo-me com um arrepio de horror.

Já se passaram dois meses daquela fatídica noite e ainda sinto calafrios de lembrar.

Como Julie havia garantido, Natasha não dera o menor sinal de que sabia que eu tinha conhecimento de que era ela a dominatrix naquele clube. Confesso que na manhã seguinte que tive que encontrá-la, estava morrendo de medo. Não só das lembranças nefastas da noite no clube, mas também com medo de que a situação ficasse constrangedora para ambos e eu tivesse que demiti-la.

Apesar de Natasha ser aterrorizante às vezes, ainda era uma ótima secretária.

Porém, ela fingira que nada tinha acontecido e eu fiz o mesmo. Assim, seguimos em frente.

— Não, só isso — respondo a dispensando.

Ela se levanta para sair.

— Então irei fazer o meu horário de almoço. Está um lindo dia para ir ao Cemitério Abney Park — completa.

Sim, Natasha continua com sua mania esquisita de ir almoçar em cemitérios e Julie havia me dito que ela continuava insistindo que fosse junto.

— Convidou Julie de novo? — questiono divertido.

— Sim, mas ela disse que hoje vai almoçar com Justin — acrescenta antes de sair da sala.

Eu franzo o olhar.

Julie vai almoçar com o novo chefe de novo?

Pensando bem ela fazia muito isso ultimamente.

A verdade é que aparentemente meu medo de que Julie e Justin não se dessem bem e que teriam um péssimo relacionamento assim como era com Erin, tinha sido infundado.

Naquela primeira semana depois da contratação de Justin, eu questionava Julie sobre como estava indo sua adaptação ao novo chefe e ela apenas dava de ombro com cara de deboche.

— Estou sendo boazinha, como pediu!

— O que quer dizer? Está tudo bem?

— É... estou tentando, ok?

Na segunda semana indaguei o que ela estava achando de Justin. Porque a mim ele me parecia ser muito competente e tinha ótimas e originais ideias.

— É... ele é mesmo inteligente — ela respondera lixando a unha, com o olhar fixo na TV onde passava “Friends ” .

— Só isso que tem a dizer? Aposto que deve estar aprendendo muito com ele.

— É, acho que sim. — E em seguida explodira em gargalhada com alguma coisa engraçada na série, e ainda aumentou o som, dando a conversa por encerrada.

Eu desisti de questioná-la sobre o assunto por fim. Ao que parecia, as coisas estavam mesmo prosseguindo sob controle, porque conhecendo Julie e sua inclinação para se meter em problemas, se algo estivesse errado, a situação já teria explodido em alguma confusão.

Mas não. Estava tudo na mais absoluta calmaria.

E agora, pensando bem. Estava calmo até demais...

“Ela foi almoçar com Justin.”

Quantas vezes eu tinha ouvido algo assim naqueles últimos dois meses?

Lembro-me de um dia em que pedira a Natasha para chamar Julie a minha sala, pois eu estava estressado com os péssimos números de vendas naquela semana e contrariando todas as minhas regras de não mais chamar Julie para algum interlúdio sexual, decidi que era exatamente o que precisava naquele momento, mas Natasha tinha respondido que Julie saíra com Justin.

— Saíram?

— Sim, Nancy disse que foram à Primark.

— Que diabos foram fazer na Primark?

— Eu também acho aquela loja uma merda — Natasha dissera.

À noite, Julie chegou em casa cheia de sacolas.

— Você saiu para fazer compras no horário de trabalho?

— Justin que insistiu!

— Como assim?

— Ele comentou que precisava de roupas novas. E sabe, eu sou quase uma personal stylist nas horas vagas! Meu estilo é muito bom e disse que se quisesse podíamos ir à Primark, porque tinha ótimas promoções! Olha essa blusa, Simon. Foi só cinco libras! Cinco libras e devo dizer que Justin estava meio cético, você sabe, ele é todo metido com aqueles ternos caros, mas eu disse que podia vesti-lo muito bem e com ótimos preços, ele nem ia sentir a diferença.

— Isso não me parece muito apropriado.

— Por que não? Você disse que queria que eu me desse bem com meu chefe. Eu estou tentando, Simon.

— Então o fato de estar fazendo compras com seu chefe é uma prova de que estão se entendendo bem?

Ela deu de ombros de novo com pouco caso.

— Como disse, estou me esforçando...

Mark bate na minha porta fazendo com que eu volte ao presente.

— Simon, quer almoçar comigo hoje? Podemos aproveitar para falar sobre alguns remanejamentos necessários.

— Claro, por que não? Eu só vou terminar alguns e-mails. Nos encontramos na The Evy daqui uns vinte minutos?

— Tudo bem.

Assim que Mark se afasta, checo meu celular. Não há mensagem de Julie. Às vezes nós saímos para almoçar juntos, mas, pensando bem, acho que já faz mais de um mês que não fazemos isso.

Claro, ela geralmente almoça com Justin Taylor agora.

Bem, isso não deveria me incomodar.

Porém, sem saber muito por que, desço para o andar comercial.

Julie ainda está em sua mesa, ocupada em passar batom, olhando atentamente sua imagem no monitor.

— Julie.

Ela dá um pulo, assustada.

— Simon, me assustou! Credo, por que chegou assim rasteiro como uma cobra?

— Você que estava distraída se maquiando no horário de trabalho.

— Não veio pegar no meu pé, não é? Estou saindo para almoçar com Justin.

— Você parece fazer muito isso ultimamente, não?

— Sim, é prático. Podemos falar de trabalho enquanto comemos — respondeu distraída, guardando a maquiagem na bolsa.

— Então estão mesmo se dando muito bem.

— Simon, não entendi o que veio fazer aqui — diz impaciente. — Espero que não tenha vindo me dar uma bronca ou passar sermão. Eu estou me comportando!

— Não, não vim te dar bronca. Você fala como se eu fosse algum tirano ou algo assim.

— Você é meio tirano sim, e sabe disso!

— E como Justin Taylor é como chefe?

— Ele é legal.

— Você parece muito reticente para falar dele sempre que pergunto. Então eu tinha razão, não? — Não posso deixar de ser um pouco presunçoso.

Ela hesita, mas de repente seu rosto se ilumina.

— Ah Simon, sim, eu estava me fazendo de louca, para não dar o braço a torcer e para você não ficar todo cheio de si dizendo que tinha razão! Mas a verdade é que Justin é o máximo! Estou apaixonada por ele!

— O quê?

— Sim, ele é o chefe mais legal do mundo! E tinha razão, ele é superinteligente, sabe tudo sobre relações públicas e estou aprendendo tanto! Sério, eu tenho que te agradecer por ter trazido Justin para minha vida! Estou amando cada segundo que passo com ele! Obrigada, Simon! — Ela aperta minha mão e se levanta pegando a bolsa, ignorando meu estado apoplético com suas palavras. — Eu preciso ir!

Fico observando ela se afastar.

Que porra foi aquela?

Como Julie passava de um verdadeiro ódio pelo novo chefe que tomou seu lugar para...

Como foram mesmo suas palavras?

Completamente apaixonada?

Que porra está acontecendo?

Ainda aturdido, caminho pelo corredor e vou até o banheiro, antes de ir encontrar Mark no restaurante.

Enquanto estou no mictório, Justin Taylor entra.

— Ei, Simon, como está?

Ele se coloca ao meu lado e abre a braguilha.

Eu o encaro como se o visse pela primeira vez.

“Estou apaixonada por ele.”

As palavras de Julie voltam a minha mente.

Recordo-me de que o achei um cara bem-apessoado. Sim, ele ainda me parecia um desses modelos de cueca ou perfume caro.

Será que Julie tinha percebido isso?

“Estou apaixonada por ele.”

Quer dizer, ela não tinha dito aquilo literalmente, claro. Era um modo de dizer. Eu tinha entendido. Julie só estava expressando sua empolgação com o novo chefe. O quanto estavam se dando bem e tudo o mais.

Não era isso que eu queria?

Seu idiota, você queria que sua esposa estivesse toda empolgada com esse cara ao seu lado, que parece um modelo italiano e... Olho para baixo e dou uma manjada. Merda. Ainda por cima é bem-dotado!

— Tudo bem? — Justin termina e fecha a calça, desvio o olhar, tentando disfarçar que estava manjando sua rola.

— Sim, estava distraído, me desculpe.

— Ok, amanhã temos aquela reunião com o pessoal do Harvey e Co., certo? — ele se refere à empresa de telecomunicações com a qual estamos em negociação para criar alguns aplicativos.

— Sim, claro — respondo distraído, fechando minha braguilha também, não sem antes dar uma boa olhada para meu pau, era tão grande quanto o de Justin, não era?

— Da nossa parte está quase tudo pronto, e devo dizer Julie ajudou muito, ela tem ótimas ideias, estamos trabalhando em uma ótima sintonia!

Ele sorri e acena.

— Até mais.

Lavo minhas mãos, ainda meio atordoado. Estou caminhando em direção ao elevador quando Rachel e Angie saem de uma sala, caminhando à minha frente, e não notam minha presença.

— Julie é muito sortuda, né? — Rachel diz.

— Por quê?

— De ter o Justin como chefe! Quem dera ele fosse meu chefe, eu não ia resistir!

Eu paro, meio me escondendo atrás de uma planta.

Que porra Rachel está dizendo?

— Mas Julie é casada, Rachel! — Angie refuta.

— E daí? Tudo bem que Simon é um gato também, mas vamos combinar? Ele é sério demais! Não tem senso de humor, está sempre carrancudo e dando ordens! Você já viu como Justin é simpático? E gentil?

— Ah sim, ele é um gentleman . Tão educado! E culto, já percebeu?

— Sim, e elegante! Já reparou naqueles ternos?

— Eu queria saber o que tem embaixo — Angie sussurra e as duas riem enquanto desaparecem corredor adentro.


Eu ainda continuo atordoado enquanto almoço com Mark, fingindo prestar atenção no que ele diz quando na verdade estou remoendo sobre tudo o que descobri do novo gerente de Relações Públicas. Quer dizer então que Justin Taylor tinha se tornado uma espécie de símbolo sexual das mulheres pelos corredores da DBS?

O mesmo cara que passava o dia inteiro com Julie.

Fazendo compras com Julie.

Almoçando com Julie.

E o que mais ele fazia com Julie?

Ok, talvez eu esteja passando dos limites com minha imaginação. O que mais poderia estar acontecendo?

Só porque Justin Taylor é um cara bonitão — e bem-dotado — além de ser simpático, culto e sei lá mais o que, não quer dizer que Julie tenha algum interesse a mais por ele além do chefe-assistente.

“Ah Simon, estou apaixonada por ele.”, a famigerada sentença volta a rondar minha mente.

— E então, podemos marcar a reunião para a próxima semana? — Mark pergunta quando estamos voltando para a DBS.

— Que reunião?

— Simon, nunca te vi distraído desse jeito. A reunião para combinarmos as mudanças do setor financeiro.

— Ah sim, claro. Fale com Natasha.

Entramos no elevador e de repente Mark segura a porta quando avistamos Julie e Justin andando apressados em nossa direção.

— Obrigada, Mark! — Justin sorri com seus dentes muito brancos.

Mas minha atenção está em Julie. Ela tem o rosto corado e os olhos brilhando.

— Ei, rapazes! — Ela pisca pra mim e se vira. Ela e Justin a nossa frente, enquanto o elevador sobe.

Meu olhar preso na nuca dos dois.

Em dado momento, Julie fica na ponta dos pés e cochicha algo no ouvido do Justin que começa a rir.

E de repente, os dois estão rindo de alguma piadinha particular.

Que porra?!

O elevador para no andar comercial e eles saltam, acenando alegremente, enquanto desaparecem corredor adentro.

— Esse cara foi uma ótima aquisição — Mark comenta — Ele é perfeito.

Arg.

Perfeito? Até Mark está apaixonado por Justin Taylor?


No fim do dia, Julie manda uma mensagem, quando já estou aguardando no carro, que não irá embora comigo como habitualmente fazemos.

“Não me espere. Eu e Justin temos que refazer alguns apontamentos para a reunião de amanhã com a Harvey e Co. Nos vemos em casa!”


Simples assim.

Ok, é absolutamente compreensível, penso enquanto dou partida. Ao que parece Justin tinha transformado Julie em uma espécie de workaholic .

Eu devia estar orgulhoso.

Só que não.


Já passa das nove quando escuto a porta abrindo e Julie surge na cozinha.

Estou sentado na bancada com meu computador, um vinil de música clássica tocando e um copo de vinho, enquanto tento trabalhar. Eu deveria estar feliz por ter o apartamento só pra mim, para voltar a meus velhos hábitos de viciado em trabalho, dos quais me orgulhava antes de Julie ter entrado na minha vida, mas a verdade é que estava olhando o relógio de cinco em cinco minutos me perguntando que horas Justin Taylor liberaria minha esposa para vir pra casa.

— Ei, aí está você! — Ela passa por mim e abre a geladeira retirando de lá uma garrafa de água.

— Onde estava até agora? — pergunto sério.

— Como assim? Estava na DBS. Eu te falei, eu e Justin...

— São mais de nove horas da noite, Julie.

— Ei, está bravo porque estava trabalhando? Você também está! Aliás, aposto que adorou que eu não estava aqui te distraindo e pôde ficar brincando de CEO viciado em trabalho! — Ri enchendo um copo.

— Não deveria trabalhar tanto. Esquece que está grávida?

— Gravidez não é doença! E eu me sinto muito bem! Graças a Deus todos aqueles sintomas bizarros dos quais aquelas mulheres reclamaram não me atingiram ainda. E espero que não me atinjam! Eu fui uma boba de ficar com medo. Eu disse que seria uma grávida estilo Kate Middleton!

Eu a observo enquanto toma sua água.

— Pedi comida chinesa. Já comi, me perdoe por não te esperar.

— Eu já jantei com Justin. — Ela guarda a água na geladeira.

— Achei que estavam na DBS até agora.

— Nós pedimos uma pizza, enquanto trabalhávamos.

— Justin sabe que está grávida?

— Claro que não. Ninguém sabe, não combinamos que seríamos discretos? Embora ache que minha barriga já está começando a despontar, vai ser difícil esconder por mais tempo.

— Então não contou ao seu novo melhor amigo, Justin?

— Novo melhor amigo? — Ela ri.

— Vocês parecem muito próximos.

— Sim, acho que tem razão! Ele é maravilhoso, Simon! Eu te disse como ele é inteligente? E é tão generoso, me ensina tanto! Estamos mesmo nos dando muito bem! De novo, ponto pra você, eu fui uma boba por achar que ele seria um desastre como a Erin. Justin me disse que a Erin devia ser daquele jeito comigo porque se sentia ameaçada. E o Justin acha que eu sou mesmo muito talentosa! E também o Justin tem certeza que eu...

Com um grunhido, eu a puxo e a calo com um beijo.

Justin isso, Justin aquilo! Arg, já chega!

— Uau, o que foi isso? — Ela abre os olhos, ofegante quando finalmente a solto.

— Estava com saudade! — E sem pedir permissão a pego no colo e a levo para cama.

— Mas nem te contei ainda que eu e Justin...

— Porra, chega de falar — rosno a colocando na cama e a beijando com força de novo.

Julie ri, e vem pra cima de mim, sentando no meu colo enquanto tira a blusa.

— Acho que é uma boa ideia! Depois de passar o dia com o Justin eu preciso mesmo...

Caralho, ela ia continuar falando daquele cara enquanto a gente estava transando?

— Achei que ia parar de falar...

— Ops, então vou usar minha boca pra algo mais interessante... — abre minha camisa e desce com seus lábios por meu peito.

Mas quando está chegando à minha calça eu a paro, a imagem do pinto de Justin voltando a minha mente.

Mas que merda?

Empurro Julie.

— O que foi?

— Acho que... não vai rolar.

— Como assim? — indaga entre confusa e divertida. — Por quê?

Como dizer a minha esposa que meu pinto não está funcionando porque não consigo parar de pensar que o pinto de Justin Taylor é maior que o meu?

— Simon, você está muito esquisito...

— Acho que só estou cansado.

— Simon você... você... — ela aponta para meu pau — seu pau não subiu?

— Porra, Julie! — De repente estou corando feito um colegial.

Ela começa a rir.

— Ai meu Deus, Simon!

— Não é engraçado.

— É sim!

— Desculpe se não acho legal você ficar rindo da minha cara!

— Simon, não fica bravo. Isso acontece com todo cara ! Pelo menos é o que dizem. Deve estar mesmo estressado! E quer saber? Eu também estou bem cansada! Vou tomar um banho. — Ela pula da cama indo para o banheiro. — Justin acabou comigo hoje!

Puta que Pariu!


Na manhã seguinte, estou tomando café enquanto olho as notícias pelo celular, esperando Julie se arrumar, quando ela me surpreende entrando na cozinha toda apressada.

— O que foi?

— Estou indo! Justin está chegando e não tem onde estacionar! — Ela pega o casaco e o veste.

— Como assim? Ele veio te buscar?

— Ah, me esqueci de te falar ontem? Combinamos de ele me buscar, porque precisamos conversar sobre a reunião!

— Achei que fôssemos juntos para a reunião!

— Fará muito mais sentido se eu for com Justin. Ainda temos que ajustar alguns detalhes.

— Mas ainda são oito da manhã! A reunião é às 10h na Harvey.

— Sim, vamos tomar café juntos, enquanto acertamos alguns detalhes e depois vamos! — Ela se aproxima e me dá um beijo rápido no rosto. — Nos vemos lá!

Demoro apenas dez segundos depois que ela fechou a porta atrás de si, para sair do estupor e, tentando acalmar minha desconfiança, pegar as chaves do carro e correr.

Foda-se.

Aquela merda de amizade bizarra entre Justin e Julie já está me cheirando a algo que não quero nomear, mas que por mais que eu diga a mim mesmo que é absurdo, não consigo tirar da cabeça.

O cara é bonitão.

Não só bonitão, como inteligente, elegante, gentil e culto.

Está lhe ensinando o que sabe, e a transformando em um sua pupila.

Julie está claramente encantada por ele.

Apaixonada, não foi essa a palavra que usou?

Ela passa mais horas com esse cara do que comigo.

Seu marido.

O pai do filho dela.

Aquele que ontem tinha brochado e ela nem tinha se importado.

A Julie de outros tempos teria surtado. Teria me obrigado a tomar Viagra, ou teria começado a tecer suas teorias malucas sobre crises de casamento.

Mas ela tinha apenas virado as costas muito calmamente e aceitado.

Por quê?

Por que tinha um cara de pau gigante trabalhando com ela agora?

Porra, eu sei que quem está surtando sou eu com aquelas desconfianças, mas o que posso pensar?

Eu conheço Julie. Ela é impulsiva.

E não para até conseguir o que quer. Ela se torna obcecada.

Ela é maliciosa e conseguiu que eu, o cara por quem ela tinha uma paixonite, o cara que disse que nunca ia se envolver com uma funcionária e muito menos ficar noivo dela, se transformasse em seu marido.

E agora parece que seu interesse está em outro lugar.

Mas ela seria capaz de me trair?

Eu não sou uma mocinha de romance, Simon , ela havia dito.

Cacete, eu tenho que tirar isso do meu sistema.

Entro no carro e saio da garagem a tempo de ver o carro de Justin parando e Julie entrando.

Eu os sigo, tentando conter a vontade de bater na traseira do carro daquele calhorda, tirá-lo do carro pelo colarinho e bater sua cabeça no capô até me dizer exatamente que merda estava fazendo com minha mulher.

Mas eu não sou assim. Eu não sou impulsivo.

Eu sou frio e calculista quando eu quero.

E agora eu quero descobrir que diabos está acontecendo.

Alguns minutos depois, eles param o carro em frente a uma... Loja de lingerie?

Que porra?...

Os dois saem do carro. Julie engancha os braços no de Taylor.

Meu pulso acelera de ciúme.

Espero os dois entrarem na loja, uma famosa marca de lingerie sexys, e faço o mesmo.

Na minha mente me recordo de Julie mentindo descaradamente. “Nós vamos tomar café e nos prepararmos para a reunião.”.

Mentirosa!

Percorro os corredores, procurando por eles. Avisto Justin sentado em um sofá. E então vejo Julie saindo de um dos provadores, vestindo um espartilho preto e desfilando na frente de Justin, que a aprecia.

— Que porra é essa? — Avanço na direção deles, com ganas assassinas.

Julie e Justin se viram pra mim, surpresos.

— Simon, o que está fazendo aqui? — Julie indaga.

— Acho que sou eu que tenho que fazer essa pergunta! Que merda está fazendo desfilando de lingerie na frente desse cara? Mentiu pra mim dizendo que estava trabalhando! O que mais mentiu, Julie? Estava mesmo trabalhando ontem? Ou quando dizia estar fazendo compras, almoçando? Ou ficava desfilando de lingerie ou Deus sabe mais o quê? Sabia que tinha alguma coisa, ainda bem que te segui...

— Você me seguiu? Que merda está dizendo?

— Ei, Simon, calma. — Justin se levanta, mas eu o empurro.

— Seu filho da puta, está fazendo o que com a minha mulher! Eu vou quebrar sua cara e depois vou cortar seu pau gigante fora...

— Simon, pelo amor de Deus, para com isso — Julie se coloca na minha frente! — Ficou maluco?

— Fiquei? Então como explica tudo o que vem rolando, Julie? Por que está de lingerie na frente do seu chefe?

— Acha que estou tendo um caso com o Justin?

— Acho? Acho?

— Simon, seu idiota. — Ela me empurra! — Não acredito que está pensando isso de mim!

— Simon, desculpe se achou isso, cara , mas não estou tendo um caso com a Julie... — Justin se intromete.

— Quer que eu acredite? Acha normal sua secretária desfilar assim na sua frente?

— Simon, para de ser ridículo! O Justin é gay! Gay, seu idiota!

O quê?

 


Capítulo 7

 

Julie


Por um momento eu acho que estou em uma espécie de pesadelo.

Só isso explica aquela situação bizarra!

Como é que chegamos a este ponto? Onde meu marido invadia a Victoria Secret me acusando de dormir com meu chefe gay?

Caramba, Simon passou de todos os limites agora!

— Gay? — ele repete aturdido.

— Achei que você soubesse — Justin diz. — Até acreditei que poderia estar dando em cima de mim quando manjou meu pau no banheiro.

— Você manjou o pau do Justin? — grito, horrorizada.

O rosto de Simon adquire uma expressão culpada.

— Não! Quer dizer, talvez eu tenha feito isso, mas não com essa intenção, eu nem sabia que você era gay!

— E por isso achou que eu estava transando com o Justin? — Estou tão furiosa que mal posso conter a vontade de bater em Simon.

Como ele pode pensar algo assim de mim?

— O que eu poderia pensar?

De repente o celular de Justin toca.

— Eu preciso atender.

Ele se afasta e acho que está bem satisfeito de sair da linha de tiro.

— Sério, Simon? Sério?

— Você passou os últimos dois meses só falando desse cara! Até saíam para fazer compras juntos!

— E isso não bastou para perceber que ele era gay? Claro que eu fiz compras com Justin! Ele tem muito estilo!

— Como eu poderia saber? A única coisa que estava percebendo era que minha mulher estava mais empolgada do que era apropriado com o novo chefe bonitão de pau gigante!

— Pau gigante? Que diabos?...

— Sim, eu manjei o pau dele no banheiro! E percebi que além de ser boa pinta, ele ainda é bem-dotado. E todas suas colegas dizendo que ele era irresistível de tão educado, culto, simpático e mais um monte de elogio! Com inveja de você por poder ficar ao lado dele!

— O Justin é tudo isso mesmo, mas ele é gay! Nem que eu quisesse dar pra ele, ele iria querer! Era mais fácil ele dar em cima de você do que de mim.

— Agora que estou percebendo! Por que não me disse?

— Eu achei que soubesse! Não é óbvio?

Ainda me recordo do ranço que sentia de Justin Taylor quando cheguei para trabalhar depois de prometer a Simon que seria boazinha.

Eu estava pronta para odiá-lo, já intuía que ele seria como Erin, iria ficar se gabando de como era bom, quando na verdade não passava de um incompetente e ainda por cima iria passar os dias me humilhando, dizendo que eu só prestava para lhe servir café.

Só que Justin nunca pediu que eu lhe servisse um café sequer. Aliás, me surpreendi quando ele mesmo pegou um café pra mim, ao me chamar para nossa primeira reunião.

E foi só a primeira das minhas surpresas.

Justin era mesmo um cara legal. Disse-me que estava impressionado com o trabalho que eu tinha feito, e que poderíamos trabalhar em parceria a partir de então, para que não só ele pudesse me ensinar o trabalho, mas também para que eu pudesse guiá-lo nas questões da DBS que ele ainda não estivesse a par.

Confesso que em um primeiro momento eu desconfiei. Afinal, passei um tempo terrível sendo assediada moralmente pela bruxa da Erin. E acabei dizendo isso a ele. Justin sorrira e dissera que Erin provavelmente se sentia ameaçada por meu talento.

Sério. Ele disse bem assim.

Claro, como qualquer pessoa, eu gostava de ser elogiada e decidi que podia dar uma chance a Justin, mesmo ainda um tanto desconfiada.

Porém, Justin continuou se mostrando um chefe muito justo. E mais: ele não só elogiava meu trabalho, como também meu cabelo. Ou minhas roupas, entendia até de marca de sapato, já que chegou a dizer um dia que meu Louboutin era muito bonito, mas que era da coleção passada.

E foi aí que eu entendi tudo.

Justin Taylor era gay!

Claro que ele só podia ser gay! Lindo daquele jeito, e ainda inteligente e bem-educado? Quer dizer, não havia problema nenhum dele ser gay. No entanto para as mulheres da empresa que estavam criando o fã-clube Justin Taylor, se estapeando para ver quem seria a primeira da fila, isso seria uma tragédia.

Obviamente não para mim. Por mais que eu estivesse bem impressionada com Justin, em nenhum momento senti atração por ele. Ao que parece, Simon Bennett tinha me estragado para os outros homens. Quer dizer, às vezes eu dava uma checada na bunda do Justin e tipo, agora que Simon disse que ele tinha o pau gigante, fiquei com bastante vontade de dar uma olhada para confirmar, mas era só um interesse hipotético.

Claro que jamais iria trair Simon com meu chefe. Mesmo se Justin fosse hétero!

E pensar que Simon achava que eu era capaz disso me deixa muito furiosa!

Eu, a esposa compreensiva que tinha passado a noite sem dormir direito tendo pesadelos com pênis murchos, se perguntando o que tinha feito de errado para o marido não funcionar direito, isso com menos de um ano de casada!

Para descobrir que o cretino estava o tempo todo pensando que eu estava trepando com meu chefe contra os arquivos! E tudo o que eu queria vindo a esta loja era comprar umas lingeries bem safadas pra ver se a coisa dele voltava a funcionar!

Foi ideia de Justin. Depois que deixei claro que já tinha sacado que da fruta que ele gosta eu como até o caroço, nossa relação subiu para outro nível. Justin agora não era só meu chefe, ele era meu amigo. Sério, éramos praticamente almas gêmeas! Ele me contava sobre seu amante latino, Miguel, e eu lhe contava sobre Simon.

— A única coisa óbvia é que disse com todas as letras que estava apaixonada por ele! O que queria que eu pensasse? — Simon continua.

— Foi modo de dizer!

— Você passava todo o tempo com ele! Pegando carona com ele, passando horas depois do expediente com ele...

— Ainda não acredito que achou que eu estava te traindo. Estou ultrajada!

— Olhe pra você, Julie! Disse que iria tomar café com seu chefe para verificar detalhes de trabalho, mas em vez disso te pego desfilando de lingerie para ele!

— Eu estava fazendo isso para você! Liguei para o Justin depois que foi dormir, não conseguia pegar no sono, preocupada com você! Com o seu... probleminha!

Eu tinha mesmo ficado apavorada com a brochada de Simon. Não falei nada para ele na hora porque não queria deixá-lo mal. Eu sabia como os homens eram com essas coisas.

— Você o quê?

— Eu disse ao Justin que você não tinha conseguido, enfim...

— Caralho, Julie!

— Eu não sabia o que fazer! Fiquei preocupada, que, sei lá, tivesse perdido o interesse em mim. Talvez fosse algo com a gravidez, não sei!

— Como pode pensar numa coisa dessas? Não tinha nada a ver com você, ou melhor, tinha a ver com o pau gigante do Justin! Eu não conseguia parar de pensar que você poderia estar interessada.

— Simon, nem que o Justin tivesse três paus eu ia achar melhor que você, de onde tira essas asneiras? Olha pra mim! Eu vim até esta loja para comprar lingeries sexys para apimentar nossa vida sexual! Porque eu amo você e não um cara de pau gigante! Foi por isso que eu saí mais cedo de casa e menti! Justin me aconselhou a fazer algumas coisas e por isso estávamos juntos aqui! E agora estou puta com você porque não confiou em mim! Achou que eu fosse capaz de te trair!

Começo a chorar.

— Julie, me desculpe, não chore. — Simon tenta me tocar, mas dou um passo atrás.

— Vá embora, Simon, não quero falar com você agora.

Volto para o provador, ignorando seus chamados.

Como ele pode achar que eu fosse capaz de traí-lo?

Visto minhas roupas e estou um pouco mais calma quando saio do provador. Simon ainda está ali com Justin ao lado.

— Não falei que não queria falar com você? — indago com frieza.

— Nós precisamos conversar...

— Não quero falar com você agora! Eu vou com Justin! Temos trabalho a ser feito!

Passo por ele, puxando Justin, que ainda olha para trás, lançando um olhar de desculpas a Simon.

— Julie, talvez devesse conversar com Simon...

— Está maluco? Não ouviu as merdas que ele disse?

— Ele me contou que está brava porque ele achou que estávamos fodendo ou algo assim.

— Sim, um absurdo!

Justin abre a porta do carro pra mim e eu me acomodo no banco de passageiro enquanto ele dá a volta.

Noto o carro de Simon. Contenho a vontade insana de sair e furar seus pneus de novo.

— Ele não sabia que eu era gay... — Justin diz, dando partida.

— E daí? Não era motivo para desconfiar de mim! Estou com tanta raiva!

— Se acalme. Eu entendo que esteja nervosa, mas não acho que seja legal para sua gravidez.

Arregalo os olhos, surpresa.

Eu não tinha dito a Justin sobre estar grávida ainda.

— Como sabe?...

— Julie, passo todos os meus dias com você, já tinha sacado há algum tempo. Sem contar que devia tomar mais cuidado quando fica checando sites com nomes sugestivos tipo “Como se livrar do inchaço da gravidez”.

— Eu e Simon decidimos que íamos manter segredo por um tempo, você sabe, para não causar mais falatório. Simon estava com medo da confusão. Nosso noivado foi um escândalo! E nem sei como é que mantivemos nossos empregos. Quer dizer, Simon é esperto pra cacete e conseguiu reverter a situação, mas agora que também é acionista, ele não quer que isso prejudique sua carreira de novo!

— Simon parece se preocupar muito com a carreira dele, não?

— Preocupado é pouco! A carreira é a vida dele!

— Isso te irrita?

— Como não irritar?

— Mas você sabia disso quando casaram.

— É, tem razão. Eu sempre soube e acho que uma das coisas que me atraem nele é justamente isso. — Suspiro. — Mas como ele pode achar que eu ia traí-lo?

— Vocês terão que conversar sobre isso. É uma questão de confiança.

— Claro que é! A questão que ele não confia em mim! — Volto a sentir raiva.

— Agora se acalme. Vamos tomar café como combinamos e nos concentrar na apresentação da Harvey. Fiquei sabendo que teremos concorrência.

— Como é?

— Parece que outra empresa ofereceu um preço melhor. Então estaremos lá com eles para apresentar nossa proposta. Isso quer dizer que temos que arrasar.

— Mas nós vamos arrasar! — garanto jogando para o fundo da mente minha discussão com Simon.


Quando chegamos a Harvey, somos levados à sala de conferência deles. Simon já está lá com os executivos da empresa, dentre eles, o CEO, Martin Harvey, um senhor careca de uns cinquenta anos.

Ignoro o olhar ansioso de Simon, quando entro na sala com Justin, sorrindo para os nossos futuros clientes.

— Aí estão eles. — Simon parece entender que não é o momento para continuarmos nossa discussão. E nos apresenta para os homens na sala. — Este é Justin Taylor, ele que fará a apresentação. E essa é Julie... — Ele hesita.

— Harris — respondo. Melhor evitar perguntas embaraçosas sobre minha ligação com Simon no momento. — Sou assistente de Justin.

— Justin irá apresentar nossa proposta — Simon continua.

— Na verdade, quem irá apresentar é a Julie — Justin diz.

Simon franze o olhar, surpreso. Assim, como eu.

— Eu? Mas Justin...

— Veja só, o pessoal da Richmond chegou. — Um dos executivos se afasta para receber nossos concorrentes.

Eu encaro Justin.

— Justin, não combinamos isso!

— Sim, na nossa última reunião, você não me disse que Julie iria apresentar. — Simon também está confuso.

— O que foi, Simon? Está duvidando de que eu seja capaz? — Deixo minha raiva vir à tona de novo.

— Não é nada disso!

— Mas é o que parece...

— Ainda está com raiva de mim...

— Ei, vocês dois, acho que não é o momento de continuarem essa discussão — Justin nos interrompe. — Eu só acho que a Julie poderia apresentar, porque os aplicativos que a Harvey está solicitando são especificamente para o público feminino. E Julie está muito preparada para falar. Deve saber que Julie é muito capaz de realizar essa tarefa, Simon.

Simon fica em silêncio por um momento, e sei que sua mente está tentando achar a melhor solução.

— Sim, ela é. Então eu concordo.

Sinto meu estômago se revirando.

— Bennett, venha conhecer o pessoal da Richmond — Harvey o chama e ele se afasta.

— Justin, eu não sei se é a melhor opção que eu apresente — expresso minha dúvida.

— Não fique com medo. Vai dar certo. Você está familiarizada com a apresentação tanto quanto eu. Somos uma equipe, Julie.

Respiro fundo, tentando me contaminar por sua confiança em mim.

Sim, claro que eu posso fazer aquilo.

Eu sou mesmo uma incrível oradora. E conheço o projeto como a palma da minha mão.

Já posso ver a mim mesma falando com confiança, desfilando na frente dos executivos da Harvey todo meu charme e conhecimento!

Eles vão ficar muito empolgados! Vão querer nos pagar o dobro! Talvez eu até ganhe um bônus!

Sim, poderia comprar um Louboutin novo. Justin tem razão, o meu é mesmo da última coleção e está ficando fora de moda e...

— Vamos nos sentar? — Harvey nos chama e nos sentamos nas poltronas dispostas na sala, em direção ao projetor. — A RP da Richmond está chegando, ela que vai apresentar primeiro.

Relanceio o olhar para os dois homens da Richmond. Não vejo nenhuma mulher entre eles.

— Sabia que seria interessante colocar você. Veja só, a Richmond também terá uma mulher apresentando — Justin cochicha.

— Mas que merda é essa? — Simon sussurra olhando para a porta e meu pior pesadelo está em curso quando vejo ninguém menos que minha ex-chefe entrando na sala.

— Desculpe pelo atraso, senhores. — Erin avança pela sala sacudindo seus cabelos ruivos, os saltos batendo no chão.

Louboutin última coleção, droga!

Seus olhos de rapina pousam em mim e Simon, triunfantes.

A demônia já sabia que estaríamos ali!

— Olha só, os Bennett! — exclama com asco na voz. — Como vai o feliz casal?

— Casal? — Um dos executivos da Harvey franze a testa.

— Não sabiam que Julie é casada com Simon Bennett? Ah, achei que fosse de conhecimento geral, afinal, parece que ainda escondem a relação... — Ela mexe em seus papéis sobre a mesa. — Enfim, estou pronta para começar minha apresentação.

Escuto os executivos da Harvey cochichando entre si enquanto me lançam olhares desconfiados.

Merda. Agora eles devem estar especulando se estou aqui só porque sou esposa do CEO.

Inferno!

Começo a me sentir muito nervosa.

Como vou me apresentar agora? Com aquele ar de desconfiança pairando sobre minha cabeça, afinal, eles podem achar que não sou competente o bastante e que só conquistei aquela posição porque durmo com Simon!

E ainda vou ter que me apresentar depois de Erin, que continuará ali, me espiando com seu olhar cheio de sarcasmo?

Calma, Julie! Erin é péssima. Certeza que vai fazer uma apresentação de merda e você vai pisar na cabeça dela com a sua, que está perfeita! Há!

— Sim, pode começar. — Harley dá o sinal verde.

Erin começa a falar e, puta que pariu! Ela está indo muito bem.

Como é que conseguiu? Certeza que deve ter alguma assistente idiota que faz tudo pra ela, só pode! Porque Erin jamais faria algo tão bom assim sozinha.

E enquanto ela prossegue com sua apresentação, começo a me sentir realmente ansiosa.

Droga.

Por que aquela bruxa tinha que voltar a minha vida como um encosto do mal? Será que nunca iria me livrar daquela cretina com cabelo de palhaço assassino?

Ela termina a explanação e percebo que não tinha prestado atenção em nada nos últimos minutos, perdida em meus pensamentos.

— Muito bem, Senhorita York. Foi perfeito — Harvey elogia. — Agora é sua vez, senhorita... Harris, quer dizer, Bennett.

Merda!

— Julie, talvez seja melhor deixar Justin prosseguir — Simon segura meu braço, preocupado.

— E deixar essa vaca rir da minha cara?

— Julie, por favor...

Solto meu braço.

— Você sabia que ela estaria aqui?

— Claro que não!

— Se preferir que eu faça... — Justin sugere, mas eu me levanto.

Não vou deixar Erin me intimidar.

— Não. Estou preparada, eu faço!

Caminho até a frente da sala e Erin sorri com presunção, fechando seu laptop.

— E nos encontramos de novo, Julie!

— Infelizmente. — Abro meu laptop, achando a apresentação. Tentando me manter focada no meu trabalho e não na vontade de esfregar a cara de Erin no asfalto.

— Estou vendo que está se dando muito bem com seu novo chefe.

— Sim ele é um ótimo profissional, ao contrário de algumas pessoas...

— Ah, continua com raiva de mim?

— Claro que não, nem lembro que você existe.

— Deve ter sido difícil pra você, ter continuado como assistente, quando achou que ia pegar o cargo de gerente! O que aconteceu? Mesmo dormindo com Simon, ele não quis te promover? Deve ter percebido que não era boa o suficiente...

— Cala sua boca — rosno em sua direção, começando a perder a paciência.

— Julie, já pode começar — Simon nos interrompe, certamente percebendo as trocas de “gentilezas” sussurradas entre mim e minha ex-chefe do mal.

Eu sorrio, ignorando Erin, que finalmente se afasta sentando em um dos sofás.

— Claro, vamos começar.

Respiro fundo e, mesmo com meu estômago revirando, começo a falar.

Eu tenho aquela apresentação na ponta da língua e sei que está muito boa. Então tento me concentrar nisso, usando meu melhor tom persuasivo, mas não dá para ignorar Erin na minha frente, sorrindo com deboche, revirando os olhos, cochichando com o seu colega, os dois rindo. De mim, com certeza.

Será que estou falando alguma merda?

Olho para Simon e ele parece apreensivo.

Justin sorri para mim, me encorajando a ir em frente.

Os executivos da Harvey estão impassíveis.

Meu Deus, temos que fechar esse negócio. Simon não vai me perdoar se eu estragar tudo.

Isso, não vou deixar Erin me intimidar. Com um sorriso, sigo em frente, estou enjoada de verdade agora, mas vou continuar. Eu vou terminar e esfregar aquele contrato na fuça descarada de Erin.

E focando nisso, caminho até onde ela está. Ao lado dela estão os executivos da Harvey. Aumento meu tom de voz. Entrando na reta final da minha apresentação.

— Enfim, a Richmond apresentou um ótimo produto, mas devem levar em consideração que a DBS é líder em seu segmento. E todos os nossos últimos apps, foram um sucesso. E tenho certeza, senhores, que faremos uma ótima parceria e... — De repente meu estômago revira de um jeito que paro de falar, tamanha é a onda de náusea que me acomete. — Enfim, acho que encerramos por aqui...

— Mas eu tenho algumas dúvidas. — Erin levanta a mão. — Não acho que ficou muito claro alguns pontos...

— Tenho certeza que se o pessoal da Harvey tiver dúvida, eles mesmos me perguntarão, mas agora eu preciso terminar... — Tento me afastar, porque, já está difícil segurar a ânsia, mas Erin segura meu braço.

— Calma, Julie, só estou querendo ajudar, lembra que já trabalhamos juntas e acho que aprendeu muito comigo por isso fez uma apresentação razoável. Certeza que ninguém está pensando que está aqui porque é esposa do CEO da DBS e...

— Erin, acho que isso já está ficando inapropriado. — Escuto a voz de Simon como se vindo de muito longe enquanto continuo tentando me livrar das mãos de Erin, que seguram meu pulso.

E sem aviso, a onda de ânsia que me ameaçava, vem com força total e não consigo fazer nada a não ser me inclinar para frente e despejar um jato de vômito no sapato Louboutin de Erin.

 


Capítulo 8

 

Julie


— Está melhor? — Simon pergunta quando saio do banheiro depois da tragédia que foi o término da nossa apresentação na Harvey.

— Fisicamente sim, mas emocionalmente estou um lixo! — choramingo ainda chocada com o que aconteceu.

Eu tinha vomitado a sala inteira!

Primeiro vomitei nos sapatos de Erin, que pulou para longe de mim, gritando, horrorizada (ok, aqui eu tinha um total de zero arrependimento).

Não contente, eu tinha me virado, na ânsia de tentar fugir, e vomitado na camisa cara de Martin Harvey.

Eu tinha vomitado no nosso possível cliente, cacete!

Foi então que Simon me alcançou, me segurando para longe dos outros executivos e uma lata de lixo apareceu na minha frente (depois descobri que foi Justin que tivera o bom senso) onde eu ainda dei mais umas duas vomitadas, enquanto Simon segurava meu cabelo. Erin ainda gritava enojada me xingando de nomes nada bonitos e alguém dizia que Harvey deveria ir trocar de camisa.

Depois de toda aquela cena de filme de terror, Simon me levara para o banheiro.

Agora eu só queria voltar no tempo e não ter comido aquela quantidade enorme de panquecas com Justin no café da manhã.

— Eu sinto muito! Aposto que o Senhor Harvey vai me processar! Não, ele vai processar a DBS inteira por minha causa...

— Julie, se acalma, nada disso vai acontecer. Foi um acidente. — Simon segura meu braço, me guiando pelo corredor. — Vem, vamos embora.

— Foi uma tragédia! Eu vomitei em cima do dono da empresa! Certeza que vamos perder o negócio para a Richmond! — Continuo choramingando enquanto entramos no elevador. — Vamos perder para a bruxa da Erin! Isso se ela não me processar também! Ai meu Deus, ela vai me fazer pagar outro sapato Louboutin! Não quero comprar um Louboutin para aquela ridícula!

Simon me guia para fora da empresa e entramos no seu carro.

— Precisa se acalmar. Nada disso vai acontecer. Sim, foi inconveniente você ter vomitado no fim da sua apresentação, ainda mais em cima do Harvey, mas eu expliquei que está grávida.

— Você contou?

— Claro que sim. Ele foi compreensivo. E quanto a sua apresentação, já tinha terminado, e devo dizer, foi muito bem.

— Fui bem até começar a expelir vômito como a garotinha de “O Exorcista” possuída!

Simon ri, enquanto dá partida.

— Foi realmente engraçado ver a Erin gritando.

— Não foi engraçado.

— Foi sim. Ela pegou os sapatos vomitados e jogou no lixo. E numa coisa tem razão, ela exigiu mesmo que lhe comprasse outro. Mas não se preocupe, eu já lhe dei a merda de um cheque!

— Não gosto da ideia de dar dinheiro para aquela bruxa! Ainda não acredito que ela estava aqui, aposto que foi de propósito! Ela queria me humilhar!

— Não pense mais nisso, tem que se acalmar. Já passou.

— E cadê o Justin?

— Ele ficou lá na Harvey, pediu para conversar com os executivos e melhorar nossa posição.

— Tomara que ele consiga reverter a merda que eu fiz... — murmuro.

— Não se culpe. Se perdermos este negócio a culpa não será sua.

— Não? Até parece!

— Não vai, Julie. Agora relaxa e pare de ficar ansiosa. Isso não pode te fazer bem. Vou te levar pra casa para descansar.

— Eu quero ir trabalhar.

— Não, vai ficar em casa hoje.

Eu não rebato. Apenas fecho os olhos e tento fazer o que ele pediu.


— Você parece extenuada — Simon diz quando chegamos em casa. — Vou te preparar um banho.

— E queria que eu estivesse como? — murmuro enquanto ele me guia até o banheiro. — Primeiro foi a noite maldormida pensando naquele seu probleminha...

Ele bufa enquanto abre as torneiras e volta para me ajudar a tirar as roupas, que ainda têm respingos de vômito.

— Depois da briga na Victoria Secret, e a decepção de saber que você pensou que eu seria capaz de traí-lo e depois encontrar a Erin na Harvey... E terminar com meu show de horror regado a vômito... — Começo a chorar, sem poder me controlar.

— Julie, por favor, não chore. — Simon acaricia meu rosto. — Sabe que me assusta pra caralho quando fica assim! Eu prefiro quando fica louca e rasga meus pneus ou ameaça riscar meus vinis...

Sacudo cabeça, fungando.

— São os hormônios, eu acho! Mas sério, essas coisas só acontecem comigo! — resmungo enquanto Simon me ajuda a entrar na banheira. — Devo estar com algum encosto, como diz Natasha! Talvez devesse ir para uma das festas malucas de bruxaria da minha mãe e dançar nua ao luar para afastar seja lá o que estiver me prejudicando! Aposto que deve ter sido algum vodu! Sim, Erin é bem capaz de fazer um vodu para mim.

— Pare de falar na Erin. Com alguma sorte, nunca mais veremos aquela cretina na nossa frente de novo! — ele diz tirando as próprias roupas.

— Eu não te convidei para meu banho! — exclamo, quando o vejo entrar na banheira. — Não esqueci as merdas que me disse hoje cedo!

Ignorando minha reclamação, Simon me puxa para perto, me fazendo ficar entre suas pernas e me abraça, pousando os lábios em minha nuca.

— Me desculpe — murmura.

— Acha que só pedir desculpas resolve o que fez?

— Eu queria que se colocasse no meu lugar, Julie. Você é uma mulher incrível. Linda e sexy. E já deixou bem claro em muitas ocasiões que não é uma garota boba que não corre atrás do que quer. Você é impulsiva e se estivesse mesmo apaixonada por Justin, eu duvido que não fosse ficar com ele.

Eu me viro o encarando.

— Acredita mesmo nessas merdas que está dizendo?

— Você estava íntima demais do seu chefe, tem que concordar. Só falava dele, e o quanto ele era incrível. Mentiu pra mim. Eu não tinha como saber que essa intimidade toda era porque ele não representava nenhuma ameaça.

— Mas o Justin não seria nenhuma ameaça nem que fosse, hétero! Estou casada com você, eu amo você! Vamos ter um bebê juntos! Acha que bastaria aparecer um cara bonito que eu pularia na cama dele e te deixaria? Acha que sou tão volúvel?

Ele não responde e eu entendo a resposta. E isso dói.

— Ah, Simon, você quebra meu coração assim...

— Eu sinto muito, por favor, eu fui um idiota! É só que às vezes você é intensa demais! E tem todas essas histórias desses ex-namorados...

— Ex-namorados, disse bem! Caras que fazem parte do meu passado! Simon, você também ficou com sabe Deus quantas mulheres! E não interessa pra mim! Porque elas não estão aqui e eu sim! E devia ser assim pra você também. O que interessa é o que vivemos agora! E agora não há nada no mundo que eu queira mais que você. Eu sou obcecada por você esqueceu?

Ele sorri.

— Minha pequena psicopata.

— Eu sou louca por você. E nem por mil chefes de pintos gigantes eu ia te trocar.

Simon sorri e me beija, e eu derreto como sempre, inebriada por todo amor que sinto por ele.

Simon é um babaca às vezes, mas eu o amo desse jeito.

Porque eu não sou perfeita também.

— Então estou perdoado? — Ele encosta a testa na minha.

— Sabe que sim! — Eu me viro, me encaixando em seu colo, e soltando um gemido de apreciação, e alívio, por que não dizer, ao notar que aparentemente o probleminha de Simon estava resolvido.

— Então já está se sentindo bem para transar? — Sorri, mordendo meu pescoço e deslizando a mão por minha barriga, até me tocar entre as pernas e solto um gemido de rendição.

— Se você está pronto eu também estou, Senhor Bennett. — Eu me movo contra seus dedos, sentindo meu ventre se contrair de prazer e ansiedade.

Então ele me beija de novo e eu me abaixo até que esteja dentro de mim, onde é o seu lugar.

— Eu amo o jeito que faz isso. — Suspiro, jogando a cabeça para trás e me movendo em cima dele.

Simon guia minha cintura, ditando o ritmo, enquanto seus lábios fazem um caminho de fogo por meu pescoço, até o meu ouvido.

— E eu amo você...

— Ah Simon... — Eu o beijo, aumentando o ritmo, meu coração batendo rápido de amor e paixão, nossos corpos se movendo juntos, até explodirmos em um orgasmo doce, quente e perfeito.


— Tudo bem? — Ele acaricia minhas costas devagar, enquanto nossas respirações vão voltando ao normal e levanto a cabeça do seu ombro para encará-lo.

— Posso fazer uma pergunta?

— Que pergunta?

— O Justin tem mesmo o pau gigante?

— Porra, Julie! — Simon bufa e eu rio.

— Você me deixou curiosa, é tipo muito grande mesmo?

— Ah sei lá... não olhei direito, mas ele poderia seguir carreira no pornô, ia ganhar uma grana boa.

E a gente ri.

E eu fico feliz que Simon esteja superando porque já está até fazendo piada do assunto.

— Você também poderia ganhar uma grana no pornô, Senhor Bennett — garanto e ele ri com presunção. — Não só pelo tamanho, mas pela performance, satisfeito?

— Acho que terei que te levar para a cama e te dar uma recompensa por todos esses elogios, Senhora Bennett!

— Concordo! Mas pode me dar comida antes? — peço, porque meu estômago já está reclamando de fome.

— Tudo bem, vamos te alimentar e depois vamos passar a tarde inteira na cama, o que acha?

— Acho perfeito!

***

Na manhã seguinte, ainda estou flutuando em uma nuvem de felicidade quando acordo, mas fico confusa ao notar que Simon não está mais na cama.

— Simon? — Eu o chamo, mas o apartamento está em silêncio.

Percorro o apartamento e realmente Simon não está em nenhum lugar.

Pego o celular, disposta a achar meu marido que sumiu. Simon atende depois alguns toques.

— Oi, Julie.

— Onde se meteu?

— Estou na DBS.

— Tão cedo?

— Não é tão cedo. Eu deixei você dormir um pouco mais. Como está se sentindo?

— Estou bem, sabe que nem tive aqueles enjoos que todo mundo fala. Só vomitei ontem acho que de nervoso! Mas deveria ter me acordado para eu ir com você! Fiquei sem carona!

— Não ficou, Justin estará passando aí em meia hora para te buscar.

— Justin? Sério?

— Sim, sério. Agora vá se arrumar, preciso voltar ao trabalho.

Ele desliga e ainda fico parada com o celular na mão um tanto aturdida.

Ontem Simon estava morrendo de ciúme de Justin e agora pedia que ele viesse me buscar?

Bem, agora ele sabe que Justin é gay. E acho que depois de ontem tinha entendido finalmente que aquela Julie maluca que pulava de um relacionamento a outro, não existia mais.

Agora eu só amava um CEO workaholic .

Suspiro, feliz.

Sim, ontem tinha sido incrível! Graças a Deus o probleminha de Simon foi apenas temporário!

Ele mostrou serviço cinco vezes!

Sim, ele podia mesmo ser um ator pornô se quisesse, penso divertida.


— E aí, como está? — Justin pergunta enquanto estamos no carro a caminho do trabalho.

— Estou ótima!

— Eu fiquei assustado ontem, parecia cena de um filme de terror. — Ele ri.

— Se fosse um filme de terror eu teria matado Erin à marretada! Nossa, que raiva de ver aquela nojenta de novo! Ela fez de propósito! Erin tem muita raiva de mim por ter sido demitida da DBS. Mas eu não tenho culpa se ela era péssima! Se bem que ontem ela fez uma boa apresentação, não acha?

— Sim, ela fez.

— Isso é uma droga! Ela foi muito bem e eu vomitei em todo mundo! Vamos perder esse negócio!

— Você foi bem também, não se preocupe. E as coisas com Simon?

— Nós tivemos uma conversa ontem e acabei perdoando o fato de ele achar que eu seria capaz de traí-lo. Como ele pode achar que eu ia me apaixonar por você, sendo que a gente acabou de casar?

— De certa forma eu entendi a desconfiança. Ele não sabia que eu era gay. Se coloque no lugar dele, Julie. Pense se ele tivesse uma nova secretária e que ficassem juntos pra cima e pra baixo. Depois do expediente, fazendo compras, e Simon a elogiasse o tempo inteiro...

— Eu ia ficar histérica — confesso.

Justin ri estacionando o carro.

— É o que estou querendo dizer.

— Mas não foi só esse o problema! Parece que Simon estava se sentindo ameaçado pelo meu histórico!

Nós saltamos e caminhamos até os elevadores.

— Você sabe, eu tive um monte de namorados e parece que isso assombra o Simon! Homens são tão idiotas!

— Vocês precisam conversar mais sobre essas coisas. Acho que houve um grande mal-entendido. Ele poderia ter externado seu ciúme de vê-la comigo e você já poderia ter esclarecido que temos uma intimidade porque eu sou gay.

Entramos no elevador e Justin aperta o botão do nosso andar.

— Teria poupado toda essa confusão.

— Acho que tem razão. Às vezes esqueço que eu e Simon nos conhecemos há tão pouco tempo.

— Então é isso, precisam de mais comunicação.

Sim, Justin tem razão, penso enquanto saímos do elevador.

Toda a merda de ontem teria sido evitada se eu e Simon conversássemos mais sobre nossas dúvidas e inseguranças.

E estou tão distraída com meus pensamentos que não percebo que Justin está me levando para a sala de reunião.

— O que estamos fazendo aqui?

Ele pisca e abre a porta.

— Surpresa!

E eu quase caio para trás quando vejo todos meus colegas lá dentro, a sala toda decorada com balões e faixas de “Seja bem-vindo, bebê Bennett.”.

— Que diabos é isso? — sussurro apalermada, e Nancy é a primeira a me abraçar.

— Parabéns! Estou tão contente pelo bebê! Por que não me disse? Vai ter que me contar tudo e...

— Ei, deixa a gente cumprimentar a Julie também. — Alan me abraça e vejo Benjamin gravando tudo logo atrás, Angie está enxugando algumas lágrimas e tudo parece uma grande bagunça agora.

— Gente, como descobriram?...

— A história se espalhou ontem depois que você passou mal na Harvey — Alan diz.

— Ah droga! Mas não deviam fazer essa festa, Simon vai ficar muito bravo...

— Simon não está bravo. — De repente Simon aparece por entre as pessoas com Natasha ao lado.

E realmente ele não parece nada bravo. Ele está sorrindo!

Será que ainda não acordei e aquilo é um dos meus sonhos bizarros?

Mas se fosse um sonho, ele estaria pelado e com um balão amarrado no...

— Julie, que felicidade! — Rachel passa por ele e me abraça toda efusiva. — E aí, está de quanto tempo?

— Vai querer saber o sexo? — Angie pergunta.

— Claro que não! — Nancy refuta. — Por que ela saberia antes e estragaria a surpresa?

— Ah então podemos abrir uma aposta! — Benjamin grita!

— Deixa que eu organizo! — Phillip grita ainda mais alto.

— Gente, melhor não, não se esqueçam da confusão que foi na aposta de antes — Mark, sempre sensato, se intromete.

Mas minha atenção ainda está em Simon sorrindo.

— O que aconteceu com você? Por que não está bravo com toda essa festa e as pessoas falando da minha gravidez?

— Eles descobriram ontem e não tinha como conter a onda. Aí quando Nancy pediu para fazer uma festa eu acabei deixando.

— Melhor que comemorem e façam todas as perguntas que têm que fazer agora e o assunto morre e deixa de ser novidade mais brevemente — Justin diz.

— Sim, me parece uma estratégia inteligente — concordo.

— Meus parabéns, Julie — Natasha diz, sem expressão alguma no rosto. — Você sabe que os bebês vêm ao mundo para cumprir uma missão que ficou inacabada de sua última reencarnação. Eu só espero que seu bebê não tenha sido um assassino ou algo assim, porque...

— Natasha, ok, já entendemos — Simon a corta. — E sim, Justin tem razão, mas também temos outro motivo para estarmos comemorando. — Ele e Justin trocam um olhar.

— Julie, nós fechamos negócio com a Harvey — Justin comunica.

— Jura? — explodo em alegria. — Não acredito! Mesmo depois de todo meu vexame?

— Eu falei que eles não levariam isso em conta. No final, o que contou foi que nós tínhamos a melhor proposta e que ela foi muito bem apresentada por você e Justin. Meus parabéns!

— Estou tão feliz! — Sorrio, meu olhar capturando todos os detalhes da festinha de meus colegas. — Está tudo tão perfeito... — Então começo a chorar.

— Ei, por que está chorando, Julie? — Simon indaga entre confuso e exasperado, enquanto Justin me entrega um lenço.

— Talvez seja o bebê lhe passando as más lembranças de sua outra vida...

— Natasha! — Simon a repreende.

— Não, é só... Acho que são os hormônios. — Fungo, enxugando o rosto.

— E aí, vocês já escolheram o nome do bebê? — Angie se aproxima.

— Ainda não, Angie — Simon responde. — E acho que já dá para acabar essa festa não? Vamos voltar ao trabalho! Eu tenho uma conferência agora. Vamos, Natasha. — Simon ativa o modo CEO, chamando sua secretária, e desaparece porta afora.


Nós voltamos ao trabalho e, como era de se esperar, meus colegas estão em polvorosa e encheram minha caixa de e-mail. E as mensagens vão desde simples felicitações até sugestões de nomes de bebês (sério que queriam que meu filho se chamasse Adolph?), algumas fotos duvidosas de estilo de bomba tira-leite (eu teria que usar aquela coisa no meu peito?), até as posições mais aconselháveis para transar durante a gravidez (hum, algumas eram até interessantes...).

— Ei, Julie, vamos almoçar hoje? — Nancy passa pela minha mesa. — Precisa me contar todas as novidades.

— Não vai dar, Nancy.

— Por que não? Vai almoçar com o Justin? Você não acha que está grudada demais no seu novo chefe bonitão? Oh, Julie, pelo amor de Deus, vocês não estão tendo um caso, né?

— Claro que não, para de falar bobagem!

— Mas vou falar, está todo mundo meio desconfiado, porque o Justin é lindo demais...

— Vocês poderiam parar de fazer fofoca! O Justin é gay, será que não perceberam?

— Sério?

— Sim, e eu não vou almoçar com o Justin. E sim, com o Simon, até mais!

Deixo Nancy ainda atordoada com a novidade sobre Justin e subo para o andar da diretoria. Acho que Simon merece uma atenção especial hoje, depois de se sentir preterido por esses dois meses.

— Oi, Natasha, Simon está aí? — Passo pela secretária e entro na sala de Simon.

Ele me encara surpreso.

— Senhora Bennett, a que devo sua visita ilustre? — Ele fecha o notebook e eu me aproximo, sentando em seu colo e o beijando com vontade. — Acha isso apropriado? — Ele ri.

— De vez em quando vale a pena sair dos trilhos um pouquinho.

— De vez em quando? — Ele levanta uma sobrancelha.

— Eu vim te chamar para almoçar. — Ignoro sua ironia.

— Oh... Nada de almoço com seu chefe bonitão?

— Prefiro o CEO bonitão...

É sua vez de me beijar agora e estou toda derretida quando ele me encara com aquele sorriso mais lindo do mundo.

— Então, estamos bem? — Ainda indaga e percebo certa insegurança.

— Sim, estamos — garanto. — Simon, andei pensando e esses problemas que tivemos foi falta de comunicação, sabe?

— Então já andou fazendo suas teorias? — comenta divertido.

— Você poderia ter me perguntado sobre minha intimidade com Justin. Eu falaria que ele é gay e acabaria o problema.

— É, tem razão.

— Então a partir de agora vamos conversar sobre tudo, ok?

— Ok, acho que posso concordar com isso.

— Está vendo, posso até escrever um livro sobre como superar problemas no casamento. Até já posso me ver em um programa de TV, serei como aquelas conselheiras amorosas, salvando casamentos fracassados e...

— De onde você tira essas coisas, Julie? — Simon ri.

— Você pode rir, mas é bem possível!

— Certo, vamos almoçar então, Senhora Bennett.

Ele me tira do colo.

— E mais uma coisa. — Seguro sua mão. — Eu podia ter contado sobre Justin, mas agi como se fosse um segredo. Então vamos prometer, nada mais de segredos entre nós, está bem? Promete?

Por um momento Simon não responde, e um calafrio estranho passa pela minha espinha. Mas o momento passa quando Simon sorri e me beija, puxando-me para fora da sala.

— Combinado.

 


Capítulo 9

 

Julie


— Senhora Bennett, acho que terminamos. Como eu expliquei, está tudo correndo muito bem com sua gravidez. Está de acordo com o que deve ser na vigésima semana. — O médico encerra o exame de ultrassom.

— Já é possível saber o sexo? — Simon questiona e lhe dou um tapa.

— Ei, não queremos saber!

— Por que me bateu?

— Se a gente souber o sexo do bebê vai estragar a surpresa.

— Não vejo por que não saber antes. Você anda falando em fazer compras, decorar quarto e tudo o mais, poderia ser mais fácil para escolher uma paleta de cores, por exemplo.

— Essa coisa de paleta de cores é tão antigo, Simon! Nós somos pais modernos! Podemos fazer o quarto da cor que bem entendermos sem seguir um modelo arcaico pré-estabelecido.

— Agora vai me dizer que vai criar nosso bebê sem gênero?

— Podia ser! Eu seria uma pioneira! Já posso até ver daqui a vinte anos, uma estátua sendo erguida em minha homenagem em frente ao hospital St. Mary!

— Não exagera, Julie. Então não vai mesmo querer saber o sexo do nosso bebê? Não está nem um pouco curiosa?

Sim, nisso ele tem razão, eu estou mesmo curiosa. Mas vou esperar.

Encaro meu obstetra, o Doutor Davis.

Eu gostava muito do médico com quem vinha me consultando desde que descobri a gravidez. Graças a Deus, Simon era rico e tínhamos um plano de saúde excelente que cobria um pré-natal particular, assim, eu podia fazer um ultrassom por mês e me consultar com um obstetra. Aqui na Inglaterra, os planos de saúde são caríssimos e praticamente todo mundo tem seus bebês pelo sistema público, onde as mulheres são acompanhadas por uma midwife , uma espécie de enfermeira obstétrica ou parteira se preferir chamar, que inclusive até realiza os partos, todos normais em sua maioria, e o médico só é chamado se houver algum problema com a mãe ou o bebê.

Isso me leva a outra questão.

— Na verdade, o mais importante aqui é saber se já podemos marcar a cesárea.

O médico retira os óculos me encarando como fazia todas as vezes em que eu tocava nesse assunto.

— Senhora Bennett, já explicamos que seu parto será normal. Sua gravidez está transcorrendo sem nenhum problema. E se tudo continuar assim, seu bebê nascerá normalmente, sem necessidade de uma cirurgia.

— Mas isso não é justo! Eu não quero ficar sofrendo daquele jeito por horas! É desumano!

— Julie, escute o médico... — Simon toca minha mão.

— Ah, para você é fácil falar, não é pela sua vagina que o bebê terá que passar! — Encaro o médico de novo. — Olha, eu sei que todo mundo prefere o normal, mas acho que eu tenho direito de escolher. Estamos em um país livre e este não é o sistema público de saúde! O meu marido pode pagar, inclusive! Fale pra ele, Simon! Fale que você é rico!

Simon revira os olhos.

— Já acabamos por aqui?

— Sim, já terminamos. Já podem ir.

— Então vamos, Julie. Ainda falta mais de quatro meses para o bebê nascer, temos tempo de discutir esses detalhes depois. E precisamos ir agora, senão nos atrasaremos para o jantar na casa da sua mãe.

— Eu preciso ir ao banheiro antes! — O bebê cada vez maior fazia o útero pressionar minha bexiga e eu vivia indo ao banheiro.

— Tudo bem, eu te espero no carro.


Quando passo no banheiro e esvazio minha bexiga aproveito para responder algumas mensagens que Florence, a cunhada de Simon, havia deixado. Ela estava louca para vir para Londres e fazermos compras para o bebê.

Quando encontro Simon, ele já está impaciente dentro do carro.

— Demorou muito!

— Você quer é passar no Burger King e comprar hambúrgueres antes de irmos, porque, como eu, não suporta a comida da minha mãe.

— Ninguém suporta a comida da sua mãe.

— Isso tem razão. Sabe que uma vez tivemos um cachorro e o coitado morreu depois de comer um frango esquisito que ela fez?

— Coitado do cachorro. Não sei como ela não matou você ou seu pai. Por que demorou no banheiro? Está tudo bem?

— Florence me mandou mensagem. Ela quer marcar para vir a Londres e irmos fazer compras para o bebê.

— Não quer mesmo saber o sexo do bebê? — Simon insiste.

— Vamos esperar, já falei. Claro que estou curiosa, mas vai ser muito mais legal quando formos surpreendidos.

— Florence já sabe o sexo do bebê dela. — Ela está com oito meses de gravidez.

— Eu não sou a Florence!

— Sean está alucinado depois que descobriu que vão ter um menino. Eles estão procurando uma casa para se mudarem, porque quer construir um campo de rúgbi de presente.

— Minha nossa, um campo de rúgbi? Não é exagero?

— Falou a pessoa que disse que se tivéssemos uma menina, deveríamos nos mudar para um castelo, já que ela teria que ter um lugar maior para receber seu futuro pretendente, o Príncipe George!

— Ótimo voltar a este assunto! Precisamos mesmo nos mudar!

— Não vou comprar um castelo, Julie!

— Ok, talvez eu tenha exagerado no negócio do castelo, mas eu acho que precisamos de uma casa maior! Eu já estou até pensando na decoração! Podíamos chamar os irmãos Scott...

— Irmãos Scott?

— Sim, daquele programa americano da TV a cabo, não conhece?

— Claro que não.

— Eu acho que seria incrível!

— Podemos pensar nisso depois. Que tal o Burger King? — Ele pisca.


Uma hora depois Simon estaciona em frente à casa dos meus pais.

— Aí estão vocês! — Avisto mamãe saindo na varanda, e papai logo atrás, empurrando a cadeira de rodas de vovó Mary.

Ainda acho incrível que vovó, contrariando todas as expectativas, ainda esteja conosco. O câncer havia recuado mais uma vez e ao que parece, vovó ainda vai permanecer algum tempo entre nós. Eu só espero que ela fique para conhecer seu bisneto.

Ou bisneta, corrijo-me mentalmente ao sair do carro, seguida de Simon.

— Nossa, como você está linda, filha! — Mamãe me abraça e depois toca minha barriga. — A deusa está tão feliz com mais um mulher no mundo!

— Podemos ter um menino, mamãe.

— Eu aposto que é uma menina! Sabe que a deusa me mostrou sua bebê em sonho! A pequena Luz Dourado do sol poente apareceu para mim neste sonho, com seu sorriso tão lindo...

— Espera, quem é Luz Dourada do sol poente?

— Sua filha, claro.

— Pelo amor de Deus, mamãe! — Passo por ela e vou até meu pai e vovó.

— Mas que barrigão, hein? — Papai me abraça. — Tem certeza que não são dois?

— Temos certeza, Tom — Simon responde enquanto eu abraço minha avó.

— Como a senhora está, vovó? Estava com tanta saudade! Tem certeza que está mesmo bem pra sair da clínica? A gente podia ter ido te visitar lá!

— Querida, eu não queria perder o aniversário do seu pai.

Sim, hoje nós comemoraríamos o aniversário de quarenta e cinco anos de papai. E eu e Simon tínhamos até comprado uma câmera fotográfica supermetida à besta pra ele.

Certeza que papai, como bom fotógrafo amador, ia pirar.

Só espero que ele não queira tirar mais fotos de Simon pelado.

— Você está tão linda grávida, Julie! Como está este bebê? — vovó pergunta quando entramos.

— Estou ótima, vovó! E o bebê também. Fizemos mais um ultrassom hoje.

— E quando vai nascer?

— Está programado para outubro.

— Julie está insistindo que tem que fazer uma cesárea — Simon comenta quando aceita uma cerveja do meu pai.

— Ficou louca? — Mamãe fica horrorizada.

— Devia me apoiar, mãe!

— Ela está com medo das dores — Simon responde por mim de novo.

— Simon, você não tem lugar de fala aqui! Como eu já te disse antes, só aceito opinião de quem tem vagina!

— Pois eu tenho uma vagina e você nasceu sem o menor esforço! — mamãe diz.

— Você ficou três dias em trabalho de parto, Alicia — papai rebate.

— Três dias? — Arregalo meus olhos em choque.

— Pois o meu parto foi muito fácil, querida — vovó comenta. — Não deve ter medo. Você é uma menina forte, vai dar tudo certo.

— E a deusa vai te proteger! — Mamãe dá tapinhas na minha mão. — Eu já estou preparando todos os rituais necessários.

— Rituais?

— Sim! Eu e minhas amigas estamos preparadas!

— Espera, acha que vou querer suas amigas malucas da Wicca na minha sala de parto entoando cânticos e soltando fumaça de origem duvidosa?

— Claro que sim. Inclusive deveria optar pelo parto em casa. Sim, seria maravilhoso. Poderia ser aqui na nossa sala. Já posso imaginar Jane tocando tambor, e Penny entoado cânticos para a deusa enquanto todas nós dançamos nuas ao seu redor e...

— Nem pensar! Eu vou ter o meu bebê em um hospital como deve ser!

— Julie que tem que escolher como deve ser o parto dela, Alicia — vovó se intromete. — Deixa a menina em paz. Agora vamos jantar!

— Eu acho que a gente podia ficar conversando um pouco mais. — Simon hesita, porque a hora de comer na minha casa sempre é um suplício.

— Não se preocupe, eu encomendei o jantar no pub local hoje — papai diz —, você sabe, para sua mãe não ter trabalho. — Ele pisca.

Mamãe não aceita que é péssima cozinheira.

— Graça a Deus — Simon sussurra com alívio.


— E então, eu sabia que poderiam não querer o nome que escolhi e já fiz uma lista de algumas sugestões — mamãe comenta depois do jantar, quando todos nós estamos acomodados na sala e papai já abriu seus presentes.

Mamãe lhe deu uma garrafa com um líquido âmbar esquisito, acompanhado por uma piscadela que eu ia fingir que não vi, dizendo que era afrodisíaco, o que eu ia fingir que não escutei.

Vovó tinha tricotado um cardigã e, é claro, meu presente e de Simon fez muito sucesso, tanto é que papai estava louco tirando foto de tudo.

— Mamãe, nós vamos escolher o nome do bebê e não será um desses nomes bizarros hippies !

— Não pode colocar um nome no seu bebê sem criatividade, filha!

— Fui eu que insisti para que ela não colocasse em você o nome de Papoula Selvagem — vovó diz divertida.

— Obrigada, vovó! — Beijo sua mão, realmente agradecida.

— E Julie é um lindo nome. Foi seu pai quem escolheu.

— Vai querer escolher o nome do bebê também, Simon? — pergunto curiosa.

— Acho que devemos escolher juntos.

— Você já tem alguma ideia?

Mamãe senta ao seu lado.

— Que tal Iluminada Flor da manhã?

— Mãe, para! Mas agora eu quero saber, Simon. Já pensou em algo?

— Vai deixar eu escolher? — Ele me desafia, porque sabe que sou um tanto controladora neste assunto.

— Se forem nomes razoáveis sim.

— Por isso deveríamos saber o sexo do bebê, assim ficaria mais fácil.

— Não vai me convencer. — Bocejo, me sentindo cansada. Ultimamente eu vinha me sentindo cada vez mais assim.

— Acho melhor irmos dormir.

— Esperem, eu fiz algo para vocês. — Vovó nos estende um pacote.

— O que é isso? — Pego o embrulho e o abro, revelando um lindo sapatinho branco de crochê. — Ah, vovó, que fofo! É o primeiro presente do bebê!

— Obrigada, Mary, é lindo — Simon agradece vovó.

— Tenho certeza que independente de ser menino ou menina, vai ser uma criança muito amada. Porque tem pais ótimos como vocês.

Eu a abraço, emocionada, torcendo para que ela veja nosso bebê nascer.

— Agora é hora de dormir. — Simon me puxa pela mão.

— E como vai a vida sexual de vocês? — mamãe pergunta.

— Mamãe! — Coro até a raiz dos cabelos com sua pergunta indiscreta.

— Qual o problema de perguntar? Eu tenho experiência e sei que às vezes é difícil manter as coisas funcionando devidamente neste período! Seu pai, por exemplo, morria de medo de transar comigo, dizia que ia machucar o bebê. — Ela ri.

— Alicia, tenho certeza que ninguém quer saber disso — vovó reclama. — Deixe Julie ir dormir em paz.

— E, por favor, nada de ir na porta do quarto tocar tambor! — aviso.

— Não sei por que reclama, veja só, a minha dança da fertilidade deu supercerto! — Ela sorri presunçosa fazendo me lembrar da primeira vez que eu trouxe Simon aqui e fomos interrompidos por mamãe dançando e tocando tambor na porta do quarto quando íamos transar.

— Boa noite, mãe! — Aceno, deixando Simon me levar para meu quarto.

— Sua mãe é divertida — Simon diz quando fecha a porta.

— Diz isso porque só a vê de vez em quando! Não sabe o que foi crescer com uma mãe entoando cânticos para deusa a sua volta a cada vez que você menstruava! — reclamo enquanto tiramos a roupa para dormir.

De repente, visualizo minha imagem no espelho. Minha barriga já está bem maior agora. E ainda vai crescer mais, penso, com certo pavor. Meu bebê está cada vez mais real para mim. Sinto um arrepio de apreensão e ansiedade sempre que pensava que em poucos meses ele irá nascer.

— Acha que estou gorda? — pergunto a Simon e ele sorri, se aproximando e me abraçando por trás, as mãos pousando em meu ventre dilatado.

— Sim, está.

— Simon! Você devia dizer “não, você está linda! Nunca a vi tão maravilhosa com este brilho no olhar e muito sexy também...”.

— Só perguntou se estava gorda, eu respondi!

— Devia ser um pouco mais romântico!

Ele me vira de frente, segurando meu rosto.

— Julie, você está gorda e vai ficar mais ainda. Mas eu ainda quero transar com você, melhor assim?

Eu rolo os olhos.

— Está bem...

Ele me beija devagar e persuasivamente, fazendo minha pulsação acelerar.

— Então me leva pra cama...

Ele ri e faz o que pedi, o resto das nossas roupas sendo tiradas do caminho.

Eu o puxo para mim, o beijando com vontade enquanto me coloco em cima dele encaixando nossos corpos com facilidade.

Simon geme e segura meus seios, agora bem maiores.

— Eles estão muito bons assim — diz com um sorriso safado.

— Sério? — Eu me movo em cima dele e então de repente um pensamento me ocorre. — Estou mesmo gorda? — Paro, ofegante.

— Quê?

— Você disse que estou gorda.

— Julie, você está linda, ok? Agora continua...

— Não, estou me sentindo um elefante, fecha os olhos, não quero que olhe pra mim.

— Mas eu gosto de ver você.

— Então vamos mudar de posição!

— Ok! — ele resmunga.

Saio de cima dele.

— Como quer?

— De lado? — respondo ainda meio em dúvida.

— Está bem...

Nós nos posicionamos de novo e ele me penetra por trás, me fazendo gemer, enquanto seus lábios desbravam meu pescoço com suaves mordidas. Ele sabe que isso me deixa louca.

— Isso é tão bom... — sussurro, mas de repente Simon para. — O que foi?

— Acha que estou machucando o bebê?

— De onde tirou isso?

— Sua mãe disse que seu pai achava que machucava o bebê, eu nunca tinha parado para pensar, mas...

— Simon, sério que vai falar do sexo entre minha mãe e meu pai agora?

— Eu só estou falando que podemos estar machucando o bebê...

— Não está! Nós perguntamos ao Doutor Davis, lembra?

— Eu sei, mas...

Eu o empurro.

— Certo, agora você cortou todo o clima! — Puxo a coberta para cima de mim.

— Eu cortei? Foi você que começou com o papo de que estava gorda!

— Você que me chamou de gorda!

— Já olhou para a sua barriga!

— Ai Simon, eu perguntei para você responder o contrário e não a verdade!

Ele começa a rir.

— Eu não me importo se está gorda ou não, ok?

— Eu duvido! E se eu ficar cada vez mais gorda, mesmo depois que o bebê nascer?

— Ainda seria minha esposa, claro.

— Não ia pedir o divórcio e me trocar por alguma modelo magra?

— Claro que não. Eu acho você linda, Julie, mas eu gosto de você de qualquer jeito.

— Ok, isso foi bonitinho. — Eu me inclino e o beijo.

— Não vai dizer o mesmo de mim? Ainda vai me amar se eu desenvolver uma barriga de chopp?

— Não, eu te trocaria por um cara com barriga de tanquinho — provoco e Simon grunhe irritado.

— Está vendo? Depois sou eu que corto clima! — Ele me abraça me beijando e de repente nós dois paramos quando sentimos o bebê mexendo.

— Sentiu isso? — Simon me encara chocado e eu sorrio.

— Sim! Eu senti!

Nós dois rimos. Era a primeira vez que o bebê mexia. E isso o torna tão real. Um lembrete que agora éramos três, mesmo que ele não estivesse efetivamente ali ainda.

De repente sinto o chute de novo.

— Uau, essa foi forte! — sussurro.

Simon sorri, tocando minha barriga e o bebê mexe mais uma vez.

— Acha que ela vai ser tão intensa quanto a mãe.

— O que disse?

Simon faz uma cara culpada.

— Nada, eu...

— Você disse ela! Simon, você já sabe o sexo do bebê?

— Ok, eu sei. Eu tive que perguntar ao Doutor Davis. Por favor, não fica brava...

Eu começo a chorar.

— Merda, Julie, por que está chorando? Não fica brava...

— Eu não estou brava, estou feliz. Estou emocionada. A gente vai ter uma menina.

Ele sorri e me abraça.

— Sim, nós teremos uma menina.

Eu o abraço de volta, explodindo de felicidade.

Eu vou ter uma filha!

A futura esposa do Príncipe George está a caminho.

Afasto Simon para encará-lo.

— O castelo! Agora nós temos que ter o castelo.

— Não, nem começa!

— Está bem... mas temos que começar a fazer o quarto! E o enxoval. Ah, tudo em tons de rosa e...

— Achei que ia ser uma mãe moderna e não seguir padrões de cores...

— Dane-se eu posso fazer o que eu quiser! Se bem que rosa talvez não combine com o tom do cabelo dela.

— Tom do cabelo?

— Acho que ela vai ser ruiva como você! Vai combinar com o tom loiro do George.

— Minha filha não vai casar com o Príncipe George.

— Veremos! Ah Simon, estou tão feliz! E temos que pensar em um nome!

— O que aconteceu com o Luz Dourada do sol poente?

— Nem pensar!

Começamos a rir.

— A coitada da criança sofreria bullying a vida inteira! — Simon diz e eu concordo.

Ele acaricia minha barriga com carinho.

— Acho que ela vai ser linda como você, Julie.

— E eu espero que ela seja tão inteligente como você. Nossa, ela vai dominar o mundo!

— Eu não duvido. — Ele me beija. — Podemos transar agora?

— Por favor...

E desta vez ninguém estraga o clima.

 


Capítulo 10

 

Julie


— Minha nossa, Florence, como você ainda consegue andar! — exclamo muito impressionada não só com o tamanho da barriga da esposa de Sean, mas também com o fato de ela estar usando um salto agulha e um vestido preto que marca cada curva. Florence mais parecia saída daquela série da Netflix “Mães e Divas”. — Nem acredito que já está com nove meses!

— A gente acostuma! — Ela ri.

Estamos caminhando na Oxford Street depois de passarmos o dia fazendo compras para o enxoval do bebê. E devo dizer que nunca imaginei que pudesse ser tão divertido.

Florence, obviamente já tinha tudo preparado para a chegada do seu bebê que nasceria em breve, lá em Newcastle, a cidade onde ela mora com Sean, o irmão de Simon que é jogador de rúgbi. Mas eu não tinha comprado nada ainda. Na verdade, eu não fazia ideia do que era preciso comprar, então aceitei esperar Florence poder vir para Londres para me ajudar.

Simon ficara muito satisfeito por eu ter a ajuda de Florence que, segundo ele, “iria me orientar a não comprar coisas que não iam servir pra nada”.

— Simon, não sou tão fútil assim! — Eu havia refutado.

— Você não é fútil, você é impulsiva! E exagerada — ele se corrigiu, mas não adiantou muito.

O que Simon não sabia era que Florence não era esse modelo de mãe comedida e sensata que ele estava imaginando.

Ela simplesmente enlouquecera junto comigo enquanto entrávamos de loja em loja, babando nas roupinhas lindinhas e nos acessórios mais lindos ainda.

A primeira loja que entramos já foi um estrago.

— Você vai amar essa loja! O segundo andar é o paraíso de coisas inúteis, mas que quando a gente bate o olho, achamos que é absolutamente indispensável! Para as pessoas que querem manter a lista de compras só com o básico tem que passar longe dessa loja.

— Não quero só o básico! Quero comprar tudo o que tenho direito!

— Sabia que ia dizer isso! A Mamas & Papas é cheia daquelas coisas que você sabe que não precisa ter, mas que não sabe como vai conseguir viver sem.

— Mas nós não temos uma lista? — Ainda tentei ser ponderada, lembrando que Florence havia dito para mim que iria fazer uma lista de tudo o que eu iria precisar.

— Sim, nós temos. Mas você não vai conseguir se prender a ela somente. A lista é só um guia, para não esquecermos nada que é essencial.

E ela tinha razão. Meus olhos quase saltaram das órbitas, tamanha a quantidade de roupinhas minúsculas, uma mais fofa que a outra.

— Imagina que uma bebê cabe aqui? — comentei, pegando um body cor-de-rosa de crochê.

— Você tem tanta sorte de ter uma menina! Meninos são tão restritos! — ela dizia colocando um monte de vestido na minha cesta.

— Mas não precisa ser! Os tempos são outros! Pode colocar um vestido no seu filho se quiser! — Sim, minha mente tinha se iluminado de tantas ideias arrojadas. — Já imagino o pequeno Alexander Bennett usando vestidos e quebrando todas as regras dos gêneros! Florence, você ia ficar famosa!

— Ficou maluca? O Sean ia me matar! Vamos nos ater a roupinhas para sua bebezinha!

— Olha, Florence, esses carrinhos! — Eu fiquei alucinada com os carrinhos (tinha até um carrinho para a mãe correr com a criança! Ok, eu não corria, mas mesmo assim comprei um. Já podia me imaginar como uma mãe fitness arrasando no Hyde Park).

Agora eu estava morta de cansada e convenci Florence a irmos tomar um chá na Elan Café. Claro que todas as nossas compras seriam entregues direto na minha casa.

— Estou morrendo de fome!

Sentamos em uma das mesas do charmoso café com sua decoração em tons de rosa e abrimos o cardápio.

— Você não engordou nada, Florence! — Eu a admiro.

— Você também não.

— Porque o Simon fica controlando o que eu como! Só porque eu disse que tinha medo de desenvolver diabetes! E aí ele disse que era só eu comer direito, e a partir de então ele me controla como um general!

— É a cara do Simon fazer isso! O Sean não está nem aí. A única coisa que ele quis fazer foi o tal campo de rúgbi! Quase me deixou louca inventando que tínhamos que mudar.

— Eu vi as fotos, ficou incrível! E eu amei o quarto do bebê.

Florence tinha me enviado as fotos do quarto do bebê na casa nova e estava maravilhoso. Tudo lindo em tom bege e azul. E desde então eu vinha enlouquecendo o Simon porque nós tínhamos que nos mudar também.

— Aqui é diferente. Sou eu que insisto em mudar. Precisamos de um lugar maior.

— O apartamento do Simon é enorme, Julie.

— Mas e o bebê? Só as coisas que a gente comprou hoje já precisaria de uma casa só pra elas.

Florence ri.

— Precisa decidir logo! Já está de quase sete meses! Tem que fazer o quarto da bebê.

— É o que eu digo ao Simon.

O garçom chega com nossos pedidos.

Florence pediu uma fatia enorme de bolo e eu apenas uma salada.

— Hum, adoro doce! Sabe que passei o primeiro trimestre sem poder ver açúcar que já enjoava?

— Graças a Deus eu não enjoei quase nada! Tirando o dia que vomitei na minha ex-chefe, claro.

— Eu passei muito mal no começo, me sentia cansada, enjoada e horrorosa. Depois, no segundo trimestre, comecei a me sentir bem de novo. Quer dizer, às vezes o bebê parece que me odeia e fica chutando o tempo todo e no último mês está difícil achar posição para dormir. Porém, acho que vou até sentir falta da minha pança.

— Não tem medo do parto?

— Medo eu tenho, mas vai ter que sair de qualquer jeito.

— Eu tenho pavor! E meu obstetra cisma que não preciso de uma cesárea!

— Está sendo exagerada, Julie.

— Estou? Você já viu uma mulher em agonia de parto de perto? É terrível, Florence! E o Simon me obrigou a ver um vídeo, dizendo que eu ia me acalmar e foi como ver um filme de terror! Teve uma hora que eu achei que a bunda dela ia explodir!

— Ai, Julie, que exagero! Você precisa fazer um plano de parto e tudo vai ficar bem.

— Plano de parto?

— Ainda não fez o seu? Eu já fiz o meu, a midwife me mandou um modelo, eu posso te mandar. É essencial que tudo transcorra do jeito que você quer.

— Hum, o jeito que eu quero é que outra pessoa tenha o bebê por mim!

Nós acabamos de comer e Florence ainda insiste que temos que passar na John Lewis, uma famosa loja de departamento, que, segundo ela, tem ótimos acessórios de bebê que podemos dar uma olhada.

— Florence, sinceramente eu acho que não tenho onde enfiar mais nada! O Simon vai ter um chilique quando vir tudo o que compramos!

— Nós esquecemos de comprar uma bomba.

— Bomba?

— Sim, para tirar leite materno! Isso aqui! — Ela pega um treco que parece esquisitíssimo.

— Eu não entendi, para que serve mesmo?

— Para tirar o leite do seu peito.

— Achei que o bebê fosse tirar o leito do meu peito. — E devo dizer, não sei bem se estou de acordo com isso.

— Sim, mas vai precisar retirar para guardar, para você que trabalha vai ser bem útil. Aliás, já pensou que precisa contratar uma babá?

— Na verdade não. — Nossa, Florence tem razão. Com quem o bebê vai ficar quando eu for trabalhar?

Eu não posso levar um bebê para o trabalho, posso?

— Olha só quem eu encontro aqui.

Somos interrompidas por uma voz melodiosa e quando me viro reconheço Lorna Middleton se aproximando.

A ex-namorada escrota de Simon.

— Oi, Lorna. — Florence sorri educada.

Mas a atenção de Lorna não está em Florence. Seu olhar vai até a minha barriga.

— Nossa, Julie, como você engordou.

— Acho que é óbvio que estou grávida, não?

— Sim, eu ouvi dizer. Está de parabéns, gravidez ainda é o método mais eficiente de se conseguir um casamento vantajoso.

Ah! Abro a boca chocada de ultraje com as palavras de Lorna.

Ela tinha mesmo dito que engravidei para obrigar Simon a se casar comigo?

— Lorna! Não seja maldosa! — Florence responde.

— Deixa ela falar! É realmente triste que uma mulher, depois de dez anos do fim de um relacionamento, ainda não tenha conseguido superar!

Dessa vez é Lorna quem fica ultrajada.

— Perdão? Está se referindo a mim? Acha que não superei o Simon? Eu tenho namorado, para sua informação! Estou namorando James Gallagher, o milionário que é dono da metade de Londres, acha que estou ligando para o Simon? Faça bom proveito!

Nossa, esse cara não era o que estava com a Erin na festa dos Bennett, quando a derrubei da escada? Quer dizer, eu não a derrubei, foi sem querer, mas até hoje ela me acusava de ter tentado matá-la.

— Ei, vocês duas, já chega dessa discussão! — Florence nos repreende. — A Lorna está mesmo namorando, Julie. Claro que ela já superou o Simon. E por isso mesmo ela deveria parar de ficar jogando indireta para você, né Lorna? Essa briguinha de vocês não tem o menor cabimento! Muito feio duas mulheres ficarem discutindo por causa de homem!

— Sim, tem razão, Florence. — Levanto meu queixo. — Eu sou uma mulher moderna, que pratica a sororidade! Me desculpe, Lorna, por te acusar de não ter superado o Simon. — Nossa, eu sou mesmo muito madura e alinhada com as causas feministas! Acho que posso até escrever um artigo sobre isso. “Grávida e feminista: usando a bomba de leite para abrir caminho para os novos tempos”. — Enfim, acho que não tem mais sentido essa briga mesmo. Estou casada com o Simon e você tem um namorado bilionário e... falando nisso, James Gallagher não estava saindo com Erin York? Sabe quem é? Uma ruiva...

— Ah sim, aquela ridícula que caiu da escada para chamar a atenção na festa dos Bennett. Sei bem quem é essa. Ela não supera o James, sabe? Vive ligando para ele e aparecendo onde estamos, querendo atrapalhar.

— Ah, que vaca! Ela foi minha chefe e era tão incompetente! Claro que ela só estava com o James por causa da fortuna dele!

— É o que eu disse para ele! Que ela é só uma vaca interesseira!

— Tirou as palavras da minha boca! Lorna, acho que temos mais coisa em comum do que o Simon!

Rimos como velhas amigas.

Nossa, Lorna podia ser uma garota legal. E só o fato de ela odiar a Erin já mostra que é uma pessoa sensata como eu.

— Sim, Julie. Que pena que nunca tivemos tempo de nos conhecer melhor! Me diga, quem vai organizar seu Chá de Bebê?

— Eu não pensei nisso ainda.

— Deixe-me organizar para você.

— Não! — Florence se intromete. — Sou eu quem vai organizar o Chá de Bebê da Julie, claro.

— Mas, Florence, você está quase parindo! — Lorna questiona.

— Não me falou nada sobre isso! — Encaro Florence, confusa.

— Era para ser uma surpresa.

— Que pena. Espero que não se esqueçam de me convidar. Adoraria ter mais tempo de conversar com você, Julie. Aliás, adorei seu sapato.

— É Louboutin, da última coleção — digo orgulhosa do meu mais novo sapato que ganhei de presente de aniversário de Simon no mês anterior.

Lorna acena e se afasta. Florence fixa em mim um olhar abismado.

— O que foi isso? Em um minuto estavam brigando e no minuto seguinte conversavam como melhores amigas.

— O quê? Até que ela é legal. E tem razão, essa briga por causa do Simon já estava absurda!

— Sempre foi absurda, mas daí a ficar amiguinha da Lorna já é demais.

— Não sei por que não podemos ser amigas. Aliás, você está mesmo organizando meu Chá de Bebê?

— Não! Eu falei rápido porque não tem nada a ver Lorna organizar um Chá de Bebê para você! Além do mais, você já tem praticamente tudo.

— Mas eu gostaria de uma festinha, seria divertido.

— Tudo bem, se faz tanta questão organizo, claro.

— Eu vou amar! Podíamos fazer uma festa na casa dos pais do Simon, no jardim. Lá é tão bonito. E será que poderíamos chamar a família real?

Florence me encara como se eu fosse louca. Mas dá de ombros.

— Convidar a gente pode, eles irem é que é outra história... — De repente ela para e coloca a mão na barriga. — Ai.

— O que foi?

— Acho que foi uma contração.

— Contração? Mas ainda não é a hora do seu bebê nascer! — Eu me apavoro.

Em resposta ela geme de novo.

— Julie, acho que preciso ir para um hospital.

— Não! Você me disse que ia ter o bebê lá em Newcastle! Que já estava tudo programado, lembra?

— Eu sei, mas acho que minha bolsa estourou!

— Ai meu Deus!

Estou completamente apavorada enquanto coloco Florence em um táxi e peço que sejamos levadas ao hospital mais próximo.

Florence apenas geme de vez em quando, mas ainda parece linda e composta.

— Tem certeza que esse bebê vai nascer? Você parece calma — questiono depois de enviar uma mensagem para Simon avisar Sean. Caramba, ele está lá em Newcastle que fica a horas de Londres!

Ela respira rápido.

— Eu disse, a bolsa estourou!

— Não parece que estão rasgando sua vagina!

O motorista do táxi arregala os olhos e Florence ri.

— Está doendo, acredite.

Quando chegamos ao hospital, colocam Florence em uma cadeira de rodas e a levam para dentro. Uma midwife a examina rapidamente constatando que a bolsa de Florence não só estourou como ela está com a dilatação necessária para o bebê nascer.

Como assim?

— Vamos levá-la para a sala de parto! — Eles empurram Florence em sua maca pelo corredor, eu tento passar, mas uma enfermeira me impede.

— Não pode entrar.

— Mas eu estou com a moça que vai parir!

— Você é o pai? Somente o pai pode entrar na sala de parto. Então fique na sala de espera.

— Eu sou o pai sim!

A mulher se volta com o cenho franzido.

— O quê?

— Somos casadas! Olha aqui nosso sobrenome! — Pego meu documento. — Somos casadas e se você não me deixar passar eu vou processá-la por homofobia! Vou acabar com você! — Empurro a mulher, que ainda me fita apalermada e entro na sala de parto.

Florence já está lá, gemendo baixinho, enquanto uma midwife pede para ela fazer força.

— Como assim seu bebê já vai nascer?

— Julie, como conseguiu entrar aqui? — Ela me encara confusa, entre uma contração e outra.

— Querida, claro que eu estaria aqui com você. — Acaricio seu cabelo, vendo a enfermeira que tentou me barrar entrar na sala, ainda me encarando desconfiada.

— Vamos, Florence, empurre com força — a mulher instrui e Florence empurra.

Caramba. Fico olhando toda aquela cena, abismada.

Florence é uma lady parindo!

O pequeno Alexander não demora a nascer, tão lindinho (quer dizer, não dá para ver por cima de todo sangue e meleca que o cobre, mas Florence e Sean são muito bonitos, então deduzo que o bebê deva ser lindo também), chorando a todo pulmão.

Florence está exausta e feliz, enquanto colocam o bebê contra seu peito.

Uau.

O parto pode ser mesmo um momento emocionante!


***


— Simon, finalmente está aqui! — Corro para abraçá-lo quando entra no hospital, seguido de Sean, que passa por nós, ansioso para ver Florence e o bebê.

— Sean está arrasado por não ter chegado a tempo. Mas ninguém esperava que Florence fosse ter o bebê antes do tempo...

— Sim, Simon, foi incrível! Ela simplesmente estava lá, como se nem estivesse sentindo dor, e foi tudo tão rápido! Parecia que o bebê estava saindo por um tobogã!

— E você assistiu tudo? Achei que eles não permitissem...

— Eu dei um jeito! — Pisco. Melhor não contar da minha pequena mentira. — Simon, não foi nada assustador. Eu fiquei com medo à toa. Tenho certeza que serei como Florence e vou ter meu bebê como uma lady .

Ele sorri.

— Fico feliz que tenha parado com esse medo.

— Vamos ver o bebê!

Seguimos para o quarto e Sean está segurando o embrulho onde está o pequeno Alexander.

— Parabéns, Florence — Simon diz para Florence que está ainda com uma expressão um tanto pálida, mas bem plena de felicidade.

O bebê tinha nascido há cinco horas e ela já estaria livre para ir embora em pouco tempo.

Kate Middleton não é nada perto das mulheres da minha família!

— Quer segurá-lo? — Sean passa o bebê para o colo de Simon, que o pega, ainda meio sem jeito. Mas caramba, ele fica bem com um bebê no colo! Se eu não estivesse grávida eu ia querer engravidar de Simon neste momento!

— Ele é lindo — Simon elogia.

— Você foi o máximo, Florence. Não vejo a hora de chegar minha hora também — comento, animada.

— Desculpe ter te assustado.

O pequeno Alexander começa a chorar e Simon o passa para a mãe.

— Eu fiquei assustada, mas depois foi tudo incrível!

— Julie, vamos embora, você precisa descansar, hoje foi um dia corrido.


Nós nos despedimos de Sean e Florence e quando estamos saindo do hospital, a enfermeira que me barrou está passando e me encara com um olhar de acusação.

Eu seguro a mão de Simon.

— Vamos rápido!

— O que foi?

— Nada não... Só é melhor que aquela enfermeira não nos alcance.

— Julie, o que foi que aprontou dessa vez?

— Eu tive que inventar que era casada com a Florence para me deixarem assistir o parto!

— Ficou louca?

— Era o único jeito! Agora corre que acho que ela está vindo com o segurança...

Apresso o passo, enquanto Simon solta palavrões atrás de mim.

 


Capítulo 11

 

Simon


Quando chegamos em casa, sou surpreendido por um monte de pacotes, sacolas e afins espalhados por todos os cantos.

— Julie, que diabo é isso tudo?

— Chegaram nossas compras! — Julie corre para os pacotes e começa a abrir tudo como se fosse uma criança na manhã de Natal.

Não consigo me mexer e acho que estou tendo um AVC, tamanho é meu choque enquanto Julie continua indo de uma sacola a outra espalhando uma infinidade de roupas minúsculas, sapatinhos, mamadeiras e mais um monte de coisa que nem faço ideia para o que serve.

— Você pirou? Quantos filhos acha que vamos ter?

— Graças a Deus uma só! Bem, por enquanto! — Levanta um vestido rosa. — Olha isso, não é lindo?

— Sim, é lindo, mas... me parece muito grande...

— Ele é para quando ela tiver dez meses.

— Então por que comprou agora?

— Porque é isso que se chama enxoval!

— E que é isso? — Pego um troço que parece com um... bong de cerveja?

— É para tirar leite dos meus peitos, não é bizarro?

Tento imaginar o que ela está falando, mas desisto e vou até alguns carrinhos.

— E isso?

— Não é óbvio? Um carrinho de bebê.

— Por que estou vendo quatro deles aqui?

— Porque um é carrinho para corrida! Não é o máximo? Já me imaginou correndo no parque empurrando nossa bebê?

— Você não corre, Julie!

— Eu vou começar a correr quando a neném nascer! Vou mesmo ter que voltar à forma!

— Eu achei que tinham uma lista! Que não ia exagerar! Imagino o quanto você gastou com tudo isso!

E eu achando que Florence tinha juízo! Ao que parece ela não tinha ajudado a manter Julie na linha.

— Não sou exagerada! Para de ser pão-duro! Olha esse casaquinho? — Ela mostra um casaquinho vermelho. — Não parece um que vimos na Princesa Charlotte?

— Então acho que já comprou tudo?

— Não sei ainda...

— Julie... Além de tudo isso não compraram o que tinha na lista?

— Sim, mas...

— Então chega! A gente nem tem onde colocar esse monte de coisa!

— Por isso mesmo vou voltar ao assunto da casa nova!

Lá vamos nós. Começo a pegar os pacotes do chão.

— Já conversamos sobre isso.

— Não! Você diz que a gente não precisa mudar! Mas precisamos decorar o quarto da neném e...

— Julie, tenho três quartos extras nesse apartamento.

— Quartos de hóspedes para quando sua família ou a minha vem para a cidade!

— Eu sei que ainda está com aquela ideia maluca do castelo...

— Não é maluca! Henry tem um castelo! Você devia ter um também!

— Henry herdou o maldito castelo e quer saber? Ele nem queria morar lá!

— Como pode alguém não querer ser duque... Não entendo isso!

— Que tal levarmos tudo para um dos quartos? E você já escolhe qual quarto será o da neném?

— Eu preciso pensar mais...

— Tudo bem, mas eu só espero que você não compre mais nada.

— Claro. Entendido... Talvez eu tenha comprado só mais umas coisinhas na internet...


Uma semana depois


— Julie, você encomendou uma bicicleta?

— Não é linda? Olha essas florzinhas desenhadas, e tem essa cestinha!

— Nossa filha demorará cinco anos para poder usar isso...

— E daí? Pelo menos não vamos precisar pensar em presente de cinco anos!


Duas semanas depois


— Você comprou um penico com tablet? Onde conseguiu esse treco? — Olho horrorizado para a caixa que acabou de chegar.

— Não é legal? Quando a neném começar a usar o penico vai poder se distrair com filme ou desenho, ou até um joguinho! Sério, acho que deveria ter para adulto também!


Três semanas depois


— “Alarme para avisar que tem cocô na fralda do bebê?”, isso funciona?

— Na caixa diz que sim! — Julie responde distraída, lendo as instruções da caixa.

— Por isso comprou três?

— Somos pais de primeira viagem, vamos precisar disso!


Quatro semanas depois


— Roupinha de bebê esfregão?

Seguro o macacão que contém alguns esfregões nas perninhas e nos braços.

— Não é legal? Comprei em um site japonês! O bebê pode aprender a engatinhar e ainda limpar o chão!


Cinco semanas depois


— Peruca para bebê? Julie você enlouqueceu de vez?

Analiso a peruca bizarra na mão de Julie.

— Não! Eu vi fotos suas e você era careca quando bebê! Nossa neném pode puxar a você e precisaremos dar um jeito no estilo dela! Olha esse tom ruivo? Igual ao seu!

— Nossa filha vai usar peruca? Isso não pode estar certo, Julie!

— Para de ser antiquado! Ela vai ficar linda!


***

Algumas semanas depois, abro a porta do apartamento, enquanto afrouxo a gravata, ansioso para ver Julie.

Hoje ela havia saído mais cedo, pois ultimamente o peso da barriga a deixava irritada e ansiosa.

Falta pouco para nossa filha vir ao mundo agora.

Dou uma boa olhada na sala quando passo, aliviado de não ver nenhum pacote novo, ao que parece Julie tinha cansado de comprar porcarias na internet.

Eu a encontro na cozinha, compenetrada em seu notebook.

— O que está fazendo?

— Estou preenchendo meu plano de parto! São as informações que precisam saber no hospital.

— Então desistiu mesmo da cesárea?

— O que eu posso fazer? — Bufa.

Ela tinha ficado toda encantada com a facilidade com que Florence teve seu bebê, mas conforme as semanas foram passando, a hora do parto cada vez mais próxima, assim como os desconfortos dessa última fase, a coragem de Julie foi se esmorecendo.

Eu me aproximo e beijo seu cabelo.

— Vai dar tudo certo. Vamos ver o que tem aí? — Olho para a tela por cima da sua cabeça, lendo o que ela está preenchendo.


Meu Plano de Parto


Meu Nome: Julie Harris-Bennett

 

Onde dar à luz


Você vai ter uma escolha sobre onde ter seu bebê. Sua parteira ou obstetra vai estar apto a te dizer quais serviços estão localmente disponíveis e te orientar em qualquer problema relacionado à sua saúde ou gravidez que possa afetar sua decisão.


? Eu gostaria de dar à luz em casa.

? Eu gostaria de dar à luz em uma “casa de parto”.

? Eu gostaria de dar à luz em uma maternidade hospitalar.

? Eu não estou certa ainda sobre onde eu gostaria de dar à luz.


Meus comentários sobre onde eu gostaria de dar à luz e por que:


Eu gostaria que meu parto fosse no mesmo quarto onde nasceu os filhos da Princesa Kate. Todo mundo sabe que a Kate deu à luz em duas horas e acho que isso me daria sorte em meu próprio parto, além do mais, seria o destino se minha filha nascesse no mesmo quarto que o (provável) futuro marido.

 

 

— Julie, isso não é possível!

— Mas eles perguntaram!

— E pare de falar que nossa filha vai casar com o George! Parece a Sophia, com ideia fixa com a realeza!

— Pare você de ser chato!

Sigo para a próxima linha.


Companhias


Ter uma companhia a qual você pode se apoiar e que possa te dar suporte no parto pode ser útil. Já foi demonstrado que reduz a necessidade de remédios para a dor.

? Eu gostaria que meu companheiro ou companhia estivesse comigo durante o parto.

? Eu não gostaria que meu companheiro ou companhia estivesse comigo durante o parto.

? Eu não estou certa ainda se eu gostaria que meu companheiro ou companhia estivesse comigo durante o parto.


— Como assim? — questiono confuso. — Claro que eu estarei com você!

— Você é muito mandão, Simon, não sei se quero você sendo tirano comigo na hora do parto.

— É claro que eu vou estar com você! Se não for eu, ia ser quem? Sua mãe?

— Eu pensei no Justin.

— Nem pensar! Eu sou o pai, e eu estarei ao seu lado.

Ela abre um sorriso e me puxa para um beijo.

— Ah Simon, que fofo! Sabia que ia querer ficar ao meu lado!

— Estava me testando? — indago desconfiado.

— Sim, estava — responde sem culpa, enquanto volta a digitar.


Meu parceiro de parto ou companhia é:

Meu marido lindo CEO da DBS, Simon Bennett!


— Satisfeito? — Ela pisca.

Eu volto a ler.


Companhia durante o fórceps ou parto por ventosa


O parto por fórceps é quando o fórceps é colocado ao redor da cabeça do bebê para puxá-lo suavemente do canal vaginal. O parto a vácuo, às vezes chamada ventosa, é quando o bebê é guiado para fora por meio de uma tampa ajustada à cabeça por sucção.


? Eu gostaria que meu companheiro ou companhia estivesse comigo se eu tiver um parto por fórceps ou ventosa.

? Eu não gostaria que meu companheiro ou companhia estivesse comigo se eu tiver um parto por fórceps ou ventosa.

? Eu não me importo se meu companheiro ou companhia estiver comigo se eu tiver um parto por fórceps ou ventosa.

? Eu não estou certa ainda se eu gostaria que meu companheiro ou companhia estivesse comigo se eu tiver um parto por fórceps ou ventosa.

 

— Na verdade eu não estou certa se quero um desses troços, com nome que mais lembram armas de torturadores da santa inquisição, puxando minha bebê! — Julie exclama horrorizada.

— Acho que concordo com você aqui. Me parece mesmo armas de tortura medieval — exclamo. — Espero que não precise de nada disso.


Companhia durante a cesárea


Uma cesariana é quando o bebê nasce por meio de um corte no abdômen e no útero. Isso só será realizado quando for necessário, mas há situações em que essa é a opção mais segura para você ou seu bebê. Se sua cesariana for realizada sob anestesia local e você estiver acordada, seu parceiro ou companheiro poderá sentar-se com você.


? Eu gostaria que meu companheiro ou companhia estivesse comigo se eu tiver um parto por cesariana.

? Eu não gostaria que meu companheiro ou companhia estivesse comigo se eu tiver um parto por cesariana.

? Eu não me importo se meu companheiro ou companhia estiver comigo se eu tiver um parto por cesariana.

? Eu não estou certa ainda se eu gostaria que meu companheiro ou companhia estivesse comigo se eu tiver um parto por cesariana.


Na verdade eu estaria muito puta se me obrigassem a fazer uma cesárea depois de ficarem meses dizendo que a única opção é o parto normal!

PS: Lembrem-se que conheço ótimos advogados e que posso processar todos vocês!


— Acho que não tem necessidade de ameaçar o hospital, Julie. — Estendo o braço para o teclado para apagar o que escreveu, mas ela me dá um tapa na mão.

— Não vai apagar nada! É o meu plano e eu decido o que preciso!


Equipamentos para parto


Você pode achar que itens como barras de parede, tapetes ou pufes ajudam a mudar de posição e a permanecerem confortáveis ??durante o trabalho de parto. Se você estiver dando à luz em uma maternidade, sua parteira poderá dizer se itens específicos estão normalmente disponíveis. No entanto, você pode precisar ou preferir fornecer algum equipamento por conta própria.


? Eu planejo usar equipamentos, como tapetes ou pufes durante o parto.

? Eu não planejo usar equipamentos, como tapetes ou pufes durante o parto.

? Eu ainda não tenho certeza se gostaria de usar equipamentos, como tapetes ou pufes durante o parto .


Meus comentários sobre equipamentos para o parto e se eu vou fornecê-los:


Eu quero todos os equipamentos que vocês tiverem aí! Porém, gostaria que os tapetes e pufes combinassem entre si, de preferência que seja da mesma cor, para criar um ambiente bem harmonioso para as fotos ficarem bem instagramáveis. Segue anexo alguns modelos que andei pesquisando.

Preferência pelos tons rosa e verde, que combinará com a cor do cabelo da minha filha!


— Julie, tenho certeza que combinar pufes e tapetes não é a prioridade da maternidade!

— Pois deveriam! As fotos vão ficar ridículas com tudo fora de tom!


Estando ativa durante o parto


Mantenha-se ativa enquanto se sentir confortável. Isso ajuda o progresso do nascimento. Manter-se ativo não significa fazer nada árduo, apenas se movimentar normalmente.


? Eu gostaria de me mover durante o parto.

? Eu não gostaria de me mover durante o parto.

? Eu não me importo de me mover durante o parto.

? Eu não tenho certeza se gostaria de me mover durante o parto.


Meus comentários sobre me mover durante o parto:


Se é para me mover gostaria que instalassem um sistema de som decente, tocando “Single Ladies” da Beyoncé.

 


Eu não consigo conter a risada com esse último comentário.

— Por que está rindo, Simon? Sabe que eu venci um concurso de dança Garota Molhada fazendo essa coreografia?

Franzo a testa, já não achando graça.

— Como é?

— Nada, esquece, vamos para a próxima...


Posições para parto e nascimento


Encontre as posições que você preferir e que facilitarão o trabalho para você. Experimente várias posições na aula de pré-natal ou em casa para descobrir quais são as mais confortáveis ??para você. Você pode escolher quantas posições quiser e variar ao longo do trabalho.


? Eu gostaria de ficar na cama com minhas costas em travesseiros.

? Eu gostaria de estar de pé.

? Eu gostaria de estar sentada.

? Eu gostaria de estar de joelhos.

? Eu gostaria de estar de quatro.

? Eu gostaria de estar de cócoras.

? Eu gostaria de estar deitada de lado.

? Eu não tenho certeza ainda sobre qual posição eu gostaria de estar durante o parto.


— Colocou todas as posições?

— É difícil escolher! Se bem que de quatro acho meio bizarro! Onde estará o médico neste momento? Será que está certo isso, estou começando a achar que vou ficar muito exposta...

— Julie, se ainda não se deu conta que estará totalmente exposta, temos um problema aqui!


Contato pele a pele com seu bebê


Após o nascimento, você pode colocar seu bebê diretamente em cima de você antes que o cordão seja cortado para que você possa se aproximar imediatamente. Se preferir, peça à parteira que limpe seu bebê e envolva-o em um cobertor primeiro.


? Eu gostaria que meu bebê fosse colocado diretamente sobre minha barriga após nascer.

? Eu gostaria que meu bebê fosse limpo antes de ser dado a mim.

? Eu não me importo se meu bebê estiver limpo antes de ser dado a mim.

? Eu não tenho certeza ainda se gostaria que meu bebê fosse colocado diretamente sobre minha barriga após nascer.


— Sério? Do jeito que fez algumas observações bem frescas aqui, achei que ia mandar lavarem a bebê e fazerem escova no cabelo dela antes de lhe trazerem! — falo com ironia, recebendo um olhar irritado.

— Claro que não me importo de nossa bebê ser colocada imediatamente sobre meu peito, estarei tão ansiosa que não conseguiria esperar para vê-la! E não sou fresca! Só estou cuidando dos detalhes do meu parto! Esta pode ser a única filha que vamos ter, tem que ser um momento memorável.

Levanto a sobrancelha.

— Única?

— Bem, não pensei nisso ainda. Você já pensou?

Para falar a verdade, eu não tinha pensado nem na possibilidade deste bebê, até Julie ficar grávida, imagina se tinha pensando em mais de um.

Mas agora, enquanto esperamos, mesmo com todos os contratempos e maluquices da Julie, eu não descartava a possibilidade de que seria interessante passar por tudo de novo.

— Ai meu Deus, Simon, você é um daqueles caras que querem ter um filho por ano, até formar um time de futebol? — Ela me encara assustada, interpretando meu silêncio.

— Não, Julie! Mas não descarto a ideia de termos mais um ou dois. Claro que precisamos esperar este nascer para saber como é.

Ela sorri animada de um jeito que eu sei que o que dirá em seguida é alguma fantasia maluca.

— Podíamos ter gêmeos! Ah, Simon, seria tão bonitinho, vesti-los iguais, e eles poderiam ser idênticos e ninguém nunca saberia quem é um ou outro e quando crescessem poderiam trocar de lugar, como naquelas novelas e...

— Menos, Julie — interrompo seu delírio. — Termine seu plano de um bebê só, por enquanto!


Opções para alívio de dor


Existem muitas opções diferentes de alívio da dor. Algumas mulheres usam uma combinação de métodos. Você pode achar que deseja mais alívio da dor do que o planejado ou que um alívio mais eficaz da dor pode ser aconselhado a ajudar no parto. Você pode usar vários métodos diferentes em momentos diferentes.


? Eu gostaria de tentar respirar e relaxar.

? Eu gostaria de tentar estar na água durante o parto e/ou nascimento.

? Eu gostaria de tentar massagem.

? Eu gostaria de tentar acupuntura.

? Eu gostaria de tentar TENS (estimulação nervosa elétrica transcutânea).

? Eu gostaria de tentar gás e ar (Entonox).

? Eu gostaria de tentar injeções de anestesia.

? Eu gostaria de tentar epidural.

? Eu gostaria de tentar outros métodos de alívio à dor.

? Eu gostaria de tentar aguentar sem nenhum alívio à dor.


Minhas preferências para alívio da dor:


Eu quero todas as drogas que tiverem! Quanto menos dor melhor!

Morfina, metadona, aspirina e ...

 


Seguro sua mão.

— Está louca? Não vai tomar nenhuma droga!

— Não é você que vai ter a vagina massacrada, Simon!


Tendo uma episiotomia


Uma episiotomia é um corte no períneo (a área entre a vagina e o ânus). Isso pode ser necessário se o períneo não se esticar o suficiente e se rasgar, ou se o bebê estiver com pouco oxigênio e precisar ser entregue rapidamente.


? Eu conversei com minha parteira ou médico sobre por que uma episiotomia pode ser necessária.

? Eu não conversei com minha parteira ou médico sobre por que uma episiotomia pode ser necessária.


Meus sentimentos sobre uma possível necessidade de episiotomia:


Eu gostaria que minha vagina permanecesse intacta e não fosse destroçada como um massacre do filme “Sexta-feira 13”. Obrigada.

 

 

— Simon, por favor, prometa que não vai deixar eles cortarem minha vagina! — Ela segura minha mão com força.

— Julie, eu não entendo nada disso, se está aí é porque talvez seja necessário...

Ela respira fundo.

— Ok, não vou surtar com isso. Tenho certeza que não vai ser preciso. Serei uma lady como a Kate Middlelton. Certeza que a vagina real dela ainda está inteira!


Entregando a placenta depois do nascimento


Após o nascimento do bebê, a parteira te oferece uma injeção na coxa. Ela contém a droga sintometrina ou sintocinina, que ajuda a contrair o útero e pode prevenir o sangramento intenso que algumas mulheres podem experimentar sem ele.


? Eu conversei com minha parteira sobre o que acontece depois do parto quando a placenta é entregue.

? Eu não conversei com minha parteira sobre o que acontece depois do parto quando a placenta é entregue.


Minhas preferências sobre a entrega da placenta:


Gostaria que minha placenta fosse entregue a minha mãe, após o parto.

 


— Por que diabos sua mãe vai querer ficar com a placenta? Vai servir em um churrasco? — indago com ironia.

— Simon, para seu governo, a placenta é sim comida por alguns animais!

— Então ela vai mesmo fazer um churrasco?

— Mamãe não vai fazer churrasco com minha placenta! Mas de acordo com algumas crenças de vários lugares, principalmente os orientais, a placenta possui propriedades curativas e nutrientes.

— E o que sua mãe maluca vai fazer?

— Sinceramente eu não faço ideia, mas ela me pediu e tipo, para que eu vou querer a placenta? Ela pode ficar de presente!


Requerimentos Especiais


Favor marcar qualquer opção que se aplique a você. Você pode preencher detalhes na caixa abaixo.


? Inglês não é minha primeira língua e eu preciso de alguém presente que seja fluente no mesmo idioma que eu.

? Eu preciso de um intérprete de libras.

? Eu tenho requerimentos especiais de dieta.

? Eu e/ou meu parceiro tem necessidades especiais.

? Eu gostaria que certos costumes religiosos fossem observados.


— Que certos costumes?

— Mamãe quer levar alguns incensos e também suas amigas que tocam tambor.

— Você vai deixar isso?

— O que eu posso fazer? Ela vai ficar me atazanando o resto da vida se eu não permitir! Então, que seja!


Alimentando seu bebê


O leite materno é a melhor forma de nutrição para os bebês, pois fornece todos os nutrientes necessários e tem benefícios duradouros para a saúde do seu filho. O leite infantil pode ser usado como uma alternativa ao leite materno.


? Eu gostaria de amamentar meu bebê.

? Eu gostaria de dar mamadeira ao meu bebê.

? Eu gostaria de tentar misturar mamadeira e peito.

? Eu não tenho certeza se gostaria de alimentar meu bebê.


Meus comentários sobre o que eu sinto sobre alimentar o bebê:


Ainda não tenho certeza sobre isso.

 


— Por que não? — indago a ela.

— Eu não sei... Não me parece algo muito agradável. E Florence me contou que pode doer pra caramba. Mas por outro lado, todo mundo diz que é o melhor para a criança então... Acho que vou acabar tendo que fazer, não é?

— Eu entendo que tenha dúvidas e receios. Tudo isso é novo pra você.

— Não me acha uma mãe horrível?

— Claro que não. Tenho certeza que na hora você vai saber o que fazer, não se preocupe. — Acaricio seu rosto e ela sorri, segurando minha mão.

— Eu te amo quando é fofo comigo desse jeito.

— Desde quando eu sou fofo? Achei que fosse tirano.

Ela abraça minha cintura.

— Você é tirano também. E eu te amo apesar disso, também.

Eu me abaixo e a beijo e já estou pensando se ela reclamaria se a levasse para a cama quando somos interrompidos pela minha irmã Mila, que entra na cozinha.

— Mila, o que faz aqui? E não te pedi a chave de volta?

Ela larga a bolsa em cima do balcão, ignorando minha reclamação por ainda ter a chave do meu apartamento.

— Julie não falou? Vim ajeitar os últimos detalhes do Chá de Bebê!

— E vai ter Chá de Bebê? — Encaro Julie.

— Claro que sim! Vai ser uma festa maravilhosa! — ela responde empolgada. — Simon, eu te disse que estava organizando tudo com a Mila, já que a Florence, que tinha se oferecido para organizar, teve o bebê antes da hora!

— E quando vai ser isso?

— Daqui duas semanas!

— Julie, isso vai ficar muito em cima para quando está marcado do bebê nascer...

— Vai dar certo! A gente precisou atrasar um pouco. Porque a Florence cismou que ela iria organizar, mas aí vimos que ela estava muito enrolada com o novo bebê e que não ia dar conta e eu tive que tomar a frente — Mila explica.

— E onde vai ser?

As duas trocam um olhar animado e não sei por que sinto um arrepio na espinha.

— Vai ser na DBS!

 


Capítulo 12

 

Julie


— Está tudo tão lindo, Mila! — exclamo quando chego naquela tarde, meus olhos capturando os detalhes da decoração. Por insistência de Simon, a festa está acontecendo no último andar do prédio, onde funciona um restaurante superexclusivo.

E me dou conta agora, o local onde eu estivera há quase um ano, na festa de Natal da DBS, com uma missão muito importante na cabeça: conquistar Simon Bennett, o CEO inatingível por quem estava apaixonada.

De repente sou transportada para aquela dia. Meu vestido de brocado sensual, minha ânsia de beber todos os drinques da festa enquanto tentava tirar todas as informações de Alan sobre Simon. Foi naquele dia que eu descobri que Simon tinha uma regra rígida de nunca sair com funcionárias. E onde deu tudo errado quando Erin, minha ex-chefe bruxa, me obrigou a trocar meu lindo vestido pelo dela, um modelo horroroso, depois de eu derramar bebida no dela. Ainda lembro da minha decepção, vendo Simon de longe, tão lindo e mais inatingível do que nunca.

Mas no fim, o que considerei uma noite perdida, acabou sendo a noite mais importante da minha vida, quando fugindo de um colega assediador, entrei no carro de Simon, completamente bêbada e adormeci lá para acordar na cama dele na manhã seguinte, sem me lembrar do que tinha acontecido.

Quem poderia imaginar que a família dele iria me flagrar e me confundir com a noiva de Simon? Na verdade uma noiva que não existia, porque Simon inventou um compromisso imaginário para fugir da insistência da família para que se casasse.

E foi ali que começou a nossa história. Simon me fazendo uma proposta para ser sua noiva de mentira.

O que ele não sabia era que eu já era louca por ele e não ia desperdiçar aquela oportunidade e lhe fiz uma contraposta: eu queria passar uma noite com ele.

Abro um sorriso, ao me lembrar da cara de surpresa de Simon. E do frio na minha barriga quando ele aceitou.

Nada mais foi o mesmo depois.

E cá estamos nós. Casados de verdade.

Com uma filha a caminho.

Suspiro, feliz, passando a mão na minha barriga.

— Você gostou? — Mila indaga animada. — Achei que tinha ficado chateada com Simon por ele não deixar fazer lá na sala de reunião da DBS.

— Eu fiquei, mas ele tinha razão. Aqui é muito mais apropriado. E me traz boas lembranças.

— O que lhe traz boas lembranças? — Simon se junta a mim.

— Este lugar. Foi aqui que eu tomei todas e depois fui desmaiar lá no seu carro.

— Lembro da Erin com seu vestido. E do quanto ela reclamava por você ter derramado bebida no vestido dela e por isso tiveram que trocar.

— Você realmente nunca tinha me notado?

— Eu não passava meus dias secando as funcionárias, Julie.

— Mas ficou secando as pernas da Erin naquele vestido curto, aposto!

Ele ri.

— Erin tinha pernas bonitas, admito.

Faço uma careta.

— Bonita por fora e podre por dentro!

— Acho que tem razão, agora pare de falar da Erin, seus convidados já estão chegando.

— Estou tão animada! Obrigada por ter concordado em liberar todo mundo!

Eu sei que Chá de Bebê era algo feito pelas amigas da grávida e geralmente só as mulheres eram convidadas, mas insisti com Mila que o meu fosse diferente. Eu queria algo grandioso e com todos os meus colegas da DBS presentes, sejam eles homens ou mulheres. Quando o bebê nascesse eu sairia de licença-maternidade e iria sentir falta deles.

E agora fico muito feliz de ver todos os meus colegas chegando.

— Que decoração linda! — Nancy elogia. Sim o salão está lindo decorado em tons de rosa e dourado. — Sua cunhada arrasou!

— E eu acho que vai amar o meu presente! — Holly, minha ex-colega de apartamento diz. — Eu comprei um vestidinho lindo!

— Só quero ver onde vamos enfiar todos os presentes que vai ganhar hoje! — Simon resmunga.

— Olha só! Sean, Florence e seus pais chegaram. — Corto as reclamações de Simon e vou ao encontro de seus parentes.

— Querida, você está tão linda. — Maggie me abraça.

— Sim, está realmente muito bem, Julie — O pai de Simon elogia também.

— Obrigada. E Florence cadê o pequeno Alexander?

— Decidimos deixá-lo em Newcastle.

— E aproveitar para passarmos um tempo sozinhos, dormir uma noite inteira e essas coisas — Sean cutuca Simon. — Espero que esteja aproveitando suas últimas noites bem dormidas na vida.

— Sean, não assusta eles! — Florence o repreende.

— Olha, seus pais chegaram! — Maggie diz e me viro para ver Mila se aproximando com meus pais.

Papai segura uma máquina fotográfica e minha mãe está trazendo um... caldeirão?

— Mãe, o que é isso?

— Uma bebida mágica, querida! Sabe que não pode faltar o meu ponche da deusa.

— Mãe, isso é um Chá de Bebê não um Sabá! Espero que não tenha nenhum alucinógeno aí!

— Posso levar, é... isso aí, para a mesa de bebidas? — Mila pergunta pegando o caldeirão das mãos da minha mãe.

— Claro que sim. — Mamãe acompanha Mila até a mesa.

— Eu falei pra não trazer essa porcaria! — papai resmunga se afastando para tirar fotos.

— Simon — Natasha se aproxima —, Barbara, Collin e Brady chegaram.

— Que bom que até os acionistas vieram! — exclamo.

— Vou cumprimentá-los. — Simon se afasta.

— E como você está, Natasha? Faz tempo que não conversamos.

— Não ando muito bem. Os espíritos não estão felizes comigo. Não os sinto próximos mais...

— Espíritos? — Minha mãe se aproxima interessada.

Lá vamos nós.

— Mamãe, essa é Natasha, a secretária do Simon. Natasha, essa é Alicia, minha mãe.

— Querida, por que usa essas roupas pretas? Não cai bem em seu tom de pele. Podia usar uns tons fortes, verde, para combinar com seus olhos. E se está interessada em espíritos, deveria vir em nosso Sabá!

— Sabá? — Natasha encara minha mãe, confusa.

— Sim! Eu vejo que você é uma pessoa de muita espiritualidade! Venha ao nosso jantar mensal para louvar a deusa.

— Vocês invocam espíritos nesses jantares? — Natasha indaga interessada.

Procuro uma rota de fuga, nem um pouco interessada naquela conversa doida das duas e me afasto, para procurar Simon.

Encontro Mila arrumando a mesa de presentes. Minha nossa, é bastante coisa mesmo!

— Mila, cadê o Simon?

— Ele desceu para uma reunião com os acionistas, ou algo assim.

— Eu não acredito que Simon está trabalhando! — Eu me irrito e dou meia-volta, disposta a ir atrás de Simon e trazê-lo de volta.

Entro no elevador e sigo para o andar da diretoria e enquanto caminho pelo corredor até a sala de reunião, escuto a voz de Collin.

— Você está fazendo um ótimo trabalho, Simon, estamos fechando muitos negócios importantes. Por isso mesmo devo dizer que talvez não seja boa ideia se afastar agora.

Interrompo meus passos, surpresa.

Simon vai se afastar da DBS?

— Simon, estamos em meio a vários contratos sendo fechados, e isso é fruto do seu trabalho. A nossa estimativa de faturamento para este ano é de trinta por cento mais do que do ano passado — Brady diz.

— Eu sei que estamos em um momento de expansão — Simon responde —, mas preciso estar com mais tempo para ajudar Julie com o bebê.

Abro a boca, chocada.

Simon, o cara mais workaholic que se tem notícia, está pedindo para se afastar do trabalho para cuidar de uma bebê?

Minha nossa!

— Nós entendemos, Simon. — Agora é a voz de Barbara que escuto. — Acho que tem o direito de tirar um tempo para se dedicar a sua vida pessoal, claro. Mas afastamento por um mês? Não é muito?

— Eu tenho este direito, Barbara. Nunca tirei mais do que uma semana de férias por ano desde que entrei na DBS. E você sabe que não faria isso se não fosse realmente importante. Minha filha e Julie vão precisar de mim mais do que a DBS.

— Então já está decidido?

— Sim, eu queria apenas comunicá-los. Deixei tudo nos eixos para meu afastamento, assim que Julie tiver o bebê.

— Certo, é justo. Vamos confiar em você — Barbara concorda por fim. — Como Brady disse, estamos faturando mais por sua causa.

— Sim, você já era muito competente quando era só o CEO, agora que tem uma parte das ações parece estar implacável! — Collin ri. — Aliás, sempre fiquei curioso sobre esse fato. Sei que seu pai é um conhecido investidor e que seu avô também foi. Acredito que o dinheiro que investiu na DBS venha de sua família?

— Sim, era um fundo que meu avô me deixou. O problema é que este fundo só seria liberado para mim quando eu fizesse trinta anos.

— Ainda não tem trinta anos. Tem vinte e oito, não?

— Existia outra condição. Eu receberia o dinheiro ao fazer trinta anos ou ao me casar.

O quê? De repente sinto o chão fugindo aos meus pés.

— Ah, agora entendo o casamento tão apressado! — Brady comenta.

— Sim, eu precisava desse dinheiro para comprar as ações que a Barbara colocou à venda. Não deixaria passar a oportunidade.

Oh. Meu. Deus.

Simon casou comigo por causa do dinheiro do fundo do avô?

De repente me vem à mente uma conversa perdida nas minhas lembranças.

— Você contou a ela? — Sean perguntou no carro naquela noite em que voltamos de Paris, quando achavam que eu estava dormindo.

— Não tem por que contar. — Simon tinha respondido.

— Eu acho que deveria contar, Simon — Florence insistiu.

Era isso.

Eu tinha apagado da minha mente essa conversa estranha, mesmo ficando curiosa no momento sobre o que Simon poderia ter para contar para mim.

E depois quando lhe disse que não deveríamos mais guardar segredos um do outro, ele ficara estranho.

A certeza bate em mim como um soco no estômago. Sinto dificuldade de respirar.

Escuto as cadeiras sendo arrastadas na sala e me movo para fugir.

Não quero olhar os acionistas agora, embora deseje muito encarar a cara mentirosa de Simon e lhe perguntar quando é que ele iria me contar que nosso casamento na verdade foi um engodo para ele receber a grana do avô e virar acionista da DBS, porque, claro, tudo o que lhe interessava era sua preciosa carreira.

— Julie? — Simon me chama, mas continuo me movendo. — Julie?

— Se afasta de mim, seu... mentiroso filho da puta!

Aperto o botão do elevador. Agora estou fervendo de raiva.

— Julie, espera... — Simon alcança a porta do elevador e a segura, quando eu já estou lá dentro, apertando para descer. — O que está acontecendo?

— Eu ouvi sua conversinha com os acionistas! Como pôde, Simon? Quando é que ia me contar que se casou comigo para salvar sua carreira?

Simon empalidece, chocado.

— Porra, você ouviu...

Aproveitando seu atordoamento, o empurro e a porta do elevador se fecha.

— Julie, espera! — Ainda escuto ele sair do torpor e bater na porta, mas já estou descendo.

Encosto-me na parede, tremendo inteira. Uma lágrima cai do meu olho e luto para não desabar no chão.

Sinto-me decepcionada.

Sinto-me enganada.

Eu devia ter desconfiado que Simon deveria ter algum motivo escuso para se casar comigo de verdade e não apenas pela farsa para iludir minha avó.

Agora eu entendia.

— Filho da puta! — sussurro, saindo do elevador na garagem.

Preciso fugir. Agora.

Avisto o carro de Simon e paro.

Eu devia ter passado na minha sala e apanhado um estilete para cortar todos os pneus!

— Julie! — Escuto a voz de Simon cada vez mais próxima.

— Droga!

Corro e abro a porta do seu carro, entrando.

Caramba, Simon não fecha o carro nunca?

Abaixo para me esconder no exato momento que Simon entra no carro e senta ao meu lado.

— Que merda pensa que está fazendo?

— Me escondendo de você!

— No meu carro?

— Eu ia me abaixar, mas com essa barriga é muito difícil! Não quero olhar na sua cara agora! Estou com tanta raiva!

— Não era para ter ouvido...

— Ah claro, não era! Ia esconder isso de mim pra sempre?

— Bem... — Ele faz uma cara culpada.

— Você é muito filho da puta, Simon! Mentiroso! Por isso quis se casar comigo! Como fui idiota! Queria dinheiro para cravar suas unhas da DBS e eles não poderiam se livrar de você como queriam fazer por causa do nosso escândalo!

— Sim, eu queria comprar as ações da Barbara, e sim o casamento foi a solução perfeita.

— E você tem coragem de dizer isso assim na minha cara com essa frieza? Ou melhor, será que não deveria ter dito isso quando quis casar comigo?

— Eu sabia que ia desconfiar de mim se eu contasse na época que nos casamos. Já estava tudo uma confusão com você terminando comigo e me querendo por perto apenas para deixar sua avó feliz.

— Mas eu concordei no fim em me casar com você porque eu te amava!

— E eu também, porra!

— Não, você casou por causa da grana do seu avô!

— Julie, eu iria me casar com você mais dia menos dia!

— Mas se casou por causa da DBS! E nem teve a dignidade de me contar!

— Para você ficar brava como está agora?

— Você mentiu, Simon! E todo mundo sabia! Sua família sabia e agora até os acionistas sabem!

— Eu não queria que duvidasse de mim — ele diz com frustração. — Tem que entender!

— Ah claro, omitindo esse pequeno detalhe ajudou muito! — murmuro, me virando. Lágrimas silenciosas deslizam por meu rosto.

— Julie, eu te amo, por favor, acredite...

— Sai daqui, Simon, não quero olhar na sua cara agora...

Ele toca meu braço, e já estou o empurrando quando sinto uma pontada forte no meu ventre.

— Ai.

— O que foi? — Simon me segura com ainda mais força.

— Uma dor... — Sinto a pressão no baixo ventre e de repente entendo. — Acho que foi uma contração. Simon, a bebê vai nascer...

 


Capítulo 13

 

Julie


Simon me encara assustado.

— Agora?

— Acho que sim... — sussurro, sem saber o que fazer.

Eu tinha esperado tanto por este momento, mas agora que parecia tão real, começo a sentir medo.

— O que estão fazendo aqui? — Mila surge na garagem. — Estão todos procurando vocês, temos que abrir os presentes e...

— A Julie está tendo contrações. — Simon pula para o banco do motorista.

Mila arregala os olhos.

— Mas ainda não é a hora é?

— Temos que ir ao hospital agora. — Simon liga o carro.

— Mila, avise meus pais — grito enquanto Simon dá partida. — E alguém tem que pegar minha mala de maternidade, ai não, eu nem fiz a mala... — Choramingo, mas Simon já está saindo com o carro cantando pneus.

— Eu acho que não é a hora ainda, Simon... Talvez eu tenha exagerado... — sussurro, amedrontada. — Acho que podemos voltar à festa. Eu vi realmente alguns presentes muito interessantes e... — Paro ao notar que minha bolsa estourou. — Ai droga, acho que é sério mesmo...

Simon faz o caminho até o St. Mary Hospital em tempo recorde e quando chego lá, sou examinada imediatamente.

— Julie, sua bolsa já estourou — o obstetra comunica. — Agora temos que aguardar a dilatação necessária. Está com três centímetros de dilatação.

— Só isso?

— Você colocou no seu plano de parto que queria anestesia. Podemos lhe aplicar Peridural e...

— Não, não vou querer anestesia. As dores são de boa, acho que sou mesmo muito forte, veja só. Vou aguentar o parto muito bem. Tenho certeza que vai ser rápido.

— Pode ser que demore. É normal. — O médico tira a luva. — Aproveite o intervalo entre uma contração e outra para relaxar e descansar.

— Relaxar? Como posso relaxar em uma hora dessas? Já que estou aqui, quero que nasça logo! Kate Middleton teve seu primeiro bebê em duas horas e meia!

— Isso varia de mulher para mulher, mas em primeiras gestações geralmente leva de dez a quatorze horas. Não fique parada. Pequenas caminhadas no corredor e o uso de alguns acessórios, como bola e banquinho de parto, ajudam no processo de dilatação. Massagens e banhos com água quente também são excelentes para relaxar a musculatura, reduzindo a dor e acelerando a dilatação.

— Tudo bem, eu vou ficar calma e vou fazer tudo isso. — Abro um sorriso, enquanto Simon sai para resolver as questões burocráticas e uma enfermeira vem me preparar. — Tenho certeza que vai ser tudo rápido como foi o da Florence e da Kate! Nem acredito que minha bebê vai nascer!


Três horas depois


— Quantos centímetros de dilatação? — pergunto ansiosa para a parteira que me examina.

— Quatro.

— Só isso? Não é possível! Já estou entediada aqui!

— Por que não usa as bolas de pilates?

Reviro os olhos nem um pouco interessada, mas aceito a ajuda para descer da cama e fico quicando em cima das malditas bolas.

Simon entra no quarto de novo.

— Como está?

— Como você acha? — resmungo, virando o rosto, depois de toda a comoção da corrida até o hospital e passado o choque inicial de que minha bebê ia nascer hoje, eu tinha lembrado que estava brava com ele.

— Nossa família está aí. Eles querem entrar, mas eu disse que não é apropriado. Aliás, apareceu uma galera do escritório aí fora também, e já mandei todo mundo voltar ao trabalho.

— Ah, que carinhoso da parte deles virem me acompanhar!

— E Mila foi em casa com Florence e fizeram sua mala, não se preocupe.

— Ainda bem! Estava preocupada com isso... Ai... — De repente outra contração começa.

Simon vem e segura minha mão e eu deixo, mas quando termina eu a puxo.

— Julie, por favor, não fique brava comigo, não é o momento.

— Realmente não tinha momento mais inapropriado para eu descobrir que meu marido é um embuste!

— Ok, não vou brigar com você. Vamos nos concentrar nas contrações, tenho certeza que já, já, estará pronta...


Sete horas depois


— Só seis centímetros? Não é possível!

— Tenha paciência, é normal que demore. — O obstetra sorri, se afastando.

— Seus pais querem te ver, Julie — Simon diz entrando no quarto. — Eu falei que deveriam ir embora, pois pode demorar, mas eles querem te ver antes.

Minha mãe entra no quarto em seguida, e como não podia deixar de ser, ela está entoando cânticos e espalhando fumaça de incenso. A enfermeira e o médico trocam um olhar horrorizado.

— Filha, sorri para o papai! — Meu pai bate uma foto, o flash quase me cegando.

— Pai, acha que quero sair em uma foto desse jeito? — Eu tinha sido muito ingênua em pensar que ia me preocupar em me manter bonita durante todo o processo de parto. Meu cabelo está tão ensebado quanto o daquela grávida que eu invadi o parto e eu só quero que tudo termine e de preferência sem que ninguém registre esse momento.

— Você está linda, filha ! A deusa está tão contente! Não vejo a hora da pequena Luz Dourada do Sol Poente estar entre nós.

— Mãe, já falei que minha filha não vai ter um nome maluco desse!

— Mas precisam escolher um nome!

— A gente vai escolher, Alicia. Agora acho que deveriam ir. Julie precisa se concentrar. — Simon praticamente expulsa meus pais.

Recosto-me nos travesseiros, cansada.

Este bebê tem que nascer na próxima hora, porque já estou de saco cheio.


Doze horas depois


— Quem colocou essa música? — resmungo.

— É a música que colocou no plano de parto que queria que tocasse — Simon diz.

— Eu odeio essa música, desliga isso!

Simon faz o que eu pedi e o silêncio é pior ainda.

— Julie, vamos conversar?

Eu o encaro com raiva.

— Você! A culpa é toda sua que estou aqui passando por isso! Acha que quero conversar com você? Eu devia mesmo ter pedido para o Justin me acompanhar e... Ai... — Esqueço o que ia dizer quando outra dor rasga meu corpo e também já esqueci da raiva quando Simon segura minha mão.


Dezoito horas depois


— Eu não quero água, eu quero anestesia! — grito quando outra contração rompe meu corpo. As dores agora estão cada vez mais fortes e mais longas.

— Doutor Davis, acho que Julie já sofreu demais. — Escuto Simon dizendo, quando a contração passa e eu me recosto nos travesseiros.

Sinto-me cada vez mais cansada.

— Podemos usar uma dose mínima de peridural. Ela ainda vai sentir os movimentos e poderá andar, mas as dores serão diminuídas.

— Ah, agora que fala que posso tomar essa merda — rosno.

— Julie, você mesma disse quando chegamos que não queria anestesia... — Simon diz.

— Isso foi antes de saber que ia passar o resto da vida em trabalho de parto!

— Tudo bem, vamos à anestesia.


Vinte horas depois


— Simon, estou cansada, não aguento mais — choramingo, enquanto Simon enxuga meu rosto com uma toalha.

— O obstetra falou que se demorar mais, poderão optar por uma cesariana.

— Agora querem que eu faça uma cesárea? Que bando de filho da puta!

Simon ri.

— Não é engraçado — reclamo.

— Eu sei que não é. — Ele acaricia minha mão com o soro.

— Simon, nem escolhemos o nome da nossa bebê.

— Você é muito indecisa.

Eu tinha me debruçado nos livros de nomes de bebês nos últimos meses, mas nada parecia digno o suficiente para mim. E a cada semana eu mudava de ideia.

— Eu vou ser uma péssima mãe... — murmuro.

— Ei, não vai não. Você vai ser ótima.

— Como pode saber?

— Eu nunca pensei em como seria ter filhos. Em ter uma família, envelhecer com alguém. Mas no dia em que nos casamos, eu olhei para você e soube que estava pronto. Você era quem eu estava esperando e nem sabia. A mulher com quem eu ia passar o resto dos meus dias. A mulher que seria a mãe dos meus filhos.

— A mulher que ia facilitar pra você ser dono de parte da DBS — murmuro.

— Sim, isso também. — Ele não nega.

— Porra, Simon, sabe o que me deixa mais brava? É que podia ter me contado.

— Fiquei com medo.

— Isso prova que não me conhece direito. Eu podia até duvidar por um momento, afinal, quem não duvidaria? Mas eu ia ficar com você de qualquer jeito. Eu te amo. Fiz um monte de loucura para ficar com você. E sabe que eu adoro que seja rico, acha que não ia ficar feliz por ajudar você a ser acionista? O que me deixou magoada foi o fato de não confiar isso a mim. De não fazermos isso juntos.

Ele entrelaça os dedos nos meus.

— Esqueci que não é uma mocinha de romance, que você está mais para uma vilã psicopata.

— E você também não é nenhum mocinho, Simon Bennett.

— Por isso somos perfeitos juntos...

Somos interrompidos quando o obstetra entra no quarto.

— Já está há muito tempo em trabalho de parto, Julie. O parto não está progredindo de acordo. A regra é que só pode ficar vinte e quatro horas em trabalho de parto desde que a bolsa estoure. Podemos aplicar oxitocina, hormônios naturais para acelerar as contrações e a dilatação. Senão correrá o risco de acabar em uma mesa de cirurgia, depois de tantas horas de “trabalho”.

Eu e Simon nos entreolhamos.

— Tudo bem — murmuro.

Eu estou mais do que pronta para fazer minha neném nascer.


Vinte e três horas depois


— Empurre... Está quase saindo — o médico pede e eu coloco toda a força que posso, prendendo a respiração durante alguns segundos, colocando o queixo próximo ao peito, fixando os pés e as mãos e concentrando toda a energia na parte baixa do abdome.

— Está acabando, Julie — Simon está do meu lado, me incentivando, desde que as contrações finalmente atingiram seu ápice assim como a dilatação necessária.

— Vamos lá, já vejo a cabeça...

Sinto uma forte sensação de ardência e no momento seguinte, vejo o pequeno ser todo sujo nas mãos do médico.

— Nasceu! — Simon murmura. — Você conseguiu, ela está aqui...

Caio exausta para trás, mas sem conseguir desviar o olhar da neném que começa a chorar a todo pulmão. Uma enfermeira coloca uma tesoura na mão de Simon e ele corta o cordão. E depois de fazerem aqueles primeiros testes necessários para checar a bebê, finalmente ela é colocada em meu seio.

Uma emoção que não cabe em mim me faz chorar, sentindo nossas peles juntas.

A enfermeira me ajuda a colocá-la sobre meu peito e é incrível quando ela sozinha procura o seio, começando a mamar.

— Ela é linda, Julie — Simon elogia emocionado também.

— Como sabe? Ela está toda sujinha!

— Ok, ela parece uma sobrevivente de um filme de terror, mas eu sei que ela é linda.

Rio passando os dedos por seus cabelos que mesmo com todo sangue e outras coisas nojentas, que nem sei o que são, já dá pra ver que é como o de Simon.

Eu disse que seria!


***

— Penélope — O nome surge de repente em minha cabeça.

Faz dez horas que ela nasceu e, contrariando o fato de que fiquei vinte e três horas em trabalho de parto, eu já estou liberada para ir pra casa.

Sabia que de alguma maneira eu seria como Kate Middleton!

Simon está com a bebê no colo, enquanto ajeito minha roupa para irmos pra casa. Ainda me sinto dolorida, e não quero nem pensar em qual estado estará minha pobre vagina (que graças a Deus, não precisou ser picotada), mas também me sinto muito feliz.

— Penélope? — Simon repete.

— Sim, acho que é lindo esse nome!

Ele sorri.

— Penélope Bennett.

— Penélope Harris-Bennett — corrijo.

— Certo, Penélope Harris-Bennett. É mesmo um lindo nome. Pronta para ir para casa?

— Sim.


Simon dirige pelas ruas de Londres e ainda parece incrível que estamos finalmente com nossa filha, indo para casa.

Nós não falamos mais sobre a nossa briga e agora que tudo passou, parece que não tem mais tanta importância.

Nós estamos juntos. Temos uma bebê.

Eu sei que ele me ama. E Simon tinha razão, iríamos nos casar mais dia menos dia. Como eu disse a ele, fiquei brava por não ter me contado os reais motivos desde o começo. Teria evitado toda aquela discussão.

— Chegamos.

Simon para o carro e eu olho em volta.

— Chegamos onde? — Definitivamente não estamos em frente ao nosso prédio.

— Em casa. — Ele sorri e sai do carro, abrindo a porta traseira para tirar Penélope da cadeirinha.

Eu faço o mesmo, confusa, olhando para a casa a nossa frente.

— Casa?

Simon se coloca ao meu lado, segurando nossa bebê.

— Sim, nossa casa. Gostou?

Abro a boca em choque.

— Você comprou uma casa?

— Sim, era uma surpresa.

— Eu não acredito! Achei que não queria...

— Era só pra te irritar! Eu comprei esta casa há dois meses, e estava em reforma. Tinha razão, precisávamos de um casa maior.

— Estou em choque! — murmuro enquanto avanço pelo jardim bem-cuidado, meus olhos admirando os detalhes da casa em estilo vitoriano.

Abro a porta e meus olhos se arregalam ao ver que dentro ela é tão linda como lá fora.

— Simon, como fez isso tudo sozinho?

— Não foram os tais irmãos Scott que fizeram, claro, mas tive a ajuda de bons decoradores.

Meus olhos abismados vagueiam por tudo, sem conseguir captar todos os detalhes de uma só vez.

— Suba e abra a segunda porta — Simon me instrui e subo as escadas, com ele atrás de mim e abro a porta.

— Porra, Simon! — Não consigo evitar o palavrão ao ver o lindo quarto de bebê a minha frente.

Tudo rosa e branco. Reconheço as peças de enxoval que tinha comprado.

— Gostou? — Simon passa por mim e coloca Penélope no berço.

Pela primeira vez na vida acho que estou sem palavras.

Simon se aproxima.

— Se não gostou, pode tirar tudo e fazer o que quiser.

— Não, eu amei! Está perfeito! Ainda estou muito surpresa! — Não contenho o choro.

— Ei, não chora.

— Acho que foi toda a emoção das últimas horas.

— Pelo menos não está mais chorando de raiva — ele diz ainda em tom culpado, enxugando meu rosto. — Eu juro que não queria magoar você. Tem razão, eu deveria ter contado tudo. Mas fiquei apavorado de te perder.

— Sim, foi uma mancada feia, Simon. A sua sorte é que nunca vai conseguir se livrar de mim. — Seguro sua mão, entrelaçando nossos dedos. — Mas nunca mais faça algo assim. Somos parceiros de crime, lembra? — Sorrio.

— Então estamos bem?

— Talvez eu tenha que pensar em alguns castigos para você... Sabe que adoraria te ver apanhando da Natasha de novo...

Ele ri e me beija.

— Vai mesmo pedir afastamento da DBS para ficar com a gente?

— Claro que sim.

— Mas seu trabalho é mais importante...

— Nada é mais importante do que vocês, Julie.

— Ah, Simon — sussurro, emocionada. — Sou tão apaixonada por você!

— Eu sei — ele diz convencido.

— Já posso imaginar a gente sendo tão feliz aqui! Será que a Kate e o Willian aceitariam ser padrinhos da Penélope?

— Não viaja, Julie! Agora olhe pela janela.

Faço o que ele pediu e me surpreendo ao ver uma festa armada no jardim. Os pais de Simon estão ali, assim, como os meus.

Mamãe está dançando e batendo tambor, papai está tirando foto de uma moça loira com um vestido florido...

— Ai meu Deus, aquela é a Natasha?

Natasha está irreconhecível, usando até uma guirlanda de flores na cabeça.

— Parece que sua mãe fez uma lavagem cerebral da deusa em Natasha. E agora ela é o mais novo membro da seita maluca da sua mãe.

— A deusa deve estar tão feliz... — murmuro ainda perplexa. Minha mãe e Natasha juntas, quanta maluquice ia sair disso?

— E os funcionários da DBS também estão aí. Mas entendo que possa estar cansada. Ainda precisa se recuperar.

— Não, eu quero descer e ver todo mundo. E apresentar Penélope.

Apanho minha bebê do berço. Ela é mesmo linda, admiro, passando os dedos pelos fininhos fios de seus cabelos.

Pelo menos não ia precisar da peruca.

Eu e Simon trocamos um sorriso.

— Quem imaginou que aquela proposta maluca de noivado iria terminar assim?

— Foi mesmo um ótimo negócio! — Simon sorri segurando minha mão para fora do quarto. — E sabe quem está aí?

— Quem?

— Henry e Sophia!

— Ah, estava com saudades deles...

 

 

                                                   Juliana Dantas         

 

 

 

                          Voltar a serie

 

 

 

 

      

 

 

O melhor da literatura para todos os gostos e idades