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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


UMA LEI PARA O CORAÇÃO / Barbara Dunlop
UMA LEI PARA O CORAÇÃO / Barbara Dunlop

 

 

                                                                                                                                   

 

 

 

8° livro / UMA LEI PARA O CORAÇÃO

 

 

Um casal deveria respeitar determinadas regras...

Regra número um: Ex-marido não tem permissão de continuar seduzindo suas ex-mulheres depois da separação.

O milionário Daniel Elliot continuava exercendo grande influência sobre Amanda, sua ex-mulher. Era como se ainda fossem os jovens cuja paixão irrefreável e a chegada de um filho haviam levado a um casamento inconseqüente.

A constante intromissão dos Elliot, porém, provocou o desgaste do relacionamento e acabou por separar o casal. Mas as chamas do desejo e do amor que os uniram jamais deixaram de arder. E bastou um único encontro para que eles recomeçassem de onde tinham parado... Será que a riqueza e o poder da dinastia Elliot ameaçarão novamente o frágil vínculo que Daniel e Amanda conseguiram refazer?

 

                       O QUE ACONTECE PELA CIDADE

 

Será que a história se repete na família Elliot?

O magnata do mercado editorial, Daniel Elliot, foi visto pela cidade acompa­nhado por ninguém menos do que sua ex-esposa, a advogada Amanda Elliot.

O casal foi surpreendi­do aos beijos no restauran­te mais badalado de Nova York, durante evento be­neficente. Trajando um belo vestido de gala, a Sra. Elliot estava deslumbran­te, embora só tivesse olhos para o garboso ex-marido. O casal tem dois filhos, Bryan Elliot, proprietário do bem-sucedido restau­rante Une Nuit, e Cullen Elliot, protegido de seu pai na revista Snap. O casal, porém, dava provas visí­veis de estar interessado em bem mais do que sua prole...

Nem Daniel, nem Amanda se dispuseram a fazer qualquer comentário, e, de acordo com a se­cretária da advogada, nada está acontecendo entre sua chefe e o ex, a quem ela cha­mou de " Sr. Delícia"!

Mas há fortes indícios de que o amor está no ar! Segundo fontes seguras da Editora Elliot, o workaholic Daniel tem se ausentado com freqüência do traba­lho.

Agora, a pergunta que não quer calar é: o que Patrick Elliot, o patriarca da família, terá a dizer sobre esse inusitado "encontro familiar" ?

 

 

 

 

 

Se as coisas funcionassem conforme a vontade de Amanda, Nova York teria uma lei contra ex-maridos. Ela respirou fundo e mergulhou de cabeça na piscina do Boca Royce.

Uma lei contra ex-maridos que invadissem a vida de suas ex-mulheres. Ela esticou os braços, impulsio­nando o corpo para a frente até voltar à superfície.

Uma lei contra ex-maridos que continuassem em forma e sexy, quinze anos depois da separação. Ela começou a nadar, tentando deixar o mundo lá fora.

Uma lei contra ex-maridos que abraçassem suas ex-esposas apertado e sussurrassem palavras de con­forto, fazendo com que o mundo voltasse a fazer sen­tido.

Amanda começou a dar braçadas mais fortes para afastar aquela lembrança até tocar o outro lado da piscina e então virar para fazer o caminho de volta.

Os políticos poderiam elaborar também uma lei contra filhos que se feriam em tiroteios, filhos que se tornavam agentes secretos do governo e freqüenta­vam a escola de espionagem sem o consentimento de suas mães. Nenhuma mãe teria mais de acordar um belo dia e descobrir que dera à luz a um James Bond.

Ela achou graça naquela idéia. Por mais que ten­tasse, não conseguia imaginar Bryan usando um pas­saporte falso, dirigindo carros exóticos em terras estrangeiras, nem explodindo coisas acionando um simples controle remoto. O seu Bryan adorava cachorrinhos e pintura a dedo, e dava a vida por doces.

Suas braçadas hesitaram. A imagem do ex-marido recusava-se a sair de sua mente.

Daniel a confortara durante a longa cirurgia de Bryan. Ele a havia apoiado quando tudo ameaçava ruir. Fora tão carinhoso com ela, que a década e meia de raiva entre os dois quase desapareceu.

Seria uma trégua?

Ela deu impulso com os pés e partiu para mais uma volta, aumentando o vigor das braçadas.

Não. Isto estava fora de cogitação.

No entanto, Bryan estava se recuperando bem, Da­niel tinha voltado para o trabalho na editora e Amanda tinha uma audiência com o juiz Mercer no dia se­guinte.

Ela completou a quinta volta.

— Olá, Amanda — disse Daniel.

A mulher esfregou os olhos para ver o ex-marido. O que será que ele estava fazendo lá, na borda da piscina?

— Aconteceu alguma coisa com Bryan?

— Não, ele está bem — respondeu ele, agachando-se para olhá-la nos olhos.

Ela suspirou aliviada, agarrada à beirada.

— Graças a Deus!

— Cullen me falou que você estaria aqui.

A ansiedade voltou com a menção do outro filho.

— E Misty?

— Ela está ótima. O bebê não pára de chutar. Amanda avaliou a expressão de Daniel. Seu rosto estava calmo e impassível.

O homem se ergueu e o olhar de Amanda se fixou em seu peito musculoso e depois no torso. Daniel ti­nha um abdômen de fazer inveja a um rapaz com a metade da sua idade.

Ela se deu conta de que havia mais de 16 anos que não o via sem um paletó.

— O que é que você está fazendo aqui, então?

— Eu estava procurando por você.

Amanda tentou encontrar algum sentido para aquelas palavras. Daniel deveria estar atrás de sua mesa, no escritório da Snap, disputando a presidência da editora com os irmãos. Somente uma catástrofe o tiraria do trabalho àquela hora.

— Eu queria conversar com você.

— Como? — disse ela, tirando a água dos ouvidos. — Conversar?

— Sabe como é, trocar palavras, idéias, informa­ções — brincou.

Ele sorriu e se inclinou, estendendo-lhe a mão.

— Por que não tomamos alguma coisa juntos?

Amanda se afastou da borda e se remexeu na água.

— Não acho uma boa idéia.

— Saia da piscina, Amanda.

Não tinha a menor intenção de conversar com ele e muito menos de passar na sua frente usando um maio colado ao corpo.

— Eu ainda tenho 45 voltas para completar — ar­gumentou ela.

Aquilo, na verdade, era um exagero, mas a mulher havia decidido levar a sério os exercícios — a partir daquele momento.

Daniel cruzou os braços.

— Desde quando você segue um plano?

Quer dizer que eles iam começar a falar dos pontos fracos um do outro?

— E desde quando você deixa o seu trabalho antes das oito da noite? — perguntou ela.

— Eu só estou fazendo uma pausa.

— Sei...

Ele franziu a testa.

— O que você quis dizer com isso?

— Que você não faz pausas durante o trabalho.

— Mal nos vimos nos últimos quinze anos. Como tem tanta certeza do que faço ou deixo de fazer?

— Quando foi a última vez que você tirou um tem­po para si mesmo?

— Hoje.

— E antes disso?

Ele permaneceu em silêncio, até dar um sorriso. Amanda jogou água nele.

— Eu sabia!

Daniel ameaçou se jogar na água.

— Vou ter de entrar aí para pegá-la?

— Vá embora.

O bombardeio havia passado, era hora de cada um voltar às respectivas trincheiras.

—Eu quero conversar com você.

— Nós não temos nada para dizer um ao outro.

— Amanda...

— Se Bryan não voltou para o hospital e Misty não está em trabalho de parto, nós seguimos separados.

— Amanda! — repetiu ele, um pouco mais alto.

— É isso o que consta nos nossos papéis de divór­cio — disse ela, nadando para ainda mais longe.

Daniel a acompanhou ao longo da piscina. A mu­lher mal conseguia discernir as suas palavras em meio ao barulho da água.

— Eu achei... que você... estava progredindo... Ela desistiu e se segurou em uma das raias da pis­cina para olhar para Daniel.

— Progredindo em quê?

— Detesto quando você se faz de boba.

— E eu detesto quando você me insulta.

— Eu a insultei?

— Você me chamou de boba.

Ele abriu os braços, exasperado.

— Eu disse que você estava se fazendo de boba. Amanda, isso é mesmo necessário? Você pôde contar comigo quando precisou.

Daniel já estava usando aquilo contra ela? Ele ergueu as mãos em um gesto de rendição.

— Eu sei, eu sei. Também pude contar com você.

— Mas isso passou -— respondeu ela. — Bryan está vivo e Cullen está bem casado.

Daniel se agachou novamente, usando um tom mais grave.

— E você, Amanda?

Ela não ia conversar com Daniel a respeito de seu estado mental e emocional.

— Eu estou viva — retrucou acidamente, para en­tão mergulhar novamente na água e voltar a nadar.

O ex-marido continuou a caminhar pela borda, acompanhando os seus movimentos.

Amanda só pensava no quanto seu traseiro estava aparecendo e se o maio estava saindo do lugar.

Parou no lado oposto, tirando o cabelo do rosto.

— Será que você pode ir embora agora?

Ela não queria completar as próximas quarenta e quatro voltas com Daniel avaliando as suas coxas.

— Quero discutir uma questão legal com você — disse ele.

— Então ligue para o meu escritório.

— Mas nós somos uma família.

Ela se afastou da borda.

— Nós não somos mais uma família.

— Nós temos de discutir isso aqui?

— Você pode ir para onde quiser.

— Saia daí e venha beber uma coisa comigo.

— Vá embora, Daniel!

— Eu preciso da sua assistência jurídica.

— Você tem advogados na editora.

— Mas isso é confidencial.

— Tenho de terminar meus exercícios. Seus olhos a fitaram debaixo da água.

— Você não precisa disso.

O coração dela parou de bater por um momento. Ela se virou e voltou a nadar.

Daniel já tinha chegado na outra ponta quando ela ergueu a cabeça para respirar.

— Pode terminar. Eu espero.

Amanda trincou os dentes.

— Acho melhor não.

Ele sorriu e estendeu-lhe a mão.

Daniel acompanhou de perto a agenda frenética de Amanda nas últimas semanas. Viu como os clientes se aproveitavam dela, ligando tarde da noite.

Seus olhos escuros se estreitaram, enquanto ele aproximava a mão um pouco mais da dela. Só preci­sava da atenção de Amanda durante uns poucos dias, para colocar tudo nos trilhos.

Amanda finalmente cedeu, fazendo uma careta e pousando a sua mão pequena e macia na dele. Ele tentou não deixar transparecer o alívio que sentiu ao vê-la sair da água.

Ela se pôs de pé e Daniel ficou admirando suas pernas e a maneira como o maio laranja aderia às suas curvas. Sua atual predileção por roupas mais folga­das o havia feito pensar que Amanda talvez tivesse engordado ao longo dos últimos anos, mas esse não era o caso.

A ex-mulher estava linda. Sua cintura era bem de­finida, a barriga lisa e firme, e seus seios fartos se in­sinuavam sob a lycra.

Uma onda de desejo invadiu. Ele cerrou os dentes, tentando se controlar.

Se Daniel errasse a mão, acabaria perdendo-a para sempre. Ela passaria o resto da vida nadando nas ho­ras de trabalho e andando pela cidade naquelas rou­pas sem glamour.

Aquela imagem lhe causou um arrepio.

Amanda podia não admitir, mas precisava ampliar o seu círculo profissional e se vestir como alguém bem-sucedido.

Ela tirou sua mão da dele.

— Só um drink — advertiu ela, lançando-lhe um olhar tipo " não brinque comigo", enquanto tirava o excesso de água do maio.

— Só um drink — concordou o editor.

Daniel não tinha uma questão legal para discutir com Amanda. Aquilo tinha sido apenas uma desculpa que lhe havia ocorrido na hora para tirá-la da piscina. Precisaria de alguns minutos para pensar em algo convincente para sustentar a mentira. Com um sorri­so nostálgico, ele comentou:

— Os meninos iam adorar isto aqui.

— O que há com você? — perguntou ela.

— Eu só estou dizendo...

— Que os meninos iam adorar isto aqui.

Ela ficou em silêncio por um momento para então abrandar o olhar, ao notar que Daniel havia se entre­gado às lembranças.

O Boca Royce era a única recreação que ele e Amanda podiam bancar durante a época das vacas magras, graças ao título vitalício do clube, adquirido pela família Elliot. Bryan e Cullen costumavam na­dar ali até cansar.

Os garotos ficavam exaustos no final do dia, pron­tos para cair duros na cama. Ele e Amanda corriam para casa para comer pizza e ver um desenho anima­do com os filhos. Depois, colocavam as crianças para dormir e se enfiavam na própria cama para uma longa noite de amor.

A voz dele ficou rouca.

—Nós tivemos bons momentos, não foi?

Ela se virou sem dizer uma palavra e continuou ca­minhando pelo corredor.

—Tudo bem. —Daniel só queria mesmo organizar a vida profissional dela.

Amanda estava se sentindo bem menos vulnerável depois de devidamente vestida. Ajeitou os cabelos e passou um pouco de brilho nos lábios. Nunca usava muita maquiagem durante o dia e não iria começar agora só por causa de Daniel.

A mulher pegou a bolsa amarela de ginástica e se­guiu até o mezanino. Estava decidida a ouvir o que ele tinha a dizer, recomendá-lo a alguém que cobras­se bem mais do que ela e depois, quem sabe, sair em busca de um bom terapeuta.

Já no topo das escadas, uma recepcionista pediu para ver sua carteirinha. Daniel, porém, impecavelmente vestido em um terno Armani, tomou a frente da situação, antes que ela encontrasse o documento.

— Isso não é necessário — disse ele. — Ela é mi­nha convidada.

— Eu não sou sua convidada — respondeu Aman­da. — Também sou sócia daqui, esqueceu?

— Isso é de uma indelicadeza incrível — lamen­tou Daniel, apontando para uma pequena mesa re­donda à beira da piscina.

— Eles não me reconhecem — explicou Amanda. Daniel puxou uma das cadeiras para que ela se sentasse.

— Talvez se você... — começou ele, mas se dete­ve, dando a volta na mesa para se sentar.

— Posso lhe oferecer uma bebida, senhor? — per­guntou o garçom.

O ex-marido ergueu as sobrancelhas na direção de Amanda.

— Um suco de frutas — pediu ela.

— Nós temos um de laranja com manga.

— Parece ótimo.

— E para o senhor?

— Um uísque com gelo, por favor.

O garçom fez um meneio de cabeça e se retirou.

— Deixe-me adivinhar — disse Amanda. — Você ia dizer que se eu me vestisse mais elegantemente, ninguém pediria a minha carteirinha.

Ele nem se preocupou em discordar.

— A roupa faz a mulher — respondeu ele.

— É a própria mulher que faz a mulher — retru­cou.

— Um tailleur e um bom par de sapatos de salto alto lhe dariam muito mais credibilidade.

— Esse é o tipo de roupa que eu uso para ir à Cor­te, não ao clube.

Daniel a avaliou mais intensamente.

— Como você escolhe o seu guarda-roupa?

— Com base na minha vida, no meu trabalho, como todo mundo.

— Você é uma advogada.

— Eu sei muito bem disso.

— Amanda, advogados costumam...

— Daniel! — advertiu ela.

Não ia admitir que ele desse palpites no seu guar­da roupa.

Só estou dizendo para você tomar um banho de loja, manter um horário fixo no salão.

— Qual é o problema com o meu cabelo?

— Você é uma mulher muito bonita, Amanda.

— Sei... — respondeu ela, bufando.

Daniel parecia estar sofrendo por ela usar roupas feias e um penteado de mau gosto.

— Só estou falando de alguns blazers e de um bom corte de cabelo.

— Para eu não ser mais barrada no Boca Royce?

— Não se trata só da carteirinha, e você sabe disso.

Ela se empertigou. Aquilo não era da conta dele.

— Deixe-me em paz, Daniel.

Ele lançou-lhe um sorriso de desculpas. O garçom veio servir as bebidas e deixou o cardá­pio na mesa.

— Vamos pedir uns canapés? — sugeriu Daniel.

Amanda balançou a cabeça em negativa.

— Certo, eu também vou ficar só no uísque.

Ela olhou para a bebida e pensou no quanto ele ti­nha mudado nos últimos anos. Muito tempo já havia se passado desde que lhe servira cerveja em uma ca­neca.

— Você ainda toma cerveja?

— Às vezes.

— Eu quero dizer, em casa.

Daniel ergueu o copo, fazendo os cubos de gelo tilintarem contra o vidro fino.

— Você é uma esnobe às avessas, sabia?

— E você é um esnobe completo.

Ele a encarou. Amanda desviou o olhar. Não podia deixar que a opinião de Daniel a influenciasse.

— Por que você acha... — perguntou ele, fazendo-a erguer o olhar — que discutimos tanto?

— Porque nós não perdemos a esperança de mudar um ao outro.

Ele permaneceu em silêncio durante um bom tem­po até que um sorriso genuíno brotou em seu rosto.

— Bem, estou disposto a melhorar, se você topar.

Opa! Aquele convite ao bar não podia ser boa coi­sa.

— Será que nós podemos ir direto ao assunto?

— Que assunto?

— A questão jurídica.

Daniel se ajeitou na cadeira.

— Ah, sim... É algo um tanto... delicado.

Aquilo chamou a sua atenção.

— Verdade?

— Sim.

Haveria uma mensagem velada naquelas pala­vras? Será que Daniel estava enfrentando a dificulda­de?

— Hum, você fez alguma coisa errada?

Ele piscou, sem entender.

— Como assim?

— Algo contra a lei.

— Claro que não, Amanda!

—Então por que a reunião secreta no meio do dia?

— Esta não é uma reunião secreta.

—Nós não estamos no seu escritório.

— Você teria ido até lá?

—Não.

—Ai está.

— Daniel...

— O quê?

— Vamos logo ao que interessa. O garçom voltou.

—Gostariam de pedir algo do menu? Daniel mal virou a cabeça para responder.

—A tábua de frios seria perfeita.

O garçom se afastou e Amanda ergueu as sobran­celhas interrogativamente.

— Nunca se sabe — respondeu ele. — Nós pode­mos nos demorar um pouco por aqui.

— Se continuar nesse ritmo, com certeza sim. Ele deu um gole no uísque.

— Certo. Eu vou direto ao ponto. Estou querendo entender melhor o regulamento da empresa.

— O regulamento para os funcionários?

Como é que aquilo podia envolver uma questão delicada? Ela balançou a cabeça, desapontada, tentando pegar a bolsa.

— Daniel, não trabalho com Direito Corporativo.

O ex-marido a segurou pela mão, delicadamente.

— O que quer dizer com isso? — perguntou ele.

Amanda tentou ignorar a mão dele.

— Quero dizer que não é a minha especialidade.

— Bem, talvez não relações trabalhistas...

Ela se empertigou na cadeira. Não podia tirar a mão. Seria óbvio demais.

— Eu trabalho com Direito Criminal...

Daniel a olhou em silêncio, sentindo o sangue dela pulsar em sincronia com o seu.

— Crime — explicitou ela, aproveitando para pu­xar a mão.

Ele ficou confuso.

— Você com certeza já leu algo do tipo nos jor­nais, ou viu no cinema e na televisão...

— Sim, mas... Advogados particulares não proces­sam criminosos.

— Quem disse que eu os processo?

Ele pegou de novo a mão dela, com mais força.

— Você os defende?

— Isso mesmo — respondeu Amanda, sem fazer qualquer esforço para se libertar desta vez.

— Que tipo de criminosos?

— O tipo que é pego.

— Não banque a engraçadinha comigo.

— Estou falando sério. Aqueles que conseguem se livrar não precisam de mim.

— Está falando de ladrões, prostitutas, assassinos?

— Sim.

— E os garotos sabem disso?

— Claro.

— Não estou gostando nada disso...

— Verdade?

Como se a opinião dele importasse alguma coisa.

— Eu acho... perigoso.

— Isso não é da sua conta, Daniel. O homem a olhou intensamente.

— É da minha conta sim, senhora.

— Não é não.Você é a mãe dos meus filhos. Eu não posso dizer que nada...

—Daniel! Ele a olhou nos olhos de um jeito bastante fami­liar, deixando entrever que tinha um plano, uma missão: salvá-la.

 

Daniel precisava falar com os filhos. Bem, pelo me­nos com um deles. Teria de esperar Bryan, mas pode­ria falar com Cullen imediatamente.

Quer dizer então que Amanda era advogada de bandido? Isso era uma verdadeira catástrofe! Ela fez Literatura Inglesa depois do divórcio e cursou facul­dade de Direito para jogar tudo fora com causas per­didas?

Seus clientes provavelmente lhe pagavam com aparelhos de som roubados. Os assaltantes de banco, talvez, lhe pagassem em dinheiro vivo.

Os filhos já sabiam que ela estava correndo perigo havia anos e nunca tinham se dado ao trabalho de lhe dizer coisa alguma. É bem verdade que ele e Amanda haviam combinado de não falar mal um do outro com os filhos, mas Bryan e Cullen já eram homens cresci­dos agora!

Daniel saiu da loja do clube, onde comprou uma camisa pólo, e se dirigiu ao vestiário. Misty havia lhe dito que Cullen estaria por lá, a esta hora, jogando golfe. Ele ia ter de lhe dar algumas explicações.

Quinze minutos depois, Daniel avistou Cullen no campo preparando-se para uma tacada e foi até ele.

— Olá, pai! — disse outro rapaz.

Daniel se virou e viu seu filho mais velho.

— Bryan!

Ele estava usando uma tipóia para proteger o om­bro machucado.

—O que você está fazendo aqui? — perguntou Daniel.

—Vim jogar golfe — respondeu Bryan.

— Mais você está machucado!

Cullen se desconcentrou.

— Será que vocês dois podem calar a boca? Daniel cerrou os dentes, até a bola de Cullen desaparecer dentro do buraco.

—Oi, papai — disse Cullen, indo em sua direção.

—Mas você acabou de sair do hospital! — disse Daniel a Bryan.

—Foi uma coisa à toa.

—Foi um ferimento à bala! Você passou por uma cirurgia de três horas!

—Você sabe como são os médicos. Eles contabilizam cada segundo.

Daniel voltou-se para Cullen.

— Você teve coragem de trazê-lo para jogar?

—Eu estou fazendo o trabalho pesado — Cullen explicou. — Ele só está botando a bola no buraco.

—Ele está roubando — disse Bryan, preparando a tacada, com um só braço.

— Como se eu precisasse roubar para ganhar de um incapacitado — desdenhou Cullen.

—Eu não acredito que Lucy deixou você sair de casa — continuou disse Daniel.

—Lucy me pagou para tirá-lo de lá.

—Parece que eu não sou um bom paciente — dis­se Bryan, errando a tacada.

— Cinco! — gritou Cullen.

— Está bem — retrucou Bryan. — Eu pego você na semana que vem.

— Nós vamos saltar de pára-quedas na semana que vem — disse Cullen.

— Vocês querem me matar!

— Relaxa, pai — respondeu Bryan.

— Umas boas palmadas teriam feito maravilhas por vocês — disse Daniel.

Cullen riu.

Daniel endireitou os ombros. Os filhos podiam ser homens feitos e independentes, livres para escolher suas maluquices, mas ele ainda era o pai deles.

— Eu não vim aqui para jogar golfe. Bryan devolveu o taco para o caddy.

— Ah,é?

— Nem para nadar.

Houve um momento de silêncio. Cullen então er­gueu a sobrancelha e disse:

— Oh, muito obrigado por compartilhar isso co­nosco, papai.

Daniel olhou seriamente para os dois.

— Fui lá para falar com a mãe de vocês. Amanda me contou sobre o trabalho dela como advogada.

Cullen e Bryan se entreolharam.

— O trabalho dela na Defensoria — especificou Daniel.

— E há alguma coisa errada com isso, pai? — per­guntou Bryan.

— Muito. Sua mãe trabalha com criminosos!

Cullen inclinou a cabeça, sem entender.

—E para quem você achava que ela trabalhava? Executivos, políticos, velhinhas interessadas em redigir testamentos?

—Por que vocês nunca me contaram? Cullen tirou as luvas e as enfiou no bolso. Não falamos com você a respeito da mamãe.

—Bem, talvez vocês devessem ter falado comigo sobre isso.

— Por quê?

Como eles podiam ser obtusos quando queriam!

—Porque ela está correndo perigo.

—Que tipo de perigo? — perguntou Bryan.

—Criminosos.

Eles não representam risco algum para ela. Daniel apertou os olhos para olhar para o filho mais velho. Ele parecia muito seguro de si. Talvez soubesse de alguma coisa que ele ignorava.

—Vocês a estão vigiando?

Cullen desatou a rir.

—Papai, você anda vendo muitos filmes policiais! Mas os clientes dela são assassinos e ladrões!

—E ela é a melhor amiga deles. Acredite em mim; o índice de assassinatos de defensores é muito baixo.

—Vocês querem me ajudar ou não?

—Ajudá-lo em quê? — perguntou Cullen.

O plano original de Daniel era melhorar a imagem de Amanda e incrementar os seus negócios. Um bom estilista, no momento, porém, só serviria para atrair

uma classe melhor de criminosos. Nada disso. A si­tuação exigia medidas drásticas.

— A convencê-la a mudar de careira — disse ele.

— Ha, ha, ha — gargalhou Bryan.

— Você enlouqueceu? — perguntou Cullen.

Daniel olhou para os dois marmanjos.

— Não vão me dizer que estão com medo dela.

— Pode apostar nisso — respondeu Cullen.

O pai cruzou os braços.

— Vocês têm mais medo dela do que de mim?

— Você vai ter de se virar sozinho com a mamãe — disse Cullen.

— Vamos fazer algo mais seguro — acrescentou Bryan.

Cullen concordou com um meneio de cabeça.

— Isso. Como saltar de pára-quedas!

— Ele está me deixando nervosa — reclamou Amanda a Karen Elliot, sua ex-cunhada.

A advogada tinha ido encontrá-la no Tides, a man­são dos Elliot, onde Karen estava se recuperando de uma mastectomia.

— Mas ele chegou a fazer alguma coisa? — per­guntou Karen, com uma xícara de chá na mão.

— Sugeriu uma transformação para mim.

— Uma cirurgia plástica? — perguntou Karen.

— Não, apenas um corte de cabelo e roupas novas, mas acho que ele está aprontando.

— Você me assustou. Achei que Sharon tivesse conseguido corrompê-lo de vez.

Amanda se retraiu à menção do nome da ex-esposa de Daniel. Sharon era magra e bonita, mas nunca havia passado de uma escrava da moda.

Karen passou a mão pelo lenço que disfarçava a perda de cabelos devido à quimioterapia.

—Eu adoraria passar por uma transformação. Amanda riu. Karen não precisava daquilo. Tinha e era linda sob qualquer circunstância. Mais proponho que a gente mude de assunto e esqueça Daniel — disse Amanda.

Karen se empertigou na cadeira e pousou a xícara no pires.

—E exatamente isso o que eu vou fazer. Amanda fingiu deleite.

—Esquecer o Daniel? Não, passar por uma transformação. E você de­veria vir comigo.

Como se não bastasse Daniel ter criticado sua aparência, Karen ainda decidiu fazer coro com ele.

—Não seja tão sensível. Nós vamos passar um final de semana no Eduardo's. Banhos de lama, massagens faciais... Uma daquelas massagens vai me fa­zer sentir uma nova mulher.

—Eu não quero me transformar em uma nova mulher, Além do mais, não tenho como bancar isso.

—Manda o Daniel pagar.

—O quê? Deixar que o dinheiro de Daniel interferisse em sua vida? Karen devia ter enlouquecido.

—Afinal de contas, a idéia foi dele, não foi? — perguntou Karen com malícia. Amanda balançou a cabeça.

— Não quero agradar o Daniel. Quero que seu ma­rido me ajude a tirá-lo do meu caminho.

— Pode ser que ele saia do seu caminho se você aceitar passar por uma transformação.

— Ele ia achar que eu aceitei o seu conselho.

— E daí?

— Daí que ele quer que eu deixe de ser advogada.

— Mas ele não pode demiti-la ou coisa parecida.

Amanda se deteve. Era verdade. Ele não tinha como impedi-la de trabalhar. Os Elliot eram podero­sos, mas tudo tinha um limite. Seria preciso que Daniel a pegasse fazendo algo antiético, o que era impossível. Outra alternativa se­ria plantar uma prova contra ela, mas ele não faria isso. Já Patrick Elliot talvez o fizesse, a pedido do fi­lho.

Karen recostou-se na cadeira e suspirou, passando a mão pela testa.

— Acho que uma transformação ajudaria muito na minha recuperação. Mas eu não quero ir ao Eduar­do’s sozinha.

Amanda sabia que Karen estava tentando inverter a situação, porém não podia se recusar a acompanhar a amiga em um fim de semana no spa, depois de tudo o que ela havia passado nos últimos tempos.

— Você vai ter de me prometer que não vai contar nada a Daniel.

Um lindo sorriso formou-se no rosto de Karen.

— Acho que você devia tingir o cabelo.

— Não, eu não vou...

A advogada se deteve ao ver a expressão decepcionada da amiga.

—Acha mesmo que eu deveria tingi-lo?

—Eles são mestres em fazer luzes. Você vai adorar.

Não estava interessada em luzes, mas adorava Karen do fundo do coração.

—Que seja. Luzes!

Karen mal se conteve.

—Ótimo. Fica por minha conta.

— De jeito nenhum.

—Por conta do Michael... Vou marcar o horário. Karen estendeu a mão em direção ao telefone.

—Seu marido também não vai pagar por isso.

— Mas você disse...

—É minha ultima oferta. Nós vamos para oEduardo’s, eu pago a minha parte e ninguém conta ao Daniel.

—Combinado.

 

Daniel era um homem determinado. Tinha sempre um plano em mente, mas desta vez havia se superado. Cullen entrou no escritório do pai e colocou alguns papéis sobre a mesa.

— O levantamento de nossas vendas.

— Obrigado — agradeceu Daniel, mal olhando para o relatório.

A Regina & Hopkins era uma firma respeitável, especializada em Direito Corporativo. Conseguir um trabalho para Amanda de imediato seria um exagero, mas talvez eles dessem algumas dicas sobre a remu­neração e a margem de lucro. Taylor Hopkins pode­ria lhe fornecer essas informações.

— As vendas do mês passado foram fracas — con­tinuou Cullen. — Não vamos conseguir avançar mui­to desse jeito. É tão frustrante!

— É mesmo — respondeu Daniel.

Amanda, obviamente, ainda não se dera conta de como o exercício do Direito Corporativo poderia ser rentável, e que todo o dinheiro ganho na atividade era gerado apenas nas horas regulares de trabalho. Tay­lor certamente nunca havia sido chamado no meio da noite para tirar um traficante da prisão.

— Papai?

Daniel olhou aturdido para o filho.

—O que foi?

—Parece que estamos perdendo a competição.

—Você tem o celular de sua mãe aí? Cullen não respondeu.

—Não importa — disse Daniel, acionando a comunicação interna. — Nancy?

—Pode me conseguir o telefone de Amanda Elliot, a advogada?

—Claro — respondeu a voz do outro lado.

—Você vai ligar para a mamãe? Alguém tem de fazer isso.

—Papai, eu acho que você tem de recuar e...

—Você falou alguma coisa sobre as vendas?

—Ah, quer falar sobre isso agora?

—Quando foi que não quis falar sobre o assunto? Cullen revirou os olhos.

—Nós não estamos indo muito bem.

—Já esperávamos por isso.

Cullen apontou para um número do relatório.

— Isso aqui é sério.

Daniel teve de reconhecer que aquele era realmente um número muito baixo.

—Como estão as vendas pela internet?

—Aumentando.

—Como estão as estatísticas?

—Foi o setor que teve o maior aumento. Passou de 10% para 24% de vendas.

— Isso é bom, não?

—Mas não o bastante — disse Cullen.

O ramal interno tocou.

— Já consegui o número que o senhor solicitou.

— Eu estou indo aí. — Daniel se levantou e deu uma tapinha no ombro do filho. — Continue com o bom trabalho.

— Mas, papai... Você está indo embora?

— Acho que você tem razão. Um telefonema não é uma boa idéia.

Ele resolveu ir pessoalmente ao escritório de Amanda. Assim, ela teria mais dificuldade para recu­sar um convite seu.

Cullen colocou-se entre o pai e a porta.

— Os representantes estão esperando para fazer a videoconferência!

— Nós podemos fazer isso amanhã.

— Pai, você não percebe que nós estamos quase perdendo as esperanças de ultrapassar a tia Finola?

— Nós vamos compensar com as vendas pelo site. Esta sempre foi a nossa estratégia.

— Você não vê que essa história com a mamãe não vai dar em nada?

— Sua fé no meu taco é inspiradora.

— Eu só estou expondo os fatos realisticamente.

— Sua mãe é uma mulher inteligente. Ela vai aca­bar ouvindo a voz da razão.

Cullen colocou a mão na maçaneta.

— E o que o faz pensar que sua idéia é razoável? Daniel encarou o filho.

— Papai...

—Cuidado! — disse Daniel com o dedo em riste. Não posso mais lhe dar umas boas palmadas, mas posso demiti-lo.

—Aí mesmo é que a tia Finola acaba com você.

—Você não passa de um fedelho.

—Seu testamento está em ordem? — debochou.

—Sim e vou tirar o seu nome dele agora mesmo.

Cullen ainda o saudou, num tom gozador, observou-o desaparecer pelo corredor.

O escritório de Amanda contrastava com os da Editora Elliot. Era pequeno, escuro, e sua porta permanecia aberta para quem quisesse entrar.

A jovem recepcionista, cheia de piercings e com cabelos roxos, não parecia capaz de deter sequer uma Vovozinha, muito menos um criminoso com más intenções. Ela parou de mascar o chiclete por um momento para olhá-lo inquisidoramente.

- Eu gostaria de falar com Amanda Elliot.

A garota indicou a porta de vidro fechada.

—Ela está com Timmy Trincheira.

—Obrigado — disse Daniel.

A moça estourou uma bola de chiclete.

Depois de checar se a cadeira de vinil estava em condições de uso, Daniel se sentou e suspirou. A mulher sequer havia perguntado o seu nome ou o que ele queria com Amanda.

Era de se esperar que um lugar que atendia a uma clientela tão perigosa, contasse com um aparato mínimo de segurança. A primeira coisa que Daniel faria seria instalar um detector de metais na entrada e colo­car alguns seguranças na calçada.

Quinze minutos e várias revistas depois, Daniel viu um homem baixo, vestindo um sobretudo, sair do escritório de Amanda.

— Pode fazer uma ligação para a Corte? — pediu Amanda, pela porta aberta. — Preciso saber a nova data do julgamento de Timmy.

— Claro — respondeu a recepcionista, teclando o número com as longas unhas negras.

Ela olhou para Daniel e fez um gesto em direção à porta aberta.

— Pode entrar.

Daniel colocou a revista no lugar, ergueu-se ime­diatamente e rumou para o escritório de Amanda.

— Daniel?

— Sim — disse ele, fechando a porta. — E você tem sorte de ser apenas eu.

— Ah, é? — ironizou Amanda.

Ele se sentou em uma das cadeiras de plástico, do outro lado da mesa.

— A recepcionista deixa qualquer um entrar.

A advogada ajeitou o cabelo.

— Talvez devêssemos distribuir carteirinhas para os nossos associados. O que acha?

— Você está sendo sarcástica.

— É mesmo? E por que eu faria tal coisa? Daniel abriu o paletó.

— É um mecanismo de defesa. Você sempre faz isso quando eu estou certo e você, errada.

—E quando foi que isso aconteceu?

—Eu Tenho uma lista de datas.

—Aposto que sim.

O editor desistiu da discussão, admirando o brilho nos olhos de Amanda. Ninguém era capaz de duelar com ele como a ex-mulher.

Ela continuava rápida e brilhante.

—Jante comigo — disse ele, em um impulso. Ao ver a expressão dela, porém, percebeu o erro tático. Aquilo fora frontal demais. Parecia até um convite para um encontro amoroso.

—Daniel...

Com Cullen e Misty — acrescentou Daniel. Como chefe, ele podia muito bem obrigar o filho a acompanhá-lo! Caso isso não funcionasse, recorreria diretamente a Misty. Pelo que ele havia ouvido dos outros membros da família, as duas tinham se dado muito bem.

Os olhos de Amanda brilharam mais ainda.

— Você tem visto Misty?

—Não, mas vi Cullen hoje cedo.

—Está tudo bem com o bebê?

—Tudo em ordem. -Daniel não tinha efetivamente perguntado nada, porém Cullen certamente teria lhe dito se houvesse alguma coisa errada.

—O que posso fazer por você, Daniel?

—Jantar conosco.

—Eu quero dizer, no momento.

— Agora?

— Sim, agora. Você deve estar precisando de al­guma coisa para ter vindo até aqui.

Daniel hesitou. Não tinha planejado atacar tão di­retamente, mas...

— Falei com Taylor Hopkins hoje de manhã.

— Deixe-me adivinhar. Ele quer um conselho meu sobre uma questão muito delicada.

— Ele é um advogado, Amanda.

— Eu sei disso. Era uma piada, sabia?

O ex-marido levantou em seguida. Ela pegou uma pilha de processos.

— Relaxa, Daniel. Você não se incomoda se eu or­ganizar os meus papéis enquanto você fala, não é?

— Claro que não. Mas por que a Srta. Gótica não...

— Julie — corrigiu Amanda.

— Ótimo, Julie. Por que ela não organiza essas coisas para você?

— Ela organiza.

Daniel olhou ao redor. Amanda seguiu o seu olhar.

— Ela está aprendendo.

— Quer dizer que já foi pior?

A advogada pôs o material na mesa.

— Você veio aqui para insultar a minha equipe?

— Há quanto tempo ela trabalha aqui?

— Uns dois...

— Meses?

— Anos!

— Oh!

— Não me venha com esse "oh" ! Só porque os auxiliares da Editora Elliot têm Ph.D...

—Mas, não a estava comparando com o pessoal da editora.

Ela levantou a sobrancelha.A comparação era com o Regina & Hopkins.

—E quem foi que ganhou o jogo?

—Amanda...

—Como foi que eu me saí, comparada a uma firma calculista, obcecada por lucros e desumana

— Regina& Hopkins?

—Nossa! De onde tinha vindo tudo aquilo? Amanda pegou outra pilha de arquivos. —Foi o que eu pensei.

—Por que é que você sempre se refere a eficiência como se fossem coisas ruins?

—Porque essa tal eficiência costuma ser uma desculpa para tratar as pessoas como meras fontes de lucro.

—Mas é isso o que as pessoas efetivamente são. Elas contratam bons profissionais, paga-lhes um bom salário e eles fazem a sua empresa ganhar dinheiro.

—E quem é que decide quem são as boas pessoas?

—Amanda...

—Quem, Daniel?

—O Departamento de Recursos Humanos, ora!

A advogada elevou o tom de voz.

—Julie é uma boa pessoa, viu?

—Acredito em você.

Daniel sabia que era hora de recuar. A discussão estava por demais acalorada.

—Ela pode não ser a melhor secretária do mundo, Mas é uma pessoa muito boa.

— Eu já disse que acredito em você — respondeu ele em tom conciliador.

Amanda respirou fundo e se jogou na cadeira.

— Ela merece uma chance.

— Como foi que você a encontrou?

Ele tinha certeza de que não havia sido por inter­médio de nenhuma agência de empregos respeitável.

— Ela é uma antiga cliente.

— A mulher é uma criminosa?

— Julie foi acusada de um crime. Meu Deus, Da­niel, uma pessoa não é necessariamente culpada só porque foi presa.

— E do que é que ela foi acusada?

Amanda apertou os lábios por um momento.

— Fraude.

— Fraude?!

— Você ouviu muito bem.

O editor se levantou e deu alguns passos, tentando manter a compostura.

— Você contratou uma fraudadora para gerenciar o seu escritório de advocacia?

— Eu disse que Julie foi acusada de fraude.

— Ela era inocente?

— Havia atenuantes.

— Amanda...

O olhar dela endureceu.

— Isso definitivamente não é da sua conta.

Daniel cerrou os dentes. A conversa estava se transformando novamente em uma discussão.

— Você sempre foi parcial, Amanda.

Ela se curvou, para encará-lo.

—Se você está querendo dizer que eu enxergo nas pessoas mais do que uma simples oportunidade de tirar proveitos, tem razão.

—Ele se segurou, tentando não retrucar.

Amanda entrelaçou os dedos e esticou os braços, como se estivesse se preparando para uma luta.

—Ousa criticar o meu modo de lidar com meus funcionários? Vamos ver como você trata os seus.

—Eu só trabalho com os melhores do mercado.

— É mesmo? Conte-me algo sobre eles. Nancy, a minha secretária, é formada em administração, e é expert em informática.

Amanda batia com a caneta ritmadamente na mesa.

—Ela tem filhos?

—Não sei.

—Ela é casada?

Daniel parou para pensar.

—Acho que não. Nancy nunca teve problemas em trabalhar até tar­de. Isso certamente a teria incomodado mais se ela tivesse marido e filhos.

—Uma charada para você, Daniel. Dê-me o nome do esposo ou da esposa de um de seus funcionários.

—Misty.

—Você está roubando.

—Ele sorriu.

—Sabe qual é o seu problema?

— Sou mais esperto do que você.

Amanda jogou a caneta nele, mas ele desviou.

— Você não tem alma — disse a advogada.

Por alguma razão, as palavras dela o feriram mais do que deviam.

—-Acho que isso é um problema.

A mulher se retraiu ao ver a expressão dele, mas se recuperou rapidamente.

— O que eu quero dizer é que você está tão focado na produtividade e no lucro, que esquece que o mun­do é feito de gente. Seus empregados têm vida pró­pria. Eles não são apenas figurantes na sua vida.

— Eu sei muito bem disso.

— É mesmo? — disse ela, cética. — Vamos com­parar, então. Pergunte-me qualquer coisa sobre Julie.

— Julie?

— Sim... A recepcionista gótica...

— Ah, Julie.

Amanda ficou esperando, enquanto Daniel tentava pensar em uma pergunta relevante.

— Ela tem antecedentes criminais? A advogada se recostou na cadeira.

— Não. Julie tem um apartamento no East Village, e um namoro que não ata nem desata, com um cara chamado Scott. Está fazendo um curso noturno de in­formática. A mãe luta contra uma artrite séria e ela tem dois sobrinhos, filhos de sua irmã Robin, que ela leva ao zoológico todos os sábados.

— Mas ela continua não sabendo arquivar.

— Daniel!

— Eu não entendo você, Amanda. Ela é sua em­pregada, não a sua melhor amiga.

Amanda balançou a cabeça e abriu uma gaveta.

—Eu devia saber que você não ia ser capaz de entender o meu ponto de vista — resmungou ela.

— Você contratou Sharon.

—Uau! — Daniel tencionou os ombros. Sua outra ex mulher não tinha nada a ver com isso. — Agora você desviou do assunto.

—Por quê?

—Eu não contratei Sharon.

—Seja honesto, Daniel. Você se casou com Sharon porque adorava o seu senso de humor, as suas opiniões sobre literatura e a sua visão dos acontecimentos mundiais? Ou será que foi porque ela sabia conversar com seus clientes em três línguas, entendia de gastronomia e ainda por cima ficava linda em um Dior?

— Eu me divorciei dela.

— O que aconteceu? Os canapés ficaram ruins?

Daniel ficou de pé.

—Eu não devia ter vindo aqui. Não queria aborrecer Amanda.

—Por você veio, afinal?

—Com certeza não foi para falar de Sharon.

—É claro que não, desculpe. Você sente falta dela?

—Eu me divorciei dela.

—Mesmo assim...

—Não sinto falta dela. Nem por um segundo. Ele franziu atesta.

Amanda se levantou e deu a volta na mesa.

— Então foi mesmo a conversinha mole, o papinho e as roupas de grife.

— Está querendo ver quem faz mais pontos?

— De jeito nenhum.

Daniel suspirou. O que, afinal, o havia atraído em Sharon? Seu pai tinha apoiado o casamento, porém isso não podia ser a resposta para tudo.

Ele estava se recuperando da perda de Amanda. Talvez estivesse apenas em busca de um relacionamento mais seguro.

— Daniel? Amanda interrompeu-lhe os pensamentos.

Ele pôde sentir o seu perfume.                                

— Sim?                                                              

— Eu perguntei quando.

— Quando o quê?

A mulher sorriu suavemente.

— O jantar com Cullen e Misty.

Ela ainda era tão linda... Seus lábios eram carnudos, os cabelos, brilhantes, os olhos, infinitos...

— Oh... sexta, no Premier, às oito.

— Ótimo.

— Bom.

O editor sentiu uma repentina urgência de tocar os cabelos dela. Sempre adorou passar os dedos neles.

— Daniel?

Ele pôs as mãos no bolso para se conter.

— Sim?

— Desculpe por ter falado na Sharon.

— Você acha mesmo que eu a contratei para ser a minha esposa?

Ele estava realmente curioso.

— Acho que confundiu um pouco as coisas.

— Como assim?

— Você é um homem ambicioso, Daniel.

—É mesmo? Bem, no momento, tudo o que eu ambiciono é me entender com você.

Ela inclinou o rosto e sorriu suavemente.

—Então você deveria parar de me perseguir. Você deve ter razão a esse respeito. O problema é que eu a acho irresistível.

Amanda arregalou os olhos.

Daniel parou de lutar contra o desejo e simples­mente estendeu a mão. Seus dedos liberaram o perfu­me dos cabelos de Amanda, tão familiar, conduzin­do o novamente a quinze anos atrás.

—Eu estou tentando ajudá-la, Amanda.

— Não preciso de ajuda.

— Precisa sim. — Ele a beijou suavemente na teta. — E para a sua sorte, eu estou disponível.

A advogada agarrou na mesa, assim que a porta do escritório se fechou, para se apoiar.

—O que ele quis dizer com "estou disponível"?

E por que ele a beijou?

Bem, ele não a havia beijado exatamente, mas...

—Amanda?

A porta do escritório se abriu e Julie enfiou a cabeça na fresta. Ela sorriu maliciosamente. Quem era o " super-hiper-ultra" ?

Amanda olhou para ela, sem expressão.

— O cara que acabou de sair...

— Daniel?

— Isso! — respondeu Julie, fingindo desmaiar. — "Daniel Delícia".

— Ele é o meu ex-marido.

— Caraca! Você dispensou aquele gato?

— Dispensei.

— Onde é que você estava com a cabeça?

— Ele era pretensioso, ansioso e controlador.

— E daí?

Boa pergunta. Aliás, péssima pergunta. Amanda havia tido bons motivos para deixar Daniel, entre eles, a sua obsessão pelo sucesso e a recusa em se tor­nar minimamente independente do pai.

— Daí que isso me irritava — disse Amanda. Julie balançou a cabeça e suspirou.

— Deus dá nozes a quem não tem dentes! O que é que ele queria?

— Tomar conta da minha vida.

— E você vai deixar?

— De jeito nenhum.

— Vai vê-lo de novo?

— Não.

Bem, não depois de sexta-feira. Mas isso não con­tava, já que Cullen e Misty iam estar presentes. Julie deu de ombros.

— Bem, seu cliente das duas está aí. Amanda olhou no relógio.

— Nossa! Já são quase duas e meia.

— Eu não quis interromper.

Ela empurrou Julie em direção à porta.

— Ele é um cliente, e me paga. Pode interromper à vontade quando for assim.

A recepcionista olhou para Amanda.

— Achei que você ia transar com ele na mesa.

— Está bem, está bem — disse Amanda, ignoran­do a aceleração de seu pulso.

A garota riu baixinho.

— Pelo menos é isso o que eu teria feito.

 

Amanda vasculhou o armário em busca de algo para s vestir para o jantar com Daniel. Não queria usar nada j ousado demais.

Acabou escolhendo um Valentino de seda em tons de laranja, amarelo e vermelho. Ele deixava muito a desejar no quesito conforto. Era um modelo sem alças, o que a obrigaria a usar um daqueles torturantes corpetes para manter os seios na posição certa, mas lhe caía muito bem.

Ela olhou no relógio. Opa!

Amanda jogou o vestido na cama e foi tomar uma ducha. A luz da secretária eletrônica estava piscando, porém decidiu ignorá-la. Havia ficado até tarde no escritório lendo, e estava com pouco tempo para la­var o cabelo e se enfiar no maldito corpete.

A advogada entrou no banho, esfregando a cabeça furiosamente. Fechou então a água, se enxugou e foi para o corredor.

Lá, ajoelhou-lhe no tapete macio, em frente ao ar­mário, e remexeu no emaranhado de sapatos até en­contrar suas sandálias douradas. Voltou, correndo para o quarto e vestiu o corpete. Ainda bem que tinha raspado as pernas pela manhã.

Agradeceu aos céus pelo zíper ter fechado facil­mente. Passou uma escova no cabelo, ainda no ba­nheiro, e enfiou as sandálias rapidamente.

A bolsa! Amanda correu de volta para o quarto e pegou uma bolsa de noite. Avistou um par de brincos de rubi na cômoda e completou o visual.

Pronto.

O cabelo secaria no táxi.

Ela pegou as chaves e encaminhou-se para a porta da frente.

— Sra. Elliot?

Um chofer uniformizado estava esperando por ela na escada de baixo, ao lado de uma limusine.

— Sim?

O homem abriu a porta de trás com mesuras.

— Com os cumprimentos do Sr. Elliot. Amanda olhou para o carro.

— Ele me disse para lhe pedir desculpas, caso a se­nhora não tivesse ouvido a mensagem da secretária eletrônica a tempo.

O primeiro instinto de Amanda foi mandar a limusine de volta. Depois, porém, acabou achando que uno valia a pena dispensar o conforto.

Ela sorriu para o motorista e atravessou a calçada.

— Obrigada.

—Não há de quê.

A advogada olhou o interior do carro. Havia um bar, uma tevê, três telefones e um controle de vídeo-game

—Você não teria um secador de cabelos, teria?

— Infelizmente, não, senhora. Mas se a senhora precisar de mais alguns minutos...

— Não, obrigada. Eu já estou atrasada.

— Essa é uma prerrogativa das mulheres. Amanda balançou a cabeça e entrou na limusine.

— Eles vão ter de me agüentar assim mesmo.

— A senhora está linda — respondeu o motorista, diplomaticamente.

— Obrigada. E muito obrigada também por vir me pegar.

— O prazer é todo meu — disse o homem, fechan­do a porta.

Ela se recostou e ficou observando as luzes da ci­dade através das janelas.

— O sr. Elliot pediu que eu me desculpasse tam­bém pelo problema com o restaurante.

— Problema?

— Ele não conseguiu fazer as reservas no Premier.

Amanda teve de conter o riso. Um Elliot rejeitado por um maitre? Daniel devia ter ficado furioso.

— Para onde estamos indo, então?

— Para o apartamento do sr. Elliot.

— O apartamento?

O motorista fez um meneio de cabeça, olhando-a pelo espelho.

— Isso mesmo, senhora.

Amanda levou a mão ao estômago. Uau! Ela respi­rou fundo. Ok. Podia lidar com isso.

Misty e Cullen também estariam lá. Além do mais, haveria pelo menos outros doze empregados na casa. Aquilo, afinal, não era um encontro.

Embora ele a tivesse beijado. Na testa... Amanda pôs as mãos na cabeça.

— Senhora?

— Está tudo bem.

Ela estava indo para o apartamento de Daniel. Jantaria com ele, conversaria com o filho e a nora e tal­vez até pudesse sentir o bebê chutar, para então ir embora, antes que as coisas se complicassem.

Simples!

As coisas se complicaram bem antes do que ela es­perava.

— Misty não estava se sentindo muito bem — dis­se Daniel, enquanto fechava a porta.

— Quer dizer que eles não vêm? — perguntou Amanda, já olhando para a saída.

— Ela estava com muita dor nas costas.

Uma noite inteira sozinha com Daniel era mais do que ela podia suportar no momento.

— Por que você não me ligou?

— Eu liguei. Deixei um recado na secretária.

— Então por que mandou o carro?

— A mensagem era para avisar que nós havíamos mudado o local do jantar, não para cancelá-lo.

— Mas...

Daniel fez um gesto, convidando-a a entrar.

— Por favor.

Amanda hesitou.

— Amanda?

Ela respirou fundo e desceu a pequena escada. O lugar era magnífico. Um apartamento de dois anda­res, repleto de esculturas e pinturas abstratas. O con­junto de sofás e poltronas em tons de marrom e azul-marinho criava um ambiente muito propício para uma reunião. As janelas grandes ofereciam uma bela vista do parque.

— Eu estive com Taylor Hopkins hoje cedo — disse Daniel, atravessando o enorme recinto.

Aquele lugar era imaculado demais, até mesmo para Daniel. Não havia uma única revista nas mesas, nada de papéis jogados, nada de poeira, nem mesmo um fiapo no tapete. Amanda não sabia se aquilo ainda era influência de Sharon, ou se Daniel havia desen­volvido alguma mania de perfeição.

— Ele estava livre hoje, por isso, tomei a liberdade de convidá-lo para jantar conosco-disse Daniel, pegando duas taças.

O olhar de Amanda reencontrou o dele.

— Quem foi que você convidou para o jantar?

— Taylor.

— Porquê?

— Porque ele estava livre.

Taylor estava livre? O mesmo Taylor que Daniel havia mencionado na terça-feira? Taylor o supra-sumo da advocacia?

— O que é que você está planejando?

— Abrir o vinho. Quer?

— Está querendo me convencer de que você en­controu por acaso o Taylor depois que Misty ligou?

Amanda não acreditava que algo na vida de Daniel pudesse ser aleatório.

— Depois que Cullen ligou, na verdade — corri­giu ele.

— O que está acontecendo, Daniel?

Ele deu de ombros, servindo o vinho.

— Nada.

— Por que você convidou o Taylor?

— Porque Stuart já tinha tirado o salmão do con­gelador e porque eu e você íamos ficar sozinhos.

Um homem de paletó branco entrou na sala.

— Posso ajudar com as bebidas, senhor?

— Obrigado — agradeceu Daniel, deixando a garrafa aos cuidados do rapaz paramentado.

— Poderíamos ter remarcado — disse Amanda.

— E quem ia comer o salmão?

Ela estreitou os olhos. Havia algo de suspeito ali, embora não soubesse dizer exatamente o quê.

— Quer dar uma olhada no apartamento antes do jantar? — perguntou o editor, em tom casual.

Talvez estivesse sendo paranóica. Talvez Daniel não estivesse querendo interferir na sua vida.

— Tudo bem — concordou Amanda.

O mordomo serviu uma taça de vinho a cada um.

— Jantar daqui a uma hora? — perguntou Stuart.

— Parece ótimo — respondeu Daniel.

Daniel pôs a mão nas costas de Amanda para con­duzi-la.

— Vamos começar pelo andar de cima. Amanda tentou relaxar e apreciar a decoração. O ambiente cheirava a cera e desinfetante.

— Sua casa é muito... arrumada — disse ela.

— Isso foi um elogio? — ironizou.

— Não sei — mentiu ela.

— Você preferiria que fosse uma bagunça?

Ela preferiria que tivesse alma.

— Bem, a minha casa é definitivamente muito mais bagunçada do que a sua.

— Você tem uma empregada?

— Por quê?

— Fiquei imaginando se você tinha contratado uma antiga cliente para isso também.

Amanda resistiu à tentação de lhe dar um chute.

— Eu não tenho empregada.

— Compreendo.

Nenhuma reprovação. Somente um comedido "compreendo".

— Pessoas comuns costumam limpar a própria casa — lembrou Amanda.

Ele abriu uma porta e acendeu a luz.

— Esta é a biblioteca.

Mais um cômodo impecável. Duas poltronas de couro, de frente uma para a outra, com uma mesa antiga no meio. Havia ainda uma escrivaninha no canto, e um aquário que ia do teto ao chão.

Ela olhou os livros.

— Shakespeare — disse Daniel. É claro que era.

— Alguma coisa mais leve?

— A primeira edição de Dickens.

— Algo mais novo?

— A Vida de Pi.

— Eu desisto.

Talvez ele não estivesse representando. Talvez ti­vesse mesmo se transformado.

— Desiste de quê?

— Sr. Elliot? — interrompeu Stuart. — Sua visita

— Obrigado.

Daniel sorriu para Amanda e indicou a porta.

— Taylor! Que bom que você veio!

— Eu não perderia isso por nada — respondeu ele, sói lindo para Amanda enquanto ela e Daniel desciam as escadas.

A manda e Taylor se cumprimentaram.

— Você provavelmente não se lembra de mim. Kiiren e Michael nos apresentaram em uma festa.

— No Ritz — respondeu Amanda ao advogado. - ela se lembrava. O homem havia sido um cava­lheiro e tinha um sorriso caloroso que pouco lembrava o profissional frio e calculista que realmente era.

— Você se lembra? — surpreendeu-se ele, prolon­gando o aperto de mão.

— Merlot? — perguntou Daniel. Taylor soltou lentamente a mão de Amanda, mas manteve o olhar fixo no dela.

— Eu adoraria.

Daniel convidou Taylor para que ele falasse com Amanda, e não para que a olhasse apaixonadamente e risse de tudo o que ela dissesse.

Não esperava que Taylor ficasse lhe dando tapinhas nas costas, muito menos tocando em seu braço ou fazendo perguntas sobre a sua vida pessoal. Sabia, porém, que Amanda era uma mulher atraente e sen­sual...

Tinha de aceitar o fato de que outros homens pu­dessem se sentir atraídos por ela. Ele não podia dei­xar que isso o aborrecesse, mas ficou furioso quando Taylor se levantou e ofereceu carona a Amanda.

Ela olhou para Daniel que se manteve impassível.

— Não, obrigada — respondeu a advogada.

Daniel conduziu Taylor até a saída, tentando se conter. As relações dela com outros homens não lhe diziam respeito. Ele tinha de manter o foco no seu ob­jetivo principal — fazê-la mudar de carreira.

Ele agradeceu sinceramente a presença de Taylor.

Quando voltou à sala, encontrou Amanda enroscada no sofá, tomando uma segunda xícara de café.

— Espero você tenha se divertido — disse Daniel, retomando o lugar à sua frente.

— Que coincidência, você encontrar o Taylor no Boca Royce.

— Foi mesmo.

— Esses detalhes todos sobre o trabalho dele são mesmo muito interessantes — admitiu ela.

— Também achei.

— Não tinha idéia de como o Direito Corporativo podia ser tão fácil e lucrativo.

— Me dá vontade de virar advogado — disse ele.

— Eu também. Espere aí. Eu já sou advogada!

Daniel sorriu. Ela era engraçada quando relaxava.

— E sabe do que mais... — Amanda estalou os de­dos. — Ouvir Taylor falar assim me faz pensar por que eu passei tantos anos defendendo criminosos.

— É mesmo? — tentou não parecer interessado.

— Se eu mudasse de carreira agora e começasse a trabalhar com Direito Corporativo, poderia comprar uma Mercedes em pouquíssimo tempo!

— Poderia — concordou ele.

Ele teria de agradecer a Taylor no dia seguinte. O cara havia acertado na mosca.

— Eu poderia dormir até mais tarde, ganhar in­gressos de meus clientes para os melhores espetácu­los, e ainda comprar roupas na Quinta Avenida.

Daniel pousou as mãos nos braços da poltrona, tentando não demonstrar sua avidez.

— A Snap teria imenso prazer em contratar o seu trabalho e lhe dar uma excelente recomendação.

— Aposto que você poderia conseguir espaço em um escritório para mim também.

— E claro — respondeu Daniel.

Ele estava surpreso e deleitado com o rumo que aquela conversa estava tomando.

— Você poderia alugar uma van para transportar meus arquivos...

— Eu adoraria ajudar nisso.

— Poderia até contratar alguém para dispensar os meus clientes atuais.

Os olhos dela começaram a brilhar e Daniel sentiu um aperto no estômago.

— Eu...

— E me arranjar uma nova recepcionista.

Daniel estava se sentindo um perfeito idiota.

— Você está me gozando, não é?

— É claro que estou! Você achou que essa arma­ção ia funcionar?                                                  

— Eu... Eu só estava querendo...                    

— Eu sei, eu sei... Só estava querendo me ajudar.

— Daniel, você chegou a convidar Cullen e Misty?       ]

— Tinha pensado em convidá-los, mas acabou achan­do melhor chamar apenas Taylor. Amanda colocou as mãos nos quadris.

— Eu sabia. Pode, por favor, me deixar em paz?

— Mas...

— Caia fora!

— Tudo bem.

Discutir com ela agora não o levaria a lugar algum.

— Boa escolha. Até porque a sua própria vida não anda lá essas coisas.

Daniel se empertigou.

— O quê?

— Nada.

— Como nada?

— Está bem, eu disse que a sua vida não anda lá essas coisas.

— Por que está dizendo isso?

— Olhe só ao seu redor — disse ela com um gesto. Daniel olhou e tudo o que viu lhe pareceu perfeita­mente normal.

— O que não lhe parece estar funcionando?

— É tudo impecável. Perfeito. Não há vida aqui.    

— Você ganha muitos casos na Corte com argu­mentos desse tipo?

Ela inclinou a cabeça e cruzou os braços, eviden­ciando os seios. Mais essa! Agora mesmo é que ele não ia conseguir se concentrar.

— Estou começando a achar que você está precisando de ajuda profissional.

O editor ficou sem fala por um momento. Ela esta­va preocupada com ele?

— É a sua vida que está fora de controle — retru­cou Daniel.

— Pelo menos eu sei o que quero.

— Eu sei exatamente o que quero.

— E o que é?

Ele escolheu a resposta mais simples.

— A presidência da Editora Elliot.

— Claro. Podemos voltar a falar de você agora? Não sou eu que estou com problemas.

— Amanda, eu vi o seu escritório. —

E eu vi o seu apartamento.

— O que é que você mudaria aqui?

Amanda estreitou os olhos escuros. Daniel se aproximou, baixando a voz.

— — É sério. Estou disposto a seguir o seu conselho.

Não está não.

— Estou sim. Ele se aproximou ainda mais. Se aceitasse o con­selho dela, ela poderia se sentir inclinada a seguir o seu.

— Seja direta, Amanda. Eu agüento.

Ela ficou em silêncio, mas logo decidiu falar.

— Está bem. Vou ser direta. Você parou de sentir.

— Sentir o quê?

— Tudo.

Isso não era verdade. Especialmente agora. Espe­cialmente naquele exato momento.                          

Ela colocou a mão sobre o ombro dele. Os múscu­los de Daniel se contraíram.

— Sinta — disse ela.

— Eu estou sentindo.

Os olhos dela ficaram cor de chocolate. Amanda se colocou na ponta dos pés, inclinou a cabeça e entreabriu os lábios para beijá-lo.

As lembranças invadiram a mente deles. Paixão, desejo. Tudo foi catapultado para décadas atrás. Seus braços estavam em torno dela, puxando-a para perto. Ele a beijou com intensidade, sentindo aquele perfu­me tão familiar.

O corpo dela estava gravado em seu cérebro. Suas mãos deslizavam por Amanda, revivendo tudo. Como ele tinha sentido falta dela!                          

Ele sentiu cada partícula de seu corpo voltar à vida. As cores e as emoções giravam dentro dele como em um caleidoscópio.

Amanda enlaçou o pescoço dele. Seus seios arfantes roçaram-lhe a pele, fazendo-o perder o controle.Daniel teve vontade de arrancar a roupa dela e deitá-la ali mesmo, sobre o tapete macio.

O gemido dela vibrou contra a sua boca. Ele sussurrou que a queria, muito, muito, muito...

Aquilo fez com que ela se retraísse. O rosto de Amanda estava vermelho e seu cabelo, completa­mente despenteado.

Nunca houve mulher mais desejável do que ela. Nunca. Mas ela não era mais dele havia muito tempo.

— Desculpe — disse ele. — Eu não tinha o direito...

Daniel não sabia o que dizer. Nunca se deixava le­var daquela maneira. Orgulhava-se de seu autocontrole.

— Não precisa se desculpar. Já avançamos bastan­te hoje. Você até conseguiu sentir alguma coisa!

— Quer dizer que isso foi uma espécie de terapia?

— É claro.

Era isso o que aquele beijo tinha significado para ela? Ele tinha embarcado em todas aquelas lembranças sozinho?

Daniel queria que ela mudasse de carreira, mas sabia que havia um limite para conseguir isso, e estava com a sensação de que havia acabado de alcançá-lo.

 

Amanda apoiou a cabeça no assento da limusine. Beijar Daniel foi mesmo terapêutico para ela.

Ela só conseguir manter o controle devido aos anos de prática com juízes severos.

Os beijos de Daniel sempre foram maravilhosos. Amanda suspirou quando o carro acelerou, deixando-se levar pelas lembranças. A mente voltou ao primei­ro beijo que eles trocaram na festa de formatura.

Amanda era então uma aluna aplicada, com uma vida social pouco movimentada. Era mais provável encontrá-la em uma exposição de fotografias ou em um diretório, participando de alguma atividade polí­tica, do que em uma festa. Por isso mesmo, ela não pensou duas vezes quando sua amiga Bethany lhe ofereceu um convite para a festa de formatura de Ro­ger Dawson, na suíte presidencial do Riverside.

O evento foi um tumulto só. A música estava alta, o ponche, amargo, e os salgadinhos estavam sendo utilizados como mísseis. Amanda se perdeu de Be­thany. E ver o rosto familiar de Daniel, sozinho perto da porta, deu-lhe um grande alento.

Os dois já haviam se encontrado em várias oca­siões durante o ano, quando ela ainda namorava um de seus amigos. Daniel era um cara legal e conhecia todo mundo. Com sorte, ele a apresentaria às pessoas e ela não ficaria mais plantada no meio da festa.

— Ei, Daniel — gritou ela, acenando.

— Amanda! — respondeu o rapaz, sorrindo calo­rosamente. — Eu não sabia que você vinha à festa.

— Vim com a Bethany, mas me perdi dela...

— Elliot? — chamou alguém.

— Sim? — atendeu Daniel.

— Você alugou um quarto aqui no hotel, não foi? Ele assentiu.

— Nós estamos precisando de um balde de gelo e mais alguns copos — disse o rapaz.

— Pode deixar que eu pego — respondeu Daniel. A moça ficou desolada. Justo agora que ela havia encontrado alguém para conversar!

— Você me ajuda, Amanda?

— Claro — concordou ela, rapidamente. Daniel foi abrindo espaço a cotoveladas até a

porta.

— Meu quarto fica bem no final do corredor.

— Você não queria dirigir até a sua casa na volta? perguntou ela, só para puxar assunto.

Ele riu, um pouco sem jeito.

— Foi Michael, meu irmão mais velho, quem alugou esse quarto para mim. Ele achou que eu poderia me dar bem na festa.

Amanda engoliu em seco e tentou parecer natural: Ah, sim... Você está com a Shelby, não é?

— Foi o que eu pensei também, mas da última vez que a vi, ela estava dançando com o Roger. Parece que é ele quem vai se dar bem esta noite.

Ela não estava muito acostumada a conversar so­bre sexo, muito menos com bonitões que provavel­mente já haviam dormido com metade da torcida da escola. Amanda sentiu o rosto esquentar.

Ao ver que ela não respondia, Daniel baixou o olhar.

— Desculpe. Eu não queria ser grosseiro.

A moça balançou a cabeça, embaraçada.

— Você não foi grosseiro.

— Fui sim. — Ele se deteve. — É aqui.

Amanda nunca dormira em um hotel cinco estrelas antes. Ficou admirada com os enormes sofás vinho, o bar ao fundo e a suíte com banheira Jacuzzi e tudo o mais.

— Fique à vontade — disse Daniel, jogando a cha­ve sobre a mesa. — Eu só vou levar alguns minutos.

— Uau! — deslumbrou-se Amanda. — Michael deve ter achado que você ia se dar mesmo muito bem.

— Michael é o otimista da família! — brincou. Sobre a mesa de centro, havia um arranjo de flores, uma caixa de bombons e uma pilha de revistas. O que mais chamou a atenção de Amanda, porém, foi um aparelho, repleto de botões coloridos.

— Isso é um controle remoto? — perguntou ela. Já tinha ouvido falar neles, mas nunca havia visto um de perto.

— Não sei — respondeu Daniel, enquanto pegava os copos. — Experimente para ver.

Ela apertou o botão e a tevê começou a funcionar.

— É isso aí!

Daniel riu com a excitação dela. Amanda brincava com os botões e trocava várias vezes de canal. - Acho que isso vai se tornar muito popular.

— Não consigo achar o balde de gelo — disse Da-md.

— Quer que eu dê uma olhada no banheiro?

— Eu faço isso. Você poderia me fazer um grande lavor comendo alguns desses chocolates. Michael deve ter gastado uma fortuna com eles.

Amanda sorriu satisfeita. Aboletou-se no sofá e retirou o papel dourado de uma das trufas.

Aquilo, com certeza, estava bem mais agradável do que aquela festa horrorosa.

— Não achei o balde de gelo — disse Daniel. —Ei! Isso é o American Graffiti?

Amanda olhou para a tela.

— Acho que sim.

— Que legal! Que tal os chocolates?

— Maravilhosos! — respondeu a moça.

Na trama da tevê, formandos de colégio comemoravam sua última noite juntos. Daniel desembrulhou um chocolate e fez um gesto em direção à tevê.

— Mais ou menos como nós — comparou ele.

Amanda assentiu. Tal como as personagens do fil­me, eles estavam prestes a ingressar em um mundo totalmente novo. Aquela perspectiva a excitava, mas também parecia assustadora. Seus pais pouparam di­nheiro para o seu primeiro ano de faculdade, mas ela sentiu que as coisas seriam muito difíceis depois disso.

— São deliciosos — constatou Daniel, pegando a caixa e colocando-a no sofá entre ele e Amanda. — Seria uma pena deixar que eles se estragassem.

Ela deixou o chocolate derreter na língua enquanto , assistia ao filme com o rapaz, em silêncio.                 ]

— E então, o que é que você vai fazer? — pergun­tou Daniel, pegando outro chocolate.

— Depois da festa?

— De formada. Você teve ótimas notas, não foi?

Amanda assentiu.

— Eu fui aceita para a New York University.

— Que ótimo! E o que você vai estudar?

— Literatura Inglesa e Direito. E você?

— Eu vou trabalhar no negócio da família — respondeu Daniel, sem muita animação.

— Mas é trabalho garantido — argumentou ela. Ele ficou calado por alguns minutos.

— Só que eu realmente queria...

— Diga.

Daniel se revirou no sofá e olhou para ela.

— Você tem de me prometer que não vai rir.

— Prometo.

— Está bem. Eu gostaria de convencer meu pai a lançar uma nova revista.                                            

Amanda ficou impressionada. Aquilo parecia bem mais interessante do que a faculdade de Direito.

— Sério? Que tipo de revista?                          

— Aventuras em terras estrangeiras, ação. Eu poderia viajar pelo mundo todo, escrever artigos e enviá-los para Nova York.                                              

Repentinamente, Amanda se sentiu chata e co­mum. Ela não estava sequer cogitando deixar o esta­do, e lá estava Daniel se preparando para uma aventura pelo mundo.

— Você achou a idéia idiota — disse ele, decep­cionado.

— Não — assegurou-lhe a moça. — Eu achei a idéia fantástica, só fiquei com inveja.

— Inveja???

— Parece incrível.

Daniel pegou outro chocolate e sorriu para ela en­quanto o desembrulhava e colocava na boca.

— É mesmo, não é?

Voltaram a atenção novamente para o filme. Pouco depois, ele foi até o bar.

— Estes chocolates estão me deixando com sede. Você já tomou champanhe alguma vez?

Amanda arregalou os olhos.

— Onde é que nós vamos conseguir champanhe?

Ele ergueu uma garrafa verde.

— Mas você não vai se meter em encrenca? Daniel deu de ombros, enquanto tirava o arame em torno da rolha.

— O quarto está no nome de Michael.

— Portanto, eles vão pensar que...

— Eu não me importo com o que eles vão pensar disse ele, estourando o champanhe.

Ele sorriu e lhe passou duas taças. Depois verteu uma delas, virou um pacote de salgadinhos em uma tigela e se sentou junto a Amanda, no sofá. A personagem de Roger Howard estava brigando com a namorada.

Os dois brindaram ao som da música do filme.

— Feliz formatura — sussurrou ele. A garota olhou nos seus olhos azuis profundos, já

completamente à vontade.

— Acho que você não vai mais se dar bem hoje. Os olhos dele brilharam e um sorriso se fez.

— Já não tenho mais chance alguma. Você acabou com os bombons que eu ia usar para seduzir a meni­na.

Ela deu um tapa no ombro dele.

— Eu não comi tudo sozinha, sabia?

— Essa era a minha arma secreta — brincou. Em vez de responder, ela tomou champanhe.

— Nossa, como isto é bom! — Ergueu então a taça; contra a luz e ficou admirando as bolhas. — Acho que esta é que deveria ser a sua arma secreta.

— De que adianta? Você está acabando com ela também — reclamou ele.

Amanda sorriu e tomou mais um gole.

— A vida é dura às vezes, não é?

Ele riu e bebeu o champanhe, olhando para a tela.

— O que foi que eu perdi?

— Terry está tentando se dar bem.

— Richard Dreyfuss já encontrou a loura?

— Ainda não.

Amanda suspirou, contente. Tinha detestado a fes­ta. Estava muito mais feliz ali, assistindo confortavelmente a um filme divertido, rindo e conversando com Daniel. A garrafa de champanhe já estava pela metade quando o personagem de Richard Dreyfuss parte num avião.

— Ele nem chegou a encontrá-la!

— Ela vai ficar para sempre como a mulher misteriosa — respondeu Amanda.

Daniel pousou a taça.

— Não se pode deixar as oportunidades escaparem.

— Está querendo dizer que ele não podia ter perdi­do a chance de beijar a loura?

— Mais ou menos isso.

Amanda recolheu o "piquenique" e caminhou descalça até o bar, sentindo a maciez do tapete.

— Acho que devíamos voltar para a festa — disse ela relutantemente.

Ele se levantou em seguida, pegando as taças.

— Você tem razão. Nós acabamos não encontran­do o balde de gelo.

— Acho que, a esta altura, ninguém vai perceber que está faltando gelo.

A moça se virou e ficou cara a cara com ele, ou, melhor, para a peito, já que ele era uns quinze centí­metros mais alto que ela. Daniel estendeu a mão por trás dela para colocar as taças no bar.

— Amanda?

— Sim? Amanda se deu conta, de repente, de que o clima entre os dois havia mudado.

— Eu estava pensando — começou ele, aproximando-se quase imperceptivelmente.


Aquilo deveria tê-la feito se sentir acuada, mas não foi o que aconteceu. Ele se inclinou sobre ela, po­rém não se sentiu intimidada. Apenas respirou fundo, notando o seu perfume masculino.

— Pensando em quê?

— Nessas oportunidades perdidas — continuou o rapaz, ajeitando uma mecha de cabelo dela.

A garota estava entendendo perfeitamente os si­nais que ele lhe estava enviando, mas não conseguia acreditar que Daniel estivesse se insinuando para ela.

— Você quer dizer, no filme? — despistou Amanda.

— Estou falando da formatura. Aquilo a deixou confusa.

— Pode ser que nós nunca mais nos encontremos.

— Pode ser — concordou ela.

Seus caminhos mal haviam se cruzado enquanto estudaram na mesma escola, que dirá com ela na New York University e ele pelo mundo afora, colecionan­do histórias para sua revista.

— Então... — disse ele, respirando fundo.

— Então?

— O que é que nós vamos fazer a respeito? Amanda viu os olhos dele escurecerem, seu sorri­so desaparecer e seus lábios se abrirem.

— Daniel?

— É agora ou nunca, Amanda.

Ele deslizou a palma da mão sobre a bochecha dela, muito lentamente, e acariciou-lhe os cabelos.

— Eu vou beijá-la — avisou ele, com voz rouca.

— Eu sei — sussurrou ela, desejando ardentemen­te aquele beijo.

Foi tudo perfeito. O universo conspirou.

Os lábios dele tocaram os seus, primeiro com fir­meza, e depois com ternura, úmidos, quentes.

Amanda passou os braços em torno do seu pesco­ço, respondendo à pressão que ele estava exercendo sobre ela, abrindo os lábios e inclinando a cabeça para aprofundar ainda mais o beijo. Sentiu-se tomada de um desejo, que nunca havia conhecido antes.

Ela já tinha beijado outros rapazes, mas nada se comparava ao que sentiu ao ser tocada por ele. Nin­guém nunca tomara seu corpo e sua alma daquele jeito.

Abrindo seus lábios convidativamente, ela ansiou para que ele a explorasse com mais força e mais profundamente. A língua dele invadiu sua boca, e ela quase gemeu de prazer.

Com o braço livre, Daniel enlaçou a cintura dela, pousando a mão em suas costas para segurá-la com mais firmeza contra o seu corpo.

Amanda o apertou com mãos trêmulas. O beijo se prolongou. A língua de Daniel explorou sua boca, fazendo com que ela a abrisse ainda mais para rece­bê-lo.

Um som emergiu das profundezas do peito de Da­niel quando ele a apoiou sobre o bar. Sua mão forte passeou por Amanda, até alcançar-lhe as costelas, espremendo-lhe os seios.

Amanda sentiu os mamilos enrijecerem. Ela queria que ele a tocasse, mas não teve coragem de pedir.

Daniel acariciou seu pescoço com a outra mão. Ela ficou tensa, à espera de que os dedos dele finalmente agarrem seus seios por completo, e se contorceu de prazer com a intensidade da sensação quando eles finalmente chegaram ao seu destino.                          

— Amanda... — murmurou o rapaz.

Arfante, ela deslizou a mão pelo peito dele, por baixo do paletó, abrindo caminho até chegar ao calor das suas costas, pressionando os seios com mais for­ça contra as mãos dele.

Seu corpo todo latejava de desejo, fazendo-a per­der qualquer noção de tempo, espaço ou razão.

— Daniel... — respondeu Amanda.

— Isso é...

Ele a beijou novamente, acariciando-a por sobre o tecido sedoso de seu vestido de frente única. Daniel brincou com o polegar em torno de seu mamilo intumescido, provocando intensas sensações. Ela sequer sabia que poderia existir algo tão intenso.

A reserva e a timidez desapareceram completa­mente. Ela o desejava com todas as forças do seu ser. Desejava-o como nunca desejou alguém antes.

Daniel passou a explorar-lhe o pescoço, beijando-a violentamente, ferozmente, queimando a pele ma­cia com seu furor delicioso.

Amanda jogou a cabeça para trás, oferecendo-se a ele. Gemendo, ela se agarrou às suas costas.

Ele beijou seu ombro. Seus lábios moveram-se en­tão para o meio dos seios, e ela arfou. Suas mãos che­garam até o laço que lhe prendia o vestido.

— Diga-me para parar — pediu ele, enquanto de­satava o nó e passava a língua pela sua pele.

— Não pare — disse ela, quase sem fôlego e louca de desejo. — Não pare.

A intensa pulsação entre suas coxas estava atin­gindo o ponto máximo, deixando-a desesperada, lou­ra por dar vazão ao desejo que a consumia.

— Amanda — disse ele, em um gemido.

O laço se soltou e o tecido deslizou até a sua cintura. Daniel ficou vidrado em seus seios.

Ela arqueou o corpo, fechando os olhos e passando audaciosamente os dedos pelos cabelos enquanto ba­lançava a cabeça para soltá-los.

— Você é linda... — murmurou Daniel. Amanda estava se achando bonita e desejável, pela primeira vez na vida. Ela baixou o paletó dele, ansio­sa por sentir a pele dele tocando a sua.

O paletó caiu no chão e ela tratou da gravata.

Daniel respirou fundo enquanto ela a soltava.

— Amanda — repetiu ele, quase em desespero. Ela o beijou na boca novamente, abrindo-lhe os botões da camisa.

— Nós podemos parar. Isso vai acabar comigo, mas nós ainda podemos...

Pele, enfim! Os lábios dela tocaram o peito desnu­do de Daniel, fazendo todo o seu corpo estremecer.

— Nós não vamos parar — respondeu a moça, respirando intensamente junto à sua pele quente.

— Graças a Deus! Ele brincou com seu mamilo, fazendo as pernas dela fraquejarem. Depois a ergueu nos braços, beijando sua boca e carregando-a para o quarto. Amanda roçou os dedos em seu peito e deslizou as mãos sobre os mamilos dele, tentando fazê-lo sentir a mesma coi­sa que ela.

Na cama, as mãos dele acariciaram-lhe as costas desnudas, agarrando suas nádegas e puxando-a para si.

Ela tremeu ao pensar no por vir, porém não hesi­tou. Não havia força no universo que pudesse impe­di-la de seguir adiante.

— Amanda? — estranhou ele, recuando e olhando para ela em meio à escuridão do quarto.

A garota tirou a camisa dele, sem olhar para Da­niel.

— Você está nervosa?

— Não — mentiu ela. O rapaz se deteve.

— Você já...

Não fazia sentido mentir. Ele ia acabar descobrin­do mesmo. Amanda balançou a cabeça lentamente.

— Desculpe.

Ele afrouxou o abraço e disse suavemente:

— Desculpá-la? Você acabou de... — Ele beijou sua boca com ternura, e depois as bochechas. — Se você estiver mesmo certa disso...

— Eu estou — respondeu a moça, arfando.

Um sorriso se formou no rosto de Daniel. Ele tra­çou um rastro com os dedos pela barriga de Amanda, passando pelo umbigo, para depois brincar com os cachos sedosos que recobriam a parte mais secreta.

— Gosta disso? — perguntou ele, com os olhos in­cendiando os dela.

— Gosto.

Seu toque tomou-se ainda mais firme e profundo. Amanda agarrou os ombros dele.

— O que devo fazer?

— Nada — sussurrou ele.

— Mas...

— Você é perfeita, Mandy. Não há como você fa­zer nada de errado.

Ele a ajeitou sobre a cama, com toda a delicadeza.

— Avise-me se eu a machucar.

— Você não está me machucando.

Ele, na verdade, estava bem longe disso.

Daniel a deixou por um segundo para tirar as próprias calças, voltando logo em seguida para tocar lodo o seu corpo. Amanda permaneceu algum tempo quieta, desejando absorver todas aquelas sensações que ele estava provocando nela.

Depois respirou fundo, ansiosa por retribuir as atenções. Roçando de leve pelo peito dele, ela desceu até alcançar o seu ponto mais sensível. Ele reagiu imediatamente ao toque, contraindo o abdômen. Arfante, ele gemeu e beijou sua boca. Amanda arqueou o corpo, em uma entrega sem limites, implorando, muda que sem dizer uma palavra, para que ele intensificasse as carícias. Ela fechou a mão em torno do seu membro ereto e o calor dele a incendiou.

Daniel soltou um palavrão, e Amanda se retraiu.

— Eu o machuquei?

— Você está me matando, querida.

— Desculpe.

Daniel riu.

— Eu quero que você me mate um pouco mais. Amanda obedeceu.

Ele deitou em cima dela, deixando entrever em seu rosto o esforço que estava fazendo para se controlar.

— É agora ou nunca.

A moça se abriu para recebê-lo.

— Agora — respondeu ela, com convicção.

Daniel penetrou-a com um único e rápido movi­mento. Amanda arregalou os olhos por causa da dor, porém ele a beijou com ternura, acalmando-a.

— Vai ficar tudo bem — sussurrou ele.

Já estava tudo bem. A dor passou rápido, mas a paixão persistiu.

Ele começou a se mover dentro dela, ativando um vulcão em seu interior. A lava quente do desejo in­cendiava suas coxas, seus seios.

Daniel acelerou gradativamente os movimentos, beijando-a com intensidade cada vez maior, fazendo o corpo dela ceder às suas investidas.

Uma luz ardia por trás dos olhos de Amanda. Uma corrente de prazer nascida do ponto onde eles esta­vam ligados se espalhou por todo o seu corpo.

Ele arfou, repetindo o nome dela. O mundo inteiro parou por um milésimo de segundo, quando todo o seu corpo se tencionou, para então ser levado pelo puro êxtase.

— Sra. Elliot?

Uma voz invadiu os seus pensamentos. Era o mo­torista da limusine.

Ela pôs a mão sobre o peito, tentando se recompor ii pós ter sido flagrada fantasiando sobre Daniel.

— Sim?

O chofer apontou para o prédio à direita.

— Chegamos.

— Claro — respondeu Amanda, abrindo a porta da limusine, um pouco cambaleante. — Eu já estou indo.

Amanda permitiu que ele a ajudasse a sair do ban­co de trás, agradeceu e atravessou a calçada até che­gar ao prédio e introduzir cuidadosamente a chave.

As lembranças da noite da festa de formatura, porém, recusavam-se a desaparecer. Ela e Daniel haviam feito amor durante toda a noite. Despediram-se na manhã seguinte, sabendo que provavelmente nunca mais se veriam.

Era o que teria acontecido. Amanda teria ido para ii New York University e Daniel teria girado o mundo, se não fosse por Bryan...

 

Daniel estacionou o carro no meio-fio, em frente à Corte, determinado a mudar de tática. Ele devia saber que seu plano com Taylor não funcionaria com uma mulher tão inteligente quanto Amanda.

Agora estava decidido a investir mais na inteligên­cia e menos na pressão, por isso resolveu descobrir o que atraía a ex-mulher na defesa de criminosos.

A recepcionista de Amanda havia lhe dito onde encontrá-la. Ela estava defendendo uma mulher acu­sada de fraude.

Ele bateu a porta do carro e cerrou os dentes a ca­minho da entrada. Abriu as portas, atravessou o cor­redor e procurou pela sala de número cinco. Uma vez lá dentro, enfiou-se rapidamente na fila dos fundos para Amanda não vê-lo. Ela estava sentada na mesa dos réus, ao lado de uma mulher de blusa marrom, enquanto outro advogado interrogava a testemunha.

— O senhor pode identificar a assinatura do che­que, sr. Burnside?

A testemunha desviou o olhar da prova que tinha nas mãos e fez um meneio em direção à ré.

— É a assinatura de Mary Robinson.

— Mary tinha autorização para assinar cheques? — perguntou o advogado.

A testemunha assentiu. - Apenas para comprar material de escritório e coisas do tipo.

— Mas ela não poderia assinar um cheque em seu próprio nome, não é?

— De maneira alguma. Isso é fraude.

Amanda levantou.

— Protesto, Meritíssimo. Isso é especulação.

— Mantido — disse o juiz. Ele olhou para a teste­munha. — Responda só ao que lhe for perguntado.

A pessoa apertou os lábios.

— Pode nos dizer o valor do cheque? — perguntou o advogado.

— Três mil dólares.

— Sr. Burnside, pode nos dizer se a sra. Mary Rohinson comprou material de escritório com esta quantia?

— Ela roubou isso — disse a testemunha.

— Meritíssimo! — Amanda interveio.

— Mantido — disse o juiz, impacientemente.

— Mas ela roubou! — insistiu o sr. Burnside. () juiz olhou para ele.

— Está discutindo comigo? Ele cerrou os dentes.

Boa tacada, pensou Daniel. O juiz olhou para Amanda.

Nenhuma pergunta — respondeu ela.

— A Acusação está satisfeita — disse o advogado.

— Sra. Elliot pode chamar a sua primeira testemu­nha -pediu o juiz.

— A Defesa gostaria de chamar Collin Radaski.

Um homem vestindo um terno escuro foi até o centro. Amanda virou-se para olhá-lo e Daniel teve de se esconder atrás de uma mulher que usava um chapéu grande.

A testemunha fez o juramento e Amanda se apro­ximou.

— Sr. Radaski, poderia declarar a sua função na Construtora Westlake?

Radaski se inclinou em direção ao microfone.

— Eu sou assistente administrativo.

— É parte dos seus deveres aprovar os cheques re­lativos à folha de pagamento?

— Sim.

Amanda voltou para a mesa dos réus e pegou uma folha em meio aos seus papéis.

— E verdade, sr. Radaski, que Jack Burnside ins­truiu o senhor a não pagar as férias dos empregados?

— Há algumas pendências nesse caso.

— É verdade também que a construtora não paga as horas extras de seus empregados?

— Nós temos um acordo verbal com os emprega­dos a esse respeito.

Amanda ergueu as sobrancelhas e fez uma pausa, evidenciando sua descrença.

— Um acordo verbal?

— Sim, senhora.

Ela voltou para a mesa e remexeu novamente em seu material.

— Sr. Radaski, o senhor tem consciência de que vem atentando contra a lei nesses últimos dez anos?

— O que é que isso tem a ver com...

— Protesto — interveio o promotor.

— Com base em quê? — perguntou o juiz.

— A testemunha não está em condições de...

— A testemunha é o assistente administrativo res­ponsável pela folha de pagamento da construtora — pontuou Amanda.

— Negado — falou o juiz. Daniel não se conteve de orgulho. Amanda folheou algumas notas.

Daniel tinha certeza de que aquilo não passava de encenação. Ela sabia exatamente o que faria a seguir.

— O senhor está consciente também — prosse­guiu ela — de que, de acordo com a firma de contabilidade Smith & Stanford, a Construtora Westlake deve aos seus empregados, antigos e atuais, um total de 171.661 dólares de atrasados?

Radaski ficou, aturdido.

— Meritíssimo eu gostaria de acrescentar este re­latório ao processo como prova. Minha cliente deseja mover uma ação contra a Construtora Westlake, rei­vindicando o ressarcimento de 1.286 dólares que a empresa deve a ela por férias e horas extras que não foram pagas.

— Mas ela roubou 3 mil dólares — gritou Jack Muni si de da galeria.

O juiz bateu o martelo.

Os lábios de Amanda se curvaram num sorriso.

— Bem vou entrar em contato com os antigos e atuais empregados da construtora para defender os seus interesses e mover uma ação contra a Westlake.

O juiz olhou para o promotor.

— Eu gostaria de pedir um recesso para conversar com o meu cliente.

— Acho que seria mesmo o melhor a fazer — con­cordou o juiz, batendo o martelo mais uma vez. — Esta sessão está suspensa até as 15 horas de quinta-feira.

Daniel saiu rapidamente da Corte. Compreendeu o que atraía Amanda naquela profissão, mas suspeitava de que aqueles momentos cinematográficos fossem muito raros e espaçados. Uma coisa, porém, não po­dia negar: ela era muito boa no que fazia.

Amanda olhou para o pequeno envelope que acompanhava um buquê de rosas vermelhas.

— Parabéns!

Confusa, ela o abriu.

— Eu a vi na Corte hoje. Você será a primeira pessoa para quem ligarei, se eu roubar um banco.

— D.

— São do sr. Delícia? — perguntou Julie, entran­do na sala com uma pilha de arquivos nas mãos.

— São de Daniel — confirmou Amanda. Julie cheirou as rosas.

— Agora você vai ter de transar com ele em cima da sua mesa.

Amanda sorriu com a irreverência de Julie.

— Daniel não é esse tipo de homem.

— Está mais do que provado que o homem que en­via rosas vermelhas para o escritório de uma mulher quer transar com ela em cima da mesa de trabalho.

— De onde é que você tira essas coisas?

— Você não leu a última Cosmo?

— Acho que perdi essa.

— Eu empresto a minha.

— E o que significam rosas amarelas?

— Amarelas significam que ele quer transar em cima da mesa de trabalho. Todos os homens querem.

— Não o Daniel.

Amanda não podia imaginá-lo nessa situação. Ele encararia isso como um verdadeiro sacrilégio.

— Faça um teste — aconselhou Julie.

— Daniel não é afeito a surpresas.

— Você por acaso estava esperando essas rosas? Amanda se deteve.

—Tenho de admitir que isso foi uma surpresa.

— Viu?

— Ele é meu ex-marido.

Ela não ia transar com ele em cima de mesas, nem em nenhum outro lugar. Já bastava tê-lo beijado.

— Mas ele é muito charmoso.

Ele era charmoso, beijava bem e, a menos que ela tivesse redondamente enganada, havia correspon­dido àquele beijo, o que significava que estava interesssado nela. Ou seja: encrenca à vista.

— Amanda?

— Hum?

— Você também o acha charmoso...

— Eu acho é que estou atrasada para a reunião.

Sua reunião, na verdade, era uma visita à sua que­rida amiga Karen. Amanda a encontrou no terraço do Tides, rodeada de álbuns e panfletos.

— Que bom que chegou! — disse Karen. — Te­nho que me decidir entre a pedicura e o reflexologista.

— O que é que você está fazendo?

— Já fiz as nossas reservas no Eduardo's, mas te­mos de comparecer a uma entrevista antes.

Ela já estava ficando animada com a perspectiva de passar o fim de semana em um spa. Karen apontou para a jarra de chá gelado.

— Está com sede?

— Hum, isso seria ótimo. Quer também?

— Por favor — respondeu Karen. — Conte-me o que está acontecendo no mundo.

— No mundo todo?

— No seu mundo.

— Eu ganhei um caso esta manhã — contou Amanda, enchendo os copos.

— Parabéns.

— Ainda não é oficial. O juiz vai decidir na quin­ta-feira, mas eu ameacei mover uma ação contra a Construtora Westlake pelo não-pagamento de férias e horas extras. Eles vão acabar aceitando um acordo.

— Esse era o caso de uma tal de Mary, acusada de fraude, não era?

— Sim, uma mulher muito doce. Mãe solteira de dois filhos. Não falou uma vez sequer com um advo­gado nesses seis meses de prisão.

— Mas ela roubou mesmo o dinheiro, não roubou?

— Digamos que ela se apropriou dos atrasados que a construtora estava lhe devendo.

Karen sorriu.

— Quer ser a minha advogada?

— Você não precisa de uma.

— Quem sabe? Ando muito entediada. Pensei em seqüestrar alguém ou coisa parecida.

— Você tem falado com Daniel? Os olhos de Karen brilharam.

— Não, e você?

Amanda arrependeu-se da piadinha. Fugir do as­sunto, porém, só atiçaria ainda mais Karen.

— Daniel me mandou flores — admitiu Amanda.

— Que tipo de flores?

— Rosas.

— Vermelhas?

— Sim.

— Meu Deus!

— Não é o que você está pensando.

— E o que mais poderia ser? — perguntou Karen. -Quantas rosas? Uma dúzia?

Amanda hesitou.

— Duas.Duas dúzias de rosas! Eram para me parabenizar.

— Pelo quê? — perguntou Karen. — O que é que vocês dois andaram fazendo?

— Não é nada disso. Daniel foi me ver na Corte. Eu ganhei o caso e ele me mandou flores.

— Ele foi vê-la na Corte?

— Sim.

— Por quê?

— Não tenho a menor idéia. — Ela tomou um gole de chá gelado. — Isso está me deixando nervosa. Ele tinha prometido que ia me deixar em paz depois da­quela história com Taylor Hopkins.

— Que história com Taylor Hopkins?

— Daniel convidou Taylor para jantar conosco e me introduzir no culto ao "Dólar Todo-Poderoso".

— Bem, Taylor é definitivamente o cara certo para esse tipo de coisa. Já viu a casa nova dele?

— Não.

Karen folheou um dos álbuns.

— Aqui está. Amanda foi até ela.

— Legal.

— Fica na praia. Tem uma quadra de tênis ótima. Era mesmo uma bela casa, mas Amanda não era do tipo que se impressionava com riqueza.

— Que linda essa foto de Scarlet e Summer — dis­se Amanda, olhando para um dos álbuns de família.

— Foi tirada no ano passado.

— E quem é esta aqui com Gannon?

— Alguém com quem ele saía antes da Erika.

— Você tem fotos do casamento deles?

— Claro!

Karen pegou o álbum oficial da cerimônia.

— Que vestido lindo! — comentou Amanda.

— Ela é uma mulher maravilhosa. Está fazendo limito bem ao Gannon.

Na página seguinte, havia uma foto de toda a família. O olhar de Amanda se deteve em Daniel. Ele es­lava deslumbrante em um smoking.

Foi então que ela viu a mulher ao lado dele.

— Opa! — exclamou Karen.

Era Sharon. Ela era pequena e magra e tinha o cabelo tingido de louro bem claro, milimetricamente arrumado. Parecia ter menos de quarenta anos. A ma­quiagem estava perfeita, e o vestido era maravilhoso.

— Não me pareço em nada com ela, não é? — per­guntou Amanda, sentindo-se repentinamente mal.

— Graças a Deus — respondeu Karen, virando-se para encarar a amiga. — Você sabe muito bem que Daniel se divorciou dela.

— Mas se casou com ela.

— Ele amava você. Amanda balançou a cabeça.

— Eu estava grávida. Karen apertou o braço da amiga.

— Você é gentil, solidária, inteligente, doce...

— E ela é magra, linda, fica divina em roupas de grife c sabe conversar em várias línguas.

— Ela é cruel e frágil.

— Mas fica maravilhosa em um vestido de noite.

— Você também. A advogada sorriu.

— Você não me vê em um vestido de noite há mais de uma década. Na verdade, eu mesma não me vejo em um vestido de noite há anos.


— Pois talvez esteja na hora de mudar isso.

— Eu uso corpete — confessou Amanda. Karen riu.

— Bom, pelo menos eu não preciso mais disso. Amanda congelou, horrorizada.

— Muito obrigada. Essa foi a minha primeira pia­da sobre o câncer.

A amiga ficou embaraçada.

— Mas eu...

— Não se atreva a me pedir desculpas. Eu sei que você só trouxe esse assunto à tona porque esquece completamente da minha cirurgia.

Era verdade. Amanda não se lembrava da mastectomia quando pensava em Karen, mas sim da maravilho­sa amiga que ela era.

— É por isso que eu adoro você — disse Karen apertando-lhe o braço. — Essas questões estética não fazem a menor diferença para você.

Amanda olhou de novo para Sharon.

— Mas é óbvio que isso não vale para Daniel.

— Não creio que isso seja verdade.

— A única coisa que Sharon tem de bom é a apa­rência, certo?

— Certo — concordou Karen.

— Pois então. Foi isso que atraiu Daniel — disse Amanda, olhando para as suas calças simples, em um tom de azul marinho e sua blusa branca.

— Você se importa com o que ele pensa?

Boa pergunta. Amanda não deveria se importar com isso. Mas o beijo, as flores, as lembranças...

— Papai? — disse Cullen, cutucando Daniel por baixo da mesa e entregando-lhe um bilhete.

Daniel voltou à realidade e concentrou-se nos rostos cheios de expectativa do restante da equipe. Ele estava imaginando se Amanda tinha gostado das flo­res. Olhou disfarçadamente para o papel, no qual es­lava escrito: "Diga: Cullen tem esses números."

Daniel ergueu o olhar e se recostou na cadeira.

— Cullen tem esses números.

A atenção de todos voltou-se para o filho.

— As vendas na Espanha e na Alemanha parecem bastante promissoras — começou Cullen. — A situa­ção na França ainda está indefinida, mas creio que os gastos de tradução para entrarmos no Japão não com­pensariam.

Michael, o irmão de Daniel, assentiu.

— Tivemos resultados semelhantes com a Pulse. Também acho que o Japão nos dará pouco retorno.

Depois foi a vez de Finola, a irmã de Daniel, falar.

— Mas a Charisma é boa para qualquer mercado.

— Isto porque vocês trabalham basicamente com imagens — disse Michael. — Você poderia vender a sua revista lá sem sequer traduzi-la. — O que acha, Shane? — perguntou.

A atenção do grupo voltou-se para o irmão gêmeo de Finola. Todos queriam saber se ele ia defender sua própria revista ou apoiar a irmã gêmea.

A Buzz pode tomar qualquer uma das direções disse ele.

— Por que não suspendemos a discussão sobre o Japão por hoje? — perguntou Cadê McMann, o edi­tor executivo da Charisma.

— E se nós optássemos por traduzir todas as revis­tas para o espanhol e o alemão? — sugeriu Cullen. — Não correríamos grandes riscos e estaríamos aten­dendo às necessidades comuns.

O recinto ficou em silêncio por algum tempo, en­quanto todos avaliavam a proposta. Cullen sorriu.

— Acho que ninguém aqui quer correr riscos desnecessários neste momento, não é mesmo?

Todos concordaram.

— Eu posso levar essa decisão ao papai — ofere­ceu Michael.

— Por mim, tudo bem — concordou Daniel.

— Fechado, então — disse Shane, batendo a mão na mesa. — Finalizamos? Tenho um almoço de negó­cios.

Todos pegaram seus papéis e a se retiraram.

Daniel imaginou o sorriso de Amanda mais uma vez. Talvez devesse ligar só para ter certeza de que ela recebeu as rosas.

— Você pensou no que eu lhe falei sobre Jessie Clayton? — perguntou Cadê a Finola.                    

— A minha estagiária?                                  |

— Sim.                                                            

— Ainda não tenho uma opinião formada. Eu mal a vi. Parece até que ela está me evitando.

— Mas por quê? — perguntou Cadê.

— Quem sabe? — respondeu Finola, rindo. — Talvez eu seja assustadora.

— Eu não confio nela.

— Então providencie uma investigação.

— Talvez eu faça mesmo isso — respondeu Cadê, desaparecendo no corredor.

— Pai, você tem um minuto? — perguntou Cullen quando Daniel estava se preparando para levantar.

— Claro.

Eles ficaram a sós na sala.

— O que está acontecendo? — começou Cullen.

— Como assim?

O filho balançou a cabeça.

— Como assim? Eu tive de salvar a sua pele três vezes hoje, durante a reunião. O que é que o estava deixando tão distraído?

— Você não...

Cullen indicou o bilhete que havia passado ao pai pouco antes.

— Bem, talvez eu estivesse mesmo distraído.

— Jura?

— Eu estava pensando...

— Na mamãe.

— Nos negócios.

— Sei. Quer que eu acredite nisso?

Ele pousou a caneta e olhou firme para o pai.

— O que você está fazendo? Daniel tentou decifrar o que havia por trás da expressão do filho.

— Em relação a quê?

— Você foi à Corte ontem.

— E daí? Estou tentando fazer com que sua mãe mude de carreira. Você sabe disso.

Cullen balançou a cabeça, sorrindo para o pai.

— Papai...

— Que foi?

— Admita.

— Admitir o quê?

— Você está a fim da mamãe. Daniel quase engasgou.

— O quê?

— Isso não tem nada a ver com a carreira dela.

Daniel não respondeu. Apenas olhou incredulamente para o filho.

Cullen se ajeitou na cadeira.

— Papai, eu conversei com...

— Com quem?

— Com Bryan. Nós dois achamos uma boa idéia.

— O que é que vocês acham uma boa idéia?

— Você e mamãe reatarem. O pai ergueu as mãos.

— Uau!

— Talvez tenha dificuldade em convencê-la...

— Sua confiança em mim me comove.

— Mas nós achamos que vai valer a pena.

— Acham, é?

— Com certeza.

Daniel olhou severamente para Cullen.

— Não se meta na minha vida — ordenou ele.

— Papai...

— Eu estou falando sério, Cullen.

— Eu não quero saber.

— Já está na hora de você desistir dessa história de Direito Corporativo.

— De jeito nenhum.

— Você pode simplesmente cortejá-la.

— Ela não...

— Mande flores para ela, ou algo parecido.

— Eu já... Daniel se deteve.

— Você já o quê?

Ele ergueu-se e juntou seus arquivos.

— Esta reunião está encerrada.

Cullen também se levantou.

— Você já o quê?

— Você é muito insolente.

— Ela já não namora ninguém há algum tempo.

Aquilo o deteve.

— O que você quer dizer com há algum tempo?

A idéia de Amanda namorando outra pessoa pro­vocou-lhe um aperto no coração.

— Um tal de Roberto a pediu em casamento no natal passado.

— Casamento?

— Mas ela recusou.

O utro homem pediu a sua mulher em casamento?

Daniel perdeu o fôlego. Ela poderia ter dito sim. Poderia estar casada a uma hora dessas, e ele não teria mais chance de...

O que é que ele estava pensando, afinal?

Cullen pousou as mãos sobre a mesa.

— Leve-a para passear, faça-a sentir-se especial.

Ele olhou para o filho, sem expressão.

— Ela gosta de lagosta.

Daniel sabia que Cullen tinha razão. Ele queria na­morar sua ex-mulher.

 

CAPÍTULO SETE

Daniel já havia tido centenas de encontros na vida, talvez milhares. Sabia que era importante impressio­nar, e que para isso era preciso cuidar dos detalhes.

Havia um bureau perto da Washington Square que poderia fazer uma impressão rápida e de qualidade. O motorista poderia levar o convite à casa de Amanda.

Ele chamou Nancy para tomar as providências.

Três horas depois, chegava a sua resposta. Um e-mail de Amanda.

Ele havia optado por estilo e elegância, e ela, por praticidade.

Daniel clicou duas vezes no nome dela. " Não, obrigada.", dizia a mensagem. Mais impessoal, impossível. Nenhuma explicação, nenhuma brecha para remarcar o encontro para outro dia. Mas ele não ia desistir assim tão fácil.

Ele acionou a comunicação interna mais uma vez.

— Nancy? Sim?

Ligue-me para Amanda Elliot, por favor.

— Imediatamente, senhor.

Ao ver a luz do aparelho piscando, pegou o fone.

— Amanda?

— É Julie.

— Oh! Amanda pode atender? É Daniel Elliot.

— O sr. Delícia?

— Como?

Ela riu baixinho.

— Um momento, por favor.

Daniel respirou fundo. Não queria brigar com ela, apenas marcar um encontro.

— Amanda Elliot.

— Amanda? É Daniel. Silêncio.— Recebi seu e-mail — disse ele, tentando elimi­nar qualquer tom de censura em sua voz.

— Daniel...

Ele se fez de bobo.

— Sexta é um dia ruim para você? Houve uma pausa.

— Não é uma questão de agenda.

— Ah, não? O que é, então?

— Não faça isso comigo, Daniel.

— Fazer o quê?

— As rosas eram lindas, mas...

— Mas o quê?

— Tudo bem. — Ela fez uma pausa. — Sincera­mente?

— Claro.

— Eu não tenho energia para isso. Ele se empertigou.

— Eu a faço gastar energia?

— Daniel! — disse ela, exasperada.

— Eu vou fazer as reservas, pegá-la em casa e pagar a conta. Que gasto de energia há nisso?

— Não é esse tipo de coisa que me tira a energia.

— O que é, então?

— Você! Você prometeu se afastar!

— Eu vou me afastar. Eu já estou me afastando.

— Sei — disse ela, em um tom zombeteiro. — Me espionando na Corte?

— Eu não estava espionando.

Bem, talvez estivesse, mas isso foi ontem. Agora He tinha outra missão bem melhor.

— Você estava certa e eu, errado, por isso não vou mais insistir no assunto.

Houve um longo silêncio.

— Poderia repetir isso? — disse ela, sorrindo.

— Acho que não — resmungou Daniel. Outro silêncio.

— Qual é o truque?

— Nenhum. Eu só quero jantar com você. É a mi­nha maneira de pedir desculpas.

— Desculpas? Você?

— Sim. Acho que o nosso relacionamento melhorou muito ultimamente, Mandy.

Ela sorriu ao ouvi-lo usar o seu apelido.

— Eu não quero perder isso — continuou ele. — prometo que não vou emitir opinião alguma sobre Direito Criminal ou Corporativo durante o jantar.

E alguém vai se juntar a nós no último minuto?

— Não, se eu puder evitar...

— Como assim?

— Bem, eu não posso me responsabilizar pelo comportamento de todos os cidadãos de Nova York, porém garanto que não convidei ninguém.

— Promete?

— Juro. Outro silêncio.

— Tudo bem.

— Sexta à noite?

— Sexta à noite.

— Eu pego você às oito.

— Tchau, Daniel.

— Tchau, Amanda. Daniel sorriu, segurando o fone por mais um momento. Ele tinha conseguido.

Tudo de que ele precisava agora era de uma bela caixa de chocolates finos e uma reserva no Hoffman's, cuja especialidade era lagosta.

Amanda não havia se vestido para um restaurante daquele porte. Sua maquiagem também era leve e seu cabelo estava preso atrás das orelhas, deixando à mostra pequenos brincos de jade. Ela sugeriu um pulo n bistrô da esquina para um sanduíche de filé, mas Daniel não se deixou convencer.

Ele reservou lugares no local mais badalado da cidade e estava se preparando para exibir o dinheiro os contatos que tinha, no melhor estilo Elliot.

Amanda não sabia a quem ele estava tentando im­pressionar. Restaurante caro não significava nada para ela, e ela, por sua vez, também não era nenhum tipo de troféu que ele pudesse exibir aos seus amigos.

Um garçom vestindo smoking os conduziu a uma mesa mais reservada, perto de uma grande janela com vista para o parque. Daniel pediu um martíni para cada um. Amanda tinha de admitir que as cadei­ras de encosto alto com estofado de seda eram muito confortáveis e que a louça chinesa, as obras de arte e a mobília antiga eram bem bonitas. Ela se curvou sobre a mesa.

— Você jura que isto não faz parte de um grande plano para me coagir a mudar de carreira?

— Que cínica! — disse Daniel, sorrindo.

— Experiente, você quer dizer — retrucou ela. Daniel abriu a carta de vinhos.

— Você deveria relaxar e desfrutar do jantar.

— Eu vou — disse ela. — Assim que o " momento a-há!" passar.

— "Momento a-há!"?

—- Aquele em que uma prova vem à tona e dá sentido a tudo o que até então não se podia compreender.

— Você tem passado tempo demais na Corte.

— Eu passei tempo demais casada com você.

Daniel a olhou por sobre a luz das velas.

— Vejamos se consigo esclarecer as coisas.

Aquilo a surpreendeu.

— Você vai me revelar o seu plano nefasto?

O garçom veio servir água e colocar uma cesta de piles frescos na mesa. Daniel agradeceu e voltou a atenção novamente para Amanda.

— Não há nenhum plano nefasto. Bryan é o agente secreto aqui, não eu.

— Mas ele aprendeu tudo o que sabe com o pai.

— Ele aprendeu tudo o que sabe com a CIA. Amanda sentiu um calafrio.

Daniel apertou a mão dela, desencadeando uma onda de calor que subiu por todo o seu braço.

— Desculpe.

— Está tudo bem. Já passou. É isso que importa.

— Passou — concordou Daniel. Amanda respirou fundo e retirou sua mão.

— O que é que você está tramando?

— Bem, você foi incrível lá na Corte.

Ela ficou lisonjeada com o elogio, porém não quis se deixar levar por aquela sensação.

— Muito gentil da sua parte, porém não é por isso que estamos aqui.

— Nós estamos aqui porque, ao ver você pegar aquele cara, percebi que estava errado ao querer que você mudasse de carreira.

Não havia como ignorar aquele elogio. Amanda teve certeza de que ele estava sendo sincero. O garçom serviu os martínis.

— Querem pedir agora?

— Dê-nos mais uns minutos — disse Daniel. O garçom fez uma mesura e se retirou. Daniel ergueu seu martíni para brindar com ela. Amanda ergueu a sua taça também.

— Digamos que eu acredito em você.

— Muito inteligente de sua parte. Mas eu continuo achando que você está querendo alguma coisa.

— Está tudo claro como água.

— Sim, os Elliot são mesmo conhecidos pela sua transparência...

— Eu estou sendo o mais transparente possível — respondeu ele, intensificando o olhar.

Ela esperou.

— Doce, flores, jantar... Isso é um encontro? — perguntou ela, aturdida.

— Isso mesmo, um encontro — Daniel sorriu.

— Não é não. Você só está me pedindo desculpas. Nós estamos retomando uma certa cordialidade em nome dos nossos filhos e netos.

Daniel deu de ombros.

— Eu não vou discutir com você, Amanda.

O garçom retornou.

— Querem pedir agora?

— Sim, obrigado. — Olhou para ela. — Lagosta?

Amanda ficou tocada por ele se lembrar do seu prato predileto, mas não deixou transparecer. Aquilo não era um encontro. Ele não era seu namorado!

— Escalope — disse ela, estendendo o menu para o garçom. — E uma salada verde.

Daniel ergueu as sobrancelhas.

— Tem certeza?

— Sim.

- Eu vou querer o escalope também, então.

- Mas...

Ela esperava que Daniel pedisse uma costeleta.

Alguém começou a tocar uma harpa. Amanda es­tendeu o guardanapo sobre o colo e se refez. Precisa se manter a calma esta noite.

Não se esforçou para encontrar um assunto neutro.

— Conseguiu solucionar seus problemas legais?

Daniel tomou um gole do martíni.

— Que problemas legais?

— Aqueles do regulamento dos empregados.

— Ah! Infelizmente, parece que vamos ter de des­pedir o funcionário.

— Você vai despedir alguém?

— Temo que sim.

Seu instinto de defesa aflorou imediatamente.

— Você está sendo muito leviano com o ganha-pão dos outros.

— A leviandade partiu dele.

— O que foi que ele fez?

— Tratou de assuntos pessoais no de trabalho.

— Como assim?

— Ligou dizendo que estava doente e depois foi visto na Sétima Avenida por um de nossos gerentes.

— Ele podia estar indo comprar algum remédio.

— De acordo com as minhas fontes, ele parecia muito saudável e bem-disposto.

— Suas fontes? Bryan teve mesmo a quem puxar.

— Você sabe muito bem que uma companhia do porte da Editora Elliot não pode se dar ao luxo de per­mitir que seus empregados faltem ao trabalho alegan­do falsos problemas de saúde.

— Perguntou a ele o que estava acontecendo?

— Não pessoalmente.

— Alguém o fez?

— Pediram-lhe que trouxesse o atestado médico, mas ele não tinha.

Amanda se curvou sobre a mesa.

— Talvez ele não tenha ido ao médico. Daniel tomou mais um gole de seu martíni.

— Ele disse que estava doente e não estava.

— Ele tem testemunhas?

— Por quê? Está querendo assumir esse caso? Ela o encarou com um sorriso desafiador.

— Eu adoraria.

Daniel puxou a sua cadeira.

— Acho que poderíamos dançar.

— Como?

Ele indicou a escada com um meneio de cabeça.

— Há uma pista de dança no terraço, lá em cima.

— Mas nós já pedimos os nossos pratos.

Ele se levantou e estendeu a mão para Amanda.

— Vou pedir que esperem um pouco para servir. Amanda arregalou os olhos.

— Eu estou arruinando o seu encontro perfeito?

— Digamos que você é um desafio maior.

— Talvez você devesse me abandonar.

— Eu sou um cavalheiro...

A mulher se levantou, sem pegar na mão dele.

— Daniel, você podia muito bem cancelar os nos­sos pedidos e me levar para casa.

Daniel ficou tenso, esperando pela resposta.

Aquela seria a coisa mais segura a fazer. Dançar com ele era a opção mais estúpida e perigosa.

— Não seja ridícula.

Daniel pegou na mão dela e ela se odiou pelo alí­vio que sentiu. Os dedos dele eram quentes e fortes. Toda e qualquer resistência desapareceu, como que por encanto, de seu corpo.

— Isso não é um encontro — insistiu ela, enquanto o ex-marido a conduzia para o salão.

— É claro que é. Eu lhe enviei rosas.

— Minha casa está parecendo uma floricultura.

— E isso é ruim?

— É estranho.

— Seus namorados não lhe enviavam flores?

A advogada virou a cabeça para olhar para ele.

— Que namorados?

— Cullen me falou de um tal Roberto.

Ela tropeçou em um degrau e teve de se agarrar ao corrimão. Roberto queria salvar o mundo. Amanda se contentava em fazer a sua parte.

Daniel enlaçou sua cintura para ajudá-la.

— Soube que o sujeito a pediu em casamento.

Amanda se recompôs.

— É verdade.

— E você recusou.

— Recusei.

— Por quê?

— Não é da sua conta.

A advogada abriu uma porta no alto da escada, sendo logo envolvida pelo som de um quarteto de cordas.

O ex-marido se adiantou e segurou a porta para ela.

— Como quiser.

Amanda se surpreendeu com a reação dele.

Ele e a guiou até a pista de dança.

Aceitar dançar com ele havia sido um erro fatal. A noite toda havia sido um grande erro. Amanda deve­ria ter imaginado.

A brisa da noite estava fria. Até as estrelas esta­vam cooperando. Brilhavam intensamente.

Ela inclinou a cabeça para admirar as manchas prateadas salpicadas sobre o fundo púrpura.

— Tudo o que você faz é sempre assim perfeito?

— Perfeito? — perguntou ele, contendo o riso.

— Flores perfeitas, jantar perfeito, céu perfeito...

— Basta um pouco de planejamento. Ela baixou a cabeça.

— E você é o arquiteto-mor!

— Sou.

— Você já fez alguma coisa sem planejar?

— Não.

— Nada?

Daniel deu de ombros.

— De que adiantaria?

O quarteto começou a tocar outra valsa. Daniel a puxou mais para perto. Ela não devia estar gostando daquilo. Não queria estar gostando daquilo.

— Poderia ser divertido — disse ela, esforçando-se para manter a conversa. A última coisa que queria era deixar os devaneios correrem soltos.

— O que há de tão divertido na desorganização? O vento fez o cabelo cair sobre seu rosto.

— Eu estou falando de espontaneidade.

O ex-marido ajeitou o cabelo dela atrás da orelha, meando sua bochecha com os dedos.

— Espontaneidade é só um eufemismo para o bobos.

Espontaneidade é fazer aquilo que se quer na hora em que sequer.

— Isso não passa de capricho.

— Está me chamando de caprichosa? Ele apoiou a testa na dela e suspirou.

— Eu não a estou chamando de nada. Só estou di­zendo que não mudo de opinião radicalmente de uma semana para outra.

— E em um mês, um ano?

— Existem diferentes níveis de planejamento.

Amanda parou de dançar.

— Tem coisas planejadas para o ano que vem?

— É claro.

— Não é possível!

— Há coisas que precisam ser feitas com antece­dência. Congressos, conferências. Não se pode sim­plesmente pegar um avião para Paris e improvisar um display da Editora Elliot para ser exibido na Liga Eu­ropéia de Periódicos.

— E se alguma coisa mudar?

Ele a trouxe de volta para a dança, colocando a mão em suas costas, fazendo-a tremer.

— O que poderia mudar?

Apesar de seu esforço para encontrar um bom ar­gumento, Amanda ficava cada vez mais suave.

— Mas nunca teve vontade de se deixar levar?

— Não.

— Nem mesmo com as coisas pequenas?

— Amanda, não existem coisas pequenas... Aquilo era loucura.

— Não seria divertido escolher um restaurante no calor do momento?

— E esperar duas horas para conseguir uma mesa?

Ela lhe deu um tapinha no braço.

— Você está sendo obtuso.

— Eu estou sendo é lógico. Planejar não tira a gra­ça das coisas. O planejamento, na verdade, é o que garante a diversão, uma vez que evita todas as preocupações desnecessárias.

— Você deveria pegar leve de vez em quando.

— Não acho uma boa idéia.

— Isso o faria se sentir vivo novamente.

Daniel se deteve e tirou outra mecha de cabelo do rosto dela. Seu nervosismo, desta vez, foi evidente.

— Você acha mesmo? — perguntou ele.

— Tenho certeza — garantiu ela.

— Tudo bem. Então aqui vai uma coisa não plane­jada.

O interesse dela se aguçou.

— O que é?

Ele a trouxe lentamente para junto do seu corpo e então colou os lábios nos dela.

Amanda arregalou os olhos. Oh, oh. Havia espontaneidades e espontaneidades.

— Isso... —sussurrou ele.

Foi um beijo suave. Os lábios dele mal se abriram, e seu braço em torno dela a deixou livre, em vez de apertá-la com mais força.

Tudo não durou mais do que alguns segundos, mas provocou uma tempestade de sensações dentro de Amanda. Suas pernas chegaram a bambear.

Os dois permaneceram imóveis em meio aos outros casais que dançavam, olhando nos olhos um do outro, com a respiração ofegante.

— Você não planejou isso, não é? — disse Daniel.

— Por quê? Você planejou?

— Claro. Durante toda a semana.

— O quê?

Ele riu baixinho.

— Eu sou o arquiteto-mor, lembra?

— Mas...

— E não acho que o meu planejamento tenha me roubado o prazer de estar com você.

Amanda recuou.

Um pensamento assustador invadiu a sua mente.

— Por favor, diga-me que você não tem mais nada planejado para esta noite.

O sorriso de Daniel foi luminoso.

— Talvez seja melhor eu não responder.

 

Era segunda-feira de manhã quando Nancy anunciou pela comunicação interna:

— A Sra. Elliot gostaria de falar com o senhor.

Amanda? Aqui?

Ele mal podia acreditar.

Ela pareceu assustada depois do beijo na sexta-feira. Por isso, Daniel decidiu se afastar por alguns dias.

Talvez ele não devesse ter ido com tanta sede ao pote. Porém o fato é que queria namorá-la e queria que ela soubesse que estava interessado nela.

Levantou-se e ajeitou a gravata, passando a outra mão no cabelo.

— Daniel? — chamou Nancy.

O editor apertou o botão da comunicação.

— Pode mandar entrar. Daniel sorriu para dar as boas-vindas à visita. Seu sorriso, porém, logo desapareceu. Era Sharon. A outra Sra. Elliot. Lia adentrou o escritório, deixando a porta bate.

— Onde é que você estava com a cabeça? — disse entre dentes.

— Como?

— No Hoffman's?

Ele se jogou na cadeira, remexendo nos papéis.

— Em que posso ajudá-la, Sharon?

— Pode respeitar os termos do nosso divórcio?

— Você já recebeu o cheque deste mês. Sharon o havia descontado em questão de horas.

— Não estou falando de dinheiro. Estou falando do nosso acordo.

— Nosso acordo sobre o quê? — Daniel assinou a carta à sua frente, e então passou a avaliar um relató­rio. — Eu estou muito ocupado no momento. — Não queria perder seu precioso tempo com Sharon.        

Ela apoiou as mãos sobre a mesa de Daniel e se inclinou na sua direção, tentando intimidá-lo.          

— O nosso acordo de dizer aos nossos amigos que fui eu que quis me separar de você.                        

— Eu nunca disse o contrário a ninguém.            

— Uma ação vale muito mais que mil palavras!  

Ele olhou para o relógio.

— Podemos pular esse assunto? Eu tenho uma reu­nião com Michael às dez.

A mulher cerrou os dentes e seu rosto ficou marca­do por rugas ao redor dos olhos, apesar das diversas cirurgias pelas quais havia passado.

— Ninguém vai acreditar em mim se o virem tro­cando carícias com outra mulher.

Daniel se empertigou.

— Não era outra mulher, era Amanda.

Sharon agitou a mão.

— Não importa. Você não...

— E nós não estávamos trocando carícias.

— Fique longe dela, Daniel.

— Não.

Os olhos azuis de Sharon quase saltaram.

— O quê?

Ele se levantou e cruzou os braços.

— Eu disse que não.

— Como você se atreve...

— Eu me atrevo porque estamos divorciados e vou encontrar quem eu quiser, quando bem entender.

— Nós tínhamos um acordo — disse ela, arfando.

— Eu aceitei mentir antes para salvar a sua reputa­ção, mas agora já chega. Fui claro?

Daniel nunca mais deixaria que ninguém interfe­risse no seu relacionamento com Amanda.

A mulher mudou a expressão repentinamente, mino em um passe de mágica. Era embaraçoso pen­sar que ele já havia caído naquele truque.

— Mas, Daniel... eu vou ser humilhada!

— Por quê?

— Porque as pessoas vão achar que você me aban­donou.

— Se você quiser salvar a sua reputação, vai ter de arranjar seus próprios encontros. Saia. Seja feliz. Mostre a todos que não quer mais saber de mim.

Ela começou a verter lágrimas de crocodilo, porém Daniel não se sensibilizou.

Sharon ia ter de se virar sozinha dali por diante. Daniel havia lhe dado a casa, as obras de arte e os empregados. Ela não conseguiria tirar mais nada dele.

— Você pode enganá-los como quiser, mas me deixe fora disso!

— Mas, Daniel...

— Chega!

— Pelo menos, mantenha as aparências.

— Adeus, Sharon...

Ela pegou a bolsa e saiu, fazendo pose.

Manter Amanda longe da vista dos outros? De jei­to nenhum!

Ele chamou Nancy outra vez.

— Temos algum convite para uma recepção de alto nível este fim de semana? Algo bem badalado?

— Ele a beijou? — perguntou Karen, com os olho verdes iluminados por um sorriso.

Estava trabalhando no jardim, às voltas com violetas-africanas e fertilizantes.

— Você acha que eu estou ficando louca? -— Por se apaixonar pelo seu ex-marido?

— Dito assim em voz alta, soa muito pior!

— Isso tudo é muito bonito — disse Karen, tirano as luvas coloridas e se jogando em uma cadeira.

A advogada foi rapidamente até ela.

— Você está bem?

Karen fez um meneio de cabeça e sorriu.

— Só estou um pouco cansada. Mas é um cansaço bom. — Ela olhou para as plantas.

Amanda se agachou e apertou a mão da amiga.

— É ótimo vê-la assim, com tanta disposição.

— Vamos voltar a falar de você e de Daniel. Amanda resmungou, fazendo Karen rir. Um telefone tocou.

Karen olhou para a bolsa de Amanda.

— Não é o seu celular?

— Oh, eu esqueci de desligá-lo!

— Veja quem é — sugeriu Karen.

Amanda viu o número e sentiu um nó no peito.

— É Daniel.

— Fale com ele — insistiu a amiga. Ela resolveu atender.

— Amanda Elliot.

— Oi, Mandy. Sou eu, Daniel.

A advogada sentiu um calor por dentro.

— Oi, Daniel.

— Você está livre sábado à noite?

— Ah... no sábado?

Karen fez que sim com a cabeça, vigorosamente.

— Deixe-me ver... — Amanda fez uma pausa para não parecer muito afoita. — Estou livre no sábado.

— Ótimo! Haverá um baile para arrecadar fundos pura um museu no Riverside Ballroom.

No Riverside? O hotel onde eles haviam feito amor pela primeira vez?

Amanda não conseguiu dizer uma única palavra.

— Posso pegá-la às oito?

— Eu, ah...

— O traje é a rigor, mas é por uma boa causa. Amanda?

— Sim?

— Oito horas está bom para você?

— Claro.

— Ótimo.

— Então, até lá. Amanda desligou o celular.

— Outro encontro? — perguntou Karen com um mi riso maroto.

— Um evento beneficente no Riverside.

Karen assobiou.

— E que encontro!

— Não tenho roupa para isso.

— É claro que tem.

Amanda colocou o celular de volta na bolsa.

— É sério. Não tenho absolutamente nada que sir­va para um lugar como esse.

— Vamos ver se posso ajudá-la.

— Como assim?

— Scarlet deve ter centenas de vestidos.

— Eu não poderia fazer isso.

— É claro que poderia. Vai ser divertido. — Karen tomou Amanda pelo braço.

— Se isso a deixar mais à vontade, ligarei para ela para pedir permissão, assim que você encontrar alguma coisa que lhe agrade.

— Acha que ela vai me deixar usar um dos vesti dos? — perguntou Amanda, seguindo Karen escadaria acima.

— Claro!

Amanda hesitou.

— Eu não...

— Faça-me esse favor. É como se eu estivesse indo à festa também!

— Você gosta mesmo desse tipo de coisa?

— Adoro me empetecar.

— Esta é a diferença entre nós.

Amanda ficava artificial com roupas formais, sem falar nos penteados armados e na maquiagem pesada

— Vai beijá-lo de novo? — perguntou Karen.

— Eu não pensei nisso.

Que mentira! Ela não havia pensado em outra coisa desde sexta-feira.

— Bem, então pense a respeito.

Elas entraram em um dos quartos do andar de cima e Karen abriu um enorme guarda roupa.

— Certo. Vou me sentar bem aqui, e você vai fazer um desfile de modas para mim e me contar sobre o beijo que deu no seu ex-marido.

A advogada riu.

— Foi tudo muito rápido.

— Mas foi bom? — continuou Karen, ajeitando-se em uma poltrona.

Amanda relembrou o momento pela milésima vez.

— Foi bom.

Muito bom, na verdade. Do tipo "acho que me lembro por que foi que me casei com você".

— Você devia ver a sua cara — disse Karen, rindo.

— Nós estamos divorciados.

— Talvez ele só esteja interessado no seu corpo.

Amanda se recostou na porta.

— Hellooo! Depois de Sharon?

— Especialmente depois dela. Aquela mulher pode sair muito bem em fotografias, mas, de perto, não passa de um monte de Botox e maquiagem.

Karen desatou a rir.

— A mulher é assustadora, especialmente quando começa a falar. Já você, se torna cada vez mais interessante a cada minuto.

Amanda não acreditava nela, porém achava a amiga simplesmente adorável.

— Agora vamos arrasar aquele homem com o ves­tido mais sexy que encontrarmos — disse Karen.

— Eu não sei bancar a mulher fatal.

— Não seja idiota.

— Você sabe muito bem o que ele vai pensar se eu chegar assim, toda produzida.

— O que ele vai pensar?

— Você sabe... Ele vai achar... Vai achar que e estou interessada nele.

— Mas você está!

— Não como namorado.

— Como o que, então?

Amanda tirou a blusa e suspirou.

— Grande pergunta!

— Ele pode ser o seu amante — sugeriu Karen.

— Um caso? Com Daniel?

— Não seria a primeira vez que você dormiria com ele, não é?

Amanda revirou os olhos e Karen riu novamente.

— Devo concluir que era bom?

— É claro que era.

A advogada tirou as calças e as colocou sobre cama. Sexo nunca havia sido problema no seu casamento. O problema foi a família dominadora de Daniel e sua ânsia por ganhar dinheiro.

Os dois tinham algo muito sólido no início do relacionamento. Ela ficou arrasada ao ver aquilo se de fazer aos poucos, mas o sexo, ah, o sexo...

— Quer dizer então que o sexo era bom, mas o casamento era ruim?

— É uma boa maneira de definir as coisas.

— Você poderia ficar com o melhor dos dois. Dor­mir com o bom amante e viver longe do mau marido.

Amanda se deteve. Aquilo podia ser uma loucura completa, porém também uma grande idéia.

— Nós estamos no século XXI — disse Karen.

Ter Daniel apenas como amante?

Será que ela realmente poderia tirar vantagem dos pontos fortes de Daniel e simplesmente ignorar seus pontos fracos?

— Você vai precisar de um vestido especial — disse Karen, piscando para ela.

Amanda estava com a sensação de que havia algo de errado naquilo, mas não sabia dizer o que era.

— Eu não poderia...

— Poderia sim — interrompeu Karen. — Não é ilegal ou imoral, nem faz mal à saúde.

A empregada dos Elliot apareceu na porta.

— As senhoras estão precisando de alguma coisa?

— Sim, Olive. Champanhe e suco de laranja — respondeu Karen. — Estamos comemorando.

— Você pode beber? — perguntou Amanda.

— Moderadamente.

— Eu trago já — disse Olive, saindo do quarto. Karen apontou imperiosamente para o armário.

— Quero que comece pelos vestidos mais ousados.

Amanda entrou no hotel usando um vestido longo de seda preta, com um belo desenho dourado na fren­te.O modelo era oriental, sem mangas, com uma gola que dispensava o uso de qualquer jóia, e uma fenda na parte de trás, para facilitar o caminhar. Uma roupa elegante, porém não excessivamente provo­cante.

Scarlet havia insistido para que ela ainda usasse uma tornozeleira fina de ouro que brilhava quando ela andava, complementando o visual das sandálias de tiras. Os saltos eram mais altos do que os que ela costumava usar, mas ela pôde contar com o braço de Daniel para se apoiar.

Ao atravessar os arcos decorados, ela sentiu o per­fume dos arranjos de flores e admirou a beleza dos lustres. As mesas estavam impecavelmente postas em torno de uma pista de dança, no centro do salão.

Então, ela viu Patrick e Maeve e quase tropeçou.

— Você não me disse que seus pais também vi­riam — sussurrou ela no ouvido de Daniel, sentindo-se novamente com dezoito anos e indefesa.

— E isso é um problema? — respondeu ele.

— É — disse ela, entre dentes.

— Por quê?

— Porque eles não gostam de mim.

— Não seja ridícula.

Amanda engoliu em seco e começou a sentir uma

espécie de claustrofobia. Ela não pertencia àquele ambiente. Jamais havia pertencido.

— Daniel, meu querido! — falou uma mulher de cerca de sessenta anos, com diamantes que seriam su­ficientes para saldar a dívida externa, beijando Da­niel nas bochechas.

Ele sorriu e apertou-me a mão.

— Sra.Cavalli!

— Eu vi sua mãe no sorteio da Sociedade Humani­tária na semana passada.

— Ouvi dizer que foi um sucesso.

— Foi mesmo.

O olhar da Sra. Cavalli recaiu sobre Amanda. Daniel pousou a mão nas costas dela.

— Esta é minha amiga. Amanda, Sra. Cavalli.

Ela estendeu a mão para cumprimentá-la.

— Prazer em conhecê-la.

— Vai ao chá do hospital das crianças, querida?

A advogada olhou para Daniel.

— Ela trabalha durante o dia — respondeu ele.

A Sra. Cavalli arregalou os olhos.

— Ah, entendo...

— Amanda é advogada.

— Isso é adorável, minha querida. Quem sabe em uma outra oportunidade?

— Quem sabe? — retrucou Amanda. A Sra. Cavalli fez um aceno.

— Vou procurar por Maeve.

— Foi um prazer revê-la — disse Daniel.

— Daniel? — era uma voz forte, vinda de um ho­mem grisalho de smoking, que lhe estendia a mão.

— Senador Wallace! — cumprimentou Daniel.

— Você acompanhou a oscilação do preço do petróleo esta tarde? — perguntou Wallace. — Nós te­mos de perfurar no Alasca. Quanto mais rápido, me­lhor.

— E quanto às medidas de conservação?

Mostre-me um milionário disposto a desligar o ar-condicionado e eu lhe mostrarei um liberal democrata disposto a apoiar Adam Simpson — respon­deu o senador, rindo com gosto.

Amanda sorriu, apesar de não ter entendido a pia­da.

Ela apertou o braço de Daniel, que rapidamente desviou a atenção de Wallace.

— O senhor se lembra de Bob Solomon? Ele foi um grande apoiador da campanha de Nixon — disse Daniel. — Bob, venha cá cumprimentar o senador.

Os dois entabularam conversa e Daniel aproveitou para tirar Amanda de lá.

— Vamos embora daqui — sugeriu ele.

— Vamos lá para cima.

— Lá para cima? Amanda olhou para ele.

Ela havia planejado beber alguma coisa antes do momento fatídico, porém sabia que não ia conseguir agüentar mais aquela festinha.

— Eu tenho uma confissão a fazer.

— Diga.

— Eu reservei um quarto.

— Você o quê?

— Eu... —- Espere. Droga! — Ele soltou o braço dela e a virou. — Continue andando. Não olhe para trás.

— São os seus pais?

— Não! Meu Deus, Amanda. Eles gostam de você.

— Não gostam não.

Ele a conduziu rapidamente para um canto onde se esconderam. As cortinas valorizavam as portas de vi­dro que conduziam a uma varanda que dava para a Quinta Avenida. Tinha começado a chover, por issonão havia ninguém do lado de fora. As gotas de água na vidraça borravam a visão das luzes da cidade, es­curecendo o cantinho isolado.

— De quem foi que escapamos? — perguntou ela.

— De Sharon.

Amanda ficou sem fala. Eles estavam se escon­dendo da ex-mulher dele? Por quê?

— Tem sido muito difícil lidar com ela.

A advogada deu alguns passos para trás.

— Se você ainda sente alguma coisa por ela... Daniel estendeu a mão a tempo de detê-la.

— Não sinto nada por ela — respondeu Daniel. — O problema é que ela é espalhafatosa e imprevisível, e eu não queria que ela a insultasse.

— Me insultar?

Ele se aproximou ainda mais dela, com a voz cada vez, mais grave.

— Esqueça Sharon. Vamos voltar àquela parte em que você reservou um quarto.

O coração de Amanda deu uma cambalhota. Ela respirou fundo. Aquilo ia ser mais difícil do que havia imaginado.

A voz dele se transformou em um sussurro. - Eu já aluguei um quarto aqui certa vez.

— É mesmo? — respondeu ela, entrando no jogo. Os olhos dele brilhavam.

— Havia uma festa de formatura e eu me dei mui­to, muito bem.

Amanda baixou a cabeça e ficou olhando para o peito de Daniel.

— Ei. Será que você está me fazendo uma propos­ta indecorosa?

A mulher assentiu lentamente.

— Estou.

Um sorriso largo iluminou o rosto de Daniel.

— Eu aceito.

Ele acariciou seu rosto e inclinou a cabeça para beijá-la.

Amanda se esticou para alcançá-lo, com os mús­culos tensos e todo o corpo vibrando de desejo.

Os lábios dele tocaram os dela, e suas pernas fra­quejaram. Ele abriu a boca, acariciando-lhe com a ponta da língua. O pulso dela acelerou, e seus corpos se fundiram em um calor delicioso.

As mãos de Amanda se entrelaçaram atrás do pes­coço dele, e ela colou o corpo ao dele enquanto ele , lhe enlaçava a cintura, segurando-a com firmeza.

O beijo se aprofundou e prolongou. O barulho da chuva ecoava em seus ouvidos.

— Mandy... — sussurrou ele.

Daniel beijou-a mais uma vez e agarrou suas náde­gas, colando-a ao seu corpo, de modo que ela pudesse sentir o quanto estava excitado.

— Daniel... — devolveu ela, em um gemido.

— Uh, hum!

Uma voz masculina soou por trás dela. Amanda viu o senador, Sharon e outras duas pessoas olhando para eles em um silêncio constrangedor.

 

Os olhos de Sharon brilhavam. Sua boca havia se transformado em um traço fino e raivoso. O senador parecia estar se divertindo. Ele fez uma rápida sauda­ção e foi embora. Já os Willkinsons tiveram a grande­za de desaparecer em meio à festa. Sharon avançou sobre eles.

— Você perdeu a cabeça?

— Isso é mesmo necessário? — perguntou Daniel, mantendo o braço em torno de Amanda.

— É necessário sim. O que foi que eu lhe pedi?

Amanda fez menção de ir embora.

— Acho melhor...

— Você não vai a lugar algum — ordenou Daniel.

Ela arregalou os olhos.

— Espere, por favor. E, Sharon, volte para o salão.

— De jeito nenhum. Eu vou virar a piada da festa.

— Só se você agir de modo que favoreça isso.

— Você acha que essa história ainda não circulou pelo salão dezenas de vezes?

Mas só faz três minutos que nós viemos para cá. Ela ergueu o dedo em riste.

— Foi você quem criou essa situação, e é você que vai me tirar dela.

— Não seja melodramática.

— Você vai dançar comigo.

— O quê?

— Eu estou falando sério, Daniel. Trate de me ti­rar para dançar para que todos nos vejam conversan­do e rindo juntos.

— De jeito nenhum.

— Você me deve isso.

— Eu não lhe devo nada.

Amanda conseguiu se desvencilhar dele.

Ele não podia culpá-la. Quem poderia suportar tes­temunhar a briga de um casal recém-divorciado?

Daniel se deu conta de que teria de neutralizar Sharon se quisesse continuar com Amanda.

— Está bem — concordou ele, voltando-se então para Amanda. — Isso só vai levar um minuto. Você pode me encontrar lá na estátua?

— Claro — disse ela, dando de ombros, com uma expressão enigmática no rosto.

Sharon o agarrou pelo braço e ele a seguiu até o salão de dança. A meio caminho do salão, porém, Daniel viu Amanda indo embora.

Ele largou Sharon e saiu correndo atrás dela.

— Amanda! — Ele conseguiu alcançá-la na meta­de do corredor. — O que você está fazendo?

— É melhor você voltar para a festa, Daniel. Não vai querer que as pessoas fofoquem sobre você.

— Não me importo com as fofocas.

Ele havia acabado de deixar Sharon plantada no meio do salão. Já não haveria como evitar o falatório.

— Você se importa sim — retrucou ela.

— Eu só estava tentando me livrar de Sharon.

— Dançando com ela?

— Você viu o que aconteceu.

— Eu vi o que aconteceu.

— Então você sabe...

— Que me largou em nome das aparências?

— Não foi nada disso.

Ele não se importava com o que as pessoas pode­riam dizer. Só queria tirar Sharon do caminho.

— Foi exatamente isso. Não que eu alguma vez ti­vesse esperança de que poderia ser diferente.

Ela balançou a cabeça e recomeçou a andar.

— Amanda!

— Isso tudo foi um erro, Daniel.

— O que foi um erro?

— Você, eu, nós. Pensar que poderíamos ter o me­lhor dos dois mundos.

O editor não compreendeu.

— Como assim, o melhor dos dois mundos?

— Não importa.

— Importa sim. Você reservou um quarto. Nós te­mos um quarto só para nós.

Ela revirou os olhos.

— Claro. Vamos nos esconder lá em cima... E se o senador nos vir? E se os seus pais nos virem?

— Eu não me importo.

— Importa-se sim.

Daniel a pegou pelo braço.

— Vamos lá. Você e eu. Lá para cima. Agora.

— Nossa, é o convite mais romântico que eu já re­cebi na minha vida! — disse ela, soltando o braço.

Daniel cerrou os dentes.

O porteiro abriu a porta de vidro.

— Boa noite, Daniel — despediu-se Amanda.

Daniel não teve outra opção a não ser vê-la partir.

— Bom dia — disse Cullen, entrando no escritório do pai. — Soube que você esteve com a mamãe.

— Como foi que você soube disso?

Ele já estava tentando falar com Amanda havia trinta e seis horas.

— A tia Karen contou para Scarlet, que conto para Misty.

— As fofocas correm rápido nesta família. Cullen puxou uma cadeira.

— Como foi?

Daniel fechou a cara. Ele estava fulo com Sharon e um pouco bravo com Amanda.

— O que foi? — perguntou Cullen, vendo a ex­pressão do pai. — Não quero saber dos detalhes ínti­mos. Mamãe vai contar tudo para a tia Karen, e eu vou acabar sabendo de qualquer jeito.

— Onde está o relatório de vendas semanal?

Cullen se retraiu.

— Você quer falar de negócios?

— Nós estamos no escritório, não estamos?

— Mas...

— Como acabou a história com Guy Lundin?

Aquele caso da falsa alegação de doença o impor­tunou durante toda a semana. Não que ele quisesse adotar o estilo de trabalho de Amanda. Só queria compreender o que havia acontecido e descobrir como evitar que isso se repetisse no futuro.

— Por acaso está querendo me dizer que o fato de lhe perguntar sobre a mamãe no horário de traba­lho pode ser comparado ao que ele fez?

— Depende de quanto tempo você vai se ater ao assunto. Ele foi demitido?

— Eu vou falar com o RH esta tarde.

— O que lhe diz a sua intuição? O filho parecia confuso.

— Ora, você já dispõe de todos os dados que pude­mos comprovar.

Podia ser, mas ele continuava ouvindo a voz de Amanda perguntando-lhe o quanto ele realmente co­nhecia seus empregados.

— E quanto aos não-comprovados?

— Nada relevante.

— Existe algum?

— Bem, Guy Lundin afirma que estava levando a mãe para uma clínica de oncologia.

— Alguém da equipe checou essa informação?

— Não havia motivo para isso.

— Como não?

— Nossos empregados não têm direito a dispensa pura levar familiares a consultas médicas.

— E como é que eles fazem, então? Daniel havia saído com Amanda durante o horário de trabalho. Ele havia encomendado flores para ela durante o horário de trabalho. Se ela tivesse ficado doente, ele com certeza a teria levado ao médico durante o horário de trabalho.

— A respeito de quê? — perguntou o filho.

— Consultas médicas de familiares. Emergências.

Cullen ergueu as mãos.

— Eu não sei.

— Bem, talvez devêssemos pensar nisso. Você acha que a mãe de Guy está mesmo doente?

— Ele não costuma faltar. Só deixou de vir uma vez no ano passado, e duas no ano anterior.

— Vamos deixar isso de lado — disse Daniel, guardando a carta que deveria assinar.

— Mas a minha reunião...

— Cancele. Dê uma chance ao rapaz.

— E o que vai acontecer da próxima vez que um empregado quiser levar um familiar ao médico?

— Boa pergunta.

— Obrigado.

Daniel acionou a comunicação interna.

— Nancy?

— Sim?

— Nós temos uma cópia do regulamento?

— Temos. Quer que eu a leve aí?                      

— Ainda não.                                                  

— Tudo bem.                                                   

Cullen se curvou para a frente.

— O que é que você está fazendo?

— Respondendo à sua pergunta.

— Quer ver o relatório de vendas agora? Daniel levantou e relaxou os ombros.

— Não. Você cuida disso. Avise-me se houver al­guma coisa que eu precise saber.                              

— Tem certeza?                                                  

— Você é um gerente de vendas muito eficiente.Eu já lhe disse isso alguma vez?

— Pai?

Ele saiu de trás da mesa e deu um tapinha no ombro do filho.

— Você é realmente muito bom nisso.

— Você está bem?

— Não — disse ele, conduzindo Cullen até a por-lii. — Mas estou me esforçando para ficar.

Cullen olhou para o pai com estranheza, porém se deixou levar até a recepção.

Depois que ele foi embora, Daniel parou do lado dii mesa de Nancy.

— Será que você pode fazer uma pesquisa? Nancy pegou papel e caneta.

— Claro.

— Descubra se as companhias do mesmo porte que a nossa dispensam seus empregados para tratar de assuntos familiares.

— Assuntos familiares?

— Se eles têm direito de faltar quando é preciso levar alguém da família ao médico.

— Isso tem alguma coisa a ver com Guy Lundin?

— Você é realmente muito esperta — brincou Da­niel.

— Vou tratar disso agora mesmo — disse ela. Daniel já entrava sala quando resolveu voltar.

— Como vai sua família? I Ia estranhou a pergunta.

— Eles estão bem.

— Seus filhos estão agora com...

Sarah tem nove e Adam, sete.

— Certo. Eles gostam da escola?

— Sim...

Daniel assentiu.

— Isso é bom.

Ele tamborilou na mesa dela antes de voltar para o seu escritório.

Sarah e Adam. Tinha de anotar isso em algum lu­gar.

Daniel reclinou-se na cadeira e pegou o fone.

— Escritório de Amanda Elliot.

— Olá, Julie. É Daniel.

— Tenho ordens para não passar suas ligações.

— Eu imaginei.

— Quer me subornar? Ele riu. Estava gostando cada vez mais dela.

— O que preciso fazer?

— Que tal uma caixa daqueles chocolates maravi­lhosos que Amanda trouxe outro dia?

— Vão estar na sua mesa em uma hora.

— Amanda pode falar com você agora mesmo — disse ela, transferindo a chamada.

— Amanda Elliot.

— Sou eu. Silêncio.

— Eu segui o seu conselho hoje. Ele ficou esperando.

— Que conselho?

Bingo!

— Encomendei uma revisão do regulamento.

— Encomendou?

— E, pedi à minha secretária para pesquisar. A propósito, os filhos dela se chamam Sarah e Adam.

— Você teve de ir atrás dessa informação, não foi?

— O que importa é que eu descobri.

— Certo. Eu vou lhe dar um crédito por isso.

Ele aproveitou a deixa.

— Saia comigo de novo, Amanda.

— Daniel...

— Para onde você quiser. Qualquer coisa.

— Isso não vai dar certo.

O pânico ameaçou tomar conta dele.

— Você não tem como prever isso. O que é que a sua intuição está lhe dizendo, Amanda?

— A minha intuição?

— É, o seu instinto. Esqueça a lógica...

— Esquecer a lógica?

— Deixe-se levar pela emoção, Amanda. Você também pode seguir o meu conselho.

A voz dela ficou mais suave.

— Isso não é justo, Daniel...

Ele usou o mesmo tom que ela.

— E quem foi que falou em justiça? Amanda suspirou.

— Qualquer lugar?

— Qualquer um.

— Um piquenique. Na praia.

— Domingo às cinco. Ela ainda hesitou por alguns instantes.

— Está bem.

— Eu pego você.

— Nada de limusines.

— Prometo.

Amanda só especificou que ele não poderia vir de limusine, mas não disse nada sobre helicópteros.

Eles pousaram no heliporto da casa de praia de um amigo de Daniel que estava em Londres. Era uma praia particular, e o proprietário havia colocado seus empregados à disposição deles.

Aquilo, porém, não se parecia em nada com o que Amanda tinha imaginado.

Uma mesa redonda fora posta sobre uma faixa lisa de areia entre as ondas revoltas e o penhasco rochoso. A toalha branca balançavam ao sabor da brisa. A mesa estava decorada com um belo arranjo de flores, lamparinas, cristais e porcelana chinesa, e ao lado dela um maitre esperava para servi-los.

Daniel pegou uma das cadeiras dobráveis e fez um gesto para que ela se sentasse.

— Pedi que iniciassem serviços com o pôr-do-sol.

— Isso é um piquenique?

O maitre se pôs em ação logo que ela se sentou.

— Nós vamos começar com margaritas — disse Daniel, acomodando-se à sua frente, do outro lado.

— Margaritas?

— Se você preferir, podemos providenciar...

— Eu gosto de margaritas. O problema é que...

— Sim?

— Isto não é um piquenique.

— Como assim?

— Um piquenique significa frango assado, torta de chocolate, toalha xadrez, formigas, vinho barato em copos de plástico.

— Agora você já está de má vontade. Todo mundo bebe margaritas na praia.

— Nos resorts, mas ninguém leva um liqüidifica­dor para um piquenique! Não haveria onde ligá-lo!

— Relaxe. O barman está preparando tudo dentro de casa.

As bebidas foram servidas logo em seguida. Esta­vam deliciosas, embora não tivessem nada de rústico.

— Vamos começar com um coquetel de camarão.

— Pare de tentar me impressionar. Ela. não tinha ido até lá para ver o dinheiro de Da­niel, mas sim para se encontrar com ele.

— Mas isto é um encontro. Por que razão eu não deveria tentar impressioná-la?

Talvez fosse hora de dizer a ele que ela já estava devidamente conquistada. Amanda estava determinada a chegar até o verdadeiro Daniel e fazer amor com ele antes do fim da noite.

— O que foi? — perguntou ele, vendo seu sorriso.

— Eu estava pensando no regulamento.

— Nancy fez um ótimo trabalho. Nós vamos enviar uma proposta ao papai.

— Você vai propor a inclusão de dispensa para tratar familiares doentes?

— Nós vamos tentar. Ele deu um gole na margarita.

O que o fez mudar de idéia?

— Quanto a enxergar os meus empregados como humanos de carne e osso?

— Sim.

— Você, é claro.

— Obrigada.

— Você tanto fez, tanto fez...

— Você me faz parecer insistente desse jeito.

Ele sorriu.

— Eu diria persistente.

— Assim como você.

— Ah, mas eu cedi.

Era verdade. Daniel fez um grande esforço para enxergar as coisas a partir do seu ponto de vista, en­quanto ela não tinha feito qualquer concessão.

As ondas ficaram mais agitadas e as gaivotas pas­saram em bando pelo céu.

Amanda tirou o cabelo do rosto.

— O que foi? —perguntou Daniel.

Ela balançou a cabeça e voltou a sorrir.

— Nada. Conte-me sobre a disputa pela presidên­cia da editora. Você acha que vai ganhar?

Daniel deu de ombros.

— Estamos vendendo muitas assinaturas pelo site.

— Ainda faltam quatro meses.

— Mas a Charisma sempre vendeu muito bem em dezembro.

Amanda assentiu, brincando com sua taça.

— Você vai ficar muito desapontado se perder?

— E claro. Eu jogo para ganhar.

— Eu sei, mas afora essa questão de ego.

— Isso não é uma questão de ego.                    

— Ora, Daniel! — Amanda riu.Ele parecia genuinamente confuso.                    

— O que foi?

— Você está querendo me dizer que conseguir o posto é mais importante para você do que vencer?

— Não estou entendendo o que você quer dizer. É tudo a mesma coisa.

— Não, senhor. São duas coisas diferentes.

— Como assim?

— Tire o paletó.

— O quê?

— Você ouviu muito bem.

Ao ver que ele não se mexia, Amanda se aproxi­mou da cadeira. Ela estava com as mãos na lapela do paletó dele quando um prenuncio de chuva se fez.

— O que você está fazendo? — perguntou Daniel.

Amanda começou a baixar-lhe o paletó.

— Estou tirando as camadas.

— Que camadas?

— Aquelas que mascaram o verdadeiro Daniel.

— Mas eu sou o verdadeiro Daniel.

— Como é que você tem tanta certeza? — retrucou manda, puxando sua manga.

— Porque eu tenho sido verdadeiro sempre.

Ela voltou sua atenção para a gravata de Daniel.

— E o que é que o seu verdadeiro eu quer?

— Você! — respondeu o ex-marido. Aquela era uma bela resposta.

— Eu quis dizer profissionalmente. Quero ser o presidente da Editora Elliot.

Não sei por que acha tão ruim que eu deseje estar no topo de uma firma na qual trabalhei toda a vida.

Ela o puxou pelo colarinho.

— Porque eu acho que a sua família andou colo­cando coisas na sua cabeça durante todos esses anos, fazendo você acreditar que queria aquilo que, na ver­dade, eram eles que queriam que você fizesse.

— Como o quê, por exemplo?

Amanda jogou a gravata sobre a mesa.

— Eu!

Daniel olhou para ambos os lados.

— Eu não estou vendo ninguém aqui da minha fa­mília me obrigando a ficar com você.

— Mas eles o induziram a se casar comigo.

— Você estava grávida.

— Eles o convenceram a ficar na editora.

— Nós precisávamos do dinheiro.

— Eles lhe disseram para permanecer no país.

— Eu fiquei aqui por sua causa.

— Ficou aqui porque eles lhe disseram para ficar. De quem foi a idéia de você se casar com Sharon?

— Minha — respondeu ele, vacilante.

— De quem foi a idéia de você disputar o cargo de presidente da editora?

O ex-marido ficou olhando para ela.

— O que é que você quer, Daniel?

Os trovões ecoaram mais perto desta vez. Raios riscaram o céu escuro, enquanto as primeiras gotas d' chuva molhavam a areia.

Daniel voltou-se para o maitre.

— Diga-lhes para trazer o toldo, Curtis. Amanda pulou do seu colo.

— Não!

— O quê?

— Nada de toldos.

— Por que não?

— Camadas, Daniel, camadas... Ele olhou para ela.

— Você por acaso perdeu o juízo?

Amanda se aproximou dele.

— Pode mandá-lo embora?

— Acha que estarei seguro aqui com você?

— Talvez. O editor hesitou ao ouvir outro trovão.

— Pode entrar, Curtis. Está tudo bem. Curtis fez um meneio e seguiu para a casa.

— Então, vamos ficar aqui fora e nos molhar?

— Isso mesmo. A vida não é organizada, Daniel. É melhor ir se acostumando.

— Posso ao menos recolocar o paletó?

— Não.

— Você quer usar? A chuva começou a engrossar, e Amanda a recebeu-a de braços abertos.

— Não.

— O jantar está perdido — disse ele.

— Nós podemos pedir uma pizza depois.

— E o que é que vamos fazer agora?

— Agora? — disse ela, pulando de novo no seu colo. Tirando o cabelo molhado do rosto dele e passando os braços em torno de sua camisa molhada.

— Agora nós vamos fazer amor.

 

Daniel olhou para o cabelo molhado de Amanda, ablusa colada a seu corpo e suas calças largas.

Havia imaginado aquele momento pelo menos um milhão de vezes, mas, em sua fantasia, havia sempre uma cama, lençóis de cetim e champanhe.

— Aqui?

— Sim. — Ela riu. — Aqui mesmo.

— Você vai ficar resfriada.

— Não me importo.

— Alguém pode nos ver — disse ele, olhando para os iates na baía.

— Está com medo de sair nas capas das revistas? .

— Não seja ridícula, Amanda.

— Beije-me, Daniel. Ele olhou para sua boca molhada. Aquilo era tentador. Muito tentador.

— Você vai ficar cheia de areia.

— Eu vou sobreviver a isso. Daniel queria que aquele momento fosse memorável, perfeito, um momento que ela guardasse par sempre como algo muito especial.

— Nós podemos entrar, pelo menos?

Amanda beijou-lhe a boca rapidamente. —- De jeito nenhum.

Ela estava mais sexy do que nunca

— Amanda... — gemeu Daniel, protestando. — Aqui e agora, expostos à chuva, ao frio, à areia com risco de sermos vistos pelos voyeurs dos iates.

— Eu não me lembro de você desse jeito — mur­murou ele, enquanto dava início a um novo beijo.

— Você não devia estar prestando atenção -— sussurrou, abrindo os botões de sua camisa.

Ele retribuiu, deslizando as mãos por dentro da blusa dela.

— Ah, devia sim — respondeu ele, respirando profundamente. — Eu me lembro de cada centímetro de sua pele.

— De cada centímetro? Cada um deles. Quer vê-los novamente?

Ele lançou um olhar preocupado para os barcos em pleno mar agitado. Estava ficando muito escuro.Porém, Curtis não enviaria ninguém da equipe de volta à praia, a menos que ele o chamasse.

— Quero — respondeu Daniel, tomando a única decisão possível. — E como quero.

Amanda afastou as pernas de modo a montar sobre ele. Sorriu maliciosamente e tirou a blusa, exibindo os seios.

Um raio brilhou, iluminando sua pele. O mundo parou ao seu redor. Incapaz de se conter, ele se curvou para a frente e beijou um seio, depois o outro, sentindo o sabor da pele delicada, provocando-a com língua, extraindo o máximo daquele momen­to, desfrutando das mais incríveis sensações.

Impacientemente, ele a deitou sobre seu paletó, tirando as próprias roupas para depois se deitar com ela, sobre a proteção da toalha de mesa.

Ela sorriu ao vê-lo nu, acariciando todo o seu cor­po com o olhar. Estendeu então as mãos na direção dele e enterrou os dedos em seu cabelo úmido, puxando-o para um longo e intenso beijo.

As gotas de chuva praticamente evaporavam em contato com sua pele aquecida. Ela era a mulher mais sexy da face da Terra. Daniel estava tendo de se controlar muito para não tomá-la imediatamente.

— Senti a sua falta — admitiu ela.

Ele parecia que ia explodir. Segurou-lhe o rosto e beijou seus doces lábios, absorvendo o sabor e deleitando-se na sensação de tê-la de novo em seus braços.

— Oh, Amanda. Isto é tão... Real?

Ele assentiu.

O cabelo dela estava todo embaraçado, cheio de areia. Sua maquiagem estava borrada e gotas de chuva respingavam em seu rosto e, no entanto, não havia mulher mais linda do que ela no mundo,

— Eu me lembro.

— Eu também. Lembro que você era maravilhoso, lembro que você era linda.

Amanda apertou os braços com força. -Quero você. Agora.

— Ainda não. Não havia nada que Daniel quisesse mais no momento, e nada o impediria de fazê-lo, mas tinha de fazer aquele momento perdurar. Ainda teria muitas

noites solitárias pela frente depois desta, e queria guardar ardentes lembranças que o confortassem no futuro.

Sabia que estava sendo egoísta, mas simplesmente não tinha como evitar.

Daniel colocou a mão em concha sobre o seio dela sentindo o mamilo enrijecido. Amanda gemeu.

— Gosta? — perguntou ele.

— Sim...

Ele roçou o polegar sobre o bico do seio e ela pressionou a ponta dos dedos contra o seu corpo.

Sua reação era puro combustível para o fogo. Daniel deixou as mãos e os lábios vagarem livremente, fazendo-a arfar de excitação, deleitando-se com sua habilidade de lhe proporcionar prazer.

Daniel traçou uma linha com a ponta dos dedos a longo de suas coxas, até encontrar a fonte de todo calor. Amanda soltou um gemido alto quando ele massageou a sua região mais sensível, que latejava de desejo à espera dele. Ela ergueu os quadris, ansiosos por recebê-lo dentro de si.

— Oh, Daniel...

— Eu sei — disse ele, para então beijá-la profundamente — Eu sei. Entregue-se.

A mulher respondeu correndo os dedos por seu peito, seus mamilos, seu umbigo e abdômen, enviando ondas de prazer para todo o corpo de Daniel.

Suas mãos pequenas e frias foram mais além, agar­rando o seu membro, acariciando-o, incitando-o.

Daniel se deitou sobre ela.

— Agora... — pediu ela novamente.

Sua única resposta foi um gemido gutural. Ele afastou suas coxas, beijando-a, enquanto entrava pouco a pouco dentro dela, lentamente.

Amanda gritou o nome dele, soluçando descontroladamente.

Ele quase gritou "eu te amo", mas aquela não era ii hora para isso.

Amanda — sussurrou ele, acelerando o ritmo de seus movimentos.

Daniel acariciou-lhe o seio e ela se agarrou aos mãos dele, enterrando as unhas na pele. Ela jogou a cabeça para trás e fechou os olhos. Trovejava, e as ondas batiam na praia com todo o seu furor.

Nem mesmo uma armada inteira de paparazzi poderia detê-lo agora. Ela era sua. Depois de todos esses anos, era sua novamente.

Amanda mordeu os lábios inferior e sua respiração se tornou ainda mais irregular. Ele podia senti-la, cada vez mais agitada, enlouquecida.

Ele esperou, esperou, esperou...

Daniel! — gritou ela, e ele então se deixou levar.

Os raios riscaram o céu e a terra tremeu quando ele a levou ao clímax.

Quando tudo acabou, os dois permaneceram, arfantes, nos braços um do outro. Daniel estava apoia­do nobre os cotovelos, usando o calor de seu corpo para mantê-la aquecida.

Ele beijou sua testa e ficou ao lado dela. Sabia que tinham de se levantar, vestir-se e entrar na casa, mais simplesmente não conseguia se convencer a se desvencilhar dela.

Amanda sorriu, ainda de olhos fechados.

— Eu amo a espontaneidade.

Seu coração se agitou por um momento ao ouvir aquelas palavras, mas ele rapidamente se deu conta de que ela não havia feito uma declaração de amor.

— E o que a faz pensar que eu não planejei isso? — provocou ele.

A advogada abriu os olhos imediatamente.

— Não é verdade!

— É claro que é.

— Daniel, você não planejaria uma coisa dessas,

— E o que é pior, você também planejou isso!

— Imagine!

— Está tentando me convencer de que não estava determinada a fazer amor comigo esta noite?

— Eu não sabia quando, nem como.

— Nem por isso deixa de ser um plano. Amanda sentiu um arrepio quando o vento frio soprou em seu corpo e as gotas de chuva, agora um pouco mais branda, caíram sobre sua pele quente.

— Não. É apenas uma idéia.

— Pura semântica.

— Filosofia.

Ele riu.

— Admita que a sua filosofia não é tão diferente da minha — disse ele, rindo.

— Você acha?

— Pois então por que é que você quer se tornar o presidente da Editora Elliot.

Daniel pegou sua camisa, sacudiu a areia e cobriu-se com ela.

— Porque eu quero um escritório de esquina.

— Você já tem um escritório de esquina.

— Mas esse fica no vigésimo terceiro andar.

— Argumento fraco, Daniel, muito fraco.

— Você está fazendo isso parecer mais importante do que realmente é. Ela balançou a cabeça.

— Não estou não. Foi o seu pai quem lhe disse para lutar pela presidência.

— Eu estou na disputa porque quero o cargo, e não porque alguém me disse para querê-lo.

Apesar de não admitir, porém, ele ponderou a res­peito do que ela tinha dito. Será que ele teria pensado em ser o presidente da editora se seu pai não estabelecesse aquela disputa? Ele entrou de cabeça naquela competição junto com os irmãos, mas nunca parou para analisar as coisas direito.

Amanda continuou desafiando-o.

— Conte-me qual foi a última coisa que você desejou que não foi sugerida por outra pessoa.

— A mudança no regulamento.

— Ah, isso não foi idéia sua.

— Não especificamente.

— Você se lembra da festa de formatura?

— Em detalhes.

— E lembra-se dos planos que você tinha de fazer uma revista sobre aventuras?

— Claro.

Ela passou a ponta do dedo sobre o seu braço aquecendo todo o seu corpo.

— Aquele era você, Daniel. Aquela idéia era sua.

Daniel assentiu, achando que aquele argumento, na verdade, dava razão a ele.

— E o que foi que aconteceu? — perguntou ela.

— Que pergunta mais tola. Bryan aconteceu. Você aconteceu.

—Você nunca pensou em como as coisas teriam sido se tivesse seguido o seu plano original? O editor desviou o olhar.

— Não — mentiu ele.

— Nunca?

— Que sentido tem isso agora?

Ela se sentou, deixando cair a camisa.

— Todo o sentido do mundo. Sempre me perguntei o que aconteceria se eu mandasse Patrick para o inferno.

— Como assim?

— Ah, você sabe. Se eu tivesse decidido ir aos tribunais para brigar pela guarda de Bryan. Nenhum juiz negaria isso a uma mãe, mesmo naquela época.

A garganta de Daniel secou. Ele balançou a cabeça, sem poder acreditar no que estava ouvindo.

— Patrick ameaçou tirar Bryan de você? — perguntou ele, com a voz embargada.

— Você não...

O editor se levantou imediatamente, deu alguns passos e passou a mão pelos cabelos molhados.

— Meu pai ameaçou tirar o Bryan de você?

— Isso já faz muito tempo. Eu achei que você...

Daniel cerrou os punhos e todos os músculos do seu corpo se tencionaram.

— Você achou que eu sabia disso?

A manda assentiu e então balançou a cabeça.

— Sinto muito. Eu não devia ter trazido esse assunto à tona.

— Você tem razão, não faz sentido ficar usando em termos hipotéticos.

Ele respirou fundo, tentando se acalmar. Estava tudo claro agora. Nada do que aconteceu tinha sido culpa dela. Amanda tinha sido obrigada a se casar.

Isso explicava muita coisa. Ela ficou ao seu lado como uma prisioneira por causa do filho. Era surpreendente que aquilo tivesse durado tanto tempo.

Daniel compreendeu que Amanda tinha razão. Patrick era mais perigoso do que havia imaginado.

Será que ele mesmo queria se tornar o presidente da editora? Aquela, no entanto, não era uma pergunta que ele poderia responder naquele momento, muito menos enquanto Amanda tremia de frio na praia.

— Sou eu quem lhe deve desculpas — disse ele, murmurando suavemente. — Meu pai jamais deveria ter feito uma coisa dessas. Eu não sabia que você tinha sido chantageada.

Amanda estremeceu em seus braços.

— Isso já faz muito tempo.

Ela assentiu, beijando sua testa.

— Já faz muito tempo...

A mulher ergueu o queixo para olhar para ele.

— Nós podemos fazer coisas espontâneas nova­mente um dia desses?

— A qualquer hora. Em qualquer lugar! Seus lábios se curvaram num sorriso radiante.

Daniel cerrou os dentes ao cruzar o escritório do pai, às oito tia manhã de segunda-feira. Ele tinha pen­sado em confrontá-lo na noite anterior, mas não quis fazê-lo na frente da mãe.

— Olá, Daniel — saudou a secretária de Patrick.

— Eu preciso vê-lo — disse Daniel. — Agora.

— Temo que isso não seja possível.

— Olhe bem para mim. Agora.

A Sra. Bitton olhou-o por sobre os óculos.

— Olhe bem para mim você. Ela costumava intimidá-lo, mas não neste dia.

— Arranque-o de onde quer que ele esteja! A mulher deu um sorriso meio debochado.

— Acho que isso não seria uma boa idéia.

— Não me importo com o que ele esteja fazendo

— Ele está sobrevoando o Texas.

— E quando é que ele chega?

— Ele estará aqui às duas da tarde, mas já tem um reunião marcada com o diretor de arte.

— Pois então, reagende.

— Daniel...

— Olhe bem para os meus olhos, Sra. Bitton.

A secretária se deteve.

— Eu posso adiar a reunião para duas e meia.;|

— É o bastante para mim.

Amanda sabia que não haviam se passado nem doze horas desde que eles tinham deixado a praia, mas Daniel tinha dito "a qualquer hora, em qualquer lugar", e ela resolveu não perder mais nenhuma oportunidade de tirá-lo de seu mundinho.

Ela parou na mesa de Nancy carregando uma saco­la da Buster Burgers.

— Ele está livre?

Nancy ergueu os olhos e sorriu para Amanda. Ela acionou a comunicação interna.

— A Sra. Elliot está aqui.

Houve silêncio do outro lado.

— Certo — respondeu Daniel, abruptamente.

A secretária fez sinal para Amanda entrar.

— Não se preocupe. Ele está tendo uma manhã difícil. Você, com certeza, irá animá-lo.

Daniel desviou o olhar de seus papéis.

— Amanda?

— Quem é que você estava esperando?

Ele balançou a cabeça e se levantou.

— Nada, ninguém. Que bom que você veio. Eu trouxe o almoço.

Daniel olhou para a sacola e desconfiado.

Buster Burgers?

— Você já experimentou?

— Nunca. A advogada colocou a sacola sobre a mesa.

— São maravilhosos.

— Ele olhou para a porta.

— Você a trancou?

— Tranquei... — disse, passando os dedos por sua gravata prateada. — Você disse a qualquer hora...

Daniel ficou boquiaberto e a deteve.

— Amanda...

Ela sorriu.

— Este é um lugar qualquer, e esta é uma hora qualquer, e eu vim aqui atrás de espontaneidade.

— Certo...

Amanda balançou a cabeça e libertou as mãos, de­satando o nó da gravata dele.

— Você enlouqueceu?

— Não.

— E se alguém...

— Você tem de confiar um pouco mais na Nancy.

— Mas...

Ela passou a língua pelo contorno dos lábios dele e minou no fundo de seus olhos azuis.

— Eu tenho pensado em transar com você na mi­nha mesa de trabalho desde a primeira vez em que você foi ao meu escritório.

Daniel não conseguiu dizer uma única palavra. Ela tirou-lhe a gravata e começou a abrir os botões de sua camisa.

— Você quer os hambúrgueres antes? — pergun­tou ela, inclinando-se para dar um beijo quente e mo­lhado em seu peito. — Ou quer a mim primeiro?

O homem soltou um som que era metade gemido e metade palavrão, enlaçando sua cintura com força.

— Nós podemos ser rápidos — garantiu ela. — Eu não estou usando nada por baixo desta saia.

Daniel inclinou a cabeça para beijar sua boca. Um desejo incontrolável tomou conta dele.

Amanda tirou a camisa dele do caminho, deleitando-se com a sensação de sua pele quente contra a sua contra seus dedos.

Ele a segurou com firmeza, en­quanto a outra mão serpenteava por sua coxa.

Daniel soltou um gemido quando alcançou suas nádegas desnudas. Ergueu-a e colocou-a então sobre a mesa, levantando a saia sem interromper o beijo.

— Meu Deus, o que você está fazendo comigo...

Murmurou ele enquanto a acariciava, fazendo-a se contorcer sobre a madeira lisa.

— E o que você está fazendo comigo? — pergun­tou ela, arfando, com o rosto enterrado em seu pesco­ço, inalado seu perfume.

— Acontece que eu estou um pouco ocupado no momento. — Seus dedos desceram por entre as per­nas dela, provocando-a, excitando-a. — Não estou bem certo se esta é a hora ou o lugar adequado pa...

— Não brinque assim comigo...

Amanda arqueou o corpo, ansiosa para que ele prosseguisse com a exploração.

— Como se você não estivesse brincando comigo.

— É para o seu próprio bem — disse ela arfando.

— Para o meu próprio bem? — perguntou ele, co­meçando a beijar a parte interna de suas coxas.

Amanda se apoiou sobre os cotovelos.

— Está bem, esta parte é para o meu próprio bem — disse ela, sentindo os músculos derreterem.

Daniel riu contra o seu corpo, e seguiu mais para cima. Sua voz vibrou contra o seu corpo.

— Acho que existe alguma norma contra isso.

— Não se atreva a parar.

— Talvez até duas normas.

— Daniel!

Ele riu novamente, e então beijou seu sexo. A re­dação da Snap transformou-se por um momento em um pedaço de paraíso. Ela arfava em busca de ar, agarrando-se na ponta da mesa enquanto ele pratica­mente a enlouquecia.

Amanda estava nas nuvens, voando, prestes a...

— O que foi? — perguntou ele, erguendo o olhar.

— Ah-ah!

Ela se endireitou e o puxou para si pelos ombros.

— Foi o bastante para você? — quis saber ele, levantando-se devagar.

— Eu ainda nem comecei — disse ela, procurando alcançar a parte de baixo de suas calças.

Daniel tentou detê-la, mas ela o acariciou por cima do tecido, fazendo-o gemer, agarrando-se à mesa com a mão livre.

— Você é meu, Daniel! — decretou ela.

— Eu não posso — disse ele entre dentes, afrou­xando a mão que tentava detê-la.

Amanda abriu o botão da calça dele. O zíper des­ceu facilmente e sua mão entrou em contato com o calor de sua intimidade.

— Amanda...

— Eu quero que você faça amor comigo em cima de sua mesa de trabalho!

— Você está fora do...

Ela o segurou com mais força.

— Agora!

Daniel soltou um palavrão, embora mais parecesse rezar, e a puxou para si, com um gemido de rendição.

Ele deslizou as mãos por debaixo de suas nádegas e a penetrou, sussurrando em seu ouvido o quanto ela era bonita, o quanto gostava do seu cheiro, do seu sabor.

Amanda perdeu a noção de tempo. A tensão foi crescendo dentro dela até o escritório começar a gi­rar. Ela o beijou ardentemente, entrelaçando a língua a dele. Daniel enterrou os dedos na sua carne macia, enquanto avançava, cada vez mais dentro dela.

As sensações explodiam dentro do corpo de Amanda como fogos de artifício. Seus músculos se contraíram em torno dele, uma, outra, e mais outra vez.

As mãos de Daniel ainda estavam enfiadas em seus cabelos quando a respiração de ambos finalmente começou a voltar ao normal. Ele beijou sua testa gentilmente, acariciando-lhe o rosto.

— Eu estou começando a gostar dessa tal esponta­neidade — admitiu ele.

— Você dá um sentido completamente novo a essa palavra — ironizou Amanda. — Hambúrgueres?

Daniel riu e a abraçou com força.

— Há um banheiro ali, depois daquela porta, se você quiser se refrescar.

Ela beijou-lhe a boca.

— Quero sim.

— Certo. — assentiu ele, retribuindo o beijo.

— Eu espero que você goste de Coca-cola.

— Claro.

— Acho que não há tempo de repetir a dose.

— Não se comermos os hambúrgueres também.

— Você não ia querer perder uma iguaria dessas! Ele deu um passo para trás e ela desceu da mesa. Enquanto se arrumava e escovava o cabelo,

Amanda pôde ouvir Daniel desembrulhar os pacotes. Ao voltar para o escritório, ela pegou a gravata que estava pendurada sobre uma das cadeiras e a enrolou em torno do próprio pescoço. Daniel lhe estendeu um hambúrguer, sentando-se na cadeira ao lado da dela.

— Nada mal — disse ele, após a primeira mordida.

— E você acha que eu ia lhe dar algo que não fosse bom? — perguntou ela, desembrulhando o sanduí­che.

— Aparentemente, não.

— Onde foi que você os comprou?

— Do outro lado da rua. Você conhece a lanchone­te, não é? É uma cadeia nacional.                          

— Sério?                                                    

Ela balançou a cabeça e riu levemente.              

— Lá fora existe um mundo, sabia?

Daniel parou de comer por um momento e olhou intensamente para ela.

— Quer mostrá-lo para mim?

Amanda foi invadida por um sentimento de culpa. Ele estava fazendo a sua parte. Estava disposto a ce­der e a experimentar coisas novas, enquanto ela não havia feito qualquer movimento em sua direção.

Daniel não tinha culpa de ter um pai que era um gênio maquiavélico. Dentre todos os seus irmãos, fora ele, na verdade, quem mais havia lutado pela sua independência, e se Bryan era hoje o único Elliot que havia conseguido fugir ao jugo de Patrick, isso se de­via, em parte, a ele também.

Ela engoliu em seco, tomando uma decisão.

— Só se você me mostrar o seu mundo também. Ele amassou o papelão e o jogou no lixo, animado com a idéia.

— Claro! O que você quer conhecer primeiro? Pa­ris? Roma? Sidney?

— Eu estava pensando no Metropolitan.

— Mas você já foi ao Metropolitan.

— Já, mas você pode ir a lugares melhores.

— La Bohème com pizza, então?

Amanda riu e se levantou, jogando a embalagem de sanduíche no lixo também.

— Tenho um compromisso a uma hora — disse ela.

Daniel beijou-a suavemente na boca e estendeu a mão para pegar sua gravata. Ela balançou a cabeça e segurou a peça com força.

— Meu suvenir.

— Está bem — concordou ele, sem resistir.

A advogada pegou a bolsa e deu um último gole de sua Coca-cola, quando o viu abrir uma gaveta e tirar outra gravata de dentro dela.

A mulher pousou o copo sobre a mesa e correu até ele, confiscando a segunda gravata. — Ei!

— Nada de gravatas. Ele ainda tentou pegá-la, mas ela se esquivou.

— O que você quer dizer com nada de gravata?

Ela enrolou a segunda gravata no próprio pescoço.

— Esse é o preço que se paga pela espontaneidade.

— Mas Nancy vai perceber o que aconteceu.

Amanda sorriu para ele.

— Com certeza.

— Amanda....

— Ligue para mim, ok? — ordenou ela, desapare­cendo rapidamente pela porta.

 

Daniel entrou no escritório do pai às duas em ponto, fazer amor com Amanda tinha aplacado sua ira. Fazer amor com ela havia aparado todas as arestas do mundo.

Fazer amor com a ex-mulher, porém, também o havia feito lembrar de como o pai manipulou cruel­mente uma adolescente grávida e apavorada.

— Algum problema? — começou o pai, sem desviar o olhar dos papéis que estava assinando.

Daniel se esforçou para manter a calma.

— Sim, nós temos um problema. Patrick olhou para ele.

— E o que seria?

— Você chantageou Amanda.

O homem não esboçou reação alguma.

— Eu não troquei mais de três palavras com ela nos últimos dezesseis anos.

Daniel se aproximou dele.

— Você ameaçou tirar o Bryan dela! Como você pôde fazer uma coisa dessas? Ela era apenas uma garota com dezoito anos, grávida e indefesa!

Patrick pousou a caneta e ajeitou os ombros.

— Fiz. o que era melhor para a nossa família.

Daniel bateu com a mão na mesa do pai.

— O melhor para você, o melhor para a família, mas não o melhor para Amanda.

— Amanda não era responsabilidade minha.

— Amanda é a minha mulher! — gritou Daniel.

— Era a sua mulher.

Daniel cerrou os dentes e respirou fundo. Patrick se levantou.

— Essa história é muito antiga, Daniel, e eu tenho uma reunião agora.

— Não se atreva.

— Você está me ameaçando?

Por alguma estranha razão, o homem que o intimi­dara a vida inteira não parecia mais tão ameaçador agora.

— Nós ainda não terminamos a nossa conversa.

O pai deu a volta na mesa.

— Nós definitivamente terminamos a conversa e você tem muita sorte de ainda ter um emprego.

Daniel impediu a passagem de Patrick.

— Você vai ter de pedir desculpas a Amanda.

Os olhos de Patrick faiscaram.

— Amanda fez sua própria escolha...

— Você não lhe deixou outra alternativa.

— Foi ela quem decidiu dormir com você.

— Você não sabe nada sobre o que aconteceu aquela noite.

— Está querendo me dizer que ela fez alguma coi­sa contra a vontade?

Daniel sentiu a cabeça explodir. Fechou os punhos e avançou para cima do pai.

— Está insinuando que eu a violentei?

— Foi isso o que aconteceu?

— É claro que não!

— Então ela fez o que fez de livre e espontânea vontade. Havia um bebê a caminho. Um Elliot. Eu só protegi a minha família.

Patrick fez menção de desviar de Daniel.

— Você traiu a nós dois! — berrou o filho.

— Vocês estavam errados! — respondeu Patrick, enfurecido. Ele ainda olhou para o filho por um momento e que saiu do escritório.

Daniel não se sentiu em condições de continuar trabalhando. Voltar para casa de nada adiantaria, e ele estava aborrecido demais para ligar para Amanda. Acabou indo parar na " mesa Elliot", no Une Nuit, d restaurante de seu filho. Bryan não estava lá. Ainda bem. Daniel ficou feliz por poder tomar seu uísque No cantinho em um lugar reservado. — Olá — disse Michael.

— Olá — respondeu Daniel, olhando ao redor para ver se havia mais alguém com o irmão. Ele não queria saber de companhia no momento.

— Ouvi dizer que"você colocou o chefe contra a parede — começou Michael, fazendo sinal para que o garçom lhe trouxesse sua bebida habitual. Daniel assentiu.

— Algo relacionado ao trabalho?

— Não, assunto pessoal.

— Amanda? — perguntou ele, enquanto o garçom lhe servia o martíni.

— O que foi que você soube?

— Que você mandou a sra. Bitton reagendar as reuniões do papai para que ele pudesse recebê-lo e que você o pegou de jeito. E que ainda está de pé!

— E empregado também!

Michael pegou a azeitona de sua bebida e a colo­cou na boca.

— Amanda é a única pessoa que poderia fazer você explodir desse jeito.

Daniel pousou o uísque na mesa.

— Ele ameaçou tirar o Bryan dela se ela não se ca­sasse comigo.

Michael ficou em silêncio por um momento.

— Eu sei.

— Você sabe?

— Sim. Ele achou que a mamãe morreria se per­desse o seu neto.

— Por que você não me disse nada?

— Eu estava com o rabo preso na época. Fui eu quem lhe arranjou a suíte, lembra?

— E depois?

— Vocês pareciam felizes. Essa também não me pareceu a melhor coisa a dizer mais tarde, quando as coisas começaram a complicar.

Daniel se virou na cadeira.

— Ele foi inescrupuloso!

Shane, seu irmão mais novo, apareceu e se sentou ao lado de Daniel.

— Quem foi inescrupuloso?

— Papai chantageou Amanda para se casar com Daniel — informou Michael.

— O quê? — perguntou Shane.

Daniel se virou para olhar diretamente para Shane.

— Na época da formatura de colégio.

— Ah, naquela época.

— Por quê? Por acaso houve outra vez em que isso aconteceu? — quis saber Daniel.

— Como foi que ele a chantageou? — perguntou Shane, ignorando a ironia do irmão.

Daniel terminou seu uísque, ainda tomado de ira ao pensar no que o pai havia feito.

— Ele a obrigou a se casar comigo para não perder a guarda de Bryan.

Finola chegou e se juntou a eles.

— Poderia ter sido pior — disse ela.

Os três silenciaram ao lembrar que Patrick havia forçado Finola a abrir mão da filha que gerara quando linha apenas quinze anos.

Shane apertou a mão de sua irmã gêmea.

— Tem razão.

— Oh, Fin! — exclamou Daniel, sentindo-se um canalha. Ele, ao menos, tivera a chance de criar o fi­lho.

Michael fez sinal para que o garçom trouxesse mais uma rodada.

— Vocês não acham que esta família precisava de uma boa terapia?

Finola tentou conter as lágrimas.

— Como assim " acham" ? Nós estamos nos ma­tando para ver quem consegue o posto do nosso pai!

Daniel colocou um cubo de gelo na boca.

— Pode ser que restem apenas três competidores nessa disputa depois desta tarde.

Shane caiu na gargalhada.

— O que foi que você aprontou?

— Eu gritei com ele.

— Você gritou com o papai? — perguntou Finola.

— Eu o obriguei a pedir desculpas a Amanda e o detive por um minuto ou dois antes que ele conse­guisse sair do escritório.

— Fisicamente? — quis saber Michael.

— Nós não trocamos socos, nem pontapés — disse Daniel. Todos riram com ele.

— Talvez sobrem apenas dois — disse Michael. Os irmãos voltaram a atenção para ele.

— Eu estou muito mobilizado com a saúde de Karen. Não tenho energia para essa disputa. Ela precisa de mim, e eu quero estar disponível.

— Eu também penso em desistir — admitiu Sha­ne.

— Do que é que você está falando? — perguntou Michael. — Você não tem razão alguma para isso.

O garçom chegou com as bebidas.

— Não seja ridículo — disse Finola a Shane. — Você adora seu trabalho.

— É verdade, mas odeio ser manipulado. Ele ma­goou a todos nós, um de cada vez.

Os outros três assentiram, concordando.

Daniel estava se sentindo com se tivessem lhe tira­do uma venda dos olhos.

— Voltar a trabalhar na editora quando papai me disse que essa seria a única maneira de pagar o que ele gastou com Bryan foi o pior erro da minha vida.

Ele afastou a lembrança da doença cardíaca de Bryan, não querendo reviver a tensão pela qual tinha passado antes da cirurgia que curou o filho.

Finola inclinou a cabeça.

— Se você não tivesse voltado...

— Amanda e eu ainda poderíamos estar casados.

— E pobres — completou Michael.

— Porém, casados — consertou Shane. — Largue tudo e case-se novamente com ela!

— Uau! — exclamou Michael. — Como foi que nós chegamos a isso?

Daniel riu, mas algo em sua mente lhe dizia para levar o conselho do irmão a sério.

— Você está muito amargo — disse Fin a Shane.

— Eu só estou limpando a área. Prefiro você no comando ao Daniel — brincou o irmão.

Daniel cutucou Shane.

— Posso saber por quê?

— Porque ela gosta mais de mim do que você! - Isso lá é verdade — retrucou Daniel.

Michael estava mastigando sua segunda azeitona.

— Não acho que podemos deixar Finola levar essa assim de mão beijada — disse ele a Daniel.

— Claro que não! — respondeu Daniel, rindo. — Afinal, ela é uma mulher.

— Lá vêm vocês de novo! — bufou Finola.

Amanda tentou se convencer de que Sharon Elliot realmente estava em seu escritório.

— Surpresa! — falou ela, adentrando o recinto com seus indefectíveis saltos altos. Seu cabelo estava preso em um coque, e a maquiagem era pesada.

Julie fez uma careta por trás da mulher e fechou a porta, deixando as duas a sós.

Amanda fechou seu arquivo e pôs-se de pé.

— O que posso fazer por você?

— Na verdade, sou eu quem pode fazer alguma coisa por você — começou Sharon, sorrindo e sen­tando-se em uma das cadeiras.

— Ah, muito obrigada — respondeu Amanda. Sharon curvou-se para a frente, fazendo balançar seus brincos de diamante. As pedras dos anéis em seus dedos brilharam quando ela cruzou as mãos.

— Eu sei o que você está fazendo.

— Sabe?

— Sim.

— E eu respeito.

— Muito obrigada.

— Mas acho que você pode estar buscando o que quer no lugar errado.

— Oh? mesmo?

— Daniel, é, por assim dizer, muito exigente.

— Por assim dizer...

Amanda esperava que ela fosse embora mais de­pressa se concordasse com tudo o que ela dissesse. Sharon abriu a bolsa e tirou de lá um papel.

— Eu tomei a liberdade de trazer uma lista de ho­mens em potencial.

— Em potencial para quê? — perguntou Amanda.

— Para namorar — respondeu Sharon. Ela desdo­brou o papel e sorriu para Amanda, forjando uma es­pécie de cumplicidade feminina. — São todos bonitos, inteligentes, disponíveis...

Ela lhe estendeu o papel.

Amanda o tomou de suas mãos, cuidadosamente.

— Você me passou uma lista dos seus namorados?

— Não são meus namorados — Sharon riu. — Mas podem ser seus.

Amanda deixou cair o papel.

— O quê?

A outra mulher balançou a cabeça.

— Minha querida, o Daniel nunca mais vai se apaixonar por você. Considere isso como um presentinho de uma esposa abandonada para outra.

Tudo fazia sentido agora.

— Devo concluir então que você o quer de volta.

— Eu?! É claro que não. Quando não se está mais nas graças de Patrick, nem adianta tentar.

Amanda tinha de concordar com ela.

— Houve uma época, porém — prosseguiu Sharon —, em que ele só queria saber de mim.

— Você dormiu com Patrick?!

— É claro que não! Mas ele me recrutou para Da­niel. Sabia exatamente o que queria de uma nora.

— E conseguiu — resmungou Amanda.

— Por algum tempo, sim — suspirou Sharon. — Mas vamos voltar à lista — disse, levantando-se e pegando o papel. — Giorgio é interessante, não é muito alto, mas é bastante atraente. Ele tem uma mansão que dá para o parque e...

— Obrigada — respondeu Amanda, fechando a lista —, mas não estou interessada em namorados.

Sharon fez um biquinho.

— Mas...

— Na verdade, estou muito ocupada no momento — cortou Amanda, devolvendo-lhe a lista.

Sharon não a pegou.

— Você está namorando Daniel?

Não exatamente. Ela só estava dormindo com ele. Seu relacionamento com ele não passaria desse pon­to. Sharon, porém, tinha razão numa coisa. Para agar­rar Daniel, primeiro era preciso agarrar Patrick.

A porta se abriu e Julie colocou o rosto na fresta.

Amanda teve vontade de beijar a sua secretária.

— Há alguém aqui que deseja vê-la — disse Julie.

Amanda não se importou em saber quem era, con­tanto que conseguisse tirar Sharon de lá. Pegou a lista e a colocou na mão da "concorrente".

— Muito obrigada pela visita. Julie abriu a porta.

Sharon ficou olhando para uma e para outra. Amanda chegou a achar que ela ia se recusar a ir em­bora, mas ela se empertigou, cerrou os dentes e saiu.

De repente, porém, ela se deteve no meio do corre­dor e virou-se novamente para olhar para Amanda.

— Parece que eu a subestimei.

Antes que Amanda conseguisse decifrar a mensa­gem, Patrick Elliot entrou em seu escritório.

Ela tentou um gesto desesperado para Julie, porém a funcionária já havia voltado para seu posto.

— Amanda — começou ele com voz tensa, assim que a porta se fechou.

— Sr. Elliot — respondeu ela, meio nervosa..

A advogada não se lembrava da última vez em que liiivia ficado a sós com ele.

— Por favor, chame-me de Patrick.

— Está bem — disse ela, ainda mais desconcerta­da.

— Posso me sentar?

— É claro.

Patrick, porém, permaneceu de pé até Amanda perceber que ele estava esperando que ela se sentasse primeiro. Ela o fez, aproveitando para secar disfarçadamente as mãos úmidas em suas calças.

O homem finalmente se sentou.

— Vou direto ao assunto. Meu filho me disse que eu lhe devo desculpas.

Amanda abriu a boca, estupefata, para fechá-la imediatamente depois, assim que se deu conta do que ele tinha dito. Ficou em silêncio, olhando para ele.

— Não concordo com Daniel — prosseguiu Patrick. — Não me arrependo do que fiz.

Amanda suspirou.

Agora era ele mesmo novamente. Seu cabelo podia ter ficado branco nesse meio tempo e a linha do queixo podia estar mais suave do que antes, mas seus olhos azuis continuavam gelados como sempre.

— Eu não me arrependo de ter mantido Bryan em minha família — continuou ele —, e não me arrependo de ter garantido que Maeve pudesse conviver com o neto. Mas me arrependo... Eu me arrependo de não ter levado os seus interesses em conta.

Amanda devia estar ouvindo coisas. Patrick Elliot havia acabado de lhe pedir desculpas?

— Isso já faz muito tempo — ponderou a advoga­da, percebendo tardiamente que não havia lhe agra­decido, embora nem soubesse ao certo o que reco­mendava a etiqueta em uma circunstância como aquela.

Ele assentiu.

— Já faz muito tempo mesmo. Mas Daniel tem ra­zão. Você estava sozinha, e eu tirei vantagem disso. Eu sei que fiz a coisa certa. Bryan merecia ter o direto de crescer como um Elliot, assim como nós merecía­mos conhecê-lo, mas... digamos que eu não pesei os possíveis efeitos colaterais das minhas atitudes.

Amanda sentiu um frio na espinha.

— Você me via como um efeito colateral?

Como era possível que uma pessoa sobrevivesse por tantos anos sem ter uma alma?

— Eu a via como uma circunstância... desfavorá­vel — respondeu ele.

— E resolveu brincar de Deus.

Aquele pedido de desculpas não fora o bastante para aplacar os anos de raiva contida. Ela não mere­cia ter sido manipulada daquela maneira!

— Eu não me considero Deus — disse Patrick.

— Então, por que é que resolveu agir como se fos­se? — perguntou ela em um tom ainda mais amargo.

Ele se levantou.

— Creio que esta reunião está encerrada.

— Eu estou falando sério, Patrick. — Ela não po­dia deixar que ele fosse embora daquele jeito. — Você tem de parar com isso.

Patrick franziu as sobrancelhas.

— Parar com o quê?

— Com essa mania de comandar sua família com mão de ferro.

— Acho que você não sabe, mas estou deixando a presidência da editora.

Ela riu ironicamente.

— E manipulando-os feito marionetes.

— É isso o que você acha que eu estou fazendo?

— E não é?

Eles se olharam em silêncio por um momento.

— Com todo o respeito, Amanda, eu não lhe devo esse tipo de explicação.

— Você está certo. Mas vai acabar tendo de se explicar a Daniel. Um dia, ele vai acordar e ver quem você realmente é.

— Acho que esse dia foi hoje.

— Então você sabe do que eu estou falando.

— Não, mas acho que compreendi outra coisa.

Ela esperou.

— Acho que sei o que você significa para ele. Amanda se retraiu.

— O quê?

Será que Patrick sabia do caso deles? O ex-sogro passou a mão nas costas de sua ca­deira.

— Parece que o meu erro não foi fazer com que você se casasse com ele, mas sim, ter permitido que você se divorciasse dele.

— Permitido?

— Ele ainda precisa de você, Amanda.

Patrick lançou um sorriso calculado que era ainda mais assustador do que sua cara amarrada.

— Deixe-me em paz!

— Isso não vai ser possível. Tenha um bom dia.

 

Daniel achou que ia precisar dar pelo menos uma volta em torno do Central Park para ganhar coragem.

E outra ainda para convencer Amanda de que eles teriam uma chance juntos.

Ele colocou o anel de diamante de três quilates no bolso e checou novamente o champanhe que havia escondido debaixo do assento da carruagem.

Julie o havia ajudado de bom grado, comprometendo-se a levar Amanda até a entrada do parque na hora certa. Ele não sabia que métodos ela havia usa­do, mas já conseguia ver as duas mulheres descendo a Avenida Sessenta e Sete.

Ele ajeitou a gravata, apalpou a caixa que escon­deu no bolso do paletó e seguiu em direção à calçada movimentada.

- Amanda! — cumprimentou. Daniel?

Eu tenho de ir embora — disse Julie, desapare­cendo rapidamente em meio à multidão. Amanda se virou na direção da voz dela.

— O que...

Ela deve ter alguma coisa importante para fazer pensou Daniel, pegando em seu braço.

Amanda acertou o passo com o dele, esticando o pescoço à procura de Julie.

— Ela queria que eu olhasse uns sapatos.

— Talvez ela tenha mudado de idéia — sugeriu ele, baixando a mão para pegar a dela.

Amanda olhou para ele, desconfiada.

— De onde é que você está vindo?

— Do parque.

— Você estava caminhando?

Daniel assentiu. Aquela lhe pareceu uma história tão boa quanto qualquer outra.

— Senti muito a sua falta — admitiu ele.

A expressão dela se suavizou e os olhos cor de chocolate ganharam um ar malicioso.

— Eu poderia dar um pulo no seu escritório?

Ele se aproximou ainda mais.

— Eu poderia comprar uma gravata nova...

Amanda sorriu e Daniel retribuiu o sorriso, sentin­do-se tão feliz quanto uma criança na noite de Natal.

Ela ia aceitar seu pedido de casamento.

Os dois poderiam fazer amor todas as noites, acor­dar juntos todas as manhãs, visitar os netos... Ele er­gueu-lhe a mão e beijou os dedos dela.

Não havia nada que ele desejasse mais no momento do que envelhecer ao lado de Amanda.

Bem, havia outra coisa, porém conversariam sobre isso depois que ele a convencesse a se casar com ele. Amanda certamente o apoiaria na mudança de carreira.

— Você também poderia vir ao meu escritório. — Ela puxou a mão dele entrelaçada à dela e a beijou. — Eu andei tendo umas fantasias...

— Hum, estou gostando disso.

— Nesse momento, no entanto, quero lhe revelar a minha própria fantasia.

— É sexual?

— Melhor que isso. É espontâneo.

Ela ergueu a sobrancelha.

— Venha.

Daniel a puxou por entre o movimento de pedes­tres e a levou para dentro do parque, até chegar à carruagem que havia alugado.

— Entre — disse ele para Amanda.

— É esta a sua fantasia?

— Está fazendo pouco de mim?

— É claro que não.

— Então entre — repetiu, oferecendo a mão para ajudá-la a subir.

Amanda atendeu ao pedido. Daniel entrou em ajuda e fechou a porta, fazendo sinal para que o cocheiro desse a partida.

A noite caiu sobre a cidade, ao som das patas dos cavalos contra o chão de pedra. As luzes dos arranha-céus brilhavam ao longe, enquanto as das árvores, em torno do parque, iam se acendendo, uma a uma, à me­dida que eles iam passando.

Daniel esticou o braço por trás do assento dela.

— Isto aqui fica lindo à noite — disse Amanda.

— Você é que é linda.

— Você usa essa cantada com freqüência?

— Não. Quantas vezes você acha que eu levei uma mulher para dar uma volta de carruagem no parque?

Amanda olhou para ele.

— Não sei. Quantas?

— Poucas.

— Quer dizer que você já fez isso antes.

— Está querendo me dizer que você só considera espontâneo algo que nunca tenha sido feito antes?

— Não, mas o ineditismo garante um bônus extra.

— Você deveria ter me avisado a tempo. Ela riu e deitou a cabeça em seu ombro.

O mundo lhe pareceu absolutamente perfeito.

Daniel a beijou na testa e entrelaçou sua mão dela. Os sons da cidade foram desaparecendo, dando lugar ao som das patas dos cavalos e aos ruído da carruagem, que preencheram a noite.

Ele queria fazer logo a pergunta fatídica, mas tam­bém queria que aquele passeio durasse para sempre.

— Champanhe? — murmurou ele. Amanda se ajeitou no assento.

— Onde é que arranjaremos champanhe aqui? Ele lhe mostrou um cooler, de onde tirou uma gar­rafa de Laurent-Perrier e duas taças.

— Espontaneidade, hein? — perguntou ela.

— Eu só pensei nisso esta manhã. A advogada riu.

Daniel não pôde resistir e a beijou. Amanda passou os braços em torno do pescoç dele, respondendo avidamente à sua iniciativa.

— Quem é que precisa de champanhe? — murmurou ele, puxando-a mais para perto e mergulhando nas profundezas de sua boca.

Ela se afastou e olhou para o champanhe, cheia de más intenções.

— Eu não quero estragar a sua espontaneidade tão cuidadosamente calculada.

Daniel pegou a garrafa.

— Contanto que você me prometa que nós vamos poder nos beijar depois.

— Vou pensar no seu caso.

— Você ia morrer se planejasse minimamente al­guma coisa?

— Eu gosto de manter todas as possibilidades.

— Pense em mim, então, como uma dessas possi­bilidades — disse ele, fazendo a rolha do champanhe saltar. — Uma possibilidade para esta noite — conti­nuou ele, estendendo-lhe as taças e vertendo o líqui­do espumante — e para todas as outras.

Ela franziu a boca, confusa.

— Amanda...

— Sim?

— Essas últimas semanas... juntos... significaram muito para mim.

A advogada sorriu.

— Para mim também, Daniel.

— Eu me lembrei de tantas coisas... — Ele des­viou o olhar para as luzes da cidade, lá longe. — Eu voltei a sentir coisas que já não sentia havia anos.

O ex -marido olhou no fundo dos seus olhos.

— Eu percebi que aquilo que eu sentia por você não mudou em nada esses anos todos. — Daniel...

Ele colocou um dedo sobre seus lábios.

— Ssshhhhh.

Daniel pôs a mão dentro do bolso para pegar a cai­xa de veludo e abri-la, oferecendo-lhe o anel.

— Case-se comigo, Amanda.

A mulher arregalou os olhos e ficou ofegante. Ele resolveu se apressar antes que ela reagisse.

— Eu a amo, Amanda. Nunca deixei de amá-la.

O olhar de Amanda pousou sobre o anel e depois sobre o rosto dele novamente.

— Isso é...

— Sei que você acha que eu estou sendo apressa­do, mas nos conhecemos tão bem e há tanto tempo...

— Eu ia dizer inacreditável.

Seu tom de voz era estranho, quase acusatório.

— Amanda?

Daniel olhou para ela. Os dois não eram estranhos, já estavam saindo havia duas semanas, e tinham feito amor duas vezes nesse meio tempo.

— Eu pensei muito sobre nós.

— Você pensou mesmo? Você?

Ele repassou a conversa na mente, tentando enten­der o que tinha dado errado.

— Sim.

Amanda olhou para o relógio.

— Ele deixou o meu escritório há apenas duas ho­ras.

— Quem?

Amanda balançou a cabeça e riu friamente.

— Não, Daniel. Eu não vou me casar com você. A resposta foi uma estaca fincada em seu coração.

— Eu não quero ser mais uma marionete da sua fa­mília — desdenhou ela.

Daniel foi tomado de pânico e começou a buscar uma maneira de fazê-la mudar de idéia.

— Por que a minha família entrou na conversa?

Ela colocou sua taça vazia no cooler.

— Eu quero que você me leve para casa.

Daniel deu o caso por encerrado.

— Está bem.

Amanda passou a noite inteira repetindo para si mesma que havia tomado a decisão mais acertada. Daniel não queria se casar mesmo com ela. Não mais do que desejava ser o presidente da Editora Elliot.

Patrick fez uma lavagem cerebral em todos eles, e não havia nada que ela pudesse fazer para mudar isso. O melhor que tinha a fazer era salvar a si mesma.

Ela ainda estava dizendo isso a si quando o despertador tocou. No café-da-manhã, porém, começou a se questionar. Será que havia mesmo tomado a melhor decisão?

Não havia dúvidas de que Patrick estava por trás tramando aquilo. Daniel talvez jamais a tivesse pedido cm casamento novamente se o pai não o tivesse insti­gado a fazê-lo, mas havia algo mais. Havia um ma­pa entre ela e Daniel que Amanda não podia negar.

Ela colocou o rosto entre as mãos. E se tivesse aca­bado de cometer o maior erro de toda a sua vida?

Aquele anel era perfeito. Daniel era perfeito.

Amanda se sentiu ridícula.

Ela o havia perdido, mas tinha de tirá-lo da cabeça.

Amanda pegou o telefone e ligou para Karen, qua­se automaticamente.

— Alô — atendeu Karen, calorosa, apesar de ain­da ser tão cedo.

— Karen? É Amanda.

— Oh, meu Deus! Michael me contou o que acon­teceu. A família inteira está falando no assunto.

— E mesmo?

— Claro. Ninguém consegue acreditar.

Ela não sabia se estava entendendo direito. Daniel havia contado a todos sobre a proposta de casamento que lhe havia feito? Aquilo era inacreditável.

— Cullen soube por alto — disse Karen — e ligou paraBryan...

— Cullen soube por alto?

— Patrick deve estar furioso... — suspirou Karen.

— Por eu ter dito não? Houve um silêncio.

— Porque nenhum de seus filhos jamais ousou gri­tar com ele antes.

— Eu não...

— Pagaria qualquer coisa para ter visto isso. Mi­chael me disse que Daniel o colocou contra a parede. Todos estão apostando para ver quem vai ceder pri­meiro.

— Como assim, ceder?

Se eles brigaram, já haviam feito as pazes. Afinal, Patrick tinha ido ao seu escritório para se desculpar e Daniel a pediu em casamento logo em seguida.

— Eles não estão se falando.

— Não pode ser. -Eles se falaram ontem. Depois que Patrick tinha ido vê-la. Depois que decidiu fazer com que Daniel a pedisse em casamento.

— Eu tenho certeza de que eles não estão se falan­do — disse Karen.

Amanda passou os dedos pelos cabelos ainda úmi­dos. Aquilo não fazia sentido, a menos...

— Oh, não!

— Amanda?

A voz de Karen parecia distante.

— Eu ligo mais tarde — despediu-se Amanda, co­locando o fone no gancho.

Havia algo de muito errado naquilo tudo. Se Da­niel realmente não falou com Patrick, ela só podia concluir que a proposta de casamento havia partido única e exclusivamente dele...

Amanda soltou um palavrão.

Daniel pousou a carta cuidadosamente digitada so­bre a mesa. Havia imaginado que Amanda estaria presente para ver aquilo, de braço dado com ele, sor­rindo orgulhosa, fazendo planos para uma cerimônia de casamento simples — talvez uma viagem para Madagascar. Estava disposto a lhe dar tudo o que ela quisesse, mas ela nem sequer permitiu expor seu pla­no Amanda o descartou.

Mas ele se propunha a fazer qualquer coisa que ela lhe pedisse, mas ela não havia lhe dado nem mesmo a gentileza de uma escuta justa.

Ele pegou uma caneta de ouro e assinou sua carta de demissão com um floreio. Ao que parecia, ele teria de ir sozinho para Madagascar.

A porta de seu escritório se abriu.

Daniel ergueu o olhar, esperando encontrar Nancy, mas foi Amanda quem adentrou o recinto.

Ela refreou seus passos ao vê-lo, olhando para ele entre confusa e surpresa.

Nancy apareceu logo em seguida, claramente dis­posta a convidá-la a se retirar.

— Está tudo bem — disse Daniel, dispensando a secretária. Nancy assentiu e fechou a porta.

— Em que posso ajudá-la? — perguntou ele.

— Eu, ah... — Ela deu mais um passo temeroso na direção dele e pigarreou. — Eu queria...

Daniel guardou a caneta, sem tentar disfarçar a im­paciência. Depois cruzou os braços, sentindo-se sufi­cientemente forte para olhá-la nos olhos.

— Eu estou um pouco ocupado esta manhã.

Amanda arregalou os olhos, parecendo vulnerá­vel, mas ele se manteve impassível.

— Por quê, Daniel?

— Por que o quê?

Ela ficou em silêncio por algum tempo.

— Por que você me pediu em casamento?

— Pensei que tivesse deixado tudo muito claro.

— Eu achei que seu pai tinha falado com você.

— Como assim? Meu pai sempre fala comigo.

— Foi ele quem o convenceu a me pedir em casa­mento?

— Não, desde os meus dezoito anos.

— Então, por quê?

Ele deu de ombros.

— Não sei. Como eu não tenho um cérebro, liguei para uma agência de matrimônios e me disseram para pedi-la em casamento depois do quinto...

— Daniel!

— ...encontro. Também me sugeriram um passeio de carruagem e champanhe. Providenciaram ainda um belo anel e cartões com frases de efeito. Quer ver?

— Pare, Daniel.

— Eu tenho um dia muito importante pela frente. Quer, por favor, se retirar?

Amanda ficou assustada com sua ira, mas ele não estava nem um pouco propenso a ser cuidadoso com ela no momento, ainda mais agora, tendo de olhar para ela, tão sexy e desejável, fazendo-o lembrar de como tudo poderia ter sido diferente.

— Está me olhando com ódio — acusou ela.

— Não estou não.

— Está sim. Eu não consigo dizer o que vim dizer com você me olhando desse jeito.

Daniel deixou os braços caírem e tentou suavizar sua expressão. Queria acabar logo com aquilo.

— Está bem.

— Eu vim dizer que sinto muito. — Ela se aproxi­mou um pouco mais. — Vim dizer também... que aquele anel era simplesmente perfeito. — Ela tocou seu braço, mas ele se afastou. — Eu sinto muito por ter entendido tudo errado, mas depois que o seu pai...

— Meu pai?

— Ele passou no meu escritório ontem para me pe­dir desculpas.

Daniel se apoiou na mesa.

— Meu pai lhe pediu desculpas?

— Disse que você lhe tinha dito para fazer isso.

— Bem... É verdade.

O fato é que ele nunca havia pensado que o pai realmente fosse atender ao seu pedido.

— Ele falou que você ainda precisava de mim. En­tão você apareceu com aquele anel e eu...

— Você juntou dois mais dois...

— E acabou dando cinco! Desculpe, Daniel... — Sua mão estremeceu. Ela olhou nos seus olhos. — Eu adorei aquele anel.

Um peso saiu de seus ombros. Daniel sentiu um aperto no peito e seu coração bateu acelerado.

— Está me dizendo que o quer de volta? Daniel já o havia devolvido à loja, mas poderia re­solver tudo com um simples telefonema.

— Ele era perfeito — disse Amanda.

— Você odeia coisas perfeitas.

— É mesmo? Bem, eu estou me esforçando para mudar isso. — Ela passou os braços em torno da sua cintura e colou o corpo ao dele. — Porque você é per­feito e eu o quero de verdade.

— Eu não estou mais com o anel — confessou ele. A decepção de Amanda foi evidente.

Foi então que ele olhou o clipe que prendia a sua carta de demissão. Começou a entortar o clipe, trans­formando-o em um anel.

— Você aceita se casar comigo mesmo assim? — perguntou ele, estendendo-lhe o anel improvisado.

Ela sorriu e lhe ofereceu o dedo.

— Claro que aceito, porém isso não vai eximi-lo de me dar aquele anel de diamante da sua proposta tão bem planejada.

Daniel colocou o anel no dedo dela.

— Você odeia quando eu planejo as coisas.

— Eu estava pensando em uma suíte no Riverside com algumas rosas e um quarteto de cordas.

— Acho que vou ter de deixar isso ao seu encargo.

— Daniel pegou a carta e a estendeu para Amanda.

— Eu tenho de tratar de outros planos. Ela se pôs a ler a carta.

— Eu não estou entendendo.

— Estou oferecendo o meu cargo de editor-chefe a Cullen.

— Por quê?

— Eu vou viajar.

— Para onde?

— Para todos os lugares. Pretendo criar uma nova revista sobre aventuras.

Ela arregalou os olhos.

— E seu pai concordou com isso??

— Eu não sei.

— Você não perguntou a ele?

— Não. Você quer vir comigo?

Um sorriso cresceu no seu lindo rosto.

— Pode apostar nisso.

A manda se aninhou ao peito nu de Daniel.

Cullen havia assumido o cargo de editor-chefe da Snak e Patrick havia aceitado com estranha facilida­de a idéia de Daniel lançar uma revista sobre aventuras, pela Editora Elliot. Bryan e Cullen estavam exultantes com o reatamento dos pais.

Eles ainda não haviam feito planos até agora, po­rém Amanda sabia que mais cedo ou mais tarde Da­niel cederia à tentação e alugaria um salão para fes­tas.

Ela beijou o peito dele.

— Eu já disse que o amo?

Daniel lhe beijou na testa e a estreitou nos braços.

— Não nos últimos trinta minutos, mas aqueles gemidos agudos fizeram muito bem ao meu ego.

Ela o cutucou.

— Eu não gemi tão alto assim.

— Ah, gemeu sim.

— Quer parar de contar vantagem?

— Eu não estou contando vantagem — disse ele, acariciando-lhe os cabelos. — Só estou feliz por ter recuperado a minha espontaneidade com você. Nada mais de planos de agora em diante.

Ela sentiu um aperto no peito.

— Não quero que você mude por minha causa.

— Eu estou mudando por minha causa. E em parte por sua causa também, já que você é a melhor coisa que eu não planejei em toda a minha vida. Eu amo você, Amanda — sussurrou ele.

O telefone tocou, interrompendo o beijo. Amanda olhou o relógio.

— Mas quem será a essa... Daniel atendeu.

— Alô? Cullen?

Amanda se ajeitou na cama.

— Ela está bem? Aliás, estão bem? Daniel tapou o bocal.

— É uma menina!

Ela pulou da cama e começou a catar as roupas.

— Três quilos e duzentos — informou Daniel. — Maeve Amanda Elliot!

Ela sentiu um aperto no peito e seus olhos se en­cheram de lágrimas.

— Nós estamos a caminho — disse ele, desligando o telefone.

— Nós somos avós! — exultou Amanda, enquanto se vestia.

Os dois chegaram à maternidade em menos de quinze minutos. Ficaram em frente ao berçário, à procura de uma placa que identificasse a neta.

— Mamãe! — exclamou Cullen, abraçando-a em seguida. — Eu nem posso acreditar no que você pas­sou por minha causa. Como posso lhe agradecer? —

Disse ele, beijando-a.

— Você não tem de me agradecer — respondeu a Cullen. — Você era o filho mais maravilhoso do mundo.

Cullen se afastou para olhá-la nos olhos.

— Oh, mamãe!

Ela sorriu para o filho.

— Parabéns, papai. Cullen balançou a cabeça, sem conseguir acreditar. Virou-se então para o pai, estendendo-lhe a mão.

— Você passou por isso duas vezes!

Daniel riu, abraçando o caçula, enquanto Amanda enxugava as lágrimas.

O pai de primeira viagem olhou pelo vidro do ber­çário. Havia uma enfermeira virando um berço.

— Lá está ela! É tão pequenininha!

Amanda se aproximou do vidro, enquanto a enfer­meira colocava o berço no centro da primeira fila.

— Eu chego a ter medo de tocar nela — confessou Cullen.

Daniel lhe deu um tapinha nas costas.

— Você vai se sair bem, meu filho. Vai alimentá-la, trocar as fraldas e, quando menos esperar, ela vai estar lhe pedindo para contar historinhas para dormir.

Cullen riu e abraçou os pais.

— Eu só espero sobreviver às primeiras vinte e quatro horas.

Amanda apoiou a cabeça no peito do filho.

— Ela é linda!

— É mesmo — concordou ele.

— Como está Misty? — perguntou Daniel.

— Está perfeita. Ela é maravilhosa. — Ele respi­rou profundamente. — Está dormindo agora.

— Onde está meu irmão?

Bryan e Lucy chegaram, e os três tiveram de se se­parar para que Cullen pudesse cumprimentar o irmão e a cunhada. Elliots começaram a lotar o corredor da enfermaria, falando e rindo sem parar. O estômago de Amanda se contraiu ao ver Patrick e Maeve dobra­rem o corredor. No que será que ela havia se metido?

— Vai ficar tudo bem — sussurrou Daniel em seu ouvido, com a mão em torno de sua cintura.

Amanda, porém, não estava tão certa disso.

Patrick a cumprimentou com um meneio de cabe­ça e Karen a chamou de longe, acenando para ela em meio ao tumulto. Daniel a segurou com firmeza. A pequena Maeve abriu a boca em um grande bocejo, provocando um suspiro coletivo de todos os adultos ali reunidos. Era óbvio que estavam todos derretidos pela mais nova integrante do clã.

Amanda pousou a cabeça no peito de Daniel e de­positou toda a sua fé nos laços firmes que ligavam os Elliot. Sabia que poderia haver percalços no cami­nho, mas dessa vez eles conseguiriam ultrapassá-los.

Juntos.

 

                                                                                Barbara Dunlop 

 

 

                      

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