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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


UM RASTRO DE CRIMINALIDADE / Blake Pierce
UM RASTRO DE CRIMINALIDADE / Blake Pierce

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Carolyn Rainey podia sentir que algo estava errado. Era difícil explicar o sentimento. Mas enquanto caminhava pela sinuosa rua residencial para encontrar sua filha de doze anos, a pele na parte de trás do pescoço formigava.
Aparentemente, nada estava fora do comum. Carolyn sempre saiu da casa por volta das 2:30 para se encontrar com Jessica. Ela gostava da caminhada solitária e breve. Isso permitia que ela arejasse a cabeça durante a segunda metade do dia.
A Escola Secundária Playa del Rey liberava os alunos às 2:35 e Jessica todos os dias voltava de bicicleta para a casa. No momento em que ela conseguia colocar tudo que estava em seu armário de volta na sua mochila, logo após ela ia até a sua bicicleta, despedia-se de seus amigos e pegava a estrada, geralmente isso acontecia às 2:45.
Mãe e filha invariavelmente se encontravam em torno de 2:50, aproximadamente, no meio do caminho entre a escola e a casa. Então, elas voltavam para casa juntas, Carolyn andando, Jessica de bicicleta lentamente ao lado dela, ocasionalmente circulando sua mãe e brincando.
Elas conversavam sobre os eventos do dia: quem teve uma paixão por quem, qual professor acidentalmente usou uma palavra “feia”, qual era a música que estavam ensaiando no coral. Quando chegavam em casa, sempre havia um lanche à espera, após, Jessica mergulhava em sua lição de casa e Carolyn voltava a fazer o seu trabalho. Elas tinham uma rotina e era sempre o mesmo, com alguns minutos a mais ou a menos.
Mas Carolyn caminhava há quase meia hora. Eram quase 15h e ela estava a quase dois terços do caminho para a escola. Ela já deveria ter encontrado Jessica.
Talvez sua filha precisou ir ao banheiro. Ou talvez ela tenha se deixado levar por uma conversa com Kyle, o menino fofo da sua aula de inglês. Mas a sensação de formigamento em seu pescoço dizia a Carolyn que algo mais havia acontecido.
Quando ela virou a próxima esquina, ela viu que estava certa. A bicicleta roxa de Jessica, coberta de adesivos do filme A Bela e a Fera e fotos de seus cantores favoritos, Selena Gomez e Zara Larsson, estava deitada, com metade na calçada, metade na rua.
Ela correu até a bicicleta e olhou firme para ela, congelada de medo. Olhando em volta desesperadamente, ela vislumbrou algo nos arbustos da casa mais próxima. Ela se apressou e puxou os galhos. Um ramo quebrou e ficou pendurado.
Ela olhou para aquilo, quase incapaz de processar o que estava vendo. Era a mochila de Jessica. Carolyn caiu de joelhos, suas pernas de repente ficaram bambas. Seu coração bateu quase fora de seu peito quando a percepção a atingiu: sua filha desapareceu.

 

 

 


 

 

 


CAPÍTULO UM

A Detetive Keri Locke estava frustrada. Ela estava sentada à sua mesa na Divisão do Pacífico Oeste de Los Angeles do Departamento de Polícia de Los Angeles, estudando a tela do computador a sua frente.

Tudo estava ocorrendo ao redor dela, a delegacia estava agitada. Dois adolescentes que haviam roubado uma bolsa e tentado fugir em skates estavam sendo fichados. Um senhor idoso estava sentado em uma mesa próxima, explicando a um paciente policial como alguém pegava seu jornal matinal todos os dias antes que ele pudesse sair para pegá-lo. Dois caras gorduchos estavam algemados em bancos em extremidades opostas da área de espera, porque eles tinham começado uma luta de bar no meio da tarde e ainda queriam continuar nela. Keri ignorava todos eles.

Nos últimos vinte minutos, ela esteve se debruçando sobre cada mensagem na seção "estritamente platônico" da Craiglist de Los Angeles. Era a mesma coisa que esteve fazendo todos os dias nas últimas seis semanas, quando sua amiga, a colunista Margaret "Mags" Merrywether, dera-lhe uma pista que ela esperava que pudesse ajudá-la a encontrar sua filha desaparecida, Evie.

Evie fora raptada a cerca de cinco anos atrás. Porém após buscas incansáveis, e majoritariamente infrutuosas, Keri havia a encontrado finalmente, apenas para tê-la arrancada de seus braços novamente. A memória de ver Evie sendo levada em uma van preta, virando uma esquina e desaparecendo de vista, talvez para sempre, era demais. Ela afastou o pensamento de sua cabeça e voltou o foco para o que estava na sua frente. Afinal, era uma pista. E ela precisava desesperadamente de uma pista.

Era final de novembro quando Mags entrou em contato com uma figura obscura conhecida apenas como Viúvo Negro. Ele era um “solucionador de problemas” que se tornou lendário por fazer o trabalho sujo dos ricos e poderosos, quer seja assassinando inimigos políticos, fazendo repórteres incômodos desaparecerem ou roubando material confidencial.

Nesse caso, Keri suspeitava que ele estivesse com sua filha ou pelo menos soubesse a localização dela. Isso, porque apenas há seis semanas, Keri havia rastreado o homem que sequestrou Evie todos aqueles anos atrás. Ele era um sequestrador profissional conhecido como Colecionador. Keri aprendera que seu nome verdadeiro era Brian Wickwire, após tê-lo matado em uma luta de vida ou morte.

Usando informações que encontrou no apartamento de Wickwire posteriormente, Keri conseguiu remontar a localização de Evie. Foi até lá bem a tempo de ver um homem mais velho forçando a garota a entrar na van preta. Ela a chamou e até mesmo olhou nos olhos de sua filha, agora com treze anos. Na verdade, havia ouvido Evie dizer a palavra "Mamãe".

Mas o homem bateu no carro de Keri com a van e escapou. Atordoada e incapaz de perseguir, foi forçada a assistir impotente enquanto sua filha desaparecia da sua vista uma segunda vez. Mais tarde naquela noite, ela foi informada que a van havia sido encontrada em um estacionamento vazio. O homem mais velho fora baleado na cabeça ao estilo de uma execução. Evie se fora.

Por muitas semanas depois, a delegacia havia seguido cada pista, balançado todas as árvores na busca de sua filha. Mas elas eram todas becos sem saída. E sem qualquer evidência para continuar, a equipe teve que prosseguir com outros casos eventualmente.

No fim das contas, foi Mags, que parecia uma modelo de capa da revista Southern Socialite, mas que na verdade era uma repórter investigativa dura como pedra, que forneceu uma nova pista. Ela contou para Keri que a situação com Evie a lembrou de alguém que ela havia investigado anos atrás, chamado Viúvo Negro. Ele tinha fama pelos disparos duplos em estacionamentos tarde da noite. Sabia-se que ele dirigia um Lincoln Continental sem placas, o qual fora visto nas imagens das câmeras de segurança do estacionamento no qual a van preta foi encontrada.

E foi Mags que, usando um palpite de uma fonte confidencial e escrevendo anonimamente, entrou em contato com ele, usando o aparentemente ultrapassado quadro de mensagens da Craiglist. Supostamente, era como ele gostava de se comunicar com novos clientes em potencial.

E, para a sua surpresa, ele respondeu quase imediatamente. Ele disse que entraria em contato e, em breve, iria pedir a ela que criasse um novo endereço de e-mail para que eles pudessem se comunicar confidencialmente.

Infelizmente, ele ficou no escuro depois daquela comunicação inicial. Mags entrou em contato mais uma vez cerca de três semanas atrás, mas não teve resposta de volta. Keri queria que ela tentasse novamente, mas Mags insistiu que essa era uma má ideia. Pressionar esse cara faria apenas com que ele se entocasse novamente. Por mais frustrante que isso fosse, elas teriam que esperá-lo entrar em contato mais uma vez.

Mas Keri temia que isso nunca mais ocorresse. E ao escavar o quadro "estritamente platônico" pela terceira vez hoje, ela não poderia deixar de pensar que, o que uma vez pareceu uma pista promissora, poderia ser apenas mais um devastador beco sem saída.

Fechou a janela no monitor e cerrou os olhos enquanto respirava profundamente várias vezes. Tentando não deixar a desesperança dominá-la, permitiu sua mente flutuar para onde quisesse. Algumas vezes isso a levava ao inesperado, revelando lugares que ajudaram a resolver mistérios que ela pensava estarem além dela.

O que eu estou deixando passar? Sempre há um vestígio. Eu só tenho que reconhecer quando vir um.

Mas isso não funcionou dessa vez. Seu cérebro continuava circulando ao redor da ideia do Viúvo Negro, indetectável e incognoscível.

É claro que alguma vez ela também pensou a mesma coisa sobre o Colecionador. E apesar disso, conseguiu encontrar seu paradeiro, matá-lo e usar as informações em seu apartamento para descobrir a localização de sua filha. Se ela conseguiu uma vez, conseguiria fazê-lo de novo.

Talvez eu precise revisar os e-mails do Colecionador novamente ou retornar a vasculhar seu apartamento. Talvez eu tenha perdido alguma coisa na primeira vez, porque eu não sabia o que procurar.

Ocorreu-lhe que ambos os homens—o Colecionador e o Viúvo Negro—operavam no mesmo mundo. Ambos eram criminosos profissionais de aluguel—um sequestrador de crianças, o outro um assassino. Não parecia impossível que os caminhos deles tivessem se cruzado em algum ponto. Talvez o Colecionador guardasse um registro disso em algum lugar.

E então, ela percebeu que havia outra peça do tecido conectivo. Ambos tinham ligações com o mesmo homem, um abastado advogado do centro da cidade chamado Jackson Cave.

Para a maioria das pessoas, Cave era um proeminente advogado corporativo. Mas Keri o conhecia como o negociante sombrio que representava a escória da sociedade, que estava envolvido secretamente em tudo, de redes de escravas sexuais, passando por operações de tráfico de drogas até assassinato por encomenda. Infelizmente, ela não poderia provar nada disso sem revelar alguns dos próprios segredos.

Mas mesmo sem provas, ela estava certa de que Cave estava envolvido com ambos os homens. E se esse fosse o caso, talvez eles tivessem interagido. Não era muita coisa. Mas era algo para acompanhar. E ela precisava de algo, qualquer coisa, para evitar perder a cabeça.

Ela estava prestes a ir até a sala de evidências para procurar pelas coisas do Wickwire, quando seu parceiro, o Detetive Ray Sands, se aproximou.

—Eu cruzei com o Tenente Hillman na sala do café, ele disse.

—Ele acabou de receber uma chamada e nos deu o caso. Eu posso te dar os detalhes enquanto dirigimos até lá. Está pronta para sair? Você parece estar no meio de alguma coisa.

—Apenas um pouco de pesquisa, ela respondeu, bloqueando o monitor, nada que não possa esperar. Vamos.

Ray olhou para ela curioso. Ela sabia que ele estava totalmente ciente de que ela não estava sendo completamente sincera. Mas ele não disse qualquer coisa enquanto ela se levantou e seguiu o caminho para a saída da delegacia.


*


Keri e Ray eram membros da Unidade de Pessoas Desaparecidas da Divisão Pacífico Oeste. A divisão era considerada a melhor de todo o LAPD e eles eram as duas principais razões para isso. Eles haviam resolvido mais casos nos últimos dezoito meses que a maior parte de divisões inteiras no dobro desse tempo.

E também era verdade que Keri era vista como imprevisível e que conseguia criar tantos problemas quantos conseguia resolver. De fato, tecnicamente, atualmente ela estava sob investigação pelo Assuntos Internos a respeito de como se deu o confronto com o Colecionador. Todos continuavam a dizê-la que era apenas uma formalidade. Ainda sim, isso pairava sobre ela, como uma nuvem de chuva sempre ameaçando a desabar.

Entretanto, apesar dos atalhos que eles pegavam algumas vezes, ninguém poderia questionar seus resultados. Ray e Keri eram os melhores dos melhores, mesmo que estivessem passando por alguns soluços pessoais por esses dias.

Keri preferiu não pensar sobre isso enquanto Ray lhe repassava os detalhes do caso a caminho da cena. Ela não conseguiria lidar com ambos, um caso de pessoa desaparecida e a sua complicada relação com Ray, ao mesmo tempo. De fato, ela teve que olhar para fora da janela para evitar focar nos seus fortes e escuros antebraços segurando o volante.

—A vítima em potencial é Jessica Rainey, disse Ray. Ela tem doze anos e mora em Playa del Rey. A mãe normalmente a encontra no caminho de bicicleta da escola para casa. Hoje ela encontrou a bicicleta caída no canto da rua e a mochila enfiada em um arbusto próximo.

—Nós sabemos alguma coisa sobre os pais? Perguntou Keri enquanto eles se dirigiam para o Culver Boulevard em direção à comunidade a beira-mar, onde ela também morava. Muitas vezes, desavenças entre os pais é um fator determinante. Uma boa metade dos seus casos de desaparecimento de crianças envolvia um dos pais sequestrando o filho.

—Ainda não muito, disse Ray enquanto cortava o tráfego.

Era início de janeiro e fazia frio lá fora, mas Keri reparou gotas de suor escorrendo pela cabeça careca de Ray enquanto ele dirigia. Ele parecia nervoso acerca de alguma coisa. Antes que ela pudesse dar continuidade ao assunto, ele prosseguiu.

—Eles são casados. A mãe trabalha em casa. Ela faz convites de casamento artesanais. O pai trabalha na Silicon Beach, para uma empresa de tecnologia. Eles têm um filho mais novo, um garoto de seis anos de idade. Ele está aos cuidados da escola hoje. A mãe verificou e ele está lá, são e salvo. Hillman disse a ela para deixá-lo lá por agora, para que o dia dele possa continuar normal o maior tempo possível.

—Não muito para seguirmos, comentou Keri. A CSU está a caminho?

—Sim, Hillman os enviou ao mesmo tempo em que nos enviou. Eles podem já estar por lá, tomara que estejam processando a bicicleta e a mochila para digitais.

Ray atravessou o cruzamento com o Jefferson Boulevard rapidamente. Agora, Keri quase conseguia ver o apartamento dela à distância. O oceano estava apenas a oitocentos metros depois dele. A casa dos Rainey ficava em um setor separado, mais chique, da comunidade, em uma grande colina com casas multimilionárias. Eles estavam a menos de cinco minutos de lá.

Keri reparou que Ray havia ficado excepcionalmente silencioso. Ela podia dizer que ele estava reunindo coragem para dizer algo. Ela não conseguia explicar o porquê, mas ela temia isso.

Ela e Ray Sands se conheciam há mais de sete anos, antes de Evie ser raptada, quando ela era uma professora de criminologia na Universidade Loyola Marymount e ele era o detetive local que tinha sido voluntariado pelo chefe para dar uma palestra na turma dela.

Após Evie ser sequestrada e a vida de Keri desmoronar, ele estivera ali, tanto como detetive trabalhando no caso quanto um amigo amparador. Ele sempre esteve ao lado dela durante o divórcio e o descalabro de sua carreira. Foi Ray que a convenceu a se juntar à força policial. E quando ela veio para a Divisão Oeste de Los Angeles, após dois anos como policial de rua, ela se tornou sua parceira na Divisão de Pessoas Desaparecidas.

Em algum lugar ao longo do caminho, a relação dos dois se tornou mais próxima. Talvez fosse, parcialmente, todo o flerte de brincadeira. Talvez fosse o fato de que ambos haviam salvado a vida um do outro múltiplas vezes. Talvez fosse, em parte, simples atração. Ela até reparou que Ray, um galanteador de destaque, havia parado de mencionar outras mulheres, mesmo de brincadeira.

O que quer que fosse, nos últimos poucos meses eles passaram bastante tempo fora na casa um do outro após o trabalho, indo juntos a restaurantes, ligando um para o outro para conversas não relacionadas a trabalho. Era como se fossem um casal de todas as formas, menos uma. Eles nunca deram o salto final para consumar a conexão. Diabos, eles nunca nem tinham se beijado.

Então, por que eu estou com medo do que eu acho que ele está prestes a falar?

Keri adorava passar o tempo com Ray e parte dela desejava levar as coisas para o próximo nível. Ela se sentia tão próxima ao homem, que era quase esquisito que nada tivesse acontecido. Contudo, por motivos que ela não podia encontrar palavras para descrever, ela temia dar esse próximo passo. E ela podia sentir Ray prestes a cruzar o limite.

—Posso perguntar algo a você? Ele perguntou enquanto fazia a curva à esquerda, saindo do Culver para a Pershing Drive, a estrada serpenteante que levava a parte mais abastada de Playa del Rey.

—Acho que pode.

Não. Por favor, não. Você vai arruinar tudo.

—Eu me sinto mais próximo a você do que qualquer outra pessoa no mundo, ele disse suavemente. E eu tenho a sensação de que você se sente da mesma maneira em relação a mim. Estou certo?

—Sim.

Estamos quase chegando à residência. Apenas dirija um pouco mais rápido para eu poder sair desse carro.

—Mas nós temos feito nada a respeito disso, ele disse.

—Acredito que não, ela concordou incerta sobre o que mais dizer.

—Eu quero mudar isso.

—Aham.

—Então, eu estou oficialmente te convidando para um encontro, Keri. Eu gostaria de levá-la para sair nesse final de semana. Você gostaria de ir jantar comigo?

Houve uma longa pausa antes que ela respondesse. Quando ela abriu a boca, não estava inteiramente certa sobre o que iria sair.

—Eu acho que não, Ray. Obrigada, mesmo assim.

Ray permaneceu no banco do motorista, seus olhos olhando diretamente à frente, boquiaberto, sem dizer uma palavra.

Keri, também aturdida com a própria resposta, permaneceu da mesma maneira e lutou contra o ímpeto de pular de um carro em movimento.


CAPÍTULO DOIS


Sem mais outra palavra entre eles, eles viraram à direita saindo da Pershing Drive para a íngreme Rees Street e, então, saíram à esquerda para a Ridge Avenue. Keri viu o caminhão da Unidade de Cena Criminal em frente a uma grande casa no topo da colina.

—Eu vejo o caminhão da CSU, ela disse maliciosamente, apenas para quebrar o silêncio.

Ray assentiu e estacionou o carro atrás do caminhão. Eles saíram e se dirigiram para a casa. Keri gastou tempo com seu cinto de armas para deixar Ray ir um pouco à sua frente. Ela conseguia sentir que ele não estava com ânimo para andar ao lado dela.

Ao segui-lo pelo caminho até a porta da frente, ela admirou mais uma vez o exuberante espécime físico que ele era. Ray era um afro-americano ex-boxeador profissional de quarenta anos de idade, careca, 105 kg e um metro e noventa e cinco de altura.

Apesar dos desafios que ele havia enfrentado desde que se aposentou do esporte, incluindo um divórcio, conseguir um olho de vidro e ser baleado, ele ainda parecia que poderia pisar de volta no ringue. Ele era musculoso, mas não pesado, com uma agilidade graciosa, inesperada para um homem do seu tamanho. Essa era uma razão para ser tão popular com as mulheres.

Alguns meses atrás, ela teria se perguntado por que ele estaria na dela. Mas ultimamente, apesar de estar se aproximando do seu trigésimo sexto aniversário, ela retomou parte do entusiasmo jovem que a fez popular.

Ela nunca seria uma supermodelo. Mas desde que ela retornou com o Krav Maga e cortou a bebida, ela havia perdido quase cinco quilos. Estava de volta ao peso de cinquenta e sete quilos, anteriores a briga do divórcio e que pareciam muito bem na silhueta de um metro e sessenta e sete. As bolsas embaixo dos olhos dela haviam desaparecido e ela, ocasionalmente, usava o cabelo loiro escuro solto ao invés do seu usual rabo de cavalo. Ela estava se sentindo bem consigo mesma recentemente. Então por que ela disse não para o encontro?

Lide com seus problemas pessoais depois, Keri. Foco no seu trabalho. Foco no caso.

Ela forçou todos os pensamentos alheios ao caso para fora da mente e olhou ao redor enquanto eles se aproximavam da casa, tentando sentir o mundo dos Rainey.

A Playa del Rey não era um bairro grande, mas as divisões sociais eram bem acentuadas. Embaixo, próximo a onde Keri morava, em um apartamento em cima de um restaurante chinês barato, a maioria do pessoal era da classe trabalhadora.

O mesmo era verdade para as pequenas ruas residenciais que se dirigiam para o interior da Manchester Avenue. Elas eram quase todas povoadas pelos residentes de enormes complexos de apartamentos e condomínios. Mas mais próximo à praia, e na grande colina onde os Rainey moravam, as casas variavam de grandes a massivas e quase todas tinham vista para o oceano.

Essa casa ficava em algum lugar entre grande e massiva, não uma mansão por si só, mas o mais próximo de uma que alguém pode chegar sem os muros de proteção exteriores e grandes pilares. Apesar disso, dava a impressão de um lar genuíno.

A grama no gramado da frente era um pouco longa e estava espalhada de brinquedos, incluindo um escorregador de plástico e um triciclo que no momento estava de cabeça para baixo. O caminho que eles tomaram para chegar até a casa era coberto com desenhos de giz colorido, alguns claramente eram o trabalho de uma criança de seis anos. Outras seções eram mais sofisticadas, feitas por um pré-adolescente.

Ray tocou a campainha e olhou diretamente pelo postigo, se recusando a fitar Keri. Ela poderia sentir a frustração e confusão emanando dele e preferiu ficar em silêncio. De qualquer forma, ela não sabia o que dizer.

Keri ouviu os passos rápidos de alguém correndo até a porta e segundos depois a mesma abriu para revelar uma mulher nos seus trinta e tantos anos. Ela vestia calças soltas e uma blusa casual, mas profissional. Ela tinha cabelo escuro curto e era atraente de uma forma agradável, de expressão franca que nem os olhos manchados de lágrimas podiam esconder.

—Sra. Rainey? Perguntou Keri com sua voz mais tranquilizadora.

—Sim. Vocês são os detetives? Ela perguntou suplicante.

—Somos nós, respondeu Keri. Eu sou Keri Locke e esse é meu parceiro, Ray Sands. Nós poderíamos entrar?

—Claro, por favor. Meu marido, Tim, está no andar de cima coletando algumas fotos de Jess. Ele estará aqui embaixo em um minuto. Vocês já sabem de alguma coisa?

—Ainda não, disse Ray. Mas vejo que nossa unidade de cena criminal chegou. Onde eles estão?

—Na garagem, eles estão verificando se há digitais nas coisas de Jess. Um deles me disse que eu não deveria tê-las movido de onde eu as encontrei. Mas eu estava com medo de apenas deixá-las na rua. E se elas fossem roubadas e nós perdêssemos alguma evidência?

Enquanto falava, sua voz ficou mais alta e as palavras começaram a se atropelar em um ritmo frenético. Keri podia dizer que ela mal estava se mantendo firme.

—Está bem, Sra. Rainey, ela lhe garantiu. A CSU ainda vai ser capaz de conseguir qualquer digital em potencial e você pode nos mostrar aonde encontrou as coisas dela depois.

Logo então, eles escutaram passos e se viraram para ver um homem segurando uma pilha de fotos descendo as escadas. Magro, com um cabelo castanho rebelde de ninho de passarinho e óculos com hastes de arame fino, Tim Rainey vestia calças cáqui e uma camisa de abotoar. Ele se parecia exatamente com o que Keri imaginava que um executivo da indústria de tecnologia seria.

—Tim, sua esposa disse, esses são os detetives que estão aqui para ajudar a encontrar Jess.

—Obrigado por terem vindo, ele disse, sua voz era quase um sussurro.

Keri e Ray apertaram as mãos com ele e ela notou que a outra mão segurando as fotos estava tremendo ligeiramente. Os olhos dele não estavam vermelhos como os da sua esposa, mas sua fronte era mais sulcada e todo seu rosto parecia contraído. Ele parecia um homem esmagado pelo estresse do momento. Keri não podia culpá-lo. Afinal, ela já estivera naquela posição.

—Por que não nos sentamos todos e vocês podem nos dizer o que sabem, ela disse, reparando que os joelhos dele estavam perto de se dobrarem.

Carolyn Rainey conduziu todos até a sala de estar da frente, onde seu marido deixou as fotos em cima de uma mesa de centro e desabou pesadamente em um sofá. Ela se sentou ao lado dele e colocou sua mão sobre o joelho dele, que estava balançando para cima e para baixo descontroladamente. Ele recebeu a mensagem e se aquietou.

—Estava andando para encontrar Jess depois da escola, começou Carolyn. Nós temos a mesma rotina todos os dias. Eu caminho. Ela pedala a bicicleta dela. Nós nos encontramos em algum lugar no meio e voltamos juntas. Quase sempre nos juntamos perto do mesmo lugar, um quarteirão a mais ou a menos.

O joelho de Tim Rainey começou a balançar novamente e ela deu palmadinhas gentis em suas costas para lembrá-lo de se recompor. Uma vez mais, ele se aquietou. Ela continuou.

—Eu comecei a me preocupar quando cheguei a dois terços do caminho até a escola e ainda não a havia visto. Isso tinha acontecido apenas duas vezes antes. Uma vez foi porque ela esqueceu um livro didático no armário e precisou voltar. Na outra vez ela teve uma forte dor de estômago. Ambas às vezes ela me ligou para me informar o que estava acontecendo.

—Desculpe interromper, disse Ray. Mas você pode me passar o número do celular dela? Talvez nós possamos conseguir rastreá-lo.

—A primeira coisa que pensei foi isso. Na realidade, eu liguei para ela assim que eu vi as coisas dela. Começou a tocar logo em seguida. Eu o encontrei debaixo do mesmo arbusto no qual sua mochila estava.

—Você tem o celular consigo agora? Perguntou Keri. Ainda pode haver informações preciosas a serem coletadas dele.

—A Unidade de Cena Criminal está fazendo a varredura dele.

—Isso é ótimo, disse Keri. Nós iremos dar uma olhada quando eles terminarem. Vamos repassar algumas informações básicas se vocês não se importam.

—É claro, disse Carolyn Rainey.

—Jessica mencionou alguma coisa recentemente sobre ter uma queda por um amigo?

—Não. Ela realmente mudou quem ela tinha uma queda há pouco tempo. As aulas acabaram de recomeçar essa semana depois das férias de inverno e ela disse que o tempo de folga a fez ver as coisas de um jeito diferente. Mas, já que o primeiro garoto nem nunca soube que ela gostava dele, eu não acho que isso importe.

—Ainda, se você puder anotar o nome de ambos, seria de grande ajuda, disse Ray. —Alguma vez ela mencionou ver alguma pessoa estranha na escola ou no caminho de lá ou para casa?

Ambos os Rainey balançaram a cabeça.

—Eu poderia? Perguntou Keri, apontando para as fotos na mesa.

Carolyn assentiu. Keri pegou as fotos empilhadas e começou a repassá-las. Jessica Rainey era uma garota de doze anos perfeitamente normal com um sorriso largo, com os cintilantes olhos da mãe e o cabelo selvagem do pai.

—Nós vamos seguir todas as pistas possíveis, Ray lhes assegurou. Mas eu não quero que vocês pulem para qualquer conclusão ainda. Ainda há uma chance de que isso seja apenas algum tipo de desentendimento. Nós não tivemos o informe de uma criança raptada nessa comunidade há uns bons dois anos, então não queremos fazer nenhuma suposição a essa altura.

—Eu agradeço, disse Carolyn Rainey. Mas Jess não é o tipo de garota que foge para a casa de um amigo e deixa todas as suas coisas largadas no canto da rua. E ela nunca partiria sem levar o celular. Simplesmente, não é ela.

Ray não respondeu. Keri sabia que ele se sentia obrigado a sugerir outras possibilidades. E ele normalmente era muito menos tendencioso a pular para a teoria de rapto do que Keri. Mas mesmo ele estava tendo dificuldades em encontrar razões legítimas pelas quais Jessica abandonaria todas as suas coisas.

—Tudo bem se nós levarmos algumas dessas fotos? Ela perguntou, quebrando o silêncio desconfortável. Queremos que elas circulem pela força policial.

—Claro, peguem todas se é o que vocês desejam, disse Carolyn.

—Não todas, disse Tim, removendo uma da pilha. Foi a primeira vez que ele falou desde quando todos se sentaram. Eu gostaria de manter essa foto se vocês puderem seguir sem ela.

Era uma foto de Jessica na floresta usando equipamentos de caminhada, com uma mochila grande demais para ela amarrada em suas costas. Seu rosto estava borrado com o que parecia ser tinta e ela tinha uma badana de arco-íris amarrada na cabeça. Ela tinha um largo sorriso de felicidade. Não ajudaria muito no propósito de identificação. E mesmo se ajudasse, Keri podia sentir que era muito especial para ele.

—Fique com ela. Nós temos mais que o suficiente, ela disse suavemente antes de retomar os negócios. Agora, há algumas coisas que nós iremos precisar de vocês e todas em curto prazo. Vocês podem querer anotar. Em situações assim, tempo é crucial então nós talvez tenhamos que sacrificar seus sentimentos por informação. Vocês estão bem com isso?

Ambos assentiram.

—Bom, ela disse antes de mergulhar. Então, aqui está o que vai acontecer. Sra. Rainey, nós vamos precisar que você nos mostre a rota que você fez para encontrar sua filha e a rota usual dela daquele ponto até a escola. Vamos querer olhar pelo quarto dela, incluindo quaisquer computadores ou tablets que ela possa ter. Como mencionei, nós também vamos vasculhar o telefone dela quando a CSU tiver terminado com ele.

—Certo, disse a Sra. Rainey, anotando tudo enquanto Keri continuava.

—Vamos precisar das informações de contato de todos os amigos que você conseguir pensar e de quaisquer crianças com as quais ela possa ter tido problemas durante o ano passado. Precisaremos do número do diretor. Nós podemos pegar as informações de contato dos professores e dos conselheiros de orientação na escola. Mas se vocês já as possuírem, seria ótimo.

—Nós podemos lhes fornecer todas elas, Carolyn prometeu a eles.

—Nós também vamos precisar dos nomes e números de qualquer treinador ou tutor que ela tenha, adicionou Ray, assim como os nomes daqueles dois garotos que ela tinha uma queda. Detetive Locke e eu vamos nos dividir para maximizar o tempo.

Keri o fitou. A voz dele parecia completamente normal, mas ela podia sentir que havia mais do que uma conveniência profissional de trabalho.

Não leve isso para o lado pessoal. É uma boa ideia.

—Sim, ela concordou. Por que a Sra. Rainey e eu não seguimos rota até a escola antes que escureça? Nessa época do ano, o sol estará se pondo em menos de uma hora. Você pode me dar aqueles números de contato no caminho.

—E Sr. Rainey, disse Ray, você pode me mostrar o quarto de Jessica. Depois disso, eu recomendo que você vá buscar seu filho. Qual é o nome dele?

—Nathaniel. Nate.

—Certo, bem, a CSU já haverá partido quando vocês voltarem, então não vai haver tantas pessoas por aqui. Vocês vão querer tentar manter as coisas o mais normal possível para ele. Dessa maneira, se nós precisarmos perguntar algo a ele, ele não vai se fechar.

Tim Rainey assentiu distraidamente, como se houvesse acabado de se lembrar de que também tinha um filho. Ray continuou.

—Quando você for, eu vou até a escola para falar com o pessoal por lá. Nós também vamos verificar se há alguma filmagem que possa ser de ajuda. Sra. Rainey, vou encontrar com você e a Detetive Locke na escola e levá-la de volta para casa.

—Você vai colocar um Alerta Âmbar? Perguntou Carolyn Rainey, se referindo a mensagem de sequestro enviada para o público em geral.

—Ainda não, disse Ray. É possível que nós iremos fazer isso em breve, mas não até que tenhamos mais informações para compartilhar. Nós ainda não sabemos o suficiente.

—Vamos nos mover, disse Keri. Quanto mais rápido nós verificarmos todas essas caixas, melhor será o cenário do que possa ter acontecido.

Todos ficaram de pé. Carolyn Rainey pegou sua bolsa e os conduziu até a porta da frente.

—Vou lhes informar se nós descobrirmos alguma coisa, ela disse ao marido enquanto ela lhe dava um beijo na bochecha. Ele assentiu, então a puxou para um longo e apertado abraço.

Keri fitou Ray que estava assistindo ao casal. Apesar de si, ele olhou para ela de relance. Ela ainda podia ver a ferida em seus olhos.

—Ligarei quando chegarmos à escola, Keri disse calmamente para Ray. Ele assentiu sem responder.

Ela sentiu a picada da frieza dele, mas ela entendeu. Ele tinha se aberto e corrido um grande risco. E ela o rejeitou sem explicação. Provavelmente, era bom que tivessem algum espaço nos próximos instantes.

Enquanto as duas mulheres saíram e começaram a caminhar para longe da casa, um pensamento reverberou na cabeça dela.

Eu estraguei tudo massivamente.


CAPÍTULO TRÊS


Noventa minutos depois, de volta à sua mesa, Keri deixou escapar um suspiro de profunda frustração. A maior parte da última uma hora e meia foi improfícua.

Eles não encontraram nada incomum no caminho até a escola e não se depararam com qualquer sinal óbvio de luta. Não havia marcas estranhas de pneu próximas ao ponto onde a Sra. Rainey encontrara as coisas de Jessica. Keri passou em todas as casas perto do local para verificar se algum dos residentes tinha uma câmera de vídeo voltada para a rua que pudesse se de algum uso. Nenhum tinha.

Quando eles chegaram à escola, Ray já estava lá conversando com a diretora, que prometeu enviar uma corrente de e-mail para todos os pais da escola pedindo por qualquer informação que eles pudessem ter. O responsável pela segurança tinha todas as imagens das câmeras de segurança do dia reunidas, então Keri sugeriu que Ray ficasse por lá e as assistisse enquanto ela levava a Sra. Rainey de volta para casa e retornava ao escritório para ligar para todos que poderiam ter pistas em potencial.

Para Carolyn Rainey, deve ter parecido simplesmente que dois parceiros estavam dividindo as tarefas de forma eficiente. E estavam, em certo grau. Mas o pensamento de sentar constrangedoramente no banco do passageiro enquanto Ray dirigia de volta para a divisão Oeste de LA, era algo que ela não estava esperando agora.

Então, ao invés disso, eles pegaram um Luft de volta para a casa dos Rainey e Keri continuou para a delegacia de lá. Foi aí que ela gastou a última meia hora ligando para todos os amigos e colegas de classe de Jessica. Ninguém tinha qualquer coisa incomum para compartilhar. Todas três amigas se lembraram dela saindo da escola de bicicleta e acenando para eles enquanto saia do estacionamento. Tudo parecia bem.

Ela ligou para ambos os garotos que Jessica tivera uma queda nas semanas recentes e, enquanto ambos sabiam quem ela era, nenhum pareceu conhecê-la bem ou mesmo estar ciente de como ela se sentia. Keri não estava chocada de forma alguma. Ela se lembrou de que naquela idade ela preenchia cadernos inteiros com os nomes dos garotos que ela gostava, sem nunca ter falado com eles de verdade.

Ela conversou, ou deixou mensagens, com todos os professores de Jessica, com o técnico de softball, com o tutor de matemática e até com o chefe da vigilância do bairro. Ninguém que ela contatou sabia de qualquer coisa.

Ela ligou para Ray, que atendeu ao primeiro toque.

—Sands.

—Eu não encontrei qualquer coisa aqui, ela disse, decidindo se focar somente na matéria em mãos. Ninguém viu qualquer coisa fora do ordinário. Os amigos dela disseram que tudo parecia bem quando ela deixou a escola. Eu ainda estou esperando por algumas ligações, mas não estou otimista. Você teve mais sorte?

—Até agora não. O alcance das câmeras de segurança se estende só até o fim do quarteirão da escola em cada direção. Eu posso vê-la se despedindo dos amigos, do jeito que você descreveu, e então pedalando. Nada acontece enquanto ela está visível. O guarda está reunindo a imagens do início dessa semana para mim, para ver se havia alguém perambulando ao redor nos dias anteriores. Pode demorar um tempo.

O que não foi dito nessa última linha era a suposição de que ele não retornaria para a delegacia tão cedo. Ela fingiu não reparar.

—Acho que nós deveríamos emitir o Alerta Âmbar, ela disse. São seis da noite agora. Então, se passaram três horas desde que a mãe dela discou 911. Nós não temos qualquer evidência sugerindo que se trata de alguma outra coisa que não um sequestro. Se ela foi raptada logo depois da escola, entre as duas e quarenta e cinco e às três da tarde, ela poderia estar tão longe quanto Palm Springs ou San Diego por agora. Precisando reunir tantos olhos nisso quanto seja possível.

—De acordo, disse Ray. Você pode se encarregar disso para que eu possa continuar revisando essas gravações?

—Claro, você vai voltar para a delegacia depois disso?

—Eu não sei, ele respondeu sem compromisso. Depende do que eu encontrar.

—Certo, bem, me mantenha notificada, ela disse.

—O farei, ele respondeu e desligou sem se despedir.

Keri se obrigou a não focar na desfeita e a colocar sua atenção em preparar o Alerta Âmbar para ser emitido. Ao terminar, ela viu seu chefe, o Tenente Cole Hillman, andando em direção à sala dele.

Ele estava vestindo o uniforme de sempre, calças, casaco esportivo, gravata frouxa e camisa de manga curta que não conseguia manter para dentro das calças devido a sua ampla circunferência. Ele já passava um pouco dos cinquenta, mas o trabalho o havia envelhecido de maneira tal que havia linhas profundas em sua testa e no canto dos seus olhos. O cabelo sal e pimenta recentemente era mais sal do que pimenta.

Ela pensou que ele estava indo até a mesa dela e iria demandar uma atualização da situação, mas ele nunca olhou na direção dela. Por ela estava tudo bem, já que queria verificar com o pessoal da CSU para saber se encontraram alguma impressão digital.

Depois de submeter o Alerta Âmbar, Keri andou pelo ambiente da delegacia, o qual parecia incomumente quieto para essa hora da noite, e desceu o corredor. Ela bateu na porta da CSU e colocou a cabeça para dentro sem esperar por permissão.

—Alguma sorte no caso Jessica Rainey?

A encarregada, uma garota de vinte e alguma coisa com cabelos escuros e óculos, olhou por sobre a revista que estava lendo. Keri não a reconheceu. O serviço de recepcionista da CSU era desgastante e tinha alta rotatividade. Ela digitou o nome no banco de dados.

—Nada na mochila ou na bicicleta, disse a garota. Eles ainda estão checando algumas digitais do telefone, mas do modo que estavam falando, não pareciam promissoras.

—Você poderia, por favor, pedir a eles que informassem a Detetive Locke assim que terminarem, independente do resultado? Mesmo que não haja digitais úteis, eu preciso verificar aquele celular.

—Entendido, Detetive, ela disse enterrando seu nariz de volta na revista antes mesmo que Keri fechasse a porta.

Em pé sozinha no silencioso corredor, Keri respirou fundo e percebeu que não havia mais nada para ela fazer. Ray estava verificando as imagens da vigilância da escola. Ela havia emitido o Alerta Âmbar. O relatório da CSU estava pendente e ela não conseguiria ver o telefone de Jessica até que terminassem com ele. Ela falara, ou estava esperando o retorno, com todos que tinha ligado.

Ela se escorou na parede e fechou os olhos, permitindo seu cérebro relaxar pela primeira vez em horas. Mas assim que ela o fez, pensamentos indesejáveis a inundaram.

Ela viu a imagem do rosto de Ray, ferido e confuso. Ela viu uma van preta com sua filha dentro virando a esquina na escuridão. Ela viu os olhos do Colecionador enquanto ela espremia seu pescoço, drenando a vida do homem que sequestrara sua filha há cinco anos, mesmo que ele já estivesse morrendo devido a uma ferida na cabeça. Ela viu as imagens granuladas do homem conhecido apenas como Viúvo Negro, enquanto ele baleava outro homem na cabeça, retirava Evie da van do homem e a enfiava no porta malas do seu próprio carro antes de desaparecer para sempre.

Seus olhos se arregalaram abertos e ela viu que estava de frente para a sala de evidências. Ela havia estado ali várias vezes nas semanas recentes, debruçando-se sobre as fotos do apartamento de Brian "O Colecionador" Wickwire.

As evidências de verdade estavam sendo mantidas na Divisão Central, porque o apartamento dele ficava na jurisdição deles. Eles tinham consentido em deixar o fotógrafo da polícia do Oeste de LA a tirar fotos de tudo, conquanto ficasse na sala de evidências deles. Por ter matado o homem, Keri não estava em uma posição de discutir com eles.

Mas ela não havia visto as fotos há vários dias e agora algo sobre elas a estava consumindo. Havia uma coceira no fundo do seu cérebro que ela simplesmente não conseguia coçar, algum tipo de conexão que ela sabia que estava escondida logo fora da beirada da sua consciência. Ela entrou na sala.

O encarregado das evidências não estava surpreso em vê-la e deslizou a lista de presença na direção dela sem uma palavra. Ela assinou, então foi diretamente para a estante com a caixa de fotos. Ela não precisava da data de referência, já que sabia exatamente em qual prateleira e em qual fileira estava. Ela pegou a caixa da prateleira e a puxou para uma das mesas nos fundos.

Ela se sentou, ligou a lâmpada da mesa e espalhou todas as fotos em frente a ela. Havia olhado para elas dúzias de vezes antes. Todo livro que Wickwire possuía foi catalogado e fotografado, assim como cada peça de roupa e cada item das prateleiras da sua cozinha. Acreditava-se que esse homem estivesse envolvido no rapto e na venda de até cinquenta crianças ao longo dos anos e os detetives da Divisão Central estavam deixando nenhuma pedra sem revirar.

Mas Keri sentia que o que estava a provocando não era nenhuma das fotos que ela havia estudado anteriormente. Era algo que ela tinha registrado apenas de passagem antes. Alguma coisa que estivera chacoalhando na sua mente quando estava de pé no corredor minutos antes, deixando todas as suas dolorosas lembranças se desaguarem sobre ela.

O que era? Qual conexão você está tentando fazer?

E então ela viu. No fundo de uma foto da mesa do Colecionador, havia uma série de fotos de natureza. Eram todas fotos 5 x 7 alinhadas horizontalmente. Havia um sapo em uma pedra. Ao lado, havia uma foto de uma lebre com as orelhas levantadas. E próximo a essa, havia um castor trabalhando em uma represa. Um pica-pau estava no meio de uma bicada. Um salmão capturado em filme enquanto saltava de uma correnteza. E ao lado desta, havia a imagem de uma aranha em um trecho de lama—uma viúva negra.

Uma viúva negra. Viúvo Negro. Há algo nisso?

Pode ter sido apenas uma coincidência. Obviamente, os detetives da Central não pensaram muito nas fotos, já que eles nem as catalogaram como evidência. Mas Keri sabia que o Colecionador gostava de manter registros codificados.

De fato, essa foi a maneira com a qual ela encontrou os endereços de onde Evie e múltiplas outras garotas sequestradas estavam sendo mantidas. O Colecionador os havia escondido bem à vista, em código alfanumérico em um monte de cartões postais aparentemente inócuos na gaveta de sua mesa.

Keri sabia que o Colecionador e o Viúvo Negro compartilhavam uma conexão: ambos foram contratados em várias ocasiões pelo advogado Jackson Cave.

Os caminhos deles se cruzaram em algum ponto, talvez em um serviço? Era essa a maneira que Wickwire mantinha as informações de contato de um companheiro pecador de aluguel, caso eles precisassem se juntar alguma vez?

Keri sentiu uma certeza a inundando, uma que normalmente só vinha quando ela descobria uma pista crucial em um caso. Estava certa de que, se ela pudesse acessar aquela foto, poderia encontrar algo de útil sobre ela.

O único problema era que a mesma estava no apartamento de Brian Wickwire, o qual ainda estava isolado por policiais da Divisão Central. A última vez que ela tentou entrar, há duas semanas, havia uma fita de cena criminal ao redor de todo o apartamento e dois policiais estacionados em frente ao prédio para deter quaisquer bisbilhoteiros.

Keri estava apenas começando a considerar como ela poderia navegar aquele desafio quando seu telefone tocou. Era Ray.

—Ei, ela disse hesitante.

—Você pode voltar para a casa dos Rainey imediatamente? Ele perguntou, pulando as cortesias.

—Claro. O que aconteceu?

—Eles acabam de receber uma nota de resgate.


CAPÍTULO QUATRO


Vinte ansiosos minutos depois, Keri estacionou na casa dos Rainey. Mais uma vez um caminhão da CSU já estava estacionado à frente. Ela bateu na porta da frente. Ray abriu quase imediatamente e ela podia dizer pelo olhar em sua face que a situação era sinistra. Ela olhou por cima dos ombros dele e viu os Rainey sentados juntos em um sofá. Ela estava em prantos. Ele parecia traumatizado.

—Estou feliz que você esteja aqui, disse Ray sinceramente. Eu estou aqui há apenas cinco minutos, mas estou tendo dificuldades em mantê-los sem saírem dos trilhos.

—Há um horário? Perguntou Keri serenamente enquanto adentrava.

—Sim. O cara quer que a transferência ocorra hoje à meia noite. Ele está pedindo cem mil.

—Nossa.

—E isso não é o pior, disse Ray. Você precisa ler a carta. É... esquisita.

Keri entrou na sala. Um investigador da CSU estava espanando o que parecia ser um envelope do FedEx. Ela olhou de volta para Ray, que assentiu.

—Louco, né?! Ele disse. Eu nunca havia visto uma carta de resgate chegar via FedEx antes. É do mesmo dia. Eu já dei o número de rastreamento para Edgerton. Ele disse que foi postada de algum lugar em El Segundo. O carimbo do horário era de uma e cinquenta e oito da tarde.

—Mas isso foi antes da Jessica ser raptada, disse Keri.

—Exato. O sequestrador deve ter postado antes de tê-la agarrado—bem descarado. Suarez está se dirigindo para lá nesse momento para buscar por alguma gravação em potencial do lugar.

—Parece bom, disse Keri enquanto se conduzia para a sala de estar onde os Rainey estavam. Ela foi assegurada que alguns dos seus melhores indivíduos estavam na mistura. O Detetive Kevin Edgerton era um mago da tecnologia e o Detetive Manny Suarez era um policial experiente e obstinado. Nada vai escorregar por eles.

—Oi, ela disse suavemente e ambos os Rainey olharam acima para ela. Os olhos de Carolyn estavam estufados e vermelhos, mas não havia mais lágrimas. Tim estava pálido como um fantasma, sua face rígida e apertada.

—Olá, Detetive, Carolyn conseguiu sussurrar.

—Eu poderia dar uma olhada na carta? Ela perguntou, mirando a folha de papel na mesa de centro. A carta já estava em um envelope transparente de evidência.

Eles assentiram mudos. Ela se moveu para mais perto para enxergar melhor. Antes mesmo de ler o conteúdo, ela podia perceber que a carta não tinha sido impressa usando um computador. Havia sido datilografada em uma folha de papel padrão 8 x 11. Isso a preocupou imediatamente.

Toda impressora ligada a um computador tem a própria assinatura identificável, representada por um padrão de pontos não reconhecíveis a olhos sem discernimento. Os pontos impressos em código juntamente com o texto do documento fornecem o fabricante, modelo e até o número de série da impressora usada. Se a pessoa que digitou essa carta sabia o suficiente para evitar uma impressora de computador, isso sugeria que ela provavelmente não era um amador.

A carta em si era igualmente problemática. Nela se lia:


Sua filha tem um espírito sombrio. O espírito deve ser podado para que uma criança saudável possa crescer em seu lugar. Isso vai destruir o corpo da criança, mas salvará sua alma. Tão triste que isso tenha que ser feito. O desejo de elevação do criador assim o demanda. Eu posso libertar essa criança do espírito com minhas tesouras de poda sagradas, o mecanismo do Senhor. Os demônios precisam ser desenraizados do seu interior.

Todavia, se prometerem vocês próprios a redimi-la por meios de sangria de purificação, como Ele comandara, eu irei retorná-la a vocês para o procedimento. Mas vocês precisam compensar-me pelo meu sacrifício. Eu demando $100 000 para ser curada. Deve ser dinheiro vivo, não rastreável. Não envolva as autoridades, os imundos provedores da miséria sórdida sobre esse mundo. Se vocês assim o fizerem, eu retornarei a criança ao solo do qual ela veio. Eu empregarei a maquinaria do Senhor para espalhar os restos gotejantes dela entre as ervas arruinadas da cidade. Eu forneci provas de que sou sincero em minhas reivindicações.

Meia noite. Apenas o pai. Pois apenas os pais salvarão o mundo da impureza.

Chace Park. A ponte perto da água.

$100 000. Meia noite. Sozinho.

A carne da sua carne depende da sua súplica.


Keri olhou para Ray. Havia tanto a se processar que ela escolheu deixar a maior parte de lado por hora e focar nos elementos mais evidentes da carta.

—O que ele quer dizer com 'fornecer provas'? Ela o perguntou.

—Também havia várias mechas de cabelo em um saco plástico no pacote, ele respondeu. Estamos testando para ver se elas batem.

—Ok, há muito em que se debruçar nessa coisa, disse Keri se voltando para os Rainey. Mas por hora, vamos focar na parte que não é psicopatia. Em primeiro lugar, vocês fizeram a escolha certa ao nos procurar. Os pais que seguem as instruções para não entrar em contato com as autoridades normalmente têm as piores consequências.

—Eu não queria ligar para vocês, admitiu Tim Rainey. Mas Carrie insistiu.

—Bem, nós estamos gratos que você o tenha feito, reiterou Keri, que então virou para Ray. Você conversou com eles a respeito do dinheiro?

—Nós estávamos prestes a fazer isso quando você chegou aqui, Ray disse e então focou sua atenção nos Rainey. Não é uma má ideia garantir o dinheiro, mesmo que não esperemos entregá-lo. Isso nos dá mais opções. Vocês pensaram sobre como podem consegui-lo?

—Nós temos a quantia, disse Tim Rainey, mas não em dinheiro vivo. Eu liguei para o banco para conversar sobre a transferência de alguns títulos. Eles disseram que era difícil fazer esse tipo de transação depois do horário comercial e era impossível com tão pouca antecedência.

—Eu entrei em contato com os gerentes dos nossos fundos e eles disseram a mesma coisa, adicionou Carolyn Rainey. Eles podem ser aptos a conseguir a quantia amanhã cedo pela manhã, mas não até meia noite e não em dinheiro vivo.

Keri se virou para Ray.

—É estranho que ele tenha feito a carta chegar tão tarde, ela disse. Ele tinha que saber seria quase impossível conseguir o dinheiro a tempo. Por que tornar tão difícil?

—Esse cara não parece estar jogando com todas as cartas, notou Ray. Talvez ele não esteja a par da velocidade e dos desafios das instituições financeiras.

—Há outra opção, interrompeu Tim Rainey.

—E qual é? Perguntou Ray.

—Eu trabalho para a Venergy, a nova plataforma para jogos móveis sediada em Playa Vista. Eu trabalho diretamente com Gary Rosterman, o cara que comanda a empresa. Ele é podre de rico e gosta de mim. Ainda, Jessica e a filha dele frequentaram a mesma escola juntas em Montessori até o ano passado. Elas são amigas. Eu sei que ele tem o dinheiro em mãos. Talvez ele possa me adiantar.

—Ligue para ele, disse Ray. Mas se ele concordar, peça a ele para ser discreto.

Rainey assentiu agressivamente. A sua fisionomia sombria se elevou ligeiramente. Ele pareceu encorajado por ter a esperança renovada. Ou talvez fosse apenas porque ele havia conseguido algo para focar sua atenção.

Enquanto ele discava o número, Ray se voltou para Keri e acenou com a cabeça, indicando para se afastarem dos Rainey. Quando eles estavam fora do alcance dos ouvidos, ele sussurrou, eu acho que nós deveríamos levar a carta de volta para a delegacia. Nós precisamos de toda a unidade em cima disso, ter as ideias deles sobre o que ela significa; talvez convocar o psicólogo. Nós precisamos verificar por casos recentes similares na área.

—De acordo, disse Keri. Eu também quero filtrar a carta pela base de dados federal para ver se bate com mais alguma outra coisa. Quem sabe o que vamos encontrar? Eu tenho um pressentimento bem ruim nesse caso.

—Mais que o normal? Por quê?

Keri explicou suas preocupações sobre a carta datilografada versus uma carta usando um computador. Isso ressoou com Ray.

—Seja esse cara doido ou doido de pedra, ele parece ser um profissional, ele disse.

Tim Rainey terminou sua ligação e se voltou para eles.

—Gary disse que irá fazê-lo, ele disse. Falou que pode conseguir o dinheiro em mãos em cerca de três horas.

—Isso é ótimo, disse Ray. Nós vamos mandar alguém para coletá-lo quando estiver pronto. Nós não queremos um civil transportando esse volume de dinheiro se pudermos evitar.

—Nós vamos retornar para a delegacia agora, Keri lhes disse. Vendo a repentina ansiedade nas faces deles, ela adicionou rapidamente, nós vamos deixar dois policiais fardados aqui com vocês, como uma precaução. Eles podem nos contatar a qualquer momento.

—Mas por que vocês estão partindo? Perguntou Carolyn Rainey.

—Nós queremos correr a carta de resgate pelo nosso banco de dados e conversar com alguns especialistas. Nós estamos reunindo toda a nossa Unidade de Pessoas Desaparecidas no caso de vocês. Mas eu prometo que estaremos de volta em poucas horas. Nós vamos dispor todo o plano para o parque com vocês e explicar exatamente o que estamos fazendo. Tão logo nós os deixarmos, eu irei ligar para ter a vigilância a postos por lá imediatamente. Tudo estará em ordem com bastante antecedência ao encontro. Nós temos o controle.

Carolyn Rainey se levantou e deu a ela um abraço surpreendente poderoso. Ela fez o mesmo com Ray. Tim Rainey assentiu polidamente a ambos. Keri podia dizer que o breve respiro da sua angústia se apagara e ele estava de volta ao modo permanente de crise.

Ela entendia sua posição melhor que a maioria e sabia que tentar acalmá-lo ou dizer a ele para se acalmar era perda de tempo. A filha dele estava desaparecida. Ele estava surtando. Ele apenas o fazia mais silenciosamente que a maioria.

Enquanto partiam, Ray abafou durante sua respiração, é melhor acharmos ela rapidamente. Se não acharmos, estou preocupado que o pai dela tenha um infarto.

Keri queria discordar, mas não poderia. Se ela recebesse uma carta como esta quando Evie fora raptada, ela poderia ter perdido a cabeça literalmente. Mas os Rainey tinham alguma coisa intercedendo por eles, mesmo que não soubessem. Eles tinham Keri.

—Então vamos encontrá-la rapidamente, ela disse.


CAPÍTULO CINCO


—Eu estou dizendo a você, é apenas um disfarce, gritava o Detetive Frank Brody indignado. Toda aquela baboseira sobre maquinaria e o Senhor é só para nos distrair. Esse cara é um vigarista, puro e simples!

A sala de conferências da delegacia era uma massa de barulho e vozes nervosas e estava começando a irritar Keri. Ela estava tentada a gritar para todos se calarem, mas experiências dolorosas a ensinaram que algumas dessas pessoas precisavam colocar para fora antes que qualquer coisa útil fosse alcançada.

Brody, um veterano da velha guarda da unidade, a menos de um mês da aposentadoria, estava convencido que a carta era uma farsa. Como sempre, ele tinha algum tipo de molho na sua camisa, a qual estava enfiada para dentro das calças, mas lhe faltava um botão, de forma que parte de sua larga barriga estava exposta. Como sempre, Keri pensou, ele estava mais interessado em falar alto do que em estar certo.

—Você não sabe isso! A Policial Jamie Castillo gritou de volta. Você só quer que isso seja verdade, porque faz o caso mais fácil de entender.

Castillo não era uma detetive ainda, mas devido à sua competência e entusiasmo, ela havia se tornado basicamente um membro júnior da unidade, quase sempre atribuída aos casos de lá. E apesar da sua situação de caloura, ela não era tímida.

Bem agora, seus olhos escuros ardiam e seus cabelos pretos, amarrados para trás em um rabo de cavalo, estavam balançando para cima e para baixo com as respostas exaltadas. Seus braços musculosos e sua silhueta atlética estavam ambos fortemente dobrados em frustração.

—Nenhum de nós é especialista nesse tipo de coisa, insistiu o Detetive Kevin Edgerton. Nós precisamos trazer o psicólogo da polícia.

Keri não estava surpresa que Edgerton quisesse seguir essa rota. Alto e magro com cabelo castanho perpetuamente despenteado, ele era um gênio da computação que sabia os prós e contras de tudo, de um smartphone até rede elétrica. Mas ainda não tinha trinta anos, ele não confiava sempre nos seus instintos quando se tratava de coisas com soluções menos pretas e brancas. Era sua natureza defender a especialização se estivesse disponível.

O problema era que Keri não estava confiante que o psicólogo da polícia teria mais alguma outra visão da carta que o resto deles. Qualquer conclusão que ele estivesse tendendo a extrair seria apenas especulação. Se esse fosse o caso, ela confiava mais na própria especulação do que na dos outros.

O Tenente Hillman levantou suas mãos em um apelo por calma e silêncio. Para a surpresa de Keri, todos obedeceram.

—Eu enviei uma cópia da carta para a casa do Dr. Freeney. Ele a está analisando agora. Nós teremos um retorno em breve. Nesse meio tempo, alguma outra ideia? Sands?

Ray estivera sentado em silêncio, esfregando o topo de sua careca, absorvendo tudo. Desse ângulo, Keri podia ver o reflexo das luzes da delegacia no olho de vidro que repôs o olho que ele havia perdido lutando boxe. Ele olhou para cima e ela conseguia dizer qual a posição dele mesmo antes de ele se pronunciar.

—Eu estou inclinado a concordar com o Frank. A carta é tão exagerada que é difícil de comprar. Tudo é tão superaquecido. Isso é, exceto pela parte sobre querer o dinheiro e onde levá-lo. Essa sessão é completamente direta; bem conveniente, se você perguntar. Ainda...

—O quê? Perguntou Hillman.

—Bem, eu só não sei se isso faz qualquer diferença. Nós sabemos tão pouco e não temos muito tempo. Independente de ele ser um psicopata ou um vigarista intérprete, ainda há uma entrega a ser feita em poucas horas.

—Eu não tenho certeza que concordo, Keri disse finalmente. Ela não adorava contradizer o parceiro publicamente sob quaisquer circunstâncias e especialmente não com as coisas entre eles do jeito que estavam no momento. Mas isso não era sobre aquilo agora. Era sobre o trabalho e encontrar essa garota. Keri nunca tinha segurado sua língua sobre um caso antes e não iria começar agora, independentemente das consequências pessoais.

—Olha, eu não sei ao certo se esse cara está fingindo ou se é de verdade. Mas eu acho que importa qual é o correto. Se ele estiver apenas fingindo ser algum tipo de religioso fanático e isso for tudo sobre dinheiro, eu prefiro assim. Então, isso é transacional para ele, não pessoal. E esse cenário é bem mais previsível. Significa que é mais provável que ele apareça. E uma de suas prioridades é manter Jessica viva.

—Mas eu não compro isso, disse Ray, mostrando que ele a conhecia tão bem quanto ela o conhecia.

—Eu estou cético. Eu acho que é possível que essa coisa do dinheiro tenha sido tão direta, porque ele não acredita nela de verdade e estava apenas dizendo o que ele deveria dizer em uma carta de resgate. E se essa for a parte falsa e a parte real for a coisa de doido? Quero dizer, o contraste entre essas duas seções é tão dramático que chega a ser ridículo. A linguagem 'superaquecida' parece ser onde a paixão dele está.

—Parece ser, interrompeu Brody. Keri se lembrou de manter a cabeça nivelada. O cara prestes a aposentar, que já não dava a mínima, estava armando, esperando que ele pudesse irritá-la para tornar o argumento dela menos credível. Ela assentiu educadamente e continuou.

—Sim, Frank, parece ser. Eu não finjo saber de alguma coisa com certeza. Mas toda aquela conversa de libertá-la do seu próprio espírito maligno, da maquinaria do Senhor, é bem detalhada, como se ele houvesse desenvolvido algum tipo de liturgia pessoal para refletir sua própria religião distorcida—uma na qual ele esteja no controle, como se fosse o Papa da própria fé demente. E se isso for verdade, nós temos um problema muito maior.

—Como assim? Perguntou Edgerton.

—Porque se isso tudo é realmente sobre limpar espíritos e agradar a deidade dele, então ele não se importa com o dinheiro realmente. Pode ser apenas uma maneira de justificar o rapto para ele mesmo em termos sociais. Ele diz a ele próprio que se trata do dinheiro para que ele possa funcionar normalmente de algum jeito. Mas no fundo, ele sabe que aquilo é apenas uma desculpa, que a razão real pela qual ele a levou é muito mais sombria e profunda.

—Então, Locke, disse Hillman, você está sugerindo que essa cara está tendo algum tipo de batalha interna e que o dinheiro é apenas uma forma para ele esconder de si mesmo o que ele realmente quer fazer com a garota?

—Talvez.

—Isso parece esticado demais, ele disse. Além da linguagem que ele usou, o que você tem para suportar a teoria?

—Não é apenas a linguagem, Tenente. O próprio fato de que ele ofereceu retorná-la, para deixar o próprio pai purificá-la, sugere que ele possa estar tentando lutar contra essa coisa, que ele está tentando encontrar uma saída, alguma maneira de não libertá-la do demônio matando-a.

Ela parou de falar e olhou ao redor para as faces dos seus colegas de trabalho, que eram uma mistura de ceticismo e intriga genuína. Até Hillman parecia estar reconsiderando.

—Ou ele pode apenas estar atrás do dinheiro e suas patranhas são tão cheias de baboseiras quanto ele, disse Brody zombando. O comentário dele pareceu drenar a boa vontade da sala e Keri sentiu todos recuando para seus cantos seguros.

—Você é um Neandertal! Disse Castillo enojada.

—Sim? Ele cuspiu de volta. Eu acho que um puxão de cabelos lhe serviria muito bem.

—Você quer fazer isso agora, velhote? Disse Castillo, dando um passo em direção a ele. Eu derrubo seu rabo de baleia encalhada de volta por oceano.

—Basta! Berrou Hillman. Nós temos uma garota de doze anos de idade para salvar e não temos tempo para essa merda. E Brody, outro comentário sexista como esse e eu vou deduzir seu pagamento pelo resto da sua maldita carreira, mesmo que seja por apenas um mês, você me entendeu?

Brody calou a boca relutantemente. Castillo parecia que ainda não havia terminado, então Keri colocou a mão sobre o ombro dela e a levou para longe.

—Deixe ir, Jamie, ela abafou na respiração. Esse cara está a um burrito de distância de um ataque cardíaco. Você não quer ser culpada quando ele capotar.

Castillo riu apesar da raiva. Ela estava prestes a responder quando o Detetive Manny Suarez entrou na sala. Manny não tinha muito que se reparar, com seu restolho comprido, seus pneuzinhos e suas pálpebras pesadas que lembravam Keri do anão Soneca. Mas ele era um detetive durão e capaz. E mais importante no momento, ele estava retornando do escritório do FedEx de onde a nota de resgate fora expedida. Keri torcia para que ele tivesse boas notícias.

—Dê-me alguma coisa boa, disse Hillman.

Suarez balançou a cabeça enquanto se sentava à mesa da sala de conferências e tirava um único recibo de um envelope pardo que ele estava segurando. Ele o jogou sobre a mesa.

—É isso, ele disse. Essa é o único pedaço de evidência significativa que eu consegui recuperar da loja do FedEx. Aí tem apenas o horário e a data da compra, a qual foi feita com dinheiro. É isso.

—Não havia alguma imagem das câmeras de segurança que você pudesse cruzar com o horário da compra? Perguntou Hillman.

—Há, mas é quase toda inútil. A imagens do exterior do lugar mostram alguém entrando. Mas a pessoa está usando um suéter pesado com uma jaqueta de capuz e óculos escuros. Eu estou circulando as imagens, mas não vai ajudar muito. É até difícil dizer se é um homem ou uma mulher.

—E do interior da loja do FedEx? Perguntou Castillo.

Suarez tirou uma segunda folha de papel do envelope e a colocou sobre a mesa também. Parece com uma foto, mas era basicamente branca com preto nos contornos.

—Essa é uma imagem estática da câmera interior, ele disse. Parece que ele estava usando um par de óculos refletores de laser que arrancaram tudo na tela. Isso é como as imagens se parecem todo o tempo em que a pessoa está lá.

—Isso é tecnologia de ponta, notou Edgerton impressionado. Normalmente esse tipo de coisa é usada apenas para assaltos de alto escalão.

—E outras câmeras? Perguntou Ray. As que ele não olhou diretamente.

—Elas não foram afetadas. Mas o suspeito ficou convenientemente fora do quadro de cada uma delas. Parece que ele sabia exatamente onde cada câmera estaria e conduziu para longe de todas, exceto a que ele não podia evitar, diretamente atrás do caixa. E essa foi a que ele apagou.

—Eu estou assumindo que ele evitou todas as outras câmeras exteriores no caminho também? Supôs Keri. Sem chance de ele ter entrado no carro e nós conseguirmos uma marca ou número da placa?

—Sem chance, confirmou Suarez. Nós o temos virando a esquina. Mas a direção que ele tomou leva a um bloco industrial, onde nenhum dos negócios tem câmeras. De lá ele poderia ter ido a qualquer lugar.

—Eu odeio colocar pilha, adicionou Edgerton, analisando o notebook à sua frente. Mas eu tenho mais más notícias. A mochila e o telefone de Jessica foram um fracasso. A CSU acaba de me mandar um e-mail dizendo que eles não encontraram qualquer digital inesperada.

O celular do Tenente Hillman tocou, mas ele indicou para que Edgerton continuasse enquanto se retirava da sala para atender a ligação. Kevin continuou de onde havia parado.

—E eu venho correndo um programa usando o cartão SIM dela, procurando por atividades suspeitas. Acaba de terminar. Mas não há nada fora do comum. Cada uma das ligações que ela fez ou recebeu nos últimos três meses é da sua família ou dos amigos.

Keri e Ray trocaram um olhar silencioso. Nem mesmo a tensão entre eles poderia minar a preocupação compartilhada de que esse caso estava indo ladeira abaixo rapidamente.

Antes que alguém pudesse responder Edgerton, Hillman retornou. Keri percebeu pela expressão dele que havia mais notícias ruins chegando.

—Era o Dr. Freeney, ele disse. Ele também compra a teoria do vigarista. Ele acha que esse cara está fingindo a loucura e só quer o dinheiro.

Ótimo. Todas as pistas que nós temos levaram a lugar nenhum e agora o consenso da unidade é que esse cara é apenas um sequestrador ordinário.

Keri não podia explicar, nem a ela mesma. Mas seus instintos a diziam que o consenso estava perigosamente errado; que esse sequestrador completamente outra coisa. E ela temia que, se eles não voltassem de volta no caminho certo, Jessica Rainey pagaria o preço.


CAPÍTULO SEIS


Enquanto os minutos levando a entrega se passavam, Keri tentava ignorar a pontada de ansiedade crescendo em seu estômago. O tempo estava se acabando e Keri sentia que estavam ficando rapidamente sem opções. Ela dizia a si mesma ativamente para não perder a esperança, para lembrar que Jessica estava lá fora em algum lugar, esperando desesperadamente para alguém encontrá-la.

Já que o escritório do FedEx e a mochila de Jessica não levaram a lugar algum, a equipe começou a perseguir opções menos específicas do caso e, assim, opções menos promissoras.

Edgerton colocou os parâmetros do caso em uma base de dados federal para ver se havia qualquer registro de sequestros similares. Os resultados viriam em breve, mas eliminá-los seria demorado.

Ele também inseriu a carta de resgate no sistema pela chance mínima de que a linguagem cruzasse com alguma carta anterior. Era um tiro no escuro. Se uma carta estranha desse jeito fora enviada para alguém antes, eles estavam confiantes de que teriam ouvido algo sobre isso.

Suarez estava olhando em uma lista de agressores sexuais que moravam na área para ver se algum deles tinha um registro desse tipo de crime. Castillo havia ido ao parque para preparar a vigilância. Brody saíra da delegacia, alegando que estava indo falar com algum tipo de informante de rua. Keri suspeitava que ele houvesse saído apenas para comer alguma coisa.

Ela e Ray se debruçaram sobre arquivos de casos antigos, procurando por quaisquer casos antigos ou não resolvidos que batessem com o caso de Jessica. Era possível que fosse o trabalho de alguém de volta as ruas depois de um longo tempo na prisão. Se esse fosse o caso, precederia o tempo dos dois na força policial e eles não se lembrariam dos detalhes. Nenhum deles pensou que o exercício traria bons frutos, mas não sabiam o que mais fazer.

Depois de mais de uma hora sem sucesso, eles saíram. Era quase 10 da noite e ela e Ray estavam retornando para a casa dos Rainey. Era a mesma rota que eles tomaram naquela manhã, quando tudo tinha estado normal, até o momento em que ele a convidou para sair. Ambos estavam cientes do fato, mas estavam muito ocupados para deixar que isso ficasse no caminho naquele instante.

Enquanto dirigiam, Ray estava no telefone com o Detetive Garrett Patterson, que ainda estava na delegacia coordenando a vigilância do local de entrega, Chace Park.

Patterson, um cara quieto e livresco por volta dos seus trinta, era um aficionado por tecnologia como Edgerton. Mas diferentemente de seu colega mais novo, Patterson parecia contente em se focar nas minúcias dos casos. Ele adorava atividades como se debruçar sobre registros telefônicos e comparar endereços de IP, tanto que isso o deu o apelido de Serviço Braçal, com o qual ele não se importava nem um pouco.

Patterson não era o tipo de detetive que iria fazer saltos instintivos de dedução. Mas podiam contar com ele para definir um perímetro minucioso de vigilância eletrônica e de vídeo, o que seria efetivo e indetectável.

—Eles estão preparados, Ray disse a Keri ao desligar. A equipe de vigilância está a postos. Manny está indo para a casa do chefe do Rainey agora para acompanhar ele e o dinheiro para a central móvel na van no Shopping Waterside.

—Ótimo, disse Keri. Enquanto você conversava, eu tive uma ideia. Tenho um amigo que conheço de quando eu morava na casa flutuante na marina. Ele tinha um barco de pesca e eu aposto que ele nos levaria para sair para que pudéssemos observar a área de entrega da água. O que você acha?

—Eu digo que entre em contato, disse Ray. Quanto mais olhos discretos conseguirmos na área de entrega, melhor.

Keri enviou uma mensagem para seu amigo, um ríspido e antigo marinheiro chamado Butch. Na verdade, ele era menos um amigo do que uma companhia para uma bebida ocasional, que gostava tanto de uísque quanto ela. Depois que ela perdeu Evie, o casamento e seu trabalho em uma rápida sucessão, ela comprou uma decrépita velha casa flutuante na marina e morou lá por vários anos.

Butch era um amigável aposentado da Marinha que gostava de chamá-la de "Copper", não perguntava sobre o passado dela e estava feliz em trocar histórias profissionais com ela. Naquele tempo, era exatamente o tipo de companhia que ela procurava. Mas recentemente ela se mudou da marina para seu apartamento e reduziu significativamente o consumo de álcool, eles não saíam juntos ultimamente.

Aparentemente, ele não estava guardando rancor, já que ela teve resposta quase imediatamente com um texto que dizia: "sem problemas—vejo você em breve, Copper.

—Estamos bem, ela disse a Ray, então deixou sua mente derivar para algo que a estava consumindo. Ela não percebeu por quanto tempo havia ficado em silêncio até que Ray interrompeu seus pensamentos.

—O que foi, Keri? Perguntou Ray ansiosamente. Eu posso dizer que você está remexendo alguma pista na sua cabeça.

Mais uma vez, Keri se impressionou com como ele conseguia ler sua mente.

—É apenas a entrega. Alguma coisa nisso me intriga. Por que esse cara, assumindo que seja um cara, nos daria a localização tão antecipadamente? Ele deve saber que se os Rainey entraram em contato conosco, teríamos horas para fazer exatamente o que estamos fazendo—estabelecer um perímetro, instalar vigilância, reunir força de trabalho. Por que nos dar uma vantagem inicial? Eu entendo demandar o dinheiro antecipadamente para dar-lhes tempo de reuni-lo. Mas se fosse eu, ligaria às onze e quarenta e cinco da noite para revelar o ponto de entrega e dizer que o encontro seria à meia noite.

—Pergunta justa, ele concordou. E ela se encaixa na sua suspeita de que ele realmente não liga para o dinheiro.

—Eu não quero atacar essa ideia, mas eu realmente acho que não, ela disse.

—Então sobre o que você acha que ele se importa? Perguntou Ray.

Keri estivera remoendo isso na cabeça e estava contente com a oportunidade de compartilhar em voz alta.

—Quem quer que esse cara seja, eu acho que ele está obcecado com a Jessica. Eu sinto como se ele a conhecesse ou pelo menos já a encontrou. Ele a esteve observando.

—Isso encaixa. Tudo sugere que ele tem planejado isso por um tempo.

—Exato. Aqueles óculos especiais que ele usou no FedEx, saber exatamente onde as câmeras estavam, raptá-la no tempo perfeito quando ela já estava fora de vista da escola, mas ainda não tinha encontrado com a mãe, em uma parte do bairro onde nenhum vizinho tem câmeras de segurança exteriores. Todos esses são sinais de alguém que esteve trabalhando nisso por um longo tempo.

—Faz sentido. Mas a pesquisa com quadro de funcionários fornecido pelo encarregado de segurança na escola veio vazia. Eu verifiquei novamente na delegacia. Nenhum professor tinha registros de alguma coisa além de multas de estacionamento.

—E os zeladores ou motoristas da escola?

—Eles são empregados terceirizados. Mas todos que entram em contato com a escola têm que passar por uma verificação de antecedentes. Nós podemos repassar a lista novamente. Mas o cara foi bem minucioso.

—Ok então, e os empregados nas lojas ao decorrer do caminho de bicicleta ou trabalhadores da construção civil em uma casa sendo construída por perto—pessoas que a veriam todos os dias e seriam familiares com a rotina dela e que têm ficha na polícia?

—Essas são boas pistas para perseguimos de manhã. Mas eu espero que nós peguemos esse cara em flagrantes hoje à noite e nada disso seja necessário.

Eles encostaram na casa dos Rainey e reparam um carro de polícia estacionado ao longe no quarteirão. Foi-lhes instruído para não estacionar muito perto da casa no caso de o sequestrador passar por ali. Eles caminharam até a porta e bateram. Um policial abriu e eles entraram imediatamente.

—Como eles estão indo? Perguntou Ray silenciosamente.

—A mãe tem passado a maior parte do tempo lá em cima com o garotinho, tentando mantê-lo ocupado, respondeu o policial.

—E se manter ocupada, adicionou Keri.

—Também acho, concordou o policial. O pai esteve quieto a maior parte do tempo. Ele tem passado bastante tempo estudando o mapa do parque no notebook. Ele tem nos perguntado todo tipo de questão sobre nossa vigilância, a maioria das quais nós não temos resposta.

—Ok, obrigado, disse Ray. Com sorte, nós podemos dar algumas.

Exatamente como o policial disse, Tim Rainey estava sentado na mesa da cozinha, com um mapa do Google do Burton Chace Park na tela do notebook.

—Oi, Sr. Rainey, disse Keri. Nós entendemos que você tenha algumas perguntas.

Rainey olhou para cima e, por um momento, mal pareceu reconhecê-los. Então seus olhos se focaram e ele assentiu.

—Eu tenho várias na verdade.

—Vá em frente, disse Ray.

—Certo. A carta disse para não contatarmos as autoridades. Como vão impedir que vocês sejam vistos?

—Primeiro, nós instalamos câmeras escondidas pelo parque, respondeu Ray. —Nós seremos capazes de monitorá-las remotamente a partir de uma van em um estacionamento próximo. Também, o parque é povoado com alguns sem teto e nós fantasiamos adequadamente uma policial para se misturar. Ela está lá há horas, de modo a não atrair suspeitas dos outros. Nós teremos um pessoal no Windjammers Yacht Club ao lado, observando de um quarto com vidro fumê no segundo andar. Um deles é um atirador de elite.

Keri viu os olhos de Tim Rainey se alargarem, mas ele não disse nada enquanto Ray continuou.

—Nós teremos um drone aéreo à disposição, mas não vamos usá-lo a não ser que seja absolutamente necessário. É quase silencioso e pode operar de até cento e vinte metros. Mas não queremos nos arriscar com isso. No total, temos quase uma dúzia de policiais externos, mas ao alcance de sessenta segundos do local, para te auxiliar se as coisas derem errado. Isso inclui a Detetive Locke e eu. Nós estaremos em um barco civil na marina, longe o suficiente para evitar suspeitas, mas perto o suficiente para observar os eventos com binóculos. Nós pensamos nisso cuidadosamente, Mr. Rainey.

—Ok, isso é óbvio. Então, o que exatamente eu tenho que fazer?

—Estou feliz que você perguntou, disse Ray. Isso é o que nós vamos repassar agora. Por que não nós preparamos logo aqui, já que você tem o mapa aberto?

Ele e Keri se sentaram um de cada lado de Rainey e ela assumiu.

—Então, você deve encontrá-lo na ponte entre as pérgulas na parte de trás do parque, próximo à água. E é exatamente o que você vai fazer, disse Keri. O parque em si estará oficialmente fechado, então você não poderá parar no estacionamento com cancela. Provavelmente isso é parte do motivo para ele estava fazendo isso à meia noite. Qualquer carro no estacionamento pareceria suspeito. Você vai parar no estacionamento público a um quarteirão de distância. Nós te daremos troco. Tudo o que você tem que fazer é estacionar, pagar e andar em direção à área da entrega. Tudo faz sentindo até agora?

—Sim, disse Rainey. Quando vou receber o dinheiro do resgate?

—Você vai pegá-lo no Shopping Waterside perto do parque.

—E se o sequestrador estiver observando?

—Tudo bem, assegurou-lhe Keri. Seu chefe estará fazendo a entrega para você, bem em frente aos caixas do Bank of America. Ele está sendo preparado por um dos nossos detetives nesse instante. Haverá policiais na área, também fora de vista, no caso de o sequestrador tentar apanhar o dinheiro nessa hora.

—E você está marcando o dinheiro com algum tipo de localizador de GPS?

—Estamos, admitiu Ray, entrando na conversa, "e a bolsa também. Mas os localizadores são todos muito pequenos. O da bolsa será cosido junto à costura. Os localizadores inseridos no dinheiro são adesivos pequenos e transparentes, colocados em notas individuais. Mesmo se ele encontrar as notas exatas, as marcações são muito difíceis de ver.

Keri sabia por que Ray respondera àquela questão. Estava evidente pela expressão azeda de Rainey que ele não estava feliz a respeito dos localizadores. Ele não o disse, mas eles podiam dizer que ele estava preocupado que isso pudesse colocar Jessica em risco.

Ray se pronunciou, de forma que ele fosse o portador dessas informações indesejadas. Dessa maneira, a empatia e a confiança que Keri estava construindo com o pai ansioso não seriam prejudicadas. Keri assentiu o seu agradecimento imperceptível para o parceiro. Rainey não pareceu notar. Ela percebeu que ele ficou agitado pelo que Ray disse, mas não fez objeção. Ele continuou.

—Então, o que eu faço em seguida? Ele perguntou a Keri, olhando incisivamente para longe de Ray.

—Como eu disse anteriormente, depois de você pegar o dinheiro do resgate, dirija para o estacionamento a um quarteirão de distância do Chace Parl. Então, apenas saia e ande para a ponte entre as pérgulas. Haverá policiais na área, mas você não vai vê-los. E não é seu trabalho se preocupar com qualquer coisa disso. Tudo que você tem que fazer é ir até a ponte com o dinheiro.

—O que acontece quando ele chegar? Rainey queria saber.

—Você vai solicitar por sua filha. Em teoria, ele vai estar com a impressão de que você está sozinho. Então, não vai parecer certo se você apenas entregar o dinheiro a ele sem uma luta. Ele ficaria desconfiado. Eu duvido seriamente que ele vai tê-la com ele. Ele pode te dar uma localização. Ele pode dizer a você que lhe enviará a localização uma vez que ele estiver em segurança. Ele pode dizer que ele irá enviar a localização por FedEx—

—Você não acha que ela estará lá? Interrompeu Rainey.

—Eu ficaria muito surpresa. Ele estaria entregando toda a vantagem dele se ela estivesse com ele. A melhor aposta dele para manter você na linha é manter você temendo pela segurança de Jessica. Você precisa se preparar para a possibilidade de ela não estar lá.

—Entendo. E depois?

—Depois de você expressar sua desconfiança sobre entregar o dinheiro, dê o dinheiro. Tente não negociar algum outro plano com ele. Não tente dominá-lo. Ele pode estar nervoso. Ele provavelmente estará armado. Nós não queremos fazer qualquer coisa que leve a um confronto.

Tim Rainey assentiu relutantemente. Keri não gostava desse humor e decidiu que precisava ser mais enfática.

—Sr. Rainey. Eu preciso que você prometa que não vai fazer alguma tolice. Nossa melhor aposta é que ele diga a você onde encontrá-la ou a devolva depois da entrega. Mesmo se ele não te disser nada, não entre em pânico. Nós vamos rastreá-lo. Quando for a hora certa, nós vamos prendê-lo. Se você resolver a questão com suas próprias mãos, isso pode acabar mal para ambos, você e Jessica. Estamos claros quanto a isso, senhor?

—Sim. Não se preocupe. Eu não vou fazer qualquer coisa que coloque Jessica em risco.

—Claro que não, disse Keri tranquilizando-o apesar de suas dúvidas. O que você vai fazer é completar a entrega, retornar para o seu carro e dirigir para cá de volta. Nós lidaremos com tudo o mais a medida for acontecendo, ok?

—Você vai colocar um microfone em mim? Ele perguntou, nitidamente deixando de respondê-la diretamente.

—Sim, disse Ray, pulando na conversa novamente, e câmeras minúsculas também. Nenhum deles vai ser perceptível, especialmente à noite. Mas a câmera pode nos ajudar a identificá-lo. E o áudio nos permitirá saber se você está em perigo.

—Nós seremos capazes de nos comunicar?

—Não, disse-lhe Ray. Quero dizer, nós obviamente seremos capazes de te ouvir. Mas dar-lhe um fone de ouvido seria arriscado. Ele poderia vê-lo. E nós queremos que você fique focado no que você precisa fazer.

—Mais uma coisa, adicionou Keri. Há uma chance que ele possa nem aparecer. Ele poderia ficar assustado e recuar. Ele pode nunca ter tido a intenção de vir. Esteja preparado para isso também.

—Você acha que é isso que vai acontecer? Perguntou Rainey. Ele claramente nunca nem havia considerado a possibilidade.

Keri lhe deu a resposta mais sincera que ela podia reunir.

—Eu não tenho absolutamente qualquer ideia do que vai acontecer. Mas precisamos descobrir.


CAPÍTULO SETE


Keri pensou que poderia estar enjoada. Era quase engraçado. Afinal, ela morou em uma casa flutuante por vários anos. Mas flutuar em um veleiro nas águas abertas do canal, enquanto segurava binóculos nos olhos por períodos tão longos era uma proposta diferente.

Butch oferecera jogar a âncora no Pipsqueak, mas ambos Keri e Ray ficaram preocupados que um barco estacionário na água pudesse parecer suspeito. É claro, um barco vagando sem rumo para frente e para trás não era muito melhor.

Depois de cerca de quinze minutos, Butch sugeriu que eles se demorassem perto de uma doca do outro lado do parque, onde ao menos outros barcos os fariam se destacar menos. Keri, incerta de que ela poderia segurar a náusea por muito mais tempo, pulou na sugestão.

Eles encontraram um ponto livre e protelaram ali enquanto a meia noite se aproximava. O mordaz vento de inverno uivava lá fora. Sentada no pequeno banco próximo à janela, Keri podia escutar as águas ruidosamente lambendo o casco. Ela acolheu isso, tentando sincronizar a respiração ao seu ritmo. Ela sentiu o nó em seu estômago começar a afrouxar e o suor em sua testa reduzir um pouco.

Eram 11:57 da noite. Keri levou os binóculos aos olhos novamente e olhou através da água para o parque. Ray, poucos metros acima, estava fazendo o mesmo.

—Vendo alguma coisa? Perguntou Butch lá de cima. Ele estava animado para fazer parte de uma operação policial e estava tendo dificuldade em esconder isso. Era provavelmente a coisa mais agitada que lhe acontecia em anos.

Ele era o mesmo cara durão que ele se lembrava, definido por sua pele açoitada pelas condições do clima, seu feixe de cabelo branco despenteado e o cheiro perpétuo de álcool no seu hálito. Sob circunstâncias normais, operar um barco nas condições dele era uma violação. Mas ela estava disposta a deixar isso passar considerando a situação.

—Há algumas árvores bloqueando parcialmente a vista, ela murmurou de volta em voz alta. E é difícil ver com o reflexo da janela, mesmo com as luzes apagadas aqui embaixo.

—Eu não posso fazer nada sobre as árvores, disse Butch. Mas, sabe, as janelas abrem parcialmente.

—Eu não sabia, ela admitiu.

—Por quanto tempo você morou naquele barco? Perguntou Ray.

Keri, alegremente surpresa que ele estava inclinado a se envolver em provocações, botou a língua para fora antes de adicionar, "Aparentemente não tempo suficiente.

Uma voz chegou pelos seus comunicadores, interrompendo o momento mais natural que tiveram em todo o dia. Era o Tenente Hillman.

“Aviso a todas as unidades. Aqui é a Unidade Um. O mensageiro tem a carga, estacionou e está em rota para o destino a pé.”

Hillman era uma das pessoas posicionadas no segundo andar do Windjammers Club, o qual tinha um ponto de vista de grande parte do parque, incluindo a ponte. Ele estava usando termos não específicos pré-estabelecidos para todos os envolvidos evitarem compartilhar muitas informações pelas linhas de comunicação, as quais sempre pareciam ser hackeadas por cidadãos curiosos que gostavam de bisbilhotar o tráfego da polícia. Rainey era o mensageiro. A bolsa de dinheiro era a carga. A ponte era o destino. O sequestrador seria referenciado como o sujeito e Jessica como o recurso.

—Aqui é a Unidade Quatro. Posso ver o destino, disse Keri, finalmente encontrando um ângulo com uma visão clara da ponte. Não há qualquer pessoa visível nas proximidades.

—Aqui é a Unidade Dois, veio a voz da Policial Jamie Castillo, que estava atuando no papel de mulher sem teto no parque. O mensageiro acaba de passar por minha localização a oeste do prédio comunitário próximo ao café. As outras únicas pessoas que eu vejo são dois indivíduos sem teto. Ambos estiveram aqui por toda a tarde. Ambos aparentam estar dormindo.

—Mantenha um olho nesses indivíduos, Unidade Dois, disse Hillman. Não sabemos como o sujeito se parece. Qualquer coisa é possível.

—Entendido, Unidade Um.

—Espero que vocês possam me escutar, um nervoso Tim Rainey sussurrou alto no microfone em sua lapela. Estou no parque e seguindo para ponte.

—Arg, abafou Ray sob sua respiração. Nós vamos ter comentários em tempo real desse cara?

Keri franziu o cenho para ele.

—Ele está nervoso, Ray. Pegue leve com ele.

—Aviso a todas as unidades. Aqui é o QG, Manny Suarez disse da van no estacionamento do shopping que servia como central móvel. Temos olhos em toda a área e não há movimento no momento a não ser o mensageiro, que está a cinquenta metros do destino.

Keri olhou para seu relógio. 11:59 da noite. À distância, ela ouviu o motor de um barco na outra extremidade do canal principal da marina. Marinheiros, que gostavam de tomar banho de sol durante o dia nas docas, estavam chamando um ao outro. Fora disso, o vento e as ondas, estavam silenciosos.

—Movimento na Mindanao Way aproximando-se do parque, veio uma voz desconhecida e agitada.

—Identifique sua unidade, bradou Hillman, e não use nomes próprios.

—Desculpe, senhor. Aqui é a Unidade Três. Há um veículo se aproximando do parque pela... rua que leva a ele. Parece ser uma moto.

Keri percebeu quem era a Unidade Três—o Policial Roger Gentry. A Oeste de LA não era a maior divisão do LAPD e eles estavam com carência de força de trabalho a essa hora, então Hillman juntou todos policiais não encarregados e isso incluía Gentry. Ele era novato, no trabalho há menos de um ano, cerca do mesmo tempo que Castillo, mas muito menos confiante ou, aparentemente, capaz.

—Alguém mais tem visual? Hillman perguntou.

—Alguém pode escutar isso? Perguntou Tim Rainey demasiadamente alto, aparentemente por esquecer que ninguém poderia respondê-lo. Parece que alguém está vindo.

—Aqui é a Unidade Dois, disse Castillo a partir do seu recanto improvisado perto do centro comunitário. Tenho visual. É uma moto. Não consigo identificar da minha posição, mas é pequena, uma Honda, eu acho. Apenas um motorista. Entrou no parque e está seguindo a ponta sul da estrada de serviço na direção geral do destino e do mensageiro.

Keri também via a moto agora, acelerando pela estrada de serviço que contornava a borda do parque próxima a água. Ela voltou sua atenção para Tim Rainey, que estava em pé rígido no meio da ponte, sua mão direita segurando a bolsa firmemente.

—Aqui é a Unidade Um, anunciou Hillman. Nós temos o rifle a postos, preparado para dar assistência. Alguém tem um visual atualizado do veículo?

—Aqui é Unidade Quatro, disse Ray. Temos um visual. Motorista sozinho viajando acerca de oitenta quilômetros por hora pela borda da estrada de serviço. Veículo virando à direita, para o norte, na direção geral do destino.

—Acho que é alguém de moto, disse Tim Rainey. Alguém sabe quem é? É o cara? Ele está com Jess?

—Unidade Quatro, aqui é a Unidade Um, disse Hillman, ignorando a conversa de Rainey. "Você vê alguma arma? Rifle, preparar.

—Rifle pronto, veio a voz do atirador ao lado de Hillman em um quarto no segundo andar do clube de iatismo.

—Aqui é a Unidade Quatro, respondeu Ray. Não vejo qualquer arma. Mas minha visão está comprometida pela escuridão e pela velocidade do veículo.

—Rifle ao meu sinal, disse Hillman.

—Ao seu sinal, o atirador respondeu calmamente.

Keri assistiu enquanto o condutor da moto apertou os freios e de repente empinou a moto de forma dramática. Quando a roda da frente atingiu o asfalto novamente, o piloto foçou a moto em uma volta curta, fazendo três círculos antes de sair e acelerar de volta na direção de onde veio.

—Aqui é a Unidade Quatro, ela disse rapidamente. Desengajar. Repito, recomendo o Rifle a não prosseguir. Acho que temos um piloto se divertindo em mãos.

—Rifle, desengajar, ordenou Hillman.

Certamente, a moto continuou de volta por onde havia chegado, pela estrada de serviço e através do estacionamento pago. Ela perdeu visão da moto quando entrou de novo na Mindanao.

—Quem tem olhos no mensageiro? Perguntou Hillman com urgência.

—Aqui é a Unidade Quatro, continuou Keri. O mensageiro está abalado, mas ileso. Ele está parado lá, sem saber como proceder.

—Francamente, eu também estou, admitiu Hillman. Vamos apenas ficar alertas, pessoal. Isso pode ter sido uma distração.

—Alguém está vindo me buscar? Perguntou Rainey, como se em resposta a Hillman. Devo apenas ficar aqui? Vou assumir que devo a não ser que eu escute o contrário.

—Deus, eu queria que ele se calasse, abafou Ray, colocando sua mão sobre o microfone de forma que apenas Keri e Butch pudessem o ouvir. Keri não respondeu.

Depois de cerca de dez minutos, Keri viu Rainey, ainda de pé no meio da ponte, verificar seu telefone.

—Espero que você possa me ouvir, ele disse. Acabo de receber uma mensagem. Diz ‘Ao envolver as autoridades, você traiu minha confiança. Você sacrificou a oportunidade de redimir a criança pecadora. Agora devo determinar remover o demônio eu mesmo ou perdoar a sua insubordinação e permiti-lo mais uma vez purificar a alma dela. O destino dela estava em suas mãos. Agora está nas minhas.’ Ele sabia que vocês estavam aqui. Todo seu planejamento elaborado foi para nada. E agora eu não tenho ideia se ele vai entrar em contato comigo novamente. Vocês podem ter matado a minha filha!

Ele gritou essa última frase, sua voz irrompendo em fúria. Keri podia ouvir sua voz mesmo através da marina como se viesse dos comunicadores. Ela o viu cair de joelhos, largar a bolsa, levar as mãos ao rosto e começar a chorar. A dor dele sentia intimamente familiar.

Era o choro de angústia de um pai que acreditava que sua criança estava perdida para sempre. Ela reconhecia isso, porque ela havia chorado da mesma forma quando a sua própria filha fora raptada e ela não podia fazer nada para impedir.

Keri saiu correndo da cabine do barco e chegou ao convés apenas a tempo de vomitar do outro lado no oceano.


CAPÍTULO OITO


Jessica Rainey contraiu os dedos para impedi-los de ficarem dormentes outra vez. Eles estavam amarrados atrás de suas costas, atados ao cano no qual ela se recostava sentada. O chão era asfalto, duro e frio. A única luz fluorescente que pendia do teto piscava intermitentemente, tornando impossível cair no sono.

Ela não estava certa de quanto tempo ela estivera nesse lugar, mas sabia que havia sido tempo o suficiente para o dia virar noite. Ela podia perceber, porque pequenas rachaduras na parede deixavam a luz do sol entrar na sala. Não havia mais luz agora.

Ela nem reparou nas rachaduras inicialmente. Quando ela acordou, tudo que ela fez foi gritar e tentar se soltar dando trancos no cano. Ela gritou por ajuda. Ela gritou por seus pais. Ela gritou até por seu irmão mais novo, Nate, não que ele poderia tê-la ajudado.

E ela puxou tão forte as amarras em seus pulsos que quando olhou para trás, podia ver as gotas de sangue onde haviam sido cavadas em sua pele e pingado no chão.

Foi por volta daquela hora que ela reparou que não estava vestindo as próprias roupas. Alguém as removeu e as substituiu com um vestido sem mangas que batia em seus joelhos. Claramente, era feito em casa, cosido desigualmente.

Além disso, era grosseiro e áspero, como se fosse feito de vários sacos de estopa. Se ela não estivesse tão dolorida, ela estaria totalmente focada no quanto estava coçando. Ela se recusou a pensar sobre como teria passado de uma vestimenta para outra.

Depois de ter se desgastado de tanto gritar e berrar e a adrenalina ter desaparecido do seu sistema, ela tentou se lembrar do que tinha acontecido. A última coisa que ela conseguia recordar era pedalar a bicicleta subindo o grande morro na Rees Street, quando sentiu uma dor aguda na nuca. Parecia com o choque elétrico que ela tomava algumas vezes ao tocar uma maçaneta de metal em uma porta depois de andar em um carpete, mas cem vezes pior.

E era isso. A próxima coisa que ela sabia era que estava nessa sala que era iluminada em apenas um metro e oitenta ao redor dela antes de cair na escuridão. Ela não tinha ideia das dimensões, mas ela estava bem certa de que as paredes eram feitas do mesmo asfalto do chão. Quando ela gritou, soou abafado, como se nenhum som pudesse escapar da sala.

E suas costas doíam, não da forma como o resto dela doía, que era mais uma dor por estar presa na mesma posição por tanto tempo. Havia um ponto em particular em suas costas que parecia queimado.

De fato, era o mesmo ponto onde ela sentiu a dor mais cedo. Quanto mais ela pensava sobre isso, mais Jessica suspeitava que alguém havia cutucado aquele local com alguma coisa como aguilhão para gado. Ela se lembrou de ler sobre eles na sessão das aulas de história sobre os Estados do Oeste.

Os rancheiros os usavam nas vacas algumas vezes para fazê-las irem na direção que eles queriam. Ela se lembrava do Sr. Hensarling dizendo que isso dava um susto no gado, mas um aguilhão faria muito pior com um ser humano.

Agora que o terror inicial e a exaustão haviam se esvaído, Jessica notou algo mais: ela estava com fome. Ela não tivera nada para comer ou beber desde o almoço. E seja lá que horas sejam agora, ela tinha certeza de que era tarde.

Mas ninguém tinha vindo para oferecer comida ou pelo menos para verificar se ela ainda estava viva. Ela não havia ouvido qualquer barulho desde que chegou, além da sua própria voz e o chocalho ocasional dos canos.

Eu fui deixada aqui apenas para morrer? Eu vou ver minha família de novo? Eu vou saber quem fez isso comigo algum dia?

Logo então, a luz acima dela queimou completamente. Muito cansada e rouca para gritar, ela pressionou as costas contra o cano, como se isso pudesse oferecer algum tipo de proteção.

Depois de alguns segundos, um zumbido começou e uma opaca luz azul de emergência se acendeu no outro lado do cômodo. Os olhos dela começaram a se ajustar lentamente à penumbra e ela notou algo no mesmo lado de onde a luz emanava. Ela piscou, na vã esperança de que isso pudesse ajudar de alguma forma. Eventualmente, a figura entrou em foco e ela percebeu que tinha o formato de um humano.

—Olá, ela chamou animadamente. Você no canto—você pode me ouvir?

Não houve resposta. Ela olhou um pouco mais de perto e notou que havia algo estranho a respeito da imagem, deitada de lado sem firmeza. Parecia humano, mas de alguma forma diferente. Ela estava perplexa. E então, em um momento de reconhecimento, ela percebeu o que estava olhando. Era um esqueleto humano.

Jessica Rainey descobriu que ainda podia gritar afinal.


CAPÍTULO NOVE


Mesmo que ela não se sentisse realmente, Keri fingia estar calma e controlada para o bem de seu passageiro.

Tim Rainey estava tão chocado que ela teve que levá-lo para casa no seu próprio carro. Ray disse que ele queria verificar algumas das pistas na delegacia, então Manny Suarez os seguiu e a buscou de volta.

No caminho, ela tentou dizer a Rainey que ainda havia esperança, que eles ainda tinham várias pistas para seguir. Mas ela podia dizer que ele não estava escutando de fato e parou de tentar depois de alguns minutos. Quando eles chegaram a casa dele, ele saiu do carro e fechou a porta atrás dele sem dizer uma palavra.

De volta na delegacia, Keri ficou surpresa ao descobrir que havia muito pouco em vias de atividade investigativa. Isso até que ela se lembrou de que já passava da 1 da madrugada e não havia muito mais que pudesse ser feito até de manhã.

Como Rainey está? Perguntou Hillman quando ele viu Keri e Manny entrarem.

Nada bem, admitiu Keri. Ela estava igualmente zangada e aturdida. Eu esperaria que tendesse mais para zangado pela manhã. Nós sabemos o que nos entregou? Como diabos esse cara sabia que nós estávamos lá?

—Eu estou revisando as imagens da cena, disse Edgerton. Até agora, eu não consegui encontrar nenhum erro da nossa parte.

Hillman suspirou pesadamente. Ele havia visto muitas dessas situações e Keri notou que ele não estava tão ligeiro para colocar a culpa como de costume.

—Pessoal, talvez não tenhamos feito nada de errado afinal. Esse cara tem planejado isso há muito tempo. É razoável pensar que ele se preparou para essa emergência também.

—É como Keri mencionou para mim mais cedo, adicionou Ray. Ele nos deu muito tempo de vantagem na área da entrega. É possível que ele já tivesse instalado câmeras na área ou na casa dos Rainey. Se ele estivesse os testando para ver se nos ligariam, não seria difícil descobrir que eles o fizeram.

Keri apreciou que mesmo que ele estivesse chateado com ela, Ray estava disposto a reconhecer que suas suspeitas não estavam fora de lugar.

—Eu só estou preocupada que talvez não tenhamos outra chance, disse Manny. Talvez ele não queira arriscar outra tentativa.

Keri estava tentada a relembrá-los sobre as dúvidas dela de que o sequestrador alguma vez tenha tido a intenção de aparecer, mas decidiu que agora não era o momento.

—O que aconteceu ao motociclista? Ela perguntou ao invés disso.

—Nada, veio uma voz do sofá no canto. Keri olhou na direção e viu que era Frank Brody, esparramado preguiçosamente.

—Você pode ser um pouco mais específico? Ela perguntou, tentando manter o tom não conflituoso. Ela nem havia atinado que ele fora parte da operação.

—Era apenas algum adolescente se divertindo. Nós o paramos a alguns quarteirões de lá. Verificamos e ele não tem registro de outra coisa além de duas multas por excesso de velocidade pelo mesmo tipo de coisa. Ele vai à uma escola em Venice—sem conexão óbvia com a garota ou qualquer coisa na região.

Garrett Patterson, que tinha permanecido na delegacia para ajudar com a coordenação, limpou a garganta.

—Se você tem algo a dizer, Patterson, apenas cuspa logo, rosnou Brody. Isso não é uma escola de boas maneiras.

Pela primeira vez, Keri concordou com ele. Patterson era ótimo em peneirar dados, mas a sua reticência em ir a campo ou mesmo em se pronunciar nas reuniões estavam ficando enfadonhas. Patterson engoliu a seco e falou.

—Eu só ia dizer que rastreamos o telefone que enviou a mensagem para o Sr. Rainey. Era um celular descartável. Sua última localização no GPS foi na marina, não muito longe do parque. Achamos que foi jogado no mar depois que foi usado.

—O que eu queria era saber é como esse cara tinha até o número do celular do Rainey, questionou Ray. Eu verifiquei o telefone dele. Sua lista de contatos é pequena e ele não faz muitas ligações. Você pode perceber que ele é bem cuidadoso por trabalhar com tanta coisa proprietária naquela companhia de jogos. Ele não sai passando o seu número de celular para qualquer um.

—É uma pergunta justa, disse Hillman. Mas considerando a quantidade de tempo que esse cara empenhou em seu plano, eu não posso dizer que estou chocando que ele colocou as mãos no número de alguma forma. Aqui está minha pergunta. Há algo a mais que possamos fazer aqui essa noite ou estamos apenas girando nossas engrenagens?

—Os parâmetros do caso que coloquei no banco de dados federal de pessoas desaparecidas estão sendo comparados, disse Edgerton. Nós poderemos procurar por casos similares em algumas horas. Por volta do horário que o dia começa para outros departamentos das polícias locais na Costa Leste e no Centro-oeste receberem os dados. Então, eles verão nosso alerta. Talvez alguém irá reconhecer um padrão e entrar em contato. Mas, fora isso, eu não consigo pensar em mais nada que possamos fazer.

—Alguém mais? Perguntou Hillman. Quando ninguém se pronunciou, ele continuou. Então, vão todos para casa. Tirem algumas horas de sono. Estejam de volta aqui bem cedo. Com sorte, alguma coisa vai ter aparecido até lá.

Keri, ao se virar para sair, olhou de relance para uma das telas de televisão no canto da área de discussões.

—Ah não, ela gemeu.

Todos os outros olharam e viram o que a tinha aborrecido. A tela estava mostrando um alerta no noticiário local sobre o desaparecimento de Jessica Rainey. Keri não precisava ouvir o que a repórter estava dizendo para saber que esse era um desenrolar frustrante. A mulher estava em pé em frente à casa dos Rainey e a chamada na parte de baixo da tela dizia: Garota local raptada próximo à sua casa.

—Arrume mais um par de alvinegros no local agora! Hillman latiu para o sargento administrativo. Eu quero um perímetro ao redor da casa e a vizinhança fechada. Quando os diretores de telejornais relutarem, digam-lhes que é uma cena de crime ativa. Ninguém, a não serem os moradores, está liberado naquele quarteirão sem uma autorização. Jornalistas vão ter que fazer o show deles abaixo na Pershing. Entendido?

—Entendi, Tenente, o sargento gritou de volta.

—E diga aos policiais na cena que assim que a transmissão ao vivo terminar, eles precisam escoltar aquela equipe de TV para fora do quarteirão, entendido?

—Entendido, Tenente.

Hillman olhou em volta e vendo todos ainda por lá, lembrou-lhes, isto não muda nada para todos vocês. Vão para casa. Durmam. Voltem cedo. Vejo vocês amanhã.

Como se para ilustrar seu ponto, ele andou direto para fora da delegacia sem olhar para trás. Ray fez uma linha direta logo atrás dele e Keri teve que correr para alcançá-lo.

—Ei, Ray, nós podemos conversar um minuto? Ela perguntou enquanto ambos saiam pela entrada de funcionários na noite fresca. Ela esperava que o breve momento de leveza no veleiro do Butch tivesse aberto as portas.

—Escute, Keri. Não estou com ânimo para isso agora. Estou exausto. Estou confuso. Eu não quero ser irritante, mas nós poderíamos manter as coisas profissionais por agora e dizer adeus até a manhã?

—Claro, ela disse, tentando manter o tom sem soar muito ferido. Claro, Certo.

Ela parou de andar e o deixou atravessar o estacionamento sozinho. Ela permaneceu lá em silêncio enquanto ele chegava ao carro, arrancava e deixava o estacionamento. Ele nunca nem olhou na direção dela.

Incerta sobre o que fazer, ela andou devagar até o carro dela, um Honda Civic Híbrido usado que havia substituído seu Toyota Prius usado, o qual fora destruído quando o homem que estava raptando Evie o esmagou de frente. Ela fechou a porta e descansou a cabeça no volante.

Ela sabia que não havia nada mais que pudesse fazer por Jessica Rainey nas próximas horas. Qualquer coisa que ela tentasse seria o equivalente investigativo a raspar metal com metal. Mas ela também sabia que estava muito ligada para ir para casa e dormir.

Ela imaginou Tim e Carolyn Rainey deitados na cama, olhos bem abertos, com pensamentos horripilantes rebatendo por suas cabeças. Sr. Rainey teria, quase certamente, ido lá fora para confrontar a repórter invadindo a privacidade deles. Era o que ela teria feito, em parte por raiva, em parte apenas para ter algo para fazer. Ela esperava que os policiais posicionados fora da casa o detivessem. Isso só tornaria as coisas piores.

Presos em casa, eles ficariam obcecado com cada pequeno detalhe do dia, imaginando o que eles poderiam ter feito diferente, o que eles poderiam ter deixado passar. Era o que ela fez todos os dias. Era o porquê de ela se debruçar sobre as imagens de vigilância do Viúvo Negro executando o homem que estivera segurando Evie e enfiando-a no porta malas do seu carro.

Keri jogou sua cabeça para cima tão repentinamente que quase distendeu um músculo em seu pescoço. Ela havia acabado de ter o que alguns chamam de epifania.

Há um detalhe que eu ainda não verifiquei. E agora é uma boa hora para fazê-lo.


*


Keri estacionou no Sunset Boulevard, a cerca de um quarteirão de distância do apartamento de Brian Wickwire no Echo Park e andou o resto do caminho. Ainda era difícil de pensar nele como Brian Wickwire, um homem com um nome e um apartamento e uma geladeira cheia de comida.

Por tanto tempo ela pensara nele apenas como o Colecionador, o monstro que sequestrou sua filha em um parquinho bem na sua frente; o homem que havia matado um adolescente inocente que tentou detê-lo.

É claro, agora ele não era mais uma ameaça, depois do confronto perto do Dia de Ação de Graças. Não havia ido como ela esperava. Ela queria uma confissão e a localização de Evie. Mas ficou claro rapidamente que ele não ia compartilhar essa informação.

E então, mesmo depois que eles lutaram e ele estava morrendo devido a uma queda deixou sangue jorrando de seu crânio, ele a provocou ao ponto que ela se viu o estrangulando o resto de vida que restava dele.

Após isso, ela foi direto ao apartamento dele e encontrou a prova que levou ao seu temporário, dolorosamente curto, encontro com Evie e a descoberta de dúzias de outras crianças desaparecidas. Agora, ela estava esperando que o apartamento dele pudesse conter mais uma pista, alguma coisa sobre a identidade ou localização do Viúvo Negro.

Keri sabia que ainda havia uma viatura da Divisão Central estacionada em frente ao prédio do apartamento de Wickwire, o que era o motivo pelo qual ela estava vestida com um moletom com um capuz demasiadamente grande escondendo seu rosto. Além dela, alguns macabros e curiosos fãs de crimes reais tentaram invadir a casa do famoso Colecionador para roubar algum tipo de lembrança.

Diferentemente da maioria desses amadores, Keri tinha acesso ao projeto do prédio e sabia que, em adição às entradas laterais e frontais, havia também uma porta próxima ao portão da garagem no beco. Ela se trancava automaticamente e não havia maçaneta exterior, então era supostamente segura.

Mas Keri sabia que com esse modelo de porta, um imã extremamente poderoso, projetado especificamente, poderia ser usado para arrastar a tranca para trás, de maneira que a porta poderia ser aberta do lado de fora. Depois de verificar para ter certeza de que estava sozinha no beco, ela fez exatamente isso. Era um truque que ela aprendeu com um ladrão que havia detido nos seus dias de patrulha e não era a primeira vez que vinha a calhar.

Após conseguir entrar, ela pegou as escadas da garagem para o andar do Wickwire. Espreitando no corredor, ela viu que estava vazio. Qualquer outra coisa seria surpreendente às 2 da madrugada em noite da semana. Tão silenciosamente quanto podia, ela caminhou pelo corredor, verificando por alguma nova câmera de segurança que pudesse ter sido colocada desde sua última visita.

Vendo nada, ela chegou até a porta e rapidamente a arrombou, ignorando a faixa policial cruzando a porta. Uma vez dentro e deixando as luzes apagadas, ela ignorou tudo o mais e moveu em direção à parede atrás da mesa do Wickwire.

As fotos de animais na natureza ainda estavam alinhadas, do jeito que estavam na foto que ela vira anteriormente. E ali estava a imagem da viúva negra que ela estava esperando tão desesperadamente para ver.

Keri começou por ela, repentinamente nervosa por tocá-la com medo que suas suspeitas fossem despedaçadas e ela voltasse para a estaca zero, sem qualquer pista para seguir ou indícios para estudar. Se essa não render frutos, ela não saberia o que fazer.

Você não tem tempo para olhar para o próprio umbigo. Faça o que você veio fazer aqui.

Ignorando o formigamento nervoso percorrendo sua espinha, Keri estendeu suas mãos com luvas e removeu delicadamente a foto da parede. Ela a virou para ver o verso. Estava muito escura para enxergar se havia alguma coisa escrita ou marcada.

Keri olhou ao redor e decidiu ir até ao banheiro, que não tinha janelas para o exterior e não poderia trair sua presença se ela ligasse a luz. Ela entrou, fechou a porta e apertou o interruptor—nada. A energia deve ter sido desligada.

Não é grande coisa. Para isso que as lanternas de celular servem.

Ela ligou a sua e estudou o verso da moldura da foto de perto. Mas não havia nada de incomum nisso. Era apenas o verso de uma moldura de fotografia padrão. Keri deslizou a proteção de trás da foto para ver se havia algo escrito no verso da própria foto. Havia nada. Frustrada e sem qualquer ideia do que fazer em seguida, ela lutou contra a vontade de rasgar a foto em pedaços. Ao invés disso, ela deslizou de volta no lugar.

Estava prestes a desligar a lanterna e retornar a foto para a parede, quando ela avistou de relance alguma coisa no chão perto do seu sapato. Era um pedaço de papel. Ela poderia tê-lo deixado escapar completamente se tivesse desligado a luz uma fração de segundo mais cedo.

Pegou o papel do chão, percebendo que deve ter sido colocado entre a parte de trás da moldura e a foto em si e caído sem ela ter percebido. Ela segurou a luz em cima dele e viu uma frase escrita em lápis claro: "a verdade pode ser encontrada nas ervas.”

Mesmo que ela não tivesse ideia do que significava, Keri sabia que a frase fora escrita por Wickwire. Ela reconheceu ambas a sua letra e a maneira que ele se recusava a capitalizar qualquer letra, nunca. Ela tirou uma foto do papel e o retornou para a moldura.

Se algo viesse disso, ela gostaria de direcionar a Divisão Central para onde eles poderiam encontrar a evidência relevante. Se ela levasse o papel com ela, seria inútil em termos de processar alguém no futuro, embora isso parecesse um sonho distante no momento.

Ela colocou a foto de volta na parede e deixou o complexo de apartamentos da mesma forma que ela tinha entrado, evitando contato humano o tempo inteiro. Ela se apressou pelo Sunset até seu carro e havia acabado de abrir a porta, animada por ter entrado e por finalmente poder tirar o moletom pesado, quando um carro encostou atrás dela, estacionou e desligou o motor.

Ela olhou para trás, inquieta. Havia uma tonelada de lugares para estacionar na rua. Por que alguém escolheria estacionar diretamente atrás dela no meio da noite? O motorista desligou os faróis do carro e ela soube imediatamente o porquê. Era o advogado do Colecionador, Jackson Cave.


CAPÍTULO DEZ


Keri sentiu seus joelhos começarem a ceder e se agarrou o teto do carro para se apoiar. Ela tentou esconder o choque e o medo rastejante que ela sentia crescer dentro de si.

O que ele está fazendo aqui? Como ele sabia que eu estaria aqui a esta hora? Ele chamou os policiais da Divisão Central?

Todas essas perguntas estavam nadando simultaneamente na cabeça dela, mas ela se forçou a parecer indiferente, já que essa era a maior reviravolta de eventos que ela encontrara hoje.

Cave saiu do carro dele, um último modelo da Tesla, e fechou a porta. Ele estava vestido com o que Keri imaginou ser um traje casual das 2 da madrugada para ele— calça, sapatos, um suéter de gola rolê e um casaco esportivo. Mesmo a esta hora, seu cabelo preto penteado para trás estava imaculado. Sua pele perfeitamente bronzeada quase brilhava sob as luzes da rua.

—Surpresa em me ver? Ele perguntou enquanto andava na direção dela com algo entre um sorriso e um olhar de desprezo no rosto, expondo seus dentes perturbadoramente brancos.

—Indo para uma partida de croqué? Rebateu Keri, indicando a vestimenta dele com a cabeça. Ela havia aprendido que quando se lida com Jackson Cave qualquer indício de vulnerabilidade era uma responsabilidade legal.

—Você é engraçada, ele disse sem rir. Parou a cerca de dois metros dela. Os seus olhos azuis penetrantes se fixaram nela e se estreitaram. Que coincidência, você e eu nos encontrando. Afinal, minha residência principal é em Hollywood Hills e você mora naquele apartamento acabado em Playa del Rey, em cima de uma restaurante chinês que fede à quilômetros de distância. E ainda, estamos ambos aqui, bem ao lado do apartamento do Sr. Wickwire, no meio da noite. Estranho, você não acha?

—Não consegui dormir, trabalhando em um caso difícil. Então eu saí para dirigir e dar uma caminhada. Qual é a sua desculpa, Cave? Sondando jardins de infância para assombrar mais tarde nesta manhã?

—Você é maravilhosa, Detetive, disse Cave e dessa vez seu sorriso parecia genuíno. Eu poderia passar a noite toda trocando farpas com você. Você é muito mais divertida que a maioria dos advogados que eu vejo no tribunal. Infelizmente, o tempo é curto. Podemos falar francamente?

—Sempre.

—Eu não estou muito feliz a respeito da morte do meu cliente, Sr. Wickwire. Ele... como eu posso colocar isso? Trouxe um monte de negócios, se você sabe o que quero dizer.

—Eu sei exatamente o que você quer dizer, disse Keri categoricamente.

—Bem, eu sinto como se você nunca tivesse recebido a punição devida por aquilo. Meu entendimento é de que o Sr. Wickwire possa ter sido estrangulado até a morte, mesmo enquanto ele sangrava do cérebro. E mesmo assim, apesar da investigação deles, o Assuntos Internos ainda está para ver se é adequado te acusar de alguma coisa.

—Temos que respeitar o processo.

—Sim, isso é verdade. O processo é muito importante, por isso o ritmo da investigação pode precisar ser... acelerado. Eu sei que o seu Tenente Hillman foi lutar por você na sua audição. E eu entendo que o Chefe Beecher ainda é uma tiete da sua detetive premiada, aquela que resgatou a jovem Ashley Penn, que frustrou as maquinações cruéis do Dr. Jeremy Burlingame e que salvou Sarah Caldwell de um bordel mexicano. Mas detetive, você não é a única com conexões no alto escalão do LAPD.

—Não me diga? Quem você está subornando esses dias, Cave? Perguntou Keri casualmente, apesar de sentir que ele estava prestes a largar a marreta que estivera segurando.

—Eu nunca subornaria alguém, Detetive, ele respondeu, fingindo-se de ofendido. —E eu não estou dizendo isso porque eu sei que você ligou o gravador do seu celular no segundo que você percebeu que era eu atrás de você.

Keri olhou involuntariamente para baixo no bolso onde seu telefone descansava e esperneou mentalmente por isso. Ele continuou, não reparando ou não se importando.

—O que eu estou dizendo é que o seu tempo chegou, Detetive Locke. Seus dias de deslizar sem consequências por suas ações estão chegando ao fim. Estou de olho em você. Eu acho que você sabe disso. Então, seja por invadir o apartamento de Brian Wickwire, roubar um pen drive do meu escritório ou por assassinar um homem indefeso sofrendo com uma lesão na cabeça, você enfrentará justiça. As coisas estão prestes a ficar muito ruins para você.

Apesar de sentir o ímpeto de vomitar, Keri se recusou a permitir sequer uma batida de silêncio passar entre eles, por medo de dar vantagem a ele.

—Você sabe, se uma pessoa não te conhecesse melhor, acharia que você está um pouco assustado. O que está acontecendo? Jack é um medroso?

Cave não respondeu, ao invés disso deu-lhe o seu sorriso mais estreito antes de dar meia volta e retornar ao seu carro. Ele abriu a porta e estava entrando quando adicionou uma última coisa.

—Vejo você por aí, ele disse antes de bater à porta, dar partida no carro e arrancar para o boulevard deserto.

Keri esperou até que as suas lanternas traseiras tivessem feito a curva antes de se sentar. Apesar da temperatura na casa dos dez e poucos graus, ela estava suando. Ela tirou o moletom, fechou a porta e deu vários goles de ar. Ela percebeu que esteve segurando a respiração.

Ela desligou o gravador no celular e sentou silenciosamente no carro por alguns minutos, permitindo seu corpo recobrar o equilíbrio. Era quase demais para processar. Jackson Cave sabia que ela estava ali e tinha vindo confrontá-la.

Ela não se incomodou em preocupar sobre como ele teria sabido. Ele pode ter câmeras instaladas, sensores colocados no apartamento ou ter encontrado uma nova maneira de colocar uma escuta no telefone dela ou de colocar um rastreador no carro dela. Ele havia feito ambos no passado, apesar de ela não pode provar que havia sido ele.

O que mais a preocupava eram as ameaças dele. Ela realmente havia feito todas aquelas coisas que ele alegou—invadir em um apartamento, roubar dados do escritório dele, matar um homem que não era mais uma ameaça para ela, puramente por vingança.

Ele pode provar alguma dessas coisas? Ele realmente tem conexões de alto escalão na força?

Ela estava quase certa de que este último era verdade. E com as conexões, recursos financeiros e intenções maliciosas dele, ele tinha mais que apenas uma chance razoável de conseguir que ela fosse demitida e potencialmente encarcerada.

Aquelas coisas eram verdadeiras. Mas então ela se lembrou de mais uma coisa que era verdade.

Ele não é o único com cartas para jogar. E ele sabe disso.

Por qual outro motivo Jackson Cave apareceria para provocá-la e intimidá-la no meio da noite? Ela tinha acertado na mosca. Ele estava realmente assustado.

Afinal, enquanto ela havia cometido os próprios crimes, ele também havia. Ele era uma peça crucial, se não o líder de um esquema de escravas sexuais. Ele estava envolvido em múltiplos sequestros de crianças e na venda dessas crianças. Ele se associou com sequestradores e, se as suspeitas dele estavam corretas, talvez até um assassino.

Ela não poderia provar nada daquilo sem expor suas próprias violações da lei. Mas tudo isso era verdade. E ele sabia que Keri estava por cima de tudo isso. Ele estava aterrorizado que ela tivesse encontrado alguma coisa no apartamento do Wickwire que poderia conectá-lo com incontáveis crimes. Ele estava preocupado que ela estivesse por cima de algo que poderia derrubá-lo.

E ele não tinha ideia se ela havia compartilhado essa informação com outros ou se havia colocado em um cofre de segurança. E até que ele soubesse disso, ele não poderia arriscar matá-la. Ele precisava destruir a reputação dela, de maneira que qualquer alegação que ela fizesse contra ele pareceria desesperada e patética.

Ele era bom em esconder isso, mas Jackson Cave estava com medo.

Os pensamentos de Keri foram interrompidos por seu telefone tocando. Ela olhou para o relógio no carro. Eram 2:44 da madrugada. Quem estaria ligando a esta hora? Ela pegou o telefone. Era Ray. Ela respondeu imediatamente.

—Eu achei que você não quisesse conversar até de manhã. Teve uma mudança de opinião? Ela perguntou.

—Nós temos uma pista, ele disse, ignorando a pergunta. Uma das amigas de Jessica acordou no meio da noite e recordou algo. Ela disse que Jessica contou-lhe sobre estar sendo seguida por alguém em uma van preta algumas semanas atrás.

—Por que todos os sequestradores de criança precisam dirigir vans? Perguntou Keri. Digo, eles não sabem que é um cliché?

—Keri, você quer soltar piadas inapropriadas ou você quer me encontrar na delegacia em vinte minutos para podermos ir interrogar essa menina?

—Faça trinta e eu estarei lá.

—Por que tanto tempo? Ele perguntou. Você não está no seu apartamento?

—Eu vou explicar depois. Vejo você na delegacia, ela disse e desligou antes que ele pudesse perguntar qualquer outra coisa.


*


Keri os conduziu da delegacia até a casa da garota. Ela preferia dessa forma, porque ela poderia focar na rua ao invés de sentar de forma constrangedora no banco do passageiro, imaginando se era seguro trazer à tona a conversa dessa manhã, ou tecnicamente, da manhã passada.

Ray não a perguntara sobre a localização dela no meio da noite e ocorreu a ela que ele pudesse pensar que ela estava com alguém. Ela não tinha certeza sobre como desmentir essa noção sem entrar em um tópico que ele claramente não queria discutir. Foi em torno do instante que decidiu apenas deixar estar, que ela se escutou falar.

—Não era a casa de algum cara quando você me ligou, se é isso que você está pensando.

Incapaz de colocar as palavras de volta na boca, ela manteve os olhos focados na rua e fingiu que ela não tinha feito qualquer coisa.

—O quê? Ele perguntou boquiaberto.

Mude de assunto, Keri. Ou melhor ainda, mantenha sua maldita boca fechada.

—Eu só estou dizendo que se você pensou que o motivo de eu estar evasiva no telefone mais cedo era porque eu estava dormindo com algum cara que mora a mais de vinte minutos da delegacia, eu não estava.

—Keri, nem sei como responder isso, ele respondeu, surpreendentemente ponderado. Eu sei que você é um pouco bitolada, mas-

—Eu só queria que você soubesse, ela disse, sabendo que cada palavra estava a cavando mais fundo.

—É não é da minha conta o que você faz. Nós não estamos... você não me deve... Realmente não quero falar sobre isso agora. Estamos no meio de um caso pelo amor de Deus. Podemos apenas nos concentrar nisso e lidar com aquilo mais tarde?

—Sim, concordou Keri, finalmente conseguido tomar conta de si. Eu não vou trazer o assunto à tona de novo. Você está certo. A falta de sono está mexendo comigo. Além disso, acho que chegamos.

Ela encostou próximo a casa em uma seção menos ostentativa, mas ainda impressionante, da Playa del Ray na esquina da Falmouth Avenue com Cabora Drive. Eram quase 3:30 da madrugada quando eles caminharam até a frente, mas podiam ver várias luzes acesas.

Ray bateu na porta discretamente, no caso de alguma pessoa no interior ainda estivesse dormindo. Depois de poucos segundos, um homem de trinta e poucos anos em um robe abriu a porta. O cabelo dele estava atrapalhado e seu rosto tinha traços de barba mal feita, mas seus olhos estavam abertos e claros. Obviamente, ele estava completamente acordado há um tempo.

—Detetives Locke e Sands? Ele perguntou.

—Sim, disse Ray.

—Por favor, entrem. Eu sou Evan Coombs. Minha filha Cate está na cozinha com minha esposa. Nós temos filhas gêmeas que ainda estão dormindo lá em cima, então se vocês puderem manter a voz baixa, eu lhes agradeceria.

—É claro, Keri disse enquanto Evan Coombs os guiou rapidamente para a parte de trás da casa. Quando eles chegaram à cozinha, ela viu a Sra. Coombs, também de robe, colocando alguns mini marshmallows na caneca e uma garota loira vestindo pijamas da Mulher Maravilha. A garota estava assistindo distraidamente um episódio de um desenho animado na pequena televisão em cima da bancada. Keri se perguntou se ela teria reconhecido o programa se Evie ainda estivesse por perto.

A mãe olhou para cima, os viu e andou até eles. Apesar da hora e do robe, ela parecia moderadamente composta. O cabelo dela estava em um coque solto e tinha a expressão forçadamente composta de alguém que havia passado grande parte da noite evitando que a criança perdesse a cabeça.

—Oi, eu sou Cindy Coombs, ela disse, estendendo a mão que não segurava uma xícara de café. Cate estava bem abalada antes, mas ela se acalmou. Acho que ela está pronta para falar. Nós lhe dissemos que não há nada a temer. Então se vocês pudessem reforçar isso, ajudaria.

—Claro, Sra. Coombs, assegurou-lhe Keri. Seremos muito delicados. Posso ir me sentar ao lado dela?

—Por favor. Deixe-me desligar a TV.

Sra. Coombs andou até Cate, colocou uma mão em seu ombro e conversou com ela calmamente dizendo algo que Keri não conseguiu ouvir. O que quer que fosse, Cate se virou imediatamente da televisão assim que sua mãe a desligou. Além do olhar amedrontado em seu rosto, ela parecia uma garota de doze anos perfeitamente normal e bem ajustada.

—Oi, Cate, disse Keri. Eu sou a Detetive Locke e esse é meu parceiro, Detetive Sands. Mas você pode nos chamar de Keri e Ray. Podemos nos juntar a você?

Cate assentiu hesitante, seus olhos castanhos cheios de apreensão.

—Isso é chocolate quente? Perguntou Keri.

Cate assentiu.

—Eu amo os mini marshmallows, notou Ray, apontando para eles. O problema com os grandes é que você tem que tentar beber ao redor deles e a coisa derrama em você. Isso já aconteceu com você?

—Sim, ela disse obviamente impressionada. É por isso que eu sempre vou de minis.

—Inteligente, disse Ray. Então, Cate, está tudo bem se nós fizermos algumas perguntas sobre o que você disse para os seus pais?

—Aham.

—Ok, então por que você não começa nos contando o que você disse a sua mãe e ao seu pai, sobre Jessica e a van.

—Ok, disse Cate hesitante. Bem, eu não lembro exatamente quando foi isso, mas definitivamente antes das férias de inverno. Mas estávamos almoçando na área de piquenique no campus e essa van passou. Jessica apontou para ela e disse que a lembrava de algo bizarro que havia acontecido no dia anterior com uma van diferente.

—E o que era? Perguntou Keri.

—Ela disse que estava pedalando para casa e quando ela virou na Manitoba, ela ficou atrás dela e a seguiu todo o caminho quase até onde ela normalmente encontra com a mãe. Quando Jessica virou em uma garagem e parou, ela finalmente foi embora.

—Mas era a mesma van que vocês viram no almoço? Reiterou Ray.

—Não. Aquela era vermelha. Ela disse que a que a seguiu era preta e tinha um escrito dourado na lateral. Mas passou tão rápido que ela não conseguiu ler. Era em letra cursiva.

—Ok, isso é de grande ajuda, Cate. Ela disse se ela deu uma olhada no motorista? Perguntou Keri.

—Ela disse apenas que era um cara. Mas ela não disse como ele se parecia. A expressão dela sugeria que ela pensava que estava os decepcionando.

—Isso tudo é ótimo, disse Ray a encorajando. Há algo mais que você consegue se lembrar? Ela mencionou isso de novo alguma outra vez?

—Não. Ela nunca disse qualquer coisa depois. Mas ela parecia realmente assustada quando contou sobre isso aquela vez.

—E você diz que isso foi antes das férias de inverno, solicitou Keri. Você lembra se foi depois da Ação de Graças?

—Acho que sim. Sim, foi. E estava quente o suficiente para sentar lá fora. Isso ajuda? Você pode voltar e ver o tempo daquele dia? Ela perguntou esperançosa.

—Nós podemos com certeza, disse Keri. Esse é um detalhe especialmente importante para lembrar. Vai realmente nos ajudar a reduzir as buscas.

Enquanto ela falava, Ray olhou por cima para ela e ela podia dizer que ele tinha chegado à mesma conclusão que ela. Eles provavelmente já tinham explorado Cate Coombs por todas as respostas que ela tinha. Ela assentiu para ele.

—Ok, escute, Cate, ele disse se levantando. Você tem sido uma grande ajuda. Jessica é realmente sortuda de ter uma amiga como você. Eu acho que nós temos tudo o que precisamos por agora. Mas se você se lembrar de alguma outra coisa, por favor, diga aos seus pais e eles nos ligarão. Parece bom?

Cate olhou para Ray, que se erguia sobre ela. Mas Keri podia sentir que ela achava seu tamanho reconfortante, ao invés de intimidador.

—Jess vai ficar bem? Ela o perguntou.

Ele se curvou próximo a ela e deu a ela seu sorriso mais caloroso, aquele que nunca falhou em derreter o coração de Keri.

—Nós vamos trabalhar muito duro para encontrá-la. E quando nós o fizermos, vamos contar a ela que ela te deve um grande abraço de agradecimento.

Cate assentiu, satisfeita, se não completamente convencida.

Ao deixarem a casa e voltar para o carro de Keri, Ray olhou para seu relógio.

—Pouco depois das quatro da madrugada, ele notou, você acha que é muito cedo para voltar até os Rainey e perguntá-los sobre isso?

Keri olhou para ele e a expressão dela deve ter sido reveladora, porque ele não esperou por uma resposta.

—Você não acha que nós estaríamos os acordando, né?!

—Não, Ray. Eu lhe garanto que nenhum deles tenha dormido por um instante essa noite. Sonhar é pior.


CAPÍTULO ONZE


Keri estava certa. Depois que eles haviam passado pelas barreiras policiais e estacionado em frente à casa, eles conversaram com um policial fora da casa que disse que Tim Rainey havia saído várias vezes para falar com ele e que a última visita foi há apenas vinte minutos.

Ao invés de bater na porta ou tocar a campainha, Ray mandou uma mensagem dele dizendo que estavam lá fora e perguntando se eles poderiam entrar. A porta abriu menos de quinze segundos depois e pela sua falta de ar e olhar de pânico, eles conseguiam dizer que ele temia pelo pior.

—Não temos más notícias, Sr. Rainey, disse Keri imediatamente. Tanto quanto sabemos, nada mudou a respeito de Jessica. Nós só estamos aqui para fazer mais algumas perguntas que achamos que possam ser úteis.

Rainey pareceu respirar novamente e os direcionou para dentro. Ele marchou para a cozinha, deixando-os para fechar a porta.

—Sua esposa está acordada? Perguntou Ray. Achamos que ela pode ser útil também.

—Ela está lá em cima na cama com o Nate, disse Rainey, sua voz fina e estridente de chorar e de exaustão. Ele não parava de chamar pela irmã. Eu vou buscá-la. Tem café na cozinha se vocês quiserem.

Keri e Ray sentaram-se silenciosamente na mesa do café, esperando os Rainey descerem. Nenhum deles queria discutir o caso por medo de dizer algo que eles não queriam ouvir por acaso. E conversa casual estava fora de questão por inúmeras razões.

Após alguns minutos, eles escutaram o ranger das escadas e logo ambos Tim e Carolyn Rainey estavam sentando em frente a eles na mesa, cada um os encarando com olhos vermelhos e cansados. Keri estava incerta sobre como abordar o assunto, então ela apenas mergulhou.

—Alguma vez Jessica mencionou uma van a seguindo, talvez por volta da segunda semana em dezembro?

No caminho para cá, ela havia verificado o tempo em dezembro e descobriu que houve apenas uma sequência de três dias na qual a temperatura aumentou atipicamente para calorosos 15 graus.

—Não, eu definitivamente teria me lembrado disso, disse Carolyn. Eu teria falado logo de cara. Ela disse algo a você, Tim?

Ele balançou a cabeça, negando.

—Por quê? Ele perguntou.

Ray respondeu:

—Uma amiga dela, Cate Coombs, disse que Jessica contou a ela que uma van a seguiu um dia da escola até o ponto onde você costuma se encontrar com ela, Sra. Rainey. Mas aparentemente foi uma única vez, porque ela nunca mencionou isso novamente.

—Não, ela nunca disse qualquer coisa, reiterou Carolyn Rainey. Mas ela pode não ter dito. Eu acho que ela temia que se dissesse alguma coisa como essa, eu não a deixaria mais pedalar sozinha, o que é verdade. Cate disse mais alguma coisa?

—Ela disse que Jessica disse a ela que era uma van preta com um escrito dourado em letras cursivas, disse Keri.

A cor foi drenada do rosto de Carolyn Rainey.

—O que foi? Perguntou Keri.

—Eu acho que sei de qual van ela estava falando. Por volta do final de outubro, perto do Halloween, eu havia acabado de tomar banho e saí para o quarto quando pensei ter visto movimento através das cortinas bem do lado de fora da janela. Eu gritei e corri até lá. Quando cheguei, eu não pude ver ninguém.

—Mas quando eu desci, vi um cara qualquer carregando uma escada em uma van do outro lado da rua. Era preta e tinha um escrito dourado em letras cursivas na lateral. Nossos vizinhos tinham alguma reforma sendo feita no toldo deles e a van esteve estacionada ali por toda a manhã. Eu não refleti sobre isso até então. Mas quando vi o cara com a escada, fiquei desconfiada.

—Você chamou a polícia ou falou com seu vizinho? Perguntou Ray.

—Não. Eu comecei a pensar que poderia ter imaginado a coisa toda. Mas fiquei alerta. E o cara ficou ali por mais uma hora, trabalhando no toldo. Ele não agia culpado ou apressado. Parecia apenas estar fazendo o serviço. Então ele saiu e eu não pensei sobre isso novamente, até agora. Vocês acham que isso possa estar relacionado?

—Difícil dizer. Qual é o nome do seu vizinho? Perguntou Ray, tentando manter sua voz casual.

—Marcy Price.

—Eu sei que é cedo, mas você se importaria ir até a casa da Marcy para ver se ela tem as informações de contato da empresa de construção?

—Não é necessário. Depois que tudo isso aconteceu, ela me deu o cartão deles, porque eu estava pensando em reformar nossa varanda dos fundos na primavera.

Ela se levantou e foi até um Rolodex antigo no balcão da cozinha. Dentro de segundos ela havia encontrado o cartão e o entregou. Em dourado, letras cursivas, lia-se Salter Home Improvement.

—Podemos ficar com ele? Perguntou Ray.

—Sim, disse Carolyn Rainey, visivelmente se permitindo criar esperanças. —Vocês acham que pode ser ele?

—Nós obtivemos muitas pistas falsas, disse Keri a ela, tentando calcar o entusiasmo. Definitivamente vamos dar uma olhada. Mas eu não pularia para qualquer conclusão nesse momento.

—Eu gostaria que você tivesse me contado isso na noite passada, disse Tim Rainey repentinamente, seu tom cheio de amargor.

Keri mordeu a língua, se recusando a lembrá-lo que ela havia feito exatamente isso.

—Nós vamos conferir isso, disse Ray rapidamente. Eu sei que é difícil, mas tentem dormir um pouco. Mesmo algumas horas podem ajudar.

Tim Rainey abriu a boca para responder mais sua esposa colocou a mão sobre a dele e ela parou.

—Obrigada, detetives, ela disse. Por favor, nos comuniquem se descobrirem alguma coisa.

Ambos Keri e Ray assentiram, se apressando para a saída antes que falassem algo mais que irritasse o marido.


*


A manhã estava quase raiando quando Keri e Ray estacionaram em frente à casa de Enrique Hernandez, logo ao lado de La Brea em Mid-City. De acordo com Martin Salter, proprietário da Salter Home Improvement, Hernandez havia feito algum trabalho no toldo de Marcy Price no dia vinte e seis de outubro.

Ele passou o endereço de Hernandez para eles sem qualquer problema, claramente esperando ser de ajuda e evitar qualquer culpabilidade pelo que o empregado possa ter feito. Ray o avisou para não ligar para Hernandez para avisá-lo, mas isso era claramente desnecessário. Sua voz ao telefone sugeria que essa ideia nunca lhe ocorreu.

A Policial Jamie Castillo estacionou próximo a eles um momento depois e saiu. Ela não estava de uniforme, mas estava usando o cinto de armas.

—Então, vocês me chamaram só porque esse cara tem um sobrenome hispânico e precisam que eu traduza?

—Não, disse Ray defensivamente. Nós te chamamos, porque não queríamos fazer acrobacias para envolver a delegacia de Mid-City e nós queríamos um reforço confiável. Além disso, de acordo com o chefe dele, esse cara tem um bom inglês.

—Ela estava te provocando, Ray, observou Keri.

—Sim, eu estava te provocando, Ray, disse Castillo.

—É Detetive Sands para você, Policial Castillo, respondeu rispidamente.

—Não estou no horário de trabalho, ela respondeu mal-humorada. Eu posso te chamar de Ray-Ray se eu quiser.

—Agora ele está te provocando, Jamie, disse Keri. Cara, eu sou a única com um senso de humor por aqui?

Ela viu Ray e Jamie trocarem olhares que sugeriam que eles não achavam o senso de humor dela era sua característica mais marcante, mas ninguém disse qualquer coisa.

—Então, qual é a verdade nua e crua? Perguntou Castillo.

—De acordo com o chefe dele, Hernandez tem morado sozinho desde quando sua mulher o deixou no verão passado e ele aparentemente não tem namorado. Então, achamos que ele está sozinho aqui, disse Keri.

—Ele foi preso duas vezes, acrescentou Ray. Uma vez por bisbilhotar, situação muito similar ao que Carolyn Rainey descreveu. A outra foi por se exibir para uma mulher em um shopping. Em ambos os casos ele recorreu por liberdade condicional—nunca serviu qualquer tempo.

—Então nada com crianças? Perguntou Castillo, soando surpresa.

—Não, mas tem uma vez para tudo, disse Ray.

—Digo para o enxotarmos para fora, sugeriu Keri. Não temos um mandado ou uma equipe grande, então temos que fazê-lo sair. Se Ray bater na porta com o peito estufado e você ficar ao lado dele parecendo carrancuda, ele pode tentar correr para os fundos. Eu estarei esperando lá para derrubá-lo. Tentativa de evasão deve ser suficiente para nos dar uma prisão.

—Parece um bom plano, disse Ray. Só, por favor, não tente se fazer de aríete nesse cara. Você já sofreu danos suficientes para um ano.

Ele estava se referindo as diversas lesões que ela havia incorrido ano passado, incluindo uma costela rachada, uma clavícula quebrada, uma cavidade ocular fraturada, um pescoço bem estirado, mais hematomas do que ela conseguia contar e pelo menos duas concussões confirmadas.

—Farei o meu melhor, treinador, ela disse.

—Agora ela está provocando você, Castillo disse para Ray, pegando o ritmo das coisas.

—Obrigado pelo aviso, Policial. Vamos começar? Vai haver luz do dia em uns poucos minutos e a escuridão é nossa amiga.

—Vamos fazer isso, concordou Keri.

Castillo assentiu e todos se moveram em direção a casa. Ray e Jamie ficaram para trás perto da caixa de correio em frente à calçada, enquanto Keri contornou ao pela da lateral da casa, mantendo-se abaixada o suficiente para evitar ser vista pela janela. Ela manteve os olhos atentos para qualquer luz, mas viu nenhuma.

Havia uma cerca de madeira nas laterais da casa, mas tinha apenas um metro e meio de altura e ela era capaz de passar por ela sem muito problema. Ela permaneceu ali em silêncio por um momento, escutando por qualquer som no interior.

Na sua experiência, se Hernandez tinha um cão, estava por volta do momento que começaria a latir. Ela escutou nada e prosseguiu com cautela pelos fundos, desabotoando seu coldre e removendo a arma.

O sol estava agora espreitando o horizonte e Keri fechou a jaqueta. A madrugada era normalmente a parte mais fria do dia e essa não era uma exceção. A temperatura estava na casa dos 4 graus e ela conseguia ver sua respiração ao avançar ao longo dos fundos da casa.

Ela estava relutante em subir na varanda de trás, já que era de madeira e ela não sabia o quanto ela poderia ranger. Ela olhou ao redor e viu uma mangueira ligada a uma torneira em uma extremidade da varanda e pegou a ponta, estendendo-a suavemente ao longo do comprimento da varanda antes de tomar uma posição do outro lado. Posicionada e certa de que Ray estava ficando impaciente, ela mandou uma mensagem dizendo que estava pronta.

Um segundo depois ela ouviu uma batida na porta da frente.

—Polícia, ela ouviu Ray dizer em sua voz mais grave. Precisamos falar com o Enrique Hernandez. Por favor, venha até a porta da frente, senhor.

Keri ouviu uma agitação no interior e então algo mais semelhante a correr precipitadamente.

—Por favor, venha até a porta, Sr. Hernandez, Ray disse novamente, mais alto e mais forte.

Keri imaginou Hernandez enfiando algum calçado e rastejando até a porta da frente, onde ele poderia espiar pelas cortinas. Vendo Ray e Jamie, ele teria três opções: abrir a porta, exigir ver um mandato ou tentar correr.

Se ele não estava com Jessica na casa ou alguma coisa a esconder, sua melhor aposta era apenas abrir a porta. Se ele não estava com Jessica, mas havia algo ilegal que queria manter oculto, ele estaria melhor exigindo o mandado.

Havia quase nenhuma circunstância em que era aconselhável fugir, a não ser manter uma garota pré-adolescente presa contra a vontade dentro de casa. Então todas as apostas estavam abertas. Keri esperou ansiosamente para ver por qual caminho as coisas iriam. Não demorou muito para saber.

Em poucos segundo, ela escutou o ruído de passos pesados em direção a ela. Um momento depois, Hernandez se atirou pela porta de trás. Era um cara pesado, especialmente pela sua altura modesta. Ele ostentava uma barriga impressionante e tufos de cabelo agarrados à cabeça quase careca. Ele usava apenas um samba-canção e uma camisa branca que era mais buraco que camisa.

Apenas de tudo isso, ele estava se movendo rapidamente. Keri mal teve tempo de dar um puxão na mangueira e prender seu pé esquerdo enquanto ele descia as escadas. Ele perdeu o equilíbrio e tombou desajeitadamente para frente, aterrissando pesadamente sobre sua barriga e escorregando o resto do caminho até parar no sopé.

Keri deu a volta rapidamente ao redor da varanda e foi vigorosamente em direção a ele, sua arma apontada diretamente para ele.

—Fique no chão, ela ordenou.

Hernandez olhou para cima, para ela e, sem hesitar, virou-se e começou a voltar a subir as escadas. Parte dela queria apenas atirar nela. Mas se ele estava escondendo Jessica em outro lugar, eles precisariam interrogá-lo. Então, em vez disso ela o perseguiu de volta para cima das escadas e na casa. Agora, eram circunstâncias exigentes e um mandado de busca poderia ser expedido.

No segundo em que ela passou pela porta, ela percebeu que estava em desvantagem, mas com sua arma. O sol estava surgindo lá fora, mas ainda estava escuro lá dentro e ela não conhecia o lugar. Ela parou onde estava, apertando os olhos na escuridão cinza do cômodo, escutando Hernandez tentando escapar.

Mas ela não ouviu qualquer coisa. Ele estava apenas a dez passos à frente dela quando ele entrou na casa, o que significava que ele tinha que estar perto, ou escondendo ou esperando para atacar.

Ela estava na cozinha. Havia uma pequena mesa em um canto à sua direita. A geladeira, fogão e forno estavam todos à sua esquerda. A cozinha tinha duas saídas além da porta de trás. Uma dava em uma grande sala de estar diretamente à frente dela. A outra, a esquerda da geladeira, levava a um corredor que ela imaginou que abrigava os quartos.

Sem chances de ele ter ido pelo corredor. Eu estava aqui antes que ele pudesse ter saído de vista.

Ela podia escutar Ray berrando do lado de fora. Ele estava ameaçando arrombar a porta. Castillo estava calada e Keri suspeitou que ela estivesse a caminho ao redor dos fundos para entrar. Ela não sabia se algum deles tinha escutado ela falar com Hernandez ou percebido que ela já estava na casa.

Ambos logo estariam dentro, mas ela não sabia o quão em breve. E se Hernandez estava armado, eles poderiam estar caminhando para uma emboscada, bem como ela temia que ela pudesse.

Certa de que Hernandez estava na grande sala a sua frente, ela se deslocou para a parede adjacente e permaneceu parada por um momento, procurando ouvir um piso rangendo, uma respiração pesada—qualquer coisa.

Ela pensou ter escutado algo como um grunhido do outro lado da parede, mas não podia ter certeza. Ao avançar para mais perto da porta aberta, ela decidiu que sua melhor opção era rolar para a sala e mirar de volta para a parede na qual ela suspeitava que ele estivesse se escorando.

Ela levou um instante para se reunir e estava prestes a mergulhar na sala de estar quando escutou um barulho atrás dela. Ela girou o corpo bem a tempo de vez Hernandez se jogando nela.


CAPÍTULO DOZE


Na fração de segundo antes de colidirem, Keri se lembrou de não reagir com exagero.

Ela viu que as mãos dele estavam vazias, então resistiu ao ímpeto de atirar. Ao invés disso, ela ergueu a arma de forma que sua bunda bateu na testa de Hernandez pulando nela. Ele bateu bem no meio, mas isso não impediu o seu momento de seguir para frente. Ele se chocou contra ela e ambos caíram na sala principal com ele por cima dela.

Ao cair, Keri deixou sua arma para que ela pudesse usar seus braços para se preparar para a queda. Felizmente, chão da sala do Hernandez tinha carpete e a maior parte do peso dele pousou na sua metade inferior assim que ela conseguiu diminuir o impacto quando ela bateu, permitindo cotovelos e antebraços levarem o peso ao invés da sua cabeça.

Sem esperar para verificar se estava contundida, Keri olhou para baixo para o homem desabado por cima da sua cintura e pernas. Ele parecia atordoado da batida na cabeça e sem fôlego da queda ao chão. Apesar de ter seus braços se agarrando a ela, Keri conseguiu liberar sua perna direita e a bateu com força no seu ombro esquerdo.

Os braços dele relaxaram imediatamente e ela conseguiu se soltar. Ela ficou de joelhos e agarrou sua arma, que repousava no carpete perigosamente perto da mão esquerda de Hernandez. Ela estava acabando de se levantar quando Ray finalmente conseguiu arrombar a porta da frente. Uns poucos segundos depois, Jamie também estava na sala, havia entrado pelo quintal.

—Você está bem? Perguntou Ray, seus olhos arregalados de preocupação.

Keri levou um segundo para ter certeza. Ela balançou os braços e fez círculos com os ombros. Sem danos. Sua parte inferior havia levado a maior parte do impacto e ela parecia ter sobrevivido a isso também.

—Estou bem, ela disse finalmente antes de olhar para Hernandez. Mas eu não estou certa sobre esse cara. E você, Enrique—esse ombro está bem? Você está com pouco de dor de cabeça?

Enrique, ainda fora de si, gemeu ininteligível.

—Eu vou algemá-lo, disse Castillo. Por que você não tira um momento de folga, Keri?

Ela estava quase, quando seu olho pegou um painel sobressaindo da parede da sala. Ela foi até lá e percebeu imediatamente como Hernandez havia conseguido saltar sobre ela. O painel era articulado como uma porta, permitindo essencialmente um caminho estreito entre aquela sala e o corredor dos quartos. Ele andou sorrateiramente através dele e deu a volta por trás dela enquanto sua atenção estava focada na sala de estar.

Ela notou algo mais sobre o painel. Era oco. Ela ligou a lanterna do telefone e iluminou através abertura. A parede inteira entre a sala de estar e o banheiro não era de gesso, mas também era oca, com um espaço de cerca de cinquenta centímetros de largura. Ela conseguiu penetrar a abertura facilmente, embora imaginasse que pudesse ser um desafio para Hernandez.

Alguém poderia estar escondido entre essas paredes?

—Achei alguma coisa, ela chamou. Logo Ray estava espiando pela abertura.

—O que você vê? Ele perguntou. É muito estreito para eu passar.

Ela considerou fazer uma piada sobre como Hernandez parecia ter sido capaz de passar, mas não achou que seria bem recebida, então ela a guardou.

—Fica mais largo à medida que eu avanço, ela disse de volta. E então, sem aviso, ela se encontrou em uma pequena sala, do tamanho de um closet, iluminada por uma pequena lâmpada no canto do chão. Mas não era a sala em si que chamou sua atenção. Era o que estava nas paredes.

Elas eram todas recobertas com dúzias de fotos do que parecia ser mulheres desavisadas em vários níveis de nudez. Algumas foram tiradas através de cortinas, outras através de vidro e ainda mais algumas através de janelas claramente abertas. Ela reconheceu Carolyn Rainey em várias. Claramente, nenhuma das mulheres estava ciente de que estavam sendo fotografadas.

Por um momento Keri teve certeza de que eles tinham o sujeito. Mas após uma inspeção mais cautelosa, seu coração começou a afundar. Ela tirou algumas fotos das paredes com o celular antes de serpentear de volta pela passagem e retornar para a sala de estar.

—O que você encontrou? Perguntou Ray esperançoso.

—Dê-me um segundo, ela disse a andou até o sofá onde Castillo havia instruído Hernandez a se sentar.

—Você o avisou dos direitos dele? Ela perguntou a policial.

Castillo assentiu. Keri olhou para homem patético a sua frente, suando profusamente apesar do frio e de estar quase sem roupas.

—Por que você acha que estamos aqui? Ela lhe perguntou.

—Pelo que eu fiz? Ele perguntou mais que afirmou. Ele tinha um sotaque forte, mas não tinha problemas em se fazer compreendido.

—E o que seria isso? Ela pressionou.

—Raptar a menina.

—Qual garota?

—Aquela da Playa; a qual a mãe tinha cabelo preto—Rainey.

—Você está confessando ter a sequestrado? Exigiu Castillo, incapaz de se controlar. Mas essa não era seu interrogatório e Keri atirou um olhar nela para lembrá-la deste fato.

—Sim. Sim. Eu levei a garota, disse Hernandez, quase inebriado.

—Onde ela está então? Perguntou Keri, estudando-o de perto.

—Não posso dizer, ele insistiu. Eu só posso dizer com algumas condições.

—E quais são as suas condições? Keri perguntou com cautela. Nada disso parecia estar certo.

—Eu quero falar com minha esposa.

—Você quer dizer sua ex-mulher, interrompeu Ray. Seu chefe falou que ela te deixou, porque você não conseguia parar de espiar as janelas de mulheres.

—Nós estamos apenas separados, insistiu Hernandez. Não é da sua conta de qualquer maneira. Se vocês quiserem ver a garota viva de novo algum dia, deixem-me falar com minha esposa. Façam-na vir me ver.

Keri acenou para Castillo ficar de olho nele e ela e Ray retiraram-se para a cozinha.

—Vale a pena tentar, disse Ray quando estavam fora de alcance.

—Isso parece ser legítimo para você? Perguntou Keri. Esse parece o tipo de cara que bolou o sequestro e toda aquela cena no parque na noite passada?

—Francamente, não, admitiu Ray. Mas as pessoas podem ser surpreendentes. Talvez isso seja uma atuação. Ou talvez ele tenha apenas tropeçado nisso. De toda forma, nós temos um cara confessando um crime. Não podemos simplesmente ignorar isso.

—Ray, eu estou noventa e cinco por cento certa de que esse cara está confessando apenas para conseguir ficar numa sala com sua ex. Ele é claramente um pervertido. E ele pode nem ser tudo isso. Mas um sequestrador de crianças—eu não vejo isso.

—O que então? O que estava naquela sala lá trás?

—Imagens—toneladas de imagens de mulheres nuas e quase nuas.

—Isso é incrível, ele disse. Digo, não incrível. Mas é uma evidência convincente, certo?

—Eu acho que não, disse Keri relutante enquanto tirava o telefone para mostrar a ele as fotos que ela tinha tirado.

—Por que não? Ele perguntou.

—Porque são todas fotos de mulheres—mulheres adultas crescidas. Eu não ficaria surpresa se não haver uma mulher abaixo de vinte e cinco no conjunto. Não é um covil lá trás. É onde ele guarda seu estoque de material amador de masturbação.

Ela entregou o telefone e Ray rolou silenciosamente pelas imagens, processando todas. Ele estava prestes a responder quando o telefone dele tocou. Ele devolveu o dela.

—É Hillman, ele disse e atendeu. Depois de escutar por cerca de vinte segundos, ele respondeu "Sim, senhor" e desligou.

—O que foi? Perguntou Keri.

—Ele disse para irmos até a casa dos Rainey. Eles acabam de receber outro pacote do FedEx.

—O que mais? Ela perguntou. Estava claro que ele estava escondendo algo.

Ray soltou um longo suspiro antes de responder.

—Em adição à outra carta, no pacote havia uma peça da roupa que Jessica estava vestindo ontem. Estava coberta de sangue.


CAPÍTULO TREZE


Keri olhou para cima para perceber que eles estavam de volta a Playa del Rey. Ela deixou Ray dirigir e entrou em algum tipo de transe no caminho até lá. Ela não estava certa sobre o que estivera pensando na viagem de quarenta e cinco minutos. Ela poderia chutar que tinha alguma coisa a ver com crianças sendo brutalizadas e pais devastados, mas não tinha qualquer memória disso.

E ainda, de alguma forma, eles estavam aqui agora. Ray não falou nada no caminho. Durante o tempo deles como parceiros, ele aprendeu que algumas vezes era melhor deixá-la sozinha para ela traçar o caminho por seus pensamentos e emoções. Ele sabia que ela normalmente saia do outro lado. Normalmente.

Houve um tempo, não muito distante, quando momentos que lembravam Keri intensamente de perder sua filha a enviariam para ataques de pânico incapacitantes. Algumas vezes ela iria hiperventilar. Outras vezes ela teria dificuldade de respirar de toda forma. Algumas poucas vezes ela perderia a força nas pernas e cairia de joelhos. Em pelo menos uma ocasião ela realmente desmaiou. Felizmente, ela estava sozinha e acordou após apenas alguns segundos.

Mas isso não acontecia em meses, não desde que ela havia tomado a decisão consciente de se recusar a deixar o medo de um resultado horrível minar sua determinação em alcançar um positivo. Ela torcia para que esse apagão estendido não fosse um sinal que sua determinação estava escorregando.

Uma vez lá, demorou 5 minutos para navegar entre todas as barreiras policiais e caminhões de TV nas ruas ao redor da casa dos Rainey. Quando eles finalmente saíram na Rindge Avenue, tiveram que estacionar a meio quarteirão de distância, por causa de todas as viaturas.

—O que Castillo fez com Hernandez? Perguntou Keri, percebendo que ela tinha ficado alheia a tudo o que aconteceu depois que Ray mencionou as roupas ensanguentadas de Jessica Rainey.

—Ela o levou para a delegacia para fichamento. Edgerton vai verificar o GPS do telefone dele. Mas, a menos que ele apareça com algo surpreendente, parece que ele não é o nosso cara. Este pacote foi expedido no FedEx do aeroporto logo após a meia-noite. E quanto mais penso nisso, mais a sua teoria sobre ele ser apenas um pervertido faz sentido.

—Sim, concordou Keri, tentando forçar sua mente de volta ao modo investigativo. Se eu tivesse que chutar, eu apostaria que ele estava seguindo Jessica até em casa apenas para dar uma olhadinha na mãe dela. Ele possuía várias fotos dela no quarto.

Eles chegaram à porta, onde mostraram seus distintivos para o policial de guarda na frente. Ele assentiu com a cabeça e abriu a porta. Estavam prestes a entrar quando Ray pôs uma mão no ombro dela.

—Eu sei que isto é difícil para você. Mas eu tenho que saber—você está pronta para ir agora? Há uma família ali que precisa de Keri Locke na capacidade máxima.

—Coloque-me no jogo, treinador. Estou pronta para isso, ela disse com muito mais convicção do que ela sentia.

Ray a analisou de perto e ela podia dizer que ele não foi completamente convencido. Mas ambos sabiam que não havia nada a se fazer sobre isso, então ele simplesmente assentiu e indicou para ela ir à frente.

Quando eles entraram na cozinha, descobriram que grande parte da equipe já estava lá. O Tenente Hillman e Manny Suarez estavam isolados em um canto, olhando para o que Keri assumiu que fosse a carta de resgate.

Os Rainey estavam sentados na mesa do café. O rosto de Carolyn estava contraído, como se ela estivesse tentando mantê-lo junto. Tim Rainey tinha o olhar vazio de um homem que usara todas as suas reservas de energia e agora não passava de uma casca. Ele tem estado em tamanha montanha emocional que Keri suspeitava que ele estivesse entorpecido a maior parte do tempo.

Edgerton e Brody estavam sentados à mesa com eles e Brody falava calmamente. Keri não conseguia ouvir o que ele estava dizendo, mas ele usava um tom que ela nunca escutara antes. Ele soava simpático, até mesmo reconfortante.

Tim Rainey os fitou por um instante, com um olhar entre vazio e hostil, então ele retornou sua atenção para Brody. Keri e Ray foram discretamente até Hillman e Suarez.

—Essa é a carta? Perguntou Ray, indicando a folha de papel dentro de um saco Ziploc em cima da bancada.

—Sim, disse Suarez, deslizando-a. Talvez você tenha mais sorte com ela do que nós. É muito confuso.

Keri e Ray observaram a carta, que era, mais uma vez, datilografada, não impressa por um computador. Era muito mais curta que a primeira, mas igualmente perturbadora.


Você não merece uma segunda chance. E ainda dou-lhe uma.

A pecadora deveria estar fertilizando o solo neste momento e ainda sim vive.

Você violou o juramento de um pai ao trazer os porcos imundos.

Estou tentado a massacrar a jovem violadora de sua lei, como se ela também fosse um porco.

Eu incluí um presentinho para você, com um toque do sangue que será derramado se você falhar comigo novamente.

Esta criatura deve ser aniquilada, seja por mim ou por você.

Forneça-me $200 000 e pode ser você.

Ligue para o número na roupa.


Keri olhou para o pequeno pedaço do que parecia ser parte de uma camisa no saco ao lado da carta. Estava encharcada de sangue exceto por uma pequena sessão, na qual um número de telefone fora escrito em tinta preta.

—O Sr. Rainey já tentou discar para o número? Keri perguntou Hillman, já sabendo a resposta.

—Imediatamente, ele respondeu. Conseguiu nada. Nem sequer tocou. Ele enviou uma mensagem também e recebeu uma mensagem de erro.

—Edgerton verificou, acrescentou Manny. Não é um número ativo. Nunca foi. É como se ele tivesse apenas inventando.

—Pelo menos, sabemos que o tecido é real, disse Hillman. A mãe o identificou como sendo de uma blusa que ela vestia para ir à escola ontem. Vai levar um tempo até checar o DNA, mas o tipo sanguíneo bate.

—Não entendo, disse Ray. Ele dá um número falso e a sua carta não inclui qualquer instrução de entrega? Como os Rainey vão saber onde e quando entregar o dinheiro?

Eles todos ficaram em silêncio por um momento antes que Keri finalmente falasse.

—Eles não vão, ela disse. Eu sei que nenhum de vocês compra minha teoria, mas eu não acho que esse cara se importa com o dinheiro. Eu acho que ele só quer torturar essas pessoas.

—Mas por que sequer mencionar o dinheiro então? Perguntou Manny.

—Para dar-lhes falsas esperanças, ela respondeu. Um sequestrador que realmente quisesse o dinheiro teria sido muito claro sobre onde levá-lo. Ele não teria dado um número de telefone inválido. Isso é inteiramente sobre outra coisa.

—O quê? Perguntou Hillman, parecendo disposto a ser convencido.

—Eu não tenho ideia, ela admitiu.

—Então para o quê você serve? Uma voz exigiu por detrás dela.

Keri girou para ver Tim Rainey a encarando, com veneno em seus olhos.

—Desculpe? Ela disse dividida entre confusão e ressentimento.

—Você não tem ideia, ele disse repetindo as palavras dela. Mas você deveria ser o detetive gênio que sempre encontra a criança desaparecida. Já te vi no noticiário. Você é um verdadeiro herói.

—Tim, pare, sua esposa interrompeu, colocando a mão sobre a dele. Mas ele a sacudiu com raiva e continuou, agora gritando com tudo para Keri.

—Não! Ela é a detetive superstar, sempre os traz de volta a salvo, exceto quando se trata de encontrar minha filha—ou a sua própria!

Um silêncio encheu a sala. Keri sentiu lágrimas começarem a se formar no fundo dos seus olhos, mas piscou com força para força-las de volta. Ela sentiu Ray faz um movimento imperceptível na direção dela, como se para protegê-la de alguma forma das palavras cortantes de Rainey.

—Papai? Uma pequena e assustada voz disse de um canto do cômodo.

Todos se viraram para ver o pequeno Nate Rainey no portal da cozinha. Ele estava vestindo pijamas de futebol e segurando seu ursinho Pooh pendurado pelo braço. Seus cabelos castanhos amontoados em um lado, onde deve ter sido pressionado contra o travesseiro durante a noite. Ele estava tremendo.

—Está tudo bem, Natey, disse seu pai, ficando de pé imediatamente, precipitando-se para o filho e o recolhendo em seus braços. Ele o carregou para fora do cômodo sem outra palavra e eles podiam ouvir seus passos nas escadas enquanto ele levava o menino de volta para o quarto.

Com eles partindo, a sala retornou ao silêncio. Keri podia sentir todos os olhos nela.

—Sinto muito, disse Carolyn Rainey, sua voz angustiada. Ele não quis dizer isso. Ele está tão no limite.

—Tudo bem, disse Keri rapidamente tentando fazer as coisas voltarem ao normal. Mas não estavam bem. Nem perto.


*


Jessica acordou em um sobressalto.

Apesar de sua posição estranha, sentando com as costas contra o poste de metal e os braços algemados atrás dele, ela conseguiu pegar no sono. Mas agora havia um barulho alto ressoando do outro lado da porta de metal, como se alguém estivesse deslizando uma barra por ela. Então houve outro estrondo, como se outra tranca tivesse sido aberta.

Após um momento, a porta se abriu lentamente, iluminando um raio de luz na sala que, fora isso, estava quase completamente escura. Jessica tentou piscar o sono dos seus olhos. Ela percebeu que estava prendendo a respiração e se lembrou de inspirar.

—Quem é? Ela tentou gritar. Sua voz saiu como um coaxar rouco. Não houve resposta.

Um segundo depois alguém entrou pela porta. Era impossível ver qualquer coisa a não ser uma figura em silhueta. A pessoa estava segurando alguma coisa e com a porta mais aberta, ela percebeu que era uma pequena escada.

A pessoa passou silenciosamente por ela, colocou a escada no chão e ficou sobre a mesma. Então Jessica percebeu o que ele estava fazendo—substituindo a lâmpada queimada. Depois de alguns segundos estava rosqueada e a luz inundou a sala Jessica desviou o olhar e fechou os olhos, abrindo-os lentamente para deixá-los se ajustarem.

—Por favor, deixe-me ir, ela implorou. A pessoa disse nada.

Ela podia ouvi-lo descer, dobrar a escada e sair da sala. Quando ela conseguiu realmente enxergar novamente, ela havia saído. Ela olhou no canto onde o esqueleto repousava e percebeu que o quarto não era muito mais brilhante. Ainda era difícil definir a forma. Só tinha parecido mais brilhante no início, porque ela estivera na escuridão por muito tempo.

A figura sombria retornou para o cômodo e ela deu uma boa olhada nela pela primeira vez. Baseada no porte era um homem. Ele tinha cerca de um metro e oitenta e cerca de 80 quilos. Ele vestia jeans e uma camisa de trabalho com mangas compridas e cor cáqui. Ele estava segurando algum tipo de balde.

Mas todos esses detalhes despencaram quando ela se permitiu olhar o rosto dele—ou pelo menos tentou. Ele estava usando um chapéu circular, quase semelhante a um chapéu de safari. Mas pendurando da borda, havia algum tipo de rede colorida que tornava quase impossível ver seus traços. Depois de um segundo ela entendeu o que era—uma máscara de apicultor. Não tinha certeza do porquê, mas a descoberta fez sua espinha gelar.

Ela olhou rapidamente para o balde em suas mãos, imaginando se havia alguma colmeia dentro dele. Mas quando ele colocou o balde ao lado dela, ela viu que estava cheio com algum tipo de guisado. Ele pegou algo do seu bolso de trás e Jessica se retorceu em uma antecipação de medo. Mas era apenas uma garrafa plástica de água. Ele desenroscou a tampa e colocou a garrafa ao lado do balde.

Ele se moveu para trás dela a ela perdeu o perdeu de vista, sem saber o que ele estava fazendo. Sem falar, ele começou a ajustar as algemas dela. Por um momento ficou claro o que ele havia feito. A mão esquerda dela ainda estava presa ao poste, mas sua mão direita agora estava solta e aparentemente livre para beber e dar uma colherada no guisado do balde próximo.

Ela alcançou a garrafa, ignorando a mistura de dor e dormência que o movimento causou, e imediatamente começou a beber. Uma parte desceu pelo cano errado e ela tossiu por um instante, arquejando para recobrar o fôlego.

Uma vez que havia terminado com a garrafa toda, ela voltou sua atenção para o balde. Mergulhando o dedo na mistura, ela descobriu que o guisado tinha sido aquecido, mas não tão quente que ela não pudesse fazer uma concha com a mão e comer. Ela mirou o homem acima, que estava a encarando abaixo silenciosamente.

—Por que você está fazendo isto? Ela perguntou.

Ele continuou a olhar, falando nada. Ela queria olhá-lo de cima para fingir que não estava com medo. Mas qual era o ponto? Ela não poderia ver seu rosto. Ela não tinha ideia de como era a expressão dele. E o estômago dela estava roncando. Eventualmente ela desistiu e puxou o balde para próximo de si.

O gosto era fraco, mas não condenável. Ela pensou ter identificado batatas, cenouras e talvez até carne moída. Ela não sabia que horas eram ou quanto tempo se passara desde que ela comeu pela última vez, mas ela estava terrivelmente com fome e foi preciso tudo que tinha para se impedir que enfiar montes da comida pegajosa pela boca.

O homem se retirou do cômodo, deixando a porta parcialmente aberta e se foi por vários minutos. Ela sabia que ele havia retornado, porque ela escutou algum tipo de murmúrio no corredor. No início, não conseguia nem identificá-lo como um idioma, mas quando ele se aproximou ela conseguiu definir algumas palavras, como "pecado", "punição" e "redentor".

Quando se aproximou, ela conseguiu reconhecer sentenças completas. Mas sua voz baixa crescente era difícil de entender e as palavras não pareciam fazer qualquer sentido.

—Purificar o corpo, purificar a alma. Até o solo, até que se torne vermelho. Servir ao redentor, trazendo a luz de sua vingança em plena flor. O obsceno fora maculado. O maculado deve voltar a terra.

Ela podia vê-lo agora. Ela estava voltando para o quarto, arrastando algo pesado atrás dele. Quando ficou visível, Jessica notou que era um grande saco de estopa, provavelmente do mesmo material que foi usado para fazer o vestido que ela usava.

Ele arrastou o saco até o canto do quarto próximo ao esqueleto. E então, sem cerimônia e sem qualquer palavra, ele levantou o saco pelo fundo. Algo caiu com um baque ao lado do esqueleto antes de rolar alguns centímetros na direção de Jessica.

Mesmo com a luz parca, ela viu o que era—uma garota de cerca da mesma idade que ela, talvez um pouco mais velha. Ela vestia uma saia preta curta e um tomara que caia rosa. Sua face estava pesadamente maquiada, mas claramente ela estivera chorando, já que a maquiagem escorreu pelas bochechas, fazendo-a parecer algum tipo de palhaço triste.

Não foi até que o homem na máscara de apicultor fez o sinal da cruz que Jessica compreendeu completamente o fato de que a garota não estava apenas inconsciente—ela estava morta.

De repente, o estômago dela se retorceu com força e ela sentiu o guisado subir pela boca. Ela tentou alcançar o balde, mas não o segurou a tempo. Vômito foi expelido por todo lado, incluindo sobre toda ela. Quando havia terminado, ela tentou gritar, mas saiu apenas um pequeno rangido.

O homem olhou brevemente para ela. Mesmo que ela não pudesse ver a expressão dele, ela podia dizer que ele estava enojado com ela. Ele saiu do cômodo, deixando-a encarando o corpo frio e sem vida da adolescente a três metros dela. Jessica viu que os lábios dela estavam azuis e a pele branca como giz. Como ela não reparou que a garota estava morta imediatamente?

O homem retornou ela viu que ele segurava uma mangueira. Mesmo que ela soubesse o que estava vindo, Jessica não pode deixar de recuar quando o jato de água gelada atingiu seu corpo. Ele a acertou com força total e a picada do jato de água gelada arrancou-lhe fôlego. Depois que ela estava encharcada, o homem lavou o vômito, que foi principalmente para o ralo a alguns metros dela.

O apicultor finalmente desligou a água e saiu, batendo a porta atrás dele. Jessica escutou múltiplas trancas se fecharem e o som dos passos dele vagueando pelo corredor. Mesmo depois que ela soube que ele se fora, ela permaneceu ali, muito apavorada para falar, tremendo silenciosamente enquanto a água pingava do seu ensopado vestido caseiro de pano de saco.


CAPÍTULO QUATORZE


Keri vasculhou a lista em sua mesa pelo que parecia ser a centésima vez. Ela sentia a frustração crescer no peito e antes que pudesse se controlar, pegou sua caneca de café e a arremessou contra um arquivo próximo. A caneca estilhaçou, enviando dúzias de pedaços de cerâmica por todo o chão da área de discussões.

—Sinto muito, ela disse para ninguém em particular, mesmo que ela não sentisse. Eram 8 da manhã e ela havia se debruçado sobre a lista de estupradores locais com zero sucesso.

—Não se preocupe sobre isso, disse Ray e sinalizou para Roger Gentry, o policial da noite passada que fora repreendido por Hillman por usar nomes específicos dos lugares pelo rádio na noite passada durante a entrega.

—Sim, Detetive? Gentry disse, animado por ser notado.

—Sim, Gentry. Eu tenho um importante trabalho para você. Ache uma vassoura e uma pá e limpe essa bagunça.

—Sim, Detetive, disse Gentry, o entusiasmo sumido de sua voz.

—Você está golpeando parede de tijolos também? Ray perguntou simpaticamente para Keri.

—Sim. Eu já olhei todos os zeladores e motoristas de ônibus que a escola tinha contrato. Nenhum único acerto. Quero dizer, isso é bom quanto à segurança dos alunos. Mas não nos ajuda muito. E revisar esses arquivos dos agressores sexuais parece perda de tempo. Se esse cara foi preso antes, nós saberíamos sobre isso. Ele não é do tipo que consegue esconder sua loucura embaixo de um arbusto.

—Keri, olhe ao redor, disse Ray. Todos ou outros foram para casa para um cochilo. A única razão de você ainda estar aqui é por causa do que Tim Rainey disse. Você sente que tirar um intervalo seria falhar com a Jessica.

—Meio que o seria, Ray.

—Não, ele respondeu. Correr em círculos quando você está muito exausta para pensar é falhar com ela. Tirar algumas horas de sono para que você possa voltar renovada para isso pode dar a ela uma chance melhor na verdade. Por favor, vá para casa, nem que seja só por um tempo. Deite-se na sua cama. Se dê um tempo de descanso. Eu até te levo até em casa.

Keri empurrou a cadeira para trás e respirou fundo.

Ele está certo. Eu não benefício para Jessica nesse estado. Eu preciso ficar longe um pouco, tomar uma nova perspectiva.

—Justo, ela disse. Eu vou me afastar por um instante. Obrigada pela oferta de carona, mas eu acho que estou bem. Eu meio que preciso ficar sozinha de qualquer jeito.

Ela se levantou, pegou sua bolsa e começou a ir para a saída.

—Keri... disse Ray.

Ela se virou para olhar para ele e podia perceber que ele estava lutando com o que tinha a dizer. Então, sua expressão mudou e ela sabia que ele decidira não seguir com seu pensamento original.

—Apenas se dê um tempo, ok? Ele implorou.

—Ok, ela disse, muito cansada para discutir, mesmo que ela não pensasse que merecia uma pausa. Eu te vejo em algumas horas.

Ela saiu da delegacia e entrou no carro. Sentiu as pálpebras ficando pesadas e se preocupou que pudesse cair no sono ali mesmo. Ao invés disso, pegou o celular e ligou para alguém que ela gostaria de ligar a horas.

—Margaret Merrywether falando.

Keri sorriu para o familiar sotaque sulista da sua boa amiga.

—Mags, ela disse. É a Keri. Eu estou prestes a fazer algo incrivelmente estúpido e preciso da sua ajuda.

—Quando e onde, querida? Perguntou Mags sem hesitação.

—Eu preciso que você me ajude a entrar em contato com o Viúvo Negro, ela disse, fazendo referência ao assassino por encomenda que havia matado o homem que aprisionou Evie e a levou para um destino desconhecido.

Mags não respondeu na hora e Keri sabia que ela estava determinando como calibrar sua resposta da melhor maneira.

—Você sabe que eu tentei isso, querida, Mags disse solidariamente. Ele nunca respondeu. O que faz você achar que ele irá agora?

—Porque eu acho que ele usa uma senha para ter certeza de que todos com quem ele interage sejam adequados. Você não tinha a senha, então ele te rejeitou. Mas eu acho que sei qual é.

—Qual?

—Mato, disse Keri. Eu acho que ela vai fazer uma pergunta e a resposta vai envolver a palavra 'mato'.

—Como você descobriu isso? Perguntou Mags, sua curiosidade borbulhando.

—Melhor não entrar nisso, para seu próprio bem. Mas eu estou apostando que, se ele me responder, eu não vou ter muito prazo.

—Prazo para fazer o que?

—Resgatar Evie.

Mais uma vez, houve um silêncio do outro lado da linha. Finalmente, Mags respondeu.

—Querida, você sabe que eu te adoro. E eu nunca subestimaria você. Eu vi do que você é capaz. Você é como uma heroína para mim. Mas você tem certeza que é aconselhável ir por esse caminho? Você está falando sobre capturar um assassino de verdade. E mesmo que você chame a atenção dele e ele não te mate, não há garantia que ele vai levá-la até sua filha.

—Eu sei disso, Mags. Mas tenho que tentar.

—Você tem? Perguntou Mags, consternada. Você soa bêbada ou exausta. Eu não estou te julgando, mas de toda forma, você pode não estar na melhor condição para ser páreo com esse Viúvo Negro.

—Talvez, mas não estou sozinha, disse Keri. Pelo contrário, eu vou ter a melhor jornalista investigativa da costa oeste comigo—Mary Brady.

—Shh. Não diga isso em voz alta, sussurrou Mags. Mary Brady era o pseudônimo sob o qual ela escrevia uma coluna para o jornal alternativo Weekly L.A. A identidade real de Mary Brady era um segredo bem guardado, destinado a proteger Mags contra qualquer retaliação dos frequentemente perigosos alvos de suas colunas.

—Desculpe-me, Keri pediu desculpas. Eu sou um pouco incisiva. Estou no meio de um caso árduo e eu não dormi a noite inteira. Mas nós atingimos um beco sem saída agora e essa pode ser minha única janela para verificar essa coisa. Então, você vai me ajudar? Por favor?

Ela sabia que Mags tinha um ponto fraco por ela. Isso, junto com a excitação por ajudar em um caso, era demais para ela. Só levou um segundo para ela escavar.

—Ah, está bem, ela disse, tentando soar convencida. Como fazemos isso?

—Dê-me a identificação da Craiglist que você tem para esse cara, disse Keri. Eu vou mandar uma mensagem para ele.

—Mas se ele rastrear e descobrir quem você é?

—Eu sempre tenho alguns celulares descartáveis por perto, disse Keri, abrindo o porta luvas para pegar um. Eu vou usar um desses.

—Você ao menos tem um identificador da Craiglist, Keri?

—Eu criei um no dia que você me disse como ele opera, ela admitiu.

—O que acontece se ele responder?

—Quando ele o fizer, nós mandamos um cara que eu conheço para o encontro, disse Keri. Ela já prometeu me ajudar se eu precisasse da ajuda dele algum dia.

—Quem é?

—Meu instrutor de Krav Maga—o nome dele é Uriel.

—Você vai colocar um civil em risco? Perguntou Mags. Ela soava genuinamente horrorizada.

—Não, claro que não. Uriel consegue cuidar de si mesmo. Além disso, tudo o que ele tem que fazer é aparecer. Eu nem vou pedir a ele para se encontrar com o Viúvo Negro. Como eu disse, eu só quero Evie. E eu acho que eu sei como encontrá-la.

—Então, por que seu cara tem que saber Krav Maga? Perguntou Mags desconfiada.

—No caso de as coisas derem errado, eu quero que meu bode expiatório seja capaz de se proteger. É só uma precaução.

—Querida, eu estou um pouco incomodada que seu termo para esse cara seja 'bode expiatório'.

—Mags, só me dê o identificador. Eu sei o que eu estou fazendo.

Mags finalmente consentiu. Keri enviou sua mensagem. Nela se lia:

Procurando por uma conexão. Ouvi que você pode ajudar.

—Quanto tempo levou para ele responder de novo? Ela perguntou,

—Não me lembro, disse Mags. Mas foi rápido. Ele deve receber alertas quando alguém envia mensagens para o identificador dele.

Como se a respondesse, uma mensagem chegou em segundos.

Envie-me um e-mail por aqui.

A mensagem seguia com um endereço de e-mail. Keri tinha criado uma conta de e-mail anônima para esse propósito e enviou-lhe um e-mail imediatamente. Ela o manteve curto e doce.

Como você solicitou.

Dessa vez a resposta levou alguns minutos.

Qual é a verdade hoje?

Como ela esperava, era o teste da senha. Aqui foi onde Mags havia sido travada. Ela não estava ciente disso e não importa o quão convincente ela fosse, ele não iria responder a não ser que ela possuísse a senha.

Keri digitou a resposta, mas delongou-se antes de enviá-la.

—Como está indo por aí? Perguntou Mags apreensivamente pelo telefone.

—Ok. Eu estou prestes a enviar a senha e eu estou preocupada que se eu estragar isso e estiver errada sobre isso, eu tenha perdido minha conexão restante com Evie.

—Você só está se preocupando com isso agora? Perguntou Mags incrédula. Eu estive preocupada com isso do segundo que você sugeriu essa ideia.

—Sim, bem, eu acho que é muito tarde para mudar de ideia, Keri disse e apertou enviar. No seu recado lia:

A verdade pode ser encontrada nas ervas.

Ela permaneceu no banco do motorista do seu carro frio pelo que sentiu ser uma eternidade. Na verdade, foram apenas vinte segundos. Uma nova resposta apareceu na tela.

Como posso ajudar?

Keri deu um suspiro de alívio. Mags escutou.

—O que foi? Ela perguntou ansiosa. Você tem que me contar o que está acontecendo, Keri!

—Desculpa. Funcionou. Estou dentro.

Keri vinha planejando sua resposta para essa perguntou por semanas e não precisava de tempo para pensar sobre ela.

Procurando por companhia, mas meus gostos são arriscados. Ouvi dizer que você pode ajudar.

Ela leu a mensagem em voz alta para Mags antes de pressionar enviar.

—O que você está fazendo? Ela perguntou.

—Você vai ver. Ou vai funcionar ou não.

Uma resposta veio do Viúvo Negro.

Prossiga.

Keri o fez.

A filha da detetive, do noticiário. Eu gostaria de estar com ela. Ouvi que você poderia me apontar a direção certa.

Ela estava entrando em um território perigoso agora. Era possível que o cara decidisse que toda essa conversa não valia o risco e apenas se afastasse. Uma nova mensagem surgiu.

Onde você escutou isso?

Agora era hora de assumir o maior risco até então. Sem tirar tempo para pensar demais, ela digitou sua mensagem, lendo em voz alta para Mags apenas depois que já havia a enviado, por medo que sua amiga tentasse convencê-la a desistir.

Um sócio do Cave me disse. Disse que o chefe quer mantê-la sob sigilo. Mas por uma taxa de indicação, ele abriu a boca. Eu paguei. Posso fazer o mesmo por você.

—Você é louca? Perguntou agressivamente Mags, depois de saber o que Keri havia escrito. Ele vai correr para as montanhas. Ou pior, ele vai entrar diretamente em contato com Cave para alertá-lo.

—Então eu não estou pior do que estava antes, disse Keri, com aço na voz. Ele pode fazer uma dessas coisas. Mas eu acho que não. Esse cara pode ser um assassino de sangue frio. Mas eu não acho que ele é um ideólogo e não acho que lealdade é uma prioridade para ele também.

—O que você quer dizer? Perguntou Mags.

—Ele é um facilitador e homem de negócios. Ele fez um trabalho para o Cave—ele pegou minha filha e matou o homem que a detinha. Mas eu duvido que alguma vez ele prometeu manter a localização dele sob sigilo. Se ele pode receber duas vezes pela mesma garota, por que não?

—Talvez porque Cave possa ir atrás dele? Sugeriu Mags. Era um bom ponto. Mas era um ponto que Keri já havia considerado.

—Eu não acho que Cave saiba quem é o Viúvo Negro mais do que eu sei. Esse cara opera nas sombras e não é vantagem para ele deixar qualquer cliente saber sua identidade. Isso o permite a liberdade de fazer esse tipo de transação sem temer as consequências.

Mags não tinha uma resposta para isso. Keri sabia no que ela estava pensando. Como alguém que usou uma identidade secreta para no próprio trabalho dela, manter tantas pessoas quanto possível no escuro era uma sábia decisão.

—Keri, disse Mags depois de um momento, você reconsiderou apenas perseguir isso pelo departamento? Com todos os recursos dele, não seria o melhor caminho para frente?

—Eu tentei. Isso é um beco sem saída. Eu posso provar que Cave está metido em algo nojento, mas não sem revelar como eu obtive essa informação. E eu não obtive de forma... completamente legal. Para ser honesta, eu nem me importo mais sobre isso. Se eu mesma ir para a cadeia é o preço para salvar Evie, vale a pena pagar.

—Então qual é o problema? Perguntou Mags.

—Provar que ele é sujo ou mesmo um criminoso não é suficiente. Eu preciso de algum tipo de evidência de que ele está conectado com o caso de Evie para o LAPD grampear os telefones dele ou fazer outra vigilância. Eu acredito que ele está envolvido. Eu sei nas minhas entranhas. Mas eu não posso provar. E o departamento não vai atrás de um advogado tão poderoso como Cave baseado em meus instintos. Esse é o motivo pelo qual eu estava esperando contratar meu próprio detetive particular para segui-lo.

—Você acha que ele possa pegar Cave indo ver Evie?

—Sem chance, disse Keri. Cave nunca faria isso. Além disso, eu duvido seriamente que ele saiba exatamente onde ela está. Se eu achasse que ele soubesse, eu sairia da força agora e o seguiria dia e noite. Mas ele é muito esperto para isso. Ele sabe como se isolar. Ele pode conhecer um cara que conhece um cara que sabe onde ela está. Mas ela não gostaria de muitos detalhes para si mesmo. Esse cara conhece todos os truques.

Ambas ficaram quietas por um momento. Keri podia dizer que sua amiga estava remoendo toda a magnitude da situação.

—O Viúvo Negro respondeu? Ela finalmente perguntou.

—Ainda não, disse Keri.

—Eu acho que ele está correndo para as montanhas.

—Margaret Merrywether— eu vim até você pela sua sofisticada sagacidade do Sul, não por dúvidas e recriminações. Vamos ser positivas. Talvez ele esteja apenas verificando onde ela está.

—Eu preciso de um uísque, Mags murmurou, mas fora isso manteve silêncio.

Uma nova mensagem surgiu.

Envie $10 000 para essa conta agora. Quando eu tiver o dinheiro, vou fornecer um endereço.

Ela leu a mensagem para Mags enquanto respondia.

Fazendo isso agora.

—Você tem dez mil apenas esperando para uma situação desse tipo? Perguntou Mags.

—Eu vendi minha casa flutuante alguns meses atrás. Eu ia usar o dinheiro para contratar aquele detetive particular que mencionei. Mas isso parece um uso mais efetivo dos meus recursos.

Ela enviou o dinheiro da sua conta anônima do Paypal para a dele.

—E se ele fugir com seu dinheiro e não te dar a informação?

—Isso seria um erro. Ninguém conhece esse cara. Ele não pode usar o charme dele para conquistar clientes em potencial. Tudo que ele tem para trabalhar é a reputação. Ele é conhecido por fazer o trabalho que ele é pago para fazer. Esse é um trabalho, talvez o mais fácil que ele já teve. Mas ainda é um trabalho. Ele não pode se permitir renegar. É ruim para os negócios.

Trinta segundos depois, seu palpite foi confirmado quando uma nova mensagem surgiu.

6050 Randolph Street, Commerce. Última localização conhecida de dois dias atrás. Não posso prometer que ela ainda esteja lá. Boa sorte e aproveite.

Keri digitou um rápido "obrigada" antes de voltar para o seu celular normal e inserir o endereço em um mapa.

—Onde fica isso? Perguntou Mags.

—É um armazém ao sul da cidade, não muito longe do LA River, disse Keri, esvaziando sua voz.

—O que foi de errado? Perguntou Mags. Você acha que ele estava mentindo?

—Não. Acho que ele dizia a verdade.

—Então qual é o problema? Perguntou Mags perplexa.

—A última vez que eu vi um armazém como esse, isolado em uma área industrial, estava sendo usado como local temporário para um bordel.

—Isso não te surpreende, né?! Perguntou Mags confusa.

—Não. Eu sempre temi que Evie estivesse sendo forçada em prostituição. Mas eu também pude me deixar imaginar que ela talvez tivesse sido sortuda o suficiente para evitar isso de alguma forma. Se ela está nesse lugar, então eu nem penso mais em voltar atrás.


CAPÍTULO QUINZE


Uma hora depois, às 9:30 da manhã, Keri e Mags, que insistiu em se juntar a ela, estavam sentadas no estacionamento de uma empresa de lavagem a seco do outro lado da rua do armazém. As coisas fizeram sentido surpreendentemente rápido.

Keri não queria que Mags viesse, mas viu em primeira mão o quão implacável sua amiga deveria ser como repórter investigativa quando tentou defender sua posição.

—Isso pode não ser seguro, dissera Keri. E eu não consigo estar focada em encontrar Evie e preocupar com você ao mesmo tempo.

—Você não tem que se preocupar comigo, Mags a assegurou. Eu vou ficar no carro o tempo todo. Fora isso, você está metade em coma no momento. Estou preocupada que você caia no sono no volante. Deixe-me dirigir você até lá e você pode cochilar no caminho.

—Estou cansada, admitiu Keri. Mas eu ainda acho que não seja uma boa ideia. Quem sabe o que pode acontecer?

—Escute, Mags a respondera em um tom duro que Keri não estava acostumada a ouvir, você já me disse o endereço do armazém. Então eu estou indo, de uma forma ou de outra. Esse prostíbulo móvel parece uma história que eu deveria estar cobrindo. Eu não vou apenas ignorá-la. Eu posso te encontrar por lá ou nós podemos ir juntas e eu posso ser sua motorista enquanto você tirar alguns minutos de descanso.

—Tudo bem, Keri tinha resmungou relutantemente.

Como se verificou, ela não dormiu nem um pouco no caminho até lá, mas era agradável ter companhia e dar uma pequena pausa para seu cérebro. E como as coisas se encaminharam, a pausa foi muito curta.

Uriel, seu instrutor de Krav Maga, cancelou a aula de iniciantes das 9 horas para ajudá-la sem hesitação. Ele dirigiu até lá separadamente e ela explicou o plano para ele no caminho.

Ela disse a ele para não tentar ser um herói. Era apenas para ele fingir que está procurando por Evie, para que ele pudesse passar um "tempo de qualidade" com ela. Keri o daria $5 000, também da sua casa flutuante. Se Evie não estivesse ali, ele deveria apenas partir.

Eles poderiam oferecer outra garota a ele. Se eles o fizessem, ele deveria recusar e dizer que ele tinha seu coração em Evie, dar um dos números dos celulares descartáveis de Keri e pedir a eles para entrarem em contato se ela ficasse disponível mais tarde. Se Evie estivesse lá, ele deveria dizer que perdeu o ânimo e que não poderia seguir. Se eles colocassem obstáculos ou demandassem pagamento pelo incômodo, ele deveria apenas pagá-los, sair e voltar para ela.

Uriel encostou às 9:35, estacionou na rua em frente ao armazém e saiu. Ele viu Keri do outro lado da rua e acenou para ela quase imperceptivelmente com a cabeça antes de se dirigir para o armazém.

Uriel Magrev tinha um metro e oitenta e cinco e 86 quilos de puro músculo, os quais seu suéter justo normalmente destacava. A sua pele com o bronzeado escuro de Israel era da mesma cor que seu cabelo castanho. Ao andar para longe delas, Mags deixou escapar um assovio baixo.

—Você tem certeza que ele é apenas seu instrutor de Krav Maga? Ela perguntou. Porque parece que ele poderia dar instrução em várias outras atividades.

—Não me faça eu me arrepender de deixar você vir, disse Keri. A única razão pela qual o fiz é porque você ofereceu para dirigir. Eu estou tão cansada que mal consigo ficar de pé.

—Como uma jornalista, Mags disse, suas sobrancelhas levantadas, eu tenho que lhe dizer que eu reparei você evadir minha pergunta.

—Não, Mags, Keri disse, não tão irritada quando ela disse. Ele é meu instrutor e meu amigo. Mas nada mais.

—Certo. Você só tem olhos para seu parceiro. Como está indo?

—Uma história para outra hora, disse Keri.

—É justo, disse Mags. Keri podia dizer que ela estava deixando essa passar mesmo se que ela sentisse que havia mais para discutir. Mas se você não está interessada em Uriel, e se ele sobreviver ao armazém, você se importa se eu me apresentar para ele?

—Você não acha inapropriado perguntar isso quando minha filha pode estar dentro daquele bordel?

—Querida, por que acha que estou fazendo tudo isso? É para tirar sua cabeça do que possa estar acontecendo aí. Eu te conheço bem o suficiente para saber que você ficaria obcecada com isso todo segundo se eu não te distraísse. Ou ela está lá dentro ou não está e nós vamos descobrir em alguns minutos. Então, enquanto isso, seu instrutor está disponível?

Keri sorriu apesar de si. Era verdade. Se Mags não estivesse sentada com ela agora, toda agitada com Uriel, ela provavelmente estaria perdendo a cabeça com ansiedade. Ela decidiu seguir a brincadeira e relaxar até que ela tivesse motivos para ficar tensa.

—Eu acho que ele é solteiro, disse Keri, e tentando não soar invejosa, mas falhando, adicionou E eu suspeito que ele ficaria na sua também, com esse cabelo ruivo flamejante e essa pele de porcelana e essas pernas que não envelhecem.

—Que agradável você dizer isso, Mags disse, piscando os olhos divertidamente. Talvez eu o chame para sair se ele voltar daquele armazém intacto.

—Ele vai ficar bem, garantiu-lhe Keri. Uriel esteve na Shayetet 13 por seis anos antes de vir para cá.

—O que é isso?

—São as Forças Especiais de Israel—tipo a versão deles dos SEALS da Marinha. Provavelmente, ele poderia matar todos naquele lugar com as próprias mãos se ele quisesse.

—Meu Deus, Mags ronronou, se abanando ostensivamente.

Keri não disse, mas a verdade era que enquanto ela não tinha dúvidas que Uriel pudesse cuidar se si, ela estava preocupada. Apesar do seu charme e atitude tranquila, Keri sentia que ele havia passado por muita coisa na vida prévia. Ele nunca falava disso, mas ela podia dizer que ele estava reprimindo algum tipo de sofrimento secreto.

Ela suspeitava que não precisasse muito para os seus antigos instintos voltarem à tona. Se ele visse Evie, ela temia que ele pudesse ignorar as instruções dela e tentar tomar alguma medida. E não importa o quão bom ele fosse com as mãos, era preciso apenas uma bala para igualar as chances.

Felizmente, ele saiu do armazém depois de cinco minutos, parecendo incólume. Ao andar para seu carro, ele indicou casualmente para Keri ir até ele.

—Fique aqui, disse Keri a Mags enquanto saia do carro.

—Mas e sobre a apresentação?

—Não é hora disso, Mags.

Ela pensou ter escutado um resmungo ao correr pela rua, mas não ligou.

—Como foi? Ela perguntou, embora pudesse ver pela expressão dele que ele saiu de mãos vazias. Parte dela estava aliviada.

—Desculpe-me. Eu não vi Evie, ele disse com seu inglês fortemente acentuado, mas meticuloso. Eu sei que você está desapontada por ela não estar ali. Mas talvez seja melhor que ela não esteja. Há outras garotas ali, no momento algumas sendo... usadas. Foi difícil ver aquilo e não fazer nada.

—Eu sei que você queria ajudá-las, disse Keri. Mas na verdade poderia tê-las colocado em um perigo maior. Obrigada pelo apoio. Os cafetões disseram alguma coisa sobre ela?

—Eles disseram que eles não sabiam sobre quem eu estava falando. Mas eu pude perceber que eles estavam mentindo. E eu achei ter visto a cabeça de uma das garotas levantar quando eu a mencionei. Definitivamente, ela esteve lá em algum momento, provavelmente foi recente. E não parece que eles se estabeleceram ali há muito tempo.

—Alguma coisa a mais que eu precise saber? Perguntou Keri.

—Sim, se você decidir ter uma conversa com eles, eu iria focar no cara com suéter branco com boné dos Lakers para trás. Claramente, ele estava no comando e ele foi o que negou demais que ela estivera ali em algum momento. E mais uma coisa.

—Sim?

—Há seis homens no total. Todos eles têm cassetetes. Visivelmente eles têm usado isso para manter as garotas na linha. Mas apenas dois deles tem armas—ambas pistolas. O cara do boné do Lakers coloca a dele na cintura nas costas e o cara gordo com uma blusa cinza e um casaco de couro usa a dele em um coldre de ombro. Eu senti que eles não confiam nos outros caras para as carregarem—ou muito jovens ou muito voláteis.

—Uau, as habilidades nunca largam você, largam? Ela disse impressionada.

—Algumas vezes eu gostaria que elas largassem, Keri. Por que você acha que eu ensino mulheres do lado oeste em vez de fazer segurança? Eu estou terminado com aquela vida.

—Então não há como eu convencer você a aplicar para a academia de polícia e entrar para o LAPD? Nós poderíamos usar você.

—Estou bem, obrigado, ele disse sorrindo.

—A propósito, esse é o principal motivo para você ensinar mulheres do lado oeste? Achei que você apenas gostasse da companhia.

—Bem, há isso também. Falando nisso, talvez você possa trazer sua amiga ruiva que eu vi mais cedo para a próxima aula. Ela parece picante.

—Você não faz ideia, disse Keri, virando para o seu carro e entendendo porque Uriel disse mais cedo. Mags não estava por lá. Para onde ela foi?

—Talvez ela tenha ido ao banheiro, sugeriu Uriel. Ou talvez ela seja apenas tímida.

Keri estava prestes a desiludi-lo dessa noção quando viu o sorriso largo no rosto dele e percebeu que ele já tinha entendido que ela não era.

—Obrigada, Uriel. Você deve ir agora, antes de se meter em algum problema de verdade.

—Vejo você na aula semana que vem, ele disse. Então, ele devolveu os $5 000, deu-lhe um beijo na bochecha, pulou no carro e arrancou.

Keri retornou pela rua e empurrou a porta da frente da empresa de lavagem a seco. Estava trancada. Ela bateu com força e esperou. Sem resposta. Ela perambulou pelos fundos para ver se havia alguma outra entrada que Mags poderia ter usado para encontrar um banheiro. Estava trancada também. O lugar parecia fechado. Desconcertada, ela lhe mandou uma mensagem.

Onde você está?

Não houve resposta. Mas quase imediatamente depois de enviar, ela escutou um grito do outro lado da rua, próximo a um canto do armazém.

—Ah não, Mags, ela gemeu.


CAPÍTULO DEZESSEIS


Keri pegou seu colete a prova de balas e o vestiu enquanto se apressava pela rua e corria para onde ela havia escutado as vozes altas. Ela se obrigou a parar de hiperventilar e manter o controle. Pareceu ajudar. Ao se aproximar, ela percebeu que havia apenas uma voz elevada. Era um jovem agitado.

A outra voz pertencia a Mags. O tom dela era calmo e comedido, não traindo o medo que ela deveria estar sentindo. Keri relembrou que ela não era a única que estivera em situações ardilosas.

Mas Mags não estava armada e dois dos caras lá dentro estavam. Keri pensou brevemente em pedir reforços. Mas ela sabia que demoraria muito. O que fosse acontecer, aconteceria nos próximos poucos minutos.

Além disso, ela derrotaria todo o propósito de verificar esse lugar extraoficialmente. Se houvesse uma batida no armazém, seria um recorde, um que nem mesmo Jackson Cave poderia encobrir. E se ele percebeu que Keri estava próxima assim de encontrar Evie, ele poderia trancá-la ou pior.

Eu tenho que fazer isso agora. E eu tenho que manter segredo. Isso vai requerer alguma criatividade.

Ao formular um plano enquanto ela se apressava para a porta da frente, Keri se lembrou de que isso não se tratava apenas de encontrar Evie. Se desse errado, alguma coisa poderia acontecer com a única amiga que ela tinha desde que Evie fora raptada. Isto era inaceitável.

Ela bateu forte na porta principal do armazém. Enquanto a porta estava sendo destrancada, ela fechou sua jaqueta para esconder o colete a prova de balas e sua arma. Ela também desfez o rabo de cavalo e deixou o cabelo cair para frente, de modo que seu rosto relativamente reconhecível não fosse visível. Se fosse espalhado que Keri Locke estivera aqui, Cave também descobriria isso. Ela não poderia deixar qualquer rastro.

A porta abriu para revelar o cara gordo que Uriel mencionara. Ele não estava brincando. O cara tinha bem mais que 130 quilos e usava um extravagante colar de ouro que estava parcialmente escondido nas dobras da pele de seu pescoço. Keri reparou que a arma não estava mais no coldre de ombro dele. Ele a tinha em mãos, não a apontando diretamente para ela, mas também não apontando para o outro lado.

—O quê? Ele exigiu rispidamente.

—Eu acho que perdi minha amiga, ela disse na sua voz mais coquete. Nós ouvimos dizer que esse lugar possa ter algumas jovens garotas para que a gente pudesse jogar... alguns jogos especiais. Mas eu fui até o pequeno banheiro do outro lado da rua e acho que ela não conseguiu esperar. Eu podia ouvir a voz dela aqui. Ela estava causando algum problema para vocês, rapazes?

O gordo parecia perdido em como responder. Keri tomou vantagem da indecisão dele para entrar.

—Obrigado, docinho, ela disse. Está muito frio lá fora.

Ela andou pelo armazém como se pretendesse dar uma olhada por Mags. Três homens—garotos na verdade—estavam espalhados em vários pontos pelo lugar, segurando cassetetes a postos.

O cômodo cavernoso estava cheio de colchões sujos, a maior parte dos quais estava desocupada. Mas alguns poucos tinham jovens garotas deitadas. Apesar do que Uriel lhe disse, ela escaneou a face delas para ver se Evie estava entre elas. Ela não estava. Mas três daquelas garotas estavam acompanhadas por homens adultos que estavam, até bem recentemente, tendo sexo forçado com elas. Todo mundo agora estava olhando para ela.

Keri já havia estado em um lugar como este antes. Apenas alguns meses antes, enquanto procurava uma adolescente, ela havia descoberto outro desses inesperados armazéns bordéis. Ela e Ray haviam derrubado o cabeça daquela rede de tráfico sexual. Ela gostaria que estivesse surpresa ao descobrir que havia outros.

Finalmente, ela viu Mags no canto que ela esperava. Havia dois homens próximos a ela. Um era outro jovem garoto, provavelmente não mais velho que dezesseis anos. Ele segurava um cassetete e estava de pé ao lado do cara principal. Uriel o descrevera bem.

Ele estava vestindo casacos e calças com costura dourada e tinha um boné amarelo dos Los Angeles Lakers virado para trás. Ele parecia estar nos vinte e poucos anos e tinha um olhar duro, como se já tivesse visto e feito coisas ruins. A sua arma ainda estava na cintura por hora, mas ele não devia ser subestimado.

Mags estava de pé ao seu lado, tentando parecer casual. Era quase impossível, dadas às circunstâncias, mas ela estava quase tirando de letra. Ela mostrou a Keri um sorriso apertado que gritava silenciosamente Eu não tenho ideia do que diabos eu faço agora.

Mas Keri tinha.

—Margaret, eu fiquei imaginando para onde você fugiu. Sua pequena Mary estava preocupada, ela disse antes de virar a sua atenção para o boné do Lakers. Nós devíamos fazer tudo juntas. É por isso que nos chamam de M&Ms, rapazes. Porque nós derretemos na... bem, vocês pegaram a ideia.

—Eu estava apenas tentando dar uma espiadinha na mercadoria, querida, disse Mags, pegando rápido e jogando junto. Mas você me mandou a mensagem e eu acho que isso assustou nosso amigo aqui.

—Tão impetuosa, disse Keri, antes de voltar a atenção para o Boné do Lakers. Eu não posso levá-la a lugar algum.

O Boné do Lakers a estava observando desconfiadamente e ela sabia que ela tinha que abaixar a guarda dele rapidamente ou talvez nunca conseguisse. Ela viu um boné do Chicago Bulls largado em um colchão próximo e se curvou para pegá-lo.

—Eu espero que isso não te ofenda como um fã do Lakers, ela disse enquanto colocava o boné, puxando a aba para baixo para esconder seu rosto mais do que o cabelo escondia. Eu não quero irritar nosso anfitrião. Afinal, nós estamos aqui para fazer amor, não guerra.

Ela andou na direção dele tão sensualmente quanto ela podia com um colete a prova de balas e uma arma sob o casaco. Finalmente o cara do Boné dos Lakers falou.

—Que diabos você pensa que está fazendo, vadia?

Keri mal piscou os olhos enquanto continuava indo na direção dele.

—Vocês estão dizendo que apenas cavalheiros podem se divertir com essas garotas? E nós vadias? Nosso dinheiro não vale aqui?

Isso pareceu dar uma pausa para o cara do Cara do Boné do Lakers.

—Como você ouviu falar sobre nós? Ele perguntou.

—Um cara do trabalho mencionou esse lugar. Ele sabe que eu gosto de... aventura e achou que eu pudesse gostar disso. Mas ele nunca mencionou ser tratado dessa maneira. Ela apontou a arma do Cara Gordo com a cabeça para elucidar seu ponto.

—Nós temos que proteger a mercadoria, moça, disse o cara do Boné do Lakers.

—Eu entendo isso. Mas agora que somos todos amigos, minha amiga e eu podemos dar uma olhada no que vocês têm no estoque hoje?

—Nunca tivemos uma cliente mulher aqui, mas eu acho que isso não importa. Primeiro temos que te revistar e ter certeza que você realmente tem o dinheiro.

O coração de Keri afundou. Ela esperava sair daqui sem levantar suspeitas ou ter um confronto. Mas uma revista revelaria sua arma e o seu colete, vestimenta incomum para metade de um casal de lésbicas procurando por prostitutas menores de idade. Eles saberiam que ela era uma tira, o que pioraria a situação.

—Tudo bem, docinho, ela disse, tentando canalizar o charme sulista de Mags. Mas se lembre, sem toques extras. Nós não curtimos esse tipo de coisa.

Ela deu um olhar para Mags que esperava que a alertasse que as coisas estavam prestes a ficarem cabeludas. Sua amiga pareceu entender e assentiu levemente com a cabeça.

—Eu vou com você, Ruiva, disse o cara do Boné do Lakers para ela. Sammo, você verifica a baixinha.

Enquanto o cara do Boné dos Lakers começava a revista, Mags deu uma risadinha, então se inclinou e sussurrou algo para ele. Keri não sabia o que ela estava dizendo, mas o estava distraindo, o que era bom o suficiente.

—Deixe-me tirar meu casaco para você ela disse para Sammo, o qual estava colocando sua arma de volta no coldre enquanto se arrastava pesadamente até ela.

Ela se afastou dele para abrir o casaco e casualmente tirou sua própria arma do coldre de ombro enquanto esperava por ele tocá-la de costas. Ela necessitava saber qual a posição dele antes de reagir.

Dois dos jovens preguiçosos com os cassetetes não pareceram registrar o que ela estava fazendo. Mas o terceiro claramente o fez. Os olhos dele se arregalaram e ele pareceu que estava prestes a falar. Ele abriu a boca, mas não parecia conseguir encontrar as palavras.

Keri o assistiu, rezando pelo toque grosseiro de Sammo. Felizmente, ela o sentiu apenas um momento depois quando ele colocou as mãos na sua cintura. Ela não podia arriscar esperar mais.

Ela deu uma risadinha de leve, para chamar a atenção de Sammo para sua face. Olhando de volta, ela viu que tinha funcionado. Na hora, ela levantou sua perna direita e bateu a sola de seu sapato para trás no joelho direito dele.

Ele gemeu e suas mãos imediatamente deixaram a cintura dela. Ela girou e esmagou a cabeça dele com uma coronhada enquanto a perna dele se dobrava e ele desmoronava no chão. Sem esperar para ver se ela o tinha nocauteado, deu-lhe um pontapé na têmpora para ter certeza. Ele deitou imóvel. A coisa toda tinha tomado menos de quatro segundos.

—Chefe! O garoto do cassetete mais atento finalmente gritou.

Keri virou o rosto para o Boné do Lakers, que estivera de costas para ela até agora, com atenção focada na sedutora e picante Mags. Ele processou o que havia acontecido rapidamente e começou a alcançar a arma nas costas da sua cintura com uma mão enquanto agarrava o pescoço de Mags com a outra.

Keri levantou sua própria arma e apontou para ele.

—Eu não faria isso, ela disse, sua voz mantendo-se nivelada, escondendo a ansiedade que sentia. Tudo que nós queremos fazer é sair. Se você pegar essa arma, eu vou ter que atirar em você. Se você se afastar da minha amiga, nós vamos apenas andar para fora daqui e esquecer que essa coisa toda acontecer.

—Quem é você? Demandou o Boné do Lakers, sua mão ainda pairando no meio do ar ao seu lado.

—Eu sou apenas uma garota que cresceu em uma vizinhança complicada e aprendeu a tomar conta de si. Eu gosto de me divertir, Chefe. Mas isso não é legal. Eu não gosto de ter armas apontadas para mim. E não gosto que coloquem as patas em mim. Então nós vamos sair agora.

—Eu não posso deixar você ir, vagabunda. Como isso iria parecer?

—Como iria parecer se eu atirasse em você e você tivesse que explicar para seu chefe que alguma mina te derrubou? Isso é, se você sobreviver. Assim, é o nosso segredinho. Ninguém tem que saber. Eu tenho certeza que seus garotos aqui podem manter a boca fechada, certo garotos?

No canto do olho, ela os viu assentindo. O Boné dos Lakers parecer estar hesitante. Mas então, seus olhos se acenderam e ela podia dizer que ele teve uma ideia.

—Que tal você largar sua arma ou eu quebro o pescoço da sua amiga?


CAPÍTULO DEZESSETE


Keri sentiu um pouco de bile subir em sua garganta e engoliu de volta. Suas mãos tremiam levemente segurando a arma e ela esperava que o Boné do Lakers não pudesse perceber isso de onde ele estava.

Ela estivera tão perto de esfriar as coisas, mas agora ele piorou a situação. Ela se lembrou de que, apesar da ameaça dele, nada tinha mudado de verdade.

—Você não quer fazer isso, Chefe. Se você matar minha amiga, o que você acha que eu vou fazer, rastejar em uma bola e começar a chorar? Ou atirar em você até que eu fique sem balas?

O Boné do Lakers parecia estar considerando o cenário. Ela continuou, sem querer perder a vantagem.

—A única forma de isso terminar bem para você é se você se afastar dela, deitar de bruços e deixá-la remover sua arma da sua cintura. Então nós partimos. A Margaret aqui vai até deixar sua arma na porta, para você recuperá-la uma vez que nós nos formos. Você pode dizer ao seu chefe qualquer ideia que você queira depois disso. Todo mundo sai ganhando. Caso contrário, você acaba como o Sammo ali.

O Boné do Lakers permaneceu em silêncio por alguns momentos, ponderando suas opções. Finalmente ele respondeu.

—Se isso acontecer, eu não saio ganhando. Eu perco moral.

Keri voltou seu foco para Mags, que estava claramente tentando chamar a atenção dela. Até agora, sua amiga estivera quieta pela maior parte, deixando a detetive treinada manejar a situação. Mas estava claro pela sua expressão que ela estava prestes a tomar as rédeas nas próprias mãos.

Keri queria balançar a cabeça, mas o Boné dos Lakers a assistia de perto e iria reparar. Isso não importava mais, porque um segundo depois, Mags levantou o pé e enfiou o afiado salto de seu sapato por cima do tênis do Boné dos Lakers.

Ele engasgou de dor e a soltou o suficiente para Mags se largar e afastar. Keri foi em direção a ele, mas ele rapidamente se reagrupou e buscou por sua arma na cintura.

—Não, ordenou Keri, agora apenas a três metros dele. Você estará morto antes de tirá-la.

Sua mão parou no ar, seus dedos tremendo, os olhos sem piscar. Agora de perto, ocorreu a ela que ele poderia estar drogado. Se esse fosse o caso, então racionalizar com ele poderia ser em vão. O dedo dela tocou o gatilho enquanto ela esperava pela decisão dele.

Ele piscou. Era um gesto pequeno, mas ela sabia o que significava. Na própria cabeça, ele concedeu. O que foi confirmado quando ele afastou a mão da cintura e suspirou profundamente.

—Boa escolha, Chefe, disse Keri. Agora deite no chão para minha chegada remover sua arma.

Ele fez como mandado. Mags tirou a arma da cintura dele e foi para o lado de Keri.

—Agora o resto de vocês, rapazes, venham aqui aonde eu possa vê-los e deitem ao lado do seu chefe.

Eles seguiram as instruções. Quando estavam todos no jeito, ela andou até eles, pegou um dos cassetetes e se inclinou próxima ao Boné dos Lakers. Sua cabeça estava abaixada, então não podia vê-la.

—Você está saindo de boa, Chefe, ela sussurrou. Isso poderia ter sido muito pior para você. Não tente me encontrar. Já matei homens mais durões do que você. Você entende, vadia?

Ele começou a responder, mas Keri não esperou para ouvir. Ela desceu o cassetete na cabeça dele. Houve um estalo alto e então um segundo quando a cabeça dele acertou o chão do armazém. O corpo dele ficou largado. Ele estava inconsciente.

As coisas andaram rápido depois disso. Keri mandou os garotos mais novos arrastarem o Boné dos Lakers e Sammo para o banheiro e, então, entregarem todos os celulares e entrarem eles mesmos. Ela arrancou a maçaneta do lado de dentro da porta e então a trancou por fora.

Ela queria prender os clientes, os quais ela amontoou em um canto afastado do armazém. Mas isso significaria que ela estaria quebrando o disfarce. Nesse momento, eles pensavam que ela era uma versão feminina deles—um adulto tentando tirar vantagem de garotas menores de idade. Mas os prenda e eles saberão que era uma mentira. Mesmo os trancar no banheiro com os outros e discar 911 era imprudente.

Prisões, mesmo por outros, significaria burocracia e conversa fiada sobre a garota fodona que abateu a todos. Era apenas mais um jeito de a notícia chegar até Cave. Também aumentava as chances de que todos que ela prendeu quisessem vingança. Ela não precisava de mais inimigos. Agora, era apenas o Boné dos Lakers e, talvez, Sammo, que a queriam morta. Eles iriam querer com mais vontade ainda depois do que ela estava prestes a fazer.

—Rapazes, ela disse para os três clientes. Esse é seu dia de sorte. Vocês podem ir.

Foi preciso tudo que ela tinha para não chamá-los de pervertidos enquanto caminhavam para a saída. O homem na frente, um cara de quarenta e poucos anos de camisa polo e uma jaqueta retrô da Members Only, deu um meio sorriso de escárnio enquanto passava. Algo nela atinou.

Ela adiantou-se ligeiramente e o chutou na canela. Estremecendo de dor, ele soltou um murro em sua direção. Ela desviou facilmente, agarrando o braço dele e o prendendo nas costas dele. Parando apenas a uma fração de centímetro de quebrá-lo, ela segurou o braço dele ali, deixando-o imaginar se ela daria aquele empurrãozinho final.

—Você vai zombar de mim outra vez, valentão? Ela murmurou enquanto marchava com ele até a porta.

Se por pânico ou dor, ele não respondeu. Keri o jogou contra a porta de metal antes de levantar o joelho até a virilha dele, fazendo contato direto. Ela largou o braço dele enquanto ele se dobrava para frente, chocando sua testa contra a porta. A batida alta reverberou pelo armazém. Enquanto ele afundava para o chão, ela se voltou para os clientes restantes.

—Alguém mais quer me dar um olhar de desaprovação? Ela perguntou. Talvez compartilhar alguns pensamentos?

Os homens permaneceram em silêncio, congelados no lugar.

—Eu achei que não. Saiam. Não voltem. Ou eu vou usar a minha arma. Não que eu precise dela.

Eles se apressaram para fora, seguidos de perto pelo Cara do Esgar, que rastejava mais que andava. Ela bateu a porta atrás dele, tentando descarregar toda sua ira naquele ato para que ela pudesse colocá-la de lado para o que ela sabia que iria acontecer em seguida.

Quando eles se foram, ela voltou a atenção para as garotas. Havia oito delas no total. Keri queria perguntar a elas se haviam visto Evie. Mas ela sabia que isso poderia detonar seu disfarce. Qualquer uma dessas garotas pode dizer aos cafetões sobre a mulher suspeitosamente curiosa no armazém.

Além disso, nenhuma delas tinha qualquer condição de responder as perguntas. Metade parecia assustada. A outra metade estava muito drogada para expressar qualquer emoção. Mags estava sentada em um colchão ao lado de uma que estava particularmente em mau estado, ajudando-a a tomar um pouco de água.

Ainda, essa poderia ser a única chance que ela teria de perguntá-las sobre Evie. Se ela ao menos não tentasse, então todo esforço para encontrar o Viúvo Negro, sem mencionar os $10 000 que ela o mandou, seriam desperdiçados. Ela decidiu pelo menos dar uma última, muito delicada tentativa.

—Ouçam, meninas, disse Keri para aquelas que conseguiam ouvi-la. Minha amiga e eu não estamos interessadas em machucar vocês ou fazer qualquer coisa que vocês não queiram. De fato, nós queremos ajudá-las, se vocês permitirem. Eu conheço uma mulher que gerencia um lar para garotas na situação de vocês. Eu não sei se ela pode hospedar todas vocês, mas tenho certeza que se ela não puder, ela irá encontrar outros lugares que possam. Nós até daremos caronas a vocês.

—Eu não quero ir para algum lar, uma das garotas drogadas disse arrastada. Eu só quero sair daqui.

—Isso também está ok, disse Keri, mesmo que cada parte dela gritasse que não estava ok. Se você quiser apenas uma carona até a rodoviária ou um abrigo ou qualquer lugar, nós podemos coordenar isso também. Mas eu duvido que alguma de vocês queira ficar aqui, certo?

Todas que podiam balançaram a cabeça.

—Ok, então nós faremos isso acontecer. Eu tenho apenas uma pergunta. Aquele cara que veio hoje mais cedo perguntando sobre aquela garota, eu sei que vocês não podiam dizer qualquer coisa para ele antes. Mas agora vocês podem falar abertamente. Alguma de vocês a viu aqui?

De início, Keri não pensou que alguma delas responderia. Mas finalmente, uma loira maltrapilha se pronunciou.

—Eu só cheguei aqui essa manhã, ela disse. Mas eles não tiraram ou colocaram alguém desde então.

Duas outras garotas, ambas hispânicas, ambas com cerca de doze anos, balançaram a cabeça tristemente. A última, uma morena pálida que aparentava ter medo que o Boné dos Lakers pudesse explodir para fora do banheiro a qualquer segundo, mal a considerou, olhando para o outro lado sem responder.

—Isso é muito importante, insistiu Keri, tentando manter sua voz nivelada. Se vocês pudessem ao menos relembrar...

Mags, sentada ao lado da que estava mal responsiva no colchão, chamou sua atenção e, quase imperceptivelmente, balançou a cabeça. Keri sabia o que ela estava tentando dizer. Inferno, ela também estava pensando nisso.

Não é bom. Essas garotas não sabem de coisa alguma. E elas estavam em péssimas condições. Golpeá-las com perguntas apenas as deixaria pior. Deixe-as estarem. Você vai encontrar outro caminho. Sempre há outro caminho.

Relutantemente, Keri afastou o próprio sofrimento de lado na cova crescente de seu estômago e tentou se focar nessas garotas, todas precisando desesperadamente de ajuda.

Ela mandou os táxis levarem quatro garotas drogadas diretamente ao hospital. Das quatro restantes, as duas hispânicas pediram para ir para abrigos. Apenas duas, a loira maltrapilha e a morena pálida, estavam interessadas no lar.

Elas entraram no banco de trás e Mags dirigiu, já que Keri sentia, apesar de tudo, que ela poderia pegar no sono ao volante. Ela tinha que fazer uma ligação, mas antes que fizesse ela se virou para a amiga e perguntou a questão que estava a consumindo por meia hora.

—Que diabos você estava pensando? Ela demandou.

—O quê?

—Eu falando com Uriel e você decidiu espiar para ver um bordel gerenciado por bandidos armados?

—Eu não sabia que eles estavam armados, respondeu Mags, casualmente demais para o gosto de Keri.

—Não é engraçado. As coisas poderiam ter ido muito pior lá.

—Eles nem sabiam que eu estava ali até você me mandar mensagem.

—Essa é a sua defesa? Perguntou Keri descrente.

—Eu não preciso de uma defesa... Mary, ela disse acidamente, aparentemente sem certeza se ainda precisava manter o artifício dos nomes falsos perante as duas garotas no banco de trás, embora ambas parecessem alheias. A verdade é, eu vi uma mulher loira próxima aos fundos do armazém e pensei que pudesse ser a pessoa pela qual estamos procurando, então eu fui verificar. Eu não queria elevar suas esperanças caso eu estivesse errada.

—E?

—E foi uma boa coisa eu não ter dito não, porque acabou sendo uma idosa muito baixinha usando uma peruca inapropriada.

—Você está dizendo a verdade?

—Estou. Apesar de admitir que, uma vez que eu estava lá, eu pensei que dar uma espiada lá dentro não faria mal algum. E não teria feito se eu não tivesse recebido uma mensagem muito alta enquanto estava tentando espiá-los.

—Então você colocou sua segurança em jogo por uma história em potencial? Perguntou Keri incrédula.

—Isso começou porque eu pensei que eu pudesse ter visto Evie! E então, já que eu estava mesmo por lá... ela suspirou escute, eu sei o que você faz da vida. Mas você não sabe por que eu faço. E eu não vou me desculpar por perseguir uma história que eu acredito ser importante.

—O que você quer dizer com 'eu não sei o porquê você faz?

—Todos temos nossos demônios, disse Mags. Nem todo mundo acaba nos noticiários. Mas nós ainda os temos. Enfim, eu vi uma oportunidade de chegar perto de uma situação que pudesse valer a pena investigar, então eu a agarrei. Em retrospecto, talvez não tenha sido a decisão mais sábia. Mas, querida, eu não sou sempre a garota mais sábia. Pergunte meu ex-marido sobre isso.

Keri percebeu que sua amiga não iria ceder. Elas eram iguais no departamento de teimosia. Ela decidiu deixar isso pra lá por enquanto, especialmente contando que ela ainda tinha que achar um lugar para as garotas.

Ela ligou para Rita Skraeling, que operava a South Bay Shared Home na Redondo Beach. Ela hospedava uma garota de quatorze anos de idade chamada Susan Granger, a qual Keri tinha resgatado do cafetão dela ano passado.

Nos meses recentes, Susan havia realmente florescido na casa. Keri tentava visitá-la semanalmente. Susan parecia interessada em se tornar uma policial e salpicava Keri com questões sobre a força policial em toda visita.

—Agora tenho espaço para uma garota, disse Rita, sua voz rouca, manchada de nicotina, ralando pelo telefone. Dê-me a que parecer pior. Eu vou te mandar o endereço de outro bom lugar em Long Beach para a outra garota. Eu sei que eles têm uma vaga aberta agora.

—Obrigada, Rita, e mais uma coisa. Isso precisa ser extraoficial. Na papelada, diga apenas que um bom samaritano as trouxe. Eu não posso ter isso rastreado para mim.

—Normalmente, eu diria esqueça isso, respondeu Rita. Mas já que é você, eu vou olhar para o outro lado.

—Eu agradeço.

Ela tinha acabado de desligar quando outra chamada chegou. Era Ray.

—Você dormiu um pouco? Ele perguntou.

—Sim, ela mentiu, relembrando repentinamente de novo de como exausta ela estava. O que pega?

—A CSU encontrou uma impressão digital parcial nas coisas de Jessica Rainey, uma que eles não notaram antes. Castillo e eu estamos a caminho para verificar isso agora. Você pode nos encontrar?

—Claro, ela disse. Onde?

—Na escola. A impressão pertence a um dos professores dela.


CAPÍTULO DEZOITO


Keri encostou o carro na frente da escola às 10:45 da manhã. Ela ficou ali parada por um momento, imaginando se a pessoa claramente desequilibrada que havia raptado Jessica estava em uma das salas de aula no aparentemente prístino campus.

Mas havia concordado em dirigir as garotas para os lares compartilhados para que Keri pudesse ir diretamente para lá. Nenhuma delas falou muito pelo resto do caminho de volta, mas o abraço que elas compartilharam antes de se separarem foi bem intenso. Keri podia sentir a amiga lhe agradecendo com a força do seu aperto.

—As bebidas são por sua conta na próxima, disse Keri quando eles se separaram. Mas assentiu, mas disse nada. Era uma rara ocasião quando Margaret Merrywether era deixada sem palavras.

Keri sacudiu a agradável memória de sua cabeça e focou na tarefa em mãos. Havia um sequestrador em potencial na escola e era o trabalho dela desvendar os fatos.

Ela andou até o escritório principal, fechando sua jaqueta contra o frio no ar. Ray e Jamie Castillo estavam esperando. Quando ela entrou, eles a atualizaram.

—O nosso suspeito é Justin Hensarling, disse Ray. Trinta e um anos de idade. Ele ensina história para a 6a série. Jessica está na turma do terceiro horário. A CSU encontrou uma impressão parcial na estampa do logo da escola em uma camisa de educação física. Eles não pensaram em verificar as roupas no início, porque ela normalmente não mantém impressões. Mas Edgerton notou o logotipo e os fez tentar.

—Por que estamos tão suspeitos sobre a impressão na camisa dela? Perguntou Keri. Não poderia ser casual?

—É possível, disse Ray. Mas as meninas só usam uniformes de ginástica durante as aulas de ginástica. E ele não dá aulas de ginástica. Sua sala de aula é claramente do outro lado do campus. Não há motivos para a sua impressão ter tido contato com a camisa dela.

—Justo, disse Keri. Vamos conhecer o Sr. Hensarling.

—Ok, então como você quer que lidemos com isso? Perguntou Castillo. Se ele é o nosso cara, ele pode ficar desconfiado se a diretora o pedir para ir até o escritório. Não queremos que ele perca a cabeça em uma sala cheia de crianças.

—Bom ponto, disse Keri. Ele é casado?

—Sim, disse Castillo olhando no registro dele. Por três anos.

—Ok, disse Keri, parando por um momento para pensar antes se lançar seu plano. Nós pedimos para um assistente de escritório ir até a sala dele e solicitá-lo no corredor, porque ele tem uma mensagem urgente da sua esposa. Quando ele sair, nós estaremos lá esperando para escoltá-lo para uma área segura.

Ray e Jamie assentiram e momentos depois a diretora concordou com o plano com a condição de que eles ficassem fora de vista. Ela não queria assustar as crianças. E se isso acabasse sendo uma explicação inocente, ela não queria que a reputação do professor ficasse afetada, porque ele foi visto sendo interrogado por policiais fardados.

Eles concordaram e a assistente os levou para a sala de aula. Castillo aguardou em um corredor externo enquanto Keri e Ray se posicionaram de cada lado da porta da sala de aula, fora de vista.

A assistente, visivelmente nervoso, bateu na porta e a abriu.

—Você tem um recado, Sr. Hensarling, ela disse com a voz trêmula.

Ray olhou para Keri e ela sabia que ele estava pensando a mesma coisa que ela—essa mulher vai estragar tudo.

—Bem, pode falar, Nicole, eles escutaram Justin Hensarling dizer casualmente.

—Hum, você pode querer dar uma olhada aqui fora, ela respondeu. É da sua esposa.

Eles escutaram um arrastar enquanto Hensarling empurrava sua cadeira para trás rapidamente.

—Continuem a leitura, alunos, ele disse, sua voz agora muito menos casual. Já volto.

Ocorreu a Keri que a voz receosa da assistente pudesse ser um benefício na verdade. Hensarling poderia atribuí-la a má notícias da esposa, que ela estava relutante em compartilhar. Um segundo depois, ele saiu para o corredor.

—O que foi, Nicole? Ele perguntou ao pegar o papel. Você tem me preocupado aqui.

Ele desdobrou o papel, viu que estava em branco e olhou para cima, confuso. Foi só então que ele percebeu Keri de pé a alguns metros de distância.

—O que está acontecendo?

—Você pode ir agora, Nicole, disse Ray por trás de Hensarling, surpreendendo-o. Precisamos ter uma conversa com você, Sr. Hensarling.

Nicole correu fora e o professor recuou-se de Ray involuntariamente. Keri se moveu para próximo atrás dele e falou tranquilamente no ouvido dele.

—Sua esposa está bem, senhor. Mas nós somos do LAPD e precisamos falar com você. E nós gostaríamos que você fosse lá para fora para podermos conversar sem fazer uma cena. Você entende?

Hensarling estava tremendo, mas ele assentiu e seguiu Keri pela porta onde Jamie esperava. Ray seguia atrás de perto. Jamie os levou para uma alcova afastada e fora de vista de qualquer sala de aula.

—Sr. Hensarling, disse Ray quando eles finalmente pararam, você sabe por que estamos aqui?

—Não? Hensarling respondeu embora soasse mais como uma pergunta.

—Há algo que você queira nos contar a respeito das suas interações com seus alunos? Perguntou Keri. Ela não queria ser muito acusatória para começar. Talvez ele fosse se enforcar sem a ajuda deles.

—Eu não sei do que você está falando. Ele insistiu pouco convincente.

—Sr. Hensarling, disse Ray. Você conhece Jessica Rainey?

—Claro que eu a conheço, ele disse, soando irritado com a pergunta. Ela está na minha turma. Sobre o que é isso? Vocês acham que eu tenho algo a ver com o desaparecimento dela?

Keri olhou e assentiu para Jamie, que se adiantou.

—Nesse ponto eu vou ler os seus direitos para você, Sr. Hensarling, ela disse, olhando de maneira intimidante para o uniforme dela. Se você ainda quiser responder nossas perguntas depois disso, eu tenho certeza de que podemos esclarecer tudo isso.

Ela começou a ler os direitos dele. Quando ela havia terminado, Keri deu um passo à frente e disse em uma voz calma.

—Compreendendo estes direitos, está disposto a falar conosco, Sr. Hensarling?

—Sim. Não tenho qualquer coisa a esconder, ele disse com confiança.

—Então por que sua impressão digital foi encontrada na camisa de ginástica de Jessica Rainey? Perguntou Ray.

O rosto do Hensarling ficou branco e ele ficou perplexo por cinco segundos antes de responder.

—Não é o que vocês pensam, ele disse finalmente, de repente soando muito menos confiante.

—O que é então? Perguntou Ray.

—Oh, Jesus. Não posso acreditar nisso. Eu nunca pensei que alguém se importaria.

—Sr. Hensarling, disse Keri, se aproximando ainda mais de forma que estava apenas a centímetros de distância dele. Eu estou perdendo a paciência com você. Há uma garota desaparecida lá fora. Se você não é o responsável, explique-se. Seja lá o que você tenha feito, se não foi sequestrar uma criança, você estará com problemas muito menores, caso seja solícito quanto a isso.

—Oh Deus, ele disse, começando a chorar. Eu tenho essa coisa. Eu gosto de... cheirar as roupas delas.

—O quê? Castillo deixou escapar com desgosto, recebendo um olhar de repreensão de Keri e Ray. Uma vez que um suspeito começa a falar, você não faz qualquer coisa que os faça parar.

—Eu gosto de cheirar as roupas das meninas, ele repetiu. Há algo sobre o cheiro depois que elas suaram. Eu sei que parece estranho, mas... eu gosto.

—Continue, disse Keri, certificando-se de manter qualquer julgamento fora de sua voz.

—Quando as garotas estão no almoço ou em um intervalo, algumas vezes eu pego as roupas delas das mochilas e... as cheiro. Eu juro que é tudo. Não as calcinhas ou nada—apenas as roupas de ginástica usadas. Eu nem olho para ver de quem são. Não importa. Devo ter cheirado a roupa de Jessica em algum momento. Realmente não sei.

Os três ficaram em silêncio. Ninguém realmente sabia o que dizer. Keri nunca tinha ouvido nada assim antes. Ela tinha certeza que isso era ilegal, mas nem ao menos sabia exatamente qual lei ele tinha quebrado. Eventualmente, ela se forçou a falar.

—Onde você estava ontem à tarde entre duas e meia e três? Ela perguntou.

—O quê? Ele perguntou, ainda abalado pelo tópico anterior.

—Onde você estava— Keri começou a repetir quando Hensarling interrompeu.

—Eu tive um decatlo acadêmico, ele respondeu animado. Sou o treinador. As aulas terminam às duas e trinta e cinco. A equipe começa a praticar as duas e quarenta e cindo e corre até às quatro da tarde. Eu estive na minha sala de aula o tempo todo. Há dez estudantes que podem atestar isso.

Keri, Ray e Jamie se entreolharam. Nenhum deles conseguia esconder a decepção. O sinal tocou e crianças começaram a jorrar no pátio.

—Você tem aula neste horário, Sr. Hensarling? Perguntou Ray.

—Sim, ele respondeu.

—Bem, nós vamos ter que chamar um substituto. Você precisará vir até a delegacia para discutir isso com mais profundidade. Por favor, espere aqui com a Policial Castillo.

Ele adentrou para o interior da alcova e sinalizou para Keri se juntar a ele.

—O que você acha? Ele perguntou.

—Acho que ele provavelmente está dizendo a verdade. Quem iria admitir algo assim se não fosse verdade? Além disso, ele não dá a impressão que eu tenho das cartas de resgate. Eu duvido que ele pudesse reunir esse tipo de fervor.

—Bem, impressão ou não, ele é culpado de algo, embora eu não tenha certeza do quê, disse Ray. Podemos pedir a Castillo para verificar o álibi com as crianças do decatlo. Enquanto isso, vamos levá-lo para a delegacia para que possamos entregá-lo para alguém e seguir algumas pistas que possam levar a algum lugar de verdade.

—Parece bom para mim, concordou Keri. Não queria passar nem um segundo a mais do que preciso com esse cara.

—Ei pessoal, Castillo os chamou, Edgerton não queria interromper vocês, então ele me mandou uma mensagem.

—O que se passa? Perguntou Ray.

—Vocês deveriam voltar para a delegacia. Ele acaba de receber uma ligação de um xerife no Missouri. Ele reconheceu o modus operandi. Parece que nosso cara fez isso antes.


CAPÍTULO DEZENOVE


Keri, Ray e a equipe estavam todos no escritório do Tenente Hillman com a porta fechada. Estava mais quieto do que na sala de discussões, então eles poderiam conduzir melhor a conferência com o Xerife Mitch Calvert do Condado de Boone, no Missouri, o qual, de acordo com uma busca rápida no mapa, incluía a cidade de Columbia.

—Nossa equipe inteira está com você Xerife Calvert, disse Kevin Edgerton, que falara rapidamente com o xerife mais cedo. Você poderia dizer a todos o que você me disse mais cedo?

—Claro. Por onde devo começar? Perguntou Calvert. Pela sua voz, Keri imaginou que ele estivesse na casa dos cinquenta ou sessenta anos.

—Xerife, aqui é o Tenente Cole Hillman. Eu dirijo a Unidade de Pessoas Desaparecidas da nossa Divisão Oeste de LA. Nós agradecemos o contato. Talvez você pudesse começar nos dizendo o que o faz pensar que possa haver uma conexão entre o seu caso e o nosso.

—Claro. A primeira coisa foram as cartas—as cartas de resgate. Elas têm o mesmo tipo de linguagem que tivemos em algumas cartas de um caso aqui a cerca de sete anos atrás.

—Oi, Xerife, aqui é a Detetive Keri Locke. Como elas são similares? Perguntou Keri.

—Elas tinham o mesmo tom religioso, como se o cara fosse um fanático. Também, nosso cara também nunca apareceu na primeira entrega do resgate. E na segunda carta que recebemos, não havia pedido de encontro, assim como na segunda que vocês receberam. Ainda, nossa garota tinha cerca da mesma idade—onze anos, o nome era Noreen Appleton. De uma pequena cidade chamada Elkhurst nos arredores de Columbia.

—Aqui é Ray Sands, Xerife. Como nunca ouvimos falar sobre o seu caso quando estávamos procurando por outros similares? Perguntou Ray.

—É vergonhoso dizê-lo. Mas nós conseguimos uma confissão de um mendigo e fechamos o caso. O cara era novo na cidade e tinha sido preso algumas vezes por coisas diminutas, então já havia alguma animosidade em relação a ele dos moradores locais.

—Mas você tinha dúvidas? Perguntou Keri.

—Eu tinha. Isso nunca pareceu certo para mim. Eu não sabia como o cara teria acesso uma máquina de escrever para escrever essas cartas. E ele não falava da maneira floreada na qual elas eram escritas. Eu duvido que ele sequer soubesse a maioria das palavras nelas. E nós nunca achamos um corpo. Mas nós tínhamos a confissão, então não era um caso sem solução e não havia razão para inserir as cartas no banco de dados.

—Você diz que nunca encontrou um corpo? Perguntou Keri.

—Não. Nós vasculhamos o condado, até usamos cães farejadores, que eram um gasto real para nós. Tivemos que trazê-los de St. Louis. Mas não fez qualquer diferença no final. E nosso suspeito se recusou a dizer qualquer coisa. Na época, nós achamos que ele estava se protegendo—ninguém, difícil de construir um caso. Mas olhando para trás, eu acho que talvez ele apenas pudesse saber de nada.

—Detetive Manny Suarez aqui. Quantas cartas vocês receberam ao todo? Perguntou Suarez.

—Apenas as duas. Nunca tivemos notícias dele depois disso. Eu não sei se ele perdeu o interesse ou se mudou ou o que foi. Claro, se fosse o mendigo, isso fazia sentido, porque nós o prendemos, então talvez ele nunca teve o tempo para escrever uma terceira. Mas eu realmente não compro isso.

—Ele foi condenado? Perguntou Hillman.

—Ele foi. O júri levou menos de trinta minutos. Assassinato em primeiro grau—mesmo sem o corpo, ele pegou de trinta anos para perpétua. Porém não durou muito—não era um fã de confinamento. Nós o encontramos na cela dele na manhã em que ele deveria ser transportado para a prisão estadual. Ele tinha raspado uma lasca da bandeja de comida de metal e a usou para cortar os pulsos.

—Sinto muito, Xerife, disse Hillman.

—Sim, eu também. É um daqueles que eu gostaria de ter de volta, sabe? Especialmente se o meu atalho colocou outra garota em risco.

—Por que você acha que ele confessou se ele não tinha que fazê-lo? Imaginou Keri.

—Eu me fiz essa pergunta várias vezes. Parte de mim acha que ele só fez isso pela atenção. Eu podia perceber que ele gostava de todas as câmeras ao redor. Mas uma vez que ele viu a família da menina no tribunal, ele pareceu perder o entusiasmo. Eu acho que ele sabia que ele estava contribuindo para o sofrimento deles. Seu pedido de desculpas na sentença foi realmente tocante, o que era estranho considerando que ele não era culpado. Talvez ele estivesse expiando por outros pecados.

A sala ficou em silêncio depois disso enquanto todos desciam pelo ralo.

—Obrigado, Xerife, Hillman disse eventualmente. Eu acho que isso responde tudo. Talvez você pudesse nos enviar cópias das suas cartas de resgate. Pode haver algo útil nelas.

—Farei isso. Desejo toda sorte a vocês. E para aquela garota também, ele disse antes de desligar.

—Bem, vocês sabem o que isso significa? Disse Brody. Ele estivera em silêncio durante toda a chamada de conferência, então Keri estava surpresa que ele tenha acrescentado alguma coisa agora.

—O quê, Frank? Perguntou Hillman.

—Significa que esse cara cometeu crime em vários estados. É federal agora. Nós podemos entregar isso para a FBI e deixá-los lidar com esse caso do cão.

—Jesus, Brody, disse Keri, com repulsa e incapaz de escondê-la. Não está aposentado ainda? Por favor, me diga que você vai em breve, porque você já praticamente já saiu.

—O quê? Porque eu vejo um caso perdedor quando eu vejo um? Pelo menos nós podemos tirá-lo do nosso livro de registro. Menos um caso não resolvido para a Divisão Oeste de LA. Estou realmente jogando em equipe aqui.

—Não estou certo sobre a parte do jogador de equipe, disse Hillman, pegando o telefone e discando. Mas ele está certo. Eu realmente preciso chamar o FBI. Não há garantias de que esse seja o mesmo suspeito, mas nós temos que alertá-los caso seja. Eles provavelmente vão querer enviar uma equipe para Elkhurst também.

—Mas no segundo em que nós fizermos isso, eles vão nos desligar, alertou Keri.

—Não necessariamente, disse Hillman. Eles vão querer tomar posição com certeza. Mas eles precisarão que nós os repassemos o caso e eu suspeito que eles vão nos querer como suporte tático e para estabelecer um relacionamento com a família.

—Como o que Locke estabeleceu com Tim Rainey? Perguntou Brody sarcástico.

Ray se levantou e encarou Brody, que estava deitado negligentemente em um sofá.

—Cale a boca, Frank, ele disse em uma voz baixa e abrupta. Conheça seus limites ou eu vou ajudá-lo a encontrá-los.

Ray Sands era o único detetive na unidade que Frank Brody era relutante em encher o saco. Ciente de que ele havia ido muito longe, ele levantou e correu para fora, resmungando algo sobre ter que ir urinar.

—Obrigada, disse Keri. Mas eu tinha sob controle.

—Eu sei que tinha, mas eu fiquei preocupado que a sua versão de ‘sob controle’ fosse chutá-lo na garganta. Eu só queria poupar sua suspensão.

Antes que ela pudesse responder, Hillman desligou.

—Os federais dizem que eles estiveram esperando pela nossa chamada, ele disse. Estarão aqui em dez minutos.


*


Os agentes do FBI Winchester e Crowley sentaram na sala de conferências, ouvindo enquanto a Unidade de Pessoas Desaparecidas os atualizavam com tudo que sabiam sobre o caso até agora. Winchester era o mais novo dos dois, provavelmente com menos de trinta e cinco. Atraente de uma maneira robusta, ele claramente passava boa parte do seu tempo malhando. Ele vestia uma camisa de botão justa que acentuava o peitoral e braços salientes. Keri não estava impressionada. Ele continuava interrompendo para fazer perguntas sobre o que eles iriam dizê-lo de qualquer forma.

Crowley parecia ter mais potencial. Ele era mais velho, provavelmente próximo dos cinquenta, e tinha barba grande o suficiente para sugerir que ele se esquecia das aparências quando trabalho consumia tudo. Sua camisa e jaqueta estavam amassadas, quase como se ele houvesse dormido com elas na noite passada. Ele ficou quieto a maior parte do tempo e os comentários que ele fazia eram pertinentes.

—Esse é um caso ímpar, ele reconheceu quando terminaram com a apresentação. —Eu tenho que dizer, nós temos uma boa cota de cartas de resgate e muitas cartas de fanáticos religiosos. Mas eu acho que elas nunca se sobrepuseram antes.

—E elas não estão se sobrepondo aqui também, disse Winchester com confiança injustificada. O que eu acho que nós temos aqui é um cara fingindo ser louco para nos manter fora do rastro.

Mesmo que ela tivesse acabado de conhecê-lo, Keri já estava cheia desse cara, especialmente se ele fosse apenas regurgitar as teorias caducas dos colegas dela.

—Então por que ele não pegou o dinheiro na primeira noite no parque, quando ele tinha vantagem tática? Ela perguntou, tentando manter o desdém fora da voz.

O resto da unidade, mesmo Brody, assentiu concordando.

—Talvez algo não estivesse certo, disse Winchester defensivamente, alguma coisa que apenas ele soubesse.

—Ok, rebateu Keri. Então e sobre a segunda carta? Ele nem forneceu um local de entrega. Como ele ia pegar o dinheiro?

—Ele provavelmente iria fazê-lo pelo número de telefone que ele deu aos Rainey. Mas algo deu errado com isso.

—Então, de acordo com você, disse Keri, seu sangue subindo, o mesmo cara que raptou Jessica sem ninguém ver, que conseguiu evitar a vigilância na loja do FedEx, que não deixou um único indício da sua identidade também se esqueceu de comprar um celular que funcionasse?

Ray olhou duro para ela, um aviso de que ela estava em território perigoso. Indispor um agente do FBI nunca era uma jogada inteligente.

—É possível, resmungou Winchester.

—Possível, disse Crowley, tentando abaixar a temperatura na sala. Mas não provável.

—Ok, disse Winchester. Então, talvez não seja sobre o dinheiro. Talvez ele seja apenas um pervertido maluco sexual. Você leu aquelas cartas. Esse cara está seriamente na discussão de pecado.

Keri riu apesar de si. Agora Hillman lançou um olhar para ela. Ela estava impressionada que ele não havia a desligado ainda. Parte dela suspeitava que ele se sentia da mesma maneira sobre Winchester e gostava de assisti-lo tomando estacadas.

—Detetive Locke, disse Crowley com uma pitada de diversão, eu presumo que você sente de forma diferente?

—Eu sinto. Ele pode ser uma aberração, mas duvido que seja do tipo pervertido sexual.

—Como você poderia saber isso? Demandou Winchester.

—Basta olhar para as cartas, Agente. Sim, elas são sobre pecado—mas o dela, não o dele. Ele não quer estuprar essa garota. Isso seria uma violação da sua fé distorcida.

—O que ele quer então? Perguntou Crowley.

—Quer apenas o que ele diz que quer—purificá-la através de sangue.

—Você realmente acredita nisso? Perguntou Winchester cético.

—Por que não acreditaria? Qual é aquela famosa frase—quando alguém mostra a você quem é, acredite nele. Ele está nos mostrando quem ele é, mesmo se ele estiver tentando lutar contra isso.

—O que te faz pensar que ele esteja tentando lutar contra isso? Perguntou Crowley.

—É como eu disse para a unidade naquela primeira noite—se ele estivesse completamente comprometido com isso, ele não teria oferecido retorná-la para Tim Rainey purificá-la. Ele devia saber que o pai dela não a mataria. Mas se ele pode se convencer que isso é possível, então ele não está violando suas crenças deixando-a ir. Significa que ainda há algum resquício de humanidade nele lutando contra os impulsos assassinos.

—Isso é verdade, disse Crowley, talvez passemos usar isso. Talvez possamos apelar para o que resta dessa humanidade.

—Talvez, disse Keri cética. Mas vejo alguns problemas com isso.

—Quais? Exigiu Winchester, quase de maneira beligerante.

—Nós não temos ideia de como entrar em contato com ele, disse Keri, recusando-se a ser provocada pelo tom do cara. Todas as interações dele ocorreram de uma só maneira. Ele envia cartas. Ele envia mensagens e desliga o telefone. Não há forma de conectarmos com ele se não pudermos nos comunicar com ele.

—Bom ponto, concordou Crowley. Qual é o outro?

—O outro o quê?

—Você disse que via problemas, ele a lembrou. Havia outro?

—Sim. Mesmo que nós saibamos como entrar em contato com esse cara, pode não ser nenhum benefício.

—Por que diz isso? Ele perguntou.

—Porque, se o que o xerife do Missouri nos disse está correto, nós podemos não receber mais cartas. Eles receberam só duas. Então nunca ouviram dele novamente. Era como se ele pudesse segurar a escuridão de lado apenas por um tempo antes de desistir. Se esse é o caso, talvez já estejamos muito atrasados.


*


Jessica sabia que era dia. Ela podia ver minúsculas lascas de luz entre as fendas na sala de concreto. Ela estava tentada a gritar por ajuda novamente, mas ela sabia que era perda de tempo. Aquelas pequenas rachaduras não eram suficientes para sua voz penetrar. Fora isso, ela estava muito cansada para tentar.

A maior parte da sua energia das últimas horas fora focada em encontrar uma forma de soltar sua mão esquerda, ainda algemada ao poste no meio do cômodo. Ela tentou bater nele com o balde que continha o guisado. Ela teve visões de se libertar e então acertar o cara na cabeça com o balde quando ele entrasse no lugar.

Mas tudo o que ela conseguiu foi machucar seu pulso. E ela estava relutante em tentar novamente, porque nas horas que se seguiram, ela teve que usar o balde como toalete. Ao invés disso, ele conseguiu rasgar um pedaço da garrafa d'água e transformá-lo em um pino fino. Por mais de uma hora agora ela esteve cutucando no buraco da fechadura da algema, tentando destrancá-la de alguma forma.

Até agora, não tinha funcionado. Tudo que ela tinha a mostrar pelos esforços era um vestido de saco ensopado de suor e alguns dedos cortados. Ela estava apenas ponderando se deveria desistir quando escutou um barulho. Levou um momento para ela perceber que era uma voz—a voz do homem.

Ele estava em algum lugar logo atrás da porta e parecia que estava falando com alguém. Não demorou muito para ela entender que ele estava em uma discussão calorosa consigo mesmo. Ela não conseguiu distinguir sentenças inteiras, mas podia ouvir frases como "essência apodrecendo", "ritual de purificação" e "misericórdia pelo cordeiro.

Despontou nela que ele estava discutindo sobre ela, debatendo consigo mesmo se deveria matá-la ou não. Uma voz, calma e mais quieta, parecia estar fazendo o caso para poupar a vida dela. A outra voz, mais alta e exaltada, acreditava que havia chegado a hora de "liberá-la da prisão da miséria carnal.

Jessica parou de tentar libertar a mão e se arrastou de volta para o outro lado do poste de metal, o mais longe da porta possível. Ela olhava alerta para a porta, esperando para ver se ele a abriria. Mas após alguns segundos, as vozes recuaram, como se ele estivesse andando pelo corredor. Ela tomou um gole profundo de ar, somente agora ciente de que ela tinha prendido a respiração o tempo todo.

Ao respirar pela segunda vez, ela sentiu algo diferente no ar. Havia um cheiro pútrido que lhe fazia lembrar a vez que sua família tinha ido a uma viagem para as montanhas. Quando eles entraram na cabana alugada, foram imediatamente arrebatados com um cheiro rançoso similar.

Desenrolou-se que um guaxinim havia, de alguma forma, entrado na cabana, mas não conseguiu achar o caminho de volta. O pai dela havia descoberto o corpo em putrefação enrolado embaixo da cama no quarto principal.

Uma onda de percepção e horror se quebrou sobre Jessica. Ela se virou para o canto escurecido do cômodo e viu que agora ela estava pelo menos um metro e meio mais próxima do corpo da garota morta do que estivera antes. Apenas essa pequena diferença na distância era suficiente para que o mau cheiro do corpo putrefato da garota sobrecarregasse suas narinas.

Jessica se apressou de volta para o outro lado do poste e procurou o balde. Indiferente para o que já estava dentro dele, ela se inclinou e vomitou.


CAPÍTULO VINTE


Keri precisava de uma pausa. Suas costas doíam e seus olhos estavam começando a embaçar involuntariamente.

Pelas últimas cinco horas ela e o resto da equipe estiveram se debruçando sobre os relatórios do FBI e da policial local de todo o país. Eles estiveram repassando cada caso que possuía pelo menos uma marca similar ao caso de Jessica Rainey, procurando por uma brecha. Até então, estavam de mãos vazia.

Os Agentes Crowley e Winchester, agora oficialmente a cargo do caso, concederam acesso aos arquivos de casos do FBI para a Unidade. Isso poderia soar como uma forma de cooperação e boa vontade. Mas na verdade, era apenas uma maneira de eles despejarem o trabalho braçal nos tiras locais, enquanto eles iam a campo para olhar os lugares já examinados pelo LAPD.

De acordo com Hillman, eles já tinham ido à escola e à casa dos Rainey para entrevistar a família e estavam agora a caminho do Chance Park. Keri duvida que eles achariam alguma coisa nova, mas ela estava satisfeita em tê-los fora do seu pé.

Ela se levantou, alongou e foi até a salinha do intervalo para pegar um café. Olhando para fora pela janela, pela primeira vez em horas, ela viu que estava escuro agora. O relógio marcava 5:57 da tarde.

Ver o tempo mexeu com sua memória. Havia uma chamada desconfortável que ele precisava fazer e se ela não fizesse antes das 6 da noite, seria ainda mais estranha.

Como ela usou uma boa parcela do dinheiro da venda da casa flutuante para pagar o Viúvo Negro pela dica sobre o bordel no armazém, ela não tinha o suficiente restando para o investigador particular que ela queria contratar para seguir Jackson Cave. Mas havia uma pessoa com recursos quase ilimitados e, em teoria, desejo de usá-los: seu ex-marido, Stephen.

Com todas as próprias pistas esgotadas, o plano de Keri era ter o investigador rastreando os movimentos e ligações de Cave para ver se estes pudessem revelar algo sobre Evie. Ela já sabia que o advogado estava envolvido.

Pensando bem, ela se lembrou de todas as conexões dele com o caso. Ele tinha sido o advogado para o Colecionador, que originalmente tinha raptado a filha dela há quase seis anos. Logo no outono passado, ele havia avisado o homem mais velho que estava mantendo Evie que Keri estava atrás dele. E ele, quase certamente, contratou o Viúvo Negro para matar o homem mais velho e retornar Evie para as sombras. De alguma forma, Jackson Cave era a chave de tudo isso. E ela precisava saber o que ele sabia.

O investigador particular que ela queria contratar era um cara chamado Curt Wadlow. Keri o conhecia, pois seus trabalhos haviam se sobreposto em vários casos. Ela gostava dele e o respeitava. Ele e sua pequena equipe eram meticulosos e cuidadosos, o que era essencial quando se vai atrás de alguém tão astuto e poderoso como Cave. Mas esse talento não sai barato.

Ela poderia pagar o depósito de $5 000 para Wadlow. Mas ele a avisou que o tipo de vigilância que seria necessário para ir atrás de alguém como Jackson Cave aumentaria rapidamente, potencialmente chegando a tão alto quanto $20 000 no primeiro mês. E isso era depois da descontada a taxa que ela sabia que ele estava dando. Ela não tinha o dinheiro.

Aí era onde o ex-marido dela entraria. Ela e Stephen Locke haviam se divorciado há quase cinco anos. Enquanto a vida de Keri desmoronou por um tempo depois disso, a dele parecia apenas melhorar. Ele foi feito sócio em uma agência de talentos em Beverly Hills. Ele se casou com uma de suas clientes, uma aspirante a estrela animada, mas sem talento, chamada Shalene. Eles tiveram um filho, um menino chamado Sammy que agora estava com cerca de três anos.

Keri ressentia, mas não tanto devido a sua nova vida quanto em quão facilmente ele havia largado a sua antiga. Ele continuou sem olhar para trás uma única vez e não parecia sequer ter sido colocado para baixo pela dissolução do casamento ou pela perda da sua própria filha.

Às vezes, Keri achava que ela estava sendo maldizente. Mas então ela relembrou como, há menos de um ano atrás, ela fora até ele implorando por ajuda para contratar um investigador. Ele não apenas rejeitou o pedido, ele disse que ela precisava continuar sua vida, que ele estava preocupado com a saúde mental dela.

A reunião tinha acabado em gritos, principalmente da parte dela. Ela disse algumas coisas que desejava poder retornar. É claro, isso foi antes de Keri ter visto Evie com os próprios olhos, chegando a vinte metros dela antes de ser arrancada uma segunda vez.

Então Keri saiu para o atipicamente frio da noite de Los Angeles e se preparou para ligar um homem que ela desprezava e para implorar pelo dinheiro para encontrar a própria filha. Ela sabia que ele normalmente chegava em casa por volta das 6 da noite e se ele estivesse em casa quando ela ligasse, ele provavelmente não atenderia. Melhor alcançá-lo quando ele estava sozinho.

Ela discou o número dele e esperou enquanto o telefone tocava, tentando ignorar a sensação esquisita crescendo em seu peito. Após três toques, ele atendeu.

—Oi, Keri, ele disse, sua voz já soando desconfiada.

—Oi, Stephen. Liguei em uma boa hora?

—Estou quase em casa, então só tenho alguns minutos, ele disse. Está tudo ok?

—Sim. Desculpe-me por te incomodar. Não vou enrolar. Preciso da sua ajuda.

—O que é desta vez? Ele perguntou laconicamente.

Keri sentiu a irritação subir na garganta e lembrou-se de mantê-la contida. Isso já era de se esperar. Ela sabia que ele iria provocá-la, mesmo que ele não percebesse que estava fazendo isso.

Mantenha a calma. Mantenha o foco no seu objetivo. Faça o que for necessário. Evie é mais importante do que seu orgulho.

—Eu não sei se você está ciente disso, mas tivemos uma novidade no caso de Evie em novembro.

—Continue, ele disse sem revelar qualquer coisa.

—Logo depois da Ação de Graças, eu encontrei uma pista que me levou ao endereço de onde ela estava sendo mantida. Eu vi um homem a enfiar em uma van cinza. Eles fugiram, mas eu a vi, Stephen. Era nossa garotinha. Ela até gritou "mamãe" para mim. Estou te enviando um vídeo agora. É de um estacionamento do Walmart mais tarde naquela mesma noite. Mostra o homem que a pegou sendo baleado e o atirador a carregando para o porta malas do carro e dirigindo para longe.

"Eu estou vendo o vídeo", disse Stephen, evasivo.

"Ok, bem, infelizmente, aí é onde todas as pistas se esgotaram. O homem que a colocou no porta malas é um assassino profissional. Ele sabe como cobrir seus rastros. Já tentei localizá-lo, mas isso só levou a becos sem saída. Mas eu tenho outra ideia.

—E qual é? Ele perguntou.

Essa é a hora que ele normalmente fica desdenhoso. Por que ele está recuando?

—Eu sei que nós discutimos isso antes, mas eu quero contratar um investigador particular. Há outra pista que vale a pena seguir, uma que eu sei que tem potencial. Mas segui-la vai ser caro, mais caro do que eu posso dar conta. Eu preciso da sua ajuda, Stephen.

Houve um longo silêncio do outro lado da linha. Ela quase podia imaginar seu ex-marido reunindo a coragem para dizer o que ele vinha claramente segurando todo esse tempo. Ela o imaginou tirando o cabelo ondulado dos olhos e ajustando os modernos óculos de armação fina, dois ele não precisava realmente.

—Keri, tenho uma confissão a fazer, ele disse calmamente.

—Qual? Ela perguntou, tentando manter o nível de sua voz, mesmo enquanto seu estômago revirava.

—Eu já havia visto vídeo.

—Como?

—Seu parceiro, o Detetive Sands, mostrou-me, ele disse.

—O quê? Ela perguntou confusa. Quando?

—No mês passado. Ele veio até o escritório e me mostrou. Ele me pediu pela mesma coisa que você, dinheiro para contratar o investigador que você quer.

—Por que essa é a primeira vez que estou ouvindo isso? Ela exigiu.

—Provavelmente porque ele não queria lhe dizer o que eu disse a ele, o que eu vou repetir para você. Não vejo nada nesse vídeo que prove que a garota nele é Evie.

—O quê? Keri disse, descrente. Mas é ela. Ela está vestindo as mesmas roupas daquela noite mais cedo. Essa é a mesma van. Está toda amassada.

—Você não vai gostar que eu tenho que dizer, Keri. É por isso que eu não entrei em contato—porque eu estava preocupado sobre como você reagiria.

—Apenas me diga, Stephen, ela disse, se obrigando a manter o amargor fora de sua voz. Ainda havia uma chance de que ela pudesse convencê-lo, mas apenas se ela permanecesse fria.

—Você não pode ver o rosto dela na filmagem, Keri. E ninguém estava com você quando você diz tê-la visto naquela noite mais cedo. Quando eu o pressionei, até seu parceiro admitiu que ela estava tomando a sua palavra de que a garota era Evie.

—Por que eu mentiria?

—Não acho que você esteja mentindo, Keri. Acredito que você viu uma garota naquela noite que estava sendo forçada em uma van e que você se envolveu em uma batida tentando persegui-la. O vídeo realmente mostra uma garota. Mas faz quase seis anos desde que a perdemos. E você está me dizendo que no meio da noite, de uma distância considerável, você reconheceu uma garota que você não vê desde quando ela tinha oito anos e sabia que era sua filha. Não é possível que você tenha visto uma garota loira e desejou que fosse Evie?

—Ela me chamou quando eu gritei o nome dela, Stephen, ela disse, sabendo que a voz dela estava ficando difícil e incerta sobre como parar isso. Era ela.

—Por favor, se coloque no meu lugar, Keri. Minha filha, nossa filha, está desaparecida há mais de meia década. E minha ex-esposa que, sem qualquer avaliação razoável tem dedicado a vida para encontrá-la, diz que a viu. Mas ninguém mais a viu. E as imagens de vídeos que ela alega mostrá-la são inconclusivas. E é esperado que eu vire meu mundo de ponta cabeça baseado nisso, me permitir ter esperança novamente baseado apenas na... sua palavra?

Keri sabia que a palavra dela já não significava qualquer coisa para ele, então ela nem se incomodou em apelar com base nisso. Mas Stephen era um homem prático. Talvez fosse a maneira de conquistá-lo.

—Mesmo se você tiver dúvidas, que mal há? Ela perguntou. O pior que pode acontecer é você gastar um pouco de dinheiro e isso não se desenrolar. Os possíveis benefícios superam os custos.

—Não o custo emocional, Keri. É como se eu tivesse essa ferida e com o tempo ela cicatrizou e se curou. Mas o que você está propondo não apenas arrancaria uma casquinha. Pegaria uma faca e cortaria um novo buraco na ferida. Por que eu faria isso comigo mesmo?

—Porque você pode ter sua filha de volta, insistiu Keri devagar, sabendo que ela estava perto dos limites do autocontrole.

—Mas é o seguinte, e eu odeio dizer isso. Eu não acredito em você. Não acho que você está mentindo. Mas eu não acredito que você viu o que você pensa que viu. E eu não estou querendo despedaçar minha vida baseado na sua palavra. Não posso continuar abrindo a ferida. Tenho que ir adiante com a minha vida. Você pode entender isso?

Keri, quase soterrada com frustração e no limite da ira, abriu a boca. Ela estava prestes a responder quando algo dentro dela a fez parar. Era como se uma luz tivesse sido acesa, não apenas na cabeça dela, mas em toda ela. Era uma epifania, talvez a mais triste que ela já havia experimentado. Ele simplesmente não ligava mais.

O que ele disse era razoável na superfície. A dor de tentar encontrar Evie e falhar era demais para ele. Mas ela podia sentir que não era verdade. Ela podia dizer pela voz dele que ele estava expressando emoções que já não estavam mais ali de verdade.

Houve um tempo no qual havia amado Evie e Keri. Ele fora um bom pai e um marido decente. Mas ele não as amava mais. Ele desligara essa parte dele há muito tempo atrás. Talvez ele sentisse que precisava disso para sobreviver. E Keri não facilitou as coisas para ele. Sua bebedeira e as traições e aura permanente de luto o empurraram para longe.

Mas ela se recusava a acreditar que qualquer pai que ainda se importasse iria rejeitar algum dia a chance, o quão pequena fosse, de encontrar seu filho desaparecido. Mesmo agora, anos depois, os pais das crianças desaparecidas que ela não conseguiu encontrar iam até a delegacia para perguntar se havia alguma pista nova. Uma vez, Ray lhe contou sobre um pai que, pela última década, continuava indo todos os anos no dia que sua filha desapareceu para verificar com ele na esperança de que ele pudesse ter descoberto um novo indício.

Mas não Stephen. Estava acabado para ele. Ele havia escolhido essa nova vida, sua nova esposa e o filho vivo, que ainda podia abraçar e beijar e ler histórias à noite. Parte dela entendia isso. Ela não estava com tanta raiva quanto ela esperava. Ele não era uma má pessoa. Mas alguma parte da sua alma havia atrofiado devido ao que ocorreu. E se foi para sempre.

Ele nunca concordaria em dar o dinheiro para ela ou ajudá-la de qualquer forma. Fazer isso não seria apenas perseguir uma pista que pudesse dar em nada. Significava virar o seu mundo de cabeça para baixo. E isso não era algo que ele estava disposto ou era capaz de fazer. Apenas não era ele. Então ela parou de pedir.

—Eu entendo, ela disse.

—Sinto muito, Keri.

—Tudo bem.

—Eu espero que você encontre alguma paz.

—Obrigada, ela disse e desligou.

Estava sozinha.

Ou talvez não completamente.

Ao olhar para cima, deixando o ar gelado secar as lágrimas que corriam por suas bochechas, ela viu Ray saindo pela porta, olhando ao redor. Enquanto ele espreitava no escuro, ela o estudou, o homem que tinha pedido secretamente ao seu ex-marido por ajuda, porque ele sabia que isso seria muito difícil para ela.

Ele era o homem que havia se colocado na reta, arriscando seu orgulho e independência ao pedir a ela para ser mais que apenas uma parceira e amiga. Apesar da conversa que ela acabara de ter, Keri sentiu um sorriso começar nos cantos de sua boca.

—Você está procurando por mim? Ela chamou, percebendo enquanto dizia que a pergunta tinha mais que um significado.

Ele se virou na direção dela.

—Sim, você vai querer voltar para dentro. Tim Rainey está prestes a fazer uma conferência ao vivo na TV.


CAPÍTULO VINTE E UM


Quando Keri chegou à sala de conferências, coração batendo forte e sem fôlego devido a corrida, todos já estavam amontoados ao redor do monitor. Ela abriu caminho através para que pudesse ver.

Rainey estava subindo para o microfone. Sua face estava tensa e esgotada pela falta de sono. Ele estava claramente nervoso, mas sua expressão era determinada.

—Essa mensagem é para a pessoa que está com a minha filha. Eu vou aceitar todos os seus termos. Eu irei onde eu precisar ir e pagar a quantia que você exigir. Só quero minha filha de volta, por favor. Eu farei qualquer coisa. Eu imploro. Deixe minha pequena Jess ir. Isso é tudo o que eu tenho a dizer.

Com isso, ele se virou e retornou para a casa, ignorando as luzes dos flashes e a cacofonia das perguntas gritadas pelos repórteres reunidos.

—Arg, ela escutou o Tenente Hillman dizer e se virou para vê-lo cair em uma cadeira no canto da sala.

—Isso não é bom, murmurou Manny Suarez.

—O que esse idiota estava pensando? Exigiu Brody, exprimindo rispidamente a pergunta que todos estavam fazendo em silêncio.

—Ele está desesperado, disse Ray. Pegue leve com ele. Ainda, isso é um pesadelo. Eu só posso imaginar todas as ligações que ele já está recebendo dos malucos e vigaristas. Eu não posso acreditar que ele achou que isso era uma boa ideia.

—Nem eu posso, concordou Keri.

—Parece suspeito, observou Ray.

—Não faz o menor sentido. Eu sei que ele está desesperado. Mas que bem ele achou que isso faria? Ele não é estúpido. Ele deveria saber que um grande apelo público não iria ter qualquer impacto no cara que fez isso. Você leu as cartas. Elas pareciam o trabalho de um cara que ficaria balançado por um pai devotado?

—Elas não pareciam com o trabalho de alguém que pudesse ser abalado por qualquer coisa, salientou Ray.

—Exato. Alguma coisa aqui não está certa, disse Keri enquanto caminhava até a sua mesa para pegar o casaco.

—O que você está planejando fazer? Perguntou Ray, seguindo-a.

—Eu vou ir até e perguntar a ele que diabos está acontecendo realmente.

—Mas não é mais nosso caso, Keri, ele sussurrou. Nós não podemos só ir entrando. Os federais terão nossas cabeças.

—Não a nossa, Keri insistiu. Só a minha. E talvez não. Winchester é um cretino, mas eu acho que eu posso convencer o Agente Crowley a me dar uma chance com Rainey. Você fica aqui e mantém Hillman ocupado enquanto eu me estiver me esgueirando para fora.

—Isso é uma ordem? Perguntou Ray, mas impressionado que bravo.

—Desculpe, você poderia me dar cobertura para que eu possa violar as ordens?

—Seria um prazer, ele disse. Apenas me mantenha informado.

— “Isso é uma ordem? Perguntou mesquinhamente enquanto se dirigia rapidamente para a porta, não o deixando ter uma resposta. Ela o imaginou atrás dela, lutando contra o ímpeto de fazer um comentário sarcástico, sabendo que atrairia atenção com isso. Uma vez mais, ela sentiu um sorriso se espreitando pelos lábios.


*


Não havia sorrisos a serem dados na casa dos Rainey quando ela chegou quarenta e cinco minutos depois. Foi difícil o suficiente navegar a multidão de barreiras de madeira, policiais e caminhões de TV na vizinhança ao redor apenas para chegar a porta da frente. Mas quando ela entrou, ela quase imediatamente recebida pelo Agente Winchester com a testa franzida.

—Que diabos você está fazendo aqui? Ele exigiu grosseiramente.

—Eu só queria atualizar você e o Agente Crowley na situação daquela pesquisa dos arquivos dos casos que vocês pediram para fazermos, ele respondeu docemente. Houve alguns progressos interessantes. Onde está Crowley? Eu posso atualizá-los juntos.

Ela podia ver que ele queria expulsá-la, mas a frase "progressos interessantes" o manteve de lado. Era um monte de mentiras. Não havia progressos. Mas se ela pudesse ao menos encontrar Crowley, estava bem certa de que pudesse convencê-lo a deixá-la falar com Tim Rainey e determinar o que estava acontecendo.

—Siga-me, Winchester rosnou e mostrou o caminho para a cozinha, onde uma meia dúzia de agentes, incluindo Crowley, estava amontoada em torno do balcão da cozinha estudando o que parecia ser um mapa da área. Carolyn Rainey e Nate estavam sentados na mesa do café, montando um quebra-cabeça. Tim Rainey não estava à vista.

Crowley olhou para cima e ao vê-la se aproximou.

—Isso é uma pequena surpresa, Detetive Locke. Ao que devemos a honra?

—Ela disse que os arquivos dos casos que demos a eles tinham alguma coisa de interessante, Winchester disse antes que Keri pudesse responder.

—Sério? Perguntou Crowley, parecendo moderadamente surpreso.

—Sim, disse Keri. O que eu achei de interessante foi que havia nada virtualmente interessante em qualquer um deles. Foi quase como se eles nos fossem entregues como um trabalho exaustivo para que possamos ficar fora do caminho do FBI. Mas eu sei que vocês nunca fariam isso.

Crowley e Winchester trocaram olhares desconfortáveis, mas nenhum deles falou, então ela continuou.

—De qualquer forma, eu só queria relatar que nem um único arquivo tinha qualquer coisa de valor. Mas já que estou aqui, como as coisas estão indo?

Winchester parecia irritado por eles terem sido enganados, mas Crowley, aparentemente se divertindo, respondeu.

—Tenho certeza de que você viu aquele pesadelo de declaração que Rainey deu.

—Vi.

—Então você pode imaginar a reação que recebemos. Estamos recebendo ligações de todo maluco na área da Grande Los Angeles. Está sendo terrível.

—Porque você acha que ele fez aquilo? Perguntou Keri. Ele deveria saber que não traria qualquer benefício.

—Eu adoraria perguntar a ele, disse Winchester. Mas no segundo que ele entrou na casa, ele foi direto para o quarto, fechou a porta e a trancou.

—Ele murmurou algo sobre precisar descansar e disse para avisá-lo se recebêssemos alguma resposta relevante, acrescentou Crowley.

—Então ele fez esse apelo apaixonado pela filha e simplesmente foi para cima tirar um cochilo? Perguntou Keri incrédula.

—Ele não está realmente na melhor forma, disse Winchester.

—Vocês se importam se eu subir e tentar falar com ele? Ela perguntou.

Winchester pareceu abismado com a ideia.

—Ele vai arrancar sua cabeça fora, ele disse, não completamente triste.

—Está bem. Ele já me odeia. Um cáustico bate boca a mais não vai fazer grande diferença para mim. Eu só não quero pisar nos pés de ninguém. Afinal, agora é o caso de vocês.

—Sabe, Crowley meditou, não é uma péssima ideia. Se ele diz alguma coisa relevante, é ótimo. Se ele te apaga ou explode em você, nosso relacionamento com ele não vai ser prejudicado. Eu digo: à vontade.

Winchester, incapaz de pensar em uma boa razão para se opor a ideia e provavelmente intrigado com alguém gritando com Keri, acenou com a cabeça.

—Ok, eu conto a vocês como foi, ela disse. Isso é, se vocês não conseguirem adivinhar pelos berros e gritos.

Ao se virar para sair, ela pegou Carolyn Rainey olhando para ela furtivamente, quase culposamente. A mulher afastou os olhos no segundo que Keri fez contato visual.

Aquilo era estranho.

Mas dizendo nada, Keri deixou o cômodo e subiu as escadas. O quarto dos Rainey ficava no fim do corredor. Ela chegou ali e parou por meio segundo antes de bater.

Isto é realmente uma boa ideia? Talvez eu deveria deixar o homem descansar. Ele claramente precisa disso.

Mas ela não podia largar a sensação de que algo não estava certo. E então ela bateu, suavemente no início e depois mais alto.

Sr. Rainey. É a Detetive Locke, eu sei que você está infeliz comigo, mas eu preciso falar com você. É importante.

Ela esperou alguns segundos e então bateu novamente, dessa vez batendo ruidosamente. Não havia como ele não ouvir aquilo.

Sr. Rainey, realmente preciso que você abra a porta.

Ela olhou para o sopé das escadas e viu um par de agentes colocarem a cabeça para fora da porta da cozinha para olhar para ela.

Agora estou empenhada.

Ela bateu forte na porta com os punhos, fazendo a coisa toda tremer. Já que não houve resposta, ela verificou a maçaneta. Estava trancada de fato. Agora ela estava genuinamente preocupada. Uma imagem de Tim Rainey deitado na cama com um pote de pílulas para dormir aberto na mão passou pela cabeça dela.

Sr. Rainey, ela gritou. Estou preocupada com a sua segurança. Se você não abrir a porta nesse instante, eu vou ter que arrombá-la. Você tem cinco segundos.

Ela começou a contagem regressiva. Quando ela chegou a zero, ela se preparou para bater o ombro na porta. Ela estava quase começando a se mover para frente quando sentiu uma mão no antebraço. Era Winchester.

—Mesmo que eu adorasse ver você se atirando nessa porta, talvez seja melhor você me deixar tentar.

—Você acha que eu não consigo fazer isso? Ela exigiu.

—Eu tenho certeza que você consegue, mas eu também sei que você quebrou sua clavícula a menos de um ano atrás. Se alguém mais está querendo usar o corpo como aríete, talvez seja melhor deixá-lo.

—Como você sabe sobre minha clavícula? Demandou Keri.

—Nós somos o FBI, Detetive Locke. Você ficaria impressionado com o que nós sabemos.

Antes que ela pudesse responder, ele se lançou à porta, batendo com uma força que ela não pensava ser possível. Houve um estalo alto enquanto a porta saia das dobradiças e batia no chão. Winchester tropeçou para dentro, quase caindo antes de se equilibrar. Keri entrou logo depois dele. Rainey não estava na cama, nem em qualquer lugar do quarto.

—Onde diabos ele está? Perguntou Winchester.

—Boa pergunta, disse Keri. Você verifica embaixo da cama e no closet. Eu pego o banheiro.

Sem esperar por uma resposta, ela foi em direção de onde ela assumiu ser o banheiro. Ela desfez o fecho em seu coldre e descansou os dedos sobre o cabo da arma, pronta para retirá-la se necessário.

O banheiro, inclusive o box e o closet, também estavam vazios. Quando ela voltou para o quarto, viu Winchester verificando a janela. Ela notou que ele estava segurando a arma frouxamente na mão direita.

—Trancada por dentro, ele disse quando a viu. Ele não está no closet ou embaixo da cama.

—O banheiro está limpo também, disse Keri bem quando Crowley e dois outros agentes invadiram o quarto.

—Que diabos? Ele perguntou para ninguém em particular.

—Ele não está aqui, disse Winchester.

—Onde diabos ele se meteu?

Winchester olhou desamparado para Keri.

—Não faço absolutamente a mínima ideia, ela admitiu.


CAPÍTULO VINTE E DOIS


Keri ignorado o caos ao seu redor. Enquanto os agentes do FBI vasculhavam o quarto, encostou-se contra o corrimão do corredor, permitindo seus pensamentos viajarem para onde quisessem, esperando que eles formassem algo coerente e útil.

Desde quando havia visto Tim Rainey dar sua declaração à imprensa, algo parecia estranho. Não havia razão para fazê-lo e ele certamente sabia disso. Mas ele o fez de qualquer maneira. Ela lembrou-se do rosto dele enquanto ele falava. Ele não parecia desesperado. Ele parecia determinado, como se tivesse um propósito específico em mente.

Após cerca de cinco minutos, os agentes se reuniram fora do quarto, desanimados. Eles não encontraram qualquer coisa que sugerisse como Rainey havia saído ou para onde ele possa ter ido. Ela entrou de volta no quarto e sentou-se na cama, tentando se colocar na mentalidade de Timothy Rainey.

Estava claro para ela que a declaração à imprensa era uma artimanha de algum tipo. Talvez tivesse a intenção de fazer o FBI pensar que ele havia perdido a cabeça, assim eles apenas o deixariam sozinho tempo suficiente para ele sair. Ela suspeitava que, embora isso fosse parte daquilo, havia mais alguma coisa na sua performance. Ele tinha algum propósito mais profundo.

Qual era?

Duas outras questões cruciais a consumiam. Como ele saíra e, mais importante, para onde ele foi?

Ela deixou a última questão de lado por hora, escolhendo focar na primeira, a qual parecia mais resolúvel por enquanto. Levantando, ela vagou pelo quarto por alguns minutos, espiando o closet e ligando a luz. Ela sentiu ao longo das paredes por algum espaço oco, mas não encontrou.

Ele se abaixou de bruços e iluminou em baixo da cama com sua lanterna, procurando por qualquer carpete atrapalhado que pudesse revelar um alçapão. Ela sabia que os agentes do FBI já haviam verificado isso, mas queria um desencargo de consciência.

Ela caminhou até a janela ainda trancada. Como ele poderia ter saído e a deixado trancada? E ainda que ele o tivesse feito, era uma queda de seis metros até o chão abaixo. Era difícil de imaginar que ele pudesse sair ileso de um salto como esse.

Ela fez seu caminho até o banheiro e olhou mais de perto no closet, também verificando por espaços ocos. Não havia qualquer um deste, mas ela notou algo incomum.

O closet tinha uma parede que se encaixava no interior do cômodo, cortando o cômodo, retangular de outra maneira. Ele retornou ao banheiro, assumindo que ela descobriria que a parede era inserida, porque o chuveiro ou a banheira necessitaria do espaço extra. Mas nenhum deles necessitava.

De fato, aquela seção da parede se projetava no espaço do chuveiro também, fazendo-o um pouco menor do que o esperado. Ela deu umas batidas, mas era sólido. Intrigada, ele foi ao quarto contíguo, de Nate, e descobriu a mesma seção sem propósito da parede sobressaindo ligeiramente para o cômodo. Ela bateu no trecho e ali encontrou nenhum ponto oco também.

Assim como as outras seções que havia verificado, a parede parecia mais firme de alguma forma mais esponjosa que uma parede de gesso regular. Com um pressentimento, ela agarrou o taco de baseball de alumínio de Nate, que estava no chão ao lado da cama dele, agachou como um rebatedor e oscilou o taco com toda sua vontade na seção incomum da parede.

A força do impacto arremessou o taco de suas mãos e estremeceu todo seu corpo. Ela verificou o local onde havia acertado a parede e não encontrou nada, apenas um leve rasgo no papel de parede do Batman. Ela cravou suas unhas e descascou o papel de parede.

Atrás do mesmo, havia uma grossa camada de espuma. Ela tirou o seu canivete suíço e cortou por ela. A espuma tinha pelo menos um centímetro de espessura. Ela conseguiu remover um pedaço e sentiu o que estava por trás. Era algum tipo de metal. Quando ela bateu nele com sua lanterna, não fez eco. Seja lá o que fosse, era espesso.

Só então, Crowley entrou no quarto e ligou a luz.

—O que está acontecendo, Locke? Fez um barulho como se você tivesse caído no chão ou algo do tipo.

—Agente Crowley. Eu acho que descobri como Rainey saiu, ela disse, batendo novamente no metal. Infelizmente, nós vamos precisar de uma ajudinha para entrar aí.

—O que é isso? Ele perguntou.

—Se meu palpite está certo, é um quarto do pânico. E estou chutando que tem sua própria saída da casa.

—Um quarto do pânico? Essas coisas são impenetráveis.

—São. A não ser que você saiba como entrar, ela disse enquanto passava por ele e se dirigia para a escadaria. E há alguém aqui que acho que possa nos ajudar com isso.

Ela se apressou para baixo nas escadas e virou na cozinha, onde ela não ficou surpresa em encontrar Carolyn Rainey a encarando diretamente. Agora Keri entendeu por que a mulher tinha lhe dado aquele olhar estranho mais cedo.

—Sra. Rainey, disse Keri, você vai ter de deixar um dos agentes tomar conta de ajudar o Nate com esse quebra-cabeça. Nós precisamos conversar.

Carolyn Rainey sussurrou algo no ouvido do filho, deu-lhe um beijo na bochecha e acenou para o agente mais próximo tomar o seu lugar. Então, ela se levantou muda e seguiu Keri até a sala de estar.

—Eu preciso do código de acesso para o quarto do pânico, disse Keri sem nenhum rodeio.

—Eu não sei do que você está falan-

—Não desperdice meu tempo, Sra. Rainey. Eu quero a localização do painel de acesso e o código. Então, você vai nos dizer onde foi o seu marido.

Carolyn Rainey permaneceu ali, suas pernas aparentemente travadas no lugar. Ela abriu a boca, a fechou e então a abriu novamente. Claramente ela estava passando por alguma batalha interna.

—Você pode pensar que está protegendo o Tim, disse Keri, forçando o tom dela para vários graus mais suaves, mas você não está. Você está colocando-o em um risco muito maior. A não ser que ele tenha algum tipo de treinamento das Forças Especiais do qual eu não saiba, onde quer que ele tenha ido, ele está em clara desvantagem.

—Ele tem uma arma, disse Carolyn. Winchester, que acabara de se juntar a elas, resmungou. Carolyn Rainey olhou para ele com confusão no rosto.

—Isso não é nada mais tranquilizador, disse Keri, respondendo sua questão não perguntada. Eu garanto a você que a pessoa da qual ele está atrás também tem uma e está mais acostumado a usá-la. Deixe-me ajudar seu marido. O que quer que ele esteja fazendo, não vai trazer Jessica de volta. Eu odeio ter que ser brusca, mas esse cara não vai devolvê-la por qualquer preço. A única maneira de a encontrarmos é através de um trabalho investigativo diligente. Com esta proeza, seu marido está colocando sua filha e ele próprio em um perigo maior. Agora me diga o que eu quero saber.

Keri podia ver a barragem se rompendo nos olhos de Carolyn Rainey antes que ela falasse. Depois de um segundo, tudo pulou para fora.

—O painel de acesso está embaixo de um ladrilho atrás um toalheiro no nosso banheiro. Apenas o empurre e ele irá saltar para fora e deslizar para o lado para revelar o teclado. O código é 93 #1576 #.

Winchester, que havia anotado o código, pulou escada acima três degraus por vez. Um enxame de agentes o seguiu. Keri e Carolyn Rainey foram deixadas sozinhas no sopé da escada.

—Não fará diferença alguma para vocês, continuou Rainey. Ele está muito longe.

—É por isso que você vai me contar tudo, insistiu Keri. A declaração à imprensa— era só um truque para que o FBI pensasse que ele tinha perdido a cabeça e deixá-lo sozinho no quarto?

—Isso foi apenas um benefício colateral A verdade é que, quando recebemos o último pacote de FedEx, também estava incluído um pequeno número de telefone com uma nota. Ela dizia para esconder o número de telefone e não mencioná-lo para a polícia. Dizia que nós receberíamos uma mensagem de texto em algum momento e se nós seguíssemos exatamente as instruções, nós ainda poderíamos ter Jessica de volta para que o Tim próprio a purificasse.

—Vocês receberam a mensagem esta noite?

—Sim. Dizia para convocarmos uma coletiva de imprensa e implorar pela vida dela. Não era importante o que Tim diria. Ele só queria ter certeza que fosse televisionado. Então, o sujeito saberia que nós recebemos a mensagem e que estávamos querendo encontrá-lo. Ele disse para encontrá-lo exatamente vinte minutos após o término da coletiva.

—Ele se foi, gritou Crowley, emergindo do quarto. Há um mastro de bombeiro lá que leva a uma porta escondida abaixo, nos fundos da casa. Winchester acabou de escorregar. Ele disse que há pegadas frescas na grama lá fora.

Keri assentiu e se voltou para Carolyn.

—Onde ele foi? Ela sussurrou. Diz-me rapidamente para eu conseguir uma vantagem. É melhor se nem todos aparecerem de uma vez com as sirenes retinindo. Isso poderia afugentar o cara. Eu posso entrar rapidamente e em silêncio.

Carolyn Rainey não precisava ser convencida.

—Ele disse para o encontrarmos nas quadras de basquete no Del Rey Lagoon Park, lá na esquina do Pacific com o Convoy.

—Isso fica a menos de um quilômetro daqui, disse Keri. Também ficava a menos de meio quilômetro do apartamento dela e apenas um quarteirão da praia. Ela havia caminhado pela lagoa dúzias de vezes nos meses recentes.

—Sim, mas ele tinha que chegar lá a pé, então vinte minutos não era muito tempo. Por isso ele estava com tanta pressa para ir para o quarto.

—Ok, escute. Eu vou sair agora. Dê-me cinco minutos de vantagem e, então, diga ao Crowley o que me disse. Entendido?

—Por favor, certifique-se que ele esteja bem, implorou Carolyn Rainey.

—Farei o meu melhor, disse Keri, sem fazer promessas.

Ela se dirigiu para a porta da frente e reparou Crowley a olhando atentamente com curiosidade.

—Eu vou ligar para a delegacia e atualizá-los, ela o chamou. Talvez alguém tenha visto algo.

Ele assentiu, embora parecesse menos que convencido. Ela também não estaria se outro agente da lei tivesse partido de interrogar alguém agressivamente para andar casualmente a passos lentos até a saída.

Quando ela saiu passou pela porta, caminhou até seu carro tão rapidamente quanto podia sem que levantasse suspeitas. Ela duvidava que Carolyn Rainey iria segurar por muito tempo diante do interrogatório do FBI. A única vantagem que Keri tinha era a sua familiaridade com a área e sua breve vantagem inicial.

Ela seria sortuda em ter dois minutos na frente dos federais.


CAPÍTULO VINTE E TRÊS


Foi preciso cada grama de comedimento que Keri possuía para não enfiar o pé no acelerador quando atingiu a estrada. Mas isso teria levantado suspeitas do FBI, policiais locais e também da mídia, então ela cruzou a vizinhança nos quarenta quilômetros por hora recomendados. Levou apenas três minutos para chegar até Del Rey Lagoon Park, mas cada segundo parecia uma hora.

Quando ela encostou a um quarteirão de distância do escuro e deserto parque, ela podia dizer que estava muito atrasada. O que quer que tenha ocorrido, já havia acabado.

Ela podia ver uma figura sombria curvada ao lado de uma van U-Haul alugada com a porta de correr aberta, sua silhueta era visível na fraca luz do interior. Parecia Tim Rainey. Em algum lugar próximo a ele, ela ouviu um terrível grito agudo e rouco.

Ela partiu em corrida, ignorando a queimadura gelada em sua garganta ao inspirar o ar gélido da noite. Enquanto se aproximava, ela viu movimento e percebeu que ele estava vivo. Ela desacelerou um pouco, o suficiente para tirar a arma. Quando ela o alcançou, viu que ele estava de quatro e percebeu que o grito agudo era na verdade ele chorando suavemente com o que restava de sua voz rouca.

Ela podia ver uma mochila azul embaixo de seu tronco. Parecia cheia e aberta. Ao lado de sua mão direita, deitada no chão, havia uma pistola. Ela olhou para cima, espiando dentro da van. Estava completamente vazia. Ela se moveu para perto de Rainey e chutou a arma para fora de seu alcance.

—Sr. Rainey, ela disse, seus olhos ainda procurando toda a área, é a Detetive Locke. Diga-me o que aconteceu.

Na distância, mas ficando mais alto, ela podia ouvir o som de várias sirenes. Ela olhou para o relógio. Ela havia estacionado sessenta segundos atrás e supôs que eles estariam aqui em outros sessenta. O Agente Crowley era impressionante.

—Tim, ela disse, esperando que o toque pessoal pudesse atingi-lo, nós temos um problema de verdade nas mãos. Você saiu de fininho debaixo do nariz do FBI. Você veio aqui por conta própria. E você tem uma arma. Isso pode acabar muito mal para você. Eu quero ajudar. Mas nós temos apenas quarenta e cinco segundos antes que esse lugar esteja abarrotado de policiais. Então me diga o que aconteceu. Agora!

Isso pareceu balançá-lo para fora de seus devaneios. Ele olhou para ela. Seus olhos estavam inchados pelo choro ininterrupto.

—Ele disse que a entregaria para mim. Apenas traga o dinheiro e nós faremos a troca. Ele foi tão específico. Ele disse que ele estaria em uma U-Haul esperando por mim. Eu ia atirar nele se ele estivesse lá, mas eu estava preocupado que eu pudesse atingi-la então eu não atirei. E então, quando eu abri a porta achei que iria ver o corpo sem vida dela. Se eu tivesse, teria usado a arma em mim mesmo.

—Mas ela não estava lá? Perguntou Keri, escolhendo pular o último comentário dele. A van estava vazia?

—Exceto por isso, ele disse, segurando um saco plástico com algum tipo de tecido dentro. É outro pedaço da blusa dela. Estava apenas jogado no chão da van.

Ele largou o saco cair no chão. Keri notou um escrito nele. Ele deu um passo para mais perto e viu, em uma letra de forma grossa, uma palavra: PECADOR.

Ela olhou para cima. As sirenes estavam muito mais perto agora e ela achou que pudesse vez as luzes piscando rompendo a escuridão apenas a quarteirões de distância.

—Você viu alguém afinal? Ela implorou.

—Alguns carros passaram por aqui. Algumas pessoas passaram pela área. A maior andando com cachorros. Não havia algum cara sozinho. Estou aqui a mais de uma hora. Após um tempo eu percebi que ele esteve apenas brincando comigo. Ele não quer o dinheiro. Ele quer apenas nos torturar. Eu nunca vou ver minha garotinha de novo.

Ele colocou a cabeça para trás e retornou seu miado rouco.

Keri queria dizer algo reconfortante, mas temia que ele pudesse estar certo. Ao invés disso, ela focou no trabalho em mãos.

—Tim, ouça com atenção. Só temos alguns segundos. Preciso que você se levante.

Ele ficou onde ele estava, em suas mãos e joelhos, seu corpo protegendo a sacola de dinheiro como se fosse sua filha. As sirenes estavam ensurdecedoras agora e ela podia perceber os carros virando a esquina a qualquer momento.

O cara já era. Você tem que protegê-lo dele mesmo.

Ela se moveu rapidamente até Tim Rainey, colocou as mãos sob suas axilas e o levantou de pé. Ele parecia indiferente. Então ela retirou um lenço do bolso dele e o usou para pegar a arma de Tim. Depois de verificar a segurança, ela a enfiou na parte de trás da cintura dele.

Os carros e suas incansáveis luzes piscantes haviam virado a esquina. Tudo ao redor deles estava banhado em azul, vermelho e branco, como se estivessem em uma boate ao ar livre. Ela percebia que Tim estava ciente de nada disso e, sem parar para pensar sobre isso, ele deu-lhe uma forte tapa no rosto.

Ele tropeçou um instante, mas a ação dele pareceu tê-lo trazido de volta ao mundo. Seus olhos inchados clarearam-se um pouco e ele olhou diretamente para ela. Ela podia ouvir veículos derrapando até pararem e portas de carros sendo abertas.

—Ouça-me, Tim. Isso é importante. Não conte a ninguém que você tirou sua arma. Você pode entrar em apuros por isso. Apenas diga a eles o que aconteceu, menos a arma. Ela ficou na sua cintura. Você só a trouxe para proteção. Você entende?

Ele assentiu vagamente. Ela reiterou o ponto.

—Esses caras vão perdoar muita coisa para um sujeito na sua situação: não mencionando o telefone, fugir—eles são ruins, mas compreensíveis. Porém se eles acharem que você é um justiceiro indomável, eles podem ter que te levar sob custódia. E Carolyn e Nate precisam de você agora, assim como você precisa deles. Então, sem papo de arma, ok?

—Ok, ele disse, parecendo entender. Havia vozes gritando, ficando mais próximas. Ela não podia entender as palavras, mas o tom não soava amistoso.

—Ok, Tim, ela disse calmamente, ignorando as vozes e focando toda a sua atenção em Rainey, ambos precisamos levantar nossas mãos acima da cabeça agora, para eles saberem que não somos uma ameaça. Eu vou dizer a ele que você tem uma arma de maneira que eles não sejam surpreendidos. Apenas deixe-os a levar e siga as ordens deles. Você entendeu?

—Entendi, ele respondeu, levantando as mãos em uníssono com ela. As costas dela estavam viradas para as pessoas correndo na direção deles, mas ela podia ouvi-los se aproximando e podia dizer que eles estariam ao alcance dos ouvidos muito em breve.

—Tim, eu sei que as coisas parecem sem esperança, ela disse, alto o suficiente para apenas ele escutar. Os olhos deles estavam fixos um no outro. Mas eu lhe dou minha palavra. Não terminei com isso. Eu não desisti de encontrar Jessica.

Ele olhou para ela e abriu a boca como se fosse falar, então a fechou novamente. Ela sabia que ela estava fazendo promessas que talvez não pudesse cumprir. Mas se isso ajudasse Timothy Rainey a não se matar, valia a pena.

—Eu vou ter que lidar com esses caras primeiro, ela continuou, fazendo referência aos agentes que estavam apenas a metros de distância. Mas eu vou continuar procurando pela sua fila. Não desista. Não se machuque. Seja um marido para Carolyn e um pai para Nate. Esse é o seu trabalho. Prometa-me que vai fazer seu trabalho.

Os federais estavam em cima deles agora, se aglomerando. Mas antes que eles forçassem Timothy Rainey para o chão e algemassem suas mãos atrás das costas, Keri teve certeza de vê-lo acenar.


CAPÍTULO VINTE E QUATRO


Uma hora depois, Keri, estava sentada no sofá de dois lugares manchado do escritório do Tenente Hillman, esperando, fingindo que tudo estava bem, mesmo que definitivamente não estivesse. A porta estava fechada, então ela não conseguia ouvir muita coisa. Mas ela sabia que todos na sala de discussões estavam lançando olhares furtivos nela, então ela manteve a face impassível, escondendo a ansiedade espumante que sentia por dentro.

Muito do que aconteceu depois que o FBI chegou à lagoa era um borrão. Ela informou aos agentes que Rainey estava armado e, apesar dos protestos dela de que ele não era uma ameaça, eles o levaram sob custódia, Crowley também a algemou brevemente. Ela suspeitava que era principalmente devido a um sentimento de frustração e não reclamou.

Ele e o Winchester a interrogaram no caminho para a delegacia. Ela respondeu a maioria das perguntas deles honestamente, dizendo que ela achou que a chegada da cavalaria de uma só vez colocaria a vida de Tim Rainey em risco e a de Jessica também se ela estivesse lá.

Eles bradavam com ela que não era decisão dela, que era um caso federal, que ela havia deliberadamente retido informação relevante e potencialmente obstruído a justiça. Ela queria zombar da última acusação, mas recuou, sabendo que seria contraproducente.

Ao contrário, ela se desculpou repetidamente, dizendo que pensou estar fazendo a coisa certa para ajudar a manter Tim Rainey seguro e que percebeu depois que isso foi um erro. Quando chegaram à delegacia, a fúria dentro dos dois homens parecia ter abrandado.

Mas isso não significava que eles ainda não iriam buscar algum tipo de ação disciplinar. O próprio fato de ela estar encalhada no escritório do Hillman todo esse tempo, enquanto ele se reunia com eles na sala de conferência com isolamento acústico, sugeria que as coisas estavam nada azuis.

Na sala de discussões, ela podia ver toda a equipe de pé desconfortavelmente, assistindo à ação pelas janelas da sala de conferências como se fosse um filme mudo. De vez em quando, Ray olhava na direção dela e dava de ombros ou balançava a cabeça. Ela o conhecia bem, mas não tinha ideia do que essa linguagem corporal dele significava.

Finalmente, a reunião acabou. Keri esticou o pescoço para ver o que estava acontecendo. Para o terror dela, viu que não era apenas Hillman, Crowley e Winchester que estiveram na reunião. Também, os dois detetives do Assuntos Internos que vinham investigando a morte do Colecionador pelas mãos dela.

Havia mais uma pessoa na sala, a Chefe do LAPD Reena Beecher. Beecher saiu para o corredor e Keri se deslumbrou com como um policial veterano com trinta anos na força pudesse parecer tão suntuoso. Em meados dos seus cinquenta anos com um cabelo preto cinzento amarrado para trás em um coque profissional, ela era alta, com uma silhueta esguia e rosto angular marcado por profundas marcas de preocupação. Ela parecia um falcão moderadamente atraente.

Beecher fora capitã da Divisão Oeste de LA quando Keri entrou. Ainda que Keri mal conhecesse a mulher, ela estava ciente que Beecher havia advogado por ela. O resgate de Keri de múltiplas crianças em casos de grande importância havia permitido Beecher a salvá-la de ações disciplinares e até mesmo de suspensão em mais de uma ocasião.

Mas alguns meses atrás, Reena Beecher fora promovida para chefe de polícia de todo o Departamento de Polícia de Los Angeles. E ao mesmo tempo que uma maior autoridade por parte dela pudesse ter parecido bom para Keri na superfície, ela se preocupava que isso poderia ser contraproducente na verdade.

Beecher não era mais apenas uma advogada para policiais na divisão dela. Ela era responsável pela a reputação de toda a força. Keri temia que suas ações nesta noite poderiam não deixá-la em uma boa posição com seu anjo da guarda.

Beecher saiu da sala de discussões sem olhar de volta para Keri. Isso não era um bom sinal. O olhar no rosto de Hillman enquanto ele andava na direção dela reforçava sua preocupação. Ele estava franzindo o cenho e toda sua face parecia contraída, como se ele estivesse sentindo dor física.

Ele abriu a porta, entrou e a fechou de novo rapidamente. Então, ele andou até sua mesa e se sentou, seus olhos no chão o tempo inteiro.

Isso não é bom. Ele gosta de encarar as pessoas em submissão. Mas ele nem está fazendo contato visual.

—Qual é a história, chefe? Ela perguntou em um tom forçado, casual, ela sabia que não era convincente.

Finalmente, ele olhou para ela e ela se preparou para o que sentiu que estava por vir. Ele suspirou profundamente.

—Eu vou começar com as boas notícias, ele disse, porque não há muitas delas e não vai demorar muito. O FBI decidiu não prosseguir qualquer ação formal contra você. Crowley gosta de você, apesar do que você fez. E mesmo aquele babaca do Winchester parece respeitá-la. Eles sabem que sem você eles ainda poderiam estar esperando Tim Rainey sair do quarto.

—Até agora, tudo bem, disse Keri, mais para se animar do que qualquer outra coisa.

—Eu também acho que eles decidiram que não precisam colocar mais pilha em todo o resto.

—Todo resto? Ela perguntou.

—O Assuntos Internos está reavaliando o caso envolvendo você e o Colecionador, Brian Wickwire.

—Eu pensei que eu estava em vista de ser liberada, disse Keri.

—Aquela foi uma determinação preliminar. E é o motivo pelo qual você é permitida continuar na ativa. Mas o AI recebeu hoje uma pista de uma fonte alegando que você foi ao apartamento do Wickwire depois do seu confronto com ele e manipulou evidências.

—Tenente, eu— Keri começou.

—Não diga qualquer coisa, Locke, interrompeu Hillman. Eu não quero saber e eu muito certamente não quero ser uma testemunha. Apenas fique com sua boca fechada e entre em contato com seu representante do sindicato. Não compartilhe qualquer coisa com qualquer pessoa além dele. E isso inclui seu parceiro. Ele pode ser chamado para testemunhar também.

—Eles disseram quem é a fonte? Não posso confrontar meu acusador? Keri sabia muito bem quem era a fonte—Jackson Cave. Mas a questão era: como ele deu a pista para o AI? Ele se revelou? Ele entrou em contato com eles diretamente ou através de um intermediário?

—Eles não disseram, respondeu Hillman. Mas isso é definitivamente algo a ser levado para o seu representante. Pode ser uma linha de defesa convincente.

—O que a Chefe Beecher tinha a dizer? Perguntou Keri.

—Não havia muito que dizer. Você sabe que ela foi à guerra por você em mais de uma ocasião. Ela até me impugnou quando eu quis te suspender depois do caso Ashley Penn. Mas isso está fora das mãos dela. Se parecer que ela está acobertando um tira justiceiro, mesmo um que está atrás do cara que raptou a filha... bem, não é factível politicamente.

—Então, o que isso significa?

—Significa que você está suspensa indefinidamente, Keri, disse Hillman, contando a ela o que ela já suspeitava. Será com pagamento, mas você não poderá voltar até que isso esteja resolvido.

—Não posso nem fazer trabalho de escritório?

—Não pode—regulamento. Fora isso, não se sabe o quanto isso pode durar.

—Eu posso pelo menos terminar o caso Rainey? Eu prometi a Tim Rainey que eu continuaria procurando a filha dele.

—Receio que não, disse Hillman. A suspensão entra em vigor imediatamente. E Keri, você sabe tão bem quanto eu que você não deveria ter feito essa promessa, com suspensão ou não.

Keri queria dizê-lo que fora para convencer um pai suicida no limite, mas isso requeria revelar que Rainey tirara a arma, tornando sua vida ainda mais complicada. Ela ficou quieta.

—E mais uma coisa, disse Hillman, uma expressão pesarosa no rosto. Vou precisar do seu distintivo e da sua arma.

Sem discussão ou demora, Keri desfez o coldre do cinto e o colocou na mesa de Hillman, com a arma apensa. Então, ela tirou o distintivo e o colocou ao lado da sua arma.

—O que eu faço agora?

—Vá para casa, ele disse gentilmente. Está tarde. Entre em contato com seu representante do sindicato e agende uma reunião para o mais cedo possível. Então vá dormir. As coisas vão parecer um pouco melhores pela manhã. Apenas veja isso como as muito necessárias férias.

—Então eu deveria apenas relaxar e tomar algumas margaritas enquanto uma garota está sendo mantida em cativeiro por um fanático religioso assassino de crianças?

—Keri, ele disse, só porque você se foi, não significa que o caso está acabado. O FBI está nele. Nós estamos nele. Existem outros investigadores qualificados no mundo, sabe.

—Eu sei, mas... ela começou a dizer, mas ele levantou sua mão para pará-la.

—Além disso, ele continuou, você tem mais no que focar além de apenas um caso. Isso é sua carreira em jogo. Ela está realmente em risco e é onde sua atenção deveria estar no futuro próximo. Agora, vá para casa e veja se você consegue dormir por doze horas ou mais. Você parece bem acabada.

Ela estava prestes a ficar ofendida com essa última frase quando viu Hillman abrir um raro sorriso. Ele estava apenas brincando com ela, dando um sufoco para sacudi-la da tristeza. Não era o estilo dele. Ele sentiu uma onda de emoção a acertar. Se Cole Hillman, a nuvem cinza humana, estava tentando fazê-la se sentir melhor, as coisas deviam estar bem ruins.

—Certo, chefe, ela disse calmamente e se virou para porta.

—Ei, Locke, ele disse quando ela começou a sair, se você contar isso para eu vou negar. Mas mesmo com sua bagagem e sua atitude terrível e sua falta de consideração por autoridade e sua falta de habilidade de lidar agradavelmente com outros, você deve ser a melhor detetive da Pessoas Desaparecidas que eu já tive. Espero ter você de volta. Seria uma vergonha não ter você por perto, me levando para uma aposentadoria precoce.

—Obrigada, Tenente, ela disse, porque sabia que ela não podia dizer mais nada sem perder o controle.

Ela foi até a mesa dela, preparada para colocar todas suas coisas essenciais em uma caixa antes de ir embora. Mas ela descobriu que Ray já havia feito isso. Ele estava encostado na caixa, esperando por ela.

—Eu atinei que você não iria querer todos assistindo enquanto você arrumava suas coisas, então eu empacotei tudo para você. Se eu esqueci alguma coisa importante, me avise eu posso pegar para você amanhã.

—Obrigada, ela disse. Você sabia que eu estava sendo suspensa?

—Não oficialmente. Mas não foi difícil ler a linguagem corporal lá dentro. Você quer que eu te leve até a lagoa para você pegar seu carro?

—Claro, ela disse. Vamos dar o fora daqui. Eu posso sentir uns cem olhos em mim agora.

Ele concordou com a cabeça e pegou a caixa de coisas. Quando Keri se virou para sair, ela encontrou uma pequena multidão que tinha se juntado atrás dela. Todos da unidade—Kevin Edgerton, Manny Suarez, Jamie Castillo, Garrett Patterson, mesmo Frank Brody—estavam ali.

—Não tão rápido, disse Edgerton. Você acha que você vai sair daqui sem dizer tchau?

—Não é permanente, insistiu Keri. Eu estou só em suspensão.

—Nós sabemos, ele respondeu. Mas não damos a mínima. Estamos te mandando embora do jeito certo, nem que seja apenas por algumas semanas.

Antes que ela pudesse pará-lo, ele estava enrolando os braços ao redor dela. Patterson foi o próximo. Manny Suarez balançou a cabeça com um sorriso magoado no rosto.

—Vai ser tão entediante sem você por perto, ele disse, puxando-a para um abraço. Acho que eu vou ter que ser o garoto problema agora.

—Boa sorte com isso, disse Keri. Você já teve um mau relatório? Além disso, eu sei de mais alguém que é um forte candidato para criança problema.

Ela apontou para a Policial Jamie Castillo com a cabeça, que estava de pé um pouco distante, com olhos tingidos de humidade que ela tentava remover piscando em vão. Keri acenou para ela e Jamie foi rapidamente até lá para abraçá-la, escondendo suas lágrimas limpando a bochecha na camisa de Keri.

Você vai pegar o cajado enquanto eu estiver fora? Keri murmurou em seu ouvido.

Castillo assentiu e se afastou um pouco, olhando Keri diretamente nos olhos.

Você sabe que você é o motivo pelo qual eu me tornei policial, certo? Eu acho que nunca te disse isso.

Keri balançou a cabeça, estupefata.

Cerca de três anos atrás, um garotinho desapareceu no meu bairro tarde da noite. Ele tinha quatro anos de idade. A mãe dele discou nove-um-um, mas os policiais não apareceram por quase uma hora. Quando eles finalmente chegaram, fizeram entrevistas rasas e tomaram algumas notas. Eles chamaram reforços e fizeram uma busca da área.

Mas depois de meia hora sem encontrar qualquer coisa, eles desistiram. Disseram para mãe dele que ele provavelmente foi até a casa de um amigo e estaria de volta depois. Ela ficou nervosa. Era mais de meia-noite agora, ela lhes disse. O garotinho dela não iria visitar os amigos no meio da noite. Mas os policiais não queriam lidar com essa mulher que estava perdendo a cabeça. Disseram apenas que entrariam em contato e saíram. Quero dizer, todos, exceto um.

Keri sentiu um sobressalto de reconhecimento, percebendo que ela já sabia essa história. O rosto dela começou a ficar vermelho. Castillo ignorou e continuou falando.

Uma policial fardada, loira, aparência animada, mas com um olhar determinado para ela, obviamente bem júnior, disse ao parceiro para ir a frente, que ela gostaria de dar mais uma olhada ao redor. Então o parceiro a deixou lá. Todos o fizeram.

Ela foi até a mãe e perguntou se teria um pouco de chá. Elas entraram na casa e ela conversou com a mãe por vinte minutos, fazendo perguntas sobre o filho dela. Não só coisas do tipo como ele se parecia e o que ele vestia, mas o que ele gostava de fazer, quais eram as comidas favoritas dele. A mãe disse que ele adorava construir coisas, que ele sempre fingia estar criando prédios com o Lego e os caminhões Tonka. Eu sei disso porque a janela estava aberta e eu estava escondida lá fora ouvindo.

Depois de um tempo, a mãe se acalma e o policial disse que ia dar uma olhada ao redor um pouco só em caso de ela ter perdido alguma coisa antes. Ela deixou a casa e seguiu andando toda a vizinhança por horas. Eu segui atrás dela, tendo certeza de manter a distância. Eu ouvi o parceiro dela no rádio. Ele parecia irritado que ela ainda estava lá fora, dizendo que ele ser escorraçado pelos outros policiais e ela poderia, por favor, deixá-lo ir buscá-la? Ela disse a ele para vir ajudar ou para parar de encher o saco. Ele não veio.

Fui para casa depois disso, porque estava tarde e eu estava cansada, por isso perdi o resto do que aconteceu. Mas pelo que eu li depois, logo antes do amanhecer, ela passou por uma obra a cerca de um quilometro e meio de distância. Ela atravessou o portão da cerca e procurou por toda a área. Em uma construção semiacabada, ela encontrou uma geladeira que havia tombado pela frente de modo que a porta estava virada para baixo. Havia um som vindo de dentro. Ela rolou a geladeira na direção dela e abriu a porta.

O garotinho estava lá dentro. Estava chorando, mas vivo. Ele foi até o local, porque sua mãe havia passado por lá de carro mais cedo naquele dia e ele viu o equipamento de construção e as vigas expostas e queria ver de perto. Ele escalou a geladeira brincando, mas estava em uma superfície irregular e quando ele fechou a porta, ela caiu para frente, o prendendo lá dentro.

Ele havia desaparecido numa sexta à noite. A equipe de construção não estava programada para retornar ao trabalho até segunda de manhã. Até então, ele teria sufocado com certeza. Mas não o fez, porque um policial com um palpite não desistiria, mesmo quando todos os outros o fizeram.

Eu pensei comigo mesma que talvez aquela policial pudesse precisar de um pouco mais de ajuda de pessoas que eram tão obstinadas quanto ela. Então, naquele dia eu decidi terminar de obter meu diploma do ensino médio, para que eu pudesse me juntar a academia de polícia e, talvez algum dia, ajudá-la. E agora, aqui estou, trabalhando com ela todos os dias.

Como você nunca me contou essa história? Perguntou Keri, nem tentando esconder as lágrimas escorrendo pelo rosto.

Eu queria guardá-la para quando fosse mais embaraçoso para você, disse Jamie, secando sua própria bochecha com as costas das mãos.

Bem, missão cumprida.

Eu sei que muito em breve nós vamos te ver, Keri ela disse, dando um último beliscão no braço.

Keri se virou para encontrar mais uma pessoa restante no caminho. Frank Brody estava em frente a ela, sua camisa manchada de molho para fora como de costume.

Acho que devia dizer algo, ele murmurou, senão todos vão pensar que sou um verdadeiro idiota.

—Esse navio já zarpou, disse Ray sorrindo.

—Cala a boca, Sands. Eu estou tentando ser legal aqui!

—É, cala a boca, Sands, concordou Keri. Eu quero ouvir isso.

—Ok, Locke, vamos manter isso breve. Eu acho que você não é a pior detetive com o qual eu trabalhei. E mesmo que você seja um sofrimento enorme na minha traseira que me dá uma dor de cabeça permanente, você fez algo de bom por aqui. E mesmo que provavelmente eu já esteja aposentando a tempos antes de você voltar, supondo que você vai, o que eu duvido, espero que você esmague esses trastes da AI. Além disso, você tem uma dela de uma bunda.

—Obrigado, Franklin, disse Keri.

E com isso, ela e Ray deixaram a delegacia de polícia da Divisão do Pacífico Oeste de Los Angeles. Keri não podia se impedir de imaginar se, para ela, essa seria última vez.


CAPÍTULO VINTE E CINCO


Eles estavam quase na casa dela quando uma onda de exaustão acertou Keri.

—Você acha que poderia me deixar em casa? Perguntou ao Ray. Estou realmente cansada. Eu vou caminhar até a lagoa e pegar meu carro de manhã.

—Claro, ele disse e encostou no pequeno beco atrás do edifício no qual o apartamento de Keri ficava e o restaurante chinês abaixo dele. Eram quase 9 da noite e o lugar estava bem vazio, embora o forte cheiro de frango Kung Pao ainda pairasse pesado no ar.

Keri se arrastou pelas escadas até o seu apartamento, com Ray carregando sua caixa do trabalho logo atrás.

—Você pode só deixá-la na mesa do café, ela disse. Eu lido com isso pela manhã. Não é como se eu tivesse algo a mais para fazer.

—Você quer um pouco de água? Ele perguntou, aparentemente se recusando a entrar nesse assunto.

—Claro, ela disse e desabou no sofá. Ray serviu dois copos, em seguida entregou-lhe um e se sentou ao lado dela.

—Um dia e tanto, ele disse.

—Uma semana e tanto, ela rebateu.

—E não ainda acabou.

—Para mim acabou, ela destacou.

—Não, não acabou. Você ainda tem trabalho a fazer. Você tem que ligar para o representante do sindicato, para citar uma coisa.

—Eu vou fazer isso amanhã, Ray. Só quero dar uma pausa no meu cérebro por uma noite, sabe?

—Sei, ele disse.

Keri percebeu que ele também deveria estar completamente destruído. Ela olhou para ele. Seus olhos estavam fechados. Ele ficava bem assim, relaxado, como se a brutalidade do mundo não conseguisse tocá-lo. Ela se perguntou quanto tempo levou para ele se acostumar a fechar a pálpebra por sobre aquele olho de vidro, quanto tempo levou para ele ficar em paz com perder uma parte de si.

—O quê? Ele perguntou, sentindo seus olhos nele de algum modo.

—Nada, ela disse, apesar de não parar de contemplá-lo. Você é um cara interessante, Ray Sands.

—Interessante como? Ele perguntou, abrindo os olhos e olhando de volta para ela.

—Bem, se eu nunca tivesse te conhecido e encontrasse um cara negro enorme e careca e escutasse que ele era uma ex-lutador de boxe profissional, eu não sei se meu primeiro pensamento seria 'Ele provavelmente é um salvador de crianças desaparecidas. Ele reúne famílias. Ele conserta os lugares que estão quebrados no mundo.' Eu não teria dado esse salto, eu acho que não.

Ele se sentou e olhou para ela, metade envergonhado, metade confuso.

—Acho que essa foi a coisa mais legal que você já me disse.

—Sério? Ela perguntou. Isso é muito triste. Não deveria ser. Nunca contei que você é gentil?

—Não acho que já, ele disse.

—Ou insondavelmente corajoso?

—Eu lembraria disso, ele a garantiu.

—Ou perigosamente atraente?

Houve um longe silêncio ao vê-lo processando as palavras dela. Ela o assistia, seriamente ciente do odor de Kung Pao flutuando pela sala. Ela inspirou o cheiro, repentinamente consciente de tudo ao seu redor.

Ela reparou em como sua lâmpada de chão projetava sombras pela sala. Ela reparou que a poeira na sua mesa de café era perturbadoramente grossa. E ela reparou que apesar do tempo frio, uma gota de suor estava escorrendo pela testa de Ray na mesma velocidade que uma gota de condensação no copo d'água que ele estava segurando.

—O que você está fazendo, Keri? Ele perguntou finalmente.

—Desculpe-me pelo outro dia, ela disse. No carro. Eu estava assustada.

—Você não está assustada agora? Ele perguntou.

—Não, ela disse. E de alguma forma, ela não estava. Ela podia sentir o corpo tenso e pilhado dele pulsando com energia nervosa. Ainda assim, ela se sentia calma, completamente, quase preguiçosamente à vontade.

—O que mudou? Ele perguntou, ainda hesitantes apesar de si.

—Talvez seja porque eu tenha sido suspensa, ela murmurou, se inclinando para mais perto dele, sentindo-se confiante como nunca havia se sentido na vida. Não somos colegas de trabalho mais.

—E o que acontece quando você pegar seu distintivo de volta? Ele perguntou, mas com menos hesitação que antes.

—Eu vou cruzar aquela ponte, ela disse, parando para pincelar os lábios dele com os dela, quando eu chegar lá.

Eles ficaram ali, centímetros de distância, congelados no tempo e espaço, pelo segundo mais longo da vida de Keri. E então, sem pensar uma segunda vez, ela o beijou de novo, dessa vez firme e profundamente. Ele não hesitou mais e puxou-a para si, parando apenas para tirar o cabelo dos olhos dela, para que pudesse vê-la melhor.

Alguma coisa nisso fazia o sangue dela subir e antes que soubesse, ela havia o puxando para baixo no sofá e subido em cima dela, nunca deixando os lábios se separarem por mais de um instante. Ray tentou colocar seu copo d'água na mesa de café, mas errou completamente. Keri escutou o copo tombar no chão e estilhaçar. Ela não se importava.


*


Quando Keri acordou na manhã seguinte, ela descobriu que estava na cama. Então ela se lembrou que depois do sofá e da mesa da cozinha, foi na cama que ela e Ray eventualmente terminaram.

Ela deu uma olhada no relógio da cabeceira da cama. Passavam das 8 da manhã. Ela não conseguia se lembrar a última vez que ela havia se levantado tão tarde. Ela rolou na cama para descobrir que estava sozinha. Sentando, se atentou por algum barulho do banheiro.

—Ray? Ela chamou. Não houve resposta. Ela se levantou, colocou o roupão e andou até a sala de estar. Ela não podia dizer se os arrepios que sentia por todo corpo eram pelo nervosismo ou pelo frio no ar da manhã.

—Ray, onde você está? Ela perguntou, ainda que na verdade houvesse apenas dois cômodos nos quais ele poderia estar e se ele não estava em algum deles, ele não estava aqui.

Uma ponta de preocupação crepitava na parte de trás de seu cérebro, ainda que ela soubesse que era ridículo. Ele se mandou? Ela notou que o copo quebrado ao lado do sofá havia sido limpado.

Ele limpou o vidro e então saiu?

Ela estava começando a sacudir o pensamento da cabeça, quando a porta da frente se abriu e Ray entrou. Ele estava segurando uma bandeja com dois cafés do lugar descendo a rua.

—Bom dia, dorminhoca, ele disse, um largo sorriso no rosto. Eu teria deixado um recado, mas eu não consegui encontrar uma caneta. Ou um papel.

—Eu pensei, ela mentiu, pegando o café. Sentindo-se mais tímida do que na noite passada, ela perguntou, Como você está?

—Estou muito, muito bem, disse meio pateta. Eu não me sentia bem assim há um bom tempo. Como você está?

—Eu também estou muito bem, ela disse. Você já executou um serviço valioso para uma senhora em necessidade. Você está livre para ir agora.

Seu rosto caiu e ela sabia que ela não podia continuar brincando com ele.

—Você é sempre fácil assim de provocar? Ela perguntou.

O sorriso dele voltou imediatamente.

—Eu acho que você me deve por isso, ele disse divertidamente.

—Devo? O que eu lhe devo?

—Eu posso pensar em alguma coisa, ele respondeu, andando em direção a ela.

Ele estava se inclinando para beijá-la quando o telefone dela tocou. Ela reconheceu o toque. Era Susan Granger, a prostituta adolescente de quatorze anos de idade que ela havia resgatado do cafetão e a hospedado no lar compartilhado para garotas da Rita Skraeling.

Ray deve ter visto algo nos olhos dela, porque ele se afastou.

—Não sei quem é, mas posso dizer você precisa respondê-la.

—Você tem certeza? Ela perguntou. Isso provavelmente pode esperar.

—Não. Vai ficar te consumindo. Atenda.

Ela não precisou escutar duas vezes.

—Oi, Susan. É a Keri Locke. Está tudo bem?

—Oi, Detetive Locke. Desculpe-me te ligar, mas é meio que importante, ela disse. Keri podia ouvir a tensão na voz dela.

—O que foi, querida?

—Você sabe aquela garota que sua amiga, Sra. Merrywether, trouxe para cá ontem, a que você achou no armazém bordel?

—Sim, claro, disse Keri.

—Ela quer que você venha até aqui. Ela diz que tem informações sobre sua filha.


CAPÍTULO VINTE E SEIS


Quando Keri apareceu na frente do lar compartilhado, eram quase 9 da manhã. Depois que ela havia recebido a chamada de Susan, Ray a deixou imediatamente no carro dela próximo à lagoa e ela foi diretamente para o lar compartilhado, pegando o caminho por trás pela praia, ao longo da Vista del Mar, para evitar o tráfego da hora do rush. Rita Skraeling estava esperando por ela na porta da frente quando ela chegou.

—O nome dela é Darla—ela tem treze anos, arranhou Rita enquanto caminhavam o longo corredor para a área dos quartos. Ela estava hesitante em dizer alguma coisa no começo. Mas Susan conseguiu que ela se abrisse. Ela mencionou que um homem havia chegado logo antes de você perguntar sobre a garota chamada Evie. Quando Susan ouviu isso, ela pressionou e... bem, eu vou apenas deixá-la lhe dizer. De qualquer maneira, ela sabe mais detalhes do que eu.

Elas foram para um quarto com portas fechadas no fim do corredor. Rita bateu.

—Aqui é a Sra. Skraeling, ela disse. Posso entrar, por favor?

Keri olhou para ela, surpresa com a, normalmente insolente, atitude formal da mulher.

—Estamos tentando restabelecer os limites para elas; deixá-las saber que elas têm direito a um espaço pessoal, ambos com seus corpos e seus arredores.

Depois de um momento, uma voz familiar respondeu.

—Por favor, entre, disse Susan.

Rita abriu a porta e elas entraram. O quarto tinha duas camas de casal. Susan estava esparramada casualmente em uma delas, ao lado de outra garota, que estava curvada, sentada de pernas cruzadas e se abraçando. Era a garota do armazém, Darla. Ela havia sido tão pouco responsiva antes disso que Keri nem havia aprendido seu nome. Ela decidiu se concentrar em Susan para tentar deixar a outra garota à vontade.

—Ei, Susan. Como vai? Leu algum Nancy Drew novo ultimamente? Ela perguntou, se referindo à série de livros. Susan se tornara obcecada com ele e adorava discutir cada um deles depois que ela terminava. Keri achava um desafio terminá-los a tempo para os encontros semanais delas.

—Oi, Detetive. Na verdade, terminei o mais novo anteontem. Estou pronta para falar sobre ele quando você estiver, mas talvez não hoje.

Mais uma vez, Keri se maravilhou com como a garota apavorada que ela encontrou na rua no meio da noite apenas meses atrás, estava agora transbordando com tanta confiança, totalmente confortável nos seus arredores. O seu cabelo loiro pendia em cachos encaracolados sobre seus ombros e ela vestia uma camiseta azul claro que dizia "Grrrl Power" em letras grandes em negrito.

—Sim, vamos adiar, ela concordou. Eu estou um pouco atrasada de qualquer jeito. Vejo que você tem companhia.

—Sim, tenho certeza de que você se lembra da Darla. Você a hospedou aqui depois de ajudá-la a ir embora da situação ontem.

Keri estava impressionada com como Susan fazia o seu melhor para evitar engatilhar qualquer memória ruim de Darla mantendo a linguagem não específica. Ela havia dito em múltiplas ocasiões que queria ser uma policial e Keri quase já podia imaginá-la em um uniforme azul mesmo agora. Ela sufocou a vontade de sorrir.

—É claro que eu me lembro da Darla. Bom te ver de novo.

Darla olhou brevemente para cima para reconhecer Keri antes de retornar o foco para seu colo. A garota estava incomensurável pálida, como se não fosse exposta à luz do sol em meses. Seu cabelo preto fora claramente lavado na noite passada, mas ele estava pendurado em longas e fibrosas cordas que pendiam para baixo, cobrindo suas calças de moletom.

—Bem, de qualquer maneira, começou Susan, Darla e eu nos falamos essa manhã e ela comentou que ontem um homem foi até lá logo antes de você e estava perguntando sobre uma garota loira chamada Evie. Você conhece esse cara?

—Sim, ele é um amigo meu chamado Uriel. Eu pedi a ele que fosse até lá e desse uma olhada ao redor, porque eu ouvi dizer que minha filha pudesse estar lá dentro e esperava que ele pudesse descobrir.

—Bem, Darla ouviu o que ele disse. E então, quando você entrou mais tarde e também perguntou sobre ela, Darla reconheceu você da TV e percebeu que a Evie sobre a qual ele estava perguntando era sua filha.

—É isso mesmo, Darla? Perguntou Keri, tentando envolver a garota reticente.

Darla assentiu sem olhar para cima. Então, em uma voz baixa, quase um sussurro, ela falou.

—Desculpe por não ter dito alguma coisa ontem. Eu estava muito assustada para falar na frente dos outros. Mas me senti mal depois. Então eu sabia que tinha que lhe contar. Eu a vi.

Keri senti o sangue sumir do seu rosto. Susan também reparou e levantou uma mão, como se para dizer, fique tranquila. Keri respirou fundo e se forçou a falar calmamente, como se a pergunta dela não fosse grande coisa.

—Darla, você disse que viu minha filha, Evie, no armazém?

Darla assentiu novamente e acrescentou em outro quase sussurro, não aquele dia; no dia anterior. Eles a levaram no dia anterior.

—Eles disseram para onde estavam a levando? Keri perguntou com uma voz tão comedida quanto podia reunir.

—Não quero dizer, murmurou Darla.

Keri abrir a boca e estava prestes a falar, quando ela sentiu a mão de Rita Skraeling tocar seu antebraço gentilmente.

—Calma, ela murmurou silenciosamente.

Keri engoliu seco, tentando não deixar a tensão que ela sentia vazar em sua voz. Mas antes que pudesse dizer alguma coisa, Susan a resgatou novamente.

—Detetive Locke, acho o que a preocupação da Darla é que ela não quer ferir seus sentimentos. O que ela tem para dizer a você é triste e ela não quer que a pessoa que a salvou fique triste. Não é, Darla?

Darla assentiu e Susan continuou pressionando.

—Mas o que eu disse a ela foi que você lida com coisas tristes todos os dias. Você encontra garotas como eu e ela todos os dias. E mesmo que isso te faça triste, não te impede de repetir no dia seguinte. Triste é parte do trabalho.

—Isso é verdade, concordou Keri, sentindo um soco no estômago enquanto se lembrava que triste não era mais parte do trabalho, porque ela não tinha um emprego.

—Eu disse a Darla, Susan continuou, que o que faz a tristeza valer a pena são os momentos felizes, quando você consegue devolver uma criança de volta para uma família que os ama, como aquela garota Sarah, o que você encontrou no México.

—Sim, disse Keri, acompanhando, porque Susan parecia saber o que ela estava fazendo e porque ela estava preocupada com a brutalidade de perder a chance de ajudar garotas nesse estado pudesse esmagá-la. Foi um momento feliz.

—Então eu disse para Darla que se há alguma coisa que ela possa lhe dizer que possa lhe dar uma chance de encontrar sua filha seria bom, mesmo se parte dela te deixar triste.

—Susan tem razão, Darla, concordou Keri. Se há alguma coisa que você possa me dizer, eu agradeceria muito. Não ficarei zangada que você me disse uma coisa triste. Você não causou qualquer coisa disso tudo. Não é sua culpa. Por favor, não tenha medo de me dizer.

Darla pareceu parar de respirar. Keri preocupou-se que ela poderia ter forçado demais, mesmo que ela sentisse que mal havia pressionado alguma coisa. Mas logo quando ela estava prestes a desistir, Darla levantou a cabeça e olhou diretamente para ela com seus olhos escuros devastados.

—O principal homem que a pegou disse que ela era um bom partido, porque ela era combativa e porque ela era filha da moça policial. Isso a tornava ainda mais um prêmio, como se qualquer um que a pegar estará punindo você na verdade. Então ela é muito cara. Eles iam promovê-la a Hill House Party.

—O que isso significa, uma Hill House Party? Perguntou Keri.

Susan pulou na conversa. Elas são como armazéns, muitas garotas à venda, mas de alto padrão. Eles usam uma casa chique no Hollywood Hill e trazem caras ricos, que pagarão mais que os preços dos armazéns.

—Como você sabe sobre disso? Perguntou-lhe Keri, tentando manter o horror fora de sua voz.

—Eu fui levada para uma dessas quando era mais nova, respondeu Susan. Eu acho que eu tinha onze anos. Eles disseram que eu estava fresca, então eu era valiosa. Mas acho que eu não era mais tão fresca depois daquilo, porque nunca fui levada de volta.

—Você já esteve em uma dessas? Keri perguntou Darla, que balançou a cabeça. —Você sabe como encontrá-las?

Darla não respondeu, então Keri olhou para Susan.

—Elas também surgem do nada, como os armazéns, então nem mesmo os clientes sabem onde elas estão até receberem uma mensagem com algumas horas de antecedência. Algumas vezes eles montam algumas em uma semana. Algumas vezes, vão meses entre festas se eles acham que vocês estão na cola deles.

—Então não tem como saber onde ela estará ou quando, Keri disse, frustrada.

Susan olhou para ela, então para Darla. Finalmente ela falou.

—Diga a ela, Darla.

Keri mordeu a língua, lutando contra o desejo de balançar a garota. Darla parecia estar reunindo coragem. Aparentando encontrá-la, levantou a cabeça novamente.

—Eu os escutei dizer que eles a estavam levando para a Vista e que sua filha era o Prêmio de Sangue.

O sangue de Keri gelou e seus dedos começaram a formigar.

—O que isso significa? Como assim, Prêmio de Sangue?

A cabeça de Darla estava para baixo novamente e ela parecia estar tremendo. Keri olhou para Susan, que tinha lágrimas nos olhos enquanto falava.

—Vista é o nome da maior Hill House Party. Eles fazem apenas uma vez ao ano. Nunca anunciam quando. Poderia ser amanhã. Poderia ser em seis meses. E o Prêmio de Sangue é o maior prêmio da noite. Eles a leiloam. Quem pagar mais fica com ela e então... Ela se foi.

—O quê? Exigiu Keri.

—Eles a matam depois. Ele corta a garganta dela na badalada de meia-noite, bem ali, na frente de todos.

Um pesado silêncio encheu a sala. Susan baixou a cabeça. Nem mesmo Rita Skraeling podia fazer contato visual.

Keri de repente se sentiu tonta e fraca. Sua pele estava úmida e fria. Seus olhos tremulavam e então se fecharam involuntariamente. Suas pernas se dobraram e ela sentiu que estava caindo. Ela procurou pela parede, mas sentiu apenas o ar vazio.

Enquanto caía, ela sentiu braços, quatro deles, todos fortes, agarrando-a e a mantendo erguida. Ela conseguiu abrir os olhos de leve e viu que os braços a haviam arrastado para a outra cama no quarto e que ela estava deitada de costas. Ambas Susan e Rita Skraeling pairavam sobre ela, olhares preocupados nos rostos.

—Eu vou pegar uma água para você, disse Rita e então se virou para Susan. —Sente-se com ela e segure a mão dela até eu voltar.

Um momento depois, Rita tinha ido e tudo que Keri podia ver era o rosto de Susan. Ela sentiu a garota acariciando seu braço gentilmente com uma mão e com a outra apertando sua mão. Havia um olhar nos olhos dela que Keri não conseguia encaixar. Não era bondade ou mesmo simpatia realmente. E então, ela identificou o’ que era: determinação.

Como se para confirmar, Susan se inclinou e murmurou calmamente no ouvido de Keri.

—Eu tenho um plano.

Os olhos de Keri se arregalaram de surpresa. Ela ainda se sentia tonta e fora de si e não estava certa de que havia ouvido corretamente a garota.

—O qu...?

—Apenas escute. Eu vou descobrir onde e quando é a Vista. E quando eu o fizer, eu te aviso.

—Como? Ela perguntou, as palavras soando engraçadas nos seus lábios dormentes.

—Eu vou disfarçada. Eu vou voltar para a prostituição e encontrar um jeito de ser convidada para a Vista. É o único jeito. De outra forma, quando você descobrir sobre isso, vai ser muito tarde.

—Nããã...

—Shhh. Descanse. Sra. Skraeling está trazendo a água. Você vai se sentir melhor em um minuto.

Levou vários minutos, mas depois de um pouco d'água e alguns cookies, Keri realmente se sentia melhor. Quando ela conseguiu se levantar, agradeceu Darla pela informação e andou com Susan e com Sra. Skraeling de volta para o corredor.

—Rita, você se importa se eu tiver uma palavra em particular com Susan? Ela perguntou.

—Claro que não, se estiver tudo bem por ela.

—Claro, disse Susan, parecendo ter esperado por isso. Por que não vamos para a biblioteca?

A biblioteca na verdade era apenas uma sala de sol com um par de prateleiras cheias de livros, um sofá de dois lugares e dois pufes. Elas se sentaram juntas no sofá. Antes que Keri pudesse dizer qualquer coisa, Susan se lançou.

—Não se preocupe, Detetive. Eu não vou realmente fazer o que eu disse. Eu não estou louca.

—Então porque você disse aquilo? Perguntou Keri, pouco convencida.

—Eu vi o quão machucada você ficou e a ideia apenas surgiu na minha cabeça. Mas eu sei agora que isso não é algo que realmente pudesse acontecer. Quero dizer, mesmo se eu estivesse falando sério, quais são as chances de eu realmente entrar? Praticamente zero. Eu devo ter lido muito Nancy Drew.

Keri estudou o rosto da garota. Ela parecia sincera. Mas as meninas que tinham aprendido a sobreviver nas ruas eram habilidosas em fazer as pessoas acreditarem no que elas queriam. Normalmente Keri era muito boa em ver através de tais fachadas. Mas ela não estava normalmente comprometida emocionalmente a esse nível.

—Mas, continuou Susan, eu gostaria de entrar em contato com algumas garotas que eu conhecia, para ver se eles escutaram alguma coisa. Eu sei que é um tiro no escura, mas se alguém tem uma pista, vale seguir, você não acha?

—Eu acho que você pode fazer isso, disse Keri relutantemente, sentindo que mesmo isso talvez fosse demais, se a Sra. Skraeling disser que está tudo bem. Mas nada além disso, ok?

—Ok.

—Eu preciso que você me prometa, Susan. Eu não sei o que vai acontecer com a minha filha. Mas eu não posso suportar perder você também. Você se tornou muito especial para mim. Você tem tanto potencial e eu vejo você o realizando mais e mais dele a cada dia. Prometa-me que você não vai colocar nada disso em risco.

—Eu prometo, Detetive, disse Susan sorrindo. Foi apenas um pensamento selvagem. Eu nunca faria qualquer coisa que interferisse com nossos encontros do clube do livro. Eu estava esperando na verdade que pudesse chamar Darla para se juntar no próximo. O que você acha? Terapia de mistério Nancy Drew?

—Estou dentro, disse Keri enquanto se levantavam e se davam um abraço de despedida.

—Vejo você em breve, eu espero, disse Susan enquanto Keri se dirigia para a porta.

—Tudo bem? Perguntou Rita ao encontrar-se com Keri na porta da frente.

—Eu acho que sim, só fique de olho naquela ali, ela disse, olhando de volta para Susan, que estava imersa em um livro, as pernas cruzadas sob ela, seu cabelo loiro balançando levemente, a luz do sol da manhã destacando seu rosto sereno.

—Por quê? Perguntou Rita.

—Porque ela me lembra eu mesma e isso normalmente significa problema.


*


Keri estava na Rodovia 405 cerca de metade do caminho para a casa. Ela estava se focando na imagem mental do cabelo loiro encaracolado de Susan escovando os ombros dela, deixando isso acalmá-la, qualquer coisa para impedir a cova de pânico borbulhante na sua barriga de ferver.

O cabelo de Susan era com um mantra visual, mantendo-a sem se despedaçar completamente. Era estranho como alguma coisa pequena como esta poderia ter um impacto emocional tão forte em uma pessoa.

De repente, ela teve um sobressalto de reconhecimento que quase a fez desviar para a faixa ao lado. Ela podia se sentir hiperventilando e se lembrou de respirar mais devagar. Ela olhou as horas. Eram quase 10 da manhã. Se ela se apressasse, poderia estar na casa dos Rainey por volta das 10:15.


CAPÍTULO VINTE E SETE


Jessica não estava certa de quanto tempo ela dormira, quando foi acordada repentinamente pelo som de música alta. Era algum tipo de canção de órgão com homens cantando, mas eles repetiam várias vezes a mesma palavra: koyaanisqatsi.

A porta se abriu e o apicultor ficou visível novamente. Ele levantou sua mão para o alto como se ordenasse Jessica a se levantar. Ele tentou, mas teve complicações. Ela esteve repousando no chão de concreto por tanto tempo e em uma posição tão desconfortável que ambas as pernas estavam dormentes.

Usando o poste de metal como apoio, ela finalmente se levantou. Um segundo depois, ela estava sendo regada com água tão fria que arrancou seu fôlego. Depois de cerca de trinta segundos, o homem desligou a mangueira, andou até ela e destrancou a algema presa ao poste. Ele, então, a prendeu no próprio braço.

Ele começou a andar em um ritmo acelerado. Jessica levou um segundo para processar que ela deveria ir com ele. Ela deslizou no chão escorregadio, tropeçou e caiu de joelhos, mas o homem parecia indiferente e continuou andando, arrastando-a por vários segundos até que ela recuperasse o passo.

Eles estavam andando por um túnel frio e mal iluminado em direção a uma escadaria de madeira. Quando chegaram lá, ele imediatamente começou a subi-los rapidamente, até mesmo pulando um degrau inteiro. Foi necessário tudo que Jessica tinha para acompanhá-lo. No topo das escadas havia outra porta de metal semelhante a que havia no cômodo que ela vinha sendo mantida.

Ele destrancou a porta e a puxou por uma massa espessa de trepadeiras selvagens recobertas por espinhos afiados, formando algo como um túnel. Ele parecia inafetado, mas os espinhos pontiagudos cortaram os braços e o rosto dela e ela estremeceu involuntariamente. Isso pareceu irritá-lo e ele puxou a algema com força, arremessando-a para a frente forçadamente.

E então, de repente, havia luz do sol, pelo menos uma versão dela. O telhado de onde quer que eles estivessem, era feito de algum tipo de tela transparente e o cômodo era sufocantemente quente. Havia plantas de tamanhos variados ao longo de todo o espaço cavernoso. Eles estavam em uma estufa.

De repente, Jessica percebeu que não era mais um quarto à prova de som e abriu a boca para gritar. O início rouco da palavra ajuda tinha começado a escapar de seus lábios quando o homem enfiou um pano grosso na boca dela.

Ela olhou para ele e embora não conseguisse ver sua expressão, ela sabia que ele deveria ter antecipado a reação dela, perguntando-se se o pano seria realmente necessário. Ele deu um puxão em seu braço novamente, mais forte dessa vez, e ela viu para onde ele a estava levando. No meio da estufa havia uma longa laje de pedra erguida sobre dois blocos de pedra adicionais.

Isso lhe pareceu familiar, mas Jessica não conseguir especificar direito o porquê. Ela sabia que havia visto esse tipo de coisa antes em algum lugar, talvez em um livro texto ou em um museu. O homem pegou as algemas de ambos os pulsos e a jogou na laje de maneira que ela se deitasse.

Ele agarrou o braço direito dela e o prendeu em alguma coisa pendente ao lado da laje. Era um tipo de manilha. Enquanto ele fazia o mesmo com todos outros seus membros, ela o ouviu murmurar alguma coisa suavemente para si mesmo. Sua voz era baixa e ela demorou alguns segundos para entender. Mas depois de repetições suficientes, ela entendeu. Ele estava dizendo ‘purificar o pecador.'

E foi quando ela percebeu no que ela estava deitada. Era um altar.


*


Keri estava discutindo com o agente do FBI posicionado na porta da frente dos Rainey. Ela exigiu ver a família, mas o agente, jovem e de queixo quadrado, simplesmente repetiu a frase que, aparentemente, foi orientado a dizer: Você não tem autorização para entrar, senhora. Quaisquer requisições para falar com a família devem passar pelos canais apropriados.

Depois de três vezes dando voltas com ele, ela ficou tentada a usar força física. Foi apenas o conhecimento de que agredir um oficial federal poderia resultar em mais problemas para ela na investigação do Assuntos Internos que a impediu.

Ambos permaneceram ali, encarando um ao outro em um silêncio tenso e constrangedor, quando Keri ouviu a porta ser destrancada. Ela abriu para revelar Tim Rainey. Ele estava vestindo uma camiseta e shorts de ginástica. Os círculos sob os olhos dele eram tão escuros por falta de sono, que parecia que ele havia levado um soco em cada um.

Mas ela notou que seu cabelo estava penteado e que os seus olhos não tinham aquele olhar selvagem, em pânico, com os quais se tornou acostumada. Ele tinha a aparência de um homem que havia resignado os eventos ao redor dele.

—Deixe-a entrar, ele disse para o agente calmamente, mas firme.

—Senhor, ela não tem auto— o homem começou a dizer antes que Rainey o interrompesse.

—Eu digo quem tem autorização para entrar na minha casa, Agente Buxton. Afaste-se.

Após hesitar brevemente, Buxton se afastou e Keri entrou. Rainey fechou a porta atrás dela.

—Café? Ele perguntou.

—Claro. Ela queria entrar e imediatamente fazer-lhe perguntas, mas sentiu que ele queria abordar outro assunto. Ela cerrou os dentes e forçou-se a não falar mais nada até ter uma noção melhor das ideias na cabeça dele.

—Estou surpreso em vê-la, ele disse enquanto liderava o caminho em direção a cozinha. Achei que você havia sido enxotada do caso.

—Não só do caso, mas da força inteira, ela respondeu e vendo as sobrancelhas dele erguidas, continuou. Eu fui suspensa, mas não por isso. Eu tive um ano passado... controverso. Eu nem sempre sigo o protocolo à risca.

—Você quer dizer, como ajudar secretamente um cara meio perdido da cabeça a não ser encarcerado por tirar uma arma em um espaço público e ameaçar atirar em uma van?

Ele estava sorrindo ligeiramente. Keri tomou isso como um bom sinal e decidiu responder gentilmente.

—Isso não é nada. Eu fiz coisas muito mais contra as regras que aquilo. Seguir ordens não é o meu forte de verdade.

—Bem, eu queria agradecê-la por violá-las ontem à noite. Você estava certa. Aconteça o que acontecer com a Jess, Carrie e Nate precisam de mim. Se vamos sobreviver a isso, eu preciso estar aqui por eles.

Ele serviu uma xícara para ela e um para si.

—Onde eles estão, a propósito? Ela perguntou.

—Ambos dormindo no quarto de Nate. Eles precisam disso.

—Você também, salientou Keri.

—Acredite, eu tentei. Nem mesmo medicação tem ajudado. Mas eu tenho certeza de que você não está aqui para conferir os meus hábitos de sono, Detetive. Eu posso dizer que há algo que você quer discutir. Vá em frente.

—Você está certo, ela admitiu. Mas antes que eu diga qualquer coisa, eu preciso esclarecer algumas coisas. Eu não estou mais nesse caso e estou oficialmente em suspensão do LAPD. Então, qualquer coisa que eu perguntar é apenas como uma civil preocupada, você entende?

—Entendo.

—E as questões que eu tenho, não vai necessariamente melhorar o desfecho para Jessica, ela disse. Não quero que fique esperançoso.

—Entendido, ele disse, soando como se ele realmente pudesse.

—Ok, vamos voltar para o primeiro pacote do FedEx que vocês receberam. O horário era uma e quarenta e oito da tarde, certo?

—Parece certo, ele concordou.

—E pensamos que isso era muito descarado, porque Jessica nem havia saído da escola até às duas e trinta e cinco. Então ele o enviou antes mesmo de raptá-la. Ficamos todos impressionados que ele pudesse tomar tal risco, porque se algo desse errado com o sequestro e você recebesse a carta, você tomaria precauções e ele provavelmente nunca teria outra chance.

—Sim, com certeza teríamos. Ele estava correndo um grande risco.

—Mas havia alguma outra coisa estranha sobre isso, algo que eu não pensei realmente até agora, disse Keri.

—O quê?

—Aquele pacote também tinha mechas do cabelo de Jessica. Mas como ele mandaria mechas do cabelo dela à uma e quarenta e oito se ele nem havia a sequestrado até cerca de duas e quarenta e cinco?

A boca de Rainey caiu aberta. Como? Ele perguntou genuinamente perplexo.

—Ele tinha que ter acesso à sua casa antes do rapto. Ele esteve na sua casa.

Rainey ficou quieto por vários segundos.

—Você acha que esse homem invadiu e roubou um pouco do cabelo dela? Ele perguntou chocado.

—Duvido disso. Sua esposa trabalha em casa. Não há muito tempo quando a casa está desocupada e não acho que ele tentaria isso à noite. Você tem um sistema de segurança e há muitas variáveis. Acho que você ou sua esposa deixaram este homem entrar na sua casa. Acho que ele é um parente ou alguém que trabalhou para vocês.

—Mas nós já demos uma lista a vocês de todos que nós conhecemos e que fazem trabalhos para nós, ele a lembrou. Eu pensei que vocês não encontraram alguém que fosse suspeito. E eu ouviu que aquele cara que trabalhou na casa do nosso vizinho, o bisbilhoteiro, era um beco sem saída.

—Ele era, admitiu Keri. Mas eu acho que nós deixamos algo escapar. Eu odeio pedir a você para acordar sua esposa, mas eu quero repassar todos que tiveram acesso a essa casa com ambos. Você pode chamá-la e pegar a lista que vocês montaram?

Rainey hesitou por um segundo. Ela podia dizer que ele não queria arrancar sua esposa do sono, especialmente para confrontar a possibilidade de que ele eles pudessem convidado uma ameaça para a própria casa. Mas ele assentiu.

—Dê-me alguns minutos. Ele disse e saiu da cozinha.

Keri tomou um gole do café, mas estava muito ansiosa para ficar parada. Ela se levantou e perambulou pela cozinha, então fez seu caminho por alguns dos cômodos do primeiro andar. Pelo canto dos olhos, ela viu movimento em frente à casa e andou até lá.

Ela vagou até a sala de jantar e abriu as cortinas para ver o que era a comoção. Um dos fotógrafos do jornal local aparentemente havia entrado no perímetro e estava tirando fotos da casa de perto. Dois policiais estavam o retornando forçadamente para trás da faixa policial.

Keri olhou para a cena. Ainda havia múltiplos veículos da força policial na rua e uma faixa policial amarela criava uma região oval ao redor não somente da casa, mas também de partes das propriedades dos vizinhos.

Ela olhou no quintal da frente e viu que estava sendo devastado por todo o tráfego de pessoas. Uma pequena bola de futebol Nerf repousava na grama. Com tudo acontecendo, ninguém pensou em recolher o brinquedo e ele estava jogado desamparadamente, quase escondido pelas longas folhas de grama.

Um pensamento surgiu na cabeça de Keri e ela quase largou seu café enquanto se dirigia para cima das escadas. Ela estava quase subindo quando viu Tim e Carolyn Rainey saindo do quarto de Nate e andando nas pontas dos pés na direção dela. Eles devem ter visto o olhar no rosto dela, porque imediatamente pegaram o passo. Eles estavam na metade da escada quando Keri, incapaz de esperar mais, deixou a pergunta escapar.

—Vocês cuidam do próprio quintal ou alguém faz isso para vocês?

—Nós contratamos alguém, disse Carolyn, surpreendida. George McHugh Tree and Lawn Service. Ele estava na lista. Eu pensei que todos que nós demos a vocês estivessem livres.

—Quando foi a última vez que ele veio até aqui? Sua grama parece um pouco crescida.

—Foi há várias semanas atrás, agora que eu pensei nisso. Ele só vem a cada duas semanas no inverno e ele teve que adiar da última vez, porque um dos seus funcionários havia saído e ele estava sobrecarregado com outros clientes. Ele finalmente ligou e disse que viria em alguns dias. Por quê?

—É só isso então? Perguntou Keri. Ele tem empregados?

—Sim, Carolyn respondeu, entendendo de repente.

—Mas eles não estão na lista, observou Keri.

—Não. Para ser sincero, nem sei os nomes deles e, já que faz um tempo que estiveram aqui, eu nem sequer pensei nisso. Ele revesa dois ou três caras.

—Você já os deixou entrar na casa, para usar o banheiro por exemplo?

—Todas as vezes, disse Carolyn, sua voz vacilante.

—Eu preciso o número de George McHugh, ordenou Keri.

Carolyn correu para a cozinha. Tim encarou Keri, seus olhos bem abertos.

—Lembre-se, não fique esperançoso, disse-lhe Keri.

Um segundo depois, Carolyn retornou com o número de McHugh. Keri ligou e o pegou diretamente. Até algumas semanas antes, ele tinha três empregados; ele deu o nome e informações de todos. O cara que havia saído era Johnny Peters.

—Uma última coisa, Keri o perguntou. Por que ele saiu?

—Ele realmente não tinha um grande motivo, disse McHugh. Disse apenas que estava cansado de LA e era hora de seguir em frente.

—Como ele era? Perguntou Keri.

—Quieto. Educado. Na dele. Na maior parte, apenas fazia o trabalho dele e ia para casa. Ele parecia gostar especialmente de cuidar das plantas; realmente tinha um dedo verde. Nunca tive um problema com ele; fiquei triste em vê-lo sair.

Keri desligou imediatamente e ligou para Jamie Castillo no celular dela.

—Já ficou louca parada em casa? Perguntou Jamie quando atendeu.

—Eu preciso de sua ajuda, Jamie, respondeu Keri bruscamente, dispensando as formalidades.

—Sempre, respondeu Jamie sem hesitação.

—Mas eu preciso que você faça isso discretamente, para ninguém saber que é para mim. Eu não quero te meter em problemas.

—Não tem problema. O que é?

—Apenas para ser clara, Keri a relembrou, isso pode ser um problema para você se as pessoas erradas descobrirem que você está me ajudando. Você não precisa.

—Você esqueceu com quem está falando? Perguntou Jamie, insultada ao extremo.

—Justo. Aqui está o que eu preciso. Eu vou enviar para você os nomes e número da previdência social de três caras que trabalharam para o serviço de jardinagem dos Rainey. Os coloque em todas os bancos de dados e pegue as fotos das carteiras de motorista. Mas eu quero que você dê atenção particular para Johnny Peters. Veja se ele tem ficha. Verifique se há algum outro nome. E envie a foto dele para o Xerife Calvert no Missouri para ver se ele o reconhece. Então me fale o que você conseguiu, ok? Isso é sensível ao tempo.

—Já estou nisso, Jamie disse e desligou antes que Keri pudesse acrescentar qualquer coisa.

Os Rainey estavam olhando para ela com um misto de ansiedade e otimismo que era inquietante.

—Por favor, não comecem a ficar muito animados, ela insistiu. Mesmo se esse for o cara, vocês devem se preparar para a possibilidade de ser tarde demais. Tim, você foi uma testemunha do bastardo cruel que ele é. As chances de que ele já tenha feito algo horrível são muito fortes. Não se esqueçam disso.

Ambos assentiram, mas ele percebeu que estavam permitindo uma centelha de esperança reacender-se dentro deles. E apesar das suas dúvidas, ela não podia culpá-los.

Só demorou dez minutos para Castillo ligar de volta. No segundo em que ela começou a falar, Keri podia sentir que haviam encontrado alguma coisa.

—Keri?

—Sim.

—Eu estou com o Xerife Calvert na linha comigo, ela disse. Ele que conversar com você. Vá em frente, Xerife.

Keri susteve a respiração, esperando pelo homem mais velho falar.

—Detetive Locke?

—Sim, Xerife, estou aqui.

—O cara, Peters—eu o reconheço.


CAPÍTULO VINTE E OITO


Keri correu para seu carro, enquanto escutava Calvert. Ela havia acaba de se despedir dos Rainey, dizendo-lhe que ela tinha uma pista que precisava seguir e retornaria a eles assim que soubesse de mais a respeito.

Enquanto falava, inseriu o endereço listado na carteira de motorista de Peters no GPS e partiu. Ficava em Mar Vista, próximo ao aeroporto de Santa Monica. Permitindo uma breve parada em seu apartamento para pegar suas armas pessoais não fornecidas pelo departamento, levaria cerca de vinte minutos para chegar lá. Ela colocou o Xerife Calvert no viva voz.

—Então, este cara Peters usava outro nome, quando eu o encontrei, ele disse. —Também era alguma coisa com 'J'. Vou lembrar em um minuto. De todo jeito, ele era parte de um grupo religioso. Você sabe essas caravanas que vão de cidade em cidade e montam essas tendas missionárias de serviços? Era um desse tipo de coisas.

—Você se lembra de alguma coisa sobre o grupo? Perguntou Keri. Era uma espécie de culto?

—Eles estavam muito devotos. Mas eu não diria que parecia um culto. O pessoal por aqui também é bastante religioso. Essas pessoas talvez fossem um tom mais intenso, mas não para tanto que fosse uma preocupação, se bem me lembro.

—Então o que fez Peters tão memorável?

—Bem, ele costumava podar minha grama de vez em quando, para citar uma coisa. Ele fez isso por várias pessoas na cidade. Eu acho que era como ele tirava uns trocados. Mas só isso não conseguia colar comigo. É que eu tive que prendê-lo uma vez por proselitismo na rua.

—Isso não é permitido? Perguntou Keri surpresa.

—Não, é. Mas ele estava literalmente na rua, bloqueando o tráfego. E ele era um pouco mais agressivo que a maioria. Colocou as mãos em algumas pessoas; as deixou desconfortáveis. Eu recebi algumas reclamações, então eu fui falar com ele. Ele era muito educado e foi para a calçada, mas se recusou a parar de invadir o espaço de outras pessoas. Eu insisti educadamente. Ele se recusou educadamente. Então eu, educadamente, o algemei e o levei à delegacia para passar a noite.

—O que aconteceu depois disso?

—Nada demais, ele disse. Eu o deixei ir pela manhã. Nunca tivemos mais problemas com ele. Eu tenho que dizer, ele nunca me pareceu o tipo que seria capaz de algo como isso.

—Então, por quanto tempo ele ficou na cidade? Perguntou Keri, ignorando o último comentário. Na experiência dela, quase ninguém parecia ser capaz dos crimes que cometeram. Significava nada.

—Não me lembro exatamente. Acredito que a caravana deixou o condado algumas semanas depois e eu assumo que ele foi com eles. Eu não me lembro de vê-lo depois disso.

—Desculpem-me por interromper, desaguou Jamie. Mas eu venho checando a história do Jason Peters, Keri. E parece que ele não existe.

—O quê? Perguntou Keri enquanto virava do Culver no Lincoln e seguia ao norte para Mar Vista.

—Ele se candidatou para a carteira de motorista há três anos, mas não existe registro dele antes disso. Sem contas de energia elétrica, sem conta bancária, sem presença em mídia social. Tudo começa depois disso. Mas mesmo assim não há muito. Ele é pago em dinheiro. Além da carteira e do contrato de locação do apartamento dele, não há qualquer papel ou registro digital do cara. Ele não usa quaisquer serviços da cidade ou se ele faz, ele paga por eles em dinheiro. Sem conta de telefone celular. E claro, nada on-line.

Keri ficou em silêncio por um momento. Jamie e o Xerife Calvert ambos pareciam perdidos também.

—Xerife, disse Keri, apostando contra as chances. Por acaso você oficialmente fichou Peters, quando o prendeu? Tirou uma foto para o arquivo? Coletou impressões digitais?

—Claro, ele respondeu, soando um pouco ressentido. Nós seguimos o procedimento aqui também, Detetive, mesmo em delitos menores.

—Desculpe-me, ela respondeu. Eu não quis insinuar que não. Estava apenas esperando que você pudesse conferir seus registros para ver se ainda tem o material arquivado?

—Claro, mas já faz um tempo. Se eu tivesse a data aproximada, tenho certeza que poderia caçá-lo.

—Verifique as duas semanas antes e depois da data que Noreen Appleton desapareceu.

Calvert ficou em silêncio por um momento e ela sabia que as engrenagens estavam girando em sua cabeça.

—Dê-me um minuto, ele disse.

Enquanto esperavam, Castillo se pronunciou.

—Keri?

—Sim, Jamie?

—Eu não quis dizer mais cedo enquanto o xerife estava falando, mas Ray está do meu lado nesse momento. Eu entrei na sala de conferências para um pouco de privacidade e ele me seguiu. Agora ele está em cima de mim, segurando a mão para o telefone. Ele parece bastante irritado.

—Há mais alguém aí com você? Perguntou Keri.

—Não.

—Então coloque o telefone no viva-voz.

—Está ligado disse Jamie um momento depois.

—Como está indo essa agradável manhã, Raymond? Ela perguntou docemente, tentando fazer um curto-circuito no que ela sabia que estava vindo.

—Eu sei que você não está investigando esse caso no dia depois que você foi suspensa da força, ele disse com raiva, soando nem um pouco confiante, porque nenhuma pessoa sã faria isso.

—Eu sou apenas uma garota normal explorando um palpite, ela disse pouco convincente. Eu estava indo lhe informar assim que eu terminasse de falar com o Xerife Calvert.

—Me informe agora!

Antes que ela pudesse responder, Calvert se pronunciou.

—Ei, pessoal. Só vou fingir que eu estava com vocês em espera e não ouvi qualquer coisa da conversa, se estiver tudo bem por vocês. Tendo estabelecido isso, tenho algumas informações para vocês.

—Vá em frente, Xerife, disse Keri, feliz pela interrupção.

—O verdadeiro nome do sujeito é Jason Petrossian. Ele teria trinta anos agora. Eu estou olhando para a foto dele e, definitivamente, é o mesmo cara. Ele foi detido uma semana antes de Noreen desaparecer. Tomei a liberdade de colocar impressões digitais dele no banco de dados federal agora. É algo que deveria ter feito na época, mas a ideia nem sequer me ocorreu no momento.

—O que você encontrou, Xerife? Perguntou Keri, certa pelo tom dele de que não era algo bom.

—Bem, cerca de quatro anos antes de passar por aqui, ele foi preso na Pennsylvania por conexão com o desaparecimento de um uma garota de doze anos de idade chamada Bethany Jeffers. Mas os investigadores por lá não conseguiram ligar o crime a ele em definitivo. Eventualmente, tiveram que liberá-lo. Ele sumiu do radar logo depois. A garota nunca foi encontrada.

Ninguém falou durante vários segundos. Finalmente, Keri limpou a garganta.

—Obrigada, Xerife.

—Sim, ele disse suavemente. Lamento não poder ajudar mais.

—Você tem sido de grande ajuda, insistiu Ray.

—Sim, respondeu Calvert amargamente, não posso deixar de sentir que se eu tivesse feito um pouco mais a devida diligência na época, Noreen Appleton pudesse ter sido encontrada e a garota de vocês não estaria desaparecida.

—Não havia como você saber, disse Keri.

—Todos sabemos que isso não é verdade, disse o Xerife Calvert, sua voz grossa com arrependimento. Se não se importam, eu vou dizer adeus por agora. Quero acompanhar alguns tópicos que deveria ter olhado antes na época.

—É claro, disse Keri.

—Por favor, me informem como as coisas se movimentaram por aí?

—Certo, prometeu Ray. Ele esperou o clique indicando que Calvert havia desligado antes de dizer alguma coisa a mais.

—Keri, você ainda está aí?

—Estou, ela disse, agarrando o volante enquanto se preparava para mais lavação de roupa suja. Mas a voz dele se manteve nivelada.

—Ok, ele disse. Castillo e eu vamos para o meu carro agora para seguir para o apartamento do Petrossian. Uma vez que estivermos na rua, eu vou ligar para o Agente Crowley para alertá-lo, para que ele possa nos encontrar. Então, ligarei para Hillman para atualizá-lo.

—Isso tudo parece bom, disse Keri, plenamente ciente de que ele não havia terminado.

—Até agora, ninguém que abriria o bico sabe sobre o seu envolvimento nisso. Você ainda não fez algo hoje para comprometer sua carreira completamente. Nós podemos simplesmente dizer que você descobriu essa pista e nos passou. Você pode dar a volta com o carro, retornar para o seu apartamento e ninguém vai saber de nada. Parece bom?

—Você sabe que eu não posso fazer isso, disse Keri categoricamente.

—Claro que pode. Você está me dizendo que você não vai.

—Estou a menos de dez minutos da casa dele. O tempo extra que vocês levariam para chegar aqui pode ser a diferença entre Jessica Rainey viver e morrer. Isso não é uma opção. Então, estou te dizendo que eu não posso.

—Você poderia pelo menos, por favor, esperar até chegarmos aí? Ele implorou. Ela ficou impressionada. Ele a conhecia bem o suficiente para mudar de tática quando percebia que estava lutando uma batalha perdida.

—Se eu não ver qualquer sinal de perigo iminente e você puder chegar lá em quinze minutos, eu pensarei nisso.

—Nós estaremos lá, disse Ray.

Keri desligou, sentindo-se um pouco culpada. Afinal, ela não tinha intenção de esperar.


CAPÍTULO VINTE E NOVE


Keri reconsiderou sua decisão quando chegou ao endereço. Alguma coisa sobre o lugar não parecia correta.

Sentada no carro mais embaixo na rua, ela tirou os binóculos e estudou o apartamento. Foi em um pequeno complexo, a unidade final de um prédio com seis apartamentos de solteiro. Ficavam todos no segundo andar, diretamente acima das respectivas garagens.

O que a incomodava era que as unidades eram muito amontoadas. Não havia como ele conseguir carregar uma garota da sua garagem até o apartamento sem ser notado. E eles eram tão pequenos que, se ela ainda estivesse viva, não havia como ele mantê-la quieta o suficiente para evitar detecção.

Mesmo se ela estivesse morta, os vizinhos sentiriam o cheiro de algo. Keri se permitiu meio segundo para considerar o que ela havia se tornado, que podia reparar esse detalhe com tanta naturalidade e sem emoção.

Preocupe-se com seu desvanecido senso de empatia mais tarde. Descubra isso.

Então, se ele não a está mantendo no apartamento dele, onde mais ela poderia estar? Se ele havia alugado um depósito em algum lugar, haveria registro disso. Mesmo lugares que recebem em dinheiro vivo, normalmente necessitam que uma ficha seja preenchida com algum tipo de depósito de segurança no cartão de crédito.

Ela olhou ao redor para ver se havia algum depósito na área imediata. O apartamento ficava em uma colina perto da Rose Avenue próximo à Centinela Avenue. Via o Santa Monica College por cima. O diminuto Santa Monica Airport também era visível à distância. Ele podia até mesmo ver um pequeno campo do Little League e um viveiro com múltiplas estufas. Mas não havia complexos de depósitos à vista.

O telefone dela tocou. Era Ray.

—Quão perto você está? Ela perguntou.

—Três minutos daí, ele disse. Crowley e Winchester também estão a caminho. Na verdade, eles podem chegar aí primeiro, já que o prédio do FBI na Wilshire fica mais perto. Eles insistiram para não entramos. Eles estão sendo bastante possessivos.

—Sim, bem. Eu não acho que seja o lugar de qualquer jeito.

—Por que não? Ele perguntou.

—Muito pequeno, muito exposto. Apenas não me parece certo.

—Nós estaremos aí para verificar em breve, ele respondeu. Fique fora de vista. Você não precisa dos federais vendo você.

—Apresse-se, insistiu Keri. Se esse não é o lugar, nós precisamos começar a procurar pelo lugar certo logo. Tenho que ir — eles estão aqui.

Keri desligou e abaixou a cabeça enquanto o sedan carregando Crowley e Winchester passou. Eles estacionaram a meio quarteirão do complexo de apartamentos e andaram com confiança em direção a ele. Eles não deram indícios que planejavam esperar por Ray e Castillo.

Quando chegaram ao prédio, Winchester deu um solavanco na parte inferior da porta da garagem, mas não aconteceu nada. Deve ter sido trancada. Eles prosseguiram para a escadaria exterior e chegaram ao topo, em frente a Unidade 1. Petrossian morava na Unidade 6, então eles tinham que passar por todos os outros apartamentos para chegar lá.

Keri rapidamente enviou uma mensagem para Ray para dizer: eles estão aqui—aproximando da porta do apto.

Quando chegaram próximo, Crowley espreitou pela janela. Usando os binóculos, parecia a Keri que as cortinas estavam fechadas. Ambos os homens de ficaram de joelhos e engatinham até que estivessem em frente a porta para Unidade 6.

Um texto chegou e Keri olhou para ele. Era de Ray dizendo: encostando agora.

Keri olhou para cima para ver o carro dele passar pelo dela e estacionar a alguns metros à frente. Ele e Castillo saíram e olharam na direção dela. Ela apontou para a porta do apartamento e ambos olharam a tempo para ver os agentes do FBI puxar as armas.

Os homens estavam de cada lado da porta. Keri viu Crowley bater e ouviu a voz à distância.

—FBI—temos um mandado, abra.

Eles esperaram cerca de cinco segundos. Então Crowley falou novamente, mais alto dessa vez.

—FBI—abra a porta agora!

Ainda não houve resposta. Crowley assentiu para Winchester, que deu um passo da porta e a chutou. Ele correu para dentro, seguido de perto por seu parceiro.

—Vamos, Ray disso para Castillo e, então, apontou para Keri. Você fica aqui.

Keri assentiu, lutando contra o desejo de correr para o apartamento. Ela assistiu Ray e Jamie fez exatamente isso antes de voltar sua atenção de volta para a porta. Nenhum tiro tinha sido disparado. Ela podia ouvir vozes, embora não pudesse entender o que estavam dizendo.

Ray havia acabado de chegar ao topo das escadas, com Jamie na metade da subida, quando de repente uma explosão abalou o apartamento. Uma bola de fora estouro para fora da porta seguida pelo Agente Winchester, que tropeçou para fora coberto em chamas. Ela conseguia ouvir seus gritos claramente. Ele caiu no estreito chão do corredor e tentou rolar de um lado para o outro.

Keri pulou para fora do carro e começou a correr na direção do complexo, seus olhos fixados em Winchester. Em segundos, Ray havia o alcançado e estava usando a própria jaqueta para abafar as chamas. Crowley ainda não havia saído.

Quando ela chegou ao pé das escadas, ela encontrou Jamie Castillo deitada de costas no chão. Ela se apressou e se inclinou para próximo da jovem policial. Ela estava consciente e seus olhos estavam abertos, mas parecia desorientada.

Keri correu as mãos pelo corpo de Jamie e pelo cabelo, sentindo por feridas abertas ou sangue jorrando. Sua face e mão, ambas expostas, tinham vários pequenos cortes, mas nada muito ruim. Keri sentiu a cabeça de Jamie novamente, verificando por sangramentos que possam ter resultado da queda.

—Estou ok, Jamie gritou de repente. Eu usei os braços para aliviar a queda. Não bati a cabeça.

—Você pode me ouvir? Perguntou Keri.

—Eu realmente não posso ouvir você, gritou Jamie, ainda mais alto dessa vez. Meus ouvidos estão zumbindo demais.

Keri assentiu e tirou sua própria jaqueta e a repousou sobre a cabeça de Jamie.

—Fique aqui, ela gritou. Não tente se mover.

Jamie acenou sua compreensão e Keri correu pelas escadas. Winchester ainda estava no chão do corredor. Ele não estava mais pegando fogo, mas ele estava se contorcendo no chão, gemendo alto. Ray não estava à vista.

Ela tirou a arma e se aproximou devagar da porta carbonizada da Unidade 6. Somente então ela percebeu que não havia colocado o colete a prova de balas. Ele fez uma respiração longa e profunda, então pivotou e girou para dentro do cômodo. Levou um segundo para ela se encontrar. Tudo estava esfumaçado e seções da sala ainda estão queimando.

—Aqui, ela escutou uma voz chamar e a seguiu.

Ray estava no canto do café, ajoelhado por cima de Crowley, fazendo ressuscitação cardiopulmonar. O agente do FBI estava inidentificável, toda a frente de seu corpo irreconhecivelmente queimada. Ray olhou para ela e balançou a cabeça.

—Vamos tirá-lo daqui, ela disse.

Ray assentiu e colocou as mãos sob as axilas de Crowley. Keri agarrou a parte inferior dos joelhos e eles o levaram para fora e o deitaram ao lado de Winchester.

—Como ele está? Alguém gritou da escada. Era Jamie, tentando ficar de pé e se segurando no corrimão para apoiar-se.

—Ele está morto, Ray gritou de volta.

—O quê?

—Ela não consegue ouvir nada, disse Keri. Seus ouvidos estão zumbindo da explosão. Como você é capaz de me ouvir?

—Mal posso. Parece que os sinos da igreja estão nos meus ouvidos. Estar perto de uma parede que ajudou um pouco, talvez?

Keri se lembrou que Ray havia chegado ao topo das escadas quando a explosão aconteceu. Fazia sentido que não estar tão exposto possa ter lhe oferecido alguma mínima proteção.

Ela o examinou e ele parecia estar bem em geral, embora seus jeans estivessem com sangue na parte superior da sua perna direita. Ela se inclinou para mais próximo e viu que havia um pedaço de vidro cravado nela. Sangue estava vazando para fora dos dois lados.

—Eu preciso fazer a chamada, disse Ray. Winchester precisa de uma ambulância urgente.

—Ray, você tem um grande pedaço de vidro na sua perna. Olhe.

Ele olhou para baixo enquanto discava seu celular.

—Eu vou sobreviver, ele disse, em seguida, acrescentou, São meus ouvidos tocando ou ouço sirenes à distância?

—Sirenes, disse Keri notando-as também.

—Então você deveria dar o fora daqui. Não há nada que você possa fazer para ajudar esses caras e se você for encontrada aqui, só fará mais difícil você conseguir sem emprego de volta.

Keri olhou para baixo para os dois homens no chão, um morto o outro não muito melhor. Então ela olhou para Jamie, que tinha desmoronado no último degrau de cima das escadas.

—Eu não posso apenas sair, ela insistiu. Petrossian armou isso. Ele matou um agente do FBI. Eu preciso ajudar.

—Eu entendo, Keri disse para Ray, colocando o telefone chamando no ouvido, Mas não há nada que você possa fazer aqui e agora. Vá.

Então ele apontou para o telefone para indicar que alguém tinha atendido.

—Sim, ele gritou no microfone. Esse é o Detetive Raymond Sands, distintivo número 22391. Eu preciso de assistência médica de emergência imediata na...

Keri tirou sua atenção de Ray de volta para os dois agentes do FBI no chão aos seus pés. Ele estava certo, é claro. Não havia nada que ela pudesse fazer para ajudar. E se ela fosse encontrada em uma cena de crime enquanto suspensa, ela poderia garantir que nunca mais voltaria para a força. Ela tinha que ir.

As sirenes foram ficando mais alta, mas ela levou um momento para pegar a jaqueta de Ray, que ele tinha usado para apagar as chamas engolindo Winchester e delicadamente a colocou sobre o rosto desfigurado de Crowley.

Ele era um bom rapaz. Ele não merecia isso.

Ela olhou para fora para toda a extensão das casas à distância. Para o oeste, ela podia ver vagamente onde a terra encontrava o Oceano Pacífico. Muito mais perto, agora ela podia ver melhor o campo de beisebol que ela havia notado antes. Ela também podia ver o viveiro e suas estufas. No letreiro, apropriadamente se lia Ocean View Nursery.

Ela também notou algo que não fora capaz antes a partir do seu carro abaixo, outra estufa isolada das outras. Ela era bloqueada por uma cerca de madeira, como se estivesse em uma propriedade separada. E pareceu estar em pior estado que todas as outras. Algo clicou em seu cérebro.

—Keri, vai! Ray sibilou, acordando-a de seu devaneio.

Ela olhou para cima. Ele estava apontando para uma ambulância e dois carros de polícia em alta velocidade na Centinela, logo abaixo deles. Eles estariam aqui em menos de um minuto.

—Seja cuidadoso com aquela perna, ela gritou enquanto corria por ele e começava a descer as escadas. Ao passar por Castillo, ela bateu em seus ombros. A policial olhou para cima para ela com uma expressão agradável, mas embaçada.

Ela correu de volta para o carro e estava acabando de sair e se dirigir pela rua quando viu a ambulância chegar no retrovisor.

Ela virou para a direita, fora de vista dos veículos de polícia se aproximando. Mas ela não virou novamente a direita e desceu o morro que a colocaria de volta no caminho para Play del Rey. Pelo contrário, ela virou à esquerda e seguiu para cima no morro, em direção àquela estufa isolada.


CAPÍTULO TRINTA


Keri estava do outro lado da rua do viveiro, perdida em pensamentos. Ela ignorou os empregados que tinham saído para a rua para olhar para o edifício de apartamentos em chamas várias centenas de metros de distância.

Ela estava juntando as peças do quebra-cabeça em sua cabeça, certificando-se que todas se encaixavam. Petrossian morava nas proximidades, mas seu apartamento não era equipado para esconder uma garota sequestrada. Ele gostaria de mantê-la em algum lugar por perto para um acesso fácil, algum lugar que ele se sentisse confortável.

O chefe dele, George McHugh, havia dito que ele realmente gostava de cuidar de plantas; que ele tinha um dedo verde. Mesmo anos atrás, em Elkhurst, ele tinha aparado gramados.

Então, ela se lembrou da linguagem das cartas. Elas estavam cobertas com termos como "podado", "crescer", "desenraizar", "solo", "ervas daninhas" e "fertilizar". Ela até relembrou a referência a uma "estufa" a qual agora parecia óbvia em retrospecto.

Ele adorava jardinagem e plantas. Que melhor lugar para manter Jessica do que uma estufa isolada, fora de mão, a uma distância caminhável do apartamento dele? Não era à prova de som, mas de alguma forma ela suspeitava que Petrossian havia encontrado uma maneira de contornar isso.

Ela saiu do carro e aproximou-se de uma mulher de meia-idade que parecia ser a gerente do viveiro. Ela tinha um cabelo bem cacheado e óculos que pendiam de uma corrente em seu pescoço.

—O que há com uma estufa atrás da cerca? Perguntou Keri.

—O quê? Disse a mulher distraidamente enquanto encarava a fumaça subindo no ar. Essa não é realmente uma boa hora.

—Senhora, Keri em sua voz mais autoritária, eu preciso da sua atenção total. Estou com o Departamento de Polícia de Los Angeles e estou lhe perguntando sobre a pequena estufa que permeia com essa propriedade. É parte do seu empreendimento?

A mulher se virou para ela. Ela ainda estava irritada, mas um olhar nos olhos cintilantes de Keri e ela decidiu não fazer alvoroço.

—Ainda pertence ao dono do viveiro, ela disse. Mas tem alguns vazamentos e a danos causados pela água, então ele parou de usá-la. Um homem local ofereceu dinheiro para usá-la, disse que iria consertá-la e pagar um aluguel mensal. Ele apenas perguntou se poderia instalar uma cerca para privacidade, de forma que os clientes não entrariam por engano.

—Você já esteve dentro?

—Uma vez ou duas para pegar o aluguel, a mulher respondeu, tornando-se mais interessado a cada pergunta, por quê?

—Como é lá dentro? Exigiu Keri, respondendo à pergunta com uma dela própria. Você vê algo incomum?

—Não. Ele fez um bom trabalho. É apenas uma estufa com um monte de plantas. Ele curte mais cipós tropicais do que eu. Mas acho que ele gosta de experimentar. Você pode me dizer do que se trata?

—Apenas mais uma questão. O nome dele é Johnny Peters?

—Sim, disse a mulher. Você está começando a me assustar.

—Escute. Eu preciso que você feche o viveiro. Você e todos os seus empregados e clientes devem deixar a propriedade. Faça isso rapidamente e discretamente. Vá até a cafeteria local ou algo do tipo.

—É desse nível? A mulher perguntou com suspeitas.

—É desse nível, disse Keri, tirando sua arma do coldre, sabendo que isso teria o efeito desejado. Johnny Peters é muito perigoso e você não vai querer estar perto daqui quando eu falar com ele.

Isso pareceu fazer um impacto, já que a mulher se afastou dela, virou e expulsou todo mundo para os respectivos carros. Ela começou a trancar a porta da frente do viveiro, mas Keri a impediu.

—Há algum caminho até lá atrás sem ser pela porta da cerca? Ela perguntou.

—Acredito que você poderia dar a volta pelos fundos da propriedade e escalar uma das cercas vivas. Mas elas são altas.

—Obrigada, disse Keri. Agora tranque saia daqui.

Enquanto a mulher fechava o escritório principal e corria para o carro dela, Keri retornou para o próprio carro e abriu o porta malas. Ela prendeu a pequena pistola dentro do seu coldre do calcanhar e colocou o colete a prova de balas emitido pelo departamento que Hillman se esquecera de recolher dela ontem. Ela havia se esquecido dele no apartamento do Petrossian e foi sortuda em não precisar dele. Ela não iria cometer o mesmo erro duas vezes.

Então, ela andou ao longo do perímetro da cerca até os fundos da propriedade do viveiro. Ela viu as cercas vivas sobre as quais a mulher estava falando. Elas eram altas, mas tinha ramos grossos que ela estava bem certa que poderia ajeitar para escalar por cima da parede.

Antes disso, pegou o telefone e digitou um texto. Nele se lia:

Encontrei o local do sequestrador. Pequena estufa adjacente à Ocean View Nursery na Centinela & Rose. Não distante do apartamento dele. O nome do suspeito é Johnny Peters também conhecido como Jason Petrossian. Preocupada que ele saiba que foi pego e pode tomar ações drásticas. Empregados evacuados. Entrando. Silenciando telefone. Preciso de reforço.

Ela enviou para Ray, Jamie, Hillman, Edgerton, Suarez, Patterson e até Frank Brody. Não havia como esconder seu envolvimento agora. Estava envolvida, não importava o desfecho. Ela poderia cair por insubordinação, mas se isso significasse salvar Jessica Rainey, era um pequeno preço a pagar.

Keri silenciou seu telefone, colocou sua arma no coldre e começou a escalar a videira que parecia mais resistente. Os ramos aguentaram e ela conseguiu espreitar por cima da cerca. A estufa ficava apenas a cinco metros de distância. Não havia ninguém à vista e ela não conseguia ouvir nada incomum.

Tão rapidamente e silenciosamente quanto ela poderia, ela escalou sobre o muro e fez a queda de dois metros no chão. A terra era dura devido ao frio e seus joelhos chacoalharam. Ela pensou que eles poderiam se dobrar e ela cairia. Mas apesar da dor, mantiveram-se estáveis.

Ela puxou a arma novamente e cuidadosamente foi até a frente da estufa, tendo cuidado para não pisar em nenhuma das crepitantes folhas mortas no chão. Quando ela deu a volta até a frente, viu que a porta estava ligeiramente aberta. Ajoelhou-se o mais baixo que podia e se aproximou vagarosamente.

Quando estava logo fora da porta, ela se manteve parada por um momento, empenhando-se para escutar alguma coisa que não o vento, os exautores do viveiro ao lado e o som distante das sirenes, esperançosamente de uma ambulância correndo com Winchester, Ray e Jamie para o hospital mais próximo.

Diminuiu sua respiração e reparou que quando o fez, o ar exalado era visível no ar gelado. Com seu dedo indicador esquerdo, ela empurrou a porta levemente para abri-la, ouvindo por qualquer rangido. Havia um lamento baixinho, quase inaudível mesmo para ela.

Estava em uma posição vulnerável agora e sabia que tinha que se mover rápido. Sem esperar para pensar, ela empurrou a porta com tudo com sua mão esquerda e rolou para a estufa no que ela esperava que fosse uma posição não convencional. Ela se apressou imediatamente para trás de um grande vaso e inspecionou o espaço.

Ninguém estava imediatamente visível e ela ainda não ouvia qualquer coisa. Como esperado, a estufa estava repleta de plantas de vários tamanhos e cores. Ela não tinha ideia do que qualquer uma delas era e não ligava realmente. Ela estava apenas procurando por movimento por trás de alguma delas.

Ela andou pelas laterais do lugar, ficando próxima as plantas maiores, procurando alguém escondido por detrás delas. Em um ponto, ela bateu em um pequeno tamborete, e derrubou uma lata de spray para vespas e abelhas. Ela conseguiu endireitá-la antes que tombasse ao chão. Depois de verificar todo o lugar, ela se sentiu bastante confiante de que ele não estava ali.

Ele saiu delicadamente para o centro da estufa, inteiramente ciente de que esse lugar era ainda mais provável de ter uma armadilha do que o apartamento dele. Agora que ela finalmente tinha uma linha de visão clara, Keri reparou algo que havia negligenciado antes.

O que inicialmente parecia ser uma mesa de trabalho de pedra no meio daquele espaço era na verdade outra coisa. Ela se aproximou e viu as manilhas presas próximas aos quatro cantos da mesa retangular.

Havia manchas de sangue escuras em uma extremidade, perto de onde Keri imaginou que o pescoço de uma pessoa de bruços repousaria. A realização de que o que estava na frente dela a acertou em uma onda e ela lutou contra a vontade de vomitar. Era um altar de sacrifício.

Ao olhar para longe, ela reparou algo no canto do olho. Espiando de perto, ela viu o que pareciam ser pequenas gotas de sangue relativamente fresco nas beiradas do altar e mais, logo acima das manchas escuras de sangue, onde a cabeça de uma pessoa deveria estar posicionada. Elas estavam acabando de começar a secar. Keri imaginou que elas tinham menos de dez minutos.

A quantidade de sangue era pequena demais para ser de um corte de faca ou mesmo um furo na pele. E viu mais delas. Elas estavam no chão próximo ao altar e mais ainda ao longo de uma linha que levava até um espesso aglomerado de vinhas, aparentemente as que a gerente do viveiro havia mencionado.

De fato, elas pareciam incomuns comparadas com tudo o mais na estufa, grossas e onduladas, como cobras verdes. E elas tinham espinhas afiados, claramente a fonte das gotículas de sangue. Eles deviam ser difíceis de cultivar e manter. Eram tão viçosos que era difícil ver através deles para as sobras além.

Enquanto esse pensamento atravessava sua mente, ele levantou a arma involuntariamente e apontou em direção às trepadeiras. Eram densas o suficiente que alguém poderia facilmente ter se escondido neles e saído atrás dela quando estivera estudando o altar. Ela se puniu silenciosamente por não reparar isso mais cedo.

Mas ninguém havia saído. E agora ela estava mirando a arma na escuridão. Se ele estava lá, ele entregou sua vantagem tática.

Ou não? Isso é parte de sua armadilha?

—Saiu com suas mãos para cima, ela ordenou em uma voz quase tão alta como um sussurro. Não havia movimento ou som em frente a ela.

Ela tirou sua lanterna caneta e iluminou a escuridão, procurando por algum trinco ou indícios de um chão falso. Vendo nenhum, ela entrou com cuidado na folhagem grossa e viscosa, espremendo seus olhos quase até fechar para evitar que eles fossem furados pelos espinhos. Foi só então quando ela sentiu os espinhos rasgando sua pele enquanto ela se movia para frente que ela atinou que eles pudessem estar envenenados. Não teria sido difícil pincelar alguns deles com uma droga que pudesse incapacitá-la ou mesmo matá-la.

Tarde demais para se preocupar com isso agora.

Ele avançou outro passo para descobrir que havia chegado ao fim do túnel de trepadeiras. Ela estava no muro de trás da estufa. Mas algo pareceu fora do lugar. O muro em frente a ela era grosso demais para ser da cobertura de polietileno que cobria o resto da estufa.

Procurou sua lanterna e bateu levemente no muro. Era metal, alguma coisa muito grossa, talvez até a prova de som. Ela iluminou com a lanterna a parte do meio do muro e viu que estava procurando—uma pequena alavanca que claramente era algum tipo de maçaneta. O grande pedaço de metal era uma porta, uma que certamente levava ao subsolo, o que explica como Petrossian conseguiu criar um ambiente a prova de som em uma estufa barata.

Satisfeita consigo mesmo, Keri colocou a lanterna de lado, fez uma pegada melhor na arma e alcançou a maçaneta. Ela respirou fundo e acalmando e permitiu a quietude e o silêncio a envolver. Mas não estava completamente silencioso.

Estava quase abrindo a porta quando reparou o barulho fraquíssimo vindo de algum lugar sob ela. Soava quase como um zumbido leve. Tirou a lanterna novamente e apontou para o local. Sobre ela havia algum tipo de telhado de madeira, bem escondido entre as trepadeiras. Moveu a luz ao longo da madeira até o ponto que se encontrava com a porta. Foi quando ela viu.

No telhado de madeira havia uma pequena cabeça de prego protuberante, não mais longa que um centímetro. Mas estava próximo a porta e esta com certeza pegaria no topo dele quando abrisse. E isso forçaria para baixo a porta do que era aparentemente uma escotilha no teto, liberando o que quer que estivesse zunindo dentro. Se lembrando do spray que ela quase derrubou, ela precisaria apenas de um palpite do que poderia ser.

Keri considerou brevemente arranca a cabeça do prego. Mas se preocupou que fazendo isso, a armadilha do teto poderia abrir. Além disso, havia nenhuma garantia de que ele não tivesse criado reservas caso ela encontrasse aquele. Frustrada, ela saiu do pequeno túnel e de volta para a seção principal da estufa.

Não tenho tempo para isso. Ele deve saber sobre a batido em seu apartamento e da explosão. Ele tem que assumir que nós vamos vasculhar a área e descobrir que ele aluga esse local. Não há tempo para ser tão cuidadosa. Eu poderia já estar atrasada demais para ajudar Jessica.

Keri caminhou até o spray para vespas e o balançou. Estava meio cheio. Ela olhou ao redor, desesperada por alguma solução, quando seus olhos caíram em um rolo de corda. Olhando ao redor, ela reparou pedaços dele ao redor de toda estufa, sendo usados para afastar alguns galhos uns dos outros, de forma que não crescessem retos.

Se é forte o suficiente para isso, talvez eu possa usá-lo para algo mais.

Desenrolou uma faixa da corda de cerca de três metros de comprimento, cortou com uma tesoura e retornou para o túnel de trepadeiras. Colocou o spray no chão, perto da entrada e voltou para a caverna espinhosa.

Usando a lanterna para se guiar, ela enrolou gentilmente a parte do meio da corda ao redor da cabeça do prego várias vezes. Então, segurando as duas pontas da corda cuidadosamente, ela recuou para a boca do túnel, colocou sua arma no coldre e pegou a lata de spray novamente.

Ela deu uma boa pegada na corda, enrolando-a ao redor dos dedos. Então, recusando-se em pensar muito nas consequências, ela deu um solavanco forte. Quase imediatamente, ela ouviu um clique e um guincho enquanto a as dobradiças da escotilha do teto giravam. Um momento depois, houve um baque segundo por um alto e raivoso zumbido.

Keri deu um passo e esperou, sabendo que estava por vir e ainda, se sentindo aterrorizada.


CAPÍTULO TRINTA E UM


Keri queria fugir correndo, mas manteve seu território, sabendo que teria mais sucesso se todas suas pequenas inimigas estivessem concentradas em uma região. Estava levando mais tempo do que ela esperava, como se as pequenas bastardas estivessem perdidas nas trepadeiras e não pudessem achar o caminho da saída. E então, de repente elas acharam.

Um enxame massivo de abelhas emergiu do túnel aparentemente de uma só vez, tão espesso no ar que elas criavam sua própria nuvem escura. Elas convergiram em direção a Keri enquanto ela levantava a lata e usava o spray em um longo arco de trás para frente.

Ela viu dúzias das pequenas monstrinhas caírem imediatamente, mas as outras temporariamente dispersas e, aparentando estar ainda mais lívidas, se moviam em enxame tentando se reagruparem. Keri tirou vantagem da confusão delas para correr para a porta. Ela agarrou um pote vazio e pesado no caminho. Uma vez que a porta estava entreaberta, ela a escorou com o pote e deu alguns passos para trás, esperando pelo próximo ataque inevitável.

Demorou apenas alguns segundos antes que elas começassem a voar para fora. Mas porque a porta estava apenas parcialmente aberta, ela foi mais uma vez capaz de atingi-las em bloco. Elas jorraram para fora por uns bons dez segundos e Keri usou o spray nelas o tempo inteiro.

Finalmente, a horda diminuiu até um filete. Keri parou de usar o spray, recuou para a estufa, chutou o pote e fechou a porta. Olhando ao redor, ela viu que ainda haviam algumas abelhas no interior, mas apenas algumas ainda estavam voando com algum senso de propósito e elas pareciam mais focadas em escapar do que em atacar.

Ela estava tentada a destruir cada uma delas individualmente, mas sabia que ela precisava do resto do spray para a colmeia, a qual ela assumiu ter batido no chão no túnel de trepadeiras e ainda estaria hospedando alguns soldados adicionais.

Indo até a entrada do videiro, ela iluminou lá dentro. A colmeia estava de fato lá, repousando esmagada como um melão de favos de mel. Havia abelhas zumbindo ao redor desesperadamente, mas não tantas quanto ela esperava. Ela avançou para frente e, segurando a dobra do outro cotovelo na boca, nariz e olhos, ela usou o spray na colmeia até que a lata estivesse vazia. Então ela o chutou para o canta e avançou novamente.

Ela sentiu mais picadas, mas dessa vez não estava certa se eram dos espinhos ou das abelhas. Ela não se importava mais. Colou a pequena lanterna de lado, tirou a arma e puxou a alavanca da porta de metal. Ela se abriu facilmente e, para sua surpresa, silenciosamente.

Ela se afastou para o lado da entrada, onde ela ainda estava fora de vista e espiou lá dentro. A porta realmente levava para baixo. Havia um voo íngreme de escadas de madeira, iluminado apenas por uma lâmpada nua pendendo de um fio sobre a cabeça. Ela podia ver apenas um pouco além do pé da escada, onde o que parecia ser um túnel se estendia para a escuridão.

Keri estava preste a descer quando teve uma ideia. Tão rápido quanto podia, ela pegou a corda que havia usado para arrancar a cabeça do prego e a enrolou ao redor da dobradiça de metal da escotilha do teto. Então ela pegou a outra ponta e a amarrou no cabo da alavanca, de maneira que a porta de metal ficasse entreaberta. Dessa forma, ela e Jessica seriam capazes de escapar rapidamente. Também permitiria qualquer agente da lei que encontrasse a estufa a localizar a entrada subterrânea sem procurar para sempre.

Satisfeita que a corda era forte o suficiente para segurar, ela iniciou a descida com os olhos focados no pé da escada e no túnel além. Mesmo andando cuidadosamente, ela descobriu que o quarto degrau era um pouco frágil e desceu para o próximo rapidamente para recobrar o equilíbrio.

A dobradiça do quinto degrau se dobrou, então instalou, se tornando em uma tábua de madeira na vertical. O degrau em si desapareceu. Keri percebeu que havia caído em outra das armadilhas de Petrossian. Mas não havia nada que ela poderia fazer enquanto perdia o equilíbrio e tropeçava para a frente. Ela se lançou ao chão pelos últimos dez degraus, sua queda interrompida intermitentemente pelos degraus de madeira restantes.

Esparramada sobre sua barriga no sopé da escada, Keri esperou uma batida, preparando-se para lidar com a dor de qualquer lesão que pudesse ter sofrido. Seus joelhos latejavam onde haviam atingido um degrau na descida e suas palmas pareciam em carne viva onde ela as havia estendido para levar o baque da queda. Mas fora isso, ela parecia funcional. Aparentemente, o piso de terra fofa tinha a protegido de alguma coisa pior.

Ela olhou ao redor na luz parca, procurando pela arma que deixara cair quando precisou das duas mãos livres para se preparar para a queda. Mas a maior parte do túnel estava em sombras. Poderia estar em qualquer lugar.

Severamente ciente de quão indefesa ela estava, Keri procurou pela pequena pistola em seu coldre do calcanhar. Ao removê-la, escutou movimento na escuridão a frente dela. Tão rápido quanto podia, ela liberou a arma e girou para apontá-la na direção do som.

Mas ela não foi rápida o suficiente. Logo quando ela estava estendendo a arma para frente, mas antes que pudesse puxar o gatilho, um corpo se apressou para a frente e um pé chutou sua mão com força, mandando a pistola voando para algum lugar atrás dela.

Ela tentou desviar rolando da figura, mas que pudesse conseguir tempo o suficiente para ficar de pé. Mas suas costas se chocaram contra o degrau de baixo, não dando lugar algum para ir. A figura estava vindo até ela novamente. Mesmo que não pudesse ver seu rosto, ela conseguiu ver que suas mãos estavam vazias. Elas estavam enroladas em punhos cerrados dirigidos diretamente para o rosto dela.

Keri estava em uma posição esquisita, deitada de lado, presa pelas escadas em suas costas. Ainda assim, ela conseguiu levantar o braço direito para desviar o primeiro soco. Ela não era tão feliz com o segundo, que bateu com força no seu maxilar direito.

A força foi surpreendente; suficiente para bater todo seu corpo contra o primeiro degrau. A dor na bochecha fez perder o fôlego involuntariamente. Por um segundo, sua visão era uma constelação cintilantes pontos de cor.

Como resultado, ela não viu o segundo golpe vindo. Ele acertou sua têmpora direita, fazendo-a perder qualquer reserva de tensão acumulada que ela ainda mantinha. Ela caiu bruscamente para trás, incapaz de se mover ou mesmo de focar em qualquer coisa senão a dor em sua mente.

Ela estava vagamente ciente de que alguém a estava arrastando pelos pés pelo chão de terra. Ela sentiu a parte de trás da cabeça bater em algumas pedras, mas essa dor era pálida em comparação a agonia pulsante que corria para cima e para baixo no lado direito de seu rosto.

Ignorar a dor ou você vai morrer. Encontre uma saída disso.

Keri se forçou a pensar. Ela deveria estar morta. Se o agressor quisesse cortar sua garganta, ele poderia tê-lo feito por agora. Isso significava que ele a queria viva por um motivo, mesmo que só brevemente. Ela tinha que usar essa janela de tempo.

Ela abriu os olhos. Apesar do borrão, ela viu que estava sendo puxada em direção a uma sala iluminada no fim do túnel. O homem que a arrastada era difícil de ser ver tão claramente, porque estava contra a luz, mas ela podia dizer que usava algum tipo de máscara.

Alguns momentos depois, eles estavam na sala e ela percebeu que era—uma máscara de apicultor. A absoluta esquisitice disso o fazia mais assustador do que ela esperaria. Mesmo em tanto sofrimento, ela sentiu um aperto de medo no peito.

Sua face não era completamente visível atrás da rede, mas certamente se parecia com a foto da carteira de motorista de Johnny Peters. Enquanto espremia os olhos para ter uma visão mais clara, ela sentiu seus pés batendo no chão. Ele os havia largado. A superfície parecia mais dura que antes, como asfalto ou concreto. Processando aquele detalhe, ela viu que ele estava indo na direção dela.

Ela tentou levantar as mãos em defesa, mas elas estavam apenas vagamente responsivas e nunca ficaram mais latas que apenas alguns centímetros do chão. O punho dele se chocou contra o peito dela e ela sentiu o ar deixar seu corpo.

Ela tossiu e engasgou, tentando respirar desesperadamente. Depois do que pareceu ser uma eternidade, ela finalmente conseguiu inspirar. Devagar, conseguiu abriu os olhos lacrimejantes novamente para descobrir que havia se enrolado em posição fetal.

Ela olhou ao redor e reconheceu a sala pela primeira vez. Também era iluminada apenas por uma lâmpada acima de sua cabeça. Toda o espaço era envolto em concreto, o que era certamente a prova de som. Estava deitada ao lado de um poste de metal que se estendia do chão até o teto.

No chão, havia um balde de metal caído de lado. Mesmo em seu estado, sentiu algo nauseante e pôde sentir do que era composta a poça de líquido próxima ao balde.

Virando sua cabeça gentilmente, viu pernas, quatro, a cerca de dois metros de distância. Ela jogou o pescoço para cima e viu algo que a encheu com ambos alívio e terror. Jessica Rainey estava de pé diretamente à sua frente, viva e consciente.

Mas Johnny Peters estava bem atrás dela. Seu braço esquerdo abraçando fortemente seu peito. Sua mão direita segurava uma faca de caça com uma lâmina de seis polegadas contra a garganta da garota.

Keri tentou falar, mas percebeu que palavras ainda não estavam disponíveis para ela. Respirar era ainda um desafio. Ele viu que ela estava tentando e aparentemente decidiu que ela o faria antes. E assim, pela primeira vez desde que ela o encontrara, Johnny Peters falou.

—Você interrompeu o ritual de purificação. Então agora você vai assisti-lo. E então você vai ter a honra de fazer parte dele.

Ciente de que ele poderia agir a qualquer momento, Keri se fez falar.

—Seu ritual é impuro, ela raspou. Não sabia o que iria acontecer, mas qualquer coisa que o pudesse confundir ou atrasar valeria a tentativa.

—O quê? Ele exigiu, soando surpreso e com raiva.

—Johnny, ela resmungou enquanto rolava para ficar de quarto, "não foi como você planejou, foi? Não tem altar aqui embaixo. Você acha que o Criador ficaria satisfeito com o jeito como você está conduzindo esse sacrifício?

—O que você quer dizer? Ele perguntou, sua voz ainda parecia no limite, mas agora mais cheia de perplexidade do que fúria.

—Estamos embaixo da terra, Johnny, disse Keri com uma voz forte, agarrando o poste e se puxando para ficar de pé. Esse não é o lugar para honrar o Senhor, onde as minhocas rastejam e os ratos correm ao redor. Eu pensei que você queria purificar Jessica. Mas fazer isso aqui seria vergonhoso. Ela deveria estar lá em cima, no altar, na completa luz do Senhor. Fazer isso nesse buraco seria uma transgressão contra ele. É isso que você quer?

Enquanto ele pensava sobre isso, Keri tomou noção da situação. Estava com dor, mas estava funcional. Sabia que ela poderia se descolar se precisasse. Não tinha arma alguma, mas Johnny Peters não parecia ter qualquer coisa além da faca. Jessica estava imunda e aterrorizada. Mas fora o que pareciam ser cortes de espinhos, ela não parecia estar fisicamente machucada.

—Você não me deu outra escolha, rosnou Peters, arrancando seu foco de volta para ele. Você interferiu com o sacramento. Não é mais seguro fazê-lo lá em cima. O criador irá entender que meus motivos eram verdadeiros. Ele me perdoará.

Keri viu sua pegada se apertar na faca e falou rapidamente.

—Ele vai? Ela perguntou. Você realmente tem mostrado motivos puros, Johnny?

—O que você está dizendo?

—Alguém que se orgulhasse do que está fazendo iria esconder sua face atrás de uma máscara? Ou ele deixaria o Senhor olhar para baixo sobre seu servo sem obstáculos?

—Eu a tirei antes, quando eu estava prestes consumar a purificação, ele insistiu.

—Então faça isso novamente agora, se você não tem algo para se envergonhar.

Ele fez exatamente isso, mantendo a faca na garganta de Jessica ao largá-la com sua outra mão, arrancar a máscara e jogá-la no canto. A face atrás dela não evocava qualquer senso se pura maldade. Johnny Peters era apenas um homem de trinta anos com cabelo loiro escuro, curto. Sua pele era bronzeada, um resultado de trabalhar fora o dia todo. Seus olhos azuis estariam belos se não fossem tão alucinados.

—Satisfeita? Ele perguntou petulante.

—Você não deveria perguntar se eu estou satisfeita. Você deveria estar perguntando se ele está, o Criador. Eu, por mim, não acho que ele está.

—Por que não? Ele perguntou, apertando a faca novamente. Keri reparou que ele havia inadvertidamente cortado o pescoço de Jessica e uma fina linha de sangue estava escorrendo em direção ao vestido de estopa que ela vestia.

É agora ou nunca. Ele está confuso. Eu o tenho de joelhos. Manda ver.

—Porque se ele estivesse, por que ele me mandaria, Jason?

—Do que me chamou?

—Eu sei quem você é, Jason Petrossian, porque o Criador me enviou. Ele me ordenou pará-lo. Eu sou seu anjo da vingança.

—Você está mentindo! Você está só tentando me enganar! Ele estava gritando agora.

—Então por que ele me diria que eu sou o anjo guardião por elas?

—Por quem? Ele gritou.

—Pelas garotas que você tentou matar, Jason. Eu fui enviada aqui para trazê-las de volta a você.

—Do que você está falando? Tentou matar?

—Você sabe de quem eu estou falando, Jason. Você tentou matar Bethany Jeffers na Pennsylvania. Você tentou matar Noreen Appleton no Missouri. Mas o Senhor as ressuscitou.

—Ressuscitou? Ele sussurrou enquanto seus olhos se alargaram. Keri viu sua pegada na faca ceder ligeiramente.

—Ele me fez a guia delas, ela continuou, não querendo perder a energia. Eu as trouxe a você, Jason. Eu as trouxe aqui, sob o comando do Senhor, para mostrar-lhe a verde.

—Que verdade?

—Pergunte-as você mesmo, ela disse, apontando para o túnel atrás dele.

Jason se virou para olhar para trás. Ao fazê-lo, Keri se abaixou, pegou o balde no chão e caminhou silenciosamente na direção dele. Ele começou a se virar para ela.

—Eu não vejo. Mas antes que ele pudesse completar a frase, ela estava ali, batendo o balde na faca com uma mão enquanto o empurrava para longe de Jessica com a outra mão. Desequilibrado, caiu para trás contra a parede do cômodo.

Tudo pareceu ir mais devagar. Keri viu Jason olhar para a faca. Ela não a havia tirado da mão dele, mas ela havia furado o balde que agora cobria a lâmina. Ele olhava para como se não pudesse entender direito como tal coisa era possível.

—Corra, Jessica, Keri gritou para a garota, que parecia igualmente perplexa. Pelo túnel e pelas escadas.

Jessica Rainey não precisa ouvir aquilo duas vezes. Se virou e correu para a porta. Jason deu um passo na direção dela, mas Keri pulou nele ao mesmo tempo, acertando-o contra a porta de metal. Ele se dobrou de joelhos enquanto a força da colisão a jogou de volta para o centro do cômodo.

A porta de metal que havia batido com força contra a parede, rebateu e girou de volta. Enquanto ambos assistiam do chão, incapazes de pará-la, a porta se bateu e trancou. Keri escutou um som que clique enquanto se travava.

Jason encarava a porta, incrédulo. Então se voltou para ela, sua expressão se tornando um misto de ambos raiva e algo próximo de prazer. Ele pegou o aro do balde e arrancou a faca do mesmo. Um sorriso cruel surgiu no seu rosto.

—Agora, ele disse enquanto se recolocava de pé, você está presa aqui comigo.


CAPÍTULO TRINTA E DOIS


Keri também ficou de pé. Uma calma inexplicável veio sobre ela. Jessica estava segura. Mesmo se Jason tivesse uma chave para a porta, não havia chances de ele chegar até Keri antes que ela escapasse e encontrasse ajuda. A polícia estaria ali a qualquer segundo, se já não estivesse.

É claro, eles não chegariam a tempo de ajudar Keri, presa nessa masmorra com um maluco. Mas algo a ocorreu naquele momento.

Eu não preciso da ajuda deles.

—Não, Jason, ela disse vagarosamente. Você está preso aqui comigo.

Um lampejo de hesitação passou pelos olhos dele. Era tudo que ela precisava.

Todo o seu treinamento valeu a pena na hora em que ela correu na direção dele. Ele virou o rosto na direção dela, a faca de caça firme na sua mão direita. Ele começou a oscilá-la de lado na direção dela. No último segundo, ela caiu no chão, sentir uma ondulação no ar bem acima da cabeça assim que a faca passou por cima dela.

Ela rolou na direção dele, deixando seu momento se chocar contra as pernas dele. Ele já estava sem equilíbrio de oscilar a faca e errar. Keri chutou o pé abaixo dele, fazendo-o tombar de cara para frente.

Keri, quem nunca parou de se mover, levantou-se fora de seu rolamento e voltou em direção a ele. Ele ainda segurava a faca. Mesmo que ele estivesse em uma posição estranha, ele a lançou de volta em direção a ela, como Keri já estava esperando.

Ela desviou por pouco e deixou a faca passar bem a sua frente antes de chutar para baixo o antebraço dele, jogando a faca contra o chão. A lâmina estava na direção contrária dela, então ela bateu o outro pé nas costas da mão dele. O chute falhou e a faca caiu de seus dedos. Ela a chutou para um canto escuro da sala, próximo a uma lombada escura que Keri não havia notado antes, uma lombada que ela desconfiava ser um corpo.

Jason ainda estava se contorcendo por ter sua mão esmagada, mas tempo se levantar com a outra mão. Keri chutou seu braço sob ele e seu lado esquerdo bateu com força no chão de concreto. Agora ele estava deitando de costas, arquejando.

Ela não esperou que ele se recuperasse. Pelo contrário, ela caiu por cima dele, os joelhos dela ficaram sobre o estômago dele para aparar a queda. Isso forçou o peito e cabeça dele a guinarem para cima e para frente como uma gangorra, bem como ela sabia que aconteceria. Ela socou seu rosto enquanto ele se erguia na direção contrária ao seu punho. Rosto e punho se impactaram e a cabeça dele caiu de volta para baixo. Seu crânio bateu no chão com um baque que deu satisfação a Keri.

Ele gemeu de agonia, mas ela não se importou. Ela o golpeou implacavelmente no peito e no rosto, uma vez após da outra. Ela não parou até que as articulações dos dedos estivessem machucadas e ela não pudesse mais sentir seus braços.

Finalmente, ela recuou e olhou para ele. Ele estava imóvel, a não ser pelo leve movimento de seu peito subindo e descendo. Ele não parecia estar consciente.

No silêncio, Keri sentiu uma repentina batida nos ouvidos. Isso a assustou tanto que ela perdeu o equilíbrio e caiu sobre Jason Petrossian. Após um momento, ela percebeu que na verdade o barulho não estava vindo da sua cabeça, mas da porta. Alguém estava batendo nela.

Ela pensou ter ouvido outro barulho também. Soava como um leve murmúrio. Finalmente, ela entendeu. Pessoas estavam do outro lado da porta gritando.

Ela se apoiou sobre suas mãos e joelhos e apalpou Jason. No bolso direito de suas calças, ela encontrou uma longa chave de metal. Rastejou até a parede e a usou para se apoiar ao ficar de pé. Então cambaleou até a porta, colocou a chave e girou. Houve um clique. Ela viu a alavanca se mover e recuou enquanto a porta abria.

Em frente a ela, estava Ray. Sua coxa direita estava pesadamente enfaixada. Com ele estava a Divisão de Pessoas Desaparecidas inteira. Hillman e Suarez estavam um de cada lado de Ray, cada um o apoiando para impedi-lo de perder o equilíbrio. Edgerton e Castillo eram os próximos. Ela estava se escorando pesadamente nele. Patterson estava em seguida e trazendo a retaguarda estava Frank Brody. Ele estava curvado, respirando pesadamente com as mãos nos joelhos.

—Você está bem? Perguntou Ray.

—Aham, ela disse, apesar de não ter certeza disso. Petrossian está no chão ali. Ele está inconsciente por enquanto.

Suarez deixou Ray aos cuidados de Hillman e entrou no cômodo. Patterson seguiu rapidamente. Aparentemente, ele estava abraçando mais o trabalho de campo. Keri começou a sair da sala, mas de repente ficou ciente que toda dor que ela havia ignorado até agora estava correndo de volta para ela.

Todo o lado direito de sua cabeça doía. Seu peito queimava. E ao andar para frente, seu joelho que havia batido na escada pareceu travar. Ela se sentiu começar a cair para frente.

Keri procurou pela parede, mas estava muito longe. Ela estava na metade do caminho para o chão, quando um par de braços a pegou e amortecem a queda gentilmente. Ela olhou para cima para ver o rosto preocupado de Brody,

—Frank, ela disse sorrindo para seus olhos sanguíneos, eu não sabia que você se importava.

E então ela desmaiou.


CAPÍTULO TRINTA E TRÊS


Ao contrário de algumas das muitas visitas de Keri a hospitais, esta durou apenas vinte e quatro horas. Os médicos determinaram que nenhum dos ferimentos necessitava de mais de uma noite de observação. Ela tinha hematomas no peito devido ao soco. O joelho estava inchado, mas não havia qualquer dano estrutural. Apesar de ter sido atingida duas vezes na cabeça, ela não teve uma concussão.

Eles haviam se preocupado que ela tivesse uma fratura no osso orbital perto do seu olho direito. Ela teve essa mesma lesão no osso orbital esquerdo em um confronto prévio com outro sequestrador no ano passado. Mas ela saiu com sorte dessa vez-apenas um rosto inchado e arroxeado.

Enquanto se deitava no sofá de seu apartamento se recuperando, múltiplos benfeitores vieram. Ela fez seu melhor para ser amigável e aberta a conversas. Mas, no fundo, ela já estava coçando para voltar na caçado por Evie. Os médicos haviam insistido que ela não ficasse de pé por pelo menos vinte e quatro horas e ela já estava ficando louca de ócio.

Como resultado, ela se viu ficando impaciente, apesar de seus maiores esforços para não ficar. Ray, que estava ficando com ela para dar uma mão, claramente sentiu sua frustração e tentou manter as visitas curtas.

Primeiro os Rainey passaram por lá. O pequeno Nate estava animado que uma policial morasse tão perto e perguntou se ela queria ir à casa dele para brincar.

—Talvez quando eu me sentir um pouquinho melhor, sugeriu Keri, tentando manter o nervosismo fora de sua voz para o pequeno rapaz.

Tim Rainey não conseguia parar de agradecê-la. Ele usou todos os lenços que ele havia trazido e passou para os de Keri com todo seu assoar de nariz e enxugação de lágrimas. Mas fora isso, ele manteve a compostura. Jessica não estava muito falante, mas ela segurou a mão de Keri o tempo inteiro que estiveram lá. Carolyn se demorou um pouco para trás enquanto Tim descia a escada com as crianças.

—O psicólogo disse que ela ainda está em choque, ela disse quando todos saíram. A recuperação vai demorar um longo tempo. Mas mesmo assim ele a mandou para casa. Ele acha que é melhor para Jess estar em um ambiente familiar. Nós teremos alguém a visitando diariamente por um tempo. Mas eu queria que você soubesse que fisicamente, pelo menos, ela está bem. Apenas alguns cortes, arranhões e desidratação.

—Fico feliz, disse Keri.

—Isso é graças a você. Nós nunca iremos esquecer. E não vou esquecer que você salvou o meu marido também. Eu sei que você está passando por um momento difícil com seu departamento agora. Mas você deveria saber—eu vou ser bem eloquente e visível na imprensa. Se você perder seu emprego, não vai ser porque minha voz não foi ouvida.

—Obrigada, Sra. Rainey, disse Keri calmamente.

—É Carolyn. E a propósito, eu estou trazendo cookies amanhã, então fiquem atentos.

Os outros membros da equipe passaram ao decorrer do dia, embora Frank Brody não o tenha feito. De acordo com Edgerton, ele alegava estar passando mal. Mas todo mundo suspeitava que o cara não poderia lidar mais com qualquer situação calorosa.

Castillo ligou do hospital. Ela estava sendo mantida sob observação por causa da concussão que havia sofrido na explosão da bomba. Ela disse que eles esperavam liberá-la no dia seguinte e que então ela iria passar lá em pessoa.

O Xerife Calvert também ligou para saber notícias dela. Ele disse que o departamento estava montando uma equipe para refazer o paradeiro do Petrossian durante tempo que passou em Elkhurst. Agora que eles tinham alguma coisa para seguir, ele esperava encontrar o corpo de Noreen Appleton.

Keri derivava para dentro e para fora do sono por muito do final da tarde. Quando ela finalmente se sentou, Ray lhe disse que Mags havia ligado enquanto ela estava tirando uma soneca mais cedo e que iria ligar para ela de volta quando tivesse alguns dias para descansar. Hillman a visitou no início da noite e sua visita acabou sendo mais longa por necessidade.

—Você está recuperada o suficiente para algumas atualizações? Ele perguntou, puxando uma cadeira da cozinha para a sala de estar e a colocou em frente ao sofá de Keri.

—Tenho a sensação de que elas vêm se eu estiver pronta ou não.

—Temo que sim. Ele admitiu. Por onde você quer começar?

—Como o Winchester está?

—Ele está na ala dos queimados com queimaduras de primeiro grau em quarenta por cento do corpo. Eles o têm em coma induzido, por isso é muito cedo para saber quais outros danos ele possa ter sofrido. Eu te manterei informada. Também, eu não sei se você vai querer comparecer, mas o funeral de Crowley é depois de amanhã.

—Estarei lá, assegurou-lhe Keri antes de continuar rapidamente. Ela simplesmente não podia pensar naquilo agora. Qual é a situação com Petrossian?

—Ele está consciente agora, sob guarda armada no hospital. Os direitos deles foram lidos, mas ele não parava de falar, principalmente sobre rituais de purificação. Ele alega que você é um agente de Satã.

—Ele é o primeiro facilmente, murmurou Keri sarcasticamente.

—Sim, bem, parece que o advogado dele já está preparando uma defesa por insanidade. E essa é uma daquelas raras vezes em que isso pode funcionar. Ele nunca andará livre novamente, mas posso vê-lo passar o resto de seus dias em uma ala psiquiátrica.

—Ele admitiu a alguma coisa? Perguntou Keri.

—Não com tantas palavras, mas ele fez breves referências às outras cidades em suas divagações. O FBI está rastreando todos os lugares nos quais ele morou e verificando casos de pessoas desaparecidas que batem com o padrão dele. Eu odeio dizer isso, mas acho que encontrarão muitos. Isso sem contar os outros corpos que encontramos na sala sob a estufa.

—Eles já foram identificados? Perguntou Keri.

—Um dele foi. Carlotta Cantu foi a vítima mais recente, provavelmente morta nas últimas 72 horas. Ela trabalhava nas ruas em East Los Angeles.

—Quantos anos ela tinha? Perguntou Keri, sabendo que a resposta a estriparia.

—Ela tinha doze anos.

—Eu me pergunto por que ele a escolheu, disse Ray. Ela não parece se encaixar no perfil.

—Quem sabe? Disse Hillman. Talvez houvesse uma conexão que não conhecemos.

"Ou talvez" meditou Ray, "ela foi apenas para praticar.

—E o outro corpo? Perguntou Keri rapidamente, processando o que Ray disse, mas se recusando a deixar isso se aprofundar dela verdadeiramente.

—Era apenas um esqueleto, então sem identificação ainda. Estamos esperando os registros de arcada dentária. Mas o médico legista diz que ela era uma mulher, entre as idades de doze e quatorze. Ela está morta há cerca de três meses.

Keri assentiu com a cabeça, mas não respondeu. Ray foi até ela e entregou-lhe uma xícara de chá.

—Diga o resto a ela, disse Hillman.

—O resto? Perguntou Keri inquisitivamente.

—Não ia acertar você com tudo de uma vez só, disse Hillman, fitando Ray ameaçadoramente. Mas acho que agora não tenho escolha.

—Acho que não, ela concordou. Então desembucha.

—Há notícias ruins definitivas e meio que boas notícias menos definitivas.

—Más notícias primeiro, ordenou Keri. Sempre.

—A má notícia é que a investigação do Assuntos Internos ainda está em curso. Alguém poderoso quer te derrubar e, apesar de acontecimentos recentes que trabalharia a seu favor, eles estão se recusando a fechá-la.

Keri olhou para Ray, que acenou de volta. Ambos sabiam quem era o "alguém poderoso".

—E o as notícias boas menos definitivas? Ela perguntou, puxando-se em uma posição mais vertical.

—Você é muito popular agora. Você acaba de salvar uma garotinha e pegou o que parece ser um assassino em série de crianças. Vamos colocar de lado agora o fato de que você não era tecnicamente uma policial quando você o fez. A mídia está no seu lado. E enquanto a Chefe Beecher teve que navegar em uma política complicada quando se trata de você, você sabe que ela sempre esteve do seu lado também. Ela vê isso como uma chance de fechar a porta na coisa toda.

—Como a porta se fecharia? Perguntou Keri suspeita.

—Se ela conseguir do jeito dela, disse Hillman, com uma repreensão formal pelas suas ações a respeito do Colecionador. Afinal, ele realmente sequestrou sua filha. A maioria das pessoas pode entender como você pode ter quebrado um pouco as regras um com aquele. Ela quer seguir em frente a partir disso. E na minha experiência, quando Reena Beecher quer algo, ela consegue, não importa quão poderosas sejam as forças do outro lado.

Keri estava mais cética, mas guardou suas dúvidas para si mesma, por agora.

—Obrigado, Tenente, ela disse.

Depois que ele saiu, ela sentiu uma onda de exaustão se quebrar sobre ela.

—Que horas são? Perguntou à Ray, bocejando, apesar dos seus esforços.

—Quase sete da noite.

—Não sei quanto tempo mais vou aguentar.

—Sim, foi um grande dia para você, deitando no sofá e tudo, ele disse, a carregando no colo e levando-a ao quarto.

—Ei! Não me provoque. Estou convalescente.

—Eu sei, ele disse enquanto a colocava delicadamente na cama e levantou as cobertas para ela.

—Que tal um banho? Eu não tomei banho o dia todo.

—Você pode tomar banho de manhã, ele sussurrou ao beijá-la na bochecha e desligou a lâmpada ao lado da cama.

—É só isso que recebo? Exigiu Keri, tentando soar firme mesmo enquanto sentia as pálpebras ficando pesadas. Não quer ter algum tempo sensual?

—Em breve, ele disse ao fechar a porta.

Mas Keri não o escutou. Ela já estava dormindo.


CAPÍTULO TRINTA E QUATRO


Quando ela acordou na manhã seguinte, eram 7:08. Ela não conseguiu se lembrar da última vez que ela dormiu doze horas seguidas. Ela e Ray estavam tendo um agradável café da manhã com o café e bagels que ele havia comprado, quando o celular de Keri tocou.

—Você pode me passar? Ela perguntou, já que ela estava novamente no sofá e o telefone estava sobre a mesa da cozinha.

—Seus dias de convalescente estão chegando ao fim, ele rosnou divertidamente ao jogá-lo para ela.

Ela olhou para a tela. Era o número do lar compartilhado da Susan Granger. Atendeu e era a própria Susan no outro lado.

—Como vai, Susan? Ela perguntou.

—Você está sentada? A garota perguntou em um tom de voz que Keri nunca havia ouvido sair da boca dela. Ela soava desencorajada, quase em pânico.

—Eu estou deitada no sofá. Por quê? O que há de errado?

—Eu fiz o que nós conversamos e entrei em contato com algumas garotas da rua que eu ainda mantenho contato. Uma delas me retornou um e-mail ontem tarde da noite, mas eu estava dormindo, então não o vi até agora.

—Ok, disse Keri, o temor na voz da adolescente começando a mexer com ela.

—Ela disse que o boato pela cidade é que o evento do Vista que acontece uma vez ao ano, o que tem o Prêmio de Sangue, vai acontecer amanhã à noite.

—Amanhã à noite? Repetiu Keri, incerta de que havia compreendido plenamente as palavras que acabara de escutar.

—Sim, confirmou Susan. Ela contou que o que dizem por aí é que as coisas estão muito quentes e que se não o fizerem rápido, podem acabar levando prejuízo com o Prêmio de Sangue desse ano.

—Por quê? Perguntou Keri, percebendo que sua voz parecia muito distante. Ray estava olhando para ela com uma expressão consternada.

—Porque os policiais estão chegando muito perto. Eles estão chamando o prêmio desse ano de mini porco, porque dizem que é a filha de uma tira.

—Mini porco? Sussurrou Keri, mal capaz de entender a palavra.

—Sinto muito, Detetive Locke. Mas Darla estava certa. Eles escolheram a Evie. Ela é o Prêmio de Sangue.

Keri mal conseguia ouvi-la mais. Ela olhou para Ray, mas ele estava embaçado. Tudo foi um turbilhão de sons e imagens. Ela sentiu o telefone escorregar de seus dedos.

Ela reconhecia esse sentimento. Era um ataque de pânico, como os que ela costumava ter, aqueles que ela pensou que havia superado. Mas agora, ela sabia que não.

E enquanto ela começava a deslizar para a familiar escuridão úmida, um último pensamento atravessou sua cabeça:

Eu tenho trinta e seis horas para salvá-la.

E eu vou.

Por Deus, eu vou.

 

 

                                                   Blake Pierce         

 

 

 

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