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Planeta Criança



Poesia & Contos Infantis

 

 

 


VIKING BESTA / Emmanuelle de Maupassant
VIKING BESTA / Emmanuelle de Maupassant

                                                                                                                                                   

                                                                                                                                                  

 

 

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Maio de 960 AD
Acordou com o crepitar do fogo. Brilhando e faíscando, a palha estava acesa, brilhando através de um véu de fumaça acre.
O pé da cama estava em chamas. Ele se sentou para chutar as peles, respirar fundo para gritar, mas sua garganta se fechou com as cinzas sujas.
— Bretta! — Gritou seu nome, sacudindo-a, mas ela não respondeu. Abaixando-se a seu lado, a levantou-a em seus braços e, forçado a inalar, foi atingido pela tosse.
Pelos deuses! Tinham que sair.
Com os olhos ardendo, encontrou o chão.
O fogo estava se movendo rapidamente, as chamas lambendo as madeiras.
Eldberg enterrou o rosto no ombro de Bretta. Ela estava flácida, com a cabeça para trás.
Encontre a porta.
Ele deu vários passos, ignorando as brasas escaldantes sobre os pés descalços, desprezando o calor feroz. Nada importava senão escapar. Estava quase lá quando algo atingiu sua cabeça.
Bretta rolou de seus braços quando ele caiu. Chamou o seu nome, ou pensou que sim.
Bretta! Minha esposa. Meu amor. Mãe do nosso filho ainda por nascer.
E então, embora a sala estivesse iluminada por chamas, havia apenas escuridão.

 


 


Maio de 960AD

Eldberg dormiu por três dias e noites, seu corpo ainda não estava pronto para acordar.

Quando o fez, foi para uma dor lancinante.

A lembrança daquela noite voltou com a força de todos os trovões de Thor, atingindo o medo no coração de Eldberg. Ele já sabia seu destino, mas não o aceitaria, até que a verdade fosse dita em voz alta.

Sweyn, o comandante de sua guarda de batalha, ficou de um lado, com o rosto severo, ladeado por Fiske, Rangvald, Hakon, Ivar, mas ninguém o olhava nos olhos — nem mesmo Thoryn, o mais firme de seus homens de armas.

Somente Sigrid — tia de Bretta — reuniu coragem, embora seus dedos tremessem.

— O teto do grande salão ficou em chamas. — Sua voz não se elevou acima de um sussurro. — Ivar e Thoryn lutaram contra elas para arrastá-lo para fora. — Sigrid respirou fundo. — Três vezes, Thoryn voltou por Bretta, mas a fumaça era muito densa, o calor muito feroz.

Ela mordeu o lábio. — Rangvald e Fiske o impediram de tentar novamente. Minha Bretta! Ela é...

O peito de Eldberg se contraiu.

— Ela se foi, meu jarl.

Um calafrio passou por ele — um desespero repentino e terrível. Permaneceu imóvel, disposto a controlar seu desejo de uivar de angústia. A esposa dele! A mulher com quem casou por ordem do pai, um casamento contratado para vincular sua lealdade a Skálavík. A esposa por quem nunca esperava sentir amor. A esposa que o adorava, inexplicavelmente e sem reservas.

E a criança.

Suas mãos juntaram o pano sobre o qual estava deitado.

Seu filho. Seis meses no útero.

Eldberg engoliu a bile azeda e apertou o queixo. Com intensidade renovada, examinou os rostos diante dele. Afastando Sigrid, olhou para Thoryn.

A miséria do homem estava gravada profundamente, seus lábios secos e brancos. Thoryn era corajoso e leal; teria dado sua vida para salvar Bretta.

Eldberg virou-se para Sweyn. De todos os seus homens, ele era mais como ele, ambicioso e implacável, capaz de agir sem remorso ou piedade.

Roubado em criança por berserkers saqueadores, Eldberg havia sido escravizado até seu décimo quinto ano, quando sua altura, força e vontade implacável haviam conquistado um verdadeiro lugar entre eles. Conhecia apenas seus caminhos, onde brutalidade e selvageria eram recompensadas.

Como mercenário de Beornwold, pago para participar de suas viagens de incursão ao oeste, Eldberg lutou ao lado de Sweyn nesses quinze anos e viu seu ciúme, pois Eldberg era o favorito acima de todos os outros. O velho jarl o escolheu para se casar com Bretta, gerar a linhagem de Beornwold e tomar seu manto.

Sweyn obedecia sem nenhum senso de irmandade, mas porque isso o levou a comandar os outros, em nome de seu jarl.

Mantenha seus inimigos por perto, Beornwold havia lhe dito há muito tempo.

Eldberg fez uma careta. Ouviu bem essas palavras; dando autoridade a Sweyn, satisfazendo as necessidades que guiavam o outro homem, fazendo uso dela. Sweyn se tornou ganancioso? Desejou a morte de seu jarl e a de seu herdeiro, ainda por nascer?

Os Norn tinham retirado apenas um fio desse tear.

Uma névoa de fúria desceu, um véu vermelho que tirou sua cabeça momentaneamente do travesseiro. Ansiava pelo punho da espada, enfiando as unhas nas palmas das mãos. Pelo lado esquerdo, envolto em unguento e ataduras, veio uma pontada de dor.

A convicção o tomou. Sweyn havia planejado tudo. Tinha tentado matá-lo e tomar seu lugar. Tinha assassinado Bretta!

— Como o fogo começou? — Eldberg manteve a voz nivelada, abordando Sweyn diretamente. Apesar de sua fúria, procuraria evidências com cuidado.

— Eu descobri, meu Jarl, e tenho o culpado algemado. — Ele gesticulou, dispensando Ivar e Fiske da sala. — Nós o capturamos na mesma noite de seu crime. Um espião de Svolvaen, enviado para matá-lo.

Reunindo suas forças, Eldberg se ergueu um pouco. — Me levante, Sweyn.

Como pedido, seu comandante o levantou sob os braços, colocando em uma posição sentada. A pontada de dor foi maior do que Eldberg havia previsto, mas cuidou de não deixar transparecer. Já sofrera muitas feridas. Isso não era diferente.

Sigrid correu para a frente para colocar travesseiros nas costas dele, com o rosto comprimido. Balançou a cabeça bruscamente, reconhecendo seus cuidados. Nela, pelo menos, podia confiar. Sigrid criou Bretta como sua e respeitou o amor entre sua sobrinha e o jarl.

O homem arrastado para a sala, curvado, era uma cabeça mais baixa do que as que estavam ao seu redor. Fiske e Ivar o apoiavam de ambos os lados, pois ele não conseguia ficar de pé. A cabeça e os membros pendiam frouxos, os pulsos e os tornozelos dobrados em ângulos não naturais. Os dois olhos estavam inchados e fechados dentro do rosto ensanguentado. Sua mandíbula pendia frouxa, quebrada.

— O homem foi espancado quase até a morte. — Eldberg encarou Sweyn com um olhar gelado.

— Eu o interroguei. Foi necessário.

Eldberg estreitou o olhar. — E agora ele não pode mais falar.

— Eu descobri tudo o que precisa saber, meu jarl. O sucessor de Hallgerd, Gunnolf de Svolvaen, o enviou. De um barco de pesca, nadou até a enseada do norte e subiu os penhascos de mãos nuas. Esperando até escurecer, entrou nas florestas, observando vários dias antes de agir.

— Não foi visto? Todo esse tempo?

Sweyn deu de ombros. — Ele é mais doninha que guerreiro, hábil em se esconder.

— E por quê? E o tratado? Quase trinta verões se passaram. Por que esse Gunnolf agiria de maneira tão tola? Svolvaen não é páreo para a nossa força.

— Responde a sua própria pergunta, Jarl. — Sweyn abaixou a cabeça. — Com medo do que já fomos e do que temos o poder de ser, Gunnolf enviou seu homem para coletar quais informações poderiam ser úteis. — Olhou para cima novamente. — E para nos ferir mortalmente, causando sua morte.

Eldberg se mexeu, estremecendo. — Puxe sua cabeça para trás. Quero vê-lo.

Sweyn agarrou o cabelo do homem pelo topo.

No calor da batalha, Eldberg não pensaria em cortar o membro ou a cabeça de um homem, mas o estado do prisioneiro o fez fazer uma careta. Incapaz de fechar a boca, baba ensanguentada pendia do queixo. Sua mandíbula e nariz provavelmente estavam quebrados, a carne ferida e crua.

Eldberg gostava de olhar nos olhos de um homem, para julgar pelo que via por dentro, mas a carne inchada o impedia de fazê-lo. Voltou o olhar para Sweyn, cujos próprios olhos cinza-granito continuavam impassíveis.

— Como foi feito?

Sweyn deu resposta sem hesitação. — Soube da posição da sua câmara na casa comprida. Carregava um arco e era capaz de disparar flechas flamejantes para onde teriam mais efeito. Quando nossos vigias viram as chamas, seu quarto já estava em perigo.

Eldberg foi assaltado, de repente, pela memória do funeral de Beornwold. Sweyn havia ensopado uma tira de linho em óleo de peixe e a enrolado na flecha, mergulhando a cabeça no caldeirão de fogo antes de apontar a pira para a nave do velho jarl. Sweyn não era apenas um adepto de espada e machado, mas um de seus arqueiros mais magistrais.

Eldberg olhou significativamente para Sweyn. — O vira-lata foi bem preparado. Tínhamos ele capaz de me responder, eu tenho muito a perguntar. — Se o seu homem de armas relatava a verdade, o assassino diante deles tinha sido astuto, corajoso e favorecido pelos deuses, pois os guardas sob o comando de Sweyn varriam o perímetro de Skálavík diariamente.

O comércio da cidade de metais e armas, feito a partir do minério escavado nas montanhas, tornou Skálavík rica. Quase não havia necessidade de invasão para trazer recompensa aos seus cofres. Muitos de toda a região vinham até eles. Seus guerreiros se empenhavam agora em proteger o comércio da cidade, garantindo sua segurança.

— E agora, meu jarl? — Sweyn molhou os lábios. — Alguns golpes do meu machado e podemos jogá-lo em partes aos porcos.

Um gorgolejo subiu da garganta do prisioneiro, e seus pés arranharam-se momentaneamente antes de cair novamente.

— É apropriado — declarou Eldberg. — Se um homem está disposto a infligir dor, deve esperar o mesmo. — Segurou o olhar de seu comandante, mas Sweyn não se encolheu.

Sinalizando seu desejo de se deitar novamente, Rangvald e Hakon avançaram. Eldberg empalideceu quando o ajudaram, mas não expressou seu desconforto. As queimaduras levariam tempo para cicatrizar, mas não eram nada comparadas às feridas que rasgavam seu coração. A dor se tornaria parte dele. Se concentraria nessa dor, sentiria e lembraria.

E o dia de acerto de contas chegaria.

Fechou os olhos, recostando-se. — Segure a cabeça do infeliz na fogueira e mantenha-a lá até que eu não ouça mais seus gritos.


Eldberg

F

inalmente dormiu. Em seu sonho, abraçou-a mais perto. Sua pele era macia e suas mãos carinhosas, apesar de seus dedos estarem congelados.

Não vá embora. Eu preciso de você. Fique comigo. Bretta!

Mas seus braços não a seguravam.

Acordando, foi inundado de suor, sozinho, e seu peito tão aberto que mal conseguia respirar. Ela foi para sempre, seu único amor. Uma esposa e o filho que carregava. Um filho ou uma filha.

Queria uivar para Odin e Thor, jurar vingança por tudo o que foi tirado dele. Jogou a cabeça para trás, o deixou cair um choro triste. Deixe que os outros ouçam e tremam por conhecer sua angústia. Não encontraria descanso até que tivesse devorado seus inimigos. Deixe que conheçam a besta que era, e que o temam. Um homem desfigurado não apenas de corpo, mas de alma: A Besta de Skálavík.

 

 

Elswyth


30 de julho de 960AD

O

fiorde estava cheio de luz cintilante e do chiado de filhotes de albatroz. Eirik puxou fundo os remos, o calor do verão como veias douradas em suas costas.

Seus ombros flexionaram enquanto remava, completamente nu, bronzeado, musculoso. As ondas lambiam suavemente.

Deixando o barco deslizar, levantou os remos dos suportes, guardando-os em segurança. Ele se mostrou colocando as mãos atrás da cabeça e descansando o olhar, onde eu tinha levantado meu vestido de linho verde para aproveitar o sol em minha pele.

— É lenta para se recuperar, esposa.

— Ainda não sou esposa. — Eu suprimi um sorriso. — Estou livre para fazer o que quiser até que os votos sejam proferidos.

— Deseja me desobedecer? — Os olhos de Eirik brilharam com malícia. — Se é o castigo que deseja, levante suas saias e eu ficarei feliz em avermelhar seu traseiro.

— E você, marido? — Puxei meu vestido mais alto e abri minhas pernas, oferecendo a vista que procurava. — Vou precisar puni-lo? Ou abandonará sua maldade quando nos casarmos?

Em um único movimento, ele se ajoelhou diante de mim. — Só tenho olhos para você, esposa. — Ele piscou, deixando claro para onde dirigia sua admiração.

Envolvendo seus longos cabelos em volta dos meus dedos, puxei sua cabeça para trás. — Helka tem me ensinado a usar o arco. Me dê uma causa e precisará se proteger.

Ele fingiu refletir, e eu me empurrei com mais força, rindo, mas aliviei meu aperto quando suas mãos descansaram logo acima dos meus joelhos. Suas mãos estavam calejadas de manejar não apenas espada e machado, mas enxada e pá, de cultivar nos campos, mas eram quentes e seu toque gentil.

— Não precisa duvidar da minha fidelidade. — Selou sua promessa com um beijo na minha coxa. — Só haverá felicidade. — Ele continuou para cima, sua barba dourada pastando suave contra a minha pele. — E muitos filhos.

Sua voz era rouca quando levou a boca aos meus cachos. Sua língua me encontrou, a ponta balançando para frente e para trás, e eu gemi, sentindo minha umidade crescer. A dor familiar agitou-se na minha barriga. Eirik me mostrou o que era desejar e ser desejada em troca.

Seu coração era meu, ele disse. No entanto, eu segurei uma parte de mim, com medo de que visse o quanto eu precisava dele.

Não fazia muito tempo, deixou Svolvaen sob o comando de Gunnolf, para fazer um casamento de aliança. O dever era mais forte que o amor, ele me disse. Mesmo agora, na véspera do nosso casamento, eu não sabia se podia confiar no meu coração aos seus cuidados.

Também não sabia se podia confiar em mim mesma.

Na noite de Ostara, quando Gunnolf me seduziu, não recebi bem esse estranha sedução que me consumia? Acreditei ter sido traída, que Eirik nunca me amara, que ele voltaria casado. Pedaço por pedaço, eu morri, deixando Gunnolf reivindicar o que Eirik havia jogado tão descuidadamente, até que mal me lembrava de quem era. Não queria lembrar.

Empurrei os ombros de Eirik, subitamente com medo, insegura de mim mesma, mas ele agarrou minha cintura e me puxou firme em direção à sua boca.

— Eu te quero. —Ele enterrou a língua mais profundamente, alcançando onde seu pênis logo seguiria. — E isso, para sempre.

Lutei apenas brevemente, segurando-me com força na parte elevada do convés até que pudesse pensar apenas que ele não deveria parar. Sempre foi assim, desde os primeiros dias, quando ele chegou a Holtholm como invasor, e eu não pude negá-lo.

Deslizei meus dedos por seus cabelos, cedendo à fome urgente de sua boca. Com uma dor ansiosa, eu o queria, mas ele levou seu tempo pois se excitava em me ver. Me provocou longa e lentamente, até que minha barriga se contraiu com dor doce e eu estremeci, cega pela luz brilhante.

Afrouxando os broches que seguravam meu vestido, puxei tudo o que vestia sobre minha cabeça, até ficar tão nua como ele, que se moveu para me cobrir.

Pressionou os lábios nas minhas pálpebras e na minha testa, e na dobra da minha garganta, afastou meu cabelo para acariciar atrás da minha orelha.

Enrosquei meus braços em seu pescoço, acolhendo seu peso e o longo deslizamento de sua penetração, perdida pela sensação de estar cheia e esticada.

— Tão apertada. Tão quente. — Ele enterrou o rosto no meu peito, chupando a cada impulso, depois roçando meu mamilo com os dentes, produzindo um prazer agudo.

Não conseguia ficar parada. Queria tudo dele. Acariciando suas nádegas, eu o puxei mais fundo, passando minhas pernas em torno das dele. — Eirik! — Eu respirei seu nome, ofegando por ar, tremendo, enquanto me abraçou com força. Um choque abrasador tomou conta de mim, quente e ardente. Levantei meus quadris para recebê-lo, chorando na profundidade de sua invasão final, arqueando quando jorrou sua semente, desejando tudo o que daria.


E

sfreguei minha bochecha em seu peito, ouvindo o bater de água contra a lateral do barco enquanto estávamos deitados juntos.

Eirik me embalou. — É minha, Elswyth. — Seus lábios tocaram o topo da minha cabeça. Com ternura, eu acariciei meu cabelo. — Eu só desejo...

Me levantei, desejando saber o que o incomodava, mas ele balançou a cabeça.

— É tolice, pois ela está morta nesses trinta anos.

Sentando, coloquei minha mão sobre seu coração. Ele falou da mãe apenas uma vez, do sequestro dela quando Eirik tinha três anos de idade.

— Quer me contar?

Uma sombra cruzou seu rosto. — Não muda nada insistir no passado.

Tirei o cabelo dos olhos dele. — Mas isso pode aliviar seu coração e...

Ele pegou meu pulso e virou minha palma para encontrar seus lábios, segurando-o lá por vários momentos. — Deseja saber o que me dói, esposa, para que possa compartilhar no entendimento.

— Sim.

Eirik voltou minha mão ao peito, segurando-a ali com a sua. Respirou devagar, a testa franzida, reunindo seus pensamentos.

— Por muitos anos, não tinha conhecimento. Só mais tarde descobri o que ninguém queria me dizer. Meu avô, jarl na época, casou-se com Ingrid de Skálavík e nasceram dois filhos: primeiro Hallgerd, depois minha mãe, Agnetha. Quando Agnetha alcançou a idade do noivado, eles prometeram a ela Beornwold, sobrinho de Ingrid, Jarl de Skálavík.

Mordi o lábio, pois sabia que esse contrato nunca havia sido cumprido.

— Hallgerd virou jarl pela morte de seu pai e rejeitou o contrato, entregando Agnetha a seu amigo mais próximo, Wyborn.

— Uma união de amor?

Eirik assentiu. — Metade do dote que iria com Agnetha foi enviada a Beornwold como compensação, e parecia que o assunto estava resolvido. Minha mãe logo deu à luz Gunnolf, seguido por Helka e eu. Mais de seis anos se passaram.

Eu fiz uma careta, sabendo que as brigas de sangue começaram por ofensas muito menores. — Mas Beornwold não havia esquecido.

— Não, Beornwold nem esqueceu nem perdoou. Após a morte de minha avó, ele veio tomar Agnetha à força, dizendo que o que havia sido prometido não deveria ser retido.

— E Hallgerd derrotou os atacantes de Skálavík em retirada.

— Sim — disse Eirik — mas não antes de meu pai tombar e minha mãe ser levada por Beornwold. — Eu apertei minhas mãos. — Svolvaen esvaziou suas lojas e cofres para sua libertação, e um pacto foi assinado. O fabricante de barcos e seus dois filhos mais velhos foram a Skálavík para construir três naves de dragagem. Em troca, não haveria mais conflitos.

Engoli em seco, me perguntando se eu era corajosa o suficiente para pedir mais. — E ela falou do que passou durante o seu cativeiro?

Eirik não respondeu, apenas olhando para o fiorde. Por fim, disse — Quando Svolvaen enviou um resgate por sua libertação, Beornwold a enviou de volta, mas não era a mesma. Acordei uma manhã e ela se foi novamente. Todo mundo estava procurando. Foi no dia seguinte que um barco de pesca a encontrou boiando lá fora.

— Oh, Eirik!

Eu me arrependi de ter perguntado.

A mãe dele havia tirado a vida, sofrendo pelo marido perdido, por ela e pela parte perdida de si mesma tomada por Beornwold. O mais triste foi que Eirik, Helka e Gunnolf haviam perdido os dois.

Eirik pegou minha túnica, passando por cima da minha cabeça, depois estendeu meu vestido verde, me ajudando a vestir antes de vestir suas próprias roupas. — Meu irmão cresceu achando Hallgerd fraco por ter assinado a trégua. Sempre falou em vingança pela morte de nossos pais, mas sabia que não tínhamos a força de Skálavík. Um ataque teria trazido o fim de tudo.

— E o que deseja, Eirik?

— Também ansiava por justiça, mas não vou pedir a outros que dêem suas vidas para aplacar minha tristeza. Todos vivemos com feridas do nosso passado. É mais sensato encontrar uma maneira de enxergar além deles. — Movendo-me para o outro extremo do barco, colocou os remos mais uma vez.

— Concluiremos as fortificações iniciadas por Gunnolf quando a colheita do verão for colhida, mas não pretendo brigar com Skálavík. Beornwold morreu há quatro temporadas e o sangue ruim acabou.

Não dissemos mais nada enquanto Eirik virou o barco. O céu ficou escuro, um crepúsculo suave antes das breves horas de escuridão.

Meu coração deveria estar cheio de alegria, mas havia um segredo alojado ali, mantido guardado nas últimas semanas. Não tinha certeza no começo, mas minha convicção estava crescendo e eu precisava contar a Eirik. Ele logo notaria por si mesmo, e deveria falar antes que chegasse a hora.

Por tanto tempo eu desejei um filho, e Freya me respondeu, mas meu passado se apegava ao meu ombro como a sombra mais escura.

Gunnolf morreu na noite em que Eirik retornou a Svolvaen, mas eu permaneci em seu poder, pois temia que o bebê que carregava não tivesse sido gerado pelo homem que amava.

Apenas mais algumas semanas, e eu direi a ele.

Mas dizer o quê?

Que seu próprio irmão, tendo me mantido sua cama, plantou sua semente onde Eirik falhou? Que seu herdeiro podia nascer dessa luxúria, e não do amor entre nós?

Eirik jurou perdão por tudo o que havia passado naqueles dias incertos, mas perdoaria isso? Certamente melhor para mim fingir certeza e afirmar que a concepção ocorreu apenas após o retorno de Eirik. Poderia até ser verdade.

Queria um casamento construído sobre confiança e honestidade. Em vez disso, começaria com uma mentira.

 

 

Elswyth


31 de julho de 960AD

—U

m brinde ao nosso jarl e à sua boa dama — berrou Olaf. Ele se elevou acima de nós, de pé sobre a mesa. — Que os deuses nos dêem esse tipo de esposas, inteligentes e engenhosas, e com a beleza superada apenas por Freya.

Eirik sorriu e inclinou a cabeça em agradecimento enquanto nossos convidados bebiam, e havia muito barulho de xícaras para serem recarregadas.

— Precisará procurar na floresta para encontrar sua namorada, Olaf! — Anders gritou do outro lado do corredor. —Alguns ursos certamente estarão dispostos a abraçá-lo.

— Não há necessidade de ir tão longe — gargalhou Halbert. — O curral de ovelhas está do lado de fora. Meia dúzia de queridas para escolher, Olaf!

Os outros rugiram na risada, homens e mulheres, fazendo gestos irreverentes. Guðrún, caminhando entre eles com seu jarro de hidromel, foi jogada de um colo para o seguinte, até aterrissar no de Olaf, com muito aplauso e com rubor, pois todos sabiam que ela nutria sentimentos ternos por ele.

Não pude deixar de me sentir satisfeita. Desde a minha chegada a Svolvaen, lutei por aceitação e aprovação. Agora, vendo como fazia Eirik feliz, seu povo me concedeu sua bênção. Fiz minha parte como anfitriã naquele dia, dando muitos beijos em bochechas.

Só Bodil, de pé, afastada, fez uma careta quando olhei para ela.

Pode manter sua aparência azeda, pensei. Pois agora estou casada e Eirik não as terá mais! Dei-lhe um sorriso inocente, mas continuou a me olhar furiosa, e me repreendi por ser mesquinha. Embora já tenha sido amante de Eirik, ele não mostrou nenhuma inclinação por ela desde que me trouxe para Svolvaen.

Resolvi aproveitar a alegria, que havia se mudado para o apoio dos cotovelos para a queda de braço. Com tanto hálito bêbado, os ataques rapidamente aumentaram, até que vários homens caíram no chão, com o rosto vermelho. Incumbiram Eirik de enfrentar todos. Os perdedores de cada luta recebiam uma punição leve, um chifre de cerveja trazido para beber em um longo gole, para mais aplausos.

Morava em Svolvaen um ano inteiro, mas ainda estava para me acostumar com a natureza barulhenta de tais reuniões. Com algum alívio, recuei, sendo um privilégio da noiva, para pedir a Sylvi que deixasse de lado o prato que ela carregava e me acompanhasse para pentear meu cabelo. Eu o deixara solto hoje como Eirik mais gostava, caindo por minha cintura.

Do outro lado da divisória de madeira da câmara de Eirik, veio o som de pés batendo e gritos de encorajamento. Fechei os olhos quando ela passou o osso esculpido no meu cabelo, deixando sua atenção me acalmar.

— Meus parabéns, minha senhora — Sylvi falou suavemente enquanto trabalhava. — E que os deuses lhe enviem suas bênçãos e toda a felicidade que uma noiva possa desejar.

Murmurei meus agradecimentos, mas não mais, pois sabia que se referia à obtenção de filhos. Ela já adivinhara, talvez, na minha condição, mas eu sabia que não diria nada. Sylvi sempre fora hábil em guardar segredos.

— Que linda está. O escarlate da noiva está se destacando em sua pele.

Sylvi tingiu a lã, embebendo-a na casca do amieiro da montanha, e a cor se tornou vívida. Toquei sua mão em gratidão. — Sempre foi gentil, Sylvi, uma boa amiga.

Ela apertou meus dedos em troca, depois puxou o pente novamente. Recolheu meu cabelo dos meus ombros, tomando cuidado para não abrir os broches de cobre presos às alças do meu vestido. Inclinei minha cabeça para trás e distraidamente toquei o adorno no meu corpete. Não apenas qualquer broche, mas os pedaços de marfim que Asta me presenteou antes de sua morte.

Asta.

Ainda podia ver o rosto dela tão claramente.

Desde a noite em que Gunnolf e Faline caíram no abismo sobre os penhascos, cessaram os rumores sobre a caminhada espiritual de Asta, e fiquei feliz, pois esse outro reino não tinha lugar ali.

O corpo de Gunnolf havia chegado à praia depois de alguns dias, embora o de Faline nunca tivesse sido encontrado. Com a espada e o escudo no peito, enviamos o jarl para a próxima vida na pira de um navio em chamas.

Me perguntei se ele e Asta haviam encontrado a paz que não tiveram neste mundo. Houve muita morte e muita infelicidade, mas Eirik estava certo, começaríamos de novo.

Fizemos nossos votos naquela manhã, na margem do fiorde, ao lado de Helka e Leif, com todos os svolvaen testemunhando nosso casamento.

Helka logo retornaria a Bjorgyn com seu novo marido, para desfrutar de outros ritos diante do próprio povo de Leif, mas, até então, celebraríamos juntos.

O olhar de Eirik não vacilou quando fazia a promessa me manter como um marido deveria, cuidando de mim, me alimentando e me vestindo, me protegendo e me dando filhos. A última que ele falou com um sorriso, que retornei quando meu coração tremia, consciente do bebê que já estava crescendo no meu ventre.

Com dois porcos e uma cabra oferecidos em sacrifício a Odin, os animais foram prontamente levados para assar. O banquete não pôde começar realmente até que a carne estivesse pronta. Mesmo assim, havia muita alegria nas mesas, cada uma com a abundância de nossa colheita no meio do verão, e todos os convidados recebiam um pão assado na forma de uma roda solar.

Embora Eirik desejasse nosso casamento sem demora, optamos por esperar um tempo aparentemente razoável e conduzir nossas festividades para coincidir com o Lithasblot, agradecendo a Urda pela generosidade com as terras de Svolvaen. O clima era agradável para amadurecer as plantações e, graças às algas que descobri nas cavernas do penhasco, curamos a doença que atormentava nosso povo. Estávamos fortes o suficiente novamente para cuidar dos campos. As primeiras frutas foram colhidas e o gado estava indo bem.

— Aqui. Tudo pronto, e é como uma capa de ouro, minha senhora. — Deixando de lado o pente, Sylvi se ajoelhou para recolocar meus chinelos. Também eram novos, feitos de couro mais macio e costurados para combinar com minhas roupas de noiva.

Parecia estranho, ainda, ter outros esperando por mim. Por tanto tempo, tinha sido pouco mais que uma escrava, primeiro como o brinquedo de Eirik, trazido das costas ocidentais da minha terra natal para seu prazer, e depois à mercê de seu irmão, Gunnolf, naqueles dias sombrios de ausência de Eirik. Em nome, eu era "livre", mas havia poucas opções diante de mim.

Tivemos a sorte de ter Alvis, o rapaz que cuidava de nosso gado, para buscar água e lenha. Mas sempre ajudei Sylvi e Guðrún, pois havia muito trabalho a ser feito, limpar a lebre da panela, amassar pão, misturar leite com queijo e manteiga, fumar e salgar carne e peixe e trabalhar no tear. Com a colheita segura, estaremos ocupados fazendo as conservas nas próximas semanas. Não importa minha posição como esposa do jarl, jurei que esses deveres não mudariam, embora eu fosse poupada das tarefas mais onerosas.

Outro rugido de risada surgiu dentro do salão. Quando Sylvi olhou para cima, ela chamou minha atenção. Suspirei, um pouco cansada, sabendo que a folia continuaria por muito tempo. Houve muito o que preparar nas últimas semanas, para essa celebração, e nós duas estávamos exaustas.

No entanto, Sylvi apenas sorriu. — Faz muito tempo desde que houve alegria, minha senhora. Devemos deixá-los se divertir.

Ela estava certa, é claro, mas eu relutava em encarar novamente os gracejos e as tolices dos homens. A porta da casa comprida estava aberta esta noite e seria fácil para mim escapar por um tempo.

Cheia com tantos, a casa estava quente e meus braços estavam nus, mas Eirik me deu um presente de casamento, uma capa na altura do joelho de material finamente tecido, enfeitada com a pele de raposa que ele caçara no inverno passado, na cor castanho-avermelhada. Coloquei-o nos meus ombros, feliz por sair. Uma brisa estremecia as folhas da floresta.

Havia apenas algumas horas de escuridão, pois ainda era o auge do verão, mas a verdadeira noite estava sobre nós agora. Mais abaixo, havia a luz distante de tochas. Ainda hoje à noite, os vigias estavam em guarda, e eu os imaginei impacientes em seus postos, esperando ser aliviados, para que eles pudessem se juntar à festa.

Subi a colina, ansiosa para deixar para trás a celebração indisciplinada. Era meu hábito procurar o ar da noite, pois muitas vezes eu era perturbada por sonhos inquietos, que me atormentavam muito tarde. Talvez isso tenha explicado meu cansaço.

Respirei fundo, desejando me libertar dos meus medos. Eirik e eu estávamos casados, e nada poderia impedir nossa felicidade. Em breve, contaria sobre o bebê, e ele gostaria de acreditar que era dele.

No entanto, algo roeu dentro de mim. Eu não sabia o que os deuses do meu novo lar fariam da minha falsidade, mas o Deus onisciente da minha antiga vida não aprovaria. No meu coração, nem eu.

Olhei para o céu, como se procurasse a resposta lá, e as nuvens se abriram para me mostrar a lua. Cheia e baixa, enchia o céu com tanta luz que fiquei deslumbrada, mas apenas momentaneamente. Assim que o orbe se revelou, uma sombra passou da qual um crânio parecia se formar, a mandíbula se abrindo em um sorriso malicioso. Queria desviar o olhar, mas a visão me deixou paralisada.

Nunca antes eu tinha visto uma coisa dessas, embora soubesse que o céu do verão trazia truques da mesma maneira que o inverno boreal.

No momento seguinte, pelo canto do olho, vi algum movimento ou ouvi passos, mas quem estava lá foi mais rápido que eu.

Uma mão de aço se fechou na minha garganta, enquanto outra apertou minha boca. Meu grito de protesto deu em nada e me fez apenas receber um tratamento mais duro, pois fui arrancada de onde estava, minhas costelas esmagadas quando fui arrastada, meus braços presos e meus pés roçando a grama.

É apenas uma brincadeira! Um dos homens de Eirik vem me levar de volta.

Exceto que não poderia ser, para quem quer que fosse, seu tratamento comigo era muito duro. Não fez nenhuma tentativa de falar, nem de me devolver ao chão, e não estávamos indo em direção à casa comprida, mas para longe, para os lados da floresta.

Eu bati, socando sua perna e depois arranhando com minhas unhas. Libertando um braço, puxei meu cotovelo com força em sua coxa, depois novamente. Com uma maldição, me virou de pé, e eu torci para arranhar seu rosto, mas apenas arranhei o couro duro que envolvia seu peito. Seus dedos ainda estavam pressionados na minha boca, e eu os mordi, apenas para ter minha cabeça empurrada violentamente para trás para meu mal.

Por fim, ele falou e com uma calma mortal. — Tente isso de novo e vou quebrar seu pescoço. — Seus olhos estavam frios, seu rosto que eu nunca tinha visto antes, uma face sem emoção.

E então eu vi as chamas.

Meu sequestrador me afastou um pouco, mas pude ver claramente que a palha da casa comprida estava acesa. A lua estava clara mais uma vez e a cena bem iluminada.

Havia talvez trinta homens, alguns ainda jogando suas tochas no telhado e pela porta.

Isso tinha acontecido tão rápido. Eu saí e não vi ninguém, mas deveriam estar escondidos atrás das casas, agachados nas sombras.

A noite se encheu de gritos e gritos desesperados. Vários surgiram da porta da casa comprida. Não estavam em condições de se defender, desarmados, desorientados, tão atordoados quanto eu. Seus atacantes os deixaram errar, cambaleando com os olhos cegos, mas suas armas já estavam desembainhadas.

Não!

Meu próprio grito de advertência foi abafado pela mão que me segurava, dedos cravando em minhas bochechas.

Mais do nosso povo surgiu pela porta, caindo no chão, ofegando.

Eirik!

Eu o vi e Helka também, tossindo através da fumaça. A bainha do vestido de Helka estava em chamas. Eirik a jogou na grama e a rolou, batendo para parar as chamas. Não viu o homem que se aproximava, que estava em pé sobre ele com uma espada levantada. Na elegância de seu casamento, ninguém duvidava do status de meu marido.

Ele era o Jarl de Svolvaen.

Houve barulho de estalos quando turfa no teto se iluminou e grandes pedaços da cobertura externa caíram no espaço abaixo.

Não havia necessidade de luar agora. As tochas encharcadas de óleo lançadas sobre nossa casa haviam feito um trabalho rápido. O céu inteiro parecia queimar.
Em meio ao brilho horrível, vi o homem pairar sobre Eirik, mais alto que os que o cercavam. As chamas iluminaram seu rosto.

O terror atingiu meu coração. Sob aquele brilho âmbar, sua pele estava vermelha e enrugada, emoldurada por uma juba de cabelos que brilhavam em cobre, e seus olhos estavam escuros de ódio. Com as duas mãos, ele ergueu a lâmina e mergulhou-a para baixo, perfurando o corpo de Eirik.

Eu gritei tão alto, que nem a mão de ferro no meu rosto conseguiu silenciar meu grito.

Eirik!

Sem ver o atacante, sem chance de se defender, ele foi derrubado. O bruto colocou o pé nas costas de Eirik, levantando-se para retirar sua espada, depois o chutou para que os olhos de Eirik vissem as estrelas.

Se aqueles olhos ainda eram capazes de ver, eu não sabia, pois não havia movimento e meu coração congelou.

Não! Não pode ser. Não está morto!

Eirik!

Deve se levantar!

O soluço que subiu na minha garganta me sufocou.

Eu devo ir até ele. Ajudem-no.

Lutei novamente, sabendo que tinha que me libertar. Embora meus braços estivessem presos, chutei de volta a canela do meu sequestrador.

— Bikkja! — Ele cuspiu a maldição e me puxou, afastando-me apenas para me dar um tapa forte na bochecha.

O mundo girou e senti o ombro do bruto na minha barriga.

— Eirik. — Tentei levantar a cabeça, fazê-lo me ouvir, mas não havia fôlego nos meus pulmões. Não via nada através das minhas lágrimas.

Estávamos nos afastando do assentamento, contornando a borda das árvores, descendo em direção ao prado, depois cortando galhos que puxavam meus cabelos. Ainda assim, seguimos em frente até ouvir o rio.

Deitada de novo, descobri que meus joelhos não me seguravam.
Eu não conseguia pensar, não conseguia me mexer. Nada fazia sentido.

Se me deixassem, me enrolaria embaixo das árvores e fecharia os olhos. Talvez não fosse real. Se fosse dormir, não iria acordar mais tarde e descobrir que tudo tinha sido um sonho horrível?

Mas não deveria ser deixada. Havia quatro pequenos barcos sentados na água cintilante. Ao nosso redor, outros estavam deslizando pela margem e pulando a bordo.

Fui jogada com muita força e caí de costas. Nós deslizamos juntos sobre folhas meio podres antes de ser jogada sobre a lateral do último navio e empurrada para dentro da área coberta.

Foi assim que vieram, invisíveis, mas de onde? E com tanta discrição.

Com qual propósito? Para me capturar? Não fazia sentido.

Destruir Svolvaen? Não prejudicamos ninguém.

Saquear nossos armazéns? Não pegaram nada.

Olhei para os rostos ao meu redor - homens como aqueles que estavam se banqueteando em nosso salão. Homens com sangue nas mãos. Fediam a fumaça.

O barco estava quase cheio e os mais próximos me examinaram. Um, cujos olhos eram mais gentis que o resto, inclinou a cabeça em minha direção. — O que é isso, irmão? Disseram-nos para não levar ninguém. Vai quebrar o seu braço ou o seu pescoço.

— Não é da sua conta, Thoryn. — Meu captor zombou. — Além disso, existem regras diferentes para mim. Eu faço o que quero.

O outro homem franziu o cenho.

— Pronto. Feito. — O grito veio da frente.

Aquele que estava sentado ao meu lado puxou uma corda de debaixo do assento, e observei silenciosamente enquanto ele amarrava minhas mãos.

— Diga uma palavra ou me dê algum problema, e eu acabo com você. — Ele apertou o nó final, depois sorriu, mostrando dois dentes faltando. — Posso fazer isso de qualquer maneira, mas não pensarei duas vezes se não ficar de boca fechada.

Quando partimos, olhei para trás, esperando ver Eirik, querendo acreditar que estivesse ileso e que tinha conseguido, de alguma forma, seguir-nos.

Mas ele não estava lá.

Não havia ninguém nas árvores acima de nós.

A brisa carregava apenas gritos distantes.

 

 

Elswyth


31 de julho de 960AD

O

s barcos eram rasos e estreitos, e os homens remavam com cuidado. Em um lugar, onde a via navegável se curvava, ficaram presos na lama e tiveram que usar todos os remos para voltar a se mover.

Vi apenas a forma escura dos outros barcos à frente, e os homens agachados diante de mim, remando firmemente para casa. Passamos por prados até que as planícies se tornassem colinas, e o rio serpenteou por um vale arborizado.

Estava sozinha e aqueles que amava estavam mortos. O povo de Svolvaen não era meu de nascimento, mas havia se tornado minha família. Tremendo, agarrei as bordas da minha capa, puxando-a para fechar o melhor que pude. Minhas mãos estavam bastante dormentes com a corda.

Meus olhos ficaram pesados pelo som constante dos respingos dos remos, mas não havia espaço para deitar ou qualquer lugar macio para descansar minha cabeça. No entanto, cochilei e acordei quando passamos por uma rocha, subindo abruptamente, o rio mais estreito do que nunca. Dos seixos e fendas cresciam árvores pendentes, cujos galhos freqüentemente roçavam a cabeça dos homens. A cada vez, eles acalmavam os remos e abaixavam os ombros para que o barco deslizasse silenciosamente sob a folhagem.

No alto, a lua havia desaparecido em um céu violeta. Fomos seguidos, mas não pelos olhos humanos. Um bando de lobos saltava sobre os penhascos acima, olhando para nós. Felizmente, havia outras presas. Somente o inverno os levava à caça imprudente.

O sol nasceu implácavel e meus lábios ficaram secos. Meu sequestrador bebeu de sua bolsa e a encheu novamente do rio, mas me afastou quando indiquei minha sede. Apenas Thoryn me ofereceu água, que eu engoli agradecida até que o outro homem a pegou.

Por fim, o abismo se abriu de um lado e a floresta desceu ao nosso encontro, trazendo o som do canto dos pássaros e o farfalhar de pequenas criaturas se movendo sob as samambaias. Os homens mal haviam trocado uma palavra em toda a nossa jornada, mas pareciam ficar mais relaxados quando as árvores se tornaram escassas, sorrindo um para o outro, felizes, eu supunha, por não estar longe de suas camas.

Embora minhas mãos estivessem atadas, parecia não ser suficiente. Próximo ao nosso destino, meu sequestrador amarrou uma segunda corda, que ele passou no meu pescoço. Cansada até os ossos, não lutei. O pouco de luta que restava dentro de mim eu conservaria para quando precisasse.

Fiquei surpresa ao ver a linha das árvores dando lugar a picos irregulares. Montanhas ferozes pairavam acima. Quando os primeiros barcos jogaram suas cordas em terra, os homens desembarcaram sem demora. Um era mais alto que o resto, os ombros mais largos e o cabelo flamejante, vermelho e selvagem, caindo pelos ombros. Ele gritou para dois que estavam esperando no píer e, quando se virou, uma nova onda de enjoo me envolveu. O lado esquerdo do rosto estava enrugado com cicatrizes grosseiras. Era o homem que matou Eirik.

Instintivamente, eu me abaixei, não desejando que me visse, pois nada de bom poderia resultar em chamar a atenção de alguém tão brutal.

Meu sequestrador esperou até que todos os outros deixassem nosso barco antes de me levantar na plataforma, depois puxou a corda amarrada no meu pescoço, me levando para cima. Mal conseguia acompanhar, tropeçando para trás, mas ele parecia satisfeito por deixar os outros nos ultrapassarem.

Não foi até chegarmos ao cume do prado que cheirei o ar salgado e vi o fiorde lá embaixo, uma faixa de prata reluzente com montanhas dominando o outro lado. O assentamento era muito maior que Svolvaen, com prédios espalhados por toda a largura do porto. A maioria dos homens se afastou, descendo para aquelas habitações, até que apenas eu e meu captor, subiamos ainda, longe da agitação principal da cidade, as encostas florestais à nossa esquerda.

À nossa frente havia uma herdade, um edifício grande o suficiente, imaginei, para abrigar várias centenas de pessoas e, de palha nova, os juncos ainda não desgastados pelo tempo. Havia currais e árvores para o gado; um cavalo estava sendo levado de seu estábulo; alguém estava pendurando peixe no fumeiro; e as mulheres estavam produzindo manteiga nos laticínios. De um prédio vinha o cheiro característico de peles curtidas, ricas e terrosas e levemente adocicadas. De outro, o martelo de um ferreiro soava limpo.

Pareceu-me uma maravilha que, enquanto o coração de Svolvaen tivesse sido destruído, e o meu com ele, aqui, a vida continuasse normalmente.

Esperava que nos aproximássemos da casa comprida, pois eu seria apenas uma escrava, trazida para servir. Se tivesse sorte, seria permitido que algo comesse e bebesse, pelo menos, antes de receber o trabalho a fazer.

— Lá não. — Vendo a direção em que eu olhei, puxou com mais força a corda, esfolando meu pescoço enquanto me guiava para frente, mais para cima da colina.

Havia outra cabana, no alto do promontório, separada. Aproximando-me, vi que tinha uma visão não apenas do fiorde e da cidade, mas também das montanhas distantes e das águas abertas ao norte, pontilhadas de pequenas ilhas. Era um ponto de observação, com uma tocha um grande poste, pronta para ser acesa em aviso.

Três homens estavam sentados, com as armas colocadas ao lado, concentrados em algum jogo. Olharam para cima quando nos aproximamos.

— O que é isso, Sweyn? — chamou um. — Entretenimento? — Ele sorriu, puxando sua barba.

Sweyn apenas grunhiu e deu um chute na porta. Hesitei, mas a corda estava firme em meu pescoço. Empurrou maliciosamente, me carregando porta a dentro, e engoli um soluço. Minhas pernas ameaçaram desabar debaixo de mim e meu pescoço era machucado. Estava com fome, com sede, assustada e doente.

A luz da porta aberta revelava um banco ao lado e um baú grande, roupas de cama empilhadas em um canto. Sweyn puxou a corda, mão sobre mão, até não haver distância entre nós.

Seu rosto tinha uma expressão de crueldade encantada quando ele alcançou meu peito, apertando bruscamente, apertando meu mamilo. — Roupas finas para uma bela dama. — Ele se aproximou. — E também é fina bem por baixo delas, eu diria.

Tentei me afastar para longe, mas a corda em volta do meu pescoço tornava isso impossível. Fiquei muito quieta, consciente do seu suor e da acidez do seu hálito.

Ele enfiou a mão dentro da gola larga do meu vestido, dedos calejados grosseiros sobre a minha pele macia, tomando posse do que agora pensava ser dele. Pegou meu peito na palma da mão, amassando a carne, depois encontrou a ponta do meu mamilo e o beliscou.

Fiz o meu melhor para permanecer sem expressão, recusando-me a mostrar meu medo. Em vez disso, falei com toda a força que pude. — Por que veio para Svolvaen? Por que me levou?

— Porque eu pude. O que isso importa? — Com um sorriso malicioso, ele retirou a mão e estalou— Tire. Quero-a nua quando estivermos fodendo.

— Eu não vou.

Segurando meu rosto, ele o virou para cima. — Vamos levar isso lá para fora. Não será tão orgulhosa quando tiver três segurando-a. Sou um homem generoso. Depois de preenchê-la, eles poderão se revezar. Então veremos se vale a pena mantê-la viva.

— Não! — A palavra surgiu estrangulada, e ele riu, os olhos brilhando com alegria maliciosa.

Estava sozinha, sem ninguém para me ajudar. Ninguém se importava se eu vivia ou morria, e eu queria viver. Não apenas pelo filho que eu carregava, mas por mim.

Se pudesse correr rápido o suficiente, passando pelos homens do lado de fora, chegaria à herdade. Lá, alguém teria pena de mim. Ficaria à mercê deles, mas as mulheres da casa não deixariam que me usassem como prostituta. Disse isso a mim mesma, convocando que força restava dentro de mim. Sabendo que só tinha uma chance, levantei o joelho.

Sweyn deve ter percebido minha intenção, pois recuou enquanto eu agia, conseguindo me virar pela metade, de modo que eu o peguei apenas parcialmente na virilha, mas foi o suficiente para fazê-lo dobrar. Amaldiçoando, me soltou e cambaleou para trás.

Com o coração martelando, corri. Ele estaria apenas alguns passos atrás, e eu sentiria o punho dele pelo que fiz. Cegamente, corri para a porta, levantando minha bainha para evitar cair. Mas devo ter julgado mal, pois a porta ficou escura e colidi com uma parede dura. Uma parede em pé três cabeças acima de mim, usando um peitoral de couro com um machado pendurado no cinto. Uma parede de puro músculo, cujas mãos agarraram meus ombros para me impedir de cair.

Minha cabeça caiu para trás e perdi todo o poder de me mover.
Era o demônio, seu cabelo selvagem uma crina de fogo. O lado do rosto estava marcado. Seu olho esquerdo mal havia se curado. As queimaduras eram recentes, mas, há muito tempo, uma lâmina cortou profundamente sua bochecha, deixando um corte na barba.

Sem pestanejar, olhou para mim e eu fui atraída por seus olhos. Mesmo naquela penumbra, vi como eles eram incomuns, verde e dourado. Havia poder naqueles olhos, como se pudesse exigir alguma coisa, e outros obedeceriam.

Testemunhei sua surpresa pela maneira como o encarei, e seu aperto aumentou, como se não tivesse certeza de que eu era real. Sua voz subiu profundamente de seu peito, rouca, como se fosse difícil para o som emergir de sua garganta.

— Eu ordenei que não houvesse prisioneiros.

Eu não conseguia ver o bruto de onde estava fugindo, mas ouvi o barulho de seus pés.

— Os deuses a jogaram facilmente no meu caminho, Jarl. Eles queriam que eu a levasse.

Em resposta, o demônio vermelho tocou o broche de marfim no corpete do meu vestido. Examinou a corda sobre meus pulsos e o laço grosso pendurado no meu pescoço. — Tome tantas escravas de cama quanto seu pênis precisa, Sweyn, mas não essa mulher.

Meu coração batia estranhamente. Deveria ser salva, afinal?

E então meu sangue se transformou em gelo, pois aqueles olhos, tão intensos, estavam sobre os meus novamente.

— Sou eu quem a possuírei, pois tenho uma dívida a cobrar.

 

 

Elswyth


1 de agosto de 960AD

R

ecebi uma caneca de soro de leite coalhado, que engoli avidamente e um pedaço de pão. Com minha fome apaziguada, minha vontade foi restaurada.

Mais de uma vez, enfrentei a morte, mas ainda estava aqui. Se os deuses tinham um plano para mim, eu estava pronta para ouvi-lo. Por alguma razão, fui levada para as mãos desse assassino; o homem que matou meu marido, que deve ter encomendado a queima de nossa casa comprida.

A lembrança disso me encheu de desejo de esvaziar meu estômago, mas eu precisava ser mais forte do que isso. A tristeza que me enchia já estava se transformando em raiva, uma emoção mais útil para aproveitar, pois poderia me manter viva.

O jarl ordenou que eu fosse lavada e fui levada para a casa de banhos. Os escravos não olharam para o mestre quando lhes deu suas ordens, nem queriam olhar para mim, a princípio.

A cabana era grande o suficiente para abrigar uma família, mas continha uma grande banheira de madeira, montada como um barril. Nunca tinha visto isso, nem a maneira como foi enchida. Acima da fogueira, o caldeirão estava suspenso por correntes, pendurado em uma haste de metal, e um longo bico emergia de seu lado.

Aquelas que me trouxeram para dentro tiveram que empurrar a metade inferior do caldeirão para que caisse água na banheira.

Devem ter sido necessários oito caldeirões para deixar a água ao seu nível atual. O banho não tinha sido planejado para mim, disso tinha certeza. Havia uma mesa ao lado da banheira, sobre a qual havia roupas de cama e sabão.

As duas mulheres me ajudaram a me despir e subir os degraus, segurando minhas mãos enquanto eu me afundava na água fumegante. Gradualmente, ficaram mais corajosas, e eu as vi olhar uma para a outra e voltar para mim. Viram o leve arredondamento da minha barriga, a curva distinta, baixa. Eirik pensou que eu estava apenas comendo bem, mas podia ver que elas sabiam melhor.

Deveria ganhar a confiança delas. Talvez saibam uma maneira de eu escapar.

Ou, se eu permanecer e viver o tempo suficiente para ver o nascimento do bebê, poderão encontrar um local seguro para a criança ser criada. Não queria pensar nisso. Não conseguia pensar nisso, pois tal coisa parecia muito distante e muito triste com tudo o que havia acontecido nos últimos dias e noites.

Mas precisava delas, então sorri enquanto esfregavam minhas costas e inclinei minha cabeça para lavarem meu cabelo. Murmurei meus agradecimentos e perguntei seus nomes e de onde vieram. Apenas deram de ombros com isso. As duas nasceram aqui, Thirka e Ragerta, e sempre foram escravas.

O nome deste lugar? Skálavík.

Lutei contra o meu medo quando ouvi.

Apenas dois dias atrás, Eirik me contou sua história, sobre os atos sombrios de Beornwold de Skálavík. Mas esse jarl, o demônio, não era Beornwold.

Eu forcei minha memória. Meses atrás, ouvia Gunnolf planejar a aliança que fortaleceria Svolvaen. Eirik sugerira casamento entre Helka e o novo jarl de Skálavík. Ela protestou veementemente, mas Gunnolf descartou a ideia de qualquer maneira, pois o jarl era recém-casado, ele disse.

Isso era alguma coisa! Se puder falar com a noiva dele, certamente sentirá pena de mim, pois perdi muito. Qualquer pessoa com um coração sentiria minha dor. Perguntaria sobre ela, quando tivesse a chance. Mas primeiro, queria conhecer mais do meu inimigo, do homem que havia destruído tudo o que amava.

— A Besta, eles o chamam de Aifur — disse Ragerta. — Embora o nome de nascimento dele seja assustador o suficiente.

— A montanha de fogo, é isso que significa, Eldberg. — Thirka baixou a voz, como se dissesse que o conjuraria na sala.

— E o que fez para ganhar essa reputação? — Virei o sabão em minhas mãos, fingindo uma indiferença que não sentia.

Ragerta olhou para a porta. — Dizem que foi levado pelos berserkers quando menino e criado entre eles como escravo, mas que sua bravura lhe rendeu sua liberdade e lutou entre eles por um tempo.

— Já ouviu falar daqueles homens que são mais parecidos com bestas? —adicionou Thirka. — Usam apenas a pele de ursos ou lobos e vivem como eles, na floresta.

— Podem até pular fogo sem serem prejudicados. — Os olhos de Ragerta estavam arregalados.

— Ele afirma que pode fazer isso?

— Não. Nunca fala dessa vida. — Ragerta se mexeu inquieta, seus olhos se afastando. — Apenas uma vez ouvi um homem mencionar isso, um comerciante, anos atrás, antes de Eldberg se tornar jarl. Fez uma piada, sobre ir para a floresta não para caçar animais selvagens, mas para acasalar com eles.

— O que aconteceu? — Parte de mim não queria saber, mas ainda ouvia.

— Era como se estivesse possuído. —Sua voz ficou mais baixa. — Seu rosto ficou quente e inchado, e começou a tremer por toda parte, tão grande era a sua raiva, como se quisesse se transformar em uma verdadeira fera diante de nós.

— E os dentes dele! — Thirka chiou. — Arreganhou os dentes como se quisesse morder.

— E o comerciante?

— Nunca vi ninguém mais assustado. Ele congelou, encolhido, depois recuperou a razão e fugiu. Eldberg o seguiu para fora. Thirka empurrou o punho contra a boca, incapaz de continuar.

Olhei para Ragerta, incentivando-a a terminar a história.

Mordeu o lábio, acrescentando rapidamente. — Quando voltou, estava segurando algo pequeno, que jogou para os cães.

Engoli de volta um gosto repentino de bile. Era uma coisa horrível profanar um corpo.

— O barco dele se tornou o de Eldberg, é claro — disse Thirka.

No momento seguinte, senti uma corrente de ar nas costas e as duas mulheres se encolheram, seus rostos transformados pelo medo, um medo terrível.


A

braçando meus joelhos no meu peito, fiquei muito quieta. Embora não pudesse vê-lo, ouvi o peso de seus passos e senti sua presença atrás de mim.

Thirka e Ragertaboth se apressaram para partir, nos deixando a sós.

— Levante-se. — Aquela voz rouca novamente, as palavras ditas abruptamente, esperando ser obedecida.

Não respondi, nem me movi.

Foram necessários apenas dois passos para ele me alcançar, colocando a mão minha nuca, e meu coração pulou no meu peito. Não era apenas um estranho tocando minha pele nua, mas o homem que assisti matar meu marido, um homem que eu tinha todos os motivos para odiar.

Estava com muito medo de olhar para ele, nem desejei obedecer, mas o que deveria fazer? Poderia argumentar com um homem assim?

Antes que tivesse a chance de decidir, a pressão na minha nuca aumentou. Lentamente, ele me levantou. A realização me fez espalhar água, depois cuspir em choque. Meus pés tropeçavam para se manter enquanto minhas mãos voavam para onde ele me segurava, mas não havia como combater sua força. A água escorria dos meus cabelos e descia pelo meu corpo.

Somente quando me colocou em pé, me soltou, me virando para encará-lo. Minha humilhação foi imediata, e eu trouxe minhas mãos para me cobrir, embora o gesto fosse ridículo. Agarrou-me pelo queixo, me virando para a luz do fogo.

— Vai olhar para mim.

Abaixei meus olhos por vergonha, mas ergui naquela hora.

A sala estava quente com vapor, mas eu tremi.

Como antes, me estudou intensamente, não meu corpo, mas minha boca, nariz e olhos. Sua sobrancelha ficou tensa em concentração. — Se parece com alguém... — Sua voz sumiu. — Impossível, é claro, pois não é uma mulher de Skálavík, nem mesmo uma mulher de Svolvaen.

— É verdade — afirmei claramente, determinada a não ser intimidada. — Eu venho de Holtholm, muito a oeste, e ainda estaria lá se Eirik e seus homens não tivessem procurado refúgio conosco durante uma tempestade. Fui de bom grado a Svolvaen, não como escrava de Eirik, mas como uma mulher livre. — Segurei meu queixo um pouco mais alto. — Ontem, ele me fez sua esposa. — Conforme disse isso, a lembrança do que aconteceu veio como um flash.

Ele não disse nada.

— É seu hábito sequestrar mulheres de seus aliados e queimar suas aldeias? Que tipo de homem é?

Eu me afastei de suas mãos. Ele não tinha o direito de me tocar.

— Eu vi! Não deu a Eirik a chance de ficar de pé. Ele nem sabia quem o estava atacando.

— Não era meu plano sequestrá-la. Isso foi algo de Sweyn, sozinho, e acredito que não sabia quem era, apenas uma mulher que gostou. Mas os deuses a trouxeram para minhas mãos, assim como trouxeram a boa sorte de encontrar todos os Svolvaen reunidos em um só lugar, e seu marido de madrugada aos meus pés. Eu o desejei morto, e ele está. Lamento apenas que sua morte tenha sido rápida demais. Quanto aos aliados, não reconheço nenhum tratado!

Recuei horrorizada, porque nunca ouvi um homem falar sem honra. — Era meu marido. O homem que amei!

O lado direito da boca se curvou em um sorriso de escárnio. Era escrava dele, submissa, e de seu irmão, ao que parece, quando este Eirik a abandonou.

Sua declaração me chocou em silêncio. Baixando a cabeça, senti a vergonha daqueles dias sombrios. — Eirik me amou e voltou. Não queria outra mulher. — Tropecei na minha explicação, sabendo que nada poderia desculpar as escolhas que fiz. — Eu acreditava que havia sido abandonada, mas estava errada.

Teria que viver com meus pecados e, ainda assim, arrancaram meu coração. Talvez fosse infiel, minha vontade de sobreviver mais forte que minha fidelidade. Mesmo me tornando a noiva de Eirik, não consegui falar honestamente, sem confessar meu medo de que o filho que eu carregava fosse de Gunnolf.

No entanto, por tudo isso, precisava da honestidade desse homem. Precisava saber por que atacou Svolvaen. Embora desejasse cuspir na cara dele, me acalmei.

Enrolando meus braços com mais força sobre meu corpo, enquadrei minha pergunta com cuidado. — Quebrou nosso tratado de paz. Por que razão?

A resposta de Eldberg foi puro gelo. — Vê meu rosto, isso foi causado pelo assassino que seu jarl enviou a Skálavík.

Eu não entendia — Eirik desejou paz. Ele nunca teria...

Eldberg me interrompeu antes que eu pudesse dizer mais. — E, ainda, minha esposa e meu filho ainda não nascido estão mortos por sua ordem de seu jarl, de Gunnolf.

A esposa e o filho dele? Mortos?

Nos últimos dias, uma loucura estranha tomou conta do nosso antigo jarl. Ele não confiava em ninguém. Foi violento e cruel, mesmo para aqueles que desejavam servi-lo. Poderia ter ordenado alguma ação terrível?

Mas Eirik não sentia culpa pela ação de seu irmão.

Comecei a explicar, mas Eldberg se lançou em minha direção.

— Não muda nada! — A cada palavra, ele me sacudiu. — Seu marido não fez nada para conter o mal do irmão e por isso mereceu a morte. Seu sangue roubou o que eu mais considerava, e retribuí em espécie. O fim dele foi rápido, mas o seu castigo se desenrolará à minha vontade.

Eu chorei, porque ele estava me esmagando dolorosamente.

— Agora não é mais que minha escrava e servirá na minha cama, disposta ou não, até que me chame de seu mestre, abandonando qualquer lealdade que deu ao jarl de Svolvaen.

— Nunca! — Eu levantei minha mão para golpeá-lo, mas ele pegou meu pulso e torceu meu braço. Gritei, lutando.

Meu instinto foi escapar de seu domínio, fugir, embora não houvesse lugar para eu ir. Estava nua e sem amigos, e mais sozinha que nunca. Mas poderia me submeter como pedia? Cada batida do meu coração protestou. Deveria ser humilhada e mantida com medo, sabendo que qualquer dissidência traria pior punição.

Ofeguei através das minhas lágrimas. — Eu imploro sua misericórdia. Saiba que imploro não apenas por mim, mas pela criança que carrego. É inocente e não deve ser punida.

Soltando-me, deu um passo para trás e, desta vez, foi o meu corpo que recebeu sua avaliação pelo brilho da luz do fogo: meus seios, depois minha barriga, permanecendo na área entre minhas pernas e descendo por seu comprimento.

Com um sorriso zombador, segurou meu peito, medindo seu peso e suavidade, roçando meu mamilo com a impressão grosseira de seu polegar. A outra mão, deitou no meu ventre. Seu toque foi gentil, mas eu estremeci. Lágrimas de vergonha picaram meus olhos enquanto ficava impotente.

Eu resisti muito, casada com um marido porco em Holtholm, submissa, mesmo nas mãos de Eirik nos primeiros dias, atormentada nos longos meses de sua ausência, quando Gunnolf se tornara meu amante. Não poderia suportar isso também?

Havia um brilho escuro nos olhos de Eldberg quando abaixou a mão, roçando os cachos da minha fenda. Seu dedo me separou e estremeci. Lentamente, empurrou um dedo para dentro. Eu me virei, não desejando que visse meu rosto, mas ele rosnou, me comandando com aquele som selvagem para encontrar seus olhos. Estavam cheios de sombras.

Empalantes, impiedosos, continham algo muito mais consumidor do que luxúria.

Um vazio.

Sua voz era um sussurro cruel, mesmo quando enrolou o dedo dentro da minha carne. — Talvez na primavera a leve a Kaupang ou Hedeby e venda no mercado de escravos. Algum velho rico a compraria, e a criança, ou um dos bordéis da classe alta. Poderia encontrar um comerciante de um dos haréns do leste; eles valorizam uma tez pálida e cabelos como os seus.

Não pude conter um grito estrangulado.

Ele não poderia!

Mas é claro que poderia. O que lhe importava?

Retirando suas mãos, ele as trouxe para minhas bochechas, me ordenando novamente a olhar em seus olhos. — Ou em pagamento pelo meu filho assassinado, não devo matar esse bebê quando nascer?

Deus me ajude, e Freya também.

Poderia viver comigo mesmo se me tornasse sua prostituta voluntariamente? Se permitisse ou não, ele faria o que queria. Não era melhor aceitar o que eu não pude lutar contra? Permanecer viva? Se eu o agradasse, poderia ganhar favores? Talvez até a minha liberdade?

A luta me deixou. Por enquanto, diria o que fosse necessário. Faria o que pediu. Eu suportaria.

— Juro pela vida da criança que levo, o servirei. Serei sua escrava e me submeterei a tudo o que mandar. — Eu me obriguei a segurar seu olhar de aço.

Houve um último lampejo em seus olhos antes que sorrisse, e senti uma onda de enjoo. Não sabia com o que havia concordado.

 

 

Eldberg


1 de agosto de 960AD

—S

eja rápido com isso. — Eldberg jogou um pano para ela. Apertou o linho no peito enquanto se secava, tentando cobrir sua nudez.

Um pouco tarde para isso. Estava tentando não chorar.

Ele a viu sair da água. Quase o fez gargalhar, clemência por ela carregar um filho. O fato apenas despertou sua raiva de um lugar mais profundo.

Três meses se passaram, e a dor estava gravada para sempre em sua alma. Sentia isso constantemente. A escuridão. O desespero.

Viveu com apenas um propósito agora.

Vingança.

Incendiou Svolvaen e amaldiçoou todos eles a Hel enquanto gritavam. Viu os homens responsáveis pela morte de Bretta pagarem por isso com suas vidas. Foi vitorioso sobre seus inimigos. E ainda o veneno fluía por suas veias.

Elswyth estava prendendo os broches em seus ombros, dedos elegantes trabalhando o alfinete. Aquele vestido! Muito parecido com o de Bretta no dia em que se casaram.

Algo nela o deixava desconfortável. Esse era o truque de Loki? Alguns acreditariam que era o trabalho dos deuses. O humor deles pode ser mais cruel que o de qualquer homem.

Sweyn deve ter visto a semelhança. Foi por isso que ele a capturou, certamente. O mesmo cabelo sedoso, caindo espesso sobre os ombros, a mesma inclinação para cima dos olhos, a mesma curva recuada para o lábio superior. Mais do que isso, o jeito que ela mexia as mãos e inclinava a cabeça.

Era um eco da sua esposa perdida. Quando a encontrou na casa de vigia, vendo-a naquela penumbra, só por um momento, pensou que fosse Bretta encontrada novamente, não morta, afinal das contas.

A realidade disso trouxe um golpe, como se já não tivesse sofrido o suficiente. Não sua esposa, mas a de seu inimigo, entregue em suas mãos.

Ah, sim. Odin havia lhe apresentado a oportunidade de um tipo diferente de vingança. As possibilidades eram quase esmagadoras.

Ela também sabia disso.

O bem mais precioso de seu inimigo à sua mercê, tornando-se sua escrava de boa vontade. Poderia destruí-la em uma única noite, se quisesse ou em uma única hora. Mas havia caminhos mais agradáveis até o fim que ele procurava.

Se o jarl de Svolvaen visse essa cena do Valhalla, o que ele veria? Sua amada açoitada e estuprada?

Não.

Havia uma maneira melhor.

Pedaço por pedaço, ele a reduziria, até que se submetesse acomo nunca fizera ao marido. Temendo o pior tratamento, ficaria grata pelo que recebeu e ele ofereceria não apenas o tormento da dor prevista, mas também o prazer.

Estava de pé no vestido de noiva usado para seu inimigo, esperando-o, Eldberg, para comandá-la. Com o tempo, a faria ansiar e implorar. A faria implorar por ele. Ele a faria trair o que pensava que acreditava.

Essa seria sua verdadeira vingança.


O

ar estava denso com o cheiro de javali assado, um banquete para os homens que retornam, em recompensa por uma missão bem cumprida. Eldberg os deixou ver seu prêmio, guiando-a pela corda que Sweyn amarrava em seu pescoço, embora deixasse suas mãos livres.

Caminhou firmemente atrás dele, com os pés firmes e a cabeça erguida, embora baixasse os olhos. Um silêncio se fez no meio da folia, enquanto observavam o jarl obrigar sua aquisição ao longo da casa comprida. Sweyn assistiu o mais próximo de todos.

A divisão era apenas uma cortina. Ela estaria ciente disso, sabendo que aqueles do outro lado seriam capazes de ouvir tudo o que se passava entre eles. Saberia também que os homens dele imaginariam o que estaria fazendo com ela?

Uma nova mulher sempre era interessante. Uma nova escrava sempre uma possibilidade e uma tentação. Deixaria claro que era dele, que, por enquanto, proibia que qualquer um a tocasse. Mas ela não saberia disso. Que tema e sinta a misericórdia dele ao mesmo tempo.

Fora de vista, o barulho do banquete continuou, risadas e comentários obscenos além da divisão que separava sua câmara do resto do corredor.

Eldberg pretendia começar imediatamente. Como ela passasse suas primeiras horas daria o tom para o que estava por vir.

Poderia deixá-la passar a noite no chão, os tornozelos e pulsos amarrados, o laço apertado em volta do pescoço, presa a um gancho na parede. O pensamento de vê-la assim provocou um choque em sua virilha, mas havia outras maneiras de fazê-la sofrer, não como uma cachorra espancada e acorrentada.

Quando pediu que retirasse suas roupas, não houve discussão. Eldberg tirou um pedaço de seda jade de seu baú. Estava entre as melhores roupas que trocou em sua última viagem a Hedeby. Seda que comprou como presente para Bretta, que ela nunca teve a chance de costurar em um vestido, guardado na câmara de Sigrid.

Fez um gesto para Elswyth para que ela colocasse suas roupas sobre o baú. Pegaria mais tarde, para que soubesse que não tinha nada com o que se cobrir.

Esse privilégio teria que ser conquistado.

Colocou os braços em volta dos seios, como se quisesse se confortar, mas não fez nada para cobrir entre as pernas. Fez questão de olhar para aquela parte dela enquanto rasgava a seda em tiras. As fibras cederam facilmente, rasgando a trama, a destruição de algo que tinha sido bonito.

Fez um gesto com a cabeça novamente para ela deitar na cama, esticar os braços e as pernas, expor-se, para que nada estivesse oculto.

A palma da mão dele encontrou a dela brevemente enquanto dava seu primeiro nó. Suas mãos, pequenas e graciosas, cerraram os punhos. Olhou-o com os olhos arregalados, incrédula e depois renunciou quando a amarrou com a seda, cada pulso, cada tornozelo, e depois olhou para as vigas.

Como estava pálida. Seus cabelos grudavam na pele, mechas sobre cada seio. Seus mamilos, grandes discos de rosa, fizeram sua boca secar. Se pegasse os botões de rosa entre os dentes, lambesse e chupasse, gemeria da mesma maneira que Bretta fizera? Ela avançaria, precisando que ele levasse sua suavidade mais fundo em sua boca, precisando que a possuísse?

Não. Ele sabia a resposta para isso.

Como cativa, não podia fazer nada para impedi-lo de tomar seu corpo, mas podia reter sua mente. Para que sua vingança fosse completa, ele também queria isso.

Havia muitas maneiras pelas quais ele poderia subjugá-la, mas, por enquanto, daria a ela algo em que pensar.

— Olhe para mim. — Ele se inclinou perto o suficiente para que ela sentisse a respiração dele no rosto, perto o suficiente para que o gibão de couro roçasse seu seio. Estaria ciente de seu peso, saberia que poderia esmagá-la simplesmente deslocando seu corpo sobre o dela.

Ainda assim, olhou para as madeiras, mas ele guiou o queixo para baixo, até que ela permitiu que seus olhos se encontrassem. Falou suavemente, deixando cada palavra se desenrolar. — Um dia, em breve, me dará tudo.

Mostrando a última tira de seda, ele a envolveu com os nós dos dedos, apertando-a com força, depois colocou a tira sobre os olhos dela.

Ela apertou os lábios, sem dizer nada enquanto ele segurava. Somente quando colocou as mãos sobre as costelas dela, ela respondeu com um suspiro trêmulo. O pulso dela acelerou. Ela tremeu.

O que ela estava imaginando?

Que ele iria fodê-la?

Nesta posição, deitada aberta, ela poderia ter certeza disso.

E se ele lhe dissesse outra coisa?

Que mandaria seus homens, dedos gordurosos com carne, bocas ansiosas sobre ela, erguendo os quadris para encontrar seus impulsos, um por um, até que ele decidisse que o castigo dela era suficiente.

Sim, ela acreditaria nisso.

Seu peito subiu e caiu, e engoliu em seco, a preocupação em seus lábios. Ela se mexeu, testando os laços. Não eram tão firmes que não conseguisse se mexer. Um pé flexionado. Esticou os dedos e depois os fechou.

Ele não disse nada, sabendo que diria a si mesma muito mais.


E

ldberg havia oferecido sacrifícios diários aos deuses, e olhavam favoravelmente para ele. As cicatrizes permaneceriam, mas manteve todos os dedos na mão esquerda. O resto foi superficial. Mesmo onde seus cabelos e barba estavam chamuscados, havia um crescimento.

Ainda assim, a dor o testou, pinicadas estranhas onde o tecido tocava, um sinal de sua cura. Somente os olhos daquele lado realmente o incomodavam. Os cílios se foram substituídos por pele com bolhas. Alguma visão permaneceu, mas, com o olho semicerrado, era difícil avaliar a distância. Quando ele se cansava, até suas próprias mãos se recusaram a entrar em foco.

Se os outros sabiam, ninguém havia falado sobre isso, e se Sweyn ou qualquer outro pensava em usurpá-lo, esperaram demais para agir de acordo com essa ambição. Os mais próximos de Eldberg serviram com medo, mas também com respeito. Quem dentre eles se atreveria a afirmar-se seu rival, apto a ocupar seu lugar?

Não esperavam que ele pegasse suas armas. Ainda não. Nem esperavam que liderasse o ataque a Svolvaen. Ele se esforçou para fazer as duas coisas, para mostrar que era tenaz, um homem cuja força vital queimava mais forte do que as chamas enviadas para consumi-lo.

Naquela noite, Eldberg foi atormentado por faíscas de dor em seu lado. Em resposta, bebeu mais hidromel do que se sentaria bem no estômago e deixou a festa continuar por mais tempo do que ele pretendia.

Fiske e Hakon tentaram atraí-lo para uma conversa, evitando qualquer pergunta sobre a mulher, embora a curiosidade fosse evidente.

Sweyn não disse nada, sentado à parte, incapaz de esconder sua carranca.

Eldberg deixou passar. O homem tinha o direito de alimentar seu descontentamento, desde que não demonstrasse desrespeito total.

Foi uma provação sentar-se tanto tempo, sabendo que ela estava deitada em seu quarto, mas a espera faria o trabalho dele por ele. Somente quando a maioria dos homens desmaiou nos bancos compridos, ele voltou.

O pavio tinha queimado baixo, mas a luz era suficiente para ele ver seu corpo esbelto, pálido como a luz da lua, esticado sobre as peles de ovelha, ocupando a cama em que ele teria se jogado se estivesse sozinho.

Atiçada pelo som de seus passos, ela torceu contra a seda que continha, esforçando-se para identificar quem estava na câmara.

Ficou ao seu lado, deixando-a sentir sua presença. Ela conheceria o cheiro do corpo dele e o ritmo com que respirava.

Ela levantou a cabeça e ele pensou por um momento que diria alguma coisa, mas recostou-se novamente.

Seu pênis ficou duro. Seu corpo lembrava a satisfação de entrar em uma mulher.

Nas horas que se passaram, teve tempo de planejar. Do baú, puxou a menor das colunas de mármore e o cinto que a acompanhava. As tiras de couro eram duras, novas. Outro presente para Bretta, um que ela nunca viu. Ele esfregou o polegar sobre a pedra.

Uma coisa estranha, pensou, mas o comerciante que o vendeu o dispositivo garantiu que as mulheres nobres do sul do Mediterrâneo as usavam. Havia cinco peças de mármore, cada uma ligeiramente mais larga e mais longa que a anterior, cinzelada e depois polida. Apenas o bastão final tinha alguma semelhança com seu próprio órgão, mas o comerciante havia explicado o pensamento por trás da progressão.

Algo sobre isso o despertou, a idéia de assistir Bretta tocar a coisa contra aquela parte dela que foi projetada para seu prazer. Observando-a empurrar a pedra fria dentro de seu calor, movendo-a para dentro e para fora e pensando o tempo todo o que realmente queria.

Que o desejava, Eldberg nunca duvidou. Serviu a Beornwold por mais de dez anos antes do velho acertar o contrato. Naquela época, Eldberg viu Bretta crescer de criança para mulher, e viu como ela o admirava. Timidamente, a princípio, pois ela era inocente. Mais tarde, com uma intensidade que falava da paixão que traria para a cama do marido.

Ele esperou, não se casando, tornando-se indispensável para o velho. Não havia ninguém mais forte, ninguém mais formidável, ninguém mais capaz de assumir o comando de Skálavík. Depois que Beornwold percebeu isso, o acordo foi direto.
E Bretta, tão bonita, tão ansiosa e apaixonada, era dele.

Eldberg fez uma careta. Sempre, voltava a isso, para o que tinha sido dele e o que havia sido tirado dele.

Movendo-se para a cama, levou a mão diretamente a ela, a palma da mão contra cachos macios, os dedos pressionados na abertura do sexo dela.

Ela sacudiu, tentando evitar o seu toque. Sua barriga, suavemente arredondada, movia-se rapidamente com a respiração. Contra a ponta gorda do polegar, a pele dela estava fria.

Mas não é assim para a carne entre as pernas. Lá estava quente.

Como seria para ela ficar aqui, exposta, todo esse tempo?

Sem dúvida, seus ombros estavam doendo, embora ele a tivesse amarrado e dado folga suficiente para permitir que ela flexionasse os cotovelos.

O que ela mais temia?

Uma mudança sutil localizou seu inchaço.

Assim, ele deu prazer a Bretta, com os dedos e a língua. Havia uma maneira de estimular uma mulher, assim como havia um homem.

Mergulhando lá dentro, pegou aquele creme e esfregou levemente a parte que seria incapaz de controlar. Ela se afastou, mas seus quadris empurraram para frente, encontrando a carícia novamente.

A cativa dele.

Ele jogou o jogo pacientemente, deixando-a resistir com protestos murmurados, afastando-se e depois avançando em sua direção até que a umidade cobria não apenas os dedos, mas as coxas dela.

Algo dentro dele se apertou.

Abrindo-a com uma mão, ele tocou a barra de mármore contra sua suavidade.

— O que é isso?

— É com o que concordou, escrava. Nada mais.

Com um único empurrão, deslizou a coluna dentro dela.

— Eu não quero isso — Ela moveu os quadris, depois se abateu, tentando expulsar a coisa que a enchia.

— Uma maneira ingrata de se comportar quando recebe um presente.

Quando ela se levantou novamente, tentando sacudir a vara, Eldberg enfiou o cinto de couro embaixo das costas. Seus dedos não eram tão ágeis quanto antes, e o pavio tinha quase queimado, mas não precisava de sua visão para prender a correia em volta da cintura dela.

— O que está fazendo?

No escuro, enfiou a vara no suporte de couro e colocou as correias sobre o abdômen inferior, amarrando-as na frente do cinto. Estes, puxou com força, de modo que o eixo de mármore foi completamente puxado para dentro de seu corpo, mantido firmemente no lugar.

— Eu não quero isso! — ela sussurrou de novo e se debateu, depois emitiu outro som de raiva e ficou imóvel. — Quando me movo...

Satisfeito, puxou uma das peles de ovelha da cama e a jogou no chão. Ela teria a noite toda para ferver.

De manhã, aliviaria o desconforto dela, pelo menos por um tempo.

— Tire isso — disse ela calmamente. — Por favor.

Ele sorriu.

— Já está implorando?

 

 

Elswyth


1 de agosto de 960 dC

E

u imaginei todas as maneiras que poderia matá-lo. Uma lâmina no coração ou um corte em seu pescoço. Talvez um machado no crânio ou um veneno de ação rápida. Até espancá-lo até a morte com a coisa que deixou dentro de mim.

Quando inclinei meus quadris, senti uma dor de desejo em meu sexo. Foi provocador e humilhante de uma maneira que não pude expressar em palavras.

E quanto tempo ficaria amarrada?

As restrições só se irritaram quando lutei, então fiquei quieta e tentei desviar meus pensamentos.

Concordei em obedecê-lo pelo bem do bebê que carregava e também pelo meu bem, já que não queria morrer, mas meu sangue ferveu.

Eu me vingaria, não apenas por mim, mas por Eirik e todos os de Svolvaen.

Era um bruto horrível, que matou o homem que eu amava e, o que quer que pensasse, nunca pertenceria a ele.

Em sua loucura, Gunnolf havia condenado Svolvaen a seu destino cruel, e todos nós pagamos o preço. Eldberg havia sido injustiçado, mas não fomos os culpados, e não havia justiça na retribuição que trouxe sobre nós.

A fera se deitara no chão, o cheiro de hidromel forte em seu hálito. Enquanto eu estava acordada, ele roncou.

Por fim, devo ter cochilado, pois acordei com a penumbra do amanhecer filtrando através do buraco de fumaça nas vigas, e o homem que eu detestava em pé acima de mim, segurando a faixa que cobria meus olhos.

— Eu preciso mijar. — Não fiz nenhum esforço para esconder minha carranca. — E beber um pouco — acrescentou com menos brusquidão. Não estava em posição de mostrar meu temperamento.

Ele tinha sido valente e brutal no dia anterior, mas parecia deprimido esta manhã, com o rosto cinzento. Não disse nada e se moveu como se estivesse desconfortável.

Uma cabeça ruim, eu esperava, de muita bebida. Talvez suas costas estivessem rígidas por causa da noite no chão.

Desatou o cinto e amarras de minha cintura primeiro, puxando sua mão pela minha barriga, deixando seus dedos roçarem meus cachos úmidos antes de puxar o que havia me atormentado. Não pude deixar de ofegar quando saiu do meu corpo.

Graças aos deuses!

Alívio e mais alguma coisa.

Estava um pouco dolorida por ter ficado preenchida, mas também muito molhada. Tendo mantido a coisa dentro de mim por tanto tempo, parecia estranho que ela se fosse.

Com a libertação de meus pulsos, meu impulso foi arranhar o rosto dele, mas eu não era uma tola. Seja qual for o estado em que estava, continuava mais forte do que eu. Se quisesse infligir dor, teria que esperar até que conhecesse melhor este lugar e ter um aliado para me ajudar a escapar.

Mesmo com todos os quatro membros livres, não conseguia me corrigir. O tempo de imobilidade me deixou rígida, minhas mãos e pés cheios de alfinetadas. Esfreguei meus pulsos, balancei-os, girei meus ombros e depois meus tornozelos. Tudo doeu.

Com um grunhido, Eldberg me levantou para sentar e pegou um penico no canto.

Mais humilhação!

Uma prisioneira neste quarto, amarrada à cama, empalada e fazendo xixi em uma panela.

Cerrei os dentes, me colocando na beira da cama. Cautelosamente, agachei-me sobre a tigela.

— Vire-se, não consigo! — Lancei-lhe um olhar sombrio.

Ele resmungou novamente e chamou Ragerta. Deveria estar esperando, pois apareceu rapidamente.

— Comida e cerveja para nós dois. — Ele passou a mão pelos cabelos desgrenhados. — Água quente e um pano.

Quando me empurrou de volta para a cama, pegou o penico e passou para ela.

— Se livre disso.

Ela olhou para mim, não mostrando nenhuma surpresa com o meu estado nu. Claro que não faria. Todo mundo sabia do meu propósito na câmara do jarl.

Já havia vozes e movimentos na parte principal do salão.

Malditos sejam, pensei. Eram os homens que queimaram Svolvaen. Os homens que me levaram para este lugar. Esperava que a comida rica que haviam comido na noite anterior tornasse o intestino líquido. Esperava que se sentissem tão mal quanto Eldberg.

Enroscando meus pés embaixo de mim e meus braços em volta do meu corpo, encolhi-me no canto. Graças à estação do ano, não senti muito frio, mas desejei me cobrir e recuperar alguma dignidade.

Ele se sentou pesadamente na beira do colchão, com a cabeça nas mãos, e eu pensei novamente em dar um golpe em seu crânio. Mas eu não tinha arma, nada de peso suficiente. O arnês e aquela coisa de pedra estavam sobre o tronco, fora de alcance.

No retorno de Ragerta, pegou a caneca dela e bebeu, limpando a boca e acenando para que ela a enchesse novamente. Sentindo sede, fiz o mesmo.

Havia mingau, exatamente como o grøt que Sylvi costumava fazer, adoçado com mel. Comi faminta, raspando com a colher.

— Não precisa me amarrar novamente — arrisquei. — Tem o meu juramento de que cumprirei nosso trato.

Eldberg olhou por cima do ombro, enxugou a boca novamente e jogou a tigela para longe.

— Farei o que quiser. — Deixe-o pensar assim! Encarei as costas dele, mas, ajoelhando-me para frente, toquei seu cabelo, gentilmente erguendo-o acima da orelha esquerda, revelando as cicatrizes que corriam pelo pescoço.

Ele se moveu mais rápido do que eu imaginava capaz, segurando meu pulso, torcendo-o para longe.

Gritei, mas ele apenas se afastou com mais força, me deixando deitada na cama novamente, seu peso caindo sobre mim.

— Não consigo respirar!

A outra mão dele veio à minha garganta. — Nem pense em me seduzir com mentiras, escrava. — Sua coxa ficou entre as minhas. — Vou saber quando realmente deseja me agradar. — Soltando seu aperto no meu pescoço, abaixou a mão, apertando meu mamilo com força, me fazendo ofegar com o quão repentino foi.

— Quando chegar a hora, me levará ao seu corpo e implorará por minha semente. Vai foder de todas as maneiras que uma mulher pode tomar um homem, e a víbora em você se esforçará para obter mais. Vai me montar até sua boceta doer e ainda assim implorar.

Presa embaixo dele, fervi. Nunca imploraria.

Ele estava ficando excitado. Através de suas roupas, estava duro contra o meu estômago. Estava muito consciente da minha nudez, elos de couro e correntes contra o meu peito e a minha barriga, sarja de lã entre as pernas.

Antes que tivesse a chance de responder, ele me virou de costas. Com minha bochecha pressionada contra as cobertas, encarei a parede.

— Foda-se! — Eu não pude evitar. O homem era um animal. Mais uma vez, estava amarrando meu pulso, enrolando a seda e atando-a, me puxando para frente para prender a faixa na cabeceira da cama.

Não pude fazer nada para impedi-lo de amarrar a outra mão.

— Por favor. — Eu não poderia deixá-lo fazer isso de novo. — Não precisa...

— Quieta, escrava. Ele separou minhas pernas.

Embora nenhum dos elos fosse esticado e as peles de carneiro fossem macias para repousar, não pude suportar a ideia de ser obrigada a permanecer imóvel novamente.

— Não faça isso.

E então senti o pano úmido, puxado suavemente pela parte interna da coxa. Quente e depois frio, dos dois lados. Eldberg mergulhou-o na água novamente e depois espremeu o excesso. Segurou o pano no meu sexo e depois afastou minhas nádegas, puxando-o pelo vinco, pressionando meu ânus.

Um medo trêmulo estava tomando conta de mim, que ele iria entrar por lá. Eu senti o tamanho dele quando pressionou o meu estômago.

Colocou de lado o pano e descansou a palma da mão no meu traseiro.

— Não vai me machucar. — Minha voz soou tão pequena.

A cama rangeu e ouvi a tampa do baú abrir. Tive um vislumbre do que retirou. Outra das colunas de pedra, embora maior e esculpida de maneira diferente - sua cabeça mais bulbosa, o eixo ligeiramente curvado e cravejado de pedras salientes.

— Não! — Eu protestei, lutando contra minhas lágrimas.

— Concordou com tudo. — Ele sentou novamente e me separou.

Não pude oferecer resistência e esperei um impulso cruel ao máximo, mas entrou suave dentro de mim. Com cada pedra deslizando no meu interior, não pude deixar de ofegar.

— Bastardo! — Eu sussurrei, mas ele não disse nada, apenas mantendo a coisa parada. Minha vontade não contava para nada.

Depois de alguns momentos, o retirou, bem devagar, até que me deixou completamente. Seria uma tortura mais lenta, e uma que o divertisse, independentemente da sua má noite de sono. Esfregou a cabeça arredondada onde eu estava inchada, cutucando, provocando, antes de me penetrar novamente, hesitante, com todo o seu comprimento.

Mantive meus olhos na parede e mordi meu lábio.

Logo terminaria. Em breve.

Em seguida, torceu, de modo que tocou de novas maneiras, e moveu a outra mão para baixo da minha barriga, a palma quente. Respirei fundo quando estendeu o polegar para pressionar contra o meu lugar mais sensível.

Era incapaz de me mover ou resistir enquanto ele simulava o ato entre um homem e uma mulher, usando o cabo de pedra para deslizar em mim, para frente e para trás, e a ponta do polegar para me provocar.

Eu me estiquei na cama, mas ele me levantou na palma da mão para que seu empalamento se tornasse mais profundo. Enterrei meu rosto na pele de ovelha, recusando-me a me ouvir gemer. Apesar de tudo que eu sentia, meu ódio e humilhação, raiva e nojo, eu sabia o que ele estava me convencendo. Um calor ardente ultrapassava todo pensamento. Dor e prazer penetrante estavam aumentando. Quando quebrou, a onda me fez cair, rasgando um grito que rasgou minha garganta e me fez lutar contra os laços que me seguravam.

A voz de Eldberg estava quase cansada. — Já é minha, escrava.


E

le me deixou amarrada o dia todo, mas sem o cinto, sem a invasão de seu brinquedo. Duas vezes, Ragerta veio segurar um copo nos meus lábios, me ajudando a beber. Para minhas outras necessidades, deslizou o pote debaixo de mim.

Meu peito estava apertado com a recusa de chorar.

Cruzei um limiar, traída por meu corpo. Embora os segredos do meu coração fossem meus, Eldberg havia conquistado uma pequena parte de mim e com tanta facilidade.

Ouvi os sons de trabalho do salão, conversas abafadas e a voz de uma mulher dando ordens. Do lado de fora, havia o som de vacas e o balido de ovelhas. Houve marteladas, batidas de manteiga batendo, asas batendo e gritos repentinos.

Ragerta me trouxe o nattmal de caldo de legumes, colocando-o na minha boca com rápida eficiência. Perguntei-lhe se Eldberg já havia feito isso antes e o que havia acontecido, mas ela simplesmente balançou a cabeça sem responder, como se estivesse preocupada com quem poderia ouvi-la.

Depois, fiquei deitada em silêncio, sabendo que ele viria em breve.

Quando o fez, o quarto estava completamente escuro e acendeu o pavio em um prato de óleo, como na primeira noite.

Não chegou perto de mim no começo, e permaneci virada enquanto se despia. Não queria olhar para ele enquanto tirava a roupa, embora não tivesse dúvida de que seus olhos estavam em mim. Ouvi o tilintar de suas armas e a queda suave de sua túnica e perneiras no chão. Muito tempo se passou antes que dissesse — Deseja que te toque?

Mantive meu rosto virado. — Concordei em atendê-lo, mas sou sua prostituta involuntária. O que quer que aconteça é seu desejo, não meu.

Foi uma resposta insolente e mal aconselhada, mas ele não falou em ameaça de punição. Em vez disso, desamarrou a faixa em torno de um dos meus tornozelos e esfregou a pele, suas mãos calejadas firmes na massagem, restaurando o fluxo de sangue.

Subindo na cama, removeu a restrição da minha outra perna e me acariciou da mesma maneira.

Um nó se formou na minha garganta, mas não agradeci. Qualquer bondade que me mostrava foi para seus próprios fins.

Sendo parcialmente livre, deveria ter me sentido mais capaz de me defender, mas não havia verdade nisso. Apenas ganhou poder para me posicionar de outras maneiras. Minhas mãos ainda estavam atadas, afinal.

Resolvi não fazer nada para ajudá-lo.

Foda-me, e será como se eu fosse um cadáver.

Sua perna roçou a minha enquanto ele passava as mãos pelas minhas panturrilhas e coxas, mantendo minhas pernas ao redor dele, até que apertou meus quadris.

Inclinando-se para a frente, levou os lábios à minha nádega, seu hálito tão quente quanto a língua.

— Não sente nada? — Ele roçou-me com os dentes, passando de uma bochecha para a outra, devorando minha carne com a boca aberta, chupando e mordendo, embora sem força suficiente para me machucar, o tempo todo segurando meus quadris firmemente.

Eu me contorci, mas fiquei em silêncio.

Movendo uma mão para as minhas costas, usou a outra para sondar minha umidade. — Deseja isso. — Ele pressionou com o polegar, circulando, provocando. — Me quer dentro de você.

Minha cabeça zumbia com fúria enquanto me contorcia sob sua carícia, ainda não dando resposta.

Ele riu baixo. — O que está pensando, esperando por mim?

— Que quer me torturar — sibilei — para me punir por algo que sou inocente.

— Puni-la. — Ele retirou a mão. — É isso que deseja?

— Não! Isso não é o que disse!

Ele se levantou da cama e ouvi a tampa do baú abrir.

Não ousei olhar, mas ouvi som viajar pelo ar. A dor foi imediata, uma picada ardente no sulco das minhas nádegas inferiores.

— É isso que quer, escrava?

— Não! — Eu chorei, com medo de que ele me atacasse novamente.

Tentei juntar minhas pernas, mas a mão dele me invadiu. Três dedos deslizaram facilmente para dentro.

Contra a minha vontade, líquido veio das profundezas da carne que ele tocava.

— Nega esse prazer, mas em breve pensará apenas no homem que a domina agora.

Chutando meus pés, tentei me afastar. — Se tiver prazer, será obra minha, não sua.

Afastando-se novamente, ele me golpeou duas vezes com o bastão, na curva mais carnuda do meu traseiro.

O gemido dos meus lábios veio espontaneamente. Eu o detestava, mas havia um puxão dentro de mim. Meu corpo se abriu para ele, apesar da rebelião da minha mente.
Estava sozinha e assustada, dolorida, zangada e excitada. Dizer o que queria ouvir tornaria tudo mais fácil, mas eu ainda não conseguia me render.

— Não desejo isso — solucei, enterrando meu rosto nas cobertas.

Esperei que me punisse novamente, mas senti sua mão alisando meu cabelo.

Sem falar, desamarrou as últimas faixas. Enquanto me enrolava, passou o braço pelo meu corpo, me puxando para o calor do seu peito.

Estava ciente de sua nudez, de sua excitação pressionada na fenda das minhas nádegas, mas não fez nenhum movimento para forçar sua penetração, nem perguntou novamente o que eu queria dele. Fiquei tensa, consciente dele atrás de mim, sua respiração se tornando a de um homem que dormia.

Cansada, fechei os olhos.

Eu não me conhecia mais, nem entendia o homem que me mantinha em cativeiro.

 

 

Elswyth


3 de agosto de 960 DC

R

agerta me acordou, ajudou-me a sentar, colocando uma tigela de grøt em minhas mãos.

— Onde ele está? — Eu não o senti se levantar da cama. Se estivesse por perto, me amarraria de novo, agora que estava acordada?

— No porto. Há um novo barco de comércio lá — ela sussurrou. — Mas não vai demorar. — Ela indicou o balde parado. — Tenho água para que se lave. Me disse para ajudá-la rapidamente.

— Ragerta. — Coloquei minha mão em seu braço, querendo dizer alguma coisa, querendo explicar minha vergonha, fazê-la entender que estava aqui contra minha vontade. Claro que era desnecessário. O que importava? Era a escrava de cama de seu mestre, e não havia nada para desculpar ou julgar.

— Obrigada — disse simplesmente.

A água estava quente e bem-vinda, não tão refrescante quanto uma tina na sala de banho, mas eu dificilmente poderia esperar esse privilégio, a menos que fosse desejo de Eldberg que eu fosse levada para lá.

— Ele disse que deveria cuidar de você. — Ragerta deu um sorriso de desculpas.

Não havia nada a fazer a não ser esperar seu retorno. Ele teria qualquer prazer que o divertisse, suponho, então iria embora mais uma vez. Poderia tentar convencê-lo novamente de que não precisava me amarrar, que eu seria obediente.

Essa era minha maior esperança, não era? Só se fosse livre poderia ter esperança de escapar. Ainda não, talvez, mas assim que tiver um plano.

Mas o que significa conformidade? Aceitação resignada? Não.

Submeter não era suficiente.

Ele desejava mais do que isso, me curvar à sua vontade, fazer com que me contorcesse e implorasse, e negasse o amor que nutria por Eirik.

Ainda não poderia me forçar a fazer isso, mas deve haver outro caminho.

Não seria passiva como uma escrava.

Eu convidaria sua paixão, mas em meus próprios termos.


R

agerta estava certa; não demorou a voltar. Entrando na câmara, imediatamente dominou tudo ao seu redor. Ragerta saiu correndo, deixando-nos sozinhos.

Pensei cuidadosamente em como me apresentaria e o que diria. Já tinha perdido quase dois dias e duas noites. Quanto mais cedo eu o fizesse acreditar que era flexível, mais cedo poderia escapar.

Abaixei-me sobre as peles de ovelha, levantando os braços e separando as pernas, simulando a posição em que me amarrou.

Seu olhar estava totalmente sobre o meu corpo enquanto fazia isso, e senti uma nova energia encher a sala, como se não houvesse nada além da minha nudez e seu desejo de possuir o que via.

— Me espere, escravo. — Era mais uma afirmação do que uma pergunta, mas eu balancei a cabeça, separando minhas pernas um pouco mais e virando um joelho para fora, para que pudesse ver o que lhe oferecia.

Nenhum de nós falou enquanto ele desamarrou o couro em sua cintura, de onde pendiam sua adaga de lâmina curta e seu machado. Puxou a túnica rudemente sobre a cabeça e puxou o cordão da calça, chutando-a para longe.

Com a luz do sol do meio da manhã filtrando-se pela abertura central no telhado da maloca, era capaz de vê-lo como nunca antes.

As queimaduras que marcavam seu rosto percorriam toda a extensão de seu corpo, mas apenas do lado esquerdo, pelo pescoço, passando por um ombro e descendo pelos músculos do braço.

Eram vergões feios e salientes quebrando os contornos de sua tinta corporal, cicatrizes marcando o plano rígido de seu peito e as cristas de seu estômago, alcançando a dobra profunda de seu abdômen e continuando pela coxa, até o pé.

Sua excitação já era proeminente, saltando do cabelo ruivo em sua virilha. A visão fez minha respiração ficar presa na garganta.

Aproximando-se, pegou minha mão e me guiou para circundá-lo.

Esfregando minha palma em sua espessura, disse: — Agora, vê o que vou enfiar dentro de você.

Minha punição e sua vingança. Minha boca ficou seca de repente. Ficará feliz quando isso for feito?

Com sua mão sobre a minha, acariciou para cima a partir da raiz, apertando com força de modo que meus dedos quase foram esmagados sob os dele. Não foi preciso mais nada para ficar rígido como ferro, uma gota de umidade brilhando na ponta.

Ele deu um golpe final e me soltou. — Outro dia a ensinarei a me levar à boca. Por agora, desejo descobrir completamente o que possuo.


Inclinando-se para perto, sua voz era rouca e suave. — Não segure nada. — Ele acenou com a cabeça para a cortina que nos separava da câmara maior. — Deixe todos ouvirem que sou seu mestre, que não é mais uma mulher de Svolvaen, mas minha.

Tocando meu quadril, me rolou para frente. Minhas nádegas ainda estavam sensíveis dos três golpes que sofri.

Ele se ajoelhou para recuperar seu cinto de couro e eu congelei de horror. Era isso o que significava, ser possuído pela Besta? Pretendia me açoitar com o couro grosso que carregava suas armas?

Talvez tenha ouvido meu suspiro, pois ergueu os olhos.

Segurando a alça na mão, ele me observou com curiosidade. — Isso te excita? — Considerei minhas nádegas e depois o cinto. — Aprecia o prazer apenas quando temperado com a dor? — Ele pareceu pensar sobre isso, esfregando o couro entre os dedos.

— Devo primeiro lhe dar prazer e então veremos.

Pegou uma pequena bolsa e um frasco de dentro.

Uma poção? Eu me perguntei. Ouvi dizer que existiam essas coisas, aquela sensação e paixão intensificadas. Apenas uma vez eu experimentei tal coisa, respirando a fumaça sagrada das celebrações Ostara de Svolvaen. Não era eu mesma naquela noite, minhas inibições diminuíram, até que dei boas-vindas a uma união que nunca deveria ter sido.

Eldberg voltou para a cama, sentando-se acima de mim.

Quando abriu a garrafa, trouxe um cheiro forte, gengibre e sálvia? Não tinha certeza. Esses podem ser bebidos quando preparados como uma tintura.

— Neroli — ele murmurou — e sândalo. Paguei um bom preço esta manhã. Vê, escrava, o que faço para conseguir o que desejo de você.

Não fazia sentido. Ele só tinha que se colocar entre minhas pernas e o ato estaria feito.

Suas mãos, embora calejadas, ficaram lisas e escorregadias, acariciando meus ombros, puxando meus braços para os lados. Seus polegares viajaram para baixo, até que encontrou as covinhas na parte inferior das minhas costas. Lá, agarrou minha cintura, e sua excitação roçou em mim.

Amassando, esfregou a curva dos meus quadris e a plenitude das minhas bochechas, seus dedos trabalhando na parte mais carnuda, movendo-se para a dobra onde encontraram minhas coxas. Novamente, voltou para minhas nádegas, o óleo perfumado auxiliando seus movimentos. Trabalhou para frente e para trás, seus dedos mergulhando mais abaixo, deslizando na fenda do meu traseiro, roçando meus cachos, me encorajando a aceitar suas carícias.

O tempo todo fechei os olhos e tentei imaginar que era Eirik quem me tocava, mas não consegui me enganar. Essas mãos não eram de Eirik.

Eldberg se abaixou nas minhas costas, seu pau aninhado onde suas mãos acariciaram, entre minhas nádegas. Sua coxa empurrou insistentemente entre minhas pernas, obrigando-me a abrir mais.

Ele estava respirando com dificuldade, esfregando, então cutucando onde queria entrar.

Não! Não posso! Eu tinha levado um homem dentro de mim antes, mas Eldberg era maior do que qualquer amante do meu passado, e temia o que ele era capaz, que pudesse me usar com muita violência. De repente, tive medo de tomá-lo. O que eu estava fazendo! No auge do desejo, ele iria me despedaçar.

Ele se mexeu, puxando minhas pernas entre as suas, de modo que montou totalmente em meus quadris. Naquele momento, virei-me rapidamente e o óleo escorregadio permitiu que escorregasse de costas.

Nesta posição, pelo menos, teria uma chance melhor de desviá-lo.

— Meu Lorde. — Eu estava ciente da minha voz tremendo. — Eu imploro — Inclinei minha cabeça para trás, me obrigando a olhar para ele, dizendo as palavras que sabia que queria ouvir. — Deve me possuir por todos os lugares.

Alcançando seus dedos, eu os trouxe para o meu peito. — Mas primeiro, me acaricie aqui. — Molhei meus lábios. — Gaste sua semente aqui, se quiser, ou na minha barriga. Deixe-me esfrega-lo na minha pele, para que possa sentir o seu cheiro.

Sua expressão era inescrutável, seus olhos semicerrados. Sua ereção descansou no meu estômago, uma haste dura pressionando onde não havia entrada.

Recuando, ele se sentou sobre as pernas, sua excitação acima de mim.

Agarrando minhas pernas, as trouxe de cada lado das suas. Alcançando abaixo, ele levantou meus quadris, de modo que meu sexo descansasse em seus testículos.

Só então derramou mais óleo nas palmas das mãos.

Seus dedos, leves e firmes, percorreram minha barriga, circulando, movendo-se cada vez mais alto, até que segurou meus seios em suas mãos, cobrindo e revelando, segurando seu peso, depois soltando. Esfregando meus mamilos até doerem.

Mesmo com meu medo, não queria que parasse. Sob o ritmo de sua carícia, uma estranha langor tomou conta de mim e um calor baixo em meu ventre.

E, o tempo todo, eu estava ciente de sua masculinidade, a cabeça escura e inchada, o eixo, com veias grossas.

Por fim, trouxe sua boca onde suas mãos tinham acariciado, mordendo suavemente, roçando com os dentes, então sugando forte, de forma que eu arqueei em sua fome. Sua boca estava quente como fogo na minha pele, sua barba roçando suavemente, me fazendo gemer, mesmo enquanto sentia repulsa.

Quando nossos olhos se encontraram novamente, os seus brilharam sombriamente e ele tocou meus lábios com a língua.

Não posso! Essa intimidade é para amantes, não para o que existe entre nós. Não sou mais do que um corpo para o seu prazer e para a vingança perversa que pensa fazer.

Eu me virei, mas ele enfiou os dedos no meu cabelo. Estava indefesa novamente, minha garganta exposta.

Sua boca era insistente, beijando meu pescoço e minha mandíbula, depois voltando aos meus lábios.

Ele mudou, trazendo sua excitação para o meu núcleo.

Sabia que esse momento chegaria, mas lutei, apenas para que ele capturasse meus pulsos e os arrastasse acima da minha cabeça, palma com palma.

No momento seguinte, entrou em mim, tomando posse com um único golpe. Eu gritei, embora mais em choque do que de dor. Minha própria excitação traidora o ajudou.

Ele se segurou dentro de mim, o cabelo macio de seu peito pressionando meus seios, sua respiração suave na minha bochecha. Pensei ter levado tudo, mas ele pressionou novamente e percebi que ainda não estava no limite.

Mordi meu lábio para não gemer. Ele ia tão profundo.

Recuando, parou antes de seu segundo impulso. Veio mais facilmente, assim como o seguinte e o seguinte.

Baixou a boca para o meu mamilo, puxando a ponta para seu calor úmido. Uma vez lá, não o soltou, consumindo e exigindo, puxando com mais força, enviando uma chama ardente ao meu útero.

Enquanto ele resistia e estremecia, suas feições se contorceram.

Com as últimas pulsações de seu prazer, ficou quieto, e a expressão em seu rosto era deplorável. Vi ali um eco de tudo o que sentia, desespero e dor, e um abismo de terrível solidão.

Eirik estava morto e eu era uma escrava de cama deste homem, assim como fui da cama de Gunnolf. Conhecia esse caminho e o vazio dolorido e sem alma que viria.

 

 

Elswyth


4 de agosto de 960 DC

N

a manhã seguinte, não foi Ragerta quem me trouxe comida. A mulher que afastou a cortina não era escrava.

— Levante-se. Deixe-me vê-la. — Reconheci sua voz, uma que eu ouvi muitas vezes desde que fui trazida para o quarto de Eldberg. De alguma forma, ela era a amante aqui, embora não fosse sua esposa, eu sabia.

O quarto cheirava a acasalamento, espesso com suor e o cheiro de sexo. Franzindo o cenho, ela apertou os lábios e as rugas que isso trouxe à boca tornaram aparente sua idade. Seu cabelo, preso em uma trança grossa, era de um tom semelhante ao meu, apenas um pouco mais claro nas têmporas. Tinha a expressão de quem viu muito da amargura da vida. Estava gravado em seu rosto. Talvez o meu fosse o mesmo, ou logo seria.

Levantei-me da cama, puxando meu cabelo sobre meus seios e apertando minhas mãos para cobrir meu sexo. Essa parte de mim estava dolorida, pois Eldberg tinha me tomado mais duas vezes durante a noite.

Não hesitou em examinar minha nudez, depois meu rosto, olhando fixamente para cada característica, como se houvesse algum quebra-cabeça que desejasse decifrar. Encontrou meus olhos, e algo brilhou nos dela.

— Não desejo estar aqui — disse baixinho. — E não permaneço de boa vontade.

A mulher acenou com a mão em despedida. — Se dependesse de mim, seria jogado do penhasco e esse seria o seu fim.

Sua boca se apertou novamente e ela franziu a testa. — Como não é minha decisão, se tornará útil. Não apenas aqui — ela olhou brevemente para a cama — Mas de outras maneiras.

Meu coração deu um salto repentino. Deveria escapar desse confinamento? Fazer isso seria o primeiro passo para encontrar uma maneira de deixar este lugar.

— Pode tecer, suponho? Sabe preparar carne, como fazer pão e mingau?

— Sim, todas essas coisas. — Eu concordei.

— Então se vista, encontraremos seu trabalho. — De um saco ao lado dela, ela jogou um pacote de tecido. — É muito bom para uma escrava, mas ele insiste que o use.

Era minha própria camiseta de baixo e vestido, costurados para o dia do meu casamento. Segurando-os contra o peito, senti uma pontada forte.

Fazer com que usasse o vestido enquanto servia em sua casa era uma piada cruel. No entanto, estava feliz, pois era meu, e usá-lo manteria em mente tudo o que havia perdido. Isso me daria forças para fugir e me vingar do homem que infligiu tanto sofrimento.

A mulher não havia devolvido minha capa. Que, com sua gola de pele macia, imaginei que tenha guardado para si mesma.

— Não deve sair de casa e, se nos causar problemas, ele vai amarrá-la novamente. Talvez prefira isso, ser usada para prostituição e nada do trabalho real. — Ela fungou com desgosto óbvio.

— Não, eu só desejo...

— Não fale a menos que eu faça uma pergunta!

O olhar que me deu me garantiu que deveria evitar provocar seu temperamento.

— E mantenha uma língua civilizada! Conheça o seu lugar e me chame de senhora.

Com isso, ela saiu.

Balancei o vestido. Ainda havia lama na bainha, mas seca, seria fácil escovar. Verificando seu bolso fundo, meus dedos se fecharam sobre o que coloquei lá quando me despi na casa de banho: o amuleto que Eirik me deu, o martelo, Mjolnir, a arma mágica de Thor.

Todos aqueles meses passados, Eirik partiu com Helka em sua missão para Bjorgyn e colocou-o em meu pescoço, prometendo voltar. Passou-se mais tempo do que qualquer um de nós havia previsto, mas sempre usei o pingente e ele manteve sua palavra.

Eu ousaria usar de novo?

Não tinha mais o poder de trazê-lo de volta para mim. Nada poderia fazer isso. E Eldberg provavelmente tiraria de mim se visse.

Melhor deixar onde estava.

Estavam todos juntos agora, Eirik, Gunnolf e Asta.

Helka também e Astrid? Estavam assistindo daquele outro reino? Isso não conseguia pensar. Já que estava viva, minhas preocupações estavam neste mundo.

Entrando no salão principal da casa grande, fiquei surpresa novamente com seu tamanho, o dobro do nosso em Svolvaen.

A porta principal estava escancarada e a luz do sol entrava também pelo buraco no telhado, diretamente acima da fogueira.

Na área da cozinha, Thirka estava arrancando a pele de uma lebre.

Na outra extremidade, lãs estavam empilhadas, prontas para o tingimento. Ragerta estava tecendo lã cardada em fios, enquanto a mulher que tinha vindo até mim estava em seu tear.

Fixando-me com um olhar, sacudiu a cabeça em direção a uma calha de madeira perto do fogo, uma enorme lareira delimitada por pedras que chegam aos meus joelhos. Três panelas de ferro fervilhavam sobre suas chamas, uma cheia de água e as outras duas com guisado - todas suspensas por correntes, enganchadas no alto das vigas do teto. Uma grade de barras de ferro cobria uma extremidade, para assar carne.

— Quando terminar de divagar, há pão para amassar.

Ajoelhei-me junto ao cocho e comecei a dobrar as pontas da massa. Nunca tinha visto tanto, o suficiente para fazer cinquenta pães ou mais. Logo, meus braços e costas doíam de tanto curvar. Sentei-me nos calcanhares por um momento, endireitando-me e rolando meus ombros.

— Cadela preguiçosa! Eu não disse que podia parar! — a senhora gritou alto o suficiente para que todos ouvissem. — Continue assim ou vou levar a bétula para você.

Já conheci mulheres como ela, do tipo que gosta de intimidar quem não consegue se defender.

— Vá e ajude-a, Ragerta, ou estaremos esperando até meia-noite. — Ela fez uma careta.

Correndo para se juntar a mim, Ragerta se ajoelhou ao lado. — Aqui, vou pegar uma ponta da massa e você a outra. Levante o mais alto que puder, dobre para dentro e empurre com força para o meio. Não vai demorar muito para Sigrid puní-la, então não dê um motivo.

Era muito mais fácil juntas, e trabalhamos em silêncio, cientes dos olhos duros nos observando, até que eu não pude evitar.

— Quem é ela? — Eu sussurrei.

— Sigrid? — Ragerta girou a massa e nós a levantamos novamente. Mantendo a cabeça baixa, ela falou no cocho — a irmã do velho chefe.

— Irmã de Beornwold? — Eu olhei por cima do ombro. Parte da trama parecia estar se desgastando no tear e ela tentava torcer novas fibras no fio vertical. — E é a senhora aqui?

— Sempre foi. Éuma megera, nunca está feliz, mas ficou pior desde que Bretta morreu.

Bretta. Esposa de Eldberg. Não pela primeira vez, eu me perguntei sobre ela.

— Como ela era, essa Bretta?

Ragerta parou de amassar, mas não respondeu.

Pegou um dos remos de cabo longo ao lado da calha.

— Pedaços do tamanho de um punho — ela orientou. — Puxe-os para fora e role-os na palma da mão. Sigrid gosta ligeiramente achatados.

Demonstrando, ela colocou um no remo. — Quando tivermos pães, vamos colocá-los sobre as brasas.

Novamente nós trabalhamos.

Do lado de fora vinha o som de gado mugindo, passando na frente da casa grande, sendo conduzido para o pasto.

— Ele a amava?

As sobrancelhas de Ragerta se ergueram. — Todos nós amávamos Bretta.

Como Asta, pensei. Todos nós amávamos a esposa de Jarl Gunnolf.

— Mas que tipo de casamento foi esse?

Ragerta olhou para mim e senti minhas bochechas ficarem vermelhas. Não sabia por que estava perguntando.

— Arranjado, é claro. Beornwold não tinha filhos e precisava de um herdeiro.

Eldberg juntou-se a ele inicialmente como soldado pago, nas viagens do jarl para invadir as terras ocidentais. Quando Beornwold viu sua força, o adotou e o casou com Bretta. Sua descendência certamente continuaria na linha.

— Exceto por ela ter morrido.

Ragerta franziu a testa. — Foi uma coisa terrível. Horrível. — Ela pareceu pensar por um momento, então afastou a imagem. — Sigrid foi sua mãe desde o início. Um parto ruim, sabe...

Eu sabia. Vi minha cota de bebês e mães morrerem. Inconscientemente, minha mão foi para minha barriga. E se isso acontecer comigo? Quem cuidaria dessa criança?

Perguntei apressadamente, não querendo perder minha chance. — Há alguém por quem tem sentimentos, Ragerta? Alguém que ama?

— Por Freya! Que coisa para se perguntar! — Ragerta parecia confuso. — Há um ou dois que deixei me levar para fora, e alguns com quem tive que me deitar, independentemente da minha escolha. Não sou tola o suficiente para pensar que isso importa. Não sou nada para eles, nem eles para mim.

Não sabia o que dizer. Era uma coisa triste para qualquer mulher admitir, mesmo uma como Ragerta, que passaria seus dias como escrava.

— Agora, pergunte a Thirka e poderá ouvir uma resposta diferente. — Ragerta deu um sorriso malicioso. — Thoryn tem sido doce com ela neste meio ano, e ele é melhor do que a maioria.

Estávamos quase chegando ao fim da massa e a última das vacas havia passado pela porta.

Mas nada vai sair disso — resmunguei. — Não, a menos que Eldberg a liberte.

— Verdade. Nenhuma escrava pode se casar com um homem livre, então ela vai ficar... — Estando os pães todos nas brasas, Ragerta fez crescer. — Pois Eldberg nunca libertou ninguém em sua posse. Aqueles que o desapontam ou irritam, vende no mercado de escravos, ou dá um fim mais rápido.

Com esse pensamento em minha mente, a sala de repente ficou mais sombria, o sol escureceu. Olhando para cima, vi o jarl parado na soleira, sua largura e altura recortadas em silhueta escura contra a luz.

Estava ciente de que a sala estava ficando em silêncio, de Thirka ter parado de trabalhar, e Sigrid também; Ragerta ficou boquiaberta.

— Venha. — Com um movimento de cabeça, indicou que deveria entrar em seu quarto.

Ttirou suas próprias roupas, depois as minhas. Jogando-me na cama, me amarrou como da primeira vez, mas com muito mais força, e se deitou de costas. Estava presa embaixo de seu corpo, com seu pau aninhado entre minhas nádegas, suas próprias pernas estendidas para tocar o comprimento das minhas.

Estendeu a mão para pegar meus seios em suas mãos, amassando-os como eu fiz com o pão, apertando sua maciez em suas palmas. Beijou minha coluna, mas estava muito impaciente para gastar mais tempo me preparando.

— Conte-me. — Sua excitação cutucou onde ele tentou me reivindicar na noite anterior.

— Estou pronta para o senhor, meu lorde.

Não era verdade nem mentira. Meu medo era potente, mas quando amarrou as faixas nos meus tornozelos e pulsos, uma dor quente começou na minha barriga, a cobra se desenrolando mais uma vez, sibilando seu próprio desejo.

— E o que devo fazer com você?

— Entre em mim, meu jarl. — Eu fechei meus olhos. Contra minha vontade, era sua posse e me submeteria a tudo o que fosse necessário.

Desceu uma das mãos pela minha barriga, depois abaixou, até a parte inchada de mim. Enquanto eu gemia, sua voz, sempre tão áspera, estava rouca de desejo. — Me agrada, escrava.

Empurrando dentro de mim, seus dedos pressionaram a minha área delicada, levantando-me para encontrar seu ritmo.

— Diga-me — disse ele novamente.

— Por favor. — Com meu corpo sacudido pela força dele, era difícil falar. — Por favor. — Isso era o que ele queria, que eu implorasse.

— Mais?

— Sim. — Minha voz estava estrangulada, mas não podia negar. Estava inchada e molhada. — Sua semente. Derrame dentro de mim, Meu Lorde.

Escorregadio, recuou e com seu próximo golpe, empurrou em meu lugar mais apertado.

Queridos deuses! Meu instinto foi de apertar contra a intrusão, mas seus dedos mergulharam e acariciaram, e a cobra dentro de mim se contorceu em ondas ondulantes, sua língua lambendo quente. Quando entrou, atacou com o veneno da dor e do prazer combinados.

— Meu Lorde — eu sussurrei. — Meu Lorde.

 

 

Eldberg


4 de agosto de 960 DC

E

ldberg arrancou a última tira de carne, gordurosa entre os dedos, depois trouxe a boca para sugar o suco do osso.

Estava faminto. Com fome o suficiente para comer outro prato inteiro de comida. Faminto por outra coisa também, embora tenha consumido aquela iguaria em particular durante a maior parte da tarde.

Observou enquanto ela se dirigia a cada convidado, todos sentados em duas longas mesas colocadas ao longo do corredor, de cada lado da lareira central. Para comemorar o sucesso na queima de Svolvaen, todos eram bem-vindos. Seus homens nunca relutaram em compartilhar a abundância da mesa de seu jarl. Várias noites de folia foram planejadas.

Enquanto Elswyth enchia as canecas com hidromel, os olhos de todos os homens estavam sobre ela. Ela manteve os seus abaixados, sem dúvida ansiosa para passar despercebida. Como se isso fosse possível!

O corpete esguio do vestido e a costura baixa no decote a colocaram bem em exibição, deixando todos verem sua maturidade. Seios de deixar até a deusa Freya com inveja! Sedoso ao toque, cheio e pesado. Mamilos de um rosa pálido, grandes e macios como os de uma menina, até que endureciam sob sua língua, desejando ser sugados.

Saciou seu pênis bem o suficiente, mas estava duro novamente, pensando em sua rigidez e calor, pensando em como era se mover dentro dela. Tinha sido satisfatório observar sua luta, tentar negá-lo, mas preferia vê-la dócil, submetendo-se a atos que considerava vergonhosos, mas incapaz de controlar sua resposta.

Ela olhou para ele e a viu tremer.

Bom! Tomou um longo gole, esvaziando a caneca e erguendo-a. Deixe-a vir até ali.

Eldberg observou o balanço de seus quadris enquanto ela caminhava, quadris feitos para um homem se agarrar. Era uma bela parte da feminilidade, embora se comportasse mais como uma virgem, como se nunca tivesse sido tocada antes, como se o ato de transar fosse uma grande surpresa, e as maneiras como a tomou até então desconhecidas. Não parecia provável que fosse verdade, mas despertou nele uma mistura de relutância e paixão.

Só quando ela ficou ao lado dele, olhou para cima, seus lábios se separando enquanto o olhava no rosto. Aqueles lábios! Um pouco inchados. Um pouco machucados.

Ela não queria beijá-lo, mas se recusou a deixá-la escapar impune. Uma escrava obedecia a seu mestre. Não tinha o direito de evitar nada.

Quando estendeu a jarra para reabastecer sua caneca, ele colocou a mão em volta da cintura dela e o seu cheiro subiu para ele: mel e almíscar. Ela se contorceu, quase se afastando, mas a puxou para mais perto.

A curva de seu seio estava diante de seu rosto. Como seria fácil liberar aquela generosidade e saboreá-la novamente. Pelos deuses, estava duro como ferro! Queria levantar a saia dela e puxá-la para seu colo bem aqui.

— Eldberg! — A voz de Sigrid, estridente ao lado dele, se intrometeu. —Ouviu o que disse?

Distraído, relaxou seu aperto na cintura de Elswyth, e ela perfeitamente escapou.

— O que é, Sigrid? Precisa me importunar enquanto eu como? — Eldberg fez uma careta.

Nenhum outro ousava falar com ele como Sigrid. Não pela primeira vez, se repreendeu por permitir. Seus modos astutos o faziam querer torcer o seu pescoço, mas tinha uma dívida com ela. Era um homem que nunca se esquecia de uma injúria e nunca perdoava um insulto, mas também não ignorava o serviço dos leais.

Todos aqueles anos Beornwold ficou sem uma esposa, ela tinha sido a senhora deste salão, cuidando da casa. Além disso, criou sua filha, amando Bretta como uma verdadeira mãe. Só ela, de qualquer pessoa em Skálavík, sabia a dor que Eldberg sofrera. Sem falar nisso, ela entendeu.

Ele não tinha esquecido, também, que cuidou dele durante sua recuperação. O curandeiro havia fornecido unguentos, mas Sigrid os administrou e, durante as primeiras semanas, quando o sono era impossível sem a vinda dos pesadelos, se sentou ao lado dele.

Ela merecia certo respeito e status, e não a expulsaria de casa, embora frequentemente o levasse ao limite de seu temperamento.

Sigrid baixou a voz, mas suas palavras não foram menos mordazes. — Está ficando tolo, sobrinho? Deixando essa vadia domá-lo? Tem feito pouco além andar atrás dela desde o seu retorno.

— Se alguma coisa precisa ser domada, gostaria que fosse sua língua — retrucou Eldberg. — Cuidado, senhora, para que não estique o pescoço muito em direção à minha lâmina.

— Ha! — Sigrid tomou um gole de sua caneca. — Isso é mais parecido com o jarl que servimos! Um homem pronto para agir quando alguém abaixo dele passa do ponto. — Ela colocou a mão em seu braço. — Cuidado, sobrinho, ou vai fazer Skálavík rir de sua loucura, um jarl que abandona seus deveres em busca de uma vadia!

Eldberg removeu a mão de Sigrid e a fixou com um olhar de aço. — Se precisar de seu conselho, saberá. Até então, é melhor sentarmos em silêncio.

Sigrid balançou a cabeça, ignorando o aviso, embora baixasse a voz. — Verá a verdade quando ela te encarar. Até então, cometa seus erros.

Rangendo os dentes, Eldberg acenou para um dos outros escravos, apunhalando um pedaço de carneiro do prato.

— E o que é, boa tia, isso é claro para todos, exceto para mim!

Sigrid se aproximou mais. — Ela é uma devassa. Não serve para nada além de abrir as pernas.

— Essa é toda a reclamação que tem dela? — Eldberg engasgou de tanto rir. — Um homem deve derramar sua semente, o que te importa de quem é a garganta ou boceta que eu uso para esse propósito? Ela é minha escrava na cama, nada mais.

Sigrid se mexeu na cadeira. — Concordou que ela ajudaria como os outros fazem.

— Isso ela pode, quando não tenho nenhum uso imediato para ela abaixo de mim. Se ela está em falta, então ensine-a, mas não resmungue para mim, Sigrid.

Pegando uma maçã da tigela, cortou em quatro com a faca. — Contanto que lhe agrade, é uma razão boa o suficiente para ficar. Não direi mais nada sobre isso.

— Odin seja louvado! — Eldberg foi esvaziar sua caneca, mas descobriu que estava seca. Onde estava Elswyth? Queria levar uma jarra de hidromel e ela para seu quarto.

— Só uma coisa...

Eldberg olhou ferozmente e depois suspirou. — Muito bem, Sigrid, fale e pronto, mas nada mais.

— Observe-a bem, meu jarl, pois temo que use seus truques para prender um homem. Há algo de bruxa nela. Deve ter notado que se parece com... — A mão dela veio novamente para o braço dele. — Talvez eu seja a tola, mas seria o jeito de uma feiticeira tornar sua aparência familiar e se infiltrar sob sua pele. — A voz de Sigrid tremeu. — Não quero brigar, apenas para mostrar minha preocupação.

— Suas palavras são enigmas para mim, Sigrid. — Eldberg esfregou a testa. — Mas não teremos mais disputas. Que isso seja um fim. — Eldberg olhou para ela, para sua pequena feiticeira, parada na outra extremidade do corredor, ao lado do quarto de Sigrid.

Levou a mão à testa, parecendo cansada. Havia um desânimo resignado nela.

Talvez a tenha trabalhado muito duro em sua cama.

Posso fazer com ela o que quiser. É minha cativa. Minha escrava. Minha vingança.

Mas era outra coisa também. Havia um elemento de verdade no aviso de Sigrid, pois não era uma espécie de feitiço quando um homem não conseguia tirar os olhos de uma mulher?

Ela estava se curvando para encher a xícara de Sweyn, seus longos cabelos trançados soltos e dourados caindo sobre seu ombro.

A atenção de Eldberg voltou-se para o comandante de sua guarda de batalha. Ele agarrou a ponta da trança de Elswyth e a puxou para baixo, sussurrando em seu ouvido. Algum comentário obsceno, provavelmente, porque ela ficou vermelha e se afastou.

As escravas da casa de Eldberg estavam lá para serem pegas, se seus homens de armas tivessem desejo abatê-las. Nunca os negou esse privilégio, embora a maioria tivesse suas próprias escravas e uma esposa além disso.

Mas Elswyth não era como as outras.

Era dele.

Outros podiam olhar para ela, mas ela era apenas para sua cama.

Teria uma conversa com Sweyn. Ninguém deveria tocá-la. Mostraria sua lâmina para qualquer cão que o desobedecesse. Eldberg avançou. Ele seria claro e afastaria aquele olhar malicioso, cobiçoso.

Havia dado apenas cinco passos quando ouviu o grito de Thoryn do outro lado do corredor. — Thirka!

Houve um grito e comoção quando o prato da serva atingiu a mesa, derramando comida. Suas saias estavam em chamas. Ela gritou de novo, correndo para frente e para trás, batendo no fogo com as mãos.

Eldberg saltou para frente, jogando-a no chão, rolando-a para frente e para trás. No entanto, o fogo lambia e a mulher gritou.

— Use isto! Cubra-a! — Elswyth jogou uma trouxa de pano a seus pés.

Com as chamas sufocadas, os gritos de terror de Thirka transformaram-se em soluços. Gemendo, olhou para cima com os olhos arregalados. Thoryn saltou sobre a mesa. Ajoelhando-se ao lado dela, pegou a mão de Thirka, com o rosto cinza. — Ela deu um passo para trás, chegando muito perto das brasas.

— Tão cansada. — Thirka estava resmungando. — Só preciso deitar.

— Está tudo bem — sussurrou Thoryn. — Vou cuidar de você. — Ele a pegou.

— Com sua licença, jarl, vou levá-la para minha cabana.

Como eu perdi isso? — pensou Eldberg. Thoryn estava apaixonado pela garota. Sob seu próprio nariz, e ele não percebeu.

— Posso fazer uma pomada para as queimaduras. — Elswyth estava ao lado deles, levantando a bainha da saia de Thirka. Ela estremeceu com o que viu.

— Temos mel — disse Ragerta. Ela torceu as mãos. — E há calêndula no jardim de ervas.

— Reúna-os rapidamente e confrei, se tiver. — Ela pensou por um momento. —Se tem raiz de valeriana, vamos colocar em infusão para ela beber e triturar as outras como pomada.

Ela se virou para Thoryn. — Deve espalhar bem nos pés e panturrilhas, nas mãos também. Deite Thirka no chão e descubra as pernas. Vai precisar de alguns lençóis para envolvê-la, depois de aplicar a pomada.

Eldberg olhou para Elswyth maravilhado. Os olhos baixos e seu olhar desamparado se foram. Uma faísca se acendeu dentro dela, dando-lhe um novo propósito.

Thoryn engoliu em seco. — Boa senhora, meu agradecimento, mas...

Ele olhou para Eldberg. — Eu poderia ter a ajuda dela. Não sei se consigo... — A voz de Thoryn vacilou.

Encostou a testa na de Thirka. — Ela está queimada.

Queimada.

Eldberg sabia o que era ser tocado pelo fogo. Os curandeiros fizeram suas pomadas, com ervas não apenas de Skálavík, mas também comercializadas em terras distantes. Aloe, não foi, que espalharam sobre ele. Aloés refrescantes e calmantes. Um pequeno pote permaneceu, que ainda usava no olho.

— Sigrid!

Ela não havia saído de seu lugar na mesa principal.

— A pomada para os meus olhos. Vá buscar.

Cortando um pedaço de sua maçã, ela o pegou entre os dentes. — É caro e não haverá mais até o retorno do comerciante. Tem certeza, meu jarl, que deseja usá-lo nesta escrava?

Eldberg cerrou os punhos. — Pegue, Sigrid.

Ele olhou de seu amigo para Elswyth. — Vá, Thoryn, e leve-a com você. Ragerta trará o que precisa. Há lua suficiente para ela ver. Encontrará as plantas e levará tudo para sua cabana.

Elswyth hesitou, como se não acreditasse, depois correu atrás de Thoryn.

Só depois que saíram Sigrid veio correndo até ele, com o rosto contorcido de raiva.

— Aquela vadia! Ela se atreveu a entrar em meu quarto e a pegou! Minha nova capa!

Era raro para Eldberg rir, mas agora sentia que isso crescia. O pano em que envolveram Thirka era do mesmo vermelho do vestido de Elswyth.

 

 

Elswyth


4 de agosto de 960AD

T

hirka teve sorte, o raciocínio rápido de Eldberg a salvou de ferimentos maiores. Ela se curaria, se suas feridas fossem mantidas limpas. Haveria cicatrizes, mas voltaria a andar. As queimaduras em suas mãos eram superficiais, as palmas já estavam acostumadas a trabalhar perto do calor do fogo.

Ragerta e eu trabalhamos rapidamente para preparar o unguento de mel, confrei e calêndula, espalhando-o bem e envolvendo-o com tiras de linho. Usamos aloe onde as queimaduras pareciam mais graves, a parte de trás dos joelhos de Thirka e a parte inferior da coxa. Para aliviar seu desconforto, nós amassamos raiz de valeriana, mergulhando em água quente. Isso, deveria beber a cada hora do dia. Encontraria casca de salgueiro quando houvesse mais tempo, pois era o melhor remédio para subjugar a dor e era fácil de mastigar. Talvez a floresta tivesse hamamélis também. Assim que Thirka começasse a curar, isso ajudaria no processo.

— Tem o meu agradecimento. —Thoryn agarrou-nos pela mão quando alcançamos a casa grande. — Se posso recompensá-las, então me digam a maneira, e será feito.

O céu noturno já estava clareando, o fiorde cintilando sob um sol baixo e forte. O ar estava fresco, graças a uma brisa que soprava do mar, e tudo silenciou. Os residentes de Skálavík dormiriam mais uma hora, embora houvesse movimento no porto. Os pescadores se levantaram cedo, avançando sob aquelas montanhas sombreadas de violeta.

Todos nós precisávamos dormir, mas a luz da manhã era linda demais para se afastar e não tinha vontade de me juntar àquele que me esperava. Ragerta e eu paramos, observando Thoryn recuar.

— A mãe dele morreu no início da primavera. Estava morando sozinho —disse Ragerta com tristeza.

— Ele não tem servos? — Eu notei o toque de uma mulher nas cobertas de tecido de sua cama e paredes, mas o caldeirão estava vazio, e sua túnica parecia ter passado muitos dias sem ser lavada.

Ragerta deu um pequeno sorriso. — Ele a vendeu. Thirka disse que prometeu não ter outra mulher em casa até que pudesse se juntar a ela.

— Bem, ela está sob seu teto, agora. — Dei uma cutucada em Ragerta. —Talvez seja onde vai ficar.

— Se o jarl permitir. — Ela bocejou. — Foi uma noite estranha, e diria que os deuses tiveram uma participação nisso. Muitas são as histórias de amantes unidos após dolorosas provações. O acidente de Thirka pode aproximá-los.

Sim, se a Besta tem um coração e deixá-la ir, pensei. Tinha visto pouco até agora, mas também não esperava que agisse como agiu, arriscando-se por alguém tão insignificante aos seus olhos.

As duas sentinelas que percorriam o perímetro da casa grande fizeram seu circuito e pararam diante de nós agora.

— Melhor ir para a cama — disse um. — A senhora vai sacudi-la antes que o galo cante duas vezes.

— A menos que prefira ficar conosco? — O outro deu uma piscadela. — Vamos deitá-la bem, mas não posso jurar que vá dormir.

— Uma oferta atraente, tenho certeza. — Ragerta revirou os olhos. — Mas arranco o meu próprio dedo em vez de uma cutucada sua. Será mais limpo, de qualquer forma!

Os guardas riram e deram um tapa amigável no traseiro de Ragerta quando nos viramos para entrar.

Por um breve momento, me perguntei se poderia ter corrido naqueles momentos em que estivemos sozinhas. Ragerta não teria me impedido.

Não seja ridícula. Não teria chegado às árvores.

Mas minha hora vai chegar.

Melhor ser paciente.

Assista e aprenda, e descubra o melhor caminho.

Eu terei apenas uma chance.

Dentro do corredor, Kellick, o rapaz que cortava lenha e fazia outras tarefas, empilhou as valetadeiras e os copos de um lado, mas não foram lavados. Esse trabalho pode ficar para mim, além de muitos outros, agora que Thirka não pôde ajudar. Sigrid ficava feliz em trabalhar em seu tear, mas não imaginei que assumisse o trabalho sujo da casa.

Embora estivesse cansada, a perspectiva me agradou. Quanto mais era necessária para outras tarefas, menos tempo poderia passar na cama de Eldberg e mais eu aprenderia sobre este lugar para onde vim.

Parei na cortina. Estava acordado? A cama rangeu e ouvi um suspiro e um ronco grunhido. Saberia se não me juntasse a ele? Poderia dormir em um banco no corredor, como os outros escravos. Mas, ele saberia quando acordasse, e isso serviria de alguma forma para despertar sua raiva.

Vestindo minha camisa, tomei meu lugar ao seu lado. Ele suspirou novamente e se virou, seu braço vindo sobre mim, me puxando para perto.

Enrijeci ao seu toque, mas ele ainda estava dormindo e sonhando - com algo que o perturbou, ao que parecia, porque gritou, embora não alto o suficiente para acordar.

Sacudiu-se e murmurou, então se enrolou de volta para mim mais uma vez. E fiquei deitada ouvindo, enquanto os seus murmúrios se transformavam em palavras que compreendia: “Não” e “Encontre-a”.

Ele me puxou com mais força para a curva de seu corpo e seus lábios encontraram meu pescoço.

— Meu amor, meu amor...

E com sua carícia, repetiu o nome da mulher com quem sonhava.

Bretta.


N

as semanas que se seguiram, Thoryn ia à casa grande todas as manhãs, acompanhando-me até sua casa para atender Thirka. Sob seus cuidados, ela floresceu, curando-se mais rapidamente do que eu esperava.

Ele ofereceu a Eldberg o dobro do valor dela e deveriam se casar assim que Thirka pudesse ficar de pé sem ajuda.

jarl não falou sobre isso, apenas comprou dois escravos para substituí-la, um casal de sangue nórdico e mais velhos, escravizados durante uma invasão ao norte. Embora Sigrid mantivesse Ragerta e eu ocupadas, o trabalho ficou mais fácil, com mais ombros para suportar o fardo.

O humor de Eldberg era variado, às vezes com raiva, outras, atencioso. Houve dias em que me manteve em sua cama, observando enquanto fazia minha tensão aumentar, me levando para a liberação, fazendo-me estremecer de paixão que não pude conter.

Esforcei-me por fechar minha mente contra tudo que me envergonhava, aceitando que uma escrava não tinha o privilégio de escolha. O que mais me envergonhou foi meu desejo de ser consolada e acariciada. Queria desafiá-lo, mas lutei contra o impulso de estender a mão. Uma estranha intimidade havia crescido entre nós, e era como se dois homens diferentes residissem dentro dele.

Apesar desses pensamentos, não esqueci que era sua cativa e ele meu mestre, enquanto isso o divertisse. Quando esse tempo acabasse, não sabia o que viria. Poderia se livrar de mim da maneira que quisesse, vendendo-me em algum mercado distante, para quem pagasse o melhor preço. Vender meu filho também, se sobrevivesse.

A necessidade de escapar permanecia comigo, embora não soubesse como realizaria tal plano. Arrumar-me em algum navio mercante provavelmente me levaria de um perigo a outro. Tentar cruzar as montanhas seria uma loucura. O rio que me trouxe a Skálavík passava pela orla do povoado apenas para fluir para o fiorde. Poderia seguir o caminho da água que me trouxe a este lugar, mas não sabia se restava algo de Svolvaen.

Se meus velhos amigos tivessem sobrevivido, achavam que estava morta ou que havia conspirado com Skálavík para provocar os acontecimentos daquela noite terrível? Doeu-me pensar nisso. As amizades que fiz eram preciosas para mim, duramente conquistadas como foram.

Astrid. Ylva. Torhilde. Helka... E Eirik. Era tolice minha esperar que ainda pudessem viver? Não tinha visto a casa comprida pegar fogo e ouvido os gritos de quem estava dentro? Não tinha testemunhado Eldberg ficar sobre Eirik e mergulhar sua lâmina em seu corpo?

Muitas vezes vi Eirik em meus sonhos, de forma tão vívida, seus ombros alinhados para a batalha, sua espada erguida em desafio.

Alcançar Bjørgen seria minha melhor chance. Jarl Ósvífur me concederia proteção, certamente, honrando minha posição como viúva de Eirik. Talvez, Helka e Leif tenham sobrevivido ao ataque, e eu os encontraria seguros lá, embora dificilmente parecesse possível ter esperança. Se estivessem vivos, não teriam vindo e barganhado pela minha libertação?

Ainda assim, precisava acreditar que havia um lugar para mim, em algum lugar além de Skálavík.


A

bsinto para cólicas estomacais, milfólio para estancar o sangramento, bardana para aliviar dores nos ossos e matricária para amenizar uma dor de cabeça. Toquei cada planta enquanto as contava para mim mesmo, depois quebrei um caule de lavanda, esfregando-o entre os dedos. Lavanda para dormir. Reconheci muitos outros artemísia, chicória, camomila, angélica, mil-folhas e banana.

Tinha cultivado as mesmas plantas em Svolvaen, usando-as em tantas combinações quando estava em busca de uma cura para a doença que nos atormentava. Mal eu sabia, então, que a resposta estava nas cavernas do fiorde, onde uma alga marinha em particular crescia espessa nas paredes.

O jardim de ervas tinha sido de Bretta e tinha crescido negligenciado, urtigas crescendo entre as fileiras de plantas. Não que as folhas de urtiga não fossem úteis, mas não podiam inundar tudo ao seu redor.

Sigrid não deveria ter permitido que crescesse demais, mas não era minha função corrigi-la. Em vez disso, resolvi arrumar um pouco a cada dia.

Esta manhã, estava procurando erva-doce e tomilho. Com confrei e calêndula, fariam um bom bálsamo para a pálpebra de Elberg, que ainda chorava e parecia não querer curar.

Além do pequeno jardim, onde a grama crescia, avistei as flores brancas e espumosas da salsinha gigante. Agora havia uma fonte de retribuição! Uma gota de seiva de sua haste em cada olho queimaria sua visão inteiramente, mas me ocorreu que eu nunca, agora, iria querer infligir tal coisa a ele.

Com o passar do tempo, o desejo de me vingar havia desaparecido. Poderia facilmente ter escondido uma faca e cortado sua garganta enquanto ele dormia, mas perdi o gosto por tal vingança.

Quando fugisse, jurei, não teria sangue nas mãos.

Ainda assim, pulei ao sentir o toque de Eldberg em meu ombro.

— Misturando suas poções, escrava? — Ele arrancou o tomilho dos meus dedos, levando-o ao nariz.

— Para o senhor, meu lorde. — Segurei tudo o que reuni. — Me permitiu ajudar Thirka, e vou ajudá-lo também, se permitir.

— Acha meu ferimento desagradável? — A velha dureza estava em sua voz. — Não sou bonito o suficiente para você? — Ele me agarrou pelos ombros. — Isso é facilmente remediado, pois posso me fartar de você sem que nenhum de nós veja o rosto do outro.

— Não, Meu Lorde. Se ofende facilmente. Pensei apenas em aliviar o desconforto desta ferida que está há tanto tempo cicatrizando.

Ele se soltou e uma sombra passou por seu rosto, um lampejo fugaz de remorso, pensei, por ter falado asperamente.

Não era sua maneira de retirar as palavras faladas ou pedir desculpas, pois era o jarl e não havia necessidade de se explicar, mas me puxou contra o peito.

— Vim procurá-la com uma missão própria, e isso servirá a ambos os propósitos, se quiser tentar me curar. O comerciante que nos vendeu o aloés há alguns meses voltou e seu navio carrega outros remédios. Seria bom criar uma caixa de remédios. Thoryn me falou de sua habilidade e, tendo conhecimento, deve me ajudar a escolher, pois confio em seu julgamento, assim como em qualquer curandeiro em Skálavík.

Era um grande elogio, o primeiro que ouvi de seus lábios, mas sabia que não devia parecer muito satisfeito ou dar qualquer valor a isso.

Em vez disso, inclinei a cabeça para trás, oferecendo meus lábios, que tomou com avidez, ousado e exigente, envolvendo-me em seus braços enquanto reclamava minha boca completamente.

Foi o suficiente, aquele beijo, para despertar sua masculinidade e, quando parou, estava respirando pesadamente. Tirando a túnica, a colocou sobre a fileira de camomila em que estávamos e me guiou para colocar-me sobre ela.

— Não pode querer dizer... não aqui! — Protestei, mas ele já havia afrouxado o fecho da calça e sua mão estava por baixo da minha saia.

— Sou o jarl e é meu desejo. Quanto à sua modéstia, não se preocupe, pois as plantas estão crescidas o suficiente para nos esconder.

E não houve discussão depois disso, pois ele reivindicou outro beijo e se moveu entre minhas pernas, sua carne quente na minha.


F

oi com alguma leveza de coração que caminhei ao lado de Eldberg até o porto. Nunca tive permissão para ir além da cabana de Thoryn, e só então em sua companhia. Outras vezes, estive sob o olhar atento de Sigrid ou da guarda da casa comprida.

Como Svolvaen, o coração de Skálavík estava em seu porto, mas era mais do que um lugar de pesca. À medida que descíamos o promontório, Eldberg me disse que os mercadores costumavam nos visitar, negociando por ossos de baleia e óleo de baleia de Skálavík, peles e arenque, machados e pontas de flechas e lâminas de todos os tipos. A forja era trabalhada por seis homens fortes, cuja habilidade atraia muitos em busca de armas finas. O metal saiu da própria rocha acima do assentamento, com muitos para extrair para fundição.

Em troca, Skálavík comprava contas de âmbar das terras bálticas, pedra-sabão, sal, sedas, outros tecidos finos e grãos também. A terra aqui não se prestava ao cultivo de tais safras, e muita cevada era necessária para pão e cerveja.

O lugar estava agitado, as pessoas se acotovelando para examinar os muitos produtos à venda. O cheiro da fumaça da fogueira misturava-se aos odores pungentes de peixe e gado, enquanto os compradores regateavam ruidosamente. Passamos por barracas de carne, nozes e queijos, os frequentadores do mercado se afastando quando Eldberg se aproximou, abrindo caminho para seu jarl e me olhando com curiosidade que não escondiam. Tinha tirado a camomila do meu cabelo e me alisado o melhor que pude, mas senti minha aparência miserável, pois o vestido que usava estava no meu corpo quase três semanas sem lavar, já que eu não tinha outro para substituir.

Nosso destino era um navio ancorado na baía, de onde um pequeno barco a remo havia sido enviado, esperando por nós no final do cais. Eldberg saltou direto e segurou minha mão para me ajudar a embarcar.

— Este capitão prefere permanecer na água com sua carga, por seu valor especial. — Ele acenou com a cabeça para o homem parado no convés, observando nossa abordagem. — É bastante adequado para mim, pois oferece mais privacidade para nossas transações.

Uma escada de corda foi lançada ao lado, permitindo-nos subir, de mão em mão.

Fiquei surpreso com o tamanho do navio e sua organização. O convés era amplo e quase limpo, exceto por rolos de corda bem enrolados. As velas estavam bem amarradas, permitindo que o navio ficasse perfeitamente imóvel na âncora.

— Selamlar, Yusuf. — Eldberg inclinou levemente a cabeça antes de tocar a testa e o coração.

— Baris seninle olsun, arkadasim — o homem respondeu, oferecendo o mesmo gesto de boas-vindas em troca.

O capitão sorriu, seus olhos piscando rapidamente sobre mim antes de voltar para Eldberg. Atrás dele estavam oito membros de sua tripulação, cada um tão castanho quanto o capitão, com as pernas firmemente plantadas e os olhos fixos em nós. Embora parecessem à vontade, cada um usava uma arma no cinto.

— E que a paz esteja com você, meu amigo. — Eldberg avançou para apertar a mão do outro.

— Tem algo especial para trocar hoje, certo? Um tesouro com olhos como joias e pele de marfim.

Uma onda de frio passou por mim, ouvindo aquelas palavras faladas com dificuldade na língua nórdica. Olhei com medo para Eldberg. Afinal, era esse o momento em que cumpriria sua ameaça? Nesse caso, então não havia tola maior do que eu, pois comecei a acreditar que Eldberg lamentaria me perder, quando chegasse o dia em que escapasse.

— Ha! — Eldberg respondeu com diversão clara, o canto de sua boca se contraindo. — Ela é minha para vender, mas se eu fosse capaz de me separar dela, eu pediria safiras grandes o suficiente para combinar com aqueles olhos, Yusuf.

— Me perdoe. — O capitão baixou a cabeça. — Simplesmente presumi...

A grande resposta de Eldberg foi quase tão desconcertante quanto minha crença de que poderia me vender. Falou, verdadeiramente, como se fosse preciosa para ele.

— Neste caso, tenho sedas e pulseiras de ouro, trazidas de Constantinopla. É para isso que veio, sim, para adornar este brinquedo querido e torná-la adequada para o seu harém?

— Não muda nada, Yusuf! — vociferou Eldberg, claramente gostando do jogo, embora meu próprio temperamento doesse ao ouvi-los falar assim de mim.

— Pode me tentar com suas bugigangas mais tarde, embora garanta que não tem nada a oferecer que se compare à tentação da pele dela nua. Não precisa de roupas finas para ficar bonita para mim. Eu a manteria nua dia e noite, se não fosse necessário me arrastar para atender a outros assuntos ocasionalmente. — Eldberg encontrou meus olhos, e os dele ainda estavam rindo, não se importando com a raiva que brilhava nos meus.

— Mas, é claro, o estado natural de uma mulher é sempre o mais desejável — respondeu o capitão, e vi um toque de lascívia quando mirou em mim novamente, sem dúvida me imaginando sem a capa do meu vestido.

Eldberg pigarreou e se recompôs, perguntando mais seriamente — São os remédios que vim buscar, Yusuf. Como aqueles que negociou antes, quando não pude cumprimentá-lo e Thoryn veio em meu lugar. — Ele virou o rosto, indicando as queimaduras que haviam cicatrizado. — O aloés foi eficaz e compraríamos mais, junto com amostras de outros ingredientes que recomenda. Se eles se mostrarem potentes, compraremos volumes maiores na próxima vez que navegar até nós.

— Vejo que não é apenas afortunado em sua companhia, mas sábio, Jarl Eldberg. — O capitão tocou seu coração. — E será um prazer fornecer tudo o que precisa.

Virando-se, deu instruções em sua própria língua, enviando dois de seus homens para o convés. Voltaram com um baú.

Abrindo-o, Yusuf pegou um pote de cerâmica selado com cera. — Uma moeda de prata para uma ânfora de alóe, meu amigo. Para o resto, prepararei um pequeno frasco de cada especiaria de meu estoque pessoal e explicarei suas propriedades. Por isso, de boa-fé, não cobro, mas voltarei com as marés vivas e volumes maiores, dos quais pode comprar o quanto quiser. Se isso lhe agrada, eu trocaria pelas peles que colher neste inverno. Suas raposas estão particularmente bem, e tenho compradores que as esperam no leste.

Eldberg concordou e prosseguiram com o negócio, Yusuf decantando pequenas quantidades de poções e pós coloridos, dando seu nome e aplicação: cúrcuma e gengibre, para neutralizar dores no corpo e ajudar na digestão, óleo de cravo para o alívio da dor de dente, e canela para facilitar a respiração. Eram vinte ou mais, cada um com seu próprio remédio, que guardei na memória.

— E isso, meu amigo, tenho certeza de que não tem utilidade para isso. — O capitão sacudiu uma pequena bola, fazendo-a chocalhar. — Aumenta a capacidade do homem e mantém sua força, para a criação de muitos filhos. — Ele deu um pequeno sorriso. — Embora não precise, colocarei esta noz-moscada com seus outros medicamentos, no caso de um dos homens sob seu comando desejar testar sua potência.

Apertando as mãos, Eldberg agradeceu por sua meticulosidade e abriu a bolsa em seu cinto, contando as moedas necessárias. Quando terminou, segurou mais cinco.

— O que mais tem para mim então, Yusuf? Mostre-me o seu melhor. Algo adequado para ser usado pela minha rainha de ouro.

Fiquei vermelha ao ouvi-lo me chamar assim, pois a brincadeira foi às minhas custas. Seja lá o que ele me nomeasse, ainda era sua escrava, sem qualquer direito de recusar a ele ou seu presente.

O capitão pensou por um momento antes de dar instruções novamente, enviando outro de seus homens para buscar o que pediu.

Havia três rolos de tecido, cada um com comprimento suficiente para fazer um vestido. O primeiro era de um rico brocado verde, o seguinte em ouro pálido, entrelaçado com prata, e o último uma seda de azul cintilante, seus matizes semelhantes aos do fiorde.

Além disso, Yusuf produziu um bracelete intrincadamente moldado em prata e cravejado de pérolas, com broches para combinar.

Fiquei sem palavras, pois nem mesmo o tecido do meu vestido de noiva era tão bom, e nunca usei nenhum adorno de valor, exceto o broche de marfim que Asta me deu.

Eldberg balançou a cabeça. — Tem um bom olho, Yusuf. Empacote tudo e nós o deixaremos. Desejo-lhe uma boa viagem e aguardo o seu regresso.

— Veda arkadasim. Adeus, meu amigo.

Enquanto remamos de volta ao cais, Eldberg se inclinou para a frente, apoiando os antebraços nos joelhos. — Ficará muito elegante, minha Elswyth, mas eu quis dizer o que disse.

— E o que foi, Meu Lorde? — Eu olhei para a água, não confiando em mim mesma para encontrar a intensidade de seu olhar.

— Não importa o quão bom seja o seu vestido, sempre a preferirei fora dele.

 

 

Eldberg


31 de outubro de 960 DC

O

s moleiros, gaivotas e andorinhas-do-mar haviam voado, deixando o vento gemer sua perda através dos penhascos que pairavam acima de Skálavík.

Eldberg ergueu o rosto para o pulso ondulante de luz trêmula, verde cintilante, silencioso. Mesmo com os olhos fechados, o brilho permaneceu, ondulando e quebrando, tão vívido quanto a memória de seu rosto.

Em sua mente, ele a alcançou.

Me vê, Bretta?

Reuniram-se para marcar o rito de Alfablót, para homenagear as almas dos mortos e os espíritos das trevas, o Dökkalfar. Invisíveis para os vivos, misteriosos e em seu estado mais poderoso durante as longas noites, tais forças residiam na montanha acima de Skálavík. Esta noite, receberiam seu sacrifício, e todos os homens se lembrariam de sua fragilidade na escuridão do desconhecido.

Sweyn conduziu o jovem touro dentro do círculo sagrado, uma pedra para cada homem de Skálavík e cada homem atrás de uma pedra.

— Convocamos nossos ancestrais do sexo masculino para nos proteger, para falar por nós pela escuridão. — A voz de Eldberg soou, dirigindo-se a todos ao seu redor. — Oferecemos este blót, esta libação, e imploramos misericórdia durante o longo frio do inverno, para que possamos viver para ver o sol voltar.

Erguendo o machado, Eldberg girou-o três vezes sobre a cabeça antes de enterrá-lo com um baque surdo no crânio do bezerro. Foi uma morte limpa, a criatura caindo no chão com a lâmina ainda alojada no osso. Não deu nenhum berro, apenas um puxão repentino e um olhar arregalado.

Plantando o pé firmemente contra o ombro do animal, Eldberg largou a arma e gesticulou para Sweyn. Com uma tigela rasa colocada ao lado do pescoço da criatura, seu homem jurado se ajoelhou e mergulhou sua adaga profundamente, trazendo um jorro de sangue.

Quando o recipiente estava cheio, o ergueu e Eldberg mergulhou o polegar no líquido, marcando a testa de seu comandante e depois a sua. Enquanto a força vital do touro embebia o solo sob seus pés, Eldberg levou o prato aos lábios e bebeu.

— Comprometidos com a lealdade, permaneceremos, irmão para irmão, até entrarmos naquele outro reino.

— Até entrarmos naquele outro reino. — A resposta percorreu o círculo com a passagem da tigela, todos bebendo e recebendo a marca de seu jarl.

Tendo completado sua jornada, o prato voltou ao centro do círculo, e cada homem acenou com a cabeça sobriamente para seu vizinho. Haveria festa mais tarde, com a carne do animal assada e uma porção trazida de volta a este lugar com uma caneca de hidromel. Por enquanto, partiriam em silêncio, carregando a carcaça da besta entre eles.

O vento estava aumentando e Eldberg podia sentir o cheiro de nuvens de tempestade se formando.

— Gostaria de lhe falar, meu jarl. — Sweyn tocou seu braço, puxando-o de lado. — Pois há mais a temer do que as forças do mundo oculto.

Eldberg examinou seu comandante. — Deseja me avisar, Sweyn?

O outro endireitou os ombros.

— Aquela vadia, ela o enfeitiçou. — Ele umedeceu os lábios, hesitando. — E quanto mais redonda sua barriga cresce, mais ela o tem sob seu feitiço.

— Está corajoso, esta noite, Sweyn. — Eldberg o encarou com um olhar severo. — Acha que pode me dizer que escrava merece o calor da minha cama?

O olhar de Sweyn se desviou. — Ela governa não só sua cama, Meu Lorde. As roupas que usa são mais finas que as de Sigrid e ela não desempenha mais as funções de escrava. Existem duas senhoras agora, pois os outros escravos a seguem com mais disposição do que sua verdadeira dama.

— Se for verdade, então isso diz mais da carência de Sigrid do que de Elswyth. Quanto aos deveres dela, cabe a mim decidir.

— Perdoe-me, Meu Lorde — Sweyn se atreveu a erguer o olhar — mas os homens estão dizendo que permite que esta mulher, uma inimiga de Skálavík, torça ao seu comando, para que negligencie suas visitas ao porto e às minas. — Ele engoliu em seco. — Entregue-a aos homens da guarda e estará livre novamente, Meu Lorde.

Eldberg sentiu o gosto de cinzas na língua. Nenhum homem tinha o direito de falar com ele assim. Nenhum homem deveria ousar.

Fechou a mão em volta do pescoço de Sweyn. — Pensa em me julgar? — Eldberg apertou com mais força. — Foi longe demais, Sweyn. — Lentamente, levantou o homem em suas mãos, tirando seus pés do chão. — Ela acalmou a inquietação da minha dor e suas habilidades trouxeram cura aos meus olhos; por isso eu a favoreço, mas sou seu mestre.

— Seu olho, Meu Lorde! — Ele balbuciou, chutando os pés. — Ela mandou meu irmão para as cavernas do fiorde, fazendo Thoryn trazer de volta todas as algas que pôde encontrar. Ela queria uma. É o que ela usava no cataplasma, um tipo que só cresce no escuro, escondido. — Sweyn ofegou por ar. — Os feitiços dela não usam os medicamentos que comprou do Mikklagard Turk. Ela não é melhor do que a velha que vive na montanha, mergulhando em coisas que nenhum homem deveria saber.

Eldberg deixou Sweyn cair, seus lábios se curvando em desgosto.

— Está dispensado de seu posto de comandante da guarda. A partir de amanhã, se reportará à mina.

Sweyn rastejou para trás, segurando a garganta. — Aquele lugar! Não! — Ele olhou para Eldberg com a boca aberta, incrédulo. — Tenho servido fielmente. Fiz tudo o que ordenou. — Ele balançou sua cabeça. — Não mereço isso.

— Serviu a si mesmo. — Eldberg tocou o cabo da adaga embainhada em sua cintura. — Eu o liberto de seu vínculo. É um homem livre. Vá para onde quiser. Se a mina não combina com você, encontre sua fortuna em outro lugar.

Sweyn se levantou com dificuldade, os olhos escuros de ódio. Tentou pegar a lâmina em seu próprio cinto, mas Eldberg foi rápido demais. Sua arma cortou a parte de trás do pulso de Sweyn antes que pudesse sacar.

Tropeçando para trás, Sweyn gritou, segurando o ferimento sob o braço.

— Eu tenho sua resposta. — Eldberg limpou o sangue de sua adaga. — Saiba que o deixo viver apenas em sinal de seu serviço anterior. Amanhã, vai embora. Não me importo para onde vai. Se te ver de novo, minha lâmina abrirá sua garganta.

Sweyn cuspiu no chão. — Maldito seja a boca de Hel, e aquela vadia!

Eldberg deu um único passo à frente. Foi o suficiente. Sweyn correu, descendo o promontório e se afastando, em direção à casa grande.

A chuva estava caindo. Ele deveria entrar, juntar-se aos seus homens, mas um desejo mais forte o chamava, sob a sombra da montanha.

Queria ver a mulher sábia, Hildr. Foi uma noite auspiciosa, Alfablót. A noite dos mortos.

Que melhor hora para consultar essas forças invisíveis? Para procurar a vidente que existia entre as almas sombrias da montanha e o mundo dos homens.

Havia visitado sua caverna apenas uma vez. Quando Beornwold tomou Eldberg pela primeira vez como seu comandante, oferecendo-lhe um lar permanente, insistiu em que Hildr lançasse as runas.

Ela falou em enigmas, é claro. Ele estava impaciente, querendo saber o que via. Aqueles olhos sombreados de branco o haviam enervado; cegos, mas vendo algo que outros não podiam. Ela tocou o lado esquerdo dele e puxou a mão. Muito quente, ela disse. Então, cobrindo o olho com a palma da mão, murmurou algo sobre a marca de Odin.

Parecera um absurdo na época.

Ele sabia melhor agora.

Eldberg puxou sua pele de lobo para mais perto e virou o rosto para a montanha.


S

ua memória não havia falhado. Embora a entrada fosse coberta por vinhas, o pedaço de chão na frente apresentava sinais de pés; aqueles da velha e aqueles que a visitaram.

Houve um bater de asas e uma coruja voou baixo, parando na árvore ao lado da entrada, voltando seu olhar que piscava lentamente para ele.

Lá dentro, a caverna era como se lembrava. Galhos e pedras empilhados, runas arranhadas nas paredes e havia os rudimentos da vida, cobertores embrulhados, uma panela, facas e um machado.

O cheiro de seu fogo, galhos de pinheiro e musgo, era forte, mas a caverna estava fria, apesar das chamas intensas, trazidas para o alto por uma corrente de ar de cima. A fumaça subiu, puxada por uma fenda na rocha superior. Água pingou em algum lugar nas costas.

Hildr ergueu a cabeça, farejando o ar, seus olhos turvos se voltaram em sua direção. Ela era mais osso do que carne, tendões envoltos em trapos.

— Estava esperando-o. — Ela fez um gesto com a mão. — Sente. Beba comigo. — Havia duas xícaras.

Eldberg levou o nariz cautelosamente à bebida; fungos e galhos. Ele fez uma careta e a ouviu rir.

— Nada para envenená-lo, apenas para ajudar. — Ela deu um gole em sua própria xícara. — Ainda vai viver muito, mas não veio perguntar isso, não é?

— Não. — Eldberg colocou um pouco do líquido na boca, obrigando-se a segurá-lo ali, ignorando a amargura.

As runas estavam dispostas ao lado dela: fragmentos de osso, alguns esculpidos, bicos e garras, uma pena de coruja. Ela os tocou levemente com as pontas dos dedos. — Mas tem uma pergunta.

— Possivelmente.

— Então diga à escuridão. — Sua voz, antes tão frágil quanto a asa de uma mariposa, era insistente. Ela o alcançou, pegando sua mão, colocando-a perto das runas. — Imagine tudo em sua mente. Eles vão ouvir.

Ele prendeu os fragmentos entre as duas palmas, sacudindo-os como fizera da primeira vez, depois jogando tudo no chão. Espalharam-se, caindo aleatoriamente. Olhou, procurando algum padrão, mas não havia nenhum. Mesmo assim, a vidente se curvou para frente, seus dedos tremendo sobre as peças, sentindo onde cada uma havia se acomodado.

— Sim — sua voz sussurrou. — Vi isso antes mesmo de sua chegada.

— O que? — Eldberg teve que se conter para não a sacudir. — O que vê?

— Duas garras estão se tocando. Existe conflito. No seu passado, nestes dias está vivendo, e mais por vir. O bico está para cima, afiado, perigoso, a ameaça de ferir. A vida está em jogo. Alguém lhe deseja o mal. Existe inveja. Existe traição.

Eldberg sibilou. — Isso eu sei sem que me diga. O que mais, velha?

Revelando mais gengiva do que dente, Hildr sorriu. — O que deseja não lhe trará felicidade.

Eldberg fechou os olhos, repentinamente cansado. Sua jornada foi perdida. Ela não lhe disse nada de valor.

— Não deseja ouvir, mas deve aprender. — Com cuidado, ela recolheu as runas, colocando-as como antes, cada uma em seu lugar designado. — É a aranha na teia e na mosca. Cada movimento determina o que virá. Muito está escrito, mas existem muitos caminhos. Deve escolher.

Eldberg suspirou. Tinha ouvido o suficiente.

Só quando se levantou, ela rastejou para frente, agarrando com os dedos, enganchando-se nos laços cruzados que prendiam o pelo em volta da perna dele.

— Deixe os mortos descansar. — Sua voz rouca. — E olhe para os vivos.

Sua cabeça se ergueu, seus olhos olhando além dele.

— Na floresta! Encontre-a!

 

 

Sweyn


31 de outubro de 960AD

O

corredor estava cheio, pessoas descansando nos bancos compridos, brincando e rindo. Uma competição de queda de braço havia começado nas mesas centrais. Pedaços de carne já estavam chamuscando nas assadeiras, o animal tinha sido imediatamente abatido. O rico aroma de ensopado se espalhava pela fumaça do fogo.

Sweyn se esgueirou até onde a moça supervisionava a abertura de um novo barril de hidromel. Puxou sua manga. — O jarl pediu por você. Ele está esperando.

Ela parecia não ouvi-lo por causa da alegria ao redor, então ele sacudiu a cabeça, pronunciando a palavra com clareza. — Lado de fora.

Elswyth franziu a testa. — Ele não vem? Estão todos esperando por ele.

Sweyn olhou em volta. Até onde podia ver, ninguém estava esperando por nada, exceto mais hidromel.

—Deve vir comigo. — Sweyn colocou a mão sob o cotovelo dela, guiando-a para fora do local.

Cautelosamente, o deixou levá-la adiante.

Do outro lado da sala, Sigrid chamou sua atenção e fechou a cara. Ficava mais azeda a cada dia, deslocada e descontente. Antes de Sweyn levar Elswyth até a porta, Sigrid os interceptou.

— Ela tem coisas para fazer aqui. Nós todos temos. Para onde está indo? — Sigrid latiu sua pergunta, agarrando Elswyth pelo outro braço.

— Ordens de Jarl. — Sweyn encolheu os ombros. — Deve se juntar a ele no promontório. Alguma parte do ritual que quer que participe, favorecida como ela é. — Ele deu um sorriso doentio, sabendo que o pedido irritaria Sigrid.

— Mais do mesmo! E quando precisarmos de toda a ajuda! — Sigrid cuspiu sua réplica. — Vá em frente, então. — Seus lábios se ergueram em um sorriso de escárnio, apertando o cotovelo da garota o suficiente para fazê-la estremecer. — Talvez seja o seu sangue que ele quer, minha querida, um blót mais poderoso para os da escuridão.

— Nada disso, tenho certeza. — Sweyn amaldiçoou Sigrid por sua língua cruel. Ele tinha visto o jarl entrando nas árvores em vez de segui-lo, mas não sabia quanto tempo demoraria até que Eldberg se juntasse a eles. Para que seu plano funcionasse, Sweyn precisava que Elswyth viesse rapidamente.

— Eu mal estou vestida... — Ela indicou seu vestido, uma peça frágil de seda azul brilhante, usado sobre um simples vestido branco. Era mais adequado para os meses de verão passados, mas ficava quente no salão quando tantos se reuniam. Os homens teriam o peito nu antes que a noite terminasse.

— Não vamos demorar. — Sweyn a puxou novamente. — Não o deixe esperando.

Sigrid fez uma última carranca enquanto levava Elswyth para fora.

Definitivamente, havia um tempo mais frio soprando, com rajadas de chuva caindo persistentemente. A guarda de dois passou em sua caminhada pelo perímetro, ombros curvados contra o vento, e Sweyn os chamou. — Devem entrar e pegar uma taça de hidromel. O jarl lhes trata bem. Saia assim que beber, lembre-se!

Não precisaram ouvir duas vezes.

Sweyn respirou com mais facilidade. Só precisava levá-la até a linha das árvores e eles estariam fora de vista.

— Minha capa! — Elswyth tentou recuar. — Eu vou buscar.

Sweyn praguejou novamente. — Não. Não está frio o suficiente para isso, e aquela coisa está queimada. Seria uma pena que usasse para o que o jarl tem em mente.

Ela pareceu considerar. Thoryn havia devolvido a capa dias após o acidente de Thirka, e Sigrid tinha torcido o nariz, o interior agora enegrecido pelas chamas. Eldberg havia prometido a Sigrid uma nova capa de pele assim que a temporada de caça começasse, e o mesmo para Elswyth, para desgosto da mais velha.

Sweyn podia ver a garota pensando. Ela o estava usando na noite em que Sweyn a sequestrou. Pareceu subitamente ficar ciente de quão forte ele segurava seu braço, quão persistentemente a estava arrastando para longe da porta.

— Pare! Eu não quero ir. Isso não está certo. Não acredito em você!

Em um único movimento, Sweyn golpeou a testa dela com a sua. Ela se encolheu imediatamente e, com um último olhar sobre ela, colocou-a no ombro. Mesmo com sua barriga arredondada, era um peso fácil de levantar.

Contornou a borda da casa grande e foi para a borda da floresta.


S

weyn carregou-a tão profundamente nas árvores quanto ousou. Muito perto e seriam vistos; longe demais, e perderia um tempo precioso.

Pelos dentes de Fenrir, odiava aquela escória furiosa. Deveria ter morrido no incêndio, e tudo teria funcionado de forma diferente. Sweyn manteve as coisas funcionando enquanto aquele bastardo ingrato estava à beira da morte. Quem mais senão ele teria se tornado jarl no lugar de Eldberg? Mesmo aquela miserável cadela da Sigrid teria dado sua bênção.

Agora, se quisesse manter a cabeça no pescoço, teria que fugir. Eldberg havia se recuperado de ferimentos que teriam matado um homem comum, e permanecia o mais forte entre eles. Ninguém poderia enfrentá-lo em um único combate e esperar vencer.

Mas daria a Eldberg algo para que se lembrasse dele - tudo voltaria ao normal. Ninguém tratava Sweyn assim e se safava com isso.

Quanto a esta aqui!

Sweyn ajoelhou-se sobre Elswyth, agarrando seu rosto com uma mão. Ela estava voltando lentamente, ainda não totalmente consciente.

Trazê-la para Skálavík foi um erro.

Era verdade que distraiu Eldberg naquelas primeiras semanas, um benefício inesperado, considerando todas as coisas, mas sua influência o mudou de maneiras que Sweyn não poderia ter previsto.

O temperamento de Eldberg sempre fora selvagem. Juntamente com sua força de guerreiro e habilidade com a espada, o tornava invencível. Durante seu casamento com Bretta, uma mudança foi aparente. Estava determinado a ver Skálavík prosperar como um porto comercial. Seu legado, Eldberg o chamara, seu desejo de que um dia rivalizassem com Hedeby como um lugar para os mercadores se reunirem. Em vez de saquear outras terras para obter riquezas, a riqueza fluiria para Skálavík por meio do comércio.

A morte de Bretta, e do filho ainda não nascido de Eldberg, quase quebrou o jarl, sua dor o reduzindo ao bárbaro que ele fora tantos anos atrás. Sweyn esfregou as mãos alegremente ao ver isso, pois isso facilitou o caminho para suas próprias ambições. Eldberg havia sobrevivido ao incêndio, mas ele provocaria sua morte, de uma forma ou de outra.

Nos meses anteriores, Elswyth havia acalmado o animal selvagem, domesticando-o mais uma vez. Isso gerou muita conversa, e não em críticas à prostituta Svolvaen. Longe de negligenciar seus deveres como jarl, Eldberg os abraçou com maior vigor, expandindo a produção da mina e o número de homens treinados no forjamento de armas. Enquanto isso, sua guarda do porto garantiu o bom funcionamento do mercado e a segurança de todos os navios que entravam no fiorde de Skálavík.

Mesmo que Eldberg não tivesse percebido, Sweyn podia ver o que estava por vir. O jarl libertaria Elswyth como fez com Thirka, assim que desse à luz, talvez antes. Então se casaria com a moça e geraria seu próprio herdeiro.

As ambições de Sweyn para si mesmo foram frustradas, mas havia uma parte do futuro de Eldberg que Sweyn poderia arruinar. Com alguma sorte, a descoberta enviaria seu jarl de volta ao abismo de onde ele havia escalado.

As pálpebras de Elswyth tremeram quando Sweyn segurou seu pescoço. Esmagaria sua garganta rápida e facilmente, e então iria embora.

Mas, olhando para ela, lembro-se do motivo de tê-la levado em primeiro lugar. O vestido frágil que estava usando ficou úmido com a chuva. Agarrou-se a seus seios, ainda mais voluptuoso em sua condição madura. O ar frio apertou seus mamilos. Ele deixou cair uma mão para apertar sua carne. Entre o indicador e o polegar, beliscou a ponta, e ela choramingou, embora não se mexesse totalmente.

Foi o suficiente para enviar uma onda de calor à sua virilha.

Por Thor e Odin e todos os deuses, ela queria o pau de Skálavík e, antes que quebrasse seu lindo pescoço, o daria a ela.

Com avidez, levantou as saias dela, afastando suas pernas com o joelho.

Era uma escrava capturada e a foderia como uma.

Agarrando seus quadris, mergulhou os dedos em sua bainha. Estava pronta o suficiente para a metida. Não haveria nada para impedi-lo de entrar ao máximo.

Seu cabelo caiu solto sobre sua cabeça, seda dourada sobre as folhas meio podres e musgo. Seus lábios, carnudos e suaves, o convidaram. Tudo o que Eldberg havia desfrutado seria dele.

Avançou sobre ela, saqueando sua boca enquanto sua excitação cutucava sua umidade.

Tarde demais ele percebeu sua loucura.

Enquanto os dentes dela apertavam sua língua, a boca de Sweyn se encheu de sangue.


Elswyth

D

espertei com a dor na testa, com a incapacidade de respirar, com o peso dele sobre mim. O instinto me fez morder a coisa sondadora na minha boca, e seu berro quebrou para me acordar.

Ele saltou, praguejando, e o levantamento de seu peso permitiu que eu me afastasse dele.

Sweyn!

Engolindo em seco, gritei, mas ele estava em cima de mim imediatamente. Uma forte bofetada me jogou nas folhas. Saltou sobre mim então, segurando meus dois braços firmemente no chão.

— Faça isso de novo e vou quebrar seu pescoço.

Com os olhos cheios de lágrimas, vi a fúria nos dele. Ofegante, forcei minhas palavras. — Me machuque e Eldberg vai matá-lo por isso.

— Estarei muito longe. — Seu rosnado era o de uma criatura selvagem.

— E quando encontrarem meu corpo? Eldberg saberá que foi você, Sweyn.

— Ele pode. — Um brilho perverso iluminou seus olhos. — Ou as feras vão acabar com você, e não haverá nenhuma evidência. Ele vai pensar que fugiu.

Engoli meu medo.

Era verdade. É o que todos pensariam.

Tive que mantê-lo falando. Eldberg pode estar aqui. Ele pode ter me ouvido gritar. Eu só precisava de tempo.

— O que eu fiz, Sweyn? — Falei baixinho. — O que o faz me odiar? Porque estamos aqui?

— Por quê? — Sweyn atirou a palavra de volta para mim. — Se acha tão especial? É ele que quero machucar!

Eu não entendi. Minha cabeça latejava. Tinha batido quando caí? Nada fazia sentido. Sweyn tinha autoridade, status e respeito. Por queestava fazendo isso?

Deixei minha voz calma. — Não vai me machucar, Sweyn. Sabe que não está certo. Vai matar o bebê assim como eu. O que os deuses dizem sobre isso? O que dizem os ancestrais? Não fecham esta noite? Não estão assistindo?

— Cale-se! — Sweyn apoiou-se mais fortemente nos meus braços e gritei de dor. — Não sabe nada sobre isso. Não pertence a este lugar. Não é nada!

De todas as coisas que poderia ter dito, esta cortou profundamente.

Passei uma vida inteira sem pertencer.

Mas eu não era nada.

Olhei em seu rosto, reunindo todas as minhas forças para falar claramente. — Tentaram me matar em Svolvaen, mas não conseguiram. Amarraram-me ao cais, mas eu escapei. Morava nas cavernas e escalei os penhascos. Acredita que uma mulher comum poderia fazer isso? Se não fosse nada, acha que ainda estaria vivo!

Os olhos de Sweyn se estreitaram.

Estava inseguro, eu senti.

Alguns acreditaram que era uma feiticeira. Não tinha magia. Não teci feitiços. Mas tinha outro poder. O de uma mulher que se recusou a ser intimidada. Não importa o que acontecesse, me conhecia. Cometi erros e paguei por eles, mas era uma sobrevivente.

Se pudesse fazer Sweyn me temer, ainda poderia viver.

— Juro pelo meu próprio deus e por todos aqueles que governam aqui, me machuquem e vou amaldiçoá-lo. Cada pestilência eu o irei visitar, até que deseje estar morto e nunca ter posto os olhos em mim!

Ele soltou meus braços, recostando-se.

Estava com medo.

De algum lugar nos arbustos, ouviu-se um farfalhar. Duvidava que Sweyn tivesse notado antes, mas sua atenção disparou, ouvidos aguçados.

— Vá rápido enquanto tem a chance. Vá, Sweyn! Deixe-me aqui com os animais da floresta, se quiser, mas corra enquanto pode.

— Pensa em me enganar com tal absurdo? — Ele franziu a testa.

Em algum lugar, bem longe, uma coruja piou.

— Que assim seja.

Congelei quando puxou a faca da bainha. Depois de tudo que disse, ainda tiraria minha vida? Assisti com horror quando pegou a lâmina na bainha do meu vestido, rasgando uma longa tira, depois outra.

O primeiro usou para amarrar meus tornozelos. No segundo, envolveu meus pulsos, colocado atrás das minhas costas.

— Se as criaturas a pegarem, não será culpa minha. Está nas mãos dos deuses agora. Deixe que a salvem.

Temia que ele estivesse certo.

Meu destino estava em quem me encontraria primeiro, Eldberg ou os predadores que vagavam por este lugar escuro.

 

 

Elswyth


31 de outubro de 960 DC

N

ão importa o quanto girasse, meus dedos não alcançariam o tecido que prendia meus pulsos. Recusei-me a ceder. Não sabia em que direção Skálavík estava, mas acreditava que alguma força mve guiava. Eu tinha fé nesse poder orientador.

Puxando meus pés para baixo, consegui ficar de pé, mas as amarras em volta dos meus tornozelos estavam muito apertadas. Perdi o equilíbrio, caindo para a frente nas folhas úmidas. Tentei de novo, e de novo, mas só consegui raspar os braços e o rosto nas amoreiras.

Quantas vezes imaginei escapar, tinha pensado em qual caminho poderia tomar através da orla da floresta e descer para os prados, encontrando o rio e seguindo-o de volta para Svolvaen.

Eu me perguntava como poderia escapar de ser pega.

Agora, precisava ser encontrada.

Precisava que Eldberg viesse atrás de mim antes que as feras cheirassem meu sangue.

Rolando para colocar minhas costas contra uma árvore, sentei-me fria e tremendo, olhando através da escuridão. Quantos olhos estavam me observando? Escutava a respiração das criaturas da floresta, imaginando movimento onde não havia nenhum.

Devia gritar? Se Eldberg estivesse por perto, isso o ajudaria a me encontrar, mas e aquelas outras bestas? Se eu as chamasse também?

Fechei minha mente para o que mais poderia estar à espreita, entidades para as quais não tinha nome. Havia esbarrado com as coisas desconhecidas do outro mundo antes, quando o espírito inquieto de Asta atravessou o véu.

Enrolando-se pequena como uma criança, enterrei meu nariz até os joelhos, tão bem quanto minha barriga permitia.

O tempo passou, as sombras ficaram mais escuras, e então tive certeza de ouvir gravetos quebrando.

Algo estava nos arbustos.

Olhei em volta. Havia um galho que pudesse agarrar para me defender? Nada estava perto. Em qualquer caso, minhas mãos estavam amarradas.

Seja o que for, deixe que não me veja. Faça passar.

Sentei-me muito quieta, respirando superficialmente. Meu pulso disparou na minha garganta.

Quando a coisa explodiu na vegetação rasteira, eu gritei. Asas batendo, rangendo, girando para longe, algum tipo de faisão. Uma criatura tão assustada quanto eu.

Um soluço ficou preso na minha garganta, me fazendo rir e chorar.

Apenas um pássaro, nada para me machucar.

Através da escuridão, algo estava olhando para mim, a menos de vinte passos de distância. Olhei com mais atenção e vi olhos brilhantes. Eu vi um lampejo de presa. Um javali! Aqueles suínos de cerdas ásperas tinham temperamento cruel. Uma única gota de sangue coagulado poderia rasgar um homem em dois.

— Vá embora! — Eu gritei novamente.

Eu rosnei. Eu assobiei. Lati como um cachorro.

Ainda assim, a criatura me assistia. Ouvi seu grunhido e ele emergiu da samambaia, balançando a cabeça, bufando, preparando-se para atacar. Deu uma patada no chão, jogando folhas e pedaços de musgo.

Eu gritei, recuando contra a árvore. Minha hora havia chegado.

Mas houve outro som, um passo suave?

A besta ergueu o focinho, contraindo as narinas, sentindo alguma outra presença. Não conseguia ver e não tive coragem de me virar.

Um lobo? Ou mais de um?

Brigariam para decidir de quem eu seria a minha refeição?

E então uma voz firme, baixa e firme, me comandou. — Fique quieto.

Rapidamente, eu vi a lâmina brilhante. Eldberg atirou seu machado de verdade, cravando-o no pescoço do javali. A criatura se debateu e gritou, o sangue jorrando. Em fúria, abaixou a cabeça e correu para encontrar seu atacante, mas a adaga de Eldberg estava pronta. Quando estava quase em cima dele, afundou-o no focinho do javali.

A besta caiu imediatamente. Rolou para o lado, puxando o ar, e Eldberg agiu rapidamente, dando o golpe final para acabar com a dor da criatura.

Fechei meus olhos, não querendo ver mais, meu coração ainda disparado. Percebi que Eldberg estava me libertando, primeiro meus pés e depois minhas mãos.

Sua palma estava na minha testa, então seus lábios e seus braços me envolveram. Mole e entorpecida, cedi à exaustão.


D

esejei que a cama parasse de se inclinar para frente e para trás. Timidamente, toquei minha testa. O que tinha acontecido? Os eventos da noite não pareciam reais, embora minhas dores e hematomas me dissessem o contrário.

Foram meus gritos que trouxeram Eldberg ao meu lugar exato. De Sweyn não havia sinal. O vigia do porto informou que ele pegou um pequeno barco de pesca e deixou o fiorde há não muito tempo. O navio poderia carregá-lo de alguma forma, se ele evitasse naufragar nas rochas costeiras.

Eldberg ajudou-me a tirar minhas roupas imundas, esfregou meu cabelo para secar e envolveu-me em sua cama quente. Puxou as peles até meus ombros, mas ainda assim estava com frio.

Ragerta trouxe soro de leite quente e me ofereceu uma bebida, embora devagar. Ele caminhava pela câmara e cruzou os braços. Sua voz era severa. — Prometa-me que nunca vai embora.

Estava muito cansada para discutir, mas também não queria contar-lhe uma mentira.

— Sabe que eu não fiz. Sweyn me levou.

Ele acenou com a mão com desdém. — Claro, já que dificilmente teria planejado amarrar suas próprias mãos e pés. Eu peço porque desejo que diga.

Veio se sentar ao meu lado, pegando minha mão. — Poderia ter morrido.

Era verdade. Rezei para que Eldberg viesse, e ele fez isso, mas eu nunca poderia prometer abandonar a esperança de minha liberdade.

Em vez disso, perguntei: — Por que se arriscou por mim?

— Porque é minha e um homem protege o que é dele.

Não tive forças para lhe dizer novamente que não era dele. Já havia exaurido esse raciocínio há muito tempo. Uma paz incômoda havia caído entre nós, sua brutalidade inicial havia se esgotado, e estava em dívida com muitas coisas.

Ragerta trouxe um pouco do aloe. Virando minha mão, Eldberg mergulhou na panela e tocou o bálsamo calmante nos vergões do meu pulso.

— Ainda não prometeu.

— Eu... — As palavras ficaram presas na minha garganta. Se dissesse isso, que resistência sobraria?

— Elswyth. — Sua voz era atraente. Ele olhou para minha mão descansando na sua, então ergueu os olhos, prendendo-me em seu olhar, de uma escuridão líquida. — Seus lábios estão tremendo. — Ele falou baixinho, inclinando-se, até que sua boca estivesse perto da minha.

— Não... — eu disse, sabendo que era mentira.

— Está febril de necessidade por mim, como eu por você.

Queria me afastar de seu beijo, fechar meus olhos contra ele, mas não consegui. Eu não estava mais lutando.

Seus lábios eram suaves nos meus, persuadindo-me com puxões e cutucadas suaves, até que minha boca estivesse totalmente aberta e sua língua deslizou sobre a minha. Perdi-me no desejo de ser acariciada com ternura.

Disse a mim mesmo para não pensar mais; para deixar de lado o que era antes, para deixar de lado o passado. Haveria apenas agora, e os beijos de um homem que era forte e vulnerável. Não éramos iguais? Egoísta. Cruel. Ele me machucava. Ainda assim, precisava ser amado. Era meu inimigo e ele era eu mesma.

E, no entanto, fui compelida a falar o que pensava. Quebrei o beijo, dizendo: — Faça sua promessa, me libertar da escravidão, para que meu filho nasça livre.

— Não precisa temer nada.

Queria que fosse verdade, ter certeza de que seus sentimentos por mim eram mais fortes do que seu desejo de vingança. Eldberg havia destruído tudo de que eu gostava. Isso não poderia ser facilmente perdoado, mas queria deixar de lado essa raiva. Ela me consumiu por muito tempo.

Ele pegou minhas duas mãos. — Desejo estar inteiro novamente e tomá-la como esposa.

Sua expressão, sempre tão zombeteira, não era mais. Eu o testemunhei em todos os estados de espírito, mas nunca neste, tão intenso, tão certo.

Ele virou minha palma, levando-a aos lábios. — Se te escravizar, será por meio do amor.

As palavras foram suficientes e empurrei as peles para baixo, levando-me até ele. — Toque-me, Meu Lorde. — Foi uma exigência, mas feita com suavidade.

Gentilmente, ele obedeceu, passando os dedos pelos meus seios, por toda a minha barriga arredondada, dura com o bebê, até passar os dedos entre meus cachos, deslizando o dedo onde sabia que eu estaria molhada.

Nenhum outro comando foi necessário. Ele se trouxe nu para mim e eu abracei o corpo que eu conhecia tão bem, a curva apertada de suas nádegas e coxas poderosamente musculosas, os contornos firmes de suas costas.

Enquanto ele se movia dentro de mim, a expressão em seus olhos acalmou minha respiração, pois era como se estivesse procurando por minha alma, sedento por mais do que o esquecimento de uma rendição estremecida.

Era um desejo que nos assombrava.

 

 

Eirik


1 de novembro de 960AD

E

le percebeu vozes e barulho em algum lugar, longe. Tudo estava escuro, pois não estava pronto para abrir os olhos, mas esticou a ponta dos dedos, esfregando a trama do pano sobre o qual estava deitado.

Tentou se mexer um pouco, estendendo a mão para Elswyth, mas seus braços estavam pesados e não obedeciam, como se apenas sua mente tivesse acordado e não seu corpo. Ainda não.

Se pudesse se mover, a encontraria. Ela estaria lá, ao lado dele. Queria beijá-la. A esposa dele. Para atraí-la para perto, seus dedos se enredarem em seu cabelo dourado.

— Elswyth. — Seus lábios se moveram para formar a palavra, mas sua boca estava seca demais para fazer o som. Tentou novamente, sem sucesso.

Alguém apertou sua mão e uma voz feminina perguntou: — Está acordado?

Claro que estava. Podia ouvi-la. Helka.

Ele devolveu a pressão do toque de sua irmã.

— Graças aos deuses!

Sua mão recebeu um aperto mais forte e foi levantada para a bochecha de sua irmã. Ela estava chorando? O que importava?

Um homem podia dormir até tarde no dia seguinte ao casamento, com certeza. Não conseguia se lembrar de como foi para a cama, mas não era a primeira vez que outro o carregava. Se um homem não podia ficar bêbado no dia em que se casava com a mulher que amava, quando poderia?

Embora sua garganta estivesse seca, sua cabeça estava livre da dor que geralmente acompanhava o excesso de hidromel.

— Beba isso.

Uma xícara tocou seus lábios, molhando-os, e Eirik engoliu em seco, agradecido. Ele queria abrir os olhos, mas era tão difícil.

— O que lembra? — Os lábios de Helka pressionaram sua testa.

Eirik lutou para lembrar. A festa de casamento e Elswyth linda em seu vestido carmesim, seu diadema não de ouro batido, mas de flores do prado. E o salão repleto de gloriosos ramos de flores. Noiva e noivo, eles desfilaram, em seguida, foram carregados de uma extremidade do corredor para a outra, passando por cima das cabeças de seus convidados. Todos aplaudiram ruidosamente.

Houve jogos, charadas e lutas, e carne suficiente para encher a barriga de um homem três vezes.

Mais tarde, Elswyth, dominada pelo calor da sala, foi tomar um pouco de ar, e Olaf o desafiou para uma disputa de bebida. Dez chifres foram secados. — Suba na mesa — disse Olaf. — Quem chegar primeiro ao fim, sem cair, será o vencedor.

Mas ele ouviu um grito. Em seguida, gritando.

Fogo!

Olhou para cima. O telhado estalava, o âmbar lambia entre as vigas, comendo a turfa, seca pelo bom tempo. Pedaços estavam caindo.

O coração de Eirik saltou de pânico.

Havia chamas!

Ele apertou a mão de Helka com força e respirou fundo, enchendo os pulmões de ar.

— F-fogo! — Ele forçou a palavra. — Fogo! — Ele engoliu mais ar. — Helka! Fogo!

Precisava acordar adequadamente e abrir os olhos. Precisava avisá-los. Colocá-los todos em segurança. Seus ombros levantaram uma pequena fração, mas era como se um grande peso o estivesse pressionando para trás. Lutou para se sentar e uma dor terrível percorreu suas costelas.

— Shh, acalme-se. — A mão de Helka tocou seu peito. — Estamos todos seguros. O fogo está apagado agora.

Ela fez uma pausa momentânea. — O que mais, Eirik? Do que mais se lembra?

Ele saltou da mesa. Tochas acesas voaram pela porta, mas ainda assim as pessoas empurraram, tropeçando, chamando umas às outras, correndo para escapar.

Helka estava por perto, tossindo através da fumaça. Agarrando-a, correu para frente e sairam, mas a bainha de seu vestido estava acesa. Para abafar as chamas, a empurrou para o chão.

Deveria estar escuro, mas o fogo iluminou tudo com seu brilho. Onde estava Elswyth? Ela estava segura?

E então ele viu. Entre a fumaça e os gritos e a correria de corpos, havia outros. Em pé, observando. Um grito de comando e um brilho de aço.

Instintivamente, suas mãos alcançaram a espada, mas não havia bainha em seu cinto. Apenas sua adaga cerimonial pendurada ali.

Mal teve tempo de agarrar o cabo de joias quando foi perfurado pela dor. Viu a lâmina atravessada. O sangue borbulhou em sua boca; a adaga escorregou de sua mão. E então ele estava de costas, o chão estranhamente macio, e uma figura apareceu acima.

Alguém chamou seu nome.

O céu violeta ficou mais escuro e os gritos ao redor dele desmaiaram, até que houve apenas o ruído irregular de sua respiração.

A voz distante não existia mais.

E a luz também se apagou.


Helka

—E

irik! — Helka beliscou suas bochechas.

Levou mais de três fases da lua para seu irmão acordar. Ela não permitiria que escapasse de novo tão cedo.

Nos primeiros dias, pensou que estava perdido. O ferimento foi muito grave; como poderia se recuperar? Mas seu irmão era forte. Mais do que qualquer outro homem que ela conhecia.

As Norns criaram um destino cruel para Svolvaen naquela noite, mas a lâmina que o perfurou apenas cortou seu pulmão, penetrando sob suas costelas. Ele derramou muito sangue e lutou contra a febre, mas havia passado, a ferida estava se curando bem, embora tivesse permanecido inconsciente.

Nunca perdeu a esperança de que voltasse para ela, insistindo em cuidar dele em sua própria cabana. Apoiando-o, colocou pequenas quantidades de caldo entre seus lábios, massageando sua garganta para fazê-lo engolir.

Por fim, um olho se abriu.

— Elswyth. — Desta vez, ele falou o nome dela claramente.

Helka gesticulou para Leif parado perto da porta, sinalizando para ir buscar os outros.

Eirik precisava saber. Tinha que contar a ele. — Svolvaen foi atacado. — Engoliu em seco. — Leif escapou com outros pela abertura nos fundos da casa grande.

— Estou feliz com isso... mas Elswyth?

— Procuramos em todos os lugares para onde possa ter corrido, em todos os lugares que poderia ter se escondido.

— Não a encontrou? — O rosto de Eirik estava pálido.

Ela pegou as mãos dele. — Os dois guardas que estavam de vigia tiveram suas gargantas cortadas. — Ela respirou fundo. — Ambos tinham “Skálavík” riscado em suas testas.

Eirik começou lutando novamente para se sentar, apenas para cair de costas nos travesseiros. Seu rosto se contorceu de dor. — Ela foi levada, como nossa mãe foi.

— Nenhuma mensagem foi recebida para o resgate dela, mas estou convencida de que está certo.

— Devemos enviar um emissário, garantir a segurança dela, — a voz de Eirik estava implorando.

— Queria fazer isso, mas havia tantos feridos. Anders se ofereceu, mas não pude dispensá-lo. Eu precisava de todos.

— Todo esse tempo... — Eirik olhou para cima.

Nenhum dos dois falou.

Se Elswyth estivesse viva, o que teria sofrido? Se ela voltasse, como sua mãe, estaria quebrada de uma forma que não poderia ser consertada? A Besta de Skálavík ganhou seu nome não por causa da gentil hospitalidade.

— Só preciso de alguns dias para me levantar, depois vou pegar um barco. Vou trazê-la de volta, e se Eldberg a machucou, vai pagar com a vida.

Helka acenou com a cabeça. Por enquanto, o acalmaria. Ela e Leif já haviam feito planos. Não podiam ignorar o ato de agressão de Skálavík. Leif cavalgaria para Bjørgen e retornaria com guerreiros suficientes para tripular os barcos de Svolvaen. Mostrariam a Skálavík que não estavam sem aliados.

— Elswyth é forte — Helka disse o que ela sabia que Eirik precisava ouvir. — Ela vai resistir.

Eirik voltou seu olhar para as vigas. Era demais para ele, Helka sabia. Teve muitas semanas para aceitar o que havia acontecido; semanas em que ela e Leif ajudaram os sobreviventes de Svolvaen a se unirem. As crianças mais novas, pelo menos, não tinham estado no salão naquela noite. E seus atacantes ignoraram os armazéns de Svolvaen, que poderiam facilmente ter destruído.

— Há algo mais. — Embora Eirik parecesse miserável, Helka queria que soubesse o máximo possível. — Gunnolf enviou alguém para Skálavík, enquanto estávamos em Bjørgen. Temos uma testemunha. Ele chegou ontem, alegando que nosso homem incendiou o salão do Jarl por ordem de Gunnolf. Muitos morreram, incluindo a esposa de Jarl Eldberg.

Eirik se voltou para ela alarmado. — Mesmo assim... — O significado não foi perdido por ele.

Helka acenou com a cabeça. — E havia apenas um objetivo no ataque a Svolvaen.

— Vingança. — A expressão de Eirik estava congelada. Ele lambeu os lábios e Helka ofereceu-lhe a água novamente. — Quem é esta testemunha?

Helka se virou para a porta. Leif estava esperando, o estranho atrás dele, flanqueado por Olaf e Anders.

Helka assentiu bruscamente. — O nome dele é Sweyn e ele tem suas próprias contas a acertar.

 

 

Elswyth


1 de dezembro de 960AD

C

onforme o manto do inverno caiu, as montanhas se transformaram em gelo e o mundo abaixo se amontoou contra os ventos amargos. O sol havia se afastado tanto que parecia ter sumido para sempre. As longas noites estavam sobre nós.

Os armazéns de Skálavík estavam ricamente carregadas com sua própria colheita e uma abundância comercializada. Eldberg e seus homens fizeram muitas viagens de caça, fornecendo-nos peles para serem trocadas quando os mercadores voltassem, e com caça, que defumamos e salgamos.

Dentro da minha barriga, inchada e arredondada, o bebê socou punhos e pés inquietos, e pensei em como teria colocado a mão de Eirik para sentir seus movimentos. Em vez disso, era Eldberg quem via a vida crescer dentro de mim.

Ele fez um berço, finamente esculpido e feito de pedra, embora demorasse mais três luas antes de segurarmos a criança.

Não queria esperar, mas precisava de tempo para deixar de lado minhas memórias e concordamos que o ano novo veria nosso casamento. Naquele dia, ganharia minha liberdade e ficaria ao lado de Eldberg como sua igual. Ainda chorava, mas queria acreditar que Eldberg havia mudado, que poderia olhar para o que estava por vir, em vez de para trás.

Quando a temporada de Jul começou, a casa comprida acolheu a todos. Pensei no ano que passou, em como decoramos o salão de Svolvaen, em Helka equilibrada sobre os ombros de Eirik, prendendo os ramos festivos sob os quais nosso povo se divertia. Era outra vida.

Em Skálavík, também, os homens juntaram visco e grinaldas verdes, envolvendo as vigas, e o local se tornou um local de alegria e jogos, banquetes e bebidas. Nós, mulheres, participamos, pois as escravas não poderiam ter preparado tudo sozinhas, e foi um prazer trabalhar lado a lado para encher as travessas que cada uma de nós gostaria. Muitos relutaram, a princípio, em me aceitar como outra coisa senão o que eu tinha sido, mas viram o status que Eldberg me proporcionou e acharam sensato, suponho, mostrar rostos mais amigáveis. Logo seria a esposa de seu jarl, compartilhar a amargura de Sigrid não lhes traria nenhum favor.

Ivar começou a contar uma história diferente dos deuses a cada dia, da travessura de Loki e da astúcia de Odin. Ele era um bom skald, reunindo muitos à sua volta enquanto assumia cada voz, usando gestos e canções para ilustrar seus contos. Não importava que as histórias já fossem familiares. O tempo passava rápido.

Estava começando a história da Caçada Selvagem, contando sobre o exército de mortos cavalgando pela noite, liderado em sua perseguição pelo poderoso Sleipnir, o corcel de oito pernas de Odin.

Do outro lado da sala, onde ajudei Ragerta a temperar os pedaços de carne, captei os olhos de Eldberg. Ele estava conversando com Rangvald, mas me deu seu sorriso lento. Conhecia bem aquele olhar, ele queria me levar de volta para sua cama e fazer nosso próprio entretenimento.

Lançando seu olhar brevemente sobre a sala, se levantou e entrou em nosso quarto.

Enxugando minhas mãos, fiz menção de me juntar a ele, mas não dei mais do que alguns passos quando vi que Rangvald seguia nosso conde.

Era uma coisa estranha, pois Eldberg raramente convocava seus homens para reuniões privadas. A curiosidade se agitou dentro de mim e me perguntei se planejavam juntos os rituais do Jólablót, quando nosso casamento seria celebrado.

Juntando-me aos que estavam pelos cantos, ouvindo a história de Ivar, coloquei-me perto da divisão entre a câmara do nosso jarl e o salão principal. Eu mal conseguia entender suas palavras, pois eles falavam baixo. Mas com meu dedo pressionado em um ouvido e o outro direcionado para a cortina, percebi pedaços de sua conversa.

Ouvi menção do nome de Ivar, que foi enviado para algum lugar e recentemente retornou, e estava viajando como um skald.

Fiz uma careta para isso. Não fazia sentido. Ivar trabalhava como carpinteiro e tinha família em Skálavík. Ele era um dos homens de Eldberg. Apesar de sua esperteza com as palavras, por que ele desejaria vagar por outros povoados?

Rangvald falou: — Ivar havia se disfarçado, encurvado e encapuzado. Ele ficou apenas uma noite; tinha sido suficiente ver o que precisavam.

O que era isso?

As próximas palavras que ouvi trouxeram um punho gelado ao meu peito.

Svolvaen.

Ivar tinha estado em Svolvaen?

Eu me inclinei para frente. O que Ivar estava fazendo?

— Ele está lá — sussurrou Rangvald — ... com um propósito ... conquistar com mentiras ... conduzi-los até aqui.

Eldberg praguejou. — Eles têm aliados?

— A irmã se casou com um homem Bjørgen.

Helka! Eles devem significar Helka.

Ela estava viva?

— Estaremos prontos. Ninguém pode se aproximar sem ser visto... dobre os guardas no rio e no porto... alerte o vigia no promontório.

Pensaram que Svolvaen iria atacar? Impossível! Helka nunca seria tão temerária, a menos que ela ignorasse a força de Skálavík.

Rangvald novamente. — O jarl...

Sua voz baixou. Eu não pude ouvir.

O que dizer do jarl?

Eirik estava morto. Outro havia tomado seu lugar. Olaf, talvez? Ele tinha sobrevivido? Ou Anders?

— Acordou... muito tempo...

Acordou?

Eldberg falou. —... venha para sua própria matança... Bloodeagle...

Apertei minhas unhas em minhas palmas.

Helka me contou sobre o Bloodeagle, que Gunnolf uma vez infligiu isso a alguém que se recusou a reconhecê-lo como jarl, tendo-o acusado de assassinar Hallgerd.

O homem havia sido contido de bruços, tendo a forma de uma águia com asas estendidas cortadas em suas costas. Suas costelas foram decepadas da espinha com um machado, uma por uma.

Eu enjoei com o pensamento disso.

E foi pior. Pois os ossos e a pele de ambos os lados haviam sido puxados para fora, seguidos por seus pulmões. Abram-se como asas, disse Helka, tremendo enquanto ele ofegava seu último suspiro.

Nenhum homem merecia tal morte.

— ... o sangue deve satisfazer o sangue.

— Sim, meu jarl.

Os pés se aproximaram da cortina. A voz de Rangvald era clara. — Este Eirik deve pagar a dívida de Svolvaen.

Agarrei a cortina para me impedir de cair.

Não podia ser!

Eirik, vivo?

 

 

Elswyth


1 de dezembro de 960 DC

P

or tantos meses, pensei que Eirik estava morto. Sofri, gastei minha raiva e, finalmente, aceitei. Acreditava que tinha morrido e barganhei com Eldberg, para salvar a mim e ao meu filho ainda não nascido.

Poderia me permitir acreditar em Eirik vivo? Suponha que Ivar estivesse errado. Se meu marido sobreviveu, quem mais sobreviveu àquela noite de chamas e ruína?

Viriam atrás de mim, como Eldberg parecia pensar, ou eles acreditariam que eu tinha ido de bom grado, uma traidora de meu povo? Havia alguns em Svolvaen que nunca confiaram em mim. Eles envenenariam a orelha de Eirik?

Ele me perdoou por ter aceitado Gunnolf como meu amante. Entendeu que eu me achava abandonada. Quão pouca fé eu tinha, mas Eirik não tinha malícia, culpava a si mesmo. Fui eu quem duvidou, nunca ele. Mesmo no dia do nosso casamento, mantive meus segredos, falhei em compartilhar meu medo de que a criança que carregava fosse de seu irmão.

E agora? Se nos reuníssemos, ele poderia aceitar o que eu me tornei aqui em Skálavík? Ele poderia perdoar essa traição e perdoar?

Se nos encontrássemos novamente, jurei que não guardaria nada. Só isso, certamente, ganharia sua confiança. Só então poderíamos ser reconciliados como marido e mulher.

E Eldberg?

Eu o temi e me enfureci. Eu o odiei.

Mas também o amava, porque algo nos conectava. Quando olhei em seus olhos, reconheci sua dor.

E os sentimentos dele por mim?

Ele professou amor, mas eu não era mais do que uma posse? Um símbolo de sua vitória sobre aqueles que o destruiriam?

Não adiantaria implorar a ele para abandonar sua sede de vingança. Eu disse a ele muitas vezes que Gunnolf, de mente doentia, deve ter enviado o homem responsável pela morte de Bretta; que Eirik buscava apenas a paz e Svolvaen não instigou agressão.

Pelo menos, isso tinha sido verdade antes. Se Eirik sobreviveu, como relatou Ivar, e viesse atrás de mim, o que aconteceria? Os guerreiros de Skálavík estariam vigilantes. Tinham a vantagem. Mesmo com os homens de Bjørgen atrás dele, poderia Eirik esperar subjugar Skálavík?

Eu temia que estivesse caindo em uma armadilha.

De alguma forma, tive que avisar ele e todos os Svolvaen. Se pudesse encontrar o caminho de volta, quanto derramamento de sangue seria evitado, por Svolvaen e Skálavík.

Esperar era uma tortura, mas eu sabia que minha única esperança de fugir viria enquanto Eldberg dormisse. Eu me vestiria o mais aquecida que pudesse, um vestido de lã sobre minhas duas roupas íntimas, minha capa com peles de raposa que Eldberg tinha me dado recentemente e coberturas para pés e pernas que costurei com as mesmas.

Ao longo da noite, muitas vezes enchi novamente a xícara de Elberg, precisando ter certeza de que não iria acordar quando eu me levantasse e garanti que sua bandeja estivesse carregada. Com a barriga cheia de hidromel e alimentos, ele dormiria profundamente.

Não deu nenhuma indicação do que havia falado com Rangvald. Se não tivesse ouvido, não teria percebido, embora sentisse seus olhos em mim mais do que o normal.

— Venha, Elswyth, me beije. — Ele me puxou para seu colo e não se importou com quem testemunhou enquanto me abraçava.

Até Sigrid parecia aceitar seus planos, um tanto aliviada pelos presentes que ele lhe dera. Hoje à noite, ela usava uma estola de pele sobre o vestido. Ocorreu-me que ela nunca se casou, cuidando primeiro da casa de seu irmão e agora de Eldberg. Ela nunca quis um homem para ela mesma? Uma família?

Ela cuidou de Bretta, é claro.

Eldberg sussurrou palavras carinhosas em meu ouvido. — Não demorará muito até que os deuses abençoem nosso casamento, e devo chamá-la não apenas a mulher que amo, mas também esposa. — Embora eu tivesse barriga grande, seus braços ainda me envolviam. Trancou os dedos na depressão da minha cintura e esfregou a boca no meu pescoço.

— O resto será esquecido. Haverá apenas a nossa promessa, abandonando todas as outras.

Se não soubesse tudo o que sabia, teria pensado que ele era meramente amoroso, mas ouvi o tom duplo de suas palavras, pois acreditava em Eirik vivo, sem intenção de me dizer. Ele se casaria comigo sem me oferecer o conhecimento que traria escolha.

Apesar de suas belas palavras, ainda era uma prisioneira, pois não teria permissão para voltar para Svolvaen. Não haveria dúvida disso.

— Sim, Meu Lorde. — Toquei as marcas recém-cicatrizadas ao redor de seu olho esquerdo e as que cobriam sua bochecha. — E nós dois perdoaremos, pois nada de bom vem de feridas torcidas, nem pode o amor crescer quando abrigamos o engano.

Seus lábios se contraíram, mas ele não disse nada, apenas levando minha palma aos lábios.

Doeu-me oferecer uma mentira, mas era nada menos do que merecia, e tentei não pensar na traição que Eldberg sentiria quando descobrisse que eu havia partido.

Se Eirik viesse para Skálavík, Eldberg terminaria o que havia começado e mataria o homem que amava. Isso eu não permitiria, não enquanto tivesse forças para evitá-lo.

À medida que a ficava mais tarde e as cabeças dos nossos convidados assentiam em seus peitos, levantei-me para falar com Thirka. Agora a esposa de Thoryn, ela parecia radiante, embora tivesse se sentado timidamente ao lado dele durante o banquete. Tendo servido na casa comprida tantos anos, devia parecer estranho estar lá a não ser como uma escrava. Eu me perguntei se sua mente viajou para a noite em que o fogo saltou ao seu redor e quase lhe custou tudo.

— Está feliz, Thirka? — Eu apertei a mão dela. — Thoryn é um marido atencioso e a cura continua bem?

— Oh sim, minha senhora. — Ela sorriu de verdade. — Muito graças a você. — Ela suspirou. — Nunca pensei em ser tão feliz.

— Me dá prazer ouvir isso. — Eu a puxei para mais longe da mesa, acenando para aqueles que estavam sentados em cada lado.

— Deseja o mesmo contentamento para mim, eu acho. — Eu a segurei, garantindo que ela ficasse perto.

— Claro. — Ela parecia incerta. — E será assim, espero, agora que o jarl vai se casar com você. Não é fácil, mas... — Sua voz sumiu.

O que ela poderia dizer sobre esse assunto? Eu tinha sido sua escrava e ainda era, mas agora ele queria me chamar de esposa. Thirka sabia a verdade disso tão bem quanto eu.

— E me ajudaria, Thirka, se houvesse alguma pequena coisa que eu pedisse? — Baixei a voz, pois ninguém mais podia ouvir o que eu queria dizer a ela, pelo menos não ainda.

— De qualquer maneira que eu puder. — Ela devolveu a pressão dos meus dedos.

Meu coração aqueceu. Eu não queria colocá-la em perigo, pois mesmo Thoryn seria incapaz de evitar que Eldberg punisse Thirka se o jarl a considerasse cúmplice da minha fuga. Mas ela diria tudo o que pedisse, e de boa vontade.

— Antes de me comprometer com nosso jarl, há um ritual de limpeza que quero realizar. Preciso ir sozinha e lavar meus pés no rio.

Thirka parecia ansiosa. — Mas está muito frio, minha senhora. — Ela olhou para minha barriga arredondada. — E...

— Não há nada com que se preocupar. — Tentei parecer reconfortante. — É assim que fazíamos as coisas em Holtholm, onde eu morava antes. É muito ... revigorante! E estou com calor o tempo todo com o bebê crescendo. Vou me abrigar bem e são apenas meus pés. Entrarei e sairei rapidamente.

— Quer que te acompanhe? — Perguntou Thirka.

— É muito gentil. — Suspirei. — Mas o ritual tem que ser conduzido sozinho, há outros elementos nele. — Eu pensei em meus pés, inventando os detalhes rapidamente. O plano não funcionaria se Thirka quisesse me acompanhar.

— Há palavras a serem ditas, e irei me dirigir ao meu antigo deus, bem como àqueles que todos reverenciamos aqui em Skálavík.

— Oh! — Thirka ficou surpresa, repentinamente desconfortável. — E o que o jarl disse?

— É para isso que preciso da sua ajuda. — Eu olhei em volta. Ninguém parecia estar prestando atenção em nós. — Ele é muito protetor e com a geada tão forte, não quer que eu vá.

— Ele vai tentar impedi-la.

— Exatamente. — Eu inclinei minha cabeça. — Realizar o ritual é importante para mim, então vou deixar a casa comprida de manhã cedo e me encaminhar para o rio. Quando Eldberg acordar, vai se perguntar onde estou.

— Quer que diga a ele onde foi? — Thirka mordeu o lábio. Sem dúvida, a ideia de dizer qualquer coisa ao jarl a enchia de apreensão.

— Sim. Diga a ele, Thirka, assim como eu expliquei para você. Deixe-o saber que eu não a deixaria vir comigo. Diga que não queria que ele se preocupasse. — Eu engoli, me odiando pelo que estava prestes a dizer. — Que voltarei mais tarde, quando o ritual estiver completo.

Isso me daria mais tempo, esperava, antes que Eldberg viesse me procurar. Quando ele o fizesse, estaria avançada em meu caminho.

 

 

Elswyth


2 de dezembro de 960AD

A

casa grande estava quente e poucos desejavam se aventurar lá fora. Por fim, nossos convidados adormeceram, deitados nos bancos. Eldberg me levou para a cama com uma intenção amorosa, mas bebeu demais para ser capaz, eu tinha cuidado disso. Ele dormiu profundamente, seus roncos tão altos quanto qualquer outro no corredor. O fogo se extinguiu em brasas brilhantes.

Eu abri a porta, ouvindo os guardas. Percorriam o perímetro da propriedade.

A lua mudou entre as nuvens que passavam e o chão brilhou branco, refletindo a luz que havia. Não demorou muito para eu ouvir vozes e pés batendo. Estavam reclamando de como estava frio. Eles se aproximaram, então se afastaram e eu saí.

Eu me achava bem abrigada, com mãos, cabeça e até mesmo meu rosto cobertos, mas a crueza da noite me atingiu. A neve estava caindo, embora levemente. Teria que continuar andando.

Fui para a borda da floresta. Lá, estaria escondida da vista. Se ficasse na sombra das árvores, poderia descer a encosta da colina. De lá, usaria o rio como meu guia, mas não ao longo de suas margens. Em vez disso, escalaria até onde a floresta abraçava os penhascos, mantendo a água à vista.

Em algum momento, eu precisaria descer, seguir o rio novamente, mas isso seria mais um dia de caminhada. Quanto tempo demoraria para chegar a Svolvaen? De barco, a viagem durou quase toda a noite e as primeiras horas da manhã. A pé, imaginei três dias.

Eldberg iria me procurar, eu tinha poucas dúvidas, mas estaria algumas horas atrás e não haveria rastros. A neve cuidaria disso.

Eu prometi não fugir, mas o que essa promessa significava entre meu inimigo e eu? Ouvindo Eldberg falar tão cheio de ódio ainda, sua intenção de vingança implacável, como eu poderia permanecer?

Eu só precisava continuar andando. Tudo seria simples, contanto que evitasse cair no abismo, congelar até a morte, ou correr para os lobos.

Mesmo se fosse feita em pedaços por alguma criatura cheia de fome de inverno e encontrasse meu fim esta noite, saberia que tentei. Por muito tempo aceitei meu destino, pensando que Eirik estava morto. Agora, tinha um motivo para tentar o caminho de volta para Svolvaen.

Escondida entre as árvores, alcancei a água, depois subi, através das encostas da floresta. Mantendo o som do rio à minha esquerda, continuei, minha capa bem enrolada para evitar as amoreiras.

No outono, a floresta estava cheia de sons. Agora, estava amortecido pela neve, exceto pelo vento que se movia muito acima, através dos galhos que rangiam e do barulho distante do rio, viajando pelo abismo abaixo. O dossel das árvores dava alguma proteção, mas os flocos ainda caíram, parando em meus cílios e nariz.

Um passo e depois outro, disse a mim mesmo, cada passo era um estalo suave.

Tirando a cobertura do meu rosto, concentrei-me em minha respiração, inspirando e expirando, observando a nuvem branca deixar minha boca.

Continuei me movendo, mas parei de ver meus pés, parei de ouvir. Tropeçando na raiz de uma árvore, caí de joelhos, as mãos plantadas no branco. Consciente, percebi que não conseguia mais ouvir água. Eu me deixei vagar cegamente. E por quanto tempo?

Era muito cedo para o céu clarear, e isso aconteceria por um curto período de tempo no meio do dia. Como, então, saberia em que direção andar? Eu posso apenas me levar mais para dentro da floresta.

Eu descansaria um pouco, não para dormir, mas para recuperar as forças. Assim que o céu clareasse, não seria capaz de ver mais claramente onde as árvores deram lugar ao abismo?

Tirei o odre de água que enfiei no bolso mais fundo e toquei em meus lábios, querendo engolir avidamente, mas o líquido estava muito frio contra meus dentes.

Eu comi um pouco de pão. Não muito, mas o suficiente. Arranquei um pedaço e segurei na minha língua, amolecendo. Havia queijo também, o pedaço com metade do tamanho da minha palma. Mordendo-o, fechei os olhos, saboreando seu gosto.

Com minha capa embaixo de mim e o tecido enrolado perto do rosto, agachei-me contra um tronco caído, espanando a neve para revelar o musgo, e dobrei o cotovelo para colocar a cabeça.


E

u não pretendia dormir, mas acordei com o canto baixo de um pássaro próximo. Uma coruja em sua última caça noturna? O céu estava clareando, e eu estava certa, de um lado, as árvores pareciam mais densas, as sombras muito mais escuras. Para o outro, pareciam afinar, revelando a luz do dia. O desfiladeiro tinha que ser para esse lado.

Não havia tempo a perder, mas o gelo havia entrado em meus ossos. Com grande esforço, desdobrei os joelhos, empurrando o tronco para cima. A dor de ficar em pé me fez engasgar e me xinguei por ter ficado imóvel por tanto tempo. Se tivesse dormido mais, talvez nem tivesse acordado.

Qual coração teria parado primeiro? O meu, ou o do bebê dentro de mim, aninhado sem saber em carne quente?

Com passos vacilantes me arrastei para frente, sabendo que deveria continuar me movendo. Deveria agitar meu sangue para me aquecer e tornar meus membros úteis novamente.

Imaginei Eldberg subindo na sela e partindo a galope, procurando sinais do meu rastro, curvando-se com olhos penetrantes. Olhei para trás, meio esperando vê-lo, mas ainda estava sozinha.

Pense apenas no que deve fazer.

Logo, ouvi o barulho da água novamente, ficando mais alto conforme me aproximava. Chegando à beira das árvores, agarrei um galho e olhei para baixo. Lá estava ele, o rio, a luz do sol e um céu agora sem nuvens.

Meu progresso era lento, mas as sensações estavam voltando aos meus membros. Continuei lutando e, em pouco tempo, percebi que o chão estava se inclinando para baixo. As paredes escarpadas do abismo estavam recuando, dando lugar a contornos mais suaves, a floresta inclinando-se para encontrar a beira da água.

Eu poderia ter permanecido dentro das árvores, mas queria sentir o calor do sol, o pouco que havia. Desceria para caminhar o mais próximo possível do rio. Continuando em frente, não haveria chance de me perder.

Cuidadosamente, continuei, segurando, de um galho para o próximo. Com o avançar, ficou muito mais íngreme e escorregadio, a profundidade congelada da neve em pó e as folhas se abrindo quando meu peso desceu. De repente, eu estava deslizando, escorregando por trás, derrapando mais rápido em direção à beira, onde a margem descia até a água. Com medo, eu abri meus braços, cavando em meus calcanhares, precisando agarrar algo para parar minha queda. Passando por samambaias e samambaias, minha capa saiu de cima de mim e minhas saias subiram. Estava agarrando punhados de nada que pudesse impedir minha queda e o rio estava correndo mais perto.

Então, houve um solavanco e gritei, parando tão repentinamente que perdi o fôlego. Minha capa ficou presa em um toco, deixando-me pendurada.

Eu fiquei lá por um momento, querendo chorar e rir. Estava sem fôlego e machucada e arranhei minhas mãos, mas estava ilesa. Só precisava me recompor. Deitada aqui, só fiquei com frio. Precisava me sentar, para desembaraçar minha capa.

O rio estava muito perto, a água correndo abaixo dos meus pés. Eu seria capaz de andar aqui com segurança o suficiente. Poderia até escorregar e seguir direto ao longo do rio. Não havia pedras e cascalho em ambos os lados, ao longo de alguns trechos de água, ao lado das águas rasas?

Rolando para o lado, olhei para trás em direção às profundezas da floresta e a encosta acima de mim, muito mais íngreme do que eu imaginava. Tive a sorte de não ter me machucado de verdade.

Eu me virei, apoiando-me nos cotovelos, e a capa ficou esticada, puxando meu pescoço. Eu me atrapalhei com os broches presos de cada lado e a tira de couro entre eles. Mas, quando a tira se soltou, comecei a cair de repente, olhando para minha capa, ainda presa ao tronco caído. Eu estava agarrando punhados de neve e matéria apodrecida, e então não havia nada embaixo de mim.

Ao atingir a água, mil agulhas de gelo me perfuraram.

Ofegante, vim à superfície, espirrando de susto, meus pés lutando para se apoiar no leito do rio. Parecia que meus pulmões iriam explodir de tão frios a água e o ar. Parecia que me congelava quando entrou em meu corpo.

A torrente gelada e impetuosa roubou-me o movimento, o pensamento. Isso me roubou o fôlego.

Eu tinha parado um pouco além da parte rasa, a água não mais profunda do que meu peito, mas a corrente era forte, varrendo de volta por onde vim. Com as pedras escorregadias por baixo, lutei para ficar de pé.

Chutar. Para. Conseguir. Sair!

Obriguei-me a olhar para a margem e disse a mim mesma para empurrar, para nadar, mas meus membros já estavam dormentes.

Em água mais quente, sem minha saia pesada, poderia ter conseguido, mas meu vestido ficou pesado. Escorregando de lado, afundei novamente, puxei, caindo na água agitada até que bati contra uma pedra na curva do rio e emergi sufocada.

Eu me agarrei, abrindo meus braços. Segurando a pedra contra o peito, tossi a água que engoli e chorei pela minha tolice, pois agora morreria, fraca demais para escapar do rio.

Se soltasse, tudo estaria acabado. O bebê que carregava nunca respiraria. Eu nunca veria Eirik novamente. Estava com medo de fazer isso, de ser varrida desta vida.

E então, acima do barulho em volta dos meus ouvidos, ouvi o relincho de um cavalo e a voz de um homem, severa no comando. Um garanhão estava em cima de mim, chutando respingos da parte rasa, seu cavaleiro envolto em peles grossas, e o rosto que olhou para baixo estava cheio de fúria, mal contida.

Guiando o cavalo para a trincheira mais profunda, Eldberg inclinou-se para me puxar para cima, segurando-me por baixo dos braços para me sentar na sela diante dele.

Sem dizer uma palavra, nos levou de volta à parte rasa e incitou o garanhão a um galope. Tremendo, coloquei minha cabeça em seu peito. Eu não tinha mais nada e minhas lágrimas caíram silenciosamente enquanto a água escorria de minhas roupas e cabelos encharcados.

Tinha acabado.


Eldberg

D

esde antes do amanhecer, cavalgava rio acima, procurando sinais de sua passagem, onde ela talvez estivesse se escondendo ou onde poderia ter deixado o rio. Havia fendas ao longo de todo o abismo que podiam ser escaladas, levando para a floresta.

Thirka viera até ele, Thoryn ao seu lado, para explicar a ausência de Elswyth, e parecia acreditar no que ela havia lhe contado, que Elswyth havia se levantado cedo para realizar um ritual de limpeza. Mas ele suspeitou imediatamente. Uma nevasca havia soprado durante a noite, e estava perto o suficiente da hora de dar à luz para fazer uma excursão tão temerária.

Se ela tivesse ouvido Rangvald ou Ivar conversando, ou o que havia acontecido entre ele e Rangvald, seria motivo suficiente para ir até Svolvaen.

Ainda assim, descobrir que ela havia partido o enfureceu. Ela veio a ele como uma escrava, e a usou com pouca misericórdia naqueles primeiros dias, mas não tinha mostrado a ela como seus sentimentos mudaram? Ele não a encheu de presentes e tornou sua vida mais fácil? Mais que isso. Concedeu a maior honra ao pedir-lhe para ser sua esposa, e jogou tudo na cara dele. Ela o abandonou e o traiu.

Agora, ele a carregava, molhada até os ossos e tremendo, para a casa de banhos. Ele deixou instruções com Ragerta para atiçar o fogo e encher o barril. Rapidamente, tirou as roupas encharcadas de Elswyth, depois as suas.

Ela não ofereceu resistência quando a abaixou, mole em seus braços. Debaixo da água, ele tentou esfregar a vida de volta em seu corpo. Seus dentes continuaram batendo, mas ela olhava para ele, tocando seu peito.

Havia muito em sua expressão, embor não dissesse nada enquanto ele massageava o comprimento de seus membros, suas mãos e dedos, pés e dedos dos pés. Seus lábios estavam tingidos de azul. Ele viu novamente a semelhança, aqueles olhos olhando para ele... muito parecidos com...

Colocou-a na água, deixando a água cobrir a parte de trás de sua cabeça, seu cabelo espalhado. Quando ele a levantou novamente, notou sangue escorrendo, um corte que o calor havia aberto. Virando a cabeça dela, olhou atrás da orelha, onde tantas vezes beijou, logo acima da pequena verruga. Erguendo o cabelo dela, viu a ferida. Parecia pequena o suficiente para não precisar de costura.

Ele separou o cabelo de cada lado, verificando se não havia perdido mais nada.

Sob seus dedos, os sentiu antes de vê-los. Mais duas verrugas. Com um logo abaixo da linha do cabelo, elas formaram a forma familiar.

Seus dedos tremeram.

Como ele perdeu isso?

Como não viu?

Tantas vezes a semelhança o impressionou, mas ele a empurrou de sua mente. Agora ele entendia.

A mesma marca, dada no nascimento, usada por todos os membros da linha de Beornwold, um triângulo atrás da orelha. A de Beornwold tinha sido escura e proeminente. As de Sigrid estavam mais fracas. A de Bretta era a mesma da pele de Elswyth, apenas, mas altas. A linha do cabelo de Elswyth cobriu as outras manchas, mas elas estiveram lá o tempo todo.

E aqueles olhos, tão parecidos com os de Bretta.

Quem era ela?

 

 

Elswyth


3 de dezembro de 960AD

E

ldberg segurou meu rosto com as mãos.

Esperava que me repreendesse, no mínimo, para me repreender pela tolice. Mas sua raiva inicial havia se dissipado, substituída por uma intensidade de um tipo diferente, como se ele percebesse algo que não sabia antes e estivesse me vendo pela primeira vez.

Havia hesitação em sua voz rosnando. — Elswyth, preciso saber...

Nesse momento, a porta se abriu.

Thoryn estava na soleira. Do outro lado, houve gritos e uma onda de movimento. — Uma invasão, meu jarl! — Thoryn estava sem fôlego. — Foram vistos nas falésias mais altas, onde a floresta encontra a montanha. O guarda do promontório foi abatido! Ordenei aos homens que permanecessem no porto e ao longo do rio, caso fosse uma distração, mas estamos reunindo todos em armas para enfrentar os atacantes.

Eldberg havia saído da água, arrastando suas roupas. Embora seu machado e adaga curta estivessem pendurados em seu cinto, estava sem lâmina mais longa.

— Dê-me sua espada.

— Meu jarl? — Eu nunca tinha visto Thoryn hesitar em obedecer a Eldberg, mas a espada de um homem era uma extensão de seu braço. Com relutância, a desembainhou. Thoryn tinha o Valknut esculpido no punho: o símbolo de Odin: três triângulos entrelaçados com o poder da vida sobre a morte.

— Fique aqui, Thoryn. Proteja-a. Esconda-a na floresta, se necessário, mas ela não será levada.

Eldberg lançou um último olhar para mim e se foi.

Thoryn ficou carrancudo, evidentemente descontente. Olhando em volta, ele viu primeiro minhas roupas molhadas no chão e depois outro vestido, seco e limpo, dobrado para o lado. Ragerta deve ter deixado para mim.

Ele jogou a toalha. — Seja rápida, Elswyth. Vou guardar a porta enquanto se veste.

Senti como se pudesse deitar e dormir um dia e uma noite inteiros, mas trabalhei o mais rápido que pude. Meus dedos formigaram estranhamente, ainda parcialmente dormentes, e minhas mãos tremeram enquanto amarrava minhas botas. Estavam úmidos do rio, mas eu precisava estar pronta. A qualquer momento, Thoryn pode insistir em se mover, e não gostaria de andar descalça na neve.

Lá fora, os gritos ficaram mais altos. Eu reconheci o anel da lâmina atingindo a lâmina. Foi como Rangvald advertiu, os sobreviventes de Svolvaen chamaram seus aliados Bjørgen para ajudá-los? E com que propósito eles vieram? Se Eirik estivesse vivo, como Ivar dissera, ele estaria aqui? Mal podia me permitir acreditar, mas tinha esperança.

Thoryn tirou a faca do cinto, passando-a pelo cabo. — Pegue-a e esteja preparado para usá-la.

Eu só usei uma faca para preparar carne, nunca para matar ninguém. E por que eu faria agora? Os homens de Svolvaen me conheceriam e nunca me machucariam.

Mas e os guerreiros de Bjørgen? Eles nunca me viram antes.

Toquei sua ponta fina. — Sob as costelas, aqui. —Thoryn apontou. — Empurre com força, e vai direto. Ou atrás, se precisar, da mesma forma, nos órgãos moles.

Agarrou seu machado. — Preciso ver como a luta vai. Não vou te deixar, mas deve estar preparada.

Acenou para mim antes de soltar a trava. Trazendo seu rosto para perto, espiou pela abertura, mas, no mesmo instante, a porta se abriu.

Uma figura saltou para dentro da sala, a silhueta contra a luz fraca, seu escudo bloqueando o golpe da lâmina de Thoryn. Os dois lutaram, seus machados travando enquanto se empurravam. Então, Thoryn gritou de surpresa. Ele caiu para trás, baixando o machado.

— Sweyn!

— Sim, irmãozinho. Sou eu! — Ele chutou a porta e seu olhar passou por mim.

Eu encolhi até a parede oposta, o cabo da navalha firme na minha palma, seu aço frio, achatado contra a parte de trás do meu pulso.

— Exatamente o que estava procurando.

Thoryn, incerto, olhou de Sweyn para mim e vice-versa. — Desapareceu sem uma palavra. Porque irmão? Não éramos dignos o suficiente, os homens que estiveram ao seu lado desde que seguramos nossas espadas de madeira pela primeira vez? Desejou tanto nos deixar?

Sweyn estreitou os olhos. — Me pergunta isso? Onde estava sua lealdade quando Beornwold morreu? Eu era seu favorito até a chegada de Eldberg. Ele teria me escolhido para tomar seu lugar, me escolhido para casar com Bretta. Era o segundo do nosso jarl antes que aquela escória furiosa ganhasse a confiança do velho, mas ninguém em Skálavík falou em favor da minha reivindicação. Onde estava sua irmandade então? Ou era seu próprio ciúme? Prefere ver uma regra estranha do que se curvar a mim?

Thoryn balançou a cabeça. — Tanta raiva, bróðir. Os deuses não nos mostram a loucura de parentes se voltando contra parentes?

— E esta. — Sweyn sacudiu a cabeça em minha direção. — Ela não é parente, mas isso não importa. Eldberg não conhece lealdade, e nem ela, uma prostituta que arruma a cama onde é mais macio.

Uma consciência nascente pareceu surgir em Thoryn. — Estava procurando por ela? Não achou que estava morta, Sweyn, desde que a deixou para isso?

— Eu precisava ter certeza. — Ele torceu o lábio. — Antes de cortar a garganta do último homem do vigia do promontório, descobri o que precisava saber, que a cadela ainda vivia.

Thoryn ergueu o machado novamente, mas seu rosto estava cheio de tristeza. — Nos traiu.

— Sim! E foi fácil! Aqueles idiotas Svolvaen acreditaram prontamente o suficiente que tentei ajudar sua preciosa Elswyth. — Seu rosto se contorceu em um sorriso zombeteiro. — Tão triste que nos separamos na floresta!

Sweyn jogou o escudo de lado, colocando as duas mãos no machado.

— Eu pensei apenas em encontrar abrigo lá, mas são mais fortes do que imaginamos com seus amigos Bjõrgen. Há um número suficiente para tomar Skálavík, e sou eu quem receberá o comando quando o fizerem.

Thoryn foi ágil, balançando seu machado em direção ao peito de Sweyn, mas seu irmão foi mais rápido, parando o golpe e enviando sua própria lâmina no braço de Thoryn.

Eu gritei quando Thoryn desabou. Ele caiu no chão, gemendo e segurando o ferimento.

Sweyn olhou para ele. — Foi minha barganha, irmão, conduzi-los até aqui, trazendo-os através do abismo nos penhascos. Deve se lembrar de como descobrimos a fenda que leva à caverna e do pacto que fizemos para manter tudo em segredo? Nosso lugar especial, que nenhum outro conhecia.

Puxando o braço contra o peito, Thoryn estremeceu. — Não é meu irmão, mas um espírito enviado para destruir o que construímos.

Sweyn o empurrou levemente com o pé. — Se estiver certo, então realmente não devo nada a Skálavík e devo tirar dele o que achar adequado.

Jogando a cabeça para trás, Thoryn fez uma careta. — E ajudou nosso inimigo o tempo todo, eu suponho, com aquele verme que colocou a casa comprida em chamas.

— Ah não! Que entendeu completamente errado. — A risada de Sweyn foi triste. — Encontrei o desgraçado vira-lata nos espionando, com certeza, na orla da floresta, mas fui eu quem atirei aquelas flechas. Uma viagem de caça gratificante, de fato, pois peguei um bode expiatório por meu delito e quebrei sua mandíbula antes de arrastá-lo para nosso jarl.

Ouvindo essas palavras, o aposento girou diante de mim. Todo esse tempo, Eldberg acreditava que o homem de Gunnolf era o responsável pelo incêndio que matou sua esposa. Com base nisso, atacou Svolvaen e culpou Eirik tanto quanto seu irmão. Mas Sweyn era a víbora, esperando para enviar seu veneno ao coração de Skálavík.

Thoryn fechou os olhos. — E agora, Sweyn? Deve me matar, pois não permitirei sua vilania, não enquanto viver.

— Sim, irmão, vai morrer, e a prostituta com você. Veja como ela estremece. — Sua voz estava cheia de desprezo. — Não haverá ninguém vivo para contradizer minha história.

Quando Sweyn se curvou para Thoryn, colocando as mãos em seu pescoço, aproveitei a única chance que tive. Atirando-me pela sala, mergulhei a faca com todas as minhas forças no lado de Sweyn.

Ele gritou de agonia, de raiva. Torcendo-se, tentou arrancar a faca, mas pulei para frente novamente, puxando a lâmina livre. Ele cambaleou para o lado, sem acreditar quando o sangue jorrou do ferimento.

Eu olhei para Thoryn. Estava pálido, mas seus lábios se moveram, me incentivando a agir.

De joelhos, Sweyn estava tateando em busca do machado que havia deixado cair. Fortalecendo-me, pulei sobre ele e dirigi a faca para a carne novamente, através de seu pescoço.

Com um grito de horror, recuei, vendo Sweyn cair. Desta vez, não houve grito, apenas o gorgolejo de um homem tentando desesperadamente respirar. Ele lutou brevemente antes de sua cabeça cair para trás, e não se moveu mais.

— Elswyth. — A voz de Thoryn rouca. —Ajude-me!

Sua túnica estava manchada de vermelho. Estava fraco, mas ainda consciente. Onde a lâmina havia entrado, o tecido foi rasgado e eu o rasguei ainda mais, para ver melhor o ferimento. Era profundo e o sangue subia escuro.

Agarrando as toalhas, enrolei uma, pressionando-a contra a carne aberta, ordenando a Thoryn que segurasse enquanto eu puxava o outro pano, amarrando bem apertado. Puxando Thoryn, coloquei-o com mais segurança no canto. Mesmo se ele desmaiasse, permaneceria de pé. Isso lhe daria mais tempo. Porém, se vivesse, seria a vontade dos deuses, pois não poderia fazer mais nada sem agulha e linha.

Para encontrá-los, precisava sair de onde estávamos.

Precisa chegar à casa comprida.

 

 

Elswyth


3 de dezembro de 960AD

D

esde que Sweyn entrou, não prestei atenção à comoção lá fora. Agora, ouvia novamente o choque de metal e os gritos de homens mortos, não imediatamente do lado de fora, mas mais abaixo na colina. Estava com medo de confrontar o que estava além da porta, mas precisava ajudar Thoryn e a mim mesma.

Limpei a navalha na túnica de Sweyn e respirei fundo.

O frio era cruel depois do calor da casa de banho, e não tinha capa para meus ombros, mas havia pouco tempo para pensar em conforto, apenas em ação.

Homens feridos, mortos e moribundos, estavam entre mim e a casa comprida, mas nada para me impedir de alcançá-la. A neve, caindo suavemente, já estava cobrindo os corpos, o chão manchado de vermelho abaixo deles.

Em vinte passos, cheguei ao grande salão e parei para respirar, inclinando minha cabeça contra a moldura da porta aberta. De dentro vinha o som de móveis afastados.

Alguém estava lá, movendo-se pelo espaço.

Um guerreiro Bjørgen, ávido por espólios enquanto seus irmãos lutavam? Ou um homem Svolvaen, que poderia me levar a Eirik?

Segurando a faca diante de mim, corri para dentro, pressionando minhas costas contra a parede.

Estavam na câmara mais distante.

— Pegue o que quiser. Não vou te impedir! — Foi Sigrid, assustada, descoberta em seu esconderijo. Ouviu-se o barulho de alguma coisa virada, depois um grito agudo. — Não me machuque, por favor!

Eu amaldiçoei. Por mais que não gostasse de Sigrid, não podia ficar parada e permitir que ela fosse machucada. Rapidamente, fiz meu caminho através do espaço, parando onde o tear de Sigrid estava pendurado. Embaixo havia vários sacos de lã, ainda a serem fiados, e quando parei, um tombou. Houve um guincho, depois um murmúrio baixo. Dois pares de olhos espiaram.

Ragerta e Thirka!

Vendo-me, se arrastaram para fora, agarrando minhas mãos, puxando-me para seus braços. Elas ficaram tão satisfeitas em me ver quanto eu a elas, mas não havia tempo a perder. Com meu dedo pressionado em meus lábios, apontei para as facas de cozinha.

— Eu não sei de nada! — Sigrid gritou atrás da cortina.

Empunhando nossas armas, puxamos o pano de lado.

No chão, seu agressor estava torcendo o braço de Sigrid atrás das costas. O torturador ergueu os olhos e, ao me ver, bufou de surpresa.

— Helka! — Larguei a faca e corri para ela.

No momento seguinte, Leif apareceu, prendendo Thirka e Ragerta pelo pescoço.

— Está tudo bem. — Fiz sinal às mulheres para baixarem as lâminas. — Somos amigas aqui.

— Viemos por, Elswyth, para levá-la para casa. — Helka se ergueu, seus olhos brilhando como fogo. — E para vingar aqueles que morreram em Svolvaen, as famílias que foram dilaceradas. Faremos Skálavík pagar!

— Não! — Eu não aguentava. Essa luta deve cessar antes que mais pessoas percam suas vidas. — Skálavík foi traída! — Pegando a mão de Sigrid, puxei-a para cima. Foi Sweyn. Enganou a todos. Ele ateou o fogo que matou Bretta!

A mão de Sigrid voou para a boca e seu rosto se enrugou, mas então ela se sacudiu. — Eu não acredito! Está pronta para seus truques astutos novamente!

Eu poderia tê-la sacudido por tamanha estupidez.

— Thoryn sabe. Ele ouviu Sweyn confessar.

Thoryn!

Virei-me para Thirka, dizendo-lhe que fosse ao balneário e levasse tudo o que fosse necessário. Ragerta ajudaria. Se pudessem estancar o sangramento, ele teria uma chance.

— Este Sweyn, que nos trouxe aqui — Helka me fez olhar para ela. — Ele nada disse sobre isso, apenas sobre suas queixas e que tentou ajudá-la.

Uma fúria quente e branca surgiu em minhas veias. — Ele queria me matar. Não tem honra ou verdade, servindo apenas a si mesmo. Tudo isso... — De repente, descobri que estava chorando. — Tudo. É o trabalho dele.

— Venha, Leif, vamos arrancar cada membro de seu corpo e arremessá-lo dos penhascos! — Pegando suas armas, Helka empurrou Sigrid.

— Ele já está morto, Helka. — Eu segurei a faca. — Por minha mão.

Helka parou imediatamente. Virando-se, ela ficou parada por um momento, apenas olhando para mim. Então, seu olhar caiu para minha barriga. Seus olhos se arregalaram e ela me apertou contra ela novamente.

Sempre lutando por sua vida, corajosa. — Ela enterrou o rosto no meu cabelo.

— Eirik? — Eu precisava saber. — Ele está vivo? Está aqui? — Meu coração disparou.

Eldberg estava possuído por um ódio que não toleraria outro resultado além da morte de Eirik. Se ele o encontrasse, o mataria, mesmo que isso trouxesse seu próprio fim.

Eu não podia negar que amava os dois, de maneiras diferentes.

Pensar que se feririam ou morreriam!

Eu não aguentava.

Ela assentiu. — Encontraremos uma maneira de parar com essa loucura.

Tirando a besta de suas costas, Helka a passou para mim. — Se lembra de como usar isso?


Eirik

E

irik agarrou sua espada, a arma que o havia servido em todos os tempos, seu Coração dos Mortos. Elevando sua oração a Thor e Odin, ele pediu força.

Havia apenas um homem que Eirik procurava.

Se Elswyth estivesse viva, apenas a morte desse homem a libertaria.

Tinha ouvido falar das crueldades de seu adversário e da força bruta que trouxe a aniquilação a seus inimigos.

Correndo para encontrar o inimigo que avançava, Eirik lançou sua lâmina no estômago de um homem. Seu machado cortou o pescoço de outro. Em meio a carne espetada e crânios rachados, ele estava ciente de seus irmãos guerreiros e dos guerreiros Bjørgen lutando ao lado, mas estava decidido em seu propósito.

Eldberg!

Que trouxe vingança a Svolvaen por um crime cometido apenas à porta de Gunnolf. Que matou homens e mulheres inocentes de sua má ação. Quem sequestrou sua esposa, degradando-a como sua escrava de cama!

Em meio à confusão de gritos, Eirik o viu, muito mais alto do que qualquer outra pessoa, sua cabeça sem proteção, seu cabelo uma massa selvagem de cobre e seu rosto com cicatrizes no lado esquerdo.

A multidão da batalha pareceu se separar quando Eirik olhou para o jarl de Skálavík e sua voz soou clara. — É hora de provar minha lâmina, Eldberg!

Aqueles ao redor deles recuaram, abrindo caminho para os dois cujo encontro moldaria tudo o que estava por vir. Através da luz fraca, cada um avaliou seu inimigo. Foi um encontro que demorou muito para acontecer.

— Ou tem coragem apenas para se esconder no meio da noite, sequestrando mulheres, como Beornwold antes de você.

Em resposta, Eldberg trovejou para frente, sua espada erguida totalmente acima de sua cabeça, caindo sobre seu inimigo. A fúria ferveu em seu terrível grito de guerra, a ira de um homem que sofreu dor e perda, e lutaria até a morte para exigir sua vingança.

Eldberg investiu e girou, desferindo um golpe que poderia ter derrubado Eirik antes que ele fizesse um único ataque, mas Eirik se jogou para o lado, rolando para longe. Pulando para cima, ergueu o escudo para evitar o próximo ataque. Foi rápido em chegar. A espada de Eldberg ressoou na borda de metal.

Eirik manteve os pés firmes, mas não conseguiu um único golpe em retaliação, mal se defendendo do ataque que Eldberg desceu sobre ele. Estava cansando, se esforçando para resistir ao ataque de seu adversário. Helka o avisou, sua força não voltara ao que era.

Apesar do ar gelado, o suor encharcou seu corpo, mas ele só precisava de um golpe certeiro, um movimento rápido, esfaqueando sob o braço levantado de Eldberg, na carne sensível e desprotegida.

Quando a arma de Eldberg caiu novamente, Eirik ergueu sua espada. Agora era a hora de atacar, entre os golpes de seu inimigo, mas Eldberg parecia antecipar seus movimentos.

Com um gemido, Eirik bloqueou o peso do aço em mergulho. Cambaleou, vacilando, depois caiu sobre um joelho.

A neve havia começado a cair novamente, flocos leves sobre a pele aquecida.

Em horror silencioso, Eirik testemunhou a espada de Eldberg entrar em seu ombro, cortando músculos, carne e ossos. A força quebrou a lâmina em duas, deixando-o empalado.

Elswyth, meu amor, onde está?

De longe, ouviu-se um grito.


Eldberg

E

ldberg puxou a espada e jogou-a para longe, depois empurrou Eirik para o chão sob o pé com a bota. Puxando a túnica de seu inimigo, ele colocou as costas nuas e, de seu cinto, pegou seu machado. Prometeu Bloodeagle, e isso ele iria entregar. Primeiro, a pele seria arrancada, depois as costelas cortadas na espinha. Enquanto mergulhava as mãos no sangue desse homem, ele ofereceria a morte a Odin. Quanto aos pulmões, ele os queimaria e deixaria que a fumaça fosse transportada para Valhalla como prova de sua vitória.

De pé, ele ergueu o machado bem acima da cabeça e berrou seu triunfo.

Muitos daqueles que estavam lutando já haviam recuado, vendo o jarl de Svolvaen à mercê da Besta.

Eldberg olhou em volta, deleitando-se com sua conquista.

Que todos vejam e temam!

Ninguém pegaria o que era dele. Skálavík! Elswyth! E sua verdadeira vingança! Ele não teria nada negado.


Elswyth

H

elka nunca os alcançaria a tempo. Tive de atirar e rezar para que minha mira fosse certeira.

Somente quando a flecha perfurou seu ombro, Eldberg me viu. O machado caiu de suas mãos e seu rosto voltou-se totalmente para o meu. Mostrou primeiro descrença, depois tristeza agonizante, como se uma luz abrasadora tivesse se apagado.

Eu o traí.

Ele cambaleou, vacilou e caiu para a frente.

 

 

Elswyth


3 de dezembro de 960AD

E

u amei os dois.

Não sabia como isso poderia ser, mas era verdade.

Eldberg a princípio se recusou a olhar para mim, embora me permitisse limpar e curar o ferimento. Deixei minha escolha clara, pegando em armas contra ele. O ferimento que eu infligia poderia ferí-lo para sempre.

— Amava sua esposa. Deve entender. — Sentei-me ao lado da cama que compartilhamos.

O que quer que Eldberg tenha imaginado que sentia por mim, não era amor. Um desejo de possuir ou ver em mim o que ele perdeu. Mas eu nunca seria Bretta, e ele não era Eirik. Queria que eu o amasse, como ele passou a ansiar por mim, mas isso nunca seria.

Eirik foi o marido que escolhi.

— Há muita coisa que não sabe. — Ele me olhou com cautela, como se fosse muito doloroso ou muito perigoso manter meu olhar.

— O corte atrás da orelha...

Eu toquei com cuidado. Ele havia cicatrizado, mas permaneceu sensível.

— Tem uma verruga... — Ele fez uma pausa. — Há mais duas, dentro do seu cabelo. Três ao todo.

— E daí? Muitos têm essas marcas na pele.

— Assim não.

Eldberg me disse então sobre sua convicção, que era da linha de Beornwold, que o bebê que carregava era neto de Beornwold, que Bretta era minha meia-irmã. Eu disse a ele há muito tempo como fui concebida, pelo estupro de minha mãe durante um ataque viking. Passaram-se mais de vinte anos antes de Eldberg se juntar ao serviço de Beornwold.

— Tantas vezes eu a vi em você. Pensamento positivo, acreditava, mas havia mais do que isso. Sigrid também viu, embora não quisesse aceitar.

Sempre soube que pertencia a outro lugar. Depois de tudo o que aconteceu, tudo que suportei, para descobrir que Skálavík era aquele lugar! Que meu pai esteve aqui o tempo todo. E uma irmã...

Isso não mudou nada entre Eldberg e eu, mas forneceu um motivo mais forte para Svolvaen e Skálavík deixarem de lado sua rixa de sangue. Os clãs já estavam unidos, através de Ingrid de Skálavík, avó de Eirik. Agora, a criança que carreguei os uniriam novamente.

— Vai falar com Eirik. Vai concordar com uma trégua. — Contei a Eldberg o que Sweyn havia se gabado, que era o responsável pelo incêndio, que sua ambição era mais forte do que a lealdade para consigo mesmo.

Gunnolf, meio louco como estava, não planejou o ataque.

Thoryn deu testemunho, tendo ouvido cada confissão suja dos lábios de Sweyn, e Eldberg acenou com a cabeça em aceitação, como se sempre tivesse sabido a verdade disso. Ele retaliou contra Svolvaen quando nenhuma culpa estava entre seu povo.

— Para o meu bem, por qualquer amor que tenha por mim, deixará de lado o passado?

Ele acenou com a cabeça, cansado. — Não apenas por sua causa, mas por Bretta. É apropriado que tenha se vingado daquele que tirou a vida dela. Nunca esquecerei, nem perdoarei, mas é uma porta que devo fechar ou perderei minha razão, e minha vontade de permanecer neste mundo.

Eu trouxe sua mão para minha bochecha.

Havia algo de bom nele; que eu acreditava de todo o meu coração.


M

uitos ficaram feridos e muitos mortos. A casa comprida estava cheia de homens que precisavam de tratamento. Sigrid ajudava, com Ragerta e Thirka, embora não quisesse falar comigo.

Ela não me mostrou nada além de má vontade, me vendo como uma intrusa. Quando Eldberg contasse a ela o que sabia, talvez seus modos se suavizassem. Enquanto isso, eu estava contente com a amizade nascida de verdadeira bondade, que aqueles de coração mais gentil haviam oferecido gratuitamente.

Thoryn estava recuperando suas forças, e Eldberg também, embora nenhum dos dois empunhasse uma arma como antes.

Foi a cabeceira de Eirik que mantive nas semanas seguintes, Eldberg tendo concedido abrigo a todos os feridos de Svolvaen. Ele veio muito cedo para a batalha e mal tinha forças para suportar esta ferida recente, mas eu acreditava que se recuperaria. Meu indomável Eirik!

Um sinal foi lançado do topo do penhasco logo após a batalha, chamando os navios que aguardavam no fiorde. Leif e Helka navegaram sem demora, com aqueles aptos a pegar remos, devolvendo-os a Svolvaen e Björgen.

Nosso tratado foi firmado, para que Skálavík mantivesse sua independência, embora as forças de Bjørgen tivessem posto as de Skálavík de joelhos. Os navios de Svolvaen e Bjørgen seriam bem-vindos no porto e teriam preferência em todos os termos de troca. Em momentos de necessidade, prometemos que um ajudaria o outro.

Eu disse a Eirik sobre minha captura e a barganha que fiz com Eldberg para me manter viva. Em nome da paz que precisávamos, para o bem de Svolvaen, aceitou o que foi feito, embora tenha visto que isso consumia seu coração.

Quanto ao bebê crescendo dentro de mim, uma vez que sua surpresa passou, eu vi a incerteza que o oprimia.

— Há algo entre você e Eldberg? — ele perguntou. — Precisa me contar, Elswyth. Se houver amor... Seu rosto se contorceu, pois ele não conseguia expressar todos os seus temores. — E esta criança...

— Não, marido. — Eu trouxe meus lábios aos dele, deixando-o sentir meu amor através do meu beijo. — Só você tem meu coração, e o bebê está previsto para duas luas a partir de agora.

Imediatamente, a esperança substituiu o desespero, mas havia mais a ser dito. Eu tinha que contar tudo a ele. Não poderíamos construir um futuro com meias verdades. — Quase um ano atrás, foi embora, e muita coisa aconteceu que me trouxe tristeza.

— Me contou isso — respondeu Eirik. — Da crueldade de Gunnolf e suas exigências. Se tivesse vivido, eu o teria desafiado até a morte pela forma como a tratou. Do jeito que foi, os deuses fizeram sua própria justiça por sua traição.

Eu balancei minha cabeça, meus olhos ardendo. — Mas, a criança — Minha bravura me falhou. — E se...

Eirik espalhou seus dedos largamente sobre meu estômago. — Amarei a criança, quer carregue o sangue do meu irmão ou o meu próprio. — Ele esboçou um sorriso cansado. Vou ensinar o menino a ser um guerreiro valente, para que possa assumir o manto de Svolvaen.

— E se tivermos uma filha? — Eu levantei uma sobrancelha, afastando minhas lágrimas.

— Vou ensiná-la da mesma forma. Será como sua tia, Helka.

Pressionei minha mão sobre a dele, cheio de uma nova alegria. A vida estava crescendo dentro de mim. Uma criança que criaríamos juntos. Muito se perdeu: minha mãe e avó, e as crianças com quem cresci, minha primeira casa deixada para trás, minha senhora Asta, e muitos de Svolvaen.

A vida era frágil e a felicidade preciosa demais para ser jogada fora. Valia a pena lutar. Não sabia se poderíamos colocar de lado todo remorso, mas sabia que deveríamos tentar.

— Pode me perdoar, por tudo o que aconteceu? Acredita que sou digna de tomar meu lugar ao seu lado como sua esposa? — Quase tive medo de encontrar seu olhar, pois sabia que nada estaria escondido ali, mas ele olhou bem nos meus olhos.

— É mais forte do que qualquer mulher, até mesmo do que Helka! Pelo sangue de Odin, o que suportou! Tem a determinação de dez homens! Sempre foi forte, sendo como é. Sou eu que devo me esforçar para provar que sou digno de merecê-la.

Ele enterrou o rosto na minha barriga. — Agradeço aos deuses que ainda está viva e imploro que nada nos separe enquanto ainda caminhamos nesta terra. Não há paz para mim em um mundo sem você nele.

Nós nos beijamos então, ternamente e por muito tempo, lembrando a sensação dos lábios um do outro e a maravilha que era o nosso amor. Isso só ficaria mais forte, pois ambos havíamos aprendido o que importava, a crença, a confiança e o pertencimento.

Toquei a velha cicatriz que descia pela testa e bochecha de Eirik. Havia muitos mais, em seu torso e nas costas. Em mim mesma, a maioria estava escondida bem no fundo, mas eram tão reais quanto as de Eirik. Antes, poderia ter desejado que fossem embora, mas sabia melhor agora. As cicatrizes eram recordações de tudo o que vivemos. Eram lembretes do que precisamos aprender se quisermos continuar e começar de novo.

 

 

Epílogo


2 de fevereiro de 961 DC

Agarrei a mão de Eirik, me preparando contra a crescente onda de dor.

— Economize suas forças, minha senhora. — Ragerta passou um pano frio na minha testa. — Ainda vai demorar.

Thirka acenou com a cabeça enquanto minhas feições relaxavam. — E o jarl, ele pode tomar um pouco de ar.

Eirik parecia abatido, mas disse: — Não vou embora.

Durante a noite, as duas mulheres molharam meus lábios com água e murmuraram orações por mim, mas minha fortaleza diminuiu, até que mal podia gritar contra os espasmos, minha respiração ficando superficial com a luz bruxuleante da lâmpada.

Estava quase amanhecendo quando Ragerta balançou meu ombro.

— Chegou a hora. Deve abaixar e empurrar a criança.

— Chega... Só dormir... — Queria fechar meus olhos novamente, mas Eirik esfregou minha mão entre as suas. Ele parecia tão pálido.

— Deve, Elswyth. Em breve teremos nosso filho e nossa vida começará uma nova temporada. Mas deve lutar!

Movendo-se para o topo da cama, trouxe meus ombros para descansar em seu peito.

— Juntos, faremos isso, esposa. Tem minha força e a sua própria.

Fiz o que pediu, esforçando-me, grunhindo, forçando toda a minha vontade na criança.

— A cabeça! — Thirka gritou. — De novo, Elswyth, e o bebê estará aqui!

Os braços de Eirik estavam firmes em mim. — Minha corajosa esposa, pode fazer isso!

Novamente me esforcei, forçando a dor para baixo, e fui retribuída com a sensação de uma grande mudança, de um peso movendo-se dentro de mim.

Engasguei e caí no abraço de Eirik, sua bochecha pressionada contra a minha.

Ragerta ergueu a criança para nós vermos, e houve um choro forte. — É perfeita, uma bela filha!

Ela colocou o bebê no meu peito e as lágrimas brotaram dos meus olhos. Durante toda a tristeza dessas temporadas passadas, tive a criança que tanto desejava, o tesouro mais precioso. Era a criação do meu corpo, milagrosa e pertencente a mim como nada mais havia feito.

Quando se aninhou em meu peito, Eirik pressionou sua boca em meu ouvido, sussurrando: — Eu tenho tudo. — Ele ergueu a mãozinha dela e eu vi o orgulho em seu rosto, vi que ele sentia isso também.

Seu cabelo era claro, como o meu. Como o de Eirik. Se ela era de Gunnolf, não havia nada em sua aparência para mostrar. Talvez nunca soubéssemos. Talvez isso nunca importasse.

Era minha e de Eirik e rezei para que ela soubesse, sempre, o que era ser amada.

 

 

                                                   Emmanuelle de Maupassant         

 

 

 

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