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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


UM LONGO ENTARDECER - P.2 / Sandra Brown
UM LONGO ENTARDECER - P.2 / Sandra Brown

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

Biblio VT

 

 

 

Lydia estava estendendo roupa na corda que Ross tinha disposto entre a esquina do carro e um álamo jovem, quando Anabeth chegou correndo, quase sem fôlego, com um brilho de emoção nos olhos.

 

Sabe o que acaba de deter-se junto ao rio? E continuou, sem aguardar a resposta: A carreta de um mascate. Vai carregado com toda classe de coisas. Leoa Watkins já pôs o grito no céu porque é domingo, e se supõe que as pessoas não devem comprar no dia do Senhor, mas o senhor Grayson há dito que as circunstâncias não são normais e que as pessoas não podem ir às compras à cidade aos sábados. Vi com meus próprios olhos que Priscilla comprava uma barra de caramelo e a escondia no bolso. Mamãe há dito que fosse, porque já localizou um cilindro de tecido que te servirá para te fazer um bonito vestido e estreá-lo em 4 de julho.

 

 

 

 

Lydia fazia uma pausa em seu trabalho para escutar como a moça debulhava a notícia sem tomar fôlego. Ross, que estava remendando uma brida, também tinha feito um alto para ouvi-la. Os dois estalaram em gargalhadas ao mesmo tempo.

 

A relação entre ambos era tão tensa da manhã seguinte ao Owentown que sua risada lhes surpreendeu. Quando se olharam, as gargalhadas emudeceram, e os dois, turvados, desviaram a vista.

 

Bem, é que não vais baixar a ver o que tem? Perguntou com incredulidade Anabeth, enquanto Lydia voltava a reatar sua tarefa.

 

Não necessito nada - respondeu em voz baixa.

 

Mas Mamãe diz que esse tecido te sentaria melhor que a ninguém, porque é como dourado e com seu cabelo e tudo... Tem que ver as coisas maravilhosas que tem esse homem.

 

Tenho trabalho que fazer, Anabeth repôs com paciência Lydia, e olhou a Ross.

 

O homem deixou a um lado a brida e entrou na carroça. Lydia não necessitava nem desejava nada, mas seria todo um detalhe por sua parte que se oferecesse a acompanhá-la ao carro do mascate só para jogar uma olhada.

 

Não teria que ter esperado nada dele. Ross apenas lhe tinha dirigido a palavra desde que se inteirou de que Winston Hill a tinha visitado a noite que ele se encontrava ausente. Todas as noites, depois de que Lee e ela se deitavam, Ross preparava sua cama sob o carro. Ninguém se tinha dado conta. A maioria dos homens dormiam ao ar livre, porque era mais fresco.

 

Lydia sim se deu conta. Sentia falta do som de sua respiração. Sentia falta de sua presença. Sentia falta de lhe olhar enquanto ele tirava a camisa e as botas.

 

Deixará-te comprar algo sua mamãe? Perguntou Lydia com voz estrangulada.

 

Papai nos deu dez centavos a cada um.

 

Pois será melhor que te apresse, antes que Priscilla Watkins leve tudo.

 

Anabeth riu, mas logo voltou a ficar séria.

 

Tem razão. Seriamente que não vais vir?

 

Estava muito contente de que tivessem eleito a ela para comunicar a notícia Ross e a Lydia. Entretanto, todo seu entusiasmo se veio abaixo, por causa da indiferença que os dois tinham mostrado ante sua mensagem.

 

Lydia meneou a cabeça.

 

Quando voltar, vem me mostrar suas compras.

 

Anabeth partiu arrastando os pés no pó, mas em seguida se reanimou e correu para o rio.

 

Lydia.

 

A jovem olhou Ross por cima da corda de tender improvisada.

 

Sim?

 

Ross agarrou sua mão e puxou ela. Abriu-lhe os dedos e deixou cair várias moedas em sua palma.

 

Vá comprar-te algo.

 

Lydia contemplou o dinheiro que brilhava em sua mão, e depois levantou a vista para o carro. Estava segura de que Ross tinha dinheiro escondido em algum lugar na carreta, mas não sabia onde e tampouco lhe importava. O dinheiro carecia de importância para ela, porque nunca tinha tido e por isso seu coragem não significava nada para ela. A única razão de que significasse algo agora era porque Ross o tinha dado.

 

Não necessito nada.

 

Não compre algo que necessite. Compra algo que deseje.

 

Ela olhou esperançada os seus olhos verdes.

 

Por quê? Perguntou.

 

A pergunta enfureceu Ross. Sempre que Hill se apresentava com algum de seus presentes, um favo de mel lhe gotejava, tão doce como sua linguagem, um livro de poesia que, em sua opinião, podia-lhe gostar, um bolo de pêssego que Moisés acabava de assar, Lydia nunca perguntava o motivo do presente. Claro que aquele cavalheiro de maneiras refinadas sempre tinha pedido permissão a Ross antes de obsequiar a sua esposa (sim, maldição, sua esposa), com um de seus presentes. Lydia sempre lhes agradecia com acanhamento, humildade e a vista baixa. Mas ele, seu marido? OH, não. Não podia aceitar sua generosidade com um daqueles agradecimentos e sorrisos radiantes que dedicava a Winston Hill.

 

Ross jamais teria confessado que tinha ciúmes, mas ciúmes era o que reatava em seu interior como uma serpente que envenenava todo o seu sistema.

 

Porque todo mundo pensará que sou um marido desprezível se não deixar que minha esposa - pronunciou a toda pressa a palavra - compre umas quinquilharias.

 

Lydia se encrespou. Passou por diante dele e agarrou Lee. Por nada do mundo gastaria o seu dinheiro nela, mas talvez encontrasse algo para o bebê.

 

Deixa Lee aqui. Eu lhe vigiarei.

 

Não! Deu meia volta e agitou o punho que sujeitava o dinheiro. Eu me ocuparei dele. Para isso me pagam, não?

 

Saiu sem lhe dar tempo a responder.

 

O dia da Independência amanheceu claro e ensolarado. No acampamento se respirava um ambiente espectador. Era um dia festivo, dedicado ao descanso das duras horas de viagem, a cozinhar guloseimas, a rir, à música e à alegria. Se alguém grunhia que era uma festa unionista, os murmúrios eram prontamente sossegados. Os estados do Sul tinham conseguido a independência do governo britânico tanto como os do Norte. Depois de longas semanas de viagem, os imigrantes aproveitariam qualquer desculpa para tomar um descanso.

 

Mamãe tinha convencido Lydia para que comprasse ao mascate suficiente tecido dourado para fazer um vestido. Lydia não sabia costurar, mas com a ajuda de Mamãe e um padrão emprestado pela senhora Rigsby, tinha confeccionado o vestido. Mamãe lhe dava pontos quase toda noite. Lydia achava errado, mas Mamãe insistiu em que preferia passar uma velada tranqüila costurando no carro dos Coleman antes que padecer o caos que reinava no seu. Por conseguinte, face aos protestos de Lydia, o vestido esteve terminado quando chegou o momento de colocá-lo. Ficarem acampado junto ao rio Ouachita. Como resultado de uma primavera chuvosa, a campina estava verde, pese ao calor do verão. Permitiu-se que as senhoras utilizassem primeiro o rio, assim que terminaram as tarefas matutinas, todas desfilaram para as bordas cobertas de erva com toalhas e pastilhas de sabão, para tomar um dos poucos banhos autênticos que tinham desfrutado desde a sua partida.

 

Os festejos começaram ao anoitecer. Os homens retornaram do rio, depois de banhar-se pela tarde enquanto as mulheres faziam a sesta. Alguns homens estavam irreconhecíveis, com o cabelo penteado para trás, uma gravata estreita, uma reluzente fivela de cinturão, ou uns suspensórios reservados em exclusiva para os domingos. As mulheres também tinham acrescentado alguns adornos ao seu vestido e dedicado mais esforços ao penteado.

 

Ross tinha se banhado no rio e vestia calças negras, camisa branca e colete de veludo negro. No lugar de gravata, atou-se ao pescoço um lenço. Escovou-se o cabelo, mas não utilizou o azeite que passava a maioria dos homens. Reparou em que seu cabelo estava cumprido de novo. Teria que pedir a Lydia que o cortasse...

 

Endireitou-se e contemplou a escova que sujeitava na mão, como se não reconhecesse o objeto nem ao homem que o sustentava. Com que facilidade ia a sua mente o nome dela, enquanto que poucas vezes se lembrava do de Vitória. Desejava de forma muito natural lhe pedir que voltasse a lhe cortar o cabelo, uma intimidade habitual entre um homem e uma mulher que viviam juntos. Maldição!

 

- Está preparada, Lydia? Gritou.

 

A jovem se inspecionou no espelho, umedeceu os lábios e beliscou as faces, como Mamãe tinha aconselhado. Vestiu-se com a ajuda de Mamãe e Anabeth, enquanto Marynell e Atlanta se encarregavam de Lee.

 

Lydia passou as mãos sobre a saia para convencer-se de que era real. Tinham costurado o tecido dourado até convertê-la no vestido mais bonito que tinha usado em sua vida, ainda mais bonito que os que Ross lhe tinha comprado em Memphis. O decote deixava ao descoberto seu pescoço e a parte superior do peito. As mangas curtas e bufantes mal cobriam os seus braços. O sutiã se abotoava até a cintura, e uma ampla faixa, presa com um laço na parte posterior, separava-o da saia franzida e larga até os pés. Não tinha muitas anáguas para alargá-la, mas se balançava à altura de seus tornozelos com muita graça.

 

Mamãe estava decidida que Lydia usasse o cabelo «como a natureza ditava», quer dizer, revolto, livre e encaracolado. Tinham-no adornado com rosas amareladas silvestres que tinham pego na borda do rio pela manhã. Pôs uma generosa dose de colônia.

 

Lydia?

 

Ross injetou toda sua frustração na chamada.

 

Já vou - respondeu a jovem com acanhamento, e saiu à parte posterior.

 

Ross teria ficado boquiaberto ao ver sua mulher, a não ser porque estava apertando os dentes por causa de seu nervosismo. O suave algodão definia com absoluta claridade sua pequena silueta. Sua pele tinha adquirido a cor do damasco amadurecido, graças ao sol que tinha tomado pese ao chapéu de palha que sempre utilizava quando ia ao assento do carro. Seu cabelo... Bem, pensou que, em outro tempo, tinha-lhe assombrado que o deixasse solto. Agora, já não lhe surpreendia nem ofendia. De fato, preferia-o assim.

 

Secou as palmas nas pernas das calças e estendeu a mão para ajudá-la a baixar os degraus do carro, algo que ela fazia sem a menor dificuldade cem vezes ao dia.

 

Acredito que o jantar já começou - disse por dizer algo.

 

Sinto te atrasar. Teria que ter se adiantado. Já teria alcançado você.

 

Não passa nada.

 

O sorriso corajoso de Lydia se transformou em uma nova decepção. Ross não ia dizer nada sobre seu aspecto radiante, como Mamãe lhe tinha prometido. Sentiu-se perigosamente perto das lágrimas e quis voltar para carro, mas não demoraram em ficar apanhados na festa. Todas as mulheres tinham contribuído ao jantar com um prato de sua especialidade. Entregaram a Lydia e Ross pratos cheios de comida.

 

Antes inclusive de que terminasse o jantar, todos os que sabiam tocar o violino, incluído Moisés, esfregaram seus arcos e começaram a tocar.

 

Quando a comida restante foi guardada e os pratos estiveram lavados, os casais menos afetados saíram a dançar ao compasso das alegres melodias que interpretavam violinos e gaitas. Mamãe seguia o ritmo com as palmas ao tempo que vigiava com afeto a Zeke, quem afundou de novo sua taça no barril de cerveja que alguém havia trazido da cidade mais próxima.

 

Vá dançar - ordenou. Eu me ocuparei de Lee.

 

Lydia olhou ao seu marido, que sustentava entre os dentes um cigarro comprido e estreito.

 

Nunca aprendi a dançar - replicou Ross imperturbável.

 

Mamãe teve vontades de lhe dar um chute no traseiro, mas não se rendeu.

 

Isso dá igual. Aqui não há nenhum perito. Agarre a sua dama nos braços e siga o compasso da música.

 

Eu tampouco sei dançar, Ross - disse Lydia, e confiou em que sua falta de experiência lhe animasse a tentá-lo.

 

Ross passeou a vista por seu rosto e seu corpo, e soube que não poderia rodeá-la entre seus braços, tão linda como estava, e manter a promessa de não lhe fazer amor.

 

- Então o melhor será que não nos ponhamos em ridículo, verdade? Encaminhou-se para o barril de cerveja.

 

Bem - bufou Mamãe - olhe que vi homens estúpidos e obstinados, mas este se leva a palma.

 

Lydia, humilhada, com as faces acesas, cravou a vista no chão. Então, as pontas de duas botas lustrosas apareceram em seu campo visual.

 

Concede-me a honra de dançar contigo, Lydia?

 

A jovem elevou os olhos e viu o olhar cálido e sincero de Wínston Hill. Este esquadrinhou seu rosto, mas não com a aberta hostilidade ou a intensidade aterradoras próprias de Ross, a não ser agradado pelo que via.

 

Mamãe sorriu e a animou.

 

- Vamos, Lydia. O cavalheiro te pediu um baile.

 

Não sei - murmurou Lydia. Por outra parte, desejava-o, mas temia provocar a ira de Ross.

 

Winston riu e moveu a mão para assinalar aos casais que seguiam o ritmo da música sem preocupar-se com a forma.

 

- Acredito que ninguém sabe. - Estendeu a mão para ela. Dança comigo, Lydia.

 

Falava com tal entusiasmo, com tal convencimento, que Lydia, sem pensar nas conseqüências, estendeu-lhe as mãos e deixou que a conduzisse para o círculo. Winston deslizou uma mão por sua cintura, levantou sua mão com a outra e começou a mover-se como outros bailarinos.

 

Ao princípio Lydia experimentou a sensação de que tinha seis pés, todos aleijados e incapazes de ir à mesma direção, mas Winston era paciente e pedagógico. Lydia não demorou em tranqüilizar-se e começou a pegar tranquilidade. Depois de completar o círculo quatro vezes, sentiu-se como se voasse e já não quis parar.

 

Quando Ross viu sua esposa nos braços de outro homem, nada menos que nos de Winston Hill, que ia muito elegante, com um traje de linho branco e botas de couro marrom, esticou os dedos automaticamente ao redor da jarra de lata que se estava levando aos lábios.

 

Sem dar-se conta de que seus olhos se entreabriram até converter-se em frestas verdes, contemplou os movimentos do casal como um falcão. Respondeu com laconismo às perguntas que lhe dirigiam, porque Lydia, com sua saia ao vento, sua boca sorridente, seu cabelo alvoroçado, tinha concentrado sua atenção. Cada vez que passava ao seu lado sem lhe ver, sorridente e jubilosa, os dedos de Ross espremiam a jarra. Engoliu outro gole de cerveja e o nó que se formou em seu estômago se esticou um pouco mais.

 

- Vamos, idiota - riu Priscilla, enquanto avançava na escuridão. - Já disse a você que ninguém te viu roubar aquela cerveja.

 

- Se alguém nos viu, teremo-nos metido em uma boa confusão respondeu Bubba, e lançou um cauteloso olhar para trás.

 

Cale-se! Ninguém nos emprestou atenção. Eles estão passando muito bem com sua estúpida festa. Apoiou-se contra uma árvore e teve boa conta de jogar os seios para frente. Tinha me ocorrido montar uma pequena festa só para nós dois, Bubba ronronou, e lhe atraiu para si. Dê-me um sorvo de cerveja.

 

Priscilla tinha esperado com ânsia o baile durante toda a semana depois que Scout lhe havia dito que não estava disposto a desperdiçar o 4 de julho com uma turma de idiotas, e tinha ido à cidade, sem ela. Daria uma lição a aquele desgraçado. Pensava que era o único homem do mundo? Nem muito menos.

 

Fique na minha frente, Bubba, para que ninguém me veja.

 

Colocou-lhe onde desejava e levantou a mão que sujeitava a jarra de cerveja para sua boca. Inclinou-a, bebeu um pouco, mas deixou que quase toda escorregasse pelo queixo e o seio.

 

OH, Bubba, me dê um lenço, depressa. Se mamãe cheirar a cerveja, não sei do que pode ser capaz.

 

Bubba tirou um lenço do bolso posterior e o estendeu, enquanto contemplava como em transe os riachos de cerveja que desapareciam no interior do sutiã de Priscilla. Olhou-a como idiotizado quando ela desabotoou o último botão.

 

Misericórdia - disse a moça – Caiu cerveja até a cintura. Vou desabotoar a regata, mas você não fará nada de que vá se envergonhar depois, verdade, Bubba?

 

O menino assentiu, aturdido. Todas as palavras de advertência que sua mãe lhe tinha amassado escorregaram de sua mente com tanta facilidade como os botões da regata de Priscilla se deslizavam pelas casas.

 

A moça, sem deixar de lhe olhar, passou o lenço sobre seus seios desnudos e os levantou, moveu-os, esfregou os mamilos até que se endureceram e secou a imaginária cerveja derramada.

 

Quando o lenço se deslizou por última vez sobre seu torso e o deixou completamente nu ao apartá-lo, Bubba gemeu. O som nasceu em sua virilha, subiu até a garganta e surgiu de seu corpo.

 

É muito bonita, Priscilla - disse com voz afogada.

 

Com certeza diz só por dizer - ronronou a jovem, que arqueou as costas e elevou os seios para que Bubba os pudesse examinar melhor.

 

Não, não, Priscilla. Eu te amo. Já lhe havia isso dito.

 

Se me quisesse, beijaria-me e... faria-me amor.

 

Bubba a olhou, mudo de assombro, e se aproximou um pouco mais a jovem. Apertou seu corpo contra o dela e aproximou sua boca à sua. Priscilla se arqueou para esfregar seu montículo contra o inchaço que esticava as calças de Bubba, quem emitiu um gemido e se esmagou contra ela. O moço apoiou as mãos sobre seus seios nus e os acariciou com suavidade.

 

OH, Bubba, que prazer.

 

Ela deslizou a língua sobre seus lábios. O menino retrocedeu imediatamente. Estava confuso, mas viu os olhos ardentes da Priscilla e notou que sua mão lhe atraía de novo para os seus seios. Bubba emitiu um gemido desesperançado, e suas bocas voltaram a fundir-se.

 

Esta vez, ele também abriu a boca, deixou-se guiar por Priscilla e introduziu a língua na boca da jovem. Beliscou seus seios com dedos que atuavam segundo seu instinto. Não empregou muita delicadeza. Priscilla não queria meio termo. Retorceu-se entre Bubba e a árvore, gemendo de prazer.

 

Tenho que te ensinar algo - sussurrou, e o apartou.

 

Bubba, a quem lhe fervia o sangue nas veias, não estava muito disposto a parar. Tentou capturar a boca da jovem de novo, mas ela o empurrou, lançou uma gargalhada e rechaçou as mãos que procuravam seus seios.

 

Está bem, Bubba Langston - disse, com zombadora severidade. Promete que não contará isto a ninguém. Eu o ocultarei de mamãe. Levantou a saia e as anáguas, e elevou o joelho até apoiá-la na coxa do moço. Comprei estas ligas de cetim vermelho ao mascate. Vê? Não são bonitas?

 

Bubba não olhou as ligas. Ficou sem respiração ao ver a suave extensão de coxa branca que começava em cima.

 

Sim, vejo-as - disse com voz rouca. Tocou a liga com o dedo e seguiu subindo até chegar à coxa.

 

Deveria se envergonhar, Bubba - repreendeu Priscilla, embora não fizesse nada para detê-lo.

 

Bubba, animado, prosseguiu sua exploração. O fôlego escapou com força de seus lábios quando encontrou pêlo cacheado.

 

Priscilla, não leva...

 

Hoje tem feito muito calor. Queria ir fresca, OH, Bubba, não deveria, não. Deus, está me tocando aí?

 

Deixe-me, Priscilla - suplicou o moço. Não te farei mal. Faço-te mal? Pararei.

 

Não! Bubba - fez um gesto de retirar-se, mas quando a jovem arqueou o corpo voltou para o lugar. Um homem pode ficar violento se uma dama lhe deixa chegar tão longe, e depois... OH, aí, Bubba, aí. Estremeceu-se. Sim...

 

Priscilla suspirou Bubba, e sepultou a boca em seu pescoço.

 

Note o quão molhada que me está pondo, Bubba.

 

Tenho-a tão dura que me dói - murmurou o menino entre seus seios.

 

Eu te ajudarei.

 

Agarrou a parte dianteira de suas calças com dedos peritos. Acariciou-lhe.

 

Jesus, Jesus - gemeu Bubba.

 

Iria morrer e Mamãe e todos outros descobririam do que, mas lhe dava igual. Sentiu que seus dedos exploravam a gruta ardente da jovem.

 

OH, Bubba, que gostoso - suspirou ela. Mas aqui não. Junto ao rio. Vamos, apresse-se.

 

Bubba, aturdido, retirou a mão e deu um passo atrás. Priscilla baixou a perna e fechou o sutiã. Depois, dirigiu-lhe um olhar cheio de promessas, agarrou-lhe da mão e se dirigiu para o rio. Ambos pararam em seco quando viram Luke Langston que os estava olhando, sentado em um toco próximo. Como indiferente à presença de ambos, o moço estava esculpindo um pau com sua navalha.

 

Olá – gorjeou- Bonita noite, verdade?

 

Pequeno bastardo bisbilhoteiro - gritou Priscilla - Desde quando está aí?

 

Mais ou menos, desde que essa coisa metida nas calças da Bubba começou a crescer. Desde quando te dedica a plantar cabaças em seus calções, Bubba? Essa é a maior que vi em minha vida.

 

Matarei você - vaiou Bubba, e se precipitou para o seu irmão, que se levantou do toco como impulsionado por uma mola e desapareceu entre as árvores, gritando como um índio, Bubba saiu disparado atrás dele.

 

Estúpidos caipiras - murmurou Priscilla, enquanto arrumava a roupa. Não deixou de salmodiar aquela ladainha até que chegou a sua carroça e se deixou cair no colchão, onde se queixou amargamente de sua frustração e do triste e que era a sua vida.

 

Ross deu as costas aos bailarinos e afundou sua taça no barril de cerveja. Estava muito furioso. O ciúme lhe roia. Estava um pouco bêbado. O último era quão único podia controlar, mas não queria. Bebeu outra jarra de cerveja e desejou que fosse uísque, para poder embebedar-se mais depressa.

 

Que bolas lhe importava se ela se exibia diante de um maricas como Hill? Iria se separar dela. Assim que chegassem a Telhas e se estabelecessem, iniciaria os trâmites do divórcio. Da guerra, tudo seguia de cabeça para baixo naquela parte do país. Não seria difícil obter o divórcio.

 

Balançou-se sobre seus pés e sua fúria aumentou, enquanto tentava aparentar que escutava a piada que contava o senhor Appleton. Todo mundo estava atento da menor palavra obscena. A atenção de Ross estava concentrada em Lydia, que estava sorrindo ao senhor Hill. Nunca lhe tinha dispensado daquela maneira. Considerou repulsiva sua boca sensual e a forma voluptuosa em que seu corpo se balançava ao compasso da música. Ao menos, isso se disse.

 

Estava se expondo ao em ridículo de propósito, nem mais nem menos. Dançar com seu presunçoso amigo era sua forma de revelar as deficiências de seu marido. Bem, Por Deus que não ia ficar ali parado e permitir que aquela puta com quem lhe tinham casado lhe deixasse no ridículo. Embora tivesse que agarrá-la pelo cabelo e arrastá-la...

 

Onde estava?

 

Ross passeou o olhar entre os animados bailarinos. Seus olhos intoxicados tentaram enfocar os casais, mas transcorreram vários minutos e não pôde localizar nem a Lydia nem ao Winston. Atirou a jarra ao chão e começou a abrir passo com cotoveladas entre a ruidosa multidão.

 

Ouça, Coleman, vigia...

 

Aonde vai, Ross?

 

Ross não bebeu o bastante?

 

Onde está sua mulher ... ?

 

Era indiferente a tudo que lhe rodeava. Notou que aquela tensão já familiar aumentava. A violência que aninhava em seu interior enchia todos seus poros, procurava uma saída. Não tinha experimentado com tanta força aquela sensação do último golpe com Jesse e Frank. Fechou os punhos como um autômato; como um autômato, levou a mão para a pistola e sua carga mortífera. Não estava em seu lugar, mas seguiu avançando entre os reunidos, concentrado em encontrar a sua mulher e ao seu amante.

 

Ross - disse às garotas que levassem Lee a nosso carro e lhe deitassem, para que Lydia e você possam ficar na festa até que queiram - disse Mamãe quando Ross passou ao seu lado. Ele a olhou sem ver. Podem deixá-lo em nosso carro até manhã. Não é necessário que...

 

Onde está? Vaiou Ross.

 

Mamãe o estava observando fazia uma hora e sabia que estava louco de ciúmes. Teve a prudência de reprimir um sorriso. Deixou que seu olhar escorregasse sobre os bailarinos.

 

Quem? Lydia?

 

Sim, Lydia.

 

Ross cuspiu o nome, pois parecia como se retê-lo na boca durante muito tempo lhe resultasse insuportável.

 

Não sei. A última vez que a vi estava dançando com o senhor Hill.

 

Ross abriu caminho entre um grupo e cambaleou em direção aos carros, que em sua maior parte estavam às escuras e vazios. Se tinha ido a sua carreta... Se os encontrassem juntos... Não queria saber... Tinha que saber... onde estava.

 

Lydia nunca tinha passado tão bem em sua vida. Winston a tratava como se ela não fosse lixo, vivido em um chiqueiro e padecido os abusos sexuais de seu meio-irmão. Winston a tratava como a uma senhora, felicitava-a por seu aspecto e sua forma de dançar, lhe ia procurar taças de ponche, ria com ela, compartilhava sua alegria.

 

Quando começou a tossir, Lydia, perguntou se estava bem. Ele insistiu que sim e ela aceitou sua palavra, até que tiveram que deixar de dançar e sair do círculo de casais. Winston sofria um ataque de tosse, como Lydia nunca tinha visto.

 

O que posso fazer, Winston? - Perguntou, e apoiou uma mão em seu ombro quando ele se dobrou pela cintura, com todo o corpo convulso, como se afogasse.

 

Sinto-o - ofegou o jovem. Estou bem.

 

Mas não era certo. Havia gotas de sangue nas comissuras de seus lábios e sua pele tinha adquirido a cor da cera velha.

 

Quer que vá procurar ao Moisés? 

 

Ele, moveu negativamente a cabeça e levou o lenço à boca uma vez mais. 

 

Está se divertindo - explicou com voz estrangulada quando a tosse remeteu por fim. Entretanto, o seguinte ataque foi pior que o último, e Lydia se sentiu muito alarmada.

 

Winston, me diga o que posso fazer.

 

Minha medicina - respondeu com voz rouca o jovem.

 

Lydia procurou com o olhar a Ross, mas ele estava com os homens congregados ao redor do barril de cerveja e teria tido que abrir-se passo entre os bailarinos para chegar ao seu lado. Não queria deixar sozinho ao Winston tanto momento. Aferrou sua manga.

 

Onde está sua medicina? Onde está, Winston?

 

No carro - conseguiu articular Winston.

 

Vamos.

 

Lydia decidiu ocupar-se dele no lugar de ir a busca de outra pessoa. Possivelmente morreria de um acesso de tosse antes de conseguir a ajuda de alguém, e sabia que o jovem se sentina envergonhado se montasse um escândalo por sua causa. Rodeou sua cintura com o braço e estendeu a outra sobre seu peito. Guiou-lhe para a zona de sombras onde os carros se detiveram para passar a noite.

 

Onde está sua carreta? Perguntou.

 

Winston a assinalou com um gesto débil, e cruzaram pouco a pouco o acampamento.

 

Sinto muito, Lydia - repetia sem cessar o doente.

 

Cala. Não fale ou voltará a tossir.

 

Odeio-me por isso.

 

Não é tua culpa. Chegaram por fim ao carro de Hill. Pode subir?

 

Ele assentiu, e graças a um supremo esforço de vontade, içou-se, com a respiração entrecortada. Teve que deter-se várias vezes para tossir. Uma vez dentro, Lydia piscou para acostumar-se à escuridão, enquanto Winston se arrastava para o seu colchão. Deixou-se cair de costas como um saco, sacudido por outro acesso de tosse.

 

Lydia, cujos olhos já se adaptaram a escuridão, procurou um abajur, fósforos, e não demorou para acender a mecha. Manteve a chama baixa.

 

Onde está o medicamento? Perguntou em voz baixa, enquanto Winston se esforçava em introduzir ar em seus pulmões exaustos.

 

O homem assinalou um cofrinho de madeira. Lydia o aproximou, levantou a tampa, e dentro da caixa de teca forrada de veludo apareceram vários frascos escuros de soluções. Winston indicou com uma mão trêmula o que necessitava.

 

Lydia apartou o cofre e desarrolhou o frasco. Levantou a cabeça do Winston com uma mão e apertou o frasco contra os seus lábios. O jovem bebeu uma boa quantidade, e depois se estendeu na cama de armar.

 

Obrigado, Lydia.

 

Está melhor? Perguntou a moça. Tinha o sobrecenho enrugado de preocupação e a boca franzida de angústia.

 

Fios de cabelo rodeavam seu rosto como filamentos de luz. Tinha a pele rosada a causa do esforço. O perfume a colônia impregnava o interior do carro, austero e masculino. Lydia não tinha nem idéia de quão bonita resultava aos olhos do doente, que teria dado algo naquele momento por ser forte e vigoroso.

 

Estou melhor - respondeu com tristeza, e desejou que lhe olhasse com paixão, em lugar de pena.

 

Deixa que te ajude a tirar isto.

 

Desenredou a gravata de seda e desabotoou com a maior desenvoltura o seu colete e a camisa.

 

Winston agarrou suas mãos para detê-la.

 

Já o fará Moisés quando retornar. Volta para a festa. Encontro-me bem.

 

Quer que vá lhe buscar agora?

 

O fez um gesto negativo com a cabeça, que tinha apoiada sobre o fino travesseiro de algodão.

 

Quando se der conta de que não estou dançando, virá. Apertou fortemente a mão da moça e disse: Obrigado, Lydia.

 

De nada.

 

Guiada por um instinto maternal, seus dedos brincaram para trás os cachos empapados que cobriam a testa do Winston. Ao mesmo tempo, ele levou sua outra mão aos lábios e a beijou com doçura.

 

Ross entrou pela abertura da lona como um furacão. Sobressaltada pelo ruído, Lydia voltou a cabeça, mas não antes que Ross tivesse visto o que sua mente enlouquecida pelo ciúmes interpretou como uma cena de amor.

 

Lydia se encolheu. Ross já não levava postos nem o colete nem o lenço. Tinha abertos vários botões da camisa, que deixavam ao descoberto os músculos e um tapete de pêlo escuro. Seu rosto era aterrador. Seus olhos verdes a transpassaram. Seu cabelo, caído em desordem sobre a testa, parecia tão indômito como sua feroz expressão; sua boca era uma linha magra e arisca. Com as pernas bem separadas, os músculos de suas coxas se marcavam nos rodeadas calças negras.

 

Até a alma mais valente se acovardava ante aquela magnífica presença física. Sua feroz expressão prometia o pior a qualquer que considerasse seu inimigo.

 

Ross - gritou Lydia.

 

Uma cena comovedora - rugiu ele.

 

Winston se esforçou em levantar-se.

 

Deixe-me...

 

Está doente. Busquei você. Estava tossindo. Teve...

 

É minha mulher - grunhiu Ross, e se plantou com grande rapidez ante ela. Agarrou-a pelo braço e a pôs em pé de um puxão. Não queria que fosse. Ainda não o desejo, mas enquanto o seja, maldição, se comportará como é devido.

 

Ross, me escute, o suplico - gemeu Winston. Quão último queria era causar problemas a Lydia por lhe tratar bem. As circunstâncias são enganosas. Aqui não aconteceu nada inapropriado...

 

Ainda - replicou Ross - mas acredito que cheguei bem a tempo.

 

Não! Gritou Lydia, e tratou de soltar seu braço da presa de Ross.

 

Vamos.

 

Levou-a a rastros para a abertura do carro e a empurrou para fora.

 

Está doente - disse Lydia, enquanto cravava os seus pés na terra e tratava de largar-se de Ross, que a agarrava fortemente pelo braço. Teria devido...

 

Vais receber o que ansiava, mas o vais receber de mim, de seu marido - soprou Ross.

 

Lydia tropeçou com ele e se agarrou ao seu cinturão para apoiar-se. A ira que brilhava em seus olhos a aterrorizava. Seus dentes começaram a bater e seus ossos se negaram a sustentá-la.

 

O que... o que quer dizer?

 

Já tinham chegado ao seu carro. Ross a agarrou em braços e subiu os degraus que conduziam acima. Quase se dobrou pela metade para entrar.

 

Lee...

 

Está com Mamãe. - Riu, e um calafrio percorreu a espinha dorsal da moça. Até manhã.

 

Sem mais cerimônias a jogou sobre o colchão, e Lydia se apressou a cobrir as pernas com a saia. Um desagradável sorriso apareceu no rosto de Ross.

 

Economize suas demonstrações de decência, Lydia. Se até agora tinha alguma dúvida, esta noite demonstraste o que é.

 

Não – sussurrou ela, e se refugiou na esquina da carroça. Já tinha visto aquela expressão. No rosto de Clancey. Era implacável. Significava que nenhuma súplica impediria a aquele homem obter o que desejava. Os olhos de Ross estavam iluminados por um excesso de álcool, fúria e desejo. - Não, Ross, por favor - soluçou, e cobriu o peito com os braços.

 

Ele tirou a camisa e deixou ao descoberto seu peito e seu estômago. Lydia contemplou a combinação de músculos e tendões. A feia cicatriz parecia um irado olho vermelho que a olhava. Ele desabotoou a fivela do largo cinturão e o tirou pelas presilhas. Lydia se encolheu em um gesto protetor, pensando que primeiro ia golpeá-la, mas Ross deixou cair ao chão o cinturão e começou a desabotoar-se pouco a pouco as calças.

 

Lydia elevou seus olhos nublados para ele. Rogaram-lhe em silêncio que não o fizesse, que não a maltratasse, que não a utilizasse como Clancey.

 

Ross, por favor.

 

Queria um homem? Perguntou ele com voz sedosa, enquanto se agachava para o colchão. Bem, conseguiste-o.

 

Ross se moveu com tal rapidez que Lydia, um momento antes, estava encolhida em um rincão do carro, e ao seguinte se encontrou debaixo dele, arrastada por mãos que se moviam com agilidade e destreza sobrenaturais.

 

Presa pelo pânico, ansiosa por escapar, debateu-se com violência, golpeou com braços e pernas, converteu seus dedos em garras.

 

Não - não repetiu, enquanto lutava contra a força inamovível que a esmagava.

 

OH, sim. - A quantos te entregaste, né? Não sou eu diferente a todos eles?

 

As mãos de Ross destroçaram as pétalas de rosa que adornavam seu cabelo, enquanto ela rodava de um lado a outro. Seu cabelo se esparramou sobre seu rosto, pescoço e braços.

 

Não, Ross, Ross. Deus, não permita que me faça isto - gritou, impotente.

 

Deus não te ajudará, Lydia. Deus não escuta. Nunca está perto quando lhe necessita.

 

Agarrou as mãos dela com um punho de ferro e as estendeu sobre sua cabeça. Seus dedos ávidos manipularam os botões do sutiã até desabotoá-los. Uma vez afastado o vestido, rasgou a cinta de sua regata e desabotoou os diminutos botões. Sua respiração se acelerou quando puxou a um lado as roupas e pôde ver seus seios nus.

 

Lydia gemeu, fechou os olhos e apartou a cabeça. Se tão somente o tivesse pedido, ela teria concedido. Poderia ter trocado sua rendição em troca de sua futura amabilidade. Se a tivesse tratado bem, ela se teria devotado a ele sem necessidade de que ele o pedisse.

 

Mas ia maltratá-la, a violá-la, a deixá-la cheia de hematomas, como o tinha feito Clancey. Esta vez seria pior. Ross podia ferí-la de uma forma que Clancey desconhecia. Ela sentia afeto por Ross, e o fato de que ele a tratasse com tão pouco respeito a feria até o fundo de seu ser. Não lhe ocorreria maltratar a algum de seus cavalos.

 

Ross não se permitiu tocar os seus seios. Uma fresta de prudência em sua mente cegada pelo álcool lhe advertiu que começaria a sentir ternura por ela se a acariciava. Não devia ocorrer. Lydia necessitava um castigo e ele ia dar.

 

Subiu-lhe a saia e as anáguas até a cintura e se apoderou do cinto de suas calças interiores. A puxou com força, rompeu a sujeição e os baixou. Lançou um grunhido e tentou sujeitar suas coxas. Rasgou com brutalidade suas calcinhas e lhe separou as pernas com o joelho. Extraiu o membro viril das calças e se deitou sobre ela.

 

Se fosse Clancey, Lydia lhe teria olhado aos olhos, desafiante, para lhe demonstrar o ódio que sentia, mas ela não odiava Ross, e em lugar de lhe dedicar aquele altivo e condenatório olhar de seus olhos dourados, manteve a cabeça apartada enquanto ele a penetrava. Não esperava a dor lacerante que a percorreu. Arqueou o corpo e lançou um grito.

 

Ross sepultou todo seu membro nas vísceras dela e continuou escavando. Depois, quando todo seu peso a esmagou, esperou. Inalou grandes quantidades de ar e sua cabeça começou a limpar-se. Então, pela primeira vez desde que a tinha visto no carro de Hill, foi consciente do que estava fazendo. Os ciúmes raivosos que tinham tingido de vermelho todo seu mundo se elevaram como a névoa e se enfrentou cara a cara com o remorso. Um remorso imenso.

 

E prazer. Enorme. Como jamais tinha experimentado. Não queria sentir prazer. Entretanto, este impregnava sua mente, seu coração, seu estômago, seu membro, que ela envolvia. Tinha que demonstrar-se a si mesmo que ainda seguia consciente. Possivelmente era uma fantasia, o produto erótico de uma letargia alcoólica.

Moveu-se um pouco, sem querer despertar do sonho, em caso de que estivesse sonhando. Mas era real. Balançou-se sobre ela, e milagrosas sensações lhe alagaram ao compasso de seus movimentos rítmicos.

 

Não - sussurrou, não pode ser certo.

Sua voz desmentiu as palavras. Era a voz de um homem que experimentava a maior gratificação física de sua vida.

Era um engano. Ele não podia permitir-se aquele prazer. Não o faria. Retrocedeu, com a intenção de levantar-se, mas seu corpo não lhe deixou e voltou a afundar-se naquele delicioso abismo.

Maldição, não devia ser assim contigo - suspirou no pescoço de Lydia.

Traiu suas melhores intenções e suas mãos se abriram passo entre os corpos. Encontrou seus seios amadurecidos e maleáveis, e a acariciou com a sensibilidade investigadora de um cego. Sopesou com suas mãos sua abundância. Acariciou a suave carne. Examinou os mamilos com as pontas dos dedos, encantado com sua textura quando se endureceram sob seu polegar.

Sem dar-se conta de que se moveu, sua cabeça substituiu à mão e começou a lhe beijar os seios. Sua boca bigoduda se moveu sobre ela em uma carícia errática até que os lábios encontraram um mamilo, duro e rosado, e se fecharam ao seu redor com delicadeza, enquanto sua língua o saboreava com breves lambidas. Depois o chupou com suavidade, introduziu-o por completo na boca e saboreou, saboreou, saboreou à mulher...

Levantou a cabeça e contemplou aqueles olhos cor uísque que o olhavam totalmente aberto, sem compreender. Ross viu seus próprios dedos, brancos por causa da pressão, que aprisionavam os pulsos da moça. Soltou-as imediatamente. Subiu as mãos para o seu cabelo, afundou os dedos na massa rebelde, até que fechou os dez ao redor de seu crânio.

 

Jogou a cabeça de Lydia para trás e fundiu suas bocas com tanta intimidade como seus sexos. O calor do beijo se intensificou até que esmagou seus lábios sobre os de Lydia, até que suas línguas se encontraram, até que já não pôde controlar o beijo em uma explosão de fogo que surgia de suas virilhas e penetrava pelo portal de sua vagina.

 

Seus lábios modelaram o nome da jovem a partir de seus gemidos de satisfação suprema.

 

Permaneceu muito tempo deitado sobre ela depois da crise que lhe tinha estremecido, suspenso em um estado de transe. Depois não recordou que tinha rodado a um lado, tinha-a estreitado contra si e se afundou em uma plácida inconsciência.

 

Olá! Disse a puta com voz cansada. Meu nome é Pearl.

     

Deus! Era o seu último cliente da noite e aquela cadela de Madame LaRue lhe enviava aquele refugo humano como pagamento por haver-se bancado a esperta aquela manhã. Em 4 de julho tinha sido um dia infernal. As ruas de Owentown eram um enxame de trabalhadores da ferrovia que tinham ido para celebrar a festividade. Constituíam um grupo ruidoso, excitados como um rebanho de búfalos, e a mulher experimentava a sensação de que todos se deitaram com ela. Estava cansada e dolorida. E agora tinha que atender a aquele, o pior do lote.

 

Da ferrovia? Perguntou, em um débil intento de cercar conversação.

 

Clancey Russell lançou um bufado depreciativo enquanto fechava a porta as suas costas.

 

Sou o bastante preparado como para não romper os testículos por outro. Reservo-lhes um melhor uso.

 

Ele se apontou com ar insinuante.

 

Pearl pôs em prática o seu profissionalismo e sorriu, pese ao asco que lhe inspirava aquele indivíduo, que ia sujo e cheirava a mil demônios.

 

Vejamos seu dinheiro ronronou. Antes de deixar que a tocasse, comprovaria que aquele refugo humano levasse dinheiro em cima.

 

Clancey afundou a mão no bolso para tirar o dinheiro que tinha roubado de uma mesa de pôquer, quando os jogadores se encetaram em uma discussão. Tinha-lhe bastado para pagar uma boa comida e uma garrafa de uísque. Por conseguinte, fazia semanas que não sentia o estômago tão cheio e quente. Atirou a importância estipulada sobre a velha penteadeira coberta com uma toalha de mesa de ponto amarelado.

 

Já viu meu material disse com arrogância. Vejamos agora o teu.

 

Embora Pearl fizesse uma cara sedutora, por dentro tremia de asco. O homem baixou os suspensórios e começou a desabotoar a camisa. Quando a tirou, Pearl viu os círculos de suor seco que manchavam as axilas da descolorida roupa interior de cor, vermelho que levava em cima aquele asqueroso. Para ganhar tempo assinalou o papel dobrado que tinha caído da camisa do tipo.

 

O que é isso?

 

Algo que agarrei. Um pôster de busca e captura. Nunca se sabe o que pode passar. Vamos, neném, tire isso.

 

Pearl ficou de joelhos sobre a cama desvencilhada e tirou a velha bata que uma puta veterana lhe tinha presenteado. Nem sequer a triste fileira de plumas que tinha costurado no decote melhorava o seu aspecto.

 

Ficou nua. Os olhos de Clancey brilharam de luxúria e uma careta de crueldade apareceu em sua boca. Pearl tinha fama de serviçal, e por um bom preço acessava a tudo, sempre que não a maltratassem, mas seu coração se acelerou quando percebeu a maldade que aparecia nos olhos incolores de Clancey enquanto a inspecionava. Desabotoou as calças e deixou ao descoberto um sexo inchado e purpúreo, que inclusive aos olhos cansados do Pearl era repugnante.

 

Se esse papel for tão importante, me deixe vê-lo disse, e estendeu a mão para o pôster. Algo com tal de impedir que aquele animal lhe pusesse em cima.

 

E uma merda - disse Clancey, e avançou sobre ela. O que você quer...

 

Ouça, esse parece... Vá, como disse que se chamava? O homem da caravana.

 

Clancey fechou as mãos sobre seus seios e lhe beliscou os mamilos com rudeza.

 

Ai! Para, tem-me feito mal. Não compreende o que intento te dizer? Vi esse homem faz uns dias...

 

Clancey se ergueu, olhou-a e depois desviou a vista para o pôster.

 

Não é mais que um montão de lixo.

 

Clancey não sabia ler. Tampouco sabia por que tinha pego o pôster aquela noite no botequim de Knoxville, só se lembrava de que aqueles dois tipos elegantes tinham falado a respeito de como acreditavam que tinha morrido aquele homem, mas agora dava a impressão de que se fazia passar por outra pessoa. Tinha roubado umas jóias. Isso é o que haviam dito.

 

Vale cinco mil dólares - disse Pearl, e o cansaço deu passo a certo entusiasmo. Aquilo podia ser o bilhete que a tiraria de Owentown e das garras de Madame LaRue.

 

Cinco mil dólares? Clancey se levantou de um salto e lhe arrebatou o pôster da mão. E diz que viu este tipo recentemente?

 

Pearl não era preparada, mas sim ardilosa. Os dois anos com o Madame LaRue tinham servido de algo. Guardaria em segredo o que sabia sobre o homem do pôster. Se valia cinco mil dólares, não permitiria que aquele sujo filho de puta se interpusesse em seu caminho.

 

Piscou com ar sedutor e deixou que sua mão seguisse por debaixo da cintura do homem.

 

Ui, só te estava tirando o sarro. Pensava que queria falar sobre mim, não sobre um pôster velho.

 

Clancey lhe deu um murro na mandíbula. Ouviu-se um rangido sinistro e a mulher caiu sobre o desbotado travesseiro, aturdida pela dor.

 

Se arrependerá de te haver burlado de mim, puta, se não me disser onde viu este homem. Entendeste-me? Esbofeteou-a em cada face e beliscou a parte interna de sua coxa com os dedos da outra mão. Entendeste-me?

 

Pearl assentiu, com a vista nublada e os ouvidos ensurdecidos.

Muito bem, escuto-te. Subiu a mão por sua perna com semblante ameaçador. A mulher choramingou. Fala.

 

Clancey retorceu a carne branca da mulher entre seus dedos.

 

O... carro se obstruiu e ele.... acredito que era ele..., ajudou-nos e nos acompanhou até a cidade. É mais velho agora que o homem da foto, não leva o cabelo comprido e deixou crescer o bigode. Pode ser que não seja o mesmo tipo.

 

Mas Pearl albergava poucas dúvidas a respeito. Quem poderia esquecer aqueles olhos, e sua forma de olhar, como se fosse lhe recordar até o fim de seus dias, se lhe tinha tratado bem ou mau?

 

Chamava-se Clark?

 

Não, não... Era... Não me lembro.

 

Clancey atirou com força de seu pêlo púbico.

 

Refresquei-te a memória?

 

Brotaram lágrimas dos olhos da mulher, que lançou um chiado, mas Clancey voltou a esbofeteá-la. Ninguém ouviria os seus gritos de auxílio. No salão de abaixo havia uma grande gritaria. Ouvia as gargalhadas, o tamborilar do piano, o estrondo da farra. Ninguém poderia ajudá-la.

 

CO... Coleman. Disse que se chamava Coleman.

 

Hóstias! Esse era. Esse era o nome do tipo ao que procuravam os dois cavalheiros do Knoxville. Estava na carreta onde Lydia se escondia. «Matar dois pássaros de um tiro. Não dizia sempre isso papai?»

 

Riu para si enquanto Pearl fazia patéticos esforços por lhe rechaçar. Tinha visto o homem uns dias antes. Estava se aproximando. Assim que amanhecesse, reataria a perseguição do carro. Demônios, começaria aquela mesma noite. Viajaria mais depressa que a carreta. Mas antes devia fazer outra coisa.

 

Pearl? Não te chama assim? Apoderou-se de um de seus seios e o espremeu. Bonito nome, Pearl. Você também é muito bonita. E se deu bem com o velho Clancey. É claro que sim.

 

A mulher sorveu suas lágrimas. Possivelmente se rendesse aos seus desejos poderia fazer contato com o xerife antes que ele para comunicar o paradeiro do senhor Coleman.

 

Obrigado sussurrou.

 

Tenho a intenção de te recompensar, Pearl. Sim, senhor. Clancey Russell sempre dá o que acredita que alguém se merece.

 

Massageou seu ventre com as mãos sujas, aprofundou entre as coxas e a explorou com rudeza.

 

Pearl apertou os dentes e obrigou aos seus lábios inchados a imitar um sorriso. Não sorriu segundos depois, quando Clancey a penetrou como um esporão, com brutalidade, rasgando suas zonas internas enquanto cravava os dedos na carne branda de seus seios.

 

Faz-me mal -gritou Pearl.

 

E você gosta, puta. O suor escorria de sua testa gordurenta. Enlouquece-te.

 

Rodeou sua garganta com uma mão e apertou a laringe. A cada investida de seus quadris, Clancey apertava com mais força, até que os olhos da mulher lhe saíram das órbitas e sua boca se abriu de par em par. Clancey, concentrado em satisfazer sua luxúria, até depois de derramar seu sêmen, não se deu conta de que Pearl já não se debatia.

 

Nenhuma de suas companheiras sentiu falta de Pearl até a tarde seguinte. Madame LaRue não recordava como se chamava o último cliente de Pearl, nem tampouco seu aspecto. Dava a impressão de que toda a população masculina de Arkansas tinha desfilado a noite anterior pelo botequim.

 

«Como ia lembrar se de todos?», perguntou ao acossado xerife. Não pôde lhe proporcionar a descrição. Todos os homens suados e fedorentos que desejavam uma mulher se pareciam.

 

Mas Madame sabia que não era verdade. Gostou muito daquele outro tipo uma semana antes. O alto do cabelo negro e os olhos verdes. Tinha pensado, pela forma no que se movia e comportava, que ele era diferente, mas, por desgraça para ela, não era mais que outro caipira muito apaixonado por sua mulher para deitar-se com uma puta. Ela se tinha enfurecido quando ele abandonou o carro aquela noite, mas depois, Madame tinha recordado à garota do cabelo especial, os olhos estranhos e o porte orgulhoso. Talvez não pudesse culpar ao homem por amá-la.

 

Todos os músculos do corpo de Lydia estavam doloridos, Tentou adotar uma postura mais cômoda, mas não a encontrou. O carro estava às escuras, logo que iluminado pelo primeiro resplendor da aurora. Reinava o silêncio. Depois da festa noturna, todo mundo dormiria mais do que o habitual.

 

O homem deitado junto à Lydia estava imóvel. O braço que rodeava sua cintura pesava como o chumbo. Sua respiração era suave e regular; logo que agitava o cabelo de Lydia, apanhado sob sua face. A suave cadência de sua respiração era tranqüilizadora, testemunho de que Lydia não tinha passado sozinha as horas escuras da noite, e de que alguém mais forte tinha adormecido ao seu lado para protegê-la.

 

Uma lágrima solitária escorregou de seu olho até o cabelo. Não era desagradável despertar ao seu lado. E agora a desprezaria. Mais lágrimas seguiram o caminho da primeira.

 

Possivelmente ele estava no certo respeito a ela. Possivelmente ela tinha nascido puta. Clancey tinha descoberto sua lascívia, como uma enfermidade que crescesse em seu interior à medida que seu corpo maturava. Ele tinha respondido ao estímulo. Ross o tinha sabido desde o começo. O que tinha ocorrido aquela noite demonstrava que Ross tinha razão. Porque quando ela devia o rechaçar com energia, foi incapaz de fazê-lo. Tinha gostado muito do que lhe estava fazendo.

 

Tentou virar a cabeça ao outro lado, mas tinha o cabelo preso e teve que seguir olhando o teto de lona, sob pena de correr o risco de despertá-lo.

 

Algo lhe tinha ocorrido ontem à noite quando Ross começou a mover-se sobre ela. Algo. Estranho, terrível, vergonhoso e maravilhoso. Quando a língua dele se moveu com a mesma habilidade em sua boca que...

 

Fechou os olhos e mordeu o lábio inferior. Quando lhe soltou as mãos, em vez de debater-se, tinha-as apoiado sobre seus ombros e saboreado a sensação da pele nua de Ross. Seus dedos se haviam engarfiado ao redor dos músculos tensos para lhe rodear mais. Tinha apertado as coxas contra os seus quadris.

 

De fato, havia-se sentido decepcionada quando ele se apartou e caiu adormecido. No lugar de desprezar-se, sentiu que seu corpo formigava ao rememorar o acontecido. Ele a insultaria e desprezaria pelo que era.

 

Tentou reprimir sem êxito um soluço e Ross se removeu ao seu lado. Despertou pouco a pouco, moveu e estirou as pernas. O braço que rodeava sua cintura se contraiu, e depois se relaxou. Respirou fundo, e a seguir exalou um longo suspiro estremecido.

 

Lydia soube em que preciso instante abriu os olhos. Notou como ele cravava o seu olhar em seu perfil. Ross seguiu deitado um momento interminável, enquanto o coração de Lydia saltava dentro de seu peito. Por fim, Ross levantou o braço e se levantou. Olhou-a.

 

Lydia experimentou um poderoso impulso de lhe tocar, um impulso tão forte que devia reprimir para não estender a mão e alisar a dobra que fendia o seu sobrecenho, jogar para trás o cabelo ingovernável que caía sobre sua testa, apagar a rigidez de sua boca. Mas não pôde. Depois do de ontem à noite, ele não quereria tocá-la. De modo que seguiu imóvel e deixou que seus olhos o olhassem, tratando de apagar de seu rosto qualquer expressão que pudesse trair seus sentimentos tumultuosos.

 

Olhou-o enquanto os olhos dele exploravam seus seios, nus porque tinha carecido da iniciativa necessária para se mover e voltar a fechar a roupa. Tampouco teria podido. Os braços de Ross a tinham mantido aprisionada toda a noite. Cruzou os braços sobre o seio, envergonhada.

 

Um som gutural, que devia ser uma blasfêmia, formou-se na garganta de Ross. Ele apartou seu olhar dela, mas seus olhos caíram sobre as saias ainda recolhidas ao redor de sua cintura e os objetos interiores, amontoadas junto aos seus pés.

 

Envergonhado, com movimentos torpes e desordenados, cobriu-a de novo com suas saias. Lydia tinha as mãos apoiadas sobre o estômago, e quando Ross deixou que seus olhos as examinassem, viu os pulsos arroxeados e torceu a boca. Embora fosse o ato mais difícil de sua vida, obrigou-se a olhar no rosto. Não percebeu sinais visíveis de sofrimento, à exceção daquela incerteza nos olhos.

 

Fiz-te mal?

 

«Uma pergunta estúpida, Coleman se disse. Olha-a, homem. Está coberta de hematomas. » Retificou a pergunta.

 

Dói-te?

 

Lydia negou com a cabeça, sem piscar nem lhe aliviar daquele olhar acusador. Ross se levantou, vacilante. Sem mais palavras, Fechou as calças, agarrou a camisa e saiu do carro.

 

Lydia rodou de lado, sepultou a cabeça entre suas mãos e chorou. Passou muito momento antes que se decidisse a levantar-se e dedicar-se às rotinas cotidianas. Lavou-se escrupulosamente, bastante alarmada ao descobrir rastros de sangue em suas coxas. Esfregou-se com força, para eliminar as impurezas internas e poder ser aceita de novo. Recolheu o cabelo para trás e o prendeu à cabeça, como se fosse um símbolo de sua maldade que devesse ocultar.

 

Quando reuniu suficiente coragem para sair do carro, Ross estava agachado em frente ao fogo. Bebia o café que tinha preparado. Já se tinha barbeado, mas parecia cansado.

 

Lydia enlaçou seus dedos.

 

Irei procurar Lee, e depois prepararei o café da manhã.

 

Como Ross se limitou a continuar contemplado o fogo sem dizer nada, Lydia deu uns passos em direção do carro dos Langston.

 

Lydia.

 

Seu nome, pronunciado com brutalidade, obrigou-a a parar e dar meia volta. Ross estava de pé ante ela, mas a Lydia resultou impossível olhar diretamente ao fogo verde de seus olhos.

 

Quanto ao de ontem à noite... começou Ross.

 

Ela sacudiu a cabeça antes que a acusasse.

 

Não ocorreu nada entre o senhor Hill e eu. Juro-o. Ele se encontrava mau. Não parava de tossir. Cuspiu sangue. Ajudei-o a voltar para o seu carro e lhe dava seu remédio. Isso foi tudo.

 

Ross atirou os sedimentos do café ao chão, amaldiçoou e afundou as mãos em seus bolsos.

 

Não queria falar disso. Seguiu outro tenso silêncio, durante o qual foram incapazes de olhar-se. Acredito que isto não vai funcionar - disse, com uma calma mortal que gelou o sangue nas veias de Lydia. Assim que cheguemos a Telhas, encontrarei um modo de nos divorciar. - Lydia baixou a cabeça para que não pudesse ver suas facções afundadas. Não será difícil.

 

Não - respondeu a jovem com voz áspera. - Não o será.

 

Ali reinam o caos e a confusão. As tropas federais que ocupam...

 

Sim.

 

Eu me encarregarei de tudo.

 

De acordo.

 

Maldição, Lydia, quer me olhar? Ordenou Ross, elevando a voz. Quando ela levantou a vista, viu a exasperação cortante no rosto de Ross. Não choraria. Não o faria.

 

Olhou-lhe sem pestanejar, ocultando sua dor e desespero. Diga algo - gritou ele furioso.

 

Como esperava que reagisse quando acabava de lhe comunicar que a deixaria largada em qualquer sítio, agora que já se acostumou a viver com ele? O que queria que dissesse. Que abandonar a Lee a faria feliz? Que a faria feliz ficar só de novo, sem família, sem ninguém que cuidasse dela em um lugar desconhecido, sem meios de sustento? Claro, ele pensava que sim poderia ganhar a vida. De puta. As lágrimas foram aos seus olhos, mas não pensava proporcionar a aquele homem arrogante o prazer de regozijar-se por elas. Cuidaria de si mesmo. Já o tinha feito antes.

 

Elevou o queixo um ápice.

 

Vou procurar Lee - foi tudo que disse, antes de afastar-se a toda pressa.

 

Quando voltou para carro, Ross estava de pé junto a Lucky, já selado, dedicado a sujeitar um alforje.

 

Estarei ausente um ou dois dias explicou. Scout e eu nos adiantaremos e jogar uma olhada. Se necessitar ajuda, chama Bubba.

 

O coração lhe deu um tombo.

 

De acordo, Ross.

 

O homem terminou de atar as correias de couro e se aproximou dela. As esporas tilintavam a cada passo. Aquele som alegre estava desconjurado.

 

Aplaudiu a Lee nas costas e se agachou para beijar sua têmpora.

 

Adeus, filho.

 

Lydia sentiu seu fôlego quente sobre o ombro e o pescoço. Estava tão maravilhosamente perto e cheirava tão bem, a cavalos, couro, sabão de barbear e homem.

 

Quando Ross levantou a cabeça, seus olhares se encontraram um instante. Lydia desejava uma palavra amável dele, um pequeno gesto para saber que não a desprezava. Não aconteceu nada. Ross deu meia volta, colocou o chapéu e subiu com agilidade à cadeira.

 

Estalou a língua e o robusto garanhão deu meia volta.

 

Ross se apressou a lhe chamar, e avançou dois passos.

 

Ele atirou das rédeas e a olhou -. Tome cuidado - sussurrou. Viu que os olhos de Ross se abriam de par em par sob o chapéu, Depois, assentiu e se afastou.

 

O dia era quente e todo mundo se alegrou de que a caravana não realizasse um trajeto muito longo. Sobre tudo Lydia, que tinha conduzido a parelha. Acamparam logo. Mamãe ordenou a Bubba e Luke que recolhessem lenha.

 

Tenham pressa, para que possa começar a preparar o jantar. Lydia jantará conosco. Parece-me que está um pouco esgotada, e a obrigarei a deitar-se cedo.

 

Os meninos já se afastavam bastante do acampamento quando Bubba puxou Luke para que se detivesse.

 

Tenho que te fazer uma proposição - sussurrou.

 

Luke tirou o chapéu e secou o suor de sua testa.

 

Qual? Perguntou com desconfiança.

 

Você gostaria de te ocupar dos cavalos de Ross esta noite? Dar de comer e escovar, tudo.

 

A idéia era atrativa. Ainda tinha ciúmes da amizade de seu irmão com o homem ao que ambos idolatravam, mas tanta generosidade devia ter seu preço.

 

O que tenho que fazer?

 

Terminar de recolher a lenha e se esquecer de onde me viu da última vez quando Mamãe o pergunte.

 

Luke entreabriu os olhos e examinou ao seu irmão com desconfiança. Bubba se tinha escovado o cabelo e levava uma camisa limpa.

 

Como me esqueci de ontem à noite? Vai se encontrar outra vez com Priscilla, verdade?

 

Não é teu problema. Quer fazer o trato ou não?

 

Luke riu ao advertir o nervosismo de seu irmão.

 

Não me apresse, caralho. Deixe-me pensar um momento

 

Acariciou o queixo. Bubba fechou os punhos, mas conteve sua ira. Zangar-se não lhe serviria de nada. Só aumentaria a teimosia de Luke.

 

Bem, eu me encarrego do trabalho e mantenho a boca fechada, e você me dá a navalha que comprou ao mascate. O que te parece?

 

Uma merda - a soprou Bubba. Não é justo. É uma navalha nova.

 

Luke encolheu os ombros.

 

Parece que não tem muita vontade de se deitar com essa garota.

 

Deu as costas a Bubba e se afastou com ar indiferente.

 

Espera! Gritou Bubba, enquanto corria atrás dele. Não me neguei. Só penso que é um fodido estelionatário.

 

Um brilho travesso iluminou nos olhos de Luke.

 

Um homem de negócios corrigiu, e deu uns golpes na têmpora com o dedo indicador. E aceitarei minha navalha nova agora, obrigado.

 

Bubba, enfurecido, deu-lhe a navalha. Se Priscilla não lhe houvesse dito que fosse pontual, teria ensinado aquele mucoso quem era o mais preparado dos dois. Bubba apontou com o dedo ao seu irmão.

 

Lembre-se. Não me viu.

 

Que passe bem - disse Luke. Ah, Bubba, uma coisa mais. Contarár-me tudo, verdade?

 

Isso não se faz.

 

Nesse caso, talvez recorde que te vi passeando pelo bosque com a Pris...

 

De acordo, contarei. Tenho que ir.

 

Encaminhou-se para o lugar do encontro, enquanto Luke ria dele.

 

Priscilla estava ofendida. Tinha querido chegar tarde para que Bubba se perguntasse se ia vir. Em troca foi ela que chegou primeiro. Quando o menino se apresentou, balbuciando mil desculpas, ela jogou a cabeça para trás.

 

Bem, estou segura de que minha mãe nos localizará de um momento a outro. Fez tanto ruído como um camundongo disse, com aspereza.

 

Bubba ficou desconsolado.

 

-Sinto chegar tarde, Priscilla, mas tive que fazer um trato com o Luke.

 

Esse pequeno...

 

Esta vez não nos incomodará. Juro-lhe isso.

 

Priscilla tinha passado o dia raivosa. Scout a tinha deixado outra vez sem nem sequer despedir-se. Seu corpo estava inflamado desde ontem à noite, e embora tivesse que aplacá-lo um caipira como Bubba Langston, não desejava mais adiamentos. Apoiou a mão sobre o peito do menino.

 

Lamento me haver zangado contigo disse. É que tenho muita vontade de que volte a me beijar. Apertou mais a mão. Meu Deus, seu coração pulsa como um tambor, Bubba.

 

Sim. E o teu?

 

Priscilla levava o vestido mais apertado que tinha, de vários anos atrás. Sua mãe tinha ameaçado jogá-lo fora repetidas vezes, mas Priscilla insistia em conservá-lo. Gostava porque seus seios transbordavam do sutiã.

 

Levantou a mão de Bubba com os olhos entreabertos e a posou sobre seu seio. Apertou-a com força.

 

Comprova-o você mesmo sussurrou.

 

Bubba se tornou altivo. Tinha caído na conta de que Priscilla podia burlar-se de um homem. Durante todo o dia, seu corpo se excitava ao pensar nela e na receptiva que se mostrou a noite anterior. Aquela manhã, quando se aproximou dele para lhe propor que se encontrassem, enquanto Mamãe estava distraída, Bubba tinha decidido que já não a deixaria tomar a iniciativa. Ross Coleman não permitiria que uma mulher lhe manipulasse daquela maneira. Se desejasse a uma mulher, tomaria. Bubba queria fazer tudo como Ross.

 

Agora, ante a surpresa de Priscilla, o moço a empurrou sobre a erva e lhe desabotoou com rapidez o vestido, tirou-lhe a regata e acariciou seus seios. Sorriu agradado quando seus mamilos avermelhados floresceram e se endureceram. Deitou-se ao seu lado e sacrificou uma mão para afrouxar as calças.

 

Depois a beijou, introduziu a língua em sua boca, ao tempo que esfregava o membro contra suas saias e brincava com seus seios. Priscilla começou a pensar que, ao final, não tinha feito uma eleição tão má. A agressividade recém descoberta de Bubba a excitava. Acrescentava um elemento de perigo ao que estavam fazendo, como se o moço fosse enlouquecer a qualquer momento.

 

Ela conseguiu liberar-se de suas calças interiores, agarrou o membro duro e pulsátil, e lhe guiou. A boca de Bubba percorria os seus seios, beijava, lambia, emitia ruídos animais.

 

Não! Exclamou, quando ela começou a lhe friccionar. Quero fazê-lo.

 

Colocou-se sobre ela e perfurou sua carne. A moça se arqueou instintivamente e gritou, mas não demorou em compassar seus movimentos com os de Bubba. Pela mente deste não passou nem por um momento a idéia de prolongar o prazer. Ao cabo de um instante, estalou em seu interior e se esvaziou de todo o desejo que lhe tinha atormentado durante meses.

 

Maldição, Bubba - grunhiu Priscilla. Agüentaste muito pouco.

 

Ele não a ouviu, não ouviu nada. Limitou-se a continuar deitado sobre ela, pensando que aquilo era o melhor que podia passar a um corpo, e que assim que se recuperasse voltaria a fazê-lo. E voltaria a fazê-lo. Morria de vontade de presumir disso ante Luke.

 

Ross emprestava pouca atenção ao seu entorno enquanto cavalgava junto ao Scout, que era taciturno e insolente, e recordava Ross de uns anos antes. Não gostava do jovem, mas tinha acessado a lhe acompanhar para poder pensar, para não ter que olhar Lydia e recordar quão maravilhosa tinha sido a noite e quanto a desejava de novo. Só se ela desejava-o. Nunca mais voltaria a tomá-la pela força.

 

«Violação.» Meu Deus! Fez muitas coisas em sua vida das que se envergonhava, mas nunca tinha forçado a uma mulher. Tinha matado homens, muitos. Tinha sido um ladrão que não havia sentido o menor remorso por roubar. Tinha assolado propriedades. Mentido. Enganado. Mas nunca havia se sentido tão enfurecido consigo mesmo como então.

 

O que te parece se acamparmos aqui? –perguntou Scout.

 

Estupendo - acessou Ross, e puxou as rédeas.

 

Irei procurar água enquanto você acende o fogo. Não sei muito cozinhar. Se o fizer você, eu lavarei os pratos.

 

Ross assentiu enquanto desencelava Lucky. Preparou metodicamente o acampamento, algo que tinha feito mil vezes em sua época de fugitivo. A divisão do trabalho, as brigas, as maldições pela má sorte, os planos para o seguinte grande golpe, as brigas entre camaradas, eram lembranças familiares. E durante todos aqueles anos de farras com os foragidos mais depravados, jamais tinha violado a uma mulher.

 

O ciúme o corroeu quando a viu com Hill, embora o sentido comum lhe dissesse que, até no caso de que Lydia estivesse predisposta, o código de honra de Hill nunca lhe permitiria tomar à mulher de outro homem. Aquela manhã, antes de partir, Ross se tinha desculpado, perguntado a Moisés pela saúde de seu amo e sugerido lhe aliviar de algumas tarefas para que pudesse cuidar de Winston, quem tinha dado seus mais efusivos agradecimentos através de Moisés.

 

Mas não podia compensar Lydia. Estava muito envergonhado. Era incapaz de lhe oferecer suas desculpas. Face ao que tivesse sido, agora era sua mulher e, na prática, a mãe de seu filho. Ela tinha se negado, mas não lhe tinha importado. Havia a possuído e forçado como um selvagem.

 

Tinha sido maravilhoso despertar ao seu lado pela manhã. Só que, imediatamente, recordou o ocorrido de noite. Quando viu os hematomas em seus pulsos e braços enquanto cobria os seus seios indefesos, quando viu sobre suas coxas os restos ressecados de sua violação, junto com o sangue, sentiu-se mortificado.

 

Nem sequer se tinha parado a pensar que estaria quase tão apertada como uma virgem depois de dar a luz. Seria um milagre que não lhe tivesse ocasionado lesões permanentes. Amaldiçoou-se enquanto agitava a frigideira de feijões. Possivelmente as lesões não teriam cura. Possivelmente naquele mesmo momento estaria sangrando sem remédio.

 

Cheira bem - comentou Scout. Ajoelhou-se junto ao fogo e se serviu de uma xícara de café.

 

Quando quiser.

 

Ross se recostou contra uma árvore e contemplou o pôr-do-sol. Quando tinha ido, Lydia parecia abatida, mas não doente. Por sorte, não a tinha maltratado com excesso.

 

Era lógico que ela teria olhado com cautela quando. Ele tinha procurado um brilho de perdão em seus olhos. Para Ross teria bastado que ela tivesse feito o menor protesto de que era muito cedo para falar de divórcio, pois só tinham casados umas poucas semanas. Entretanto, Lydia tinha se limitado a lhe olhar com aqueles olhos que podiam ser tão alegres como a luz do fogo ou tão duros como uma pedra, segundo seu humor. O desprezo que sentia para ele era evidente.

 

Não come? Perguntou Scout, com a boca cheia de feijões.

 

Ross sacudiu a cabeça.

 

Neste momento não tenho fome. Possivelmente mais tarde.

 

Que caralho importava se lhe perdoava ou não? Era uma puta. Seguro que já a tinham maltratado em anteriores ocasiões. Por que devia preocupar-se com isso?

 

«Porque tinha medo de ti, bastardo. Sabia, mas não fez conta.

 

»Poderia haver resistido mais.

 

»Resistiu tudo o que pôde. Prestasse atenção nela? Uma rajada de vento forte poderia derrubá-la. Que possibilidades tinha contra um bruto como você?

 

»Bom, ela o buscou.

 

» Ser violada?

 

»Pode ser que ser violada não, mas o informou que o desejava quando se esfregava contra ti, você fazia pequenos favores e se arrumava o cabelo como se acabasse de dar a queda mais satisfatória. E todos esses pedaços de carne que deixa ver?

 

»Acidente.

 

»Seriamente?

 

»Acredito que sim.

 

»Tinha pensado assim em Vitória alguma vez? Até o ponto de acreditar que se não a via, se não a tocava, se não faziam amor, explodiria?

 

»Não me lembro.

 

»Sim, lembra-se. A resposta é não. A amava, mas ela não usurpava todos seus pensamentos, e isso é o que na verdade o preocupa, não era certo? Foi dez vezes melhor com essa garota que antes com sua mulher. Com qualquer mulher. Era incapaz de esquecê-lo.

 

»Farei-o.

 

»Duvido-o. Só de pensar nisso, ficava dura como uma viga.

 

»Sim, sim, sim! Foi fantástico e o desejo outra vez. O que vou fazer, maldição?»

 

É estupendo afastar uns dias desses caipiras desgraçados- comentou Scout.

 

Sim - foi a lacônica resposta de Ross.

 

Seria à hora de jantar. Ela estaria inclinada sobre o fogo e o calor avermelharia suas faces. Ele sairia de atrás do carro depois de lavar-se, olhariam-se, ela umedeceria os lábios como sempre que ficava nervosa.

 

A pequena Watkins está me enlouquecendo. Uma ninfomaníaca, disse Scout, enquanto cortava um cilindro de tabaco. Ofereceu a Ross, que negou com a cabeça. Sabe o que fez?

 

O que? Perguntou Ross, que nem sequer sabia do que estavam falando.

 

Deus, mergulhar no corpo de Lydia tinha sido como encontrar-se em casa pela primeira vez em sua vida. Sua intenção tinha sido possuí-la com rudeza, rapidez e de forma desapaixonada, mas uma vez dentro dela, descobriu que não podia. A sensação era muito boa. Acaso lhe tinha rodeado as costas com os braços, ou ele queria recordá-lo assim?

 

Scout continuava o relato de suas aventuras eróticas.

 

Bom, atirei-me isso várias vezes, e agora começou a falar de bodas, meninos e tudo isso. Lançou uma risada. Direi-te uma coisa, tem um caralho escuro como um demônio. Provaste alguma vez esse favo? Não, claro que não, sobre tudo com esse suculento pedaço de carne com quem te casaste, que te espera cada noite.

 

Ross se moveu à velocidade do raio. Chutou o peito de Scout com os calcanhares de ambas as botas e lhe enviou rodando para trás. Antes que o homem se recuperasse, Ross caiu sobre ele, plantou o joelho na base de sua espinha dorsal e arqueou seu corpo com o braço debaixo de seu queixo. Scout ouviu o estalo sinistro de uma pistola ao ser martelada. Como demônios a tinha tirado Ross de sua capa? Scout nunca saberia.

 

Tem algo mais que dizer a respeito de minha mulher? Perguntou Ross. Seu tom suave aterrorizou Scout muito mais que a rapidez mortífera com que tinha desencapado a pistola.

 

Não..., não gaguejou. Não quis ofendê-la. Juro por Deus que não... Ai! Uivou, quando Ross aumentou a pressão de seu joelho e braço. Juro por Deus que não pretendia lhe faltar o respeito.

 

Pouco a pouco, a presa mortal se afrouxou. Ross ficou em pé lentamente, e embainhou a pistola.

 

Acredito que agora sim tenho fome - disse, com uma voz tão fria e metálica como o comprido canhão de sua arma, que Scout ainda sentia fazendo cócega em sua nuca.

 

O jovem se foi tranqüilizando e viu que Ross se servia com indiferença em seu prato de lata. Scout nunca tinha pensado que Coleman era como outros membros da caravana. Agora estava seguro disso. Aquele homem ocultava mais coisas das que ninguém suspeitava, e ele não albergava o menor desejo de descobrir.

 

A expressão de Mamãe era tão dura como uma pedra quando Bubba entrou com olhos sonhadores no círculo de luz. Seus pés logo que tocavam o chão. Estava flutuando em um estado de euforia.

 

Pode-se saber onde estava?

 

A ensurdecedora voz de Mamãe reduziu a pedacinhos sua sensação de bem-estar e lhe devolveu à realidade.

 

Oi?

 

Vou açoitar aos dois - disse Mamãe, e agitou uma amedrontadora vara de salgueiro ante a cara da Bubba. Faz horas que lhes enviei a procurar lenha e não lhes vi o cabelo após. Onde está o inútil de seu irmão? Poderia açoitar aos dois ao mesmo tempo.

 

Luke não tornou?

 

A Bubba estava custando muito centrar-se. Priscilla não só tinha secado seu corpo, mas também parecia ter espremido todo seu cérebro. Quando compreendeu que Luke não tinha completado sua parte do trato, ficou quase tão lívido como Mamãe.

 

Não, não retornou. A que se dedicou os dois?

 

Eu... Nós... fomos procurar lenha e Luke disse que a traria.

 

Pois não o fez, e tive que enviar ao seu esgotado pai a procurá-la. E bem?

 

Disse que ia... Já sei... Com certeza está no curral, com os cavalos do senhor Coleman... Disse...

 

Não, não está ali. Enviei Marynell a dar uma olhada, e Lydia está se ocupando desses cavalos. Atlanta disse que Luke não está no acampamento. Se está encobrindo alguma de suas travessuras...

 

Voltou a agitar a vara.

 

Bubba rogou a Deus que Priscilla não lhes estivesse escutando. Riria dele. Atuando toda a tarde como um homem e receber umas palmadas de noite como um menino.

 

Não, Mamãe, juro-te que...

 

Bubba se interrompeu quando advertiu que Mamãe já não lhe escutava. De repente, tinha solto a vara que sacudia. Levou a mão avermelhada e calejada à boca, e Bubba, pela primeira vez em sua vida, viu que as faces de sua mãe empalideciam, enquanto o separava de um empurrão e avançava cambaleante.

 

Senhora Langston - disse Moisés em voz baixa – eu o encontrei no bosque.

 

Levava nos braços ao Luke, que parecia surpreendentemente pequeno e infantil. Havia um lenço preso ao redor da garganta do moço, mas a brecha da navalhada era visível. Tinha a camisa rígida, pegajosa, vermelha, empapada em sangue que se secou com rapidez por causa do calor do verão.

 

Bubba desabou contra a roda do carro de sua família e começou a vomitar.

 

Lydia contemplou o buraco quadrado aberto na terra e se negou a acreditar que o vulto envolto em um edredom que descansava no fundo fosse o alegre e peralta Luke Langston. Os membros da caravana se erguiam sombrios e silenciosos, enquanto o senhor Grayson oficiava a breve cerimônia fúnebre. Era a segunda morte que se produzia do início da viagem. Não havia ataúde. Não tinham tido tempo de fabricar ou comprar um.

 

Lydia deixou que as lágrimas escorregassem sobre suas faces sem tentar as secar. Por sorte Lee estava quieto e calado em seus braços. Talvez intuísse a tragédia da situação, a tensão dos adultos que lhe rodeavam?

 

Lydia ignorava como podia Mamãe Langston manter-se tão serena. Apresentava o aspecto de cada dia, seu escasso cabelo recolhido para trás, vestida com roupas de chita e o perpétuo avental. Estava muito erguida, e seu rosto era uma máscara carente de toda expressão. Tinha as mãos enlaçadas sobre sua cintura deformada. Só a branca rigidez de seus nódulos delatava sua dor. A família estava congregada ao seu redor. Zeke, curvado, parecia muito mais velho que no dia anterior. Anabeth tentava imitar a dignidade de sua mãe, mas as demais garotas, abraçadas entre si, choravam sem cessar. Samuel parecia perplexo, ao bordo das lágrimas. O pequeno Micah, que não entendia nada, estava ao lado de sua mãe, obstinado a sua saia, e contemplava com ar solene a cerimônia.

 

Mas Bubba, Bubba era o que dava mais pena. Seus olhos estavam afundados como se fosse ele o que estivesse na tumba. Estava bastante mais pálido que o cadáver, lavado e envolto cuidadosamente para o enterro. Se a cara de Luke se via plácida na morte, a de seu irmão maior estava estragada pela dor e o desespero.

 

Esses dois meninos eram muito unidos – murmuravam as pessoas.

 

Demorará muito tempo em deixar de sentir falta de Luke.

 

O senhor Grayson terminou de ler o Salmo 23 e fechou a Bíblia encadernada em pele. Pigarreou.

 

Quando quiser, Mamãe...

 

Mamãe se agachou, agarrou um punhado da terra que tinham extraído para cavar a tumba de seu filho e a pulverizou sobre o cadáver.

 

Filhos - disse.

 

Um a um, os irmãos e irmãs de Luke Langston se aproximaram do bordo da tumba para arrojar um punhado de terra. Quando chegou o turno de Bubba, este contemplou o buraco na terra com olhos muito consternados e uma expressão muito triste para poder chorar. Lançou um grito de angústia, deu meia volta e correu entre as pessoas reunidas em torno da tumba. Mamãe o seguiu com o olhar, com expressão tão desolada como a do moço.

 

Zeke - disse, e puxou seu marido pelo braço.

 

Zeke se removeu, agarrou mecanicamente um punhado de terra e deixou que caísse na tumba como se carecesse de importância para ele.

 

A família aguardou com ar solene enquanto todos outros desfilavam ante eles para repetir o ritual e iniciavam uma lenta e triste procissão para o acampamento.

 

Ao cabo de pouco momento, só acompanhavam aos Langston Lydia e o senhor Grayson.

 

Fiquem o tempo que desejar. Não acredito que ninguém tenha vontade de viajar hoje. Enviarei a alguns homens indicou a tumba aberta, quando vocês se retiraram.

 

Mamãe assentiu.

 

Lydia deu um abraço a cada um dos Langston e depois deixou que o senhor Grayson lhe acompanhasse para os carros. Sentia falta de Ross. Se ele estivesse ao seu lado, talvez pudesse suportar a idéia da morte brutal de Luke. Ross ajudaria a Bubba a superar o horror de ver assassinado ao seu irmão de uma forma absurda e cruel.

 

Sentia uma imensa dor pela perda de Luke. Apreciava-o por seu senso de humor e seu caráter travesso, sua vontade de viver, sua mente vivaz. Desejava chorar por sua morte inútil. Desejava que Ross a abraçasse enquanto chorava.

 

Mas ele se foi, e ela tinha que ser forte para ajudar Mamãe e Zeke. Nunca poderia lhes recompensar o bastante por havê-la acolhido quando ninguém mais o teria feito, mas podia lhes ajudar a superar a tragédia.

 

Quando retornou ao acampamento, Lydia compreendeu imediatamente que o assassinato de Luke teria sérias repercussões, à margem da dor por sua perda. A noite anterior, depois de que Moisés trouxe o corpo, já era muito tarde para enviar um cavaleiro em busca de um agente da lei. A cidade com xerife mais próxima se encontrava a trinta quilômetros, teria que atravessar um território desconhecido, e ninguém queria ver-se misturado com as tropas federais que ainda ocupavam Arkansas.

 

O senhor Grayson tinha enviado um mensageiro antes que amanhecesse. Já tinha retornado, e informado aos ávidos e inquietos ouvintes de que o xerife não estava disponível, pois se encontrava na zona mais afastada do condado e não voltaria até passados uns dias. O ajudante se negou a abandonar o escritório.

 

Não têm notícia de crimes similares por estas paragens explicou com gravidade o senhor Sims. Disse que..., hummm..., pensássemos em alguém da caravana...

 

Insinuou que um de nós tenha assassinado ao menino? Perguntou Grayson.

 

Sims retorceu entre os dedos a brida de seu cavalo.

 

Mais ou menos. Eu lhe disse que não estava de acordo, mas...

 

Bem, eu estive dando voltas ao assunto interrompeu com voz estridente Leoa Watkins. Quando todos os olhos se voltaram para ela, cobriu-se com o xale, elevou os ombros com arrogância e deixou que a tensão crescesse. Ontem vi alguém rondando pelo bosque. Não suspeitei nada até que o menino dos Langston apareceu morto, mas agora acredito que é meu dever como cristã denunciá-lo.

 

Jesse, seu marido, passeou um nervoso olhar em torno dele. Lydia sempre tinha pensado que o homem tinha tanto medo de sua sombra como de sua mulher. A julgar por sua expressão, teria preferido que a mulher mantivesse a boca fechada. Priscilla, ao seu lado, só manifestava aborrecimento.

 

Leoa, você não sabe...

 

Cale-se, Jesse ordenou a mulher, e seu marido se acovardou. Esta gente tem que saber se está dando proteção a um assassino.

 

Todo mundo se estremeceu, inclusive Lydia.

 

Senhora Watkins, não pensará que alguém desta caravana matou Luke disse o senhor Grayson.

 

Os olhos de furão de Leoa percorreram o círculo das pessoas. Tinha a todo mundo onde desejava, atendido pela intriga.

 

Quem lhe trouxe, né? Coberto de sangue.

 

Moisés? Exclamou Lydia. Está acusando Moisés de assassinar Luke?

 

Não necessitamos a intromissão de forasteiros - replicou Leoa, sem dignar-se a olhar Lydia. Em troca, desviou seus olhos duros e carentes de cor para o negro.

 

Os que estavam perto dele retrocederam com sigilo e lhe olharam com desconfiança. Era como se nunca lhe tivessem visto antes, embora fizesse semanas que viajavam em sua companhia.

 

Vi-lhe ontem andar furtivamente pelo bosque, quando me dirigia ao rio - sussurrou em voz alta Leoa Watkins. Um brilho de maldade apareceu em seus olhos, fecundados de ódio e prejuízos. Eu digo que ele é o assassino.

 

Houve murmúrios de assentimento e o coração de Lydia se acelerou. Devia ser um pesadelo horrível e logo despertaria, despertaria com o braço protetor de Ross ao redor de sua cintura.

 

Por que quereria Moisés matar a alguém? Perguntou um homem.

 

É um antigo - escravo raciocinou Leoa, com os braços abertos. Agora que é livre, tomou gosto a matar brancos. Em algumas ocasiões, hei sentido que seus olhos escorregavam sobre mim e minha filha. Um só olhar desses olhos escuros e malvados é suficiente para te gelar o sangue nas veias.

 

Isso é ridículo! Gritou Lydia, mas o tumulto afogou sua voz.

 

Moisés lançava olhadas nervosas ao redor dele. A família Hill lhe tinha protegido durante toda sua vida, mas sabia o bastante sobre os cavaleiros noturnos que aterrorizavam aos negros libertos para estar assustado. Tinha visto multidões incitadas a linchar os negros por suspeitas imaginárias, suspeitas muito menos acusadoras que o sangrento assassinato de um moço branco.

 

Digo que lhe atemos e nós mesmos julguemos gritou Leoa. Ninguém sabe quando o xerife decidirá a vir em nossa ajuda. Enquanto isso, poderiam produzir-se mais assassinatos. Querem que Moisés ande solto entre nossos filhos? Perguntou à senhora Norwood, que estava ao seu lado.

 

Esperem! Ordenou o senhor Grayson, com ambas as mãos levantadas. Todos lhe respeitavam o suficiente para deter seu avanço hostil para o Moisés e voltar a vista fazia o chefe da caravana. Ainda não escutamos Moisés. Foi ao bosque ontem? Perguntou ao negro.

 

Sim, senhor. Fui pegar ervas medicinais para preparar um chá ao senhor Hill. É bom para sua tuberculose.

 

Lydia tinha visitado Winston aquela mesma manhã. Tinha melhor aspecto. Confiava em que não ouvisse de sua cama do carro as acusações vertidas contra o seu amigo.

 

Viu o Luke Langston?

 

Não, senhor, até que lhe encontrei tal como lhe trouxe.

 

Mentiras - gritou a senhora Watkins. Vai acreditar nele? Seguro que foi pegar ervas venenosas para matar ao senhor Hill. Eu o vi, repito, rondando, como a ponto de lançar-se sobre alguma pobre alma despreparada. Jesse, trás a corda.

 

O homem se apressou a obedecer, e outros avançaram sobre o negro.

 

Tudo ocorreu de uma vez. Lydia olhou ao seu redor e deixou a Lee nos braços da senhora Greer.

 

Não lhes deixe fazê-lo - gritou ao Grayson.

 

O chefe da caravana estava assombrado de ver pessoas tão civilizada comportar-se como bárbaros. Limitou-se a contemplar a cena em silêncio. Moisés, quando viu aqueles homens enfurecidos correr em sua direção, assustou-se, deu meia volta e fugiu.

 

Escapa - gritou alguém.

 

Detenham-no!

 

Não, Moisés, não! Gritou Lydia, e saiu atrás dele, ao compreender que sua fuga equivalia a uma confissão de culpabilidade para aquelas pessoas enlouquecidas.

 

Detenha-o, Jesse. Traz a carabina gritou Leoa ao seu marido.

 

Naquele preciso momento, o cavalo de Ross apareceu de improviso e penetrou no círculo como uma flecha negra. Lucky deu meia volta assim que seus cascos tocaram o chão, de forma que a Lydia e Moisés ficaram separados dos outros. O rifle de Ross apontava à multidão, em tanto sua pistola mirava Jesse Watkins, que tinha ficado petrificado com a mão esdeitada para a carabina, tal como sua mulher lhe tinha ordenado. Todo mundo ficou imóvel, tanto por causa da surpresa como do medo. Todos quantos tiveram a desgraça de olhar aos olhos de Ross naquele momento saborearam o medo, acre e repugnante.

 

Eu se fosse você não o faria.

 

Foram as únicas palavras que pronunciou, quase em um sussurro sibilante, mas a mão de Watkins se separou da escopeta como se a corda de uma marionete tivesse atirado dela.

 

Que todo mundo fique quieto até que averigúe que caralho está passando.

 

Também eu gostaria de sabê-lo. Era a voz de Mamãe. Para ouvir o alvoroço, os Langston tinham voltado para acampamento. Mamãe experimentou um grande alívio ao comprovar que, passasse o que acontecesse, não era por causa de Bubba. O menino já não era o mesmo de antes, e aquela mudança drástica era mais profunda que sua dor.

 

Os membros da caravana estavam estupefatos. Todos consideravam Ross Coleman um homem valente, um homem que não se metia nos assuntos de outros, devoto de sua primeira mulher, e que agora dava a impressão de estar adaptando-se a ser pai e cuidar de sua nova esposa. Colaborava quando lhe pediam ajuda, mas não dava conselhos sem que o solicitassem. Jamais convidava às confidências, mas ria das brincadeiras de qualquer um e tomava um gole de uísque quando as mulheres não olhavam, como qualquer outro homem. Era um bom tipo, não tão cordial como alguns, mais arrumado que a maioria, bastante reservado, mas trabalhava duro.

 

Agora, entretanto, viam um aspecto daquele homem que lhes era desconhecido. Sua voz, dotada de uma serena persuasão, teria podido deter uma avalanche. E aqueles olhos, penetrantes como os de uma águia, eram temíveis e hipnóticos. Ninguém se moveu por temor a que Ross interpretasse mal o movimento e disparasse. Todos lhe tinham visto desencapar a pistola enquanto seu cavalo saltava entre os carros. Quase podiam acreditar que o tinham visto. O que se negavam a acreditar era que ao mesmo tempo Ross tivesse tirado o rifle de sua capa com a mão esquerda.

 

Ross desmontou sem que um músculo de seu rosto se movesse. Ainda tinha as duas armas apontadas e preparadas para disparar.

 

Lydia.

 

Sim?

 

Vem aqui.

 

Lydia nunca se alegrou mais de ver alguém em sua vida. Experimentou o impulso de correr para ele, rodear sua cintura com os braços e abandonar-se a sua força. Em troca, dirigiu um olhar tranqüilizador a Moisés e avançou até chegar ao lado de Ross.

 

-O que passou? Perguntou ele, sem apartar a vista de outros.

 

A jovem tragou saliva, temerosa de ficar a gaguejar, e depois lhe referiu o assassinato de Luke e o ocorrido aquela manhã. Ao inteirar-se da morte do moço, um estremecimento percorreu o corpo de Ross e olhou aos Langston, que seguiam agrupados. Pelo resto, não se alterou. Quando Lydia terminou de lhe explicar os detalhes principais, Ross embainhou a pistola, ao intuir que o estalo de violência se acalmou. Baixou o rifle.

 

Caminhou entre os apaziguados membros da caravana que se achavam em completo silêncio, só quebrado pelo tinido de suas esporas, e encarou o senhor Grayson.

 

Acredita que o velho Moisés é capaz de matar a alguém?

 

Não - disse o homem, envergonhado, e meneou a cabeça. O ajudante do xerife local deixou a solução do problema em nossas mãos, mais ou menos. Não soube o que fazer.

 

Eu sim sei o que vou fazer.

 

Mamãe tinha escutado a explicação de Lydia com tanta atenção como Ross. Encaminhou-se para Leoa Watkins, e sem prévio aviso a esbofeteou com todas suas forças.

 

Enterrei três filhos, e pode ser que ainda deva sepultar a outros seres queridos antes que chegue minha hora. Só peço a Deus que, nesse momento, você esteja bem longe de minha família, para não aumentar sua dor. Além de ser uma bruxa velha e malvada, é uma idiota, Leoa Watkins. Se Moisés tivesse assassinado ao meu filho, por que teria me trazido seu corpo? Ergueu-se em toda sua estatura. É você cruel e nunca conheceu a felicidade. Dá-me pena.

 

Leoa passeou o olhar pelo grupo e só viu hostilidade, quando uns momentos antes tinha visto obediência.

 

Apartou suas saias e se voltou para a carreta. Ao observar que Jesse e Priscilla tinham a vista cravada no chão, sem segui-la, carregou para eles.

 

E bem?

 

Os dois a seguiram com docilidade ao interior do carro.

 

Mamãe foi primeira a reagir. Virou-se e falou com os congregados.

 

Não me surpreende seu comportamento, mas acredito que alguns de vós deveriam se desculpar.

 

Todo mundo baixou a vista com ar culpado e começou a desfilar para as carretas. Alguns lançaram olhadas envergonhadas a Moisés, quem se erguia com tranqüila dignidade, mas sem altivez.

 

Lydia recuperou Lee e se aproximou do negro.

 

Sinto muito, Moisés. Foi horrível o que lhe fizeram. Encontra-se bem?

 

Estou bem, senhorita Lydia. Obrigado por me defender.

 

Ela sorriu e lhe tocou o braço.

 

Não foi mais do que Winston e você fizeram por mim quando eu era a proscrita. Se esta tarde cuidar de Lee um momento acrescentou, farei o jantar para você e Winston.

 

O gesto pretendia insuflar confiança, e o obteve. Os olhos do velho se encheram de lágrimas.

 

Obrigado. O agradecemos muito.

 

Sentiu a presença de Ross detrás dela e se voltou.

 

O café te espera no carro - disse em voz baixa.

 

Ross a olhou e Lydia experimentou a sensação de que estava esquadrinhando sua alma.

 

Irei assim que tenha dado os pêsames aos Langston.

 

Lydia não queria afastar-se dele nem um momento. Queria lhe olhar, assegurar-se de que havia voltado e a olhava como se tivesse tido saudades, mas se ficava com ele um segundo mais, Ross possivelmente leria em seus olhos a tormenta que açoitava o seu coração. Deu meia volta a toda pressa.

 

Quando Ross entrou no carro, um momento depois, seu cansaço era patente. Agradeceu com uma sacudida de cabeça a xícara de café que lhe deu e se deixou cair em um tamborete.

 

Grande confusão encontrei ao voltar.

 

Pensava que se ausentaria vários dias.

 

A indiferença de sua voz era adquirida. De fato, ardia em desejos de saber por que havia tornado Ross antes do previsto à caravana.

 

E eu, mas... encolheu-se de ombros. Decidi retornar antes que amanhecesse. Scout continuará explorando.

 

Por que não o dizia de uma vez? Por que não confessava que lhe era impossível manter-se afastado dela por mais tempo, que ontem à noite não tinha parado de dar voltas em suas mantas, até decidir que tentar dormir era uma perda de tempo? Tinha recolhido suas coisas e selado o cavalo, despertado a um surpreso e adormecido Scout para lhe dizer que trocava de planos, e depois retornado ao seu lado o mais depressa possível.

 

Alegro-me que voltou a tempo.

 

Lydia não tinha nada que fazer com as mãos. Lee dormia. Tinha terminado as tarefas matutinas. O melhor que podia fazer com elas era eliminar com massagens o cansaço que derrubava os ombros de Ross, apagar com dedos acariciantes as rugas que sulcavam sua testa. Ardia com o desejo de lhe tocar, mas não o fez. Enlaçou as mãos.

 

Ross contemplou a xícara enquanto dava voltas ao líquido.

 

Não posso acreditar que alguém tenha matado a sangue frio a esse pequeno. Por quê? Por que, maldição?

 

Não sei, Ross. O que vai fazer o senhor Grayson?

 

Acredita que deveríamos dedicar o dia de hoje a dar uma olhada pelos arredores, se por acaso encontramos alguma pista sobre a identidade do assassino.

 

Deveríamos? Perguntou com voz trêmula a jovem.

 

Ofereci-me como voluntário.

 

Ah.

 

Lydia se sentou no outro tamborete em frente a ele e apertou as mãos com força. Tinha visto o cadáver de Luke, a navalhada que quase lhe tinha separado a cabeça do tronco. Estremeceu-se.

 

O que crê que encontrarão?

 

Nada - foi a lacônica resposta de Ross. Ela o contemplou fascinada enquanto ele revisava metodicamente a pistola e o rifle. Podem ser índios, mas duvido que haja tribos de guerreiros tão ao este. Além disso, não foi uma morte nobre, para conseguir comida ou algum propósito definido. Foi pelo puro prazer de matar. Nesse caso, pode ser algum renegado com o que Luke se topou. Há milhares deles rondando pelo Sul da guerra, enfrascados em sua luta particular, dedicados a vingar-se por sua conta, que descarregam seu ódio sobre pessoas inocentes como Luke. Este tipo de assassino é hábil, acostumado a matar e desaparecer. A estas alturas, já se encontrará a muitos quilômetros de distância.

 

Por que tem que ir você em sua busca?

 

As mãos de Ross se imobilizaram. Levantou a cabeça. A angústia que tinha captado na voz de Lydia era autêntica.

 

Por que defendeu Moisés, te expondo a receber um balaço?

 

Lydia apartou a vista de seu olhar inquisitivo.

 

Claro que deve ir –murmurou. Mas não deixe que te ocorra nada, quis suplicar. Quis dizer que parece cansado.

 

Sim. Esta manhã cavalguei muito.

 

Para ver-te. Para cheirar seu cabelo, que inclusive em um dia triste como o de hoje cheira a luz do sol. Para comprovar se seu corpo é real ou só uma quimera que me tem enfeitiçado. Para ouvir sua voz.

 

Enquanto se levantava, embainhou a pistola. Lydia não deixou de observar a destreza com que o fazia, ou o gesto automático de atar a pistola à coxa com correias de couro. Colocou o chapéu, inclinado sobre a testa, e agarrou o rifle.

 

Não me espere até depois de obscurecer disse, enquanto calçava as luvas de pele.

 

Lydia esqueceu que desejava manter em segredo suas emoções e correu para ele. Apoiou as duas mãos sobre seu braço, que estava cruzado sobre seu estômago para sustentar o rifle.

 

Ross, irá com cuidado?

 

Quando se tinha preocupado alguém por ele assim? Em toda a sua fodida vida, quando se tinha preocupado alguém por sua segurança? Inclusive Vitória tinha dado por sentado que sabia cuidar de si mesmo. Se alguém necessitava amparo era ela, não ele. Quando lhe tinha devotado alguém com tanta preocupação aparente, não pelo que significava para ambos se sobrevivia ou não, a não ser com preocupação exclusiva por sua segurança?

 

Pensou na noite que tinha passado sonhando com ela, nas horas que tinha estado cavalgando sem descanso, para voltar para o seu lado. Pensou na ânsia que embargava o seu corpo por estreitar-se com o de Lydia uma vez mais..., e o mal que o tinha passado tentando esquecer seu esplendor.

 

Estava lhe olhando com aqueles olhos que lhe recordavam o uísque de melhor qualidade. Seu cabelo pedia a gritos que o separasse de suas faces. Sua boca estava úmida, convidativa, como se desejasse ser beijada.

 

Por Deus todo poderoso, podia-se permitir lhe dar um beijo.

 

Diante de Deus, de Leoa Watkins e de qualquer um que queria olhar, agarrou sua cabeça pela nunca e a elevou para ele. Procurou sua boca com ternura. Degustou-a até que notou os lábios dóceis, deslizou a língua entre eles e a afundou naquela doce caverna, que se fechou ao seu redor.

 

Lydia se sentiu débil. Só pôde pensar em quão maravilhoso era compartilhar aquela intimidade com ele. Deixou as mãos onde estavam, sobre o braço preso entre seus corpos, mas se apertou mais, até afundar os nódulos nos músculos de seu estômago.

 

A língua de Ross se mergulhou repetidas vezes em sua boca, a base de deliciosas incursões. Lydia escutou seu próprio murmúrio de desejo e necessidade. Experimentou o poderoso impulso de separar os joelhos e enlaçar com elas a Ross. Esmagou suas pernas contra as dele.

 

O peso de seus seios sobre o braço deixou Ross tonto. Quis soltar o rifle, levá-la no colo até o carro, vê-la nua, acariciá-la com ternura, esquecer tudo, exceto perder-se nela de novo, mas não podia, de forma que se economizou mais penalidades.

 

Apartou-se lentamente. Primeiro extraiu a língua de sua boca, mas se deteve brincar com seu lábio superior. Depois roçou sua boca com os lábios e o bigode. Finalmente se soltou, abriu os olhos e viu um olhar tão sonhador e confuso como devia ser o seu.

 

Irei com cuidado - disse com voz rouca. Depois liberou o braço de suas mãos, soltou os cachos que seu punho aprisionava na nuca de Lydia e partiu.

 

Esteve fora o resto do dia e não retornou até bem entrada a noite. Lydia passou quase toda a jornada com os Langston. Mamãe abraçava aos seus filhos, que não deixavam de chorar. Era uma cena maravilhosa e terrível ao mesmo tempo. Lydia não teve nenhum ombro sobre o que chorar quando sua mãe morreu. Ao menos os Langston podiam ajudar-se mutuamente a suportar a pena. Zeke encontrava consolo no trabalho; de vez em quando, aproximava-se de Mamãe e apoiava uma mão nodosa sobre seu ombro, sem necessidade de dizer nada. A família compartilhava a dor.

 

Todos exceto Bubba. Ele estava sentado sozinho não muito longe da carroça, mas isolado de todos outros. O coração de Lydia se partia cada vez que o olhava. Luke e ele sempre discutiam, mas se amavam. A dor de Bubba aterrorizava a Lydia. Absorvia ao moço. Até o ponto de que esqueceu cuidar dos cavalos de Ross.

 

Lydia se encarregou dos animais. Era exaustivo, mas experimentou a grande satisfação de fazê-lo por Ross. Tentou separar de sua mente o beijo da manhã. Quando não o obtinha, seus joelhos se liquidificavam, avermelhava e todo seu corpo se punha a tremer. Teve vontade de tocar os seios, de esfregá-los até que os mamilos, propensos a endurecer, relaxassem. Sua virilha ardia cada vez que pensava na boca de Ross sobre a sua, na energia que havia sentido crescer entre suas coxas. Pensou nele sem camisa, nas constelações que desenhava o seu pêlo sobre os músculos duros de seu peito. Especulou sobre como seria o resto de seu corpo, e seu rosto avermelhou de vergonha; mas não podia apartar aquele pensamento, e a intervalos voltava para suas fantasias.

 

Por mais que o tentasse, Lydia não podia esquecer a sensação de o ter dentro, grosso, duro, quente e pulsátil. Não podia esquecer as sensações que a tinham invadido cada vez que Ross a penetrava. Mamãe estava no certo. Com o homem correto, era fantástico.

 

Moisés foi visitá-la ao anoitecer, e perguntou com acanhamento se havia dito a sério de lhes preparar o jantar se ele cuidava de Lee no ínterim. Ela reafirmou e o enviou a passear com Lee pelo acampamento enquanto fritava massa de farinha de milho em gordura de bacon para acompanhar o guisado de coelho que cozia desde a primeira hora da tarde.

 

Quando Moisés, Lee e ela foram ao carro de Hill, ficaram surpreendidos ao ver Winston sentado fora e bebendo Xerez. Lydia declinou a taça que lhe oferecia, mas comentou sua boa saúde aparente.

 

Sinto-me muito melhor. Provou o guisado e se desfez em elogios. Lydia, Moisés me contou o ocorrido esta manhã disse, quando terminou de comer e apartou o prato. Não culpo a ninguém. Sei como começam estas coisas, como gente, pelo geral pacífica, deixa-se apanhar nelas. Não obstante, quero te agradecer com todo meu coração por defender Moisés em minha ausência.

 

Lydia baixou a vista, afligida.

 

O agradecimento é desnecessário. Os dois são meus amigos.

 

Um ex-escravo e um tuberculoso. Moisés, acredito que a uma moça tão adorável não custaria nada encontrar amigos muito mais apresentáveis que nós.

 

Lydia fez coro às suas gargalhadas, mas pouco sabiam que eles se contavam entre os escassos amigos que tinha tido em sua vida.

 

Ross retornou a carroça tarde, mas Lydia seguia acordada. Tinha escutado a chegada dos homens, e esperou até que lhe ouviu fora. Aproximou-se da parte posterior do carro.

 

Ross? Chamou em voz baixa.

 

Sinto haver despertado.

 

Encontraste quem matou Luke?

 

Seguiu um longo silencio. Ross suspirou.

 

Não. Foi como eu pensava. Nem acampamento, nem rastros, nada.

 

Dispôs-se a estender as mantas para dormir.

 

Por que não dorme dentro? Perguntou ela, vacilante. Se subirmos os lados, fará tanto afresco como fora. Ross não respondeu. Sei que está cansado.

 

Muito.

 

Então será melhor que descanse aqui.

 

Ross o duvidava seriamente, mas subiu ao carro de todos os modos. Assim que Lydia viu que tinha aceito sua sugestão, voltou para o seu colchão, para que não pensasse que esperava algo. Entretanto, rezou por isso... Viu que tirava a camisa e as botas e se deitava ao outro lado do carro.

 

Como está Lee? Hoje não o vi muito.

 

Lydia ocultou a decepção de que não se deitou ao seu lado.

 

Enredou os dedos no meu cabelo e pensei que não conseguiria tirá-los se não me arrancava a cabeça.

 

Ross riu. Um som agradável e confortante na escuridão.

 

Já imagino onde terá sido.

 

Maldição, não tinha querido dizer aquilo. As palavras flutuaram no ar da noite, enquanto ele continha o fôlego e esperava não havê-la ofendido.

 

Lydia, sensível a sua aparência pouco convencional, interpretou mal o comentário.

 

Sei que meu cabelo é... diferente..., indisciplinado. Não é como... barba de milho.

 

«Não é como o de Vitória», pensou.

 

É muito bonito – disse Ross em voz baixa. Flexionou os dedos e recordou a sensação daqueles cachos vermelhos quando se encrespavam ao seu redor.

 

Obrigado - sussurrou ela. As lágrimas se amontoaram em seus olhos. Tinha-lhe dedicado muito poucos elogios. Entesouraria aquele.

 

De nada.

 

«Fodido hipócrita - pensou Ross para si. Está aqui deitado, recitando frases educadas, quando está pensando em quão maravilhoso foi estar com ela, e em quanto você gostaria de ter outra desculpa como a embriaguez para repeti-lo.»

 

Boa noite disse tenso e irritado consigo mesmo, e lhe deu as costas.

 

Seguiram deitados longo momento na escuridão, sabendo que tanto o um como o outro seguiam acordados, mas não se diziam nada. Face ao cansado que sentia Ross, seus olhos pareciam cheios de areia cada vez que tentava fechá-los para dormir. Por fim ouviu a suave respiração de Lydia e soube que adormeceu.

 

«Isto não é bom», pensou enquanto voltava a trocar de posição, com a esperança de amansar à parte de seu corpo que se empenhava em lhe manter acordado. Seu sexo estava duro e zangado com ele por seu estúpido rechaço auto imposto. Durante as largas e escuras horas da noite, Ross também começou a pensar que era uma estupidez.

 

Ela tinha um passado. Ele também. Ela não se parecia em nada com Vitória. Era completamente diferente em muitos aspectos. Estavam casados legalmente. Instáveis que eram os governos locais nos últimos tempos, obter o divórcio seria bastante difícil. Talvez seguissem casados durante muito tempo. O que ia fazer? Viver como um monge ou comprar mulheres por horas?

 

Pensou na noite solitária em Owentown e compreendeu que não desejava algo semelhante.

 

Desejava Lydia.

 

E talvez, quando a possuísse, superaria aquela fixação. Ele estava bêbado a noite que tinha feito amor com ela. Possivelmente por isso sua imaginação o fazia recordar aqueles momentos de uma forma mais agradável do que em realidade tinham sido.

 

A quem tenta enganar? Ninguém esteve bêbado até esse ponto.

 

Mas era uma boa desculpa para tentar convencer-se, com todas suas forças, de que devia aproximar-se dela, depertá-la a beijos e...

 

Não. Lydia pensaria que só desejava isso dela. E por mais que seu corpo o ansiasse, não era quão único ele necessitava. Tinha chegado a depender de sua tranqüila eficácia, das comidas que lhe preparava, da ordem que mantinha as coisas, do carinho com que cuidava de Lee. Também desejava todas essas coisas dela. E gostava da forma em que lhe escutava quando falava, de forma que tudo o que ele dizia parecia importante. Queria que se preocupasse um pouco por ele quando partia, como hoje. Não só que lhe rodeasse seu corpo, mas também a sua alma.

 

Uma coisa era certa: não podia seguir daquela maneira, sempre com uma vara em suas calças e a mente dividida em dois. Cedo ou tarde, voltaria a cometer alguma obscenidade, como a noite de 4 de julho, e não desejava voltar a ver aquele medo em seu rosto se podia evitá-lo.

 

Amanhã. Começaria a tratá-la como uma esposa amanhã, e assim, possivelmente ela se sentisse como uma esposa e uma coisa conduziria à outra. Iniciaria a campanha assim que amanhecesse. Possivelmente lhe daria um beijo de bom dia. Sim. Pela manhã.

 

Dormiu saboreando aquele beijo.

 

Mas pela manhã Lydia tinha desaparecido.

 

Ross despertou com uma sensação de descanso absoluto, em que pese a que só tinha adormecido umas poucas horas. Ainda não tinha amanhecido. O céu era de um cinza escuro, e ainda não apareciam brilhos de luz para o este.

 

Ross se levantou e seus olhos voaram como flechas para o outro lado da carroça. Piscou para acostumar-se a tênue luz, convencido de que seus olhos lhe estavam enganando, porque dava a impressão de que o lugar onde Lydia sempre dormia estava vazio. Aproximou-se e seu coração se paralisou, para acelerar-se a seguir. Tocou os lençóis para confirmar o que seu cérebro se negava a aceitar.

 

Lydia não estava.

 

Lee dormia tranqüilamente em sua caixa.

 

Lydia nunca o deixaria sozinho. Voluntariamente, não. E rondava um assassino pelos arredores.

 

Ross engatinhou para a parte posterior e apartou as lonas. Nada. Não se via uma alma no acampamento. As fogueiras da noite só eram montes de cinzas frias. Procurou sua pistola, comprovou que estava carregada e a guardou no cinturão de suas calças. Esquecendo a camisa, as botas e o chapéu, saltou pela parte traseira da carroça e se deixou cair em silencio sobre a terra empapada de rocio. Passeou a vista pelo acampamento, mas não percebeu movimento algum nem sequer no carro dos Langston, onde pensava que Lydia podia ter ido.

 

Ficou a correr através do espesso bosque em direção ao rio, sem fazer caso dos ramos que estorvavam seu passo. Era o único lugar ao que teria podido ir sozinha. Não se ouvia nada mais que sua respiração agitada e o batimento do coração ensurdecedor dê seu coração, enquanto imaginava Lydia nas mãos de um homem capaz de matar com crueldade a um menino.

 

Ou teria fugido, tal como ele, em mais de uma ocasião, tinha pensado que faria algum dia? Teria se cansado de Lee e dele, e teria voltado para o que fazia antes que os Langston a encontrassem? Que fazia? Por que saía sorrateiramente em plena noite?

 

«Ela não o faria», pensou Ross. A idéia não lhe consolou, porque a alternativa era pior. Acelerou o passo. Esgotado, chegou ao rio. Apoiou o braço contra uma árvore e tomou ar. Seus olhos esquadrinharam a borda oposta. Ao princípio não a viu, só seu vestido pendurado em um arbusto. Depois localizou sua diminuta silueta ao longe. Estava deitada de lado, com os joelhos encolhidos sobre o seio e a cabeça inclinada.

 

Estava ferida? Inconsciente? Morta? Deus!

 

Extraiu a pistola do cinto, sustentou-a em alto e mergulhou no rio. Saiu ao outro lado, com as pesadas calças de tecido escorrendo.

 

Lydia! Gritou.

 

Ela se levantou, sobressaltada, e voltou a cabeça bem a tempo de lhe ver surgir do rio. A água transparente escorregava sobre seu peito e seus braços, rodeava as calças a suas formas. Lydia tinha cruzado o rio depois de lavar-se, e tinha a camisa pega ao torso e as coxas. A umidade da manhã tinha encaracolado de maneira incontrolável seu cabelo, que rodeava o seu rosto e caía sobre as costas. Quando Lydia o viu, os olhos saturados de lágrimas se transbordaram e gotas cristalinas escorregaram sobre suas faces úmidas. A surpresa entreabriu seus lábios, que formaram em silêncio o nome de Ross.

 

Este parou em seco. Tentou recuperar o fôlego, mas deu a impressão de que se acelerava, ao igual ao seu coração, ao ver sua nudez quase total, sua pele molhada, seu cabelo ingovernável, seu ar espectador. Atirou a pistola ao chão e avançou para ela. Seus joelhos se apoiaram sobre a suave erva, ao tempo que acariciava a face de Lydia com uma mão e recolhia uma lágrima com o polegar.

 

O que está fazendo aqui? Jesus, Lydia, deu-me um susto de morte quando despertei e vi que não estava.

 

Sinto muito. Não acreditei que despertaria antes que eu voltasse. Não se deu conta de que falava com tanta rapidez e atropeladamente como ele, ou de que tinha subido a mão para o seu cabelo, ou de que estava afundando os dedos nas mechas escuras. Ontem não pude me banhar por culpa de tudo o que... Esta noite não dormi bem...

 

Por que estava chorando?

 

Ross posou a outra mão sobre a nuca de Lydia, levantou a abundante cabeleira e acariciou sua suave pele com as pontas dos dedos.

 

Uma cascata de lágrimas brotou de novo. Não sabia como explicá-lo, nem sequer sabia explicar a ela mesma.

 

Pelo Luke, suponho. Ontem foi um dia espantoso, Ross, antes que chegasse. Estava triste, e depois tive medo quando as pessoas... Moisés... Queria que estivesse ao meu lado e me alegrei tão quando te vi.

 

Não chore, não chore repetiu Ross, enquanto inclinava a cabeça e começava a recolher suas lágrimas com o bigode, os lábios, a língua. Quando se apoderou de sua boca, foi com o desespero, a urgência que buliam no interior de ambos. Os lábios de Lydia se abriram. Depois a língua de Ross penetrou com suavidade em sua boca, deu e recebeu. A jovem emitiu um ronrono gutural.

 

As mãos de Ross escorregaram pelos ombros de Lydia até agarrá-la pelas axilas e levantá-la. Apertou-a contra o seu peito nu e molhado, que voltou a umedecer sua camisa. Sentiu a pressão de seus mamilos, eretos já a causa da água fria. Lydia tremia um pouco, e ele confiou em que não fosse de medo, mas sim de um desejo tão voraz como o seu. Enterrou o rosto na curva de seu pescoço. Lydia jogou a cabeça para trás para lhe permitir acessar. Sua generosidade lhe encheu de confiança, e semeou de beijos aquela extensão sedosa que lhe oferecia.

 

Lydia não sabia o que lhe estava passando, nem de onde procedia aquela sensação de ingravidez. Por uma parte, acreditava que poderia voar; pela outra, todo seu corpo lhe desejava muito ancorado ao de Ross por uma deliciosa lassidão da que não desejava recuperar-se jamais. Sentiu-se mais viva que nunca, mas ignorava como ia reagir ante a nova consciência de seu ser. Com toda naturalidade, enlaçou seus braços ao redor do pescoço de Ross e se apertou mais contra ele.

 

OH, Lydia - suspirou Ross, e liberou seus lábios com um beijo abrasador que deu conta de sua paixão desatada.

 

Ainda ficava suficiente lucidez para compreender que poderiam lhes ver qualquer um que se aproximasse do rio. Agarrou-a pelos braços e avançou cambaleante, semi incurvado para um maciço de madressilvas. A trepadeira tinha subido aos ramos mais baixas de um carvalho, para logo derramar-se até o chão. Quando estiveram ao outro lado daquela cortina natural e aromática, depositou-a sobre o chão.

 

A camisa molhada revelava as formas da moça aos seus olhos ávidos. Aderia-se aos montículos proeminentes de seus seios. Através do tecido transparente, Ross viu as aréolas escuras e os mamilos eretos. Seus olhos descenderam pela fileira de botões, percorreram a estreita coluna das costelas até a concavidade do abdômen. O tecido se afundava no oco do umbigo se amoldava depois a suave colina de seu sexo e delineava sua forma de V. As coxas esbeltas não escaparam aos seus olhos escrutinadores.

 

Lydia abriu os olhos de par em par quando viu que Ross começava a desabotoá-los calças. Ele reparou na agitação de seus seios, que vibravam com cada pulsada do coração, compassado ao dele.

 

Não voltarei a te fazer dano.

 

Sei.

 

Sentiu-se impulsionado a justificar o ato, a justificar-se.

 

Casei-me contigo. É minha mulher.

 

Sim, sim.

 

Seu cabelo ficou esparso sobre a erva, e posou uma mão a cada lado, com as palmas para cima, os dedos engarfiados, indefesa. Ross se ajoelhou sobre ela e apartou suas pernas. Colocou suas grandes mãos sobre as dela, as cobrindo por completo. Sorriu ao descobri-lo, e lhe correspondeu com outro sorriso.

 

Suas palmas se esfregaram, e o contraste foi como uma descarga elétrica para ambos. As de Ross eram ásperas e calosas, as dela, frágeis e suaves. Ross apoiou seus dedos sobre os dela e os moveu acima e abaixo, maravilhado por quão pequenos eram em comparação com os dele. Explorou suas palmas com o dedo do meio de cada mão e as massageou com suavidade.

 

Notou que de repente Lydia respirava fundo, viu como suas pálpebras violetas se agitavam e seus lábios se entreabriam. Enlaçou seus dedos com força e a cobriu, estômago contra estômago. Os seios de Lydia absorveram o peso de seu peito. Acomodou seu membro duro e pulsátil no berço que formavam as coxas de Lydia. Dobrou o pescoço e apoiou a cabeça sobre seu ombro. Roçou sua orelha com a boca.

 

É maravilhoso te sentir contra mim, Lydia. Deus me perdoe, mas é maravilhoso.

 

Não o desejava?

 

Tremia sua voz porque tinha medo do que ia passar, ou porque tinha medo de que não passasse?

 

Não - disse com voz estrangulada. Não o desejava.

 

A Lydia teria gostado de saber o motivo, mas Ross acariciou sua orelha com a boca e esqueceu a pergunta. Fez cócegas o bordo com o bigode. Tomou ar com força. Lambeu o lóbulo com sua língua, úmida e brincalhona.

 

Ross... ofegou a jovem, e espremeu suas mãos entre as dela.

 

Ross as soltou. Rodeou seu queixo com uma mão e beijou seus lábios.

 

Não pude esquecer quão maravilhoso é te beijar. Bem sabe Deus que o tentei, mas não pude.

 

Beijou-a de novo, fez o amor a sua boca com a língua, penetrou e escavou, prometeu e cumpriu.

 

Eu tampouco pude esquecê-lo.

 

Lydia suspirou quando a boca de Ross começou a vagar sobre suas maçãs do rosto e sentiu as carícias de seus dedos no pescoço.

 

Esquece-o, por favor. Estava bêbado, não tinha direito a te abordar de uma maneira tão violenta. Perdoe-me.

 

Esquecê-lo? Perguntou ela, sem compreender.

 

Ross tocou a comissura de seus lábios com a língua, e logo a acariciou com o bigode.

 

Violei-te, Lydia.

 

Ela desconhecia a palavra, e estava a ponto de perguntar o significado quando a boca de Ross reclamou de novo seus lábios. Esta vez lhe rodeou as costas com seus braços e Ross gemeu quando sentiu suas primeiras carícias vacilantes, com dedos tímidos, sobre a pele nua.

 

Ross se levantou sobre um cotovelo e percorreu sua garganta com beijos vorazes. Moveu sua boca faminta sobre a dela, como se temesse que fosse desaparecer de um momento a outro e lhe deixasse ofegante. Examinou a fragilidade de sua clavícula com as pontas dos dedos. Fechou a mão com delicadeza ao redor de seu braço e recordou os hematomas que lhe tinha causado a vez anterior. Esfregou com o polegar a sensível parte interior do braço, e ela se estremeceu. Animado, deixou que a mão escorregasse até seu seio.

 

Cobriu-o com sua mão, maravilhado do bem que se adaptavam. Pese ao obstáculo da camisa, Ross percebeu o calor de sua pele, os batimentos do coração irregulares de seu coração, que sentia em sua palma. Empurrou o seio para cima, e apareceu por cima do decote da camisa.

 

Seus lábios desejavam percorrer aquele delicioso volume. Lydia se estremeceu quando o bigode e a barba incipiente roçaram sua pele. Sensações desconhecidas para ela tão somente umas semanas antes, mas agora maravilhosamente familiares, floresceram nas profundidades de seu corpo, subiram para os seus seios, travavam sua garganta. Sua feminilidade floresceu, escandalosamente úmida e vibrante, mas não sentiu a menor vergonha quando se arqueou por instinto contra sua contrapartida masculina, que prometia mitigar aquele vago desejo que a atormentava.

 

Ross murmurou uma falsa blasfêmia, esfregou seu mamilo com o polegar e abriu os lábios para tocar a pele fria com sua língua quente e úmida. Lydia arqueou as costas sobre a erva e pronunciou seu nome em um gemido. Abraçou-lhe com mais força e se apertou contra sua ereção. Abriu as coxas e Ross se alojou com firmeza entre elas. Beijou-a como se queria absorvê-la por completo.

 

Encaixou a mão entre os dois corpos para levantar o bordo de sua camisa. Quando retirou a mão, roçou com os dedos seu montículo. O pêlo era abundante, suave, encaracolado, espesso. A respiração de Lydia se paralisou ao mesmo tempo em que a de Ross se encalhava em sua garganta.

 

Sua cabeça começou a dar voltas. Desejava seguir tocando-a. Desejava afundar os dedos naquele doce ninho, explorar suas profundidades. Mas tinha jurado tratá-la como a uma esposa. As esposas não gostavam desse tipo de carícias. Nenhuma mulher decente permitiria que um homem lhe acariciasse seu sexo, a menos que quem lhe tocasse fosse um médico ancião e de confiança. Vitória teria fingido que aquela carícia casual não tinha ocorrido. Ross retirou a mão a contra gosto.

 

O extremo de seu membro a sondou, vacilante, e sentiu a tensão de suas coxas ao fechar-se em volto dele.

 

Não te farei - mal sussurrou. Pensou que se esperava muito mais, morreria.

 

Pouco a pouco, as pernas de Lydia relaxaram, separaram-se mais. Ele a penetrou lentamente, de uma única, larga e firme investida. Ross sussurrou seu nome quando se afundou no úmido e sedoso envoltório de seu sexo, que lhe rodeou, aprisionou-lhe, alojou-lhe, e então Ross experimentou tal paz e júbilo que teve vontades de chorar e gritar.

 

Não tinha sido um produto de sua imaginação ébria. Era tão eufórico como recordava. Melhor. Porque esta vez ela se moveu com ele e acariciou com delicadeza suas costas. Repetiu seu nome em sussurros que davam de presente seus ouvidos.

 

Lydia abriu os olhos quando ele ficou rígido, preparando-se para ou inevitável. Sua pequena e branca mão subiu para tocar com ternura a cicatriz de seu peito. Ross grunhiu e apertou os dentes, a causa do imenso prazer que lhe embargava. Moveu os quadris, mergulhou-se ainda mais em sua fogueira receptiva. Moveu-se com lentidão para controlar-se, para atrasar-se. Não foi suficiente.

 

Compreendeu que o clímax se morava e rendeu a fortaleza. Apertou-a contra o seu corpo e banhou sua vagina de fogo líquido.

 

Quando terminou, derrubou-se sobre ela. O perfume do novo dia, da erva coberta de rocio, da madressilva e do produto de seu corpo impregnou seu olfato. Inalou ar, afundou o nariz em seu cabelo e esperou a que seu corpo se relaxasse. Reinava o silêncio. Nada se movia na paragem silvestre que tinham convertido em templo de amor, nada, exceto a corrente do rio. Seu gemido era uma canção, uma canção de ninar que lhes sumiu em um torpor ainda mais profundo.

 

Ross quase adormeceu, quando sentiu que os dedos de Lydia tocavam seu cabelo.

 

Ross, Lee não demorará para despertar.

 

Ele suspirou e a liberou de seu peso. Levantou-se e lhe deu as costas. Lydia observou a marca do cinturão em sua pele, a leve vermelhidão de suas nádegas, a capa de pêlo sobre os rins.

 

Estivemos fora muito tempo - disse Ross.

 

Lydia se levantou, ajustou a camisa sobre suas coxas e tocou a pele suave das costas de Ross, impoluta salvo pela cicatriz que corria sob sua omoplata esquerda.

 

Eu não opino o mesmo.

 

Ross voltou a cabeça e a escrutinou com olhos do mesmo tom verde brilhante que a erva sobre a qual tinham jazido. A pele de Lydia era rosácea, como ocorre depois do amor. Os olhos âmbar eram limpos, e tinha os lábios inchados e úmidos por causa dos beijos. Sua expressão era cândida, inocente, generosa.

 

Ross compreendeu naquele mesmo momento que lhe importava uma merda o seu passado ou com quantos homens se deitou. Só sábia que nenhuma mulher lhe tinha satisfeito tanto em toda sua vida. Não só lhe tinha comovido com seu corpo, mas também com um espírito afim, que lhe arrastaria para ela uma e outra vez.

 

Estendeu um dedo e acariciou uma zona na curva de seu seio que tinha arranhado com a barba incipiente. Ross levantou os olhos e sorriu com acanhamento. Lydia sorriu, e de repente riu de alegria. Ross riu também e os dois se desabaram enlaçados sobre a erva. Ele beijou sua boca, mais saborosa e suculenta que antes. Ela respondeu, rodeou seu pescoço com os braços e acariciou o cabelo de sua nuca. Cheirou-lhe e quis provar o sabor de sua pele.

 

-OH, Lydia, maldição. Levantou-se e a arrastou atrás dele. Se não frear agora, não serei capaz de fazê-lo.

 

Ela apartou a vista com recato quando ele abotoou as calças com movimentos torpes para ocultar a nova ereção.

 

Voltemos antes que Lee comece a uivar e desperte a todo o acampamento.

 

Ross recolheu sua pistola e cruzaram o rio. A água lhes chegava à cintura. Quando chegaram à borda, a camisa se pegou ao corpo de Lydia e revelava tudo que Ross acabava de tocar. À luz da manhã, seus seios eram duas colinas cremosas que se elevavam sobre o decote de renda do objeto. Seus mamilos empurravam com descaramento a cambraia molhada. O tecido, rodeada como uma segunda pele, transparente a sombra escura de seu sexo.

 

Será melhor que te vista - disse Ross com voz apagada.

 

Depois de recolher a roupa limpa que havia trazido, Lydia se escondeu depois de um matagal e tirou a camisa molhada. Olhou-se e comprovou surpreendida que tivesse o mesmo aspecto de antes, salvo pelas marcas vermelhas que a barba de Ross tinha deixado sobre seus seios. Sentia-se diferente por completo. Seu corpo formigava de vida da cabeça aos pés. Não obstante, notava em seu interior certa insatisfação que não podia definir. Um desejo misterioso ainda a possuía. Não era desagradável, a não ser algo que se devia saborear.

 

Vestiu a roupa interior, uma camisa limpa e o vestido. Tinha deixado os sapatos e as meias no carro. Quando saiu de atrás do matagal, Ross estava guardando a pistola no cinto.

 

Não se preocupe - disse em tom humorístico, ao ver seu olhar de preocupação. Não vou deixar que se dispare contra nada valioso.

 

Lydia avermelhou até a raiz dos cabelos.

 

Preparada? Perguntou ele.

 

Sim.

 

De repente se sentia tímida, e face à brincadeira, acreditou que ele também estava nervoso, agora que tinham feito o amor de novo. Não conversaram enquanto retornavam ao acampamento. Quando saíram do bosque, viram que Mamãe se dirigia ao seu carro com uma vasilha de leite. Parou em seco e lhes contemplou com franca curiosidade.

 

Ross era consciente da pistola, de seus pés descalços e de seu peito nu, com a cicatriz acusadora. Lydia abraçou a camisa molhada que tinha escorrido. Teve a impressão de que pesava cinqüenta quilogramas quando Mamãe a olhou.

 

Perdão - resmungou Ross, e desapareceu no interior da carroça.

 

Mamãe lhe seguiu com o olhar e voltou seus olhos inquisidores para a Lydia.

 

Fomos..., fomos nadar gaguejou a moça, e deixou cair a camisa sobre a parte posterior do carro, como se queimasse.

 

Já vejo - replicou Mamãe.

 

Ross está... me ensinando a nadar.

 

Ah, sim?

 

Sentiu-se como uma idiota quando assentiu para confirmar sua mentira.

 

Não teria que haver-se incomodado em trazer o leite de Lee. Pensava ir procurar eu mesma.

 

Durante várias semanas o temos feito igual. Não vejo motivos para trocar.

 

Estava pensando no Luke.

 

Mamãe exalou um profundo suspiro e deixou o balde sobre o chão do carro.

 

Sempre sentirei falta dele. Até o dia de minha morte, sentirei falta dele, mas está morto, Lydia, e não podemos fazer nada para recuperá-lo. Por algum motivo o bom Deus decidiu lhe chamar, e não penso discutir com Ele.

 

Lydia pensou que lutaria com todas suas forças contra qualquer poder, divino ou humano, que tentasse lhe arrebatar Lee ou Ross, mas calou.

 

A vida segue. Falamos entre nós e decidido deixar nossa dor na tumba de Luke. Todos, exceto Bubba. Ele se sente muito mal.

 

Direi a Ross que fale com ele.

 

Acredito que não servirá de nada, mas lhes agradecerei isso. Foi cuidar dos cavalos. Mamãe lançou um triste olhar em direção ao curral. Lydia se perguntou se sabia que Bubba tinha esquecido suas tarefas ontem à noite. Mamãe sacudiu a cabeça e sorriu a Lydia. Vá com seu marido. Pode ser que necessite de ajuda para tirar essas calças molhadas.

 

Riu para si enquanto voltava para o seu carro.

 

Lydia encontrou Ross vestido e inclinado sobre o berço de Lee.

 

Ainda dorme?

 

Acaba de despertar. Cresceu muito. Acredito que logo terá que comprar um berço normal.

 

Será melhor que esperemos até que nos estabeleçamos.

 

Lydia lançou uma exclamação afogada ao dar-se conta de que havia verbalizado sua prece mais urgente. Dois dias antes Ross havia dito que seguiriam juntos só até que pudessem divorciar-se em Telhas.

 

Quer seguir casada? Perguntou ele com certa brutalidade.

 

Eu sim quero. Se você o quiser também.

 

Ross confiava em que a moça expressasse algum sentimento por ele, um indício de que a separação lhe resultaria tão triste como a ele. Depois do ocorrido àquela manhã, não podia demonstrar certo entusiasmo por sua convivência? Uma vez mais tinha aceso a curta mecha de seu mau humor.    

 

Bem, a partir de agora, viveremos como um casal casado afirmou. Levantou seu queixo com um dedo. Um marido tem direitos, sabe? Compreende o que te estou dizendo?

 

Acredito que sim.

 

Para que não houvesse dúvida, rodeou sua cintura com um braço e a esmagou contra o seu peito. Ao mesmo tempo a beijou com violência nos lábios.

 

Quando a soltou, ela retrocedeu e cobriu os seios com uma mão trêmula.

 

O que acontece? Perguntou Ross, arrependido já de sua rudeza.

 

O coração me pulsa muito depressa.

 

Os olhos frágeis de Ross se cravaram em seus seios.

 

Sim? Perguntou com voz oca.

 

Com o beijo pretendia lhe demonstrar quem mandava, que por pura benevolência ia conservar ao seu lado, com a condição de que compartilhasse sua cama. Entretanto, o beijo lhe tinha alterado tanto como a ela. Só notava o sabor de sua boca. Seu perfume o embriagou. Sentiu-a como minutos antes debaixo dele, dócil e feminina, lhe aceitando por completo.

 

Lydia - murmurou com ternura.

 

Ia abraçá-la de novo, quando alguém lhe chamou do lado de fora. Amaldiçoou, passou uma mão frustrada sobre a braguilha das calças, agarrou o chapéu e saiu.

 

Durante o café da manhã explicou a Lydia que o tinham pedido que guiasse a caravana até o lugar de acampamento que Scout e ele tinham eleito. Lydia supôs que o tinham pedido por sua boa pontaria. Toda a caravana seguia nervosa pelo assassinato de Luke. Ela se sentia orgulhosa de que tivessem eleito Ross para lhes ajudar, e ao mesmo tempo estava preocupada porque temia que passasse algo.

 

Importa-se de conduzir hoje o carro? Perguntou Ross da garupa de uma égua, que estava inquieta e ansiosa por partir.

 

Não. Lydia sorriu do assento da carreta. Pedi a Anabeth que me acompanhasse. Pensei que a ajudaria a esquecer Luke.

 

Ross assentiu com solenidade.

 

Tentei falar com Bubba quando fui ao curral. O tema de Luke é tabu. Olhou para a vanguarda da caravana. Os primeiros carros começavam a mover-se. Tenho que ir.

 

Até a noite.

 

Sua mensagem, expresso com serena ênfase, era claro. O coração de Ross se expandiu em seu peito. Deixou escorregar os olhos sobre seu rosto, tocou-se o bordo do chapéu e se afastou entre uma nuvem de pó.

 

Lydia o viu muitas vezes antes da noite, pois ele inventou desculpas para atrasar-se e olhá-la de longe. As pessoas começavam a comentar que o senhor Coleman desempenhava o seu trabalho de vigilância com muita eficácia. Proporcionava-lhes uma sensação de segurança saber que um homem com sua experiência no exército (como, se não, tinha adquirido aquele talento com as armas?) protegia-lhes.

 

Sua confiança poria a prova Ross muito mais do que ele podia imaginar.

 

Aquela noite terminou suas tarefas a toda pressa, retornou à carreta muito antes do acostumado e se lavou com celeridade mas completamente, enquanto cantarolava para si. Quando entrou no carro para procurar roupa limpa, reparou em que Lydia tinha varrido e ordenado o interior, de forma que havia mais espaço...

 

Só se via uma cama. Tinha combinado os dois colchões para convertê-los em uma só cama, bem acolchoada e dobrada. Um buquê de flores silvestres, colocado em um copo de água, descansava sobre a cômoda de carvalho.

 

Lydia se mostrou tão nervosa como ele durante o jantar, e deu a impressão de que tinha muita pressa por lavar os pratos. Deu a mamadeira e esfregou com uma esponja Lee, para que dormisse melhor, e logo o deitou. Compartilharam uma última xícara de café, e quando o sol ficou, dispuseram-se a entrar no carro, momento em que apareceu o senhor Grayson.

 

Boa noite, senhora Coleman.

 

Boa noite, senhor Grayson.

 

O homem contemplou assombrado a jovem, que já não se parecia em nada ao ser imundo que Mamãe tinha levado a carro do Coleman semanas antes. Era uma criatura bonita, embora o seu cabelo fosse muito rebelde e seus olhos muito eloqüentes. A cor de sua pele era notável, e um homem não podia ignorá-lo, como tampouco podia deixar de admirar suas formas. Custou-lhe apartar os olhos dela para falar com seu marido.

 

Ross, sinto muito lhe pedir isso mas te importaria patrulhar pelo acampamento esta noite?

 

Patrulhar? Repetiu Ross, apavorado. Queria deitar-se com a Lydia o antes possível.

 

Grayson pigarreou e se removeu inquieto.

 

Alguns homens se reuniram e chegaram à conclusão de que se sentiriam mais seguros se alguém como você... habilidades... vigiasse-nos. Ofereceram-se a alternar-se, mas temo que se matem entre si sem querer se o fizerem. Todo mundo está nervoso porque o assassino de Luke Langston segue solto. Incomodaria-te muito?

 

Muitíssimo, mas como ia negar-se?

 

Muito bem. Só esta noite.

 

Grayson emitiu uma tosse.

 

Bom, os da caravana pensam que possivelmente pudesse fazer guarda durante uma ou duas semanas. Ofereceram-se a lhe pagar se apressou a acrescentar.

 

Uma maldição escapou dos lábios apertados de Ross, e Grayson lançou outro olhar inquieto em direção a Lydia.

 

Como vou passar acordado toda a noite, e depois conduzir o carro todo o dia?

 

Toda a noite não. Outros lhe relevarão por turnos passada a meia-noite. Poderá dormir umas quantas horas.

 

«Mas não poderei lhe dedicar tempo a minha mulher», pensou Ross.

 

Por favor, Ross. Só até que saiamos desta zona e os nervos de todo o mundo se acalmem um pouco.

 

Ross não ficava outra alternativa que aceitar. Que desculpa podia aduzir? A autêntica não, certamente.

 

Transcorreram os dias. A caravana atravessou o sul de Arkansas. Todo mundo começou a tranqüilizar-se, à medida que se afastavam do ponto onde Luke tinha sido assassinado. Todo mundo, exceto Ross, que cada dia tinha um aspecto mais áspero. As pessoas começava a temer encontrar-se cara a cara com ele. Pelo geral, topavam-se com uns olhos verdes coléricos, dos quais partiam rugas de cansaço e tensão.

 

A paciência de Ross se esgotou ao finalizar o sexto dia. Assim que acabou de atender seus cavalos, dirigiu-se como um raio para o seu carro e apartou as lonas. Surpreendeu Lydia, despreparada que estava se lavando em uma bacia. Tinha o cabelo recolhido de maneira precária sobre a cabeça. Mechas desobedientes tinham escapado e caíam sobre seu pescoço e ombros, ainda molhados depois da lavagem. Surpreendida, deixou cair a toalha, que caiu dentro da terrina. A jovem deixou cair os braços aos flancos. Sua camisa desabotoada cobria os mamilos. Duas meias luas de carne enchiam o espaço central da abertura.

 

Ross, sem pronunciar uma palavra, deixou que seus olhos se deslocassem da base de sua garganta, onde observou um frenético batimento do coração, até o vale de seus seios, para descender logo até o umbigo. Contemplou aquele ponto durante um comprido e silencioso momento. Depois deu meia volta, saiu da carroça e se encaminhou a Grayson.

 

Quero falar contigo rugiu.

 

Claro, Ross.

 

Grayson se afastou com o Ross, para impedir que sua mulher pudesse escutar qualquer expressão pouco afortunada.

 

A especialidade de Ross não eram os discursos. Em realidade, tivesse-lhe querido dizer a Grayson: «Escuta, Grayson, estou quente e quero me deitar com minha mulher, se você e outros membros desta fodida caravana estiverem de acordo.» Entretanto, já não era um patife e não podia falar como se o fosse. Conseguiu controlar-se com um supremo esforço.

 

Estou farto, entendido? Não quero passar mais noites afastado de mi... família. Quase não tive tempo de urinar durante toda a semana. Um homem tem o direito a soltar um taco. O dinheiro extra é estupendo, mas... Respirou fundo, exasperado, quando a visão da carne perfumada de Lydia foi a sua mente. Demito-me.

 

De acordo, Ross. Acredito que todos se convenceram de que foi um incidente isolado e já não corremos perigo.

 

Ross deixou que seu corpo se relaxasse. Tinha esperado uma forte discussão. Como não se produziu, sentiu-se envergonhado pela forma em que tinha abordado Grayson.

 

Muito bem. Até manhã.

 

Afastou-se da parte do rio onde todo mundo se estava aprovisionando de água, tirou-se a roupa e saltou à corrente.

 

Você crê que foi um incidente isolado?

 

Estavam na carroça, depois do jantar, com os tachos já limpos, Lee deitado, e aguardavam a que transcorresse um intervalo decente para deitar-se.

 

Ross olhou Lydia enquanto esta escovava o cabelo.

 

Sim, acredito que foi um renegado, que agora se encontra já muito longe. Foi o primeiro que te disse.

 

Lydia deixou a escova e começou a desamarrar os sapatos.

 

Dá a impressão de que Mamãe e outros aceitaram a morte de Luke. Não sei como se pode superar a morte de um filho.

 

Pensava em como se sentiria se algo ocorria a Lee. Por isso ficou gelada e muda para ouvir a resposta incisiva de Ross.

 

Você superou a perda do teu.

 

Inclinou a cabeça e tirou os sapatos. Não era um filho, a não ser um produto inanimado da vergonha e os maus entendimentos.

 

Não era o mesmo murmurou.

 

Por quê?

 

Era diferente.

 

Lydia.

 

Ross esperou até que lhe olhou, então falou de novo, e o fez com uma seriedade capaz de comunicar a sua mulher que exigia uma resposta.

 

Quem era o pai?

 

Já descalça, aproximou-se do tamborete onde Ross estava sentado. Ajoelhou-se em frente a ele, posou as mãos sobre suas coxas, justo em cima dos joelhos, e lhe olhou no rosto. As lágrimas conseguiram que seus olhos brilhassem como veio ante a tênue luz do abajur.

 

Não era ninguém, Ross. Ninguém. Nem sequer se merece um pensamento.

 

Inclinou a cabeça enquanto falava. Seu cabelo se derramou como uma cascata sobre um ombro.

 

Odiava-lhe. Era cruel. Fazia mal a outros, me machucar, proporcionava-lhe prazer. Deixá-lo não significou lhe abandonar, a não ser escapar dele. Para salvar minha vida, para salvar minha alma. Acredite, Ross.

 

Chorava, mas só pelos olhos. As lágrimas escorregavam sobre suas faces como um rio prateado, mas sua voz não se quebrou. Era uma pura súplica.

 

Foi o único, Ross, juro-lhe isso. O único homem que me possuiu. Resistia cada vez. Nunca estive com ele por vontade própria. Não queria ter um filho dele. Alegro-me de que morrera. Fechou as mãos sobre suas coxas. Quisera que não lhe tivesse conhecido nunca. Quisera que me tivesse mantido pura e virgem para ti.

 

Lydia...

 

Ela moveu a cabeça e não lhe deixou terminar. Já que tinha chegado tão longe, queria lhe explicar o que sentia. Talvez não voltasse a reunir forças para isso.

 

Pensou que eu era lixo quando os Langston me acolheram. Era certo, eu tinha vivido como lixo, mas no fundo sabia que eu não era má. Queria viver entre pessoas decentes. Quando se casou comigo, tomei a decisão de esquecer meu passado. Tinham-me presenteado com uma vida nova, e estava decidida a deixar a velha atrás.

 

»As vezes que estivemos juntos não têm nada que ver com o que passou antes. Ensinaste-me que o que ocorre entre um homem e uma mulher não tem por que ser vergonhoso, doloroso e horrível.

 

As mãos de Ross rodearam seu rosto. Secou as lágrimas com os polegares. Deslizou sua mão do alto da cabeça à nuca, fascinado pelo tato do cabelo contra sua palma.

 

A melhor época de minha vida foi a que passei contigo e Lee. Não posso trocar o passado, embora eu gostaria de esquecê-lo, mas, por favor, não o utilize contra mim. Quero ser uma boa mãe para Lee. Quero ser uma boa esposa para ti. Sou ignorante e torpe e tenho muito que aprender. Ensina-me, Ross. Tento com todas minhas forças esquecer minhas origens. Não pode esquecê-los você também, por favor?

 

Quem era ele, Sonny Clark, para julgar a outros? Acaso ele não se considerou uma vítima de sua herança, não tinha tratado de perdoar-se por suas passadas transgressões? Se ele era capaz de absolver-se de toda culpa, esgrimindo sua sórdida educação como motivo, como podia condenar Lydia? Sem a menor duvida, ela também tinha sido uma vítima. Tanto lhe importava o que ela tinha sido, quem tinha engendrado ao seu filho?

 

Agora que tinha a cabeça de Lydia apoiada sobre seu joelho, com o cabelo esparramado sobre sua coxa como uma meada de seda emaranhada, não podia negar-se a amá-la apoiando-se em uns princípios confusos. O que ela tinha feito antes de conhecê-la, lhe desejava muito insustancial.

 

Ross elevou sua cabeça com ternura. Separou os joelhos e a atraiu para si. Fechou os dedos ao redor de seu pescoço e os enlaçou em sua nuca.

 

É bonita, Lydia disse em voz baixa.

 

Ela sacudiu a cabeça, tudo que lhe permitiram os fortes dedos que rodeavam sua garganta.

 

Não.         

 

Sim o é.

 

Ele se recreou nos olhos afundados que banhavam seu rosto de um resplendor esmeralda.

 

Até que te conheci, não.

 

Ross a atraiu para si e se inclinou para beijar seus lábios. Roçou-os com o bigode. Afastou as mãos de sua garganta e escorregaram para os seus seios. Percorreu seu rosto com os lábios, que depositaram beijos fugazes sobre suas faces úmidas, as pálpebras, o nariz, as têmporas, para logo voltar para sua boca. Deslizou as mãos para o oco de suas costas.

 

Ross aplicou uma pressão lenta, mas constante, até amoldá-la ao seu corpo.

 

Sonhei com isto toda a semana -Confessou contra os seus lábios. Desejei-te com todas minhas forças. Suspirou. Do primeiro momento te desejei, e me odiei por isso.

 

Custou-lhe muitíssimo admiti-lo. Lydia nem sequer podia imaginar o esforço que Ross teve que fazer para lhe confessar aquela debilidade. Ninguém que tivesse visto o jovem pistoleiro de sangue fogoso equilibrar-se sobre um homem a menor provocação, real ou imaginária, reconheceria ao indivíduo que agora acariciava com reverência a face de sua amante.

 

Pensava que me odiava - sussurrou a jovem, e moveu a cabeça de um lado a outro, encantada pelo tato dos lábios dele contra os seus. A boca de Ross. Uma idéia embriagadora, que acelerou sua respiração e agitou seu estômago.

 

Tentei-o. Não pude. Estou farto de nos castigar aos dois.

 

Então a faceta agressiva de sua natureza se reafirmou. Ross se apoderou de sua boca possessivamente, em tanto a imobilizava contra o peito. Seus lábios acessaram quando a língua de Ross os apertou e acariciou a suave e úmida pele. Lydia gemeu e rodeou seu pescoço com os braços.

 

Entregaram-se aos desejos que lhes tinham atormentado durante os últimos dias. Homenagearam mutuamente suas bocas, deixaram que suas línguas se encetassem em um festivo combate.

 

Por fim, Lydia se separou e apoiou a face sobre seu peito para recuperar o fôlego.

 

Não sabia que as pessoas podiam fazer isto com suas bocas sussurrou em voz baixa.

 

Ross levantou seu queixo e lhe dedicou um sorriso travesso.

 

Pouca gente o faz.

 

O coração de Lydia golpeava contra suas costelas.

 

Por quê?

 

Ross se encolheu de ombros.

 

Não sabem o que perdem, talvez.

 

Alegro-me de que você o faça. Eu não desejo perder, quero dizer.

 

Ross lançou uma vibrante e estrondosa gargalhada.

 

Você gosta? Ela assentiu com veemência. Então vamos repetir de novo murmurou. Atraiu-a para si para fundir-se em outro beijo apaixonado.

 

Sem que suas bocas se desunissem, Ross separou um pouco o corpo para poder deslizar sua mão para os botões do sutiã de pescoço alto. A resposta de Lydia renovou sua confiança. De jovem, tinha sido muito impaciente para empregar a delicadeza. Durante sua carreira de foragido, o tempo não lhe tinha permitido atrasar-se, ao fazer o amor com uma mulher, embora tampouco o tinha acreditado necessário, porque as putas consideravam excitante sua luxúria desatada. O puritanismo de Vitória lhe tinha convertido em um homem nervoso e torpe. Tinha medo de ofendê-la com cada um de seus movimentos. Mas Lydia...

 

Quando todos os botões estiveram desabotoados, Ross baixou a boca até seu pescoço e o mordiscou com suavidade, enquanto lhe tirava o vestido.

 

Sempre cheira bem.

 

O fôlego de Ross acariciou sua pele e convocou aquela ingravidez em seu estômago.

 

Já com os braços livres das mangas do vestido, ela elevou as mãos para a cabeça de Ross, afundou os dedos na massa negra de seu cabelo e a apertou contra si, enquanto ele seguia mordiscando-a.

 

Ross a olhou. Tinham baixado a luz do abajur para eliminar sombras reveladoras na lona, mas brilhava o suficiente para arrojar um resplendor dourado sobre a pele de sua mulher. O bordo de renda de sua camisa deixava ao descoberto a curva superior de seus seios. A textura do vale que os separava intrigava a Ross, pois imaginava aveludada sob os dedos de um homem, sob a língua de um homem.

 

Percorreu com o dedo o bordo da camisa de um lado a outro, pouco a pouco, logo em sentido inverso, enquanto seguia o seu movimento com os olhos. Quando os elevou para o seu olhar tenro, sorriu agradado. Desabotoou-se e tirou a camisa. Continuando, tirou-se o cinturão, e depois começou a desabotoar as calças. Ela continuava como em transe e só olhava os seus olhos. Os dela estavam totalmente abertos, e mostravam um tom âmbar escuro.

 

Dou-te medo, Lydia?

 

Ela negou com a cabeça.

 

Não. Antes sim, mas já não.

 

Bom, você também me dava medo - disse ele, lançando uma leve gargalhada.

 

Eu?

 

Era incompreensível que Ross pudesse ter medo de algo.

 

Não te dava conta do muito que me custava passar a noite contigo sem te tocar, sobre tudo quando dava de mamar a Lee?

 

Ainda deseja me tocar?

 

 

Ross fechou os olhos, como se sentisse dor.

 

Muitíssimo.

 

Lydia lhe agarrou a mão, posou-a sobre seu seio e apertou.

 

-Assim?

 

Deus, sim.

 

Ross gemeu. Sua outra mão se reuniu com a primeira. Massageou com carinho seus suaves seios, elevou-os, comprimiu-os, para deixar logo que se acomodassem sob suas palmas. Lydia suspirou seu nome quando os dedos de Ross descreveram círculos ao redor de seus mamilos. Explorou e implorou com doçura, até que ficaram eretos.

 

Abriu-me aquela camisa na primeira noite sussurrou ela, aturdida.

 

Ross a olhou com olhos incrédulos.

 

Estava bêbado respondeu com voz rouca.

 

  1. Lydia inclinou a cabeça, envergonhada. A julgar por sua expressão, adivinhava que acabava de lhe dizer algo terrível

 

Sinto muito. Não sei nada destas coisas. Pensei que você gostaria...

 

É claro que sim, mas...

 

Caramba, se sua esposa era uma das poucas em todo o continente que não fugia as carícias de seu marido, seria parvo que o dissesse.

 

Amaldiçoou os diminutos botões enquanto seus dedos lutavam com eles. Depois de uns instantes frustrantes, lhe apartou as mãos com delicadeza. Soltou os botões um a um, com movimentos lentos e inconscientemente sedutores.

 

Ao princípio, só apareceu uma franja de pele, depois, as curvas internas de seus seios, e. Por fim, o sulco que dividia o seu estômago. Lydia se inclinou para diante, de forma que quase tocou com a cabeça o queixo de Ross, enquanto se tirava a camisa. O cabelo escorregou sobre seu rosto, e quando se ergueu, cobriu-a de uma forma fascinadora.

 

Produziu-se um rugido nos ouvidos de Ross que não escutava desde que se deitou pela primeira vez com uma mulher, muitos anos antes. Logo que era mais que um moço, mas recordava a secura de sua boca, o suor que molhava suas palmas e seu lábio superior, o tamborilar de seu coração. Como agora.

 

Apartou seu cabelo e contemplou seus seios. Eram volumosos coroados de coral, muito bonitos, altos, redondos, maternais, eróticos. Os seios de uma Madonna... e de uma amante. Recordou a primeira noite que a viu, contemplou aqueles seios cheios de leite e a boca ávida de seu filho, que chupava os mamilos. Uma nova quebra de onda de sangue alagou seu membro. A potente ereção lhe produziu dor.

 

Quando posou as mãos sobre ela, experimentou mil sensações que percorreram seu braço até o coração. Como enfeitiçado, acariciou a carne suave, e comprovou com prazer que se adaptava à forma de suas mãos e ao movimento de seus dedos. Sua pele escura contrastava com a brancura cremosa de Lydia.

 

Soprou com suavidade sobre o mamilo, que se ergueu tentador, a aréola escura que o rodeava se enrugou de uma forma adorável. Ross sussurrou uma maldição, rodeou o seio com sua mão e baixou a cabeça.

 

Ao princípio Lydia sentiu a carícia sedosa e áspera ao mesmo tempo do bigode, e depois o beijo úmido. Apoiou as mãos sobre as faces de Ross e jogou a cabeça para trás. A língua de Ross se deslizou sobre o leito de carne rosácea, uma e outra vez, banhou-o com o rocio de sua boca. Depois o encerrou na prisão ardente e úmida de seus lábios e chupou com suavidade.

 

Lydia emitiu uma exclamação afogada de surpresa e prazer, e se apertou mais contra ele. Um grito entrecortado surgiu de seus lábios. Os braços de Ross se fecharam sobre os quadris de Lydia, que se arqueou para trás. Ross a devorou com doçura, saboreou cada centímetro da carne que, durante semanas, tinha sonhado saborear. Banhou seus mamilos com a língua, secou-os com o bigode. Sujeitou-os entre os dentes de sua boca quente e febril, e puxou eles ritmicamente.

 

Era um ritmo carnal, ambos respondiam ao uníssono. Ross compreendeu que a possuiria de novo com brutalidade, se não aplacava o seu desejo. Elevou-a e balançou sua cabeça sob o queixo. Os seios molhados de Lydia se esmagaram contra o seu peito nu.

 

Lydia, Lydia repetiu sem cessar, em tanto a balançava contra ele até que os dois se acalmaram. Esta vez não seria brusco e rápido, a não ser lento e paciente.

 

Lydia se apartou e acariciou suas faces ásperas.

 

Isto arranha disse, e enrugou o nariz de uma forma cômica.

 

Sinto muito. Terei que me barbear.

 

Não! Exclamou a jovem. Seu entusiasmo arrancou uma gargalhada a Ross, mas se conteve quando ouviu sua seguinte observação. Tem muitas cicatrizes.

 

Tocou a cicatriz que aparecia sobre seu mamilo esquerdo. Depois as pontas de seus dedos perambularam sobre seu peito e ombros, em busca de mais cicatrizes e sinais.

 

Temo que sim.

 

A guerra?

 

Ross apartou sua mão e beijou seus dedos.

 

Algumas, sim.

 

Disse-o em um tom que indicava sua determinação de não falar mais a respeito. Estava entregue ao estudo de como oscilavam seus seios ao menor movimento, ou de como algumas mechas de cabelo que caíam sobre seus ombros flertavam com seus mamilos. Lydia não aparentava o menor acanhamento ante aquela detalhada inspeção, antes manifestava uma curiosidade quase infantil por Ross.

 

Vamos à cama disse este com voz rouca.

 

Ross já tinha tomado a decisão de que não ia dormir de calças curtas, e de maneira nenhuma ia vestir uma daquelas ridículas camisas de dormir que Vitória insistia em que colocasse. Ia dormir tal e como tinha nascido, e se a Lydia não gostasse... Bem, teria que acostumar-se. Tirou as botas, as meias três-quartos e as calças, e os jogou ao outro lado do carro.

 

Lydia engatinhou a toda pressa para a cama e permaneceu imóvel quando Ross apagou a chama do abajur. Fez-se a escuridão no carro. Seus ouvidos já se acostumaram a seguir os movimentos de Ross e sabia que estaria nu quando se deitasse ao seu lado.

 

Estava aterrorizada e excitada ao mesmo tempo pela idéia. Clancey lhe tinha mostrado obscenamente suas partes íntimas desabotoando-a braguilha das calças, mas nunca tinha visto um homem adulto nu por completo. É obvio, Ross era bonito da cintura para acima. Não podia imaginar que o resto de seu corpo fosse repulsivo. De todos os modos, ficou rígida e assustada quando ele se deitou ao seu lado.

 

Ross não encontrou a menor resistência quando a atraiu para ele. Seus braços a aprisionaram, ao tempo que capturava sua boca na escuridão. Graças à experiência contida naquele beijo, os temores de Lydia se dissiparam.

 

Tocou as pernas de Ross com seus pés nus, e não foi tão horrível. Tinha os seios apoiados contra o muro peludo de seu peito, e o contato era eletrizante. Ross nu não deixava de ser Ross. Sabia que não devia temer nada dele.

 

Lydia lhe rodeou com seus braços e acariciou os músculos de suas costas. Deixou que suas mãos descendessem mais abaixo da cintura e tocou o que tinha admirado aquela manhã no rio. Deslizou as palmas sobre as curvas firmes de suas nádegas.

 

Deus todo-poderoso grunhiu Ross, e a deitou sobre os lençóis. Agradeceu a luz da lua que lhe ajudou a desatar o cinturão das anáguas e as calças interiores de Lydia. Agarrou tudo com uma mão e lhe desceu de um só movimento o vestido e os objetos interiores, que formaram um montão de tecido e fio ao pé da cama.

 

Então seus olhos admiraram os pés pequenos, os delicados tornozelos, a forma das panturrilhas, as esbeltas colunas de suas pernas. Cortou-lhe a respiração ao ver o ninho de cachos cor torrada. O triângulo em sombras delimitava a sua feminilidade, ao igual à suave redondez de seus quadris, a colina de seu estômago, a perfeição de seus seios. Sua beleza o cativou e a contemplou, absorveu-a, durante um longo momento.

 

Da puberdade, Lydia nunca tinha estado completamente nua diante de ninguém, nem sequer ante sua recatada mãe. Sentiu-se alarmada pela atenção que lhe emprestava Ross. Não era como as demais mulheres? Era feia como um pecado e o ignorava? Tinha alguma deformidade?

 

Ross? Perguntou trêmula, e cobriu sua feminilidade com uma mão protetora.

 

Ross saiu do transe e se deitou ao seu lado. Apertou seu corpo áspero contra a serosidade de Lydia, com o fim de experimentar o erotismo do contraste.

 

Meu Deus suspirou, enquanto apoiava a mão sobre seus seios. Durante vários minutos se limitou só a abraçá-la, sem acreditar que lhe tivesse sido concedido aquele presente. Parecia inconcebível que alguma vez a tivesse considerado grosseira e vulgar. Ela era única e linda..., e era dela.

 

Levantou-se e se inclinou para poder beijar sua boca. Logo que introduziu a língua na doce cavidade de sua boca, mas sim a passeou com suavidade sobre seus lábios. Lydia apoiou a mão sobre sua cabeça com idêntica delicadeza.

 

Ross tomou um de seus seios com uma mão e o levou a boca. Descreveu círculos de beijos ao seu redor, cada vez mais perto da cúpula. Acariciou o mamilo com um movimento circular de seus lábios, até endurecê-lo como uma pedra. Depois o lambeu com a língua.

 

Lydia se estremeceu e se elevou do colchão, para logo deixar cair de novo. Em seu interior, entre as pernas, experimentou aquela agitação que já lhe era familiar, o desejo de algo indefinido e desconhecido. A culminação, se seu arauto era aquele gozo quase insuportável, não podia ser menos esplêndido.

 

Ross posou a mão sobre sua cintura, apertou-a um pouco e continuou descendendo pela curva de seu quadril até a coxa. Sua pele era como cetim quente. Acariciá-la era como ser acariciado. Seus dedos percorreram a coxa, detiveram-se uma fração de segundo e invadiram o frondoso matagal de pêlo castanho.

 

Não ouviu nenhuma objeção; tão somente um leve gemido surgiu dos lábios de Lydia. Ross, vacilante, apartou as coxas da jovem e acomodou sua mão entre elas. Carne dócil, cálida e úmida, rodeou seus dedos.

 

Lydia resmungou entre dentes seu nome, à medida que se familiarizava com seu mistério.

 

Ross! Gritou ela.

 

Ele retirou a mão imediatamente e a apoiou sobre seu joelho.

 

Sinto muito. Pararei. Só queria te tocar.

 

Tem que fazê-lo? Perguntou ela, como temerosa.

 

Não - a tranqüilizou. Não tenho que fazê-lo. Nunca voltarei a te tocar assim se você não...

 

Não! Exclamou a jovem, um pouco histérica. Quero dizer se tiver que parar?

 

A maldição afogada selou os lábios de Lydia, um momento antes que ele a beijasse. Sua mão obrou com mais audácia, mas não com menos delicadeza. Dois dedos encontraram a confortável fenda e se fundiram em seu abraço líquido. O polegar massageou o diminuto capuz mágico.

 

Viu que o rosto de Lydia adotava aquela expressão sublime que tinha advertido quando dava de mamar a Lee. Tinha invejado aquela expressão e desejado ser ele seu causador. Viu que seus mamilos se esticavam, seu estômago se convulsionava, sua respiração se acelerava, e quase explodiu de desejo que exigia liberação.

 

Cobriu-a, substituiu os dedos por seu sexo, apertou até que seu corpo engoliu o dela. Permaneceu uns instantes completamente imóvel, respirando em seu pescoço, alojado em suas vísceras. Depois levantou a cabeça e a olhou aos olhos.

 

Nunca havia sentido isso, Ross. É assim como tem que ser? Sussurrou, e percorreu seu bigode com a ponta de um dedo.

 

Ross fechou os olhos e sacudiu a cabeça. Esforçou-se em não mover-se ainda, em não apressar-se.

 

Não. Tão maravilhoso, não.

 

Então perdeu o controle e começou a mover os quadris. Praticou todas as técnicas que lhe tinham ensinado, tanto em bordéis como ao redor dos fogos de acampamento. Retrocedeu até sair quase de seu interior, para logo mergulhar-se até o fundo. Acariciou os muros de seu corpo, com rapidez, com lentidão, a ritmos que roubavam o sentido de Lydia.

 

Roçou seus mamilos com o peito, acariciou-lhe o estômago com o seu, massageou suas coxas com mãos poderosas. Estava perdido em sua feminilidade, em sua doçura, e não desejava que lhe encontrassem jamais.

 

O rosto de Lydia expressava um prazer supremo, o qual serviu para intensificar o seu. Quando chegou ao orgasmo, Ross notou a estremecida reação de Lydia. Abraçaram-se enfebrecidamente, quando um deus benevolente lhes jogou nos céus para logo lhes devolver com suavidade à terra.

 

Os dedos de Lydia percorreram lentamente suas costas cobertas de suor, enquanto jaziam entrelaçados em um exausto abraço. Ross se recuperou por fim, separou-se dela, deitou-se de costas e tomou ar várias vezes.

 

Ao ver que permanecia imóvel durante comprido momento, Lydia apoiou a mão sobre seu estômago e perguntou com certo temor:

 

Você está bem, Ross?

 

Ele reuniu suficiente força para lançar uma risada.

 

Lydia, como pode ser tão inocente e perita ao mesmo tempo?

 

Ficou de lado e a olhou com ternura. Mechas de cabelo encaracolado se pegavam a suas faces, úmidas de suor. Sua pele exibia o brilho rosáceo da satisfação sexual. Tinha os olhos limpos e adormecidos quando lhe sorriu com acanhamento. «Deus, que bonita era», pensou Ross. Abraçou-a, em que pese ao calor da noite.

 

Vamos dormir.

 

Lydia se aconchegou contra ele, embalada pela sensação de amparo que lhe proporcionava o seu corpo. Ross cobriu seu seio com a mão, em tanto ela posava ao seu sobre o oco de sua cintura. Quando dormiram, ambos sorriam.

 

Ross despertou com uma letargia pouco comum. Não recordava uma noite em que tivesse adormecido melhor. Antes de abrir os olhos, cobriu o rosto com o cabelo de Lydia e aspirou seu perfume. A jovem ainda dormia. Levantou-se com cuidado, tratando de não despertá-la. Queria examinar o que a escuridão da noite tinha oculto.

 

Deixou que seus olhos vagassem a vontade sobre as doces formas de sua mulher. Sua pele apetitosa para a vista como para o tato. Ainda conservava o seu sabor na língua. Uma leve capa de sardas adornava suas faces. Sorriu ao pensar que a dotavam de um incrível aspecto infantil. Entretanto, seus olhos adornados de espessas pestanas, deitadas agora como leques sobre suas faces, eram os de uma mulher. Multefaceadas, brilhantes de lágrimas em um momento, nublados pela paixão ao seguinte. Falavam por si só, prometiam maravilhas, e a excitação formigou em seu membro adormecido quando recordou a forma sensual com que o havia olhado.

 

Tinha os lábios entreabertos. Naquele momento ele só desejava introduzir sua língua entre eles, penetrá-los. Possuía a boca mais doce. E sabia beijar.

 

Que mais sabia?

 

Uma ruga apareceu em seu sobrecenho e o bigode se agitou de irritação. Por que demônios seguia pensando nisso? Parecia tão inocente, e entretanto...

 

Ontem à noite tinha vivido o sonho sexual de um homem convertido em realidade. Lydia não tinha fingido. Ross tinha ouvido que algumas mulheres experimentavam a mesma pequena morte que os homens. As prostitutas a fingiam, porque acreditavam que assim o esperavam seus clientes. Duvidava que Vitória tivesse ouvido falar de algo parecido, e se assim fosse, teria ficado horrorizada.

 

Vitória. Suas lembranças ainda lhe incomodavam mais que outra coisa. Sentia falta dela. Ainda a amava. Mas como podia seguir amando-a e desfrutar do corpo de Lydia com tal abandono? Era possível amar a uma mulher e estar obcecado com outra? Odiava as comparações que sua mente lhe obrigava a estabelecer.

 

Enquanto o corpo de Vitória tinha sido frio alabastro, o de Lydia era marfim esvaziado em ouro líquido. Em ocasiões, Vitória era recatada até o ponto de lhe exasperar. Nunca lhe tinha deixado que a visse completamente nua. Agora Lydia estava deitada nua ao seu lado. Lindamente nua. Ela tinha transpassado os limites sem pudor. Tinha se entregado com generosidade, lhe permitindo um acesso ilimitado, tudo que tinha querido fazer. Vitória teria desacordado se tivesse movido em seu interior como o tinha feito com Lydia. Teria ficado quieta, lhe teria aceito, mas depois teria saltado da cama para ir lavar-se, como se o produto de Ross fosse algo degradante.

 

Lydia se tinha obstinado a ele, tinha-lhe ordenhado com seu corpo, moveu-se com ele, emitido aqueles sons musicais que pareciam percorrer seu corpo como sussurros e acariciavam seu membro. Quando tudo terminou, havia-se coberto o estômago com as mãos e abraçado, como se entesourasse a essência de Ross que tinha passado a integrar-se em seu corpo.

 

Pensar naquilo lhe produziu uma ereção. Amaldiçoou a si mesmo e a amaldiçoou a ela também. Porque assim como ele adorava sua natureza sensual, ela o enfeitiçava. Como tinha chegado a adquirir Lydia aquelas aptidões, esse talento para amar que lhe tinha transportado a um reino sexual que inclusive ele, com toda sua experiência, desconhecia?

 

Contemplou seus seios. Inclusive em repouso, os mamilos se viam um pouco inflamados. Seu estômago subia e baixava ao compasso de sua respiração, e Ross quis pôr sua boca sobre ele, afundar a língua em seu umbigo. Desejou percorrer de novo com os dedos aquele sedoso triângulo de pêlo.

 

Quem é, Lydia...?

 

Nem sequer sabia, o seu sobrenome.

 

Claro que ela tampouco sabia o seu.

 

Admirou sua beleza à luz do amanhecer e soube que era capaz de perdoar seu passado, como lhe tinha pedido. Com tal de que não lhe tivesse mentido a respeito de que ela também ia esquecer o... Se alguma vez descobrisse que lhe tinha mentido a respeito, nunca a perdoaria.

 

Não se atreveu a tocá-la, pois do contrário lhe teria sido impossível partir. Vestiu as calças e saiu.

 

Minutos depois Lydia despertou e procurou Ross. Não estava ao seu lado, mas lhe ouviu mover-se fora. Levantou-se, deu uma olhada a Lee, que continuava dormindo, e começou a lavar-se na bacia que descansava sobre a cômoda. Esfregou seu sexo com um pano úmido. Suas faces se acenderam quando recordou como a havia tocado Ross, como tinha reagido ela.

 

Pensaria mal dela?

 

O que lhe tinha passado? Durante um terrível momento pensou que ia morrer, embora, ao mesmo tempo, nunca se havia sentido mais viva. O prazer se derramou sobre ela como uma cascata. Tão intenso foi o prazer que não acreditou que seu corpo fosse capaz de contê-lo. Obstinado-se a ele com avidez, para que durasse mais. Tinha fechado os membros ao redor de Ross, com a ânsia de reter em suas vísceras tudo que fosse possível de sua virilidade.

 

Cobriu o rosto com as duas mãos, respirou fundo e rogou não ter feito algo impróprio de uma mulher casada.

 

Apartou os cabelos do rosto, mas deixou que escorregasse sobre suas costas. Não lhe havia dito Ross que era bonito, que ela era bonita? Depois de vestir-se, saiu do carro. Não viu Ross, e se alegrou. Ainda não estava preparada para encontrar-se cara a cara com ele, pois se sentia turvada pelo que tinha acontecido durante a noite.

 

Ele apareceu por detrás dela enquanto Lydia vertia café em uma xícara.

 

Bom dia - disse ele em voz baixa.

 

Ela se voltou pouco a pouco e elevou os olhos com cautela. Ficou sem fôlego ao lhe ver a nova luz do sol. Era o homem mais bonito que tinha visto em sua vida. Seu cabelo brilhava, pois o tinha lavado depois de barbear-se. O alegre brilho de seus olhos e a tenra curva de seu sorriso lhe estavam dizendo que tudo ia bem. Seu comportamento de ontem à noite não lhe tinha irritado. Ficou convencida de que tinha feito o que se supunha que as esposas tinham que fazer quando estavam com seus maridos. Comportou-se como Ross esperava. Experimentou um alívio imenso.

 

Bom dia.

 

Teve vontade de rir.

 

Para mim? Ross indicou com uma sacudida de cabeça a xícara de café.

 

Ela a estendeu sem dizer uma palavra e sorriu; seu rosto rivalizava em brilho com o sol. Ross segurou a xícara, mas ao mesmo tempo rodeou sua nuca com a mão livre e a levantou para sua boca.

 

Ainda a estava beijando quando Mamãe Langston chegou ao carro uns minutos depois, com o balde de leite para Lee. Olhou-lhes um momento, radiante como uma mãe orgulhosa, e pigarreou ruidosamente.

 

Outra pista falsa - disse Howard Majors, enquanto tirava o chapéu e o pendurava no cabide da habitação de seu hotel de Baltimore.

 

Dá a impressão de que teve uma decepção ao comprovar que a garota da funerária não era minha filha, Majors. Lamento lhe haver feito perder seu tempo.

 

Foda-se - resmungou para si Majors, aborrecido, e se serviu de uma taça generosa, algo que fazia muito poucas vezes no meio da amanhã.

 

Vance Gentry começava a lhe crispar os nervos. Quase começava a simpatizar com o jovem casal que tinha fugido dele. Talvez Sonny Clark não tivesse raptado a sua esposa, nem a tinha obrigado a roubar as jóias, Talvez ela ardesse em desejo de partir de casa para livrar-se daquele tirano insuportável.

 

Durante a semana que tinham demorado para chegar a Baltimore, Gentry se tinha mostrado desagradável e agressivo, mas Majors tinha tolerado seu comportamento e o tinha compreendido. Ao fim e ao cabo, Gentry estava convencido de que a moça assassinada na habitação de um hotel próximo ao porto devia ser sua filha. Majors o tinha duvidado do primeiro momento, embora as descrições físicas se ajustavam às de Clark e Vitória Gentry.

 

Aquele assassinato não era próprio de Clark. Ele era veloz como o raio com a pistola, e violento quando lhe encurralavam, sem temor a nada, mas nunca tinha sido um assassino desumano, em especial até o ponto de apunhalar a uma mulher muito depois de que estivesse morta. Não concordava com a forma de atuar de Clark, que sempre se conduzia com movimentos rápidos e eficazes.

 

Majors tinha suportado o comportamento beligerante de Gentry por deferência. Agora já se cansou.

 

Não foi uma perda de tempo, senhor Gentry respondeu, com mais diplomacia da que o homem merecia.

 

Não, só uma perda de meu dinheiro.

 

Ao menos agora sabemos que sua filha talvez siga com vida.

 

Então onde caralho está?

 

Não sei.

 

Não sabe. Gentry estava tão furioso que seu cabelo branco pareceu a ponto de saltar de sua cabeça quando se voltou para o fodido detetive - Para que acredita que lhe estou pagando? Pago-lhe para que localize a minha filha e ao foragido de seu marido.

 

Majors contou pouco a pouco até dez e se recordou a si mesmo que depois daquele caso lhe aguardava a aposentadoria.

 

Pode me despedir quando queira, senhor Gentry. Eu seguirei procurando Sonny Clark, pois agora sei que está vivo. Eu o busco por cinco acusações de assassinato, que nós saibamos, e assaltos a bancos em vários estados. A lista de seus delitos é tão larga como meu braço. Por outra parte, embora não tenha colaborado com eles há uns anos, poderia salvar a vida em troca de nos ajudar a capturar aos irmãos James. Bem, quer que trabalhe para você, ou prefere continuar sozinho?

 

Gentry se balançou sobre seus saltos, estava furioso, mas tratou de apaziguar-se. Sua ira não se dirigia tanto para o agente de Pinkerton como para a situação em que se achava. Lamentava não possuir o controle absoluto, mas sabia que o detetive contava com uma rede de informadores e comunicações que ele não podia emular, embora tivesse o dinheiro.

 

Não vejo que seja necessário que nos separemos agora.

 

Muito bem. Nesse caso, pedirei com toda educação que não volte para insultar-me com comentários depreciativos. É obvio, alegrei-me de saber que aquele cadáver não era o de sua filha.

 

Serviu-se outro copo e passou a garrafa ao Gentry, uma silenciosa indicação de que, se queria um gole, o servisse ele mesmo.

 

Gentry aceitou a reprimenda.

 

E agora o que? Perguntou, depois de servir um copo.

 

Suponho que voltaremos para o escritório do Knoxville. Partiremos desde o zero outra vez. Estenderemos as antenas e veremos o que acontece.

 

Gentry engoliu seu uísque de um só trago. Não lhe queimou mais o estômago que sua raiva. Quando pusesse as mãos em cima de Ross Coleman, ou de qualquer maneira que se chamasse, enviaria a merda à Agência Pinkerton, aos governos de vários estados e a qualquer que queria capturá-lo vivo.

 

Mataria aquele bastardo.

 

Os dias transcorriam com lentidão para Ross e Lydia porque ambos esperavam com ânsia que chegasse a noite. Ross sempre estava ocupado com seus cavalos ou com os de outros, caçando, ou em outras tarefas que lhe impediam de conduzir sua parelha. E assim era melhor. Os dias que se sentava ao lado dela durante as longas horas da jornada eram horríveis. Cada roce de seu braço, cada carícia fugaz, cada olhar, cada beijo roubado, faziam-lhe desejar o anoitecer.

  

   As noites lhes pertenciam. Visitavam outros carros da caravana, mas assim que a decência o permitia voltavam para a carroça e deixavam que sua intimidade lhes abraçasse como eles se fundiam em um abraço. Cada noite sua intimidade aumentava um pouco mais. Envergonhavam-se menos de demonstrar seus sentimentos, eram mais generosos com seus corpos.

  

   Lydia acreditava que não podia ser mais feliz. Não adjudicava etiquetas ao que sentia por Ross. Só sabia que sem ele sempre faltaria algo em sua vida, um complemento indispensável de seu próprio ser. Não se comunicavam seus sentimentos mediante palavras, mas Lydia não sabia o bastante para sentir falta daquela intimidade em particular. Sabia tudo que precisava saber pela forma em que ele a olhava e a tocava.

  

   Uma tarde, como de costume, Lydia se achava imersa em uma nuvem de satisfação enquanto se lavava, preparando-se para a volta de Ross a hora de jantar. Tinha posto a ferver os feijões no fogo e havia massa de milho pronta para fritar. Moisés tinha pego amoras e lhe tinha dado umas contas para que as compartilhasse com Ross como sobremesa.

  

   Quando ouviu o golpe no exterior do carro, terminou de abotoar o vestido, passou por última vez a mão sobre seu cabelo e apartou as lonas.

  

   Retrocedeu horrorizada e contemplou o malvado e feio rosto de seu meio-irmão, Clancey Russell.

 

 

Lydia abriu a boca para gritar, mas o terror emudeceu sua voz. Clancey aproveitou aqueles segundos para entrar no carro e fechar a mão sobre sua boca.

 

Calma, calma, não vais montar nenhum escândalo, verdade, senhora Coleman? Moveu uma faca de caça ante seus narizes. Porque se o faz, o primeiro que chegue encontrará isto na barriga. E esse poderia ser seu marido.

 

Lydia abriu os olhos de par em par. Clancey lançou uma risada.

 

Vejo que captei sua atenção.

 

Baixou a mão pouco a pouco, embora não embainhasse a faca. Lydia estava muito estupefata para reagir. Clancey era o fantasma encarnado de seus pesadelos, um espectro ressuscitado de entre os mortos. A ferida de sua cabeça lhe tinha deixado uma espantosa cicatriz que lhe dotava de um aspecto ainda mais repulsivo. Fedia. Perguntou-se como tinha podido viver com ele dez anos, por não mencionar...

 

Tragou a bílis que enchia sua boca. Como podia estar vivo? Como? Tinha-lhe visto golpear-se contra aquela rocha, tinha ouvido o rangido do crânio e contemplado o sangue derramando-se.

 

Pensava que tinha morrido, né? Burlou-se o homem, lendo seus pensamentos. Revolveu-te como uma fera quando te alcancei em Knoxville. Esperneou e me arranhou como uma gata selvagem, até que perdi o equilíbrio e caí. Eu gosto das mulheres com caráter. Como sem dúvida recorda.

 

Seus olhos de réptil a inspecionaram com lascívia: Lydia se estremeceu de ódio e medo.

 

E estou muito zangado contigo, irmãzinha, por me fazer cair contra aquela rocha e me abrir a cabeça. Doeu-me muitíssimo durante semanas, tinha a vista imprecisa. Sim. Mas agora já vejo com claridade. Seus olhos a percorreram de novo. E vale a pena olhar o que estou vendo.

 

Se meu marido te encontrar aqui, matará você - disse Lydia, com muita mais valentia da que sentia, pois, por dentro, tremia de medo. Medo de que Clancey se vingasse dela por lhe haver abandonado meio morto, e ainda mais medo de que Ross descobrisse o que tinha sido para aquele homem. A idéia lhe provocou náuseas.

 

Seu marido, né? Sabia que ele tem outra esposa? Perguntou com astúcia. Uma tia rica?

 

Vitória? Morreu.

 

Morreu? Repetiu estupidamente Clancey. Ficou desconcertado um momento, e depois ergueu os ombros com arrogância. Acredito que isso não altera meus planos.

 

Bem, se seu plano era me dizer que meu marido era bígamo, perdeste o tempo. Já pode ir.

 

Mais devagar - disse com voz sedosa Clancey. Temos muito do que falar.

 

Passeou a vista pelo carro e assentiu para expressar sua aprovação. Quando viu a caixa onde Lee dormia, aproximou-se e olhou. Lydia, que teria podido sair como um raio naquele momento, não se atreveu. Não podia deixar sozinho Lee com o Clancey, e não podia avisar a ninguém de sua presença por temor a que lhes dissesse quem era.

 

É meu filho? Perguntou, e assinalou com a faca a Lee.

 

Não! Exclamou Lydia. Empurrou ao homem e se interpôs entre ele e o menino. Seu filho nasceu morto. Este é o de Ross. Vitória morreu ao dar a luz.

 

Clancey arranhou seu pescoço áspero e grosso com a folha da faca, enquanto contemplava Lee. Lançou uma gargalhada arrepiante.

 

Bonita história.

 

É verdade! Gritou Lydia ao intuir suas suspeitas. O menino que me fez estava morto quando dei a luz no bosque. Enterramo-lo.

 

Clancey encolheu os ombros.

 

Dá igual. Este pequeno é muito simpático. Não me importaria ficar com ele se não for meu, dá-me igual se estiver bem cuidado ou não.

 

O coração de Lydia se deteve, e imediatamente seguinte começou a bater contra suas costelas. Sentiu a garganta seca.

 

O que quer?

 

Clancey riu.

 

Agora começamos a nos entender. Sempre disse que não era tola. Sempre o disse.

 

Lydia estava histérica, aterrorizada pelo que aquele homem podia fazer e aterrorizada ante a idéia de que Ross chegasse e encontrasse Clancey no carro. Era a hora em que estava acostumado a retornar ao acampamento. Outros já estavam preparando o jantar em suas fogueiras. Sentiriam falta dela? Viria alguém a procurá-la? Voltaria Ross e a encontraria com o Clancey?

 

O que quer? Repetiu.

 

«Não! Por favor, Meu Deus, não.»

 

Estou no fundo do poço, irmãzinha. É claro que sim. Ocorre-me que agora talvez poderia dar um empurrãozinho, por dizê-lo de algum jeito, ao seu pobre meio-irmão. Cravou os olhos nela e baixou a voz. Dando-me as jóias que seu marido roubou do pai de sua primeira mulher.

 

Lydia lhe olhou sem compreender.

 

Do que está falando? Perguntou com voz trêmula. Que jóias? Não temos jóias, e Ross não é um ladrão.

 

Clancey se apoiou contra a caixa e procurou dentro da camisa o pôster que levava em cima fazia dois meses, o pôster que havia tirado a vida à puta de Owentown.

 

Olhe bem isto - disse, enquanto alisava as rugas tinham amassado o papel. Esse marido estupendo e quase galhardo ao que parece dar tanta importância não é o santo que você crê.

 

Lydia contemplou o desenho e o comparou com o rosto de seu marido. Mais jovem, com cabelo mais longo, sem bigode, mas os olhos, as sobrancelhas e a mandíbula eram de Ross Coleman, sem a menor duvida. Sonny Clark. Leu a lista de delitos que, em teoria, tinha cometido, e gelou o sangue nas veias. Sentiu-se tonta e se apoiou no bordo da cômoda para não perder o juízo.

 

Não estava segura, mas a cifra cinco seguida de três zeros devia representar uma boa quantidade de dinheiro oferecida como recompensa à pessoa que informasse sobre o paradeiro de Sonny Clark.

 

Elevou seus olhos abatidos para Clancey.

 

Vai denunciá-lo pelo dinheiro.

 

O homem arranhou o gordurento cabelo.

 

Não sou um homem ambicioso. Imagino que as jóias devem valer mais de cinco mil, e não seria necessária a intervenção da lei, já me entende. Portanto, pensei que você poderia me dar as jóias e eu me separaria de seu caminho. Despediríamo-nos como bons amigos e deixaria em paz ao seu mando e ao pequeno.

 

Lydia abriu os braços.

 

É que não há jóias. Já disse que não sei do que está falando.

 

Ele a agarrou e aproximou seu rosto ao dela.

 

E eu te digo que sim, garota. Vi ao seu sogro falando com um cavalheiro elegante, que parecia ser um representante da lei. Perseguem ao seu marido por raptar a sua própria esposa e levar as jóias como bota de cano longo.

 

Ross não faria...

 

Clancey a agitou com violência.

 

Deixa de dizer isso. Ele é um assassino, verdade?

 

Lydia tentou pensar. Não pôde. Ross, um assassino? Sua habilidade no manejo das armas. Mas um assassino? Assassino. Assaltante de bancos. Assaltante de trens. Era impossível, e entretanto o pôster assim o afirmava.

 

Não sei nada dessas jóias. Ross amava a sua mulher. Dirigiam-se a Telhas para fazer-se criadores de cavalos. Não a raptou.

 

Bom, isso é o que seu sogro pensa, e está ansioso por saber o que foi deles. Eu me ocuparei de que se inteire, a menos que você encontre essas jóias e me dê isso. Beliscou a parte mais carnuda de seu braço. Não estará mentindo ao velho Clancey sobre essas jóias, verdade, garota?

 

Não respondeu Lydia, e Clancey se deu conta de que dizia a verdade. Afrouxou um pouco sua presa. Se houver jóias aqui, não sei onde estão.

 

Deveria as encontrar, por seu próprio interesse.

 

Ross se desfez das coisas de Vitória quando nos casamos. Acredito que as enterrou ou as deu. Não sei. Seria impossível as localizar agora. Além disso, não posso roubar ao meu marido, exclamou.

 

Prefere que acabe como aquele pequeno loiro que tive que matar, né? Era teu amigo, verdade?

 

Lydia ficou imóvel e branca como a cera.

 

Luke? Balbuciou. Você matou ao Luke?

 

Chamava-se assim? Não fomos apresentados antes que corresse para o acampamento para avisar de que eu lhes seguia. Tinha que impedi-lo, verdade? E o impedi.

 

Lançou uma risada maníaca.

 

Lydia cobriu a boca quando a bílis ascendeu de novo. Luke Langston tinha morrido por sua culpa. Depois de que a encontrasse no bosque e se ocupasse de que a atendessem até recuperar a saúde, o moço tinha morrido de uma maneira absurda.

 

Detestaria ter que fazer algo tão feio outra vez, seriamente, mas se esse pequeno daí não é meu, como você diz... Emudeceu de forma ameaçadora e acariciou a folha da faca enquanto olhava a Lee, que tinha despertado e gorgolejava e agitava os membros alegremente. E se entregasse seu marido à lei, bem, só ficaríamos você e eu outra vez. Não estaria mau.

 

Acariciou seu seio com a ponta da faca e o moveu ao redor do mamilo.

 

Ela apartou a mão com coragem.

 

Eu... procurarei as jóias, mas não acredito que as encontre. Se não puder as encontrar, deixará-nos em paz, verdade?

 

Não tem alternativa, irmãzinha, porque se não encontrar nada, terei que procurar dinheiro de outra maneira, por exemplo, indo à lei para comunicar que conheço o paradeiro de Sonny Clark. Inclinou-se para ela e lhe arrojou seu fôlego fétido ao rosto. É tão bom na cama como eu, irmãzinha?

 

Deixa de me chamar isso! Não sou sua irmã.

 

Não, é claro que não. Arranhou o áspero queixo. Possivelmente minha concubina. Ela empalideceu, e Clancey voltou a emitir sua risada repugnante. Não penso nisso agora, porque tenho que me preocupar com meu futuro. Embainhou a faca e se aproximou da entrada do carro. Virei a ver-te freqüentemente. Tem trabalho que fazer. Olhou uma vez mais a Lee. É claro que é bonito. Seria uma pena que algo mau lhe acontecesse.

 

Desapareceu.

 

Lydia desabou sobre o chão do carro, seus músculos se renderam por fim depois do terrível sobressalto de ver Clancey vivo, disposto a converter de novo sua vida em um inferno.

 

Arrastou-se para a cama e se deitou. Levantou os joelhos até o peito em um gesto protetor, como tinha feito tantas vezes depois de que Clancey abusava dela. Como naquelas ocasiões, chorou, porque Clancey a seguia violando, embora de outra maneira. Estava violando a nova vida que tinha empreendido com Ross. Tinha-a manchado por dentro antes que ela soubesse o que era amar. Tinha-a manchado. Por causa de sua maldade, Lydia tinha se considerado indigna, até que Ross tinha conseguido que se sentisse limpa e valiosa como ser humano.

 

Agora Clancey Russell ia destruir sua vida pela segunda vez.

 

Lydia?

 

Ouviu que Ross a chamava do exterior e se apressou a secar suas lágrimas. Não devia sabê-lo. Devia evitar a toda custo que o averiguasse. Ele a desprezaria se inteirasse de algo. Repugnaria-lhe saber que tinha entregue seu filho aos cuidados de uma mulher que tinha mantido relações íntimas com alguém como Clancey, por não mencionar a repulsão que experimentaria por ter estado com ela. Lydia se propôs fazer quanto estivesse em suas mãos para impedir que Ross o averiguasse.

 

Ross apartou as lonas e olhou no interior.

 

Lydia, o que ... ? A viu deitada sobre o colchão e pensou, alarmado, que lhe ocorria algo. O que acontece?

 

Saltou dentro e se ajoelhou ao seu lado. Agarrou sua mão e a apertou com força.

 

Ross era bonito aos seus olhos, até com as roupas poeirentas da viagem, o cabelo amassado de usar o chapéu todo o dia, a linha vermelha que a cinta do chapéu tinha desenhado em sua testa. Era bonito e o amava.

 

Amava-o. O sentimento a embargou, encheu-a, fluiu às extremidades de seu corpo. Embora tivesse sido um assassino, um ladrão, face ao que tivesse feito ou qual era o seu autêntico nome, amava-o. Nunca devia saber de Clancey. Nunca.

 

Ross viu as lágrimas em seus olhos e tragou saliva. Atingiu-lhe um medo que jamais tinha imaginado.

 

Lydia, está doente?

 

Ela sacudiu a cabeça com veemência e apertou a mão de Ross contra sua face.

 

Não me encontro muito bem, mas não estou doente. Só cansada, acredito.

 

O alívio de Ross foi evidente. Seus ombros relaxaram enquanto exalava um suspiro.

 

Todo mundo tem direito a descabeçar uma sesta de vez em quando. Tomou o pulso na garganta. Está segura de que está bem?

 

Sim, sim. A jovem se levantou. Já estou bem. Darei a mamadeira a Lee, e depois prepararei o jantar...

 

Tranqüila - riu Ross, e apoiou as mãos sobre seus ombros. Antes de pensar em jantar, quero provar algo no que estive pensando todo o dia.

 

Agarrou o queixo de Lydia entre o polegar e o dedo médio, e elevou sua boca. Ao princípio aplicou uma leve pressão, depois abriu os lábios e reclamou os de Lydia com a doce sucção que era sua especialidade.

 

Lydia, que se sentia manchada pela presença de Clancey, liberou sua boca da de Ross e se apartou. Considerava ao seu meio-irmão uma enfermidade que a tinha infectado durante dez anos, e não queria contagiar Ross.

 

Acredito que os feijões vão queimar.

 

Antes que ele pudesse detê-la, ela saiu do carro.

 

Comportou-se igual o resto da noite. Ross não compreendia o motivo. Estava nervosa, saltava ao menor ruído. Lydia era faladora, entretanto, aquela noite foi incapaz de terminar uma frase. Inclusive se mostrou áspera com Marynell e Anabeth, que vieram depois do jantar para oferecer-se a cuidar de Lee enquanto Ross e ela foram passear juntos.

 

Ross se levantou confundido do tamborete. A última vez que tinham ido de passeio depois do ocaso, afastaram-se bastante do acampamento para fazer amor em um campo de trevos.

 

Enquanto rodavam pelo perfumado prado e se beijavam com paixão, ele tinha lutado com as calças de Lydia, por debaixo da saia. Ela não tinha protestado, mas teve um susto quando, ainda vestido, Ross se tinha posto em cima dela.

 

Ross, o que faz? Exclamou.

 

Adivinha-o - replicou ele, enquanto rodeava suas nádegas com as mãos e a atraía para si.

 

Lydia emitiu um ofego de prazer quando ele a penetrou. Tocou-a de uma maneira nova e seus sentidos entoaram uma canção. Parecia uma virgem, com a saia desdobrada em círculo ao seu redor e as pernas abertas, mas não havia nada recatado em seu olhar erótico, quando o instinto de seu corpo ditou que rodasse em cima de Ross.

 

Este tinha acariciado suas coxas, indo para cima, mais acima, até tocar ao ponto em que seus corpos se uniam. Olhou-a enquanto Lydia jogava a cabeça para trás e seu cabelo caía sobre suas costas, e afundou os polegares para o autêntico centro de seu corpo. Sempre com a mesma delicadeza, massageou a chave que abria toda a sua feminilidade. Os polegares esfregaram a fonte mágica e notou que o corpo de Lydia se fechava ao seu redor como um punho de seda.

 

Ela gritou seu nome aos céus e caiu para frente, apoiando-se com os braços em cima dele. Ross puxou a blusa da cintura de sua saia, levantou-a e abriu a regata. Beijou seus seios, seguiu a forma dos mamilos com a língua. Tanta ternura era a contrapartida da violenta explosão que teve lugar em suas virilhas.

 

Muito depois ela tinha jazido como uma bonita boneca em cima de seu peito. Ross tinha sorrido ao céu, aspirado o perfume do trevo, o dele, o dela, o da noite do verão, e admitido que nunca tivesse experimentado tanta paz, bem-estar e felicidade em sua vida. Tinha engrenado as mãos sobre suas costas para apertá-la contra ele. Tinha que agradecer aquela mulher tanta sorte.

 

Por isso, quando as filhas dos Langston sugeriram que fossem dar um passeio, o pulso de Ross se acelerou e seu corpo reagiu da maneira mais profunda.

 

Lydia rechaçou o convite e seu crescente desejo com um seco «Não quero que ninguém cuide de Lee, exceto eu». As moças a olharam com uma expressão peculiar.

 

Esteve nervoso todo o dia. Possivelmente tenha dor de estômago.

 

Aquela noite ela se deitou antes que Ross entrasse. Ele se deu conta de que não estava adormecida, embora o fingisse. Amaldiçoou às mulheres em geral quando se deitou ao seu lado. Que caralho lhe passava?

 

Então sentiu uma pontada de culpabilidade. A regra.

 

Por Deus, quase tinha esquecido que Vitória passava vários dias na cama por essa causa, e Lydia tinha conduzido a carreta todo o dia, cuidado de Lee e cozinhado.

 

Voltou-se para ela.

 

Lydia?

 

Tinha o rosto separado de Ross e revivia mentalmente seu encontro com Clancey, ao tempo que tentava reprimir o medo que retorcia suas vísceras.

 

Sim?

 

Não merecia ser sua esposa. Tinha sido a puta de Clancey. Não por sua vontade, mas sua puta, a fim de contas. Um soluço escapou de seus lábios.

 

Ross o ouviu e a voltou para ele, sem fazer caso de sua momentânea resistência. Apertou seu rosto contra o peito e acariciou seu cabelo.

 

Dorme - sussurrou, e depositou um beijo suave sobre sua têmpora. Já não amaldiçoava a ternura que lhe inspirava. Sua origem era uma parte dele que desconhecia. Não podia controlá-la, de modo que se entregou a ela. Ainda amava Vitória e sempre a amaria, mas ela estava morta, ele estava vivo, e um homem civilizado necessitava de uma companheira.

 

Estará melhor pela manhã.

 

Ross foi o primeiro a dormir. Lydia, ao seu lado, escutou o ritmo regular de seu coração, cheia de amor, e se perguntou como ia escapar de Clancey desta vez.

 

Começou a tranqüilizar-se um pouco quando transcorreram três dias sem que Clancey aparecesse de novo. Possivelmente só tinha brincado com ela para assustá-la. Possivelmente lhe tinha passado algo. Possivelmente...

 

De todos os modos Lydia esteve revistando o carro.

 

Ainda não me sinto bem - mentiu a Ross a manhã seguinte à visita de Clancey. Crê que Bubba se importaria me substituir hoje? Acredito que ficarei dentro com Lee.

 

Ross a examinou com atenção, mas ela evitou seus olhos. Estava doente de verdade e não o queria dizer? Ross não lhe tinha feito amor, pois supôs que aquela noite ela não teria respondido como sempre a suas carícias. Acaso Lydia pensava em abandoná-lo? Um milhão de possibilidades passaram por sua mente, e não suportava nenhuma.

 

De acordo - respondeu tirante, e se afastou.

 

Lydia sabia que estava pondo a prova os nervos de Ross, mas não podia evitá-lo. Estava lutando por sua vida, pela dele e pela de Lee.

 

Aquele dia olhou em todas as caixas, em todas as gavetas da cômoda em qualquer lugar onde Ross ou Vitória tivessem podido ocultar as jóias. Não acreditava que Ross soubesse algo dessas jóias, em que pese a que tinha escondido dinheiro no carro. Descobriu-o em um açucareiro de porcelana da China que Ross tinha envolto com papel de jornal. Mas não achou nem rastro das jóias.

 

Clancey devia estar equivocado, mas se não encontrava o que ele estava decidido a possuir, o que aconteceria? Denunciaria Ross? Maltrataria Lee? Diria a Ross que ela era sua concubina?

 

Não demorou a descobrí-lo.

 

Ao quarto dia, enquanto estava inclinada sobre a fogueira, levantou a vista e o viu de pé a escassos centímetros dela. Não sabia de onde tinha saído. Materializou-se de um nada.

 

Encontraste-o? Perguntou.

 

Não. Não há nada. Procurei.

 

Não me venha agora com desculpas. Está aí, digo que sim.

 

Não, Clancey.

 

Passeou um nervoso olhar ao seu redor. O que ocorreria se alguém a via falando com ele? Todo mundo estava dedicado aos seus afazeres, como se tratasse de uma noite qualquer, e não aquela em que seu mundo se faria migalhas... pela segunda vez.

 

Disse que as estive procurando.

 

Por toda parte?

 

Sim - afirmou ela com energia.

 

Clancey arranhou a virilha.

 

Bem, nesse caso, acredito que deverei me aproximar da cidade mais próxima e avisar ao xerife de que neste carro se oculta um homem procurado pela lei. Suponho que se produzirá um bom alvoroço.

 

Afastou-se dois passos.

 

Não, espera! Gritou Lydia.

 

Clancey deu meia volta e a transpassou com o olhar.

 

Lydia retorceu as mãos e umedeceu seus lábios.

 

Eu... Possivelmente exista lugares onde não procurei. Não é fácil.

 

Não disse que fosse ser fácil. Disse o fizesse.

 

Dê-me uns quantos dias mais, Clancey, por favor.

 

Ele se aproximou dela com ar predador.

 

E para abrandar meu coração, o que me dará, né?

 

Lydia retrocedeu. Ele a seguiu.

 

Ainda não tive tempo de passar por uma cidade, compreende? Faz dias que gostaria muitíssimo de uma mulher, e...

 

Será melhor que tenha poderosos motivos para tentar encurralar a minha mulher contra o carro, senhor.

 

A voz mortífera se ouviu o meio metro de ambos, quando Ross saiu pelo outro lado da carreta. Clancey reagiu com instinto animal e lançou a mão para a capa da faca.

 

Eu não o faria - se limitou a advertir Ross.

 

Foi suficiente. Antes que a mão de Clancey tivesse chegado a metade do caminho da capa, Ross já empunhava a pistola, cujo canhão ficou apoiado sobre a ponta do nariz largo e esmagado de Clancey, justo entre os olhos. Clancey levantou as mãos e as estendeu tanto como pôde, para as afastar ao máximo de seus flancos.

 

Agora, ao menos que queira que lhe voe os miolos, sugiro que se afaste de minha mulher.

 

Era a primeira vez em sua vida que Lydia via Clancey obedecer a alguém. Nunca tinha emprestado atenção às ordens ébrias de Otis Russell. Estava pálido e suado quando se afastou dela, arrastando os pés.

 

Cuidado com esse Colt, senhor - gaguejou Clancey, e tratou de lançar uma risada. Sua mulher é tão assustadiça como um pônei. Só perguntei onde estava você e começou a tremer.

 

Ross não acreditou nem por um momento. Lydia tinha o aspecto de ter visto um fantasma.

 

Bem, já me encontrou. O que quer?

 

Trabalho: Você é Coleman, verdade?

 

Lydia olhou assustada a Clancey. O que era o que pretendia? Ross ficou imediatamente à defensiva. Lydia viu que seus olhos cintilavam e seus lábios se apertavam sob o bigode.

 

Quem quer sabê-lo?

 

Meu nome é Russell.

 

Antes de seguir falando, Clancey tratou de advertir se produzia alguma reação por parte de Coleman, para ouvir seu nome, mas não foi assim. Isso significava que a garota não lhe tinha falado de seu passado. Desejou possuir a coragem suficiente para lhe comunicar que era ele quem lhe tinha enchido a sua barriga como um tambor grande.

 

Ouvi que tem uns cavalos estupendos.

 

Onde o ouviu?

 

Não me lembro – enrugou o rosto, como se tentasse recordar. Sou bom com os cavalos, e pensei que talvez me contrataria para ajudar a cuidá-los.

 

Ross baixou o canhão da pistola e a embainhou.

 

Não necessito de ajuda - espetou.

 

Seguro que são uns animais estupendos. Não pode emprestar um pouco de ajuda a um pobre homem?

 

Hei dito que não necessito ajuda - repetiu Ross, com uma voz que tivesse segado as veias de um homem valente - Já contratei a um jovem para me ajudar.

 

Clancey estalou a língua.

 

Vá, que pena, não? A história de minha vida. Um dia tarde e um dólar menos.

 

Já pode partir, Russell - disse Ross.

 

Lydia advertiu um momentâneo brilho de ódio no rosto de Clancey. Não gostava que lhe dissessem o que devia fazer, e Ross já o tinha humilhado uma vez.

 

Muito bem. Sinto lhe haver incomodado. Saudou com o chapéu a Lydia. Lamento havê-la assustado, senhora. Evito os problemas sempre que posso. Apoiou a mão sobre a camisa e Lydia ouviu o rangido do papel. Era sua forma de recordar o pôster de busca e captura. Sempre concedo às pessoas o benefício da dúvida.

 

Voltaria a averiguar se tinha descoberto as jóias.

 

Vá embora, Russell.

 

Os lábios de Ross nem sequer se moveram quando pronunciou estas palavras.

 

Clancey lhe dirigiu um olhar de ódio, esboçou um sorriso matreiro e se afastou para um esquálido cavalo, que estava preso e não longe do carro. Ross e Lydia o seguiram com o olhar até que se perdeu de vista.

 

Ross se voltou para ela e a agarrou pelos ombros. Dobrou os joelhos para esquadrinhar melhor seu rosto.

 

Fez mal a você? O que disse? Está bem?

 

Os dentes de Lydia bateram e gaguejou quando respondeu.

 

Sim, estou bem.

 

Estava morta de medo. Vi a expressão em seu rosto.

 

Fui uma parva por me assustar. Era estranho, mas acredito que inofensivo.

 

Bem, pois eu não acredito. Vou seguí-lo...

 

Não! Gritou Lydia, e o agarrou pelas mangas. Não, Ross. É... Poderia ser perigoso.

 

É o que parece, não advertiu que se havia contradito. Ross lamentava não ter disparado sobre aquele homem quando teve a oportunidade de fazê-lo. Conteve-se para não aterrorizar Lydia. Nunca a tinha visto tão aterrorizada.

 

Só até que se afaste o bastante. Enviarei a Bubba para que te faça companhia.

 

Ross estava ansioso por assegurar-se de que o tal Russell só era um vagabundo. Incomodava-lhe que aquele homem soubesse tanto sobre ele. Sabia algo mais, além de que Ross Coleman possuía uma manada de cavalos? Sabia algo a respeito de Sonny Clark? Valia a pena comprová-lo.

 

Ross seguia preocupado horas depois, quando retornou ao acampamento, depois de ter perdido o rastro de Russell depois do anoitecer. Passeou pelo acampamento e perguntou se alguém tinha visto aquele tipo ou falado com ele. Tranqüilizou-se um pouco quando o senhor Lawson lhe contou que Russell tinha estado no curral pela tarde, quando se dispunha a acampar.

 

Perguntou-me de quem eram os cavalos. Disse o seu nome. Inclusive indiquei sua carreta. Sinto muito, Ross.

 

Não importa. Suponho que efetivamente tão somente é um vagabundo em busca de trabalho, mas não acredito que nos convenha sua companhia.

 

Estou de acordo admitiu Lawson. Um inseto repugnante.

 

Ross voltou para o seu carro e decidiu que tinha deixado voar muito sua imaginação. Tinham passado mais de três anos desde que uma bala lhe tinha alcançado e o tinham dado por morto. No que Ross Coleman concernia, Sonny Clark tinha morrido. Não obstante, os caçadores de recompensas e agentes da lei se alegrariam muito de saber que vivia sob uma nova identidade. As precauções nunca eram poucas.

 

Bubba estava sentado nos degraus do carro e contemplava as brasas agonizantes da fogueira. Ficou em pé de um salto e agarrou o rifle apoiado contra a parte posterior do carro quando ouviu aproximar-se de Ross.

 

Tranqüilo, sou eu disse Ross. Onde está Lydia?

 

Adormecida - respondeu Bubba, com a mesma melancolia que manifestava da morte de Luke.

 

Lee está bem?

 

Sim.

 

Alguma novidade durante minha ausência?

 

Não.

 

Não podia contar a Ross que Priscilla Watkins lhe tinha aproximado às escondidas e lhe tinha suplicado que falassem. Deslizou-se por detrás dele assim que Lydia entrou na carroça e apagou o abajur.

 

Bubba tinha sussurrado da escuridão.

 

O menino tinha girado em redondo, e ao ver quem lhe tinha sobressaltado e arrancado de sua triste reflexão, olhou-a com fúria.

 

Vá embora - murmurou, e voltou a sentar-se nos degraus do carro.

 

Quero falar contigo, Bubba - choramingou a moça. Evitaste-me desde... desde ... desde dia que mataram ao Luke.

 

Exato. Compreendeste a mensagem?

 

Priscilla apertou os dedos contra os seus lábios trêmulas.

 

Por que me trata tão mal, Bubba? Deixei que me fizesse amor, fui amável contigo, e agora me paga isso assim. Como qualquer homem, que primeiro pede e suplica satisfazer sua luxúria, e depois deixa plantada a pobre garota que se deixou utilizar.

 

Bubba já se sentia bastante miserável, não necessitava que lhe acossasse. Sabia que a estava tratando mau, mas cada vez que a olhava recordava o cadáver de Luke, pendurando nos braços de Moisés.

 

Se não tivesse estado com Priscilla aquela tarde. Se não a tivesse manuseado de cima abaixo. Se seus seios..., se sua boca...

 

Em que pese a tudo, notou que uma quebra de onda de paixão lhe assaltava. Controlava o seu corpo, mas não podia dominar nem seu cérebro, nem seu coração. Como podia desejar voltar a fazer amor, quando ainda chorava ao seu irmão? Devia ser um pervertido. Também detestava que Priscilla se desse conta de sua excitação. A moça se aproximou dele, colocado uma mão sobre a braguilha e esfregado seu membro através do tecido.

 

Já não gosta, Bubba?

 

Até na escuridão, o moço pôde dar-se conta de que Priscilla não levava nada debaixo do vestido de chita. Uma ereção tinha sido o fruto de suas manipulações, e um grunhido de desprezo por si mesmo surgiu de sua garganta.

 

Separou-a de um empurrão.

 

Deixe-me em paz.

 

A jovem, enfurecida, jogou para trás o cabelo, chutou o chão e fechou os punhos.

 

Muito bem, mas te advirto que se me tiver feito um menino, lamentará. O meu papai te matará.

 

Tinha desaparecido na escuridão depois daquela funesta, embora absurda, ameaça, e Bubba ficou mais desconsolado que nunca. Tinha pensado que tal circunstância era impossível.

 

Agora saiu de suas meditações para pedir a Ross que repetisse sua pergunta.

 

Hei dito se ficou um pouco de café. Dá igual. Acredito que sim que ficou algo.

 

Ross se serviu dos restos e tirou o pote do fogo.

 

Lydia me disse que ficaram feijões, se por acaso quisesse.

 

Ross negou com a cabeça.

 

Já tenho o bastante. Obrigado por vigiar. Já pode ir ao seu carro. Eu apagarei o fogo.

 

Bubba vacilou, e Ross, ao intuir que a distração do moço era fruto de sua dor pela morte de Luke, esperou, em tanto bebia o café com aparente indiferença. Não pressionaria ao menino para que lhe contasse suas penas, mas se Bubba desejava aliviar sua alma, escutaria-lhe com gosto.

 

Recorda aquele touro que tinham nossos vizinhos do Tennessee. O pedimos emprestado para nossa vaca - começou Bubba sem mais preâmbulos. Pigarreou e esfregou a mão na perna da calça da calça. Logo, atirou de um fio solto do punho da camisa. E, bom, cada vez que..., já sabe, cada vez que ele a montava, ela paria.

 

Sim - respondeu Ross. Tomou outro sorvo de café e contemplou os carvões fumegantes.

 

Estava-me perguntando - tossiu, se ocorre o mesmo conosco. Com os humanos, refiro-me.

 

Ross atirou os restos do café ao chão e se levantou. Tirou o chapéu, pendurou-o de um prego que me sobressaía da parte posterior do carro, tirou a camisa e verteu água na bacia de lata que utilizava para lavar-se.

 

Se o que perguntas for se uma mulher concebe cada vez que está com um homem, a resposta é não - respondeu, depois de molhar o rosto e o pescoço. Secou-se com uma toalha.

 

Quantas vezes crê que são necessárias? Quero, dizer... se entrar nela várias vezes, digamos três ou quatro, poderia ser que ... ?

 

Bubba - Ross apoiou uma mão sobre o ombro do moço - Por que não me conta o que se preocupa?

 

Bubba olhou Ross com expressão afligida, e depois inclinou a cabeça. Ross sentiu que os magros ombros do moço começavam a tremer sob suas mãos, depois Bubba explodiu em soluços.

 

A história surgiu a fervuras, seu desejo por Priscilla, um desejo que lhe enlouquecia, o momento em que subornou Luke para que fizesse suas tarefas, enquanto ele se encontrava com a moça junto ao rio. Confessou como tinham passado aquela tarde. Também lhe disse que tinha sido sua primeira vez e que tinha sido uma experiência incrível.

 

Chorava a lágrima viva, depois secou o nariz e os olhos com a manga da camisa, e confessou sua dor:

 

Mas se eu não tivesse estado com ela, Luke ainda seguiria vivo. Foi por minha culpa. Comportei-me como um asqueroso bastardo, enquanto cortavam o pescoço do meu irmão.

 

Ross amaldiçoou ao céu. Por que tinha que sofrer o moço aquela culpa? Não era suficiente que ao seu irmão tivessem assassinado brutalmente?

 

Contemplou o rosto desolado da Bubba e quase invejou sua capacidade de gostar tanto de alguém. Quando ele tinha a idade daquele moço, matou ao seu primeiro homem. Não havia sentido nada, salvo certo júbilo. Não havia sentido nenhuma pontada de remorso, muito menos o desespero atormentador que experimentava Bubba. O menino ignorava a sorte que tinha ao ser capaz de chorar.

 

Não foi por sua culpa, Bubba disse. Luke sempre ia passear sozinho. Poderia ter ocorrido em qualquer outro momento. Foi pura coincidência que você estivesse então com Priscilla. Ross recordou os dias em que desejava com tanto ardor a Lydia que acreditou morrer se não a possuísse. Qualquer homem compreende o que é desejar a uma mulher.

 

Caralho, quisera não a houvesse tocado. Agora ela diz que poderia estar grávida. Mamãe me matará. Se a dela não me mata antes.

 

Ross lançou uma gargalhada, e Bubba lhe olhou surpreso.

 

Você gosta muito de Priscilla?

 

Ross não queria denegrir a moça se por acaso o menino estava apaixonado por ela, ou acreditava está-lo.

 

Bubba se removeu inquieto.

 

Ao princípio pensei que queria me casar com ela. Seriamente pensava que a amava. Amaldiçoou outra vez. Priscilla tem razão. Disse que só me interessava me deitar com ela, e agora que já aconteceu, importa-me. Suponho que terei que me casar com ela - acrescentou com escasso entusiasmo.

 

Terá que pegar a fila.

 

O que?

 

Scout me disse que Priscilla o estava pressionando para que se casasse com ela, Bubba disse com suavidade. Essa moça esteve com muitos outros homens. Não esclareceu que ele também tinha recebido o convite muitas vezes. Priscilla o tinha sugerido com sutileza, mas um homem não podia deixar de dar-se conta. E se ficar grávida, custará muitíssimo demonstrar quem é o pai. É um pendão muito preparado e te faz dançar ao seu som. Quando viu a expressão desolada do moço, aplaudiu-lhe as costas. Há uma Priscilla na vida de cada homem, a garota que lhe inicia, que lhe seduz, e que logo atua como se estivesse ofendida.

 

Você também teve uma, Ross?

 

Ross franziu o cenho e se perguntou o que diria Bubba se soubesse que ele tinha sido iniciado por todo um harém, cujas mulheres lhe tratavam com atenção agradada as tarde ou noites em que o negócio não ia muito bem. Sorriu na escuridão e seus dentes cintilaram.

 

Esta é a segunda lição que deve aprender: um cavalheiro não fala destas coisas.

 

Viu que Bubba sorria e se tranqüilizou. Pela primeira vez do assassinato de Luke, voltava a ser ele mesmo.

 

Não se culpe pela morte de Luke.

 

Sempre terei remorsos.

 

Claro que sim. A dor demorará para desaparecer admitiu Ross, mas um homem tem que deixar para atrás seus equívocos e tratar de melhorar a próxima vez. Assinalou com um dedo ao moço. E te afaste de pendões como Priscilla Watkins. Se ela te deixou que a possuísse, também deixará que qualquer outro homem o faça. Dentro de uns anos encontrará a alguém especial.

 

Como Lydia.

 

Lydia?

 

Ross elevou a cabeça com brutalidade. Pensava que Vitória seria a mulher ideal para um jovem.

 

Bubba tragou saliva, temeroso de ter suscitado a ira de Ross.

 

Não queria te ofender, mas Lydia é a mulher mais bonita que vi em minha vida. Luke e eu pensamos o mesmo o dia que a encontramos no bosque, embora então seu aspecto fosse desastroso.

 

Como seu ídolo ficou lhe olhando sem a menor expressão, Bubba prosseguiu:

 

É frágil e limpa, mas não a assustam as tarefas duras.

 

«Lydia, deitada entre os trevos, com a roupa enrugada, ria das manchas verdes de suas meias e lhe pegou em brincadeira quando ele brincou a respeito de um ponto úmido em seu joelho. Lydia, que nunca se zangava com ele por revolver seu cabelo com os dedos. Lydia, com rugas de concentração no rosto, inclinada sobre as páginas de um livro, que se esforçava por ler corretamente.» 

 

É fina e tudo isso, mas também é valente.

 

Valente? Repetiu Ross. Era como se estivessem falando de alguém a quem Ross não conhecesse, mas sobre quem desejasse solicitar opiniões.

 

Sim. Quando você se ausentou, ela se encarregou de cuidar dos cavalos, porque eu me sentia mortificado. Ao princípio lhe deram medo, mas não deixou que isso a detivesse. Possivelmente não lhe deveria dizer isso, mas lhes dá açúcar às escondidas e assim conseguiu que os animais emprestem tanta atenção às palavras que lhes sussurra como a ti. Também me perseguiu para que a ensinasse a montar. Disse que o faria se você não se opunha, mas ela explicou que queria mantê-lo em segredo até que pudesse te fazer uma surpresa. Dou-lhe lições com uma das éguas sempre que você tem que se ausentar. Não se importa, verdade, Ross?

 

Ross, aturdido, meneou a cabeça. Lydia montando a cavalo?

 

Não, acredito que tem que acostumar-se aos cavalos, porque estará rodeada deles quando nos estabelecermos.

 

Tinha querido lhe fazer uma surpresa?

 

Isso é o que eu pensei - disse Bubba, contente de que Ross não se zangasse com ele por tomar a liberdade de ensinar a sua mulher a montar. Teria que vê-la, presa à cadeira como se o fosse nisso a vida. Lançou uma risada. Está aprendendo a montar escarranchada, claro, se por acaso não tivesse uma cadeira de mulher.

 

Claro.

 

Finge que não sabe quando te der a surpresa.

 

É obvio.

 

Bubba olhou para o carro com expressão ofegante.

 

Quisera eu encontrar uma mulher como Lydia algum dia. Depois, temeroso de ter ultrapassado os limites da amizade, apressou-se a acrescentar. Boa noite, Ross, e obrigado por ... obrigado por tudo.

 

Desapareceu na escuridão.

 

Boa noite respondeu Ross, distraído.

 

O carro estava às escuras e mediu até chegar ao colchão. Tirou-as botas e as calças, e se deitou junto à forma adormecida de sua mulher.

 

Ross? Perguntou ela.

 

Já voltei.

 

Seguiu-lhe?

 

Perdi-lhe na escuridão. Acredito que não se escondeu pelos arredores. Não há por que preocupar-se.

 

Lydia rezou para que fosse certo.

 

Jantaste algo?

 

Não tenho fome.

 

Um rugido de seu estômago lhe desmentiu.

 

Sim que tem! Exclamou Lydia. Estendeu a mão para lhe acariciar o estômago, mas errou seu objetivo e roçou com os dedos a flecha de pêlo acetinada que apontava desde seu umbigo para baixo.

 

Ross gemeu quando seu corpo reagiu de maneira instantânea. A abstinência que tinha mantido durante os dias em que Lydia fazia ornamento daquele estado de ânimo tão volúvel já lhe estava afetando. Quando Lydia ia retirar a mão, ele se apoderou dela e a apertou sobre seu abdômen. Livrou-se da roupa interior e tirou a camisola com a mão livre.

 

Tenho fome, Lydia. Dê-me de comer.

 

Beijou-a com voracidade, lançou a língua para sua boca. Descreveu um caminho de dentadas até o pescoço. Atrasou-se na curva de seu seio e vagou sem rumo até encontrar o mamilo.

 

A jovem gemeu de prazer.

 

Provou meu leite uma vez. Lembra-te?

 

OH, Deus, é claro que sim - murmurou Ross, e introduziu ou em sua boca a maior quantidade de seio possível.

 

Quisera que ainda tivesse leite. Daria-te de comer muito a gosto, Ross.

 

O gemido que exalou Ross nasceu de seu coração, em sua alma, e obrigou que a mão de Lydia descendesse por seu corpo. Lydia só resistiu um momento, e logo permitiu que ele guiasse sua mão da abundante mata de pêlo para o seu membro viril. Então Ross liberou sua mão, para que ela procedesse ao seu desejo.

 

Ross, como em estado de transe, sussurrou o nome de Lydia, recitou-o enquanto beijava os seus seios, acariciava-os com a língua e o bigode, mordiscava-os brandamente com os lábios. Lydia, pensando no muito que o amava, percorreu com as pontas dos dedos a dura e aveludada longitude de seu membro. A seguir fechou a mão ao seu redor.

 

Ross emitiu uma blasfêmia, ou talvez uma prece, quando os dedos de Lydia começaram a tomar nota da forma, o tato, a textura e a dureza do membro. Ela descobriu as primeiras gotas de umidade em seu pênis e as utilizou para lubrificar a ponta do seu pênis.

 

OH, Deus, Lydia. Sim, sim.

 

Suas palavras eram desconexas; sua respiração, entrecortada.

 

Mais depressa, meu amor. Assim. OH, querida... OH...

 

Avançou sobre ela e pediu desculpas por sua pressa. Não foi necessário, porque o corpo de Lydia estava cheio de desejo e seu coração saltava de alegria pelo presente que lhe tinha devotado. Ross mergulhou em sua fogueira, e quando tudo teve acabado, quando descansou em uma neblina dourada de esgotamento e satisfação suprema, pensou no que Bubba havia dito. O moço tinha toda a razão.

 

Lydia era uma mulher muito especial.

 

 

Madame LaRue contemplou com indiferença o desenho a tinta que descansava sobre o escritório do abarrotado e cheio salão que as garotas chamavam «a habitação da frente». Retorceu uma mecha de cabelo negro como o azeviche ao redor de seu dedo. Se lhe causou surpresa o rosto que a olhava do papel, não o demonstrou. Não arqueou as sobrancelhas pintadas, reprimiu qualquer movimento de seu rosto empoeirado, suas faces não se tingiram de cor, salvo pelo ruge que se aplicou antes.

 

Não, cavalheiros. Esse não é o homem que enviei à habitação de Pearl a noite que foi assassinada. Estão seguros de que não gostariam de um pouco de xerez?

 

Gentry saltou da poltrona de brocado rosa, aproximou-se da janela e apartou com rudeza as cortinas com borlas. Majors, diplomático, paciente e imperturbável como sempre, falou com amabilidade à mulher, que tinha feito um nome no pouco tempo que levava em Owentown. O assassinato de Pearl, ao que parece sem motivo, tinha servido para rodear as suas garotas de uma aura de intriga que Madame tinha lucrado.

 

Madame LaRue disse Majors, recorde que isto só é a reprodução artística de uma fotografia. Rogo-lhe que o olhe de novo e nos diga se tiver visto alguma vez a este homem em seu... local.

 

Isso não é o que me tinha perguntado, senhor Majors. Você me perguntou se era o homem que enviei a Pearl, e lhe respondi que não.

 

Estamos perdendo o tempo! Explodiu Gentry. Afastou-se da janela e descarregou um murro sobre o escritório de Madame. Por que intercambia jogos de palavras com esta puta?

 

Os olhos ardilosos de Madame percorreram de cima abaixo ao cavalheiro alto e distinto, enquanto seus lábios pintados desenhavam uma careta de desprezo. Tinha conhecido a muitos de sua estirpe. Aqueles autonomeados guias morais da comunidade dirigiam campanhas contra locais como o seu, mas os freqüentavam com mais regularidade que a maioria dos homens e estavam acostumados a preferir às putas mais viciosas.

 

Desprezou Gentry com um delicado bufo. O homem da Pinkerton era um autêntico cavalheiro, em que pese a ser um representante da lei. Ela não o discriminava por que o fosse. Alguns de seus melhores amigos e fiéis clientes tinham sido homens da lei.

 

Por favor, senhor Gentry suspirou Majors, cansado.

 

Arrependia-se até de haver mencionado a viagem a Owentown. Quando tinham retornado a Knoxville e descoberto que não tinha obtido nenhuma informação nova, dedicou-se a investigar todo o material reunido.

 

Tinham descartado previamente o relatório de um agente clandestino destacado em Owentown, o qual tinha acreditado ver um homem parecido com Sonny Clark em um botequim da cidade. Entretanto, o assassinato de uma prostituta na mesma população constituía uma coincidência que valia a pena investigar. Sem nenhuma pista melhor que seguir, Gentry e ele tinham chegado à cidade ferroviária, e tinham decidido interrogar à famosa Madame LaRue, embora começasse a pensar que tinham chegado a outro beco sem saída.

 

Quem é este homem? Perguntou com voz sedosa a mulher, em tão fazia balanço do atrativo de Majors. Possivelmente lhe ofereceria uma sessão gratuita por sua amabilidade, quando terminassem de falar de negócios. Quanto ao outro homem, podia ir à merda. Acaso deveria ser precavida, se me encontrar isso?

 

Não lhe diga...

 

Gentry! Ladrou Majors. Cale a boca.

 

Quando Gentry se derrubou de novo em sua poltrona, furioso, mas calado, Majors continuou. A Gentry incomodava que alguém descobrisse o matrimônio de Clark com sua filha, mas Majors decidiu contar a Madame LaRue a verdadeira história.

 

Chama-se Sonny Clark. Foi membro do bando dos James faz uns anos. Depois desapareceu. Não participou de mais golpes, que nós saibamos, mas a lei ainda o busca. O senhor Gentry desconhecia sua verdadeira identidade, quando lhe contratou para trabalhar em seu rancho.

 

A mulher arqueou as sobrancelhas de maneira eloqüente e lançou um olhar zombador em direção a Gentry. Este avermelhou ainda mais.

 

Agora está casado com a filha de Gentry. Os dois fugiram com as jóias da família, sem deixar nem rastro. O senhor Gentry, naturalmente, está preocupado por sua filha.

 

Por quê? Perguntou Madame com calma.

 

Por quê? Face às advertências de Majors, Gentry voltou a saltar de sua poltrona. Esse homem é um criminoso, um assassino, um ladrão. Só Deus sabe que padecimentos lhe terão infligido.

 

Madame pensou uma vez mais naquela surpreendente jovem que andava com passo orgulhoso e altivo por entre a erva alta, e pensou que sabia cuidar muito bem de si mesmo.

 

Não é o homem que subiu à habitação de Pearl aquela noite repetiu.

 

Nesse caso, já lhe roubamos bastante seu tempo Majors se dispôs a levantar-se. Obrigado.

 

Não obstante, ele esteve aqui.

 

Não falar com a lei de um homem alto e arrumado que a tinha rechaçado porque estava muito apaixonado por sua bela esposa, era uma coisa, mas guardar silêncio sobre um homem alto e bonito que era um famoso criminoso, que tinha sido membro da banda dos James, era abusar da generosidade limitada de Madame. Ao fim e ao cabo, ela tinha que pensar no negócio. E falatórios, estrategicamente pulverizados, de que tinha recebido em seu próprio carro ao foragido Sonny Clark sem sabê-lo, talvez...

 

Contemplou o desenho que descansava sobre o escritório, e pensou no talento daquele homem. O fogo verde de seus olhos podia fundir o coração da mulher mais fria, e Madame o tinha experimentado com mais de um homem. Suas carícias combinavam a rudeza necessária para produzir excitação e a suficiente ternura para que uma mulher se sentisse adorada, em lugar de utilizada. Ela tinha sentido desejo por ele. Quando tinha manuseado seus seios, um ronrono de prazer se formou em sua garganta.

 

Mas também recordava que aquele homem tinha rechaçado seus braços ansiosos, que se tinha solto de seu peso, apagado seu beijo da boca e contemplado seu corpo nu com repugnância, dirigida tanto a ele como a ela. Como podia uma mulher defender a um homem que tinha rechaçado o que outros compravam generosamente?

 

Madame tinha captado a atenção dos dois homens. Estendeu a mão para a garrafa de xerez que descansava sobre o escritório. Pouco a pouco, com respeito, os dois cavalheiros voltaram a sentar-se. Madame serviu o vinho em uma taça de cristal, que estendeu ao senhor Gentry. Seus lábios se curvaram em um sorriso cordial, mas seus olhos continuavam sendo gélidos.

 

Um pouco de xerez, senhor Gentry?

 

Gentry estendeu a mão para a taça, enquanto mordiscava sem piedade a parte interna de sua mandíbula.

 

Sim. Como ela não soltou a taça imediatamente, acrescentou: Por favor.

 

Lydia se deteve para recuperar o fôlego. O tempo era fundamental, e se estava esgotando. Ross chegaria de um momento a outro para jantar. Atlanta Langston tinha pego Lee para dar um passeio pelo acampamento, e logo o traria de volta.

 

Secou a testa suada com a manga e empurrou uma vez mais a cômoda, que se moveu apenas uns centímetros. Tentou-o de novo, e aplicou todo seu peso sobre o móvel. Esta vez conseguiu apartá-lo do flanco do carro.

 

Se as jóias existiam e estavam no carro, Lydia sabia que deviam estar escondidas sob a cômoda. Tinha procurado em todas as partes. Durante dias, em cada momento livre, tinha registrado, elevado as madeira e procurado por todos os esconderijos possíveis. Não tinha encontrado nada e estava ao bordo do desespero.

 

Se podia evitá-lo, não iriam capturar Ross com jóias roubadas em sua posse. Explicaria-lhe como tinha averiguado das jóias no momento adequado..., se é que tinha a ocasião de fazê-lo. Ela seguia acreditando que Ross não sabia nada daquelas jóias. No ínterim, estava disposta a fazer quanto estivesse em sua mão para lhe proteger de Clancey e dos homens que lhe perseguiam.

 

Ficou de joelhos, agarrou a lima que lhe tinha facilitado levantar outras madeira e a encaixou entre as frestas. Ficou a subi-la e baixá-la, o suor que caía sobre seus olhos a incomodava, por fim conseguiu elevar parte da tabela. Deslizou a mão por debaixo, mecanicamente, sem a menor esperança.

 

Seu fôlego se deteve o mesmo tempo que sua mão se imobilizava. Pois em lugar de apalpar a tosca superfície inferior do carro, sua mão tinha entrado em contato com algo brando.

 

Olhou debaixo da tabela, ao tempo que sua mão se apoderava do objeto brando e o extraía. Viu que se tratava de uma bolsa de veludo negro, de uns vinte e cinco centímetros de comprimento e quinze de largura, atada com uma corda de seda negra pela parte superior. Era pesada.

 

O suor escorregou por suas têmporas e entre os seios de Lydia, quando desatou o nó e inclinou a bolsa sobre sua palma. O conteúdo se esparramou. Sua forte exclamação ressonou no carro silencioso, golpeado pelo sol. O pulso ensurdecedor que pulsava no interior de sua cabeça apagou os ruídos procedentes do exterior.

 

Sua mão estava cheia de objetos bonitos. Nunca, até então, tinha visto uma jóia, exceto as bagatelas do mascate e algum ocasional camafeu ou medalhão que as senhoras usavam aos domingos. Contemplou com reverência as pedras resplandecentes multicoloridas, que molharam as cores do arco sobre as paredes de lona da carreta, quando captaram o brilhante sol da tarde que se filtrava pelas frestas. Anéis, brincos, braceletes, colares, broches, alguns com engastes de ouro e prata, complexos e frágeis como teias. Lydia não apreciou seu valor monetário. Só se deleitou em sua beleza.

 

Saiu de seu sonho e guardou os objetos na bolsa. O que podia fazer? Se a escondia em outro lugar antes de entregá-la a Clancey, cabia a possibilidade de que Ross descobrisse seu desaparecimento. Claro que ela estava segura de que seu marido desconhecia sua existência, não? Não era assim? Em qualquer caso, era melhor as deixar onde estavam, embora isso significasse voltar a mover a cômoda.

 

Acabava de devolver a bolsa ao seu esconderijo e pôr a cômoda em seu lugar, quando Ross abriu de improviso as lonas.

 

O que está fazendo?

 

Lydia estava inclinada sobre a cômoda para recuperar o fôlego, e girou em redondo quando ouviu sua voz, afligida por um grande sentimento de culpabilidade.

 

Nada - se apressou a responder. Tragou saliva e rezou para que seu coração se tranqüilizasse. Era o seu marido um ladrão?

 

Tem as faces coloridas.

 

Sim? Levou as mãos ao seu rosto avermelhada. Tenho calor. Não corre nada de ar. Ainda não tive tempo de me lavar.

 

Ross sorriu e entrou.

 

Vamos nadar.

 

Aproximou-se de Lydia, enlaçou as mãos ao redor de seu pescoço. A boca de Ross estava quente quando cobriu a sua, sorveu seu sabor, banhou seu úmido lábio superior com a língua.

 

Está salgada.

 

Os músculos de Lydia se liquidificaram, como lhe acontecia sempre que ele a beijava. Pese ao calor, apertou-se contra ele e apoiou as mãos sobre seu peito. Tinha a camisa molhada.

 

Já disse que ainda não me lavei.

 

Nem eu tampouco. Estou coberto de pó. Vamos ao rio - murmurou em seu pescoço. Suas mãos tinham encontrado os seios de Lydia e se dedicavam a massageá-los com indiscutível talento. Tiraremos toda a roupa e...

 

Não. Apartou-lhe e se livrou de suas mãos. Não posso fazer isso. Alguém poderia nos ver.

 

Ross riu de sua indignação, pois seu arrebatamento tinha provocado que os cachos saltassem ao redor de sua cabeça e seus olhos cintilassem como cometas.

 

De acordo. Eu tirarei toda a roupa e você se banhará em camisa.

 

Não sei nadar - replicou ela com pudor.

 

Tinha aprendido a flertar nos últimos tempos. Não sabia como o chamavam, nem sequer era consciente de que ela atuava com paquera. Só sabia que quando era travessa e conseguia que Ross a perseguisse, ele parecia desfrutar mais. Deu-lhe as costas e se encaminhou ao extremo do carro.

 

Os braços de Ross a enlaçaram por detrás. Apertou as costas dela contra o seu peito e empurrou seus quadris contra o traseiro de Lydia. Uma mão se fechou sobre um seio e moveu o mamilo com o polegar. A outra descendeu por seu estômago, e uns dedos pinçaram em suas vísceras.

 

Então faremos algo que saiba fazer. Como isto. Sabe fazê-lo, verdade?

 

Hummm... ronronou Lydia, e cabeceou. Você me ensinou.

 

Deu a volta em seus braços e durante vários minutos se fundiram em um beijo. Não só participaram suas bocas, mas também seus corpos. Os seios de Lydia se esmagaram contra o peito de Ross, e ela esfregou a ereção com seu montículo.

 

Deus bendito resmungou Ross, e a separou. Tem razão. Faz um calor espantoso. Tinha o rosto coberto de suor. Vamos procurar Lee e baixemos ao rio.

 

Ajudou-a a descender do carro, e enquanto caminhavam com as mãos enlaçadas, Ross se perguntou desde quando só idéia de fazer amor lhe parecia muito divertida.

 

Quando Lydia despertou à manhã seguinte, Ross seguia adormecido. A noite tinha sido muito movimentada. Primeiro tinham passado uma hora no rio com Lee. Depois Ross lhe tinha dado um susto de morte quando mergulhou durante o que ela calculou cinco minutos seguidos. Gritou seu nome histericamente, aferrando bem a Lee, e esquadrinhou a superfície da água, banhada pela luz do crepúsculo. De repente, Ross emergiu rugindo da água como um monstro marinho.

 

OH, poderia te matar.

 

Lydia saiu em sua perseguição, estorvada pela corrente e as rochas escorregadias. Procurava sujeitar bem a Lee, que esperneava de alegria ao sentir-se afresco pela primeira vez desde que se despertou.

 

Beije-me, em troca - disse Ross, e lançou uma gargalhada ao presenciar os esforços que fazia Lydia para mover-se na água. Agarrou-a pelos braços e a atraiu para si. Capturou sua boca, balançaram-se na corrente, saboreando seu mútuo sabor quente, com Lee apertado entre ambos, sem que nenhum dos dois fizesse conta.

 

Nadar com essa camisa tem suas vantagens comentou Ross quando soltou sua boca.

 

Lydia baixou a vista e viu que o magro tecido se amoldava a suas formas, e revelava mais que cobria. Seus mamilos eram faróis impudicos e rosáceos. Justo então, com uma força pouco comum, Lee deu uma pesada e seu pé se enredou com o bordo de renda da camisa de Lydia e puxou o objeto para baixo. Sua pele apareceu branca, úmida, brilhante à luz do entardecer, suave como o mármore, coroada por aquele delicioso pico.

 

Foi muito para Ross, que emitiu um grunhido gutural e deslizou uma mão por debaixo de seu seio, liberou-o do tecido e baixou a boca para ele. Beijou a suave curva, apoderou-se do mamilo e puxou com suavidade, enquanto desenhava círculos ao seu redor com a língua.

 

Ross, Ross murmurou Lydia.

 

Lágrimas de amor e felicidade alagaram seus olhos. Desejou que o momento se prolongasse eternamente, mas notou a ereção de Ross contra sua coxa. Apoiou a mão em sua face e lhe apartou com doçura a cabeça.

 

Não nos afastamos o suficiente. Alguém poderia nos ver, e Lee estará conosco.

 

Os olhos de Ross refletiram o dossel verde dos ramos que se elevavam sobre suas cabeças quando sorriu. Lydia nunca lhe pediria que parasse, mas Ross entendeu sua mensagem. Voltou a cobrir seu seio com reverência.

 

Acredito que Lee tem vontade de jantar. Eu, ao menos, estou morto de fome.

 

Ross agarrou ao menino e o apertou contra o seu peito enquanto retornavam ao acampamento. Uma vez mais Lydia desejou chorar pelo amor que sentia por Ross e Lee.

 

Mais tarde Lydia se extasiou contemplando a forma adormecida de seu marido e não pôde acreditar que Deus tivesse tido a bondade de entregar-lhe para repreender-se, seus olhos se desviaram para a cômoda e voltou para a realidade. Quando voltaria Clancey?

 

Apareceu aquela mesma manhã, quando Ross foi procurar água ao rio.

 

Bom dia, senhora Coleman disse.

 

Lydia se voltou pouco a pouco e lhe dedicou aquele olhar de desdém que sempre lhe enfurecia, tratando assim de dissimular seu medo. Não disse nada.

 

Encontraste-as?

 

Sim.

 

A cobiça iluminou os olhos de Clancey, mas Lydia não se moveu.

 

Vamos, puta estúpida, me dê antes que alguém nos veja.

 

Não posso. Estão muito bem escondidas e demorarei um pouco par as tirar.

 

Clancey blasfemou, irritado, e esteve a ponto de esbofeteá-la, mas o acampamento começava a mostrar certa atividade e sabia que não devia chamar a atenção.

 

Esta noite, pois.

 

No carro não.

 

Perto do curral, depois de que todo mundo tenha encerrado aos cavalos. Lydia assentiu. Clancey se dispôs a desaparecer entre as árvores, mas antes se voltou para ela. Será melhor que não falte ao encontro, garota, se souber o que te convém.

 

Lydia assentiu de novo.

 

Esperou com temor o entardecer.

 

E este chegou, lavanda, púrpura e dourado. Tinha preparado o jantar para quando Ross retornasse a carroça. Não lhe resultou fácil, mas tinha conseguido recuperar a bolsa das jóias durante o descanso do meio-dia.

 

Um ambiente ansioso reinava em toda a caravana. Faltavam escassos dias para chegar ao seu destino. Scout confiava em cruzar o rio Vermelho ao cabo de dois dias. Depois demorariam uns três mais até chegar a Jefferson. A maioria dos componentes da caravana continuaria sua viagem, mas o grupo se separava naquela cidade. Todos começavam já a intercambiar direções de parentes onde estariam localizados até que se estabelecessem definitivamente.

 

Ross foi falar com Grayson depois de jantar. Mamãe tinha levado Lee a dar um passeio e se deteve conversar com a senhora Sims, enquanto seus dois gêmeos engatinhavam ao seu redor. A Lydia não custou nada deslizar-se até o curral, sem ser vista.

 

Caminhou bem rígida e com ar digno, embora fosse tremendo de medo. Desembaraçaria-se por fim de Clancey?

 

Ela tinha acreditado que estava morto, e entretanto ele tinha ressuscitado para atormentá-la de novo. A idéia de lhe entregar as jóias da falecida esposa de Ross era odiosa, mas também lhe aterrorizava que pudessem capturar Ross com elas na carroça. Se Clancey se apoderasse dessas jóias, partiria e nunca voltaria a lhes incomodar.

 

Lydia não o viu quando se materializou detrás dela. Deteve-a agarrando-a pelo cabelo.

 

Uh! Disse em voz baixa.

 

Lydia liberou seu cabelo e girou em redondo.

 

Tira as mãos de cima de mim.

 

Falaram em sussurros enquanto entravam em um bosque. Nem sequer os cavalos do curral próximo deram conta de sua presença.

 

Se me tocar outra vez, Ross te matará.

 

Clancey exibiu uma desagradável fileira de dentes cariados e manchados de tabaco quando sorriu.

 

Mas não vai inteirar se, verdade? Você vai dizer a ele. Eu não. Sobre tudo se tiver trazido as jóias.

 

Trouxe-as. Tirou a bolsa do bolso e a jogou. Não volte a me incomodar nunca mais.

 

Lydia tentou afastar-se.

 

Clancey lhe impediu o passo apoiando a mão sobre o tronco de uma árvore. Esteve a ponto de golpeá-la no queixo. Ela retrocedeu, desconcertada. Quando se recuperou, estava encurralada contra a árvore. Clancey a esmagou com seu corpo corpulento.

 

Está muito agressiva, garota. Muito agressiva. Não sei se isso eu gosto ou não.

 

Deixe-me ir.

 

Lydia tentou elevar o joelho. Em uma ocasião lhe tinha golpeado na virilha com o joelho, e descobriu imediatamente que era um método seguro de impedir suas perseguições.

 

Clancey esquivou seu joelho.

 

Está conseguindo que me irrite, garota. E que me ponha brincalhão.

 

Seu fôlego fétido golpeou o rosto de Lydia como uma bofetada. Clancey espremeu seus seios brutalmente.

 

Não soluçou a jovem, e se revolveu. Não permitiria que voltasse a ocorrer. Depois de Ross, não. Antes Clancey teria que matá-la.

 

Certo é que morre de vontades por me ter entre as pernas, em lugar desse foragido com o que te ataste. Seguro que sabe montar melhor seus cavalos que a ti.

 

OH, Deus, não.

 

Clancey rasgou seu sutiã e beliscou seus mamilos.

 

Sentiu falta, né?

 

Lydia não gritou, porque um só grito alertaria ao acampamento e todo mundo acudiria correndo. Veriam Clancey. Saberiam o que lhe tinha feito. Ele lhes diria... OH, Deus. O que podia fazer? Ross jamais devia averiguar sobre Clancey, mas seria capaz de ficar com ele se Clancey a desonrava de novo? Não. Revolveu-se e arranhou seu rosto com as unhas.

 

Clancey lutou com os botões da braguilha e lhe subiu as saias.

 

Não, não, não.

 

Tampou-lhe a boca com uma mão e golpeou sua cabeça contra a árvore.

 

Lydia!

 

Seu nome surgiu de um nada e soou com muita mais intensidade da real. Clancey deu meia volta. O homem e ele se olharam durante um momento interminável, ambos se achavam paralisados pela surpresa. Depois o outro homem jogou para trás a cabeça e emitiu um grito de furor enquanto se precipitava para Clancey com a intenção de lhe estrangular.

 

Não, Winston! Gritou Lydia.

 

Muito tarde. Clancey, com um prazer quase lascivo e não pouco desprezo para o homem de facções delicadas, vestido com um traje branco, tirou a pistola de seu cinturão e disparou a queima roupa contra o peito do Winston Hill.

 

O som do disparo ressonou no silêncio da noite.

 

Clancey Mecagüen amaldiçoou sua alma, enquanto contemplava com ódio não dissimulado ao homem caído na terra, e depois a Lydia.

 

Winston gritou a moça, e se deixou cair junto à silueta ensangüentada.

 

Merda! Exclamou Clancey, antes de correr para as árvores.

 

Lydia nem sequer se deu conta de que Clancey fugia. Olhava horrorizada a mancha escarlate que aumentava de tamanho com alarmante rapidez sobre a camisa de Winston.

 

Winston, Winston soluçou, inclinada sobre ele.

 

Pensava que estava morto, mas os olhos do jovem se abriram com um grande esforço.

 

Lydia... Está bem?

 

Sim, sim.

 

As lágrimas escorregaram por seu rosto até o queixo, e caíram de ali como gotas de chuva para mesclar-se com o sangue que encharcava o peito de Winston.

 

Não fale disse. Agitou as mãos sobre seu peito, para cicatrizar a ferida.

 

Não me levei... como um homem... nos últimos tempos. Lydia aferrou sua mão e a levou a face. Ao menos..., morrerei... como tal.

 

Não fale, por favor. Não morra!

 

Winston sorriu.

 

É melhor..., muito melhor assim, amiga minha.

 

Seus olhos se fecharam, e depois de exalar um suspiro estremecido, aquele espantoso gorgoteo de seu peito emudeceu. Lydia sussurrou seu nome, sabendo de que ele já não podia ouvi-lo. Percorreu seu corpo com os olhos, como se procurasse uma maneira de revivê-lo.

 

Foi então quando viu a bolsa de veludo aprisionada entre os dedos de Winston. A tinha arrebatado de Clancey. O ataque de Winston tinha surpreendido tanto ao seu meio-irmão que não se deu conta de que tinha perdido seu ansiado tesouro.

 

Alguém gritou seu nome. Ross. Mamãe. Passos apressados se ouviram entre as árvores. Ramos cobertos de folhas foram apartadas a um lado. Cada vez mais perto.

 

Como um autômato, apoderou-se da bolsa e a escondeu no bolso de seu vestido, justo quando Ross saía do bosque.

 

Lydia! Gritou. Parou-se em seco quando a viu inclinada sobre Winston.

 

Que o Senhor tenha piedade de sua alma exclamou Mamãe, que a seguia. Voltou-se e bloqueou o passo. Que os meninos voltem para acampamento.

 

Lydia olhou Ross por cima do cadáver de seu amigo. Seus olhos estavam banhados em lágrimas.

 

Ross! Gritou, e estendeu a mão para ele.

 

Várias pessoas rodearam Ross, enquanto este continuava petrificado, contemplando a sua mulher com o cabelo revolto e derramado sobre as costas, o sutiã esmigalhado, o peito e o pescoço arranhados e arroxeados. Pressentiu o grito feroz que se abria passo em seu peito antes que surgisse por sua boca. Apartou a outros a empurrões e a obrigou a ficar de pé.

 

Lydia, incapaz de sustentar-se, aferrou-se ao seu ombro.

 

Cubra-se - sussurrou Ross em seu ouvido.

 

Olhou-lhe fixamente, incapaz de compreender seu aborrecimento. Ross aferrou com rudeza o bordo do sutiã e lhe cobriu os seios.

 

O que passou, senhora Coleman?

 

Grayson teve que repetir a pergunta várias vezes antes que penetrasse em seu cérebro aturdido. Por que a olhava Ross com o cenho franzido? Não se dava conta de que tinha tentado lhe proteger? «Meu amigo acaba de morrer por minha culpa», quis gritar ao seu rosto frio e áspero.

 

Atordoada, voltou-se para o Grayson e outros, que esperavam ouvir seu relato.

 

O que? Ah, um homem gaguejou. Eu estava passeando. Um homem...

 

Que homem? Tinha-o visto antes?

 

Olhou a Grayson como se não o conhecesse. Por que lhes preocupava Clancey? Winston Hill estava morto. Tinha lhe emprestado livros. Ross a tinha ajudado a lê-los.

 

OH... Não, não, não disse, movendo a cabeça negativamente. Atacou-me. O senhor Hill... Sua voz tremeu de uma forma incontrolável. O senhor Hill tentou me ajudar.

 

Já é suficiente, cavalheiros disse Mamãe, enquanto rodeava a Lydia com seus fornidos braços. Eu me ocuparei de Lydia. Dá a impressão de que alguém tenta vingar-se nesta caravana. Será melhor que vão atrás dele. Não terá ido muito longe.

 

Ninguém tinha reparado em que Moisés tinha saído de entre as árvores. Manteve-se afastado de outros, com a vista cravada no corpo de seu anterior proprietário, seu amigo. Recordava o dia em que Winston nasceu. Celebrou-se uma festa na mansão. Então ele só era um ajudante de criado, mas tinha tomado carinho ao jovem amo. Tinha-lhe querido sempre, porque Winston o tratava como a um homem, não como a um negro.

 

Acredito que deveríamos levar ao senhor Hill... começou Grayson, com a sensação de que todo o peso do mundo tinha recaído sobre seus ombros.

 

Eu me ocuparei.

 

Moisés afastou a outros com um gesto digno e se ajoelhou junto ao corpo do Winston. Levantou o cadáver nos braços, com o cuidado que uma mãe põe ao agarrar ao seu filho, e o levou para sua carreta. A única demonstração de sua dor foram as lágrimas que convertiam seus olhos em espelhos escuros.

 

Uma vez sob o amparo do carro dos Langston, entregue aos cuidados de Mamãe, Lydia deu rédea solta a sua dor e desespero. Primeiro Luke, agora Winston. Os dois tinham morrido por sua culpa. Por sua culpa. Lixo. Era indigna de todos eles.

 

Onde está Ross? Perguntou.

 

Onde está? Por que a tinha olhado com tanto ódio? Tinha averiguado sobre Clancey?

 

Foi em busca de seu atacante. Suspeito que também é o assassino de Luke. Bebe chá.

 

E Lee?

 

Anabeth já o deitou. Tenta dormir um pouco e esquecer tudo o que ocorreu.

 

Não posso. Eles morreram por minha culpa.

 

Não diga tolices, Lydia. Não foi por sua culpa.

 

Suas palavras não serviram de consolo, e finalmente Mamãe a deixou sozinha para que chorasse, até que se sumiu em um sonho provocado pelo esgotamento.

 

Enterraram ao senhor Hill à manhã seguinte. Lydia esteve ao lado de seu marido, com os olhos secos e a expressão impenetrável. Tinha orado até secar-se. Não falaram.

 

Ninguém a culpou, mas sim a compadeceram. Afirmaram que tinha tido sorte de não acabar assassinada também. «Ou algo pior», sussurraram as mulheres a suas costas. Suas condolências pelo horroroso ataque que tinha sofrido só conseguiram que Lydia se sentisse pior. Não merecia sua compaixão, a não ser suas acusações. Ross não lhe ofereceu nenhuma palavra de consolo.

 

Viajaram todo o dia. Estavam muito perto de seu destino para tomar um dia de descanso, e os temores de todo o mundo se renovaram a causa do segundo assassinato.

 

Moisés, como sempre, conduziu a carreta de Hill. Outros se separaram de seu caminho para não lhe incomodar. Foi ao carro de Lydia de noite.

 

Sinto muito, Moisés disse ela.

 

Ele o teria preferido assim, senhorita Lydia. A enfermidade lhe estava matando, e considerava que a morte que lhe esperava carecia de coragem. Foi melhor assim.

 

Isso disse sussurrou a jovem. Aferrava-se a tudo que pudesse mitigar seu sentimento de culpabilidade. Disse-me isso antes de morrer.

 

Foi sincero. Ele pensava muito em você. Se morreu por protegê-la, morreu como desejava.

 

Obrigado, Moisés.

 

Apertou agradecida as mãos de seu amigo.

 

Convidou-lhe para jantar com Ross e ela, mas Moisés se negou e retornou ao carro que tinha compartilhado com Winston. Quando Ross apareceu a hora de jantar, mostrou a mesma reserva silenciosa que manifestava desde que a tinha visto inclinada sobre o cadáver de Winston. Jantaram em silêncio. Lydia logo que podia ver seus olhos, ocultos sob as espessas sobrancelhas, mas sabia que não a olhava. Era como ao princípio, como se sua visão lhe resultasse repulsiva.

 

Quando se retiraram à carreta, Lydia tinha os nervos à flor de pele. Clancey quase a tinha violado (agora já conhecia o significado da palavra). Tinha visto morrer ao seu amigo. Não merecia um mínimo de compaixão?

 

A indiferença de Ross a enfurecia. Acaso não devia respeitar seus sentimentos? Depois de deitar a Lee, voltou-se para Ross, disposta a lhe obrigar a confessar suas preocupações. Viu que ele estava enrolando umas mantas.

 

O que faz?

 

Fazia semanas que não dormiam separados.

 

Vou dormir fora.

 

Ela umedeceu os lábios.

 

Eu gostaria que ficasse aqui comigo... e Lee. Ele seguiu transportando, sem olhá-la. Lydia não queria admitir quanto sentia falta do consolo de seus braços. Utilizou outra desculpa. Esse homem poderia seguir rondando pelos arredores. Sentirei-me mais segura se ficar.

 

Ross se encaminhou para o extremo do carro. Deteve-se, deu meia volta e passeou o olhar por seu corpo com evidente desagrado. Lançou uma gargalhada desdenhosa.

 

Lydia, até um imbecil se daria conta de que é perfeitamente capaz de cuidar de ti mesma.

 

Deu-lhe as costas de novo. Aquele desprezo, aquela expressão fria em seu rosto, encresparam-na até extremos inimagináveis. Avançou sobre ele.

 

Avançou para ele, agarrou-lhe do braço e lhe obrigou a dar meia volta. Se não o tivesse pego de surpresa, jamais teria conseguido realizar aquela façanha, mas o ataque o pegou despreparado, e também o fogo que ardia nos olhos âmbar de Lydia.

 

O que quer dizer, Ross Coleman? Diga-me por que não me olha, por que não me toca desde ontem. Desafio-te a me dizer isso

 

Ross deixou cair as mantas como se arrojasse uma luva. Pôs os braços em jarras.

 

Muito bem, direi-lhe isso. Falou em voz baixa porque Lee dormia e porque não queria que os vizinhos pudessem escutar sua conversação. Em que pese a isso, sua voz não foi menos violenta. Tremia de raiva. Eu não gostei de encontrar a minha mulher sozinha no bosque com outro homem, o vestido rasgado e os seios descobertos, para que todo mundo os visse. Sinto que Hill tenha morrido, sinto-o muitíssimo, mas o que estava fazendo com ele, maldição?

 

Não estava com ele - se encrespou Lydia. Estava sozinha. Fui passear, a tomar o afresco. Detestava lhe mentir, mas não podia permitir que suspeitasse um encontro romântico entre o Winston e ela. Winston chegou bem a tempo. Dá-te conta do que tivesse passado se ele não chegasse a deter aquele homem?

 

Os músculos da mandíbula de Ross se esticaram.

 

Bem, não me teria surpreendido. Produz esse efeito nos homens, e sabe muito bem. O próprio Hill estava apaixonado por ti, e se não tivesse sido um cavalheiro do Sul, te teria atirado em cima faz muito tempo. Hal Grayson a olha com olhos de cordeiro degolado. Todos os homens da caravana deixam suas ocupações para te devorar com os olhos quando passa. Inclusive Bubba Langston fica duro quando lhe sorri. Todos morrem por te jogar um pó. Não ponha esse rosto de assombro se burlou, quando ela se encolheu, desolada. Sabe que é certo. Aferrou-a pelos ombros e a aproximou de um centímetro de seu rosto. Convida a isso disse, com a voz sibilante de um violador.

 

Lydia olhou seu rosto acusador até que assimilou todo o impacto de suas palavras. Então lágrimas de fúria encheram seus olhos. Apartou-lhe as mãos e retrocedeu como uma gata encolerizada.

 

Como é que sabe tanto a respeito, senhor Coleman? O beato senhor Coleman, casado com a pura e virginal Vitória. O que sabe de mim, pelo que sinto, pelo que sou? Não sabe nada!

 

Ross ficou estupefato pela transformação. O cabelo rodeava sua cabeça como uma grinalda, iluminada pela luz do abajur. Seus olhos brilhavam com a qualidade hipnótica de uma chama na escuridão.

 

Convidei a meu meio-irmão a me violar?

 

Você...

 

Sim, meu meio-irmão. Não de sangue. Seu pai estava casado com minha mãe. Quando o velho morreu e já ninguém pôde lhe ordenar que me deixasse em paz, violou-me. A primeira vez ocorreu no abrigo, onde tínhamos aos poucos animais de granja que havia naquele pestilento lugar. Foi muito apropriado, porque assim me senti, como um animal. Agarrou-me por surpresa e me atirou ao esterco. Fez-me mal. Eu tinha sangue nas pernas e marcas de dentes nos seios quando terminou. Os mesmos seios que tanto lhe ofenderam ontem. e... OH, Deus, que mais te dá?

 

Cobriu o rosto com as mãos e se desabou sobre chão do carro, abismada em suas lembranças.

 

- Estava suja, muito suja. Lavei-me e lavei, esfreguei-me por dentro e por fora, mas ainda me sentia suja.

 

Ross, sem apartar a vista dela, aproximou um tamborete com a ponta da bota. Sua cólera, a ponto de estalar um momento antes, apagou-se como uma vela surpreendida por uma repentina calma. Sentou-se, enlaçou as mãos e apertou os nódulos dos polegares contra os seus lábios enquanto contemplava a desgraça de Lydia.

 

Foi seu meio-irmão quem te deixou grávida?

 

Lydia assentiu, derrotada. Tinha a vista cravada na distância.

 

Quando não era o bastante rápida para lhe esquivar, o bastante forte para lhe rechaçar, o fazia outra vez.

 

Poderia ter fugido. Insinuou Ross.

 

A jovem soprou, apartou a cortina de cabelo com a mão e lhe transpassou com o olhar.

 

Minha mãe estava doente. O velho a tinha maltratado durante anos, tratando-a como a uma pulseira. Quando ele morreu, minha mãe ficou na cama e não voltou a levantar-se. Se eu tivesse fugido ou me houvesse suicidado, algo que me passou pela cabeça muitas vezes, meu meio-irmão a teria deixado morrer de fome ou a tivesse estrangulado enquanto dormia. Ele não a teria cuidado. Tive que ficar.

 

Lydia beliscou o tecido de sua saia.

 

Quando minha mãe se deu conta de que eu ia ter um filho, chorou durante dias seguidos. Levantou-se da cama e ameaçou matar a meu meio-irmão pelo que me tinha feito. Ele riu e a esbofeteou. Minha mãe chorou ainda mais, culpou-se pelo que tinha passado. Morreu ao cabo de poucas semanas. Deitou-se uma noite e não voltou a despertar.

 

As lágrimas riscaram atalhos de cristal sobre suas faces.

 

Fui à manhã seguinte e vaguei ao azar durante semanas, vivendo do que encontrava. Uma família de granjeiros me tratou com amabilidade. Deram-me de comer e fiquei com eles um tempo, mas logo... tive que prosseguir meu caminho. Andei até que me desabei para dar a luz. Já sabe o resto.

 

Lydia guardou silêncio, convencida de que seu sonho de uma vida melhor tinha terminado. Agora que conhecia o seu passado, Ross a desprezaria.

 

Tinha omitido a parte em que Clancey a encontrou pela primeira vez. Lydia tinha contado ao granjeiro e a sua mulher que seu marido estava morto e que tentava voltar para casa dê sua família antes que o menino nascesse. Clancey apareceu e lhes disse que era uma esposa desencaminhada. Lydia fugiu, mas ele a alcançou antes que tivesse percorrido um quilômetro. Revolveu-se contra ele. Durante a resistência, Clancey caiu e golpeou a têmpora contra uma rocha. Lydia pensou que estava morto. O que diria Ross se lhe revelava que seu detestável meio-irmão ainda a perseguia?

 

Seguiram sentados em um tenso silêncio. Por fim Ross se removeu e exalou um profundo suspiro.

 

Eu era um foragido, Lydia.

 

Era o último que esperava que dissesse. Lydia levantou a vista e lhe olhou. Sua expressão tinha passado da desolação ao estupor.

 

Um foragido? Repetiu. Já sabia. Tinha visto o pôster. O que não acabava de acreditar era que Ross o confessasse. Era um sinal de confiança?

 

Associei-me com os irmãos James. Assaltei trens. Disparei contra pessoas. Matei.

 

Suas palavras eram concisas, mas Lydia intuiu que uma comporta se abria em seu interior. Ross tinha oculto o segredo durante anos, e agora queria revelá-lo.

 

Fala - disse ela em voz baixa.

 

Minha mãe era uma puta - disse com brutalidade, e a olhou para observar sua reação.

 

Tinha imaginado a mesma cena com Vitória, imaginado o horror que se pintaria em seu rosto, a palidez da pele, o tremor dos lábios, a piscada de seus olhos. Não leu nada semelhante no rosto de Lydia. Devolveu-lhe o olhar, com expectativa. Ross desejou castigar a capacidade de compreensão de Lydia, talvez para pô-la a prova.

 

Você me entende: minha mãe era uma puta gorda, preguiçosa e suja.

 

Se acaso, a compaixão suavizou as facções de Lydia.

 

Amava-a?

 

A pergunta quase lhe fez saltar as lágrimas.

 

Esforcei-me. Deus, é claro que sim que me esforcei. Possivelmente sim. Quando era pequeno, desejava que ela me amasse, mas... encolheu os ombros, como à defensiva, e endireitou as costas. Eu era um acidente molesto, e ela nunca deixou que o esquecesse.

 

E seu pai?

 

Nunca cheguei a conhecê-lo. Lançou uma gargalhada desprovida de alegria. Ela tampouco sabia quem era. Nem sequer sei a data exata de meu nascimento. A madame da casa onde trabalhava minha mãe deixava que ficasse em uma habitação traseira com o encarregado da barra, que me esbofeteava cada vez que abria a boca. Daisy, assim se chamava, não me deixava chamá-la mamãe, trabalhava toda a noite e dormia de dia. Quase sempre estava sozinho, percorria as ruas da cidade, metia-me em confusões, roubava, rompia janelas, cometia toda classe de infração. Fartei-me dessa vida e consegui trabalho na cavalariça. Aí foi onde aprendi tudo o que sei sobre cavalos. Quando tinha quatorze anos, Daisy morreu.

 

Como?

 

Despertou uma manhã com dor de estômago. Não melhorou. O médico disse que tinha febre estomacal e não havia nada que fazer. Morreu a tarde seguinte.

 

»A madame me pôs na rua. Eu já me tinha aborrecido de trabalhar na cavalariça. Pensei que, fizesse o que fizesse, as pessoas da cidade sempre pensaria em mim como o filho de Daisy, a puta. Do que servia tentar me regenerar? Passava horas na sala de jogo do prostíbulo. Aprendi a beber a blasfemar, a brincar pôquer. Aprendi, sobre tudo, a cuidar de mim mesmo.

 

»Roubei um cavalo ao homem para quem tinha trabalhado e me larguei. Fui dando tombos de um lado a outro. O primeiro homem que matei me tinha acusado de fazer armadilhas no pôquer. Desencapou a pistola quando o chamei maldito mentiroso. Eu desencapei mais rápido.

 

Fazia armadilhas?

 

Ross sorriu com tristeza.

 

É obvio. Acredito que era uma aposta de cinco dólares. Matei a um homem por cinco asquerosos dólares. Olhou-a com solenidade um momento antes de continuar. Tinha uns vinte anos quando estalou a guerra. Juntei-me a um bando de guerrilheiros. Era como uma festa. Podia roubar e matar, tudo com a bênção do Exército Confederado. Em que pese a tudo, fui um bom soldado. Os homens indiferentes à morte se arriscam e, pelo geral, sobrevivem. São os homens nobres quem morre.

 

»Mas a guerra terminou e a única alternativa de um pistoleiro era continuar fazendo o mesmo até que alguém lhe matasse. Uma noite, em um botequim, entestai a um homem que ao final se acovardou. Penetre Younger estava presente, viu-me dirigir a pistola e me convidou a conhecer Jesse e Frank. Foi então quando me uni ao seu bando.

 

Lydia não conhecia aqueles homens, mas supôs que eram foragidos famosos.

 

Estive com eles uns dois anos. Um dia assaltamos um banco que em teoria era uma ninharia. Um ajudante do xerife muito teimoso conseguiu que lhe matassem no tiroteio. Eu voltei atrás para recolher a um dos Younger, cujo cavalo tinha sido alcançado de um disparo. Alguém, acredito que foi o xerife, feriu-me. Parece-me que fui o único ferido de gravidade naquele tiroteio. Tiveram que me deixar no bosque para fugir da partida que nos perseguia.

 

Abandonaram-lhe?

 

Não podiam fazer outra coisa. Encolheu os ombros. Se tivesse em seu lugar, eu também teria fugido.

 

Mas poderia morrer!

 

Ross riu de sua ingenuidade.

 

Essa era a idéia. Deu-me por morto. Lydia, meu nome autêntico é Sonny Clark. Sonny Clark morreu aquela tarde nas montanhas do Tennessee.

 

A compreensão iluminou no rosto de Lydia.

 

Foi então quando John Sachs te encontrou.

 

Não me lembro. Despertei dias depois em sua cabana. De algum jeito, Deus sabe como, graças a aquelas porções que me obrigava a beber e aos emplastros fedorentos que aplicava em minhas feridas, sobrevivi, e ao cabo de uns meses estava de novo em forma. A cicatriz do peito? Lydia assentiu. Uma bala que entrou e saiu. Nunca compreenderei como errou o coração e os pulmões.

 

A mente de Lydia ficou em funcionamento e deduziu o resto.

 

Mudou o nome.

 

Sachs o sugeriu. Enquanto estava inconsciente me tinha cortado o cabelo para curar uma ferida que tinha na cabeça.

 

Lydia ficou a tremer ao pensar em Ross sangrando. Antes que nenhum dos dois fosse consciente do movimento, ela estava sentada entre seus joelhos, com as mãos apoiadas sobre suas coxas.

 

Tinham crescido o bigode e a barba. Barbeei-me a barba, mas o bigode me fazia parecer mais velho, diferente. Trabalhe na casa de Sachs durante quase um ano, passei o inverno ali. Quando parti, eu já não era o mesmo homem.

 

Suas mãos acariciaram o cabelo de Lydia, que descansava a face sobre sua coxa.

 

Também troquei por dentro. Queria viver e dar um sentido a minha vida. Acredito que tenho que dar as graças a Sachs por tudo isso. Ele foi o primeiro ser humano que se interessava por mim em toda minha puta vida. Senti que lhe devia algo por haver-se tomado a moléstia de me salvar.

 

»Quão único eu sabia fazer, além de matar, era cuidar cavalos. Sachs sugeriu que fosse procurar trabalho às cavalariças do Gentry. Deixei o passado atrás, Lydia, mas debaixo do nome e o rosto novo ainda sou Sonny Clark, um assassino, ainda um fora da lei, provavelmente reclamado em alguns estados.

 

Era verdade, mas não queria dizer-lhe. Levantou a cabeça e lhe olhou.

 

Mudou e não é Sonny Clark. Você mesmo há dito que esse homem morreu faz anos. Tocou seu bigode. É Ross Coleman.

 

Os olhos de Ross expressaram uma estranha ternura. Ele mesmo não teria podido reconhecer-se naquele gesto.

 

Lamento o que disse antes. Quem sou eu para te julgar, tendo em conta meu passado? Enredou os dedos em seu cabelo. Deus, Lydia, que mal o terá passado.

 

A jovem rodeou sua cintura com os braços e apoiou a cabeça sobre seu peito.

 

Até que te conheci. Você me fez sentir como uma mulher decente, mas ... mas ontem, quando me olhou como...

 

Ross sussurrou desculpas em seu cabelo.

 

Equivoquei-me. Estava louco de ciúmes, Lydia.

 

Ciúmes? Porque pensou que me tinha escapado para me encontrar com Winston? Era meu amigo. Isto é tudo. E todos esses que nomeaste, eu nunca hei...

 

Sei, não tem feito nada a propósito. Minha mente estava confusa, mas, maldição, punha-me lívido quando vi todos esses homens te devorando os seios com o olhar.

 

Não desejo a outro homem, Ross. Pensava que jamais desejaria a nenhum. Passou os dedos por seu espesso cabelo. Mas você me beijou e me tocou... Sua voz emudeceu e agachou a cabeça com acanhamento. E agora eu adoro tudo o que me faz.

 

Ross proferiu uma daquelas blasfêmias, que em seu contexto não eram tais blasfêmias. Levantou a cabeça de Lydia e passou o polegar sobre seus lábios.

 

Eu adoro o que fazemos juntos.

 

Beijou-a com voracidade e ternura ao mesmo tempo, sondou com a língua as curvas de sua boca. Deslizou a mão desde seu ombro até seu seio e o abrangeu. Quando ouviu seu gemido, apartou-a imediatamente.

 

Sei que ontem estava assustada e dolorida. Deus, quando penso no que esteve a ponto de passar...Cerrou os olhos e apertou os dentes, brancos e resplandecentes debaixo do bigode. Não temos que fazer nada agora. Entenderei-o.

 

Lydia se levantou e lhe ofereceu as costas, apartando o cabelo do pescoço.

 

Quer me ajudar com estes botões, por favor?

 

O peito de Ross se encheu de uma emoção indescritível, a mais potente que tinha experimentado em sua vida. Sentou-se no bordo do tamborete. Lydia estava de pé entre suas pernas abertas. Ao princípio os dedos de Ross reagiram com estupidez ao começar a desabotoar a fila de botões de sua blusa.

 

Quando esta esteve aberta, Ross desenredou o cinto da saia, as cintas das anáguas, e as desceu pelas pernas. Passou a mão por debaixo da camisa e desatou o cinto das calças. Quando os baixou até seus tornozelos, Lydia tirou as pernas dos objetos e as apartou com o pé.

 

Era terrivelmente excitante que só levasse a blusa e a camisa. Quando tirou a blusa e começou a desabotoar a camisa, Ross lhe agarrou as mãos por detrás.

 

Deixe-me fazê-lo.

 

Guiado tão somente por seu sentido do tato, procurou cada botão e o soltou pouco a pouco. Moveu as mãos entre seus seios e se tomou largos descansos para acariciá-los através do tênue algodão. Depois as fez descender mais abaixo de sua cintura para desabotoar todos os botões da camisa.

 

Com delicadeza, sem que ela protestasse, foi baixando a camisa por seus braços, até que o tecido rodeou seus quadris como uma nuvem. Suas costas era uma imaculada extensão de pele cálida e brilhante. Dos ombros aos quadris, sua coluna riscava um canal pouco profundo. Apoiou um dedo sobre o atalho e foi baixando até a muito mesmo base.

 

Sedutoras covinhas gêmeas apareciam a ambos os lados da coluna, no ponto onde os quadris começavam a curvar-se. Beijou-os por turno, e subiu pela delicada coluna até as omoplatas.

 

Lydia se estremeceu de prazer quando sentiu o calor úmido de sua língua que descendia pelo centro de suas costas. Ao chegar à cintura, Ross beijou com ardor sua pele, rodeou seu corpo com as mãos até encontrar seus seios e os massageou com suavidade. Sua língua acariciava enquanto sua boca sugava a zona erógena.

 

Vire-se - ordenou com ternura.

 

Como já imaginava, Lydia tinha os mamilos inchados e escuros, graças ao enfeitiço de seus dedos. Ross apoiou as mãos sobre suas nádegas, aproximou-a mais para ele e beijou as tensas cúpulas. Acariciou seus seios com o nariz, esfregou-os com a cabeça.

 

A tênue luz do abajur arrojava o seu resplendor sobre a moça, que fazia aparecer sombras dançantes sobre sua pele dourada e aromática. Ross teve vontade de devorá-la. Em troca, dominou seu instinto canibal e curvou as mãos sob seus seios, até que os polegares se encontraram no vale que corria entre suas costelas.

 

Inclinou-se para frente e roçou com seus lábios seu estômago. Depois desenhou com a língua uma sequência de sensações eróticas sobre o diafragma. Com os polegares continuava acariciando a curva inferior de seus seios, mas se desviavam com freqüência até os mamilos, avermelhados e inchados. Procurou com a boca o seu umbigo. Descreveu um círculo ao seu redor com a ponta da língua. Depois, com um suave empurrão, desflorou-o.

 

As mãos de Lydia se fecharam sobre sua cabeça, puxando-lhe o cabelo. Não sabia que existissem tais níveis de prazer. Era errado o que estavam fazendo? Era algo que todo mundo sabia, mas que ela acabava de aprender?

 

O corpo de Ross era um caos. O sangue bombeava errática mas irrevogavelmente para a sua virilha. Notava as mãos de Lydia em seu cabelo, cheirava o perfume de sua pele, saboreava sua beleza. Estava se afogando nela, mas não era suficiente. Nem por indício. Desejava mais. Tudo.

 

Tornou-se para trás e, a tênue luz, viu a extensão de carne que revelava a abertura da camisa, que ainda descansava sobre seus quadris. Debaixo do umbigo reinavam as sombras, mas viu o ninho de pêlo encaracolado, iluminado.

 

Seu pulso se acelerou, seu sexo raivoso pôs a prova os botões das calças. Vacilou, sem atrever-se ainda. Depois se inclinou de novo para frente e apoiou os lábios entre os borde do tecido. Ela não se moveu. Ross esfregou o bigode contra o seu estômago com extrema delicadeza, descendeu, até que roçou o bordo superior do doce triângulo. Abriu os lábios. Soprou sobre o suave pêlo.

 

Todo o corpo de Lydia reagiu com um súbito espasmo. Conteve a respiração, lançou uma exclamação afogada e puxou o cabelo de Ross.

 

Ele se sentiu envergonhado imediatamente da vantagem que tinha tomado e retrocedeu a toda pressa. Ergueu-se com movimentos torpes e quase se deu com a cabeça contra a lona. Lydia, com toda naturalidade, desfez-se da camisa e ficou de pé ante ele, embelezada tão somente com sapatos e meias.

 

Ela ainda não se dava conta de quão sedutora era, e sua ingenuidade involuntária devolveu a prudência Ross por uns instantes.

 

Tire os sapatos, mas deixe as meias.

 

Por quê? Perguntou a jovem, sem fôlego.

 

Ross tirou as botas e as calças. O montículo de carne que esticava sua roupa interior era algo mais que evidente.

 

Eu gosto de seu aspecto com elas.

 

Lydia obedeceu, mordiscou o lábio inferior e lhe dedicou um sorriso impudico. Ross grunhiu e começou a lutar com os botões de sua camisa.

 

Deixa que o eu faça, antes que tenha que te costurar todos os botões - disse ela.

 

Apartou as mãos de Ross e começou a desabotoar os botões. Abriu a camisa. Primeiro seus olhos, e depois as pontas de seus dedos localizaram a cicatriz. Tocou-a com ternura.

 

Esteve a ponto de morrer sussurrou.

 

Elevou-se nas pontas dos pés até que sua boca ficou ao mesmo nível que a cicatriz. Quando moveu os lábios, logo que acariciaram a pele rosada.

 

Alegro-me muito de que não fosse assim.

 

Desprezou os últimos vestígios de recato, beijou a cicatriz, afundou a língua no oco. Ross emitiu um suave gemido e a rodeou com os braços. Lydia, mais confiante, deslizou os lábios sobre seu peito. O pêlo, cacheado fez cócegas sua boca e seu nariz, mas gostou dessa sensação em seu rosto. Roçou com os seios seu estômago e a coluna sedosa de cabelo escuro que o dividia em duas metades. O mamilo de Ross se contraiu quando os dedos de Lydia revoaram sobre ele, e a jovem considerou a circunstância tão digna de atenção que tocou o nódulo com a língua. Lambeu-o com delicadeza.

 

Ross ficou surpreso pela cálida sensação que lhe percorreu.

 

Foda-se - amaldiçoou entre dentes, e começou a lutar com a roupa interior. Está me ensinando coisas que ignorava.

 

Lydia se deitou sobre o colchão, mas ficou a rir ao observar seus frenéticos esforços por livrar-se da roupa interior. Ross lhe dirigiu um olhar ameaçador com os olhos verdes entreabertos.

 

Crê que é divertido?

 

Lydia tentou reprimir suas gargalhadas, mas não pôde. Surgiram com toda espontaneidade. Enquanto rodava de um lado a outro sem poder deixar de rir, Ross não pôde por menos que sorrir. Deitou-se nu ao seu lado e a apanhou em um abraço de urso.

 

Crê que é divertido? Repetiu, enquanto o fazia cócegas nos flancos.

 

Não, não. Basta, por favor, protestou Lydia, enquanto tentava rechaçar suas mãos.

 

Essas risadas aos meus gastos custarão muito caras respondeu Ross, enquanto esfregava o nariz contra o seu pescoço.

 

O que?

 

Terá que te deixar postas as médias.

 

Estava deitado entre as pernas de Lydia, ajeitado sobre ela, com sua ereção acomodada entre ambos.

 

Suas respirações se fundiram quando as risadas de Lydia se acalmaram. Trocaram um olhar carregado de paixão. Ross reparou no pulso que pulsava em sua garganta. Quando ela sentiu o membro viril que se agitava sobre seu montículo, abriu os olhos de par em par.

 

Se você gostar, deixarei-me isso postas.

 

Eu gosto de você.

 

Aquela afirmação tão decidida surpreendeu aos dois por igual. Seus olhos se encontraram, imobilizaram-se, penetraram na alma e a mente do outro.

 

Seriamente?

 

Perguntou-o em voz tão baixa que Ross apenas a ouviu.

 

Sim.

 

Se ainda não o tinha compreendido, agora já estava convencido. Tinha-o negado em cada passado do caminho, mas ela significava mais para ele do que tinha imaginado. Os ciúmes que lhe tinham consumido a noite anterior só eram um morno presságio da emoção que agora lhe embargava e que lhe sacudiu até os alicerces mais profundos de seu ser.

 

Não podia ignorar o que estava sentindo. Excitava-lhe. Aterrorizava-lhe. Já não desejava combater contra esse sentimento.

 

Não soube o que dizer. Deveria explicá-lo com demonstrações de afeto. Deixou vagar um dedo sobre seus seios, ao redor dos mamilos, que despontavam por ele.

 

Nunca tinha tido tanta intimidade com um corpo de mulher confessou com acanhamento.

 

Lydia compreendeu o muito que lhe havia custado reconhecer aquilo, agarrou-lhe pelo pescoço com uma mão e baixou sua cabeça para o seio, oferecendo-lhe com a outra mão.

 

É maravilhoso quando me toca com a língua.

 

Um rugido ofegante escapou da garganta de Ross enquanto banhava os seus mamilos com a língua. Apertou os seios um contra outro até que ela gemeu de paixão.

 

Ross, não pode existir nada melhor que isto ofegou.

 

Só tinha introduzido a ponta do membro em sua úmida fenda. Estava saboreando a crescente antecipação da posse total.

 

Sim resmungou contra o seu seio. Há outras coisas.

 

Quais? Perguntou Lydia com um gemido, enquanto Ross se afundava uns centímetros mais em seus limites úmidos e suaves. Ensina-me.

 

Ross elevou a cabeça e a olhou aos olhos, com a respiração entrecortada. Só leu neles uma sincera curiosidade. Não havia medo, nem resignação. Nem conhecimento prévio, certamente.

 

Ajoelhou-se entre suas coxas. Sem deixar de olhar seu rosto, por temor a descobrir sinais de asco ou medo, acariciou sua tíbia com a mão, ainda embutida na meia de algodão negro. Depois dobrou a cabeça e beijou a parte interna da coxa, justo em cima da liga, e esfregou a pele sensível com toda a boca.

 

Ross suspirou Lydia.

 

Tem umas pernas muito bonitas, Lydia sussurrou.

 

Deslizou as mãos sobre a pele dócil e passou uma por debaixo da liga para acariciar a parte posterior do joelho. Baixou a meia o suficiente para beijar o joelho, para tocar a parte posterior com a língua.

 

Praticou o mesmo ritual erótico com a outra perna. Prisioneira do prazer carnal, Lydia voltou a cabeça a um lado e lhe olhou enquanto suas mãos subiam pelas coxas, massageavam, acariciavam. Quando seus olhos se encontraram, a intensidade do olhar de Ross queimou sua alma. Sussurrou seu nome e fechou os olhos.

 

É tão bonita esta zona. Seus dedos pentearam o pêlo vermelho. Uma cor muito bonita. Sua voz tinha trocado de tom e ressonância. Era rouco por causa da paixão, carregada de desejo.

 

Lydia se estremeceu para ouvi-la e sentir sua carícia. O dedo de Ross seguiu o contorno de seu montículo, percorreu os terrenos baixos que confluíam em suas coxas. Então a tocou na mais íntima de suas partes, acariciou com suavidade, tomou seu suco cremoso nas pontas dos dedos e a elogiou por sua quantidade.

 

A lassidão de Lydia se desvaneceu e abriu os olhos de par em par ao sentir aquela úmida carícia no interior da coxa. O cabelo de Ross fazia cócegas sua pele como se fosse seda, sua barba a arranhava de uma maneira deliciosa, mas resistiu a acreditar o que lhe estava fazendo até que seus olhos o verificaram.

 

-Ross! Gritou, estupefata, e agarrou algumas mechas de seu cabelo para lhe levantar a cabeça, mas já era muito tarde. Estava-a beijando, e em lugar de lhe apartar, apertou-lhe com mais força. Um espasmo de êxtase derrubou sua cabeça sobre o travesseiro.

 

Beijou-a com a mesma delicadeza que tinha beijado sua boca.

 

E foi maravilhoso e não pôde parar.

 

Os polegares de Ross apartaram com ternura as dobras protetoras que albergavam o centro de sua feminilidade. Aplicou com destreza sua língua. Cada generosa lambida era um tributo a sua doçura, a sua juventude, a sua inocência, face aos abusos padecidos. Cicatrizou com a boca lhe acariciem suas feridas emocionais; curou-as com beijos. Com os lábios suplicantes expressou sua gratidão pela generosidade com que lhe entregava o seu corpo, porque nunca lhe tinham concedido o privilégio de tanto amor.

 

As quebras de onda de felicidade se derramaram sobre a Lydia como correntes minguantes, até que ofegou em busca de ar. O que estava acontecendo não tinha tido capacidade em sua imaginação. E ao mesmo tempo em que a transtornava, sabia que era um presente único de Ross, e que o prazer consistia em aceitá-lo sem o menor obstáculo.

 

O prazer irresistível continuou com cada ágil movimento de sua língua, com cada carícia de sua boca, até que se acelerou e sua vagina se contraiu. Justo quando ela perdeu o controle, Ross se colocou em cima dela e aferrou seu corpo estremecido. Seu membro era uma pressão incessante que a encheu por completo. Ross se mergulhou com uma veloz investida e seu sêmen penetrou nela como uma corrente de fogo.

 

Longos momentos depois, quando Lydia recuperou o sentido, deu-se conta de que jaziam em uma imobilidade absoluta e de que ela aferrava Ross pela parte posterior das coxas. Ainda lhe notava duro e poderoso em seu interior.

 

Ross? Suplicou em voz baixa.

 

Sinto muito. Não foi suficiente.

 

Começou a mover-se, com lentidão ao princípio, depois com os ataques cada vez mais acelerados que lhe tiravam o fôlego, e a levou de novo até o bordo daquele abismo insondável. Esta vez se precipitaram juntos, foram engolidos por sua escuridão acetinada, envoltos em seu quente abraço de veludo.

 

Ross, louco de alegria, com o rosto sepultado em seu pescoço, soluçou seu nome quando se afundaram naquele dourado e lânguido epílogo.

 

Estou cansada, mas não quero ir dormir. Tenho medo de despertar e descobrir que tudo foi um sonho.

 

Lydia estava beliscando entre os dedos mechas do pêlo do peito de Ross, que suspirou de prazer.

 

Sei. Eu tampouco quero dormir. É tão maravilhoso te abraçar. Fechou os braços ao seu redor e depositou um tenro beijo em sua têmpora. Lydia, com a vida que levaste, como aprendeste a falar tão bem? Como Mamãe comentou uma noite, durante um discurso desumano sobre minha estupidez e teimosia, suas maneiras são refinados. Eu imitava Vitória e ao seu pai. Quem ensinou a ti?

 

Nem sempre vivi no mesmo lugar. Nós, meu verdadeiro pai, mamãe e eu, vivíamos em uma cidade. Não recordo grande coisa dela, mas sim me lembro de nossa casa. Minha mãe tinha vasos de barro com flores no alpendre dianteiro. Eu tinha uma habitação no piso de acima, com uma janela. Lembro que no verão me sentava de noite ante a janela E deixava que as cortinas se agitassem contra meu rosto. Eram brancas e franzidas, e se podia ver através.

 

A mão de Ross percorreu lentamente a curva de suas nádegas.

 

Quando construirmos nossa casa, comprarei-te cortinas franzidas brancas. Ela se aconchegou mais perto. O que aconteceu com seu pai?

 

Morreu. Chamava-se Joseph Bryant. Lydia se levantou de repente e anunciou com orgulho: Esse é o meu nome, Lydia Bryant.

 

Ele a deitou de novo e lhe deu um sonoro beijo na boca.

 

Já não. Agora é Coleman.

 

Já sabe a que me referia murmurou, enquanto se recostava contra ele. Meu pai escrevia artigos para o jornal. Às vezes se zangava, porque às pessoas não gostavam do que ele escrevia. Acredito que era sobre os escravos. Um dia anunciou a minha mãe que se ia ao norte para encontrar um novo lar onde viver. Os três estavam muito emocionados, mas meu pai adoeceu ali e morreu. Nunca voltamos a vê-lo. Apenas lhe recordo.

 

Imagina não ter sabido jamais quem era o seu pai. Claro que nenhum dos clientes de minha mãe era de primeira qualidade.

 

Lydia contemplou sua expressão amargurada e suavizou a tensão com o dedo.

 

Para te haver engendrado, deve ser um homem extremamente bonito e forte, mas me dá igual quem fosse.

 

As facções de Ross se suavizaram e beijou sua mão.

 

Continua. Quando voltou a casar a sua mãe?

 

Não estou segura. Acredito que eu tinha uns dez anos. Tivemos que abandonar nossa casa e deixar todas as coisas. Parece-me que a gente do povo não tratava bem a minha mãe por causa do que meu pai tinha escrito no jornal.

 

Ross deduziu que Bryant tinha sido um abolicionista. Foi ao norte, possivelmente não pôde acostumar-se à mudança de clima e morreu de alguma doença bronquial. A mãe de Lydia, viúva, tinha perdido tudo.

 

Lembro de uma habitação escura no alto de uma casa velha. Era onde vivíamos. Minha mãe costurava, acrescentava bordados aos lenços de outras senhoras e coisas assim. Um dia veio e me disse que tinha conhecido a um homem, que vivia em uma granja nas montanhas.

 

Suspirou.

 

Casaram-se, e aquele homem disse que nos levaria a sua casa. Sua casa não era tal, a não ser uma cabana fria no inverno e calorosa no verão. Tive que dormir em um celeiro, e a única forma de subir a ele era mediante uma escada. Aquele lugar era sujo, e minha mãe tinha que trabalhar como uma escrava cada dia para preparar as comidas e manter minimamente decente a cabana. Agora sei que devia estar muito desesperada para casar-se com ele. Ela pensou que em uma granja devia haver muita comida, que devia ser um lugar mais são onde me criar, em lugar do desvão onde estávamos vivendo. O homem tinha exagerado e minha mãe estava predisposta a acreditar seus exageros. Aquele indivíduo tinha conseguido uma escrava livre.

 

E o meio-irmão?

 

Era mais velho que eu. Já era um homem quando minha mãe e eu nos mudamos à cabana. O velho e ele sempre estavam brigando entre si e com os vizinhos, a quem odiava. E claro, a sua vez, todo mundo nos odiava. Quando íamos à cidade a comprar provisões, as pessoas nos insultavam. Minha mãe ficava a chorar, e não demorou em negar-se a voltar para a cidade, de modo que eu tampouco ia. Eu tinha medo de estar sozinha com aqueles homens.

 

Ross a apertou mais.

 

Essa vida terminou, Lydia. Estou contente de que me tenha contado isso. Assim se explicam muitas coisas. Para mim também foi um grande alívio te haver confessado minha verdadeira identidade. É o único ser vivo que conhece a verdade sobre mim. Meu segredo morreu com o John Sachs. Nunca o hei dito a ninguém.

 

Ela não era quão única sabia. Clancey sabia. Outras pessoas também procuravam Sonny Clark, mas nunca lhe encontrariam se ela podia evitá-lo. Aprisionou-lhe entre seus braços.

 

Alguma vez o disse a Vitória?

 

Suas mãos deixaram de acariciá-la.

 

Não - respondeu com suavidade. Nunca o disse.

 

Lydia sorriu para si. Talvez Vitória tivesse sido seu amor. Ainda o tinha. Mas ela tinha algo que Vitória não pôde conseguir: sua fé.

 

Ross?

 

Ummm ... ?

 

Estava maravilhado pela suavidade de seu estômago. Acariciou a pele com o dorso da mão.

 

O que fez antes...

 

Ross ficou tenso.

 

Sim?

 

Nada, dá igual.

 

Diga-me – disse.

 

É... Não sei... Possivelmente pensará...

 

Não sei o que pensarei se não me diz isso.

 

Bem, estava-me perguntando... deu-se a volta para apoiar-se sobre seu peito e olhou aos olhos. Se eu poderia fazer isso a ti.

 

Jefferson bulia de atividade. A segunda maior cidade do Texas, depois de Galveston, era, em 1872, um centro comercial e encruzilhada de caminhos. Navios com rodas de paleta se alinhavam em seus moles e vomitavam passageiros, que continuariam sua rota para o oeste em, carretas, descarregavam mercadorias, embarcavam enormes quantidades de algodão com destino aos mercados de Nova Orleans.

 

As ruas estavam abarrotadas de gente, em sua maior parte viajantes de passagem, que compravam, vendiam, comercializavam, regateavam, carregavam ou descarregavam. Dinheiro e mercadorias trocavam de mãos. Os negros libertos procuravam passar desapercebidos. Aristocratas que tinham perdido tudo durante a guerra se empenhavam em fingir que o conflito não tinha trocado suas vidas, sobre tudo seu posto na sociedade. Aos aventureiros lhes cuspia ou recebia com obsequiosidade, segundo a quantidade e cor de seu dinheiro e a generosidade com que o dilapidavam. Membros de famílias respeitáveis se acotovelavam com os mais incompetentes traficantes que rondavam pela zona do porto ao anoitecer. Era um bom lugar para encontrar e ser encontrado... e para perder-se.

 

Vance Gentry, que inspecionava da garupa de seu cavalo o mar de carretas que rodeava a cidade em quilômetros à redonda, suspirou desalentado.

 

Como caralho espera encontrá-los entre todo este barulho? Perguntou a Howard Majors com um significativo movimento da cabeça.

 

Encontraremo-lhes - repôs com calma Majors...

 

Bem, comecemos - disse Gentry, e esporeou ao seu cavalo.

 

Não. Esta noite começaremos a fazer perguntas com discrição. Se nos lançarmos a olhar em cada carro, pode ser que lhe ponhamos em sobre aviso. Se queria esconder-se, não lhe custaria nada fazê-lo entre essa massa de gente.

 

Gentry proferiu floridas blasfêmias. Desde que Madame LaRue lhes tinha posto na pista de Ross, tinha passado dias e dias de viagem em trens poeirentos e fumegantes, com intermináveis atrasos no horário, comidas imprestáveis e camas duras, quando as havia. Majors e ele tinham subido ao navio no Shreveport, uma embarcação lotada e lenta. Sua paciência se estava esgotando, e a constante insistência do Majors em manter a cautela lhe irritava, sobre tudo porque já estavam muito perto.

 

Sabiam que a caravana ia desagregar-se em Jefferson. Vitória podia estar em qualquer das carroças que rodeavam a cidade. Gentry queria aliviá-la o antes possível das humilhações e penalidades que estivesse padecendo, antes que Coleman tivesse a oportunidade de continuar sua viagem. Quase tinha esquecido o alívio que tinha experimentado quando Madame LaRue comentou que tinha visto em aparente bom estado à esposa do senhor Coleman.

 

Muito bem concedeu a contra gosto. Esta noite faremos perguntas. Amanhã começarei a procurar a minha filha, goste ou não.

 

Puxou as rédeas de seus arreios e se encaminhou de novo para o centro da cidade, onde tinham tido a sorte de encontrar habitações.

 

Majors lhe seguiu de perto. Estava farto das ameaças de Gentry. Se não estivesse tão decidido a capturar Sonny Clark antes de aposentar-se, para retirar-se de uma maneira gloriosa, há muitas semanas teria abandonado e recomendado a Gentry que contratasse a outra pessoa. Sim o tivesse feito, Gentry teria alugado a pistoleiros, sem dúvida. Queria ocultar que seu genro era o famoso Sonny Clark. Que melhor forma de manter o segredo que matando-o?

 

Majors esporeou ao seu cavalo. Não queria perder de vista ao Gentry. Em que pese a que havia dito em numerosas ocasiões que desejava capturar vivo a Clark, estava seguro de que aquele homem não lhe tinha escutado. Majors não confiava nele.

 

Lágrimas das grandes gemas grandes como ervilhas se desprenderam das pálpebras de Priscilla Watkins e escorregaram sobre suas faces.

 

É odioso, isso é o que é, Bubba Langston. Pensava que depois do que me fez te comportaria como um cavalheiro e pediria minha mão a papai.

 

Bubba admirou o pôr-do-sol, enquanto mordiscava um caule de erva.

 

Seriamente o pensou?

 

O moço tinha mudado. Priscilla tinha podido seguir sua evolução dia a dia. Bubba já não caminhava com a estupidez de um adolescente, a não ser com o passo seguro de um homem consciente de sê-lo. Seus olhos já não estavam cheios de curiosidade e perplexidade pelo que o mundo lhe ia oferecer a seguir; eram os olhos firmes e calculadores de um homem que não dava nada por seguro, e neles se liam todas aquelas características novas de sua personalidade, enquanto contemplava o ocaso. O fato de que não se fixou em que levava o seu melhor vestido para celebrar a chegada a Jefferson ofendeu Priscilla. Nos últimos tempos, ele apenas se fixava nela, quando se encontravam. Ia direto ao assunto, a tomava rápida e metodicamente. Priscilla tinha se alegrado quando Bubba começou a superar a morte do Luke, mas ele não havia tornado a ser tão tenro nem havia lhe tornado a sussurrar coisas bonitas como aquela primeira vez.

 

Por que crê que te deixo me fazer isto? Perguntou-lhe. Lançou um olhar angustiado para o carro, confiando em que mamãe não a ouvisse. Pensava me casar contigo, do contrário eu nunca...

 

E o que pensava fazer com Scout? Perguntou Bubba, enquanto desviou os olhos do céu chamejante para olhá-la.

 

A moça umedeceu os lábios e piscou. Se a tivesse esbofeteado, não se teria ficado mais estupefata.

 

Scout? Disse surpreendida.

 

Sim, Scout. Recorda que também iria casar-se com ele, ou só queria escapar de sua mãe sem importar muito pouco quem te ajudasse a fazê-lo?

 

Por dentro, Priscilla fervia de raiva. Com quem pensava aquele menino estúpido que estava falando? Não obstante, conseguiu manufaturar outra série de lágrimas, sólidas e perfeitas, que escorregaram sobre suas faces.

 

Bubba, Bubba, quem te contou estas mentiras sobre mim? Já sabe que eu só quero a ti para sempre. Quem lhe haja isso dito estava ciumento, isso é tudo. Porque quero a ti e a ninguém mas.

 

Bubba estirou seu comprido corpo, que tinha adquirido uma grande harmonia durante os últimos três meses. Já não parecia que fosse todo braços e pernas.

 

Por isso ouvi, deitaste-te com todo mundo que não estava já comprometido.

 

O desespero se apoderou de Priscilla. Scout já lhe tinha dedicado uma despedida zombadora. Tinha terminado o trabalho para o que tinha sido contratado e partia para outra aventura. Ficou furiosa e indignada pela facilidade com que a tinha deixado plantada.

 

Bubba era sua última oportunidade. Não tinha a menor intenção de enclausurar-se em uma espantosa granja com o estúpido de seu pai e sua insuportável mãe como única companhia. Nunca voltaria a ter outra oportunidade de trocar de vida, exceto uma de trabalho e rotina. Lançou um olhar de preocupação para o carro, agarrou a mão de Bubba e a apoiou sobre seu coração. Fechou os olhos em uma fingida demonstração de paixão.

 

Bubba, sente meu coração. Pulsa só por seu amor. Juro-lhe isso. Sente o muito que te amo, Bubba.

 

Um suspiro entrecortado surgiu de seus lábios quando Bubba começou a mover a mão sobre seu corpo. Um sorriso de triunfo substituiu à careta de encantamento. O menino a acariciou com destreza recém adquirida. Priscilla emitiu um leve gemido quando seu mamilo se ergueu sob o insistente polegar do moço.

 

Abriu os olhos quando ele deixou cair a mão.

 

É bonita, Priscilla, e mostras os atributos que atraem aos homens, mas não gostaria de ter uma esposa que os exiba para que o primeiro que passar.

 

Bastardo - vaiou, e se separou dele.

 

Bubba não se deu conta até então de quão feia podia chegar a ser. Seu rosto se deformou até converter-se em uma máscara cruel. Era uma menina mimada e sempre faria sua santa vontade. Bubba se alegrou de que Ross lhe tivesse precavido respeito daquela puta.

 

Não foi um homem até que eu te ensinei, e estar contigo foi como derrubar-se com um porco. Ouviste-me? Gritou. Um porco asqueroso!

 

Bubba sorriu.

 

Bom, não teria podido ter uma professora melhor. Obrigado pelas lições e as práticas.

 

Deu meia volta e se afastou com o passo tranqüilo e desenvolvido de um homem que acaba de tirar um peso de cima.

 

Priscilla girou em redondo, louca de furor, e descobriu a sua mãe detrás dela. Seu rosto enxuto estava tingido de púrpura. Tinha as fossas nasais quase fechadas. Estendeu uma mão similar a uma garra e esbofeteou a sua filha com todas suas forças. Uma mancha vermelha apareceu na face de Priscilla.

 

A moça nem sequer se alterou. Limitou-se a olhar a sua mãe e enquanto isso um lento sorriso entreabriu seus voluptuosos lábios. Entrou no carro sem dizer uma palavra, baixou uma mala de vime apartou a um lado ao seu silencioso pai e começou a guardar seus pertences.

 

O que crê que está fazendo, garota? Perguntou Leoa.

 

Fugir de ti. Vou para Jefferson a procurar trabalho.

 

Os olhos incolores de Leoa piscaram com fúria.

 

Não irá a nenhum lugar.

 

Olhe-me bem. Priscilla se voltou para sua mãe. Não penso terminar sendo uma velha amargurada e ressecada como você, enclausurada em alguma parte de terra esquecido de Deus com um idiota como esse. Assinalou ao seu pai. Vou viver de uma maneira muito diferente.

 

O que fará?

 

Priscilla fechou a mala e olhou a sua mãe de novo.

 

O que mais eu gosto - replicou, com olhos cintilantes. O que durante tanto tempo tenho feito de graça. A partir de agora terão que me pagar.

 

Puta? Sussurrou Leoa, estupefata. Vai ser uma puta? .

 

Priscilla sorriu.

 

A melhor paga da história. Olhe, mamãe, quando não lhe querem, suspira por ser querida. Durante anos sonhei com as maneiras de conseguir que alguém me queira. Pretendo entesourar todo o amor que você não me deu. Cada vez que abraço a um homem entre minhas pernas, pensarei nas vezes que você não me abraçou. Espero que possa viver com essa culpa.

 

Atirou a mala pelo extremo do carro e saltou. Agarrou a mala e se dirigiu para Jefferson, sem olhar atrás nem um momento.

 

Leoa se revolveu contra o seu marido.

 

Bem, estúpido mentecapto, vais ficar aí sentado sem fazer nada?

 

O homem olhou a sua mulher com olhos cansados e que fazia muitos anos que não se viam tão animados.

 

Sim. Não vou fazer nada para trazê-la de volta. Apesar das desgraças que recaiam sobre ela, sempre viverá melhor que ao seu lado. Oxalá tivesse tido essa coragem faz tempo.

 

Podemos escrevemos cartas - disse Lydia, chorosa.

 

Não sabemos ler nem escrever, mas quando um dos meninos aprender... A voz de Mamãe se quebrou por causa da emoção. Vou sentir saudades. Cheguei a te amar como a uma filha.

 

Não estaria aqui se não fosse por você.

 

Lydia e Mamãe voltaram a abraçar-se. Lydia absorveu a energia da mulher. As garotas choravam e se aferravam às saias de Lydia. Micah e Samuel se erguiam com solenidade junto ao seu pai. Todos pareciam tristes.

 

Lydia se despediu de outras famílias da caravana. Uma a uma tinham sido engolidas pelo caos de Jefferson, em direção ao seu seguinte destino. Os Langston partiam a primeira hora do dia seguinte. Assim que carregassem provisões no carro, transladariam-se aos limites ocidentais do acampamento. Como não voltariam a ver Lydia, estavam-se despedindo.

 

Iremos vê-los. Ross já disse que sim. Dentro de um ou dois anos, quando a casa estiver construída. Disse que Moisés vem conosco? Será de grande ajuda. Ross já tinha pensado pedir antes que Moisés oferecesse seus serviços.

 

Falava muito e com excessiva precipitação, mas se parasse, sabia que começaria a chorar.

 

Ama-o, verdade, moça? Perguntou Mamãe em voz baixa quando Lydia se deteve para recuperar o fôlego.

 

Sim, eu o amo. Faz-me sentir... Procurou as palavras adequadas, mas não havia nenhuma que descrevesse como se sentia desde que Ross a cuidava, e como! Não a amava como tinha amado Vitória, mas lhe tinha afeto. Faz-me sentir limpa e nova por dentro. Respeitada e honrada. Não importa o que tenha sido antes.

 

Ele também te ama - disse Mamãe, e aplaudiu a mão de Lydia.

 

A jovem negou com a cabeça.

 

Ainda ama Vitória.

 

Mamãe desprezou sua argumentação com um gesto.

 

Talvez ele acredite assim, mas você é a que compartilha sua cama. Qualquer dia se dará conta de que é você a quem ama. A julgar pela freqüência com que exibe nos últimos tempos esses dentes brancos, acredito que esse dia não está muito longínquo. Nunca o via tão radiante quando ela vivia. Dava a impressão de que algo lhe preocupava em todo momento, como se esforçasse em fazê-la feliz. Os dois serão muito felizes. Eu sei.

 

Eu também acredito, Mamãe.

 

A mulher estudou a Lydia.

 

Faz uma semana ou assim, pensei que estava zangada comigo por algo.

 

Lydia esquivou os olhos penetrantes de Mamãe. Era certo que tinha sido incapaz de confiar-se a Mamãe, depois de descobrir que Clancey tinha matado Luke. Seu sentimento de culpabilidade pela morte do moço não lhe permitia manter aquela estreita relação que tinha compartilhado antes com Mamãe. Não se tinha dado conta de que ela sim tinha notado que Lydia a evitava.

 

Não estava zangada contigo. Acredito que já temia o momento da despedida, e tratava de me acostumar a viver sem te ter perto. As lágrimas se amontoaram detrás de seus Olhos. Eu te amo, Mamãe. Amo a todos vocês.

 

Mamãe a abraçou com força.

 

Nós também te amamos, Lydia.

 

Quando se separaram, Lydia abraçou de uma em uma às garotas. Inclusive abraçou Zeke, que se ruborizou como um adolescente.

 

Cuide-se, Lydia disse com acanhamento.

 

Bubba disse que iria mais tarde ao seu carro para despedir-se. Mamãe secou os olhos com uma esquina do avental. Queria esperar que Ross voltasse. O menino está destroçado por ter que separar-se de seu herói.

 

Ross não demorará para retornar da cidade. Tenho que me dar pressa em preparar o jantar.

 

Agarrou Lee dos braços reticentes de Anabeth, olhou-lhes, memorizou seus rostos bondosos e queridos, e sentiu falta de Luke. Sua morte sempre pesaria sobre sua consciência. Se não fosse por ela...

 

Adeus disse, e deu meia volta antes de explodir em lágrimas.

 

Lydia pensou em Clancey e apressou o passo. Tinha que tirar a bolsa das jóias de seu esconderijo. Clancey viria por ela, estava segura. Teria seguido à caravana da noite em que matou ao Winston. Quando teria se dado conta de que não levava as jóias em cima? Estaria furioso, predisposto à violência. Lydia queria estar preparada quando aparecesse de novo. Viria, e quando o fizesse, daria-lhe as jóias imediatamente.

 

Estava convencida de que Ross não sabia nada a respeito das jóias. Vitória as tinha escondido em sua carreta. Lydia sabia que Ross se orgulhava de haver se elevado de uma vida criminal a uma respeitável. Só dependia de sua determinação e capacidade de trabalho. Jamais teria permitido que Vitória levasse as jóias da família. A mulher o tinha feito às escondidas. Portanto, se Lydia entregasse as jóias a Clancey e comprava dessa forma o seu desaparecimento, Ross não se inteiraria de nada.

 

Preparou a toda pressa o jantar, mas Lee parecia decidido a distraí-la, porque primeiro sujou a fralda e foi necessário trocá-lo, e depois ficou a chorar quando Lydia tentou acender o fogo. Negou-se a tranqüilizar-se até que Lydia lhe deu meia garrafa de leite. Ross tinha comprado uma vaca até chegar a Jefferson, para que já não tivessem que depender dos Norwood.

 

Os atrasos impediram que tirasse a bolsa de seu esconderijo. Quando o jantar começou a ferver, subiu ao carro. Acabava de empurrar um ou dois centímetros a cômoda, quando ouviu a voz de Ross.

 

Lydia!

 

Suspirou consternada, alisou o cabelo e se aproximou da parte posterior do carro.

 

Estou aqui.

 

Apareceu a cabeça pela abertura a tempo dever que Ross saltava do assento de um reboque de plataforma. O homem sentado ao seu lado tirou o puído chapéu, mas não se levantou.

 

Ross sorriu.

 

Não poderá acreditar a sorte que tivemos disse. Apresento-te ao senhor Pritchard. Minha esposa, Lydia. O homem cabeceou em direção a Lydia. Esta lhe olhou, e teve um mau pressentimento. Ross continuou com o mesmo entusiasmo de antes. Conhecemo-nos na cidade. O senhor Pritchard esteve esperando semanas para poder comprar um carro. Vendi-lhe o nosso e quer tomar posse dele agora mesmo.

 

Diz que quer percorrer a maior quantidade de quilômetros antes que comece o inverno.

 

Pensei que, se ele e sua família partissem agora, poderiam chegar ao Passo e passar ali o inverno, antes de seguir para Califórnia.

 

Quer pegar o carro agora?

 

Assim que tenhamos descarregado tudo o que não vai comprar riu Ross. Ofereceu-se a nos ajudar, de modo que mãos à obra. Comprei este reboque com o dinheiro que o senhor Pritchard pagou, porque o necessitaremos mais tarde. Lee e você podem dormir no carro de Moisés durante a viagem. De momento nos ficaremos, se por acaso não terminamos a cabana no tempo que tenho pensado.

 

Por que não lhe vendeste a carreta de Moisés? Perguntou Lydia, histérica.

 

Porque não é tão grande como esta e Pritchard tem cinco filhos. Ross voltou a cabeça para o homem, que sorriu. Começa a transladar ao carro tudo o que precise ter à mão.

 

Lydia ficou atordoada enquanto o senhor Pritchard descia do carro. Ross e ele começaram a desmantelar o que tinha sido seu lar nos últimos dois meses.

 

Quando Ross se fixou em sua expressão afligida, aproximou-se, apoiou as mãos sobre seus ombros e os apertou com delicadeza.

 

O que acontece, Lydia?

 

Nada - gaguejou.

 

O senhor Pritchard, com a ajuda do Moisés, estava descarregando a cômoda do carro de Ross e a transladou à carreta que Moisés tinha herdado de Winston. Só teria demorado uns segundos em recuperar a bolsa de veludo, mas a ocasião não se apresentou. Ross a olhou de uma maneira estranha.

 

Eu... tive que me despedir dos Langston.

 

Atraiu-a para ele e a beijou na boca.

 

Sei que está triste, mas prometi que iríamos vê-los e o disse a sério. Possivelmente o ano que vem. Beijou-a de novo. Agora faz o favor de me ajudar a selecionar as coisas, e me diga o que necessitará e o que podemos vender.

 

Trabalharam até tarde da noite. Os Pritchard que tinham chegado a Jefferson procedentes de Mississipi, estavam ansiosos por prosseguir seu caminho depois de um atraso de seis semanas, devido à demanda de artigos e o esgotamento dos fornecimentos. A senhora Pritchard e os meninos (cinco meninos, tinha anunciado com orgulho o homem enquanto admirava a Lee) estavam na cidade, comprando o que podiam para completar o que Ross lhes vendia.

 

Por fim, depois de duas horas de árduo trabalho, disse-lhes adeus. Ross lhe tinha ensinado a forma de unir os cavalos e se despediu de cada um dos animais. Pareciam pouco decididos a partir, mas finalmente obedeceram as ordens do senhor Pritchard, que agitou a mão e lhes desejou boa sorte enquanto se afastava com o carro, a parelha, a roda de reposto, dois barris de água... e as jóias dos Gentry.

 

Lydia não tinha tido a menor oportunidade de tirá-las do carro. Teria se alegrado das vê-las desaparecer, a não ser por Clancey. O que ia fazer quando seu meio-irmão viesse buscá-las? O que?

 

Em face ao cansados que estavam, Ross insistiu em transladar o carro de Hill e o novo até o extremo sul da cidade, longe da multidão. Lydia realizava todas as tarefas desconsolada; a preocupação que sentia roubava energias ao seu corpo. Seu rosto devia refletir cansaço, porque assim que se instalaram para passar a noite, Ross se aproximou e a abraçou.

 

Será melhor que vá ver Lee no carro de Moisés e durma um pouco.

 

Lydia se aferrou a ele, temerosa de que Clancey já tivesse denunciado seu paradeiro às autoridades.

 

Não. Dorme comigo esta noite, Ross. Vem para a cama comigo e me abrace forte, por favor, suplicou, agarrada ao seu colete de veludo.

 

Ross sorriu.

 

Eu gostaria, mas Moisés e eu temos muito que fazer esta noite. Você, descansa. Depois de amanhã partiremos para nosso lar.

 

Lydia levantou a cabeça para ouvir a palavra.

 

Lar - repetiu, como se fosse um termo carinhoso Ross, será isso possível para mim, para nós?

 

Abraçou-lhe com força, desejosa de já estar em seu lar, a salvo de qualquer ameaça.

 

Será possível - confirmou ele em um sussurro. Beijou-a, introduziu a língua em sua boca. Notou através da roupa os contornos familiares de seu corpo, que se amoldavam ao dele. Reagiu com uma sólida ereção. Lydia a repreendeu, vê o que me está fazendo? Acariciou seu cabelo com os lábios antes de apartar-se com expressão pesarosa. Tenho que ir trabalhar, mulher.

 

Deu-lhe uma palmada nas nádegas enquanto assinalava em direção ao carro de Hill.

 

Lydia desejou haver-se perdido no calor do abraço de Ross, utilizado seu carinho como uma poção que lhe impedisse de pensar em Clancey. Devia contar-lhe tudo? Sobre Clancey, sobre as jóias? Deteve-se na escuridão e deu meia volta. Ross já se pôs a trabalhar com o Moisés. Estava pondo as coisas no reboque e falava animadamente sobre planos que tinha feito aquela tarde.

 

Como poderia lhe dizer agora, quando, se Mamãe tinha razão, estava a ponto, de amá-la, que nenhum dos dois se encontrava livre do meio-irmão que a tinha manchado?

 

Além da ameaça que Clancey representava, estava a pergunta do que faria Ross quando se inteirasse de tudo. E se tomava a vingança por sua mão e matava Clancey? Sem dúvida a lei cairia sobre ele. E se em lugar de desprezar Clancey a odiava a ela? Ao saber que Clancey ainda constituía um fator importante na vida de Lydia, arrependeria-se de havê-la tomado por esposa, inclusive de lhe haver feito amor? Não, não o diria. Só podia esperar que Clancey não lhes seguisse.

 

Deu a volta e se encontrou cara a cara com a personificação de seus pensamentos, que lhe bloqueava o caminho ao carro.

 

Boa noite, irmãzinha grunhiu.

 

Seu tom de voz gelou o sangue nas veias de Lydia, que dirigiu um veloz olhar para Ross e Moisés. Este se dedicava a acender o fogo para preparar café, enquanto Ross ordenava coisas no reboque. Os dois estavam conversando enquanto trabalhavam.

 

Está louco? Perguntou Clancey. Se Ross te chegar a ver...

 

Teríamos muito do que falar, não? Como por exemplo, que iria roubar-lhe as jóias para dar ao seu querido meio-irmão.

 

Lydia tragou saliva e deu a volta ao carro, para que Ross não a visse falando com o homem que, em uma anterior ocasião, tinha afirmado desconhecer. Clancey a seguiu e a agarrou pelo braço.

 

Onde estão as jóias? Quero-as agora! Conseguiu as recuperar de algum jeito quando aquele menino bonito me atacou.

 

Não fui eu! Respondeu com veemência, E lutou por liberar seu braço das garras de Clancey Eu queria que levasse isso para nos liberar de ti. Winston as agarrou quando caiu. Voltei-as a esconder sob as madeira do chão e...

 

Vá pegá-las.

 

Lydia mordeu o lábio inferior até que sangrou.

 

Não posso.

 

Atirou-a contra o carro com tanta força que seus ouvidos começaram a zumbir e ficou sem fôlego.

 

Hei dito que vá buscar - rugiu perto de seu rosto.

 

Ross vendeu o carro esta tarde. Já não o temos. Não sabia que ia desfazer-se dele tão logo. Juro-o, Clancey. Vendemos antes que eu pudesse tirar as jóias.

 

Olhou-a com olhos malignos, e depois passeou a vista ao redor do acampamento, para comprovar sua afirmação.

 

Merda! Exclamou, e a palavra golpeou o rosto de Lydia como uma bofetada. Bem, sinto-o por ti.

 

Soltou-a com tal brutalidade que Lydia esteve a ponto de cair ao chão.

 

O que quer dizer?

 

Era como se seus lábios se converteram em borracha e não funcionassem bem. Tinha a garganta seca. A cabeça lhe dava voltas.

 

Quero dizer que ainda há cinco mil dólares esperando ao homem que denuncie ao seu marido, isso é o que quero dizer.

 

Não, Clancey...

 

Quis agarrar sua manga, mas o homem se soltou.

 

 

Teve a oportunidade de comprar meu silêncio. O preço eram as jóias que me extorquiste.

 

Disse-te...

 

Fecha o pico. Levantou a mão para golpeá-la. Entretanto, acariciou seu pescoço. Talvez meu preço tenha mudado. Talvez prefira a ti. Está disposta a abandonar a esse teu marido, tão forte e carinhoso, e vir comigo, com preço por salvar sua pele?

 

Uma quebra de onda de asco a invadiu. O tato de Clancey era frio e gélido, como se pulverizasse limo sobre sua pele quando a tocava. Seu estômago se rebelou e enviou arcadas para sua garganta. Estremeceu-se, sem poder controlar-se. Era insofrível. Nunca mais. Por nada do mundo.

 

Por Ross? Para salvar a vida de Ross?

 

Como podia permitir que aquele animal a tocasse, depois de conhecer o amor de Ross? Por Deus bendito, como? Para salvar Ross e a Lee suportaria o que fosse, inclusive Clancey.

 

Abriu os olhos, que tinha fechado porque lhe resultava impossível suportar sua feiúra, e lhe olhou com frieza.

 

De acordo. Irei contigo.

 

Clancey lançou uma gargalhada suave, mas não menos mortífera. Passou a mão sobre seus seios com rudeza.

 

Poderia te ter quando me desse a vontade, irmãzinha. Separou-se dela. Em que pese ao seu excelente aspecto, neste momento prefiro os cinco mil dólares. Não têm comparação com seu caralho escuro e suculento.

 

Tinha-a humilhado, mas já não lhe importava. Suplicaria, se fosse necessário.

 

Não, Clancey, por favor. Não nos faça isto.

 

Lutei muito por esse dinheiro, coração. Lembra-te do menino ao que tive que matar? Como se chamava?

 

Luke Langston.

 

Sim, Langston. Um bastardo de muito cuidado. Quase me escapou. Lutou como um puma. E aquele tio tão elegante...

 

Winston Hill. Matou aos dois. Eram meus amigos.

 

Eu era o seu amigo, antes que me desse às costas. Deixou-me por morto, garota. Foi minha mulher. Escapou-te com a barriga cheia por meu menino. Tenho a intenção de que pague o que me fez. Tenho que fazer coisas na cidade.

 

O que vais fazer?

 

De momento procurar esse carro. Se me houver dito a verdade, não pode estar muito longe.

 

Lydia pensou nos senhores Prítchard e em seus cinco filhos. Mais inocentes sobre sua consciência.

 

Não poderá encontrá-lo disse inutilmente.

 

Clancey espremeu sua mandíbula na mão.

 

Reza por isso - sussurrou, ou me verá pela manhã com a lei a minhas costas.

 

Deu meia volta e se afastou. Lydia lhe seguiu com o olhar. Repetir a lista de seus crimes que só tinha servido para tomar consciência de quanto o odiava, quanto desejava lhe ver morto. Avançou dois passos para ele, mas em seguida se deteve. Como ia matá-lo? Carecia de armas. Clancey a derrotaria com facilidade, talvez a assassinaria, e depois voltaria por Lee e Ross.

 

«Deus, o que vou fazer?», Perguntou-se, enquanto subia ao carro, onde Lee dormia placidamente. Não podia ficar sentada a esperar que aquele animal arruinasse sua vida uma vez mais. Tinha que fazer algo. Mas o que? O que?

 

No exterior, uma sombra se arrancou das que rodeavam a carreta. Materializou-se e tomou a forma de um homem, que jogou uma olhada ao interior do carro e viu a Lydia inclinada sobre o menino. A jovem se retorcia as mãos e chorava. A silhueta cravou a vista no homem que caminhava com passo decidido para a cidade. Apertou os lábios e fechou os punhos.

 

Então, com o maior sigilo, seguiu ao homem.

 

Clancey não dava crédito a sua boa sorte. Uma sorte incrível!

 

Tinha localizado a carroça dos Pritchard estacionado na rua principal, em frente a um armarinho. O inseto e a estreita de sua mulher, junto com seus cinco filhos, estavam amontoando fornecimentos sobre a calçada, enquanto discutiam sobre a melhor maneira de carregá-los no carro.

 

Vigiou-lhes do outro lado da rua. Quando todos entraram no armazém para tirar outro carregamento, atravessou a rua e entrou na carroça sem que ninguém se desse conta. Só demorou uns momentos em localizar as madeira que Lydia já tinha levantado. Antes que os Pritchard saíssem carregados, Clancey tinha oculto a bolsa de veludo dentro da camisa e posto pés em empoeirada, contente de não ter matado a ninguém, nem ter atraído a atenção sobre sua pessoa.

 

Tinha pensado na melhor maneira de abordar à lei. Devia entrar no escritório do xerife e anunciar a voz em grito que conhecia o paradeiro de Sonny Clark? Clancey pensava que os homens da lei não eram muito inteligentes. Cabia a possibilidade de que o xerife nem sequer soubesse quem era Sonny Clark. Ao fim e ao cabo, o foragido não tinha atuado em Telhas. Passariam dias antes que a lei reunisse a suficiente informação para realizar uma detenção. Enquanto isso Clark e Lydia já teriam fugido. Não, mataria-lhes antes de deixar que escapassem. Como podia lhes vigiar a ambos e a um xerife imbecil ao mesmo tempo?

 

E se Lydia abria a boca e contava a alguém que Clancey era o responsável pelos assassinatos de Luke e Winston? Seria sua palavra contra a sua, é obvio. Quem ia acreditar na mulher de um criminoso como Clark?

 

Claro que várias testemunhas afirmariam ter visto Clancey nas cercanias da caravana. Não poderiam lhe acusar de nada, mas lhe impediriam de levar a recompensa.

 

Agora que já tinha as jóias, Clancey queria denunciar Clark para obter a recompensa e continuar seu caminho, mas qual era o melhor método de fazê-lo?

 

Seguia pensando nisso quando entrou no vestíbulo do hotel e se dirigiu para o bar. Passeou o olhar ao redor da sala. O primeiro que sua mente registrou foram os dois homens sentados em poltronas a uma mesa pequena. Um falava muito excitado, inclinado sobre a mesa, e a golpeava com os punhos. O outro escutava, com expressão de aborrecimento em seu rosto vulgar, mas seus olhos não deixavam de inspecionar, como um profissional, à multidão que abarrotava o salão.

 

Clancey lhes vigiou, enquanto deixava que outros clientes fossem rodeando. Aquela noite em Knoxville estava bastante aturdido por causa da ferida na cabeça e bastante bêbado, mas não o suficiente para que sua memória lhe falhasse agora. Eram os mesmos dois homens. Aqueles que lhe tinham inspirado a idéia de que Lydia talvez tivesse se refugiado na caravana. Os mesmos dois homens que perseguiam Clark.

 

Esteve a ponto de lançar um grito de júbilo. Miúdo bastardo afortunado era.

 

Tirou o pôster enrugado que sempre levava dentro da camisa e apertou a bolsa de jóias contra o seu estômago, enquanto se aproximava daqueles cavalheiros. Atirou o pôster sobre a mesa, entre ambos, sem pronunciar nenhuma palavra.

 

O homem do cabelo grisalho interrompeu seu discurso e levantou a vista, irritado.

 

Que caralho ... ?

 

O outro homem apoiou a mão sobre seu pulso para silenciá-lo, quando viu que era Clancey quem tinha atirado o pôster.

 

Convidam a uísque a um homem que tem uma grande sede e muito do que falar?

 

Clancey puxou para trás o gordurento chapéu e lhes olhou com arrogância, convencido de sua importância.

 

Majors aproximou uma cadeira vazia à mesa e agarrou outro copo da bandeja que descansava sobre o aparador próximo. Clancey sorriu como se soubesse um segredo que a ambos adorariam saber, e eles lhe olharam com desagrado e profundo interesse ao mesmo tempo. Nas circunstâncias nas que se achavam não se podiam permitir remilgos.

 

Clancey bebeu vários copos de uísque e se secou a boca com a manga.

 

Meu nome é Russell, Clancey Russell.

 

Eu sou Howard Majors, da Agência de Detetives Pinkerton. Este é o senhor Vance Gentry.

 

Clancey se esparramado, passeou a vista ao seu redor com ar indiferente e se serviu de outro generoso copo de uísque.

 

Tenho uma casa no Tennessee, perto da fronteira da Carolina do Norte anunciou. Faz meses que persigo a minha mulher, que fugiu com meu filho na barriga.

 

Pelo amor de Deus, homem... começou Gentry, mas a voz serena e profissional do Majors lhe interrompeu.

 

Tudo isso é muito interessante, senhor Russell, mas lhe importaria de dizer como chegou a suas mãos este pôster e o que sabe a respeito?

 

Clancey sorriu e revelou seus dentes cariados.

 

Nada, exceto que sei onde está esse tipo neste preciso momento.

 

Gentry saltou da cadeira, agarrou Clancey pela gola da camisa e quase o levantou da cadeira. O uísque escorregou sobre a mão de Clancey.

 

Onde? Perguntou Gentry.

 

A explosão de Gentry irritou tanto a Majors que esteve a ponto de lhe apontar com a pistola que levava escondida. Ficou em pé, empurrou ao homem com violência e lhe ordenou que se sentasse e calasse. Os três homens já tinham atraído a atenção de outros clientes do hotel, coisa que Majors não desejava. Ao menos, ainda não. Gentry obedeceu a contra gosto, não sem antes lançar um olhar ameaçador a Clancey.

 

Majors se voltou para Clancey, que estava lambendo o uísque derramado sobre sua mão.

 

Sinto muito, senhor Russell. O senhor Gentry está muito nervoso. Sua filha está casada com Clark. Ambos fugiram de sua casa do Tennessee faz meses e não sabe nada dela após. Está muito preocupado.

 

Clancey já sabia, mas não queria revelá-lo. Seus planos de ganhar o dinheiro da recompensa e pôr pés em empoeirada quanto antes não incluíam mesclar-se com a lei ou Gentry. Que Lydia e Clark dessem a notícia da morte de sua filha.

 

Devia fazer-se de parvo com respeito às jóias. Enterraria-as de noite. Ao dia seguinte Lydia pilharia os dedos, se lhes dizia que conhecia sua existência. Arruinaria a relação de Lydia com aquele marido ao que admirava tanto. Na opinião de Clancey, Lydia ainda não tinha pago o suficiente as cachorradas que lhe tinha feito. Ele se encarregaria de que aquela gata levasse seu castigo.

 

Clancey era um bom ator quando queria. Sua reação surpreendeu aos dois homens. Estalou em gargalhadas.

 

Casado com sua filha, né? Bom, não sei como lhe soltar isto, Gentry, mas segui a pista desse homem porque ele foi quem se levou a minha mulher, que afirma que está casada com ele e não comigo, e que o pequeno é dele, rio meu. Não ouvi que Clark vá com outra mulher.

 

Estamos perdendo o tempo gritou Gentry, sem dignar-se a olhar a Clancey, e dirigindo-se a Majors. Não sabe de que fala. Está bêbado.

 

Esta vez foi Clancey quem se enfureceu.

 

Estão procurando Sonny Clark, aliás Ross Coleman, verdade? Bem, ele está aqui, acampado a um quilômetro da cidade. Hoje tive uma pequena discussão com minha mulher quando os achei. Ela recuperou a prudência. Piscou os olhos um olho com expressão obscena. Um estupendo exemplar, sim senhor. Manterá ele ocupado esta noite até que eu volte com a lei.

 

Uma hora depois os três homens se separaram. Gentry se voltou para Majors quando Clancey já não pôde lhes ouvir.

 

Não disse a sério de esperar a que se faça de dia para que esse homem nos conduza até ali, verdade? Exclamou, quando Majors se encaminhou à escada.

 

Muito a sério. Não quero ir de noite. Clark poderia aproveitar a escuridão para escapar.

 

Agarraríamo-lhe por surpresa.

 

Também podemos fazê-lo pela manhã. Por isso Russell nos há dito, Clark não suspeita nada.

 

Se fez algo a Vitória - sussurrou, furioso, Gentry, embora o vestíbulo se encontrasse deserto, salvo por um empregado adormecido atrás do escritório. Russell não sabia nada dela. Vai correr o risco de que Clark fuja, quando seguimos sem conhecer o paradeiro de minha filha? Tinha elevado a voz outra vez. Bem, Por Deus que estou farto de sua cautela. Não esperarei a que seja de dia. Irei atrás dele agora e...

 

Gentry se encontrou de repente sacudido e arrojado contra a parede. Majors não era tão alto nem forte como ele, mas em que pese a que tinha alcançado a idade da aposentadoria, era robusto e contava com a vantagem do fator surpresa. Dominou com facilidade ao homem.

 

Escute-me, Gentry. Estou farto de você, de seu caráter e de seus discursos. Paga à agência, logo tenho que lhe agüentar, mas não me vai dizer como tenho que fazer meu trabalho. Faremos a minha maneira. A minha maneira.

 

Para sublinhar suas palavras, afundou mais os punhos no peito de Gentry, ao que agarrava pelas lapelas.

 

Se isso significa ter que lhe encadear à cama ou chamar o xerife para que lhe detenha sob alguma acusação falsa, farei-o com tal de evitar que vá esta noite como um potro desbocado e danifique tudo. O que prefere?

 

Gentry, furioso com a situação em que se encontrava, olhou aos olhos do detetive e leu uma resolução que até lhe custaria vencer.

 

Esperarei até manhã respondeu, rígido.

 

Majors soltou o fino tecido da jaqueta de Gentry. Seus olhos, penetrantes e incisivos, disseram-no tudo.

 

Clancey desceu pelo passeio, cantarolando para si, com um sorriso estúpido desenhado no seu rosto. Já ensinaria aquela puta. Tinha a intenção de estar com Gentry e Majors, quando estes a surpreendessem com seu marido pela manhã. Esperava pegá-los na cama.

 

Soltou uma gargalhada lasciva e pensou em seus seios. Cacete, Havia tetas por todo o país. Compraria as melhores. Obteria o dinheiro da recompensa amanhã, depois de que detiveram o Clark. Já tinha as jóias.

 

Clancey Russell seria muito feliz. Sim, senhor. Ia instalar se na cúpula do mundo. Já não havia nada que pudesse impedir-lhe

 

Ouça, senhor sussurrou uma voz das escuras sombras de um beco.

 

Sim? Perguntou Clancey. Cambaleou-se, muito bêbado, e tratou de enfocar o olhar. Quem me chama?

 

Eu. A voz saiu das sombras. Recorda-me?

 

Clancey piscou até que as duas imagens que apareciam ante seus ébrios olhos se fundiram em uma. Depois ficou boquiaberto e os olhos estiveram a ponto de sair-se das órbitas. Estava vendo um maldito fantasma!

 

Isto é pelo Luke. Meu irmão.

 

Bubba afundou a faca até o punho entre as costelas de Clancey e puxou para cima. Contemplou o feio rosto de Clancey, que primeiro se deformou de surpresa, depois de horror e dor, e por fim adotou a expressão vazia da morte.

 

Bubba tirou a faca e deixou que o corpo caísse com um sinistro ruído à ruela semeada de lixo. Ajoelhou-se ao seu lado só um segundo, antes de sumir de novo nas trevas, sem que ninguém lhe visse.

 

Ross estava deitado em seu leito improvisado, com as mãos enlaçadas detrás da cabeça e a vista cravada no negro céu aveludado, tachonado de estrelas e uma meia lua. Estava contente, estava em paz. A felicidade discorria por seu corpo como nata abundante e espessa.

 

Quando tinha visto morrer Vitória, pensou que sua vida tinha terminado.

 

Bem longe disso. Ross estava aprendendo que a vida oferecia tantas alegrias como penúrias. Não tinha por que ser uma luta constante por demonstrar a própria valia. Quando alguém se preocupava com voçê, sentia-se automaticamente valioso.

 

Lydia se preocupava com ele.

 

Vitória também. Ela não teria desafiado ao seu pai e contraído matrimônio com ele, se não o amasse. Vitória tinha passado por cima as convenções e a classe social. Mas teria casado com ele se conhecesse o seu passado? Teria amado da mesma forma?

 

Ross não acreditava. Talvez, mas não queria. Nunca tinha reunido a coragem necessária para pôr o seu amor a prova. Para ele, Vitória tinha constituído um tesouro, algo que devia cuidar e proteger, resguardar de qualquer coisa desagradável, conservar a todo custo. Não acreditava que tivesse tolerado a verdade sobre ele. Entretanto, Lydia parecia amá-lo mais por isso.

 

Amor? Por que tinha acudido a palavra a sua mente? É que Lydia o amava? Ela o tinha demonstrado de cem maneiras, nos pequenos favores que o fazia, a espera que aparecia em seus olhos quando o olhava, aquela falta de fôlego que estrangulava sua voz quando falavam. Não tinha tido em conta aquelas demonstrações de afeto até agora. Vitória tinha ocupado por completo sua mente e seu coração. Mas agora...

 

Grunhiu e apoiou um braço sobre seus olhos fechados quando recordou a noite em que lhe tinha demonstrado seu amor tão livremente. Deus, tinha existido alguma outra mulher mais hábil na arte de amar a um homem? A lembrança daquela noite o acariciou, do mesmo modo que as mãos delicadas de Lydia tinham acariciado o membro intumescido.

 

Nunca tinha repelido sua nudez. A idéia de um homem nu seria repugnante para a maioria das mulheres «decentes». Lydia, sem vergonha, nem acanhamento, tinha examinado seu corpo com sincera admiração. Tinha glosado seu corpo com as mãos, tinha-o sensibilizado.

 

Recostou-se contra ele, para descender de uma forma lenta e excitante por seu corpo. Lydia depositou beijos fugazes e leves em seu peito, lambeu seus mamilos, beliscou sua pele com os lábios, alvoroçou seu pêlo com as pontas dos dedos. Beijou seu umbigo de forma brincalhona.

 

- Lydia, não tem por que fazê-lo - havia dito ele, com voz áspera. Para desmentir suas palavras, tinha enredado os dedos entre seu cabelo.

 

Quero fazê-lo - tinha sussurrado ela, agitando o pêlo de seu abdômen com o fôlego.

 

O primeiro contato de seus lábios foi vacilante, recatado, tímido. Ross tinha contido o fôlego. O seu membro pulsava preso na mão de Lydia. Ross se sentia mais homem que nunca, e ao mesmo tempo débil e indefeso, por causa do doce amor daquela mulher, que não só tinha subjugado seu corpo, mas também seu coração.

  

   Tinha blasfemado, rezado e repetido seu nome como um possesso, quando a língua de Lydia começou a inspecionar cada textura e sabor de seu corpo. Sentiu-se alheio a todo pensamento lógico e só reagiu à magia que ela tecia. Os lábios de Lydia, incentivados pela resposta de Ross, que já não era tímida, provaram todo seu corpo.

 

   Quando Ross sentiu o primeiro tremor do clímax, colocou-a escarranchado sobre ele, e seu calor lhe envolveu. Lydia se derrubou sobre seu peito e cobriu ambos os corpos com seu glorioso cabelo. Ross agarrou seu rosto entre as mãos e aproximou sua boca para beijá-la com a mesma voracidade e intimidade que possuía a fusão de seus corpos. Provou seu próprio sabor nos lábios de Lydia e derramou palavras de amor em sua boca quando a alagou de sêmen.

  

   O corpo de Ross estava coberto com uma fina camada de suor, ao recordar essa última vez que ele e Lydia fizeram amor. A pressão de sua virilha era tão selvagem como naquela ocasião, e se amaldiçoou por ter insistido em que sua mulher dormisse sozinha com Lee.

  

   De repente sentiu o impulso de ir ao seu lado. O que responderia ela se lhe perguntasse nesses momentos o que sentia por ele? Sempre tinha sido sincera. Não podia acusá-la nesse sentido. Nunca tinha mentido para ele. Embora não tivesse afirmado que o amava, pensou que, com o mínimo estímulo, faria-o. Queria ouvir aquelas palavras de sua boca. Desejava-o com todas suas forças. De repente Ross sentiu que era vital para ele ouvi-la dizer que o amava.

  

   Lançou um olhar para o carro e lançou um suspiro de pesar. Estaria adormecida e seria cruel despertá-la, mas amanhã de noite...

  

   Amanhã de noite, e a seguinte, e todas as demais noites, até o fim de seus dias. Aguardava com ânsia cada uma delas.

 

Bubba se deslizou com sigilo até o carro de Hill e chamou Lydia em voz baixa.

 

Temerosa de que Clancey houvesse retornado, Lydia correu a abrir as lonas.

 

Sou eu, Bubba.

 

Lydia suspirou aliviada.

 

O que está fazendo a estas horas da noite? Perguntou em sussurros.

 

Trouxe isso para você - Bubba também falava em voz baixa.

 

Lydia, levou a mão livre à boca para sufocar um grito. A bolsa das jóias lhe parecia insuportavelmente pesada.

 

De onde tiraste esta bolsa?

 

Teve a impressão de que sua garganta quase se fechava ao redor das palavras, e descobriu que ficava muito pouco fôlego.

 

Bubba não respondeu de uma maneira direta a sua pergunta.

 

Não voltará a matar a mais pessoas inocentes como Luke. Assegurei-me disso.

 

Bubba tinha matado Clancey!

 

A família que comprou o carro...

 

Segui você, vi tirar essa bolsa. Não fez mal a ninguém e nunca saberão nada.

 

Lydia ficou assombrada pela mudança que tinha experimentado Bubba. Já não era o moço que tinha conhecido umas semanas atrás. Aquele jovem franco apenas se parecia com ele. Certa dureza tinha aparecido em sua mandíbula, um rastro de desconfiança se desenhava em seus olhos, antes tão inocentes. Em que momento tinha substituído Bubba sua ingenuidade por aquela atitude desenvolvida e experimentada? Bubba sustentou seu olhar sem pestanejar, quando antes teria afastado a vista, ruborizado.

 

Lágrimas nublaram os olhos de Lydia. Aquele moço adorável se transformou em um homem, e agora já sabia todas as coisas odiosas que os homens deviam encarar e fazer. Tinha vingado ao seu irmão, e ao mesmo tempo tinha devotado a ela um presente. Lydia ignorava como tinha averiguado sobre Clancey, e se absteve de perguntá-lo. Graças a Bubba o seu meio-irmão estava morto, e com sua morte, Ross voltava a ser livre.

 

Tocou a face de Bubba com as pontas dos dedos. Era impensável agradecê-lo por matar a um homem, mas queria informar o que significava para ela.

 

Sabe sobre Ross?

 

O jovem assentiu.

 

O suficiente. Ninguém saberá por mim, Lydia, como ele não saberá o teu com... Deixou a frase sem acabar.

 

Você devolveu a vida a nós dois. Primeiro, quando me encontrou no bosque à espera da morte, e agora, isto. Nós estamos em dívida contigo, Bubba.

 

O jovem moveu a cabeça negativamente. Seu cabelo loiro brilhou à luz da lua.

 

Eu devia a Luke.

 

Lydia agitou a bolsa das jóias.

 

Não a quero.

 

Imaginava isso.

 

Não é minha nem tampouco de Ross.

 

Mas possivelmente pertença a Lee.

 

É obvio! Um dia Lee conheceria a história de sua mãe. Ross gostaria de dar algo dele. Lydia decidiu ocultar a bolsa em uma das caixas embaladas e deixar que Ross a «descobrisse». A guardaria para Lee.

 

Sim, acredito que tem razão. Estas jóias são de Lee.

 

Lydia sorriu a Bubba, que soube que recordaria aquele sorriso durante toda sua vida. Como também recordaria a expressão de Clancey ao morrer. Bubba sabia que aquela imagem o perseguiria durante muito tempo. Não se sentia culpado por haver matado. Russell o merecia. Tinha assassinado Luke e ao senhor Hill. A lei das montanhas, olho por olho, estava muito arraigada na jovem mente de Bubba para que se sentisse culpado por saldar contas.

 

Só lamentava ter tido que fazê-lo. Não tinha desfrutado fazendo-o. O seu estômago tinha revirado.

 

Nunca presumiria de ter matado a um homem. Nem sequer o diria aos seus pais, nunca lhes diria que a morte de Luke tinha sido vingada. Nunca poderia pagar a dívida contraída com seu irmão, mas tinha ajudado Ross e Lydia, razão mais que suficiente para justificar o que tinha feito.

 

Adeus, Lydia.

 

A moça tragou saliva.

 

Adeus, Bubba. Pensarei freqüentemente em vós.

 

O jovem contemplou uns instantes seu rosto banhado pela lua, e desejou que seus destinos se cruzassem quando ele fosse uns anos mais velho. Depois se odiou por aquele pensamento. Ela pertencia Ross e sua união era perfeita. Só esperava encontrar um dia a uma mulher tão maravilhosa como Lydia.

 

Para dissimular seus sentimentos, tirou o chapéu, deu meia volta e desapareceu na escuridão.

 

Lydia entrou na escuridão do carro, abriu uma caixa que continha roupas de cama e pôs a bolsa entre dois edredons. Depois engatinhou para o colchão e se deitou. Fazia muito tempo que não rezava. Muito antes que sua mãe morresse, já o considerava inútil. Naquele momento tentou recordar as palavras corretas, mas não pôde, assim que as inventou. Sua oração não foi poesia lírica ou poética. Foi torpe, mas sincera. Confiava em que Deus compreendesse quão agradecida estava.

 

Cruzou os braços sobre seu corpo e deixou que todas suas preocupações e temores a abandonassem. Ross e ela eram livres. Amanhã partiriam para o seu novo lar. Ninguém saberia sobre os seus passados. Seriam o senhor e a senhora Coleman, invejados por sua felicidade.

 

Talvez amanhã encontrasse a coragem necessária para confessar a Ross quanto o amava.

 

Um ramo se quebrou sob o pé de Bubba, e antes que pudesse dar outro passo, a pistola de Ross já apontava ao seu peito.

 

Maldição, Ross, sou eu, Bubba.

 

Sinto muito.

 

Ross soltou o percussor de seu Colt e o escondeu debaixo da cadeira de montar, que fazia as vezes de travesseiro. Os velhos costumes eram difíceis de desterrar. Olhou para Moisés, que roncava muito perto. Desviou a vista para o jovem, que havia se agachado junto ao fogo.

 

O que faz rondando em plena noite?

 

Não podia dormir.

 

Ross suspirou, ainda martirizado pela monstruosa ereção que não cedia. Sentia muitas saudades de Lydia.

 

Eu tampouco.

 

Além disso, queria me despedir.

 

Ross contemplou a silhueta de Bubba, recortada contra o resplendor do fogo do acampamento. Onde estava aquele moço entusiasta que tinha conhecido no condado de McMinn, Tennessee? Tinha crescido. Seu peito já não era côncavo. Uma insinuação de barba aparecia em seu queixo e no lábio inferior. Sua voz era diferente. Seu comportamento já era de um homem.

 

De modo que não vais aceitar minha oferta - disse Ross em voz baixa. Intuía a luta que se levava a cabo no foro interno do jovem.

 

Bubba resmungou uma blasfêmia e atirou ao fogo o galho com o que estava brincando. Examinou os olhos de Ross a tênue luz.

 

Ross, já sabe que nada eu gostaria mais que ir contigo, Lydia e Moisés para trabalhar com vós, mas não posso.

 

Sei, Bubba. Disse-o a sério, não te equivoque, mas quando perguntei isso já sabia que devia ir com sua família. Só queria que soubesse o quanto sentiremos falta de você.

 

Obrigado, Ross. Contemplou o fogo com semblante sombrio. Meu pai está ficando velho. A morte de Luke o afetou muito. Acredito que já não o entusiasma tanto fundar uma granja como quando fomos.

 

Assim que encontre um pedaço de terra, passará.

 

Talvez - replicou Bubba sem grande convicção, mas necessitará ajuda, e eu sou o filho mais velho. Mamãe e ele dependem de mim. Não posso decepcioná-los, embora isso signifique não ir contigo.

 

Ross se levantou do colchão, agachou-se junto à Bubba e apertou seu ombro.

 

É uma decisão própria de um homem. Alegro-me de que a tenha tomado.

 

Seus olhos se encontraram um momento, emocionados, e logo se desviaram, turvados. Ross deixou cair a mão.

 

Contemplaram as brasas durante longo momento, até que Ross rompeu o silêncio.

 

Lydia está decidida a ir ver vocês. Pensei que dentro de um ou dois anos sua granja terá prosperado o bastante para criar alguns cavalos. O que te parece se trago uma boa égua e um garanhão para ajudar você a começar?

 

Nos olhos de Bubba apareceu aquele júbilo infantil que ninguém tinha visto fazia semanas.

 

Diz-o a sério? Perguntou, entusiasmado, mas imediatamente se desinflou e seu sorriso desapareceu. Não teremos muito dinheiro, Ross.

 

Ross encolheu os ombros.

 

Já pensaremos em algo. Você se encarregue de ter o curral preparado.

 

Farei-o, mas foda-se, dois anos!

 

Ross lançou uma risada.

 

Passarão mais depressa do que pensa. Ross removeu o fogo sem necessidade. Dirigiu um olhar sorrateiro a Bubba. Despediste-te de Priscilla?

 

Bubba soprou.

 

Sim. Tinha razão, Ross. É um problema. Encontrei-me com Scout antes que partisse e começamos a comparar notas, por dizê-lo de algum jeito. Nunca mais voltarei a me atar com uma mulher como ela.

 

Ross voltou a rir.

 

Como ela possivelmente não, mas te atará de todos os modos. Não podemos as deixar em paz. Elas nos agarram antes de sabermos como.

 

Sim? Perguntou Bubba, como dando a entender que tinha dedicado alguma reflexão ao tema. O que devemos fazer, Ross? Quero dizer que algum dia quero me casar e fundar uma família, mas, caralho, estou todos os dias com os botões da braguilha suspensos.

 

Ross sorriu como sem lhe dar importância.

 

Nesse caso já somos dois.

 

Quer dizer ... ?

 

Quero dizer que quando você tem uma boa noite, você sente ainda mais falta durante o dia.

 

Bubba contemplou ao seu ídolo, e logo os dois explodiram em gargalhadas, até que Moisés se removeu em seu colchão e ficou de lado.

 

Será melhor que baixemos a voz, ou despertaremos todo mundo.

 

Já tenho que ir. Minha mãe não dorme até que todos os pintinhos estão no galinheiro, e nosso carro está a um quilômetro daqui.

 

Ross se levantou e estendeu a mão.

 

Cuide-se, Bubba, e não se preocupe com as mulheres. Se você conseguiu sobreviver a um verão com Priscilla, saberá se arrumar bem da próxima vez.

 

Bubba apertou com solenidade a mão de Ross.

 

Você é melhor que qualquer outro homem que tenha conhecido, exceto Luke.

 

Ross apertou a mão do menino.

 

Muito obrigado pelo elogio, Bubba. Lydia ensinou Anabeth a ler e a escrever. Procura que nos escreva cartas para nos mantermos informados.

 

Bubba esteve a ponto de ficar em ridículo quando os olhos começaram a queimar. Soltou a mão de Ross e se afastou uns passos.

 

Cuida bem de Lydia e Lee.

 

Farei-o.

 

Acredito que ganhei o direito de ser chamado por meu nome, verdade?

 

Ross, surpreso, refletiu um momento.

 

Suponho que sim. Depois lançou uma gargalhada em voz baixa. Qual é?

 

Jacob - murmurou Bubba com acanhamento. Eu não gosto muito. Ao cabo de uma breve pausa, acrescentou. O que te parece Jake? Soa bem. Ergueu-se e inclinou a cabeça. Sim, Jake.

 

Ross assentiu.

 

Cuide-se, Jake.

 

Até logo, Ross.

 

Até dentro de um ano ou assim, Bubba.

 

Ross se estendeu em seu leito. Sentia uma tristeza indefinida por Bubba. Algo nele era diferente. Mais amadurecido. Ross tinha captado certa tensão no jovem. Quase como a que Ross tinha sentido aos dezesseis anos, quando matou...

 

Mas era impossível. Bubba era um bom menino, e seria um homem melhor ainda. Ross estava convencido.

 

Enquanto mergulhava no sonho, experimentou uma grande sensação de confiança sobre o futuro. Esperança no amanhã. Mal podia esperar que amanhecesse...

 

Não se mova, filho de puta.

 

Ross sabia que tentar agarrar o Colt seria uma estupidez. Todos seus nervos treinados o disseram. E demonstraram que estavam certo quando abriu os olhos e viu o canhão de uma pistola, não tão longa e atemorizante como a sua, mas igualmente mortífera se disparada a escassos centímetros de seu nariz.

 

O céu estava cinza, quase tingido de rosa. Não tinha adormecido tanto. Era cedo. Os arredores se encontravam em silêncio.

 

Olhou a mão que sustentava a pistola, subiu pelo forte braço até os ombros impressionantes e o rosto de granito de seu sogro. Os olhos de Gentry brilhavam sob seu chapéu de aba larga.

 

Ross controlou sua surpresa com tanta autoridade como aos seus músculos.

 

Senhor Gentry - disse, e se perguntou que caralho estava fazendo aquele homem a centenas de quilômetros de seu lar, lhe apontando uma pistola. Tinham tido suas diferenças. Gentry se opôs que Vitória se casasse com ele, mas por que emanava ódio dele como o perfume barato de uma puta? O que ... ?

 

-Onde está, ela? Onde está Vitória?

 

Então Ross reagiu. Apoiou-se sobre os cotovelos e contemplou o congestionado rosto do homem.

 

Vitória? Perguntou com incredulidade. Não se tinha informado? Não tinha chegado a carta ao seu destino? Vitória morreu, senhor Gentry - disse em voz baixa.

 

Viu que um estremecimento percorria ao ancião, mas só os olhos de Gentry se moveram. Apertou com mais força a pistola. Pelo resto, seguiu perfeitamente imóvel.

 

Morta?

 

Escrevi-lhe faz meses. Morreu ao dar a luz antes que saíssemos do Tennssee.

 

Não te movas, bastardo – gritou o homem, e deu chute brutal nas costelas de Ross.

 

Ross ouviu que suas costelas rangiam ao mesmo tempo em que Moisés despertava e se levantava.

 

Quieto, negro, do contrário matarei ao seu amigo - ameaçou Gentry.

 

Ross? Perguntou Moisés, vacilante.

 

Faz o que diz - disse Ross, com voz afogada. Lágrimas de dor foram aos seus olhos. Deitou-se de lado e protegeu com um braço a costela quebrada. Conte sobre Vitória.

 

Moisés olhou ao homem branco e reconheceu seus cruéis prejuízos imediatamente, mas não tinha outra alternativa que falar e ajudar a Ross.

 

A esposa do senhor Coleman morreu quando dava a luz ao seu filho, justo antes de chegar a Memphis - explicou em voz baixa Moisés. Enterramo-la.

 

Gentry lançou uma breve gargalhada.

 

Crê que vou acreditar em sua palavra? Minha filha não estava grávida. Teria me dito isso. Ou é porque acabou com ela depois de raptá-la e roubar as jóias? Onde a deixou? Acredito que está morta, sim, e acredito que você a matou.

 

Jóias? - Ross meneou a cabeça, com a esperança de despertar e dar por concluída aquele ridículo pesadelo.

Quebras de onda de dor percorreram seu corpo, brilhantes brilhos de luz amarela nublaram sua visão. Precisava vomitar.

 

Senhor Gentry, não sei do que está falando - disse com voz entrecortada. Sachs me deu o título de propriedade de umas terras do Texas.

 

Sachs está morto - replicou Gentry.

 

A notícia não surpreendeu a Ross. A última vez que o viu, antes de partir, soube que seu amigo estava perto da morte. Mesmo assim sentiu uma enorme tristeza. Sachs tinha sido o primeiro ser humano que se preocupou por Sonny Clark.

 

Cedeu-me suas terras, porque sabia que ele nunca poderia as desfrutar. Vitória e eu decidimos ir com meus cavalos para fundar nosso próprio rancho. Inteiramo-nos de que se formou uma caravana e unimos a ela para poder viajar sem riscos.

 

Esperas que acredite que minha filha abandonou seu lar, e tudo que amava, para seguir a um inútil?

 

Seu rosto ia avermelhando a cada momento que passava. Tremia de fúria, e Ross não gostava da forma em que seu dedo se curvava sobre o gatilho da pistola. Entretanto, ele não podia desencapar a sua, pois sua costela quebrada dificultaria os seus movimentos. Além disso, não queria ameaçar ao seu sogro.

 

Não fui eu quem tomou a decisão, a não ser Vitória - disse, com uma calma que não sentia. Eu queria esperar que você voltasse da Virginia para partimos. Queria que você soubesse do bebê...

 

Gentry descarregou um punho sobre a mandíbula de Ross, o qual desabou no chão.

 

Fecha sua suja boca e não volte a falar do bebê. Não te bastou matando-a?

 

O que acontece, Ross?

 

Ross ouviu a voz de Lydia entre a nuvem de dor e cólera que o envolvia. Pensava aceitar sem discutir as insensatas acusações de Gentry, para rechaçá-las assim que o fosse possível, mas o que podia fazer com a visão nublada por causa do murro do Gentry e uma costela quebrada?

 

Lydia - disse em voz tão alta como permitiu sua respiração ofegante. Traz para Lee.

 

A voz afogada de Ross e sua postura encolhida desconcertaram Lydia, até que reparou no homem que lhe apontava com uma pistola. Saltou do carro, apertou Lee contra o seu peito e se aproximou correndo. Não tinha tido tempo de vestir-se e os seios que transbordavam por cima de sua camisa brilhavam em tons dourados e rosas, como o céu para o este.

 

O primeiro que se fixou Gentry foi em seus seios, sem deixar por isso de apontar Ross com sua pistola. A garota era lixo, a pura imagem da luxúria. Clark se tinha desfeito da bonita, elegante e adorável Vitória, para juntar-se com aquela puta. A esposa fugitiva de Russell. Gentry sentiu que uma nova quebra de onda de ira percorria todo seu corpo. Que Clark preferisse a aquela rameira em lugar da sua amada filha era um insulto que acrescentava uma nova dimensão ao seu ódio.

 

Retrocede - ordenou a Lydia, quando esta se aproximou de Ross.

 

A moça parou em seco e aferrou Lee contra os seus seios.

 

Quem é você? O que quer?

 

Lydia, é o pai de Vitória. Mostre Lee. É seu neto, Gentry.

 

Mentiroso.

 

Esse menino é seu neto. Juro-o. Vitória morreu quando deu a luz.

 

É verdade corroborou Lydia. Meu filho nasceu morto. Eu dava de mamar a Lee. Ross não se casou comigo até semanas depois de que Vitória morresse.

 

Imaginei que vós dois tentariam me dar o golpe com este menino para me tirar dinheiro - disse Gentry. Cuspiu no chão, perto do rosto de Ross. Sinto náuseas só de pensar que tocou a minha filha - disse em voz baixa.

 

Já sei, maldição - rugiu Ross. Dá-me igual, mas vai renegar o filho de Vitória, carne de sua carne, por uma questão de orgulho?

 

O homem nem sequer dedicou um olhar ao menino.

 

Por que classe de imbecil me toma ... , Clark? Quando Ross elevou a cabeça com brutalidade, Gentry lançou uma gargalhada. OH, sim, sei tudo sobre ti, maldito foragido. Também sei tudo sobre essa puta. Grande cena comovedora acaba de interpretar. Mas conheci seu marido ontem à noite. Sustentei uma interessante conversação com o senhor Russell. Você, o grande Sonny Clark, foi posto em ridículo por um par de caipiras.

 

Ross olhou sem compreender ao seu sogro.

 

Russell?

 

Marido? Repetiu Lydia.

 

Clancey Russell. Disse que te conheceu faz uma ou duas semanas. Disse que fingiu ir pedir trabalho, quando sua mulher e ele planejavam te denunciar.

 

O primeiro pensamento de Ross foi que seu sogro havia enlouquecido. Depois seus olhos se cravaram em Lydia e descobriu a verdade em seu rosto, pálido, arrasado pelo sentimento de culpa e o medo.

 

Era o seu marido? Perguntou com incredulidade, ansioso de que ela o negasse.

 

Não. Clancey Russell não era meu marido - disse Lydia, e moveu a cabeça lentamente de um lado a outro. Ainda morto, Clancey seguia atormentando-a. - Era meu meio-irmão.

 

Deus do céu, também são parentes - burlou Gentry.

 

Seu meio-irmão? Rugiu Ross.

 

Os olhos de Lydia suplicaram compreensão.

 

Sim.

 

Maldição! Amaldiçoou Ross. Conhecia meu passado, antes que lhe contasse isso, verdade?

 

Sim, mas...

 

E você e o meio-irmão ao que afirmava odiar...

 

Odiava-o..., odeio-o.

 

Não podia revelar que Clancey tinha morrido nas mãos de Bubba.

 

Os dois pensavam me entregar em troca da recompensa.

 

Não - protestou histericamente Lydia. - Não, Ross. Ele me ameaçou denunciar você, se não lhe entregava as jóias.

 

As jóias? Que jóias?

 

As jóias que me roubaste, explicou Gentry. A herança da família Gentry. Não me cabe a menor duvida de que obrigou a Vitória a abrir a caixa forte que estava oculta atrás do quadro que pendura no comilão. Escondemo-as ali para evitar que os ianques as levassem, entretanto só serviu para que um ladrão como você nos roubasse. Não sabia que Russell estava informado. Esta mulher a que chamas sua esposa deve dizer-lhe.

 

Se o que quer são as jóias, as darei - disse Lydia, e avançou um passo para Gentry. As entregaria de boa vontade se com isso não seguisse mirando Ross. Lee... Levantou o menino para o seu avô.

 

O homem retrocedeu, como se o bebê fosse o filho do diabo.

 

Dê ao negro e vá procurar as jóias.

 

Moisés agarrou Lee, que chorava por causa da fome e a tensão que crepitava ao seu redor. Lydia levantou o bordo de sua camisa e correu para o carro, meteu-se dentro e tirou as jóias de seu esconderijo. Esquivou os olhos acusadores de Ross quando correu para Gentry e estendeu a bolsa.

 

Joga ao chão. A moça obedeceu. Olhe isso, Clark. Peguei você com as mãos na massa. É suficiente para te matar.

 

Nunca tinha visto essa bolsa - gritou Ross.

 

Ele não as roubou - disse Lydia. - Vitória as levou quando abandonaram o Tennessee.

 

Cale-se! Gritou Gentry. É indigna de pronunciar seu nome.

 

Agarrou o braço de Lydia com a mão livre e o retorceu às costas. Obrigou-a a virar o rosto para Ross.

 

Olhe-a, Clark. Esta é a classe de mulher que te convém, não minha Vitória. Olha-a, semi-nua sem a menor vergonha. Manteve-te ocupado ontem à noite, como Russell disse que faria, para que ele pudesse nos avisar de seu paradeiro?

 

Não! Gemeu Lydia, presa na dor e a vergonha. Clancey estava vingando a sua maneira. Ela podia passar por cima dos insultos de Gentry. Era a decepção estampada no rosto de Ross o que a estava matando.

 

Como soube das jóias, Lydia? Perguntou Ross, sem que sua voz delatasse o menor sentimento.

 

A moça tragou saliva e piscou para dissimular a dor que Gentry lhe estava infligindo.

 

Clancey me disse isso. Não sei como o averiguou. Apareceu com uns pôsteres nos que se reclamava sua busca e captura, e ameaçou...

 

Quando?

 

Justo depois de que matassem ao Luke.

 

Ross amaldiçoou e ficou a rir. Primeiro surgiram de seu peito rugidos profundos, que acabaram por converter-se em gritos de desespero. Sabia que a dor de seu flanco lhe estava levando a bordo do delírio, mas se abandonou na histeria.

 

Faz semanas.

 

Teria Lydia mentido em todos e em cada um dos momentos que tinham estado juntos?

 

Seus olhos afiados como lâminas fez pequenas incisões no rosto de Lydia. A jovem umedeceu os lábios.

 

Ele matou Luke, Ross, porque o menino o viu rondando no bosque próximo à caravana. Também foi ele quem me atacou e matou Winston.

 

E não foi capaz de dizer a ninguém, nem sequer a mim?

 

Tinha medo de que alguém fizesse mal a ti ou a Lee.

 

Ou talvez estivesse protegendo ao seu meio-irmão - replicou Ross, furioso.

 

Olhou seus seios, que transbordavam por cima da camisa. Estava um pouco inclinada, para tentar aliviar a dor que lhe causava Gentry, o qual só servia para destacar seu volumoso busto. Seu cabelo era uma juba revolta que rodeava sua cabeça e caía sobre os ombros.

 

Você se encontrou com ele em segredo, às minhas costas.

 

Sim, mas...

 

Esteve aqui ontem à noite?

 

Não. Quero dizer sim, mas...

 

Quando me suplicou que dormisse contigo, era para me ter ocupado? Foi sua puta, verdade? Obedecia a todas suas ordens.

 

As palavras de Ross a golpearam no peito como um canhão. O ar fugiu de seu corpo por causa do impacto. Olhou aqueles frios olhos verdes, que tanto conhecia. Depois do que tinham sido, o um para o outro durante as últimas semanas, Lydia não entendia como Ross ainda podia seguir acreditando o pior a respeito dela.

 

Sim - vaiou entre dentes. Sim, era sua puta, e sim, ele esteve aqui ontem à noite. Disse-lhe que iria com ele. Ofereci-lhe abertamente minha pessoa e meu corpo. Fui sua puta para salvar a vida de minha mãe. Teria sido sua puta durante o resto de minha vida, se com isso tivesse salvado a ti e a Lee. Ser sua puta não resultaria pior que ser a tua, porque isso é o que ainda pensa de mim, verdade?

 

Seu rosto brilhava à luz do sol. Os raios inflamavam seu cabelo e a convertiam em uma labareda e os seus olhos despediram um resplendor feroz ao olhar Ross. Nunca a tinha visto mais bonita. Calor, fogo, sexualidade, orgulho e valentia, tudo ao mesmo tempo. Deus, que coragem demonstrava ao lançar aquela confissão. E Ross a amava por tudo isso.

 

Antes que Ross pudesse dizer algo, Gentry jogou Lydia ao chão. Ela tratou de agarrar sua pistola, mas o homem lhe apartou a mão. Aquela fração de segundo foi suficiente para que Ross rodasse de lado, extraindo ao mesmo tempo o Colt oculto sob sua cadeira de montar e o engatilhasse.

 

Gentry girou em círculo e disparou contra a silueta móvel de Ross. Lydia gritou, mas a bala se afundou no pó, a escassos centímetros da cabeça de Ross. Seus anos de experiência como pistoleiro só lhe tinham ensinado uma resposta. Disparou seu Colt.

 

Gentry contemplou como atordoado a carne ferida que revelava a manga rota e enegrecida de sua jaqueta. Levantou a pistola de novo.

 

Eu não o faria.

 

Todos os reflexos condicionados de Ross ficaram em ação. Já não sentia a dor das costelas quebradas. Já não tinha a visão nublada. Sua voz possuía o timbre quebradiço das lascas de gelo ao cair sobre uma superfície refletiva. Tinha falhado de propósito a primeira vez. Agora o canhão de sua pistola apontava diretamente à testa de Gentry.

 

Jogue a pistola, senhor Gentry.

 

Você a matou. É o responsável por sua morte, tanto a assassinou a sangue frio como o fez de outro modo. Vou matar você por isso, embora me custe a vida.

 

Não quero lhe matar, senhor Gentry.

 

O homem emitiu uma desagradável gargalhada.

 

Você adoraria me matar, porque sabe que sempre te odiei. Vi a verdade nas maneiras educados que tentava copiar de seus superiores. É lixo. Sempre foi, e sempre o será.

 

- Seu braço está dormente e sangrando – assinalou Ross.

 

- O mundo me agradecerá por te eliminar.

 

- Não quero matar você, filho de puta! Gritou Ross. Jogue a fodida pistola.

 

Gentry sorriu e seu dedo se esticou sobre o gatilho.

 

Ross atirou a um lado seu Colt.

 

Não o matarei, Gentry. Nego-me. Assassinará a um homem desarmado.

 

Seus olhos verdes não se desviaram nem um momento dos do Gentry. Se a pessoa olhasse nos olhos... E Ross sabia que ia disparar.

 

Como você queira - disse Gentry em voz baixa, e curvou seu dedo indicador.

 

Não! Gritou Lydia, e ficou diante de Ross.

 

Jogue a arma!

 

A ordem dirigida a Gentry procedia de um homem montado a cavalo. Tinha um rifle apoiado contra o seu ombro e apontava para Gentry.

 

As armas se dispararam ao mesmo tempo. Uma bala destroçou o coração de Gentry e o matou imediatamente.

 

O homem que tinha disparado blasfemou, e saltou do cavalo antes que este se detivesse por completo.

 

Moisés apertou Lee contra o seu peito.

 

Senhor, Senhor - murmurou.

 

A bala disparada por Gentry alcançou Lydia, que notou uma dor abrasadora e se aferrou à camisa de Ross. Tentou elevar a cabeça, lhe olhar aos olhos. Ansiava ver neles seu perdão e sua compreensão, mas não teve forças para levantá-la. Uma cortina negra tinha caído sobre seus olhos, e não viu nada.

 

Ross gritou seu nome quando ela desabou sobre ele. Notou o sangue quente que empapava o seu peito.

 

Lydia, Lydia! Gritou com voz rouca, indiferente a tudo que o rodeava, só atento ao suave peso derrubado sem vida sobre ele.

 

Deito-a de costas no chão e contemplou seu rosto. Estava muito pálida.

 

Não, Deus, não!

 

Ross moveu os lábios, mas nenhum som brotou deles.

 

Aquele ia ser seu inferno por todos os pecados tinha cometido? Amar a duas mulheres. Perder a ambas. Tinha amado Vitória pelo que representava, assim o ensinou. Mas Lydia, Lydia. Tinha-o ensinado o que significava amar. Amar sem qualificativos. Não amar por causa de, a não ser apesar de.

 

Não morra - suplicou. Apoiou a cabeça sobre seus seios e se esforçou por escutar os batimentos do coração de seu coração. Necessito-te. Não morra.

 

Notou seu muito leve fôlego na face e soluçou de agradecimento.

 

O canhão de um rifle se afundou em seu ombro. Levantou a cabeça. Um homem ao que não conhecia olhava-o. Ross compreendeu que o homem o tinha reconhecido como Sonny Clark.

 

Meu nome é Majors. Sou agente de Pinkerton.

 

Ross devolveu o olhar, com olhos tão acerados como seus nervos. Tinha chegado o dia que sempre tinha temido. Ele o tinha estado esperando. Sempre teria que pagar. Sempre. A felicidade, por efêmera que fosse, exigia um alto preço.

 

Contemplou os lábios entreabertos que lutavam por cada preciosa baforada de ar. A luz da manhã tingia suas pestanas de um delicado tom violeta. Sua fragilidade translúcida lhe comoveu até destroçar sua alma.

 

Assinarei uma confissão completa - disse Ross em voz baixa, sem apartar a vista de Lydia. Depois o agente de Pinkerton foi transpassado por uns olhos verdes que tinham aterrorizado os corações de homens melhores que ele. Se salvar a vida de minha mulher.

 

Ross contemplou suas botas e o sujo chão, tão imundo como ele. Sem barbear, sem se lavar, manchado de suor. O sangue de Lydia tinha deixado uma mancha parda em sua camisa.

 

«Quatro dias - pensou com as mãos enlaçadas entre os joelhos.» Quatro fodidos dias estava sentado naquela cela, sem saber se Lydia vivia ou tinha morrido. Onde estava, onde estava Lee? Supunha que Moisés teria feito cargo do menino, mas tampouco estava seguro.

 

Ao que parece as suas costelas não tinham quebrado. Durante os dois primeiros dias ficou deitado e imóvel, com a esperança de que se curassem por si só, mas a dor não era nada comparado com sua angústia.

 

Não tinha visto ninguém, salvo a outros prisioneiros, que pelo geral tinham sido encerrados por estarem bêbados e por escândalo público. Depois de urinar e vomitar em um rincão, e de caírem adormecidos por causa do uísque, eram postos em liberdade. O gordo ajudante do xerife que trazia as sobras da comida não lhe havia dito nada.

 

Não sabia nada, salvo que um detetive de Pinkerton e Vance Gentry tinham descoberto quem era em realidade Ross Coleman e lhe tinham seguido a pista. Seria julgado, mas não era difícil adivinhar qual seria o veredicto. Enforcariam-no.

 

Levantou-se da suja cama de armar e passeou pela cela quadrada, sem pisar nos montes de lodo que preferia não identificar. Por que não tinha morrido três anos antes, por causa das feridas que deveriam o haver matado? Lydia tinha dado sua vida para lhe salvar. Podia pedir alguém mais amor? E tinha morrido pensando que a odiava.

 

- Coleman.

 

Girou em círculo. Era o ajudante do xerife. Aquele homem era um porco, tanto por sua falta de higiene como por seu comportamento. Ross não respondeu.

 

Jogou um par de algemas entre os barrotes. Ross as apanhou no ar.

 

.Ponha-as - disse o ajudante, enquanto mastigava tabaco e um rio pardo escorria pelas comissuras de sua boca larga.

 

Ross obedeceu. Seria que por fim ia poder ver o detetive, para que este o interrogasse e tomasse nota de sua confissão? Não soltaria objeto até saber o estado de Lydia. E se havia... morrido, não diria nada até que permitissem ver o seu corpo.

 

O carcereiro abriu a porta e com uma sacudida de cabeça indicou Ross que saísse. Caminharam pelo estreito corredor, indo o guardião uns passos por detrás do prisioneiro. A atmosfera da habitação exterior, em que pese a sua estreiteza e o calor do verão, era muito mais suportável que a da cela, e Ross inalou grandes quantidades de ar para eliminar o fedor que tinha ficado aderido a suas fossas nasais.

 

Vamos - disse o ajudante. Encaixou o chapéu de Ross sobre a cabeça deste. E nada de truques advertiu.

 

Guiou Ross pelas calçadas da cidade. Os transeuntes, que se dirigiam aos seus assuntos, dedicaram um olhar ao homem algemado. Pelo visto, Majors não tinha anunciado a identidade do prisioneiro. Seu nome não era muito conhecido naquela parte do oeste, embora todo mundo tivesse ouvido falar de Jesse e Frank James. A falta de curiosidade a respeito de sua pessoa era surpreendente.

 

Percorreram várias quadras até que o ajudante se deteve.

 

Aqui - disse, e subiram pela calçada de pedra que conduzia à uma limpa casa de um piso.

 

Ross deixou que o homem o empurrasse pela porta até entrar em um vestíbulo, onde se ouvia o tictac de um relógio de pêndulo.

 

Doutor! Chamou o ajudante.

 

Um homem saiu de uma habitação situada na parte posterior da casa e fechou a porta a suas costas. Jogou o colete sobre sua barriga e caminhou para eles. Lançou um olhar pouco amistoso ao ajudante.

 

Obrigado, Ernie - disse o doutor.

 

Passou junto Ross para abrir a porta, uma sutil maneira de indicar ao ajudante que podia partir. O gordo saudou com o chapéu a contra gosto e saiu.

 

O homem baixo e calvo contemplou o rosto barbudo de Ross.

 

Sou o doutor Hanson. Assinalou a porta pela que acabava de sair. Sua esposa está aí dentro.

 

O coração de Ross deu um tombo. Devia estar morta. Do contrário, não o teriam tirado do cárcere. Se estivesse viva, teriam dado permissão para visitá-lo no cárcere.

 

Deu um profundo suspiro, e com a respiração entrecortada avançou para a porta. Foi difícil, mas conseguiu girar o pomo ainda com as mãos algemadas. Cruzou a porta e a fechou uma vez dentro. Pouco a pouco, deu meia volta e passeou a vista por aquela habitação ventilada pela brisa, até que descobriu a cama.

 

Tinha esperado ver Lydia deitada com seu melhor vestido, as mãos cruzadas sobre seu peito imóvel. Em troca, só viu um edredom de alegres cores estendida sobre a estreita cama de ferro e uma colcha dobrada sobre a barra do extremo.

 

Seus olhos investigaram a habitação até que a viu sentada em uma cadeira de balanço perto de uma janela aberta. Olhava-o com os olhos totalmente abertos, sem piscar. Estava completamente imóvel. Ia vestida com uma blusa e uma saia. Nada se movia, salvo o cabelo de Lydia, que a brisa agitava ao redor de sua cabeça. Já não tinha aquela palidez cadavérica, mas não tinha recuperado toda a cor.

 

O agente de Pinkerton estava de pé ao seu lado.

 

Baixou a vista para as algemas.

 

Esse imbecil do ajudante - grunhiu.

 

Tirou uma chave do bolso, cruzou a habitação com agilidade e abriu as algemas, que escorregaram dos pulsos de Ross. Segurou-as e guardou no bolso.

 

Lamento que tenham devolvido o seu marido algemado como um delinqüente comum, senhora Coleman - disse, quase com jovialidade.

 

Ross pensou que, ou tinha perdido o ouvido, ou seguia apanhado em um pesadelo extravagante. Aquele homem tinha chamado a sua mulher senhora Coleman?

 

Lydia sorriu ao detetive. Ross só desejava embeber-se na contemplação de sua imagem, mas o detetive lhe falou.

 

Todos esses ridículos cargos contra você, senhor Coleman, foram retirados, certamente.

 

Ross contemplou aquele homem, incrédulo e estupefato. Seus olhos lançaram um milhão de perguntas, com tanta rapidez como o código Morse.

 

Majors pigarreou e desviou a vista daqueles olhos penetrantes. Não queria recordar que ia cometer um ato insólito, contrário a todos os princípios que ele tinha defendido ao longo de sua carreira. As coisas eram brancas ou negras, corretas ou incorretas. Até muito pouco não tinha acreditado naquela zona cinza onde o dever e a responsabilidade se viam afetados pelos sentimentos e pelos instintos.

 

Mas na prática ele tinha convivido com Vance Gentry durante os dois últimos meses. Tinha-lhe desagradado o compromisso dogmático e inquebrável do homem, com uma idéia, tanto se fosse falsa como verdadeira. Tinha visto o homem conhecido como Ross Coleman inclinado sobre sua esposa, suplicando que não morresse. Tinha passado horas com a moça, investigado o seu passado, perguntado pelo homem com quem se casou em circunstâncias excepcionais.

 

Tinha discutido consigo mesmo durante dias, mas ao amanhecer daquele dia já sabia o que ia fazer. A justiça daquele ato era duvidosa e dependia exclusivamente de seu ponto de vista, mas ia fazer de todos os modos.

 

Aproximou-se da outra janela da habitação e apartou a cortina, em teoria para admirar as rosas do verão da senhora Hanson. Mas em realidade o detetive preferia não lhes olhar, enquanto dava as explicações pertinentes.

 

Tal como eu o vejo, senhor Coleman, Gentry pensava que sua filha lhe tinha abandonado. Enfureceu-se com os dois por fugir dele. Como pai, não posso culpá-lo por isso, mas não é um crime que uma esposa parta com seu marido sem avisar aos pais.

 

Olhou para ambos por cima do ombro. Ross não se moveu, mas o observava com muda desconfiança. A mulher estava olhando ao seu marido. Voltou-se de novo para a janela.

 

Dediquei os últimos dias a realizar certas pesquisas. Vitória Gentry Coleman morreu ao dar a luz. Jovem, teria economizado muitos problemas se tivesse documentado de seu falecimento como é devido.

 

A boca de Ross se moveu sem êxito. Era uma armadilha? Para que? O homem sabia muito bem quem era. Lançou um olhar inquisitivo a Lydia. Ela sacudiu apenas a cabeça, para lhe informar de que sabia tanto como ele.

 

O sacerdote que presidiu o enterro me assegurou que se ocuparia da papelada.

 

Majors meneou a cabeça.

 

E ainda, todos outros membros da caravana com quem falei confirmaram a história que sua mulher, sua atual mulher, contou-me. Voltou-se para o Ross. A propósito, lamento que tivesse que permanecer no cárcere até terminar de comprovar estes dados.

 

Ross não disse nada, nem tampouco Lydia, que não havia dito nada desde que ele entrou na habitação. Estava doente? Transtornada? Por que olhava Lydia com a mesma cautela que tinha visto em seus olhos a primeira noite, quando a tinham conduzido a sua carreta para que desse o seio a Lee?

 

Majors tirou algo do bolso e o jogou sobre a cama. Era a bolsa de veludo negro.

 

Gentry o acusou de roubar estas jóias.

 

Eram de Vitória. Não as quero - replicou Ross.

Se Majors tinha albergado alguma dúvida a respeito, ficou convencido de que estava obrando bem. Sonny Clark não teria chorado sobre o corpo de uma mulher ferida. Sonny Clark teria saído a tiros de uma situação comprometida. Sonny Clark tinha fama de ter destroçado qualquer cela que tinha tido a má sorte de lhe alojar. Ross Coleman tinha passado os últimos dias com a vista cravada nas paredes, silencioso e sumido em sua dor.

Ross Coleman era um homem admirado e respeitado por todos aqueles com quem viajava. Teria podido matar Gentry em defesa própria, mas não o tinha feito. Quando o deteve, comportou-se com docilidade, não isenta de hostilidade. Sua principal preocupação era sua mulher. Não tinha pedido nem um favor para si, mas sim tinha rogado que a transladassem imediatamente à consulta de um médico. Não tinha tentado escapar.

Agora desdenhava uma pequena fortuna em jóias. Não, aquele homem já não era Sonny Clark. Era Ross Coleman, e Majors ia deixar que vivesse em paz. Com a idade, estava ficando sentimental, mas não gostava de absolutamente de se aposentar com aquelas duas vistas arruinadas sobre sua consciência.

Talvez você não as queira, mas legalmente pertencem ao seu filho, senhor Coleman. Não acredita que deveria as guardar até que ele seja maior de idade?

 

Ross cabeceou pouco a pouco. Majors estendeu a bolsa a Ross, que a sua vez a deu a Lydia.

 

Os restos do senhor Gentry já vão caminho do Tennessee. Telegrafei ao seu advogado, que me informou de que se ocuparia dos preparativos do funeral. Majors tossiu e passeou ante a janela antes de prosseguir. Interroguei a sua esposa a respeito de seu falecido meio-irmão e...

 

Falecido?

 

Sim, claro. Não pôde inteirar-se da notícia. Encontrei-o morto a manhã que segui Gentry, a quem tinha advertido que não acusasse a você de roubo e seqüestro sem a minha presença. Quando despertei e fui a sua habitação, descobri que seu sogro havia saído.

 

Majors umedeceu os lábios ao recordar sua irritação naquele momento. Tinha saído a toda pressa do hotel em direção à cavalariça, e foi então quando viu o corpo de Clancey estendido no beco que corria paralelo ao hotel. Supôs que Gentry tinha matado Russell para impedir que divulgasse a história sobre o matrimônio de sua filha com Sonny Clark.

 

O assassinato de Russell segue sem solução - disse com ar pensativo.

 

Coleman não podia havê-lo feito. Quando interrogou Moisés, este afirmou que Coleman não se separou dele da tarde até que Gentry despertou pela manhã. E a moça? Majors a olhou. Se tinha escapado para assassinar ao seu meio-irmão, coisa que duvidava, era muito justificável.

 

Lydia continuou em silêncio, rezando para que Majors não lesse seus pensamentos. Jamais delataria ao assassino de Clancey. Nem sequer a Ross. Bubba o tinha pedido que guardasse o segredo. Manteria sua promessa.

 

Ouviram falar de um pistoleiro chamado Sonny Clark? Perguntou de repente Majors.

 

Os olhos de Lydia se encontraram um momento com os de Ross, antes de desviá-los para o detetive. Ross assentiu. Não diria nada em voz alta até saber a que jogava Majors.

 

Lydia sentiu o coração na garganta.

 

Ouvi dizer que tinha morrido - disse pouco a pouco o detetive, sem apartar a vista do rosto de Ross. Dizem que morreu faz anos, por causa das feridas recebidas durante o assalto a um banco. O que opina dessa teoria?

 

Está morto - afirmou Ross.

 

Está seguro?

 

Sim.

 

Majors assentiu, sem deixar de olhar Ross com astúcia.

 

Se estivesse vivo, suponho que não poderia dar nenhuma luz sobre o paradeiro atual dos irmãos James.

 

Juro Por Deus que não sei nada ao respeito - respondeu Ross de todo coração.

 

Majors intuiu que aquele homem não mentia.

 

Sim - disse. Acredito-lhe. Acariciou a orelha como se estivessem falando de um tema sem importância. Minha última missão oficial como detetive de Pinkerton será pulverizar a notícia de que Sonny Clark morreu lançou uma alegre gargalhada. Estou seguro de que muitos agentes da lei e caçadores de recompensas vão ter uma grande decepção. Não obterão nenhuma recompensa graças a ele.

 

Em que pese a que fosse difícil, Ross e Lydia se mantiveram imperturbáveis. Só o pomo de Adão de Ross se movia de cima abaixo quando tragou saliva.

 

Majors se aproximou da porta e a abriu.

 

Não vejo motivos para lhe reter mais.

 

Fez um gesto para indicar que podia partir.

 

As outras únicas pessoas que conheciam a autêntica identidade de Ross Coleman tinham morrido: Vance Gentry e Clancey Russell. Madame LaRue receberia uma carta de Majors comunicando que o pistoleiro tinha morrido perfurado de balas. Não especificaria a data.

 

Majors tinha interrogado a fundo Moisés. Tinha perguntado se o senhor Coleman se mostrava violento em alguma ocasião. O escravo livre tinha jurado que o senhor Coleman era um dos homens mais educados ao que tinha tido o prazer de conhecer. Não sabia nada sobre o passado de Coleman.

 

É obvio, Moisés mentia, pois tinha ouvido tudo que Gentry havia dito aquela manhã, mas Majors sabia que o negro levaria o segredo à tumba. Lydia Coleman não falaria nunca do turbulento passado de seu marido. Bastava ver como o olhava para saber que seu amor por ele transcendia os limites da normalidade.

 

Seu marido a tinha ajudado a levantar-se, sem trocar nenhuma palavra. Majors viu as lágrimas de gratidão que brilhavam nos olhos estranhos daquela mulher, quando se aproximou dele. Escolheu suas palavras com muito cuidado.

 

Você foi muito amável. Obrigado.

 

Saiu da habitação e deixou Ross a sós com o detetive. Os dois homens trocaram um olhar. Ross abriu a boca, mas Majors agarrou a mão para lhe calar.

 

É melhor que não me agradeça.

 

O agradecimento equivaleriam a uma confissão. Não podia arriscar-se a admitir que lhe tinham concedido um favor sem precedentes.

 

Ross apertou a mão do homem. Depois saiu a toda pressa para reunir-se com sua esposa. Howard Majors lhes viu afastar-se. Sorriu para si e se perguntou se era um semideus ou só um velho caduco e sentimental.

 

O doutor Hanson lhes acompanhou até o lugar onde Moisés tinha acampado com as duas carretas, ao redor da cidade. O negro lhes recebeu com entusiasmo. Reencontraram-se com Lee, que tinha sido bem atendido, ao igual a Lucky e as éguas. A nova vaca leiteira tinha também muito bom aspecto. Depois que Ross e Lydia agradeceram ao médico, este retornou à cidade. Ross prendeu os cavalos.

 

Aquele dia só viajaram uns quantos quilômetros seguindo paralelos ao rio que desembocava nas terras de Ross, quem tinha entregue o título de propriedade no escritório de registros o dia que tinha vendido a carreta aos Pritchard. Tudo estava em ordem para que tomassem posse imediata.

 

Assim que acamparam para passar a noite, Moisés procurou desaparecer discretamente.

 

Acredito que irei rio abaixo para ver se posso pescar um bom peixe para o jantar.

 

Percebia a tensão que reinava entre Ross e Lydia. Não tinham trocado nenhuma palavra. Ross tinha conduzido o reboque e Moisés a carreta. Lydia tinha viajado deitada na parte posterior.

 

Obrigado, Moisés - disse Ross, enquanto desenganchava a parelha. Será ótimo.

 

Levarei Lee. Dormirá à sombra, e se acordar, começarei a lhe ensinar a nobre arte da pesca.

 

Se não for incomodar...

 

Não. Ficamos grandes amigos. Seus olhos escuros se encontraram com os de Ross. Acredito que demoraremos bastante em retornar.

 

Ross terminou os preparativos do acampamento, acendeu o fogo e desceu ao rio para tomar banho. Esfregou-se forte para tirar o odor do cárcere. Depois de vestir calças limpas, barbeou a barba de quatro dias e começou a sentir-se de novo como um ser humano.

 

Já voltava para acampamento quando Lydia apareceu à parte posterior do carro de Hill. Retrocedeu quando o viu, mas depois desceu a terra com decisão.

 

Faz calor no carro. Acredito que me sentarei junto à água para me refrescar.

 

Tirou a blusa, mas seguia com a saia posta. Ia descalça. A vendagem que rodeava o ombro de Lydia era uma dolorosa prova da recente tragédia que os dois tinham vivido. Ross ficou sem fala.

 

Ela passou longe sem lhe olhar aos olhos. Quando ele a alcançou, sentou-se à borda do rio. Contemplava o lento fluir das águas. A luz do sol poente se derramava sobre ela como ouro líquido. Quase parecia muito bonita, muito etérea, para tocá-la. Quase.

 

Ross se sentou ao seu lado. Depois de um longo e silencioso momento, voltou-se para ela e tocou a vendagem com o dedo.

 

Por que o fez, Lydia?

 

O que? - Perguntou ela com voz oca.

 

Quando Ross tinha entrado na habitação do médico com aquele aspecto cansado, sujo, atordoado e desnutrido, ela tinha desejado saltar da cadeira e jogar-se em seus braços, mas tinha recordado a expressão de asco em seu rosto quando Gentry o tinha obrigado a vê-la como era em realidade. Ia obrigar a repetir os motivos de sua relação com Clancey?

 

Por que se interpôs quando Gentry me disparou?

 

Lydia elevou a cabeça. Os olhos de ambos se encontraram.

 

Porque eu te amo - respondeu, quase sem mover os lábios. Faria qualquer coisa para salvar você.

 

Embora isso tivesse significado voltar com Russell?

 

Um espasmo de repulsão alterou o rosto de Lydia um instante, mas não houve vacilação em seus olhos quando respondeu.

 

Sim, embora tivesse tido que voltar com ele.

 

Lydia. - Seu nome surgiu como um grito entrecortado de seus lábios quando a apertou em seus braços e enterrou a cabeça na curva de seu pescoço. Pensava que tinha morrido. Não me disseram nada. Deus, não pode imaginar o que padeci ao pensar que tinha sacrificado sua vida por mim.

 

Lydia lhe acariciou o cabelo, ainda molhado do banho. Alisou-o com suavidade, temerosa de acreditar no que estava ouvindo.

 

Ross agarrou seu rosto entre as mãos e a jogou para trás. Roçou seus lábios com os polegares.

 

Pensava que te tinha perdido antes que soubesse o quanto te amava.

 

-Ross! Exclamou ela. Pensava que me desprezava. Vi-o em seus olhos, em seu rosto...

 

Sinto muito, sinto muito. Semeou de beijos seu rosto. Por um momento o fiz, mas logo compreendi o quanto havia custado dizer que voltaria com Russell. Sabia quanto o detestava. Então compreendi o muito que devia me amar.

 

Beijou-a. Passou uma mão por detrás de sua nuca e a atraiu para ele. Acariciou sua boca com os lábios e o bigode, antes de afundar a língua no doce orifício e passeá-la a vontade.

 

Quando por fim se separaram, sem fôlego, ela embalou sua cabeça entre as mãos e olhou aos olhos.

 

Lamento que devesse inteirar-se assim de que Vitória pegou as jóias. Tentava impedir que o senhor Gentry te disparasse, do contrário nunca o haveria dito.

 

Ross acariciou com delicadeza os seus lóbulos entre os dedos indicadores e polegar.

 

Ela não confiava em mim, Lydia. Não confiava que a cuidasse.

 

Estou segura de que sim, só que estava acostumada a ter coisas bonitas. Ele não acreditava, mas assentiu. Sei que a amava, Ross, e me parece perfeito.

 

Ross estudou sua boca e se perguntou se algum dia se cansaria de saboreá-la. «Não», pensou.

 

Amava Vitória pelo muito que me ajudou. Sempre a amarei por Lee, mas - acrescentou, enquanto lhe roçava os lábios com os seus - Você é meu amor. Meu mais prezado amor, ao que seguirei querendo e necessitando todos os dias de minha vida.

 

Ela mal teve tempo de sussurrar seu nome, quando ele procurou outra vez os seus lábios. À medida que o beijo se intensificava, tombaram-se sobre a erva fria e verde. Quando seus lábios se separaram por fim, olharam-se. O dedo indicador de Ross seguiu o rebordo de renda de sua camisa e despertou pontadas de desejo em todo seu corpo.

 

Por que crê que ele fez isso, Lydia?

 

Sua mão se imobilizou.

 

Os dedos de Lydia, que estavam adorando os planos de seu rosto, descansaram também.

 

Não sei.

 

Passei quatro dias sem saber se estava viva ou morta. Não parava de pensar em ti, deitada na erva e coberta de sangue, enquanto me levavam a rastros. Deus! –Afundou a cabeça no vale de seus seios. Se Majors me obrigou a passar pelo calvário e ignorar o que te tinha ocorrido, por que me deixou em liberdade?

 

Lydia passou os dedos por seu cabelo.

 

Deve ter compreendido que já não era o homem de antes, que tinha mudado por completo. Mas tinha que assegurar-se. Chegou à conclusão de que não era justo fazer que Ross Coleman pagasse os pecados de Sonny Clark.

 

E os pecados de Ross Coleman? Perdoará-me alguma vez por ter duvidado de ti?

 

O sorriso de Lydia foi um pouco travessa.

 

Se me amar agora.

 

Os olhos de Ross cintilaram de paixão reprimida a ponto de explodir.

 

Não podemos. Machucarei você.

 

Beijou a vendagem.

 

Só é uma ferida superficial. O médico disse que meu desmaio foi causado pela impressão mais que pela gravidade da ferida. Leu dor nos olhos de Ross e o interpretou mal. É feia. Ficará uma cicatriz - disse com acanhamento.

 

Ross grunhou e beijou as curvas superiores de seus seios.

 

Essa bonita cicatriz sempre me recordará o teu amor.

 

Inclusive quando brigarmos, como sem dúvida ocorrerá?

 

Inclusive isso. Caralho, eu tenho uma para casa uma de nossas brigas. Excita-me. Levantou a mão e sorriu. E se começarmos a comparar cicatrizes, ainda ficam muitas para me alcançar.

 

Estendeu as mãos para a cinta de sua camisa e a desenredou.

 

Tem certeza de que está bem?

 

Sim - respondeu Lydia com ar sonhador, enquanto o ajudava a liberar os botões e tirava o objeto.

 

Quando se deitou de novo, Ross contemplou seus seios.

 

Sempre me esqueço do quanto você é magnífica. Cada vez que te contemplo nua é como descobrir um novo tesouro.

 

Encheu as mãos dela, acariciou, massageou. As pontas de seus dedos brincaram com seus mamilos, que responderam imediatamente a suas carícias. Inclinou a cabeça, tomou um em sua boca e o chupou com delicadeza.

Ainda tem sabor de leite. A primeira noite que a trouxeram para meu carro, lembro que vi isto - seguiu com o dedo o contorno da auréola, pérola de seu leite. - Já naquele momento te desejei. Que Deus me perdoe, mas assim foi.

 

Ross, por favor.

 

Acessou a sua súplica e se levantou para tirar as calças. Lydia o surpreendeu quando se ajoelhou em frente a ele. Ela não tinha pudor em fazer amor ao ar livre. Tinha ouvido Moisés dizer que Lee e ele se ausentariam durante muito tempo.

 

Olhou Ross com seus olhos âmbar e passeou as mãos sobre seu estômago.

 

Eu tirarei isso.

 

Passou a boca sobre seu umbigo orlado de pêlo. Os dedos de Ross se fecharam ao redor de sua cabeça, ao tempo que pronunciava o seu nome com lábios trêmulos. Lydia desabotoou os botões de suas calças um a um, e seus lábios acariciaram com ternura o que ia surgindo. Foi aquela carícia escorregadia de seu fôlego, seus lábios, sua língua, o que o enlouqueceu de paixão.

 

Ela acariciou com as mãos a parte superior de suas coxas, e logo subiu até seus quadris. Baixou as calças de um só e firme movimento sobre os músculos tensos de suas nádegas. Sua ereção perfeita era uma afirmação de seu amor e um bonito símbolo de masculinidade. Beijou-lhe com tenra reverência.

 

Ai, meu amor.

 

Ross lançou um grunhido retumbante quando se liberou da roupa interior. Deitou Lydia sobre a erva. Ajoelhou-se ao seu lado, desabotoou sua saia, soltou suas anáguas e todas as demais roupas.

 

Ross sorriu. O cabelo de Lydia estava esparramado sobre a erva. Um arco íris de cores crepusculares pintava o seu corpo de vermelho, ouro e lavanda. O resplendor natural de sua pele dotava ao espectro de um brilho especial. A vendagem branca não diminuía sua beleza, mas sim a aumentava. Deitou ao seu lado e tomou em seus braços. Voltou seu rosto para ele com o ombro ferido mais elevado.

 

É tão bonita - sussurrou. Ama-me tão bem, Lydia. Agora tem sentido.

 

Tocou seus seios, beijou-os, lambeu os mamilos até que brilharam. Depois deslizou os dedos entre o ninho de pêlo vermelho. Separou suas coxas com delicadeza.

 

Beijou seu estômago, e depois passeou sua boca sobre o precioso montículo de sua feminilidade. Rendeu tributo com os lábios ao altar de seu sexo. Depois a amou até a culminação com uma língua autoritária, decidida a proporcionar prazer e demonstrar seu amor.

 

Ross, Ross exclamou Lydia com voz entrecortada, e o abraçou.

 

Ross subiu até olhar o rosto e apoiou sua coxa sobre o quadril.

 

Não se esforce - ordenou em voz baixa. - Deixe a mim.

 

Penetrou-a com uma suave investida. Apertou-a contra o seu peito e foi aprofundando ao ritmo de cada carícia. Lydia moveu os quadris contra o seu estômago, e quando ele murmurou seu prazer supremo, repetiu o evocador movimento.

 

A comoção se precipitou sobre ela como sempre, embora cada vez fosse única. Primeiro a sensação de que a acariciavam com uma luva de veludo de dentro fora, e tudo ao mesmo tempo. Depois se jogava de cabeça em um estado de estupor onde só reinavam as sensações.

 

A seguir o jorro de luz que acompanhava ao estalo de calor líquido que surgia da virilha de Ross. Afluía como uma corrente a suas vísceras, alagava sua vagina, todo seu corpo, de amor. O mais sublime era aquele deslizamento leve em seu abraço, onde percebia a fortaleza de seu amor.

 

Eu te amo - sussurrou ela contra o seu peito, cujo pêlo estava agora cacheado e úmido. Beijou a cicatriz que corria sobre seu mamilo esquerdo.

 

Eu também te amo. Você me libertou do passado.

 

Lydia suspirou.

 

E você a mim, Ross. E você a mim. Só fica o futuro.

 

Permaneceram deitados e entrelaçados durante muito tempo. Os vaga-lumes sulcavam o ocaso como estrelas fugazes. O disco vermelho do sol ficou suspenso sobre o horizonte, como se resistisse a deixar atrás o dia. O céu adquiriu um vívido tom anil. O crepúsculo se fechou em torno deles e foi bem-vindo.

 

E desde aquele dia a aurora seria igualmente doce. 

 

                                                                  Sandra Brown

 

 

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