Irmandade da "Adaga Negra"
Capítulo SEIS
Sopa de frango e estrelinhas da Campbell.
Enquanto Mary se debruçava sobre o fogão na cozinha principal do Lugar Seguro, ela mexia a sopa sem parar com uma colher de inox, observando as estrelas de massas
quase inchadas girando com os quadrados de carne branca e fatias de cenoura. A panela era a menor que tinham na casa. O caldo era amarelo, e o cheiro doce a lembrou
das doenças simples que teve quando era criança... Constipações, gripes, streptococos.
Coisas mais fáceis do que o câncer.
Ou a Esclerose Múltipla que tinha levado sua mãe.
A tigela em que despejou as coisas era creme com anéis concêntricos amarelos na borda. Ela pegou uma nova colher da gaveta e deu a volta no balcão em direção à grande
mesa de madeira.
— Aqui, – Ela disse para Bitty. — E vou te dar alguns Saltines.
Como se essa tragédia fosse algo que você pudesse superar em vinte e quatro horas, se fosse apenas hidratado suficiente?
Bem, pelo menos uma refeição simples como esta não era suscetível de sair pela culatra. E tão logo Bitty tivesse comido, Mary iria encontrar outro membro do pessoal
para atender a menina e, em seguida, obter algum aconselhamento para si mesma.
Quando voltou da despensa com o pacote de biscoitos, Bitty estava experimentando a sopa e Mary sentou-se do outro lado da mesa para não ficar em cima da menina.
A embalagem plástica se recusou a cooperar e Mary a abriu com força, derramando Saltines e grãos de sal sobre a madeira.
— Droga.
Ela comeu um... E então percebeu que não teve qualquer alimento há algum tempo e estava com fome também...
— Meu tio virá me buscar.
Mary congelou no meio da mastigação.
— O que você disse?
— Meu tio, – Bitty não olhou pra cima, apenas continuou movendo a colher através da sopa fumegante. — Ele virá me buscar. Vai me levar pra casa.
Mary retomou a coisa toda da mastigação, mas sua boca era como um misturador de cimento tentando processar cascalho.
— Sério?
— Sim.
Com mãos cuidadosas, Mary recolheu as bolachas espalhadas, empilhando-as em grupos de quatro.
— Eu não sabia que você tinha um tio.
— Eu tenho.
— Onde ele mora?
— Não em Caldwell, – Bitty tomou outra colher e colocou-a na boca. — Mas ele sabe como chegar aqui. Todo mundo sabe onde fica Caldwell.
— Ele é o Irmão de sua mahmen?
— Sim.
Mary fechou os olhos. Annalye nunca mencionou nenhum parente. Não tinha divulgado isso na ficha ou nominado um parente mais próximo. E a mulher teve conhecimento
de que sua condição estava deteriorando, então se houvesse um Irmão em algum lugar, certamente teria contado sobre ele para alguém e isso teria ido para seu arquivo.
— Gostaria que eu tentasse entrar em contato com ele pra você? – Perguntou Mary. — Sabe onde ele mora?
— Não, – Bitty olhou para sua sopa. — Mas ele virá me buscar. Isso é o que a família faz. Eu li naquele livro.
Mary tinha uma vaga lembrança de um livro infantil sobre os diferentes tipos de família: biológica, adotiva, avós, bem como aqueles que resultavam a partir de doadores
de esperma, óvulos doadores, fertilização in vitro. O ponto era, não importa como eles surgiram ou com que se parecessem, em cada caso, todo mundo tinha uma unidade,
com um monte de amor em torno deles.
— Bitty.
— Sim?
O celular de Mary começou a vibrar no bolso do casaco que ela ainda não tinha tirado e ficou tentada a deixar quem quer que fosse ir para o correio de voz. Exceto
pelo que os Irmãos estavam fazendo esta noite com aquele ataque enorme?
Quando tirou seu celular pra fora e viu quem era, pensou, oh Deus.
— Butch? Olá?
Houve interferência na conexão. Vento? Vozes?
— Olá. – Ela disse mais alto.
— ... Indo pegar você.
— O quê? – Ela levantou-se da cadeira. — O que você está dizendo?
— Fritz, – O Irmão gritou. — Indo pegar você! Nós precisamos de você aqui fora!
Ela amaldiçoou.
— Quanto é ruim?
— Fora de controle.
— Merda. – Ela suspirou. — Eu vou sair rápido. Poupar tempo.
Houve uma série de estouros, alguns xingamentos e depois então distorção, como se Butch estivesse correndo.
— ... Escreva a localização. Rápido!
Quando a ligação foi cortada, ela olhou para a menina e tentou não soar tão em pânico quanto estava.
— Bitty, eu sinto muito. Tenho que ir.
Aqueles olhos castanhos claros levantaram para os dela.
— O que há de errado?
— Nada. Eu só... Vou trazer Rhym pra você. Ela vai sentar aqui e talvez vocês duas possam ter uma sobremesa?
— Estou bem. Estou indo para cima e embalar minhas coisas, então estou pronta para meu tio.
Mary sacudiu a cabeça.
— Bitty, antes de fazer isso, não seria melhor que você e eu devêssemos tentar encontrá-lo primeiro?
— Está tudo bem. Ele sabe sobre mim.
Estabilizando a respiração. Por muitos motivos.
— Vou passar mais tarde e ver como você está indo.
— Obrigada pela sopa.
Quando a menina voltou a comer, ela não pareceu se importar com quem estava em torno dela ou não, como de costume.
E foi com uma dor de cabeça martelando que Mary foi numa rápida busca da supervisora de admissão, que estava fazendo trabalho dobrado por que uma das outras assistentes
sociais estava fora em licença maternidade. Depois de explicar a Rhym tudo o que tinha acontecido, Mary decolou em uma corrida deixando a casa e saltou para o Volvo.
A antiga Escola Brownswick para meninas ficava a cerca de dez minutos de carro. Ela fez isso em sete, disparando pelas estradas, esquivando-se em torno dos desenvolvimentos
suburbanos, passando rapidamente pelos sinais amarelos e vermelhos. O SUV não foi construído para esse tipo de treinamento, o caixão quadrado, pesado, balançando
pra lá e pra cá, mas não se importava. E merda, parecia que ela nunca chegaria ao limite do campus abandonado.
Pegando seu telefone, desacelerou e olhou suas mensagens de texto.
Lendo em voz alta, ela falou:
— Contorne os portões principais... Dê a volta... Merda!
Algo disparou para a rua, a figura movendo-se como uma boneca de trapo e tropeçando diretamente na frente do seu carro. Pisando nos freios, ela atingiu o homem...
Não, era um lesser: o sangue que salpicou pelo pára-brisa era negro como tinta e a coisa decolou mais uma vez, embora um de seus pés parecesse quebrado.
Com o coração acelerado, engoliu em seco e socou o acelerador novamente, com medo de que houvesse outros por trás dele, mas ainda mais aterrorizada por tudo o que
estava acontecendo com Rhage. Reverificando seu celular, ela seguiu as direções rodeando os fundos da escola para a rua de mão única que a levou para dentro da bagunça
desgrenhada de uma paisagem.
Bem quando se perguntava onde diabos deveria ir a partir dali, a pergunta foi respondida.
Do outro lado do prado, a besta se destacava entre os prédios abandonados como algo saído de um filme do canal SyFy. Alto o suficiente para alcançar os telhados,
grande o suficiente para deixar anão mesmo um dormitório, como um tigre brincando com uma refeição, a coisa estava em modo de ataque total.
Arrancando o telhado de um galpão com seus dentes.
Ela não se incomodou em desligar o motor.
Mary jogou o Volvo no parque e saltou pra fora. No fundo de sua mente, estava ciente de que o desigual pop-pop-pop no fundo eram balas voando, mas não se preocuparia
com isso. Sobre o que ela estava em pânico?
Quem diabos estava naquele prédio.
Enquanto corria na direção do dragão, colocou dois dedos na boca e soprou com força.
O assobio era estridente, alto como um grito... E não fez nenhuma impressão afinal, enquanto as telhas da estrutura de tijolos eram cuspidas para um lado.
O rugido que se seguiu foi algo que ela conhecia muito bem. O animal estava pronto para sua feliz refeição, e toda aquela coisa de arranca-vigas era sua maneira
de entrar no prédio.
Mary tropeçou em alguma coisa, oh, Deus, era um lesser que estava sem um braço... E continuou, assoprando outro assobio. E uma terceira vez...
A besta congelou, seus flancos bombeando dentro e fora, tons de roxo piscando na escuridão como se a coisa fosse iluminada por dentro por uma fonte elétrica.
O quarto assobio fez a cabeça da besta virar ao redor.
Retardando sua corrida, Mary levou as mãos à boca.
— Venha aqui! Venha, garoto!
Como se o animal fosse apenas o maior cão do mundo.
O dragão soltou um pff e depois soprou pelas narinas, o som algo entre um folguedo abafado por uma almofada e um motor a jato decolando.
— Venha cá você! – Ela disse. — Deixe isso. Não é seu.
A besta voltou a olhar para o que eram agora apenas quatro paredes de tijolos e não muito mais, e um grunhido ondulado saiu dos lábios negros de dentes irregulares
que teria dado uma grande insegurança a um creme dental branco. Mas, como um pastor alemão chamado para sentar aos pés do treinador, a maldição de Rhage se afastou
de seu trabalho de desconstrução e pulou para ela.
Enquanto o dragão vinha através das ervas daninhas e espinheiros, seu grande peso sacudia o chão tão fortemente que Mary teve que estender os braços para se equilibrar.
Mas por incrível que pareça, a coisa estava sorrindo para ela, sua face horrível transformada por uma alegria que não teria acreditado se não tivesse visto isso
cada vez que estava perto do monstro.
Esticando as mãos para cima, ela cumprimentou aquela grande cabeça caída com palavras suaves de elogios, colocando a palma da mão em sua bochecha redonda, deixando-o
respirar o cheiro dela e ouvir sua voz. Em sua visão periférica, viu duas pessoas saírem do prédio destruído... Certificando-se que um deles tinha o corpo saudável
e correndo muito, e outro estava em cima de um ombro forte, obviamente ferido.
Ela não teve coragem de olhar diretamente para ver quem era. A melhor chance deles era sua ligação com a maldição... E era estranho. Tão feio como a coisa era, tão
terrível e mortal quanto poderia ser... Ela sentia um amor duradouro aquecer seu corpo. Seu Rhage estava lá, em algum lugar, preso sob as camadas de músculos e escamas
e percepção de terceiros, mas mais do que isso, ela adorava a besta também...
Os tiros vieram da direita e, por instinto, gritou e abaixou-se para cobrir a cabeça.
O dragão assumiu dali em diante, girando na direção dos atiradores, ao mesmo tempo conseguiu embrulhar sua cauda em torno de Mary e guardá-la contra seu flanco.
E então eles estavam em movimento. O passeio foi áspero, como um touro mecânico que sofre de surtos de energia, e ela se agarrou a um dos espinhos maiores por sua
querida vida.
Graças a Deus por aquela saliência óssea. Por que o que aconteceu em seguida envolveu um monte de Danças e Gritos.
Primeiro houve gritos. Terríveis, gritos de pesadelo que teve que tapar os ouvidos para bloquear; exceto que não se atreveu a largar com risco de ser jogada livre...
Pra cima e pra frente...
Um lesser, que estava vazando como uma peneira, saiu voando sobre o dorso da besta e sangue negro bateu em Mary como uma chuva de mau cheiro. A coisa aterrissou
num monte quebrado e o perseguidor que seguia um segundo lesser, que também estava sobre os ombros, bateu no primeiro como uma pedra.
Oh... Veja. Sem cabeça. Onde estava aquilo...
Algo que era vagamente redondo e tinha um rosto de um lado e uma cabeleira loira no outro lado através da grama crescida que tinha sido achatada sob as enormes patas
traseiras do dragão... Patas... Garras... Tanto faz.
A fera a mantinha junto para o passeio para o resto da diversão e jogos. Falando de uma refeição saudável. Em seu rastro, braços e pernas, mais cabeças – raramente
um torso, por que isso era provavelmente bom de comer – cobriam o chão. Felizmente nada parecia ser um Irmão ou um lutador, mas oh, Deus, o cheiro. Ela ia ter que
higienizar seu nariz por um mês depois disso.
Justo quando estava perdendo a noção do tempo, no exato momento em que não tinha certeza se podia aguentar por muito mais tempo, o ímpeto do animal diminuiu a velocidade
e parou. A sua cabeça grande balançou pra esquerda e pra direita. Seu corpo deu a volta. Mais uma busca.
A paisagem parecia vazia de qualquer coisa que se movesse, estático, prédios decadentes, árvores sem folhas e sombras escuras que permaneciam onde quer que olhasse.
Os Irmãos ainda tinham de estar no campus; de maneira nenhuma que iriam embora sem Rhage. Mas sem dúvida eles estavam assistindo o grande dragão por trás de uma
boa cobertura. E, assim com os lessers? O saldo do inimigo deve ter caído fora, sendo incapacitado ou ter sido comido.
O ataque maciço parecia ser mais...
Querido Deus, a carnificina deixada para trás. Como eles iam limpar isto? Deviam haver uns cem lessers no retorcido chão, mesmo se eles estivessem apenas em pedaços.
Mary acariciou a palma da mão na base grossa da cauda.
— Obrigado por me manter segura. Pode me descer agora.
A besta não estava tão confiante quanto ela estava e continuou a examinar a cena da batalha, os músculos dos seus ombros se contraindo, aquelas enormes patas traseiras
tensas e prontas para saltar. Nuvens de vapor do hálito quente saindo de suas narinas, queimando no ar frio da noite como parte do show de um mágico.
— Está tudo bem. – Disse ela, acariciando aquelas escamas.
Engraçado, teria pensado que as coisas seriam ásperas, mas eram suaves e flexíveis, um fino entrelaçamento de camadas que mudava com os movimentos do dragão e mostrava
todas as cores do arco-íris em cima de uma base roxa.
— Realmente está tudo bem.
Depois de um momento, a cauda da besta desenrolou e ela desceu para o chão.
Puxando seu casaco e suas roupas de volta no lugar, ela olhou ao redor.
Em seguida, colocou as mãos nos quadris e olhou para cima.
— Ok, garotão, você fez um ótimo trabalho. Obrigada... Estou orgulhosa de você. – Quando a coisa orgulhosa abaixou a cabeça, ela acariciou o focinho. — É hora de
ir, apesar de tudo. Você pode deixar o Rhage voltar?
Aquela grande cabeça foi lançada no ar, o sangue negro dos lessers que tinha consumido piscando como um revestimento oleoso abaixo da garganta e no peito. Estalando
as mandíbulas duas vezes, os dentes e presas travando com um som como dois SUVs batendo um no outro, grelha a grelha. O rugido que veio a seguir foi de protesto.
— Está tudo bem, – Ela murmurou enquanto permanecia em pé. — Eu te amo.
A besta abaixou o focinho e assoprou para fora o ar úmido.
E então bem desse jeito, seu corpo entrou em colapso, um castelo de areia caído com uma onda, uma estatueta de cera aquecida dissolvida em uma poça. Em seu lugar,
Rhage apareceu de cara no chão, sua enorme tatuagem de volta enrolando-se à sua volta, suas pernas nuas dobradas como se seu estômago já o incomodasse.
— Rhage, – Ela disse quando se agachou ao lado dele. — Você está de volta, meu amor.
Quando não houve resposta, nem mesmo um gemido de “vou vomitar”, ela franziu a testa.
— Rhage...?
Quando colocou a mão no ombro dele, a imagem tatuada do dragão em sua pele ganhou vida, deslocando-se de modo que sua cabeça estava sob o toque dela.
— Rhage? – Ela repetiu.
Por que ele não estava se movendo? Normalmente ficaria desorientado e com dor, mas sempre se virava para ela, assim como a tatuagem da besta fez, buscando cegamente
sua voz, seu toque, sua conexão.
— Rhage.
Alcançando a parte superior do braço, colocou toda sua força para puxá-lo mais plano contra o chão.
— Oh Deus…!
Havia sangue vermelho no peito. No meio de todas as manchas negras que a besta tinha consumido, havia uma fonte de sangue vermelho muito real, muito terrível e de
grande expansão no centro de seu torso.
— Socorro! – Ela gritou para a paisagem. — Socorro!
Os Irmãos já estavam vindo de todas as direções, abandonando seus esconderijos, correndo através do campo de batalha que estava cheio de lessers mutilados. E à direita
em seus calcanhares, como um farol de um Deus benevolente, vinha a unidade móvel e cirúrgica de Manny – o trailer-ambulância se dirigia para eles com o bom pé pesado
do médico no acelerador.
Mary avistou Vishous na multidão por causa de sua experiência em resgate médico.
— Você precisa ajudá-lo!
Aquela mancha vermelha... Estava à direita no esterno do Rhage.
E seu hellren tinha um coração forte, mas não era impenetrável.
O que tinha acontecido?
Capítulo SETE
Vishous foi o primeiro a chegar no Rhage enquanto o irmão ressurgia da carne do dragão... e merda, foi de pré-besta má a pós-maldição pior. O cara não estava se
movendo, não estava respondendo nem à sua shellan. Sua coloração era cinzenta como uma lápide de granito e havia um monte de sangue vermelho.
O que era apenas a ponta do iceberg. A verdadeira questão era quanto devia ter dentro daquela cavidade torácica.
— Ajude-me! – Mary disse enquanto colocava as mãos sobre a ferida e empurrava para baixo como se estivesse tentando conter o vazamento. — Ajude-o, oh, Deus, V...
O bom era que a unidade cirúrgica pisou nos freios e Jane tinha vindo com Manny, tendo se transferido através de seu próprio veículo. Assim que os cirurgiões bateram
as portas da frente do trailer, ambos os médicos atingiram o chão correndo com mochilas pretas cheias de equipamentos médicos.
— Eles estão aqui – V disse. Não que o par pudesse fazer muita coisa.
— Será que ele foi baleado? Eu acho que ele foi baleado. Oh Deus...
— Eu sei, venha aqui. Deixe-os olharem...
Mary sacudiu a cabeça e lutou contra ser puxada para trás.
— Ele está morrendo...
— Dê-lhes algum espaço para trabalhar. Vamos.
Porra, isso era culpa dele. Se não tivesse confrontado... Mas que porra. A visão tinha sido o que tinha que ser, e era exatamente isso aqui e agora: Rhage de costas
no chão nu, seu sangue por toda parte, V segurando Mary enquanto ela puxava e chorava.
— Um único tiro. – V anunciou. — Provável hemorragia cardíaca com tamponamento e derrame pleural.
Deus, queria que pudesse cobrir os ouvidos de Mary quando falou, mas como se ela já não soubesse o que era!
Os médicos não desperdiçaram um segundo, verificando sinais vitais enquanto Ehlena saltava para os fundos do trailer trazendo a maca com ela.
Vishous captou o olhar de sua companheira enquanto Jane escutava os sons cardíacos de Rhage, e quando ela balançou a cabeça ele soube, sem quaisquer outras palavras,
que tudo o que tinha adivinhado era verdade.
Merda.
— O que eles estão fazendo? – Mary balbuciou contra ele. — O que eles vão fazer?
V abraçou a fêmea mais apertado enquanto ela continuava a murmurar em seu ombro, a cabeça virando em direção a seu companheiro.
— Eles estão indo ajudá-lo, certo? Estão indo consertá-lo... Certo?
Jane e Manny começaram a falar em linguagem médica, e quando Vishous pegou a essência das palavras, fechou os olhos brevemente. Quando bateu as pálpebras novamente,
Manny estava de um lado de Rhage, colocando um dreno de tórax para drenar os fluídos em torno dos pulmões e Jane estava realizando uma pericardiocentese com uma
agulha que parecia tão longa quanto seu braço.
O que era um movimento de vai-com-tudo.
Normalmente este procedimento era feito com a orientação de ultrassom, mas ela não tinha escolha a não ser ir cegamente através do quinto ou sexto espaço intercostal
ao lado do coração.
Se ela errasse? Entrasse fundo demais?
Mary lutou em seus braços.
— O que eles estão fazendo...
— Ele está parando. – Manny vociferou.
— Rhage!
Ehlena estava lá com as pás, mas o quanto era bom em caso de uma enorme hemorragia? Inferno, mesmo se o dreno do tórax e a agulha fizesse o trabalho, nenhum dos
dois corrigiria o trauma cardíaco. A única chance de verdadeira sobrevivência era colocar o Irmão em uma máquina de circulação sanguínea (bypass) então Jane poderia
trabalhar sua magia e reparar seja qual for a ruptura ou perfuração sem sangue e sem movimento.
Abruptamente, tudo ficou em câmera lenta quando Rhage abriu os olhos, respirou fundo... E virou o rosto para Mary.
Seus lábios brancos começaram a se mover.
Mary empurrou contra o abraço de V e ele a soltou, permitindo que fosse até ele. Pelo amor de Deus, esta poderia ser a última chance da fêmea se comunicar com seu
companheiro. Fazer as pazes com ele. Resolver seus acertos para encontrá-lo do outro lado.
Vishous franziu a testa quando a imagem de sua mãe abandonada, deitada naquele estrado, voltou para ele.
É melhor você cumprir a porra da sua promessa, ele pensou para os céus. É melhor assumir a responsabilidade e tomar conta dos dois. Seria fodidamente melhor você
fazer certo a respeito daquela promessa, ele pensou para os céus. Seria melhor você levantar o homem e cuidar dos dois.
Mary caiu de joelhos ao lado da cabeça de Rhage e colocou a orelha em sua boca. O fato de que a equipe médica recuou sem dúvida foi perdido para ela, mas Vishous
sabia o que isso significava, e não era nada bom.
Que o ritmo do coração que estava sendo monitorado tão atentamente não estava ficando mais estável. Que a pressão arterial não estava ficando mais forte. Que a hemorragia
não estava parando. E o tubo e a agulha não foram longe suficiente.
V olhou para Butch, e quando o policial olhou para o outro lado do drama, V pensou sobre como os três formaram um vínculo tão apertado. A trindade, eles eram chamados.
Grudados como carrapatos e chatos como a merda, nas palavras de Tohr.
V olhou em volta. Os outros Irmãos estavam em circulo fechado, formando uma barreira de proteção e preocupação em torno de Rhage e Mary. No entanto, nenhum dos combatentes
tinha suas armas à mostra e, de tempos em tempos, um tiro soava quando eles atiravam nos lessers cujos corpos iam mostrando muita animação.
Quando Mary começou a falar com suave desespero, Vishous amaldiçoou novamente quando ficou claro para ele que, mesmo embora o casal tivesse um final que resultava
em ficar juntos, o resto deles estava perdendo Rhage e Mary. Maldição, era impossível imaginar a mansão sem eles.
Merda era supor não afundar com isso.
Risque isso, pensou, enquanto lembrava-se de sua visão. Não queria que acabasse assim. V moveu os olhos para sua companheira, e quando Jane apenas balançou a cabeça,
seu sangue gelou.
Jesus Cristo, não.
De repente uma imagem de Rhage na mesa de pebolim do Pit veio à mente. O Irmão não estava jogando no momento; estava em pé ao lado, comendo com vontade algum tipo
de burrito do Taco Bell. Estava comendo com as duas mãos, na verdade, com um chimichanga na outra mão. Alternando mordidas, o FDP consumindo cerca de quatro mil
calorias, com o sorvete de chocolate com menta crocante que ele tinha conseguido de sua geladeira, e metade de um bolo de chocolate que ele pegou de sobremesa antes
de vir da casa principal.
Ei V, o Irmão disse em um momento. Você algum dia vai raspar essa barbicha feia em torno de sua boca grande? Ou vai continuar parecendo um dos rejeitados da Affiliction2
como um serviço público para o que não fazer com uma gilete?
Irritante pra caralho.
E ele não daria sua bola restante para ter qualquer parte disso novamente. Mesmo se apenas como adeus.
O tempo era demasiado finito: não importa quanto dele você teve com alguém que amava, quando o fim chegava, não era o suficiente.
— Eu te amo. – Mary disse com voz quebrada. — Eu te amo…
Enquanto ela acariciava o cabelo loiro de Rhage da testa, sua pele estava tão fria e estranhamente seca. Sua boca manchada de sangue estava se movendo, mas ele não
tinha ar suficiente em seus pulmões para falar e, oh Deus, eles estavam cinza... Seus lábios estavam ficando...
Mary olhou para Manny. Dra. Jane. Ehlena. Então encontrou os olhos dos Irmãos. John Matthew. Blay e Qhuinn.
Por último olhou para Vishous... E ficou horrorizada com a luz distante em seus olhos.
Eles tinham desistido. Todos eles. Ninguém estava correndo para empurrá-la pra longe do caminho para que pudessem entubar seu companheiro, ou dar choque em seu coração
para voltar ao ritmo, ou rachar sua caixa torácica aberta e fazer o que fosse preciso para conseguir o que quer que estivesse errado voltar a funcionar em ordem.
Rhage arqueou com um gemido e tossiu um pouco mais de sangue. E quando ele começou a engasgar, ela conheceu uma nova definição de terror.
— Eu vou te encontrar, – Disse a ele. — No outro lado. Rhage! Está me ouvindo? Vou te encontrar no outro lado!
O ofegar e barulho, a dor em seu rosto, a agonia do grupo ao seu redor... Tudo tornou-se tão cristalino que doía os olhos e ouvidos, manchando seu cérebro para sempre.
E estranhamente, pensou em Bitty e sua mãe e o que tinha acontecido na clínica.
Oh merda, se ela deixasse o planeta... O que ia acontecer com a garota? Quem iria cuidar tanto como ela cuidava da agora órfã?
— Rhage... – Mary puxou seus ombros. — Rhage! Não! Espere, fique aqui...
Mais tarde ela tentaria trazer à tona por que a conexão sináptica foi feita quando o fez. Ela saberia como ela tinha, possivelmente, pensado em tudo... Teria suores
frios sobre o que teria acontecido em seguida e o que não teria acontecido em seguida... Se aquele raio não tivesse saído do nada quando o fez.
Às vezes escapar de um acidente por milímetros era quase tão traumático quanto o impacto.
Mas tudo isso veio depois.
No momento do falecimento de seu amado, no mesmo instante em que sentiu que ele havia deixado seu corpo para fazer a viagem para o Fade... De repente, e sem motivo
que pudesse pensar, ela vociferou:
— Role-o de lado. Façam isso!
Começou a puxá-lo sozinha, mas não deu em nada, ele era muito pesado e ela não podia conseguir um bom aperto em seu tronco maciço.
Olhando para cima, acenou para os Irmãos.
— Ajudem-me! Porra, me ajudem!
V e Butch caíram ao lado dela e viraram Rhage para seu lado direito. Arqueando em volta de seu companheiro, Mary recuou para o outro lado. As cores brilhantes da
tatuagem do dragão estavam desaparecendo, como se o brilho da imagem fossem um termômetro da saúde de Rhage. Focando novamente, colocou a mãos sobre a forma da besta,
Deus, ela odiava como a resposta foi lenta.
— Vem comigo, – Ela disse com urgência. — Preciso que você venha comigo.
Isso era loucura, pensou enquanto passava lentamente as palmas das mãos em torno do torso de Rhage, mas alguma coisa a guiava, algum tipo de vontade que certamente
não sentiu como dela própria. Porém não ia discutir como a imagem da besta seguia seu toque... E era estranho: não foi até ela fazer o caminho nas costelas que percebeu
o que estava fazendo.
Louca, pensou novamente. Completamente louca.
Vamos lá, não era como se o dragão tivesse sido treinado em medicina de emergência e muito menos cirurgia cardíaca.
Mas ela não parou.
— Ajude-me, – Ela disse engasgada para a besta. — Oh, por favor... Vamos lá, ajude-o, salve-o... Salve a si mesmo salvando-o...
Simplesmente não podia deixar Rhage ir. Não importava nestes últimos momentos que havia uma saída cósmica para os dois, que por causa do que a Virgem Escriba tinha
dado a ela, eles não tinham que se preocupar com algum tipo de separação. Ela ia tentar salvá-lo.
Trabalhando com ela, os Irmãos viraram Rhage deitado de costas novamente, e as lágrimas de Mary caíram sobre o peito nu de seu companheiro enquanto ela transferia
as mãos sobre o ilusoriamente pequeno buraco de cerca de uma polegada à direita de seu esterno.
Deus, sentia como se a ferida fosse do tamanho de uma sepultura.
— Apenas cure-o... De alguma forma, por favor... Por favor...
A tatuagem permaneceu onde ela parou.
— Cure isso…
O tempo parecia rastejar, e com os olhos lacrimejantes olhou para o peito de Rhage esperando por um milagre. Enquanto os minutos passavam e ela transitava para um
plano emocional miserável que era mais tenso que pleno pânico, muito menor do que totalmente deprimida, e tão vasta que era duas vezes o tamanho da galáxia, pensou
novamente no que Rhage dissera sobre as horas que ele passou ao lado da cama dela naquele hospital humano: sabendo que ela ia morrer, incapaz de fazer nada, perdido
embora soubesse o lugar de onde o corpo físico dele estava.
Era como se a gravidade não tivesse controle sobre mim, ele disse, e ainda assim estava me esmagando ao mesmo tempo. E então você iria fechar os olhos e meu coração
iria parar. Tudo o que eu conseguia pensar era que, em algum momento no futuro, você ia ter essa aparência para sempre. E a única coisa que eu sabia com certeza
era que eu nunca seria o mesmo, e não de uma boa maneira... Por que eu sentiria sua falta mais do que jamais iria importar com qualquer outra coisa na minha vida.
Mas então a Virgem Escriba tinha mudado tudo isso.
No entanto, aqui estava Mary... Lutando para mantê-lo vivo.
E o porquê... Quando ela realmente focou na questão... Parecia errado, tudo errado, e ainda assim ela não iria parar.
No início, a chama de calor não foi registrada no meio de todas as suas emoções. Havia muito na frente de sua mente e a mudança de temperatura foi muito sutil. O
calor logo se tornou impossível de ignorar, no entanto.
Piscando os olhos, franziu a testa para baixo, para suas mãos.
Não se atreveu a afastar as palmas das mãos para ver o que estava acontecendo embaixo.
— Rhage? Rhage... Você está conosco?
O calor rapidamente se tornou tão intenso que irradiava pelos braços dela e aquecia o ar que respirava quando se inclinou sobre seu companheiro. E então sentiu um
tranco, como se a besta estivesse rolando por perto...
Sem qualquer aviso, Rhage abriu a boca, lançando uma inspiração gigante e empurrou seu torso do chão, jogando-a de bunda no chão. Enquanto as mãos dela voavam, a
tatuagem foi revelada e estava…
A imagem do dragão tinha perdido seus contornos, suas cores num redemoinho em conjunto e ainda permaneciam distintas, como uma daquelas antigas coisas spin-art que
ela tinha feito nas feiras quando era pequena.
Ela não podia mais ver a ferida da bala.
Houve um suspiro coletivo, seguido por alguns sérios “mas que porra é essa?” e em seguida uma série de aleluias que foram proferidas com um sotaque de Boston.
— Mary? – Rhage engasgou confuso.
— Rhage!
Só que antes que ela pudesse alcançá-lo, ele começou a tossir em grandes espasmos, dobrando a cabeça para frente, apertando sua barriga distendida, sua mandíbula
se estendendo.
— O que há de errado com ele? – Mary disse quando chegou para frente, mesmo que isso não fosse como se pudesse fazer qualquer coisa para ajudar. Inferno, os médicos
pareciam igualmente confusos, e eram eles que tinham o Dr. na frente de seus nomes.
Rhage tossiu a maldita bala pra fora.
Direto na mão dela.
Por último, um grande arquejo, algo veio voando de sua boca e ela pegou o pedaço pontiagudo de chumbo por reflexo... Quando Rhage abruptamente começou a respirar
profundamente, inalando facilmente como se não tivesse nada de errado com ele.
Girando a coisa sobre a palma, ela começou a rir.
Não pôde evitar.
Segurando a bala entre o polegar e o indicador, ela a ergueu para os Irmãos, os médicos e os guerreiros, por que Rhage ainda estava cego. E então montou nas pernas
estendidas de seu companheiro e tomou seu rosto entre as mãos.
— Mary...? – Ele disse.
— Estou bem aqui, – Ela alisou o cabelo dele para trás. — E você também.
Instantaneamente ele se acalmou ainda mais, um sorriso repuxando sua boca.
— Minha Mary?
— Sim... Estou bem aqui.
E então, querido Senhor, ela estava chorando tanto que se tornou tão cega quanto ele estava. Mas isso não importava.
De alguma forma, a besta tinha feito o trabalho e...
— Mary, eu...
— Eu sei, eu sei, – Ela o beijou. — Eu te amo.
— Eu também, mas vou vomitar.
E com isso, ele a tirou suavemente para fora da linha de fogo, virou-se para o lado e vomitou tudo sobre os shitkickers de Vishous.
Capítulo OITO
Era uma maneira e tanto de voltar dos mortos.
Enquanto Rhage jogava seus biscoitos por toda parte, seu cérebro era nada mais que ovos mexidos...
Okay, não era uma boa ideia pensar em ovos de qualquer forma.
Uma segunda rodada das evacuações abdominais tomaram seu corpo, contorcendo-o da cabeça aos pés, e enquanto ele deixava seu estômago falar, ouviu a voz seca de V
ao longe.
— Não é minha noite, – O Irmão resmungou. — Não é minha noite com os vômitos.
Huh? Rhage pensou antes de deixar pra lá. Tudo que realmente se importava, fora o fato de que ele agora podia respirar e falar de novo, era sua Mary. Esticando seu
braço pra fora, procurou contato com ela de novo... E ela pegou sua palma na mesma hora, entrelaçando com a dele, segurando, isso o acalmava e ao mesmo tempo lhe
dava energia.
No instante que a conexão foi feita, sua confusão começou a dissipar.
Não, isso não estava exatamente certo. Ele não tinha ideia de como conseguiu ir de estar parado na porta do Fade, encarando a escolha que estava atônito de estar
confrontando mesmo estando ciente de que estava morrendo... Para de alguma forma estar sendo jogado de volta no seu próprio corpo e escutando claro como o dia a
voz mais perfeita da sua Mary, sem a interferência estática do medo e dor.
Nenhum ponto desse mistério foi esclarecido... Mas simplesmente estava cagando pra isso. Contanto que sua Mary estivesse com ele? O resto era merda que ele...
— Machucado? – Ele falou de repente. — Alguém está machucado?
A Besta teria...
— Todos estão bem. – Ela disse a ele.
— Me desculpe por estar doente. – Deus, o visual pós-festa do blackout era horrível, mas aguentaria isso no lugar de uma soneca na terra em qualquer dia e duas vezes
no domingo, como os humanos diriam. — Eu sinto muito...
— Rhage, precisamos colocar você dentro do RV. E não, não vou deixar você. Jane vai só verificar seus sinais vitais e então nós vamos dar o fora daqui. Não é seguro.
Oh, certo. Eles estavam no campus, no campo de batalha, sem dúvida alvos fáceis.
Com uma explosão de memória, tudo voltou pra ele. A discussão com V... A corrida no campo...
A bala no seu coração.
Com sua mão livre bateu no peito, tateando para encontrar o furo, procurando sangue... E descobrindo que apesar de ter o torso molhado e pegajoso... Não havia nenhum
ferimento discernível.
Só uma parte estranha naquele centro que parecia incandescente com o calor de uma fogueira. E foi aí que a comichão começou. Iniciando com a área sobre seu coração,
mudou ao redor em um remendo sólido, traçando sobre suas costelas, fazendo cócegas debaixo do seu braço, movendo até o centro das suas costas.
Era a Besta voltando para sua posição. Mas por quê?
É, arquive isso no final de uma fila bem longa de hã — o quê?
— Mary, – Ele falou em sua cegueira. — Mary...?
— Está tudo bem, vamos só sair daqui juntos, e quando estivermos a salvo, vou explicar tudo... Ou ao menos contar o que sei.
Pela próxima hora, sua shellan cumpriu sua promessa... Mas quando que ela desapontou alguém? Ela ficou ao lado dele a cada centímetro do caminho, desde o momento
em que foi colocado na maca e ganhando um passeio atribulado na RV do Manny... Da evacuação difícil no gramado crescido do campus até o caminho macio das ruas pavimentadas
da avenida... Do pare-e-continue do sistema de segurança do Centro de Treinamento da Irmandade... Até finalmente a chegada no quarto de recuperação da clínica.
A viagem o exauriu... Mas também, passou a maior parte do tempo vomitando partes de lessers e engasgando no gosto nauseante do sangue negro deles. E era engraçado:
normalmente passava por essa parte puto da vida e pronto para o sofrimento acabar logo. Nessa noite? Estava tão grato de estar vivo que não se importava de ter a
pior indigestão/dor de barriga/infecção estomacal do mundo acontecendo.
Você vai morrer hoje à noite, porra!
Maldição, Vishous estava sempre certo. Exceto que Rhage tinha de alguma forma derrotado a previsão e voltado do Fade: por alguma razão, por algum milagre, estava
de volta... E não achava que era por que a Virgem Escriba tinha feito um favor pra ele. Ela já tinha feito um depósito digno de prêmio da loteria na sua conta existencial
quando salvou sua Mary e, além disso, pelos últimos dois anos, a Mãe da Raça esteve sem contato como aquele parente estranho que você agradece por se manter longe.
Então seu irmão estava errado? A resposta curta para isso é sim, considerando que Rhage estava nesse momento deitado na cama de hospital ao invés de alguma nuvem
no céu.
Mas por quê?
— Aqui, – Sua Mary disse. — Eu tenho o que você precisa.
Verdade em tantos níveis, pensou enquanto virou sua cabeça em direção ao som da voz dela. Quando uma série de bolhas fizeram cócegas no seu nariz, ele estremeceu
de alívio.
Plop-plop, fizz-fizz, porra, sim.
— Obrigado, – Ele balbuciou, por que estava com medo que se tentasse enunciar demais as palavras ia começar a vomitar de novo.
Ele bebeu tudo que estava no copo e deitou de novo contra os travesseiros... E então o som de Mary colocando o copo vazio de volta e a sensação do peso dela sobre
o colchão o fez lacrimejar por alguma razão estúpida.
— Eu vi o Fade, – Falou quietamente.
— Você viu? – Ela pareceu estremecer, a cama transmitiu o sutil tremor de onde estava sentada. —É realmente assustador escutar isso. Como foi?
Ele franziu a testa.
— Branco. Tudo era branco, mas não tinha nenhuma fonte de luz. Foi esquisito.
— Eu teria encontrado você, você sabe. – Ela respirou fundo. — Se você não tivesse voltado, eu teria... Não sei como, mas teria encontrado você.
O ar que ele soltou durou o tempo de uma vida pra ele.
— Deus, eu precisava escutar isso.
— Você pensou o contrário?
— Não. Bem, exceto por me perguntar se era possível. Você deve ter pensado a mesma coisa ou não teria se esforçado tanto para me salvar.
Houve um momento de silêncio.
— Sim, – Ela suspirou. — Eu queria salvar você.
— E estou contente que funcionou. – Mesmo, ele estava. Honestamente. — Eu, ah...
— Você sabe que amo muito você, Rhage.
— Por que isso soa como uma confissão? – Ele forçou uma risada. — Só estou brincando.
— Eu realmente odeio a morte.
Okay, alguma coisa estava acontecendo. E não era só a respeito dele. Ela soava estranhamente... Derrotada, o que não era o sentimento de uma fêmea que tinha arrastado
o traseiro triste do seu hellren de volta da porta da morte. Tipo. Literalmente.
Rhage tateou ao seu redor tentando achar as mãos dela, e quando a segurou, elas tremeram.
— O que mais aconteceu hoje à noite? E não diga “nada”. Eu posso sentir sua emoção.
Mas não podia sentir o cheiro. Tinha muito cheiro de lesser no seu nariz e no seu sistema digestivo. Você quer falar sobre a porra da doença do refluxo gastresofágico?
— Não é tão importante quanto você, – Ela se virou para beijá-lo na boca. — Nada é tão importante quanto você.
Onde você está? Ele se perguntou. Minha Mary... Para onde você foi?
— Deus, eu estou cansado, – Ele falou no silêncio entre eles.
— Quer que eu te deixe sozinho para que consiga dormir?
— Não. – Rhage apertou as mãos dela e sentiu como se estivesse tentando prendê-la à ele. —Nunca.
Na quietude do quarto do hospital, Mary se pegou estudando o rosto de Rhage como se estivesse tentando tornar a memorizar os traços que conhecia tão bem e que estavam
marcados no seu cérebro. Mas então, ela não estava realmente se prendendo à toda aquela beleza ímpia. Estava procurando por alguma coragem dentro de si mesma. Ou
algo assim.
Você pensaria, levando em consideração a profissão dela, que seria melhor em momentos como aquele.
Conte a ele, pensou. Fale sobre Bitty e sua mãe, e o fato de ter feito merda no seu emprego e estar se sentindo como uma fracassada.
O problema era, toda aquela confissão tagarela orientada parecia tão egoísta considerando que ele tinha morrido uma hora atrás: era como encontrar alguém que teve
um acidente de carro feio e querer explicar para essa pessoa como sua noite foi ruim também, por que você conseguiu uma multa por excesso de velocidade e um pneu
furado.
— Eu teria absolutamente ido e encontrado você de alguma forma, – Enquanto repetia as palavras que já tinha dito, sabia que ele tinha acertado o prego na cabeça...
Por que sentia como se tivesse algo a confessar. — Mesmo, eu teria.
Ótimo, agora ela estava com náuseas.
Exceto, Deus, como podia dizer pra ele que lutou tanto para salvá-lo não por causa deles e sua relação, ou até mesmo pelos seus Irmãos e a tragédia que a perda dele
teria sido para todos, mas por causa de outra pessoa inteiramente diferente? Mesmo que esse alguém e todos os problemas dela fosse uma causa a se discutir? Mesmo
que essa terceira parte fosse uma criança recém órfã no mundo?
Só que parecia como uma traição aos dois e suas vidas juntos. Quando você encontra amor verdadeiro, quando recebe esse presente, você não toma decisões de vida ou
morte baseadas em problemas ou situações de ninguém mais. A menos que fosse seu filho, claro... E os céus sabiam que ela e Rhage nunca, jamais teriam qualquer criança.
Okay, ai. Aquilo doeu.
— O que dói? – Rhage perguntou.
— Desculpe. Nada. Sinto muito, só foi uma longa noite.
— Entendo o sentimento, – Ele soltou a mão dela e esticou seus enormes e largos braços, os músculos marcando sua pele e formando sombras afiadas. — Venha deitar.
Me deixe me sentir como um macho ao invés de um pedaço de carne, quero abraçar você.
— Você não precisa pedir duas vezes.
Esticando ao lado dele na cama, colocou sua cabeça no peito dele, bem sobre o esterno dele, e respirou fundo. Enquanto a sombria especiaria do aroma de vinculação
dele florescia no ar, ela fechou seus olhos e tentou dissipar toda a discriminação caótica que estava tropeçando e caindo dentro do seu crânio, palhaços de circo
que ela não achava graça nenhuma.
Felizmente, o contato com a pele de Rhage, seu calor do corpo, sua vital presença era como Valium sem os efeitos colaterais. Tensão lentamente deixou seu corpo e
aqueles bastardos com os narizes de borracha, as perucas baratas e os sapatos idiotas sumiram no plano de fundo.
Sem dúvida eles voltariam. Mas não podia se preocupar com isso agora.
— Está batendo tão forte de novo, – Ela murmurou. — Eu amo o som do seu coração.
Amava também a subida e descida estável do seu poderoso peitoral.
E quem diria... A visão de toda aquela pele macia e sem pelo sobre aqueles pesados músculos não era ruim também.
— Você é tão grande. – Falou enquanto esticava o braço e nem conseguiu circular o torso dele.
A risada que reverberou através dele foi um pouco forçada. Mas ele deu continuidade a ela.
— É? Me conte como eu sou grande.
— Você é muito, muito grande.
— Só meu peitoral? Ou está pensando em... Outros lugares?
Ela conhecia aquele tom muito bem... Estava inteiramente ciente de onde seu companheiro tinha ido com a cabeça – e certa o bastante, quando olhou ainda mais pra
baixo do seu corpo coberto pelo lençol, cada centímetro dele estava claramente ainda funcional, indiferente da experiência de quase morte.
Particularmente um certo trinta centímetros. Mais ou menos.
Seus olhos foram em direção à porta e desejou que a coisa estivesse trancada. Havia tantas pessoas da equipe médica por ali – okay, só três. Mas quando você estava
querendo um pouco de privacidade, eram três a mais do que se queria.
Quando Rhage girou os quadris, aquele enrijecimento debaixo dos lençóis acertou um ponto dela que o fez morder o lábio inferior, e Mary sentiu seu corpo inteiro
responder com uma onda de calor. Deus, odiava a estranha distância que os tinha separado, aquela sutil desconexão que sentia a um tempo agora: de alguma forma, mesmo
que o amor deles não tivesse diminuído, eles pareciam ter perdido o toque um com o outro... Apesar do fato deles dizerem os seus Eu Amo Você todas as vezes certas
e dormirem na mesma cama, e não se imaginarem com mais ninguém.
Mas pensando bem, quando foi a última vez que tiraram a noite de folga, qualquer um dos dois?
Rhage esteve ocupado com a guerra e os ataques contra Wrath e seu trono – e desde que Bitty e sua mãe chegaram ao Lugar Seguro, Mary teve uma preocupação profissional
que não a deixou descansar. Diabos, a preocupação por Bitty e Annalye esteve com ela até mesmo quando estava dormindo.
Em fato, sonhava com a garotinha quase todos os dias ultimamente.
Tempo demais, Mary pensou. Faz tempo demais desde que ela e Rhage focaram neles mesmos de maneira apropriada.
Então, sim, mesmo que fosse um Band-Aid que sem dúvida nenhuma seria temporário, e apesar do lugar público em que eles estavam, e sim, sem nenhuma consideração pelo
fato de que Rhage estava morto mais cedo... Mary colocou sua mão debaixo dos lençóis e desceu sua palma lentamente pelo estômago definido do seu companheiro.
Rhage chiou e gemeu, sua pélvis girando de novo, seus braços esticando para que pudesse segurar nas barras da cabeceira da cama.
— Mary... Eu quero você...
— O prazer é meu.
A excitação dele era grossa e longa, e enquanto a circulava, a sensação aveludada dele e os sons que ele fazia no fundo da garganta e o modo que o aroma de vinculação
ascendia ainda mais era exatamente o tipo de proximidade que eles precisavam. Isso era só sobre eles; nada mais era bem-vindo – o emprego dela, o dele, as preocupações
nem o estresse dele. A esse respeito, sexo era como o melhor limpador do mundo, levando embora a poeira e as coisas cotidianas da Vida Normal que tinham entorpecido
a conexão deles, deixando o amor que tinham um pelo outro fresco e espumante como nunca.
— Monte em mim, – Rhage exigiu. — Fique nua e suba em mim.
Mary olhou pro equipamento medico que estava ao redor da cama dele e quis falar um palavrão. Muitos bipes na tela.
— E quanto às maquinas? As coisas estão ficando muito excitantes.
— Beeeeem, é por que eu estou começando realmente a ficar excitado.
— Se eles aumentarem muito...
Bem ao sinal, o monitor cardíaco disparou o alarme estridente. E assim que Mary arrancou sua mão de debaixo, Ehlena entrou correndo no quarto.
— Está tudo bem, – Rhage disse para a enfermeira com uma risada. — Estou bem. Confie em mim.
— Só vou checar as coisas... – Então Ehlena parou. E sorriu. — Oh.
— É, oh. – Rhage tinha aquela colossal cara de pau de se recostar como um leão que estava prestes a ser alimentado. Ele até piscou na direção geral de Mary. — Então
você acha que talvez pode me desconectar só um pouquinho?
Ehlena riu e sacudiu a cabeça enquanto arrumava a máquina.
— Sem chance. Não até você ter mais tempo estabilizado satisfatoriamente.
Rhage se inclinou até Mary e sussurrou.
— Eu quero você de volta satisfatoriamente. É isso o que eu preciso.
A enfermeira foi em direção à porta.
— Estou logo ali na sala de cirurgia se precisarem de mim. Estamos prestes a operar.
Rhage franziu a testa.
— Operar quem?
—Houve alguns feridos. Nada sério, não se preocupe. Comportem-se vocês dois, ok?
— Obrigada Ehlena, – Mary deu tchau para a outra fêmea. — Você é a melhor.
Quando a porta fechou, Rhage baixou o tom da voz.
— Me desconecte.
— O quê?
— Ou você faz ou eu faço, mas preciso de você, agora.
Quando Mary não se moveu, Rhage começou a tatear cegamente procurando as máquinas, batendo em alguns computadores na mesa que parecia custar mais do que uma casa.
— Rhage! – Mary começou a rir enquanto segurava as mãos dele. — Qual é...
E então ele a ergueu e colocou sobre os quadris dele, ajustando-a no topo da sua ereção. E sim, assim que o peso dela pareceu ser registrado, aquele bip-bip-bip
começou de novo.
— Você pode me conectar de volta assim que eu acabar, – Informou a ela. — E mesmo sendo um sacrifício, se quiser só me masturbar, concordo em esperar por você mais
tarde. Mas cheguei perto da morte hoje uma vez já, não faça seu hellren morrer de desejo.
Mary teve que sorrir pra ele.
— Você me mata.
—E você podia me tocar? Por favor?
Ela sacudiu a cabeça apesar do fato de que ele não podia vê-la.
— Você simplesmente não aceita não como resposta, não é?
— Quando se refere à você? – Rhage ficou sério, seus olhos azuis cor das Bahamas a encarando cegamente, sua linda face sombria. — Você é tanto minha força quanto
minha fraqueza, minha Mary. Então o que me diz? Quer completar minha noite? E devo te lembrar... Eu morri nos seus braços mais cedo.
Mary soltou uma gargalhada e enquanto caiu pra frente sobre ele, colocou sua cabeça contra o pescoço dele.
— Eu amo tanto você.
— Ahhhhhh, isso é o que eu gosto de ouvir, – Mãos grandes acariciaram as costas dela. — Então o que vai ser, minha Mary?
Capítulo NOVE
Assistir das sombras não era o curso normal para Xcor, filho de ninguém.
Como um guerreiro sem lei e deformado, de fato líder de um time de sociopatas renegados, estava mais acostumado à ação. Preferivelmente com sua foice. Ou faca. Arma.
Seus punhos. Presas.
Ele pode não ser descendente do Bloodletter, como uma vez acreditou, mas de fato foi criado pelo mais cruel guerreiro – e as brutas lições que recebeu no acampamento
de guerra por aquela mão de luvas com espinhos foram bem aprendidas.
Ataque antes de ser atacado era sua primeira e mais importante de todas as regras. E tinha se mantido como seu primário princípio de operação.
Havia vezes, no entanto, quando uma certa neutralidade de ação era requerida, muito mais como um instinto discutindo o contrário, e enquanto se resguardava atrás
de uma carcaça queimada de um carro na pior parte dos becos de Caldwell, ele reinava sobre si. À frente, parado ao lado de uma poça mal iluminada por lâmpadas de
postes de trinta anos de idade, três lessers estavam trocando itens; um par de mochilas sendo entregues por uma única bolsa de pano.
Pelo que havia observado ultimamente nas ruas, estava confiante de que uma carregava dinheiro, e a outra marcada de preto estava carregada de pó e uma variedade
de injetáveis.
Inspirando, discerniu os cheiros e os catalogou. O trio ainda não tinha desbotado para o branco, seus cabelos escuros e castanhos significavam que o recrutamento
deles era recente na Sociedade Lesser – e de fato, aquilo era tudo que se encontrava no Mundo Novo. Desde que ele e seu bando de bastardos fizeram a viagem através
do oceano do País Antigo, o único inimigo que eles encontraram eram esses recém-introduzidos, na maioria de variedade inferior.
Era lamentável. Mas onde faltava qualidade tinha uma abundância em quantidade.
E os caçadores encontraram um novo empreendimento nos negócios, não é mesmo? Esse trio em particular, entretanto, não iria muito longe em suas venturas de tráfico.
Assim que eles terminassem com a pequena troca de mãos, ele ia matá-los...
Três toques diferentes de celulares tocaram, todos abafados, todos registrados somente por causa da audição afiada de Xcor. As coisas se moveram rápido dali em diante.
Após cada um deles checar o que só podia ser uma mensagem de texto, eles discutiram por um mero momento; então se enfiaram em um veículo quadrado, o brilho prata
do exterior o qual estava cheio de fotos de tacos e pizza.
Como um analfabeto, ele não conseguia ler o que estava escrito.
Como um guerreiro, ele nunca deixaria que isso o fizesse deixar seu alvo fugir.
Quando o veículo passou por ele, Xcor fechou os olhos e desmaterializou para o topo do carro, encontrando um lugar onde conseguiu se acomodar graças à área mais
baixa atrás de um tipo de saída de ar. Não tinha nenhuma intenção de chamar reforços. Não importa aonde os lessers iriam ou quem encontrariam, se ele fosse dominado,
podia ir embora sem ninguém saber de sua presença.
Palavras mais verdadeiras nunca foram faladas, como ocorreu.
O fato de que o motorista prosseguiu na direção do Rio Hudson não foi uma surpresa. Dado o lugar onde eles estavam vendendo, podia-se facilmente pensar que havia
algum conflito, armado ou não, que precisava de reforços na área das pontes – ou talvez fosse algo com a Irmandade. Mas afinal, aquela rançosa selva de concreto
não era o destino deles. Uma rampa logo foi transposta e a avenida foi seguida com velocidade crescente, tanto que precisou se segurar protegendo seu corpo contra
o vento, enroscando seu braço ao redor da base da barra e segurando forte.
A viagem foi dura, mas não foi por causa do terreno não nivelado, foi mais pelo vento frio e a velocidade.
Não muito depois, no entanto, outra saída foi tomada e a velocidade diminuiu tanto que pôde erguer sua cabeça e identificar a seção suburbana que era o norte do
centro da cidade. Aquela área populosa não durou. Logo uma área mais rural se apresentou.
Não, era um parque ou algo assim.
Não... Era outra coisa.
Quando por fim uma esquerda foi tomada entrando em um tipo de propriedade, não podia dizer onde estava. Era um lote vazio, grama crescida... Ou melhor, era um prédio
abandonado. Uma escola? Sim, ele pensou. Mas o lugar não era mais para humanos.
O cheiro de lessers estava no ar a um nível tão penetrante que seu corpo respondeu às camadas de fedor, adrenalina bombando, os instintos aguçados e prontos para
lutar.
O primeiro dos caçadores mutilados se apresentou em uma dispersão através do gramado crescido, e enquanto o veículo continuou em frente, mais e mais apareceram.
Fechando os olhos, ele se acalmou e desmaterializou até o terraço de um prédio de cinco andares à frente de onde a caminhonete eventualmente parou. Pisando cuidadosamente
sobre os galhos caídos e montes de folhas flutuando nas frias poças de água, Xcor foi até a beirada. A verdadeira escala do que foi um ataque massivo à Sociedade
Lesser era evidente pelos acres de carnificina no centro do campus: uma grande faixa de grama e árvores pisoteadas em camadas com partes de corpos quase mortos,
semi-vivos, de caçadores, e uma onda de sangue negro e oleoso do Ômega.
Era como a própria representação do Dhund.
— A Irmandade. – Ele falou para o vento.
Essa era a única explicação. E enquanto considerava qual tinha sido a estratégia do ataque deles, sentiu inveja que ganharam o presente dessa batalha. Como queria
que tivesse sido ele e seus soldados...
Xcor se virou.
Algo estava se movendo no terraço atrás dele. Falando. Xingando.
Na escuridão e com extremo silêncio, retirou sua lâmina da bainha e se abaixou, apoiando nas coxas. Seguindo em frente no vento frio, seguiu os sons que estavam
na direção do vento e testou o ar. Era humano.
— ... filmagem! Não! Estou dizendo, é uma merda!
Xcor veio por detrás do rato sem rabo, e permaneceu sem ser notado enquanto o humano falava no celular.
— Estou em cima do terraço, peguei a merda em vídeo! Não, idiota, TJ e o Soz se mandaram, mas eu subi aqui... Era um dragão... O que? Não, Jo, o efeito do LSD passou
hoje de manhã... Não! Se é um flashback, por que acabei de postar no YouTube?
Xcor ergueu sua faca acima do ombro.
—Não! Estou falando sério, eu...
O humano calou a boca assim que Xcor o acertou na parte de trás da cabeça com o cabo da sua arma. E quando o corpo amoleceu e caiu para o lado, Xcor pegou o telefone
e colocou no seu ouvido.
A voz de uma mulher estava dizendo:
— Dougie? Dougie! O que aconteceu?
Xcor finalizou a conexão, colocou o telefone na sua jaqueta e se inclinou para pular do terraço. Os três lessers que ele havia acompanhado não foram longe com o
caminhão de comida. Eles pareciam embasbacados pelo que os cercava, incapazes de responder levando em conta a magnitude das perdas.
Melhor cuidar deles primeiro antes que eles caiam fora.
Pisando sobre o macho caído, pulou do prédio, desmaterializando enquanto caía, e tornou a se materializar no chão antes que sofresse o impacto da queda e acabasse
se matando.
O caçador o viu, e isso era exatamente o que queria.
Ia fazer a matança dele um pouco mais desafiadora.
Enquanto os três corriam de volta para a caminhonete, ele se materializou em cima do que estava na traseira, perfurando-o no peito e numa busca mandando-o de volta
para o Ômega em um milhão de flashes e um estouro! Próximo, ele se lançou para frente e agarrou o segundo pelos ombros, tirando o equilíbrio dele e cortando a garganta
antes de jogar de lado. O terceiro capturou no ar enquanto estava tentando se fechar dentro da caminhonete no banco do motorista.
— Não, camarada. – Rosnou enquanto sacudia a coisa e a derrubava. — Todos por um, um por todos.
O lesser caiu no chão, e antes que pudesse responder, Xcor o chutou na cara, quebrando a estrutura óssea, destruindo as feições, rendendo os olhos à nada mais que
poças de fluído.
Xcor olhou por cima do ombro. Seria improvável que a Irmandade deixasse uma bagunça daquelas para os humanos encontrarem. Mesmo que o Campus fosse abandonado, cedo
ou tarde, um Homo Sapiens qualquer da variedade jovem ia romper a unidade do terreno. Assim como aquele no terraço.
Algo devia ter acontecido ao curso da luta. Algum ferimento crítico talvez, que precisasse encurtar o tempo de limpeza...
Xcor nunca viu chegar. Nunca escutou nada.
Um momento, estava plenamente consciente de seus arredores.
No outro, alguém ou algo tinha feito com ele o mesmo que ele fez com o humano no terraço.
Nem teve tempo de um último pensamento, no tão decisivo que foi o golpe na sua cabeça.
Vishous abaixou seu braço devagar enquanto olhava de cima o enorme macho que tinha acabado de cair aos seus pés.
Então imediatamente pegou de volta sua arma, apontando-a com as duas mãos, girou ao redor de si mesmo.
— Onde vocês estão, garotos? – Disse baixinho. — Hein, filhos da puta? Onde estão?
Não havia chance de Xcor, cabeça do Bando de Bastardos, ter ido sozinho. Não tinha maneira nenhuma, porra.
V não tinha tanta sorte.
Exceto que nada lhe respondeu. Nenhum contra ataque. Ninguém correndo de um prédio ou de trás de uma árvore com uma arma atirando. Tudo que tinha lá eram partes
de lessers e torsos no chão, o vento gelado batendo na sua face, e muito silêncio.
O som do assobio à esquerda o avisou da posição de Butch. E então teve outro pela direita. Um terceiro acima.
V assoviou de volta e seus irmãos vieram em uma corrida sem pressa.
Ele manteve os olhos em Tohr, e assim que o guerreiro estava ao alcance, V apontou a arma direto em seu peito coberto de couro.
— Pare aí mesmo.
Tohr parou. Ergueu as palmas.
— Mas que inferno você está fazendo?
— Butch, vire-o. – V falou, indicando com a cabeça para o vampiro aos seus pés.
No instante em que Tohr viu quem era, sua mão abaixou e suas presas ficaram à mostra.
— Agora você entendeu. – V balbuciou. — Eu sei que você tem o direito de matá-lo, mas não pode. Estamos nos entendendo? Você não vai acabar com ele, certo?
Tohrment rosnou.
— Essa não é sua decisão para tomar, V. Vai se foder, esse fodido é meu...
— Eu vou atirar em você, porra. Estamos entendidos? Pare aí mesmo.
Aparentemente o Irmão não estava ciente de ter dado um passo à frente. Mas Butch e todo mundo entendeu na mesma hora – e o policial se aproximou de Tohr cautelosamente.
— A morte pode ser sua, – Butch disse. — Mas nós o levamos de volta com a gente primeiro. Falamos com o bastardo, pegamos a informação, então ele é seu, Tohr. Mais
ninguém vai fazer a finalização além de você.
Phury concordou com a cabeça.
— V está certo. Você o mata agora e nós perdemos o interrogatório. Seja lógico quanto a isso, Tohr.
Vishous olhou ao redor. Os quatro tinham retornado ao Campus com a ideia de apunhalar o máximo que podiam de volta para o Ômega e fazer a limpeza que conseguissem
– mas essa pequena descoberta mudou o objetivo principal.
— Butch, leve-o de volta no Hummer. Agora. – V sacudiu a cabeça em direção à Tohr. — E não, você não vai ir com ele como retaguarda.
— Você me entendeu errado. – Tohr disse sombriamente.
— Entendi? Está ciente de que tem uma adaga na mão? Não? – Enquanto seu irmão olhou pra baixo com alguma surpresa, V sacudiu a cabeça. — Não pense que sou quem está
com problemas pra pensar. Você fica com a gente, Tohr. O tira se encarrega disso.
— Estou ligando para Qhuinn e Blay, – Butch falou enquanto pegava o seu telefone. — Quero eles aqui comigo.
— E é por isso que eu amo você. – V balbuciou enquanto manteve os olhos em Tohr.
O Irmão não tinha abaixado a adaga ainda. E isso estava bem. Tão logo Xcor estivesse em seu caminho, V ia se certificar de que Tohr colocasse seu impulso assassino
em bom uso.
Um momento depois, Blay e Qhuinn se materializaram na cena, e ambos soltaram um palavrão quando viram a cara feia e com cicatriz que estava virada pra cima sem expressão
de um corpo desmaiado.
Butch fez um trabalho rápido algemando Xcor, e então ele e Qhuinn pegaram o bastardo pelos pés e pelas mãos, carregando-o como um saco de batatas em direção ao Hummer
à prova de balas completamente preto que estava estacionado atrás de umas das salas de aula. A máquina de cara feia era na verdade a segunda versão do SUV, o primeiro
foi roubado quando ele se descuidou na frente de uma farmácia no inverno passado.
V não moveu um músculo até que viu que a coisa tinha ido a caminho da propriedade pisando fundo no acelerador.
— Não é que eu não confio em você, – ele disse a Tohr. — Eu só não...
Vishous calou a boca. E ficou imóvel de novo.
— O que aconteceu? – Phury perguntou.
V não tinha ideia. E isso não era bom. A única coisa que tinha certeza era que o panorama tinha mudado abruptamente de uma forma sutil, mas inegável, uma onda carregando
e se estendendo sobre os corpos dos caçadores como se uma sombra tivesse sido jogada sobre o Campus.
— Merda, – Vishous chiou. — O Ômega está chegando!
Capítulo DEZ
A beleza estava nos ouvidos de quem vê.
Enquanto Rhage percorria com as mãos pra cima e pra baixo as coxas de Mary, ele podia estar cego, mas sabia exatamente o quanto sua shellan era linda quando ela
se sentou sobre seus quadris, equilibrou seu peso e colocou as palmas sobre seu peito.
— Então, como é que vai ser? – Ele perguntou enquanto mexia sua pélvis.
Com sua ereção acariciando o centro dela, mesmo através das cobertas e das calças que estava usando, a resposta dela foi rouca.
— Como eu posso algum dia, – Ela sussurrou — dizer não pra você?
Deus, essas palavras... E ainda mais do que isso, sua voz! Elas o fizeram pensar na primeira noite em que ele a conheceu. Foi aqui embaixo no Centro de Treinamento,
logo após a besta ter aparecido. Ele estava cego na ocasião, e andando pelo corredor à procura de um treino para distraí-lo de seu tédio e recuperação. Ela tinha
chegado às instalações com John Matthew e Bella, como intérprete para o menino que era mudo e precisava de alguém que soubesse linguagem de sinais para se comunicar.
No segundo em que falou com ele, sua voz o acorrentou de vez, como se cada sílaba que tinha pronunciado tivesse vindo com elos de aço. Ele soube naquele momento
que a teria. É claro que, na ocasião, não tinha planejado que ela seria o amor de sua vida. Mas sua vinculação pensou diferente e ele agradecia a Deus por isso.
Graças a Deus também que ela desejou tê-lo da mesma forma.
— Vem cá, minha Mary...
Ela se moveu para um lado.
— Mas estarei ligando os aparelhos novamente no instante em que terminar.
Rhage deu um sorriso tão largo que seus dentes da frente cintilaram.
— Por mim tudo bem, espere, o quê? Aonde você vai?
Mesmo com seus protestos, Mary não parou até desmontar por completo, e não apenas desligar a máquina.
— Precisamos fazer isso de forma parcialmente discreta, – O bip parou. — Estou falando sério sobre colocar isso de volta em você quando terminarmos.
Torcendo para o lado, ele estendeu a mão, em sua cegueira, agarrando sua cintura e puxando-a em sua direção.
— Venha aqui.
Todo pensamento sumiu quando sentiu a mão dela em cima das cobertas... Diretamente sobre seu pau.
O som que saiu dele fervilhando era em parte um Hmmmmmm e parte gemido. Seu toque, mesmo através das cobertas, foi o suficiente para disparar seu coração, ferver
seu sangue, superaquecer sua pele com um delicioso arrepio.
E deixá-lo a apenas um passo de um orgasmo.
O colchão da cama do hospital deslocou conforme ela se esticou ao lado dele, e a palma da sua mão se moveu sob o lençol, deslizando ohhhhhhh, tão pra baixo. Espalhando
suas pernas para lhe dar todo o acesso ao que ela queria, arqueou sua cabeça para trás e inclinou a coluna para o céu quando ela agarrou sua ereção. Gritou seu nome,
sentiu a besta surgindo também, o dragão se dirigindo à crista da onda de prazer junto com ele, enquanto ainda estava amarrado.
Como se tivesse aprendido boas maneiras.
— Minha Mary... – E então engasgou. — Oh sim.
Ela começou a acariciá-lo de forma macia e lenta, e foi estranho o modo como ela o afetava. O sexo o fazia se sentir tão poderoso, tão másculo, tão foda, que se
perguntou como sua carne conseguia conter o grande rugido da batida erótica... E ainda assim ela era o mestre de tudo dele, e a totalidade da sua reação também,
totalmente no controle, dominando-o de forma que o fazia totalmente fraco diante dela.
E diabos que isso era sexy.
— Você é tão bonito. — Ela disse numa voz rouca. — Oh, olhe para você, Rhage...
Ele adorou a ideia de que ela estava olhando para ele, vendo o que estava fazendo com ele, deleitando-se no controle que tinha sobre ele, literalmente. E se não
podia tocá-la, se tinha que ser um bom menino e manter suas mãos pra si mesmo, pelo menos ela poderia desfrutar do fato de trazê-lo de joelhos, sabendo que só ela
tinha a capacidade de fazer isso com ele.
Afinal, apesar de qualquer distância que tenha surgido entre eles ultimamente, nada tinha mudado para ele. Mary era a única mulher que queria, a única que via, sentia
seu cheiro e não podia esperar para estar com ela.
Isso foi bom para eles. Esta ligação sexual escaldante era importante para eles agora.
Especialmente agora que ela caiu em um ritmo bombeando seu pau, apertando a ponta. Mais rápido. Mais rápido ainda.
Até que ele estava ofegante, e a doce dor de antecipação atravessou seu corpo e sua cabeça girou.
Não estava mais cansado. Não.
— Mary, – Fez um grande esforço na cama arqueando, agarrando o colchão de um lado e a grade de proteção do outro. — Mary, espera...
— O que?
Quando ela parou, ele sacudiu a cabeça.
— Não, continue... Só quero que você faça algo pra mim.
— O que? – Ela disse enquanto corria a palma da mão pelo seu pau... E depois para baixo... E depois para cima...
Que porra ele tinha na cabeça... Ohhh, certo.
— Vem cá, vem mais perto, – Quando ela fez, ele sussurrou algo em seu ouvido.
O riso dela o fez sorrir também.
— Sério? – ela disse. — Isso é o que você quer?
— Sim. – arqueou seu corpo novamente, revirando os quadris para que a ereção fosse em direção ao seu aperto.
— Por favor? E vou implorar se você quiser... Adoro quando te imploro coisas.
Mary se deslocou mais para cima na cama do hospital e começou a trabalhar nele a sério novamente. Então inclinou perto da sua orelha...
... E com pronúncia perfeita disse:
— Inconstitucionalissimamente.
Deixando escapar uma maldição feito louco, Rhage gozou tão forte que viu estrelas, sua ereção latejando forte na mão dela, seu gozo fazendo as coisas muito, muito
bagunçadas debaixo daquelas cobertas. E o tempo todo, seu único pensamento era o quanto amava sua fêmea.
Como ele a amava demais.
Duas portas abaixo do orgasmo induzido por vocabulário do Rhage, Layla estava sentada em sua própria cama de hospital, uma bola gigante de fio vermelho em seu lado
direito, o cachecol mais comprido na história do mundo se esticando até o chão do outro lado. Entre os dois? Uma barriga que estava crescendo tão inchada dos bebês
gêmeos que ela carregava que se sentia como se alguém tivesse dobrado um colchão e amarrado a coisa com um cinto no seu torso.
Não que ela estivesse em posição de reclamar. Os dois eram saudáveis, e contanto que ela ficasse na cama, sabia que estava dando a eles a melhor chance de sobrevivência.
E certamente Qhuinn, o pai deles, e seu amado Blay, mimavam-na implacavelmente aqui embaixo, como se os dois preferissem ser aqueles a atravessar a permanência auto-imposta
para ela.
Eles eram machos tão maravilhosos.
Enquanto fazia outra virada no fim de outra fileira, sorriu quando se lembrou de Blay sugerindo que ela tricotasse alguma coisa, pois isso ajudou sua mãe Lírica
a conseguir atravessar seu próprio repouso na cama na gravidez dele. Isso provou ser um bom conselho – havia algo singularmente calmante no clic-clic das agulhas
e o fio macio entre seus dedos, e o progresso que podia medir de forma tangível. Porém, neste momento, teria que cortar a coisa em segmentos ou dar para uma girafa.
Afinal, assistir maratonas de Donas de Casa de verdade sem fazer alguma coisa, qualquer coisa produtiva, era positivamente insustentável. Não importa que Lassiter
dissesse o contrário.
Agora, Terapia de Casais com Dra. Jenn? Isso talvez fosse uma história diferente – embora, claro, ela não aprendeu coisas relevantes para sua própria relação. Por
que não tinha um macho para chamar de seu.
Não, ela tinha uma obsessão nada saudável que bateu de frente e queimou. O que era uma boa coisa – embora a perda do que nunca devia querer em primeiro lugar causou
dor inimaginável e injustificável.
Mas afinal, uma pessoa não se apaixonava pelo inimigo. E não só por que era uma Escolhida.
Era por que Xcor e seu Bando de Bastardos, declarou guerra para Wrath e a Irmandade.
Era por isso que...
— Pare com isso, – Ela murmurou enquanto fechava os olhos e parava as agulhas. — Só… Pare.
Realmente não pensou que pudesse aguentar mais um instante a culpa e o conhecimento de sua traição daqueles quem lhe eram mais queridos. Contudo, qual era o outro
curso? Sim, mentiram para ela e então foi coagida… Mas no fim, seu coração foi onde não devia ter ido.
E apesar de tudo, isso nunca foi devolvido a ela.
Quando ouviu outro som ali fora no corredor, deu uma olhada para sua porta e se forçou a se perder na distração. Houve um monte de atividade no centro de treinamento
hoje à noite – vozes, sons de passos, portas abrindo e fechando – e de alguma forma, isso tudo só a fez se sentir mais isolada em vez de menos. Mas aí, quando as
coisas ficavam quietas, havia menos sugestões para lembrá-la de tudo que estava perdendo.
Ainda assim, não estaria em qualquer outro lugar.
Colocando a mão em seu estômago arredondado, pensou que sim, a vida como ela conhecia ultimamente estava mais focada interiormente que exteriormente – e a qualquer
hora que ficasse inquieta, tudo que tinha que fazer era se lembrar de tudo que estava em jogo.
Ela pode nunca ter o amor que Qhuinn e Blay compartilhavam, mas pelo menos as crianças seriam dela e deles.
Isso teria que ser suficiente para sua vida, e seria. Não podia esperar para segurá-los, cuidar deles, vê-los crescer.
Assumindo que ela sobrevivesse ao parto. Assumindo que todos eles sobrevivessem.
Quando um alarme suave veio de seu telefone, ela saltou e apertou a tecla de silenciar o alarme.
— Já está na hora?
Sim, estava. Sua liberdade chegou. Trinta minutos para se esticar, caminhar e ir para um passeio.
Dentro dos confins do centro de treinamento, claro.
Empurrando o tricô em direção à base das agulhas, enfiou as pontas dentro do rolo, e esticou seus braços e pernas, esticou as pontas dos pés, flexionou seus dedos.
Então moveu seus pés pra fora da cama e colocou seu peso neles. As demandas da gravidez e toda sua inatividade forçada a levaram a uma certa fraqueza nos músculos,
uns que não curavam, não importa quanto se alimentasse de Qhuinn e Blay – então aprendeu a ser cautelosa sempre que se levantava.
Primeira parada foi o banheiro, algo que tinha permissão para usar prontamente, mas inevitavelmente adiava. Não havia necessidade de tomar banho, o que ela fez cerca
de doze horas atrás durante essa meia hora para estar de pé e passear.
Não, isto seria puramente para investigar.
O que estava acontecendo ali fora?
Enquanto encabeçava para a porta, alisou o cabelo, que parecia estar crescendo tão rápido quanto seu cachecol: as ondas loiras desciam passando dos seus quadris
agora, e supôs que devia cortá-lo em um certo ponto. Sua camisola de flanela era igualmente longa e larga, do tamanho de uma barraca florida, e seus chinelos faziam
um som de shhht-shhht-shhht acima do chão nu. Com suas costas já doloridas e um braço estendido para se estabilizar, sentiu como se fosse séculos mais velha do que
realmente era.
Empurrando a porta para sair, ela...
Imediatamente deu um passo atrás.
Tanto que sua bunda bateu no painel, fechando.
Do outro lado, dois machos estavam de pé, altos e orgulhosos, expressões idênticas de tensão marcando seus rostos.
E pelo idêntico, quis dizer exatamente isso.
Eles eram gêmeos.
Quando eles focaram nela, ambos se recolheram como se vissem um fantasma.
— Olhem pra onde olham, – Veio um grunhido desagradável.
Layla chicoteou sua cabeça em direção ao aviso.
— Zsadist?
O Irmão com o rosto com cicatrizes caminhou a passos largos para ela, colocando seu corpo, com todas suas armas, entre ela e os dois estranhos, embora nenhum dos
machos fizesse um movimento agressivo em direção a ela. Não surpreendentemente, foi um bloqueio muito bem sucedido. O tórax e os ombros do Zsadist eram tão largos
que ela não podia mais ver o par – e este era claramente o plano dele.
— Voltem lá pra dentro com ele, – Zsadist vociferou. — Antes que eu ponha vocês naquele quarto.
Não houve nenhum argumento, e abruptamente os cheiros estranhos dissiparam como se eles realmente desaparecessem do corredor.
— Eles não fizeram nada comigo, – Ela disse. — Realmente, acho que se eu fizesse Buu! eles poderiam muito bem sair correndo.
Z deu uma olhada por cima do ombro.
— Acho que você devia voltar ao seu quarto.
— Mas tenho permissão para esticar minhas pernas duas vezes por noite!
O Irmão suave, mas firmemente, tomou seu cotovelo e a escoltou de volta para sua cama.
— Não nesse instante. Vou dizer a você quando estiver okay. Nós temos algumas visitas inesperadas e não estamos correndo nenhum risco com você.
— Quem são eles?
— Ninguém com quem você precise se preocupar, e eles não vão ficar muito tempo, – Z a colocou de volta em posição. — Posso te trazer alguma comida?
Layla exalou.
— Não, obrigada.
— Algo para beber então?
— Estou bem. Mas obrigada.
Depois de se curvar profundamente o Irmão partiu, e meio que esperava ouvir os sons distantes da pistola dele varrendo aqueles dois soldados só por olhar para ela.
Mas era como as coisas funcionavam. Como uma fêmea grávida, era a coisa mais valiosa no planeta, não só para seu jovem pai, mas para cada único membro da Irmandade.
Era como viver com uma dúzia de irmãos mais velhos superprotetores e mandões.
Ou Irmãos, como era o caso.
E normalmente, poderia ter desafiado até Zsadist. Mas não reconheceu aqueles machos grandes, e Deus sabia que já entrou em bastantes problemas confraternizando com
lutadores que ela não conhecia – e eles tinham que ser soldados. Eram de constituição pesada e forte, e estavam usando coldres.
Embora vazios.
Então eles não eram inimigos, ela decidiu, ou não teriam mesmo permissão para estar no centro de treinamento. Mas eles não eram exatamente de confiança também.
Do nada, uma imagem do rosto duro do Xcor veio à sua mente – e a pontada de dor que a atravessou foi tão forte que os bebês mexeram em sua barriga como se sentissem
isto também.
— Pare com isto. – Ela sussurrou para si mesma.
Agarrando o controle remoto da TV, ela ligou a tela do outro lado do quarto. Certo. Ela ficaria aqui até que aqueles estranhos partissem. Então sairia e se sentaria
com o irmão do Qhuinn, Luchas, que estava em recuperação duas portas adiante e parecia esperar ansiosamente suas visitas regulares. Então talvez um bate-papo com
a Dra. Jane em sua escrivaninha, ou talvez Blay e Qhuinn voltassem de suas rondas até lá e eles caminhariam até as salas de aula.
Quem quer que sejam aqueles soldados, duvidava que os Irmãos os deixassem ficar mais tempo além do absolutamente necessário. Pelo menos pela reação do Zsadist.
E todas as armas das quais eles muito claramente foram despojados.
Capítulo ONZE
Sem tempo. Absolutamente nenhum maldito tempo.
Com uma erupção do mal permeando o ar, Vishous tirou sua luva forrada de chumbo e levantou sua mão incandescente. Fechando os olhos e se concentrando – por que sua
vida, e a vida de seus dois irmãos, de fato dependiam disso – ele liberou uma série de lufadas de impulso de si mesmo – exceto que o mhis se estendeu somente do
tamanho de um bolso sobre todo o campus panorâmico, uma pequena parte, não maior do que a distância de duas polegadas em frente ao seu rosto e duas polegadas atrás
dos corpos de Phury e Tohr.
Graças a Deus o Hummer está fora da propriedade.
— Ninguém se mexe, – V comandou quando uma barreira ondulante e irisdecente se formou em volta deles, parecido com bolhas de sabão de uma criança feita com detergente.
Ele não tinha nem ideia se isso iria funcionar, mas sabia que teria de acontecer – a atmosfera estava se tornando uma densa sombra de maldade. Inferno, mesmo com
o mhis no lugar, sua pele pinicava com um aviso para correeeeeeeeeeeeer!
E foi quando o Ômega em pessoa apareceu a cento e trinta metros à frente.
Falando sobre anticlímax. Na superfície, a figura de tinta transparente em suas roupas brancas alvejantes parecia intimidante como um peão de xadrez animado. Mas
isso fazendo uma avaliação visual. Internamente, cada célula que constituía seu corpo, cada neurônio que queimava em seu cérebro, todas as emoções que já teve ou
que teria começou a gritar como se estivesse sob um horrendo ataque mortal.
Atrás dele, um suave murmúrio se iniciou e V olhou de relance por cima do ombro. Phury tinha começado a rezar no Antigo Idioma.
— Shhh, – Vishous sussurrou.
Phury imediatamente engoliu a fala, mas seus lábios seguiram se movendo, continuando a oração. E sim, V pensou em sua mãe fazendo seu não-posso-nem-mesmo-estar-lá-em-acima
– e ficou tentado a dizer ao cara que ele estava perdendo seu tempo. Mas tanto faz. Não há razão para roubar a ilusão de seu irmão.
Depois, e se o mhis não funcionar? Eles três e o que eles oraram, ou o que não oraram, estavam indo para um ponto discutível diretamente fora do planeta.
O Ômega se virou lentamente avaliando sua “morte”, e V ficou tão tenso que correu o risco de cair pra frente como uma tábua. O olhar do mal não se demorou onde ele
e seus irmãos estavam parados, então sugeriu que o mhis estava funcionando – provavelmente pelo menos parcialmente, por que o irmão da Virgem Escriba estava muito
distraído pela devastação da sua Sociedade.
Merda, este é meu tio, V pensou sombriamente.
E então o Ômega passou oscilando, andando com seus próprios pés, sangue negro encharcando o gramado, do mesmo jeito que a mãe de V perambulava.
A chuva começou a cair do céu, as gotas frias batendo no cabelo e nariz de V, seus ombros, nas costas de suas mãos. Mesmo a coisa fazendo cócegas na sua pele, não
se moveu para afastar aquilo ou se abrigar – e francamente, sim, poderia ter feito sem se recordar exatamente de como sua ilusão de ótica estava inconsistente com
a realidade. Aquela chuva passou pela barreira?
Inferno, você poderia colocar um jornal sobre sua cúpula e ter uma proteção melhor contra a chuva.
Porra.
De tempos em tempos, Ômega parava para se curvar e pegar um braço, uma perna, uma cabeça. E jogava de volta onde quer que estivesse no gramado, como se estivesse
procurando por alguma coisa em específico. E então parou sem aviso.
Um gemido baixo soou fora do campus, o som entrando e se espalhando no vazio, morrendo nos edifícios sem ecoar.
E então Ômega estendeu suas palmas para a frente.
A porcaria de uma brisa bateu nas costas de V e jogou seus cabelos na cara e nos olhos, ondulando a frente da sua jaqueta também até o couro começar a agitar, e
teve que apertar a coisa contra seu corpo.
De repente, os restos do massacre, todos os pedaços mortos e manchados, liquidificou em uma sombra viscosa que colocou para dentro de si, tornando-se um maremoto
que quebrou dentro de seu mestre, sua casa, seu núcleo.
O Ômega absorveu tudo isso, reivindicando a parte de si que tinha dado aos seus induzidos durante a cerimônia de iniciação, chamando de volta à sua essência, reabsorvendo
tudo até que o campo de batalha estivesse limpo como estava antes do ataque ter sido travado, nada além de grama pisada e árvores derrubadas para mostrar o que a
Besta e a Irmandade fizeram.
Quando tudo estava acabado, Ômega parou no centro da praça da escola, olhando ao redor como se desse uma checada dupla no trabalho. E então, tão rápido quanto chegou,
a entidade desapareceu em si mesmo, um sutil flash foi só o que restou de sua presença – e até mesmo isso desapareceu um segundo depois.
— Esperamos, – V sibilou. — Vamos esperar.
Ele não estava dando por certo que o Ômega tinha realmente ido embora dali. O problema era que o amanhecer estava vindo... E sim, se o mhis não podia proteger os
três da chuva, também não iria proteger porcaria nenhuma da “sempre em frente” luz do sol.
Mas poderiam se permitir ficar mais um pouquinho. Só pro caso.
Melhor ser cauteloso do que descoberto. Depois, precisava de um momento para que seu testículo restante pudesse voltar para o seu lugar novamente.
Porra.
Capítulo DOZE
— Eu não acredito que isto seja necessário.
De volta ao centro de treinamento da Irmandade, Assail olhou de seu corpo para o humano de cabelos escuros que estava fechando o corte em sua panturrilha e tornozelo
com agulha e linha. Quando o homem não respondeu e nem moderou seus cuidados, Assail revirou os olhos.
— Eu disse...
— Sim, sim. – O cara enfiou a agulha entre a pele mais uma vez e puxou até que a linha preta fosse esticada. — Você deixou perfeitamente claro. A única coisa que
vou tornar a dizer é que a MRSA3 não dá a mínima se você é vampiro ou humano, e deixar uma ferida aberta de seis polegadas em sua perna é a definição da estupidez.
— Eu curo bastante rápido.
— Não tão rápido, amigo. E você pode parar de se contorcer? Eu me sinto como se estivesse trabalhando em um peixinho dourado na água.
Na verdade, ele não podia. Suas extremidades tinham ideias próprias no momento, e enquanto verificava o relógio de parede e calculava o pouco tempo que tinha antes
do amanhecer, o tremor tinha piorado...
A porta do quarto abriu e seus primos retornaram.
— Pensei que não quisessem assistir, – Assail murmurou. E de fato, Ehric, o da esquerda, foi cuidadoso em não olhar para o trabalho de reparação.
Embora o assassino proficiente que o homem era, seu estômago revolvia em náuseas nas questões clínicas, uma contradição que podia ser uma fonte de diversão, mas
não era no momento.
Na verdade, Assail não estava com disposição para qualquer tipo de leviandade. Não tinha consentido em ser trazido aqui para esta instalação de tratamento da Irmandade.
O que queria fazer era voltar para sua casa no Hudson e arranhar a coceira que estava rapidamente se tornando um rugido.
— Quando você terá terminado? – Perguntou ele.
— Vou radiografar seu ombro a seguir.
— Não há necessidade.
— De onde veio seu diploma médico?
Assail amaldiçoou e deitou-se horizontalmente sobre a maca. O foco acima dele, com suas luzes brilhantes e armação microscópica, era como algo saído de um filme
de ficção científica. E enquanto fechava os olhos, era impossível não se lembrar dele vindo aqui com sua Marisol logo depois que a livrou de Benloise... Deles dois
passando pelo extenso sistema de engatilhamentos direcionando ao subterrâneo e entrando nesta instalação estelar.
Porém tentou instruir sua mente para outro lugar. A destinação desse pensamento era simplesmente dolorosa demais para suportar.
— Vou ter de partir antes do amanhecer, – Revelou. — E quero nossas armas, telefones e outros artigos pessoais devolvidos a nós prontamente.
O médico não respondeu até ter aplicado seu último ponto e atado um nó um pouco apertado na base do tornozelo de Assail. — Importa-se de dizer a seus rapazes para
sair novamente por um minuto?
— Por quê?
Ehric falou. — Zsadist nos quer aqui. E não estou inclinado a discutir com o Irmão enquanto estou desarmado e desejoso de manter o suprimento de sangue da minha
cabeça.
O médico sentou-se em seu banco giratório e, pela primeira vez, Assail leu a costura no jaleco branco do humano: Dr. Manuel Manello, Cirurgião Chefe. Havia um adorno
e o nome de um sistema hospitalar abaixo da escrita cursiva preta.
— Os Irmãos o trouxeram pra cá de outras espécies para esta noite? – Perguntou Assail. — Como isso é possível?
O Dr. Manello abaixou o olhar para seu nome. — Jaleco velho. E velhos hábitos custam a morrer... Não eles.
Enquanto o humano encarava Assail no olho, Assail franziu o cenho.
— O que quer dizer?
— Você consente que eu fale abertamente na frente desses dois?
— Eles são meu sangue.
— Isso é um sim?
— Você humanos são tão estranhos.
— E você pode cortar esse tom superior, imbecil. Estou casado com uma de sua espécie, ok? E desculpe-me por pensar que você poderia não querer ser avaliado a respeito
do seu vício em drogas na frente da dupla dinâmica... Caso eles não sejam relacionados a você.
Assail abriu a boca. Fechou. Abriu novamente.
— Não sei do que está falando.
— Oh, sério? – O homem arrancou as luvas azuis brilhantes e colocou os cotovelos sobre os joelhos, inclinando-se. — Você está inquieto na minha mesa como se estivesse
revestido por colméias. Está suando frio, e não porque esteja com qualquer dor. Suas pupilas estão dilatadas. E tenho certeza que se eu te desse seu casaco de volta,
a primeira coisa que faria seria dar uma desculpa para ir ao banheiro e usar o resto da coca que estava no frasco, e que tirei do interior do bolso da frente. Como
estou indo? Lendo sua mente corretamente? Ou vai mentir como um filho da puta?
— Eu não tenho um problema com drogas.
— Uh-huh. Claro que não.
Enquanto o humano ficava de pé, Assail fez algumas análises ignorando a si mesmo... De maneira nenhuma iria olhar para seus primos: podia sentir seus olhares gêmeos
em cima dele bem mais que o bastante, muito mais que obrigado.
Pelo menos nenhum deles disse nada.
— Olha, não tenho nada a ver com isso, – O Dr. Manello foi até uma mesa de trabalho na qual um computador, algumas canetas e um bloco descansavam. Inclinando-se,
escreveu alguma coisa e rasgou a folha fixada da ponta, dobrando-a ao meio. — Aqui está meu número. Quando chegar ao fundo do poço, ligue pra mim e podemos te ajudar
na desintoxicação. Entretanto, esteja ciente de que o uso prolongado de cocaína leva a todos os tipos de coisas divertidas, como ataques de pânico, paranóia e até
desenvolver psicoses. Você já está na categoria da perda de peso, e como eu mencionei, está cheio de tiques da porra. Seu nariz também fica escorrendo o tempo todo,
então tenho certeza que seu septo está desviado.
Assail olhou para o cesto de lixo ao lado dele e perguntou como todos aqueles Kleenex tinham terminado ali. Certamente, não poderia ter sido... Huh. Ele tinha um
chumaço de lenços na mão e não tinha conhecimento de ter pegado.
— Eu não sou viciado.
— Então tome isto e jogue fora, – O humano segurou o papel rasgado. — Queime isto. Enrole a coisa para cima e use-o para cheirar sua próxima dose. Como eu disse,
não me importo.
Quando Assail aceitou o que foi oferecido, o médico virou como se já tivesse esquecido toda a interação.
— Assim, quanto a esse raio-X? Os Irmãos dirão quando você poderá ir. A saída não é uma coisa voluntária, como eu tenho certeza que você compreendeu.
Assail fez um show de esmagar o papel e lançou-o no lixo com os lenços.
— Sim, – disse secamente. — Estou bastante ciente do quão precisamente involuntário tudo isso é.
Vishous dirigiu o food-truck de volta para o complexo. Como um morcego saído do inferno.
A coisa não foi construída pra velocidade, e manobrar esse trambolho lembrou-lhe de um velho avião tentando decolar numa pista de terra... Tudo vibrava, a tal ponto
que você juraria que estava simplesmente além da inteira desintegração molecular. Mas manteve o pé no acelerador... O que era o que se fazia quando tinha, ohhhhhhh,
cerca de 25 minutos de verdadeira escuridão à esquerda e pelo menos trinta e sete milhas de estrada pra cobrir. E você realmente não queria abandonar evidências
factíveis mortais ao lado da estrada.
Ainda assim, caso acontecesse o pior, ele e Tohr, por que V tinha insistido na carona de volta com ele, poderiam encostar e desmaterializar direto até os degraus
da mansão em um nanossegundo: Butch tinha acabado de mandar uma mensagem para reportar que retornou ao centro de treinamento em segurança com Xcor. Assim, ninguém
tinha que se preocupar com Tohr agindo por fora em alguma ideia brilhante que envolvesse sangue derramado e um saco coletor de cadáveres com o nome do Bastardo nele.
Pelo menos não durante os próximos dez minutos, em todo o caso.
— Você salvou nossas vidas quando o Ômega apareceu.
Vishous olhou de relance sobre o assento da frente. Tohrment esteve em silêncio na posição de atirador desde que eles dois dirigiram pra fora do campus cerca de
vinte minutos após o Ômega ter se levantado e desaparecido.
— E eu não ia matar Xcor.
— Está certo disso mesmo?
Quando Tohr não disse mais nada, V pensou: Siiiiiimmmm, com certeza você não estava indo assassinar o filho da puta.
— Não é como se eu não entendesse, – V murmurou enquanto um mergulho na estrada ajudou a empurrar a velocidade do food-truck ao norte a setenta milhas por hora.
— Todos nós queremos eliminá-lo.
— Eu realizei a traqueotomia em Wrath. Enquanto ele estava morrendo no meu colo depois que o fodido do Xcor atirou nele.
— Bem, e depois havia o fato de que você tinha o Lassiter dirigindo naquele momento, – V disse secamente. — Isso teria me assustado tanto.
— Estou falando fodidamente sério, V.
— Eu sei.
— Onde é que vamos colocá-lo?
V sacudiu a cabeça. — Depende de quanto tempo o Bastardo passou desmaiado.
— Quero trabalhar nele, Vishous.
— Veremos, meu irmão. Veremos.
Ou, em outras palavras: abso-fodida-lutamente não. A agressão rolaria fora dos poros do irmão, mesmo que Tohr tentasse dar uma de homem “calmo e sob controle”, era
como a maior bandeira vermelha que alguém já tivesse obtido.
Enquanto eles ficavam em silêncio, V colocou a mão dentro de sua jaqueta de couro e tirou um cigarro enrolado à mão. Acendendo a coisa com um isqueiro Bic vermelho,
exalou um pouco de fumaça e abriu a janela para que não enchesse seu irmão de fumaça.
Desejo de matar a parte, Tohr tinha levantado uma boa maldita pergunta... Onde diabos colocariam o prisioneiro? Havia uma abundância de salas de interrogatório no
centro de treinamento... O problema era, eles eram mais da variedade do estilo “mesa e cadeira”, o tipo de coisa que foi usado, por exemplo, para falar com Mary,
John Matthew e Bella quando eles chegaram a primeira vez à instalação.
Nada luxuoso, mas certamente civilizado.
Nada que fosse equipado para a tortura.
Ainda.
Ainda bem que sua vida amorosa fornecia-lhe acesso imediato a todos os tipos de correias, fivelas, correntes e grampos. E sim, provavelmente iria precisar de alguns
dos seus equipamentos maiores também.
— Vou cuidar disso. abso-fodida-lutamente disse ele.
— O que? Xcor?
— Sim. Cuido disso.
Tohr amaldiçoou suavemente como se estivesse enciumado. Mas então o irmão deu de ombros.
— Isso é uma coisa boa. Ele é perigoso... É como ter um serial killer em casa. Vamos querer alguns bloqueios seriamente fortes.
Trancas reforçadas não dariam nem pra metade, pensou V. Nem mesmo perto.
CONTINUA
Capítulo SEIS
Sopa de frango e estrelinhas da Campbell.
Enquanto Mary se debruçava sobre o fogão na cozinha principal do Lugar Seguro, ela mexia a sopa sem parar com uma colher de inox, observando as estrelas de massas
quase inchadas girando com os quadrados de carne branca e fatias de cenoura. A panela era a menor que tinham na casa. O caldo era amarelo, e o cheiro doce a lembrou
das doenças simples que teve quando era criança... Constipações, gripes, streptococos.
Coisas mais fáceis do que o câncer.
Ou a Esclerose Múltipla que tinha levado sua mãe.
A tigela em que despejou as coisas era creme com anéis concêntricos amarelos na borda. Ela pegou uma nova colher da gaveta e deu a volta no balcão em direção à grande
mesa de madeira.
— Aqui, – Ela disse para Bitty. — E vou te dar alguns Saltines.
Como se essa tragédia fosse algo que você pudesse superar em vinte e quatro horas, se fosse apenas hidratado suficiente?
Bem, pelo menos uma refeição simples como esta não era suscetível de sair pela culatra. E tão logo Bitty tivesse comido, Mary iria encontrar outro membro do pessoal
para atender a menina e, em seguida, obter algum aconselhamento para si mesma.
Quando voltou da despensa com o pacote de biscoitos, Bitty estava experimentando a sopa e Mary sentou-se do outro lado da mesa para não ficar em cima da menina.
A embalagem plástica se recusou a cooperar e Mary a abriu com força, derramando Saltines e grãos de sal sobre a madeira.
— Droga.
Ela comeu um... E então percebeu que não teve qualquer alimento há algum tempo e estava com fome também...
— Meu tio virá me buscar.
Mary congelou no meio da mastigação.
— O que você disse?
— Meu tio, – Bitty não olhou pra cima, apenas continuou movendo a colher através da sopa fumegante. — Ele virá me buscar. Vai me levar pra casa.
Mary retomou a coisa toda da mastigação, mas sua boca era como um misturador de cimento tentando processar cascalho.
— Sério?
— Sim.
Com mãos cuidadosas, Mary recolheu as bolachas espalhadas, empilhando-as em grupos de quatro.
— Eu não sabia que você tinha um tio.
— Eu tenho.
— Onde ele mora?
— Não em Caldwell, – Bitty tomou outra colher e colocou-a na boca. — Mas ele sabe como chegar aqui. Todo mundo sabe onde fica Caldwell.
— Ele é o Irmão de sua mahmen?
— Sim.
Mary fechou os olhos. Annalye nunca mencionou nenhum parente. Não tinha divulgado isso na ficha ou nominado um parente mais próximo. E a mulher teve conhecimento
de que sua condição estava deteriorando, então se houvesse um Irmão em algum lugar, certamente teria contado sobre ele para alguém e isso teria ido para seu arquivo.
— Gostaria que eu tentasse entrar em contato com ele pra você? – Perguntou Mary. — Sabe onde ele mora?
— Não, – Bitty olhou para sua sopa. — Mas ele virá me buscar. Isso é o que a família faz. Eu li naquele livro.
Mary tinha uma vaga lembrança de um livro infantil sobre os diferentes tipos de família: biológica, adotiva, avós, bem como aqueles que resultavam a partir de doadores
de esperma, óvulos doadores, fertilização in vitro. O ponto era, não importa como eles surgiram ou com que se parecessem, em cada caso, todo mundo tinha uma unidade,
com um monte de amor em torno deles.
— Bitty.
— Sim?
O celular de Mary começou a vibrar no bolso do casaco que ela ainda não tinha tirado e ficou tentada a deixar quem quer que fosse ir para o correio de voz. Exceto
pelo que os Irmãos estavam fazendo esta noite com aquele ataque enorme?
Quando tirou seu celular pra fora e viu quem era, pensou, oh Deus.
— Butch? Olá?
Houve interferência na conexão. Vento? Vozes?
— Olá. – Ela disse mais alto.
— ... Indo pegar você.
— O quê? – Ela levantou-se da cadeira. — O que você está dizendo?
— Fritz, – O Irmão gritou. — Indo pegar você! Nós precisamos de você aqui fora!
Ela amaldiçoou.
— Quanto é ruim?
— Fora de controle.
— Merda. – Ela suspirou. — Eu vou sair rápido. Poupar tempo.
Houve uma série de estouros, alguns xingamentos e depois então distorção, como se Butch estivesse correndo.
— ... Escreva a localização. Rápido!
Quando a ligação foi cortada, ela olhou para a menina e tentou não soar tão em pânico quanto estava.
— Bitty, eu sinto muito. Tenho que ir.
Aqueles olhos castanhos claros levantaram para os dela.
— O que há de errado?
— Nada. Eu só... Vou trazer Rhym pra você. Ela vai sentar aqui e talvez vocês duas possam ter uma sobremesa?
— Estou bem. Estou indo para cima e embalar minhas coisas, então estou pronta para meu tio.
Mary sacudiu a cabeça.
— Bitty, antes de fazer isso, não seria melhor que você e eu devêssemos tentar encontrá-lo primeiro?
— Está tudo bem. Ele sabe sobre mim.
Estabilizando a respiração. Por muitos motivos.
— Vou passar mais tarde e ver como você está indo.
— Obrigada pela sopa.
Quando a menina voltou a comer, ela não pareceu se importar com quem estava em torno dela ou não, como de costume.
E foi com uma dor de cabeça martelando que Mary foi numa rápida busca da supervisora de admissão, que estava fazendo trabalho dobrado por que uma das outras assistentes
sociais estava fora em licença maternidade. Depois de explicar a Rhym tudo o que tinha acontecido, Mary decolou em uma corrida deixando a casa e saltou para o Volvo.
A antiga Escola Brownswick para meninas ficava a cerca de dez minutos de carro. Ela fez isso em sete, disparando pelas estradas, esquivando-se em torno dos desenvolvimentos
suburbanos, passando rapidamente pelos sinais amarelos e vermelhos. O SUV não foi construído para esse tipo de treinamento, o caixão quadrado, pesado, balançando
pra lá e pra cá, mas não se importava. E merda, parecia que ela nunca chegaria ao limite do campus abandonado.
Pegando seu telefone, desacelerou e olhou suas mensagens de texto.
Lendo em voz alta, ela falou:
— Contorne os portões principais... Dê a volta... Merda!
Algo disparou para a rua, a figura movendo-se como uma boneca de trapo e tropeçando diretamente na frente do seu carro. Pisando nos freios, ela atingiu o homem...
Não, era um lesser: o sangue que salpicou pelo pára-brisa era negro como tinta e a coisa decolou mais uma vez, embora um de seus pés parecesse quebrado.
Com o coração acelerado, engoliu em seco e socou o acelerador novamente, com medo de que houvesse outros por trás dele, mas ainda mais aterrorizada por tudo o que
estava acontecendo com Rhage. Reverificando seu celular, ela seguiu as direções rodeando os fundos da escola para a rua de mão única que a levou para dentro da bagunça
desgrenhada de uma paisagem.
Bem quando se perguntava onde diabos deveria ir a partir dali, a pergunta foi respondida.
Do outro lado do prado, a besta se destacava entre os prédios abandonados como algo saído de um filme do canal SyFy. Alto o suficiente para alcançar os telhados,
grande o suficiente para deixar anão mesmo um dormitório, como um tigre brincando com uma refeição, a coisa estava em modo de ataque total.
Arrancando o telhado de um galpão com seus dentes.
Ela não se incomodou em desligar o motor.
Mary jogou o Volvo no parque e saltou pra fora. No fundo de sua mente, estava ciente de que o desigual pop-pop-pop no fundo eram balas voando, mas não se preocuparia
com isso. Sobre o que ela estava em pânico?
Quem diabos estava naquele prédio.
Enquanto corria na direção do dragão, colocou dois dedos na boca e soprou com força.
O assobio era estridente, alto como um grito... E não fez nenhuma impressão afinal, enquanto as telhas da estrutura de tijolos eram cuspidas para um lado.
O rugido que se seguiu foi algo que ela conhecia muito bem. O animal estava pronto para sua feliz refeição, e toda aquela coisa de arranca-vigas era sua maneira
de entrar no prédio.
Mary tropeçou em alguma coisa, oh, Deus, era um lesser que estava sem um braço... E continuou, assoprando outro assobio. E uma terceira vez...
A besta congelou, seus flancos bombeando dentro e fora, tons de roxo piscando na escuridão como se a coisa fosse iluminada por dentro por uma fonte elétrica.
O quarto assobio fez a cabeça da besta virar ao redor.
Retardando sua corrida, Mary levou as mãos à boca.
— Venha aqui! Venha, garoto!
Como se o animal fosse apenas o maior cão do mundo.
O dragão soltou um pff e depois soprou pelas narinas, o som algo entre um folguedo abafado por uma almofada e um motor a jato decolando.
— Venha cá você! – Ela disse. — Deixe isso. Não é seu.
A besta voltou a olhar para o que eram agora apenas quatro paredes de tijolos e não muito mais, e um grunhido ondulado saiu dos lábios negros de dentes irregulares
que teria dado uma grande insegurança a um creme dental branco. Mas, como um pastor alemão chamado para sentar aos pés do treinador, a maldição de Rhage se afastou
de seu trabalho de desconstrução e pulou para ela.
Enquanto o dragão vinha através das ervas daninhas e espinheiros, seu grande peso sacudia o chão tão fortemente que Mary teve que estender os braços para se equilibrar.
Mas por incrível que pareça, a coisa estava sorrindo para ela, sua face horrível transformada por uma alegria que não teria acreditado se não tivesse visto isso
cada vez que estava perto do monstro.
Esticando as mãos para cima, ela cumprimentou aquela grande cabeça caída com palavras suaves de elogios, colocando a palma da mão em sua bochecha redonda, deixando-o
respirar o cheiro dela e ouvir sua voz. Em sua visão periférica, viu duas pessoas saírem do prédio destruído... Certificando-se que um deles tinha o corpo saudável
e correndo muito, e outro estava em cima de um ombro forte, obviamente ferido.
Ela não teve coragem de olhar diretamente para ver quem era. A melhor chance deles era sua ligação com a maldição... E era estranho. Tão feio como a coisa era, tão
terrível e mortal quanto poderia ser... Ela sentia um amor duradouro aquecer seu corpo. Seu Rhage estava lá, em algum lugar, preso sob as camadas de músculos e escamas
e percepção de terceiros, mas mais do que isso, ela adorava a besta também...
Os tiros vieram da direita e, por instinto, gritou e abaixou-se para cobrir a cabeça.
O dragão assumiu dali em diante, girando na direção dos atiradores, ao mesmo tempo conseguiu embrulhar sua cauda em torno de Mary e guardá-la contra seu flanco.
E então eles estavam em movimento. O passeio foi áspero, como um touro mecânico que sofre de surtos de energia, e ela se agarrou a um dos espinhos maiores por sua
querida vida.
Graças a Deus por aquela saliência óssea. Por que o que aconteceu em seguida envolveu um monte de Danças e Gritos.
Primeiro houve gritos. Terríveis, gritos de pesadelo que teve que tapar os ouvidos para bloquear; exceto que não se atreveu a largar com risco de ser jogada livre...
Pra cima e pra frente...
Um lesser, que estava vazando como uma peneira, saiu voando sobre o dorso da besta e sangue negro bateu em Mary como uma chuva de mau cheiro. A coisa aterrissou
num monte quebrado e o perseguidor que seguia um segundo lesser, que também estava sobre os ombros, bateu no primeiro como uma pedra.
Oh... Veja. Sem cabeça. Onde estava aquilo...
Algo que era vagamente redondo e tinha um rosto de um lado e uma cabeleira loira no outro lado através da grama crescida que tinha sido achatada sob as enormes patas
traseiras do dragão... Patas... Garras... Tanto faz.
A fera a mantinha junto para o passeio para o resto da diversão e jogos. Falando de uma refeição saudável. Em seu rastro, braços e pernas, mais cabeças – raramente
um torso, por que isso era provavelmente bom de comer – cobriam o chão. Felizmente nada parecia ser um Irmão ou um lutador, mas oh, Deus, o cheiro. Ela ia ter que
higienizar seu nariz por um mês depois disso.
Justo quando estava perdendo a noção do tempo, no exato momento em que não tinha certeza se podia aguentar por muito mais tempo, o ímpeto do animal diminuiu a velocidade
e parou. A sua cabeça grande balançou pra esquerda e pra direita. Seu corpo deu a volta. Mais uma busca.
A paisagem parecia vazia de qualquer coisa que se movesse, estático, prédios decadentes, árvores sem folhas e sombras escuras que permaneciam onde quer que olhasse.
Os Irmãos ainda tinham de estar no campus; de maneira nenhuma que iriam embora sem Rhage. Mas sem dúvida eles estavam assistindo o grande dragão por trás de uma
boa cobertura. E, assim com os lessers? O saldo do inimigo deve ter caído fora, sendo incapacitado ou ter sido comido.
O ataque maciço parecia ser mais...
Querido Deus, a carnificina deixada para trás. Como eles iam limpar isto? Deviam haver uns cem lessers no retorcido chão, mesmo se eles estivessem apenas em pedaços.
Mary acariciou a palma da mão na base grossa da cauda.
— Obrigado por me manter segura. Pode me descer agora.
A besta não estava tão confiante quanto ela estava e continuou a examinar a cena da batalha, os músculos dos seus ombros se contraindo, aquelas enormes patas traseiras
tensas e prontas para saltar. Nuvens de vapor do hálito quente saindo de suas narinas, queimando no ar frio da noite como parte do show de um mágico.
— Está tudo bem. – Disse ela, acariciando aquelas escamas.
Engraçado, teria pensado que as coisas seriam ásperas, mas eram suaves e flexíveis, um fino entrelaçamento de camadas que mudava com os movimentos do dragão e mostrava
todas as cores do arco-íris em cima de uma base roxa.
— Realmente está tudo bem.
Depois de um momento, a cauda da besta desenrolou e ela desceu para o chão.
Puxando seu casaco e suas roupas de volta no lugar, ela olhou ao redor.
Em seguida, colocou as mãos nos quadris e olhou para cima.
— Ok, garotão, você fez um ótimo trabalho. Obrigada... Estou orgulhosa de você. – Quando a coisa orgulhosa abaixou a cabeça, ela acariciou o focinho. — É hora de
ir, apesar de tudo. Você pode deixar o Rhage voltar?
Aquela grande cabeça foi lançada no ar, o sangue negro dos lessers que tinha consumido piscando como um revestimento oleoso abaixo da garganta e no peito. Estalando
as mandíbulas duas vezes, os dentes e presas travando com um som como dois SUVs batendo um no outro, grelha a grelha. O rugido que veio a seguir foi de protesto.
— Está tudo bem, – Ela murmurou enquanto permanecia em pé. — Eu te amo.
A besta abaixou o focinho e assoprou para fora o ar úmido.
E então bem desse jeito, seu corpo entrou em colapso, um castelo de areia caído com uma onda, uma estatueta de cera aquecida dissolvida em uma poça. Em seu lugar,
Rhage apareceu de cara no chão, sua enorme tatuagem de volta enrolando-se à sua volta, suas pernas nuas dobradas como se seu estômago já o incomodasse.
— Rhage, – Ela disse quando se agachou ao lado dele. — Você está de volta, meu amor.
Quando não houve resposta, nem mesmo um gemido de “vou vomitar”, ela franziu a testa.
— Rhage...?
Quando colocou a mão no ombro dele, a imagem tatuada do dragão em sua pele ganhou vida, deslocando-se de modo que sua cabeça estava sob o toque dela.
— Rhage? – Ela repetiu.
Por que ele não estava se movendo? Normalmente ficaria desorientado e com dor, mas sempre se virava para ela, assim como a tatuagem da besta fez, buscando cegamente
sua voz, seu toque, sua conexão.
— Rhage.
Alcançando a parte superior do braço, colocou toda sua força para puxá-lo mais plano contra o chão.
— Oh Deus…!
Havia sangue vermelho no peito. No meio de todas as manchas negras que a besta tinha consumido, havia uma fonte de sangue vermelho muito real, muito terrível e de
grande expansão no centro de seu torso.
— Socorro! – Ela gritou para a paisagem. — Socorro!
Os Irmãos já estavam vindo de todas as direções, abandonando seus esconderijos, correndo através do campo de batalha que estava cheio de lessers mutilados. E à direita
em seus calcanhares, como um farol de um Deus benevolente, vinha a unidade móvel e cirúrgica de Manny – o trailer-ambulância se dirigia para eles com o bom pé pesado
do médico no acelerador.
Mary avistou Vishous na multidão por causa de sua experiência em resgate médico.
— Você precisa ajudá-lo!
Aquela mancha vermelha... Estava à direita no esterno do Rhage.
E seu hellren tinha um coração forte, mas não era impenetrável.
O que tinha acontecido?
Capítulo SETE
Vishous foi o primeiro a chegar no Rhage enquanto o irmão ressurgia da carne do dragão... e merda, foi de pré-besta má a pós-maldição pior. O cara não estava se
movendo, não estava respondendo nem à sua shellan. Sua coloração era cinzenta como uma lápide de granito e havia um monte de sangue vermelho.
O que era apenas a ponta do iceberg. A verdadeira questão era quanto devia ter dentro daquela cavidade torácica.
— Ajude-me! – Mary disse enquanto colocava as mãos sobre a ferida e empurrava para baixo como se estivesse tentando conter o vazamento. — Ajude-o, oh, Deus, V...
O bom era que a unidade cirúrgica pisou nos freios e Jane tinha vindo com Manny, tendo se transferido através de seu próprio veículo. Assim que os cirurgiões bateram
as portas da frente do trailer, ambos os médicos atingiram o chão correndo com mochilas pretas cheias de equipamentos médicos.
— Eles estão aqui – V disse. Não que o par pudesse fazer muita coisa.
— Será que ele foi baleado? Eu acho que ele foi baleado. Oh Deus...
— Eu sei, venha aqui. Deixe-os olharem...
Mary sacudiu a cabeça e lutou contra ser puxada para trás.
— Ele está morrendo...
— Dê-lhes algum espaço para trabalhar. Vamos.
Porra, isso era culpa dele. Se não tivesse confrontado... Mas que porra. A visão tinha sido o que tinha que ser, e era exatamente isso aqui e agora: Rhage de costas
no chão nu, seu sangue por toda parte, V segurando Mary enquanto ela puxava e chorava.
— Um único tiro. – V anunciou. — Provável hemorragia cardíaca com tamponamento e derrame pleural.
Deus, queria que pudesse cobrir os ouvidos de Mary quando falou, mas como se ela já não soubesse o que era!
Os médicos não desperdiçaram um segundo, verificando sinais vitais enquanto Ehlena saltava para os fundos do trailer trazendo a maca com ela.
Vishous captou o olhar de sua companheira enquanto Jane escutava os sons cardíacos de Rhage, e quando ela balançou a cabeça ele soube, sem quaisquer outras palavras,
que tudo o que tinha adivinhado era verdade.
Merda.
— O que eles estão fazendo? – Mary balbuciou contra ele. — O que eles vão fazer?
V abraçou a fêmea mais apertado enquanto ela continuava a murmurar em seu ombro, a cabeça virando em direção a seu companheiro.
— Eles estão indo ajudá-lo, certo? Estão indo consertá-lo... Certo?
Jane e Manny começaram a falar em linguagem médica, e quando Vishous pegou a essência das palavras, fechou os olhos brevemente. Quando bateu as pálpebras novamente,
Manny estava de um lado de Rhage, colocando um dreno de tórax para drenar os fluídos em torno dos pulmões e Jane estava realizando uma pericardiocentese com uma
agulha que parecia tão longa quanto seu braço.
O que era um movimento de vai-com-tudo.
Normalmente este procedimento era feito com a orientação de ultrassom, mas ela não tinha escolha a não ser ir cegamente através do quinto ou sexto espaço intercostal
ao lado do coração.
Se ela errasse? Entrasse fundo demais?
Mary lutou em seus braços.
— O que eles estão fazendo...
— Ele está parando. – Manny vociferou.
— Rhage!
Ehlena estava lá com as pás, mas o quanto era bom em caso de uma enorme hemorragia? Inferno, mesmo se o dreno do tórax e a agulha fizesse o trabalho, nenhum dos
dois corrigiria o trauma cardíaco. A única chance de verdadeira sobrevivência era colocar o Irmão em uma máquina de circulação sanguínea (bypass) então Jane poderia
trabalhar sua magia e reparar seja qual for a ruptura ou perfuração sem sangue e sem movimento.
Abruptamente, tudo ficou em câmera lenta quando Rhage abriu os olhos, respirou fundo... E virou o rosto para Mary.
Seus lábios brancos começaram a se mover.
Mary empurrou contra o abraço de V e ele a soltou, permitindo que fosse até ele. Pelo amor de Deus, esta poderia ser a última chance da fêmea se comunicar com seu
companheiro. Fazer as pazes com ele. Resolver seus acertos para encontrá-lo do outro lado.
Vishous franziu a testa quando a imagem de sua mãe abandonada, deitada naquele estrado, voltou para ele.
É melhor você cumprir a porra da sua promessa, ele pensou para os céus. É melhor assumir a responsabilidade e tomar conta dos dois. Seria fodidamente melhor você
fazer certo a respeito daquela promessa, ele pensou para os céus. Seria melhor você levantar o homem e cuidar dos dois.
Mary caiu de joelhos ao lado da cabeça de Rhage e colocou a orelha em sua boca. O fato de que a equipe médica recuou sem dúvida foi perdido para ela, mas Vishous
sabia o que isso significava, e não era nada bom.
Que o ritmo do coração que estava sendo monitorado tão atentamente não estava ficando mais estável. Que a pressão arterial não estava ficando mais forte. Que a hemorragia
não estava parando. E o tubo e a agulha não foram longe suficiente.
V olhou para Butch, e quando o policial olhou para o outro lado do drama, V pensou sobre como os três formaram um vínculo tão apertado. A trindade, eles eram chamados.
Grudados como carrapatos e chatos como a merda, nas palavras de Tohr.
V olhou em volta. Os outros Irmãos estavam em circulo fechado, formando uma barreira de proteção e preocupação em torno de Rhage e Mary. No entanto, nenhum dos combatentes
tinha suas armas à mostra e, de tempos em tempos, um tiro soava quando eles atiravam nos lessers cujos corpos iam mostrando muita animação.
Quando Mary começou a falar com suave desespero, Vishous amaldiçoou novamente quando ficou claro para ele que, mesmo embora o casal tivesse um final que resultava
em ficar juntos, o resto deles estava perdendo Rhage e Mary. Maldição, era impossível imaginar a mansão sem eles.
Merda era supor não afundar com isso.
Risque isso, pensou, enquanto lembrava-se de sua visão. Não queria que acabasse assim. V moveu os olhos para sua companheira, e quando Jane apenas balançou a cabeça,
seu sangue gelou.
Jesus Cristo, não.
De repente uma imagem de Rhage na mesa de pebolim do Pit veio à mente. O Irmão não estava jogando no momento; estava em pé ao lado, comendo com vontade algum tipo
de burrito do Taco Bell. Estava comendo com as duas mãos, na verdade, com um chimichanga na outra mão. Alternando mordidas, o FDP consumindo cerca de quatro mil
calorias, com o sorvete de chocolate com menta crocante que ele tinha conseguido de sua geladeira, e metade de um bolo de chocolate que ele pegou de sobremesa antes
de vir da casa principal.
Ei V, o Irmão disse em um momento. Você algum dia vai raspar essa barbicha feia em torno de sua boca grande? Ou vai continuar parecendo um dos rejeitados da Affiliction2
como um serviço público para o que não fazer com uma gilete?
Irritante pra caralho.
E ele não daria sua bola restante para ter qualquer parte disso novamente. Mesmo se apenas como adeus.
O tempo era demasiado finito: não importa quanto dele você teve com alguém que amava, quando o fim chegava, não era o suficiente.
— Eu te amo. – Mary disse com voz quebrada. — Eu te amo…
Enquanto ela acariciava o cabelo loiro de Rhage da testa, sua pele estava tão fria e estranhamente seca. Sua boca manchada de sangue estava se movendo, mas ele não
tinha ar suficiente em seus pulmões para falar e, oh Deus, eles estavam cinza... Seus lábios estavam ficando...
Mary olhou para Manny. Dra. Jane. Ehlena. Então encontrou os olhos dos Irmãos. John Matthew. Blay e Qhuinn.
Por último olhou para Vishous... E ficou horrorizada com a luz distante em seus olhos.
Eles tinham desistido. Todos eles. Ninguém estava correndo para empurrá-la pra longe do caminho para que pudessem entubar seu companheiro, ou dar choque em seu coração
para voltar ao ritmo, ou rachar sua caixa torácica aberta e fazer o que fosse preciso para conseguir o que quer que estivesse errado voltar a funcionar em ordem.
Rhage arqueou com um gemido e tossiu um pouco mais de sangue. E quando ele começou a engasgar, ela conheceu uma nova definição de terror.
— Eu vou te encontrar, – Disse a ele. — No outro lado. Rhage! Está me ouvindo? Vou te encontrar no outro lado!
O ofegar e barulho, a dor em seu rosto, a agonia do grupo ao seu redor... Tudo tornou-se tão cristalino que doía os olhos e ouvidos, manchando seu cérebro para sempre.
E estranhamente, pensou em Bitty e sua mãe e o que tinha acontecido na clínica.
Oh merda, se ela deixasse o planeta... O que ia acontecer com a garota? Quem iria cuidar tanto como ela cuidava da agora órfã?
— Rhage... – Mary puxou seus ombros. — Rhage! Não! Espere, fique aqui...
Mais tarde ela tentaria trazer à tona por que a conexão sináptica foi feita quando o fez. Ela saberia como ela tinha, possivelmente, pensado em tudo... Teria suores
frios sobre o que teria acontecido em seguida e o que não teria acontecido em seguida... Se aquele raio não tivesse saído do nada quando o fez.
Às vezes escapar de um acidente por milímetros era quase tão traumático quanto o impacto.
Mas tudo isso veio depois.
No momento do falecimento de seu amado, no mesmo instante em que sentiu que ele havia deixado seu corpo para fazer a viagem para o Fade... De repente, e sem motivo
que pudesse pensar, ela vociferou:
— Role-o de lado. Façam isso!
Começou a puxá-lo sozinha, mas não deu em nada, ele era muito pesado e ela não podia conseguir um bom aperto em seu tronco maciço.
Olhando para cima, acenou para os Irmãos.
— Ajudem-me! Porra, me ajudem!
V e Butch caíram ao lado dela e viraram Rhage para seu lado direito. Arqueando em volta de seu companheiro, Mary recuou para o outro lado. As cores brilhantes da
tatuagem do dragão estavam desaparecendo, como se o brilho da imagem fossem um termômetro da saúde de Rhage. Focando novamente, colocou a mãos sobre a forma da besta,
Deus, ela odiava como a resposta foi lenta.
— Vem comigo, – Ela disse com urgência. — Preciso que você venha comigo.
Isso era loucura, pensou enquanto passava lentamente as palmas das mãos em torno do torso de Rhage, mas alguma coisa a guiava, algum tipo de vontade que certamente
não sentiu como dela própria. Porém não ia discutir como a imagem da besta seguia seu toque... E era estranho: não foi até ela fazer o caminho nas costelas que percebeu
o que estava fazendo.
Louca, pensou novamente. Completamente louca.
Vamos lá, não era como se o dragão tivesse sido treinado em medicina de emergência e muito menos cirurgia cardíaca.
Mas ela não parou.
— Ajude-me, – Ela disse engasgada para a besta. — Oh, por favor... Vamos lá, ajude-o, salve-o... Salve a si mesmo salvando-o...
Simplesmente não podia deixar Rhage ir. Não importava nestes últimos momentos que havia uma saída cósmica para os dois, que por causa do que a Virgem Escriba tinha
dado a ela, eles não tinham que se preocupar com algum tipo de separação. Ela ia tentar salvá-lo.
Trabalhando com ela, os Irmãos viraram Rhage deitado de costas novamente, e as lágrimas de Mary caíram sobre o peito nu de seu companheiro enquanto ela transferia
as mãos sobre o ilusoriamente pequeno buraco de cerca de uma polegada à direita de seu esterno.
Deus, sentia como se a ferida fosse do tamanho de uma sepultura.
— Apenas cure-o... De alguma forma, por favor... Por favor...
A tatuagem permaneceu onde ela parou.
— Cure isso…
O tempo parecia rastejar, e com os olhos lacrimejantes olhou para o peito de Rhage esperando por um milagre. Enquanto os minutos passavam e ela transitava para um
plano emocional miserável que era mais tenso que pleno pânico, muito menor do que totalmente deprimida, e tão vasta que era duas vezes o tamanho da galáxia, pensou
novamente no que Rhage dissera sobre as horas que ele passou ao lado da cama dela naquele hospital humano: sabendo que ela ia morrer, incapaz de fazer nada, perdido
embora soubesse o lugar de onde o corpo físico dele estava.
Era como se a gravidade não tivesse controle sobre mim, ele disse, e ainda assim estava me esmagando ao mesmo tempo. E então você iria fechar os olhos e meu coração
iria parar. Tudo o que eu conseguia pensar era que, em algum momento no futuro, você ia ter essa aparência para sempre. E a única coisa que eu sabia com certeza
era que eu nunca seria o mesmo, e não de uma boa maneira... Por que eu sentiria sua falta mais do que jamais iria importar com qualquer outra coisa na minha vida.
Mas então a Virgem Escriba tinha mudado tudo isso.
No entanto, aqui estava Mary... Lutando para mantê-lo vivo.
E o porquê... Quando ela realmente focou na questão... Parecia errado, tudo errado, e ainda assim ela não iria parar.
No início, a chama de calor não foi registrada no meio de todas as suas emoções. Havia muito na frente de sua mente e a mudança de temperatura foi muito sutil. O
calor logo se tornou impossível de ignorar, no entanto.
Piscando os olhos, franziu a testa para baixo, para suas mãos.
Não se atreveu a afastar as palmas das mãos para ver o que estava acontecendo embaixo.
— Rhage? Rhage... Você está conosco?
O calor rapidamente se tornou tão intenso que irradiava pelos braços dela e aquecia o ar que respirava quando se inclinou sobre seu companheiro. E então sentiu um
tranco, como se a besta estivesse rolando por perto...
Sem qualquer aviso, Rhage abriu a boca, lançando uma inspiração gigante e empurrou seu torso do chão, jogando-a de bunda no chão. Enquanto as mãos dela voavam, a
tatuagem foi revelada e estava…
A imagem do dragão tinha perdido seus contornos, suas cores num redemoinho em conjunto e ainda permaneciam distintas, como uma daquelas antigas coisas spin-art que
ela tinha feito nas feiras quando era pequena.
Ela não podia mais ver a ferida da bala.
Houve um suspiro coletivo, seguido por alguns sérios “mas que porra é essa?” e em seguida uma série de aleluias que foram proferidas com um sotaque de Boston.
— Mary? – Rhage engasgou confuso.
— Rhage!
Só que antes que ela pudesse alcançá-lo, ele começou a tossir em grandes espasmos, dobrando a cabeça para frente, apertando sua barriga distendida, sua mandíbula
se estendendo.
— O que há de errado com ele? – Mary disse quando chegou para frente, mesmo que isso não fosse como se pudesse fazer qualquer coisa para ajudar. Inferno, os médicos
pareciam igualmente confusos, e eram eles que tinham o Dr. na frente de seus nomes.
Rhage tossiu a maldita bala pra fora.
Direto na mão dela.
Por último, um grande arquejo, algo veio voando de sua boca e ela pegou o pedaço pontiagudo de chumbo por reflexo... Quando Rhage abruptamente começou a respirar
profundamente, inalando facilmente como se não tivesse nada de errado com ele.
Girando a coisa sobre a palma, ela começou a rir.
Não pôde evitar.
Segurando a bala entre o polegar e o indicador, ela a ergueu para os Irmãos, os médicos e os guerreiros, por que Rhage ainda estava cego. E então montou nas pernas
estendidas de seu companheiro e tomou seu rosto entre as mãos.
— Mary...? – Ele disse.
— Estou bem aqui, – Ela alisou o cabelo dele para trás. — E você também.
Instantaneamente ele se acalmou ainda mais, um sorriso repuxando sua boca.
— Minha Mary?
— Sim... Estou bem aqui.
E então, querido Senhor, ela estava chorando tanto que se tornou tão cega quanto ele estava. Mas isso não importava.
De alguma forma, a besta tinha feito o trabalho e...
— Mary, eu...
— Eu sei, eu sei, – Ela o beijou. — Eu te amo.
— Eu também, mas vou vomitar.
E com isso, ele a tirou suavemente para fora da linha de fogo, virou-se para o lado e vomitou tudo sobre os shitkickers de Vishous.
Capítulo OITO
Era uma maneira e tanto de voltar dos mortos.
Enquanto Rhage jogava seus biscoitos por toda parte, seu cérebro era nada mais que ovos mexidos...
Okay, não era uma boa ideia pensar em ovos de qualquer forma.
Uma segunda rodada das evacuações abdominais tomaram seu corpo, contorcendo-o da cabeça aos pés, e enquanto ele deixava seu estômago falar, ouviu a voz seca de V
ao longe.
— Não é minha noite, – O Irmão resmungou. — Não é minha noite com os vômitos.
Huh? Rhage pensou antes de deixar pra lá. Tudo que realmente se importava, fora o fato de que ele agora podia respirar e falar de novo, era sua Mary. Esticando seu
braço pra fora, procurou contato com ela de novo... E ela pegou sua palma na mesma hora, entrelaçando com a dele, segurando, isso o acalmava e ao mesmo tempo lhe
dava energia.
No instante que a conexão foi feita, sua confusão começou a dissipar.
Não, isso não estava exatamente certo. Ele não tinha ideia de como conseguiu ir de estar parado na porta do Fade, encarando a escolha que estava atônito de estar
confrontando mesmo estando ciente de que estava morrendo... Para de alguma forma estar sendo jogado de volta no seu próprio corpo e escutando claro como o dia a
voz mais perfeita da sua Mary, sem a interferência estática do medo e dor.
Nenhum ponto desse mistério foi esclarecido... Mas simplesmente estava cagando pra isso. Contanto que sua Mary estivesse com ele? O resto era merda que ele...
— Machucado? – Ele falou de repente. — Alguém está machucado?
A Besta teria...
— Todos estão bem. – Ela disse a ele.
— Me desculpe por estar doente. – Deus, o visual pós-festa do blackout era horrível, mas aguentaria isso no lugar de uma soneca na terra em qualquer dia e duas vezes
no domingo, como os humanos diriam. — Eu sinto muito...
— Rhage, precisamos colocar você dentro do RV. E não, não vou deixar você. Jane vai só verificar seus sinais vitais e então nós vamos dar o fora daqui. Não é seguro.
Oh, certo. Eles estavam no campus, no campo de batalha, sem dúvida alvos fáceis.
Com uma explosão de memória, tudo voltou pra ele. A discussão com V... A corrida no campo...
A bala no seu coração.
Com sua mão livre bateu no peito, tateando para encontrar o furo, procurando sangue... E descobrindo que apesar de ter o torso molhado e pegajoso... Não havia nenhum
ferimento discernível.
Só uma parte estranha naquele centro que parecia incandescente com o calor de uma fogueira. E foi aí que a comichão começou. Iniciando com a área sobre seu coração,
mudou ao redor em um remendo sólido, traçando sobre suas costelas, fazendo cócegas debaixo do seu braço, movendo até o centro das suas costas.
Era a Besta voltando para sua posição. Mas por quê?
É, arquive isso no final de uma fila bem longa de hã — o quê?
— Mary, – Ele falou em sua cegueira. — Mary...?
— Está tudo bem, vamos só sair daqui juntos, e quando estivermos a salvo, vou explicar tudo... Ou ao menos contar o que sei.
Pela próxima hora, sua shellan cumpriu sua promessa... Mas quando que ela desapontou alguém? Ela ficou ao lado dele a cada centímetro do caminho, desde o momento
em que foi colocado na maca e ganhando um passeio atribulado na RV do Manny... Da evacuação difícil no gramado crescido do campus até o caminho macio das ruas pavimentadas
da avenida... Do pare-e-continue do sistema de segurança do Centro de Treinamento da Irmandade... Até finalmente a chegada no quarto de recuperação da clínica.
A viagem o exauriu... Mas também, passou a maior parte do tempo vomitando partes de lessers e engasgando no gosto nauseante do sangue negro deles. E era engraçado:
normalmente passava por essa parte puto da vida e pronto para o sofrimento acabar logo. Nessa noite? Estava tão grato de estar vivo que não se importava de ter a
pior indigestão/dor de barriga/infecção estomacal do mundo acontecendo.
Você vai morrer hoje à noite, porra!
Maldição, Vishous estava sempre certo. Exceto que Rhage tinha de alguma forma derrotado a previsão e voltado do Fade: por alguma razão, por algum milagre, estava
de volta... E não achava que era por que a Virgem Escriba tinha feito um favor pra ele. Ela já tinha feito um depósito digno de prêmio da loteria na sua conta existencial
quando salvou sua Mary e, além disso, pelos últimos dois anos, a Mãe da Raça esteve sem contato como aquele parente estranho que você agradece por se manter longe.
Então seu irmão estava errado? A resposta curta para isso é sim, considerando que Rhage estava nesse momento deitado na cama de hospital ao invés de alguma nuvem
no céu.
Mas por quê?
— Aqui, – Sua Mary disse. — Eu tenho o que você precisa.
Verdade em tantos níveis, pensou enquanto virou sua cabeça em direção ao som da voz dela. Quando uma série de bolhas fizeram cócegas no seu nariz, ele estremeceu
de alívio.
Plop-plop, fizz-fizz, porra, sim.
— Obrigado, – Ele balbuciou, por que estava com medo que se tentasse enunciar demais as palavras ia começar a vomitar de novo.
Ele bebeu tudo que estava no copo e deitou de novo contra os travesseiros... E então o som de Mary colocando o copo vazio de volta e a sensação do peso dela sobre
o colchão o fez lacrimejar por alguma razão estúpida.
— Eu vi o Fade, – Falou quietamente.
— Você viu? – Ela pareceu estremecer, a cama transmitiu o sutil tremor de onde estava sentada. —É realmente assustador escutar isso. Como foi?
Ele franziu a testa.
— Branco. Tudo era branco, mas não tinha nenhuma fonte de luz. Foi esquisito.
— Eu teria encontrado você, você sabe. – Ela respirou fundo. — Se você não tivesse voltado, eu teria... Não sei como, mas teria encontrado você.
O ar que ele soltou durou o tempo de uma vida pra ele.
— Deus, eu precisava escutar isso.
— Você pensou o contrário?
— Não. Bem, exceto por me perguntar se era possível. Você deve ter pensado a mesma coisa ou não teria se esforçado tanto para me salvar.
Houve um momento de silêncio.
— Sim, – Ela suspirou. — Eu queria salvar você.
— E estou contente que funcionou. – Mesmo, ele estava. Honestamente. — Eu, ah...
— Você sabe que amo muito você, Rhage.
— Por que isso soa como uma confissão? – Ele forçou uma risada. — Só estou brincando.
— Eu realmente odeio a morte.
Okay, alguma coisa estava acontecendo. E não era só a respeito dele. Ela soava estranhamente... Derrotada, o que não era o sentimento de uma fêmea que tinha arrastado
o traseiro triste do seu hellren de volta da porta da morte. Tipo. Literalmente.
Rhage tateou ao seu redor tentando achar as mãos dela, e quando a segurou, elas tremeram.
— O que mais aconteceu hoje à noite? E não diga “nada”. Eu posso sentir sua emoção.
Mas não podia sentir o cheiro. Tinha muito cheiro de lesser no seu nariz e no seu sistema digestivo. Você quer falar sobre a porra da doença do refluxo gastresofágico?
— Não é tão importante quanto você, – Ela se virou para beijá-lo na boca. — Nada é tão importante quanto você.
Onde você está? Ele se perguntou. Minha Mary... Para onde você foi?
— Deus, eu estou cansado, – Ele falou no silêncio entre eles.
— Quer que eu te deixe sozinho para que consiga dormir?
— Não. – Rhage apertou as mãos dela e sentiu como se estivesse tentando prendê-la à ele. —Nunca.
Na quietude do quarto do hospital, Mary se pegou estudando o rosto de Rhage como se estivesse tentando tornar a memorizar os traços que conhecia tão bem e que estavam
marcados no seu cérebro. Mas então, ela não estava realmente se prendendo à toda aquela beleza ímpia. Estava procurando por alguma coragem dentro de si mesma. Ou
algo assim.
Você pensaria, levando em consideração a profissão dela, que seria melhor em momentos como aquele.
Conte a ele, pensou. Fale sobre Bitty e sua mãe, e o fato de ter feito merda no seu emprego e estar se sentindo como uma fracassada.
O problema era, toda aquela confissão tagarela orientada parecia tão egoísta considerando que ele tinha morrido uma hora atrás: era como encontrar alguém que teve
um acidente de carro feio e querer explicar para essa pessoa como sua noite foi ruim também, por que você conseguiu uma multa por excesso de velocidade e um pneu
furado.
— Eu teria absolutamente ido e encontrado você de alguma forma, – Enquanto repetia as palavras que já tinha dito, sabia que ele tinha acertado o prego na cabeça...
Por que sentia como se tivesse algo a confessar. — Mesmo, eu teria.
Ótimo, agora ela estava com náuseas.
Exceto, Deus, como podia dizer pra ele que lutou tanto para salvá-lo não por causa deles e sua relação, ou até mesmo pelos seus Irmãos e a tragédia que a perda dele
teria sido para todos, mas por causa de outra pessoa inteiramente diferente? Mesmo que esse alguém e todos os problemas dela fosse uma causa a se discutir? Mesmo
que essa terceira parte fosse uma criança recém órfã no mundo?
Só que parecia como uma traição aos dois e suas vidas juntos. Quando você encontra amor verdadeiro, quando recebe esse presente, você não toma decisões de vida ou
morte baseadas em problemas ou situações de ninguém mais. A menos que fosse seu filho, claro... E os céus sabiam que ela e Rhage nunca, jamais teriam qualquer criança.
Okay, ai. Aquilo doeu.
— O que dói? – Rhage perguntou.
— Desculpe. Nada. Sinto muito, só foi uma longa noite.
— Entendo o sentimento, – Ele soltou a mão dela e esticou seus enormes e largos braços, os músculos marcando sua pele e formando sombras afiadas. — Venha deitar.
Me deixe me sentir como um macho ao invés de um pedaço de carne, quero abraçar você.
— Você não precisa pedir duas vezes.
Esticando ao lado dele na cama, colocou sua cabeça no peito dele, bem sobre o esterno dele, e respirou fundo. Enquanto a sombria especiaria do aroma de vinculação
dele florescia no ar, ela fechou seus olhos e tentou dissipar toda a discriminação caótica que estava tropeçando e caindo dentro do seu crânio, palhaços de circo
que ela não achava graça nenhuma.
Felizmente, o contato com a pele de Rhage, seu calor do corpo, sua vital presença era como Valium sem os efeitos colaterais. Tensão lentamente deixou seu corpo e
aqueles bastardos com os narizes de borracha, as perucas baratas e os sapatos idiotas sumiram no plano de fundo.
Sem dúvida eles voltariam. Mas não podia se preocupar com isso agora.
— Está batendo tão forte de novo, – Ela murmurou. — Eu amo o som do seu coração.
Amava também a subida e descida estável do seu poderoso peitoral.
E quem diria... A visão de toda aquela pele macia e sem pelo sobre aqueles pesados músculos não era ruim também.
— Você é tão grande. – Falou enquanto esticava o braço e nem conseguiu circular o torso dele.
A risada que reverberou através dele foi um pouco forçada. Mas ele deu continuidade a ela.
— É? Me conte como eu sou grande.
— Você é muito, muito grande.
— Só meu peitoral? Ou está pensando em... Outros lugares?
Ela conhecia aquele tom muito bem... Estava inteiramente ciente de onde seu companheiro tinha ido com a cabeça – e certa o bastante, quando olhou ainda mais pra
baixo do seu corpo coberto pelo lençol, cada centímetro dele estava claramente ainda funcional, indiferente da experiência de quase morte.
Particularmente um certo trinta centímetros. Mais ou menos.
Seus olhos foram em direção à porta e desejou que a coisa estivesse trancada. Havia tantas pessoas da equipe médica por ali – okay, só três. Mas quando você estava
querendo um pouco de privacidade, eram três a mais do que se queria.
Quando Rhage girou os quadris, aquele enrijecimento debaixo dos lençóis acertou um ponto dela que o fez morder o lábio inferior, e Mary sentiu seu corpo inteiro
responder com uma onda de calor. Deus, odiava a estranha distância que os tinha separado, aquela sutil desconexão que sentia a um tempo agora: de alguma forma, mesmo
que o amor deles não tivesse diminuído, eles pareciam ter perdido o toque um com o outro... Apesar do fato deles dizerem os seus Eu Amo Você todas as vezes certas
e dormirem na mesma cama, e não se imaginarem com mais ninguém.
Mas pensando bem, quando foi a última vez que tiraram a noite de folga, qualquer um dos dois?
Rhage esteve ocupado com a guerra e os ataques contra Wrath e seu trono – e desde que Bitty e sua mãe chegaram ao Lugar Seguro, Mary teve uma preocupação profissional
que não a deixou descansar. Diabos, a preocupação por Bitty e Annalye esteve com ela até mesmo quando estava dormindo.
Em fato, sonhava com a garotinha quase todos os dias ultimamente.
Tempo demais, Mary pensou. Faz tempo demais desde que ela e Rhage focaram neles mesmos de maneira apropriada.
Então, sim, mesmo que fosse um Band-Aid que sem dúvida nenhuma seria temporário, e apesar do lugar público em que eles estavam, e sim, sem nenhuma consideração pelo
fato de que Rhage estava morto mais cedo... Mary colocou sua mão debaixo dos lençóis e desceu sua palma lentamente pelo estômago definido do seu companheiro.
Rhage chiou e gemeu, sua pélvis girando de novo, seus braços esticando para que pudesse segurar nas barras da cabeceira da cama.
— Mary... Eu quero você...
— O prazer é meu.
A excitação dele era grossa e longa, e enquanto a circulava, a sensação aveludada dele e os sons que ele fazia no fundo da garganta e o modo que o aroma de vinculação
ascendia ainda mais era exatamente o tipo de proximidade que eles precisavam. Isso era só sobre eles; nada mais era bem-vindo – o emprego dela, o dele, as preocupações
nem o estresse dele. A esse respeito, sexo era como o melhor limpador do mundo, levando embora a poeira e as coisas cotidianas da Vida Normal que tinham entorpecido
a conexão deles, deixando o amor que tinham um pelo outro fresco e espumante como nunca.
— Monte em mim, – Rhage exigiu. — Fique nua e suba em mim.
Mary olhou pro equipamento medico que estava ao redor da cama dele e quis falar um palavrão. Muitos bipes na tela.
— E quanto às maquinas? As coisas estão ficando muito excitantes.
— Beeeeem, é por que eu estou começando realmente a ficar excitado.
— Se eles aumentarem muito...
Bem ao sinal, o monitor cardíaco disparou o alarme estridente. E assim que Mary arrancou sua mão de debaixo, Ehlena entrou correndo no quarto.
— Está tudo bem, – Rhage disse para a enfermeira com uma risada. — Estou bem. Confie em mim.
— Só vou checar as coisas... – Então Ehlena parou. E sorriu. — Oh.
— É, oh. – Rhage tinha aquela colossal cara de pau de se recostar como um leão que estava prestes a ser alimentado. Ele até piscou na direção geral de Mary. — Então
você acha que talvez pode me desconectar só um pouquinho?
Ehlena riu e sacudiu a cabeça enquanto arrumava a máquina.
— Sem chance. Não até você ter mais tempo estabilizado satisfatoriamente.
Rhage se inclinou até Mary e sussurrou.
— Eu quero você de volta satisfatoriamente. É isso o que eu preciso.
A enfermeira foi em direção à porta.
— Estou logo ali na sala de cirurgia se precisarem de mim. Estamos prestes a operar.
Rhage franziu a testa.
— Operar quem?
—Houve alguns feridos. Nada sério, não se preocupe. Comportem-se vocês dois, ok?
— Obrigada Ehlena, – Mary deu tchau para a outra fêmea. — Você é a melhor.
Quando a porta fechou, Rhage baixou o tom da voz.
— Me desconecte.
— O quê?
— Ou você faz ou eu faço, mas preciso de você, agora.
Quando Mary não se moveu, Rhage começou a tatear cegamente procurando as máquinas, batendo em alguns computadores na mesa que parecia custar mais do que uma casa.
— Rhage! – Mary começou a rir enquanto segurava as mãos dele. — Qual é...
E então ele a ergueu e colocou sobre os quadris dele, ajustando-a no topo da sua ereção. E sim, assim que o peso dela pareceu ser registrado, aquele bip-bip-bip
começou de novo.
— Você pode me conectar de volta assim que eu acabar, – Informou a ela. — E mesmo sendo um sacrifício, se quiser só me masturbar, concordo em esperar por você mais
tarde. Mas cheguei perto da morte hoje uma vez já, não faça seu hellren morrer de desejo.
Mary teve que sorrir pra ele.
— Você me mata.
—E você podia me tocar? Por favor?
Ela sacudiu a cabeça apesar do fato de que ele não podia vê-la.
— Você simplesmente não aceita não como resposta, não é?
— Quando se refere à você? – Rhage ficou sério, seus olhos azuis cor das Bahamas a encarando cegamente, sua linda face sombria. — Você é tanto minha força quanto
minha fraqueza, minha Mary. Então o que me diz? Quer completar minha noite? E devo te lembrar... Eu morri nos seus braços mais cedo.
Mary soltou uma gargalhada e enquanto caiu pra frente sobre ele, colocou sua cabeça contra o pescoço dele.
— Eu amo tanto você.
— Ahhhhhh, isso é o que eu gosto de ouvir, – Mãos grandes acariciaram as costas dela. — Então o que vai ser, minha Mary?
Capítulo NOVE
Assistir das sombras não era o curso normal para Xcor, filho de ninguém.
Como um guerreiro sem lei e deformado, de fato líder de um time de sociopatas renegados, estava mais acostumado à ação. Preferivelmente com sua foice. Ou faca. Arma.
Seus punhos. Presas.
Ele pode não ser descendente do Bloodletter, como uma vez acreditou, mas de fato foi criado pelo mais cruel guerreiro – e as brutas lições que recebeu no acampamento
de guerra por aquela mão de luvas com espinhos foram bem aprendidas.
Ataque antes de ser atacado era sua primeira e mais importante de todas as regras. E tinha se mantido como seu primário princípio de operação.
Havia vezes, no entanto, quando uma certa neutralidade de ação era requerida, muito mais como um instinto discutindo o contrário, e enquanto se resguardava atrás
de uma carcaça queimada de um carro na pior parte dos becos de Caldwell, ele reinava sobre si. À frente, parado ao lado de uma poça mal iluminada por lâmpadas de
postes de trinta anos de idade, três lessers estavam trocando itens; um par de mochilas sendo entregues por uma única bolsa de pano.
Pelo que havia observado ultimamente nas ruas, estava confiante de que uma carregava dinheiro, e a outra marcada de preto estava carregada de pó e uma variedade
de injetáveis.
Inspirando, discerniu os cheiros e os catalogou. O trio ainda não tinha desbotado para o branco, seus cabelos escuros e castanhos significavam que o recrutamento
deles era recente na Sociedade Lesser – e de fato, aquilo era tudo que se encontrava no Mundo Novo. Desde que ele e seu bando de bastardos fizeram a viagem através
do oceano do País Antigo, o único inimigo que eles encontraram eram esses recém-introduzidos, na maioria de variedade inferior.
Era lamentável. Mas onde faltava qualidade tinha uma abundância em quantidade.
E os caçadores encontraram um novo empreendimento nos negócios, não é mesmo? Esse trio em particular, entretanto, não iria muito longe em suas venturas de tráfico.
Assim que eles terminassem com a pequena troca de mãos, ele ia matá-los...
Três toques diferentes de celulares tocaram, todos abafados, todos registrados somente por causa da audição afiada de Xcor. As coisas se moveram rápido dali em diante.
Após cada um deles checar o que só podia ser uma mensagem de texto, eles discutiram por um mero momento; então se enfiaram em um veículo quadrado, o brilho prata
do exterior o qual estava cheio de fotos de tacos e pizza.
Como um analfabeto, ele não conseguia ler o que estava escrito.
Como um guerreiro, ele nunca deixaria que isso o fizesse deixar seu alvo fugir.
Quando o veículo passou por ele, Xcor fechou os olhos e desmaterializou para o topo do carro, encontrando um lugar onde conseguiu se acomodar graças à área mais
baixa atrás de um tipo de saída de ar. Não tinha nenhuma intenção de chamar reforços. Não importa aonde os lessers iriam ou quem encontrariam, se ele fosse dominado,
podia ir embora sem ninguém saber de sua presença.
Palavras mais verdadeiras nunca foram faladas, como ocorreu.
O fato de que o motorista prosseguiu na direção do Rio Hudson não foi uma surpresa. Dado o lugar onde eles estavam vendendo, podia-se facilmente pensar que havia
algum conflito, armado ou não, que precisava de reforços na área das pontes – ou talvez fosse algo com a Irmandade. Mas afinal, aquela rançosa selva de concreto
não era o destino deles. Uma rampa logo foi transposta e a avenida foi seguida com velocidade crescente, tanto que precisou se segurar protegendo seu corpo contra
o vento, enroscando seu braço ao redor da base da barra e segurando forte.
A viagem foi dura, mas não foi por causa do terreno não nivelado, foi mais pelo vento frio e a velocidade.
Não muito depois, no entanto, outra saída foi tomada e a velocidade diminuiu tanto que pôde erguer sua cabeça e identificar a seção suburbana que era o norte do
centro da cidade. Aquela área populosa não durou. Logo uma área mais rural se apresentou.
Não, era um parque ou algo assim.
Não... Era outra coisa.
Quando por fim uma esquerda foi tomada entrando em um tipo de propriedade, não podia dizer onde estava. Era um lote vazio, grama crescida... Ou melhor, era um prédio
abandonado. Uma escola? Sim, ele pensou. Mas o lugar não era mais para humanos.
O cheiro de lessers estava no ar a um nível tão penetrante que seu corpo respondeu às camadas de fedor, adrenalina bombando, os instintos aguçados e prontos para
lutar.
O primeiro dos caçadores mutilados se apresentou em uma dispersão através do gramado crescido, e enquanto o veículo continuou em frente, mais e mais apareceram.
Fechando os olhos, ele se acalmou e desmaterializou até o terraço de um prédio de cinco andares à frente de onde a caminhonete eventualmente parou. Pisando cuidadosamente
sobre os galhos caídos e montes de folhas flutuando nas frias poças de água, Xcor foi até a beirada. A verdadeira escala do que foi um ataque massivo à Sociedade
Lesser era evidente pelos acres de carnificina no centro do campus: uma grande faixa de grama e árvores pisoteadas em camadas com partes de corpos quase mortos,
semi-vivos, de caçadores, e uma onda de sangue negro e oleoso do Ômega.
Era como a própria representação do Dhund.
— A Irmandade. – Ele falou para o vento.
Essa era a única explicação. E enquanto considerava qual tinha sido a estratégia do ataque deles, sentiu inveja que ganharam o presente dessa batalha. Como queria
que tivesse sido ele e seus soldados...
Xcor se virou.
Algo estava se movendo no terraço atrás dele. Falando. Xingando.
Na escuridão e com extremo silêncio, retirou sua lâmina da bainha e se abaixou, apoiando nas coxas. Seguindo em frente no vento frio, seguiu os sons que estavam
na direção do vento e testou o ar. Era humano.
— ... filmagem! Não! Estou dizendo, é uma merda!
Xcor veio por detrás do rato sem rabo, e permaneceu sem ser notado enquanto o humano falava no celular.
— Estou em cima do terraço, peguei a merda em vídeo! Não, idiota, TJ e o Soz se mandaram, mas eu subi aqui... Era um dragão... O que? Não, Jo, o efeito do LSD passou
hoje de manhã... Não! Se é um flashback, por que acabei de postar no YouTube?
Xcor ergueu sua faca acima do ombro.
—Não! Estou falando sério, eu...
O humano calou a boca assim que Xcor o acertou na parte de trás da cabeça com o cabo da sua arma. E quando o corpo amoleceu e caiu para o lado, Xcor pegou o telefone
e colocou no seu ouvido.
A voz de uma mulher estava dizendo:
— Dougie? Dougie! O que aconteceu?
Xcor finalizou a conexão, colocou o telefone na sua jaqueta e se inclinou para pular do terraço. Os três lessers que ele havia acompanhado não foram longe com o
caminhão de comida. Eles pareciam embasbacados pelo que os cercava, incapazes de responder levando em conta a magnitude das perdas.
Melhor cuidar deles primeiro antes que eles caiam fora.
Pisando sobre o macho caído, pulou do prédio, desmaterializando enquanto caía, e tornou a se materializar no chão antes que sofresse o impacto da queda e acabasse
se matando.
O caçador o viu, e isso era exatamente o que queria.
Ia fazer a matança dele um pouco mais desafiadora.
Enquanto os três corriam de volta para a caminhonete, ele se materializou em cima do que estava na traseira, perfurando-o no peito e numa busca mandando-o de volta
para o Ômega em um milhão de flashes e um estouro! Próximo, ele se lançou para frente e agarrou o segundo pelos ombros, tirando o equilíbrio dele e cortando a garganta
antes de jogar de lado. O terceiro capturou no ar enquanto estava tentando se fechar dentro da caminhonete no banco do motorista.
— Não, camarada. – Rosnou enquanto sacudia a coisa e a derrubava. — Todos por um, um por todos.
O lesser caiu no chão, e antes que pudesse responder, Xcor o chutou na cara, quebrando a estrutura óssea, destruindo as feições, rendendo os olhos à nada mais que
poças de fluído.
Xcor olhou por cima do ombro. Seria improvável que a Irmandade deixasse uma bagunça daquelas para os humanos encontrarem. Mesmo que o Campus fosse abandonado, cedo
ou tarde, um Homo Sapiens qualquer da variedade jovem ia romper a unidade do terreno. Assim como aquele no terraço.
Algo devia ter acontecido ao curso da luta. Algum ferimento crítico talvez, que precisasse encurtar o tempo de limpeza...
Xcor nunca viu chegar. Nunca escutou nada.
Um momento, estava plenamente consciente de seus arredores.
No outro, alguém ou algo tinha feito com ele o mesmo que ele fez com o humano no terraço.
Nem teve tempo de um último pensamento, no tão decisivo que foi o golpe na sua cabeça.
Vishous abaixou seu braço devagar enquanto olhava de cima o enorme macho que tinha acabado de cair aos seus pés.
Então imediatamente pegou de volta sua arma, apontando-a com as duas mãos, girou ao redor de si mesmo.
— Onde vocês estão, garotos? – Disse baixinho. — Hein, filhos da puta? Onde estão?
Não havia chance de Xcor, cabeça do Bando de Bastardos, ter ido sozinho. Não tinha maneira nenhuma, porra.
V não tinha tanta sorte.
Exceto que nada lhe respondeu. Nenhum contra ataque. Ninguém correndo de um prédio ou de trás de uma árvore com uma arma atirando. Tudo que tinha lá eram partes
de lessers e torsos no chão, o vento gelado batendo na sua face, e muito silêncio.
O som do assobio à esquerda o avisou da posição de Butch. E então teve outro pela direita. Um terceiro acima.
V assoviou de volta e seus irmãos vieram em uma corrida sem pressa.
Ele manteve os olhos em Tohr, e assim que o guerreiro estava ao alcance, V apontou a arma direto em seu peito coberto de couro.
— Pare aí mesmo.
Tohr parou. Ergueu as palmas.
— Mas que inferno você está fazendo?
— Butch, vire-o. – V falou, indicando com a cabeça para o vampiro aos seus pés.
No instante em que Tohr viu quem era, sua mão abaixou e suas presas ficaram à mostra.
— Agora você entendeu. – V balbuciou. — Eu sei que você tem o direito de matá-lo, mas não pode. Estamos nos entendendo? Você não vai acabar com ele, certo?
Tohrment rosnou.
— Essa não é sua decisão para tomar, V. Vai se foder, esse fodido é meu...
— Eu vou atirar em você, porra. Estamos entendidos? Pare aí mesmo.
Aparentemente o Irmão não estava ciente de ter dado um passo à frente. Mas Butch e todo mundo entendeu na mesma hora – e o policial se aproximou de Tohr cautelosamente.
— A morte pode ser sua, – Butch disse. — Mas nós o levamos de volta com a gente primeiro. Falamos com o bastardo, pegamos a informação, então ele é seu, Tohr. Mais
ninguém vai fazer a finalização além de você.
Phury concordou com a cabeça.
— V está certo. Você o mata agora e nós perdemos o interrogatório. Seja lógico quanto a isso, Tohr.
Vishous olhou ao redor. Os quatro tinham retornado ao Campus com a ideia de apunhalar o máximo que podiam de volta para o Ômega e fazer a limpeza que conseguissem
– mas essa pequena descoberta mudou o objetivo principal.
— Butch, leve-o de volta no Hummer. Agora. – V sacudiu a cabeça em direção à Tohr. — E não, você não vai ir com ele como retaguarda.
— Você me entendeu errado. – Tohr disse sombriamente.
— Entendi? Está ciente de que tem uma adaga na mão? Não? – Enquanto seu irmão olhou pra baixo com alguma surpresa, V sacudiu a cabeça. — Não pense que sou quem está
com problemas pra pensar. Você fica com a gente, Tohr. O tira se encarrega disso.
— Estou ligando para Qhuinn e Blay, – Butch falou enquanto pegava o seu telefone. — Quero eles aqui comigo.
— E é por isso que eu amo você. – V balbuciou enquanto manteve os olhos em Tohr.
O Irmão não tinha abaixado a adaga ainda. E isso estava bem. Tão logo Xcor estivesse em seu caminho, V ia se certificar de que Tohr colocasse seu impulso assassino
em bom uso.
Um momento depois, Blay e Qhuinn se materializaram na cena, e ambos soltaram um palavrão quando viram a cara feia e com cicatriz que estava virada pra cima sem expressão
de um corpo desmaiado.
Butch fez um trabalho rápido algemando Xcor, e então ele e Qhuinn pegaram o bastardo pelos pés e pelas mãos, carregando-o como um saco de batatas em direção ao Hummer
à prova de balas completamente preto que estava estacionado atrás de umas das salas de aula. A máquina de cara feia era na verdade a segunda versão do SUV, o primeiro
foi roubado quando ele se descuidou na frente de uma farmácia no inverno passado.
V não moveu um músculo até que viu que a coisa tinha ido a caminho da propriedade pisando fundo no acelerador.
— Não é que eu não confio em você, – ele disse a Tohr. — Eu só não...
Vishous calou a boca. E ficou imóvel de novo.
— O que aconteceu? – Phury perguntou.
V não tinha ideia. E isso não era bom. A única coisa que tinha certeza era que o panorama tinha mudado abruptamente de uma forma sutil, mas inegável, uma onda carregando
e se estendendo sobre os corpos dos caçadores como se uma sombra tivesse sido jogada sobre o Campus.
— Merda, – Vishous chiou. — O Ômega está chegando!
Capítulo DEZ
A beleza estava nos ouvidos de quem vê.
Enquanto Rhage percorria com as mãos pra cima e pra baixo as coxas de Mary, ele podia estar cego, mas sabia exatamente o quanto sua shellan era linda quando ela
se sentou sobre seus quadris, equilibrou seu peso e colocou as palmas sobre seu peito.
— Então, como é que vai ser? – Ele perguntou enquanto mexia sua pélvis.
Com sua ereção acariciando o centro dela, mesmo através das cobertas e das calças que estava usando, a resposta dela foi rouca.
— Como eu posso algum dia, – Ela sussurrou — dizer não pra você?
Deus, essas palavras... E ainda mais do que isso, sua voz! Elas o fizeram pensar na primeira noite em que ele a conheceu. Foi aqui embaixo no Centro de Treinamento,
logo após a besta ter aparecido. Ele estava cego na ocasião, e andando pelo corredor à procura de um treino para distraí-lo de seu tédio e recuperação. Ela tinha
chegado às instalações com John Matthew e Bella, como intérprete para o menino que era mudo e precisava de alguém que soubesse linguagem de sinais para se comunicar.
No segundo em que falou com ele, sua voz o acorrentou de vez, como se cada sílaba que tinha pronunciado tivesse vindo com elos de aço. Ele soube naquele momento
que a teria. É claro que, na ocasião, não tinha planejado que ela seria o amor de sua vida. Mas sua vinculação pensou diferente e ele agradecia a Deus por isso.
Graças a Deus também que ela desejou tê-lo da mesma forma.
— Vem cá, minha Mary...
Ela se moveu para um lado.
— Mas estarei ligando os aparelhos novamente no instante em que terminar.
Rhage deu um sorriso tão largo que seus dentes da frente cintilaram.
— Por mim tudo bem, espere, o quê? Aonde você vai?
Mesmo com seus protestos, Mary não parou até desmontar por completo, e não apenas desligar a máquina.
— Precisamos fazer isso de forma parcialmente discreta, – O bip parou. — Estou falando sério sobre colocar isso de volta em você quando terminarmos.
Torcendo para o lado, ele estendeu a mão, em sua cegueira, agarrando sua cintura e puxando-a em sua direção.
— Venha aqui.
Todo pensamento sumiu quando sentiu a mão dela em cima das cobertas... Diretamente sobre seu pau.
O som que saiu dele fervilhando era em parte um Hmmmmmm e parte gemido. Seu toque, mesmo através das cobertas, foi o suficiente para disparar seu coração, ferver
seu sangue, superaquecer sua pele com um delicioso arrepio.
E deixá-lo a apenas um passo de um orgasmo.
O colchão da cama do hospital deslocou conforme ela se esticou ao lado dele, e a palma da sua mão se moveu sob o lençol, deslizando ohhhhhhh, tão pra baixo. Espalhando
suas pernas para lhe dar todo o acesso ao que ela queria, arqueou sua cabeça para trás e inclinou a coluna para o céu quando ela agarrou sua ereção. Gritou seu nome,
sentiu a besta surgindo também, o dragão se dirigindo à crista da onda de prazer junto com ele, enquanto ainda estava amarrado.
Como se tivesse aprendido boas maneiras.
— Minha Mary... – E então engasgou. — Oh sim.
Ela começou a acariciá-lo de forma macia e lenta, e foi estranho o modo como ela o afetava. O sexo o fazia se sentir tão poderoso, tão másculo, tão foda, que se
perguntou como sua carne conseguia conter o grande rugido da batida erótica... E ainda assim ela era o mestre de tudo dele, e a totalidade da sua reação também,
totalmente no controle, dominando-o de forma que o fazia totalmente fraco diante dela.
E diabos que isso era sexy.
— Você é tão bonito. — Ela disse numa voz rouca. — Oh, olhe para você, Rhage...
Ele adorou a ideia de que ela estava olhando para ele, vendo o que estava fazendo com ele, deleitando-se no controle que tinha sobre ele, literalmente. E se não
podia tocá-la, se tinha que ser um bom menino e manter suas mãos pra si mesmo, pelo menos ela poderia desfrutar do fato de trazê-lo de joelhos, sabendo que só ela
tinha a capacidade de fazer isso com ele.
Afinal, apesar de qualquer distância que tenha surgido entre eles ultimamente, nada tinha mudado para ele. Mary era a única mulher que queria, a única que via, sentia
seu cheiro e não podia esperar para estar com ela.
Isso foi bom para eles. Esta ligação sexual escaldante era importante para eles agora.
Especialmente agora que ela caiu em um ritmo bombeando seu pau, apertando a ponta. Mais rápido. Mais rápido ainda.
Até que ele estava ofegante, e a doce dor de antecipação atravessou seu corpo e sua cabeça girou.
Não estava mais cansado. Não.
— Mary, – Fez um grande esforço na cama arqueando, agarrando o colchão de um lado e a grade de proteção do outro. — Mary, espera...
— O que?
Quando ela parou, ele sacudiu a cabeça.
— Não, continue... Só quero que você faça algo pra mim.
— O que? – Ela disse enquanto corria a palma da mão pelo seu pau... E depois para baixo... E depois para cima...
Que porra ele tinha na cabeça... Ohhh, certo.
— Vem cá, vem mais perto, – Quando ela fez, ele sussurrou algo em seu ouvido.
O riso dela o fez sorrir também.
— Sério? – ela disse. — Isso é o que você quer?
— Sim. – arqueou seu corpo novamente, revirando os quadris para que a ereção fosse em direção ao seu aperto.
— Por favor? E vou implorar se você quiser... Adoro quando te imploro coisas.
Mary se deslocou mais para cima na cama do hospital e começou a trabalhar nele a sério novamente. Então inclinou perto da sua orelha...
... E com pronúncia perfeita disse:
— Inconstitucionalissimamente.
Deixando escapar uma maldição feito louco, Rhage gozou tão forte que viu estrelas, sua ereção latejando forte na mão dela, seu gozo fazendo as coisas muito, muito
bagunçadas debaixo daquelas cobertas. E o tempo todo, seu único pensamento era o quanto amava sua fêmea.
Como ele a amava demais.
Duas portas abaixo do orgasmo induzido por vocabulário do Rhage, Layla estava sentada em sua própria cama de hospital, uma bola gigante de fio vermelho em seu lado
direito, o cachecol mais comprido na história do mundo se esticando até o chão do outro lado. Entre os dois? Uma barriga que estava crescendo tão inchada dos bebês
gêmeos que ela carregava que se sentia como se alguém tivesse dobrado um colchão e amarrado a coisa com um cinto no seu torso.
Não que ela estivesse em posição de reclamar. Os dois eram saudáveis, e contanto que ela ficasse na cama, sabia que estava dando a eles a melhor chance de sobrevivência.
E certamente Qhuinn, o pai deles, e seu amado Blay, mimavam-na implacavelmente aqui embaixo, como se os dois preferissem ser aqueles a atravessar a permanência auto-imposta
para ela.
Eles eram machos tão maravilhosos.
Enquanto fazia outra virada no fim de outra fileira, sorriu quando se lembrou de Blay sugerindo que ela tricotasse alguma coisa, pois isso ajudou sua mãe Lírica
a conseguir atravessar seu próprio repouso na cama na gravidez dele. Isso provou ser um bom conselho – havia algo singularmente calmante no clic-clic das agulhas
e o fio macio entre seus dedos, e o progresso que podia medir de forma tangível. Porém, neste momento, teria que cortar a coisa em segmentos ou dar para uma girafa.
Afinal, assistir maratonas de Donas de Casa de verdade sem fazer alguma coisa, qualquer coisa produtiva, era positivamente insustentável. Não importa que Lassiter
dissesse o contrário.
Agora, Terapia de Casais com Dra. Jenn? Isso talvez fosse uma história diferente – embora, claro, ela não aprendeu coisas relevantes para sua própria relação. Por
que não tinha um macho para chamar de seu.
Não, ela tinha uma obsessão nada saudável que bateu de frente e queimou. O que era uma boa coisa – embora a perda do que nunca devia querer em primeiro lugar causou
dor inimaginável e injustificável.
Mas afinal, uma pessoa não se apaixonava pelo inimigo. E não só por que era uma Escolhida.
Era por que Xcor e seu Bando de Bastardos, declarou guerra para Wrath e a Irmandade.
Era por isso que...
— Pare com isso, – Ela murmurou enquanto fechava os olhos e parava as agulhas. — Só… Pare.
Realmente não pensou que pudesse aguentar mais um instante a culpa e o conhecimento de sua traição daqueles quem lhe eram mais queridos. Contudo, qual era o outro
curso? Sim, mentiram para ela e então foi coagida… Mas no fim, seu coração foi onde não devia ter ido.
E apesar de tudo, isso nunca foi devolvido a ela.
Quando ouviu outro som ali fora no corredor, deu uma olhada para sua porta e se forçou a se perder na distração. Houve um monte de atividade no centro de treinamento
hoje à noite – vozes, sons de passos, portas abrindo e fechando – e de alguma forma, isso tudo só a fez se sentir mais isolada em vez de menos. Mas aí, quando as
coisas ficavam quietas, havia menos sugestões para lembrá-la de tudo que estava perdendo.
Ainda assim, não estaria em qualquer outro lugar.
Colocando a mão em seu estômago arredondado, pensou que sim, a vida como ela conhecia ultimamente estava mais focada interiormente que exteriormente – e a qualquer
hora que ficasse inquieta, tudo que tinha que fazer era se lembrar de tudo que estava em jogo.
Ela pode nunca ter o amor que Qhuinn e Blay compartilhavam, mas pelo menos as crianças seriam dela e deles.
Isso teria que ser suficiente para sua vida, e seria. Não podia esperar para segurá-los, cuidar deles, vê-los crescer.
Assumindo que ela sobrevivesse ao parto. Assumindo que todos eles sobrevivessem.
Quando um alarme suave veio de seu telefone, ela saltou e apertou a tecla de silenciar o alarme.
— Já está na hora?
Sim, estava. Sua liberdade chegou. Trinta minutos para se esticar, caminhar e ir para um passeio.
Dentro dos confins do centro de treinamento, claro.
Empurrando o tricô em direção à base das agulhas, enfiou as pontas dentro do rolo, e esticou seus braços e pernas, esticou as pontas dos pés, flexionou seus dedos.
Então moveu seus pés pra fora da cama e colocou seu peso neles. As demandas da gravidez e toda sua inatividade forçada a levaram a uma certa fraqueza nos músculos,
uns que não curavam, não importa quanto se alimentasse de Qhuinn e Blay – então aprendeu a ser cautelosa sempre que se levantava.
Primeira parada foi o banheiro, algo que tinha permissão para usar prontamente, mas inevitavelmente adiava. Não havia necessidade de tomar banho, o que ela fez cerca
de doze horas atrás durante essa meia hora para estar de pé e passear.
Não, isto seria puramente para investigar.
O que estava acontecendo ali fora?
Enquanto encabeçava para a porta, alisou o cabelo, que parecia estar crescendo tão rápido quanto seu cachecol: as ondas loiras desciam passando dos seus quadris
agora, e supôs que devia cortá-lo em um certo ponto. Sua camisola de flanela era igualmente longa e larga, do tamanho de uma barraca florida, e seus chinelos faziam
um som de shhht-shhht-shhht acima do chão nu. Com suas costas já doloridas e um braço estendido para se estabilizar, sentiu como se fosse séculos mais velha do que
realmente era.
Empurrando a porta para sair, ela...
Imediatamente deu um passo atrás.
Tanto que sua bunda bateu no painel, fechando.
Do outro lado, dois machos estavam de pé, altos e orgulhosos, expressões idênticas de tensão marcando seus rostos.
E pelo idêntico, quis dizer exatamente isso.
Eles eram gêmeos.
Quando eles focaram nela, ambos se recolheram como se vissem um fantasma.
— Olhem pra onde olham, – Veio um grunhido desagradável.
Layla chicoteou sua cabeça em direção ao aviso.
— Zsadist?
O Irmão com o rosto com cicatrizes caminhou a passos largos para ela, colocando seu corpo, com todas suas armas, entre ela e os dois estranhos, embora nenhum dos
machos fizesse um movimento agressivo em direção a ela. Não surpreendentemente, foi um bloqueio muito bem sucedido. O tórax e os ombros do Zsadist eram tão largos
que ela não podia mais ver o par – e este era claramente o plano dele.
— Voltem lá pra dentro com ele, – Zsadist vociferou. — Antes que eu ponha vocês naquele quarto.
Não houve nenhum argumento, e abruptamente os cheiros estranhos dissiparam como se eles realmente desaparecessem do corredor.
— Eles não fizeram nada comigo, – Ela disse. — Realmente, acho que se eu fizesse Buu! eles poderiam muito bem sair correndo.
Z deu uma olhada por cima do ombro.
— Acho que você devia voltar ao seu quarto.
— Mas tenho permissão para esticar minhas pernas duas vezes por noite!
O Irmão suave, mas firmemente, tomou seu cotovelo e a escoltou de volta para sua cama.
— Não nesse instante. Vou dizer a você quando estiver okay. Nós temos algumas visitas inesperadas e não estamos correndo nenhum risco com você.
— Quem são eles?
— Ninguém com quem você precise se preocupar, e eles não vão ficar muito tempo, – Z a colocou de volta em posição. — Posso te trazer alguma comida?
Layla exalou.
— Não, obrigada.
— Algo para beber então?
— Estou bem. Mas obrigada.
Depois de se curvar profundamente o Irmão partiu, e meio que esperava ouvir os sons distantes da pistola dele varrendo aqueles dois soldados só por olhar para ela.
Mas era como as coisas funcionavam. Como uma fêmea grávida, era a coisa mais valiosa no planeta, não só para seu jovem pai, mas para cada único membro da Irmandade.
Era como viver com uma dúzia de irmãos mais velhos superprotetores e mandões.
Ou Irmãos, como era o caso.
E normalmente, poderia ter desafiado até Zsadist. Mas não reconheceu aqueles machos grandes, e Deus sabia que já entrou em bastantes problemas confraternizando com
lutadores que ela não conhecia – e eles tinham que ser soldados. Eram de constituição pesada e forte, e estavam usando coldres.
Embora vazios.
Então eles não eram inimigos, ela decidiu, ou não teriam mesmo permissão para estar no centro de treinamento. Mas eles não eram exatamente de confiança também.
Do nada, uma imagem do rosto duro do Xcor veio à sua mente – e a pontada de dor que a atravessou foi tão forte que os bebês mexeram em sua barriga como se sentissem
isto também.
— Pare com isto. – Ela sussurrou para si mesma.
Agarrando o controle remoto da TV, ela ligou a tela do outro lado do quarto. Certo. Ela ficaria aqui até que aqueles estranhos partissem. Então sairia e se sentaria
com o irmão do Qhuinn, Luchas, que estava em recuperação duas portas adiante e parecia esperar ansiosamente suas visitas regulares. Então talvez um bate-papo com
a Dra. Jane em sua escrivaninha, ou talvez Blay e Qhuinn voltassem de suas rondas até lá e eles caminhariam até as salas de aula.
Quem quer que sejam aqueles soldados, duvidava que os Irmãos os deixassem ficar mais tempo além do absolutamente necessário. Pelo menos pela reação do Zsadist.
E todas as armas das quais eles muito claramente foram despojados.
Capítulo ONZE
Sem tempo. Absolutamente nenhum maldito tempo.
Com uma erupção do mal permeando o ar, Vishous tirou sua luva forrada de chumbo e levantou sua mão incandescente. Fechando os olhos e se concentrando – por que sua
vida, e a vida de seus dois irmãos, de fato dependiam disso – ele liberou uma série de lufadas de impulso de si mesmo – exceto que o mhis se estendeu somente do
tamanho de um bolso sobre todo o campus panorâmico, uma pequena parte, não maior do que a distância de duas polegadas em frente ao seu rosto e duas polegadas atrás
dos corpos de Phury e Tohr.
Graças a Deus o Hummer está fora da propriedade.
— Ninguém se mexe, – V comandou quando uma barreira ondulante e irisdecente se formou em volta deles, parecido com bolhas de sabão de uma criança feita com detergente.
Ele não tinha nem ideia se isso iria funcionar, mas sabia que teria de acontecer – a atmosfera estava se tornando uma densa sombra de maldade. Inferno, mesmo com
o mhis no lugar, sua pele pinicava com um aviso para correeeeeeeeeeeeer!
E foi quando o Ômega em pessoa apareceu a cento e trinta metros à frente.
Falando sobre anticlímax. Na superfície, a figura de tinta transparente em suas roupas brancas alvejantes parecia intimidante como um peão de xadrez animado. Mas
isso fazendo uma avaliação visual. Internamente, cada célula que constituía seu corpo, cada neurônio que queimava em seu cérebro, todas as emoções que já teve ou
que teria começou a gritar como se estivesse sob um horrendo ataque mortal.
Atrás dele, um suave murmúrio se iniciou e V olhou de relance por cima do ombro. Phury tinha começado a rezar no Antigo Idioma.
— Shhh, – Vishous sussurrou.
Phury imediatamente engoliu a fala, mas seus lábios seguiram se movendo, continuando a oração. E sim, V pensou em sua mãe fazendo seu não-posso-nem-mesmo-estar-lá-em-acima
– e ficou tentado a dizer ao cara que ele estava perdendo seu tempo. Mas tanto faz. Não há razão para roubar a ilusão de seu irmão.
Depois, e se o mhis não funcionar? Eles três e o que eles oraram, ou o que não oraram, estavam indo para um ponto discutível diretamente fora do planeta.
O Ômega se virou lentamente avaliando sua “morte”, e V ficou tão tenso que correu o risco de cair pra frente como uma tábua. O olhar do mal não se demorou onde ele
e seus irmãos estavam parados, então sugeriu que o mhis estava funcionando – provavelmente pelo menos parcialmente, por que o irmão da Virgem Escriba estava muito
distraído pela devastação da sua Sociedade.
Merda, este é meu tio, V pensou sombriamente.
E então o Ômega passou oscilando, andando com seus próprios pés, sangue negro encharcando o gramado, do mesmo jeito que a mãe de V perambulava.
A chuva começou a cair do céu, as gotas frias batendo no cabelo e nariz de V, seus ombros, nas costas de suas mãos. Mesmo a coisa fazendo cócegas na sua pele, não
se moveu para afastar aquilo ou se abrigar – e francamente, sim, poderia ter feito sem se recordar exatamente de como sua ilusão de ótica estava inconsistente com
a realidade. Aquela chuva passou pela barreira?
Inferno, você poderia colocar um jornal sobre sua cúpula e ter uma proteção melhor contra a chuva.
Porra.
De tempos em tempos, Ômega parava para se curvar e pegar um braço, uma perna, uma cabeça. E jogava de volta onde quer que estivesse no gramado, como se estivesse
procurando por alguma coisa em específico. E então parou sem aviso.
Um gemido baixo soou fora do campus, o som entrando e se espalhando no vazio, morrendo nos edifícios sem ecoar.
E então Ômega estendeu suas palmas para a frente.
A porcaria de uma brisa bateu nas costas de V e jogou seus cabelos na cara e nos olhos, ondulando a frente da sua jaqueta também até o couro começar a agitar, e
teve que apertar a coisa contra seu corpo.
De repente, os restos do massacre, todos os pedaços mortos e manchados, liquidificou em uma sombra viscosa que colocou para dentro de si, tornando-se um maremoto
que quebrou dentro de seu mestre, sua casa, seu núcleo.
O Ômega absorveu tudo isso, reivindicando a parte de si que tinha dado aos seus induzidos durante a cerimônia de iniciação, chamando de volta à sua essência, reabsorvendo
tudo até que o campo de batalha estivesse limpo como estava antes do ataque ter sido travado, nada além de grama pisada e árvores derrubadas para mostrar o que a
Besta e a Irmandade fizeram.
Quando tudo estava acabado, Ômega parou no centro da praça da escola, olhando ao redor como se desse uma checada dupla no trabalho. E então, tão rápido quanto chegou,
a entidade desapareceu em si mesmo, um sutil flash foi só o que restou de sua presença – e até mesmo isso desapareceu um segundo depois.
— Esperamos, – V sibilou. — Vamos esperar.
Ele não estava dando por certo que o Ômega tinha realmente ido embora dali. O problema era que o amanhecer estava vindo... E sim, se o mhis não podia proteger os
três da chuva, também não iria proteger porcaria nenhuma da “sempre em frente” luz do sol.
Mas poderiam se permitir ficar mais um pouquinho. Só pro caso.
Melhor ser cauteloso do que descoberto. Depois, precisava de um momento para que seu testículo restante pudesse voltar para o seu lugar novamente.
Porra.
Capítulo DOZE
— Eu não acredito que isto seja necessário.
De volta ao centro de treinamento da Irmandade, Assail olhou de seu corpo para o humano de cabelos escuros que estava fechando o corte em sua panturrilha e tornozelo
com agulha e linha. Quando o homem não respondeu e nem moderou seus cuidados, Assail revirou os olhos.
— Eu disse...
— Sim, sim. – O cara enfiou a agulha entre a pele mais uma vez e puxou até que a linha preta fosse esticada. — Você deixou perfeitamente claro. A única coisa que
vou tornar a dizer é que a MRSA3 não dá a mínima se você é vampiro ou humano, e deixar uma ferida aberta de seis polegadas em sua perna é a definição da estupidez.
— Eu curo bastante rápido.
— Não tão rápido, amigo. E você pode parar de se contorcer? Eu me sinto como se estivesse trabalhando em um peixinho dourado na água.
Na verdade, ele não podia. Suas extremidades tinham ideias próprias no momento, e enquanto verificava o relógio de parede e calculava o pouco tempo que tinha antes
do amanhecer, o tremor tinha piorado...
A porta do quarto abriu e seus primos retornaram.
— Pensei que não quisessem assistir, – Assail murmurou. E de fato, Ehric, o da esquerda, foi cuidadoso em não olhar para o trabalho de reparação.
Embora o assassino proficiente que o homem era, seu estômago revolvia em náuseas nas questões clínicas, uma contradição que podia ser uma fonte de diversão, mas
não era no momento.
Na verdade, Assail não estava com disposição para qualquer tipo de leviandade. Não tinha consentido em ser trazido aqui para esta instalação de tratamento da Irmandade.
O que queria fazer era voltar para sua casa no Hudson e arranhar a coceira que estava rapidamente se tornando um rugido.
— Quando você terá terminado? – Perguntou ele.
— Vou radiografar seu ombro a seguir.
— Não há necessidade.
— De onde veio seu diploma médico?
Assail amaldiçoou e deitou-se horizontalmente sobre a maca. O foco acima dele, com suas luzes brilhantes e armação microscópica, era como algo saído de um filme
de ficção científica. E enquanto fechava os olhos, era impossível não se lembrar dele vindo aqui com sua Marisol logo depois que a livrou de Benloise... Deles dois
passando pelo extenso sistema de engatilhamentos direcionando ao subterrâneo e entrando nesta instalação estelar.
Porém tentou instruir sua mente para outro lugar. A destinação desse pensamento era simplesmente dolorosa demais para suportar.
— Vou ter de partir antes do amanhecer, – Revelou. — E quero nossas armas, telefones e outros artigos pessoais devolvidos a nós prontamente.
O médico não respondeu até ter aplicado seu último ponto e atado um nó um pouco apertado na base do tornozelo de Assail. — Importa-se de dizer a seus rapazes para
sair novamente por um minuto?
— Por quê?
Ehric falou. — Zsadist nos quer aqui. E não estou inclinado a discutir com o Irmão enquanto estou desarmado e desejoso de manter o suprimento de sangue da minha
cabeça.
O médico sentou-se em seu banco giratório e, pela primeira vez, Assail leu a costura no jaleco branco do humano: Dr. Manuel Manello, Cirurgião Chefe. Havia um adorno
e o nome de um sistema hospitalar abaixo da escrita cursiva preta.
— Os Irmãos o trouxeram pra cá de outras espécies para esta noite? – Perguntou Assail. — Como isso é possível?
O Dr. Manello abaixou o olhar para seu nome. — Jaleco velho. E velhos hábitos custam a morrer... Não eles.
Enquanto o humano encarava Assail no olho, Assail franziu o cenho.
— O que quer dizer?
— Você consente que eu fale abertamente na frente desses dois?
— Eles são meu sangue.
— Isso é um sim?
— Você humanos são tão estranhos.
— E você pode cortar esse tom superior, imbecil. Estou casado com uma de sua espécie, ok? E desculpe-me por pensar que você poderia não querer ser avaliado a respeito
do seu vício em drogas na frente da dupla dinâmica... Caso eles não sejam relacionados a você.
Assail abriu a boca. Fechou. Abriu novamente.
— Não sei do que está falando.
— Oh, sério? – O homem arrancou as luvas azuis brilhantes e colocou os cotovelos sobre os joelhos, inclinando-se. — Você está inquieto na minha mesa como se estivesse
revestido por colméias. Está suando frio, e não porque esteja com qualquer dor. Suas pupilas estão dilatadas. E tenho certeza que se eu te desse seu casaco de volta,
a primeira coisa que faria seria dar uma desculpa para ir ao banheiro e usar o resto da coca que estava no frasco, e que tirei do interior do bolso da frente. Como
estou indo? Lendo sua mente corretamente? Ou vai mentir como um filho da puta?
— Eu não tenho um problema com drogas.
— Uh-huh. Claro que não.
Enquanto o humano ficava de pé, Assail fez algumas análises ignorando a si mesmo... De maneira nenhuma iria olhar para seus primos: podia sentir seus olhares gêmeos
em cima dele bem mais que o bastante, muito mais que obrigado.
Pelo menos nenhum deles disse nada.
— Olha, não tenho nada a ver com isso, – O Dr. Manello foi até uma mesa de trabalho na qual um computador, algumas canetas e um bloco descansavam. Inclinando-se,
escreveu alguma coisa e rasgou a folha fixada da ponta, dobrando-a ao meio. — Aqui está meu número. Quando chegar ao fundo do poço, ligue pra mim e podemos te ajudar
na desintoxicação. Entretanto, esteja ciente de que o uso prolongado de cocaína leva a todos os tipos de coisas divertidas, como ataques de pânico, paranóia e até
desenvolver psicoses. Você já está na categoria da perda de peso, e como eu mencionei, está cheio de tiques da porra. Seu nariz também fica escorrendo o tempo todo,
então tenho certeza que seu septo está desviado.
Assail olhou para o cesto de lixo ao lado dele e perguntou como todos aqueles Kleenex tinham terminado ali. Certamente, não poderia ter sido... Huh. Ele tinha um
chumaço de lenços na mão e não tinha conhecimento de ter pegado.
— Eu não sou viciado.
— Então tome isto e jogue fora, – O humano segurou o papel rasgado. — Queime isto. Enrole a coisa para cima e use-o para cheirar sua próxima dose. Como eu disse,
não me importo.
Quando Assail aceitou o que foi oferecido, o médico virou como se já tivesse esquecido toda a interação.
— Assim, quanto a esse raio-X? Os Irmãos dirão quando você poderá ir. A saída não é uma coisa voluntária, como eu tenho certeza que você compreendeu.
Assail fez um show de esmagar o papel e lançou-o no lixo com os lenços.
— Sim, – disse secamente. — Estou bastante ciente do quão precisamente involuntário tudo isso é.
Vishous dirigiu o food-truck de volta para o complexo. Como um morcego saído do inferno.
A coisa não foi construída pra velocidade, e manobrar esse trambolho lembrou-lhe de um velho avião tentando decolar numa pista de terra... Tudo vibrava, a tal ponto
que você juraria que estava simplesmente além da inteira desintegração molecular. Mas manteve o pé no acelerador... O que era o que se fazia quando tinha, ohhhhhhh,
cerca de 25 minutos de verdadeira escuridão à esquerda e pelo menos trinta e sete milhas de estrada pra cobrir. E você realmente não queria abandonar evidências
factíveis mortais ao lado da estrada.
Ainda assim, caso acontecesse o pior, ele e Tohr, por que V tinha insistido na carona de volta com ele, poderiam encostar e desmaterializar direto até os degraus
da mansão em um nanossegundo: Butch tinha acabado de mandar uma mensagem para reportar que retornou ao centro de treinamento em segurança com Xcor. Assim, ninguém
tinha que se preocupar com Tohr agindo por fora em alguma ideia brilhante que envolvesse sangue derramado e um saco coletor de cadáveres com o nome do Bastardo nele.
Pelo menos não durante os próximos dez minutos, em todo o caso.
— Você salvou nossas vidas quando o Ômega apareceu.
Vishous olhou de relance sobre o assento da frente. Tohrment esteve em silêncio na posição de atirador desde que eles dois dirigiram pra fora do campus cerca de
vinte minutos após o Ômega ter se levantado e desaparecido.
— E eu não ia matar Xcor.
— Está certo disso mesmo?
Quando Tohr não disse mais nada, V pensou: Siiiiiimmmm, com certeza você não estava indo assassinar o filho da puta.
— Não é como se eu não entendesse, – V murmurou enquanto um mergulho na estrada ajudou a empurrar a velocidade do food-truck ao norte a setenta milhas por hora.
— Todos nós queremos eliminá-lo.
— Eu realizei a traqueotomia em Wrath. Enquanto ele estava morrendo no meu colo depois que o fodido do Xcor atirou nele.
— Bem, e depois havia o fato de que você tinha o Lassiter dirigindo naquele momento, – V disse secamente. — Isso teria me assustado tanto.
— Estou falando fodidamente sério, V.
— Eu sei.
— Onde é que vamos colocá-lo?
V sacudiu a cabeça. — Depende de quanto tempo o Bastardo passou desmaiado.
— Quero trabalhar nele, Vishous.
— Veremos, meu irmão. Veremos.
Ou, em outras palavras: abso-fodida-lutamente não. A agressão rolaria fora dos poros do irmão, mesmo que Tohr tentasse dar uma de homem “calmo e sob controle”, era
como a maior bandeira vermelha que alguém já tivesse obtido.
Enquanto eles ficavam em silêncio, V colocou a mão dentro de sua jaqueta de couro e tirou um cigarro enrolado à mão. Acendendo a coisa com um isqueiro Bic vermelho,
exalou um pouco de fumaça e abriu a janela para que não enchesse seu irmão de fumaça.
Desejo de matar a parte, Tohr tinha levantado uma boa maldita pergunta... Onde diabos colocariam o prisioneiro? Havia uma abundância de salas de interrogatório no
centro de treinamento... O problema era, eles eram mais da variedade do estilo “mesa e cadeira”, o tipo de coisa que foi usado, por exemplo, para falar com Mary,
John Matthew e Bella quando eles chegaram a primeira vez à instalação.
Nada luxuoso, mas certamente civilizado.
Nada que fosse equipado para a tortura.
Ainda.
Ainda bem que sua vida amorosa fornecia-lhe acesso imediato a todos os tipos de correias, fivelas, correntes e grampos. E sim, provavelmente iria precisar de alguns
dos seus equipamentos maiores também.
— Vou cuidar disso. abso-fodida-lutamente disse ele.
— O que? Xcor?
— Sim. Cuido disso.
Tohr amaldiçoou suavemente como se estivesse enciumado. Mas então o irmão deu de ombros.
— Isso é uma coisa boa. Ele é perigoso... É como ter um serial killer em casa. Vamos querer alguns bloqueios seriamente fortes.
Trancas reforçadas não dariam nem pra metade, pensou V. Nem mesmo perto.
CONTINUA
Capítulo SEIS
Sopa de frango e estrelinhas da Campbell.
Enquanto Mary se debruçava sobre o fogão na cozinha principal do Lugar Seguro, ela mexia a sopa sem parar com uma colher de inox, observando as estrelas de massas
quase inchadas girando com os quadrados de carne branca e fatias de cenoura. A panela era a menor que tinham na casa. O caldo era amarelo, e o cheiro doce a lembrou
das doenças simples que teve quando era criança... Constipações, gripes, streptococos.
Coisas mais fáceis do que o câncer.
Ou a Esclerose Múltipla que tinha levado sua mãe.
A tigela em que despejou as coisas era creme com anéis concêntricos amarelos na borda. Ela pegou uma nova colher da gaveta e deu a volta no balcão em direção à grande
mesa de madeira.
— Aqui, – Ela disse para Bitty. — E vou te dar alguns Saltines.
Como se essa tragédia fosse algo que você pudesse superar em vinte e quatro horas, se fosse apenas hidratado suficiente?
Bem, pelo menos uma refeição simples como esta não era suscetível de sair pela culatra. E tão logo Bitty tivesse comido, Mary iria encontrar outro membro do pessoal
para atender a menina e, em seguida, obter algum aconselhamento para si mesma.
Quando voltou da despensa com o pacote de biscoitos, Bitty estava experimentando a sopa e Mary sentou-se do outro lado da mesa para não ficar em cima da menina.
A embalagem plástica se recusou a cooperar e Mary a abriu com força, derramando Saltines e grãos de sal sobre a madeira.
— Droga.
Ela comeu um... E então percebeu que não teve qualquer alimento há algum tempo e estava com fome também...
— Meu tio virá me buscar.
Mary congelou no meio da mastigação.
— O que você disse?
— Meu tio, – Bitty não olhou pra cima, apenas continuou movendo a colher através da sopa fumegante. — Ele virá me buscar. Vai me levar pra casa.
Mary retomou a coisa toda da mastigação, mas sua boca era como um misturador de cimento tentando processar cascalho.
— Sério?
— Sim.
Com mãos cuidadosas, Mary recolheu as bolachas espalhadas, empilhando-as em grupos de quatro.
— Eu não sabia que você tinha um tio.
— Eu tenho.
— Onde ele mora?
— Não em Caldwell, – Bitty tomou outra colher e colocou-a na boca. — Mas ele sabe como chegar aqui. Todo mundo sabe onde fica Caldwell.
— Ele é o Irmão de sua mahmen?
— Sim.
Mary fechou os olhos. Annalye nunca mencionou nenhum parente. Não tinha divulgado isso na ficha ou nominado um parente mais próximo. E a mulher teve conhecimento
de que sua condição estava deteriorando, então se houvesse um Irmão em algum lugar, certamente teria contado sobre ele para alguém e isso teria ido para seu arquivo.
— Gostaria que eu tentasse entrar em contato com ele pra você? – Perguntou Mary. — Sabe onde ele mora?
— Não, – Bitty olhou para sua sopa. — Mas ele virá me buscar. Isso é o que a família faz. Eu li naquele livro.
Mary tinha uma vaga lembrança de um livro infantil sobre os diferentes tipos de família: biológica, adotiva, avós, bem como aqueles que resultavam a partir de doadores
de esperma, óvulos doadores, fertilização in vitro. O ponto era, não importa como eles surgiram ou com que se parecessem, em cada caso, todo mundo tinha uma unidade,
com um monte de amor em torno deles.
— Bitty.
— Sim?
O celular de Mary começou a vibrar no bolso do casaco que ela ainda não tinha tirado e ficou tentada a deixar quem quer que fosse ir para o correio de voz. Exceto
pelo que os Irmãos estavam fazendo esta noite com aquele ataque enorme?
Quando tirou seu celular pra fora e viu quem era, pensou, oh Deus.
— Butch? Olá?
Houve interferência na conexão. Vento? Vozes?
— Olá. – Ela disse mais alto.
— ... Indo pegar você.
— O quê? – Ela levantou-se da cadeira. — O que você está dizendo?
— Fritz, – O Irmão gritou. — Indo pegar você! Nós precisamos de você aqui fora!
Ela amaldiçoou.
— Quanto é ruim?
— Fora de controle.
— Merda. – Ela suspirou. — Eu vou sair rápido. Poupar tempo.
Houve uma série de estouros, alguns xingamentos e depois então distorção, como se Butch estivesse correndo.
— ... Escreva a localização. Rápido!
Quando a ligação foi cortada, ela olhou para a menina e tentou não soar tão em pânico quanto estava.
— Bitty, eu sinto muito. Tenho que ir.
Aqueles olhos castanhos claros levantaram para os dela.
— O que há de errado?
— Nada. Eu só... Vou trazer Rhym pra você. Ela vai sentar aqui e talvez vocês duas possam ter uma sobremesa?
— Estou bem. Estou indo para cima e embalar minhas coisas, então estou pronta para meu tio.
Mary sacudiu a cabeça.
— Bitty, antes de fazer isso, não seria melhor que você e eu devêssemos tentar encontrá-lo primeiro?
— Está tudo bem. Ele sabe sobre mim.
Estabilizando a respiração. Por muitos motivos.
— Vou passar mais tarde e ver como você está indo.
— Obrigada pela sopa.
Quando a menina voltou a comer, ela não pareceu se importar com quem estava em torno dela ou não, como de costume.
E foi com uma dor de cabeça martelando que Mary foi numa rápida busca da supervisora de admissão, que estava fazendo trabalho dobrado por que uma das outras assistentes
sociais estava fora em licença maternidade. Depois de explicar a Rhym tudo o que tinha acontecido, Mary decolou em uma corrida deixando a casa e saltou para o Volvo.
A antiga Escola Brownswick para meninas ficava a cerca de dez minutos de carro. Ela fez isso em sete, disparando pelas estradas, esquivando-se em torno dos desenvolvimentos
suburbanos, passando rapidamente pelos sinais amarelos e vermelhos. O SUV não foi construído para esse tipo de treinamento, o caixão quadrado, pesado, balançando
pra lá e pra cá, mas não se importava. E merda, parecia que ela nunca chegaria ao limite do campus abandonado.
Pegando seu telefone, desacelerou e olhou suas mensagens de texto.
Lendo em voz alta, ela falou:
— Contorne os portões principais... Dê a volta... Merda!
Algo disparou para a rua, a figura movendo-se como uma boneca de trapo e tropeçando diretamente na frente do seu carro. Pisando nos freios, ela atingiu o homem...
Não, era um lesser: o sangue que salpicou pelo pára-brisa era negro como tinta e a coisa decolou mais uma vez, embora um de seus pés parecesse quebrado.
Com o coração acelerado, engoliu em seco e socou o acelerador novamente, com medo de que houvesse outros por trás dele, mas ainda mais aterrorizada por tudo o que
estava acontecendo com Rhage. Reverificando seu celular, ela seguiu as direções rodeando os fundos da escola para a rua de mão única que a levou para dentro da bagunça
desgrenhada de uma paisagem.
Bem quando se perguntava onde diabos deveria ir a partir dali, a pergunta foi respondida.
Do outro lado do prado, a besta se destacava entre os prédios abandonados como algo saído de um filme do canal SyFy. Alto o suficiente para alcançar os telhados,
grande o suficiente para deixar anão mesmo um dormitório, como um tigre brincando com uma refeição, a coisa estava em modo de ataque total.
Arrancando o telhado de um galpão com seus dentes.
Ela não se incomodou em desligar o motor.
Mary jogou o Volvo no parque e saltou pra fora. No fundo de sua mente, estava ciente de que o desigual pop-pop-pop no fundo eram balas voando, mas não se preocuparia
com isso. Sobre o que ela estava em pânico?
Quem diabos estava naquele prédio.
Enquanto corria na direção do dragão, colocou dois dedos na boca e soprou com força.
O assobio era estridente, alto como um grito... E não fez nenhuma impressão afinal, enquanto as telhas da estrutura de tijolos eram cuspidas para um lado.
O rugido que se seguiu foi algo que ela conhecia muito bem. O animal estava pronto para sua feliz refeição, e toda aquela coisa de arranca-vigas era sua maneira
de entrar no prédio.
Mary tropeçou em alguma coisa, oh, Deus, era um lesser que estava sem um braço... E continuou, assoprando outro assobio. E uma terceira vez...
A besta congelou, seus flancos bombeando dentro e fora, tons de roxo piscando na escuridão como se a coisa fosse iluminada por dentro por uma fonte elétrica.
O quarto assobio fez a cabeça da besta virar ao redor.
Retardando sua corrida, Mary levou as mãos à boca.
— Venha aqui! Venha, garoto!
Como se o animal fosse apenas o maior cão do mundo.
O dragão soltou um pff e depois soprou pelas narinas, o som algo entre um folguedo abafado por uma almofada e um motor a jato decolando.
— Venha cá você! – Ela disse. — Deixe isso. Não é seu.
A besta voltou a olhar para o que eram agora apenas quatro paredes de tijolos e não muito mais, e um grunhido ondulado saiu dos lábios negros de dentes irregulares
que teria dado uma grande insegurança a um creme dental branco. Mas, como um pastor alemão chamado para sentar aos pés do treinador, a maldição de Rhage se afastou
de seu trabalho de desconstrução e pulou para ela.
Enquanto o dragão vinha através das ervas daninhas e espinheiros, seu grande peso sacudia o chão tão fortemente que Mary teve que estender os braços para se equilibrar.
Mas por incrível que pareça, a coisa estava sorrindo para ela, sua face horrível transformada por uma alegria que não teria acreditado se não tivesse visto isso
cada vez que estava perto do monstro.
Esticando as mãos para cima, ela cumprimentou aquela grande cabeça caída com palavras suaves de elogios, colocando a palma da mão em sua bochecha redonda, deixando-o
respirar o cheiro dela e ouvir sua voz. Em sua visão periférica, viu duas pessoas saírem do prédio destruído... Certificando-se que um deles tinha o corpo saudável
e correndo muito, e outro estava em cima de um ombro forte, obviamente ferido.
Ela não teve coragem de olhar diretamente para ver quem era. A melhor chance deles era sua ligação com a maldição... E era estranho. Tão feio como a coisa era, tão
terrível e mortal quanto poderia ser... Ela sentia um amor duradouro aquecer seu corpo. Seu Rhage estava lá, em algum lugar, preso sob as camadas de músculos e escamas
e percepção de terceiros, mas mais do que isso, ela adorava a besta também...
Os tiros vieram da direita e, por instinto, gritou e abaixou-se para cobrir a cabeça.
O dragão assumiu dali em diante, girando na direção dos atiradores, ao mesmo tempo conseguiu embrulhar sua cauda em torno de Mary e guardá-la contra seu flanco.
E então eles estavam em movimento. O passeio foi áspero, como um touro mecânico que sofre de surtos de energia, e ela se agarrou a um dos espinhos maiores por sua
querida vida.
Graças a Deus por aquela saliência óssea. Por que o que aconteceu em seguida envolveu um monte de Danças e Gritos.
Primeiro houve gritos. Terríveis, gritos de pesadelo que teve que tapar os ouvidos para bloquear; exceto que não se atreveu a largar com risco de ser jogada livre...
Pra cima e pra frente...
Um lesser, que estava vazando como uma peneira, saiu voando sobre o dorso da besta e sangue negro bateu em Mary como uma chuva de mau cheiro. A coisa aterrissou
num monte quebrado e o perseguidor que seguia um segundo lesser, que também estava sobre os ombros, bateu no primeiro como uma pedra.
Oh... Veja. Sem cabeça. Onde estava aquilo...
Algo que era vagamente redondo e tinha um rosto de um lado e uma cabeleira loira no outro lado através da grama crescida que tinha sido achatada sob as enormes patas
traseiras do dragão... Patas... Garras... Tanto faz.
A fera a mantinha junto para o passeio para o resto da diversão e jogos. Falando de uma refeição saudável. Em seu rastro, braços e pernas, mais cabeças – raramente
um torso, por que isso era provavelmente bom de comer – cobriam o chão. Felizmente nada parecia ser um Irmão ou um lutador, mas oh, Deus, o cheiro. Ela ia ter que
higienizar seu nariz por um mês depois disso.
Justo quando estava perdendo a noção do tempo, no exato momento em que não tinha certeza se podia aguentar por muito mais tempo, o ímpeto do animal diminuiu a velocidade
e parou. A sua cabeça grande balançou pra esquerda e pra direita. Seu corpo deu a volta. Mais uma busca.
A paisagem parecia vazia de qualquer coisa que se movesse, estático, prédios decadentes, árvores sem folhas e sombras escuras que permaneciam onde quer que olhasse.
Os Irmãos ainda tinham de estar no campus; de maneira nenhuma que iriam embora sem Rhage. Mas sem dúvida eles estavam assistindo o grande dragão por trás de uma
boa cobertura. E, assim com os lessers? O saldo do inimigo deve ter caído fora, sendo incapacitado ou ter sido comido.
O ataque maciço parecia ser mais...
Querido Deus, a carnificina deixada para trás. Como eles iam limpar isto? Deviam haver uns cem lessers no retorcido chão, mesmo se eles estivessem apenas em pedaços.
Mary acariciou a palma da mão na base grossa da cauda.
— Obrigado por me manter segura. Pode me descer agora.
A besta não estava tão confiante quanto ela estava e continuou a examinar a cena da batalha, os músculos dos seus ombros se contraindo, aquelas enormes patas traseiras
tensas e prontas para saltar. Nuvens de vapor do hálito quente saindo de suas narinas, queimando no ar frio da noite como parte do show de um mágico.
— Está tudo bem. – Disse ela, acariciando aquelas escamas.
Engraçado, teria pensado que as coisas seriam ásperas, mas eram suaves e flexíveis, um fino entrelaçamento de camadas que mudava com os movimentos do dragão e mostrava
todas as cores do arco-íris em cima de uma base roxa.
— Realmente está tudo bem.
Depois de um momento, a cauda da besta desenrolou e ela desceu para o chão.
Puxando seu casaco e suas roupas de volta no lugar, ela olhou ao redor.
Em seguida, colocou as mãos nos quadris e olhou para cima.
— Ok, garotão, você fez um ótimo trabalho. Obrigada... Estou orgulhosa de você. – Quando a coisa orgulhosa abaixou a cabeça, ela acariciou o focinho. — É hora de
ir, apesar de tudo. Você pode deixar o Rhage voltar?
Aquela grande cabeça foi lançada no ar, o sangue negro dos lessers que tinha consumido piscando como um revestimento oleoso abaixo da garganta e no peito. Estalando
as mandíbulas duas vezes, os dentes e presas travando com um som como dois SUVs batendo um no outro, grelha a grelha. O rugido que veio a seguir foi de protesto.
— Está tudo bem, – Ela murmurou enquanto permanecia em pé. — Eu te amo.
A besta abaixou o focinho e assoprou para fora o ar úmido.
E então bem desse jeito, seu corpo entrou em colapso, um castelo de areia caído com uma onda, uma estatueta de cera aquecida dissolvida em uma poça. Em seu lugar,
Rhage apareceu de cara no chão, sua enorme tatuagem de volta enrolando-se à sua volta, suas pernas nuas dobradas como se seu estômago já o incomodasse.
— Rhage, – Ela disse quando se agachou ao lado dele. — Você está de volta, meu amor.
Quando não houve resposta, nem mesmo um gemido de “vou vomitar”, ela franziu a testa.
— Rhage...?
Quando colocou a mão no ombro dele, a imagem tatuada do dragão em sua pele ganhou vida, deslocando-se de modo que sua cabeça estava sob o toque dela.
— Rhage? – Ela repetiu.
Por que ele não estava se movendo? Normalmente ficaria desorientado e com dor, mas sempre se virava para ela, assim como a tatuagem da besta fez, buscando cegamente
sua voz, seu toque, sua conexão.
— Rhage.
Alcançando a parte superior do braço, colocou toda sua força para puxá-lo mais plano contra o chão.
— Oh Deus…!
Havia sangue vermelho no peito. No meio de todas as manchas negras que a besta tinha consumido, havia uma fonte de sangue vermelho muito real, muito terrível e de
grande expansão no centro de seu torso.
— Socorro! – Ela gritou para a paisagem. — Socorro!
Os Irmãos já estavam vindo de todas as direções, abandonando seus esconderijos, correndo através do campo de batalha que estava cheio de lessers mutilados. E à direita
em seus calcanhares, como um farol de um Deus benevolente, vinha a unidade móvel e cirúrgica de Manny – o trailer-ambulância se dirigia para eles com o bom pé pesado
do médico no acelerador.
Mary avistou Vishous na multidão por causa de sua experiência em resgate médico.
— Você precisa ajudá-lo!
Aquela mancha vermelha... Estava à direita no esterno do Rhage.
E seu hellren tinha um coração forte, mas não era impenetrável.
O que tinha acontecido?
Capítulo SETE
Vishous foi o primeiro a chegar no Rhage enquanto o irmão ressurgia da carne do dragão... e merda, foi de pré-besta má a pós-maldição pior. O cara não estava se
movendo, não estava respondendo nem à sua shellan. Sua coloração era cinzenta como uma lápide de granito e havia um monte de sangue vermelho.
O que era apenas a ponta do iceberg. A verdadeira questão era quanto devia ter dentro daquela cavidade torácica.
— Ajude-me! – Mary disse enquanto colocava as mãos sobre a ferida e empurrava para baixo como se estivesse tentando conter o vazamento. — Ajude-o, oh, Deus, V...
O bom era que a unidade cirúrgica pisou nos freios e Jane tinha vindo com Manny, tendo se transferido através de seu próprio veículo. Assim que os cirurgiões bateram
as portas da frente do trailer, ambos os médicos atingiram o chão correndo com mochilas pretas cheias de equipamentos médicos.
— Eles estão aqui – V disse. Não que o par pudesse fazer muita coisa.
— Será que ele foi baleado? Eu acho que ele foi baleado. Oh Deus...
— Eu sei, venha aqui. Deixe-os olharem...
Mary sacudiu a cabeça e lutou contra ser puxada para trás.
— Ele está morrendo...
— Dê-lhes algum espaço para trabalhar. Vamos.
Porra, isso era culpa dele. Se não tivesse confrontado... Mas que porra. A visão tinha sido o que tinha que ser, e era exatamente isso aqui e agora: Rhage de costas
no chão nu, seu sangue por toda parte, V segurando Mary enquanto ela puxava e chorava.
— Um único tiro. – V anunciou. — Provável hemorragia cardíaca com tamponamento e derrame pleural.
Deus, queria que pudesse cobrir os ouvidos de Mary quando falou, mas como se ela já não soubesse o que era!
Os médicos não desperdiçaram um segundo, verificando sinais vitais enquanto Ehlena saltava para os fundos do trailer trazendo a maca com ela.
Vishous captou o olhar de sua companheira enquanto Jane escutava os sons cardíacos de Rhage, e quando ela balançou a cabeça ele soube, sem quaisquer outras palavras,
que tudo o que tinha adivinhado era verdade.
Merda.
— O que eles estão fazendo? – Mary balbuciou contra ele. — O que eles vão fazer?
V abraçou a fêmea mais apertado enquanto ela continuava a murmurar em seu ombro, a cabeça virando em direção a seu companheiro.
— Eles estão indo ajudá-lo, certo? Estão indo consertá-lo... Certo?
Jane e Manny começaram a falar em linguagem médica, e quando Vishous pegou a essência das palavras, fechou os olhos brevemente. Quando bateu as pálpebras novamente,
Manny estava de um lado de Rhage, colocando um dreno de tórax para drenar os fluídos em torno dos pulmões e Jane estava realizando uma pericardiocentese com uma
agulha que parecia tão longa quanto seu braço.
O que era um movimento de vai-com-tudo.
Normalmente este procedimento era feito com a orientação de ultrassom, mas ela não tinha escolha a não ser ir cegamente através do quinto ou sexto espaço intercostal
ao lado do coração.
Se ela errasse? Entrasse fundo demais?
Mary lutou em seus braços.
— O que eles estão fazendo...
— Ele está parando. – Manny vociferou.
— Rhage!
Ehlena estava lá com as pás, mas o quanto era bom em caso de uma enorme hemorragia? Inferno, mesmo se o dreno do tórax e a agulha fizesse o trabalho, nenhum dos
dois corrigiria o trauma cardíaco. A única chance de verdadeira sobrevivência era colocar o Irmão em uma máquina de circulação sanguínea (bypass) então Jane poderia
trabalhar sua magia e reparar seja qual for a ruptura ou perfuração sem sangue e sem movimento.
Abruptamente, tudo ficou em câmera lenta quando Rhage abriu os olhos, respirou fundo... E virou o rosto para Mary.
Seus lábios brancos começaram a se mover.
Mary empurrou contra o abraço de V e ele a soltou, permitindo que fosse até ele. Pelo amor de Deus, esta poderia ser a última chance da fêmea se comunicar com seu
companheiro. Fazer as pazes com ele. Resolver seus acertos para encontrá-lo do outro lado.
Vishous franziu a testa quando a imagem de sua mãe abandonada, deitada naquele estrado, voltou para ele.
É melhor você cumprir a porra da sua promessa, ele pensou para os céus. É melhor assumir a responsabilidade e tomar conta dos dois. Seria fodidamente melhor você
fazer certo a respeito daquela promessa, ele pensou para os céus. Seria melhor você levantar o homem e cuidar dos dois.
Mary caiu de joelhos ao lado da cabeça de Rhage e colocou a orelha em sua boca. O fato de que a equipe médica recuou sem dúvida foi perdido para ela, mas Vishous
sabia o que isso significava, e não era nada bom.
Que o ritmo do coração que estava sendo monitorado tão atentamente não estava ficando mais estável. Que a pressão arterial não estava ficando mais forte. Que a hemorragia
não estava parando. E o tubo e a agulha não foram longe suficiente.
V olhou para Butch, e quando o policial olhou para o outro lado do drama, V pensou sobre como os três formaram um vínculo tão apertado. A trindade, eles eram chamados.
Grudados como carrapatos e chatos como a merda, nas palavras de Tohr.
V olhou em volta. Os outros Irmãos estavam em circulo fechado, formando uma barreira de proteção e preocupação em torno de Rhage e Mary. No entanto, nenhum dos combatentes
tinha suas armas à mostra e, de tempos em tempos, um tiro soava quando eles atiravam nos lessers cujos corpos iam mostrando muita animação.
Quando Mary começou a falar com suave desespero, Vishous amaldiçoou novamente quando ficou claro para ele que, mesmo embora o casal tivesse um final que resultava
em ficar juntos, o resto deles estava perdendo Rhage e Mary. Maldição, era impossível imaginar a mansão sem eles.
Merda era supor não afundar com isso.
Risque isso, pensou, enquanto lembrava-se de sua visão. Não queria que acabasse assim. V moveu os olhos para sua companheira, e quando Jane apenas balançou a cabeça,
seu sangue gelou.
Jesus Cristo, não.
De repente uma imagem de Rhage na mesa de pebolim do Pit veio à mente. O Irmão não estava jogando no momento; estava em pé ao lado, comendo com vontade algum tipo
de burrito do Taco Bell. Estava comendo com as duas mãos, na verdade, com um chimichanga na outra mão. Alternando mordidas, o FDP consumindo cerca de quatro mil
calorias, com o sorvete de chocolate com menta crocante que ele tinha conseguido de sua geladeira, e metade de um bolo de chocolate que ele pegou de sobremesa antes
de vir da casa principal.
Ei V, o Irmão disse em um momento. Você algum dia vai raspar essa barbicha feia em torno de sua boca grande? Ou vai continuar parecendo um dos rejeitados da Affiliction2
como um serviço público para o que não fazer com uma gilete?
Irritante pra caralho.
E ele não daria sua bola restante para ter qualquer parte disso novamente. Mesmo se apenas como adeus.
O tempo era demasiado finito: não importa quanto dele você teve com alguém que amava, quando o fim chegava, não era o suficiente.
— Eu te amo. – Mary disse com voz quebrada. — Eu te amo…
Enquanto ela acariciava o cabelo loiro de Rhage da testa, sua pele estava tão fria e estranhamente seca. Sua boca manchada de sangue estava se movendo, mas ele não
tinha ar suficiente em seus pulmões para falar e, oh Deus, eles estavam cinza... Seus lábios estavam ficando...
Mary olhou para Manny. Dra. Jane. Ehlena. Então encontrou os olhos dos Irmãos. John Matthew. Blay e Qhuinn.
Por último olhou para Vishous... E ficou horrorizada com a luz distante em seus olhos.
Eles tinham desistido. Todos eles. Ninguém estava correndo para empurrá-la pra longe do caminho para que pudessem entubar seu companheiro, ou dar choque em seu coração
para voltar ao ritmo, ou rachar sua caixa torácica aberta e fazer o que fosse preciso para conseguir o que quer que estivesse errado voltar a funcionar em ordem.
Rhage arqueou com um gemido e tossiu um pouco mais de sangue. E quando ele começou a engasgar, ela conheceu uma nova definição de terror.
— Eu vou te encontrar, – Disse a ele. — No outro lado. Rhage! Está me ouvindo? Vou te encontrar no outro lado!
O ofegar e barulho, a dor em seu rosto, a agonia do grupo ao seu redor... Tudo tornou-se tão cristalino que doía os olhos e ouvidos, manchando seu cérebro para sempre.
E estranhamente, pensou em Bitty e sua mãe e o que tinha acontecido na clínica.
Oh merda, se ela deixasse o planeta... O que ia acontecer com a garota? Quem iria cuidar tanto como ela cuidava da agora órfã?
— Rhage... – Mary puxou seus ombros. — Rhage! Não! Espere, fique aqui...
Mais tarde ela tentaria trazer à tona por que a conexão sináptica foi feita quando o fez. Ela saberia como ela tinha, possivelmente, pensado em tudo... Teria suores
frios sobre o que teria acontecido em seguida e o que não teria acontecido em seguida... Se aquele raio não tivesse saído do nada quando o fez.
Às vezes escapar de um acidente por milímetros era quase tão traumático quanto o impacto.
Mas tudo isso veio depois.
No momento do falecimento de seu amado, no mesmo instante em que sentiu que ele havia deixado seu corpo para fazer a viagem para o Fade... De repente, e sem motivo
que pudesse pensar, ela vociferou:
— Role-o de lado. Façam isso!
Começou a puxá-lo sozinha, mas não deu em nada, ele era muito pesado e ela não podia conseguir um bom aperto em seu tronco maciço.
Olhando para cima, acenou para os Irmãos.
— Ajudem-me! Porra, me ajudem!
V e Butch caíram ao lado dela e viraram Rhage para seu lado direito. Arqueando em volta de seu companheiro, Mary recuou para o outro lado. As cores brilhantes da
tatuagem do dragão estavam desaparecendo, como se o brilho da imagem fossem um termômetro da saúde de Rhage. Focando novamente, colocou a mãos sobre a forma da besta,
Deus, ela odiava como a resposta foi lenta.
— Vem comigo, – Ela disse com urgência. — Preciso que você venha comigo.
Isso era loucura, pensou enquanto passava lentamente as palmas das mãos em torno do torso de Rhage, mas alguma coisa a guiava, algum tipo de vontade que certamente
não sentiu como dela própria. Porém não ia discutir como a imagem da besta seguia seu toque... E era estranho: não foi até ela fazer o caminho nas costelas que percebeu
o que estava fazendo.
Louca, pensou novamente. Completamente louca.
Vamos lá, não era como se o dragão tivesse sido treinado em medicina de emergência e muito menos cirurgia cardíaca.
Mas ela não parou.
— Ajude-me, – Ela disse engasgada para a besta. — Oh, por favor... Vamos lá, ajude-o, salve-o... Salve a si mesmo salvando-o...
Simplesmente não podia deixar Rhage ir. Não importava nestes últimos momentos que havia uma saída cósmica para os dois, que por causa do que a Virgem Escriba tinha
dado a ela, eles não tinham que se preocupar com algum tipo de separação. Ela ia tentar salvá-lo.
Trabalhando com ela, os Irmãos viraram Rhage deitado de costas novamente, e as lágrimas de Mary caíram sobre o peito nu de seu companheiro enquanto ela transferia
as mãos sobre o ilusoriamente pequeno buraco de cerca de uma polegada à direita de seu esterno.
Deus, sentia como se a ferida fosse do tamanho de uma sepultura.
— Apenas cure-o... De alguma forma, por favor... Por favor...
A tatuagem permaneceu onde ela parou.
— Cure isso…
O tempo parecia rastejar, e com os olhos lacrimejantes olhou para o peito de Rhage esperando por um milagre. Enquanto os minutos passavam e ela transitava para um
plano emocional miserável que era mais tenso que pleno pânico, muito menor do que totalmente deprimida, e tão vasta que era duas vezes o tamanho da galáxia, pensou
novamente no que Rhage dissera sobre as horas que ele passou ao lado da cama dela naquele hospital humano: sabendo que ela ia morrer, incapaz de fazer nada, perdido
embora soubesse o lugar de onde o corpo físico dele estava.
Era como se a gravidade não tivesse controle sobre mim, ele disse, e ainda assim estava me esmagando ao mesmo tempo. E então você iria fechar os olhos e meu coração
iria parar. Tudo o que eu conseguia pensar era que, em algum momento no futuro, você ia ter essa aparência para sempre. E a única coisa que eu sabia com certeza
era que eu nunca seria o mesmo, e não de uma boa maneira... Por que eu sentiria sua falta mais do que jamais iria importar com qualquer outra coisa na minha vida.
Mas então a Virgem Escriba tinha mudado tudo isso.
No entanto, aqui estava Mary... Lutando para mantê-lo vivo.
E o porquê... Quando ela realmente focou na questão... Parecia errado, tudo errado, e ainda assim ela não iria parar.
No início, a chama de calor não foi registrada no meio de todas as suas emoções. Havia muito na frente de sua mente e a mudança de temperatura foi muito sutil. O
calor logo se tornou impossível de ignorar, no entanto.
Piscando os olhos, franziu a testa para baixo, para suas mãos.
Não se atreveu a afastar as palmas das mãos para ver o que estava acontecendo embaixo.
— Rhage? Rhage... Você está conosco?
O calor rapidamente se tornou tão intenso que irradiava pelos braços dela e aquecia o ar que respirava quando se inclinou sobre seu companheiro. E então sentiu um
tranco, como se a besta estivesse rolando por perto...
Sem qualquer aviso, Rhage abriu a boca, lançando uma inspiração gigante e empurrou seu torso do chão, jogando-a de bunda no chão. Enquanto as mãos dela voavam, a
tatuagem foi revelada e estava…
A imagem do dragão tinha perdido seus contornos, suas cores num redemoinho em conjunto e ainda permaneciam distintas, como uma daquelas antigas coisas spin-art que
ela tinha feito nas feiras quando era pequena.
Ela não podia mais ver a ferida da bala.
Houve um suspiro coletivo, seguido por alguns sérios “mas que porra é essa?” e em seguida uma série de aleluias que foram proferidas com um sotaque de Boston.
— Mary? – Rhage engasgou confuso.
— Rhage!
Só que antes que ela pudesse alcançá-lo, ele começou a tossir em grandes espasmos, dobrando a cabeça para frente, apertando sua barriga distendida, sua mandíbula
se estendendo.
— O que há de errado com ele? – Mary disse quando chegou para frente, mesmo que isso não fosse como se pudesse fazer qualquer coisa para ajudar. Inferno, os médicos
pareciam igualmente confusos, e eram eles que tinham o Dr. na frente de seus nomes.
Rhage tossiu a maldita bala pra fora.
Direto na mão dela.
Por último, um grande arquejo, algo veio voando de sua boca e ela pegou o pedaço pontiagudo de chumbo por reflexo... Quando Rhage abruptamente começou a respirar
profundamente, inalando facilmente como se não tivesse nada de errado com ele.
Girando a coisa sobre a palma, ela começou a rir.
Não pôde evitar.
Segurando a bala entre o polegar e o indicador, ela a ergueu para os Irmãos, os médicos e os guerreiros, por que Rhage ainda estava cego. E então montou nas pernas
estendidas de seu companheiro e tomou seu rosto entre as mãos.
— Mary...? – Ele disse.
— Estou bem aqui, – Ela alisou o cabelo dele para trás. — E você também.
Instantaneamente ele se acalmou ainda mais, um sorriso repuxando sua boca.
— Minha Mary?
— Sim... Estou bem aqui.
E então, querido Senhor, ela estava chorando tanto que se tornou tão cega quanto ele estava. Mas isso não importava.
De alguma forma, a besta tinha feito o trabalho e...
— Mary, eu...
— Eu sei, eu sei, – Ela o beijou. — Eu te amo.
— Eu também, mas vou vomitar.
E com isso, ele a tirou suavemente para fora da linha de fogo, virou-se para o lado e vomitou tudo sobre os shitkickers de Vishous.
Capítulo OITO
Era uma maneira e tanto de voltar dos mortos.
Enquanto Rhage jogava seus biscoitos por toda parte, seu cérebro era nada mais que ovos mexidos...
Okay, não era uma boa ideia pensar em ovos de qualquer forma.
Uma segunda rodada das evacuações abdominais tomaram seu corpo, contorcendo-o da cabeça aos pés, e enquanto ele deixava seu estômago falar, ouviu a voz seca de V
ao longe.
— Não é minha noite, – O Irmão resmungou. — Não é minha noite com os vômitos.
Huh? Rhage pensou antes de deixar pra lá. Tudo que realmente se importava, fora o fato de que ele agora podia respirar e falar de novo, era sua Mary. Esticando seu
braço pra fora, procurou contato com ela de novo... E ela pegou sua palma na mesma hora, entrelaçando com a dele, segurando, isso o acalmava e ao mesmo tempo lhe
dava energia.
No instante que a conexão foi feita, sua confusão começou a dissipar.
Não, isso não estava exatamente certo. Ele não tinha ideia de como conseguiu ir de estar parado na porta do Fade, encarando a escolha que estava atônito de estar
confrontando mesmo estando ciente de que estava morrendo... Para de alguma forma estar sendo jogado de volta no seu próprio corpo e escutando claro como o dia a
voz mais perfeita da sua Mary, sem a interferência estática do medo e dor.
Nenhum ponto desse mistério foi esclarecido... Mas simplesmente estava cagando pra isso. Contanto que sua Mary estivesse com ele? O resto era merda que ele...
— Machucado? – Ele falou de repente. — Alguém está machucado?
A Besta teria...
— Todos estão bem. – Ela disse a ele.
— Me desculpe por estar doente. – Deus, o visual pós-festa do blackout era horrível, mas aguentaria isso no lugar de uma soneca na terra em qualquer dia e duas vezes
no domingo, como os humanos diriam. — Eu sinto muito...
— Rhage, precisamos colocar você dentro do RV. E não, não vou deixar você. Jane vai só verificar seus sinais vitais e então nós vamos dar o fora daqui. Não é seguro.
Oh, certo. Eles estavam no campus, no campo de batalha, sem dúvida alvos fáceis.
Com uma explosão de memória, tudo voltou pra ele. A discussão com V... A corrida no campo...
A bala no seu coração.
Com sua mão livre bateu no peito, tateando para encontrar o furo, procurando sangue... E descobrindo que apesar de ter o torso molhado e pegajoso... Não havia nenhum
ferimento discernível.
Só uma parte estranha naquele centro que parecia incandescente com o calor de uma fogueira. E foi aí que a comichão começou. Iniciando com a área sobre seu coração,
mudou ao redor em um remendo sólido, traçando sobre suas costelas, fazendo cócegas debaixo do seu braço, movendo até o centro das suas costas.
Era a Besta voltando para sua posição. Mas por quê?
É, arquive isso no final de uma fila bem longa de hã — o quê?
— Mary, – Ele falou em sua cegueira. — Mary...?
— Está tudo bem, vamos só sair daqui juntos, e quando estivermos a salvo, vou explicar tudo... Ou ao menos contar o que sei.
Pela próxima hora, sua shellan cumpriu sua promessa... Mas quando que ela desapontou alguém? Ela ficou ao lado dele a cada centímetro do caminho, desde o momento
em que foi colocado na maca e ganhando um passeio atribulado na RV do Manny... Da evacuação difícil no gramado crescido do campus até o caminho macio das ruas pavimentadas
da avenida... Do pare-e-continue do sistema de segurança do Centro de Treinamento da Irmandade... Até finalmente a chegada no quarto de recuperação da clínica.
A viagem o exauriu... Mas também, passou a maior parte do tempo vomitando partes de lessers e engasgando no gosto nauseante do sangue negro deles. E era engraçado:
normalmente passava por essa parte puto da vida e pronto para o sofrimento acabar logo. Nessa noite? Estava tão grato de estar vivo que não se importava de ter a
pior indigestão/dor de barriga/infecção estomacal do mundo acontecendo.
Você vai morrer hoje à noite, porra!
Maldição, Vishous estava sempre certo. Exceto que Rhage tinha de alguma forma derrotado a previsão e voltado do Fade: por alguma razão, por algum milagre, estava
de volta... E não achava que era por que a Virgem Escriba tinha feito um favor pra ele. Ela já tinha feito um depósito digno de prêmio da loteria na sua conta existencial
quando salvou sua Mary e, além disso, pelos últimos dois anos, a Mãe da Raça esteve sem contato como aquele parente estranho que você agradece por se manter longe.
Então seu irmão estava errado? A resposta curta para isso é sim, considerando que Rhage estava nesse momento deitado na cama de hospital ao invés de alguma nuvem
no céu.
Mas por quê?
— Aqui, – Sua Mary disse. — Eu tenho o que você precisa.
Verdade em tantos níveis, pensou enquanto virou sua cabeça em direção ao som da voz dela. Quando uma série de bolhas fizeram cócegas no seu nariz, ele estremeceu
de alívio.
Plop-plop, fizz-fizz, porra, sim.
— Obrigado, – Ele balbuciou, por que estava com medo que se tentasse enunciar demais as palavras ia começar a vomitar de novo.
Ele bebeu tudo que estava no copo e deitou de novo contra os travesseiros... E então o som de Mary colocando o copo vazio de volta e a sensação do peso dela sobre
o colchão o fez lacrimejar por alguma razão estúpida.
— Eu vi o Fade, – Falou quietamente.
— Você viu? – Ela pareceu estremecer, a cama transmitiu o sutil tremor de onde estava sentada. —É realmente assustador escutar isso. Como foi?
Ele franziu a testa.
— Branco. Tudo era branco, mas não tinha nenhuma fonte de luz. Foi esquisito.
— Eu teria encontrado você, você sabe. – Ela respirou fundo. — Se você não tivesse voltado, eu teria... Não sei como, mas teria encontrado você.
O ar que ele soltou durou o tempo de uma vida pra ele.
— Deus, eu precisava escutar isso.
— Você pensou o contrário?
— Não. Bem, exceto por me perguntar se era possível. Você deve ter pensado a mesma coisa ou não teria se esforçado tanto para me salvar.
Houve um momento de silêncio.
— Sim, – Ela suspirou. — Eu queria salvar você.
— E estou contente que funcionou. – Mesmo, ele estava. Honestamente. — Eu, ah...
— Você sabe que amo muito você, Rhage.
— Por que isso soa como uma confissão? – Ele forçou uma risada. — Só estou brincando.
— Eu realmente odeio a morte.
Okay, alguma coisa estava acontecendo. E não era só a respeito dele. Ela soava estranhamente... Derrotada, o que não era o sentimento de uma fêmea que tinha arrastado
o traseiro triste do seu hellren de volta da porta da morte. Tipo. Literalmente.
Rhage tateou ao seu redor tentando achar as mãos dela, e quando a segurou, elas tremeram.
— O que mais aconteceu hoje à noite? E não diga “nada”. Eu posso sentir sua emoção.
Mas não podia sentir o cheiro. Tinha muito cheiro de lesser no seu nariz e no seu sistema digestivo. Você quer falar sobre a porra da doença do refluxo gastresofágico?
— Não é tão importante quanto você, – Ela se virou para beijá-lo na boca. — Nada é tão importante quanto você.
Onde você está? Ele se perguntou. Minha Mary... Para onde você foi?
— Deus, eu estou cansado, – Ele falou no silêncio entre eles.
— Quer que eu te deixe sozinho para que consiga dormir?
— Não. – Rhage apertou as mãos dela e sentiu como se estivesse tentando prendê-la à ele. —Nunca.
Na quietude do quarto do hospital, Mary se pegou estudando o rosto de Rhage como se estivesse tentando tornar a memorizar os traços que conhecia tão bem e que estavam
marcados no seu cérebro. Mas então, ela não estava realmente se prendendo à toda aquela beleza ímpia. Estava procurando por alguma coragem dentro de si mesma. Ou
algo assim.
Você pensaria, levando em consideração a profissão dela, que seria melhor em momentos como aquele.
Conte a ele, pensou. Fale sobre Bitty e sua mãe, e o fato de ter feito merda no seu emprego e estar se sentindo como uma fracassada.
O problema era, toda aquela confissão tagarela orientada parecia tão egoísta considerando que ele tinha morrido uma hora atrás: era como encontrar alguém que teve
um acidente de carro feio e querer explicar para essa pessoa como sua noite foi ruim também, por que você conseguiu uma multa por excesso de velocidade e um pneu
furado.
— Eu teria absolutamente ido e encontrado você de alguma forma, – Enquanto repetia as palavras que já tinha dito, sabia que ele tinha acertado o prego na cabeça...
Por que sentia como se tivesse algo a confessar. — Mesmo, eu teria.
Ótimo, agora ela estava com náuseas.
Exceto, Deus, como podia dizer pra ele que lutou tanto para salvá-lo não por causa deles e sua relação, ou até mesmo pelos seus Irmãos e a tragédia que a perda dele
teria sido para todos, mas por causa de outra pessoa inteiramente diferente? Mesmo que esse alguém e todos os problemas dela fosse uma causa a se discutir? Mesmo
que essa terceira parte fosse uma criança recém órfã no mundo?
Só que parecia como uma traição aos dois e suas vidas juntos. Quando você encontra amor verdadeiro, quando recebe esse presente, você não toma decisões de vida ou
morte baseadas em problemas ou situações de ninguém mais. A menos que fosse seu filho, claro... E os céus sabiam que ela e Rhage nunca, jamais teriam qualquer criança.
Okay, ai. Aquilo doeu.
— O que dói? – Rhage perguntou.
— Desculpe. Nada. Sinto muito, só foi uma longa noite.
— Entendo o sentimento, – Ele soltou a mão dela e esticou seus enormes e largos braços, os músculos marcando sua pele e formando sombras afiadas. — Venha deitar.
Me deixe me sentir como um macho ao invés de um pedaço de carne, quero abraçar você.
— Você não precisa pedir duas vezes.
Esticando ao lado dele na cama, colocou sua cabeça no peito dele, bem sobre o esterno dele, e respirou fundo. Enquanto a sombria especiaria do aroma de vinculação
dele florescia no ar, ela fechou seus olhos e tentou dissipar toda a discriminação caótica que estava tropeçando e caindo dentro do seu crânio, palhaços de circo
que ela não achava graça nenhuma.
Felizmente, o contato com a pele de Rhage, seu calor do corpo, sua vital presença era como Valium sem os efeitos colaterais. Tensão lentamente deixou seu corpo e
aqueles bastardos com os narizes de borracha, as perucas baratas e os sapatos idiotas sumiram no plano de fundo.
Sem dúvida eles voltariam. Mas não podia se preocupar com isso agora.
— Está batendo tão forte de novo, – Ela murmurou. — Eu amo o som do seu coração.
Amava também a subida e descida estável do seu poderoso peitoral.
E quem diria... A visão de toda aquela pele macia e sem pelo sobre aqueles pesados músculos não era ruim também.
— Você é tão grande. – Falou enquanto esticava o braço e nem conseguiu circular o torso dele.
A risada que reverberou através dele foi um pouco forçada. Mas ele deu continuidade a ela.
— É? Me conte como eu sou grande.
— Você é muito, muito grande.
— Só meu peitoral? Ou está pensando em... Outros lugares?
Ela conhecia aquele tom muito bem... Estava inteiramente ciente de onde seu companheiro tinha ido com a cabeça – e certa o bastante, quando olhou ainda mais pra
baixo do seu corpo coberto pelo lençol, cada centímetro dele estava claramente ainda funcional, indiferente da experiência de quase morte.
Particularmente um certo trinta centímetros. Mais ou menos.
Seus olhos foram em direção à porta e desejou que a coisa estivesse trancada. Havia tantas pessoas da equipe médica por ali – okay, só três. Mas quando você estava
querendo um pouco de privacidade, eram três a mais do que se queria.
Quando Rhage girou os quadris, aquele enrijecimento debaixo dos lençóis acertou um ponto dela que o fez morder o lábio inferior, e Mary sentiu seu corpo inteiro
responder com uma onda de calor. Deus, odiava a estranha distância que os tinha separado, aquela sutil desconexão que sentia a um tempo agora: de alguma forma, mesmo
que o amor deles não tivesse diminuído, eles pareciam ter perdido o toque um com o outro... Apesar do fato deles dizerem os seus Eu Amo Você todas as vezes certas
e dormirem na mesma cama, e não se imaginarem com mais ninguém.
Mas pensando bem, quando foi a última vez que tiraram a noite de folga, qualquer um dos dois?
Rhage esteve ocupado com a guerra e os ataques contra Wrath e seu trono – e desde que Bitty e sua mãe chegaram ao Lugar Seguro, Mary teve uma preocupação profissional
que não a deixou descansar. Diabos, a preocupação por Bitty e Annalye esteve com ela até mesmo quando estava dormindo.
Em fato, sonhava com a garotinha quase todos os dias ultimamente.
Tempo demais, Mary pensou. Faz tempo demais desde que ela e Rhage focaram neles mesmos de maneira apropriada.
Então, sim, mesmo que fosse um Band-Aid que sem dúvida nenhuma seria temporário, e apesar do lugar público em que eles estavam, e sim, sem nenhuma consideração pelo
fato de que Rhage estava morto mais cedo... Mary colocou sua mão debaixo dos lençóis e desceu sua palma lentamente pelo estômago definido do seu companheiro.
Rhage chiou e gemeu, sua pélvis girando de novo, seus braços esticando para que pudesse segurar nas barras da cabeceira da cama.
— Mary... Eu quero você...
— O prazer é meu.
A excitação dele era grossa e longa, e enquanto a circulava, a sensação aveludada dele e os sons que ele fazia no fundo da garganta e o modo que o aroma de vinculação
ascendia ainda mais era exatamente o tipo de proximidade que eles precisavam. Isso era só sobre eles; nada mais era bem-vindo – o emprego dela, o dele, as preocupações
nem o estresse dele. A esse respeito, sexo era como o melhor limpador do mundo, levando embora a poeira e as coisas cotidianas da Vida Normal que tinham entorpecido
a conexão deles, deixando o amor que tinham um pelo outro fresco e espumante como nunca.
— Monte em mim, – Rhage exigiu. — Fique nua e suba em mim.
Mary olhou pro equipamento medico que estava ao redor da cama dele e quis falar um palavrão. Muitos bipes na tela.
— E quanto às maquinas? As coisas estão ficando muito excitantes.
— Beeeeem, é por que eu estou começando realmente a ficar excitado.
— Se eles aumentarem muito...
Bem ao sinal, o monitor cardíaco disparou o alarme estridente. E assim que Mary arrancou sua mão de debaixo, Ehlena entrou correndo no quarto.
— Está tudo bem, – Rhage disse para a enfermeira com uma risada. — Estou bem. Confie em mim.
— Só vou checar as coisas... – Então Ehlena parou. E sorriu. — Oh.
— É, oh. – Rhage tinha aquela colossal cara de pau de se recostar como um leão que estava prestes a ser alimentado. Ele até piscou na direção geral de Mary. — Então
você acha que talvez pode me desconectar só um pouquinho?
Ehlena riu e sacudiu a cabeça enquanto arrumava a máquina.
— Sem chance. Não até você ter mais tempo estabilizado satisfatoriamente.
Rhage se inclinou até Mary e sussurrou.
— Eu quero você de volta satisfatoriamente. É isso o que eu preciso.
A enfermeira foi em direção à porta.
— Estou logo ali na sala de cirurgia se precisarem de mim. Estamos prestes a operar.
Rhage franziu a testa.
— Operar quem?
—Houve alguns feridos. Nada sério, não se preocupe. Comportem-se vocês dois, ok?
— Obrigada Ehlena, – Mary deu tchau para a outra fêmea. — Você é a melhor.
Quando a porta fechou, Rhage baixou o tom da voz.
— Me desconecte.
— O quê?
— Ou você faz ou eu faço, mas preciso de você, agora.
Quando Mary não se moveu, Rhage começou a tatear cegamente procurando as máquinas, batendo em alguns computadores na mesa que parecia custar mais do que uma casa.
— Rhage! – Mary começou a rir enquanto segurava as mãos dele. — Qual é...
E então ele a ergueu e colocou sobre os quadris dele, ajustando-a no topo da sua ereção. E sim, assim que o peso dela pareceu ser registrado, aquele bip-bip-bip
começou de novo.
— Você pode me conectar de volta assim que eu acabar, – Informou a ela. — E mesmo sendo um sacrifício, se quiser só me masturbar, concordo em esperar por você mais
tarde. Mas cheguei perto da morte hoje uma vez já, não faça seu hellren morrer de desejo.
Mary teve que sorrir pra ele.
— Você me mata.
—E você podia me tocar? Por favor?
Ela sacudiu a cabeça apesar do fato de que ele não podia vê-la.
— Você simplesmente não aceita não como resposta, não é?
— Quando se refere à você? – Rhage ficou sério, seus olhos azuis cor das Bahamas a encarando cegamente, sua linda face sombria. — Você é tanto minha força quanto
minha fraqueza, minha Mary. Então o que me diz? Quer completar minha noite? E devo te lembrar... Eu morri nos seus braços mais cedo.
Mary soltou uma gargalhada e enquanto caiu pra frente sobre ele, colocou sua cabeça contra o pescoço dele.
— Eu amo tanto você.
— Ahhhhhh, isso é o que eu gosto de ouvir, – Mãos grandes acariciaram as costas dela. — Então o que vai ser, minha Mary?
Capítulo NOVE
Assistir das sombras não era o curso normal para Xcor, filho de ninguém.
Como um guerreiro sem lei e deformado, de fato líder de um time de sociopatas renegados, estava mais acostumado à ação. Preferivelmente com sua foice. Ou faca. Arma.
Seus punhos. Presas.
Ele pode não ser descendente do Bloodletter, como uma vez acreditou, mas de fato foi criado pelo mais cruel guerreiro – e as brutas lições que recebeu no acampamento
de guerra por aquela mão de luvas com espinhos foram bem aprendidas.
Ataque antes de ser atacado era sua primeira e mais importante de todas as regras. E tinha se mantido como seu primário princípio de operação.
Havia vezes, no entanto, quando uma certa neutralidade de ação era requerida, muito mais como um instinto discutindo o contrário, e enquanto se resguardava atrás
de uma carcaça queimada de um carro na pior parte dos becos de Caldwell, ele reinava sobre si. À frente, parado ao lado de uma poça mal iluminada por lâmpadas de
postes de trinta anos de idade, três lessers estavam trocando itens; um par de mochilas sendo entregues por uma única bolsa de pano.
Pelo que havia observado ultimamente nas ruas, estava confiante de que uma carregava dinheiro, e a outra marcada de preto estava carregada de pó e uma variedade
de injetáveis.
Inspirando, discerniu os cheiros e os catalogou. O trio ainda não tinha desbotado para o branco, seus cabelos escuros e castanhos significavam que o recrutamento
deles era recente na Sociedade Lesser – e de fato, aquilo era tudo que se encontrava no Mundo Novo. Desde que ele e seu bando de bastardos fizeram a viagem através
do oceano do País Antigo, o único inimigo que eles encontraram eram esses recém-introduzidos, na maioria de variedade inferior.
Era lamentável. Mas onde faltava qualidade tinha uma abundância em quantidade.
E os caçadores encontraram um novo empreendimento nos negócios, não é mesmo? Esse trio em particular, entretanto, não iria muito longe em suas venturas de tráfico.
Assim que eles terminassem com a pequena troca de mãos, ele ia matá-los...
Três toques diferentes de celulares tocaram, todos abafados, todos registrados somente por causa da audição afiada de Xcor. As coisas se moveram rápido dali em diante.
Após cada um deles checar o que só podia ser uma mensagem de texto, eles discutiram por um mero momento; então se enfiaram em um veículo quadrado, o brilho prata
do exterior o qual estava cheio de fotos de tacos e pizza.
Como um analfabeto, ele não conseguia ler o que estava escrito.
Como um guerreiro, ele nunca deixaria que isso o fizesse deixar seu alvo fugir.
Quando o veículo passou por ele, Xcor fechou os olhos e desmaterializou para o topo do carro, encontrando um lugar onde conseguiu se acomodar graças à área mais
baixa atrás de um tipo de saída de ar. Não tinha nenhuma intenção de chamar reforços. Não importa aonde os lessers iriam ou quem encontrariam, se ele fosse dominado,
podia ir embora sem ninguém saber de sua presença.
Palavras mais verdadeiras nunca foram faladas, como ocorreu.
O fato de que o motorista prosseguiu na direção do Rio Hudson não foi uma surpresa. Dado o lugar onde eles estavam vendendo, podia-se facilmente pensar que havia
algum conflito, armado ou não, que precisava de reforços na área das pontes – ou talvez fosse algo com a Irmandade. Mas afinal, aquela rançosa selva de concreto
não era o destino deles. Uma rampa logo foi transposta e a avenida foi seguida com velocidade crescente, tanto que precisou se segurar protegendo seu corpo contra
o vento, enroscando seu braço ao redor da base da barra e segurando forte.
A viagem foi dura, mas não foi por causa do terreno não nivelado, foi mais pelo vento frio e a velocidade.
Não muito depois, no entanto, outra saída foi tomada e a velocidade diminuiu tanto que pôde erguer sua cabeça e identificar a seção suburbana que era o norte do
centro da cidade. Aquela área populosa não durou. Logo uma área mais rural se apresentou.
Não, era um parque ou algo assim.
Não... Era outra coisa.
Quando por fim uma esquerda foi tomada entrando em um tipo de propriedade, não podia dizer onde estava. Era um lote vazio, grama crescida... Ou melhor, era um prédio
abandonado. Uma escola? Sim, ele pensou. Mas o lugar não era mais para humanos.
O cheiro de lessers estava no ar a um nível tão penetrante que seu corpo respondeu às camadas de fedor, adrenalina bombando, os instintos aguçados e prontos para
lutar.
O primeiro dos caçadores mutilados se apresentou em uma dispersão através do gramado crescido, e enquanto o veículo continuou em frente, mais e mais apareceram.
Fechando os olhos, ele se acalmou e desmaterializou até o terraço de um prédio de cinco andares à frente de onde a caminhonete eventualmente parou. Pisando cuidadosamente
sobre os galhos caídos e montes de folhas flutuando nas frias poças de água, Xcor foi até a beirada. A verdadeira escala do que foi um ataque massivo à Sociedade
Lesser era evidente pelos acres de carnificina no centro do campus: uma grande faixa de grama e árvores pisoteadas em camadas com partes de corpos quase mortos,
semi-vivos, de caçadores, e uma onda de sangue negro e oleoso do Ômega.
Era como a própria representação do Dhund.
— A Irmandade. – Ele falou para o vento.
Essa era a única explicação. E enquanto considerava qual tinha sido a estratégia do ataque deles, sentiu inveja que ganharam o presente dessa batalha. Como queria
que tivesse sido ele e seus soldados...
Xcor se virou.
Algo estava se movendo no terraço atrás dele. Falando. Xingando.
Na escuridão e com extremo silêncio, retirou sua lâmina da bainha e se abaixou, apoiando nas coxas. Seguindo em frente no vento frio, seguiu os sons que estavam
na direção do vento e testou o ar. Era humano.
— ... filmagem! Não! Estou dizendo, é uma merda!
Xcor veio por detrás do rato sem rabo, e permaneceu sem ser notado enquanto o humano falava no celular.
— Estou em cima do terraço, peguei a merda em vídeo! Não, idiota, TJ e o Soz se mandaram, mas eu subi aqui... Era um dragão... O que? Não, Jo, o efeito do LSD passou
hoje de manhã... Não! Se é um flashback, por que acabei de postar no YouTube?
Xcor ergueu sua faca acima do ombro.
—Não! Estou falando sério, eu...
O humano calou a boca assim que Xcor o acertou na parte de trás da cabeça com o cabo da sua arma. E quando o corpo amoleceu e caiu para o lado, Xcor pegou o telefone
e colocou no seu ouvido.
A voz de uma mulher estava dizendo:
— Dougie? Dougie! O que aconteceu?
Xcor finalizou a conexão, colocou o telefone na sua jaqueta e se inclinou para pular do terraço. Os três lessers que ele havia acompanhado não foram longe com o
caminhão de comida. Eles pareciam embasbacados pelo que os cercava, incapazes de responder levando em conta a magnitude das perdas.
Melhor cuidar deles primeiro antes que eles caiam fora.
Pisando sobre o macho caído, pulou do prédio, desmaterializando enquanto caía, e tornou a se materializar no chão antes que sofresse o impacto da queda e acabasse
se matando.
O caçador o viu, e isso era exatamente o que queria.
Ia fazer a matança dele um pouco mais desafiadora.
Enquanto os três corriam de volta para a caminhonete, ele se materializou em cima do que estava na traseira, perfurando-o no peito e numa busca mandando-o de volta
para o Ômega em um milhão de flashes e um estouro! Próximo, ele se lançou para frente e agarrou o segundo pelos ombros, tirando o equilíbrio dele e cortando a garganta
antes de jogar de lado. O terceiro capturou no ar enquanto estava tentando se fechar dentro da caminhonete no banco do motorista.
— Não, camarada. – Rosnou enquanto sacudia a coisa e a derrubava. — Todos por um, um por todos.
O lesser caiu no chão, e antes que pudesse responder, Xcor o chutou na cara, quebrando a estrutura óssea, destruindo as feições, rendendo os olhos à nada mais que
poças de fluído.
Xcor olhou por cima do ombro. Seria improvável que a Irmandade deixasse uma bagunça daquelas para os humanos encontrarem. Mesmo que o Campus fosse abandonado, cedo
ou tarde, um Homo Sapiens qualquer da variedade jovem ia romper a unidade do terreno. Assim como aquele no terraço.
Algo devia ter acontecido ao curso da luta. Algum ferimento crítico talvez, que precisasse encurtar o tempo de limpeza...
Xcor nunca viu chegar. Nunca escutou nada.
Um momento, estava plenamente consciente de seus arredores.
No outro, alguém ou algo tinha feito com ele o mesmo que ele fez com o humano no terraço.
Nem teve tempo de um último pensamento, no tão decisivo que foi o golpe na sua cabeça.
Vishous abaixou seu braço devagar enquanto olhava de cima o enorme macho que tinha acabado de cair aos seus pés.
Então imediatamente pegou de volta sua arma, apontando-a com as duas mãos, girou ao redor de si mesmo.
— Onde vocês estão, garotos? – Disse baixinho. — Hein, filhos da puta? Onde estão?
Não havia chance de Xcor, cabeça do Bando de Bastardos, ter ido sozinho. Não tinha maneira nenhuma, porra.
V não tinha tanta sorte.
Exceto que nada lhe respondeu. Nenhum contra ataque. Ninguém correndo de um prédio ou de trás de uma árvore com uma arma atirando. Tudo que tinha lá eram partes
de lessers e torsos no chão, o vento gelado batendo na sua face, e muito silêncio.
O som do assobio à esquerda o avisou da posição de Butch. E então teve outro pela direita. Um terceiro acima.
V assoviou de volta e seus irmãos vieram em uma corrida sem pressa.
Ele manteve os olhos em Tohr, e assim que o guerreiro estava ao alcance, V apontou a arma direto em seu peito coberto de couro.
— Pare aí mesmo.
Tohr parou. Ergueu as palmas.
— Mas que inferno você está fazendo?
— Butch, vire-o. – V falou, indicando com a cabeça para o vampiro aos seus pés.
No instante em que Tohr viu quem era, sua mão abaixou e suas presas ficaram à mostra.
— Agora você entendeu. – V balbuciou. — Eu sei que você tem o direito de matá-lo, mas não pode. Estamos nos entendendo? Você não vai acabar com ele, certo?
Tohrment rosnou.
— Essa não é sua decisão para tomar, V. Vai se foder, esse fodido é meu...
— Eu vou atirar em você, porra. Estamos entendidos? Pare aí mesmo.
Aparentemente o Irmão não estava ciente de ter dado um passo à frente. Mas Butch e todo mundo entendeu na mesma hora – e o policial se aproximou de Tohr cautelosamente.
— A morte pode ser sua, – Butch disse. — Mas nós o levamos de volta com a gente primeiro. Falamos com o bastardo, pegamos a informação, então ele é seu, Tohr. Mais
ninguém vai fazer a finalização além de você.
Phury concordou com a cabeça.
— V está certo. Você o mata agora e nós perdemos o interrogatório. Seja lógico quanto a isso, Tohr.
Vishous olhou ao redor. Os quatro tinham retornado ao Campus com a ideia de apunhalar o máximo que podiam de volta para o Ômega e fazer a limpeza que conseguissem
– mas essa pequena descoberta mudou o objetivo principal.
— Butch, leve-o de volta no Hummer. Agora. – V sacudiu a cabeça em direção à Tohr. — E não, você não vai ir com ele como retaguarda.
— Você me entendeu errado. – Tohr disse sombriamente.
— Entendi? Está ciente de que tem uma adaga na mão? Não? – Enquanto seu irmão olhou pra baixo com alguma surpresa, V sacudiu a cabeça. — Não pense que sou quem está
com problemas pra pensar. Você fica com a gente, Tohr. O tira se encarrega disso.
— Estou ligando para Qhuinn e Blay, – Butch falou enquanto pegava o seu telefone. — Quero eles aqui comigo.
— E é por isso que eu amo você. – V balbuciou enquanto manteve os olhos em Tohr.
O Irmão não tinha abaixado a adaga ainda. E isso estava bem. Tão logo Xcor estivesse em seu caminho, V ia se certificar de que Tohr colocasse seu impulso assassino
em bom uso.
Um momento depois, Blay e Qhuinn se materializaram na cena, e ambos soltaram um palavrão quando viram a cara feia e com cicatriz que estava virada pra cima sem expressão
de um corpo desmaiado.
Butch fez um trabalho rápido algemando Xcor, e então ele e Qhuinn pegaram o bastardo pelos pés e pelas mãos, carregando-o como um saco de batatas em direção ao Hummer
à prova de balas completamente preto que estava estacionado atrás de umas das salas de aula. A máquina de cara feia era na verdade a segunda versão do SUV, o primeiro
foi roubado quando ele se descuidou na frente de uma farmácia no inverno passado.
V não moveu um músculo até que viu que a coisa tinha ido a caminho da propriedade pisando fundo no acelerador.
— Não é que eu não confio em você, – ele disse a Tohr. — Eu só não...
Vishous calou a boca. E ficou imóvel de novo.
— O que aconteceu? – Phury perguntou.
V não tinha ideia. E isso não era bom. A única coisa que tinha certeza era que o panorama tinha mudado abruptamente de uma forma sutil, mas inegável, uma onda carregando
e se estendendo sobre os corpos dos caçadores como se uma sombra tivesse sido jogada sobre o Campus.
— Merda, – Vishous chiou. — O Ômega está chegando!
Capítulo DEZ
A beleza estava nos ouvidos de quem vê.
Enquanto Rhage percorria com as mãos pra cima e pra baixo as coxas de Mary, ele podia estar cego, mas sabia exatamente o quanto sua shellan era linda quando ela
se sentou sobre seus quadris, equilibrou seu peso e colocou as palmas sobre seu peito.
— Então, como é que vai ser? – Ele perguntou enquanto mexia sua pélvis.
Com sua ereção acariciando o centro dela, mesmo através das cobertas e das calças que estava usando, a resposta dela foi rouca.
— Como eu posso algum dia, – Ela sussurrou — dizer não pra você?
Deus, essas palavras... E ainda mais do que isso, sua voz! Elas o fizeram pensar na primeira noite em que ele a conheceu. Foi aqui embaixo no Centro de Treinamento,
logo após a besta ter aparecido. Ele estava cego na ocasião, e andando pelo corredor à procura de um treino para distraí-lo de seu tédio e recuperação. Ela tinha
chegado às instalações com John Matthew e Bella, como intérprete para o menino que era mudo e precisava de alguém que soubesse linguagem de sinais para se comunicar.
No segundo em que falou com ele, sua voz o acorrentou de vez, como se cada sílaba que tinha pronunciado tivesse vindo com elos de aço. Ele soube naquele momento
que a teria. É claro que, na ocasião, não tinha planejado que ela seria o amor de sua vida. Mas sua vinculação pensou diferente e ele agradecia a Deus por isso.
Graças a Deus também que ela desejou tê-lo da mesma forma.
— Vem cá, minha Mary...
Ela se moveu para um lado.
— Mas estarei ligando os aparelhos novamente no instante em que terminar.
Rhage deu um sorriso tão largo que seus dentes da frente cintilaram.
— Por mim tudo bem, espere, o quê? Aonde você vai?
Mesmo com seus protestos, Mary não parou até desmontar por completo, e não apenas desligar a máquina.
— Precisamos fazer isso de forma parcialmente discreta, – O bip parou. — Estou falando sério sobre colocar isso de volta em você quando terminarmos.
Torcendo para o lado, ele estendeu a mão, em sua cegueira, agarrando sua cintura e puxando-a em sua direção.
— Venha aqui.
Todo pensamento sumiu quando sentiu a mão dela em cima das cobertas... Diretamente sobre seu pau.
O som que saiu dele fervilhando era em parte um Hmmmmmm e parte gemido. Seu toque, mesmo através das cobertas, foi o suficiente para disparar seu coração, ferver
seu sangue, superaquecer sua pele com um delicioso arrepio.
E deixá-lo a apenas um passo de um orgasmo.
O colchão da cama do hospital deslocou conforme ela se esticou ao lado dele, e a palma da sua mão se moveu sob o lençol, deslizando ohhhhhhh, tão pra baixo. Espalhando
suas pernas para lhe dar todo o acesso ao que ela queria, arqueou sua cabeça para trás e inclinou a coluna para o céu quando ela agarrou sua ereção. Gritou seu nome,
sentiu a besta surgindo também, o dragão se dirigindo à crista da onda de prazer junto com ele, enquanto ainda estava amarrado.
Como se tivesse aprendido boas maneiras.
— Minha Mary... – E então engasgou. — Oh sim.
Ela começou a acariciá-lo de forma macia e lenta, e foi estranho o modo como ela o afetava. O sexo o fazia se sentir tão poderoso, tão másculo, tão foda, que se
perguntou como sua carne conseguia conter o grande rugido da batida erótica... E ainda assim ela era o mestre de tudo dele, e a totalidade da sua reação também,
totalmente no controle, dominando-o de forma que o fazia totalmente fraco diante dela.
E diabos que isso era sexy.
— Você é tão bonito. — Ela disse numa voz rouca. — Oh, olhe para você, Rhage...
Ele adorou a ideia de que ela estava olhando para ele, vendo o que estava fazendo com ele, deleitando-se no controle que tinha sobre ele, literalmente. E se não
podia tocá-la, se tinha que ser um bom menino e manter suas mãos pra si mesmo, pelo menos ela poderia desfrutar do fato de trazê-lo de joelhos, sabendo que só ela
tinha a capacidade de fazer isso com ele.
Afinal, apesar de qualquer distância que tenha surgido entre eles ultimamente, nada tinha mudado para ele. Mary era a única mulher que queria, a única que via, sentia
seu cheiro e não podia esperar para estar com ela.
Isso foi bom para eles. Esta ligação sexual escaldante era importante para eles agora.
Especialmente agora que ela caiu em um ritmo bombeando seu pau, apertando a ponta. Mais rápido. Mais rápido ainda.
Até que ele estava ofegante, e a doce dor de antecipação atravessou seu corpo e sua cabeça girou.
Não estava mais cansado. Não.
— Mary, – Fez um grande esforço na cama arqueando, agarrando o colchão de um lado e a grade de proteção do outro. — Mary, espera...
— O que?
Quando ela parou, ele sacudiu a cabeça.
— Não, continue... Só quero que você faça algo pra mim.
— O que? – Ela disse enquanto corria a palma da mão pelo seu pau... E depois para baixo... E depois para cima...
Que porra ele tinha na cabeça... Ohhh, certo.
— Vem cá, vem mais perto, – Quando ela fez, ele sussurrou algo em seu ouvido.
O riso dela o fez sorrir também.
— Sério? – ela disse. — Isso é o que você quer?
— Sim. – arqueou seu corpo novamente, revirando os quadris para que a ereção fosse em direção ao seu aperto.
— Por favor? E vou implorar se você quiser... Adoro quando te imploro coisas.
Mary se deslocou mais para cima na cama do hospital e começou a trabalhar nele a sério novamente. Então inclinou perto da sua orelha...
... E com pronúncia perfeita disse:
— Inconstitucionalissimamente.
Deixando escapar uma maldição feito louco, Rhage gozou tão forte que viu estrelas, sua ereção latejando forte na mão dela, seu gozo fazendo as coisas muito, muito
bagunçadas debaixo daquelas cobertas. E o tempo todo, seu único pensamento era o quanto amava sua fêmea.
Como ele a amava demais.
Duas portas abaixo do orgasmo induzido por vocabulário do Rhage, Layla estava sentada em sua própria cama de hospital, uma bola gigante de fio vermelho em seu lado
direito, o cachecol mais comprido na história do mundo se esticando até o chão do outro lado. Entre os dois? Uma barriga que estava crescendo tão inchada dos bebês
gêmeos que ela carregava que se sentia como se alguém tivesse dobrado um colchão e amarrado a coisa com um cinto no seu torso.
Não que ela estivesse em posição de reclamar. Os dois eram saudáveis, e contanto que ela ficasse na cama, sabia que estava dando a eles a melhor chance de sobrevivência.
E certamente Qhuinn, o pai deles, e seu amado Blay, mimavam-na implacavelmente aqui embaixo, como se os dois preferissem ser aqueles a atravessar a permanência auto-imposta
para ela.
Eles eram machos tão maravilhosos.
Enquanto fazia outra virada no fim de outra fileira, sorriu quando se lembrou de Blay sugerindo que ela tricotasse alguma coisa, pois isso ajudou sua mãe Lírica
a conseguir atravessar seu próprio repouso na cama na gravidez dele. Isso provou ser um bom conselho – havia algo singularmente calmante no clic-clic das agulhas
e o fio macio entre seus dedos, e o progresso que podia medir de forma tangível. Porém, neste momento, teria que cortar a coisa em segmentos ou dar para uma girafa.
Afinal, assistir maratonas de Donas de Casa de verdade sem fazer alguma coisa, qualquer coisa produtiva, era positivamente insustentável. Não importa que Lassiter
dissesse o contrário.
Agora, Terapia de Casais com Dra. Jenn? Isso talvez fosse uma história diferente – embora, claro, ela não aprendeu coisas relevantes para sua própria relação. Por
que não tinha um macho para chamar de seu.
Não, ela tinha uma obsessão nada saudável que bateu de frente e queimou. O que era uma boa coisa – embora a perda do que nunca devia querer em primeiro lugar causou
dor inimaginável e injustificável.
Mas afinal, uma pessoa não se apaixonava pelo inimigo. E não só por que era uma Escolhida.
Era por que Xcor e seu Bando de Bastardos, declarou guerra para Wrath e a Irmandade.
Era por isso que...
— Pare com isso, – Ela murmurou enquanto fechava os olhos e parava as agulhas. — Só… Pare.
Realmente não pensou que pudesse aguentar mais um instante a culpa e o conhecimento de sua traição daqueles quem lhe eram mais queridos. Contudo, qual era o outro
curso? Sim, mentiram para ela e então foi coagida… Mas no fim, seu coração foi onde não devia ter ido.
E apesar de tudo, isso nunca foi devolvido a ela.
Quando ouviu outro som ali fora no corredor, deu uma olhada para sua porta e se forçou a se perder na distração. Houve um monte de atividade no centro de treinamento
hoje à noite – vozes, sons de passos, portas abrindo e fechando – e de alguma forma, isso tudo só a fez se sentir mais isolada em vez de menos. Mas aí, quando as
coisas ficavam quietas, havia menos sugestões para lembrá-la de tudo que estava perdendo.
Ainda assim, não estaria em qualquer outro lugar.
Colocando a mão em seu estômago arredondado, pensou que sim, a vida como ela conhecia ultimamente estava mais focada interiormente que exteriormente – e a qualquer
hora que ficasse inquieta, tudo que tinha que fazer era se lembrar de tudo que estava em jogo.
Ela pode nunca ter o amor que Qhuinn e Blay compartilhavam, mas pelo menos as crianças seriam dela e deles.
Isso teria que ser suficiente para sua vida, e seria. Não podia esperar para segurá-los, cuidar deles, vê-los crescer.
Assumindo que ela sobrevivesse ao parto. Assumindo que todos eles sobrevivessem.
Quando um alarme suave veio de seu telefone, ela saltou e apertou a tecla de silenciar o alarme.
— Já está na hora?
Sim, estava. Sua liberdade chegou. Trinta minutos para se esticar, caminhar e ir para um passeio.
Dentro dos confins do centro de treinamento, claro.
Empurrando o tricô em direção à base das agulhas, enfiou as pontas dentro do rolo, e esticou seus braços e pernas, esticou as pontas dos pés, flexionou seus dedos.
Então moveu seus pés pra fora da cama e colocou seu peso neles. As demandas da gravidez e toda sua inatividade forçada a levaram a uma certa fraqueza nos músculos,
uns que não curavam, não importa quanto se alimentasse de Qhuinn e Blay – então aprendeu a ser cautelosa sempre que se levantava.
Primeira parada foi o banheiro, algo que tinha permissão para usar prontamente, mas inevitavelmente adiava. Não havia necessidade de tomar banho, o que ela fez cerca
de doze horas atrás durante essa meia hora para estar de pé e passear.
Não, isto seria puramente para investigar.
O que estava acontecendo ali fora?
Enquanto encabeçava para a porta, alisou o cabelo, que parecia estar crescendo tão rápido quanto seu cachecol: as ondas loiras desciam passando dos seus quadris
agora, e supôs que devia cortá-lo em um certo ponto. Sua camisola de flanela era igualmente longa e larga, do tamanho de uma barraca florida, e seus chinelos faziam
um som de shhht-shhht-shhht acima do chão nu. Com suas costas já doloridas e um braço estendido para se estabilizar, sentiu como se fosse séculos mais velha do que
realmente era.
Empurrando a porta para sair, ela...
Imediatamente deu um passo atrás.
Tanto que sua bunda bateu no painel, fechando.
Do outro lado, dois machos estavam de pé, altos e orgulhosos, expressões idênticas de tensão marcando seus rostos.
E pelo idêntico, quis dizer exatamente isso.
Eles eram gêmeos.
Quando eles focaram nela, ambos se recolheram como se vissem um fantasma.
— Olhem pra onde olham, – Veio um grunhido desagradável.
Layla chicoteou sua cabeça em direção ao aviso.
— Zsadist?
O Irmão com o rosto com cicatrizes caminhou a passos largos para ela, colocando seu corpo, com todas suas armas, entre ela e os dois estranhos, embora nenhum dos
machos fizesse um movimento agressivo em direção a ela. Não surpreendentemente, foi um bloqueio muito bem sucedido. O tórax e os ombros do Zsadist eram tão largos
que ela não podia mais ver o par – e este era claramente o plano dele.
— Voltem lá pra dentro com ele, – Zsadist vociferou. — Antes que eu ponha vocês naquele quarto.
Não houve nenhum argumento, e abruptamente os cheiros estranhos dissiparam como se eles realmente desaparecessem do corredor.
— Eles não fizeram nada comigo, – Ela disse. — Realmente, acho que se eu fizesse Buu! eles poderiam muito bem sair correndo.
Z deu uma olhada por cima do ombro.
— Acho que você devia voltar ao seu quarto.
— Mas tenho permissão para esticar minhas pernas duas vezes por noite!
O Irmão suave, mas firmemente, tomou seu cotovelo e a escoltou de volta para sua cama.
— Não nesse instante. Vou dizer a você quando estiver okay. Nós temos algumas visitas inesperadas e não estamos correndo nenhum risco com você.
— Quem são eles?
— Ninguém com quem você precise se preocupar, e eles não vão ficar muito tempo, – Z a colocou de volta em posição. — Posso te trazer alguma comida?
Layla exalou.
— Não, obrigada.
— Algo para beber então?
— Estou bem. Mas obrigada.
Depois de se curvar profundamente o Irmão partiu, e meio que esperava ouvir os sons distantes da pistola dele varrendo aqueles dois soldados só por olhar para ela.
Mas era como as coisas funcionavam. Como uma fêmea grávida, era a coisa mais valiosa no planeta, não só para seu jovem pai, mas para cada único membro da Irmandade.
Era como viver com uma dúzia de irmãos mais velhos superprotetores e mandões.
Ou Irmãos, como era o caso.
E normalmente, poderia ter desafiado até Zsadist. Mas não reconheceu aqueles machos grandes, e Deus sabia que já entrou em bastantes problemas confraternizando com
lutadores que ela não conhecia – e eles tinham que ser soldados. Eram de constituição pesada e forte, e estavam usando coldres.
Embora vazios.
Então eles não eram inimigos, ela decidiu, ou não teriam mesmo permissão para estar no centro de treinamento. Mas eles não eram exatamente de confiança também.
Do nada, uma imagem do rosto duro do Xcor veio à sua mente – e a pontada de dor que a atravessou foi tão forte que os bebês mexeram em sua barriga como se sentissem
isto também.
— Pare com isto. – Ela sussurrou para si mesma.
Agarrando o controle remoto da TV, ela ligou a tela do outro lado do quarto. Certo. Ela ficaria aqui até que aqueles estranhos partissem. Então sairia e se sentaria
com o irmão do Qhuinn, Luchas, que estava em recuperação duas portas adiante e parecia esperar ansiosamente suas visitas regulares. Então talvez um bate-papo com
a Dra. Jane em sua escrivaninha, ou talvez Blay e Qhuinn voltassem de suas rondas até lá e eles caminhariam até as salas de aula.
Quem quer que sejam aqueles soldados, duvidava que os Irmãos os deixassem ficar mais tempo além do absolutamente necessário. Pelo menos pela reação do Zsadist.
E todas as armas das quais eles muito claramente foram despojados.
Capítulo ONZE
Sem tempo. Absolutamente nenhum maldito tempo.
Com uma erupção do mal permeando o ar, Vishous tirou sua luva forrada de chumbo e levantou sua mão incandescente. Fechando os olhos e se concentrando – por que sua
vida, e a vida de seus dois irmãos, de fato dependiam disso – ele liberou uma série de lufadas de impulso de si mesmo – exceto que o mhis se estendeu somente do
tamanho de um bolso sobre todo o campus panorâmico, uma pequena parte, não maior do que a distância de duas polegadas em frente ao seu rosto e duas polegadas atrás
dos corpos de Phury e Tohr.
Graças a Deus o Hummer está fora da propriedade.
— Ninguém se mexe, – V comandou quando uma barreira ondulante e irisdecente se formou em volta deles, parecido com bolhas de sabão de uma criança feita com detergente.
Ele não tinha nem ideia se isso iria funcionar, mas sabia que teria de acontecer – a atmosfera estava se tornando uma densa sombra de maldade. Inferno, mesmo com
o mhis no lugar, sua pele pinicava com um aviso para correeeeeeeeeeeeer!
E foi quando o Ômega em pessoa apareceu a cento e trinta metros à frente.
Falando sobre anticlímax. Na superfície, a figura de tinta transparente em suas roupas brancas alvejantes parecia intimidante como um peão de xadrez animado. Mas
isso fazendo uma avaliação visual. Internamente, cada célula que constituía seu corpo, cada neurônio que queimava em seu cérebro, todas as emoções que já teve ou
que teria começou a gritar como se estivesse sob um horrendo ataque mortal.
Atrás dele, um suave murmúrio se iniciou e V olhou de relance por cima do ombro. Phury tinha começado a rezar no Antigo Idioma.
— Shhh, – Vishous sussurrou.
Phury imediatamente engoliu a fala, mas seus lábios seguiram se movendo, continuando a oração. E sim, V pensou em sua mãe fazendo seu não-posso-nem-mesmo-estar-lá-em-acima
– e ficou tentado a dizer ao cara que ele estava perdendo seu tempo. Mas tanto faz. Não há razão para roubar a ilusão de seu irmão.
Depois, e se o mhis não funcionar? Eles três e o que eles oraram, ou o que não oraram, estavam indo para um ponto discutível diretamente fora do planeta.
O Ômega se virou lentamente avaliando sua “morte”, e V ficou tão tenso que correu o risco de cair pra frente como uma tábua. O olhar do mal não se demorou onde ele
e seus irmãos estavam parados, então sugeriu que o mhis estava funcionando – provavelmente pelo menos parcialmente, por que o irmão da Virgem Escriba estava muito
distraído pela devastação da sua Sociedade.
Merda, este é meu tio, V pensou sombriamente.
E então o Ômega passou oscilando, andando com seus próprios pés, sangue negro encharcando o gramado, do mesmo jeito que a mãe de V perambulava.
A chuva começou a cair do céu, as gotas frias batendo no cabelo e nariz de V, seus ombros, nas costas de suas mãos. Mesmo a coisa fazendo cócegas na sua pele, não
se moveu para afastar aquilo ou se abrigar – e francamente, sim, poderia ter feito sem se recordar exatamente de como sua ilusão de ótica estava inconsistente com
a realidade. Aquela chuva passou pela barreira?
Inferno, você poderia colocar um jornal sobre sua cúpula e ter uma proteção melhor contra a chuva.
Porra.
De tempos em tempos, Ômega parava para se curvar e pegar um braço, uma perna, uma cabeça. E jogava de volta onde quer que estivesse no gramado, como se estivesse
procurando por alguma coisa em específico. E então parou sem aviso.
Um gemido baixo soou fora do campus, o som entrando e se espalhando no vazio, morrendo nos edifícios sem ecoar.
E então Ômega estendeu suas palmas para a frente.
A porcaria de uma brisa bateu nas costas de V e jogou seus cabelos na cara e nos olhos, ondulando a frente da sua jaqueta também até o couro começar a agitar, e
teve que apertar a coisa contra seu corpo.
De repente, os restos do massacre, todos os pedaços mortos e manchados, liquidificou em uma sombra viscosa que colocou para dentro de si, tornando-se um maremoto
que quebrou dentro de seu mestre, sua casa, seu núcleo.
O Ômega absorveu tudo isso, reivindicando a parte de si que tinha dado aos seus induzidos durante a cerimônia de iniciação, chamando de volta à sua essência, reabsorvendo
tudo até que o campo de batalha estivesse limpo como estava antes do ataque ter sido travado, nada além de grama pisada e árvores derrubadas para mostrar o que a
Besta e a Irmandade fizeram.
Quando tudo estava acabado, Ômega parou no centro da praça da escola, olhando ao redor como se desse uma checada dupla no trabalho. E então, tão rápido quanto chegou,
a entidade desapareceu em si mesmo, um sutil flash foi só o que restou de sua presença – e até mesmo isso desapareceu um segundo depois.
— Esperamos, – V sibilou. — Vamos esperar.
Ele não estava dando por certo que o Ômega tinha realmente ido embora dali. O problema era que o amanhecer estava vindo... E sim, se o mhis não podia proteger os
três da chuva, também não iria proteger porcaria nenhuma da “sempre em frente” luz do sol.
Mas poderiam se permitir ficar mais um pouquinho. Só pro caso.
Melhor ser cauteloso do que descoberto. Depois, precisava de um momento para que seu testículo restante pudesse voltar para o seu lugar novamente.
Porra.
Capítulo DOZE
— Eu não acredito que isto seja necessário.
De volta ao centro de treinamento da Irmandade, Assail olhou de seu corpo para o humano de cabelos escuros que estava fechando o corte em sua panturrilha e tornozelo
com agulha e linha. Quando o homem não respondeu e nem moderou seus cuidados, Assail revirou os olhos.
— Eu disse...
— Sim, sim. – O cara enfiou a agulha entre a pele mais uma vez e puxou até que a linha preta fosse esticada. — Você deixou perfeitamente claro. A única coisa que
vou tornar a dizer é que a MRSA3 não dá a mínima se você é vampiro ou humano, e deixar uma ferida aberta de seis polegadas em sua perna é a definição da estupidez.
— Eu curo bastante rápido.
— Não tão rápido, amigo. E você pode parar de se contorcer? Eu me sinto como se estivesse trabalhando em um peixinho dourado na água.
Na verdade, ele não podia. Suas extremidades tinham ideias próprias no momento, e enquanto verificava o relógio de parede e calculava o pouco tempo que tinha antes
do amanhecer, o tremor tinha piorado...
A porta do quarto abriu e seus primos retornaram.
— Pensei que não quisessem assistir, – Assail murmurou. E de fato, Ehric, o da esquerda, foi cuidadoso em não olhar para o trabalho de reparação.
Embora o assassino proficiente que o homem era, seu estômago revolvia em náuseas nas questões clínicas, uma contradição que podia ser uma fonte de diversão, mas
não era no momento.
Na verdade, Assail não estava com disposição para qualquer tipo de leviandade. Não tinha consentido em ser trazido aqui para esta instalação de tratamento da Irmandade.
O que queria fazer era voltar para sua casa no Hudson e arranhar a coceira que estava rapidamente se tornando um rugido.
— Quando você terá terminado? – Perguntou ele.
— Vou radiografar seu ombro a seguir.
— Não há necessidade.
— De onde veio seu diploma médico?
Assail amaldiçoou e deitou-se horizontalmente sobre a maca. O foco acima dele, com suas luzes brilhantes e armação microscópica, era como algo saído de um filme
de ficção científica. E enquanto fechava os olhos, era impossível não se lembrar dele vindo aqui com sua Marisol logo depois que a livrou de Benloise... Deles dois
passando pelo extenso sistema de engatilhamentos direcionando ao subterrâneo e entrando nesta instalação estelar.
Porém tentou instruir sua mente para outro lugar. A destinação desse pensamento era simplesmente dolorosa demais para suportar.
— Vou ter de partir antes do amanhecer, – Revelou. — E quero nossas armas, telefones e outros artigos pessoais devolvidos a nós prontamente.
O médico não respondeu até ter aplicado seu último ponto e atado um nó um pouco apertado na base do tornozelo de Assail. — Importa-se de dizer a seus rapazes para
sair novamente por um minuto?
— Por quê?
Ehric falou. — Zsadist nos quer aqui. E não estou inclinado a discutir com o Irmão enquanto estou desarmado e desejoso de manter o suprimento de sangue da minha
cabeça.
O médico sentou-se em seu banco giratório e, pela primeira vez, Assail leu a costura no jaleco branco do humano: Dr. Manuel Manello, Cirurgião Chefe. Havia um adorno
e o nome de um sistema hospitalar abaixo da escrita cursiva preta.
— Os Irmãos o trouxeram pra cá de outras espécies para esta noite? – Perguntou Assail. — Como isso é possível?
O Dr. Manello abaixou o olhar para seu nome. — Jaleco velho. E velhos hábitos custam a morrer... Não eles.
Enquanto o humano encarava Assail no olho, Assail franziu o cenho.
— O que quer dizer?
— Você consente que eu fale abertamente na frente desses dois?
— Eles são meu sangue.
— Isso é um sim?
— Você humanos são tão estranhos.
— E você pode cortar esse tom superior, imbecil. Estou casado com uma de sua espécie, ok? E desculpe-me por pensar que você poderia não querer ser avaliado a respeito
do seu vício em drogas na frente da dupla dinâmica... Caso eles não sejam relacionados a você.
Assail abriu a boca. Fechou. Abriu novamente.
— Não sei do que está falando.
— Oh, sério? – O homem arrancou as luvas azuis brilhantes e colocou os cotovelos sobre os joelhos, inclinando-se. — Você está inquieto na minha mesa como se estivesse
revestido por colméias. Está suando frio, e não porque esteja com qualquer dor. Suas pupilas estão dilatadas. E tenho certeza que se eu te desse seu casaco de volta,
a primeira coisa que faria seria dar uma desculpa para ir ao banheiro e usar o resto da coca que estava no frasco, e que tirei do interior do bolso da frente. Como
estou indo? Lendo sua mente corretamente? Ou vai mentir como um filho da puta?
— Eu não tenho um problema com drogas.
— Uh-huh. Claro que não.
Enquanto o humano ficava de pé, Assail fez algumas análises ignorando a si mesmo... De maneira nenhuma iria olhar para seus primos: podia sentir seus olhares gêmeos
em cima dele bem mais que o bastante, muito mais que obrigado.
Pelo menos nenhum deles disse nada.
— Olha, não tenho nada a ver com isso, – O Dr. Manello foi até uma mesa de trabalho na qual um computador, algumas canetas e um bloco descansavam. Inclinando-se,
escreveu alguma coisa e rasgou a folha fixada da ponta, dobrando-a ao meio. — Aqui está meu número. Quando chegar ao fundo do poço, ligue pra mim e podemos te ajudar
na desintoxicação. Entretanto, esteja ciente de que o uso prolongado de cocaína leva a todos os tipos de coisas divertidas, como ataques de pânico, paranóia e até
desenvolver psicoses. Você já está na categoria da perda de peso, e como eu mencionei, está cheio de tiques da porra. Seu nariz também fica escorrendo o tempo todo,
então tenho certeza que seu septo está desviado.
Assail olhou para o cesto de lixo ao lado dele e perguntou como todos aqueles Kleenex tinham terminado ali. Certamente, não poderia ter sido... Huh. Ele tinha um
chumaço de lenços na mão e não tinha conhecimento de ter pegado.
— Eu não sou viciado.
— Então tome isto e jogue fora, – O humano segurou o papel rasgado. — Queime isto. Enrole a coisa para cima e use-o para cheirar sua próxima dose. Como eu disse,
não me importo.
Quando Assail aceitou o que foi oferecido, o médico virou como se já tivesse esquecido toda a interação.
— Assim, quanto a esse raio-X? Os Irmãos dirão quando você poderá ir. A saída não é uma coisa voluntária, como eu tenho certeza que você compreendeu.
Assail fez um show de esmagar o papel e lançou-o no lixo com os lenços.
— Sim, – disse secamente. — Estou bastante ciente do quão precisamente involuntário tudo isso é.
Vishous dirigiu o food-truck de volta para o complexo. Como um morcego saído do inferno.
A coisa não foi construída pra velocidade, e manobrar esse trambolho lembrou-lhe de um velho avião tentando decolar numa pista de terra... Tudo vibrava, a tal ponto
que você juraria que estava simplesmente além da inteira desintegração molecular. Mas manteve o pé no acelerador... O que era o que se fazia quando tinha, ohhhhhhh,
cerca de 25 minutos de verdadeira escuridão à esquerda e pelo menos trinta e sete milhas de estrada pra cobrir. E você realmente não queria abandonar evidências
factíveis mortais ao lado da estrada.
Ainda assim, caso acontecesse o pior, ele e Tohr, por que V tinha insistido na carona de volta com ele, poderiam encostar e desmaterializar direto até os degraus
da mansão em um nanossegundo: Butch tinha acabado de mandar uma mensagem para reportar que retornou ao centro de treinamento em segurança com Xcor. Assim, ninguém
tinha que se preocupar com Tohr agindo por fora em alguma ideia brilhante que envolvesse sangue derramado e um saco coletor de cadáveres com o nome do Bastardo nele.
Pelo menos não durante os próximos dez minutos, em todo o caso.
— Você salvou nossas vidas quando o Ômega apareceu.
Vishous olhou de relance sobre o assento da frente. Tohrment esteve em silêncio na posição de atirador desde que eles dois dirigiram pra fora do campus cerca de
vinte minutos após o Ômega ter se levantado e desaparecido.
— E eu não ia matar Xcor.
— Está certo disso mesmo?
Quando Tohr não disse mais nada, V pensou: Siiiiiimmmm, com certeza você não estava indo assassinar o filho da puta.
— Não é como se eu não entendesse, – V murmurou enquanto um mergulho na estrada ajudou a empurrar a velocidade do food-truck ao norte a setenta milhas por hora.
— Todos nós queremos eliminá-lo.
— Eu realizei a traqueotomia em Wrath. Enquanto ele estava morrendo no meu colo depois que o fodido do Xcor atirou nele.
— Bem, e depois havia o fato de que você tinha o Lassiter dirigindo naquele momento, – V disse secamente. — Isso teria me assustado tanto.
— Estou falando fodidamente sério, V.
— Eu sei.
— Onde é que vamos colocá-lo?
V sacudiu a cabeça. — Depende de quanto tempo o Bastardo passou desmaiado.
— Quero trabalhar nele, Vishous.
— Veremos, meu irmão. Veremos.
Ou, em outras palavras: abso-fodida-lutamente não. A agressão rolaria fora dos poros do irmão, mesmo que Tohr tentasse dar uma de homem “calmo e sob controle”, era
como a maior bandeira vermelha que alguém já tivesse obtido.
Enquanto eles ficavam em silêncio, V colocou a mão dentro de sua jaqueta de couro e tirou um cigarro enrolado à mão. Acendendo a coisa com um isqueiro Bic vermelho,
exalou um pouco de fumaça e abriu a janela para que não enchesse seu irmão de fumaça.
Desejo de matar a parte, Tohr tinha levantado uma boa maldita pergunta... Onde diabos colocariam o prisioneiro? Havia uma abundância de salas de interrogatório no
centro de treinamento... O problema era, eles eram mais da variedade do estilo “mesa e cadeira”, o tipo de coisa que foi usado, por exemplo, para falar com Mary,
John Matthew e Bella quando eles chegaram a primeira vez à instalação.
Nada luxuoso, mas certamente civilizado.
Nada que fosse equipado para a tortura.
Ainda.
Ainda bem que sua vida amorosa fornecia-lhe acesso imediato a todos os tipos de correias, fivelas, correntes e grampos. E sim, provavelmente iria precisar de alguns
dos seus equipamentos maiores também.
— Vou cuidar disso. abso-fodida-lutamente disse ele.
— O que? Xcor?
— Sim. Cuido disso.
Tohr amaldiçoou suavemente como se estivesse enciumado. Mas então o irmão deu de ombros.
— Isso é uma coisa boa. Ele é perigoso... É como ter um serial killer em casa. Vamos querer alguns bloqueios seriamente fortes.
Trancas reforçadas não dariam nem pra metade, pensou V. Nem mesmo perto.
CONTINUA
Capítulo SEIS
Sopa de frango e estrelinhas da Campbell.
Enquanto Mary se debruçava sobre o fogão na cozinha principal do Lugar Seguro, ela mexia a sopa sem parar com uma colher de inox, observando as estrelas de massas
quase inchadas girando com os quadrados de carne branca e fatias de cenoura. A panela era a menor que tinham na casa. O caldo era amarelo, e o cheiro doce a lembrou
das doenças simples que teve quando era criança... Constipações, gripes, streptococos.
Coisas mais fáceis do que o câncer.
Ou a Esclerose Múltipla que tinha levado sua mãe.
A tigela em que despejou as coisas era creme com anéis concêntricos amarelos na borda. Ela pegou uma nova colher da gaveta e deu a volta no balcão em direção à grande
mesa de madeira.
— Aqui, – Ela disse para Bitty. — E vou te dar alguns Saltines.
Como se essa tragédia fosse algo que você pudesse superar em vinte e quatro horas, se fosse apenas hidratado suficiente?
Bem, pelo menos uma refeição simples como esta não era suscetível de sair pela culatra. E tão logo Bitty tivesse comido, Mary iria encontrar outro membro do pessoal
para atender a menina e, em seguida, obter algum aconselhamento para si mesma.
Quando voltou da despensa com o pacote de biscoitos, Bitty estava experimentando a sopa e Mary sentou-se do outro lado da mesa para não ficar em cima da menina.
A embalagem plástica se recusou a cooperar e Mary a abriu com força, derramando Saltines e grãos de sal sobre a madeira.
— Droga.
Ela comeu um... E então percebeu que não teve qualquer alimento há algum tempo e estava com fome também...
— Meu tio virá me buscar.
Mary congelou no meio da mastigação.
— O que você disse?
— Meu tio, – Bitty não olhou pra cima, apenas continuou movendo a colher através da sopa fumegante. — Ele virá me buscar. Vai me levar pra casa.
Mary retomou a coisa toda da mastigação, mas sua boca era como um misturador de cimento tentando processar cascalho.
— Sério?
— Sim.
Com mãos cuidadosas, Mary recolheu as bolachas espalhadas, empilhando-as em grupos de quatro.
— Eu não sabia que você tinha um tio.
— Eu tenho.
— Onde ele mora?
— Não em Caldwell, – Bitty tomou outra colher e colocou-a na boca. — Mas ele sabe como chegar aqui. Todo mundo sabe onde fica Caldwell.
— Ele é o Irmão de sua mahmen?
— Sim.
Mary fechou os olhos. Annalye nunca mencionou nenhum parente. Não tinha divulgado isso na ficha ou nominado um parente mais próximo. E a mulher teve conhecimento
de que sua condição estava deteriorando, então se houvesse um Irmão em algum lugar, certamente teria contado sobre ele para alguém e isso teria ido para seu arquivo.
— Gostaria que eu tentasse entrar em contato com ele pra você? – Perguntou Mary. — Sabe onde ele mora?
— Não, – Bitty olhou para sua sopa. — Mas ele virá me buscar. Isso é o que a família faz. Eu li naquele livro.
Mary tinha uma vaga lembrança de um livro infantil sobre os diferentes tipos de família: biológica, adotiva, avós, bem como aqueles que resultavam a partir de doadores
de esperma, óvulos doadores, fertilização in vitro. O ponto era, não importa como eles surgiram ou com que se parecessem, em cada caso, todo mundo tinha uma unidade,
com um monte de amor em torno deles.
— Bitty.
— Sim?
O celular de Mary começou a vibrar no bolso do casaco que ela ainda não tinha tirado e ficou tentada a deixar quem quer que fosse ir para o correio de voz. Exceto
pelo que os Irmãos estavam fazendo esta noite com aquele ataque enorme?
Quando tirou seu celular pra fora e viu quem era, pensou, oh Deus.
— Butch? Olá?
Houve interferência na conexão. Vento? Vozes?
— Olá. – Ela disse mais alto.
— ... Indo pegar você.
— O quê? – Ela levantou-se da cadeira. — O que você está dizendo?
— Fritz, – O Irmão gritou. — Indo pegar você! Nós precisamos de você aqui fora!
Ela amaldiçoou.
— Quanto é ruim?
— Fora de controle.
— Merda. – Ela suspirou. — Eu vou sair rápido. Poupar tempo.
Houve uma série de estouros, alguns xingamentos e depois então distorção, como se Butch estivesse correndo.
— ... Escreva a localização. Rápido!
Quando a ligação foi cortada, ela olhou para a menina e tentou não soar tão em pânico quanto estava.
— Bitty, eu sinto muito. Tenho que ir.
Aqueles olhos castanhos claros levantaram para os dela.
— O que há de errado?
— Nada. Eu só... Vou trazer Rhym pra você. Ela vai sentar aqui e talvez vocês duas possam ter uma sobremesa?
— Estou bem. Estou indo para cima e embalar minhas coisas, então estou pronta para meu tio.
Mary sacudiu a cabeça.
— Bitty, antes de fazer isso, não seria melhor que você e eu devêssemos tentar encontrá-lo primeiro?
— Está tudo bem. Ele sabe sobre mim.
Estabilizando a respiração. Por muitos motivos.
— Vou passar mais tarde e ver como você está indo.
— Obrigada pela sopa.
Quando a menina voltou a comer, ela não pareceu se importar com quem estava em torno dela ou não, como de costume.
E foi com uma dor de cabeça martelando que Mary foi numa rápida busca da supervisora de admissão, que estava fazendo trabalho dobrado por que uma das outras assistentes
sociais estava fora em licença maternidade. Depois de explicar a Rhym tudo o que tinha acontecido, Mary decolou em uma corrida deixando a casa e saltou para o Volvo.
A antiga Escola Brownswick para meninas ficava a cerca de dez minutos de carro. Ela fez isso em sete, disparando pelas estradas, esquivando-se em torno dos desenvolvimentos
suburbanos, passando rapidamente pelos sinais amarelos e vermelhos. O SUV não foi construído para esse tipo de treinamento, o caixão quadrado, pesado, balançando
pra lá e pra cá, mas não se importava. E merda, parecia que ela nunca chegaria ao limite do campus abandonado.
Pegando seu telefone, desacelerou e olhou suas mensagens de texto.
Lendo em voz alta, ela falou:
— Contorne os portões principais... Dê a volta... Merda!
Algo disparou para a rua, a figura movendo-se como uma boneca de trapo e tropeçando diretamente na frente do seu carro. Pisando nos freios, ela atingiu o homem...
Não, era um lesser: o sangue que salpicou pelo pára-brisa era negro como tinta e a coisa decolou mais uma vez, embora um de seus pés parecesse quebrado.
Com o coração acelerado, engoliu em seco e socou o acelerador novamente, com medo de que houvesse outros por trás dele, mas ainda mais aterrorizada por tudo o que
estava acontecendo com Rhage. Reverificando seu celular, ela seguiu as direções rodeando os fundos da escola para a rua de mão única que a levou para dentro da bagunça
desgrenhada de uma paisagem.
Bem quando se perguntava onde diabos deveria ir a partir dali, a pergunta foi respondida.
Do outro lado do prado, a besta se destacava entre os prédios abandonados como algo saído de um filme do canal SyFy. Alto o suficiente para alcançar os telhados,
grande o suficiente para deixar anão mesmo um dormitório, como um tigre brincando com uma refeição, a coisa estava em modo de ataque total.
Arrancando o telhado de um galpão com seus dentes.
Ela não se incomodou em desligar o motor.
Mary jogou o Volvo no parque e saltou pra fora. No fundo de sua mente, estava ciente de que o desigual pop-pop-pop no fundo eram balas voando, mas não se preocuparia
com isso. Sobre o que ela estava em pânico?
Quem diabos estava naquele prédio.
Enquanto corria na direção do dragão, colocou dois dedos na boca e soprou com força.
O assobio era estridente, alto como um grito... E não fez nenhuma impressão afinal, enquanto as telhas da estrutura de tijolos eram cuspidas para um lado.
O rugido que se seguiu foi algo que ela conhecia muito bem. O animal estava pronto para sua feliz refeição, e toda aquela coisa de arranca-vigas era sua maneira
de entrar no prédio.
Mary tropeçou em alguma coisa, oh, Deus, era um lesser que estava sem um braço... E continuou, assoprando outro assobio. E uma terceira vez...
A besta congelou, seus flancos bombeando dentro e fora, tons de roxo piscando na escuridão como se a coisa fosse iluminada por dentro por uma fonte elétrica.
O quarto assobio fez a cabeça da besta virar ao redor.
Retardando sua corrida, Mary levou as mãos à boca.
— Venha aqui! Venha, garoto!
Como se o animal fosse apenas o maior cão do mundo.
O dragão soltou um pff e depois soprou pelas narinas, o som algo entre um folguedo abafado por uma almofada e um motor a jato decolando.
— Venha cá você! – Ela disse. — Deixe isso. Não é seu.
A besta voltou a olhar para o que eram agora apenas quatro paredes de tijolos e não muito mais, e um grunhido ondulado saiu dos lábios negros de dentes irregulares
que teria dado uma grande insegurança a um creme dental branco. Mas, como um pastor alemão chamado para sentar aos pés do treinador, a maldição de Rhage se afastou
de seu trabalho de desconstrução e pulou para ela.
Enquanto o dragão vinha através das ervas daninhas e espinheiros, seu grande peso sacudia o chão tão fortemente que Mary teve que estender os braços para se equilibrar.
Mas por incrível que pareça, a coisa estava sorrindo para ela, sua face horrível transformada por uma alegria que não teria acreditado se não tivesse visto isso
cada vez que estava perto do monstro.
Esticando as mãos para cima, ela cumprimentou aquela grande cabeça caída com palavras suaves de elogios, colocando a palma da mão em sua bochecha redonda, deixando-o
respirar o cheiro dela e ouvir sua voz. Em sua visão periférica, viu duas pessoas saírem do prédio destruído... Certificando-se que um deles tinha o corpo saudável
e correndo muito, e outro estava em cima de um ombro forte, obviamente ferido.
Ela não teve coragem de olhar diretamente para ver quem era. A melhor chance deles era sua ligação com a maldição... E era estranho. Tão feio como a coisa era, tão
terrível e mortal quanto poderia ser... Ela sentia um amor duradouro aquecer seu corpo. Seu Rhage estava lá, em algum lugar, preso sob as camadas de músculos e escamas
e percepção de terceiros, mas mais do que isso, ela adorava a besta também...
Os tiros vieram da direita e, por instinto, gritou e abaixou-se para cobrir a cabeça.
O dragão assumiu dali em diante, girando na direção dos atiradores, ao mesmo tempo conseguiu embrulhar sua cauda em torno de Mary e guardá-la contra seu flanco.
E então eles estavam em movimento. O passeio foi áspero, como um touro mecânico que sofre de surtos de energia, e ela se agarrou a um dos espinhos maiores por sua
querida vida.
Graças a Deus por aquela saliência óssea. Por que o que aconteceu em seguida envolveu um monte de Danças e Gritos.
Primeiro houve gritos. Terríveis, gritos de pesadelo que teve que tapar os ouvidos para bloquear; exceto que não se atreveu a largar com risco de ser jogada livre...
Pra cima e pra frente...
Um lesser, que estava vazando como uma peneira, saiu voando sobre o dorso da besta e sangue negro bateu em Mary como uma chuva de mau cheiro. A coisa aterrissou
num monte quebrado e o perseguidor que seguia um segundo lesser, que também estava sobre os ombros, bateu no primeiro como uma pedra.
Oh... Veja. Sem cabeça. Onde estava aquilo...
Algo que era vagamente redondo e tinha um rosto de um lado e uma cabeleira loira no outro lado através da grama crescida que tinha sido achatada sob as enormes patas
traseiras do dragão... Patas... Garras... Tanto faz.
A fera a mantinha junto para o passeio para o resto da diversão e jogos. Falando de uma refeição saudável. Em seu rastro, braços e pernas, mais cabeças – raramente
um torso, por que isso era provavelmente bom de comer – cobriam o chão. Felizmente nada parecia ser um Irmão ou um lutador, mas oh, Deus, o cheiro. Ela ia ter que
higienizar seu nariz por um mês depois disso.
Justo quando estava perdendo a noção do tempo, no exato momento em que não tinha certeza se podia aguentar por muito mais tempo, o ímpeto do animal diminuiu a velocidade
e parou. A sua cabeça grande balançou pra esquerda e pra direita. Seu corpo deu a volta. Mais uma busca.
A paisagem parecia vazia de qualquer coisa que se movesse, estático, prédios decadentes, árvores sem folhas e sombras escuras que permaneciam onde quer que olhasse.
Os Irmãos ainda tinham de estar no campus; de maneira nenhuma que iriam embora sem Rhage. Mas sem dúvida eles estavam assistindo o grande dragão por trás de uma
boa cobertura. E, assim com os lessers? O saldo do inimigo deve ter caído fora, sendo incapacitado ou ter sido comido.
O ataque maciço parecia ser mais...
Querido Deus, a carnificina deixada para trás. Como eles iam limpar isto? Deviam haver uns cem lessers no retorcido chão, mesmo se eles estivessem apenas em pedaços.
Mary acariciou a palma da mão na base grossa da cauda.
— Obrigado por me manter segura. Pode me descer agora.
A besta não estava tão confiante quanto ela estava e continuou a examinar a cena da batalha, os músculos dos seus ombros se contraindo, aquelas enormes patas traseiras
tensas e prontas para saltar. Nuvens de vapor do hálito quente saindo de suas narinas, queimando no ar frio da noite como parte do show de um mágico.
— Está tudo bem. – Disse ela, acariciando aquelas escamas.
Engraçado, teria pensado que as coisas seriam ásperas, mas eram suaves e flexíveis, um fino entrelaçamento de camadas que mudava com os movimentos do dragão e mostrava
todas as cores do arco-íris em cima de uma base roxa.
— Realmente está tudo bem.
Depois de um momento, a cauda da besta desenrolou e ela desceu para o chão.
Puxando seu casaco e suas roupas de volta no lugar, ela olhou ao redor.
Em seguida, colocou as mãos nos quadris e olhou para cima.
— Ok, garotão, você fez um ótimo trabalho. Obrigada... Estou orgulhosa de você. – Quando a coisa orgulhosa abaixou a cabeça, ela acariciou o focinho. — É hora de
ir, apesar de tudo. Você pode deixar o Rhage voltar?
Aquela grande cabeça foi lançada no ar, o sangue negro dos lessers que tinha consumido piscando como um revestimento oleoso abaixo da garganta e no peito. Estalando
as mandíbulas duas vezes, os dentes e presas travando com um som como dois SUVs batendo um no outro, grelha a grelha. O rugido que veio a seguir foi de protesto.
— Está tudo bem, – Ela murmurou enquanto permanecia em pé. — Eu te amo.
A besta abaixou o focinho e assoprou para fora o ar úmido.
E então bem desse jeito, seu corpo entrou em colapso, um castelo de areia caído com uma onda, uma estatueta de cera aquecida dissolvida em uma poça. Em seu lugar,
Rhage apareceu de cara no chão, sua enorme tatuagem de volta enrolando-se à sua volta, suas pernas nuas dobradas como se seu estômago já o incomodasse.
— Rhage, – Ela disse quando se agachou ao lado dele. — Você está de volta, meu amor.
Quando não houve resposta, nem mesmo um gemido de “vou vomitar”, ela franziu a testa.
— Rhage...?
Quando colocou a mão no ombro dele, a imagem tatuada do dragão em sua pele ganhou vida, deslocando-se de modo que sua cabeça estava sob o toque dela.
— Rhage? – Ela repetiu.
Por que ele não estava se movendo? Normalmente ficaria desorientado e com dor, mas sempre se virava para ela, assim como a tatuagem da besta fez, buscando cegamente
sua voz, seu toque, sua conexão.
— Rhage.
Alcançando a parte superior do braço, colocou toda sua força para puxá-lo mais plano contra o chão.
— Oh Deus…!
Havia sangue vermelho no peito. No meio de todas as manchas negras que a besta tinha consumido, havia uma fonte de sangue vermelho muito real, muito terrível e de
grande expansão no centro de seu torso.
— Socorro! – Ela gritou para a paisagem. — Socorro!
Os Irmãos já estavam vindo de todas as direções, abandonando seus esconderijos, correndo através do campo de batalha que estava cheio de lessers mutilados. E à direita
em seus calcanhares, como um farol de um Deus benevolente, vinha a unidade móvel e cirúrgica de Manny – o trailer-ambulância se dirigia para eles com o bom pé pesado
do médico no acelerador.
Mary avistou Vishous na multidão por causa de sua experiência em resgate médico.
— Você precisa ajudá-lo!
Aquela mancha vermelha... Estava à direita no esterno do Rhage.
E seu hellren tinha um coração forte, mas não era impenetrável.
O que tinha acontecido?
Capítulo SETE
Vishous foi o primeiro a chegar no Rhage enquanto o irmão ressurgia da carne do dragão... e merda, foi de pré-besta má a pós-maldição pior. O cara não estava se
movendo, não estava respondendo nem à sua shellan. Sua coloração era cinzenta como uma lápide de granito e havia um monte de sangue vermelho.
O que era apenas a ponta do iceberg. A verdadeira questão era quanto devia ter dentro daquela cavidade torácica.
— Ajude-me! – Mary disse enquanto colocava as mãos sobre a ferida e empurrava para baixo como se estivesse tentando conter o vazamento. — Ajude-o, oh, Deus, V...
O bom era que a unidade cirúrgica pisou nos freios e Jane tinha vindo com Manny, tendo se transferido através de seu próprio veículo. Assim que os cirurgiões bateram
as portas da frente do trailer, ambos os médicos atingiram o chão correndo com mochilas pretas cheias de equipamentos médicos.
— Eles estão aqui – V disse. Não que o par pudesse fazer muita coisa.
— Será que ele foi baleado? Eu acho que ele foi baleado. Oh Deus...
— Eu sei, venha aqui. Deixe-os olharem...
Mary sacudiu a cabeça e lutou contra ser puxada para trás.
— Ele está morrendo...
— Dê-lhes algum espaço para trabalhar. Vamos.
Porra, isso era culpa dele. Se não tivesse confrontado... Mas que porra. A visão tinha sido o que tinha que ser, e era exatamente isso aqui e agora: Rhage de costas
no chão nu, seu sangue por toda parte, V segurando Mary enquanto ela puxava e chorava.
— Um único tiro. – V anunciou. — Provável hemorragia cardíaca com tamponamento e derrame pleural.
Deus, queria que pudesse cobrir os ouvidos de Mary quando falou, mas como se ela já não soubesse o que era!
Os médicos não desperdiçaram um segundo, verificando sinais vitais enquanto Ehlena saltava para os fundos do trailer trazendo a maca com ela.
Vishous captou o olhar de sua companheira enquanto Jane escutava os sons cardíacos de Rhage, e quando ela balançou a cabeça ele soube, sem quaisquer outras palavras,
que tudo o que tinha adivinhado era verdade.
Merda.
— O que eles estão fazendo? – Mary balbuciou contra ele. — O que eles vão fazer?
V abraçou a fêmea mais apertado enquanto ela continuava a murmurar em seu ombro, a cabeça virando em direção a seu companheiro.
— Eles estão indo ajudá-lo, certo? Estão indo consertá-lo... Certo?
Jane e Manny começaram a falar em linguagem médica, e quando Vishous pegou a essência das palavras, fechou os olhos brevemente. Quando bateu as pálpebras novamente,
Manny estava de um lado de Rhage, colocando um dreno de tórax para drenar os fluídos em torno dos pulmões e Jane estava realizando uma pericardiocentese com uma
agulha que parecia tão longa quanto seu braço.
O que era um movimento de vai-com-tudo.
Normalmente este procedimento era feito com a orientação de ultrassom, mas ela não tinha escolha a não ser ir cegamente através do quinto ou sexto espaço intercostal
ao lado do coração.
Se ela errasse? Entrasse fundo demais?
Mary lutou em seus braços.
— O que eles estão fazendo...
— Ele está parando. – Manny vociferou.
— Rhage!
Ehlena estava lá com as pás, mas o quanto era bom em caso de uma enorme hemorragia? Inferno, mesmo se o dreno do tórax e a agulha fizesse o trabalho, nenhum dos
dois corrigiria o trauma cardíaco. A única chance de verdadeira sobrevivência era colocar o Irmão em uma máquina de circulação sanguínea (bypass) então Jane poderia
trabalhar sua magia e reparar seja qual for a ruptura ou perfuração sem sangue e sem movimento.
Abruptamente, tudo ficou em câmera lenta quando Rhage abriu os olhos, respirou fundo... E virou o rosto para Mary.
Seus lábios brancos começaram a se mover.
Mary empurrou contra o abraço de V e ele a soltou, permitindo que fosse até ele. Pelo amor de Deus, esta poderia ser a última chance da fêmea se comunicar com seu
companheiro. Fazer as pazes com ele. Resolver seus acertos para encontrá-lo do outro lado.
Vishous franziu a testa quando a imagem de sua mãe abandonada, deitada naquele estrado, voltou para ele.
É melhor você cumprir a porra da sua promessa, ele pensou para os céus. É melhor assumir a responsabilidade e tomar conta dos dois. Seria fodidamente melhor você
fazer certo a respeito daquela promessa, ele pensou para os céus. Seria melhor você levantar o homem e cuidar dos dois.
Mary caiu de joelhos ao lado da cabeça de Rhage e colocou a orelha em sua boca. O fato de que a equipe médica recuou sem dúvida foi perdido para ela, mas Vishous
sabia o que isso significava, e não era nada bom.
Que o ritmo do coração que estava sendo monitorado tão atentamente não estava ficando mais estável. Que a pressão arterial não estava ficando mais forte. Que a hemorragia
não estava parando. E o tubo e a agulha não foram longe suficiente.
V olhou para Butch, e quando o policial olhou para o outro lado do drama, V pensou sobre como os três formaram um vínculo tão apertado. A trindade, eles eram chamados.
Grudados como carrapatos e chatos como a merda, nas palavras de Tohr.
V olhou em volta. Os outros Irmãos estavam em circulo fechado, formando uma barreira de proteção e preocupação em torno de Rhage e Mary. No entanto, nenhum dos combatentes
tinha suas armas à mostra e, de tempos em tempos, um tiro soava quando eles atiravam nos lessers cujos corpos iam mostrando muita animação.
Quando Mary começou a falar com suave desespero, Vishous amaldiçoou novamente quando ficou claro para ele que, mesmo embora o casal tivesse um final que resultava
em ficar juntos, o resto deles estava perdendo Rhage e Mary. Maldição, era impossível imaginar a mansão sem eles.
Merda era supor não afundar com isso.
Risque isso, pensou, enquanto lembrava-se de sua visão. Não queria que acabasse assim. V moveu os olhos para sua companheira, e quando Jane apenas balançou a cabeça,
seu sangue gelou.
Jesus Cristo, não.
De repente uma imagem de Rhage na mesa de pebolim do Pit veio à mente. O Irmão não estava jogando no momento; estava em pé ao lado, comendo com vontade algum tipo
de burrito do Taco Bell. Estava comendo com as duas mãos, na verdade, com um chimichanga na outra mão. Alternando mordidas, o FDP consumindo cerca de quatro mil
calorias, com o sorvete de chocolate com menta crocante que ele tinha conseguido de sua geladeira, e metade de um bolo de chocolate que ele pegou de sobremesa antes
de vir da casa principal.
Ei V, o Irmão disse em um momento. Você algum dia vai raspar essa barbicha feia em torno de sua boca grande? Ou vai continuar parecendo um dos rejeitados da Affiliction2
como um serviço público para o que não fazer com uma gilete?
Irritante pra caralho.
E ele não daria sua bola restante para ter qualquer parte disso novamente. Mesmo se apenas como adeus.
O tempo era demasiado finito: não importa quanto dele você teve com alguém que amava, quando o fim chegava, não era o suficiente.
— Eu te amo. – Mary disse com voz quebrada. — Eu te amo…
Enquanto ela acariciava o cabelo loiro de Rhage da testa, sua pele estava tão fria e estranhamente seca. Sua boca manchada de sangue estava se movendo, mas ele não
tinha ar suficiente em seus pulmões para falar e, oh Deus, eles estavam cinza... Seus lábios estavam ficando...
Mary olhou para Manny. Dra. Jane. Ehlena. Então encontrou os olhos dos Irmãos. John Matthew. Blay e Qhuinn.
Por último olhou para Vishous... E ficou horrorizada com a luz distante em seus olhos.
Eles tinham desistido. Todos eles. Ninguém estava correndo para empurrá-la pra longe do caminho para que pudessem entubar seu companheiro, ou dar choque em seu coração
para voltar ao ritmo, ou rachar sua caixa torácica aberta e fazer o que fosse preciso para conseguir o que quer que estivesse errado voltar a funcionar em ordem.
Rhage arqueou com um gemido e tossiu um pouco mais de sangue. E quando ele começou a engasgar, ela conheceu uma nova definição de terror.
— Eu vou te encontrar, – Disse a ele. — No outro lado. Rhage! Está me ouvindo? Vou te encontrar no outro lado!
O ofegar e barulho, a dor em seu rosto, a agonia do grupo ao seu redor... Tudo tornou-se tão cristalino que doía os olhos e ouvidos, manchando seu cérebro para sempre.
E estranhamente, pensou em Bitty e sua mãe e o que tinha acontecido na clínica.
Oh merda, se ela deixasse o planeta... O que ia acontecer com a garota? Quem iria cuidar tanto como ela cuidava da agora órfã?
— Rhage... – Mary puxou seus ombros. — Rhage! Não! Espere, fique aqui...
Mais tarde ela tentaria trazer à tona por que a conexão sináptica foi feita quando o fez. Ela saberia como ela tinha, possivelmente, pensado em tudo... Teria suores
frios sobre o que teria acontecido em seguida e o que não teria acontecido em seguida... Se aquele raio não tivesse saído do nada quando o fez.
Às vezes escapar de um acidente por milímetros era quase tão traumático quanto o impacto.
Mas tudo isso veio depois.
No momento do falecimento de seu amado, no mesmo instante em que sentiu que ele havia deixado seu corpo para fazer a viagem para o Fade... De repente, e sem motivo
que pudesse pensar, ela vociferou:
— Role-o de lado. Façam isso!
Começou a puxá-lo sozinha, mas não deu em nada, ele era muito pesado e ela não podia conseguir um bom aperto em seu tronco maciço.
Olhando para cima, acenou para os Irmãos.
— Ajudem-me! Porra, me ajudem!
V e Butch caíram ao lado dela e viraram Rhage para seu lado direito. Arqueando em volta de seu companheiro, Mary recuou para o outro lado. As cores brilhantes da
tatuagem do dragão estavam desaparecendo, como se o brilho da imagem fossem um termômetro da saúde de Rhage. Focando novamente, colocou a mãos sobre a forma da besta,
Deus, ela odiava como a resposta foi lenta.
— Vem comigo, – Ela disse com urgência. — Preciso que você venha comigo.
Isso era loucura, pensou enquanto passava lentamente as palmas das mãos em torno do torso de Rhage, mas alguma coisa a guiava, algum tipo de vontade que certamente
não sentiu como dela própria. Porém não ia discutir como a imagem da besta seguia seu toque... E era estranho: não foi até ela fazer o caminho nas costelas que percebeu
o que estava fazendo.
Louca, pensou novamente. Completamente louca.
Vamos lá, não era como se o dragão tivesse sido treinado em medicina de emergência e muito menos cirurgia cardíaca.
Mas ela não parou.
— Ajude-me, – Ela disse engasgada para a besta. — Oh, por favor... Vamos lá, ajude-o, salve-o... Salve a si mesmo salvando-o...
Simplesmente não podia deixar Rhage ir. Não importava nestes últimos momentos que havia uma saída cósmica para os dois, que por causa do que a Virgem Escriba tinha
dado a ela, eles não tinham que se preocupar com algum tipo de separação. Ela ia tentar salvá-lo.
Trabalhando com ela, os Irmãos viraram Rhage deitado de costas novamente, e as lágrimas de Mary caíram sobre o peito nu de seu companheiro enquanto ela transferia
as mãos sobre o ilusoriamente pequeno buraco de cerca de uma polegada à direita de seu esterno.
Deus, sentia como se a ferida fosse do tamanho de uma sepultura.
— Apenas cure-o... De alguma forma, por favor... Por favor...
A tatuagem permaneceu onde ela parou.
— Cure isso…
O tempo parecia rastejar, e com os olhos lacrimejantes olhou para o peito de Rhage esperando por um milagre. Enquanto os minutos passavam e ela transitava para um
plano emocional miserável que era mais tenso que pleno pânico, muito menor do que totalmente deprimida, e tão vasta que era duas vezes o tamanho da galáxia, pensou
novamente no que Rhage dissera sobre as horas que ele passou ao lado da cama dela naquele hospital humano: sabendo que ela ia morrer, incapaz de fazer nada, perdido
embora soubesse o lugar de onde o corpo físico dele estava.
Era como se a gravidade não tivesse controle sobre mim, ele disse, e ainda assim estava me esmagando ao mesmo tempo. E então você iria fechar os olhos e meu coração
iria parar. Tudo o que eu conseguia pensar era que, em algum momento no futuro, você ia ter essa aparência para sempre. E a única coisa que eu sabia com certeza
era que eu nunca seria o mesmo, e não de uma boa maneira... Por que eu sentiria sua falta mais do que jamais iria importar com qualquer outra coisa na minha vida.
Mas então a Virgem Escriba tinha mudado tudo isso.
No entanto, aqui estava Mary... Lutando para mantê-lo vivo.
E o porquê... Quando ela realmente focou na questão... Parecia errado, tudo errado, e ainda assim ela não iria parar.
No início, a chama de calor não foi registrada no meio de todas as suas emoções. Havia muito na frente de sua mente e a mudança de temperatura foi muito sutil. O
calor logo se tornou impossível de ignorar, no entanto.
Piscando os olhos, franziu a testa para baixo, para suas mãos.
Não se atreveu a afastar as palmas das mãos para ver o que estava acontecendo embaixo.
— Rhage? Rhage... Você está conosco?
O calor rapidamente se tornou tão intenso que irradiava pelos braços dela e aquecia o ar que respirava quando se inclinou sobre seu companheiro. E então sentiu um
tranco, como se a besta estivesse rolando por perto...
Sem qualquer aviso, Rhage abriu a boca, lançando uma inspiração gigante e empurrou seu torso do chão, jogando-a de bunda no chão. Enquanto as mãos dela voavam, a
tatuagem foi revelada e estava…
A imagem do dragão tinha perdido seus contornos, suas cores num redemoinho em conjunto e ainda permaneciam distintas, como uma daquelas antigas coisas spin-art que
ela tinha feito nas feiras quando era pequena.
Ela não podia mais ver a ferida da bala.
Houve um suspiro coletivo, seguido por alguns sérios “mas que porra é essa?” e em seguida uma série de aleluias que foram proferidas com um sotaque de Boston.
— Mary? – Rhage engasgou confuso.
— Rhage!
Só que antes que ela pudesse alcançá-lo, ele começou a tossir em grandes espasmos, dobrando a cabeça para frente, apertando sua barriga distendida, sua mandíbula
se estendendo.
— O que há de errado com ele? – Mary disse quando chegou para frente, mesmo que isso não fosse como se pudesse fazer qualquer coisa para ajudar. Inferno, os médicos
pareciam igualmente confusos, e eram eles que tinham o Dr. na frente de seus nomes.
Rhage tossiu a maldita bala pra fora.
Direto na mão dela.
Por último, um grande arquejo, algo veio voando de sua boca e ela pegou o pedaço pontiagudo de chumbo por reflexo... Quando Rhage abruptamente começou a respirar
profundamente, inalando facilmente como se não tivesse nada de errado com ele.
Girando a coisa sobre a palma, ela começou a rir.
Não pôde evitar.
Segurando a bala entre o polegar e o indicador, ela a ergueu para os Irmãos, os médicos e os guerreiros, por que Rhage ainda estava cego. E então montou nas pernas
estendidas de seu companheiro e tomou seu rosto entre as mãos.
— Mary...? – Ele disse.
— Estou bem aqui, – Ela alisou o cabelo dele para trás. — E você também.
Instantaneamente ele se acalmou ainda mais, um sorriso repuxando sua boca.
— Minha Mary?
— Sim... Estou bem aqui.
E então, querido Senhor, ela estava chorando tanto que se tornou tão cega quanto ele estava. Mas isso não importava.
De alguma forma, a besta tinha feito o trabalho e...
— Mary, eu...
— Eu sei, eu sei, – Ela o beijou. — Eu te amo.
— Eu também, mas vou vomitar.
E com isso, ele a tirou suavemente para fora da linha de fogo, virou-se para o lado e vomitou tudo sobre os shitkickers de Vishous.
Capítulo OITO
Era uma maneira e tanto de voltar dos mortos.
Enquanto Rhage jogava seus biscoitos por toda parte, seu cérebro era nada mais que ovos mexidos...
Okay, não era uma boa ideia pensar em ovos de qualquer forma.
Uma segunda rodada das evacuações abdominais tomaram seu corpo, contorcendo-o da cabeça aos pés, e enquanto ele deixava seu estômago falar, ouviu a voz seca de V
ao longe.
— Não é minha noite, – O Irmão resmungou. — Não é minha noite com os vômitos.
Huh? Rhage pensou antes de deixar pra lá. Tudo que realmente se importava, fora o fato de que ele agora podia respirar e falar de novo, era sua Mary. Esticando seu
braço pra fora, procurou contato com ela de novo... E ela pegou sua palma na mesma hora, entrelaçando com a dele, segurando, isso o acalmava e ao mesmo tempo lhe
dava energia.
No instante que a conexão foi feita, sua confusão começou a dissipar.
Não, isso não estava exatamente certo. Ele não tinha ideia de como conseguiu ir de estar parado na porta do Fade, encarando a escolha que estava atônito de estar
confrontando mesmo estando ciente de que estava morrendo... Para de alguma forma estar sendo jogado de volta no seu próprio corpo e escutando claro como o dia a
voz mais perfeita da sua Mary, sem a interferência estática do medo e dor.
Nenhum ponto desse mistério foi esclarecido... Mas simplesmente estava cagando pra isso. Contanto que sua Mary estivesse com ele? O resto era merda que ele...
— Machucado? – Ele falou de repente. — Alguém está machucado?
A Besta teria...
— Todos estão bem. – Ela disse a ele.
— Me desculpe por estar doente. – Deus, o visual pós-festa do blackout era horrível, mas aguentaria isso no lugar de uma soneca na terra em qualquer dia e duas vezes
no domingo, como os humanos diriam. — Eu sinto muito...
— Rhage, precisamos colocar você dentro do RV. E não, não vou deixar você. Jane vai só verificar seus sinais vitais e então nós vamos dar o fora daqui. Não é seguro.
Oh, certo. Eles estavam no campus, no campo de batalha, sem dúvida alvos fáceis.
Com uma explosão de memória, tudo voltou pra ele. A discussão com V... A corrida no campo...
A bala no seu coração.
Com sua mão livre bateu no peito, tateando para encontrar o furo, procurando sangue... E descobrindo que apesar de ter o torso molhado e pegajoso... Não havia nenhum
ferimento discernível.
Só uma parte estranha naquele centro que parecia incandescente com o calor de uma fogueira. E foi aí que a comichão começou. Iniciando com a área sobre seu coração,
mudou ao redor em um remendo sólido, traçando sobre suas costelas, fazendo cócegas debaixo do seu braço, movendo até o centro das suas costas.
Era a Besta voltando para sua posição. Mas por quê?
É, arquive isso no final de uma fila bem longa de hã — o quê?
— Mary, – Ele falou em sua cegueira. — Mary...?
— Está tudo bem, vamos só sair daqui juntos, e quando estivermos a salvo, vou explicar tudo... Ou ao menos contar o que sei.
Pela próxima hora, sua shellan cumpriu sua promessa... Mas quando que ela desapontou alguém? Ela ficou ao lado dele a cada centímetro do caminho, desde o momento
em que foi colocado na maca e ganhando um passeio atribulado na RV do Manny... Da evacuação difícil no gramado crescido do campus até o caminho macio das ruas pavimentadas
da avenida... Do pare-e-continue do sistema de segurança do Centro de Treinamento da Irmandade... Até finalmente a chegada no quarto de recuperação da clínica.
A viagem o exauriu... Mas também, passou a maior parte do tempo vomitando partes de lessers e engasgando no gosto nauseante do sangue negro deles. E era engraçado:
normalmente passava por essa parte puto da vida e pronto para o sofrimento acabar logo. Nessa noite? Estava tão grato de estar vivo que não se importava de ter a
pior indigestão/dor de barriga/infecção estomacal do mundo acontecendo.
Você vai morrer hoje à noite, porra!
Maldição, Vishous estava sempre certo. Exceto que Rhage tinha de alguma forma derrotado a previsão e voltado do Fade: por alguma razão, por algum milagre, estava
de volta... E não achava que era por que a Virgem Escriba tinha feito um favor pra ele. Ela já tinha feito um depósito digno de prêmio da loteria na sua conta existencial
quando salvou sua Mary e, além disso, pelos últimos dois anos, a Mãe da Raça esteve sem contato como aquele parente estranho que você agradece por se manter longe.
Então seu irmão estava errado? A resposta curta para isso é sim, considerando que Rhage estava nesse momento deitado na cama de hospital ao invés de alguma nuvem
no céu.
Mas por quê?
— Aqui, – Sua Mary disse. — Eu tenho o que você precisa.
Verdade em tantos níveis, pensou enquanto virou sua cabeça em direção ao som da voz dela. Quando uma série de bolhas fizeram cócegas no seu nariz, ele estremeceu
de alívio.
Plop-plop, fizz-fizz, porra, sim.
— Obrigado, – Ele balbuciou, por que estava com medo que se tentasse enunciar demais as palavras ia começar a vomitar de novo.
Ele bebeu tudo que estava no copo e deitou de novo contra os travesseiros... E então o som de Mary colocando o copo vazio de volta e a sensação do peso dela sobre
o colchão o fez lacrimejar por alguma razão estúpida.
— Eu vi o Fade, – Falou quietamente.
— Você viu? – Ela pareceu estremecer, a cama transmitiu o sutil tremor de onde estava sentada. —É realmente assustador escutar isso. Como foi?
Ele franziu a testa.
— Branco. Tudo era branco, mas não tinha nenhuma fonte de luz. Foi esquisito.
— Eu teria encontrado você, você sabe. – Ela respirou fundo. — Se você não tivesse voltado, eu teria... Não sei como, mas teria encontrado você.
O ar que ele soltou durou o tempo de uma vida pra ele.
— Deus, eu precisava escutar isso.
— Você pensou o contrário?
— Não. Bem, exceto por me perguntar se era possível. Você deve ter pensado a mesma coisa ou não teria se esforçado tanto para me salvar.
Houve um momento de silêncio.
— Sim, – Ela suspirou. — Eu queria salvar você.
— E estou contente que funcionou. – Mesmo, ele estava. Honestamente. — Eu, ah...
— Você sabe que amo muito você, Rhage.
— Por que isso soa como uma confissão? – Ele forçou uma risada. — Só estou brincando.
— Eu realmente odeio a morte.
Okay, alguma coisa estava acontecendo. E não era só a respeito dele. Ela soava estranhamente... Derrotada, o que não era o sentimento de uma fêmea que tinha arrastado
o traseiro triste do seu hellren de volta da porta da morte. Tipo. Literalmente.
Rhage tateou ao seu redor tentando achar as mãos dela, e quando a segurou, elas tremeram.
— O que mais aconteceu hoje à noite? E não diga “nada”. Eu posso sentir sua emoção.
Mas não podia sentir o cheiro. Tinha muito cheiro de lesser no seu nariz e no seu sistema digestivo. Você quer falar sobre a porra da doença do refluxo gastresofágico?
— Não é tão importante quanto você, – Ela se virou para beijá-lo na boca. — Nada é tão importante quanto você.
Onde você está? Ele se perguntou. Minha Mary... Para onde você foi?
— Deus, eu estou cansado, – Ele falou no silêncio entre eles.
— Quer que eu te deixe sozinho para que consiga dormir?
— Não. – Rhage apertou as mãos dela e sentiu como se estivesse tentando prendê-la à ele. —Nunca.
Na quietude do quarto do hospital, Mary se pegou estudando o rosto de Rhage como se estivesse tentando tornar a memorizar os traços que conhecia tão bem e que estavam
marcados no seu cérebro. Mas então, ela não estava realmente se prendendo à toda aquela beleza ímpia. Estava procurando por alguma coragem dentro de si mesma. Ou
algo assim.
Você pensaria, levando em consideração a profissão dela, que seria melhor em momentos como aquele.
Conte a ele, pensou. Fale sobre Bitty e sua mãe, e o fato de ter feito merda no seu emprego e estar se sentindo como uma fracassada.
O problema era, toda aquela confissão tagarela orientada parecia tão egoísta considerando que ele tinha morrido uma hora atrás: era como encontrar alguém que teve
um acidente de carro feio e querer explicar para essa pessoa como sua noite foi ruim também, por que você conseguiu uma multa por excesso de velocidade e um pneu
furado.
— Eu teria absolutamente ido e encontrado você de alguma forma, – Enquanto repetia as palavras que já tinha dito, sabia que ele tinha acertado o prego na cabeça...
Por que sentia como se tivesse algo a confessar. — Mesmo, eu teria.
Ótimo, agora ela estava com náuseas.
Exceto, Deus, como podia dizer pra ele que lutou tanto para salvá-lo não por causa deles e sua relação, ou até mesmo pelos seus Irmãos e a tragédia que a perda dele
teria sido para todos, mas por causa de outra pessoa inteiramente diferente? Mesmo que esse alguém e todos os problemas dela fosse uma causa a se discutir? Mesmo
que essa terceira parte fosse uma criança recém órfã no mundo?
Só que parecia como uma traição aos dois e suas vidas juntos. Quando você encontra amor verdadeiro, quando recebe esse presente, você não toma decisões de vida ou
morte baseadas em problemas ou situações de ninguém mais. A menos que fosse seu filho, claro... E os céus sabiam que ela e Rhage nunca, jamais teriam qualquer criança.
Okay, ai. Aquilo doeu.
— O que dói? – Rhage perguntou.
— Desculpe. Nada. Sinto muito, só foi uma longa noite.
— Entendo o sentimento, – Ele soltou a mão dela e esticou seus enormes e largos braços, os músculos marcando sua pele e formando sombras afiadas. — Venha deitar.
Me deixe me sentir como um macho ao invés de um pedaço de carne, quero abraçar você.
— Você não precisa pedir duas vezes.
Esticando ao lado dele na cama, colocou sua cabeça no peito dele, bem sobre o esterno dele, e respirou fundo. Enquanto a sombria especiaria do aroma de vinculação
dele florescia no ar, ela fechou seus olhos e tentou dissipar toda a discriminação caótica que estava tropeçando e caindo dentro do seu crânio, palhaços de circo
que ela não achava graça nenhuma.
Felizmente, o contato com a pele de Rhage, seu calor do corpo, sua vital presença era como Valium sem os efeitos colaterais. Tensão lentamente deixou seu corpo e
aqueles bastardos com os narizes de borracha, as perucas baratas e os sapatos idiotas sumiram no plano de fundo.
Sem dúvida eles voltariam. Mas não podia se preocupar com isso agora.
— Está batendo tão forte de novo, – Ela murmurou. — Eu amo o som do seu coração.
Amava também a subida e descida estável do seu poderoso peitoral.
E quem diria... A visão de toda aquela pele macia e sem pelo sobre aqueles pesados músculos não era ruim também.
— Você é tão grande. – Falou enquanto esticava o braço e nem conseguiu circular o torso dele.
A risada que reverberou através dele foi um pouco forçada. Mas ele deu continuidade a ela.
— É? Me conte como eu sou grande.
— Você é muito, muito grande.
— Só meu peitoral? Ou está pensando em... Outros lugares?
Ela conhecia aquele tom muito bem... Estava inteiramente ciente de onde seu companheiro tinha ido com a cabeça – e certa o bastante, quando olhou ainda mais pra
baixo do seu corpo coberto pelo lençol, cada centímetro dele estava claramente ainda funcional, indiferente da experiência de quase morte.
Particularmente um certo trinta centímetros. Mais ou menos.
Seus olhos foram em direção à porta e desejou que a coisa estivesse trancada. Havia tantas pessoas da equipe médica por ali – okay, só três. Mas quando você estava
querendo um pouco de privacidade, eram três a mais do que se queria.
Quando Rhage girou os quadris, aquele enrijecimento debaixo dos lençóis acertou um ponto dela que o fez morder o lábio inferior, e Mary sentiu seu corpo inteiro
responder com uma onda de calor. Deus, odiava a estranha distância que os tinha separado, aquela sutil desconexão que sentia a um tempo agora: de alguma forma, mesmo
que o amor deles não tivesse diminuído, eles pareciam ter perdido o toque um com o outro... Apesar do fato deles dizerem os seus Eu Amo Você todas as vezes certas
e dormirem na mesma cama, e não se imaginarem com mais ninguém.
Mas pensando bem, quando foi a última vez que tiraram a noite de folga, qualquer um dos dois?
Rhage esteve ocupado com a guerra e os ataques contra Wrath e seu trono – e desde que Bitty e sua mãe chegaram ao Lugar Seguro, Mary teve uma preocupação profissional
que não a deixou descansar. Diabos, a preocupação por Bitty e Annalye esteve com ela até mesmo quando estava dormindo.
Em fato, sonhava com a garotinha quase todos os dias ultimamente.
Tempo demais, Mary pensou. Faz tempo demais desde que ela e Rhage focaram neles mesmos de maneira apropriada.
Então, sim, mesmo que fosse um Band-Aid que sem dúvida nenhuma seria temporário, e apesar do lugar público em que eles estavam, e sim, sem nenhuma consideração pelo
fato de que Rhage estava morto mais cedo... Mary colocou sua mão debaixo dos lençóis e desceu sua palma lentamente pelo estômago definido do seu companheiro.
Rhage chiou e gemeu, sua pélvis girando de novo, seus braços esticando para que pudesse segurar nas barras da cabeceira da cama.
— Mary... Eu quero você...
— O prazer é meu.
A excitação dele era grossa e longa, e enquanto a circulava, a sensação aveludada dele e os sons que ele fazia no fundo da garganta e o modo que o aroma de vinculação
ascendia ainda mais era exatamente o tipo de proximidade que eles precisavam. Isso era só sobre eles; nada mais era bem-vindo – o emprego dela, o dele, as preocupações
nem o estresse dele. A esse respeito, sexo era como o melhor limpador do mundo, levando embora a poeira e as coisas cotidianas da Vida Normal que tinham entorpecido
a conexão deles, deixando o amor que tinham um pelo outro fresco e espumante como nunca.
— Monte em mim, – Rhage exigiu. — Fique nua e suba em mim.
Mary olhou pro equipamento medico que estava ao redor da cama dele e quis falar um palavrão. Muitos bipes na tela.
— E quanto às maquinas? As coisas estão ficando muito excitantes.
— Beeeeem, é por que eu estou começando realmente a ficar excitado.
— Se eles aumentarem muito...
Bem ao sinal, o monitor cardíaco disparou o alarme estridente. E assim que Mary arrancou sua mão de debaixo, Ehlena entrou correndo no quarto.
— Está tudo bem, – Rhage disse para a enfermeira com uma risada. — Estou bem. Confie em mim.
— Só vou checar as coisas... – Então Ehlena parou. E sorriu. — Oh.
— É, oh. – Rhage tinha aquela colossal cara de pau de se recostar como um leão que estava prestes a ser alimentado. Ele até piscou na direção geral de Mary. — Então
você acha que talvez pode me desconectar só um pouquinho?
Ehlena riu e sacudiu a cabeça enquanto arrumava a máquina.
— Sem chance. Não até você ter mais tempo estabilizado satisfatoriamente.
Rhage se inclinou até Mary e sussurrou.
— Eu quero você de volta satisfatoriamente. É isso o que eu preciso.
A enfermeira foi em direção à porta.
— Estou logo ali na sala de cirurgia se precisarem de mim. Estamos prestes a operar.
Rhage franziu a testa.
— Operar quem?
—Houve alguns feridos. Nada sério, não se preocupe. Comportem-se vocês dois, ok?
— Obrigada Ehlena, – Mary deu tchau para a outra fêmea. — Você é a melhor.
Quando a porta fechou, Rhage baixou o tom da voz.
— Me desconecte.
— O quê?
— Ou você faz ou eu faço, mas preciso de você, agora.
Quando Mary não se moveu, Rhage começou a tatear cegamente procurando as máquinas, batendo em alguns computadores na mesa que parecia custar mais do que uma casa.
— Rhage! – Mary começou a rir enquanto segurava as mãos dele. — Qual é...
E então ele a ergueu e colocou sobre os quadris dele, ajustando-a no topo da sua ereção. E sim, assim que o peso dela pareceu ser registrado, aquele bip-bip-bip
começou de novo.
— Você pode me conectar de volta assim que eu acabar, – Informou a ela. — E mesmo sendo um sacrifício, se quiser só me masturbar, concordo em esperar por você mais
tarde. Mas cheguei perto da morte hoje uma vez já, não faça seu hellren morrer de desejo.
Mary teve que sorrir pra ele.
— Você me mata.
—E você podia me tocar? Por favor?
Ela sacudiu a cabeça apesar do fato de que ele não podia vê-la.
— Você simplesmente não aceita não como resposta, não é?
— Quando se refere à você? – Rhage ficou sério, seus olhos azuis cor das Bahamas a encarando cegamente, sua linda face sombria. — Você é tanto minha força quanto
minha fraqueza, minha Mary. Então o que me diz? Quer completar minha noite? E devo te lembrar... Eu morri nos seus braços mais cedo.
Mary soltou uma gargalhada e enquanto caiu pra frente sobre ele, colocou sua cabeça contra o pescoço dele.
— Eu amo tanto você.
— Ahhhhhh, isso é o que eu gosto de ouvir, – Mãos grandes acariciaram as costas dela. — Então o que vai ser, minha Mary?
Capítulo NOVE
Assistir das sombras não era o curso normal para Xcor, filho de ninguém.
Como um guerreiro sem lei e deformado, de fato líder de um time de sociopatas renegados, estava mais acostumado à ação. Preferivelmente com sua foice. Ou faca. Arma.
Seus punhos. Presas.
Ele pode não ser descendente do Bloodletter, como uma vez acreditou, mas de fato foi criado pelo mais cruel guerreiro – e as brutas lições que recebeu no acampamento
de guerra por aquela mão de luvas com espinhos foram bem aprendidas.
Ataque antes de ser atacado era sua primeira e mais importante de todas as regras. E tinha se mantido como seu primário princípio de operação.
Havia vezes, no entanto, quando uma certa neutralidade de ação era requerida, muito mais como um instinto discutindo o contrário, e enquanto se resguardava atrás
de uma carcaça queimada de um carro na pior parte dos becos de Caldwell, ele reinava sobre si. À frente, parado ao lado de uma poça mal iluminada por lâmpadas de
postes de trinta anos de idade, três lessers estavam trocando itens; um par de mochilas sendo entregues por uma única bolsa de pano.
Pelo que havia observado ultimamente nas ruas, estava confiante de que uma carregava dinheiro, e a outra marcada de preto estava carregada de pó e uma variedade
de injetáveis.
Inspirando, discerniu os cheiros e os catalogou. O trio ainda não tinha desbotado para o branco, seus cabelos escuros e castanhos significavam que o recrutamento
deles era recente na Sociedade Lesser – e de fato, aquilo era tudo que se encontrava no Mundo Novo. Desde que ele e seu bando de bastardos fizeram a viagem através
do oceano do País Antigo, o único inimigo que eles encontraram eram esses recém-introduzidos, na maioria de variedade inferior.
Era lamentável. Mas onde faltava qualidade tinha uma abundância em quantidade.
E os caçadores encontraram um novo empreendimento nos negócios, não é mesmo? Esse trio em particular, entretanto, não iria muito longe em suas venturas de tráfico.
Assim que eles terminassem com a pequena troca de mãos, ele ia matá-los...
Três toques diferentes de celulares tocaram, todos abafados, todos registrados somente por causa da audição afiada de Xcor. As coisas se moveram rápido dali em diante.
Após cada um deles checar o que só podia ser uma mensagem de texto, eles discutiram por um mero momento; então se enfiaram em um veículo quadrado, o brilho prata
do exterior o qual estava cheio de fotos de tacos e pizza.
Como um analfabeto, ele não conseguia ler o que estava escrito.
Como um guerreiro, ele nunca deixaria que isso o fizesse deixar seu alvo fugir.
Quando o veículo passou por ele, Xcor fechou os olhos e desmaterializou para o topo do carro, encontrando um lugar onde conseguiu se acomodar graças à área mais
baixa atrás de um tipo de saída de ar. Não tinha nenhuma intenção de chamar reforços. Não importa aonde os lessers iriam ou quem encontrariam, se ele fosse dominado,
podia ir embora sem ninguém saber de sua presença.
Palavras mais verdadeiras nunca foram faladas, como ocorreu.
O fato de que o motorista prosseguiu na direção do Rio Hudson não foi uma surpresa. Dado o lugar onde eles estavam vendendo, podia-se facilmente pensar que havia
algum conflito, armado ou não, que precisava de reforços na área das pontes – ou talvez fosse algo com a Irmandade. Mas afinal, aquela rançosa selva de concreto
não era o destino deles. Uma rampa logo foi transposta e a avenida foi seguida com velocidade crescente, tanto que precisou se segurar protegendo seu corpo contra
o vento, enroscando seu braço ao redor da base da barra e segurando forte.
A viagem foi dura, mas não foi por causa do terreno não nivelado, foi mais pelo vento frio e a velocidade.
Não muito depois, no entanto, outra saída foi tomada e a velocidade diminuiu tanto que pôde erguer sua cabeça e identificar a seção suburbana que era o norte do
centro da cidade. Aquela área populosa não durou. Logo uma área mais rural se apresentou.
Não, era um parque ou algo assim.
Não... Era outra coisa.
Quando por fim uma esquerda foi tomada entrando em um tipo de propriedade, não podia dizer onde estava. Era um lote vazio, grama crescida... Ou melhor, era um prédio
abandonado. Uma escola? Sim, ele pensou. Mas o lugar não era mais para humanos.
O cheiro de lessers estava no ar a um nível tão penetrante que seu corpo respondeu às camadas de fedor, adrenalina bombando, os instintos aguçados e prontos para
lutar.
O primeiro dos caçadores mutilados se apresentou em uma dispersão através do gramado crescido, e enquanto o veículo continuou em frente, mais e mais apareceram.
Fechando os olhos, ele se acalmou e desmaterializou até o terraço de um prédio de cinco andares à frente de onde a caminhonete eventualmente parou. Pisando cuidadosamente
sobre os galhos caídos e montes de folhas flutuando nas frias poças de água, Xcor foi até a beirada. A verdadeira escala do que foi um ataque massivo à Sociedade
Lesser era evidente pelos acres de carnificina no centro do campus: uma grande faixa de grama e árvores pisoteadas em camadas com partes de corpos quase mortos,
semi-vivos, de caçadores, e uma onda de sangue negro e oleoso do Ômega.
Era como a própria representação do Dhund.
— A Irmandade. – Ele falou para o vento.
Essa era a única explicação. E enquanto considerava qual tinha sido a estratégia do ataque deles, sentiu inveja que ganharam o presente dessa batalha. Como queria
que tivesse sido ele e seus soldados...
Xcor se virou.
Algo estava se movendo no terraço atrás dele. Falando. Xingando.
Na escuridão e com extremo silêncio, retirou sua lâmina da bainha e se abaixou, apoiando nas coxas. Seguindo em frente no vento frio, seguiu os sons que estavam
na direção do vento e testou o ar. Era humano.
— ... filmagem! Não! Estou dizendo, é uma merda!
Xcor veio por detrás do rato sem rabo, e permaneceu sem ser notado enquanto o humano falava no celular.
— Estou em cima do terraço, peguei a merda em vídeo! Não, idiota, TJ e o Soz se mandaram, mas eu subi aqui... Era um dragão... O que? Não, Jo, o efeito do LSD passou
hoje de manhã... Não! Se é um flashback, por que acabei de postar no YouTube?
Xcor ergueu sua faca acima do ombro.
—Não! Estou falando sério, eu...
O humano calou a boca assim que Xcor o acertou na parte de trás da cabeça com o cabo da sua arma. E quando o corpo amoleceu e caiu para o lado, Xcor pegou o telefone
e colocou no seu ouvido.
A voz de uma mulher estava dizendo:
— Dougie? Dougie! O que aconteceu?
Xcor finalizou a conexão, colocou o telefone na sua jaqueta e se inclinou para pular do terraço. Os três lessers que ele havia acompanhado não foram longe com o
caminhão de comida. Eles pareciam embasbacados pelo que os cercava, incapazes de responder levando em conta a magnitude das perdas.
Melhor cuidar deles primeiro antes que eles caiam fora.
Pisando sobre o macho caído, pulou do prédio, desmaterializando enquanto caía, e tornou a se materializar no chão antes que sofresse o impacto da queda e acabasse
se matando.
O caçador o viu, e isso era exatamente o que queria.
Ia fazer a matança dele um pouco mais desafiadora.
Enquanto os três corriam de volta para a caminhonete, ele se materializou em cima do que estava na traseira, perfurando-o no peito e numa busca mandando-o de volta
para o Ômega em um milhão de flashes e um estouro! Próximo, ele se lançou para frente e agarrou o segundo pelos ombros, tirando o equilíbrio dele e cortando a garganta
antes de jogar de lado. O terceiro capturou no ar enquanto estava tentando se fechar dentro da caminhonete no banco do motorista.
— Não, camarada. – Rosnou enquanto sacudia a coisa e a derrubava. — Todos por um, um por todos.
O lesser caiu no chão, e antes que pudesse responder, Xcor o chutou na cara, quebrando a estrutura óssea, destruindo as feições, rendendo os olhos à nada mais que
poças de fluído.
Xcor olhou por cima do ombro. Seria improvável que a Irmandade deixasse uma bagunça daquelas para os humanos encontrarem. Mesmo que o Campus fosse abandonado, cedo
ou tarde, um Homo Sapiens qualquer da variedade jovem ia romper a unidade do terreno. Assim como aquele no terraço.
Algo devia ter acontecido ao curso da luta. Algum ferimento crítico talvez, que precisasse encurtar o tempo de limpeza...
Xcor nunca viu chegar. Nunca escutou nada.
Um momento, estava plenamente consciente de seus arredores.
No outro, alguém ou algo tinha feito com ele o mesmo que ele fez com o humano no terraço.
Nem teve tempo de um último pensamento, no tão decisivo que foi o golpe na sua cabeça.
Vishous abaixou seu braço devagar enquanto olhava de cima o enorme macho que tinha acabado de cair aos seus pés.
Então imediatamente pegou de volta sua arma, apontando-a com as duas mãos, girou ao redor de si mesmo.
— Onde vocês estão, garotos? – Disse baixinho. — Hein, filhos da puta? Onde estão?
Não havia chance de Xcor, cabeça do Bando de Bastardos, ter ido sozinho. Não tinha maneira nenhuma, porra.
V não tinha tanta sorte.
Exceto que nada lhe respondeu. Nenhum contra ataque. Ninguém correndo de um prédio ou de trás de uma árvore com uma arma atirando. Tudo que tinha lá eram partes
de lessers e torsos no chão, o vento gelado batendo na sua face, e muito silêncio.
O som do assobio à esquerda o avisou da posição de Butch. E então teve outro pela direita. Um terceiro acima.
V assoviou de volta e seus irmãos vieram em uma corrida sem pressa.
Ele manteve os olhos em Tohr, e assim que o guerreiro estava ao alcance, V apontou a arma direto em seu peito coberto de couro.
— Pare aí mesmo.
Tohr parou. Ergueu as palmas.
— Mas que inferno você está fazendo?
— Butch, vire-o. – V falou, indicando com a cabeça para o vampiro aos seus pés.
No instante em que Tohr viu quem era, sua mão abaixou e suas presas ficaram à mostra.
— Agora você entendeu. – V balbuciou. — Eu sei que você tem o direito de matá-lo, mas não pode. Estamos nos entendendo? Você não vai acabar com ele, certo?
Tohrment rosnou.
— Essa não é sua decisão para tomar, V. Vai se foder, esse fodido é meu...
— Eu vou atirar em você, porra. Estamos entendidos? Pare aí mesmo.
Aparentemente o Irmão não estava ciente de ter dado um passo à frente. Mas Butch e todo mundo entendeu na mesma hora – e o policial se aproximou de Tohr cautelosamente.
— A morte pode ser sua, – Butch disse. — Mas nós o levamos de volta com a gente primeiro. Falamos com o bastardo, pegamos a informação, então ele é seu, Tohr. Mais
ninguém vai fazer a finalização além de você.
Phury concordou com a cabeça.
— V está certo. Você o mata agora e nós perdemos o interrogatório. Seja lógico quanto a isso, Tohr.
Vishous olhou ao redor. Os quatro tinham retornado ao Campus com a ideia de apunhalar o máximo que podiam de volta para o Ômega e fazer a limpeza que conseguissem
– mas essa pequena descoberta mudou o objetivo principal.
— Butch, leve-o de volta no Hummer. Agora. – V sacudiu a cabeça em direção à Tohr. — E não, você não vai ir com ele como retaguarda.
— Você me entendeu errado. – Tohr disse sombriamente.
— Entendi? Está ciente de que tem uma adaga na mão? Não? – Enquanto seu irmão olhou pra baixo com alguma surpresa, V sacudiu a cabeça. — Não pense que sou quem está
com problemas pra pensar. Você fica com a gente, Tohr. O tira se encarrega disso.
— Estou ligando para Qhuinn e Blay, – Butch falou enquanto pegava o seu telefone. — Quero eles aqui comigo.
— E é por isso que eu amo você. – V balbuciou enquanto manteve os olhos em Tohr.
O Irmão não tinha abaixado a adaga ainda. E isso estava bem. Tão logo Xcor estivesse em seu caminho, V ia se certificar de que Tohr colocasse seu impulso assassino
em bom uso.
Um momento depois, Blay e Qhuinn se materializaram na cena, e ambos soltaram um palavrão quando viram a cara feia e com cicatriz que estava virada pra cima sem expressão
de um corpo desmaiado.
Butch fez um trabalho rápido algemando Xcor, e então ele e Qhuinn pegaram o bastardo pelos pés e pelas mãos, carregando-o como um saco de batatas em direção ao Hummer
à prova de balas completamente preto que estava estacionado atrás de umas das salas de aula. A máquina de cara feia era na verdade a segunda versão do SUV, o primeiro
foi roubado quando ele se descuidou na frente de uma farmácia no inverno passado.
V não moveu um músculo até que viu que a coisa tinha ido a caminho da propriedade pisando fundo no acelerador.
— Não é que eu não confio em você, – ele disse a Tohr. — Eu só não...
Vishous calou a boca. E ficou imóvel de novo.
— O que aconteceu? – Phury perguntou.
V não tinha ideia. E isso não era bom. A única coisa que tinha certeza era que o panorama tinha mudado abruptamente de uma forma sutil, mas inegável, uma onda carregando
e se estendendo sobre os corpos dos caçadores como se uma sombra tivesse sido jogada sobre o Campus.
— Merda, – Vishous chiou. — O Ômega está chegando!
Capítulo DEZ
A beleza estava nos ouvidos de quem vê.
Enquanto Rhage percorria com as mãos pra cima e pra baixo as coxas de Mary, ele podia estar cego, mas sabia exatamente o quanto sua shellan era linda quando ela
se sentou sobre seus quadris, equilibrou seu peso e colocou as palmas sobre seu peito.
— Então, como é que vai ser? – Ele perguntou enquanto mexia sua pélvis.
Com sua ereção acariciando o centro dela, mesmo através das cobertas e das calças que estava usando, a resposta dela foi rouca.
— Como eu posso algum dia, – Ela sussurrou — dizer não pra você?
Deus, essas palavras... E ainda mais do que isso, sua voz! Elas o fizeram pensar na primeira noite em que ele a conheceu. Foi aqui embaixo no Centro de Treinamento,
logo após a besta ter aparecido. Ele estava cego na ocasião, e andando pelo corredor à procura de um treino para distraí-lo de seu tédio e recuperação. Ela tinha
chegado às instalações com John Matthew e Bella, como intérprete para o menino que era mudo e precisava de alguém que soubesse linguagem de sinais para se comunicar.
No segundo em que falou com ele, sua voz o acorrentou de vez, como se cada sílaba que tinha pronunciado tivesse vindo com elos de aço. Ele soube naquele momento
que a teria. É claro que, na ocasião, não tinha planejado que ela seria o amor de sua vida. Mas sua vinculação pensou diferente e ele agradecia a Deus por isso.
Graças a Deus também que ela desejou tê-lo da mesma forma.
— Vem cá, minha Mary...
Ela se moveu para um lado.
— Mas estarei ligando os aparelhos novamente no instante em que terminar.
Rhage deu um sorriso tão largo que seus dentes da frente cintilaram.
— Por mim tudo bem, espere, o quê? Aonde você vai?
Mesmo com seus protestos, Mary não parou até desmontar por completo, e não apenas desligar a máquina.
— Precisamos fazer isso de forma parcialmente discreta, – O bip parou. — Estou falando sério sobre colocar isso de volta em você quando terminarmos.
Torcendo para o lado, ele estendeu a mão, em sua cegueira, agarrando sua cintura e puxando-a em sua direção.
— Venha aqui.
Todo pensamento sumiu quando sentiu a mão dela em cima das cobertas... Diretamente sobre seu pau.
O som que saiu dele fervilhando era em parte um Hmmmmmm e parte gemido. Seu toque, mesmo através das cobertas, foi o suficiente para disparar seu coração, ferver
seu sangue, superaquecer sua pele com um delicioso arrepio.
E deixá-lo a apenas um passo de um orgasmo.
O colchão da cama do hospital deslocou conforme ela se esticou ao lado dele, e a palma da sua mão se moveu sob o lençol, deslizando ohhhhhhh, tão pra baixo. Espalhando
suas pernas para lhe dar todo o acesso ao que ela queria, arqueou sua cabeça para trás e inclinou a coluna para o céu quando ela agarrou sua ereção. Gritou seu nome,
sentiu a besta surgindo também, o dragão se dirigindo à crista da onda de prazer junto com ele, enquanto ainda estava amarrado.
Como se tivesse aprendido boas maneiras.
— Minha Mary... – E então engasgou. — Oh sim.
Ela começou a acariciá-lo de forma macia e lenta, e foi estranho o modo como ela o afetava. O sexo o fazia se sentir tão poderoso, tão másculo, tão foda, que se
perguntou como sua carne conseguia conter o grande rugido da batida erótica... E ainda assim ela era o mestre de tudo dele, e a totalidade da sua reação também,
totalmente no controle, dominando-o de forma que o fazia totalmente fraco diante dela.
E diabos que isso era sexy.
— Você é tão bonito. — Ela disse numa voz rouca. — Oh, olhe para você, Rhage...
Ele adorou a ideia de que ela estava olhando para ele, vendo o que estava fazendo com ele, deleitando-se no controle que tinha sobre ele, literalmente. E se não
podia tocá-la, se tinha que ser um bom menino e manter suas mãos pra si mesmo, pelo menos ela poderia desfrutar do fato de trazê-lo de joelhos, sabendo que só ela
tinha a capacidade de fazer isso com ele.
Afinal, apesar de qualquer distância que tenha surgido entre eles ultimamente, nada tinha mudado para ele. Mary era a única mulher que queria, a única que via, sentia
seu cheiro e não podia esperar para estar com ela.
Isso foi bom para eles. Esta ligação sexual escaldante era importante para eles agora.
Especialmente agora que ela caiu em um ritmo bombeando seu pau, apertando a ponta. Mais rápido. Mais rápido ainda.
Até que ele estava ofegante, e a doce dor de antecipação atravessou seu corpo e sua cabeça girou.
Não estava mais cansado. Não.
— Mary, – Fez um grande esforço na cama arqueando, agarrando o colchão de um lado e a grade de proteção do outro. — Mary, espera...
— O que?
Quando ela parou, ele sacudiu a cabeça.
— Não, continue... Só quero que você faça algo pra mim.
— O que? – Ela disse enquanto corria a palma da mão pelo seu pau... E depois para baixo... E depois para cima...
Que porra ele tinha na cabeça... Ohhh, certo.
— Vem cá, vem mais perto, – Quando ela fez, ele sussurrou algo em seu ouvido.
O riso dela o fez sorrir também.
— Sério? – ela disse. — Isso é o que você quer?
— Sim. – arqueou seu corpo novamente, revirando os quadris para que a ereção fosse em direção ao seu aperto.
— Por favor? E vou implorar se você quiser... Adoro quando te imploro coisas.
Mary se deslocou mais para cima na cama do hospital e começou a trabalhar nele a sério novamente. Então inclinou perto da sua orelha...
... E com pronúncia perfeita disse:
— Inconstitucionalissimamente.
Deixando escapar uma maldição feito louco, Rhage gozou tão forte que viu estrelas, sua ereção latejando forte na mão dela, seu gozo fazendo as coisas muito, muito
bagunçadas debaixo daquelas cobertas. E o tempo todo, seu único pensamento era o quanto amava sua fêmea.
Como ele a amava demais.
Duas portas abaixo do orgasmo induzido por vocabulário do Rhage, Layla estava sentada em sua própria cama de hospital, uma bola gigante de fio vermelho em seu lado
direito, o cachecol mais comprido na história do mundo se esticando até o chão do outro lado. Entre os dois? Uma barriga que estava crescendo tão inchada dos bebês
gêmeos que ela carregava que se sentia como se alguém tivesse dobrado um colchão e amarrado a coisa com um cinto no seu torso.
Não que ela estivesse em posição de reclamar. Os dois eram saudáveis, e contanto que ela ficasse na cama, sabia que estava dando a eles a melhor chance de sobrevivência.
E certamente Qhuinn, o pai deles, e seu amado Blay, mimavam-na implacavelmente aqui embaixo, como se os dois preferissem ser aqueles a atravessar a permanência auto-imposta
para ela.
Eles eram machos tão maravilhosos.
Enquanto fazia outra virada no fim de outra fileira, sorriu quando se lembrou de Blay sugerindo que ela tricotasse alguma coisa, pois isso ajudou sua mãe Lírica
a conseguir atravessar seu próprio repouso na cama na gravidez dele. Isso provou ser um bom conselho – havia algo singularmente calmante no clic-clic das agulhas
e o fio macio entre seus dedos, e o progresso que podia medir de forma tangível. Porém, neste momento, teria que cortar a coisa em segmentos ou dar para uma girafa.
Afinal, assistir maratonas de Donas de Casa de verdade sem fazer alguma coisa, qualquer coisa produtiva, era positivamente insustentável. Não importa que Lassiter
dissesse o contrário.
Agora, Terapia de Casais com Dra. Jenn? Isso talvez fosse uma história diferente – embora, claro, ela não aprendeu coisas relevantes para sua própria relação. Por
que não tinha um macho para chamar de seu.
Não, ela tinha uma obsessão nada saudável que bateu de frente e queimou. O que era uma boa coisa – embora a perda do que nunca devia querer em primeiro lugar causou
dor inimaginável e injustificável.
Mas afinal, uma pessoa não se apaixonava pelo inimigo. E não só por que era uma Escolhida.
Era por que Xcor e seu Bando de Bastardos, declarou guerra para Wrath e a Irmandade.
Era por isso que...
— Pare com isso, – Ela murmurou enquanto fechava os olhos e parava as agulhas. — Só… Pare.
Realmente não pensou que pudesse aguentar mais um instante a culpa e o conhecimento de sua traição daqueles quem lhe eram mais queridos. Contudo, qual era o outro
curso? Sim, mentiram para ela e então foi coagida… Mas no fim, seu coração foi onde não devia ter ido.
E apesar de tudo, isso nunca foi devolvido a ela.
Quando ouviu outro som ali fora no corredor, deu uma olhada para sua porta e se forçou a se perder na distração. Houve um monte de atividade no centro de treinamento
hoje à noite – vozes, sons de passos, portas abrindo e fechando – e de alguma forma, isso tudo só a fez se sentir mais isolada em vez de menos. Mas aí, quando as
coisas ficavam quietas, havia menos sugestões para lembrá-la de tudo que estava perdendo.
Ainda assim, não estaria em qualquer outro lugar.
Colocando a mão em seu estômago arredondado, pensou que sim, a vida como ela conhecia ultimamente estava mais focada interiormente que exteriormente – e a qualquer
hora que ficasse inquieta, tudo que tinha que fazer era se lembrar de tudo que estava em jogo.
Ela pode nunca ter o amor que Qhuinn e Blay compartilhavam, mas pelo menos as crianças seriam dela e deles.
Isso teria que ser suficiente para sua vida, e seria. Não podia esperar para segurá-los, cuidar deles, vê-los crescer.
Assumindo que ela sobrevivesse ao parto. Assumindo que todos eles sobrevivessem.
Quando um alarme suave veio de seu telefone, ela saltou e apertou a tecla de silenciar o alarme.
— Já está na hora?
Sim, estava. Sua liberdade chegou. Trinta minutos para se esticar, caminhar e ir para um passeio.
Dentro dos confins do centro de treinamento, claro.
Empurrando o tricô em direção à base das agulhas, enfiou as pontas dentro do rolo, e esticou seus braços e pernas, esticou as pontas dos pés, flexionou seus dedos.
Então moveu seus pés pra fora da cama e colocou seu peso neles. As demandas da gravidez e toda sua inatividade forçada a levaram a uma certa fraqueza nos músculos,
uns que não curavam, não importa quanto se alimentasse de Qhuinn e Blay – então aprendeu a ser cautelosa sempre que se levantava.
Primeira parada foi o banheiro, algo que tinha permissão para usar prontamente, mas inevitavelmente adiava. Não havia necessidade de tomar banho, o que ela fez cerca
de doze horas atrás durante essa meia hora para estar de pé e passear.
Não, isto seria puramente para investigar.
O que estava acontecendo ali fora?
Enquanto encabeçava para a porta, alisou o cabelo, que parecia estar crescendo tão rápido quanto seu cachecol: as ondas loiras desciam passando dos seus quadris
agora, e supôs que devia cortá-lo em um certo ponto. Sua camisola de flanela era igualmente longa e larga, do tamanho de uma barraca florida, e seus chinelos faziam
um som de shhht-shhht-shhht acima do chão nu. Com suas costas já doloridas e um braço estendido para se estabilizar, sentiu como se fosse séculos mais velha do que
realmente era.
Empurrando a porta para sair, ela...
Imediatamente deu um passo atrás.
Tanto que sua bunda bateu no painel, fechando.
Do outro lado, dois machos estavam de pé, altos e orgulhosos, expressões idênticas de tensão marcando seus rostos.
E pelo idêntico, quis dizer exatamente isso.
Eles eram gêmeos.
Quando eles focaram nela, ambos se recolheram como se vissem um fantasma.
— Olhem pra onde olham, – Veio um grunhido desagradável.
Layla chicoteou sua cabeça em direção ao aviso.
— Zsadist?
O Irmão com o rosto com cicatrizes caminhou a passos largos para ela, colocando seu corpo, com todas suas armas, entre ela e os dois estranhos, embora nenhum dos
machos fizesse um movimento agressivo em direção a ela. Não surpreendentemente, foi um bloqueio muito bem sucedido. O tórax e os ombros do Zsadist eram tão largos
que ela não podia mais ver o par – e este era claramente o plano dele.
— Voltem lá pra dentro com ele, – Zsadist vociferou. — Antes que eu ponha vocês naquele quarto.
Não houve nenhum argumento, e abruptamente os cheiros estranhos dissiparam como se eles realmente desaparecessem do corredor.
— Eles não fizeram nada comigo, – Ela disse. — Realmente, acho que se eu fizesse Buu! eles poderiam muito bem sair correndo.
Z deu uma olhada por cima do ombro.
— Acho que você devia voltar ao seu quarto.
— Mas tenho permissão para esticar minhas pernas duas vezes por noite!
O Irmão suave, mas firmemente, tomou seu cotovelo e a escoltou de volta para sua cama.
— Não nesse instante. Vou dizer a você quando estiver okay. Nós temos algumas visitas inesperadas e não estamos correndo nenhum risco com você.
— Quem são eles?
— Ninguém com quem você precise se preocupar, e eles não vão ficar muito tempo, – Z a colocou de volta em posição. — Posso te trazer alguma comida?
Layla exalou.
— Não, obrigada.
— Algo para beber então?
— Estou bem. Mas obrigada.
Depois de se curvar profundamente o Irmão partiu, e meio que esperava ouvir os sons distantes da pistola dele varrendo aqueles dois soldados só por olhar para ela.
Mas era como as coisas funcionavam. Como uma fêmea grávida, era a coisa mais valiosa no planeta, não só para seu jovem pai, mas para cada único membro da Irmandade.
Era como viver com uma dúzia de irmãos mais velhos superprotetores e mandões.
Ou Irmãos, como era o caso.
E normalmente, poderia ter desafiado até Zsadist. Mas não reconheceu aqueles machos grandes, e Deus sabia que já entrou em bastantes problemas confraternizando com
lutadores que ela não conhecia – e eles tinham que ser soldados. Eram de constituição pesada e forte, e estavam usando coldres.
Embora vazios.
Então eles não eram inimigos, ela decidiu, ou não teriam mesmo permissão para estar no centro de treinamento. Mas eles não eram exatamente de confiança também.
Do nada, uma imagem do rosto duro do Xcor veio à sua mente – e a pontada de dor que a atravessou foi tão forte que os bebês mexeram em sua barriga como se sentissem
isto também.
— Pare com isto. – Ela sussurrou para si mesma.
Agarrando o controle remoto da TV, ela ligou a tela do outro lado do quarto. Certo. Ela ficaria aqui até que aqueles estranhos partissem. Então sairia e se sentaria
com o irmão do Qhuinn, Luchas, que estava em recuperação duas portas adiante e parecia esperar ansiosamente suas visitas regulares. Então talvez um bate-papo com
a Dra. Jane em sua escrivaninha, ou talvez Blay e Qhuinn voltassem de suas rondas até lá e eles caminhariam até as salas de aula.
Quem quer que sejam aqueles soldados, duvidava que os Irmãos os deixassem ficar mais tempo além do absolutamente necessário. Pelo menos pela reação do Zsadist.
E todas as armas das quais eles muito claramente foram despojados.
Capítulo ONZE
Sem tempo. Absolutamente nenhum maldito tempo.
Com uma erupção do mal permeando o ar, Vishous tirou sua luva forrada de chumbo e levantou sua mão incandescente. Fechando os olhos e se concentrando – por que sua
vida, e a vida de seus dois irmãos, de fato dependiam disso – ele liberou uma série de lufadas de impulso de si mesmo – exceto que o mhis se estendeu somente do
tamanho de um bolso sobre todo o campus panorâmico, uma pequena parte, não maior do que a distância de duas polegadas em frente ao seu rosto e duas polegadas atrás
dos corpos de Phury e Tohr.
Graças a Deus o Hummer está fora da propriedade.
— Ninguém se mexe, – V comandou quando uma barreira ondulante e irisdecente se formou em volta deles, parecido com bolhas de sabão de uma criança feita com detergente.
Ele não tinha nem ideia se isso iria funcionar, mas sabia que teria de acontecer – a atmosfera estava se tornando uma densa sombra de maldade. Inferno, mesmo com
o mhis no lugar, sua pele pinicava com um aviso para correeeeeeeeeeeeer!
E foi quando o Ômega em pessoa apareceu a cento e trinta metros à frente.
Falando sobre anticlímax. Na superfície, a figura de tinta transparente em suas roupas brancas alvejantes parecia intimidante como um peão de xadrez animado. Mas
isso fazendo uma avaliação visual. Internamente, cada célula que constituía seu corpo, cada neurônio que queimava em seu cérebro, todas as emoções que já teve ou
que teria começou a gritar como se estivesse sob um horrendo ataque mortal.
Atrás dele, um suave murmúrio se iniciou e V olhou de relance por cima do ombro. Phury tinha começado a rezar no Antigo Idioma.
— Shhh, – Vishous sussurrou.
Phury imediatamente engoliu a fala, mas seus lábios seguiram se movendo, continuando a oração. E sim, V pensou em sua mãe fazendo seu não-posso-nem-mesmo-estar-lá-em-acima
– e ficou tentado a dizer ao cara que ele estava perdendo seu tempo. Mas tanto faz. Não há razão para roubar a ilusão de seu irmão.
Depois, e se o mhis não funcionar? Eles três e o que eles oraram, ou o que não oraram, estavam indo para um ponto discutível diretamente fora do planeta.
O Ômega se virou lentamente avaliando sua “morte”, e V ficou tão tenso que correu o risco de cair pra frente como uma tábua. O olhar do mal não se demorou onde ele
e seus irmãos estavam parados, então sugeriu que o mhis estava funcionando – provavelmente pelo menos parcialmente, por que o irmão da Virgem Escriba estava muito
distraído pela devastação da sua Sociedade.
Merda, este é meu tio, V pensou sombriamente.
E então o Ômega passou oscilando, andando com seus próprios pés, sangue negro encharcando o gramado, do mesmo jeito que a mãe de V perambulava.
A chuva começou a cair do céu, as gotas frias batendo no cabelo e nariz de V, seus ombros, nas costas de suas mãos. Mesmo a coisa fazendo cócegas na sua pele, não
se moveu para afastar aquilo ou se abrigar – e francamente, sim, poderia ter feito sem se recordar exatamente de como sua ilusão de ótica estava inconsistente com
a realidade. Aquela chuva passou pela barreira?
Inferno, você poderia colocar um jornal sobre sua cúpula e ter uma proteção melhor contra a chuva.
Porra.
De tempos em tempos, Ômega parava para se curvar e pegar um braço, uma perna, uma cabeça. E jogava de volta onde quer que estivesse no gramado, como se estivesse
procurando por alguma coisa em específico. E então parou sem aviso.
Um gemido baixo soou fora do campus, o som entrando e se espalhando no vazio, morrendo nos edifícios sem ecoar.
E então Ômega estendeu suas palmas para a frente.
A porcaria de uma brisa bateu nas costas de V e jogou seus cabelos na cara e nos olhos, ondulando a frente da sua jaqueta também até o couro começar a agitar, e
teve que apertar a coisa contra seu corpo.
De repente, os restos do massacre, todos os pedaços mortos e manchados, liquidificou em uma sombra viscosa que colocou para dentro de si, tornando-se um maremoto
que quebrou dentro de seu mestre, sua casa, seu núcleo.
O Ômega absorveu tudo isso, reivindicando a parte de si que tinha dado aos seus induzidos durante a cerimônia de iniciação, chamando de volta à sua essência, reabsorvendo
tudo até que o campo de batalha estivesse limpo como estava antes do ataque ter sido travado, nada além de grama pisada e árvores derrubadas para mostrar o que a
Besta e a Irmandade fizeram.
Quando tudo estava acabado, Ômega parou no centro da praça da escola, olhando ao redor como se desse uma checada dupla no trabalho. E então, tão rápido quanto chegou,
a entidade desapareceu em si mesmo, um sutil flash foi só o que restou de sua presença – e até mesmo isso desapareceu um segundo depois.
— Esperamos, – V sibilou. — Vamos esperar.
Ele não estava dando por certo que o Ômega tinha realmente ido embora dali. O problema era que o amanhecer estava vindo... E sim, se o mhis não podia proteger os
três da chuva, também não iria proteger porcaria nenhuma da “sempre em frente” luz do sol.
Mas poderiam se permitir ficar mais um pouquinho. Só pro caso.
Melhor ser cauteloso do que descoberto. Depois, precisava de um momento para que seu testículo restante pudesse voltar para o seu lugar novamente.
Porra.
Capítulo DOZE
— Eu não acredito que isto seja necessário.
De volta ao centro de treinamento da Irmandade, Assail olhou de seu corpo para o humano de cabelos escuros que estava fechando o corte em sua panturrilha e tornozelo
com agulha e linha. Quando o homem não respondeu e nem moderou seus cuidados, Assail revirou os olhos.
— Eu disse...
— Sim, sim. – O cara enfiou a agulha entre a pele mais uma vez e puxou até que a linha preta fosse esticada. — Você deixou perfeitamente claro. A única coisa que
vou tornar a dizer é que a MRSA3 não dá a mínima se você é vampiro ou humano, e deixar uma ferida aberta de seis polegadas em sua perna é a definição da estupidez.
— Eu curo bastante rápido.
— Não tão rápido, amigo. E você pode parar de se contorcer? Eu me sinto como se estivesse trabalhando em um peixinho dourado na água.
Na verdade, ele não podia. Suas extremidades tinham ideias próprias no momento, e enquanto verificava o relógio de parede e calculava o pouco tempo que tinha antes
do amanhecer, o tremor tinha piorado...
A porta do quarto abriu e seus primos retornaram.
— Pensei que não quisessem assistir, – Assail murmurou. E de fato, Ehric, o da esquerda, foi cuidadoso em não olhar para o trabalho de reparação.
Embora o assassino proficiente que o homem era, seu estômago revolvia em náuseas nas questões clínicas, uma contradição que podia ser uma fonte de diversão, mas
não era no momento.
Na verdade, Assail não estava com disposição para qualquer tipo de leviandade. Não tinha consentido em ser trazido aqui para esta instalação de tratamento da Irmandade.
O que queria fazer era voltar para sua casa no Hudson e arranhar a coceira que estava rapidamente se tornando um rugido.
— Quando você terá terminado? – Perguntou ele.
— Vou radiografar seu ombro a seguir.
— Não há necessidade.
— De onde veio seu diploma médico?
Assail amaldiçoou e deitou-se horizontalmente sobre a maca. O foco acima dele, com suas luzes brilhantes e armação microscópica, era como algo saído de um filme
de ficção científica. E enquanto fechava os olhos, era impossível não se lembrar dele vindo aqui com sua Marisol logo depois que a livrou de Benloise... Deles dois
passando pelo extenso sistema de engatilhamentos direcionando ao subterrâneo e entrando nesta instalação estelar.
Porém tentou instruir sua mente para outro lugar. A destinação desse pensamento era simplesmente dolorosa demais para suportar.
— Vou ter de partir antes do amanhecer, – Revelou. — E quero nossas armas, telefones e outros artigos pessoais devolvidos a nós prontamente.
O médico não respondeu até ter aplicado seu último ponto e atado um nó um pouco apertado na base do tornozelo de Assail. — Importa-se de dizer a seus rapazes para
sair novamente por um minuto?
— Por quê?
Ehric falou. — Zsadist nos quer aqui. E não estou inclinado a discutir com o Irmão enquanto estou desarmado e desejoso de manter o suprimento de sangue da minha
cabeça.
O médico sentou-se em seu banco giratório e, pela primeira vez, Assail leu a costura no jaleco branco do humano: Dr. Manuel Manello, Cirurgião Chefe. Havia um adorno
e o nome de um sistema hospitalar abaixo da escrita cursiva preta.
— Os Irmãos o trouxeram pra cá de outras espécies para esta noite? – Perguntou Assail. — Como isso é possível?
O Dr. Manello abaixou o olhar para seu nome. — Jaleco velho. E velhos hábitos custam a morrer... Não eles.
Enquanto o humano encarava Assail no olho, Assail franziu o cenho.
— O que quer dizer?
— Você consente que eu fale abertamente na frente desses dois?
— Eles são meu sangue.
— Isso é um sim?
— Você humanos são tão estranhos.
— E você pode cortar esse tom superior, imbecil. Estou casado com uma de sua espécie, ok? E desculpe-me por pensar que você poderia não querer ser avaliado a respeito
do seu vício em drogas na frente da dupla dinâmica... Caso eles não sejam relacionados a você.
Assail abriu a boca. Fechou. Abriu novamente.
— Não sei do que está falando.
— Oh, sério? – O homem arrancou as luvas azuis brilhantes e colocou os cotovelos sobre os joelhos, inclinando-se. — Você está inquieto na minha mesa como se estivesse
revestido por colméias. Está suando frio, e não porque esteja com qualquer dor. Suas pupilas estão dilatadas. E tenho certeza que se eu te desse seu casaco de volta,
a primeira coisa que faria seria dar uma desculpa para ir ao banheiro e usar o resto da coca que estava no frasco, e que tirei do interior do bolso da frente. Como
estou indo? Lendo sua mente corretamente? Ou vai mentir como um filho da puta?
— Eu não tenho um problema com drogas.
— Uh-huh. Claro que não.
Enquanto o humano ficava de pé, Assail fez algumas análises ignorando a si mesmo... De maneira nenhuma iria olhar para seus primos: podia sentir seus olhares gêmeos
em cima dele bem mais que o bastante, muito mais que obrigado.
Pelo menos nenhum deles disse nada.
— Olha, não tenho nada a ver com isso, – O Dr. Manello foi até uma mesa de trabalho na qual um computador, algumas canetas e um bloco descansavam. Inclinando-se,
escreveu alguma coisa e rasgou a folha fixada da ponta, dobrando-a ao meio. — Aqui está meu número. Quando chegar ao fundo do poço, ligue pra mim e podemos te ajudar
na desintoxicação. Entretanto, esteja ciente de que o uso prolongado de cocaína leva a todos os tipos de coisas divertidas, como ataques de pânico, paranóia e até
desenvolver psicoses. Você já está na categoria da perda de peso, e como eu mencionei, está cheio de tiques da porra. Seu nariz também fica escorrendo o tempo todo,
então tenho certeza que seu septo está desviado.
Assail olhou para o cesto de lixo ao lado dele e perguntou como todos aqueles Kleenex tinham terminado ali. Certamente, não poderia ter sido... Huh. Ele tinha um
chumaço de lenços na mão e não tinha conhecimento de ter pegado.
— Eu não sou viciado.
— Então tome isto e jogue fora, – O humano segurou o papel rasgado. — Queime isto. Enrole a coisa para cima e use-o para cheirar sua próxima dose. Como eu disse,
não me importo.
Quando Assail aceitou o que foi oferecido, o médico virou como se já tivesse esquecido toda a interação.
— Assim, quanto a esse raio-X? Os Irmãos dirão quando você poderá ir. A saída não é uma coisa voluntária, como eu tenho certeza que você compreendeu.
Assail fez um show de esmagar o papel e lançou-o no lixo com os lenços.
— Sim, – disse secamente. — Estou bastante ciente do quão precisamente involuntário tudo isso é.
Vishous dirigiu o food-truck de volta para o complexo. Como um morcego saído do inferno.
A coisa não foi construída pra velocidade, e manobrar esse trambolho lembrou-lhe de um velho avião tentando decolar numa pista de terra... Tudo vibrava, a tal ponto
que você juraria que estava simplesmente além da inteira desintegração molecular. Mas manteve o pé no acelerador... O que era o que se fazia quando tinha, ohhhhhhh,
cerca de 25 minutos de verdadeira escuridão à esquerda e pelo menos trinta e sete milhas de estrada pra cobrir. E você realmente não queria abandonar evidências
factíveis mortais ao lado da estrada.
Ainda assim, caso acontecesse o pior, ele e Tohr, por que V tinha insistido na carona de volta com ele, poderiam encostar e desmaterializar direto até os degraus
da mansão em um nanossegundo: Butch tinha acabado de mandar uma mensagem para reportar que retornou ao centro de treinamento em segurança com Xcor. Assim, ninguém
tinha que se preocupar com Tohr agindo por fora em alguma ideia brilhante que envolvesse sangue derramado e um saco coletor de cadáveres com o nome do Bastardo nele.
Pelo menos não durante os próximos dez minutos, em todo o caso.
— Você salvou nossas vidas quando o Ômega apareceu.
Vishous olhou de relance sobre o assento da frente. Tohrment esteve em silêncio na posição de atirador desde que eles dois dirigiram pra fora do campus cerca de
vinte minutos após o Ômega ter se levantado e desaparecido.
— E eu não ia matar Xcor.
— Está certo disso mesmo?
Quando Tohr não disse mais nada, V pensou: Siiiiiimmmm, com certeza você não estava indo assassinar o filho da puta.
— Não é como se eu não entendesse, – V murmurou enquanto um mergulho na estrada ajudou a empurrar a velocidade do food-truck ao norte a setenta milhas por hora.
— Todos nós queremos eliminá-lo.
— Eu realizei a traqueotomia em Wrath. Enquanto ele estava morrendo no meu colo depois que o fodido do Xcor atirou nele.
— Bem, e depois havia o fato de que você tinha o Lassiter dirigindo naquele momento, – V disse secamente. — Isso teria me assustado tanto.
— Estou falando fodidamente sério, V.
— Eu sei.
— Onde é que vamos colocá-lo?
V sacudiu a cabeça. — Depende de quanto tempo o Bastardo passou desmaiado.
— Quero trabalhar nele, Vishous.
— Veremos, meu irmão. Veremos.
Ou, em outras palavras: abso-fodida-lutamente não. A agressão rolaria fora dos poros do irmão, mesmo que Tohr tentasse dar uma de homem “calmo e sob controle”, era
como a maior bandeira vermelha que alguém já tivesse obtido.
Enquanto eles ficavam em silêncio, V colocou a mão dentro de sua jaqueta de couro e tirou um cigarro enrolado à mão. Acendendo a coisa com um isqueiro Bic vermelho,
exalou um pouco de fumaça e abriu a janela para que não enchesse seu irmão de fumaça.
Desejo de matar a parte, Tohr tinha levantado uma boa maldita pergunta... Onde diabos colocariam o prisioneiro? Havia uma abundância de salas de interrogatório no
centro de treinamento... O problema era, eles eram mais da variedade do estilo “mesa e cadeira”, o tipo de coisa que foi usado, por exemplo, para falar com Mary,
John Matthew e Bella quando eles chegaram a primeira vez à instalação.
Nada luxuoso, mas certamente civilizado.
Nada que fosse equipado para a tortura.
Ainda.
Ainda bem que sua vida amorosa fornecia-lhe acesso imediato a todos os tipos de correias, fivelas, correntes e grampos. E sim, provavelmente iria precisar de alguns
dos seus equipamentos maiores também.
— Vou cuidar disso. abso-fodida-lutamente disse ele.
— O que? Xcor?
— Sim. Cuido disso.
Tohr amaldiçoou suavemente como se estivesse enciumado. Mas então o irmão deu de ombros.
— Isso é uma coisa boa. Ele é perigoso... É como ter um serial killer em casa. Vamos querer alguns bloqueios seriamente fortes.
Trancas reforçadas não dariam nem pra metade, pensou V. Nem mesmo perto.
CONTINUA
Capítulo SEIS
Sopa de frango e estrelinhas da Campbell.
Enquanto Mary se debruçava sobre o fogão na cozinha principal do Lugar Seguro, ela mexia a sopa sem parar com uma colher de inox, observando as estrelas de massas
quase inchadas girando com os quadrados de carne branca e fatias de cenoura. A panela era a menor que tinham na casa. O caldo era amarelo, e o cheiro doce a lembrou
das doenças simples que teve quando era criança... Constipações, gripes, streptococos.
Coisas mais fáceis do que o câncer.
Ou a Esclerose Múltipla que tinha levado sua mãe.
A tigela em que despejou as coisas era creme com anéis concêntricos amarelos na borda. Ela pegou uma nova colher da gaveta e deu a volta no balcão em direção à grande
mesa de madeira.
— Aqui, – Ela disse para Bitty. — E vou te dar alguns Saltines.
Como se essa tragédia fosse algo que você pudesse superar em vinte e quatro horas, se fosse apenas hidratado suficiente?
Bem, pelo menos uma refeição simples como esta não era suscetível de sair pela culatra. E tão logo Bitty tivesse comido, Mary iria encontrar outro membro do pessoal
para atender a menina e, em seguida, obter algum aconselhamento para si mesma.
Quando voltou da despensa com o pacote de biscoitos, Bitty estava experimentando a sopa e Mary sentou-se do outro lado da mesa para não ficar em cima da menina.
A embalagem plástica se recusou a cooperar e Mary a abriu com força, derramando Saltines e grãos de sal sobre a madeira.
— Droga.
Ela comeu um... E então percebeu que não teve qualquer alimento há algum tempo e estava com fome também...
— Meu tio virá me buscar.
Mary congelou no meio da mastigação.
— O que você disse?
— Meu tio, – Bitty não olhou pra cima, apenas continuou movendo a colher através da sopa fumegante. — Ele virá me buscar. Vai me levar pra casa.
Mary retomou a coisa toda da mastigação, mas sua boca era como um misturador de cimento tentando processar cascalho.
— Sério?
— Sim.
Com mãos cuidadosas, Mary recolheu as bolachas espalhadas, empilhando-as em grupos de quatro.
— Eu não sabia que você tinha um tio.
— Eu tenho.
— Onde ele mora?
— Não em Caldwell, – Bitty tomou outra colher e colocou-a na boca. — Mas ele sabe como chegar aqui. Todo mundo sabe onde fica Caldwell.
— Ele é o Irmão de sua mahmen?
— Sim.
Mary fechou os olhos. Annalye nunca mencionou nenhum parente. Não tinha divulgado isso na ficha ou nominado um parente mais próximo. E a mulher teve conhecimento
de que sua condição estava deteriorando, então se houvesse um Irmão em algum lugar, certamente teria contado sobre ele para alguém e isso teria ido para seu arquivo.
— Gostaria que eu tentasse entrar em contato com ele pra você? – Perguntou Mary. — Sabe onde ele mora?
— Não, – Bitty olhou para sua sopa. — Mas ele virá me buscar. Isso é o que a família faz. Eu li naquele livro.
Mary tinha uma vaga lembrança de um livro infantil sobre os diferentes tipos de família: biológica, adotiva, avós, bem como aqueles que resultavam a partir de doadores
de esperma, óvulos doadores, fertilização in vitro. O ponto era, não importa como eles surgiram ou com que se parecessem, em cada caso, todo mundo tinha uma unidade,
com um monte de amor em torno deles.
— Bitty.
— Sim?
O celular de Mary começou a vibrar no bolso do casaco que ela ainda não tinha tirado e ficou tentada a deixar quem quer que fosse ir para o correio de voz. Exceto
pelo que os Irmãos estavam fazendo esta noite com aquele ataque enorme?
Quando tirou seu celular pra fora e viu quem era, pensou, oh Deus.
— Butch? Olá?
Houve interferência na conexão. Vento? Vozes?
— Olá. – Ela disse mais alto.
— ... Indo pegar você.
— O quê? – Ela levantou-se da cadeira. — O que você está dizendo?
— Fritz, – O Irmão gritou. — Indo pegar você! Nós precisamos de você aqui fora!
Ela amaldiçoou.
— Quanto é ruim?
— Fora de controle.
— Merda. – Ela suspirou. — Eu vou sair rápido. Poupar tempo.
Houve uma série de estouros, alguns xingamentos e depois então distorção, como se Butch estivesse correndo.
— ... Escreva a localização. Rápido!
Quando a ligação foi cortada, ela olhou para a menina e tentou não soar tão em pânico quanto estava.
— Bitty, eu sinto muito. Tenho que ir.
Aqueles olhos castanhos claros levantaram para os dela.
— O que há de errado?
— Nada. Eu só... Vou trazer Rhym pra você. Ela vai sentar aqui e talvez vocês duas possam ter uma sobremesa?
— Estou bem. Estou indo para cima e embalar minhas coisas, então estou pronta para meu tio.
Mary sacudiu a cabeça.
— Bitty, antes de fazer isso, não seria melhor que você e eu devêssemos tentar encontrá-lo primeiro?
— Está tudo bem. Ele sabe sobre mim.
Estabilizando a respiração. Por muitos motivos.
— Vou passar mais tarde e ver como você está indo.
— Obrigada pela sopa.
Quando a menina voltou a comer, ela não pareceu se importar com quem estava em torno dela ou não, como de costume.
E foi com uma dor de cabeça martelando que Mary foi numa rápida busca da supervisora de admissão, que estava fazendo trabalho dobrado por que uma das outras assistentes
sociais estava fora em licença maternidade. Depois de explicar a Rhym tudo o que tinha acontecido, Mary decolou em uma corrida deixando a casa e saltou para o Volvo.
A antiga Escola Brownswick para meninas ficava a cerca de dez minutos de carro. Ela fez isso em sete, disparando pelas estradas, esquivando-se em torno dos desenvolvimentos
suburbanos, passando rapidamente pelos sinais amarelos e vermelhos. O SUV não foi construído para esse tipo de treinamento, o caixão quadrado, pesado, balançando
pra lá e pra cá, mas não se importava. E merda, parecia que ela nunca chegaria ao limite do campus abandonado.
Pegando seu telefone, desacelerou e olhou suas mensagens de texto.
Lendo em voz alta, ela falou:
— Contorne os portões principais... Dê a volta... Merda!
Algo disparou para a rua, a figura movendo-se como uma boneca de trapo e tropeçando diretamente na frente do seu carro. Pisando nos freios, ela atingiu o homem...
Não, era um lesser: o sangue que salpicou pelo pára-brisa era negro como tinta e a coisa decolou mais uma vez, embora um de seus pés parecesse quebrado.
Com o coração acelerado, engoliu em seco e socou o acelerador novamente, com medo de que houvesse outros por trás dele, mas ainda mais aterrorizada por tudo o que
estava acontecendo com Rhage. Reverificando seu celular, ela seguiu as direções rodeando os fundos da escola para a rua de mão única que a levou para dentro da bagunça
desgrenhada de uma paisagem.
Bem quando se perguntava onde diabos deveria ir a partir dali, a pergunta foi respondida.
Do outro lado do prado, a besta se destacava entre os prédios abandonados como algo saído de um filme do canal SyFy. Alto o suficiente para alcançar os telhados,
grande o suficiente para deixar anão mesmo um dormitório, como um tigre brincando com uma refeição, a coisa estava em modo de ataque total.
Arrancando o telhado de um galpão com seus dentes.
Ela não se incomodou em desligar o motor.
Mary jogou o Volvo no parque e saltou pra fora. No fundo de sua mente, estava ciente de que o desigual pop-pop-pop no fundo eram balas voando, mas não se preocuparia
com isso. Sobre o que ela estava em pânico?
Quem diabos estava naquele prédio.
Enquanto corria na direção do dragão, colocou dois dedos na boca e soprou com força.
O assobio era estridente, alto como um grito... E não fez nenhuma impressão afinal, enquanto as telhas da estrutura de tijolos eram cuspidas para um lado.
O rugido que se seguiu foi algo que ela conhecia muito bem. O animal estava pronto para sua feliz refeição, e toda aquela coisa de arranca-vigas era sua maneira
de entrar no prédio.
Mary tropeçou em alguma coisa, oh, Deus, era um lesser que estava sem um braço... E continuou, assoprando outro assobio. E uma terceira vez...
A besta congelou, seus flancos bombeando dentro e fora, tons de roxo piscando na escuridão como se a coisa fosse iluminada por dentro por uma fonte elétrica.
O quarto assobio fez a cabeça da besta virar ao redor.
Retardando sua corrida, Mary levou as mãos à boca.
— Venha aqui! Venha, garoto!
Como se o animal fosse apenas o maior cão do mundo.
O dragão soltou um pff e depois soprou pelas narinas, o som algo entre um folguedo abafado por uma almofada e um motor a jato decolando.
— Venha cá você! – Ela disse. — Deixe isso. Não é seu.
A besta voltou a olhar para o que eram agora apenas quatro paredes de tijolos e não muito mais, e um grunhido ondulado saiu dos lábios negros de dentes irregulares
que teria dado uma grande insegurança a um creme dental branco. Mas, como um pastor alemão chamado para sentar aos pés do treinador, a maldição de Rhage se afastou
de seu trabalho de desconstrução e pulou para ela.
Enquanto o dragão vinha através das ervas daninhas e espinheiros, seu grande peso sacudia o chão tão fortemente que Mary teve que estender os braços para se equilibrar.
Mas por incrível que pareça, a coisa estava sorrindo para ela, sua face horrível transformada por uma alegria que não teria acreditado se não tivesse visto isso
cada vez que estava perto do monstro.
Esticando as mãos para cima, ela cumprimentou aquela grande cabeça caída com palavras suaves de elogios, colocando a palma da mão em sua bochecha redonda, deixando-o
respirar o cheiro dela e ouvir sua voz. Em sua visão periférica, viu duas pessoas saírem do prédio destruído... Certificando-se que um deles tinha o corpo saudável
e correndo muito, e outro estava em cima de um ombro forte, obviamente ferido.
Ela não teve coragem de olhar diretamente para ver quem era. A melhor chance deles era sua ligação com a maldição... E era estranho. Tão feio como a coisa era, tão
terrível e mortal quanto poderia ser... Ela sentia um amor duradouro aquecer seu corpo. Seu Rhage estava lá, em algum lugar, preso sob as camadas de músculos e escamas
e percepção de terceiros, mas mais do que isso, ela adorava a besta também...
Os tiros vieram da direita e, por instinto, gritou e abaixou-se para cobrir a cabeça.
O dragão assumiu dali em diante, girando na direção dos atiradores, ao mesmo tempo conseguiu embrulhar sua cauda em torno de Mary e guardá-la contra seu flanco.
E então eles estavam em movimento. O passeio foi áspero, como um touro mecânico que sofre de surtos de energia, e ela se agarrou a um dos espinhos maiores por sua
querida vida.
Graças a Deus por aquela saliência óssea. Por que o que aconteceu em seguida envolveu um monte de Danças e Gritos.
Primeiro houve gritos. Terríveis, gritos de pesadelo que teve que tapar os ouvidos para bloquear; exceto que não se atreveu a largar com risco de ser jogada livre...
Pra cima e pra frente...
Um lesser, que estava vazando como uma peneira, saiu voando sobre o dorso da besta e sangue negro bateu em Mary como uma chuva de mau cheiro. A coisa aterrissou
num monte quebrado e o perseguidor que seguia um segundo lesser, que também estava sobre os ombros, bateu no primeiro como uma pedra.
Oh... Veja. Sem cabeça. Onde estava aquilo...
Algo que era vagamente redondo e tinha um rosto de um lado e uma cabeleira loira no outro lado através da grama crescida que tinha sido achatada sob as enormes patas
traseiras do dragão... Patas... Garras... Tanto faz.
A fera a mantinha junto para o passeio para o resto da diversão e jogos. Falando de uma refeição saudável. Em seu rastro, braços e pernas, mais cabeças – raramente
um torso, por que isso era provavelmente bom de comer – cobriam o chão. Felizmente nada parecia ser um Irmão ou um lutador, mas oh, Deus, o cheiro. Ela ia ter que
higienizar seu nariz por um mês depois disso.
Justo quando estava perdendo a noção do tempo, no exato momento em que não tinha certeza se podia aguentar por muito mais tempo, o ímpeto do animal diminuiu a velocidade
e parou. A sua cabeça grande balançou pra esquerda e pra direita. Seu corpo deu a volta. Mais uma busca.
A paisagem parecia vazia de qualquer coisa que se movesse, estático, prédios decadentes, árvores sem folhas e sombras escuras que permaneciam onde quer que olhasse.
Os Irmãos ainda tinham de estar no campus; de maneira nenhuma que iriam embora sem Rhage. Mas sem dúvida eles estavam assistindo o grande dragão por trás de uma
boa cobertura. E, assim com os lessers? O saldo do inimigo deve ter caído fora, sendo incapacitado ou ter sido comido.
O ataque maciço parecia ser mais...
Querido Deus, a carnificina deixada para trás. Como eles iam limpar isto? Deviam haver uns cem lessers no retorcido chão, mesmo se eles estivessem apenas em pedaços.
Mary acariciou a palma da mão na base grossa da cauda.
— Obrigado por me manter segura. Pode me descer agora.
A besta não estava tão confiante quanto ela estava e continuou a examinar a cena da batalha, os músculos dos seus ombros se contraindo, aquelas enormes patas traseiras
tensas e prontas para saltar. Nuvens de vapor do hálito quente saindo de suas narinas, queimando no ar frio da noite como parte do show de um mágico.
— Está tudo bem. – Disse ela, acariciando aquelas escamas.
Engraçado, teria pensado que as coisas seriam ásperas, mas eram suaves e flexíveis, um fino entrelaçamento de camadas que mudava com os movimentos do dragão e mostrava
todas as cores do arco-íris em cima de uma base roxa.
— Realmente está tudo bem.
Depois de um momento, a cauda da besta desenrolou e ela desceu para o chão.
Puxando seu casaco e suas roupas de volta no lugar, ela olhou ao redor.
Em seguida, colocou as mãos nos quadris e olhou para cima.
— Ok, garotão, você fez um ótimo trabalho. Obrigada... Estou orgulhosa de você. – Quando a coisa orgulhosa abaixou a cabeça, ela acariciou o focinho. — É hora de
ir, apesar de tudo. Você pode deixar o Rhage voltar?
Aquela grande cabeça foi lançada no ar, o sangue negro dos lessers que tinha consumido piscando como um revestimento oleoso abaixo da garganta e no peito. Estalando
as mandíbulas duas vezes, os dentes e presas travando com um som como dois SUVs batendo um no outro, grelha a grelha. O rugido que veio a seguir foi de protesto.
— Está tudo bem, – Ela murmurou enquanto permanecia em pé. — Eu te amo.
A besta abaixou o focinho e assoprou para fora o ar úmido.
E então bem desse jeito, seu corpo entrou em colapso, um castelo de areia caído com uma onda, uma estatueta de cera aquecida dissolvida em uma poça. Em seu lugar,
Rhage apareceu de cara no chão, sua enorme tatuagem de volta enrolando-se à sua volta, suas pernas nuas dobradas como se seu estômago já o incomodasse.
— Rhage, – Ela disse quando se agachou ao lado dele. — Você está de volta, meu amor.
Quando não houve resposta, nem mesmo um gemido de “vou vomitar”, ela franziu a testa.
— Rhage...?
Quando colocou a mão no ombro dele, a imagem tatuada do dragão em sua pele ganhou vida, deslocando-se de modo que sua cabeça estava sob o toque dela.
— Rhage? – Ela repetiu.
Por que ele não estava se movendo? Normalmente ficaria desorientado e com dor, mas sempre se virava para ela, assim como a tatuagem da besta fez, buscando cegamente
sua voz, seu toque, sua conexão.
— Rhage.
Alcançando a parte superior do braço, colocou toda sua força para puxá-lo mais plano contra o chão.
— Oh Deus…!
Havia sangue vermelho no peito. No meio de todas as manchas negras que a besta tinha consumido, havia uma fonte de sangue vermelho muito real, muito terrível e de
grande expansão no centro de seu torso.
— Socorro! – Ela gritou para a paisagem. — Socorro!
Os Irmãos já estavam vindo de todas as direções, abandonando seus esconderijos, correndo através do campo de batalha que estava cheio de lessers mutilados. E à direita
em seus calcanhares, como um farol de um Deus benevolente, vinha a unidade móvel e cirúrgica de Manny – o trailer-ambulância se dirigia para eles com o bom pé pesado
do médico no acelerador.
Mary avistou Vishous na multidão por causa de sua experiência em resgate médico.
— Você precisa ajudá-lo!
Aquela mancha vermelha... Estava à direita no esterno do Rhage.
E seu hellren tinha um coração forte, mas não era impenetrável.
O que tinha acontecido?
Capítulo SETE
Vishous foi o primeiro a chegar no Rhage enquanto o irmão ressurgia da carne do dragão... e merda, foi de pré-besta má a pós-maldição pior. O cara não estava se
movendo, não estava respondendo nem à sua shellan. Sua coloração era cinzenta como uma lápide de granito e havia um monte de sangue vermelho.
O que era apenas a ponta do iceberg. A verdadeira questão era quanto devia ter dentro daquela cavidade torácica.
— Ajude-me! – Mary disse enquanto colocava as mãos sobre a ferida e empurrava para baixo como se estivesse tentando conter o vazamento. — Ajude-o, oh, Deus, V...
O bom era que a unidade cirúrgica pisou nos freios e Jane tinha vindo com Manny, tendo se transferido através de seu próprio veículo. Assim que os cirurgiões bateram
as portas da frente do trailer, ambos os médicos atingiram o chão correndo com mochilas pretas cheias de equipamentos médicos.
— Eles estão aqui – V disse. Não que o par pudesse fazer muita coisa.
— Será que ele foi baleado? Eu acho que ele foi baleado. Oh Deus...
— Eu sei, venha aqui. Deixe-os olharem...
Mary sacudiu a cabeça e lutou contra ser puxada para trás.
— Ele está morrendo...
— Dê-lhes algum espaço para trabalhar. Vamos.
Porra, isso era culpa dele. Se não tivesse confrontado... Mas que porra. A visão tinha sido o que tinha que ser, e era exatamente isso aqui e agora: Rhage de costas
no chão nu, seu sangue por toda parte, V segurando Mary enquanto ela puxava e chorava.
— Um único tiro. – V anunciou. — Provável hemorragia cardíaca com tamponamento e derrame pleural.
Deus, queria que pudesse cobrir os ouvidos de Mary quando falou, mas como se ela já não soubesse o que era!
Os médicos não desperdiçaram um segundo, verificando sinais vitais enquanto Ehlena saltava para os fundos do trailer trazendo a maca com ela.
Vishous captou o olhar de sua companheira enquanto Jane escutava os sons cardíacos de Rhage, e quando ela balançou a cabeça ele soube, sem quaisquer outras palavras,
que tudo o que tinha adivinhado era verdade.
Merda.
— O que eles estão fazendo? – Mary balbuciou contra ele. — O que eles vão fazer?
V abraçou a fêmea mais apertado enquanto ela continuava a murmurar em seu ombro, a cabeça virando em direção a seu companheiro.
— Eles estão indo ajudá-lo, certo? Estão indo consertá-lo... Certo?
Jane e Manny começaram a falar em linguagem médica, e quando Vishous pegou a essência das palavras, fechou os olhos brevemente. Quando bateu as pálpebras novamente,
Manny estava de um lado de Rhage, colocando um dreno de tórax para drenar os fluídos em torno dos pulmões e Jane estava realizando uma pericardiocentese com uma
agulha que parecia tão longa quanto seu braço.
O que era um movimento de vai-com-tudo.
Normalmente este procedimento era feito com a orientação de ultrassom, mas ela não tinha escolha a não ser ir cegamente através do quinto ou sexto espaço intercostal
ao lado do coração.
Se ela errasse? Entrasse fundo demais?
Mary lutou em seus braços.
— O que eles estão fazendo...
— Ele está parando. – Manny vociferou.
— Rhage!
Ehlena estava lá com as pás, mas o quanto era bom em caso de uma enorme hemorragia? Inferno, mesmo se o dreno do tórax e a agulha fizesse o trabalho, nenhum dos
dois corrigiria o trauma cardíaco. A única chance de verdadeira sobrevivência era colocar o Irmão em uma máquina de circulação sanguínea (bypass) então Jane poderia
trabalhar sua magia e reparar seja qual for a ruptura ou perfuração sem sangue e sem movimento.
Abruptamente, tudo ficou em câmera lenta quando Rhage abriu os olhos, respirou fundo... E virou o rosto para Mary.
Seus lábios brancos começaram a se mover.
Mary empurrou contra o abraço de V e ele a soltou, permitindo que fosse até ele. Pelo amor de Deus, esta poderia ser a última chance da fêmea se comunicar com seu
companheiro. Fazer as pazes com ele. Resolver seus acertos para encontrá-lo do outro lado.
Vishous franziu a testa quando a imagem de sua mãe abandonada, deitada naquele estrado, voltou para ele.
É melhor você cumprir a porra da sua promessa, ele pensou para os céus. É melhor assumir a responsabilidade e tomar conta dos dois. Seria fodidamente melhor você
fazer certo a respeito daquela promessa, ele pensou para os céus. Seria melhor você levantar o homem e cuidar dos dois.
Mary caiu de joelhos ao lado da cabeça de Rhage e colocou a orelha em sua boca. O fato de que a equipe médica recuou sem dúvida foi perdido para ela, mas Vishous
sabia o que isso significava, e não era nada bom.
Que o ritmo do coração que estava sendo monitorado tão atentamente não estava ficando mais estável. Que a pressão arterial não estava ficando mais forte. Que a hemorragia
não estava parando. E o tubo e a agulha não foram longe suficiente.
V olhou para Butch, e quando o policial olhou para o outro lado do drama, V pensou sobre como os três formaram um vínculo tão apertado. A trindade, eles eram chamados.
Grudados como carrapatos e chatos como a merda, nas palavras de Tohr.
V olhou em volta. Os outros Irmãos estavam em circulo fechado, formando uma barreira de proteção e preocupação em torno de Rhage e Mary. No entanto, nenhum dos combatentes
tinha suas armas à mostra e, de tempos em tempos, um tiro soava quando eles atiravam nos lessers cujos corpos iam mostrando muita animação.
Quando Mary começou a falar com suave desespero, Vishous amaldiçoou novamente quando ficou claro para ele que, mesmo embora o casal tivesse um final que resultava
em ficar juntos, o resto deles estava perdendo Rhage e Mary. Maldição, era impossível imaginar a mansão sem eles.
Merda era supor não afundar com isso.
Risque isso, pensou, enquanto lembrava-se de sua visão. Não queria que acabasse assim. V moveu os olhos para sua companheira, e quando Jane apenas balançou a cabeça,
seu sangue gelou.
Jesus Cristo, não.
De repente uma imagem de Rhage na mesa de pebolim do Pit veio à mente. O Irmão não estava jogando no momento; estava em pé ao lado, comendo com vontade algum tipo
de burrito do Taco Bell. Estava comendo com as duas mãos, na verdade, com um chimichanga na outra mão. Alternando mordidas, o FDP consumindo cerca de quatro mil
calorias, com o sorvete de chocolate com menta crocante que ele tinha conseguido de sua geladeira, e metade de um bolo de chocolate que ele pegou de sobremesa antes
de vir da casa principal.
Ei V, o Irmão disse em um momento. Você algum dia vai raspar essa barbicha feia em torno de sua boca grande? Ou vai continuar parecendo um dos rejeitados da Affiliction2
como um serviço público para o que não fazer com uma gilete?
Irritante pra caralho.
E ele não daria sua bola restante para ter qualquer parte disso novamente. Mesmo se apenas como adeus.
O tempo era demasiado finito: não importa quanto dele você teve com alguém que amava, quando o fim chegava, não era o suficiente.
— Eu te amo. – Mary disse com voz quebrada. — Eu te amo…
Enquanto ela acariciava o cabelo loiro de Rhage da testa, sua pele estava tão fria e estranhamente seca. Sua boca manchada de sangue estava se movendo, mas ele não
tinha ar suficiente em seus pulmões para falar e, oh Deus, eles estavam cinza... Seus lábios estavam ficando...
Mary olhou para Manny. Dra. Jane. Ehlena. Então encontrou os olhos dos Irmãos. John Matthew. Blay e Qhuinn.
Por último olhou para Vishous... E ficou horrorizada com a luz distante em seus olhos.
Eles tinham desistido. Todos eles. Ninguém estava correndo para empurrá-la pra longe do caminho para que pudessem entubar seu companheiro, ou dar choque em seu coração
para voltar ao ritmo, ou rachar sua caixa torácica aberta e fazer o que fosse preciso para conseguir o que quer que estivesse errado voltar a funcionar em ordem.
Rhage arqueou com um gemido e tossiu um pouco mais de sangue. E quando ele começou a engasgar, ela conheceu uma nova definição de terror.
— Eu vou te encontrar, – Disse a ele. — No outro lado. Rhage! Está me ouvindo? Vou te encontrar no outro lado!
O ofegar e barulho, a dor em seu rosto, a agonia do grupo ao seu redor... Tudo tornou-se tão cristalino que doía os olhos e ouvidos, manchando seu cérebro para sempre.
E estranhamente, pensou em Bitty e sua mãe e o que tinha acontecido na clínica.
Oh merda, se ela deixasse o planeta... O que ia acontecer com a garota? Quem iria cuidar tanto como ela cuidava da agora órfã?
— Rhage... – Mary puxou seus ombros. — Rhage! Não! Espere, fique aqui...
Mais tarde ela tentaria trazer à tona por que a conexão sináptica foi feita quando o fez. Ela saberia como ela tinha, possivelmente, pensado em tudo... Teria suores
frios sobre o que teria acontecido em seguida e o que não teria acontecido em seguida... Se aquele raio não tivesse saído do nada quando o fez.
Às vezes escapar de um acidente por milímetros era quase tão traumático quanto o impacto.
Mas tudo isso veio depois.
No momento do falecimento de seu amado, no mesmo instante em que sentiu que ele havia deixado seu corpo para fazer a viagem para o Fade... De repente, e sem motivo
que pudesse pensar, ela vociferou:
— Role-o de lado. Façam isso!
Começou a puxá-lo sozinha, mas não deu em nada, ele era muito pesado e ela não podia conseguir um bom aperto em seu tronco maciço.
Olhando para cima, acenou para os Irmãos.
— Ajudem-me! Porra, me ajudem!
V e Butch caíram ao lado dela e viraram Rhage para seu lado direito. Arqueando em volta de seu companheiro, Mary recuou para o outro lado. As cores brilhantes da
tatuagem do dragão estavam desaparecendo, como se o brilho da imagem fossem um termômetro da saúde de Rhage. Focando novamente, colocou a mãos sobre a forma da besta,
Deus, ela odiava como a resposta foi lenta.
— Vem comigo, – Ela disse com urgência. — Preciso que você venha comigo.
Isso era loucura, pensou enquanto passava lentamente as palmas das mãos em torno do torso de Rhage, mas alguma coisa a guiava, algum tipo de vontade que certamente
não sentiu como dela própria. Porém não ia discutir como a imagem da besta seguia seu toque... E era estranho: não foi até ela fazer o caminho nas costelas que percebeu
o que estava fazendo.
Louca, pensou novamente. Completamente louca.
Vamos lá, não era como se o dragão tivesse sido treinado em medicina de emergência e muito menos cirurgia cardíaca.
Mas ela não parou.
— Ajude-me, – Ela disse engasgada para a besta. — Oh, por favor... Vamos lá, ajude-o, salve-o... Salve a si mesmo salvando-o...
Simplesmente não podia deixar Rhage ir. Não importava nestes últimos momentos que havia uma saída cósmica para os dois, que por causa do que a Virgem Escriba tinha
dado a ela, eles não tinham que se preocupar com algum tipo de separação. Ela ia tentar salvá-lo.
Trabalhando com ela, os Irmãos viraram Rhage deitado de costas novamente, e as lágrimas de Mary caíram sobre o peito nu de seu companheiro enquanto ela transferia
as mãos sobre o ilusoriamente pequeno buraco de cerca de uma polegada à direita de seu esterno.
Deus, sentia como se a ferida fosse do tamanho de uma sepultura.
— Apenas cure-o... De alguma forma, por favor... Por favor...
A tatuagem permaneceu onde ela parou.
— Cure isso…
O tempo parecia rastejar, e com os olhos lacrimejantes olhou para o peito de Rhage esperando por um milagre. Enquanto os minutos passavam e ela transitava para um
plano emocional miserável que era mais tenso que pleno pânico, muito menor do que totalmente deprimida, e tão vasta que era duas vezes o tamanho da galáxia, pensou
novamente no que Rhage dissera sobre as horas que ele passou ao lado da cama dela naquele hospital humano: sabendo que ela ia morrer, incapaz de fazer nada, perdido
embora soubesse o lugar de onde o corpo físico dele estava.
Era como se a gravidade não tivesse controle sobre mim, ele disse, e ainda assim estava me esmagando ao mesmo tempo. E então você iria fechar os olhos e meu coração
iria parar. Tudo o que eu conseguia pensar era que, em algum momento no futuro, você ia ter essa aparência para sempre. E a única coisa que eu sabia com certeza
era que eu nunca seria o mesmo, e não de uma boa maneira... Por que eu sentiria sua falta mais do que jamais iria importar com qualquer outra coisa na minha vida.
Mas então a Virgem Escriba tinha mudado tudo isso.
No entanto, aqui estava Mary... Lutando para mantê-lo vivo.
E o porquê... Quando ela realmente focou na questão... Parecia errado, tudo errado, e ainda assim ela não iria parar.
No início, a chama de calor não foi registrada no meio de todas as suas emoções. Havia muito na frente de sua mente e a mudança de temperatura foi muito sutil. O
calor logo se tornou impossível de ignorar, no entanto.
Piscando os olhos, franziu a testa para baixo, para suas mãos.
Não se atreveu a afastar as palmas das mãos para ver o que estava acontecendo embaixo.
— Rhage? Rhage... Você está conosco?
O calor rapidamente se tornou tão intenso que irradiava pelos braços dela e aquecia o ar que respirava quando se inclinou sobre seu companheiro. E então sentiu um
tranco, como se a besta estivesse rolando por perto...
Sem qualquer aviso, Rhage abriu a boca, lançando uma inspiração gigante e empurrou seu torso do chão, jogando-a de bunda no chão. Enquanto as mãos dela voavam, a
tatuagem foi revelada e estava…
A imagem do dragão tinha perdido seus contornos, suas cores num redemoinho em conjunto e ainda permaneciam distintas, como uma daquelas antigas coisas spin-art que
ela tinha feito nas feiras quando era pequena.
Ela não podia mais ver a ferida da bala.
Houve um suspiro coletivo, seguido por alguns sérios “mas que porra é essa?” e em seguida uma série de aleluias que foram proferidas com um sotaque de Boston.
— Mary? – Rhage engasgou confuso.
— Rhage!
Só que antes que ela pudesse alcançá-lo, ele começou a tossir em grandes espasmos, dobrando a cabeça para frente, apertando sua barriga distendida, sua mandíbula
se estendendo.
— O que há de errado com ele? – Mary disse quando chegou para frente, mesmo que isso não fosse como se pudesse fazer qualquer coisa para ajudar. Inferno, os médicos
pareciam igualmente confusos, e eram eles que tinham o Dr. na frente de seus nomes.
Rhage tossiu a maldita bala pra fora.
Direto na mão dela.
Por último, um grande arquejo, algo veio voando de sua boca e ela pegou o pedaço pontiagudo de chumbo por reflexo... Quando Rhage abruptamente começou a respirar
profundamente, inalando facilmente como se não tivesse nada de errado com ele.
Girando a coisa sobre a palma, ela começou a rir.
Não pôde evitar.
Segurando a bala entre o polegar e o indicador, ela a ergueu para os Irmãos, os médicos e os guerreiros, por que Rhage ainda estava cego. E então montou nas pernas
estendidas de seu companheiro e tomou seu rosto entre as mãos.
— Mary...? – Ele disse.
— Estou bem aqui, – Ela alisou o cabelo dele para trás. — E você também.
Instantaneamente ele se acalmou ainda mais, um sorriso repuxando sua boca.
— Minha Mary?
— Sim... Estou bem aqui.
E então, querido Senhor, ela estava chorando tanto que se tornou tão cega quanto ele estava. Mas isso não importava.
De alguma forma, a besta tinha feito o trabalho e...
— Mary, eu...
— Eu sei, eu sei, – Ela o beijou. — Eu te amo.
— Eu também, mas vou vomitar.
E com isso, ele a tirou suavemente para fora da linha de fogo, virou-se para o lado e vomitou tudo sobre os shitkickers de Vishous.
Capítulo OITO
Era uma maneira e tanto de voltar dos mortos.
Enquanto Rhage jogava seus biscoitos por toda parte, seu cérebro era nada mais que ovos mexidos...
Okay, não era uma boa ideia pensar em ovos de qualquer forma.
Uma segunda rodada das evacuações abdominais tomaram seu corpo, contorcendo-o da cabeça aos pés, e enquanto ele deixava seu estômago falar, ouviu a voz seca de V
ao longe.
— Não é minha noite, – O Irmão resmungou. — Não é minha noite com os vômitos.
Huh? Rhage pensou antes de deixar pra lá. Tudo que realmente se importava, fora o fato de que ele agora podia respirar e falar de novo, era sua Mary. Esticando seu
braço pra fora, procurou contato com ela de novo... E ela pegou sua palma na mesma hora, entrelaçando com a dele, segurando, isso o acalmava e ao mesmo tempo lhe
dava energia.
No instante que a conexão foi feita, sua confusão começou a dissipar.
Não, isso não estava exatamente certo. Ele não tinha ideia de como conseguiu ir de estar parado na porta do Fade, encarando a escolha que estava atônito de estar
confrontando mesmo estando ciente de que estava morrendo... Para de alguma forma estar sendo jogado de volta no seu próprio corpo e escutando claro como o dia a
voz mais perfeita da sua Mary, sem a interferência estática do medo e dor.
Nenhum ponto desse mistério foi esclarecido... Mas simplesmente estava cagando pra isso. Contanto que sua Mary estivesse com ele? O resto era merda que ele...
— Machucado? – Ele falou de repente. — Alguém está machucado?
A Besta teria...
— Todos estão bem. – Ela disse a ele.
— Me desculpe por estar doente. – Deus, o visual pós-festa do blackout era horrível, mas aguentaria isso no lugar de uma soneca na terra em qualquer dia e duas vezes
no domingo, como os humanos diriam. — Eu sinto muito...
— Rhage, precisamos colocar você dentro do RV. E não, não vou deixar você. Jane vai só verificar seus sinais vitais e então nós vamos dar o fora daqui. Não é seguro.
Oh, certo. Eles estavam no campus, no campo de batalha, sem dúvida alvos fáceis.
Com uma explosão de memória, tudo voltou pra ele. A discussão com V... A corrida no campo...
A bala no seu coração.
Com sua mão livre bateu no peito, tateando para encontrar o furo, procurando sangue... E descobrindo que apesar de ter o torso molhado e pegajoso... Não havia nenhum
ferimento discernível.
Só uma parte estranha naquele centro que parecia incandescente com o calor de uma fogueira. E foi aí que a comichão começou. Iniciando com a área sobre seu coração,
mudou ao redor em um remendo sólido, traçando sobre suas costelas, fazendo cócegas debaixo do seu braço, movendo até o centro das suas costas.
Era a Besta voltando para sua posição. Mas por quê?
É, arquive isso no final de uma fila bem longa de hã — o quê?
— Mary, – Ele falou em sua cegueira. — Mary...?
— Está tudo bem, vamos só sair daqui juntos, e quando estivermos a salvo, vou explicar tudo... Ou ao menos contar o que sei.
Pela próxima hora, sua shellan cumpriu sua promessa... Mas quando que ela desapontou alguém? Ela ficou ao lado dele a cada centímetro do caminho, desde o momento
em que foi colocado na maca e ganhando um passeio atribulado na RV do Manny... Da evacuação difícil no gramado crescido do campus até o caminho macio das ruas pavimentadas
da avenida... Do pare-e-continue do sistema de segurança do Centro de Treinamento da Irmandade... Até finalmente a chegada no quarto de recuperação da clínica.
A viagem o exauriu... Mas também, passou a maior parte do tempo vomitando partes de lessers e engasgando no gosto nauseante do sangue negro deles. E era engraçado:
normalmente passava por essa parte puto da vida e pronto para o sofrimento acabar logo. Nessa noite? Estava tão grato de estar vivo que não se importava de ter a
pior indigestão/dor de barriga/infecção estomacal do mundo acontecendo.
Você vai morrer hoje à noite, porra!
Maldição, Vishous estava sempre certo. Exceto que Rhage tinha de alguma forma derrotado a previsão e voltado do Fade: por alguma razão, por algum milagre, estava
de volta... E não achava que era por que a Virgem Escriba tinha feito um favor pra ele. Ela já tinha feito um depósito digno de prêmio da loteria na sua conta existencial
quando salvou sua Mary e, além disso, pelos últimos dois anos, a Mãe da Raça esteve sem contato como aquele parente estranho que você agradece por se manter longe.
Então seu irmão estava errado? A resposta curta para isso é sim, considerando que Rhage estava nesse momento deitado na cama de hospital ao invés de alguma nuvem
no céu.
Mas por quê?
— Aqui, – Sua Mary disse. — Eu tenho o que você precisa.
Verdade em tantos níveis, pensou enquanto virou sua cabeça em direção ao som da voz dela. Quando uma série de bolhas fizeram cócegas no seu nariz, ele estremeceu
de alívio.
Plop-plop, fizz-fizz, porra, sim.
— Obrigado, – Ele balbuciou, por que estava com medo que se tentasse enunciar demais as palavras ia começar a vomitar de novo.
Ele bebeu tudo que estava no copo e deitou de novo contra os travesseiros... E então o som de Mary colocando o copo vazio de volta e a sensação do peso dela sobre
o colchão o fez lacrimejar por alguma razão estúpida.
— Eu vi o Fade, – Falou quietamente.
— Você viu? – Ela pareceu estremecer, a cama transmitiu o sutil tremor de onde estava sentada. —É realmente assustador escutar isso. Como foi?
Ele franziu a testa.
— Branco. Tudo era branco, mas não tinha nenhuma fonte de luz. Foi esquisito.
— Eu teria encontrado você, você sabe. – Ela respirou fundo. — Se você não tivesse voltado, eu teria... Não sei como, mas teria encontrado você.
O ar que ele soltou durou o tempo de uma vida pra ele.
— Deus, eu precisava escutar isso.
— Você pensou o contrário?
— Não. Bem, exceto por me perguntar se era possível. Você deve ter pensado a mesma coisa ou não teria se esforçado tanto para me salvar.
Houve um momento de silêncio.
— Sim, – Ela suspirou. — Eu queria salvar você.
— E estou contente que funcionou. – Mesmo, ele estava. Honestamente. — Eu, ah...
— Você sabe que amo muito você, Rhage.
— Por que isso soa como uma confissão? – Ele forçou uma risada. — Só estou brincando.
— Eu realmente odeio a morte.
Okay, alguma coisa estava acontecendo. E não era só a respeito dele. Ela soava estranhamente... Derrotada, o que não era o sentimento de uma fêmea que tinha arrastado
o traseiro triste do seu hellren de volta da porta da morte. Tipo. Literalmente.
Rhage tateou ao seu redor tentando achar as mãos dela, e quando a segurou, elas tremeram.
— O que mais aconteceu hoje à noite? E não diga “nada”. Eu posso sentir sua emoção.
Mas não podia sentir o cheiro. Tinha muito cheiro de lesser no seu nariz e no seu sistema digestivo. Você quer falar sobre a porra da doença do refluxo gastresofágico?
— Não é tão importante quanto você, – Ela se virou para beijá-lo na boca. — Nada é tão importante quanto você.
Onde você está? Ele se perguntou. Minha Mary... Para onde você foi?
— Deus, eu estou cansado, – Ele falou no silêncio entre eles.
— Quer que eu te deixe sozinho para que consiga dormir?
— Não. – Rhage apertou as mãos dela e sentiu como se estivesse tentando prendê-la à ele. —Nunca.
Na quietude do quarto do hospital, Mary se pegou estudando o rosto de Rhage como se estivesse tentando tornar a memorizar os traços que conhecia tão bem e que estavam
marcados no seu cérebro. Mas então, ela não estava realmente se prendendo à toda aquela beleza ímpia. Estava procurando por alguma coragem dentro de si mesma. Ou
algo assim.
Você pensaria, levando em consideração a profissão dela, que seria melhor em momentos como aquele.
Conte a ele, pensou. Fale sobre Bitty e sua mãe, e o fato de ter feito merda no seu emprego e estar se sentindo como uma fracassada.
O problema era, toda aquela confissão tagarela orientada parecia tão egoísta considerando que ele tinha morrido uma hora atrás: era como encontrar alguém que teve
um acidente de carro feio e querer explicar para essa pessoa como sua noite foi ruim também, por que você conseguiu uma multa por excesso de velocidade e um pneu
furado.
— Eu teria absolutamente ido e encontrado você de alguma forma, – Enquanto repetia as palavras que já tinha dito, sabia que ele tinha acertado o prego na cabeça...
Por que sentia como se tivesse algo a confessar. — Mesmo, eu teria.
Ótimo, agora ela estava com náuseas.
Exceto, Deus, como podia dizer pra ele que lutou tanto para salvá-lo não por causa deles e sua relação, ou até mesmo pelos seus Irmãos e a tragédia que a perda dele
teria sido para todos, mas por causa de outra pessoa inteiramente diferente? Mesmo que esse alguém e todos os problemas dela fosse uma causa a se discutir? Mesmo
que essa terceira parte fosse uma criança recém órfã no mundo?
Só que parecia como uma traição aos dois e suas vidas juntos. Quando você encontra amor verdadeiro, quando recebe esse presente, você não toma decisões de vida ou
morte baseadas em problemas ou situações de ninguém mais. A menos que fosse seu filho, claro... E os céus sabiam que ela e Rhage nunca, jamais teriam qualquer criança.
Okay, ai. Aquilo doeu.
— O que dói? – Rhage perguntou.
— Desculpe. Nada. Sinto muito, só foi uma longa noite.
— Entendo o sentimento, – Ele soltou a mão dela e esticou seus enormes e largos braços, os músculos marcando sua pele e formando sombras afiadas. — Venha deitar.
Me deixe me sentir como um macho ao invés de um pedaço de carne, quero abraçar você.
— Você não precisa pedir duas vezes.
Esticando ao lado dele na cama, colocou sua cabeça no peito dele, bem sobre o esterno dele, e respirou fundo. Enquanto a sombria especiaria do aroma de vinculação
dele florescia no ar, ela fechou seus olhos e tentou dissipar toda a discriminação caótica que estava tropeçando e caindo dentro do seu crânio, palhaços de circo
que ela não achava graça nenhuma.
Felizmente, o contato com a pele de Rhage, seu calor do corpo, sua vital presença era como Valium sem os efeitos colaterais. Tensão lentamente deixou seu corpo e
aqueles bastardos com os narizes de borracha, as perucas baratas e os sapatos idiotas sumiram no plano de fundo.
Sem dúvida eles voltariam. Mas não podia se preocupar com isso agora.
— Está batendo tão forte de novo, – Ela murmurou. — Eu amo o som do seu coração.
Amava também a subida e descida estável do seu poderoso peitoral.
E quem diria... A visão de toda aquela pele macia e sem pelo sobre aqueles pesados músculos não era ruim também.
— Você é tão grande. – Falou enquanto esticava o braço e nem conseguiu circular o torso dele.
A risada que reverberou através dele foi um pouco forçada. Mas ele deu continuidade a ela.
— É? Me conte como eu sou grande.
— Você é muito, muito grande.
— Só meu peitoral? Ou está pensando em... Outros lugares?
Ela conhecia aquele tom muito bem... Estava inteiramente ciente de onde seu companheiro tinha ido com a cabeça – e certa o bastante, quando olhou ainda mais pra
baixo do seu corpo coberto pelo lençol, cada centímetro dele estava claramente ainda funcional, indiferente da experiência de quase morte.
Particularmente um certo trinta centímetros. Mais ou menos.
Seus olhos foram em direção à porta e desejou que a coisa estivesse trancada. Havia tantas pessoas da equipe médica por ali – okay, só três. Mas quando você estava
querendo um pouco de privacidade, eram três a mais do que se queria.
Quando Rhage girou os quadris, aquele enrijecimento debaixo dos lençóis acertou um ponto dela que o fez morder o lábio inferior, e Mary sentiu seu corpo inteiro
responder com uma onda de calor. Deus, odiava a estranha distância que os tinha separado, aquela sutil desconexão que sentia a um tempo agora: de alguma forma, mesmo
que o amor deles não tivesse diminuído, eles pareciam ter perdido o toque um com o outro... Apesar do fato deles dizerem os seus Eu Amo Você todas as vezes certas
e dormirem na mesma cama, e não se imaginarem com mais ninguém.
Mas pensando bem, quando foi a última vez que tiraram a noite de folga, qualquer um dos dois?
Rhage esteve ocupado com a guerra e os ataques contra Wrath e seu trono – e desde que Bitty e sua mãe chegaram ao Lugar Seguro, Mary teve uma preocupação profissional
que não a deixou descansar. Diabos, a preocupação por Bitty e Annalye esteve com ela até mesmo quando estava dormindo.
Em fato, sonhava com a garotinha quase todos os dias ultimamente.
Tempo demais, Mary pensou. Faz tempo demais desde que ela e Rhage focaram neles mesmos de maneira apropriada.
Então, sim, mesmo que fosse um Band-Aid que sem dúvida nenhuma seria temporário, e apesar do lugar público em que eles estavam, e sim, sem nenhuma consideração pelo
fato de que Rhage estava morto mais cedo... Mary colocou sua mão debaixo dos lençóis e desceu sua palma lentamente pelo estômago definido do seu companheiro.
Rhage chiou e gemeu, sua pélvis girando de novo, seus braços esticando para que pudesse segurar nas barras da cabeceira da cama.
— Mary... Eu quero você...
— O prazer é meu.
A excitação dele era grossa e longa, e enquanto a circulava, a sensação aveludada dele e os sons que ele fazia no fundo da garganta e o modo que o aroma de vinculação
ascendia ainda mais era exatamente o tipo de proximidade que eles precisavam. Isso era só sobre eles; nada mais era bem-vindo – o emprego dela, o dele, as preocupações
nem o estresse dele. A esse respeito, sexo era como o melhor limpador do mundo, levando embora a poeira e as coisas cotidianas da Vida Normal que tinham entorpecido
a conexão deles, deixando o amor que tinham um pelo outro fresco e espumante como nunca.
— Monte em mim, – Rhage exigiu. — Fique nua e suba em mim.
Mary olhou pro equipamento medico que estava ao redor da cama dele e quis falar um palavrão. Muitos bipes na tela.
— E quanto às maquinas? As coisas estão ficando muito excitantes.
— Beeeeem, é por que eu estou começando realmente a ficar excitado.
— Se eles aumentarem muito...
Bem ao sinal, o monitor cardíaco disparou o alarme estridente. E assim que Mary arrancou sua mão de debaixo, Ehlena entrou correndo no quarto.
— Está tudo bem, – Rhage disse para a enfermeira com uma risada. — Estou bem. Confie em mim.
— Só vou checar as coisas... – Então Ehlena parou. E sorriu. — Oh.
— É, oh. – Rhage tinha aquela colossal cara de pau de se recostar como um leão que estava prestes a ser alimentado. Ele até piscou na direção geral de Mary. — Então
você acha que talvez pode me desconectar só um pouquinho?
Ehlena riu e sacudiu a cabeça enquanto arrumava a máquina.
— Sem chance. Não até você ter mais tempo estabilizado satisfatoriamente.
Rhage se inclinou até Mary e sussurrou.
— Eu quero você de volta satisfatoriamente. É isso o que eu preciso.
A enfermeira foi em direção à porta.
— Estou logo ali na sala de cirurgia se precisarem de mim. Estamos prestes a operar.
Rhage franziu a testa.
— Operar quem?
—Houve alguns feridos. Nada sério, não se preocupe. Comportem-se vocês dois, ok?
— Obrigada Ehlena, – Mary deu tchau para a outra fêmea. — Você é a melhor.
Quando a porta fechou, Rhage baixou o tom da voz.
— Me desconecte.
— O quê?
— Ou você faz ou eu faço, mas preciso de você, agora.
Quando Mary não se moveu, Rhage começou a tatear cegamente procurando as máquinas, batendo em alguns computadores na mesa que parecia custar mais do que uma casa.
— Rhage! – Mary começou a rir enquanto segurava as mãos dele. — Qual é...
E então ele a ergueu e colocou sobre os quadris dele, ajustando-a no topo da sua ereção. E sim, assim que o peso dela pareceu ser registrado, aquele bip-bip-bip
começou de novo.
— Você pode me conectar de volta assim que eu acabar, – Informou a ela. — E mesmo sendo um sacrifício, se quiser só me masturbar, concordo em esperar por você mais
tarde. Mas cheguei perto da morte hoje uma vez já, não faça seu hellren morrer de desejo.
Mary teve que sorrir pra ele.
— Você me mata.
—E você podia me tocar? Por favor?
Ela sacudiu a cabeça apesar do fato de que ele não podia vê-la.
— Você simplesmente não aceita não como resposta, não é?
— Quando se refere à você? – Rhage ficou sério, seus olhos azuis cor das Bahamas a encarando cegamente, sua linda face sombria. — Você é tanto minha força quanto
minha fraqueza, minha Mary. Então o que me diz? Quer completar minha noite? E devo te lembrar... Eu morri nos seus braços mais cedo.
Mary soltou uma gargalhada e enquanto caiu pra frente sobre ele, colocou sua cabeça contra o pescoço dele.
— Eu amo tanto você.
— Ahhhhhh, isso é o que eu gosto de ouvir, – Mãos grandes acariciaram as costas dela. — Então o que vai ser, minha Mary?
Capítulo NOVE
Assistir das sombras não era o curso normal para Xcor, filho de ninguém.
Como um guerreiro sem lei e deformado, de fato líder de um time de sociopatas renegados, estava mais acostumado à ação. Preferivelmente com sua foice. Ou faca. Arma.
Seus punhos. Presas.
Ele pode não ser descendente do Bloodletter, como uma vez acreditou, mas de fato foi criado pelo mais cruel guerreiro – e as brutas lições que recebeu no acampamento
de guerra por aquela mão de luvas com espinhos foram bem aprendidas.
Ataque antes de ser atacado era sua primeira e mais importante de todas as regras. E tinha se mantido como seu primário princípio de operação.
Havia vezes, no entanto, quando uma certa neutralidade de ação era requerida, muito mais como um instinto discutindo o contrário, e enquanto se resguardava atrás
de uma carcaça queimada de um carro na pior parte dos becos de Caldwell, ele reinava sobre si. À frente, parado ao lado de uma poça mal iluminada por lâmpadas de
postes de trinta anos de idade, três lessers estavam trocando itens; um par de mochilas sendo entregues por uma única bolsa de pano.
Pelo que havia observado ultimamente nas ruas, estava confiante de que uma carregava dinheiro, e a outra marcada de preto estava carregada de pó e uma variedade
de injetáveis.
Inspirando, discerniu os cheiros e os catalogou. O trio ainda não tinha desbotado para o branco, seus cabelos escuros e castanhos significavam que o recrutamento
deles era recente na Sociedade Lesser – e de fato, aquilo era tudo que se encontrava no Mundo Novo. Desde que ele e seu bando de bastardos fizeram a viagem através
do oceano do País Antigo, o único inimigo que eles encontraram eram esses recém-introduzidos, na maioria de variedade inferior.
Era lamentável. Mas onde faltava qualidade tinha uma abundância em quantidade.
E os caçadores encontraram um novo empreendimento nos negócios, não é mesmo? Esse trio em particular, entretanto, não iria muito longe em suas venturas de tráfico.
Assim que eles terminassem com a pequena troca de mãos, ele ia matá-los...
Três toques diferentes de celulares tocaram, todos abafados, todos registrados somente por causa da audição afiada de Xcor. As coisas se moveram rápido dali em diante.
Após cada um deles checar o que só podia ser uma mensagem de texto, eles discutiram por um mero momento; então se enfiaram em um veículo quadrado, o brilho prata
do exterior o qual estava cheio de fotos de tacos e pizza.
Como um analfabeto, ele não conseguia ler o que estava escrito.
Como um guerreiro, ele nunca deixaria que isso o fizesse deixar seu alvo fugir.
Quando o veículo passou por ele, Xcor fechou os olhos e desmaterializou para o topo do carro, encontrando um lugar onde conseguiu se acomodar graças à área mais
baixa atrás de um tipo de saída de ar. Não tinha nenhuma intenção de chamar reforços. Não importa aonde os lessers iriam ou quem encontrariam, se ele fosse dominado,
podia ir embora sem ninguém saber de sua presença.
Palavras mais verdadeiras nunca foram faladas, como ocorreu.
O fato de que o motorista prosseguiu na direção do Rio Hudson não foi uma surpresa. Dado o lugar onde eles estavam vendendo, podia-se facilmente pensar que havia
algum conflito, armado ou não, que precisava de reforços na área das pontes – ou talvez fosse algo com a Irmandade. Mas afinal, aquela rançosa selva de concreto
não era o destino deles. Uma rampa logo foi transposta e a avenida foi seguida com velocidade crescente, tanto que precisou se segurar protegendo seu corpo contra
o vento, enroscando seu braço ao redor da base da barra e segurando forte.
A viagem foi dura, mas não foi por causa do terreno não nivelado, foi mais pelo vento frio e a velocidade.
Não muito depois, no entanto, outra saída foi tomada e a velocidade diminuiu tanto que pôde erguer sua cabeça e identificar a seção suburbana que era o norte do
centro da cidade. Aquela área populosa não durou. Logo uma área mais rural se apresentou.
Não, era um parque ou algo assim.
Não... Era outra coisa.
Quando por fim uma esquerda foi tomada entrando em um tipo de propriedade, não podia dizer onde estava. Era um lote vazio, grama crescida... Ou melhor, era um prédio
abandonado. Uma escola? Sim, ele pensou. Mas o lugar não era mais para humanos.
O cheiro de lessers estava no ar a um nível tão penetrante que seu corpo respondeu às camadas de fedor, adrenalina bombando, os instintos aguçados e prontos para
lutar.
O primeiro dos caçadores mutilados se apresentou em uma dispersão através do gramado crescido, e enquanto o veículo continuou em frente, mais e mais apareceram.
Fechando os olhos, ele se acalmou e desmaterializou até o terraço de um prédio de cinco andares à frente de onde a caminhonete eventualmente parou. Pisando cuidadosamente
sobre os galhos caídos e montes de folhas flutuando nas frias poças de água, Xcor foi até a beirada. A verdadeira escala do que foi um ataque massivo à Sociedade
Lesser era evidente pelos acres de carnificina no centro do campus: uma grande faixa de grama e árvores pisoteadas em camadas com partes de corpos quase mortos,
semi-vivos, de caçadores, e uma onda de sangue negro e oleoso do Ômega.
Era como a própria representação do Dhund.
— A Irmandade. – Ele falou para o vento.
Essa era a única explicação. E enquanto considerava qual tinha sido a estratégia do ataque deles, sentiu inveja que ganharam o presente dessa batalha. Como queria
que tivesse sido ele e seus soldados...
Xcor se virou.
Algo estava se movendo no terraço atrás dele. Falando. Xingando.
Na escuridão e com extremo silêncio, retirou sua lâmina da bainha e se abaixou, apoiando nas coxas. Seguindo em frente no vento frio, seguiu os sons que estavam
na direção do vento e testou o ar. Era humano.
— ... filmagem! Não! Estou dizendo, é uma merda!
Xcor veio por detrás do rato sem rabo, e permaneceu sem ser notado enquanto o humano falava no celular.
— Estou em cima do terraço, peguei a merda em vídeo! Não, idiota, TJ e o Soz se mandaram, mas eu subi aqui... Era um dragão... O que? Não, Jo, o efeito do LSD passou
hoje de manhã... Não! Se é um flashback, por que acabei de postar no YouTube?
Xcor ergueu sua faca acima do ombro.
—Não! Estou falando sério, eu...
O humano calou a boca assim que Xcor o acertou na parte de trás da cabeça com o cabo da sua arma. E quando o corpo amoleceu e caiu para o lado, Xcor pegou o telefone
e colocou no seu ouvido.
A voz de uma mulher estava dizendo:
— Dougie? Dougie! O que aconteceu?
Xcor finalizou a conexão, colocou o telefone na sua jaqueta e se inclinou para pular do terraço. Os três lessers que ele havia acompanhado não foram longe com o
caminhão de comida. Eles pareciam embasbacados pelo que os cercava, incapazes de responder levando em conta a magnitude das perdas.
Melhor cuidar deles primeiro antes que eles caiam fora.
Pisando sobre o macho caído, pulou do prédio, desmaterializando enquanto caía, e tornou a se materializar no chão antes que sofresse o impacto da queda e acabasse
se matando.
O caçador o viu, e isso era exatamente o que queria.
Ia fazer a matança dele um pouco mais desafiadora.
Enquanto os três corriam de volta para a caminhonete, ele se materializou em cima do que estava na traseira, perfurando-o no peito e numa busca mandando-o de volta
para o Ômega em um milhão de flashes e um estouro! Próximo, ele se lançou para frente e agarrou o segundo pelos ombros, tirando o equilíbrio dele e cortando a garganta
antes de jogar de lado. O terceiro capturou no ar enquanto estava tentando se fechar dentro da caminhonete no banco do motorista.
— Não, camarada. – Rosnou enquanto sacudia a coisa e a derrubava. — Todos por um, um por todos.
O lesser caiu no chão, e antes que pudesse responder, Xcor o chutou na cara, quebrando a estrutura óssea, destruindo as feições, rendendo os olhos à nada mais que
poças de fluído.
Xcor olhou por cima do ombro. Seria improvável que a Irmandade deixasse uma bagunça daquelas para os humanos encontrarem. Mesmo que o Campus fosse abandonado, cedo
ou tarde, um Homo Sapiens qualquer da variedade jovem ia romper a unidade do terreno. Assim como aquele no terraço.
Algo devia ter acontecido ao curso da luta. Algum ferimento crítico talvez, que precisasse encurtar o tempo de limpeza...
Xcor nunca viu chegar. Nunca escutou nada.
Um momento, estava plenamente consciente de seus arredores.
No outro, alguém ou algo tinha feito com ele o mesmo que ele fez com o humano no terraço.
Nem teve tempo de um último pensamento, no tão decisivo que foi o golpe na sua cabeça.
Vishous abaixou seu braço devagar enquanto olhava de cima o enorme macho que tinha acabado de cair aos seus pés.
Então imediatamente pegou de volta sua arma, apontando-a com as duas mãos, girou ao redor de si mesmo.
— Onde vocês estão, garotos? – Disse baixinho. — Hein, filhos da puta? Onde estão?
Não havia chance de Xcor, cabeça do Bando de Bastardos, ter ido sozinho. Não tinha maneira nenhuma, porra.
V não tinha tanta sorte.
Exceto que nada lhe respondeu. Nenhum contra ataque. Ninguém correndo de um prédio ou de trás de uma árvore com uma arma atirando. Tudo que tinha lá eram partes
de lessers e torsos no chão, o vento gelado batendo na sua face, e muito silêncio.
O som do assobio à esquerda o avisou da posição de Butch. E então teve outro pela direita. Um terceiro acima.
V assoviou de volta e seus irmãos vieram em uma corrida sem pressa.
Ele manteve os olhos em Tohr, e assim que o guerreiro estava ao alcance, V apontou a arma direto em seu peito coberto de couro.
— Pare aí mesmo.
Tohr parou. Ergueu as palmas.
— Mas que inferno você está fazendo?
— Butch, vire-o. – V falou, indicando com a cabeça para o vampiro aos seus pés.
No instante em que Tohr viu quem era, sua mão abaixou e suas presas ficaram à mostra.
— Agora você entendeu. – V balbuciou. — Eu sei que você tem o direito de matá-lo, mas não pode. Estamos nos entendendo? Você não vai acabar com ele, certo?
Tohrment rosnou.
— Essa não é sua decisão para tomar, V. Vai se foder, esse fodido é meu...
— Eu vou atirar em você, porra. Estamos entendidos? Pare aí mesmo.
Aparentemente o Irmão não estava ciente de ter dado um passo à frente. Mas Butch e todo mundo entendeu na mesma hora – e o policial se aproximou de Tohr cautelosamente.
— A morte pode ser sua, – Butch disse. — Mas nós o levamos de volta com a gente primeiro. Falamos com o bastardo, pegamos a informação, então ele é seu, Tohr. Mais
ninguém vai fazer a finalização além de você.
Phury concordou com a cabeça.
— V está certo. Você o mata agora e nós perdemos o interrogatório. Seja lógico quanto a isso, Tohr.
Vishous olhou ao redor. Os quatro tinham retornado ao Campus com a ideia de apunhalar o máximo que podiam de volta para o Ômega e fazer a limpeza que conseguissem
– mas essa pequena descoberta mudou o objetivo principal.
— Butch, leve-o de volta no Hummer. Agora. – V sacudiu a cabeça em direção à Tohr. — E não, você não vai ir com ele como retaguarda.
— Você me entendeu errado. – Tohr disse sombriamente.
— Entendi? Está ciente de que tem uma adaga na mão? Não? – Enquanto seu irmão olhou pra baixo com alguma surpresa, V sacudiu a cabeça. — Não pense que sou quem está
com problemas pra pensar. Você fica com a gente, Tohr. O tira se encarrega disso.
— Estou ligando para Qhuinn e Blay, – Butch falou enquanto pegava o seu telefone. — Quero eles aqui comigo.
— E é por isso que eu amo você. – V balbuciou enquanto manteve os olhos em Tohr.
O Irmão não tinha abaixado a adaga ainda. E isso estava bem. Tão logo Xcor estivesse em seu caminho, V ia se certificar de que Tohr colocasse seu impulso assassino
em bom uso.
Um momento depois, Blay e Qhuinn se materializaram na cena, e ambos soltaram um palavrão quando viram a cara feia e com cicatriz que estava virada pra cima sem expressão
de um corpo desmaiado.
Butch fez um trabalho rápido algemando Xcor, e então ele e Qhuinn pegaram o bastardo pelos pés e pelas mãos, carregando-o como um saco de batatas em direção ao Hummer
à prova de balas completamente preto que estava estacionado atrás de umas das salas de aula. A máquina de cara feia era na verdade a segunda versão do SUV, o primeiro
foi roubado quando ele se descuidou na frente de uma farmácia no inverno passado.
V não moveu um músculo até que viu que a coisa tinha ido a caminho da propriedade pisando fundo no acelerador.
— Não é que eu não confio em você, – ele disse a Tohr. — Eu só não...
Vishous calou a boca. E ficou imóvel de novo.
— O que aconteceu? – Phury perguntou.
V não tinha ideia. E isso não era bom. A única coisa que tinha certeza era que o panorama tinha mudado abruptamente de uma forma sutil, mas inegável, uma onda carregando
e se estendendo sobre os corpos dos caçadores como se uma sombra tivesse sido jogada sobre o Campus.
— Merda, – Vishous chiou. — O Ômega está chegando!
Capítulo DEZ
A beleza estava nos ouvidos de quem vê.
Enquanto Rhage percorria com as mãos pra cima e pra baixo as coxas de Mary, ele podia estar cego, mas sabia exatamente o quanto sua shellan era linda quando ela
se sentou sobre seus quadris, equilibrou seu peso e colocou as palmas sobre seu peito.
— Então, como é que vai ser? – Ele perguntou enquanto mexia sua pélvis.
Com sua ereção acariciando o centro dela, mesmo através das cobertas e das calças que estava usando, a resposta dela foi rouca.
— Como eu posso algum dia, – Ela sussurrou — dizer não pra você?
Deus, essas palavras... E ainda mais do que isso, sua voz! Elas o fizeram pensar na primeira noite em que ele a conheceu. Foi aqui embaixo no Centro de Treinamento,
logo após a besta ter aparecido. Ele estava cego na ocasião, e andando pelo corredor à procura de um treino para distraí-lo de seu tédio e recuperação. Ela tinha
chegado às instalações com John Matthew e Bella, como intérprete para o menino que era mudo e precisava de alguém que soubesse linguagem de sinais para se comunicar.
No segundo em que falou com ele, sua voz o acorrentou de vez, como se cada sílaba que tinha pronunciado tivesse vindo com elos de aço. Ele soube naquele momento
que a teria. É claro que, na ocasião, não tinha planejado que ela seria o amor de sua vida. Mas sua vinculação pensou diferente e ele agradecia a Deus por isso.
Graças a Deus também que ela desejou tê-lo da mesma forma.
— Vem cá, minha Mary...
Ela se moveu para um lado.
— Mas estarei ligando os aparelhos novamente no instante em que terminar.
Rhage deu um sorriso tão largo que seus dentes da frente cintilaram.
— Por mim tudo bem, espere, o quê? Aonde você vai?
Mesmo com seus protestos, Mary não parou até desmontar por completo, e não apenas desligar a máquina.
— Precisamos fazer isso de forma parcialmente discreta, – O bip parou. — Estou falando sério sobre colocar isso de volta em você quando terminarmos.
Torcendo para o lado, ele estendeu a mão, em sua cegueira, agarrando sua cintura e puxando-a em sua direção.
— Venha aqui.
Todo pensamento sumiu quando sentiu a mão dela em cima das cobertas... Diretamente sobre seu pau.
O som que saiu dele fervilhando era em parte um Hmmmmmm e parte gemido. Seu toque, mesmo através das cobertas, foi o suficiente para disparar seu coração, ferver
seu sangue, superaquecer sua pele com um delicioso arrepio.
E deixá-lo a apenas um passo de um orgasmo.
O colchão da cama do hospital deslocou conforme ela se esticou ao lado dele, e a palma da sua mão se moveu sob o lençol, deslizando ohhhhhhh, tão pra baixo. Espalhando
suas pernas para lhe dar todo o acesso ao que ela queria, arqueou sua cabeça para trás e inclinou a coluna para o céu quando ela agarrou sua ereção. Gritou seu nome,
sentiu a besta surgindo também, o dragão se dirigindo à crista da onda de prazer junto com ele, enquanto ainda estava amarrado.
Como se tivesse aprendido boas maneiras.
— Minha Mary... – E então engasgou. — Oh sim.
Ela começou a acariciá-lo de forma macia e lenta, e foi estranho o modo como ela o afetava. O sexo o fazia se sentir tão poderoso, tão másculo, tão foda, que se
perguntou como sua carne conseguia conter o grande rugido da batida erótica... E ainda assim ela era o mestre de tudo dele, e a totalidade da sua reação também,
totalmente no controle, dominando-o de forma que o fazia totalmente fraco diante dela.
E diabos que isso era sexy.
— Você é tão bonito. — Ela disse numa voz rouca. — Oh, olhe para você, Rhage...
Ele adorou a ideia de que ela estava olhando para ele, vendo o que estava fazendo com ele, deleitando-se no controle que tinha sobre ele, literalmente. E se não
podia tocá-la, se tinha que ser um bom menino e manter suas mãos pra si mesmo, pelo menos ela poderia desfrutar do fato de trazê-lo de joelhos, sabendo que só ela
tinha a capacidade de fazer isso com ele.
Afinal, apesar de qualquer distância que tenha surgido entre eles ultimamente, nada tinha mudado para ele. Mary era a única mulher que queria, a única que via, sentia
seu cheiro e não podia esperar para estar com ela.
Isso foi bom para eles. Esta ligação sexual escaldante era importante para eles agora.
Especialmente agora que ela caiu em um ritmo bombeando seu pau, apertando a ponta. Mais rápido. Mais rápido ainda.
Até que ele estava ofegante, e a doce dor de antecipação atravessou seu corpo e sua cabeça girou.
Não estava mais cansado. Não.
— Mary, – Fez um grande esforço na cama arqueando, agarrando o colchão de um lado e a grade de proteção do outro. — Mary, espera...
— O que?
Quando ela parou, ele sacudiu a cabeça.
— Não, continue... Só quero que você faça algo pra mim.
— O que? – Ela disse enquanto corria a palma da mão pelo seu pau... E depois para baixo... E depois para cima...
Que porra ele tinha na cabeça... Ohhh, certo.
— Vem cá, vem mais perto, – Quando ela fez, ele sussurrou algo em seu ouvido.
O riso dela o fez sorrir também.
— Sério? – ela disse. — Isso é o que você quer?
— Sim. – arqueou seu corpo novamente, revirando os quadris para que a ereção fosse em direção ao seu aperto.
— Por favor? E vou implorar se você quiser... Adoro quando te imploro coisas.
Mary se deslocou mais para cima na cama do hospital e começou a trabalhar nele a sério novamente. Então inclinou perto da sua orelha...
... E com pronúncia perfeita disse:
— Inconstitucionalissimamente.
Deixando escapar uma maldição feito louco, Rhage gozou tão forte que viu estrelas, sua ereção latejando forte na mão dela, seu gozo fazendo as coisas muito, muito
bagunçadas debaixo daquelas cobertas. E o tempo todo, seu único pensamento era o quanto amava sua fêmea.
Como ele a amava demais.
Duas portas abaixo do orgasmo induzido por vocabulário do Rhage, Layla estava sentada em sua própria cama de hospital, uma bola gigante de fio vermelho em seu lado
direito, o cachecol mais comprido na história do mundo se esticando até o chão do outro lado. Entre os dois? Uma barriga que estava crescendo tão inchada dos bebês
gêmeos que ela carregava que se sentia como se alguém tivesse dobrado um colchão e amarrado a coisa com um cinto no seu torso.
Não que ela estivesse em posição de reclamar. Os dois eram saudáveis, e contanto que ela ficasse na cama, sabia que estava dando a eles a melhor chance de sobrevivência.
E certamente Qhuinn, o pai deles, e seu amado Blay, mimavam-na implacavelmente aqui embaixo, como se os dois preferissem ser aqueles a atravessar a permanência auto-imposta
para ela.
Eles eram machos tão maravilhosos.
Enquanto fazia outra virada no fim de outra fileira, sorriu quando se lembrou de Blay sugerindo que ela tricotasse alguma coisa, pois isso ajudou sua mãe Lírica
a conseguir atravessar seu próprio repouso na cama na gravidez dele. Isso provou ser um bom conselho – havia algo singularmente calmante no clic-clic das agulhas
e o fio macio entre seus dedos, e o progresso que podia medir de forma tangível. Porém, neste momento, teria que cortar a coisa em segmentos ou dar para uma girafa.
Afinal, assistir maratonas de Donas de Casa de verdade sem fazer alguma coisa, qualquer coisa produtiva, era positivamente insustentável. Não importa que Lassiter
dissesse o contrário.
Agora, Terapia de Casais com Dra. Jenn? Isso talvez fosse uma história diferente – embora, claro, ela não aprendeu coisas relevantes para sua própria relação. Por
que não tinha um macho para chamar de seu.
Não, ela tinha uma obsessão nada saudável que bateu de frente e queimou. O que era uma boa coisa – embora a perda do que nunca devia querer em primeiro lugar causou
dor inimaginável e injustificável.
Mas afinal, uma pessoa não se apaixonava pelo inimigo. E não só por que era uma Escolhida.
Era por que Xcor e seu Bando de Bastardos, declarou guerra para Wrath e a Irmandade.
Era por isso que...
— Pare com isso, – Ela murmurou enquanto fechava os olhos e parava as agulhas. — Só… Pare.
Realmente não pensou que pudesse aguentar mais um instante a culpa e o conhecimento de sua traição daqueles quem lhe eram mais queridos. Contudo, qual era o outro
curso? Sim, mentiram para ela e então foi coagida… Mas no fim, seu coração foi onde não devia ter ido.
E apesar de tudo, isso nunca foi devolvido a ela.
Quando ouviu outro som ali fora no corredor, deu uma olhada para sua porta e se forçou a se perder na distração. Houve um monte de atividade no centro de treinamento
hoje à noite – vozes, sons de passos, portas abrindo e fechando – e de alguma forma, isso tudo só a fez se sentir mais isolada em vez de menos. Mas aí, quando as
coisas ficavam quietas, havia menos sugestões para lembrá-la de tudo que estava perdendo.
Ainda assim, não estaria em qualquer outro lugar.
Colocando a mão em seu estômago arredondado, pensou que sim, a vida como ela conhecia ultimamente estava mais focada interiormente que exteriormente – e a qualquer
hora que ficasse inquieta, tudo que tinha que fazer era se lembrar de tudo que estava em jogo.
Ela pode nunca ter o amor que Qhuinn e Blay compartilhavam, mas pelo menos as crianças seriam dela e deles.
Isso teria que ser suficiente para sua vida, e seria. Não podia esperar para segurá-los, cuidar deles, vê-los crescer.
Assumindo que ela sobrevivesse ao parto. Assumindo que todos eles sobrevivessem.
Quando um alarme suave veio de seu telefone, ela saltou e apertou a tecla de silenciar o alarme.
— Já está na hora?
Sim, estava. Sua liberdade chegou. Trinta minutos para se esticar, caminhar e ir para um passeio.
Dentro dos confins do centro de treinamento, claro.
Empurrando o tricô em direção à base das agulhas, enfiou as pontas dentro do rolo, e esticou seus braços e pernas, esticou as pontas dos pés, flexionou seus dedos.
Então moveu seus pés pra fora da cama e colocou seu peso neles. As demandas da gravidez e toda sua inatividade forçada a levaram a uma certa fraqueza nos músculos,
uns que não curavam, não importa quanto se alimentasse de Qhuinn e Blay – então aprendeu a ser cautelosa sempre que se levantava.
Primeira parada foi o banheiro, algo que tinha permissão para usar prontamente, mas inevitavelmente adiava. Não havia necessidade de tomar banho, o que ela fez cerca
de doze horas atrás durante essa meia hora para estar de pé e passear.
Não, isto seria puramente para investigar.
O que estava acontecendo ali fora?
Enquanto encabeçava para a porta, alisou o cabelo, que parecia estar crescendo tão rápido quanto seu cachecol: as ondas loiras desciam passando dos seus quadris
agora, e supôs que devia cortá-lo em um certo ponto. Sua camisola de flanela era igualmente longa e larga, do tamanho de uma barraca florida, e seus chinelos faziam
um som de shhht-shhht-shhht acima do chão nu. Com suas costas já doloridas e um braço estendido para se estabilizar, sentiu como se fosse séculos mais velha do que
realmente era.
Empurrando a porta para sair, ela...
Imediatamente deu um passo atrás.
Tanto que sua bunda bateu no painel, fechando.
Do outro lado, dois machos estavam de pé, altos e orgulhosos, expressões idênticas de tensão marcando seus rostos.
E pelo idêntico, quis dizer exatamente isso.
Eles eram gêmeos.
Quando eles focaram nela, ambos se recolheram como se vissem um fantasma.
— Olhem pra onde olham, – Veio um grunhido desagradável.
Layla chicoteou sua cabeça em direção ao aviso.
— Zsadist?
O Irmão com o rosto com cicatrizes caminhou a passos largos para ela, colocando seu corpo, com todas suas armas, entre ela e os dois estranhos, embora nenhum dos
machos fizesse um movimento agressivo em direção a ela. Não surpreendentemente, foi um bloqueio muito bem sucedido. O tórax e os ombros do Zsadist eram tão largos
que ela não podia mais ver o par – e este era claramente o plano dele.
— Voltem lá pra dentro com ele, – Zsadist vociferou. — Antes que eu ponha vocês naquele quarto.
Não houve nenhum argumento, e abruptamente os cheiros estranhos dissiparam como se eles realmente desaparecessem do corredor.
— Eles não fizeram nada comigo, – Ela disse. — Realmente, acho que se eu fizesse Buu! eles poderiam muito bem sair correndo.
Z deu uma olhada por cima do ombro.
— Acho que você devia voltar ao seu quarto.
— Mas tenho permissão para esticar minhas pernas duas vezes por noite!
O Irmão suave, mas firmemente, tomou seu cotovelo e a escoltou de volta para sua cama.
— Não nesse instante. Vou dizer a você quando estiver okay. Nós temos algumas visitas inesperadas e não estamos correndo nenhum risco com você.
— Quem são eles?
— Ninguém com quem você precise se preocupar, e eles não vão ficar muito tempo, – Z a colocou de volta em posição. — Posso te trazer alguma comida?
Layla exalou.
— Não, obrigada.
— Algo para beber então?
— Estou bem. Mas obrigada.
Depois de se curvar profundamente o Irmão partiu, e meio que esperava ouvir os sons distantes da pistola dele varrendo aqueles dois soldados só por olhar para ela.
Mas era como as coisas funcionavam. Como uma fêmea grávida, era a coisa mais valiosa no planeta, não só para seu jovem pai, mas para cada único membro da Irmandade.
Era como viver com uma dúzia de irmãos mais velhos superprotetores e mandões.
Ou Irmãos, como era o caso.
E normalmente, poderia ter desafiado até Zsadist. Mas não reconheceu aqueles machos grandes, e Deus sabia que já entrou em bastantes problemas confraternizando com
lutadores que ela não conhecia – e eles tinham que ser soldados. Eram de constituição pesada e forte, e estavam usando coldres.
Embora vazios.
Então eles não eram inimigos, ela decidiu, ou não teriam mesmo permissão para estar no centro de treinamento. Mas eles não eram exatamente de confiança também.
Do nada, uma imagem do rosto duro do Xcor veio à sua mente – e a pontada de dor que a atravessou foi tão forte que os bebês mexeram em sua barriga como se sentissem
isto também.
— Pare com isto. – Ela sussurrou para si mesma.
Agarrando o controle remoto da TV, ela ligou a tela do outro lado do quarto. Certo. Ela ficaria aqui até que aqueles estranhos partissem. Então sairia e se sentaria
com o irmão do Qhuinn, Luchas, que estava em recuperação duas portas adiante e parecia esperar ansiosamente suas visitas regulares. Então talvez um bate-papo com
a Dra. Jane em sua escrivaninha, ou talvez Blay e Qhuinn voltassem de suas rondas até lá e eles caminhariam até as salas de aula.
Quem quer que sejam aqueles soldados, duvidava que os Irmãos os deixassem ficar mais tempo além do absolutamente necessário. Pelo menos pela reação do Zsadist.
E todas as armas das quais eles muito claramente foram despojados.
Capítulo ONZE
Sem tempo. Absolutamente nenhum maldito tempo.
Com uma erupção do mal permeando o ar, Vishous tirou sua luva forrada de chumbo e levantou sua mão incandescente. Fechando os olhos e se concentrando – por que sua
vida, e a vida de seus dois irmãos, de fato dependiam disso – ele liberou uma série de lufadas de impulso de si mesmo – exceto que o mhis se estendeu somente do
tamanho de um bolso sobre todo o campus panorâmico, uma pequena parte, não maior do que a distância de duas polegadas em frente ao seu rosto e duas polegadas atrás
dos corpos de Phury e Tohr.
Graças a Deus o Hummer está fora da propriedade.
— Ninguém se mexe, – V comandou quando uma barreira ondulante e irisdecente se formou em volta deles, parecido com bolhas de sabão de uma criança feita com detergente.
Ele não tinha nem ideia se isso iria funcionar, mas sabia que teria de acontecer – a atmosfera estava se tornando uma densa sombra de maldade. Inferno, mesmo com
o mhis no lugar, sua pele pinicava com um aviso para correeeeeeeeeeeeer!
E foi quando o Ômega em pessoa apareceu a cento e trinta metros à frente.
Falando sobre anticlímax. Na superfície, a figura de tinta transparente em suas roupas brancas alvejantes parecia intimidante como um peão de xadrez animado. Mas
isso fazendo uma avaliação visual. Internamente, cada célula que constituía seu corpo, cada neurônio que queimava em seu cérebro, todas as emoções que já teve ou
que teria começou a gritar como se estivesse sob um horrendo ataque mortal.
Atrás dele, um suave murmúrio se iniciou e V olhou de relance por cima do ombro. Phury tinha começado a rezar no Antigo Idioma.
— Shhh, – Vishous sussurrou.
Phury imediatamente engoliu a fala, mas seus lábios seguiram se movendo, continuando a oração. E sim, V pensou em sua mãe fazendo seu não-posso-nem-mesmo-estar-lá-em-acima
– e ficou tentado a dizer ao cara que ele estava perdendo seu tempo. Mas tanto faz. Não há razão para roubar a ilusão de seu irmão.
Depois, e se o mhis não funcionar? Eles três e o que eles oraram, ou o que não oraram, estavam indo para um ponto discutível diretamente fora do planeta.
O Ômega se virou lentamente avaliando sua “morte”, e V ficou tão tenso que correu o risco de cair pra frente como uma tábua. O olhar do mal não se demorou onde ele
e seus irmãos estavam parados, então sugeriu que o mhis estava funcionando – provavelmente pelo menos parcialmente, por que o irmão da Virgem Escriba estava muito
distraído pela devastação da sua Sociedade.
Merda, este é meu tio, V pensou sombriamente.
E então o Ômega passou oscilando, andando com seus próprios pés, sangue negro encharcando o gramado, do mesmo jeito que a mãe de V perambulava.
A chuva começou a cair do céu, as gotas frias batendo no cabelo e nariz de V, seus ombros, nas costas de suas mãos. Mesmo a coisa fazendo cócegas na sua pele, não
se moveu para afastar aquilo ou se abrigar – e francamente, sim, poderia ter feito sem se recordar exatamente de como sua ilusão de ótica estava inconsistente com
a realidade. Aquela chuva passou pela barreira?
Inferno, você poderia colocar um jornal sobre sua cúpula e ter uma proteção melhor contra a chuva.
Porra.
De tempos em tempos, Ômega parava para se curvar e pegar um braço, uma perna, uma cabeça. E jogava de volta onde quer que estivesse no gramado, como se estivesse
procurando por alguma coisa em específico. E então parou sem aviso.
Um gemido baixo soou fora do campus, o som entrando e se espalhando no vazio, morrendo nos edifícios sem ecoar.
E então Ômega estendeu suas palmas para a frente.
A porcaria de uma brisa bateu nas costas de V e jogou seus cabelos na cara e nos olhos, ondulando a frente da sua jaqueta também até o couro começar a agitar, e
teve que apertar a coisa contra seu corpo.
De repente, os restos do massacre, todos os pedaços mortos e manchados, liquidificou em uma sombra viscosa que colocou para dentro de si, tornando-se um maremoto
que quebrou dentro de seu mestre, sua casa, seu núcleo.
O Ômega absorveu tudo isso, reivindicando a parte de si que tinha dado aos seus induzidos durante a cerimônia de iniciação, chamando de volta à sua essência, reabsorvendo
tudo até que o campo de batalha estivesse limpo como estava antes do ataque ter sido travado, nada além de grama pisada e árvores derrubadas para mostrar o que a
Besta e a Irmandade fizeram.
Quando tudo estava acabado, Ômega parou no centro da praça da escola, olhando ao redor como se desse uma checada dupla no trabalho. E então, tão rápido quanto chegou,
a entidade desapareceu em si mesmo, um sutil flash foi só o que restou de sua presença – e até mesmo isso desapareceu um segundo depois.
— Esperamos, – V sibilou. — Vamos esperar.
Ele não estava dando por certo que o Ômega tinha realmente ido embora dali. O problema era que o amanhecer estava vindo... E sim, se o mhis não podia proteger os
três da chuva, também não iria proteger porcaria nenhuma da “sempre em frente” luz do sol.
Mas poderiam se permitir ficar mais um pouquinho. Só pro caso.
Melhor ser cauteloso do que descoberto. Depois, precisava de um momento para que seu testículo restante pudesse voltar para o seu lugar novamente.
Porra.
Capítulo DOZE
— Eu não acredito que isto seja necessário.
De volta ao centro de treinamento da Irmandade, Assail olhou de seu corpo para o humano de cabelos escuros que estava fechando o corte em sua panturrilha e tornozelo
com agulha e linha. Quando o homem não respondeu e nem moderou seus cuidados, Assail revirou os olhos.
— Eu disse...
— Sim, sim. – O cara enfiou a agulha entre a pele mais uma vez e puxou até que a linha preta fosse esticada. — Você deixou perfeitamente claro. A única coisa que
vou tornar a dizer é que a MRSA3 não dá a mínima se você é vampiro ou humano, e deixar uma ferida aberta de seis polegadas em sua perna é a definição da estupidez.
— Eu curo bastante rápido.
— Não tão rápido, amigo. E você pode parar de se contorcer? Eu me sinto como se estivesse trabalhando em um peixinho dourado na água.
Na verdade, ele não podia. Suas extremidades tinham ideias próprias no momento, e enquanto verificava o relógio de parede e calculava o pouco tempo que tinha antes
do amanhecer, o tremor tinha piorado...
A porta do quarto abriu e seus primos retornaram.
— Pensei que não quisessem assistir, – Assail murmurou. E de fato, Ehric, o da esquerda, foi cuidadoso em não olhar para o trabalho de reparação.
Embora o assassino proficiente que o homem era, seu estômago revolvia em náuseas nas questões clínicas, uma contradição que podia ser uma fonte de diversão, mas
não era no momento.
Na verdade, Assail não estava com disposição para qualquer tipo de leviandade. Não tinha consentido em ser trazido aqui para esta instalação de tratamento da Irmandade.
O que queria fazer era voltar para sua casa no Hudson e arranhar a coceira que estava rapidamente se tornando um rugido.
— Quando você terá terminado? – Perguntou ele.
— Vou radiografar seu ombro a seguir.
— Não há necessidade.
— De onde veio seu diploma médico?
Assail amaldiçoou e deitou-se horizontalmente sobre a maca. O foco acima dele, com suas luzes brilhantes e armação microscópica, era como algo saído de um filme
de ficção científica. E enquanto fechava os olhos, era impossível não se lembrar dele vindo aqui com sua Marisol logo depois que a livrou de Benloise... Deles dois
passando pelo extenso sistema de engatilhamentos direcionando ao subterrâneo e entrando nesta instalação estelar.
Porém tentou instruir sua mente para outro lugar. A destinação desse pensamento era simplesmente dolorosa demais para suportar.
— Vou ter de partir antes do amanhecer, – Revelou. — E quero nossas armas, telefones e outros artigos pessoais devolvidos a nós prontamente.
O médico não respondeu até ter aplicado seu último ponto e atado um nó um pouco apertado na base do tornozelo de Assail. — Importa-se de dizer a seus rapazes para
sair novamente por um minuto?
— Por quê?
Ehric falou. — Zsadist nos quer aqui. E não estou inclinado a discutir com o Irmão enquanto estou desarmado e desejoso de manter o suprimento de sangue da minha
cabeça.
O médico sentou-se em seu banco giratório e, pela primeira vez, Assail leu a costura no jaleco branco do humano: Dr. Manuel Manello, Cirurgião Chefe. Havia um adorno
e o nome de um sistema hospitalar abaixo da escrita cursiva preta.
— Os Irmãos o trouxeram pra cá de outras espécies para esta noite? – Perguntou Assail. — Como isso é possível?
O Dr. Manello abaixou o olhar para seu nome. — Jaleco velho. E velhos hábitos custam a morrer... Não eles.
Enquanto o humano encarava Assail no olho, Assail franziu o cenho.
— O que quer dizer?
— Você consente que eu fale abertamente na frente desses dois?
— Eles são meu sangue.
— Isso é um sim?
— Você humanos são tão estranhos.
— E você pode cortar esse tom superior, imbecil. Estou casado com uma de sua espécie, ok? E desculpe-me por pensar que você poderia não querer ser avaliado a respeito
do seu vício em drogas na frente da dupla dinâmica... Caso eles não sejam relacionados a você.
Assail abriu a boca. Fechou. Abriu novamente.
— Não sei do que está falando.
— Oh, sério? – O homem arrancou as luvas azuis brilhantes e colocou os cotovelos sobre os joelhos, inclinando-se. — Você está inquieto na minha mesa como se estivesse
revestido por colméias. Está suando frio, e não porque esteja com qualquer dor. Suas pupilas estão dilatadas. E tenho certeza que se eu te desse seu casaco de volta,
a primeira coisa que faria seria dar uma desculpa para ir ao banheiro e usar o resto da coca que estava no frasco, e que tirei do interior do bolso da frente. Como
estou indo? Lendo sua mente corretamente? Ou vai mentir como um filho da puta?
— Eu não tenho um problema com drogas.
— Uh-huh. Claro que não.
Enquanto o humano ficava de pé, Assail fez algumas análises ignorando a si mesmo... De maneira nenhuma iria olhar para seus primos: podia sentir seus olhares gêmeos
em cima dele bem mais que o bastante, muito mais que obrigado.
Pelo menos nenhum deles disse nada.
— Olha, não tenho nada a ver com isso, – O Dr. Manello foi até uma mesa de trabalho na qual um computador, algumas canetas e um bloco descansavam. Inclinando-se,
escreveu alguma coisa e rasgou a folha fixada da ponta, dobrando-a ao meio. — Aqui está meu número. Quando chegar ao fundo do poço, ligue pra mim e podemos te ajudar
na desintoxicação. Entretanto, esteja ciente de que o uso prolongado de cocaína leva a todos os tipos de coisas divertidas, como ataques de pânico, paranóia e até
desenvolver psicoses. Você já está na categoria da perda de peso, e como eu mencionei, está cheio de tiques da porra. Seu nariz também fica escorrendo o tempo todo,
então tenho certeza que seu septo está desviado.
Assail olhou para o cesto de lixo ao lado dele e perguntou como todos aqueles Kleenex tinham terminado ali. Certamente, não poderia ter sido... Huh. Ele tinha um
chumaço de lenços na mão e não tinha conhecimento de ter pegado.
— Eu não sou viciado.
— Então tome isto e jogue fora, – O humano segurou o papel rasgado. — Queime isto. Enrole a coisa para cima e use-o para cheirar sua próxima dose. Como eu disse,
não me importo.
Quando Assail aceitou o que foi oferecido, o médico virou como se já tivesse esquecido toda a interação.
— Assim, quanto a esse raio-X? Os Irmãos dirão quando você poderá ir. A saída não é uma coisa voluntária, como eu tenho certeza que você compreendeu.
Assail fez um show de esmagar o papel e lançou-o no lixo com os lenços.
— Sim, – disse secamente. — Estou bastante ciente do quão precisamente involuntário tudo isso é.
Vishous dirigiu o food-truck de volta para o complexo. Como um morcego saído do inferno.
A coisa não foi construída pra velocidade, e manobrar esse trambolho lembrou-lhe de um velho avião tentando decolar numa pista de terra... Tudo vibrava, a tal ponto
que você juraria que estava simplesmente além da inteira desintegração molecular. Mas manteve o pé no acelerador... O que era o que se fazia quando tinha, ohhhhhhh,
cerca de 25 minutos de verdadeira escuridão à esquerda e pelo menos trinta e sete milhas de estrada pra cobrir. E você realmente não queria abandonar evidências
factíveis mortais ao lado da estrada.
Ainda assim, caso acontecesse o pior, ele e Tohr, por que V tinha insistido na carona de volta com ele, poderiam encostar e desmaterializar direto até os degraus
da mansão em um nanossegundo: Butch tinha acabado de mandar uma mensagem para reportar que retornou ao centro de treinamento em segurança com Xcor. Assim, ninguém
tinha que se preocupar com Tohr agindo por fora em alguma ideia brilhante que envolvesse sangue derramado e um saco coletor de cadáveres com o nome do Bastardo nele.
Pelo menos não durante os próximos dez minutos, em todo o caso.
— Você salvou nossas vidas quando o Ômega apareceu.
Vishous olhou de relance sobre o assento da frente. Tohrment esteve em silêncio na posição de atirador desde que eles dois dirigiram pra fora do campus cerca de
vinte minutos após o Ômega ter se levantado e desaparecido.
— E eu não ia matar Xcor.
— Está certo disso mesmo?
Quando Tohr não disse mais nada, V pensou: Siiiiiimmmm, com certeza você não estava indo assassinar o filho da puta.
— Não é como se eu não entendesse, – V murmurou enquanto um mergulho na estrada ajudou a empurrar a velocidade do food-truck ao norte a setenta milhas por hora.
— Todos nós queremos eliminá-lo.
— Eu realizei a traqueotomia em Wrath. Enquanto ele estava morrendo no meu colo depois que o fodido do Xcor atirou nele.
— Bem, e depois havia o fato de que você tinha o Lassiter dirigindo naquele momento, – V disse secamente. — Isso teria me assustado tanto.
— Estou falando fodidamente sério, V.
— Eu sei.
— Onde é que vamos colocá-lo?
V sacudiu a cabeça. — Depende de quanto tempo o Bastardo passou desmaiado.
— Quero trabalhar nele, Vishous.
— Veremos, meu irmão. Veremos.
Ou, em outras palavras: abso-fodida-lutamente não. A agressão rolaria fora dos poros do irmão, mesmo que Tohr tentasse dar uma de homem “calmo e sob controle”, era
como a maior bandeira vermelha que alguém já tivesse obtido.
Enquanto eles ficavam em silêncio, V colocou a mão dentro de sua jaqueta de couro e tirou um cigarro enrolado à mão. Acendendo a coisa com um isqueiro Bic vermelho,
exalou um pouco de fumaça e abriu a janela para que não enchesse seu irmão de fumaça.
Desejo de matar a parte, Tohr tinha levantado uma boa maldita pergunta... Onde diabos colocariam o prisioneiro? Havia uma abundância de salas de interrogatório no
centro de treinamento... O problema era, eles eram mais da variedade do estilo “mesa e cadeira”, o tipo de coisa que foi usado, por exemplo, para falar com Mary,
John Matthew e Bella quando eles chegaram a primeira vez à instalação.
Nada luxuoso, mas certamente civilizado.
Nada que fosse equipado para a tortura.
Ainda.
Ainda bem que sua vida amorosa fornecia-lhe acesso imediato a todos os tipos de correias, fivelas, correntes e grampos. E sim, provavelmente iria precisar de alguns
dos seus equipamentos maiores também.
— Vou cuidar disso. abso-fodida-lutamente disse ele.
— O que? Xcor?
— Sim. Cuido disso.
Tohr amaldiçoou suavemente como se estivesse enciumado. Mas então o irmão deu de ombros.
— Isso é uma coisa boa. Ele é perigoso... É como ter um serial killer em casa. Vamos querer alguns bloqueios seriamente fortes.
Trancas reforçadas não dariam nem pra metade, pensou V. Nem mesmo perto.